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crianças e adolescentes e, por se identificar com os conflitos e angústias das personagens, esse
auditório adere ao discurso. Grande parte dele sofre por um amor não correspondido, está
insatisfeito com seu aspecto físico, deseja um amor eterno ou sente-se diferente dos outros.
As paixões são todos e quaisquer sentimentos que podem alterar os julgamentos e causar
mudança nas pessoas. A esse respeito, na introdução da Retórica das Paixões de Aristóteles,
Fonseca (2000) afirma que:
Quando se refere a caráter, deve-se entender a autoridade do orador, a qual depende de
sua prudência, de sua virtude e de sua benevolência. As paixões não são entendidas aqui
como virtudes ou vícios permanentes, mas estão relacionadas com situações transitórias
provocadas pelo orador. É preciso, porém, considerar os hábitos ou tendências
preponderantes, as pessoas com maior ou menor inclinação para cada uma dessas
paixões e ainda os motivos que a provocam. (FONSECA, 2000, p. XV)
Se ethos e pathos acordam sentimentos e emoções, o logos constitui-se no raciocínio
lógico, e, portanto, na razão. A paixão é o lugar do Outro, foge ao logos, centrado no caráter
apodítico, proveniente da identidade redutora do sujeito. Segundo Meyer (2000), a retórica
constitui-se num ajuste da distância entre os indivíduos, e as paixões revelam, portanto, a
intensidade desta distância. Pela paixão, temos a fusão da consciência do outro com a que temos
de nós mesmos, e ao mesmo tempo, evidencia-se uma diferença entre os indivíduos que
determina a identidade de cada um. Aceitar o outro é aceitar a nós mesmos porque o outro,
independentemente da nossa vontade, está em nós, age sobre nós e vive conosco. Admitir as
diferenças, preocupar-se com o que o sensível nos permite ver nos outros é fundamental para se
alcançar uma identidade comum. No ato retórico estamos sempre prontos a debater sobre uma
identidade com o objetivo de aboli-la, mantê-la ou reforçá-la.
Aristóteles (2000) aceita as paixões, mas nega seus excessos, e postula a necessidade de
manter-se um meio termo para que elas não contrariem a razão: o excesso seria muito prejudicial.
Enquanto a virtude exige a reflexão, a paixão manifesta-se sem ela. A razão, portanto, é uma
paixão refletida, contida, subordinada a um fim pensado. Para ele, por não escolher suas paixões,
o homem não é responsável por elas, mas sim pela influência que exercem sobre suas ações. Por
isso, é possível julgar o aspecto ético do sujeito. O juízo é feito devido à possibilidade das
paixões serem dosadas: sem paixão não há como estabelecer uma escala de valores éticos.
Conforme Lebrun (1995), a grande dificuldade, em Aristóteles, para determinar se houve
desmedida, se a paixão foi além do que deveria, é que não há uma referência única para todos os