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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Paula Renata Camargo de Jesus
Os Slogans na Propaganda de Medicamentos.
Um estudo transdisciplinar: Comunicação, Saúde e
Semiótica.
DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
SÃO PAULO
2008
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2
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Paula Renata Camargo de Jesus
Os Slogans na Propaganda de Medicamentos.
Um estudo transdisciplinar: Comunicação, Saúde e
Semiótica.
DOUTORADO EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA
Tese apresentada à Banca
Examinadora
como exigência parcial para obtenção
do
título em Doutor (a) em
Comunicação e
Semiótica pela Pontifícia
Universidade Católica de São
Paulo, sob orientação da Profa.
Dra. Maria Lucia Santaella Braga.
SÃO PAULO
2008
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3
Banca Examinadora
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DEDICATÓRIA
A dedicatória é uma verdadeira prova de
amor e de reconhecimento.
Dedico este estudo à memória de meu pai
(que deve estar bastante orgulhoso da filha
que o ama tanto) e à minha mãe, que
sempre acreditou na minha capacidade de
realização.
5
AGRADECIMENTOS
À família, em especial: Claudia, Rosana, Bruno,
Marcela e Élbio.
Aos grandes companheiros, pela amizade e paciência:
Giovanna, Batista, Vinícius, Lina e JM.
À CAPES, por acreditar no meu projeto.
À UNISANTA e à Universidade IMES, pelo apoio.
À orientadora Lucia Santaella.
Aos queridos Wilson Bueno e Gino Giacomini Filho.
Aos amigos, alunos, pesquisadores e professores.
6
RESUMO
Estudar o slogan como mensagem publicitária constitui tarefa bastante
complexa, sobretudo o slogan de medicamentos, que além de procurar ser objetivo,
conciso e persuasivo, características peculiares do slogan, deve se preocupar com
regulações existentes nesse tipo de propaganda no Brasil. Esta tese propõe um estudo
transdisciplinar de comunicação, saúde e semiótica (com ênfase na semiótica de
Charles Sanders Peirce). A pesquisa é embasada na perspectiva teórica construída
com base num conjunto de concepções encontradas em autores que transitam nessas
áreas aparentemente distintas. Estudou-se o slogan a partir da pesquisa bibliográfica,
em livros e documentos, em busca de elementos históricos fundamentais para
compreender sua configuração, função e tendências nas propagandas de
medicamentos de venda livre na mídia de massa, em especial nos outdoors e na
mídia exterior, onde ele é propagado, mesmo com restrições legais, e nas entrevistas
de opinião profissional, a fim de ouvir várias vozes a respeito do assunto. A pesquisa
empírica contribuiu para a análise semiótica peirceana, por meio de registros de
imagens de propagandas ao ar livre, a fim de se fazer as análises verbal e visual
expostas na mídia exterior e no outdoor. Por fim, conclui-se que os slogans de
medicamentos têm como herança a linguagem de apelo à salvação utilizada por
poetas em séculos passados, e que, ao serem inseridos atualmente em determinado
contexto, como na mídia de exterior, são persuasivos, embora, muitas vezes, deixem
de respeitar leis que regulam a propaganda de medicamentos no país. Por meio da
complementaridade entre verbal e visual, percebe-se que a linguagem persuasiva dos
slogans é legitimada quando inserida na mídia de massa.
Palavras-chave: Slogans; propaganda; medicamentos; mídia de massa; semiótica
peirceana.
7
ABSTRACT
Studying slogans as advertising messages is a rather complex task,
particularly medication slogans, which, in addition to seeking to be objective,
concise, and persuasive – characteristics that are peculiar to slogans –, must also be
concerned with the regulations that govern this type of advertisement in Brazil. This
thesis proposes a transdisciplinary study of communications, health, and semiotics
(with emphasis placed on Charles Sanders Peirce’s semiotics). The research is based
on the theoretical perspective built based on a set of conceptions found among
authors who transit in these apparently distinct areas. Slogans were analyzed based
on bibliographic research, in books and documents, in search of fundamental
historical elements to understand how they are configured, their function, and trends
in advertisements designed for medications marketed freely over means of mass
communication, particularly billboards and external media, where they are
propagated, even with legal restrictions. Additionally, they were also studied through
professional opinion interviews, the purpose of which was hear several voices on the
matter. The empirical research contributed to the Peircean semiotics analysis, via
records of advertisement images presented in open air, in order to undertake the
verbal and visual analyses as exhibited in the exterior media and in billboards.
Finally, it is concluded that medication slogans inherit a language that appeals to
salvation which was used by poets of past centuries and which, when currently
inserted in certain contexts, such as in external media, is persuasive, although the
slogans often disrespect the laws that govern medication-related advertisement in
Brazil. Through verbal and visual complementarity, it is noticed that the slogans’
persuasive language is made legitimate when inserted in the means of mass
communication.
Key words: Slogans; advertisement; medications; means of mass communication,
Peircean semiotics.
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Outdoor do Xarope São João (OUTDOOR, 1997, p.8)........................................... 22
Figura 2. Cartão - postal de Medicamento (CADENA, 2001, p. 23)....................................... 23
Figura 3. Cartão Publicitário (Mica Cartões Publicitários, 2007)........................................... 24
Figura 4. Primeiro Anúncio de Aspirina no Brasil (Si é Bayer é bom, 2005, p. 17)................. 26
Figura 5. Carro promocional da Aspirina (RAMOS, 1983, s.p.). ........................................... 28
Figura 6. Cinema projetado pelo furgão da Cafiaspirina (Si é Bayer é bom, 2006, s.p.)........... 29
Figura 7. Anúncio de Elixir de Nogueira (RAMOS, 1983, s.p.)............................................. 36
Figura 8. Anúncio de Bromil (CADENA, 2001, p. 54) ......................................................... 43
Figura 9. Anúncio de Elixir Doria (CADENA, 2001, p. 93).................................................. 60
Figura 10. Testemunhal de Olavo Bilac para Bromil (CADENA, 2001, p. 24) ....................... 61
Figura 11. Anúncio de Sonridor com Glória Pires (Revista Coop, mar. 2007) ........................ 62
Figura 12. Biotonico Fontoura no ponto de venda (Drogaria Onofre, São Paulo, 2007)........... 63
Figura 13. Emulsão Scott no ponto de venda (Drogaria Onofre, São Paulo, 2007).................. 65
Figura 14. Anúncio de Anador em abrigo de ônibus (Avenida Paulista, São Paulo, 2007)....... 66
Figura 15. Anúncio de Neosaldina (Revista Caras, out. 2007)............................................... 68
Figura 16. Anúncio de Aspirina (Folheto da Liesa, Rio de Janeiro, 2006).............................. 70
Figura 17. Anúncio de Aspirina, ½ página dupla (Revista Caras, mar. 2007).......................... 71
Figura 18. Bula de medicamento de venda livre de Doril...................................................... 91
Figura 19. Capa da Revista Veja (26 jun. 2002)................................................................... 98
Figura 20. Capa da Revista Época (06 set. 1999).................................................................. 98
Figura 21. Imagem do site Pfizer (2007).............................................................................. 99
Figura 22. Imagem da Pfizer no Second Life (2007)............................................................. 99
Figura 23. Indoor de Redoxon (Drogasil, Shopping Center 3, São Paulo, 2007)................... 100
Figura 24. Outdoor de Calminex (Avenida Bandeirantes, São Paulo, 2006)......................... 101
Figura 25. Folheto do evento promocional de Neosaldina, com regulamento (2007)............. 102
Figura 26. Folheto da campanha contra a Dengue (Parceria da Prefeitura de
São Vicente e Dôrico, 2005)
............................................................................................. 103
Figura 27. Foto do Sal de Fruta Eno no Supermercado Zona Sul (Rio de Janeiro, fev. 2006). 104
Figura 28. Anúncio de Levitra na Revista da LIESA (Rio de Janeiro, carnaval 2006)........... 105
Figura 29. Capa no jornal Publi Metro (São Paulo, 03 ago. 2007)........................................ 106
Figura 30. Capa da Revista IstoÉ (26 nov. 2003)............................................................... 107
Figura 31. Anúncio de página dupla do Viagra, com Pelé (Revista IstoÉ, 10 abr. 2002)........ 109
9
Figura 32. Display de Aspirina no ponto de venda (Drogaria Onofre, São Paulo, 2007)........ 111
Figura 33. Slogan “uma boa idéia”, da Caninnha 51........................................................... 130
Figura 34. Logo Bayer (Si é Bayer é bom, 2006, s.n.)......................................................... 133
Figura 35. Assinatura do Banco Itaú (Revista Veja, 2007). ................................................. 136
Figura 36.Assinatura de Biotonico (JESUS, 2000, p. 68).................................................... 137
Figura 37.Assinatura de Biotonico no taxidoor (São Paulo, 2006)....................................... 137
Figura 38. Indoor Rinazina (Itália, jul. 2007)..................................................................... 138
Figura 39. Abrigo de ônibus luminoso de Neosaldina (Rua Bela Cintra, São Paulo, 2006).... 139
Figura 40. Folheto de Cafiaspirina (2006).......................................................................... 142
Figura 41. Imagens da linha de Aspirina (http://www.bayer.com.br) e fotos da
Aspirina da Grécia, Aspirina Forte da Grécia e Bayaspirina da Argentina
............................ 142
Figura 42. Taxidoor de Apracur (São Paulo, ago. 2006)...................................................... 147
Figura 43. Assinatura de Coristina D e no busdoor (São Paulo, set. 2005)........................... 151
Figura 44. Anúncio antigo de Melhoral (adquirido em Feira de Antiguidades, 2007)............ 156
Figura 45. Taxidoor de Melhoral (São Paulo, nov. 2006).................................................... 156
Figura 46. Campanha de Mídia Exterior do Itaú (Agência Africa, 2003).............................. 159
Figura 47. Assinatura de Mylicon gotas (Agência Stimma, 2007)........................................ 163
Figura 48. Assinatura do medicamento Motilium (Agência Stimma, 2007).......................... 163
Figura 49. Folheto Tylenol em ponto de venda (2006)....................................................... 166
Figura 50. Painel interno de estação de trem na Itália (2007).............................................. 166
Figura 51. Imagem de telão com propaganda de Aspirina na Itália (2007)........................... 167
Figura 52. Outdoor do medicamento Guaraína (OUTDOOR, 1997 p. 9).............................. 177
Figura 53. Outdoor de Coristina D (2006) ......................................................................... 177
Figura 54. Taxidoor de Benegrip (2007)............................................................................ 178
Figura 55. Propaganda de Estomazil na lateral do ônibus (2005)......................................... 178
Figura 56. Taxidoor “interativo” do analgésico Saridon (2005)........................................... 179
Figura 57. Anúncio de Viagra na lateral da Drogaria São Paulo
(Av. Paulista, São Paulo, 2006)
......................................................................................... 180
Figura 58. Aspirin na Alemanha (sede da Bayer em Leverkusen, 1999)............................... 180
Figura 59. Coristina D em abrigo de ônibus (2006) ............................................................ 181
Figura 60. Outdoor de Gelmax (São Paulo, 2006).............................................................. 186
Figura 61. Taxidoor de Doril (São Paulo, 2006)................................................................. 194
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................. 12
1 RESGATE HISTÓRICA DA PROPAGANDA DE MEDICAMENTOS
NO BRASIL................................................................................................................... 19
1 O começo de uma longa história: “larga-me, deixa-me gritar” ............................. 19
2 No ritmo da história: “é melhor e não faz mal”..................................................... 29
3 Sons, imagens, mudanças: “o Brasil precisa de sangue bom!”.............................. 35
2 A CRIAÇÃO NA PROPAGANDA DE MEDICAMENTOS................................. 40
1 Poetas e Artistas na criação: “a polícia dos pulmões”........................................... 40
2 A poesia comercial: ‘”se é Bayer, é bom”............................................................. 45
3 A hora e a vez das agências: “posso sorrir outra vez” ........................................... 47
4 A criação nas mãos das duplas: “tenha sempre à mão”......................................... 51
5 Processos que envolvem a criação: “a vitamina dos campeões”........................... 55
5.1 Cases da propaganda de medicamentos: “alívio já”........................................ 62
3 PROPAGANDA E INDÚSTRIA FARMACÊUTICA............................................ 72
1 Breve histórico da indústria farmacêutica no Brasil.............................................. 72
1.1 Doença e saúde – a busca pela cura................................................................. 77
1.2 Os medicamentos – controlados ou “descontrolados”?................................... 80
1.3 Automedicação: “prescrição de saúde”............................................................ 85
1.4 Medicamentos enquanto produto: “tomou, passou!”....................................... 89
2 Propaganda de Medicamentos................................................................................ 94
2.1 Estratégias utilizadas – “é a solução”............................................................... 94
3 Ética na Propaganda de Medicamentos no Brasil................................................ 112
3.1 Regulação e Reações: “por onde passa, cicatriza”......................................... 116
3.2 Várias vozes: representantes da indústria, da propaganda e da saúde ........... 122
4 OS SLOGANS........................................................................................................... 127
1 Slogan – possível diálogo em busca da definição................................................ 127
2 O lugar do slogan na propaganda......................................................................... 131
2.1 Slogans e marcas: “dá uma fome de leão”..................................................... 131
11
2.2 Texto e contexto: “para aquela dor animal”................................................... 143
2.3 Slogans que marcam – função e configuração: “pra você ficar legal” .......... 150
2.4 Tendências do slogan na propaganda ............................................................ 156
2.5 Criação dos slogans de medicamentos na atualidade:potência no
combate à dor de cabeça”............................................................................... 162
5 ANÁLISE SEMIÓTICA DOS SLOGANS DE MEDICAMENTOS.................... 169
1 Slogans à luz da Semiótica Peirceana.................................................................. 170
1.2 O verbal e o visual dos slogans na mídia exterior ......................................... 173
2 Teoria Semiótica como instrumento de análise: seleção do corpus –
critérios da análise................................................................................................ 182
2.1 Medicamentos Gelmax: “protege e dá um alííííííííííívio.”............................. 186
2.2 Medicamento Doril: “tomou Doril,a dor sumiu.”.......................................... 192
CONCLUSÃO............................................................................................................. 199
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 202
ANEXOS
Anexo 1................................................................................................................... 216
Anexo 2................................................................................................................... 225
Anexo 3................................................................................................................... 227
Anexo 4................................................................................................................... 230
12
INTRODUÇÃO
Estudar o slogan como mensagem publicitária constitui tarefa bastante
complexa, sobretudo por ele apresentar algumas particularidades, em especial
objetividade, concisão, persuasão e impacto, tudo isso acompanhando a marca em
seu contexto.
Esta tese propõe uma análise transdisciplinar de comunicação, saúde e
semiótica do slogan na propaganda de medicamentos no Brasil. Tal idéia, embora
sistematizada a partir de 2004, na verdade teve inicio com uma seqüência de
pesquisas bibliográficas e empíricas, iniciadas no Curso de Mestrado em
Comunicação Social, em 1997, e que, ao longo de uma década, jamais foi esquecida
tampouco esgotada, ao contrário sempre encontrou em áreas de pensamento e de
conhecimento, aparentemente distintas, espaços para se ampliar.
A razão do estudo transdisciplinar encontra prováveis explicações em
alguns autores que, aqui, serão apresentados como representantes dessas áreas de
conhecimento. Sommerman (2006, p. 20) afirma que, assim como o pensamento
transdisciplinar propõe a “dança dos prefixos” nos processos da formação e da
pesquisa (multi, pluri, inter e trans), possibilita diferentes posições epistemológicas.
As discussões se ampliam e as contradições aparecem, mas permitem o surgimento
da integração. Parece ilógico ter que fragmentar para depois promover a integração,
mas historicamente a trajetória é interessante, já que, ao serem fragmentadas, novas
áreas do saber surgiram, proporcionando uma amplitude de conhecimento a ponto de
recorrerem à integração para troca e somatória de conhecimento. A complexidade do
conceito de interdisciplinaridade, tratada por Sommerman, remete ao início de uma
crescente hiperespecialização, durante o século XX, cooperando para o
13
desenvolvimento da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Segundo ele, o
diálogo entre as diferentes disciplinas criou novas disciplinas, transferindo métodos
de uma disciplina para outra, proporcionando uma troca de conteúdos. Essa
reciprocidade com enriquecimentos mútuos é interdisciplinaridade (ibid., p. 33).
A transdisciplinaridade seria uma parte superior à integração, por se
tratar da construção de um sistema total, sem fronteiras entre as disciplinas. Teria
sido, na década de 70, Jean Piaget o primeiro a se referir ao termo transdisciplinar,
com o emprego da palavra em quadro que atravessaria as disciplinas, não se
contentando apenas com as trocas entre elas. Não haveria, então, especialistas
transdisciplinares, mas pesquisadores que se identificam com estudos
transdisciplinares, partindo do campo do diálogo entre ciências, epistemologias,
culturas e tradições (ibid., p. 49).
Transitar por diferentes pensamentos, conhecer e compreender as
intenções e, sobretudo, interpretar diferentes vozes, enriquecem a pesquisa e
promovem discussões pertinentes.
Armand e Michèle Mattelart (2004) acreditam que a comunicação
recobre uma multiplicidade de sentidos e está envolta de várias disciplinas, já que os
processos de comunicação despertam o interesse de outras disciplinas. Durante sua
construção, a comunicação, um campo particular das ciências sociais, sempre esteve
em busca de uma legitimidade científica, encontrando muitas vezes em outras
disciplinas e áreas.
Ainda a respeito da comunicação, Santaella (2001, p. 81) dedica boa
parte de seus estudos à comunicação: “como um tópico de pesquisa, a comunicação
nunca se limitou a qualquer domínio social.” A autora cita ainda uma passagem de
Eliseo Verón, afirmando que a ciência da comunicação é um cruzamento de
14
múltiplas problemáticas que correspondem a disciplinas diferenciadas,
caracterizando as ciências da comunicação como um nó de ciências.
Para Santaella; Noth, (2004), defender a transdisciplinaridade da
comunicação é também evidenciar que a relação que a comunicação entretém com a
semiótica refere-se a apenas uma das possíveis facetas da comunicação, do mesmo
modo que a face comunicacional é apenas uma entre outras facetas da semiótica.
A partir do momento em que se percebe o quanto enriquecida torna-se a
relação da comunicação com a semiótica, seja na aplicação de suas teorias e
respectivas metodologias na análise da linguagem verbal, visual, sonora utilizada nas
mídias, compreende-se a importância desses dois campos de conhecimento e o
caráter inter, multi e transdisciplinar de cada um que, com a interconexão de ambos,
existe o enriquecimento.
Os autores afirmam: “Não há semioticista que possa acalentar qualquer
dúvida a respeito do caráter inter, multi e transdisciplinar da semiótica.” (ibid., p. 74-
75), já que quando os estudos da semiótica moderna foram implantados, variadas
disciplinas (medicina, biologia, educação, direito, literatura, etc) que lidam com
signos e, portanto com a semiótica, passaram a interagir. Nesse sentido, a semiótica
passa a ser metadisciplina e, uma vez metadisciplinar, atua como multidisciplinar,
por levar ao encontro da semiótica outros campos interdisciplinares, como a teoria da
gestalt (que será utilizada no presente trabalho), a teoria da informação e outras não
menos importantes.
Fernando Lefèvre (2004), com sua formação em Pedagogia,
Comunicação e Semiótica e experiência em Saúde Pública, acredita ser indispensável
encarar o campo da saúde com o pensamento transdisciplinar. Para ele, a educação e
a comunicação são fundamentais para um bom entendimento da saúde, não deixando
15
de lado a ênfase no comportamento individual, mas tornando pertinente a ampliação
de discussões da saúde nos aspectos sociais.
O diálogo entre os estudiosos constitui uma prática necessária. No
diálogo, “a tolerância é o reconhecimento do direito às idéias e verdades contrárias às
nossas(art.14 da Carta da Transdisciplinaridade, Convento de Arrábia, Portugal, 2 a
6 de novembro de 1994). Tolerância e abertura são duas atitudes imprescindíveis ao
diálogo entre os diferentes saberes, as diferentes culturas, as diferentes teorias e os
diferentes modos individuais de ser (Manifesto da Transdisciplinaridade, no Anexo
3).
Uma vez que aconteça a intersecção, dificilmente, há impedimentos para
crescimentos em pesquisas, projetos e realizações em Comunicação, Saúde e
Semiótica.
Retomando o objeto de estudo, alguns questionamentos podem ser
levantados quanto ao slogan na propaganda de medicamentos. O slogan na
propaganda de medicamentos seria apenas fruto de uma herança histórica e cultural,
sem qualquer tipo de evolução quanto ao conteúdo de suas mensagens? O slogan
utiliza apenas a linguagem verbal ou também a linguagem visual para persuadir as
pessoas na propaganda de medicamentos? Existe uma preocupação ética de quem
cria e veicula os slogans de medicamentos na mídia de massa? Os slogans de
medicamentos são como os slogans de produtos quaisquer ou, pelo fato de serem
medicamentos, produtos relacionados à saúde das pessoas, devem ser pensados,
elaborados e propagados de maneira diferente?
Os objetivos do presente estudo são: analisar a importância histórica do
slogan na propaganda de medicamentos, buscando uma compreensão da utilização
da linguagem do mesmo; investigar o papel da linguagem dos slogans na propaganda
16
de medicamentos, não apenas como frase isolada, mas como um conceito inserido no
contexto; entender o processo de construção, criação e configuração do slogan, como
diferencial mercadológico, levando em consideração questões éticas e sociais;
verificar a relação da linguagem verbal e visual dos slogans na propaganda de
medicamentos e, para isso, buscar elementos no instrumental semiótico para análise
da linguagem do slogan na propaganda de medicamentos de venda livre; analisar o
papel do slogan presente na mídia exterior, por se tratar da única mídia de massa
exclusivamente publicitária.
A utilização da semiótica justifica-se por ser ela capaz de analisar tudo o
que é comunicado em uma mensagem e por estar centrada na emissão, ou seja, nos
processos que geram os efeitos, o que é indicado para esse tipo de estudo. A
semiótica peirceana pode fornecer definições e classificações de códigos, linguagens,
signos e nessas definições e classificações podem ser buscados os princípios que
norteiam o método de análise de todas as formas de expressão das imagens e marcas:
nome, imagem, slogan..., na mídia de massa em que estas possam aparecer.
No percurso do presente estudo, após o levantamento de problemas e
hipóteses, a busca por respostas apontava não apenas a direção de livros,
publicações, pesquisas, sites, mas também da opinião profissional, realizada por
meio de entrevistas a publicitários que vivenciaram e têm contato direto com o
slogan e com a propaganda de medicamentos no dia a dia, do registro imagético por
meio de fotos captadas em ruas e avenidas de São Paulo. E, ainda, estando o
medicamento inserido na área da saúde, com implicações de cunho ético, com
regulação de comercialização e propagação do mesmo, não era suficiente um estudo
centrado apenas na história, na memória, nas entrevistas, tampouco no levantamento
e na observação das propagandas encontradas na mídia de massa, era necessário
17
buscar informações nas resoluções, códigos, enfim na legislação brasileira
(Resolução RDC 102/ANVISA e Anexo I/CONAR) em torno da propaganda de
medicamentos, onde o slogan encontra lugar.
O recorte talvez seja a maior dificuldade em um estudo tão rico em
informações. Fazer um recorte é considerar a possibilidade de excluir partes
importantes que integram um todo, assim como é resumir ou agregar outras tantas
partes para prestigiar o foco. Decisão difícil talvez, sobretudo necessária em um
estudo abrangente e contemporâneo, com o ritmo acelerado de atualizações.
Considere-se convidado a conhecer os slogans de medicamentos sob a
ótica da comunicação, saúde e semiótica em cinco capítulos, claramente delimitados.
O capítulo um apresenta a trajetória da propaganda no Brasil: aspectos históricos,
sobretudo da propaganda de medicamentos, seus primeiros criadores, então poetas e
ilustradores, e o surgimento da primeira agência de propaganda, suas transformações
assim como as da mídia de massa. O capítulo dois, denominado “A criação na
Propaganda de Medicamentos” prolonga o capítulo um, no que diz respeito a
informações históricas, preocupando-se em destacar os nomes dos primeiros poetas
que assumiram a função de redator na propaganda, ilustradores, o surgimento das
duplas de criação em agências e os processos que envolvem a criação, com a
inserção de cases da propaganda de medicamentos de venda livre. O capítulo três
promove um resgate à história da indústria farmacêutica enquanto fabricante de
medicamentos e seu poder em altos investimentos em pesquisa, marketing e
propaganda, utilizando-se das mais variadas estratégias de venda e divulgação, por
vezes desconhecendo ou desrespeitando as leis brasileiras. Representantes da
indústria, da saúde e da propaganda, em depoimentos e entrevistas, expressam suas
opiniões a respeito. O capítulo quatro concentra-se no estudo do slogan, em sua
18
amplitude verbal, sem excluir a visual. Explora, também, sua conceituação, por meio
da manifestação de alguns autores, seu lugar na propaganda, sua importância em
relação à marca de um produto exaltando sua posição no contexto, seja de uma
assinatura, de um anúncio ou de uma campanha. O capítulo evidencia a função e a
configuração do slogan, apresentando as mutações e tendências pelas quais os
slogans vêm passando, principalmente na propaganda de medicamentos, com o
advento da regulação. Por fim, o capítulo cinco mostra o fértil diálogo da semiótica
peirceana com a propaganda, iniciando-se pela definição de semiótica, que se
apresenta nos estudos da área da saúde; em seguida, apresenta o verbal e o visual dos
slogans de medicamentos em seu contexto, na mídia de massa, especificamente na
mídia exterior. O capítulo finda com o aproveitamento aplicativo do instrumental
semiótico na análise das linguagens verbal e visual nas propagandas dos
medicamentos Gelmax e Doril.
É importante ressaltar que o verbal e o visual permeiam os capítulos de
um a quatro, como pano de fundo, ilustrando-os por vezes, ao serem utilizados como
referências importantes, para, no capítulo cinco, palavras e imagens ocuparem lugar
de destaque na análise semiótica peircena do slogan de medicamentos na mídia
exterior. É o capítulo onde se evoa a complementaridade entre o verbal e o visual.
19
1 RESGATE HISTÓRICO DA PROPAGANDA DE MEDICAMENTOS NO
BRASIL
1 O começo de uma longa história: “larga-me, deixa-me gritar!”
A história da propaganda de medicamentos no Brasil começou,
praticamente, junto à história da própria propaganda no país. “Durante vasto período,
nos mais diversos meios de comunicação, a indústria farmacêutica e seus produtos
ocuparam e ocupam lugar de destaque” (TEMPORÃO, 1986, p. 37).
Em um cenário de crescimento, a propaganda encontrou espaços para
nascer e crescer, entrando na história e criando sua própria história, em uma trajetória
de longa data, transitando por caminhos “de compras e vendas”, literatura, arte,
cultura e entretenimento.
Diante de incertezas quanto à precisão de datas a respeito da origem de
alguns anúncios bem como da autoria dos mesmos, as publicações de Ricardo Ramos
(filho do literário Graciliano Ramos) uma das principais referências de pesquisa a
respeito da história da propaganda no Brasil, têm registrado o que, provavelmente,
tenha sido o primeiro anúncio publicitário em meio de comunicação de massa. Trata-
se de venda de imóvel, publicado em 1808, no jornal Gazeta do Rio de Janeiro. Tal
anúncio era constituído apenas por palavras: “Quem quiser comprar uma morada de
casas de sobrado, com frente para Santa Rita, fale com Ana Joaquina da Silva, que
mora nas mesmas casas, ou com o capitão Francisco Pereira de Mesquita, que tem
ordem para as vender.” (RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 15). A linguagem da
época “morada de casas”, a localização “frente para Santa Rita”, a referência
“capitão Francisco” e a intenção de venda já sinalizavam como seria um anúncio
publicitário. Esses tipos de anúncios tinham algo em comum, eram concisos e
20
constituídos apenas pelo verbal, ou seja, sem imagens. Também conhecido como
“classificado”, esse tipo de anúncio sobreviveu ao tempo e ainda existe.
Outro anúncio do mesmo período era o de escravos. Tal “mercadoria” era
anunciada comumente: “Vende-se uma preta ainda rapariga, de bonita figura, a qual
sabe lavar, engomar, coser e cozinhar, na Rua do Ouvidor número 35, primeiro
andar.” (ibid., p. 16). E outros como: “Fugio um escravo de nome Adão, de idade de
40 anos mais ou menos. Quem o apreender e entregar a seu senhor receberá a
gratificação de seu trabalho” ou “Vende-se um creoulo de 22 anos sem vício e muito
fiel: bom e aceado cozinheiro, copeiro, bolieiro, para tratar, a ladeira de S. Francisco
n.4”(MARTINS, 1997, p. 23). As primeiras manifestações comerciais da propaganda
brasileira em jornal tinham o tom informativo, mas também de oferta, algo que até
então pertencia aos camelôs, vendedores informais ou mesmo à propaganda boca a
boca.
Paralelamente aos jornais, os cartazes, folhetos e painéis pintados já
ocupavam a cena urbana das grandes cidades, promovendo a comunicação e dando
início à poesia do comércio. Martins (1997, p. 24) comenta que os tapumes das
construções serviam para exibir cartazes anunciando produtos e serviços, como
medicamentos, lojas. Estava anunciada a origem do outdoor e dos letreiros, por vezes
ilustrados, seguindo o exemplo dos desenhistas Lautrec e Chéret, franceses que
popularizaram os cartazes. Data de 1860 o primeiro cartaz.
A propaganda passou a incorporar-se ao cenário urbano por meio de
painéis pintados em paredes, madeira, metal e placas que se multiplicaram. A
expansão da mídia de massa aconteceu rapidamente, com o crescimento das grandes
cidades e com a evolução do sistema de transportes (RAMOS e MARCONDES,
1995, p. 19).
21
A propaganda, antes voltada à elite, com a abolição da escravatura,
passou a conhecer um novo receptor, o ex-escravo. De produto, o escravo passou a
consumidor. Como tal, foi em busca de sapatos (símbolo de liberdade) e trocou as
ervas e chás medicinais dos engenhos por medicamentos (CADENA, 2001, p.14-15).
Em 1875, com os jornais “Mequetrefe” e “O Mosquito”, surgiram os
primeiros anúncios com ilustrações, desenhos e litogravuras. Em 1898, o jornal “O
Mercúrio” recebeu um tratamento diferenciado, impresso em duas cores e todo
ilustrado. Foi o primeiro jornal de propaganda comercial. Hotéis, lojas de confecções
e medicamentos eram, então, os grandes anunciantes (GONTIJO, 2004, p. 299). A
principal publicação sobre doenças ocupou o período de 1887 a 1940 e ficou
conhecida como “O Pharol da Medicina”, que além de divulgar os produtos Granado,
tinha como anunciantes o Pó da Pérsia, Bálsamo Maravilhoso do Unguento Santo,
Óleo de Fígado de Bacalhau, Magnésia Fluida e, mais tarde, o Xarope Bromil. “O
Pharol” chegou a atingir em vinte anos a marca de cem mil exemplares
(SGANZERLA, 1999, p. 5).
Os produtos Granado eram fabricados pela Casa Granado em uma
farmácia (conhecida como botica, local onde remédios e produtos de higiene eram
fabricados) que servia também como ponto de encontro entre estadistas, diplomatas e
escritores. A Casa Granado, com sua gráfica, editava o almanaque “Pharol da
Medicina” onde, além de anúncios, eram publicados artigos médicos e pequenas
peças literárias (VIEIRA, 2003, p. 70). O polvilho antisséptico Granado, que existe
desde 1903, atualmente é produto-símbolo da empresa, fabricado no Rio de Janeiro e
em Belém do Pará (EDLER, 2006, p. 68).
Mas não eram somente as boticas que vendiam medicamentos no país,
lojas de barbeiro, padeiros e ourives também o faziam. E, desde essa, já havia
22
prescrição de uso de medicamento “Se os cirurgiões curavam de medicina e os
médicos aviavam suas receitas, os boticários receitavam por conta própria.” (ibid., p.
23).
Em 1895, “o antes e o depois”, estratégia utilizada até hoje na
propaganda, fez parte do anúncio de Xarope Peitoral de Alcatrão, estampando duas
fotos, com o bom resultado do produto: “Eu era assim, cheguei a ficar assim! Sofria
horrivelmente dos pulmões, mas graças ao milagroso xarope peitoral de alcatrão e
jatahy, consegui ficar curado e bonito” (TEMPORÃO, 1986, p. 42).
A chegada da “Revista da Semana”, em 1900, despertou a assiduidade de
alguns anunciantes, como Drogaria J.Amarante, Vinho Baruel e Antarctica e
passaram a disputar os melhores espaços da revista. Os anúncios de medicamentos se
avolumaram (SGANZELA, 1999, p. 5). Anunciante da “Revista da Semana”, em
1900, o Xarope São João continha em seu anúncio a imagem de um homem, como se
estivesse amordaçado, sendo ameaçado por tosse, bronquite, rouquidão, em busca do
xarope como o salvador. O texto ainda se valia de frases como: “...é a única garantia
de sua saúde....é o remédio científico, apresentado sob a forma de um saboroso licor.
O único que não ataca o estômago, nem os rins...”
Figura 1. Outdoor do Xarope São João.
23
Foi inclusive o famoso Xarope São João um dos primeiros anunciantes a
se utilizar do outdoor de quatro folhas, juntamente com uma numerosa gama de
remédios variados (OUTDOOR, 1997, p. 10).
Segundo Vieira (2003, p.120), medicamentos destacavam-se pelos
rótulos, caso de Emulsão Scott, fabricado no Brasil desde 1908 e, décadas depois, do
mesmo fabricante Smithkline Beecham o antiácido Eno, conhecido por “Depois da
farra, Eno”. Emulsão Scott, assim como outros medicamentos, na ânsia da descoberta
de novas maneiras para anunciar, utilizou cartões-postais, trazidos para o Brasil por
Castro Moura, em 1901. Inicialmente artesanais, posteriormente com sofisticadas
litografias, chegaram a atuar como mala-direta. Assim como o Emulsão Scott, As
Pílulas Catharticas do Dr. Ayer e outros anunciantes também aderiram aos cartões
para se propagarem (CADENA, 2001, p.16).
Figura 2. Cartão-postal.
Há, alguns anos, o cartão voltou ao mercado publicitário, não mais como
cartão-postal, mas como cartão publicitário, uma mídia alternativa. Empresas como
Mica Cartões Publicitários, certificada pela International Freecard Alliance e
Jokerman Postais Publicitários, administram a produção e distribuição dos cartões
em espaços publicitários no interior de cafés, bares, restaurantes, cinemas, teatros,
24
etc com propaganda de medicamentos, automóveis, bebidas, vestuários, eventos e
muitos outros produtos.
Figura 3. Cartão Publicitário do Medicamento Naldecon.
A volta ao passado remete à frase: “O Brasil é um vasto hospital”, de
Ricardo Ramos que a utiliza para justificar a crescente fase de anunciantes em
jornais: medicamentos, tônicos e licores, óleos, pílulas e pós. Os anunciantes tinham
que, legalmente, obter aprovação da Inspetoria Geral de Higiene, cujo integrante era
o médico sanitarista Oswaldo Cruz (VIEIRA, 2003, p. 72). O jornal era considerado
uma mídia tradicional na época. Entretanto, as revistas não tinham a mesma
credibilidade, mesmo assim, anúncios com melhor elaboração surgiram nas revistas
“Revista da Semana”, “O Malho”, “Cri-Cri”, “A Careta”, “Fon-Fon”, “A Lua”. Esta
revista paulista de 1910, teve como anunciantes, em suas últimas capas nos dez
primeiros números, os preparados: Bromil, famoso pela frase “cura a tosse em 24
horas” e Saúde da Mulher “infalível nas moléstias das senhoras” (TEMPORÃO,
1986, p. 39).
Profissional marcante na história, o propagandista conhecido pelos
anúncios desses preparados, José Lyra, o “Homem-Reclame”, foi responsável por um
grande painel de Bromil na lateral de um novo teatro paulistano, o Teatro São José.
25
A Lyra deve-se o impulso aos cartazes de propaganda artística (RAMOS e
MARCONDES, 1995, p. 26-27).
A propaganda de Biotonico Fontoura marcou a história da propaganda de
medicamentos do Brasil. Biotonico Fontoura surgiu em 1910 (criado por Cândido
Fontoura), na cidade de Bragança Paulista, interior de São Paulo, como um
antitêmico, ou seja, um composto de ferro para o sangue e fósforo para os músculos e
nervos.
1
Por volta de 1916, Fontoura, colaborador no setor de medicina do jornal
“O Estado de S. Paulo” conheceu Monteiro Lobato, que escrevia artigos para o
jornal. Um dia, adoecendo e fora de forma, Lobato recebeu de Fontoura a indicação
do Biotonico. Tomou, ficou bem e, como retribuição ao amigo, escreveu um livro
criando o personagem Jeca Tatu. Tatuzinho, caboclo pobre, morava no mato, em
uma casinha de sapé, vivia na pobreza e tinha mulher e filhos, magros e tristes que,
ao tomarem Biotonico Fontoura, ficavam fortes e bem dispostos (TEMPORÃO,
1986, p. 58). A história fez um grande sucesso. Além de alavancar a venda do
medicamento, já havia vendido 10 milhões de exemplares do livro, em 1941 (ibid.).
Lobato passou a redigir e ilustrar um almanaque que continha orientações
fundamentais sobre saúde e higiene. Baseado em histórias e exemplos educativos,
divulgava os preceitos sanitários, utilizando mensagens simples e de fácil
compreensão. Ao utilizar a linguagem popular, fato pouco comum na época, a
linguagem publicitária passou a evoluir consideravelmente (MARTINS, 1997, p. 33).
Assim, Lobato foi levado a incursões na área da publicidade. Chegou a
colaborar com o Instituto Medicamenta e, como sabia desenhar, desenvolveu um
novo rótulo para o Biotonico Fontoura (medicamento que ainda existe com pequenas
1
Biotonico não tem acento conforme o rótulo do medicamento Biotonico Fontoura.
26
alterações em sua composição, anuncia na mídia de massa e pouco se modificou em
rótulo). Escreveu anúncios, almanaques e até um conto, o “Conto Industrial”, cuja
trama homenageia o amigo Fontoura.
Outro medicamento imprescindível na história da propaganda no Brasil é
Aspirina. Todavia, antes disso, faz-se importante conhecer um pouco sobre a Bayer,
indústria farmacêutica de origem alemã, fabricante da Aspirina.
A Bayer chegou ao Brasil em 1896. Dois consultores da empresa, F.
Applet e A. Rusterholtz, desembarcaram ao Rio de Janeiro com o objetivo de
levantar possibilidades comerciais dos Estados Unidos. Fundaram a Walty Lindt &
Cia, posteriormente Blum & Cia, a primeira e, durante quinze anos, a principal
representante dos produtos Bayer no Brasil (JESUS, 2000, p. 20).
Em 9 de fevereiro de 1911, a Bayer fundou sua própria firma comercial,
a Frederico Bayer & Cia, no Rio de Janeiro, que passou a responder por toda a
distribuição dos produtos no país. O primeiro anúncio da Bayer no Brasil data de
setembro de 1911, na “Revista Careta”, no Rio de Janeiro, o de Aspirina, introduzida
para comercialização em todo o mundo a partir de 1899 (ibid.).
Figura 4. Primeiro Anúncio de Aspirina no Brasil.
27
Uma característica marcante da empresa alemã era a regularidade em
anunciar. No jornal “O Estado de S.Paulo”, em março de 1911, o fortificante
Somatose, da Bayer, oferecia força e vigor. Somatose também foi anunciado na
“Revista Careta”, em novembro de 1911, assim como vários outros anúncios da
Bayer veicularam na “Careta” no mesmo ano (Si é Bayer é bom, 2005, p. 17-19).
Os anúncios da Bayer tinham como características, também, as marcas
acompanhadas de frases de efeito: Adalina “a fonte eterna da juventude”,
Bayaspirina “silêncio”, Instantina “num instante vae-se o mal” (TEMPORÃO, 1986,
p. 48-49). Medicamentos para dores em geral, principalmente cefaléias, ganharam
destaque nos anúncios, como o de Cafiaspirina.
Durante a Primeira Grande Guerra, a linguagem dos anúncios,
principalmente os de medicamentos, registrou os momentos difíceis em que o mundo
estava. Santogen “dá auxílio e levanta exaustos os que caem por falta de energia e
vitalidade”, Alcatrão-Guyet “a polícia dos pulmões”, Rhodine “em nada se parece
com outros comprimidos”, Urudonal “lava o sangue, amacia as artérias e evita a
obesidade” e Xarope de Grindélia “pedir e exigir sempre contra tosse” (RAMOS e
MARCONDES, 1995, p. 28-29).
Em 1920, a Bayer surpreendeu o mercado da indústria farmacêutica não
apenas pelo número de anúncios, mas pela criatividade e tecnologia impressas nesses
anúncios. Só com Aspirina, 23 anúncios surgiram com uma campanha bem planejada
em três direções: a primeira, “O êxito da vida”, “As amarguras da vida” e “A vida é
deliciosa”; a segunda, “Mais poder”, “O máximo da eficácia”, “Proteção”; e a
terceira, “Os salteadores da saúde”, “Os piratas modernos”, “Os vigaristas da
medicina”. As campanhas da Bayer eram sucessivas na mídia. Em 1923, deu-se o
lançamento da campanha de Cafiaspirina “contra a dor e o mal-estar causados pela
28
intemperança”, “a dor das dores” e “Oh! Que pontadas violentas”, respectivamente
para dores de dente e nevralgia (ibid., p. 30).
A preocupação da Bayer era a de criar uma empatia com os brasileiros.
Seu lado germânico passou a ser latino, optando pela face brasileira nas palavras,
buscando, nessa cultura, o diálogo. É nítida, em seus anúncios, a presença da
sociedade e de tipos populares, festejos, paisagens, hábitos e costumes. Era a
propaganda de uma empresa alemã sem sotaque, conforme o pesquisador Zélio
Alves Pinto na edição especial do livro “Reclames da Bayer” (Si é Bayer é bom,
2005, s.p.).
A promoção dos medicamentos da Bayer era arrojada e inovadora. Os
carros, peruas e furgões pintados com propaganda da Aspirina ou Cafiaspirina
percorriam o interior das cidades brasileiras e, quando paravam, projetavam
desenhos animados, documentários e filmes sobre os produtos da Bayer.
Figura 5. Carro promocional da Aspirina.
Por curiosidade, foi assim que os primeiros brasileiros tiveram contato
com o cinema. O filme “Cinema, Aspirinas e Urubus” (2005), do diretor Marcelo
Gomes, gravado no sertão da Paraíba, retrata bem esse fato histórico da Bayer, ao
mostrar um alemão vendendo Aspirina. Para persuadir a população humilde, ele
29
monta seu “balcão de vendas”, com uma placa “Aspirina, o fim de todos os males” e
projeta ao ar livre, ao anoitecer, uma película em preto e branco com noticiário da
moderna cidade de São Paulo seguido do comercial de Aspirina “...na hora da dor
não perca a cabeça, tome Aspirina”. Ao assistir ao filme, a população se convence da
mensagem e faz fila para comprar Aspirina.
Figura 6. Cinema ao ar-livre.
2 No ritmo da história: “é melhor e não faz mal”
O que justifica o grande investimento da indústria farmacêutica em
propaganda no Brasil, no final do século XIX, são as multinacionais. A presença
delas se intensificou bastante na década de 1930, quando sete laboratórios europeus
se instalaram no país: Bayer (1890), Rhodia (1919), Beecham (1922), Merck (1923),
Andromaco (1928), Roche (1931), Glaxo (1936), Ciba (1937), além dos americanos:
Sidney Ross (1920), Johnson & Johnson (1936) e Abbot (1937) (EDLER, 2006, p.
114). Desde meados do século XIX, os medicamentos eram grandes anunciantes de
30
jornal e seriam ainda os precursores da mídia ao ar livre e de mídias alternativas
(CADENA, 2001, p. 21).
Apesar de prevalecerem os laboratórios estrangeiros, os nacionais, como
o do Dr. Eduardo França, Silva Araújo, Daut & Lagunilla (fabricante de Bromil) e
Dr. Machado ofereciam produtos de boa aceitação. Os anúncios eram mais próximos
da realidade das pessoas, sem muita formalidade (ibid.).
Data de 1920 a primeira licença para instalação de emissora de rádio no
país (SGANZELA, 1999, p. 8). As transmissões chegaram em 7 de setembro de 1922
e, no ano seguinte, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro e a Rádio Clube de
Pernambuco apresentam-se, historicamente, como as primeiras emissoras de rádio
(CASTELO BRANCO, 1990, p. 173).
A precisão de Sidney Ross em anunciar em rádio fez do medicamento o
maior anunciante do meio na década. Com agência própria, Sidney Ross
praticamente determinava a melhor emissora, a partir do momento que anunciava na
mesma (CADENA, 2001, p.106).
Em 1929, foi instalada a primeira empresa exibidora de outdoor do país:
a Publix, de Amadeo Viggiani e Martha Paturan de Oliveira (ibid., p.62). Nessa
época, os outdoors eram pequenos, recortados de forma oval e afixados em postes.
Pouco depois, a Companhia Americana de Anúncios em Estradas de Rodagem, uma
empresa de painéis, lançou uma subdivisão chamada Empresa Americana de
Propaganda, destinada exclusivamente aos cartazes urbanos
(http://
www.outdoor.org.br).
Por volta de 1930, chegou ao Brasil a primeira agência norte-americana,
a Ayer, para atender a Ford, até então cliente da primeira agência brasileira, A
Eclética, surgida em 1913. Na década de 1930, a J.W. Thompson (ainda hoje, uma
31
das principais agências no Brasil) atendia a General Motors. Com as grandes
agências, a função de publicitário, mesmo embrionária, passava a crescer
(MARCONDES, 2002, p. 23).
Nos aparelhos de rádio e alto-falantes, propagava-se o som; nas ruas, os
bondes transportavam pessoas e divulgavam anúncios de Lugolina e Rhum
Creosotado, cujos textos eram tão famosos que as crianças saiam repetindo
(TEMPORÃO, 1986, p. 60). O jingle de Lugolina, considerado pioneiro, pois
antecede a chegada do rádio, está registrado no disco Memória da Pharmacia
(lançado em 1981, em uma parceria da Roche e da Fundação Roberto Marinho). A
criação desse jingle tinha como ritmo a polca, de 1894, com letra e música do médico
e farmacêutico Eduardo França, o fabricante de Lugolina. Era o pioneirismo do
jingle no Brasil (CASTELO BRANCO, 1990, p.172).
No período de 1930 a 1950, o rádio alcançou a glória, com centenas de
emissoras espalhadas pelo país. Radionovelas como: “Renúncia”, “Céu cor-de-rosa”,
“Helena” e “O Direito de Nascer” faziam grande sucesso e atraíam grandes
patrocinadores. O mesmo ocorria com programas como o de Orlando Silva, que tinha
como patrocinadores Fandorine e Urudonal, além de Sidney Ross, um dos maiores
anunciantes de rádio, com As Pílulas de Vida do Dr Ross: “fazem bem ao fígado de
todos nós” (TEMPORÃO, 1986, p. 64).
O rádio, mesmo misturando notícias da Segunda Grande Guerra com
radionovelas, contou com grandes anunciantes, um momento diferente, mas criativo
para a propaganda, que misturava informação com imaginação. Ramos e Marcondes
(1995, p. 47) registram esse período como o mais criativo em frases de efeito ou
slogans. O Repórter Esso, além de ser “o primeiro a dar as últimas”, era também
“testemunha ocular da história”.
32
A propaganda em rádio foi um marco para a indústria farmacêutica. Ao
lado da Bayer, a Sidney Ross, instalada no Brasil desde a década de 20, concentrou
sua veiculação na Rádio Nacional até 1952, acompanhando a era de ouro do rádio.
Sidney Ross tornou-se o maior anunciante de rádio, recebendo atendimento
diferenciado da emissora. Chegou a criar uma house-agency, ou seja, agência
própria, com cerca de setenta funcionários (TEMPORÃO, 1986, p. 65).
O poder de persuasão do rádio mereceu registro no Anuário do Rádio de
1948, em uma declaração de Sangirardi Júnior: “imagine agora essa força posta a
serviço da propaganda comercial, bem orientada, e você verá o que o rádio
representa como conquistador de mercados, como vendedor de produtos e utilidades
e como prestador de serviços.”
Os anunciantes utilizaram as emissoras de rádio em todos os lugares do
país, tendo medicamentos como destaque com uma linguagem mais popular em spots
e jingles, além das repetidas frases de efeito “Melhoral é melhor e não faz mal”;
“Pílulas de Vida do Doutor Ross, fazem bem ao fígado de todos nós”; “A tosse me
sufoca. Depressa Grindélia de Oliveira Júnior”; e “Mitigal acaba com as coceiras,
Mitigal é um remédio muito bom” (TAVARES, 1999, p. 43).
Com o rádio, as frases de feito ou slogans, que antes eram apenas
impressos, passaram a ser interpretados, falados, repetidos por meio de uma
sonoridade especial.
A fase de ouro do jingle, na década de 1940, revelou grandes autores:
André Filho, Evaldo Rui, Gilberto Martins, Haroldo Barbosa, Ivo Picinini, José
Scatena, Geraldo Mendonça e outros. No estúdio Gravações Geraldo Mendonça e
Rádio Serviços de Propaganda, surgiram jingles memoráveis, como: “Melhoral,
Melhoral, é melhor e não faz mal.” e “Magnésia leitosa, gostosa, fiel, magnésia,
33
leitosa, de Orlando Rangel.” (CASTELO BRANCO, 1990, p.187). Com a cultura de
radionovelas, interpretações eram comuns no rádio. Os textos tinham empatia:
“Sangue limpo. Sangue puro. Sangue forte. Elixir de Nogueira. Energia, vigor, saúde
integral. Elixir de Nogueira. O grande depurativo. Elixir de Nogueira.” (ibid., p.
188).
Aos poucos, o mercado de medicamentos industrializados foi ampliado,
baseando-se na propaganda popular, aumentando, assim, o número de farmácias nas
principais capitais. O rádio teve um papel importante na história da propaganda
brasileira. Os anunciantes passaram a ter voz por meio das propagandas. As grandes
indústrias presentes na economia brasileira, além de anunciarem em outros meios de
comunicação, passavam a investir também no rádio (MARCONDES, 2002, p. 28).
Marshal McLuhan dedicou um capítulo ao rádio em seu livro: “Os meios
de comunicação como extensão do homem”. Em certo momento, relata (1969, p.
335) o poder que o rádio tem de envolver as pessoas em profundidade,
principalmente por acompanhar as pessoas aonde quer que elas possam ir. O autor
ainda destaca o imediatismo e a prestação de serviço do rádio.
O apogeu do rádio e a expectativa da TV marcaram a década de 1940, tão
conturbada pelos acontecimentos da Segunda Grande Guerra. A Rádio Nacional
instalou o seu sistema de ondas curtas e, com ele, possibilitou uma mídia literalmente
nacional.
Na Segunda Guerra, diferentemente da Primeira, o cenário foi menos
dramático e mais ameno quanto à linguagem. As Pastilhas Minorativas utilizaram
“posso sorrir outra vez”; o Colírio Moura Brasil, “duas gotas, dois minutos, dois
olhos claros e bonitos”, assim como outros anunciantes, que não retrataram um
período de guerra, mas sim de menos dramaticidade nos anúncios.
34
No auge do rádio, alguns profissionais se dividiram entre profissionais de
propaganda e produtores artísticos: Rodolfo Lima Martensen, da Lintas; Scatena, da
Standard; José Roberto Whitaker Penteado, da Thompson; Sangirardi Júnior, da
Ayer e Manuel Leite da McCann. Com a explosão do jingle e o surgimento de
estúdios, surgiram nomes importantes. Gilberto Martins merece destaque nesse
sentido por ter sido o maior nome do rádio comercial. Não se pode esquecer também
de Sivan Castelo, Hervê Cordovil, Victor Dagô, Edson Borges, Heitor Carillo,
Lourival Marques, José Mauro e Miguel Gustavo. Como intérpretes dos jingles,
destacam-se as vozes de Hebe Camargo, Isaurinha Garcia, Francisco Alves, Orlando
Silva, Dircinha Batista, Silvio Caldas e Ary Barroso (CADENA, 2001, p.107).
Essa época foi determinante para as modificações na Bayer, por ser uma
empresa alemã. Cerca de três anos após o início do conflito mundial, o Brasil rompeu
relações com a Alemanha e seus aliados. As empresas e entidades alemãs instaladas
em solo brasileiro ou sofreram intervenção por parte do governo nacional ou tiveram
que mudar de nomes. Nesse processo, a Bayer ficou sob intervenção federal. Suas
instalações foram confiscadas e seus principais diretores e gerentes, presos. E mesmo
após o fim da guerra, as empresas da Bayer continuaram sob o comando de
interventores militares (JESUS, 2000, p. 58).
Levou tempo para que a Bayer se recuperasse. Em 1956, a empresa
adquiriu a Companhia de Ácidos em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro. Somente em
1969, quando mudou sua razão social para Bayer do Brasil Indústrias Químicas Ltda,
decidiu construir sua matriz (ibid.)
Encontra-se a marca Bayer em diversas áreas de atuação. No campo da
saúde, destaca-se a Aspirina, que segundo o Guiness Book, o livro dos recordes, é o
medicamento mais vendido do mundo. Além disso, os americanos elegeram-no como
35
uma das cinco principais invenções do século, ficando atrás apenas da televisão, do
telefone e do automóvel, segundo pesquisa realizada pela Revista Newsweek (“Folha
de S. Paulo”, Cotidiano, 1999, p. 7).
Cadena (2001, p.108) classifica a década de 1940 como “final de uma
etapa” para a propaganda de medicamentos, que desde 1850, tinha sido o maior
anunciante do Brasil. Para ele, laboratórios e seus representantes foram os grandes
responsáveis pela comunicação de massa: inventaram o testemunhal, desbravaram os
espaços ao ar livre e desenvolveram técnicas no ponto de venda, popularizaram o
anúncio em cores e, num primeiro momento, viabilizaram o rádio.
Em 1939, a política do Estado Novo criou o DIP, Departamento de
Imprensa e Propaganda. O órgão procurava controlar os produtos, principalmente do
segmento farmacêutico. Em 1941, o DIP impôs severas restrições à propaganda de
medicamentos. A Lei das Contravenções Penais incluía pelo menos cinco itens
restritivos à propaganda, um deles específico à categoria de medicamentos. Além da
Bayer, outros laboratórios estrangeiros também sofreram intervenções. Em 14 de
fevereiro de 1942, foi criado o Decreto-Lei 4.113, regulamentando a propaganda de
médicos e dentistas e de qualquer produto farmacêutico ou instituição de saúde.
Esses fatos abalaram o segmento, acostumado a comandar o mercado (ibid.).
3 Sons, imagens, mudanças: “o Brasil precisa de sangue bom”
Em 1942, final da Segunda Guerra, o tema da guerra entrou na
propaganda, ao participar da revista “Publicidade”, com anúncios de soldados e
caricaturas de líderes nazistas. Os anúncios estamparam frases de efeito ou slogans:
“Piralgina destrói qualquer dor”, o produto era demonstrado por bombas caindo
36
sobre a palavra dor. Redundante, mas havia relação das palavras com as imagens
(RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 46). Os depurativos usaram apelos: “O Brasil
precisa de sangue bom! Tome Elixir de Nogueira” (ibid., p. 47), inclusive os
testemunhais com personalidades da época.
Figura 7. Anúncio de Elixir de Nogueira.
Os anos 50 representaram período significativo no crescimento da
propaganda brasileira em diferentes meios de comunicação, diferenciando-se em
termos da linguagem visual à medida que foi ampliada a exploração de recursos
como fotografia e cor. Foi o período de auge da revista “O Cruzeiro” e do
surgimento do semanário “Manchete”.
“Mas é o desenvolvimento da televisão, sobretudo nos Estados Unidos
que marca a nova era que se avizinha para o Brasil. A conjugação da imagem ao som
cria um órgão de comunicação inteiramente novo.”, segundo Ramos e Marcondes
(1995, p. 50).
37
Em 1950, surge a TV Tupi, em São Paulo, a primeira emissora de
televisão brasileira e a primeira da América Latina, por iniciativa de Assis
Chateaubriand. Com textos ainda radiofônicos e muitas falhas por ser ao vivo e não
existir video-tape (que só surgiria uma década depois), a TV foi evoluindo aos
poucos, embora contasse com uma legião de telespectadores, que podiam ouvir e ver
os artistas, filmes e produtos, o que atraiu muito o anunciante (ibid., p.51).
A produção para TV nesse período era artesanal. Tudo começou com
cartões pintados à mão, substituídos pelo slide e depois pelo filme de 16 mm. Não
existia controle do tempo de duração de cada filme. Um comercial de 30 segundos
chegava a 40 ou 50 segundos e os intervalos comerciais também não apresentavam
duração definida. A criação para a TV era mera adaptação das peças criadas para o
rádio. Havia quem jurasse que a TV não passava de um rádio com imagens (ibid., p.
52).
Apesar de anunciar na TV, a indústria farmacêutica continuou investindo
em rádio, já que o espaço na mídia televisiva possuía alto custo (TEMPORÃO, 1986,
p. 66).“Em termos publicitários o rádio perde o duelo para a TV, sendo os anos 60 os
piores de sua existência. O desinteresse do anunciante se reflete nos criadores de
textos e jingles, notando-se a perda de qualidade” (CASTELO BRANCO, 1990,
p.194).
Nas ruas, surgiu o cartaz de 32 folhas. O formato quadrado das 16 folhas
não agradava mais agências e anunciantes, pois dificultava a criação e o layout.
Como era inviável a retirada de todos os cartazes de 16 folhas e sua substituição
pelos de 24 (padrão adotado em vários países estrangeiros), optou-se simplesmente
pela colocação de uma nova tabuleta de 16 ao lado da anterior, nascendo assim o
“brasileiríssimo” cartaz de 32 folhas (OUTDOOR, 1997, p. 11).
38
Na área gráfica, o processo de gigantografia desenvolvido por Renato
Nanô, em 1961, causou uma verdadeira revolução no meio. O anunciante pioneiro
deste tipo de impressão foi a Nestlé, com o Leite Ninho, por meio da agência
McCann-Erickson. Devido à gigantografia, as campanhas de outdoor puderam
utilizar os mesmos cromos dos anúncios de jornais ou revistas, dispensando os
decoradores e facilitando muito a integração da campanha publicitária como um
todo. O novo sistema só se firmou em 1967, após uma longa fase de aperfeiçoamento
(http://www.outdoor.org.br).
Apesar do baixo índice de audiência do rádio, quando comparado à TV,
ainda assim o rádio se manteve vivo. Os spots e jingles continuaram a ser veiculados.
Nesse período, a força dos jingles, surgidos em décadas anteriores, ficou marcada por
frases impactantes: “Vitalidade para a vida toda”, de Elixir de Inhame Goulart; “Mais
alegria em seu lar”, das Lâmpadas Philco; “Sorria com a proteção de Kollynos”,
“Bem-estar na hora”, de Sonrisal e “O gosto da vitória”, de Kollynos, que ficou 14
anos no ar (CASTELO BRANCO, 1990, p. 197).
No final da década de 1970, o locutor Zé Bétio, na rádio Record, em São
Paulo, não apenas falava da Atalaia Jurubeba, mas indicava-a ao público. Zé Bétio
era um locutor bastante popular que aproveitava sua empatia para conversar com as
ouvintes: “A senhora tá gorda? Já não passa mais na catraca do ônibus? Todo mundo
chama a senhora de repolhuda?” E dava seqüência ao indicar um emagrecedor que
prometia mudar a vida da ouvinte (TEMPORÃO, 1986, p.118).
Aparentemente adormecida, a propaganda de medicamentos
paulatinamente voltava ao cenário. Segundo Temporão (1986, p. 67), em 1978,
aconteceu a retomada de crescimento das práticas promocionais da indústria
farmacêutica. As especialidades mais anunciadas passaram a ser os analgésicos, as
39
vitaminas, os fortificantes e emagrecedores. “Com a televisão a publicidade
eminentemente informativa passa para uma publicidade valorativa, onde os
componentes escritos são dominados pelos icônicos”.
Na mídia impressa, os textos e as ilustrações transmitiam a informação e
a mensagem da propaganda, mas já não tinham tanto alcance como o rádio este, por
sua vez, permitia que o consumidor usasse a imaginação e construísse algumas
situações em sua mente. A TV atingia grandes contingentes da população, mostrando
o produto e demonstrando o seu uso, o que colocava a propaganda não apenas como
instrumento de persuasão, mas também com uma função educativa, ao informar
sobre a doença e o uso correto do medicamento (ibid.).
A história da propaganda apresenta relação direta com a história da
propaganda de medicamentos no Brasil. Portanto, o que foi visto até agora é só o
início dos velhos e novos tempos. Uma história que tem começo e talvez esteja longe
do fim. A história da propaganda de medicamentos envolve, sobretudo, pessoas. É
nesse sentido que o próximo capítulo apresenta as pessoas que criaram os anúncios
de medicamentos, a chegada das agências de propaganda e os fatos que marcaram a
história.
40
2 A CRIAÇÃO NA PROPAGANDA DE MEDICAMENTOS
1 Poetas e Artistas na criação: “a polícia dos pulmões”
Segundo Marcondes (2002, p. 14), a criação dos primeiros anúncios no
Brasil nasceu da junção do jornalismo com a arte, já que as ofertas encontradas nos
anúncios classificados em jornais provieram não só de uma necessidade de
informação, mas também de uma necessidade comercial. “A propaganda nasceu
prestando serviços, na forma que poderíamos chamar de primórdios dos classificados
modernos” (ibid., p. 15). Apesar de conter, por longo tempo, apenas informações em
forma de textos, estes, aos poucos, foram se diferenciando uns dos outros, tomando
forma criativa. Eram os primeiros sinais dos poetas na propaganda brasileira.
Para Ramos e Marcondes (1995, p. 3), os poetas foram os primeiros a
fazer redação publicitária no Brasil. Um exemplo é Casimiro de Abreu, precursor do
texto publicitário, em 1850, que utilizou rimas em seus anúncios. “O público, na
maioria analfabeto ou semi-alfabetizado, encontrava nas rimas a indispensável ajuda
mnemônica para melhor guardar temas e anúncios, era o que os anunciantes
desejavam, por isso buscavam os poetas.” (ibid.).
Um bom exemplo é o cartaz afixado em bondes, elaborado pelo poeta
Bastos Tigre, que informava o seguinte: “Veja ilustre passageiro, o belo tipo faceiro
que o senhor tem ao seu lado. E no entanto acredite, quase morreu de bronquite,
salvou-o o Rhum Creosotado.” (TEMPORÃO,1986, p.36).
Mas há quem conteste essa autoria. Ricardo Ramos, no livro Um Estilo
de Propaganda (1983, s.p.), escreveu: “Eu, por mim, faz trinta anos soube que
Álvaro Moreyra escreveu essa ótima sextilha para Rhum Creosotado. Como soube
41
que a frase ‘Fechadura Lafonte, fecha e dura’ foi inventada por Guilherme de
Almeida”.
Em meio às incertezas de autoria, a história da propaganda brasileira
surge das mãos de grandes poetas e artistas plásticos. Segundo Carrascoza (2003, p.
65), não foram poucos os escritores e poetas no Brasil que eventual ou regularmente
colocaram seu talento a serviço da propaganda. Desde os primeiros versos criados
para divulgar produtos e serviços, em meados do século XIX até os dias de hoje é
marcante a participação de nossos literatos na galeria daqueles que redigiram
anúncios, folhetos, spots, jingles, comerciais e todo tipo de peças publicitárias.
Os literatos contribuíram para a formação da nossa linguagem
publicitária, empregando a literatura para fins publicitários, produzindo peças
literárias, dentre elas, inúmeros poemas, numa relação em que a Literatura colocou-
se a serviço da Publicidade. Cada trecho que um poeta escreveu para um anúncio
representa muito na história de nossa propaganda e foi peça fundamental para que ela
evoluísse de maneira que conquistasse o mundo inteiro, através de peças premiadas
nos principais festivais do setor (ibid.). Os literatos contribuíram para a formação da
linguagem publicitária, produzindo poemas para anúncios e obtendo, com isso,
prêmios nos principais festivais do setor.
Foi a partir de 1900 que poetas e artistas passaram a fazer parte da
propaganda, efetivamente presente nos jornais: Olavo Bilac, Emílio de Meneses,
Hermes Fontes, Basílio Viana. Enquanto os poetas elaboravam os textos para os
anúncios, os mesmos eram ilustrados por J.Carlos, K. Lixto e Julião Machado
(RAMOS, 1983, s.p.).
Os poetas eram vistos como “detentores de um discurso portador de
credibilidade” e utilizavam dessa imagem para benefícios profissionais oferecidos
42
pela propaganda, pois ela dava visibilidade ao autor, expandindo até mesmo a
divulgação de seus livros. Nos primeiros passos dessas etapas, no Brasil, os poetas
foram o que se chama hoje de free lancers da redação publicitária. Além da rima, o
ritmo, muito bem utilizado pelo poeta, também também marcou a propaganda de
medicamentos.
Olavo Bilac foi o que, dentre todos os escritores, mais criou textos
publicitários de sua época, chegando a participar, juntamente com outros poetas, em
1908, de um concurso de cartazes publicitários, com a utilização de poesia para o
xarope contra tosse, Bromil. O xarope prometia: “cura a tosse em 24 horas”
(CARRASCOZA, 2003, s.p.).
A partir de 1906, dez anos após Julião Machado ilustrar os primeiros
anúncios para o Xarope de Alcatrão e Jatay, de Honório de Prado, a propaganda
passa a ser em cores. K. Lixto, grande cartazista, foi quem mais produziu anúncios,
durante quase 50 anos. Influenciado por Julião Machado, ilustrou peças da Bayer,
Light, Caixa Econômica Federal, Cigarros Veado, água Mineral Salutaris, conhaque
Macieira, Parc Royal. Para a Loteria Federal, teria criado também um slogan
“insista, não desista”.
J.Carlos, considerado por José Lins do Rego como o Villa-Lobos da
Caricatura, emprestou seu traço à propaganda brasileira. Uma característica de seu
estilo são os rostos arredondados para Cigarros Belmonte, Loteria Federal,
laboratório farmacêutico Daut & Lagunilla, entre 1907 e 1909, divulgando os
produtos Bromil e A Saúde da Mulher. Seu traço impressionou Walt Disney, que lhe
fez convites de trabalho, nunca aceitos. A relação verbal (inicialmente anúncios
apenas em textos, como nos classificados) e visual estava se firmando.
43
Políticos como Afonso Pena, Barão do Rio Branco, Pinheiro Machado e
Rodrigues Alves passaram também a ocupar os anúncios, por meio de diálogos que,
muitas vezes, chegam a testemunhos. As caricaturas e charges emprestam à
propaganda a inflexão do humor. Uma quadrinha criada por Olavo Bilac, por
100$000 “aviso a quem é fumante, tanto o Príncipe de Gales, como o Dr. Campos
Sales, usa Fósforos Brilhante.” Durante a campanha civilista, Rui Barbosa promove
os artigos mais diversos (RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 26-27).
Os escritores que criavam anúncios eram ousados. Bastos Tigre parodiou
Os Lusíadas, com o seu Bromilíadas em mais de 40 anúncios seqüenciais, para
Bromil.
Figura 8. Anúncio de Bromil.
Os “reclames”, como ficaram conhecidos os anúncios, eram
aparentemente ingênuos quanto à linguagem persuasiva, pois não havia um
especialista para escrever a respeito de medicamentos. Em alguns momentos, os
médicos davam seus depoimentos; em outros, os poetas eram solicitados a escrever,
enquanto artistas plásticos e pintores ilustravam os anúncios, quase sempre com
44
imagens de sofrimentos, com a promessa de cura pelo medicamento. A ida ao
encontro do gosto popular acabou por agradar ao consumidor e ao cliente, anunciante
da época. Marcondes esclarece (2002, p. 202) que a rima favorece a lembrança,
facilita a repetição e é interessante para a propaganda, ainda mais em tempos sem
mídia de massa. Verso e rima favorecem a memorização. Marcondes (ibid.) explica:
“diziam reclame porque as mensagens publicitárias entravam no meio da
programação e as pessoas reclamavam disso”.
Bastos Tigre criou “Se é Bayer, é bom”, durante a Semana de 22 e
eternizou a frase.
Essa frase é tão popular que até entrou para o folclore, por meio de
histórias como aquela daquele pai humorista, que afirmava que perdia um
amigo, mas não perdia a piada. Ao ser apresentado pela filha ao proposto
futuro genro, figura que não lhe era simpática, já pronto para dizer não, ao
ouvir que o pretendente trabalhava na Bayer, só para não perder a piada,
perdeu a filha e comentou: se é Bayer, é bom! E a filha casou e foi-se
embora (Si é Bayer , é bom, 2005, s.p.)
A cruz, marca da Bayer, foi criada em 1900 por Hans Scheneider,
empregado na fábrica da Bayer em Elberfeld, na Alemanha. Todavia, somente 10
anos depois, começou a ser impressa nos comprimidos, que existe atualmente com
pequenas modificações estéticas.
Em 1922, Semana de Arte Moderna, ano da independência literária no
Brasil, o país conheceu um novo estilo da poesia. Mario de Andrade, Graça Aranha e
Oswald de Andrade especialmente acabaram por abrir um caminho importante para a
poesia concreta dos irmãos Augusto e Haroldo de Campos e Décio Pignatari (com os
precursores: Mallarmé, Joyce, Cummings e Ezra Pound). Sob essa influência, a
poesia concreta, contra o marasmo e a opinião dogmática, enveredou-se por
caminhos abstratos (TOBIAS, 1967, s.p.). Ao utilizar palavras e formas e aplicar
45
ideograma chinês, a poesia concreta continha uma preocupação estética. Talvez por
isso tenha sido utilizada e ainda o é na propaganda.
Segundo Renato Castello Branco (1990, p. 51), Monteiro Lobato “abriu
caminho para que outros escritores de envergadura e com a mesma
representatividade nos meios literários viessem para a propaganda, sem medo de ver
comprometido ou diminuído seu prestígio como escritores ou poetas”.
Desde os primeiros anúncios, ecoavam-se os pregões e enumeravam-se
as ofertas, sempre em feitio de convite, mesmo nos versos de Casemiro de Abreu
(descoberto por Raymundo Magalhães Júnior, como o primeiro escritor da
propaganda no Brasil) e outros poetas que trabalharam na propaganda: Guimarães
Passos, Felipe de Oliveira, Álvaro Moreyra, Guilherme de Almeida, Ribeiro Couto,
Menotti Del Pichia (RAMOS, 1983, s.p.).
2 A poesia comercial: “se é Bayer, é bom”
Amadores ou profissionais, os anúncios não eram muito diferentes de
seus autores. Alguns ganharam dinheiro, outros não.
Para Carrascoza (2003, p. 69), o trabalho de Monteiro Lobato, com seu
Jeca Tatuzinho “é uma obra-prima de comunicação que mistura as técnicas narrativas
e os expedientes persuasivos da propaganda: conta a vida de um caboclo no
consagrado estilo do eu-era-assim-e-fiquei-assim, graças a um produto: o Biotonico
Fontoura”.
Sem recursos para custear a publicação de seu livro O Sacy Pererê,
Lobato recorreu a patrocinadores, e a obra passou a ter, na sua abertura, quatro
anúncios ilustrados por Voltolino vendendo: máquinas de escrever Remimgton,
46
chocolates Lacta, cigarros Castelões, Caza Stolze, de artigos fotográficos e, no
fechamento, mais três: Casa Freire, louças e objetos de arte, Chocolate Falchi e
Bráulio & Cia, drogaria e perfumaria. Foram provavelmente os primeiros
merchandisings da nossa propaganda, pois em todos eles os produtos são oferecidos
pelo Sacy, que aparece em situações irreverentes e assustadoras, como nos próprios
relatos do livro (CARRASCOZA,1999, p. 65).
Olavo Bilac chegou a lucrar com a propaganda. Conforme visto
anteriormente, ele ganhou cem mil réis pela quadrinha: “Aviso a quem é fumante,
tanto o Príncipe de Gales, como o Dr. Campos Sales, usa Fósforos Brilhante.”
(RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 26-27). Já Bastos Tigre não teve a mesma
sorte. A frase que acompanhou e ainda acompanha a marca da Bayer: “Se é Bayer é
bom”, é de 1922, sem direitos autorais, segundo a família.
Em 1928, O escritor e redator Orígenes Lessa fez uma declaração
surpreendente em seu ensaio “Retrato de uma cidade através de anúncios de jornal,
São Paulo de 1868”, ao admitir verdadeira admiração por escritores anteriores a ele
(Casimiro de Abreu, Olavo Bilac, Guimarães Passos, Hermes Fontes, José Lins do
Rego) e afirmar que os escritores sempre foram redatores de anúncios e só os fizeram
para pagar suas contas (RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 84).
Guilherme de Almeida também ganhou dinheiro com a propaganda:
recebeu 30 contos pela criação do anúncio da fechadura La Fonte, “a fechadura que
fecha e dura”. Na época, essa quantia seria suficiente para comprar dois automóveis
novos da Chevrolet (ibid., p. 39).
O mesmo ocorreu com Manuel Bandeira, que ainda muito jovem ganhou
50 mil réis de um laboratório para redigir o anúncio das Pílulas Minorativas “Meu
Deus que mulher durinha! Foi um buraco na minha vida. Mas eu mato ela na cabeça,
47
vou mandar-lhe uma caixinha de Minorativas, pastilhas purgativas. É impossível que
não faça efeito!” (CADENA, 2001, p. 65).
É importante reconhecer o espírito crítico existente na voz e nas palavras
de escritores e estudiosos que viveram os dois lados da experiência: poesia e
propaganda e, que até os tempos atuais, reconhecem o quão importante foi ter vivido
paradoxalmente esses caminhos, ora lucrativos, ora divertidos, ora frustrantes.
Quando não buscavam uma recompensa financeira, escritores e artistas
plásticos queriam, pelo menos, o reconhecimento. Alguns se sentiram constrangidos
por serem artistas e atuarem na propaganda, outros aproveitaram a oportunidade de
publicar anúncios, ganhar para isso e divulgar sua literatura. “Décio Pignatari, poeta
e crítico irreverente, começou sua experiência publicitária pela Grant Advertising.
Certamente havia um indisfarçável conflito entre o concretista inovador e as peias da
agência, cerceadoras da criação livre” (CASTELO BRANCO,1990, p.14). Pignatari
foi redator de anúncios para Coca-Cola.
3 A hora e a vez das agências: “posso sorrir outra vez”
Mais do que escritor, Lessa era criativo, o que realmente fez toda a
diferença no início da propaganda brasileira. Com imaginação fértil e noção de
propaganda, Lessa desenvolveu trabalhos para as primeiras agências de publicidade,
já como redator, e não simplesmente escritor. Conhecido por seu forte
temperamento, certa vez foi procurado por um fabricante de sabonetes que queria
algo parecido com o anúncio da fechadura La Fonte, “a fechadura que fecha e dura”,
criado por Guilherme de Almeida. A insistência do cliente foi tanta, que Lessa,
48
irritado, criou: “Sabonete..., o sabonete que sabo e nete.” (RAMOS e
MARCONDES, 1995, p. 39).
Orígenes Lessa, uma das principais personalidades da criação publicitária
brasileira, iniciou em propaganda em dezembro de 1928, no departamento de
propaganda da General Motors, como tradutor. Em seguida, foi para a agência “A
Eclética”, em um período em que ninguém entendia nada de publicidade. Lessa dizia
que não bastava apenas vender, mas era importante ensinar qual a utilidade do
produto. “[…] um tempo em que poucos sabiam para que servia uma geladeira
elétrica. O automóvel era anunciante. Eram vendidos uns 20 ou 30 por mês no país
inteiro, uma exorbitância.” (ibid.)
Antes das agências, existiam os agentes de propaganda, também
conhecidos por escritórios que tratavam de negócios com anúncios. Eram
marginalizados e funcionavam como departamentos comerciais de jornais e de
propaganda ao ar livre.
Em São Paulo, no ano de 1913, surgia a agência Castaldi & Benatton,
semente daquela que seria considerada a pioneira das agências de publicidade no
Brasil, “A Eclética”. Castaldi redigia anúncios, preparava layouts e chegou a criar o
primeiro anúncio em cores em jornais, vermelho-rosa, publicado no jornal “O Estado
de S.Paulo” (CADENA, 2001, p. 41).
No rádio, enquanto os locutores brigavam com os nomes estrangeiros, as
Pastilhas Minorativas seguiam com o jeito brasileiro “Posso sorrir outra vez”. A
Ayer tratava a propaganda e suas mensagens como encantamento: “Para os óculos, o
leno. Para os olhos, Lavolho” e “Duas gotas, dois minutos, dois olhos claros e
bonitos”, do Colírio Moura Brasil (MARCONDES e RAMOS, 1995, p. 47)
49
A Companhia de Annuncios em Bonds surgiu em 1927 e no ano seguinte
contratou os artistas plásticos poloneses recém-chegados ao país: Henrique
Mirgalowsky (o Mirga) e Bruno Lekowski, contemporâneos de Fritz Lessin. Mirga
foi considerado um dos maiores diretores de arte de todos os tempos na propaganda
brasileira. Falecido na década de 1960, na verdade Mirga foi mais ilustrador do que
diretor de arte. Outros nomes passaram pela Bonds: Oswaldo Morgantetti, Ceslau
Rommaszo, João Cardaci, Humberto Pace, Ivo Araújo, Rubens Vaz, José Luiz
Guida, Domingos Braga, Otilo Polato e Henrique Zwilbergerg (ibid., p. 63).
Muitos encontraram realização profissional em agências brasileiras:
Antônio Nogueira, Mário Mello, Hélio Silveira da Mota, Júlio Cosi Júnior,
Domingos Barone, Oswaldo Alves, Abel Guimarães, Caio A. Domingues, Alberto
Silva e Sérgio Graciotti (RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 61-62).
No final da década de 1930, a propaganda começou a se profissionalizar,
por meio de novas agências e trabalhadores que migravam de outras áreas. A agência
Lintas trouxe da Inglaterra o diretor de arte Jim Abercrombie, que passou a atuar
com o brasileiro Rodolfo Lima Martensen e com outros destacados profissionais
londrinos: John Maurice Mason e Gerald Stevens (CADENA, 2001, p. 90).
No inicio da década de 1960, plantou-se a semente da DPZ... “a
pretensão dos sócios catalães Francesc Petit e José Zaragoza e do brasileiro Ronald
Persischetti é fazer uma trabalho solto, afinado com a semiótica propagada ao mundo
por Umberto Eco, onde o design assume a maior expressão da linguagem”
(CADENA, 2001, p. 157). Petit e Zaragoza, junto a Duailibi, fundam a DPZ,
verdadeiro celeiro de talentos, por onde passaram vários profissionais de criação:
Neil Ferreira, Washington Olivetto, Nizan Guanaes e outros (ibid.).
50
Na década de 1970, muitas foram as fusões de agências nacionais com
estrangeiras, o que estimulava o aparecimento de novos talentos em criação.
Contudo, a partir de 1975, as agências nacionais passam a dominar o mercado
brasileiro. A agência MPM se espalha pelo país, nas principais capitais. Agências e
produtoras firmam parceria, realizando bons trabalhos, como o Garoto Bom-Bril,
interpretado por Carlos Moreno que imprime uma linguagem única na propaganda,
criada por Petit e Olivetto e produzida por Andrés Bukowinsky (CADENA, 2001, p.
187). Em todo o país, as agências proliferam. Ainda que São Paulo fosse o pólo
irradiador, não só as agências como também os meios de comunicação regionais
passaram a assumir importante papel.
Entre as décadas de 1970 e 1980, cresceu o número de agências: CBBA,
Fischer & Justus, DM9, Giovanni, Ítalo Bianchi, Módulo, Símbolo. Despontaram,
também, profissionais pertencentes a elas: Ercílio Tranjan da Denison, Julinho César
Xavier da Almap, Sérgio Graciotti da MPM, Jaques Lewkowicz da Caio Domingues,
Clóvis Calia da Proeme, Rogério Steinberg da Estutural, Agnelo Pacheco da Norton,
Cláudio Carillo da McCann, Lula Vieira da SSCB&Lintas, Alberto Dijinishian da
JWT, Raul Cruz Lima da Salles e Herberto Klaus Isnenghi da Denison (CADENA,
2001, p.190). Com isso, o jargão “dança das cadeiras” passou a ser incorporado pela
área de criação.
Neste período, Oswaldo Miran consagrou-se como grande ilustrador,
chegando a ganhar prêmios. Washington Olivetto, Eduardo Fischer e Nizan Guanaes
passaram a ser conhecidos e reconhecidos como grandes criadores. As mulheres
também ocuparam um lugar importante na propaganda e na criação: Helga Miethke,
pela JWT; Magy Imoberdorf, pela Lage, Stabel & Guerreiro; Christina Carvalho
Pinto, pela CBBA; e Ana Carmem Longobardi, pela McCann e MPM (ibid.).
51
4 A criação nas mãos das duplas: “tenha sempre à mão”
Redator-principiante e depois redator-chefe, no final da década de 1940 e
boa parte da década 1950, Caio Aurélio Domingues pertenceu ao tempo em que
redação e arte eram separadas. A trajetória na criação era a de receber as informações
por meio do contato, a seguir preparar o texto, entregar ao contato e só depois
encaminhar ao diretor de arte. Redação não opinava em imagem e o diretor de arte
não interferia no texto. Mesmo assim, Domingues relata que redator ganhava a
metade do que um diretor de arte recebia como salário.
Nos anos 50, começaram a surgir as primeiras tentativas de dupla de
criação: Domingues e Eric Nice; José Zaragoza e Francisco Petit, em parceria com
José Kfouri. Roberto Duailibi, pertencente à quarta geração de publicitários no
Brasil, iniciou suas atividades em 1953, na Colgate-Palmolive, ganhando 250
cruzeiros velhos (RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 67).
As décadas de 1950 e 1960 são consideradas como “era da criatividade”
na propaganda brasileira. Segundo Roberto Duailibi, a propaganda estava se
profissionalizando, passando de intuitiva para objetiva, mais interessante ao
consumidor. Cultivava-se a concisão nas mensagens que começavam a ser criadas
por redator e diretor de arte. Nomes como o do próprio Duailibi, Júlio Cosí, Castello
Branco, Antônio Nogueira, Alex Periscinoto, Ivan Meira, Zaragoza e Eric Nice
destacaram-se nessa época (CASTELLO BRANCO, 1990, p.121).
A primeira escola de propaganda surgiu em São Paulo, em 1951, a
Escola Superior de Propaganda, idealizada pelos próprios profissionais da
propaganda: Rodolfo Lima Martensen, Ítalo Éboli, Renato Castelo Branco, Antonio
Nogueira e Geraldo Souza Ramos (RAMOS e MARCONDES, 1995, p. 53-54).
52
Muitos se formaram na Escola. É o caso de Dualibi, que, ao concluir o curso, passou
a redator de uma pequena agência, a CIN, junto a Ênio Mainardi. Duailibi conta que
enfrentou um caminho árduo, principalmente pelo fato de o Brasil viver em uma
economia de total privação, o que só mudou com a fabricação de automóveis no país
(ibid., p. 67).
Na década de 1960, a criatividade integrou efetivamente redação à
direção de arte, mostrando uma acentuada evolução criativa. As agências brasileiras
se beneficiaram: Alcântara Machado, Denison, Norton, CIN, Mauro Salles, MPM,
P.A. Nascimento, DPZ, Proeme, Aroldo Araújo, Benson (ibid.).
Em 1965, já com os meios de comunicação consolidados e as duplas de
criação em relação estreita, surge o Clube dos Diretores de Arte, o que seria anos
depois o Clube de Criação. Uma vez fixado o conceito de duplas, a agência DDB faz
escola, contrariando o conservadorismo de nomes seguidos nos Estados Unidos:
Claude Hopkins, Raymond Rubicam e Leo Burnett. DDB foi seguida por agências
como: Alcântara Machado, Proeme e DPZ, e depois a Norton, com a contratação de
talentos, como: Neil Ferreira, José Jarbas de Souza, José Fontoura da Costa, Aníbal
Gustavino e Carlos Wagner de Morais (CADENA, 2001, p.162).
Foi justamente na década criativa da propaganda, com o surgimento das
duplas, que o título, o texto e o slogan junto à marca começaram a se agrupar
coerentemente, compondo as principais instâncias da mensagem verbal, o que
prevalece na maioria dos anúncios em tempos atuais.
As duplas não pararam mais de compor idéias e acrescentar momentos À
história. Cabia à dupla, inclusive, a criação de frases impactantes, slogans. A frase de
efeito ou slogan “uma boa idéia”, de 1978, para uma bebida popular como a
aguardente 51 é de Maggy Imobedorf e Joaquim Pereira Leite (MARCONDES,
53
2002, p. 225). Tal slogan se consagrou não apenas pela campanha que a dupla
elaborou ao mostrar diversas situações que fortaleciam o número 51, mas por ser
aceita pelas pessoas, gerando a propaganda boca a boca.
Alguns dos profissionais da propaganda já citados anteriormente
merecem destaque. Se hoje a criação da propaganda brasileira é uma das mais
reconhecidas do mundo, isso se deve a pioneiros como Alex Periscinoto. Desde que
entrou na propaganda, no final da década de 1950, até hoje, Periscinoto respira
propaganda, o que o levou a se tornar um dos profissionais mais reverenciados do
mercado.
José Zaragoza, um dos fundadores e o primeiro presidente do Clube de
Criação de São Paulo, estreou como publicitário logo que chegou ao Brasil, em 1952,
e entrou para a J.W.Thompson. Na DPZ, formou uma dupla famosa com o criativo
Neil Ferreira, que conquistou vários prêmios e lançou conceitos e personagens, como
o Baixinho da Kaiser.
Roberto Duailibi é considerado um dos mais brilhantes redatores da
história da propaganda brasileira. Quando dirigia a redação da J.W.Thompson, na
década de 1960, chegava a escrever mais de 30 anúncios por dia. Nessa mesma
época, passou também pela C&N, McCann-Erickson e Standard. Uniu-se a Francesc
Petit e José Zaragoza em 1968, para fundar a DPZ, agência considerada como uma
escola da publicidade do país.
Neil Ferreira nunca foi dono de agência, embora a maioria delas cobice
sua criatividade. Dois filmes do início da década de 1980 premiados com Leão de
Ouro no Festival de Cannes exemplificam essa atração. O primeiro é o comercial
“Morte do Orelhão”, para a Telesp, contra o vandalismo nos telefones públicos; o
outro é “Banheiro”, que marcou a estréia do Baixinho da Kaiser.
54
Agnelo Pacheco, autor de campanhas como a do tênis All Star, nos anos
80, e da frase “Tomou Doril, a dor sumiu”, iniciou sua carreira escrevendo contos
policiais e novelas de humor para a TV Itacolomi, dos Diários Associados.
Washington Olivetto nasceu em São Paulo. Começou em propaganda aos
19 anos. Daí em diante foi para a DPZ, ganhou todos os prêmios e homenagens da
profissão e alguns fora dela, abriu sua própria agência, a W/Brasil, revelou outros
talentos e continua sendo referência como profissional.
Da AlmapBBDO, Marcello Serpa, considerado um dos melhores
diretores de arte do mundo, é o brasileiro mais premiado no Art Directors Club de
Nova York.Pertence a ele o primeiro Grand Prix da América Latina no Festival de
Cannes, em 1993.
Fábio Fernandes, um dos publicitários mais premiados de sua geração,
presidente da F/Nazca Saatchi&Saatchi, já recebeu em sua carreira os principais
prêmios nacionais e internacionais da propaganda. Só em Cannes foram 43 Leões.
Alguns deles, conquistados no ano de 2001, levaram sua agência ao degrau mais alto
do festival para obter o cobiçado título de Agency of the Year. Entretanto, Fernandes
não é somente reconhecido pelas suas idéias brilhantes.
Assim como Fernandes, Duailibi, Guanaes, Olivetto e outros tantos
profissionais de criação abandonaram a dupla, ao assumir ou agregar cargos
executivos nas agências, lançando-se como diretores, presidentes, enfim
proprietários.
Do final da década de 1980 para cá, com o advento da tecnologia, passou
a ser vital o conhecimento e o domínio de novas técnicas para o aprimoramento da
criação. O uso de ferramentas como a informática passou a assumir um papel
fundamental na criação e na produção (http://
www.revistapropaganda.com.br).
55
5 Processos que envolvem a criação: “a vitamina dos campeões”
Criação passa por etapas, sobretudo a criação publicitária que convive
com idéias encomendadas. Nos tempos atuais, diferentemente de trabalhos artísticos
ou descomprometidos com prazo em alguns casos, a propaganda atua com o job, ou
seja, um trabalho a ser elaborado e executado em curto espaço de tempo por
agências, geralmente bem remunerado.
Se no início da propaganda no Brasil, a intenção de venda contou, em
primeira instância, com a informação por meio de classificados de jornais, para
somente depois recorrer aos escritores e poetas que se integraram aos artistas
plásticos e ilustradores, nas décadas de 1950 e 1960, não foi muito diferente com as
duplas de criação: redator e diretor de arte atuando juntos nas agências de
propaganda.
Algo é notório: ao se analisarem as etapas da criação ao longo da
história, na elaboração de logotipos, logomarcas, slogans, anúncios, campanhas, não
existe fórmula de sucesso, muito menos regra de como se criar uma boa idéia. O que
existem são métodos e variadas técnicas. O momento de inspiração, embora muitas
vezes associado a uma lâmpada acesa sobre a cabeça, não é exato. Inspiração está
associada a trabalho, ou seja, conhecimento, pesquisa, informação de assuntos gerais,
muita técnica que pode ser adquirida ao longo de muito tempo, ao experenciar
situações mais diversas e adversas.
Em frustradas tentativas, escolas de publicidade e agências de
propaganda pensaram em implantar fórmulas, regras ou técnicas rigorosas ou tão
disciplinadoras a fim de padronizar as etapas de criação. Apesar da existência das
56
duplas, agências também acreditaram e ainda acreditam em equipes de criação ou
grupos, fugindo de um modelo convencional.
Hoje, ao receber as informações necessárias para o desenvolvimento da
criação, o conhecido briefing de criação, ou seja, o resumo das informações
importantes, redator e diretor de arte ou a equipe de criação não seguem,
necessariamente, as mesmas regras, embora direcionem a criação segundo o mesmo.
Redatores e diretores de arte, junto aos diretores de criação, trocam
informações e conhecimentos, concebem idéias durante o brainstorm (uma reunião
criativa), desenvolvem roughs (rascunhos), fazem anotações abreviadas e concisas,
roteiros, materializando, assim, as peças a serem veiculadas na mídia de massa, com
preocupações estéticas.
O registro do processo de criação pode ser verificado por entrevistas e
depoimentos de artistas, como sugere Salles (2000, p. 18). O mesmo também pode
acontecer com os publicitários, embora seja difícil conseguir o material, uma vez
que, por hábito ou até por falta de cultura de se arquivar o processo criativo em
agências, os roughs, geralmente, são descartados. Washington Olivetto, certa vez em
palestra, chegou a declarar que se todas as agências de propaganda arquivassem os
rabiscos, roughs, inclusive de material não aprovado por clientes, certamente o que é
considerado lixo seria algo de extremo valor na propaganda.
Embora estudos como a Crítica Genética (SALLES, 2000) apresentem
uma abordagem importante em relação ao processo criativo, no que tange à arte, a
parte que integra este capítulo se refere aos processos que envolvem a criação na
propaganda, sugeridos por Roberto Duailibi e Simonsen Jr (2000, p. 25-30). Dualibi
(o D, da DPZ) e Simonsen Jr acreditam que o processo de criação deve passar por
57
sete estágios seqüenciais: identificação, preparação, incubação, aquecimento,
iluminação, elaboração e verificação (ibid.).
Na identificação, é fundamental detectar o problema a ser resolvido
(convém lembrar que reconhecer o problema não é tarefa fácil). Levantar novas
dúvidas, novas possibilidades, requer um olhar atento. A preparação pode ser direta
ou indireta. Na direta, busca-se o máximo de informações pertinentes à solução do
problema; na indireta, a busca por informações acontece de um modo geral, a fim de
contribuir para a solução do problema, mas não exatamente com o foco no mesmo,
podendo ser inclusive inconsciente. Após a busca incansável de informações na
preparação, a incubação faz-se necessária. É a pausa. Uma reação da mente humana
quanto ao excesso de informações adquiridos, muitas vezes sob pressão e angústia.
No aquecimento, já com a sensação de uma solução próxima, retoma-se o processo
consciente do trabalho – seria o limiar da criatividade. Na iluminação, termos como
euréka ou insight são comuns, já que fazem referência ao surgimento da idéia.
Elaboração, processo totalmente consciente, é o momento de trabalhar a idéia
descoberta e ter conhecimento das ferramentas para fazer o melhor uso possível
dessa idéia. Por fim, a verificação, como o próprio nome indica, são as pesquisas em
busca da validação da idéia ou de todo o trabalho realizado nas etapas descritas. O
processo de criação na propaganda e a busca consciente por soluções de problemas
são condições diárias nessa área de atuação.
Um exemplo de oportunidade é o caso do complexo vitamínico Vitassay,
da DM Farmacêutica (Monange), do final da década de 1970. Roberto “Dudu”
Carvalho, então responsável pela criação do laboratório, escolheu Pelé como
personagem da campanha, associando o atleta com “a vitamina dos campeões” por
quinze anos (CAMPANHAS INESQUECÍVEIS, 2007, p. 79). Essa associação de
58
vitória, conquista, energia e vitalidade com o personagem famoso beneficiou a
imagem do medicamento.
O approach tem relação com o contexto de cada campanha e é utilizado
pela dupla de criação da agência. Muitas vezes, a criação da propaganda resulta de
uma parceria da dupla de criação da agência com o próprio cliente, ou até de
profissionais de outras áreas da propaganda (marketing, planejamento, atendimento,
pesquisa, mídia, produção).
Um exemplo de fatos da vida real incorporados à criação de uma
campanha de medicamentos é o da pomada Gelol. O publicitário Duda Mendonça,
nos anos 80, elaborou a campanha “Não basta ser pai, tem que participar.” O filme
publicitário mostrava, por meio da emoção, o pai que assistia ao filho jogando
futebol. Este, ao se contundir, tinha sua dor aliviada pela pomada Gelol. Duda
Mendonça relata que a idéia do filme surgiu de uma experiência pessoal com os
filhos. A mensagem “Não basta ser pai, tem que participar”, após 23 anos, ainda gera
recall (lembrança), sendo utilizada em situações distintas ao medicamento (ibid., p.
113).
O publicitário Celso Loducca, com o desafio de trabalhar a divulgação
de alguns medicamentos, então de venda livre (OTC) do Laboratório Aché inovou ao
utilizar o humor nas propagandas das pastilhas Benalet, satirizando diversas
situações durante a campanha (ibid., p.185).
Ao criador, cabe o domínio das técnicas e o largo conhecimento geral,
pois quanto maior for o repertório do mesmo, maior sua habilidade para atuar em
criação na propaganda. Portanto, atuar em criação não é apenas esperar que uma
lâmpada se acenda com uma “uma boa idéia”, mencionando o slogan de 51, é ter
59
consciência de que o insight, ou seja, a etapa iluminação surge após muita
informação, pesquisa e dedicação.
O apelo ao medo, utilizado pelos comunicadores de marketing não deixa
de ser uma estratégia da propaganda de medicamentos desde o seu início. A dor
como vilã e o medicamento como salvador sempre caminharam juntos. Segundo
Kotler (1996, p. 521), “Os apelos emocionais tentam despertar emoções negativas ou
positivas para motivar a compra. Os comunicadores têm trabalhado com apelos de
medo, culpa e vergonha para fazer com que as pessoas façam coisas que deveriam.”
A promessa, com uma abordagem que contempla a solução imediata de um
problema, também é encontrada não apenas na propaganda de medicamentos.
Exemplo disso são os slogans: Cafiaspirina “A enxaqueca some, o ânimo aparece”;
“Melhoral é melhor e não faz mal”; Sal de Fruta Eno “Alívio já”; “Gripe ou
resfriado, Descon dá resultado”; “Tomou Doril, a dor sumiu”;“Gripou? Fluviral
desgripa”; e muitos outros.
Anúncios com promessas quase que imediatas de cura, e até ameaças ao
consumidor são explicadas por Lefèvre. Para ele, o motivo pelo qual a propaganda
utiliza a ameaça em relação ao consumidor, é a de que a própria doença constitui um
sofrimento, uma dor, uma agressão, uma invasão, e a saúde, ao contrário, representa
o alívio, o controle do sofrimento (1999, p. 102).
Kotler comenta que, por muitos anos, os comunicadores acreditavam que
a eficácia de uma propaganda aumentava com o nível de medo produzido na
mensagem, mas, com o tempo, ficou constatado que não existe prova de que os
apelos emocionais de medo ou culpa motivem a compra. A credibilidade da fonte,
sim, pode moderar a eficácia de um apelo de medo (1996, p.521). Ou seja, a
credibilidade em determinada marca do medicamento, sua eficácia, não apenas
60
baseada em promessas e ameaças, mas nos próprios resultados, na cura, é que
propicia uma fidelidade à marca. Para Temporão (1986, p. 45), a característica da
indústria farmacêutica na propaganda, qual seja, a de utilizar a dor como vilã e o
medicamento como salvador atravessou anos.
Figura 9. Anúncio de Elixir Doria.
O testemunhal, bastante presente na propaganda de medicamentos,
também não constitui novidade, por ser uma abordagem utilizada há décadas. Olavo
Bilac fez uso de sua imagem e de suas palavras para admitir o uso de Bromil, mesmo
nunca tendo superado as dores do peito (CADENA, 2001, p. 24). Padre Cícero
também testemunhou em favor para Emulsão Jonas “Attesto a bem da verdade que
usei o preparado Emulsão Jonas e também tenho empregado em pessoas de minha
família, obtendo sempre os melhores resultados nos casos de anemia, fraqueza,
61
debilidade geral, etc. Juazeiro-Ceará, 27 de outubro de 1919. Padre Cícero Romão
Baptista.” (ibid., 52).
Figura 10. Testemunhal do escritor Olavo Bilac para Bromil.
Para Ferrès, outro recurso emocional para a promoção de um produto se
concentra no uso de figuras famosas. A prova de que esse tipo de propaganda
funciona é que as pessoas se identificam com as personalidades e acabam
consumindo o produto apresentado por elas, conforme comprovam algumas
pesquisas já realizadas (1998, p. 217-218).
Exemplos dessas propagandas se encontram na própria mídia televisiva,
assim como na campanha toda. Quando o medicamento é vitamina, personalidades
esportivas como Pelé, Zico, Gustavo Borges e outros estão sempre em evidência. No
caso dos analgésicos, é comum flagrar atrizes e atores Denise Fraga, Débora Bloch,
Antonio Fagundes, Regina Duarte (JESUS, 2000, p. 22). A atriz Glória Pires, em
horário nobre da TV Globo, testemunha na propaganda: “Por isso Sonridor é a minha
escolha”. Assim como o merchandising (em uma tradução livre, seriam as
62
propagandas ao vivo em programas de televisão, muitas vezes utilizando o
testemunhal de apresentadores) de Raul Gil com Melhoral e Fausto Silva com Gelol
são alguns dos exemplos de apresentadores que exaltam a eficácia dos medicamentos
durante seus programas.
A criação na propaganda não é livre, é comprometida com cliente,
agência, enfim com resultados. E sempre teve esse comprometimento, caso contrário
não seria propaganda, nem teria como base as lógicas comerciais da publicidade.
Figura 11. Testemunhal da atriz Glória Pires para Sonridor.
5.1 Cases da propaganda de medicamentos: “alívio já”
Alguns medicamentos marcaram presença no início da propaganda no
Brasil e até os tempos atuais se mantêm no mercado farmacêutico e na propaganda.
Ao visitar drogarias pelo Brasil, as pessoas deparam-se com
medicamentos antigos, com sabor nostálgico, ainda fabricados e vendidos no país.
Essência de Vida Olina, Biotonico Fontoura, Elixir de Inhame Goulart, Xarope São
63
João, Pílulas de Vida do Dr. Ross, Emulsão Scott, Sal de Fruta Eno e Aspirina são
alguns deles (GOMIDE, “O Estado de S.Paulo”,14 de nov. 1999, p. 15 ).
Figura 12. Biotonico Fontoura no ponto de venda.
Naldecon é um medicamento antigripal que age no organismo aliviando e
controlando os sintomas da gripe. Quando consumido à noite, proporciona um sono
mais tranqüilo. Naldecon Dia, por não possuir anti-histamínico na sua fórmula, é
indicado para o consumo durante o dia, pois não tira a disposição da pessoa. A
campanha criada pela agência Giovanni,FCB para tal medicamento compreendeu a
veiculação de filmes publicitários de 30 segundos, com versão de 15, anúncios
impressos, mídia exterior e material de ponto de venda.
Os atores Júlia Lemmertz e Alexandre Borges são os protagonistas do
filme. Júlia começa elogiando o marido, dizendo que, além de ele ser bonito e
inteligente, ainda cuida bem dela: "Ontem, por exemplo, eu estava gripada... não ia
dormir bem". "Eu dei Naldecon para ela", completa Alexandre. "Dormi tranqüila e
acordei super bem", diz Júlia, que no final do filme, completa: "Diz a verdade, não é
o homem que você pediu a Deus?".
64
Glaxo Smithkline é o resultado da fusão de duas das maiores indústrias
mundiais no segmento farmacêutico, a Glaxo Wellcome e a Smithkline Beecham. A
empresa centenária no Brasil, tem uma longa história de contribuição para a saúde
dos brasileiros. Entre os medicamentos estão os consagrados, Sal de Fruta Eno e
Emulsão Scott. Sal de Fruta Eno, disponível nos sabores tradicional, laranja e
guaraná, é um antiácido efervescente presente há mais de 70 anos na vida dos
brasileiros, indicado para o alívio da azia e má digestão. Emulsão Scott é um tônico
para adultos e crianças, com óleo de fígado de bacalhau, vitaminas A e D, em 3
sabores: tradicional, laranja e morango (http://
www.gsk.com.br).
O CONAR, Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária
(http://
www.conar.org.br), analisou a campanha “Alívio já. Eno Guaraná” em
anúncios de revista e TV, que prometia “Alívio Já! Com a energia e o sabor do
guaraná” com o sal de fruta Eno, afirmando que a ação de alívio da azia e da má
digestão era dinamizada pelo sabor de guaraná. A questão discutida foi o sabor e a
energia do guaraná, e não a promessa de “alívio já”. Muitas vezes esse tipo de análise
ou denúncia é requerido ao CONAR pela concorrência, incomodada com os
lançamentos e o diferencial do concorrente.
“Sal de Fruta ou Sal de Frutas?” foi o questionamento utilizado em
campanha por Serginho Groisman, garoto-propaganda de Eno, com o propósito de
educar os consumidores e aproximá-los ainda mais do medicamento, já bastante
popular.
Sal de Fructa Eno começou a ser produzido no Rio de Janeiro em 1932,
pelo mesmo fabricante de Emulsão Scott, presente em São Paulo, desde 1908
(VIEIRA, 2003, p. 120).
65
Fortes anunciantes sempre se associaram ao bem-estar das pessoas. Scott,
feito à base de óleo de fígado de bacalhau, garantia ser um fortificante e
reconstituinte rico em vitaminas, cálcio e fósforo, indicado à criança anêmica. Os
rótulos de Emulsão Scott conservaram a imagem do pescador que carrega nas costas
um grande bacalhau. Essa imagem, presente na embalagem do medicamento e nos
anúncios, foi, inclusive, citada em música de Billy Blanco (ibid., p. 124).
Figura 13. Emulsão Scott no ponto de venda.
Atualmente, mais vendido no norte e nordeste do país, Emulsão Scott
acrescentou ao óleo de fígado de bacalhau sabores laranja e morango e ao rótulo de
frasco plástico, a figura do pescador carregando o bacalhau permanece. O Sal de
Fruta Eno, não mais Sal de Fructa Eno, também tem versão sabores: natural, laranja e
guaraná e permanece líder em vendas de antiácidos. Sofreu várias alterações visuais,
sempre ressaltando a palavra Eno, inclusive em rádio e TV. O frasco plástico de Eno
com borbulhas, fazendo referência à efervescência do antiácido se mantém (ibid., p.
122-123) assim como os “saquinhos” com a dose do medicamento. Eno conseguiu,
através do tempo, atualizar sua imagem.
66
Analgésicos são os medicamentos mais presentes na vida dos brasileiros.
Vendidos em farmácias e drogarias, também são encontrados, mesmo que
ilegalmente, em lojas de conveniência, padarias, camelôs, como produto qualquer e
não como medicamento. O analgésico, primeira classe de medicamentos produzida
em escala industrial, indicado para alívio de dores e febre, pode ter como princípio
ativo: paracetamol ou dipirona ou ácido acetilsalicílico.
Exemplo de analgésico à base de dipirona é Anador. Fabricado pela
Boehringer Ingelheim do Brasil, Anador, lançado no Brasil em 1953, é um
analgésico e antitérmico à base de dipirona sódica, substância descoberta em 1922 na
Alemanha, presente em mais de 120 países. Inicialmente, a marca Anador
desenvolveu-se no mercado nordestino e ficou conhecido como “um remédio para
dor de corpo”. Na década de 1980, passou a fazer parte do mercado de éticos e de
venda livre. Investiu no segmento de medicamento antitérmico em comprimidos e
em gotas. Em propagandas distintas, Anador gotas foi divulgado pelo slogan “Febre
não tem hora, tenha sempre em casa Anador” e Anador comprimidos “Contra dor,
tenha sempre Anador” (FREIRE e ALMEIDA, 2001, p.19-20).
Figura 14. Anúncio de Anador em abrigo de ônibus luminoso.
67
A estratégia de geração para geração foi utilizada em campanhas com
artistas famosos: família Goulart, família Montenegro, etc. Tornou-se “Anador,
tradição no combate à dor” e da década de 1990 até os tempos atuais, Anador investe
em propagandistas e nos pontos de venda, com material de propaganda específico e
eventos que reúnem os representantes (ibid. p.23). Atualmente, conforme imagem
anterior, Anador mudou de embalagem e existe também na versão paracetamol,
recomendado no combate à dor e à febre.
Neosaldina é outro exemplo de analgésico com princípio ativo dipirona,
cafeína e isometepteno, mais conhecido no combate à enxaqueca. Lançada em 1972
pela Knoll, inicialmente ético, era propagado apenas aos médicos. Na década de
1980, o medicamento passou a patrocinar festas populares, como a da cerveja no Rio
de Janeiro. Apesar da divulgação promocional, Neolsaldina sempre teve a aceitação
de médicos. Segundo Freire e Almeida, “[…] em 1999 era o terceiro produto em
unidades da indústria farmacêutica segundo IMS, registrando, somente na versão
drágeas, vendas de 1,3 milhão caixa/mês” (2001, p. 83-84).
Com o slogan “Com Neosaldina a dor de cabeça passa logo de cara”, o
medicamento seguiu investindo em comunicação na mídia, inclusive no programa da
apresentadora Ana Maria Braga. Além disso, ações promocionais no Sambódromo
do Rio, Festa Oktoberfest em Blumenau e Recifolia em Recife e nas datas sazonais
foram constantes (ibid.,p. 90).
Em 2005, então pertencente ao laboratório Altana, uma empresa do
Grupo Altana, de origem alemã, com atuação no Brasil, Argentina e Mercosul, o
analgésico Neosaldina enfrentou um problema de plágio no Brasil, mas por
unanimidade conseguiu a suspensão da comercialização de Neuralgina, fabricado
68
pelo laboratório brasileiro Cifarma Científica Farmacêutica
(
http://conjur.estadao.com.br/static/text/34982,1).
O medicamento, até novembro de 2003, pertencia à Abbott e nessa data
foi vendida à Altana Pharma. Depois de escolher a Fischer como a agência de
Neosaldina, em março de 2004, três meses depois a Altana iniciou a veiculação da
campanha filme de 30 segundos para Tv, spots de rádio e produção de mídia exterior,
com mensagens em placas de rua, outdoors, front lights, back lights, busdoors,
prismas de táxi, relógios de ruas e peças de mobiliário urbano, como bancas de jornal
e pontos de ônibus, que teve como objetivo principal rejuvenescer a marca com os
atuais consumidores, além de atrair o público jovem, com o slogan "Não leve dor de
cabeça. Leve Neosaldina".
Seguindo a linha popular de comunicação, a expressão boca a boca
“Chama a Neosa”, ou “Estou com uma dor de cabeça, quero uma Neosa!”,
Neosaldina atualmente tem campanha explorando o apelido do medicamento.
Figura 15. Anúncio de página dupla em revista de Neosaldina.
69
Atualmente, Neosaldina pertence ao laboratório Nycomed Pharma (ex
Altana Pharma) e sua comunicação a Thanks Comunicação.
Aspirina, um clássico nos estudos de medicamentos, talvez seja um dos
nomes mais citados na mídia, nos livros, filmes e pelas pessoas. Tamanha
consagração do medicamento consolidou a marca e o nome. Aspirina vem de “a”,
para “acetil”, e “spir”, de “spirea”, outra fonte natural da salicina, produzida a partir
da casca do salgueiro (Salix alba). Seu efeito analgésico foi descoberto em 1763, seu
princípio ativo, em 1828, e a síntese na forma do ácido salicílico, elaborada em 1859.
Só em 1897 seria substituído por ácido acetilsalicílico. Todavia, as virtudes da planta
já eram conhecidas desde a Grécia e também por índios americanos (JESUS, 2000, p.
60).
Em 1899, Bayer lança a Aspirina; em 1905, esta chega ao Brasil.
Atualmente, é considerado o medicamento mais vendido do mundo pelo Guiness
Book. Inicialmente utilizado para combater as dores do reumatismo, em seguida foi
associado à cura ou ao alívio de gripes, resfriados, febres, ressaca, nevralgias e dor
de dente e ouvido (Folha de S.Paulo, 28 de fev 1999, Cotidiano, p.7), além de ser
utilizada em dores no corpo, em doenças cardiológicas (caso da Aspirina Prevent,
esta apresenta uma tecnologia de fabricação diferenciada, que consiste no
microencapsulamento de partículas de tamanhos diferentes. Tais partículas
proporcionam uma absorção gradual pelo intestino e oferecem maior proteção à
mucosa gástrica), em tratamentos de casos de tumores intestinais, etc (FREIRE e
ALMEIDA, 2001, p. 30).
Acredita-se que existem inúmeras pesquisas acerca da benfeitoria do
ácido acetilsalicílico, como a Aspirina, mas também muita propaganda e pouca
informação. Segundo Nascimento (2003, p. 102), a Aspirina e outros analgésicos
70
causam por ano quase tantas mortes quanto a aids nos Estados Unidos. Um estudo
publicado na revista New England Journal of Medicine relata que as úlceras
provocadas pelo uso excessivo do medicamento são responsáveis por milhares de
mortes por ano.
Aspirina sempre teve a preocupação de ser popular. Conforme se
examinou no capítulo 1, os primeiros anúncios de Aspirina no Brasil transcreviam o
cotidiano do brasileiro. Aspectos culturais, como carnaval e futebol, sempre
marcaram presença e, até os tempos atuais, a agência de propaganda
ALMAP/BBDO, responsável pela propaganda de Aspirina, utiliza o bom humor em
anúncios de revista e nos filmes veiculados pela TV. Aspirina patrocina o folheto das
letras de músicas de escolas de samba do Rio, com mensagens segmentadas.
Figura 16. Anúncio de Aspirina em folheto.
71
A Aspirina tem inúmeras histórias consagradas. Poucos dizem “Vou
tomar um analgésico para dor de cabeça”, mas sim “Vou tomar uma Aspirina”.
Aspirina tornou-se solução de problemas diversos e sinônimo de analgésico.
Segundo pesquisa realizada pela Bayer do Brasil há pouco mais de três anos, com a
finalidade de saber a opinião dos consumidores sobre a provável alteração do slogan
da Bayer “Se é Bayer, é bom”, das mais de mil pessoas entrevistadas, 89% optaram
pela permanência do mesmo (Campanhas Inesquecíveis, 2007, p. 171).
Há 10 anos, o professor Gustav Born, de Londres, no encerramento de
um Simpósio sobre Aspirina, realizado em Veneza, afirmou: “os próximos cem anos
de Aspirina ainda vão ser mais emocionantes do que os últimos.” (FREIRE e
ALMEIDA, 2001, p. 29).
Figura 17. Anúncio de Aspirina, ½ página dupla em revista.
Atualmente, em 2007, com Leis e Resoluções da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA) e Conselho Nacional de Auto-Regulamentação
Publicitária (CONAR), como será visto no próximo capítulo, há várias restrições nos
processos que envolvem a criação em propaganda de medicamentos.
72
3 PROPAGANDA E INDÚSTRIA FARMACÊUTICA
1 Breve histórico da indústria farmacêutica no Brasil
A história da indústria farmacêutica no Brasil, segundo Edler (2006, p.
104), tem início no final do século XIX, com o surgimento dos primeiros laboratórios
farmacêuticos nacionais,
“[...] mas foi a partir da segunda metade da década de 1910 que ocorreu o
maior e mais duradouro desenvolvimento da nossa indústria farmacêutica.
Em 1913, o Brasil contava com 765 estabelecimentos produtores de
medicamentos; ao findar a Primeira Guerra Mundial, esse número já era
1.181, chegando a 1.329 estabelecimentos em 1930.”
Para Carlini (2004, p.52), “a utilização da expressão botica para farmácia
e boticário para o farmacêutico vem desde o descobrimento do Brasil, perdurando até
as primeiras décadas do século 19”. As boticas instaladas, utilizando práticas
artesanal e empírica, assemelhavam-se às congêneres européias, trazidas por
farmacêuticos que transferiam seus conhecimentos às novas gerações, num processo
de pai para filho. Os remédios, então, eram preparados nas próprias boticas.
Herança indígena, a fé desde sempre teve espaço na cultura popular
brasileira, portanto, o remédio ou o fato de remediar a doença não tinha uma busca
racional apenas no preparado, mas na crença. Edler (2006, p.48) relembra: “os
remédios iam da oração à sangria, passando pelos exorcismos, fórmulas mágicas,
talismãs, ervas, minerais e substâncias de origem animal. Para um mesmo fenômeno,
os pacientes invocavam explicações múltiplas e se sentiam livres para chamar todo
tipo de terapeutas.” Nesse período, a maior parte da população, formada por pobres e
escravos, contava com remédios caseiros, muitas vezes recomendados por
curandeiros.
73
“As desigualdades sociais e culturais, herdadas do período colonial e
acentuadas até o limite com a escravidão, se refletiam também no uso dos
remédios. O acesso aos produtos das farmácias, boticas e drogarias,
muitos deles importados, era quase sempre uma prerrogativa dos brancos
ricos.” (EDLER, 2006, p. 80).
E, ainda hoje, segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde
(OMS), cerca de 2 bilhões de pessoas (1/3 da população mundial) ainda não têm
acesso a medicamentos essenciais e mais de 10 milhões de vidas poderiam ser salvas
anualmente até 2015 (ITALIANI, 2007, p.2).
A produção industrial de medicamentos cresceu lentamente. Em 1907,
existiam aproximadamente 60 estabelecimentos funcionando no país; já nas duas
primeiras décadas do século XX, as farmácias preparavam as receitas indicadas por
médicos, além de fabricarem elixires, vinhos e licores reconstituintes, pomadas e
produtos de beleza (EDLER, 2006, p. 96-97). “De acordo com a avaliação da
Organização Mundial da Saúde, até os anos 40, a indústria farmacêutica consistia
essencialmente na manufatura orientada a produtos que já se encontravam
disponíveis” (ITALIANI, 2007, p. 3).
Na década de 1950, farmacêuticos sem formação teórica nem técnica,
como José Maria Camargo, eram, provavelmente, os únicos responsáveis pela saúde
da população da pequenina cidade rural de Parapuan, interior de São Paulo. Os
moradores, carentes de médicos, depositavam toda a confiança nas mãos do “doutor”
Zeca que, além de manipular os medicamentos, aplicar injeções e curar feridas
expostas, tinha em sua farmácia São Carlos uma caderneta de anotações para
controlar as dívidas dos moradores, que lhe pagavam quando e como podiam.
As maiores indústrias farmacêuticas do mundo faturam, em conjunto,
cerca de 500 bilhões de dólares/ano. Estima-se que elas invistam cerca de 40 bilhões
de dólares por ano em pesquisa de novas moléculas inéditas. O custo aproximado
74
para que uma única nova substância chegue ao mercado ultrapassa 800 milhões de
dólares (NEIVA, 2005, p. 62-64). Esse número é bastante contestado por jornalistas,
como Márcia Angell, uma autoridade americana no campo da política de saúde e da
ética médica, ex-editora-chefe do New England Journal of Medicine. Ela afirma que
o marketing está disfarçado de pesquisa, colocando em dúvida os valores declarados
pela indústria farmacêutica nos estudos acerca da descoberta de novos medicamentos
(2007, p.171).
As farmácias ou drogarias, consideradas como ponto de venda de
medicamentos, chegam aos aproximados 55 mil estabelecimentos no Brasil (país
com o maior número de farmácias no mundo), com proporção de aproximadamente 4
farmácias para cada 10 mil habitantes (ITALIANI, 2007, p. 22). Em tempos de
boticas, os boticários eram presentes, mas atualmente o profissional farmacêutico
nem sempre é, cedendo lugar aos atendentes ou balconistas, estes resumem suas
atividades a ler a receita prescrita pelo médico, vender o medicamento, indicar um
medicamento sem controle de receita ou receber a visita de um representante da
indústria farmacêutica, também conhecido por propagandista.
Antes boticas, hoje farmácias e até “ciberfarmácias” estão presentes na
vida dos brasileiros, que recebem diariamente e-mails de supostas farmácias
canadenses que oferecem, sem receita e a preço às vezes abaixo do mercado
nacional, vários medicamentos, inclusive os que deveriam ser vendidos apenas sob
prescrição médica. Segue transcrito o slogan de uma delas: "The meds you order is
the meds you get" ("O medicamento que você encomenda é o que você recebe").
Além de muitas vezes não receber o medicamento solicitado, o consumidor ainda
corre o risco de obter medicamentos falsificados. O próprio Viagra pode ser
comprado através de site:
www.viagrabrasil.kit.net. As farmácias “virtuais” vendem
75
medicamentos controlados para o mundo todo, sem que haja uma fiscalização nesse
sentido. A exemplo de “ciberfarmácias”, alguns sites atuam livremente no mercado,
como
www.medicamentosbrasil.com.br, além de oferecerem medicamentos, efetuam
as entregas, divulgam e fazem promoção de produtos.
A indústria farmacêutica brasileira cresceu 4% em volume de vendas no
terceiro trimestre de 2007. Foram comercializadas 388,3 milhões de unidades de
medicamentos no Brasil. Pelo critério de valor, o mercado farmacêutico brasileiro
cresceu 22% entre julho e setembro de 2007, na comparação com o mesmo período
em 2006 (http://www.folhaonline.com.br).
Alguns fatores são responsáveis por esse crescimento. Um deles se refere
ao fato de o mercado industrial farmacêutico ser considerado oligopólio, porque está
dividido entre poucas empresas, o que as tornam capazes de alterar preços e controlar
o próprio negócio no país.
Em média 20% do faturamento do setor farmacêutico se origina de
empresas de capital nacional, sendo que a produção e a comercialização dos
genéricos estimulam a produção no país, promovendo a ampliação da participação
dos laboratórios nacionais no mercado brasileiro, a exemplo dos laboratórios Aché,
EMS, Medley e Eurofarma (EDLER, 2006, p. 108). Dentre esses, EMS-Sigma
Pharma conquistou a liderança nacional do segmento em faturamento e em unidades
vendidas (115, 6 milhões de reais, em 2006). Um dos grandes responsáveis por esse
desempenho é o medicamento genérico (Revista D2B, jul. 2007, p. 22).
Os gastos per capita com produtos farmacêuticas também variam muito.
Nos países ricos, o valor ultrapassa os US$400, enquanto nos países mais pobres não
chega a US$4. Hoje, cerca de 15% da população mundial consomem 90% dos
medicamentos disponíveis (ITALIANI, 2007, p. 2).
76
Segundo Italiani (ibid., p. 27), as vendas do setor farmacêutico estão
divididas em: 32% medicamentos de tarja vermelha; 30% em produtos de higiene e
beleza; 23% de medicamentos controlados (tarja preta); 15% medicamentos de venda
livre, como analgésicos, antigripais, antiácidos, também conhecidos como OTC
(Over The Counter).
A indústria farmacêutica investe em P&D, ou seja, Pesquisa e
Desenvolvimento. Um dos setores que mais recebe investimentos em pesquisas é o
dos medicamentos contra a dor. A busca por grandes descobertas está promovendo
profundas transformações na indústria farmacêutica. Como os investimentos têm de
ser cada vez maiores e as mentes brilhantes capazes de sintetizar esses medicamentos
não são exatamente abundantes, as empresas que atuam nessa área estão passando
por fusões e associações. Tornaram-se freqüentes, ainda, fusões entre gigantes da
área farmacêutica e empresas de biotecnologia, de onde tem saído boa parte das
novas descobertas dos medicamentos.
A concorrência entre os laboratórios é grande no Brasil. Há oito anos
uma norma da Organização Mundial do Comércio estabeleceu a validade da patente
de um medicamento. Ela dá ao fabricante de um medicamento vinte anos de
exclusividade para a sua produção e comercialização. Ou seja, um laboratório cria
uma molécula e, antes mesmo de saber se ela será útil para um novo medicamento,
requer a sua patente. Como pode levar, em média, doze anos para o medicamento
chegar às farmácias, isso significa que o fabricante pode ter apenas oito anos para
vendê-lo com exclusividade. Vencida a patente, o caminho está aberto para a
produção de concorrentes e genéricos.
Segundo Italiani (2007, p.47-48), a FDA (Food and Drug Administration,
surgida em 1906, nos Estados Unidos) é responsável pela aprovação de um
77
medicamento, ainda na fase de P&D, inclusive dos genéricos, considerados cópias de
medicamentos de referência cujos direitos exclusivos (patentes) de comercialização
expiraram.
No Brasil, a responsável pelo processo de aprovação de novos
medicamentos é a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária, criada em
1999). “No Brasil, o patenteamento para a área farmacêutica foi abolido por
completo em 1969, pelo Decreto-lei nº 1.005/69, que permaneceu em vigor até a
adoção da atual Lei de Propriedade Industrial, Lei nº 9.279/96.” (ITALIANI, 2007,
p.6).
É notório o investimento da indústria farmacêutica em pesquisa e
tecnologia, inclusive quando comparada aos outros setores do mercado.
Recentemente, foi publicado um relatório lançado pela Consultoria Booz Allen
Hamilton sobre as empresas mais inovadoras do mundo. Dentre as 20 empresas que
mais investem em P&D estão as representantes da indústria farmacêutica: Pfizer (2º
lugar), Johnson&Johnson (7º), GlaxoSmithKline (10º), Sanofi-Aventis (14º) e
Novartis (16º), entre outras (Revista ÉpocaNegócios, jan. 2008, p. 30). Isso
comprova o investimento em novas idéias, pesquisas e descobertas em busca da cura.
1.1 Doença e saúde – a busca pela cura
Buscando entender a dor, a cura e a própria relação saúde e doença,
pode-se compreender a existência do medicamento, dos altos investimentos da
indústria farmacêutica em marketing e na comunicação, especificamente na
propaganda no país.
78
A saúde sempre foi relacionada à doença, e a partir do momento que se
aliou à cura e não à prevenção, o medicamento passou a agir imediatamente na vida
do ser humano. Segundo Sontag (1984, p. 91), doença sempre foi usada como
metáfora para reforçar acusação de que uma sociedade era injusta ou corrupta.
“Nenhuma enfermidade tem sua lógica característica. As imagens que se fazem da
doença são usadas para exprimir preocupação com a ordem social, e a saúde é algo
de que presumivelmente todos têm conhecimento.” Sontag (ibid.,p. 7) acrescenta
“meu ponto de vista é que doença não é uma metáfora e que a maneira mais honesta
de encará-la e mais saudável de ficar doente é aquela que esteja mais depurada de
pensamentos metafóricos, que seja resistente a tais pensamentos.”
Doença sempre esteve ligada à dor, um dos maiores desafios da
medicina, talvez porque tal palavra ultrapasse o seu próprio significado. A dor é
vista, muitas vezes, como uma linguagem que o corpo usa para dizer à consciência
que algo não está bem. O assunto saúde atravessou séculos, principalmente por
envolver dois aspectos relevantes à condição humana: nascer e morrer. “Somente a
partir do século XIX, graças ao desenvolvimento científico, é que a saúde passa a ser
vista como uma relação do ser humano com o meio em que vive” (ZUBIOLI, 2004,
p. 191).
A preocupação com a saúde esteve presente desde o princípio da
civilização. Zubioli (ibid.) relata em seus estudos que documentos antigos, como o
Código de Humaribi (1792-1750 a.C.), o Papiro Ebers (1550 a.C.) e a Bíblia trazem
referências à saúde, estabelecendo procedimentos necessários à preservação da
mesma (ibid.).
A precariedade de pesquisas e, sendo assim, do desenvolvimento da
Ciência até a Idade Média, fez com que saúde e doença tivessem relação com desejos
79
divinos. Como a dor não pode ser medida de maneira objetiva, a exemplo da pressão
do sangue e de níveis de colesterol, muitas vezes a cura é vista de maneira subjetiva.
Um sintoma patológico leva pessoas a pedirem ajuda a profissionais de saúde e
recorrerem ao medicamento em busca de alívio ao sofrimento. “Na psicanálise,
contudo, o sintoma é um mal-estar que se impõe a nós, além de nós e nos
interpela.”(SANTAELLA, 2004a, p.134-135). A autora também cita que “Em Lacan,
a concepção de sintoma foi passando por modificações, conforme sua clínica e
ensino avançaram do registro Imaginário, para o Simbólico e, por fim, para o Real.”
Lacan atribuiu o sintoma a uma mensagem cifrada, ou seja, um signo, no sentido de
C.S.Peirce: “aquilo que representa algo para alguém.” O sintoma representa algo
enigmático para aquele que o sofre e, na análise, também para aquele que o escuta
(ibid.)
São inúmeros os fatores que fazem parte desse contexto, mas sem dúvida
o sintoma cultural somado à falta de informação faz com que a população brasileira
seja vítima da situação.
Em 1947, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu saúde como
“[...] o estado do mais completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a
ausência de enfermidade.” Em 1949, após perceber que a definição ainda não
deixava claro o que realmente era saúde, a OMS conceituou saúde da seguinte
maneira:
Saúde pública é a ciência e a arte de evitar a doença, prolongar a vida e
promover a saúde física e mental e a eficiência, através de esforços
organizados da comunidade, visando ao saneamento do meio, ao controle
das infecções comunitárias, à educação do indivíduo nos princípios da
higiene pessoal, à organização de serviços médicos e de enfermagem para
o diagnóstico precoce e o tratamento da doença e ao desenvolvimento dos
mecanismos sociais que assegurarão a cada pessoa na comunidade o
padrão de vida adequado para a manutenção da saúde.
(
http://www.anvisa.gov.br)
80
Lefèvre (1999, p. 94) afirma que “faz parte da semiótica da saúde e da
doença, além da dimensão estritamente significativa do problema, também uma
importante dimensão pragmática relativa a sensações orgânicas que cercam as idéias
de saúde e doença.” Em outras palavras, para ele é de suma importância que as
pessoas de modo geral entendam o experenciar da sensação de dor, isto é, de doença
e de alívio de dor, isto é, de saúde.
As relações entre dor e medicamento são tão estreitas que, em situações
rotineiras, quando, por exemplo, alguém diz que está com dor de cabeça,
imediatamente o ouvinte faz um diagnóstico, dá um palpite ou até prescreve um
medicamento.
É reconhecida a importância do medicamento na vida das pessoas. O
problema é quando essa importância passa a ser uma dependência. Ao propor uma
reflexão a respeito da presença da propaganda de medicamentos no Brasil, alguns
aspectos podem ser verificados: a saúde das pessoas, o processo de cura, o papel da
indústria farmacêutica, as estratégias de marketing e propaganda utilizadas, os
agentes da saúde, questões estéticas e questões éticas.
1.2 Os medicamentos – controlados ou “descontrolados”?
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA),
medicamento é produto farmacêutico com finalidade profilática, curativa, paliativa
ou para fins de diagnóstico. Remédios seriam os recursos para aliviar o desconforto,
como um preparado caseiro com plantas medicinais, mas não industrializado.
2
Usualmente, as palavras medicamentos e remédios são empregados nas
literaturas e mesmo na propaganda com o mesmo significado. O fato é que remédios
2
http://www.anvisa.gov.br/medicamentos/glossario/index.htm
81
têm várias formas de apresentação, que vão de práticas religiosas, filosofias de vida
aos medicamentos. Medicamentos são em geral compostos químicos sintetizados em
laboratório, ou seja, pela indústria farmacêutica. Esse emprego ainda ocorre em
virtude de a palavra remédio ser popular.
Medicamento, segundo Pignarre (1999, p. 52), tem relação com
medicamentos da medicina oficial ou medicamentos modernos, os reconhecidos pelo
FDA (Food and Drug Administration), que têm relação distante das práticas
empíricas e se aproxima da farmacologia racional ou de pesquisa genética. O autor
também conceitua medicamento de laboratório como efeito de molécula que implica
efeito biológico in vitro, assim como noções de estabilizador, inscritor, marcador,
arrombador e phármakon.
Para explicar a palavra phármakon e seu significado quando utilizado, é
válido recorrer a Derrida (1997, p. 46). Segundo ele, a tradução corrente de
phármakon por remédio, droga benéfica, pode não ser exata. “A tradução de
phármakon por remédio não poderia ser, pois, nem aceita, nem recusada, segundo
Platão, como remédio do que como veneno.” Platão suspeitava do phármakon em
geral, mesmo quando se tratava de drogas utilizadas com fins terapêuticos e
manejadas com boas intenções. Para ele, não havia remédio inofensivo e, portanto,
phármakon jamais poderia ser simplesmente benéfico.
Medicamento, por isso, não deixa de ser droga e apresenta efeitos
colaterais. Antialérgicos causam sonolência; antibióticos fazem mal aos rins;
cortisona provoca pressão alta e assim sucessivamente. Nenhum medicamento
poderia ser consumido sem o acompanhamento de um médico.
As definições a seguir foram extraídas do vocabulário da ANVISA
(
http://www.anvisa.gov.br/medicamentos/glossario/index.htm)
82
Medicamento de venda livre é aquele cuja dispensação não requer
autorização, ou seja, receita expedida por profissional. Medicamento ético
é o medicamento cujo uso requer a prescrição do médico ou dentista e que
apresenta em sua embalagem, tarja (vermelha ou preta) indicativa desta
necessidade. Medicamento de marca comercial (medicamento de
referência) é aquele elemento que identifica uma série de produtos de um
mesmo fabricante ou que os distinga dos produtos de outros fabricantes,
segundo a legislação de propriedade industrial. Medicamento similar é
aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresenta a
mesma concentração, forma farmacêutica, via de administração,
posologia e indicação terapêutica, preventiva ou diagnóstica, do
medicamento de referência registrado no órgão federal responsável pela
vigilância sanitária, podendo diferir somente em características relativas
ao tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem,
rotulagem, excipientes e veículos, devendo sempre ser identificado por
nome comercial ou marca. Medicamento genérico é o medicamento
similar a um produto de referência ou inovador, que se pretende ser com
este intercambiável, geralmente produzido após a expiração ou renúncia
da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada
a sua eficácia, segurança e qualidade.
Como não há como mensurar as sensações dolorosas, pois a dor é uma
experiência pessoal e intransferível, a busca ao alívio inclui diferentes recursos: chá
com ervas, remédios diversos, benzedeiras, medicamentos etc. Alguns destes, como
analgésicos, oferecem bem-estar momentâneo. Antigripais, na verdade, não curam a
gripe, mas aliviam os sintomas. Ambos, analgésicos e antigripais, causam inúmeras
complicações, como úlceras, hemorragias digestivas e problemas no fígado
(NASCIMENTO, 2003, p. 94).
Aparentemente inocente, o uso diário de analgésico, campeão em
consumo entre os medicamentos de venda livre, segundo o Conselho Regional de
Farmácia do Estado de São Paulo, pode transformar uma dor de cabeça em problema
crônico. Ele serve, no máximo, como paliativo para amenizar dores esporádicas. O
antiácido alivia os sintomas da indigestão em minutos. O efeito é rápido, mas a azia
pode voltar.
Importa saber diferenciar gripe de resfriado. A gripe, doença que
costuma atingir o aparelho respiratório, causa dores musculares e febres altas. É
causada pelo vírus influenza e costuma demorar uma semana para passar. Não há
83
medicamentos que combatam o vírus, portanto aqueles conhecidos como antigripais
têm o objetivo de aliviar os sintomas semelhantes aos de resfriados. Causado por
mais de 200 tipos de vírus, o resfriado tem incômodos mais leves que os da gripe e
demora até quatro dias para passar.
Em razão da variedade de sintomas, as fórmulas de medicamentos para
combatê-lo costumam ser compostas por analgésico, antitérmico, antihistamínico e
broncodilatador.
3
O medicamento de venda livre (também conhecido por OTC ou isento de
prescrição médica), como o próprio nome indica, pode ser adquirido sem receita
médica. Já o medicamento ético, por ser controlado (tarjas preta ou vermelha), só
pode ser comprado com prescrição médica, mesmo quando vendido pela internet. A
respeito dessa distinção, Dr José Ruben de Alcântara Bonfim, médico sanitarista e
coordenador executivo da Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos
(SOBRAVIME) diz:
“É uma irrisão a separação, proposta há décadas pela indústria
farmacêutica no país, entre produtos "éticos" e "populares" (ditos de
venda livre). Com resguardo para os produtos que têm na rotulagem a
tarja preta, vende-se qualquer produto farmacêutico ao incauto
consumidor que queria resolver um problema de saúde. A presença
efetiva do farmacêutico nos estabelecimentos (farmácias e drogarias) seria
um passo, associado com medidas de educação do público quanto aos
riscos de consumo de fármacos sem orientação do médico ou do
farmacêutico, para disciplinar a venda de produtos farmacêuticos
mediante a introdução da dispensação, ato técnico que não pode ser
realizado por comerciantes e seus auxiliares, há poucos anos disfarçados
com a denominação, oriunda da indústria, de "farmacistas" e
"balcofarmacistas"” (1999, p. 233).
A discussão é ainda mais longa, quando o assunto é pílula inócua, ou
placebo. No Brasil, as publicações a respeito de placebo datam de 1998, com o
polêmico “caso Microvlar”, do laboratório Schering do Brasil que, ao testar
embalagens, comercializou, no lugar do medicamento, pílula de farinha, inócua,
3
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/inde25102007.htm
84
gerando grande conflito no mercado farmacêutico, inclusive na vida de mulheres que
engravidaram, contra a vontade.
Para Pignarre, o placebo deve ser “duplo cego”, pois nem quem
prescreve, nem o paciente deve saber quem recebe a molécula ou o “vazio
terapêutico”. Pignarre acredita que talvez seja a maneira mais simples e eficaz de
testar uma molécula candidata a medicamento (1999, p.17). Para ele, pode-se
também fazer a seguinte distinção: efeito placebo implica negociação, socialização,
modo de domesticação, modo de usar, arte de consumo e efeito biológico in vivo e
em série em um ser vivo humano; medicamento diz respeito a efeito biológico in
vitro e ex vivo, e noções de: estabilizador, inscritor, phármakon, marcador,
arrombador (ibid., p. 52). No mais, o efeito placebo exerce um efeito físico e
psicológico produzido por um medicamento que nem fabricado cientificamente o é.
Esse fato faz com que alguns pesquisadores e, principalmente, médicos relutem em
utilizá-lo.
Com todo o conhecimento existente na ciência, o placebo ainda
permanece como mistério. Seu bom ou mau uso pode significar uma vida,
principalmente enquanto seus efeitos são pouco conhecidos a fundo e seu
funcionamento, isto é, como realmente agem os placebos, ainda é alvo de muitas
teorias, inclusive a abordagem psicológica.
Estudos freudianos e lacanianos utilizam-se da experiência com o
placebo, em suas pesquisas: “O placebo, de fato, deve nos separar da ilusão
substancial. Não há possibilidade de separar o medicamento do sujeito. O sonho da
pureza bioquímica é uma ilusão, mas o sonho do isolamento da crença no
medicamento como sugestão também o é.” (Revista Clique, 2002, p.28).
85
1.3 Automedicação: “prescrição de saúde”
Algumas práticas voluntárias ou irracionais vêm chamando a atenção dos
profissionais de saúde: autotratamento, autocuidado, autoprescrição e
automedicação. Apesar de parecidas, elas são muito diferentes entre si.
Autotratamento tem relação com o fato de autotratar-se de maneira
voluntária, por meio de chás, ervas, banhos, etc. Entretanto, ele também pode ser
farmacológico. Segundo definição do Dr. Bonfim
4
: “entende-se por autotratamento
farmacológico a situação em que pacientes conseguem e utilizam produtos
farmacêuticos sem nenhuma intervenção do médico, seja para o diagnóstico da
doença, seja na prescrição ou na supervisão do tratamento.”
O autotratamento é mais freqüente no norte e nordeste do Brasil, não
excluindo as demais regiões, onde é comum a venda de “garrafadas” (misturas feitas
à base de plantas e raízes) que prometem verdadeiros milagres. Em cada parte do
país, seja por questão geográfica seja por cultural, as pessoas encontram novas
formas de se autotratar. Para Zubioli (2004, p. 246), “o autotratamento farmacológico
é o uso de fármacos, não sujeitos à receita médica, por iniciativa própria dos
usuários, com assistência ou aconselhamento farmacêutico.”
Autocuidado pode ser definido como prática individual, com os seguintes
procedimentos: higiene, nutrição e estilo de vida. Age mais como prevenção de
doenças e qualidade de vida (ibid.).
Autoprescrição consiste no uso de remédios com tarja vermelha, isto é,
proibidos, sem prescrição nem orientação médica. Ao contrário da automedicação
4
José Ruben de Alcântara Bonfim. Palestra realizada no I Seminário Internacional de Propaganda de
Medicamentos, em Brasília, dia 06 de abril de 2005.
86
responsável, a autoprescrição representa um grande risco à saúde do paciente e deve
ser evitada.
Segundo a ANVISA, “automedicação é o uso de medicamento sem a
prescrição, orientação e ou o acompanhamento do médico ou dentista”.
(
http://www.anvisa.gov.br/medicamentos/glossario/index.htm).
Automedicação responsável é o uso de medicamentos que não precisam
de receita médica para tratar pequenos males, como resfriados, enxaqueca, azia, etc.
Essa prática, reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), só é
aconselhável para países desenvolvidos, uma vez que nos subdesenvolvidos ou em
fase de desenvolvimento, como o Brasil, saúde, médicos e medicamentos não são
acessíveis.
Nesse sentido, há de se preocupar com o uso abusivo de medicamentos e
processos voluntários de cura, que mostram que cerca de 30% das intoxicações são
causadas pelo uso irracional de medicamentos (Revista Superinteressante, fev. 2003,
p. 45).
Um fato cultural acompanha o brasileiro: a indicação de medicamentos
ou tratamento aos familiares e amigos. Ao propor um tipo de chá ou analgésico ou,
ao entrar em uma farmácia e comprar de maneira indiscriminada medicamentos, o
leigo (ou seja, o não especialista na área da saúde) pode contribuir para o
aparecimento de pessoas dependentes, talvez os hipocondríacos, vistos como
doentes. O dependente de medicamentos não se contenta com um único comprimido:
uma substância leva à outra, pelos próprios efeitos colaterais. Portanto, a
automedicação tem relação direta com o uso indiscriminado, irracional de
medicamentos, inclusive os que deveriam ser vendidos apenas sob prescrição
87
médica
5
. Corroborando o que foi dito, seguem depoimentos de pessoas que se
automedicam ou se automedicaram durante algum tempo:
Depoimento 1.“Eu me medico desde os 15 anos. Pegava a bula, lia a
indicação, ia lá e tomava. Eu acordo, já coloco logo o remédio no nariz. É a primeira
coisa que eu faço. Vou dormir com o descongestionante do lado. Eu tenho um na
sala, tenho no meu quarto, um na bolsa e dois de reserva. Eu não consigo ficar sem.
Sou viciada totalmente…Tomo analgésico direto, remédio para dor de cabeça,
dipirona. Para mim, é igual à água” (estudante Amanda Diniz).
Depoimento 2: “Eu passei a me automedicar porque eu não acreditava muito
em hospital. Eu pensei que ia melhorar rápido tomando esses remédios. Mas, quando
procurei o médico, já era tarde. Foi uma trombose. Aí que eu descobri o que eu fiz
comigo mesmo. Eu já sabia que eu ia acordar depois da anestesia, se acordasse, sem
a perna esquerda” (publicitário Armando Ribeiro)
Depoimento 3: “Não sabia que fazia mal” (costureira Josefa Figueiredo, que
passou por uma transfusão de sangue, pois estava tomando um analgésico comum e
teve hemorragia).
“O risco é a dependência química. É uma dependência mesmo, como se
fosse uma dependência à cocaína”, alerta o professor de toxicologia clínica Luiz
Querino, da UFF
6
.
Automedicação abrange as diversas formas pelas quais o indivíduo
decide, sem avaliação médica, o medicamento e a maneira de utilizá-lo para alívio
sintomático ou cura: compartilhar medicamentos com outros membros da família ou
do círculo social, descumprir a prescrição profissional, prolongar ou interromper
5
Paula Renata Camargo de Jesus. Palestra realizada no 1º Congresso Brasileiro sobre o Uso Racional
de Medicamentos, Porto Alegre, 15 de outubro de 2005.
6
Todos os depoimentos são do Programa Fantástico, da TV Globo coletado em
http://fantastico.globo.com/Jornalismo/Fantastico/0,,AA1653547-4005,00.html
88
precocemente a dosagem e o período de tempo indicados na receita. O consumo de
medicamentos pode ser considerado um indicador indireto de qualidade dos serviços
de saúde
7
. “[…]o brasileiro tende a se automedicar também porque não encontra
posto de saúde perto de casa, precisa esperar dias e até meses para ser atendido por
um médico” (NASCIMENTO, 2003, p. 38). E quando é atendido no Sistema Único
de Saúde (SUS) ou mesmo em uma consulta particular ou por convênio com Plano
de Saúde, muitas vezes o médico nem o examina, seja por falta de tempo, porque é
mal remunerado, despreparado. Enfim, a relação médico/paciente, no Brasil, na
maioria das vezes, é precária e a comunicação interpessoal fica restrita à
verticalização: o médico prescreve o medicamento e o paciente, doente e fragilizado,
compra-o ou, sem condições de fazê-lo, o substitui ou não se medica.
Estudo desenvolvido por Isaac Epstein (2002, p. 96) apresenta como
proposta a interação entre médico e paciente. Para ele, a comunicação entre as partes
é insuficiente, principalmente quando o primeiro não consegue transmitir sua
mensagem ao segundo. “Existe uma crença generalizada de que o médico deve
manter uma certa distância social do paciente para reforçar sua imagem como figura
portadora de autoridade.”
Os “ruídos” da comunicação médico/paciente ou simplesmente a
confiança do paciente em acatar tudo o que o médico diz (muitas vezes por não ter
outra alternativa frente à doença) faz com que uma receita médica determine o rumo
da vida de uma pessoa. No caso dos idosos, alvo da indústria farmacêutica e dos
planos de saúde, o diálogo com o médico é substituído por exames e receitas
(LOPES, 2000, p. 64).
7
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S002175572007000600010&lng=pt&nrm=is
o&tlng=pt
89
Fatores econômicos, políticos e culturais têm contribuído para o
crescimento e a difusão da automedicação no mundo. Tais fatores se relacionam,
dentre outros, a uma grande disponibilidade de produtos; simbolização da saúde que
o medicamento pode representar; publicidade irresponsável; pressão para a
conversão de medicamentos de venda condicionada à apresentação da receita em
medicamentos vendidos livremente nos balcões de farmácia e supermercados;
qualidade da assistência à saúde; dificuldade de acesso aos serviços de saúde em
países mais pobres. Estas mudanças dependem de uma vontade de mudanças na
política de saúde do país, na organização do sistema médico e no comportamento da
indústria farmacêutica (NASCIMENTO, 2003, p. 41).
Na opinião de Nascimento (ibid., p. 38) “a propaganda de medicamentos
nos meios de comunicação de massa é um estímulo freqüente para a automedicação,
especialmente porque explora o desconhecimento dos possíveis consumidores sobre
os produtos e seus efeitos.”
Segundo Lefèvre (1991, p. 14) a automedicação no Brasil já é um
problema grave de Saúde Pública e de Educação em Saúde Pública. O medicamento
é visto como mercadoria comum, submetido às lógicas comerciais e o consumo
irracional chega a ser uma ferida na sociedade.
1.4 Medicamento enquanto produto: “tomou, passou!”
Conforme visto anteriormente, em medicamentos e automedicação, fica
evidenciado o fato de o medicamento ser visto como produto, mercadoria. Por
definição da própria ANVISA, medicamento é produto. Entretanto, há diferença
quanto a sua comercialização, divulgação e venda, em relação a qualquer outro
produto. “Produto pode ser definido como um objeto de satisfação para o consumidor
90
e pode ser vendido por suas características tangíveis ou intangíveis […] os produtos
são identificados e diferenciados pelo uso de marcas registradas.” (PINHO, 2001, p.
32).
As marcas estão presentes em todos os momentos da vida das pessoas.
Com o passar do tempo, desenvolve-se uma fidelidade a determinada marca, muitas
vezes mais do que a um produto, seja por herança cultural seja pela exposição via
propaganda. “O potencial sígnico para marcas parece ilimitado, não só por elas
expressarem convicções de consumo, como também por representarem um universo
de possibilidades erosivas com relação a si mesmas.” (PEREZ, 2004, p.3).
A preocupação está na banalização, pois como qualquer outro produto
associado apenas ao lucro, o medicamento pode se tornar um objeto de consumo. A
grande quantidade de brindes, amostras-grátis, outdoors e propaganda destinada ao
público leigo estimulam o consumo irracional e desenfreado, que leva a gastos
supérfluos, atraso no diagnóstico e na implementação da terapêutica adequada,
reações adversas e confusão entre sintomatologias.
Ao levar em conta o consumo, Baudrillard (1993, p. 206) afirma que
este:
“[...] não é apenas uma prática material, nem uma fenomenologia da
abundância, não se define nem pelo alimento que se digere, nem pela
substância oral e visual das imagens e mensagens, mas pela organização
de tudo, isto é, em substância significante; é ele a totalidade virtual de
todos os objetos e mensagens constituídos de agora então em um discurso
cada vez mais coerente.”
É neste momento que o uso da propaganda faz com que se eleve na
sociedade, através da utilização de terapias medicamentosas, a busca por soluções
para problemas ainda não totalmente solucionáveis. A exploração do valor simbólico
do medicamento, socialmente sustentado pela indústria farmacêutica, agências de
propaganda e empresas de comunicação, passa a representar um dos mais poderosos
91
instrumentos para a indução e fortalecimento de hábitos voltados para o aumento de
seu consumo. “Os medicamentos passam a simbolizar possibilidades imediatas de
acesso não apenas à saúde, mas ao bem estar e à própria aceitação social, como se
estes ‘produtos’ pudessem ser adquiridos na farmácia.” (NASCIMENTO, 2005, p.
22).
“O medicamento enquanto símbolo da saúde é a possibilidade mágica
que a ciência, por intermédio da tecnologia, tornou acessível de representar, em
pílulas ou gotas, um valor/desejo sob a forma de triunfo definitivo, a cura.”
(LEFÈVRE, 1991, p. 23)
Um pouco mais de 16 anos após a afirmação anterior, Lefèvre, bastante
preocupado, disse
8
“O problema é que medicamento na nossa cultura é um objeto de
especificidade técnica, mas tem sido tratado como produto qualquer. Outra questão é
a bula. Apesar de obrigatória é uma contradição. Para quem é a bula? A linguagem é
inadequada a quem necessita do medicamento mesmo o de venda livre, portanto seria
indicada aos médicos?”
Figura 18. Bula de medicamento de venda livre: Doril
8
Fernando Lefèvre é livre-docente da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo,
formado em Pedagogia na USP, mestre em Semiótica pela Universidade de Paris (Sorbonne).
Entrevista concedida à pesquisadora em 08 de novembro de 2007, no Instituto de Pesquisa do
Discurso do Sujeito Coletivo (IPDSC), São Paulo.
92
Lefèvre disse ainda ser alérgico ao ácido acetilsalicílico e que
desenvolveu uma úlcera em virtude do uso: “As pessoas não acreditam que a
ingestão da Aspirina (ácido acetilsalicílico) possa fazer mal, pois medicamento existe
para o bem, para curar e não causar danos à saúde das pessoas. Ainda mais a
Aspirina, tradicional, usada de geração em geração!”
O sintoma capitalista faz-se presente no país por meio de marketing, ou
seja, um medicamento vale mais que seu valor terapêutico, já que o invólucro que
protege a substância, a embalagem, a distribuição, a propaganda, enfim, as
ferramentas utilizadas pelo mercado da indústria farmacêutica o encarecem.
Quanto à embalagem do medicamento, segundo Farina (2002, p. 181), a
proteção do produto é uma de suas principais funções. Embalando-se o produto,
espera-se proteger os consumidores contra variações atmosféricas; armazenando-o,
pode-se evitar contaminação, inseto, microorganismo, poeira, etc. Todavia, em um
mercado altamente competitivo, com grande número de marcas, a embalagem deve
transcender suas principais funções, para servir como instrumento de destaque do
produto frente à concorrência. “A embalagem deixou de ser apenas o invólucro
protetor do produto, isolando-o de contatos impuros e da própria ação atmosférica”.
Há de se considerar que tanto no medicamento ético, como no de venda
livre, o designer desenvolve apenas o rótulo e o cartucho (caixinha, etc), já que a
forma da embalagem, do invólucro que contém o produto, os frascos e as bisnagas
são, quase sempre, modelos adquiridos diretamente pela indústria farmacêutica em
setores especializados na produção desse material. A legislação brasileira, por meio
do INMETRO (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade
Industrial), impõe uma série de menções obrigatórias nas embalagens dos mais
diversos produtos. Tais informações devem estar visíveis na embalagem e indicar
93
composição ou substância, código de barras, datas de validade e de fabricação, dados
do fabricante, peso líquido, designação do produto, entre outras características
consideradas essenciais para assegurar sua estabilidade. A legislação não permite o
uso de imagens (fotos ou ilustrações). A utilização de formas figurativas é liberada
apenas para embalagens de medicamentos de venda livre, restrita à representação do
produto (pílulas, pastilhas) ou aos seus componentes (frutas e ervas) (JESUS;
CARDOSO; BOSSOLO apud: AJZENBERG, 1999, p. 78 -79).
“Não há dúvida sobre a influência que a propaganda gera sobre o
consumidor, fazendo com que adquira produtos ou serviços sob pressões
internas (usos e costumes) e externas (informações inadequadas), que
deformam o contrato de consumo, tornando-o não mais um ato
voluntário, mas sim um ato condicionado.” (GUIMARÃES, 2007, p. 102)
No caso da saúde, ainda existe a presença do médico que, ao prescrever
determinado medicamento, não permite que o paciente se valha de outro.
O médico sanitarista Dr. Bonfim não aceita que medicamentos sejam
vendidos nem anunciados como mercadoria qualquer e alerta para o perigo de
ingestão de medicamentos que considera perigosos, de venda livre no Brasil, mas
proibidos no exterior, como é o caso da dipirona sódica. Tal substância, utilizada em
analgésicos e banida em 16 países, inclusive há mais de 20 anos nos Estados Unidos,
pode causar doenças graves como a agranulocitose e a aplasia medular. O
agravamento desses distúrbios é passível de levar à morte.
Para Lefèvre (1991, p. 36), há tempos a saúde está incorporada pela
indústria farmacêutica como produto. Em seu livro O medicamento como mercadoria
simbólica, cita diversos casos em que os planos de saúde, por exemplo, utilizam a
palavra saúde em seus slogans. Atualmente, não é diferente, percebe-se que os
fabricantes de medicamentos, os próprios laboratórios, utilizam a palavra “saúde” em
seus slogans em busca de fortalecimento da marca, conseqüentemente, dos seus
94
produtos, os medicamentos. Organon “Intimidade com a saúde da mulher”; Sanofi
Aventis “O essencial é a sua saúde”; Pfizer “Saúde para uma vida melhor”; Sigma
Pharma “Prescrição de saúde”; Farmasa “Saúde por excelência”.
Lefèvre manifestou à ANVISA, ao CONAR, publicamente em
entrevistas, aulas, congressos e livros que é totalmente contra a propaganda de
medicamentos e, por isso, não se coloca a favor do controle da mesma. Afirma que
nem a ANVISA, nem o governo têm condições de controlar e fiscalizar a propaganda
da indústria farmacêutica.
Há 25 anos trabalhando com Educação e atuando também na área da
Saúde, em seu recente estudo a respeito da Lógica Sanitária e Lógica do Senso
Comum, Lefèvre mostra que a vida cotidiana é regida conforme hábitos dela própria
e que esses são incompatíveis com a Lógica Sanitária. “Médico enxerga doente como
algo fora dele e prescreve conforme uma lógica, do ponto de vista Sanitário, da
Saúde, que não é o ponto de vista das pessoas.”
2 Propaganda de Medicamentos
Alguns autores como Perez (2004, p.142), Pinho (1990, p. 16), Sampaio
(1999, p. 25), Sandmann (1999, p. 10), Rabaça e Barbosa (2001, p. 598), Guimarães
2007, p. 96) reconhecem os termos publicidade e propaganda como sinônimos e se
valem deles indistintamente.
Tal fato se deve aos termos publicidade e propaganda serem utilizados,
muitas vezes, como sinônimos no Brasil. Há quem concorde com esse ponto de vista
e há quem discorde dele. A polêmica existe. O termo publicidade é, muitas vezes,
utilizado como referência comercial em campanhas de produtos ou mesmo para
denominar o publicitário, o profissional de agência de publicidade e propaganda e/ou
95
mídia de massa; já o termo propaganda ocupa um terreno mais amplo, ao ser
utilizado em todo tipo de propagação ou divulgação de idéias, seja religiosa, política,
ideológica, institucional, na propaganda boca a boca, inclusive na propaganda de
medicamentos, que denomina o “propagandista”, enquanto profissional que
representa a indústria farmacêutica.
Portanto, ao utilizar termos como publicidade e/ou propaganda neste
estudo, é importante registrar que não será feita distinção dos termos. A palavra
“propaganda” será utilizada com mais freqüência por ser, então, mais abrangente
(SANDMANN, 1999, p. 10).
A história da propaganda no Brasil inicia-se, praticamente, com a
propaganda de medicamentos (conforme capítulo 1). Desde esse tempo, as práticas, o
investimento e o discurso da indústria farmacêutica se fazem presentes na vida dos
brasileiros. Para justificar essa afirmação, o brasileiro gasta por ano quase um bilhão
de reais com medicamentos contra a gripe. E é justamente para conquistar esse
consumidor, com a promessa de alívio imediato, que a indústria farmacêutica investe
em propaganda. Antigripais são medicamentos de venda livre ou OTC e não há
restrições legais quanto ao seu anúncio, ao contrário dos medicamentos sob
prescrição médica, e cerca de 80% das vendas é concentrada nos meses de inverno.
Além de marcas tradicionais, muitas outras, regionais, aumentam o investimento
publicitário. A linguagem das campanhas, porém, historicamente não mudou muito
(
www.observatoriodaimprensa.com.br).
Segundo Ibobe Mídia, o investimento dos laboratórios farmacêuticos em
propaganda cresceu, em 2007, quase 70% em comparação aos últimos três anos,
contra 33,6% do investimento publicitário em geral. A maior parte do investimento
do segmento (71% do total) acontece na TV aberta, que é seguida pelos canais por
96
assinatura. Juntos, esses dois meios representam 82% do investimento total. O
brasileiro demonstra grande preocupação com o tema saúde em geral e é
reconhecidamente “entusiasta” em relação às novidades do setor. Dados da
Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que o Brasil está entre os cinco
maiores consumidores de medicamento do mundo.
9
O processo de comunicação utilizado pela indústria farmacêutica
envolve, basicamente, duas frentes, a primeira: o consumidor final (a população)
com o medicamento de venda livre; a segunda: o setor da saúde, representado por
médicos e farmacêuticos (em hospitais o setor de compras operacionaliza junto a
equipes médicas a aquisição do medicamento). Apenas medicamento de venda livre
pode ser propagado à população. A indústria farmacêutica tem sua própria agência de
propaganda (house agency) ou departamento de marketing e propaganda ou ainda é
atendida por uma agência de propaganda. Cita-se como exemplo uma agência
grande como a ALMAP/BBDO, que é responsável pela propaganda da Aspirina na
mídia de massa. O serviço também pode ser terceirizado, quando as grandes agências
contratam as menores, porém mais experientes e familiarizadas com a criação e as
leis que envolvem a propaganda de medicamentos, segundo Gisela Carvalhinho
10
.
As agências atuam com a mídia de massa na propagação de
medicamentos de venda livre, a exemplo do que fazem com os demais produtos do
mercado submetidos às lógicas comerciais. Já os medicamentos éticos, também
clientes de grandes ou pequenas agências de propaganda, por serem controlados e
vendidos apenas sob prescrição, são divulgados aos médicos e farmacêuticos por
9
http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRedirect?temp=0&proj=PortalIBOPE&pub=
T&db=caldb
10
Gisela Carvalhinho é diretora de contas da agência Stimma, especializada em propaganda de
medicamentos. Informações fornecidas em entrevista à pesquisadora, em 14 de junho de 2007, na
FENAPRO, São Paulo.
97
profissionais denominados propagandistas e por revistas segmentadas, específicas da
indústria farmacêutica. A propaganda é controlada pelo CONAR, submetido à
fiscalização da ANVISA.
O resumo apresentado serve como introdução para a compreensão das
estratégias de marketing e de propaganda, utilizadas pelas agências de propaganda e
pela indústria farmacêutica.
2.1 Estratégias utilizadas - “é a solução”
Considerando que estratégia é um discurso muito próximo da prática,
torna-se necessária a compreensão das estratégias utilizadas na propaganda de
medicamentos, em seu verdadeiro ambiente, ou seja, no mercado.
Segundo Kotler (1996, p. 523), “As empresas farmacêuticas utilizam
uma bateria completa de canais de comunicação para levar suas mensagens aos
médicos.” Os propagandistas, representantes dos laboratórios em farmácias e nos
consultórios médicos, têm pouco mais de cinco minutos para apresentar um novo
medicamento e convencer o médico de prescrevê-lo. Para isso, apresentam-se com
folhetos, canetas, calendários e outros brindes, além de revistas do laboratório e
amostras-grátis.
Tornou-se comum, na mídia de massa, muitas reportagens destacando os
benefícios e malefícios de medicamentos de tarja vermelha ou preta que entram no
mercado. Nas capas, apresentam-se matérias a respeito de doença, curas e novos
medicamentos, uma espécie de “informação patrocinada” ou, talvez, matéria paga.
As revistas direcionadas aos médicos pertencem aos laboratórios e ganham espaço de
veiculação em consultórios e clínicas. Cada laboratório tem sua revista, onde pode
publicar matérias de interesse da indústria, inclusive anúncios de medicamentos
98
controlados, os éticos. Mas a grande mídia contribui com os laboratórios na
divulgação, como apresentam as capas abaixo.
Figura 19. Capa da Revista Veja. Figura 20. Capa da Revista Época.
A história continua e se repete. Desde a chegada do rádio na década de
1930, a propaganda de medicamentos se fez presente, por meio de patrocínio de
radionovelas, de programas, spots e jingles. O rádio continua sendo uma mídia
importante para a propaganda de medicamentos, principalmente o radiojornalismo,
que possui muita credibilidade, especialmente grandes emissoras, como: Band, CBN,
Band News, Jovem Pan.
A TV faz parte da história da propaganda de medicamentos, seja pelo
filme publicitário seja pelo testemunho em programas. A presença de personalidades,
como artistas de novela e apresentadores de programas de grandes audiências,
depondo a favor dos medicamentos é fato rotineiro (Regina Casé diz que Coristina D
vale por três; Denise Fraga afirma que quando se toma Doril, a dor some; Leonardo
canta em tom sertanejo que a “marvada” gripe some com Apracur; Luiz Gustavo diz
que com Gelmax a azia se vai e o alívio chega; o ex-jogador de futebol Raí, após
encenação de machucar a perna jogando, fala que Flanax o curou; e Glória Pires, em
99
horário nobre na TV Globo, finaliza o filme publicitário do analgésico Sonridor
dizendo: “Por isso Sonridor é a minha escolha”).
Na TV, também são feitas coberturas de eventos e transmissões
exclusivas. O programa Amaury Jr., transmitido nos finais de noite, na Rede TV,
cobriu a Festa do Peão de Barretos, que se realiza anualmente no interior de São
Paulo, em 03 de setembro de 2005. O destaque foi a Bayer do Brasil. O laboratório
montou uma “fazendinha” próxima à arena do evento. Vários médicos foram
convidados, divulgando três medicamentos do laboratório: antiinflamatório para
dores musculares, analgésico e disfunção erétil. O presidente da Bayer no Brasil
ainda ocupou boa parte do programa divulgando as marcas e comentando que o touro
do rodeio devia tomar Levitra, que dá “poder” e “masculinidade”, ou seja,
divulgando o medicamento para disfunção erétil. Uma vez transmitido pela TV, a
dimensão torna-se bem maior, uma vez que a informação deixa de ocupar apenas o
espaço do evento, sobretudo a quem está fisicamente no local, para ser transmitida no
âmbito nacional.
Na internet, assim como sites dos laboratórios, existem as
“ciberfarmácias”, farmácias virtuais, com negociações reais, sem exigência de receita
médica de medicamentos controlados, além de ambientes pseudo virtuais, como o
Second Life.
Figura 21. Imagem do site Pfizer. Figura 22. Imagem da Pfizer no Second Life.
100
O outdoor surgiu no Brasil nos primeiros cartazes e, aos poucos, por ser a
única mídia de massa exclusivamente publicitária, acabou se mantendo nos cenários
urbanos, inclusive com transformações consideráveis quanto ao formato e material,
com a chegada também da mídia exterior. Se nos primeiros outdoors, conforme
indicado no capítulo 1, os xaropes Bromil e São João estiveram presentes, ainda hoje
os medicamentos de venda livre: antigripais, analgésicos, antiácidos, ocupam, além
de outdoor, a mídia exterior (frontlight, backlight, busdoor, taxidoor e mobiliário
urbano: relógio digital, abrigo de ônibus, placas de rua, etc., indoor, etc.)
Figura 23. Indoor luminoso de Redoxon.
Com a propaganda em outdoor e na mídia exterior proibida na capital de
São Paulo (Projeto de Lei 619/06, da Lei Municipal nº14.233/06 também conhecida
como Cidade Limpa, na íntegra no Anexo 4), a propaganda de medicamentos
procura investir não apenas no mobiliário urbano, mas nas cidades vizinhas, nos
ônibus intermunicipais e na mídia alternativa, como os cartões publicitários (Mica e
Jokerman) e ações estratégicas em eventos.
101
Fitness Brasil, evento de ginástica que abriga uma feira esportiva,
acontece anualmente na cidade de Santos, litoral de São Paulo. Em 2005, enquanto
os atletas praticavam aulas de aeróbica, duas promotoras uniformizadas, contratadas
pela indústria farmacêutica, abordavam as pessoas na feira e distribuíam amostras-
grátis de suplemento vitamínico, o Supradyn, “prescrevendo-o” duas vezes ao dia a
crianças, senhores, senhoras, atletas, indiscriminadamente. Outra promotora
distribuía amostras-grátis de um creme sedativo e balsâmico, utilizando o seguinte
discurso: “Calminex tira o roxo deixado por lesões”. Tal promotora só não
mencionava que o medicamento, formulado em creme, é indicado para lesões em
cavalos, embora existisse na embalagem a imagem de um cavalo e de uma vaca, com
a seguinte prescrição: uso veterinário. Pouco tempo depois, o que se via nas ruas da
capital paulista era o seguinte outdoor.
Figura 24. Outdoor de Calminex.
Em 2007, a embalagem de Calminex foi alterada. Outra ação
diferenciada foi a utilizada em julho de 2007 pelo xarope Mucosan. Quando se
entrava com o carro no estacionamento do Shopping Frei Caneca, em São Paulo, e
apertava-se o botão para liberação do cupom, ouvia-se uma tosse e, em seguida, a
cancela, com a propaganda do medicamento, liberava a entrada.
102
No verão de 2006, Salompas, medicamento contra contusões, patrocinou
um evento de volley de praia feminino no Rio de Janeiro. Na cidade, cartazes e
folhetos foram distribuídos como forma de divulgação do Salompas Cup.
Em 2007, Neosaldina lançou uma ação promocional, mobilizando o
público jovem com um festival de curta-metragens “Uma idéia de dor de cabeça.
Uma câmera na mão”. O vídeo de um minuto de duração era enviado ao site
www.curtasneosaldina.com.br o mais votado ganhava 5 mil reais e tinha a
oportunidade de ser veiculado no canal de TV:MTV.
Figura 25. Folheto do evento promocional com regulamento.
O Brasil é sem dúvida muito grande. Há de se considerar as diferenças
climáticas, sobretudo reconhecer que no inverno propagandas e vendas de antigripas
e xaropes aumentam bastante, já no período das festas de fim de ano e no carnaval,
os antiácidos anunciam mais. Aspectos culturais e comerciais, além de estratégias,
variam de região para região. Exemplo: em João Pessoa, no estado da Paraíba, as
103
farmácias têm balcões voltados para as calçadas; raramente, encontram-se
farmacêuticos nos estabelecimentos; e balconistas atendem à população. A
incidência de compras e consumo de medicamentos nessa região é muito grande.
Outro tipo de ação, que parece gerar uma imagem positiva e responsável
à indústria farmacêutica, é a de cunho social, com o patrocínio de cartazes e folhetos
alertando a população a respeito dos cuidados para evitar determinada doença, como
no caso da Dengue. Dependendo da região, existe uma ação da indústria junto à
Secretaria de Saúde da cidade.
Figura 26. Folheto da campanha contra a Dengue.
Em 2006, em Belo Horizonte, Minas Gerais, uma rede de drogarias
(Drogaria Araújo) vendia, no mesmo espaço físico, medicamentos, brinquedos,
salgadinhos, refrigerantes e ração para cachorros. Também em Minas, mas na cidade
de Monte Verde, bastante visitada por turistas, inclusive paulistas, ainda se
comercializa, sem qualquer autorização da ANVISA, uma pomada chamada Unha de
Gato. Vendida em uma latinha, serve para inflamações e infecções em geral.
104
Em Brasília (Revista Istoé, 8 de nov. 2005, p. 51), houve o flagrante de
venda de antibióticos e antidrepressivos em uma rua conhecida como Rua das
Farmácias, porque há uma farmácia ao lado da outra. No Rio de Janeiro,
medicamentos são vendidos também em padarias, camelôs e supermercados. A foto
que segue, de 2006, mostra o Sal de Fruta Eno sendo vendido no supermercado Zona
Sul, em Ipanema. O medicamento está colocado na seção de bebidas alcoólicas.
Figura 27. Foto do Sal de Fruta Eno, em supermercado.
Como se não bastasse o poder da indústria farmacêutica em altos
investimentos de marketing, ela encontra como parceira a mídia de massa, que
legitima algumas informações e divulga, muitas vezes sem responsabilidade,
medicamentos a leigos, que não deveriam receber determinada informação sem
orientação de um profissional da saúde.
A indústria farmacêutica não poupa esforços para estar no carnaval
carioca. No sambódromo, há distribuição de vários produtos e revistas. Exemplo: a
LIESA (Liga das Escolas de Samba do Rio de Janeiro), em 2006, tinha como
anunciante uma farmácia cujo anúncio era do medicamento para disfunção erétil
105
Levitra. Na mensagem do anúncio, uma promessa: “Esse carnaval vai pegar fogo!”.
O medicamento tinha preço reduzido em 25%, ou seja, promoção de medicamento
para disfunção erétil em mídia de massa, uma propaganda ilegal.
Figura 28. Anúncio de Levitra em revista.
O discurso persuasivo da propaganda de medicamentos está presente na
mídia de massa através de frases, expressões, enfim palavras que produzem efeitos,
principalmente quando repetidos em rádios, emissoras de televisão, revistas,
outdoors e até no material de ponto de venda (farmácias e drogarias). Revistas
semanais destacam nas capas a chegada de novas drogas que prometem curas
milagrosas; no rádio, patrocinando os locutores líderes de audiência e programas
jornalísticos de muita credibilidade, nos outdoors anunciando antigripais,
analgésicos, vitaminas, xaropes e fortificantes; na televisão, artistas famosos
interpretando papéis persuasivos em filmes publicitários, em vários casos, o discurso
é praticamente o mesmo, os slogans sofrem pequenas alterações: “Gripe ou resfriado,
106
Descon é o resultado”; “Tá gripando? Aspirina C”; “É gripe? Benegrip”; “Gripou?
Fluviral desgripa”.
Em cinema e jornal impresso, não existem muitos registros de
propagandas de medicamentos como nas outras mídias. Há, no primeiro, uso
freqüente das palavras Aspirina e Viagra citados no próprio contexto da cena em
grandes produções cinematográficas. Espontaneamente ou não, na verdade esses
medicamentos são colocados como solução de problemas. No segundo, há várias
matérias (pagas ou não), casos de anúncios em cadernos de esportes e outros, a
exemplo do laboratório Elli Lilly no jornal Publi Metro de São Paulo, com uma
estratégia de divulgação “disfarçada” do medicamento Cialis, indicado para casos de
disfunção erétil.
Figura 29. Anúncio da Lilly na capa do jornal Publi Metro.
Não é diferente na hora de propagar o Viagra. Em 2006, na capital
paulista, com uma abordagem surpreendente no Dia dos Pais, promotoras com
camisetas azuis entravam em algumas churrascarias e distribuíam bombons em
formatos circulares, com papel laminado azul e adesivo da Pfizer.
107
O Viagra certamente revolucionou o mercado, muito mais até pelo
marketing da Pfizer. Lançado em 1998, então sem concorrência, reinou absoluto,
chegando a ser consumido em um ritmo de quatro comprimidos por segundo. Por ser
controlado, já que legalmente só pode ser vendido sob prescrição médica, o Viagra
passou a ser contrabandeado e fez parte da mídia, em forma de reportagem, diversas
vezes. Informação ou propaganda, o fato é que o Viagra sempre esteve na mídia de
massa.
Figura 30. Capa da Revista IstoÉ.
Matérias de capas e manchetes, às vezes apelativas “A pílula milagrosa”,
na Revista Veja, em 1º. de abril de 1998, ou da mesma revista, na matéria de capa de
24 de maio de 2000, com a manchete “Sexo depois dos 40 – vaidade, vida mais
saudável e a medicina ajudam homens e mulheres na cama”. Essa matéria mostra
homens e mulheres praticando esportes, namorando e finaliza com o seguinte
quadro: arsenal da meia-idade, onde existe uma lista de medicamentos para
disfunção erétil, inclusive o Viagra, encabeçando a lista. Ainda na Revista Veja, a
manchete “Super-remédios”, com sentido de super-homem, salvador, tem em suas
108
páginas internas um estudo interessante sobre a evolução dos mais diferentes
medicamentos, inclusive valorizando a pesquisa feita por cientistas durante muitos
anos. Ao lado, existe um quadro destacando alguns medicamentos, denominando-os
como “estrelas”. O Viagra aparece como a melhor pílula para disfunção erétil, por
ser a primeira contra impotência. Seu grau de satisfação chega a 80%. Nas páginas
internas, fotos do comprimido azul, depoimentos de pessoas, felizes com o uso do
medicamento, inclusive as “mil e uma novas utilidades” que ele oferece. No
conteúdo da matéria, passagens como: “Viagra serve para aplacar a ansiedade de
quem sofre de ejaculação precoce [...] garotões melhoram a performance [...]
mulheres se juntaram à legião de adeptos [...] italianos têm sorvete azul que contém o
medicamento [...] em Paris, a substância do medicamento serve como tempero de
alguns pratos”. Capas de revistas semanais, de grande tiragem, sempre destacaram as
reportagens a respeito de medicamentos, exemplos: “Remédios de última geração –
como eles funcionam, quanto custam e como obtê-los”, da Revista Época de 2 de
maio de 2005; “A verdade sobre os remédios – 100 remédios e suplementos mais
consumidos no Brasil”, da Revista Veja de 2 de fevereiro de 2005; “Acomplia – a
superpílula. Chegou ao Brasil o primeiro medicamento do mundo que, de uma só
vez, combate a temida gordura, melhora a diabete…”, da Revista IstoÉ de 2 de maio
de 2007; “Viver sem dor – um novo arsenal garante o alívio do sofrimento que atinge
76 milhões de brasileiros”, da Revista IstoÉ de 24 de outubro de 2007.
Se há um grande investimento por parte da indústria em pesquisas, há
também em marketing, exemplo disso é que na Pfizer, embora 90% dos responsáveis
pela condução da pesquisa sejam cientistas, a equipe é chefiada por profissionais de
marketing. Preocupada com propaganda, a Pfizer utiliza personalidades quando se
trata do Viagra. Nos Estados Unidos, o conhecido político republicano Bob Dole foi
109
o garoto-propaganda, enquanto no Brasil, Pelé fez esse papel. O marketing faz parte
da filosofia da empresa Pfizer (Revista Exame, 24 de fev., 1999, p. 71). Proibida no
Brasil, a propaganda feita por Pelé foi retirada da mídia.
Figura 31. Anúncio do Viagra, em página dupla de revista.
Os propagandistas exercem um papel fundamental na divulgação de
novos medicamentos, especialmente dos éticos. É uma comunicação interpessoal,
junto aos balconistas de farmácia, farmacêuticos e médicos, em consultórios.
Segundo Pinho (2001, p. 88), a comunicação interpessoal pode ser classificada
como: oral, escrita ou audiovisual, mas sempre acontece para um número limitado de
pessoas. No caso do propagandista, existe um treinamento, principalmente de estudo
e conhecimento do medicamento e de como, em poucos minutos, entreter o médico
no consultório, com entrega de brindes, agenda, bloco de anotações, canetas,
calendários, porta-retratos e amostras-grátis. Algumas vezes, as associações
profissionais se envolvem na relação entre laboratórios e médicos, caso ocorrido em
1997, quando a Sociedade de Pediatria de São Paulo solicitou à SmithKline Beecham
que custeasse a viagem de um médico ao Congresso em Sidney, na Austrália. O
diretor médico do laboratório explicou na ocasião que era uma maneira do médico se
atualizar profissionalmente e que em troca o laboratório ganharia o reconhecimento
110
do seu nome (Revista Veja, 9 de fev. 2000, p. 49). Alguns médicos não aceitam
visitas de propagandistas, nem recebem revistas dos laboratórios. Outros médicos
recebem os propagandistas e assumem que não têm tempo para ir a Congressos e que
essas visitas são bem-vindas, a partir do momento que levam informações de
pesquisas e novos medicamentos ao consultório.
Quanto aos médicos que aceitam visitas de propagandistas, Dr. Bonfim
ironiza:
“[...] antes de respirar para o próximo paciente, surge aquele rapaz com
sorriso e ar crédulo, que solícito, pede para entrar e traz consigo mais um
brinde e com o brinde, mais uma monografia geralmente assinada por um
médico, um ‘papa’, de quem ninguém duvida.” (1999, p. 226).
A presença da propaganda aos médicos teve início na pós Segunda
Guerra, com a expansão da indústria farmacêutica.
Segundo Angell (2007, p. 157), “os laboratórios farmacêuticos são
extremamente generosos com os médicos nas suas atividades ‘educativas’. Os
laboratórios fornecem informações aos médicos e os médicos dão um feedback aos
laboratórios...mas o dinheiro só vai num sentido.” A autora faz várias denúncias à
indústria farmacêutica e chega a relatar casos onde a indústria se infiltra no meio
médico, na mídia (por meio de programas supostamente educativos), inclusive na
população.
Seria o caso do surgimento espontâneo da população preocupada, por
exemplo, com a hepatite C. O movimento cresce e na verdade o que está por trás é a
indústria, como a Shering-Plough, fabricante do medicamento Rebetron. Seria outra
forma de marketing disfarçado de informação, e mais, o patrocínio de grupos de
defesa de pacientes. Casos assim relatados por Márcia Angell aconteceram e ainda
acontecem nos Estados Unidos, mas não se deve esquecer que as mesmas indústrias
americanas e européias estão presentes no Brasil.
111
Em relação às visitas aos farmacêuticos e, na ausência deles, aos
balconistas de farmácias, o material no Ponto de Venda, ou PDV (farmácias e redes
de drogarias), as ações são diversas, folheto de ofertas do estabelecimento com
medicamentos, sacola para embalar compras, display ou faixa de gôndola destacando
o medicamento, além de práticas diferenciadas premiando o farmacêutico e/ou
balconista que mais vender determinado medicamento.
Figura 32. Display de Aspirina no ponto de venda.
As denúncias de propinas a balconistas de farmácias e farmacêuticos,
assim como a médicos, foram investigadas, discutidas e, em alguns casos,
confirmadas em 2000, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), cujo relator,
Deputado Ney Lopes, constatou várias irregularidades no mercado farmacêutico
brasileiro, inclusive essa. A chamada “empurroterapia” ou “b.o.” (bom para otário)
refere-se à indicação de medicamento por parte das farmácias aos clientes, em troca
de presentes ou dinheiro da indústria farmacêutica. Casos como patrocínio de
médicos aos Congressos Internacionais, reformas em consultórios e dinheiro em
troca de prescrição também foram confirmados pela CPI.
A propaganda de medicamentos foi indicada como um dos principais
problemas relacionados ao mercado farmacêutico no Brasil, segundo o Relatório
112
Final da CPI de Medicamentos da Câmara dos Deputados (LOPES, N. Brasília:
2000, mai. 30). Nascimento (2005, p. 17) conclui que, entre os graves problemas
identificados pela CPI, estão:
[...] o superfaturamento no preço das matérias-primas adquiridas nas
matrizes das indústrias no exterior, a cartelização do setor no Brasil, o
abuso nos preços praticados pelo comércio varejista, o estímulo à
“empurroterapia” e à comercialização de produtos sem comprovação
científica de seu real impacto na saúde.
Enquanto pesquisadores, acadêmicos, profissionais da área de saúde e
comunicação e órgãos que atuam em defesa do consumidor reúnem-se em
congressos e workshops em prol da saúde da população, a indústria farmacêutica atua
rápido, elaborando estratégias de marketing e utilizando a propaganda como
poderosa ferramenta para vender e anunciar os mais variados medicamentos no
mercado brasileiro.
Segundo Lefèvre, a ANVISA tenta fiscalizar, mas há tempos tal
fiscalização se tornou incontrolável. “Propaganda de medicamento tem que ser
proibida. É o mesmo que propagar arma de fogo. Não pode.”
Além disso, as multas são irrisórias diante dos investimentos com
propaganda. Em 2003, o total de multas chegou a R$ 3,5 milhões. No mesmo ano, a
indústria farmacêutica investiu R$ 3,4 bilhões com propaganda, cerca de 20% de seu
faturamento total, que foi de R$ 17 bilhões (
http://www.cremesp.com.br ).
3 Ética na Propaganda de Medicamentos no Brasil
A questão ética a ser abordada no presente estudo não é a de
aprofundamento teórico, nem de incursões no mundo do Direito, mas busca o
reconhecimento da existência de Leis, Decretos, Códigos, enfim de textos legais que
há décadas atuam na propaganda de medicamentos no Brasil.
113
Segundo Nascimento (2005, p. 41), uma conquista da sociedade
brasileira, que trouxe impacto à regulamentação do mercado de medicamentos e
particularmente da propaganda, é o Direito de Defesa do Consumidor inscrito na
Constituição de 1988. Antes dessa conquista, a fim de relembrar passagens
importantes em proteção ao consumidor, Giacomini Filho (1991, p. 36-40) relata
que, em 1976, foi concluída a Comissão Parlamentar de Inquérito de Defesa do
Consumidor, registrando vários temas, dentre eles medicamentos e indústria
farmacêutica. Em 1987, foi criada pelo governo paulista a Secretaria da Defesa do
Consumidor, absorvendo PROCON e IPEM e, no mesmo ano, criado o Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC).
Em 1990, foi a vez do Código de Defesa do Consumidor. De acordo com
ele, os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não podem acarretar
riscos à saúde ou à segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e
previsíveis em decorrência de sua natureza, obrigando-se os fornecedores, em
qualquer hipótese, a dar as informações adequadas e necessárias a seu respeito. O
Código proíbe, ainda, a publicidade enganosa ou abusiva. Toda publicidade deve ser
clara para que o consumidor possa identificá-la facilmente. O fornecedor deve
manter informações técnicas e científicas para provar que a propaganda é verdadeira.
Tudo o que for anunciado deve ser cumprido, pois as informações da propaganda
fazem parte do contrato. Portanto, é direito do consumidor informação sobre
quantidade, características, composição, preço e riscos que o produto porventura
apresente. O Código configura crime contra as relações de consumo, sem prejuízo do
disposto no Código Penal e leis especiais, qualquer agressão a esses princípios
(NASCIMENTO, 2005, p.42).
114
Nascimento afirma ainda que existem mais textos legais relativos aos
produtos submetidos ao regime de vigilância sanitária: o Decreto 79.094, de 5 de
janeiro de 1977, e a Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976, demonstram que há
muito tempo o governo brasileiro possui elementos legais suficientes para regular e
fiscalizar a propaganda de medicamentos no país: explicitamente voltados para
“todos os meios de divulgação, comunicação, ou publicidade, tais como cartazes,
anúncios luminosos ou não, placas, referências em programações radiofônicas,
filmes de televisão ou cinema e outras modalidades”
O Decreto 79.094 já determina, em 1977, em seu Artigo 117, que:
A propaganda dos medicamentos, drogas ou de qualquer outro produto
submetido ao regime da Lei número 6.360, cuja venda dependa de
prescrição por médico ou cirurgião-dentista, somente poderá ser feita
junto a esses profissionais através de publicações específicas.
Já no seu Artigo 118, ao tratar dos chamados “medicamentos de venda
livre”, o Decreto determina que:
A propaganda dos medicamentos, drogas ou de qualquer outro produto
submetido ao regime da Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976, e deste
Regulamento, cuja venda independa de prescrição do médico ou
cirurgião-dentista, prescindirá de autorização prévia do Ministério da
Saúde, deste que sejam observadas as seguintes condições: I - Registro do
produto, quando este for obrigatório, no órgão de vigilância sanitária
competente do Ministério da Saúde. II - Que o texto, figura, imagem, ou
projeções não ensejem interpretação falsa, erro ou confusão quanto à
composição do produto, suas finalidades, modo de usar ou procedência,
ou apregoem propriedades terapêuticas não comprovadas por ocasião do
registro a que se refere o item anterior. III - Que sejam declaradas
obrigatoriamente as contra-indicações, indicações, cuidados e
advertências sobre o uso do produto.
E mais: o Parágrafo 2º deste artigo prevê que
No caso de infração, constatado a inobservância do disposto nos itens I, II
e III deste artigo, independentemente da penalidade aplicável, a empresa
ficará sujeita ao regime de prévia autorização previsto no artigo 58 da Lei
nº 6.360, de 23 de setembro de 1976, em relação aos textos de futuras
propagandas.
Já na Lei nº6.360, em seu Artigo 59, está assegurado que:
115
Não poderão constar de rotulagem ou de propaganda dos produtos de que
trata esta Lei, designações, nomes geográficos, símbolos, figuras,
desenhos ou quaisquer indicações que possibilitem interpretação falsa,
erro ou confusão quanto à origem, procedência, natureza, composição ou
qualidade, que atribuam ao produto finalidades ou características
diferentes daquelas que realmente possuam. (2005, p. 43-44)
Há quase 30 anos existe a preocupação em se regular a questão do
mercado farmacêutico no Brasil. Portanto essa preocupação ética não é de 2000, com
o processo de elaboração da Resolução de Diretoria Colegiada (RDC 102) pela
ANVISA, de 30 de novembro de 2000.
Conforme o Relatório da CPI de Medicamentos, diversas irregularidades
na prática de venda e propagação de medicamentos foram encontradas. Escândalos
que envolvem desde a cartelização da indústria às mais ousadas estratégias de
marketing e propaganda.
Guimarães apresenta em seu livro A Publicidade Ilícita e a
Responsabilidade Civil das Celebridades que dela Participam a presença constante
de artistas na propaganda de medicamentos. Em alguns momentos, interpretam uma
cena de dor de cabeça, dor nas costas, azia; em outros, colocam o nome, como em
um testemunhal, exaltando o medicamento, como se fosse um sabonete ou algo que
não pudesse fazer mal à saúde. É uma grande responsabilidade. Guimarães (2007, p.
117) relata o caso da atriz Maitê Proença, garota-propaganda das pílulas
anticoncepcionais Microvlar (do escândalo das pílulas inócuas, de farinha, vendidas
no mercado), que processou a fabricante Schering do Brasil, pleiteando o
ressarcimento pelos prejuízos que sua imagem havia sofrido.
Atletas famosos (Zico, Raí, Pelé), cantores (Leonardo, Sandy e Júnior,
Angélica, Xuxa), apresentadores (Hebe, Ana Maria Braga, Jô Soares, Raul Gil,
Ratinho) e incontáveis artistas de novela (Lima Duarte, Luiz Gustavo, Juca de
Oliveira, Regina Duarte, Glória Pires e famílias inteiras, como a Goulart e a
116
Montenegro) fizeram propaganda de medicamentos na TV, rádio, revistas, mídia
exterior. Entretanto, para os publicitários que trabalham com a indústria
farmacêutica, isso não parece ser problema, mas solução. Dudu de Carvalho,
responsável por algumas propagandas como Doril, Vitassay e Biotonico Fontoura
disse: “Gente famosa traz retorno ao comercial […] o cachê é maior, mas o retorno é
melhor, porque a lembrança é mais forte. Uso um ator que está na novela e veiculo a
propaganda no intervalo dela.” (GUIMARÃES, 2007, p. 162).
Giacomini Filho (1991, p. 106) lembra ainda que: “[...] a atuação ética da
publicidade também é controvertida na área de medicamentos, tanto quando se dirige
ao público incentivando a automedicação como diretamente ao médico”. Salienta que
muitas das ações feitas pela indústria farmacêutica não passam pelas agências nem
pela mídia de massa porque são direcionadas aos médicos e farmacêuticos.
Difícil discutir e classificar ética. Ou se tem ou não se tem. Não se
deveria dar tanta importância a medicamento ético, não-ético ou a-ético, venda livre
ou não livre, mas sim de condutas éticas, e isso sim envolve indústrias,
consumidores, governo e publicitários, ou seja, uma boa vontade e atitude coletiva.
3.1 Regulação e Reações: “por onde passa, cicatriza”
Na perspectiva atual, leis, códigos, resoluções, decretos, anexos a
respeito de propaganda de medicamentos, não faltam no Brasil. A questão é se são
conhecidas, reconhecidas, aplicadas e cumpridas.
Segundo Lei da Vigilância Sanitária nº 6.360, de setembro de 1976
(atualizada pela Lei nº 9.294, de julho de 1996), medicamento ético não pode ser
anunciado na mídia de massa. Restringe-se apenas às publicações segmentadas aos
117
médicos. O medicamento de venda livre (OTC) pode fazer propaganda na mídia de
massa.
Ao transcreverem-se trechos importantes da RDC 102 da ANVISA
(restrito aqui à Propaganda de Medicamentos de Venda Livre) e do Anexo I do
CONAR, nota-se que existem convergências, divergências, contradições e que muito
do que já existe não é cumprido. Estas passagens contribuem com informações
precisas para as análises propostas no capítulo 5. A resolução RDC 102, da
ANVISA, e o Anexo I, do CONAR, estarão na íntegra no final da Tese, no Anexo 1
e Anexo 2, respectivamente.
Para se compreender melhor a trajetória que levou à formulação da
Resolução de Diretoria Colegiada (RDC 102), de 30 de novembro de 2000, foi
utilizado o seguinte raciocínio:
A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária no
uso da atribuição que lhe confere o art. 11 inciso IV do Regulamento da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária aprovado pelo Decreto n°
3.029, de 16 de abril de 1999, c/c o artigo 8°, IV do Regimento Interno
aprovado pela Portaria n° 593 de 25 de agosto de 2000, em reunião
realizada em 29 de novembro de 2000, Considerando a Lei n° . 6.360 de
23 de setembro de 1976 publicada no DOU de 24 de setembro de 1976;
Considerando a Medida Provisória 2.039-22/2000; considerando a
Constituição Federal de 1988; considerando o disposto na Lei 9782, de 26
de janeiro de 1999; considerando o Decreto n.° 79.094, de 5 de janeiro de
1977, que regulamenta a Lei n° 6360, de 24 de setembro de 1976;
considerando a Lei n°.6.368, de 21 de outubro de 1976; considerando o
Decreto n° 78.992, de 21 de dezembro de 1976, que regulamenta a Lei n°
6368, de 21 de outubro de 1976; considerando a Lei n° 6.437, de 20 de
agosto de 1977, sobre infrações sanitárias; alterada pela Lei n° 9005 de 16
de março de 1995 e pela Lei n° 9.695 de 20/08/1998, DOU de
21/08/1998; considerando a Lei n° 9.294 de 15 de julho de 1996;
considerando o Decreto nº 2.018, de 0l de outubro de 1996 que
regulamentar Lei n° 9294, de 15 de julho de 1996: considerando a M.P.
n° 1.814, de 26 d.e fevereiro de 1999; considerando o art. 3° da M.P. n°
1912-10, de 25 de novembro de l999; considerando a Lei n° 8078, de 11
de setembro de 1990; considerando Decreto n° 2.181, de 20 de março de
1997; adotou a seguinte Resolução de Diretoria Colegiada e eu, Diretor-
Presidente, determino a sua publicação. Gonçalo Vecina Neto.
REQUISITOS PARA MEDICAMENTOS DE VENDA SEM
EXIGÊNCIA DE PRESCRIÇÃO
Art. 9° Qualquer tipo de propaganda; publicidade ou promoção
de medicamento dirigida ao público em geral deve ser realizada de
118
maneira que resulte evidente o caráter promocional da mensagem e deve
sujeitar-se às disposições legais descritas neste regulamento técnico.
Parágrafo único: As comunicações dirigidas aos profissionais de
saúde, veiculadas em meios de comunicação de massa, verbais ou não
verbais, consideram-se propaganda, devendo submeter-se ás disposições
legais descritas neste regulamento técnico.
Art. 10 Na propaganda, publicidade e promoção de
medicamentos de venda sem exigência de prescrição é vedado:
I - estimular e/ou induzir o uso indiscriminado de medicamentos
e/ou emprego de dosagens e indicações que não constem no registro do
medicamento junto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária;
II - incluir mensagens de qualquer natureza dirigidas a crianças
ou adolescentes; conforme classificação do Estatuto da Criança e do
Adolescente, bem como utilizar símbolos e imagens com este fim;
III - promover ou organizar concursos, prometer ou oferecer
bonificações financeiras ou prêmios condicionados à venda de
medicamentos;
IV - sugerir ou estimular diagnósticos aconselhando um
tratamento correspondente, sendo admitido apenas que sejam utilizadas
frases ou imagens que definam em termos científicos ou leigos a
indicação do medicamento para sintomas isolados;
V - afirmar que um medicamento é "seguro", "sem contra-
indicações"; "isento de efeitos secundários ou riscos de uso" ou usar
expressões equivalentes;
VI - afirmar que o medicamento é um alimento, cosmético ou
outro produto de consumo, da mesma maneira que nenhum alimento,
cosmético ou outro produto de consumo possa mostrar ou parecer tratar-
se de um medicamento;
VII - explorar enfermidades, lesões ou deficiências de forma
grotesca, abusiva ou enganosa, sejam ou não decorrentes do uso de
medicamentos;
VIII - afirmar e/ou sugerir ter um medicamento efeito superior a
outro usando expressões tais como: "mais eficaz", "menos tóxico" , ser a
única alternativa possível dentro da categoria ou ainda utilizar expressões,
como: "o produto", "o de maior escolha", "o único" , "o mais
freqüentemente recomendado", "o melhor". As expressões só poderão ser.
utilizadas se comprovadas por evidências científicas, e previamente
aprovadas pela ANVISA;
IX - afirmar e/ou sugerir ter um medicamento efeito superior a
outro usando expressões tais como: "mais efetivo", "melhor tolerado". As
expressões só poderão ser utilizadas se comprovadas por evidências
científicas, e previamente aprovadas pela ANVISA;
X - usar de linguagem direta ou indireta relacionando o uso de
medicamento ao desempenho físico, intelectual, emocional, sexual ou a
beleza de uma pessoa, exceto quando forem propriedades aprovadas pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária;
XI - sugerir que o medicamento possua características
organolépticas agradáveis tais como: "saboroso", "gostoso", "delicioso"
ou expressões equivalentes.
Art. 11 No caso específico de ser mencionado nome e/ou
imagem de profissional como respaldo das propriedades anunciadas do
medicamento, é obrigatório constar na mensagem publicitária o nome do
profissional interveniente, seu número de matricula no respectivo
conselho ou outro órgão de registro profissional.
Art. 12 A propaganda, publicidade e promoção de medicamento
de venda sem exigência de prescrição deverão incluir, além das
informações constantes no inciso I do artigo 3° desta regulamentação:
119
a) o nome comercial do medicamento; o numero de registro na
Agência Nacional de Vigilância Sanitária e o nome dos princípios ativos
segundo a DCB e na sua falta a DCI;
b)as advertências: "AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, O
MEDICO DEVERA SER CONSULTADO". A inclusão da mensagem
deverá respeitar as seguintes regras:
§ 1° No rádio, a advertência será veiculada imediatamente após o
término da mensagem publicitária e terá locução diferenciada, cadenciada
e perfeitamente audível.
§ 2° Na televisão, cinema e assemelhados serão observado:
a) após o término da mensagem publicitária, a advertência será
exibida em cartela única, com fundo azul em letras brancas, de forma a
permitir a perfeita legibilidade e visibilidade, permanecendo imóvel no
vídeo;
b) a cartela obedecerá ao gabarito RTV de filmagem no tamanho
padrão de 36,5cmx27cm (trinta e seis e meio centímetros por vinte e sete
);
c) as letras da cartela serão de família tipográfica Univers,
variação Medium, corpo 38, caixa alta;
d) toda propaganda de medicamentos conterá obrigatoriamente a
advertência indicando que "AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, O
MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO". *
§ 3° Nas placas luminosas, nos painéis eletrônicos e na Internet
serão observados os itens a, b e c constantes do parágrafo 2º;
§ 4° Nos painéis, cartazes, munidores, jornais, revistas ou
qualquer outra forma de mídia impressa, os textos advertência serão
escritos em letras de cor preta, padrão Univers 65 bold, sendo impresso
sobre retângulo branco com um filete interno emoldurando a advertência
sendo observado o seguinte:
CARTAZES, CARTAZETES, PAINÉIS
0 a 250 cm2/Corpo 16, 251 a 500 cm2/Corpo 20, 501 a 1000
cm2/Corpo 24, 1001 a 1500 cm2/Corpo 26, 1501 a 2000 cm2/Corpo 30,
2001 a 3000 cm2/Corpo 36,3001 a 4000 cm2/Corpo 40,4001 a 5000
cm2/Corpo 48.
REVISTAS
Páginas Dupla/Página simples/Corpo 12, ½ Página/Corpo 8, ¼
Página/Corpo 4
JORNAIS
Tamanho Padrão: 1 Página/Corpo 24, ½ Página/Corpo 16, ¼
Página/Corpo 8
Tamanho Tablóide:1 Página/Corpo 16, ½ Página/Corpo 10, ¼
Página/Corpo 8
a) Qualquer tamanho não especificado nos itens relacionados a
revistas e jornais será proporcionalizado tomando-se por base a definição
para 1/4 de página” (http://e -legis.anvisa.gov.br)
O Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (CONAR)
surgiu em 1980, dez anos antes do Código de Defesa do Consumidor, com o
propósito de ser a autoresposta e a autoprevenção do setor publicitário com relação a
seus próprios abusos (MARCONDES, 2002, p. 89).
O ANEXO "I" do CONAR refere-se aos Produtos Farmacêuticos Isentos de
Prescrição (ou de venda livre):
120
A publicidade dos produtos submetidos a este Anexo observará
as normas específicas que se seguem, as quais complementam as normas
gerais deste Código. Para os efeitos deste Anexo, são considerados
produtos farmacêuticos isentos de prescrição, também conhecidos como
medicamentos populares ou OTC - over the counter -, aqueles cuja venda,
nos termos da lei, está dispensada da apresentação de receita emitida por
Médicos e Cirurgiões-Dentistas.
1.A embalagem, rotulagem e publicidade de medicamentos
populares deverão estar em conformidade com a legislação pertinente:
a. entende-se por embalagem todo invólucro, recipiente ou
qualquer forma de acondicionamento, removível ou não, destinado a
cobrir, empacotar, envasar, proteger ou manter, especificamente ou não,
os produtos de que trata este Anexo;
b. entende-se por rotulagem qualquer identificação por palavras
ou ilustrações presentes na embalagem.
2. A publicidade de medicamentos populares:
a. não deverá conter nenhuma afirmação quanto à ação do
produto que não seja baseada em evidência clínica ou científica;
b. não deverá ser feita de modo a sugerir cura ou prevenção de
qualquer doença que exija tratamento sob supervisão médica;
c. não deverá ser feita de modo a resultar em uso diferente das
ações terapêuticas constantes da documentação aprovada pela Autoridade
Sanitária;
d. não oferecerá ao consumidor prêmios, participação em
concursos ou recursos semelhantes que o induzam ao uso desnecessário
de medicamentos;
e. deve evitar qualquer inferência associada ao uso excessivo do
produto;
f. não deverá ser feita de modo a induzir ao uso de produtos por
crianças, sem supervisão dos pais ou responsáveis a quem, aliás, a
mensagem se dirigirá com exclusividade;
g. não deverá encorajar o Consumidor a cometer excessos
físicos, gastronômicos ou etílicos;
h. não deverá mostrar personagem na dependência do uso
contínuo de medicamentos como solução simplista para problemas
emocionais ou estados de humor;
i. não deverá levar o Consumidor a erro quanto ao conteúdo,
tamanho de embalagem, aparência, usos, rapidez de alívio ou ações
terapêuticas do produto e sua classificação (similar/genérico);
j. deverá ser cuidadosa e verdadeira quanto ao uso da palavra
escrita ou falada bem como de efeitos visuais. A escolha de palavras
deverá corresponder a seu significado como geralmente compreendido
pelo grande público;
k. não deverá conter afirmações ou dramatizações que
provoquem medo ou apreensão no Consumidor, de que ele esteja, ou
possa vir, sem tratamento, a sofrer de alguma doença séria;
l. deve enfatizar os usos e ações do produto em questão.
Comparações injuriosas com concorrentes não serão toleradas. Qualquer
comparação somente será admitida quando facilmente perceptível pelo
Consumidor ou baseada em evidência clínica ou científica. Não deverão
ser usados jargões científicos com dados irrelevantes ou estatísticas de
validade duvidosa ou limitada, que possam sugerir uma base científica
que o produto não tenha;
m. não deverá conter qualquer oferta de devolução de dinheiro
pago ou outro benefício, de qualquer natureza, pela compra de um
medicamento em função de uma possível ineficácia;
n. a publicidade de produto dietético deve submeter-se ao
disposto neste Anexo e, no que couber, nos anexos "G" e "H". Não deverá
121
incluir ou mencionar indicações ou expressões, mesmo subjetivas, de
qualquer ação terapêutica.
3. A referência a estudos, quer científicos ou de consumo,
deverá sempre ser baseada em pesquisas feitas e interpretadas
corretamente.
4. Qualquer endosso ou atestado, bem como a simples referência
a profissionais, instituições de ensino ou pesquisa e estabelecimentos de
saúde, deverá ser suportada por documentação hábil, exigível a qualquer
tempo.
5. A publicidade de medicamentos não oferecerá a obtenção de
diagnóstico à distância.
6. Não conterá afirmações injuriosas às atividades dos
profissionais de saúde ou ao valor de cuidados ou tratamentos destes.
7. Quando oferecer a venda do produto por meio de telefone ou
endereço eletrônico, deverá explicitar a razão social e o endereço físico do
anunciante a fim de facilitar ação fiscalizatória e reclamações.
(http://www.conar.org.br).
Novas normas de propagandas de medicamentos de venda livre estão
surgindo. Consciente das necessidades de mudança e atualização, a gerente de
propaganda da ANVISA, Ana Paula Dutra, admite que as novas normas pretendem
promover o uso racional dos medicamentos. Dentre as medidas sugeridas, destaca
que as propagandas voltadas à população passarão a conter o seguinte alerta: “Isto é
um medicamento. Seu uso pode trazer riscos e efeitos colaterais. Leia atentamente a
bula e, em caso de dúvida, consulte o médico ou a orientação de um farmacêutico” e
não mais “Ao persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado.” Frase que
ficou polêmica, por ser considerada subjetiva e perigosa: “[...] quem criou essa frase
não sabia o que estava fazendo, é um slogan que mais incentiva a automedicação do
que qualquer outra propaganda!”, segundo Lefèvre.
Ainda de acordo com as propostas apresentadas fica proibida a
publicidade enganosa, abusiva, indireta ou subliminar, bem como merchandising de
medicamentos. Também serão proibidas mensagens bastante comuns atualmente, tais
como: “Aprovado e recomendado por especialista”. Da mesma forma, a propaganda
não poderá mais sugerir que o medicamento não tem efeitos colaterais ou pode ser
utilizado por qualquer pessoa, de qualquer faixa etária, por meio de slogans como:
122
“O medicamento para toda a família”; “Para todo tipo de mulher...”; “Ideal para
todas as crianças...” (
http://www.cremesp.com.br/222).
3.2 Várias vozes: representantes da indústria, da propaganda e da saúde.
Há vários depoimentos e opiniões quando se trata de ética na propaganda
de medicamentos. Dar voz é abrir possibilidades de diálogos e promover reflexões
mais profundas. Aqui estão reunidos alguns depoimentos de representantes da
indústria farmacêutica, da publicidade e propaganda e de professores e pesquisadores
em saúde, não necessariamente na ordem contrários ou favoráveis à propaganda de
medicamentos.
Antonio Marcelo, corregedor do Conselho Federal de Medicina, diz que
o conselho é contrário à propaganda de medicamentos na mídia de massa, pois os
propagandistas divulgam os medicamentos aos médicos e o consumidor não tem o
mesmo nível de percepção dos profissionais.“A publicidade nas rádios e em alguns
canais de TV oferece medicamentos que não têm eficácia. Essas são publicidades
enganosas e não há fiscalização sobre isso.”(Jornal O Globo, 07 de mar. 2007, p. 28).
José Ruben de Alcântara Bonfim, coordenador executivo da Sociedade
Brasileira de Vigilância Médica/SOBRAVIME, denuncia que no Brasil não existe
vontade por parte da indústria farmacêutica de se promover a ética e que, portanto,
seria pertinente, com base no Art 58, da Lei nº 6.360/76, que o Ministério da Saúde
produzisse outro regulamento, ou seja, um decreto que só permitisse a propaganda de
material impresso mediante prévio exame de comissão de especialistas formada para
esta finalidade, com participação de entidades de defesa do consumidor.
Aurélio Villafranca Saez, presidente da Associação Brasileira da
Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição, é favorável à propaganda de
123
medicamentos e afirma que em nenhum país do mundo, medicamento de venda livre
tem a propaganda proibida. Ele afirma que não se consome esse tipo de produto por
impulso e que, por isso, a propaganda não aumenta a venda. O consumidor troca de
marca, mas não toma um remédio de que não precisa (Jornal O Globo, 07 de mar.
2007, p. 28).
Segundo Marilena Lazzarini, presidente mundial da Consumers
Internacional, a investigação preliminar com vinte laboratórios da indústria
farmacêuticas, líderes de mercado, constatou 972 violações ao código de práticas
estabelecido pela própria indústria entre 2002 e 2005, o que mostra que, em todo o
mundo, a autoregulação não está funcionando adequadamente e os governos devem
esforçar-se mais para assegurar sanções contra as companhias que não estão
cumprindo os direitos dos consumidores (ibid.)
Para Wilson da Costa Bueno, jornalista e professor-doutor do Programa
de Pós-Graduação em Comunicação Social da UMESP, a imprensa deveria ser mais
cuidadosa e investigativa e não acreditar que só porque os laboratórios farmacêuticos
incluem no término de suas propagandas “se persistirem os sintomas, consulte o seu
médico” são grande coisa, uma vez que continuam estimulando a automedicação e
não mencionam os efeitos colaterais dos medicamentos à população (2005, p. 129).
Fernando Lefèvre posiciona-se:
“Sou contra a propaganda de medicamentos. O governo deveria ser duro e
intervir na indústria, não dá para controlar, já tentaram, tem que abolir a
propaganda. A propaganda é conivente, aderente ao consumo. Em nossa
sociedade, o indivíduo não tem acesso ao profissional de saúde, a maioria
não tem acesso. Mas tem acesso às farmácias e toma o que lhe falam pra
tomar, não pode ser assim.”
Gabriel Tannus, presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de
Pesquisa, que reúne 28 empresas e representa 50% do mercado farmacêutico, diz que
124
a regulamentação da Anvisa é muito boa e afirma que a indústria farmacêutica é séria
e quer uma propaganda ética (Jornal O Globo, 07 de mar. 2007, p. 28).
O presidente da Federação Nacional dos Médicos (FENAM), Heder
Murari Borba, é contra todo tipo de propaganda de medicamento nos meios de
comunicação de massa. “A propaganda estimula a automedicação e mesmo os
medicamentos livres de prescrição têm contra-indicações e geram algum risco. Quem
tem que prescrever qualquer medicamento é o médico, não o comercial de televisão.”
(
http://www.cremesp.com.br/).
Para Humberto Alves Mendes, vice-presidente da Federação Nacional
das Agências de Propaganda (FENAPRO), fica difícil trabalhar com a indústria
farmacêutica, por causa da ANVISA. Ele é a favor do livre arbítrio, “restrição ainda
é aceitável, mas proibição é absurdo nos dias de hoje. Tornou-se um hábito culpar a
propaganda por tudo!
Gisela Carvalhinho diz: “não é nada fácil trabalhar com propaganda de
medicamentos: ético ou de venda livre. É bastante complexo. Slogans ou anúncios
são elaborados em duas ou mais versões, porque tudo deve seguir a RDC 102.”
Gisela informa também que a partir da agência, a propaganda é aprovada pelos
médicos e pelo jurídico do laboratório. Portanto, se cria com precaução para não se
perder a conta, nem ter o cliente multado pela ANVISA.
Para o pesquisador da Fundação Osvaldo Cruz, o jornalista Álvaro
Nascimento, a publicidade de medicamentos no Brasil precisa sofrer um choque
civilizatório. Ele não acha que as medidas mudam a realidade das propagandas
atuais, que induzem ao uso irracional e incorreto de medicamentos
(
http://www.cremesp.com.br/).
125
Como manifesto, no site do CONAR, foi exposta a carta a seguir como
protesto à ANVISA.
ANVISA NÃO É COMPETENTE PARA LEGISLAR SOBRE
PUBLICIDADE
Um manifesto do CONAR, ABA, ABAP, ABERT, ABTA,
ANER, ANJ, CENTRAL DE OUTDOOR, FENAPRO, FENEEC e IAB
Às autoridades e ao mercado publicitário:
A propósito de manifestações de autoridades do Executivo
federal reconhecendo à ANVISA (Agência Nacional de Vigilância
Sanitária) a competência para legislar sobre publicidade e, ainda, diante
das reiteradas iniciativas daquela agência neste sentido, as entidades
signatárias esclarecem o seguinte:
1. A Constituição federal determina, expressamente, que
compete privativamente à União legislar sobre propaganda comercial
(Art. 22 inciso XXIX) Determina ainda, no capítulo “Da Comunicação
Social”, que “compete a lei federal estabelecer os meios legais que
garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem (...) da
propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à
saúde e ao meio ambiente” (Art. 220, § 3º, inciso II) e também que “a
propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos,
medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do
inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário,
advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.” (Art. 220, § 4º).
2. No momento em que a ANVISA ensaia a imposição de
restrições à liberdade de expressão comercial por via de resoluções de sua
Diretoria Colegiada, as entidades signatárias reafirmam sua confiança no
estado de direito democrático, e esclarecem às autoridades, à opinião
pública e ao mercado publicitário que estão atentas e coesas na defesa das
prerrogativas constitucionais asseguradas à propaganda comercial.
São Paulo, maio de 2007.”(
http://www.conar.org.br/)
Não há como não reconhecer que a indústria farmacêutica, quando faz
algum tipo de investimento em pesquisa sobre qualquer produto, o faz com a
finalidade de lucro, que seria o fator responsável pela sua sobrevivência. Mas a
questão é verificar a intensidade e a amplitude desses fatores enquanto filosofia da
empresa, o quanto isso envolve a atuação da própria sociedade, como fiscalizadora
para o estabelecimento de limites aceitáveis.
O mesmo acontece com a propaganda. Há o interesse da agência em
lucrar ao prestar os seus serviços e uma tendência em encarar o medicamento como
mercadoria qualquer, assim como faz com os demais produtos e clientes submetidos
126
às lógicas comerciais. O que não significa, nem justifica o desrespeito e o
descumprimento de leis.
No cenário de opiniões controversas, com luta por interesses diversos, é
muito difícil se chegar a um consenso. Se os depoimentos anteriores fossem
transformados em frases de efeito, impactantes, possíveis slogans seriam
descobertos. Entretanto, não é essa a proposta deste estudo. Apesar dos slogans
nortearem o presente estudo, a partir dos próximos capítulos receberão destaque
quanto à definição e análise.
127
4 OS SLOGANS
Nos capítulos anteriores, frases de efeito e slogans foram citados
praticamente como sinônimos. A esses termos somam-se outros, como: frase feita,
lema, apelido pragmático do nome próprio. De que maneira, então, se pode definir
slogan? Palavras, frases, slogans são encontrados comumente em estudos do âmbito
verbal, sem excluir o visual, mas com ênfase no primeiro. O presente capítulo parte
da definição de texto, de aspectos verbais da linguagem, a fim de se compreender o
lugar do slogan na propaganda. Conforme visto no capítulo anterior, publicidade e
propaganda podem ser tratadas de maneira indistinta, portanto, slogan, neste estudo,
será seguido das palavras “publicitário” ou “de propaganda”, também sem distinção.
1 Slogan - possível diálogo em busca da definição
Segundo Reboul (1975, p. 4), “O slogan é um tema multifário
(interdisciplinar?) que concerne à Lingüística, à Filosofia Analítica, à Retórica, à
Psicologia Social, à História sem falar nas técnicas de publicidade e propaganda. A
dificuldade desse tipo de estudo vem da extrema disparidade dos campos de
pesquisa.”
Essa interdisciplinaridade que Reboul menciona ou a
transdisciplinaridade que este estudo propõe, é o que faz com que o slogan seja visto
por olhares diferentes.
A origem da palavra slogan, segundo Reboul, é gaélica: sluagh-ghairm,
que significava na Escócia “o grito de guerra de um clã”. O francês atribuiu ao
slogan o mesmo sentido de propaganda, doutrinamento, reclame. O inglês adotou o
128
termo por volta do século XVI, para, no século XIX, transformá-lo em divisa de um
partido e, a seguir, em palavra de ordem eleitoral. Nesse mesmo século, o americano
acabou dando um sentido comercial ao slogan (ibid., p. 7-8). O slogan tem sua
verdadeira origem, não na propaganda, mas nas tradições milenares das frases feitas
e dos ditos populares (IASBECK, 2002, p. 49). As conhecidas Sagradas Escrituras,
repletas de provérbios e figuras de retórica, utilizadas para mudar o comportamento
de um grande número de pessoas, já sinalizavam, de certo modo, o papel das frases
de efeito, o discurso curto, plástico e objetivo, frases feitas (ibid., 58).
Na visão de Sandmann (1999, p. 92), o uso e o jogo com a frase feita é
um dos aspectos ou figuras que mais proporciona anotações, quando do exame das
características da linguagem da propaganda. Para ele, frase feita é a seqüência fixa de
menor ou maior de número de palavras que forma uma unidade sintática, podendo
tornar-se marcante pelo seu uso. Portanto, frase feita na propaganda pode ser tomada
como sinônimo de slogan, considerando alguns aspectos: seu simples uso, às vezes
com pequenas alterações; seu uso com reinterpretação; e seu uso com modificações
que produzem mudança de rumo, alterando sua essência (ibid.).
Líderes políticos, tais como Adolph Hitler, Mussolini e Churchil
levantaram multidões e mobilizaram milhares de pessoas ao usarem frases de
impacto como prova de poder e liderança, conquistando uma verdadeira legião de
seguidores. Tais frases, verdadeiros textos concisos e persuasivos, discursos políticos
recheados de ideologia, em nada se diferenciam da intenção da propaganda, e, por
isso, assumem um efeito poderoso. Alguns slogans políticos brasileiros ficaram
bastante conhecidos:“50 anos em 5” usado por Juscelino Kubitschek, na década de
50; “varre, varre vassourinha”, de Jânio Quadros em 1961; “Brasil, ame-o ou deixe-
o”, dos anos 70; da década de 1990 até poucos anos atrás: "Maluf faz", do político
129
Paulo Maluf e o slogan das últimas eleições presidenciais utilizado pelo atual
presidente: "não vamos trocar o certo pelo duvidoso".
Reboul argumenta a respeito dos slogans políticos diferenciando-os do
slogan publicitário. Entretanto, o próprio Reboul reconhece que as diferenças nada
têm de essencial, uma vez que ambos os slogans se assemelham em vários aspectos.
Exemplo disso é o uso de palavras como “vote” ou “compre”, que servem
respectivamente ao político e publicitário. Para o autor, o slogan ideológico é mais
espontâneo, dura mais tempo ou o tempo todo e pode suscitar atos diversos, inclusive
o de um grupo social (1975, p. 97-99). Reboul chega à conclusão de que todo slogan
é ideológico, porque “[…] participa de um tipo de comunicação vertical e
irreversível e integra os indivíduos na sociedade de consumo” (ibid., p.100).
Para Iasbeck (2002, p. 71), “O slogan é, quase sempre, uma frase de
efeito […] porém, nem toda frase de efeito é um slogan.” A frase de efeito pode
estar inserida nos argumentos de um texto publicitário. Algumas frases de efeito
acabaram ganhando o status de slogans em algumas campanhas. Exemplo “não é
nenhuma Brastemp!” Era frase de efeito e passou a slogan de campanha,
provavelmente por ter conquistado um efeito de penetração na linguagem popular.
Carrascoza valoriza o slogan, colocando-o num grau único de
importância: o minimalismo na propaganda. A justificativa é a de que o slogan não
apenas simplifica a expressão, mas explica, em poucas e precisas palavras, sensações
ou conceitos profundos. “Em busca dessa concisão, criou aforismos, sentenças,
máximas, ditados, epigramas, versículos e outros tipos de minimalismo.” (2003, p.
55).
Martins (1997, p. 132) aponta, de forma mais direta: “O slogan é máxima
ou frase curta, concisa, marcante. É expressão concentrada que sugere uma idéia,
130
expressão enfática, simples, resumida e dinâmica”. Ainda segundo ele, o slogan
publicitário deve, além de ser positivo, breve, compreensível, preciso, incisivo,
rítmico e simpático, sempre chamar a atenção. Para o autor (ibid., p.134), “o slogan
publicitário é uma frase que tem maior informação em maior concisão, ou seja,
harmonia entre as formas de conteúdo, que dá ênfase aos artigos, aos prefixos e
neologismos e trocadilhos”.
Malanga (1977, p. 79) compara slogan a um lema, que nada mais é que
uma frase breve e sugestiva, destinada a evocar imediatamente a marca a que se
refere por leitura ou audição. Para ele, o lema ou o slogan publicitário constitui um
elemento comum no anúncio ou na campanha.
Reboul (1975, p. 39) reconhece o slogan como: “[...] uma fórmula
concisa e marcante, facilmente repetível, polêmica e freqüentemente anônima,
destinada a fazer agir as massas tanto pelo seu estilo quanto pelo elemento de
autojustificação, passional ou racional que ela comporta.”
Cabe esclarecer que repetível, nesse caso, é o fato de ir além da
repetição. Reboul refere-se a repetível como o momento em que o slogan deixa de
ser apenas repetido, para ser repetível, ou seja, tão eficiente que é agradável de
repetir. “Um verdadeiro slogan é, portanto, uma fórmula que se pode repetir e que
gostamos de repetir. Seu poder vem daí, em primeiro lugar.” (ibid., p. 51).
Figura 33. Slogan “uma boa idéia”, da Caninha 51.
131
Para Lefèvre (1999, p. 69), slogan é “um modo característico de enunciar
a mensagem publicitária que consiste em fazer seguir ao nome do produto uma outra
mensagem que poderíamos chamar de apelido pragmático do nome”. Na opinião de
Lefèvre, em propaganda a utilização de um nome de um produto não basta. Há
necessidade de um valor agregado ao nome, à marca, algo que efetivamente
acrescente, forneça uma concretude positiva, como saúde, juventude, beleza.
Exemplo: a frase de efeito, frase feita, ou seja, o slogan.
2 O lugar do slogan na propaganda
O slogan publicitário é uma mensagem publicitária e esta nasce da união
de vários fatores psico-sócio-econômicos de uma sociedade de consumo e acaba
sendo conduzida a uma representação da cultura a que pertence. É nesse contexto
que certos valores, mitos e idéias são utilizados. Slogans e a relação com a marca,
assim como slogan enquanto linguagem verbal e visual, no contexto, serão expostos
a seguir.
2.1 Slogans e marcas: “dá uma fome de leão”
Para Perez,
“o slogan é ‘primo’ de antigas tradições orais, como as manifestações por
meio dos ditos populares e das frases feitas, ou até mesmo dos gritos de
guerra. Receberam destacada importância nos anúncios publicitários por
resumirem em si a identidade de uma marca ou produto. Os slogans são
vocalizações (vocare em latim), representando vocatio, chamada ou
vocalização da marca.” (2004, p. 86)
A proposta dos slogans é a de aproximar os consumidores das marcas.
Sua função é colaborar para o reconhecimento e fixação das mesmas. Exemplo de
Chevrolet, que tinha seu slogan “Andando na frente” direcionado à marca e,
132
atualmente, utiliza “Conte comigo”, em uma tentativa de aproximação do
consumidor. Algo não muito diferente acontece com a marca Claro, telefonia celular,
com o “A vida na sua mão”. Aqui, há a utilização da metáfora para aproximar o
mundo das pessoas e, ao mesmo tempo, passar a sensação de que o consumidor pode
ter todas as facilidades por meio do celular.
São várias as definições de marca. Podem-se, porém, destacar pelo
menos três que contribuem com este estudo:
a) a encontrada no “Dicionário de Comunicação” (BARBOSA e RABAÇA, 2001, p.
455): “marca é símbolo que funciona como elemento identificador e representativo
de uma empresa, produto, etc”;
b) a clássica, encontrada nos estudos de marketing: “marca é um nome, termo, sinal,
símbolo ou desenho, ou uma combinação dos mesmos, que pretende identificar os
bens de um vendedor ou grupo de vendedores e diferenciá-los daqueles dos
concorrentes.” (KOTLER, 1995, p. 232-233); e
c) uma mais atual, proposta por Perez (2004, p. 10): “marca é uma conexão
simbólica e afetiva estabelecida entre uma organização, sua oferta material,
intangível e aspiracional e as pessoas para as quais se destina.”
O nome da marca é a parte pela qual pode ser denominado o produto, ou
seja, as marcas se expressam pelo nome. Exemplos: o produto hastes flexíveis com
pontas de algodão é conhecido pela marca Cotonetes; o medicamento dipirona sódica
é conhecido pelo nome Anador. Além do nome, as marcas também se expressam por
logotipo que, segundo Kotler (1995, p. 233), “é aquela parte da marca que pode ser
reconhecida, mas não é pronunciável, tais como símbolo, desenho ou letras
distintivas.” Para Barbosa e Rabaça (2001, p. 441), “logotipo é símbolo ou grupo de
letras apresentadas em desenho característico, destinado a funcionar como elemento
133
de identidade visual de uma empresa, produto, etc”.
Figura 34. logo Bayer.
Reboul (1975, p. 25) exemplifica a relação tipográfica entre logotipo e
slogan com um slogan de 1890, das Pílulas Pink, indicadas para pessoas pálidas, a
fim de demonstrar a importância da forma e do sentido, como que antecipando a
importância verbal e visual. Este exemplo, cuja fórmula joga com aliteração do P que
inicia cada palavra, remete também à poesia concreta de Décio Pignatari.
O logotipo pode ser analisado de maneira mais ampla, já que é
importante e faz parte da marca, um patrimônio da empresa. Em outro contexto, não
apenas tipográfico, nem das lógicas de marketing, logotipo ou logomarca (já que,
muitas vezes, são palavras utilizadas como sinônimo, por referirem-se à marca,
principalmente em seu aspecto visual) possui uma função além da verbal. Segundo
Perez (2004, p. 53), “logotipo possui uma dimensão semiótica não-verbal, icônica,
que incorpora, por conotação, significados complementares ao próprio nome.” Para a
autora (ibid., p.47), as marcas apresentam-se de diversas maneiras: por meio de
nome, logotipo, forma, embalagem, rótulo, cor, slogan, jingle, mascote, etc.
134
As marcas utilizam-se dos slogans como valiosos instrumentos de
comunicação para ajudar na criação ou manutenção da lembrança. O slogan
publicitário tem a função de reforçar uma imagem de marca por meio da associação
de um valor a um nome. O slogan tem o propósito de satisfazer, seduzir, mostrar,
demonstrar e de agradar. Os slogans publicitários favorecem a divulgação da marca
e, assim, afetam seu reconhecimento e lembrança. Pinho (1996, p. 75-78) aponta,
como um dos slogans mais conhecidos e lembrados no Brasil, o da Bayer “Se é
Bayer, é bom” e justifica sua escolha ao afirmar que esse slogan consegue
demonstrar o valor da marca e reforçar uma imagem positiva do produto.
Conquistar a fidelidade do consumidor é o objetivo de qualquer marca.
Se o investimento para conquistar novos consumidores é considerado alto, mantê-los
nem sempre o é, principalmente quando estes se sentem satisfeitos em relação à
marca que consomem. Por exemplo, se alguém da família usou a vida toda
determinado analgésico, existe uma forte tendência de a família toda usar. Além da
tradição e da eficácia, especificamente do medicamento, existe uma relação estreita
entre pessoas e “produto”, isto é, a fidelidade (sem excluir o fato de alguns
medicamentos gerarem alto índice de dependência, conforme visto no capítulo
anterior). Mas retomando a tradição, algumas marcas, assim como os respectivos
slogans, parecem imortais: Bic “é assim que se escreve”; chocolate Bis “quem pede
um, pede bis”; caninha 51 “uma boa idéia”; maionese Helmann's “verdadeira
maionese”; leite Moça “você faz maravilhas com Leite Moça”; Philco “tem coisas
que só a Philco faz pra você.” ; pilhas Ray-O-Vac “ as amarelinhas”; Rexona “sempre
cabe mais um quando se usa Rexona”; “Se é Bayer, é bom”. É a tradição, a cultura,
algo que o tempo e a memória fixaram durante anos na mente das pessoas, devido à
mídia de massa ou à propaganda boca a boca.
135
Alguns produtos, assim como os medicamentos, acreditam nas marcas
sugestivas para contribuir com a lembrança, principalmente os medicamentos de
venda livre, que investem na propaganda na mídia de massa. Essas marcas sugerem
no nome a indicação do produto. Como exemplo de medicamentos antidores, são as
marcas Anador, Dôrico, Saridon, Dorflex, Doril, além dos slogans que reforçam esse
sentido: “Tomou Doril, a dor sumiu”.
Ainda a respeito da marca, Ferrès (1998, p. 205-207) acredita que tanto
os produtos, quanto suas marcas têm personalidade. Freqüentemente, cria-se para o
produto um contexto que não se relaciona com o seu valor de uso. De forma
inconsciente, o receptor ou o consumidor transfere os valores desse contexto.
Segundo o autor, isso acontece para que, ao adquirir determinado produto ou marca o
consumidor pense estar adquirindo também uma determinada personalidade,
geralmente a desejada. É o consumo de símbolos, mais do que de produtos.
Desenvolver a lembrança demanda repetição, ou seja, uma lembrança
imediata é mais difícil principalmente se o slogan estiver ausente ou com baixa
freqüência na mídia de massa. “Manter um alto nível Top of Mind através de
exposição constante pode criar não apenas o conhecimento da marca, mas também
um destaque tal que pode inibir a lembrança de outras marcas” (AAKER, 1998,
p.79).
Sobre a importância do slogan no marketing, Aaker (ibid., p. 216) afirma
que o slogan publicitário pode ser confeccionado para uma estratégia de
posicionamento e acrescentado à marca sem muitas limitações legais. O slogan
possui a capacidade de propiciar uma associação adicional à marca, remover alguma
ambigüidade desta, e, muitas vezes, até gerar um valor próprio, passível de
exploração. Para o autor, da mesma forma que a marca, o slogan pode ser muito
136
eficaz se for específico, memorizável, relevante, interessante, engraçado, sobretudo
se tiver forte relação com a marca.
Se o slogan almeja promover uma empresa, produto ou serviço, sua
função é a de compor, junto à marca, um signo identificador e individualizador. Uma
vez que o slogan seja atrelado ao logotipo, é constituída uma assinatura (IASBECK,
2002, p. 178).
Figura 35. Assinatura do Banco Itaú.
Embora seja basicamente empregado na fixação da marca, segundo
Reboul, o slogan formula uma necessidade coletiva, proporcionando uma simples
resposta à expectativa das pessoas. O slogan transfere uma necessidade real para um
objeto ou para um ato sem relação de necessidade. O slogan concilia necessidades
opostas entre si diante de uma situação nova. O slogan satisfaz em esperança
necessidades atiçadas pela própria promessa, o que não deixa de ser uma ilusão
(1975, p. 60). Neste ponto específico a que Reboul se refere, slogan de medicamento,
exerce exatamente tais papéis, conforme verificado em capítulos anteriores.
O slogan publicitário pode ocupar uma função específica no contexto do
anúncio ou da campanha publicitária, a de assinatura, talvez a mais comum, mais
utilizada, uma vez que pode anteceder (ou até existir sem) anúncio ou campanha.
Biotonico Fontoura já teve como slogan “o mais completo fortificante” e atualmente
seu slogan “dá uma fome de leão” atua metaforicamente na mídia de massa.
137
Para Vestergaard; Schroder (1996, p. 52), a assinatura é como uma
conexão entre a marca e a estrutura do anúncio (ilustração, título, texto). Como o
slogan publicitário, quase sempre, permanece junto à marca, para o leitor mais
atento, a assinatura, composta pelo nome da marca e o slogan, seria apenas uma
simples repetição. Todavia, para os desatentos à mensagem do anúncio, o slogan
assumiria outro sentido, persuadindo diretamente o leitor, provável consumidor.
Figura 36. Assinatura de Biotonico. Figura 37. Assinatura de Biotonico no taxidoor.
Uma vez parte da assinatura, o slogan encontra lugar: na embalagem
(refrigerante Coca-Cola “Viva o lado Coca-Cola da vida”; do achocolatado Nescau
“Energia que dá gosto!”; do açúcar União “Viva momentos de União”; e de tantos
outros produtos, no rótulo (guaraná Antarctica “ O original do Brasil”), na fachada de
estabelecimentos, no material de ponto de venda, em sacolas, adesivos, cartões de
visita e uma infinidade de possibilidades de divulgação, sem descartar a propaganda
boca a boca e a mídia de massa. Nessa o slogan exerce papel importante no contexto
da campanha, localizado no encerramento do anúncio.
Ao assinar um documento ou cheque, o que legitima a mensagem
anterior é a assinatura. Portanto, esta tende a encerrar, finalizar uma mensagem, com
destaque para, visualmente, um deslocamento necessário para a percepção de que se
trata de marca e slogan, portanto, de assinatura do anúncio. Não cabe restringir
138
anúncio à propaganda impressa, pois as variações de anúncio na propaganda são
diversas. Dependendo de onde está inserido e por quem é mencionado, segue uma
linguagem: propaganda ou anúncio em revista, jornal, “peça publicitária” em
outdoor, propaganda em rádio, comercial ou filme na TV e cinema, ciber-anúncio ou
propaganda digital na internet ou até o antigo “reclame”.
Figura 38. Indoor luminoso de Rinazina (Itália).
“O slogan, escrito ou falado, não aparece isoladamente na peça
publicitária, a não ser em casos especiais, quando, pela notória divulgação e
conhecimento público, é capaz de evocar, por si só, todo o contexto do objeto ou
idéia anunciados” (IASBECK, 2002, p. 177).”
Como exemplo, pode-se citar a propaganda de mídia exterior, que pode
ser constituída por título e ilustração, all type (apenas por palavras) ou assinatura, já
que essa mídia de massa exige rapidez na leitura.
Em revista, jornal, outdoor, a assinatura, geralmente, concentra-se na
parte inferior do lado direito, respeitando a linearidade e a direção de leitura, ou seja,
finalizando o anúncio. Já no contexto da mídia de massa eletrônica, TV e cinema,
139
geralmente aparece na cena final, no packshot , acompanhando a imagem do produto,
com a locução do personagem ou a voz do locutor em off (voz sem imagem), ou seja,
finalizando a propaganda, comercial ou filme publicitário. No rádio, a assinatura
também surge no fechamento, nos segundos finais do spot ou jingle e ainda é
acrescentada, em caso de medicamentos, a mensagem “Ao persistirem os sintomas, o
médico deverá ser consultado”. Na internet, os formatos específicos dessa mídia
(banner, fullbanner, pop-up, etc) acabam por limitar os espaços da assinatura, que
aparece no momento final da propaganda, denominada também como propaganda
digital.
Figura 39. abrigo de ônibus lumninoso de Neosaldina.
Ao mencionar a mensagem exigida pela ANVISA, é importante ressaltar
que ela deve ser utilizada em todas as propagandas de medicamentos. Todavia, essa
mensagem é alvo de críticas. Segundo Lefèvre, a frase ou slogan elaborado pela
ANVISA que em alguns anúncios aparece “A persistirem os sintomas, o médico
deverá ser consultado.” ou “Ao persistirem os sintomas, o médico deverá ser
consultado.” é menos interessante e mais confusa do que qualquer slogan elaborado
pela indústria farmacêutica.
140
“Quem inventou essa frase não sabia o que estava fazendo. A frase da
ANVISA é um estímulo à automedicação. É subjetiva, não é
compreendida. O que significa persistir? Quer dizer que você pode tomar
o medicamento por sua conta e risco e se não curar procura o médico?
Absurdo. Quem sabe explicar o que é persistir? As pessoas mal sabem o
que significa a palavra, muito menos quando está persistindo algo.”
E a respeito do slogan na propaganda, Lefèvre ironiza: “O pessoal da
propaganda é esperto, inteligente. “Quem criou o slogan ‘Tomou Doril, a dor sumiu’,
usou a rima e entendeu bem a essência da coisa! Captou bem a idéia.”
Conforme citados anteriormente, os slogans da Coca-Cola Co., por
exemplo, têm uma preocupação universal, ou seja, o slogan é único em vários países,
com a devida tradução, e ganhou tanta força para a marca que chega a fazer parte da
própria embalagem do produto: “Sempre” Coca-Cola no Brasil; “Always”, nos países
de língua inglesa; e “Siempre” em países de língua espanhola. A Coca-Cola está
presente em toda a mídia de massa com seu slogan.
Ainda a respeito dos slogans da Coca-Cola, Perez; Bairon (2002, p. 106)
acreditam que o slogan oraliza máximas que a coletividade aceita como verdadeira e
que a Coca-Cola tem em seus slogans uma grande arma de fixação da imagem da
marca. Seguem os slogans da Coca-Cola, cronologicamente: até 1942, “Deliciosa e
refrescante”; de 1942 a 1950, “A pausa que refresca”; de 1951 a 1965, “ Isto faz um
bem”; de 1966 a 1971, “Tudo vai melhor com Coca-Cola”; de 1972 a 1976, “Isso é
que é, Coca-Cola”; de 1977 a 1982, “Coca-Cola dá mais vida”; de 1983 a 1989,
“Coca-Cola é isso aí!”; de 1989 a 1993, “Emoção pra valer!”; de 1993 a 1999,
“Sempre”; de 2000 a 2001, “Curta Coca-Cola”; em 2001, “Gostoso é viver”; em
2002, “Essa é a real”; e o atual, de 2007, “Viva o lado Coca-Cola da vida”.
A Coca-Cola sempre fez uso da propaganda como arma na divulgação e
fixação de seus slogans. Especialmente no jingle, a Coca-Cola conseguiu a
141
propagação e repetição. Na propaganda em rádio, o verbal tem presença quase
absoluta, ficando o spot ou o jingle envolvidos no ambiente da musicalidade e da
locução. E mesmo os jingles, comerciais musicados, cantados, pela própria
característica de melodia, servem para criar um clima favorável à aceitação da
mensagem, predispondo o ouvinte à sua efetiva recepção e até mesmo à sua
propagação natural, a propaganda boca a boca.
Provavelmente o rádio seja a mídia de massa onde o slogan encontra
maior efetividade. A repetição e o ritmo contribuem para a fixação e memorização
das marcas e dos slogans: “Casas Bahia, dedicação total a você”; “Mais barato, mais
barato, Extra!”.
Acontece, ainda, de, em um mesmo anúncio, existir mais de uma
assinatura, não apenas naquele que divulga eventos e que negocia, no espaço
publicitário, cotas de patrocínio, com marcas e seus respectivos slogans, mas da
umbrella brand (marca “guarda-chuva”) que, segundo Perez (2004, p. 18), é a
estratégia adotada por empresas que atuam em setores diversificados ou têm linhas
de produtos. Exemplo desse fato corrente é de empresas tradicionais, como
Volkswagen, Nestlé, Fiat, Bom Bril, 3 M, Parmalat, Samsung, Chanel, etc. A Ford
tem o slogan “Viva o novo”, que além de assinar seus anúncios, assina também os
anúncios dos carros e caminhões fabricados pela empresa. Cada carro e cada
caminhão têm marca e slogan que assinam seus anúncios: “Ford Fiesta, melhor só
sendo seu”; “Ford Ranger, tudo o que você sempre quis numa pick-up de verdade”.
O mesmo acontece com o banco Bradesco, “Bradescompleto”, que assina os
anúncios dos serviços oferecidos pela instituição financeira: Crédito Bradesco “Ao
seu alcance”. A Bayer é outro exemplo, pois assina seus anúncios institucionais e os
dos medicamentos por ela fabricados: os controlados nas publicações direcionadas
142
aos médicos e os medicamentos de venda livre, na mídia, como no folheto de
Cafiaspirina.
Figura 40. Folheto de Cafiaspirina com detalhe na assinatura Bayer.
Considera-se Aspirina como um caso à parte quando se trata de marca,
pois é marca com extensão de linha, ou seja, pode ser considerada também uma
marca “guarda-chuva”: Aspirina, Aspirina C, Aspirina Infantil, AspiSport e
Cafiaspirina ou Bayaspirina ou Aspirina Extra ou ainda Aspirina Forte, conforme o
país.
Figura 41. Linha de Aspirina no Brasil e fotos da Aspirina da Grécia,
Aspirina Forte da Grécia e Bayaspirina da Argentina
143
A respeito de assinatura, existe uma passagem interessante em
“Comunicação e Discurso” (PINTO, 1999, p. 24) que comprova a importância do
slogan no contexto de um anúncio, campanha ou da sociedade:
“[...] a linguagem verbal e as outras semióticas com que se constroem os
textos são partes integrantes do contexto sócio-histórico e não alguma
coisa de caráter puramente instrumental, externa às pressões sociais. Têm
assim papel fundamental na reprodução, manutenção ou transformação
das representações que as pessoas fazem e das relações e identidades com
que se definem numa sociedade, pois é por meio dos textos que se travam
as batalhas que, no nosso dia-a-dia, levam os participantes de um
processo comunicacional a procurar ‘dar a última palavra’, isto é, a ter
reconhecido pelos receptores o aspecto hegemônico do seu discurso.”
Enquanto texto publicitário, discurso persuasivo, o slogan busca dar “a
última palavra” no contexto, seja como assinatura, seja em relação aos concorrentes.
Enfim, busca a legitimação da mensagem.
2 Texto e contexto: “para aquela dor animal!
Uma vez identificando o slogan como palavra, frase feita ou frase de
efeito e compreendendo seu papel junto à marca, compondo uma assinatura, convém
verificar o slogan enquanto linguagem verbal, situá-lo em seu contexto, entendendo
o significado deste, para, após seguir na análise de slogan também na linguagem
visual.
Segundo Pignatari (2002, p. 49), a formação de uma mensagem, uma
palavra, uma cadeia de palavras, implica a seleção de sinais, como o alfabeto, por
exemplo, numa determinada ordem, possibilitando estatisticamente estabelecer
diversos graus de aproximação a uma língua ou a um texto.
A palavra “texto”, segundo Carrascoza (2004, p. 15), provém do latim
textus, que significa tecido: “em sua dimensão verbal, essa urdidura é realizada por
144
meio de palavras que se imbricam, se abraçam, formando uma trama de
significação.”
“Segundo Nöth, a etimologia de ‘texto’, algo que é tecido, indica um dos
sentidos privilegiados de textualidade como designando aquilo que se circunscreve
em um todo coerente.” (SANTAELLA, 2001, p. 277). Para Santaella,
[]há um certo consenso em se considerar que esse todo é transfásico,
isto é, transcende a unidade da frase, mas os limites do todo são muito
discutíveis. Há teóricos que aceitam a unidade frase, mas os limites do
todo são muito discutíveis. Há teóricos que aceitam unidades de uma
palavra ou de uma sentença como texto (sinais de trânsito, ordens ou
provérbios, por exemplo). Nesse caso, os critérios de textualidade são
estabelecidos pragmaticamente no processo comunicativo ou contexto
situacional.” (ibid.)
O texto escrito deve ser, segundo a gramática da língua portuguesa,
linear. Essa linearidade faz parte de uma organização hierárquica, onde uma palavra
em seqüência de outra forma frases, o texto. Essa seqüência linear da língua permite
a leitura da escrita. Segundo Eco (2004b, p. 154), a manifestação linear do texto deve
estar em conformidade com regras normativas da escrita.
Lotman (1978, p. 111-112) reconhece que slogan constitui, em si mesmo,
um texto, uma vez que tem características como tal, ou seja: expressão, por onde
realiza um sistema, tornando-se sua encarnação material; delimitação, uma vez que
cria fronteiras com outros textos cujos signos não entram no seu conjunto; e
estrutura, ou seja, uma organização interna que o transforma, ao nível sintagmático,
num todo estrutural.
“A noção de texto não se situa no mesmo plano que a de frase; nesse
sentido, o texto deve ser distingüido do parágrafo, unidade tipográfica de várias
frases. O texto pode coincidir com uma frase como com um livro inteiro;ele se define
por sua autonomia e por seu fechamento.” (DUCROT ; TODOROV, 2007, p. 267).
145
Para Santaella (2007, p. 285) a definição mais comum de texto é a de
uma seqüência relativamente coesa e coerente de signos lingüísticos. Seria a cadeia
mais longa ou mais breve de signos lingüísticos com suas regras combinatórias. Para
a autora, a semiótica expandiu o sentido da palavra “texto” para abranger além da
linguagem verbal, peças, pinturas, sinais, etc.
Apesar da aceitação da origem da palavra “texto” pelos autores, não há
consenso sobre sua definição. Até mesmo porque a palavra “texto” é empregada
como: mensagem verbal; em alguns casos, somente relacionado à escrita; como texto
escrito e também é reconhecido como uma única palavra ou uma sentença. Portanto,
o texto pode ser aceito como mensagem em quaisquer códigos, mas também é
utilizado como discurso. Da mesma forma, não há consenso no conceito de discurso
(SANTAELLA, 2001b, p. 276).
Iasbeck (2002, p. 37-38) diz que “o discurso só se dá a conhecer pelos
textos que produz e é o conjunto desses textos que, ao mesmo tempo, estabelece a
fisionomia do discurso, lhe dá fronteiras e identidades sociais.” Portanto, a prática
produtiva é que gera o discurso. Sendo assim, surgem os discursos científicos,
discursos literários e, na área da propaganda, discursos específicos, discursos
também conhecidos como persuasivos.
Para Citelli (2005, p. 55), “o texto publicitário resulta da conjunção de
múltiplos fatores. Alguns estão ancorados nas ordenações sociais, culturais,
econômicas e psicológicas dos grupos humanos para os quais as peças estão
voltadas.” Citelli argumenta que o texto publicitário resulta também do uso de
componentes estéticos e de uso dos efeitos retóricos, necessários para a persuasão,
onde não faltam as figuras de linguagem e as técnicas argumentativas. Como
146
exemplo de texto publicitário, cita o slogan “Nove entre dez estrelas do cinema usam
Lux”, do sabonete Lux Luxo (ibid., p. 56).
Carrascoza (2004, p. 15-17) entende que o texto presente na propaganda
existe para cumprir uma função utilitária, a de persuadir um auditório particular. No
caso da propaganda, auditório seria o público-alvo. Nesse sentido, o texto deve, por
meio de elementos de persuasão, ser percebido como algo positivo. O autor justifica:
“Não é por acaso que a palavra persuadir contém a raiz latina svad, a mesma da
palavra suave.” (ibid.)
Citelli (2005, p. 9) discorre sobre o assunto persuasão, quando reconhece
que os pensadores gregos (de Sócrates a Platão) escreveram sobre o persuasão, mas é
com Aristóteles e sua proposta de estrutura de discurso que se pode entender a
respeito de tal assunto. A idéia do livro de Aristóteles, “Arte Retórica”, não é
confundir retórica com persuasão, muito menos retórica com ética. Para ele, retórica
não é persuasão, nem ética, já que a retórica não entra no mérito do que está sendo
dito, mas sim de como o que está sendo dito o é de modo eficiente. Portanto, segundo
Citelli, ao se referir aos textos de Aristóteles, a retórica pode revelar como se faz
persuasão, mas não o é. “Persuadir é, sobretudo, a busca de adesão a uma tese,
perspectiva, entendimento, conceito, etc. evidenciado a partir de um ponto de vista
que deseja convencer alguém sobre a validade do que se enuncia.” (ibid., p.14).
Iasbeck (2002, p. 46) reforça que os primeiros textos comerciais da
história da propaganda brasileira eram somente escritos, na quase ausência de
retórica persuasiva, repleto de substantivos e pouco adjetivados. Não eram
apropriados a produtos de beleza nem a medicamentos porque necessitavam de
apelo, convencimento.
147
Dentro da questão contexto, na teoria semiótica de C.S.Peirce, as
palavras são leis porque pertencem a um sistema. Por assim dizer, as palavras se
conformam a certas combinações por causa das línguas. A lei de que as palavras são
portadoras fará com que, cada vez que a palavra ou frase for utilizada, seja entendida
como significando ao sistema a que pertencem (Santaella, 2002, p 14). Vista dessa
maneira, a teoria semiótica nos permite penetrar no movimento interno das
mensagens e de recursos nelas utilizados. Porém, por ser uma teoria muito abstrata, a
semiótica permite apenas o mapeamento do campo das linguagens (ibid., p 5).
O contexto é de grande importância para a compreensão do papel e da
validade do slogan. Seja político, ideológico, publicitário, o slogan precisa ser
reconhecido em um contexto social determinado. Reboul (1975, p. 100) reforça a
importância do slogan em seu contexto. Na maioria das vezes, fora dele, o slogan
perde seu poder. O slogan utilizado por Mussolini “Meglio vivere um giorno da
leone che cento anni da pecora”, do período fascista, remete àquele contexto e é
incompreensível fora dele (ibid.).
Um exemplo atual é o slogan do antigripal Apracur: “’marvado’ contra a
gripe”. A palavra “marvado” está escrita de maneira incorreta, na verdade seria
malvado, um adjetivo. “Marvado” faz parte da linguagem coloquial em que o cantor
sertanejo Leonardo, garoto-propaganda da campanha de Apracur, refere-se à valentia
do medicamento em enfrentar os sintomas da gripe. Portanto, o slogan “marvado
contra a gripe”, fora da campanha publicitária, não tem muito sentido.
Figura 42. Apracur em taxidoor.
148
Segundo Iasbeck (2002, p. 49), é importante que o slogan publicitário
seja localizado no desenvolvimento massivo da publicidade no final do século
XIX e no início do século XX. Nesse período, a publicidade passou a revitalizar o
slogan, dando-lhe um destaque especial no contexto da sua eficiente e peculiar
retórica. Iasbeck afirma que slogan é uma fórmula verbal apelativa, que tem na
publicidade, de um modo geral, seu maior canal de veiculação. Para ser
impactante, despertar atenção, levar à memorização e conseguir seus objetivos
incitativos, não pode abrir mão de efeitos estilísticos e retóricos (ibid., p. 70).
Para Reboul, a comunicação de massa é a grande responsável pelo
alcance dos slogans, já que estes ganham força persuasiva a partir do momento
que ultrapassam os limites de um grupo restrito (1975, p. 11). Segundo o autor, a
propaganda pertence à comunicação de massa, entendida esta como:
“[...] um número indefinido, geralmente imenso, de indivíduos cujo único
elo é receber a mesma mensagem. Um camelô que vende um tira-
manchas na feira dirige-se a algumas pessoas e adapta-se às reações delas.
O anunciante de um tira-manhas na televisão dirige-se a milhões de
desconhecidos cujo único elo é a mensagem a que estão submetidos. A
massa, em si, é passiva e atomizada. Na verdade é a comunicação de
massas que cria a massa. Para que ela exista, são necessários meios de
comunicação modernos, de grande difusão.” (REBOUL, 2000, p. 85)
É no ambiente da mídia de massa, constituída por aspectos
diferenciadores (formatos, linguagem e origem histórica, como já foi visto nos
capítulos 1 e 2), que, de fato, o slogan encontra seu lugar, ampliando seus efeitos
devido às possibilidades da existência de veículos de comunicação que compõem
essa mídia, que convivem de maneira harmoniosa na sociedade brasileira.
“A crer-se em Marshall MacLuhan, um dos grandes mestres da
comunicação, o conteúdo de um veículo é o veículo anterior. Dessa forma, a palavra
falada seria o conteúdo da palavra escrita. Do mesmo modo que o conteúdo do
149
cinema seria o teatro e que o conteúdo da televisão seria o cinema.” (PIGNATARI,
1984, p. 11).
Procurando acompanhar o raciocínio de Décio Pignatari, o rádio antecede
a TV e já utilizava um formato imagético, a partir das radionovelas e dos programas
de auditórios, que mais tarde foram adaptados à TV. O mesmo ocorre com o outdoor,
que, hoje mais amplo e inserido em mídia exterior, seria o conteúdo do cartaz. Por
comparação, os cartazes em bondes que circulavam em grandes metrópoles seriam os
primeiros sinais de taxidoor e busdoor.
Cabe ressaltar que são muitos os estudos e termos utilizados para definir
e empregar a palavra comunicação: canal, meio e mídia. O que interessa para esta
tese é o meio de comunicação massa ou mídia de massa e seus veículos, por onde são
propagadas as mensagens, enquanto contexto do slogan. Sem querer ser reducionista,
mas em prol da objetividade, este estudo leva em consideração a comunicação
contemporânea, não apenas como teorizada por Shannon; Weaver, tampouco por
Marshall McLuhan, mas a que atende à propaganda observada no capítulo 1: a
chegada dos meios de comunicação de massa ao Brasil, sua evolução, sua mutação e
o surgimento de novos meios de comunicação de massa, atualmente, denominada
mídia de massa.
A eficácia de um slogan está na maneira de ele se incorporar ao cotidiano
das pessoas em contextos diversos; ao assumir força expressiva da realidade de uma
sociedade, da cultura, costumes, hábitos. O valor comunicacional da propaganda é
reconhecido, sobretudo, ao verificar a força dos slogans em determinado contexto.
Não apenas na associação com a marca, no contexto de uma campanha, mas no
contexto social e cultural. É importante considerar o slogan publicitário não como
uma frase isolada de seu contexto, pelo contrário.
150
Percebe-se que o slogan não está restrito apenas à linguagem verbal, à
imagem do slogan. Portanto, o aspecto visual deve ser considerado. A linguagem
visual do slogan, junto à verbal, será analisada no capítulo 5, mas é pertinente
ratificar a utilização da linguagem verbal junto à visual, pelo exemplo de anúncio da
vitamina Cewin. O slogan “a vitamina C de todas as estações.” dessa vitamina
apresenta o conceito de que o uso da vitamina não se restringe ao outono, inverno,
primavera ou verão, à estação climática. Quando inserido no anúncio, que tem como
imagem o sol, as nuvens, folhas caindo da árvore, complementa a idéia. E quando
esse amúncio está inserido em um painel do metrô, por exemplo, há também uma
adequação da criação à mídia, fazendo referência à “estação”, além de climática, à do
metrô. Portanto o texto, a imagem e o seu contexto devem sempre ser considerados
em uma análise de slogan na propaganda.
3 Slogans que marcam – função e configuração: “pra você ficar legal”
Os slogans publicitários existem porque existem marcas. Para
compreender melhor o slogan, é importante adentrar em seu mundo e conhecer suas
características, sua função, enfim, a sua configuração. “O slogan reúne, de forma
compactada, uma série de informações que podem ser lidas de múltiplas formas.”
(IASBECK, 2002, p. 176). Slogan é considerado linguagem verbal, por suas
características, mas também visual inserido na mídia de massa (com exceção da
mídia que não possui imagem). Há um diferencial em seu contexto (seja na mídia
seja na sociedade).
Segundo Iasbeck, os slogans podem conter uma ou mais características:
brevidade (frase sintética: Tim “viver sem fronteiras”); condensação (um signo que
151
reúne outros signos, mas destaca os mais significativos, por causa do público a que
se refere: “Coca-Cola é isso aí!”); autoridade (afirma mesmo quando nega algo, tem
firmeza: Folha de S.Paulo “não dá para não ler”); prestígio (procura atrair prestígio à
marca: “Se a marca é Cica, bons produtos indica”); anonimato (quando o público não
consegue identificar de imediato a que marca pertence o slogan: “de bem com você”,
da marca Batavo); ambigüidade (mais de um sentido, constituído por diferentes
vozes, despertando curiosidade: “sinal de qualidade”, da Vivo, ou “com Gatorade,
você vai mais longe”); humor (o humor está presente em boa parte da propaganda
brasileira, o slogan bem humorado e de bom gosto tende a ser simpático: “Tostines é
fresquinho porque vende mais ou vende mais porque é fresquinho?”); impacto (pode
ser inusitado, provocando leituras curiosas: “movidos pela paixão”, da Fiat);
cadência (mesmo quando é apenas lido, tem ritmo: “mais barato, mais barato,
Extra!”, dos Hipermercados Extra); comunicação imediata (sem muitas reflexões,
busca o imediatismo: “porque a vida é agora.” Cartão Visa); repetição (contém
elementos que facilitam a repetição: “abuse, use C&A”) (ibid., p. 176-177). Alguns
dos slogans citados possuem mais de uma característica, fato que ocorre em virtude
de o slogan ser um texto persuasivo, cujo efeito é percebido no seu contexto.
Figura 43. Assinatura de Coristina e no busdoor.
O estudo da linguagem tem uma preocupação particular na definição do
slogan. Segundo Reboul (1975, p.19),
152
“[...] para definir o slogan, convém determinar seu sentido gramatical.
Aparentemente, trata-se de uma frase ou de um grupo de frases, pois do
ponto de vista semântico acredita-se que o slogan basta-se a si mesmo e
que pode ser verdadeiro ou falso.”
Para Reboul (ibid.,p. 22), o slogan publicitário pode ainda variar de
acordo com a tipologia utilizada, a oralidade, o ritmo, ou seja, a sua configuração,
por causa do contexto em que está inserido. Slogan não inclui necessariamente o
nome da marca, sendo classificado por Reboul como slogan incompleto, que só
ganha sentido completo junto à marca: “Alívio já!”, por exemplo, do Sal de Fruta
Eno. “[…] e slogan completo basta-se a si mesmo”, já que é acompanhado pela
marca: “Gripou? Fluviral desgripa”. O slogan incompleto não é menos importante,
apenas depende de outros fatores da marca (logotipo, tradição, fama, etc), para ter
sentido completo, e talvez seja mais criativo por utilizar, com mais variação, alguns
recursos lingüísticos (ibid.)
As funções de linguagem também fazem parte do universo do slogan.
Roman Jakobson (2001, p. 129) apresenta as seis funções básicas da comunicação
verbal: emotiva, referencial, poética, fática, metalingüística e conativa, funções essas
que dialogam entre si. Para compreender a proposta das funções como um todo, é
importante saber que os fatores que sustentam o modelo de comunicação proposto
por Jakobson atendem à finalidade de transmitir uma mensagem de alguém para um
outro, ou seja, o processo comunicacional se dá por meio de emissor e receptor,
usando do código que por sua vez refere-se a um contexto. Essa mensagem do
emissor ao receptor se faz através de um canal.
Nota-se, por meio da publicação de Jakobson, que a função de linguagem
que predomina no slogan publicitário é a função conativa, já que essa função
caracteriza uma comunicação centrada no destinatário. Essa função é a mais utilizada
na propaganda, por seu caráter persuasivo e por carregar traços de argumentação,
153
além de ser orientada para o destinatário, receptor, público-alvo ou consumidor. O
imperativo e o vocativo fazem parte da função conativa e a 2 ª pessoa do verbo
também.
Segundo Iasbeck, os slogans, enquanto frases de efeito, têm parentesco
com provérbios, máximas, jargões, clichês, divisas e palavras de ordem (2002, p. 59-
60). São parentescos e afinidades que, por vezes, tornam os slogans pouco criativos.
Mas nem sempre a propaganda busca algo totalmente original, principalmente em
slogans, uma vez que a lembrança e a repetição podem estar associadas a frases
conhecidas e muito utilizadas. O slogan “sem comparação” já foi utilizado pela
Brastemp e hoje o é pela cerveja Itaipava. O slogan “a primeira impressão é a que
fica”, a priori, é do desodorante Axe, mas comumente está associado às gráficas
menores. Ou seja, muitas vezes, a mesma frase pertence a várias marcas, de
segmentos ou épocas diferentes.
Nos slogans são utilizados termos de muita significação, a fim de
solidificar a frase, como as figuras de retórica. Iasbeck reforça que o emprego de
artifícios lingüísticos contribui para que os slogans ganhem impacto e se tornem
expressivos, adquirindo feições estéticas que muito os aproximam das construções
poéticas (ibid., p. 105). Segundo Ducrot; Todorov (2007, p.253-254), “as figuras de
retórica foram classificadas de mil maneiras para tornar inteligíveis os princípios da
classificação”. A seguir serão citadas as figuras mais comuns encontradas nos
slogans:
a) aliteração: repete os mesmos sons – “bem estar bem”, da Natura;
b) antítese: aproxima duas palavras antônimas – “é melhor e não faz mal”
(slogan anterior de Melhoral);
154
c) comparação: estabelece paralelo entre dois sentidos – “não é nenhuma
Brastemp”, da Brastemp; ou “sem comparação”, da cerveja Itaipava;
d) elipse: faz com que o receptor seja cúmplice da frase, a complete – “passa
Gourmet que dá”, da maionese Gourmet;
e) hipérbole: corresponde a um exagero proposital – “aqui todo mundo pode
voar”, da companhia áerea Gol; ou “o antiinflamatório que faz sucesso no
mundo todo”, do medicamento Nisulid;
f) ironia: emprego de uma palavra com o sentido de seu antônimo – “nem parece
banco”, do Unibanco; ou “não dá pra não ler”, do jornal Folha de S.Paulo;
g) repetição: retoma a mesma palavra na frase – “mais barato, mais barato,
Extra!”, dos Hipermercados Extra;
h) silepse: uma mesma palavra com mais de um sentido, participando de mais de
uma construção sintática – “O Brasil somos todos nós” do Governo Federal;
i) Zeugma: tipo de elipse em que o termo subentendido pertence à oração
anterior – “Gripou? Fluviral desgripa”;
j) exclamação: reforça o sentido da palavra ou frase – “Ah!”, do creme dental
Sorriso (antes, Kolynos); ou “Bom pra gripe é coristina D. Vale por 3.”;
k) metáfora: substitui uma palavra por outra quando há semelhança, seria a
transposição. As metáforas são bastante utilizadas na propaganda de
medicamentos – “para aquela dor animal”, do balsâmico Calminex; ou “dá
uma fome de leão”, do fortificante Biotonico Fontoura; ou ainda “a dor de
cabeça passa logo de cara”, do analgésico Neosaldina;
155
l) metonímia: bastante utilizada na propaganda de medicamentos, caracteriza-se
como forma metafórica, ou seja, é a substituição de um termo por outro que
com ele tem relação de sentido lógica e constante, ou seja, quando há
contigüidade entre os termos – “a terapia indispensável”, do medicamento
Capoten; ou “protege e dá um alííííííííííívio”, de Gelmax, um antiácido.
Para C.S.Peirce e também para Saussure, toda relação sígnica em
presença é metonímica: “a realidade só nos é dada a conhecer através dos signos, e
estes não dão conta de representá-la em toda sua complexa pluralidade.” (IASBECK,
2002, p. 87)
Segundo Lefèvre (1999, p. 69), expressões metonímicas como “a dor
sumiu” dizem muito mais que um simples nome da marca. São expressões que falam
com o consumidor, persuadindo-o. O autor se posiciona contra a propaganda de
medicamentos e discorda do slogan já que se trata de recurso comunicativo utilizado
pela propaganda para agregar valor à marca. Slogans como: “a saúde do seu fígado”,
de Hepatoviz, e “feita sob medida para a sua enxaqueca”, da Aspirina Forte, que não
deixam de exaltar a qualidade do medicamento, para ele, são perigosos.
Bonsiepe (1997, p. 153-154), ao analisar imagens, leva em consideração
as figuras retóricas visuais-verbais: metonímia, analogia, paralelismo, inversão
metafórica, hipérbole e outras. Para ele as figuras retóricas vivem da linguagem
cotidiana e, por isso mesmo não podem ser traduzidas em outra linguagem. “O que
pode ser uma figura em inglês não o é necessariamente em português.” Cabe também
compreender a polissemia neste sentido e as possibilidades de interpretação
existentes. Segundo Martine Joly (1996) encontra-se com facilidade na propaganda
metáforas visuais, assim como a hipérbole visual é freqüente, com ampliações que
podem corresponder a afirmações por meio de negações ou comparações visuais.
156
Para Reboul, os slogans espalham-se por toda parte, aparecem em todo
lugar: na voz dos locutores, vendedores ambulantes, anúncios, outdoors, rádios, TV,
cinema. “Dizer que eles assediam é pouco, eles instalam-se com naturalidade na
memória, na linguagem e até no pensamento das pessoas. Se o slogan prolifera
assim, é porque assume uma função que só ele pode desempenhar” (1975, p. 2-3).
4 Tendências do slogan na propaganda
A partir da definição de slogan, da sua configuração na linguagem verbal
e visual, assim como em um contexto, algumas aterações podem ser verificadas, não
como evolução ou involução, mas mutações do slogan na propaganda.
Sistematicamente, essas transformações podem ser observadas como tendências. Os
novos tempos e tecnologias e, um detalhe fundamental, a própria concorrência
acirrada em busca de consumidores, fazem com que os slogans publicitários exerçam
o papel de reforço e “acompanhante” da marca na assinatura, mas aproximem-se
cada vez mais do consumidor.
Figura 44. Anúncio em revista de Melhoral. Figura 45. Melhoral em taxidoor.
157
Conforme figuras anteriores, o medicamento Melhoral, antes tinha como
slogan “é melhor e não faz mal”, referente à marca; atualmente, seu slogan atual é
“pra você ficar legal”, coloquial, com a preocupação de se dirigir ao público
consumidor. Essa mudança na linguagem persuasiva acaba por evidenciar a presença
da função conativa. O Banco Itaú “Feito para você”, através da função conativa,
referente ao receptor, também valoriza o consumidor “você” na mensagem do
slogan, da mesma forma que mostra o quanto se preocupa em atender bem. Por ser
uma instituição financeira, oferece um serviço ao consumidor, zela por sua imagem,
seu nome, sua marca. Segundo Iasbeck (2002, p. 108), “as modernas fórmulas
sloguísticas têm fugido cada vez mais do imperativo explícito.”
Publicitários americanos, como Claude Hopkins e David Ogilvy, eram
contra a existência do humor na propaganda, assim como preservavam a linguagem
formal, talvez por haverem vivido em outro século ou longe da brasilidade. Para eles,
o valor de um slogan podia estar na sua capacidade de expressar, em poucas
palavras, um argumento de vendas fundamental. Os slogans tinham que ser fáceis de
decorar e para tal precisavam ser breves.
Quanto à brevidade, sabe-se que o slogan muito longo não se fixa
facilmente na memória. Não existe um número preciso de palavras, mas quanto mais
curto, menor é o risco de esquecimento, até porque, ao elaborar-se um slogan, não se
sabe ao certo se a marca estará freqüentemente na mídia de massa, o que o tornará
mais ou menos repetido, no sentido literal de Reboul. Segundo Citelli (2005, p. 56),
um bom slogan deve ter entre quatro a sete palavras gramaticais, sem contar as
preposições e/ou conectivos. Ainda para Citelli “[…] o preço a ser pago para se
dizer tudo em quase nada é que praticamente nada pode ser dito, a não ser sob a
forma do efêmero, do descontínuo e da simulação…os slogans publicitários
158
costumam extrair efeitos pragmáticos a partir do rompimento com as normas
consideradas gramaticalmente corretas” (2000-2001, p.35-38)
Atualmente, não existe regra que proíba o slogan de conter: palavras
negativas (Unibanco “nem parece banco”); interrogações (“É gripe? Benegrip.”);
grande número de palavras (slogan anterior da Semp Toshiba “nossos japoneses são
mais criativos que os japoneses dos outros” - o atual é “nosso negócio é diversão”);
gírias (Calminex “para aquela dor animal!”); exclamação (Sal de Fruta Eno “alívio
já”). Quanto à pontuação, o slogan aparece na assinatura, muitas vezes, sem qualquer
pontuação, ou seja, como uma frase solta, sem ponto-final, não seguindo as normas
gramaticais. Exemplos: Gol “use sem dó”; Banco do Brasil “todo seu”; Campari “só
ele é assim”.
O que se nota, em um primeiro momento, é que, por anos, os slogans
exerceram um único papel, o de acompanharem a marca em campanhas publicitárias.
Eram, por isso, atemporais. Atualmente, são mais ousados, comprometidos com a
marca, mas também exercem outras funções no contexto de uma campanha, como:
tema e título. Em uma campanha, mesmo que se altere texto ou imagem, procura-se
manter a assinatura. Assinatura é identidade da marca e não se deve alterar de
maneira repentina, sem pesquisas ou estudos.
Mas o que acaba por ser condição específica de alteração ou adaptação
do slogan é a campanha. A campanha publicitária conduz a marca e o slogan em
específicas. Não é à toa que “Se é Bayer, é bom” existe desde 1922, quando foi
criado por Bastos Tigre, sem qualquer mudança até então. São diversos os fatores
envolvidos em campanhas, desde posicionamento ou reposicionamento da marca até
ofertas e datas especiais como estratégia de oportunidade. E quando se trata de
campanhas, o slogan pode ter um conceito tão forte que passa a posicionar a marca
159
no mercado, conduzindo a temática da campanha por determinado período, como um
slogan de campanha. Outro exemplo de slogans com relação direta à campanha são
os do refrigerante Sprite. Com o slogan “Imagem não é nada, sede é tudo. Obedeça
sua sede. Beba Sprite".” direcionava sua campanha com forte posicionamento ao
jovem, ao belo, ou seja, apesar de contraditória e polêmica, a frase passou de slogan
a conceito da campanha. Atualmente, não é muito diferente, Sprite assume com seu
slogan “é assim que as coisas são”, o espírito jovem e conduz a campanha enquanto
conceito.
O slogan também pode exercer ainda o papel de título no anúncio, pela
sedução persuasiva que adquire em campanhas temporárias na mídia de massa, fato
que ocorre com maior incidência em outdoors, na mídia exterior.
Figura 46. Campanha de Mídia Exterior do Banco Itaú.
O slogan, com o passar do tempo, adquiriu uma preocupação visual, no
âmbito estético, não apenas pelos profissionais de criação (redatores e diretores de
arte), mas pela própria empresa, enquanto detentora da marca, que percebeu o
sentido que o slogan tem a partir dos cuidados com tipologia, alinhamento, corpo e
160
cor das palavras, junto ao logotipo. A respeito do slogan, seguem opiniões de
profissionais de publicidade e propaganda, em entrevistas.
Para Stalimir
11
, diretor de criação, o slogan é a definição de como a
marca quer ser percebida pelo mercado consumidor. Sua importância, portanto, é
determinante para a compreensão da proposta comercial. Além do conteúdo focado
em informação relevante e concisa, sua forma contribui no estabelecimento de
afinidade com o público-alvo. Enfim, o slogan deve dizer ao mercado "a que veio" a
marca. Stalimir prossegue: “O slogan é desenvolvido na compreensão clara do
conceito de marketing e na pesquisa das demandas do consumidor potencial. Ele
deve responder a um ‘problema’ (real ou sugerido), como ‘solução’ objetiva.” Para
ele, o slogan nasce da clareza do significado do produto, serviço ou candidatura (no
caso de marketing político) em determinada circunstância de mercado. Deve
impactar na evidência da "oportunidade" contrastada com uma demanda evidente ou
latente.
Segundo Cristiane
12
, o slogan tem a ver com o fato de se sentir a essência
daquilo que o produto entrega. Sendo assim, o slogan deve ter um apelo racional ou
emocional de bastante impacto. “Impacto é muito importante para um slogan. O
slogan é a síntese da marca e para criar algo que represente isso é necessário ler tudo
sobre o cliente ou o produto e só depois criar o slogan. Este é o meu método, pelo
menos.”
Carrascoza
13
, comenta: “[...] o slogan deve resumir a essência de uma
11
Stalimir Vieira é publicitário, com 32 anos de experiência, ex-diretor de criação das agências DPZ,
W/Brasil e Bates, em São Paulo, e DDB Argentina, professor e autor de livros. Entrevista exclusiva
concedida à pesquisadora em 10 de abril de 2007, na UNISANTA, em Santos.
12
Cristiane Albano é redatora na G2, agência nova do Grupo Grey. Trabalhou na Young & Rubicam,
DPZ e DENTSU. Entrevista concedida à pesquisadora, em 30 de nov. de 2007, em São Paulo.
13
João Anzanello Carrascoza é professor de Redação Publicitária na Escola de Comunicação e Arte
da USP e redator sênior da agência J.W.Thompson.
161
marca, um produto ou uma campanha. O slogan mais tradicional é composto por
uma frase curta, direta, afirmativa e fácil de repetir. É, em geral, uma conclusão
Parmalat ‘porque somos mamíferos’ ou um convite à ação ‘Abuse e use C&A’”
(QUINTANILHA, 2007, p. 24-27).
Kleber Fonseca, diretor de criação da DPZ, lembra que há nos slogans
muito de métrico, ritmo, musicalidade e rima, uma herança do rádio, onde o slogan
na década de 20 teve destaque na propaganda. Kleber diz que “o slogan é o DNA do
produto, seu sobrenome, sua verdade incontestável.” (ibid., 26-27)
Miguel Bemfica, diretor de criação da agência DM9/DDB, afirma que
muitas vezes chega-se a criar cem ou duzentos slogans para a mesma campanha. O
acerto, no caso, não é soma de todos os erros, como sugere o ditado, mas a subtração
de equívocos e excessos. No caso, seria a edição (ibid., p.27)
Sérgio Godilho, diretor de criação da agência África, acredita que o
slogan simples pode funcionar em várias línguas, traduzido ou adaptado. Algumas
multinacionais optam por manter no slogan o idioma da campanha original no
mundo todo, Nike “just do it” (ibid).
Para Mendes
14
, o slogan é muito importante e pode mudar o conceito de
uma marca. Relembra: “Pirelli é mais pneu”. “O slogan “9 entre 10 estrelas usam
sabonete Lever”, existe desde a década de 40 e hoje não é mais Lever, é Lux.
Slogans imortais como esse são conceituais, como o que Bastos Tigre criou para
Bayer: “se é Bayer, é bom”.
Para Gisela Carvalhinho, “o slogan atua diretamente no posicionamento
do medicamento; é o conceito e deve estar como assinatura em todas as peças que
14
Humberto Alves Mendes, vice-presidente executivo da Federação Nacional das Agências de
Propaganda (FENAPRO) em entrevista exclusiva concedida à pesquisadora, em 14 de junho de 2007,
na sede da FENAPRO, São Paulo.
162
puder, mas uma vez que existem fusões entre os laboratórios, mudanças no mercado,
lançamentos de novos medicamentos, inclusive genéricos e similares, os slogans
mudam também com mais freqüência.”
2.5 Criação dos slogans de medicamentos na atualidade: “potência no combate à
dor de cabeça”
Na elaboração de slogans e de propaganda de medicamentos como um
todo, tanto os leigos como grande parte dos especialistas em propaganda
desconhecem as questões legais que envolvem os medicamentos. Segundo Gisela
Carvalhinho, já mencionada anteriormente, as agências de publicidade e propaganda
não estão preparadas para atender à indústria farmacêutica, por isso existem as
houses e um crescimento do nicho de agências especialistas em propaganda de
medicamentos. Gisela, que há nove anos tem como clientes os laboratórios, explica
que no processo de criação do slogan, independentemente de ser de medicamento
ético ou de venda livre, o redator e o diretor de arte atuam juntos. A dupla de criação
deve conhecer as regras da indústria e a RDC 102, ou seja, não criar slogan para
medicamentos como seria feito um slogan para sabonetes, molho de tomate ou
produto qualquer, até porque expressões como: "mais eficaz", "menos tóxico","o
produto", "o de maior escolha", "o único", "o mais freqüentemente recomendado", "o
melhor" só podem ser utilizadas se comprovadas por evidências científicas, e
previamente aprovadas pela ANVISA. Vale lembrar que também não é permitido o
uso de palavras que valorizem, comparem ou elogiem o medicamento, como os
adjetivos: saboroso, gostoso, delicioso, muitas vezes substituídos por sinônimos e
metáforas. A dupla de criação deve utilizar recursos diferenciadores. Como exemplo
a marca e o slogan do concorrente do medicamento antigases Luftal.
163
Ao se referir à palavra “hipoalergênico” (produto cujas chances de causar
alergia são menores que outros medicamentos), o medicamento busca o diferencial
em relação à concorrência que não oferece tal benefício, fato que interfere,
principalmente na pediatria.
Figura 47. Assinatura de Mylicon gotas
Uma exigência da ANVISA é a existência do número entre parênteses
que fica no final do slogan, indicando a referência, como uma nota de rodapé. Esse
número é explicado no final da propaganda, indicando o estudo que comprova
cientificamente o que foi escrito no slogan. Como exemplo, Gisela cita o slogan de
Travatan “Controle persistente”, sob indicação, entre parênteses, o número 1:
“[...] significa que é um colírio usado por pessoas que tem glaucoma e
precisam ter um controle rígido da pressão intra-ocular. Este
medicamento consegue manter a pressão intra-ocular estável, por um
período de até 63 horas e, por isso, o slogan pode conter a palavra
“persistente”, já o concorente não, portanto esse diferencial, uma vez com
a indicação do estudo, pode ser utilizado.”
Figura 48. Assinatura do medicamento Motilium
164
Uma estratégia mercadológica mais comum, mas que o medicamento
também utiliza, é o nome do fabricante no slogan. O Motilium vem perdendo lugar
no mercado para medicamentos genéricos e similares e, para manter sua imagem
relacionada à qualidade do fabricante Janssen, utiliza a palavra “original” no slogan
para se diferenciar dos concorrentes, não cometendo irregularidades.
Ao propor a análise de algumas propagandas de medicamentos em seu
estudo, o jornalista Álvaro Nascimento (2005, p. 83-84) comenta que a propaganda
de medicamentos no Brasil é contraditória à Política Nacional de Medicamentos
(Portaria do Ministério da Saúde nº 3.916 de 30 de outubro de 1998) que indica que o
uso de produtos farmacêuticos deve ser racional, ético e correto, ou seja, deve haver
um maior controle da propaganda dos medicamentos de venda livre, o que não
corresponde aos atuais mecanismos regulatórios do setor na atualidade.
Entretanto, Nascimento não deixa de reconhecer que a questão cultural
também está presente quanto ao uso indiscriminado do medicamento que,
incentivado pela propaganda na mídia de massa, atinge grandes dimensões. Exemplo
de repertório utilizado em propaganda de medicamentos de venda livre é referir-se ao
fato de não ser problemática a ingestão em demasia de comidas gordurosas ou
bebidas alcoólicas demasiadamente, contanto que antes e após essa ingestão, se tome
o medicamento Engov. Ou seja, mostra-se a realidade “encenada”, fato comum
principalmente na TV. O telespectador, provável consumidor, identifica-se com a
situação apresentada e passa a consumir o medicamento ou a comprá-lo e fazer uso
indiscriminado dele, o que gera a automedicação, tão preocupante, como já foi
apresentado neste estudo.
Nascimento (ibid, p. 88 – 89) sustenta suas colocações ao apontar dois
165
medicamentos de venda livre que desrespeitaram a RDC 102, em filmes publicitários
veiculados na TV. O primeiro foi o antigripal Apracur que citava “...quando os
sintomas da gripe aparecem, Apracur sempre aparece. Apracur, esse remédio que
caiu do céu.” Embora faça uso da metáfora, a propaganda não atenderia ao Art. nº10,
I: pois estaria estimulando o uso indiscriminado do medicamento. O segundo foi
Atroveran, analgésico popular no Brasil há mais de 50 anos, utilizado principalmente
por mulheres no tratamento de cólicas abdominais. A propaganda apresentava o
diálogo entre duas adolescentes. Uma reclamava estar indisposta por causa da cólica.
A outra dizia não ter esse tipo de problema por usar Atroveran, e indicava o
medicamento, afirmando que ninguém precisa sofrer, já que existe o efeito rápido de
Atroveran. Ao convencer a colega, a mesma passa a usar Atroveran e fica bem e
disposta. Ainda na propaganda a locução confirmava: “Não deixe a cólica estragar o
seu dia. Tome Atroveran.” Neste caso, os artigos da RDC 102 desrespeitados seriam:
Art. nº3, I: não consta a contra-indicação principal do medicamento, apenas
advertência. Art. nº10, I: estimula o uso indiscriminado de medicamento. Art. nº10,
II: mensagem direcionada a adolescentes. Art. nº10, IV: sugere diagnóstico por
aconselhar o tratamento. Art. nº10, X: relaciona o uso do medicamento ao
desempenho físico, emocional e beleza de uma pessoa.
Já o folheto de Cataflan Emulgel, que já saiu de circulação, utilizava
figura retórica visual e verbal, com o slogan “onde ele passa, passa a dor”. A imagem
mostrava o gel em forma de coração no pescoço de uma mulher. A promessa de cura
imediata era nítida. A propaganda do medicamento foi considerada, pela ANVISA,
enganosa e abusiva.
O folheto de Tylenol, distribuído em farmácias e drogarias de São Paulo,
próximo ao analgésico, utiliza o slogan “potência no combate à dor de cabeça” e o
166
número de referência 4,5. No conteúdo da propaganda, todas as frases que compõem
o texto estão referenciadas, caso contrário afirmações como “potencializa a ação
analgésica do paracetamol em 40%” (5,6) ou “acelera o início de ação analgésica”
(8) não seriam possíveis, segundo RDC 102, da ANVISA.”
Figura 49. Folheto de Tylenol em ponto de venda e detalhe no número de referência.
Em países como Itália, painéis de quase três metros, internos, como este
da Stazione Centrale di Milano ou Milano Centrale, em Milão (Julho 2007, no verão)
anunciam medicamentos utilizando imagem de pessoas e nos slogans, metáforas.
Figura 50. Painel interno de estação de trem (Milão, Itália).
Ainda na Itália, mas no verão de Veneza, Aspirina anunciou em julho de
167
2007, em um grande telão, mas com qualidade de som e imagem de TV digital, cenas
bem produzidas de pessoas utilizando o medicamento, o que não é permitido nas
propagandas de medicamentos no Brasil.
Figura 51. Propaganda de Aspirina em telão na Stazione Venezia Santa Lucia (Veneza, Itália).
No próximo capítulo, destaca-se o slogan de medicamento de venda
livre na mídia exterior, em análise semiótica peirceana.
Entretanto, para encerrar este capítulo, é interessante observar o valor
que a indústria farmacêutica confere ao slogan. Em quase todos os laboratórios, é
notória a presença e o destaque do slogan junto à marca. A utilização de substantivos
e adjetivos traduz os valores que, culturalmente, são esperados de um medicamento.
Palavras como: saúde, confiança, bom, proteção, devido à relação entre
alívio/combate e dor, presentificam-se nos slogans dos principais laboratórios da
indústria farmacêutica no Brasil: Teuto “se é Teuto, é de confiança; Pfizer “saúde
para uma vida melhor”; Bristol-Myers Squibb “nossa missão é prolongar e melhorar
a vida humana”; Libbs “sinta-se bem a cada momento da vida”; Aché “100%
brasileira”; Boehringer Ingelheim “valor através da inovação”; Eurofarma “Brasil,
sempre”; Medley “todo equilíbrio alcançado é um novo ponto para recomeçar”;
Sigma Pharma “prescrição de saúde”; Mantecorp “a melhor indústria farmacêutica
168
do Brasil”; Farmasa “saúde por excelência”; Sandoz “uma decisão saudável”; EMS
“trabalhando sério para você sorrir sempre”; Apsen “transformando necessidades
especiais em grandes conquistas”; Bayer “se é Bayer, é bom”.
169
5 ANÁLISE SEMIÓTICA DOS SLOGANS DE MEDICAMENTOS
Para concluir a proposta deste estudo transdisciplinar que envolve
comunicação, saúde e semiótica, faz-se necessário sistematizar as definições de
semiótica como já realizado em comunicação (publicidade, propaganda, mídia de
massa, slogans, etc) e em saúde: (saúde, doença, remédios, medicamentos, etc).
Definir semiótica constitui tarefa complexa, uma vez que há diferentes
escolas e correntes de estudos e pesquisas. Entretanto, por questões de pertinência ao
tipo de análise que se busca, especialmente aquela que se volta para o entrelaçamento
de linguagens verbais e visuais, a semiótica de Charles Sanders Peirce se revelou
mais adequada. Autores como Lucia Santaella e Winfried Nöth citam com muita
propriedade, em várias publicações, a trajetória dos estudos relacionados à semiótica.
Nöth, em seu livro A semiótica no século XX (1996), oferece uma visão panorâmica
sobre o assunto, iniciando pelo fundador da semiótica estruturalista, Ferdinand
Saussure, sem deixar de apresentar as idéias de Louis Hjelmslev, Roman Jakobson,
Roland Barthes, Algirdas Julien Greimas, Charles Morris e lógica de Charles Sandres
Peirce, já visitada em Panorama da Semiótica – de Platão a Peirce (1995). Santaella
publicou vários livros em que a semiótica é tema central, em especial a semiótica
peirceana. Juntos, Santaella e Nöth, lançaram Comunicação e Semiótica (2004) e
abriram caminho para a compreensão daquilo que a teoria ou ciência dos signos traz
de contribuição para os mais diversos campos do conhecimento, especialmente a
comunicação, pois, por ser uma metadisciplina, a semiótica dialoga com outros
campos interdisciplinares.
A semiótica, propriamente dita encontra seu ancestral mais antigo na história da
medicina, aí entendida como o primeiro estudo diagnóstico dos signos das doenças. O
médico grego Galeno de Pérgamo (139-199), por exemplo, referiu-se à diagnóstica
como sendo “a parte semiótica” da medicina […] a partir da tradição médica, o termo
semiótica também começou a adquirir sentidos mais amplos. Dentro da semiótica
170
moderna, porém, estabeleceu-se uma nova semiótica médica que estuda aspectos da
medicina, da microbiologia e até da psicanálise, sob o ponto de vista de uma semiótica
geral. (NÖTH, 1995, p.19-20).
Segundo Ducrot (apud Todorov 2007, p. 89-90) a semiótica ou
semiologia é a ciência dos signos, mas, por muito tempo, a reflexão sobre os signos
se confundiu com reflexão sobre a linguagem, só ganhando a semiótica uma
independência, a partir do filófoso norte-americano C.S.Peirce (1839-1914). Antes
disso, a exemplo de Lotman, a estrutura diádica do signo, para os demais
semioticistas, não estava no signo, mas no texto concebido não apenas como fala
lingüística, mas como fenômenos culturais e estéticos em geral (SANTAELLA;
NÖTH, 2004).
1 Slogans à luz da Semiótica Peirceana
De acordo com Lúcia Santaella (2002),
“[…]o estudo da linguagem e dos signos é muito antigo. A preocupação
com os problemas da linguagem começam na Grécia. A semiótica
implícita compreende todas as investigações sobre a natureza dos signos,
da significação e da comunicação, é uma semiótica explícita quando a
ciência semiótica propriamente dita começou a se desenvolver”.
Para Winfried Nöth (1995, p. 5) relata que, para Peirce “a semiótica não
é uma ciência especial ou especializada, como são as ciências especiais, a física, a
química, a biologia, a sociologia, a economia, etc., quer dizer, ciências que têm um
objeto de estudo delimitado e de cujas teorias podem ser extraídas ferramentas
empíricas para serem utilizadas em pesquisas aplicadas” (1995, p. 5).
É importante definir signo, conceito central da semiótica peirciana:
“Signo ou Representamen é aquilo que, sob certo aspecto ou modo,
representa algo para alguém. Dirige-se a alguém, isto é, cria, na mente
dessa pessoa, um signo equivalente, ou talvez um signo mais
desenvolvido. Ao signo assim criado denomino interpretante do primeiro
signo. O signo representa alguma coisa, seu objeto. Representa esse
objeto não em todos os seus aspectos, mas com referência a um tipo de
171
idéia que eu, por vezes, denominei fundamento do representame.”
(PEIRCE, 2003, p. 46).
Segundo Santaella (2004c, p. 169-170), o modelo peirceano do
conhecimento é triádico.
“[…] nesse modelo, o signo é o termo mediador, o meio para o
conhecimento. Todo conhecimeto é mediado, ocorrendo por meio de
representações, isto porque todo pensamento se dá em signos e não há
pensamento que não seja dialógico por excelência, pois a mera presença
de um signo chama a presença de outro signo.”
Um outro aspecto notável da atividade semiótica de Peirce são suas
classificações das variedades de signos:
“[…] já percebemos que o número “três” desempenha aqui um papel
fundamental (tanto quanto o “dois” em Saussure) […] uma outra
distinção conhecida mas habitualmente mal interpretada: ícone, índice e
símbolo são três níveis do signo que correspondem à gradação
Primariedade, Secundariedade, Terceiridade.” (DUCROT;TODOROV,
2007, p. 90).
Segundo Santaella (2001, p. 53),
“[…] as classificações devem funcionar como meios para iluminar a
pluralidade e não para fixar um signo dentro de uma distinção em
detrimento das outras. Além disso, a secundidade pressupõe a
primeiridade, quer dizer, a inclui, assim como a terceiridade pressupõe a
secundidade e a primeiridade, incluindo-as dentro de si, Assim como para
ser signo, algo não precisa deixar de ser coisa, para ser um legi-signo, um
signo não precisa deixar de ser um sin-signo e um quali-signo. Ao
contrário, não pode deixar de ser esses três as pectos ao mesmo tempo.
“O dialogismo peirceano implica o signo entendido como processo,
fluxo contínuo.” (SANTAELLA, 2004c, p. 170)
Por volta de 1906, Peirce descobriu que existem dez tricotomias e
sessenta e seis classes de signos. A análise das divisões adicionais nunca foi
satisfatoriamente completada (2003). Dentre as sessenta e seis, há dez principais, às
quais ele dedicou observações detalhadas. Essas dez se estabelecem na relação: do
signo consigo mesmo (Quali-signo, Sin-signo, Legi-signo), do signo com seu objeto
(Ícone, Índice, Símbolo) e do signo com seu interpretante (Rema, Dicente,
Argumento).
172
Segundo Santaella (2000, p.121):
“Cada uma dessas divisões foi então re-subdividida de acordo com as
variações próprias das categorias de primeiridade, secundidade e
terceiridade. Os signos em si mesmos podem ser: 1.1 qualidades; 1.2
fatos; e 1.3 ter a natureza de leis ou hábitos. Os signos podem estar
conectados com seus objetos em virtude de: 2.1 uma similaridade; 2.2 de
uma conexão de fato, não cognitiva; e 2.3 em virtude de hábitos (de uso).
Finalmente, para seus interpretantes, os signos podem representar seus
objetos como: 3.1 sendo qualidades, apresentando-se ao interpretante
como mera hipótese ou rema; 3.2 sendo fatos, apresentando-se ao
interpretante como dicentes; e 3.3 sendo leis, apresentando-se ao
interpretante como argumentos. Dessas nove modalidades, Peirce extraiu
as combinatórias possíveis.”
Para compreender os slogans é importante considerar que, na teoria
semiótica peirceana, as palavras são leis porque pertencem a um sistema. Por assim
dizer, as palavras se conformam a certas combinações por pertencerem ao sistema
das línguas. A lei de que as palavras são portadoras fará com que, cada vez que a
palavra ou frase for utilizada, seja entendida como significando o que o sistema a faz
significar (Santaella, 2002). Vista dessa maneira, a teoria semiótica permite penetrar
no movimento interno das mensagens e de recursos nelas utilizados.
“Se entendermos como Peirce, que a realidade só nos é dada a conhecer
através dos signos, e que estes não dão conta de representá-la em toda sua
complexa pluralidade, poderemos concluir que toda relação sígnica é
metonímica. Um detreminado signo jamais dará conta de representar ‘in
totum’, um objeto ou uma idéia.” (IASBECK, 2002, p. 87).
A idéia de aplicação da semiótica peirceana na propaganda, no presente
estudo, justifica-se também na colocação de Sandmann (1999, p. 17) que considera
que, para Saussure, “os signos inteiramente arbitários realizam melhor que os outros
o ideal do procedimento semiológico”, ou seja, aplica-se à linguagem técnica ou
científica, desprovida de emotividade, não-ambígüa, muitas vezes monossênica,
enquanto a linguagem da propaganda, muitas vezes emotica e polissêmica, dá-se
melhor com textos em que há a combinação de mais tipos de signos, como a
semiótica peirceana permite analisar.
173
1.2 O verbal e o visual dos slogans na mídia exterior
Segundo Marshall McLuhan (1964, p. 182), “Todas as palavras do
mundo não bastam para descrever um balde, embora seja possível dizer, em poucas
palavras como se faz um balde.” Há quem defenda a importância do visual sobre o
verbal. Aproveitando o exemplo de McLuhan em relação ao balde, o medicamento
pode ser visualmente medicamento em qualquer lugar do mundo, mas a palavra, ou
seja, verbalmente sofre alteração, à medida que o idioma muda. Aspirina é um
exemplo (citado e mostrado no capítulo 4).
Todavia, o que mais interessa neste estudo é constatar que palavras e
imagens, ou seja, linguagens verbais e visuais, complementam-se, interpenetram-se,
enfim, ajudam-se mutuamente na constituição da mensagem publicitária. Para isso é
importante, a exemplo do que foi feito até aqui, verificar as opiniões, dialogando
com outros autores.
Para Iasbeck (2002, p. 43),
“[…] grande parte dos textos escritos da publicidade utilizam-se de vários
mercanismos retóricos e se a retórica da imagem tem a sua força
(conforme Roland Barthes, 1971) também é desejável que o registro
verbal seja analisado e investigado nos possíveis cruzamentos com a
retórica da imagem, que a ele se justapõe em contigüidade espacial.”
Para reconhecer e interpretar as mensagens visuais importa o discurso
verbal. A separação das duas dimensões, verbal e visual, não é tão radical quanto se
tem afirmado. A imagem necessita da linguagem verbal para ser esmiuçada,
refletida, compreendida. Assim como a expressão verbal pode ser incompleta
tornando-se, muitas vezes mais rica associada à imagem, esta, por sua vez, encontra-
se na busca de uma reflexão consciente, que somente é possível através da palavra
(SANTAELLA; NÖTH,1999).
174
O verbal, especificamente do slogan, já visto no capítulo 4, abre
possibilidades instigantes e bastante interessantes ao ser verificado neste capítulo
junto ao visual, formando uma terceira, a linguagem híbrida. Segundo Santaella e
Nöth (1998, p. 67). deve-se ter mais cuidado ao se referir à imagem da palavra, já
que muitas vezes, há duas linguagens: uma falada, outra escrita, e várias formas de
escrita. Nos meios gráficos existe a linguagem híbrida, onde palavras e imagens se
misturam.
Para entender melhor este mecanismo e caminhar para uma análise
verbal e visual do objeto de estudo, vale compreender que a imagem tem sido objeto
de estudo interdisciplinar. Há investigações da imagem na história da arte, em teorias
antropológicas e sociológicas, nos meios de comunicação de massa e, inclusive, nas
campanhas publicitárias.
“Imagens têm sido meios de expressão da cultura humana desde as
pinturas pré-históricas das cavernas, milênios antes do aparecimento do registro da
palavra pela escritura” (SANTAELLA;NÖTH, 1998, p. 13). Imagens ainda podem
ser analisadas em domínios visuais: desenhos, pinturas, gravuras, fotografias,
representando objetos materiais, fazendo parte do ambiente visual ou em domínio
imaterial: visões, fantasias, em geral como representações mentais.
Na vida cotidiana, as imagens proliferam rapidamente através da mídia
de massa. A TV é invadida por signos, assim como na internet com a convergência
das mídias com signos saltando nas telas dos monitores e também nos outdoors,
causando grande impacto visual nas ruas e avenidas das cidades e estradas. Joly
(1996) concorda com esses aspectos da imagem, sobretudo na propaganda. Para a
autora, a descrição de uma mensagem visual publicitária é aparentemente simples e
evidente, na medida em que constitui a transcodificação das percepções da imagem
175
para a linguagem verbal. É, portanto, necessariamente parcial nos dois sentidos do
termo. Dificilmente encontra-se exatidão num exercício quase sempre surpreendente
pela diversidade de resultados. Cada indivíduo indica pontos diferentes de visão,
embora grande parte das observações possam convergir.
Nas relações entre a imagem e mensagem predomina a
complementaridade. Quer dizer, as mensagens são organizadas de modo visual, mas
o verbal acrescenta informações específicas que o visual não é capaz de transmitir. A
tentativa de verificar linguagem: verbal e visual na propaganda é interessante, pois,
juntas, elas podem proporcionar diversas interpretações.
Portanto, a relação entre a imagem e seu contexto verbal é intima e
variada. A imagem pode ilustrar um texto verbal ou o texto pode
esclarecer a imagem na forma de um comentário. Em ambos os casos, a
imagem parece não ser suficiente sem o texto, fato que levou alguns
semioticistas logocêntricos a questionarem a autonomia semiótica da
imagem. A concepção defendida de que a mensagem imagética depende
do comentário textual tem sua fundamentação na abertura semiótica
peculiar à mensagem visual […] o contexto mais importante da imagem é
a linguagem verbal.(SANTAELLA;NÖTH, 1998, p. 53).
Na multiplicidade de linguagens verbais e visuais, uma linguagem
híbrida surge como ponto focal da análise do slogan em seu contexto, o outdoor,
uma mídia de massa exclusivamente publicitária, um elemento do espaço urbano que
convive diretamente com as ruas, praças, edifícios, carros, ônibus e pessoas.
Segundo o antropólogo Massimo Canevacci (1997):
Às vezes parece que as únicas provas concretas, socialmente ‘visíveis’ da
pesquisa social, só possam ser efetuadas através de publicidade.O que faz
com que interpretar a publicidade metropolitana, as suas escolhas
comunicativas em nível da multiplicidade das linguagens, dos conteúdos
e dos saltos metacomunicativos, seja o objetivo fundamental para se
decifrar os sistemas urbanos de orientação que fazem moda.
Para Ferrara (1981, p. 120), “[…] a cidade é um processo contextual
onde tudo é signo, linguagem. Ruas, avenidas, praças, monumentos, edificações,
configuram-se como uma realidade sígnica que informa sobre seu próprio objeto, isto
176
é, o contexto.” E é, justamente neste contexto que se encontram os outdoors e grande
parte da mídia exterior.
Canevacci (1997, p. 184-185) refere-se aos grandes cartazes publicitários
das ruas, os outdoors, como uma fonte tanto inexaurível quanto renovável de
comunicação urbana “[…] neles é possível ler-se não só a mensagem explícita, a que
se destina a vender, mas também o sistema de valores de uma determinada época,
num específico contexto sócio-cultural.”
O autor prosegue:
“[…] os signos tornaram-se ‘super’ nas nossas ruas e no nosso sistema
cognitivo; e, simultaneamente, o que é ‘super’ não pode ser senão signo.
A supremacia da sua união, da fusão entre os dois termos, atesta e, eu
quase diria, proclama em público uma verdade acontecida, comunicativa,
que o contexto urbano tem forçosamente de legitimar.”
Faz-se importante relembrar o surgimento do outdoor e do processo para
mídia exterior, já mencionado nos capítulos 1 e 2. Data de agosto de 1929, em São
Paulo, a instalação da primeira empresa exibidora de outdoor no Brasil. Eram
pequenos, recortados de forma oval e afixados em posters. Porém, como não havia
critérios de padronização entre as empresas exibidoras, proliferavam cartazes de 8,
16, 32 folhas (tanto vertical como horizontal) ou até de 64. Com uma dificuldade
pelos padrões estrangeiros, os cartazes eram impressos no formato de 24 folhas, e
não havia no Brasil tabuleta para este padrão. Todos eram refilados a estilete e,
posteriormente colados nas tabuletas de 16 folhas.
O cartaz de 32 folhas nasceu nos anos 60, já que o cartaz de 16 folhas
não agradava nem as agências nem anunciantes por ter um formato quadrado. Como
seria praticamente inviável a retirada de todos os cartazes de 16 folhas e sua
conseqüente substituição pelos de 24, optou-se simplesmente pela colocação de uma
177
nova tabuleta de 16 folhas ao lado da anterior, nascendo assim o cartaz de 32 folhas
(
http://www.outdoor.org.br).
Figura 52. Outdoor do medicamento Guaraína
Em vários países do mundo, o termo outdoor designa todo e qualquer
tipo de propaganda exposta ao ar livre. Porém, no Brasil, convencionou-se chamar de
outdoor apenas um meio específico com características próprias que o diferenciam
das outras mídias exteriores. O outdoor é formado por folhas de papel coladas em
estruturas metálicas modulares de 9 metros de comprimento por 3 metros de altura.
Instalam-se esses quadros a uma altura mínima do chão ou sobre muros, em terrenos
alugados, sempre respeitando a distância entre as peças previstas pela lei. Os cartazes
são afixados por coladores que têm um técnica toda especial para dispor folhas
(normalmente 32 ou 16) na ordem certa e formar a mensagem
(
http://www.outdoor.org.br).
Figura 53. Outdoor de Coristina D.
178
Mas esse formato evoluiu, e muito. Hoje a propaganda ao ar livre não se
restringe ao outdoor. O outdoor deu espaço para outdoor com aplique (parte que vai
além do formato convencional do outdoor), e, com liberdade na criação, elaboração,
produção e veiculação, surgiu a mídia exterior. Mídia exterior é a denominação
genérica dos meios de comunicação que expõem propaganda ao ar livre. Como
exemplo: empena (anúncio exposto ao longo de grandes edifícios), envelopamento
(que “forra” edifícios, ônibus, metrô), back light (parece o outdoor, mas com luz
própria e qualidade suficiente para ficar um ano sem ser alterado), front light
(também parece o outdoor, mas com iluminação frontal, permitindo ser visualizado
melhor durante à noite), taxidoor (propaganda em taxi), busdoor (propaganda em
ônibus), painel digital, etc.
Figura 54. Taxidoor Benegrip.
Figura 55. Propaganda de Estomazil na lateral do ônibus
179
O outdoor pode ser reconhecido como mídia exterior, uma vez que está
exposto ao ar livre, mas é diferenciado em sua classificação profissionalmente. A
mídia exterior, com suas inúmeras variações em formatos e recursos visuais, faz
parte do maquinismo social, maquinismo que deve ser compreendido por um
conjunto de signos, verbais e visuais.
A interatividade, muito utilizada para fixar marcas e mensagens, como o
slogan na mente das pessoas, também ocupa espaço em taxidoors. A exemplo do
utilizado pelo analgésico Saridon, que gerava uma intenção de movimento a partir de
uma imagem fixa, apenas aproveitando-se de um elemento físico que a própria mídia
exterior, no caso o taxi, enquanto carro possui: o farol.
Figura 56. Taxidoor “interativo” do analgésico Saridon
Todavia, se a criatividade e a interatividade encontraram, na mídia
exterior, um meio de propagação dos medicamentos, a mesma mídia exterior ou
externa, neste caso específico, foi utilizada por meio de propaganda abusiva na
180
lateral de uma Drogaria na Avenida Paulista, ao anunciar venda de medicamento
para disfunção erétil, o que é proibido.
Figura 57. Anúncio de Viagra na lateral da Drogaria São Paulo.
Segundo Grande Otelo (CADENA, 2001, p. 292), “Cidade sem anúncios,
para mim é blecaute.”
Figura 58. Aspirina em Leverkusen, na Alemanha.
Nem sempre imponentes como o edifício envelopado pela Aspirina, em
1999, na sede da Bayer, em Leverkusen, em comemoração aos seus cem anos, mas
polêmicos, a mídia exterior e o outdoor, sempre foram alvo de discussões. Para
181
alguns, é a mídia de massa mais democrática, para outros um escândalo visual e até
responsável pela poluição visual de grandes cidades. O fato é que, com a “Cidade
Limpa”, está proibida toda e qualquer propaganda ao ar livre, na capital de São
Paulo, segundo o Projeto de Lei 619/06 (Lei Municipal 14.233/06, conhecida por
Cidade Limpa) aprovado em setembro de 2006, na Câmara Municipal de São Paulo e
sancionado pelo prefeito Gilberto Kassab. Em decorrência disso, anunciantes dos
mais diversos setores, inclusive da indústria farmacêutica, passaram a investir em
outras mídias de massa, mas também no permitido mobiliário urbano: cabines de
segurança, placas direcionais, tótens de bens culturais, banheiros públicos, tótens
informativos, relógios de rua ou digitais, quiosques e abrigos de ônibus.
Figura 59. Propaganda de Coristina D em abrigo de ônibus.
Dando seqüência a este estudo, realizado na cidade de São Paulo, quando
não havia proibição de outdoor nem de mídia exterior, a seguir a análise semiótica
peirceana será aplicada na propaganda de dois medicamentos de venda livre Gelmax,
em outdoor e Doril, em taxidoor, em propagandas de 2006, na cidade de São Paulo.
Cabe ressaltar que, como a referida legislação vigora só no município de São Paulo,
esses medicamentos, com as mesmas mensagens, continuam divulgando suas
propagandas em cidades vizinhas (região do Grande ABC, litoral paulista, cidades do
182
interior de São Paulo) e em outros estados brasileiros.
2 Teoria Semiótica como instrumento de análise: seleção do corpus – critérios da
análise
Segundo Santaella (2002, p. 59), “[...] semiótica é a teoria de todos os
tipos de signos, códigos, sinais e linguagens. [...] Ela nos permite compreender
palavras, imagens, sons em todas as suas dimensões e tipos de manifestações”.
Levando em consideração que a semiótica estuda os processos perceptivos e que as
linguagens estão fundamentadas em esquemas perceptivos, pode-se entender melhor
o potencial comunicativo dos diversos tipos de mensagens, como as da propaganda
de medicamentos.
Para Iasbeck (2002, p.107-116), o slogan é um mecanismo verbal que
não busca evocar a racionalidade, mas sim a levar o maior número de pessoas ao
consumo. A mensagem publicitária é constituída de uma série de outros atrativos que
não apenas o escrito. Portanto, ao ser veiculado em mídia impressa, a conjugação
entre texto escrito e imagem, de acordo com as características da mídia, no conjunto
interativo, faz com que o slogan não funcione como um mero sintagma verbal, pois
pode adquirir sentido no conjunto do anúncio. Em outras palavras, deve-se levar em
consideração a imagem e o contexto.
Consciente de que a semiótica é centrada na emissão, ou seja, nos
processos que geram os efeitos, pode-se comparar os efeitos potencialmente gerados
com a inferida intenção do emissor nas análises de medicamentos de venda livre.
Em um primeiro momento, é fundamental compreender que, para que se
possa aplicar o método semiótico em uma determinada realidade mercadológica,
183
como no caso do slogan de medicamento, deve-se ter contato com as diversas
informações a respeito do objeto de estudo, do signo a ser analisado.
Segundo Perez (2004, p. 149) são condições para essa análise: a) atitude
fenomenológica, proposta por Santaella, baseando-se em Charles Sanders Peirce, que
envolve a capacidade contemplativa (capacidade de se ver realmente o que está
diante dos olhos. “Diz respeito à sensação que o fundamento do signo é capaz de
gerar em nossas mentes”); b) capacidade de distinção (capacidade de perceber as
diferenças no signo e seguir adiante com a observação) e c) capacidade de
generalização (momento de disseminar as observações feitas no signo e estendê-las
em categorias).
Essas condições, por assim dizer, ficam ainda mais consistentes, quando
Santaella (apud CHIACHIRI, 2006, s.p.) indica que, para explorar o potencial
comunicativo, a semiótica propõe pelo menos três pontos de vista fundamentais e
complementares através dos quais se procede à análise:
1) qualitativo-icônico - onde são analisados os aspectos qualitativos da
mensagem: cores, texturas, composição, formas, enfim pontos que têm grande poder
de sugestão. Também devemos considerar, diante dessas características qualidades
abstratas: força, delicadeza, fragilidade, pureza, etc, ou seja, a nossa capacidade
contemplativa;
2) singular-indicativo - análise da mensagem como algo que existe em
um espaço e tempo determinados, sendo assim as qualidades de que esse se compõe
(cores, formas, tamanho) sejam vistas em função do seu uso, analisa-se a mensagem
em seu contexto, mas também as funções que desempenha, levando em consideração
a adequação do aspecto qualitativo icônico;
184
3) convencional-simbólico – análise dos padrões do design da mensagem
(como um tipo de produto, por exemplo), análise do poder representativo da
mensagem, análise do tipo de consumidor visado pela mensagem e dos significados
que esse produto pode despertar nele.
Um caminho interessante a seguir e que pode auxiliar na presente análise,
uma vez que se busca a compreensão do slogan, enquanto verbal e visual, no
contexto da mídia exterior é a abordagem gestaltista. No que se refere à aplicação
das teorias gestálticas para a compreensão dos sistemas visuais da cultura, faz
sentido recorrer a três dos autores mais expressivos: Arnheim, Aumont e Dondis.
A abordagem gestaltista que, em geral, para qual a percepção do mundo é
um processo de organização, de ordenamento de dados sensoriais (AUMONT, 1995,
p. 93) é encontrada de modo sistemático nas obras de Rudolf Arnheim. Para ele, ao
lado do pensamento verbalizado, há espaço para um modo de pensamento mais
imediato, que se organiza diretamente a partir dos perceptos dos nossos sentidos: o
pensamento sensorial, privilegiando o pensamento visual. Ainda, segundo Aumont,
de todos os nossos sentidos, a visão é o mais intelectual, o mais próximo do
pensamento e, talvez o único cujo funcionamento esteja de fato próximo ao do
pensamento.
Dondis (2007) afirma que os elementos visuais constituem a substância
básica do que vemos e seu número é reduzido a ponto, linha, forma, direção, tom,
cor, textura, dimensão, escala e movimento. Ainda, para Dondis, a interação e o
efeito da percepção humana sobre o significado visual provêm de pesquisas e
experimentos da psicologia da Gestalt. A palavra Gestalt, para Arnheim (1997) é um
substantivo comum alemão, usada para configuração ou forma e tem sido aplicada a
185
um conjunto de princípios científicos extraídos de experimentos de percepção
sensorial.
“Arnhein é autor da obra aonde aplica grande parte da teoria da Gestalt,
desenvolvida por Wertheimer, Kohler e Koffka à interpretação das artes
visuais. Arnheim explora não apenas o funcionamento da percepção, mas
também a qualidade das unidades visuais individuais e as estratégias de
sua unificação em um todo final completo. Qualquer acontecimento
visual é uma forma com conteúdo, mas o conteúdo é extremamente
influenciado pela importância das partes constitutivas, como a cor, o tom,
a textura, a dimensão, a proporção e suas relações compositivas com o
significado”. (DONDIS, 2007, p. 22)
O critério de seleção do “corpus” para análise da linguagem verbal e
visual do slogan de medicamentos na mídia exterior, especificamente outdoor e
taxidoor, foi:
- medicamentos de venda livre (OTC), por não terem tarjas: vermelha
nem preta e, portanto, legalmente poderem anunciar na mídia de massa;
- medicamentos da categoria: analgésico e antiácido, por estarem entre os
mais vendidos e os que mais anunciam (segundo a Agência Nacional de Vigilância
Sanitária/ANVISA);
- outdoor e mídia exterior (taxidoor) por se tratar de mídia de massa
exclusivamente publicitária e aonde os primeiros anunciantes em potencial da
propaganda brasileira, os medicamentos, divulgaram e também por ser possível
verificar como o slogan configura-se de maneira verbal e visual, uma vez que pelas
próprias características dessa mídia, a mensagem publicitária apresenta-se restrita em
assinatura do anúncio;
- cidade de São Paulo, pelo maior número de anunciantes de
medicamentos em mídia exterior até 2006 (a partir de 2007 foi proibida a propaganda
nesta mídia de massa, conforme já abordado) , segundo Central de Outdoor
(http://www.outdoor.org.br).
186
- período de análise: 2006, por ser o período de crescimento de anúncios
de medicamentos em mídia exterior em São Paulo, assim como o crescimento da
própria mídia exterior (ibid.).
Ainda em relação à aplicação método, deverá ser levado em consideração
o potencial comunicativo do slogan, inserido nos processos comunicativos, sendo
assim possível analisar o slogan através de literaturas selecionadas em levantamento
bibliográfico e no registro documental (imagens fotográficas).
2.1 Medicamento Gelmax: “protege e dá um alííííííííííívio.”
A propaganda de medicamentos na mídia exterior, tanto em outdoor
como em taxidoor, age com rapidez. Exatamente por isso, sua mensagem é concisa e
restrita, muitas vezes, ao título, à imagem e assinatura. A mensagem tende a ser
rápida na propaganda de medicamentos, evitando à fiscalização da ANVISA, por
isso também a escolha da mídia exterior, por parte da indústria.
Figura 60. Outdoor de Gelmax (cidade de São Paulo, bairro Ipiranga, no período: julho de 2006 a novembro de 2006).
O anúncio do medicamento Gelmax, veiculado em outdoor, remete à
lembrança da campanha publicitária, via outras mídias, veiculada no mesmo período
(julho a novembro de 2006). Apresenta o personagem (representado pelo ator Luiz
187
Gustavo) interpretando o pai de família que passa por várias preocupações, com
sintomas de azia, até que o medicamento o alivia, mostrando sua eficácia.
A trajetória a seguir contribui para o reconhecimento dos elementos
visuais existentes no anúncio de medicamento a ser estudado por meio da teoria da
Gestalt, proposta por Dondis (2007). A análise tem início pelo levantamento dos
elementos visuais e verbais. A seguir, adentra-se na compreensão dos processos
comunicativos, proposta por Lucia Santaella em Semiótica Aplicada (2002, p 59-61),
processos esses que incluem, pelo menos, três faces: significação ou representação,
referência e interpretação das mensagens.
Inicialmente, faz-se necessário o levantamento dos elementos verbais e
visuais:
Espaço – topologia: anúncio (3,0 x 9,0m), da proporção (1:3) composto
por 32 ou 16 folhas fixas em um suporte). Fundo: fundo infinito, onde predomina o
amarelo com degradée e o destaque com a frase nova embalagem no canto superior
esquerdo.Textura: bolhas próximas ao produto. Formas: (figurativas, geométricas,
abstratas) – figurativa: Luiz Gustavo (ator) segurando a embalagem, quatro
embalagens no canto, fontes: título (slogan), subtítulo e palavras. Cores: camisa azul
do personagem, suspensório vinho e preto, cores das fontes: preto e vinho, cores da
embalagem: amarelo/branco degradée, vermelho no logo, informações em preto.
Tom (não enquanto cor, mas na relação luz e sombra): Luz iluminando o rosto, luz
iluminando a mão com o produto, luz no fundo da assinatura (embalagens no canto).
Escala: As embalagens seguem a escala natural na proporção com o ator. Dimensão:
Ator com embalagem (ocupa menos da metade do espaço) e Fontes com embalagem
ocupam a maior parte do anúncio. Movimento: Movimento do ator, realidade
secundária. Movimento de composição levemente inclinado.
188
Após elencados os elementos visuais, a análise será feita com base em
três pontos de vista, como sugere o método de análise semiótica de Lucia Santaella,
verificando: aspectos qualitativos-icônicos, singular-indicativo e convencional-
simbólico.
As cores da embalagem: amarela/branca degradée também fazem parte
do fundo do anúncio, o que valoriza a embalagem do medicamento em cores amarela
e vermelha na marca. Essa repetição dá grande consistência e coerência à imagem
como um todo, por criar um ambiente inteiramente impregnado pelas cores da
embalagem. As cores amarela e vermelha, que fazem parte da marca, têm uma certa
relação com alimento, vontade de comer e o medicamento alivia o mal estar causado
pela azia, que tem relação com ingestão de alimentos. As bolhas brancas remetem ao
medicamento, que ao ser colocado em água provoca bolhas, é efervescente. O
destaque para “nova embalagem” é cor de vinho, em letras brancas, gerando um
contraste e o vinho é a cor da marca, assim como do título (slogan) e subtítulo. O
suspensório do personagem tem as cores vinho e preta, assim como o preto aparece
de maneira sutil nas embalagens. A camisa azul do personagem remete à confiança e
sobriedade.
No tom percebe-se a luz iluminando o rosto do personagem, uma
luminosidade também na mão do personagem que segura o medicamento, destacando
ainda mais o ponto focal do anúncio e novamente uma luz no fundo das embalagens
no canto direito inferior, local geralmente de destaque da assinatura do anúncio.
O fundo é infinito. Nele predomina o amarelo com degradée, a textura de
bolhas está próxima ao nome do medicamento (marca) que está no topo, central do
anúncio. As bolhas no fundo reforçam a tipologia também arredondada e, apesar de a
composição não apresentar uma simetria, é harmoniosa nos elementos que a
189
constituem. A frase “nova embalagem” concentra-se no canto esquerdo superior,
acrescentando uma informação.
Forma figurativa: o personagem interpretado pelo ator Luiz Gustavo não
apenas segura a embalagem como também sugere o uso do mesmo. Quatro
embalagens no canto direito inferior ocupam uma área onde, geralmente, localiza-se
a assinatura (marca e slogan). O título (slogan) e o subtítulo estão centralizados e
ocupam uma área de 2/3 do anúncio, não sussurrando, mas sim gritando. Algumas
palavras que mostram os benefícios do medicamento estão em alinhamento irregular
no anúncio, apenas como informação complementar.
As embalagens seguem a escala natural na proporção com o personagem,
nivelando o grau de importância. O personagem segurando a embalagem ocupa
menos da metade do espaço total do anúncio, embora tenha bastante destaque. A
marca, cujo grande corpo ocupa uma área de importância, pois está na parte central
do anúncio, é acompanhada pelo título (slogan), também em grande dimensão. Ou
seja, as fontes e as embalagens, localizadas na parte inferior do lado direito, ocupam
a maior parte do anúncio.
Percebem-se como textura apenas as bolhas, próximas à marca Gelmax,
na parte central do anúncio, próximas ao título (slogan) sugerindo o alívio, que é
reforçado pela palavra alívio, com nove “i”, o que mostra movimento, uma vez que a
frase de efeito está levemente inclinada e permite uma leitura de leveza, ao mesmo
tempo em tom de exagero. O movimento do ator é uma realidade secundária. A
inclinação da cabeça em direção à mão que segura a embalagem do medicamento,
como se estivesse sugerindo o uso do mesmo e o olhar maroto, como se estivesse
dizendo algo favorável ao uso do medicamento, despertam a atenção de quem olha o
190
anúncio. A figura é fixa, estática, sem movimento real, embora passe a sensação do
movimento real pela expressão do personagem.
Nos aspectos qualitativos-icônicos, em seu fundamento, percebe-se um
anúncio pouco atraente, ou melhor, que deixa muito a desejar no aspecto sensorial,
até porque a ética da propaganda de medicamentos limita a criação a ponto de não
permitir o apelo visual e a linguagem mais sensível e menos racional nos anúncios. A
mensagem é muito clara e direta, mas, ao mesmo tempo, pouco explorada quanto à
sensação e sedução da propaganda.
No aspecto singular-indicativo, embora haja um aspecto sensorial
bastante enfraquecido na mensagem, o apelo à dor ou ao alívio da dor sempre está
embutido, de alguma maneira, na propaganda de medicamentos. O personagem, ator
de novelas conhecido do público, pela alta exposição na televisão, segurando o
medicamento e praticamente sugerindo o uso do mesmo, pode levar o observador a
esse sentido indicativo fundamental, o que reforça a mensagem de que se trata de um
medicamento que pode aliviar os sintomas da azia, etc. Nesse sentido, a propaganda
de medicamentos mostra, demonstra, utiliza personagens expostos na mídia e
recursos persuasivos por meio de imagens e palavras, o que estimula pessoas
fragilizadas pela enfermidade, ao uso do medicamento.
No aspecto convencional-simbólico, é onde pode-se realmente analisar o
slogan (no anúncio exercendo um papel de título) próximo à marca, enquanto
mensagem verbal e visual. As palavras: protege e alívio, em posição de destaque no
anúncio, remetem ao lado emocional, ao mesmo tempo racional do receptor,
provável doente ou enfermo. Protege remete à proteção, cuidado, confiança,
credibilidade. Alívio, como se apresenta com a repetição de nove “is”, remete a
movimento, mas também à credibilidade, à certeza de estar consumindo o
191
medicamento certo. Fazem parte do contexto, o famoso ator Luiz Gustavo como
personagem, com a imagem associada diretamente ao medicamento, uma vez que o
tem em sua mão, o slogan próximo à marca (utilizado como título) com forte apelo
verbal e visual e a mensagem inserida em uma mídia de alta exposição, como a mídia
exterior.
Na perspectiva histórica, pode-se verificar que a propaganda de
medicamentos no Brasil nasceu com os textos longos e elaborados, assumidos por
grandes poetas. Cabia, portanto, à direção de arte, aos artistas na época, apenas a
ilustração dos títulos, feita de maneira bastante rudimentar e pouco atrativa. Hoje, a
imagem, geralmente figurativa, é bastante presente na propaganda de medicamentos.
Os personagens, assim como o denominado o garoto-propaganda, ocupam grande
parte das mensagens na mídia de massa. O personagem na propaganda funciona,
muitas vezes, como uma legenda que acompanha - em simultaneidade - a narrativa
da peça ou da campanha, imprimindo à mensagem um tom didático ou pedagógico
que dissimula o menosprezo às competências interpretantes do receptor, em prol da
garantia do entendimento desejado pelo anunciante. Essa função é bastante forte nos
anúncios que divulgam medicamentos.
Quanto ao anúncio analisado, percebe-se que apesar de pouco atraente no
âmbito criativo e sensorial, levando em consideração que: quem consome um
medicamento é alguém fragilizado, pois necessita do medicamento por sofrer de má
digestão ou azia; existe uma mensagem persuasiva afirmando que o medicamento
protege e alivia, além de combater os sintomas da má digestão, esse sentido remete
às raízes da propaganda de medicamentos que sempre prometeu milagres e curas sem
cautela. O slogan em tom exagerado, metafórico, exerce papel de título no anúncio,
sendo verbal e visual.
192
Quanto à questão ética, segundo o Anexo I, referente a produtos
farmacêuticos isentos de prescrição do CONAR (na íntegra no Anexo 2), caso do
medicamento Gelmax, a propaganda de medicamento no outdoor não estaria de
acordo com os itens:
a. não deverá conter nenhuma afirmação quanto à ação do produto que
não seja baseada em evidência clínica ou científica; i. não deverá levar o
Consumidor a erro quanto ao conteúdo, tamanho de embalagem,
aparência, usos, rapidez de alívio ou ações terapêuticas do produto e sua
classificação (similar/genérico); j. deverá ser cuidadosa e verdadeira
quanto ao uso da palavra escrita ou falada bem como de efeitos visuais. A
escolha de palavras deverá corresponder a seu significado como
geralmente compreendido pelo grande público.
Portanto não deveria ser veiculada em mídia de massa. No entanto, não
chega a ferir os artigos da RDC 102, embora haja exagero no uso das palavras e
chegue bem próximo de prometer algo, com o risco de não cumprir.
2.2 Medicamento Doril: “tomou Doril, a dor sumiu.”
Doril é um medicamento de venda livre, nacional, produzido pela DM
Indústria Farmacêutica/Dorsay Monange. O analgésico utiliza uma propaganda que,
de certa forma, parece incomodar bastante os estudiosos, seja de comunicação, seja
de saúde. Médicos, professores, pesquisadores, como Fernando Lefèvre, José Ruben,
Álvaro Nascimento, que fazem parte de um time de críticos fervorosos das práticas
utilizadas pela propaganda de medicamentos, praticamente condenam a utilização de
slogans como o de Doril “Tomou Doril, a dor sumiu”.
Muitos são os artigos na internet, trabalhos apresentados em congressos
que polemizam o slogan “tomou Doril, a dor sumiu” inclusive metaforicamente. O
livro Campanhas Inesquecíveis (2007, p. 35), faz um breve relato das campanhas
bem sucedidas de Doril, denominando-o “Slogan do analgésico Doril caiu no uso
193
cotidiano”. Ao lado do relato, expõe fotos dos diversos filmes publicitários que
fazem parte da trajetória de Doril na mídia de massa. Nas fotos, há presença de
personagens famosos da TV Globo e figuras de muita credibilidade no mundo
artístico e junto à população: Chico Anysio, Antonio Fagundes, Eva Wilma e Jô
Soares. De certa forma, isso contribuíu para o fortalecimento da marca, pois tais
personagens repetem por diversas vezes na mídia de massa o slogan “Tomou Doril, a
dor sumiu”. O slogan teria surgido da seguinte maneira:
Depois de focar a gripe, a companhia decidiu mudar a mira para o
segmento de analgésicos. Durante as discussões para a investida, surgiu
uma brincadeira com as palavras Doril e sumiu. Dessa associação saiu o
slogan “tomou Doril a dor sumiu” e uma das campanhas de maior
assimilação do público (CAMPANHAS INESQUECÍVEIS, 2007, p 35).
A campanha já teve mais de cinqüenta produções em sua história, todas
criadas e dirigidas por Roberto “Dudu” Carvalho.
Novamente, é importante destacar a característica da mídia. A
propaganda exposta no taxi chama-se taxidoor e circula pelas ruas, avenidas, enfim,
a imagem é fixa, mas ganha movimento no próprio meio. A mensagem verbal e
visual é rápida, concisa e restrita, geralmente em assinatura (marca e slogan) ou pela
marca, produto e slogan. Como o verificado na análise do medicamento Gelmax,
independentemente do tipo de mídia exterior em que esteja inserida, a mensagem
tende a ser rápida na propaganda de medicamento, devido às restrições legais
impostas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
O anúncio do medicamento Doril, veiculado em taxidoor, não estava
atrelado a qualquer campanha, ou seja, não havia uma comunicação em outras mídias
de massa (no período de julho a novembro de 2006) que justificasse a propaganda de
Doril na mídia exterior, como mídia de apoio às demais ou algo parecido, fato que
194
ocorre com certa freqüência. A trajetória a seguir, aponta o modelo sugerido no
processo da análise anterior.
Depois de detectados os elementos visuais existentes na propaganda, a
análise será feita com base em três pontos de vista: aspectos qualitativos-icônicos,
singular-indicativo e convencional-simbólico.
Figura 61. Taxidoor de Doril (cidade de São Paulo, no período: julho de 2006 a dezembro de 2006).
A cor predominante é o vermelho. “O vermelho sugere perigo, amor,
calor e vida e mais uma centena de coisas. Cada uma das cores também tem
inúmeros significados associativos e simbólicos” (Dondis, 2007, p.64). As palavras
estão escritas em branco. Pode-se admitir nessa análise o vermelho como a dor, o
perigo e branco como a paz, o alívio. Como se a dor estivesse representada pelo
vermelho e o slogan, o nome da marca inserido na frase (slogan completo) e a
embalagem em branco fossem a cura ou o alívio. As cores branca e vermelha, cores
da embalagem, fortalecem a imagem do medicamento, mas podem estar relacionados
195
simplesmente às cores de primeiros socorros, onde há uma cruz vermelha e o fundo
branco.
O fundo do carro é branco, cor utilizada obrigatoriamente no táxi da
cidade de São Paulo. O anúncio inserido no carro tem fundo infinito, vermelho. São
utilizadas duas tipologias, as palavras que constituem o slogan: Tomou e Sumiu, em
caixa alta, condensada, light, letras sem serifas. Doril em caixa baixa, bold, é a
mesma tipologia da marca, existente na embalagem. Apesar da composição não
apresentar uma simetria, é harmoniosa com elementos que a constituem. O
alinhamento da frase é irregular, valorizando a palavra Doril, ou seja, a marca que
está situada na parte central do anúncio, ocupando a maior parte do mesmo. A
embalagem ocupa o canto direito superior, interagindo com a frase Tomou Doril,
sumiu; ou seja, a palavra DOR não faz parte do slogan no anúncio.
A palavra Tomou, por iniciar a frase e estar no lado esquerdo superior (a
linguagem verbal é linear, seqüencial), destaca-se pela boa visibilidade, assim como
a boa legibilidade. Já a palavra Sumiu está no lado direito inferior, em localização
pouco privilegiada, quase sem leitura, embora a embalagem acima da palavra,
reforçasse a idéia de que ao tomar o medicamento a dor some, como “sumindo” com
a palavra.
A imagem da embalagem que contém seis comprimidos ocupa a parte
direita do anúncio e não chega a 1/3 do mesmo. O slogan ocupa a maior parte do
anúncio, mostrando seu grau de importância. A marca, na frase, tem o corpo maior
que as demais palavras e ocupa uma área de importância, pois está na parte central
do anúncio. Existe ainda a mensagem do Ministério da Saúde, do lado esquerdo
inferior. O anúncio ocupa a parte lateral do carro, das quatro portas (dos dois lados).
196
Apesar da imagem estática, letras e embalagem, sem movimento real, a
sensação é de um certo movimento com a irregularidade do alinhamento, variação da
tipologia e inclinação da embalagem. Uma vez o carro em movimento, a sensação é
de um slogan “gritado”.
Nos aspectos qualitativos-icônicos, verificado em seu fundamento, o
anúncio consegue exercer certa força de atração sobre o observador. O vermelho
enquanto perigo, dor e as letras em branco, ou seja, o slogan junto à embalagem
transmite paz, alívio, cura. O doente, enfermo, ou seja, o observador pode ter certo
pressentimento, mesmo que não tenha consciência clara do conteúdo que está
absorvendo. Não se trata de um anúncio criativo nem mesmo com certa atração, mas
desperta atenção especificamente pelas cores e seus significados.
No aspecto singular-indicativo, tem-se um aspecto sensorial interessante
da dor em vermelho e do alívio em branco, assim como da posição da embalagem do
medicamento localizada sobre a palavra Sumiu, colocando fim à dor.
No aspecto convencional-simbólico, é onde pode-se completar a análise
sobre qual efeito o slogan tem a intenção de produzir. O verbal e o visual interagem.
As palavras: Tomou e Sumiu, junto à embalagem e à encorpada palavra Doril,
utilizam-se da rima e da metáfora, momento em que a propaganda do medicamento
analgésico pode justificar-se à ANVISA, em meio a tantas restrições, alegando tratar-
se de uma expressão verbal, uma rima ingênua. O slogan “Tomou Doril, a dor
sumiu”, no anúncio é apresentado por “Tomou Doril sumiu”, ao lado da embalagem
contendo seis comprimidos, imagem representada pela foto da embalagem original.
O anúncio tem forte apelo verbal. Tem um apelo visual a partir do momento em que
promete que a dor suma e cria um ambiente com tipologia, cores e a apresentação da
197
embalagem como solução de problema. O anúncio está inserido em uma mídia de
alta exposição, como a mídia exterior.
Novamente vale recorrer à herança histórica e cultural, repleta de
promessas na linguagem da propaganda de medicamentos e rimas, feitas pelos
prováveis redatores publicitários da história da propaganda, os poetas. Doril atua
exatamente assim na propaganda atual. Resgata a rima e a repetição e o apelo à cura
imediata. À direção de arte, cabe o uso adequado de cores, tipologia, alinhamento e
localização da embalagem do medicamento, assim como à dupla, redator e diretor e
arte, cabe o conhecimento do contexto, ou seja, do taxidoor que, ao transitar por ruas,
veicula e propaga a mensagem verbal e visual.
Como o verificado anteriormente, a propaganda de Doril é bastante
polêmica. Nascimento (2005, p. 101) expressa indignação e documenta com pesquisa
as cem propagandas de medicamentos na mídia de massa que apresentam
irregularidades, inclusive Doril.
Fernando Lefèvre (1999, p 13) discute o significado de Doril, por meio
de uma leitura diferenciada, não menos atenta aos riscos de uma interpretação
errônea. Em um primeiro momento, posiciona o slogan como uma afirmação
verdadeira que enuncia um mito (o ato de tomar o medicamento para fazer a dor
sumir) e, num segundo momento, coloca o slogan como representação. “A fortaleza
da representação advém tamm do fato de que, para muitos indivíduos, a dor
efetivamente some com Doril...mas claro que, a força dessa representação pode ser
aparente, já que o mal que desaparece do corpo dos homens tende a reaparecer”
(1999, p 95).
O slogan de Doril, portanto sua propaganda, já que é basicamente
composta pelo slogan em seu aspecto verbal e visual, no aspecto ético, não atenderia
198
o Anexo I, relacionado a produtos faramacêuticos isentos de prescrição, do CONAR
nos seguintes itens:
a. não deverá conter nenhuma afirmação quanto à ação do produto que
não seja baseada em evidência clínica ou científica; c. não deverá ser feita
de modo a resultar em uso diferente das ações terapêuticas constantes da
documentação aprovada pela Autoridade Sanitária; i. não deverá levar o
Consumidor a erro quanto ao conteúdo, tamanho de embalagem,
aparência, usos, rapidez de alívio ou ações terapêuticas do produto e sua
classificação(similar/genérico); j. deverá ser cuidadosa e verdadeira
quanto ao uso da palavra escrita ou falada bem como de efeitos visuais. A
escolha de palavras deverá corresponder a seu significado como
geralmente compreendido pelo grande público.
Quanto à RDC 102, a propaganda de Doril estaria infringindo o Art. nº
10, I ao estimular e/ou induzir o uso indiscriminado do medicamento (por prometerr
cura imediata) e Art. n10º, IV ao sugerir ou estimular diagnósticos. Mas vale lembrar
que, ao ler atentamente todos os artigos, e ver claramente a propaganda, assim como
o slogan enquadrado em várias possibilidades de proibição, ainda assim, não se pode
afirmar que o slogan de Doril, localizado em taxidoor é totalmente enganoso, exceto
(que não explicitamente colocado na RDC 102) que a rima utilizada e o uso da
metáfora acabam por prometer o que, provavelmente, não se pode cumprir. Até
porque, é uma frase subjetiva e a dor pode sumir para algumas pessoas enquanto para
outras não. Fato esse mostra que existe problema na formulação da RDC102, a
exemplo do que apontam alguns estudiosos no assunto (Fernando Lefèvre, José
Ruben Bonfim, Nascimento e outros), tornando-a muitas vezes polêmica e pouco
eficiente.
199
CONCLUSÃO
A partir desta tese, conclui-se que, no estudo dos slogans, existem
algumas particularidades, em especial a objetividade. O slogan na propaganda
enquanto frase, portanto verbal, apesar de conciso, é acima de tudo persuasivo e tenta
ser marcante, gerando impacto, buscando a possível repetição por meio da mídia de
massa que o legitima ou através da propaganda boca a boca, tornando-se repetível,
conforme cita Olivier Reboul (O Slogan, 1975).
É possível, por meio de estudo transdisciplinar, conhecer o slogan em
diferentes pensamentos, a fim de compreender as intenções e, sobretudo, as
diferentes vozes presentes em áreas de conhecimento distintas ou aparentemente
distintas, o que enriquece a pesquisa e promove discussões pertinentes. A pesquisa
em comunicação, saúde e semiótica não tem fronteiras, como as próprias imagens
que ilustraram ou fizeram parte da análise do estudo mostraram.
Por meio das ferramentas oferecidas pela semiótica, em especial a
proposta por C.S.Peirce, foi possível compreender a importância da linguagem verbal
e visual, sobretudo a linguagem persuasiva do slogan na propaganda de
medicamentos, utilizada por Gelmax e Doril, respectivamente, analisados enquanto
medicamentos de venda livre em outdoor e taxidoor, em São Paulo (em 2006,
quando ainda era permitida a existência desse tipo de mídia na cidade, proibida por
lei municipal).
Reconhecendo-se que existem regulações em relação à propaganda de
medicamentos no Brasil, tanto na utilização da linguagem verbal quanto na
linguagem visual (RDC 102/ANVISA e ANEXO I/CONAR), nota-se que o que não
existe, muitas vezes, é o cumprimento das mesmas, tampouco fiscalização suficiente
200
dos órgãos que regulam esse tipo de propaganda. A punição, ou seja, a multa a quem
desrespeita as leis é irrisória, o que acaba por permitir a ilegalidade. Nesse sentido, a
indústria farmacêutica utiliza o slogan de medicamentos, sobretudo os de venda
livre, também conhecidos por OTC ou isentos de prescrição médica, ainda nos
moldes dos primeiros slogans criados para os medicamentos no início da propaganda
no Brasil, quando, na ausência de regulações, a propaganda era elaborada por poetas
e escritores, os redatores publicitários daquela época e ilustradores que exerciam a
função do que hoje provavelmente seria o diretor de arte.
Na verdade, porém, um longo tempo se passou e, apesar da herança
cultural do brasileiro em utilizar ervas e remédios para se curar e de nos slogans
ainda existirem expressões e rimas, atualmente a propaganda de medicamentos não é
mais elaborada por poetas ou artistas plásticos, mas sim elaborada por profissionais
de criação publicitária que, comumente, tentam “dar um jeitinho” para que a
mensagem verbal e/ou visual na propaganda de medicamentos, não seja considerada
abusiva ou enganosa.
A indústria farmacêutica, responsável por pesquisas importantes na área
da saúde, não mede esforços em ações de marketing, investindo na propaganda, sua
principal aliada junto à mídia de massa. O medicamento é considerado, tanto pela
indústria como pelo olhar da propaganda, produto comum. O doente, geralmente
fragilizado, é tido como consumidor qualquer, fato que assusta pesquisadores e
autoridades, uma vez que a saúde de uma população não deveria estar nas mãos da
lógica comercial.
Saúde de um país que se mostra em fase de desenvolvimento econômico,
mas que presencia na própria mídia que propaga medicamentos, números de um
consumo desenfreado de medicamentos, gerando um alto índice de automedicação e,
201
ao mesmo tempo, de mortes em filas de postos de saúde e hospitais por excesso ou
falta de medicamentos.
Dez anos depois do primeiro encontro entre criatura e criadora, pesquisa
e pesquisadora, chega-se à conclusão de que este estudo envolveu tempo, vontade,
pesquisa e muita persistência e que, pela complexidade do assunto e sua
contemporaneidade, não deve se esgotar aqui.
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http://hygeia.fsp.usp.br/~flefevre/Discurso_sujeito_coletivo.htm. Acesso em: 10 set.
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http://www.conar.org.br/ .Acesso em: 10 jun. 2007.
214
http://www.scielosp.org. Acesso em: 17 dez. 2007.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_abstract&pid=S1413-
81232007000500031&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 12 nov. 2007.
www.olharvital.ufrj.br/aut/2006_05_25/materia_faceseinterfaces.htm. Acesso em: 02
set. 2006.
http://www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRedirect?temp=0&proj=Port
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http://www.cremesp.com.br/Edição 222. Acesso em: 23 fev. 2006.
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http://mantecorp.tv1.com.br/Principal/Consumidores/Produtos/Identifique.aspx?c=90
Acesso em: 20 nov. 2007.
http://www.pfizer.com.br/pesquisa_bib_home.asp. Acesso em: 20 jun. 2007.
http://www.roche.com.br/Company/default_PT.htm Acesso em: 22 out. 2007.
http://www.bayer.com.br/bsa/home.nsf/DocsBySubject/03256C6B004D580503256C
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. Acesso em: 10 jan. 2006.
http://www.sindusfarma.org.br/ Acesso em: 22 fev. 2007.
http://www.novartis.com.br/_sua_saude/index.shtml. Acesso em: 05 jul. 2007.
215
http://www.gazetamercantil.com.br/ Acesso diário desde nov. 2006.
http://www.meioemensagem.com.br/ Acesso diário desde out. 2005.
http://www.folha.uol.com.br/ Acesso diário desde jan. 2006.
216
ANEXOS
Anexo 1
RESOLUÇÃO-RDC N" 102, DE 30 DE NOVEMBRO DE 2000
A Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária no uso da
atribuição que lhe confere o art. 11 inciso IV do Regulamento da Agência Nacional
de Vigilância Sanitária aprovado pelo Decreto n° 3.029, de 16 de abril de 1999, c/c o
artigo 8°, IV do Regimento Interno aprovado pela Portaria n° 593 de 25 de Agosto de
2000, em reunião realizada em 29 de novembro de 2000, Considerando a Lei n° .
6.360 de 23 de setembro de 1976 publicada no DOU de 24 de setembro de 1976;
Considerando a Medida Provisória 2.039-22/2000; considerando a Constituição
Federal de 1988; considerando o disposto na Lei 9782, de 26 de janeiro de 1999;
considerando o Decreto n.° 79.094, de 5 de janeiro de 1977, que regulamenta a Lei
n° 6360, de 24 de setembro de 1976; considerando a Lei n°.6.368, de 21 de outubro
de 1976; considerando o Decreto n° 78.992, de 21 de dezembro de 1976, que
regulamenta a Lei n° 6368, de 21 de outubro de 1976; considerando a Lei n° 6.437,
de 20 de agosto de 1977, sobre infrações sanitárias; alterada pela Lei n° 9005 de 16
de março de 1995 e pela Lei n° 9.695 de 20/08/1998, DOU de 21/08/1998;
considerando a Lei n° 9.294 de 15 de julho de 1996; considerando o Decreto nº
2.018, de 0l de outubro de 1996 que regulamentar Lei n° 9294, de 15 de julho de
1996: considerando a M.P. n° 1.814, de 26 d.e fevereiro de 1999; considerando o art.
3° da M.P. n° 1912-10, de 25 de novembro de l999; considerando a Lei n° 8078, de
11 de setembro de 1990; considerando Decreto n° 2.181, de 20 de março de 1997;
adotou a seguinte Resolução de Diretoria Colegiada e eu, Diretor-Presidente,
determino a sua publicação.
Art.1º Aprovar o Regulamento sobre propagandas, mensagens publicitarias e
promocionais e outras práticas cujo objeto seja a divulgação, promoção ou
comercialização de medicamentos de produção nacional ou importados, quaisquer
que sejam as formas e meios de sua veiculação, incluindo as transmitidas no decorrer
da programação normal das emissoras de rádio ë televisão.
Art.2º A inobservância do disposto nesta Resolução configura infração de natureza
sanitária, sujeitando os infratores às penalidades previstas na Lei n° 6.437; de 1977,
sem prejuízo de outras sanções de natureza civil ou penal cabíveis.
Art. 3° Esta Resolução de Diretoria Colegiada entra em vigor na data de sua
publicação.
GONZALO VECINA NETO
ANEXO I
REGULAMENTO
Art.1º Este Regulamento se aplica às propagandas mensagens publicitarias e
promocionais e outras práticas cujo objeto seja a divulgação, promoção e/ou
217
comercialização de medicamentos, de produção nacional ou importados, quaisquer
que sejam suas formas e meios de veiculação incluindo as transmitidas no decorrer
da programação normal das emissoras de rádio e televisão.
TÍTULO I
REQUISITOS GERAIS
Art. 2° Para efeito deste regulamento são adotadas as seguintes definições: *
MENSAGEM RETIFICADORA é a que corrige ou emenda erros, equívocos,
enganos ou o que não se mostra certo ou exato e recompõe a verdade, segundo as
normas impostas por este regulamento.
PRÊMIO - refere-se a tudo aquilo que se recebe ou se ganha em razão de trabalho
executado e/ou serviço prestado.
PROMOÇÃO - é um conjunto de atividades informativas é de persuasão,
procedentes de empresas responsáveis pela produção e/ou manipulação, distribuição,
comercialização, órgãos de comunicação e agências de publicidade com o objetivo
de induzir a prescrição, dispensação, aquisição e utilização de medicamentos .
PROPAGANDA/PUBLICIDADE conjunto de técnicas utilizadas com objetivo de
divulgar conhecimentos e/ou promover adesão a princípios; ideias ou teorias ,
visando exercer influência sobre o público através de ações que objetivem promover
determinado medicamento com fins comerciais.
PROPAGANDA/PUBLICIDADE/PROMOÇÃO - ABUSIVA são aquelas que
incitam discriminação de qualquer natureza, a violência, exploram o medo ou
superstições, se aproveitem de deficiência de julgamento e experiência da criança,
desrespeite valores ambientais, ou que sejam capazes de induzir o usuário a se
comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança.
PROPAGANDA/PUBLICIDADE/PROMOÇÃO ENGANOSA qualquer modalidade
de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa,
ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, que seja capaz de induzir em erro
o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade,
propriedades; origem, preço e quaisquer outros dados sobre medicamentos,
Art. 3° Na propaganda, mensagens publicitárias e/ou outras práticas cujo objeto seja
a promoção de medicamentos, devem ser cumpridos os requisitos gerais, sem
prejuízo dos que particularmente se estabeleçam para determinados tipos de
medicamentos, sendo exigido:
I - constar, em português, de forma clara. e precisa a contra-indicação principal, se
for o caso, tal como foi registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária; *
II - Os mesmos requisitos do inciso I, aplicam-se às formulações oficinais, tendo
como embasamento técnico-científico a literatura nacional e internacional
oficialmente reconhecida e relacionada em anexo.
Art. 4° É vedado:
I - anunciar medicamentos não registrados pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária nos casos exigidos por lei;
II - realizar comparações, de forma direta e/ou indireta, que não estejam baseadas em
informações comprovadas por estudos clínicos veiculados em publicações indexadas;
III - anunciar o mesmo medicamento como novo, depois de transcorridos dois anos
da data de início de sua comercialização, exceto novas apresentações ou novas
indicações terapêuticas registradas junto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária;
IV - provocar temor; angústia e/ou sugerir que a saúde de uma pessoa será ou poderá
ser afetada por não usar o medicamento;
V - discriminar, por motivos de nacionalidade, sexo, raça, religião e outros;
218
VI - publicar mensagens tais como: "Aprovado", "Recomendado por especialista",
"Demonstrado em ensaios clínicos" ou "Publicidade Aprovada pela Vigilância
Sanitária" ; pelo "Ministério da Saúde", ou órgão congênere Estadual, Municipal e
Distrito Federal, exceto nós casos especificamente determinados pela Agência
Nacional de Vigilância
Sanitária;
VII - sugerir diminuição de risco, em qualquer grau, salvo nos casos em que tal
diminuição de risco conste explicitamente das indicações ou propriedades aprovadas
no ato de registro junto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e, mesmo nesses
casos, apenas em publicações dirigidas aos profissionais de saúde;
VIII - incluir mensagens, verbais e não verbais, que mascarem as indicações reais
dos medicamentos registrados junto a Agência Nacional de Vigilância Sanitária;
IX - atribuir propriedades curativas ao medicamento quando este é destinado -
conforme registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - apenas ao
tratamento sintomático e/ou ao controle de doenças crônicas;
X - sugerir ausência de efeitos colaterais ou adversos ou utilizar expressões tais
como: "inócuo", "seguro" ou " produto natural", exceto nos casos registrados na
Agência Nacional de Vigilância Sanitária;
Art. 5° Tendo em vista a especificidade do meio de comunicação, denominado
"Internet", a de mundial de computadores, a promoção de medicamentos pelo
referido meio deverá observar os seguintes requisitos, além dos demais previstos
neste regulamento:
a) é vedada a veiculação de propaganda, publicidade e promoção de medicamentos
de venda sob prescrição, exceto quando acessíveis exclusivamente a profissionais
habilitados prescrever ou dispensar medicamentos;
b) na veiculação da propaganda e publicidade de medicamentos de venda sem
exigência de prescrição devem constar da mensagem publicitária a identidade do
fornecedor e seu "endereço geográfico".
Art. 6° As informações veiculadas pelo Serviço de Atendimento ao Consumidor
deverão respeitar as normas do presente regulamento e demais normas aplicáveis.
Art. 7° O programa de fidelização, dirigido ao consumidor, é permitido dentro dos
seguintes critérios: *
I - não vise estimular a venda, prescrição e/ou dispensação de medicamentos; *
II - mediante anuência prévia da ANVISA; *
III - no momento de solicitação da anuência prévia, a empresa deverá apresentar à
ANVISA, um sistema informatizado que garanta a dispensação de medicamentos de
venda sob prescrição somente mediante a apresentação de receita médica;
IV - os pontos acumulados no programa devem corresponder ao valor total da nota
fiscal.*
Art. 8° A propaganda de descontos nos preços de medicamento de venda sem
exigência de prescrição nas suas variadas formas (faixas, panfletos, outdoors e
outros), deverá conter o nome do produto; DCB/DCI e o seu preço podendo ser
acrescentado o nome do fabricante.
Parágrafo único: É vedada a propaganda, publicidade ou promoção, ao público leigo,
de descontos para medicamentos de venda sob prescrição.
TITULO II
REQUISITOS PARA MEDICAMENTOS DE VENDA SEM EXIGÊNCIA DE
PRESCRIÇÃO
219
Art. 9° Qualquer tipo de propaganda; publicidade ou promoção de medicamento
dirigida ao público em geral deve ser realizada de maneira que resulte evidente o
caráter promocional da mensagem e deve sujeitar-se às disposições legais descritas
neste regulamento técnico.
Parágrafo único: As comunicações dirigidas aos profissionais de saúde, veiculadas
em meios de comunicação de massa, verbais ou não verbais, consideram-se
propaganda, devendo submeter-se ás disposições legais descritas neste regulamento
técnico.
Art. 10 Na propaganda, publicidade e promoção de medicamentos de venda sem
exigência de prescrição é vedado:
I - estimular e/ou induzir o uso indiscriminado de medicamentos e/ou emprego de
dosagens e indicações que não constem no registro do medicamento junto a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária;
II - incluir mensagens de qualquer natureza dirigidas a crianças ou adolescentes;
conforme classificação do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como utilizar
símbolos e imagens com este fim;
III - promover ou organizar concursos, prometer ou oferecer bonificações financeiras
ou prêmios condicionados à venda de medicamentos; *
IV - sugerir ou estimular diagnósticos aconselhando um tratamento correspondente,
sendo admitido apenas que sejam utilizadas frases ou imagens que definam em
termos científicos ou leigos a indicação do medicamento para sintomas isolados;
V - afirmar que um medicamento é "seguro", "sem contra-indicações"; "isento de
efeitos secundários ou riscos de uso" ou usar expressões equivalentes; *
VI - afirmar que o medicamento é um alimento, cosmético ou outro produto de
consumo, da mesma maneira que nenhum alimento, cosmético ou outro produto de
consumo possa mostrar ou parecer tratar-se de um medicamento;
VII - explorar enfermidades, lesões ou deficiências de forma grotesca, abusiva ou
enganosa, sejam ou não decorrentes do uso de medicamentos;
VIII - afirmar e/ou sugerir ter um medicamento efeito superior a outro usando
expressões tais como: "mais eficaz", "menos tóxico" , ser a única alternativa possível
dentro da categoria ou ainda utilizar expressões, como: "o produto", "o de maior
escolha", "o único" , "o mais freqüentemente recomendado", "o melhor". As
expressões só poderão ser. utilizadas se comprovadas por evidências científicas, e
previamente aprovadas pela ANVISA; *
IX - afirmar e/ou sugerir ter um medicamento efeito superior a outro usando
expressões tais como: "mais efetivo", "melhor tolerado". As expressões só poderão
ser utilizadas se comprovadas por evidências científicas, e previamente aprovadas
pela ANVISA; *
X - usar de linguagem direta ou indireta relacionando o uso de medicamento ao
desempenho físico, intelectual, emocional, sexual ou a beleza de uma pessoa, exceto
quando forem propriedades aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária;
XI - sugerir que o medicamento possua características organolépticas agradáveis tais
como: "saboroso", "gostoso", "delicioso" ou expressões equivalentes.
Art. 11 No caso específico de ser mencionado nome e/ou imagem de profissional
como respaldo das propriedades anunciadas do medicamento, é obrigatório constar
na mensagem publicitária o nome do profissional interveniente, seu número de
matricula no respectivo conselho ou outro órgão de registro profissional.
220
Art. 12 A propaganda, publicidade e promoção de medicamento de venda sem
exigência de prescrição deverão incluir, além das informações constantes no inciso I
do artigo 3° desta regulamentação:
a) o nome comercial do medicamento; o numero de registro na Agência Nacional de
Vigilância Sanitária e o nome dos princípios ativos segundo a DCB e na sua falta a
DCI;
b)as advertências: "AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MEDICO DEVERA
SER CONSULTADO". A inclusão da mensagem deverá respeitar as seguintes
regras: *
§ 1° No rádio, a advertência será veiculada imediatamente após o término da
mensagem publicitária e terá locução diferenciada, cadenciada e perfeitamente
audível.
§ 2° Na televisão, cinema e assemelhados serão observado:
a) após o término da mensagem publicitária, a advertência será exibida em cartela
única, com fundo azul em letras brancas, de forma a permitir a perfeita legibilidade e
visibilidade, permanecendo imóvel no vídeo;
b) a cartela obedecerá ao gabarito RTV de filmagem no tamanho padrão de
36,5cmx27cm (trinta e reis e meio centímetros por vinte e sete );
c) as letras apostas na cartela serão de família tipográfica Univers, variação Medium,
corpo 38, caixa alta;
d) toda propaganda de medicamentos conterá obrigatoriamente a advertência
indicando que "AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER
CONSULTADO". *
§ 3° Nas placas luminosas, nos painéis eletrônicos e na Internet serão observados os
itens a, b e c constantes do parágrafo 2º;
§ 4° Nos painéis, cartazes, munidores, jornais, revistas ou qualquer outra forma de
mídia impressa, os textos advertência serão escritos em letras de cor preta, padrão
Univers 65 bold, sendo impresso sobre retângulo branco com um filete interno
emoldurando a advertência sendo observado o seguinte:
CARTAZES, CARTAZETES, PAINÉIS
0 a 250 cm2 Corpo 16
251 a 500 cm2 Corpo 20
501 a 1000 cm2 Corpo 24
1001 a 1500 cm2 Corpo 26
1501 a 2000 cm2 Corpo 30
2001 a 3000 cm2 Corpo 36
3001 a 4000 cm2 Corpo 40
4001 a 5000 cm2 Corpo 48
REVISTAS
Páginas Dupla/Página simples Corpo 12
221
½ Página Corpo 8
¼ Página Corpo 4
JORNAIS
Tamanho Padrão
1 Página Corpo 24
½ Página Corpo 16
¼ Página Corpo 8
Tamanho Tablóide
1 Página Corpo 16
½ Página Corpo 10
¼ Página Corpo 8
a) Qualquer tamanho não especificado nos itens relacionados a revistas e jornais será
proporcionalizado tomando-se por base a definição para 1/4 de página.
REQUISITOS PARA MEDICAMENTOS DE VENDA SOB PRESCRIÇÃO
Art. 13 Qualquer propaganda, publicidade ou promoção de medicamentos de venda
sob prescrição, fica restrita aos meios de comunicação dirigida, destinados
exclusivamente aos profissionais de saúde habilitados a prescrever ou dispensai tais
produtos e devem incluir:
I - informações essenciais compativeis.com as registradas junto a Agência Nacional
de Vigilância Sanitária como:
a) o nome comercial do medicamento, se houver;
b) o nome do princípio ativo segundo a DCB - na sua falta a DCI o nome genérico e
o número de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária ;
c) as indicações;
d) as contra-indicações;
e) os cuidados e advertências (incluindo as reações adversas mais frequentes e
interações medicamentosas);
f) a posologia.
II - a classificação do medicamento em relação à prescrição e dispensação.
Art. 14 É vedada a veiculação de propaganda e publicidade de medicamentos sujeitos
à prescrição dirigida a proprietários de farmácias não farmacêuticos, balconistas ou
outras pessoas não habilitadas para dispensação de medicamentos.
Art. 15 As citações, tabelas ou outras ilustrações extraídas de publicações científicas
utilizadas em qualquer propaganda, publicidade ou promoção, devem ser fielmente
reproduzidas e especificar a referência bibliográfica completa.
Art. 16 Quando se tratar de medicamento genérico, de acordo com a Lei 9.787/99 e
suas regulamentações, deverá haver a inclusão da frase: "medicamento genérico - Lei
9.787/99".
222
Art. 17 Quando se tratar de medicamento à base de substâncias sujeitas a controle
especial deverão ser respeitadas as limitações e advertências previstas na legislação
sanitária em vigor.
REQUISITOS PARA VISITAS DE PROPAGANDISTA DE PRODUTOS
FARMACÊUTICOS
Art. 18 Os representantes dos laboratórios devem transmitir informações precisas e
completas sobre os medicamentos que representem no decorre da ação de
propaganda promoção é publicidade junto aos profissionais de saúde habilitados a
prescrever e dispensar.
Parágrafo único. Em suas ações de promoção, propaganda e publicidade, os
representantes aludidos no caput deste artigo devem limitar-se às informações
científicas e características do medicamento registradas junto a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária.
Art. 19 É proibido outorgar, oferecer ou prometer, prêmios, vantagens pecuniárias ou
em espécie, aos profissionais de saúde habilitados a prescrever ou dispensar
medicamentos, bem como aqueles que exerçam atividade de venda direta ao
consumidor.
Parágrafo único: Os profissionais de saúde habilitados a prescrever ou dispensar
medicamentos, bem como aqueles de atividade de venda direta de medicamentos ao
consumidor, não podem solicitar ou aceitar nenhum dos incentivos indicados no
caput deste artigo se estes estiverem vinculados a prescrição, dispensação ou venda.
Art. 20 O patrocínio por um laboratório fabricante ou distribuidor de medicamentos,
de quaisquer eventos públicos ou privados, simpósios, congressos, reuniões,
conferências é assemelhados seja ele parcial ou total, deve constar em todos os
documentos de divulgação ou resultantes e conseqüentes ao respectivo evento.
§ 1° Qualquer apoio aos profissionais de saúde, para participar de encontros,
nacionais ou internacionais, não deve estar condicionado à promoção de algum tipo
de medicamento ou instituição e deve constar claramente nos documentos referidos
no caput desse artigo.
§ 2° Todo palestrante patrocinado pela indústria deverá fazer constar o nome do seu
patrocinador no material de divulgação do evento.
Art. 21 A distribuição de amostras grátis somente poderá ser feita em embalagens,
com apresentação de no mínimo 50% do conteúdo da original aprovadas pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária, destinadas exclusivamente aos
profissionais habilitados a prescrever ou dispensar medicamentos.
§ 1° A distribuição de que trata o caput deste artigo deverá ser realizada em
embalagens contendo a seguinte expressão: " AMOSTRA GRÁTIS" , em destaque
com os caracteres nunca inferior a 70% do tamanho do nome comercial ou, na sua
falta, da DCB/DCI em tonalidades contrastantes ao padrão daquelas, inseridos no
segundo terço da embalagem secundária e em cada unidade farmacêutica da
embalagem primária.
§ 2° Deve constar da rotulagem da amostra grátis o número de lote e a empresa deve
manter atualizado e disponível à Agência Nacional de Vigilância Sanitária seu
quadro de distribuição por um período mínimo de 2 anos.
§ 3° A distribuição de amostras grátis de medicamentos à base de substâncias sujeitas
a controle especial, dar-se-á mediante os dispositivos regulamentados na legislação
sanitária vigente.
DISPOSIÇÕES GERAIS
223
Art. 22 Fica estabelecido o prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de
publicação deste regulamento, para as empresas responsáveis pela produção,
distribuição e comercialização, órgãos de comunicação e agências de publicidade se
adequarem às novas disposições objeto desta republicação, abaixo citadas: *
a) artigo 3°, I;
b) artigo 7°;
c) artigo 7°, I;
d) artigo 7°, II;
e) artigo 7°, III;
f) artigo 7°, IV;
g) artigo 10, III;
h) artigo 10, V;
i) artigo 10, VIII;
j) artigo 10, IX;
k) artigo 12, b;
1) artigo 12, § 2°, d;
m) artigo 21, § t°;
n) artigo 22.
Parágrafo único. No caso de descumprimento do disposto no caput deste artigo, as
matérias terão a sua veiculação suspensa e qualquer outra referente ao produto, no
prazo de 90 dias, só poderá ser veiculada após autorização da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária, independentemente de outras sanções aplicáveis.
Art. 23 É permitida a propaganda de medicamentos genéricos em campanhas
publicitárias patrocinadas pelo Ministério da Saúde e nos recintos dos
estabelecimentos autorizados a dispensá-los, com indicação do medicamento de
referência.
Art. 24 No caso de ser submetida a análise por parte da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária, o titular do produto ou o representante da empresa deverá
manter em seu poder à disposição da Autoridade Sanitária, pelo prazo de 05(cinco)
anos, a documentação técnica e/ou científica que autorize a propaganda, publicidade
ou promoção.
Art. 25 A inobservância ou desobediência ao disposto neste regulamento, configura
infração de natureza sanitária sujeitando 0 infrator ao processo, penalidades e
sanções previstas na Lei 6437, de 20 de agosto de 1977, e em outros específicos.
§ 1° Quando configurada a infração de que trata o "caput" deste artigo, a autoridade
sanitária autuante poderá determinar à empresa responsável pelo medicamento que
publique mensagem retificadora ocupando os mesmos espaços na mídia.
§ 2° Quando configurada a inflação de que trata o "caput" deste artigo, a autoridade
sanitária autuante poderá notificar o Ministério Público Federal do local da sede do
meio de comunicação utilizado.
ANEXO II
LITERATURAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS OFICIALMENTE
RECONHECIDAS
FARMACOPÉIA BRASILEIRA
FARMACOPÉIA BRITÂNICA
FARMACOPÉIA EUROPEIA
224
FARMACOPÉIA NÓRDICA
FARMACOPÉIA JAPONESA
UNITED STATES PHARMACOPEIA
USP NATIONAL FORMULARY
MARTINDALE, WILLIAN
EXTRA PHARMACOPÉIA
DICTIONAIRE VIDAL
EDITIONS DU VIDAL
REMINGTON FARMÁCIA
EDITORIAL MÉDICA PANAMERICANA
REVISTAS INDEXADAS
USP DI INFORMACION DE MEDICAMENTOS
WASHINGTON – OPAS
225
Anexo 2
ANEXO "I" - Produtos Farmacêuticos Isentos de Prescrição
A publicidade dos produtos submetidos a este Anexo observará as normas
específicas que se seguem, as quais complementam as normas gerais deste Código.
Para os efeitos deste Anexo, são considerados produtos farmacêuticos isentos de
prescrição, também conhecidos como medicamentos populares ou OTC - over the
counter -, aqueles cuja venda, nos termos da lei, está dispensada da apresentação de
receita emitida por Médicos e Cirurgiões-Dentistas.
1. A embalagem, rotulagem e publicidade de medicamentos populares deverão estar
em conformidade com a legislação pertinente:
a. entende-se por embalagem todo invólucro, recipiente ou qualquer forma de
acondicionamento, removível ou não, destinado a cobrir, empacotar, envasar,
proteger ou manter, especificamente ou não, os produtos de que trata este Anexo;
b. entende-se por rotulagem qualquer identificação por palavras ou ilustrações
presentes na embalagem.
2. A publicidade de medicamentos populares:
a. não deverá conter nenhuma afirmação quanto à ação do produto que não seja
baseada em evidência clínica ou científica;
b. não deverá ser feita de modo a sugerir cura ou prevenção de qualquer doença que
exija tratamento sob supervisão médica;
c. não deverá ser feita de modo a resultar em uso diferente das ações terapêuticas
constantes da documentação aprovada pela Autoridade Sanitária;
d. não oferecerá ao consumidor prêmios, participação em concursos ou recursos
semelhantes que o induzam ao uso desnecessário de medicamentos;
e. deve evitar qualquer inferência associada ao uso excessivo do produto;
f. não deverá ser feita de modo a induzir ao uso de produtos por crianças, sem
supervisão dos pais ou responsáveis a quem, aliás, a mensagem se dirigirá com
exclusividade;
g. não deverá encorajar o Consumidor a cometer excessos físicos, gastronômicos ou
etílicos;
226
h. não deverá mostrar personagem na dependência do uso contínuo de medicamentos
como solução simplista para problemas emocionais ou estados de humor;
i. não deverá levar o Consumidor a erro quanto ao conteúdo, tamanho de embalagem,
aparência, usos, rapidez de alívio ou ações terapêuticas do produto e sua
classificação (similar/genérico);
j. deverá ser cuidadosa e verdadeira quanto ao uso da palavra escrita ou falada bem
como de efeitos visuais. A escolha de palavras deverá corresponder a seu significado
como geralmente compreendido pelo grande público;
k. não deverá conter afirmações ou dramatizações que provoquem medo ou
apreensão no Consumidor, de que ele esteja, ou possa vir, sem tratamento, a sofrer de
alguma doença séria;
l. deve enfatizar os usos e ações do produto em questão. Comparações injuriosas com
concorrentes não serão toleradas. Qualquer comparação somente será admitida
quando facilmente perceptível pelo Consumidor ou baseada em evidência clínica ou
científica. Não deverão ser usados jargões científicos com dados irrelevantes ou
estatísticas de validade duvidosa ou limitada, que possam sugerir uma base científica
que o produto não tenha;
m. não deverá conter qualquer oferta de devolução de dinheiro pago ou outro
benefício, de qualquer natureza, pela compra de um medicamento em função de uma
possível ineficácia;
n. a publicidade de produto dietético deve submeter-se ao disposto neste Anexo e, no
que couber, nos anexos "G" e "H". Não deverá incluir ou mencionar indicações ou
expressões, mesmo subjetivas, de qualquer ação terapêutica.
3. A referência a estudos, quer científicos ou de consumo, deverá sempre ser baseada
em pesquisas feitas e interpretadas corretamente.
4. Qualquer endosso ou atestado, bem como a simples referência a profissionais,
instituições de ensino ou pesquisa e estabelecimentos de saúde, deverá ser suportada
por documentação hábil, exigível a qualquer tempo.
5. A publicidade de medicamentos não oferecerá a obtenção de diagnóstico à
distância.
6. Não conterá afirmações injuriosas às atividades dos profissionais de saúde ou ao
valor de cuidados ou tratamentos destes.
7. Quando oferecer a venda do produto por meio de telefone ou endereço eletrônico,
deverá explicitar a razão social e o endereço físico do anunciante a fim de facilitar
ação fiscalizatória e reclamações.
Código e Anexos
São Paulo, 1º de outubro de 2003.
227
Anexo 3
O MANIFESTO DA TRANSDISCIPLINARIDADE
Considerando que a proliferação atual das disciplinas acadêmicas e não acadêmicas
leva a um crescimento exponencial do saber, o que torna impossível qualquer visão
global do ser humano,
Considerando que somente uma inteligência capaz de abarcar a dimensão planetária
dos conflitos atuais poderá enfrentar a complexidade de nosso mundo e o desafio
contemporâneo da autodestruição material e espiritual de nossa espécie,
Considerando que a vida esta fortemente ameaçada por uma tecnociência triunfante,
que obedece apenas à lógica assustadora da eficácia pela eficácia,
Considerando que a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais
acumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva a uma ascensão de um
novo obscurantismo, cujas conseqüências no plano individual e social são
incalculáveis,
Considerando que o crescimento dos saberes, sem precedente na história, aumenta a
desigualdade entre aqueles que os possuem e aqueles que deles são desprovidos,
gerando assim desigualdades crescentes no seio dos povos e entre as nações de nosso
planeta,
Considerando ao mesmo tempo que todos os desafios enunciados tem sua
contrapartida de esperança e que o crescimento extraordinário dos saberes pode
levar, a longo prazo, a uma mutação comparável à passagem dos hominídeos à
espécie humana,
Considerando o que precede, os participantes do Primeiro Congresso Mundial de
Transdisciplinaridade (Convento de Arrábida, Portugal, 2-7 de novembro de 1994)
adotaram a presente Carta, que contém um conjunto de princípios fundamentais da
comunidade dos espíritos transdisciplinares, constituindo um contrato moral que todo
signatário desta Carta faz consigo mesmo, sem qualquer pressão jurídica e
institucional.
ARTIGO 1- Qualquer tentativa de reduzir o ser humano a uma definição e de
dissolvê-lo em estruturas formais, quaisquer que sejam, é incompatível com a visão
transdisciplinar.
ARTIGO 2- O reconhecimento da existência de diferentes níveis de Realidade,
regidos por lógicas diferentes, é inerente à atitude transdisciplinar. Toda tentativa de
reduzir a Realidade a um único nível, regido por uma única lógica, Não se situa no
campo da transdisciplinaridade.
ARTIGO 3- A transdisciplinaridade é complementar à abordagem disciplinar; ela faz
emergir do confronto das disciplinas novos dados que as articulam entre si; e ela nos
oferece uma visão da Natureza e da Realidade. A transdiciplinaridade não busca o
domínio de várias disciplinas, mas a abertura de todas àquilo que as atravessa e as
ultrapassa.
228
ARTIGO 4- O ponto de sustentação da transdiciplinaridade reside na unificação
semântica e operativa das acepções através e além das disciplinas. Ela pressupõe uma
racionalidade aberta, mediante um novo olhar sobre a relatividade das noções de
definição e de objetividade. O formalismo excessivo, a rigidez das definições e o
exagero da objetividade, incluindo a exclusão do sujeito, levam ao empobrecimento.
ARTIGO 5- A visão trandisciplinar é resolutamente aberta na medida que ultrapassa
o campo das ciências exatas devido ao seu diálogo e sua reconciliação, não apenas
com as ciências humanas, mas também com a arte,a literatura, a poesia e a
experiência interior.
ARTIGO 6- Com relação à interdisciplinaridade e à multidisciplinaridade, a
transdisciplinaridade é multireferencial e multidimensional. Embora levando em
conta os conceitos de tempo e de História, a transdisciplinaridade não exclui a
existência de um horizonte trans-histórico.
ARTIGO 7- A transdiciplinariedade não constitui nem uma nova religião, nem uma
nova filosofia, nem uma nova metafísica, nem uma ciência das ciências.
ARTIGO 8- A dignidade do ser humano é também de ordem cósmica e planetária. O
aparecimento do ser humano sobre a Terra é uma das etapas da história do Universo.
O reconhecimento da Terra como pátria é um dos imperativos da
transdisciplinaridade. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade, mas, a
título de habitante da Terra, ele é ao mesmo tempo um ser transnacional. O
reconhecimento pelo direito internacional da dupla cidadania - referente a uma nação
e a Terra- constitui um dos direitos da pesquisa transdisciplinar.
ARTIGO 9- A transdisciplinaridade conduz a uma atitude aberta em relação aos
mitos e religiões e aqueles que os respeitam num espírito transdisciplinar.
ARTIGO 10- Não existe um lugar cultural privilegiado de onde se possa julgar as
outras culturas. A abordagem transdisciplinar é ela própria transcultural.
ARTIGO 11- Uma educação autêntica não pode privilegiar a abstração no
conhecimento. Ela deve ensinar a contextualizar, concretizar e globalizar. A
educação transdisciplinar reavalia o papel da intuição, do imaginário, da
sensibilidade e do corpo na transmissão dos conhecimentos.
ARTIGO 12- A elaboração de uma economia transdisciplinar está baseada no
postulado de que a economia deve estar a serviço do ser humano e não o inverso.
ARTIGO 13- A ética transdisciplinar recusa toda atitude que se negue ao diálogo e à
discussão, qualquer que seja sua origem - de ordem ideológica, cientificista,
religiosa, econômica, política, filosófica. O saber compartilhado deveria levar a uma
compreensão compartilhada, baseada no respeito absoluto das alteridades unidas pela
vida comum numa única e mesma Terra.
ARTIGO 14- Rigor, abertura e tolerância são as características fundamentais da
atitude e da visão transdisciplinares. O rigor na argumentação que leva em conta
229
todos os dados é a melhor barreira em relação aos possíveis desvios. A abertura
comporta a aceitação do desconhecido, do inesperado e do imprevisível. A tolerância
é o reconhecimento do direito às idéias e verdades contrárias às nossas.
Artigo Final - A presente Carta de Transdisciplinaridade foi adotada pelos
participantes do Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade e não
revindica nenhuma outra autoridade além de sua obra e sua atividade.
Convento de Arrábida, 6 de novembro de 1994
Comitê de Redação:
Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu
230
Anexo 4
PROJETO DE LEI Nº 379/06
Dispõe sobre a ordenação dos elementos que compõem a paisagem urbana do
Município de São Paulo.
A Câmara Municipal de São Paulo
D E C R E T A:
CAPÍTULO I
DOS OBJETIVOS, DIRETRIZES, ESTRATÉGIAS E DEFINIÇÕES
Art. 1º. Esta lei dispõe sobre a ordenação dos elementos que compõem a paisagem
urbana, visíveis a partir de logradouro público no território do Município de São
Paulo.
Art. 2º. Para fins de aplicação desta lei, considera-se paisagem urbana o espaço aéreo
e a superfície externa de qualquer elemento natural ou construído, tais como água,
fauna, flora, construções, edifícios, anteparos, superfícies aparentes de equipamentos
de infra-estrutura, de segurança e de veículos automotores, anúncios de qualquer
natureza, elementos de sinalização urbana, equipamentos de informação e
comodidade pública e logradouros públicos, visíveis por qualquer observador situado
em áreas de uso comum do povo.
Art. 3º. Constituem objetivos da ordenação da paisagem do Município de São Paulo
o atendimento ao interesse público em consonância com os direitos fundamentais
da pessoa humana e as necessidades de conforto ambiental, com a melhoria da
qualidade de vida urbana, assegurando, dentre outros, os seguintes:
I - o bem-estar estético, cultural e ambiental da população;
II - a segurança das edificações e da população;
III - a valorização do ambiente natural e construído;
IV - a segurança, a fluidez e o conforto nos deslocamentos de veículos e pedestres;
V - a percepção e a compreensão dos elementos referenciais da paisagem;
VI - a preservação da memória cultural;
VII - a preservação e a visualização das características peculiares dos logradouros e
das fachadas;
VIII - a preservação e a visualização dos elementos naturais tomados em seu
conjunto e em suas peculiaridades ambientais nativas;
IX - o fácil acesso e utilização das funções e serviços de interesse coletivo nas vias e
logradouros;
X - o fácil e rápido acesso aos serviços de emergência, tais como bombeiros,
ambulâncias e polícia;
XI - o equilíbrio de interesses dos diversos agentes atuantes na cidade para a
promoção da melhoria da paisagem do Município.
Art. 4º. Constituem diretrizes a serem observadas na colocação dos elementos que
compõem a paisagem urbana:
231
I - o livre acesso de pessoas e bens à infra-estrutura urbana;
II - a priorização da sinalização de interesse público com vistas a não confundir
motoristas na condução de veículos e garantir a livre e segura locomoção de
pedestres;
III - o combate à poluição visual bem como à degradação ambiental;
IV - a proteção, preservação e recuperação do patrimônio cultural, histórico, artístico,
paisagístico, de consagração popular, bem como do meio ambiente natural ou
construído da cidade;
V - a compatibilização das modalidades de anúncios com os locais onde possam ser
veiculados, nos termos desta lei;
VI - a implantação de sistema de fiscalização efetivo, ágil, moderno, planejado e
permanente.
Art. 5º. As estratégias para a implantação da política da paisagem urbana são as
seguintes:
I - a elaboração de normas e programas específicos para os distintos setores da
Cidade, considerando a diversidade da paisagem nas várias regiões que a compõem;
II - o disciplinamento dos elementos presentes nas áreas públicas, considerando as
normas de ocupação das áreas privadas e a volumetria das edificações que, no
conjunto, são formadoras da paisagem urbana;
III - a criação de novos padrões, mais restritivos, de comunicação institucional,
informativa ou indicativa;
IV - a adoção de parâmetros de dimensões, posicionamento, quantidade e
interferência mais adequados à sinalização de trânsito, aos elementos construídos e à
vegetação, considerando a capacidade de suporte da região;
V - o estabelecimento de normas e diretrizes para a implantação dos elementos
componentes da paisagem urbana e a correspondente veiculação de publicidade;
VI - a criação de mecanismos eficazes de fiscalização sobre as diversas intervenções
na paisagem urbana.
Art. 6º. Para os efeitos de aplicação desta lei, ficam estabelecidas as seguintes
definições:
I - anúncio: qualquer veículo de comunicação visual presente na paisagem visível do
logradouro público, composto de área de exposição e estrutura, podendo ser:
a) anúncio indicativo: aquele que visa apenas identificar, no próprio local da
atividade, os estabelecimentos e/ou profissionais que dele fazem uso;
b) anúncio publicitário: aquele destinado à veiculação de publicidade, instalado fora
do local onde se exerce a atividade;
c) anúncio especial: aquele que possui características específicas, com finalidade
cultural, eleitoral, educativa ou imobiliária, nos termos do disposto no artigo 19 desta
lei;
II - área de exposição do anúncio: a área que compõe cada face da mensagem do
anúncio, devendo, caso haja dificuldade de determinação da superfície de exposição,
ser considerada a área do menor quadrilátero regular que contenha o anúncio;
III - área livre de imóvel edificado: a área descoberta existente entre a edificação e
qualquer divisa do imóvel que a contém;
IV - área total do anúncio: a soma das áreas de todas as superfícies de exposição do
anúncio, expressa em metros quadrados;
232
V - bem de uso comum: aquele destinado à utilização do povo, tais como as áreas
verdes e institucionais, as vias e logradouros públicos, e outros;
VI - bem de valor cultural: aquele de interesse paisagístico, cultural, turístico,
arquitetônico, ambiental ou de consagração popular, público ou privado, composto
pelas áreas, edificações, monumentos, parques e bens tombados pela União, Estado e
Município, e suas áreas envoltórias;
VII - espaço de utilização pública: a parcela do espaço urbano passível de uso e
fruição pela população;
VIII – mobiliário urbano é o conjunto de elementos que podem ocupar o espaço
público, implantados, direta ou indiretamente, pela Administração Municipal, com as
seguintes funções urbanísticas:
a) circulação e transportes;
b) ornamentação da paisagem e ambientação urbana;
c) descanso e lazer;
d) serviços de utilidade pública;
e) comunicação e publicidade;
f) atividade comercial;
g) acessórios à infra-estrutura;
IX - fachada: qualquer das faces externas de uma edificação principal ou
complementar, tais como torres, caixas d’água, chaminés ou similares;
X - imóvel: o lote, público ou privado, edificado ou não, assim definido:
a) imóvel edificado: aquele ocupado total ou parcialmente com edificação
permanente;
b) imóvel não-edificado: aquele não ocupado ou ocupado com edificação transitória,
em que não se exerçam atividades nos termos da legislação de uso e ocupação do
solo;
XI - lote: a parcela de terreno resultante de loteamento, desmembramento ou
desdobro, contida em uma quadra com, pelo menos, uma divisa lindeira a via de
circulação oficial;
XII - testada ou alinhamento: a linha divisória entre o imóvel de propriedade
particular ou pública e o logradouro ou via pública.
Art. 7º. Para os fins desta lei, não são considerados anúncios:
I - os nomes, símbolos, entalhes, relevos ou logotipos, incorporados à fachada por
meio de aberturas ou gravados nas paredes, sem aplicação ou afixação, integrantes de
projeto aprovado das edificações;
II - os logotipos ou logomarcas de postos de abastecimento e serviços, quando
veiculados nos equipamentos próprios do mobiliário obrigatório, como bombas,
densímetros e similares;
III - as denominações de prédios e condomínios;
IV - os que contenham referências que indiquem lotação, capacidade e os que
recomendem cautela ou indiquem perigo, desde que sem qualquer legenda, dístico ou
desenho de valor publicitário;
V - os que contenham mensagens obrigatórias por legislação federal, estadual ou
municipal;
VI - os que contenham mensagens indicativas de cooperação com o Poder Público
Municipal, Estadual ou Federal;
VII - os que contenham mensagens indicativas de órgãos da Administração Direta;
233
VIII - os que contenham indicação de monitoramento de empresas de segurança com
área máxima de 0,04m2 (quatro decímetros quadrados);
IX - aqueles instalados em áreas de proteção ambiental que contenham mensagens
institucionais com patrocínio;
X - os que contenham as bandeiras dos cartões de crédito aceitos nos
estabelecimentos comerciais, desde que não ultrapassem a área total de 0,09m2 (nove
decímetros quadrados);
XI - os “banners” ou pôsteres indicativos dos eventos culturais que serão exibidos na
própria edificação, para museu ou teatro, desde que não ultrapassem 10% (dez por
cento) da área total de todas as fachadas;
XII - a denominação de hotéis ou a sua logomarca, quando inseridas ao longo da
fachada das edificações onde é exercida a atividade, devendo o projeto ser aprovado
pela Comissão de Proteção à Paisagem Urbana — C.P.P.U.;
XIII – a identificação das empresas nos veículos automotores utilizados para a
realização de seus serviços.
CAPÍTULO II
DAS NORMAS GERAIS
Art. 8º. Todo anúncio deverá observar, dentre outras, as seguintes normas:
I - oferecer condições de segurança ao público;
II - ser mantido em bom estado de conservação, no que tange a estabilidade,
resistência dos materiais e aspecto visual;
III - receber tratamento final adequado em todas as suas superfícies, inclusive na sua
estrutura;
IV - atender às normas técnicas pertinentes à segurança e estabilidade de seus
elementos;
V - atender às normas técnicas emitidas pela Associação Brasileira de Normas
Técnicas — ABNT, pertinentes às distâncias das redes de distribuição de energia
elétrica, ou a parecer técnico emitido pelo órgão público estadual ou empresa
responsável pela distribuição de energia elétrica;
VI - respeitar a vegetação arbórea significativa definida por normas específicas
constantes do Plano Diretor Estratégico;
VII - não prejudicar a visibilidade de sinalização de trânsito ou outro sinal de
comunicação institucional, destinado à orientação do público, bem como a
numeração imobiliária e a denominação dos logradouros;
VIII - não provocar reflexo, brilho ou intensidade de luz que possa ocasionar
ofuscamento, prejudicar a visão dos motoristas, interferir na operação ou sinalização
de trânsito ou, ainda, causar insegurança ao trânsito de veículos e pedestres, quando
com dispositivo elétrico ou com película de alta reflexividade;
IX - não prejudicar a visualização de bens de valor cultural.
Art. 9º. É proibida a instalação de anúncios em:
I - leitos dos rios e cursos d’água, reservatórios, lagos e represas, conforme
legislação específica;
II - vias, parques, praças e outros logradouros públicos, salvo os anúncios de
cooperação entre o Poder Público e a iniciativa privada, a serem definidos por
234
legislação específica, bem como as placas e unidades identificadoras definidas no §
6º do artigo 22 desta lei;
III - imóveis situados nas zonas de uso estritamente residenciais, salvo os anúncios
indicativos nos imóveis regulares e que já possuíam a devida licença de
funcionamento anteriormente à Lei nº 13.430, de 13 de setembro de 2002;
IV - postes de iluminação pública ou de rede de telefonia, inclusive cabines e
telefones públicos, conforme autorização específica, exceção feita ao mobiliário
urbano nos pontos permitidos pela Prefeitura;
V - torres ou postes de transmissão de energia elétrica;
VI - nos dutos de gás e de abastecimento de água, hidrantes, torres d’água e outros
similares;
VII - faixas ou placas acopladas à sinalização de trânsito;
VIII - obras públicas de arte, tais como pontes, passarelas, viadutos e túneis, ainda
que de domínio estadual e federal;
IX - bens de uso comum do povo a uma distância inferior a 30,00m (trinta metros) de
obras públicas de arte, tais como túneis, passarelas, pontes e viadutos, bem como de
seus respectivos acessos;
X - nos muros, paredes e empenas cegas de lotes públicos ou privados, edificados ou
não;
XI - nas árvores de qualquer porte;
XII - nos veículos automotores, motocicletas, bicicletas e similares e nos “traillers”
ou carretas engatados ou desengatados de veículos automotores, excetuados aqueles
utilizados para transporte de carga.
Art. 10. É proibido colocar anúncio na paisagem que:
I - oblitere, mesmo que parcialmente, a visibilidade de bens tombados;
II - prejudique a edificação em que estiver instalado ou as edificações vizinhas;
III - prejudique, por qualquer forma, a insolação ou a aeração da edificação em que
estiver instalado ou a dos imóveis vizinhos;
IV - apresente conjunto de formas e cores que se confundam com as convencionadas
internacionalmente para as diferentes categorias de sinalização de trânsito;
V - apresente conjunto de formas e cores que se confundam com as consagradas
pelas normas de segurança para a prevenção e o combate a incêndios.
Art. 11. A aprovação do anúncio indicativo nas edificações e áreas enquadradas
como Zonas de Preservação Cultural – ZEPEC e nos bens de valor cultural fica
condicionada à prévia autorização da Secretaria Municipal de Planejamento –
SEMPLA e da Secretaria Municipal de Cultura – SMC, nos termos do artigo 125 da
Lei nº 13.885, de 23 de agosto de 2004.
CAPÍTULO III
DA ORDENAÇÃO DA PAISAGEM URBANA
Art. 12. Para os efeitos desta lei, considera-se, para a utilização da paisagem urbana,
todos os anúncios, desde que visíveis do logradouro público em movimento ou não,
instalados em:
I - imóvel de propriedade particular, edificado ou não;
II - imóvel de domínio publico, edificado ou não;
III - bens de uso comum do povo;
IV - obras de construção civil em lotes públicos ou privados;
235
V - faixas de domínio, pertencentes a redes de infra-estrutura, e faixas de servidão de
redes de transporte, de redes de transmissão de energia elétrica, de oleodutos,
gasodutos e similares;
VI - veículos automotores e motocicletas;
VII - bicicletas e similares;
VIII - “trailers” ou carretas engatados ou desengatados de veículos automotores;
IX - mobiliário urbano.
X – aeronaves em geral e sistemas aéreos de qualquer tipo
§ 1°. Para fins do disposto neste artigo, considera-se visível o anúncio instalado em
espaço externo ou interno da edificação e externo ou interno dos veículos
automotores, excetuados aqueles utilizados para transporte de carga.
§ 2°. No caso de se encontrar afixado em espaço interno de qualquer edificação, o
anúncio será considerado visível quando localizado até 1,00m (um metro) de
qualquer abertura ou vedo transparente que se comunique diretamente com o
exterior.
Seção I
Do Anúncio Indicativo em Imóvel Edificado, Público ou Privado
Art. 13. Ressalvado o disposto no artigo 16 desta lei, será permitido somente um
único anúncio indicativo por imóvel público ou privado, que deverá conter todas as
informações necessárias ao público.
§ 1º. Os anúncios indicativos deverão atender as seguintes condições:
I - quando a testada do imóvel for inferior a 10,00m (dez metros) lineares, a área
total do anúncio não deverá ultrapassar 1,50m2 (um metro e cinqüenta decímetros
quadrados);
II - quando a testada do imóvel for igual ou superior a 10,00m (dez metros) lineares e
inferior a 100,00m (cem metros lineares), a área total do anúncio não deverá
ultrapassar 4,00m2 (quatro metros quadrados);
III - quando o anúncio indicativo for composto apenas de letras, logomarcas ou
símbolos grampeados ou pintados na parede, a área total do anúncio será aquela
resultante do somatório dos polígonos formados pelas linhas imediatamente externas
que contornam cada elemento inserido na fachada;
IV - quando o anúncio indicativo estiver instalado em suportes em forma de totens
ou estruturas tubulares, deverão eles estar contidos dentro do lote e não ultrapassar a
altura máxima de 5,00m (cinco metros), incluídas a estrutura e a área total do
anúncio.
§ 2º. Não serão permitidos anúncios que descaracterizem as fachadas dos imóveis
com a colocação de painéis ou outro dispositivo.
§ 3º. Não serão permitidos anúncios instalados em marquises, saliências ou
recobrimento de fachadas, mesmo que constantes de projeto de edificação aprovado
ou regularizado.
§ 4º. O anúncio indicativo não poderá avançar sobre o passeio público ou calçada. §
5º. Nas edificações existentes no alinhamento, regulares e dotadas de licença de
funcionamento, o anúncio indicativo poderá avançar até 0,15m (quinze centímetros)
sobre o passeio.
§ 6º. Os anúncios deverão ter sua projeção ortogonal totalmente contida dentro dos
limites externos da fachada onde se encontram e não prejudicar a área de exposição
de outro anúncio.
236
§ 7º. Será admitido anúncio indicativo no frontão de toldo retrátil, desde que a altura
das letras não ultrapasse 0,20m (vinte centímetros), atendido o disposto no “caput”
deste artigo.
§ 8º. Não serão permitidas pinturas, apliques ou quaisquer outros elementos com fins
promocionais ou publicitários, que sejam vistos dos logradouros públicos, além
daqueles definidos nesta lei.
§ 9º. A altura máxima de qualquer parte do anúncio indicativo não deverá
ultrapassar, em nenhuma hipótese, a altura máxima de 5,00m (cinco metros).
§ 10. Na hipótese do imóvel, público ou privado, abrigar mais de uma atividade, o
anúncio referido no “caput” deste artigo poderá ser subdividido em outros, desde que
sua área total não ultrapasse os limites estabelecidos no § 1º deste artigo.
§ 11. Quando o imóvel for de esquina ou tiver mais de uma frente para logradouro
público oficial, será permitido um anúncio por testada, atendidas as exigências
estabelecidas neste artigo.
Art. 14. Ficam proibidos os anúncios indicativos nas empenas cegas e nas coberturas
das edificações.
Art. 15. Nos imóveis edificados, públicos ou privados, somente serão permitidos
anúncios indicativos das atividades neles exercidas e que estejam em conformidade
com as disposições estabelecidas na lei de uso e ocupação do solo em vigor e
possuam as devidas licenças de funcionamento.
Parágrafo único. Não serão permitidos, nos imóveis edificados, públicos ou privados,
a colocação de “banners”, faixas ou qualquer outro elemento, dentro ou fora do lote,
visando chamar a atenção da população para ofertas, produtos ou informações que
não aquelas estabelecidas nesta lei.
Do Anúncio Indicativo em Imóvel Público ou Privado Situado em Lotes com
Testada Igual ou Superior a 100 Metros Lineares
Art. 16. Nos imóveis públicos ou privados com testada igual ou maior que 100,00m
(cem metros) lineares poderão ser instalados 2 (dois) anúncios com área total não
superior a 10,00m2 (dez metros quadrados) cada um.
§ 1º. As peças que contenham os anúncios definidos no “caput” deste artigo deverão
ser implantadas de forma a garantir distância mínima de 40,00m (quarenta metros)
entre elas.
§ 2º. A área total dos anúncios definidos no “caput” deste artigo não deverá, em
nenhuma hipótese, ultrapassar 20,00m2 (vinte metros quadrados).
Do Anúncio Indicativo em Imóvel Não-Edificado, Público ou Privado
Art. 17. Não será permitido qualquer tipo de anúncio em imóveis não-edificados, de
propriedade pública ou privada, ressalvado o disposto no parágrafo único deste
artigo.
Parágrafo único. Caso seja exercida atividade na área não-edificada, que possua a
devida licença de funcionamento, poderá ser instalado anúncio indicativo, observado
o disposto no artigo 13 desta lei.
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Do Anúncio Publicitário em Imóvel Público ou Privado
Art. 18. Fica proibida, no âmbito do Município de São Paulo, a colocação de anúncio
publicitário nos imóveis públicos e privados, edificados ou não.
Dos Anúncios Especiais
Art. 19. Para os efeitos desta lei, os anúncios especiais são classificados em:
I - de finalidade cultural: quando for integrante de programa cultural, de plano de
embelezamento da cidade ou alusivo à data de valor histórico, não podendo sua
veiculação ser superior a 30 (trinta) dias, conforme decreto especifico do Executivo,
que definirá o projeto urbanístico próprio;
II - de finalidade educativa, informativa ou de orientação social, religiosa, de
programas políticos ou ideológicos, em caso de plebiscitos ou referendos populares;
III - de finalidade eleitoral: quando destinado à propaganda de partidos políticos ou
de seus candidatos, na forma prevista na legislação federal eleitoral;
IV - de finalidade imobiliária, quando for destinado à informação do público para
aluguel ou venda de imóvel, não podendo sua área ultrapassar 1,00m² (um metro
quadrado) e devendo estar contido dentro do lote.
§ 1º. Nos anúncios de finalidade cultural e educativa, o espaço reservado para o
patrocinador será determinado pelos órgãos municipais competentes.
§ 2º. Os anúncios referentes à propaganda eleitoral deverão ser retirados no prazo
máximo de 15 (quinze) dias, a contar da data da realização das eleições ou
plebiscitos.
Art. 20. A veiculação de anúncios especiais relacionados a eventos culturais ou
empreendimentos imobiliários sediados nos limites do Centro Histórico do
Município de São Paulo dependerá de análise prévia e autorização dos órgãos
competentes.
Seção II
Do Anúncio Publicitário no Mobiliário Urbano
Art. 21. A veiculação de anúncios publicitários no mobiliário urbano será feita nos
termos estabelecidos em lei específica, de iniciativa do Executivo.
Art. 22. São considerados como mobiliário urbano de uso e utilidade pública os
seguintes elementos, dentre outros:
I - abrigo de parada de transporte público de passageiro;
II - totem indicativo de parada de ônibus;
III - sanitário público “standard”;
IV - sanitário público com acesso universal;
V - sanitário público móvel (para feiras livres e eventos);
VI - painel publicitário/informativo;
VII - painel eletrônico para texto informativo;
VIII – placas e unidades identificadoras de vias e logradouros públicos;
IX - totem de identificação de espaços e edifícios públicos;
X - cabine de segurança;
XI - quiosque para informações culturais;
238
XII - bancas de jornais e revistas;
XIII - bicicletário;
XIV - estrutura para disposição de sacos plásticos de lixo e destinada à reciclagem;
XV - grade de proteção de terra ao pé de árvores;
XVI - protetores de árvores;
XVII - quiosque para venda de lanches e produtos em parques;
XVIII - lixeiras;
XIX - relógio (tempo, temperatura e poluição);
XX - estrutura de suporte para terminal de Rede Pública de Informação e
Comunicação;
XXI - suportes para afixação gratuita de pôster para eventos culturais;
XXII - painéis de mensagens variáveis para uso exclusivo de informações de
trânsito;
XXIII - colunas multiuso;
XXIV - estações de transferência;
XXV - abrigos para pontos de táxi.
§ 1º. Abrigos de parada de transporte público de passageiros são instalações de
proteção contra as intempéries, destinados aos usuários do sistema de transporte
público, instalados nos pontos da parada e terminais, devendo, em sua concepção, ter
definidos os locais para veiculação de publicidade e os painéis informativos
referentes ao sistema de transporte e sua integração com o metropolitano.
§ 2º. Totem indicativo de parada de ônibus é o elemento de comunicação visual
destinado à identificação da parada de ônibus, quando houver impedimento para
instalação de abrigos.
§ 3º. Sanitários “standard” e com acesso universal são instalações higiênicas
destinadas ao uso comum, sendo implantados em praças e nos terminais de transporte
de uso coletivo, e os chamados sanitários públicos móveis instalados em feiras livres
e eventos.
§ 4º. Painel publicitário informativo é o painel luminoso para informação a
transeuntes, consistindo num sistema de sinalização global para a cidade, que
identificará mapas de áreas, marcação dos pontos de interesse turístico, histórico e de
mensagens de caráter educativo.
§ 5º. Painel eletrônico para texto informativo consiste em painéis luminosos ou
totens orientadores do público em geral, em relação aos imóveis, paisagens e bens de
valor histórico, cultural, de memória popular, artístico, localizados no entorno e
ainda com a mesma função relativamente a casas de espetáculos, teatros e auditórios.
§ 6º. Placas e unidades identificadoras de vias e logradouros públicos são aquelas que
identificam as vias e logradouros públicos, instaladas nas respectivas confluências.
§ 7º. Totens de identificação de espaços e edifícios públicos são elementos de
comunicação visual destinados à identificação dos espaços e edifícios públicos.
§ 8º. Cabine de segurança é o equipamento destinado a abrigar policiais durante 24
horas por dia, com acesso externo tipo balcão para atendimento dos transeuntes, com
capacidade para prestação de primeiros socorros, contendo pequeno sanitário, além
de espaço para detenção provisória de, pelo menos, 1 (uma) pessoa.
Art. 23. Os elementos do mobiliário urbano não poderão:
I – ocupar ou estar projetado sobre o leito carroçável das vias;
II - obstruir a circulação de pedestres ou configurar perigo ou impedimento à
locomoção de pessoas com deficiência e mobilidade reduzida;
239
III - obstruir o acesso a faixas de travessias de pedestres, escadas rolantes ou entradas
e saídas de público, sobretudo as de emergência ou para pessoas com deficiência e
mobilidade reduzida;
IV - estar localizado em ilhas de travessia, exceto pontos de ônibus e
relógios/termômetros digitais;
V - estar localizado em esquinas, viadutos, pontes e belvederes, salvo os
equipamentos de informação básica ao pedestre ou de denominação de logradouro
publico.
Parágrafo único. A instalação do mobiliário urbano nos passeios públicos deverá
necessariamente observar uma faixa de circulação de, no mínimo, metade de sua
largura, nunca inferior a 1,50m (um metro e cinqüenta centímetros); nos calçadões, a
faixa de circulação terá 4,50m (quatro metros e cinqüenta centímetros) de largura.
CAPÍTULO IV
DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
Seção I
Do Licenciamento e do Cadastro de Anúncios – CADAN
Art. 24. Os anúncios indicativos somente poderão ser instalados após a devida
emissão da licença que implicará seu registro imediato no Cadastro de Anúncios -
CADAN.
Art. 25. O licenciamento do anúncio indicativo será promovido por meio eletrônico,
conforme regulamentação específica, não sendo necessária a sua renovação, desde
que não haja alteração em suas características.
Parágrafo único. Qualquer alteração na característica, dimensão ou estrutura de
sustentação do anúncio implica a exigência de imediata solicitação de nova licença.
Art. 26. A colocação de anúncio de finalidade cultural ficará sujeita à autorização da
Secretaria Municipal de Cultura – SMC, dispensando-se seu licenciamento.
Art. 27. Ficam dispensados de licenciamento os anúncios instalados em mobiliários e
equipamentos urbanos, inclusive quanto ao seu cadastramento no órgão competente
estabelecido no respectivo contrato.
Art. 28. O despacho de indeferimento de pedido da licença de anúncio indicativo será
devidamente fundamentado.
Parágrafo único. O indeferimento do pedido não dá ao requerente o direito à
devolução de eventuais taxas ou emolumentos pagos.
Art. 29. O prazo para pedido de reconsideração de despacho ou de recurso é de 30
(trinta) dias corridos, contados a partir da data da publicação do despacho no Diário
Oficial da Cidade.
Parágrafo único. Os pedidos de reconsideração de despacho ou de recurso não terão
efeito suspensivo.
SEÇÃO II
Do cancelamento da licença do anúncio
240
Art. 30. A licença do anúncio será automaticamente extinta nos seguintes casos:
I - por solicitação do interessado, mediante requerimento padronizado;
II - se forem alteradas as características do anúncio;
III - quando ocorrer mudança de local de instalação de anúncio;
IV - se forem modificadas as características do imóvel;
V - quando ocorrer alteração no Cadastro de Contribuintes Mobiliários - CCM;
VI - por infringência a qualquer das disposições desta lei ou de seu decreto
regulamentar, caso não sejam sanadas as irregularidades dentro dos prazos previstos;
VII - pelo não-atendimento a eventuais exigências dos órgãos competentes;
VIII - pela ocorrência da hipótese prevista no parágrafo único no artigo 25 desta lei.
Art. 31. Os responsáveis pelo anúncio, nos termos do artigo 32 desta lei, deverão
manter o número da licença de anuncio indicativo ou CADAN de forma visível e
legível do logradouro público, sob pena de aplicação das sanções estabelecidas nos
artigos 40 e seguintes.
Parágrafo único. Os responsáveis pelo anúncio deverão manter, no imóvel onde está
instalado, à disposição da fiscalização, toda a documentação comprobatória da
regularidade junto ao Cadastro de Anúncio – CADAN, da inscrição no Cadastro de
Contribuintes Mobiliários – C.C.M. e dos pagamentos da Taxa de Fiscalização de
Anúncio – T.F.A..
SEÇÃO III
Dos responsáveis pelo anúncio
Art. 32. Para efeitos desta lei, são solidariamente responsáveis pelo anúncio o
proprietário e o possuidor do imóvel onde o anúncio estiver instalado.
§ 1°. A empresa instaladora é também solidariamente responsável pelos aspectos
técnicos e de segurança de instalação do anúncio, bem como de sua remoção.
§ 2°. Quanto à segurança e aos aspectos técnicos referentes à parte estrutural e
elétrica, também são solidariamente responsáveis os respectivos profissionais.
§ 3°. Quanto à segurança e aos aspectos técnicos referentes à manutenção, também é
solidariamente responsável a empresa de manutenção.
§ 4º. Os responsáveis pelo anúncio responderão administrativa, civil e criminalmente
pela veracidade das informações prestadas.
SEÇÃO IV
Das Instâncias Administrativas e Competências
Art. 33. Para a apreciação e decisão da matéria tratada nesta lei, serão observadas as
seguintes instâncias administrativas, no âmbito da competência das Subprefeituras:
I - Supervisor de Uso e Ocupação do Solo;
II - Chefe de Gabinete;
III - Subprefeito;
IV - Prefeito.
Art. 34. Compete à Secretaria Municipal de Coordenação das Subprefeituras –
SMSP:
241
I - supervisionar e articular a atuação das Subprefeituras em matéria de paisagem
urbana;
II - expedir atos normativos e definir procedimentos administrativos para fiel
execução desta lei e de seu regulamento;
III - gerenciar o cadastro único dos anúncios da cidade - CADAN, bem como a
veiculação eletrônica no “site” da Prefeitura para o conhecimento e acompanhamento
de todos os cidadãos.
Art. 35. Compete à Comissão de Proteção à Paisagem Urbana – CPPU:
I - apreciar e emitir parecer sobre casos de aplicação da legislação de anúncios,
mobiliário urbano e inserção de elementos na paisagem urbana;
II - dirimir dúvidas na interpretação de dispositivos desta lei ou em face de casos
omissos;
III - elaborar e apreciar projetos de normas modificativas ou inovadoras da legislação
vigente, referentes a anúncios, mobiliário urbano e paisagem urbana, com as
justificações necessárias visando sua constante atualização, diante de novas
exigências técnicas e peculiares locais;
IV - propor à Comissão Municipal de Política Urbana diretrizes relativas à política
municipal de proteção e promoção da boa qualidade da paisagem urbana;
V - propor e expedir atos normativos administrativos sobre a ordenação dos
anúncios, paisagem e meio ambiente,
VI - expedir atos normativos para fiel execução desta lei e de seu regulamento,
apreciando e decidindo a matéria pertinente.
Art. 36. Compete às Subprefeituras:
I - licenciar e cadastrar os anúncios indicativos, inclusive os que já foram
protocolados anteriormente à data da publicação desta lei;
II - fiscalizar o cumprimento desta lei e punir os infratores e responsáveis, aplicando
as penalidades cabíveis.
Art. 37. Compete à Secretaria Municipal de Cultura – SMC:
I - expedir atos normativos quanto à classificação dos anúncios de finalidade cultural
e quanto às características e parâmetros para anúncios em bens de valor cultural,
conforme definido no inciso VI do artigo 6° desta lei;
II - emitir parecer, no âmbito de suas atribuições, quanto ao enquadramento das
situações não previstas ou passíveis de dúvidas;
III - autorizar e fixar condições para a instalação dos anúncios indicativos nos bens
de valor cultural, conjuntamente com a Secretaria Municipal de Planejamento –
SEMPLA, conforme o artigo 125 da Lei nº 13.885, de 25 de agosto de 2004.
Art. 38. Compete á Empresa Municipal de Urbanização – EMURB, quanto aos
elementos da paisagem urbana:
I - propor normas e programas específicos para os distintos setores da cidade;
II - disciplinar os elementos presentes nas áreas públicas, considerando as normas de
ocupação das áreas privadas e a volumetria das edificações;
III - a criação de novos padrões, mais restritivos, de comunicação institucional,
informativa ou indicativa;
242
IV - elaborar parâmetros de dimensões, posicionamento, quantidade e interferência
mais adequados à sinalização de trânsito, aos elementos construídos e à vegetação,
considerando a capacidade de suporte da região;
V - propor normas e diretrizes para implantação dos elementos componentes da
paisagem urbana para a veiculação da publicidade;
VI - propor mecanismos eficazes de fiscalização sobre as diversas intervenções na
paisagem urbana.
CAPÍTULO V
DAS INFRAÇÕES E PENALIDADES
Art. 39. Para os fins desta lei, consideram-se infrações:
I - exibir anúncio:
a) sem a necessária licença de anúncio indicativo ou a autorização do anúncio
especial, quando for o caso;
b) com dimensões diferentes das aprovadas;
c) fora do prazo constante da licença de anúncio indicativo ou da autorização do
anúncio especial;
d) sem constar de forma legível e visível do logradouro publico, o número da licença
de anúncio indicativo ou CADAN;
II - manter o anúncio em mau estado de conservação;
III - não atender a intimação do órgão competente para a regularização ou a remoção
do anúncio;
IV - veicular qualquer tipo de anúncio em desacordo com o disposto nesta lei e nas
demais leis municipais, estaduais e federais pertinentes;
V - praticar qualquer outra violação às normas previstas nesta lei ou em seu decreto
regulamentar.
Parágrafo único. Para todos os efeitos desta lei, respondem solidariamente pela
infração praticada os responsáveis pelo anúncio nos termos do artigo 32.
Art. 40. A inobservância das disposições desta lei sujeitará os infratores, nos termos
de seu artigo 32, às seguintes penalidades:
I – multa;
II – cancelamento imediato da licença do anúncio indicativo ou da autorização do
anúncio especial;
III – remoção do anúncio.
Art. 41. Na aplicação da primeira multa, sem prejuízo das demais penalidades
cabíveis, os responsáveis serão intimados a regularizar o anúncio ou a removê-lo,
quando for o caso, observados os seguintes prazos:
I - 5 (cinco) dias, no caso de anúncio indicativo ou especial;
II - 24 (vinte e quatro) horas, no caso de anúncio que apresente risco iminente.
Art. 42. Na hipótese do infrator não proceder à regularização ou remoção do anúncio
instalado irregularmente, a Municipalidade adotará as medidas para sua retirada,
ainda que esteja instalado em imóvel privado, cobrando os respectivos custos de seus
responsáveis, independentemente da aplicação das multas e demais sanções cabíveis.
Parágrafo único. O Poder Público Municipal poderá ainda interditar e providenciar a
remoção imediata do anúncio, ainda que esteja instalado em imóvel privado, em caso
243
de risco iminente de segurança ou da reincidência na prática de infração, cobrando os
custos de seus responsáveis, não respondendo por quaisquer danos causados ao
anúncio quando de sua remoção.
Art. 43. As multas serão aplicadas da seguinte forma:
I - primeira multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por anúncio irregular;
II - acréscimo de R$ 1.000,00 (mil reais) para cada metro quadrado que exceder os
4,00m2 (quatro metros quadrados);
III - persistindo a infração após a aplicação da primeira multa e a intimação referidas
no artigo 41 e nos incisos I e II deste artigo, sem que sejam respeitados os prazos ora
estabelecidos, será aplicada multa correspondente ao dobro da primeira, reaplicada a
cada 15 (quinze) dias a partir da lavratura da anterior, até a efetiva regularização ou a
remoção do anúncio, sem prejuízo do ressarcimento, pelos responsáveis, dos custos
relativos à retirada do anúncio irregular pela Prefeitura.
§ 1º. No caso do anúncio apresentar risco iminente, a segunda multa, bem como as
reaplicações subseqüentes, ocorrerão a cada 24 (vinte e quatro) horas a partir da
lavratura da multa anterior até a efetiva remoção do anúncio.
§ 2º. Nos casos previstos nos artigos 9º e 10 desta lei, em que não é permitida a
veiculação de anúncios publicitários por meio de “banners”, lambe-lambe, faixas,
pinturas e outros elementos que promovam profissionais, serviços ou qualquer outra
atividade nas vias e equipamentos públicos, as sanções estipuladas neste artigo serão
também aplicadas aos respectivos responsáveis, que passarão a integrar cadastro
municipal próprio, que será veiculado pela Internet no “site” da Prefeitura, na
condição de “cidadão não responsável pela cidade”.
CAPÍTULO VI
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Art. 44. Todos os anúncios publicitários, inclusive suas estruturas de sustentação,
instalados, com ou sem licença expedida a qualquer tempo, dentro dos lotes urbanos
de propriedade publica ou privada, deverão ser retirados pelos seus responsáveis até
31 de dezembro de 2006. Parágrafo único. Em caso de descumprimento do disposto
no “caput” deste artigo, serão impostas as penalidades previstas nos artigos 40 a 43
desta lei:
I - à empresa registrada no Cadastro de Empresas de Publicidade Exterior –
CADEPEX que tenha requerido a licença do anúncio;
II - ao proprietário ou possuidor do imóvel onde o anúncio estiver instalado;
III - ao anunciante;
IV - à empresa instaladora;
V - aos profissionais responsáveis técnicos;
VI - à empresa de manutenção.
Art. 45. Todos os anúncios especiais autorizados e indicativos já licenciados deverão
se adequar ao disposto nesta lei até 31 de dezembro de 2006.
§ 1º. O prazo previsto no “caput” deste artigo poderá ser prorrogado por mais 90
(noventa) dias, caso os responsáveis pelo anúncio justifiquem a impossibilidade de
seu atendimento, mediante requerimento ao órgão competente do Executivo.
§ 2º. Em caso de não atendimento aos prazos previstos neste artigo, serão impostas as
penalidades previstas nos artigos 40 a 43 desta lei.
244
Art. 46. Fica extinto o Cadastro de Empresas de Publicidade Exterior – CADEPEX.
Art. 47. Novas tecnologias e meios de veiculação de anúncios, bem como projetos
diferenciados não previstos nesta lei, serão enquadrados e terão seus parâmetros
estabelecidos pela Comissão de Proteção da Paisagem Urbana – C.P.P.U..
Art. 48. O Poder Executivo promoverá as medidas necessárias para viabilizar a
aplicação das normas previstas nesta lei, em sistema computadorizado,
estabelecendo, mediante portaria, a padronização de requerimentos e demais
documentos necessários ao seu cumprimento.
Art. 49. Os pedidos de licença de anúncios indicativos e de autorização de anúncios
especiais pendentes de apreciação na data da entrada em vigor desta lei deverão
adequar-se às exigências e condições por ela instituídas.
Art. 50. O Poder Executivo poderá celebrar termo de cooperação com a iniciativa
privada visando à execução e manutenção de melhorias urbanas, ambientais e
paisagísticas, bem como à conservação de áreas municipais, atendido o interesse
público.
§ 1º. O Poder Executivo estabelecerá critérios para determinar a proporção entre o
valor financeiro dos serviços e obras contratadas e as dimensões da placa indicativa
do termo de cooperação, bem como a forma de inserção dessas placas na paisagem.
§ 2º. Os termos de cooperação terão prazo de validade de, no máximo, 3 (três) anos e
deverão ser publicados na íntegra no Diário Oficial da Cidade, no prazo máximo de
30 (trinta) dias contados da data de sua assinatura, observadas as normas constantes
desta lei e as disposições estabelecidas em decreto.
Art. 51. A Secretaria Municipal de Coordenação das Subprefeituras e as
Subprefeituras poderão celebrar contratos com empresas privadas, visando à
prestação de serviços de apoio operacional para a fiscalização, bem como de
remoção de anúncios.
Art. 52. A Secretaria Municipal de Coordenação das Subprefeituras publicará, no
Diário Oficial da Cidade, no prazo de 30 (trinta) dias a partir da publicação desta lei,
todas as licenças dos anúncios indicativos, com a respectiva data de emissão, número
do Cadastro de Anúncios – CADAN, nome da empresa responsável e data de
validade de cada anúncio.
Parágrafo único. Caberá à Secretaria Municipal de Coordenação das Subprefeituras a
veiculação, pela Internet, das publicações relativas às licenças emitidas por cada
Subprefeitura.
Art. 53. A Secretaria Municipal de Habitação - SEHAB publicará, no Diário Oficial
da Cidade, no prazo de 30 (trinta) dias a partir da publicação desta lei, todas as
licenças dos anúncios publicitários, com a respectiva data de emissão, número do
Cadastro de Anúncios – CADAN, nome da empresa responsável e data de validade
de cada anúncio.
245
Art. 54. O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de 60 (sessenta)
dias, contados da data de sua publicação.
Art. 55. As despesas com a execução desta lei correrão por conta das dotações
orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.
Art. 56. Ficam revogadas as Leis nº 10.571, de 8 de julho de 1988, nº 11.613, de 13
de julho de 1994, nº 12.849, de 20 de maio de 1999, nº 13.517, de 29 de janeiro de
2003, nº 13.525, de 28 de fevereiro de 2003, alterada pela Lei nº 13.687, de 19 de
dezembro de 2003, e as Leis nº 14.017, de 28 de junho de 2005, e nº 14.066, de 17 de
outubro de 2005.
Art. 57. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, aplicando-se também a
todos os pedidos de licenciamento de anúncios pendentes de apreciação.
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