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Tratar do termo pesquisa remete à produção de conhecimentos, saberes...
Como expor a proposta de trabalho aos estudantes sem hierarquizar saberes,
conhecimentos; sem desfazer a pesquisa diária, em cada sala de aula, em cada
espaço reservado às matérias escolares? E ao mesmo tempo, problematizar os
conteúdos repetidos, os conhecimentos empoeirados e isolados, aprisionados em
grades de currículos pré-ativos, em prédios quase abandonados?
Nos primeiros contatos, conversamos sem demora sobre o estudo que faço.
Fiz o convite para participarem da investigação, dez estudantes aceitaram construir
o grupo. No seguir das aulas, outros falaram em entrar na pesquisa. Algumas
ocupadas com os cursinhos pré-vestibulares têm tão-somente os fins- de-semana
sem compromissos, mas mostraram disposição para fazer parte.
Com freqüência, no decorrer dos dias, ouvi interrogações acerca do início da
pesquisa, pareciam curiosas com o projeto. Outros estudantes apenas escutavam as
conversas em silêncio. Para aquelas que me procuravam e indagavam,
argumentava: aguardo a qualificação e preparo os procedimentos metodológicos, o
sinal verde... No entanto, percebia que a pesquisa já estava acontecendo.
Passaram-se alguns meses, talvez muitos dias, muitas questões,
pensamentos, idéias, informações, leituras... Por fim, o dia, a hora e o lugar
definidos. Os começos possíveis, as palavras escritas, lidas, refletidas...
Quarta com estudantes – dia 23 de maio de 2007
Primeiro encontro, um encontro: nove estudantes. Falar sobre a pesquisa sem
deixar escapar minhas expectativas de capturar o que transgride do consumo, o que
rompe, o que quebra, desmantela a ordem, essa ordem... Indícios, ícones, símbolos,
signos... Qualquer palavra que desarrume a gramática, que construa novos ou
outros sentidos, que desfaça os moldes. É isso que procuro? É isso que procuro.
Antes das quinze horas, o chimarrão pronto, as dez pastas amarelas vazias,
as canetas, os desenhos, as anotações recém finalizadas na agenda. A espera, a
esperança...
Chegaram quase ao mesmo tempo, uns caminhando, outros de moto. Faltou
a Luana. Tratei de relatar os objetivos, fazer os primeiros questionamentos, as
primeiras conversas sobre o consumo, as coisas consumidas na escola, sugeri
comentários de desenhos que versavam acerca do consumo (uma forma de inspirar
as conversas e as escrituras). Depois escreveram e guardaram nas pastas
amarelas... Uma pasta para cada um, uma permaneceu vazia.
Uma hora quase cronometrada, sem relógio, com o tempo da intuição, das
relações, dos relógios desmanchados de Salvador Dali. Programada a próxima
quarta: entregar observações, anotações, apontamentos sobre as coisas
consumidas ou conversadas pelas estudantes do terceiro ano (colegas da escola).
Encontro encerrado. Algumas estudantes ficaram conversando sobre várias e
outras coisas. Foram-se, começou a chover e três retornaram correndo. Parou a
chuva e continuamos lendo o que foi escrito, pensando em fotografar, filmar e fazer
uma janta.
Transcorreram dois dias do encontro, Luana me procurou. Moradora do
centro da cidade, disse da falta de passagem escolar e, por isso, sua ausência na
quarta-feira, dia de paralisação contra as reformas educacionais dos governos. Mas
continuará.