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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PÓS-GRADUAÇÃO – MESTRADO EM EDUCAÇÃO
A APRENDIZAGEM DA ORTOGRAFIA E O USO DE
ESTRATÉGIAS METACOGNITIVAS
CAROLINA REIS MONTEIRO
PELOTAS, RS, BRASIL
ABRIL/2008
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS
FACULDADE DE EDCUAÇÃO – FaE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CURSO DE MESTRADO
A APRENDIZAGEM DA ORTOGRAFIA E O USO DE ESTRATÉGIAS
METACOGNITIVAS
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal de Pelotas, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Educação.
Mestranda: Carolina Reis Monteiro
Orientadora: Profª Drª Ana Ruth Moresco Miranda
Linha de Pesquisa – Formação docente: Ensino,
Aprendizagem e Conhecimento.
Pelotas
2008
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Banca Examinadora
Profª Drª Drª Ana Ruth Moresco Miranda (Orientadora) - UFPel
Profª Drª Magda Floriana Damiani - UFPel
Prof Dr Artur Gomes de Morais - UFPe
Dados de catalogação na fonte:
Aydê Andrade de Oliveira CRB - 10/864
M775a Monteiro, Carolina Reis.
A aprendizagem da ortografia e o uso de estratégias metacognitivas /
Carolina Reis Monteiro. - Pelotas, 2008.
171f.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação.
Universidade Federal de Pelotas.
1. Aprendizagem da ortografia. 2. Estratégias metacognitivas I. Monteiro,
Ana Ruth Moresco, orient. II. Título.
CDD 372.632
.
Ao meu marido e amigo João Vicente.
Para Ana Ruth, obrigada por me
oferecer modelos a serem “imitados”.
AGRADECIMENTOS
À minha orientadora Drª Ana Ruth Moresco Miranda, pela orientação
dedicada, pelo exemplo de profissionalismo e pela confiança que sempre depositou
em mim.
À Drª Magda Floriana Damiani, por ter contribuído, desde a graduação em
Pedagogia, na minha formação acadêmica e profissional.
Ao Dr. Artur Gomes de Morais, pelas importantes contribuições apresentadas
para o desenvolvimento e aprimoramento desta dissertação.
À Ana Paula e à Taiçara, pela amizade e pelo companheirismo.
Ao Dr. Carlos Adriano Ferraz, pela confecção do abstract.
Às colegas do Seminário de Dissertação e Tese, pela troca de experiências e
pelas discussões enriquecedoras.
A todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste trabalho.
Penso que das condutas infantis fica
para nós uma lição mais geral:
quando se aprende sobre a
ortografia a partir da reflexão,
sempre há o que descobrir (Morais,
2005b, p.96)
RESUMO
MONTEIRO, Carolina Reis. A aprendizagem da ortografia e o uso de estratégias
metacognitivas. 2008, 171p. Dissertação de Mestrado Programa de Pós-
Graduação em Educação. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.
Este trabalho apresenta o resultado de uma pesquisa sobre o uso de
estratégias metacognitivas no processo de aprendizagem da ortografia de uma
turma de segunda série do Ensino Fundamental de uma Escola Particular da cidade
de Pelotas. A ortografia possui diversas facetas que devem ser consideradas pela
criança, pois suas regras não são da mesma natureza e envolvem diferentes
competências para sua aquisição. Em alguns momentos, a criança precisará atentar
para a posição de determinada letra na palavra, em outros, precisará observar a
morfologia da palavra, dentre outros aspectos. Em conseqüência disso, foi proposta
uma intervenção que privilegia a reflexão e a explicitação de pensamentos bem
como o uso de estratégias metacognitivas. As atividades propostas que visavam o
uso de estratégias metacognitivas tiveram como foco os erros relacionados às
motivações fonéticas e fonológicas, às correspondências regulares contextuais e às
correspondências irregulares que se verificam entre as letras e os sons do sistema
ortográfico. O erro ortográfico, nesse estudo, é considerado construtivo e importante
para o processo de aquisição, pois indica as hipóteses que a criança tem a respeito
de como se estrutura o conhecimento ortográfico. Os objetivos centrais desse
estudo consistem em: a) descrever e analisar a evolução dos erros ortográficos
encontrados nas produções textuais das crianças, os quais são classificados com
base em três categorias (categoria 1 - motivação fonética e fonológica; categoria 2 -
não observância de regras contextuais; e categoria 3 - irregularidade do sistema
ortográfico); e b) avaliar os efeitos das atividades metacognitivas desenvolvidas
sobre a performance ortográfica das crianças. Os resultados encontrados têm
mostrado que os erros pertencentes à primeira categoria deixam de ser observados
a partir das primeiras intervenções; os da categoria 2 apresentam uma crescente
redução no número de ocorrências à medida que as atividades de metacognição vão
sendo desenvolvidas e as crianças passam a construir regras que regulam o uso da
ortografia; os erros que se enquadram na categoria 3, embora passem a ser
encontrados com menor freqüência, são aqueles que se mostram mais persistentes
à intervenção, uma vez que demandam também o uso de estratégias mnemônicas.
É importante salientar que os resultados revelam uma clara influência positiva das
atividades reflexivas para a ampliação do conhecimento ortográfico das crianças
estudadas, o que se manifesta tanto nas produções textuais espontâneas como nas
explicitações verbais das crianças em relação aos erros e à norma ortográfica.
Palavras-chave: Aprendizagem da ortografia, estratégias metacognitivas
ABSTRACT
MONTEIRO, Carolina Reis. A aprendizagem da ortografia e o uso de estratégias
metacognitivas. 2008, 171p. Dissertação de Mestrado Programa de Pós-
Graduação em Educação. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.
This dissertation presents the results of a research on the use of
metacognitive strategies in the learning process of orthography in a second grade
class at a private elementary school in the city of Pelotas. Orthography has many
aspects that should be considered by the child, because its rules are not of the same
kind and involve different competencies in order to be acquired. Sometimes the child
will need to pay attention to the letter’s position in a word, and sometimes he/she will
need to observe the word’s morphology, among other aspects. Having all this in
mind, an intervention that would favor reflection and the expression of thoughts as
well as the use of metacognitive strategies has been proposed. The activities, which
aimed at the use of metacognitive strategies, had their focus on the errors
concerning phonetic and phonologic motivations, as well as on the mistakes
concerning the regular contextual correspondences and irregular correspondences
that take place among the letters and sounds of the orthographical system. The
orthographical error, in this study, has been considered constructive and important
for the acquisition process, because it indicates the hypotheses the child has
concerning the way the orthographical knowledge is structured. So, the main aims of
this study are: a) to describe and to analyze the development of those orthographical
errors found in the children’s textual productions, which have been classified
according to three categories (category 1 - phonetic and phonologic motivations;
category 2 non observance of contextual rules; category 3 - orthographical
system’s irregularities); and b) to evaluate the effects of the metacognitive activities
on the children’s orthographical performance. Our findings have shown that the
errors classified in the first category were no longer observed after the initial
interventions. The errors classified in the second category decreased as the
metacognitive activities started to take place and the children begin to construct rules
for the use of the orthography; finally, the errors classified in the third category,
although decreasing their frequency, are the most resistant to the intervention, since
they also demand the use of mnemonic strategies. It is important to mention that the
results reveal a clear positive influence of reflexive activities upon the growth of the
orthographical knowledge of the children that participated in this study and this is
expressed both in children’s spontaneous textual productions, as well as in the oral
accounts concerning their errors and the orthographical rules.
Key-words: orthography learning; metacognitive strategies.
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS...................................................................................................16
LISTA DE TABELAS..................................................................................................17
LISTA DE GRÁFICOS................................................................................................18
LISTA DE QUADROS .............................................................................................. 19
1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................20
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................28
2.1 Aquisição da escrita.............................................................................................28
2.1.1 A psicolingüística contemporânea e a aprendizagem da escrita .................... 28
2.1.2 A teoria piagetiana para compreensão da aquisição da escrita........................30
2.2 A ortografia ..........................................................................................................32
2.2.1 O sistema ortográfico do português .................................................................32
2.2.2 Propostas para análise dos erros ortográficos ................................................ 34
2.2.2.3 Classificação dos erros de escrita ................................................................ 37
2.2.3 Tipo de erro ..................................................................................................... 39
2.2.3.1 Erros relacionados à motivação fonética....................................................... 39
2.2.3.2 Erros relacionados à motivação fonológica.................................................. 41
2.2.3.2.1 Casos de supergeneralização ................................................................... 43
2.2.3.3 Erro relacionado ao sistema ortográfico ....................................................... 44
2.2.3.3.1 Correspondência regular contextual .......................................................... 44
2.2.3.3.2 Correspondência irregular ......................................................................... 45
2.2.3.3.3. Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia ......... 47
2.2.4 O ensino e a aprendizagem da ortografia ....................................................... 49
2.3 Sobre ensino e aprendizagem ............................................................................ 52
2.3.1 Teoria Sócio-histórica .......................................................................................52
2.3.2 O conceito de boa-aprendizagem.................................................................... 55
2.3.3 Metacognição ...................................................................................................60
2.3.3.1. Estratégias Cognitivas, Metacognitivas e Mnemônicas .............................. 62
2.3.3.2 Implicações do conceito de metacognição na aprendizagem....................... 64
3. METODOLOGIA DE PESQUISA ........................................................................ 67
3.1 Sujeitos ................................................................................................................67
3.2 Metodologia da intervenção ................................................................................68
3.3 Coleta de dados ................................................................................................ .69
3.3.1 Textos ................................................................................................ ..............69
3.3.2 Diário de campo ...............................................................................................70
3.3.3 Entrevistas ........................................................................................................71
3.3.4 Ditado ................................................................................................ ..............71
3.4 Grupo de controle ............................................................................................... 72
4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ..............................................................74
4.1 Os erros ............................................................................................................. 74
4.1.1 Erros de motivação fonética ............................................................................ 74
4.1.1.2 Erros relacionados à grafia das vogais ........................................................ 75
4.1.1.3 Erros relacionados à grafia dos ditongos ..................................................... 78
4.1.1.4 Erros relacionados à grafia com apagamento .............................................. 80
4.1.1. 5 Supergeneralização .................................................................................... 81
4.1.2 Erros de motivação fonológica ........................................................................ 83
4.1.1.2 Erros relacionados à relação fonema-grafema ............................................ 83
4.1.1.3 Erros relacionados à grafia da s estruturas silábicas ................................... 84
4.1.3 Erros relacionados às correspondências regulares contextuais...................... 85
4.1.3.1 Coda nasal ................................................................................................... 86
4.1.3.2 Grafia do ‘r’ ................................................................................................... 87
4.1.3.3 Grafia do // e /g/ .......................................................................................... 88
4.1.4 Erros relacionados à correspondência irregular .............................................. 89
4.1.4.1 A grafia do /s/ ............................................................................................... 89
4.1.4.2 A grafia do /z/ ............................................................................................... 91
4.1.4.3 A grafia do //................................................................................................ 92
4.1.4.4 A grafia do // ............................................................................................... 93
4.1.4. 5 A grafia do ‘h’ ............................................................................................... 94
4.1.5 Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia ................. 95
4.1.5.1 Caso do ‘s’ .................................................................................................... 95
4.1.5.2 Grafia do ‘ç’ em contexto indevido ............................................................... 96
4.1.6 Análise quantitativa dos erros ......................................................................... 97
4.2 As intervenções pedagógicas ........................................................................... 104
4.2.1 Motivação fonética ..........................................................................................110
4.2.2 Motivação fonológica ..................................................................................... 118
4.2.3 Correspondência regular contextual .............................................................. 125
4.2.4 Correspondência irregular ............................................................................. 129
4.2.5 Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia ............... 134
4.3 A correção das redações e o uso de estratégias de aprendizagem ................ 137
4.3.1 O grupo de controle ....................................................................................... 139
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 144
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................ 148
APÊNDICES ........................................................................................................... 157
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 - /p/ - /b/ ................................................................................................ 121
FIGURA 2 - /t/ - /d/ ................................................................................................. 121
FIGURA 3 - /f/ - /v/ .................................................................................................. 122
FIGURA 4 - /k/ - /g/ ................................................................................................. 122
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Erros relacionados à motivação fonética e à supergeneralização
..................................................................................................................................117
TABELA 2 - Erros relacionados à grafia das estruturas silábicas ......................... 119
TABELA 3 - Erros relacionados ao traço [sonoro] ................................................. 124
TABELA 4 - Erros relacionados à correspondência regular contextual ................ 128
TABELA 5 - Erros relacionados à correspondência irregular ................................ 130
TABELA 6 - Erros relacionados aos casos em que a regularidade diminui as
possibilidades de grafia .......................................................................................... 136
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1- Erros relacionados à motivação fonética ............................................ 98
GRÁFICO 2- Erros relacionados à motivação fonológica ........................................ 99
GRÁFICO 3- Casos de supergeneralização .......................................................... 100
GRÁFICO 4- Erros relacionados à correspondência regular contextual ............... 101
GRÁFICO 5- Erros relacionados à correspondência irregular ............................... 102
GRÁFICO 6- Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia ... 103
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Grafia das vogais .................................................................................. 40
QUADRO 2 Redução do ditongo ............................................................................ 40
QUADRO 3 Apagamento do infinitivo (-r) ................................................................ 40
QUADRO 4 Trocas relacionadas ao traço [sonoro] ................................................. 42
QUADRO 5 Casos de supergeneralização .............................................................. 43
QUADRO 6 Casos de correspondência regular contextual ..................................... 44
QUADRO 7 Casos do Fonema /s/ ........................................................................... 46
QUADRO 8 Casos de correspondências irregulares ............................................... 47
QUADRO 9 /s/ intervocálico, /s/ pós-consonantal e uso indevido do ‘ç’ ................. 48
QUADRO 10 Erros motivados foneticamente: grafia das vogais ..............................77
QUADRO 11 Erros motivados foneticamente: redução do ditongo ..........................79
QUADRO 12 Erros motivados foneticamente: grafia com apagamento .................. 80
QUADRO 13 Erros relacionados à supergeneralização .......................................... 82
QUADRO 14 Erros de motivação fonológica: relação fonema-grafema .................. 84
QUADRO 15 Erros de motivação fonológica: grafia das estruturas silábicas ......... 85
QUADRO 16 Erros relacionados à grafia da coda nasal ......................................... 86
QUADRO 17 Erros relacionados à grafia do ‘r’........................................................ 87
QUADRO 18 Erros relacionados à grafia do // e // ............................................... 88
QUADRO 19 Erros relacionados à grafia do /s/ ....................................................... 90
QUADRO 20 Erros relacionados à grafia do /z/ ....................................................... 91
QUADRO 21 Erros relacionados à grafia do // ....................................................... 92
QUADRO 22 Erros relacionados à grafia do / / .......................................................93
QUADRO 23 Erros relacionados à grafia do ‘h’ ...................................................... 94
QUADRO 24 Erros relacionados à grafia do ‘s’ intervocálico e ‘s’ pós-
consonantal............................................................................................................... 96
QUADRO 25 - Uso indevido do ‘ç’ ........................................................................... 97
INTRODUÇÃO
No estudo proposto, faço a descrição e a análise do processo de
aprendizagem ortográfica de alunos da 2
a
série do Ensino Fundamental de uma
escola particular de Pelotas. Além disso, avalio os efeitos de uma prática
pedagógica para o ensino da ortografia centrada na utilização de estratégias
metacognitivas em sala de aula.
A idéia de estudar o ensino e a aprendizagem da ortografia surgiu pelo fato
de ser a ortografia um dos principais conteúdos a serem ensinados ao longo do
segundo ano letivo do Ensino Fundamental, juntamente com o desenvolvimento e o
aprimoramento da produção textual. Acredito ser a aprendizagem da ortografia uma
tarefa fundamental no período em que a criança, após ultrapassar os estágios mais
avançados de conceituação da escrita, começa a ocupar-se de suas produções
textuais. Nesse período, ao se utilizarem de estratégias para a solução de
problemas ortográficos, podem ter maior autonomia e desenvoltura na escrita.
Estudos como os de Morais (1995, 1999b, 2003, 2005a, 2005b), Melo & Rego
(1998), Matteoda (1999) e Leal & Roazzi (2005) fazem referência a posições
controversas relativamente às formas de ensinar e de aprender ortografia. Essas
posições podem ser agrupadas em duas vertentes principais: a que concebe o
ensino e a aprendizagem como sendo vinculados à memorização; e outra que
entende a aprendizagem unicamente a partir da interação com o material escrito e
com a leitura, sem que precise haver ensino sistemático do conteúdo. Todos os
estudos acima citados, no entanto, são unânimes em apontar para uma terceira
posição segundo a qual o ensino e a aprendizagem da ortografia são interpretados
como um processo que se desenvolve por meio de atividades que possibilitem a
formulação e a explicitação de hipóteses e a construção de conhecimentos acerca
do objeto estudado.
A essa terceira via vincula-se o presente estudo, a partir de cujo
desenvolvimento pretendo contribuir para com a discussão sobre o ensino e a
aprendizagem da ortografia, por meio da análise dos dados de escrita resultantes de
uma experiência pedagógica que propõe um ensino sistemático do conteúdo
ortográfico, ancorado em teorias de aprendizagem que enfocam a construção do
conhecimento por meio da interação do sujeito com o objeto de sua aprendizagem.
Os estudos de Ferreiro & Teberosky ([1979] 1999) propiciaram o surgimento
de uma nova vertente teórica que modificou a compreensão que se tinha sobre as
relações entre o aprendiz e a escrita. Fundamentadas na teoria piagetiana, as
autoras pesquisaram o processo de aquisição da escrita na perspectiva do sujeito
que aprende. Os resultados da pesquisa dessas autoras evidenciaram a
aplicabilidade da teoria de aprendizagem proposta por Piaget (1976), enfatizando e
confirmando a hipótese segundo a qual a criança, ao iniciar o processo de aquisição
da escrita, possui conhecimentos sobre a estrutura e o funcionamento de sua
língua materna, utilizando-os como uma referência para pensar sobre a escrita.
Assim, no processo de aquisição do sistema alfabético, o sujeito é intelectualmente
ativo e está continuamente formulando regras e generalizando hipóteses a respeito
da organização da escrita. Nessa perspectiva, o erro é considerado construtivo, pois
revela as hipóteses que a criança tem sobre o objeto do conhecimento.
Ao estudar a aquisição da escrita, sob o ponto de vista do aprendiz, Lemle
(1983) dividiu o processo de alfabetização em cinco etapas e, a partir da análise
dessas etapas, sugere uma seqüência de ensino baseada nos conhecimentos
prévios e nas hipóteses dos alunos em relação à escrita ortográfica. Segundo a
autora, o aprendiz da escrita, além de ter hipóteses e passar por etapas antes de
aprender a escrever, também tem hipóteses e passa por etapas no processo de
apropriação da escrita ortográfica.
Em relação ao ensino e à aprendizagem da ortografia, são poucos trabalhos
que propõem metodologias de ensino e discutem a interferência do professor nesses
processos. Estudos como o de Nunes (1985, 1992), Oliveira & Nascimento (1990),
Alvarenga (1995), Rego & Buarque (2005), Monteiro (2005), Guimarães (2005) e
Miranda et alli (2005) descrevem e analisam os erros ortográficos e suas motivações
sem, no entanto, descreverem uma intervenção pedagógica e um processo de
aprendizagem potencializado pelo trabalho do professor.
A pesquisa realizada por Melo & Rego (1998), a partir de uma intervenção,
sugere que o professor deva atuar como mediador do processo de aprendizagem
das regras ortográficas. Nessa pesquisa foram propostas atividades nas quais as
crianças tiveram oportunidade de discutir e refletir sobre as várias possibilidades do
uso do ‘r’ e do ’rr’. Os resultados mostram um maior domínio da ortografia no grupo
que passou pela intervenção, em se comparando a outros grupos de crianças
submetidos a outras metodologias de ensino da ortografia. Todas as crianças do
grupo que passou pela intervenção demonstraram uma clara compreensão das
restrições contextuais envolvidas no uso do ‘r’ e do ‘rr’. Diante dos resultados, as
autoras concluem que o professor que conhece os processos cognitivos do aluno e
a natureza da ortografia poderá lançar questionamentos que desestabilizem as
hipóteses das crianças e as motivem a discutir e refletir sobre essas hipóteses.
Esse professor poderá, assim, orientá-las na construção do conhecimento acerca
das regras ortográficas.
Morais (1999b) buscou modificar a prática pedagógica voltada para o ensino
da ortografia a partir da utilização de atividades que proporcionassem aos alunos um
processo de explicitação e tomada de consciência sobre as restrições contextuais da
norma ortográfica. Por meio de uma análise quantitativa dos dados de escrita,
Morais (1999b, p. 9) sugere que “um melhor desempenho ortográfico pode ser
obtido através de estratégias de ensino que levem o aprendiz a tomada de
consciência e a um nível explícito das restrições regulares da norma de notação
escrita”.
Neste trabalho, parto da idéia segundo a qual é importante a instrução
escolar para que a criança aprenda a norma ortográfica e, nesse sentido, a atuação
do professor como mediador da aprendizagem torna-se imprescindível.
Para Vigotski (1996), o professor deve intervir na zona de desenvolvimento
proximal dos alunos, partindo dos seus conceitos espontâneos para poder atingir os
conceitos científicos. A prática pedagógica proposta neste trabalho foi fundamentada
em autores como Vigotski (1996), Pozo (2002), Flavell (1999), dentre outros, que
estudaram o processo de aprendizagem escolar. Conceitos vigotskianos tais como:
‘mediação’, ‘zona de desenvolvimento proximal’ e ‘imitação’ auxiliaram e
fundamentaram o planejamento das atividades pedagógicas empregadas no
desenvolvimento do trabalho, as quais produziram os dados a serem analisados.
Pozo (2002) descreve diferentes tipos de aprendizagem e contribui para
esta pesquisa com seu conceito de ‘boa aprendizagem’. Para o autor, a ‘boa
aprendizagem’ ocorreria à medida que fossem utilizadas estratégias de ensino pelo
professor para potencializar a aprendizagem dos alunos. Além de Pozo (2002),
Flavell (1999) discute e aprofunda os conceitos de metacognição e de estratégias
metacognitivas, os quais são de extrema relevância para este estudo.
Para entender como se estrutura o sistema ortográfico e quais são as
regularidades que podem servir como elemento facilitador do processo de
aprendizagem, busco em Lemle ([1983, [1982] 2002), Morais (1995, 1999b, 2003,
2005a, 2005b), Faraco (2003), Zorzi (1998) e Guimarães (2005) subsídios para este
trabalho. Por enfocar também o erro ortográfico, utilizo, entre outros, autores como
Nunes (1985, 1992), Cagliari (1997), Miranda et alli (2005) Rego & Buarque (2005),
Monteiro (2005) e Guimarães (2005), os quais descrevem e classificam os erros
ortográficos bem como analisam suas motivações. Partindo do esquema de estágios
proposto por Lemle (1983) e do estudo das classificações existentes, proponho uma
classificação que sugere algumas etapas para aprendizagem da norma ortográfica,
baseada nas motivações e explicações das crianças ao cometer os erros
ortográficos. Devo salientar que, neste estudo, a concepção de erro baseia-se na
perspectiva piagetiana a qual interpreta o erro não como construtivo, mas
também como resultado de uma etapa em que o sujeito formula e testa suas
hipóteses. Nessa perspectiva, o erro não impede o sujeito de alcançar a resposta
correta, e parece permitir os acertos posteriores.
Esta pesquisa tem como objetivo geral descrever e analisar o processo de
aprendizagem ortográfica com base em dados de escrita produzidos por alunos da
2
a
série do Ensino Fundamental de uma Escola Particular de Pelotas, bem como
discutir e avaliar o efeito das atividades metacognitivas desenvolvidas em sala de
aula sobre a performance ortográfica dos alunos estudados.
Os objetivos específicos são: a) descrever e analisar os erros ortográficos
encontrados nos textos de dezenove crianças da 2
a
série, produzidos ao longo do
ano letivo; b) discutir as intervenções pedagógicas adotadas, as quais visaram levar
os alunos a utilizarem estratégias metacognitivas, a construírem regras e a
explicitarem seus conhecimentos sobre o objeto estudado; c) avaliar os progressos
dos alunos através de suas produções; d) comparar os resultados de testes
realizados com quatro dessas crianças da 2
a
série, as quais passaram por uma
intervenção pedagógica centrada em estratégias de metacognição, e quatro crianças
de uma outra turma de 2
a
série da mesma escola, que não tiveram acesso a esse
tipo de atividade.
Tais objetivos foram formulados a partir das seguintes hipóteses: a) o uso
de estratégias metacognitivas pode melhorar a performance ortográfica de alunos do
Ensino Fundamental; b) quanto maior o nível de abstração e explicitação de regras
ortográficas, melhor o rendimento ortográfico do aluno; c) os alunos que passam por
uma intervenção pedagógica que vise o uso de estratégias metacognitivas têm mais
facilidade para identificar os erros ortográficos bem como para explicitar suas
hipóteses, fazendo uso das estratégias de pensamento construídas no decorrer da
intervenção pedagógica.
Além dos objetivos e hipóteses referidos, pretendo com este trabalho
oferecer subsídios que possam contribuir para com a discussão relativa à prática
pedagógica centrada na aprendizagem do aluno, colaborando dessa forma para a
melhoria do ensino nas séries iniciais.
Esta dissertação encontra-se organizada em seis partes. Além dessa
introdução, um capítulo de revisão teórica, o qual está dividido em três seções
que tratam de aspectos relacionados ao sistema de escrita, à ortografia e aos
processos de ensino e de aprendizagem ortográfica; o capítulo seguinte à revisão
teórica apresenta a metodologia da intervenção e da pesquisa; após, tem-se um
capítulo que descreve e analisa os erros ortográficos encontrados nos textos
coletados e discute e analisa os dados da pesquisa, utilizando os referenciais
teóricos relacionados ao estudo e, por fim, um capítulo que apresenta as
considerações finais da pesquisa.
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1. Aquisição da escrita
2.1.1 A psicolingüística contemporânea e a aprendizagem da escrita
Ainda que não seja objetivo deste estudo discutir o processo de aquisição
da língua oral, à guisa de introdução, serão apresentadas algumas das principais
contribuições da psicolingüística contemporânea relativamente à aquisição da
linguagem.
Nos anos 60, as discussões da psicolingüística surgem, de acordo com
Slobin (1980), para explicar a aquisição da língua oral como um contraponto às
teorias tradicionais de base behaviorista, as quais se mostraram incapazes de
explicar como as crianças produzem formas lingüísticas que nunca ouviram sem ferir
as regras gerais da gramática da língua que estão adquirindo. De acordo com as
teorias tradicionais, a criança aprende a língua oral por associação, ou seja, os
adultos reforçam seletivamente as produções orais das crianças. Isso seria
comprovado pelo fato de que a criança, ao produzir um som semelhante à fala
adulta, seria reforçada positivamente através de gestos, demonstração de carinho,
etc. Desse modo, o ambiente onde a criança está inserida seria o fator principal para
a seleção e significação de sua fala.
Contrapondo-se a essa posição, surgem estudos que mostram uma visão
diametralmente oposta. Segundo essa nova perspectiva, a criança, durante seu
processo de aquisição da linguagem, é ativa e procura compreender a natureza da
linguagem que está a sua volta, formulando hipóteses, buscando regularidades e
criando sua própria gramática guiada pelos princípios da gramática da língua alvo.
As crianças quando falam, por exemplo, ‘eu sabo em vez de ‘eu sei’, estão
generalizando uma flexão que é característica dos verbos regulares. Essa
regularização do verbo não foi realizada por simples imitação ou reforço seletivo do
adulto, uma vez que tal forma não é produzida na gramática adulta. Pode-se dizer
que ela é a demonstração de que a criança, desde pequena, busca entender sua
língua, fazendo generalizações de regras. De acordo com esse pensamento, os
erros podem ser chamados de erros construtivos, pois indicam as hipóteses que as
crianças constroem até chegar ao acerto, isto é, às formas que correspondem
àquelas da gramática do adulto.
As influências dos estudos lingüísticos posteriores ao gerativismo
1
podem
ser observadas não no que diz respeito à aquisição da linguagem oral, mas
também da escrita. Ferreiro & Teberosky ([1979] 1999, p.26), em sua ‘Psicogênese
da língua escrita’, claramente inspirada nas idéias chomskianas, fazem referência à
insuficiência dos modelos associacionistas para explicar a aquisição da linguagem,
que o sujeito adquire um significativo conhecimento sobre a estrutura de sua
1
O termo gerativismo refere-se à teoria da linguagem que foi desenvolvida por Chomsky e seus
seguidores. Segundo Lyons (1987), o gerativismo teve uma influência enorme, não apenas na
lingüística, mas também na filosofia, psicologia e outras disciplinas preocupadas com a linguagem.
língua desde os primeiros anos de sua existência sem que receba instrução
específica para isto. Ao transporem essa idéia para o campo dos estudos
relacionados à escrita as autoras contribuem para o aparecimento de novas linhas
de investigação sobre a aquisição da escrita e acabam por aproximar as concepções
de Chomsky e Piaget.
2.1.2 A teoria piagetiana para compreensão do processo de aquisição da
escrita
Os estudos de Ferreiro & Teberosky ([1979], 1999) surgiram como uma
inovação nas discussões sobre aquisição da escrita, exatamente por conectarem a
psicologia genética e a psicolingüística. Antes de esses estudos serem realizados,
as publicações especializadas em alfabetização discutiam duas grandes temáticas:
a difusão de métodos sintéticos e analíticos para alfabetizar e o estabelecimento de
capacidades prévias necessárias para se alfabetizar. A pesquisa proposta pelas
autoras discute a aquisição da escrita na perspectiva piagetiana de sujeito,
definindo-o como um sujeito cognoscente, ativo no processo de conhecer.
Essa concepção de sujeito modifica completamente a visão sobre a
aquisição da escrita. Enquanto na perspectiva behaviorista os estímulos controlam
as respostas, na teoria piagetiana é o sujeito quem controla suas respostas, os
estímulos são transformados pelos sistemas de assimilação e de acomodação do
sujeito. Nesse ato de transformação, o sujeito interpreta o estímulo e, somente em
conseqüência dessa interpretação, sua conduta se faz compreensível (FERREIRO E
TEBEROSKY, [1979] 1999).
É, a partir da teoria de Piaget (1976), que a escrita passa a ser considerada
como um objeto de conhecimento e o sujeito da aprendizagem como um sujeito
ativo “que compara, exclui, ordena, categoriza, reformula, comprova, formula
hipóteses, reorganiza” (FERREIRO & TEBEROSKY, [1979] 1999, p. 32).
Partindo da idéia de um sujeito ativo, o processo de aprendizagem de
conhecimentos não é linear e contínuo. Durante esse processo, o sujeito poderá
fazer generalizações erradas que, de acordo com essa teoria, apesar de erradas
podem ser construtivas. Os erros construtivos possuem importância central na teoria
de Piaget, uma vez que constituem os pré-requisitos necessários para a obtenção
da resposta correta. Segundo Ferreiro & Teberosky ([1979] 1999, p. 25), os erros
construtivos são “respostas que se separam das respostas corretas, mas que longe
de impedir alcançar estas últimas, parecem permitir os acertos posteriores”.
Em relação à aquisição da escrita, as autoras descrevem e analisam uma
série de estágios, os quais estão relacionados a diferentes níveis de conceituação.
De acordo com essa proposta, a criança começa a formular hipóteses sobre como
se estrutura a escrita e passa por estágios caracterizados como pré-silábico e suas
subdivisões, silábico e suas subdivisões, silábico-alfabético e alfabético. Deve-se
considerar também que, ao se apropriar do sistema alfabético de escrita, a criança
constrói diversos conhecimentos sobre o funcionamento desse sistema a partir das
hipóteses que formula. Em etapas iniciais do processo de apropriação da escrita, ela
trabalha com hipóteses relativas à quantidade e à variedade de caracteres (é preciso
um número mínimo de letras e/ou é preciso que as grafias sejam variadas para que
se possa ler) e precisa compreender que letras são objetos substitutos - “quer dizer,
como objetos cuja função é a de representar outros objetos” (FERREIRO, 1990,
p.108).
Ao entender o funcionamento alfabético da escrita, a criança começa a
analisar a relação entre fala e escrita e descobre que ela não é direta e que uma
letra pode ter vários sons, assim como um som pode ser representado por várias
letras. Em razão disso, considera-se que a ortografia pode ser tomada como um
objeto de reflexão, uma vez que o sistema é organizado por regras sobre as quais
os alunos devem constantemente refletir e explicitá-las.
2.2 A ortografia
2.2.1. O sistema ortográfico
2
do português
Neste trabalho, por se tratar de uma intervenção em uma 2
a
série, parto da
idéia de que a maioria das crianças estejam no nível alfabético de aquisição da
escrita, o que significa dizer que elas entendem que cada som corresponde a uma
grafia. É nesse estágio do processo de aquisição que a criança é capaz de aprender
regras relacionadas ao sistema ortográfico da sua língua.
Kato (2002), ao escrever sobre a natureza da ortografia do português,
afirma que, embora a primeira intenção fosse a de fazer um alfabeto de natureza
fonética, o fato de toda a língua mudar, impediu que a escrita tivesse uma natureza
estritamente fonética. Segundo a autora, na verdade, a natureza da ortografia é
essencialmente fonêmica, isto é, a escrita procura representar aquilo que é
funcionalmente significativo. Kato (2002) mostra que nossa escrita tem diferentes
motivações: fonêmica, fonêmica e fonética, fonética, lexical e diacrônica.
2
Nesta pesquisa a expressão “sistema ortográfico” está sendo usada com o mesmo sentido de
“norma ortográfica”.
A motivação fonêmica é observada quando uma mesma letra apresenta
mais de uma realização fonética de um mesmo fonema
3
como, por exemplo, na
palavra casa: o primeiro /a/ é pronunciado como [a] e o segundo como []. A
motivação fonêmica e fonética é observada quando um fonema tem uma
realização possível, como, por exemplo, o /b/ e grande parte das consoantes do
nosso sistema. A motivação fonética é observada quando a escolha ortográfica é
foneticamente motivada como, por exemplo, no uso do ‘m’ antes de ‘p’ e ‘b’. Nesse
caso, a motivação é preponderantemente fonética uma vez que /m/, /p/ e /b/ são
bilabiais.
A motivação lexical leva em consideração a motivação histórica e a família
da palavra como, por exemplo, a grafia do ‘c’ nas palavras, medicina, medicar’. E,
por fim, a motivação diacrônica é observada quando só podemos explicar a grafia da
palavra se recorremos à história da língua. Esses casos exemplificam bem as
chamadas regras arbitrárias.
Desse modo, a partir de estudos como os de Kato
(2002), Lemle ([1982], 2002), Morais (1995, 1999b, 2003, 2005a, 2005b), Miranda
(2005, 2006, 2007, 2008), dentre outros, pode-se concluir que a ortografia possui
diversas facetas que devem ser consideradas pela criança, pois suas regras não são
da mesma natureza e envolvem diferentes competências para sua aprendizagem.
Em alguns momentos, a criança precisará atentar para a posição de determinada
letra na palavra, em outros, precisará observar aspectos relativos à morfologia, por
exemplo.
3
Um fonema é uma unidade representacional que se relacionada a um som da fala e é constituído de
um conjunto de traços (de base acústica ou articulatória) que contribuem para distinguir significados
na língua (SCLIAR-CABRAL, 2003).
2.2.2. Propostas para análise dos erros ortográficos
Autores como Lemle ([1982], 2002), Nunes (1985, 1992), Morais (1995,
1999b, 2003, 2005a, 2005b), Cagliari (1999), Zorzi (1998) e Guimarães (2005)
definiram propostas para análise e classificação dos erros ortográficos que serviram
de base para a categorização definida para este trabalho.
A proposta de Lemle ([1982], 2002) tem sido uma importante referência para
os estudos relacionados à ortografia do português. Ao analisar a relação que se
estabelece entre o sistema fonológico e o ortográfico, a autora caracteriza três tipos
de correspondências entre letras e fonemas: correspondências biunívocas, nas
quais cada fonema corresponde a uma letra e cada letra corresponde a um fonema;
correspondências de um para mais de um, determinadas pela posição, nas quais
cada letra tem um som em uma dada posição, cada som corresponde a uma letra
em uma determinada posição e. por último, relações de concorrência, nas quais
existe mais de uma letra para um mesmo som.
A partir dessa análise, a autora propõe uma classificação dos erros de escrita
categorizados como falhas de primeira, segunda e terceira ordem. As falhas de
primeira ordem são aquelas em que não correspondência linear entre a
seqüência de sons e a seqüência de letras tais como: repetições de letras ‘ppai’ para
‘pai’, omissões de letras ‘trs’ para ‘três’, troca nas ordens das letras ‘parto’ para
‘prato’, falhas decorrentes do conhecimento ainda inseguro do formato de cada letra
‘rano para ‘ramo’, falhas decorrentes da incapacidade de classificar algum traço
distintivo do som como em ‘sabo’ para ‘sapo’, por exemplo. As falhas de segunda
ordem são aquelas em que a escrita se aproxima de uma transcrição fonética da fala
como nos exemplos ‘matu’ para ‘mato’ e azma’ ´para ‘asma’. As falhas de terceira
ordem são aquelas em que trocas entre letras concorrentes como, por exemplo,
‘xinelo’ para ‘chinelo’, ‘jigante’ para ‘gigante’ e ‘trese’ para ‘treze’ como também os
casos de influências dialetais como em ‘craro’ para ‘claro’ (Lemle, [1982] 2002, p.
40-41).
A análise de erros proposta por Carraher (1986) fundamenta-se na idéia
segundo a qual os erros de ortografia cometidos pelas crianças refletem um vínculo
estabelecido com a escrita alfabética, visto que a criança acredita em uma
correspondência biunívoca entre letra e som. A autora utiliza diferentes categorias
que procuram categorizar os erros que a criança comete no processo de
desenvolvimento da escrita ortográfica. Essas categorias são: transcrição da fala,
supergeneralização, ausência de marcação da nasalização, desconsideração de
regras contextuais, ligação à origem da palavra, trocas de letras e sílabas de
estruturas complexas.
Morais (1995) classifica as regras ortográficas nos seguintes grupos:
correspondências fonográficas regulares de tipo biunívoco, correspondências
fonográficas de tipo regular contextual, correspondências fonográficas de tipo
regular morfológica e correspondências fonográficas de tipo irregular. As
correspondências fonográficas regulares de tipo biunívoco são aquelas em que um
fonema terá apenas uma representação gráfica e uma representação gráfica
corresponderá a apenas um fonema. As correspondências fonográficas de tipo
regular contextual são aquelas em que o contexto na palavra vai definir qual letra
deverá será utilizada, ou seja, é possível formular a regra que define o valor da letra
em função do contexto específico em que ela se encontra. As correspondências
fonográficas de tipo regular morfológica são aquelas em que aspectos relacionados
à categoria gramatical da palavra orientam a escolha da letra. E, por último, as
correspondências fonográficas de tipo irregular são aquelas quais um fonema pode
ser representado por vários grafemas
4
e a análise do contexto não é capaz de ajudar
na decisão sobre o uso de um ou outro grafema. Por que ‘hoje’ é com ‘h’ e ‘ontem’ é
sem? Por que ‘cidade’ é com ‘c’ e ‘sempre’ com ‘s’? Perguntas como essas
podem ser respondidas pela etimologia da língua ou pela tradição de uso.
A categorização proposta por Cagliari (1997) tem por objetivo auxiliar o
professor na análise de erros encontrados nos textos espontâneos das crianças. O
autor utiliza as seguintes categorias: transcrição fonética, uso indevido de letras,
hipercorreção, modificação da estrutura segmental da palavra, juntura intervocabular
e segmentação, forma morfológica diferente, forma estranha de traçar as letras, uso
indevido de maiúsculas e minúsculas e de acentos.
Zorzi (1998) realizou uma pesquisa com dados de escrita de alunos de 1
a
a
4
a
série que tinha como objetivo geral “compreender como se a apropriação
progressiva do sistema ortográfico” (p. 27). Para atingir esse objetivo, o autor propôs
uma classificação composta por dez categorias, a saber: alterações ou erros
decorrentes da possibilidade de representações múltiplas, alterações ortográficas
decorrentes do apoio na oralidade, omissão de letras, alterações caracterizadas por
junção ou separação das palavras, generalização de regras, alteração
caracterizadas por substituições envolvendo a grafia de fonemas surdos e sonoros,
acréscimo de letras, letras parecidas, inversão de letras e uma categoria
denominada pelo autor de “outras” que engloba erros que não são categorizados em
nenhuma das categorias anteriores.
4
Segundo Scliar-Cabral (2003), grafema é uma ou duas letras que representam um fonema. De
acordo com a autora, enquanto os dígrafos correspondem a um grafema, a letra ‘h’ de palavras como
‘honra’, não corresponde a nenhum.
Guimarães (2005), partindo do estudo de diferentes propostas para
categorização dos erros ortográficos, propôs uma classificação que divide os erros
em dois grandes grupos. O primeiro grupo relaciona-se ao sistema gráfico e diz
respeito aos meios de que uma língua dispõe para exprimir os sons produzidos
pelos seus usuários. Esse grupo engloba dois sub-tipos de erros: aqueles
decorrentes do estabelecimento das relações diretas entre as letras e os sons da
fala, e aqueles que revelam problemas representacionais relacionados a fonemas ou
estruturas silábicas. O segundo grupo se relaciona ao sistema ortográfico e engloba
dois tipos de erros: aqueles decorrentes da não observância de regras ortográficas
específicas, os chamados erros contextuais e aqueles motivados pela arbitrariedade
do sistema. Quanto ao sistema gráfico, considerando os aspectos fonéticos e/ou
fonológicos, os erros podem ser do tipo: motivação fonética e motivação fonológica
(segmento e sílaba). Quanto ao sistema ortográfico, os erros podem ser do tipo:
correspondência regular contextual e correspondência irregular arbitrária.
2.2.2.3 Classificação dos erros de escrita
Dois estudos referidos anteriormente, a proposta de Lemle (1983) para as
etapas de aquisição e a categorização proposta por Guimarães (2005) para a
classificação dos erros ortográficos, são importantes para que se possa observar o
ponto de vista do aluno, pois revelam parte da motivação subjacente ao erro de
escrita encontrado nas suas produções textuais. Devo salientar também que, além
disso, os estudos dessas autoras permitem definir algumas etapas e hipóteses da
aquisição da escrita ortográfica as quais, se compreendidas, podem servir como
auxílio para o professor que trabalha com a ortografia, tanto no planejamento como
na execução das suas intervenções pedagógicas.
Lemle (1983) divide o processo de alfabetização em cinco etapas. A primeira,
denominada pré-requisitos perceptuais e nocionais, consiste no desenvolvimento de
aptidões tais como: representar através de uma seqüência de letras a seqüência de
sons da fala; segmentar a escrita em palavras; ter capacidade de perceber
diferenças visuais entre traços semelhantes como por exemplo, q’ e ‘p’; ter
capacidade de discriminar sons fonêmicos separados apenas por um traço distintivo.
A segunda etapa relaciona-se à hipótese inicial do aprendiz sobre o funcionamento
da escrita e é denominada hipótese biunívoca, pois em se considerando a relação
entre letra e fonema, uma letra corresponde a um fonema e um fonema, a uma letra.
A terceira etapa é relativa à hipótese da regularidade contextual uma vez que o
aluno percebe que uma letra pode representar diferentes sons ou um fonema pode
ser representado por diferentes letras, o contexto, porém, prevê a utilização de
determinada letra. A quarta etapa, na qual há equivalência entre letras e
idiossincrasias ortográficas, caracteriza-se pelo fato de o aprendiz começar a
perceber que em algumas palavras o contexto não define qual letra será utilizada e,
portanto, a escolha por determinada letra é arbitrária. A última etapa envolve a
construção de regras morfológicas e consiste na observação, pelo aluno, da
morfologia das palavras com o objetivo de reduzir os casos de irregularidades da
norma ortográfica.
As etapas do processo de aquisição da escrita e da aprendizagem da
ortografia definidas por Lemle (1983) e as discussões sobre as propostas de
categorização dos erros apresentadas por Guimarães (2005) estão sintetizadas nas
categorias utilizadas neste trabalho, as quais serão apresentadas na ordem
seqüencial em que foram trabalhadas em sala de aula.
2.2.3 Tipo de erro
2.2.3.1. Erros relacionados à motivação fonética
São os erros que as crianças cometem, em fase inicial de escolarização, por
estabelecerem uma relação direta entre os sons e os grafemas, ou seja, as crianças
escrevem conforme “falam”, estabelecendo para cada letra um valor sonoro, o que
se traduz em grafias para as palavras ´descobriu’ e ‘embora’ como ‘discubriu’ e
‘imbora’. Segundo Carraher (1986), os erros de motivação fonética serão mais
freqüentes quanto maior for a diferença entre a variedade lingüística falada pela
criança e a forma escrita.
De acordo com Cagliari (1999), Carraher (1986) e Miranda et alli (2005),
esses erros tendem a diminuir à medida que a criança convive com a escrita e
percebe a distinção entre língua falada e língua escrita, por isso a importância de o
professor trabalhar com aprendizagem da escrita e explicitar a diferença entre esses
modos de linguagem.
Foram considerados erros de motivação fonética aquelas formas de escrita
que tentavam representar a pronúncia das palavras, como erros relacionados às
grafias das vogais, à redução do ditongo e ao apagamento do infinitivo, conforme
mostram os quadros abaixo.
Quadro 1: Grafia das vogais
Casos Exemplo Forma ortográfica
Levantamento da vogal pretônica inicial
5
intão então
Levantamento da vogal postônica final denti dente
Levantamento da vogal átona do clítico di de
Quadro 2: Redução dos ditongos
Casos Exemplo Forma ortográfica
‘ou’ por ‘o’ – posição medial otro outro
‘ou’ por ‘o’ ditongo como morfema
flexional
fico ficou
‘ei’ por ‘e’ dexou deixou
‘ai’ por ‘a’ baxo baixo
Quadro 3: Apagamento do infinitivo ( -r )
Casos Exemplo Forma ortográfica
Apagamento do morfema
-r
fala falar
Os exemplos mostrados nos quadros 1, 2 e 3, de erros motivados
foneticamente, são interpretados como reflexos de que a escrita da criança está
sendo influenciada pela linguagem oral, pois, mesmo na forma oral mais próxima do
padrão, dificilmente os ditongos e o ‘r’ do infinitivo, por exemplo, serão pronunciados.
5
Neste trabalho não serão analisados os casos de juntura como na grafia de ‘dinovo’ para ‘de novo’.
Assim como, os casos, apresentados no quadro 1, relacionados à grafia das vogais
podem ser observados na fala.
São considerados também erros de motivação fonética os casos de
inserção de vogais, representando o que ocorre na fala de alguns dialetos, como por
exemplo, ‘feis’ e ‘talveis’; casos de apagamento do ‘s de plural ‘as casa’ para ‘as
casas’; casos de coalescência
6
como ‘ocalipito’ para ‘eucalipto’; grafia das palatais
como ‘milio’ para ‘milho’, dentre outros (Guimarães, 2005).
Apesar de a maioria dos erros de motivação fonética refletirem uma
tentativa da criança em ‘traduzir’ a forma oral para a forma escrita, segundo Abaurre
(1991, 1999) e Miranda (2007), o que ocorre são vazamentos de conhecimentos
lingüísticos construídos pela criança os quais podem gerar erros ortográficos.
2.2.3.2 Erros relacionados à motivação fonológica
Nesse caso, os erros relacionam-se tanto a aspectos segmentais como
prosódicos
7
. São considerados erros segmentais aqueles relacionados às trocas /p/-
/b/, /t/-/d/, /f/-/v/, por exemplo. Esses erros decorrem do fato de os sons serem muito
parecidos, ou seja, o modo e o ponto de articulação para a produção de cada um
desses pares é exatamente o mesmo, exceto pela vibração ou não das cordas
vocais, o que os torna diferentes é apenas o valor do traço [sonoro]. Esses erros são
comumente encontrados na fala inicial das crianças e podem voltar a aparecer
6
A coalescência é o mecanismo por meio do qual dois segmentos são fundidos, formando apenas um
que preserva características de ambos (Lamprecht (2004).
7
A prosódia é uma área da fonologia que trata de aspectos supra segmentais tais como o acento, o
ritmo e a entonação. Segundo Nespor e Vogel (1986, p. 93), para a fonologia prosódica “a
representação mental da fala está dividida em fragmentos hierarquicamente organizados, o menor
deles é a sílaba e o maior é a frase entonacional”.
durante o processo de aprendizagem da ortografia. Como exemplo de trocas, pode-
se ter:
Quadro 4: Trocas relacionadas ao traço [sonoro]
Casos Exemplos Forma ortográfica
Troca /k/ pelo /g/ griança criança
Troca /g/ pelo /k/ amicos amigos
Troca /b/ pelo /p/ tupo tubo
Troca /p/ pelo /b/ sabo sapo
Troca /f/ pelo /v/ veriado feriado
Troca /v/ pelo /f/ fejo vejo
Troca // pelo // ajou achou
Troca // pelo // cheito jeito
Troca /d/ pelo /t/ itea idéia
Troca /t/ pelo /d/ dudo tudo
Troca /k/ pelo /g/ aguilo aquilo
Troca /g/ pelo /k/ ninquem ninguém
Os erros apresentados no quadro 4 são freqüentes na escrita da criança e
após ela ser ensinada sobre as diferenças entre os sons parecidos, como por
exemplo ‘faca’ e ‘vaca’, passa a discriminá-los com maior facilidade e a reconhecer
quando ocorrem essas trocas na sua escrita.
Também podem ser classificados como erros de motivação fonológica os
erros relacionados à grafia de estruturas silábicas mais complexas: CCV como em
prato’ e CVC como em lista´. Essas grafias podem ocasionar dificuldades no início
do processo de apropriação da escrita ortográfica, provocando erros do tipo ‘binco’
para brinco e ‘mu' para ‘um’, em que a criança tende a reduzir sílabas complexas à
forma canônica CV.
Para Carraher (1986), os erros relacionados à grafia das sílabas de
estruturas complexas são freqüentes no início do processo de aquisição da escrita e
tendem a diminuir na medida em que a criança percebe as diferentes estruturas
silábicas.
2.2.3.2.1 Casos de supergeneralização
Relacionados aos erros de motivação fonética e fonológica, encontram-se
os erros provocados pela supergeneralização de regras. A supergeneralização
ocorre quando as crianças não levam em consideração sub-regularidades do
sistema e generalizam regras a um contexto em que elas não se aplicam. Os casos
abaixo serão classificados como erros motivados pela supergeneralização de regras.
Quadro 5: Casos de supergeneralização
Casos Exemplos Forma ortográfica
Abaixamento da vogal alta final sentio sentiu
Abaixamento da vogal pretônica boraco buraco
Abaixamento da vogal tônica broxa bruxa
Abaixamento da vogal postônica não-final círcolo círculo
Abaixamento da vogal pretônica inicial enteligente inteligente
Troca ‘u’ pelo ‘l’ nos verbos
8
sail saiu
Ao escrever ‘broxa, ‘círcolo’, ‘sentio’ e ‘boraco’, a criança estaria
supergeneralizando uma regra percebida: grafa-se ‘o’ mas pronuncia-se ‘u’. Do
mesmo modo, ao escrever ‘sail’ para ‘saiu’, a criança supergeneraliza uma regra que
8
Apesar de o caso do ‘u’ em final dos verbos ser considerado uma regularidade morfológica, nesta
pesquisa, casos relativos à morfologia e sua relação com a ortografia não foram abordados.
orienta a grafia de ‘l’ quando se pronuncia ‘u’ na posição final da sílaba; e no caso de
‘enteligente’ para ‘inteligente’, a regra que orienta a grafia de ‘e’ quando se
pronuncia ‘i’.
2.2.3.3 Erro relacionado ao sistema ortográfico.
2.2..3.3.1 Erros relacionados à correspondência regular contextual
Nesse caso, o contexto dentro da palavra é que vai definir qual letra terá de
ser utilizada, pois existe uma regra que define o valor da letra em função do contexto
específico em que ela se encontra, como mostra o quadro 6:
Quadro 6: Casos de correspondência regular contextual
Erros contextuais Exemplos Forma ortográfica
/x/ inicial rrato rato
/x/ intervocálico corendo correndo
/x/ pós-consonantal enrrolou enrolou
Coda nasal
9
bamco banco
‘g’ na frente do ‘a’ ‘o’ ‘u’ jola gola
‘j’ na frente do ‘a’ ‘o’ ‘u’ cagu caju
9
De acordo com Cagliari (2007) não é fácil definir quando ocorrem ou não consoantes nasais na
posição pós-vocálica, pois existe variação entre os dialetos. Para o dialeto do Rio Grande do Sul,
Bisol (2001) defende que a produção de uma consoante nasal com ponto de articulação, o qual é
assimilado da consoante seguinte.
No quadro 6, pode-se observar erros que são cometidos em decorrência da
não observância de regras contextuais as quais determinam as grafias permitidas
para os determinados contextos. No primeiro caso, para representar o ‘r-forte’, a
criança utiliza um ‘r’ entre vogais, infringindo a regra que determina a grafia do
dígrafo ‘rr’ para grafar ‘r-forte’ intervocálico. No segundo caso, ela grafa um dígrafo,
‘rr’, num contexto em que ele não é permitido, pois a regra determina que o dígrafo
pode ser grafado entre vogais. No caso da grafia das codas
10
nasais, a regra
determina que antes de ‘p’ e ’b’ se usa ‘m’, e nos demais contextos usa-se ‘n’. Por
fim, no caso da grafia do ‘j’ e do ‘g’ na frente do ‘a’, ‘o’, ‘u’ o que ocorre é a mudança
do som // para /g/, se o contexto da utilização do grafema não for observado.
2.2.3.3.2. Erros relacionados à correspondência irregular
Nesse caso, não regra que defina a utilização de determinada letra para
um dado contexto. São, portanto, os casos considerados arbitrários
11
no sistema
ortográfico, como por exemplo, o uso do ‘h’ em início de palavra. Lemle ([1982],
2002) afirma que esses erros são motivados pelas relações múltiplas que se
definem pelo fato de haver um grafema representado por vários fonemas e um
fonema representado por vários grafemas. Utilizando como exemplo o fonema /s/,
reproduzo a seguir um quadro que resume as opções disponíveis à criança,
considerando-se o contexto e os grafemas, para representá-los na escrita:
10
Codas são elementos consonânticos que ocupam o final das sílabas. Nas palavras ‘mel’ e ‘par’, por
exemplo, o ‘l’ e o ‘r’ ocupam posição de coda.
11
Nesta pesquisa, os termos arbitrários/arbitrariedade estão sendo utilizados como correspondentes
a irregulares/irregularidade.
Quadro 7: Casos do fonema /s/
Contexto /s/ Possíveis grafias
Início da palavra silêncio
cimento
´s´, ´c´
´c´, ´s´
Intervocálico excêntrico
nasça
nasce
maçã
massa
macio
sintaxe
´xc´, ´ss´, ´c´
´sç´, ´ss´, ´ç´
´sc´, ´ss´, ´c´
´ç´, ´ss´, ´sç´
´ss´, ´ç´, ´sç´
´c´, ´ss´, ´sc´
´x´, ´ss´, ´c´
Posição de coda experiência
leste
´x´, ´s´
´s´,´x´
Depois de coda pensar
onça
conceito
´s´, ´ç´/ ´c´
´ç´/´c´ ´s´
Final de palavra rês
vez
´s´, ´z´
´z´, ´s´
Fonte: Miranda et alii(2005)
Como se pode observar no quadro 7, à criança apresenta-se a difícil tarefa de
escolha, pois o sistema possibilita no mínimo dois grafemas para grafar o /s/ e não
nenhuma regra que determine a escolha correta. No quadro a seguir apresento
os principais casos de erros motivados pela irregularidade da norma ortográfica.
Quadro 8: Casos de correspondências irregulares
Correspondências irregulares Exemplos Forma Ortográfica
/s/ antes de ‘e’ e ‘i’ início de
palavra
sinema,
cempre
cinema, sempre
/s/ intervocálico dice, almosso disse, almoço
/s/ pré e pós-consonantal testo, texte texto, teste
/z/ intervocálico aprezentação apresentação
/
/ com ‘x’ ou ‘ch’ pranxa,
deichar
prancha, deixar
/
/ com ´j´ ou ´g´ antes de ‘e’ e
‘i’
sugeira, jente sujeira, gente
‘h’ no início da palavra orrivel horrível
Fonte: Adaptado de Miranda et alii (2005)
Como se observa no quadro dos casos de correspondências irregulares, a
maioria dos erros são motivados pela grafia do /s/, que, conforme apresentado no
quadro 8, oferece inúmeras possibilidades de escolhas para sua grafia, ocasionando
assim maiores dificuldades para a criança.
2.2.3.3.3. Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia
Os casos em que o contexto diminui a possibilidade de grafia são os erros em
que a criança comete por não respeitar o contexto da palavra, porém não tem como
prever o grafema correto para aquela posição, como mostram os exemplos do
quadro 9:
Quadro 9: /s/ intervocálico, /s/ pós-consonantal e uso indevido do ‘ç’
Casos Exemplos Forma ortográfica
/s/ intervocálico diseram disseram
/s/ pós-consonantal pensso penso
Uso indevido do ‘ç’ çinema - doçe cinema - doce
Conforme se pode observar no quadro 9, a criança grafa um ‘s’ para
representar o som [s], porém não observa o contexto intervocálico da grafia que
determina que o ‘s’ nesse contexto tem som de [z]. Apesar de a regra excluir a grafia
do ‘s’, um caso de irregularidade se observarmos que o som [s], na posição
intervocálica, pode ser grafado com ‘ss’ como em ‘pássaro’, ‘ç’ como em ‘moça’, ‘c’
como em ‘doce’, ‘x’ como em ‘máximo’, dentre outras grafias. No segundo caso, a
criança grafa o ‘ss’, em um contexto em que o dígrafo não é permitido, pois a norma
determina que ‘ss’ é permitido entre vogais. Apesar disso, nesse mesmo contexto
outras grafias são permitidas, como por exemplo, ‘ç/c’ e ‘s’. No terceiro caso
apresentado, o uso do ‘ç’ é permitido somente na frente do ‘a’, ‘o’, ‘u’ e no meio da
palavra, no entanto, a criança comete os erros apresentados por desconhecer essa
regularidade contextual. Embora exista essa regularidade, nesse contexto poderiam
ser grafados o ‘s’/ss/ ou ‘c’. O fato de a criança aprender a regularidade do contexto
pode levá-la a evitar os erros apresentados no quadro, restando, dentro desses
contextos, apenas mais um caso de irregularidade para ser resolvido.
2.2.4 O ensino e a aprendizagem da ortografia
Conforme mencionado na introdução deste trabalho, em relação ao
processo de ensino e aprendizagem da ortografia, estudos como o de Morais
(1995,1999b, 2003, 2005a, 2005b), Melo & Rego (1998), Matteoda (1999) e Leal &
Roazzi (2003) apontam a existência de diferentes posições. Essas posições podem
ser resumidas em duas principais: a primeira posição acredita que a aprendizagem
se pela interação com o material escrito e com a leitura; a segunda posição
defende que o ensino e a aprendizagem devem focalizar exercícios de
memorização. No entanto, os autores apontam também para uma outra posição que
se fundamenta na análise do sistema ortográfico. Ao analisar as relações entre
letras e sons no nosso sistema, percebe-se que, por um lado, relações
complexas de se entender (etimologia da palavra/irregularidade) e, por outro,
regularidades. Essas regularidades podem ser compreendidas pelos alunos,
reduzindo, assim, o número de palavras que devem ser memorizadas.
Considerando os limites e as possibilidades de transformação do ensino e
da aprendizagem da ortografia, estudos como o de Morais (1995,1999b, 2003,
2005a, 2005b), Melo & Rego (1998) e Matteoda (1999) apontam para a
necessidade de promover um trabalho sistemático referente ao ensino da ortografia,
ajudando o aluno a refletir e a internalizar as restrições ortográficas.
Morais (1995) defende a idéia de que as regularidades do sistema
ortográfico podem servir como elemento facilitador para a compreensão daqueles
que estão aprendendo e que o ensino e a compreensão dessas regularidades pode
facilitar a aprendizagem da ortografia. Rego & Buarque (2005) afirmam que o
processo de ensino-aprendizagem da ortografia deve proporcionar situações que
permitam à criança compreender as restrições e as regras da ortografia,
amenizando a sobrecarga da memória.
Estudos como o de Nunes (1992) e Monteiro (2005) mostram que os erros
ortográficos não são aleatórios e sim gerados por constantes hipóteses elaboradas
pelas crianças em fase de escrita inicial. Essas hipóteses variam com a evolução da
aprendizagem. Isso significa dizer que a criança, ao escrever, pensa sobre a língua
e busca regularidades que lhe possibilitem compreender o sistema ortográfico e usa-
lo corretamente. Para complementar, Morais (2005b) argumenta que, para existir
realmente a aprendizagem dessas regras, é preciso desenvolver na criança a
capacidade de explicitá-las.
Em relação às regras contextuais, estudos como o de Morais (2003, 2005b),
Monteiro (2005), Leal & Roazzi (2005), Melo & Rego (1998) afirmam que quanto
maior o nível de explicitação dos alunos a respeito das regularidades e restrições do
sistema, melhor seu rendimento ortográfico. Através dessas explicitações, o
professor consegue entender quais as hipóteses dos alunos ao escolher
determinada grafia e dar a eles um retorno cognitivo
12
que possibilita a reflexão e a
aprendizagem, pois segundo Monteiro (2005, p.56),
as crianças estão sempre em busca de regularidades no sistema de
escrita. Essa busca de regularidades é vencida quando as hipóteses
das crianças são contrariadas por dados da realidade. É nesse momento
que o aprendiz um salto em relação à compreensão do sistema
ortográfico. Cabe à escola, portanto, estar a par desse processo e usá-lo,
como forma de fazer com que a criança evolua mais rapidamente na
utilização de regras ortográficas.
12
Retorno cognitivo é utilizado por Morais (1999) para caracterizar a intervenção do professor.
Morais (2003) acredita que a explicitação das hipóteses está diretamente
relacionada com a possibilidade de o aluno duvidar também de suas produções,
pois, segundo o autor, para corrigir deve-se saber sobre a ortografia, visto que para
encontrar soluções corretas para as dúvidas deve-se ter algum conhecimento da
norma. O autor defende que o professor deve estimular o aluno a levantar hipóteses
e a duvidar e também que o ensino de ortografia deve seguir uma ordem. A primeira
habilidade a ser ensinada é a distinção entre o que pode ser entendido e o que é
reprodutivo na ortografia. No primeiro caso é preciso construir as regras com as
crianças e proporcionar momentos para explicitação dessas regras. No segundo
caso é preciso ajudar a criança a se conscientizar de que não existem regras que
justifiquem as formas corretas fixadas pela norma.
Por fim, Morais (2003) traz a idéia de que a correção dos erros mais eficaz é
aquela que é feita durante o processo de produção, pois o professor pode estimular
os alunos a duvidarem e anteciparem soluções bem como pode ter acesso e intervir
nas hipóteses dos alunos através de suas explicitações.
Assim, saber como mediar a construção, descoberta e compreensão por
parte das crianças e ajudá-las no processo de explicitação de regras, constitui um
desafio para a prática docente. E, como este trabalho envolve uma prática
pedagógica, é preciso esclarecer quais as teorias que fundamentam as intervenções
realizadas para o ensino e a aprendizagem da ortografia.
2.3. Sobre ensino e aprendizagem
2.3.1. Teoria sócio-histórica
A teoria Sócio-histórica é representada, principalmente, pelos estudos de
Vigotski, os quais têm como enfoque principal o desenvolvimento das funções
psicológicas superiores no contexto histórico, social e cultural. Funções psicológicas
superiores tais como a atenção e a memória voluntária, o controle consciente do
pensamento, o raciocínio dedutivo e a capacidade de planejamento, diferem-se das
funções elementares por serem específicas dos seres humanos, regulando a ação
em função de um controle voluntário (REGO, 1996, p.24).
Para Vigotski (2000), o aprendizado é fundamental para o desenvolvimento
das funções psicológicas superiores. Ele explica que “o aprendizado humano
pressupõe uma natureza social específica e é um processo através do qual as
crianças penetram na vida intelectual daqueles que a cercam” (p.115). O
desenvolvimento das funções psicológicas superiores ocorre. segundo Vigotski
(2000, p. 75), da seguinte forma:
todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes:
primeiro, no nível social, e, depois, no nível individual; primeiro, entre
pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança
(intrapsicológica). Isso se aplica igualmente para atenção voluntária, para a
memória lógica e para formação de conceitos. Todas as funções
psicológicas superiores originam-se das relações reais entre indivíduos
humanos.
A partir dessa idéia, pode-se perceber a importância dos outros na
aprendizagem. Pensando nessa interação com o outro e na potencialização da
aprendizagem, Vigotski (2000, p. 112) define o conceito de zona de desenvolvimento
proximal (ZDP) como sendo “a distância entre o nível de desenvolvimento real, que
se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a
orientação do adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes”. O autor
explica que o ensino é responsável por criar novas zonas de desenvolvimento
proximal, que amplia, na criança, os vários processos de desenvolvimento que se
realizam na interação com adultos ou com companheiros mais capazes que estão
em um nível mais avançado do que ela em relação à determinada função
psicológica superior ou conhecimento. Assim, na medida em que a criança
internaliza um determinado conhecimento uma nova ZDP “emerge”. Para Vigotski
(2000, p. 113)
a zona de desenvolvimento proximal permite-nos delinear o futuro
imediato da criança e seu estado dinâmico de desenvolvimento,
propiciando o acesso não somente ao que foi atingido através do
desenvolvimento, com também aquilo que está em processo de
maturação (...) O que é zona de desenvolvimento proximal hoje, será
o desenvolvimento real amanhã ou seja, aquilo que uma criança
pode fazer com assistência hoje, ela será capaz de fazer sozinha
amanhã.
Na perspectiva vigotskiana, a escola tem papel fundamental na criação de
zonas de desenvolvimento proximal, pois é nessa instituição que as crianças têm
acesso aos conceitos científicos. Os conceitos científicos se diferenciam dos
espontâneos por serem sistematizados e apreendidos em situações escolares. Os
conceitos espontâneos referem-se àqueles construídos por meio da atividade prática
da criança e sua comunicação direta com os que a rodeiam. Apesar de diferentes,
os dois tipos de conceitos devem ser sempre relacionados. Para desenvolver os
conceitos científicos adequadamente e fazer com que a escolarização seja
significativa para vida do aluno, é preciso uma interação sistemática entre os
conceitos científicos e os espontâneos e essa interação deve ser propiciada pelo
professor em conjunto com o aprendiz. Durante essa interação, as funções
psíquicas superiores do aluno também amadurecerão, pois, como mencionado
anteriormente, os conceitos científicos, juntamente com o controle voluntário que
fomentam, influem nesse processo.
Rego (1996) escreve sobre as inúmeras contribuições da teoria de Vigotski
para a educação. A primeira contribuição, mencionada pela autora, diz respeito ao
fato de que é por meio do conceito de zona de desenvolvimento proximal que o
autor explicita a inter-relação entre o desenvolvimento, o ensino e a aprendizagem.
Também, essa teoria valoriza a escola, colocando-a como elemento principal no
desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Para a autora (1996, p. 108),
a escola desempenhará seu papel se, partindo daquilo que a criança
sabe, for capaz de desafiar a construção de novos conhecimentos, incidir
na zona de desenvolvimento proximal dos educandos. Desta forma poderá
estimular processos internos que acabarão por se efetivar, passando a se
constituir como base que possibilitará novas aprendizagens.
Assim, de acordo com essas idéias, o papel do professor é imprescindível,
pois ele é um elemento mediador entre os alunos e o objeto de conhecimento. Ele
deve propor uma intervenção pedagógica que possibilite uma relação entre os
conceitos espontâneos das crianças e os conceitos científicos, pois a compreensão
de um conhecimento é facilitada quando uma organização de novos elementos
numa estrutura de significados (POZO, 2002). Deve também oferecer modelos de
estratégias de pensamento para que a criança, num primeiro momento, possa imitar.
Para Vigotski (2000), a imitação é parte importante no aprendizado, pois permite que
as crianças, a partir de um modelo, construam suas próprias maneiras de agir
perante o objeto de conhecimento. Entretanto, é importante salientar que o autor
diferencia a imitação de mera cópia, que nela a participação do sujeito que
imita, que usa um modelo como referência para criar sua própria ação.
A criança consegue imitar o que está na sua zona de desenvolvimento
proximal. Assim, com o auxílio de um adulto ela pode imitar várias ações que vão
além da sua capacidade. Essas ações externas, inicialmente imitadas, são
reconstruídas internamente pelo sujeito, Vigotski (1996) denominou esse processo
de internalização.
Por fim, retomando suas idéias sobre a relação aprendizagem e
desenvolvimento, Vygotsky (1982, p. 243) escreve que
a instrução só é válida quando precede o desenvolvimento. Então desperta
e engendra toda uma série de funções que se encontravam em estado de
maturação e permaneciam na zona de desenvolvimento proximal. É nisso
que consiste o papel principal da instrução no desenvolvimento.
2.3.2 O conceito de boa-aprendizagem
Aproximando-se dos pressupostos que fundamentam a teoria de Vigotski
(1996, 2000), mas focalizando o papel do professor, Pozo (2002) desenvolve o
conceito “boa aprendizagem”. Sem descartar a aprendizagem por associação, Pozo
(2002) defende que a aprendizagem “requer um envolvimento ativo, baseado na
reflexão e na tomada de consciência por parte do aprendiz” (p.50).
Quando a aprendizagem não tem esta qualidade, é preciso, segundo Pozo
(2002), que ocorram mudanças. A primeira mudança educacional para promover
uma “boa aprendizagem” é, segundo o autor, a modificação das estratégias
pedagógicas utilizadas pelo professor para ensinar. O professor deve gerar uma
nova cultura da aprendizagem a partir de novas formas de instrução. Deve organizar
e planejar suas atividades levando em conta não como seus alunos aprendem,
mas principalmente como quer que seus alunos aprendam. A “boa aprendizagem”
resultaria numa mudança duradoura e transferível a novas situações e seria
conseqüência direta da prática pedagógica realizada. Segundo o autor:
tanto a construção do conhecimento como a mera associação são muito
afetadas pela seqüência em que se realizam as atividades de
aprendizagem, que as atividades anteriores vão sempre condicionar as
que vêm a seguir (Pozo, 2002, p. 62)
O ensino, então, deve basear-se num equilíbrio entre o que se tem de
aprender, a forma como se aprende e as atividades práticas para promover essa
aprendizagem. Deve ter como objetivo central criar “condições ótimas” (Pozo, 2002,
p.69) para certos tipos de aprendizagens e essas condições devem estar ligadas ao
planejamento das intervenções.
A segunda mudança educacional é entender a aprendizagem como uma
construção. A aprendizagem construtiva tenta organizar as novas aprendizagens a
partir dos conhecimentos anteriores, promovendo uma reflexão consciente sobre os
próprios conteúdos. Esse tipo de aprendizagem entende que para existir
compreensão é preciso relacionar os conhecimentos, relacionando-os com uma
estrutura de significados construída. Compreender significa, então, traduzir algo
para as próprias idéias ou palavras. Pozo (2002, p. 127) construiu um esquema que
descreve as condições ou requisitos para que se produza uma aprendizagem
construtiva.
Condições da aprendizagem construtiva
Relativas ao material Relativas à aprendizagem
Organização Vocabulário e Terminologia Conhecimentos Prévios Predisposição
Interna adaptado aos alunos favorável à compreensão
Busca do Sentido e do Significado do que se aprende
O esquema apresentado mostra que o material de aprendizagem para ser
compreendido necessita ter uma organização conceitual interna, ou seja, cada
elemento da nova informação deve ter uma conexão lógica ou conceitual com os
outros elementos que a compõem. Além de ter essa organização, convém que a
terminologia e o vocabulário empregado não sejam excessivamente novos e difíceis
para o aluno. Em relação à aprendizagem, é preciso que a intervenção pedagógica
seja organizada a partir dos conhecimentos prévios dos alunos, bem como deve
“criar” no aluno a vontade de compreender para que, por fim, ele possa atribuir
significado e sentido ao novo conhecimento a partir da reconstrução dos
conhecimentos prévios.
As características da aprendizagem construtiva seriam: basear-se na
solução de problemas ou tarefas abertas, induzir o aluno a fazer perguntas,
incentivar a ação ou a tomada de consciência de seus próprios conhecimentos,
incentivar a regulagem de seus próprios processos cognitivos, planejar atividades
que possam ser realizadas em grupo e, ainda, tornar o conhecimento transferível
para outras situações de aprendizagem.
Para o autor, tomar consciência implica aprender a fazer certas coisas com
nossos próprios processos cognitivos, utilizando-os de modo estratégico para
alcançar determinadas aprendizagens. A reflexão e tomada de consciência de
nossos processos de memória, atenção e aprendizagem, assim como os produtos
de nosso pensamento, nos proporcionam o metaconhecimento, que, segundo Pozo
(2002, p. 158) é
um saber sobre o que sabemos, que pode nos ajudar a tomar consciência
do nosso funcionamento cognitivo. Essa reflexão consciente sobre os
processos e produtos cognitivos deve, de algum modo, nos proporcionar
melhores instrumentos cognitivos para intervir nesses processos e
modificá-los.
Essa tomada de consciência pode auxiliar o aluno a dirigir melhor sua
aprendizagem. Para isso, ele deve responder a tarefas que exijam um exercício
sistemático desses processos conscientes: planejar, regular a própria prática e
corrigir seus erros, avaliar os resultados obtidos, refletir sobre suas formas de
aprender e sobre o que está aprendendo.
Tarefas como essas são muito difíceis de serem realizadas sem instrução,
portanto, os professores devem proporcionar aos alunos uma “estrutura de
andaimes”. Essa idéia de “andaimes” está vinculada ao conceito de zona de
desenvolvimento proximal de Vigotski (2000). Nas palavras de Pozo (2002, p. 165)
que se trata de construir, os professores devem construir estruturas de
‘andaimes’ que apóiem a construção desse conhecimento desde fora, o
andaime sempre um pouco acima da casa, antecipando-se, criando novas
zonas para a construção de conhecimentos, para em seguida, ir retirando
pouco a pouco esses apoios quando a construção é sólida o bastante
para se manter em por si mesma e funcionar sem necessidades de
muletas nem próteses cognitivas.
Uma dessas formas do professor ajudar os alunos é emprestar-lhes sua
consciência da tarefa, de modo que num primeiro momento envolva os alunos na
realização dessa tarefa sob a sua supervisão mais direta. De maneira gradual, o
professor deve transferir o controle das atividades para o próprio aluno, que aos
poucos se torna consciente de seus próprios processos e produtos de
aprendizagem.
Por último, o autor defende a idéia de que uma ‘boa aprendizagem’ deve
ocorrer através da interação entre professores e alunos e entre alunos e alunos, o
que ele denomina aprendizagem cooperativa. A aprendizagem cooperativa favorece
o surgimento de conflitos cognitivos entre os aprendizes e ainda suporte para a
resolução dos conflitos. Segundo Pozo (2002, p. 259),
cooperando não apenas fazemos melhores perguntas como, às vezes,
também vislumbramos melhores respostas. Os aprendizes se
proporcionam ajudas, se corrigem mutuamente, constroem conjuntamente
novos argumentos e idéias que de modo separado dificilmente teriam
criado. (...) Às vezes, os aprendizes podem elaborar melhores ajudas para
seus colegas do que o mestre, porque conhecem esse território melhor,
que acabam de passar por ele, fazendo-se as mesmas perguntas e
encontrando algumas soluções a compartilhar.
Todas essas discussões contribuem para a definição do conceito de boa
aprendizagem que é norteador da pesquisa em desenvolvimento.
2.3.3. Metacognição
Por se tratar de uma pesquisa cujo objetivo é analisar os dados de escrita
resultantes de uma prática centrada no uso de estratégias metacognitivas, torna-se
importante definir o conceito de metacognição. De uma forma breve, pode-se dizer
que a metacognição é a capacidade de conhecer e pensar sobre o seu próprio
pensar.
O primeiro autor a sistematizar o conceito de metacognição, nos anos 70,
foi Flavell. Para o autor, metacognição é o conhecimento que o sujeito tem sobre
seu próprio conhecimento, ou seja, o conhecimento dos próprios processos e
produtos cognitivos. O sentido essencial do termo é “cognição acerca da cognição”
(Flavell, 1999, p. 125)
Flavell (1999) chama atenção para a importância da monitoração cognitiva,
o que inclui quatro aspectos que se inter-relacionam: a) conhecimento
metacognitivo; b) experiências metacognitivas; c) objetivos e d) ações (estratégias).
O conhecimento metacognitivo pode ser definido como sendo o
conhecimento que o aprendiz possui sobre si próprio, sobre os fatos ou variáveis da
pessoa, da tarefa, da estratégia e sobre o modo como eles afetam os resultados dos
processos cognitivos. As experiências metacognitivas são experiências conscientes,
cognitivas e afetivas. Envolvem as impressões, sentimentos ou percepções
conscientes que podem ocorrer durante ou após um empreendimento cognitivo.
Pode-se considerar que o conhecimento metacognitivo e as experiências
metacognitivas estão interligados, na medida em que o conhecimento permite
interpretar as experiências e agir sobre elas. Estas, por sua vez, contribuem para o
desenvolvimento e a modificação desse conhecimento. Os objetivos, tanto
implícitos como explícitos, são impulsionadores e mantêm o empreendimento
cognitivo, e podem ser colocados pelo professor ou selecionados pelo próprio
aprendiz. As ações correspondem às estratégias utilizadas para potencializar e
avaliar o progresso cognitivo. Estas podem ser de dois tipos: se forem utilizadas a
serviço do processo de monitorização, ou seja, sempre que está envolvida a
avaliação da situação, as ações podem ser entendidas como estratégias
metacognitivas, produzindo experiências metacognitivas e resultados cognitivos.
Porém, se forem utilizadas para produzir progresso cognitivo, ou seja, quando a
finalidade consiste em atingir um objetivo cognitivo, podem ser entendidas como
estratégias cognitivas, produzindo experiências metacognitivas e resultados
cognitivos (FLAVELL, 1999; FIGUEIRA, 1997; RIBEIRO, 2003). Em suma, segundo
Flavell (1999, p. 129)
A principal função de uma estratégia cognitiva é lhe ajudar a alcançar o
objetivo de qualquer iniciativa cognitiva em que você esteja envolvido. Em
contraste a principal função de uma estratégia metacognitiva é lhe oferecer
informações sobre a iniciativa ou seu progresso nela. Podemos dizer que
as estratégias cognitivas são evocadas para fazer o progresso cognitivo, e
as estratégias metacognitivas para monitorá-lo.
Em relação à importância do controle consciente ou monitoração, Figueira
(1997) afirma que existem posições controversas sobre a definição da necessidade
de auto-regulação para ser considerado um processo de metacognição,
Alguns autores abordam a metacognição enfatizando quer o conhecimento
do próprio conhecimento (metaconhecimento), conhecimento dos próprios
processos cogntivos e suas formas de operação, quer o controlo executivo
ou auto-regulação do pensamento (grau de deliberação, regulação ou
monitorização cognitiva), isto é, capacidade para controlar esses
processos, outros atribuem a importância somente a uma das dimensões,
afirmando a sua independência, enfatizando ou o controlo executivo ou o
conhecimento
Desse modo, julga-se necessário afirmar que o conceito utilizado nesta
pesquisa, seguirá a concepção de Flavell (1999) que define conhecimento
metacognitivo como o conhecimento de que determinados conceitos, práticas e
habilidades são dominados enquanto outros ainda não, reconhecendo o que se é
ou não capaz de alcançar e, também, como conhecimento da maneira pela qual o
pensamento e as funções superiores (atenção, memória, compreensão) atuam na
resolução de problemas.
2.3.3.1. Estratégias Cognitivas, Metacognitivas e Mnemônicas
As estratégias de aprendizagem podem ser caracterizadas como métodos ou
ações que as pessoas utilizam para adquirir informação. Segundo Pozo (1996), elas
são os procedimentos ou atividades escolhidas pelas pessoas, a fim de facilitar a
aprendizagem, o armazenamento e/ou a utilização da informação. Para o autor, o
trabalho do professor deveria ser dirigido não para proporcionar conhecimentos
como também para fomentar as estratégias de aprendizagem.
Estudos como os de Pozo (1996), Flavell (1999) e Boruchovitch (1999)
afirmam que existem muitas pesquisas sobre quais seriam as estratégias de
aprendizagem e sobre o modo como elas poderiam ser categorizadas.
13
Neste
trabalho, torna-se necessário definir três tipos de estratégias: cognitivas,
metacognitivas e mnemônicas.
Para Flavell (1999) as estratégias cognitivas são aquelas em que os
princípios que regem as ações cognitivas são inconscientes e automáticos; as
estratégias metacognitivas são as ações conscientes e controladas que envolvem
conhecimentos sobre a pessoa, a tarefa e as estratégias empregadas durante sua
atividade cognitiva; as estratégias mnemônicas são aquelas que a pessoa utiliza, de
maneira consciente ou não, para facilitar o acesso à informação contida na memória.
Flavell (1999) aponta para a necessidade de os professores investirem no
desenvolvimento de estratégias metacognitivas, pois, segundo ele, as pesquisas
sobre estratégias de aprendizagem mostram que as estratégias cognitivas e as
mnemônicas são, mesmo que indiretamente, desenvolvidas na escola. as
estratégias metacognitivas exigem um ensino sistemático e, portanto, devem ser
privilegiadas na prática pedagógica do professor. Como o autor afirma (p. 130)
Se as habilidades metacognitivas são úteis no aprendizado escolar e se os
estudantes, especialmente os mais jovens, são deficientes nelas, surge
uma possibilidade intrigante: talvez estas habilidades possam e devam ser
ensinadas diretamente às crianças, como parte integrante do currículo
escolar.
Desse modo, apesar da prática desenvolvida neste trabalho englobar as
estratégias cognitivas e as mnemônicas, o principal enfoque foi no desenvolvimento
13
Pozo (19996) apresenta uma categorização para as estratégias de aprendizagem, as quais seriam
classificadas em dois grandes grupos: estratégias de associação e estratégias de reestruturação.
de estratégias metacongitivas, cujo principal papel é, segundo Da Silva e De
(1997), permitir aos alunos ultrapassar as possíveis dificuldades pessoais e
ambientais a fim de conseguirem obter sucesso escolar.
2.3.3.2 Implicações do conceito de metacognição na aprendizagem
A importância da metacognição na aprendizagem é uma questão discutida
por vários autores. Alguns estudos relacionados à aprendizagem, tais como Pozo
(1996) e Da Silva & De (1997), defendem que a utilização de estratégias
metacognitivas é uma maneira eficaz de potencializar o aprendizado de alunos, pois,
além de proporcionar um avanço cognitivo, o uso das estratégias possibilita ao aluno
interferir conscientemente no seu desempenho escolar.
Segundo Source & Spenser (1990) e Ribeiro (2003), o professor deveria,
por meio de atividades de pesquisa e resolução de problemas, incentivar o aluno a
usar as estratégias cognitivas e metacognitivas, pois, segundo os autores, essas
estratégias são transferidas do contexto escolar para todas as situações de
aprendizagem, mesmo fora do ambiente escolar. A eficácia da aprendizagem não
dependeria somente da idade, do nível intelectual ou da experiência do aluno, mas
sim, poderia ser diretamente influenciada pela aquisição de estratégias cognitivas e
metacognitivas que possibilitem ao aluno planejar e monitorar o seu desempenho
escolar.
Boruchovitch (1999) em seu estudo, cujo objetivo é revisar criticamente
trabalhos sobre a relação entre as estratégias de aprendizagem e o desempenho
escolar de alunos, afirma que são escassas as pesquisas que investigam o impacto
das estratégias de aprendizagem no desempenho escolar de alunos, mas que, se
analisarmos a produção acadêmica que existe, observaremos que os resultados
encontrados apontam para a análise de um melhor desempenho escolar por alunos
que passaram por uma intervenção voltada para o uso de estratégias de
aprendizagem.
As autoras Da Silva & De (1997, p.25) defendem que uma análise das
capacidades metacognitivas das crianças possibilitaria uma explicação para a
diferença no desempenho individual de crianças que apresentam capacidades
intelectuais semelhantes, pois elas podem atuar de maneira diferente sobre seus
processos de aprendizagem. Davis, Nunes & Nunes (2005), após implementarem
uma intervenção pedagógica voltada para a metacognição, perceberam que os
alunos passaram a explicitar diferentes modos de pensamentos, a apresentar maior
estímulo e coragem para encontrar as respostas certas e a transferir as estratégias e
os conhecimentos aprendidos para outros contextos.
Santos (2005), ao pesquisar o uso de estratégias metacognitivas na formação
do pedagogo, apresenta algumas contribuições da metacognição para a
aprendizagem. Segundo a autora (2005, p. 110)
A tomada de consciência dos próprios processos cognitivos facilita o
controle dos alunos sobre seus próprios processos mentais, portanto,
conecta-se a auto-regulação; (...) o aluno é estimulado a desenvolver
procedimentos com estratégias de aprendizagem mais eficientes; o aluno,
ao desenvolver estratégias de aprendizagem eficientes, melhora sua
aprendizagem; o aluno, ao melhorar sua aprendizagem, amplia seu
desenvolvimento cognitivo.
Damiani, Gil & Protásio (2005), ao avaliarem uma prática pedagógica,
desenvolvida no Curso de Pedagogia, que utilizou atividades metacognitivas e
estudos teóricos sobre a aprendizagem, perceberam que essas atividades
potencializaram os processos de aprendizagem das alunas do Curso, e que, ao
analisarem suas experiências metacognitivas, as alunas salientaram a importância
da interação para efetivamente existir um aprendizado.
Os resultados dessas pesquisas sobre o uso de metacognição nas diferentes
situações de aprendizagem indicam que uma prática voltada para o uso de
estratégias metacognitivas possibilita uma melhora no aprendizado dos alunos.
Desse modo, a decisão de planejar atividades que possibilitassem o uso de
estratégias metacognitivas é respaldada nesses estudos que divulgam os resultados
positivos de uma intervenção que visa a metacognição.
3. METODOLOGIA DE PESQUISA
Neste capítulo será apresentada a metodologia utilizada para a intervenção
realizada e também a metodologia da pesquisa. Primeiramente, será feita a
caracterização dos sujeitos e, logo após, uma breve caracterização da intervenção
realizada
14
. Em seguida, será descrita a forma de coleta de dados bem como a
definição das amostras que serão utilizadas na análise de dados. Finalizando o
capítulo, será descrito o grupo de controle.
A pesquisa é de cunho quantitativo e, posteriormente, qualitativo. A análise
quantitativa dos dados tem como objetivo fazer um levantamento da quantidade de
erros cometidos pelos alunos em relação às diferentes categorias de análise dos
erros, enquanto a análise qualitativa pretende focalizar prioritariamente o processo
de aprendizagem da escrita ortográfica.
3.1 Sujeitos
Os sujeitos da pesquisa são alunos de uma 2
a
série do Ensino Fundamental
de uma escola particular da cidade de Pelotas. A turma era formada por vinte e um
14
A coleta de dados foi realizada em 2006. As intervenções e os instrumentos para coleta de dados
propostos neste trabalho foram utilizados em uma pesquisa anterior sobre o uso de atividades
reflexivas no ensino da ortografia (MONTEIRO, 2006).
alunos dos quais foram selecionados dezenove. Os alunos selecionados obedeciam
aos seguintes critérios: a) estavam no nível alfabético de escrita e b) não possuíam
necessidades educativas especiais Todos os dezenove alunos selecionados
cursaram pelo menos um ano de pré-escola e freqüentaram a 1
a
série na mesma
escola em que se realizou a pesquisa. Dos dezenove alunos, onze são meninos e
oito são meninas, todos com idades que variam dos 7 aos 8 anos. Em relação à
escolaridade dos pais, num total de 38, 26 possuem terceiro grau completo e 12 o
Ensino Médio.
3.2. Metodologia da Intervenção
As atividades pedagógicas que foram planejadas para a intervenção
visavam:
a) levar os alunos a uma primeira análise do sistema ortográfico;
b) incentivar a explicitação de hipóteses na construção de regras ortográficas;
c) possibilitar a interação com o objeto de conhecimento e entre os colegas,
incentivando a utilização e avaliação de estratégias individuais e grupais.
d) exercitar e estimular a utilização de estratégias cognitivas, metacognitivas e
mnemônicas.
As atividades foram planejadas seguindo uma ordem. Inicialmente, elas
tiveram como foco os aspectos fonéticos e fonológicos da língua para que as
diferenças formais entre a fala e a escrita fossem estabelecidas. Posteriormente,
foram trabalhadas as correspondências regulares contextuais, as quais possuem
regularidades que, se compreendidas pela criança, podem facilitar o processo de
aprendizagem da ortografia. Por fim, foram trabalhadas as correspondências
irregulares, pois estas exigem o uso de estratégias mnemônicas. Todas as
atividades possibilitaram o uso de estratégias cognitivas e metacognitivas que, em
outros momentos da aula, eram retomadas, auxiliando no processo de pensar e
construir hipóteses sobre a língua e sobre a escrita.
Os alunos foram, ao longo do processo, anotando em um caderno
específico as regras construídas em grupo e descrevendo algumas das estratégias
exercitadas nas aulas. Tanto as regras quanto as estratégias eram escritas com as
palavras dos alunos, após a realização das atividades.
3.3 Coleta de dados
A coleta de dados foi longitudinal e estendeu-se de março a dezembro de
2006. Durante esse período, foram realizadas oficinas de produção textual,
propostas a toda turma, e foram, também, realizadas entrevistas individuais que
possibilitaram a coleta de dados referentes às explicitações de estratégias de
pensamento utilizadas pelos alunos relativamente às escolhas das grafias das
palavras. Também foram coletados dados das falas das crianças quando
respondiam a alguma intervenção relacionada à norma ortográfica.
3.3.1 Os textos
Os textos analisados para a retirada dos erros são resultantes de produções
espontâneas realizadas a partir de oficinas de produção textual. Antes de iniciar a
escrita da redação, era proposto um momento de motivação para que cada aluno
pensasse na estruturação e nos elementos de seu texto. Foram feitas perguntas,
tais como: Onde aconteceu? Com quem? Quando? O que aconteceu? Qual o
enredo? Como termina? Essas perguntas são respondidas oralmente, com o
objetivo de organizar o pensamento das crianças e ainda enriquecer as suas
narrativas com outros elementos.
Foram analisadas as produções textuais espontâneas, pois acredito que é
por meio da escrita espontânea que posso ter acesso às hipóteses e às estratégias
que os alunos utilizam na atividade de escrever. Nesse sentido, os erros ortográficos
são demonstrações dessas hipóteses e níveis de conhecimento dos alunos e
servem como fonte de informação para o planejamento das intervenções
pedagógicas.
Os textos foram coletados mensalmente de março a dezembro de 2006
(Apêndice A), ao final da coleta foi produzido um total de 190 textos. Também foram
selecionados os meses de março, junho e setembro para levantamento de erros de
10 produções textuais feitas durante esses meses, com o objetivo de observar a
quantidade de erros relacionada às diferentes categorias de análise e,
conseqüentemente, o efeito da intervenção sobre o desempenho ortográfico dos
alunos.
3.3.2 Diário de campo
No diário de campo foram feitas anotações para registrar as reações, os
questionamentos e as interações orais dos alunos. Essas anotações foram
realizadas sempre que eram desenvolvidas atividades relacionadas à norma
ortográfica e também nos momentos de escrita espontânea dos alunos. Logo após
as aulas, as anotações feitas eram digitadas e os dados organizados da seguinte
maneira: a) intervenções pedagógicas e b) momentos de escrita. A seção que
contém a transcrição das falas e das atitudes nos momentos de escrita foi
subdividida de acordo com as categorias dos erros que serão analisados no
trabalho: motivação fonética, motivação fonológica, correspondência regular
contextual e correspondência irregular.
3.3.3 Entrevistas
As entrevistas individuais tiveram como objetivo coletar dados referentes à
explicitação de hipóteses e justificativas para a escrita de determinadas palavras, a
fim de que se pudesse entender quais as estratégias que os alunos utilizavam para
resolver seus conflitos no momento da escrita.
As entrevistas foram realizadas a cada dois meses nos momentos de
correção da produção textual. As produções textuais dos alunos eram corrigidas da
seguinte maneira: a quantidade de erros encontrados em cada parágrafo era
explicitada; a criança recebia a produção com a quantidade de erros identificada e
começava a eliminar as palavras que considerasse corretas, chegando a um número
reduzido de palavras que pudessem conter os erros, os quais deviam ser
identificados. No momento da identificação e da correção dos erros eram feitas
perguntas que procuravam levar o aluno à explicitação das suas hipóteses.
3.3.4 Ditados
Foram realizados, ao final do ano letivo, dois ditados com palavras
inventadas a fim de que se pudesse verificar o uso de regras contextuais
trabalhadas. Segundo Rego e Buarque (2005), a utilização de palavras inventadas
assegura que a criança está usando as regras de contextos gerativamente, uma vez
que essas palavras, embora possam ser escritas de acordo com a norma ortográfica
do português, nunca foram visualizadas pelas crianças.
O primeiro ditado (Apêndice B), com dez palavras inventadas, foi realizado
para analisar a grafia do ‘r’ forte e fraco nos seguintes contextos: ‘r-inicial´ (renco), ´r-
forte intervocálico´ (mirro), ´r-fraco´ (paroto) ´r- pós-consonantal’ (panro).
O segundo ditado (Apêndice C), com dez frases que continham palavras
inventadas e palavras reais, teve como objetivo analisar outras regras contextuais
tais como: ´s´ intervocálico com som de [z], coda nasal, utilização do ‘ç’. Essas
palavras pertenciam a diferentes classes gramaticais
15
como: substantivo (dacimpa),
verbo (tansarou), adjetivo (telso).
3.4 O grupo de controle
A idéia de constituir um grupo de controle surgiu da necessidade de
comparar a utilização de estratégias cognitivas e metacognitivas e o nível de
explicitação de conhecimento ortográfico de crianças com padrão sócio-econômico
semelhantes. Morais (1995) pesquisou crianças, do 2
o
ao 4
o
ano de instrução formal
em leitura e escrita, da escola pública e da escola particular e percebeu que a
diferença de nível sócio-cultural influencia o rendimento e o nível de explicitação do
conhecimento ortográfico das crianças.
15
As diferentes classes gramaticais foram propostas com o intuito inicial de observar como a criança
escreveria, por exemplo, as terminações verbais. Esses dados não foram analisados devido ao foco
da pesquisa.
Desse modo, por esta pesquisa estar sendo realizada com crianças de uma
escola particular que têm acesso a materiais escritos e ao dialeto padrão, tornou-se
necessário instituir um grupo de controle que fosse composto de crianças com níveis
sócio-culturais semelhantes, mas que recebessem um tipo de instrução diferente.
O objetivo do grupo de controle é comparar o resultado de testes de dois
alunos que passaram por uma intervenção que privilegia a reflexão e a explicitação
de pensamentos bem como o uso de estratégias cognitivas e metacognitivas e dois
alunos de uma outra turma que não tiveram acesso a esse tipo de intervenção.
O critério utilizado para a escolha dos alunos foi o seu rendimento
ortográfico. As professoras, das duas turmas pesquisadas, indicaram dois alunos
com ótimo rendimento e dois alunos com rendimento regular.
Os dados foram coletados a partir da análise de um fragmento retirado da
produção textual de cada aluno. Após a leitura do fragmento realizada pelo aluno,
ele deveria identificar os erros ortográficos. Concomitantemente ao processo de
identificação dos erros, foram feitas perguntas com o objetivo de possibilitar às
crianças explicitarem seus pensamentos e suas hipóteses ao identificarem e ao
corrigirem os erros.
4. DESCRIÇÃO E ALISE DOS DADOS
Este capítulo tem o objetivo de apresentar a descrição dos erros ortográficos
encontrados nas produções textuais coletadas para esta pesquisa e analisar as
intervenções realizadas em sala de aula referentemente à ortografia. Para tanto,
será dividido em duas grandes seções. Na primeira, os erros de escrita encontrados
nas produções textuais serão descritos com base nas categorias de análise
propostas na seção 2.2.2.3 deste trabalho; na segunda, as intervenções
pedagógicas, bem como as respostas das crianças, serão discutidas a partir da
teoria que fundamenta este trabalho.
4.1 Os erros ortográficos
4.1.1. Erros de motivação fonética
Os erros de motivação fonética são interpretados neste estudo como
resultantes do fato de a criança, na tentativa de compreender as propriedades da
língua escrita, compará-la com a linguagem oral. Estou considerando que a criança
pode, em alguns momentos, estabelecer uma relação direta entre a fala e a escrita,
cometendo os erros de motivação fonética.
Na tentativa de representar a forma fonética da palavra, os alunos da 2
a
série
pesquisada cometeram erros relacionados à grafia das vogais, dos ditongos, das
codas laterais, dos ditongos nasais finais e à grafia com apagamento do ‘r’ do
infinitivo.
4.1.1.2 Erros relacionados à grafia das vogais
Ao estudar a grafia das vogais, Miranda (2006) percebeu que a criança pode
apresentar uma escrita motivada pela fonética, cometendo erros que envolvem,
sobretudo, as posições de vogais átonas em palavras da língua. Segundo Câmara
Jr. ([1970]2006), o sistema vocálico do português é formado por sete sons vocálicos
que contrastam na posição tônica, como representado a seguir:
Vogais em posição tônica
alta /i/ /u/
média /e/ /o/
média /E/ /O/
baixa /a/
(Câmara Jr., [1970] 2006, p. 41)
Por meio de um conjunto mínimo, s/a/co, s/e/, s/E/co, s/i/co, s/o/co, s/O/co,
s/u/co, pode-se observar o valor contrastivo das sete vogais na língua, pois a
substituição de uma vogal por outra, na posição tônica, altera o significado das
palavras.
De acordo com Câmara Jr. ([1970]2006), nas outras posições, porém, ocorre
uma neutralização que elimina a distinção entre os fonemas /e/ - /E/ e /o/ - /O/.
Dessa maneira, em relação às sílabas átonas, o sistema de vogais do português é
reduzido, conforme mostram as representações em a), b) e c).
pretônico postônico não final postônico final
a) b) c)
/i/ /u/ /i/ /u/ /i/ /u/
/e/ /o/ /e/ -
/a/ /a/ /a/
(Câmara Jr, [1970] 2006, p.44)
Pode-se observar que na posição pretônica os sons vocálicos ficam reduzidos
a cinco, pois nesse contexto a distintividade entre /e/ - /E/ e /o/ - /O/ é neutralizada.
Na posição postônica não final, além da neutralização das vogais médias, perda
do traço distintivo entre o /o/ e o /u/, por exemplo, abób[u]ra por abóbora. Na posição
postônica final, as vogais ficam reduzidas a três, ocorrendo alternâncias como em
‘sac[o]’ ~ ´sac[u]’ e em ‘set[e]’ ~ set[i].
Para representação gráfica do sistema vocálico do português existem cinco
grafemas ‘a’, ‘e’, ‘i’, ‘o’, u’, mais os acentos agudo, circunflexo e til assim, ao
aprender a escrita, a criança precisa perceber a assimetria que existe entre os
sistemas fonológico e ortográfico das vogais.
Os erros de escrita relacionados à grafia das vogais, encontrados nas
produções textuais pesquisadas, são apresentados e classificados, conforme mostra
o quadro 10.
Quadro 10: Erros motivados foneticamente: grafia das vogais
16
Casos Erros encontrados
Levantamento da vogal pretônica disgobriu, minino (3), divagar, pidiu (3),
apilido, dismaiaram, sinão, pindurou,
asubiava, duença.
Levantamento da vogal pretônica
inicial
ingraçado, inbora, intão (3), insinar, impresto,
insolarada, istranho, isperado, incheu.
Levantamento da vogal postônica
final
quasi
Levantamento da vogal átona do
clítico
di
Os casos que envolvem a grafia da pretônica podem ser considerados erros
decorrentes da arbitrariedade da norma, visto que em decorrência da variação
observada não é fácil determinar uma regra para grafia da vogal. Já para o terceiro e
o quarto caso, levantamento da vogal postônica final e da vogal átona do clítico,
respectivamente, é possível identificar uma regra que define a grafia do ‘e’ e do ‘o’.
Como pode ser observado no quadro 10, a maioria dos erros encontrados
refere-se ao fonema [e] que é representado graficamente pela letra ‘i’. Segundo
Lemle ([1982] 2002), se a vogal [i] estiver em uma posição acentuada, ela será
transcrita pela letra ‘i’, o que pode ser exemplificado pelas palavras ‘vida’, ‘saci’ e
16
Não foram encontrados erros relacionados à grafia da postônica não final.
‘rio’. No entanto, se a vogal [i] estiver em uma sílaba átona final, corresponderá à
letra ‘e’ em nossa ortografia ainda que produzidas oralmente como [i], como em
‘vale’, ‘corre’ e ‘morte’, por exemplo.
O estudo de Guimarães (2005) mostrou que em relação à grafia incorreta das
palavras com vogal alta na posição átona final foram encontradas somente duas
ocorrências, o que corrobora os dados desta pesquisa que mostra apenas um erro:
a grafia da palavra ‘quasi' para ‘quase’.
Em relação à grafia da vogal /o/ que sofre elevação para [u], Guimarães
(2005) mostra que um número reduzido de ocorrências, fato corroborado pelos
dados desta pesquisa nos quais não consta nenhum registro desse tipo de erro.
Miranda (2007), em um estudo quantitativo sobre a grafia das vogais átonas
finais, mostra também que esses erros não são muito freqüentes, no entanto, ao
comparar os erros relacionados à grafia da vogal posterior ‘o’ e da vogal coronal ‘e’,
verifica que existe uma predominância das trocas do ‘e’ pelo ‘i’ em se comparando
com as trocas do ‘o’ pelo ‘u’. Para a autora, esses resultados poderiam ser
explicados pelo fato de o ‘o’ átono final ser um segmento portador de traços
morfológicos enquanto o ‘e’ não possui carga morfológica alguma.
4.1.1.3 Erros relacionados à grafia dos ditongos
Os erros relacionados à grafia do ditongo são encontrados com freqüência
nas produções textuais iniciais. Segundo Câmara Jr. (2006, p. 45), o ditongo pode
ser definido como “um grupo de dois fonemas vocálicos pronunciados na mesma
sílaba sonora”. A maioria dos erros relaciona-se à redução do ditongo, também
chamada de monotongação, fenômeno que pode ser exemplificado pela grafia da
seqüência ‘ei’ como ‘e’ e da seqüência ‘ou’ como ‘o’.
Essa redução do ditongo, que é constante nos dados coletados da produção
textual dos meses iniciais, tem relação direta com o que ocorre na linguagem oral,
pois, segundo Bisol (2001), os ditongos decrescentes do português podem ser
classificados como falsos e verdadeiros. Os ditongos considerados verdadeiros são
aqueles em que a vogal alta não pode ser omitida na fala, como por exemplo, a
palavra ‘flauta’ o pode ser pronunciada ‘flata’. Há, porém, aqueles casos em que
os ditongos ‘ai’ e ‘ei’ são sistematicamente reduzidos a uma vogal em contextos
previsíveis, a saber, antes de consoantes fricativas palato-alveolares e líquidas não-
laterais, como em ‘caixa’ e ‘feira’, por exemplo. O fato de esses ditongos
pertencerem a contextos específicos permitiu a Bisol (1989) caracterizá-los como
falsos ditongos. Os dados apresentados no quadro 11 são referentes à grafia de
falsos ditongos e à grafia do ditongo ‘ou’ que, de acordo com Adamolli (2006, p.103),
“por ser um ditongo muito freqüente na língua e por ser reduzível em todos os
contextos, o ditongo [ow] vem perdendo, em praticamente todos os dialetos do
português brasileiro, a distinção entre pares como: couro/coro, roubou/robô”.
Quadro 11: Erros motivados foneticamente: redução do ditongo
Casos Erros encontrados
‘ou’ por ‘o’ – posição medial vasora (3), robou, ropa, oviu, lossa,
otro (3)
‘ei’ por ‘e’ – posição medial dexou (5), pontero, dechou,
‘ai’ por ‘a’ – posição medial embaxo (3), apachonado,
Como se pode observar no quadro 11, os erros relacionados à grafia do
ditongo ou’, ‘ei’ e ‘ai’, todos na posição medial, são decorrentes do processo de
monotongação que ocorre na linguagem oral. Considerando estudos sobre a
variação encontrada nos ditongos, tais como Paiva (1996) e Rocha (1998), pode-se
supor que a criança terá acesso à grafia dos ditongos quando entrar em contato
com a linguagem escrita. Desse modo, é possível afirmar, confirmando os estudos
de Guimarães (2005) e Adamoli (2006), que, na escrita, a aquisição do ditongo é
gradual e os erros relacionados a essa grafia podem perdurar na grafia das crianças
em fase inicial do processo de escolarização.
4.1.1.4 Errros relacionados à grafia com apagamento
Na fala dos brasileiros, excetuando-se aquelas situações formais de uso da
língua, o –r, morfema de infinitivo, é sistematicamente apagado. Nos dados de
escrita estudados, porém, foram encontrados poucos casos relacionados ao
apagamento do morfema –r, conforme mostra o quadro a seguir:
Quadro 12: Erros de motivação fonética: grafias com apagamento
Casos Erros encontrados
Apagamento do morfema -r i (ir), faze (2), entra, subi, vende, faze
(2)
O apagamento do morfema –r é um dado observado na produção oral dos
falantes, influenciando as escritas dos verbos no infinitivo. Pode-se observar nos
dados da pesquisa que esse tipo de erro aparece com pouca freqüência e, se
observarmos longitudinalmente, aparecem apenas nas primeiras produções textuais
realizadas em março. Com o passar dos meses, sofrem uma significativa redução,
tendendo a não aparecer nas produções textuais coletadas ao final do ano letivo.
Essa redução pode ser explicada pelo fato da criança perceber que o acento recai
sobre a última sílaba das palavras terminadas em ‘r’ e, em conseqüência disso,
grafa-o corretamente.
4.1.1.5 Supergeneralização
A supergeneralização é um fenômeno bastante significativo no processo de
aquisição da linguagem oral e também da escrita. Para Menn & Stel Gammon
(1997), os casos de supergeneralização demonstram a verdadeira aprendizagem
das regras, mesmo que a criança, em um primeiro momento, a utilize em contextos
em que ela não se aplica.
Os erros decorrentes da supergeneralização estão diretamente relacionados
à fonética e à fonologia da língua e são ocasionados pelo fato de a criança
generalizar regras sem observar as sub-regularidades do sistema. Neste estudo,
foram considerados erros motivados pela supergeneralização de regras os casos de
abaixamento da vogal alta final, abaixamento da vogal média postônica,
abaixamento da vogal tônica, abaixamento da vogal média postônica não final e a
grafia dos ditongos nasais finais, conforme mostra quadro 13:
Quadro 13: Erros relacionados à supergeneralização
Casos Erros encontrados
Abaixamento da vogal alta final dormio, sentio, divertio (2), vio (2), saio
(2), abrio, decidio, difício, subio,
Abaixamento da vogal pretônica molher, sobiu, fogir, corioso, cotuca,
boraco, goloso, destraída, comelão
Abaixamento da vogal tônica broxa (5).
Abaixamento da vogal postônica
não-final
círcolo, lápes
Abaixamento da vogal pretônica
inicial
empidiu, enteligente
Troca ‘u’ pelo ‘l’ nos verbos batel, pegol (4), chegol, cail, fugil (2),
fingil, vil, sail, mentil, terminol, pedil,
ouvil, pousol,
Em relação ao abaixamento da vogal átona, a criança generaliza a regra em
que o [u] átono, no final da palavra, é representado com ‘o’, então pode estender
esse tipo de grafia para os verbos sem considerar que o morfema da 3
a
pessoa do
singular no passado é grafado com ‘u’. As palavras que se encontram classificadas
como abaixamento da vogal pretônica apresentam uma alternância na pronúncia, ou
seja, as vogais altas podem ser pronunciadas como médias. Desse modo, a criança
opta pela grafia da vogal média e essa opção ocasiona a maioria dos erros
relacionados à supergeneralização encontrados nos dados de escrita da pesquisa.
No abaixamento da vogal tônica, ela generaliza a regra da grafia do ‘o’ quando o [u]
é átono, desconsiderando a posição tônica. Em relação ao abaixamento da vogal
pretônica inicial, ela generaliza a regra em que o [i] átono, no final de palavra, é
grafado com ‘e’, desconsiderando a posição inicial em que se encontra. Na troca de
‘u’ pelo ‘l’ nos verbos, a criança percebe que toda vez que pronuncia o som de [u]
em posição pós-vocálica se escreve com ‘l’ e generaliza essa regra para contextos
indevidos como no exemplo do ‘u’ do final indicando a flexão do verbo na 3
a
pessoa
do singular do pretérito perfeito.
4.1.2. Erros de motivação fonológica
Os erros de motivação fonológica encontrados nas produções textuais das
crianças relacionam-se à grafia dos encontros consonantais e à correspondência
fonema-grafema, conforme mostram os dados abaixo.
4.1.1.2 Relação fonema-grafema
Os erros referentes à relação fonema-grafema são aqueles em que a criança
troca os fonemas /p-b/, /t-d/, /f-v/, /k-g/, /-/, pois são sons muito parecidos que
se diferem em relação ao traço sonoro. Esse tipo de erro é encontrado
constantemente nas produções textuais iniciais, porém após a intervenção e a
explicitação, pode ser corrigido com facilidade. No quadro 14, percebe-se um
número reduzido desses erros devido ao fato de as diferenças entre os sons
parecidos serem trabalhadas logo no início do ano letivo.
Quadro 14: Erros de motivação fonológica: relação fonema-grafema
Casos Erros encontrados
Troca /k/ pelo /g/ disgobriu, gorrendo, griança
Troca /g/ pelo /k/ amicos
Troca /b/ pelo /p/ supa, sapia,
Troca /f/ pelo /v/ vazer, vizemos, viquei
Troca /v/ pelo /f/ fida, fez
Troca // pelo // jegou, ajou,
Troca /d/ e /t/ meto, itea, tias, acutiu,
De acordo com Matzenauer e Miranda (2005), nos dados de aquisição
fonológica observa-se uma tendência à dessonorização, especialmente em dados
de desvio de fala e nos dados de escrita, a sonorização mostrou-se, porém, o
fenômeno mais observado, especialmente em fricativas lábio-dentais (‘f’-‘v’), como
havia sido atestado por Miranda et alli (2005). Para Guimarães (2005), no entanto, a
maioria dos casos envolvendo a alteração do traço [sonoro] é relativa à
dessonorização. Nos dados desta pesquisa, o que se observa, como mostra o
quadro 14, é um equilíbrio na distribuição dos casos de sonorização e
dessonorização.
4.1.1.3 A grafia das estruturas silábicas
Os erros, que correspondem à grafia das estruturas silábicas são
considerados como sendo resultantes da dificuldade inicial da criança em grafar
sílabas complexas, tais como: CCV e CVC.
Quadro 15: Erros relacionados à grafia das estruturas silábicas
Casos Erros encontrados
Encontro consonantal tocou, peda, estanho, bicar (brincar)
Sílabas com coda lipar, polado, rinocerote, u, niguem,
bicar, trasformar, bicar (brincar), ado,
dete
O quadro 15 mostra que são poucos os dados de escrita relacionados à grafia
do encontro consonantal, pois esse tipo de erro é encontrado com maior freqüência
nas produções textuais de crianças em fase muito inicial de aquisição da escrita.
em relação à grafia das sílabas com coda, observa-se que uma maior incidência,
mesmo na segunda série. Miranda (2008), ao comparar os dados de escrita que
apresentam omissão de coda, mostra que nos dados estudados a maioria dos erros
são relativos à coda nasal e que poucos casos de erros envolvendo fricativas e
róticas. Segundo a autora, esses dados revelam que na escrita as crianças têm
maior dificuldade em representar a estrutura com nasal, exatamente aquela que, na
aquisição fonológica, não apresenta dificuldade e é adquirida precocemente. Os
dados por ela estudados revelam uma inversão da ordem de aquisição, visto que
as róticas em coda são adquiridas tardiamente, depois das fricativas (MIRANDA,
2008b, p. 7)
4.1.3 Erros relacionados às correspondências regulares contextuais
As correspondências regulares contextuais são aquelas em que o contexto
ajuda a definir qual a letra ou seqüência de letras a ser utilizada, ou seja, o uso de
um grafema pode ser definido a partir da observação do contexto na palavra. Neste
estudo, os dados de escrita coletados serão divididos em relação à grafia da coda
nasal; do ‘r’ no contexto inicial, intervocálico e pós-consonantal e do ‘j’ e do ‘g’ na
frente de ‘a’, ‘o’, ‘u’.
4.1.3.1 Coda nasal medial
Erros relacionados à grafia da cosa nasal, trocas de ‘m’ por ‘n’ ou vice-versa,
são encontrados com freqüência nas primeiras produções textuais dos alunos da 2
a
série, visto que, apesar de perceberem a existência de uma nasal em posição de
coda, desconsideram a regra contextual que determina qual a consoante nasal que
deve ser grafada nos diferentes contextos. Os erros encontrados nos textos
analisados estão apresentados a seguir:
Quadro 16: Erros relacionados à grafia da coda nasal medial
Casos Erros encontrados
Troca do ‘m’ pelo ‘n’ inbora, en, conprar, sin, zonbava, linpinha
Troca do ‘n’ pelo ‘m’ bamco, comtinuou, lomge, elefamte,
comtinuaram, ceguramdo, camtor,
comseguia, imvemtaram, comseguir.
Conforme se pode observar nos dados de escrita mostrados no quadro 16, os
erros relacionados à grafia da coda nasal o encontrados com freqüência, apesar
da existência de regra contextual que define qual grafema deve ser utilizado em
relação ao contexto em que se encontra. As pesquisas realizadas por Miranda et alli
(2005) e Guimarães (2005) mostram que, nos erros relacionados à grafia da coda
nasal, uma predominância da grafia do ‘m’ nos contextos em que o ‘n’ deve ser
grafado, o que pode ser observado nos dados apresentados no quadro 16.
4.1.3.2 Grafia do ‘r’
A grafia do ‘r’ nos diferentes contextos tem uma regra bem definida e, se
percebida pela criança, desde o início do processo de escrita ortográfica, pode levar
à diminuição de erros relacionados a essa grafia.
Quadro 17: Erros relacionados à grafia do ‘r’
Casos Erros encontrados
‘r’ inicial rriu, rrato rraiva, rrádio, rraiva
‘r’ fraco -
‘rr’ corendo, varia, arumando, caregando
‘r’ pós-
consonantal
enrrolou
Como se pode observar no quadro 17, o ‘r’ inicial, por ter som forte, foi
grafado com ‘rr’, desconsiderando o contexto inicial que determina a grafia de ‘r’
para representar o som forte nessa posição. Erros relacionados à grafia do ‘r’ fraco
não aparecem nos dados de escrita das crianças estudadas, confirmando a
tendência verificada nos estudos de Melo e Rego (1998), Guimarães (2005) e
Araújo, Garcia e Miranda (2007) segundo os quais, desde o início do processo de
aquisição da escrita, elas percebem a diferença entre o ‘r’ forte e fraco, o que
torna mais fácil a grafia do ‘r’ fraco. Esses estudos também mostram que a utilização
do ‘rr’ intervocálico é facilmente aprendida pela criança e, conseqüentemente, os
erros relacionados a esse contexto não aparecem com freqüência em seus dados de
escrita.
4.1.3.3 Grafia do // e /g/.
A grafia dos fonemas // e // pode ser prevista, pois quando houver no
contexto seguinte a presença das vogais posteriores ‘a’, ‘o’ e ‘u’ usa-se ‘j’ para o
som [], como em ‘veja’, ‘ajo’ e ‘caju’, por exemplo. Porém, pelo fato de os grafemas
‘j’ e ‘g’ terem sons iguais quando grafados antes das demais vogais, a não
observância do contexto seguinte leva a criança a cometer erros ortográficos como
os que estão apresentados a seguir.
Quadro 18: Erros relacionados à grafia do // e //
Troca do //pelo // gavali (javali), gacaré (jacaré), viagando,
agudou.
Troca // por // seginte (2), ningém, consegiu
A partir do quadro 18, percebe-se que são poucos os casos de erros
relacionados a essa correspondência regular contextual. É possível pensar que o
fato de ocorrer uma troca de fonemas quando não observada, essa ser uma regra
mais perceptível pela criança.
4.1.4 Erros relacionados às correspondências irregulares
Os erros relacionados à correspondência irregular são decorrentes das
relações múltiplas do sistema ortográfico, nas quais um grafema pode representar
vários fonemas ou um fonema pode ser representado por vários grafemas.
4.1.4.1 A grafia do /s/
Em relação à grafia do /s/, estudos que propõem uma classificação para os
erros ortográficos, como os de Lemle ([1982] 2002), Cagliari (1999) e Zorzi (1998),
mostram que a maior dificuldade que a criança encontra na aprendizagem da norma
ortográfica é relativa à grafia do fonema /s/, sendo esse caso o que gera maior
número de erros de escrita.
A tarefa de representar o fonema /s/ por meio de um grafema é extremamente
complexa para a criança, pois esse som pode ser representado de diversas formas,
conforme exemplifica a representação a seguir:
‘s’ – seis
‘c’ – cesta
‘ss’ – massa
‘ç’ – maçã
/s/ ‘x’ – experiência
‘sc’ – nascer
‘xc’ – exceto
‘sç’ – cresça
‘z – vez
Fonte: Garcia, Araújo e Miranda (2007)
Em pesquisas realizadas a partir da análise de dados de escrita de crianças
das séries iniciais, Zorzi (1998), Guimarães (2005), Garcia, Araújo e Miranda (2007)
mostram que o alto índice de erros relacionados à grafia do /s/ deve-se ao fato de,
além de haver muitas opções para a grafia, a freqüência de palavras com esse som
na língua portuguesa é bastante alta. Desse modo, nos dados de escrita desta
pesquisa também foi encontrado um grande número de erros decorrentes dessa
correspondência irregular, como mostra o quadro 19.
Quadro 19: Erros relacionados à grafia do /s/
Casos Erros encontrados
‘z’ fes (4), ves (8), felis, naris,
‘s’ cegurando, centiram, pençando, ce, anciosos,
cenão, converçam, conceguiram, ceu (seu), cempre,
cemanas, conceguir
‘c’ sercados, romanse, serejas, sedo, sereal,
sinquenta, persebeu, serto, cassique, acontesse (2),
persebe,
‘ç’ comessaram (2), almosso, prassa, onsa, dansando,
lossa, feitisso, golasso, comessar (4), alcansava,
balansar, linguissa, balansando, rassa, lensol,
‘ss’ dice (4), paçarinho, poço (posso), iço (3), pacear,
ingreço, paçar (5), paçaram (3), diceram,
imprecionada, acim (2), açou,
‘x’ Esplodir, macima, trouce (2), esperimentou,
Nos dados coletados, em relação à grafia do /s/, percebe-se uma maior
freqüência de erros relacionados à correspondência irregular, o que se explica,
provavelmente pelo alto índice de palavras do léxico infantil apresentarem o fonema
/s/. Além disso, esse fonema possui uma maior diversidade de formas gráficas,
oferecendo uma dificuldade de escolha para o aprendiz.
4.1.4.2 A grafia do /z/
A grafia do /z/ é um caso de correspondência irregular e a criança, apesar de
considerar a regra que determina que a grafia de ‘s’ entre vogais tem som /z/, terá
maior dificuldade em prever qual o grafema a ser utilizado. No quadro 18, pode-se
observar os erros encontrados.
Quadro 20: Erros relacionados à grafia do /z/
Casos Erros encontrados
Troca ‘z’ por ‘s’ disiam, veses (3), fasia (3), felises, fisesse,
faser (10), realisamos,
Troca ‘s’ por ‘z’ dezejo, coiza (3), dezistiu, dezenhando (2),
dezafinado, aprezentação, fuirozo, vizitar,
O uso do ‘z’ no sistema ortográfico do português é bastante restrito,
principalmente em posição intervocálica, na maior parte dos casos em que o [z] deve
ser grafado é o grafema s’ aquele definido pela norma. Os erros encontrados nos
textos das crianças estudadas mostram que as trocas de ‘z’ por ‘s’ ocorrem,
preferencialmente, entre vogais. Verificam-se casos em que a criança lança mão da
grafia mais comum, o ‘s’, mas também, na mesma proporção, dados em que o ‘z’ é
utilizado em vez do ‘s’. Miranda et alli (2005), em um levantamento quantitativo de
erros encontrados em textos de primeira a quarta séries, argumentam que a
utilização do ‘z’ no lugar do ‘s’ pode representar a tendência da criança em
estabelecer uma relação direta entre som e grafema. A utilização correta do ‘s’ e ‘z’
em contexto intervocálico dependerá do uso de estratégias que envolvem a memória
bem como a analogia entre formas ortográficas novas e aquelas já conhecidas.
4.1.5.3 A grafia do //
O som do // pode ser representado pelos grafemas ´g´ e ´j´ na frente do ‘e’ e
do ‘i’. Nesse contexto, a grafia do // é irregular, o que ocasiona os erros ortográficos
do tipo mostrado no quadro 21.
Quadro 21: Erros relacionados à grafia do //
Casos Erros encontrados
Troca ‘g’ por ‘j’ jelado, jente (4) majica
Troca ‘j’ por ‘g’ geito (2), sugeira (2), desegei
Como mostra o quadro 21, são poucos os erros encontrados. Neste caso
especifico, o da grafia do //, no qual se observa a concorrência entre dois grafemas
em contextos idênticos, vê-se a indefinição da criança ao ter de eleger um ou outro.
A criança precisará recorrer ao uso de estratégias mnemônicas, como por exemplo,
das estratégias de associação. Ao memorizar a forma ortográfica da palavra ‘gelo’,
poderá, através de mecanismos de associação, concluir que ‘geladeira, gelado, e
‘geleira’, por exemplo, são escritas com ‘g’. O uso desse tipo de estratégia pode
auxiliar a criança a resolver suas dúvidas e, além disso, leva à diminuição do
número de palavras a serem memorizadas, não sobrecarregando a memória do
aprendiz.
4.1.6.4 A grafia do //
A som do // pode ser representado por dois grafemas o ‘x’ e o ‘ch’. Apesar de
sua grafia ser considerada arbitrária em vários contextos, em outros é possível, de
acordo com Scliar-Cabral (2003), que seja prevista, isto é, quando estiver dentro da
palavra seguindo os ditongos [ei], [ou] e [ai], contextos em que prevalência da
grafia do ‘x’. Nos demais casos, porém, especialmente em contextos intervocálicos,
como nos exemplos de ‘bicho’ e ‘lixo’, não há regra que defina a grafia do //.
Quadro 22: Erros relacionados à grafia do //
Casos Erros encontrados
Troca ‘ch’ por ‘x’ apachonado, dechou, brucha (11),
bruchinha, puchando, relachando,
pucharam, mechesse, puchou.
Troca ‘x’ por ‘ch’ fexado, xorou, xico, xave,
Percebe-se que as crianças, de um modo geral, optam pelo ‘ch’ nos contextos
competitivos e que após a intervenção, provavelmente em decorrência do uso de
estratégias mnemônicas passam a acertar as palavras que se repetem com mais
freqüência em suas produções escritas.
4.1.7.5 A grafia do ‘h’
Para finalizar o caso das correspondências irregulares, encontradas nos
dados estudados, apresentam-se os erros relacionados ao uso do ‘h’.
Quadro 23: Erros relacionados à grafia do ‘h’
Casos Erros encontrados
Não grafia do ‘h’ ora (hora - 4), avia (havia-
2), ipopotamo (2), ouve
(houve- 2), a (há), istória
Utilização indevida do ‘h’ havistou
Os dados encontrados mostram que na maioria das vezes há a omissão do ‘h’
na grafia das crianças. Os exemplos são constituídos de palavras relacionadas ao
verbo ‘haver’ cujas formas, especialmente ‘ouve’ e ‘a’, têm outro termo
correspondente no léxico, o qual é grafado sem o ‘h’, o que também se observa nas
palavras ‘ora’ e ‘istória’. O único exemplo em que o erro decorre da utilização
indevida do ‘h’ é relativo ao verbo ‘avistar’, forma que poderia ser decorrente de uma
supergeneralização.
4.1.5 Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia
4.1.5.1 Caso do ‘s’
A representação gráfica do /s/ é considerada por autores como Monteiro
(2005), Guimarães (2005) e Miranda, Garcia e Araújo (2007) como aquela que gera
a maioria dos erros ortográficos das crianças. Apesar de a maioria dos casos das
grafias do /s/ estarem relacionados à correspondência irregular, algumas
situações em que a análise do contexto reduz as possibilidades de representação
gráfica dessa fricativa. Esses contextos serão tratados, nesta pesquisa, como casos
específicos de regularidade contextual, visto que impõem restrições que podem ser
utilizadas no momento da escrita relativamente ao uso de alguns grafemas. Os
casos da grafia do ‘s’, classificados como correspondência regular contextual, são: o
contexto intervocálico, no qual a grafia de ‘s’ ocasiona o som de [z] e o contexto pós-
consonantal, o qual determina a grafia de ‘s’ para representar o som de [s].
Quadro 24: Erros relacionados à grafia do ‘s’ intervocálico e ‘s’ pós-
consonantal
Casos Erros encontrados
‘s’ intervocálico traveseiro (3), tropesou, vasora (3),
asubiava, comesou (5), comesaram (2),
apareseu (4) asustado, pasarinha (2),
asustavam, dise (6), poso, asim, obedesia,
apresaram, grasa (2), fose, creseu, aufase,
desidiram, presisava, bisicleta, esquese,
trouse, pesoa, presisar, iso, inpresionada,
tivese, desidiu.
‘s’ pós-
consonantal
alcanssou, perssebeu, aniverssário,
penssou, consseguiu (3)
Os dados apresentados no quadro 24 revelam que os erros relacionados à
grafia do ‘s’ intervocálico e pós-consonantal são bastante freqüentes. A hipótese de
Monteiro (2005) é a de que as crianças em determinada etapa do desenvolvimento
da escrita ortográfica preferem a utilização de um ‘s’ para representar o som do [s], o
que, segundo a autora, mostra que a criança pode estar estabelecendo uma relação
direta entre um grafema e um fonema, não observando os contextos e as variáveis
envolvidas. Os dados apresentados no quadro 24 parecem corroborar tal hipótese.
4.1.5.2 Grafia do ‘ç’ em contexto indevido
Apesar do uso do ‘ç’ não ser definido por uma regra específica, é possível
excluir contextos para seu uso, uma vez que uma regra contextual que determina
que o ‘ç’ pode ser grafado antes das vogais posteriores ‘a’, ‘o’, ‘u’; e também que
não pode ocupar a posição de início de palavra. Se aprendidas pelas crianças,
essas regularidades contextuais podem evitar erros ortográficos tais como os
apresentados no quadro a seguir:
Quadro 25: Uso indevido do ‘ç’
Caso Erros encontrados
Uso do ‘ç’ em contexto indevido çeu’, apareçeu (2), pareçia,
morçego’, reçebeu (3),
perçebeu, conheçia
Como se pode observar nos dados de escrita apresentados no quadro 25, as
crianças desconsideram as regras contextuais que determinam os contextos
possíveis do ‘ç’ e utilizam-no em contextos indevidos, antes do ‘e’ e do ‘i’ e no início
de palavra.
4.1.6 Análise quantitativa dos erros
Nesta seção faço uma síntese dos resultados apresentados nas seções
anteriores, com base em uma análise quantitativa, mostrando a distribuição dos
erros encontrados de acordo com cada uma das categorias utilizadas para sua
classificação. Em relação à motivação fonética, os erros estão distribuídos conforme
mostra o gráfico 1.
Gráfico 1
Erros relacionados à motivação fonética
Erros relacionados à
grafia das vogais
Erros relacionados à
grafia do ditongo
Erros relacionados
ao apagamento do 'r'
do infinitivo
Os resultados gerais apresentados no gráfico 1 mostram uma diferença na
distribuição quantitativa dos erros encontrados. Se comparados os três tipos de
erros classificados como decorrentes da motivação fonética tem-se: 48% para erros
relacionados à grafia das vogais, 38% para erros relacionados à grafia dos ditongos
e 14% para erros relacionados ao pagamento do ‘r’ do infinitivo.
Guimarães (2005), ao analisar os erros encontrados nos textos de seis
alunos, observou também um maior número de erros relacionados à grafia das
vogais átonas. Uma das explicações possíveis para esse resultado é que a criança,
ao se deparar com a grafia da vogal média átona final, que na pronúncia da maioria
dos dialetos brasileiros sofre a elevação, tende a grafá-la com base na oralidade.
Os erros relacionados ao ditongo aparecem em segundo lugar, em termos de
freqüência, dentre os erros de motivação fonética analisados. Conforme mencionado
anteriormente, Adamoli (2006), em seu estudo sobre a aquisição escrita dos
ditongos, afirma que a criança apresenta uma dificuldade em grafar os ditongos que
sofrem processos de monotongação na fala, processos esses que se caracterizam
pelo fato das seqüências ‘ei’ e ‘ou’ passarem, respectivamente, para ‘e’ e ‘o’.
Os erros relacionados ao apagamento do ‘r’ do infinitivo são encontrados em
menor quantidade nos dados estudados e também nos dados de Guimarães (2005).
Em relação aos erros motivados pela fonologia da língua, tem-se a
distribuição no gráfico 2:
Gráfico 2
Erros relacionados à motivação fonológica
Erros relacionados
ao traço [sonoro]
Erros relacionados
à grafia das
estruturas silábicas
Como se pode observar no gráfico 2, os erros relacionados ao traço [sonoro]
representam 41% dos dados, enquanto os erros relacionados à grafia das estruturas
silábicas representam 59%. Guimarães (2005) observou uma pequena diferença
entre o número de erros desses dois tipos, confirmando os dados desta pesquisa.
Focalizando os casos de grafia das estruturas silábicas, a autora mostrou que
uma predominância dos erros relacionados à grafia da coda nasal, os quais
aparecem com maior freqüência, se comparados às grafias dos encontros
consonantais e às grafias das codas fricativas e róticas
17
. Nos erros analisados nesta
pesquisa foram encontrados apenas casos relacionados à coda nasal. Miranda
(2008), ao estudar quantitativamente a omissão da coda nas grafias das crianças,
observou que uma diferença significativa dos erros encontrados entre os três
17
Esses casos podem ser observados em palavras como ‘triste’ e ‘vermelho’, respectivamente.
tipos de coda: 76,5%, 14,7% e 8,8%, para codas nasais, fricativas e róticas,
respectivamente.
Relacionados aos erros de motivação fonética e fonológica, encontram-se os
erros de supergeneralização, os quais se comparados quantitativamente aos erros
relacionados a essas categorias, apresentam a seguinte distribuição:
Gráfico 3:
Casos de supergeneralizão
Erros relacionados à
motivação fonética
Erros relacionados à
motivação fonológica
Erros decorrentes da
supergeneralização
Como se pode observar no gráfico 3, os erros que envolvem casos de
supergeneralização representam 36%¨do total de erros em se comparando com os
erros relacionados à motivação fonética e à motivação fonológica, que totalizam
41% e 23%, respectivamente. A quantidade significativa de erros decorrentes da
supergeneralização pode ser analisada como reflexo da tentativa da criança em
definir regras do sistema ortográfico, pois esses erros são ocasionados pela
generalização de alguma regra em contextos em que ela não se aplica.
Em relação aos dados relacionados às correspondências regulares
contextuais, a distribuição dos erros pode ser observado no gráfico 4:
Gráfico 4
18
Erros relacionados à correspondência regular
contextual
Erros relacionados
à grafia da coda
Erros relacionados
à grafia do 'r'
Erros relacionados
à grafia do /Z/ e /g/
Conforme a distribuição apresentada no gráfico 4, a troca do ‘m’ pelo ‘n’ em
posição de coda foi observada em 47% dos erros envolvendo as correspondências
regulares contextuais. Em segundo lugar, aparecem os erros relacionados à grafia
do ‘r’ com 29%, seguido dos erros relacionados à grafia do // e do // com 24%.
Esses resultados são semelhantes àqueles observados por Miranda et alli (2005) os
quais mostram uma alta freqüência dos erros relacionados às codas se comparados
àqueles relacionados à grafia do ‘r’. As autoras justificam esse dado, mencionando
que uma das regras contextuais mais simples do sistema ortográfico parece ser a do
uso do ‘r’, mais acessível à criança no momento da escrita.
Em relação aos dados encontrados referentes às correspondências
irregulares, a distribuição dos erros está representada no gráfico a seguir:
18
Neste gráfico /Z/ corresponde ao fonema //.
Gráfico 5
19
Erros relacionados à correspondência irregular
Grafia do /s/
Grafia do /z/
Grafia do /Z/
Grafia do /S/
Grafia do 'h'
Como se pode observar no gráfico 5, uma predominância significativa dos
erros relacionados à grafia do /s/, totalizando 53% dos erros decorrentes das
correspondências irregulares. Esse resultado é também corroborado por estudos
como os de Miranda et alli (2005), Guimarães (2005), Monteiro (2005) e Garcia,
Araújo e Miranda (2007), os quais afirmam que a grafia do /s/ é que gera o maior
número de erros ortográficos nas produções textuais das crianças. Miranda et alli
(2005), ao analisar quantitativamente os erros relacionados à correspondência
irregular, observam que a grafia do fonema /s/ ocasiona 70% dos erros relativos a
essa categoria. Segundo as autoras, esse resultado decorre, provavelmente, do fato
de esse fonema possuir uma grande diversidade de formas ortográficas disponíveis
no sistema, oferecendo, desse modo, maior dificuldade ao aprendiz.
Os índices de erros relacionados à grafia dos fonemas fricativos /z/, //, // e
do ‘h’ que totalizam 18%, 7%, 14% e 8%, respectivamente, no conjunto de erros
decorrentes da correspondência irregular, corrobora também os resultados de
Miranda et alli (2005).
19
Neste gráfico, a legenda grafia do /Z/ corresponde à grafia do // e a legenda grafia do /S/
corresponde à grafia do //.
Em relação aos casos em que contexto diminui as possibilidades de grafia, a
distribuição dos erros encontrados está representada no gráfico 6.
Gráfico 6:
Casos em que a regularidade diminui as
possibilidades de grafia
's' intervocálico
's' pós-consonantal
Uso indevido do 'ç'
Como pode ser observado no gráfico 6, uma predominância dos erros
relacionados à grafia do ‘s’ intervocálico, totalizando 73% dos erros encontrados, o
que pode ser explicado pelo fato da criança desconhecer uma regularidade que
define que o ‘s’ grafado entre duas vogais tem o som de [z]. Com 11% de freqüência
aparecem os erros relacionados à grafia do ‘s’ pós-consonantal, em que a criança
grafam com ‘ss’ em um contexto no qual a norma determina que o dígrafo pode
ser grafado entre vogais. Os erros relacionados ao uso indevido do ‘ç’, o qual
representa 16% do total de erros dessa categoria, mostram que a criança não
reconhece os contextos possíveis do ‘ç’, grafando-o de maneira indevida. Em todos
esses casos apresentados, a freqüência de erros poderia ser diminuída se os alunos
fossem levados a construir e entender os diferentes tipos de regularidade
20
, mesmo
que não exista a definição de uma única grafia pra esses contextos.
20
Refiro-me a esses diferentes tipos, porque o caso do ‘s’ intervocálico é uma regularidade aplicada à
leitura, enquanto os casos do ‘s’ pós-consonantal e do uso indevido do ‘ç’ são regularidades aplicadas
à escrita.
A quantificação e a distribuição dos erros encontrados nas produções textuais
dos alunos, apresentadas anteriormente, serviram como material de análise para
orientar o planejamento e a execução das intervenções pedagógicas apresentadas a
seguir.
4.2 As intervenções pedagógicas
O planejamento das intervenções pedagógicas teve como principal objetivo
proporcionar o exercício de estratégias metacognitivas, visto que, pesquisas
realizadas na área da Psicologia Cognitiva, como as de Flavell (1999) e Pozo
(2002), revelam que o trabalho voltado à metacognição potencializa o desempenho
dos alunos nas diferentes áreas do conhecimento, pois uma vez utilizadas, as
estratégias metacognitivas podem ser transferidas para novas situações de
aprendizagem.
As atividades planejadas, que tinham por objetivo possibilitar o exercício e a
reflexão sobre as estratégias de pensamento empregadas nas atividades
pedagógicas, partiram do conceito de imitação definido por Vigotski (2000),
considerado neste estudo como uma parte importante do processo de
aprendizagem. O autor defende que, no início do processo de escolarização, é
preciso oferecer modelos de pensamento aos aprendizes para que, posteriormente,
a partir da imitação desses modelos, eles possam construir e internalizar um modelo
próprio. Em relação ao contexto escolar, Oliveira (1997) e Rego (1996) acreditam
que as estratégias de aprendizagem e modelos de pensamentos devam ser
construídos por meio da interação entre o professor e os alunos, ou até mesmo
entre os alunos. Desse modo, as primeiras atividades desenvolvidas em sala de aula
visavam orientar e mostrar aos aprendizes algumas estratégias possíveis para
observar e entender o objeto de conhecimento, no caso desta pesquisa, a ortografia.
Para iniciar o trabalho em relação à ortografia foi necessário problematizar,
junto à turma pesquisada, a noção que eles traziam referente ao erro ortográfico,
uma vez que, como mostram pesquisas de Cagliari (1999), Morais (2005a) e
Matteoda (1999), a cultura escolar entende o erro como um fracasso. Em
contrapartida, o estudo teórico de Ferreiro e Teberosky (1999), fundamentado na
teoria de Piaget (1976), trouxe a noção de erro construtivo, importante para o
processo de aprendizagem, o qual se analisado pelos professores e pelos alunos,
pode ser um auxiliar para acertos posteriores. Como primeira intervenção, foi
realizada uma tarefa de análise dos erros retirados das primeiras produções das
crianças, incluindo o pré-teste (Apêndice D). Nessa tarefa, a criança recebia uma
lista de palavras escritas de maneira incorreta com uma pergunta “e agora?”. Essa
atividade serviu para que refletissem sobre a necessidade de corrigir os seus erros.
Atividade 1
Algumas palavras foram
escritas de maneira errada. E
agora?
em bora
embaicho
rezolveu
ressebeu
aseitou
faser
iso
tabém
ningém
dise
cempre
felis
Nessa atividade, cujo objetivo principal era perceber os erros e não analisar
as motivações ou categorias de erros ortográficos, as crianças conseguiram
entender, discutindo com o grupo, que todas escreviam cometendo erros. Fizemos
um acordo e, a partir daquele momento, elas se propuseram a refletir e a corrigir
seus erros. Ao final de cada atividade, o aluno deveria escrever em seu caderno
uma frase sobre a aprendizagem do dia. Nesse primeiro momento, ele tentava
responder a pergunta “o que aprendi hoje?”, como mostram os exemplos de
respostas dadas pelas crianças apresentados a seguir:
“todo mundo erra até a professora
a gente está aqui para errar e aprender o certo
Após essa primeira noção trabalhada, as atividades posteriores tiveram como
objetivo trabalhar o erro de modo construtivo. Na sala de aula, escrever errado
passou a ser encarado pelo grupo como uma atitude natural, a qual deveria ser
analisada, pensada e problematizada no grupo. Para isso, foram planejadas
algumas atividades, tais como: “caixa dos erros” e “ditado dos erros”. Na primeira
atividade as crianças colocavam, na caixa dos erros, papéis com as palavras
corrigidas e que haviam sido grafadas de forma incorreta nas produções textuais.
Após a entrega das palavras, era realizado um ditado contendo aquelas
originalmente grafadas de forma incorreta. Os alunos, a partir dessa atividade,
passaram a se identificar quando a palavra ditada tinha sido escrita de forma errada
por eles.
O fragmento 1 exemplifica uma das situações em que as palavras da “caixa
dos erros” foi ditada e descreve as interações que foram observadas nesta atividade.
Fragmento 1
Eu dito a palavra: vez
- Essa fui eu que errei (M
21
.)
- Prof, como que a M. pode ter escrito errado, é tão fácil (F.)
Eu coloco no quadro: ‘quis’ e ‘fiz’ e pergunto qual a diferença do ‘s’ e ‘z’ final.
- Mas não foi isso que eu errei, eu escrevi ‘fez’ (M.)
- Ah, pessoal, a M. escreveu ‘fez’ porque é muito comum vocês trocarem o ‘f’ e o ‘v’, o ‘p’ e
o ‘b’ ou o ‘t’ pelo ‘d’. (professora)
- Ah eu sempre troco! Eu errei, escrevi ‘tez’ para ‘dez’. (G.)
Muitos alunos trazem exemplos de palavras escritas, nas quais eles tinham trocado esses
sons.
Conforme observado nesse diálogo, a criança M., ao se identificar como
produtora do erro, possibilita a reflexão coletiva sobre um tipo de erro ortográfico
freqüente nas produções textuais das crianças: a troca do ‘s’ pelo z’ em contextos
competitivos. Eu aproveito para chamar atenção sobre essa possível troca, mas a
aluna M. apresenta um outro tipo de análise para aquela palavra, pois afirma que
trocou o ‘v’ pelo ‘f’. Nesse momento, ainda não havia focalizado as trocas de
fonemas na intervenção pedagógica, mesmo assim, comento as possíveis trocas de
fonemas relacionadas ao traço [sonoro] encontradas nas produções textuais. As
crianças trazem exemplos de palavras em que essas trocas foram feitas, o que
possibilita uma discussão sobre as diferenças dos “sons parecidos”.
O ditado com as palavras erradas é uma atividade que possibilita à criança
fazer perguntas e formular hipóteses sobre os tipos de grafias possíveis na palavra.
Segundo Pozo (2002, p. 58), a aprendizagem construtiva é resultado da prática
21
As crianças serão identificadas pela letra inicial do nome e se tiverem letras iniciais iguais será
acrescentada a letra seguinte.
pedagógica centrada em tarefas abertas que induzam o aluno a fazer perguntas e
intergirem com os outros e com o objeto de conhecimento. Para o autor, esse tipo de
tarefa também incentiva a utilização e a tomada de consciência de estratégias de
aprendizagem que poderão ser transferidas em outros momentos.
O fragmento 2, trecho de um diálogo reproduzido a seguir, permite-nos
analisar como as crianças, ao interagirem com o grupo, utilizam-se de estratégias e
conhecimentos compartilhados nas discussões que acontecem no momento do
ditado.
Fragmento 2
Eu dito a palavra ‘falar’
- O que poderia ter sido escrito errado? (professora)
- Já sei o ‘f’ e o ‘v’. (G.)
- Não foi por que eu errei ‘falá’ sem ‘r’ e com acento. (V)
- Isso acontece muitas vezes porque a gente fala ‘fala’ mas escreve ‘falar’ Qual a outra
palavra que a gente escreve e não fala
22
? (professora)
- ‘Estava’ e ‘estou’ (F./Mi/R.)
- Isso mesmo! Na hora de escrever ‘tá’ e ‘tô’ a gente tem que pensar. Assim é na hora de
escrever ‘fala’, ‘come’, ‘faze’ em vez de falar’, ‘comer’, ‘fazer’(professora).
- ‘Engolir’ também né? (A.)
- Também! (professora)
Eu dito a palavra ‘cantar’ depois de ter ditado outras três palavras.
- Essa eu já sei. É que nem a do V. A gente fala ‘canta’ mas escreve com ‘r’ no fim. (Fr.)
22
Nesse momento, poderia ser abordada a regularidade morfológica, porém como não foi trabalhado
este aspecto da língua, preferi fazer relação com a fala, uma vez que inicio a intervenção pelos erros
motivados foneticamente.
Conforme observado no fragmento 2, as tarefas abertas, as quais possibilitam
discussões e tentativas de solucionar problemas e pensar sobre a escrita, podem
auxiliar no processo de aprendizagem de estratégias de pensamento. Fr., ao
retomar a explicação dada pelo colega V., em outro momento da atividade, a utiliza
de maneira correta. Para Pozo (2002), a “boa aprendizagem” envolve situações de
cooperação que permitem aprender com as respostas dos outros colegas, que,
algumas vezes, eles são mais capazes de se fazer entender e ajudar na procura de
soluções.
Depois de trabalhada a noção de erro, organizei a intervenção de acordo com
as categorias propostas no presente trabalho para a classificação dos erros, sempre
respeitando a ordenação apresentada. Mesmo que as crianças cometessem erros
motivados pelas diferentes categorias relacionadas à norma ortográfica, considerei
que trabalhando primeiramente com os erros de motivação fonética e fonológica, as
crianças aprenderiam a observar a relação fala e escrita, a procurar explicações
para os erros cometidos e a ter maior facilidade de corrigi-los, visto que estudos
como o de Carraher (1986) e Cagliari (1999) sugerem que se existir uma
intervenção, desde o início da aprendizagem da escrita ortográfica, esses erros
tendem a sofrer uma redução considerável já nas primeiras produções textuais.
Na próxima seção, serão descritas e analisadas as intervenções e as
atividades realizadas com o intuito de trabalhar as diferentes motivações dos erros
ortográficos.
4.2.1 Motivação fonética
A primeira atividade realizada propunha às crianças que escrevessem como
falava o colega. No início, os alunos não conseguiram perceber as diferenças entre
fala e escrita. Passei a oferecer exemplos da minha fala para eles perceberem que
toda a fala, inclusive a minha própria, não tinha a forma exata da escrita das
palavras. Partindo do modelo apresentado por mim, as crianças entenderam a
proposta e passaram a escutar o colega, tentando reproduzir na escrita, o que
estavam ouvindo. Os exemplos apresentados a seguir servem para ilustrar algumas
das frases escritas pelos alunos a partir da observação da fala dos colegas.
oji mia mãe foi mi trazer pra iscola di carru i ajudou a trazer as coiiisas” (sic).
u meninu saiu pra o recreiu” (sic)
Observei que esse tipo de atividade auxiliou a criança a perceber as
diferenças entre língua oral e língua escrita. Como mostra o exemplo recém
apresentado, as crianças, na tentativa de reproduzirem a pronúncia dos colegas,
procuram reproduzir também a entonação, como podemos observar na repetição da
vogal ‘i’ com o objetivo de marcar o seu alongamento na pronúncia. A partir de
atividades como essas, os alunos começaram a perceber as diferenças e a observar
a escrita tanto em relação à segmentação das palavras quanto em relação às letras
utilizadas para representar os sons.
O fragmento 3 representa uma das falas relativas ao processo da atividade.
Mostra uma reflexão inicial da criança a respeito da diferença entre língua oral e
língua escrita.
Fragmento 3
- Se a gente escrever tudo como fala daqui a pouco não vai dar pra entender nada! (Mi.)
- Mesmo que eu não entenda, quero que vocês percebam as diferenças entre fala e
escrita. (professora)
- Isso já tá! A gente fala ‘istuda’ em vez de ‘estudar’, mas a gente também fala ‘Renan’ para
‘Renan’. (R)
- Então... (professora)
- Vou anotar então que muitas vezes é diferente, mas que às vezes pode ser igual o jeito
de escrever. (Mi)
A atividade de escrever tentando reproduzir a fala do colega permite ao aluno
concluir que nem sempre escrevemos conforme falamos, como ilustra a fala do
aluno Mi. Para Cagliari (1999) é preciso que os alunos, no processo de
aprendizagem da escrita, sejam ensinados a observar as diferenças existentes entre
fala e escrita, pois, segundo o autor (p. 80), “os alunos que não receberam esse tipo
de explicação não entendem direito porque não podem escrever do jeito que eles
falam e, provavelmente, ficarão o resto da vida ‘chutando’ as letras nas palavras,
para acertar a ortografia”.
Outra atividade realizada foi a correção dos erros provocados, na qual eu
distribuía um trecho de um texto, trabalhado anteriormente, com alguns erros
foneticamente motivados. Em cada trecho era focalizado apenas um tipo de erro
com objetivo de induzir a atenção das crianças para um aspecto da escrita. Os erros
provocados nas atividades de “encontrar os erros” foram divididos em erros
relacionados à grafia das vogais, erros relacionados à grafia do ditongo e erros
relacionados ao apagamento do ‘r’ do infinitivo. Além de exercitar as estratégias de
pensamento transferidas para as situações de correção das produções textuais,
essa atividade possibilitava à criança tomar consciência dos tipos de erros
relacionados à fala, como mostra o exercício apresentado a seguir e, logo após, o
fragmento 4 que representa uma parte de uma intervenção realizada no momento da
atividade.
Encontre os 4 erros.
Gosto muito de deita de costas para coça minha barriga. Mas sabido sou apenas na hora de
lati palavras.
Sou um pouco malcriado, não obedeço sempre, gosto de faze o que quero, faço xixi na sala
da Clarice. (adaptado de Lispector (1999)).
Dicas: comece marcando as palavras certas, assim fica bem mais fácil! Todas as palavras têm algo
em comum.
Fragmento 4:
A aluna R. marca todas as palavras consideradas corretas, deixando apenas ‘coça’ ‘lati’, ‘faço’,
‘obedeço’, ‘deita’.
- Tu seguiste as dicas? (professora)
- Sim (R.)
- O que elas têm em comum? (professora)
- Essas são o ‘ç’. (R. aponta para ‘faço’, coça’, ‘obedeço’)
- Só têm três são quatro? (professora)
- Lati e deita falta o ‘r’. (R.)
- E ‘coça’ vamos ler? (professora)
- Acho que falta também! Então só falta uma sem ‘r’ no fim. (R.)
- Sim (professora)
- Faze (R.)
- Jóia! Então o que elas têm em comum? (professora)
- Falta o ‘r’ no final. (R.)
- Por que eu escolhi essas palavras? (professora)
- Porque a gente nunca fala ‘r’ no fim. (R.)
- Agora que tu descobriste ajuda o teu colega Fr. (professora)
- Fr. Estás na pista certa. Pensa o que a gente não fala mas escreve é parecido com essas
aqui que sobraram (R. aponta para ‘deita’ e ‘faze’)
- Está sem ‘r’ (Fr.)
O fragmento 4 mostra uma atividade que retoma as aprendizagens
construídas sobre as diferenças existentes entre o oral e o escrito e propicia que a
criança torne conscientes as hipóteses que constrói para a correção dos erros. Por
intermédio da intervenção, essas hipóteses são reconstruídas em forma de
conhecimentos sobre a escrita e esses conhecimentos são retomados nos
momentos de escrita e correção das produções textuais.
É importante mencionar também que esse tipo de atividade possibilitam às
crianças interagirem entre si, o que auxilia a aprendizagem de novos conhecimentos
pois, de acordo com Vigotski (2000), a criança pode imitar o que está na sua
zona de desenvolvimento proximal. Assim, com o auxílio de um adulto ou de uma
criança de conheça o tema em questão, ela pode imitar as várias ações que estão
além da sua capacidade, favorecendo a aprendizagem.
O fragmento 5 apresenta um diálogo de uma intervenção realizada no
momento da correção da redação, quando o aluno explicita e relembra o
conhecimento construído sobre a grafia do ‘r’ do infinitivo.
Fragmento 5:
No momento da redação o aluno marca os acertos ‘de repente’, ‘Beto’, ‘viu’, ‘uma’, ‘árvore’ e
quando chega na palavra ‘penso’ fala:
- Já sei o que está errado nessa parte é: Beto viu e pensou (F. lê dando ênfase ao ‘u’)
- Sim, tudo bem mas tem mais um erro olha a quantidade que marquei
23
(professora).
- Vou procurar o outro. Não sei. (F.)
- Será que tu não escreveste alguma palavra do que jeito que falas? (professora)
O aluno circula todas as palavras, deixando apenas ‘nessa’ ‘subi’.
- Está entre essas? (F.)
- Sim. Uma está certa e a outra não. Pensa! É alguma coisa que a gente trabalhou no
caderninho. (professora)
- sei. É que nem ‘fala’ falta o ‘r’. O certo é falar. Então acho que é ‘subi’ falta um ‘r’ né?
(F.)
- Isso mesmo! (professora)
- Já ia me esquecendo que a gente não escreve como fala (F).
No fragmento 5, o aluno, ao ter que descobrir qual a palavra está grafada de
forma errada, retoma o conhecimento construído e registrado no caderno, inclusive
relembrando o exemplo explicitado na intervenção ‘fala’. Por fim, conclui a correção
falando para si mesmo que estava esquecendo, “mas a gente não escreve como
fala”.
Apesar das crianças compreenderem a diferença entre fala e escrita, nos
casos da redução do ditongo e da grafia das vogais, torna-se um pouco mais difícil
identificar e explicitar as hipóteses subjacentes à maneira correta, como se pode
verificar nos fragmentos 6 e 7 apresentados a seguir:
Fragmento 6: Em relação à grafia do ditongo
23
A correção da redação, como descrita anteriormente, era feita marcando a quantidade de erros por
parágrafo, o que sempre era relembrado aos alunos para orientá-los na correção de todos os erros.
No momento da correção, a aluna I. está com dificuldade de encontrar o erro.
- Não sei o que tem aqui? (I.)
- Separa aquele que tu já sabes. (professora)
A criança circula inclusive a palavra errada.
- Será que ‘robou’ está certo? (professora)
- Acho que sim! Por que já tem o ‘u’ (I.)
- Sim o ‘u’ no final, mas será que não falta outro? (professora)
- Ah! É ‘robou’ a gente nunca fala o ‘u’, mas tem né? (I. Repete em voz alta ‘roUbou’,
escreve o ditongo e fala:)
- Agora está, ‘robou’? (I.)
- Sim. (professora)
Fragmento 7: Em relação à grafia das vogais
No momento da correção K. encontra rapidamente o erro.
- Já sei que é ‘minino’ (K.)
- Eu vejo sempre assim (Fazendo referência à palavra ‘menino’). E quando a gente fala com
‘i’ é com ‘e’. (K.)
Esses dois casos relacionados à motivação fonética causam uma certa
dificuldade na identificação e na correção devido à existência de grafias como ‘coro’
e ‘couro’ e como ‘inteligente’ e ‘empolgante’. No fragmento 6, relacionado à grafia do
ditongo, I. repete a palavra em voz alta, salientando a presença do grafema ‘u’ que
não é percebido na forma fonética da palavra, porém, quando pergunta se está
correto a palavra ‘roubou’, realiza novamente a monotongação. Adamoli (2006), ao
analisar os erros relacionados à grafia dos ditongos, constatou que uma grande
quantidade de erros ortográficos de naturezas diversas relacionadas à grafia dos
ditongos orais e que esses erros revelam a dificuldade da grafia, pois determinados
tipos de ditongos só se manifestam na forma escrita.
No fragmento 7, relacionado à grafia das vogais, K. não encontra problemas
em identificar o erro, devido ao número reduzido de palavras escritas no título da
redação “O minino Fernando” , porém, ao tentar explicar a motivação do erro, ela
generaliza uma regra que explica o motivo do erro “minino”, que não é aplicada em
palavras como ‘divisa’ e ‘piscina’, as quais falamos com [i] e escrevemos com ‘i’.
Algumas explicações encontradas pelas crianças para justificarem suas hipóteses
podem ocasionar casos de supergeneralização de regras como mostram os
fragmentos 8 e 9, que mostram a reflexão das crianças ao escreverem ‘emitar’ para
‘imitar’ e ‘professoura’ para ‘professora’.
Fragmento 8: Em relação à grafia das vogais:
No momento da correção, a criança sente dificuldade em encontrar o erro.
- Não sei o que está errado. Olho e olho e não acho nada (Vi).
- Dá uma olhada nessa palavra ‘emitar’ (professora).
- Está certa, toda vez que a gente fala ‘i’ se escreve com ‘e’ (Vi).
- Sim, em alguns casos é assim. Mas aqui se escreve com ‘i’ é ‘imitar’ (professora).
- Então tem que adivinhar. (Vi.)
Fragmento 9: Em relação à grafia do ditongo:
O aluno olha a palavra ‘professoura’ e comenta:
- Aqui está certo porque a gente não fala o ‘u’ mas tem (L.).
- Só em algumas palavrinhas outras não tem ‘u’. Professora não tem ‘u’ (professora)
A partir da fala das crianças apresentadas nos fragmentos 8 e 9, pode-se
inferir que elas estão estabelecendo relações de diferença entre a língua oral e a
língua escrita, que, nos erros relacionados à grafia das vogais e à grafia do
ditongo, elas percebem a assimetria entre esses dois modos. Porém, nesse
momento, ainda uma generalização para contextos indevidos. Esses casos de
supergeneralização podem oferecer subsídios para o professor intervir de maneira
mais eficaz, pois revelam os conhecimentos que as crianças possuem acerca da
escrita ortográfica.
Como afirmam Carraher (1986) e Cagliari (1999), na medida em que as
crianças interagem com a escrita, esses erros diminuem consideravelmente e elas
tendem a ter mais facilidade em corrigi-los, por entenderem à motivação subjacente
ao erro e aprenderem a observar, conscientemente, as divergências existentes entre
a língua oral e a língua escrita.
Na pesquisa, apesar da intervenção ter focalizado aspectos relacionados à
motivação fonética, os erros relacionados a essa categoria foram encontrados nos
dados analisados até a última coleta.
A tabela 1 apresenta a quantidade de erros de motivação fonética
encontrados nas 190 produções analisadas. Foram produzidos dez textos por mês,
por cada um dos 19 alunos.
Tabela 1: Erros de motivação fonética e supergeneralização
Gafema-som Supergeneralização
março 112 83
junho 37 48
setembro 25 28
Como se pode observar na tabela 1, os erros de motivação fonética e
supergeneralização aparecem com grande freqüência nas produções de março e
apresentam, ambos, uma redução significativa nos meses de junho e setembro. Se
forem selecionados os textos coletados para a pesquisa de março a dezembro e
observados os diferentes tipos de erros relacionados à fonética, pode-se perceber
que os referentes à grafia do apagamento do ‘r’ do infinitivo sofrem uma grande
redução, permanecendo com maior freqüência os que se relacionam à grafia das
vogais e dos ditongos.
4.2.2 Motivação fonológica
Em relação aos erros de motivação fonológica, as intervenções foram
planejadas considerando-se dois aspectos principais: a) utilização de pares mínimos
e b) correção de erros provocados tanto no caso das trocas de fonemas quanto no
caso de grafia das estruturas silábicas. A relação fonologia e ortografia, nos casos
mencionados acima, foram, inicialmente, explicitadas por meio de correção de erros
em grupo.
Com essa atividade, percebe-se que a criança, em se tratando da grafia de
estruturas silábicas complexas, possui maior facilidade em identificar e corrigir seu
erro, pois rapidamente compreende que ‘brica’ não representa [bi
ka]. Penso que
as atividades denominadas “o que falta aqui?” e “encontre os sete erros” (Apêndice
E), as quais possibilitavam à criança analisar a palavra e pensar sobre a estrutura da
sílaba, fazem com que ela aprenda a prestar atenção nesse aspecto da escrita e
passe a pensar antes de escrever palavras que contenham grafias de estruturas
complexas, como mostra o fragmento 10:
Fragmento 10:
A criança está realizando o exercício o que falta aqui?
MON_TRO
-
- Aqui é muito fácil de fazer (B.)
- Por quê? (professora)
- Assim, a gente lê, pensa e descobre que está faltando alguma coisa ali (B.)
- Onde? (professora)
- Aqui, se eu ler igual está ‘montro’, mas eu sei que é ‘monstro’, eu fico pensando, mon-
s-tro (diz a palavra devagar, quase silabando) e escrevo certo. (B.)
- E como tu sabes que é ‘monstro’ e não ‘montro’? (professora)
- Ah! Eu sempre escutei assim. (B.)
Essa intervenção mostra que a criança identifica facilmente o erro relacionado
à grafia de estruturas de sílabas e que utiliza um conhecimento de língua que
possui. Por meio da análise da quantidade de erros encontradas nas dez coletas de
dados realizadas em março, junho e setembro, percebe-se que na última coleta
existe uma redução considerável no número de erros relacionados às grafias de
estrutura silábicas, como mostra tabela 2.
Tabela 2: Erros relacionados à grafia das estruturas silábicas
Estrutura silábica
março 75
junho 4
setembro 0
Os erros relacionados à grafia das estruturas silábicas sofrem uma redução
considerável desde as primeiras produções realizadas em março, chegando a
nenhum caso em setembro, o que corrobora os resultados relacionados à grafia do
encontro consonantal, apresentados por Araújo, Garcia e Miranda (2007). As
autoras, após compararem a quantidade de erros com a quantidade de acertos
encontrados nas produções textuais de crianças de 1
a
e 2
a
série, percebem que é
mínimo o conjunto de erros desse tipo. Assim, o que se observa, a partir da análise
da quantidade de erros, é que a criança aprende a grafar corretamente e a pensar
sobre as estruturas de sílabas de sua língua, como se pode observar na frase
escrita por G. em seu caderno “as vezes agente esquese uma letra tenque ler e
voltar para descobrir que é fácil” (sic).
Em relação às trocas de fonemas, a primeira atividade realizada é de
explicitação coletiva dos erros ocasionados pelas trocas. São colocados no quadro,
os cartazes (Apêndice E) com alguns pares mínimos, para as crianças compararem
e perceberem o que acontece quando se troca um fonema, como por exemplo,
‘faca’/’vaca’, ‘pomba/’bomba’, ‘tia’/’dia’, ‘cola’/gola’. Concomitante a essas atividades,
inicio o trabalho com o livro “Não confunda” da autora Eva Furnari (2002) e peço às
crianças que escolham um par mínimo para representar, como mostra as figuras
abaixo, representativas dos fonemas trabalhados:
Figura 1: /p/ - /b/
Compro no bar com você meu par.
Figura 2: /t/ - /d/
Nem tente com teu dente!
Figura 3: /f/ - /v/
A minha vila com eu estou na fila.
Figura 4: /k/ -/g/
Uma pessoa gorda com uma corda.
A atividade “não confunda”, assim como os cartazes de pares mínimos, tem o
objetivo de chamar a atenção da criança para a mudança de sentido que pode
ocorrer em decorrência da alteração dos fonemas na língua. Elas começam a se
tornar conscientes em relação às diferenças entre os fonemas, como se pode
perceber no trecho escrito por H. em seu caderno “tem letras que é muito igual o
som a gente lembra do não confunda e não confunde”. As “regrinhas”, como as
crianças chamam, ajudam a resumir as aprendizagens e facilitam a sua retomada
dos conhecimentos construídos em outros momentos de escrita, como mostra o
fragmento 11:
Fragmento 11
O aluno T. apresenta trocas dos fonemas /f/ por /v/. Esse diálogo ocorreu no momento de
correção:
- Já sei, troquei de novo (T.)
- Então? (professora)
- Não confunda o ‘f’ e o ‘v’, mas eu sempre troco. (T.)
- E o que você deve fazer? (professora)
- Pensar muito antes de escrever e vou deixar meu caderninho aberto nesta página para
sempre me lembrar. (T.)
- Ótimo. (professora)
O aluno T. percebe que realiza essa troca de fonemas freqüentemente,
porém, lança mão de algumas estratégias para tentar evitar o erro, como pensar
antes de escrever e deixar o caderno aberto para relembrar a troca. Cagliari (1990)
explica as trocas de fonema pelo fato das crianças serem ensinadas a escreverem
em silêncio, o que dificultaria na definição de que tipo de fonema, surdo ou sonoro,
está presente na palavra. A tabela 3 mostra a quantidade de erros encontrados nas
dez produções coletadas nos meses de março, junho e setembro, relacionados às
trocas de fonemas surdos e sonoros.
Tabela 3: Erros relacionados ao traço [sonoro]
Grafema-fonema
março 63
junho 4
setembro 1
Percebe-se que a freqüência de erros relacionados à troca de fonemas tende
a diminuir após as intervenções realizadas, no entanto, esses erros voltam a
aparecer em outros momentos durante o ano letivo. Mesmo retornando, observa-se
uma maior facilidade das crianças em identificá-los, analisá-los e corrigi-los, pois
conforme Zorzi (1995) existem diversos níveis de conhecimento sobre a linguagem,
um domínio prático que se refere à capacidade de fazer usos da linguagem em
situações naturais e, ultrapassando esse nível prático, estão os conhecimentos que
resultam de reflexões realizadas sobre a própria linguagem, os quais permitem uma
tomada de consciência acerca de suas propriedades. Desse modo, “a linguagem
torna-se um tipo especial de objeto sobre o qual a criança pensa e faz julgamentos”
(ZORZI, 2006, p 12)
4.2.3 Correspondência regular contextual
Em relação à correspondência regular contextual, uma das primeiras
atividades propostas foi a construção de regras regulares contextuais
24
. Essa
24
Modelo de atividade adaptado da sugestão de Morais (2003).
atividade tem o objetivo de construir regras com as crianças, porque mesmo que a
maioria saiba algumas regras decoradas, não quer dizer que façam uso dessas
regras ao escreverem. Morais (2005b), ao discutir os casos de regularidades
contextuais, mostra o exemplo da grafia do M ou N no final das sílabas, caso para o
qual as professoras ensinam cantigas sobre a utilização dos grafemas nos contextos
devidos. Para o autor, apesar de os alunos repetirem as cantigas continuam
cometendo erros relacionados a essa grafia (2005, p. 94):
Creio que é preciso entendermos que a memorização de itens verbais não
é sinônimo de conhecimento explicitado a nível verbal. A explicitação nesse
nível requer um processo de reflexão, um trabalho de reelaboração de
conhecimentos levado a cabo pelo aprendiz (o que não nos desobriga de
ajudá-lo nesta tarefa).
Morais (2005b, p.94) salienta que para que a criança reflita sobre a ortografia,
o ensino deve ajudá-la a “’organizar’ mentalmente a norma ortográfica”, para que ela
possa entender e identificar as regularidades e as irregularidades da ortografia.
Com o intuito de auxiliar a criança a refletir sobre as regularidades da norma,
foram realizadas as atividades de construções de regras. Uma delas, referente às
regras de uso do ‘r’, foi realizada em grupo de cinco crianças e consistiu na busca de
palavras que continham a “dificuldade” trabalhada. Após encontrar uma grande
quantidade de palavras com ‘r’, as crianças deveriam compará-las e agrupá-las em
categorias. Primeiramente, solicitava-se que as discussões fossem realizadas no
grupo e, após uma primeira categorização, levantavam-se questionamentos com o
objetivo de desestabilizar as hipóteses construídas pelas crianças, além de orientá-
las nas redefinições dessas hipóteses. O diálogo abaixo tem como objetivo
exemplificar uma dessas situações:
- (professora) Hoje nós vamos aprender sobre o ‘r’ e os dois ‘r’s.
- (aluna) A gente já aprendeu na primeira série ... ‘r’ sozinho é fraco e ‘rr’ é forte.
- (professora) Será que é sempre assim? Vamos ver? Nos grupos que vocês estão procurem
palavras em que aparece o ‘r’ ou os dois ‘r’s e separem em grupos que vocês escolherem
-(aluno) Como assim?
-(professora) Primeiro vocês acham as palavras.
Os alunos encontram as palavras:
- (professora) Agora olhem para o ´r´ e olhem o que é parecido em cada palavra.
Separam o ‘r’ e o ‘rr’.
- (professora) Me expliquem o que vocês fizeram.
- (aluno) Aqui está o ‘r-forte’ (berro) e aqui o ‘r-fraco’ (careta).
- (professora) Está bem. Mas olhem aqui (a professora mostra o ‘r’ inicial, agrupado na
mesma coluna do ‘r’ sozinho). É a mesma coisa?
- (aluno) Não, um está na frente e outro no meio.
- (professora) E o som é igual?
Lêem em voz alta, raio, régua/cara, nariz.
- (aluno) Não um é mais forte que o outro.
- (professora) Está e agora?
- (aluno) Agora tem que separar o ‘r’ no início, do ‘r’ no meio.
- (professora) Muito bem! Agora olhem para ‘rr’. O que tem de parecido?
- (aluno) Está sempre no meio.
- (professora) Então pode ter uma palavra que comece com ‘rr’. O que vocês acham?
- (aluno) (olham todos os outros grupos) Não, não tem nenhuma.
- (professora) O que mais tem de parecido?
- (aluno) Também não tem no fim.
- (professora) Olhem para onde ele sempre está e pintem.
- (aluno) É sempre a, e, i, o.
- (professora) Será que não tem u também, pensem nas palavras com ‘rr’.
- (aluno) Burro.
- (professora) Isso aí. O que são a, e, i, o, u?
- (aluno) Vogais.
- (professora) Muito bom.
- (professora) O que vocês aprenderam hoje. Escrevam aí.
Escrevem: ‘r’ na frente é mais forte que ‘r’ no meio. ‘rr’ é a mesma coisa que ‘r’ na frente que é no
meio. Está sempre entre a, e, i, o, u.
Após a construção da regra do ‘r’, todas as correspondências regulares
contextuais foram trabalhadas seguindo o mesmo modelo para possibilitar ao aluno
exercitar a comparação, a inferência, o pensamento lógico e a solução de
problemas, fazendo uso de estratégias cognitivas e metacognitivas. Essas
atividades foram planejadas com a finalidade de que se pudesse conhecer a
hipótese da criança, explorar seus conhecimentos espontâneos de escrita e, a partir
deles, estabelecer relações que aproximassem esses conhecimentos das regras
ortográficas estabelecidas.
Além de construir conhecimento sobre a regra ortográfica, essas atividades
possibilitam à criança definir algumas estratégias de pensamento. Ao final da
atividade, pedi que escrevessem sobre o que fizeram para aprender. A seguir,
reproduzo duas anotações feitas pelos alunos.
eu olhei para a palavra e depois botei ela com as outras e depois eu olhei onde estava a letra e aí eu
descobri onde a letra fica na palavra” (sic)
eu fiquei em cilêncio ai olhei um lugar do ‘r’ e vi que estava certo depois olhei o outro lugar e vi
que estava certo eu pensei se está tudo certo eu vou escrever no caderno para ter depois se eu
me esqueser” (sic)
Os dois exemplos citados acima mostram que a criança está começando a
definir e compreender as ações que podem ser realizadas no momento de
aprendizagem da escrita ortográfica. A consciência dessas estratégias facilita a
correção dos erros e a resolução dos problemas que a criança encontra ao escrever,
conforme mostra o fragmento 12:
Fragmento 12:
No momento de correção, a aluna lê o parágrafo e, rapidamente, antes de marcar as palavras
certas, identifica o erro.
- Errei o ‘m’ antes de ‘p’ e ‘b’ (R.)
- Que rápido! (professora)
- Isso é muito fácil, tem regrinha. (R.)
A regra contextual aprendida pela criança pode fazer com que ocorra uma
diminuição do número de erros relacionados a essa categoria, além de facilitar a
correção desses erros. A tabela 4 mostra o número de erros encontrados nas dez
produções coletadas nos meses de março, junho e setembro.
Tabela 4: Erros relacionados à correspondência regular contextual
Número de
erros ‘r’
inicial
Número
de erros
‘rr’
Troca do
‘m’ pelo
‘n’
Troca do
‘m’ pelo ‘n’
no final de
palavras
Troca do
‘n’ pelo
‘m’
J/g na
frente do
a, o,u
março 56 79 78 42 45 39
junho 8 15 11 9 7 21
setembro 0 3 2 1 1 3
Além da redução do número de erros que pode ser verificada na tabela 4, foi
realizado um ditado com palavras inventadas para analisar, especificamente, o
conhecimento dos alunos referente à grafia do ‘r’ forte e fraco nos contextos: ‘r-
inicial’, ‘r-fraco’ e ‘r pós-consonantal’; à grafia da nasal pré-consonantal; e do ‘j’ e ‘g’
em contextos não-competitivos. Em relação a essas grafias, as crianças não
cometeram erro algum, mesmo sendo palavras nunca escritas ou visualizadas
anteriormente.
Também, para analisar os outros contextos de regularidades contextuais, foi
realizado um ditado de frases que continham palavras inventadas, as quais
permitiam a análise do uso da nasal correta em posição de coda. O conjunto
continha dez palavras, a saber, tansarou, dacimpa, gunco, lambrenou, sonrinda,
guenlo, tirrincer, sanfinão, anjuçada e trancirrou. É interessante salientar que as
crianças não cometeram sequer um erro na grafia do ‘m’ antes de p’ e ‘b’ e do n’
antes das demais consoantes.
Em relação à grafia das palavras que permitiam analisar a utilização do ‘j’ e ‘g’
antes do ‘a’, ‘o’, ‘u’, gunco, jasimo e anjuçada, verificou-se que duas crianças
escreveram a palavra ‘anjuçada’ como ‘anjoçada’, realizando um
supergeneralização, porém sem infringir a regra contextual.
Para o professor, a utilização da ‘regrinha’ construída e pensada pelas
crianças pode se tornar uma ferramenta eficaz para o ensino da ortografia, pois a
criança passa a entender o que pode ser entendido e o quepode ser reproduzido
na norma ortográfica, casos em que precisa lançar mão de estratégias mnemônicas
uma vez que envolvem irregularidades.
4.2.4 Correspondência irregular
Em relação à correspondência irregular, as atividades planejadas visam à
identificação das palavras irregulares “aquelas que não têm explicação”, nas
palavras da criança, bem como ao estímulo do uso de estratégias mnemônicas.
Algumas das atividades desenvolvidas foram: o cartaz do não erre mais
25
, o ditado
de palavras com a mesma letra (Guimarães, 2005), e a utilização de dicionário. Por
serem erros relacionados às múltiplas escolhas que a escrita nos oferece, eles
continuaram aparecendo com grande freqüência até as últimas produções textuais o
que indicou que as crianças precisavam aprender a utilizar estratégias mnemônicas
no momento da correção. A tabela 5 mostra a quantidade de erros relacionados às
correspondências irregulares encontrados nas dez produções dos meses de março,
junho e setembro, totalizando 190 produções observadas em cada mês.
Tabela 5: Erros relacionados à correspondência irregular
Grafia do
/s/
Grafia do
/z/
Grafia do /
/
Grafia do
//
Grafia do
‘h’
março 189 142 43 57 19
junho 125 104 38 24 10
setembro 91 51 17 10 1
A quantidade de erros apresentada na tabela 5, confirma os resultados
encontrados por Garcia, Araújo e Miranda (2007) que, ao analisarem a grafia do /s/
em aproximadamente mil textos de crianças de a série, mostram ser a
ocorrência de erros desse tipo aquela que apresenta maior freqüência em todas as
séries e que esses erros tendem a se manter até a 4ª série.
A grafia do /z/, nos dados estudados, também é responsável por um grande
número de erros na escrita inicial das crianças. Como é possível observar na tabela
5, uma tendência a diminuição de ocorrências desse tipo de erro. Uma das
25
Essa atividade consiste, em cada semana, uma criança confeccionar um cartaz com a palavra que
não pode ser mais errada pela turma. A seleção de palavras é feita pela freqüência de erro (Morais,
2005).
explicações possíveis poderia estar relacionada às possibilidades de grafias que,
para esse som, são menores do que a do /s/.
Os erros envolvendo a grafia do // aparecem em menor quantidade,
provavelmente pelo fato de as palavras que contêm esse fonema serem menos
freqüentes tanto no léxico da língua como nas palavras encontradas nas produções
das crianças. nas grafias do / / e o uso do ‘h’, são trabalhadas palavras de uso
freqüente na escrita das crianças, o que facilita a memorização, conforme mostram
os resultados da tabela 5, especialmente em relação ao uso do ‘h’ .
Além de serem trabalhadas as palavras que as crianças usam
freqüentemente, algumas estratégias mnemônicas, que passam pela utilização de
estratégias de associação (Pozo, 1996), podem ser ensinadas na escola, a fim de
possibilitar uma solução para problemas envolvendo as grafias de palavras com
correspondências irregulares.
O fragmento 13 mostra o momento em que L. corrige sua produção, na qual
aparecem dois erros relacionados às correspondências irregulares:
Fragmento 13:
- Não sei o que errei. Parece que é nesses ‘s’ (L.).
- Sim essas são aquelas palavras. (professora)
- As que não têm explicação. Então podes me dizer? (L.)
- Qual letra pode ser aí? (Aponto para balansando)
- Só pode ser ‘ç’. (L.)
- Então? (professora)
- Então balançar também é com ‘ç’ é da mesma família. (L.)
No fragmento recém apresentado, a criança observa o parágrafo e, após
eliminação das palavras consideradas corretas, sobram apenas as com ‘s’. Sabendo
que o maior número de casos de irregularidade estão relacionados à grafia do ‘s’,
ela aponta para as palavras escritas com ‘s’: ‘balansando’ e ‘balansar’. No momento
em que ela define a letra que torna a palavra correta, utiliza uma estratégia de
associação e generaliza para o verbo. Em outros casos outras estratégias
mnemônicas
26
ensinadas são utilizadas, como mostra o fragmento 14:
Fragmento 14:
- Como é que eu errei isso! (H.)
- Como assim?
- Chico Bento é com ‘C’ eu leio todos os dias isso, era só ter me lembrado dos gibis. (H)
Um dos modos de solucionar erros relacionados às correspondências
irregulares é relembrar a forma correta da palavra que pode ter sido vista nos livros
ou nos cartazes. Esses erros tendem a diminuir se formos analisar as palavras que
são focalizadas na intervenção, aquelas que aparecem com maior freqüência nas
26
Para Pozo (1996), as estratégias de associação, quando utilizadas conscientemente, podem ser
consideradas um tipo de estratégia mnemônica.
produções textuais das crianças. Para exemplificar, quando trabalho os sons do ‘x’,
as palavras escolhidas são do cotidiano da criança, aquelas mais utilizadas por elas,
por exemplo ‘trouxe’ e ‘texto’. Também utilizo cartazes feitos pelas crianças com
palavras de uso freqüente, relacionadas aos casos de irregularidades. Segundo
Morais (2003) é importante as listas de palavras relacionadas às irregularidades da
norma ortográfica ficarem expostas, porque para internalizar as formas corretas a
criança precisa da memória visual, “por isso, quanto mais os aprendizes ficarem
expostos às palavras, mais poderão criar ‘imagens fotográficas’ delas em sua
mente” (p. 109). O fragmento 14 traz um exemplo de uma interação em que a
criança retoma a imagem visual.
Fragmento 15:
- Já sei o que está errado! (E.).
- O que é ? (professora)
- ‘Felises’? (E.)
- Como sabes assim tão rápido?
- ‘Feliz’ estava no cartaz do ‘z’ do final. (E.)
- Então? (professora)
- Então ‘felizes’ é com ‘z’ (E.)
O aluno E., ao receber o parágrafo indicando apenas um erro, percebe
rapidamente que a palavra ‘feliz’ está errada e a corrige relembrando um cartaz
exposto em sala de aula. Desse modo, pode-se pensar que, apesar dos erros
relacionados às correspondências irregulares continuarem freqüentes até as últimas
produções, é preciso planejar atividades relacionadas a essa correspondência da
norma ortográfica, pois as crianças, durante o processo, vão incorporando algumas
palavras ao seu repertório de escrita, não cometendo mais erros.
4.2.5 Casos em que a regularidade diminui as possibilidades de grafia.
casos em que alguma regularidade pode ser observada. São aqueles em
que a grafia escolhida pela criança não é a que foi definida pela norma, mas, se
observarmos o contexto da palavra, ela poderia ser a grafia adequada, uma vez que
não altera o valor fonêmico do segmento que está sendo representado graficamente
e uma regra contextual parcial pode ajudar a criança a trabalhar com um conjunto
menor de possibilidades.
O fragmento 16 mostra uma situação em que a determinação de uma
regularidade, ainda que parcial, evita o erro:
Fragmento 16
- Aqui eu sei que está errado, eu escrevi ‘poso’ (Lê ‘pozo’) em vez de ‘posso’. (A.)
- Isso mesmo. Como tu sabes que fica ‘pozo’? (professora)
- É que ‘s’ entre vogais tem som de ‘z’. (A.)
- Então corrige. (professora)
- É com ‘ss’ ou ‘ç’. (A.)
- Aí pode ‘ç’? (professora)
- Acho que sim, tá na frente do ‘o’. (A.)
- E qual jeito tu achas que é? (professora)
- Com ´ç’. (A.)
- Existe, mas é poço de água, o ‘posso’ é com ‘ss’. (professora)
- Ah tá. (A.)
Como pode ser observado no fragmento 16, a criança ao ler a palavra
percebe a existência de uma regularidade que define o som de [z] para a grafia do
‘s’ entre vogais. No entanto, apesar de a regularidade servir para identificar o erro,
ela não define qual é o grafema que deve ser empregado na palavra ‘posso’, fato
que gera uma irregularidade. No caso da palavra ‘posso’, assim como pode ocorrer
em relação a outras formas que possuem pares homônimos, a criança tem a
possibilidade de escolher entre duas formas homófonas e, conseqüentemente pode,
neste caso, pensar que a palavra em questão deve ser grafada com ‘ç’, como o faz.
É neste momento que o professor precisa intervir levando o aluno a perceber que as
duas formas, ‘posso’ e ‘poço’, são pertencem ao léxico da língua, porém portam
significados distintos e apenas uma delas será apropriada para o contexto.
As regularidades, se ensinadas para as crianças, podem ser auxiliares à
diminuição do número de erros que envolvem essas grafias. A tabela 6 apresenta a
quantidade de erros encontrados nas dez produções textuais coletadas nos meses
de março, junho e setembro.
Tabela 6: Erros relacionados aos casos em que a regularidade diminui as
possibilidades de grafia
Uso
indevido do
‘ç’
‘s’
intervocálic
o
‘s’ pós-
consonantal
março 74
105
72
junho 16
43
23
setembro 6
22
14
Os dados apresentados na tabela 6 podem revelar que o fato de a criança
observar o contexto pode, efetivamente, levar à diminuição do número de erros,
visto que essa redução ocorre após a intervenção, como pode ser observado na
tabela recém apresentada.
Essa diminuição nos erros foi observada também no resultado do ditado de
frases que continham palavras inventadas, as quais permitiam focalizar a escolha
das crianças que, conforme os dados, respeitaram o contexto de utilização de
determinados grafemas. Se considerada a grafia do ‘ç’ em contexto indevido, por
exemplo, em palavras tais como dacimpa, tirrincer e trancirrou, vê-se que nenhuma
das grafias escolhidas (Apêndice G) pelas crianças feriam a regularidade contextual,
isto é, ‘ç’ antes de ‘e’ e i’, elas apenas indicavam as diferentes possibilidades de
grafia, resultantes da irregularidade da norma ortográfica.
As palavras do ditado que possibilitaram a observação da grafia do ‘s’
intervocálico, dacimpa
27
e anjuçada, em relação ao contexto não foram erradas e as
27
A palavra ‘dacimpa’ possibilitou a análise do uso do ‘ç’ e do uso do ‘s’ intervocálico porque, esse
contexto, permite a grafia do ‘c’, ‘sc’, ‘ss’. O objetivo do ditado era ver se a criança iria errar em
relação à regularidade.
palavras relativas ao ‘s’ pós–consonatal, tansarou, telso, tirrincer e trancirrou,
resultaram em apenas um erro ‘telsso’ para palavra ‘telso’ (Apêndice G).
4.3 A correção das redações e o uso de estratégias de aprendizagem
Além de trabalhar com a construção de conhecimentos relacionados à escrita
ortográfica nas intervenções planejadas, é na correção das redações que os alunos
utilizam as estratégias cognitivas e metacognitivas aprendidas no decorrer da
intervenção.
Nas primeiras correções, antes de iniciar a intervenção e trabalhar o uso de
estratégias, os erros eram identificados e as crianças apenas os corrigiam. Após
iniciar o trabalho voltado para o uso de estratégias de pensamento e para a
construção e conhecimentos acerca da ortografia, passei a marcar no parágrafo a
quantidade de erros e, a partir dessa informação, as crianças tinham a tarefa de ir
marcando as palavras que consideravam corretas, reduzindo assim o número de
possibilidades, isto é, de palavras que precisavam ser corrigidas.
O fragmento 17 ilustra um momento de correção e revela as estratégias
metacognitivas utilizadas pela criança.
Fragmento 17:
- Aqui eu sei que está certo lá/para/ver/o/que/ tinha/lá/ele/foi/ver/mas/ele/não/tinha. (B.
marca todas essas)
- O que sobrou? (professora)
- Então e ingreço. (B.)
- Qual dessas tu achas? (professora)
- Acho que é ingreço, parece mais difícil. (B.)
- Sim. (professora)
- Mas eu errei o ‘i’ ou o ‘ç’. (B.)
- O que achas? (professora)
- Podia ser “engresso” com ’e’ e ‘ss’ (B.)
- Acho que estás no caminho certo. (professora)
- Acho que é o ‘ç’ ingresso. Porque existe ‘inteligente’ que é com ‘i'. (B.)
Esse excerto de diálogo ilustra o uso de certos tipos de raciocínio utilizados
por B. que parecem importantes de serem considerados: o que lhe condições de
focar o possível erro, capacidade provavelmente desenvolvida pela tarefa de excluir
as formas que a criança considera ortograficamente corretas; o que lhe permite
localizar aspectos problemáticos relativos à grafia das palavras, a saber, o caso do
‘i’~’e’ pretônico e da grafia do /s/; e o que lhe conduz, por meio da analogia, ao
resultado final.
Considero que as estratégias utilizadas na correção da redação permitem ao
aluno retomar conhecimentos construídos nas intervenções, aprender a focalizar o
erro e a tornar consciente o quanto ele sabe sobre a escrita das palavras bem
como o quanto não sabe. Como defendem Da Silva e De Sá (1997), as crianças que
sabem conscientemente sobre suas facilidades e dificuldades e, além disso,
conseguem explicar as razões pelas quais chegaram à solução dos problemas
enfrentados durante o processo de aprendizagem, podem transferir essas
estratégias para novas situações bem como controlar sua atenção para aquelas
situações em que precisa de maior concentração. Assim, segundo as autoras, o
aluno pode chegar à resposta certa por meio de estratégias de pensamento, como
fica bem ilustrado no exemplo apresentado.
O fragmento 18 exemplifica um tipo de intervenção que tem o objetivo de
tornar consciente estratégias cognitivas que estão sendo utilizadas no momento da
correção, com o intuito de auxiliar na tomada de consciência dessas estratégias para
que se tornem metacognitivas e, portanto, transferíveis para outros momentos de
aprendizagem.
Fragmento 18
- Como corriges tua redação? (professora)
- Assim. Eu olho as mais fáceis que tem um monte. E aí fica com as mais difíceis. (R.)
- E aí? (professora)
- Penso, penso e corrijo. (R.)
- E se tem dúvida? (professora)
- Pergunto ou olho no caderno para lembrar. Depois vou escrevo certo e leio de novo.
Pode ser que eu me engane. Então to sempre olhando não é assim? (R.)
- Sim, a gente tem que estar sempre olhando com cuidado! (professora).
Por meio dessa fala, percebe-se que a criança consegue explicitar algumas
estratégias cognitivas e metacognitivas empregadas por ela para corrigir seus erros.
4.3.1. O grupo de controle
Com o intuito de observar o uso dessas estratégias de pensamento em
situações de correção das redações foi realizado um teste com dois alunos
integrantes da turma pesquisada e dois alunos de outra turma, os quais não tiveram
acesso ao tipo de intervenção proposta neste trabalho. Nessas sessões não foram
apontados os erros ortográficos das redações, prática anteriormente adotada. Nos
fragmentos 19 e 20 estão reproduzidos trechos do diálogo com dois alunos que
passaram pela intervenção.
Fragmento 19
-(prof.) – E aí M.? Vamos ver tua redação.
-(aluna) – Já achei um errinho.
-(prof.) – Qual é? Diz para prof.
-(aluna) – ‘Entam’.
-(prof.) – Por que achas que está errado?
-(aluna) – Porque não foi nada que já aconteceu, então é com ‘ão’.
-(prof.) – Não entendi, me explica de novo?
-(aluna) Assim oh, se é ‘foram’, ‘comeram’, ‘fizeram’ os temas
28
. aconteceu. se
aconteceu ´´e que é ‘am’.
-(prof.) Muito bem!
(prof.) – Agora vamos ver se sabes explicar o que acertou
Aponto para palavra ‘disse’. – M. porque está certo?
(aluna) – Ah! Isso eu sei. É assim um ‘s’ não podia porque ia ficar ‘dize’.
(prof.) – E podia ser com ‘ç’.
(aluna) – Não. O ‘ç’ só pode na frente das outras letras.
(prof.) – Que outras letras? Tu sabes quais são?
(aluna) – ‘a’, ‘o’, ‘u’.
Fragmento 20
28
Apesar dos casos envolvendo aspectos morfológicos da língua , em alguns momentos eu explicava
aspectos da morfologia que pudessem facilitar a escrita, como o caso retomado pela criança do
morfema ‘am’.
(prof.) –Vamos ver se encontras os erros da tua redação.
(aluna) – Aqui tá muito fácil, só pode ser o ‘avia’.
(prof.) – E com é que tu sabes?
(aluna) Assim ‘disse’, ‘bicho’ e ‘pássaro’ eu sei que é assim, porque eu me lembro. ‘Fugido’
podia ser com ‘j’... Mas eu acho que é ‘avia’ que é com ‘h’ né?
(prof.) – Sim.
(aluna) – Aqui embaixo é ‘asustado’ porque senão a gente fala ‘azustado’
(prof.) – Como assim? Sabes por que isso acontece?
(aluna) – Assim, entre as letras do tipo do ‘a’ o ‘s’ tem som de ‘z’.
Nos fragmentos 19 e 20, percebe-se que as crianças ao receberem o texto
para corrigir lançam mão das diferentes estratégias exercitadas em sala de aula, o
que faz com que encontrem seus erros , de modo similar ao que foi apresentado no
fragmento 17. Apresento, nos fragmentos 21 e 22, partes do teste realizado com as
crianças que não passaram pela intervenção:
Fragmento 21:
(prof.) – Hoje nós vamos brincar de procurar errinhos... Será que tu consegues me mostrar
onde tu erraste?
(aluno) – Sei, marca que eu corrijo
(prof.) – Eu não posso marcar na tua redação.
(aluno) – Então aponta aí que eu corrijo.
(prof.) – Vamos por partes então. Aqui ‘tá’ escrito ‘baicho’. O que você acha?
(aluno) – Acho que é com ‘x’ né?
(prof.) – E aqui tá escrito ‘cinema’.
(aluno) – Não tá certo?
(prof.) Sim. Mas vamos pensar que você não sabe escrever a palavra, de que outros jeitos
poderia ter escrito?
(aluno) – Ah! Sei! Com ‘s’.
(prof.) – E não podia ser com ‘ç’.
(aluno) – Não sei.
Fragmento 22
(prof.) – Hoje eu estou precisando de ajuda para saber se sabes falar sobre o teu texto e
corrigir teus errinhos.
(aluno) – Ah tá.
(prof.) – Você sabe me dizer o que neste pedaço está errado?
(aluno) – Não sei.
(prof.) – Procura.
(aluno) – Eu vou ter que aprender primeiro?
(prof.) – Não é só olhar e me dizer. Olha essa palavra ‘pasaram’.
(aluno) – ‘Passaram’ o que é que tem?
(prof.) – Olha essa daqui ‘casa’
(aluno) – Ah! Sei! As duas são com ‘s’.
(prof.) – Lê para mim.
(aluno) – Acho que errei essa (‘pasaram’) deve ser com ‘ss’.
Como se pode observar nos fragmentos 21 e 22, as crianças têm dificuldade
em identificar os erros, a primeira pediu para eu marcar e a segunda diz que para
saber do erro, ela tem de aprender primeiro. A facilidade e rapidez na identificação
podem ser consideradas duas habilidades desenvolvidas, as quais são resultado da
intervenção voltada para o uso de estratégias metacognitivas. Outro aspecto que
podemos observar é que as crianças que não passaram pela intervenção, têm mais
dificuldade em explicar as motivações dos erros e de fazerem uso de seus
conhecimentos ortográficos.
Se analisados os fragmentos 19 e 20, pode-se ainda perceber que as
crianças formulam hipóteses e resolvem seus problemas rapidamente na medida em
que eles surgem. Digo isso, porque, mesmo que as explicações construídas pelas
crianças não sejam capazes de dar conta do fenômeno como um todo, observa-se a
tentativa de resolver as dúvidas e os problemas que se apresentam. A situação em
que M. associa a grafia do advérbio ‘então’ à grafia dos verbos, especificamente no
que diz respeito à relação que se pode fazer entre o tempo passado e o uso de ‘ão’,
ilustra as atitudes dos alunos que passaram pela intervenção proposta, os quais ao
serem provocados pelo professor conseguem utilizar as estratégias trabalhadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho de pesquisa apresentou reflexões acerca do ensino da
ortografia nas séries iniciais e do uso de estratégias metacognitivas no processo de
aprendizagem ortográfica. A prática pedagógica apresentada nesta dissertação é
apenas uma parte de um trabalho maior voltado para o desenvolvimento da leitura e
da escrita que desenvolvo na minha sala de aula. É importante salientar que as
bases teóricas que orientam o trabalho pedagógico, em geral, são as mesmas que
nortearam o trabalho específico com a ortografia.
O foco nas atividades voltadas para o ensino e a aprendizagem da ortografia
deve-se a minha convicção de que escrever de acordo com as normas ortográficas
qualifica o texto do aluno e, além disso, possibilita-lhe pensar sobre o sistema de
escrita de sua língua, aprendizagem que pode ser transferida para outros conteúdos
e, até mesmo, para outras áreas do conhecimento.
Ao apresentar os diferentes tipos de erros bem como suas motivações neste
estudo, tive o intuito de mostrar que o processo de aprendizagem da ortografia é
bastante complexo e envolve, além de aspectos concernentes à fonética e à
fonologia, também aqueles relacionados ao sistema ortográfico. Conhecer as
diferenças existentes entre os tipos de erros ordinariamente encontrados nos textos
de alunos de série é condição necessária para a preparação de uma intervenção
pedagógica que pretende levar a criança a fazer uso de estratégias de pensamento.
vezes em que ela precisa pensar sobre as relações da escrita com a fonética e
com a fonologia da língua; outras em que necessita reconhecer regras, que
podem ser aprendidas por meio da análise do contexto, como também existem
aquelas em que as relações são estabelecidas pela norma e devem ser aprendidas
por meio do uso de estratégias que envolvem ora a analogia ora a memória.
Diante desta tarefa complexa que é aprender a escrever, o professor que
ensina a criança precisa estar fundamentado em teorias que justifiquem sua prática.
A partir dos estudos de Vigostki (2000), Pozo (2002) e Flavell (1999) foi possível
definir e desenvolver uma prática voltada para o uso de estratégia de pensamento,
para a reflexão sobre o objeto de conhecimento e para atividades que proporcionam
a interação, não entre o professor e o aluno mas também entre os próprios
alunos, o que resulta em aprendizagens mais significativas e conscientes que
podem ser transferidas para as diversas situações de aprendizagem, pelas quais as
crianças irão passar.
A partir da implementação desta pesquisa foi possível testar e também
corroborar as hipóteses inicialmente formuladas uma vez que: a) o uso de
estratégias metacognitivas, revelados nos modos de as crianças estudadas
pensarem sobre a ortografia, propiciou a reflexão sobre o sistema ortográfico e
favoreceu a iniciativa da criança na busca de soluções para os problemas
encontrados; b) a diminuição significativa do número de erros, verificada ao longo do
ano letivo, é mais um dado que, interpretado à luz das teorias sobre aprendizagem
na sala de aula e sobre estratégias metacognitivas, sustenta a idéia segundo a qual
o nível de abstração e explicitação de regras ortográficas influi positivamente na
performance ortográfica do aluno; c) a transferência de estratégias aprendidas, por
meio das atividades voltadas para o uso da metacognição e para a aprendizagem da
norma ortográfica, pode ser constatada nas situações em que as crianças, ao serem
instadas, mostraram desembaraço em tarefas que exigiam a identificação e a
correção de seus erros de ortografia bem como na explicitação de suas hipóteses.
Por se tratar de uma prática pedagógica, a pesquisa apresentou tendências
encontradas nas grafias infantis e sugestões didáticas que podem auxiliar os
professores no desenvolvimento de seu trabalho com o ensino da ortografia.
Além disso, a intervenção pedagógica sugere uma ordenação para o trabalho
com as diferentes motivações dos erros encontrados nas escritas da criança. Para
isso, é preciso que o professor conheça o funcionamento da ortografia de sua língua
para que possa definir as atividades que irá utilizar. Creio que a primeira noção a
ser trabalhada numa sala de aula, na qual existem crianças aprendendo a escrever
é o erro. Para mim, o erro deve ser considerado natural pelas crianças que estão
aprendendo, pois essa naturalidade influencia na postura dos aprendizes em relação
ao processo de aprender e de corrigir.
Após ser trabalhada a noção do erro, penso que é preciso que o professor
realize uma produção com seus alunos para saber que tipo de erros eles cometem.
Assim, é possível planejar e focalizar a prática nas necessidades e nos
conhecimentos prévios dos alunos. A partir do levantamento dos tipos de erros
existentes, o professor pode estabelecer uma ordenação dos aspectos da ortografia
a serem abordados. Acredito que aspectos relativos à fonética e a fonologia se
forem abordados desde o início da intervenção pedagógica tendem a qualificar a
escrita do aluno no que diz respeito aos erros que refletem uma tentativa de
reprodução da forma “fonética” da palavra, como também aos erros de motivação
fonológica, como a grafia das estruturas silábicas e a troca de fonemas.
Posteriormente, penso que é necessário um trabalho voltado para as
regularidades contextuais, no qual os alunos possam pensar e construir os
conhecimentos sobre as regras. Essa construção é extremamente importante para
que haja uma aprendizagem efetiva da regra e não apenas a memorização, que
saber a regra não quer dizer compreender e fazer uso desse conhecimento nos
momentos de escrita.
Como última intervenção, penso que o professor deva trabalhar as palavras
que contem as correspondências irregulares, selecionando as palavras que as
crianças erram com freqüência e que são utilizadas por elas em seus textos. As
atividades envolvendo essas correspondências devem privilegiar as estratégias
mnemônicas e lúdicas. Uma das formas de se trabalhar é separar as letras que
aparecem em contextos competitivos e trabalhá-las uma de cada vez como, por
exemplo: focalizar o ‘ge’ e ‘gi’ que aparecem com mais freqüência no vocabulário
das crianças, deixando o ‘je’ e ‘ji’ para ser focalizado em momento posterior.
Esta dissertação pode ser pensada como um ponto de partida para outras
pesquisas mais aprofundadas acerca do processo de aprendizagem da ortografia e
do uso de estratégias metacongitivas. Espero que possa servir de ferramenta para
professores, pesquisadores e interessados nessas áreas, dispostos em melhor
compreender as especificidades da ortografia e como se o processo de
aprendizagem ortográfica das crianças.
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Suplemento especial, 2006.
Apêndices
APÊNDICE A – Oficinas de coletas das produções textuais
Mês Produção Textual
Fevereiro (pré-teste) Tirinha da bruxinha. As tirinhas que formam a
história são dadas aos alunos recortadas que
ordenam e escrevem a história
Março Menino e o galho: Seqüência de imagens sobre
um menino que se machuca quando sobre no
galho de uma árvore.
Abril Tarde assustadora . é dado o título e o primeiro
parágrafo da história escrito: “Era uma tarde
chuvosa. Na escola estava tudo muito calmo.
Foi quando de repente...”
Maio Caça as borboletas: Seqüência de imagens
sobre borboletas juntamente com trabalho com
o livro “A primavera da lagarta”, Ruth Rocha.
Junho Um dia feliz: é dado o título e o início da
história: “Gabriel acordou bem cedo porque...”
Julho Chico Bento e Rosinha: partiu de um trabalho
no mês de julho sobre a festa Julina que
focalizou as histórias do Chico Bento. A
produção partiu de uma gravura do Chico
Bento e da Rosinha numa festa Junina.
Agosto Bilu: partiu de um trabalho com animais de
estimação dos alunos. Depois foi realizada a
produção sobre o cachorrinho Bilu.
Setembro Zoológico : produção sobre o passeio feito ao
zoológico.
Outubro Cebolinha mágico: partiu de um trabalho feito
com mágicas na escola e a partir de uma
gravura em que o Cebolinha transforma toda a
turma da Mônica em animais.
Novembro Monstro caseiro: partiu de um trabalho
realizado com o livro “Monstros caseiros” em
que os alunos tiveram que inventar seus
monstros e escrever as histórias.
Dezembro Caixinha misteriosa: foi confeccionada numa
aula de artes uma caixinha (de creme dental)
em que as crianças colocariam algo importante
para elas. A produção textual deveria contar a
história da caixa misteriosa.
APÊNDICE B – Ditado de palavras inventadas (adaptado de Araújo, Garcia e
Miranda, 2006)
1. mirro
2. esretico
3. paroto
4. beforre
5. melro
6. renco
7. panro
8. ferrete
9. pirrote
10. rotundo
APÊNDICE C – DITADO DE FRASES COM PALAVRAS INVENTADAS
1. Renato tansarou no pátio e foi para dacimpa.
2- O gunco apareceu na ralusa.
3- Eu vi um pássaro telso.
4- Mamãe lambrenou minha sonrinda.
5- Guenlo acordou e foi tirrincer.
6- Sanfinão pegou um jasimo.
7- Eu gostei da casa anjuçada.
8- Francisco trancirrou na escola.
9- Aline fimbou a flor.
10- Eu comi um fapatola.
APÊNDICE D – Pré- teste
A bruxinha sapeca (aluno A.)
A bruxinha está dançando e caminhando.
Ela estava tão distraída que batel na vovó do teatro que havia sido
transformada em homem.
A bruxinha transformou de novo em vovó mas ela ficou braba porque gostava
da vida de homem.
A broxa e o leão (aluno B.)
A broxa es tava sentada na pedra e de pois ela levou um susto do leão e o
leão dise que tinha um espinho e de pois ele xorou e de pois a broxa tirou o
espinho e depois eles ficaram amigos.
A broxa (aluno E)
A broxa fes uma magica e apareceu um gato e ele fes outra mágica e o gato
ficou uma cadeira.
Num dia o cão apareceu a bruxa fes uma magica para o cão virar um banco e
ela sesentiu feliz.
E o cão e o gato comesaram a brigar e ela dice pestinhas vamimbora.
A brucha (aluno F.)
Era uma vez uma menina viu a varinha da brucha e resolveu pegar. Ela
transformou a árvore em um sorvete e derramou tudo na brucha.
A bruxinha (aluno Fr.)
Ela estava sentada numa pedra e viu um cachorro e resolveu fazer um feitiço
no cachorro e transformou o cachorro em uma galinha espacial.
E a galinha espacial vil um gato e ele correu atrás do gato.
A bruxa malvada (aluno G.)
Era uma vez uma bruxinha que viu um canguru e quis transformar o canguru
em uma bola.
E o canguru se transformou em uma bola.
E a brucha foi jogar futebol.
E quando chutou a bola ela disgobriu que ela não fazia mágica.
A bruxa sapeca (aluno H.)
A bruxa estava caregando um bule e tropesou em uma pedra e quebrou o bule e a
bruxa resolveu fazer uma magica e fez aparecer uma vasora aí ela varia com
aquela vasora.
Aí ela asubiava feliz com a vasora.
Eu sou uma bruchinha (aluno I.)
Oi eu sou uma brucha vamos brincar com meu cachorrinho legal e muito
obediente.
Só que ela transformou o seu cachorrinho num disco e ficou ouvindo música e
dansando muito.
E comesou a ouvir um barulho de cachorro.
A bruxinha Queca (aluno K.)
Era uma vez uma bruxinha que se chamava Queca.
Um dia ela viu um coelho.
E ela resolveu transformar o coelho num patinete.
Ela pegou o patinete e saiu andando.
E o patinete saiu polado.
A bruxinha dorminhoca (aluno L.)
Um dia a bruxinha estava dormindo numa praia.
Quando vê apareceu um tatu bola.
E ela resolveu transformar em um?
Traveseiro e comtinuou dormindo mas quando vê o traveseiro comesou a
cavar.
A bruxinha Caca (aluno M.)
A bruxinha Caca estava sentada e viu uma galinha e achou estanho ver uma
galinha por ali.
Então resolveu transformar em uma chaleira e a Cacá achou graça e ela
agarrou na mão e ela achou graça porque a chaleira tinha botado um ovo.
A troca de chapéu (aluno Mi.)
Era uma vez um senhor ele estava lendo unjornal ele se levantou e saiu. Veio
um menino e pegol o chapéu do homem e saiu. E chegol uma molher e pegol o
chapéu do menino no dia seguinte o homem achou e pensou de quem é este
chapéu?O homem botou o chapéu e saiu com vergonha.
A bruxinha (aluno N.)
Era uma ves uma bruxinha estava dezenhando uma menina transformou um
menino o menino saiu do papel e daí ele pegou o lápis da bruxinha e escreveu uma
janela e uma cadeira e devolveu o lápis da bruxinha e voltou pro papel.
As bruxinhas (aluno P.)
Era uma vez duas bruxinhas.
Elas estavam caminhando pela rua.
Ela transformou a bruxa em um gato.
A bruxa ficou braba.
E transformou a bruxa em rato.
E elas ficaram brigando.
A brucha do 78 (aluno R.)
A brucha estava lendo livro e de repente ela dormio e os personagens
saíram do Livro corendo e a brucha acordou e quando a brucha foi continuar a ler
o livro ela deu um grito e os personagens foram inbora.
Bruxa do 71 (aluno T.)
Num belo dia a bruxa saiu para ir ao mercado.
Foi caminhado, caminhando quando de repente surgiu uma cobra do nada.
Só que a bruxa era esperta resolveu transformar a cobra numa corda.
Aí ela teve uma idéia e falou ah vou lá na Fiat um carro xega e fala eu vou
levar este Idea.
A brucha má (aluno Th.)
Era uma vez uma bruxa.
Ela achou um arbusto.
Trocou de roupa.
E foi dormir.
Mas antes fez um sol para dormir.
Derrepente o sol virou nuvem.
E choveu ensima dela.
A bruxa Queca (aluno V.)
Era uma vez a bruxa Queca tentava com sua varinha limpar a casa.
Ela não conseguiu lipar a casa mas viu um peru.
- Ah tive uma idéia, vou transformar este peru em uma vassoura.
- Alá casa transforme este peru em uma vassoura, plim.
Finalmente vou deixar a minha casa limpa.
Eba bem melhor! Logo, logo vou ter minha casa vai ficar como sempre
desegei.
Ela gritou a socorro eu não comprei passagem de avião.
Que bom que não comprei passagem de avião eu tenho muito medo de avião
mas acho que sim de vassoura.
A bruxinha (aluno Vi.)
Era uma ves uma bruxinha que sapia ti tudo. Ela fes uma majica e
transformou o rrato num rrádio e tocou.
APÊNDICE E – Atividades relacionadas à grafia das estruturas silábicas
Exemplos de atividades:
a) O que falta aqui?
ELEFA___TE VA___PIRO
b) Encontre os 7 erros?
A OÇA FOI ATRAVESSAR O RIO NUMA POTE. A PONTE QUEBROU E A
ONÇA CAIU NO FUDO DO RIO. O POBO VIU E VOOU. ELE FOI COTAR PARA O
ELEFATE. O ELEFANTE VEIO. DERRUBOU UMA ARVORÉ E SALVOU A POBRE
ONÇA. ELA AGRADECEU E FOI EBORA.
APÊNDICE F – Cartazes relacionados às trocas de fonemas surdos e sonoros
POMBA
BOMBA
FACA
VACA
QUATRO
QUAD RO
4
COLA
GOLA
APÊNDICE G – Tabelas com as formas escritas pelas crianças das palavras
inventadas contidas no ditado de frases
Tansarou (19)
Formas de grafia quantidade
Tansarou 11
Tançarou 6
dançarou 1
tansarol 1
Dacimpa (19)
Formas de grafia quantidade
Dassimpa 13
Dacimpa 4
Dascimpa 1
Daximpa 1
Telso (19)
Formas de grafia quantidade
Telso 4
Telço 12
Telçu 1
Teuço 1
Telsso 1
Tirrincer (19)
Formas de grafia quantidade
Tirrincer 10
Tirrinser 9
Anjuçada (19)
Formas de grafia quantidade
anjuçada 5
anjussada 12
anjoçada 1
anjossada 1
Trancirrou (19)
Formas de grafia quantidade
Trancirrou 4
transirrou 15
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