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Paula Maria Magalhães Teixeira
A PAISAGEM COMO ELEMENTO
DE SUSTENTABILIDADE DO
VALE DO RIBEIRÃO DA PRATA
PUC-CAMPINAS
2007
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PAULA MARIA MAGALHÃES TEIXEIRA
A PAISAGEM COMO ELEMENTO
DE SUSTENTABILIDADE DO
VALE DO RIBEIRÃO DA PRATA
Dissertação apresentada como exigência
para obtenção do título de mestre em
Urbanismo, ao programa de Pós-Graduação
na área de Urbanismo, Pontifícia
Universidade Católica de Campinas.
Orientador: Profa. Dra. Laura Machado de
Mello Bueno
PUC-CAMPINAS
2007
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Ficha Catalográfica
Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e
Informação - SBI - PUC-Campinas
t712 Teixeira, Paula Maria Magalhães.
T266p A paisagem como elemento de sustentabilidade do Vale do Ribeirão da Prata / Paula Maria
Magalhães Teixeira. - Campinas: PUC-Campinas, 2007.
192p.
Orientadora: Laura Machado de Mello Bueno.
Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências
Exatas, Ambientais e de Tecnologias, Pós-Graduação em Urbanismo.
Inclui bibliografia.
1. Arquitetura paisagística. 2. Políticas públicas. 3. Meio ambiente. 4. Planejamento urbano.
5. Embelezamento urbano. I. Bueno, Laura Machado de Mello. II. Pontifícia Universidade Católica
de Campinas. Centro de Ciências Exatas, Ambientais e de Tecnologias. Pós-Graduação em
Urbanismo. III. Título.
22.ed.CDD – t712
BANCA EXAMINADORA
Presidente e orientador Profa. Dra. Laura Machado de Mello Bueno
1º Examinador Prof. Dr. Eugenio Fernandes Queiroga
Profa. Dra. Catharina Pinheiro Cordeiro dos Santos Lima
2º Examinador Profa. Dra. Juleusa Maria Theodoro Turra
Prof. Dr. Caio Boucinhas
Campinas, 12 de junho de 2007
Aos meus pais
Orgulho e espelho da minha vida
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora Laura pela compreensão e paciência e pela oportunidade de vivenciar seu
sacerdócio e seu idealismo por causas tão nobres, e aprender a agir como forma de ser no
mundo
Aos meus pais, pela dedicação e amor em todos os momentos, essenciais para esta
conquista... e pela felicidade e emoção de tê-los na minha banca
As minhas irmãs Patrícia e Karla, ao meu irmão José Carlos, e aos meus sobrinhos, Luisa, Luis
Eduardo, Ana Paula, João Henrique e Beatriz, pelo apoio e sentido de amor e união que tanto
me fortaleceu
As minhas madrinhas, Tia Zezé e Maria, também mães, que tão afetuosamente me ajudam e
me apóiam sempre
Ao meu amigo Geraldo, por ser meu companheiro generoso, por estar sempre perto, de peito
aberto, abraço caloroso e comida na mesa... meu amigo para sempre
A minha prima Daria que me abrigou em Campinas durante tantas
noites frias e as aqueceu com seu afeto
A minha amiga Carmen, pelas viagens para Campinas, por estar sempre comigo,
ouvindo-me e apoiando-me
As minhas amigas Patrícia, Maria e Andréa que comigo estiveram sempre, me dando força e
entusiasmo para a conclusão deste trabalho
Ao amigo Lorette, primeiro grande incentivador do meu mestrado, pelo auxílio em vários
momentos, exemplo para me espelhar
Ao engenheiro Edson, que muito me ajudou através de informações
sobre o objeto de estudo e pelo carinho com que sempre me atendeu
A Prefeitura Municipal de São João da Boa Vista, nas pessoas de Ana Laura, Márcia, Marta,
entre outros, que doaram valioso material para o trabalho
As pessoas que me ajudaram a compor este trabalho e que fazem parte da história do Ribeirão
da Prata: Royce, Marilidia, Geraldo Mira, Marco Antonio, enfim todos que vivenciam esse lugar
maravilhoso e sagrado
Aos meus amigos de mestrado, pessoas com as quais tive o privilégio de conviver e que hoje
fazem parte da minha vida
As meninas da secretaria do mestrado, sempre atenciosas, alertas com os prazos, pessoas
fundamentais na vida destes mestrandos malucos
Aos professores do mestrado, urbanismo sendo história, natureza e transformação através da
vivencia cotidiana, deixaram através do conhecimento um futuro, uma esperança
E a todas as pessoas que participaram deste meu momento de vida,
meu carinho e gratidão...
Mergulhar na água da bacia
Bacia de água úmida
Bacia larga
Feminina
Mergulhar nos vales
Pedras e matas
Em suas porções de território antigo
Ocupado pelo inimigo
Que destrói a muralha e sua magia
O rio deita por entre as árvores
A cor e o cheiro de minério e lava
E de repente pedra sobre pedra
E de repente a vegetação não nasce....
O boi caminha entre as curvas de sinuosa
Tentação de cheiro e cor
Terra para o boi
Para o café
Para o olhar
Construções há muito tempo permanecem
a se olhar entre as árvores centenárias
entre o vento que tudo vigia e protege
como se o passado estive aqui
a receber o novo
Novo na agrofloresta
Nas ervas medicinais que o oval desenha
Na horta que desce o declive e o mato entra
A mostrar que o mato é presença
Da simbiose e equilíbrio biológico
Das espécies....
Homem e natureza em contato
O olhar por entre as pontes de madeira
A percorrer a rodovia que corta as propriedades
A penetrar entre as copas espessas
das árvores sobreviventes
semente de um novo amanhã que se sonha...
Paula
27/09/2006
“O universo é um enorme concerto que ultrapassa o entendimento.
O essencial é fazer bem a sua parte.”
Jacques Cousteau
RESUMO
O Vale do Ribeirão da Prata está localizado nas bordas do Maciço Alcalino do vulcão
de Poços de Caldas, nos municípios de Águas da Prata e São João da Boa Vista. O
vale faz parte da Serra da Mantiqueira, região de morros, com encostas de declividade
acentuada e é formado por uma grande quantidade de nascentes que se originam nas
encostas e nos cumes destes morros formando um complexo hídrico importante pelo
volume e qualidade de suas águas. É este complexo hídrico que qualifica a cidade de
Águas da Prata como estância hidromineral.
As características deste local são atribuídas de grande valor paisagístico e ambiental.
Áreas significativas de terras constituem um afloramento do Aqüífero Guarani, o maior
reservatório de água potável da América Latina. Graças a sua topografia acidentada, a
ocupação de seu território não se deu de forma tão predatória quanto outras áreas da
bacia hidrográfica do Rio Jaguari Mirim, da qual faz parte.
A principal característica econômica e histórica da região é a produção de café e gado.
Região de montanhas, ferrovias e fazendas históricas, com potencial turístico pouco
desenvolvido, atualmente o vale está ameaçado pelo capital especulativo e imobiliário,
através da construção de condomínios de alto padrão. O grande potencial minerário já
explorado, pode causar grandes impactos ambientais, como ocorreu em Poços de
Caldas. O reflorestamento de eucalipto está invadindo rapidamente a região.
Este trabalho pretende entender como esta paisagem evoluiu no decorrer do tempo,
como ela foi ocupada historicamente até os dias atuais, e quais os impactos
ambientais decorrentes. Pretende-se analisar a atuação das políticas públicas que
hoje agem na bacia: Planos Diretores Municipais, Planos de Bacia, Consórcios
Municipais e Intermunicipais de Turismo, Conselhos Municipais e Agências de
Desenvolvimento.
Através da análise deste território pretende-se visualizar estratégias de
desenvolvimento onde se aplique a gestão de paisagens, qualificando o crescimento
das cidades nas áreas urbanas e rurais. E criando no contexto regional a possibilidade
de implantar políticas públicas que incorporem a consciência ambiental, onde os
benefícios gerados pelo desenvolvimento possam ser distribuídos com a toda a
sociedade, com a preservação do meio ambiente e a integração da população nas
ações e responsabilidades sobre a paisagem.
ABSTRACT
The Vale do Ribeirão da Prata is located in the edges of the Bulk of the Maciço de
Poços de Caldas, in the cities of Águas da Prata and São João da Boa Vista. The
valley is part of the Serra da Mantiqueira, region of mounts, with hillsides of accented
declivity and is formed by a great amount of springs that if originate in the hillsides and
the tops of these mounts forming an important hydric complex due to quantity and
quality of its waters. It is this hydric potential that characterizes the city of Águas da
Prata as hidromineral ranch.
The characteristics of this place are attributed of great landscape and environmental
value. Due to physiographic obstructions this region has not been severely exploited
as other nearby. This work intends to understand how this landscape has been
transformed until the current days, and which the environmental impacts. It is intended
to analyze the performance of the public policies that today act in the basin: Local
management, regional plans, management of hydric resources plans Trusts and
consortia related to local services and tourism Municipals and Agencies of
Development.
The methodological approach of Landscape ecology is applied, as a new paradigm for
the ecological and sustainable occupation of the territory. Through the analysis of this
territory it is intended to visualize development strategies for better management of
landscapes, in an integrated vision of the urban and agricultural areas.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Mapa das Unidades de Bacias Hidrográficas do Estado de São Paulo
75
Figura 2. Mapa da Compartimentação da Bacia do Mogi Guaçú – UGRHI 9
77
Figura 3. Mapa da Subbacia do Rio Jaguari Mirim
78
Figura 4 . Imagem de Satélite mostrando a área da Bacia do Ribeirão da Prata
79
Figura 5. Mapa da Compartimentação da Bacia do Ribeirão da Prata
80
Figuras 6 e 7. Foto Comp. Alto Prata - Segundo trecho Fonte: Foto da autora
82
Figuras 8, 9, 10 e 11. Foto Comp. Alto Prata - Segundo trecho
Fonte: Foto da autora
83
Figuras 12e 13. Foto Comp. Alto Prata - Segundo trecho Fonte: Foto da autora
84
Figuras 14, 15 e 16. Foto Comp. Alto Prata - Terceiro trecho
Fonte: site de ecoturismo: Bioadventure
85
Figuras 17 e 18 . Fotos Compartimento Alto Prata - Terceiro trecho
Fonte: site de ecoturismo: Bioadventure
86
Figura 19 e 20. Foto Comp. Alto Prata - Quarto trecho
Fonte: site de ecoturismo: Bioadventure
86
Figura 21, 22, 23 e 24 . Foto Comp. Alto Prata - Quarto trecho
Fonte: Foto da Autora
87
Figura 25 e 26. Foto Comp. Alto Prata - Quarto trecho Fonte: Foto da autora
88
Figura 27. Foto Compartimento Medio Baixo Prata - Primeiro trecho
Fonte: Site da Prefeitura Municipal de Águas da Prata
89
Figura 28, 29, 30 e 31. Foto Comp. Medio Baixo Prata - Prim. trecho
Fonte: Foto da autora
89
Figura 32. Foto Compartimento Medio Baixo Prata - Segundo trecho
Fonte: Site da Prefeitura Municipal de São João da Boa Vista
91
Figura 33, 34, 35 e 36. Foto Comp. Medio Baixo Prata - Seg. trecho
Fonte: Foto da autora
91
Figura 37. Carta Geoambiental da Bacia do Ribeirão da Prata
Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002.
93
Figura 38. Foto Relevo sustentado por arenitos da Formação Botucatu
94
Figura 39. Foto Afloramento de rochas vulcânicas efusivas (basaltos)
94
Figura 40. Imagem de satélite mostrando a estrutura circular da intrusão alcalina
de Poços de Caldas. A porção com sistema de drenagem traçado faz
parte da Bacia do Rio Mogi Guaçu.
95
F
Figura 41. Foto Porção Montanhosa da borda oeste da intrusão alcalina de
Poços de Caldas
Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002
.
95
F
Figura 42. Nesta foto pode se observar o quanto varia o relevo dos terrenos
sustentados por rochas básicas intrusivas
Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002
.
95
Figura 43 e 44. Paisagens de relevo movimentado dos terrenos do domínio 10
. Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002
.
98
Figura 45. Foto Capela abandonada
. Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002
.
99
Figura 46. Foto Vestígio da Mata Atlântica
Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002
.
99
Figura 47. Mapa Esquemático do Aqüífero Guarani
101
Figura 48. Corte Perfil do Aqüífero Guarani
102
Figura 49. Foto Perfil de solo residual de arenitos pirambóia
Fonte: Atlas Geoambiental das Bacias hidrográficas dos rios Mogi-Guaçu
e Pardo – SP: subsídios para o planejamento territorial e gestão ambiental,
São Paulo, Secr.de Meio Ambiente do Est. de S.Paulo, 2002.
103
Figura 50. Perfil do Aqüífero Guarani a partir da área de recarga
105
Figura 51. A estação de São João da Boa Vista, c. 1910 O prédio ainda era o
antigo. Foto do álbum da Mogiana, Museu da Cia. Paulista, Jundiaí
112
Figura 52. A fachada da estação em 03/2007. Foto Leonardo Beraldo
112
Figura 53. Estação do Bairro Alegre abandonada em 24/04/1999.
Foto Ralph M. Giesbrecht
113
Figura 54. A estação de Águas da Prata nos primeiros tempos: anos 1890.
Foto cedida por Nilson Rodrigues Acervo José Flavio Mogiana
113
Figura 55. A estação em 24/04/1999. Foto Ralph M. Giesbrecht
113
Figura 56. A estação de Cascata, já desativada, em 1986.
Foto do relatório da Fepasa desse ano.
114
Figura 57. Estação da Cascata em 2004 Foto Rodrigo Falconi
114
Figura 58. Mapa de Remanescentes Florestais da Bacia do Ribeirão da Prata
120
Figura 59. Culturas de café, retirada das matas para o plantio
121
Figura 60. Gado nos topos dos morros e encostas degradação do solo,
contaminação dos aqüíferos
121
Figura 61. Encostas sem vegetação, sinais de erosão e assoreamento
121
Figura 62. Fazenda Santa Rita, plantio fora das curvas de nível
121
Figura 63. O impacto do eucalipto na paisagem
122
Figura 64. Grandes extensões de terra já estão cobertas com eucalipto
122
Figura 65. Área de exploração mineral da Alcoa em Poços de Caldas
123
Figura 66. Nos fundos, área de exploração de bauxita por Rubens Zanata,
empresário de Poços de Caldas
123
Figura 67. Condomínio Lago da Prata
128
Figura 68. Muros que dividem o condomínio da cidade : segregação urbana
128
Figura 69. Viveiros de muda do CIPREJIM
Fonte: CIPREJIM, material publicitário.
163
OBS: Fotos 59 a 68. Fotos da autora
LISTA DE TABELAS:
Tabela 1. Atividades agrícolas dos municípios de SJBV, A Prata, do Rio Jaguari
Mirim e da UGRHI (1995/1996) Fonte: LUPA – CATI / Fundação SEADE
71
Tabela 2. Atividade agropecuária dos municípios de SJBV, A Prata, do Rio Jaguari
Mirim e da UGRHI Fonte: LUPA – CATI / Fundação SEADE
71
Tabela 3. Equipamentos de irrigação nos municípios da Bacia Hidrográfica do
Ribeirão da Prata.
Fonte: Fundação SEADE
71
Tabela 4. Mineração: Concentração de lavras e requerimentos de lavras por bem
mineral e nº de ocorrência nas bacias do Rio Mogi-Guaçú – Lavras
Efetivadas/Lavras prováveis Fonte: Fundação SEADE
72
Tabela 5. Rendimento de chefes de família no ano de 1991. Dados econômicos da
Bacia Hidrográfica do Jaguari Mirim e dos municípios da Bacia do Ribeirão da
Prata. Fonte: Fundação SEADE
72
Tabela 6. Política municipal de incentivo às indústrias em 1995 em A Prata e SJBV
Fonte: Fundação SEADE
73
Tabela 7. Empregos ocupados na indústria, comércio e serviços no ano de 1996
em A Prata e SJBV . Fonte: Fundação SEADE
73
Tabela 8. Número de estabelecimentos de indústria e de serviços no ano de 1996.
Dados econômicos da Bacia do Ribeirão da Prata. Fonte: Fundação SEADE
73
Tabela 9. Número de licenças emitidas por atividade na Sub-Bacia do Rio Jaguari-
Mirim. FONTE: CETESB 1999
74
TABELA 10. Descrição das unidades geológicas da Bacia do Ribeirão da Prata
Fonte: Diagnóstico da Bacia Hidrográfica do Rio Mogi Guaçú – Relatório Zero, São
Paulo, Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Mogi Guaçú e Creupi, 1999.
92
Tabela 11. Unidades de conservação existentes na Bacia Hidrográfica do Mogi
Guaçú
Fonte: Macrozoneamento da Bacia Hidrográfica do rio Mogi-Guaçú. 1995
117
Tabela12. Áreas naturais sob proteção existentes na Bacia Hidrográfica do Mogi-
Guaçú e sua relação com as áreas naturais sob proteção do estado de São Paulo
em ha.
Fonte: Macrozoneamento da Bacia Hidrográfica do rio Mogi-Guaçú. 1995
117
Tabela 13. Levantamento da vegetação nativa: municípios de SJBV, A Prata, do
Rio Jaguari Mirim e da UGRH Fonte: SMACPRM, Programa Olho Verde, 1991 /
Fonte: Macrozoneamento da Bacia Hidrográfica do rio Mogi-Guaçú. 1995
118
Tabela14. Informações básicas sobre os sistemas de esgotos sanitários nos
municípios da Bacia do Ribeirão da Prata. Fonte: Macrozoneamento da Bacia
Hidrográfica do rio Mogi-Guaçú. 1995
125
Tabela 15. Localização das captações e lançamentos de esgoto de uso doméstico
nos municípios de A Prata e SJBV Fonte: DAEE (1999)
125
Tabela 16. Localização das captações e lançamentos de uso industrial nos
municípios da Bacia do Ribeirão da Prata Fonte: DAEE (1999)
125
Tabela 17. Informações básicas e índices de qualidade para a disposição dos
sistemas de resíduos sólidos domiciliares e de serviços de saúde Fonte: CETESB
(1999) – CD do Relatório Zero
126
Tabela18. Gastos e despesas municipais com limpeza pública e com saneamento.
Fonte: Fundação SEADE / Pesquisa Municipal Unificada – PMU
126
Tabela19. Potencial Hídrico subterrâneo da Bacia do Ribeirão da Prata
Fonte: Relatório do Mapeamento da vulnerabilidade de risco de poluição das águas
subterrâneas no Estado de São Paulo (IG, CETESB, DAEE, 1997)
127
Tabela20. Uso de água subterrânea pela indústria nos municípios da Bacia do
Ribeirão da Prata
FONTE: DAEE (1999)
127
Tabela 21. Número de consumidores de energia elétrica e consumo de energia
elétrica em Mwh em 1991. Dados econômicos dos municípios da Bacia
Hidrográfica do Ribeirão da Prata.
128
Tabela 22. Bacia Hidrográfica do Rio Mogi Guaçú Fonte: CBH-Mogi - Relatório
Zero
158
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................................
16
1. A PAISAGEM COMO ELEMENTO DE SUSTENTABILIDADE..................................... 21
1.1. Paisagem e História.................................................................................................. 22
1.1.1. A Relação do homem com a paisagem natural..................................................... 22
1.1.2. A natureza como recurso econômico.................................................................... 29
1.1.3. Impactos Ambientais............................................................................................. 37
1.2 Paisagem e Desenvolvimento Sustentável............................................................... 40
1.2.1 Sociedade insustentável......................................................................................... 40
1.2.2. O paradigma ecológico.......................................................................................... 42
1.2.3. Novos métodos de planejamento territorial........................................................... 54
1.2.4. Ecologia da Paisagem........................................................................................... 58
1.2.5. Gestão da Paisagem ............................................................................................ 63
2. CONTEXTUALIZAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA BACIA DO RIBEIRÃO DA PRATA 67
2.1. Apresentação da Metodologia de análise da paisagem........................................... 68
2.2.Características da bacia do Ribeirão da Prata.......................................................... 70
2.2.1. Características Sócio-econômicas........................................................................ 70
2.2.2. Localização geográfica e Caracterização Física da Bacia do Ribeirão da Prata.. 74
2.2.3. Definição dos compartimentos de paisagem......................................................... 79
2.2.4. Características geomorfológicas de cada compartimento..................................... 92
2.2.4.1. Compartimento Alto Prata.................................................................................. 92
2.2.4 História da ocupação da Bacia............................................................................... 107
2.2.6. Cobertura Vegetal Original e Atual........................................................................ 114
2.2.7. Impactos Sócio Ambientais na bacia..................................................................... 121
3. POLÍTICAS PÚBLICAS................................................................................................ 130
3.1. Legislação Ambiental................................................................................................ 132
3.1.1. Sistema Nacional de Unidades de Conservação.................................................. 137
3.1.2. Legislação para a Mata Atlântica........................................................................... 141
3.1.3. Problemas da política ambiental e da gestão ambiental no Brasil........................ 143
3.1.4. A Legislação aplicada à área de estudo............................................................... 146
3.2 Planos Diretores....................................................................................................... 148
3.2.1. Plano Diretor de São João da Boa Vista............................................................... 150
3.2.2. Plano Diretor de Águas da Prata........................................................................... 153
3.3. Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos................................................... 154
3.3.1. CBH Mogi-Guaçú................................................................................................... 156
3.3.1.1.Os Comitês de Bacias Hidrográficas do Estado de São Paulo........................... 156
3.3.1.2. O Comitê da Bacia do Rio Mogi-Guaçú (UGRH-09).......................................... 156
3.3.2. Consórcio Intermunicipal de Preservação da Bacia do Rio Jaguari-Mirim -
CIPREJIM..............................................................................................................
160
3.4. Agências de desenvolvimento................................................................................. 167
3.4.1. Agência de desenvolvimento de São João da Boa Vista...................................... 167
3.5. Conselhos Municipais e Intermunicipais.................................................................. 168
3.5.1. Conselhos de Turismo........................................................................................... 168
3.5.1.1. CONTUR São João da Boa Vista....................................................................... 168
3.5.1.2. COMTUR Águas da Prata 169
3.5.2. Conselhos de Preservação do Patrimônio 169
3.5.3. Conselhos do Meio Ambiente 170
3.6. O Relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas e as Políticas
Públicas Ambientais
171
4. REFLEXÕES SOBRE A FORMACÃO DA PAISAGEM DO VALE DO RIBEIRÃO DA
PRATA E DA GESTÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA UMA PAISAGEM
SUSTENTÁVEL..................................................................................................................
173
4.1. Questões apresentadas entre a teoria e a pesquisa empírica................................. 174
4.2. A importância das ações conjuntas na gestão das políticas públicas e a
abordagem da ecologia da paisagem.......................................................................
176
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 182
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA........................................................................................ 185
FONTES CONSULTADAS / ENTREVISTAS E VISITAS DE CAMPO REALIZADAS /
AUDIENCIAS ASSISTIDAS .............................................................................................
190
INTRODUÇÃO
17
Introdução
O tema
Desde muito cedo senti que os movimentos do mundo se filtravam em mim
através do meu olhar e da minha relação com a natureza.
Cresci indo em fazenda, caminhando no mato e entrando nos rios,
colhendo frutas nos pés das árvores, e correndo nos terreiros de café.
Juntamente com isso cresci percebendo o mundo se deteriorar a minha
frente, e sempre pensando no que eu poderia fazer para mudar isso.
E as montanhas e cachoeiras passavam por mim, e eu andava sobre elas,
e isso fez de mim uma pessoa melhor.
Portanto esta dissertação tem uma relação com a minha essência, com o
resgate dos valores da minha infância. Caminhar pela Bacia do Ribeirão da Prata
aflorou todos esses sentimentos. Nas conversas, nas estradas de terra, no vento,
no alto da serra... o verde e a água imprimiram coisas que não podem se
dispersar ou morrer...
Iniciei a dissertação motivada por estas reminiscências, e o tema - a
paisagem como elemento de sustentabilidade – veio amadurecido pelos
conhecimentos adquiridos no mestrado e pelas reuniões com o grupo Água no
meio urbano.
O objeto
Somente pelo olhar já se percebe a importância que este território possui.
Ao estudá-lo mais profundamente esta constatação se torna mais clara. Sua
posição geográfica, suas qualidades ambientais, a riqueza de sua história, seu
valor paisagístico, e a grata percepção da existência de muitas matas, rios e
montanhas salvos, em meio a territórios já castigados pela ação humana, traz um
sentimento de responsabilidade pela sua preservação.
Portanto, o Vale do Ribeirão da Prata, é uma região estratégica a ser
preservada. Possui na sua extensão uma área significativa de recarga do
aqüífero guarani, o maior reservatório de água potável da América Latina. As
águas que correm pelos seus rios, nascentes e cachoeiras possuem qualidades
minerais e terapêuticas, que hoje são exploradas pelas empresas de
18
engarrafamento de água e pelo turismo. Porções remanescentes da Mata
Atlântica sobrevivem.
A história do vale é contada nas primitivas inscrições rupestres encontradas
em cavernas, na arquitetura das fazendas de café, nas estações ferroviárias e
estradas de ferro que cortam as montanhas, nos hotéis que foram construídos
quando o município de Águas da Prata se transformou em estância hidromineral,
nos muros de pedra que foram destruídos pelos canhões da Revolução de 32.
A economia do vale se iniciou com o café e o gado, que devastaram
grandes áreas. Estas culturas continuam sendo as principais formas de ocupação
deste lugar, porém o eucalipto, a mineração e a especulação imobiliária (através
de condomínios de alto padrão) estão invadindo este território rapidamente e
podem comprometer sua conservação.
O método
No estudo da paisagem deparamos com novos paradigmas, novas
abordagens que não se limitam ao campo da abstração e da estética. Estes novos
conceitos se baseiam em visões ecológicas, sistêmicas e integradoras, onde a
paisagem é vista como um conjunto de elementos biológicos, geomorfológicos e
humanos que se inter-relacionam e são interdependentes. A manutenção destes
elementos e suas relações se traduz no equilíbrio ambiental e paisagístico.
A preocupação com o planejamento da ocupação territorial, através do
conhecimento dos limites e das potencialidades de uso econômico de cada
“unidade de paisagem” (definida nesta abordagem, como um espaço de terreno
com características comuns); o estudo de paisagens fundamentalmente
modificadas pelo homem, e a análise de amplas áreas espaciais, faz parte do
estudo da Ecologia da Paisagem. A ecologia da paisagem classifica os padrões
espaciais e os arranjos dos elementos que a compõem a paisagem, como
fragmentos, corredores e matrizes.
A análise do Vale do Ribeirão da Prata baseou-se nesta nova disciplina. A
Bacia hidrográfica do Ribeirão da Prata foi dividida em compartimentos de
paisagem para o estudo desta área.
19
A estrutura da dissertação
O trabalho foi dividido em quatro capítulos:
O primeiro capítulo: “A paisagem como elemento de sustentabilidade”,
se divide em Paisagem e História e Paisagem e Desenvolvimento Sustentável.
O capitulo fala da relação do homem com a paisagem natural durante a
história, de como o homem se apropriou da natureza e transformou-a em recurso
econômico. Como esta forma de exploração causou inúmeros impactos
ambientais, que desencadearam na sociedade reações de proteção ao meio
ambiente. O novo paradigma do desenvolvimento sustentável nascido da
constatação da insustentabilidade do nosso modo de produção capitalista
predatório, procura formas de desenvolvimento onde a preservação dos recursos
naturais caminhe junto com a distribuição da riqueza e com a transformação da
paisagem referenciada na identidade e da cultura local. No estudo de novos
métodos de planejamento territorial, a gestão da paisagem tem na ecologia da
paisagem conceitos importantes para instrumentalizar o planejamento territorial,
que se tornará efetivo através da integração de políticas setoriais.
O segundo capítulo: “ Contextualização Socioambiental da Bacia do
Ribeirão da Prata”, apresenta as características da bacia: sócio econômicas,
geográficas, físicas, históricas, sobre a cobertura vegetal existente e sobre os
impactos sofridos pela bacia. Foram definidos e analisados os compartimentos de
paisagem.
O terceiro capítulo: “Políticas Públicas” se divide em Legislação
Ambiental, Planos Diretores, Sistema de Gerenciamento de Recursos
Hídricos, Políticas locais de influência na bacia (Plano Diretor, Agências de
Desenvolvimento, Conselhos Municipais).
O quarto capítulo: “Reflexões sobre a formação da paisagem do vale do
Ribeirão da Prata e da Gestão das Políticas Públicas para uma paisagem
sustentável”, finaliza a dissertação discorrendo sobre as questões apresentadas
entre a teoria e a pesquisa empírica e sobre a importância das ações conjuntas na
gestão das políticas e a abordagem da ecologia da paisagem.
Nas considerações finais a constatação dos impactos ambientais que estão
aumentando através de novas formas de ocupação do território e da necessidade
urgente de criar políticas públicas para a gestão adequada da paisagem. A
20
ecologia da paisagem serviria de base para estas políticas, que colocam na
conscientização e ação da sociedade os instrumentos legítimos para construir a
sustentabilidade sócio ambiental.
CAPÍTULO 1
A PAISAGEM COMO
ELEMENTO DE SUSTENTABILIDADE
22
1. A Paisagem como elemento de sustentabilidade
1.1. Paisagem e História
Para se entender a relação do homem com a paisagem natural que hoje se
verifica se faz necessária a história. A história do homem primitivo que usou a
terra para sua subsistência até a história do homem moderno que utiliza a
natureza para o acúmulo de capital e poder. Isso significa que a apropriação via
propriedade privada sobre o meio natural e a transformação da paisagem para
atender a estas finalidades trouxeram como conseqüência o acirramento das
desigualdades sociais e econômicas e um desequíbrio ambiental que compromete
a sobrevivência na Terra.
Nesta parte do trabalho será tratada a relação do homem com a paisagem
natural durante sua história, como ele utilizou a natureza enquanto recurso
econômico e os impactos ambientais que resultaram desta forma de relação
predatória, que culminou nos novos paradigmas da paisagem.
1.1.1. A relação do homem com a paisagem natural
A relação do homem com o meio natural durante a história da humanidade
construiu a paisagem que atualmente vivenciamos. O homem utilizou a natureza
como meio de sobrevivência e desenvolvimento de sua sociedade. Os autores
citados neste capítulo mostram como se deram esta interação e se destacam na
consolidação de teorias e estudos históricos e geográficos sobre a paisagem e o
ambiente. É apresentada a produção que se foca na relação da sociedade
humana com ambiente natural e alterado, como a visão humana sobre o meio,
reflexo da cultura de cada época e local e do momento histórico vivido, foi
responsável pelas alterações e impactos realizados na paisagem.
Para Thomas (1988), o predomínio do homem sobre o meio natural é
precondição básica da história humana. Ao começar o período moderno esta
dominação seria a meta incontestável do esforço humano. Há apenas poucos
séculos atrás a idéia de resistir à agricultura, ao invés de estimulá-la parecia
ininteligível.
Como teria progredido a civilização sem a limpeza das florestas, o cultivo do solo e a
conversão da paisagem agreste da terra colonizada pelo homem? A tarefa do homem,
23
nas palavras do Gênesis (I,28), era “derrubar matas, lavrar o solo, eliminar
predadores,matar insetos nocivos, arrancar fetos, drenar pântanos ...Terra não
cultivada significava homens incultos.” (THOMAS, 1988, p. 17)
Em torno das comunidades existentes, historicamente bastante variadas,
cristalizaram-se e generalizaram-se atitudes emocionais poderosas.
“ O campo passou a ser associado a uma forma natural de vida – de paz, inocência e
virtudes simples. A cidade associou-se a idéia de centro de realizações – de saber,
comunicações, luz. Também constelaram-se poderosas associações negativas: a
cidade como lugar de barulho, mundanidade e ambição; o campo como lugar de
atraso, ignorância e limitação. O contraste entre campo e cidade, enquanto formas de
vida fundamentais, remonta à Antiguidade clássica.” ( THOMAS, 1988, p. 11)
De acordo com Thomas (1988), foi o crescimento das cidades na
Revolução Industrial, com a deteriorização do ambiente urbano que provocou a
valorização do ambiente rural.
“O notável nesse novo gosto era que o cenário mais admirado já não era a paisagem
fértil e produtiva, porém selvagem e romântica. Por isso, haveria um interesse em
preservar a natureza inculta como uma indispensável fonte de riqueza espiritual.
(THOMAS, 1988, p. 317)
Para Baltrusis (2000), a urbanização ligada à revolução industrial, com
produção capitalista, é um processo de organização do espaço que se ampara em
dois pontos essenciais: decomposição prévia das estruturas sociais agrárias e
imigração da população para os centros urbanos, o que fornecia força de trabalho
à industrialização. Os camponeses, que não detinham a propriedade da terra,
migraram para as cidades e viveram a transição do modo de produção servil do
campo para o modo de produção capitalista.
Segundo Williams (1989), na longa história das comunidades humanas,
sempre esteve bem evidente esta ligação entre a terra da qual todos nós, direta
ou indiretamente, extraímos nossa subsistência, e as realizações da sociedade
humana.
A história da Mata Atlântica brasileira e seu processo de ocupação desde
os primeiros habitantes, os indígenas, até os nossos dias, mostra como se
desenvolveu através da história a relação dos habitantes brasileiros com seu meio
natural.
24
Segundo Dean (2002), a retomada da expansão da Mata Atlântica coincidiu
com sua descoberta pelos homens, caçadores que subitamente invadiram as
planícies sul-americanas há talvez 13 mil anos.
De acordo com Dean (2002), as populações montanhesas na região da
Mata Atlântica persistiram na caça e na coleta. Porém, é possível que seus usos
do recurso florestal estivessem se intensificando. Investigações antropológicas
recentes têm mostrado o quanto é considerável o conhecimento de plantas pelos
povos pré-agrícolas e como é gradual sua passagem da coleta de produtos
vegetais para seu plantio e cultivo. No entanto, a adoção da agricultura
transformou radicalmente a relação dos homens com a floresta.
A agricultura de derrubada e queimada era extraordinariamente redutiva.
Quase tudo que estivesse vivo no interior das faixas queimadas era reduzido a
cinzas e apenas as cinzas eram aproveitadas.
“A agricultura pode, portanto, ter reduzido a complexidade e a biomassa em áreas
consideráveis da Mata Atlântica durante mais de mil anos em que foi praticada antes
da chegada dos europeus”. (DEAN, 2002, p. 46)
Porém até a chegada dos europeus em 1.500, os tupis eram ainda capazes
de se expandir mais e ainda não haviam exaurido o potencial produtivo de seu
habitat.
A colonização portuguesa desde o princípio explorou de forma devastadora
a natureza e os povos indígenas. A mata atlântica foi cruelmente reduzida e os
índios, seus primeiros habitantes, foram escravizados e mortos para servir aos
interesses mercantilistas do Reino de Portugal.
“As crônicas das descobertas, mais que as de qualquer outro capítulo da história
escrita, são de irrealismo assustador. Incapazes de compreender intelectualmente a
magnitude de sua descoberta, os portugueses tropeçaram em um meio continente,
movidos por cobiça e virtude, sem se deixarem levar por compaixão ou mesmo por
curiosidade. A Mata Atlântica os deixava impassíveis ou atônitos. Por diversas vezes
penetraram-na, e traziam apenas relatos delirantes sobre esmeraldas e ouro.
Produziram tamanha devastação entre seus irmãos que, no prazo de um século,
quase todos aqueles com quem haviam se deparado estavam mortos e suas
sociedades em ruínas. Esse foi o começo, a fundação do povoamento, da colonização
e do império, de uma civilização transferida e imposta”. (DEAN, 2002, p. 59)
O conhecimento dos povos da floresta, adquido através dos séculos foi
ignorado com a mata atlântica devastada e a exterminação de seus povos. Isto
25
significou a perda de toda uma ciência empírica que poderia ajudar na
sobrevivência.
A hostilidade com seu ambiente natural era a marca da população brasileira
neste período da história.
Dean (2002) conta que os naturalistas brasileiros colocaram a culpa da
destruição da floresta na ignorância e preguiça dos povos da floresta, sendo que a
causa da destruição estava no sistema produtivo agrícola brasileiro.
Somente depois de três séculos da sua descoberta, o interesse científico
europeu sobre a Mata Atlântica aconteceu. O homem estava abrindo os olhos
para o conhecimento do mundo natural.
“Quase trezentos anos se passaram desde que os primeiros europeus colocaram os
olhos na Mata Atlântica. Uma parte considerável dela havia sido degradada por seus
descendentes, cujas demandas tinham sido poucas, mas devastadoras. Toda essa
complexidade estava sendo destruída antes que a inteligência humana pudesse
compreendê-la. No fim do século XVIII, contudo, o interesse científico europeu estava
começando a se voltar mais sistematicamente para o mundo natural, além de suas
fronteiras. O conhecimento indígena que os primeiros invasores haviam
desdenhosamente ignorado seria, a um custo considerável, recriado e, por último,
superado. A Mata Atlântica ia, enfim, ser objeto de curiosidade”.(DEAN, 2002, p.134)
Mesmo assim, os naturalistas portugueses ignoravam as florestas
brasileiras e seus usos potenciais. Acostumados a utilizar plantas exóticas já
domesticadas, não apreciavam as espécies nativas.
A
A
Investigação sobre a situação dos recursos naturais do império foi
oficialmente patrocinada com a criação da Sociedade Auxiliar da Indústria
Nacional e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
“Não obstante, uma investigação sobre a situação dos recursos naturais do império foi
oficialmente patrocinada, ressuscitando a modesta tradição das sociedades de
ciências aplicadas do vice-reinado. A sociedade auxiliar da indústria nacional foi
construída em 1825 e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro foi fundado em 1838,
ambos apoiados pelo governo. Membros destas sociedades - viajados, instruídos e
provectos – expressavam o temor nascente quanto ao dano ambiental provocado por
mais de um século de atividade econômica intensificada e população mais densa”.
(DEAN, 2002, p. p. 236)
O desequilíbrio ambiental se intensificou. Os animais começaram a entrar
em extinção à medida que as matas que se aproximavam das cidades se
retraíam.
26
Então atitudes preservacionistas foram tomadas. A primeira tentativa de
conservação brasileira foi a Floresta da Tijuca. Ao proprietário de terra local,
Manuel Gomes Archer se deve este crédito.
O Instituto de Agricultura e o Museu Nacional Brasileiro realizaram suas
primeiras publicações científicas em 1870. Os conceitos ecológicos começaram a
aparecer, indicando um avanço para a preservação.
“O Instituto de Agricultura e o Museu Nacional iniciaram em suas áreas de publicação
das primeiras revistas científicas ... Esses e outros trabalhos no ano de 1870
demonstravam crescente familiaridade com as teorias de Liebig e Darwin e o
aparecimento de conceitos ecológicos. A frase “a economia da natureza” começou a
aparecer, juntamente com teorias experimentais sobre reprodução de plantas,
preferência por habitat, comunidade e morfologia de sementes”. (DEAN, 2002, p. 245)
Foi Loefgren, cientista paulista da primeira geração, o mais conseqüente na
luta pela conservação do meio ambiente.
“Os cientistas empregados por essas instituições assumiram suas tarefas com
dedicação, mas seu próprio mandato de eficiência os levou a levantar a bandeira da
conservação. O mais conseqüente dos cientistas paulistas da primeira geração foi
Alberto Loefgren, um botânico sueco que chegara com uma expedição de coleta e fora
contratado para dirigir as seções de metereologia e botânica da Comissão Geológica e
Geográfica. Loefgren inspirou a comemoração do Dia da Árvore no Brasil,...
Fracassou, contudo, em convencer o legislativo a tomar quaisquer outras medidas
concretas para proteger as florestas primárias remanescentes no estado. Loefgren,
entretanto, foi um provocador conseqüente. Seus apelos nos jornais paulistas em favor
da conservação dos recursos florestais foram assumidos pela classe média crítica”.
(DEAN, 2002, p. 247)
Segundo Dean (2002) o cerco final da Mata Atlântica se deu na primeira
metade do século XX. A civilização urbana e industrial havia se estabelecido e
reduzido ainda mais a floresta. Os críticos efetivos se reduziam à elite tecnocrática
e científica, e apenas nas crises de guerra ou depressão é que os movimentos
conservacionistas convergiam e exigiam uma legislação florestal como
responsabilidade do governo.
Dos anos 50 para os anos 70 houve um aumento do crescimento
populacional urbano, conseqüência da industrialização.
Na época do governo militar brasileiro, a economia do milagre econômico se
caracterizou pela falta de consciência ambiental e pela repressão política, e os
27
custos ambientais e desenvolvimento começaram a ser debatidos com amplitude
e urgência nos países desenvolvidos.
Na década de 70 a sobrevivência da Mata Atlântica, assim erigida em
preocupação mundial, não deixava de ser uma questão essencialmente local,
apenas solucionável por aqueles que a cercavam e abordavam.
“As demandas de matéria prima, energia e espaço das cidades eram imperiosas,
ameaçando esgotar tudo o que a floresta ainda tinha a oferecer. São Paulo tornara-se
a quarta maior cidade do mundo; suas indústrias absorviam quase metade das
matérias-primas do país, inclusive produtos florestais...A cidade de São Paulo era
incapaz de evitar que os favelados e seu equivalente da classe média, os
compradores de lotes oferecidos por loteadores clandestinos, invadissem terra
circundando reservatórios dos subúrbios que alimentavam as usinas hidrelétricas no
pé da escarpa litorânea e que abasteciam de água seus subúrbios ao sul.” (DEAN,
2002, p. 337)
Os graves acidentes ambientais que aconteceram na cidade de Cubatão
suscitaram um movimento ambientalista na região da Mata Atlântica em meados
dos anos 80. Em 1984 a Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza
(FBCN) foi revitalizada e a SOS Mata Atlântica foi fundada em 1986. Um pequeno
Partido Verde foi constituído no Congresso depois de 1984.
Na década de 80, outra conseqüência dos desastres ambientais, foi a
preocupação da população sobre a preservação do meio ambiente. Aproveitando-
se disso, as empresas começaram a utilizar o marketing ecológico como
estratégia de vendas. E isto acabou colaborando para elas custeassem as
organizações ambientalistas nacionais que não tinham apoio do governo.
A luta do movimento ambientalista conseguiu que se implantassem muitas
áreas de preservação na mata atlântica. Uma grande vitória foi seu tombamento
em 1992, na Conferência Mundial do Meio Ambiente do Rio de Janeiro. Foi a
primeira Reserva de Biosfera efetivada no Brasil. Seus limites foram definidos por
documentos de tombamentos da Mata Atlântica em todo território nacional.
“O movimento ambientalista foi direta ou indiretamente, responsável por uma notável
expansão dos parques e reservas na Mata Atlântica do Sudeste. Recorreu-se
amplamente à declaração do status de marco histórico – o tombamento. O
tombamento adicionava outro nível de proteção a uma diversidade de reservas e
parques e também visava coordenar e consolidar os esforços em curso. A Constituição
de 1988 respaldou mais esse conceito ao declarar toda a Mata Atlântica como
28
“patrimônio nacional”, juntamente com a Floresta Amazônica e o Pantanal. Em 1990,
no governo Collor de Mello, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), passou
para as mãos de uma diretoria enérgica que obteve da Unesco a declaração de
Reserva da Biosfera
.” (DEAN, 2002, p. 355)
Uma consciência ambiental estava alvorecendo na cultura brasileira quase
tarde demais para a Mata Atlântica.
“As demandas de espaço, água, alimento, matéria-prima e energia, por parte das
populações urbanas de crescimento rápido, desgastavam com insistência ainda maior
um domínio natural que parecia estar se esvanecendo diante delas. Como só acontece
nas histórias das relações humanas com o meio natural, apenas se começaram a
tomar medidas defensivas após a evidência de um imenso desastre. As manifestações
políticas dessa consciência ambiental eram ainda incertas, ambíguas e minúsculas,
comparadas com a tradição e coerência de outras metas sociais e com peso dos
interesses econômicos. No entanto, as organizações ambientalistas dos anos 80
conquistaram algumas vitórias e fizeram com que se esperasse cada vez mais
responsabilidade por parte dos representantes eleitos e dos burocratas. A contradição
de que padecia o movimento, afinal de contas era comum a toda sociedade brasileira:
o abismo que se estendia entre os poucos que possuíam a maior parte das matas do
país e sentiam pouca responsabilidade por sua preservação, e a massa dos cidadãos,
desesperadamente carentes de apoio de um sistema social que lhes havia negado
terra, educação e justiça.” (DEAN, 2002, p. 362)
A principal proeza das organizações ambientalistas – a expansão de um
sistema de parques, reservas e áreas de patrimônio histórico – oferecia alguma
esperança para a sobrevivência de uma floresta que estava passando a ser
identificada como a mais ameaçada do mundo.
“Os meios para se proteger o que restava estavam lentamente se expandindo, com
assistência financeira do exterior e um número maior de membros das comunidades
rurais estava cooperando em tais esforços. Embora a extensão da floresta
remanescente não fosse ainda totalmente definida, parecia estar desaparecendo a um
ritmo mais lento. Isso dificilmente era um alívio porque os meios e a vontade poderiam
não se acumular com velocidade suficiente para deter totalmente o processo.” (DEAN,
2002, p. 364)
O processo de devastação da mata atlântica reflete como o olhar do
homem sobre o meio natural foi se modificando conforme as necessidades
humanas foram mudando. O homem primitivo não tinha a necessidade do
excedente e vivia em equilíbrio com a natureza. O homem moderno evoluiu para
uma sociedade predatória. Utilizou a técnica para um desenvolvimento baseado
29
na subjugação e na destruição. Onde os interesses dos mais poderosos se
sobressaíram sobre o interesse geral. Os povos primitivos foram escravizados e a
natureza, vista apenas como recurso econômico destruída. Somente quando
grandes desastres ambientais aconteceram, o homem tomou providencias para
proteger o meio ambiente. Porém durante todo esse processo, cientistas e
pessoas preocupadas com a preservação buscaram formas mais inteligentes de
interagir. Através de pesquisas sobre o meio natural onde viviam adquiriram o
conhecimento para protegê-lo, o que fortaleceu as lutas políticas travadas em
favor da manutenção dos recursos naturais. Apesar do poder das forças políticas
e econômicas que descaracterizam as paisagens, a história cresce no aumento da
consciência da sociedade sobre a importância das paisagens construídas numa
relação de harmonia entre o homem e o meio onde vive.
1.1. 2. A natureza como recurso econômico
A história da exploração das florestas, segundo Dean (2002), explica como
a natureza apropriada como recurso econômico é destruída e se transforma em
lugar inóspito.
“A história florestal corretamente entendida é, em todo planeta, uma história de
exploração e destruição. O homem reduz o mundo natural a “paisagem” – entornos
domesticados, aparados e moldados para se adequarem a algum uso prático ou à
estética convencional – ou também, o que é ainda mais assustador, a “espaço” –
planícies desertas aplainadas a rolo compressor e sobre as quais o extremo do
narcisismo da espécie se consagra em edificações ... O mundo natural, simplificado,
em desacordo com os desejos humanos mas em resposta a seus atos, converte-se
em uma enorme macega cosmopolita de luto”. (DEAN, 2002, p. 23)
Para Williams (1989), a Revolução Industrial não transformou só a cidade e
o campo, ela baseou-se num capitalismo agrário altamente desenvolvido, tendo
ocorrido muito cedo o desaparecimento do campesinato tradicional.
“Na fase imperialista da história da Inglaterra, a natureza da economia rural, na Grã-
Bretanha e em suas colônias, foi, mais uma vez, transformada muito cedo: a
importância da agricultura doméstica tornou-se quase nula, com apenas 4% dos
homens economicamente ativos trabalhando na agricultura – isto numa sociedade
que, em toda a longa história das comunidades humanas, já havia se tornado a
primeira de população predominantemente urbana” . (WILLIAMS, 1989, p. 11)
30
Dean (2002) explica que desde o início da colonização portuguesa a
natureza brasileira foi utilizada como recurso econômico para servir à metrópole.
Os produtos encontrados e produzidos nas terras colonizadas eram exportados
para o mercado europeu. E o meio ambiente destruído para servir a esse fim.
“No Brasil, a cana de açúcar, espécie domesticada, foi plantada em campos
queimados empregando-se quase as mesmas técnicas dos tupis e valendo-se da
surpreendente fertilidade inicial da biomassa florestal reduzida a cinzas.” (DEAN, 2002,
p. 74)
“Era inevitável que uma população mais numerosa, uma atividade econômica mais
intensa, o aumento da vigilância governamental e a rivalidade européia afetassem a
integridade das florestas brasileiras. Quando os garimpeiros finalmente perderam a
esperança e adotaram a lavoura e a pecuária, contudo, estenderam seus domínios
cada vez mais para o interior da floresta ainda intocada. O século XVIII, então,
representou o início de uma tendência irreversível e cumulativa na exploração da Mata
Atlântica”. (DEAN, 2002, p. 109)
Dean
(2002) conclui que a preservação nunca foi pensada como recurso
econômico. Os colonizadores portugueses sempre priorizaram o crescimento
econômico em detrimento da preservação da floresta. Escolhendo formas de
cultivo que privilegiavam a maior produção com o menor custo. O resultado foi a
perda total da floresta e do futuro que ela podia dar.
O sucesso comercial e prático de pés de café não sombreados e não polinizados – no
entender daqueles que dirigiam o empreendimento – infelizmente teve conseqüências
funestas para sobrevivência da floresta primária. Se tivessem considerado os
polinizadores nativos ou introduzidos e praticado qualquer programa consciente de
reprodução, a preservação da floresta poderia ter sido considerada econômica, e a
área e força de trabalho dedicadas ao café, consideravelmente reduzidas”.(DEAN,
2002, p. 234)
Dean (2002) acrescenta que no Brasil Colônia, a essência da plantação de
cana de açúcar, além de uma planta exótica domesticada, era uma força de
trabalho exótica. A conservação dos recursos naturais iria se mostrar irrelevante
em uma sociedade na qual a conservação da vida humana era irrelevante.
“A ordem de Martim Afonso de Souza de construir engenhos de açúcar em São
Vicente implicava o recrutamento compulsório de uma força de trabalho escrava
similar aquelas já empregadas nas plantações de açúcar das ilhas do Mediterrâneo e
do Atlântico... Daí em diante, pelos próximos trezentos anos, o modelo português de
plantation escravagista foi copiado nos territórios ingleses, franceses e holandeses por
31
todo o Novo Mundo tropical e semi-tropical, em nome do colonialismo de exploração
intensiva”.( DEAN, 2002, p. 74)
Segundo Dean (2002), o governo português para manter seus interesses
na colônia criou o primeiro sistema de propriedade rural brasileira, a sesmaria, que
serviu para manter seus interesses na colônia. A sesmaria formou a propriedade
rural vigente até hoje: a grande propriedade monocultora e produtora de artigos de
exportação.
“Outro grande interesse dos fazendeiros era livrar-se de toda restrição ao seu
monopólio sobre as terras públicas. O sistema de sesmarias, uma ficção legal que
legitimara a usurpação do patrimônio da Coroa, mostrara-se veículo conveniente para
esse fim em todo período colonial. Durante o século XVIII, a coroa continuara a emitir
essas concessões para favorecer ricos e poderosos, com os quais se identificava e
contava para povoar a vasta colônia, a produção de bens exportáveis e defender suas
fronteiras”. (DEAN, 2002, p.. 163)
A forma de colonização brasileira estava, portanto baseada no poder
econômico da terra, que tinha como característica: o desmatamento
indiscriminado, a concentração da terra e a exclusão social.
“Na verdade, o que aqui havia eram homens que detinham o poder econômico
representado pela terra – “vastas extensões” (como mencionaria um alvará real, um
século após), pelos bens de capitais empatados em engenhos de açúcar e escravos, e
na sujeição dos agricultores, agregados e assalariados mais categorizados (técnicos
de engenho).” (DEAN, 2002, p. 8)
Dean (2002) nos conta que com a intenção de aumentar a produção na
colônia foram criados os impostos sobre terras. Sua aplicação foi ineficiente e
arbitrária. Os impostos não acabaram com os latifúndios e ainda colaboraram para
um maior desmatamento da floresta: “Em Minas Gerais, o imposto sobre terra
“improdutiva” foi causa importante de desmatamento, já que os proprietários o
evitavam queimando floresta para simular atividade agrícola ou pecuária”. (DEAN,
2002, p. 231)
De acordo com Sodero (1973), em 1548 foi implantado no Brasil o regime
de posse por D. João III a Tomé de Souza, o primeiro governador-geral do Estado
do Brasil. Surgiu da necessidade de um maior aproveitamento das terras.
Correspondia ao módulo rural, ou seja, a área necessária à exploração e
condições econômicas do concessionário.
32
“Era o regime jurídico instituído e que se firmava pela ocupação do solo em bases de
seu aproveitamento. A posse da terra só seria permitida a quem a cultivasse dentro
dos princípios estatuídos pelo bem comum, ou seja, a quem a explorasse dentro das
condições e possibilidades locais, nos termos do Regimento.“ (SODERO, 1973, p. 25)
Para Sodero (1973), a função social da propriedade da terra rural era uma
idéia latente no regime de posse. E significa o aproveitamento racional do solo, a
elevação econômica e social do lavrador e o conseqüente desenvolvimento do
país: “Se o proprietário da gleba não podia ou não queria lavrá-la, o bem de
produção assim considerado era transferido a quem o fizesse frutificar,
enriquecendo a nação com seu trabalho e produto dele.” (SODERO, 1973, p. 27)
Para Dean (2002), a especulação imobiliária das terras brasileiras deu-se
desde a colônia, quando as terras do estado foram alienadas, beneficiando a
posseiros especuladores: “As terras do estado estavam sendo alienadas por 15%
a 20% de seu valor de mercado, outorgando benesses a especuladores e
empobrecendo o estado. Além disso, os madeireiros cortavam árvores em terra
pública, livres de leis e sem pagar aluguel.” (DEAN, 2002,p. 261)
Segundo Dean (2002), Ihering, político da época do Brasil colonial, propôs
um serviço de reservas florestais para impedir a invasão de suas terras por
posseiros, mas não conseguiu vencer o jogo do poder econômico.
Sodero (1973) acrescenta que com o sistema de posse até o ano de 1700,
das 18 capitanias doadas, 13 reverteram à Coroa. Assim é que se formaram as
duas classes dentro de uma mesma sesmaria: a dos titulares e a dos ocupantes, a
dos sesmeiros e a dos posseiros. O sistema de sesmarias vigorou até 1822,
quando foi extinto.
De acordo com Baltrusis (2000), a teoria da renda agrícola de Ricardo e
Marx elaborada para o modelo de propriedade rural, demonstra o conflito de
interesses entre os proprietários fundiários e os produtores agrícolas, uma
oposição entre a renda dos proprietários e o lucro dos produtores.
“A teoria da renda fundiária agrícola de Ricardo e Marx foi elaborada para o modelo de
propriedade rural. Vários economistas depois de Ricardo e Marx irão admitir que a
origem da riqueza não é natural e sim resultado do trabalho dos homens. Depois dos
trabalhos de Ricardo e Marx “os proprietários fundiários serão considerados como
usurpadores que confiscam suas rendas, total ou em partes do sobre-lucro agrícola
(...), portanto existe um conflito de interesses entre os proprietários fundiários e os
33
produtores agrícolas, uma oposição entre a renda dos primeiros, e os lucros dos
segundos.” (BALTRUSIS, 2000, p. 17)
Para Baltrusis (2000), os conceitos de renda de Ricardo explicam a forma
de produção na agricultura brasileira. A Renda Diferencial Extensiva seria a forma
praticada no Brasil até os dias de hoje.
“Segundo Ricardo existem quatros fontes de renda, que ele, em sua análise, agrupa
em duas categorias. Uma ligada às forças produtivas e à escassez da terra e, outra
relacionada com a qualidade da terra e sua localização. Para Ricardo estas diferenças
estão ligadas umas às outras através da diferença de produtividade de trabalho
resultante, quer da qualidade diferente da terra “renda diferencial extensiva”, quer dos
rendimentos decrescentes “renda diferencial intensiva”. (BALTRUSIS, 2000, p. 18)
De acordo com Sodero (1973), o direito de propriedade foi garantido em
toda sua plenitude pela Constituição de 1824, e a desapropriação por utilidade
pública, mediante pagamento prévio e marcada como exceção.
Sodero (1973) nos conta que em 1850 foi promulgada a primeira Lei de
Terras no Brasil. E com ela surgiu a pequena e a grande propriedade rural.
“A conseqüência do regime de posse foi a pequena propriedade, advinda do regime da
posse e do desbravamento de novas terras. À pequena propriedade foi atribuído o
nome de “lavoura dos pobres”, ou lavoura de fundo de quintal. Era exatamente o
minifúndio ocupando a mão de obra familiar e associando, nas fazendas maiores, a
cultura fumageira com as de subsistência. Assim se caracterizaram dois tipos de
exploração da terra: a grande propriedade, latifundiária, monocultora e a propriedade
familiar, a simples posse.”(SODERO, 1973, p. 37)
Sodero (1973) acrescenta que a Lei de Terras de 1850 promulgou também
o sistema de terras devolutas, que significou o despejo dos posseiros de terras
devolutas ou alheias, que nelas tivessem efetuado derrubadas ou posto fogo.
Nas modificações da Lei de Terras de 1891, o direito de propriedade
continuava intangível. Em 1899 se promulgou a Lei de Terras Públicas, que
incentivava a colonização com base na pequena propriedade. O sistema de
colonato permitiu a formação de economias familiares, que, empregadas na
própria terra, transformaram tais colonos em cafeicultores ou empresários rurais
de variado tipo.
A Estruturação do Código Rural Brasileiro se iniciou em 1908, no Rio
Grande do Sul. Porém o Código Agrário Nacional não teve andamento.
34
De acordo com Sodero (1973), o Código Civil de 1917 não contemplou a
agricultura como matéria especial. Porém através do capítulo Sucessão
Hereditária estabeleceu a partilha de bens entre os herdeiros de uma família, o
que deu origem à pequena propriedade.
“Porém cuidou de dois institutos base do Direito Agrário: o Direito das coisas (posse /
propriedade) e o Direito Real sobre as coisas alheias (bens rurais e terra agricultável).
No capítulo Sucessão Hereditária estabeleceu esta sucessão de uma só maneira,
partilhando os bens em atenção ao princípio de igualdade, ou seja, todos os herdeiros
recebendo sua parte – sem atentar para os problemas da terra, do bem de produção
que iria se fragmentar. Esta subdivisão da grande propriedade por herança e partilhas
sucessivas, deu origem à pequena propriedade. Porém o latifúndio monocultor não foi
subdividido, porque o latifundiário criou uma união de interesses familiares pelo
casamento e organizou a empresa agrária latifundista e monocultora em bases de
sociedade anônima.” (SODERO, 1973 ,p. 100).
Em 1937, foi apresentado um Novo Código Agrário à Câmara Federal. Mas
não foi aprovado. Os motivos principais para sua elaboração foi falta de legislação
especial para este assunto, apesar da nossa imensa e tradicional riqueza
agropecuária e o fato do Governo provisório instituído em 1930 ter acrescentado
ao patrimônio jurídico da Nação: o Código de Águas, de Minas, de Caça e Pesca
e Florestal.
Segundo Sodero (1973), para regulamentar definitivamente o Direito Rural,
o anteprojeto do Código Rural foi redigido em 1962 contendo as disposições
relativas ao regime de propriedade rural.
“Para regulamentar o Direito Rural: um conjunto sistematizado de princípios e normas,
de direito público e de direito privado, que visa a disciplinar o uso da terra, bem como
atividades agrárias e as relações delas emergentes, com base no princípio da função
social da propriedade.” (SODERO, 1973, p. 90)
Em 1964, João Goulart assinou um decreto que declarava de interesse
social para fins de desapropriação as áreas rurais que correspondessem à função
social de propriedade. Este decreto teve aplicação prática, e em conseqüência,
por contrariar os interesses particulares dos donos das terras, João Goulart saiu
do governo.
Para Sodero (1973) portanto, o monopólio da terra era e ainda é comum a
todo território latino-americano, decorrente do seu sistema de colonização: “A
infra-estrutura agrária arcaica e defeituosa prevalecente na maior parte da
35
América Latina, inclusive no Brasil – constitui o grande ponto de estrangulamento
de sua economia e a causa primeira de seu subdesenvolvimento.” (SODERO,
1973, p. 76)
Segundo Sodero (1973), o relatório da ONU de 1967 chegou à conclusão
que a causa da miséria da América Latina é o sistema agrícola existente.
“A ONU chegou a seguinte conclusão sobre a América Latina em seu relatório
divulgado em 27.10.1967, para a Agricultura e Alimentação – FAO. As massas latino-
americanas vivem na miséria, porque ainda estão submetidas a um sistema feudal, no
qual os rurícolas se matam de trabalhar em imensas fazendas de uns poucos
latifundiários.” (SODERO, 1973, p. 76)
O extrativismo para exportação, outra forma de exploração predatória da
natureza, segundo Dean (2002), ganhou mais ímpeto no século XX .
“O comércio de orquídeas continuou a explodir e o de plumas e peles de pássaros,
especialmente de beija-flores, era grande. Não havia nenhuma lei contra as
exportações”. (DEAN, 2002, p. 265)
A remoção seletiva de madeira brasileira no fim da década de 20
transformou-se numa atividade econômica. “A transformação mais impactante nas
faixas não queimadas de floresta primária era, porém, a remoção seletiva de
madeira. No fim da década de 20, caminhões a gasolina e serrarias portáteis
movidas de vapor tornaram econômico um tráfico terrestre de madeiras de lei”.
(DEAN, 2002, p. 265)
A reforma agrária em terras improdutivas nos anos 70, de acordo com Dean
(2002), acelerou o desmatamento pelos proprietários rurais.
“A ascensão da política populista retirava a questão da reforma agrária, em prejuízo
potencial da floresta. Pelo fato de os programas de reflorestamento dos anos 70 terem
normalmente expulso pequenos produtores de modo fraudulento e mesmo violento
na verdade, em certos casos, o propósito de reflorestamento não era outro senão o de
justificar a grilagem e a especulação – era inevitável que os intermináveis eucaliptais e
pinheirais passassem a ser lvo dos adeptos da reforma agrária. Infelizmente não se
fazia qualquer distinção entre floresta nativa e floresta plantada. O Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) classificava perversamente a terra de
matas como “subutilizada””. (DEAN, 2002, p. 346)
Para Dean (2002), a industrialização no Sudeste brasileiro baseou-se no
nomadismo industrial e no industrialismo predatório.
“As cidades do Sudeste, entretanto, multiplicavam suas funções comerciais, políticas e
financeiras e adquiriam significativa capacidade industrial..Foi um período de
36
mesquinhos insumos de capital e técnica na exploração de matéria-prima, uma era
daquilo que um agrônomo chamou de “nomadismo industrial”. (DEAN, 2002, p. 256)
Dean (2002) acrescenta que a Indústria Brasileira no início século 20
dependeu da floresta como combustível para seu funcionamento.
“O Brasil ingressou na Era Industrial extremamente carente de um de seus pré-
requisitos: combustíveis fósseis de hidrocarboneto. As chuvas abundantes da região
da Mata Atlântica e sua topografia ofereciam enorme potencial hidrelétrico, que
começou a ser explorado na virada do século. Mas a energia hidrelétrica era, na
época, de difícil aplicação econômica a muitas demandas a que os combustíveis
fósseis atendiam em outros países. A indústria brasileira continuou a depender
primordialmente de seu enorme estoque de recursos vegetais nativos para ter
combustível”. (DEAN, 2002, p. 267)
E acrescenta que destruição era justificada pelos políticos conservadores
para pagar a dívida externa.
“O ambientalismo também podia ser usado para atender a objetivos ideológicos de
apelo tradicional mais amplo. Afirmava-se que a destruição florestal era conseqüência
direta do imenso ônus da dívida externa do país; a necessidade urgente de pagar
taxas de juros em caras divisas obrigava o Brasil a saquear seu patrimônio natural em
favor das exportações. Embora isso servisse à retórica antiimperialista da esquerda,
também se prestava a justificar políticos conservadores na manutenção de práticas
ambientalmente destrutivas.” (DEAN, 2002, p. 347)
Para Baltrusis (2000) no sistema capitalista, o desenvolvimento desigual, o
processo de desenvolvimento sob o controle da iniciativa privada é a causa da
especulação, poluição e padrões espaciais diferenciados. Baltrusis (2000) diz
que o preço da terra não é estabelecido pelo proprietário da terra, mas pelos
agentes da produção imobiliária.
“O preço da terra seria o mecanismo responsável pela constituição do solo urbano e
pela segregação espacial da cidade. Se o solo urbano adquire um preço é porque
vários agentes capitalistas concorrem para controlar as condições urbanas permitindo
o surgimento de lucros extraordinários.” (BALTRUSIS, 2000, p. 39)
Para Baltrusis (2000), a dinâmica do mercado permite que exista uma
especulação com os preços fundiários, provocando uma valorização fundiária em
determinadas partes da cidade e do meio rural.
De acordo com Santos (2004), a cidade constitui em si mesma, o lugar de
um processo de valorização. Esta valorização de pedaços da cidade, está
relacionada com o próprio funcionamento do mercado.
37
A crise dos anos 80 e 90 está na racionalidade econômica sobre a
racionalidade ambiental. No ideário do desenvolvimento sustentável de acordo
com Brundtland tudo se resolve pela tecnologia. O capitalismo não é base para
desenvolver o ecodesenvolvimento, o desenvolvimento humano e a sociedade
sustentável, que são os novos modelos de organização social baseados na
racionalidade ambiental. Isto é o que caracteriza o urbanismo termodinâmico de
um urbanismo regenerativo, que tem um entendimento da cidade não como
máquina, mas como um organismo vivo. Ao contrário em nome dos fluxos, da
velocidade, das incertezas de conveniência, vai-se impondo, com certeza, a
segregação, a especulação, a globalização neoliberal.
1
1.1.3. Impactos Ambientais
Para Pequeno (2001), o desenvolvimento desde o final do século passado,
se tornou cada vez mais restrito e concentrado, seja espacialmente, seja no seu
retorno, prevalecendo neste período o crescimento econômico como meta, a
industrialização como caminho e o consumo predatório dos recursos renováveis e
não renováveis como alternativa de desenvolvimento.
Este desenvolvimento, baseado na ignorância e na ganância do homem,
produziu paisagens impróprias para a vida. A natureza utilizada como recurso
econômico, alimentou o poder e a concentração de renda em todo o mundo, e
para isso foi destruída. A história mostra que somente quando o homem começou
a sentir os impactos ambientais da destruição que ele mesmo causou é que
providências foram tomadas para prever estes impactos.
Entre a Inglaterra colonialista e a Segunda Guerra Mundial, a extração de
recursos naturais e o descuido com os dejetos industriais em todo o continente
arrasou com muitos ecossistemas naturais. Os rios se transformaram em canais
de esgoto a céu aberto, e sua várzea ocupada pelas cidades em áreas de
alagadas em épocas de chuva.
1
Na área de arquitetura e Urbanismo o arquiteto Rem Koolhas faz uma critica ferrenha ao triunfo
do consumismo na sociedade e a arte transformada em apelo midiático mercantil na exposição
"Mutations", realizada em Bordéus em março de 2001. Na exposição mostrou que o metabolismo
linear da cidade (citado por Rogers em “Cidades para um Pequeno Planeta”) acelerou-se neste
novo pulsar de circulações em função de consumismos. Manifestou-se a vontade de destruir os
espaços verdes porque não se defendeu um metabolismo circular da cidade como ecossistema,
caracterizada por produzir e reciclar, no interior do seu território, o essencial da sua
sustentabilidade ecológica.
38
Para Ab’Saber (1998), nunca foram pensadas ou exigidas limitações
efetivas dos espaços agrícolas rentáveis. Daí porque a somatória espacial da
predação no conjunto das glebas, vinculada aos princípios da propriedade
privada, adquiriu grande abrangência territorial e garantiu irreversibilidade de
condições.
“O uso continuado de agrotóxicos resulta em forte envenenamento das terras e das
águas subsuperficiais em áreas preparadas para receber cultivos, nas regiões
agrícolas de maior extensão. Enquanto um grande número de riachos das sub-bacias
perdem perenidade, ocorrem concentrações de venenos nas águas subterrâneas,
processos que afetam os mananciais existentes em chapadões, colinas e patamares
de morros. Em muitos casos, trabalhadores rurais safristas (chamados “bóias-frias” no
Brasil), ao sol dos trópicos e ao longo de muitos dias, recebem os eflúvios de tais
elementos poluidores. Na área de canaviais extensivos, onde houve “pradarização”
extensiva de largos espaços, pequenos córregos tornados sazonários recebem caldas
de venenos, conduzindo-as para os rios e eventuais reservatórios de hidrelétricas”.
(pg. 33)
No final da década de 1960, ocorreu uma releitura dos fundamentos
conceituais de desenvolvimento gerada por diversas causas histórico-políticas.
Houve diversos casos de graves desastres ambientais nos países desenvolvidos e
subdesenvolvidos.
Nos países subdesenvolvidos, a ênfase na mentalidade voltada para o
consumo também provocava conseqüências graves, tais como poluição,
desigualdade social, aumento da criminalidade e insatisfações da sociedade,
estas últimas conseqüências iniciaram na década de 80.
De acordo com Dean (2002), o governo militar brasileiro, na década de 60,
investiu na aceleração da economia e no desenvolvimento do país. Investiu na
implantação de grandes complexos industriais, na construção de imensas obras
para geração de energia e na construção de estradas que cortaram o país, o
chamado “milagre econômico” produziu impactos ambientais de vultuoso
tamanho. A cidade de Cubatão, transformada em pólo industrial, viu seu território
entrar em colapso ambiental. Com seus recursos naturais completamente
dilapidados e sua população sofrendo com todo tipo de catástrofe ambiental, ela
foi socorrida na urgência de se evitar mais tragédia. Isso aconteceu depois que
seus impactos foram mostrados à imprensa e se tornaram alvo de pressões
internacionais para sua reabilitação. Infelizmente o meio ambiente precisou ser
39
completamente destruído para a sociedade tomar consciência da sua
preservação.
“Cubatão não era ainda sinônimo mundialmente famoso de catástrofe ecológica, mas
logo seria. Nos anos 50, aquela aldeia, aninhada na base da escarpa costeira, foi
escolhida pelos governos federal e estadual como importante núcleo industrial. Com
acesso ao porto de Santos e dotada de energia hidrelétrica abundante gerada pelos
reservatórios do paredão rochoso de São Paulo, foi facilmente adaptada às exigências
da fabricação de aço, petróelo, cimento e produtos químicos. Seus manguezais foram
cortados, suas baixadas foram drenadas e aterradas e se estenderam tubulações até
o porto e subindo o maciço para as respectivas indústrias e consumidores na
capital...A aldeia inchou para 100 mil habitantes, a metade dos quais favelados,
empoleirados por toda a parte, nas margens do estuário, acima das encostas e por
cima das tubulações.” (DEAN. 2002, p. 339)
Segundo Ab´Saber (1998) os impactos da agricultura sobre os
ecossistemas eliminaram coberturas arbóreas e seus componentes vivos.
“Os impactos da agricultura sobre os ecossistemas naturais, organizados em mosaicos
regionais, são muito mais drásticos e muitas vezes irreversíveis do que se possa
imaginar. Nas áreas tropicais dotadas de florestas e savanas, desde há séculos
eliminam-se coberturas arbóreas biodiversas e seus componentes vivos para se
produzirem espaços agrários”.(AB`SABER, 1998, p. 32)
De acordo com Santos
(2004), após a segunda guerra mundial, na Europa
e nos EUA, surgiu a necessidade de estudos de impacto ambiental.
“O desenvolvimento enfatizava o modelo e sociedade voltados para o consumo nos
países dominantes no espaço econômico mundial. A questão ambiental era vista como
um segmento à parte, ligada à sistematização do conhecimento da natureza e à
política de protencionismo. Durante quase 20 anos debateu-se no Congresso
Americano a necessidade de se exigir estudos de impacto ambiental e, durante essas
décadas, a idéia começou também a ser discutida em outros países.” (SANTOS, 2004,
ps. 16 e 17)
Para Ab’Saber (1998), a previsão de impactos em relação a um projeto de
qualquer tipo, destinado a uma determinada região particular, é uma operação
técnico-científica essencialmente multidisciplinar, de grande importância para os
países do Terceiro Mundo. Através da previsão se antevê quadros futuros da
organização espacial de seu território. Sendo assim as tarefas de previsão de
impactos incluem todo um estoque de interdisciplinaridade, voltado para posturas
culturais de interesse social e relevância para os cenários do futuro.
40
Rogers (2001) afirma que do mesmo modo que o conhecimento técnico
transformou o mundo rural em uma sociedade industrializada, a tecnologia da
informação está transformando a sociedade, através da divulgação de novos
conhecimentos sobre o meio-ambiente, numa sociedade global, que reconhece a
necessidade de ser plenamente consciente dos efeitos sociais e ambientais de
suas ações.
1.2. Paisagem e Desenvolvimento Sustentável
Chegamos a um impasse paradigmático, a paisagem como elemento de
sustentabilidade significa a gestão desta paisagem para que ela seja transformada
com o cuidado necessário à manutenção da vida na Terra. A ciência holística,
integradora e humanizadora busca a preservação de todas as espécies vivas, a
manutenção da biodiversidade, que não significa a intocabilidade do meio natural,
mas o uso deste de forma a manter o equilíbrio ambiental, e garantir condições de
vida autênticas para os povos que habitam estas paisagens.
1.2.1. Sociedade insustentável
Dieques (1995) alerta, iniciado o período pós-guerra, a industrialização se
coloca como principal estratégia para o desenvolvimento. A natureza, até então
fonte inesgotável de recursos e matéria prima, é constituída e atingida por
impactos negativos diversos, ao invés de ser percebida como um sistema vivo
com processos e funções próprias.
Economias capitalistas e socialistas, visando atingir altos índices de
produtividade e consumo, fazem uso de fontes de energia não renováveis e de
recursos da natureza acumulando situações de degradação sobre o meio
ambiente. Sachs (apud Pequeno, 2001) chama atenção ao momento histórico
que deu origem a “era do subdesenvolvimento” ao final dos anos 40, quando o
presidente Trumann dos Estados Unidos declara a necessidade de que os
avanços científicos e o progresso industrial sejam disponibilizados ao crescimento
e progresso do mundo subdesenvolvido. A partir dai, ficaram estabelecidos
padrões de vida diferenciados, definindo-se um modelo a ser seguido, bem como
41
a separação entre mundos desiguais, nascendo o conceito de
subdesenvolvimento.
Pequeno (2001) acrescenta que vale aqui realçar as discordâncias entre
aqueles que apregoam a modernização como base para o desenvolvimento e
outros que identificam na conjuntura mundial, categorias distintas quanto ao
desenvolvimento. De um lado os países ou regiões desenvolvidos e de outro os
subdesenvolvidos, convivendo numa relação de exploração, configurando a
interdependência e a dominância dos mais favorecidos sobre os demais.
No processo de desenvolvimento desigual emergem as disparidades
espaciais que podem ser inter-regionais, intra-regionais e mesmo intra-urbanas.
Assim, o desenvolvimento prometido e idealizado nos modelos passados tem
também produzido processos de degradação ambiental, muitas vezes no curto
prazo comprometedores de quaisquer avanços obtidos.
Desta maneira, a concepção de subdesenvolvimento de Gunnar Frank
(apud Pequeno, 2001) encontra-se em oposição ao que pretende a teoria do
desenvolvimento via modernização. Além disso, reforça que as ajudas
internacionais, melhor entendidas como empréstimos, contribuem para que novos
mercados sejam criados, nos quais o máximo de retorno e lucro é perseguido
pelos financiadores. Estes empréstimos findam pôr ser concedidos a países
enquadrados em critérios pré-estabelecidos como: estabilidade política interna,
alinhamento de política externa, políticas econômicas voltadas para a exportação.
A análise crítica do que propõe Gunnar Frank (apud Pequeno, 2001)
evidencia a importância que deve ser dada ao Estado como agente promotor do
desenvolvimento em países e regiões onde as condições sociais estejam
insatisfatórias. Todavia, ressalta-se, principalmente para a realidade atual, a
necessidade de considerar as condições locais para que se identifiquem as
orientações a serem dadas para o processo de desenvolvimento. A composição
de programas de desenvolvimento com base local, vistos de forma integrada
facilita explorar a diversidade existente, seja de recursos naturais, econômicos ou
sócios culturais, fortalecendo com bases endógenas o processo de
desenvolvimento a ser estabelecido.
Como promotores de desenvolvimento endógeno podemos citar os fóruns
sociais mundiais, as sociedades em redes e toda sociedade civil.
42
1.2.2. O paradigma ecológico
Para Ab’Saber (1998), o comportamento humano de preservação do meio
ambiente demorou a se estabelecer, a reação da inteligência humana a esses
novos processos de eliminação da vida na terra somente aconteceu, a partir da
década de 70, com as colocações do Clube de Roma na reunião de Estocolmo
(1972) e a introdução do conceito de ecodesenvolvimento ou desenvolvimento
sustentável.
De acordo com Tatames (apud Pequeno, 2001) em 1968, tem-se como
marco histórico a fundação do Clube de Roma, quando um grupo de
pesquisadores inicia o Projeto sobre a Condição Humana. Nesta investigação
constavam problemas das diversas latitudes como: os contrastes da pobreza e da
abundancia; a degradação do meio ambiente, a perda de credibilidade pelas
instituições, o crescimento urbano desordenado, a insegurança da condição de
empregabilidade, a perda de valores tradicionais e as distorções da economia
local e mundial
Logo em seguida, durante a primeira Conferência das Nações Unidas sobre
o Meio Ambiente em Estocolmo de 1972, estabelece-se a controvérsia entre
países industrializados e países subdesenvolvidos. Neste evento, os aspectos
negativos da industrialização foram vistos pelos países pobres como uma
estratégia dos países do Norte em controlar seu crescimento econômico,
reivindicando seus direitos ao desenvolvimento, á modernidade e à
industrialização (Pequeno, 2001).
Propondo uma nova ética de desenvolvimento, o discurso ambientalista se
transforma de uma visão tecnocêntrica para uma outra visão ecocêntrica, tendo
como princípios: a democracia participativa, a autonomia das comunidades, o
desenvolvimento local, a bioética e o respeito aos processos naturais (Pequeno,
2001).
Verifica-se assim o nascimento de um novo paradigma para a intervenção
no espaço substituindo-se um discurso desenvolvimentista, que acreditava no
planejamento e no progresso industrial como instrumentos que garantem os
direitos sociais, por um outro oposto. Este novo discurso trouxe a necessidade de
conter o crescimento econômico e de proteção dos recursos naturais, o retorno às
43
iniciativas locais e à discussão do papel do estado na regulamentação e no
controle dos mercados.
De acordo com Pequeno (2001), com isso, verificam-se duas rupturas:
primeiro na redefinição das relações entre a sociedade e a natureza; segundo na
escala de intervenção, da nação ao planeta.
“Assim, a visão ecologista parte para a reunificação entre natureza e sociedade,
restaurando a integridade do planeta. Os problemas ambientais vistos na paisagem de
forma cumulativa, numa abordagem histórico-geográfica, evidenciam a
responsabilidade da sociedade sobre a preservação, conservação, recuperação e
regeneração da natureza por ela transformada.” (PEQUENO, 2001, p. 30)
A proposta de desenvolvimento sustentável apresentada pela Comissão
Brundtland
2
é definida como “um processo de mudança no qual a exploração dos
recursos, a orientação dos investimentos, os rumos do desenvolvimento
tecnológico e a mudança institucional estão de acordo com as necessidades
atuais e futuras”.
De acordo com Franco (2001), o desenvolvimento sustentável tem como
finalidade a integração de preocupações ambientais ao bojo das políticas
socioeconômicas, fazendo estas políticas responsáveis por seus impactos
ambientais.
“Contabilizar tanto a degradação e a exaustão ambientais (indicadores verdes) como o
desempenho econômico é o primeiro passo no sentido dessa integração. Com
essa contabilidade integrada é possível definir com mais rigor os indicadores
econômicos de produto interno, renda nacional, capital e formação de capital,
consumo e valor adicionado, ajustados ao meio ambiente” (FRANCO, 2001, p. 41)
Estas políticas socioeconômicas então compreenderiam uma conexão de
redes urbanas, que de acordo com Franco (2001), constituem a base territorial
essencial para a sustentabilidade dos ecossistemas urbanos. Estas redes, que
compreendem as áreas urbanas e rurais, funcionam em harmonia com seu
suporte físico ambiental de âmbito regional, ou até mesmo continental.
Para Pequeno (2001) o relatório está inserido numa visão mais realista do
mundo, em comparação às propostas de crescimento zero e de auto-suficiência,
ele toma em consideração as correlações de força entre países industrializados e
2
Relatório Brundtland, conhecido como Nosso Futuro Comum, produzido pela Comissão Mundial
para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, para fundamentar a elaboração de propostas com vista
à Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento / ONU, 1992.
44
os países subdesenvolvidos. Porém é bastante suave na crítica aos países
desenvolvidos, atrelando a continuidade de seu crescimento econômico à
superação da pobreza nos países do hemisfério sul. Por isso o relatório foi taxado
por especialistas como omisso no que se refere à redução dos padrões de
consumo das sociedades industrializadas.
Um exemplo da omissão dos países desenvolvidos, foi a atitude dos EUA
em relação ao protocolo de Kyoto. O Protocolo de Kyoto foi resultado da 3ª
Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças
Climáticas, realizada no Japão em 1997. Esta conferência reuniu representantes
de 166 países para discutir providências em relação ao aquecimento global. O
documento estabeleceu a redução das emissões de dióxido de carbono (CO2),
que responde por 76% do total das emissões relacionadas ao aquecimento global,
e outros gases do efeito estufa, nos países industrializados. O conceito básico
acertado para Kyoto é o da ''responsabilidade comum, porém diferenciada'' - o que
significa que todos os países têm responsabilidade no combate ao aquecimento
global, porém aqueles que mais contribuíram historicamente para o acúmulo de
gases na atmosfera (ou seja, os países industrializados) têm obrigação maior de
reduzir suas emissões. Porém os Estados Unidos - o maior poluidor - se negou a
assiná-lo, alegando que o pacto era caro demais e excluía de maneira injusta os
países em desenvolvimento.
O atual presidente americano, George W. Bush, alegou ausência de provas
de que o aquecimento global esteja relacionado à poluição industrial e também
argumentou que os cortes prejudicariam a economia do país, altamente
dependente de combustíveis fósseis.
3
Em vez de reduzir emissões, os EUA
preferiram trilhar um caminho alternativo e apostar no desenvolvimento de
tecnologias menos poluentes. Porque isto não mexe na mudança no padrão de
consumo dos países ricos e na distribuição da riqueza. Como resultado, os EUA
3 No documentário "Uma Verdade Inconveniente", Al Gore, candidato a ultima campanha à
presidência dos EUA, apresenta dados alarmantes sobre o aquecimento global, degelo das
calotas polares e elevação do nível do mar, analisando eventos como o furacão Katrina. Existe um
grande consenso da comunidade científica quanto ao fenômeno do aquecimento global causado
pela atividade humana, reforçado pela recente divulgação das conclusões do Intergovernmental
Panel on Climate Change. Al Gore pode ter perdido as eleições nos Estados Unidos, mas ganha
audiência crescente nos quatro cantos da Terra. Ele tornou-se o mais famoso e convincente porta-
voz do aquecimento global e de suas conseqüências catastróficas
45
estão procurando parceiros para a produção destes bio-combustíveis. O Brasil,
atrelado às políticas mundiais desenvolvimentistas e grande produtor de bio-
combustíveis, possível novo parceiro dos EUA, tem sua economia agrícola
baseada em latifúndios monocultores, que realizam queimadas e exploram a mão-
de-obra, uma forma predatória de utilização da natureza, contrária ao
desenvolvimento sustentável. A riqueza do Norte em detrimento a pobreza do Sul.
O ideário de desenvolvimento sustentável, portanto, é criticado por
Rodrigues (2005), para a autora, este conceito, este objetivo a ser alcançado num
futuro é vago e abstrato. Pois não incorpora as contradições e os conflitos
existentes no planeta como um todo, e não analisa a complexidade da
configuração do mundo real.
“Partimos do pressuposto de que o uso do termo provocou deslocamentos de análises
em relação ao território, às causas e conseqüências da dilapidação das riquezas
naturais, aprofundou as formas de ocultar os conflitos entre classes sociais,
transformou a questão ambiental em agenda política de países e entre países”. (
RODRIGUES, 2005, p. 1)
Para Dean (2002), o conceito de desenvolvimento sustentável é algo
impossível de ser realizado, frente às políticas públicas da esquerda e direita
baseadas no desenvolvimento econômico como essência e na desconsideração
destas políticas no combate à pobreza como forma de evitar a destruição
ambiental.
“Tanto a esquerda como a direita se aferravam ao desenvolvimento econômico como
essência das políticas públicas. A pobreza era tida como causa última da destruição
ambiental; medidas ambientais efetivas não seriam possíveis até que se alcançasse o
desenvolvimento econômico. Contraditoriamente, os países desenvolvidos eram
corretamente responsabilizados pela maior parte da poluição mundial. O conceito de
“desenvolvimento sustentável” era cada vez mais invocado como meio de tentar o
impossível, da mesma forma que antes “racional” e “moderno” haviam justificado o
sacrifício inevitável. Desenvolvimento “sustentável” era frequentemente traduzido
como “sustentado”, mutilação sinistra, todavia mais definidora da intenção.” (DEAN,
2002, p. 347)
Rodrigues (2005) alerta sobre a importância de compreender a dinâmica da
natureza, que não obedece a fronteiras administrativas ou políticas.
“Mas como compreender a dinâmica, o tempo geológico, as diferentes escalas, se
aparentemente as problemáticas podem ser resolvidas com a tecnologia de ponta?
Como “cuidar” das riquezas naturais se o território parece não ter importância? Onde
46
estão as riquezas naturais? Qual a importância do território, espaço, lugar, paisagem?
Preservar áreas “reservadas” para a perpetuação do capital e do modo capitalista de
produzir mais e mais mercadorias ou da sociedade? Como evitar a sociedade do
descartável e a sociedade descartável?” (RODRIGUES, 2005, p. 7)
E acrescenta que a construção discursiva do desenvolvimento sustentável
parece limitar também o desenvolvimento do principal atributo do homem, ou seja,
a capacidade de pensar.
“Os deslocamentos discursivos impedem que se compreenda que os conflitos de
classe passaram, na agenda política internacional, para os conflitos de gerações?
Impede que se analise a importância do território para a reprodução ampliada do
capital? Dificulta a análise do espaço, da produção do espaço, do poder dos
detentores do conhecimento, da tecnologia na apropriação das riquezas
naturais?”(RODRIGUES, 2005, p. 8)
Rodrigues (2005) lembra que neste período – colonialismo e imperialismo
– o domínio do território era demarcado por posse, apropriação direta ou indireta
de territórios, e que essa característica altera-se com o novo imperialismo. Além
dessas riquezas naturais, desde o final do século XX, são também mercadorias: a
água, o ar puro, a atmosfera, a biosfera em sua totalidade. Há a transformação da
paisagem e do ambiente em mercadoria, e até mesmo sua financeirização, com
papéis que garantem a posse/propriedade das mercadorias no território – a
propriedade intelectual.
Para Rodrigues (2005), o desenvolvimento sustentável é um mito criado
para ocultar a importância do território, as contradições, os conflitos da
apropriação, a propriedade dos meios de produção e a existência de classes
sociais. Ao ocultar as classes sociais e deslocar os conflitos entre a geração
presente e a futura, a realidade transforma-se em abstração.
Para Machado (2005), “assumir o termo desenvolvimento sustentável,
atualmente, é adotar como premissa básica a inexoralidade do desenvolvimento
capitalista global e seus efeitos mais aparentes, tais como: poluição
transfronteiriça do ar, solo e água; aumento da degradação das condições de vida
de enormes contingentes populacionais; a dicotomia pobreza e riqueza/ norte e
sul, a perda da diversidade mundial e suas potencialidades para o avanço das
ciências; a desertificação crescente; a escassez de água; os efeitos do uso
indiscriminado das fontes não renováveis de energia.“
47
Sachs (2002) acredita que o desenvolvimento sustentável é um desafio
planetário. Ele requer estratégias complementares entre o Norte e o Sul.
Evidentemente, os padrões de consumo do Norte abastado são insustentáveis. O
enverdecimento do Norte implica uma mudança no estilo de vida, lado a lado com
a revitalização dos sistemas tecnológicos.
De acordo com Sachs (2002), no Sul, a reprodução dos padrões de
consumo do Norte em benefício de uma pequena minoria resultou em uma
apartação social. Na perspectiva de democratização do desenvolvimento, o
paradigma necessita ser completamente mudado. Por princípio, o Sul poderia ter
evitado alguns dos problemas que estamos atravessando no Norte se tivesse
pulado etapas em direção à economia de recursos, orientada para os serviços e
menos intensamente materializados, em prol do meio ambiente e da elevação do
padrão de pobreza.
Para conquistar essa mudança de paradigma, Sachs (2002) argumenta que
necessitamos, portanto, de uma abordagem holística e interdisciplinar, na qual
cientistas naturais e sociais trabalhem juntos em favor do alcance de caminhos
sábios para o uso e aproveitamento dos recursos da natureza, respeitando a sua
diversidade. Conservação e aproveitamento racional da natureza podem e devem
andar juntos.
Segundo Sachs (2002), o desafio é transformar o conhecimento dos povos
dos ecossistemas, decodificado e recodificado pelas etnociências, como um ponto
de partida para a invenção de uma moderna civilização de biomassa. Para isso
temos que utilizar ao máximo as ciências de ponta, para explorar o paradigma do
“B ao cubo”: bio-bio-bio. O primeiro b representa a biodiversidade, o segundo a
biomassa e o terceiro as biotécnicas. O autor salienta que o estudo da
biodiversidade não deveria estar limitado a um inventário das espécies e genes,
por dois motivos: primeiro, porque o conceito de biodiversidade envolve também
os ecossistemas e as paisagens; segundo, porque a biodiversidade e a
diversidade cultural estão entrelaçadas no processo histórico de co-evolução.
O progresso nesta direção pode auxiliar os países em desenvolvimento na
invenção de seus padrões endógenos de desenvolvimento mais justos e, ao
mesmo tempo, com maior respeito pela natureza, acredita fortemente Sachs.
48
“O controle do potencial de biomassa nos trópicos dá aos cientistas do Terceiro Mundo
a oportunidade de pular etapas, na frente dos países industrializados. E ao praticarem
o aproveitamento racional da natureza os países tropicais estarão contribuindo para
um gerenciamento global inteligente da biosfera. Como foi exposto em um relatório
recente, o Brasil e outros países tropicais têm todas as condições de se tornarem
exportadores de sustentabilidade, transformando o desafio ambiental em uma
oportunidade. “(SACHS, 2002, p. 42)
A preocupação em relação ao desenvolvimento sustentável cresceu cada
vez mais. Os velozes processos de urbanização e metropolização criaram
ambientes de vida cada vez mais hostis.
Então nos anos 70 e inicio dos anos 80, a conservação e a preservação
dos recursos naturais e o papel do homem integrado no meio passaram a ter
função muito importante na discussão da qualidade de vida da população, como
nos coloca Santos: “Nesse período, os conceitos sobre planejamento,
influenciados pelos estudos de impacto, sofreram uma reformulação, na qual a
questão ambiental foi amplamente contemplada”. (SANTOS, 2004, p. 18)
A autora conta que na década de 1980, grupos governamentais
organizaram-se para produzir planejamentos regionais, porém poucos
conseguiram implementar planejamentos ambientais, quase sempre barrados por
dificuldades institucionais.
Entre os anos de 1950 e 1990, segundo a autora, propostas de
gerenciamento de recursos naturais foram elaboradas. Porém as preocupações
iniciais eram essencialmente de controle ambiental, e não de mudança de postura
diante da utilização dos recursos naturais.
No Brasil, foi implantada em 1981 a Política Nacional do Meio Ambiente
através da criação da Secretaria de Meio Ambiente. Foram criados também o
SISNAMA (Sistema Nacional de Meio Ambiente) e CONAMA (Conselho Nacional
de Meio Ambiente).
“Em 1986, foi aprovado um documento legal de extrema importância: a Resolução 001
do CONAMA, que criou a obrigatoriedade de estudos de impacto ambiental no Brasil
para uma vasta gama de atividades humanas. Isso muniu as secretarias de grande
quantidade de dados ambientais. Algumas secretarias de meio ambiente
desenvolveram outro tipo de diagnóstico, visando criar APAS (Áreas de Proteção
Ambiental)”. (SANTOS, 2004, p. 19)
49
Em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento (Rio-92) uniu, em território brasileiro, 178 nações que debateram
temas voltados à conservação ambiental, à qualidade de vida na terra e à
consolidação política e técnica do desenvolvimento sustentável. Os caminhos
propostos pela Cúpula da Terra podem ser averiguados em cinco principais
documentos: Convenção sobre mudança climática, Convenção sobre diversidade
biológica, Princípios para manejo e conservação de florestas, Declaração do Rio e
Agenda 21.
Segundo Pequeno (2001), entre a Conferência de Estocolmo e a
Conferência do Rio de Janeiro, verifica-se um considerável avanço no
conhecimento do problema, na sua conceituação, chegando-se o momento de
partir para a formulação de estratégias que viabilizem o processo de
transformação pretendido com o novo modelo de desenvolvimento.
Para Guimarães (1997) A Rio-92 significou uma evolução importante do
pensamento internacional a respeito dos desafios do Terceiro Milênio.
“A situação de precariedade em que se encontram os sistemas naturais que sustentam
a vida no planeta, e que justificou a convocação da conferência, permitiu constatar que
a crise ambiental é, a um só tempo, generalizada e global. Suas causas e implicações
revelam dimensões políticas, econômicas, institucionais, sociais e culturais, e seus
efeitos transcendem as fronteiras nacionais.” ( GUIMARÃES, 1997, p. 14)
Dentre os 40 capítulos da agenda 21, que versa sobre os mais diferentes
temas, o capítulo 7 faz uma referência particular para o planejamento rural e
urbano, recomendando a avaliação das atividades humanas, do uso da terra e a
ordenação desejada dos espaços dentro dos preceitos de desenvolvimento
sustentável, desdobrado em sustentabilidade econômica, social, ambiental,
política e cultural. Assim, a nova ordem para planejamento estava documentada.
Apesar disto a Agenda 21 não tem se mostrado eficiente na interação das
agendas políticas sociais e ambientais.
O Banco Mundial, responsável pelo financiamento da Agenda 21, destina
seus recursos de forma contraditória aos interesses do programa mundial para a
preservação ambiental, segundo Guimarães (1997). Estudos publicados pelo
Environmental Defence Fund indicaram que dos 46 empréstimos concedidos pelo
Banco Mundial para programas de energia, com total de recursos que ascende
sete bilhões de dólares, apenas dois incorporam critérios de conservação
50
energética. Isto mostra a grave ineficiência na gestão da Agencia 21, que deveria
ser responsável pela transição do crescimento a padrões de sustentabilidade.
Parece mesmo inevitável sugerir, de acordo com Guimarães (1997)
principalmente a partir da realidade dos países periféricos, que o desenvolvimento
sustentável só poderá converter-se em proposta séria à medida que seja possível
distinguir seus conteúdos concretos, seus significados ecológicos, ambientais,
demográficos, políticos e institucionais.
“Não resta dúvida, por exemplo, que um dos pilares do estilo atual é a indústria
automobilística, com suas seqüelas de congestão urbana, de queima de combustíveis
fósseis e outras. Pois bem, o que poderia ser considerado sustentável para
empresários, isto é, veículos mais econômicos e equipados com conversores
catalíticos, não necessariamente o seria do ponto de vista da sociedade, que pode
privilegiar transporte público eficiente. O mesmo ocorre em relação aos recursos
naturais. Para o setor produtor de móveis ou exportador de madeiras, poderia ser
considerado sustentável a exploração florestal que promova a substituição da
cobertura natural por espécies homogêneas, posto que o mercado responde e
incentiva a competitividade individual fundada na rentabilidade ótima dos recursos.
Entretanto, para o país como um todo, é possível que a sustentabilidade radique
justamente na preservação de seus recursos florestais, seja para garantir a
manutenção dessa diversidade para fins científicos e tecnológicos, seja para promover
a manutenção da identidade cultural das populações indígenas, outorgando uma
menor rentabilidade à exportação de madeiras e móveis” ( GUIMARÃES, 1997, p. 24).
Toda esta contradição, segundo Harvey, (apud Rodrigues, 2005) é causada
pelo novo imperialismo, que impõe e onde o Estado-Nação é subjugado pelas
normas do capital financeiro, do neoliberalismo.
“A “nova” divisão territorial do trabalho, que Harvey (2005) denomina apropriadamente
de novo imperialismo, impõe o domínio político e econômico com a financeirização, a
tecnologia, o poder das corporações multinacionais. No novo imperialismo, as riquezas
naturais, os “recursos” podem ser patenteados, independentemente do local onde se
encontram. (RODRIGUES, 2005, p. 12)
De acordo com Rodrigues (2005), para os ecologistas, somos sempre
devedores e temos responsabilidades com as gerações futuras. Neste contexto,
como surgiria então a cidade sustentável? O pensamento econômico atual exclui
estas diretrizes sustentáveis. A economia é desenvolvida através da extração e do
consumo linear. O PIB analisa apenas o crescimento econômico e ignora critérios
a longo prazo, como a fertilidade do meio ambiente e o bem estar da sociedade.
51
Se na avaliação do PIB se estabelecessem critérios ecológicos, integrando as
balanças econômicas e meio-ambientais nas contas do Estado, se estabeleceria
um novo conceito de avaliação global da economia, onde a eficácia econômica é
aquela que beneficia a todos, em lugar de uns poucos em detrimento da maioria.
E o resultado seria uma modificação de comportamentos individuais e
corporativos, onde recursos seriam usados para conservação do meio ambiente,
para a redução de impactos ambientais e para a reciclagem de matérias-primas, e
impostos seriam cobrados para as atividades que danificam o meio ambiente.
Para Sachs (2002), as mudanças efetivas devem incluir: a ascensão das
comunidades acima da linha da pobreza estabelecendo formas harmônicas de
convívio com a natureza; o combate aos obstáculos políticos e institucionais,
especialmente relacionados à questão fundiária; o planejamento agroclimático
tendo a bacia hidrográfica como unidade territorial. Além disso, deve-se
reconhecer que a solução dos problemas ambientais extrapola as possibilidades
ofertadas pelo desenvolvimento rural necessitando-se estratégias para enfrentar o
problema de explosão urbana.
Em síntese, Sachs (1993) sugere que as estratégias inovadores pró-ativas
para o desenvolvimento sustentável considerem: a criação de novos modelos
gerenciais e institucionais; a formação de parcerias público-privadas; o estímulo á
iniciativa local, à criatividade e à capacitação; a promoção de economia de
recursos e combate ao desperdício; e a valorização do pluralismo tecnológico e da
imitação criativa.
O paradigma ecológico na estética e na escala intra-urbana:
Em “O Jardim de Granito”, Anne Whiston Spirn, nos desperta para o
conceito de que a natureza é um continuum, com a floresta num dos pólos e a
cidade no outro. Os mesmos processos que operam na floresta operam na cidade.
A cidade faz parte da natureza e está repleta de natureza, que não se resume a
parques e árvores.
“O ar, o solo, a água e todos os animais urbanos também são parte desse riquíssimo
jardim. Os mesmos processos que operam na floresta operam na cidade. E pergunta:
“Porque então não criar nos centros urbanos certas características da qualidade de
vida das áreas rurais? Porque não explorar seus recursos naturais?” ( SPIRN, 1995,p.
20)
52
Para ela a cidade é um jardim de granito, composto por muitos jardins
menores, disposto num mundo-jardim. Partes do jardim de granito são cultivadas
intensamente, mas a maior parte não é reconhecida e é negligenciada.
“A cidade é a conseqüência de uma complexa interação entre múltiplos propósitos e
atividades dos seres humanos e de outras criaturas vivas e dos processos naturais
que governam a transferência de energia, o movimento do ar, a erosão da terra e o
ciclo hidrológico. A cidade é parte da natureza.” (SPIRN, 1995, p. 20)
Spirn (1995) alerta de que a natureza tem sido vista como um
embelezamento superficial, como um luxo, mais do que como uma força essencial
que permeia a cidade, na forma de parques e jardins, frequentemente viram a
cidade como algo estranho à natureza, e a si mesmos como introdutores de um
pedaço da natureza da cidade.
Rodrigues (1997), nomeia essa sociedade superficial de mundo “shopping”,
e diz que a alternativa para isso é o desenvolvimento ecologicamente sustentado,
a justiça social e a democracia participada. A nova experiência perceptiva do
território da sociedade pós-industrial deste paradigma emergente, cada vez mais
sensível às questões ecológicas, é que o território cultural e a natureza não são
antagônicos. O ciclo regenerativo exige cidades ecológicas (eco - polis), exige
eco-desenvolvimento.
“Felizmente que a sociedade não é uma identidade estética. As contradições sociais e
os diferentes paradigmas criam metamorfoses no território. Surgiram já novas
gerações de arquitetos e urbanistas que propõem alternativas sociais e territoriais.
Porto Alegre e Curitiba, no Brasil, são exemplo mais conhecidos de várias
intervenções mundiais de eco-urbanismo. O livro de Miguel Ruano, "Eco-Urbanismo",
assinala sessenta projetos. A Carta Européia de energia solar na arquitetura e
planejamento urbano foi apoiada pelos nomes mais significativos da arquitetura e do
urbanismo contemporâneo (Renzo Piano, Richard Rogers, Gustav Peichl, Frei Otto, F.
Jourda, Thomas Herzog, etc...).Grandes projetos territoriais como o vale de Emscher,
na Alemanha e o vale de Toronto, no Canadá, mostram a possibilidade de
ecodesenvolvimento numa vasta área territorial.” ( RODRIGUES, 1997,p. 2)
Para Rogers (2001), a rede de conhecimento que foi gerada pela tecnologia
da informação, através da microeletrônica, e a robotização dos meios de
produção, trouxe ao homem uma nova forma de utilizar o tempo, de repensar seu
papel produtivo e criativo no mundo. E de estabelecer uma cidadania criativa,
aproveitando o tempo livre para exercer atividades de interesse comum,
53
relacionadas ao meio ambiente, à cultura, à educação, com a assimilação das
necessidades sociais que alimentam e inspiram a vida.
Segundo Rogers (2001), no mundo contemporâneo, separamos a
sociedade em três vertentes: a base de mercado que cria o capital de mercado, o
governo que cria o capital público, e a cidadania que cria o capital social. Esta
cidadania a longo prazo pode promover benefícios sociais, meio ambientais e
econômicos, com a transformação da pauta da vida urbana, gerando riqueza
social e trabalho produtivo. Esta cultura urbana, participativa, como a alma de
cada sociedade, diferenciaria as pessoas na era da globalização e da
uniformidade.
Para Rogers (2001), o espaço público da nova sociedade, deveria se
seguro e integrador, iria do maior ou mais íntimo, sendo isto fundamental para a
integração e coesão social. A acessibilidade física e intelectual nesta sociedade
de valores promoveria uma cidade integradora, tolerante a pensamentos radicais.
O compartilhar reconhece responsabilidades comuns e consolida comunidades.
Um outro ideário para o desenvolvimento é apontado por Amartya Sem
(apud Rodrigues, 2005) que afirma que o desenvolvimento pode ser visto como
um processo de expansão das liberdades reais que as pessoas desfrutam. A
sociedade sustentável é um lema proposto pelas ONGs e movimentos sociais em
1.992.
“Há diversos condicionantes para pensar esse desenvolvimento como liberdade:
acesso à saúde, à educação, ao lazer, à cultura, à informação, ao conhecimento.
Significa a remoção das fontes de privação: remover a pobreza econômica, que rouba
das pessoas a liberdade de saciar a fome, de vestir-se, de morar. A remoção das
fontes de privação implica, necessariamente, a retomada da importância do espaço,
do território. “(RODRIGUES, 2005, p. 13)
Como afirma Diegues (apud Pequeno, 2001), o conceito de sociedades
sustentáveis parece ser mais adequado que o de desenvolvimento sustentável.
Na medida em que se possibilita a cada sociedade definir seus padrões de
produção e consumo, bem como o padrão de bem estar de sua cultura, seu
desenvolvimento histórico e seu ambiente natural, tem-se uma maior diversidade
de referências, sempre respeitando seus valores intrínsecos, tornando-as
diametralmente opostas ao modelo industrializado.
54
1.2.3. Novos Métodos de Planejamento Territorial :
As ciências foram construídas a partir da observação da realidade,
fragmentando a paisagem e compreendendo de maneira particularizada as partes
componentes de um sistema que se mostrava complexo e diversificado. Dessa
forma criaram-se conceitos em várias áreas de conhecimento, com seus métodos
e escalas específicos. De acordo com Santos (2004), o planejamento propõe o
inverso – a integração e generalização. Há, desta forma, um descompasso entre a
proposta e a prática do fazer.
Um dos métodos de planejamento territorial, como nos afirma Santos, é a
adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento. O critério de bacia
hidrográfica é comumente usado porque constitui um sistema natural bem
delimitado no espaço, composto por um conjunto de terras topograficamente
drenadas por um curso d´água e seus afluentes, onde as interações, pelo menos
físicas, são integradas e, assim, mais facilmente interpretadas.
“No Brasil, a seleção da bacia hidrográfica como área de trabalho para avaliação
ambiental está assumida em muitos trabalhos acadêmicos, planejamentos oficiais e,
pelo menos em um ato legal – a Resolução CONAMA (Conselho Nacional de Meio
Ambiente) 001/86 – que, no artigo 5º item III, declara: “(...) definir os limites da área
geográfica a ser diretamente afetada pelos impactos, denominada de área de
influência do projeto, considerando em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se
localiza”. Além disso, há uma recomendação da FAO (Foods and Agriculture
Organization), desde a década de 1970, de que o planejamento adequado de bacias
hidrográficas é fundamental para a conservação de regiões tropicais.” (SANTOS,
2004,p. 142)
O método de planejamento baseado na área da bacia hidrográfica foi e
ainda é muito utilizado, porém esta forma de planejamento não contempla os
processos sociais, econômicos e ambientais. De acordo com Santos (2004),
tênuamente tem um caráter integrador do meio, tomando como referência apenas
a qualidade e quantidade de água disponível como recurso natural.
Para McHarg (1969) a bacia hidrográfica é descritível – é unificada pela
água e é permanente. E embora a bacia hidrográfica seja uma unidade
hidrológica, não é uma unidade fisiográfica e se busca uma divisão do território,
enquanto a região geomorfológica apresenta-se como uma unidade fisiográfica
em um grau inigualável.
55
Santos (2004) afirma que desde o final do século passado foram
trabalhados vários tipos de planejamento setorial, cuja discussão central ainda
estava voltada aos terrenos urbanos e às múltiplas funções da cidade, porém com
maior desenvolvimento teórico de planejamentos setoriais da área econômica e de
recursos hídricos. No período, entre os anos 1930 e 1940, cresceu a idéia de
planejamento baseado em bacias hidrográficas.
Quando a bacia hidrográfica torna-se o espaço das funções urbanas ou do
campo, a complexidade aumenta, pela diversificação de produtores e
consumidores, pelo aumento das relações intrínsecas e pela sua dependência de
fontes externas, criando uma malha que, transcende o território da bacia. O
coordenador de uma equipe de planejamento não pode perder de vista que, ao
definir uma área de referência ao estudo, deve antes reconhecer e sistematizar a
complexa teia de cada região.
Segundo Santos (2004), em alguns casos pode-se utilizar como
metodologia, além da bacia hidrográfica, o uso de diferentes áreas de trabalho,
definidas por diferentes estratégias e estudadas em diferentes escalas. Assim
pode-se somar áreas de bacia hidrográfica, limites legais, corredores, microbacias
complementares, unidades homogêneas ou áreas de fluxo de serviços, de acordo
com objetivos e abrangência escalar da proposta de planejamento.
No plano de bacia, para as previsões de impactos são feitos
levantamentos que dizem respeito a história geológica e do clima que, em
conjunto, têm interagido sobre a bacia hidrográfica, criando dessa maneira sua
forma básica. Quando isso é compreendido, as várias regiões geomorfológicas
tornam-se claramente evidentes (McHarg, 1969).
Obtidas as informações nestas áreas de conhecimento, torna-se possível
prescrever o uso do solo dominante para cada região geomorfológica e para suas
várias partes constituintes: “Os precedentes estudos de aptidões intrínsecas para
a agricultura, silvicultura, recreação e urbanização revelam valores relativos para
cada região e para a bacia, dentro de cada uso da terra especificado. Mas
procuramos otimizar não para o uso único mas para usos do solo múltiplos
compatíveis”. (MCHARG, 1969, p. 2)
56
McHarg (1969) desenvolve um instrumento para esses estudos, a matriz de
intercompatibilidades. Adjacente à matriz de intercompatibilidades encontra-se
outra que procura identificar os recursos necessários para os usos do solo
prováveis – solos produtivos para a agricultura, carvão e calcário para a
mineração, terra plana e água para localizações urbanas e assim por diante.
Segundo Santos (2004), partindo dessas premissas diferenciadas, os
profissionais de planejamento que tentam somar suas informações, pincelando
quadros de qualidade de vida, destacando a conservação de áreas verdes e
preservação de espécies raras, com bases inconsistentes de conhecimento
transformam estas informações em obsoletos documentos. Pois não há uma
proposta efetiva da construção de um novo método, somente ajustes para a
interpretação de dados. O conceito de ecologia da paisagem, que adota o enfoque
sistêmico é o que mais se aproxima de uma nova concepção para um
planejamento integrado com base em um modelo ecológico.
Para McHarg (1969), o método do planejamento ecológico é aquele pelo
qual a natureza do lugar pode ser apreendida. Em sua variação, ela oferece
diferentes recursos. O lugar deve ser compreendido para ser usado e manejado
adequadamente.
De acordo com Ab’Saber (1998), para o planejamento ecológico é
indispensável o conhecimento da estrutura da composição e da dinâmica dos
fatos que caracterizam o espaço total da região escolhida.
Franco salienta que, na atual interdependência da economia global, a
alimentação e a energia passam a ser mercadorias globais; a falta do produto ou a
mudança de preços em uma região podem ter implicações mundiais. Ela também
afirma: “As cadeias biológicas formadas por solos, ar, água seres vivos
invariavelmente são mundiais. Um distúrbio em qualquer um deles desastrosos e
inesperados distantes no tempo e no espaço.” ( FRANCO, 2001, p. 23)
Franco (2001) nos diz, que apesar dos avanços, deve-se considerar que,
num processo de planejamento, ainda é comum que a engenharia e a economia
dominem a tomada de decisões. Por isso, os planejamentos ambientais atuais são
fracos em modelos ecológicos e tratam a dimensão política de forma simplista.
“A participação pública e a interpretação das representações sociais são ainda
tratadas de forma amadora. Há ainda um hiato entre a abordagem dos planejadores
57
urbanos e economistas – estes demasiadamente preocupados com a ordenação das
atividades humanas, o desenvolvimento econômico e a geração de empregos-, e
ecologistas, ambientalistas e administradores do meio ambiente voltados para
planejamentos cujo eixo de análise é o meio biofísico.” (FRANCO, 2001, p. 24)
McHarg (1969) explica que para a análise da implantação de uma obra de
grande porte e grande impacto ambiental, é fundamental a utilização de um
método onde processos naturais podem ser interpretados como valores, de forma
a permitir uma resposta racional para um sistema de valores sociais. E salienta a
necessidade de abandonar o modelo econômico e a indiferença do homem
antropocêntrico.
Para Pellegrino (1987), os novos paradigmas da drenagem urbana
representam no conceito de planejamento ecológico integral um método de
abordagem para uma escala macro do projeto da paisagem, incorporando as
dimensões ecológicas e sociais.
Para Mattes (2001), na realidade, a nova concepção de drenagem urbana –
a dos reservatórios de contenção – iniciada a partir da década de 70, na Europa,
Estados Unidos e Japão, compreendia um conjunto de medidas inovadoras. Elas
tinham por objetivo compensar os efeitos da urbanização sobre os sistemas de
drenagem e estruturas hidráulicas, mediante o emprego de soluções
compensatórias, envolvendo vários tipos de dispositivos de retenção e detenção
das águas.
“Estes seriam implantados a partir de enfoques sistêmicos capazes de avaliar os
efeitos de intervenções, ou transformações, em toda a bacia hidrográfica.
Contemplavam, também, além de medidas destinadas a enfrentar os aspectos
quantitativos, ações destinadas a minimizar os impactos quantitativos decorrentes da
urbanização: erosão e o assoreamento, deteriorização da qualidade das águas
superficiais, contaminação dos aqüíferos provocada, principalmente, por esgotos,
efluentes industriais, poluição difusa”. (MATTES, 2001, p. 165)
Segundo Tucci (apud Mattes, 2001), para uma melhor gestão e avaliação
de controle de impactos da urbanização sobre a bacia hidrográfica, as alternativas
dos reservatórios de contenção e detenção – para o enfraquecimento de
enchentes em São Paulo – passaram a ser aplicados de forma mais intensa a
partir da década de 90. Anteriormente aplicavam uma filosofia errônea, baseada
na “idéia preconcebida” de que a boa drenagem “é aquela que permite escoar
rapidamente a água precipitada sobre a área de seu estudo”.
58
Canholi (apud Mattes, 2001) concorda com a mudança na filosofia de uso
das soluções estruturais de engenharia, a exemplo do que vem ocorrendo em
outros países: substituição do conceito de obras de drenagem baseadas na
aceleração dos escoamentos (obras de canalização) por formas de retardamento
e contenção.
Para Mattes (2001), as medidas de controle de inundações que fazem parte
do “novo conceito de drenagem urbana”, não se restringem às intervenções
físicas, ou à simples implantação de reservatórios destinados a abater o pico de
cheias.
Tucci e Genz (apud Mattes, 2001) apresentam um conjunto de medidas
para controle do aumento da cheia urbana, a partir de uma visão que procura
superar o enfoque localizado dos projetos de drenagem tradicionalmente
utilizados, baseados em obras de canalização e de simples retenção.
“Considerando unicamente os aspectos relacionados ao escoamento superficial e em
função da posição na área de uma determinada bacia hidrográfica, os autores
relacionam três medidas para o controle de inundações: medidas de controle na fonte,
de atuação mais restrita, circunscritas aos limites de uma propriedade, ou lote, praça,
área pública de um loteamento, ou mesmo de calçadas; medidas de micro drenagem
que agem sobre mais de um bairro, ou loteamento, envolvendo bacias muito pequenas
(microbacias), com áreas de apenas alguns hectares; medidas de macro drenagem
que atuam sobre os principais córregos e bacias do município”. (MATTES, 2001, p.
168)
Esses novos conceitos de drenagem urbana estão inseridos na escala
micro e macro urbana e contemplam uma atuação mais eficiente e com menos
impactos sociais.
1.2.4. Ecologia da Paisagem
De acordo com Metzger (2001), a ecologia da paisagem é uma nova área
de conhecimento dentro da ecologia marcada pela existência de duas principais
abordagens: uma geográfica, que privilegia o estudo da influência do homem
sobre a paisagem e a gestão do território; e outra ecológica, que enfatiza a
importância do contexto espacial sobre os processos ecológicos, e a importância
destas relações em termos de conservação biológica.
59
Para Tricart (1979), a abordagem geográfica é caracterizada por três
pontos fundamentais: a preocupação com o planejamento da ocupação territorial,
através do conhecimento dos limites e das potencialidades de uso econômico de
cada “unidade de paisagem” (definida nesta abordagem, como um espaço de
terreno com características comuns); o estudo de paisagens fundamentalmente
modificadas pelo homem, as “paisagens culturais” que predominam no espaço
europeu; e a análise de amplas áreas espaciais, sendo a Ecologia da Paisagem
diferenciada, nessa abordagem, por enfocar questões de macro-escalas, tanto
espaciais quanto temporais (sendo assim uma macro-ecologia).
Segundo Santos (2004), na última década, a teoria que fundamenta a
Ecologia da Paisagem vem sendo utilizada no planejamento ambiental como um
caminho integrador dos temas abordados.
Em Klink (1974), encontramos o auxílio para esta tentativa de análise, na
sua proposta de Regionalização Natural a partir de conceito de “Ecologia da
Paisagem” ou geoecologia que tem como propósito estabelecer as relações
qualitativas e quantitativas entre os vários componentes de GEOCOMPLEXO (que
compreende os vários componentes da crosta terrestre – a litosfera – o solo +
clima + cobertura), estudando a massa natural e balanços de energia de uma
paisagem; com o entendimento da Biosfera como a região que é caracterizada
pela interpenetração dos vários componentes naturais e pelos efeitos
especificamente orientados e de retro-alimentação, a região que dá lugar à vida,
que modela suas várias formas e que por sua vez, é influenciada por ela, a
mesma vida, que junto com os fatores ambientais forma na Terra unidades
funcionais, os Ecossistemas, que são espacialmente específicos e de escala
variável. Propõe, então este autor, a divisão da paisagem em Unidades Naturais,
com o propósito de definir esta diferenciação espacial da Biosfera.
A Ecologia da Paisagem, portanto enxerga na Biosfera seu campo de sua
ação. Segundo Pellegrino é na biosfera, esta sutil, complexa e dinâmica interface
da litosfera, hidrosfera e atmosfera, onde ocorrem, e aonde são movidas as
energias e as interações entre os diversos componentes se processam.
Para Pellegrino (1987) estas mudanças ocorridas na biosfera podem se
revelar positivas ou negativas, em larga ou pequena escala, dependendo da
natureza da mutação operada e do ponto do meio-físico em que se aplicou a
60
alteração; podendo até, ocasionar mudanças inesperadas, ou mesmo reações em
cadeia, no que se pretendia que fosse uma “benfeitoria” isolada.
Pellegrino (1987) acredita que desta forma, passamos a considerar esse
capital, o conjunto dos recursos oferecidos pelos subsistemas naturais, como a
oferta com a qual a sociedade pode contar para o seu desenvolvimento, e que,
portanto, tem-se que adotar medidas bastante criteriosas para o seu dispêndio, e
nas formas que dêem o melhor retorno, o que só é possível através do seu
compreendimento naquilo que oferece como valores e oportunidades.
Pellegrino (1987) acrescenta que em vista disso, torne-se imperiosa uma
ampla visão regional que vise, enquanto é tempo, aferir o grau das alterações
humanas sobre os sistemas naturais.
Pellegrino (1987) conclui que se considerando, enfim, que o espaço não é
resultado exclusivo de ação dos fluxos econômicos, e que a dialética
desenvolvimento sustentado se processa, deve-se ter como prioridade máxima a
conservação dos sistemas naturais. E finaliza que para a definição do objeto de
ação, é necessário construir-lhe um sistema próprio de identificação das
categorias analíticas, que reproduzem, no âmbito da idéia, a totalidade dos
processos, tal como eles se produzem na realidade.
Para Berry (apud Pellegrino, 1987) o ecossistema é um modelo do Sistema
Espacial, um sistema funcional integrado, dos organismos vivos, inclusive o
Homem e seus efetivos ambientes físicos, biológicos e culturais, frutos de
processos naturais e culturais de entrosamento na Biosfera. No planejamento de
sistemas espaciais – meios e fins não podem jamais se separados, mas são
partes de processo entrelaçados.
Berry (apud Pellegrino, 1987) diz que dentro da nova ótica de ecossistema,
podemos conceituar a ecologia da paisagem como a combinação de propostas de
reestruturação / recuperação da vida social em bases solidárias.
Pellegrino (1987) argumenta que a investigação de um ecossistema com o
propósito de se conseguir uma compartimentação em Unidades Naturais, deve-se
começar pela identificação dos componentes que formam a sua estrutura, e que
são funcionalmente inter-relacionados dentro do geocomplexo: Relevo, Substrato
61
Geológico e Solos, Corpos D’água ou Balanço Hídrico, Clima nas escalas
inferiores, e a Comunidade Biótica.
Para Pellegrino (1987), os planejadores buscam, dentro dessa linha,
interpretar esse mosaico, traduzir a heterogeneidade e revelar as relações ou
processos ativos entre as unidades. Se a tarefa é bem cumprida, a compreensão
dos efeitos sociais sobre o ambiente é mais explícita e as ações ou estratégias de
manejo podem ser orientadas pelos elementos da paisagem.
Para Barbosa (2004), entretanto, outros autores como Milton Santos,
consideram uma tendência dos paisagistas enfatizarem o empírico como
explicação privilegiada para esse sentido, e acreditam que estas visões continuam
sendo contribuições importantes na intermediação entre os processos humanos e
naturais para análise projetual da paisagem
4
.
Segundo Santos (2004), os ecologistas da paisagem que trabalham sob a
ótica arquitetônica também usam elementos de referência, mais baseados, porém,
nas qualidades visuais da paisagem observada em campo.
“As informações costumam ser integradas pela ordem de relevância dos indicadores
adotados, que podem definir compartimentos distintos dentro da paisagem. No
entanto, para obter a compartimentação final em unidades de paisagem, é necessária
também a inserção dos aspectos da história do local, incluindo conhecimentos desde a
evolução de processos erosivos até as transformações trazidas por mudança de
atividades ou de tipo de manejo de terra.“ ( SANTOS, 2004, p. 146)
Lyle (1994) ressalta que é necessário unificar a visão e transcender a
análise quanto à compreensão das práticas intervencionistas do homem. E
considera três ordens fundamentais para entender a formação do ecossistema:
estrutura, função e local.
Numa outra abordagem, Lyle (1994) acrescenta, a estrutura da paisagem
considera seus padrões espaciais e seus arranjos dos elementos que a compõe,
classificados como fragmentos, corredores e matrizes. Dessa forma, o
funcionamento da paisagem, entendido por seus fluxos e movimentos, quando
4
A paisagem seria uma categoria interna da totalidade, considerada um processo ou um produto
nascido do espaço apreendido e vivenciado. Possuiria uma dimensão perceptiva e uma
materialidade efetiva. As
unidades de paisagem ou fragmentos de paisagem seriam reconhecidas
pelos nossos sentidos, através da percepção do novo.
62
percebido em sua totalidade, faz ver os processos que levam à transformação da
paisagem, representada pela dinâmica das alterações dos padrões espaciais e do
funcionamento ao longo do tempo.
Assim podemos considerar matriz como a cobertura dominante da
paisagem; manchas ou fragmentos, em geral, como os remanescentes da
paisagem natural que diferem dos arredores; e corredores definem-se como
elementos da paisagem resultantes da intensificação linear de processos naturais
ou antrópicos.
Para Lyle (1994), a matriz corresponde à unidade maior da paisagem na
qual a estrutura se espacializa, podendo estar interligada a outras matrizes que a
cercam. A matriz pode reunir como elementos o sistema hidrográfico e os circuitos
produtivos urbanos, configurando uma estrutura de desenvolvimento. Assim numa
mesma matriz estas estruturas se sobrepõem e se somam definindo uma
estrutura que agrega a todos os elementos que compõem a paisagem, fazendo-a
funcionar e promovendo transformações que resumem a interação entre os
processos naturais e seus fluxos energéticos, as relações sociais de produção e
sistema de circulação.
O fragmento corresponde a um recorte diferenciado do entorno, derivado
de diversas origens, podendo ser remanescente de uma situação ambiental
anterior, ou resultado de um distúrbio na paisagem, seja ele antrópico ou natural.
Um conjunto de fragmentos dispostos linearmente na paisagem podem definir um
corredor ecológico. (Lyle, 1994)
Os corredores definem-se como elementos resultantes da intensificação
linear de processos naturais ou antrópicos como o crescimento urbano, a
implantação de redes de infra-estrutura, a construção de vias de circulação e
transporte. Nesse sentido, os corredores surgem como oportunidade primordial de
preservar a herança natural de uma região, especialmente em locais onde restam
fragmentos isolados de paisagem natural. (Lyle, 1994)
Lyle (1994) conclui que a configuração de um corredor encontra-se
diretamente relacionado a uma linearidade no espaço urbano, podendo incluir
uma série de fragmentos posicionados ao longo de um elemento da natureza,
63
como um rio ou uma linha de costa, bacias hidrográficas ou uma intervenção do
homem no espaço como uma via, uma zona de uso diversificado. As
heterogeneidades próprias de cada corredor se expressam através do meio bio-
geofísico, bem como de processos sociais, fazendo com que os mesmos
apresentem alterações na sua configuração às vezes estreitando-se, alargando-se
ou sendo interrompido. Portanto, um corredor ecológico no ambiente construído
requer consideração de critérios tanto fisiográficos como antrópicos para sua
delimitação e compreensão.
Para Barbosa (2004) a evolução do planejamento da paisagem foi um
processo lento e fragmentado e os temas sustentabilidade, ecologicamente
adequado e integrado, estética e manutenção da paisagem estão evidentemente
em recente definição.
Esta evolução se deve ao amadurecimento das idéias e conceitos
apreendidas na transformação da natureza pelo homem. Na complexidade das
relações sociais, econômicas, políticas que formam o território e que são o objeto
das práticas de gestão da paisagem.
1.2.5. Gestão da Paisagem:
A gestão da paisagem deve ser vista como um instrumento de
planejamento territorial. O pressuposto para ter a gestão da paisagem como
instrumento efetivo se dará através da integração das políticas setoriais.
Para Barbosa esta integração consiste à dimensão da sustentabilidade que
se refere às formas de participação nas políticas públicas tendo em vista o
processo de construção da cidadania e a inclusão social nos programas de
desenvolvimento. Esta realização só será possível através da democratização e
mediação do poder público nas questões de interesse social e do fortalecimento e
capacitação das organizações comunitárias.
Mata e Correia (2005) escrevem que na Europa a “Política da paisagem”
designa a formulação pelas autoridades públicas competentes de princípios
gerais, estratégias e linhas orientadoras que permitam a adoção de medidas
específicas tendo em vista a proteção, gestão e ordenamento da paisagem. De
64
acordo com eles, definiu-se nesta política o conceito de “Gestão da paisagem”,
como uma ação que visa assegurar a manutenção da paisagem, numa
perspectiva de desenvolvimento sustentável, no sentido de orientar e harmonizar
as alterações resultantes dos processos sociais, econômicos e ambientais. No
âmbito mundial este discurso parece vazio, já que os países europeus devastaram
seus recursos naturais para fortalecerem suas economias e hoje dependem dos
recursos do terceiro mundo para manterem o padrão de seu desenvolvimento.
Mata e Correia (2005) contam que localmente a política européia da
paisagem tem se organizado e avançado na construção de um território mais
sustentável. A importância da gestão das paisagens se deu a partir das seguintes
constatações:
“A paisagem contribui para a formação de culturas locais , e representa um
componente fundamental do patrimônio cultural e natural, contribuindo para o bem-
estar humano e para a consolidação da identidade local; a paisagem é em toda a parte
um elemento importante da qualidade de vida das populações: nas áreas urbanas e
rurais, nas áreas degradadas bem como nas de grande qualidade, em áreas
consideradas notáveis, assim como nas áreas da vida cotidiana; as evoluções das
técnicas de produção agrícola, florestal, industrial e mineira e das técnicas nos
domínios do ordenamento do território, do urbanismo, dos transportes, das infra-
estruturas, do turismo, do lazer e, de modo mais geral, as alterações na economia
mundial estão em muitos casos a acelerar a transformação das paisagens.” (MATA E
CORREIA, 2005, p. 2)
Mata e Correia (2005) relatam que houve na Europa o reconhecimento da
função ecológica da paisagem, e a conclusão da dependência histórica e atual do
funcionamento econômico de cada paisagem. Reconheceu-se que as atividades
produtivas e suas práticas e técnicas de aproveitamento dos recursos, resultam na
organização dos usos do solo.
A intensificação das atividades produtivas e a pressão sobre os recursos,
própria da sociedade industrial, provocaram a segregação espacial dos usos do
solo, a especialização funcional do território e a perda ou deterioração da
multifuncionalidade (ecológica, produtiva, cultural) de muitas paisagens, de modo
especialmente visível e significativo no espaço rural, em certos casos por
abandono em outros por um processo inverso de intensificação e especialização
agrícola. Segundo Mata e Correia (2005), em razão disto o conceito de
multifuncionalidade foi assumido pela política agrícola e florestal da União
65
Européia, e aplicado à análise, à avaliação e às políticas públicas de paisagem,
constituindo um caminho adequado para a defesa dos valores paisagísticos e para
um uso sustentável do território.
De acordo com Barbosa (2004), na Gestão da Paisagem é fundamental
reconhecer as diversas matrizes que dão suporte ao conceito de sustentabilidade.
São elas: a eficiência - combater o desperdício da base material do
desenvolvimento; a escala - limite quantitativo ao crescimento econômico e à
pressão que ela exerce sobre os recursos ambientais; a equidade - articular
analiticamente princípios de justiça e ecologia; a auto-suficiência - desvincular as
economias nacionais e sociedades tradicionais dos fluxos do mercado mundial
como estratégia para auto-regulação comunitária das condições de reprodução da
base material e a ética - apropriar socialmente da base material de
desenvolvimento.
Para Oseki e Pellegrino (2000), os desafios do planejamento, do projeto e
da posterior gestão de uma paisagem não são superados tendo-se apenas uma
visão espacial e temporal ampla da área, mas enfrentando as principais questões
sociais e ambientais presentes. Abastecimento de água, drenagem da água,
saneamento básico, sistemas de transporte e circulação de pessoas e
mercadorias, preservação conjunta da biodiversidade. Recursos paisagísticos,
determinantes econômicas, desigualdades sociais, relações sócio-culturais e
comunitárias são fatores essenciais a serem considerados. Para que os planos
atendam adequadamente a estas questões, deve-se contar com uma ampla gama
de conhecimentos técnicos específicos.
Segundo Forman (1986), a partir do modelo conceitual da Ecologia da
paisagem, o projeto de uma alternativa espacial deve contemplar três aspectos:
1. Determinação de padrões indispensáveis, constituídos por quatro
componentes que se constituem em prioridade máxima de um plano, porque
trazem benefícios ecológicos insubstituíveis: manutenção de grandes manchas de
vegetação natural original; corredores suficientemente largos de vegetação
original ao longo dos principais cursos d´água; manutenção do contato entre as
grandes manchas para o fluxo de espécies-chave e manutenção de fragmentos
naturais heterogêneos no meio das áreas construídas.
66
2. Utilização de um modelo de agregação de anexos (áreas periféricas)
constitui-se uma maneira eficaz para harmonizar diferentes usos do solo. Como se
deve compatibilizar usos do solo, mantendo-se ao mesmo tempo corredores e
pequenas manchas naturais através das áreas construídas, bem como a
manutenção de pequenas áreas periféricas anexas de espaços construídos
distribuídas ao longo dos limites principais das manchas e corredores naturais.
3. Definição de pontos estratégicos, aspectos únicos que tendem a ser
pontos de abastecimento e de escoamento especialmente importantes, são
também localizações de significado excepcional e duradouro da paisagem: áreas
com maior riqueza de espécies; grandes nós; interrupções nos principais
corredores; fluxos entre áreas similares; proteção de elementos com alta
sensibilidade a impactos humanos.
Podem ser estabelecidas as seguintes etapas dentro de um processo
global de planejamento: levantamento de dados, estrutura, função e dinâmica da
paisagem; dimensão ambiental da paisagem.
Para Barbosa (2004), há uma dupla responsabilidade no percurso do
planejamento de recursos naturais: de um lado a conservação de belas paisagens
e manutenção de ecossistemas, de outro, a qualificação dos espaços cotidianos.
No capítulo apresentado, no estudo da história do homem e sua relação
com a paisagem natural verificou-se que os problemas ambientais atuais são
reflexos desta intrincada relação. A natureza como recurso econômico serviu à
sociedade capitalista, tendo como base a exploração predatória e como
conseqüência grandes impactos ambientais. Esse dramático contexto produziu
reflexões na sociedade, que hoje se encontra num momento paradigmático para
enfrentar o futuro. Os novos métodos de planejamento territorial estão buscando
na ecologia da paisagem os conceitos para a gestão do território.
No próximo capítulo será apresentada a contextualização sócio ambiental
da Bacia do Ribeirão da Prata. Nesta contextualização serão obtidas informações
sobre as características naturais e históricas da bacia, sobre os dados sócio-
econômicos deste local e sobre os impactos ambientais que ocorrem nesta área.
Para o estudo da paisagem a Bacia do Ribeirão da Prata será dividida em
compartimentos, definidos de acordo com suas características naturais e
antrópicas (baseados nos conceitos da ecologia da paisagem).
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