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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marina Silveira Lopes
Sob a Sombra do Carvalho: a espacialização do imaginário
neodruídico na metrópole paulistana
Mestrado em Ciências da Religião
São Paulo
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marina Silveira Lopes
Sob a Sombra do Carvalho: a espacialização do imaginário
neodruídico na metrópole paulistana
Mestrado em Ciências da Religião
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre em
Ciências da Religião sob a orientação do
Prof.Doutor Silas Guerriero.
São Paulo
2008
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Banca Examinadora
:
_____________________________
_____________________________
_____________________________
Dedicatória
Aos meus pais, irmãos e sobrinhos que
souberam compreender, respeitar e me
alimentar com carinho num momento tão
solitário.
AGRADECIMENTOS
Ao prof. Ênio Brito, o primeiro a me acolher no programa junto com a
Andréia, sempre atenciosa e prestativa.
Ao Leandro Gaffo que pela sua dissertação vislumbrei o veio Geografia
e Religião.
Ao prof. Steven Engler por toda paciência, interesse e amizade, pena ter
regressado tão cedo ao seu país de origem.
Ao casal mais singular que conheci, Camila e Emmanuel, pela
confiança e solidariedade.
Ao meu “velho” amigo Paulo Moraes e aos “novos”, em especial,
Clarissa, Angela, Viviane, Silvia e Paulo, fiéis incentivadores.
Às amigas-irmãs Laura e Soninha pela compreensão da ausência e
pelos telefonemas de cumplicidade.
Ao meu mestre, com carinho, Prof. Silas Guerriero, que não só me
orientou nesse trabalho, como também me conduziu ao mundo da magia, das
reflexões e das mudanças de paradigmas.
À banca examinadora, ao grupo pesquisado, à CAPES, ao Programa de
Ciências da Religião e a PUCSP.
EPÍGRAFE
Cânticos para as divindades da Terra e dos grãos
Presente por presente, dizem as antigas palavras.
Um presente vos trago agora.
Pegue a taça, vire-a para leste e beba um gole.
Segure a taça numa saudação.
Sílfides de Zéfiros, governantes do Ar, peço-vos saber e inspiração,
Vire-se para o sul; dê um gole. Erga a taça:
Dragões de Fogo e Salamandras, governantes do Fogo, peço-vos energia e
mudanças.
Vire-se para oeste; dê um gole e erga a taça:
Ninfas e Ondinas, governantes da Água, peço-vos cura e amor.
Volte-se para o norte; dê um gole. Erga a taça:
Gnomos e Elfos, governantes da Terra, peço-vos prosperidade e sucesso.
Certifique-se de que deixa um pouco de vinho para o pequeno povo.
Coloque a taça no altar. Erga os braços, dizendo:
A todas as divindades da Terra e plantas e animais: o que pedi ao pequeno
povo, peço-vos agora a vós. Dai-me as oportunidades para realizar estes
desejos e a sabedoria para usar as oportunidades. Ajudai-me a saber
distinguir entre egoísmo e verdadeira aspiração. Concedei-me uma vida
equilibrada e florescente. Por isso, atribuo-vos toda a honra.
D.J. Conway, A magia celta
RESUMO
Marina Silveira Lopes
Sob a sombra do carvalho: a espacialização do imaginário neodruídico na
metrópole paulistana
A Nova Era, movimento característico dos centros urbanos e aceito por
grupos com uma intelectualidade efervescente, permitiu a reinvenção do
Paganismo. A metrópole paulistana, cosmopolita e globalizada é palco das
mais variadas vivências neopagãs. O intuito desse trabalho é verificar como os
druidas contemporâneos da BDO/Druidnetwork vivenciam o seu cotidiano e
espacializam, na cidade de São Paulo, uma religiosidade fomentada pelo
imaginário dos antigos celtas. A idéia foi centrada na premissa de que seus
adeptos chegaram ao Neodruidismo via uma farta e intensa produção literária e
cinematográfica do período arturiano que se alastrou no Brasil a partir da
década de 1980. O trabalho de campo e a análise das entrevistas mostraram
que a procura por essa religiosidade não está centrada em tais produções, mas
sim numa necessidade iminente de uma espiritualidade que contemple o ser
humano/natureza e rompa com um caráter institucional das religiões
tradicionais. Na ansiedade por essa reconexão, os druidas contemporâneos
sacralizam a paisagem geográfica adaptando-a às suas necessidades
imediatas e expressando seus desejos em prol do planeta de maneira discreta
e diária. Em espaços físicos, mentais ou virtuais trocam vivências e
aprendizados, com a certeza do porvir de uma sociedade mais justa e
harmoniosa.
Palavras-chave: Nova Era, Neodruidismo, Espacialização, Paisagem
Geográfica.
ABSTRACT
The New Age movement, primarily an urban phenomenon accepted by
groups with an effervescent intellectual stance, made possible the reinvention
of paganism. The cosmopolitan and globalized city of SãoPaulo is home to a
variety of neo-pagan practices. The objective of this study is to verify how one
group of contemporary druids, members of the BDO/Druidnetwork, experience
their daily lives and spacialize a religiosity that is informed by the imaginary of
the ancient Celts. An initial hypothesis was that practitioners initially became
acquainted with Neo-druidism due to the massive spread, since the 1980s in
Brazil, of literary and cinematic works about the Arthurian period. Fieldwork and
analysis of interviews showed that this religious path is not directly related to
such products but rather to an imminent need for a spirituality that
comprehends human being/human nature and that breaks with the institutional
character of traditional religions. Anxious for this reconnection, contemporary
druids sacralize the landscape by adapting it to their immediate needs and
expressing their concern with the natural world daily and discretely. They
exchange experiences and lessons, in physical, mental and virtual spaces,
confident in the emergence of a more just and harmonious society in the future.
Key-words: New Age; Neo-druidism; Spacialization; Landscape.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO......................................................................................................13
CAPÍTULO I: Geografia e Religião: na multiescalaridade do espaço .............19
Introdução ............................................................................................................19
1. Espaço Geográfico e Espaço Religioso: a interatividade humana.............22
1.1. A Ciência Geográfica .................................................................................22
1.1.1. Espaço Geográfico ..........................................................................23
Espacialidade e Espacialização .......................................................25
1.1.2.Território e Territorialidade ...............................................................26
1.1.3. Paisagem Geográfica .......................................................................28
1.2. Geografia Cultural ......................................................................................30
1.2.1. Geografia da Religião.......................................................................32
2. Globalização ...................................................................................................34
2.1. Encontros culturais através da porosidade das fronteiras .........................37
2.2. Os não-lugares...........................................................................................38
3. Os Novos Movimentos Religiosos (NMRs): a pluralidade religiosa na
fragmentação do espaço ....................................................................................40
3.1. A necessidade de re(inventar) tradições ...................................................40
3.2. Por um novo paradigma religioso...............................................................42
3.3. Nova Era: o holismo na paisagem geográfica ............................................47
3.4. Alquimia interior: um processo mágico na Nova Era..................................51
3.4.1. A varinha mágica na modernidade tardia.........................................57
4. O Druidismo Moderno no universo neopagão.............................................59
5. O imaginário como “arquiteto” da realidade ...............................................68
CAPÍTULO II: Espacialidade celta: a expressão das características
culturais no espaço geográfico .........................................................................72
Introdução .............................................................................................................72
1. Celta e Celticidade ..........................................................................................74
1.1. Aspectos geográficos e culturais da etnia celta .........................................74
1.2. Espacialidade: a construção do espaço urbano celta ................................81
1.3. Paleodruidismo ou Druidismo Clássico: de 1000 a.e.c. até 600 e.c...........85
1.3.1. A territorialidade dos paleodruidas...................................................85
1.4. Druidismo: uma religiosidade celta.............................................................88
1.4.1. O Panteão Céltico ............................................................................95
1.4.2. Os Oghams: a escrita sagrada.........................................................99
1.4.3. O Outro Mundo, o Síd ....................................................................100
1.4.4. As Festas Sagradas ......................................................................101
2. Meso e Neodruidismo: as ressignificações druídicas ...............................103
2.1. O Mesodruidismo a partir de 1717 até hoje .............................................103
2.1.1. John Toland e a Druid Order (DO) ................................................105
2.1.2. Henry Hurle e a Ancient Druid Order (ADO) ..................................106
2.1.3. Edward Williams e a Gorsedd Beirdd Ynis Prydain .......................107
2.2. Neodruidismo: 1964 até os dias atuais.....................................................110
2.2.1. Ross Nichols e a Order of Bards, Ovates and Druids (OBOD).......110
2.2.2. Ritos sazonais: a harmonia interior a partir da paisagem
geográfica ......................................................................................112
2.3. Paul Bouchet e o Colégio Druídico da Gália: uma vertente francesa.......116
2.3.1. Cosmogonia, símbolos e ritos .......................................................119
2.3.2. Tríades ...........................................................................................123
2.4. Philip Shallcrass e Emma Restall Orr e a British Druidic Order
(BDO)/ Druid Network..............................................................................124
2.4.1. Etapas dos rituais ...........................................................................125
2.5. Stonehenge: a força mística dos megalitos e círculos líticos ....................127
CAPÍTULO III: O druida contemporâneo: a busca do ideal de
espiritualidade por meio da transmissão do imaginário celta .....................130
Introdução ...........................................................................................................130
1. A celticidade nas metrópoles......................................................................132
1.1. Transposição do imaginário celta para a formação de novas
religiosidades ...........................................................................................132
1.1.1. O legado imaginário dos celtas .....................................................133
1.1.2. Elementos catalisadores para a alquimia interior ..........................136
1.1.3. O Neodruidismo na tropicalidade brasileira ..................................145
2. O Espaço sagrado de acordo com as necessidades imediatas................148
2.1. Ross Nichols na teia druidica...................................................................148
2.1.1. Hera Mágica ..................................................................................148
2.1.2. BDO/Druid Network e seus druidas contemporâneos ...................151
2.2. Clientela “just in time”...............................................................................152
2.3. A vivência da ancestralidade local.. .........................................................155
3. Espaço e paisagem geográfica: o indissociável ao gênero de vida do
druida contemporâneo.. ................................................................................157
3.1. A sacralidade da paisagem urbana.. .......................................................157
3.2. Porosidade da fronteira sagrada: o acesso diário ao Outro Mundo ........163
4. O caminho idílico da “verdade” ..................................................................166
4.1. Filosofia de vida ou religião......................................................................166
4.1.1. O cotidiano deificado ......................................................................168
4.2. Símbolos celtas na cidade de São Paulo.................................................171
4.3. A subjetivação da magia ancestral: uma questão de alteridade.. ............173
4.3.1. O trânsito religioso: propagação do “bem” por meio de um
sincretismo em movimento........................................................................176
4.3.2. Morte: a inseparável companheira .................................................180
4.4. Literatura: a ponte para o Druidismo Moderno........................................182
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................185
REFERÊNCIAS...................................................................................................189
ANEXOS .............................................................................................................215
Mapas
Mapa 1: Reconstrução do mapa mundi de Herodotos – 450 a.e.c. ......................75
Mapa 2: Domínio celta do período haltasiano.......................................................77
Mapa 3: Tribos e migração celta no período lateniano .........................................78
Mapa 4: Regiões culturais gauleses descritas por César em 58-50 a.e.c. ...........80
Mapa 5: Divisão territorial da Gália – atual França – em 56 a.e.c.........................80
Ilustrações
Figura 1: Àrea urbana. Oppidum dos mandúbios - Alésia....................................82
Figura 2: Planta interna do oppidum de Entremont..............................................84
Figura 3: Teixo de 700 anos.................................................................................93
Figura 4: Caldeirão de Gündestrup e suas cenas cotidianas ...............................96
Figura 5: Símbolos do alfabeto ogâmicos ..........................................................100
Figura 6: Sacerdotisa carregando o visco colhido..............................................104
Figura 7: Cerimônia da colheita do visco no solstício de inverno.......................105
Figura 8: Ritual neodruídico no equinócio de primavera em Stonehenge ..........114
Figura 9: O Triban ..............................................................................................120
Figura 10: A Cruz Druídica Revelada.................................................................121
Figura 11: O carvalho na região da Bretanha - França ......................................122
Figura 12: Composição de dólmen e menhir na região da Bretanha –
França. ............................................................................................................. 128
Figura 13:
Druida Romântico............................................................................ 134
Figura 14:
Druida Moderno: Estereótipo atual.................................................. 135
Figura 15: Triskel: sentidos de rotação ..............................................................137
Figura 16: Cruz Celta .........................................................................................137
Figura 17: Dagda, o deus druida........................................................................139
Figura 18: Brigit, deusa dos poetas, dos ferreiros e dos curandeiros.................140
Figura 19: Lug, deus solar e luminoso ...............................................................141
Figura 20: Macha, deusa dos cavalos, das batalhas e da soberania.................142
Figura 21: Oghma, deus da eloqüência, da palavra e da guerra........................143
Figura 22: Morrigan, deusa da guerra, da morte, da soberania, da fertilidade e
do amor ...............................................................................................................144
Figura 23: Ipê Amarelo – Cerrado – Região Centro-Oeste ................................147
Figura 24: Espaço holístico Hera Mágica ..........................................................150
Figura 25: Altar com diversas divindades orientais ...........................................150
13
SOB A SOMBRA DO CARVALHO: a espacialização do imaginário
neodruídico na metrópole paulistana
INTRODUÇÃO
Em função de situações histórico-sociais específicas, o ocultismo moderno
surgiu na Europa em meados do século XIX e permaneceu nos anos correntes.
Entretanto, no século XX, durante a década de 1970 emergiram inúmeros Novos
Movimentos Religiosos, dentre eles aquele que ficou conhecido com Nova Era.
Formado por variações sincréticas de religiões institucionais, do ocultismo europeu
e da orientalização do Ocidente, trouxe, de maneira peculiar, rituais, cerimônias,
comportamentos e visão de mundo totalmente adaptadas ao ethos local.
Dentro de um mosaico de variados tipos de crença, a Nova Era resgatou
religiões pagãs de sociedades arcaicas distantes de nossa historicidade, porém
inculcadas no imaginário. Esse novo movimento religioso teve sucesso nas
grandes metrópoles, onde se concentra uma intelectualidade efervescente e
informatizada. A efervescência e a informatização proporcionaram, aos seus
adeptos reflexões, pensamentos e preocupações em âmbito global.
Da Nova Era advêm o Neopaganismo, que permitiu enxergar esoterismo,
magia e romantismo na literatura da segunda metade do século XX. Procurou em
romances como As Brumas de
Avalon de Marion E.Z.Bradley, o retorno ao mundo
mítico e mágico das fadas e magos. Para muitos, tinha um caráter sedutor e
revolucionário pela cosmovisão que negava a instituicionalidade e dogmatismo
católico.
No meio desse borbulhante sistema de crenças, grupos neopagãos
ressuscitam religiosidades de civilizações que nem sequer conhecíamos. Uma
14
delas é o Neodruidismo ou o Druidismo Moderno. Reinventada a partir das
crenças no gênero de vida da etnia celta.
O estilo de vida do druida moderno não mantém relação com o tempo, o
espaço e a paisagem geográfica dos druidas históricos. Conciliar os ensinamentos
religiosos e suas práticas numa tentativa de buscar sincronismo com o passado é
inviável. Assim, esses novos druidas articulam-se num mundo repaginado pelo
concreto armado e pela verticalização das cidades para celebrar seus rituais. A
situação urbana, mesmo distante de uma paisagem natural, não se tornou
empecilho para as tais práticas. A espacialização dos ensinamentos neodruídicos
flui em qualquer direção e em todos os espaços. Para esses praticantes, todo e
qualquer espaço geográfico é sagrado.
A metrópole deu rosto a esta nova manifestação religiosa. O imaginário
celta somado ao imaginário local formam um dupla sincrética que permite aos
seus adeptos reverenciarem a ancestralidade local entremeando-se às deidades
dos clãs celtas. Essa fórmula esforçou-se em resgatar uma tradição da Europa
pré-cristã para ressignificá-la no espaço urbano da metrópole paulistana.
A geografia cultural pelo recorte da geografia da religião possibilita mostrar
como esses grupos se movimentam e sobrevivem dentro de uma cidade como
São Paulo. No mundo moderno, informatizado e globalizado, não podemos mais
convergir os estudos de qualquer origem sob um único ponto de vista. Por isso é
fundamental que a ciência geográfica interaja com diversos campos científicos
para uma análise mais completa e fidedigna dos fatos.
A paisagem geográfica sofre constantes alterações, ocasionadas pelos
processos endógenos e exógenos, naturais à sua dinâmica. Entretanto, estamos
mais próximos de uma interferência antropogênica perigosa do que poderíamos
prever. Essa interferência gerou uma dissonância entre a evolução do ser humano
e o progresso tecnológico.
De acordo com os neodruidas o planeta funciona como um organismo vivo
que sente esse descompasso entre a evolução do ser humano e o progresso
tecnológico. Para eles, a harmonia primordial poderá ser restabelecida a partir do
15
momento, em que toda a humanidade compreender que faz parte da natureza e
que sem ela o ser humano deixará de existir. Num retorno ao mito de Prometeu,
os neodruidas acreditam que exista o despertar de uma nova consciência na raça
humana. Assim, participam de movimentos ecológicos, mentalizam o bem estar do
planeta e mudam seu comportamento social.
Crêem que somente por meio de uma religiosidade que reconduza a
sacralização da natureza, a humanidade mudará seu destino. De maneira idílica e
fervorosa, os neodruidas pretendem promover a reconexão do homo religiosus à
natureza. Todavia a realidade mundial, não acalanta tal desejo, em função de uma
diversidade religiosa, social e cultural disposta no espaço geográfico.
Com todos os problemas ambientais da atualidade, o ser humano não
desacelerou o processo de destruição e continua modificando,
indiscriminadamente, a paisagem geográfica. Quanto mais avança a tecnologia
para atender às exigências
da modernidade tardia, mais se constata o estrago
generalizado ao meio-ambiente e aos seres vivos.
Os neodruidas como integrantes dos movimentos neopagãos,
conseqüentemente, novaeristas, acreditam que se cada indivíduo fizer a sua
parte, os problemas da humanidade estarão resolvidos. Acreditam de maneira
sincera e otimista no poder dos pequenos atos solidários e solitários. Cultuam e
respeitam a natureza da forma que podem, desde um simples telefonema para
evitar um corte criminoso de uma árvore, regar uma pequena planta no vaso,
instruir as pessoas a não jogarem lixo no chão até mentalizar harmonia universal
são atos presentes, imprescindíveis no seu cotidiano – problemas tipicamente
urbanos.
Tais atos estão impregnados na crença neodruídica de uma hierofania
constante. Logo, é primordial respeitar e preservar todas as coisas existentes na
Terra. Em qualquer situação tudo pode ser transportado para espaço-tempo-
sagrado (ELIADE, 2001, p.85), isolando-se do espaço-tempo-profano. Para isso,
de acordo com os druidas modernos, basta uma mentalização profunda com a
totalidade cósmica.
16
A preocupação dessas novas religiosidades que eclodiram nas metrópoles
deu subsídios para buscar no objeto desse trabalho, a possibilidade de entender
as intersecções entre o mundo celta e o imaginário construído pelo Neodruidismo
ou Druidismo Moderno. No intuito de que seus adeptos atinjam uma
espiritualidade plena e harmônica com a natureza dentro do espaço urbano.
O grupo escolhido foi o da Ordem Druídica Britânica (BDO)/ Druid Network,
ativo na cidade de o Paulo. A pesquisa foi realizada no período de fevereiro de
2006 a novembro de 2006 com praticantes na faixa etária entre 23 e 40 anos. A
abordagem dada foi sob a ótica da geografia da religião, que entrelaça as
manifestações religiosas no espaço geográfico.
O segmento foi escolhido por caracterizar-se como uma típica religiosidade
Nova Era. A Nova Era entrou no Brasil em meados da década de 1980 e com ela
veio o “boom” da religiosidade do “self” (D’ANDREA, 1996, p.92). Foi nesse
contexto que o Neodruidismo surgiu no Brasil. Ele trouxe na sua essência a
mitologia e a religiosidade dos antigos celtas, que tinham uma crença politeísta-
hierofânica pela sacralização da paisagem geográfica, principalmente, bosques e
florestas. No decorrer do trabalho indaga-se de que maneira os adultos
paulistanos despertaram para esse imaginário, via tradição britânica: Como os
druidas contemporâneos se articulam no espaço urbano da cidade de o Paulo?
Como o imaginário celta se manifesta no Neodruidismo brasileiro, no contexto da
BDO/Druid Network? Como os druidas contemporâneos se utilizam de seus
ensinamentos no cotidiano de uma metrópole?
Os questionamentos levantados convergiram para o presente trabalho. O
texto procura verificar a aceitação e transmissão do imaginário neodruídico, pelos
seus adeptos paulistanos. Como também, verificar até que ponto as narrativas
literárias e cinematográficas do mítico Rei Arthur influenciaram nesse processo.
O trabalho procurou mostrar uma dinâmica específica de um NMR Novo
Movimento Religioso - da Nova Era na capital paulista. Ressalta, também, como
esta nova tradição se manifesta na vida de um grupo social. Por meio de material
coletado em campo, verifica-se como esse imaginário se adapta com a mudança
17
do espaço geográfico para a celebração de uma crença neopagã e a mudança do
indivíduo. Busca-se deixar uma ponte para futuras pesquisas, principalmente, na
área de educação, porque o interesse nesses movimentos cresce entre os
adolescentes, em função do grande número de literatura e “games” esotéricos
divulgados e já fazem parte do cotidiano dessa camada da população urbana,
outro intuito é promover a participação da ciência geográfica nas ciências da
religião, como mais uma ferramenta de análise para os fenômenos religiosos.
O desenvolvimento da pesquisa ocorreu por meio de três métodos
diferentes e integrados: pesquisa e revisão bibliográfica e análise de textos
pertinentes ao objeto; pesquisa de campo: cinco entrevistas semi-abertas com
praticantes do Neodruidismo e observação de campo.
A dissertação se divide em três capítulos, independentes, mas interligados.
No Capítulo I: Geografia e Religião: na multiescalaridade do espaço; o foco é o
aporte teórico feito a partir de uma revisão bibliográfica. Nele apresentam-se os
conceitos de geografia, de globalização, de novos movimentos religiosos e de
imaginário. Os conceitos abordados o permeados por discussões de geógrafos,
sociólogos, antropólogos, historiadores e cientistas da religião. A proposta desse
capítulo teórico é oferecer subsídios para a leitura das entrevistas sob a
perspectiva da Geografia e da Religião.
O Capítulo II: Espacialidade Celta: a expressão das características culturais
no espaço geográfico; a diretriz é o modo pelo qual as narrativas, relatos e
documentos arqueológicos contribuíram para a reinvenção de uma tradição celta e
para a expressão, produção e transmissão de um imaginário sobre esse povo. No
texto foram apresentadas três fases para a leitura do Druidismo: paleo, meso e
neo; em acordo com estudiosos do tema e apontados no trabalho de Margot Adler.
O capítulo segundo contribui para a interpretação da realidade dos praticantes
desse grupo que será abordada no capítulo seguinte.
18
O Capítulo III O Druida Contemporâneo: a busca do ideal de
espiritualidade por meio da espacialização do imaginário celta; preocupa-se em
averiguar os fatos a partir da leitura e interpretação das entrevistas previstas.
Reporta-se aos dois capítulos anteriores discutindo a criação de um imaginário
celta, a BDO/Druid Network no Brasil, a Hera Mágica e o mundo virtual como
difusores do Neodruidismo e dos preceitos religiosos dessa tradição reinventada.
19
CAPÍTULO I: GEOGRAFIA E RELIGIÃO: na multiescalaridade do espaço
Introdução
O presente capítulo está estruturado sobre quatro temas principais: a
ciência geográfica, a globalização, os novos movimentos religiosos e o imaginário.
Estes são permeados por conceitos, questões e discussões que, amparadas por
estudos e pesquisas, serão fundamentais para a leitura e a interpretação do
Druidismo Moderno ou Neodruidismo na metrópole paulistana, assunto a ser
desenvolvido no terceiro e último capítulo.
A ciência geográfica será abordada, num primeiro momento, por meio de
uma leitura histórica, partindo da Antigüidade Clássica até o século XIX. Em
seguida, serão apresentadas uma definição dessa ciência e uma breve discussão
dos conceitos fundamentais da geografia, especialmente aqueles empregados
nesta dissertação: espaço geográfico espacialidade e espacialização -, território
e territorialidade e paisagem geográfica.
O conceito de espaço geográfico será definido a partir de Milton Santos.
Para a composição desse espaço geográfico, a espacialidade e espacilização são
processos fundamentais, segundo o geógrafo. Ao conceito de Santos, somam-se
as interpretações dadas por Carlos Moraes e aquelas oriundas da antropologia de
Marcel Mauss.
Foram articulados dois conceitos para a compreensão de paisagem
geográfica. Bertrand contribuiu com sua noção perceptiva e sensorial da paisagem
e Milton Santos com a ênfase na ação antrópica, ou seja, as modificações
causadas pelo seres humanos. Com a era da Tecnologia de Informação, trazida
pela globalização recente, as barreiras sicas dos territórios foram transpostas e
as fronteiras tornaram-se fluidas pelo acesso à internet. Face a essa metamorfose
Rogério Haesbaert atribui junto à nova modalidade territorial, a interpretação da
territorialidade que está ligada a um sentido simbólico e não físico do território.
20
Na seqüência do levantamento dos conceitos, buscou-se discutir a
geografia da religião. Num primeiro momento, como parte da geografia cultural e,
em seguida, com ênfase na necessidade de torná-la uma disciplina autônoma.
Como texto-base, serão utilizados aqueles produzidos por pesquisadores como
Frank Usarski, Zeny Rosendahl e Luiz Roberto Lobato Corrêa
.
A ponte entre a geografia cultural e a religião começa pela definição de
espaço sagrado e espaço profano de Mircea Eliade. Esse conceito se faz
importante nessa dissertação, inclusive pelo fato de ser freqüentemente utilizado
pelo grupo estudado.
O conceito de globalização, ainda que ambíguo, foi formulado neste
trabalho a partir da articulação das idéias de Anthony Giddens e Milton Santos
aliadas à historização de Eustáquio Sene e à percepção analítica de Roger
Bastide. Procurou-se, ainda uma análise à luz da religião – para isso, contribuíram
algumas idéias de Reginaldo Prandi apresentadas no artigo Globalização e
Religião.
Alinhadas à globalização, as fronteiras culturais tornaram-se porosas. Como
uma conseqüência daquilo que Marc Augé denomina supermodernidade, surgiram
os não-lugares que perderam a personalização e a marca identitária imprimindo
uma dinâmica diferente na vida cotidiana.
A efeverscência da globalização e a modernidade tardia também são
temas deste capítulo, que ainda pretende analisar, discutir e conceituar os Novos
Movimentos Religiosos, fenômeno que pode ser compreendido a partir de
algumas dinâmicas, tais como a reinvenção de tradições e a mudança de
paradigma. Esse novo paradigma passa pelo processo de orientalização do
Ocidente, definido por Collin Campbell, e culmina na Nova Era, estudada por Leila
Amaral e por Anthony D’Andrea, outras três referências neste trabalho para a
leitura do fenômeno.
21
Partindo da Nova Era, tece-se um perfil do mundo neopagão e sua
continuidade na história desde o Romantismo. Por fim buscamos diretrizes para a
compreensão do imaginário.
Nessa confluência de conceitos, idéias e discussões alicerçamos nossa
análise do Druidismo Moderno na metrópole paulistana.
22
1. Espaço Geográfico e Espaço Religioso: a interatividade humana
1.1. A Ciência Geográfica
O termo “geografia” remonta à Antiguidade Clássica (séculos VIII a.e.c. a
V e.c)
1
, e vem do grego ge, que significa “terra”, e graphien, cuja tradução é
“descrição”. Originalmente, a geografia pode ser definida, portanto, como a ciência
encarregada da descrição da terra. Muitos pensadores contribuíram para os
estudos geográficos, a exemplo dos historiadores gregos Heródoto e Estrabão,
que descreveram os aspectos naturais e sociais dos lugares por onde passaram
em suas viagens (Moraes, C., 1994, p.16). Estrabão serviu aos romanos em
muitas de suas empreitadas para descrever a geografia dos lugares conquistados.
Em seus relatos mostrou a religiosidade, hábitos e costumes do povo celta da
antiga Gália, atual França. Sua descrição foi importante para a reinterpretação do
Drudismo Moderno.
No final da Idade Média, os maiores esforços da geografia voltaram-se para
os trabalhos cartográficos, que auxiliaram na expansão marítima. Todavia, foi
somente no início do século XIX, com o naturalista e explorador Alexandre Von
Humboldt e o geógrafo Karl Ritter, ambos de origem alemã, que a geografia foi
sistematizada como ciência. A partir de então, predominaram as obras de
pensadores alemães, como Friederich Ratzel que, em Antropogeografia (1882),
difundiu a idéia de que as condições naturais exerciam influência no ser humano,
estabelecendo o determinismo geográfico. De acordo com essa visão, o
desenvolvimento das sociedades era explicável em função das condições dos
espaços dos quais os grupos sociais faziam parte.
No final do século XIX, surgiu a escola francesa, que se opôs ao
determinismo geográfico. Segundo seu principal expoente, Paul Vidal de La
Blache (1956), a superfície terrestre deveria ser estudada a partir da
1
Por tratar-se de um estudo cujo foco é o Neopaganismo, optamos, ao longo do trabalho, usar as siglas a.e.c.
(antes da era comum) e e.c. (era comum) no lugar de a.C. (antes de Cristo) e d.C. (depois de Cristo).
23
regionalização, ou seja, dividida em regiões
2
, como uma paisagem concreta,
objetiva e única. Assim, atribuiu-se à definição de região um caráter possibilitivista,
que percebe a natureza enquanto um conjunto de possibilidades humanas. Em
outras palavras, é de acordo com as necessidades que o ser humano se adapta
ao meio, desenvolve técnicas e costumes que são construídos e transmitidos
socialmente, caracterizando-se num gênero de vida.
Na primeira metade do século XX, a idéia de região foi acentuada e essa
passou a ser entendida em sua relação com a realidade social. Várias definições
de geografia foram, então, criadas. Conti, por exemplo, define a ciência geográfica
como o estudo das relações entre sociedade e natureza e dos arranjos espaciais
que derivam desse processo interativo” (CONTI apud MORAES, P.,2005,p.5).
Junto com uma gama de definições, inúmeros conceitos foram repensados e
novos instituídos. Entre eles, os de, espaço, território e territorialidade e paisagem
geográfica, os quais são norteadores da presente dissertação.
1.1.1. Espaço Geográfico
O ser humano é classificador em sua essência. A necessidade de criar
categorias é fundamental para que ele possa estabelecer uma ordem de
interpretação do mundo real. Uma dessas categorias, junto com tempo, gênero e
grau, é o espaço.
De acordo com Moraes, C. (1994, p.16), o espaço como categoria, além de
ser “destituído de sua existência empírica, seria um dado de toda forma de
conhecimento, não podendo qualificar a especificidade da geografia”. O autor
conclui sua reflexão sobre o espaço alegando que uma análise sistêmica sobre ele
seria improfícua, pois “o espaço pode ser específico do real, com características e
com uma dinâmica própria” (MORAES, C.1994, p.17).
2
Região é uma porção da superfície terrestre que tem certa padronização paisagística, resultante da
interatividade entre os grupos humanos e seu meio ambiente.
24
Um exemplo dessa ordem de interpretação do mundo está na obra
Algumas formas primitivas de classificação (1999), de Marcel Mauss. Ao
descrever as sociedades ditas arcaicas, ele destaca que elas podem ser
compreendidas por seus arranjos espaciais, mediante uma ordem classificatória.
Pelas configurações, os grupos sociais se organizam por meio de uma hierarquia,
divisão de tarefas, responsabilidades e manifestações culturais.
Os arranjos espaciais salientados por Mauss reforçam a definição de Milton
Santos (1997, p.71), para quem o espaço geográfico é indissociável dos seres
humanos, os quais o habitam e o transformam com seus processos tecnológicos.
É simultaneamente forma e função, ações humanas fornecidas pelos objetos
naturais e artificiais. Em outras palavras, é o resultado da união da sociedade com
a paisagem.
No conceito de espaço geográfico mencionado, Santos (1985, p.22)
vislumbra o espaço urbano como um produto social, de ações individuais e
coletivas, erigido sobre o sítio natural ao longo dos tempos. Ele é dinâmico,
desigual, mutável e fragmentado.
Na modernidade tardia, espaço urbano é pulverizado por manifestações
culturais que sempre foram fonte de pesquisas em diversas áreas do
conhecimento, principalmente nas ciências humanas. A religião, como
manifestação cultural
3
, é um agente formador e transformador do espaço
geográfico. Como tal desperta interesse em sua compreensão e difusão nos
rearranjos espaciais. Religião e espaço geográfico são tão uníssonos que, no final
do século XIX, surgiram teorias para o entendimento da universalidade religiosa.
3
Ver BOYER, Pascal. Religion explained: The evolutionary origins of religious thought. 2001. Atualmente,
existem correntes teóricas que atribuem a manifestação religiosa como caráter biológico da raça humana.
25
Uma delas se deu pela ótica geo-espacial da cultura. Trata-se do
difusionismo, ligado à escola histórico-cultural de Viena, que procurou explicar a
presença da religião em todas as sociedades sob três prismas:
a) o que estuda a difusão espacial de cada elemento da cultura
(...); b) o que estuda as áreas culturais com critérios sincrônico-
geográficos globais; c) o que observa as culturas em seu
desenvolvimento diacrônico em suas recíprocas intersecções.
(FILORANO ; PRANDI, 1999, p.62).
Os difusionistas, mesmo evidenciando a espacialização das religiões e da
materialidade cultural dos grupos sociais, nos mais variados momentos,
incorreram numa interpretação histórico-comparativa das religiões e não
conseguiram justificar seu caráter universal. Contudo deixaram patente a
necessidade desse tipo de análise.
Espacialidade e Espacialização
De acordo com Milton Santos (1997) a espacialidade e a espacialização
são processos geográficos que por meio dos movimentos das propriedades
espaciais e das relações sociais viabilizam a produção contínua do espaço
geográfico.
A espacialidade implica num movimento contínuo e estrutural, no qual
uma ação direta do ser humano que constrói e altera um determinado espaço.
Trata-se da “incidência da sociedade sobre um determinado arranjo espacial”
(SANTOS, 1997, p.74). Essa ação resultará em uma espacialização que é objetiva
e funcional, tendo em vista que “espacialização é o momento de inserção territorial
dos processos sociais”. (SANTOS, 1997, p.74).
O espaço geográfico, no sentido da dinâmica que estabelece entre a
natureza e os processos sociais localizados histórica e territorialmente, pode
admitir o surgimento de espacialidades diversas, que para Ramos (2002, p.68) é a
26
conseqüência das várias formas de organização espacial e que coexistem no
mesmo momento histórico. A espacialidade é subjetiva configurando de certa
maneira um arranjo geral do espaço sócio-cultural possuidora de características
que a diferenciam e a qualificam historicamente umas das outras.
É dentro dessa perspectiva que compreendemos a espacialidade religiosa
nos centros urbanos, a qual contribui com a dinâmica de construção e
reconstrução do espaço. Contudo, esse processo é mais perceptível junto às
religiões institucionalizadas, que, por seus templos e símbolos, se constituem em
partes assimiladas no espaço no qual se inserem.
A espacialização é o momento atual e circunstancial que dispõe, no espaço,
dos mais variados elementos a fim de obter efeitos estéticos e perceptivos.
Portanto, quando nos referimos às manifestações religiosas, nos referimos à
maneira como essas estão distribuídas e se utilizam da espacialidade local. Uma
vez realizada, em movimento, a espacialização torna-se fato concreto, difícil de
ser rompida. Como exemplos, podemos citar a comercialização de artigos
religiosos e as peregrinações em espaços sagrados
4
.
1.1.2. Território e Territorialidade
Território e territorialidade se configuram em dois outros importantes
processos geográficos. Desde a Antigüidade, o conceito de território impõe
relações de força entre as civilizações. A extensão territorial era identificada como
um fator de conquista e manutenção do poder. O território é uma parte do espaço
geográfico ou de outros espaços materiais e imateriais. É “o produto de uma
relação desigual de forças, envolvendo o domínio ou controle político-econômico
do espaço e sua apropriação simbólica, ora conjugados e mutuamente reforçados,
ora desconectados e contraditoriamente articulados” HAESBAERT (2002, p.121).
4
No decorrer do trabalho, será utilizado o conceito eliadiano de sagrado.
27
Ao definir território, Haesbaert (2002) trabalha com três dimensões
possíveis: a política, a simbólica e a político-simbólica. A perspectiva política
centra-se nas relações de poder dentro da multidimensionalidade do espaço
geográfico. A simbólica inter-relaciona-se com as experiências vividas entre os
grupos sociais por meio de um processo histórico e de representações culturais. A
última funde as duas perspectivas anteriores, percebendo o território como um
instrumento fundamental nas relações sociais.
As discussões sobre o conceito de território ganharam força em função do
processo de globalização recente. Essa fomentou um novo momento teórico,
segundo o qual o regional, as fronteiras e as linhas territoriais foram diluídos numa
rede imaterial de informações.
A idéia de território ultrapassou os limites físicos demarcados. Da mesma
maneira, Haesbaert (1997) ressalta que
[...] a territorialidade
se
inscreve sempre num campo de poder,
não apenas no sentido da apropriação física, material (através de
fronteiras jurídico-políticas, por exemplo), mas também imaterial,
simbólica, identitária e, por que não dizer, dependendo do grupo
social a que estivemos nos referido, afetiva. (
HAESBAERT,
1997, p.65 -
grifo nosso).
A territorialidade é mais abrangente que o território e a “todo território
corresponde uma territorialidade, mas nem toda territorialidade implica na
existência de um território” (HAESBAERT, 2007, p.7). O território precisa de uma
base material concreta. Ao passo que a territorialidade “pode ser a dimensão
simbólica, o referencial territorial (simbólico) para a construção de um território,
que não obrigatoriamente existe de forma concreta” (HAESBAERT, 2007, p.7).
Num mesmo território são possíveis diversas territorialidades, dependendo
da utilização que é dada por aqueles que detêm a autoridade. Para Sack (1986,
p.219), a territorialidade não tem a finalidade de criar e manter a ordem na
verdade, é uma estratégia para manter o controle e o poder no contexto social e
simbólico no qual está inserida.
28
A territorialidade no campo religioso está relacionada com o sagrado e com
o controle do território. O sagrado é fator determinante para a manutenção da
ordem e do controle numa territorialidade religiosa, que por sua vez significa
[...] o conjunto de práticas desenvolvido por instituições ou grupos
no sentido de controlar um dado território, onde o efeito do poder
do sagrado reflete uma identidade de fé e um sentimento de
propriedade mútuo. (ROSENDAHL, 2005, p.3)
5
.
As territorialidades sagradas são demarcadas em territórios e, para os
grupos que formam os territórios, elas exercem um poder simbólico, que termina
por ser o próprio geossímbolo. Para Bonnemaison o geossímbolo pode ser um
lugar dentro de determinado território. O geossímbolo pode ser definido com um
lugar, um itinerário, uma extensão que, por razões religiosas, políticas ou culturais,
aos olhos de certas pessoas e grupos étnicos assume uma dimensão simbólica
que fortalece em sua identidade” (BONNEMAISON, 2002, p.109).
Os processos geográficos e suas intercorrências são viáveis na construção
do espaço geográfico, pois ele contém uma dada paisagem geográfica que está
diretamente ligada ao gênero de vida do grupo social.
1.1.3. Paisagem Geográfica
Paisagem geográfica, para Santos (1997, p.61), é tudo aquilo que se define
como o domínio do visível. A paisagem não é caracterizada apenas por volumes,
mas também por cores, movimentos, odores, sons e tudo aquilo que pode ser
captado pelos sentidos.
5
Disponível em: www.comciencia.br/reportagens/2005/05/12.shtml. Acesso em: 16 fev. 2006. Território e
territorialidade: Uma perspectiva geográfica para o estudo da religião.
29
Bertrand (1972), por sua vez, lembra que paisagem geográfica não é
[...] a simples adição de elementos geográficos disparatados; é
numa determinada porção de espaço, o resultado da combinação
dinâmica, portanto, instável de elementos físicos, biológicos e
antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros,
fazem da paisagem um conjunto único e indissociável em perfeita
evolução. (BERTRAND, 1972, p.15).
A partir dos dois conceitos expostos, podemos dizer que a paisagem
geográfica é toda aquela combinação mutável que reage dialeticamente com o
espaço e é percebida pelos sentidos.
Essa percepção sensorial tende a acontecer na paisagem urbana, que,
para Carlos (2007) acontece como
[...] um “instantâneo”, registro de um momento determinado,
datado no calendário. Enquanto manifestação formal tende a
revelar uma dimensão necessária da produção espacial: aquela
dimensão do real que cabe intuir. (CARLOS, 2007, p.35).
Toda e qualquer sociedade está inserida numa paisagem geográfica e
interage com ela desde seu surgimento. Essa interatividade com a paisagem é o
resultado de movimentos superficiais e de fundo da sociedade, uma realidade de
funcionamento unitário, um mosaico de relações, de formas, funções e sentidos”
(SANTOS et. al , 1996, p.61).
Para Burkert (1996), a paisagem natural é formada por elementos físicos.
Relevo, hidrografia, vegetação e clima se combinam e recombinam no espaço,
proporcionando perplexidade e reflexão para o ser humano. Não se sabe
exatamente se é a exuberância das florestas, a magnitude das montanhas ou a
força das águas emolduradas num recorte paisagístico que influenciaram e
influenciam os grupos sociais ou se é a percepção única que muda a partir de
determinada sociedade.
30
Longe de uma visão geodeterminista, o fato é que a paisagem sempre
trouxe subsídios para a composição do sagrado. Assim, a religião natural – ou “as
formas básicas de comunicação com o sobrenatural não se desenvolveu num
vazio” (BURKERT, 1996, p.36), mas por meio de um gênero de vida diretamente
ligado a uma paisagem local.
A paisagem não é estática é constantemente alterada e adaptada às
necessidades humanas, devido à espacialização dos processos culturais, a
paisagem natural é encoberta. Os elementos primeiros são disfarçados por
elementos artificiais, os quais são alheios a ela, porém necessários para nossa
espécie. De acordo com Yazigi (2002, p.11) os acontecimentos históricos
associados às intercorrências naturais trouxeram uma infinidade de paisagens
diferentes no tempo e no espaço. Isso requer um constante olhar e uma
interpretação da paisagem geográfica, porque exprime fatos sócio-culturais
relevantes para se entender o momento histórico vivido.
As relações socioeconômicas e culturais existentes na paisagem geográfica
repercutem na espacialidade e na espacialização, compõe novos territórios e
territorialidades no sentido da construção e reconstrução do espaço geográfico,
preocupação central da geografia cultural.
1.2. Geografia Cultural
A geografia cultural teve seu início na Alemanha como um subcampo da
ciência geográfica, voltado à análise da dimensão espacial da cultura. Wagner e
Mikesell (2003) colocam que, a análise elaborada pelo geógrafo cultural, deverá
levar em consideração que qualquer
[...] sinal da ação humana numa paisagem implica uma cultura,
demanda uma história e exige uma interpretação ecológica; a
história de qualquer povo evoca a sua fixação numa paisagem,
seus problemas ecológicos e concomitantes culturais; e o
reconhecimento de uma cultura exige a descoberta de traços que
a mesma deixou na superfície terrestre. A Geografia Cultural é,
em primeiro lugar e sempre, geográfica. (WAGNER; MIKESELL,
2003, p.50).
31
O foco da religião no contexto da geografia cultural é o estudo da “interação
espacial entre uma cultura e seu ambiente terrestre complexo e a situação
espacial entre diferentes culturas” (ROSENDAHL, 2002, p.14). É nesse campo de
interatividade que encontraremos as manifestações religiosas. Descortina-se uma
nova área de estudo – a Geografia da Religião. Esta se preocupará, quando
dentro do referido subcampo, com a interpretação enfática dos elementos
religiosos.
A interatividade espaço-religiosa é analisada sob a ótica do impacto das
práticas religiosas na paisagem geográfica local e os desdobramentos que
derivam dele no campo social, para a demarcação do espaço sagrado e do
espaço profano.
A contraposição entre espaço sagrado e profano é definida por Mircea
Eliade (2001), para quem o sagrado só pode ser visto a partir e em oposição ao
profano, sendo profano aquilo que é comum que não confere significado particular
à vida. Já o sagrado é o que confere significado absoluto, particular e definitivo à
vida. É no espaço sagrado que ocorrem as manifestações hierofânicas, as quais,
segundo Eliade (1998), representam algo do sagrado que é revelado, é ainda,
para ele, o espaço sagrado àquele que ordem ao caos, o próprio axis mundi do
homo religiosus.
Aqui, não nos cabe abordar as mais variadas formas de perceber e analisar
as interfaces do sagrado na modernidade tardia. No entanto, a definição eliadiana
é muito oportuna dentro da geografia da religião brasileira, porque nela está
contida a idéia de fronteiras delimitadas entre o espaço sagrado e o espaço
profano.
Muitas das novas manifestações religiosas deslocam-se no espaço
fragmentado, ultrapassam a materialidade e a imaterialidade desse conceito e
adentram o espaço-mental, o mundo imaginário. Elas interseccionam e redefinem
o espaço-tempo sagrado e profano. Nesse sentido, o espaço urbano torna-se uma
variável importante, que promove facilmente as interesecções e espacializa
32
inúmeras combinações e práticas religiosas, oferecendo percepções diversificadas
da paisagem.
O espaço urbano é mutante e, em sua mudança, contribui para a formação
do gênero de vida urbana. Essa, para Sorre (1952, p.176), envolve as descrições
das combinações técnicas utilizadas e combinadas de acordo com as condições
físico-ambientais juntamente com a análise dos elementos espirituais dos grupos
humanos e leva à referida flexibilidade espacial.
De acordo com Carlos (2007), o estilo de vida urbana requer novas
interpretações das manifestações culturais que afloram no cotidiano,
especialmente no que diz respeito aos sistemas simbólicos, o identitário, o
imaginário e as manifestações religiosas. Nos centros urbanos o distanciamento
entre ser humano e natureza, a automação das relações e as desigualdades
sociais são significativos e deles emergem novas emoções e sentimentos.
“uma reabilitação dos sentidos humanos que nos faz pensar a cidade para além
das formas” (CARLOS, 2007, p.26).
Apesar de as paisagens dispostas nesses espaços urbanos serem
construídas e reconstruídas, num processo autofágico, o sagrado não ficou
esquecido e relegado às imagens primeiras de uma paisagem “natural”. Na
verdade, é desse pulsar das percepções urbanas que emergem novos sistemas
de crenças mais fluidos e etéreos, cujos praticantes aguçam suas percepções e
dão plausibilidade à sacralização de toda a materialidade de fluxos e contrafluxos
que tomam as cidades. São esses os aspectos passíveis de serem analisados
pela geografia da religião.
1.2.1. Geografia da Religião
Segundo Usarski (2007, p.178-181), os primeiros trabalhos alusivos à
geografia da religião cartografaram pontos físico-teológicos de paisagens
geográficas descritas na Bíblia. Durante a Idade Média, as missões cristãs
33
também foram alvo da produção cartográfica, que tinha como objetivo averigüar os
espaços conquistados e obter a mensuração de futuras áreas passíveis de
evangelização. Os trabalhos geográficos com esse intuito foram abandonados na
medida em que as pesquisas tornaram-se independentes em relação aos grupos
religiosos dominantes.
Nas primeiras décadas do século XX, os estudos nessa área
protagonizaram um reducionismo-geodeterminista. Não consideraram a
interatividade entre o espaço transformado e a religião e, sim, apenas as
características físico-ambientais que compunham o espaço religioso. Ainda
segundo Usarski, os conceitos mudaram a partir do momento em que pesquisas
sociais identificaram a manifestação religiosa em diversos campos da sociedade.
Até o início do século XX, a geografia da religião não se caracterizou como
uma disciplina, mas fez-se importante para a análise da espacialidade do campo
religioso. Foi só em meados do século XX que esse campo de pesquisa começou
a contar com uma sistematização acadêmica, graças à contribuição de autores
como Paul Fickler (Grundfragen der religions geographie, 1947), Pierre
Deffontaines (Geográphie et Religions, 1953) e Max Sorre (Rencontres de la
geógraphie et de la sociologie, 1957).
A geografia da religião consolidou-se pela obra Geography of Religions
(1967), do geógrafo cultural americano David E. Sopher. No entanto, foi a
geografia cultural de Carl Sauer (1925) que unificou geografia e religião no campo
brasileiro. Os estudos nesse campo iniciaram-se nos anos 1980, sendo Zeny
Rosendahl e Luiz Roberto Lobato Corrêa os geógrafos pioneiros. Não se pode
deixar de mencionar a escola alemã de geografia da religião analisada por Büttner
(1985) focada em três aspectos: o social, teológico e o religioso-geográfico-
interdisciplinar.
Atualmente, existem lacunas nos estudos entre geografia e religião.
Contudo, importantes pesquisas em língua inglesa como as de Chris Park
(2004), Adrian Ivakhiv (2003) e Kim Knott (2005) além das obras de alguns
34
brasileiros e representantes da escola alemã, que procuram ir além da inexata
confecção cartográfica religiosa.
Os pesquisadores advogam a realização de trabalhos com recortes
paisagísticos com o intuito de chegar a um entendimento do fenômeno religioso
local e de sua articulação no espaço geográfico. Conforme Usarski (2007), eles
buscam, com seus trabalhos, entender as novas configurações espaciais diante
de fluxos migratórios diversos e conseqüentemente sua espacialização religiosa.
O objetivo é compreender como o espaço foi ou é transformado pela religião.
Os estudos em escalas reduzidas são úteis para ilustrar alguns
detalhes dos processos pelos quais a religião se espalha de um
lugar ao outro. Eles mostram quais os tipos de processos de
difusão e de dispersão que estão presentes no trabalho e
sugerem componentes-chaves para compreender as dinâmicas
que os envolvem. (PARKER, 2004, p.17 – tradução nossa)
6
.
No Brasil a extensão territorial, a diversidade paisagística e a pluralidade
étnico-religiosa possibilitam um rico campo de pesquisa a respeito da
interatividade entre o ser humano e o espaço geográfico em suas mais variadas
percepções advindas do processo de globalização recente.
2. Globalização
A globalização, que alguns estudiosos preferem definir como um conjunto
de transformações em termos de política e economia mundial, não é uma
prerrogativa da modernidade tardia. Trata-se de um processo constante na
história. Apesar da alta tecnologia, das facilidades de comunicação e do acesso às
informações serem considerados fatores determinantes da globalização,
6
Cf original: Small scale studies are useful for illustrating some of the detailed processes by which religion
spreads from one place to another. They show what sorts of diffusion and dispersion processes are at work,
and suggest key components of the dynamics involved.
35
paradoxalmente, não se chega a um consenso sobre quando esse processo
começou a integrar a vida dos grupos sociais.
Sene (2007, p.38) destaca que um fenômeno próprio e específico,
intensificado a partir da expansão econômica pós-Segunda Guerra, teria
caracterizado a globalização recente. Ele se refere ao processo contínuo de
mundialização do capital e de formação das economias-mundo
7
, que ocorre
vários séculos. Tal fenômeno, vale destacar, faz parte da atual fase da expansão
capitalista.
O caráter técnico-científico-informacional dado a esse fenômeno após a
década de 1980, segundo Santos et.al (1999), provocou uma aceleração em todos
os setores da vida. Em conseqüência, trouxe novas composições interativas entre
os seres humanos nas relações sociais, políticas, econômicas e culturais.
De acordo com Giddens (2000), mesmo com pessoas contrárias à
globalização e com pessoas a favor dela, o fato é que essa existe e é inevitável.
Apesar da falta de consenso, notam-se lugares em que a individualidade grupal
apoiada no imaginário e na cultura se mantém, embora utilizando recursos
possíveis a partir do mundo globalizado.
Segundo Milton Santos (1996, 2000) pode-se analisar o processo de
globalização recente sob dois aspectos: o político e o tecnológico. Foi a primeira
vez na história que a tecnologia alastrou-se com tanta velocidade pelo mundo, que
desencadeou uma nova ordem político-econômica. Ordem possibilitada pelas
facilidades e rapidez das redes imateriais de informação que encurtaram o tempo
e o espaço. Entretanto, política e técnica se centram nas mãos de grupos
economicamente fortes que as manipulam de acordo com seus interesses.
Enfatizada como inevitável e irreversível, a globalização recente é acolhida por
essa política global.
7
Termo utilizado por Fernand Braudell (1996) e Immanuel Wallerstein (1976) para descreverem os
sucessivos estabelecimentos de sistemas de exploração que se desenvolveram, numa parte do mundo, no
período de conquista e exploração de territórios.
36
A humanidade sofreu mudanças radicais na maneira de interagir com o
espaço geográfico, principalmente no que diz respeito aos aspectos culturais.
Nesse processo globalizante, duas tendências divergentes coexistem. Uma tende
a uma padronização global e outra ao fortalecimento do local. Sob o prisma da
segunda tendência, conforme ele avança, cria-se um “gosto especial” pelo
diferente com ênfase na diversidade, nos contrastes espaciais, paisagísticos e
culturais.
Roger Bastide (2006) delineou essa antinomia entre o processo de
globalização e a generalização da cultura:
[...] esse fenômeno de generalização da modernidade se depara
hoje com outro fenômeno, o de uma reação defensiva contra a
dependência ou assimilação cultural: a busca de identidades
nacionais ou étnicas, o retorno às fontes, a negritude e as
ideologias dos nacionalismos emergentes. (...), que implica na
importação, do Ocidente, dos meios de modernização, desde os
capitais e técnicas até os modelos de crescimento econômico, e o
desejo de diferença, a fim de salvaguardar as originalidades
culturais. BASTIDE (2006, p.201).
Diante dessas mudanças repentinas e diacrônicas, uma religião local pode
passar pelo chamado processo de transnacionalização, quando o local torna-se
global e o global torna-se local. Os processos sociais, políticos, econômicos e
culturais afetam o local e o internacionalizam. Não é à toa, que em diferentes
partes do globo terrestre ocorrem eventos interligados e até mesmo “a menor
agitação local sacode o mundo inteiro” (WHITHEAD, 1997, p. 35).
Nesse painel é viabilizado um malthusianismo religioso
8
, uma vez que a
sociedade está sempre em movimento, atuando na produção do espaço e na
diversidade de ações. Espaço e sociedade estão intimamente conectados e é
nesse sentido que as novas manifestações religiosas também se globalizam.
8
Termo utilizado por Leonildo Silveira Campos da UMESP na palestra: O Brasil vai se tornar um país
pentecostal? Proferida na PUC-SP, em 13.09.2007 sob organização do GREPO Grupo de Pesquisa sobre
Gênero, Religião e Política. O termo nos remete a Teoria Populacional de Malthus, na qual se atribui que a
população cresceria em progressão geométrica (PG) e os meios de subsistência cresceriam em progressão
aritmética (PA).
37
A globalização da religião como resultado contínuo do mathusianismo
religioso encontra-se com a alteração das referências fundamentais. Prandi coloca
que a religião “passa a ser sem fronteira e sem território, sem ser, contudo
universal e única (...)” (PRANDI, 1997, p. 69).
Tal fenômeno refletiu em vários conceitos geográficos, como o de
fronteiras. Agora, elas são físicas ou imateriais. O efeito globalizante também
propiciou uma verdadeira teia de comunicação e troca de informações que
transitam pelas fluidas fronteiras culturais.
2.1. Encontros culturais através da porosidade das fronteiras
Na nova configuração espacial, os fluxos, os contrafluxos, os limites, o
sincretismo e as fronteiras são conceitos que interligam as manifestações e as
identidades culturais. A globalização possibilita a flexibilidade desses conceitos. A
concepção de fluxos forma material à globalização. É por eles que
conseguimos visualizar a mobilidade das coisas, tais como: capital, trabalho,
imagem, transferência de ensinamentos, religiosidades etc.
Para Hannerz (1997), nesse âmbito, os fluxos seguem várias direções. A
cada instante geo-espacial ocorre uma eclosão de fluxos e contrafluxos,
desencadeando processos culturais. Muitas vezes, esses processos parecem
tranqüilos, pois os entrecruzamentos são facilmente absorvidos.
Contudo, para o antropólogo, quando se depara com os limites, o fluxo
encontra uma resistência, isto porque o limite traz a idéia de demarcação. É difícil,
dentro da pluralidade social brasileira, buscar mecanismos de manutenção dos
limites, principalmente no campo religioso. As fronteiras tornaram-se porosas e
fluidas, com espaço para a ação de agentes no manejo da cultura. O ser humano
e a cultura centram-se na questão da mistura e da recombinação cultural, isto é
corroborado pelo mundo globalizado que permite uma troca constante, rápida e
rica das manifestações culturais tanto locais quanto globais.
38
O voraz progresso tecnológico fez com que as fronteiras reais e imaginárias
se modificassem, desaparecessem e possibilitassem a circulação de pessoas de
um lado ao outro. As pessoas mudam de país, interagem nos não-lugares. Ora
elas são locais, ora são globais, criam novos territórios com inúmeras
territorialidades e territorialidades sem territórios, ampliam seus horizontes e
pluralizam as suas atividades pelas técnicas e pelas várias possibilidades de
ações. Dessa forma, o lugar não é mais fixo e o geossímbolo passa a ser móvel
pela simultaneidade do espaço-tempo.
No ambiente globalizado, os territórios se entrelaçaram, as manifestações
culturais principalmente as religiões se sincretizaram e o fazem de maneira
diacrônica. Tal fenômeno sincrético-religioso, de acordo com Stwart e Shaw
(1994, p.3), traz a concepção de que todas as religiões se misturaram no passado
e continuam seguindo um processo interativo de trocas culturais.
O sincretismo e outros conceitos acerca do rearranjo da cultura são
largamente empregados no mundo globalizado, no intuito de interpretar a maneira
pela qual os processos culturais manifestam-se na transnacionalidade dos fatos,
como estão ligados à globalização recente e contrastam com a tradição.
2.2. Os não-lugares
Segundo Auge (1994, p.24), a superabundância espacial é um dos três
excessos possibilitados pela supermodernidade, desencadeada pela
fragmentação de espaços para atender a quantidade de informações, bens,
imagens e trânsito de pessoas. O não-lugar se originou dessa combinação. É uma
oposição à visão antropológica de lugar impressa por Marcel Mauss, na qual a
cultura localizava-se numa situação espaço-temporal e estava embasada na idéia
da totalidade do ser humano, “moderno” ou “arcaico”.
No lugar antropológico de Mauss, as pessoas viviam, celebravam suas
religiões, moravam, sacralizavam a paisagem e fixavam territórios, definindo,
39
assim, as relações, a identidade e a história de um povo. Os não-lugares, por sua
vez, são espaços criados por meio de facilidades tecnológicas. Proporcionam o
encolhimento do planeta e o imediatismo, fenômenos gerados por outros dois
excessos da supermodernidade, que, de acordo com Auge (1994), são: o excesso
factual e a individualização das referências.
Conforme o antropólogo francês, o excesso factual é provocado pela
aceleração dos fatos, pois tudo se tornou “história face à velocidade das
informações. Assim, a categoria tempo deixou de ser um mote organizador do
mundo. Quanto à individualização das referências esta é causada pelo
enfraquecimento do coletivo e pelos rearranjos singulares a partir da relação do
indivíduo com o mundo.
É importante ressaltar que o excesso factual e a individualização fazem dos
não-lugares espaços voláteis de passagem, incapazes de estabelecer elos
identitários, relacionais e históricos. Incapazes de firmar como território o lugar.
Sendo assim, não se firmam como os lugares em que vivemos, celebramos
nossas religiões e fixamos nossas territorialidades. Os não-lugares, na verdade,
são os supermercados, aeroportos, rodoviárias, pontos de ônibus, shopping-
centers, entre outras coisas.
Os transitantes dos não-lugares possuem uma responsabilidade contratual
e sua mobilidade espacial diária é possível por meio da apresentação de um
“símbolo de troca” da supermodernidade, como bilhetes de metrô, de ônibus, e-
tickets, cartões de crédito, de saque, de alimentação e os documentos pessoais.
Trata-se de uma população amorfa, solitária, calada, difusa e contínua que se
alterna a cada segundo.
40
3. Os Novos Movimentos Religiosos (NMRs): a pluralidade religiosa na
fragmentação do espaço
3.1. A necessidade de (re)inventar tradições
Tradição inteiramente pura não existe. Ela se altera e alterna de acordo
com a lenta passagem do tempo e simultaneamente pode sofrer modificações
rápidas que se tornam duradouras. Nesse ínterim, é um equívoco considerar o
“tradicional” como algo que perdura ao longo de muitos séculos. E cabe ao sujeito
da tradição atribuir a ela um conjunto de símbolos e práticas depositárias de certa
sabedoria (Giddens 2000, p. 48-49).
A tradição é um signo completo, cabe a ela conferir um sentido somatório a
um significado. É em si uma criação, que, uma vez criada, torna-se verdade e
atesta uma religião ou um ritual. Imbrica-se oralmente e tem sua manutenção
centrada no imaginário. Segundo Engler (2005), o conceito de tradição é mais
pertinente
[...] quando estes conceitos de tensão são interpretados de uma
maneira normativa: isto é, quando velho/novo, estático/dinâmico e
recebido/inovado alinham-se com o bem/mal, certo/errado e
aceitável/inaceitável. Esta superposição de oposições normativas
e conceituais faz da “tradição” uma ampla e efetiva marca. Ela
tem grandes poderes de legitimação devido a sua identificação
com a autoridade previamente estabelecida. Como resultado, a
manobra de tomar ou segurar esta forte posição (retórica e
ideológica) tem grande valor estratégico, seja para as forças
conservadoras ou reacionárias. (ENGLER, 2005, p.359 - tradução
nossa)
9
.
Os fundamentos da tradição, conservadores ou reacionários, têm sua
transmissão oral e em alguns casos escrita. Mas, segundo Maia (2001), é na
9
Cf. original: “Tradition” gains its purchase and where these conceptual tensions are read normatively: where
old/new, static/dynamic, and received/innovated become aligned with good/bad, right/wrong, and
acceptable/unacceptable. It is this superposition of normative and conceptual polarities that makes “tradition”
such a broad and effective label, with great powers of legitimization due to its identification with previously
established authority. As a result, holding or taking this high ground has great strategic value for both
conservative and reactionary forces
.
41
mensagem que alcançam sua solidificação, apresentando um significado intenso e
didático de uma geração a outra. Dessa forma, pode-se ver a tradição como um
ensinamento transmitido por alguém mais “preparado” (Julia, 2003, p. 84-85).
Fazem parte do núcleo da tradição: os mitos, as lendas, os ritos, costumes etc.
Segundo Hill (2002, p.252-260), a fé é instaurada pela tradição presa ao
passado. Em sua análise do anglicanismo nos séculos XV e XVI, ele mostra que a
leitura da Bíblia somente levaria à se interpretada por um terceiro, capaz de
dominar a tradição. No mesmo livro, Christopher Hill sinaliza o fato de que uma
tradição é mutável principalmente ao interagir com determinados grupos sociais.
A análise de Hill vai ao encontro daquela de Hobsbawm et. al (1984), que
entende por tradição inventada:
[...] um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras
tácitas ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou
simbólica, visam inculcar certos valores e normas de
comportamento através da repetição, o que implica,
automaticamente; uma continuidade em relação ao passado.
Aliás, sempre que possível, tenta-se estabelecer continuidade
com um passado histórico apropriado. (HOBSBAWM et. al, 1984,
p.9).
Todavia, essa continuidade com um passado, apontada pelo historiador,
não é um requisito fundamental da tradição reinventada, pois esta, mais do que
uma continuidade do passado, é uma ressignificação da sabedoria deste. Esta
para Bastide (2006, p.200) se constrói sobre uma necessidade de um determinado
grupo, numa determinada situação.
É a partir da Revolução Industrial que a necessidade de reinventar
tradições se intensifica. Isto porque o ser humano se frente a um desafio nunca
antes enfrentado: ele sai do espaço agrário e migra para o espaço urbano. Essa
passagem faz com que a sociedade se depare com uma nova realidade, na qual
“os deuses e reis do passado eram impotentes diante dos homens de negócios e
das máquinas a vapor do presente” (HOBSBAWM, 1998, p.69).
42
Na decorrência desse processo histórico, a modernidade tardia traz uma
intensa modificação da tradição e conseqüentemente uma invenção progressiva
dos signos religiosos. Para Carvalho (1999), isso implica na
[...] construção progressiva em vez de um mergulho na tradição
– de sistemas sincréticos cada vez mais espiralados, sempre
mutantes, mais caleidoscópicos, que se apóiam numa cultura
religiosa em constante ampliação. Ou seja, devido ao processo de
difusão massiva de informação, se tornou muito mais acessível
aos interessados uma espécie de cultura religiosa universal,
construída a partir de resumos estandardizados das religiões dos
povos do mundo – dos astecas, dos chineses, dos japoneses, dos
indianos, dos gregos etc.(CARVALHO, 1999, p.11).
Nesse contexto, surge a necessidade de reinventar tradições capazes de
dar respostas aos novos desafios da vida. Aparecem então, os novos movimentos
religiosos centrados na reedição da sabedoria do passado.
3.2. Por um novo paradigma religioso
Religião, para Clifford Geertz (1978), é um sistema cultural que se
caracteriza como um:
(1) sistema de símbolos que atua para (2) estabelecer poderosas,
penetrantes e duradouras disposições e motivações nos homens
através da (3) formulação de conceitos de uma ordem da
existência geral e (4) vestindo essas concepções com tal aura de
factualidade que (5) as disposições e motivações parecem
singularmente realistas. (GEERTZ, 1978, p.67).
Atualmente a religião tornou-se global e disponível como fonte de
declaração da identidade coletiva. Deixou de ser o epicentro da distribuição
simbólica e passou, para inúmeras pessoas, a uma nova fase de expressão do
sentir e manifestar a fé. Nesse ínterim, as fronteiras simbólicas do religioso
43
tornaram-se fluidas e terminaram por transitar de um campo religioso a um campo
mágico esotérico (Novaes, 2006). Essa mobilidade acentuou-se com a
globalização recente, que contribuiu para a criação de um contexto onde
convergem “novas” e “velhas” tradições, as quais ampliam os espaços sincréticos.
A ampliação dos espaços sincréticos caracteriza uma nova religião na qual,
segundo Greenfield e Droogers (2003, p.34), um grupo de pessoas divide um
mesmo paradigma transcendental. Esta caracteriza um grupo que busca
resultados religiosos no intuito de dispor de uma visão de mundo onde o local e o
global, o tradicional e o novo, o reflexivo e o prático se integram num caminho que
servirá a fins políticos, econômicos, sociais e ecológicos.
Os grupos que buscam um novo paradigma transcendental são comumente
denominados de Novos Movimentos Religiosos (NMRs). De acordo com Guerriero
(2006), são vistos, em geral, como exóticos e distanciados dos padrões sócio-
culturais vigentes. Contudo, esse autor aponta para o fato de que o caráter de
“novo” é dado pela diferença teológica entre os novos movimentos e as religiões
tradicionais.
Os NMRs configuram-se ou por dissidências das religiões tradicionais, ou
por rompimentos completos dos padrões religiosos instituídos. Nas duas
instâncias, o objetivo é conseguir vias diferentes para chegar à salvação ou
plenitude. Guerriero deixa claro que a maioria desses movimentos tem uma
existência volátil. A partir daí, conclui-se que sua única característica geral é a
mudança.
Uma interessante visão acerca dos NMRs é a de Bryan Wilson citado e
interpretado por Guerriero (2006, p.34). Nessa análise, argumenta que o período
no qual surgiram os NMRs, a despeito de qualquer classificação de ordem
cronológica
10
, se definiam por apresentar posturas de rejeição, condenação ou
separação da sociedade. Procuravam um meio de salvação própria e não a
mudança da sociedade como um todo. Atualmente, esses movimentos, pelo
10
Pesquisadores não chegaram a um consenso para indicar o que pode ser considerado um NMR e quando
tais movimentos tiveram início. Alguns afirmam que surgiram na década de 1930, outros após a Segunda
Guerra Mundial e outros ainda na década de 1960.
44
contrário, não renegam a sociedade mais ampla e se utilizam dela para benefícios
próprios. Guerriero (2006) complementa essa análise a partir da ótica que essas
novas religiões:
[...] passam a se integrar ao ethos do mercado da sociedade
ocidental. A própria religião passa a ser um bem de consumo
que precisa oferecer algum atrativo a clientes potenciais. A
separação radical da sociedade não é mais uma marca
característica. (GUERRIERO, 2006, p.34 - grifo nosso).
A religião passa a ser bem de consumo quando, de acordo com Carvalho
(1999, p.18), deixa de ser herdada e torna-se algo que tem de ser conquistado.
Nessa conquista, a “querela” dos espíritos é a linguagem utilizada para essa
busca, dentro de uma sociedade plural, sincrética e passiva de transformações
sociais. A procura espiritual é sempre intensa, viva, com um imaginário efusivo,
surpreendente e inusitado.
Essa busca inquieta é ponto fundamental para, na década de 1960, surgir
uma movimentação que parte dos NMRs e constrói uma religiosidade difusa,
capaz de trazer uma nova cosmovisão. A concepção de religiosidade é fluida e
“revela menor sistematicidade, podendo atingir o fragmentário e ausência de igreja
central, de hierarquia sacramental definida entre sacerdotes e fiéis”
(D’ANDREA, 2000, p.53).
Essa religiosidade difusa tem como fundamento a negação das instituições
ocidentais e a criação de um novo encanto
11
sobre o mundo. É marcada pela
contracultura, que se colocou em oposição ao Establishment
12
:
O doente é o homem condicionado que conhecemos em nossa
cultura. Sua perda básica é a da própria liberdade. Em função
disso, ele se torna, cada vez mais, um escravo que os hindus
chamam Maya. Maya significa ilusão mágica, arte, jogo. O olho
desperto o vê assim; o adormecido o confunde com o real e
11
Não nos referimos aqui ao conceito de desencantamento do mundo presente na obra A Ética Protestante e o
Espírito do Capitalismo de Max Weber.
12
Palavra de ordem ou jargão da contracultura. Utilizada para designar todo e qualquer elemento pertencente
à cultura ocidental acadêmica e, nos dizeres da época, conservadora.
45
prende-se em sua teia. Nas teias de Maya, o sujeito vive um
estado de alucinação completa, de absoluta confusão mental. Sua
mente conturbada cria uma série interminável de
monstruosidades econômicas, sociais, psicológicas e existenciais.
(MACIEL apud PEREIRA, 1985, p.17).
A cultura jovem das décadas de 1960 e 1970 alegou que toda a sociedade
ocidental estava doente. Numa procura incessante por cura, em oposição às
drogas e a sexualidade liberada, surgiram movimentos religiosos e/ou alternativos
que de acordo com Bastide (2006),
Somente as comunidades religiosas parecem mais sólidas,
porque cimentadas por uma mesma fé e voltadas para um mesmo
fim. Ainda assim, observa-se que essas pequenas comunidades
religiosas só dão realmente certo nos países de modernidade
recente onde, por conseguinte, os modelos de vida comunitários
não foram totalmente destruídos pela urbanização e pela
industrialização. (BASTIDE, 2006, p.208).
A visão de Roger Bastide corrobora, em certa medida, o conceito de
“communitas” de Victor Turner (1974), especialmente quando o autor, ao comentar
sobre as comunidades hippies e a contribuição de Allen Ginsberg, diz: “A
‘communitas’ pertence ao mundo atual; a estrutura está enraigada no passado e
se estende para o futuro pela linguagem, a lei e os costumes” (TURNER, 1974,
p.138).
A criação dessas comunidades religiosas foi influenciada pelo processo de
orientalização do Ocidente que, para Collin Campbell (1997), alterou os valores e
atitudes da sociedade ocidental. O autor mostra que a teodicéia tradicional se
deslocou e cedeu lugar à teodicéia oriental, tendo por resultado a sincretização
entre elas.
Partindo da idéia de que teodicéia é a relação de Deus com o mal e seus
planos para o ser humano, vê-se, na teodicéia semita um Deus transcendente,
preocupado com uma solução para o problema do mal” e com planos para a
humanidade. Ao passo que, na teodicéia oriental, temos o divino imanente, parte
46
integrante do mundo e interno a cada ser humano. Nessa matriz, veremos o
“problema do mal e os planos para humanidade feitos no interior de cada
indivíduo.
De acordo com Campbell, a análise de Weber sobre as teodicéias
fundamenta-se na oposição entre Ocidente e Oriente e em suas características:
predestinação e karma. Ele ainda assinala que, para Weber, a predestinação é o
antônimo do karma.
Predestinação é um conceito fundamental da teologia calvinista, segmento
protestante estudado por Max Weber em seu livro A ética protestante e o espírito
do capitalismo. O que caracteriza uma teodicéia o o conselho eterno de Deus e
o que ele pretende para os seres humanos. Segundo essa concepção, os homens
não foram criados em condições igualitárias assim, uns terão a vida eterna e
outros a danação eterna.
Karma é um termo sânscrito utilizado na religião hindu e designa ação, ato
e trabalho. De acordo com essa visão, o ser humano é responsável pelos seus
atos, os quais implicarão diretamente num karma que denota o caráter, o sucesso,
a classe social, a felicidade e o infortúnio futuro de cada um. O karma é inevitável
e sua lei é a retribuição. Mesmo assim, pode ser resgatado a partir das sucessivas
reencarnações, que permitem a evolução espiritual do ser.
O encontro com a teodicéia oriental trouxe em si a noção de uma divindade
imanente, paradigma fundamental do Monismo, doutrina que propõe a unidade do
todo. Tal concepção se opõe à noção de transcendência, paradigma do dualismo,
que busca a separação entre todas as coisas. O resultado é a busca de uma
compreensão da vida cotidiana. A divindade imanente é parte do mundo e, desse
modo, a imanência está em todas as coisas, incluindo a humanidade.
para Campbell, desde o século XVII, um processo erosivo nas religiões
ocidentais, o qual alude às forças da secularização, razão e ciência. A fisura
aberta por essas forças exógenas foi preenchida pelo caráter monista e imanente
da teodicéia oriental que possibilitou, assim, novos rearranjos espaciais e uma
nova percepção de mundo.
47
Campbell argumenta que a secularização mascara e permite essa
cosmovisão, na qual o próprio Deus judaico-cristão é reinterpretado, tornando-se
um deus pessoal. Essa visão ganhou espaço porque a “proporção das pessoas
prontas para admitir a crença em algum tipo de espírito ou força vital não decaiu
(...) mas, tem, pelo contrário, aumentado levemente nos últimos anos”
(CAMPBELL, 1997, p. 10).
Parte dessas pessoas que procuram uma nova crença vão ao encontro de
uma religiosidade difusa, viável nos centros-urbanos abastados de vasta rede de
informação e troca cultural.
3.3. Nova Era: o holismo na paisagem geográfica
O conceito de orientalização do Ocidente de Collin Campbell é indissociável
às movimentações artísticas e culturais ocorridas durante (ou desde) a década de
1960. A contracultura é o fenômeno que se marca num complexo contexto
histórico, no qual o American way of life, com seu individualismo utilitário e seu
Cristianismo, já não forneciam respostas aos indivíduos.
A contracultura surge, num primeiro momento, como face de resistência e
resposta à sociedade e aos valores que ela impunha. Em seguida, torna-se frágil e
necessita de um refúgio espiritual que se “numa crise religiosa de significado”,
a qual, segundo Bellah (1986) resulta numa “nova consciência religiosa”, que, na
década de 1970, “parecia oferecer um ambiente social estável e um conjunto
coerente de símbolos para aqueles jovens que se encontravam desorientados
pela cultura da droga e pelos movimentos políticos radicais” (BELLAH, 1986,
p.28).
Esse novo conjunto coerente de símbolos caracteriza aquilo que se
convencionou nomear como Nova Era.
48
Conforme a pesquisadora Leila Amaral (1999), o movimento Nova Era
permite
[...] a possibilidade de transformar, estilizar, desarranjar
elementos de tradições existentes e fazer desses elementos
metáforas que expressem performaticamente uma determinada
visão, em destaque em um determinado momento, e segundo
determinados objetivos. (AMARAL, 1999, p.47).
Nessa nova consciência religiosa, imprime-se um novo espírito da época,
que se prefigura pelo individualismo otimista, por uma base ‘cientifica’ e não
‘religiosa’, um autodesenvolvimento, auto-satisfação e, por fim, busca as
recompensas neste mundo, baseado nas supostas profundezas da consciência
humana. o cruzamento heterodoxo entre tradições religiosas e não-religiosas
que enfraquece os laços da tradição ao mesmo tempo em que os reinventa.
Impulsionada pela mídia durante os anos 1980, a Nova Era consolida um
novo estilo de vida nos centros urbanos, protagonizado por grupos sociais médios
e de maior nível escolar, fundamentado na autonomia do sujeito que tem por
objetivo um desenvolvimento espiritual. Neste novo estilo, temos o sincretismo
sem lugar fixo, que é “o esforço de cruzar e juntar domínios inusitados e, assim,
suspender dualidades”, o qual “traz à tona e coloca em debate um sincretismo de
novo tipo: um sincretismo em movimento” (AMARAL, 2000, p. 17).
Ao mesmo tempo em que a Nova Era traz em si um sincretismo em
movimento, ela estabelece uma relação paradoxal quando toca a ciência. Isto
porque reivindica seu caráter científico para dar plausibilidade a seu caráter
religioso. Contudo, nega os paradigmas científicos, sobretudo aqueles que
impelem futuros negativos à natureza (Giddens, 2000, p.42). Nesse paradoxo, a
ciência é utilizada, quando há interesse, ora de maneira legitimadora, ora de
maneira negativa, frente à religião e frente ao planeta, respectivamente, o que
resulta de uma forma ou outra, em diversos movimentos ecológicos.
D´Andrea (2000), mesmo ciente da dificuldade em especificar as crenças
dessa religiosidade, as divide em sete categorias conectadas entre si: energia,
49
holismo, relativismo, self-duplo, evolução espiritual, mudança de consciência e
intuição.
Energia é uma categoria-chave para os simpatizantes da Nova Era. Apesar
de conter um leque variado de interpretações e significados, é vivenciada como a
lei-cósmica inerente a todos os seres vivos ou inanimados. Numa perspectiva
concêntrica, partem dela todos os raios de entendimento da cosmologia Nova Era
e é ela quem faz o sustentáculo dessa fé.
A partir da energia, acredita-se que é possível adquirir uma compreensão
holística do universo, que nesta a confluência da totalidade e tudo é um.
Como tudo é um, não existe bem nem mal, logo, encontramos o relativismo, no
qual cada indivíduo cria sua própria moral que deve estar de acordo com o moral
da sociedade. Para o relativista, não existe religião boa ou má. Contudo, o nativo
precisa se preocupar com sua salvação individual e em vida.
O self-duplo é o self sagrado e deificado. Essa união traz a idéia de
centelha divina, segundo a qual todas as coisas são deus, mas nem todos ainda
sabem disso. Trata-se de uma perspectiva que remete tanto à filosofia religiosa
católica quanto ao gnosticismo. Para os gnósticos dos primeiros séculos, a
centelha divina representa as partículas de Deus dentro de cada ser humano e
pode ser atingida (descoberta) a partir da iniciação e da sabedoria. Santo
Agostinho traz em discussão esse conceito nos capítulos dois, três e quatro do
livro primeiro das Confissões, no qual afirma que a centelha divina é a partícula
derramada por Deus sobre cada ser e acessível por meio da conversão.
A consciência do deus interior também tem raízes na teosofia de Blavatsky,
de meados do século de XIX, e tem uma finalidade muito própria:
[...]
a de que o ser humano possui uma centelha divina no seu
interior, a de que todas as tradições místicas e religiosas
conduzem a uma mesma verdade única, embora expressa de
diferentes maneiras segundo as diferentes épocas e culturas em
que se originam, e a de que a crescente consciência da centelha
divina interior do homem conduzirá a uma Nova Era para
humanidade. (CAROZZI, 1999, p. 160).
50
Para os nativos, a evolução espiritual é o processo de melhoria do espírito.
Esta acontece de forma diacrônica e assim o passado influencia
determinantemente o presente e este influenciará determinantemente o futuro. A
influência ocorre a partir da vivência e dos atos cotidianos, que pode ser vista
como uma condição inseparável do ideário de karma, e tem como resultado a
reencarnação.
A mais mística das categorias para a Nova Era é a mudança de
consciência, a qual, segundo D’Andrea, representa a capacidade de chegar à
evolução plena. Um dos métodos para se atingir esse estágio é “parar o
pensamento”. Essencialmente, isso é feito por meio da meditação pela mudança
de consciência, o nativo acredita que chegará à “ordem superior”.
Nesse tipo de religiosidade tem-se a intuição, também chamada de
percepção. Esta carrega o acesso a segredos “cósmicos” por meio da quebra dos
padrões comuns e ordenados. Enquanto isso, os adeptos são estimulados a
desenvolverem capacidades não-intelectuais e sentimentais.
Apesar de D’Andrea definir categorias para a crença na Nova Era, a
concepção é um tanto fluida e indefinível, configurando-se melhor como adjetivo
do que como substantivo. Pode-se dar em combinações variadas, inclusive novas
religiosidades independentemente de seus praticantes.
Mesmo sendo possuidores de certo arcabouço de crenças bastante
embebidas na teosofia, os praticantes Nova Era, em grande parte, não se julgam
homo religiosus. Consideram-se, na verdade, sujeitos de uma filosofia de vida.
Para os nativos, sua religiosidade é desfeita de dogmas ou instituições, é móvel e
possibilita certa errância de lugares.
Essa filosofia pode ser compreendida enquanto busca de conhecimento
para a melhora particular da vida e também como uma procura incessante por
uma “consciência individual ampliada”. Em contrapartida, segundo Carozzi (1999,
p.160), não é meramente individual, tendo em vista que o indivíduo, ao expandir
sua consciência, expandiria a consciência do planeta e do cosmos.
51
Por ser destituída de dogmática e de instituição, o sagrado, segundo essa
filosofia, está em todo lugar. Para sentí-lo, é preciso mentalizá-lo e transformar o
profano em saqrado conforme a necessidade individual. Isso caracteriza aquilo
que Leila Amaral (1999, p.48) chamou de “sincretismo em movimento” e está em
consonância com a descanonização da paisagem na relação entre lugar e
essência. A paisagem é descanonizada na medida em que pode ser sacralizada e
resacralizada a todo o momento. Assim, fica configurado um dos parâmetros
centrais do estilo Nova Era de vivenciar o sagrado.
Essa religiosidade tornou-se notória a partir de propagandas pessoais.
Além disso, recebeu uma forte contribuição das redes imateriais de comunicação.
Hoje, por exemplo, é possível encontrar, disponíveis na internet, informações de
variados grupos Nova Era. E o ocultismo difundido a partir das experiências
teosóficas, democratizou-se e todos podem usufruir de seus ensinamentos,
principalmente com relação às práticas mágicas.
3.4. Alquimia interior: um processo mágico da Nova Era
Desde os primórdios, os seres humanos procuraram descobrir o que o
destino lhes reservava. A magia exalada pelos oráculos, profecias, quiromancias e
víceras de animais era vital para saber o amanhã”. Comumente a separação
entre fé e razão é colocada no Iluminismo, mesmo assim os pensadores desse
período não deixaram de se dedicar ao futuro. Conforme o filósofo Ernst Cassirer
(2002), o homem iluminista é aquele que
[...] renuncia sem hesitação ao socorro vindo do alto,
desbravará ele próprio o caminho para alcançar a verdade, não
pensará que possui essa verdade se não a tiver extraído e
provado à suas próprias forças. (CASSIRER, 2002, p.191).
Para o iluminista, a verdade pode, então, ser vista como aquilo que
certamente virá. Desse modo, a magia sempre faz parte da vida do ser humano.
52
Num recorte antropológico, ao fazermos uma análise temporal dos estudos
sobre magia e religião, percebemos que a magia está ligada à religião, à arte ou
até mesmo à ciência, no que diz respeito à manipulação das forças ocultas da
natureza. Para muitos povos denominados arcaicos, esses três aspectos eram
complementares. Entretanto, os primeiros trabalhos realizados sobre magia
resvalam numa linha evolutiva. À magia é conferido um caráter primitivo, pré-
lógico em detrimento a religião e cujo ápice é a ciência. De acordo com essa
concepção, a religião é considerada uma etapa superior que se manifestou em
função da decadência do processo mágico. Já a ciência é entendida como uma
etapa superior à religião, resultante de um processo evolutivo e lógico.
A concepção etnocêntrica européia do século XIX confinou as sociedades
“primitivas” aos atos mágicos. E, as sociedades “civilizadas” eram consideradas
religiosas, a caminho da universalidade científica. Essas últimas, por terem um
pensamento lógico e organizado, utilizavam-se da religião para alcançar o divino e
obter as respostas para os problemas que afligiam seus integrantes. Enquanto as
arcaicas lançavam-se à magia, sempre vivenciada com o intuito de obter a
resolução para os conflitos cotidianos, por meio do manuseio de elementos que
produziriam os efeitos desejados.
Porém, tanto religião quanto magia apresentam caráter utilitário. Ambas
estão presentes na vida dos seres humanos e, cada qual a seu modo, são
utilizadas para a resolução de conflitos. Atualmente, extrapolando os limites das
sociedades “primitivas”, existem nas novas manifestações religiosas que, focadas
no ser humano e em seus conflitos, estão abarrotadas de magia.
A obra Cultura Primitiva, de Tylor (1871), foi uma das primeiras a se
preocupar em formar um conceito sobre magia. Tylor, nos seus estudos sobre
cultura, considerava o animismo
13
como a etapa inicial da religião. Segundo ele,
as sociedades animistas estavam diretamente ligadas às práticas mágicas, isentas
de manifestações religiosas. Ele desenvolveu seu argumento com base no que
denominou de magia simpática, um tipo de magia que apresenta similaridades
13
A fé na alma individual ou anima de todas as coisas e manifestações naturais.
53
entre os artefatos a serem utilizados para a produção do ato mágico e o resultado
a ser adquirido.
Frazer, em O Ramo de Ouro (1982), a exemplo de outros antropólogos
evolucionistas, também discorreu sobre o tema. Apontou para a idéia de que todos
os ritos mágicos eram simpáticos e classificou a magia em dois tipos: a imitativa e
a de contágio
14
. Esses ritos apoiavam-se na similaridade, seja total ou em parte,
entre os elementos manipuláveis e o resultado almejado.
Segundo Frazer (1982, p.34-35), a “simpatia” é a característica necessária
e suficiente para a magia. Logo, a magia simpática está na base da maioria das
superstições. Essa se baseia na associação de idéias por similaridade ou por
contigüidade física ou temporal.
Ainda de acordo com Frazer, na medida em que as sociedades evoluíssem,
a magia daria lugar à religião e a religião à ciência. Ele atentou, também, para o
fato que a magia tem uma atribuição utilitária, prática e imediatista, pois possui um
objetivo e técnicas específicas. Além disso, seu valor utilitário e intencional é
indissociável aos seus solicitantes.
Antropólogos e sociólogos como Lévy-Bruhl, Malinowski, Evans-Pritchard,
Durkheim, Mauss, Levi-Strauss entre outros, deram seqüência aos estudos sobre
magia e formalizaram inúmeros trabalhos nas designadas sociedades primitivas”.
Criticavam o caráter evolucionista impresso por Tylor e Frazer e o pensamento
pré-lógico de Levy-Bruhl, realizavam, assim, pesquisas a partir do ponto de vista
do nativo. Procuravam manter certo relativismo cultural e se distanciavam do
etnocentrismo europeu. Numa projeção funcionalista, o pensamento mágico
sobrevive ao grupo social porque tem sentido e uma função para ele e não porque
está fora de uma lógica “civilizada”.
Em uma palavra, é inevitável que os povos morram quando os
deuses morrem, visto que os deuses nada mais são do que os
povos pensados simbolicamente (...) é preciso que se creia neles,
e que se creia com uma fé, pois que cada um só pode ser forte se
ela é compartilhada por todos. (DURKHEIM, 1977, p.6).
14
Imitativa ou homeopática: semelhante atua sobre semelhante. Contágio: relação entre duas coisas que
tiveram um contato prévio.
54
A definição de magia foi pautada a partir das crenças em forças
sobrenaturais legisladas pelas práticas, ritos e cerimônias. Apesar de impessoal,
repetitiva e manipulável, ela precisa ser avalizada pelo grupo social. Sem a
sociedade como avalista desse ato, ele não atinge o quê Levi-Strauss definiu
como eficácia simbólica em sua obra Pensamento selvagem (1970).
A magia existe se a crença nela também existir. Isso significa que acreditar
que é possível o contato entre os agentes sobrenaturais e o facilitador é decisivo
para a eficácia de um rito mágico. Numa relação dialética, a credibilidade na
magia se por meio dessa figura, que i manipular os artefatos sagrados e
coordenar o ato mágico. Habilidade e conhecimento são imprescindíveis. E,
quanto maior o mistério por parte do mago, maior será seu poder de
encantamento diante da sociedade.
A escolha minuciosa desses artefatos e o preparo do facilitador desvendam
sua iniciação aos mistérios e garantem que ele detém o controle do sobrenatural e
o sucesso do pedido.
O ritual mágico deve ter a credibilidade na resposta e na justiça. Caso o
resultado não seja o esperado, não será por falha do ato mágico, mas por
influência de elementos externos. Logo, a magia não cai em descrédito e mantém
a crença no sistema, por que é sempre avalizada pelo coletivo.
Mauss, em seu Esboço de uma teoria geral da magia (2000), sugere que a
religião tem uma estrutura invocatória que não condiz com o ato mágico. Contudo,
tanto a religião e a magia fazem sentido quando estão inseridas num contexto
social. A crença, o mago, a preparação e o rito mágico que culminam na magia
fazem parte de um sistema social mais amplo cheio de emoções e intenções.
Para Mauss, todo ato mágico está impregnado de mana. Esse termo é
considerado o mais apropriado para definir as inúmeras possibilidades de
manifestação de forças e poderes manipuláveis pelos seres humanos. O mana
está na essência do ato mágico juntamente com a manipulação dos artefatos que
causam um efeito extraordinário.
55
Em uma pluralidade religiosa, como a brasileira, o mana de Mauss tem
inúmeros sinônimos. O “axé” é um deles. Entretanto, para outras religiosidades, o
mana é substituído por vivências, experiências extra-sensoriais, meditações que
visam a transformação interna do ser humano por meio de atitudes e
pensamentos em prol da humanidade.
Num antagonismo, o processo técnico-científico garantiu um espaço
encantado para a magia. Vemos a magia fluir em várias religiosidades que
despertaram no alvorecer da modernidade tardia. Muitos desses processos
mágicos são avalizados pelas descobertas científicas.
Entre as religiosidades que se refrataram nesse contexto, a Nova Era se
destaca pela busca da harmonia e do bem-estar coletivo. O espírito de época se
revela dia após dia no surgimento de espiritualidades que transformam a procura
pelos aprendizados ancestrais no mote para uma sociedade mais justa, íntegra e
com alteridade. Para os nativos dessas religiosidades, o sentimento é perpassado
por uma sensação de pertencimento a uma totalidade cósmica, onde a comunhão
é atravessada por uma única magia: a alquimia interior.
Para as religiosidades ou espiritualidades que compõem o mosaico Nova
Era, a magia é uma transformação interior de cada indivíduo. Além desse
processo alquímico, elas também se lançam ao manuseio de objetos do poder
para que o ato mágico tenha um retorno imediato. Para muitos nativos, a magia
não precisa de um mago ou facilitador para acontecer, o indivíduo é o próprio
provedor dos artefatos mágicos e mediador com as forças da natureza. Seus
praticantes se utilizam da magia sem medo ou receio de perseguições ou
discriminações.
A crença nos efeitos mágicos e adivinhatórios da Nova Era faz parte do
ethos urbano brasileiro. O caráter mágico está no cotidiano de indivíduos que se
afirmam céticos e os efeitos mágicos trazidos pela Nova Era estão emaranhados
em todos os setores de nossa sociedade. Como na literatura de auto-ajuda - vide
o livro O Segredo (2006), um recente fenômeno editorial –, nas “vivências” em
âmbito empresarial, no Feng Shui utilizado em casa ou no trabalho, nas novelas
56
televisivas, no dia-a-dia de cada um ao acender um incenso ou mesmo adquirir
um cristal e na crença na sica quântica na tentativa de dar plausibilidade
científica a todos esses movimentos. Essas novas mentalidades convergiram para
a criação de novas culturas, identidades, territorialidades e linguagens.
Emolduradas pela globalização e pela rapidez da “Era Digital”, organizam-se em
verdadeiras teias que cobrem todo o globo.
O Neodruidismo e a Wicca, inseridos num contexto neopagão dentro da
Nova Era, são exemplos clássicos da manipulação dessa nova maneira de
praticar a magia. Ambos se utilizam do processo alquímico interno e de objetos
sagrados. Para esses praticantes, a magia ou como denominam de alquimia
interna é um processo solitário, difícil e que requer treinamento constante.
Os integrantes dessa nova mentalidade buscam uma perspectiva
de totalidade sobre a vida. A holística, (...) passa a ser um
principio defendido como muito vigor. Procura-se integrar corpo,
mente e espírito num novo nível de consciência, mais elevado.
Para tanto, vão buscar nos conhecimentos místicos antigos e nos
conhecimentos mágicos esotéricos os ingredientes que compõem
agora um novo saber. (GUERRIERO, 2003, p.55).
No caso específico da Wicca, seus seguidores acreditam na magick, termo
cunhado pelo ocultista britânico Aleister Crowley (1875-1947) para diferenciar a
mágica praticada na bruxaria ou no ilusionismo daquelas realizadas nos contextos
paranormal e religioso. A magick é uma ação ou um esforço direcionado para
atender a uma necessidade pessoal de mudança. Seus principais artefatos
mágicos são: sacola mágica, cristais, penas, facas e varinhas.
No Neodruidismo seus praticantes estão voltados para a alquimia interior,
num processo mais introspectivo e direcionado à percepção do “todo”. Também se
utilizam de artefatos sagrados, muitas vezes, somente para potencializar a “magia”
que flui nos ritos e cerimônias, os quais podem ser individuais ou coletivos (um
exemplo são as festas sazonais). Muitos dos chamados objetos de poder são
comuns às duas religiosidades, contudo, destacamos as varinhas mágicas,
presente em várias outras expressões religiosas com forte influência simbólica.
57
3.4.1. A varinha mágica na modernidade tardia
Magos, druidas, feiticeiros, profetisas e adivinhos, que outrora se utilizaram
da varinha mágica para potencializar suas previsões e curas, foram substituídos
por futurólogos. É o caso dos poetas cientificistas que, por meio dos
rastreamentos de satélites e leituras das cartas sinópticas, são capazes de prever
chuvas, estiagens, maremotos, furacões, tufões, ciclones, tsunamis,
desmatamentos, aquecimento global, nascimento e morte de estrelas. Ainda
prevêem o comportamento dos seres humanos, utilizando índices como: taxas de
natalidade, taxas de fecundidade, índice de desenvolvimento humano (IDH),
crescimento vegetativo e índices econômicos. Adequam suas previsões
meteorológicas e matemáticas à noção de progresso, para advertir acerca do
futuro da humanidade, que, segundo Bastide (2006),
[...] às vezes se diz que é impossível de ter o Progresso. Não sei
se podemos sequer refreá-lo. Auguste Comte tentou outrora,
quando pedia ao Poder Espiritual que controlasse as invenções
humanas, que censurasse, proibisse as que pudessem oferecer
algum perigo à humanidade. Inutilmente, pois os cientistas de
época fizeram pouco caso dele. Mas não podemos refreá-lo,
podemos ao menos orientá-lo para que seja colocado a serviço
dos homens, da totalidade dos homens, e não deixar que evolua
de acordo com a sua própria dinâmica interna. (BASTIDE, 2006,
p.216).
Apesar dos atos futuristas estarem repletos de cientificidade, a varinha
mágica ainda desperta o fervor dos magos esotéricos, nativos das religiosidades
Nova Era. É certo que seu código de significação foi reduzido pela indústria da
informação e ela passou a ser utilizada em livros, filmes, programas humorísticos
e comerciais de televisão, perdeu seu valor simbólico e tornou-se receptáculo e
emissor de atributos muitas vezes jocosos ou pejorativos. Por outro lado, a varinha
ainda é um importante objeto de poder dentro do mundo mágico-esotérico Nova
Era.
58
De acordo com Chevalier e Gherbrant (2005, p.930), a vara ou bastão
simboliza a clarividência e o poder. Estes podem ser oriundos de Deus, do poder,
da magia ou do demônio. Nessa lista de origem da clarividência e do poder, cada
personagem mágico terá sua vara em consonância com a sua função. Por
exemplo, a feiticeira e o bruxo recebem a vara do mal da mesma maneira que
ocorre com o bastão do adivinho:
Sem uma vara encantatória, o adivinho não pode traçar o círculo
no chão dentro do qual se encerra a fim de evocar os espíritos;
ou, no céu, traçar o quadrado dentro do qual estarão contidos os
pássaros cujo vôo interpretará. (CHEVALIER ; GHERBRANT,
2005, p.930).
Na religiosidade Nova Era, a varinha mágica é um objeto ritualístico, muito
usado em procedimentos de cura. Como por exemplo, o caduceu, símbolo da
medicina, nada mais é se não “uma vara mágica composta de uma vareta em
torno da qual se enroscam duas serpentes” (CHEVALIER ; GHERBRANT, p.931).
Seu manejo e uso requerem prática e talento do mago, bem como uma
combinação de palavras e encantamentos corretos. Para a cura efetiva, o usuário
desse instrumento deverá ter a intenção, dedicação, concentração e confiança no
“poder do universo”, representado e simbolizado por esse artefato.
A eficácia simbólica só é garantida pela crença do fiel na intenção que
proporcionará a essência do ato mágico. Para que isso ocorra, o objeto passa ser
uma extensão corpórea do mago, a conexão entre ser e tornar-se.
Incialmente, a varinha estava associada a um galho seco natural. Primeiro
coletava-se alimento com ela. Depois, com o desenvolvimento da caça, esse
objeto transformou-se em arma. Por fim, passou a ser símbolo de autoridade na
medida em que remetia aos cetros dos reis.
O mesmo atributo de poder aparece na cultura celta. Para esse povo, a
vara, além de artefato mágico por excelência, simbolizava o poder dos druidas
sobre os elementos da natureza. E, muitas vezes, era substituída pelo cajado,
59
objeto que simbolizava o poder, a magia e a autoridade em várias religiões da
Antigüidade.
Basta ao druida de Ulster, Sencha, agitar sua vara para obter o
mais completo silêncio de todos os que o rodeiam. Mais
freqüentemente um druida ou um file toca um ser humano com
sua vara para transformá-lo num animal qualquer geralmente num
pássaro (cisne) ou porco (javali) na hierarquia de sete graus dos
filid irlandeses, o doutor ou ollanh tinha direito a vara de ouro, o
file de segunda categoria ou anruth, a vara de prata, os outros
cinco graus a vara de bronze (CHEVALIER ; GHERBRANT, 2005,
p.931).
A confecção de uma varinha não é por acaso. Os materiais, as formas e os
tamanhos são escolhidos de maneira específica, entre madeira, metais e cristais,
de acordo com o que determina a tradição. Hoje, esse instrumento é largamente
utilizado por vários nativos da Nova Era com o objetivo de maximizar seus
trabalhos e tem servido para incrementar as crenças neopagãs.
4. Druidismo Moderno no universo neopagão
No período romântico, emerge o primeiro retorno ao passado não-cristão,
sobretudo em países europeus. Nas Ilhas Britânicas, essa articulação já ocorria no
início do romantismo, quando o poeta William Blake
15
(1757-1827) buscava um
retorno à mística da natureza. Segundo Burgess (1971, p.198-200) foram os
poetas Samuel Coleridge (1772-1834) e William Wordsworth (1770-1850),
responsáveis pelo manifesto romântico, que se dedicaram com maior afinco ao
resgate do paganismo: cada qual defende um modo próprio para realizar tal
resgate. Coleridge prefere a visão misteriosa, mágica e sobrenatural. Wordswoth,
15
Ver mais LISBOA, Emmanuel, G.G. ; LOPES, Marina S. O paganismo no poema ‘O cordeiro’ de William
Blake. Ciberteologia – Revista de Teologia & Cultura. ed. nº 14 - Ano II - Nov/Dez 2007.
60
por sua vez, deseja a volta à natureza e a proximidade com as coisas que se
referem a ela.
A partir desse exemplo, tem-se uma noção de que, no século XIX,
uma forte tendência ao retorno ou revisitação ao mundo pagão. E essa dinâmica
se intensifica com o surgimento de religiões e doutrinas que se alimentam do
ocultismo, também presente em boa parte dos movimentos românticos.
A necessidade de rompimento dos paradigmas, presente no romantismo,
repete-se nos anos 1960 e 1970, período da contracultura. Ambos os movimentos
buscam um individualismo e uma espiritualidade distintos das instituições. Com a
contracultura é possível estabelecer uma nova visão de mundo, a partir de
elementos oriundos do Oriente que permeiam as religiosidades difusas a
despontar nos movimentos de Nova Era. As primeiras comunidades se
organizaram nas Ilhas Britânicas. Uma parte delas volta-se à busca pelo passado
pré-cristão. Aparece, então, o neopaganismo. Favorecidos e impregnados pelos
ares da Nova Era, os grupos neopagãos se propagam com muita facilidade nos
espaços urbanos.
Segundo Jencson (1989), o neopaganismo é um “renascimento” da
adoração e dos rituais consagrados aos deuses, deusas e espíritos pré-cristãos.
Traz um sentido animista ao poder espiritual e uma reverência à natureza. Para
seus seguidores, acima das respostas práticas e imediatas, alcançadas por meio
de exercícios espirituais, está a “habilidade” em adquirir elementos mágicos no
ambiente que os cercam.
Essa proposta de religiosidade estabelece um sistema individual de crenças
baseado na religião do “self” e na reencarnação, articulando-se em torno de idéias
que envolvem atitudes e práticas comuns, tais como a xamânica, a
hiperpercepção, a meditação e a manipulação dos objetos do poder (sacola
mágica, cristais, penas, facas e varinhas). Por estarem intimamente conectados à
natureza, seus integrantes, em geral, são engajados nos movimentos ecológicos
locais e globais. Eles aguçam a percepção e reinterpretam a paisagem cotidiana
por meio das ressignificações mitológicas existentes em imaginários específicos.
61
As ressignificações advêm dos mais diversos territórios mítico-geográficos, como
o dos celtas (Druidismo Moderno e Wicca), dos vikings (Ásatrú Vanatru e
Odinismo), dos eslavos (tradições eslavas), judeus (Judeu-paganismo), além dos
grupos formados a partir de movimentos ecológicos, a exemplo do Eco-paganismo
e da Eco-magia, entre outros que surgem de maneira exponencial em relação ao
número de praticantes.
A Wicca ou a Arte ou a Antiga Religião é um dos grupos neopagãos mais
conhecidos e reconhecidos nas Américas e na Europa. Para seus nativos ou
bruxos
16
, é uma religião centrada no culto de todas as manifestações da Deusa-
Mãe ao longo da história (Diana, Isis, Brigit, Atenas, entre outras). A categoria de
bruxos e o esteriótipo decorrente dela trouxeram uma aura místico-esotérica aos
wiccanos, o que se transformou em um grande atrativo para aqueles que buscam
uma religiosidade diferente e que rompa com uma religião tradicional.
Por séculos, a bruxaria e a feitiçaria nutriram o imaginário do mundo
ocidental. Segundo Nogueira (2004), a definição e a atribuição mágica aos bruxos
e aos feiticeiros é muito tênue e está longe dos historiadores chegarem a um
consenso sobre essa questão. Mesmo assim, ele argumenta que o termo feitiçaria
traz consigo a idéia de:
[...] algo feito, para alguns autores, estando relacionado ao latim
fatum= destino. (...) ligada à magia amatória ou erótica (...) ou,
melhor dizendo, às operações mágicas vinculadas aos desejos e
paixões amorosas, (...) é sua intervenção como envenenadora e
perfumista, atividades estreitamente ligadas a esta personagem
mágica (...) a feitiçaria constituiu essencialmente uma prática
individual, de caráter “urbano”, local privilegiado onde os
problemas humanos, os ódios, as paixões, avolumam-se e
ganham densidade, reclamando a presença de um intermediário
no qual depositam as suas esperanças e desejos. (...) a bruxaria,
prática mágica rural e de caráter coletivo, que assume junto ao
imaginário de uma coletividade uma situação passiva, pois a
opinião pública é mais importante na comprobação de sua
existência que a idéia que faz de si mesma a sua protagonista no
mundo mágico, a bruxa. (NOGUEIRA, 2004, p.42 - grifo nosso).
16
Wicca e Bruxaria são usadas como sinônimos, porém são conceitos diferentes. A confusão se porque
ambos wiccanos e os bruxos da Bruxaria Moderna ou Tradicional - se autodenominam bruxos.
62
Jencson (1989) escreve em seu artigo que os trabalhos de Murray, de certa
maneira, contribuíram para a formação da Wicca. Nos anos 1920, Margaret Alice
Murray, antropóloga e egiptóloga britânica, apresentou uma teoria que apontava a
bruxaria como uma religião antiga, embasada num culto único e centrada numa
deidade feminina Deusa da Natureza e em seu respectivo consorte. Para
Murray, essa religião continuou a ser praticada, sub-repticiamente, por todo o
território europeu, a despeito das fogueiras inquisidoras do período medieval.
Os historiadores e os arqueólogos da época contra-argumentaram,
alegaram não haver provas materiais suficientes, que Margaret apoiara-se em
relatos do folclore regional. Apesar de contestada, essa teoria temperou o
imaginário da magia e dos feitiços e influenciou, no início do século XX, a criação
de novelas e de covens (locais para o encontro de iniciados).
Assim, a sedutora atmosfera pagã soergueu antigos deuses e deusas que
estavam no esquecimento humano, e levou Gerald Gardner a fundar a Wicca, em
1940. No decorrer das décadas, a Wicca se dividiu e multiplicou em várias linhas,
com destaque para a Tradição Garderiana e a Tradição Alexandrina.
Comumente, a Wicca é confundida com o Druidismo Moderno ou
Neodruidismo. Ambos, em grande parte, compõem seus sistemas de crenças nas
ressifignações da antiga religiosidade celta
17
. Suas histórias se entrecruzam pela
amizade e interesses comuns que envolveram Gerald Gardner (1884-1964) e
Ross Nichols (1902-1975), um wiccano e o outro neodruida.
Ross tinha trabalhos publicados no campo esotérico, como a História e a
Prática da Magia. Fontes nativas neodruídicas apontam que Ross ajudou Gardner
a estruturar e redigir o primeiro trabalho sobre o tema: “A Bruxaria Hoje, publicado
em 1954
18
.
Essa proximidade geo-temporal repercutiu no século XXI, tendo em vista
que tanto a Wicca quanto o Neodruidismo apresentam o mesmo panteão,
17
Segundo os celtólogos, religiosidade é a melhor definição para se reportar ao sistema de crenças dos antigos
celtas. Abordaremos o assunto no capítulo II.
18
A Wicca só se tornou pública em 1954, pois a bruxaria ainda era crime até a década de 1950 na Inglaterra.
http://www.bbc.co.uk/history/scottishhistory/modern/oddities_modern.shtml. Acesso em: 10 dez.2007.
63
compartilham inclusive os ritos, as cerimônias e as práticas cotidianas. Entretanto,
um hiato entre as duas tradições, que apresentam territorialidades religiosas
definidas.
Para os neodruidas uma linha do tempo que consolida sua tradição e é
oriunda desde os antigos druidas até hoje. Seus adeptos vêem a Wicca como uma
religião recente, de meados do século XX, criada a partir das múltiplas
combinações feitas por Gardner. Ambos descartam a reinvenção de uma tradição
e reivindicam para si a originalidade e a temporalidade da religião. Por isso, nota-
se um certo desconforto nos nativos neodruidas, quando são confundidos com
wiccanos.
A citação do representante da British Druidic Order (BDO)/Druid Network,
no Brasil, Cláudio Quintino Crow (2007) nos indica a relação entre a Wicca e o
Druidismo Moderno quanto às práticas ritualísticas:
A Wicca usa as mesmas datas, mas não aprofunda a questão da
mitologia originalmente associada a essas datas por valer-se de
uma mitologia própria. Os festivais celtas podem ser
compreendidos em diversos níveis - e o Druidismo exige que se
compreendam esses múltiplos significados. O primeiro nível é a
associação do ritual com a estação do ano; o segundo nível diz
respeito ao simbolismo e às associações dos elementos; num
terceiro nível, infelizmente pouco conhecido pela maioria das
pessoas, é preciso compreender as associações mitológicas das
datas - esta compreensão é chave para que se desfrute da real
força desses festivais, que se preservam nas associações de
outras correntes, como a astrologia e o cristianismo. Por fim,
esses conhecimentos todos se fundem na prática de cada
indivíduo, como ponte para a compreensão da relação desse
indivíduo consigo mesmo, com o mundo à sua volta, com os
deuses e assim por diante. (CROW, 2007, informação verbal)
19
.
Apesar de ambas possuírem o mesmo território tico de ressignificação,
para o Druidismo Moderno às diferenças são inúmeras entre as tradições. Para os
nativos neodruidas, além das festividades destacadas na citação acima, outra
que reside na qualidade de energia manipulada por ambos. Para os adeptos do
19
E-mail sobre a Wicca e Neodruidismo de 30 out.2007.
64
Neodruidismo, os wiccanos manipulam uma energia mais obscura e telúrica
20
,
associada à bruxaria, enquanto os eles manipulam uma energia mais leve e clara.
Conforme acrescenta Emma Restall Orr (2002b), líder da British Druidic
Order (BDO)/Druid Network, na Inglaterra:
Talvez o ponto de contraste mais óbvio no espectro do Druidismo
Moderno resida onde às linhas divisórias da tradição e da wicca
se entrelaçam, e onde a tradição se mantém inteiramente à
parte.(...) Deve-se dizer, porém, que, enquanto a wicca é uma
espiritualidade de prática mágica, buscando basicamente o poder
e a energia que criam mudança, o druidismo procura alcançar a
inspiração divina, sabendo que de dentro da awen vem toda
energia requerida para sua expressão (ORR, 2002b, p.56).
Na modernidade tardia, o Druidismo Moderno apareceu nas Ilhas Britânicas
e na Bretanha Francesa. Entre os grupos dessa tradição, todas seguem um
esoterismo e a mística trazida pela Nova Era. Filosofia de vida, centelha divina,
holismo, sacralização da paisagem geográfica, reencarnação e meditação são
conceitos que se atrelaram ao não-lugares, aos espaços pluriescalares e a
profusão de territorialidades. Esse ideário é fundante para o Druidismo Moderno.
Contudo, há uma diferença entre os grupos que se baseiam na vertente britânica e
os grupos que seguiram a vertente francesa.
Os grupos que seguem a vertente inglesa, no Brasil, são despojados com
relação às cerimônias ritualísticas e festivais. Não existe um rigor em usar as
vestes ritualísticas ou ritos de passagens atestado pela coletividade para obter
codnomes iniciáticos. No Brasil, temos, entre as várias correntes britânicas, a The
Order of Bards, Ovates & Druids (OBOD), a Loyal Arthurian Warband, e a British
Druidic Order (BDO)/Druid Network que alegam seguir os ensinamentos do
Druidismo Histórico, cuja veracidade está apoiada em dados históricos,
arqueológicos e interpretações míticas.
20
sica. Magnetismo terrestre; sua ação. Geografia. Influência do solo de uma região sobre os usos,
costumes, caráter, etc. dos habitantes. Qualidade do que é telúrico. OLIVEIRA, Céurio de. Dicionário
Cartográfico, 1983, p. 634.
65
A BDO/Druid Network tem um acesso mais flexível, com uma relação de
clientela e não de membresia com seus praticantes. E foi por essa flexibilidade
que realizamos nossa pesquisa junto a eles. O Druidismo Moderno apresenta
preceitos religiosos ressignificados das tradições celtas das Ilhas Britânicas e da
Bretanha Francesa. Para eles, toda e qualquer pessoa, independentemente de
crença, etnia e orientação sexual, pode ser um neodruida. Segundo seus
praticantes, seus ensinamentos são direcionados pela conduta, a ética e as
relações entre o grupo.
Para os nativos da BDO/Druid Network, o Neodruidismo é “uma jornada
sagrada de descoberta sobre a beleza e a santidade de toda a vida, física e
espiritual” (ORR, 2002b, p.18). Não existem escrituras sagradas, profetas ou
líderes carismáticos. Para eles, essa “jornada espiritual” busca o momento de
comunhão com a awen.
A awen é a inspiração ou a maneira neodruidica de vivenciar o mana de
Marcel Mauss. Trata-se de um vocábulo de origem galesa que significa “o espírito
que flui”. Segundo Crow (2007, informação verbal)
21
, a awen está no “todo” e é no
“todo” que ela é encontrada, numa perfeita composição. Como inspiração, é o
estímulo que leva às ações. É a sinapse que promove o contato entre um ser e
outro, de espírito para espírito. Para alcançá-la, o neodruída precisa atentar para a
sua percepção na vida cotidiana e deixar fluir o “todo” em cada um de nós. A awen
é reconhecida pela mudança na relação entre o indivíduo e o “todo”, para acessá-
la pode-se ainda recorrer a um mantra em que a própria palavra é pronunciada.
“O druida não vê o Outro Mundo
22
, mas vê este mundo com outros olhos” (CROW,
2007, informação verbal)
23
. Muitas vezes pode-se dar uma sonoridade a essa
awen, ao entoar um mantra.
Egrégora também é um conceito importante para as práticas neodruídicas.
Segundo a definição de Piacentini (2002), o termo egrégora vem do latim gregariu,
21
E-mail sobre a Awen de 08 out.2007.
22
Adotaremos a grafia em maiúscula, face o termo estar grafado dessa maneira em todos os textos que
aludem ao tema.
23
E-mail sobre a Awen de 08 out.2007.
66
aquilo “que faz parte da grei”, quer dizer, de um rebanho ou um conjunto de
pessoas”. Porém, quando reportamos o conceito à espiritualidade, esse designa
um grupo vibracional de energia sutil do qual convergem forças, pensamentos e
vibrações com um propósito ou direcionamento espiritual. No entanto, Crow (2007)
coloca que, dentro do Neodruidismo, esse termo é substituído pela expressão
[...] espírito do local quando se refere a um determinado lugar. A
expressão genius loci foi usada por Gaius Julius Caesar em seus
registros acerca dos celtas da Gália, para designar os locais
sagrados onde os druidas realizavam seus rituais. Por
similaridade, usamos “espírito do grupo”, “espírito do caminho” ou
“ancestrais quando nos referimos à egrégora de um grupo, ou de
uma tradição espiritual ou à memória dos que trilham nosso
caminho antes de nós.
(CROW, 2007, informação verbal)
24
Uma contradição moderna entre pagão do latim paganus - e neopagão
está na idéia de local. Em sua origem, o termo pagão significava “pessoa que vivia
no pagus”, ou seja, “nas áreas rurais”. Longe das cidades cristãs, os pagãos
mantinham seus cultos aos deuses e deusas ligados a terra. Hoje, o neopagão
migrou dos campos para as cidades e convive com uma pluralidade religiosa.
Trouxe a necessidade dos cultos às ancestralidades e a exaltação do espírito do
local. Segundo a der da BDO/Druid Network inglesa, o neodruida é aquele que
reverencia os espíritos e as deidades de seu lugar específico e espacializa sua
crença, pois:
A prática da também é afetada pelo ambiente circundante, uma
vez que os druidas responderão a terra à sua volta, prestando
atenção à suas necessidades e às canções e histórias dos
espíritos que nela vivem. Assim, um druida nascido e criado nas
charnecas de Lancashire terá uma prática diversa de quem
nasceu no calor da Flórida e vive agora em Kent, ou então um
druida do norte de Gales vivendo agora no Japão. (ORR, 2002b,
p.14).
24
E-mail sobre a egrégora druidica de 17 set.2007.
67
A invocação do espírito local implica na sacralização da paisagem local. Os
ensinamentos neodruídicos são extraídos da natureza. “A própria Terra, com as
marés e os ciclos da natureza, constitui a sagrada escritura da tradição é a fonte
de nossa compreensão” (ORR, 2002b, p.17). A natureza que recobria as terras
celtas é revivida miticamente nos rituais neodruidas correlacionando-se com a
natureza local.
Nas tradições neodruidicas o território não tem importância, pois, é
demarcado pela ancestralidade local. As tradições manifestam-se por meio das
territorialidades simbólicas, que vagam no espaço geográfico, que se torna espaço
sagrado e espaço profano numa relação una. Os espaços sagrado-profanos se
misturam na espacialidade dos centros urbanos. O espaço profano, para o
Neodruidismo, segundo uma visão elidiana, alinha-se a atitudes profanas para
com a “natureza” local e global. Profanar o espaço, para os neodruidas, é
desrespeitá-lo como fonte potencial de vida. Nesse sentido, as fronteiras são
fluidas e toda paisagem é passível de sacralização. Num local considerado
profano para outras religiões, os druidas modernos podem consagrá-lo como
sagrado.
Todavia, para o neodruida, os não-lugares fazem parte de um lugar maior
impregnado de sabedoria ancestral e de agentes sobrenaturais. Num não-lugar é
possível invocar os espíritos locais em sinal de ajuda ou de agradecimento,
porque todos os não-lugares estão no planeta.
Na mesma proporção em que o mundo está repleto de não-lugares, o
mundo em si para os neodruídas pode ser um único o-lugar. Isto porque, para
muitos, praticar o Neodruidismo é certeza de estarem de volta para casa, sonho
uníssono dos transitantes dos não-lugares.
68
A sra. Viviane
25
praticante do Druidismo Moderno e uma de nossas
entrevistadas ressalta que:
“Eu o sei como te explicar isso. É uma coisa louca, a primeira
vez que vi uma foto da Irlanda comecei a chorar e não sabia
nada. E minha mãe falava que sempre repetia que tinha saudade
de lá. De estar de volta para casa. O Druidismo, que a gente tem
hoje, que estamos estudando, nada mais é do que junção dos
conhecimentos da maneira que os celtas viviam, de tudo que os
antigos viviam, tipo uma hierarquia, pois os druidas eram um
pouco de tudo: juízes, professores, curandeiros, preservadores da
tradição, mediadores do sagrado. Acho que quem passava a
tradição eram os bardos. É engraçado, eu gosto da Irlanda
independente do Druidismo. O Druidismo é uma ponte para a
Irlanda. Dá para entender?” (grifo nosso).
Os praticantes exibem sua territorialidade; movimentam e ressignificam
suas práticas religiosas na paisagem geográfica em que vivem.
5. O imaginário como “arquiteto” da realidade
De acordo com os apontamentos de François Laplantine e de Liana
Trindade (2003), o imaginário se compõe e se expressa por meio de gêneros com
um fim explicativo. Transpõe a noção de tempo e espaço e passa não a negar,
mas sim a transfigurar e criar a realidade.
A imagem, etimologicamente ligada ao imaginário, não é capaz de criar ou
transfigurar a realidade:
As imagens padronizadas não conseguiram construir, através de
seus recursos simbólicos, qualquer universo do imaginário social
que pudesse superar as antigas narrativas orais, o teatro das ruas
e os rituais sagrados e profanos que fizeram durante séculos da
composição do imaginário social. (LAPLANTINE ; TRINDADE,
2003, p.8).
25
Os nomes dos entrevistados são fictícios. Ressaltamos que esses nomes não são iniciáticos à ordem. Foram
nomes concedidos pela pesquisadora, que se reportou à literatura medieval do período arturiano.
69
Assim, o imaginário é expresso por três maneiras: as narrativas orais e
escritas, o teatro e os rituais sagrados e profanos. As narrativas são originárias de
dois modos: tradição oral e literatura. A primeira inclui todos os relatos
transmitidos por um povo com o intuito de marcar sua história:
A literatura oral (...) reúne todas as manifestações da recreação
popular mantidas pela tradição. (...) entregar, transmitir, passar
adiante, o processo divulgativo do conhecimento popular ágrafo.
(CASCUDO, 1984, p.29).
a literatura, como a arte da escrita, não se imprime no imaginário pelo
valor qualitativo da obra, mas sim pelo alcance possível da mesma.
As peças teatrais, com a incursão dos atores e a visibilidade que dá vida à
história, são também compositoras do imaginário. Um exemplo é a tragédia
Prometeu Acorrentado, de Ésquilo, que conta a saga do filho de um titã que levou
o conhecimento à humanidade, terminando preso no topo de uma montanha e
tendo as ceras devoradas por um abutre. O personagem, que continua
fascinando a humanidade, ainda hoje serve para a compreensão de muitos de
seus males.
Para Laplantine e Trindade (2003, p.15-23) os rituais podem ser vistos
como atos realizados com o intento de reatualizar acontecimentos passados. São
sagrados, aqueles ligados necessariamente aos deuses e profanos aqueles
ligados à vida cotidiana.
O imaginário é produzido por três gêneros: o extraordinário, o maravilhoso e
o fantástico. O extraordinário ultrapassa a ordem estabelecida, cria um mundo fora
da realidade social construída. O maravilhoso, por sua vez, se caracteriza pela
origem do fato distante da realidade social construída que se na expressão. O
fantástico não tem uma explicação, é o sobrenatural propriamente dito (Todorov,
1970, p.147-166).
Os gêneros são transmitidos pelo religioso, simbólico e leigo. No campo
religioso, está o imaginário capaz de explicar o divino. O campo simbólico nomeia
70
e concede qualidades diversas ao mundo. E no âmbito leigo do imaginário é onde
os símbolos se constroem na realização criadora e artística.
Esse processo de expressão, produção e transmissão do imaginário resulta
num imaginário coletivo. “A construção da divindade é realizada no imaginário
coletivo” (LAPLANTINE ; TRINDADE, 2003, p.38). É a partir da criação da
divindade que se chega às explicações do imaginário para o mundo, que são: a
profética, a possessiva e a utópica. Na primeira, anuncia-se o fim do mundo. Na
possessiva, passado, presente e futuro se entrelaçam e, na relação utópica,
haverá um fim, seguido do surgimento de um lugar perfeito para se viver.
O imaginário é, enfim, uma representação que está na mente dos
indivíduos sociais. É fundamental para a realidade, no sentido de que a cria e a
transforma naquilo que é conforme a visão das pessoas.
O imaginário faz parte da representação como tradução mental de
uma realidade exterior percebida, mas apenas ocupa uma fração
do campo da representação à medida que ultrapassa um
processo mental que vai além da representação intelectual ou
cognitiva. (LAPLANTINE; TRINDADE, 2003, p.25).
Composto por imagens mentais geradas a partir de símbolos, iconografias,
pinturas, retratações, desenhos, entre outras, o imaginário tem a capacidade de
criar ou dar forma às coisas. Ocorre por uma via espaço-temporal que proporciona
ao ser humano a construção do real pela imaginação, na qual se imprimem
imagens numa relação dada pela percepção que liga o passado e o presente.
O imaginário se desvincula das imagens originais, improvisa e inventa,
estabelece relações entre os objetos de forma singular. Recompõe, assim, as
imagens com vários arranjos, distanciando-se da essência para dar vazão à
imaginação.
Fiel representante dos NMRs dentro da Nova Era, o Druidismo Moderno
apresenta uma seqüência histórica na reinvenção das tradições. Passou pelo
Paleo, Meso e Neodruidismo. Nelas inseriu-se o papel dos geossímbolos,
71
presentes em toda a paisagem geográfica natural, urbana ou imaginária, que
serão também apropriados pelas novas configurações no exercício desse tipo de
religiosidade.
A tradição neodruídica remontou, ressignificou e sincretizou elementos
celtas numa paisagem local e possibilitou a consolidação de um imaginário rico,
fértil e excitante, que permitiu vivenciar o sagrado nas múltiplas dimensões do
espaço a partir das imagens primeiras de uma civilização que vamos conhecer
agora.
72
CAPÍTULO II: ESPACIALIDADE CELTA: a expressão das características
culturais no espaço geográfico.
Introdução
Neste capítulo averiguar-se-á a forma que as narrativas históricas, acerca
dos celtas, contribuem para a expressão, produção e transmissão do imaginário
na modernidade tardia. Para tanto foi traçado um relato histórico que parte do
conceito de celta e celticidade e culmina nas significações do círculo de pedras
inglês denominado Stonehenge.
A fundamentação histórica busca fontes arqueológicas que tenham se
dedicado aos clãs celtas, como as de Adriana Baron Tacla. Outros estudiosos
dessa cultura contribuem à composição do capítulo, sobretudo: François Le Roux,
Christian-J. Guyonvarc’h e Venceslas Kruta.
O primeiro item busca a história mais antiga dos celtas. Retorna a
nomenclatura grega que definia essa etnia como uma das que habitavam a
Hiperbórea. Resulta, no relato do período de Halsatt, deste, parte-se para o
período de La Téne, no qual aparecem os vestígios da fase druídica definida como
Paleodruídismo pelos pesquisadores atuais.
A parte seguinte demonstra a espacialidade urbana dos celtas, que ocorreu
por meio dos oppida. Os oppida levam à territorialidade dos paleodruidas exercida
diante dos clãs celtas. Das territorialidades é mostrada a religiosidade celta em
acordo com os relatos romanos.
Um achado arqueológico fundamental para a compreensão dos celtas, é o
Caldeirão de Gündestrup, onde estão esculpidas cenas cotidianas da época. Esse
artefato leva a uma projeção do panteão presente nessa parte do capítulo. Outro
ponto importante é a escrita ogâmica.
O primeiro item do capítulo termina no elenco das quatro festas históricas
comemoradas pelos druidas históricos.
O segundo item trata, no início, de um hiato de tempo entre o
Paleodruidismo e o período chamado de Mesodruidismo, no qual foram fundadas
73
as primeiras ordens druídicas por: John Toland (Druid Order), Henry Hurle
(Ancient Druid Order) e por fim Edward Williams ou Iolo Morganwg, que não
fundou nenhuma ordem, mas foi o responsável pela estruturação da teologia
druídica, com início na primeira Gorsedd dos tempos modernos.
Do Mesodruidismo de Iolo prossegue-se ao Neodruidismo de Ross Nichols
fundador da Order of Bards, Ovates and Druids na Inglaterra. Em seguida, volta-se
ao Colégio Druidíco da Gália, centrado nos preceitos do Mesodruidismo de Iolo e
fundado por Paul Bouchet amigo de Nichols. Explica-se um pouco sobre essa
ordem, mesmo que não faça parte do objeto de estudo da dissertação, visto
possuir uma maneira acentuadamente distinta da BDO/Druid Network, objeto de
estudo, e também historiografada neste capítulo.
O capítulo é finalizado com um recorte dado ao monumento de pedra mais
significativo dentro do imaginário celta, o Stonehenge. Mostra como ele foi
ressignificado, e as significações que os estudos científicos imputam ao
monumento.
74
1. Celta e Celticidade
1.1. Aspectos geográficos e culturais da etnia celta
Falamos em “os celtas”, porém, esses povos nunca constituíram um império
unificado. Para Le Roux e Guyonvarch (1993), o único Império Céltico que havia
era o da ngua, da religião e da arte em dissonância com o histórico e o político.
Apesar do fator lingüístico ter sido um dos determinantes, existiram diferenças
culturais e sociais no mundo intracéltico.
No entanto a diversidade étnico-cultural e a mobilidade populacional dentro
do espaço geográfico europeu possibilitaram aos clãs celtas se propagarem em
sua cultura e sua tradição. Foram capazes de ultrapassar as rígidas fronteiras
territoriais do período de dominação romana.
Conforme Le Roux e Guyonvarch (1993) as primeiras menções ao termo
celta são do grego: keltoi. Palavra utilizada pelos helênicos, ao longo do século V
a.e.c, para se reportar às populações bárbaras da Europa temperada, distante do
mundo mediterrâneo, entre os atuais paralelos 40
o
N e 50
o
N.
Para a civilização grega, todos aqueles que ficavam acima das terras
mediterrâneas eram generalizados como hiperbóreos. Os hiperbóreos, para os
gregos, eram um povo mítico que vivia em áreas hiper(=além) e bóreia (=norte) da
Grécia.
75
Conforme mapeado abaixo:
Mapa1 – Reconstrução do Mapa Mundi de Herodotos – 450 a.e.c.
Fonte: www.ancienthistory.about.com. Acesso em: 05 set.2007.
Estudos científicos apontam os celtas como grupos populacionais
heterogêneos de origem indo-européia, que partiram de pontos limítrofes do leste
e do sudeste do continente europeu e ocuparam áreas já habitadas por
populações nativas. Sua classificação como povos indo-europeus deve-se mais à
padronização lingüística do que à geografia. Não existe prova contundente de que
uma civilização indo-européia tenha propagado uma “onda invasora”
intercontinental. Os grupos autóctones incorporados a esse contingente interferiu
de maneira singular no espaço geográfico. Do ponto de vista religioso,
sacralizaram esse espaço de acordo com seus costumes, que foram
sincretizados, pelos invasores.
76
Os celtas se dispunham em diversos clãs espalhados pelo continente
europeu. Esses clãs mantinham um relacionamento entre si, e possuíam como
denominador comum um sistema lingüístico integrado. Num espaço geográfico
com culturas similares os clãs celtas construíram uma sociedade, apesar de não
terem demarcado fronteiras territoriais. Fator, este que contribuiu para a sua
vulnerabilidade à dominação. Mesmo vulneráveis, eles garantiram uma
espacialidade importante para aquele período histórico, tanto que chegaram até as
bordas do continente asiático.
Uma vez que o sistema lingüístico foi ponto central para a união das tribos
celtas, buscou-se na filologia e na aproximação do sistema uma tentativa de
compreender melhor esses grupos sociais. Em toda a história européia antiga, a
língua foi marca de nacionalidade e ir além dessa característica dificultaria a
obtenção de informações precisas, principalmente, pela cultura ter tido uma vasta
distribuição geo-temporal e não ter deixado documentos textuais, somente
fragmentos materiais que foram coletados em vários pontos da Europa.
Autores acreditam que a migração celta, ocorreu no centro geográfico da
Europa durante a Idade do Bronze, final da civilização de Campos de Urna. A
cultura de Campos de Urna surgiu na Europa centro-oriental entre 1200 a 725
a.e.c, e se caracterizou por uma intensa troca cultural que interferiu nos aspectos
materiais, sociais e espirituais das civilizações autóctones.
A migração celta trouxe a tecnologia férrica, e com ela o término do
período. Veio a primeira Idade do Ferro que possibilitou a formação da civilização
halsatiana ou período cultural de Halsatt
26
.
26
Halsatt e La Téne foram sítios arqueológicos epôminos, respectivamente na Áustria, no Salzkammergut, e
na Suíça, junto ao lago de Neuchâtel.
77
Acompanhe no mapa, o processo de ocupação celta no período de Halsatt:
Mapa 2 – Domínio celta do período halsattiano
Fonte:www.members.aol.com/_ht_a/skyelander/celts1.html.
Acesso em: 07 set.2007
Na segunda Idade do ferro nasceu a civilização lateniana ou o período
cultural de La Téne. No início do século IV a.e.c a etnia celta transalpina cruzou os
Alpes e travou guerras sucessivas com o mundo mediterrâneo. Segundo Kruta
(1989, p.2) existiram dois grandes blocos celtas. Os celtas cisalpinos (antes dos
Alpes) e os celtas transalpinos (depois dos Alpes). Entre eles se destacaram os
gauleses (Gália–França) e os gálatas (Galácia–Turquia).
A busca por novas terras resultou na expansão celta. Disto uma vasta e
intensa rede de comércio foi criada e ao mesmo tempo ocorreu a metamorfose do
78
espaço habitado. A nova espacialidade promoveu a passagem da cultura
haltasiana para a cultura lateniana, sem nenhum rompimento cultural marcante. O
período de La Téne foi o apogeu da civilização celta. Vide mapa a seguir:
Mapa 3 – Tribos e migração celta no período lateniano. Séculos V a.e.c ao I a.e.c
Fonte: www.members.aol.com/_ht_a/skyelander/celts2.html. Acesso em: 07 set.2007.
Com os celtas latenianos, o fluxo migratório seguiu para a Península Ibérica
e as Ilhas Britânicas o quê favoreceu a propagação da cultura celta. Todavia,
existem estudos que debatem se essas correntes migratórias ocorreram.
Principalmente em direção às Ilhas de Irlanda e da Grã Bretanha, isto porque os
achados arqueológicos mais recentes mostraram que desde 7.000 anos a.e.c
havia intercâmbio entre as ilhas e o continente.
79
Como complementa Tacla (2006):
A cultura material difere em vários aspectos, mas as evidências
dessas trocas podem explicar as semelhanças culturais, assim, as
transformações culturais não podem ser mais explicadas em
termos de invasões e migrações. (TACLA, 2006, Informação-
verbal)
27
.
Durante a confluência dos períodos culturais, aproximadamente cento e
cinqüenta tribos ocuparam áreas da Europa e Ásia Menor. Quarenta e seis na
Gália, onze na Gália Cisalpina, sete na Europa Central e trinta e três na Península
Ibérica. Na Ásia menor tem-se conhecimento de uma tribo com população
estimada em mais de trinta milhões de pessoas. Essas tribos foram incorporadas
ao Império Romano, entre elas podemos destacar:
Porção continental Gália: quarenta e seis tribos gaulesas que
ocuparam regiões das atuais França, Bélgica, Suíça, Norte da Itália e
Espanha. Dentre elas estão as tribos dos aedui, alobrógios, aquitâneos,
arvenos, belgas, carnutos, cenomanos, eduanos, helvéticos, parísios,
pictos, rédanes, sêmones, séquanos e vênetos.
Porção Insular - Ilha da Grã-Bretanha e de Irlanda: mais de sessenta
tribos que ocuparam as regiões do atual Reino Unido e Eire. Dentre elas
estão as tribos dos bretões, irlandeses, escotos, caledônios e
trinovantes.
Porção continental Ásia Menor: A tribo dos gálatas ocupou o atual
território da Turquia na porção centro-ocidental do planalto de Anatólia.
Os inúmeros clãs compuseram a adjetivação celta a todos os povos da
Antigüidade Clássica que habitavam as terras além do mundo mediterrâneo.
27
TACLA, Adriane Baron. Doutora em Arqueologia Européia pela Universidade de Oxford, 2006. E-mail
sobre a Arqueologia Celta em 31 jul.2006.
80
Os mapas a seguir mostram a dsitribuição étnico-espacial dos clãs celtas:
Mapa 5 – Regiões culturais gauleses descritas
por César em 58-50 a.e.c.
Fonte: www.athenapub.com/gaulbck1.htm
Acesso em: 05 set.2007.
Mapa 4 – Divisão territorial da Gália – atual
França em 56 a.e.c.
Fonte: www.homepage.mac.com/
gravesend_imprint/ gaul.html.
Acesso em: 05 set.2007.
81
As evidências desses campos culturais apareceram em 1846 com a
descoberta dos sítios arqueológicos de Halsatt e posteriormente do de La Téne.
Essa cultura material permitiu uma avaliação de um espaço temporal entre 1200 a
200 a.e.c.. No sítio halsatiano foram encontrados indícios do gênero de vida celta
durante a época de intensos conflitos tribais e pelos problemas enfrentados face à
mudança do eixo econômico que provocou o êxodo de vários grupos étnicos.
1.2. Espacialidade Celta: a construção do espaço urbano
Com as descobertas arqueológicas no mundo europeu, foi possível
identificar, um pouco, as categorias sociais celtas em função de sua
espacialidade. A utilização planejada do espaço, as fortificações, o ambiente rural
e as inúmeras sepulturas trouxeram aos pesquisadores a chance de interpretar
esse gênero de vida que soergueu da proto-história européia.
Segundo Kruta (1989, p.27-29) os celtas proto-históricos preferiram se fixar
em zonas de chapadas ou colinas recortadas por vales e planícies de piemonte
28
,
que eram áreas excelentes para a agricultura e pecuária. Não habitavam extensas
planícies, as altas montanhas ou o litoral recortado do continente europeu. A
ocupação nessas unidades de relevo implicavam na mudança do gênero de vida
celta. Contudo, a paisagem européia sofreu pequenas alterações em função das
variações climáticas que possivelmente interferiram na economia e na
comunicação no período de transição histórica, que proporcionou uma nova
organização do espaço habitado.
A espacialidade dos núcleos urbanos celtas mudava de acordo com suas
funções: estratégica ou comercial. As habitações eram simples e apesar de serem
28
Piemonte: Acumulação de material muito heterogêneo, constituído de blocos, seixos, areias, argilas e limo
que litificado (que se forma em pedra) constitui um fanglomerado (conglomerado de divisão perceptível). Os
depósitos de piemontes se realizam sob um clima temperado e ocupam grande extensão, cujo exemplo
clássico é registrado no norte da Itália, nas encostas meridionais dos Alpes. Não se deve confundir esse tipo
de depósito com os encontrados nas regiões de clima semi-árido. GUERRA, Antonio Teixeira. Dicionário
Geológico-Geomorfológico, 1978, p.330.
82
fontes arqueológicas importantes, seus sítios não são bem explorados se
comparados à exploração das necrópoles, até mesmo pela própria condição
material de cada sítio.
O estudo dos habitats é o complemento indispensável do das necrópoles.
Eles constituem a fonte principal para o conhecimento da economia e evidenciam
mais fielmente o gênero de vida celta, pois o estudo das necrópoles, geralmente
observa apenas o resultado de modos ou influências, a continuidade ou
descontinuidade do povoamento de uma determinada região. (Kruta, 1989, p.35).
Figura 1 - Área Urbana - Oppidum dos mandúbios - Alésia em 52 a.c.e.
Fonte: www.perso.orange.fr/jean-francois.mangin/romains/bataille_alesia . Acesso em
09 set.2007.
83
Contudo as ruínas dos oppida singular oppidum (do latim: lugar
enclausurado) - são preciosas para se entender o dia-a-dia do gênero de vida
celta. Eram habitações fortificadas e agrupadas em planícies ou colinas (hillforts)
que surgiram no período halsatiano e se estendeu ao lateniano no continente
europeu. O achado dessas edificações urbanas trouxe muitas informações
arqueológicas. Os oppida podem ser vistos como um marco no processo de
urbanização do continente europeu.
Kruta (1989, p.33) descreveu que o oppidum era uma fortificação que
consistia em uma muralha de pedras secas de paramento aparelhado com vigas
verticais e horizontais. A muralha era sempre precedida de um grande fosso. A
manifestação mais característica que acompanha a transformação da sociedade
celta é o oppidum. Era situada numa via comercial importante ou na proximidade
de jazidas de matérias-primas de interesse, como o ferro e o ouro. Além das
habitações, havia locais de guarnição militar e centro religioso. Sua configuração
dependia da paisagem geográfica local.
O problema mais complicado é certamente o dos lugares de culto
(...). Cumpre dizer que a atribuição do adjetivo “cultual” a certos
vestígios, sejam eles objetos ou estruturas, foi em dado momento
um modo elegante de mascarar a incapacidade de encontrar
outra explicação.(...) as características arqueológicas dos lugares
de culto célticos começam pouco a pouco a aparecer: santuários
a céu aberto constituídos por recintos quadrangulares, poços de
sacrifícios, nascentes sagradas, mas também templos compostos
de cella rodeada por galeria.(KRUTA, 1989, p.36).
Os oppida eram divididos em várias partes a partir de um núcleo central.
Num dos sítios arqueológicos mais importantes, o oppidum de Bribracte
29
, capital
dos auedi, encontramos a seguinte espacialização: o santuário em local mais
elevado, as residências aristocráticas em platôs e as áreas com cotas mais baixas
29
Localizava-se no Monte Beuvray a 821 metros de altitude, entre as comunas de Nièvre e Saône-ey-Loire,
na atual região de Borgonha. http://fr.wikipedia.org/wiki/Mont_Beuvray. Acesso em: 09 set.2007.
84
destinadas aos artesãos. Pode não ter sido uma regra geral essa ocupação,
porém, é comum, encontrar essa distribuição em outros sítios arqueológicos.
O oppidum Entremont era similar ao de Bribracte e as demais áreas
urbanas da época. Entremont está localizado na região da Provance, atual França.
Esse sítio arqueológico nos permite visualizar como o processo de urbanização
dos oppida era bem complexo.
A figura abaixo apresenta a urbe de Entremont. Destaque para os espaços
sagrados de ritualização.
Figura 2 – Planta interna do oppidum de Entremont
Fonte: www.culture.gouv.fr/culture/arcnat/entremont/en/ Acesso em: 08 set. 2007.
Nota-se pela construção e planta dos oppida que os clãs celtas, também,
professam suas crenças dentro de espaços urbanos, não podemos deixar de
ressaltar que existia uma população extra oppida, que viviam em zonas rurais.
85
O oppidum era o coração do clã. Foi devido a esse planejamento urbano
celta que os romanos conseguiram conquistar a Gália.
Em acordo com o lugar antropológico de Mauss, a espacialidade celta
estava diretamente ligada as suas tradições religiososas, assim, Le Roux e
Guyonvarc’h (1993) ressaltam a dificuldade da civilização celta em defender-se
das investidas romanas:
Os celtas lutaram com aquilo de que dispunham e que, no fundo,
era pouca coisa. Por razões religiosas, não tinham uma
mentalidade preparada para guerra total, onde qualquer
movimento e qualquer decisão é o resultado de um cálculo
estratégico minucioso. (LE ROUX; GUYONVARC’H, 1993, p.70).
Sua tradição religiosa unida ao cotidiano dava total poder ao seu corpo
sarcedotal.
1.3. Paleodruidismo ou Druidismo Clássico: de 1000 a.e.c até 600 e.c
A divisão espaço-temporal proposta por vários estudiosos para Paleo, Meso
e Neodruidismo encontra-se no trabalho de Margot Adler, Drawing Down the
Moon: Witches, Druids, Goddess-Worshippers, and Other Pagans in America
Today (1997).
Nessa proposta presume-se um período de mil anos para o Paleodruidismo,
referindo-se especificamente a religiosidade celta clássica. Não se sabe ao certo
quando os celtas emergiram como uma cultura e quando o Paganismo se rendeu
inteiramente ao Cristianismo.
1.3.1. A territorialidade dos paleodruidas
O conceito de territorialidade veio ao encontro desse trabalho, uma vez que,
uma das categorias hierárquicas mais importantes para determinados clãs celtas,
86
o corpo sacerdotal dos druidas, exerceram uma fundamental influência, a partir do
período lateniano.
As tribos gaulesas, irlandesas, britânicas e galesas eram regidas além de
um rei por esse corpo sarcedotal, cujo mais alto nível hierárquico, supostamente,
era o de druida. Em toda a narrativa romana ficou transparente o poder exercido
pelos druidas, nos clãs gauleses. Lupi (2006) coloca que existiram também
druidas na Ilha da Irlanda e da Grã-Bretanha, contudo, os textos que nortearam a
informação são da Idade Média avançada, inexpressivos e bastante sincretizados.
Houve muitas interpretações literais com relação à palavra druida. Muitas
explicaram que druida derivava-se da palavra carvalho. No entanto, essas
colocações não se atinham em “verificar que carvalho e druida possuíam radicais
diferentes em céltico, respectivamente, deruo e dru-uid (...)
(LE ROUX ;
GUYONVARC’H, 1993, p.107). Na Gália, druidas (no plural) e druis (no singular).
Séculos depois em irlandês, druí, de forma comum dru-uid-es, siginifica: os muitos
sábios ou aqueles que possuem muito conhecimento.
Tanto na Gália quanto nas Ilhas Britânicas, eram eles que detinham a
tradição, o conhecimento ancestral, o direito consuetudinário; na prática e não nas
leis escritas, definiam o calendário e realizavam a mediação com o sagrado e com
os antepassados. Enfim, regulavam a vida político-religiosa. O nome dado aos
“druidas conjuga a sabedoria, o conhecimento e o saber, pela etimologia real e a
força (ou seja, essencialmente, a capacidade de traduzir o seu saber em prática)
pela etimologia simbólica” (LE ROUX; GUYONVARC’H, 1993, p.129).
É difícil a assertiva sobre o significado da palavra druida, que pode
significar carvalho ou sabedoria. Quando nos deparamos com os estudos
filológicos da ngua indo-européia, descobrimos que por meio da etimologia da
palavra druida, surgiram provas irrefutáveis da importância desse corpo de
sacerdotes na manutenção da integridade social e de um sentimento de união
entre as tribos celtas
.
No decorrer da história, notou-se o quanto essa categoria sacerdotal
delimitou e marcou sua territorialidade, uma vez que a concepção de Estado, para
87
os celtas centrava-se “(...) na fidelidade a um homem, a uma família, a um clã, a
uma cidade e não a uma noção de Estado demasiado abstrata (...)” (LE ROUX ;
GUYONVARC’H, 1993, p.64).
Ao traçarmos a territorialidade dos antigos druidas, percebemos que as
fronteiras eram bem delimitadas e rígidas. A língua sagrada falada pelos druidas
deu base para uma territorialidade na qual havia o controle de uma união
lingüística e étnica. Apesar de sofrer uma fragmentação espaço-temporal, esse
idioma, manteve seu significado gráfico intacto e fez o elo entre as tradições
antigas e medievais.
Foi por essa territorialidade marcada pelo poder incontestável dos druidas
que Júlio César, sob o pretexto da barbárie e dos sacrifícios sangrentos que
praticavam mais a idéia de uma benesse missionária, os perseguiu e transformou
esses sacerdotes poderosos em inofensivos curandeiros. Ao minar o poder dos
druidas, o sentimento de união celta também foi desmantelado. Os feitos de
outrora foram enclausurados na memória celta. Esse povo emergiu como galo-
romano. A territorialidade sacerdotal druídica deu lugar à expansão do território do
Império Romano.
Entretanto, segundo Tacla (2006, informação verbal)
30
os estudos
arqueológicos atuais apontam que essa categoria sacerdotal era um tipo de
“profissional” com certa hierarquia e nível de especialização. Por conseguinte,
nenhum desses dados leva a uma definição clara e hierárquica entre as “funções”
do druida. A arqueóloga atenta para a existência de sepulturas com conjuntos de
instrumentos ritualísticos: espetos, facas e machados que permitem a
interpretação de que se trata de um antigo lugar de ritos sacrificiais realizados por
um “especialista”.
Segundo os dados narrados por Júlio César em De Bello Gallico
(58-52 a.e.c.), um homem tornava-se druida, quando passava por um longo
treinamento. Para Tacla (2006) isto leva a uma possível divisão hierárquica entre
aprendizes de acordo com as fases de aprendizado. Existia um druida-chefe que
30
E-mail sobre a Arqueologia Celta de 31 jul.2006.
88
mantinha a coesão entre as tribos celtas. Era eleito durante uma grande
assembléia Gorsedd, na região de Chartres, onde habitavam os carnutos
31
. A
posição de chefia era vitalícia e suprema entre os druidas gauleses.
Categoria semelhante parece ter existido na Bretanha, entretanto, não
evidência material da existência desse sacerdócio na Península Ibérica, Norte da
Itália e Anatólia (Turquia). Geógrafos e historiadores greco-romanos também
fizeram referências a eles, tais como: Estrabão, Diodoro da Sicília, Plínio, o Velho,
Tácito, Amiano Marcelino entre outros, as definições dadas por esses, também os
identificavam como sacerdotes, adivinhos, profetas, juizes, filósofos e sábios.
Estrabão, nas suas descrições geográficas, foi quem categorizou o corpo
sacerdotal celta em druidas, bardos e vates. Afirmou que esse corpo sacerdotal
estava presente em todo o mundo celta e exerciam as seguintes funções: os
druidas eram aqueles que estavam ligados às práticas legais, fisiólogos e
filósofos; os bardos eram os poetas; trovadores, responsáveis por transmitir os
ensinamentos e manter a memória viva da tradição e aos vates eram-lhe
facultadas às adivinhações, profecias e a manipulação de ervas.
São insuficientes as provas materiais acerca das afirmações de Estrabão,
todavia contribuem para uma leitura do Druidismo Histórico.
1.4. Druidismo: uma religiosidade
32
céltica
De acordo com Adriane Baron Tacla, para os estudos das civilizações na
pré e proto-história européia, principalmente nas Ilhas Britânicas e na
Escandinávia usa-se o termo religiosidade e não religião, em função de o sagrado
ter sido indissociável ao cotidiano desses grupos sociais. O termo permite uma
ampla designação das práticas religiosas.
31
Tribo celta que tinha a reputação, entre os romanos, de ser o maior centro político-religioso na Gália.
32
O termo religiosidade utilizado pelos pesquisadores da civilização celta não alude à religiosidade Nova Era.
89
Para essas sociedades as religiões não eram reveladas e muito menos
possuíam algum livro doutrinário. Elas eram regidas pela tradição e
pela experiência do sagrado; o que margem a variações regionais e familiares,
assim:
A ação humana e a prática são o cerne de sua compreensão e,
por conseguinte, de nossa interpretação. Uma análise de macro-
escala nos permite traçar os parâmetros comuns da religiosidade
céltica através da Europa. Porém, os estudos regionais, de micro-
escala, nos mostram a enorme gama de variantes, chamando
nossa atenção para diferentes formas de agir dentro destes
padrões. (TACLA, 2007- Informação verbal)
33
.
O Druidismo, segundo Lupi (2006), parece ser uma religiosidade de origem
gaulesa que migrou para as ilhas da Grã Bretanha e de Irlanda. Nas narrativas
romanas, os gauleses, sempre foram apontados como briguentos, fortes,
guerreiros e impiedosos quanto ao modo de castigar seus inimigos e quem
infringisse suas regras. Pode ser que os bretões fossem mais pacíficos. No
entanto, argumenta-se que a imagem de sacerdotes pacíficos em comunhão com
a natureza, tenha sido propagada em função dos primeiros santos irlandeses,
como coloca o pesquisador da Universidade Federal de Santa Catarina:
[...] Patrício, Columbano e muitos outros que apresentam essas
características; aqueles que querem fazer dos celtas “uma doce
humanidade perdida atribuem essas qualidades aos irlandeses
não por serem cristãos, mas pela herança celta. Supostamente o
cristianismo romano é que veio estragar tudo. Esse tipo de
convicção pode ter algum fundamento, mas mais provavelmente
muito de modismo e fantasia, que o revival celta norte-americano
se encarregou de comercializar como um produto de fácil
consumo. (LUPI, 2006, p.3).
Conforme a descritiva de Estrabão o druida era aguçado pela percepção e
atenção das atividades diárias que regiam a vida do ser humano. As informações
33
E-mail sobre os Celtas de 28 jan.2007.
90
sobre a religiosidade céltica são muito fragmentadas e por mais que tentemos
buscar uma compreensão uniforme será inviável. Isto porque, houve vários cultos
regionais, o que dificulta um perfil homogêneo desse sistema de crenças. Outro
fator é a difícil, senão impossível, verificação de muitos acontecimentos devido à
parcuidade de registros. O conhecimento e os ensinamentos dos druidas não
chegaram até nós, pois sua transmissão era oral e não existiu ou existe nenhum
texto que os formalizem. Histórica e arqueologicamente temos apenas indícios da
doutrina.
Para os druidas a escrita era um atributo das práticas mágicas e estava
totalmente excluída para a transmissão de conhecimento resultando em uma
transmissão oral e viva. A oralidade quebrava a imobilidade da escrita e permitia
um dinamismo nos ensinamentos. A tradição céltica o possuiu escrituras
sagradas ou outros manuscritos, ficou fora da história, sem possibilidade de uma
exegese profunda ou mesmo de uma hermenêutica milenar. Irrigada pelos mitos e
narrativas históricas que foram alteradas com o intuito de confundir invasores,
dificultou a separação entre mitologia e história, obnubilando ainda mais as
possíveis interpretações.
A partir da anexação da Gália ao Império Romano, a religiosidade celta
sincretiza-se com a religião romana. Sobraram apenas os nomes de deuses,
vestígios folclóricos e uma iconografia romanizada. As análises iconográficas
levaram a uma religiosidade politeísta fortemente sincretizada. Todavia, para Le
Roux e Guyonvarc’h (1977, p.115), os celtas não tiveram um panteão como o
greco-romano onde cada Deus ou Deusa possuía uma atribuição definida.
Apontam para a possibilidade de um “monoteísmo implícito” nessa religiosidade,
pela presença de um arquétipo do Deus e da Deusa em função das características
comuns apresentadas entre as divindades.
Postura essa, muito contestada por vários autores. A maioria dos
estudiosos argumenta que essa hipótese é infundada e atesta o politeísmo celta,
como o de todas as religiões indo-européias. Esses vários deuses não são
explicados apenas pela iconografia apresentada, mas também por causa da
91
existência de inúmeros deuses e deusas regionais com nomes e características
diferentes, porém com correlações atributivas.
Devido à tradição oral desse povo não podemos precisar com detalhes a
sua religiosidade. Só podemos conceber a tradição céltica por meio do seu forte e
penetrante simbolismo e pela interpretação significativa de seus mitos, descritos
sob a ótica romana e posteriormente na literatura medieval.
O antropomorfismo foi marca nesse período, em função de uma
correspondência com o panteão religioso romano. No entanto, para os celtas,
antes da romanização da Gália e da cristianização da Irlanda, os deuses,
enquanto agentes sobrenaturais, eram de domínio do infinito e não possuíam
nenhuma representação física, reduzi-los à condição humana era uma maneira de
limitá-los e torná-los finitos.
Muitas narrativas-descritivas romanas mostraram sacrifícios, nos quais os
celtas colocavam pessoas em grandes jaulas de vime e ateavam fogo. Contudo,
não podemos tirar maiores conclusões, uma vez que esse ritual não era comum
entre os povos indo-europeus. Acredita-se que esses casos sejam mais um
exemplo da forte incidência sincrética nas religiosidades autóctones da Europa
Central. Sabe-se que em tal tipo de ritual, as vítimas sacrificiais eram malfeitores,
criminosos e prisioneiros de guerra.
A crença céltica sobre o mundo pós-morte não foi bem interpretada pelos
autores clássicos. Alguns escreveram que os druidas acreditavam na imortalidade
da alma, outros, como Ammiano Marcellino (330 a 395 a.e.c.), que acreditavam na
metempsicose, doutrina na qual a mesma alma pode animar sucessivamente
corpos diferentes, seres humanos, animais ou vegetais; a transmigração da alma.
Materialmente, nada temos que mostre a crença dos celtas em
reencarnação. Porém acreditavam na imortalidade da alma para todos os seres
humanos. De modo que uma alma poderia ou não viver muitas vidas. A
possibilidade de escolha era presente nas atitudes celtas. Não registros sobre
a idéia de karma. Era possível que a alma optasse em ir e viver do Outro Mundo
junto a seus ancestrais e seus agentes sobrenaturais para sempre. Poderia,
92
conforme sua vontade, regressar não para cumprir ou resgatar alguma coisa, mas
sim vivenciar e conhecer algo que não pôde. Para os celtas a morte era uma
complementação da vida num outro corpo no Outro Mundo.
Le Roux e Guyonvarc’h (1993, p.139) mostram que a distribuição espacial e
a orientação geográfica eram muito importantes para os celtas. Faziam parte do
contexto religioso. O ponto cardeal norte situava-se à esquerda (oeste) e o ponto
cardeal sul à direita (leste) em relação ao Sol. Quando, o Sol caminhava da
esquerda para a direita, todo o dia ficava a sul. Ponto destinado aos vivos e aos
deuses luminosos. Já o ponto cardeal norte marcava a noite, parte reservada ao
Síd o espaço sagrado destinado aos mortos e aos deuses não iluminados.
Por isso, todos os celtas tinham uma enorme preocupação com os deslocamentos
giratórios. A direta proporcionava as coisas boas e a esquerda as ruins
34
.
Eles praticavam seus ritos e cerimônias em meio aos bosques lugares
denominados de nemeton. Recentemente, estudos arqueológicos revelaram que
no interior desses bosques existiram santuários simples, de madeira, com poços
profundos para as práticas sacrificiais de humanos e de animais. (Olivieri, 2006,
informação verbal)
35
.
Nos locais ritualísticos e em toda a paisagem geográfica, o sagrado era
vivenciado pela hierofania. A pedra, a árvore, o rio, a montanha eram sagrados,
porque contavam aquilo que era anterior à própria materialidade, ou seja, era o
próprio sagrado na paisagem geográfica. Considerada a presença divina.
A floresta temperada cobria toda a região, característica do continente
europeu, com espécies específicas como bétula, faia, teixo, aveleira e macieira,
que se tornaram árvores sagradas e ritualísticas, ora por apresentarem poder
curativo ora pela resistência ao clima instável que assolava o período.
34
A maioria dos oppida gauleses a porta de acesso era construída de tal maneira que qualquer carruagem
parava e obrigatoriamente mostrava-se seu lado direito para a entrada da fortificação.
35
OLIVIERI, Fillipo é doutorando em História Antiga pela Universidade Federal Fluminense. E-mail sobre
Druidas em 14 ago.2006.
93
Mesmo, porque, a árvore representava um símbolo de força e resistência
para todos os povos indo-europeus. Para esses povos antigos o teixo:
[...] tinha propriedades mágicas porque estava sempre verde e
suas folhas não caíam no inverno. Pensavam que ela prolongava
eternamente a vida do espírito. (...) A toxidade do teixo o qualifica
para ser utilizado justamente nos casos em que é necessário
destruir uma célula doente, como as cancerosas. (CDCC, USP,
2007).
Figura 3 - Teixo com 700 anos - Bragança- fotografia © DGF - Portugal
Fonte:www.dias-com-arvores.blogspot.com/2004/08/arvores-classificadas-
teixos.html. Acesso em: 13 abr.2007.
O carvalho era a árvore sagrada, cujos ritos mais significativos eram feitos
sob sua sombra. Unia-se ao próprio druida, estabelecia um códex indecifrável
mesmo que soubessem que “o carvalho é o suporte vegetal da sabedoria e não a
própria sabedoria, um dos meios do rito e não o motor ou o beneficiário da
cerimônia religiosa” (Le ROUX;
GUYONVARC’H, 1993, p.107).
É certo que, para a experiência religiosa arcaica, a árvore (ou,
mais propriamente, certas árvores) representa um poder. que
acrescentar que este poder é devido tanto à “árvore” em si como
às suas implicações cosmológicas. Para a mentalidade arcaica, a
natureza e o símbolo coexistem. Uma árvore impõe-se à
consciência religiosa pela sua
própria substância e pela sua
forma, mas esta substância e esta forma devem o seu valor ao
fato de que impuseram à consciência religiosa, de que foram
“escolhidas”, quer dizer, se “revelaram”. (ELIADE, 1998, p.216)
94
Existem narrativas romanas que conjecturam sobre a possibilidade de os
druidas históricos terem levado uma vida monástica. A narrativa sobre a invasão
no Santuário Druídico da Ilha Môn
36
é um exemplo disso:
[...] Acies é uma palavra errônea que designa, provavelmente os
druidas, seus alunos e esposas de uns e de outros (ou
simplesmente druidesas) alinhados ao longo da margem. Para se
defender, não foram meios militares clássicos que eles puseram
em ação, mas meios mágicos. Os druidas dirigiram suas
maldições a gente que não estava nenhum modo preparada para
sofrê-las, ou dar-lhes fé, pois suas concepções religiosas eram
por demais diferentes. Os romanos não empreenderam a fuga,
como o teria feito infalivelmente um exército celta. Simples
fórmulas de imprecação ou archotes, contra o poderio militar
romano do primeiro século, eram ai dos celtas! Bem pouco [...]
(OGAM XII, 225-226 apud LAUNAY, 1975, p.116).
Le Roux e Guyonvarc’h (1993, p.124) descrevem que a cor branca sempre
foi reservada ao corpo sacerdotal em todos os povos indo-europeus. Em todas as
línguas célticas vindo-s, em irlandês find, em galês gwyn e em bretão gwenn,
significa branco, belo e sagrado. Cor concedida ao druida e as cores, azul, verde e
amarela, reservadas às categorias produtoras.
De acordo com Lupi (2006) só um registro histórico quanto à descrição
desse traje branco e imaculado do druida. Encontra-se na obra História Natural de
Plínio, o Velho, porém, é especificado na obra, que a veste branca só era utilizada
na cerimônia de colheita do visco. Planta sagrada muito resistente ao rigoroso
inverno europeu que nasce também sobre o carvalho. Seu corte era feito com a
foice de ouro
37
. Para os druidas antigos, o visco simbolizava o renascimento.
Alguns autores fizeram menção ao sacerdócio feminino. Alegaram ser
restrito à vidência, à profecia e à adivinhação. As mulheres não ocuparam a
hierarquia de um druida e também não se utilizaram da escrita mágica – os
oghams. Ponto bem divergente entre os celtólogos, porque algumas evidências
36
Atual Anglesey, no litoral do País de Gales.
37
É questionável a foice ser talhada em ouro maciço. Pois, para época trabalhar ouro maciço com um corte
preciso e afiado era muito improvável, poderia ser dourada, mas de outro material.
95
apareceram nas narrativas clássicas e medievais. Tácito descreveu o
comportamento das mulheres e dos druidas de Anglesey, quando da invasão
romana:
O exército (acies) inimigo fazia face sobre a margem, com uma
densa turba de guerreiros armados e de mulheres gritando
imprecações, vestidas de negro como as Fúrias, os cabelos em
desalinho, brandindo tochas. Ao redor, os druidas, as mãos
erguidas para o céu, lançando maldições aterradoras,
estarreceram os soldados pela novidade do espetáculo: era como
se tivessem os membros paralisados, o corpo imóvel exposto aos
golpes. Mas, ao apelo de seu chefe e exortando-se a si mesmos a
não tremer diante de uma malta de mulheres fanatizadas, fazem
avançar os hostes, esmagam toda resistência e envolvem o
inimigo em suas próprias chamas. Colocou-se em seguida uma
guarnição entre vencidos e destruiu-se seu bosque consagrado às
cruéis superstições [...]. (TÁCITO apud LAUNAY, 1975, p.115).
1.4.1. O Panteão Céltico
A descoberta do Caldeirão de Gündestrup
38
, rico artefato em prata, que
remonta ao século I a.e.c, no qual foram gravadas cenas da cultura celta, trouxe
um pouco de conhecimento sobre suas tradições. As imagens esculpidas retratam
cenas de batalhas, de sacrifícios com animais, de deuses e soldados. Acredita-se
que esses soldados estavam perfilados de tal maneira que se reportavam à
crença celta de renascimento pós-morte.
Nesse caldeirão também foram esculpidas diversas imagens do Deus
Cernunos, o deus chifrudo da Gália que estabelecia certa relação de atributos com
o deus Dagda da Irlanda.
38
Encontrado e desmontado no vilarejo dinamarquês de Gündestrup em 1891.
http://nationalgeographic.abril.com.br/ng/edicoes/90/reportagens/mt_saibamais_248053.shtml. Acesso em: 11
set.2007.
96
Conforme figura a seguir:
Figura 4 – Caldeirão de Gündestrup e suas cenas cotidianas.
Fonte:
www.ivargault.com/kelterne/celts.html. Acesso em: 07 set.2007.
A mitologia celta era povoada de heróis destemidos que lutavam em
batalhas sangrentas. Quando os heróis sobreviviam eram recompensados pelos
deuses ou deusas, após a morte, embarcavam direto para o Outro Mundo com
todos os méritos, honras e glórias. Seus deuses e deusas eram abundantes.
O mundo celta era regido pelo caráter trino das coisas. Assim, três grandes
funções foram atribuídas aos respectivos deuses e deusas: a sacerdotal, a
guerreira, e produtora artesanal. O fator tríplice estava sempre presente nos
deuses e deusas do panteão céltico. Para as deusas, a triplicidade estava
desmembrada em Donzela, Mãe e Anciã.
Os deuses e as deusas celtas não pré-estabeleciam uma sociedade.
Manifestavam-se sob diversas faces, sem hierarquia, sem divisão de trabalho e
com múltiplas funções, como no panteão cristão-católico. Brekilien (2005, p.64)
97
ressalta que o panteão céltico está mais próximo ao panteão cristão-católico do
que do panteão greco-romano, no qual os deuses e deusas recebiam nomes e
atribuições específicas. No caso católico não existe uma divisão de trabalho entre
Deus-Pai, o Filho e o Espírito Santo, nem tão pouco sobre o Jesus Infante, o
Messias, o Cordeiro de Deus, o Bom Pastor, o Salvador, o Cristo-Rei e o
Crucificado, todas essas facetas são uma mesma divindade.
Frente à complexidade do tema, ou da questão que é abordada,
restringimo-nos a alguns deuses e deusas do panteão insular. Muitas vezes esses
agentes sobrenaturais somaram-se a divindades continentais e das populações
nativas das ilhas o que gerou uma mistura e profusão de deuses e deusas dentro
do panteão céltico. Le Roux e Guyonvarc’h (1993) elencam vários deuses e
deusas, dentre eles destacamos:
Dagda - o deus bom ou deus-druida.
Era-lhe imputado o conhecimento, a justiça e a guerra. Comandava a vida e
a morte. Seus poderes emanavam tanto o bem quanto o mal. Era dono de 04
instrumentos importantes: o Caldeirão da abundância e da ressurreição; a moca,
arma terrível que mata neste mundo, mas ressuscita no Outro Mundo; a harpa
contém todas as melodias do mundo. A ária do sono, a ária do riso e a ária da
tristeza e a roda cósmica do apocalipse irlandês. Seu condutor é o druida cego
Mog Ruith. “Surdo ficará aquele que a ouvir, cego àquele que a olhar e morto
aquele quem ela cair”.
Brigit (ou, Brighid, Brigite, Brigantia, Cerridwen, Albina) – Deusa dos
poetas, dos ferreiros e dos curandeiros.
A pluralidade dos nomes é porque existem deusas com os mesmos
atributos por todo mundo celta. Ela é simultaneamente filha de Dagda, mãe dos
deuses primordiais (inclusive Dagda) e esposa e irmã de todos. Divindade
feminina única.
98
Lug (ou Lugh, Luga, Lamhfada, Llew, Llaw Gyffes, Lleu, Lugos,
Samildnach). Deus solar e luminoso.
Sua função era múltipla, o maior dentre os deuses irlandeses. Associado ao
corvo. Também conhecido como Lug da Mão Poderosa ou Mão Longa ou Lança
Longa sempre fazendo alusão ao poder de alcance e a força. Tem um aspecto
sombrio por não ser fácil acessá-lo.
Macha – Deusa dos cavalos, das batalhas e da soberania.
Pode ser uma das três faces de Morrigan.
Morrigan (ou Morrigane, Morrigu, Morrigain, Morgian) Deusa da guerra,
da morte, da soberania, da fertilidade e associada ao amor.
Divindade associada ao corvo. Conhecida como a Grande Rainha ou a
Rainha Fantasma. Pode aparecer sozinha ou compor a tríplice: a Deusa Badb, a
Deusa Macha ou a Deusa Nemain.
Oghma (ou Ogma, Ogmios) Deus da eloqüência, da palavra e da
guerra.
Deus que exerce a função de guerreiro e vigia a segunda categoria do
mundo celta. È o chefe dos mortos, o condutor. Símbolo do elo entre o divino e o
humano. Atribuído a ele a invenção da escrita mágica, os oghams. É o deus da
guerra, mas não é ele quem a faz.
Outros deuses como: Cernunos, Belenos, deus do sol e da medicina,
Keridwen, deusa do conhecimento e da abundância, Taranis, deus do trovão,
Teutatés, deus pai do povo, Sucellos, deus do martelo, Esus, deus da bondade,
eram consagrados pelos clãs celtas gauleses.
99
Estabeleceu-se uma correlação de atributos entre os deuses dos clãs
irlandeses, galeses, bretões e escoceses. Ou seja, o mundo celta tinha os
mesmos deuses e deusas com nomes diferentes.
1.4.2. Os Oghams: a escrita sagrada
Para os celtas a língua escrita não implicava na verdadeira sabedoria. Eles
nunca se utilizaram dela para passar e transmitir conhecimento, contudo isso não
quer dizer que eles não a conheciam. O fato é que toda a proto-história celta é
anepígrafa
39
.
Os clãs da Gália meridional começaram a escrever em caracteres gregos,
os cisalpinos utilizaram-se do alfabeto de origem etrusca e os celtibéricos dos
alfabetos ibéricos. Os celtas insulares tiveram outras influências, como o gaélico,
por exemplo. Os druidas não proibiam a escrita, mas pela concepção céltica, ela
era reservada as situações rigorosas e muito bem definidas.
A escrita ogâmica, na Irlanda - traços transversais, horizontais ou oblíquos,
de um lado e de outro, de uma linha vertical não permitia transcrições de textos
longos e nem uma leitura rápida.
Todavia, nas narrativas ticas e lendárias, as escritas ogâmicas
apareceram com um forte atributo da magia, ou seja, só eram utilizadas para os
fins mágicos. Distante de ser uma técnica de memorização ou de transmissão de
conhecimento, a escrita ogâmica era uma aplicação prática dos elementos
mágicos e os textos dependiam do deus da eloqüência, Oghma.
39
Aquela que se perdeu ou não tem título ou inscrição em moedas, medalhas, monumentos, baixo-relevo
antigo etc.
100
Abaixo, o alfabeto ogâmico:
Figura 5 – Símbolos do Alfabeto Ogâmico
Fonte: GRIFFEN, Toby D. Ogam: Celtic or Pre-Celtic? – Southern Illinois University
Edwadsville. 29 mar.2007.
Le Roux e Guyonvarc’h (1993) explica a utilização do alfabeto ogâmico para
as práticas mágicas:
A escrita, fixação na matéria de uma fórmula ou de um nome,
conserva até à eternidade, torna uma maldição ou um
encantamento eficazes durante o tempo que durar o suporte
madeira, pedra ou eventualmente metal sobre o qual está
gravada. (LE ROUX ; GUYONVARC’H, 1993,p.132).
1.4.3. O Outro Mundo, o Síd
Nas narrativas clássicas não vemos a descrição do Outro Mundo, apenas
sugestões de nomes: A Terra dos vivos, das mulheres, das promessas, Planície
dos Prazeres. As características desse mundo celta pós-morte vão aparecer,
somente, em fontes medievais, aludindo a um mundo idílico e paradisíaco, sem
dúvida, influenciado pela interferência da concepção cristã de paraíso. (Le Roux e
Guyonvarc’h, 1993, p.134-136).
Com efeito, esse Outro Mundo funcionaria como uma espécie de mundo
paralelo, no qual não existe a noção de pecado ou transgressão ou própria ao que
101
se compreende pelo inferno cristão. Em algumas narrativas da Idade Média esse
Outro Mundo poderia estar localizado além mar numa ilha mítica: Hy-Brazil
40
.
Os autores também colocam que o Síd nos remete à idéia de
complementaridade, entre o mundo dos vivos e dos mortos, devido ao trânsito
livre, possível entre um mundo e outro. No Síd as pessoas estão livres da ação do
tempo e das contingências do espaço. Por ser o mundo da perfeição, os
mediadores do sagrado não se faziam necessários. Visto que se tratava de um
mundo no qual todos os deuses eram druidas e todos os druidas eram deuses.
1.4.4. As Festas Sagradas
O glossário de Cormac junto com o calendário de Coligny
41
permitiram que
a história e a arqueologia decifrassem um pouco mais da religiosidade céltica,
apesar das informações fragmentadas. O calendário era lunisolar com as divisões
dos dias, meses e anos, no qual descrevia a celebração das quatro grandes festas
sagradas, entre os solstícios e equinócios, nas quais ofertavam muitas frutas,
verduras, legumes, leite e pães aos deuses, e em festas profanas bebiam e
realizavam jogos.
40
A Ilha do Brazil ou Ilha de São Bandão ou ainda Brasil de São Brandão, era uma das inúmeras ilhas que
povoavam a imaginação e a cartografia européias da Idade Média, desde o alvorecer do século IX.
Também chamada de “Hy Brasil”, essa ilha mitológica, “ressonante de sinos sobre o velho mar”, se
“afastava no horizonte sempre que os marujos se aproximavam dela. Era, portanto uma ilha “movediça”, o
que explica o fato de sua localização variar tanto de mapa para mapa. Segunda a lenda, Hy Brazil teria sido
descoberta e colonizada por São Brandão, um monge irlandês que partiu da Irlanda para o alto-mar no ano
de 565, como São Brandão nascera em 460, ele teria 105 anos quando iniciou sua viagem. O nome
“Brazil” provém da palavra celta Bress, que deu origem ao verbo inglês to bless (abençoar), Hy Brazil,
portanto significa “Terra Abençoada”. Desde 1351 até pelo menos 1721 o nome Hy Brazil podia ser visto
em mapas e globos europeus, sempre indicando uma ilha localizada no oceano Atlântico, até 1624,
expedições ainda eram enviadas à sua procura. (BUENO, 1998, p.13).
41
O glossário de Comarc é uma compilação feita em 900 a.e.c do folclore irlandês que contempla: termos,
crenças, costumes, datas comemorativas, crenças e deidades. Esse calendário tem sua fundamentação em
um achado arqueológico: setenta e três fragmentos encontrados na cidade francesa de Coligny em 1897 na
região de Ain. Acredita-se que esse achado seja do século II a. e. c.
102
Os quatro grandes festivais descritos por Le Roux e Guyonvarc’h (1993)
eram:
Samhain
42
(reunião) - Primeiro de Novembro
Início do ano celta. O tempo e o espaço desapareciam, tornavam uno para
a comunicação entre os dois mundos. Reverência à divindade soberana sob os
dois aspectos: sombra e claridade. É o momento privilegiado onde o ser humano
comunica-se com o Outro Mundo – o Síd.
Beltaine
43
(fogo de Bel) – Primeiro de Maio
Festa consagrada a Lug sob à égide da luz. Data das grandes Gorseddau,
nas quais acendiam imensas fogueiras ritualísticas.
Lugnasad (assembléia de Lug) – Primeiro de Agosto
Festa do outono e das colheitas. Reverência a Lug no seu aspecto real,
com suas multifunções – rei distribuidor de riquezas e equilíbrio.
Imbolc
44
(purificação) – Primeiro de Fevereiro
Festa de Purificação do fim do inverno. Menção ao período de lactação dos
animais. Referência à deusa Brigit.
Não se tem registro de outras festividades celtas de caráter religioso,
muitas foram criadas no período romântico, como veremos a adiante.
42
Esta cerimônia foi cristianizada como Dia de Todos os Santos e Dia dos Mortos.
43
Manteve-se no folclore da Europa continental e, que terminou como comemoração ao Dia do Trabalho.
44
Ao longo do tempo foi substituída pela festa cristã de Santa Brígida.
103
2. Meso e Neodruidismo: as ressignificações druídicas
2.1. O Mesodruidismo a partir de 1717 até hoje
A categoria sarcedotal bárdica foi à única que não sucumbiu de imediato à
dominação romana. Os druidas e ovates mostraram nitidamente sua
territorialidade dentro da cultura céltica e acabaram subjugados pelos invasores
romanos, bem antes das literaturas medievais os descreverem. Contudo, a
bárdica também foi desaparecendo, pela manutenção do antigo gênero de vida
gaulês e pela incorporação dos costumes ingleses. Poucas Eisteddfodau
reuniões bárdicas - foram realizadas por longo período de tempo.
Muitas controvérsias pairam entre os estudiosos do tema. Há um hiato
histórico que atravessa o fim da Europa pagã com o fervilhar da Europa cristã. O
resgate da religiosidade celta foi lento e moldado pelo Cristianismo. O
desaparecimento dos druidas constitui um mistério, de repente as fontes clássicas
findaram o reporte a eles.
O silêncio encobriu o druida. Mas, esse silêncio nutriu grandes obras
literárias que surgiram na Idade Média cantando os feitos arturianos ligados às
tradições celtas das Ilhas Britânicas.
No entanto, o Druidismo atual reverbera a partir do mundo cristianizado do
século XII. Quando no ano de 1176 aconteceu à primeira National Eisteddfod of
Wales
45
(Assembléia Nacional dos Bardos do País de Gales) que consistiu em um
conjunto de concursos de música e de poesia. O fato marcou o início da retomada
da “tradição” galesa e reuniu os bardos remanescentes com práticas totalmente
sincréticas.
Faz-se novamente um silêncio de quase seiscentos anos, e no início do
século XVIII, ressurgiu nas sociedades secretas da Grã-Bretanha, um novo intento
em resgatar a religiosidade celta.
45
Evento ocorrido no Castelo de Cardigan, por iniciativa do Lord Rhys, um dos últimos príncipes do País de
Gales.
104
Durante o romantismo os países ocidentais buscaram identificar sua cultura
popular e origens. Coube aos franceses e aos ingleses resgatarem os povos
celtas. Essa procura bastante fragmentada quanto ao resgate das tradições
acentuou-se sobremaneira no País de Gales. Articuladores da façanha
procuraram fatos e objetos para a comprovação e a aceitação da historicidade e
influências dos antigos celtas na formação cultural de seus países. Forjaram
provas e com algum embasamento arqueológico resgataram a religiosidade céltica
que denominaram de Druidismo.
Essa nova tradição passou por várias fases e dissidências. Podemos
alinhá-las em três grandes momentos de ressignificações: a de John Toland, a de
Henry Hurle e a de Edward Williams, mais conhecido como Iolo Morganwg.
De maneira geral os mesodruidas não praticavam nenhum tipo de sacrifício
humano ou animal. Realizavam seus ritos em nemetons adaptados à época.
Estudavam em média vinte anos e não tinham vida monástica. Atribuíram, ainda,
aos paleodruídas a construção do Stonehenge
46
e outros monumentos megalíticos
europeus. O sistema dos sacerdotes era patriarcal e hierárquico num aprendizado
que privilegiava a sociedade masculina letrada, utilizavam como instrumento
ritualístico uma foice dourada, retratada nas imagens a seguir:
46
Monumento de pedra erguido na planície de Avebury na Inglaterra. Será tratado em detalhes no tópico
sobre imaginário.
Figura 6 Sacerdotisa carregando
o visco colhido
Fonte:www.mistletoe.org.uk/Traditi
onandLegend/Images/druidSacred
MistletoebyPSINIBALDI.jpg
Acesso em: 28 set.2007.
105
2.1.1. John Toland e a Druid Order (DO)
John Toland livre-pensador, irlandês, católico convertido ao Protestantismo,
teólogo inconformado com as diretrizes do Cristianismo e deísta, foi um dos
articuladores do resgate mesodruídico. O deísmo deu a Toland uma postura
filosófico-religiosa que admitia a existência de um Deus criador, mas não
acreditava na revelação divina. A razão era o único caminho capaz de atestar a
Figura 7 - Cerimônia da Colheita do Visco no solstício de inverno de
Henri-Paul Motte
Fonte: www.musees-gallo-romains.com/presse/archives_expo/
toutatis/galerie2/pages/01%20La%20cueillette%
20du%20gui.htm.Acesso em: 18 set. 2007.
106
existência de Deus. Como deísta, não concordava com o ensinamento ou a
prática de qualquer religião institucionalizada.
Em setembro de 1717 a sociedade panteísta
47
formou um grove
48
fundado
dentro da Grande Loja Maçônica de Londres. Essa ordem professava princípios
pagãos e anticlericais. Isto foi possível porque a estrutura da maçonaria inglesa
primava pelo respeito, por uma moral natural e tolerância a todas as religiões.
Foram criados círculos druídicos e bárdicos exclusivos, ou seja, com as
chamadas linhagens “puras”. A idéia era buscar as premissas básicas do cotidiano
da civilização celta em oposição ao severo dogmatismo cristão das Ilhas
Britânicas.
O mítico grove de Toland foi a matriz para o nascimento da primeira ordem
druidica moderna. A Druid Order (DO) - Ordem Druidica. Toland considerado pai
do Druidismo Moderno, foi druida-mor até 1722. Com sua morte assumiu William
Stukeley, admirador dos druidas e defensor da hipótese de Stonehange ter sido
realmente construído pelos celtas. Os franceses, descendentes dos celtas
continentais, aderiram às idéias de Stukeley. Juntaram “documentação” e
construíram, também, uma “verdade celta” continental.
2.1.2. Henry Hurle e a Ancient Druid Order (ADO)
O carpinteiro inglês Henry Hurle a partir da Druid Order, em 1781 fundou a
Ancient Druid Order (ADO) Antiga Ordem Druidica. Essa ordem foi centrada nos
moldes de uma confraria franco-maçônica, com isso foi marcada por forte
influência cristã.
47
Pan, "tudo", + Theós, "deus", transparecendo que tudo é Deus; todos os seres e toda a existência de Deus
são concebidos como um todo.
48
Grove: bosque, arvoredo. Grupo de estudo dos druidas modernos.
107
Nesse momento, um forte senso cristão orbitou os seguidores que se
inseriram em seitas secretas monoteístas. Os paleodruidas foram vistos como
adoradores do sol, como "luz mais elevada", verdadeiros precursores do Cristo.
A ordem foi desmembrada em 1833. Surgiu a Ancient Order of Druids
(ADO) Antiga Ordem dos Druidas. As ordens instituíram cerimônias ritualísticas
bem próximas as da maçonaria francesa. Assim a Ancient Order of Druids se
transformou mais numa associação financeira de ajuda mútua do que em uma
ordem druidica propriamente dita. As duas mantêm atividades até hoje.
2.1.3. Edward Williams e a Gorsedd Beirdd Ynis Prydain
49
O movimento romântico nas Ilhas Britânicas e na França, em sua busca
pela natureza e exaltação do passado medieval e pré-cristão, impulsionou a
tradição do Mesodruidismo. Trata-se de uma tradição inventada, mas o
Mesodruidismo foi importante, principalmente para o resgate da cultura celta.
Culminou, portanto numa religiosidade disseminada pelas ilhas e pelo continente.
Marco fundamental desse período foi a primeira Gorsedd moderna que deu
subsídios à criação de ordens que buscavam aproximação ao Druidismo Histórico.
Figura fundamental e idealizadora desse acontecimento, Edward Williams utilizou
elementos trazidos do folclore britônico para essa assembléia.
O
termo britônico
designa a língua céltica falada pelos celto-bretões na Bretanha insular antiga
Britannia como também a cultura e a história dos bretões em contraposição ao
termo britânico, que surgiu a partir do Tratado de União entre Escócia e Inglaterra,
em 1710”. (DONNARD, 2006, p.95).
Essa manifestação bárdica ocorreu em 1792, nesse ano Williams
transformou o Primrose Hill, no centro de Londres, em palco para a primeira
assembléia moderna de bardos. A partir desse evento, ele recebeu o nome
49
Título original em galês: Reunião anual de bardos das Ilhas Britânicas. Inventado por Iolo é um evento
maior do que as eisteddfodau, ou seja, assembléias de bardos.
108
iniciático de Iolo Morganwg e alavancou ordens pretensamente próximas ao
Paleodruidismo.
Essa assembléia encantou os galeses-londrinos e também muitos literatos
do País de Gales, fato que contribuiu para a fundamentação do movimento
nacionalista que acontecia no país. Em Gales, Iolo organizou várias Gorseddau,
deu-lhes liturgia, rituais, cerimônias complexas e corpo de tradições o que era
diferente do caráter druídico impresso por Toland e Hurle.
Justiça seja feita: Iolo não estava simplesmente pensando no
aspecto carnavalesco do Gorsedd: esses grupos destinavam-se a
restaurar a ordem bárdica, a tornar-se uma instituição cultural
nacional em Gales, uma espécie de clube de torcedores da
linguagem, literatura e história galesa. (MORGAN, 1984, p.71).
A partir da assembléia Iolo escreveu os Barddas, livro editado em 1862.
Trata-se de um estudo druídico medieval galês, cujos fragmentos se dispõem em
dois volumes: o uso da teologia, no primeiro e o conhecimento mágico, no
segundo, isto de acordo com o sistema bárdico-druídico. Segundo Morganwg, o
sistema foi confiado a ele em fragmentos originais, por isso, reivindicou a escritura
dos verdadeiros ensinamentos dos bardos e dos druidas medievais. Nessa obra
dizia, também, que os druidas eram monoteístas, cristãos e que sua cosmologia
era estrangeira.
A obra definiu três círculos fundamentais para a existência anímica:
Ceugant, o círculo da infinitude, onde o Incriado habita pleno; Abred, o círculo da
matéria, onde vivemos e Gwynfyd, o círculo da pureza, beatitude, onde a vida está
livre de todo o mal.
Além de os Barddas, os manuscruitos base de Iolo Morganwg, também
relatavam pontos fundamentais para o mesodruida, um deles é a existência de
duas forças opondo-se no universo: Deus (Incriado), a força que tende para a vida
e Cythrawl, a força que tende para a destruição, emanado fora de Annwn, o
abismo onde pulsa a vida. Quando Deus pronunciou Men Heim o ser primordial
– se fez.
109
Iolo, também, redigiu a Oração Druídica Universal, sua forma adptada e
proferida até os dias de hoje é:
Concede-nos, ó Espírito, tua Proteção
e da Proteção, a Força
e da Força, a Compreensão.
E da Compreensão, o Conhecimento
e do Conhecimento, o Conhecimento da Justiça
e do Conhecimento da Justiça, o Amor por ela.
E o Amor por ela, o Amor por todas as Existências
e nesse Amor, o Amor, pelo Espírito e por toda a criação.
(IM/BDO apud ORR, 2002a, p.55).
Edward Williams, galês e unitarista
50
pela fusão dos elementos cristãos, das
influências literárias medievais arthurianas, do romantismo comparável ao de
William Blake e do resgate do mundo celta deu forma a esse movimento. Para
recuperar a auto-estima do povo galês Edward forjou documentos atestados de
veracidade e deu credibilidade ao resgate das tradições celtas assim, confirmou a
identidade de seu povo.
A teologia druídica de Morganwg mostrou de modo acentuado seu lado
unitarista somado a certo exagero pacifista. O Druidismo proposto por ele, não foi
questionado por ninguém, muito menos pela igreja anglicana, que o adaptava
como lhe convinha.
Nenhum dos contemporâneos de Iolo foi capaz de desmascarar
suas invenções e falsificações, e naquela época era tão
generalizado o gosto pelo mito e pelas lendas que poucos
parecem ter manifestado algum desejo de acabar com o ioloísmo
(MORGAN, 1984, p.75).
Influenciados direta, ou indiretamente por Iolo despontaram inúmeras
ordens druídicas, que se espalharam ao longo do século XX e trouxeram outras
ressignificações. Até culminar, em meados da década de 1960, numa nova fase,
o Neodruidismo.
50
Seita do século XVI, que negava o dogma da Trindade. Reconhecia em Deus uma só entidade.
110
2.2. Neodruidismo: 1964 até os dias atuais
2.2.1. Ross Nichols e a Order of Bards, Ovates and Druids
"Que o caminho seja brando a teus pés,
O vento sopre leve em teus ombros.
Que o sol brilhe cálido sobre tua face,
As chuvas caiam serenas em teus campos.
E até que eu de novo te veja,
que os Senhores te guardem
nas palmas de suas mãos"
Bênção Irlandesa
O articulador desse novo momento druídico foi Ross Nichols ou Nuinn
nome iniciático inglês de Cambridge, historiador, pintor, poeta e autor do Livro
do Drudismo”. Ross foi diácono da Igreja Católica Céltica. Essa configuração de
Igreja Católica foi possível, pois, conforme Thomas (1991, p.132) no período
histórico em que ocorreu o declínio da magia no continente europeu, as Ilhas
Britânicas tiveram um catolicismo peculiar, repleto de sincretismo pagão. Os cultos
hierofânicos não foram abolidos, mas modificados. O novo tempo transformou o
espaço habitado do mundo pagão em espaço habitado do mundo cristão,
conseqüentemente houve a interface entre os santos católicos e às divindades da
terra.
O convívio com o mundo celta pela vida de diácono da Igreja Céltica
contribuiu para que Nichols, homem culto e viajado, ingressasse na Ancient Druid
Order (ADO) – Antiga Ordem Druídica – em 1954.
Na década de 1960, da dissidência da Ancient Druid Order (ADO) nasceu, a
Order of Bards, Ovates and Druids (OBOD) – Ordem dos Bardos, Ovates e
Druidas. Ross, líder dessa nova ordem reintroduziu as cerimônias do fogo, que
foram esquecidas pelo Mesodruidismo e incorporou datas comemorativas como os
solstícios de verão e inverno
51
e os equinócios de outono e primavera, além dos
51
Solstícios: 22/23 Dezembro e 20/21 Junho. Equinócio: 20/21 Março e 22/23 Setembro. Observar a inversão
sazonal dos hemisférios. Solstício: do Latim: Solstitiu = Sol Parado. São correspondentes aos extremos
máximos do deslocamento do Sol, o qual inverte o seu sentido de deslocamento, portanto o Sol precisa parar
111
quatro festivais celtas. Considerou as três categorias sacerdotais do
Paleodruidismo: bardo, ovate e druida. Personagem carismática arrebatou
pessoas, não só ligadas ao esoterismo, mas, também de outras fés.
Essa nova ordem transformou a dinâmica druídica em mundo todo. A
dinâmica da vida moderna trouxe inúmeras adequações à prática neodruida:
sacrifícios humanos e de animais foram mimetizados pelo sacrifício pessoal.
Como por exemplo: momentos de comunhão com a egrégora druídica, entre as
atividades da vida cotidiana; encontros em nemetons: parques, praças, lugares
reservados ou por meio de uma representação mental; gênero de vida urbano;
estudos dos fatos históricos e arqueológicos sobre celtas e druidas; politeísmo
ligado às forças da natureza; exaltação ao feminino; diversificação dos artefatos
ritualísticos; estudos apostilados, sites, livros, cd’s, dvd’s, filmes, reuniões
periódicas, palestras e workshops.
Segundo o site oficial da Order of Bards, Ovates and Druids (2007), ela
desenvolveu um método de ensinar o Druidismo e o Ofício Druídico, magia
druídica. Esse método é centrado na experiência de vida de cada um. Para uma
pessoa se tornar neodruida basta freqüentar cursos de um ano, que lhe trarão os
ensinamentos por meio dos antigos contos bárdicos.
Os ensinamentos são passados à distância, apostilados e enviados para os
membros de todos os países. Porém, eles são discutidos e assimilados nos
groves. A nemeton pode ser montada num grove ou recriada individualmente, em
casa ou em qualquer outro lugar, inclusive no plano mental.
Os neodruidas além de se conectarem à web, procuram cursos para o
aprendizados do Druidismo Moderno. O objetivo dos cursos é o desenvolvimento
individual, criativo e espiritual “embasados” nas descobertas históricas e
seu movimento para retornar. Assim, será o Solstício de Verão para o hemisfério voltado para o Sol e
Solstício de Inverno para o hemisfério contra o Sol. Diferença entre o dia e a noite, os dias são mais longos,
onde ocorre o solstício de verão e mais curtos onde ocorre o solstício de inverno. Equinócio: do Latim:
aequinoctiu = noite igual. Corresponde ao ponto médio do intervalo de deslocamento, instante no qual o
intervalo de duração do período de claridade se iguala a escuridão. Os dois hemisférios estão simetricamente
dispostos em relação ao Sol. Equicio de primavera para o hemisfério que está indo do inverno para o verão
e Equinócio de Outono para o hemisfério que está indo do verão para o inverno.
112
arqueológicas do povo celta. Para eles, o aprendizado precisa ser digerido com
cuidado e calma, para que a experiência do sagrado habite cada um. Caso
contrário, tudo será mal interpretado.
A facilidade dos cursos à distância está ligada aos avanços tecnológicos.
Contudo, quando se tem pelo menos dois iniciados nas práticas druídicas, eles
podem reunir-se para esclarecimentos de dúvidas e realização dos rituais e
cerimônias. Atualmente, uma rede de “instrutores” que acessada pela internet,
suporte aos praticantes e avalia o desenvolvimento dos mesmos nas
categorias de bardos, de ovates e de druidas. É possível que eles se encontrem
em locais abertos, workshops e assembléias. Agentes multiplicadores com
conhecimento da “tradição” são colocados a postos em inúmeros fóruns de debate
na internet. Contam também com sites específicos e o jornal da ordem, tudo para
a evolução espiritual. (www.obod.co.uk. Acesso em: 25 fev.2007).
Inicialmente o curso da OBOD é feito para um “druida” solitário. No curso,
ele poderá chegar a experiências de meditação e viagens extra-sensoriais, que o
conectarão com uma espiritualidade mais profunda, cujo intento é atingir a prática
dos paleodruidas. Amantes de cantoras como Enya e Lorena Mackennitt, que
trazem uma celticidade em suas músicas
52
.
De acordo com a descrição no site da ordem, em locais abertos, os druidas
modernos gostam de contar histórias, com ensinamentos druídicos, à moda dos
antigos bardos. Sentam-se ao redor de fogueiras, realizam cerimônias, se
envolvem em experiências ocultas.
2.2.2. Ritos sazonais: a harmonia interior a partir da paisagem
geográfica
Muitas culturas européias do neolítico atribuíam grande importância às
quatro estações do ano, de outras não se têm nenhum registro
53
.
52
É difícil falar da musicalidade celta, pois a instrumentação e o ritmo atribuídos aos paleodruidas não
possuem vestígios arqueológicos suficientes para interpretação. Por isso não se pode dizer quais os
instrumentos específicos estavam ligados a tradições célticas.
53
Construções megalíticas, com Newgrange, na Irlanda mostram essa relação. A união do sol (masculino)
com a Terra (feminino) é o renascimento e a preservação da vida.
113
Os ritos e cerimônias têm importância fundamental para aqueles que
seguem o Druidismo Moderno. Os quatro principais festivais, praticados no
Paleodruidismo, foram retirados do Calendário de Colegny. Em contrapartida os
festivais que comemoram a sazonalidade foram incorporações recentes ao
calendário de cerimônias, como visto em páginas anteriores. São eles:
O Equinócio de Primavera – Cerimônia de Alban Eilir
Luz da regeneração - Numa perspectiva do hemisfério norte a chegada da
Primavera e o retorno da luz após os meses de inverno, em que as criaturas se
retraem e se recolhem. Significa a hora de recuperar o tempo perdido. De se
divertir, de celebrar e de trabalhar.
No hemisfério Sul, pela tropicalidade brasileira, que reflete a visão celta do
paraíso de Hy-Brasil, onde verão o ano todo", a primavera nos passa
despercebida, pois, ela se mistura com o verão e traz também elementos de
outono, modificando o ciclo natural de muitas culturas agrícolas.
Bebida e comida para o rito: chá de flores, bolos e doces
Decoração do altar: muitas flores, pétalas, botões de rosas e ovos pintados
e decorados.
O Solstício de Verão – Cerimônia de Hefin
Luz do verão - O Sol que tudo ilumina, que favorece a vida. Celebração do
ápice do Sol, apogeu da fertilidade na natureza. É o dia mais longo do ano,
quando se honram as forças da luz, do calor e do verão.
Bebida e comida para o rito: suco cítrico gelado ou fruta suculenta
Decoração do altar: frutas cítricas, flores vermelhas e alaranjadas, enfeites
variados de cores e aspectos solares.
O Equinócio de Outono - Cerimônia de Alban Elued ou Alban Elved ou
Alban Elfed
A Luz do Outono. Significa a maturidade tanto das colheitas quanto dos
seres humanos no mundo físico e no espiritual. Para os novos druidas é nesse
114
período que se deve avaliar o que colhemos não só na plantação, mas em nossos
ações e atos. A luz do dia e da noite se equilibram outra vez, mas diferentemente
da primavera, é um equilíbrio que norteia para o recolhimento que virá.
Bebida e comida para o rito: cerveja/pão ou bolo
Decoração do altar: muitas folhas secas cobrindo todo o altar, grãos de
milho, sementes secas.
O Solstício de Inverno – Cerimônia de Alban Arthan
Luz do Urso animal que só retorna da atividade no inverno com o retorno
do Sol. O solstício de inverno é um período que marca um ciclo da Terra Viva e de
sua relação com o Sol. Esta é a noite longa do ano, momento de honrar as forças
da escuridão e do inverno. É hora de deixar ir tudo o que está morrendo ou
terminando, é o período de escuridão e do reconhecimento da alma, de
intimidade.
Bebida e comida para o rito: vinho quente, pão ou bolo.
Decoração do altar: ervas e folhas secas, galhos secos, pinhas, e outros
elementos que lembrem o inverno.
Figura 8 - Ritual neodruídico, Stonehenge
Equinócio de Primavera - Início década de 1980
Fonte: www.imagens/google/imagens/druida.
Acesso em: 18 set.2007.
115
Nos quatro rituais que celebram as estações do ano se intercalam as
cerimônias paleodruídicas, que se apresentam com roupagem e adereços
modernos:
Samhain (31.10) – Ano novo.
Contato com o Outro Mundo. É costume deixar uma vela acesa em uma
das janelas da casa, a fim de mostrar aos ancestrais que eles são bem vindos e
esperados. Ritual introspectivo, silencioso, respeitoso feito a noite.
Bebida e comida para o rito: vinho tinto e pão caseiro
Decoração do altar: maças, abóboras, romãs, fotos e objetos dos
ancestrais.
Imbolc (2/02) – Lactação. Consagração a Brigit.
Celebrações ligadas à família. Ritual suave e alegre, celebrado de
preferência durante a noite, para que o efeito das velas tenha maior impacto.
Bebida e comida para o rito: leite, pão ou bolo à base de leite.
Decoração do altar: uma imagem de Brigit, velas coloridas, cruzes de Brigit,
caldeirão com leite.
Beltaine (1/05) – Fogueiras de purificação.
União dos amantes. Ritual de amor, que o celebra em todos os aspectos da
vida. Fertilidade. Ritual bem alegre, solto, com danças, feito à luz do dia.
Bebida e comida para o rito: vinho e bolo de mel.
Decoração do altar: flores de cores bem vivas, fitas coloridas, colares e
guirlandas.
116
Lugnasad (1/08) – Festival ligado às forças da terra.
Traz a necessidade de compartilhar trocando experiências com o grupo ou
doando a quem necessita. Ritual em agradecimento a colheita realizada na vida
dos neodruidas. Celebração longa e lenta à noite.
Bebida e comida para o rito: cerveja de trigo e pão com grãos.
Decoração do altar: hastes de trigo, aveia, grãos diversos, ou diversas
coisas que simbolizem a colheita.
As oito festas ritualísticas, conforme retiradas da página oficial da
BDO/Druid Network (jan.2008), são as mais importantes para os neodruidas, nelas
acessam aos deuses, às deusas e aos ancestrais para rememorar um tempo
mítico. Os druidas modernos da BDO/Druid Network realizam essas cerimônias
nos meses consagrados às divindades, ressaltando a força que o mito representa
naquele instante. Celebram a Roda do Ano fazendo as inversões sazonais que
leva o nome de Roda Mista.
A vida do neodruida precisa estar em harmonia com a paisagem geográfica
o quê implica diretamente as estações do ano. Cada estação do ano imprime uma
acese druídica na vida deles.
2.3. Paul Bouchet e o Colégio Druídico da Gália: uma vertente francesa
Entre as várias ordens que pululam no território brasileiro, o Colégio
Druídico do Brasil trouxe os ensinamentos do colégio francês. Faz-se importante
mencioná-lo uma vez ele está carregado de símbolos, ritos e condutas do
Mesodruidismo.
Paul Bouchet compilou os ensinamentos do Mesodruidismo romântico de
Iolo Morganwg na íntegra. Mesclou-os aos do seu amigo Ross Nichols e
configurou uma das ordens mais monoteísta no Brasil.
Os ensinamentos do Colégio Druídico da Gália chegaram ao Brasil por volta
de 1985, por meio de pessoas interessadas em estudar o Druidismo Moderno.
117
Nasce, então, o Colégio Druídico do Brasil, com sede em Niterói – RJ considerada
uma ordem fechada. Os ensinamentos são passados somente para os iniciados
durante os estudos nos nemetons, que celebram várias cerimônias entre elas as
oito principais. Os neófitos recebem nomes iniciáticos em rituais hierarquizados à
medida que os estudos vão avançando.
A eles destinam vestes de cor azul (bardo), verde (ovate), azul/branca ou
verde/branca (eubage)
54
e branca (druida). As vestes com cores específicas são
direcionadas de acordo com as habilidades desenvolvidas pelos iniciados. Ou
seja, se o iniciado tem facilidade em mexer com ervas e poções, é dada a veste
verde (ovate) e para aqueles cujo “dom” está na oralidade é dada a veste azul
(bardo). No final dos estudos, tanto bardo quanto ovate ganham a veste branca
consagrada ao druida.
É um erro do neodruidismo atribuir o azul aos bardos e o verde
aos ovates. Em primeiro lugar, azul e verde o uma e única
cor; em segundo, esta cor não é sacerdotal, que a única cor
dos sacerdotes é o branco. Em todas línguas célticas ainda
faladas, irlandês, galês e bretão, glas significa, ao mesmo tempo
azul e verde e cinzento. (LE ROUX ; GUYONVARC’H,
1993,p.124).
Para eles o tempo mínimo de estudo para tornar-se um druida é de quinze
anos. Contudo, utilizam apostilas, internet e reuniões periódicas para
esclarecimentos de dúvidas e práticas druídicas. A tradição oral foi abandonada,
pelo menos no Brasil. O grupo se reúne em local fixo no interior de São Paulo,
numa região rodeada por uma pequena porção de Mata Atlântica com uma réplica
do círculo de Stonehenge. Mantem-se conectados na web semanalmente, com o
objetivo de irradiar mentalizações para o planeta e para as pessoas que pedem
ajuda. As mulheres ocupam cargos de druidesa e até arquidruidesa. Consta de
uma estrutura hierarquizada e institucional, apesar de se auto intitularem um grupo
com uma nova “filosofia de vida” e não como grupo religioso. Estão no ano
druídico de 4379.
54
Designação criada recentemente e que define a transitoriedade entre bardo/ovate e druida.
118
Para essa ordem, a imortalidade e as vidas sucessivas da alma são
indissociáveis. Portanto, para que haja uma evolução plena são indispensáveis
três fases: o começo de tudo no abismo de Annwn. Círculo onde fica toda a
possibilidade de vida; a transmigração pelo círculo de Abred. Círculo da vida
material, do sofrimento e provações; a chegada ao círculo de Gwynfyd. Círculo
branco da pureza, da beatitude.
Após a saída da matéria de Annwn, ela é transformada em vida, é
incondicional a passagem no círculo de transmigração de Abred. Todavia, deve-se
reencarnar tantas vezes quanto necessário em Abred a fim de erradicar o karma
individual. Quando a alma atinge o círculo de Gwynfyd, o ciclo cármico termina e a
alma goza da plenitude e benevolência que lhe destina esse círculo.
Existem inúmeros rculos de migrações dentro da cosmogonia do Colégio
Druídico do Brasil. Além dos três já citados, o Círculo de Ceugant é o mais
importante e inatingível aos seres humanos, visto tratar-se da morada do Incriado.
Aquele que se autocriou e criou todas as coisas. É relevante dizer que para esses
neodruidas, os deuses do panteão celta são na verdade manifestações do
Incriado.
Para seus adeptos não há uma distinção entre os termos Paleodruidismo e
Neodruidismo. Segundo eles, o Druidismo que vivenciam é o mesmo praticado
pelos druidas antigos, transposto e adaptado para a vida na modernidade tardia.
Os fatos históricos e as fontes arqueológicas são de suma importância para eles,
que procuram cada vez mais se interar nesses estudos, com o intuito de
reafirmarem a sua crença. Porém, na maioria das vezes os fatos históricos
comprovados, as narrativas mitológicas e a ressignificação desses dois últimos
séculos se confundem e trazem à tona um discurso acadêmico, embolado com
“verdades druídicas” mostrando uma significativa reinvenção de tradição.
119
2.3.1. Cosmogonia, símbolos e ritos
Os neodruidas do Colégio Druídico do Brasil, numa comosgonia alinhada à
de Iolo, não concebe a divindade como os neodruidas da BDO/Druid Network.
Para eles o Incriado é a própria manifestação de OIV. Esse som e os três raios
de luz são representados como uma bola de “energia” e cada alma é centelha
desta energia. Durante a criação total, OIV dividiu-se em duas “formas” divinas:
Deus que é a luz, a perfeição e a representação do bem e Cythrault que é o
vazio, o nada, o mal.
O portal divino é representado por Keridwen. Significa a natureza e o
trabalho de Deus. Hu Kadarn é o próprio Deus da luz, carrega consigo os
homens para a luta contra o Cythrault, o abismo do nada no qual cairá o homem,
caso a inércia impeça sua evolução, neste lugar sombrio a alma será aniquilada.
Keridwen une-se em casamento a Hu Kadarn, essa união é simbolizada pelo
menhir, e a síntese dessa união é o próprio Deus dentro do portal divino.
(www.bretagne-celtic.com. Acesso em: 10 mar.2007).
A ordem da escola francesa, mesmo ao se definirem como uma filosofia de
vida, dão um caráter monoteísta à “religião druídica”. Acreditam que existe uma
ligação estreita entre a ciência cósmica e a entidade criativa, OIV. O nome divino
que não pode ser pronunciado, Incriado, pelo qual todas as forças da criação
provêm, inclusive as divindades hierofânicas. Entre os deuses e deusas que
cultuam estão: Dana: A Terra, a mãe de todos, a nutrição da terra por definição,
que gera tudo que germina e cresce, Lug ou Lucellos: Deus da Luz, Esus: Jove
Gálico, aquele que maneja os raios, Epona: Protetora dos cavalos e dos
cavaleiros, Don: Deusa do Mar e Bélen: Espírito Solar cujo corpo físico é chamado
Heol (Sol).
Rica em símbolos, essa ordem tem o Triban, que segundo os Barddas são
três colunas que significam a verdade, “porque não pode haver nenhum
conhecimento da verdade, mas sim a partir da luz que incide sobre ela; e as três
120
colunas das ciências, porque não pode haver ciência, mas a partir da luz e da
verdade”
55
.
Esse símbolo evidencia a origem de tudo. De acordo com a cosmogonia
mesodruídica: "Men Heim (ser primordial) viu a luz. Viu as três colunas que eram
som e luz ao mesmo tempo, e compreendeu que a Palavra e a Luz criaram a Vida.
Logo, só o Incriado pode dar origem aos três princípios fundamentais
56
”.
Eles são os três princípios druídicos representados por três raios que nunca
se encontram, pois o ponto do ser está situado na infinitude do círculo de Ceugant.
Essa vertente neodruídica converteu esses Três Sons de Luz ou Três Raios
Sonoros, nas três letras O.I.V. usando o Triban como sua representação
simbólica.
A explicação dada à representação simbólica do Triban nos remete ao
caráter monoteísta divulgado pelo Mesodruidismo de Morganwg.
Figura 9 – Representação gráfica do Triban
Fonte:www.bretagne-celtic.com/an/accueil_an.htm.
Acesso em: 13 abr.2007.
55
Cf. Original. That is to say, they are called the three columns, and the three columns of truth, because there
can be no knowledge of the truth, but from the light thrown upon it; and the three columns of sciences,
because there can be no sciences, but from the light and truth. Tradução nossa. www.sacred-
texts.com/neu/celt/bim1/bim1033.htm. Acesso em: 28 abr.2007.
56
Cf. Original
.
According to the druidic teachings: “Men Heim watched the light, saw the Three Columns
that were light and sound at the same time, and understood that Word and Light produced Life” So the
Uncreated gives rise to the three fundamental principles from which all the Force of Creation stem. Tradução
nossa. www.bretagne-celtic.com. Acesso em 28 abr.2007.
121
A Cruz Druídica Revelada
57
é para Colégio Druídico do Brasil, o mais belo,
o mais completo e o mais importante símbolo de sua cosmogonia. Sua
interpretação esotérica baseia-se na geometria centrada no número três. Isto se
pelo caráter trino da religiosidade celta, por exemplo: a tripla morte funcional
dos reis, a triplicidade de algumas deusas como Donzela, Mãe e Anciã.
57
Revelação Divina é apresentada como um processo contínuo de diálogo entre Deus e os seres humanos, que
vai desde as origens da aventura humana na Terra, até a consumação da História, no fim dos tempos.
Mediante esse processo de comunicação de Deus, manifesto de maneira singular na Sagrada Escritura, a
história humana torna-se lugar de encontro e de experiência da salvação oferecida sempre e continuamente,
por Deus, a todo gênero humano, em Cristo.
http://www.puc-rio.br/sobrepuc/depto/teologia/semanateologica/deiverbum.html. Acesso em: 15 out.2007.
Figura 10 – Cruz Druídica Revelada
Fonte: www.bretagne-celtic.com/an/accueil_an.htm. Acesso em: 13 abr.2007.
122
A cruz é construída a partir de três círculos concêntricos cujos diâmetros
são: 81, 27 e 9 cm: o círculo com diâmetro 81 cm é o círculo do Divino ou Ceugant
rodeado pelas folhas de carvalho e seu fruto – a bolota; o círculo com diâmetro 27
cm é o círculo das Migrações ou Abred e o círculo com diâmetro 9 cm é o círculo
da Luz Branca ou Gwynfyd.
Os oito círculos que tangenciam o círculo de Gwynfyd são círculos de
passagem até a evolução final da alma para ocupar esse círculo de luz, o mundo
branco. Os quatro ângulos retos que formam os braços da cruz representam os
quatro elementos gwyar (água), fun (ar), uvel (fogo) e calas (terra) ligados a
um quinto – o nwyfre (éter).
O carvalho, para todas as ordens neodruidas, simboliza lealdade, força,
vitalidade e virtude. Árvore que alude à força moral e ao vigor necessário para os
praticantes do Druidismo Moderno. Sua longevidade está ligada à dedicação e ao
esforço em busca do aprimoramento espiritual empreendido pelo praticante. É
nela que encontramos o visco.
Figura 11 – O carvalho – Região da Bretanha - França
Fonte: www.bretagne-celtic.com/an/accueil_an.htm.
Acesso em: 13 abr.2007.
123
Os neodruidas, dessa ordem, estabeleceram uma correspondência entre as
árvores sagradas da Europa e árvores brasileiras, que foram sacralizadas. Como:
o carvalho, árvore do druida, foi substituído pelo jatobá e pelo jequitibá, o chorão
salgueiro substituiu a bétula, árvore dos bardos e o teixo, a árvore do ovate, foi
considerada o pinheiro do hemisfério sul.
As celebrações dos ritos no Colégio Druídico do Brasil, em função do
hemisfério sul, seguem a seqüência natural dos meses, ou seja, são ritualizados
os agentes sobrenaturais de acordo com a sazonalidade local. Seus adeptos
celebram o que denominam de Roda do Ano. Segundo eles, a necessidade de
se estar em consonância com a ordem natural do planeta.
2.3.2. Tríades
As 46 tríades principais foram traduzidas a partir do manuscrito “Cyfrinach
Beirdd Ynys Prydain” ou “O segredo dos Bardos da Ilha Britânica” e foram
relatadas na obra “A vindication of the genuiness of the ancient British poems” ou
“Uma justificativa da autenticidade dos antigos poemas britânicos” de Sharon
Turner, historiador inglês, em 1803. As “idéias” foram retiradas da coleção
manuscrita do bardo Llywelyn Sion, de Glamorgan (1560). Essas foram somando-
se às tríades mais recentes, compostas como se fossem antigas, e que embasam
o Druidismo Moderno francês. Não foram encontradas provas que as tríades
existissem durante o Paleodruidismo.
As tríades são formadas pela interligação de três tipos de ensinamentos, no
qual cada um complementa os outros dois. Eles são transmitidos de forma lógica
num sistema organizado. Elas “cantam” a evolução do ser humano através dos
círculos de migração até que se atinja a plenitude. Annwn ou círculo da
necessidade é o começo de tudo, Abred ou círculo da matéria, onde ocorrem as
sucessivas reencarnações até chegar ao rculo da beatitude onde se liberta da
forma material e da morte - Gwynfyd. A mudança espacial está diretamente ligada
à mudança e ascendência interior do ser humano. As tríades, para eles, foram
124
escritas para facilitar e orientar essa travessia. Abaixo as tríades são exemplos
dessa mobilidade espacial dentro da cosmogonia druídica. Exemplos de tríades
retirados do site www.bretagne-celtic.com:
Tríade 12 Três círculos de vida: O círculo de Ceugant”, onde
não nenhum outro a não ser Deus, nem vivo nem morto e
ninguém, a não ser Deus, pode atravessá-la; o círculo de
“Abred” (das transmigrações), onde cada estado germina da
morte e o homem o atravessa o presente e o círculo de
“Gwynfyd”, onde cada estado germina da vida e o homem a ele
viajará no céu. (Acesso em: 13 abr.2007 – grifo nosso).
Tríade 14 Três necessidades de toda existência na vida: o
começo no “Annwn”; a travessia do Abred” e a plenitude no
Gwunfyd”, sem essas três necessidades ninguém pode existir
exceto Deus. (Acesso em: 13 abr.2007 – grifo nosso).
No Brasil, essas tríades conduzem o estilo de vida desses adeptos da ordem
francesa.
2.4. Phillip Shallcrass e Emma Restall Orr e a British Druid Order/Druid
Network
A partir das décadas de 1980 e 1990, o Neopaganismo, alicerçado pelos
ares do Movimento Nova Era proporcionou a reinvenção de tradições advindas de
culturas antigas. O Neodruidismo de Ross não escapou desse fato. A OBOD foi a
mola propulsora de diversas ordens ligadas à tradição celta, ao longo dessas duas
décadas. Para essas ordens é por meio da ritualização que se rememoram mitos
celtas, geradores de uma forte atração e credibilidade atribuídos ao Druidismo
Moderno. É importante para os seus praticantes, o fato dessa religiosidade mesmo
que seja o “passado real ou forjado a que elas se referem impõe práticas fixas
(normalmente formalizadas), tais como a repetição” (HOBSBAWN; RANGER,
1984, p.10).
125
A British Druidic Order (BDO) - Ordem Druídica Britânica nasceu da
oportunidade dada pela OBOD. Criada em meados dos anos 1980 por Philip
Shallcrass e Emma Restall Orr chegou ao Brasil em idos de 2000, representada
por Cláudio Quintino Crow. Agora incorporada a Druid Network.
Os praticantes do Druidismo Moderno da British Druidic Order/Druid
Network realizam seus aprendizados em cursos rápidos seqüenciais e
esporádicos. Acreditam que tudo possui alma, na ancestralidade local e no Outro
Mundo. Suas práticas ritualísticas podem ser coletivas e individuais, celebram
várias festas incluindo, claro, as oito festas principais.
Num remodelar constante, acompanhando a aceleração e a fluidez da
modernidade tardia a BDO/Druid Network sincretizou outros elementos e otimizou
as práticas da vivência neodruídica. Seus praticantes são ávidos na procura da
awen druídica, que nos remete ao mana de Mauss, para criar um futuro melhor.
Segundo, eles essa era a proposta dos antigos druidas, um mundo de perfeita
harmonia.
De maneira geral, os neodruídas exaltam a maneira romântica druídica de
ser: sensíveis, sábios, justos, amantes da natureza, mediadores do sagrado,
manipuladores de ervas, pacíficos, hiperperceptivos e ainda, propaga a igualdade
entre os homens e as mulheres.
2.4.1. Etapas dos rituais
Os praticantes da BDO/Druid Network utilizam rituais, cerimônias, objetos
do poder e de alguns ensinamentos de Iolo. Acreditam que cada palavra da
oração de Iolo Morganwg tem uma força capaz de mudar tudo. E traz em si
associações que invocam os espíritos locais e ancestrais. Os adeptos em
situações difíceis se libertam e mostra a possibilidade de uma realidade outra
transmutada e curada.
126
Segundo Orr (2002a) o ritual neodruídico pode ser realizado em qualquer
lugar, pois para o adepto é preciso reconhecer o espaço sagrado a todo o
momento, na realidade, para ele este espaço está no íntimo de cada um. Portanto,
para a prática de um ritual é considerável a comunhão com o cosmo, relaxado,
envolto em um círculo imaginário previamente traçado onde se possa invocar os
elementos da natureza necessários para cada tipo de ritual. Vide anexo 1.
Caso o adepto realize-o em uma clareira solitária ou coletiva, terá um altar
com determinados objetos do poder que deverão ser ofertados aos agentes
sobrenaturais. Eles creêm que os objetos sagrados podem ser qualquer coisa,
uma pena, uma pedra, uma folha. O incenso é necessário para a purificação dos
objetos, do espaço e do tempo sagrados.
Uma vela ou um pequeno archote deverá ser colocado no centro do altar.
Assim, se fará presente “o fogo” que trará luz para o círculo gico. O fogo, para
eles, é um elemento de transmutação da energia. Ao lado colocam duas vasilhas
uma com água e outra com hidromel ou qualquer bebida, na falta da vasilhas
utilizam o caldeirão de ferro preto, que para eles simboliza o útero poder da
fonte criativa feminina.
Os novos druidas usam as armas de lâmina e com elas invocam o poder
simbólico da criatividade masculina, são utilizadas para o direcionamento do fluxo
de energia. O cajado do neodruida, por sua vez tem a função de ligar duas forças:
a telúrica e a cósmica. Confeccionado a partir do galho de uma árvore,
previamente autorizado pelo espírito da mesma, esse cajado poderá ter inscrições
ogâmicas que traduzem a awen compartilhada entre a árvore e o neodruida. (Orr,
2002a, p.67-97).
Segundo Orr (2002a), antes de praticar qualquer ritual é preciso verificar se
o adepto está em harmonia com todos e tudo no local e ter certeza do desejo de
realizar o ritual. Definir o templo (interior ou exterior), consagrar o espaço sagrado
(interior ou exterior), invocar os espíritos do local, o apelo por paz, exaltar aos
espíritos das direções (Norte, Sul, Leste e Oeste), agradecer aos espíritos dos três
127
mundos (Terra, Céu e Mar), os ancestrais locais, os ancestrais consangüíneos; e
somente após esses preparativos o nemeton estará fortalecido.
Faz-se novamente a declaração de intenção para o ato ritualístico. Os
deuses druídicos são invocados e o ato se inicia. Ao término o neodruida faz o
aterramento, desenergiza a clareira, procura perceber se a awen ainda flui. Se não
o processo é ir voltando lentamente para o local de origem. Se o ritual for coletivo
faz-se o esiteddfod, um lanche comunitário e o encerramento.
2.5. Stonehenge: A força mística dos megálitos e círculos líticos
Mesmo que os paleodruidas não tenham realizado obras faraônicas, como
túmulos, templos ou monumentos para a consagração de seus deuses e deusas,
muitas obras foram creditadas a eles. Um elemento que impulsionou a imaginação
sobre a religiosidade celta, junto com a figura do sacerdote druida, foram as
ostentosas construções megalíticas. No imaginário celta e seu corpo sacerdotal
tornaram-se uno em função delas.
A construção que projeta o maior mistério é o círculo de pedras de
Stonehenge. Esse monumento lendário de pedras colossais sobrepostas ficou
inculcado na mente das pessoas por séculos. Ninguém tinha resposta para a
questão: como tão grandioso monumento havia sido erguido?
Investigado a mando de reis e de estudiosos, a atribuição da construção e
utilização dos megálitos, dólmens e Stonehenge para atos cerimoniais e
ritualísticos ficou a cargo das artes sacerdotais druídicas. A magnitude do feito foi
tamanha que influenciou o decodificador da Doutrina Espírita, Allan Kardec
58
, no
século XIX.
As construções megalíticas, principalmente o Stonehenge, foram suporte
para consolidar a religiosidade celta no mundo moderno.
58
Cf. BASSO, Nadia G; LOPES, Marina S. A influência do druidismo contemporâneo no sincretismo
kardecista. Aler, 2006. Segundo a Doutrina Espírita Kardecista, uma das reencarnações de Allan Kardec
seria a de um druida da antiga Gália, daí a origem de seu nome. Seu corpo foi sepultado sob uma réplica de
um dólmen no cemitério do Père-Lachaise, em Paris.
128
Somente em meados da década de 1950, com o método de datação pelo
carbono catorze, é que o campo científico descobriu que essas “grandes pedras”
eram anteriores à presença das tribos celtas na Europa. Eram construções
erigidas por povos do período neolítico, cujos costumes, línguas, religiões e mitos
ainda são desconhecidos, face não se ter encontrado nenhuma inscrição nesses
blocos de pedra.
Segundo a National Geographic (abr, 2006), pesquisas recentes mostram
que o sítio arqueológico de Stonehenge, Patrimônio Cultural da Humanidade
(UNESCO), era um enorme assentamento que abrigou centenas de pessoas no
passado. Os arqueólogos argumentam que as casas, possivelmente, eram dos
construtores de Stonehenge, na planície de Salisbury, Inglaterra. Essas novas
descobertas revelaram que essa construção não era isolada, mas fazia parte um
complexo religioso bem maior e utilizado para rituais funerários, anterior aos
domínios celtas.
Figura 12 Composição de dólmen e menir na região da
Bretanha-França
Fonte:www.bretagne-celtic.com/an/accueil_an.htm. Acesso
em: 10 set.2007.
129
A palavra "megalitos" significa "grande pedra" em grego. Algumas
vezes ela é usada, erroneamente, para descrever os monumentos
megalíticos.[...] enormes blocos de pedra, dispostos às vezes em
forma circular, outras vezes simplesmente alinhados. [...]
"Menhir", uma pedra isolada que domina a região. [...] Até
recentemente os historiadores associavam a construção dos
megalitos ao chamado "povo Beaker". [...] Acredita-se que este
povo, e não os Celtas como comumente é dito, construiu
parcialmente o segundo estágio de um dos grandes monumentos
megalíticos que conhecemos: Stonehenge [...].(OBSERVATÓRIO
NACIONAL DE ASTRONOMIA, 2006).
Mesmo com as dúvidas que circundam o conjunto de pedras, ele passou a
ser um ícone da religiosidade celta. Na modernidade tardia, os druidas vêem o
Stonehenge como lugar sagrado dos fundadores da tradição, um geossímbolo
druídico. Neodruidas concentraram entre a década de 1960 e a de 1980 as festas
sazonais dentro do círculo britânico, atualmente é proibida a prática ritualística no
local. A intensidade geossimbólica leva muitas ordens a construírem suas réplicas
em seus países de origem e outras a desenharem a figura geométrica por uma
representação mental.
No contexto histórico e cultural da modernidade tardia o Paleodruidismo foi
ressignificado. Prossegue dentro de um imaginário que se desliga das imagens do
real e constrói uma realidade outra. Processo viabilizado pela imaginação, que
outorga aos druidas históricos, aos círculos de pedra e aos clãs celtas da Europa
pré-cristã, valores heróico-míticos, essenciais à criação de uma nova religiosidade
frente uma sociedade de excesso factual e de referências individualizadas.
130
CAPÍTULO III O DRUIDA CONTEMPORÂNEO: a busca do ideal de
espiritualidade por meio da transmissão do imaginário celta.
Introdução
O presente capítulo centra-se na averiguação e na análise interpretativa
das entrevistas realizadas entre fevereiro de 2006 e novembro de 2006 com cinco
adeptos do Druidismo Moderno. Para tanto foram utilizados os
depoimentos/repostas às perguntas semi-abertas. O capítulo tem quatro itens com
9 partes cada.
Ao longo do capítulo dar-se-á destaque para a nomenclatura de druidas
contemporâneos. Nomenclatura definida por eles mesmos, em detrimento ao
prefixo “neo” que, segundo eles, generaliza todos os grupos recentes e quanto ao
adjetivo moderno resvala no período romântico.
Na primeira parte do capítulo comenta-se a criação de um imaginário celta
na formação de novas religiosidades. Para tanto foram utilizadas as colocações de
François de Laplantine e Liana Trindade, auxiliadas pela noção de perfectibilidade
do ser de Anthony D’Andréa.
Na seqüência foram mostradas as transposições do Paleodruidísmo na
construção do Druidismo Moderno retomando as contribuições do ocultismo do
século XIX e o penetrante simbolismo druídico em suas ressignificações. Iniciam-
se deste ponto as análises do material coletado em campo.
O ponto terceiro alude à British Druid Order (BDO) inglesa, sua fundação
por Philip Shallcrass e Emma Restall Orr em seu apelo à alquimia interior e o uso
de símbolos conferidos ao Druidismo Histórico. Finda nas retratações figurativas
de deidades celtas por Cláudio Quintino Crow.
O mesmo Cláudio Quintino Crow é figura fundamental para a quarta parte,
pois além de representante da BDO no Brasil responde pela recém fundada Druid
Network que congrega a BDO e outros seguimentos druídicos. A matriz inglesa foi
131
adaptada à realidade brasileira, conforme se faz em todo o mundo. Essa
adaptação resultou no Caer Piratininga que tem o Ipê como árvore sagrada em
transposição ao Carvalho, sagrado no hemisfério norte.
Depois de comentar a BDO/ Druid Network em sua gênese e transferência
é rememorado o idealizador do Neodruidismo, Ross Nichols e a difusão prática de
suas idéias possibilitada pela globalização recente com a fluidez das fronteiras.
Verifica-se, também, como as práticas druídicas são difundidas pelo centro
esotérico Hera Mágica, a forma como se fundou a Druid Network e investiga-se a
clientela just in time da BDO/ Druid Network por intermédio desse centro.
O item terceiro dedica-se ao espaço geográfico e como ele foi
ressignificado, assim como a paisagem a fim de uma sacralização.
O último item do capítulo volta-se as formas pelos quais os druidas
contemporâneos buscam a verdade, divinizam seu cotidiano, percebem os
símbolos no território em que estão. E na parte final tem-se o modo pelo qual o
imaginário se espacializa nas interpretações da magia, da alteridade, da morte e
da literatura, por esse grupo.
132
1. A celticidade nas metrópoles
1.1. Transposição do imaginário celta para a formação de novas
religiosidades
A Nova Era invoca a religião do self perfeito. Nesta a “perfectibilidade é
condição de liberdade espiritual e premissa lógica de uma sociedade justa e
pacífica” (D’ANDREA, 2000, p.92) propicia o avivamento de culturas antigas e
importa o imaginário de vários continentes. Tais resgates formam um mosaico
multicolorido num novo sistema de crença situado em centros urbanos. A
espacialidade e a espacialização ocorridas velozmente no espaço geográfico
urbano permitem absorção e reinterpretação vorazes, principalmente no que diz
respeito ao contato com a natureza e a individualidade do ser.
Segundo Laplantine e Trindade (1996, p.25-27) a história imprime imagens
que levam à criação de um imaginário que por sua vez é dinâmico e possuidor de
uma realidade e essência próprias. Ele vem carregado de emoções e afetividade,
que se desenrolam num processo de criação única tanto no contexto individual
quanto no contexto coletivo. Para a formação do imaginário necessidade de
imagens originais, já conhecidas e decodificadas, com isso as suposições e
imagens se modificam e desencadeiam um processo criador que reconstrói ou
transforma a realidade.
O Druidismo Moderno, um dos componentes da Nova Era, desponta no
cenário urbano como uma ponte entre o passado celta e o imaginário presente.
Revolve antigas lendas, mitos, religiosidade e gênero de vida criando um
imaginário que se enquadra na espacialidade e na paisagem geográfica da
metrópole paulistana. O resultado, para seus praticantes, é a montagem de um
sistema próprio e pessoal de crenças.
133
1.1.1. O legado imaginário dos celtas
Quando fazemos alusão aos celtas imediatamente nosso imaginário
resgata imagens e símbolos que nos remetem a um passado histórico de um povo
místico, destemido, único, homogêneo e que pela sua força e valentia deu muito
trabalho aos romanos em sua incorporação ao Império. O imaginário celta está
embasado no gênero de vida e na religiosidade indissociável a figura do sacerdote
druida.
Apesar dos fatos históricos serem muitas vezes truncados, seu legado foi
desafiador para os pesquisadores e fascinante para os leigos. Deu dinamismo e
fortaleceu um imaginário que corre de geração em geração.
O legado celta conferiu veracidade a Arthur, Gwenever e Lancelot, causou
amor e morte a Tristão e Isolda, vida aos personagens shakespearianos, criou
mundos em Tolkien, coloriu as iluminuras de William Blake e seduziu aqueles que
leram As Brumas de Avalon de Bradley (1979). Protagonizou filmes, novelas,
contos, poesias, pinturas, games e religiões.
Abaixo, Gwaine mostra em seu relato o quanto esse imaginário fortaleceu a
reinvenção de uma tradição ou o nascimento de uma nova. Discurso imbuído de
emoção, criação poética e percepção do real para a transposição de um
imaginário.
“Eu nasci e fui criado numa região da Península Ibérica até os 18
anos. é uma região que tem forte influência celta. (...) Eu fui
criado numa aldeia do interior, então, todo esse ciclo da terra todo
esse ciclo de morte, de renascimento, da colheita, das
festividades eu acabei começando a identificar todos esses
pontos da cultura celta, embora, de uma certa forma
transformados pela Igreja Católica, e por toda cultura católica que
nessa região. Contudo, eu enxergava a sobrevivência desses
elementos dentro dessa cultura. Sentia algo que me levava a
procurar uma explicação cada vez maior dentro do xamanismo e
da minha origem. Do porquê, de eu ter essa afinidade com uma
cultura celta! Por tudo isso, fazendo esse curso de Druidismo para
poder me aprofundar mais na parte histórica, num conhecimento,
digamos, mais erudito, do que vivenciado do xamanismo! (...) mas
enfim, quando fazia as perguntas, elas não me eram respondidas
134
diretamente. Mas, todo mundo falava que eu tinha uma
linhagem antiga, que tinha muita gente atrás” de mim, que
era muito antiga a conexão que eu tenho com a terra que foi
dessa minha infância e adolescência remota numa região
extremamente de influência celta”. (grifo nosso).
Nos momentos intermitentes da história dos druidas, seu estereótipo foi
traçado de acordo com interpretações díspares. Ao mesmo tempo em que
coordenavam sacrifícios sanguinários e destronavam reis eram indivíduos repletos
de altivez e bondade. O imaginário celta se fortaleceu no movimento romântico. A
imagem do druida romântico foi a que resistiu ao tempo e se disseminou na
modernidade tardia.
O paleodruida passou a ser” o druida romântico, retratado como um velho
de barbas longas
59
, roupas brancas e largas, um cajado na mão e uma foice
dourada na cintura, características que remontam ao arquétipo do velho sábio ou
do bom mago.
Figura 13 – Druida Romântico
Fonte: www.imagens.google.com/imagens/druida
Acesso em: 04 mar.2007.
59
Essa imagem ficou tão verdadeira que algumas ordens e grupos chegaram a usar barbas falsas, até o início do século
XX.
135
Essa imagem divulgada durante o século XIX adentrou o século XX, para
ilustrar histórias em quadrinhos, como o personagem Panoramix de “Asteríx e
Obelix”, ou na Literatura em personagens como Gandalf de “O Senhor dos Anéis”
e em recriações cinematográficas como Albus Dumbledore de “Harry Potter”.
Imagens que oportunamente estavam bem próximas a iconografias católicas e se
consolidaram no imaginário. Entretanto, o esteriótipo do druida romântico foi
atualizando-se de acordo com a evolução da técnica.
O ocultismo do século XIX imprimiu um caráter reencarnacionista ao druida.
O fragmento abaixo, relato de Viviane, afirma não somente o reencarnacionismo
como também o trânsito religioso no Neodruidismo, aspecto explorado mais
adiante. No trecho, a entrevistada justifica sua tranqüila adaptação a essa nova
religião, em função de ser resgate de uma tradição “sólida” que detém plena
convicção na vida pós-morte.
Figura 14 – Druida Moderno. Estereótipo protagonizado
pelos filmes atuais
Fonte: www.imagens.google.com/imagens/druida.
Acesso em: 18 set. 2007.
136
“Eu já seguia uma linha kardecista. Para mim ameniza muito o
choque da partida e da perda. A gente a morte como o fim da
vida. E com o Druidismo você acaba vendo que tudo tem uma
morte. O dia tem uma morte, o relacionamento tem uma morte. A
morte sica nunca me assustou. perdi gente próxima. Eu sinto
a falta, mas não vejo isso como um término. Acho que o lado
kardecista fez amortecer o choque.(...) a morte, nunca foi uma
coisa assim de fim. Amigos meus que partiram eu mentalizo e os
vejo. Então, para mim não me assusta. Término de
relacionamento me assusta mais. Partidas temporárias me
impactam muito mais do que a morte em si.”
podemos entender a tradição céltica por meio do seu forte e penetrante
simbolismo e pela interpretação significativa de seus mitos, descritos sob a ótica
romana e posteriormente no período medieval. Estes elementos são
imprescindíveis para a compreensão da construção do imaginário neodruídico na
metrópole paulistana.
1.1.2. Os elementos catalisadores para alquimia interior
Os druidas contemporâneos trilham três caminhos: o da inspiração e da
criatividade, o da cura e da consciência e o do ritual e da transformação. Vide
anexo II. Para essa jornada a hiperpercepção e os agentes sobrenaturais ou
divindades são partes integrantes de suas vidas. As divindades manifestam-se por
toda paisagem, carregadas de símbolos e aprendizados. Segundo Orr (2002a,
p.38) a noção de deidade descreve uma fonte de poder. Em algum momento da
evolução da nossa história, os espíritos fortes subjulgaram os espíritos fracos,
tornando-se deuses.
Para eles, os deuses estão presentes na paisagem geográfica, espalhados
em variados espaços, contribuem para a hierofanização de: árvores, praças, rios,
lagos, montanhas, de todos os lugares possíveis e imagináveis. Por essa razão
os nativos caracterizam-se pela discrição, não ostentam símbolos materiais e nem
se apresentam com estereótipos. Procuram calar-se diante de indagações sobre
137
sua religiosidade. Apesar de uma territorialidade, efetiva ela o é nítida para
sociedade, como a de outros neopagãos. Como os símbolos são importantes no
mundo místico neopagão, esses novos druidas, também se utilizam deles.
Para os seguidores da BDO/Druid Network, o triban é a representação da
própria awen, opondo-se às ordens que veêm no triban a presença do Incriado:
[...] os pontos o as posições do sol nascente no Solstício do
Inverno (SE), nos equinócios (E) e no Solstício de Verão (NE). As
linhas ou raios saem da luz do sol, estimulando a vida, dando
inspiração. (ORR, 2002b,131).
Figura 16 – Cruz Celta
Fonte: http://www.bretagne-celtic.com/
an/accueil_an.htm.Acesso em: 13 abr.2007
Figura 15 – Triskel - com os sentidos
de rotação
Fonte:www.bretagne-celtic.com/
an/accueil_an.htm.
Acesso em: 13 abr.2007.
Outro símbolo relevante, mas não
tão forte no imaginário dos druidas
contemporâneos é a Cruz Celta.
Esse símbolo foi divulgado pelos
mesodruidas, num resgate celta do
período de cristianização.
Os triskeles e as espirais eram
símbolos muito comuns na Europa
continental, as populações autóctones
usavam-os como ornamento e proteção. No
Neodruidismo eles possuem vários
significados: ciclo da vida (Infância,
Adolescência e Velhice), três elementos
(Gwyar, Fun e Calas) ou a trajetória do sul.
Os triskeles possuem dois sentidos de
rotação: a esquerda indica o negativo, o mal
e a guerra; a direita indica o positivo, o bem
e a paz.
138
As "Tríades da Bretanha" o epigramas de difícil interpretação, pois
misturam conselhos de ordem prática a reflexões filosóficas. A compreensão delas
se torna complicada nos dias atuais, pois segundo Le Roux e Guyonvarc’h (1993):
Seu o estilo é desajeitado e desastrado, segundo as nossas
concepções modernas, se os episódios sobre os quais um autor
contemporâneo faria um livro são publicados em duas ou três
linhas, é porque os transcritores não lhe atribuíram importância:
as frases são simples, geralmente curtas; as ligações são
freqüentes, mas sem variedade, com uma grande quantidade de
pleonasmos e de redundâncias de repetições, de elipses e de
subentendidos.A base de expressão é a metáfora ou, por vezes, a
figura etimológica, processos indo-europeus muito antigos. O
estilo corrente acumula os epítetos e os qualificativos sem ligação
verbal, as fórmulas triplas e os sinônimos, o que ao mesmo tempo
é pitoresco, brutal e pueril. Tudo isso se adequa muito bem à
frase céltica, de ritmo rápido, mas de fôlego curto [...]. (LE ROUX ;
GUYONVARC’H, 1993, p.91).
De acordo com Crow (2007, informação verbal)
60
, “as tríades são uma das
muitas fontes do ensino druídico. Na BDO/Druid Network o estímulo é pela
pesquisa individual”. Viviane professa-se sobre a tríade da maneira seguinte: “tem
uma tríade galesa que diz que os três desejos do druida são: curar a si mesmo,
curar a comunidade e curar o mundo”, percebe-se que a entrevistada atribui esta
tríade aos galeses a fim de atestar sua historicidade, ilustra, com isso, os
ensinamentos neodruídicos da BDO/Druid Network, como um aprendizado
autodidata.
O imaginário celta na modernidade tardia reforça o caráter trino dessa
religiosidade. Esse caráter é manifesto pela: Donzela, Mãe e Anciã, atributos de
boa parte das deusas celtas. Representações das divindades célticas foram feitas
e organizadas no O Livro de Mitologia Celta de Cláudio Quintino Crow,
representante da BDO/Druid Network no Brasil.
Tais retratações foram criticadas pelos celtólogos brasileiros. Segundo eles,
as imagens não retratam deuses e deusas do Druidismo Histórico, uma vez que
60
E-mail sobre as Tríades de 30 out.2007.
139
os celtas não possuíam modelos antropomórficos de representações divinas. As
representações só foram tomando forma pelo sincretismo aos dogmas cristãos. Ao
analisarmos essas retratações percebemos um padrão de beleza moderno com
certa sensualidade. Os atributos dados às essas entidades são os mesmo do
Paleodruidismo. Confira as figuras a seguir:
Figura 17 - Dagda, o deus druida
Fonte: O Livro da Mitologia Celta, p.135.
140
Figura 18 – Brigit, deusa dos poetas, dos ferreiros e dos curandeiros
Fonte: O Livro da Mitologia Celta, p.63.
141
Figura 19 – Lug, deus solar e luminoso
Fonte: O Livro da Mitologia Celta, p.101
.
142
Figura 20 – Macha, deusa dos cavalos, das batalhas e da soberania
Fonte: O Livro da Mitologia Celta, p.91.
143
Figura 21 – Oghma, deus da eloqüência, palavra e da guerra.
Fonte: O Livro da Mitologia Celta, p.79.
144
Muito embora esses ícones procurem mostrar deuses e deusas celtas, eles
não são necessariamente utilizados por todas as ordens druídicas existentes. Mas
Figura 22 – Morrigan, deusa da guerra, da morte, da soberania, da
fertilidade e do amor
Fonte: O Livro da Mitologia Celta,
p.115.
145
é muito possível que um grande número de druidas contemporâneos veja tais
divindades na paisagem urbana, as ressignifiquem e mantenham, criem ou
misturem ritos destinados a elas.
1.1.3. O Neodruidismo na tropicalidade brasileira
Quanto à paisagem geográfica, as ordens neodruídicas brasileiras
estabelecem uma correlação entre as árvores sagradas das florestas temperadas
e as árvores das florestas tropicais, adaptando assim, às condições climato-
botânicas do hemisfério sul.
Para os nativos da BDO/Druid Network a sacralização entre os grupos
vegetais da Europa e do Brasil são respeitadas, porém, o vital é ritualizar o espírito
local. A espacialização de seus ensinamentos acontece em clareiras que se
conectam à ancestralidade e espíritos locais, de grupos indígenas brasileiros.
Como por exemplo, a formação da primeira gorsedd brasileira Caer Piratininga
61
afiliada à Druid Network.
As tribos brasileiras possuíam pelo menos um bari ou pajé, como
é mais conhecido. Este possuía uma ligação direta com as
divindades, era muito sábio e eleito pela própria Natureza por
suas ligações com ela. Possuía dons de cura, de predizer o
futuro, podia se transformar em animais e seus conselhos eram
seguidos por todos na tribo. Isto lhe dava uma posição de líder
tribal. Podemos notar estas mesmas características nos druidas
dos povos celtas que muitas vezes tinham mais poder que o
próprio rei, além dos dons de cura, divinação, etc. Lembrando que
não é uma exclusividade masculina, mas também feminina, já que
também existiam druidesas e pajoas.
(MARCOS REIS, Caer
Piratininga. www.drudismobrasil.com.br. Acesso em: 19. jan.2008-
grifo nosso).
61
Caer palavra galesa que significa: estrutura circular. Piratininga alude ao primeiro nome da cidade de São
Paulo.Com a ameaça dos povos indígenas na então Vila de Santo André da Borda do Campo (1553), José de
Anchieta e Manoel da Nóbrega escalaram a Serra do Mar e chegaram ao planalto de Piratininga, onde
encontraram “ares frios e temperados como os de Espanha” e uma “ terra mui sadia, fresca e de boas
águas.(...) Situava-se numa colina alta plana, cercada por dois rios, o Tamanduateí e o Anhangabaú. Emplasa:
Memória da Região Metropolitana de São Paulo, 2000.
146
Essa gorsedd dedica-se à prática e difusão do Druidismo Moderno no Brasil
substituiu o clima temperado europeu pela tropicalidade brasileira. A gorsedd
nasceu da Nemeton Tabebuya. A nominação veio da junção entre as clareiras
sagradas dos celtas e Tabebuya que em tupi significa Ipê Amarelo
62
, consagrada
como a Árvore Sagrada do Brasil. Assim, Nemeton Tabebuya, significa Bosque
Sagrado de Ipês Amarelos. Dessa maneira, esses adeptos acreditam estabelecer
uma ponte de inspiração unindo as terras espiritualmente mágicas celtas e
brasileiras.
Benção do Ipê
Nutre sua fome das entranhas das terras do cerrados. Sua pele
retorcida lembra as batalhas vencidas em nome da vida e da
permanência.
Traz em suas cascas rugosas a sabedoria de muitas
experiências.
Abre-se como criança faminta ao leite fecundo das épocas
chuvosas.
Nutre no caldeirão dos renascimentos e se renova com o verde de
todas as nossas florestas.
A noite outonal lhe chama para o repouso e o silêncio meditativo.
Despe de suas roupas e se coloca nua às forças da gestação.
Quando todos ainda dormem, desperta, sorrindo: risos amarelos
emoldurados de céus azuis.
Os olhares de todos encontram em suas cores as esperanças de
matizes diversas
Que a donzela primaveril traz em seu ventre.
Abençoada sejas: Ipê Amarelo.
Mãe Tabebuya Áurea
Senhora sempre antiga e nova.
Abençoadas sejas, pois sabes quando florescer e quando
adormecer.
Abençoadas sejas, pois acolher e doar nos tempos certos.
Que seu Espírito nos ensine sempre a estar imersos na dança
cíclica das estações em Terras de Pindorama! (MARCELO
CUCHULAINN, www.drudismobrasil.com.br. Acesso em: 19
jan.2008).
A oração em destaque mostra o sincretismo de culto e de crença entre a
formação vegetal nativa brasileira e o carvalho nos paleo, meso e neodruidas de
62
Árvore símbolo do Brasil. Nome cientifico:
Tabebuya alba.
147
climas temperados. Centrados nas prerrogativas definidas por Orr (2002a) que
nos descreve:
[...]
o fluxo de energia vital está sempre em constante mutação, e
isto fica especialmente óbvio em uma ilha de clima temperado. Os
botões da primavera se abrem, macios sob a chuva fria,
alongando-se no verão antes de adotar a coloração dourada sob
as luas da colheita, para então liberar seus grãos e dançar
livremente ao sabor dos ventos frios do inverno. É a partir desta
compreensão da vida como um rio que flui que recebemos o
cerne da prática druídica: a awen.(ORR,2002a, p.149).
Figura 23 - Ipê Amarelo – Cerrado – Região Centro-Oeste
Fonte: www.druidismobrasil.com.br. Acesso em: 19 jan. 08.
O grupo em questão sacraliza o ipê amarelo, pois é essa árvore que faz o
prenúncio da primavera no Brasil com sua copa repleta de flores. Mantém-se
verde no verão e desnuda no outono e inverno. Seu significado em tupi é "madeira
que se deixa levar pelos fluxos das águas", "madeira flutuante", cuja metáfora é
aplicada pelos druidas contemporâneos da BDO/Druid Network como o objetivo do
druida: a awen, a inspiração “para melhor aproveitar os fluxos naturais da
correnteza da vida, da Natureza, e de nós mesmos”. (www.drudismobrasil.com.br.
Acesso em: 19 jan.2008).
148
2. O espaço sagrado de acordo com as necessidades imediatas
2.1. Ross Nichols na teia druídica
2.1.1. Hera Mágica
Em 1964 Ross Nichols fundou a Order Of Bards, Ovates and Druids (Ordem
dos Bardos, Ovates e Druidas) OBOD. Marcada pela contracultura e
posteriormente pelo espírito da Nova Era, estimulou uma profusão de novas
ordens druídicas dentre elas British Druidic Order (Ordem Druídica Britânica)
BDO. Criada em meados dos anos 1980 por Philip Shalcrass e Emma Restall Orr
chegou ao Brasil em idos de 2000 representada por Cláudio Quintino Crow,
posteriormente incorporada à Druid Network.
Face à dinâmica tecnico-científico-informacional trazida pela globalização
recente a BDO passou a ser divulgada em âmbito mundial por meio da internet.
Isso contribuiu para a ampliação das fronteiras culturais da ordem e permitiu sua
reformulação e renomeação, cria-se a Druid Network, responsável por congregar
todos os interessados nos ensinamentos neodruídicos.
Nessa reformulação a BDO passa a ser parte da Duid Network pela qual
seus ensinamentos são transmitidos junto a outras doutrinas em confluência ao
Druidismo Moderno. A BDO ainda existe, mas suas atividades estão suspensas
temporariamente, seus ensinamentos continuam pela Druid Network sincretizados
com outros que aludem à cultura celta ressignificada, como, por exemplo, o
Xamanismo Celta.
Um dos espaços físicos responsável pela difusão da BDO em São Paulo é
a Hera Mágica. Trata-se de um núcleo esotérico dirigido por três pessoas: Cláudio
Quintino Crow, Patrícia Fox e Priscila Machado. Crow e Fox foram iniciados no
Druidismo Moderno por Emma Restall Orr, e seus nomes, não são
149
necessariamente inciáticos nem remontam ao Druidismo, mas sim ao Xamanismo
Totêmico.
Na Hera Mágica são desenvolvidos cursos ligados a diversas
espiritualidades Nova Era como: Mistérios de Afrodite, Espiritualidade Feminina,
Bruxaria do Bem, Xamanismo Feminino, Dança do Ventre, Yoga; e outras
atividades como: a terapia: Deusa e a Mulher; e o Oráculo On-line. Dentre esses,
interessa a esta dissertação o curso de Druidismo Moderno, ministrado por
Cláudio Quintino Crow.
O núcleo esotérico situado na Vila Mariana, um bairro de classe média alta.
Insere-se no quadro definido por Magnani em seu trabalho: Mystica Urbe (1999),
onde define o circuito esotérico da cidade de o Paulo. Verifica-se que um local
de fácil acesso ligado ao alto nível de escolaridade, à boa posição financeira e à
quantidade de informação contribuem para o esparramo de núcleos Nova Era em
bairros privilegiados, nem sempre com sede própria, como é o caso da Hera
Mágica.
A perspectiva de um trabalho acadêmico foi muito bem vinda para os
adeptos e coordenadores do espaço holístico. Bastante receptivos se
prontificaram a participar das entrevistas. As entrevistas eram realizadas minutos
antes dos cursos se iniciarem.
Antes de adentrarmos ao recinto reservado para o culto, Cláudio Crow
“preparava” o espaço sagrado com meditações, saudações aos espíritos locais e
aos quatro pontos cardeais. Todos entravam de pés descalaços e se dispunham
sentados em círculo num chão acarpetado, apesar das cadeiras preparadas
para o acontecimento.
Ao centro do círculo, um caldeirão negro de ferro envolto a objetos
sagrados, que faziam alusão aos três mundos e aos cinco elementos.
A sala de tom violáceo ostentava ao centro de uma das paredes um grande
triskel. Ao lado um pequeno altar onde se misturavam imagens de divindades
orientais: japonesas, chinesas e hindus. Tais imagens deixaram transparecer
nitidamente, que o espaço era utilizado para outros ritos e consagrações de outras
150
religiosidades sincretizadas. Ao fundo da sala, objetos variados se dispunham
para venda, desde livros sobre o Drudismo Moderno a incensos.
Sempre muito integrados, todos os participantes falavam animadamente
sobre a semana e como os ensinamentos druídicos repercutiam na sua vida e o
que esperavam da aula do dia.
Figura 24 – Espaço Holístico Hera Mágica.
Fonte: Arquivo pessoal de Patrícia Fox – 2006
Figura 25 – Altar com diversas divindades orientais
Fonte: Arquivo pessoal de Patrícia Fox
-
2006
151
2.1.2. BDO/Druid Network e seus druidas contemporâneos
O Druidismo Moderno da Druid Network transita pela “web”, e se ratifica
pelos cursos. Nestes, segundo Crow, aprende-se “tudo” a respeito da cultura celta
ensinado com seriedade e sensibilidade, não somente a cultura celta é ensinada,
mas também as práticas dos druidas e druidesas antigos que são reinterpretadas
de acordo como o cotidiano da metrópole.
Os temas abordados num curso de nove meses, com o valor de R$100,00
são: O que é druidismo?”, “Druidismo e Xamanismo (elementos tradicionais)”,
“Quem o os celtas?”, “Passo-a-Passo de um Ritual Druídico”, “História do
Druidismo”; “O Outro Mundo: uma visão celta”, “Como Acessar o Xamã Interior”,
“Técnicas de Jornada ao Outro Mundo”; “Animais de Poder e Totem Pessoal”; “Os
três Caminhos do Druidismo: Bardo, Ovate e Druida
63
”; “Um Druida Moderno”; “Os
Três Mundos”; “Ancestralidade: Herança e Linhagem”; “A Roda do Ano Celta”;
“Nemeton Pessoal”; “Magia e Druidismo”; “Deidades Celtas”; “Organizações
Druídicas”; “Jornada de Cura da Terra” e “Celebração”.
Esses cursos são apostilados vide anexos seqüenciais e os encontros
acontecem semanalmente por duas horas. A seqüencialidade é opcional, varia
conforme o interesse do aluno. Quando terminado os estudos druídicos não
necessariamente um vínculo entre aluno e druida-lente, vêm novos alunos, estes
irão embora, outros chegarão, é um trânsito contínuo que resulta numa relação
just in time de clientela com a Hera Mágica.
Cerca de cem participantes receberam os ensinamentos neodruídicos
desde 2002 até novembro de 2006. A maioria dos participantes tem instrução
superior e bom nível sócio-econômico, originam-se das mais variadas regiões da
cidade, mas sempre localidades de alto-padrão como: Alto da Lapa, Alto de
Santana, Itaim Bibi, entre outros.
63
Fica, aqui, clara a diferença entre a BDO/ Druid Network e o Colégio Druídico do Brasil, no tocante as
categorias hierárquicas, em que no primeiro temos três níveis e no segundo um a mais.
152
O grupo estudado a partir de fevereiro de 2006 era composto inicialmente
por vinte e cinco membros. A faixa etária variava entre 23 e 60 anos, e tinha como
maioria numérica as mulheres. Estas, em sua maior parcela não concluíram o
curso, no entanto os homens, mesmo configurando a minoria, mantiveram-se até
o encerramento em novembro de 2006. Esse trânsito de pessoas é intensificado
pela desobrigatoriedade de filiação a Druid Network, diferentemente de algumas
outras ordens.
O curso ocorrido durante o período do presente estudo formou dezesseis
pessoas. Dentre elas cinco foram selecionados aleatoriamente para responder ao
questionário semi-aberto. Entre os entrevistados três eram mulheres. Os homens
eram profissionais de áreas técnicas como engenharia e informática. Elas por sua
vez apresentavam características profissionais díspares. A faixa etária dos
entrevistados variava entre os 20 e 30 anos, apenas um deles excedia a essa
idade e contava com 40 anos.
Durante as entrevistas buscou-se saber como o imaginário neodruidico se
configura na cidade de São Paulo. As entrevistas aconteceram na antiga sede da
Hera Mágica, com uma periodicidade esparsa sendo a primeira em 13/02/2006 e a
última em 09/10/2006.
Os dados colhidos foram divididos em oito variáveis: Entrada no
Neodruismo, Religiosidade, Religião ou Filosofia, Práticas Religiosas, Símbolos,
Magia, Morte e Literatura. A partir delas foi feita uma interpretação onde:
espacialidade, espacialização, território e territorialidade inseridos no espaço
geográfico, paisagem Geográfica, fronteiras culturais, globalização, tradição e
magia confluíssem na interpretação do imaginário via Geografia da Religião.
2.2. Clientela just in time
Conforme foi mostrado a Hera Mágica é um espaço holístico que congrega
inúmeras espiritualidades Nova Era. Indo desde o Druidismo Moderno passando
153
por práticas orientais, terapias e previsões. Devido à multiplicidade de ofertas tem-
se uma multiplicidade de passantes. Estes se caracterizam em acordo com as
prerrogativas Nova Era, entre elas: ausência de obrigatoriedade com paradigmas,
crença na reencarnação, compromisso com o planeta, sustentabilidade científica e
ancestralidade.
Contudo, muitas dessas prerrogativas podem ser encontradas noutras
espiritualidades, fator que contribui para o intenso trânsito religioso que acontece
no Neodruidismo. A própria Hera Mágica é uma facilitadora desse trânsito, pois ao
mesmo tempo em que se faz um curso sobre o Druidismo Moderno é possível que
se faça um curso para iniciar-se nos Mistérios de Afrotide, embasado na mitologia
grega.
Esses adeptos terminam por caracterizar muito mais, uma clientela passiva
a comprar vários produtos se bem atendida, do que membros de uma religião.
Uma das entrevistadas, Morgana, se expressa sobre sua chegada na Hera
Mágica: “Comecei a ler um livro do Cláudio que é A Religião da Grande Deusa.
Comecei a vir em palestras, aqui na Hera”. Nota-se pelo comentário da praticante
que foi a partir de um livro, compreendido aqui, em certa medida, como
propaganda, que foi ao espaço holístico para aperfeiçoar seus aprendizados.
O aperfeiçoamento habita os interesses particulares, foca-se numa
pretensa melhor compreensão do fenômeno neopagão e suas relações, Morgana
assim se expressa sobre o interesse no curso: “Vim fazer curso da Hera para
poder entender melhor o diálogo desses neopagãos”.
Os interesses particulares somam-se à necessidade de compreender a
própria fé. Gwaine, outro entrevistado, por ter origem ibérica, região de
ancestralidade celta, crê na existência de uma ligação geo-temporal entre sua vida
e sua religiosidade. Foi, então, que buscou a compreensão da religiosidade nos
cursos da Hera Mágica.
“[...] eu acabei fazendo cursos aqui dentro da Hera Mágica e eu
acabei fazendo esse curso. Iniciar nesse curso de Druidismo pra
me aprofundar muito mais na parte histórica, num conhecimento
mais...digamos erudito do que vivenciado do xamanismo né!”
154
A grande variabilidade de cursos oferecidos não implica em filiação a grupo
algum, conforme informa Crow, pois a própria Druid Network não requer elo de
indivíduo ou grupo para contato e participação na comunidade druídica.
A ausência de elos e o número elevado de cursos contribuem para o
sincretismo. Os praticantes variam e sincretizam suas crenças compilando uma
considerável mistura. Essa mistura pode vir de qualquer lado, seja do oriente
próximo, seja do oriente distante e até mesmo dos grupos indígenas locais
reinterpretados. Como atestam as informações dos entrevistados:
“Quem segue os gregos e são muitos que seguem. Algumas
pessoas que seguem os celtas tem adotado essa prática. Mas, a
gente segue muito o deus grego Hermes, das comunicações. Os
gregos concebiam ao deus Hermes como o cargo de mensageiro
alado que trazia as mensagens dos homens no começo. Mas, ele,
também, tinha toda uma esperteza, todo um jeito de lidar com o
mundo. Ele era um deus comerciante também, era o deus dos
ladrões tinha toda uma multifuncionalidade e ele no cenário
urbano é encarado como o deus participante que pertence a esse
caos. E eu fui aprendendo aos poucos como lidar com
Hermes”.(MORGANA).
“Eu praticamente não sigo fadas ou deuses celtas. Eu trabalho
mais com três tipos de deuses. Um deles nem faz parte do
panteão celta, que é Hermes. Outro é a deusa Brigit, que é a
senhora da forja e com Cernunus que é o senhor das florestas e
das feras. Hermes que é o senhor das comunicações”. (GALAAZ).
Conforme se nota pelas duas afirmações tem-se no Neodruidismo um
sincretismo capaz de reinterpretar um deus e transferi-lo de uma cultura à outra,
caracterizando uma fronteira cada vez mais porosa entre diversas religiosidades.
155
2.3. A vivência da ancestralidade local
A reinterpretação e a transferência de deuses não são o único resultado da
troca contínua entre as fronteiras. Outro caso de sincretismo nessa religiosidade é
a sacralização da paisagem local.
A idéia de que os paleodruidas consagravam deuses locais, transferiu-se
para o Brasil. Crow (2007) explica essa transferência da seguinte forma:
“Um dos pontos fundamentais do Druidismo é reconhecer as
características de um local (qualquer local), compreendê-las,
respeitá-las e incluí-las em suas práticas - o que vale dizer que o
Druidismo por mim apresentado é originário da Grã-Bretanha e
adequado ao Brasil sendo, por isso, diferente de um curso de
Druidismo lá. Aliás é bom que se diga que mesmo na Grã-
Bretanha, os ensinamentos druidicos variam de local para local,
leva-se em conta as variações regionais, as mudanças da
paisagem, o clima de cada local, a influência humana em cada
região e assim por diante”. (CROW, 2007, informação verbal)
64
.
A experiência de consagração do espírito local é a adaptação entre o
Druidismo aprendido e o Druidismo local e individual, assim Igraine expressa:
“[...] eu mesclo com a terra em que eu vivo né, eu não desprezo a
terra em que eu estou pisando em favor de uma terra que está
longe. Mas que está dentro do meu coração também, então, a
idéia é mesclar as duas coisas. Dagda, Brigit, Morrigan, todos
esses são deuses de culto dentro da religião druídica, mas sem
deixar de fora os outros espíritos que também estão aqui”.
Há, portanto, uma dialética entre aquilo que se aprende sobre o Druidismo
de origem e a região em que se vive. Nesse sentido configura-se uma
religiosidade que acompanha a globalização recente no que diz respeito a sua
mundialização. Assim, ao mesmo tempo em que essa tradição se dissemina pelo
globo, ela privilegia, e estabelece uma relação com o local.
64
E-mail Ancestralidade Local recebido em 19 dez. 2007.
156
O sincretismo exacerbado aliado à releitura animista do Paleodruidismo
permite diversas atribuições ao espírito local, por isso é possível que um druida
contemporâneo defenda que:
“Você não precisa chamar os deuses celtas, celtas da Europa,
você pode reconhecer os espíritos do lugar que você mora,
porque a religião druídica é uma religião animista, onde você
reconhece o espírito de tudo, tudo tem espírito, uma idéia tem
espírito, uma cadeira tem espírito, uma paisagem tem espírito, o
fato de se reconhecer e honrar esse espírito você está
cultuando um deus”. (IGRAINE).
Apesar de haver uma relação sincrética e afetiva entre o ele e o local em
que vive, nota-se, nos indivíduos uma afeição pela celticidade explorada nas
narrativas medievais. O fato promove um saudosismo, que muitos atribuem a uma
reencarnação nas regiões de espacialização celta. Um exemplo é a entrevistada
Igraine que assevera:
“Sempre me encantei muito pelas terras celtas, pelo clima, pela
Irlanda, pela Escócia, sei lá, pela Inglaterra, pela Gália, sempre
gostei daquela névoa, daquele verde, mas eu também gosto
desse... é uma coisa mais profunda”.
É possível, nesta análise, dizermos que num mundo globalizado onde as
fronteiras são transpostas com um simples clique, os druidas contemporâneos
permitem-se ressignificar mitologias. Por meio dessa ressignificação consagram
locais distintos e defendem uma espacialização em territórios aos quais seus
sentidos nunca tocaram.
157
3. Espaço e paisagem geográfica: o indissociável no gênero de vida do
druida contemporâneo
3.1. A sacralidade da paisagem urbana
A paisagem geográfica, conforme observado, o é estática. Ainda mais
quando se trata de uma paisagem urbana, pois esta é passiva de inúmeras
interferências antropogênicas e naturais. Essas interferências ocorrem em dois
momentos, no primeiro, temos a espacialidade, onde a relação é subjetiva e
estrutural; o segundo é a espacialização objetiva e funcional. (Fernandes, 2007).
Ambos são variáveis de acordo com as interferências dos atores da paisagem.
A espacialidade e a espacialização são aplicáveis à religião. Os novos
druidas, também as imprimem. Partes da paisagem que para os não-neopagãos
são destituídas de significado, para os adeptos do Druidismo Moderno não são
significativas, como também são sagradas. Morgana é capaz de identificar tal feito
na paisagem em que vive:
“Eu falei o que eu vou fazer? Aí eu lembrei dessa história do
Hermes e das pedrinhas na encruzilhada. Então pensei: Putz! Eu
tenho que colocar as pedrinhas na encruzilhada para o deus
Hermes. a gente tava voltando para a faculdade e começamos
a pegar pedrinhas do chão, lá na USP. Depois eu levei as
pedrinhas para casa e numa segunda-feira dessa semana muito
difícil, eu tive que sair, foi o primeiro compromisso. Imagine eu
toda executiva de salto alto, detesto salto alto, me sinto muito
estranha e desconfortável, fico toda preocupada toda ansiosa na
pracinha da frente da minha casa. na esquina fazendo um
bolinho de pedras e pedindo a Hermes, que me ajudasse pois a
semana prometia muitas preocupações.”
Percebemos que a entrevistada conclui seu raciocínio com a idéia de que
tudo é sagrado, conclusão que vai ao encontro da opinião de Viviane que sacraliza
o local, a natureza e seu espaço geográfico.
158
Assim, Viviane se posiciona:
“Primeiro honrar o local onde você esta. Como a sua casa. Se
você tratar o espaço urbano como a sua casa, como, por
exemplo, não jogando lixo na rua. (...) também gosto muito de
ecologia, faço parte de alguns grupos, ongs. Então não é a
consciência de não sujar o meio ambiente, não jogar o lixo na rua.
Eu prefiro comprar papel reciclado, pago um pouco mais caro,
mas compro reciclado. Verificar se alimentos, ou outras coisas
que estou comprando para a minha casa, para mim, são de
materiais biodegradáveis e recicláveis. Sempre comprar coisas
que não vão agredir o meio ambiente ou então empresas, eu
escolho empresas que não impactem tanto no meio ambiente”.
Essa sacralização do local torna-se obrigatória, em certa medida prova o
druida contemporâneo, e para alguns é até difícil de ser cumprida. Este é caso de
Igraine, que apesar da dificuldade não deixa de tentar:
“Tá sendo aos poucos né, porque minha criação não foi essa.
Então, por mais que essas coisas, a maioria eu sinto que já
estavam dentro de mim, eu estou escutando do lado de fora. É
difícil você tirar os velhos costumes e colocar costumes novos.
Como a tradição druídica como outra pagã a natureza como
sagrada, acho que a principal coisa que me força a fazer, é ter
uma vida ecologicamente correta né. Porque você respeita o seu
sagrado, o seu deus é a natureza. Eu não posso desrespeitá-la de
uma forma como gastar os atributos naturais de uma forma
desonrosa, desrespeitosa. Então, como eu disse, eu ainda estou
me esforçando pra ter uma vida um pouco mais ecologicamente
correta, economizando água, economizando bens naturais. É
tentando ajudar com causas de animais, mesmo de humanos né.
Tudo isso eu tentando entrar, fazer com que isso faça parte da
minha rotina, como escovar os dentes ou tomar água e dormir. A
gente faz pequenas coisas, a gente às vezes faz arrecadação. Às
vezes o Cláudio mesmo palestra e a gente arrecada alimentos
pra cachorro, pra gato, tudo isso... O grupo está iniciando, iniciou
esse ano então, estamos caminhando para essa intenção”.(grifo
nosso).
A preocupação com a paisagem, adjetivada como sagrada e protegida pelo
neodruida é um resultado das críticas de Roger Bastide (2006, p. 196-197) sobre
159
as mudanças que colocaram a cultura acima da natureza. Com isso a segunda
sofreu intempéries da primeira e agora se tornou a grande preocupação da
modernidade tardia. Pois a natureza, conforme inúmeras prerrogativas vigentes,
foi e tem sido destruída, necessita, portanto ser protegida e na medida do possível
resgatada, conforme o fazem os adeptos do Druidismo Moderno. Cabe, aqui,
retomar, a metonímia prometêutica à humanidade, delineada por Bastide (2006):
Prometeu quis explorar os limites da condição humana para tomar
o lugar da divindade e recriar o mundo segundo outra norma que
não a da primeira criação. Observa-se, aliás, que Zeus não se
contenta em punir Prometeu (...) mas, a humanidade como um
todo, que o aceitou, e por isso, os deuses farão com que ela
perca as vantagens obtidas dando-lhe, junto com o progresso,
novos males que irão compensar seus benefícios, os males que
irão sair da caixa de Pandora: as doenças, as inimizades, as
guerras [...].(BASTIDE, 2006, p.194).
É, portanto o neodruida, um daqueles que lutam contra os males da caixa
de Pandora. Lutam sacralizando o mundo, preocupando-se com a natureza e
dedicando-se ao outro.
Nessa retórica o espaço profano transmuta-se em sagrado, para o
praticante, quando ele pode: em uma praça pública ou, em diferentes logradouros,
depositar “pedrinhas”, ou outros objetos coletados a revelia, e transformar com
esse ato a paisagem numa manifestação hierofânica para deuses locais ou de
territórios mítico-sincréticos. Essa mobilidade permite a Morgana sacralizar,
também, seu ambiente de trabalho:
“Tem vezes que chego ao trabalho, e penso, que preciso me
concentrar, então, se puder externar um lugar de concentração,
acendo um incenso não muito forte, para não incomodar as
pessoas. Porque eu tenho muito medo de ser inconveniente. Pelo
menos para mim, essa preocupação de ser intolerante, não
quero fazer como os cristãos. No sentido de querer empurrar o
que você acredita para todo mundo e todo mundo tem que tolerar
aquilo, porque tudo vai ser entendido. Mentalizo e delimito aquele
espaço para concentração, espaço de calma, pois é o meu local
de trabalho. Abro as janelas, um mantra é entoado e daí começo
a trabalhar.” (grifo nosso)
160
Pode-se ver pela entrevista que um espaço considerado, comumente, como
profano torna-se sagrado e passa a ser parte do rito neodruídico. Marca-se, ainda,
por este depoimento uma importante característica do movimento Nova Era a
intolerância para com as religiões institucionalizadas.
No capítulo 2 mostrou-se a organização das festividades celtas. Os druidas
contemporâneos estão num tempo e lugar distante em relação aos druidas
históricos, mas ainda mantém estas comemorações e somam a tais ritos
invenções mesodruidicas de comemorações sazonais.
Pelo fato de os solstícios e equinócios serem exatamente contrários entre
hemisfério norte e hemisfério sul, os druidas contemporâneos correlacionaram as
cerimônias de início das estações do ano com o lugar em que vivem, ao passo
que mantiveram as festas sagradas nas mesmas datas que os sacerdotes
históricos.
Assim, o equinócio de primavera onde se daria a comemoração de Beltaine,
faz-se, no hemisfério sul Samhain; no solstício de verão em que se ritualiza
Lugnasad à boreal, o ritual à austral é o Imbolc; na porção setentrional por ocasião
do início do outono a comemoração é Samhain e na porção meridional comemora-
se Beltaine e por fim, acima do equador quando começa o inverno pratica-se
Imbolc e abaixo do paralelo a prática é Lugnasad. Isso designa aquilo que os
druidas contemporâneos do Brasil chamam de roda mista. As inversões sazonais
têm um valor simbólico significativo na paisagem.
O giro da roda mista caracteriza uma ressignificação. Morgana define roda
mista:
“Você inverte os equinócios e os solstícios. O solstício de inverno
é a próxima celebração, mas depois vem Lugnasad, que acontece
no meio do verão europeu. Nós fazemos isso para evitar o choque
da egrégora em Samhain, que é o festival dos mortos, quando
comemoramos o dia de finados aqui no hemisfério sul.”
161
Invertidos os rituais, são celebrados em lugares múltiplos. Uma praça, um
quarto particular, uma sala, um plano mental; individualmente ou em grupo pode-
se fazer o ritual, outrossim, deve-se praticá-lo:
“[...] além, do grupo aqui da Hera eu tenho um grupo de 7
pessoas. A gente se reúne, faz o ritual, faz uma mentalização
para nós, para o planeta,(...) ou às vezes eu faço em casa
mesmo. Porque de repente, um pode ir, o outro não pode; ou não
tem lugar específico, o dá. Assim eu faço em casa mesmo,
pego o princípio do nemeton; quando você entende o que é
sagrado. Então o seu círculo pode ser físico, astral, enfim o plano
espiritual. Eu acho que é uma questão de concentração, gosto
mais de fazer a ritualização física. A minha clareira tem os objetos
sagrados a cada período.” (VIVIANE).
O depoimento de Viviane deixa claro que o ritual independe de companhias
e de lugar, contudo alguns dos adeptos preferem ritualizar sozinhos mantendo-se
distantes de um grupo em seu contato ou agradecimento ao sagrado. Este é o
caso de Igraine:
“Tornar qualquer momento sagrado é tornar aquilo um rito, mas
a gente tem ritos mais... celebrações maiores né!... Tem a roda do
ano que tem 8 festivais, 4 de histórico e mais 4 das estações do
ano. Eu utilizo a roda mista que faz com que os históricos caiam
exatamente na data em que eles são cultuados no hemisfério
norte, mas eu respeito os equinócios e os solstícios de acordo
com o lugar que eu estou, no hemisfério sul. Fora isso, quando eu
sinto necessidade de celebrar e... quando um ciclo se completa,
quando um ciclo se inicia, o ciclo da minha vida, um emprego se
começa, o meu aniversário, o nascimento da minha filha, meu
casamento, todas essas coisas, elas me fazem necessário um
rito. Não necessariamente todo complexo todo, é.... planejado,
mas eu faço nem que seja pra acender uma vela ou simplesmente
meditar em cima daquele tema.
O lugar do contato, conforme apontado, depende do adepto. Cada um
escolhe seu lugar ritualístico, muitos optam por parques e praças, ilhas da
paisagem natural que sofreram espacialização, para eles, estas representam a
força da natureza. Isso contribui para sua utilização ritual:
162
“[..] cada vez a gente celebra num tipo de lugar. Às vezes, celebro
aqui na Hera, outras em parques, como no Horto Florestal e
Ibirapuera, casa de amigos. Meu primeiro ritual foi aqui no espaço
Hera.” (MORGANA).
Mesmo selecionando qualquer espaço geográfico para a consagração, é
comum que o nativo preocupe-se com o que pode resultar do ritual, mesmo frente
a necessidade de um lugar específico. Nessa perspectiva vemos que Gwaine
busca fugir da cidade e regozijar-se no campo a fim de invocar as divindades.
“[...] dentro do espaço urbano existe uma grande dificuldade
porque a gente tem muita dispersão, ou seja, existe muito barulho
! Não o barulho no sentido literal, mas um barulho figurado...se
a gente...no nível ...no ciclo, na velocidade, a freqüência que a
gente vibra dentro duma cidade ela é muito grande ela é muito
difícil você atingir um estágio que consiga relaxar e consiga ter
acesso a um Outro Mundo né! Eu tenho muito mais facilidade em
fazer isso por exemplo, quando eu entro pelo mato adentro, pego
meu carro e saio 3 ou 4 horas de viagem de São Paulo e eu acho
uma cachoeira ou eu acho uma pradaria e eu acho um bosque e
eu entro e aí sim eu faço essa conexão com muito mais qualidade
eu carrego as pilhas também né!
Os espaços para o neodruida são pluriescalares, inúmeros e profusos.
Motivos ligados estreitamente ao estilo de vida urbano na modernidade tardia.
Essa multiplicidade espacial reflete nos não-lugares de Marc Augé. Na antípoda
do lugar antropológico de Marcel Mauss, os novos druidas não retratam seus
rituais e sua identidade num lugar específico e utilizam-se de todo e qualquer lugar
para a consagração de seus ritos.
Mesmo que alguns druidas modernos repitam seu lugar de culto eles
conservam o direito de variação, isto devido em grande parte à veemente postura
quanto à institucionalização. É nesse sentido que uma rodoviária, um parque, um
caixa eletrônico, uma estação de metrô, um aeroporto, um ônibus, entre outros
lugares podem manifestar uma hierofania. Um exemplo da manifestação do
sagrado em lugares nos quais não existe necessariamente uma relação pessoal é
163
o de Viviane que frente a uma adversidade, numa situação atípica, entoa um
mantra (awen), estabelece contato com suas divindades e soluciona seu
problema.
“[...] segunda feira, por acaso foi meu aniversário e foi o dia que o
PCC atacou. Eu estava dentro de um ônibus, um rapaz entrou e
começou a falar: ‘Desce, desce, aquele que não quiser morrer
queimado desce do ônibus’. todo mundo, com medo, se
espremendo na janela. Foi engraçado, pois, dias atrás eu tinha
praticado um exercício com um outro grupo, aqui na Hera, que era
assim: Você vibra a awen inspiração você não precisa cantar
em voz alta. Você mentaliza e traz aquele som para dentro de si.
Lembrei-me logo dele diante da situação, então, fui fazendo isso
para me acalmar. Não queria entrar naquela vibração louca, ruim.
Onde o povo queria sair pela janela, sabe aquele tumulto que
estava na segunda feira. Eu fui entoando a awen na minha mente,
invocando proteção para mim e para os meus, para Terra, para
que se acalmasse aquilo, mas eu estava em Jurubatuba, eu
trabalho longe pra diabo. Vim de até Santana, onde eu moro,
entoando a awen mentalmente.”(VIVIANE).
Como o acesso aos espaços sagrados acontece em qualquer lugar, o
nemeton também é acessado livremente, basta para tanto, criá-lo. Pode-se dizer
então que nemeton pode ser pessoal, mas transferível quanto ao seu lugar.
“[...] é possível também fazer particular às vezes eu sento em
casa, sento no chão mesmo pego algumas pedras seguro elas
nas mãos tento me concentrar vou para o plano mental, e eu
crio digamos assim, o meu mundo, o meu bosque sagrado e
faço os meus ritos.”(GALAAZ- grifo nosso).
3.2. Porosidade da fronteira sagrada: o acesso diário ao Outro Mundo
Os nativos não apenas se valem dos não-lugares para criar nemeton,
utilizam destes na vida diária. Outro ponto nevrálgico de suas práticas religiosas é
o acesso ao Outro Mundo. Trata-se de um lugar transcendente onde buscam a
164
tranqüilidade, o equilíbrio, a harmonia, a paz interior e a sabedoria para a
resolução de seus problemas cotidianos. Igraine define Outro Mundo como:
“O Outro Mundo druídico é o paraíso, que não entra por
merecimento, não um julgamento em entrar no Outro Mundo
druídico né, você não precisa passar por um julgamento para
entrar, moram os ancestrais, os deuses, que em muitos casos
são a mesma coisa que os nossos ancestrais antigos. A maioria
das tribos celtas, elas viam seus fundadores como deuses, é...
não é necessário um julgamento pra entrar lá nessa terra de
juventude eterna entendeu? E ela está dentro de nós.”
O acesso ao Outro Mundo é livre e independente do moral do praticante,
até mesmo a freqüência que se vai a Ele é ilimitada. Galaaz se desloca para o
Outro Mundo quando:
“Meu contato com o Outro Mundo é um contato digamos, assim,
não muito freqüente. Porque eu procuro ficar mais tempo aqui do
que lá, mas um contato, como é que eu posso te
explicar...Normal! Digamos assim, quando eu preciso de alguma
coisa eu vou lá. Tento buscar alguma inspiração, alguma
informação, alguma luz quando eu estou com alguns problemas.
Tenho dificuldade de concentração. Isso é um problema, mas
mesmo assim em geral meu contato com o Outro Mundo não tem
grandes ministérios. Eu vejo o Outro Mundo como um lugar fora
dessa realidade, onde as leis são todas diferentes e por elas
serem diferentes, podem nos mostrar um jeito diferente de agir.
Um jeito até que mais resultado do que nós agimos
naturalmente.”
Galaaz não é o único que vai ao Outro Mundo resolver problemas, pois Ele
serve, entre outras coisas, exatamente para isso. Nesse sentido, Gwaine, também
o acessa em busca de soluções:
“Na realidade eu estou aqui e faço uma ponte com esse Outro
Mundo que esse mundo se torna muito real para mim
então...Hoje ele se tornou um Outro Mundo céltico porque eu
passei a identificar o que é celta naquele Outro Mundo. No
começo era um outro mundo que era meu pensava que fosse
meu, mas de repente eu vi que outras pessoas acessavam
esse Outro Mundo também.”
165
Gwaine sabe que diversas pessoas adentram o Outro Mundo, pode-se dizer
então, que Esse lugar analisado sob o prisma de Augé transforma-se num não-
lugar, onde várias pessoas entram e saem continuamente e sem um controle
específico. No entanto, esse não-lugar, mesmo com vários transitantes, implica
para cada um deles certa afetividade, pois para esses neopagãos no Outro Mundo
se encontram divindades e ancestrais.
Mesmo permitido que seja visto como um não-lugar o Outro Mundo é
também um território, no sentido que Haesbaert (2002, p.139) alerta para a
relativização do conceito de não-lugares. Para o autor, os lugares não perderam
identidade, relações e histórias como acontece com as territorialidades. É o Outro
Mundo muito mais que um não-lugar é um território com múltiplas territorialidades,
visto que cada praticante ao acessar o Outro Mundo imprime Nele suas
identidades, relações e histórias.
Quando o druida contemporâneo leva seus sentimentos, suas conexões
humanas e sua vivência para o Outro Mundo exibe-se como um deslocado social.
Na mesma perspectiva do conceito baudeleiriano de flâneur. Trata-se de uma
oposição ao cientificismo, ao determinismo e a realidade impessoal, essa nova
atitude configura aquilo que Bosi (2001, p.264) chamou de “apreensão direta dos
valores transcendentais, o Bem, o Belo, o Verdadeiro, o Sagrado, situam-se no
pólo oposto da ratio calculista e anônima.” Em certa medida essa implicação
pessoal no Neodruidismo se nutre na falta de “respostas” das religiões
institucionalizadas, e exige do praticante um nível de consciência avançado em
relação as demais pessoas da urbe cosmopolita.
“[...] quando eu tinha uns 12 ou 13 anos eu comecei a pensar,
estudar história das religiões. Comecei a ler pela primeira vez os
livros de mitologia, eu pensei assim: os gregos existiam antes de
Cristo, a religião deles é mais antiga, então é mais perto do início,
então eles devem estar mais perto da essência. Então porque que
hoje a gente cultua um Deus e Jesus Cristo. Eu não entendia
direito isso na minha cabeça, eu era muito criança, então comecei
a perguntar em minha casa. Não tinha feito catequese ainda, nem
nada.Fui fazer catequese na igreja católica quando eu estava na
7
a
. série, com 13 anos fiz a primeira comunhão. E pensava que
assim que fizesse a primeira comunhão tudo se montaria na
166
minha cabeça automaticamente.Eu não agüentava a lógica
que se firmou muito tempo e era muito repetitiva. Então
pensei, bom! O mistério não se revelou. Mas, olha tudo é
sagrado. E não aconteceu nada briguei com todo mundo naquele
dia e eu fiquei revoltada não sei que!! Não sei que!! eu passei
alguns anos vendo outras religiões, descobrindo, estudava um
pouquinho do budismo, um pouquinho do Hinduísmo. Mas
pensava que ninguém praticava isso no Brasil. Nessa época eu
morava no interior de Minas Gerais.” (MORGANA-grifo nosso)
Percebe-se pela fala de Morgana que ela não conseguia repostas às suas
indagações no Cristianismo Católico. Reflexo da vida na modernidade tardia onde
o mundo técnico-científico-informacional tem como imperativo, respostas
imediatas aos problemas humanos. Fato confirmado pela profusão de
informações, pela superabundância espacial e pela individualização das
referências. Nesse âmbito o novo druida busca soluções imediatas, mas não
prontas. O que o motiva a ser um estranho frente à multidão que procura no Outro
Mundo conclusões para o seu vazio.
4. O caminho idílico da “verdade”
4.1. Filosofia de vida ou religião
O Neodruidismo seja da BDO/Druid Network, seja de outra ordem, depara-
se com uma nomenclatura polêmica. Muitos estudiosos e até mesmo praticantes
definem, não Druidismo Moderno e também outras manifestações Nova Era
como filosofias de vida. Na mesma medida são designados como religião. Essa
discussão é ampla, mas é comum e notória, principalmente nos adeptos da
BDO/Druid Network a afirmação de que o Druidismo Moderno é uma religião.
Essa afirmação é parte da necessidade de sentirem-se homo religiosus.
Não no sentido que os entrevistados definiram como “religião nos moldes
tradicionais”, mas sim de uma religião capaz de solucionar as questões da vida
167
contemporânea na metrópole e ampliar os horizontes do ser humano frente às
mazelas trazidas pelo progresso e a criação de novos paradigmas. Muito embora,
afirmem categoricamente sua desistitucionalização mantém preceitos e posturas
que devem ser seguidas por todos os neodruidas.
Os trechos que seguem exemplificam a busca por uma religião:
“Acho que toda religião se ela não for uma filosofia de vida ela cai
no vazio. Ela não tem o porquê de ser. Eu encaro, assim, ao
contrário não acontece. Pois você pode ter uma filosofia de vida
sem ter religião, mas ao contrário não é muito cabível. Então eu
vejo como uma religião e filosofia”. (VIVIANE).
“Para mim o Druidismo não tem essa diferença. Não para dizer
assim: ele é uma religião ou uma filosofia de vida. Porque eu
acredito que a filosofia de vida compreende também a sua religião
não tem como você separar uma da outra. Existem pessoas que
dizem que Druidismo é uma filosofia de vida, independente de
religião, e outras dizem que é uma religião independente da
filosofia de vida. Para mim não, eu sigo o Druidismo no dia-a-dia,
quando estou no banho, quando estou na rua e até mesmo
quando estou na sala de aula”. (GALAAZ).
“Essa é uma pergunta que eu ainda tenho bastante conflito dentro
do Druidismo, mesmo porque o Druidismo antigo era uma
religião..o Druidismo da época dos celtas mesmo... Ele era uma
religião dos sacerdotes celtas tá! Hoje em dia é um resgate dessa
religião por ter conceitos bem amplos, ele pode ser utilizado tanto
como filosofia de vida, como uma religião utilizando os deuses da
condição celta. Unificando com a filosofia”.(IGRAINE).
“Eu ainda não consigo te responder categoricamente, se é uma
religião, um estudo, ou se um modo de vida. Precisamente, eu
acho que não é uma religião dentro dos moldes ou padrões mais
aceitos da nossa comunidade da nossa realidade atual ! Onde
na realidade eu encaro o Druidismo muito mais como uma
espiritualidade porque pra mim a palavra religião acabou sendo
uma palavra que divide as pessoas e a espiritualidade sendo uma
palavra que une as pessoas”. (GWAINE- grifo nosso).
Viviane coloca-se a favor de uma religião, mas sem deixar o caráter de uma
filosofia Nova Era. Atribui a razão de ser de uma religião ao seu caráter filosófico.
168
Na contramão dessa postura está Galaaz que sente o Druidismo Moderno como
uma religião a ser seguida em todos os momentos até os trivais.
Por sua vez, Igraine procura o meio termo e tem o Druidismo Moderno
como uma religião ao mesmo tempo que uma filosofia. Religião e filosofia de vida
são indissociáveis. Contrário aos demais é Gwaine. Este não tem o Druidismo
Moderno nem como religião, nem como filosofia, para o mais velho dos
entrevistados é uma espiritualidade. Isto corrobora com a negação da religião
institucional como algo que “divide as pessoas” e espiritualidade como algo que
“une as pessoas”. Aparece nessa opinião uma das prerrogativas da nebulosa
mística esotérica, assim definida por Champion (1997), a negação às instituições
religiosas.
4.1.1. O cotidiano deificado
No mesmo sentido em que a institucionalização é negada, também o
afastamento dela quando se precisa dos deuses. O druida contemporâneo não faz
orações, ou necessita de imagens para se deparar com a divindade. Seu contato
se dá no momento e lugar em que desejar.
“Ah! Eu invoco assim, tipo, de uma maneira bem particular, que as
pessoas às vezes acham até meio estranho. Mas, eu
falo...pó..né..Dá uma ajuda aí..vai, quebra essa!! Não tem uma
fírula maior: Oh! Deus, disso e daquilo. Não, é mais direto
mesmo.” (GALAAZ)
Essa certa intimidade com os deuses permite interpretações várias. Tal
permissividade facilita a aproximação entre fiel e divindade como conseqüência
influi no aproveitamento do aspecto que melhor se adequar a um determinado
momento. Viviane e Galaaz interpretam os deuses celtas na paisagem conforme
imediatismo da situação.
169
“Eu não digo divindades druídicas e sim celtas. São elas que
você chama dentro do Druidismo. Por que independente do
Druidismo, os deuses estão aí. No Druidismo de ontem, de hoje.
O neodruidismo. Em geral as pessoas pegam somente alguns
aspectos de cada Deus. Por exemplo, a Morrigan, ela é a Deusa
da Guerra, ela não é isso, ela é muito mais. Brigitt não é a
inspiração ela é muito mais. Eu vejo no dia-a-dia, não aquela
questão de acordar e ver. Mas, é exatamente isso que eu busco.
Ver o divino em tudo. No meu dia-a-dia. Até mesmo numa coisa
ruim que acontece. Mas, eu vejo na vontade, na gana de ir atrás
dos meus sonhos, de viver do jeito que eu quero. Ter a minha
liberdade e respeitar a liberdade dos outros. Então, se eu estou
precisando de ajuda, num momento de insegurança. Eu
chamo por Morrigan. Mesmo, que é a Deusa das Batalhas, eu
não vejo como uma batalha de campo, mas sim como uma
batalha do meu cotidiano”.(grifo nosso).
“[...] muitos deles estão presentes no dia-a-dia, por exemplo, a
Morrigan que é a deusa da guerra, antigamente, ela era venerada
nos campos de batalha e também era venerada como soberana
das terras, hoje em dia, eu a vejo como a batalha diária, no
trabalho, da mãe buscando o filho na escola, do homem
trabalhando incansavelmente. Enfim, a batalha do dia-a-dia.. Isso
é uma incorporação de um deus celta, de uma deidade celta, na
atualidade. O Campo de batalha transformou-se no trabalho,
na labuta desse processo. (grifo nosso).
Nota-se pela abordagem dada por ambos que mesmo a divindade ficando
em tudo, ela pode ser invocada exatamente no momento de necessidade. Nem
sempre nas necessidades se invoca o agente sobrenatural, momentos frívolos
também são passíveis de solicitações de intermediação.
Quando é aquela coisa, quando é um mimo de criança... Quebra
essa aí para facilitar a minha vida, porque eu quero. Eu os sinto
olhando e falando para mim: Ah! Mano, se vira entendeu, ou às
vezes quando sou realmente necessário eu noto a presença
imediata, teve várias vezes que eu estava, por exemplo, assim..
Ah! Hermes me ajuda vai..preciso chegar em tal lugar rápido e
de repente o trânsito “puff” desaparece e, eu nem noto.
(GALAAZ- grifo nosso).
170
Além, de soluções cotidianas os deuses também consolam as faltas e as
perdas sentimentais. Apóiam, reconfortam e dão recomeço aos adeptos em seus
dissabores pessoais.
“Por exemplo, um relacionamento que veio do nada, cresceu,
frutificou e acabou, ele volta para o caldeirão do Dagda, para
reciclar e de repente volta ou aparece outra pessoa. Eu estava
falando para uma amiga, coloquei a situação no caldeirão do
Dagda, se ele vai voltar ou virá um outro eu não sei. Daí ela
perguntou: Mas, como assim? Ë engraçado, a gente esquece,
pois, quando fazemos tais comentários, nem lembramos que a
outra pessoa o sabe do que estamos falando. Então a gente
explica um pouco sobre o Dagda e o que significa seu caldeirão.
Tudo na vida tem o mesmo ciclo de um ano ou um dia, pois tudo
nasce, chega ao meio da existência vai caindo, não é mais esses
dia, já é outro.” (VIVIANE).
Mesmo que a deidade solucione diversos problemas, sejam frívolos, sejam
sentimentais, o importante para o praticante da BDO/ Druid Network é que sinta a
centelha divina. Igraine exemplifica isso, tomando por base a deusa Brigit:
“É difícil você encontrar..identificar. Os deuses celtas eram
deuses da paisagem celta né! Porque eles têm mais de duzentos
mil deuses, tem deuses pan-célticos que eram cultuados em
várias regiões de tribos celtas e deuses que eram mais da
paisagem mesmo, aquele rio, aquela colina, trazer tudo isso pro
religioso é complicado, mas você consegue identificar o
arquétipo dele dentro de você. Como a deusa Brigit da... Ela é
uma deusa tríplice que é a deusa da inspiração, a deusa da forja
enquanto “forja de armas” transforma o ferro em armas,
transformação assim, e a deusa da cura em todos os aspectos,
você encontra dentro de você, pode chamar por esses aspectos
que estão dentro de você em determinadas épocas.(grifo
nosso).
As muitas abordagens que os druidas contemporâneos dão as deidades
confirmam o perfil Nova Era do Neodruidismo. Onde o importante são soluções
instantâneas e a perfectibilidade do ser, atingida se encarada cotidianamente, pois
por seu caráter individual e desistitucionalizado se enquadra na vida da metrópole,
visto que o nativo não despende tempo, nem locomoção para o contato com o
sagrado.
171
4.2. Símbolos celtas na cidade de São Paulo
O contato com o sagrado para o druida da BDO/ Druid Network precisa ser
rápido e adequado à vida na modernidade tardia. Para os adeptos tanto as
deidades quanto as práticas simbólicas inserem-se no cotidiano, são vivenciadas
a cada momento da vida, e podem acontecer ao mesmo tempo em que o nativo
faz outras coisas. Nesse sentido enquanto trabalha, ou estuda ou mesmo num
momento de lazer o druida contemporâneo pode sim exercer sua prática
simbólica.
O simbolismo para eles não passa necessariamente pelo elenco de
símbolos do paleo e mesodruidismo. Para muitos, basta que se sinta bem com um
objeto qualquer para que se confira ao objeto significado simbólico.
Para tanto cabe o apontamento de Galaaz:
“Eu carrego uma pedra, um quartzo azul que é mais para ajudar
no meu trabalho, na intelectualidade e tudo mais. Não é druídico,
eu tenho isso antes mesmo de optar pelo Druidismo, mas é como
um amuleto que eles carregavam antigamente, também eu acho
que em paralelo ao Druidismo todas as religiões têm seus
símbolos e seus amuletos. Não necessariamente é druídico, não
tem símbolo especificamente druídico, mas a partir do momento
que aquilo tenha um simbolismo e esse simbolismo é válido para
mim, e válido também para o meu caminho druídico. Eu carrego
também no pescoço um pentagrama que é um símbolo bem mais
clássico, da Grécia Antiga e tudo mais existe também na cabala.
Existem trocentas outras religiosidades, mas eu consigo
incorporar esses símbolos dentro do Druidismo para mim, ele é
válido como um símbolo druídico também”.
É notável que Galaaz não se preocupe com o sentido histórico dos
símbolos que usa, vale-se, sim das conotações afetivas a cada um. Envolvendo
tanto a pedra de quartzo, cristal de rocha simbolizador do elemento celeste das
iniciações (Chevalier; Gheerbrant, 2003 p.758), quanto o pentagrama, elemento
ritualístico fundamentado no número cinco que exprime a união dos desiguais
172
(Chevalier; Gheerbrant, 2003 p.706) comum a várias outras religiosidades Nova
Era, numa mesma rede simbólica.
Percebe-se entre os entrevistados que os mbolos celtas são conhecidos,
nem sempre usados, mas respeitados e identificados. Morgana e Viviane
reconhecem o triskel, sem necessariamente portá-lo:
“O principal símbolo que eu conheço é o triskel. Eu não uso
nenhum mbolo celta, mas tem muita gente que usa, por
exemplo, o pentagrama para uma proteção. Assim, não uso de
nenhum símbolo concretamente, porém, nos rituais,
principalmente em grupo, sempre se fecha com o mbolo. E,
depende do dia, pois se tiver um grupo muito heterogêneo
precisa-se falar um pouco dos celtas”.
“Eu gosto de círculo, não gosto de quadrado. O círculo é a forma
perfeita. O Triskel eu acho uma coisa linda, principalmente aquele
que é feito com espiral, com 3 espirais unidas. Então eu sempre
achei muito bonito, os nós celtas, acho uma coisa maravilhosa,
que trabalho incrível, que requinte feito numa época tão distante.
E, aí sei lá. Fui vendo... engraçado”.
Para Morgana o símbolo tem uma função muito mais usual e didática do
que mística. Para ela serve, sobretudo, para entendimento, mesmo que outros
dêem um aspecto muito mais usual, como no comentário que faz sobre o uso que
terceiros dão ao pentagrama.
Viviane, por sua vez, preocupa-se muito mais com o senso estético
concedido ao símbolo. Prefere o círculo
65
como “forma perfeita”, a simbologia
dessa figura geométrica remete diretamente a “perfeição, homogeneidade,
ausência de distinção ou divisão(CHEVALIER ; GHEERBRANT, 2003 p.250
grifo do autor), a entrevistada acentua uma antinomia em relação ao quadrado,
pois a simbologia deste é “a da terra por oposição ao céu, mas é também, num
65
No mundo céltico, o rculo tem uma função e um valor mágicos. Cuchulainn gravou uma inscrição em
letras ogâmicas num círculo de madeira, a fim de deter o exército da Irlanda que invadira o Ulster. O círculo
foi afixado a uma pilastra, e a inscrição ordenava expressamente a quem lesse que não seguisse adiante, a
menos que estivesse disposto a aceitar o duelo. O círculo, portanto, simboliza um limite mágico
infranqueável. O círculo tem aplicações religiosas imediatas. (CHEVALIER ; GHEERBRANT,2003 p.252).
173
outro nível, por oposição ao incriado e ao criador; é a antítese do transcendente”
(CHEVALIER ; GHEERBRANT,2003 p.750).
Esse jogo estético, presente na colocação de Viviane, em que aquilo que se
como belo torna-se o verdadeiro, vai ao encontro do que Engler (2007, p.215)
chamou de valor ou função condicionada de percepção. Pois, a praticante percebe
o valor do círculo e imputa vantagens estético-religiosas ao símbolo que julga
merecedor.
Mesmo que os símbolos sejam presentes no Druidismo da BDO/ Druid
Network, os nativos não os visualizam na metrópole, isto porque veemência na
sacralização da paisagem de modo holístico. Conforme caracteriza Galaaz:
“É meio difícil para mim. Só quando eu to assim inspirado, quando
eu acordo de muito bom humor. Naqueles dias que ‘touched by
heaven’ quando você é tocado pelos us e está vendo um
passarinho verde a que não existe, mas ainda é meio
complicado para eu enxergar os símbolos druídicos na paisagem
contemporânea de São Paulo”.
4.3. A subjetivação da magia ancestral: uma questão de alteridade
A magia para Neodruidismo, até mesmo por ser parte da Nova Era, é um
processo alquímico interno e individual com foco na melhoria da sociedade como
um todo. Caminha no mesmo sentido da interpretação que Roger Bastide (2006)
faz do mito grego de Prometeu:
O indivíduo fica submetido, por causa dos seus próprios
progressos, a exigência da criação contínua, sem poder
descansar um instante sequer, como fez Deus no sétimo dia da
Criação. Não há domingo possível para Prometeu. (BASTIDE,
2006, p.195).
Como a magia é a transformação interna e individual, ela exige uma criação
contínua, pois tem de enfrentar adversidades que a cada momento se mostram
174
diferentes. É, para o nativo, indispensável manter-se alerta frente aos riscos da
modernidade tardia. Reforça, portanto a necessidade de pensar no outro
configurando a alteridade.
Para olhar para o outro a criatividade é o eixo, por isso cada druida
contemporâneo desenvolve sua própria magia, a fim de adequá-la a si e as suas
intenções para o planeta. Nesse contexto cada nativo permite-se um ato mágico
diferente, pois:
“Respirar é magia, crescer é magia, sonhar é magia, magia é
energia e tem energia em tudo, então, acho que magia dentro do
Druidismo é simplesmente você ter a consciência dessa
realidade, de que tem magia em tudo, no crescer de uma planta,
no desejar, no sonhar, no agir, tudo isso é magia, no pensar
também”.(IGRAINE)
Mais eu não largo a minha feitiçaria. Eu escolhi dos três
graus, quero ser ovate, para mexer com as ervas, poções. A
magia está aí, eu estou tentando modificar a minha atitude, de
impor a vontade para fazer as coisas. Mas, estou na fase de
tentar integrar, mas isso é difícil, pois gera um pouco mais de
responsabilidade de consciência. Mas, estou tentando
contemporizar isso, não quero o peso da responsabilidade do
retorno”. (VIVIANE).
A leitura de ambos os textos exemplificam as diferenças na perspectiva de
magia que cada uma das entrevistadas tem. Igraine sente a magia em tudo,
Viviane por sua vez a magia, nos símbolos e manipulações de instrumentos e
ervas do poder. A utilização manual de elementos mágicos implica para Viviane
uma responsabilidade, pois se preocupa com a lei do eterno retorno. O retorno
daquilo que pode ser outorgado a si conforme suas atitudes. Essa atitude não é
particularidade de Viviane, pois outros adeptos também a têm, exemplifica-se por
Galaaz:
Eu acredito que o universo é regido por troca não existe nada
que um ganhe porque você estaria quebrando o equilíbrio do
Universo então, a partir do momento que você tem esse conceito
de troca, se você quer um benefício, nada mais justo do que você
dar um benefício também”.
175
O entrevistado defende a responsabilidade que tem diante de uma regência
universal de trocas, que acontecem mediante um processo mágico contínuo.
Essa troca se antepõe à noção antropológica de magia, visto que o Druidismo
Moderno não necessita de intermediários e aprovações coletivas, isto porque o
druida contemporâneo é o próprio mediador do sagrado, conforme atesta
Morgana:
“A magia do Drudismo é pela inspiração. Já falei que trabalho com
literatura, e atuo num projeto no qual estimula a leitura para as
crianças. E quanto mais a gente lê, mas percebe o quanto à
literatura interfere em nossas vidas. Falo isso porque para mim a
magia durídica se emana pela inspiração, uma inspiração que a
gente sente no momento, sem o crivo da racionalidade. A gente
descobre, por exemplo, qual a maneira mais adequada para
lidar com certas situações. E pondera, fica quieto, torna-se
mais tranqüila, hora de se mexer, percebe o momento em que
aquilo não vai mais dar certo, então é a hora de se retirar. Na
realidade ela aguça o nosso ‘feeling’, que a gente passa a
respeitar. Temos opção de julgamento para poder fazermos
as escolhas. E se concretiza o pensamento”. (grifo nosso).
A função que o mediador do sagrado exerce no Druidismo Moderno é
exercida pelo próprio nativo. Este sabe o momento de solucionar um problema,
pedir alguma coisa e oferecer ajuda a quem precisa.
O ato mágico passa pelo altruísmo, pois o praticante precisa estar em
conexão com o mundo. Ao implicar responsabilidade a magia implica uma
mudança individual, que terá como conseqüência a mudança do outro e resultará
na salvação da humanidade e por ela do mundo. Os vetores de propagação são a
atenção ecológica e pelo cuidado com o outro que retirará todos os males
derramados pela “Caixa de Pandora”.
176
4.3.1. O trânsito religioso: a propagação do “bem” por meio de
um sincrestimo em movimento
A profusão criativa unida à necessidade de solver os problemas do mundo
oferece uma intensa troca entre religiões. Por essa via, instrumentos de outras
tradições podem ser incorporados pelo novo druida, isto porque este indivíduo
utiliza aquilo que contribui para o seu fim, é um caso de “os fins justificam os
meios” a favor da humanidade.
“Engraçado , como eu lhe disse eu comecei na Wicca e
acabei no Druidismo por práticas que já fazia, mas o sabia que
tinham nomes. Um belo dia me falaram: “Você é wiccana” Eu
respondi “Ah! Tá sou wiccana. Fiquei curiosa e fui atrás.
Geralmente, na Wicca todos usam muito o
pentagrama”.(VIVIANE).
O fragmento acima mostra que Viviane transferiu-se da Wicca para o
Druidismo Moderno, noutros excertos traz à tona sua origem kardecista e noutras,
mostra a utilização de princípios dessas religiões na sua prática diária.
O trânsito religioso é comum nos outros entrevistados:
“Eu passei por várias religiões, a primeira que fui batizado. Eu
fiz primeira comunhão. Comecei com o Catolicismo. Conheci
algumas religiões protestantes, conheci a Umbanda, que minha
mãe faz parte. Toquei atabaque fui ogam durante umas três
sessões para ver como era, não gostei. Estudei um pouco de
Wicca, Xamanismo americano e sou assim, tipo gosto muito de
mitologia. Todas as mitologias eu me afeiçôo muito e baseado em
todas essas religiões eu cheguei até ao Druidismo onde eu me
“Assimilei mais”. Me senti em casa praticamente”.(GALAAZ).
Galaaz teve um intenso trânsito entre as tradições, foi desde a católica até
a druídica, com paragens na umbandista e na wiccana, isso exemplifica o caráter
flâneur impregnado no Druidismo Moderno. A passagem pelo Catolicismo é
177
bastante comum nos adeptos do Neodruidismo. Quase sempre se apresenta
como uma religião incutida pela família, depois, ao atingir certa independência de
escolha uma vacância que, no caso destes entrevistados, culmina no
Druidismo Moderno. Não se abandona a possibilidade de que voltem àquilo que
Leila Amaral definiu como a errância religiosa do movimento Nova Era, mas para
eles, no momento da entrevista, o Druidismo Moderno é que é a correta, pois nele
imprimem sua territorialidade sem demarcar território. Gwaine exemplifica de
maneira clara esse trânsito:
“Eu sou católico por formação, estudei em colégio de padres,
sempre questionei um pouquinho os dogmas da Igreja e nem
tinha essa conexão o grande, né! Mas, hoje eu identifico três
ciclos mágicos de minha vida, então eles foram interrompidos
duas vezes e, na terceira vez eu resolvi pesquisar um pouco mais
e me aprofundar. Como eu sou engenheiro de formação, então é
muito difícil de conciliar uma visão um pouco mais cartesiana da
vida...com uma visão de um Outro Mundo. Isso foi muito difícil
para mim, né, então, eu tive o primeiro ciclo mágico..o de ser
criado com minhas avós, de ser criado com a terra ou seja dentro
da colheita dentro de toda essa festividade. De festejar uma
colheita, festejar o natal, o dia de Nossa Senhora das Candeias,
que é Candelária...que é Brigit. Ah.. Páscoa, mas com alguns
elementos celtas ou seja de sempre festejar a coisa da
semente...na Páscoa. Tudo isso foi meio que cerceado...esse foi o
meu 1
o
. ciclo mágico que foi meio cerceado quando eu entrei
nesse colégio católico, em Portugal. Acabei abandonando um
pouco essa idéia, pois isso não era o correto. Então eu acabei
não relegando, nem renegando, mas simplesmente colocando de
lado. Quando eu vim para o Brasil...fiz a universidade de
engenharia química, então eu tenho todo esse lado de
alquimia...de ser cozinheiro...de costurar um monte de coisas que
nem sempre tem explicação e eu acabei trabalhando numa
empresa que me enviou para trabalhar numa região ao norte do
Estado do Rio de Janeiro, bem próximo a Minas Gerais e do
Espírito Santo. E, como eu era solteiro, morava na antiga casa
da fazenda. A fazenda era da empresa, e nessa casa moravam
duas senhoras já de idade que cuidavam de todos os afazeres
inclusive a alimentação para os solteiros que residiam ali. E de
repente acabei me aproximando de um culto afro-brasileiro e
freqüentando assiduamente, num dia eu ouvi a seguinte frase:
‘Você não é daqui’ Perguntei: ‘Como assim não sou daqui? Eu
não sou daqui como? Por que eu não sou daqui?’ A pessoa me
respondeu: ‘Você tem uma espiritualidade muito forte, mas você
não pertence a isso aqui.’ E por contingências da vida eu acabei,
mais uma vez, negando isso, por que eu saí dali e acabei
178
voltando a trabalhar em São Paulo. E, assim a coisa ficou
adormecida por uns tempos... esse foi o meu 2
o
. ciclo e, de
repente um belo dia, eu estava procurando um trabalho voluntário,
pois minha mãe teve câncer e, eu queria melhorar a qualidade de
vida das pessoas que tinham câncer também. Então foi que
decidi fazer um curso de massagem para trabalhar com crianças
e adultos portadores dessa doença, essa foi a maneira que eu
encontrei de ajudar, também minha mãe, e fazer algo que me
fizesse bem também. Foi nessas andanças que eu conheci um
xamã e acabei fazendo algumas jornadas com ele. Alguns
trabalhos e, de repente comecei a ouvir a mesma retórica de que
eu era muito velho, que tinha muita gente atrás de mim, que eu
tinha que trabalhar, que eu não era médium, porém tinha uma
capacidade espiritual muito grande. E continuavam a me dizer
que eu também não pertencia aquele lugar. Assim pensei: ‘Bom
de onde eu sou então?’ Foi então que comecei a procurar algo
que me ligasse as minhas origens ancestrais e locais. Como não
sou brasileiro, fui buscar no meu país de origem, resgatando
quem eram os povos que habitavam ali..Cheguei aos celtas e
conseqüentemente ao Druidismo. Como uma opção a mais, hoje
estou pesquisando o Druidismo para tentar entender, comecei a
fazer toda a conexão entre o Xamanismo e Druidismo e realmente
vou evoluir nisso, mas precisava saber toda essa parte histórica e
teórica que eu não tinha”.
Depois de uma longa jornada Gwaine chegou ao Druidismo Moderno.
Outros druidas contemporâneos não tiveram uma trajetória tão longa, contudo
chegaram ao Neodruidismo, na maioria dos casos, por um descontentamento e
pela necessidade de respostas imediatas às suas argüições:
“Sabe quando você sente que falta alguma coisa, e não sabe
exatamente o quê. Mas, você precisa achar. Foi por causa disso
que fiquei pulando por uma penca de religiões. Entrei para a
Wicca, e, comecei a entender o Neopaganismo. Na Wicca fiquei
de dois a três anos, daí comecei a estudar para saber de onde
tudo vinha, alguns ritos.Daí comecei a me familiarizar com a
cultura celta, até chegar no Druidismo. Eu consigo ver no
Druidismo uma fonte ensinamento para você se olhar a si próprio.
Eu achei, quer dizer estou tentando achar um pedaço da
alma”.(VIVIANE).
Viviane busca no Neodrudismo suas respostas, figuradas “pelo pedaço da
alma”. A procura também levou Igraine à tradição, mas não procurava respostas, e
179
sim “uma espiritualidade mais voltada a terra, ao culto do sagrado com a terra,
com a natureza e foi a tradição que eu mais me identifiquei e que mais a minha
alma brilhou, quando eu comecei a estudar, a entrar em contato eu senti mais
afinidade”.
nativos que chegam ao Neodruidismo no intuito de amarrar filosofia de
vida e religião, é o caso de Galaaz, que a partir de um autodidatismo deparou-se
com essa tradição:
“Eu comecei a estudar o Druidismo uns 2 ou 3 anos atrás. Eu
tomei como um caminho religioso e também como filosofia de vida
e com essa oportunidade, agora do curso do Cláudio, resolvi
aprofundar um pouco mais o meu conhecimento e que com isso
veio trazendo à tona outros conhecimentos muito diferentes do
que eu tinha há um tempo atrás, com o estudo auto didata”.
Esse intenso trânsito é o próprio sincretismo em movimento, onde a
tradição ressignificada dos druidas encontra-se com tradições orientais. Fruto da
orientalização do Ocidente analisada por Collin Campbell. Galaaz mostra-se como
agente facilitador desse processo sincrético:
“Eu diria que está ligado mais a uma questão pessoal de um
animal de poder de um anima que você às vezes evoca para lidar
com uma determinada situação. Está ligada, dentro do Druidismo,
também como um totem, antigamente, eles adquiriam totens:
fertilidade, batalha, colheita, dia-a-dia tudo mais essa é a visão
que eu vejo hoje para esse lobo interior. Achei não só o lobo
como rias outras entidades guias. Não “aninósticas” como
“antropomóstica”. Como em forma humana ou em forma de
animal e, às vezes em forma mítica mesmo, citando isso, vira e
mexe ou apelo para um espírito guardião que ele tem a forma de
um dragão chinês”. (grifo nosso).
A orientalização também se faz presente na vestes utilizadas em ocasiões
cerimoniais. Principalmente no caso das mulheres.
“Eu tenho algumas roupas específicas, como meus vestidos
hindus. Adoro vestido grande, sabe roupa indiana. Então, em
geral eu coloco os meus vestidos. Mas, quando estou aqui na
Hera, e não para colocar outra roupa tiro os meus sapatos. Eu
preciso de um contato físico assim me remeto a um outro lugar”!
(VIVIANE).
180
“No inverno eu não agüento fazer rituais externos. Num ritual de
Beltaine, ficamos a noite inteira celebrando esse ritual, estava
muito frio, então, todos ficaram bem agasalhados. Agora tem dia
que a gente está inspirada, então coloco um vestido indiano, pés
descalços, ou sandálias, ou tênis, bem à vontade. Não gosto de
fazer esses ritos com roupas formais e apertadas, nada de sapato
alto”. (MORGANA).
Além de elementos simbólicos como: o dragão, ou as vestimentas a
presença oriental também se fortalece pela utilização fundamental do incenso.
Outro ponto é a certeza, que os nativos têm frente ao karma indissociável à
reencarnação. Para os adeptos da BDO/Druid Network a morte é um
complemento da vida.
Para eles é certa a chegada pós-morte ao Outro Mundo. Todavia a
reencarnação é opcional.
“O que eu acho da morte? A morte é uma...é mais um estágio do
grande ciclo né, tudo na vida é cíclico, tudo nasce cresce se
reproduz e morre, isso eu sempre falei desde criança, o problema
é que a gente não consegue.... Como a gente não tem esse
contato com o Outro Mundo naturalmente, no cotidiano, a gente
não consegue reconhecer com naturalidade quando um
término desse estágio e o início de um próximo porque é assim
com tudo, a gente começa um relacionamento e termina, a vida
começa e termina, uma flor nasce cresce e morre, por que
nasceríamos diferentes? Isso não é feio, não é errado, não é ruim,
pelo contrário”. (IGRAINE).
4.3.2. Morte: a inseparável companheira
Para Igraine a morte é certa e sem maiores preocupações, mesmo não
falando sobre reencarnação, interpreta a morte como natural a todas as coisas,
uma vez que, para ela tudo tem vida e conseqüentemente alma.
181
Morgana não interpreta a morte como o fim, ela acredita que:
“A morte não é o fim, que existem outros mundos, no qual você
passa por processos para acessá-los, ciclo de reencarnação, por
exemplo. Eu não sei dizer se uma wiccana reencarna como uma
plantinha ou druida como pedra, como pregam algumas filosofias.
Eu não tive muito contato com a morte ainda. Acredito que durante
nossa vida mesmo, tem muito de morte. A gente morre para alguns
fatos e renasce para outros. Nós somos heróis, nós todos fazemos
essa jornada no nosso cotidiano é o morrer pro adormecer, às vezes
dormir é morrer. Não gosto de dormir muito. É perda de tempo, é um
tipo de morte. durmo muito quando estou profundamente triste.
Para mim morte está diretamente ligada com a vida. Mas,
estudando estou mais familiarizada com ela. Eu vivo esse momento,
estou me afastando de várias pessoas estou no momento de morte,
para o renascimento em seguida”.
Para ela a morte é heróica e cotidiana, pois, ao mesmo tempo em que
percebe todas as pessoas como heróis, observa que todos os ciclos da vida se
renovam partindo de uma morte prévia. A opinião de Galaaz se encontra com a de
Morgana:
“A morte, ela é o fim de um ciclo, é o começo de outro, um
período de renovação. É quando você reúne todo material que
obteve nessa vida, ra, analisa tudo e, faz assim, tipo..puxa,
ótimo, beleza, estou pronto para a próxima. É um período de
renovação”.
Mesmo levado pela visão da morte como mera passagem o druida
contemporâneo sabe que ela é irrevogável. Aceitar a morte pode levá-lo a um
lugar idílico muito melhor do que aquele em que se encontra. Este lugar torna-se
esperado. E a ida, muito mais que uma aceitação, para alguns, é a abertura de
uma passagem para um outro estágio da matéria, como é caso de Gwaine:
“Ah! bom, desde criança, quando eu era criança, eu não tinha
muito medo da morte, de escuro dessas coisas que quase todo
mundo tem, depois eu passei uma fase que eu passei a ter medo
das coisas que estavam escondidas e medo da morte, de morrer
medo de tudo isso, hoje eu tô começando a encarar a morte como
a visão druídica e a visão xamânica de que a morte é apenas uma
passagem. Me força pra encarar isso como a única coisa que
182
eu tenho certo na minha vida, então não adianta você ter medo,
você tem que realmente, na realidade o que eu pretendo me
preparar pra enfrentar a morte tranqüilamente como sendo
apenas uma passagem”.
A morte como passagem ratifica a visão kardecista. Essa postura contribui
para o trânsito religioso de maneira que um kardecista, comumente, mantém sua
visão de morte na transferência ao Druidismo Moderno, é o caso de Viviane.
“Eu falo se eu morresse hoje, sem problemas. Eu ia ficar pau
da vida, muito frustrada, ia brigar por não me deixarem pisar na
ilha verde ainda. E porque vocês estão me levando embora
então? Eu tenho muito mais medo de não realizar coisas e passar
para o outro lado do que o outro lado em si”.
A análise do trecho da entrevista de Viviane aliada às demais, permite dizer
que o nativo aceita sim a morte, porém não a quer, consoante atinja os objetivos
delimitados por ele para sua vida. Como no tocante à “ilha verde” que na fala da
entrevistada não retoma a idéia da ilha mítica de Hy-Brasil, considerada um
espaço mítico-sagrado; mas sim à Ilha de Irlanda como espaço físico e geográfico.
A morte idealizada e vista como aceitável encontra-se com outra
idealização, a da literatura. O druida contemporâneo comumente confere a criação
literária valor histórico e documental. Tomando de uma obra a valoração e o
atestado de sua religiosidade.
4.4. Literatura: uma ponte para o Druidismo Moderno
Em sua história a literatura revolveu raízes pagãs, sobretudo durante o
período romântico. A vertente nacionalista, da Península Ibérica, França e Grã
Bretanha, valeu-se de ideais e personagens pagãos para a criação de muitas de
suas narrativas e poemas.
183
Todavia o Druidismo Moderno volta-se à literatura do século XX. Em livros
que tematizam o heroísmo, a feminilidade e a mitologia. Confere sentidos
históricos a obras de ficção, transformando-as em documentos factuais, chegam a
criar significados contrários aos definidos pelo escritor.
Todos os entrevistados tiveram contato com o universo literário, não foi por
esse universo que adentraram ao Neodruidismo. Mas, os livros fortaleceram o
imaginário e estimularam a curiosidade contribuindo para o conhecimento do
mundo celta, explorado no Druidismo Moderno. Um exemplo do estímulo a
celticidade é o de Viviane que comenta sobre as Brumas de Avalon:
“Faz parte absurda. Eu achava que aquilo que a Marion escreveu
era lei. Hoje eu sei, através da maturidade e do conhecimento que
os fatos narrados eram ficção a partir de uma lenda. Quando li a
Brumas tinha apenas 16 anos, fiquei embevecida. Eu também li A
Luz sobre Avalon que é da Maria Nazareth. Eu tinha feito umas
anotações bizarras no livro dela, em cima do conhecimento da
Marion. Mudando várias informações, como, por exemplo, sobre o
Merlim. Que era um título e não o nome de uma pessoa. Mas, aí a
gente vai estudando é muito diferente, e vai achando os erros.
Como fantasia, eu acho o livro maravilhoso, mas tem que dar uma
peneirada. A Marion é um divisor de águas dentro do
Druidismo. Ela dá muita ênfase no livro sobre o rito de Beltaine e
escreve uma vez sobre Samhain. Quando eu li aquilo, me
arrepiou toda e dizia, eu quero fazer isso. Eu quero fazer Isso.
Eu acho que nasci em país errado, o avião perdeu a rota e me
largou a aqui”. (grifo nosso)
Mesmo que Viviane veja a obra como “muita fantasia”, a interpreta como
“um divisor de águas dentro do Druidismo”, o romance a estimulou a querer repetir
o ritual descrito nele. Sua leitura lhe possibilitou traçar uma crítica e uma
concessão factual particular ao texto.
Depois que você estuda é fogo né. Arthur fez a burrada de sair
do trono que mal era dele. Eu achava que a Gewnevere era a
pessoa mais retarda da história. Inclusive, na Marion, ela era
muito religiosa. Daí você vai entender o mito. Ela era a soberania.
Então se o cara perdendo a soberania ele é muito burro. Então
tem alguma coisa que não está certo. Então hoje, vendo dessa
maneira, eu gosto do Arthur enquanto ele tem a soberania e não
perde a nação. A segunda mancada do Arthur é que ele pede
184
para os outros irem em busca do Graal. O Graal é a busca do
feminino, aliás, assisti O Código de Da Vinci ontem. Então, ele
não vai atrás do feminino, mancada 1. Mancada 2 sem noção
total. Hoje eu vejo a Gwenever totalmente diferente. Inclusive tem
um filme antigüíssimo que chama Gwenever a rainha de Arthur.
Ele coloca a Gwen como soberana mesmo. A Visão dela de todos
os contextos e não como uma católica louca”. (grifo nosso).
Nessa passagem, a entrevistada outorga veracidade histórica às Brumas de
Avalon, ao Código da Vinci e ao filme Gwenever: a rainha de Arthur. Afirma a
partir de narrativas ficcionais verdades míticas. Constrói uma miscelânia a partir
de seus “estudos” e monta um novo mosaico mitológico. No qual o cinema e a
literatura são os veículos de transmissão.
Galaaz tem As Brumas de Avalon como o primeiro contato com o
Druidismo. Esperou anos para adquirir a maturidade necessária para a
compreensão cabível ao texto.
“O primeiro trabalho literário que eu tive conato foi A Brumas de
Avalon que foi assim o que me despertou, realmente, esse
interesse pelas lendas arturianas e tudo mais, hoje eu vejo do
meu ponto de vista, principalmente, que o romance da Marion era
muito fictício que ela criou, não necessariamente, através das
lendas. Com todo esse tipo de cultura, poesia, os mitos e tudo
mais. Não!! A primeira vez que eu ouvi falar d’As Brumas de
Avalon foi por causa da minha tia. Ela tinha em casa, e eu falei
que gostaria de ler. Ela disse-me para não ler naquele momento,
pois eu era muito criança para entender o enredo 10 anos -.
Acertamos dela me emprestar o livro, mais para frente. Normal e
deixei ele num canto. Depois, quando estava na 8
a
. série, e
tinha 14 anos, uma amigo meu já tinha lido os 4 livros e me
contou a história, ele também tinha 14 anos. Porém, ele havia me
dito que o romance era a maior putaria, que não valia a pena ler.
Fiquei decepcionado. Contudo quando estava chegando nos
meus 18 anos, li. E percebi que minha tia tinha razão, e meu
amigo estava viajando na maionese, para ele foi cedo demais
para entender toda a trama do romance. Foi esse o meu primeiro
contato”. (grifo nosso).
185
Assim como Viviane, Galaaz acentua o fato de que o livro é “muito fictício
que ela criou, não necessariamente, através das lendas”. Mas usufrui da obra
como parte importante para a compreensão do mundo celta.
Não somente As Brumas de Avalon são obras “referenciais” para os
neodruidas, outros textos literários como O Senhor dos Anéis e a idealização da
Idade Média como um tempo da capa e espada participam da construção desse
imaginário. Assim Gwaine diz:
“Desde criança, eu sempre gostei muito dos castelos da Idade
Média, da história, da indumentária, ou seja, toda parte de
armadura eu sempre gostei muito de história antiga dos cavaleiros
da Távola Redonda, do rei Arthur. Eu li o Senhor dos Anéis com
16 anos.. Meu avô que era farmacêutico... era farmacêutico,
assim.... autodidata de manipulação...uma pessoa que lia
muito..então ele me apresentou pra esse mundo. Então ele me
apresentou um pouquinho pra esse mundo de rei Arthur e aquilo
me fascinava eu achava maravilhoso, os valores morais, o
altruísmo, a magia; achava aquilo muito interessante”.
P
ara Gwaine, a idealização medieval e o prazer da literatura alicerçados
pelo seu local de origem (Serra da Estrela–Portugal) conduziram sua adesão ao
Druidismo Moderno. A valorização moral, o altruísmo e a magia, ideais buscados
na literatura, estão em pleno acordo com as preocupações do Neodruídismo.
A partir da ressignificação que o druida contemporâneo da BDO/Druid
Network faz da literatura, da morte, da magia, dos símbolos e da história celta, ele
espacializa seu imaginário em meio a uma territorialidade religiosa sem
demarcação de territórios. Redefine o espaço profano, a medida que amplia o
espaço sagrado, transmutando tudo o que pulsa na metrópole em sagrado. Visto
que é nela que está e é ela quem precisa ser sacralizada, configurada como o
próprio geossímbolo religioso.
186
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Neodruidismo, enquanto, novo movimento religioso à tropicalidade
brasileira o caráter de sagrado. Fenômeno essencialmente urbano que repercute
e se espalha pelos veios da globalização dando a oportunidade de todos terem
acessos aos seus ensinamentos. A espacialização do imaginário é vivenciada de
acordo com a paisagem e os espíritos locais.
A cidade de São Paulo, terceira maior cidade do planeta não poderia ficar
ilesa a ele. Como uma cidade global que é São Paulo proporciona inúmeras vias
de comunicação que são irradiadas para todo o Brasil. Uma dessas fontes é a
gama de produções literárias e cinematográficas que pululam numa sociedade
sedenta e ávida de novas possibilidades e crenças, que muitas vezes influenciam
no estilo de vida urbano das grandes metrópoles.
um número difícil de calcular de narrativas literárias e cinematográficas
acerca do período arturiano, período que remete a uma construção criativa acerca
do gênero de vida celta. Notou-se pela leitura e interpretação das entrevistas que
não o estas produções que encaminham nossos entrevistados pelas veredas
druídicas.
As narrativas ricas em detalhes e em verdades inventadas contribuem,
sim, para a expressão, produção e transmissão de um imaginário coletivo. Muito
embora existam adeptos que as reneguem, elas corroboram na formação do
druida contemporâneo, mas, não são necessariamente o veículo que os norteiam
ao Druidismo Moderno.
Dentre os vários motivos que levam alguém a aderir a essa nova
religiosidade, pudemos observar que certa intelectualidade e um elevado nível de
educação são fatores que contribuem para a entrada no Neodruidismo. Percebeu-
se entre os entrevistados que a maioria tinha curso superior. Esse nível de
educação, dentro de uma sociedade técnico-científico-informacional, aponta para
o fato de que muitos dos druidas contemporâneos sejam pessoas altamente
informadas, sobretudo via web.
A informação, que na modernidade tardia corre rápida e muda
continuamente é prerrogativa para a iniciação neodruídica, pois o druida
187
contemporâneo se catecumina por um curso apostilado e marcado pela exposição
de informações. Pode-se, então, interpretar que o druida contemporâneo passa
por duas fases no seu processo de informação: a autodidata em que busca na
rede mundial de computadores as informações necessárias para sua nova
religiosidade e a estudante, quando enfrenta um curso e aprende aquilo que
chamam de o verdadeiro ensinamento druídico.
O imaginário coletivo transmitido pelas narrativas se mostra nas vestimentas,
adornos, práticas, rituais e representações celtas. As festividades comemoradas
pelos celtas foram mantidas, mas a elas alinharam-se comemorações de solstícios
e equinócios. Os deuses foram retratados conforme paradigmas modernos, se
encontram com divindades de outros panteões e adquirem novas funções. Os
desejos e idealizações também passam por esse imaginário coletivo, por isso é
comum um druida contemporâneo conceder a si espadas, capas e valores
heróicos conforme nas histórias do Rei Arthur.
Valores como heroísmo e honra emprestados pelas narrativas arturianas,
somados a uma necessidade de solução para as mazelas prometêuticas, trazidas
pela modernidade e pela modernidade tardia, resultaram, no Neodruidismo, em
uma alteridade proclamada e pregada.
Pode-se atribuir a tais razões o fato de comumente averiguarmos durante
as entrevistas preocupações com a melhora do ambiente, proximidade à natureza
e cuidados com causas de animais. O neodruida, esta, portanto, ligado à idéia
disseminada em termos globais de desenvolvimento sustentável.
Aliando, a intensa distribuição de informações, a intelectualidade latente, a
preocupação, em âmbito mundial, com o planeta; têm-se, no Neodruidismo uma
forte oposição a institucionalidade. Principalmente ao Cristianismo, sobremaneira
o católico. A Igreja Romana é tida pelo druida contemporâneo como a grande
culpada pela destruição da cultura celta. A resistência também se no tocante
aos dogmas da Igreja que são vistos como absurdos e segregadores.
Essa nova tradição ao renegar os dogmas católicos, cria seus próprios
dogmas. Não chamados assim, por eles, mas de fato existem. Observou-se, nas
entrevistas, que é indiscutível a negação de preceitos cristãos. Uma das mais
188
renegadas doutrinas é a da conversão. Para os nativos, é afirmado e reafirmado o
fato de não se tentar converter quem quer que seja isso é incontestável e
fundamental para qualquer um que professe o Druidismo Moderno como religião.
A ambigüidade da negação do dogma contribui com a criação de um
outro dogma, para essa religiosidade é possível à aceitação de adeptos oriundos
das mais variadas manifestações de fé. Caracterizando um dos adjetivos da Nova
Era que é a errância religiosa.
Como são aceitos e integrados atores das mais variadas origens
religiosas, o Druidismo Moderno é exeqüível nos mais variados espaços.
Encontra, devido à intelectualidade e necessidade de transmissão informacional,
em grandes metrópoles um campo profícuo para sua disseminação. De acordo
com os druidas contemporâneos todo o espaço geográfico é passível de
sacralização, não há, portanto necessidade da divisão eliadiana entre espaço
sagrado e espaço profano.
Como todo lugar é sagrado, os lugares em que não existe um
envolvimento pessoal, ou afetivo também são sacralizados. Por isso, dentro da
sacralização do espaço geográfico, o não-lugar, também manifesta uma
hierofania. O neodruida é nesse sentido um flâneur que não demarca territórios,
mas devido ao seu “derramamento emocional” (DE FRANCO, 2007) frente ao
mundo, intensifica as territorialidades que são, para eles, múltiplas.
Assim, o druida contemporâneo constrói seu imaginário que remonta a um
passado longínquo e próximo à natureza numa metrópole petrificada. Ressignifica
o mundo e imprime o sagrado em todos os lugares. De maneira que apresenta
uma adaptabilidade singular apontando um norte na desesperança e no egoísmo
moderno.
O neodruida é altero, preocupado com o mundo, sacraliza a natureza
abandonada pelo ser humano. Adapta-se à falta de tempo da modernidade tardia
ao mesmo instante em que prima pela diversidade e acredita que cada um pode
fazer sua parte para o bem da humanidade.
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215
ANEXOS
Anexo 1
216
217
Anexo 2
218
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
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