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Outro fragmento que Ziraldo apresenta, nessa crônica, é uma receita de
broa, especiaria muito famosa da gastronomia mineira, exemplo de tradição
culinária que Dona Zizinha ensinou para Vilma e a Vilma ensinou para a
Marília: “Para usar uma expressão que eu detesto, resgatar a verdadeira broa
da infância mineira” (2003, p. 11):
Bom, pra terminar meu papo, vou revelar um segredo que minha mãe
passou para a Vilma, minha mulher, e a Vilma passou a Marília, a campeã
mundial da broa. Para usar uma expressão que eu detesto, resgatar a
verdadeira broa da infância mineira. É a seguinte: pegue uma chávena de
farinha de trigo, uma milharina, meia de leite, uma chávena rasa de açúcar
(já viu que as duas primeiras são com aquele montinho além da borda),
quatro ovos inteiros, meia chávena de óleo, duas colheres de sopa de
manteiga ou margarina (a broa lambuza os dedos da gente de óleo), duas
colheres de porroial e, last but not least, uma pitada de sal. Misture bem –
com uma colher de pau – a manteiga, o açúcar, o óleo, o sal e os ovos.
Depois coloque farinha de trigo, a milharina, o leite e, por último, o porroial e
acabe de misturar. Unte bem o tabuleiro com óleo, derrame a massa e leve
ao forno quente. Deixe assar por trinta minutos e, tão logo ela comece a
esfriar, coma. Broa não se guarda.
Ah, sim, esqueci de dizer que é preciso que a quitandeira tenha mão
boa – exigência fundamental de uma boa receita – pois, quem não leva
jeito, estraga até receita de brigadeiro (Ibidem).
Para confirmar o estilo da crônica em tom de conversa de cozinha, Ziraldo
refere-se à produção de sua crônica como “... chega de conversa de goma,
voltaremos ao sério, semana que vem“ (Ibidem).
Em outra crônica, intitulada “A síndrome do tio Chiquito”, Ziraldo se sente
à vontade para tecer elogios aos dois filhos, Fabrízia e Antônio Pinto, como
fazia o tio Chiquito. E o faz no jornal de circulação mineira, pois sabe que isso
não causaria estranhamento ao público, uma vez que todo mineiro adora
bajular os filhos:
Sabe este rapaz aí que é candidato ao Oscar de melhor diretor pelo
Cidade de Deus, o Fernando Meirelles? Vocês imaginam, um rapaz tão
jovem, fazendo um filme onde as pessoas falam português, uma língua que
povo rico do mundo nenhum fala, chegar lá, se enfiar no meio dos gringos e
emplacar quatro indicações para o prêmio mais importante do mercado
internacional do cinema. É brincadeira? Fiquei felicíssimo. Sabem por quê?
Porque o conheço, desde antes de ele começar a fazer cinema. Quer dizer,
ele fazia cinema comercial, era o rei dos comerciais da televisão paulisto-
brasileira, já cheio de prêmios. Seu sonho, porém, era fazer cinema de
verdade, só que ele nunca achava a hora. Aí, tinha uma mocinha que
trabalhava com ele e que arranjou um filme para fazer. Na empresa que ele
comandava ela estava, também, começando a fazer seus filmezinhos. Aí