Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
A PERCEPÇÃO DA SEXUALIDADE DO CORPO IDOSO
CURITIBA
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
MARCOS AUGUSTO MORAES ARCOVERDE
A PERCEPÇÃO DA SEXUALIDADE DO CORPO IDOSO
Dissertação apresentada como requisito parcial para a
obtenção do grau acadêmico de Mestre, no Programa
de Pós-graduação em Enfermagem. Setor de
Ciências da Saúde, Universidade Federal do Paraná.
Orientadora: Profª. Drª Liliana Maria Labronici
Co-orientadora: Profª. D Maria Tereza Campos
Velho
CURITIBA
2006
ads:
Arcoverde, Marcos Augusto Moraes
A percepção da sexualidade do corpo idoso / Marcos Augusto
Moraes Arcoverde – Curitiba, 2006.
88 f.
Orientadora: Liliana Maria Labronici
Co-orientadora: Maria Tereza Campos Velho
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Paraná, Setor
de Ciências da Saúde, Programa de Pós-graduação em Enfermagem,
Mestrado em Enfermagem.
1. Sexualidade – Idoso. I. Labronici, Liliana Maria. II. Universidade
Federal do Paraná. Setor Ciências da saúde. Pós-graduação em
Enfermagem. III. Título.
NLM: WY
152
TERMO DE APROVAÇÃO
MARCOS AUGUSTO MORAES ARCOVERDE
A PERCEPÇÃO DA SEXUALIDADE DO CORPO IDOSO.
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em
Enfermagem, Área de concentração Prática Profissional de Enfermagem, do Programa de
Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem, Setor de Ciências da Saúde, da Universidade
Federal do Paraná, pela seguinte banca examinadora:
Curitiba, 14 de dezembro de 2006
AGRADECIMENTOS
A DEUS que me deu o fôlego da vida e a cada dia concede-me uma nova
oportunidade para o meu aprimoramento.
À minha orientadora Professora Drª Liliana M. Labronici pelas horas de dedicação e
incentivo para que fosse possível a conclusão deste trabalho.
À Professora Drª Maria Teresa Campos Velho pela co-orientação, pois nem a
distância impediu de ser co-participante deste trabalho.
À Professora Drª Maria de Fátima Mantovani por ouvir as dificuldades encontradas
pelos mestrandos e sempre apresentar soluções práticas.
Aos professores do Programa de Pós-graduação de Enfermagem pelas
contribuições que tornaram essa caminhada possível.
Aos professores membros da banca que com suas sugestões e contribuições tinham
o único objetivo de aprimorar esta minha jornada.
Aos meus pais, Lídio e Sarah M. Moraes Arcoverde, por sempre me apoiarem na
vida acadêmica e profissional.
Aos meus irmãos, Márcio, Sarita e Silmara, pelo apoio em minhas empreitadas.
As colegas de mestrado pela convivência que resultou em troca, auxílio e amizade.
RESUMO
ARCOVERDE, M. A. M. A PERCEPÇÃO DA SEXUALIDADE DO CORPO IDOSO.
2006. 88 f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) Universidade Federal do
Paraná.
A sexualidade é a dimensão humana que está presente em toda a trajetória
existencial e pode ser vivenciada de diferentes maneiras em cada momento,
manifestando-se mediante a expressão do corpo. Todavia, é permeada de mitos e
tabu, principalmente quando relacionada ao idoso, porque a colocamos dentro de
padrões que, às vezes, não são acessíveis ao seu vivido. Esta pesquisa é qualitativa
de abordagem fenomenológica e teve como objetivo perceber como o idoso entende
e vive sua sexualidade. Foi realizada no período de janeiro a junho de 2006 e os
atores foram 10 idosos com idade entre 61 e 83 anos - quatro do sexo feminino e
seis do masculino. A coleta dos discursos se deu mediante entrevista semi-
estruturada gravada em meio digital. A análise dos discursos seguiu os momentos
da trajetória fenomenológica: descrição, redução e compreensão fenomenológica, e
dela surgiram três temas: O outro como fonte de desejo, prazer e sentimentos;
Faces ocultas e o emergir da sexualidade e O reconhecimento da modificação da
expressão da sexualidade na terceira idade. Os discursos desvelaram a
manifestação da sexualidade a partir da relação de encontro entre os corpos
viventes que se atraem, se percebem, se tocam. Assim, estabelecem uma relação
de troca e de parceria permeada pelo desejo, carinho, prazer, ternura e amor que
lhes permitem não estarem unicamente focados no ato sexual ou na procriação, mas
passam a vivenciá-la como possibilidade de prazer que alimenta a vida amorosa e
afetiva do ser humano. Os discursos também elucidaram que os idosos manifestam
a sua sexualidade mediante a prática de atividades de lazer como dançar, ouvir
música, jogar tênis, sair para jantar, ir ao teatro, visto que possibilitam o “estar com o
outro” em espaços coletivos. Enfim, foi possível compreender ainda que os idosos
reconhecem as modificações que ocorrem no seu corpo como conseqüência do
processo de envelhecimento que afeta seu desempenho sexual. Embora não
possuam o conhecimento científico adequado de todas as alterações que
acompanham o seu corpo, durante a trajetória existencial, eles as reconhecem como
fatores que apenas modificam a expressão da sua sexualidade, o que não os
impede de manifestá-la, pois o desejo e a libido permanecem. Esta pesquisa
apontou para as possibilidades da expressão da sexualidade na terceira idade que
transcende a concepção biológica e possibilita uma visão mais positiva, não apenas
do processo de envelhecimento, mas também da sexualidade dos idosos.
Palavras-chave: Sexualidade, Idoso, Corpo, Enfermagem.
ABSTRACT
ARCOVERDE, M. A. M. THE PERCEPTION OF THE SEXUALITY OF THE AGED
BODY. 2006. 88f. Thesis (Masters gedree in Nursing) Federal University of
Paraná (UFPR), Curitiba, Brazil.
Sexuality is the human being dimension that is present in all the existencial
trajectory, able to be lived in different ways at each moment, disclosing itself by
means of the expression the body, that is, of the corporeity. However, is encircled of
myths and taboo, mainly when related to the aged, because we put it inside it of
standards that, sometimes, are not accessible what was lived. This research is
qualitative of phenomenological boarding that had as objective to perceive how the
aged ones understands and lives its sexuality. This research was done through
January June 2006, and the actors were 10 aged between 61 and 83 years old,
four women and six men. The collection of the speeches if gave by means of
interview half-structuralized recorded in digital way. The analysis of the speeches
followed the moments of the phenomenological trajectory: description, reduction and
phenomenological comprehension, and of it had appeared three subjects: The other
as source of desire, pleasure and feelings; Occult faces and emerging of the
sexuality and The recognition of the modification of the expression of the sexuality in
the third age. The speeches disclose manifestation of sexuality from relation of
meeting between bodies living that are attract, perceive, touch. Thus, they establish a
relation of exchange and partnership encircled for the desire, affection, pleasure,
tenderness and love that allow them not only focus in the sexual act or the
procreation, but start to live deeply it as pleasure possibility that feeds the loving and
affective life of the human being. The speeches had also shown that the aged ones
reveal its sexuality by means of the practical one of activities of leisure as to dance,
to hear music, to play tennis, to leave supper, to go to the theater, since they make
possible "to be with the other" in collective spaces. At last, it was possible to still
understand that the aged ones recognize the modifications that occur in its body as
consequence of the aging process that affects its sexual performance. Although the
alterations do not possess adequate the scientific knowledge of all that follow its
body, during the existencial trajectory, them they recognize as factors that only
modify the expression of its sexuality, what it does not hinder them to reveal it,
therefore the desire and the libido remains. This research pointed not only with
respect to the possibilities of the expression of the sexuality in the third age that
exceeds the biological conception and makes possible a more positive vision, of the
process of aging, but also of the sexuality of the aged ones.
Word-key: Sexuality, Old-aged, Body, Nursing.
SUMÁRIO
RESUMO ..................................................................................................................... i
ABSTRACT ................................................................................................................ ii
INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 09
2. O DISCURSO DA LITERATURA SOBRE O TEMA ............................................ 15
3. A TRAJETÓRIA METODOLÓGICA PERCORRIDA ........................................... 26
3.1 PROCESSO DE OBTENÇÃO E REGISTRO DOS DISCURSOS ...................... 32
3.1.1 Cenário ........................................................................................................... 34
3.1.2 Os atores da pesquisa .................................................................................. 34
3.1.3 Delimitação temporal da pesquisa .............................................................. 35
3.1.4 Aspectos éticos ............................................................................................. 35
3.2 PROCESSO DE ANÁLISE DOS DISCURSOS .................................................. 35
4. COMPREENSÃO DO FENÔMENO ..................................................................... 43
4.1 O OUTRO COMO FONTE DE DESEJO, PRAZER E SENTIMENTOS ............. 44
4.2 FACES OCULTAS E O EMERGIR DA SEXUALIDADE .................................... 54
4.3 O RECONHECIMENTO DA MODIFICAÇÃO DA EXPRESSÃO DA
SEXUALIDADE NA TERCEIRA IDADE ................................................................... 64
5. CONSIDERAÇÕES .............................................................................................. 76
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 80
APÊNDICE ............................................................................................................... 87
ANEXO ..................................................................................................................... 89
INTRODUÇÃO
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A construção do conhecimento é uma busca constante e desafiadora que
me incita a refletir sobre a existência humana e sua multidimensionalidade. Esta
reflexão me coloca num movimento de ir e vir entre presente, passado e num
projetar-se que aponta para vários caminhos, exigindo uma pausa no aqui e agora, a
fim de que seja possível fazer as escolhas em função do objetivo que desejo
alcançar. Assim, fazer escolha significa optar por um caminho e vivenciá-lo na sua
plenitude. Neste sentido, o tema que escolhi para ampliar meu conhecimento foi a
sexualidade do idoso, visto que esta população está em constante crescimento
(BRASIL, 1999), e de acordo MINAYO e COIMBRA (2002), em 2020 seremos a
sexta população mais idosa do mundo, com 34 milhões de brasileiros com idades
que superam os 60 anos.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE
(2002), seguindo orientações da Organização Mundial da Saúde - OMS, é
considerado idoso, nos países em desenvolvimento, toda pessoa com 60 anos ou
mais, e em países desenvolvidos com 65 anos. Em todo o mundo, essa situação
gera demandas de cunho político, social, educacional e da saúde, motivo pelo qual
qualquer reflexão sobre os idosos deve abranger diversas áreas do conhecimento.
Todavia, cabe salientar que a idade cronológica não se apresenta como um
indicador preciso para as mudanças que acompanham o processo de
envelhecimento, uma vez que vários fatores podem contribuir para influenciar esse
processo durante a trajetória de vida. Devemos ter em mente que envelhecemos de
diferentes maneiras e que nem todas as pessoas da mesma faixa etária apresentam
características semelhantes. Simões (1994) reconhece que caracterizar a pessoa
idosa é um desafio, uma vez que a condição humana apresenta-se complexa e
peculiar, o que torna difícil estabelecer um perfil comum a todos.
É importante ressaltar que o fenômeno de envelhecimento da população é
local e global, e apresenta um índice de crescimento progressivo desencadeando
novas exigências sóciopolíticas e econômicas. Dessa forma, julgo pertinente a
escolha que fiz, uma vez que a sexualidade é algo intrínseco ao ser humano - que
sofre alterações socioculturais - é construída ao longo da vida, e como tudo que é
humano, ao morrer, encontra-se inacabada.
A reflexão sobre a temática ampliou o meu escopo de conhecimento,
transcendendo a concepção biológica. A superação foi fruto de leituras, observação,
discussão e contatos com a população em foco. Nesta caminhada, encontrei apoio
10
A percepção da sexualidade do corpo idoso
no pensamento de Labronici (2002), o que permitiu repensar a sexualidade como
uma das dimensões do ser humano, e como tal, envolve a multidimensionalidade,
expressa-se mediante a interação com o outro e se manifesta nas relações sociais
mediante a corporeidade.
Nesse contexto, a “sexualidade é dimensão ontológica que se manifesta na
corporeidade, expressa nossa maneira de ser e de estar no mundo mediante os
Eros que permeiam o cotidiano humano” (LABRONICI, 2002, p. 19). É uma
característica humana que não se perde com o tempo, mas vai se desenhando,
conforme a história vivenciada pelo corpo vivente em sua trajetória existencial.
Fica explícito pelo exposto que a sexualidade não se limita apenas à reação
aos estímulos eróticos (VIEIRA, 2004); ela ultrapassa o ato sexual, uma vez que
inclui o amor, o carinho, a troca de palavras, o toque, o compartilhar entre as
pessoas que se expressam e se percebem como homens ou mulheres
(ELIOPOULOS, 2005), independente da imagem apresentada, da tatuagem feita
pela postura, pelo tempo e apresentada pelo cabelo grisalho, pelas rugas, e outras
alterações decorrentes do processo de envelhecimento. Assim, compreendi que
sexualidade é dimensão humana que está presente em toda a trajetória existencial,
podendo ser vivenciada de diferentes maneiras em cada momento, manifestando-se
mediante a expressão do corpo, ou seja, da corporeidade.
O que podemos perceber nesse sentido, é que o idoso não perde a
sexualidade, mas a redescobre, e nessa perspectiva devemos olhar as
possibilidades criativas construídas pelo corpo vivido (SANTOS, 2003). Isso significa
olhá-la de outra forma, e esse novo olhar possibilita o vivenciar da sexualidade de
uma maneira diferente, uma vez que se manifesta na corporeidade que é a
expressão do corpo, motivo pelo qual é fundamental compreendê-lo como “primeiro
e único lugar da experiência humana”, a fonte de todos os nossos desejos ou Eros
(LABRONICI, 2002, p. 20).
Ao dar continuidade ao processo de ampliação e compreensão da
sexualidade além da concepção biológica, ou seja, voltada para a reprodução,
planejamento familiar, prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, AIDS, e
distúrbios sexuais, através da visão racionalista, encontrei uma escassa literatura
sobre a temática, o que também é reiterado por Eliopoulos (2005) ao afirmar que
são abundantes as publicações referentes às diversas faixas etárias, exceto para o
idoso. Essa situação parece ser sugestiva, pois a não percepção desta sexualidade
11
A percepção da sexualidade do corpo idoso
a torna carregada de pré-julgamento que contagia os profissionais na área da saúde
(CAPODIECI, 2000).
O tema escolhido apresenta-se como paradoxo, uma vez que vivemos em
um planeta onde o processo de envelhecimento é uma realidade concreta e, no
entanto, é vista apenas no que concerne a problemas físicos, ficando alguns
aspectos, como o da sexualidade e da sensibilidade, em segundo plano. A escassez
da literatura por si só justifica a realização do presente estudo.
O envelhecimento surge como um dado expressivo a partir da década de 70,
quando se denunciou que o país envelheceria e essa situação foi constatada pelo
IBGE 20 anos após. Em 1999, o Brasil contava com mais de 14,5 milhões de idosos,
o que correspondia a 8,6% da população brasileira. Um dos indicadores
demográficos que nos apontam para este crescimento é a relação criança (0-14
anos) / idoso (acima de 60) que em 1980 era de 16 (15,9) idosos para 100 crianças,
em 1991 passou para 21 idosos, e em 2000 para 29 (IBGE, 2002).
Um outro indicador demográfico relevante, divulgado na mídia, é a relação
de criança entre 0 a 5 anos por idoso, e neste caso verifica-se a inversão, uma vez
que em 1981 tínhamos 48,3 idosos para cada grupo de 100 crianças, em 1993
passamos para 76,5, em 1999 para 97,8, em 2004 a população brasileira atingiu
120,1 idosos para 100 crianças entre 0 e 5 anos (SOARES, 2005). Dessa forma, ao
comparar essas duas faixas etárias, nota-se que a mudança do perfil demográfico
caminha para o chamado envelhecimento populacional. Estimativas apontam para
que na próxima década teremos 10% da população com mais de 60 anos (PELÁEZ,
2003), o que corresponde a uma população envelhecida. Talvez, alguns dos fatores
responsáveis por este fenômeno, sejam: o planejamento familiar, a melhoria da
assistência à saúde e da qualidade de vida (BAKKER FILHO, 2000), o que, de certa
forma, são resultados do avanço da ciência e da tecnologia.
O envelhecimento populacional brasileiro acompanha o envelhecimento
mundial, e as estimativas prevêem que, em 2050, haverá no mundo porcentagens
iguais para crianças e idosos (ANDREWS apud IBGE, 2002). Essa mudança
possibilitou um novo perfil na pirâmide etária da população brasileira, pois se antes
tínhamos uma base larga e ápice estreito, indicando altas taxas de natalidade e de
mortalidade, hoje em vários Estados e municípios temos uma base retangular que
acompanha, com pequeno crescimento, as décadas seguintes (IBGE, 2004).
12
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Em Curitiba, 8,4% da população encontra-se com mais de 60 anos, esse
percentual é maior que o registrado para a faixa etária de 0 a 4 anos (8,1%)
(BRASIL, 2005). Parte dessa inversão do crescimento populacional deve-se ao
desenvolvimento e aprimoramento das ciências médicas, uma vez que doenças
como a tuberculose, lepra, meningite, pneumonia, apendicite e outras que no
passado comprometiam a saúde humana, trazendo uma diminuição na expectativa
de vida, apresentam-se controladas, de certa forma, pela ciência e pelas atenções
governamentais em promoção, prevenção e educação em saúde (PINTO, 2000).
Atualmente, as doenças que apresentam maiores taxas de prevalência são
as crônico-degenerativas, ou seja, aquelas que surgem ao longo da vida e
acompanham o ser humano até o seu término, têm um potencial de mortalidade
menor, porém, uma morbidade ou co-morbidade maior (PINTO, 2000).
O novo desenho da pirâmide populacional aliado às reflexões sobre esse
fenômeno, permitiu o desenvolvimento da gerontologia, ciência que estuda o
envelhecimento como processo em seus aspectos biopsicossociais, que tem como
objetivos a manutenção da vida, o retardo do declínio físico e prolongamento da vida
com qualidade e novas expectativas. Dessa forma, é mais abrangente e engloba a
geriatria, que se centra no estudo e tratamento dos processos de adoecimento do
idoso (VIEIRA, 2004).
É importante ressaltar que a nossa sociedade vem sofrendo mudanças em
um ritmo acelerado em função do avanço das ciências e do desenvolvimento de
novas tecnologias, e estes afetam a nossa existência de diversas maneiras. Nesse
sentido, podemos dizer que o desenvolvimento tecnológico contribui para a
longevidade do homem. Embora não seja acessível a todos que caminham para a
terceira idade, faz necessário refletir no processo de viver e ser saudável inclusive,
no envelhecimento. Assim, saúde e qualidade de vida não significam
necessariamente ausência de doença, mas seu controle, permitindo ao idoso uma
vida mais autônoma e independente, ou seja, a concessão da possibilidade de ele
próprio conduzir sua trajetória existencial.
O processo de envelhecimento permite ao corpo vivido um momento de
reflexão, no qual podemos ir em busca de um sentido individual para a nossa
existência, o que possibilita à velhice um renascimento. Entretanto, a percepção que
temos de corpo, inspira-se naquilo que soubemos desenvolver e realizar no conjunto
das nossas experiências anteriores, ou seja, a pessoa que sabe envelhecer bem,
13
A percepção da sexualidade do corpo idoso
aprende a escutar o corpo e o mundo, compreendendo seus próprios recursos
(CAPODIECI, 2000).
Diante do exposto, a pergunta norteadora desta pesquisa é:
“Qual é a percepção que o idoso possui da sua sexualidade?”
O objetivo é:
“Perceber como o idoso entende e vive sua sexualidade”.
14
A percepção da sexualidade do corpo idoso
2. O DISCURSO DA LITERATURA SOBRE O TEMA
15
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Este capítulo aborda o tema sexualidade, partindo da discussão de algumas
peculiaridades do fenômeno apresentadas por concepções encontradas na
literatura.
Primeiramente, a sexualidade não se restringe aos impulsos sexuais, nem
aos órgãos sexuais, ou ao mero ato sexual, portanto, trata da interação harmoniosa
da genitalidade, da afetividade e da relação interpessoal, motivo pelo qual não é um
meio de prazer apenas, é uma linguagem do ser humano, do corpo (VIDAL, 2002), é
uma realidade humana multidimensional que não pode ser reduzida a um único foco
e tem diversas repercussões sociais (MOSER, 2001).
A característica multidimensional é comparada por Moser (2001) como
janelas que se abrem ao mundo, permitindo que nosso corpo se comunique com ele
e com as pessoas que nos cercam. Assim, a sexualidade envolve todos os sentidos
e abrange um conjunto de experiências e emoções que se exprimem na
continuidade do prazer que acompanha a nossa trajetória existencial (CAPODIECI,
2000).
O corpo, segundo Merleau-Ponty (1990), além de expressão, é fala, é
linguagem; é essa janela que nos permite comunicar com o mundo, é o veículo do
ser no mundo, pois permite todo o movimento de ir e vir, ou seja, de espacialidade
que ora aproxima, ora distancia o outro no processo de coexistência. Essa
concepção permite que nos projetemos para e no mundo, e que esse se projete para
dentro de nós, logo não temos corpo, somos corpo, da mesma forma não temos
sexo, somos sexuados (MERLEAU-PONTY, 1999). Nessa perspectiva de
relacionamento homem e mundo, a sexualidade amplia-se em três vertentes: o eu, o
tu e o nós. A primeira orienta-se para alcançar a maturidade e a integração pessoal
do ser humano, ou seja, trata-se da construção do eu”; a segunda possibilita a
relação interpessoal, uma vez que se direciona para o outro; e a terceira, trata-se da
socialização, visto que ocorre no estabelecimento das relações interpessoais
cruzadas (VIDAL, 2002).
A sexualidade apresenta-se como uma realidade dinâmica “que faz com que
o homem tenha uma história” na qual projeta sua maneira de ser no mundo
(MERLEAU-PONTY, 1999, p. 219). Assim sendo, torna-se possuidora de diversas
dimensões tais como: a biológica, a psicológica, a dialógica, a sociocultural, a
existencial e a espiritual.
16
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Ao reconhecer as diversas dimensões que compreendem a sexualidade,
não procuro fragmentá-la, como no modelo cartesiano, mas a imagino como o cubo,
mencionado por Merleau Ponty (1990, p. 45), que é possuidor de várias faces e
mesmo a face oculta, à minha vista, “está presente ao seu modo”. Essa figura
também se torna significativa, porque a cada movimento ou a cada posição que
tenho perante o objeto, posso ver uma de suas faces. Dessa forma, cada dimensão
apresenta uma peculiaridade, mas ao interligar-se às outras, pertencem ao mesmo
fenômeno.
A dimensão biológica diz respeito ao sexo cromossômico, ao
desenvolvimento anatômico e fisiológico, aos órgãos sexuais, à resposta sexual e à
reprodução. É determinada pela presença dos cromossomos sexuais associada ao
acúmulo primitivo de células gonadais, na fase uterina, que se converterão em
testículos ou ovários. Em seguida, todo o processo de sexualização biológica
dependerá dos fatores hormonais, os quais determinarão se a genitália e os centros
cerebrais serão masculinos ou femininos. E, após o nascimento, serão os hormônios
que conduzirão o desenvolvimento das características sexuais (CAVALCANTI,
1996). Os hormônios sexuais estão presentes em toda a trajetória da vida
apresentando os seus picos e declínios, desenvolvendo uma dança hormonal,
conforme a etapa vivida.
Na terceira idade, as mudanças hormonais e físicas decorrentes do
processo de envelhecimento, não ocasionam a diminuição da libido, motivo pelo
qual o idoso tem a sua sexualidade contemplada nessa dimensão. Isso significa que,
apesar das mudanças nos padrões de resposta sexual entre homens e mulheres
durante a trajetória existencial, eles permanecem presentes (KOLONDY, MASTERS,
JOHNSON, 1982). Essa compreensão é corroborada por Capodieci (2000, p. 12) ao
afirmar que não existem, excluindo casos claramente patológicos, “obstáculos
fisiológicos para uma normal atividade sexual nos indivíduos que passam dos
sessenta anos de idade”.
No que diz respeito à dimensão dialógica, é importante lembrar que a
existência humana se constitui na relação com o outro, e, neste sentido, a
sexualidade preenche todo relacionamento do eu com o tu; é uma linguagem na
construção dos relacionamentos que se manifesta pelo olhar, pelo toque, pela dança
(VIDAL, 2002), ou seja, pelas múltiplas formas de manifestação da corporeidade,
uma vez que esta é a essência que se expressa pelo corpo que e é visto, que
17
A percepção da sexualidade do corpo idoso
toca e é tocado, que sente e é sentido, porquanto é sensível (MERLEAU-PONTY,
1990).
A sexualidade, como dimensão existencial, é desvelada por Merleau-Ponty
como coextensiva à vida, porque para ele não temos sexo, somos sexuados, o que
denota uma cumplicidade entre existência e sexualidade, ao passo que “Existe uma
osmose entre sexualidade e a existência, quer dizer, se a existência se difunde na
sexualidade, reciprocamente a sexualidade se difunde na existência, de forma que é
impossível determinar, para uma decisão ou para uma dada ação, a parte da
motivação sexual e a parte das outras motivações; é impossível caracterizar uma
decisão ou um ato como “sexual” ou “não-sexual”” (MERLEAU-PONTY, 1999, p.
234).
A ótica existencial de Merleau-Ponty possibilita compreender que a
sexualidade permite ao homem desenhar a sua história, porque nela projeta “sua
maneira de ser, quer dizer, a respeito do tempo e a respeito dos outros homens”
(MELEAU-PONTY, 1999, p. 219). Assim, não se restringe ao genital e nem a um
simples processo de respostas nos quais os órgãos sexuais são o lugar, nem é
instintiva, ela é compreendida como a maneira de ser no mundo.
É importante lembrar que a sexualidade também é um fenômeno psíquico, e
como tal faz-se necessário esboçar o desenvolvimento psicológico do ser humano
na compreensão do psicanalista Sigmund Freud, que no final do século XIX e início
do XX, se preocupou em investigar a sexualidade. Seus estudos se apresentam
como um divisor de águas para a compreensão moderna e contemporânea deste
tema, uma vez que a sexualidade vai além da genitalidade. Sua manifestação está
presente em todas as fases do desenvolvimento humano sob uma multiplicidade de
formas, é a libido, ou seja, a energia sexual em diferentes partes do corpo.
O desenvolvimento sexual em sua dimensão psicológica ocorre seguindo
algumas fases, que de certa forma, também acompanham o desenvolvimento
biológico, e sob a ótica da psicanálise existe manifestação da sexualidade a partir
do nascimento. Na criança, ela vai se fixando em regiões erógenas diversas por
apresentarem diferentes necessidades fisiológicas, que podem mais tarde se
separar da sexualidade. Segundo essas necessidades, verificamos no
desenvolvimento infantil cinco etapas ou fases: a oral, a anal, a fálica, a edípica e a
de latência (FREUD, 1979).
18
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A primeira fase do desenvolvimento sexual infantil, denominada de fase
oral, ocorre entre o terceiro ou quarto mês de vida, nos quais, a criança descobre o
prazer no fenômeno da sucção associado ao prazer da nutrição, caracterizando
assim, a boca como zona erógena. a fase anal ou esfincteriana desenvolve-se a
partir do primeiro ano e tem como característica o controle do esfíncter anal pela
criança, o que passa a ser a primeira experiência de controle sobre seu corpo, e, por
sua vez, a fase genital ou fálica, que se por volta dos três anos, caracteriza-se
pelo auto-erotismo. É um período muito importante, porque possibilita que a criança
comece a tomar consciência de si, do seu corpo.
No que diz respeito à fase edípica, nela se constrói e se soluciona o
Complexo de Édipo, e apesar de ser simultânea com a fase genital, costuma ser
estudada separadamente. Para que a criança atinja a maturidade sexual desta fase
é necessário estabelecer a primazia da região genital sobre as outras regiões
erógenas que permanecerão, entretanto, subordinadas à região genital, e deve
ainda, passar do auto-erotismo ao amor objetal, relacionado á procura do outro. A
resolução deste complexo se a partir do momento de aceitação da própria
sexualidade e da relação que estabelece com o objeto externo. Esse processo
desenvolve-se mediante a identificação com o progenitor do mesmo sexo, e em
seguida estabelece-se a última fase do desenvolvimento sexual infantil denominada
de período de latência. Neste, a criança aprende as formas de sociabilidade e a
energia sexual é deslocada para as atividades intelectuais e esportivas (FREUD,
1979).
É importante lembrar que o desenvolvimento de cada uma dessas fases
servirá de base para a construção da sexualidade, motivo pelo qual julgava-se ser
importante a resolução delas (FREUD, 1979). Contudo, o autor afirma que podem
ocorrer algumas variações de ordem cronológica e de eventos característicos de
cada fase que terão um sentido muito importante no desenvolvimento do ser
humano. Cabe destacar que, a partir da fase fálica ou genital, as diferenças
começam a existir no desenvolvimento da sexualidade no menino e na menina.
O desenvolvimento da sexualidade continua na adolescência e direciona-se
para o próprio corpo e para o corpo do outro. Ocorre o surgimento dos caracteres
sexuais secundários que leva a uma transformação mais rápida da dimensão
biológica do que da psicológica e social. Isto significa que o corpo modifica-se e
prepara-se rapidamente para a vida adulta. Entretanto, a mente e os
19
A percepção da sexualidade do corpo idoso
relacionamentos não acompanham o mesmo ritmo, podendo acarretar dificuldades
nas relações, no estabelecimento do diálogo com pares diferentes.
Na adolescência ocorrem diversas mudanças, uma vez que passará da fase
infantil para a adulta, e nessa transição encontram-se transformações do corpo, na
qual a manifestação da sexualidade não está presente, mas apresenta-se como
divisor de etapas. Elas fazem parte do processo de construção da identidade do
adolescente e que o leva ao convívio em grupos, reforçando os vínculos de amizade
com seres humanos do mesmo sexo. É nesse período que o interesse pelo outro
leva vários adolescentes a terem sua primeira experiência relacionada com o ato
sexual (LOPES, 1993; SOUZA, 2000; VIDAL, 2002). Convém destacar que as
transformações ocorrem durante toda a trajetória de vida, contudo, em nenhum outro
momento, elas são tão rápidas como na adolescência, visto que, em um prazo de 6
a 8 anos, o corpo deixa de ser criança e se transforma em adulto.
Na literatura encontramos uma fase que se inicia após a adolescência e é
denominada juventude, compreendida como o período que vai dos 18 aos 40 anos
(PAPALIA & OLDS, 2000)
1
. Nela a dimensão psicológica se caracteriza pelo
estabelecimento de relações interpessoais, mediante o diálogo interpessoal
sexualizado (VIDAL, 2002), e a sexualidade direciona-se mais especificamente pela
procura do outro.
A fase subseqüente à juventude é a meia-idade. Nela a sexualidade é
concebida como madura e pode apresentar-se de diversas formas como: a união
matrimonial, a condição de solteiro, a viuvez e a virgindade consagrada. Isso
significa que, a sexualidade expressa nesta fase, nada mais é do que a
manifestação das experiências vivenciadas pelo corpo vivido (VIDAL, 2002).
Ao tentar compreender como ocorre o desenvolvimento da sexualidade,
esquematizei mentalmente três momentos ímpares: a infância, na qual o
desenvolvimento da sexualidade apresenta-se voltado para si, uma vez que ela
possui características egocêntricas; a adolescência, que se caracteriza pelo
descobrimento do próprio corpo, mas simultaneamente leva ao interesse pelo corpo
do outro; e por último a fase adulta, na qual a sexualidade se desenvolve como uma
busca pelo outro, como complemento daquilo que não tem, e, nesse sentido, ela é
troca.
1
Por ser um contexto americano, as autoras consideram a juventude a partir dos 20 até 40 anos, a meia-idade dos
40 aos 65 anos e a terceira idade a partir dos 65 anos. Para esse estudo utilizarei as mesmas etapas,contudo,
adaptando as idades a nossa realidade (PAPALIA & OLDS, 2000, p. 27).
20
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A fase que vem a seguir é a terceira idade e, diferentemente das outras, no
que se refere à temporalidade, parece apontar para o limite da nossa existência
mais rapidamente, visto que o kronos, ou seja, o tempo cronológico torna-se fator
determinante para a deterioração do corpo em sua totalidade. Por este motivo não
devemos nos preocupar com ele, porquanto, o tempo mais importante no processo
de envelhecimento é o kairos
2
, isto é, o tempo vivido que a cada amanhecer nos
aponta para uma multiplicidade de possibilidades, que pode colorir nosso existir,
transformando nossa existência em uma grande tela plena de significados que serão
armazenados em nosso corpo que é “memória que guarda, retrata, conta e faz
história”, uma vez que vivencia e experiencia o ser e o estar no mundo (LABRONICI,
2002, p. 20).
Destarte, o tempo gera desgaste natural do nosso corpo, porquanto são 24
horas por dia o coração batendo, o pulmão inspirando oxigênio e expirando gás
carbônico, milhares de células morrendo e se renovando, o cérebro funcionando, e
assim por diante. Isso faz com que o nosso corpo jamais seja como ontem - o aqui e
agora se configuram como uma sucessão de momentos únicos, singulares que
desencadeiam uma multiplicidade de ações e reações (LABRONICI, 2002).
Todas as transformações que acontecem no corpo afetam a sua
multidimensionalidade, e, neste sentido, podemos pensar nos mitos
3
e preconceitos
que permeiam a afetividade e sexualidade do idoso, visto que ela, no senso comum,
parece estar em declínio ou ser inexistente, e até mesmo sem função.
Historicamente, a compreensão da sexualidade esteve e está centrada na
concepção reprodutiva. Esta concepção não só limita a sexualidade como também a
desvaloriza.
É interessante lembrar que, historicamente, a desvalorização da
sexualidade inicia-se com a igreja cristã que considerava o ato sexual vergonhoso
enquanto uma prática não reprodutiva. É nesta concepção que a sexualidade do
idoso se construiu (SANTOS, 2003), razão pela qual carrega o peso da
discriminação devido à existência da construção social de estereótipos assexuados
representando o envelhecimento, de forma que, o exercício dos relacionamentos
afetivos e sexuais torna-se prejudicado e de alguma forma reprimido, criando
2
Contribuição dos apontamentos realizados pela orientadora durante a banca de qualificação deste trabalho no
dia 12/06/06.
3
São pensamentos coletivos, geralmente, invenções populares que servem de proteção da angústia ante o
desconhecido (LOPES & MAIA, 2000, p. 21).
21
A percepção da sexualidade do corpo idoso
dificuldades em perceber e permitir o exercício da sexualidade após o período de
procriação (RISMAN, 2005). Por vezes, o preconceito permite o entendimento de
que a andropausa e a menopausa são os responsáveis pelas dificuldades sexuais, o
que impede de perceber que a sexualidade do idoso está além das limitações
físicas. Este impedimento surge em nível psicológico e social, e, de certa forma, o
preconceito que habita os jovens ao refutarem a sexualidade do idoso, também pode
ser encontrado neles mesmos acerca de sua própria sexualidade (SANTOS, 2003).
No que diz respeito à dimensão sociocultural, a sexualidade “representa um
conjunto de valores e práticas corporais culturalmente legitimadas na história da
humanidade” (GONÇALVES, 2005, p. 112). Por este motivo sua construção é
mutável, isto é, além de ser socialmente construída, modifica-se conforme a cultura
e ao longo da história, envolvendo também a percepção do próprio corpo. Assim, ser
homem ou mulher ultrapassa a dimensão biológica. O que recebemos ao nascer é
um status feminino ou masculino e a sociedade espera que a pessoa tenha um
comportamento compatível com ele, e isso é denominado papel sexual. Esse fato
trata de uma identificação socioantropológica, na qual a criança passa a ser
enquadrada dentro de estruturas próprias de cada sociedade, que definem o que é
ser masculino e o que é ser feminino (CAVALCANTI, 1996).
O exercício da sexualidade possibilita diversas formas de manifestação da
corporeidade que é expressão do corpo, que me faz existir e tomar consciência de
mim, do outro e do mundo. Essa consciência possibilita a percepção de tudo que
está a minha volta, das singularidades, das diferentes relações que posso
estabelecer comigo e com o outro, mediante uma postura aberta, flexível e sensível
que propiciará conhecer e experimentar sentimentos de amor e ódio, de pertença e
exclusão, sensações de prazer e dor, porquanto o corpo é objeto sensível, é veículo
do ser no mundo (MERLEAU-PONTY, 1990; 1999).
Ao mergulharmos na história, para ampliarmos a compreensão de como se
deu a construção da sexualidade, percebemos que seu significado vai modificando-
se nos diversos contextos históricos. Ora apresentava-se carregada de repressão,
preconceitos, mitos e tabus, ora com liberdade sexual (LOPES & MAIA, 2000).
Nesse sentido, a sexualidade possui múltiplas formas de manifestação durante a
trajetória existencial e que são influenciadas pela cultura.
É importante salientar que cultura pode ser compreendida como forma de
organização de uma sociedade, seus costumes e tradições transmitidas de geração
22
A percepção da sexualidade do corpo idoso
a geração, ou seja, é a manifestação de padrões de comportamento aprendidos e
desenvolvidos pelo ser humano no processo de interação social (HELMAN, 2003).
Sendo assim, percebo que as formas de manifestar a sexualidade mudam no
decorrer da trajetória existencial, mesmo ao longo da história da humanidade e nas
diferentes culturas.
A cultura influencia a construção da sexualidade que ocorre no corpo
coletivo, uma vez que é este quem estabelece normas e comportamentos, cria
tabus, mitos e preconceitos. Ao olhar para a cultura ocidental, constituída por traços
judaico-cristãos, é possível reconhecer suas peculiaridades no que se refere à
sexualidade, logo, teve suas conotações moldadas pela história e religião.
No que diz respeito ao idoso, a história deu conta de construir o mito da sua
assexualidade, tendo como referência o adulto viril. Dessa forma, toda mudança
física decorrente do processo de desenvolvimento do ser humano em sua trajetória
existencial traria a diminuição, ou até mesmo o desaparecimento do desejo, e aos
que tentassem manifestar a sua sexualidade sofreriam a decepção das dificuldades
impostas pela idade (RISMAN, 2005).
Na antiga Grécia, o exercício da sexualidade entre homens e mulheres foi
construído em torno da procriação. Alguns escritos de Aristóteles descrevem que a
saúde era vista como mais importante que o amor, motivo pelo qual, caberia ao
Estado determinar a idade mínima e máxima para a atividade sexual, uma vez que
“filhos de pais muito jovens nascem imperfeitos de corpo e de alma, e os de pais
excessivamente idosos são débeis; conseqüentemente, este período deve ser
limitado à fase de plenitude mental” (RISMAN, 2005).
O que podemos perceber é que, de alguma forma, havia razões para tal
proposição, mas que por outro lado, apresentava-se preconceituosa e
discriminatória em relação ao idoso, uma vez que nessa sociedade ele era
valorizado porque, ao possuir experiência e sabedoria, transmitia as tradições para
os mais jovens. No período mítico, os idosos eram conhecedores profundos dos
mitos e o repassavam oralmente aos mais jovens para garantir a perpetuação da
cultura e dos conhecimentos adquiridos de geração a geração (OLIVEIRA, 2000).
No que diz respeito à crença no Criador, a visão criacionista
4
, remete a uma
criação dotada de sexualidade, que era vista como algo bom, puro, ingênuo, uma
4
Teoria explicativa da origem dos seres vivos que se refere à intervenção do poder divino. Essa forma de pensar
vigorou até o século XVIII (THINES & LEMPEREUR, 1970, p. 223).
23
A percepção da sexualidade do corpo idoso
vez que Adão e Eva estavam nus e não se envergonhavam, o que resulta no
desembaraço entre os corpos. Tudo estaria tranqüilo, se não fosse o homem ter
adquirido consciência do bem e do mal. A partir daí iniciou a desigualdade entre os
gêneros, e a mulher passou a ser dominada pelo homem (BÍBLIA, 1995; SNOEK,
1981).
Na visão Patrística
5
, que abrange os pensadores cristãos no primeiro
século, a sexualidade passa a receber influências platônicas, na qual o homem não
está em seu estado natural. Ela é compreendida como produto do corpo, e portanto,
é tida como pecaminosa encontrando no matrimônio a redenção, por meio da prole,
da fidelidade e do sacramento como juramento e compromisso definitivo (SNOEK,
1981). Nesse contexto, ela era permitida apenas para a procriação, e os indivíduos
mais velhos que não poderiam mais desenvolver a sua prole eram tidos como
sofredores, visto que possuíam o desejo, mas não teriam a permissão de exercê-lo.
Esse aspecto retrata algumas formas de preconceito visto ainda hoje (RISMAN,
2005).
No período medieval, constituiu-se o celibato eclesiástico, o qual foi imposto
por uma razão econômica e não por ordenança divina, e a devoção mariana, a qual
valorizava a castidade. Neste sentido, pensar em sexualidade fora de padrões
reprodutivos do casamento era visto como prática pecaminosa. Assim, os idosos
estavam excluídos do exercício de sua sexualidade devido à impossibilidade da
fecundação. Apesar dessa repressão, houve várias formas de desenvolver a
sexualidade extramatrimonial, e isso se manteve até aproximadamente o ano 1540
com o advento do puritanismo, ou seja, uma doutrina que busca o resgate da
moralidade humana. Esse período passa a ser marcado pela inibição da nudez,
polidez da linguagem, combate à masturbação e educação diferenciada para
crianças, pelo fato de considerar determinados temas impróprios para elas. Tal
situação se mantém até surgir a revolução sexual a partir de 1870 (SNOEK, 1981).
A revolução sexual inicia-se no período moderno e Snoek (1981) a divide
didaticamente em três fases: a primeira chamada de revolução dos artistas e dos
cientistas (1870-1914) na qual a sexologia os seus primeiros passos e se
falava na libertação da mulher; a próxima é chamada de revolução da elite
intelectual (1918-1940), momento no qual as relações matrimoniais e várias outras
5
Filosofia cristã formulada pelos padres cristãos nos primeiros cinco séculos de nossa era, buscando combater a
descrença e o paganismo por meio de uma apologética da nova religião, calcando-se freqüentemente em
argumentos e conceitos procedentes da filosofia grega (HOUAISS, 2001, p. 2151).
24
A percepção da sexualidade do corpo idoso
relações sobre sexualidade, passaram a ser questionadas da forma como vinham
sendo desenvolvidas, ou seja, foi um momento em que vários pensadores refletiram
sobre o tema sexualidade; a última fase denominada de revolução sexual das
massas populares (1945 até hoje) veio derrubar praticamente todos os tabus a
respeito da sexualidade; o sexo torna-se artigo de consumo, confere-se uma maior
liberdade à busca do prazer. Devido a essa revolução, vivemos atualmente um
momento no qual a manifestação da sexualidade é expressa em sua diversidade, de
forma mais aberta.
Apesar das mudanças vividas, a construção da sexualidade ainda se dá sob
a forma de mito e preconceito, e ao referir-me à sexualidade do idoso, esse fato
parece persistir.
No que diz respeito aos estudos referentes à sexualidade do idoso,
encontraremos trabalhos a partir de 1960, sendo que em sua maioria investigam a
dimensão biológica da sexualidade (CAPOIECI, 2000).
25
A percepção da sexualidade do corpo idoso
3. A TRAJETÓRIA METODOLÓGICA PERCORRIDA
26
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A escolha do caminho a ser percorrido deve ir ao encontro do objeto a ser
investigado, uma vez que ele determina o tipo de pesquisa. Dessa maneira, esta
pesquisa é qualitativa de abordagem fenomenológica hermenêutica, fundamentada
nos conceitos percepção, corpo e corporeidade do filósofo Maurice Merleau-Ponty.
Para o autor, o ser humano é corpo, consciência encarnada, constituído de carne.
A carne não é matéria, nem substância, “consiste no envolvimento do visível
sobre o corpo vidente, do tangível sobre o corpo tangente, atestado, sobretudo,
quando o corpo se vê, se toca vendo e tocando as coisas”, de forma simultânea
(MERLEAU-PONTY, 2005, p. 141). Assim, o corpo também é compreendido como
janela que se abre para o mundo, através da qual se percebe o mundo e com o qual
interage. Não se trata simplesmente de um corpo objeto, mas corpo objeto sensível
que percebe e é percebido, porquanto, a percepção é acesso do corpo ao mundo,
ao saber, ao conhecimento. Ela nos permite uma compreensão e visão de mundo,
uma vez que passa pelo corpo.
É importante salientar que para Merleau-Ponty (1999) não temos corpo,
somos corpo, e tudo o que sabemos do mundo, mesmo que por meio da ciência, o
sabemos a partir de uma visão individual do mundo ou de uma experiência do
mundo sem a qual os símbolos da ciência não nos diriam nada, ou seja, tudo o que
sabemos, o sabemos por intermédio do corpo. Nessa concepção a percepção do
cotidiano apresenta-se como um mosaico “de um conjunto de objetos distintos”, isso
devido à “recordação de experiências anteriores”, ou seja, o saber (MERLEAU-
PONTY, 1990, p. 25).
um paradoxo revelado pela percepção: o paradoxo da imanência e da
transcendência. “Imanência, posto que o percebido não poderia ser estranho àquele
que percebe; transcendência, posto que comporta sempre um além do que está
imediatamente dado”, ou seja, ela se constrói em uma visão de mundo. Na
experiência vivida, o que percebo é algo que me é dado e que já tem um significado,
nada que percebo no mundo é ausente de significado. A visão de mundo é
possível "porque de início temos experiência dele" (MERLEAU-PONTY, 1999;1990,
p. 48-9).
Nos estudos fenomenológicos, a percepção se constitui pedra angular da
compreensão e concepção da realidade e do conhecimento. Ela, portanto, é o
acesso à experiência originária, na qual unem-se consciência e mundo vivido
(FRANÇA FILHO, 2003).
27
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A percepção que não pode ser decomposta como reunião das partes ou de
sensações (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 47) passa pela consciência, visto que,
refere-se a um estado de alerta para o mundo, motivo pelo qual é sempre
consciência de alguma coisa (MARTINS, 1992). Assim, “toda consciência é
perceptiva, mesmo que a consciência de nós mesmos”, ou seja, consciência de que
somos corpo. Ela é “o fundo sempre pressuposto por toda a racionalidade, todo
valor e toda existência” (MERLEAU-PONTY, 1990, p. 42; 1999). A consciência
perceptiva é ao mesmo tempo consciência de si e consciência do mundo (FRANÇA
FILHO, 2003). Nesse sentido, o percebido se coloca não como verdade a toda
inteligência, mas como real para todo sujeito que partilha essa percepção, assim ela
torna-se o início do conhecimento do mundo e como o ato que liga o corpo ao
exterior.
“É preciso, pois que pela percepção do outro, eu me ache colocado em relação
com o outro eu que esteja em princípio aberto às mesmas verdades que eu, em
relação com o mesmo ser que eu. E essa percepção se realiza, do fundo de
minha subjetividade vejo aparecer uma outra subjetividade investida de direitos
iguais, porque no meu campo perceptivo se esboça a conduta do outro, um
comportamento que eu compreendo, a palavra do outro, um pensamento que eu
abraço e de que aquele outro, nascido no meio de meus fenômenos, se apropria,
tratando-o segundo as condutas típicas de que eu próprio tenho a experiência”
(MERLEAU-PONTY, 1990, p. 50-51).
Para o autor, o ato perceptivo não se apresenta ingênuo de
intencionalidade, como também não se trata apenas de mera operação intelectual. É
a percepção que faz surgir o mundo, que aparece tal qual foi percebido como mundo
fenomenal (MERLEAU-PONTY, 1990).
Percepção e o que é percebido “têm a mesma modalidade existencial”, isto
significa que não podemos separar da percepção a consciência que ela tem de
atingir a coisa mesma. Desse modo, perceber é perceber algo (FRANÇA FILHO,
2003, p. 107) e a consciência perceptiva é consciência de algo.
Verifica-se que este referencial se constrói sobre o tripé percepção,
consciência e corpo (sujeito) compreendido como objeto sensível, corpo vivido,
dotado de percepção e consciência. Ele é o local de troca e de interação com o meio
e com o outro; é por meio do corpo que percebo o outro e o mundo, que tenho
experiência desse, que percebo o vivido, ou seja, tomo consciência dele. Nesse
contexto, “o corpo é o conjunto de significações experienciadas durante a trajetória
existencial que passam a fazer parte do nosso ser, da nossa bagagem cultural e
28
A percepção da sexualidade do corpo idoso
histórica e que fazem do corpo ”memória”, memória que guarda, retrata e conta
história” (LABRONICI, 2002, p. 20). Isso significa que, ele é o lugar onde tudo
permanece; do fazer ver e da fala e onde tudo se mostra (MERLEAU-PONTY, 1999;
2005); o corpo é o primeiro e único lugar da experiência humana (LABRONICI,
2002) que se expressa mediante sua corporeidade. Esta é:
“condição humana e modo de ser que caracteriza o homem na sua existência, é
o contido em toda dimensão humana. É ser flexível, é estar disponível e aberto
para o outro e para o mundo; é o resgate do corpo, é o existir, é a história de
cada um de nós, que se funde com o outro que também é corpo vivente, que
traz na sua bagagem cultural suas crenças, seus valores e sua visão de mundo,
num processo de recruzamento” (POLAK, 1996, p. 46)
Ao tomar o discurso do corpo vivente que revela a sua experiência, e o olhar
fenomenológico que busca a essência, estou falando da expressão do corpo, isto é,
da corporeidade. Assim, nesse referencial filosófico, a experiência não provém dos
nossos antepassados, nem do meio físico e social, ela se move em direção a eles e
os sustenta (MERLEAU-PONTY, 1999), o que permite adotar o corpo realmente
como corpo vivido e livre para expressar sua visão de mundo, suas crenças e
valores, isto é, sua corporeidade. A corporeidade é o que expressa a essência do
corpo que vê e é visto, que toca e é tocado, que sente e é sentido, porque é sensível
(MERLEAU-PONTY, 2005), ou seja, ela é a expressão do corpo.
O corpo constitui a base de toda experiência humana, e é possuidor de uma
intencionalidade operante que faz brotar o sentido. Essa intencionalidade é um
movimento de presença no mundo e ao mundo, e apresenta-se como característica
fundamental do corpo próprio (FRANÇA FILHO, 2003).
Esse corpo é o que me permite experienciar o mundo, além de que é
produtor e portador de significados (LABRONICI, 2002), e quando queremos
desvelá-los, compreendermos determinado fenômeno vivenciado pelo corpo vivido
mediante investigação científica, devemos utilizar a pesquisa qualitativa.
É interessante elucidar que a pesquisa qualitativa busca compreender as
experiências vividas, porque são prenhes de significados que são atribuídos por
quem a vivencia e que emergem do contexto da vida. Assim, “ela trabalha com o
universo de significados, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um
espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não
podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis“ (MINAYO, 2004, p. 21).
29
A percepção da sexualidade do corpo idoso
As pesquisas qualitativas de outra natureza assim como a fenomenológica
baseiam-se no princípio de que “os conhecimentos sobre os indivíduos são
possíveis com a descrição da experiência humana, tal como ela é vivida e tal como
ela é definida por seus próprios atores.” (POLIT & HUNGLER, 1995, p. 270). Elas
trabalham com dados não quantificáveis, coletam e analisam materiais pouco
estruturados, mas que produzem grande quantidade de material narrativo
(HANDEM, MATIOLO & PEREIRA, 2004). Seus objetos de estudos não são
mensuráveis e visíveis, uma vez que surgem da compreensão dos sujeitos
atribuídos ao fenômeno (GOMES, 2005).
De uma forma geral, as pesquisas qualitativas procuram a compreensão
particular do objeto estudado, não se preocupam com generalizações. Sua forma de
coleta de dados é a comunicação entre sujeitos e o tratamento é feito por meio da
hermenêutica
6
, ou seja, da interpretação, que é compreendida como o modo de
aclaramento dos sentidos e significados da palavra, das sentenças e dos textos e
que é desencadeada pela percepção. A generalização é abandonada e o foco da
atenção investigativa é “centrado no específico, no peculiar, no individual, almejando
sempre a compreensão e não a explicação dos fenômenos estudados”. Esse
modelo de pesquisa deve, portanto, “substituir as correlações estatísticas pelas
descrições individuais e as conexões causais objetivas pelas interpretações
subjetivas oriundas das experiências vividas” (MARTINS; BICUDO, 1989, p. 23-24).
A pesquisa qualitativa fenomenológica busca a compreensão dos
fenômenos presentes no mundo. Nesse sentido, a Fenomenologia enquanto estudo
do fenômeno que é algo concreto e não um ideal deduzido, é a realidade própria do
mundo humano e a existencialização do sentido que passa a ser parte estrutural da
consciência (LABRONICI, 2002); é uma filosofia que repõe as essências na
existência (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 1), que recoloca o homem em sua condição
existencial, partindo de seu mundo e aceitando o seu caráter de mutabilidade e
relatividade (SANTOS & POKLADEK, 2004). Nela,
“o investigador, de início, está preocupado com a natureza do que vai investigar,
de tal modo que não existe, para ele, uma compreensão prévia do fenômeno.
Ele não possui princípios explicativos, teorias ou qualquer indicação definidora
do fenômeno. Inicia o seu trabalho interrogando o fenômeno. Isso quer dizer que
6
Hermenêutica vem da palavra grega “hermeneuõ” que significa interpretar, traduzir ou falar com clareza. Essa
expressão vem de Hermes, que segundo a mitologia grega era conhecido por seus discursos eloqüentes, sendo
porta-voz de Zeus e de outros deuses. Sua função era transformar o que estava além do entendimento humano
em algo que a inteligência humana pudesse assimilar (OLIVEIRA, 2004, p. 19).
30
A percepção da sexualidade do corpo idoso
ele não conhece as características essenciais do fenômeno que pretende
estudar” (MARTINS e BICUDO, 1898, p. 92).
A fenomenologia também pode ser compreendida como voltar às coisas
mesmas, “o que significa retornar aonde elas são vividas e onde elas cobram
sentido para a vida e para a existência” (JOSGRILBERG, 2004, p. 34). Assim,
descreve como alguém se orienta para a experiência vivida, uma vez que está
interessada no mundo significativo do ser humano. Sob essa ótica, podemos afirmar
que é sempre um questionamento do modo como experienciamos o mundo; ela é
uma tentativa de desvelar e descrever as estruturas de significados internos da
experiência vivida. Dessa maneira, o foco de indagação fenomenológica é o
fenômeno vivenciado pelo sujeito e como eles interpretam essa vivência (POLIT &
HUNGLER, 1995, p. 270).
O método fenomenológico é um processo de aprendizado e de construção
de significado da experiência humana por meio do diálogo intensivo com pessoas
que estão vivendo a experiência (LOBIONDO-WOOD; HABER 2001, p.127). Assim,
a pesquisa fenomenológica nada mais é do que o estudo da experiência vivida
obtida mediante a descrição de fenômenos tais quais se apresentam à consciência,
visto que esta é o único acesso que os seres humanos têm para o mundo. É a partir
da consciência voltada para o fenômeno que emerge a intencionalidade, a abertura
do ser ao mundo, ou seja, a relação entre o homem e o mundo, o sujeito e o objeto
(VAN MANEN, 1990).
A intencionalidade é dirigir-se a algo, de forma a entrar em contato com um
objeto ou de estabelecer referências entre consciência e o objeto (MARTINS,
BOEMER & FERRAZ, 1990). Segundo esses autores, toda ação humana é
intencionalidade e é um comportamento dirigido a alguma coisa no mundo, ou seja,
refere-se a uma direção da consciência. Dessa forma, é a condição de possibilidade
para que toda experiência possa assumir forma, pois é mediante ela que os
fenômenos surgem (MARTINS, 1992).
É interessante ressaltar que a pesquisa fenomenológica não procura
explicar os fenômenos como acontece com outras ciências, mas sim descrevê-los.
Contudo, faz-se necessária a interpretação dos significados contidos na descrição
para que se possa compreender e chegar à essência do fenômeno ou da
experiência existencial. Nesse contexto, a arte da interpretação das estruturas de
significados, ou seja, a hermenêutica é imprescindível, porque possibilita
31
A percepção da sexualidade do corpo idoso
transcender a descrição do fenômeno. Isto significa que, ela passa a ser a
interpretação de uma realidade e uma interpretação daquele que fala dela. Portanto,
a interpretação e a compreensão que possibilitam desvelar a essência do fenômeno,
estão intimamente interligadas.
Chegar à essência, por sua vez, é esclarecer o mundo como ele é e se
apresenta, trata-se de colocar o mundo a ser conhecido como um fim, um objetivo a
ser alcançado. O mundo é o que está em nossa percepção, não sendo construído
por apenas o que cogito, mas pelo que vivo. Essa comunicação com o mundo
subentende uma intencionalidade, que necessariamente refere-se a uma direção da
consciência, uma vez que “consciência é sempre consciência de ...” (MARTINS,
1992, p. 61). Dessa maneira, ela emerge da relação entre o sujeito e o objeto, ou
seja, da consciência voltada para o fenômeno. Esta relação entre consciência, fonte
de significado para o mundo e fenômeno, torna sujeito e objeto inseparáveis.
3.1 PROCESSO DE OBTENÇÃO E REGISTRO DOS DISCURSOS
O processo de obtenção dos discursos ocorreu por meio de entrevista semi-
estruturada gravada em meio digital, e foi conduzido segundo o modelo de
amostragem proposto por Turato (2003) denominado de “bola de neve”, na qual o
pesquisador entrevista um sujeito escolhido conforme critérios da pesquisa ou
indicado, dependendo do tema em estudo. A partir do material coletado, transcrito e
analisado, foi apresentada uma delineação inicial de compreensão do problema. O
próximo passo foi entrevistar um segundo sujeito, recomendado pelo primeiro. Em
seguida, o material foi trabalhado da mesma maneira que o anterior. Esse processo
foi seguido sucessivamente até que o tema proposto se esgotasse e não mais se
encontrasse algo novo (TURATO, 2003). Como essa pesquisa era com idosos, a
pessoa indicada para a entrevista seguinte deveria ter idade igual ou superior a 60
anos para que pudesse participar voluntariamente.
Destaco que na pesquisa fenomenológica o discurso ou a descrição é de
fundamental importância porque contém a essência do que se busca conhecer e a
intencionalidade do ser humano. Dessa forma, a entrevista é um instrumento de
conhecimento interpessoal, é um momento de encontro face a face, no qual pode
32
A percepção da sexualidade do corpo idoso
ocorrer a apreensão de diversos fenômenos (TURATO, 2003), mediante a
hermenêutica.
Na hermenêutica fenomenológica das ciências humanas, a entrevista presta-se
a objetivos bem específicos: (1) Pode ser usada como meio de exploração e
coleta experimental de material narrativo que pode servir como um recurso para
o desenvolvimento de uma compreensão mais profunda e rica do fenômeno
humano e (2) pode ser usada como um veículo para desenvolver uma relação
de conversa com um parceiro (entrevistado) sobre o significado de uma
experiência (VAN MANEN, 1990, p. 66)
7
.
A entrevista é um encontro intencional entre corporeidades que se
percebem. Contudo, para que o pesquisador consiga perceber o outro, penetrar no
seu mundo privado, na sua subjetividade, é imprescindível ser flexível, ter uma
postura aberta, um olhar e uma escuta atentivos (LABRONICI, 2002). Isto
possibilitará que o entrevistado se sinta menos tenso; porquanto, falar, descrever
uma situação experienciada, nem sempre é fácil, e às vezes pode fazer vir à tona
sentimentos permeados por emoções que deixaram marcas em seu corpo. Ela
apresenta algumas características, tais como a empatia, a intuição e a imaginação
(MARTINS & BICUDO, 1989).
A empatia
8
“é uma penetração mútua de percepções” (MARTINS &
BICUDO, 1989, p. 53). No momento da entrevista ela é imprescindível, uma vez que
possibilita “estar com” o outro e presenciar a sua experiência, a experiência do corpo
vivido.
No que diz respeito à intuição, ela “é uma forma de contemplação”, e o que
nela se apresenta é o que é aceito e o que é dado. será possível perceber o
outro contemplando suas experiências vividas (MARTINS & BICUDO, 1989, p. 53).
Por fim, a imaginação do entrevistado pode fluir da mesma maneira que a do
entrevistador. “Pode-se imaginar quais são os dados reais e quais os fabricados e
produzidos pelos entrevistados”, visto que ela nada mais é do que a representação
do real (MARTINS & BICUDO, 1989, p. 53).
A entrevista teve como solicitação inicial:
“Fale-me sobre como você vive a sua sexualidade no seu dia-a-dia”.
E outra solicitação foi:
“O que é sexualidade para você”.
7
Tradução do autor.
8
Vem do radical grego empátheia que significa entrar no sentimento, ou a capacidade de perceber a
experiência do outro (GOLEMAN, 1995).
33
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Os discursos obtidos mediante as entrevistas gravadas foram transcritos na
íntegra e entregues por mim a cada um dos atores que fizeram parte da pesquisa, a
fim de que tomassem conhecimento, evitando, assim, qualquer tipo de distorção.
3.1.1 Cenário
A pesquisa não ocorreu no mesmo local, porque os atores eram
provenientes de indicação. O cenário foi único para cada um dos atores envolvidos
na pesquisa, visto que, após contato individual, a entrevista era agendada e o local
determinado por eles. Aconteceram nos domicílios, em clube e no local de trabalho,
na cidade de Curitiba.
3.1.2 Os atores da pesquisa
O conjunto de atores que compôs a pesquisa foi constituído de 10 idosos
sendo 01 viúva, 71 anos, cabeleireira aposentada, mas que ainda exerce a função,
católica (F I); 01 divorciada, 61 anos, professora de educação física, aposentada,
católica (F II); 01 casada, 65 anos, do lar, católica (F III); 01 viúva, 69 anos, do lar,
pensionista, católica (F IV); 01 viúvo, 83 anos, reformado da Força Aérea Brasileira,
católico (M V); 01 casado, 65 anos, aposentado, ex-comerciante, católico (M VI); 01
viúvo, 64 anos, fazendeiro aposentado, católico (M VII); 01 casado, 63 anos,
motorista, evangélico (M VIII); 01 casado, 71 anos, aposentado, ex-comerciante,
católico (M IX); 01 casado, 61 anos, desempregado, técnico administrativo,
evangélico (M X).
A primeira atriz da pesquisa foi indicada por minha orientadora e na
seqüência das indicações alguns não desejaram participar, motivo pelo qual foi
necessário procurar um novo informante para dar continuidade às entrevistas. O
contato inicial acontecia por telefone. Apresentava-me como enfermeiro e aluno do
curso de mestrado da Universidade Federal do Paraná que estava desenvolvendo
uma pesquisa sobre sexualidade. Perguntava se gostaria de fazer parte dela, e em
caso afirmativo, combinava o agendamento para a realização da entrevista.
34
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Cabe salientar que, na pesquisa qualitativa, a amostra não tende a ser
numerosa e os pesquisadores evitam impor controles à pesquisa (POLIT &
HUNGLER, 1995).
3.1.3 Delimitação temporal da pesquisa
As dez entrevistas foram realizadas no período de janeiro a julho de 2006.
3.1.4 Aspectos éticos
Por se tratar de uma pesquisa que envolve seres humanos, no que diz
respeito aos aspectos éticos, o projeto segue a Resolução 196/96 do Ministério da
Saúde, foi encaminhado ao Comitê de Ética do Setor de Ciências da Saúde da
Universidade Federal do Paraná para avaliação e parecer, e aprovado em 23 de
novembro de 2005 (ANEXO I).
Antes de dar início às entrevistas, elucidei a pesquisa, seu objetivo; li e
expliquei o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), o motivo da
gravação; solicitei que assinassem as duas vias do TCLE e entreguei-lhes uma. O
anonimato dos atores participantes foi garantido mediante a utilização das iniciais F
para indicar participante feminina e M para masculino seguido de algarismos
romanos de I a X para identificação dos discursos, sendo de I a IV para os
participantes do sexo feminino e V a X para os masculinos, seguindo a ordem
apresentada no item 3.1.2.
3.2 PROCESSO DE ANÁLISE DOS DISCURSOS
A análise dos discursos foi fundamentada na trajetória fenomenológica
proposta por Martins (1992) constituída por três momentos: descrição, redução e
compreensão.
A descrição, que assume a forma de texto na pesquisa fenomenológica “é
um procedimento para obter dados que deverão ser analisados e interpretados
35
A percepção da sexualidade do corpo idoso
fenomenologicamente, visando à busca da essência e de sua transcendência, posta
em termos contextuais” (BICUDO, 2000, p. 75). Ela é a investigação daquilo que se
mostra e que é possível ser descoberto, mas nem sempre é visto: dá-se mediante o
discurso ingênuo do sujeito, fornecendo a indicação de como o sujeito percebe
determinado fenômeno (LABRONICI, 2002). Os discursos se caracterizam como
forma de aproximação do fenômeno investigado (BICUDO,2000). Esse é o momento
de descrever a natureza da experiência tal como ela é vivida pelo corpo vivente
(MERLEAU-PONTY, 1999).
É importante lembrar que a descrição apresenta-se como ponto
fundamental do método fenomenológico, uma vez que é a forma de ir às coisas
mesmas (MARTINS, 1992). O autor fundamentado em Maurice Merleau-Ponty
afirma que ela possui três elementos:
“a percepção que assume uma primazia no processo reflexivo; a consciência
que se direciona para o mundo-vida, isto é, consciência do corps propre, ou seja,
do corpo vivido, consciência esta que é a descoberta da subjetividade e da
intersubjetividade; e o sujeito, pessoa ou indivíduo que se capaz de
experienciar o corpo vivido por meio da consciência que é a conexão entre o
indivíduo, os outros e o mundo” (MARTINS, 1992, p. 59).
A descrição, como primeiro momento da trajetória fenomenológica é
caracterizada pela epoché, que significa pôr em suspensão ou entre parênteses
(MARTINS, 1992). O fenômeno, que é aquilo que se mostra, ou que se manifesta, é
descrito como se o pesquisador não soubesse absolutamente nada a seu respeito.
Esse abandona a memória, o desejo, a imaginação e valores sugeridos pelo objeto
em descrição. É como descrever um cenário, em uma carta, com a maior exatidão
possível sem se concentrar na preferência. Ela deve ser fiel o suficiente para que o
leitor sinta-se à vontade e em condições de realizar o seu próprio julgamento.
“A tarefa de descrever desvenda progressivamente a postura de um sujeito
em relação ao mundo em que vive, revelando um modo de existir. O resultado é a
definição de um sentido, de uma perspectiva, enfim, de uma intencionalidade”
(GOMES, 1997, p. 314-15). Isto significa que a descrição constitui um passo
importante no desenvolvimento da pesquisa fenomenológica, uma vez que permite
ao pesquisador o acesso à vivência original do fenômeno estudado, bem como o
acesso à intencionalidade do entrevistado (GONÇALVES, 2005). Ela relata e aponta
para o percebido na percepção, no fundo onde esta se e se expõe por meio da
linguagem (BICUDO, 2002).
36
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A linguagem assumida pela atitude fenomenológica solicita sempre uma
interpretação hermenêutica, pois presentifica uma síntese unificadora, embora
provisória, da coisa percebida/percepção/explicitação do percebido, trazendo em
si, o mistério e a complexidade da relação signo/significado/significante/contexto
cultural (BICUDO, 2002, p.79).
O momento seguinte é o da redução fenomenológica, “que se constitui da
relação de um objeto com a consciência que sentido à existência do mesmo”.
Para tanto, o fenômeno é reduzido a tal relação para melhor compreender sua
essência, com isso é permitido que a experiência do corpo vivente seja dada ao que
é “autenticamente manifesto”. A redução ainda pode ser entendida como um
procedimento que visa a encontrar um núcleo essencial presente na experiência
vivenciada (HANDEM et al., 2004, p. 30-31).
A redução eidética proposta por MERLEAU-PONTY (1999, p. 13) “é a
resolução de fazer o mundo aparecer tal como ele é, antes de qualquer retorno
sobre nós mesmos, é a ambição de igualar a reflexão à vida irrefletida da
consciência”. A redução passa pelo ato de refletir sobre as partes da experiência
que parecem possuir significados ao pesquisador (MARTINS, 1992). Essa reflexão
“se manifesta como uma verdadeira criação, como uma mudança de estrutura da
consciência, e cabe-lhe reconhecer, para aquém de suas próprias operações, o
mundo que é dado ao sujeito, porque o sujeito é dado a si mesmo”, e a cada
momento, meu campo perceptivo é preenchido de reflexos” (MERLEAU-PONTY,
1999, p. 5).
No contexto fenomenológico, reduzir significa determinar e selecionar quais
partes da descrição são consideradas essenciais, e o seu objetivo é isolar o objeto
da consciência que constitui a experiência (MARTINS, 1992).
O último momento da análise é a compreensão fenomenológica que para
Merleau-Ponty (1999) significa reapoderar-se da intenção total, não apenas aquilo
que é para representar as propriedades percebidas, mas a maneira única de existir
que se exprime nas propriedades dos fenômenos. É o momento no qual o
pesquisador destaca da descrição e da redução, as unidades de significado, que são
unidades da descrição que fazem sentido para o pesquisador, a partir de uma
interrogação formulada (BICUDO, 2000; LABRONICI, 2002).
Para chegar à compreensão fenomenológica é necessário assumir o
resultado da redução como um conjunto de asserções significativas para o
37
A percepção da sexualidade do corpo idoso
pesquisador, mas que apontam para a experiência do corpo vivido. Esse conjunto de
asserções é o que Martins (1992) denomina de unidades de significado. A princípio,
essas unidades devem ser tomadas exatamente como são propostas pelo corpo
vivido que descreve o fenômeno. Em seguida, transforma-se a expressão do corpo
vivido em expressão própria ao pesquisador, que sustente o seu trabalho. E,
finalmente, o pesquisador desenvolve uma síntese das unidades de significados, a
qual é resultante das análises das expressões do corpo vivido. O critério observado
serão as convergências, divergências e idiossincrasias
9
.
Para iniciar a análise dos discursos ou descrições, fiz uma leitura minuciosa
e atentiva com o intuito de me familiarizar com o conteúdo. Em seguida, dei início à
redução, lendo e relendo várias vezes cada uma delas para identificar as
convergências e divergências e assim, chegar às unidades de significados, contidas
na linguagem ingênua do entrevistado, que depois de serem agrupadas, foram
transcritas na linguagem do pesquisador, dando origem às seguintes unidades
temáticas:
O outro como fonte de desejo, prazer e sentimentos;
Faces ocultas e o emergir da sexualidade;
O reconhecimento da modificação da expressão da sexualidade na
terceira idade.
O processo de análise que deu origem ao primeiro tema está elucidado a
seguir:
9
Disposição do temperamento do indivíduo, que faz com que ele sinta de um modo peculiar a
influência de diversos agentes; maneira de ver, sentir e reagir própria de cada pessoas (EGERIA,
1979, p. 330).
38
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Processo de Alise
Unidades de
significado na
linguagem do
idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
pesquisador
Síntese de
significados (FI,
FIII, FIV, MV, MVI,
MVII, MX)
Tema
emergente.
... Porque não é só
sexo em si, né.
Você tem que ter
carinho, tem que
ter beijos [...] Eu
tenho um par de
dança. Eu não
danço com todos
[...] O beijo é
importante, o toque
de pele é
importante. ( FI )
A sexualidade não
se resume a
relação sexual e se
manifesta pelo
toque do outro,
pela carícia.
Hoje o que me
deixa feliz é que
ele tá em casa. Ele
me trata bem, me
dá carinho. Ele
quando a gente
tem relação, ele é
uma pessoa que
ele fala: “Você tá
cada vez ficando
melhor, você era
boa, mas tá
ficando melhor
com essa idade”.
[...]Toda vida nós
saímos, nós
saímos de mão
pegada, se ele saí
com a mão no
bolso, eu me
engancho nele.
Quando a gente
vai sair junto, ele
sempre me
esperou, nunca ele
foi na frente e eu
atrás, nunca. Toda
vida fomos um
casal” (F III).
A sexualidade é o
convívio que
propicia afeto,
carinho e
satisfação.
Situações de
encontro
oportunizando o
emergir da
sexualidade.
A)
O outro como
fonte de desejo,
prazer e
sentimentos.
39
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
pesquisador
Síntese de
significados (FI,
FIII, FIV, MV, MVI,
MVII, MX)
Tema
emergente.
pegada, se ele saí
com a mão no
bolso, eu me
engancho nele.
Quando a gente
vai sair junto, ele
sempre me
esperou, nunca ele
foi na frente e eu
atrás, nunca. Toda
vida fomos um
casal. [...] Quando
é três horas, eu
venho aqui, faço o
chimarrão que ele
gosta, vou lá e
tomamos, ficamos
nós dois juntos, par
mim não tem coisa
melhor do mundo,
é ta junto com ele.
(FIII)
Sexualidade... é a
carícia e o desejo,
né, principalmente
a carícia, é coisa
que atrai o homem
e atrai a mulher. É
através da carícia
e do conviver que
você tá com a
pessoa, que se
torna um
relacionamento
melhor, porque
onde entra amor e
confiança na
pessoa, que torna
o sexo mais
gostoso, e é um
prazer da pessoa.
(MVII)
A sexualidade é a
carícia e o desejo
expressos no
convívio.
40
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
pesquisador
Síntese de
significados (FI,
FIII, FIV, MV, MVI,
MVII, MX)
Tema
emergente.
Um ser humano é
gerado através da
sexualidade, [...] O
jeito da natureza
normal é a
sexualidade. Eu
acho que é normal.
É o que dá prazer
pro homem, pra
mulher, é através
do amor que
acontece [...]
Sexualidade...é o
prazer de fazer o
sexo..., pelo amor,
pela vida, por
gostar um do outro,
né, ter prazer né,
que aí que ele
passa a ser uma
coisa normal. (MVI)
A sexualidade é o
ato sexual, o
prazer e o amor.
Sexualidade eu
acho que é um
complemento entre
o casal que é
casado, né. Um
complemento de
carinho e amor
(FIV)
Sexualidade... é o
relacionamento
entre dois seres de
sexo opostos, com
amor, carinho,
ternura,
sinceridade,
lealdade e
fidelidade. (MX)
A sexualidade é
um relacionamento
com amor, carinho,
ternura,
sinceridade,
lealdade e
fidelidade.
41
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
idoso
Unidades de
significado na
linguagem do
pesquisador
Síntese de
significados (FI,
FIII, FIV, MV, MVI,
MVII, MX)
Tema
emergente.
Eu acho o
seguinte, que nós
os seres humanos,
a não ser que
tenha um grande
distúrbio mental.
Nós precisamos de
contato, contato,
Freud já vai dizer
que isso é sexo.
Você abraçar uma
pessoa – ah isso aí
já é malicioso, mas
não é. É que nós
precisamos de
contato. Não há
uma pessoa
normal que não
goste de contato,
uma batida no
ombro [...] O gosto
que dá, que existe
em haver um
contato de ser
humano a ser
humano, seja de
homem com
homem, assim
quando um amigo
gosta de dar um
abraço no amigo...
uma festa de
aniversário, que
todo mundo se
abraça, isso é
bom, é gostoso. O
homem, o ser
humano necessita
disso. (MV)
A sexualidade é
contato com o
outro.
42
A percepção da sexualidade do corpo idoso
4. COMPREENSÃO DO FENÔMENO
43
A percepção da sexualidade do corpo idoso
4.1 O OUTRO COMO FONTE DE DESEJO, PRAZER E SENTIMENTOS
O ser humano tem necessidade de compartilhar e viver com seus
semelhantes, porque é um ser gregário por natureza e por condicionamento cultural
(FERRIGNO, 1998). Esse fato apresenta-se tão intenso e ligado à vida, que sua
ausência pode acarretar danos físicos e mentais, e até mesmo a morte (SCHUTZ,
1989). Dessa forma, pode ser criada uma relação de dependência, ou seja, de
necessidade de estar com o outro no processo de coexistência.
A necessidade de estar com o outro pode levar ao encontro, ao
relacionamento interpessoal, ao contato físico, e até a uma atração, uma vez que
necessitamos nutrir e sermos nutridos, tocar e sermos tocados, ver e sermos vistos,
perceber e sermos percebidos, sentir e sermos sentidos, porque somos objeto
sensível (MERLEAU-PONTY, 1999). Isso se do nascimento até a morte, e
possibilita a manifestação da sexualidade na corporeidade Assim, a sexualidade se
manifesta nas diversas formas de relações, fazendo com que a presença do outro se
torne algo, ao mesmo tempo, agradável e difícil de ser dispensado (CAPODIECI,
2000; MOSER, 2001).
É interessante lembrar que BUBER (2001) compreende a vida atual como
encontro, e, nesse sentido, não se refere ao tempo cronológico, mas ao instante
presente da relação, que se somente quando existe a presença do outro. Por
isso, não se trata de um encontro agendado, pois é fato peculiar no aqui e agora que
implica sensibilidade e espontaneidade.
Compreendo o encontro como necessário para continuidade e manutenção
da vida e que é uma necessidade dos seres vivos, muito embora o grau de
necessidade do ser humano seja mais complexo que para os outros seres. Assim, o
encontro foge da concepção cartesiana de tempo, ele é a temporalidade do aqui e
agora, ou seja, do presenteísmo.
O encontro significa estar junto, unir-se; o contato entre corpos, ver,
observar, tocar, sentir, participar, amar, compreender; conhecer intuitivamente
mediante o silêncio ou ao movimento, ao beijo ou ao abraço, a palavra ou ao gesto,
não é apenas uma reunião, é vivência, momento de experiência humana (MORENO
apud ALMEIDA, 1988). É preciso que exista uma intencionalidade, a qual leva os
corpos viventes a moverem-se em direção ao outro, de forma que, no momento de
sua concretização haja uma realização. Assim, ele propicia o relacionamento
44
A percepção da sexualidade do corpo idoso
interpessoal e manifesta, segundo Schutz (1989), necessidades compreendidas por
inclusão, controle e afeição.
A inclusão diz respeito a associações entre pessoas, aceitação e
companhia. Trata-se de um sentimento de pertença que nos leva a ser
completamente identificável, o que nos permite concluir que alguém está interessado
em nós e é capaz de nos perceber e descobrir nossas características singulares
armazenadas no corpo, na subjetividade. É a partir dessa descoberta que
possibilitamos a criação de vínculos, desde os primeiros anos de vida. A nossa
necessidade de ser e nos sentir incluso manifesta-se pelo desejo de receber
atenção e efetuar interações (SCHUTZ, 1989).
O comportamento do ser humano no processo de inclusão é determinado
pelo modo como se sente a respeito do que significa como existência, e esse
sentimento é denominado autoconceito. Desta forma, o “eu” deve se encontrar
primeiro significante para si mesmo, e, conseqüentemente se encontrará significante
para outras pessoas. Isto significa que, a necessidade de inclusão envolverá o
processo de formação de grupo, ou seja, de pertencer a um grupo, no qual
procuramos identificação. Quando ela se apresenta resolvida, poderemos desfrutar
de momentos prazerosos convivendo com várias pessoas, sem que isso nos traga
ansiedade nem dependência, e assim, seremos capazes de compreender o nosso
valor e a importância própria de ser humano (SCHUTZ, 1989).
Uma outra necessidade para a construção do encontro apresentada por
Schutz (1989) é a afeição ou afeto, que se refere às emoções íntimas e de contato
estreitos entre duas pessoas. Ela envolve vínculo, portanto, demonstra-se mais
profunda e sensível que a inclusão. Essa necessidade, de um modo geral, será a
última fase que pode emergir no desenvolvimento das relações humanas.
A construção de vínculos pode ser representada no sentido literal ou
figurativo, pelo abraço entre as pessoas envolvidas, o que significa a interação
afetiva existente. Esta situação ocorrerá de forma adequada, quando as interações
emocionais com outras pessoas não constituem problemas, ou seja, quando não se
tem medo de dar ou receber afeto.
É interessante destacar que o vínculo será formado a partir da elaboração
de afeto próprio, ou amor por si mesmo, quando o ser humano descobre que é
amado e capaz de amar. A partir dessa descoberta, ele abre-se para o
desenvolvimento afetivo com outras pessoas. É importante para ele sentir-se
45
A percepção da sexualidade do corpo idoso
querido, desejado, amado. Contudo, se isto não for possível mediante um
relacionamento, não significa que ele seja desprovido de afeto, e sim que, a
necessidade de afeto é bem ajustada, será possível vivenciar relações de
proximidade e de distanciamento sem que elas abalem a capacidade de se sentir
amado (SCHUTZ, 1989). Esta espacialidade que propicia o ir e vir durante o
processo de coexistência, possibilita vivenciar a relação “eu-tu”, e a manifestação da
corporeidade entre corpos viventes.
O corpo é o primeiro e único lugar da experiência humana. Essa
possibilidade concreta de existência faz com que ele seja o veículo do ser no
mundo; pois, coloca-nos em movimento, em contato com o outro e com o mundo
(MERLEAU-PONTY, 1999). Dele fluem nossas ações e reações, nossos desejos e
prazeres, emerge uma multiplicidade de sentimentos vivenciados mediante o
encontro. Desse modo, ele deixa de ser apenas um objeto de estudo da biologia e
passa a ser compreendido como lugar de relações interpessoais, espaço onde
ocorre a experiência humana (LABRONICI, 2002), visto que é gerador e receptor de
sentimentos dinamicamente contraditórios, no qual constantemente, revela e
esconde, e recebe, toca e é tocado, sente e é sentido, porque é objeto sensível,
ele é linguagem, é fala, é expressão (MERLEAU-PONTY, 1999).
Destarte, o corpo nos permitirá não apenas a relação com o outro e com o
mundo, como o conhecimento ou o saber. O modo de acesso ao saber ou ao
conhecimento se por meio da percepção, que se faz no mundo e não na
consciência, uma vez que se põe diante do meu corpo (MERLEAU-PONTY, 1999).
É importante destacar que mediante o toque, o corpo percebe e é percebido
pelo outro, e isso é possível porque ele é campo perceptivo e prático, e, desse
modo, a minha experiência liga-se à experiência do outro. Assim, é necessário “que
pela percepção do outro eu me ache colocado em relação com um outro eu que
esteja em princípio aberto às mesmas verdades que eu, em relação com o mesmo
ser que eu”. E essa percepção se realiza quando, “do fundo de minha subjetividade,
vejo aparecer uma outra subjetividade investida de direitos iguais, porque no meu
campo perceptivo se esboça a conduta do outro, um comportamento que eu
entendo, a palavra do outro, um pensamento que eu abraço” (MERLEAU-PONTY,
1990, p. 50-51). Nesse contexto, a consciência do corpo que percebe e é percebido
está carregado de intencionalidade, e é a percepção que irá captar a subjetividade
do outro. O outro se apresenta como vida aberta, da mesma forma que a minha, e
46
A percepção da sexualidade do corpo idoso
deste modo, se comunicam. Assim, o corpo vivente pode se colocar em uma postura
de abertura deixando-se penetrar na existência do outro por meio do encontro
(VIDAL, 2002).
A percepção que visa ao outro é para MERLEAU-PONTY (1999) uma
percepção sexual. Todavia, a compreensão a respeito da sexualidade não se
apresenta relacionada aos órgãos sexuais, mas sim ao corpo, porque algo é sexual,
quando é percebido pelo corpo - consciência encarnada - quando passa a existir
para a pessoa enquanto corpo vivente. Quando manifestamos a sexualidade é o
corpo que se encontra envolvido em uma complexa teia de relações, e é ele como
um todo que vai ao encontro, e não a parte (MOSER, 2001).
A sexualidade é a força que nos impele a abrir-nos, a sair de nós mesmos e
ir ao encontro do outro e sempre será estruturada no corpo. Ao nos predispormos a
esse processo, encontramos o outro, o “tu”, ao mesmo tempo em que nos
descobrimos como “eu”. Essa relação “eu-tu” realiza-se pela união de dois corpos
mediados por diversos sentimentos e desejos. Esses sentimentos permanecem
entre eles unindo-os, e, desta maneira, permitindo um relacionamento que envolva
afetividade (VIDAL, 2002). Assim, afetividade e sexualidade se articulam aos
conceitos de relação e troca, tornando o ser humano um ser desejante, possuidor
infinito de desejo (MONTEIRO, 2004; LABRONICI, 2002).
A afetividade para Moser (2001, p. 55) é um “conjunto de fenômenos
psíquicos que se manifestam sob a forma de emoções, sentimentos e paixões,
acompanhados sempre da impressão de dor ou prazer, de satisfação ou
insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou de tristeza” (MOSER, 2001, p.
55).
Nas entrevistas realizadas, a percepção de sexualidade emergiu a partir da
relação com o outro, que por sua vez, apresentou-se carregada de afetividade e
como fonte de prazer. Assim, podemos compreender que para os participantes
desta pesquisa a manifestação da sexualidade inclui afeto, sentimentos e
relacionamentos experienciados durante toda a trajetória existencial. Isso pode ser
elucidado nas falas a seguir:
Sexualidade eu acho que é um complemento entre o casal que é casado,
né. Um complemento de carinho e amor”. (F IV)
47
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Hoje o que me deixa feliz é que ele em casa. Ele me trata bem, me
carinho. Ele quando a gente tem relação, ele é uma pessoa que ele fala:
“Você ta cada vez ficando melhor, se era boa, mas ta ficando melhor que
essa idade.”[...] Quando é três horas, eu venho aqui, faço o chimarrão que
ele gosta, vou e tomamos, ficamos nós dois juntos, par mim não tem
coisa melhor do mundo, é ta junto com ele”. (F III)
A sexualidade para Capodieci (2000) constitui uma dimensão afetiva,
sentimental e relacional, que ocorre durante toda a existência humana. Assim,
respeita-se o corpo e suas peculiaridades desenhadas a cada fase vivida. Dessa
forma, a capacidade de amar, desejar e desfrutar de afetividade não está
relacionada a um único período vivido, mas apresenta-se coexistente com a vida.
Isto significa que não pode ser pensada e relacionada exclusivamente à genitália,
mas como algo que pertence à totalidade humana, não como objeto possuído, mas
como existência, porquanto somos corpos sexuados. Ela apresenta-se como
linguagem que permite a comunicação entre os outros corpos assumindo uma
dimensão subjetiva (VIDAL, 2002). Assim, se expressa através do corpo social
(MOSER, 2001).
As entrevistas desvelaram que a sexualidade manifesta-se por meio do
corpo e apresenta-se carregada de sentimentos diversos expressos pelos idosos,
conforme podemos constatar nos discursos a seguir:
Sexualidade... é o relacionamento entre dois seres de sexo oposto, com
amor, carinho, ternura, sinceridade, lealdade e fidelidade”. (M X)
“...É o prazer de fazer o sexo..., pelo amor, pela vida, por gostar um do
outro, né, ter prazer né, que que ele passa a ser uma coisa normal”.
(IV)
Nessas falas, os entrevistados deixam transparecer que a sexualidade
manifesta-se a partir do encontro entre dois corpos viventes que se atraem para
vivenciarem diversos sentimentos. Essa relação não é construída por seres
humanos que apenas caminham juntos, mas por corpos que se percebem, se
sentem e se deixam sentir, amam e se deixam amar. Compreendo que nesses
48
A percepção da sexualidade do corpo idoso
fragmentos do discurso existe além da afetividade, a necessidade de estar com o
outro. Assim, o relacionamento entre eles, é uma forma singular de encontro que
possibilita prazer e manifestação da sexualidade (VIDAL, 2002).
O encontro apresenta algumas características tais como: a atenção detida,
ou seja, aquela é dada ao outro, e permite que as demais coisas tenham menos
importância; a necessidade de comunhão, que possibilita o “estar-com”, deixando
florescer o desejo de presença mútua e a idealização da pessoa amada, que
propicia a descoberta e a potencialização de valores, antes ocultos, ou
imperceptíveis dos membros da relação (VIDAL, 2002).
Nesse contexto, podemos dizer que é o corpo que possibilita o encontro
como momento de coexistência mediada pela sexualidade (MERLEAU-PONTY,
1999), na qual homens e mulheres são atraídos para a consolidação desse
relacionamento. Essa relação é recíproca e permite a descoberta e construção de si
e do outro, visto que, a mulher se torna mulher sob o olhar de um homem, da
mesma forma que o homem, só se torna homem sob o olhar da mulher (BEAUVOIR,
2001).
Ressalto que o relacionamento estabelecido entre os corpos viventes
permite a multiplicidade de manifestação da sexualidade, e essas experiências
dependem da capacidade de reconhecer e compartilhar os próprios sentimentos,
atingindo a ternura e atenção mútua com o outro. Dessa maneira, sexualidade
apresenta-se de forma altamente emotiva, possibilitando o descobrimento de novas
experiências afetivas (CAPODIECI, 2000). Para o autor, essa “capacidade” é uma
arte desenvolvida pelo tempo e adquirida ao longo dos anos de experiência em
saber dar e receber afeto, o que exige conhecimento estético, sensibilidade.
A sensibilidade na terceira idade pode apresentar-se aguçada em relação às
situações cotidianas devido ao acúmulo de experiências vividas, visto que a
capacidade de aprender com elas não se perde, e, desse modo, é possível que
justamente nesse período da vida possa se atingir uma sexualidade mais madura
que transcende a genitália. Segundo CAPODIECI (2000), é possível que o idoso
atinja um nível de crescimento jamais alcançado antes, dando lugar aos sentimentos
e afetos, e, assim, fazer frutificar as experiências amadurecidas no percurso da vida
pelo fato de amar.
Ao prosseguirmos a análise e interpretação das entrevistas, percebemos em
outras falas que a sexualidade surge compreendida como prazer e sentimentos:
49
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Um ser humano é gerado através da sexualidade, [...] O jeito da natureza
normal é a sexualidade. Eu acho que é normal. É o que prazer pro
homem, pra mulher, é através do amor que acontece”. (M VI)
Sexualidade eu acho que é um complemento entre o casal que é casado,
né. Um complemento de carinho e amor”. (F IV)
Nessas falas emergem novamente a questão da afetividade relacionada ao
amor e ao prazer. O amor aqui pode ser compreendido como o sentimento que
sentido à sexualidade que busca a união íntima e a comunhão recíproca, vivenciada
em um intercâmbio pessoal de doação e aceitação. Em uma relação estável, ele
apresenta-se livre, porquanto é nascido do encontro voluntário e gratuito entre duas
pessoas. É um sentimento presente no encontro (VIDAL, 2002), que se apresenta
como forma de responsabilidade do “Eu” para com o “Tu” permitindo a cumplicidade
entre os corpos que se amam (BUBER, 2001).
A sexualidade, como dimensão ontológica do ser humano, manifesta-se
mediante os corpos que se vêem, se tocam, se percebem (LABRONICI, 2001),
possibilita, segundo JOHNSON (1996), a expressão de sentimentos como fidelidade,
paixão, afeição, estima, consideração e afirmação.
Na terceira idade, a manifestação da sexualidade pode se apresentar de
forma diferente, o que justifica sentir prazer mediante um olhar, uma carícia ou um
afago (CAPODIECI, 2000). Nessa perspectiva, encontramos as seguintes falas que
podem elucidar essa percepção:
“Sexualidade é a carícia e o desejo, né, principalmente a carícia, é coisa
que atrai o homem e atrai a mulher. É através da carícia e do conviver
que você com a pessoa, que se torna um relacionamento melhor,
porque onde entra amor e confiança na pessoa, que torna o sexo mais
gostoso, e é um prazer da pessoa”. (M VII)
“O beijo é muito importante, o toque de pele é muito importante...”. (F I)
50
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Constatamos, nos fragmentos dos discursos, a importância dada ao carinho,
ao afeto e ao amor. Apesar de tais sentimentos serem necessários, tanto para
casais jovens como para idosos, eles são desenvolvidos na temporalidade
vivenciada a partir do encontro “eu-tu” que se constitui um nós; propicia a troca e o
amadurecimento afetivo para ambos. Aqui o tempo mostra-se como aprimorador do
relacionamento. Dessa forma, esses sentimentos, afetos e carinho são
manifestações da sexualidade (CAPODIECI, 2000).
Outra forma encontrada de manifestação da sexualidade, expressa pelos
idosos participantes desta pesquisa, foi o contato físico. Este pressupõe
primeiramente o encontro, o estabelecimento de uma relação, e apresenta-se
bastante expressivo no discurso a seguir:
Eu acho o seguinte, que nós os seres humanos, a não ser que tenha um
grande distúrbio mental. Nós precisamos de contato, contato, Freud vai
dizer que isso é sexo. Você abraçar uma pessoa “Ah isso é
malicioso”, mas não é. É que nós precisamos de contato. Não uma
pessoa normal que não goste de contato, uma batida no ombro [...] O
gosto que dá, que existe em haver um contato de ser humano a ser
humano, seja de homem com homem, assim quando um amigo gosta de
dar um abraço no amigo... uma festa de aniversário, que todo mundo se
abraça, isso é bom, é gostoso. O homem, o ser humano necessita disso”.
(M V)
A função do tato é uma forma rudimentar e simples do encontro
interpessoal, que confere uma profunda experiência de companhia, de presença do
outro. Conforme Vidal (2002), esse contato pode ser denominado como carícia
hedonista ou benéfica. A carícia hedônica procura o próprio prazer de quem a
executa, enquanto que a benéfica proporciona alívio e prazer à pessoa acariciada.
Nesse sentido, o beijo e o abraço são vistos por esse autor como formas de carícia.
Para Schutz (1989), o abraço é concebido como uma representação da nossa
necessidade afetiva, e pode ser constatado na fala anterior, em que o entrevistado
atribuiu como um gesto prazeroso, e, assim, como forma de manifestação da
sexualidade.
51
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Atitudes como o abraço, o beijo, conversas amorosas, arrumar-se de forma
a sentir-se atraente e acariciar o corpo são formas de manifestação da sexualidade
para o idoso, conforme apresenta Johnson (1996), em um estudo realizado no qual
demonstrou a multidimensionalidade do comportamento sexual da pessoa idosa, em
que várias atividades foram tidas como prazerosas, e não prioritariamente a relação
sexual. Esse dado reforça que, para o idoso, as expressões de afeto representam
manifestações significativas da sexualidade. Mesmo o fato de trocar abraços entre
amigos, filhos e netos possibilitam essa realidade (CAPODIECI, 2000).
Sexualidade e afetividade articulam-se com o Eros, ou seja, com o desejo
humano que para Monteiro (2004), manifesta-se como encontro e desejo de união,
de fusão, de estar junto. Essa forma de manifestação é expressa por vários
participantes do estudo e demonstrada nos trechos dos discursos a seguir:
Porque não é sexo em si, né. Você tem que ter carinho, tem que ter
beijos [...] Eu tenho um par de dança. Eu não danço com todos” (F I).
Hoje o que me deixa feliz é que ele em casa. Ele me trata bem, me
carinho. Ele quando a gente tem relação, ele é uma pessoa que ele fala:
“Você ta cada vez ficando melhor, se era boa, mas ta ficando melhor com
essa idade”. [...] Toda vida nós saímos, nós saímos de mão pegada, se
ele saí com a mão no bolso, eu me engancho nele. Quando a gente vai
sair junto, ele sempre me esperou, nunca ele foi na frente e eu atrás,
nunca. Toda vida fomos um casal” (F III).
Encontramos nessas falas necessidades afetivas e inclusivas como suporte
da relação humana. Independente do estado civil ou idade, temos essas
necessidades e podemos supri-las mediante a manifestação da sexualidade que
ocorre de diversas maneiras no nosso cotidiano, seja a partir de gestos simples, de
atitudes que aproximam, e ajudam a solidificar o relacionamento, pois vão além da
aparência, da superficialidade. Nesse contexto, Capodieci (2002) afirma que uma
relação duradoura não será baseada apenas na atração física, mas nas atenções
cuidadosas de um parceiro para com outro. Assim, a sexualidade não se apresenta
mais focada no ato sexual ou na procriação, mas passa a ser vivenciada como
possibilidade de prazer que alimenta a vida amorosa e afetiva do ser humano. Neste
52
A percepção da sexualidade do corpo idoso
sentido, a relação se estabelece com carinho e companheirismo que podem se
intensificar com o tempo, em função do convívio e da troca que a permeia
(SANTOS, 2003). Tudo isso é possível de ser pensado e realizado porque somos
corpo consciência encarnada, e como tal, carregamos o mistério da reciprocidade
(MERLEAU-PONTY, 1999). Esta pode ser vivenciada durante toda a trajetória
existencial a partir do encontro e da manifestação da corporeidade e possibilita
penetrar na subjetividade do outro que transcende sua superficialidade (LABRONICI,
2002), ou seja, penetrar na existência do outro por meio da percepção, do contato,
manifestando assim sua sexualidade (VIDAL, 2000).
53
A percepção da sexualidade do corpo idoso
4.2 FACES OCULTAS E O EMERGIR DA SEXUALIDADE
A sexualidade se manifesta na corporeidade, não se restringe apenas à
relação sexual, ou seja, à visão biológica reprodutiva - envolve todos os sentidos -
e, portanto, abrange um conjunto de experiências, emoções e sentimentos que
emergem do corpo vivente em toda a sua trajetória existencial. Desse modo,
podemos compreendê-la de forma afetiva, sentimental e relacional respeitando o
corpo e as peculiaridades de cada fase vivida (CAPODIECI, 2000); ela é o poder
geral que a pessoa tem de “aderir a diferentes ambientes, de fixar-se por diferentes
experiências” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 219). Por manifestar-se mediante as
expressões do corpo, a sexualidade emerge de atividades humanas, e nesta
pesquisa, foi possível identificá-la em atividades destinadas ao lazer nas falas a
seguir que evidenciam essa compreensão:
“Adoro sair, adoro dançar, adoro música. Não é porque você envelheceu
que você esqueceu da tua mocidade, do contrário, a juventude fica na
lembrança”. (F I)
“Dançar é um troço que me realiza bastante, sabe!”. (M VII)
O lazer apresenta-se como fazer humano e constitui uma atividade de
exploração, fantasia, imaginação, esportes e criatividade, além do que permite a
participação social e a prática de uma cultura (FERRARI, 1996). O autor salienta que
o “fazer” é uma necessidade humana básica, mediante a qual exploramos e
dominamos a nós mesmos e o mundo que nos cerca.
É importante destacar que durante o processo de envelhecimento uma
diminuição das atividades, sobretudo aquelas relacionadas à profissão, motivo pelo
qual devemos como profissionais da área de saúde, ampliar a possibilidade de
realização de atividades lúdicas, de lazer, que contribuam com os idosos na
manutenção da saúde, e, conseqüentemente, na melhora da qualidade de vida.
A ampliação das atividades de lazer cria a possibilidade para que o idoso
faça escolhas prazerosas que propiciem a manifestação da sexualidade, e ocupe
seu tempo de maneira criativa, de forma a mantê-lo ativo. Esta situação de mudança
de rotina e ocupação do tempo parece ser um grande desafio para muitos idosos
54
A percepção da sexualidade do corpo idoso
que iniciam essa fase (VIEIRA, 2004). Isto mostra a necessidade de enriquecermos
nossas vivências ao longo da trajetória existencial, mediante a busca de soluções
para os problemas cotidianos (GEIS, 2003). Assim, é preciso criar sempre novas
experiências que determinem nosso lugar no mundo (FERREIRA, 1996), e que nos
mantenham vinculados à sociedade porque necessitamos dessa ligação (GEIS,
2003).
O conceito de lazer surge na história da humanidade associado ao trabalho,
e ao longo dos séculos ambos os conceitos vão constituindo ora relação de
proximidade, ora de afastamento entre si. Em civilizações primitivas, o trabalho
representava punição ou dor e era desprezado pelas elites. Na Idade Média ele
ganha dignidade e o lazer encontra lugar social nos dias festivos. Do século XVI ao
início do século XX, o trabalho é supervalorizado, enquanto que o lazer passa a ser
condenado e impróprio. Nesse século, com o melhoramento tecnológico da
civilização industrial, amplia-se a dimensão e importância do lazer recolocando-o na
sociedade (FERRARI, 1996), e, atualmente, pode ser compreendido como conjunto
de ocupações ou distrações às quais o indivíduo se entrega espontaneamente
durante o tempo que não é absorvido pelo trabalho” (GEIS, 2003, p. 33).
A importância dada ao lazer na atualidade nos permite atribuir-lhe um
dimensionamento que reside na possibilidade de suscitar atitudes durante a
utilização do tempo livre, como a participação consciente e voluntária na vida social,
que exige um processo de desenvolvimento de si que busca, na medida do possível,
um equilíbrio pessoal entre o repouso e a distração (FERRARI, 1996).
Cabe salientar que, grande parte destes idosos teve ao longo de sua
trajetória atividades voltadas ao trabalho, ou seja, eram corpos viventes produtivos,
com poucos momentos de ócio, de lazer. Essa característica muda nesta fase
existencial vivida, trazendo-lhes a possibilidade de enriquecer suas experiências em
busca de um desenvolvimento pessoal e momentos de prazer, diferentes do trabalho
(BALESTRA, 2002; BORINI, 2002).
Estudos realizados com idosos por Mendizábal & Carbonero (2004)
demonstram que um nível alto de atividades sociais tende a estimular a atividade
física e mental entre os idosos, favorecendo o desenvolvimento de uma boa saúde e
longevidade, o que passa a ser um motivo pelo qual é possível estimulá-los a
ampliar a participação em grupos de convivência e os laços afetivos. Portanto, é
importante que a sociedade desperte e possibilite cada vez mais aos idosos meios
55
A percepção da sexualidade do corpo idoso
para tornarem-se agentes e beneficiários de seu desenvolvimento, permitindo que
encontrem nas atividades por eles escolhidas motivos de satisfação.
É natural que os idosos procurem espaços favoráveis a sua satisfação,
encontrando em grupos sociais o local para estabelecerem suas relações, e também
a manifestação da sexualidade. Esses grupos quer sejam recreativos ou de
convivência -- são constituídos de pessoas que se reúnem periodicamente para
realizarem atividades nas quais o método fundamental é a interação que permite o
favorecimento das relações de amizade e auxiliam no desenvolvimento pessoal de
todos os participantes (MENDIZÁBAL & CARBONERO, 2004).
Para os idosos entrevistados, as atividades realizadas em grupo e que
possibilitam satisfação podem ser evidenciadas a seguir:
“Olha, eu vivo sozinho, né. E eu vou todo dia jogar tênis, e eu encontro
meu amigo lá, e conto uma piada. Eu tenho meus jantares fora, eu
tenho as minhas temporadas fora também, em hotel”. (M V)
“O prazer que eu sinto também é sair, dançar, divertir, trabalhar, assim na
chácara, no sítio, por exemplo. Eu gosto muito, é um prazer que eu
tenho”. (M VII)
“Eu adoro sair, adoro dançar, adoro música... Eu extravaso esta solidão
dançando, né. Eu tenho um par de dança. Um par só. Eu não danço com
todos, não me exponho a todos”. (F I)
Os grupos sociais, segundo Ferrari (1996), serão formados a partir de
diversas necessidades, contudo, têm como objetivo permitir que o idoso crie novos
valores, novas maneiras de pensar, de sentir e de agir, além de facilitar as
transformações das relações sociais que continuamente vão se enriquecendo.
Neles, os idosos conhecem outras pessoas, redescobrem-se, trocam, vivem,
sonham, propiciando assim, momentos agradáveis.
As atividades de lazer foram classificadas por Dumazedier (2001), de acordo
com a área de interesse em: manuais, intelectuais, associativas, ou seja, aquelas
que buscam o prazer pelo convívio social, artísticas e físicas. Elas envolvem uma
gama de possibilidades que têm como objetivo principal a socialização do idoso.
56
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Dessa maneira, ao unir o lúdico com o relacionamento interpessoal, possibilitam a
melhoria da qualidade de vida e a auto-estima, além do desenvolvimento do
pensamento crítico e da criatividade (GASPARI & SCHWARTZ, 2005).
As atividades mencionadas pelos idosos como manifestação de prazer, em
sua maioria, são realizadas em grupo, possibilitam a manifestação da corporeidade
e da sexualidade pelos corpos viventes que coexistem no mesmo espaço social, e
esta coexistência permite que cada um perceba e seja percebido, veja e seja visto,
toque e seja tocado, porque o corpo é veículo do ser no mundo (MERLEAU-PONTY,
1999) motivo pelo qual nos coloca em movimento. Este movimento pode nos levar
em direção ao outro para que o encontro se concretize, dando início a relação, e,
assim, a possibilidade da troca, porque existir é trocar (LABRONICI, 2002).
É a movimentação do corpo que nos mantém conectados com o outro e com
o mundo, motivo pelo qual é imprescindível que o corpo vivente em processo de
envelhecimento experiencie a descoberta de movimentos, pois quando os objetivos
da vida são mantidos e a motivação é preservada, os idosos não se fragilizam a
ponto de perder a direção de seus movimentos rumo a novas experiências
existenciais (BALESTRA, 2002).
Entre as atividades mencionadas pelos idosos participantes do estudo,
encontramos a dança, o jogo, o sair, ir ao teatro, participar de jantares e de viagens.
O sentido atribuído por eles para essas atividades assemelha-se com a recreação
que é compreendida como atividades realizadas com o intuito de sentir-se bem e de
se divertir. A sua finalidade é fundamentalmente lúdica, e buscam resultados
imediatos com a ocupação do tempo livre. Necessariamente ela não é uma atividade
periódica, ou com regras rígidas, uma vez que, o que procuram é apenas a sua
satisfação e realização (GEIS, 2003).
Os fragmentos dos discursos possibilitam compreender que essas atividades
proporcionam prazer e satisfação ao idoso, propiciam a sua socialização, visto que
permite a convivência em grupo, renova uma rede de afetos que se apresenta
entrelaçado ao fazer humano (BORINI, 2002) e a troca. Tal situação faz com que
permaneça ativo, e gere um sentimento de satisfação e orgulho por sentir-se
disposto, saudável e capaz de realizar tais atividades (SIMÕES, 1994), além do que,
a participação em diferentes vivências oportuniza ao idoso a possibilidade de dar
novos sentidos a sua existência (GASPARI & SCHWARTZ, 2005).
57
A percepção da sexualidade do corpo idoso
O fato de o idoso sentir-se bem e saudável passa a ser compreendido de
maneira subjetiva, e o seu comportamento deixa de ser determinado não apenas
pelas condições objetivas, mas pelas representações que a pessoa faz do seu
estado de saúde (DOLL, 1998). Dessa forma, mesmo em situações que apresentem
uma diminuição objetiva da qualidade de vida, é possível desfrutarem de satisfação
e sentimento de bem-estar, uma vez que dependem da reorganização da auto-
imagem, adequação dos objetivos e metas às condições reais e maior capacidade
de controlar as emoções (OKUN citado por DOLL, 1998).
Recentemente, em 2002, a Organização Mundial de Saúde estabeleceu o
conceito de envelhecimento ativo para designar o processo de envelhecer mantendo
a capacidade funcional e a autonomia, ampliando assim, o entendimento de saúde
para essa faixa etária (BRASIL, 2006).
Visto dessa forma, “a abordagem do envelhecimento ativo baseia-se no
reconhecimento dos direitos das pessoas idosas e nos princípios de independência,
participação, dignidade, assistência e auto-realização”, podendo ser compreendido a
partir de três componentes: a menor probabilidade de doença, alta capacidade
funcional, e engajamento social ativo com a vida, o que nos permite contemplar a
terceira idade não mais como declínio, e sim como possibilidade de um processo
saudável de vida. Ao partir de tais considerações, as propostas internacionais
sugerem que os órgãos governamentais e a sociedade civil sejam responsáveis pela
implantação de políticas e programas que melhorem e estimulem a saúde, a
participação e a segurança da pessoa idosa (BRASIL, 2006, p. 7).
Nesse contexto, as atividades físicas apresentam-se como uma forma de
promover saúde e bem-estar da população idosa, e podem ser compreendidas como
conjunto de movimentos corporais capazes de contribuir para a prevenção e
manutenção das capacidades do ser humano (VIEIRA, 2004).
Nas entrevistas realizadas, surge a descrição de tais atividades que
sugerem satisfação em executá-las.
“Tenho um namorado, mas é mais velho que eu, assim é uma companhia,
mas é uma coisa saudável, né! Jogo, saio, sabe! Vou a teatro, participo
de atividades”. (F II)
58
A percepção da sexualidade do corpo idoso
“Olha, eu vivo sozinho, né. E eu vou todo dia jogar tênis, e eu encontro
meu amigo lá, e conto uma piada. Eu tenho meus jantares fora, eu
tenho as minhas temporadas fora também, em hotel”. (M V)
A atividade física apresenta-se ligada ao bem-estar e pode ser
compreendida como um dos fatores determinantes para um estilo de vida saudável.
Atualmente, é maior o número de pessoas que atingem a terceira idade gozando de
saúde, o que permite e estimula ainda mais a execução desse tipo de atividade,
lembrando-nos que a velhice não precisa ser pensada como um período de declínio,
mas como possibilidade de renovação, mudanças e realizações. Além do mais,
alguns estudos revelam que a atividade física nesse período traz inúmeros
benefícios para o idoso (LEITE, 1996; GEIS, 2003) tais como: redução da pressão
arterial, melhora da eficiência do músculo cardíaco, aumento da vascularização do
miocárdio e da musculatura esquelética, do metabolismo, do HDL livre no sangue,
da força muscular e da produção de endorfinas e diminuição da morbi-mortalidade
em processos degenerativos (LEITE, 1996).
Cabe salientar que, as atividades físicas, além dos benefícios mencionados,
propiciam momentos de prazer, bem como a possibilidade de vivenciar experiências
criativas que colocam os idosos em contato com o próprio corpo (BALESTRA, 2002),
mantendo-os ativos e retardando algumas características do processo de
envelhecimento (SIMÕES, 1994). Isso não significa a busca da fonte da juventude,
pois perceberão os efeitos da idade cronológica, mas sim a possibilidade de realizar
as atividades com melhor disposição e desempenho em sua rotina diária, tornando-
os mais autônomos e possibilitando-lhes uma vida mais ativa. Com isso, sentem-se
capazes de tomar suas próprias decisões (BALESTRA, 2002) o que os auxilia a
perceber e vivenciar esse período como uma nova fase existencial.
É importante destacar que na terceira idade, as respostas às novas
situações cotidianas não serão resultados do ímpeto do vigor físico, mas do
aprimoramento trazido pela experiência do vivido. Assim, o envelhecimento não
carrega o sinônimo de decadência, mas de seqüência da vida (SIMÕES, 1994) que
exige adaptações diante das transformações ocorridas no corpo, e que é muito
importante desfrutar cada instante vivido, perceber o mundo e o outro, enfim, de
viver a vida em sua plenitude com tudo o que ela apresenta de possibilidades e de
fragilidades. Dessa forma, as atividades físicas deixam de cultuar o corpo belo e
59
A percepção da sexualidade do corpo idoso
reforçar padrões estéticos rigorosos, passam a representar uma forma de
relacionamento humano e de tomada de consciência do que o idoso é capaz
(BALESTRA, 2002). Isso permite reiterarmos que o possível deve ser mais
valorizado que o perfeito (SIMÕES, 1994), e contribuem para que se libertem de
preconceitos, diminuam complexos e redescubram a alegria e a espontaneidade ao
interagir socialmente, o que possibilita a percepção de si como corpo vivente, “que é
movimento em direção ao mundo, o mundo, ponto de apoio de meu corpo”
(MERLEAU-PONTY, 1999, p. 469).
Nesse contexto, o prazer pela atividade física manifesta-se na ação, e por
mais que exista um espírito competitivo, o que vale é a realização. Nessa fase da
vida, apesar de vivermos em um mundo que exige uma performance impecável que
nos transforma em competidores, não ganha o mais veloz, mas aqueles que
participam da atividade como uma experiência prazerosa que possibilita o contato
com o outro (SIMÕES, 1994). Assim sendo, percebo que existem nas atividades
físicas alguns elementos compensatórios para sua realização como a possibilidade
de encontro e de um convívio, de sociabilidade, ou seja, de ser e estar-com o outro
propiciando a construção de uma experiência rica em satisfação que pode ser
constatada na fala a seguir:
“O prazer que eu sinto também é sair, dançar, divertir, trabalhar, assim na
chácara, no sítio, por exemplo. Eu gosto muito, é um prazer que eu
tenho”. (M VII)
Os fragmentos dos discursos mostram a manifestação da sexualidade
mediante a corporeidade, porque os idosos encontram nas atividades físicas prazer
que lhes servem como estímulo para vida. Percebo também que contribuem para a
percepção do ser e estar no mundo, haja vista, que ele não se coloca como ser
passivo, mas ativo na medida em que é um corpo vivente em movimento.
Outra atividade mencionada nas entrevistas que possibilitam a manifestação
da sexualidade foi a dança compreendida como “uma forma complexa de encontro”
(VIDAL, 2002, p. 82), que envolve diversos sentidos como: tato, audição e visão.
A dança possibilita o respeito a si próprio e ao outro permitindo
transformação, reafirmação e construção significativa na busca de valores pessoais,
além de propiciar o refinamento do sentido cinestésico, ou seja, de movimentos, a
60
A percepção da sexualidade do corpo idoso
livre expressão corporal e a manifestação da sexualidade, possibilitando um
sentimento de prazer (ABRÃO & PEDRÃO, 2005).
É importante lembrar que na história da humanidade, a dança sempre
esteve ligada ao corpo, representava uma das mais antigas e elementares maneiras
de expressão do ser humano, estava relacionada à caça, à religião, à guerra, à
morte, à cura, à fertilidade, e não à arte (ALMEIDA, 2005). Nesse contexto,
podemos considerá-la como linguagem, como forma de manifestação da expressão
humana.
A dança é uma das formas de expressão do corpo, envolve um conjunto de
movimentos rítmicos, de gestualidades, de sensualidade e erotismo, “que traduzem
uma linguagem na qual todo o significado pertence ao corpo que dança solitário, ou
aos corpos que se entrelaçam” (LABRONICI, 2002, p. 75).
No discurso dos idosos entrevistados, a dança pode ser compreendida
também como um dos modos de manifestação da sexualidade, visto que possibilita
o prazer. Isso pode ser percebido a partir das seguintes falas:
“Adoro sair, adoro dançar, adoro música. Não é porque você envelheceu
que você esqueceu da tua mocidade, do contrário, a juventude fica na
lembrança [...] Quando você dança, você esquece de tudo. O contato do
homem com seu corpo faz com que você fique elétrica, que você dance
mais, se arrume mais”. (F I)
A dança nos possibilita expressar nossos sentimentos, emoções, tradições e
crenças, perceber o outro e o mundo que nos rodeia (ALMEIDA, 2005). Isso é
possível porque também é uma forma de expressão da nossa corporeidade, visto
que o corpo é autor e ao mesmo tempo espaço cênico dessa atividade (COSTA,
2004). Para a autora, a linguagem do corpo na dança exprime pensamentos
construídos por ele mesmo em seu mundo vivido, é ltipla, está aberta e
inacabada, e permite a expressão de diferentes compreensões de mundo, no qual o
corpo é o espaço que sustenta essa linguagem, pois a cada movimento ou gesto
realizado por meio da dança possibilita a inspiração de vários sentimentos. O corpo
apresenta-se como ponto de partida de existência da dança, que desvela inúmeros
horizontes para pensarmos e vivermos essa arte. Ele é ser sensível e pensante,
61
A percepção da sexualidade do corpo idoso
porque o pensamento é corporal, é vivido, é encarnado pelas experiências na dança
e na vida (COSTA, 2004).
Conforme MERLEAU-PONTY (1999), esse corpo é objeto sensível que toca
ao mesmo tempo que é tocado, percebe e é percebido, e é visto, sente e é
sentido. Essa dimensão sensível do corpo não se opõe à razão, mas coopera com
uma lógica existencial que une saberes, práticas, atitudes, valores, modo de ser e de
viver, admitindo as contradições e as incertezas humanas (NÔBREGA & TIBÚRCIO,
2004).
A dança possibilita o encontro de mundos vividos e pode revelar o desejo
pelo outro. Ela existe como atividade porque o corpo a torna possível, ao mesmo
tempo em que existe um outro corpo para dançar com ele, ou para simplesmente
apreciar o que dança. Dessa forma, ele pode ser compreendido como autor
dançante e estético que se dispõe a tornar-se espaço cênico para viver o
desconhecido, obter novos saberes, desdobrar novos códigos de movimento e criar
a linguagem que revela o corpo como ser vivente e a arte de dança (COSTA, 2004).
Ao concebermos o ato de dançar como possibilidade de manifestação da
sexualidade, corroboramos com a percepção de que essa não é apenas uma função
orgânica relacionada à procriação, e sim, uma intencionalidade que segue o
movimento geral da existência e coexiste com o corpo (MERLEAU-PONTY, 1999).
Por meio da dança os corpos se encontram, entrelaçam suas histórias e
experiências para tecer o momento vivido, cada um com sua percepção de mundo e
intencionalidade.
No encontro dos corpos dançantes, percebemos a possibilidade de
transformar o estar com o outro em uma relação imprevisível devido à
espontaneidade e improvisação dos passos na dança, ao mesmo tempo em que
existe o apoio em si e no outro para segui-los. Assim, faz-se necessário que exista
respeito pelo tempo e movimento do outro. A sensibilidade da dança surge pela
possibilidade de percepção de si e do outro, e assim podemos notar a diferença, a
peculiaridade dos corpos viventes.
Ao dançarmos podemos nos manter atentos ao corpo e aos nossos
sentimentos, perceber o outro e o mundo, bem como sentir as pulsações e
intencionalidades que existem em nós a cada movimento realizado Neste sentido, o
outro se faz necessário para a construção e apreciação da dança enquanto
manifestação da sexualidade.
62
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Destarte, a dança como possibilidade de prazer e encontro é uma das
múltiplas formas de expressão da corporeidade que manifestam a sexualidade.
Envolve vários sentidos de modo simultâneo e recíproco, uma vez que os corpos
dançantes vêem e deixam-se ver, tocam e deixam-se tocar. Eles desejam o
movimento e são capazes de sentirem-se satisfeitos por meio dos passos e gestos
possíveis. Esses corpos são arquivos vivos, os quais em si mesmo tatuam suas
histórias alicerçadas em sua sexualidade. Assim, jogar, ir ao teatro, dançar,
enquanto atividades realizadas pelos corpos idosos no cotidiano, são expressões da
corporeidade que manifestam a multiplicidade do desejo humano, a sexualidade, e
possibilitam um envelhecimento ativo e com qualidade de vida.
63
A percepção da sexualidade do corpo idoso
4.3 O RECONHECIMENTO DA MODIFICAÇÃO DA EXPRESSÃO DA
SEXUALIDADE NA TERCEIRA IDADE
Ao pensarmos no concreto da nossa existência, ou seja, no corpo
(MERLEAU-PONTY,1999), constatamos que do nascimento até a morte estamos
fisiologicamente vivenciando um processo de envelhecimento que reflete nas várias
etapas do desenvolvimento humano.
As modificações biológicas que ocorrem nesse processo afetam o nosso ser
e o estar no mundo, a nossa corporeidade, motivo pelo qual faz-se necessário
enfocá-las tanto no homem, como na mulher, para que possamos compreender a
necessidade de repensar a sexualidade na terceira idade. Esse repensar se deve ao
fato de que, se concebermos a sexualidade exclusivamente como ato sexual,
estaremos focados na visão reducionista, limitante e de perdas, e fortalecendo os
mitos e preconceitos que a permeiam durante o processo de envelhecimento.
O processo de envelhecimento tem uma importância particular para a
fisiologia da sexualidade e além de permitir novas experiências pessoais, influencia
também a vida sexual do parceiro. Entretanto, isso não impede os idosos de
desfrutarem de sua sexualidade (CAPODIECI, 2000).
No que se refere às alterações do corpo feminino, é interessante lembrar
que, embora o climatério e a menopausa não aconteçam aos sessenta anos, eles
interferem na manifestação da sexualidade da mulher idosa em função do declínio
hormonal.
O climatério é o período da vida situado entre os 35 e 65 anos, no qual
múltiplos fatores atuam simultaneamente modificando o corpo e a sexualidade
(PENTEADO et al. 2004; FAVARATO & ALDRIGHI, 2001). Embora esses autores
enfoquem a visão biológica da sexualidade em seus trabalhos, eles permitem a
compreensão de que vários serão os fatores que a afetarão, mas nem todos serão
biológicos.
Na mulher, a maioria das mudanças no processo de envelhecimento é
decorrente da diminuição dos hormônios femininos que se inicia durante o
climatério. Essa alteração determina uma diminuição da elasticidade da parede
vaginal e uma redução das glândulas mucosas, de forma que a lubrificação vaginal
diminui. Tal situação pode em alguns casos, provocar dor durante a penetração
64
A percepção da sexualidade do corpo idoso
vaginal ocorrendo, especialmente, quando a relação é demorada ou ocorre após um
longo período de abstinência (CAPODIECI, 2000).
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (WHO, 1981), o climatério
compreende uma fase pré-menopausal, que começa em torno dos quarenta anos de
idade e se estende até o início dos ciclos menstruais irregulares e/ou de
sintomatologia atribuível à falência ovariana, com duração variável; uma fase peri-
menopausal, que ocorre antes da menopausa com o surgimento de alguns sinais e
termina um ano após o seu estabelecimento e a fase pós-menopausal que acontece
após a cessação da menstruação e se estende até os 65 anos de idade.
Um dos sinais mais marcantes durante o climatério é a cessação da
menstruação, que é chamada de menopausa. Cerca de 1/3 das mulheres pode
apresentar alguns desconfortos como: ondas de calor, cefaléia, tendência ao
cansaço, instabilidade emocional e irritabilidade. Ocorre também alteração da
tonicidade dos pequenos e grandes lábios, e em casos de desequilíbrios hormonais,
a diminuição dos espasmos uterinos e da duração do orgasmo (CAPODIECI,
2000; PEDRO et al., 2003). No que se refere aos desconfortos decorrentes do
climatério, eles apresentam-se mais exacerbados em mulheres que perderam seu
papel social e não redefiniram seus objetivos existenciais (FAVARATO & ALDRIGHI,
2001).
Cabe salientar que o climatério é um fenômeno fisiológico decorrente do
esgotamento dos folículos ovarianos que ocorre em todas as mulheres de meia
idade, seguido da queda progressiva da secreção de estradiol, culminando com a
interrupção definitiva dos ciclos menstruais e o surgimento de sinais característicos
(LORENZI et al., 2005).
Devido à falência ovariana, a produção de estrógenos diminui, o que
acarreta no aumento de hormônios estimulantes ovarianos (LH hormônio
luteinizante e FSH hormônio folículo estimulante) em uma tentativa de estimular
ainda mais os ovários. Contudo, como não são absorvidos e utilizados pela glândula,
encontramos valores elevados na corrente sangüínea (NOBILE, 2002).
Nenhuma das alterações fisiológicas decorrentes do climatério altera a libido
feminina. O que ocorre é que a sexualidade, muitas vezes, é construída a partir do
princípio de procriação (MALDONADO, 2006). Então, como a menopausa e o
climatério vêm anunciar o envelhecimento do corpo e que o período fértil da mulher
está mais perto da finitude, permite-se a idéia de que a sexualidade também se
65
A percepção da sexualidade do corpo idoso
encontra no fim. Todavia, alguns autores mencionam que a sexualidade pode ser
pensada a partir da dissociação entre prazer e procriação, e é essa redescoberta
que a torna mais prazerosa (CAPODIECI, 2000; MALDONADO, 2006; NOBILE,
2002). Dessa forma, não podemos negar as etapas concluídas, vividas que
desenham no corpo sua história, contudo, o mais importante é olhar para frente e
enxergar as possibilidades de viver prazerosamente bem.
Enquanto fenômeno compreendido na abordagem psicológica, o climatério
deixa de ser apenas um conjunto de sinais e sintomas decorrentes de um processo
fisiológico e passa a ser pensado como uma experiência humana, única e singular,
cujas respostas e formas de vivenciá-lo são resultados de “ingredientes que entram
na composição da personalidade de cada mulher” (LOPES, 1999, p. 86).
No que diz respeito às modificações biológicas no homem, é importante
lembrar que a partir dos 40 anos, anualmente ocorre a diminuição de 1,2% dos
níveis circulantes de testosterona livre. O nível de testosterona total permanece
estável até os 55 anos, quando então, começa a se reduzir a uma taxa entre 0,4% a
0,8% ao ano (BONACCORSI, 2001).
Devido à alteração hormonal, a elevação do testículo se torna menor, bem
como seu tamanho diminui lentamente, a irrigação do sangue no escroto e nos
testículos decaem, os níveis de testosterona também declinam levemente, a ereção
torna-se mais lenta, ocorre a diminuição das contrações no momento da ejaculação
e do volume de líquido seminal e a secreção de líquido pré-ejaculatório vai se
tornando mínima ou ausente. Entretanto, nenhuma dessas situações desfavorece o
homem em manifestar a sua sexualidade (CAPODIECI, 2000).
É importante ressaltar que ocorre também um prolongamento do período
refratário, ou seja, período em que, após a ejaculação, o pênis permanece sem ter a
possibilidade de ficar ereto e ocorrer uma ejaculação adicional. Na adolescência ele
pode durar minutos, alterando-se para horas com o passar da idade e no idoso pode
chegar a dias (KOLONDY, MASTERS & JOHNSON, 1982; TRINDADE, 2002). Em
contrapartida, também há um aumento sobre o controle ejaculatório, podendo ter um
prolongamento do tempo entre a excitação e a ejaculação (CAPODIECI, 2000). Esse
processo vivenciado pelo homem é conhecido por andropausa, climatério viril ou
ainda insuficiência androgênica parcial. É entendido como um estado pouco
estudado e não está isolado na trajetória da vida masculina, mas faz parte do
processo de envelhecimento (BONACCORSI, 2001).
66
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Nesse contexto, são os mitos e os preconceitos que nos levam a pensar que
a andropausa e a menopausa são responsáveis pelas dificuldades sexuais. Se o
enfoque de análise da sexualidade do idoso for centrado na genitália, na qual o coito
apresenta-se como única fonte de prazer, estaríamos decretando a sua
impossibilidade como ser sexuado. O que mais interfere na vida sexual do idoso não
são apenas as limitações orgânicas, que são reflexos naturais do processo de
envelhecimento, mas as questões de ordem psicológica e social que também
respondem as mudanças ocorridas durante a trajetória existencial (SANTOS, 2003).
O que deve ser compreendido e modificado em nossa cultura em relação ao
idoso e sua sexualidade, é o mito sustentado que ela diminui automaticamente com
o avançar da idade até chegar a uma velhice assexuada. A sexualidade acompanha
toda a trajetória existencial humana, motivo pelo qual se faz necessário entender o
que pode transformá-la, e que tal transformação não faz com que na terceira idade
ela seja esquecida.
É importante lembrar que, o mito é construído imaginariamente sob valores e
modelos que têm o jovem como referencial, tornando a sexualidade inacessível ao
idoso. Assim, podemos contribuir para libertar idosos e jovens de concepções
equivocadas sobre normalidade”, concedendo a cada um a possibilidade de
vivenciar as manifestações de seu próprio corpo e dos sentimentos como diretrizes
para avaliar o que consideram justo, agravável e realmente digno de ser amado e
vivido. Isso significa que o conceito de nomalidade não pode ser generalizado ou
padronizado, uma vez que “abrange um amplo leque de variações individuais e não
aquele que faz referência a normas preestabelecidas” como condição válida para
todos (CAPODIECI, 2000, p. 63).
Isso pode ser elucidado mediante as falas:
“A sexualidade é normal, a gente ainda não tem um recolhimento ainda
assim. Não é que nem era antigamente, mas eu me considero ainda
normal. Não sei daqui para frente, mas até agora o momento, a
potencialidade por enquanto normal. Não 100% que nem era, né. De
acordo com a idade da gente, a gente vai ficando mais cauteloso, mas
não vou dizer que tenha caído bruscamente, por enquanto eu ainda me
considero normal. [...] Me sinto normal, me sinto bem. Meu corpo mudou e
67
A percepção da sexualidade do corpo idoso
a potencialidade também, mas o que mudou não me impede de ter
prazer”. (M VI)
“Não é como se eu tivesse com, digamos assim, com 20 anos, mas com
63 não tenho do que me queixar [...] Não tomo medicamento assim, para
rejuvenescer, ... pra ficar mais forte, não tomo remédio nenhum nesse
sentido. Então me sinto bem, estou satisfeito”. (M VIII)
Os entrevistados têm como referência o jovem que foram um dia, contudo
não deixam de valorizar o que são e o que podem realizar no presente enquanto
idosos, utilizam tudo o que ficou armazenado no corpo para fazer a ponte entre
presente e passado. Assim, considerar “normal”, não é o padrão juvenil que está
como pano de fundo para a comparação, mas sim o que foi construído ao longo da
vida e que permite a manifestação da sexualidade no presente. Existe no discurso
dos entrevistados a percepção de que algo mudou. Todavia, essa mudança trouxe
novas possibilidades, que serão compreendidas singularmente e individualmente
pelo corpo vivente, carregando os traços que o tempo e as experiências vividas
desenharam nele.
É importante destacar que, o corpo sexuado, o corpo vivido é “memória”
(LABRONICI, 2002), motivo pelo qual tem uma história. Entretanto, o que faz com
que o homem tenha uma história é a sexualidade. “Se a história sexual de um
homem oferece a chave de sua vida, é porque na sexualidade do homem projeta-se
sua maneira de ser a respeito do mundo, quer dizer, a respeito do tempo e a
respeito dos outros homens” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 219).
A temporalidade não elimina a possibilidade de manifestação da sexualidade
do idoso do ponto de vista biológico, uma vez que esta só é possível de ser pensada
porque o corpo é sexuado. É o preconceito criado pela sociedade que nos impede
de ver e perceber o idoso como ser sexuado, possuidor de sexualidade. Estamos
diante de um fato social, reproduzido entre as gerações, em que, por um lado, os
mais jovens não percebem a possibilidade de exercer a sexualidade em idade
avançada, por outro, alguns idosos também encaram com dificuldade a sua própria
sexualidade (RISMAN, 2005; SANTOS, 2003).
Nesse contexto, faz-se necessário conhecer o corpo e as alterações que
fazem parte do desenvolvimento normal com a finalidade de minimizar experiências
68
A percepção da sexualidade do corpo idoso
negativas advindas da falta de conhecimento adequado ou preconceito injustificado
(TRINDADE, 2002).
Ao perceber a sexualidade do idoso com um outro olhar, a possibilidade
de enfocarmos as perdas. Todavia, as inúmeras experiências vividas e acumuladas,
propiciam redesenhar a vida e a sexualidade. Compreendo que as alterações
trazidas no corpo afetarão naturalmente a sexualidade, isto significa conceber que
corpo e sexualidade estão em constantemente modificação, ou seja, inacabados e
abertos (MERLEAU-PONTY, 2000).
As modificações biológicas advindas do processo de envelhecimento podem
representar uma sensação de fragilidade e uma necessidade de revitalização que
facilitará a busca de um sentido individual da própria existência (CAPODIECI, 2000),
e refletem na imagem corporal que também pode interferir na manifestação da
sexualidade pelo fato de não ser mais um corpo atraente, uma vez que o idoso tem
como modelo o corpo juvenil, belo, e viril. Esses atributos são valorizados em nossa
sociedade que vive o culto ao corpo belo. Assim, a imagem que o idoso tem de si é
construída alicerçada no que soube desenvolver e realizar a partir de suas
experiências (CAPODIECI, 2000). Isto significa que esta imagem não reflete apenas
o seu estado interior, mas a sua história, a história do corpo, motivo pelo qual ele
deve ser compreendido como fonte de experiências significantes, como veículo de
comunicação com o mundo e expressão possível de ser-no-mundo (SIMÕES, 1994).
O corpo, a meu ver, é um verdadeiro diário vivo inesgotável de sentimentos,
emoções, desejos e percepções. Os traços desenhados pelo tempo não descrevem
apenas a fisiologia do organismo, mas carregam aspectos subjetivos, singulares de
cada ser. Esse corpo, consciência encarnada, se vê, se toca vendo, toca as coisas,
reconhecesse naquilo que (MERLEAU-PONTY, 2000). O papel utilizado para
escrever a nossa história é a própria carne, que tatua em si mesma o nosso mundo
vivido e as experiências construídas escritos nas mais diversas cores.
Na perspectiva de corpo que muda, ao discutirmos questões pertinentes ao
idoso e a manifestação de sua sexualidade, não podemos nos ater às perdas
trazidas pelo tempo cronológico, mas sim, no resgate do ainda possível, no acúmulo
de ganhos, “onde o corpo possível é mais importante que o corpo perfeito”
(SIMÕES, 1994, p.8).
É importante reconhecer que as alterações do processo de envelhecimento
refletem concretamente na manifestação da sexualidade, bem como distinguir o que
69
A percepção da sexualidade do corpo idoso
é normal ou patológico. O fato de o homem idoso ter mais dificuldade para alcançar
e manter a ereção e da mulher idosa para ter uma lubrificação vaginal, não significa
que ambos estejam doentes, menos excitados ou menos desejosos um pelo outro,
contudo, que o corpo está mudando e caminhando em um processo natural de
desenvolvimento (KOLODNY, MASTERS & JOHNSON, 1982). A mudança do corpo
é percebida pelo idoso e entendida de forma natural como as marcas que o tempo
constrói e que pode ser observada na fala abaixo.
“Hoje o que me deixa feliz é que ele em casa. Ele me trata bem, me
carinho. Ele quando a gente tem relação, ele é uma pessoa que ele fala:
“Você ta cada vez ficando melhor, você era boa, mas ficando melhor
que essa idade”.” (F III)
Notamos nessa fala que o tempo não acarretou impossibilidades, mas sim
proporcionou vivenciar uma relação que pode ser mais prazerosa permeada pelo
desejo e possibilidades. Verifica-se a percepção no idoso a respeito de sua
sexualidade que modifica ao longo da trajetória existencial. Os casais idosos podem
melhorar o seu relacionamento na vida a dois, à medida em que são capazes de
reconhecer e aceitar as modificações fisiológicas, algumas específicas da fisiologia
sexual, que são diferentes no homem e na mulher, e conseqüência do processo de
envelhecimento, não estando relacionadas ao desejo, interesse ou sentimentos que
um sente pelo outro (CAPODIECI, 2000). Para esse autor, a idade permite a
compreensão de que o mais importante não é o que se apresenta, mas o que
somos. Isto significa que o interior deve ser mais valorizado do que a aparência.
O corpo, bem como a sexualidade, modificam-se ao longo da trajetória
existencial mostrando-nos uma nova imagem. Essa imagem não será definida
apenas biologicamente, mas, psicologicamente, porque passa pela percepção de
corpo que o idoso tem de si. Assim, ele constrói uma outra imagem que é produto da
sua imaginação ou concepção particular que o indivíduo tem de si, que é resultante
de um processo que envolve fatos, experiências, impressões e sentimentos vividos
ao longo de sua existência (LINS, 2004). Assim, ao compreender que as mudanças
fazem parte de um processo pessoal e possível, é necessária uma contínua reflexão
sobre a percepção a respeito do processo de envelhecimento (BALESTRA, 2002).
70
A percepção da sexualidade do corpo idoso
As mudanças ocorridas no corpo alteram a dinâmica na trajetória existencial
e, conseqüentemente, trarão manifestações diferentes da sexualidade para a vida
do idoso e/ou do casal. Dessa forma, o momento de transformações vivido pode
propiciar uma reelaboração positiva da auto-imagem corporal em mudança,
permitindo que a sexualidade possa ser manifestado mediante sentimentos
afetuosos diferenciados, indo além do referencial jovem, encontrando novos
modelos de realização pessoal e sexual, compartilhando uma nova intimidade
(MESSINA, 2004).
Compreendo que a terceira idade é uma das possibilidades naturais da
condição humana e, que as perdas que ocorrem em função das transformações
fisiológicas, apesar de afetar a virilidade do idoso, não interferem no seu ser e estar
no mundo, porque ele tem a possibilidade de encontrar um novo sentido para a sua
existência, mediante a construção e reconstrução de conceitos em seu cotidiano.
Podemos contemplar o processo do envelhecimento e valorizar toda a trajetória
existencial realmente como condição humana, não encarando a mudança como
perda, mas como possibilidade. Assim, cada momento vivido será celebrado como
único e singular.
É importante reconhecer a sexualidade do idoso, pois é a partir da sua
redescoberta, que tanto o homem como a mulher se revitalizam, e se percebem não
mais como corpo assexuado, velho. Devemos reforçar ainda que se as mudanças
advindas com o tempo podem representar perdas, mesmo assim a vida deve ser
celebrada e a sexualidade vivida mediante uma multiplicidade de maneiras.
Cabe salientar que as mudanças e as formas de responder a elas não serão
iguais para todos, isso porque cada corpo é um ser único e singular que manifesta
seus desejos de forma subjetiva. Nas entrevistas realizadas, emergiu que os idosos
percebem as alterações ocorridas e se adequam a ela como forma de redescoberta
do corpo e de suas relações. Na fala a seguir, compreendo que ele vivencia essa
etapa da trajetória existencial percebendo que algo mudou em seu cotidiano.
“Em função da idade houve uma regressão né, no caso de relacionamento
semanais [...] Os sentimentos para mim, hoje eu creio que aprimorou mais.
O relacionamento amoroso no dia-a-dia, no relacionamento marido e mulher,
esposo né? Então em creio que aprimorou mais. [...] O ato sexual é um
momento de minuto e segundo, e o relacionamento é de 24 horas do dia,
71
A percepção da sexualidade do corpo idoso
entre dois seres. [...] Mudou esse ponto. Diminuiu nesse fator de contato, de
beijos, de lábios... o relacionamento continuou com todo respeito, com toda
dignidade”. (M X)
Encontramos nessa fala a confirmação de que algo permanece, seja ele o
desejo, seja a própria forma de relacionamento ou de manifestação da sexualidade.
O importante é reconhecer que o idoso continua tendo a libido, o desejo, ou seja, o
Eros, que pode impulsioná-lo a um relacionamento afetivo que envolva relações
sexuais ou não, nas quais ambas serão formas da manifestação de sua sexualidade.
Devemos ainda salientar questões de razão psicológica que podem interferir
em determinadas formas de manifestação da sexualidade. Do ponto de vista
psicológico, o homem precisa entender o que está acontecendo com o seu corpo
para não se sentir ou ser induzido culturalmente a pensar que está enfraquecido,
defeituoso ou debilitado (MASTERS & JOHNSON, 1984). Nessa forma de
abordagem, por se tratar de qualidade, o vivenciar da sexualidade assume um
caráter altamente subjetivo, no qual é inconcebível tentar quantificar em números de
experiências ou simplesmente pela forma que se manifesta. Sendo assim, cada um
tem a liberdade de buscar o seu próprio modo de ser, sem esquecer que para sentir
prazer, amar e ser amado, independe da funcionalidade fisiológica. Nenhuma
dessas mudanças diminui a libido, contudo, quando esse fato ocorre será
provavelmente causado por razões de ordem psicológica, que às vezes se
manifestam em defesa das alterações fisiológicas (CAPODIECI, 2000).
O que percebo é que a terceira idade pode apresentar-se tão rica, fascinante
e cheia de vida quanto os períodos vivenciados anteriormente a ela, e deve ser
encarada como um momento em que as respostas às situações vividas não venham
do vigor físico, mas do aprimoramento da sensibilidade que é conquistado pela
experiência. Nessa fase existencial,
“a vida sexual encontra alimento na ternura e na necessidade de amor. Os
parceiros podem melhorar o seu relacionamento na vida a dois na medida em
que são capazes de reconhecer que existem modificações da fisiologia sexual,
como também que estas são diferentes no homem e na mulher e que constituem
a conseqüência de mudanças específicas devidas ao processo de
envelhecimento” (CAPODIECI, 2000).
72
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Outra questão que deve ser considerada em relação às adaptações e
redefinição da sexualidade é o estado de saúde de um ou de ambos, ou a ausência
de um dos parceiros por motivo de falecimento. Nesse sentido, cada sujeito
apresentará um tipo de resposta a essas situações. Contudo, mesmo que ocorra um
decréscimo nas relações sexuais, o desejo sexual permanece, porque o homem é
um corpo desejante, ou seja, é possuidor e fonte de desejo que não deve ser
ignorado (LABRONICI, 2002; GABBAY, 2004).
É importante reconhecer que, mesmo quando a habilidade ou o desejo de se
relacionar, em termos de atividade sexual não estejam mais presentes, o desejo de
intimidade e afetividade persiste acompanhando a trajetória de vida (BYYNY &
SPEROFF, 1996).
Na busca de compreensão da redefinição da sexualidade, podemos
encontrar questões relativas ao processo saúde-doença que afeta o corpo, e desta
forma, a manifestação da sexualidade do idoso, visto que a doença pode provocar
mudanças corporais que requerem adaptação.
A redescoberta do corpo envelhecido, por vezes, pode nos revelar algum
tipo de limitação ou incapacidade funcional, que por sua vez, será fonte
alimentadora de uma imagem corporal distorcida (BALESTRA, 2002), dependendo
de como a situação for compreendida pelo idoso. Entretanto, é possível repensar e
redescobrir a sexualidade, mesmo quando existam tais limitações e isso pode ser
constatado na fala a seguir:
“Depois que deu o derrame eu perdi um pouco da..., perdi..., estacionou,
mas continuo tendo relação sexual [...] Perdi um pouco da potência. Tive
dificuldades, mas continuo tendo desejo”. (M IX)
“Se tornar impotente, isso não quer dizer que a libido cai. A libido nunca
cai... tem gente que pode até deixar de praticar o ato sexual, mas a libido
não perde nunca[...] Nenhum ser humano... deixa de ter seus desejos
sexuais. Isso morre com o corpo”. (M V)
Constatamos que o desejo e a libido continuaram no idoso impulsionando a
expressão de sua sexualidade, neste caso, direcionada para a atividade sexual.
73
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Um grupo significativo de idosos, em nossa sociedade, encontra-se em um
relacionamento estável e, sendo um relacionamento harmonioso, terão condições
favoráveis para essa redescoberta, independentemente da doença (PENTEADO et
al., 2006).
Nesse contexto de mudanças, qualquer alteração física pode afetar a nossa
multidimensionalidade, o nosso ser e estar no mundo, e quando se trata do processo
de envelhecimento, não podemos deixar de mencionar as doenças crônicas.
Algumas são chamadas de distúrbios cardiovasculares e representam uma parcela
significativa de morte entre idosos.
Dentro de cada faixa etária, e separadamente por gênero, existem os riscos
de desenvolver um problema cardiovascular. Todavia, após a menopausa, a mulher
apresenta percentual de risco de desenvolver um problema cardiovascular
semelhante ao do homem, e isso ocorre provavelmente por perderem a proteção
proporcionada pelos estrogênios (CAPODIECI, 2000).
No que se refere aos portadores de distúrbios cardiovasculares, um certo
medo em retornar às atividades sexuais, por exemplo, após um enfarto ou uma
cirurgia, mas que na verdade não representam um risco significativo para uma
complicação. Alguns autores sugerem que se deve esperar o restabelecimento geral
do idoso e que ele terá condições de avaliar, quando pode retomar essa atividade
(CAPODIECI, 2000; FAVARATO & ALDRIGHI, 2001).
Outro distúrbio comum entre idosos é a diabetes. Esse é distúrbio
metabólico que aumenta o risco de desenvolver a impotência sexual masculina, e
em escala mais reduzida a feminina. E pelo simples fato de saber que existe esse
risco, é possível que alguns idosos desenvolvam uma impotência advinda de
aspectos psicológicos e não meramente fisiológicos. Todavia, é importante lembrar
que mesmo nessa situação o desejo persiste (CAPODIECI, 2000).
No que diz respeito à saúde feminina, encontramos questões bem
singulares como o câncer uterino e o de mama. O câncer uterino pode resultar em
uma histerectomia que implicará mudanças na sexualidade por razões subjetivas.
Portanto, esse órgão tem um significado singular para a feminilidade.
O câncer de mama pode resultar em uma mastectomia, e este procedimento
cirúrgico pode alterar a auto-imagem feminina acarretando mudanças na percepção
da sexualidade por parte do parceiro e de si mesma. Esse impacto é influenciado
pela receptividade, cumplicidade e intimidade do companheiro, e poderá ocasionar
74
A percepção da sexualidade do corpo idoso
mudanças na manifestação da sexualidade do casal (NOBILE, 2002). Isso ocorre
porque esses órgãos representam a feminilidade, sexualidade e maternidade para a
mulher (DUARTE & ANDRADE, 2003).
Especificamente no homem, podemos encontrar os distúrbios da próstata
como a prostatite, hiperplasia prostática (benigna) ou câncer de próstata. Esse é o
problema mais grave e que pode ter repercussões mais sérias sobre a sexualidade
masculina, devido ao fato de que o procedimento cirúrgico destinado à cura é a
prostatectomia radical, o qual pode lesionar diversas inervações da área pubiana.
Nesse contexto, o maior problema que ocorre é a falta de informação, uma vez que
esta permite que os idosos acreditem que tal procedimento alterará, de forma
irreversível, a sua sexualidade (CAPODIECI, 2000).
Não é objetivo deste capítulo discorrer sobre as doenças que podem trazer
mudança na expressão da sexualidade, todavia, compreender que várias situações
do processo saúde doença acarretam alterações no corpo, na auto-imagem, e por
isso na sexualidade. De acordo com MERLEAU-PONTY (1999) somos corpo, não
podemos dissociá-lo em partes. Isso significa que, qualquer alteração que ocorra em
algum dos órgãos, poderá trazer conseqüências em todo o nosso ser e na forma
como nos vemos, percebemos e nos relacionamos com o mundo.
É importante perceber que todas as mudanças vividas pelo corpo durante a
trajetória existencial deixarão marcas, positivas ou negativas, e que, de alguma
forma, afetarão a corporeidade, e por sua vez, a manifestação da sexualidade.
Na perspectiva da mudança corporal, GEIS (2003) comenta que o tempo
deve ser compreendido como um continuum, no qual o ser humano apresenta-se em
constante desenvolvimento, e não envelhecendo. Assim, não devemos focar para as
perdas, mas sim para a conquista e redescoberta de um novo corpo que somos e
seremos, vivendo um novo mundo a cada amanhecer que se inicia.
75
A percepção da sexualidade do corpo idoso
5. CONSIDERAÇÕES
76
A percepção da sexualidade do corpo idoso
A minha caminhada para desvelar a percepção do idoso sobre como
entende e vive sua sexualidade, possibilitou compreender que o processo de
envelhecimento é uma condição natural do ser humano. Ocorre durante toda a
trajetória de vida, reflete as experiências vividas, e não envolve apenas a visão
biológica, uma vez que, traz implicações à sua multidimensionalidade.
Perceber o processo de envelhecimento olhando para os vários aspectos
que o acompanham, significa ir além das transformações, perdas e degenerações, e
assim possibilitar a valorização das experiências vividas, do acúmulo de vida
encontrado na pessoa idosa. Desse modo, ao escolher como método de estudo a
abordagem fenomenológica, obrigatoriamente eu teria que retornar às coisas
mesmas, ou seja, não aceitar o encobrimento e o esquecimento que acompanham
as situações ou temáticas já construídas. Precisei ir além da superficialidade do mito
que desvaloriza o idoso como ser em final da carreira existencial, e, portanto, sem
voz. Assim, ouvi-los a fim de perceber como vivenciam a sexualidade, antes de mais
nada foi valorizar o que construíram e armazenaram em seu corpo durante décadas.
Destarte, ao me permitirem adentrar em seu mundo privado, pude perceber
o vivido por eles na trajetória existencial e desvelar o fenômeno em tela, contribuindo
para a ampliação do meu conhecimento e construção do conhecimento para a
Enfermagem sobre a sexualidade do idoso, uma vez que esta faz parte da
multidimensionalidade humana.
Semelhante ao processo de envelhecimento, acredito que a sexualidade é
uma temática carregada de diversos tabus, mitos, e que para compreendê-la faz-se
necessário o abandono de toda idéia que se apresente pronta, bem como dos
preconceitos. Dessa forma, foi possível desprender-me de concepções unicamente
biológicas, e compreendê-la como dimensão humana que está presente em toda a
trajetória existencial, podendo ser vivenciada de diferentes maneiras em cada
momento, manifestando-se mediante a expressão do corpo, ou seja, da
corporeidade.
Na pesquisa em tela, os discursos mostraram que a percepção da
sexualidade do idoso emergiu a partir da relação com o outro propiciado pelo
encontro. Este possibilita que os corpos idosos se percebam e sejam percebidos,
toquem e sejam tocados, sintam e sejam sentidos, desencadeando desejo, prazer e
sentimentos diversos. Isto significa que o outro é necessário para a
complementaridade e manifestação da sexualidade. Assim, o estar-com torna-se
77
A percepção da sexualidade do corpo idoso
momento de experiência humana rica em possibilidades de manifestar desejos e
sentimentos, e, nesse sentido, a sexualidade constitui uma dimensão afetiva,
sentimental e relacional que proporciona o respeito ao corpo e as peculiaridades de
cada momento vivido.
Outra forma de os idosos vivenciarem a sexualidade foi mediante as
atividades de lazer como a dança, a música, a prática de esporte, jantar fora,
temporadas em hotéis, ir ao teatro, porque a possibilidade do estar-com em
espaços coletivos que propiciam o encontro, a troca, a reciprocidade, a convivência,
a socialização e o prazer.
Os idosos entrevistados conseguiram reconhecer que vivem a sexualidade
de maneira diferente na terceira idade, no que diz respeito ao desempenho sexual,
pois mesmo o possuindo conhecimento suficiente e aprofundado sobre as
alterações fisiológicas decorrentes do processo de envelhecimento, reconhecem as
modificações ocorridas em seus corpos, o que os levam a fazer a travessia
imaginária sobre a ponte que os conduz ao passado. Esse processo permite a
compreensão de que hoje não são como antes, contudo possibilita um
aprimoramento no relacionamento em função do acúmulo de experiências, e que o
desejo existente, permeia a relação e possibilita a manifestação da sexualidade,
independente da imagem apresentada, da tatuagem feita pela postura, pelo tempo e
apresentada pelo cabelo grisalho, pelas rugas, e outras alterações decorrentes do
processo de envelhecimento.
Percebi que os corpos idosos vivenciam um processo de envelhecimento
ativo, com autonomia e independência, pois buscam adotar em seu cotidiano,
hábitos de vida saudáveis mediante a realização de atividades prazerosas que
possibilitam a manifestação da sexualidade e refletem na qualidade de vida.
Como enfermeiro, inserido no cenário da saúde, acredito que precisamos
conhecer as peculiaridades dos corpos idosos viventes, respeitar as suas
singularidades e limitações, sem esquecer de reconhecer e incentivar as
possibilidades de cada um durante o processo de envelhecimento, e contemplar
ações de cuidados direcionadas à promoção de saúde e bem-estar, e não apenas
um procedimento técnico voltado para a doença e medicações. Transcender isso
possibilita um cuidado estético e ético voltado à multidimensionalidade humana.
Acredito ter contribuído para a ampliação e construção do conhecimento
sobre a sexualidade do idoso, porque o fenômeno vivido estava lá, armazenado
78
A percepção da sexualidade do corpo idoso
no seu corpo, aguardando ser desvelado. Ao desvelá-lo, penso ter apontado para
novas possibilidades de expressão da sexualidade na terceira idade apropriando-me
da experiência dos corpos idosos que fizeram parte deste estudo para gerar
conhecimento, mediante a pesquisa fenomenológica, além de possibilitar uma visão
mais otimista sobre ela e o processo de envelhecimento. As possibilidades aqui
reveladas são apenas demonstrações da potencialidade humana, que direciona para
o desejo, para a vontade de viver.
Ao concluir esta etapa vivida descobri a importância de valorizarmos a
experiência do outro, algo que lhe é tão singular, mas que por intermédio de um
método de pesquisa pode abrir-se para desvelar o concreto da existência humana.
79
A percepção da sexualidade do corpo idoso
REFERÊNCIAS
ABRÃO, A. C.; PEDRÃO, L. J. A contribuição da dança do ventre para a educação
corporal, saúde física e mental de mulheres que freq6uentam uma academia de
ginástica e de dança. Rev. Latino-am Enfermagem, Ribeirão Presto, v. 13, n. 2, p.
243-248, mar./abr. 2005.
ALMEIDA, L. H. H. Danças circulares sagradas: imagem corporal, qualidade de
vida e religiosidade segundo uma abordagem junguiana. Campinas, 2005. Tese
(Doutorado em Ciências Médicas) Faculdade de Ciências Médicas, Universidade
Estadual de Campinas.
ALMEIDA, W. C. Formas do encontro: psicoterapia aberta. 2 ed. São Paulo: Agora,
1988.
BAKKER FILHO, J. P. A velhice institucionalizada. In: BAKKER FILHO, J. P. É
permitido colher flores? Reflexões sobre o envelhecer. Curitiba: Chapagnat, 2000.
p. 25-39.
BALESTRA, C. M. Aspectos da imagem corporal de idosos, praticantes e não
praticantes de atividades físicas. Campinas, 2002. Dissertação (Mestrado em
Educação Física) Faculdade de Educação Física, Universidade Estadual de
Campinas.
BEAUVOIR, S. O segundo sexo. (Trad.) MILLIET, S. São Paulo: Nova Fronteira,
2001.
BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2 ed.
revista e atualizada. São Paulo: sociedade Bíblica Brasileira, 1995.
BICUDO, M. A. V. Fenomenologia: confrontos e avanços. São Paulo: Cortez
Editora, 2000.
BRASIL. Portaria 1395/GM Política de Saúde do Idoso. Anexo Política
Nacional de Saúde do Idoso. Brasília, 10 de dezembro de 1999.
BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Informações de Saúde. Informações
Gerais. Disponível em: <http://www.datasus.gov.br> Acessado em 15/05/2005.
BRASIL. Portaria n. 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de
Saúde da Pessoa Idosa.
BONACCORSI, A. C. Andropausa: insuficiência androgênica parcial do homem
idoso - uma revisão de literatura. Arq. Bras. Endocrinol. Metab. São Paulo, v. 45,
n. 1, p. 123-133, 2001.
BORINI, M. L. O. A saída do fundo do poço: representações sociais acerca da
participação em atividades de lazer em grupos de terceira idade. Campinas, 2002.
80
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Dissertação (Mestrado em Enfermagem) Faculdade de Ciências Médicas,
Universidade Estadual de Campinas.
BUBER, M. Eu e Tu. (Trad.) ZUBEN, N. A. São Paulo: Centauro, 2001.
BYYNY, R. L.; L. SPEROFF. Climatério: guia clínico de atendimento à mulher
idosa. (Trad.) CHIMELLO, E. V. D. Rio de Janeiro: Revinter, 1996.
CAPODIECI, S. A idade dos sentimentos: amor e sexualidade após os sessenta
anos. (Trad.) ANGONESE, A. Bauru: EDUSC, 2000.
CARLOS, S A. Apresentação. In: SANTOS, S. S. Sexualidade e amor na velhice:
uma abordagem de analise do discurso. Porto Alegre: Sulina, 2003.
CAVALCANTI, R. C. Identidade de gênero: novos aportes. In: LOPES, G;
GOODSON, L.;CAVALCANTI, S. Sexologia e ginecologia. Porto Alegre: Medsi,
1996.
COSTA, E. M. B. O corpo e seus textos: o estético, o político e o pedagógico na
dança. Campinas, 2004. Tese (Doutorado em Educação Física) Faculdade de
Educação Física, Universidade Estadual de Campinas.
DOLL, J. Saúde subjetiva e satisfação de vida: um estudo comparativo com pessoas
idosas no Brasil e na Alemanha. Gerontologia, Rio de Janeiro, v. 6, n. 3, p. 99-110,
1998
DUARTE, T, P.; ANDRADE, A. N. Enfrentando a mastectomia: análise dos relatos
de mulheres mastectomizadas sobre questões ligadas à sexualidade. Estudos de
Psicologia, Natal, v. 8, n. 1, p. 155-163, 2003.
DUMAZEDIER, J. Lazer e cultura popular. (Trad.) MACHADO, M. L. S. São Paulo:
Perspectiva, 2001.
EGERIA. Dicionário da língua portuguesa. São Paulo: Egeria, 1979.
ELIOPOULOS, C. Enfermagem gerontológica. (Trad.) YOSHITOME, A. Y.;
THORELL, A. 5 ed. Porto Alegre: Artmed, 2005.
FAVARATO, M. E. C.; ALDRIGHI, J. M. A mulher coronariopata no climatério após a
menoopausa: implicações na qualidade de vida. Rev. Ass. Méd. Brasil, v. 47, n. 4,
p. 339-345, 2001.
FERRARI, M. A. C. Lazer e ocupação do tempo livre na terceira idade. In: PAPALÉO
NETTO, M. Gerontologia: a velhice e o envelhecimento em visão globalizada. São
Paulo: Editora Atheneu, 1996.
FERRIGNO, J. C. Grupos de reflexão sobre o envelhecimento: uma proposta de
reconstrução da autonomia de homens e mulheres na idade. Gerontologia, Rio
de Janeiro, v. 6, n. 1, p. 27-33, 1998.
81
A percepção da sexualidade do corpo idoso
FRANÇA FILHO, J. L. A dicotomia consciência – mundo em Merleau-Ponty, uma
tentativa de superação na fenomenologia da percepção. Recife, 2003, 117 f.
Dissertação (Mestrado) Departamento de Filosofia, Universidade Federal de
Pernambuco.
FREUD, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Volume XIX (1923-
1925). Rio de Janeiro: Imago Editora, 1976.
GABBAY, R. Afetividade e sexualidade: metamorfose no envelhecer. In:
MONTEIRO, D. M. R. (org.) Dimensões do envelhecer. Rio de Janeiro: Revinter,
2004. p. 32-37.
GASPARI, J. C.; SCHWARTZ, G. M. O idoso e a ressignificação emocional do lazer.
Psicologia: teoria e pesquisa, Brasília, v. 21, n. 1, p. 69-76, jan./abr., 2005.
GEIS, P. P. Atividade física e saúde na terceira idade: teoria e prática. 5 ed. Porto
Alegre: Artmed, 2003.
GIR, E.; NOGUEIRA, M. S.; PELÁ, N. T. R. Sexualidade humana na formação do
enfermeiro. Rev. Latino-am. de Enfermagem. Ribeirão Preto, v. 8, n. 2, p. 33-40,
abri, 2000.
GOLEMAN, D. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995.
GOMES, R. A pesquisa qualitativa na saúde e na enfermagem. In: I Seminário de
Pesquisa Científica em Saúde e na Enfermagem, 2005, Curitiba. Curitiba: UFPR,
2005. 2 DVD.
GOMES, W. A entrevista fenomenológica e o estudo da experiência consciente.
Psicologia USP, São Paulo, v. 8, n. 2, p. 305-36, 1997.
GONÇALVES, T. Vivenciando o climatério: o corpo em seu percurso existencial à
luz da fenomenologia. São Paulo, 2005. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Escola
de Enfermagem da Universidade de São Paulo.
HANDEM, P. C.; MATIOLI, C. P.; PEREIRA, F. G. Metodologia: interpretando
autores. In: FIGUEIREDO, N. M. A. Método e metodologia na pesquisa científica.
São Caetano do Sul: Difusão Editora, 2004.
HELMAN, C. G. Cultura, saúde e doença. Porto Alegre: Artmed, 2003.
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Tendências demográficas:
uma análise dos resultados da amostra do Censo Demográfico 2000. Estudos e
Pesquisas: Informação demográfica e socioeconômica, n 9. Brasil: IBGE, 2004.
_______ Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Perfil dos idosos
responsáveis pelos domicílios no Brasil. Estudos e Pesquisas: Informação
demográfica e socioeconômica, n 9. Brasil: IBGE, 2002.
82
A percepção da sexualidade do corpo idoso
JOHNSON, B. K. Older adults and sexuality: a multidimensional perspective.
Journal of Gerontological Nursing, Columbia, EUA, v. 22, n. 2, p. 6-15, feb. 1996.
JOSGRILBERG, R. S. A fenomenologia como novo paradigma de uma ciência do
existir. In: POKLADEK, D. D. A fenomenologia do cuidar: prática dos horizontes
vividos nas áreas da saúde, educacional e organizacional. São Paulo: Vetor, 2004.
p. 31-51.
KOLONDY, R. C.; MASTERS, W. H.; JOHNSON, V. E. Manual de medicina sexual.
(Trad.) OLIVEIRA, N. G. São Paulo: Manole, 1982.
LABRONICI, L. M. Eros proporcionando a compreensão da sexualidade das
enfermeiras. Florianópolis, 2002. 135 f. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Centro
de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina.
_______. A corporeidade propiciando o coexistir da racionalidade e da
sensibilidade nas práticas de cuidar. Curitiba, 1998. Dissertação (Mestrado em
Assistência de Enfermagem) Universidade Federal de Santa Catarina
Universidade Federal do Paraná – Convênio Repensul.
LINS, M. I. A. Ver-se e ser visto na terceira idade. In: MONTEIRO, D. M. R. (org.)
Dimensões do envelhecer. Rio de Janeiro: Revinter, 2004. p. 02-08.
LEITE, P. F. Exercício, envelhecimento e promoção de saúde: fundamentos da
prescrição de exercícios para idosos. Belo Horizonte: Health, 1996.
LOBIONDO-WOOD, G.; HABER, J. Pesquisa em enfermagem: métodos, avaliação
crítica e utilização. 4 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001.
LOPES, G.; MAIA, M. Sexualidade e cultura: a construção dos mitos e tabus
sexuais. In.: SÁ, C. A. M.; PASSOS, M. R. L.; KALIL, R. S. Sexualidade humana.
Rio de Janeiro: Revinter, 2000.
LOPES, G. Sexualidade humana. 2 ed. Rio de Janeiro: Medsi, 1993.
LORENZI, D. R. S. et al. Fatores indicadores da sintomatologia climatérica. Rev.
Bras. Ginecol. Obstet. Rio de Janeiro, v. 27, n. 1, p. 12-19, 2005.
MALDONADO, M. T. Amor e sexualidade na idade madura. Disponível em:
<http://www.mtmaldonado.com.br/preview/trechos/maturidade.htm> Acesso em:
14/09/2006.
MARTINS, J. Um enfoque fenomenológico do currículo: educação como poiésis.
Organização de textos Vitória Helena Cunha Espósito. São Paulo: Cortez, 1992.
MARTINS, J.; BICUDO, M. A. V. A pesquisa qualitativa em Psicologia:
fundamentos e recursos básicos. São Paulo: Moraes, 1989.
83
A percepção da sexualidade do corpo idoso
MARTINS, J.; BOEMER, M. R.; FERRAZ, C. A. A fenomenologia como alternativa
metodológica para pesquisa: algumas considerações. Rev. Esc. Enf. USP, São
Paulo, v. 24, n. 1, p. 139-47, abr., 1990.
MASTERS, W. H.; JOHNSON, V. E. A resposta sexual humana. (Trad.) SERRA, A.
A. T. São Paulo: Roca,1984.
MENDIZÁBAL, M. R. L.; CARBONERO, J. A. C. Grupos de debate para idosos: guia
prático para coordenadores dos encontros. (Trad.) GONÇALVES, M. São Paulo:
2004.
MERLEAU-PONTY, M. O visível e o invisível. (Trad.) GIANOTTI, J. A.;
D’OLIVEIRA, A. M. São Paulo: Perspectiva, 2005.
_______. Fenomenologia da percepção. (Trad.) MOURA, C. A. R. São Paulo:
Martins Fontes, 1999.
_______. O primado da percepção e suas conseqüências filosóficas. (Trad.)
CESAR, C. M. Campinas: Papirus, 1990.
MESSINA, M. Velhices produzidas na contemporaneidade. In: MONTEIRO, D. M. R.
(org.) Dimensões do envelhecer. Rio de Janeiro: Revinter, 2004. p. 44-49.
MINAYO, M. C. S. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 23 ed. Petrópolis:
Vozes, 2004.
MINAYO, M. C. S.; COIMBRA JR., C. E. A. Antropologia, saúde e
envelhecimento. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2002.
MONTEIRO, D. M. R. Polifonias de Eros. In: MONTEIRO, D. M. R. (org.) Dimensões
do envelhecer. Rio de Janeiro: Revinter, 2004. p. 38-43.
MOSER, A. O enigma da esfinge: a sexualidade. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 2001.
NOBILE, L. A. Sexualidade na maturidade. São Paulo: Brasiliense, 2002.
NÔBREGA, T. P.; TIBÚRCIO, L. K. O. M. A experiência do corpo na dança butô:
indicadores para pensar a educação. Educação e pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3,
p. 461-468, set./dez. 2004.
OLIVEIRA, J. H. Como interpretar a Bíblia. In: BARNETT, J. D (coord.). Examinai
as escrituras. São José dos Campos: Cristã Evangélica, 2004.
OLIVEIRA, P. E. O ocidente e a terceira idade: uma visão histórica. In: BAKKER
FILHO, J. P. É permitido colher flores? Reflexões sobre o envelhecimento.
Curitiba: Champagnat, 2000. p. 41-49.
PELÁEZ, M. Prefácio. In: LEBRÃO, M. L.; DUARTE, Y. A. O. SABE Saúde, Bem-
estar e Envelhecimento O projeto Sabe no município de São Paulo: uma
abordagem inicial. Brasília: Organização Pan-americana da Saúde, 2003. p. 09-10.
84
A percepção da sexualidade do corpo idoso
PAPALIA, D. E.; OLDS, S. W. Desenvolvimento humano. (Trad.) BUENO, D. 7 ed.
Porto Alegre: Artmed, 2000.
PENTEADO, S. R. L. et al. Avaliação da capacidade orgástica em mulheres na pós-
menopausa. Rev. Assoc. Med. Bras. São Paulo, v. 50, n. 4. p. 444-450, 2004.
PEDRO, A. O. et al. Síndrome do climatério: inquérito populacional domiciliar em
Campinas, SP. Rev Saúde Pública, São Paulo, v. 37, n. 6, p. 735-742, 2003.
PINTO, M. J. Apresentação. In: BAKKER FILHO, J. P. É permitido colher flores?
Reflexões sobre o envelhecimento. Curitiba: Champagnat, 2000. p. 5-7.
POLAK, Y. N. S. O corpo como mediador da relação homem/mundo. Texto &
Contexto, Florianópolis, v. 6, n. 3, p. 29-43, set./dez., 1997.
POLAK, Y. N. S. A corporeidade como resgate do humano na enfermagem.
Série Teses de Enfermagem. Florianópolis: UFSC, 1996.
POLIT, D. F.; HUNGLER, B. P. Fundamentos de pesquisa em enfermagem.
(Trad.) GARCEZ, R. M. 2 ed. Porto Alegre: Artes médicas, 1995.
RISMAN, A. Sexualidade e terceira idade: uma visão histórico-cultural. Portal do
Envelhecimento. out. 2005. Disponível em:
<http://www.portaldoenvelhecimento.net/artigos/artigo531.htm> Acesso em:
25/10/2005.
SANTOS, D. L.; POKLADEK, D. D. A massificação do homem e o destino da
humanidade buscando um jeito fenomenológico de conhecer o mundo. In:
POKLADEK, D. D. A fenomenologia do cuidar: práticas dos horizontes vividos nas
áreas da saúde, educacional e organizacional. São Paulo: Vetor Editora, 2004.
SANTOS, S. S. Sexualidade e amor na velhice: uma abordagem de análise do
discurso. Porto Alegre: Sulina, 2003.
SCHUTZ, W. Profunda simplicidade: uma nova abordagem do eu interior. (Trad.)
NETTO, M. S. M. São Paulo: Agora, 1989.
SIMÕES, R. Corporeidade e terceira idade: a marginalização do corpo idoso.
Piracicaba: Unimep, 1994.
SNOEK, J. A sexualidade humana: ensaio da ética sexual. São Paulo: Edições
Paulinas, 1981.
SOARES, A. G. P. País tem 120 idosos para cada 100 crianças. Folha de São
Paulo, São Paulo, 26 nov. 2005. Retrato do Brasil, Especial, p. 4.
SOUZA, R. P. Sexualidade riscos escola. In: SA, C. A. M.; PASSOS, M. R. L.;
KALIL, R. SOUZA. Sexualidade humana. Rio de Janeiro: Revinter, 2000.
85
A percepção da sexualidade do corpo idoso
VAN MANEN, M. Researching lived experience: human science for an action
sensitive pedagogy. New York: State of New York Press, 1990.
VIDAL, M. Ética da sexualidade. (Trad.) GONÇALVES, M. S. São Paulo: Edições
Loyola, 2002.
VIEIRA, E. B. Manual de Gerontologia: um guia teórico-prático para profissionais,
cuidadores e familiares. 2 ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2004.
TRINDADE, E. Hermenêutica do existir do homem de meia-idade paternidade,
sexualidade e projeto de vida: um olhar à luz de Heidegger. Ribeirão Preto, 2002.
Tese (Doutorado em Ciências, Área: Psicologia) Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras, Universidade de São Paulo.
TURATO, E. R. Tratado da metodologia da pesquisa clínico-qualitativa.
Petrópolis: Vozes, 2003.
WHO – Word Health Organization. Reasearch on the menopause: Technical
report. Geneve: WHO, 1996.
86
A percepção da sexualidade do corpo idoso
APÊNDICE
87
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Apêndice I
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
O (a) senhor (a) está sendo convidado (a) a participar de um estudo denominado
“A sexualidade do idoso: a percepção do corpo vivido”
Esse trabalho sobre a sexualidade do idoso tem como objetivo compreender como
vocês entendem o que é a sexualidade e como vocês lidam com ela no seu dia-a-dia.
A coleta de dados será realizada mediante a resposta da seguinte questão “Fale-
me sobre como o (a) senhor (a) entende a sua sexualidade:”, e ainda “O que é sexualidade
para você”, que serão gravadas pelo pesquisador.
A participação nesse estudo é consensual, havendo liberdade para ausentar-se
em qualquer etapa, e isso não impedirá em nada suas atividades do seu dia-a-dia. Nada
será cobrado ou pago às pessoas participantes dessa pesquisa. E por ser de livre e
espontânea a sua participação na pesquisa, em nada afetará seu dia-a-dia, ou seja, a sua
participação não lhe trará privilégios ou dano algum.
Estão garantidas as informações que vocês queiram antes, durante e depois do
estudo.
O conteúdo final deste estudo estará disponível aos participantes. Os dados
resultantes da entrevista serão utilizados para o desenvolvimento de pesquisa, dissertação e
artigo a serem divulgados nos meios acadêmico e científico, no entanto, se qualquer
informação for divulgada em relatório ou publicação, isto será feito sob forma codificada,
para que a confidencialidade seja mantida.
Você terá a garantia de que qualquer problema decorrente do estudo será
conduzido pelo pesquisador.
Declaro ter recebido as informações acima e concordo em participar dessa
pesquisa nos termos apresentados.
Assinatura: _____________________________________________ (Participante)
Data: _______________
______________________________________________
Assinatura do Pesquisador
Marcos Augusto Moraes Arcoverde (Fone: 8409-2523)
Enfermeiro – Mestrando em Enfermagem
(Universidade Federal do Paraná)
88
A percepção da sexualidade do corpo idoso
ANEXO
89
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Anexo I – Parecer do Comitê de Ética.
90
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Anexo II – Entrevista
Pesquisador: Gostaria que o senhor me falasse como você vive a sua sexualidade
no seu dia-a-dia.
Ator: Bem, na minha época de juventude não existia realmente nenhuma instrução,
nem se falava em educação sexual, não existia nenhuma bibliografia sobre
educação sexual. Existia um livro de um escritor alemão que eu não lembro o nome.
um livro, e ele tratava, tratava o ato sexual assim, como assim, uma coisa
extraordinária, não era uma coisa de emotivo, não era uma coisa que o homem
deveria praticar. O ato sexual era tabu mesmo. Tabu mesmo. E isso não quer dizer
que o libido da juventude não despertasse. Despertava realmente, mas que com
todas aquelas dificuldades. E com o passar do tempo essa minha geração foi
amadurecendo, foi... foi se inventando novos conceitos sobre a vida sexual do ser
humano. Mas antigamente um casal, casado mesmo não praticava sexo pelado,
sem roupa, no claro, não. Era um tabu. Era tudo no escuro, tudo apalpando. Hoje
não, hoje os idosos que passaram por tudo isso e se atualizaram eles tão
conhecendo tudo. Tudo, inclusive as maneiras, posições. O Kama Sutra é um
negócio muito antigo, mas naquele tempo nem se falava, nem. Publicar um livro
daquele? Mas nem pensar. A igreja, os moralistas iam dar em cima e não iam...
seriam capaz até de queimar a livraria. E hoje não. Está bem divulgado. Eu acho
que está divulgado até com muita malícia, que deveria ser divulgado com mais
educação e menos malícia. E hoje até um incentivo pra juventude praticar o sexo
fora da relação, fora do amor. Porque o sexo para o ser humano seria um símbolo
de amor. Pra um animal, não. Pra um animal é o cio. O animal vai pratica o sexo e
pronto não quer saber mais nada. Para o ser humano, pra nós que temos
inteligência, temos sentimento, que temos inteligência e sentimento, o sexo seria
uma complementação do amor. Infelizmente não é o que está acontecendo. Hoje
entre a juventude, você sabe muito bem disso, hoje a juventude é uma disputa pra
ver quem, quem transa mais. Agora sobre o idoso, eu estou com 85 anos, eu não
sou uma pessoa normal pra falar sobre isso porque eu tive cirurgia da próstata. E a
cirurgia da próstata muita vezes ela é taxativa, ela determina impotência total, muitas
vezes, nem todos. Tanto que muitos senhores, não muito idosos que têm câncer de
próstata não se submete a cirurgia, preferem continuar um tratamento pra não
perder, pra não correr o risco. Um caso bem típico, Darci Ribeiro, que foi ministro, foi
91
A percepção da sexualidade do corpo idoso
figura da república, ele não admitiu ser, a cirurgia e morreu de câncer né, e não
admitiu a cirurgia com medo de perder a potência, perder, se tornar impotente, isso
não quer dizer que o libido cai, o libido nunca cai, se você, você vai ver que tem
gente de 100 anos, isso é comum você ver isso, num asilo de velhos o cara de 100
anos lá, chega uma menina bonita ele quer meter a mão, então o libido não cai
nunca, ele pode deixar de praticar o ato sexual, mas o libido ele não perde nunca.
Eu por exemplo na minha vida particular, eu perdi minha mulher fazem 8 anos, e
depois disso eu tive um problema, um caso sexual, um, e me arrependi, daí eu não
quis\fiz mais e faço perfeitamente bem, faço perfeitamente bem, agora com certeza
se eu ainda tivesse com minha mulher a minha vida sexual continuaria, depois eu
perdi minha mulher quando eu tinha 77 anos e eu tinha vida sexual normal, não
aquela de todo dia né, isso aí também não existe, eu posso te contar uma historinha
interessante, que tinha um camarada fazendo palestras sobre Educação sexual, o
cara famoso no mundo inteiro né, depois que fez uma baita de uma palestra,
auditório cheio, caríssimo, ele quis fazer uma pesquisa e começou a perguntar
a freqüência sexual do pessoal que tava assistindo né, então ele perguntava, ele ia
anotando, tantos dias tal, por semana, por mês, ele disse: Olha a última pergunta
aqui eu vou fazer porque no script, quem pratica sexo uma vez por ano? a
turma caiu na gargalhada, daí um velhinho no fundo, eu,eu,eu a turma riu de
novo daí, ele tão alegre, uma vez por ano, é hoje , é hoje, vê, isso é um exemplo
de sexo daí, é uma anedota é uma piada, mas é um exemplo do que o sexo, e a
mulher também, a mulher também, embora a mulher tenha mais recato, se esconda,
tenha vergonha, mas eu, eu encontro muitas senhoras de 50, 60 anos que falam
em sexo, e se você conta uma piada pesada ela morre de rir, então eu falo de
mulher, eu tenho muito, eu tenho muita oportunidade de ter mulheres assim, na
convivência né, e eu conto muita piada pesada mesmo, mas é a coisa que mais, vou
contar uma piada pesada, ah que bom, que bom, então o sexo morre junto com o
corpo, tem alguma outra pergunta mais? Pode perguntar!
Pesquisador: Algumas coisas o senhor até já foi respondendo, assim o senhor falou
a questão de ter perdido a esposa, algumas outras questões referente ao ato sexual,
mas você consegue na sua visão, a sexualidade seria além do ato sexual?
92
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Ator: Bom, eu não sei se esse aspecto chega a ser sexual por Freud tudo é sexual,
Freud, tudo sexual, até o nené mamar, eu acho que não, eu acho que, agora eu
acho o seguinte, que nós os seres humanos, a não ser que tenha um grande
distúrbio mental, nós precisamos de contacto, contacto, e Freud vai dizer que isso
é sexo, você abraçar uma pessoa, ah isso é malicioso, mas não é, e nós
precisamos ter contacto, não uma pessoa normal que não goste de um contacto,
uma batida no ombro, tanto que o nosso cumprimento é um aperto de mão, é um
contacto, hoje é comum, hoje é muito comum, o rapaz encontrar uma moça e, não é
beijo, é encostar a bochecha de um lado e de outro, isso é comum, algum
tempo atrás não era, com o tempo atrás, a cerimônia era o cavalheiro nem chegava
a beijar a mulher, a mão da mulher chegava perto, fazia o gesto de beijar mas
não beijava, então isso tá mudando completamente, agora, dizer que a necessidade,
ou a vontade, ou o gosto que dá, que existe em haver um contacto de ser humano a
ser humano, seja de homem com homem, assim quanto ao amigo que gosta de dar
um abraço no amigo, puxa vida, ou uma festa, aniversário, que todo mundo se
abraça, isso é bom é gostoso, o homem, o ser humano necessita isso, agora se isso
vai pro lado sexual, eu não tenho capacidade para dizer, eu acho que, eu acho que
não. Agora veja bem, o desvirtuamento do sexo está muito avançado, não precisa ir
longe, 8 indicações de Oscar é a história de dois homossexuais, até o “cowboy” se
tornou homossexual, agora por que isso, porque a maioria dos roteiristas e escritos,
etc, etc, são homossexuais, então puxando pra esse lado, as paradas dos
homossexuais, que ofensivamente vão fazer parada, gritar exigir direito etc, isso pra
mim é uma aberração, pra mim é, eu ainda sou do tempo antigo, eu acho que o
bicha eu sei que muitas vezes até é genealógico, eu acho que ele tem até, vem até
no cromossomo dele, na descendência dele, tenha parentes, as vezes não é nem o
avô ou o pai, às vezes até o tatatataravô porque nos trazemos os genes de 500
anos atrás, quem sabe um homem da caverna lá que era meu não sei o que, ele era
homossexual, quem sabe, ninguém sabe, mas grande parte também é da educação,
e é do que o mundo moderno está apresentando, são coisas que acontecem hoje na
televisão, a televisão é um instrumento com tanta divulgação, que ela transforma a
mentalidade de uma sociedade, agora nenhum ser humano, a não ser de uma
doença total houve imobilização, deixa de ter os seus desejos sexuais. Isso morre
com o corpo, quem qual é o homem, eu vejo isso e eu vou na boca maldita todo
sábado e ta cheio de velho né, passa uma dona boa, oooooooooo, o cara nunca
93
A percepção da sexualidade do corpo idoso
mais, o cara de bengala ali andando curvado, passa uma dona ele, o que é isso,
isso é, isso é o belo, heterossexual,então é isso meu companheiro, outra coisa, é,
com a educação sexual, até a igreja ela mudou um pouco o seu aspecto.
Infelizmente ela é muito conservadora, eu sou católico praticante, mas eu discordo
de muito coisa do papa, e do vaticano, discordo mesmo, e tive, uma vez eu tive
uma discussão numa palestra com um camarada, eu tive uma discussão com o
cidadão, e no fim eu fui descobrir que o cidadão era frade, eu não sabia, eu discuti
com ele sem saber nada, porque eu tava assistindo uma palestra do Padilha. O
Padilha é um professor ali muito bom, não sei se você conhece, eu tava assistindo a
palestra, e ele tava comentando alguma coisa da Cirla, Cirla é Conferencia de
Bispos Latinos Americanos, e a Cirla nessa reunião, a Cirla fez dois enunciados, um
bom natural ele disse leu isso no observatório romano que ele é assinante, e o outro,
ai ele se referiu a outro enunciado, dizia o seguinte, que os casais de encontro
que não tivessem filhos deveriam se separar, e os que tivessem filhos deveriam
continuar junto pra criar os filhos, mas como irmão e irmã, quer dizer sem sexo, o
palestrante disse que isso na verdade é uma coisa muito difícil, e o outro se
levantou, não mas isso não é da Cirla não, isso é do Vaticano, que é o papa, e ele
não pode mudar isso, ele não pode mudar isso, isso é uma lei de Deus e ele não
pode, aí eu levantei de lá e disse, pode, não pode , pode sim, porque quando Cristo
designou Pedro como fundador da igreja, como o primeiro papa, ele disse pro Pedro
que o que atares na terra, será atado no céu e o que desatares na terra, será
desatado no céu, isso no meu entender de leigo é uma procuração de amplos
poderes e tão amplos poderes que João XXIII mudou radicalmente a sistemática da
igreja católica, porque ele tinha esses poderes. o palestrante lá, o Padilha achou
que eu estava com a razão, o camarada saiu da sala né, digo ficou 2, 3 minutos
saiu, sem pedir licença, sem nada, aí o Padilha ainda falou, olha o rapaz aí o senhor,
acho que ficou magoado e saiu. terminou a palestra, o pessoal chegou pra mim,
mas rapaz, você deu o dedo no freio, freio do Bom Jesus, da igreja do Bom
Jesus, não do colégio, da igreja, e eu acho isso, eu acho que quando Deus nos deu
a vida, ele nos deu a vida, nos deu sentimento, ele nos ensinou a amar. nós
sabemos amar, dizer que o cachorro ama o dono, conversa mole, mas o cachorro, o
cachorro quer o bombom, a boa vida, acostuma com o cheiro , o carinho, tudo isso,
o domesticado porque o cachorro selvagem não tem nada disso, e antigamente
existia cachorro selvagem, mas quando Deus fez isso, ele queria que nós fôssemos
94
A percepção da sexualidade do corpo idoso
felizes, ele fez tudo para que nós fôssemos felizes. Então se um casamento
realmente se torna um transtorno, por precipitação, por não saber escolher, eu acho
lógico que se separem e que cada um procure ser feliz com outra pessoa. Eu sou a
favor disso, embora seja católico, eu sou a favor do controle do, né bem controle, do
controle da educação sexual, para efeito de procriação. Um dos flagelos do mundo
hoje é o excesso de gente, e o excesso de gente onde mais há necessidade que é a
classe pobre, é a África, é a favela, porque a classe média e rica faz, e a igreja
católica é contra isso. E eu sou contra a igreja católica nesse ponto, pra igreja
católica sexo é pra procriar e pronto. Nos meios naturais de se evitar, e outra coisa,
nós, aliás nós não, existe animais que são assim também, mas a maioria dos
animais tem contato sexual quando tem o cio, cio da fêmea, o macho sempre
disposto, se ele cheirar o cio, ele vai, e nós seres humanos não existe isso, nós
temos o desejo sexual, não precisa cheirar, não precisa a mulher no cio, então se
fosse pro procriar, Deus não faria o homem assim, Deus faria o homem igual o
animal, quando a mulher tivesse cio, e a mulher ia ter cio a cada 9 meses, ou a cada
ano, como o elefante. Então se ele nos deu essa propriedade de usar o sexo como
prazer, como complemento do amor, eu acho que competi a nós usufruir isso e não
tem esse negócio da igreja não admitir. Eu sei casos, pela minha vida, eu sei de
casos grandes, um número imenso de casos de casais que realmente, foi um passo
errado, casais que com 20 anos de casamento, com filhos adultos e tudo isso, e o
camarada começa a se embriagar, se torna alcoólatra, e bate na mulher, e pronto, e
o que que essa mulher vai fazer? Tem que separar, tem que separar, cada um vai
procurar ser feliz com outro, o cara quer encher a cara que encher no bar, a
mulher apanha, apanha e não recebe nada em casa, o marido não traz nada, gasta
tudo com bebida, o que que ela tem que fazer? Deixar esse cara pô, e ela vai
procurar um homem pra ser feliz com ele, porque o desejo sexual não morre, não
morre, e então aparece os meios artificiais da mulher se satisfazer, do homem se
satisfazer, você vai na internet cheio de troço desses, cultura do sexo, cultura do
sexo, o sexo é muito importante.
Pesquisador: O senhor comentou a respeito do contato né, no seu dia a dia, pelo
que o senhor falou isso é muito importante, no seu dia a dia você busca esse
contato?
95
A percepção da sexualidade do corpo idoso
Ator: Olha é, eu vivo sozinho né, eu vou todo dia jogar tênis, eu encontro meus
amigos lá,conto piadas, eu tenho meus jantares fora, eu tenho as minhas
temporadas fora também em hotéis, eu faço reuniões, eu do palestras também,
uma vez por mês, tenho palestra num Spa , tenho sexta-feira que vem dia 17 eu
tenho uma, e eu não vou falar de sexo não, eu vou falar, eu falo sobre experiência
de vida, sobre lições de vida, que eu tomei muitas lições de vida, muitas lições.
Particularmente minha vida sexual foi muito boa, muito boa mesmo. Na igreja, hoje
na igreja moderna, enfim, alguns padres fazem reuniões de casais, dão educação
pra casais, e eles são taxativos porque na relação entre marido e mulher tudo é
válido, desde que seja com amor. Então eu sou favorável a isso, tudo é válido desde
que seja com amor, não sei se os outros, não sei por exemplo quem tem 60 anos
hoje, como é que pensando isso, porque 60 anos hoje pra mim ele 25 anos
atrás de mim, não sei se você vai achar alguém com mais de 85 anos pra
entrevistar.
96
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo