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Universidade de São Paulo
Instituto de Química
Biotransformações de cetonas
aromáticas e cíclicas promovidas por
fungos
Artur Franz Keppler
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Dr. Leandro Helgueira de Andrade
Orientador
São Paulo, 14 de fevereiro de 2005
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Problemas resolvidos são bons para contar
- Provérbio Judeu
À Giselle,
incondicionalmente
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A importância de cada um não pode ser quantificada e sequer colocada em uma
ordem lógica.
Ao CNPq pela bolsa concedida durante o mestrado.
Ao Leandro; pela amizade, pela liberdade de expressar minhas opiniões, pela
inestimável dedicação e pela primorosa orientação.
Ao Prof. Comasseto; pela confiança, pelo exemplo, pela orientação e sobretudo por
todas as oportunidades oferecidas.
À Giselle; por todo amor, compreensão, cumplicidade de ideais e sem nenhuma sobra
de dúvidas pelo exemplo de dedicação e de eficiência em tudo o que faz. Dedico essa
Dissertação a você, que me dá forças para olhar além dos horizontes....................
À minha grande “pequena” família. Especialmente aos meus amados pai, mãe, vô
Fredi, minhas irmãs Luciana e Lilica. Sei que sem vocês eu nada seria. Obrigado pelo
amor, apoio, carinho, compreensão, exemplo de valores, de vida e muito muito mais.
Obrigado por depositarem em mim toda a confiança que uma pessoa precisa ter para
conquistar um lugar ao sol.
Às minhas amadas Vó Mia e Vó Nena, pois sei que sempre estarão comigo e todo
esse amor me dá forças para continuar; eternamente............................
À minha nova família; Toninho e Vera, que me acolheram como um filho e por isso e
muito mais serei eternamente grato.
Aos amigos do Bloco Zero: Adriana, André, Édna, Leandro, Leonardo, Luís, Pedro,
Roberto, Roberta e Thaís; pelos agradáveis momentos de trabalho e descontração,
pela indiscutível contribuição, ajuda nos momentos difíceis (e fáceis claro!), pelas
discussões científicas e por “aquelas” não tanto, que somadas acrescentaram muito
para meu desenvolvimento................em especial ao Luís, pela amizade e colaboração.
Aos amigos do Bloco Onze: Alcindo, Álvaro, Bruno, Carlos Eduardo, Cristiano,
Giuliano, Fabiano, Priscila, Rodrigo, Zé; pela ajuda e pelos agradáveis momentos de
trabalho e descontração.
Aos amigos André Augusto, Camila e Ruy; mesmo distantes, sempre presentes.
Aos amigos da Secretaria de Pós; pela ajuda nas horas mais difíceis.
Aos meus amigos fungos (em memória); pois fizeram o trabalho “sujo” em troca de
alimento e que, sem sombra de dúvidas, foram os co-autores dessa dissertação.
RESUMO
Nesse trabalho avaliamos o potencial enzimático de diferentes linhagens de
Aspergillus, investigando as biotransformações que eles promoveram em dois
substratos: 2- e 4-metilcicloexanona (1a e 1b). Todas as linhagens empregadas
apresentaram atividade de álcool desidrogenases e Baeyer-Villiger mono-oxigenases
(CHMO e CPMO), enzimas que são responsáveis pela biorredução e oxidação da
cetona, respectivamente. Utilizando o fungo A. terreus SSP 1498 selecionado na
triagem, foram preparados álcoois e lactonas com boa enantiosseletividade.
Nesse mesmo contexto, foram estudadas outras linhagens de fungos visando
determinar a presença de mono-oxigenases capazes de oxidar cetonas aromáticas.
Assim como os fungos Aspergillus, verificamos que todas as linhagens empregadas
nesse estudo também apresentaram atividade de álcool desidrogenases e Baeyer-
Villiger mono-oxigenases (APMO). A 1-fenil-etanona e seus derivados para
substituídos foram utilizados como substratos.
Adicionalmente, sintetizamos oito exemplos de compostos bi-funcionalizados
com grupos sulfeto, seleneto e carbonila (cetona). Esses compostos foram submetidos
à ação de diferentes fungos selecionados por triagem. Os produtos das reações foram
isolados e caracterizados.
O
1b
O
1a
Aspergillus
CH
3
OHO
CH
3
O
O
CH
3
123
OO
R
OH
R
Hidrólise
8
9
O
R
Biorredução
Baeyer-Villiger
OH
R
6
7
Reação de
ABSTRACT
In this work, we evaluated the enzymatic potential of different Aspergillus strains,
through the biotransformations of two substrates: 2- and 4-methylcyclohexanone (1a e
1b). All the strains employed showed alcohol dehydrogenase and Baeyer-Villiger
monooxygenase (CPMO and CHMO) activities. These enzymes can perform ketone
biorreduction and oxidation. Using the A. terreus SSP 1498 selected from the screening
study, we prepared alcohols and lactones in good enantiosselectivity.
In this way, other fungal strains were studied aiming to determine the presence
of monooxygenase activity by means of the biotransformation of aromatic ketones. Like
the Aspergillus, we observed that all strains used in this study showed alcohol
dehydrogenase and Baeyer-Villiger monooxygenase (APMO) activities. We selected 1-
phenyl-etanone and its para substituted derivates as substrates.
Additionally, we synthesized eight examples of bi-functionalized compounds with
sulfide, selenide and ketone groups. These compounds were submitted to the action of
enzymatic system of different fungi which were selected from the initial screening. The
products from the biotransformation were isolated and characterized.
O
1b
O
1a
Aspergillus
CH
3
OHO
CH
3
O
O
CH
3
123
OO
R
OH
R
Hydrolysis
8
9
O
R
Biorreduction
Baeyer-Villiger
OH
R
6
7
Reaction
CCD = cromatografias em camada delgada
CG-EM = cromatografia gasosa acoplada a um espectrômetro de massa
HPLC = cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE)
RMN = espectroscopia de ressonância magnética nuclear
IV = espectroscopia de absorção na região do infravermelho
APMO = acetofenona mono-oxigenase
BVMO’s = Baeyer-Villiger mono-oxigenases
CHMO = cicloexanona mono-oxigenase
CPMO = ciclopentanona mono-oxigenase
NADH = nicotinamida adenina dinucleotídeo (forma reduzida)
NADPH = nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato (forma reduzida)
FAD = flavina adenina di-nucleotídeo
FMN = flavina mono-nuleotídeo
THF = tetraidrofurano
LDA = diisopropilamideto de lítio
e.e. = excesso enantiomérico
uL ou μL = microlitro
mg = miligrama
mL = mililitro
MgSO
4
= sulfato de magnésio
NH
4
Cl = cloreto de amônio
Na
o
= sódio metálico
Na
2
CO
3
e K
2
CO
3
= carbonato de sódio e de potássio
NaHCO
3
= bicarbonato de sódio
NaBH
4
= boroidreto de sódio
NaCl = cloreto de sódio
m-CPBA = ácido meta-cloroperbenzóico
HCl = ácido clorídrico
LiI = iodeto de lítio
Et
3
N = trietilamina
CH
2
Cl
2
= diclorometano
AcOEt = acetato de etila
Outras siglas serão explicadas no decorrer do texto.
I.1 – Introdução
A incorporação de etapas sintéticas que utilizam as biotransformações, usando
microrganismos e/ou enzimas isoladas, está em crescente expansão na indústria e na
área acadêmica. O principal apelo para o uso das biotransformações em uma síntese
é o controle estereo/regioquímico que pode ser obtido usando reações catalisadas por
enzimas. A busca por metodologias de produção de fármacos enriquecidos
enantiomericamente é um desafio atual na química fina, conseqüência da crescente
demanda por drogas mais eficientes e seguras. Encaixando-se neste perfil, as
biotransformações estão sendo aceitas como um método eficiente de obtenção de
compostos opticamente puros e freqüentemente estão presentes em rotas sintéticas
de moléculas-chave (building blocks).
Um tema que vem sendo amplamente debatido na academia e na indústria é o
emprego de processos não agressivos ao meio ambiente, também conhecidos como
química sustentável (green chemistry).
42
Neste novo conceito, o uso de solventes
orgânicos e materiais tóxicos como reagentes que contenham metais pesados devem
ser reduzidos ou, idealmente, eliminados. As biotransformações atendem a este
compromisso e utilizam como catalisadores uma enorme gama de enzimas.
Comparadas estas metodologias com as tradicionais, observa-se que o uso de
biocatalisadores é viável, haja vista o crescente interesse por estas metodologias.
43
As enzimas podem catalisar diversas reações químicas e, de acordo com as
transformações que elas podem promover, são divididas em seis classes:
44
Óxido-
redutases, Transferases, Hidrolases, Lipases, Isomerases e Ligases.
A reação de Baeyer-Villiger é uma das mais importantes reações em síntese
orgânica e pode ser catalisada por uma oxidase, denominada mono-oxigenase. Nessa
oxidação uma cetona é transformada em um éster, isto é, ocorre a clivagem de uma
ligação carbono-carbono seguida de um processo de inserção de oxigênio (Esquema
I.1). A preparação de lactonas (ésteres cíclicos) a partir de cetonas cíclicas, foi descrita
pela primeira vez no ano de 1899
45
por Adolf Baeyer e por Victor Villiger, no entanto foi
utilizado um peróxido derivado como oxidante. Nesses mais de cem anos de oxidação
42
Lenardão; E. J.; Freitag; R. A.; Dabdoub; M. J.; Batista, A. C. F.; Silveira, C. C. Química Nova 2003, 26, 123.
43
Schoemaker, H. E.; Mink, D.; Wubbolts, M. G. Science 2003, 299, 1694.
44
Silverman, R. B. em The Organic Chemistry of Enzyme-Catalyzed Reactions. Academic Press: Califórnia, 2000.
pg 35. ISBN: 0-12-643745-9.
45
Baeyer, A.; Villiger, V. Ber. Disch. Chem. Ges. 1889, 32, 3625.
de Baeyer-Villiger, a reação foi usada na síntese de inúmeras moléculas orgânicas.
46
Desde sua descoberta, ocorreu um grande avanço na elucidação do mecanismo
47
da
reação e na aplicação dessa transformação em escala preparativa.
Esquema I.1: Mecanismo da oxidação de Baeyer-Villiger promovida por perácidos,
onde: G
m
= grupo migrante.
No entanto, a metodologia clássica apresenta diversas desvantagens porque:
(a) os reagentes e solventes halogenados são tóxicos; (b) os perácidos são oxidantes
fortes, fazendo com que em sínteses com várias etapas sejam necessárias etapas de
proteção e desproteção, para evitar produtos indesejados; (c) os perácidos são
sensíveis ao choque e em reações de grande escala o risco de acidentes é maior; (d)
a oxidação de Baeyer-Villiger promovida por perácidos não é enantiosseletiva.
Para evitar o uso dos perácidos, foram desenvolvidos procedimentos
alternativos. Atualmente, além das condições mais brandas, os trabalhos exploraram o
aspecto assimétrico da reação de Baeyer-Villiger, tendo em vista que as lactonas
quirais são intermediários valiosos para a química orgânica (síntese de fármacos
48
) e
estão presentes na estrutura de diferentes feromônios,
49
fragrâncias
50
e de inúmeras
outras moléculas bioativas.
51
46
Rens, M., Meunier, B. Eur. J. Chem. 1999, 737.
47
(a) Doering, W. E.; Speers, L. J. Am. Chem. Soc. 1950, 72, 5515. (b) Noyori, R.; Kobayashi, H.; Sato, T.
Tetrahedron Lett. 1980, 21, 2573. (c) Noyori, R.; Sato, T.; Kobayashi, H. Tetrahedron Lett. 1980, 21, 2569. (d)
Chandrasekhar, S.; Roy, C. D. Tetrahedron Lett. 1980, 28, 6371. (e) Crudden, C. M.; Chen, A.. C.; Calhoun, L. A.
Angew. Chem. Int. Ed. 2000, 39, 2852. (f) Itoh, Y.; Yamanaka, M.; Mikami, K. Organic Lett. 2003, 25, 4083.
48
Mazzini, C.; Lebreton, J.; Alphand, V.; Furstoss, R. Tetrahedron Lett. 1997, 38, 1195.
49
(a) Baraldi, P. T.; Zarbin, P. H. G.; Vieira, P. C.; Corrêa, A. G. Tetrahedron: Asymmetry 2002, 13, 621. (b)
Lebreton, J.; Alphand, V.; Furstoss, R. Tetrahedron Lett. 1996, 7, 1011. (c) Paruch, E.; Ciunik, Z.; Nawrot, J.;
Wawrzenczyk, C. J. Agric. Food Chem. 2000, 48, 4973. (d) Stritzke, K.; Schulz, S.; Nishida, R. Eur. J. Org. Chem.
2002, 3884. (d)
. Clososki, G. C., Ricci, L. C.; Costa, C. E.; Comasseto, J. V. J. Braz. Chem. Soc. 2004, 15, 809.
50
Brenna E.; Fuganti, C.; Serra, S. Tetrahedron: Asymmetry Report Number 54 2003, 14, 1.
51
(a) Alphand, V.; Furstoss, R. Tetrahedron: Asymmetry 1992, 3, 379. (b) Alphand, V.; Furtoss, R.; Moreau, S. P.;
Roberts, S. M.; Willetts, A. J. J. Chem. Soc., Perkin Trans. I 1996, 1867. (c) Murga, J.; García-Fortanet, J.; Carda,
M.; Marco, J. A. Tetrahedron Lett. 2003, 44, 1737.
C1
O
H
O
G
m
G
RCO
3
H
O
O
RO
G
m
G
intermediário de Criegee
O
O
G
m
G
O
RO
H
- RCO
2
H
O
O
G
G
m
Levando em consideração o controle quiral da oxidação de Bayer-Villiger, foram
desenvolvidos catalisadores de metais de transição
52
e metodologias organo-
catalíticas livres de metais.
53
O uso desses catalisadores mostrou modesto sucesso,
54
até a publicação do artigo de Bernini et al. (2003),
55
que apresentou um sistema
catalítico eficiente que combina CH
3
ReO
3
com líquidos iônicos. Nos últimos 10 anos, a
oxidação de Baeyer-Villiger enzimática vem sendo uma estratégia muito atrativa,
56
pois dessa forma pode-se ter o controle estereosseletivo da reação e, ao mesmo
tempo o emprego desses processos biocatalíticos atendem ao compromisso de
preservar o meio ambiente.
O biocatalisador equivalente aos peroxi-ácidos é representado pelas mono-
oxigenases, que são flavoproteínas. As flavoproteínas são uma sub-classe das
oxidases e são divididas em quatro grupos bem definidos:
57
(a) desidrogenases, (b)
elétron transferases, (c) oxidases e (d) mono-oxigenases. As mono-oxigenases são as
enzimas responsáveis pela oxidação de Baeyer-Villiger e por esse motivo são
denominadas “Baeyer-Villiger mono-oxigenases” (BVMO’s). Todas as BVMO’s
caracterizadas até hoje são dependentes de NAD(P)H e têm a flavina como grupo
prostético.
58
Elas são sub-divididas em dois grupos:
15d
- as BVMO’s do Tipo I têm a flavina adenina di-nucleotídeo (FAD) como co-fator,
utilizam o NADPH como fonte de elétrons e são compostas por sub-unidades
idênticas.
- as BVMO’s do Tipo II
têm a flavina mono-nucleotídeo (FMN) como co-fator, utilizam
o NADH como fonte de elétrons e são compostas por trímeros α
2
β.
52
(a) Murahashi S. I., Oda Y., Naota T. Tetrahedron Lett. 1992, 33, 7557. (b) Inokuchi T., Kanazaki M., Sugimoto T.,
Torii S. Synlett 1994, 4193. (c) Bolm C., Shlingloff G., Weickhardt K.; Tetrahedron Lett. 1993, 34, 3045. (d) Gusso
A., Baccin C., Pinna F., Strukul G. Organometallics 1994, 13, 3442. (e) Strukul, G. Angew. Chem. 1998, 37, 1198. (f)
Watanabe, A.; Uchida, T.; Ito, K.; Katsuki, T. Tetrahedron Lett. 2002, 43, 4481.
53
Murahashi, S. I.; Angew. Chem. 2002, 114, 2472.
54
Alphand, V.; Carrea, G.; Wohlgemuth, R.; Furtoss, R.; Woodley, J. M. Trends in Biothecnol. 2003, 21, 318.
55
Bernini, R.; Coratti, A.; Fabrizi, G.; Goggiamani, A. Tetrahedron Lett. 2003, 44, 8991.
56
Para artigos de revisão recentes veja: Stewart, J. D. Curr. Org. Chem. 1998, 2, 195. (b) Roberts, S. M.; Wan, P.
W. H. J. Mol. Catal. B: Enzymatic 1998, 4, 111. (c). Mihovilovic, M. D.; Müller, B; Stanetty, P.; Eur. J. Org. Chem.
2002, 271, 3711. (d) Kamerbeek, N. M.; Janssen, D. B.; van Berkel, W. J. H.; Fraaije, M. W. Adv. Synth. Catal. 2003,
345, 667.
57
Massey, V. J. Biol. Chem. 1994, 269, 22459.
58
Grupo prostético é uma estrutura organizada e não peptídica de uma proteína.
(i) (ii)
Esquema I.2: Estrutura da flavina (i) e do FAD (ii).
Todas as BVMO’s que foram clonadas até o momento são do Tipo I,
enquanto que
as seqüências genéticas das BVMO’s do Tipo II
permanecem desconhecidas. Apesar
de clonadas, até meados de 2004, ainda não se conhecia a estrutura cristalina das
BVMO’s. Por apresentarem especificidade frente a diferentes substratos e alta
seletividade estérea, as BVMO’s despertam um grande interesse industrial. A
cicloexanona mono-oxigenase (EC 1.14.13.22)
59
é a BVMO mais estudada e a
primeira a ser caracterizada.
60
Essa enzima mostrou-se capaz de converter mais de
100 substratos não naturais.
15b
Graças a engenharia genética e ao desenvolvimento
de processos eficientes em escala preparativa, a aplicação industrial das BVMO’s já
está sendo alcançada.
61
Um dos grandes problemas da aplicação sintética das enzimas isoladas é a
necessidade de se adicionar no meio reacional o co-fator NADPH. Por ser muito caro,
o NADPH tem que ser reciclado in situ.
62
Levando em consideração que o
metabolismo das células recicla espontaneamente o NADPH, ficou claro ao longo dos
anos que o uso de células recombinantes de Escherichia coli (contendo a BVMO
desejada) é muito mais eficiente e barato do que a abordagem que utiliza as enzimas
isoladas.
Em termos econômicos o uso do NADH é muito vantajoso, pois ele é mais
barato e estável do que o NADPH. Caso as BVMO’s (do Tipo I
) expressadas em
células de E. coli também venham a aceitar o NADH como co-fator, uma alta eficiência
59
Isolada da Acinetobacter sp NCIB 9871. Ref: Donoghue, N. A.; Norris, D. B.; Trudgill, P. W. Eur. J. Biochem.
1976, 63, 175.
60
Donoghue, N. A.; Norris, D. B.; Trudgill, P. W. Eur. J. Biochem. 1976, 63, 175.
61
Hilker, I.; Alphand, V.; Wohlgemuth, R.; Furstoss, R. Adv. Synth. Catal. 2004, 346, 203.
62
(a) Rissom, S.; Schwarz-Linek, U.; Vogel, M.; Tishkov, V. I.; Kragl, U. Tetrahedron: Asymmetry 1997, 8, 2523. (b)
Zambianchi, F.; Pasta, P.; Carrea, G.; Colonna, S.; Gaggero, J. M.; Woodley, J. M. Biothechnol. Bioeng. 2002, 78,
488.
N
OH
OH
N
OH
N
O
O
HN
O
P
O
O
O
-
P
O
O
O
-
O
HO
N
OH
N
N
N
Na
+
Na
+
N
N
NH
N
R
O
O
catalítica poderá ser alcançada, pois essas células contêm muito mais NADH do que
NADPH.
63
Kamerbeek et al. (2004)
64
sugerem que o resíduo Arg339 de uma seqüência
primária de uma HAPMO (acetofenona mono-oxigenase - Tipo I) está envolvido no
reconhecimento do NADPH e, visando aumentar a preferência pelo NADH,
promoveram mutações genéticas nessa enzima. Outros dois sítios também sofreram
modificações genéticas. Os pesquisadores conseguiram uma mutante da HAPMO que
apresentava uma elevada preferência pelo co-fator NADH, mas a atividade catalítica
dessa enzima mutante se mostrou baixa, isto é, pouco eficiente para aplicações
biocatalíticas. De acordo com esse trabalho, a elucidação da estrutura cristalina de
qualquer BVMO do Tipo I irá facilitar o estudo e a otimização das características
biocatalíticas de BVMO’s mutantes.
Alguns meses depois, Mattevi et al. (2004)
65
publicaram a primeira estrutura
cristalina de uma BVMO (Tipo I), uma fenilacetona mono-oxigenase (PAMO). Com isso
eles apresentaram a conformação do sítio ativo de uma BVMO durante a reação de
Baeyer-Villiger e demonstraram que um terminal arginina (nessa enzima a Arg337)
participa da estabilização do intermediário de Criegee durante a reação de Baeyer-
Villiger (Figura I.1).
63
Lundquist, R.; Oliveira, B. M. J. Biol. Chem. 1971, 246, 1107
64
Kamerbeek, N. M.; Fraaije, M. W.; Janssen, D. B Eur. J. Biochem. 2004, 271, 2107.
65
Malito, E.; Alfieri, A.; Fraaige, M. W.; Mattevi, A. PNAS 2004, 101, 13157.
Figura I.1: Representação esquemática das conformações do sítio ativo da PAMO
durante a reação de Baeyer-Villiger, onde: E = enzima.
Na mais recente revisão bibliográfica sobre BVMO’s, van Berkel et al. (2003)
15d
apresentam as BVMO’s que já foram identificadas e com base nesses dados, fizeram
um quadro esquemático que correlaciona os substratos estudados com as BVMO’s
mais comuns: a cicloexanona, a ciclopentanona e a acetofenona mono-oxigenases
(Figura I.2).
Figura I.2: Alguns substratos representativos para as enzimas Baeyer-Villiger mono-
oxigenases.
O caráter ambivalente da flavina C(4)-hidroperóxido é responsável pela
versatilidade das CHMO’s, que são capazes de oxidar tanto substratos ricos como
aqueles deficientes de elétrons. As CHMO’s podem promover a oxigenação
nucleofílica de cetonas (oxidação de Baeyer-Villiger), de olefinas e do boro; bem como
X
O
R
R
O
R
O
R
XO
H
H
O
R
O
O
O
R
O
R
O
O
O
Me n-Pr
O
O
MeO
S
O
HO
O
N
O
O
N
O
O
R
CHMO
CPMO
HPMO
podem oxigenar eletrofílicamente vários heteroátomos como o enxofre, o selênio, o
nitrogênio e o fósforo (Esquema I.3).
66
Esquema I.3: Mecanismo de reações de oxidação mediadas por mono-oxigenases,
onde E = enzima.
Sabe-se que as diferentes BVMO’s apresentam diferenças catalíticas e
estruturais. Wang et al. (2003)
67
compararam o potencial da CPMO e da CHMO
expressas em E. coli. frente a diferentes cetonas pró-quirais. A CPMO produziu
66
Walsh, C. T.; Chen, Y. C. J. Angew. Chem. Int. Ed. Engl. 1998, 27, 333.
67
Wang, S.; Kaeyser, M. M.; Iwaki, H.; Lau, P. C. K. J. Mol. Catal B: Enzimatic 2003, 22, 211.
NADP
+
H
2
O
O
N
N
NH
N
R
O
O
H
O
O
O
H
N
N
NH
N
R
O
O
OH
O
O
N
N
NH
N
R
O
O
NADPH
E-FAD
flavina C(4)-hidroperóxido
R
1
R
2
O
O
R
2
OR
1
PO(OCH
2
H
5
)
2
O
PO(OC
2
H
5
)
2
RB(OH)
2
RO
B(OH)
2
R
1
S
R
2
O
R
1
S
R
2
R
1
Se
R
2
R
1
Se
R
2
O
R
1
N
R
2
R
3
R
1
N
R
2
R
3
O
+ H
+
- H
+
O
2
N
N
NH
N
R
O
O
H
HO
N
N
NH
N
R
O
O
O
H
O
N
N
NH
N
R
O
O
O
H
1
3
2
4
5
4a
E-FAD
-
NADP
+
preferencialmente um dos enantiômeros da lactona correspondente enquanto que a
CHMO gerou o seu antípoda (Tabela I.1). Esse trabalho mostrou que duas enzimas
podem ser complementares e, quando purificadas, são reagentes muito úteis para a
química orgânica sintética.
Tabela I.1: Oxidação de cicloexanonas substituídas, catalisadas por CPMO e CHMO.
Substratos
(
R
)
CHMO
(
E. col
i
)
CPMO
(
E. col
i
)
Rendimento (%) e.e. (%) Rendimento (%) e.e. (%)
OH
61
9(
R
)
73
85 (
S
)
OMe 84 78 (S) 71 28 (S)
OEt - - 90 37
a
Oalila - - 80 45(S)
OBn - - 95 75(S)
OAc - - 81 5
COOEt 15 93
b
83 64
b
I 61 97 (S) 65 82 (R)
Br 63 97 (S) 70 64 (R)
Cl 56 97 (S) 64 34 (R)
a
não determinado;
b
enantiômeros opostos foram obtidos em duas biotransformações
Foi apresentado um trabalho por Stewart et al. (2004),
68
no qual são utilizadas
cinco diferentes CHMO e essas enzimas foram seletivas na conversão de 2- e 4-
alquil-cetonas. A oxidação transformou preferencialmente as cetonas nos isômeros (S)
das lactonas correspondentes. Segundo os autores, um dos grandes desafios atuais é
descobrir BVMO’s que sejam (R)-seletivas.
Outro tópico abordado na literatura é a conversão assimétrica de diferentes
grupos funcionais, utilizando o sistema enzimático de um microrganismo. No entanto,
existem poucos exemplos da geração de mais de um centro quiral a partir de um
material de partida não quiral. Algumas reações são conhecidas, como por exemplo a
redução de di-cetonas a dióis quirais,
69
a di-oxidação de anéis aromáticos por di-
oxigenases
70
e a conversão de cetonas em dióis quirais usando um mesmo
microrganismo que promove a redução da cetona e a hidroxilação do resíduo
alquídico.
71
Um trabalho sobre esse assunto foi publicado por Collado et al. (2003),
28
no qual os autores examinam as bioconversões de substratos que possuem dois
68
Kyte, B. G; Rouvière, P.; Cheng, Q.; Stewart, J. D. J. Org. Chem. 2004, 69, 12.
69
Conceição, G. J. A.; Moran, P. J. S.; Rodrigues, J. A. R. Tetrahedron: Asymmetry 2004, 14, 2327.
70
Holland, H. L.; Brown, F. M.; Barret, F. J. Ind. Microbiol. Biothechnol. 2003, 30, 292.
71
Bustillo, A. J.; García-Pajón, J. A.; Hernández-Galán, R.; Collado, I. G. Tetrahedron: Asymmetry 2003, 14, 3775.
O
R
(R,S)
O
O
R
CHMO
CPMO
grupos funcionais: sulfeto e carbonila. Os dois biocatalisadores utilizados nesse
trabalho foram capazes de gerar dois centros quirais nos substratos estudados. Esses
resultados se mostraram muito interessantes e deixaram claro que esse campo pouco
explorado da biocatálise ainda tem muito a oferecer.
I.2 – Objetivos
Este trabalho de dissertação teve como objetivo explorar o potencial enzimático
de fungos isolados no Brasil, avaliando por meio de triagem enzimática a atividade
das BVMO’s presentes nos sistemas enzimáticos desses microrganismos. Foram
avaliadas as atividades das enzimas frente a cetonas cíclicas e aromáticas. Além disso
também tivemos como objetivo estudar outra transformação assimétrica promovida por
álcool desidrogenases (ADH) presentes nessas células. Essas enzimas catalisam a
reação de biorredução e competem com as BVMO’s pelo substrato, podendo
transformar as cetonas em álcoois quirais. Os álcoois, assim como as lactonas quirais,
são materiais de partida de elevada importância sintética.
Por fim, sintetizamos uma classe de moléculas com dois grupos funcionais
(sulfeto e cetona, seleneto e cetona) e aplicamos nesses compostos os
biocatalisadores selecionados por triagem, avaliando as transformações promovidas
por esses microrganismos.
Este capítulo está dividido em três partes para melhor entendimento do trabalho. A
separação da primeira e da segunda parte foi feita tendo como base a classe de
mono-oxigenase responsável pela transformação do substrato. A terceira parte é
relativa a síntese de substratos com dois grupos funcionais e ao estudo de suas
biotransformações.
II.1 – Identificação da atividade de Baeyer-Villiger mono-oxigenases (CHMO e CPMO)
e de álcool desidrogenases em fungos.....................................................................pág.
10;
II.2 – Identificação da atividade de Baeyer-Villiger mono-oxigenase (APMO) e de álcool
desidrogenases em fungos....................................................................................pág.
28;
II.3 – Síntese e transformações biológicas de moléculas bi-funcionalizadas.........pág.
40;
II.4 – Conclusões....................................................................................................pág.
68.
II.1 - Identificação da atividade de Baeyer-Villiger mono-oxigenases
(CHMO e CPMO) e de álcool desidrogenases em fungos
Para melhor explorar o potencial enzimático dos fungos e visando também
elaborar uma biblioteca das transformações promovidas por estes microrganismos, foi
estudado nesta etapa do trabalho um único gênero de fungo que apresenta diferentes
classes de mono-oxigenases, enzimas responsáveis pela biotransformação de cetonas
em ésteres. Estudos preliminares
72
apontaram a presença destas enzimas no gênero
Aspergillus. Tendo em vista essas evidências, foi feita uma triagem das linhagens de
Aspergillus coletados em diferentes partes do Brasil, utilizando para isso cetonas
cíclicas, que são substratos modelo para este tipo de estudo.
73
A 2- e a 4-metil-
cicloexanona (1a e 1b, Esquema II.1) também podem ser consideradas sondas para a
identificação do tipo de oxidase presente no microrganismo. Conforme o levantamento
72
a) Porto, A. L. M. Isolamento e Seleção de Microrganismos Brasileiros para Reações de Biocatálise e Produção
de Metabólitos. Campinas: Instituto de Química; Universidade Estadual de Campinas, 2002. Tese de doutorado em
Química Orgânica. (b) Comasseto, J. V.; Omori, A. T.; Andrade, L. H.; Porto, A. L. M. Tetrahedron: Asymmetry
2003, 14, 711. (c) Comasseto, J. V.; Andrade, L. H.; Omori, A. T.; Assis, L. F.; Porto, A. L. M. J. Mol. Catal. B:
Enzymatic 2004, 29, 55.
dos dados apresentado por van Berkel et al. (2003),
15d
se o microrganismo oxidar a 2-
ou a 4-metil-cicloexanona, é possível afirmar que ele possui em seu metabolismo a
enzima cicloexanona ou ciclopentanona mono-oxigenase (CHMO ou CPMO). Este
conjunto de informações é esquematicamente apresentado na Figura II.1.
Figura II.1 - Alguns substratos representativos para as enzimas Baeyer-Villiger mono-
oxigenases (CHMO, CPMO e HAPMO).
Além das mono-oxigenases, na triagem também foi possível identificar nessa
classe de fungos a presença de álcool desidrogenases, que são enzimas responsáveis
pela redução da carbonila, levando ao álcool correspondente. Sendo assim, foi
possível obter dois produtos nas reações catalisadas por Aspergillus, conforme o
Esquema II.1.
Esquema II.1 – Transformação de uma cetona cíclica promovida por Aspergillus,
levando ao álcool e à lactona correspondentes.
73
Miyazawa, M.; Okamura, S.; Kameoka, H. J. Chem. Tech. Biotechnol. 1996, 65, 171.
O
1b
O
1a
Aspergillus
CH
3
OHO
CH
3
O
O
CH
3
123
X
O
R
R
O
R
O
R
XO
H
H
O
R
O
O
O
R
O
R
O
O
O
Me n-Pr
O
O
MeO
S
O
HO
O
N
O
O
N
O
O
R
CHMO
CPMO
HPMO
Na avaliação do potencial enzimático dos Aspergillus foram estudadas nove
linhagens desse fungo (Tabela II.1) frente às duas cetonas (1a e 1b) apresentadas no
Esquema II.1. O objetivo desta parte do trabalho foi identificar microrganismos que
produzem enzimas com elevado potencial catalítico para a obtenção de lactonas e
álcoois enantiomericamente enriquecidos.
Tabela II.1 – Origem das linhagens estudadas.
Linhagens estudadas
Origem
Coleção de Cultura
A. terreus SSP 1498 Connecticut, USA
A. terreus CCT 5179 Campinas-SP
A. terreus CCT 4083 Chapadinha –MA
A. foetidus CCT 2683 -
A. niger SSP 1078 Paranapiacaba-SP
A. terreus URM 3571 Recife
A. terreus URM 3422 Recife
A. terreus URM 4602 Recife
A. terreus URM 3371
Recife
II.1.1 –Estudo de metodologias de biotransformação
Inicialmente, foi feito um estudo para se comparar o potencial enzimático dos
fungos em diferentes condições reacionais. Para isso foram escolhidas aleatoriamente
quatro linhagens de Aspergillus. Os fatores de comparação foram a conversão do
substrato e o excesso enantiomérico dos produtos. Avaliou-se então o potencial
enzimático dos fungos em três abordagens usualmente empregadas em reações de
biocatálise: células em crescimento (a), células ressuspensas (1 e 3g; b e c) em solução
tampão e enzimas excretadas pelos fungos no filtrado (d) [meio de cultura de
crescimento]. Todos os experimentos foram realizados conforme procedimento III.3.1
(Parte experimental). Os frascos reacionais foram preparados da seguinte maneira:
a) Em um Erlenmeyer de 250 mL contendo 40 mL de solução tampão fosfato (pH=7),
foi adicionada a biomassa do fungo (1,0 g) e o substrato (16,5 mg; 20 μL).
b) Em um Erlenmeyer de 250 mL contendo 40 mL de solução tampão fosfato (pH=7),
foi adicionada a biomassa do fungo (3,0 g) e o substrato (16,5 mg; 20 μL).
c) Em um Erlenmeyer de 250 mL contendo 100 mL de meio de cultura com fungos
em crescimento foi adicionado o substrato (16,5 mg; 20 μL).
d) Em um Erlenmeyer de 250 mL contendo 100 mL do filtrado (meio de cultura de
crescimento) foi adicionado o substrato (16,5 mg; 20 μL).
Nas Tabelas II.2 e II.3 apresentam-se os resultados da avaliação do potencial
enzimático dos fungos em diferentes condições reacionais.
Tabela II.2: Biotransformação da cetona 1a levando ao álcool 2a e à lactona 3a.
Linha Microrganismo T (h) Cetona 1a Álcool 2a Lactona 3a
e.e. (%)
c
a
(%) e.e. (%) c
a
(%) cis:trans
cis trans
c
a
(%) e.e. (%)
1
A. terreus SSP 1498 24 9 54 (R) 27 26:74 78 80 62 35 (R)
- Células ressuspensas (1g) 48 - - 22 0:100 - 80 78 51 (R)
2
- Células ressuspensas (3g) 24 16 32 (R) 48 0:100 70 82 35 43 (R)
72 1 - 37 0:100 65 82 62 71 (R)
3
- Células em crescimento 24 49 49 (S) 47 79:21 75 80 3 99 (S)
48 21 23 (S) 74 64:36 70 80 5 99 (S)
4
- Filtrado 24 99 - - - - - - -
48 99 - - - - - - -
5
A. terreus CCT 5179 24 25 58 (S) 72 69:31 78 98 2 63 (R)
- Células ressuspensas (1g) 96 - - 60 39:61 46 98 34 42 (R)
6
- Células ressuspensas (3g) 24 23 62 (S) 74 72:28 72 98 2 -
96 - - 61 37:63 27 98 31 44 (R)
7
- Células em crescimento 24 49 84 (S) 50 81:19 77 95 - -
48 22 79 (S) 78 76:24 62 95 - -
8
- Filtrado 24 99 - - - - - - -
96 44 65 (S) 55 84:16 75 95 - -
9
A. terreus CCT 4083 24 29 66 (S) 68 76:24 72 98 3 70 (S)
- Células ressuspensas (1g) 48 8 - 81 66:34 70 98 10 33 (S)
10
- Células ressuspensas (3g) 24 24 64 (S) 72 74:26 70 98 3 70 (S)
48 9 24 (R) 73 68:32 61 98 17 33 (S)
11
- Células em crescimento 24 40 81 (S) 60 83:17 70 98 - -
48 23 75 (S) 77 72:28 66 98 - -
12
- Filtrado 24 99 - - - - - - -
72 92 13 (S) 8 95:05 66 nd - -
13
A. niger SSP 1078 48 66 - 29 32:68 49 95 4 15 (R)
- Células ressuspensas (1g) 96 50 17 (S) 39 08:92 40 83 10 -
Aspergillus
OHO
O
O
1a 2a 3a
14
- Células ressuspensas (3g) 48 65 - 26 23:77 29 91 8 80 (R)
96 53 36 (S) 32 07:93 59 86 14 9 (R)
15
- Células em crescimento 48 74 - 23 16:84 47 91 2 99 (R)
96 63 27 (S) 27 08:92 58 85 9 53 (R)
16
- Filtrado 48 98 - 2 - nd - - -
96 95 4 5 100:0 98 - - -
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 1); e.e.: excesso enantiomérico; nd: não determinado;
Configuração absoluta está entre parênteses.
b
e.e. para o álcool 2a: 29-98% [trans-álcool: e.e. em relação ao (+)-(1S,2S); cis-
álcool não foi isolado devido a baixa conversão].
Tabela II.3: Biotransformação da cetona 1b levando ao álcool 2b e à lactona 3b.
Linha
Microrganismo
T (h) Álcool 2b Lactona 3b
c
a
(%) cis:trans c
a
(%) e.e. (%)
1
A. terreus SSP 1498 24 19 40:60 81 87 (R)
-
Células ressuspensas (1g) -
2
-
Células ressuspensas (3g) 24 85 65:35 10 87 (R)
72 95 0:100 - -
3
-
Células em crescimento 24 31 - - -
48 58 35:65 - -
4
-
Filtrado 24 - - - -
48 - - - -
5
A. terreus CCT 5179 24 65 52:48 4 73 (R)
-
Células ressuspensas (1g) 96 70 02:98 28 91 (R)
6
-
Células ressuspensas (3g) 24 65 51:49 5 91 (R)
96 62 04:96 36 91 (R)
7
-
Células em crescimento 24 63 73:27 - -
96 95 66:34 - -
8
-
Filtrado 24 - - - -
96 22 51:49 - -
9
A. terreus CCT 4083 24 53 - 3 70 (R)
-
Células ressuspensas (1g) 48 77 57:43 10 90 (R)
10
-
Células ressuspensas (3g) 24 52 53:47 7 78 (R)
48 50 38:62 35 86 (R)
11
-
Células em crescimento 24 30 60:40 - -
12
-
Filtrado 24 - - - -
72 23 64:36 - -
13
A. niger SSP 1078 48 16 57:43 7 99 (R)
-
Células ressuspensas (1g) 96 28 34:66 12 99 (R)
14
-
Células ressuspensas (3g) 48 10 43:57 12 99 (R)
Aspergillus
OHO
O
O
1b 2b 3b
96 20 29:71 21 99 (R)
15
-
Células em crescimento 48 9 53:47 - -
96 13 37:73 15 99 (R)
16
-
Filtrado 48 - - - -
96 - - - -
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 1); e.e.: excesso enantiomérico;
Configuração absoluta está entre parênteses
A análise dos produtos formados nas biotransformações indica que todas as
linhagens de Aspergillus estudadas possuem enzimas que promovem a redução e a
oxidação de Baeyer-Villiger de cetonas cíclicas. Em alguns casos o 2-metil-cicloexanol
(2a) e a 7-metiloxepan-2-ona (3a) foram obtidos com boas seletividades. Por exemplo,
quando a biotransformação foi feita com o A. terreus SSP 1498 (3g de células) o trans-
2-metil-cicloexanol 2a foi obtido com 82% e.e. (Tabela II.2, linha 2). Usando 1g de
células, a mesma seletividade foi obtida (Tabela II.2, linha 1). A lactona 3a foi formada
em todos procedimentos avaliados, exceto quando o filtrado foi utilizado como fonte
enzimática (Tabela II.2, linhas 4, 8, 12, 16, 20).
Em alguns casos a lactona quiral 3a foi obtida com excesso enantiomérico
maior que 99%, mas em baixa conversão. É possível verificar que o enantiômero (R)
da lactona 3a foi obtido preferencialmente usando três das quatro linhagens, sendo
que apenas o sistema enzimático do A. terreus CCT 4083 converteu preferencialmente
a cetona 1a no enantiômero (S) da lactona 3a (Tabela II.2, linhas 9 e 10). Observa-se
também que o A. terreus SSP 1498 promove um enriquecimento enantiomérico da
lactona 3a com o passar do tempo (Tabela II.2, linhas 1 e 2). Isso pode indicar que um
dos enantiômeros da lactona formada sofre hidrólise preferencialmente (veja tópico
II.1.2).
A cetona residual foi obtida com excesso enantiomérico de 81% e 84% usando
as células em crescimento do A. terreus CCT 5179 e A. terreus CCT 4083 (Tabela II.2,
linhas 7 e 11, respectivamente). A resolução enzimática consome preferencialemente
o enantiômero (S) da cetona residual.
Resultados similares foram obtidos quando o substrato foi a 4-metil-
cicloexanona (1b). A lactona 3b foi obtida com excesso enantiomérico maior do que
99%. Assim como no caso da lactona 3a, o enantiômero (R) da lactona 3b também foi
formado preferencialmente por todas as linhagens. A maior enantiosseletividade foi
obtida quando o A. niger SSP 1078 foi utilizado como biocatalisador (Tabela II.3, linhas
13-15).
A redução da cetona levando ao álcool correspondente, promovida por todas as
linhagens, seguiu um comportamento semelhante para a cetona 1a e 1b. A cetona 1b
foi reduzida ao álcool correspondente 2b com uma ótima conversão de 95% e com
razão cis:trans de 0:100 (Tabela II.3, linha 2).
De acordo com os resultados das diferentes metodologias de triagem, pode-se
concluir que as Baeyer-Villiger mono-oxigenases e as álcool desidrogenases são
enzimas pouco ou não são excretadas no filtrado (meio de cultura de crescimento).
Portanto o uso do filtrado não foi adequado como biocatalisador. Enquanto que a
metodologia que utiliza como biocatalisador as células em crescimento, eliminando a
etapa de filtragem das células, apesar de ser muito prática este procedimento tem
como desvantagem a baixa seletividade das reações. Isso pode ocorrer pois ao se
manter o meio de cultura nutritivo no meio reacional, a massa celular tende a continuar
se desenvolvendo e, para isso pode utilizar indiscriminadamente tanto o extrato de
malte quanto o substrato (1a,b) e os produtos (2a,b e 3a,b) como fonte de carbono.
Alguns experimentos com células em crescimento se apresentaram promissores, mas
os melhores resultados para as células ressuspensas demonstraram que este
procedimento é o mais adequado para efetuar a triagem dos Aspergillus. Como os
resultados das biotransformações usando 1 e 3g de células ressuspensas se
mostraram semelhantes, o uso de 3g de células ressuspensas foi adotado na análise
do potencial catalítico das linhagens de Aspergillus remanescentes: A. terreus CCT
3571, A. terreus CCT 3422, A. foetidus CCT 2683, A. terreus CCT 4602 e A. terreus
CCT 3371. Os resultados obtidos na biotransformação das cetonas 1a,b são
apresentados nas Tabelas II.4 e II.5.
Tabela II.4: Biotransformação da cetona 1a levando ao álcool 2a e à lactona 3a.
Linha
Microrganismo T (h) Cetona 1a Álcool 2a Lactona 3a
e.e. (%)
Células Ressuspensas (3g)
c
a
(%) e.e. (%) c
a
(%) cis:trans
cis trans
c
a
(%) e.e. (%)
1
A. terreus URM 3571 24 41 52 (S) 54 76:26 81 88 4 52 (R)
48 14 20 (S) 77 65:35 79 89 8 -
Aspergillus
OHO
O
O
1a 2a 3a
2
A. terreus URM 3422 24 40 - 60 59:41 72 97 - -
48 24 57 (S) 73 48:52 75 95 3 30 (R)
3
A. foetidus CCT 2683 24 96 - 4 - 56 94 - -
48 93 - 7 32:68 25 85 - -
4
A. terreus URM 4602 24 27 49 (S) 70 75:25 47 80 3 50 (R)
48 13 - 81 68:32 41 79 6 -
5
A. terreus URM 3371 24 6 65 (R) 80 14:86 81 83 11 78 (R)
48 - - 80 0:100 72 81 20 76 (R)
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 1); e.e.: excesso enantiomérico; configuração absoluta está entre
parênteses. e.e. para o álcool 2a: 41-97% [trans-álcool: e.e. em relação ao (+)-(1S,2S); cis-álcool não foi isolado devido a baixa
conversão].
Tabela II.5: Biotransformação da cetona 1b levando ao álcool 2b e à lactona 3b.
Linha Microrganismo T (h) Álcool 2b Lactona 3b
Células Ressuspensas (3g) c
a
(%) cis:trans c
a
(%) e.e. (%)
1 A. terreus URM 3571 24 23 63:37 8 78 (R)
96 30 54:46 68 91 (R)
2 A. terreus URM 3422 24 49 52:48 - -
96 76 69:21 4 53 (R)
3 A. foetidus CCT 2683 24 6 70:30 - -
96 10 12:88 - -
4 A. terreus URM 4602 24 75 86:14 - -
96 80 79:21 16 90 (R)
5 A. terreus URM 3371 24 67 31:69 29 93 (R)
48 55 22:78 43 97 (R)
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 1); e.e.: excesso enantiomérico;
configuração absoluta está entre parênteses.
De acordo com os resultados apresentados nas Tabelas II.4 e II.5, a melhor
linhagem para promover a reação de Bayer-Villiger foi o A. terreus CCT 3371 para
ambas cetonas, 1a e 1b (Tabelas II.4 e II.5, linhas 5). As lactonas 3a e 3b foram
obtidas com 78% e 97% de e.e., respectivamente. Um incremento do excesso
enantiomérico foi observado com o progresso da reação. A mesma linhagem
transformou a cetona 1a no álcool correspondente 2a com uma razão cis:trans de
0:100 (Tabela II.4, linha 5).
Além da redução e da oxidação de Baeyer-Villiger das cetonas, foi observado
um enriquecimento da mistura diastereomérica dos álcoois (2a e 2b) inicialmente
Aspergillus
OHO
O
O
1b 2b 3b
formada. O álcool 2b, formado inicialmente com uma razão cis:trans de 65:35, foi
transformado no isômero trans exclusivamente pela ação do A. terreus SSP 1498
(Tabela II.3, linha 2). O mesmo comportamento pode ser observado com o álcool 2a
formado inicialmente com razão cis:trans de 26:74 (Tabela II.2, linha 2). Tendo como
base estes resultados, foi feito um estudo detalhado do enriquecimento das misturas
cis:trans dos álcoois 2a,b e também da mistura (R:S) das lactonas 3a,b (tópico II.1.2)
II.1.2 – Transformações dos álcoois (2a,b) e das lactonas (3a,b)
Com o intuito de elucidar o enriquecimento das misturas isoméricas dos
produtos formados nas biotransformações, os experimentos foram montados
reproduzindo a condição reacional adotada como a mais adequada para nosso
sistema biocatalítico (tópico II.1.1).
Inicialmente foi preparada a mistura diastereomérica do álcool 2a (razão
cis:trans 38:62) e a mistura cis-trans do álcool 2b (razão 34:66), a partir da redução
das cetonas correspondentes com NaBH
4
. Após sua preparação, as mesmas foram
submetidas a 3g de células do A. terreus SSP 1498 em meio tamponado. As
transformações foram monitoradas por análise cromatográfica de alíquotas retiradas a
cada 24 horas (Tabela II.6), utilizando como padrão interno a 1-(4-metoxifenil)etanona,
conforme procedimento III.3.2 (Parte experimental).
No caso da mistura diastereomérica do álcool 2a, ocorreu oxidação preferencial
do cis-2a à cetona correspondente (Tabela II.6, linha 2). A oxidação é apenas a
primeira etapa da degradação do álcool pelo sistema enzimático do microrganismo, no
qual uma mono-oxigenase também atua. Uma proposta deste mecanismo de
degradação foi apresentada (Esquema II.2) por Iwaki et al. (1999)
34a
e Cheng et al.
(2000)
,
74b
no qual podemos notar a presença da lactona correspondente, que também
é detectada no decorrer da reação (Tabela II.6, linha 3).
74
(a) Iwaki, H.; Hasegawa, Y., Teraoka, M.; Tokuyama, T.; Bergeron, H.; Lau, P. C. K.; Appl. Environ. Microbiol. 1999, 65, 5158.
(b) Cheng, Q.; Thomas, S. M.; Kostichka, K.; Valentine, J. R.; Nagarajan, V.; J. Bacteriol. 2000, 182, 4744.
OH
O
O
O
NAD
+
NADH
cicloexanol
desidrogenase
NADPH
NADP
+
1-oxa-1-oxo-
cicloeptano
lactonase
H
2
O
hidróxi-
hexanoato
desidrogenase
6-oxoexanoato
desidrogenase
(CH
2
)
4
CH
2
OH
COOH
(CH
2
)
4
COOH
COOH
(CH
2
)
4
CHO
COOH
NADH
NAD
+
NADP
+
NADPH
cicloexanona
mono-oxigenase
Esquema II.2: Seqüência metabólica do cicloexanol por uma Acinetobacter nativa,
onde: CHMO = Cicloexanona mono-oxigenase.
A baixa detecção dos intermediários (cetona e lactona) pode ser explicada pela
alta taxa de consumo dos mesmos, visto que as enzimas do microrganismo atuam
simultaneamente no meio reacional. Depois de 72 horas de reação, o trans-2-metil-
cicloexanol (2a) foi obtido quase que exclusivamente (5:95 razão cis:trans, Tabela II.6,
linha 4). Uma seqüência de enriquecimento da mistura diastereomérica do álcool 2a é
proposta (Esquema II.3), baseada nas análises cromatográficas das transformações.
Esquema II.3: Enriquecimento da mistura diastereomérica do álcool 2a pelo A. terreus
SSP 1498. Onde: ADH = Álcool desidrogenase, AO = Álcool oxidase, BVMO = Baeyer-
Villiger mono-oxigenase, LH = Lactona hidrolase.
Tabela II.6: Biotransformação das cetonas (2a e 2b) utilizando células de Aspergillus
terreus SSP 1498.
Linha Álcool T (h) Cetona 1 Álcool 2 Lactona 3
c
a, b
(%)
c
a
(%)
cis
:
trans
b
c
a, b
(%)
1
2
3
0
24
48
-
3
3
100
86
46
38
:62
31
:69
14
:86
4
72 - 37 5:95
-
-
2
2
(-)-(1R,2R)-2a
(+)-(1S,2S)-2a
OH
OH
(-)-(1R,2R)-2a
(+)-(1S,2S)-2a
(-)-(1R,2S)-2a
(+)-(1S,2R)-2a
OH
OH
OHOH
*
A. terreus
SSP 1498
LH
BVMO
ADH
ou AO
O
O
O
*
1a
3a
*
OH
O
OH
OH
2a
OH
2b
5
6
7
0
24
48
-
6
1
100
86
39
34:66
23
:73
4
:96
8
72 0
39 0:100
-
-
1
-
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica usando padrão interno (método 1);
b
não foi obbservada
enantiosseletividade na transformação.
Figura II.2: Cromatogramas do enriquecimento da mistura diastereomérica do álcool
2a (método 1).
A mistura cis:trans do álcool 2b apresentava inicialmente uma razão de 34:66.
Dos dois isômeros, o mais reativo é o cis, uma vez que este sofreu degradação
preferencial. Após 72 horas de reação, apenas o isômero trans do álcool 2b foi
detectado (Tabela II.6, linha 8). A cetona e a lactona correspondentes (1b e 3b)
também foram detectados em pequenas quantidades. De acordo com os resultados,
assume-se que o A. terreus SSP 1498 promove uma oxidação seletiva de um dos
isômeros do álcool 2b, levando à cetona correspondente.
OH OH
trans
OH OH
cis
0h
24h
48h
72h
padrão interno
0h
24h
48h
72h
HO
HO
padrão interno
As cetonas 1a e 1b são então oxidadas às lactonas correspondentes (3a e 3b)
pela Baeyer-Villiger mono-oxigenase e posteriormente sofrem reação de hidrólise
(Esquemas II.3 e II.4).
Esquema II.4: Enriquecimento da mistura cis:trans do álcool 2b pelo A. terreus SSP
1498. Onde: ADH = Álcool desidrogenase, AO = Álcool oxidase, BVMO = Baeyer-
Villiger mono-oxigenase, LH = Lactona hidrolase.
Figura II.3: Cromatogramas do enriquecimento da mistura cis:trans do álcool 2b (método
1).
3b
1b
*
O
O
O
OH
O
OH
*
OH
2b
ADH
ou AO
BVMO
LH
A. terreus
SSP 1498
OH
2b
OH
A proposta biocatalítica de degradação dos álcoois também é suportada pela
biotransformação das lactonas racêmicas 3a e 3b (Esquema II.5). Para os estudos de
resolução cinética destas lactonas, foi utilizado o mesmo procedimento do
enriquecimento das misturas isoméricas dos álcoois 2a e 2b. Como pode ser
observado na Tabela II.7, a biotransformação de 3a promove a hidrólise do
enantiômero (S) preferencialmente, levando a um aumento do excesso enantiomérico
em favor de (R)-3a. Após 72 horas de reação, a lactona (R)-3a foi detectada com
excesso enantiomérico de 66% e rendimento cromatogáfico de 20%. Um
comportamento similar pode ser observado para a lactona 3b, que sofreu degradação
completa depois de 48 horas de reação. Todos esses resultados suportam a proposta
de que os Aspergillus possuem uma seqüência metabólica análoga à apresentada no
Esquema II.2.
Esquema II.5: Hidrólise enzimática das lactonas racêmicas 3a e 3b.
Tabela II.7. Biotransformação das lactonas (3a e 3b) utilizando células de A. terreus
SSP 1498.
Linha
Lactona 3 T (h) Lactona 3
c
a
(%) e.e. (%)
1
0
24
48
100
90
37
-
18 (R)
50 (R)
72 20 66 (R)
2
0
24
48
100
13
-
-
-
-
72 - -
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica usando padrão interno (método 1); e.e.: excesso enantiomérico;
configuração absoluta está entre parênteses
(R,S)-3a
O
O
OH
O
OH
*
O
O
OH
O
OH
*
O
O
(R)-3a
(Lactona hidrolase)
O
O
(Lactona hidrolase)
A. terreus SSP 1498
A. terreus SSP 1498
(R,S)-3b
(R)-3b
O
O
3a
3b
O
O
0h
24h
48h
72h
O
O
(S)(R)
O
O
Padrão interno
Figura II.4: Cromatogramas da resolução cinética da lactona 3a (método 1).
II.1.3 - Estudo de tolerância do fungo ao substrato
Finalizada a triagem dos fungos, foi constatado que o A. terreus CCT 3371 se
apresentou como boa fonte enzimática para promover a reação de Baeyer-Villiger nas
cetonas 1a e 1b. A fim de verificar a possibilidade de se aumentar a escala das
reações biocatalisadas, foi feito um estudo de biotransformações com o A. terreus CCT
3371, utilizando diferentes concentrações dos substratos. Os experimentos foram
montados utilizando 3g de células do fungo ressuspensas em meio tamponado
(procedimento III.3.3, Parte Experimental), alterando apenas o volume dos substratos:
(20-200μL). Após 48 horas de reação foi feita a análise cromatográfica das reações.
Para a 2-metil-cicloexanona (1a, Figura II.5), a tolerância das Baeyer-Villiger
mono-oxigenases foi de 80μL de substrato para 3g de células do fungo ressuspensas
em meio tamponado. Entretanto, nessa concentração de substrato, a lactona 3a é
obtida com um rendimento cromatográfico de 2%. Comparando os resultados com 20
e 40μL de cetona, nota-se uma queda considerável na concentração da lactona 3a: de
25% para 16%. Essa queda é mais acentuada quando comparamos as reações com
40 e 60μL, passando de 16% para 6%. Conclui-se com os resultados que a
concentração ótima do substrato 1a para que o A. terreus CCT 3371 promova a reação
de Baeyer-Villiger é de 20μL/3g de células ressuspensas em meio tamponado.
Figura II.5: Influência da concentração do substrato na biotransformação da 2-metil-
cicloexanona (1a). Produto da biorredução = álcool 2a. Produto da reação de Baeyer-
Villiger = lactona 3a. Tempo reacional = 48 horas.
Para a 4-metil-cicloexanona (1b, Figura II.6), a tolerância das Baeyer-Villiger
mono-oxigenases foi de 60μL de substrato para 3g de células do fungo ressuspensas
em meio tamponado. Entretanto, nessa concentração de substrato, a lactona 3a é
obtida com um rendimento cromatográfico de 12%. Comparando as reações com 20 e
40μL, nota-se uma queda considerável na concentração da lactona 3b de 40% para
28%. Como buscamos uma condição na qual a reação de Baeyer-Villiger seja
favorecida, a concentração ótima do substrato 1b deve ser de 20μL/3g de células
ressuspensas em meio tamponado.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
20 40 60 80 100 200
substrato (uL)
Produtos (%
)
Biorredução
Baeyer-Villiger
1a
A. terreus
CCT 3371
O
2a
3a
OH
O
O
0
10
20
30
40
50
60
70
80
20 40 60 80 100 200
substrato (uL)
Produtos (%
)
Biorredução
Baeyer-Villiger
Figura II.6: Influência da concentração do substrato na biotransformação da 4-metil-
cicloexanona (1b). Produto da biorredução = álcool 2b. Produto da reação de Baeyer-
Villiger = lactona 3b. Tempo reacional = 48 horas.
Na faixa de 20-60μL de substrato nas condições empregadas para esse estudo,
observa-se que a medida que a concentração dos substratos aumenta no meio
reacional (figuras II.5 e II.6), ocorre uma diminuição sensível na atividade das BVMO’s
presentes no sistema enzimático do A. terreus CCT 3371. As BVMO’s perdem quase
que completamente a atividade com 80μL de substrato. Entretanto, pode-se observar
que a inibição da atividade das álcool desidrogenases não é tão grande na faixa de 20-
100μL e começa apenas ser afetada quando passamos de 100μL para 200μL de
substrato no meio reacional.
II.1.4 - Isolamento dos produtos 1a, 2a, 3a e 3b
Foram efetuados experimentos com uma massa maior de substrato para isolar e
a caracterizar os produtos. Foram montados 10 frascos reacionais, reproduzindo o
procedimento que utiliza 3g de células ressuspensas (tópico III.1.1), atingindo a
massa de 165 mg de substrato (200 μL). Após 48 horas de reação, a mistura reacional
foi filtrada, extraída e purificada conforme procedimento III.3.4 (Parte Experimental). A
1b 2b 3b
A. terreus
CCT 3371
OHO
O
O
configuração absoluta dos produtos foi atribuída por comparação com as rotações
óticas relatadas na literatura.
10b,75, 76
(+)-(S)-2-metilcicloexanona (1a) – substrato residual (A. terreus URM 3571);
[α]
25
D
= +9,2 (c=0,07; MeOH), e.e. 30%; Ref. 10b: [α]
20
D
= - 4,5 (c= 2,6;MeOH), (R).
(+)-(1S,2S)-2-metilcicloexanol (2a): Rendimento isolado: 1,2% (A. terreus URM 3571)
[α]
25
D
= +8,5 (c=0,7; CH
3
Cl
3
), e.e. 88%; Ref. 34: [α]
20
D
= +2,0 (c= 1,0; CH
3
Cl
3
), (1S,2S).
(+)-(R)-7-metiloxacicloexa-2-ona (3a): Rendimento isolado 30,3% (A. terreus SSP 1498)
[α]
25
D
= +16,2 (c=1,5; CH
3
Cl
3
), e.e. 51%; Ref. 10b: [α]
20
D
= -17,5 (c= 1,9; CH
3
Cl
3
), (S).
(+)-(R)-5-metiloxacicloexa-2-ona (3b): Rendimento isolado 28,0% (A. terreus SSP
1498). [α]
25
D
= +36,6 (c= 4,4; CH
3
Cl
3
); Ref. 35: [α]
25
D
= - 44,9 (c= 1,4; CH
3
Cl
3
), (S).
75
a) Miyazawa, M.; Okamura, S.; Yamaguchi, M.; Kameoka, H. J. Chem. Tech. Biothecnol. 2000, 75, 143. (b)
Miyazawa, M.; Okamura, S.; Kameoka, H. J. Chem. Tech. Biothecnol. 1996, 65, 171.
76
(a) Stewart, J. D.; Reed, K. W.; Kayser, M. M. J. Chem. Soc. Perkin Trans. 1 1996, 8, 755.
O
A. terreus URM 3571
O OH
(+)-(1S,2S)-2
a
(+)-(S)-1a
1a racêmico
O
A. terreus SSP 1498
1a racêmico
(+)-(R)-3a
O
O
O
A. terreus SSP 1498
1b racêmico
(+)-(R)-3b
O
O
II.1.5 – Aplicação das biotransformações na 2-etil-cicloexanona
Após a avaliação da atividade enzimática em diferentes linhagens de
Aspergillus, foram selecionadas duas linhagens de A. terreus a fim de verificar a
eficiência das Baeyer-Villiger mono-oxigenases frente a outro substrato. O objetivo
desse estudo foi comparar o comportamento das transformações da 2-metil-
cicloexanona (1a) com a 2-etil-cicloexanona (4), apresentada no Esquema II.5.
Esquema II.5: Estrutura da 2-etil-cicloexanona (4).
Conforme relatado na literatura,
27,35,77
quando tratamos da classe das 2-alquil-
cicloexanonas, os sítios ativos das Baeyer-Villiger mono-oxigenases conseguem
diferenciar de forma mais eficiente as faces pró-quirais das cetonas cíclicas quando
estas apresentam um grupo volumoso posicionado α a carbonila. Isso significa que as
lactonas correspondentes (produtos da reação de Baeyer-Villiger) terão um excesso
enantiomérico maior quanto maior for o volume do grupo alquila.
Para esse estudo, as condições reacionais foram empregadas de acordo com o
procedimento que utiliza 3g de células ressuspensas (tópico II.1.1) e 20μL de
substrato. Foram retiradas alíquotas com 24, 48 e 72 horas de reação e estas foram
analisadas por CG, comparando os tempos de retenção dos produtos com os tempos
de retenção dos padrões sintetizados. Os resultados estão apresentados na Tabelas
II.8.
77
(a) Stewart, J. D.; Reed, K. W.; Zhu, J.; Chen, G.; Kayser, M. M. J. Org Chem. 1996, 61,7652. (b) (b) Stewart, J.
D.; Reed, K. W.; Martinez, C. A.; Zhu, J.; Chen, G.; Kayser, M. M. J. Am. Chem Soc. 1998, 15, 3541.
4
O
Et
4
4a 4b
Aspergillus
OH
O
O
O
Tabela II.8: Biotransformação da cetona 4 levando ao álcool 4a e à lactona 4b.
Linha
Microrganismo T (h) Cetona 4 Álcool 4a Lactona 4b
Células Ressuspensas (3g)
c
a
(%) e.e. (%) c
a
(%)
cis:trans (%)
b
c
a
(%) e.e. (%)
1
A. terreus
SSP 1498 24 56 32 40 > 99 3 -
2
48 15 73 81 > 99 2 -
3
72 5 - 90 > 99 2 -
4
A. terreus
CCT 4083 24 12 67 87 > 99 1 -
5
48 0 - 100 > 99 0 -
6
72 0 - 100 > 99 0 -
a
c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 1); e.e.: excesso enantiomérico.
b
determinada somente a
relação
De acordo com os resultados apresentados na Tabela II.8, as Baeyer-Villiger
mono-oxigenases presentes nas linhagens utilizadas não foram eficientes na
oxidação da 2-etil-cicloexanona (
4). Utilizando o A. terreus SSP 1498, foi detectada
uma concentração muito baixa da lactona correspondente
4b (Tabela II.8, linha 1).
No entanto, quando a 2-metil-cicloexanona (
1a) foi submetida a essa mesma
linhagem, a concentração da lactona correspondente
3a foi significativamente maior
(62%; Tabela II.2, linha 1). Observa-se que a cetona
4 é transformada quase que
exclusivamente no álcool correspondente
4a (Tabela II.8, linhas 3 e 5), indicando
que nesse caso a atividade enzimática das álcool desidrogenases são maiores que
a das Baeyer-Villiger mono-oxigenases. Nota-se também que houve seletividade na
biorredução, visto que apenas um dos pares de isômeros foi formado (
cis ou trans).
Apesar de disponíveis três diferentes colunas quirais no nosso laboratório, a
separação dos isômeros não foi satisfatória. Por esse motivo não foi determinada a
estereosseletividade da biorredução da 2-etil-cicloexanona (
4).
6a
APMO
O
H
9a8a
Hidrólise
OH
H
OO
H
II.2 - Identificação da acetofenona mono-oxigenase (APMO) e de
álcool desidrogenases em fungos
Em estudos preliminares desenvolvidos em nosso laboratório foram
apresentados sistemas enzimáticos (vegetais, fungos e bactérias) capazes de
transformar derivados de 1-fenil-etanonas em seus correspondentes álcoois quirais.
78
Em alguns casos, foi observada uma competição entre a redução e a oxidação
(reação de Baeyer-Villiger) das cetonas aromáticas, quando essas transformações
utilizaram células de fungos como fonte enzimática. A acetofenona mono-oxigenase
(APMO) é a enzima que promove a reação de Baeyer-Villiger na 1-fenil-etanona,
15d
na
qual inicialmente ocorre a oxidação da cetona e depois o éster pode sofrer hidrólise,
gerando o fenol correspondente (Esquema II.7).
Esquema II.7: Oxidação da 1-fenil-etanona (6a)
Recentemente alguns artigos
23,79
apresentaram estudos de mono-oxigenases
capazes de oxidar cetonas aromáticas, incluindo aplicações sintéticas das reações de
Baeyer-Villiger que utilizam metodologias biocatalíticas.
Com base nas observações apresentadas acima, decidimos explorar a
eficiência enzimática de alguns fungos em reações de Baeyer-Villiger e biorredução.
Neste estudo foi feita uma triagem com dez microrganismos (Tabela II.10) em
78
(a) Comasseto, J. V.; Omori, A. T.; Porto, A. L. M.; Andrade, L. H. Tetrahedron Lett. 2004,45, 473. (b) Comasseto, J. V.; Omori,
A. T.; Porto, A. L. M.; Andrade, L. H. Tetrahedron: Asymmetry 2003, 14, 711. (c) Comasseto, J. V.; Andrade, L. H.; Omori, A. T.;
Assis, L. F.; Porto, A. L. M. J. Mol. Catal B: Enzymatic 2004, 29, 55. (d) Andrade, L. H.; Omori, A. T.; Porto, A. L. M.; Comasseto, J.
V. J. Mol. Catal B: Enzymatic 2004, 29, 47.
79
(a) Tanner, A.; Hopper, D. J. Bacteriol. 2000, 128, 6565. (b) Kamerbeek, N. M.; Moonen, M. J.; van der Vem, H. J. G.; van
Berkel, M. W. J.; Fraaije, H. M. W.; Janssen, D. B. Eur. J. Biochem. 2001, 268, 2547. (c) Moonen, M. J. H.; Rietjens, I. M. C. M.;
van Berkel, W. J. H. J. Ind. Microbiol. Biot. 2001, 26, 35. (d) Kamerbeek, N. M.; Olsthoorn, A.. J. J.; Fraaije, M. W.; Janssen, D. B.
Appl. Environ. Microbiol. 2003, 69, 419. (e) Fraaije, M. W.; Kamerbeek, N. M.; Heidekamp, A. J.; Fortin, R.; Janssen, D. B. J. Biol.
Chem. 2004, 279, 3354.
diferentes meios de cultura (Tabela II.11). Esses meios de cultura foram selecionados
de acordo com a viabilidade celular dos fungos. A 1-fenil-etanona (
6a) foi empregada
como substrato modelo para detectar a atividade da APMO e de álcool
desidrogenases.
15d, 80
Tabela II.10: Origem das linhagens estudadas.
Nome Origem Coleção de Cultura
Epicoccum nigrum SSP 1948 Luís Antônio - SP
Penicillium decumbens SSP 1944 Itirapina - SP
Curvularia lunata SSP 117 Paranapiacaba - SP
Geotrichum candidum SSP 1170 Paranapiacaba - SP
Emericella nidulans CCT 3119 Campinas - SP
Pestalotiopsis sp. SSP 1946 Itirapina - SP
Rhizopus oryzae CCT 4964 Chapadinha - MA
Aspergillus foetidus CCT 2683 -
Aspergillus niger CCT 2760 Peruíbe - SP
Aspergillus terreus SSP 1498
Solo (Connecticut, USA)
Tabela II.11: Composição dos meios de cultura.
Composição
A
Extrato de batatas 4
g
L
-1
(
Oxoid
)
; Glicose 20
g
L
-1
.
B
Dextrose 20 g L
-1
(Oxoid); Peptona 10 g L
-1
(Oxoid).
C
Extrato de levedura 4 g L
-1
(Oxoid); Amido 15 g L
-1
; K
2
HPO
4
1 g L
-1
; MgSO
4
.7H
2
O 0.5 g L
-1
.
D
Glicose 20 g L
-1
; Extrato de levedura 20 g L
-1
(Oxoid); Peptona 5 g L
-1
(Oxoid); KH
2
PO
4
1 g L
-1
;
K
2
HPO
4
2 g L
-1
; NaNO
3
2 g L
-1
; KCl 0,5 g L
-1
; MgSO
4
.7H
2
O 0,5 g L
-1
; FeSO
4
.7H
2
O 0,02 g L
-1
.
Utilizando os produtos formados como parâmetro de detecção enzimática, foi
possível identificar nesses microrganismos a presença de álcool desidrogenases,
responsáveis pela produção do álcool correspondente
7. O fenol 9 serve como
indicação da presença da APMO atuante no meio reacional. A ação de hidrolases
pode ser constata pelo consumo do éster
8, levando a formação do fenol 9, conforme
apresentado no Esquema II.8. Artigos como o de Tanner et al. (2000)
38a
suportam essa
proposta.
80
(a) Nakamura, K.; Yamanaka, R.; Matsuda, T.; Harada, T. Tetrahedron: Asymmetry 2003, 14, 2659.
7
6
OH
R
Baeyer-Villiger
Biorredução
O
R
9
8
Hidrólise
OH
R
OO
R
Esquema II.8: Biotransformações da 1-fenil-etanona e seus derivados para substituídos;
onde R= H, Cl, Me, OMe.
II.2.1 - Estudo dos meios de cultura
Para avaliar os sistemas enzimáticos dos fungos como potenciais
biocatalisadores, foi estudada a biotransformação da 1-fenil-etanona (
6a). As atividades
da APMO e das álcool desidrogenases foram comparadas nos quatro meios de cultura
selecionados. A análise da atividade enzimática foi realizada por cromatografia gasosa
após 96 horas de reação (Tabelas II.12 e II.13). Todos os experimentos foram
preparados conforme procedimento
III.3.5 (Parte experimental).
7a
6a
OH
Baeyer-Villiger
Biorredução
O
9a
8a
Hidrólise
OH
OO
Tabela II.12: Efeito do meio de cultura
a
na biotransformação da 1-fenil-etanona 6a:
Biorredução
vs. Baeyer-Villiger.
Meio de Cultura A
a
Biorredução Baeyer-Villiger
1-fenil-etanol (7a) fenol (9a)
Linha
Microrganismo
c (%) e.e. (%) config. c (%)
1 Epicoccum nigrum SSP 1948 99 92 (S) -
2 Penicillium decumbens SSP 1944 30 - - -
3 Curvularia lunata SSP 117 94 83 (S) -
4
b
Geotrichum candidum SSP 1170 - - - -
5 Pestalotiopsis sp. SSP 1946 36 37 (S) -
6 Aspergillus terreus SSP 1498 7 50 (S) ~3
7 Aspergillus niger CCT 2760 16 44 (R) ~1
8 Aspergillus foetidus CCT 2683 45 72 (R) ~2
9
b
Emericella nidulans CCT 3119 - - - -
10 Rhizopus oryzae CCT 4964 34 73 (S) -
Meio de Cultura B
a
11 Epicoccum nigrum SSP 1948 99 98 (S) -
12 Penicillium decumbens SSP 1944 12 17 (S) -
13 Curvularia lunata SSP 117 48 51 (S) -
14
b
Geotrichum candidum SSP 1170 - - - -
15 Pestalotiopsis sp. SSP 1946 47 68 (R) 40
16 Aspergillus terreus SSP 1498 53 51 (S) ~2
17 Aspergillus niger CCT 2760 9 76 (R) 8
18 Aspergillus foetidus CCT 2683 47 89 (R) ~5
19 Emericella nidulans CCT 3119 17 58 (R) 31
20 Rhizopus oryzae CCT 4964 69 77 (S) -
a
Meios de cultura: A = BDA, Glicose; B = Sabouraud-Dextrose; Tempo de Reação: 96 horas; c: concentração determinada por
análise cromatográfica (método 3); e.e.: excesso enantiomérico; Config.: configuração absoluta. O composto 8a não foi
detectado em nenhuma biotransformação.
b
A 1-fenil-etanona e os produtos esperados não foram detectados.
7a
6a
OH
Baeyer-Villiger
Biorredução
O
9a
8a
Hidrólise
OH
OO
Tabela II.13: Efeito do meio de cultura
a
na biotransformação da 1-fenil-etanona 6a:
Biorredução
vs. Baeyer-Villiger.
Meio de Cultura C
a
Biorredução Baeyer-Villiger
1-fenil-etanol (7a) fenol (9a)
Linha
Microrganismo
c (%) e.e. (%) config. c (%)
1 Epicoccum nigrum SSP 1948 99 98 (S) -
2 Penicillium decumbens SSP 1944 31 51 (R) -
3 Curvularia lunata SSP 117 53 ~6 (R) -
4
b
Geotrichum candidum SSP 1170 - - - -
5 Pestalotiopsis sp. SSP 1946 79 28 (R) -
6
b
Aspergillus terreus SSP 1498 - - - -
7 Aspergillus niger CCT 2760 ~4 82 (R) 9
8 Aspergillus foetidus CCT 2683 37 60 (R) 8
9 Emericella nidulans CCT 3119 12 99 (R) 88
10 Rhizopus oryzae CCT 4964 62 88 (S) -
Meio de Cultura D
a
11 Epicoccum nigrum SSP 1948 13 80 (S) ~2
12 Penicillium decumbens SSP 1944 11 26 (R) -
13 Curvularia lunata SSP 117 46 64 (R) 49
14 Geotrichum candidum SSP 1170 ~5 28 (S) ~2
15 Pestalotiopsis sp. SSP 1946 62 14 (R) ~3
16
b
Aspergillus terreus SSP 1498 - - - -
17 Aspergillus niger CCT 2760 ~5 66 (R) 11
18 Aspergillus foetidus CCT 2683 24 53 (R) 13
19
b
Emericella nidulans CCT 3119 - - - -
20 Rhizopus oryzae CCT 4964 72 71 (S) -
a
Meios de cultura: C = Glicose – Extrato de malte – Peptona – sais minerais; D = Extrato de levedura, peptona, glicose e sais
minerais. Tempo de Reação: 96 horas; c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 3); e.e.: excesso
enantiomérico; Config.: configuração absoluta. O composto 8a não foi detectado em nenhuma biotransformação.
b
A 1-fenil-
etanona e os produtos esperados não foram detectados.
e.e. 98%
e.e. 89%
A. foetidus CCT 2683
E. nigrum SSP 1948
(R)-7a
OH
(S)-7a
6a
OH
O
De acordo com os dados apresentados, o microrganismo que apresentou a
maior enantiosseletividade na reação de biorredução foi o
Epicoccum nigrum SSP
1948, que converteu a 1-fenil-etanona
6a no (S)-1-fenil-etanol 7a com alta conversão
(99%) e ótimo excesso enantiomérico (98%), (Tabela II.12, linha 11). Em todos os
meios de cultura de crescimento, o
E. nigrum SSP 1948 promoveu a redução da
cetona
6a, levando ao álcool (S)-7a. Quando utilizados os meios de cultura (A) e (D), a
redução de
6a apresentou uma menor enatiosseletividade (Tabela II.12, linha 1;
Tabela II.13, linha 11). O
E. nigrum SSP 1948 não apresentou atividade da
acetofenona mono-oxigenase, exceto quando o meio de cultura (
D) foi empregado
(Tabela II.13, linha 11). Neste caso o fenol
9a foi obtido em baixa conversão (2%),
indicando uma atividade modesta da enzima responsável pela reação de Baeyer-
Villiger nesse tipo de substrato. Assim como o
E. nigrum SSP 1948, outros
microrganismos promoveram a redução da cetona
6a com boa enantiosseletividade.
Diversos fungos apresentaram enantiopreferência para a formação do álcool (
R)-7a. A
melhor enantiosseletividade para a preparação do álcool (
R)-7a foi observada com o
emprego do
Aspergillus foetidus CCT 2683 (Tabela II.12, linha 18).
Conforme discutido, foi possível obter biocataliticamente os dois enantiômeros
do 1-fenil-etanol
7a utilizando dois microrganismos: com o E. nigrum SSP 1948 pode-
se obter o (
S)-1-fenil-etanol e com o A. foetidus CCT 2683 pode-se preparar o (R)-1-
fenil-etanol (Esquema II.9).
Esquema II.9: Microrganismos que preparam os dois enantiômeros do 1-fenil-etanol
(
7a).
Um dado interessante pode ser observado na transformação promovida pelo
Pestalotiopsis sp. SSP 1946. Utilizando diferentes meios de cultura, a
enantiopreferência da biorredução da cetona
6a foi modificada. Usando o meio de
cultura (
A) para o crescimento do Pestalotiopsis sp. SSP 1946, pode-se preparar o
O
H
O
MeO
O
Me
O
Cl
6a 6b 6c 6d
álcool (S)-7a com um e.e. de 36% (Tabela II.12, linha 5). Quando este fungo foi
crescido no meio de cultura (
B) obteve-se o álcool (R)-7a com um e.e. de 68%.
Verificou-se também que a APMO apresenta uma atividade considerável apenas
quando o fungo foi crescido no meio de cultura (
B), pois se detectou o fenol 9a (40%
de conversão; Tabela II.12, linha 15).
Em relação a oxidação de Bayer-Villiger, o microrganismo
Emericella nidulans
CCT 3119 apresentou a maior atividade da APMO. Quando o crescimento do
microrganismo foi realizado no meio de cultura (
C), o sistema enzimático produzido
promoveu a conversão da cetona
6a preferencialmente no fenol 9a (88% de
conversão) com uma pequena quantidade do álcool
7a (12% de conversão; Tabela
II.13, linha 9). O uso do meio de cultura (
A) e (D) no crescimento do E. nidulans CCT
3119 levou a completa degradação da cetona
6a (Tabela II.12, linha 9 e Tabela II.13,
linha 19). Assim como o
E. nidulans CCT 3119, o A. terreus SSP 1498 apresentou o
mesmo comportamento de degradação quando os meios de cultura (
C) e (D) foram
utilizados para o seu crescimento (Tabela II.13, linhas 6 e 16).
II.2.2 - Biotransformações das 1-feniletanonas para substituídas (6a-
d)
Com base nos resultados descritos para a cetona
6a, o Epicoccum nigrum SSP
1948 (meio de cultura B) foi selecionado para o estudo de biorredução das 1-
feniletanonas substituídas na posição para (
6a-d) (Tabela II.14) e o Emericella
nidulans CCT 3119 (meio de cultura C) para o estudo da oxidação desses substratos
(Tabela II.15). Para esses estudos foi utilizada a 1-fenil-etanona (
6a) e seus derivados
(
6b-d), apresentados no Esquema II.10.
Esquema II.10: Substratos utilizados no estudo.
7
6
OH
R
1. Baeyer-Villiger
Biorredução
O
R
9
2. Hidrólise
OH
R
Tabela II.14: Biotransformação de 1-fenil-etanonas para substituídas, utilizando o E.
nigrun SSP 1948
a
Meio de Cultura B
a
Biorredução Baeyer-Villiger
Produto (7) Produto (9)
Linha
Cetonas
c (%) e.e (%) c (%)
1
6a
98
98 (S)
-
2
6b
97
92 (S)
-
3
6c
63
91 (S)
-
4
6d
97
60 (S)
-
a
Meio de Cultura: B = Sabouraud-Dextrose; Tempo de reação: 96 horas; c: concentração
determinada por análise cromatográfica (método 3); e.e.: excesso enantiomérico;
configuração absoluta está entre parênteses; Os compostos 8a-d não foram detectados em
nenhuma biotransformação.
O
H
O
Me
O
MeO
O
Cl
7
6
OH
R
1. Baeyer-Villiger
Biorredução
O
R
9
2. Hidrólise
OH
R
Tabela II.15: Biotransformação de 1-feniletanonas p-substituidas, utilizando o E.
nidulans CCT 3119
a
Meio de Cultura C
a
Biorredução Baeyer-Villiger
Produto (7) Produto (9)
Linha
Cetonas
c (%) e.e (%) c (%)
1
6a
16
99 (R)
70
2
6b
25
98 (R)
75
3
6c
-
-
97
4
6d
90 95(R) 4
a
Meio de Cultura
C = Glicose – Extrato de malte – Peptona – sais minerais; Tempo de
reação: 96 horas; c: concentração determinada por análise cromatográfica (método 3); e.e.:
excesso enantiomérico; configuração absoluta está entre parênteses; os compostos 8a-d
não foram detectados em nenhuma biotransformação.
O
H
O
Me
O
MeO
O
Cl
Como pode ser observado na Tabela II.14, os produtos relativos a oxidação de
Baeyer-Villiger + reação de hidrólise (
9a-d) não foram obtidos quando as cetonas (6a-
d) foram submetidas a reação catalisada por células de E. nigrum SSP 1948. Todas as
cetonas estudadas foram reduzidas ao álcool (
S)-7 com ótimos valores de conversão e
estereosseletividade. A cetona
6a foi a que melhor apresentou enantiosseletividade na
sua redução (Tabela II.14, linha 1). Dentre as cetonas estudadas, a redução da 1-(4-
clorofenil)etanona (
6d) ocorreu com boa conversão, mas com a menor seletividade
(e.e. 60%; Tabela II.14, linha 4).
Analisando os resultados das transformações promovidas pelo
E. nidulans CCT
3119, observa-se que a 1-(4-metoxifenil)etanona (
6c) é o substrato que sofreu a maior
taxa de conversão em favor da reação de Baeyer-Villiger (Tabela II.15, linha 3). Os
resultados experimentais apresentados na Tabela II.15 mostram que a oxidação de
Baeyer-Villiger promovida por
Emericella nidulans CCT 3119 segue a mesma
amplitude migratória quando esta oxidação é promovida por reagentes convencionais
(por exemplo,
m-PCBA): H > fenil > alquil 3
o
> alquil 2
o
> alquil 1
o
> metil.
81
Isto indica
que os efeitos estereoeletrônicos da reação de Baeyer-Villiger são válidos para ambos
os casos. De acordo com a teoria dos orbitais moleculares,
5e
quanto maior a densidade
eletrônica da ligação G’-C1 no intermediário de Criegee, maior será sua a preferência
migratória (Esquema II.11).
Esquema II.11: Intermediário de Criegee de uma reação de Baeyer-Villiger. Onde: G
m
= grupo migrante; quando a cetona é a 1-fenil-etanona: G’
= fenila e G’’ = metila.
1
1
C1
O
H
1
O
G'
''G
RCO
3
H
O
O
RO
'G
G''
intermediário de Criegee
O
O
'G
''G
O
RO
H
- RCO
2
H
O
O
''G
G'
No caso das 1-fenil-etanonas (
6), o grupo fenila é aquele que migra
preferencialmente, devido a doação eletrônica dos elétrons
π do sistema aromático
para o orbital
σ* da ligação O
1
-O
2
(Esquema II.12). Essa doação eletrônica aproxima a
energia dos orbitais de fronteira envolvidos nessa reação.
82
No caso das fenil-
etanonas, só o grupo arila tem essa propriedade eletrônica e dessa forma a sua
migração é preferencial frente ao grupo metila.
Esquema II.12: Doação eletrônica do sistema π aromático para o orbital σ* (O
1
-O
2
) no
intermediário de Criegee, seu estado de transição e os produtos da reação de Baeyer-
Villiger.
Quando comparamos a amplitude migratória de grupos fenila
para substituídos
(dos substratos
6a-d), devemos considerar o efeito eletrônico do substituinte no anel
aromático. A alta atividade da APMO na oxidação da cetona
6c (Tabela II.15, linha 3) é
atribuída à doação de densidade eletrônica do grupo metoxila para o sistema
π
aromático, diminuindo muito a energia do orbital
σ* (O
1
-O
2
) e conseqüentemente
favorecendo a migração do grupo MeO-Ph. A baixa atividade dessa enzima na
oxidação da cetona
6d (Tabela II.15, linha 4) se deve a elevada eletronegatividade do
grupo cloreto que retira densidade eletrônica do sistema
π aromático e desse modo
dificulta a migração do grupo Cl-Ph.
Utilizando o E. nidulans CCT 3119, também foi observada a redução de todas
as cetonas exceto quando foi empregada a cetona
6c, que sofreu preferencialmente
reação de Baeyer-Villiger (Tabela II.15, linha 3). Em todas as reduções foram formados
preferencialmente os álcoois com configuração (
R)-7 (Tabela II.15).
81
Solomons, T. W. G.; Fryhle, C. B. Química Orgânica. Sétima Edição. Rio de Janeiro: LTC Editora, 2002. Cap 16, Vol. 2: Aldeídos
e Cetonas I. Adição Nucleofílica ao Grupo Carbonila, pg 33. ISBN 85-216-1283-4
82
Hannachi, H.; Anoune, N.; Arnaud, C.; Lantéri, P.; Longeray, R.; Chermette, H. J. Mol. Structure (Theochem) 1998, 434, 183.
Me
O
1
OH
O
2
O
R
R
Me
O
1
OH
O
2
O
R
R
R
O
1
Me
OH
O
2
O
R
Estado de Transição
Intermediário
de Criegee
Produtos da reação
de Baeyer-Villiger
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
20 40 60 80 100 200
substrato (uL)
Produtos (%)
Bayer-Villiger
Biorredução
MeO
O
E. nidulans
CCT 3119
MeO
OH
MeO
OH
6c 7c 9c
Como o E. nidulans CCT 3119 apresentou-se como boa fonte enzimática para a
oxidação de Baeyer-Villiger da cetona
6c, assim como no caso das cetonas cíclicas
(
tópico II.1.3), foi feito um estudo desta biotransformação com diferentes
concentrações deste substrato (Figura II.7). Os frascos reacionais foram preparados
reproduzindo a melhor condição reacional para promover a reação de Baeyer-Villiger
no substrato
6c, na qual são utilizados 100mL de células em crescimento (E. nidulans
CCT 3119), crescidas por 96 horas no meio de cultura C, conforme procedimento
III.3.5 (Parte Experimental).
Figura II.7: Influência da concentração do substrato na biotransformação da 1-(4-
metoxifenil)etanona (
6c) pelo E. nidulans CCT 3119. Produto da biorredução = álcool
7a. Produto da reação de Baeyer-Villiger = fenol derivado 9c. Tempo de reação = 96
horas.
Foi observada uma tolerância de 100mg para 100 mL de células em
crescimento. A partir de 60mg, ocorre uma competição entre a biorredução e a reação
de Baeyer-Villiger. O (
R)-1(4-metoxifenil)etanol (7c) pode ser obtido quando a
concentração da cetona
6c está na faixa de 60-100mg. Esta competição enzimática
pode estar ocorrendo devido a uma inibição enzimática da APMO pela cetona
6c,
substrato que aparenta ser mais tóxico para esta mono-oxigenase do que para a álcool
desidrogenase. Os resultados apresentados indicam que a concentração ótima da
cetona
6c para que o microrganismo promova a reação de Baeyer-Villiger deve estar
entre
20-40mg/100mL de células em crescimento do Emericella nidulans CCT 3119.
S
S
II.3 - Síntese e transformações biológicas de moléculas bi-
funcionalizadas
Em diversas rotas sintéticas nos deparamos com blocos de construção que
contém grupos funcionais que devem ser preservados. Usualmente são utilizadas
etapas de proteção desses grupos para depois promover a transformação em outra
parte da molécula. Neste processo perde-se tempo e muitas vezes rendimento global.
Na busca de etapas que evitem gastos desnecessários, as enzimas apresentam-se
como uma alternativa interessante. Além da estereosseletividade, estes catalisadores
podem apresentar um ótimo potencial quimiosseletivo. Por ser pouco explorado em
relação ao aspecto estereosseletivo, o estudo sistemático de microrganismos que
apresentem enzimas quimiosseletivas tende a crescer rapidamente nos próximos
anos.
Conforme o levantamento feito por van Berkel et al. (2003),
15d
as enzimas
CHMO, CPMO e HAPMO além de oxidar cetonas (
tópico II.1) podem também oxidar
sulfetos, levando a sulfóxidos (Figura II.8). Esse trabalho mostra que essas enzimas
não diferenciam o grupo carbonila do grupo sulfeto, oxidando ambos indistintamente.
Figura II.8: Oxidação de sulfetos arílicos por diferentes mono-oxigenases. Onde:
HAPMO = 4-hidróxiacetofenona mono-oxigenase, CHMO = cicloexanona mono-
oxigenase e CPMO = ciclopentanona mono-oxigenase.
II.3.1 – Triagem dos microrganismos
Em um trabalho desenvolvido em nosso laboratório,
83
foram estudados
Basidiomicetos
capazes de oxidar sulfetos. Diferentemente das mono-oxigenases
83
Ricci, L. C.; Andrade, L. H.; Porto, A. L. M.; Comasseto, J. V.; Capelari, M.; Cass, Q. B. Enzyme and Microbial Technol. 2004.
No prelo.
Substrato HAPMO CHMO CPMO
>99% (
S) 99% (R) 100% (S)
>99% (S) 37% (S) 84% (S)
mono-oxigenases
S
Me
Ar
O
S
Me
Ar
presentes nos
Aspergillus (tópico II.1), as oxidases presentes nos metabolismos dos
Basidiomicetos (lacases e peroxidases)
84
não promovem a reação de Baeyer-Villiger.
Para determinar qual enzima promove as oxidações enzimáticas em reações
catalisadas por
Basidiomicetos, com base no trabalho desenvolvido previamente,
foram selecionados os quatro fungos que apresentaram melhores resultados na
oxidação de sulfetos:
T. versicolor CCB 202, T. rigida CCB 285, I. lacteus CCB 196 e
P. sanguineos CCB 501. Escolhidos os biocatalisadores, foram selecionadas as
cetonas cíclicas
1a e 1b como substrato modelo para determinar a presença de CHMO
e CPMO (
tópico II.1).
Conforme procedimento utilizado por Ricci et al. (2003),
42
as transformações
promovidas pelos Basidiomicetos
foram feitas em frascos Erlenmeyer de 250 mL,
contendo 40 mL de solução tampão fosfato (pH=7),
3g de biomassa do fungo e 20 μL
do substrato (procedimento
III.3.6, Parte experimental). As reações foram
acompanhadas durante 168 horas e os resultados das análises cromatográficas das
alíquotas são apresentados na Tabela II.16.
Tabela II.16: Biotransformação das cetonas 1a e 1b promovida por Basidiomicetos.
Linha Microrganismo 1a 1b
Álcool 2a
c. (%)
Lactona 3a
c. (%)
Álcool 2b
c. (%)
Lactona 3b
c. (%)
1
T. versicolor CCB 202
41
b
- 79
d
-
2
T. rigida CCB 285
64
c
- -
d
-
3
I. lacteus CCB 196
57
d
- 85
d
-
4
P. sanguineos CCB 501
34
a
- 75
a
-
c: conversão determinada por análise cromatográfica; Tempo de reação: a=24h, b=72h, c=120h, d=168h
Para fins comparativos, foram mantidas as mesmas condições utilizadas para
as transformações das cetonas
1a e 1b, trocando apenas as cetonas pelos os sulfetos
10a e 10b. Os resultados estão apresentados na Tabela II.17.
84
(a) Shin, K. S.; Lee, Y. J. Arch Biochem. Biophys. 2000, 384, 109. (b) Tanaka, H.; Itakura, S.; Enoki, A. J. Biotechnol. 1999, 75, 57. (c)
Yaver, D. S.; Golightly E. J. Gene 1996, 181, 95.
1a
2a
3a
fungos
OH
O
O
O
1b 2b 3b
OH
O
O
O
fungos
Tabela II.17: Biotransformação dos sulfetos 10a e 10b promovida por Basidiomicetos.
Linha Microrganismo 10a 10b
Sulfóxido 11a
c. (%)
Sulfona 12a
c. (%)
Sulfóxido 11b
c. (%)
Sulfona 12b
c. (%)
1
T. versicolor CCB 202
75
b
5 92
a
3
2
T. rigida CCB 285
93
d
7 97
d
-
3
I. lacteus CCB 196
91
b
9 93
b
4
4
P. sanguineos CCB 501
81
c
16 94
c
5
c: conversão determinada por análise cromatográfica; Tempo de reação: a=24h, b=72h, c=120h, d=168h
Como pode ser observado na Tabela II.16, nas condições experimentais
empregadas, nenhum dos quatro Basidiomicetos foi capaz de promover a reação de
Baeyer-Villiger, indicando que estes fungos não possuem as mono-oxigenases
requeridas para este tipo de reação. Por outro lado, foram extremamente eficientes na
oxidação de sulfetos (Tabela II.17). A análise desses dados permite concluir que as
enzimas presentes nos metabolismos destes fungos apresentam, em moléculas
isoladas, seletividade para a oxidação de sulfetos. Estes resultados podem apresentar
um falso positivo, pois a intenção é avaliar a oxidação seletiva dos grupos funcionais
presentes em uma única molécula. Então, antes de sintetizar modelos para o estudo
de moléculas bi-funcionalizadas, foi feita uma análise da interferência na
biotransformação um grupo funcional na presença de outro (grupos sulfeto e carbonila
de cetonas cíclicas). Para isso, em um mesmo frasco reacional (procedimento
III.3.6,
Parte experimental), foi aplicada uma mistura dos substratos
1b e 10a (1:1) frente aos
microrganismos apresentados na Tabela II.18.
S
O
O
12a11a10a
S
O
fungos
S
S
O
O
12b11b10b
S
O
fungos
S
2b 3b
OH
O
O
fungos
1b
O
S
O
O
12a11a
10a
S
O
S
Tabela II.18: Biotransformação dos substratos 1b e 10a.
Linha Microrganismo T (h)
Álcool 2b
c.
a
(%)
Lactona 3b
c.
a
(%)
Sulfóxido 11a
c.
a
(%)
Sulfona 12a
c.
a
(%)
1
24 82 - 74 7
2 T. versicolor CCB 202 96 77 - 90 10
3 144 78 - 81 16
4 24 68 - 60 3
5 P. sanguineos CCB 501 96 56 - 45 11
6 144 44 - 21 27
7 24 71 - 32 61
8 T. frygossum CCB 203 96 69 - 42 58
9 144 70 - 38 62
10 24 36 64 16 84
11 A. terreus CCT 3571 96 24 76 9 91
12 144 24 76 10 90
13 24 100 - 14 86
14 A. terreus CCT 3320 96 100 - 12 88
15 144 100 - 8 92
a
c: conversão determinada por análise cromatográfica
Quando comparados os dados experimentais das Tabelas II.16, II.17 e II.18,
pode-se observar que a mistura dos substratos promoveu uma alteração considerável
nas transformações promovidas pelos Basidiomicetos.
Por exemplo, quando a
biotransformação da cetona
1b foi promovida pelo T. versicolor CCB 202, obteve-se o
álcool correspondente
2b com conversão de 41% (72 horas de reação; Tabela II.16,
linha 1). Usando o mesmo biocatalisador e misturando os substratos
1b e 10a, o álcool
2b foi obtido com rendimento cromatográfico de 77% (96 horas de reação; Tabela
II.18, linha 2). Um comportamento interessante pode ser observado quando o fungo
P.
sanguineos CCB 501 foi utilizado como fonte enzimática. Quando misturados os
substratos (24 horas de reação), houve um incremento na produção do álcool
2b de
100% frente à transformação da cetona
1b isolada (Tabela II.16, linha 4 e Tabela 18
linha 4).
A oxidação do sulfeto
10a pelo T. versicolor CCB 202 seguiu um
comportamento semelhante para ambos experimentos (Tabela II.17, linhas 1 e Tabela
II.18, linha 2). Quando utilizado o fungo
P. sanguineos CCB 501, a oxidação do sulfeto
10a foi afetada de forma significante quando a cetona 1b está presente no meio
reacional. Pode ser observado na Tabela II.17 (linha 4) que a oxidação do sulfeto
10a
foi lenta, atingindo um nível satisfatório de oxidação (
11a, conversão de 81%) em 120
horas. Com 96 horas de reação (Tabela II.18, linha 5), o mesmo sulfeto agora sofrendo
a influência da cetona
1b foi convertido ao sulfóxido correspondente 11a com
rendimento cromatográfico de 45%. Ao invés de ocorrer um incremento no rendimento
com o passar do tempo, há uma queda considerável de rendimento, pois o sulfóxido foi
oxidado a sulfona (Tabela II.18, linhas 5 e 6).
Foram utilizadas duas linhagens de
Aspergillus para avaliar a influência de um
grupo funcional na transformação de outro. Conforme já havia sido dito, as mono-
oxigenases presentes nas linhagens dos
Aspergillus estudadas são capazes de
promover reações de Baeyer-Villiger assim como oxidação de sulfetos (Tabela II.18,
linhas 10-15). Quando o
A. terreus CCB 3571 foi utilizado, a oxidação do grupo
carbonila foi muito eficiente frente à redução competitiva (Tabela II.18, linhas 10-12). É
interessante notar que a atividade da oxidase foi tão alta que a sulfona
11a foi o
produto majoritário da oxidação do sulfeto
10a. No caso do A. terreus CCT 3320 a
reação de Baeyer-Villiger não ocorre, apesar da oxidação do sulfeto ser extremamente
efetiva, pois se obtém prioritariamente a sulfona
12a (Tabela II.18, linhas 13-15). O
fungo
A. terreus CCT 3320 promoveu exclusivamente a oxidação do sulfeto 10a
(Tabela II.18, linhas 13-15). Apesar de ser um produto esperado, a lactona 3b não foi
detectada.
A análise dos dados deixou claro que mudando alguma variável reacional, o
comportamento do sistema enzimático pode sofrer alterações. Sendo assim, conclui-se
que nas condições experimentais empregadas, os Basidiomicetos
não apresentaram
atividade das enzimas mono-oxigenases (CHMO e CPMO). Essa afirmação é feita
porque não foi detectado o produto da reação de Baeyer-Villiger.
II.3.2 – Síntese das moléculas bi-funcionalizadas
Idealmente uma molécula modelo de um estudo biocatalítico deve ser
disponível comercialmente ou então deve ter uma rota sintética acessível. Nos estudos
preliminares de avaliação do potencial enzimático dos fungos foram utilizados
substratos modelos que eram disponíveis comercialmente. O grande desafio deste
trabalho não foi somente a busca por enzimas com potencial quimiosseletivo para a
2019
181716
15
14
13
O
SPh
O
SePh
O
SePh
O
SPh
SePh
O
SPh
O
O
SePh
O
SPh
oxidação de sulfetos, mas também a síntese de uma classe de moléculas que
contenham em seu esqueleto básico o grupo carbonila e o grupo sulfeto. As diferenças
estruturais contidas nas moléculas permitem uma análise mais detalhada do
comportamento biocatalítico de cada fungo. Inserindo-se na linha de pesquisa de
nosso laboratório, também foram preparados selenetos análogos aos sulfetos, visando
reunir dados que poderão ser úteis para futuras aplicações sintéticas. As moléculas
preparadas para este estudo são apresentadas na Figura II.9.
Figura II.9: Substratos selecionados para síntese e biotransformação.
Para explorar a influência das diferenças estruturais dos substratos nas
transformações, uma série de moléculas bi-funcionalizadas (Figura II.9) foi sintetizada
mantendo uma lógica para fins comparativos. Os grupos sulfeto e seleneto distanciam-
se do grupo carbonila nas séries
13-15 e 16-18. O substrato 16 possui uma cetona
cíclica de seis carbonos no seu esqueleto, enquanto que a cetona cíclica do substrato
19 tem cinco carbonos. Aparentemente fora da série, o substrato 20 foi sintetizado
para outro fim e aproveitado neste estudo por apresentar características interessantes.
Esse substrato é o único que tem substituiçãona posição
β ao grupo carbonila e uma
insaturação. Todos os substratos foram preparados conforme procedimentos descritos
na literatura, cada qual detalhado no capítulo
Parte Experimental.
27a; n=3, 59%
27b; n=6, 70%
R= Me, Et
n= 3, 6
O
OR
O
(CH
2
)
n
Br
(CH
2
)
n
Br
Br
O
OR
O
K
2
CO
3
O
OR
O
24 25
26
R= Me, Et
27
21 22
23
75%
O
SPh
PhSH
K
2
CO
3
PhS
O
Cl
13
O substrato (13) foi preparado a partir da reação da 2-cloro-cicloexanona (23)
com o ânion tiofenolato (
22), conforme procedimento III.1.27 (Parte experimental).
Esquema II.12: Síntese da 2-(feniltio)cicloexanona (13).
Os substratos 14, 15, 17 e 18 foram preparados partindo do ceto-éster (24), que
sofreu abstração do hidrogênio
α a carbonila. O seu enolato estabilizado (25) reagiu
com o di-bromo adequado (
26), levando aos intermediários 27a e 27b, conforme os
procedimentos
III.1.23 e III.1.24 (Parte experimental).
Esquema II.13: Síntese dos brometos (27).
Os substratos (
14 e 15) foram preparados a partir da reação dos brometos (27a
e 27b) com o ânion tiofenolato (22). Os compostos 28a e 28b foram purificados e
descarboxilados, levando aos substratos
14 e 15; conforme os procedimentos III.1.26 e
III.1.27 (Parte experimental).
Esquema II.14: Síntese da 2-[3-(feniltio)propil]cicloexanona (14) e da 2-[6-
(feniltio)hexil]cicloexanona (
15).
27
22
28
O
OR
O
(CH
2
)
n
Br
PhS
O
OR
O
(CH
2
)
n
SPh
2,6-lutidina, LiI
refluxo
O
(CH
2
)n
SPh
n=3, 71%
n=6, 78%
n= 3, 6
R= Me, Et
R= Me, Et
14, n=3 (43%)
15, n=6 (41%)
32, n=1
33, n=2
(CH
2
)
n
O
SePh
PhSeBr
(CH
2
)
n
O
LDA
(CH
2
)
n
O
34, n=1
35, n=2
36
19, n=1 (52%)
16, n=2 (48%)
A síntese dos selenetos seguiu um procedimento semelhante ao descrito acima.
Inicialmente foi preparado o selenolato de fenila (
30) a partir da reação do PhSeSePh
(
29) com NaBH
4
. Assim como o tiofenolato, o ânion selenolato reagiu com os brometos
(
27a e 27b). Os produtos foram purificados descarboxilados, levando aos substratos
17 e 18; conforme os procedimentos III.1.28 e III.1.29 (Parte experimental).
Esquema II.15: Síntese da 2-[3-(fenilseleno)propil]cicloexanona (17) e da 2-[6-
(fenilseleno)hexil]cicloexanona (
18).
Os selenetos
19 e 16 foram preparados a partir dos enolatos de lítio da
ciclopentanona (
32) e da cicloexanona (33), respectivamente. Os enolatos (34 e 35)
reagiram com o brometo de fenilselenila (
36), preparado em outro frasco reacional;
conforme os procedimentos
III.1.30 e III.1.31 (Parte experimental).
Esquema II.16: Síntese da 2-(fenilseleno)ciclopentanona (19) e da 2-
(fenilseleno)cicloexanona (
16).
PhSeB(OEt)
3
Na
PhSeSePh
NaBH
4
EtOH
n= 3, 6
R= Me, Et
O
OR
O
(C H
2
)
n
Br
O
(CH
2
)n
SePh
2,6-lutidina, LiI
refluxo
O
OR
O
(CH
2
)
n
SePh
29
30
31
27
31a; n=3, 48%
31b; n=6, 76%
R= Me, Et
17, n=3 (36%)
18, n=6 (39%)
2
14
O
SPh
SPh
O
O
O
SPh
O
O
SPh
O
O
OH
SPh
BVMO´s
redutases
desidrogenases
BVMO´s
peroxidases
lacases
dioxigenases
II.3.3 - Transformações biológicas das moléculas bi-funcionalizadas
Buscando a união da síntese orgânica e do conhecimento biocatalítico adquirido
ao longo dos estudos desenvolvidos, a aplicação dos microrganismos selecionados em
moléculas preparadas especialmente para este fim pode ser considerada a etapa que
fecha o elo entre os estudos desenvolvidos nesse trabalho.
No Esquema II.17 são apresentadas, a título de exemplo, as possíveis
transformações do substrato
14, quando aplicados os fungos utilizados neste trabalho.
Esquema II.17: Possíveis transformações do substrato 14.
Conforme resultados apresentados no
tópico II.3.1 (Tabela II.16), utilizando os
Basidiomicetos, é possível que ocorram duas transformações no substrato 14: Esses
microrganismos podem oxidar o grupo sulfeto e reduzir a carbonila. Sendo assim, para
cada substrato que contém o grupo sulfeto, existe a possibilidade da obtenção de seis
diferentes produtos. No caso dos selenetos, o número de produtos é reduzido para
quatro, já que o átomo de selênio nos substratos
14 e 15 pode sofrer uma eliminação
oxidativa (tópico
II.3.3.1).
O objetivo principal desse estudo foi verificar se as enzimas presentes no
metabolismo dos
Basidiomicetos eram quimiosseletivas para a oxidação de sulfetos,
para isso foram selecionados os fungos
Trichaptum byssogenum CCB 203 e
Pycnoporus sanguineus CCB 501. Visto que o acompanhamento das transformações
seria muito complexo, buscamos um método analítico rápido e eficiente para avaliar as
transformações. Somando a necessidade de otimizar a velocidade das análises,
minimizar tempo e os custos relativos a preparação de todos os possíveis produtos e
por estar disponível em nosso laboratório, a cromatografia gasosa acoplada a
espectrometria de massa (CG-EM) foi considerada a técnica mais adequada para este
fim.
O mesmo procedimento experimental utilizado no
tópico II.3.1 foi adotado para
efetuar as reações usando fungos. Foram retiradas alíquotas de 48, 96, 144 horas e
estas analisadas por CG-EM, utilizando o método 5 (procedimento
III.1.1, Parte
Experimental). Para facilitar a discussão dos resultados, estes serão divididos em
blocos. Nos blocos estarão contidos os substratos que apresentam semelhanças
estruturais. Os fungos serão tratados apenas pelas siglas CCB 203 e CCB 501 e para
cada alíquota é identificado o método de análise cromatográfica que foi utilizado. Os
detalhes de cada método são apresentados no tópico
III.1.1 (Parte experimental).
II.3.3.1 – Selenetos 17 e 18
De todas as reações de compostos de selênio, a eliminação oxidativa é uma
das mais conhecidas. Nesta reação o átomo de selênio é oxidado a selenóxido e
devido à instabilidade dessa espécie, ocorre uma eliminação
syn. Tomando como
exemplo a oxidação do seleneto
17 (Esquema II.18), o selenóxido 17i não foi isolado.
No entanto, o alceno
17b serviu como indício de que ocorreu a oxidação do átomo de
selênio.
Esquema II.18: Eliminação oxidativa do seleneto no substrato 17.
Os resultados obtidos nas transformações destes dois substratos mostraram
que além de oxidar sulfetos, os fungos CCB 203 e CCB 501 possuem enzimas
capazes de oxidar selenetos.
Transformação da 2-[3-(fenilseleno)propil]cicloexanona (17).
Para comprovar a pureza do substrato 17 e determinar sua fragmentação por
espectrometria de massa, foi feita uma análise de CG-EM (Figura II.10).
17i
SePh
O
17
[O]
SePh
O
OH
PhSeOH
O
17b
50 75 100 125 150 175 200 225 250 275 300
0
5000
10000
15000
20000
25000
30000
139
41
55
69
77
93
157
140
121
296
109
292183
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0 32.5 35.0
100e3
200e3
TIC
6.408
19.817
m/z 296
17
O
PhSe
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0
500e3
1000e3
1500e3
2000e3TIC
20.042
Figura II.10: Cromatograma e espectro de massa do substrato 17 (método 5).
Os fungos CCB 203 e CCB 501 consumiram rapidamente o substrato 17, pois
na alíquota referente à 48 horas de reação, nenhum traço do material de partida foi
detectado. Nessas alíquotas (dos dois fungos), foi detectada a presença do álcool
17a
(t
R
=19,8) e do produto relativo a oxidação do seleneto 17b (t
R
= 6,40), conforme Figura
II.11. Para ambos os fungos, a partir da alíquota de 96 horas de reação o produto
17b
não foi detectado.
Figura II.11: Cromatograma e espectro de massa da reação (48 horas), utilizando o
fungo CCB 501 (método 5).
17 (M
+
)
HSePh
m/z158
OH
m/z 139
OH
SePh
17a
m
/
z
298
m
/
z
138
O
17b
m
/
z
138
O
17b
OH
SePh
17a
m
/
z
298
m
/
z
81
HSePh
m/z 158
No caso do CCB 501, os dois produtos apresentam-se com uma proporção
55:45 (
17a:17b), indicando uma forte competição das enzimas pelo substrato. Quando
utilizado o CCB 203 a proporção foi de 84:16 (
17a:17b), mostrando que a atividade da
enzima que promove a oxidação do selênio é muito mais lenta que a atividade das
álcool desidrogenases presentes no sistema enzimático desse fungo.
A primeira vista, não foi fácil determinar que ocorreu a transformação do
substrato
17 no produto 17a. Os tempos de retenção do produto 17a e do substrato 17
são praticamente os mesmos (
t
R
= 19,8 e 20,0). A pequena estabilidade dos íons
moleculares (M
+
) também não permite que se possa confirmar a redução da carbonila.
No entanto, quando comparados os espectros de massa do produto
17a e do
substrato
17, nota-se um íon de m/z = 81 no espectro de 17a que não existe no
espectro do substrato
17 (Figura II.12).
Figura II.12: Espectros de massa do substrato 17 e do álcool derivado 17a.
O íon base do espectro de massa do álcool
17a é o de m/z = 81, indicando que
a fragmentação que gera este íon é altamente favorecida. Fazendo a clivagem do
produto
17a (Esquema II.19), verifica-se que o íon de m/z = 81 é oriundo da
fragmentação iniciada pelo sítio radicalar hidroxila. Sendo assim, este íon deve ser
proveniente do álcool
17a.
Esquema II.19: Fragmentação do produto 17a, levando a formação do íon de m/z = 81.
OH
SePh
17a
MM 298
g
mol
-1
MM 296 g mol
-1
17
O
SePh
m
/
z
81
OH
m/z 139
HSePh
m/z 158
17a
O
SePh
H
IE
H
2
O
SePh
m/z = 81
O
SePh
H
H
O
SePh
H
2
H
SePh
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5
500e3
1000e3
1500e3
2000e3TIC
23.258
50 75 100 125 150 175 200 225 250 275 300 325 350
0
25000
50000
75000
100000
125000
5541
83
69
95
111
338
158
121
240
181
334135
153
236
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0 32.5
250e3
500e3
750e3
1000e3
1250e3
TIC
10.950
23.175
5 10 15 20 25 30 35 40
50e3
100e3
150e3
200e3
TIC
10.908
Transformação da 2-[6-(fenilseleno)hexil]cicloexanona (18).
Para comprovar a pureza do substrato 18 e determinar sua fragmentação por
espectrometria de massa, foi feita uma análise de CG-EM (Figura II.13).
Figura II.13: Cromatograma e espectro de massa do substrato 18 (método 5).
Apesar de semelhantes, os substratos
17 e 18 apresentaram comportamentos
diferentes quando submetidos aos fungos CCB 203 e CCB 501. O cromatograma da
alíquota de 48 horas de reação do substrato
18 com o fungo CCB 203 (Figura II.14i)
contém apenas um sinal referente à transformação do substrato
18. Nenhum traço do
substrato
18 foi detectado. Isso indica que a enzima que promove a oxidação do
seleneto foi extremamente eficiente na transformação do substrato
18. Quando foi
utilizado o fungo CCB 501, na alíquota de 48 horas de reação, ainda foi detectada a
presença do substrato
18 (t
R
= 23,1; Figura II.14ii).
Figura II.14: Cromatogramas e espectros de massa das reações (48 horas), utilizando
os fungos CCB 203 (
i) e CCB 501 (ii) – método 5.
iii
18 (M
+
)
m/z 338
O
PhSe
18
m/z 83
HSePh
m/z158
O
18b
m/z 180
O
18b
m/z 180
18
O
SePh
m/z 338
m/z 83
HSePh
m/z158
m/z 83
OH
m/z 98
m/z 338
O
PhSe
18
O
18b
m/z 180
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0
0e3
500e3
1000e3
1500e3
2000e3
2500e3
TIC
10.933
22.517
24.100
Passadas 144 horas de reação com o fungo CCB 501, observa-se que uma
parte do substrato foi oxidada (alceno
18b; t
R
=10,9). Nessa alíquota foi detectado o
produto que apresenta o íon com
m/z = 81 (álcool 18a, t
R
= 24,1). Uma pequena
quantidade do substrato
18 ainda permaneceu intacto no meio reacional (Figura II.15).
Esse resultado demonstra que os fungos CCB 203 e CCB 501 possuem sistemas
enzimáticos significativamente diferentes.
Figura II.15:
Cromatograma e espectro de massa da reação (144 horas), utilizando o
fungo CCB 501 (método 5).
Como pode ser observado nos cromatogramas (Figuras II.14 e II.15), as álcool
desidrogenases presentes nos sistemas enzimáticos dos fungos CCB 203 e 501 não
foram eficazes na redução da carbonila do substrato
18, visto que o sinal do álcool 18a
somente foi detectado na alíquota de 144 horas de reação. Vale ressaltar que essas
enzimas reduziram a carbonila do substrato
17 logo nas primeiras 48 horas de reação.
Levando em consideração o aspecto qualitativo do método analítico utilizado, foi
possível avaliar a velocidade de consumo do substrato e verificar quais enzimas estão
agindo no tempo reacional determinado pela coleta da alíquota, utilizando para isso os
espectros de massas das alíquotas. As análises não foram utilizadas para fins
quantitativos.
m/z 180
O
18b
m/z 338
O
PhSe
18
m/z 340
OH
SePh
18a
m/z 83
OH
m/z 98
O
18b
m/z 180
18a
m/z 340
OH
SePh
m
/
z
81
CH
2
SePh
m/z 171
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0
0e3
250e3
500e3
750e3
1000e3
1250e3
TIC
16.092
50 75 100 125 150 175 200 225 250
0
2500
5000
7500
10000
12500
15000
17500
41
69
254
158
78
97
55
129
116
173
210145 183
195
Em relação aos fungos utilizados como fontes enzimáticas, pode-se observar
que os 3 grupos metileno que diferenciam os substratos
17 e 18 foram suficientes para
que as transformações ocorressem de forma diversa. Quando empregado o fungo
CCB 203, este promoveu em 48 horas a completa oxidação do grupo seleneto do
substrato
18. No mesmo tempo de reação, todo o substrato 17 sofreu transformações
competitivas, levando a uma mistura do produto de oxidação do grupo seleneto (45%)
com o produto de redução da carbonila (55%). Quando empregado o fungo CCB 501,
o consumo do substrato
18 não foi completo: o sinal referente ao substrato 18 foi
detectado em todas as alíquotas (48, 96 e 144 horas de reação). Contrariamente,
quando o substrato
17 foi submetido ao fungo CCB 501, passadas 48 horas de reação,
nenhum traço do material de partida foi detectado no meio reacional.
Apesar das semelhanças estruturais dos substratos
17 e 18, conclui-se que as
enzimas presentes nos metabolismos dos fungos foram altamente específicas frente
às diferenças estruturais das moléculas.
II.3.3.2 – Selenetos 16 e 19
Os resultados apontam que o grupo seleneto, estando ligado ao carbono
α ao grupo
carbonila, não sofre oxidação quando submetido aos fungos CCB 203 e o CCB 501.
Transformação da 2-(fenilseleno)cicloexanona (16).
Para comprovar a pureza do substrato 16 e determinar sua fragmentação por
espectrometria de massa, foi feita uma análise de CG-EM (Figura II.16).
Figura II.16:
Cromatograma e espectro de massa do substrato 16 (método 5).
HSePh
m/z158
m/z 254
O
SePh
16
16 (M
+
)
O
m/z 97
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0
100e3
200e3
300e3
TIC
3.308
7.900
15.725
15.925
16.108
Quando o fungo CCB 501 foi utilizado como fonte enzimática para promover a
transformação do substrato
16, após 48 horas de reação, observou-se apenas a
redução do grupo carbonila, levando ao álcool
16a (t
R
= 15,7 e 15,9), com rendimento
cromatográfico de 82%, em relação aos 18% do substrato
16 que não foi consumido
(Figura II.17). De acordo com a biblioteca de espectros de massa (CLASS-500/Wiley),
os picos com
t
R
= 3,3 e com t
R
= 7,6 são respectivamente, a cicloexanona e o ácido
octanóico. Passadas 96 horas de reação, praticamente todo o substrato foi consumido.
Figura II.17:
Cromatograma e espectros de massa da reação (48 horas), utilizando o
fungo CCB 501 (método 5).
Um comportamento semelhante foi observado quando a biotransformação foi
promovida pelo fungo CCB 203. Com 48 horas de reação, praticamente todo o
substrato foi transformado no produto
16a. A diferença marcante entre os dois fungos
foi que depois de 144 horas o fungo CCB 203 promoveu a degradação de uma parte
do produto
16a, liberando no meio reacional PhSeSePh. Enquanto que a reação com o
fungo CCB 501, nas mesmas 144 horas, não foi detectada a presença do PhSeSePh.
OH
PhSe
16a
m/z 256
m/z 254
O
SePh
16
m/z 254
O
SePh
16
m/z 256
OH
SePh
16a
HSePh
m/z158
HSePh
m/z158
O
m/z 97
m/z = 81
Com base no íon molecular detectado (M
+
= 256) e na fragmentação do produto
16a (Esquema II.20), é proposto que os picos com t
R
= 15,7 e 15,9 sejam da mistura
diastereomérica do álcool
16a (Esquema II.22).
Esquema II.20: Fragmentação do produto 16a.
O íon base do espectro de massa do produto
16a é o de m/z = 81 (Figura II.16),
indicando que esta fragmentação é altamente favorecida. Essa constatação condiz com
a elevada estabilidade do cátion alílico, dada pela deslocalização da carga positiva nos
carbonos C1 e C3.
A confirmação da estrutura do produto
16a foi possível com seu isolamento e
com a análise dos dados espectroscópicos de RMN
1
H,
13
C e IV. Para isso, foram
preparados 10 frascos reacionais utilizando o fungo CCB 501 como fonte enzimática
(procedimento
III.3.7, Parte experimental). O produto 16a foi isolado com 45% de
rendimento (dados da caracterização do produto: tópico
III.2.1; Parte experimental).
No espectro de absorção na região do infravermelho (IV) do substrato
16
(Figura II.18i), observa-se a absorção característica de estiramento da ligação C=O de
cetona,
ν = 1701 cm
-1
, que não está presente no IV do produto 16a (Figura II.18ii).
Nesse espectro do produto
16a é bem visível a banda larga característica da ligação
OH em
ν = 3441 cm
-1
, indicando que ocorreu a redução do grupo carbonila.
i
OH
HSePh
m/z = 158 m/z = 81
OH
OH
SePh
H
IE
M
+
= 256
3
1
16a
OH
SePh
1
2
50 75 100 125 150 175 200 225
0
2500
5000
7500
10000
55
240
77
184
78
104
157
117
41
131
135
212169
Figura II.18: Espectros na região do IV do substrato 16 (i) e do álcool 16a (ii).
Corroborando na elucidação estrutural da molécula, o sinal em 207 ppm (C
0
)
que caracteriza a carbonila de uma cetona no espectro de RMN
13
C do álcool 16
(anexo 49) desaparece no espectro do produto 16a (anexo 55). Os dados
espectroscópicos do produto da reação biocatalisada (
16a) confirmam sua estrutura.
Esquema II.21: Mistura dos pares de enantiômeros do álcool 16a.
Transformação da 2-(fenilseleno)ciclopentanona (19).
Para comprovar a pureza do substrato 19 e determinar sua fragmentação por
espectrometria de massa, foi feita uma análise de CG-EM (Figura II.19).
Figura II.19: Cromatograma e espectro de massa do substrato 19 (método 5).
ii
2
1
OH
SePh
(1S,2R)-16a (1R,2S)-16a
OH
SePh
1
2
+
+
2
1
OH
SePh
(1R,2R)-16a(1S,2S)-16a
OH
SePh
1
2
enantiômeros
enantiômeros
+
mistura cis
mistura trans
O
SePh
19
m/z 240
m/z 184
CH
2
CHSePh
SePh
m/z 157
19 (M
+
)
50 75 100 125 150 175 200 225
0
1000
2000
3000
4000
5000
55
77
240
184
157
104
158
67
91
117
131
242
185
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0
0e3
100e3
200e3
300e3
400e3
TIC
16.783
19.775
Após 48 horas de reação com o fungo CCB 501, pode-se observar que o
substrato
19 sofreu algum tipo de transformação, mas a identificação dos produtos foi
dificultada porque diversos produtos com tempos de retenção muito próximos se
sobrepuseram. A solução foi utilizar um outro método cromatográfico (
método 4,
procedimento
III.1.1, Parte Experimental) com uma rampa de aquecimento mais lenta,
sendo possível então determinar a presença do álcool
19a (t
R
= 16,6 e 16,7; Figura
II.20i). Uma quantidade considerável do substrato
19 não foi transformado. Nota-se
também que o fungo CCB 501 degrada as moléculas que possuem –SePh (o substrato
19 e o produto 19a), pois no cromatograma dessa alíquota também se pode verificar a
presença de uma quantidade considerável de PhSeSePh (
t
R
= 19,7). Também se
destaca o ácido octanóico (
t
R
= 10,3).
Quando utilizado o fungo CCB 203, observa-se que todo o substrato é
consumido, levando à apenas ao produto
19a, de forma seletiva, pois no
cromatograma (Figura II.20ii) aparece apenas o sinal com
t
R
= 16,7 que é referente a
um par de enatiômeros possíveis do álcool
19a (Esquema II.22).
Esquema II.22: Mistura dos pares de enantiômeros do álcool 19a.
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0
0e3
100e3
200e3
300e3
400e3
TIC
10.375
16.625
16.767
16.942
19.725
iii
mistura trans
mistura cis
+
enantiômeros
enantiômeros
2
1
OH
SePh
(1S,2S)-19a (1R,2R)-19a
OH
SePh
1
2
+
+
2
1
OH
SePh
(1R,2S)-19a(1S,2R)-19a
OH
SePh
1
2
19
O
SePh
m/z 240
PhSeSePh
m/z 314
19a
OH
SePh
m/z 242
PhSeSePh
m/z 314
m/z 242
19a
OH
SePh
m/z 240
19
O
SePh
m/z 184
CH
2
CHSePh
SePh
m/z 157
50 75 100 125 150 175 200 225 250 275 300 325
0
1000
2000
3000
4000
5000
77
157
51
314
65
234
232
117
50 75 100 125 150 175 200 225
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
67
78
158
55
156
242
91
240
Figura II.20:
Cromatograma e espectros de massa da reação (48 horas), utilizando o
fungo CCB 501(
i) e o CCB 203 (ii) – método 4.
Com base no íon molecular detectado (M
+
= 242) e na fragmentação do produto
19a (Esquema II.23), é proposto que o picos com t
R
= 16,6 e 16,7 sejam da mistura
isomérica do álcool
19a.
Esquema II.23: Fragmentação do produto 19a.
O íon base do espectro de massa do produto
19a é o de m/z = 67 (Figura II.20),
indicando que esta fragmentação é altamente favorecida. Essa constatação condiz com
a elevada estabilidade do cátion alílico, dada pela deslocalização da carga positiva nos
carbonos C1 e C3.
Para confirmar a estrutura do produto foram preparados 10 frascos reacionais
utilizando o fungo CCB 203 como fonte enzimática (procedimento
III.3.7, Parte
experimental). O produto
19a foi isolado com um rendimento baixo e essa molécula foi
caracterizada por RMN
1
H.
m/z 242
19a
OH
SePh
m/z 158
HSePh
m/z 67
PhSeSePh
m/z 314
M
+
= 242
OH
SePh
IE
OH
OH
SePh
H
OH
m/z = 158
HSePh
m/z = 67
19a
1
3
m/z 157
SePh
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0
0e3
500e3
1000e3
1500e3
2000e3
2500e3
TIC
15.425
50 75 100 125 150 175 200
0e3
10e3
20e3
30e3
40e3
50e3
60e3
70e3
80e3
110
206
41
69
162
55
91
96
135
129
149
178
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5
0e3
2500e3
5000e3
TIC
15.267
15.367
II.3.3.3 - Transformação da 2-(tiofenil)cicloexanona (13)
Para comprovar a pureza do substrato 13 e verificar sua fragmentação por
espectrometria de massa, foi feita uma análise de CG-EM (Figura II.21).
Figura II.21: Cromatograma e espectro de massa do substrato 13 (método 5).
Após 48 horas de reação, utilizando o fungo CCB 501 como fonte enzimática
(Figura II.22i), observou-se que praticamente todo o substrato foi transformado no
álcool
13a (94% de rendimento cromatográfico, t
R
= 15,2). Um comportamento
semelhante é observado quando se utiliza o fungo CCB 203 (Figura II.22ii).
Figura II.22: Cromatograma e espectros de massa da reação (48 horas), utilizando os
fungos CCB 501(
i) e CCB 203 (ii) – método 5.
m/z 206
13
O
PhS
HSPh
m/z 110
13 (M
+
)
m/z 206
O
SPh
13
13a
OH
SPh
m/z 208
HSPh
m/z 110
HSPh
m/z 110
O
m/z 97
m/z 81
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5
100e3
200e3
300e3
TIC
14.892
15.192
13
O
SPh
m/z 206
13
O
SPh
m/z 206
m/z 208
OH
PhS
13a
iii
m/z 208
OH
PhS
13a
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0
1.0e6
2.0e6
3.0e6
TIC
15.108
15.283
17.942
18.375
Na alíquota de 96 horas de reação, utilizando o fungo CCB 501, verificou-se
uma redução da área do pico do produto
13a (t
R
= 15,2) e um aumento da área do pico
referente ao substrato
13 (t
R
= 15,4), de acordo com a Figura II.23. Conforme relatado
anteriormente, com 48 horas de reação, o fungo CCB 501 havia transformado
praticamente todo o substrato
13 no produto 13a. Os picos de t
R
= 17,9 e t
R
= 18,3
foram destacados e suas estruturas são discutidas logo abaixo.
Figura II.23: Cromatograma e espectros de massa da reação (96 horas), utilizando o
fungo CCB 501 (método 5).
É proposto que o pico com
t
R
= 17,9 seja a 2-(fenilsulfinil)cicloexanona (13b). O
íon de maior intensidade desse espectro tem
m/z = 126, indicando que essa
fragmentação é favorecida energeticamente. O mecanismo de fragmentação proposto
no Esquema II.24 sustenta a afirmação de que ocorreu a oxidação do grupo sulfeto. A
pequena estabilidade do íon molecular do produto
13b (M
+
= 222) não permite que se
possa confirmar a redução da carbonila. Em contrapartida, não foi detectado no
espectro de massa de
13b o íon de m/z = 81, característico da fragmentação de um
derivado do cicloexanol (tópico
II.3.3.2, Esquema II.20). Isso sustenta a proposta de
que essa molécula não possui nenhum grupo hidroxila.
m/z 126
SPh
HO
HSPh
m/z 110
O
m/z 97
m/z 125
PhS O
m/z 81
13c
m/z 224
S
Ph
O
OH
O
S
Ph
O
m/z 222
13b
m/z 206
O
SPh
13
S
Ph
O
OH
13c
m/z 224
m/z 208
OH
PhS
13a
O
S
Ph
O
m/z 222
13b
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0
500e3
1000e3
1500e3
2000e3
TIC
14.933
15.217
17.858
18.342
Esquema II.24: Fragmentação do produto 13b.
É proposto que o pico com
t
R
= 18,3 seja o 2-(fenilsulfinil)cicloexanol (13c),
usando como base o espectro de massa e a fragmentação dessa molécula (Esquema
II.25). No espectro de massa de
13c pode-se observar que o íon de maior intensidade
tem
m/z = 81, indicando que essa fragmentação é favorecida energeticamente.
Conforme discutido previamente, esse íon é um cátion vinílico estabilizado por
ressonância.
Esquema II.25: Fragmentação do produto 13c.
O mesmo comportamento é observado na transformação promovida pelo fungo
CCB 203, após 96 horas de reação (Figura II.25).
Figura II.25:
Cromatograma e espectros de massa da reação (96 horas), utilizando o
fungo CCB 203 (método 5).
O
m/z = 126
IE
M
+
= 222
13b
O
S
Ph
O
O
S
Ph
O
H
SPh
HO
m/z = 109
SPh
HO
OH
SPh
O
13c
1
3
M
+
= 256
IE
OH
m/z = 81
OH
OH
S
O
Ph
PhS O
m/z = 125
m/z 206
O
SPh
13
S
Ph
O
OH
13c
m/z 224
m/z 208
OH
PhS
13a
O
S
Ph
O
m/z 222
13b
A confirmação da estrutura do produto 13a foi possível com o seu isolamento e
com a análise dos dados espectroscópicos de RMN
1
H,
13
C e IV. Para isso foram
preparados dez frascos reacionais (procedimento
III.3.7, Parte experimental). Foi
priorizado o isolamento do produto
13a, por isso a reação foi realizada utilizando o
fungo CCB 501 como fonte enzimática (48 horas de reação). O produto
13a foi isolado
com 75% de rendimento (dados da caracterização do produto: tópico
III.2.2; Parte
experimental).
No espectro de absorção na região do infravermelho (IV) do substrato
13
(Figura II.26i), observa-se a absorção característica de estiramento da ligação C=O de
cetona,
ν = 1708 cm
-1
, que não está presente no IV do produto 13a (Figura II.26ii).
Nesse espectro do produto
13a é bem visível a banda larga característica da ligação
OH em
ν = 3381 cm
-1
, indicando que ocorreu a redução do grupo carbonila.
Figura II.26: Espectros na região do IV do substrato 13 (i) e do álcool 13a (ii).
Corroborando na elucidação estrutural da molécula, o sinal em 207 ppm (C
0
)
que caracteriza a carbonila de uma cetona no espectro de RMN
13
C do álcool 13
(anexo 35) desaparece no espectro do produto 13a (anexo 59). Os dados
espectroscópicos da mistura isomérica do produto da reação biocatalisada (
13a)
confirmam sua estrutura.
ii
i
Esquema II.26: Mistura dos pares de enantiômeros do álcool 13a.
II.3.3.4 - Transformação da 3-[(2E)-3-(feniltio)prop-2-enil]cicloexanona (20).
Para comprovar a pureza do substrato 20 e determinar sua fragmentação por
espectrometria de massa, foi feita uma análise de CG-EM (Figura II.27).
Figura II.27: Cromatograma e espectro de massa do substrato 20 (método 5).
Diversos picos são observados nos cromatogramas da reação do substrato
20
com o fungo CCB 203, dificultando a interpretação dos resultados. Após 96 horas de
reação (Figura II.28), foi possível detectar a presença do substrato
20 e determinar a
massa de mais duas moléculas. De acordo com a biblioteca de espectros de massa
(CLASS-500/Wiley), o pico com
t
R
= 11,6 é o [(1E)-prop-1-enilsulfinil]benzeno e o pico
com
t
R
= 15,9 é o PhSSPh.
2
1
OH
SPh
(1S,2R)-13a (1R,2S)-13a
OH
SPh
1
2
+
+
2
1
OH
SPh
(1R,2R)-13a(1S,2S)-13a
OH
SPh
1
2
enantiômeros
enantiômeros
+
mistura cis
mistura trans
50 75 100 125 150 175 200 225 250
0e3
10e3
20e3
30e3
40e3
50e3
60e3
70e3
149
41
116
136
55
246
69
79
91
119
188
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5
250e3
500e3
750e3
TIC
19.758
O
PhS
m/z 246
20
(20) M
+
SPh
m/z 149
SPh
m/z 136
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0
0e3
500e3
1000e3
1500e3
2000e3
2500e3
TIC
11.508
15.900
18.750
O
SPh
m/z 246
20
PhSSPh
m/z 218
m/z 166
S
O
Figura II.28: Cromatograma e espectros de massa da reação (96 horas), utilizando o
fungo CCB 203.
Quando o fungo CCB 501 foi utilizado, apenas dois picos se destacaram no
cromatograma. Com 48 horas de reação, o substrato
20 (t
R
= 20,0) foi convertido em
um produto com
t
R
= 23,1 (Figura II.29). Essa molécula pode ser o produto da mono-
oxidação do grupo sulfeto do substrato
20 (sulfóxido 20a) ou então o produto da di-
oxidação do sulfeto do substrato
20 (sulfona 20b). Além disso, a presença do íon de
m/z = 81 no espectro de massa do produto com t
R
= 23,1 é um indício de que o fungo
também promoveu a redução da carbonila do substrato
20. As possíveis estruturas
desse produto são apresentadas no Esquema II.27.
Figura II.29: Cromatograma e espectros de massa da reação (48 horas), com o fungo
CCB 501.
5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0
2500e3
5000e3
7500e3
TIC
20.058
23.092
50 75 100 125 150 175 200 225 250
0e3
10e3
20e3
30e3
40e3
50e3
60e3
70e3
149
41
116
136
55
246
69
79
91
119
188
50 75 100 125 150 175 200 225 250
0
25000
50000
75000
100000
125000
150000
175000
200000
41
97
55
247
81
110
77
149
126
137
214
197
169
229
245 262
183
40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160 170
0e3
10e3
20e3
30e3
41
125
78
117
97
51
166
149137
50 75 100 125 150 175 200 225
0
2500
5000
7500
109
218
65
154
41
185
57
81
140
99
167
121 205
PhSSPh
m/z 218
S
m/z 109
m/z 125
PhS O
O
PhS
m/z 246
20
20a ou 20b
HSPh
m/z 110
HO
SPh
m/z 126
m/z 81
SPh
m/z 149
SPh
m/z 136
20a ou 20b
m/z 166
S
O
20
m/z 246
O
SPh
Esquema II.27: Possíveis estruturas do produto 20a e 20b.
A confirmação da estrutura do produto da biotransformação do substrato
20 foi
possível com o seu isolamento e com a análise dos dados espectroscópicos de RMN
1
H,
13
C e IV e espectro de massa de alta resolução. Para isso foram preparados dez
frascos reacionais (procedimento
III.3.7, Parte experimental). Foi utilizado o fungo CCB
501 como fonte enzimática (8 dias de reação). O produto foi isolado com 25% de
rendimento (dados da caracterização do produto: tópico
III.2.3; Parte experimental).
No espectro de massa de alta resolução foi detectado o íon molecular
protonado do produto (MH
+
265, anexo 65), comprovando que o fungo CCB 501
transformou o substrato
20 no produto 20a, isto é, promoveu a redução da carbonila e
a mono-oxidação do grupo sulfeto do substrato
20.
O espectro de IV apresentado na Figura 30i confirma a previsão baseada na
detecção do íon de
m/z = 81 do espectro de massa do produto 20a (Figura II.27). No
espectro de IV observa-se a banda larga característica da ligação OH em
ν = 3415 cm
-
1
(Figura II.28i), inexistente no espectro de IV do substrato 20. Já no IV do substrato 20
(Figura II.28ii), pode ser observada a absorção característica de estiramento da ligação
C=O de cetona,
ν = 1702 cm
-1
.
20a
m/z 264
OH
SPh
O
OH
SPh
O
O
m/z 280
20b
i
Figura II.30: Espectros na região do IV do álcool 20a (i) e do substrato 20 (ii).
No espectro de RMN
13
C do produto 20a (anexo 62) não se observa o sinal em
211 ppm (C
0
), presente no espectro de RMN
13
C do substrato 20 (anexo 52), que
caracteriza a carbonila de uma cetona. Com esses dados foi possível determinar a
estrutura do produto
20a.
II.3.3.5 – Sulfetos 14 e 15.
Os cromatogramas das transformações dos sulfetos 14 e 15 apresentaram
diversos picos, tornando muito difícil a análise das biotransformações. Avaliando as
alíquotas das reações por CCD, verificamos que seria possível isolar os produtos
majoritários das reações. Entretanto, quando tentamos purificar o bruto da reação
biocatalisada, não foi possível separar os produtos dos metabólitos dos fungos, devido
a elevada polaridade dos mesmos.
ii
II.4 – Conclusões
Utilizando diferentes substratos foi possível determinar a presença de diferentes
Baeyer-Villiger mono-oxigenases (BVMO’s) nos fungos estudados, as quais foram
capazes de oxidar cetonas cíclicas e cetonas aromáticas. Tendo como base os produtos
da transformação biológica desses substratos, foi também determinada a presença de
álcool desidrogenases nesses fungos. Assim como as BVMO’s, as álcool
desidrogenases também mostraram um comportamento assimétrico na transformação
dos substratos.
Inicialmente foi feita uma triagem de fungos do gênero
Aspergillus e dentre eles
dois fungos se destacaram:
A. terreus URM 3571 e o A. terreus SSP 1498.
Selecionados os melhores biocatalisadores, foram então preparados experimentos que
possibilitaram o isolamento e a caracterização dos produtos enantiomericamente
enriquecidos. O sistema enzimático do fungo
A. terreus URM 3571 transformou a 2-
metilcicloexanona (
1a) no (1S,2S)-2-metilcicloexanol (2a) com um e.e. de 88%. Já o
sistema enzimático do
A. terreus SSP 1498 transformou a 2- e a 4-metilcicloexanona
(
1a e 1b) nos isômeros (R) das lactonas 3a e 3b com bons excessos enantioméricos.
a
De acordo com Stewart et al. (2004),
27
atualmente os pesquisadores buscam
uma BVMO que transforme cetonas pró-quirais nos isômeros (
R) das lactonas
correspondentes. O
A. terreus SSP 1498 pode ser considerado um catalisador
assimétrico de grande validade, pois seu sistema enzimático foi capaz de converter
diferentes cetonas pró-quirais (
1a e 1b) nos isômeros (R) das lactonas
correspondentes.
Com a segunda parte do trabalho foi possível demonstrar que a alteração do
meio de cultura de crescimento dos fungos alterou as propriedades biocatalíticas
desses microrganismos, levando até a uma inversão na enantiopreferência da
biotransformação. Foi demonstrado também que os fungos
A. foetidus CCT 2683 e E.
nigrum SSP 1948 podem ser usados como catalisadores complementares, pois com
eles pode-se obter respectivamente os enantiômeros (
R) e (S) do 1-fenil-etanol com
bons excessos enantioméricos. Além disso, foi demonstrado que os efeitos
a
Andrade, L. H.; Keppler, A. F.; Schoenlein-Crusius, I. H.; Porto, A. L. M.; Comasseto J. V. Enzymatic
evaluation of different Aspergillus strains by biotransformation of cyclic ketones. Enzyme Microb. Tech.
2005, no prelo.
estereoeletrônicos que governam a reação de Baeyer-Villiger clássica são os mesmos
para as reações de Baeyer-Villiger enzimáticas.
b
A terceira e última parte do trabalho combinou o conhecimento biocatalítico
acumulado em nosso laboratório com a aplicação sintética dos biocatalisadores. Para
isso, sintetizamos oito exemplos de compostos bi-funcionalizados com grupos sulfeto,
seleneto e carbonila (cetona). Esses compostos foram transformados por dois fungos
selecionados por triagem: o
T. frygossum CCB 203 e o P. sanguineos CCB 501. Além
das análises das transformações por CG-EM, fizemos também experimentos que
possibilitaram o isolamento e a caracterização dos produtos das biotransformações. O
estudo dessas moléculas com dois sítios passíveis de sofrer biotransformações foi
apenas preliminar e trabalhos já em desenvolvimento em nosso laboratório visam
aprofundar a análise dos aspectos regio e enantiosseletivos dessas transformações.
d
Baseando-se em tudo que foi discutido, pode-se concluir com esse trabalho que
as enzimas presentes nos metabolismos desses fungos, particularmente, são muito
versáteis e quando selecionadas de forma adequada, oferecem um controle quimio e
enantiosseletivo das biotransformações. Também ficou claro que esses experimentos
não estão aprimorados para uma aplicação em grande escala, visto que o rendimento
dos produtos isolados não podem ser considerados adequados para esse fim. No
entanto, a utilização efetiva e cotidiana da biocatálise ainda é o grande desafio a ser
vencido. A compreensão das variáveis que afetam o comportamento das
biotransformações e a triagem de sistemas enzimáticos com elevado potencial
biocatalítico são as primeiras etapas para o desenvolvimento de uma tecnologia quiral
limpa e apropriada para processos industriais.
b
Andrade, L. H.; Keppler, A. F.; Schoenlein-Crusius, I. H.; Porto, A. L. M.; Comasseto J. V. Evaluation of
acetophenone monooxygenase and alcohol dehydrogenase activities in different fungal strains by
biotransformation of the acetophenone derivatives. J. Mol Catal. B: Enzimatic 2004, 31, 129.
d
Andrade, L. H.; Keppler, A. F.; Ricci, L. C.; Schoenlein-Crusius, I. H.; Porto, A. L. M.; Comasseto J. V.
manuscrito em preparação.
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