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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
INSTITUTO DE PSICOLOGIA
Francine Guerra de Luna
A (in) disciplina em oficina de jogos
São Paulo
2008
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FRANCINE GUERRA DE LUNA
A (in) disciplina em oficina de jogos
Dissertação apresentada ao Instituto de
Psicologia da Universidade de São
Paulo para obtenção do grau de Mestre
em Psicologia.
Área de concentração: Psicologia
Escolar e do Desenvolvimento Humano.
Orientador: Prof. Dr. Lino de Macedo
São Paulo
2008
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Francine Guerra de Luna
A (in) disciplina em oficina de jogos
Dissertação apresentada ao Instituto de
Psicologia da Universidade de São
Paulo para obtenção do grau de Mestre
em Psicologia.
Área de concentração: Psicologia
Escolar e do Desenvolvimento Humano.
Aprovada em:
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. _____________________________________________
Instituição:___________________Assinatura: _______________
Prof. Dr. _____________________________________________
Instituição:___________________Assinatura: _______________
Prof. Dr. _____________________________________________
Instituição:___________________Assinatura: _______________
Aos meus avós Dulce e João pelo exemplo de amor e sabedoria,
aos meus pais pelo apoio imprescindível,
ao meu marido pelo amor e companheirismo.
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Doutor Lino de Macedo por tudo que me ensinou neste anos, por todos
os desafios e situações-problema que me propôs, pelo incentivo, carinho, paciência,
dedicação, sabedoria e, especialmente, por ter sido meu mestre, compartilhando comigo tantos
momentos de confusão onde me orientava para a construção de uma disciplina.
Aos Doutores Osvaldo Luiz Ferraz e Yves de La Taille pelas críticas construtivas e
pelas sugestões feitas por ocasião do Exame de Qualificação.
Às lindas crianças que freqüentaram o LaPp neste período e me permitiram aprender a
respeito das ações de crianças em meio a risadas, brincadeiras, momentos de frustrações e
alegrias, dando vida a esse estudo.
Aos amigos, Alexandre L. Tashiro, Flávia C. S. Lobo e Liliane Felipim pelo incentivo
ao meu ingresso no mestrado.
Aos colegas do grupo de orientação, pela leitura e sugestões dadas nos diferentes
momentos de elaboração do trabalho.
À Heloísa Helena G. de O. Garcia pela leitura atenta e dedicada revisão deste trabalho.
Às companheiras de jornada da pós – graduação e eternas amigas Andréa Dias,
Camilla Schiavo Ritzmann, Cristiana Fiusa Carneiro e Elizabete V. Flory que estiveram
comigo nestes anos, refletindo desde a importância das concepções teóricas à necessidade de
mantermos nossas vidas saudáveis .
Às queridas colegas Ana Lúcia S. Petty, Márcia Z. T. Torres, Maria Célia R. M.
Campos e Norimar C. Passos que colaboraram com essa pesquisa compartilhando suas
experiências profissionais, enriquecendo nosso referencial de estudo. Em especial à Ana
Lúcia, pelos conselhos como “amiga – profissional”.
Às preciosas amigas Alessandra Carrascoza, Ana Carolina Manechini, Débora
Chabariberi, Luciana Nogueira da Cruz, Karina Maldonado, Rita Dias, Vanessa Maldonado
de Holanda, Viviane Rodrigues Granner (amiga e cunhada), dentre tantas outras que me
apoiaram, sempre dando palavras de incentivo, através de e-mails, telefonemas, abraços...
foram tantas amigas e tantas as demonstrações de carinho que seria impossível descrever
todas com precisão.
À minha maravilhosa família: mamãe, papai, irmã, avós, avôs, tios, tias, primos,
primas, todos, sem exceção, foram compreensivos, acolhedores, grandes incentivadores.
Ao lindo companheiro, Rodrigo, que escolhi para trilhar comigo esta e tantas outras
fases da minha existência. Não há palavras para agradecer a dedicação, a compreensão e os
gestos amorosos.
Aos prestativos funcionários da biblioteca do Instituto de Psicologia da USP que
sanaram minhas dúvidas referentes à formatação da Dissertação.
À CAPES pela bolsa de pesquisa que viabilizou mais tranqüilidade para a produção
deste trabalho.
À USP, aos colegas da secretária de pós-graduação do mesmo instituto, aos colegas de
do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade,
que ofereceram o apoio e condições para a realização do mestrado.
À organização Brahma Kumaris e ao Núcleo espírita Paulo de Tarso (Nept) que me
auxiliaram na meditação e conexão com Deus.
Quando nos relacionamos com algo desconhecido, ter disciplina é
uma das condições para sua elucidação, mas aceitar a confusão por
mais paradoxal que possa parecer, é, ao mesmo tempo, uma
condição. Daí a importância de um orientador, instrutor ou guia; de
alguém que nos sirva de referência, que suporte nossa confusão e
que nos possibilite, pouco a pouco, definir uma realização que torne
possível a realização de uma tarefa.
Lino de Macedo
RESUMO
LUNA , Francine Guerra de. A (in) disciplina em oficinas de jogos. 2008. 170 f. Dissertação
(Mestrado)- Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
A presente pesquisa pretendeu estudar a questão da indisciplina/disciplina em oficinas de
jogos, tendo como objetivo identificar ações de indisciplina em crianças nestes contextos. O
estudo foi feito no Laboratório de Psicopedagogia (LaPp), do Departamento de Psicologia da
Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade, do Instituto de Psicologia, da
Universidade de São Paulo. Foram observadas ao longo de um ano e meio (2005-2006), três
crianças: duas com 10 anos e uma, 11 anos. Caracterizamos do ponto de vista conceitual os
aspectos de disciplina (atenção / concentração, respeito e persistência) e indisciplina
(desatenção / dispersão, desrespeito, trapaça e desistência) tanto numa perspectiva teórica
como numa perspectiva prática (entrevistando profissionais deste Laboratório). Desta forma,
as observações relativas à indisciplina das crianças foram analisadas pelas categorias de:
desatenção/dispersão, desrespeito às regras dos jogos ou atividades, desrespeito às regras da
oficina, desrespeito aos colegas, trapaça e desistência. Como resultados, verificamos que as
atitudes mais observadas nos três sujeitos foram de desrespeito e a menos observada de
trapaça; em relação à freqüência das ações de indisciplina de cada criança, pudemos verificar
que dois dos sujeitos observados (C2 e C3) agiram com relativa indisciplina no primeiro
semestre, aumentaram as ações de indisciplina no segundo semestre e reduziram
drasticamente essas ações no terceiro semestre. C1 manteve praticamente a mesma quantidade
de ações indisciplinadas no primeiro e segundo semestre, mas também as reduziu
drasticamente no terceiro semestre. Ao final (terceiro semestre), as três crianças estavam mais
familiarizadas com o sistema de regras e, de uma maneira geral, passaram a atribuir valor ao
fato de triunfarem nas tarefas propostas, buscaram melhorar seus desempenhos e expandir a
si próprias (com valores positivos), e, conseqüentemente, agiram com menos indisciplina.
Discutimos que os jogos são excelentes meios para se observar o prejuízo das ações de
indisciplina. Consideramos estas ações negativas, porque dificultam a realização bem
sucedida das atividades pretendidas. Por fim, verificamos que as oficinas de jogos constituem
um espaço no qual, além de as crianças ampliarem seus recursos cognitivos, são
desenvolvidas atitudes favoráveis à aprendizagem, que requerem, dentre outros, o
desenvolvimento de ações de disciplina.
Palavras-chaves: disciplina; indisciplina; jogos; construtivismo; Piaget.
ABSTRACT
LUNA , Francine Guerra de. (In) Discipline in games workshops. 2008. 170 f. Dissertation
(Master degree) - Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
This research intended studying the indiscipline/discipline issue in games workshops, aiming
the identification of children’s indiscipline actions in those contexts. The study was carried
out at the Psycho-pedagogic Laboratory (Laboratório de Psicopedagogia (LaPp)), at the
Department of Learning Psychology and Personality Development, in the Institute of
Psychology at the University of Sao Paulo. Three children, two with 10 years old and one
with 11 years old, were observed along one and a half year (2005-2006). From the conceptual
point of view, the discipline aspects (attention/concentration, respect, and persistency), and
indiscipline (lack of attention/concentration, dispersion, disrespect, cheating, and quitting)
were characterized, both in a theoretical perspective and in a practical perspective
(interviewing the aforementioned laboratory’s professionals). This way, the observations
regarding the children’s indiscipline were analyzed according to the following categories:
attention deficit/dispersion, disrespect to the rules of the game or activity, disrespect to the
workshop’s rules, disrespect to colleagues, cheating, and quitting. As a result, we verified that
the attitude most often observed in the three subjects was disrespect and the least present
attitude was cheating; regarding the frequency of indiscipline actions in each child, we were
able to substantiate that two of the observed subjects (C2 e C3) acted with relative indiscipline
in the first semester, built up indiscipline actions in the second semester and drastically
lessened those actions at the third semester. C1 not only kept practically the same amount of
indiscipline actions in the first and second semesters, but also reduced them dramatically at
the third semester. At the end (third semester), the three children became familiarized with the
set of rules and, in general, seemed to value the fact that they were fulfilling the proposed
tasks, seeking to improve their performance and expand themselves (with positive values),
and, consequently, acting with less indiscipline. We point out that games are an excellent way
to observe the harm of indiscipline actions. We find these actions hindering, for they obstruct
the realization of successful intended activities. Last, we concluded that games workshops
constitute an opportunity for children to broaden their cognitive resources, developing
attitudes that foster learning, which also leads to the development of discipline actions, among
other favorable aspects.
Keywords: discipline; indiscipline; games; constructivism; Piaget.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1- Atividades realizadas no primeiro semestre de 2005.................................... 77
Quadro 2- Atividades realizadas no segundo semestre de 2005.................................... 78
Quadro 3- Atividades realizadas no primeiro semestre de 2006.................................... 79
Quadro 4- Ações indicadoras de desatenção.................................................................. 101
Quadro 5- Ações indicadoras de desrespeito ao colega................................................. 102
Quadro 6- Ações indicadoras de desrespeito ao jogo ou atividade proposta................. 103
Quadro 7- Ações indicadoras de trapaça........................................................................ 103
Quadro 8- Ações indicadoras de desrespeito às regras da oficina................................. 104
Quadro 9- Ações indicadoras de desistência.................................................................. 105
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- Ações de indisciplina de C1 ao longo das oficinas........................................ 105
Tabela 2- Ações de indisciplina de C2 ao longo das oficinas........................................ 105
Tabela 3- Ações de indisciplina de C3 ao longo das oficinas........................................ 106
LISTA DE FIGURAS
Figura 1- Feche a Caixa aberto...................................................................................... 135
Figura 2- Feche a Caixa 2 e 6........................................................................................ 135
Figura 3- Feche a Caixa 1 e 7........................................................................................ 135
Figura 4- Feche a Caixa 3 e 5........................................................................................ 136
Figura 5- Feche a Caixa 8.............................................................................................. 136
Figura 6- Jogo Imagem & Ação..................................................................................... 137
Figura 7- Exemplo de matriz do Qual é a Mensagem?.................................................. 139
Figura 8- Jogo Cara a Cara............................................................................................ 140
Figura 9- Tabuleiro do jogo Cara a Cara....................................................................... 140
Figura 10- Percurso Gigante.......................................................................................... 144
Figura 11- Dominó das Quatro Cores............................................................................ 145
Figura 12- Jogo Quarto.................................................................................................. 146
Figura 13- Tangran......................................................................................................... 148
SUMÁRIO
RESUMO...................................................................................................................... 7
ABSTRACT.................................................................................................................. 8
LISTA DE FIGURAS.................................................................................................. 9
LISTA DE QUADROS................................................................................................ 10
LISTA DE TABELAS................................................................................................. 11
INTRODUÇÃO............................................................................................................ 13
CAPÍTULO 1 – DISCIPLINA E INDISCIPLINA................................................... 21
1.1 DIFERENTES SABERES....................................................................................... 21
1.2 NOSSO RECORTE................................................................................................. 30
CAPÍTULO 2 – DISCIPLINA E JOGO.................................................................... 37
2.1 DEFINIÇÃO DE CONCEITOS: DISCIPLINA E INDISCIPLINA....................... 37
2.2 PIAGET E JOGO..................................................................................................... 43
2.3 MORAL E ÉTICA: DISCIPLINA EM SITUAÇÕES DE JOGO........................... 50
2.4 AFETIVIDADE NA TEORIA DE JEAN PIAGET................................................ 53
2.5 AS OFICINAS DE JOGOS..................................................................................... 57
2.5.1 Entrevistas........................................................................................................... 61
CAPÍTULO 3 – MÉTODO......................................................................................... 72
3.1 PARTICIPANTES................................................................................................... 72
3.2 LOCAL.................................................................................................................... 73
3.3 INSTRUMENTOS.................................................................................................. 74
3.4 PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS............................................... 74
3.4.1 Registros de observação ..................................................................................... 74
CAPÍTULO 4 – RESULTADOS................................................................................ 76
4.1 ATIVIDADES REALIZADAS AO LONGO DAS OFICINAS............................. 76
4.2 AÇÕES DE INDISCIPLINA DAS CRIANÇAS..................................................... 80
4.2.1 Desatenção/Dispersão......................................................................................... 80
4.2.2 Desistência............................................................................................................ 85
4.2.3 Desrespeito aos colegas....................................................................................... 87
4.2.4 Desrespeito às regras da oficina......................................................................... 91
4.2.5 Desrespeito às regras das atividades propostas................................................ 95
4.2.6 Trapaça................................................................................................................ 98
4.3 AÇÕES INDICADORAS DE CATEGORIAS DE INDISCIPLINA...................... 100
4.4 FREQÜÊNCIA DAS AÇÕES DE INDISCIPLINA 105
DISCUSSÃO................................................................................................................. 107
APÊNDICES................................................................................................................. 130
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 166
13
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa assume como tema aquilo que, em alguns momentos da minha vida,
chamou e ainda me chama a atenção: a questão da indisciplina/disciplina. Relatarei aqui um
desses momentos que se originou em mim como crise. Foi no quarto ano de Psicologia, em
2000, quando escolhi fazer estágio no Núcleo de Psicopedagogia. Eu e mais três colegas desse
núcleo deveríamos atender, cada um separadamente , um grupo de três crianças do atual
segundo ano do Ensino Fundamental de uma escola municipal – todas com queixas de
dificuldade de aprendizagem. Cada um dos meus colegas realmente recebeu, em seu grupo,
crianças apenas com queixas de dificuldades de aprendizagem; surpreendentemente, no meu
grupo, as crianças tinham queixas de “problemas de comportamento” – indisciplina. Quando
fui conversar com a professora e coordenadora sobre os motivos deste encaminhamento, elas
alegaram que, muitas vezes, eles atrapalhavam a aprendizagem de outros colegas e,
certamente, também prejudicavam o próprio aprendizado com suas atitudes. Senti que a
professora queria ver-se um pouco afastada desses três alunos, pois retirávamos as crianças da
sala de aula para realizar o atendimento.
Ficávamos eu e essas três crianças em uma sala reservada para nós, na escola, durante
90 minutos, duas vezes por semana. Eram três meninos lindos e muito agitados. Eles
brigavam entre si, às vezes brincando, às vezes brigando mesmo, de modo que, em muitos
momentos, presenciei cenas onde um realmente machucava o outro. Além disso, mostravam-
se bastante agitados, balançavam os pés e as mãos, corriam pela sala, demonstrando
dificuldade para permanecerem quietos.
Basicamente, o objetivo do estágio era que eu aprendesse a avaliar, intervir com jogos
e outras atividades gráficas, bem como reavaliar as crianças durante o período de um
semestre. Além de aplicar as provas de Conservação de Quantidade de Piaget – para avaliar o
14
desenvolvimento cognitivo – e a Prova de Realismo Nominal – para verificar em quais
momentos da leitura e escrita eles estavam –, também apliquei uma prova de
Desenvolvimento Moral, criada pelo meu supervisor de estágio. O que mais me intrigou é que
mesmo alcançadas evoluções cognitivas, as crianças agiam com indisciplina e agressividade
durante as sessões – principalmente nos momentos em que não toleravam a frustração de ter
perdido em um jogo, por exemplo. Ao final do estágio, ainda demonstravam comportamentos
de indisciplina na sala de aula, segundo relatava a professora.
Após um ano, fui à casa de cada uma dessas crianças e entrevistei as respectivas mães
sobre os aspectos cognitivos e “comportamentais” dos seus filhos. Segundo a visão delas, eles
se tornaram os “melhores alunos da escola” em termos cognitivos; entretanto, continuavam
indisciplinados.
Terminada minha graduação, busquei conhecer mais modalidades de intervenção
psicopedagógicas; achava que, talvez, o problema de a indisciplina ter permanecido naquelas
crianças tivesse sido conseqüência da intervenção que utilizei. Fiz uma especialização em
Psicopedagogia onde não encontrei respostas para a questão da indisciplina. Decidi, então,
estudar essa questão em profundidade dedicando-me ao mestrado. Escolhi investigá-la num
contexto onde jogos e outras atividades fossem propostos como instrumentos de intervenção.
O local de investigação foi o Laboratório de Psicopedagogia (LaPp) do Instituto de
Psicologia, integrante do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento
e da Personalidade, da USP
1
, que se pauta na perspectiva construtivista. O foco da minha
investigação foi analisar a questão da indisciplina/disciplina em oficinas de jogos.
Permiti-me apresentar brevemente algumas inquietações que marcaram minha
trajetória até aqui na primeira pessoa do singular, pois a considero uma maneira mais próxima
de referir minha história pessoal ao leitor. Entretanto, a partir de agora, dissertaremos sobre a
1
O Laboratório de Psicopedagogia em questão será mencionado, a partir de agora, apenas pela
sua sigla: LaPp.
15
pesquisa realizada e usaremos a primeira pessoa do plural (nós), conforme as exigências da
norma acadêmica. Desta forma, saímos de um conhecimento individual (eu) para um que será
construído coletivamente (nós), a partir dos diversos referenciais teóricos, observações,
entrevistas e em parceria com meu orientador.
Utilizamos o termo indisciplina/disciplina para nos referirmos à questão da disciplina
porque observamos crianças que, a princípio, apresentavam maior número de
comportamentos de indisciplina. A indisciplina foi o foco da nossa investigação e a disciplina
o plano de fundo almejado. Estes conceitos são complementares e interdependentes, pois
sempre que há confusão (indisciplina) a meta é organizar-se (disciplina) para a realização de
algo, ou seja, sempre que se constrói disciplina, antes foi necessário lidar com indisciplina.
A indisciplina/disciplina é um tema considerado importante para a aprendizagem
escolar, o mundo do trabalho e a vida em geral, mas por sua complexidade pode ser analisado
sob muitos aspectos, recortes teóricos ou empíricos. É também considerado um tema
fundamental para os participantes do LaPp, pois essa questão sempre esteve presente nas
oficinas: nas reflexões e intervenções dos profissionais, nas ações das crianças.
Escolhemos esse contexto também porque inferimos que a dimensão lúdica presente
nos jogos e outras atividades propostas nas oficinas despertam o interesse das crianças para
aprender em meio a regras. O modo de as crianças se relacionarem com as regras e com os
colegas são pontos de referência para observarmos e qualificarmos uma conduta como de
disciplina ou indisciplina.
O LaPp foi utilizado como contexto de investigação em diversas pesquisas e
publicações: Abreu, 1993; Macedo; Petty; Passos, 1997, 2000 e 2005a; Macedo, 1994, 1995,
1996, 1999, 2005b, 2006; Petty, 1995; Rabioglio, 1995; Wechler, 1995; Ribeiro, M. C. R.
1997; Carracedo, 1998; Magalhães, 1998; Queiroz, 2000; Allessandrini, 2000; Ribeiro, M. P
16
de O. 2001; Torres 2001; Bôas 2007 e 6 projetos de pesquisa de graduandos de Psicologia
(2006).
O primeiro livro escrito no contexto do LaPp foi intitulado Quatro Cores, Senha e
Dominó (MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997). Os capítulos descrevem os jogos
mencionados no título, sua história, as maneiras de jogar e discutem implicações
psicopedagógicas. Além disso, nos últimos três capítulos, Macedo escreve sobre os jogos e
sua importância na escola, tanto psicopedagógica quanto sociocultural.
No segundo livro, Aprender com jogos e situações - problema, os autores (MACEDO;
PETTY; PASSOS, 2000) apresentam seu modo de trabalhar com projetos de jogos, repensam
a educação em uma perspectiva piagetiana e analisam os jogos Quilles, Traverse, Sjoelbak,
Caravana, Resta Um, e Quarto.
O terceiro livro, Os jogos e o lúdico na aprendizagem escolar, (MACEDO; PETTY;
PASSOS, 2005a) aborda jogos como o Pega-Varetas (fatores que interferem na
aprendizagem); Conte um Conto e Continue a História (avaliação formativa e intervenção);
Tangran (da simplicidade do material à complexidade da reflexão); e Imagem & Ação, Qual é
a Mensagem? (interpretando procedimentos). Dessa forma, reflete sobre a importância do
lúdico – inclusive, do jogo – nos processos de desenvolvimento e aprendizagem escolar.
Além destes livros, o coordenador do laboratório (Prof. Dr. Lino de Macedo) sempre
se baseou nesse contexto (prático e teórico) para produzir vários escritos (MACEDO, 1994,
2000, 2005a, 2005b, 2006, dentre outros).
Alguns estudos que utilizaram o LaPp como contexto de investigação fazem
referências a aspectos atitudinais ou relacionam cognição e afetividade de crianças ou
adolescentes. Como Queiroz (2000), Torres (2001) e Macedo; Petty; Passos (2005a). Os
aspectos atitudinais desses estudos são similares ao interesse do nosso trabalho.
17
Logo na Introdução da tese de Queiroz (2000), ele relata uma experiência pessoal que
foi marco na gênese do seu interesse em pesquisar “cognição e afetividade”:
Tudo ia de mal a pior até o dia em que a minha avó, que foi professora
primária por toda a vida, atentou para o que acontecia e resolveu ensinar-me
os deveres de casa. Exatamente sobre esse ponto guardo uma forte
impressão de que, muito mais que a experiência profissional da minha avó-
professora, o cuidado afetivo dispensado por ela naqueles momentos de
crise propiciou o despertar do seu neto para a aprendizagem. Para falar
mesmo na nossa linguagem, um mundo de novas possibilidades se abriu no
contexto da escola. Como passe de mágica, sentia que me transformava
num dos melhores alunos da sala. Perdura a impressão genuína de que não
levava à escola uma dificuldade de aprendizagem baseada tão somente em
falta de estruturação cognitiva. (p. 13)
Queiroz acredita que afetividade e cognição não podem estar dissociadas nos
processos de aprendizagem. Para fundamentar essa crença, baseou-se em um curso da
Sorbonne, ministrado por Piaget em 1954, e na teoria da equilibração do mesmo autor,
utilizando o método clínico ao aplicar quatro modalidades do Jogo da Senha (três e quatro
sinais) em três estudantes de oito anos que apresentavam dificuldades de aprendizagem em
relação ao conteúdo programático geral da escola ou reiterações de comportamentos
inadequados. Ele busca, no segundo capítulo da tese, esclarecer, um pouco mais, as relações
entre afeto e cognição.
É assim, partindo de uma vivência pessoal aos sete anos, que Queiroz se inspira a
investigar a questão da afetividade em sua tese, através do estudo de três casos, por uma
análise microgenética – de observação das mudanças de comportamento quando a criança se
sente perturbada – e percebe que pouco pôde medir com objetividade a afetividade, mas muito
pôde qualificá-la na discussão de seus relatórios.
Torres (2001), realizou sua tese no contexto de oficinas de jogos para adolescentes,
desenvolvidas no LaPp. A inserção dos adolescentes – que freqüentavam o atual 6º ou 7º ano
do Ensino Fundamental da rede pública ou particular da cidade de São Paulo – no projeto de
oficinas aconteceu principalmente em virtude das queixas que os mesmos traziam sobre
dificuldades escolares. Por razões diversas, encontravam-se em situações de fracasso escolar.
18
Alguns deles não conseguiam se concentrar nas aulas ou permanecer atento a qualquer
explicação dada. Outros, ainda, recusavam-se a cumprir horários ou lições, eram
indisciplinados, não se interessavam pela escola nem revelavam qualquer envolvimento com
o aprender.
Essa autora parte da hipótese inicial de que a inserção destes alunos no projeto de
oficinas de jogos poderia proporcionar-lhes benefícios, promovendo o desenvolvimento de
aspectos cognitivos e favorecendo a construção de algumas competências e de atitudes mais
favoráveis à aprendizagem. A partir daí, traça alguns objetivos específicos para verificar essa
hipótese. Em relação à dimensão “atitudinal” (que é o foco de nossa pesquisa), ela pôde
avaliar, por meio dos diários que fez, os progressos dos sujeitos. Partindo das queixas
relatadas (dificuldades escolares), buscou interpretá-las à luz da questão do fracasso escolar.
Para isso, apoiou-se em extratos dos diários e discutiu como as relações com o saber e com a
aprendizagem foram se modificando ao longo do percurso das oficinas, possibilitando aos
alunos assumirem novas posições em suas salas de aula. Ao final, afirma que a participação
desses sujeitos no projeto de oficinas de jogos contribuiu favoravelmente para a evolução de
cada um deles.
Macedo; Petty; Passos (2005a) utilizaram o jogo Pega – Varetas para ilustrar que a
ação de jogar impõe autodisciplina: “controlar os movimentos que realiza ou controlar o
desejo de resgatar a vareta preta não significa bani-los, mas dominar impulsos, saber impor-se
um comando e conseguir adiar um desejo para conseguir melhores resultados” (p.31).
Apesar de consideramos que a questão da indisciplina/disciplina perpassa pelas
dimensões afetiva e atitudinal de processos de aprendizagem, os trabalhos supracitados não
respondem a questão de nosso estudo. Afinal, como a questão da indisciplina/disciplina pode
ser analisada em oficinas de jogos?
19
Assim, vemos que essa questão sempre esteve presente nas oficinas de jogos do LaPp
mas ainda não havia sido foco central dos estudos já produzidos. E foi nesse sentido que
buscamos contribuir com o presente trabalho.
Agora que situamos o leitor no local de investigação desse estudo, pretendemos
apresentar a maneira como esta dissertação foi subdividida.
No capítulo 1 mostramos diferentes olhares referentes à questão da
indisciplina/disciplina. Para tanto, apresentamos saberes sócio – históricos, psicológicos,
médicos (DDA -Déficit de Atenção ou DA/H- Déficit de Atenção e Hiperatividade) e morais
que perpassam, atualmente, o estudo desta questão. Ao final deste capítulo, discorremos sobre
a nossa concepção de indisciplina e disciplina: como podem ser observadas em oficinas de
jogos que têm como base teórica o construtivismo (piagetiano).
Exploramos, no Capítulo 2 a relação entre disciplina e jogo. Definimos os conceitos de
disciplina e indisciplina segundo a perspectiva que seguiremos na pesquisa. Descrevemos
como Piaget utilizou-se de jogos para investigar diferentes questões ao longo de suas obras.
Destacamos a importância dos conceitos de moral e ética em situações de jogo onde a questão
da indisciplina/ disciplina é o foco de investigação. Abordamos a relevância da afetividade na
teoria de Piaget. E, por fim, falamos sobre as oficinas de jogos do LaPp. No item sobre as
oficinas de jogos, incluímos entrevistas que foram realizadas com profissionais deste
laboratório para que pudéssemos construir um olhar sobre o que pensam profissionais que
trabalham com oficinas de jogos sobre uma referência para a questão da disciplina e
indisciplina pautada no pensamento e na prática destes profissionais.
No Capítulo 3 descrevemos a metodologia utilizada neste trabalho. Apresentamos os
instrumentos utilizados, os sujeitos que participaram desse estudo, as formas e procedimentos
20
de coleta de dados: observamos e registramos em diários escritos as ações de indisciplina de
três crianças ao longo de um ano e meio em oficinas de jogos.
No Capítulo 4 os resultados são expostos da seguinte maneira: construímos três
quadros referente as atividades realizadas ao longo dos três semestres com o intuito de
ilustrarmos o programa das oficinas; descrevemos as ações das crianças separadas por
categorias, através de uma narrativa e extratos dos registros de observação; apresentamos
quadros que ilustram e resumem as ações indicadoras de indisciplina nas crianças; enfim, com
o objetivo de mostrar ao leitor a freqüência das ações de cada criança, construímos quadros
das ações de indisciplina observadas em cada criança ao longo dos três semestres de oficina.
No capítulo referente à Discussão, apresentamos a pesquisa (escolha dos sujeitos,
local, objetivos); discutimos sobre algumas definições de indisciplina e os prejuízos destas
ações para as crianças (ilustramos com exemplos de jogos utilizados nas oficinas); refletimos
sobre jogo e indisciplina na escola, na ludoterapia, na Psicopedagogia; falamos sobre a
contribuição das entrevistas com as profissionais para o nosso trabalho; discutimos os
resultados (análise dos sentidos 1, 2 e 3 nas categorias -ações- de indisciplina, freqüência das
ações das crianças); expusemos algumas observações das ações de disciplina; retomamos a
questão da disciplina relacionada à vontade (afetividade), o respeito às regras: questão moral
e, enfim, falamos sobre a estrutura dos quatro momentos da oficina e os benefícios que as
oficinas do LaPp oferecem para a construção de ações de disciplina.
21
CAPÍTULO 1 – DISCIPLINA E INDISCIPLINA
1.1 Diferentes saberes
Neste primeiro capítulo faremos alguns apontamentos sobre os conceitos de disciplina
e indisciplina em diferentes perspectivas: sociológica, escolar, moral, médica, psicológica. No
final do capítulo, anunciaremos a teoria que servirá de base para nosso estudo.
Ao olharmos o significado da palavra disciplina no dicionário, verificamos os
seguintes significados:
1) ensino e educação que um discípulo recebia do mestre; 2) obediência às
regras e aos superiores; 3) regulamento sobre a conduta dos diversos
membros de uma coletividade, imposto ou aceito democraticamente, que
tem por finalidade o bem-estar dos membros e o bom andamento dos
trabalhos; 4) ordem, bom comportamento; 5) obediência a regras de cunho
interior, firmeza, constância; 6) castigo, penitência, mortificação; 7) ramo
do conhecimento, ciência, matéria (Dicionário Eletrônico Houaiss.
Disponível em: <http://www.dicionariohouaiss.com.br>. Acesso em: 03
maio 2006).
Cada época e cada cultura vêem a questão da disciplina a seu modo. Utilizamo-nos da
história para contextualizar a questão da disciplina em uma perspectiva sociológica (em
diferentes tempos).
No século XVIII, o corpo era objeto e alvo de poder. Assim, a disciplina era imposta
através do corpo: modelando-o, manipulando-o, treinando-o. Entretanto, Foucault
(1977/1984) adverte que não era a primeira vez que o corpo servia como objeto de
investimentos, pois em qualquer sociedade o corpo está preso no interior de relações de poder
intensas e diversas, que lhe impõem limitações, proibições. A diferença é que, naquele século,
a disciplina atinge um tipo e um grau de massificação nunca antes aplicada. Ela fabrica corpos
dóceis, submissos, altamente especializados e capazes de desempenhar inúmeras funções.
22
Não se trata de cuidar do corpo em massa, grosso modo, como se fosse uma
unidade indissociável, mas de trabalhá-lo detalhadamente; de exercer sobre
ele uma coerção sem folga, de mantê-lo ao nível mesmo da mecânica
(FOUCAULT ,1977/1984, p. 126)
Ao mesmo tempo, a disciplina era massificadora e individualizadora. Todos se
sujeitavam às mesmas obrigações num lugar determinado. Nos colégios jesuítas,
principalmente após 1762, o espaço escolar se desdobrara, a classe tornara-se homogênea. Por
exemplo, na arte de colocar os homens enfileirados, a disciplina individualizava os corpos.
Nos colégios havia a conhecida ordenação por fileiras. Nesse conjunto de alinhamentos, cada
aluno, segundo determinados atributos ocupava sucessivas filas e esses deslocamentos
marcavam relações hierárquicas de poder.
[...] filas de alunos na sala, nos corredores, nos pátios; colocação atribuída a
cada um em relação a cada tarefa e cada prova; colocação que ele obtém de
semana em semana, de mês em mês; de ano em ano; alinhamento das classes
de idade umas depois das outras; sucessão dos assuntos ensinados, das
questões tratadas segundo uma ordem crescente. E nesse conjunto de
alinhamentos obrigatórios, cada aluno, segundo sua idade, seus
desempenhos, seu comportamento, ocupa ora uma fila, ora outra; ele se
desloca o tempo todo numa série de casas; umas idéias, que marcam uma
hierarquia do saber ou das capacidades, outras devendo traduzir no espaço
da classe ou do colégio essa repartição de valores ou dos méritos.
(FOUCAULT,1977/1984, p. 134)
No controle da atividade, a disciplina consistia em saber utilizar corretamente o tempo,
estabelecendo horários rígidos de trabalho, sempre repetitivos e constantes. As atividades
eram cercadas ao máximo por ordens a que se tinha que responder o mais rapidamente
possível. Tratava-se de construir um tempo integralmente útil, sem desperdícios: “[...] 8:45
entrada do monitor; 8:52 chamada; 8:56 entrada das crianças e oração; 9 horas entrada nos
bancos; 9:04 primeira lousa; 9:08 ditado; 9:12 segunda lousa.” (FOUCAULT, 1977/1984, p.
137)
As sociedades disciplinares atingiram o seu apogeu no séc. XX e tinham como
característica principal a vigilância para controlar os indivíduos constantemente.
23
A maquinaria que permitiu um padrão de visibilidade das sociedades disciplinares era
o modelo do Panóptico de Jeremy Bentham (1748-1832), segundo Foucault.
Duas imagens, portanto, da disciplina. Num extremo, a disciplina– bloco, a
instituição fechada, estabelecida à margem, e toda voltada para funções
negativas: fazer parar o mal, romper as comunicações, suspender o tempo.
No outro extremo, com o panoptismo, temos a disciplina – mecanismos: um
dispositivo funcional que deve melhorar o exercício do poder tornando-o
mais rápido, mais leve, mais eficaz, um desenho das coerções subtis para
uma sociedade que está por vir. (FOUCAULT,1977/1984, p. 184)
Esse modelo de disciplina acompanhou a realidade educativa da escola “tradicional”,
que ocorreu nos séculos XVII, XVIII, XIX e XX. Vale lembrar que o conteúdo das
respectivas pedagogias tradicionais varia ao longo do tempo.
Aquilo que é educativamente tradicional em uma época difere do que é
tradicional em outra [...]; a maior parte da realidade educativa funciona
sempre com base em costumes, hábitos, rotinas e práticas herdadas. Trata-se
de práticas “tradicionais” que pouco a pouco vão evoluindo em função de
fatores bastante diversos, exógenos e endógenos. (FOUCAULT,1977/1984,
p. 19)
O sociólogo francês Durkheim viveu em uma época (1858 a 1917) onde o momento
fora, por vezes, assinalado como o “vazio moral da III República”. Segundo sua concepção
teórica, a disciplina é um fator sui generis da educação, pois regula condutas, prescreve ações.
Cabe à educação a tarefa de inculcar nas crianças o “espírito” de disciplina, isto é, hábitos de
condutas que represem e canalizem seus desejos.
Deste modo, a disciplina é coercitiva, impõe hábitos às vontades e freios às crianças; a
estratégia pedagógica é constituída pelas punições. Durkheim (1895/1984) destaca a
necessidade de pais e educadores em geral colocarem limites nas crianças, ele enfatiza a
necessidade de restrição, limitação das condutas humanas na educação. O autor defende uma
educação que impõe disciplina, que limite condutas infantis e forme cidadãos conscientes de
seus deveres e possuidores de uma consciência de que há limites morais.
Toda a educação consiste num esforço contínuo para impor às crianças
maneiras de ver, de sentir e de agir às quais elas não chegariam
24
espontaneamente, – observação que salta aos olhos todas as vezes que os
fatos são encarados tais como são e tais quais sempre foram. Desde os
primeiros anos de vida, são as crianças forçadas a comer, beber, dormir em
horas regulares; são constrangidas a terem hábitos higiênicos, a serem
calmas e obedientes; mais tarde, obrigamo-las a aprender a pensar nos
demais, a respeitar usos e conveniências, forçamo-las ao trabalho, etc., etc.
Se, com o tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é porque pouco a pouco
dá lugar a hábitos, a tendências internas que a tornam inútil, mas que não a
substituem senão porque dela derivam” (DURKHEIM, 1895/1984, p.5).
Entretanto, Durkheim (1922/1947) era contrário aos castigos corporais, aplicados na
época em que viveu; considerava a censura aplicada com reprovação e energia por pais ou
professores o castigo moral por excelência. Suas idéias referendam ao “ensino tradicional”.
O século XX contou com pedagogos e pedagogias inovadoras, os quais criticavam as
pedagogias que eles próprios denominaram “tradicionais”. Contudo, não foram as pedagogias
“inovadoras” que dominaram o pensamento pedagógico daquela época, mas a “pedagogia
tradicional”.
[...] o movimento da Escola Nova (Ferriére, Montessori, Decroly,
Kerschensteiner...), Dewey, Ferrer e Guardiã, Makarenko, Piaget, Freinet,
Neill e outras pedagogias antiautoritárias, Freire, etc. [...] na realidade da
escola do século XX, aqueles pedagogos e suas pedagogias foram, de fato, a
exceção. (TRILLA, 2006, p. 19)
Trilla (2006) expõe a narrativa da biografia escolar de diversos autores que viveram
entre 1950 e 1960 e escreveram seus testemunhos em forma de novelas ou obras do gênero
memorialista. Através dessas narrativas, percebemos alguns sentimentos dos alunos em
relação à escola “tradicional”: tédio, monotonia, ausência de vida, rotina, tristeza, solidão,
aprisionamento, aniquilamento do espírito. Um dos sentimentos que mais nos impressionou
foi o ódio à escola. Certamente, uma das principais causas desse sentimento eram os castigos
impostos (recurso onipresente para a disciplina) com formas sangrentas ou sofisticadas, as
quais controlavam o corpo e o espírito “com a gama de instrumentos que poderiam ter seu
lugar em qualquer museu de terror” (TRILLA, 2006, p. 30); e se a penalidade não recorria às
sangrentas palmatórias, incidiam sobre cópias intermináveis.
25
A disciplina que Foucault descreveu era mantida por uma autoridade (instituição) que
manipulava, vigiava e punia. Nossa perspectiva é de autodisciplina, ou seja, de controle si
mesmo. O próprio sujeito deve ser capaz de escolher se submeter a determinadas regras e
comportamentos, mesmo diante de dificuldades. Além disso, essa autodisciplina se
desenvolve com base no respeito mútuo, recíproco, alheio a qualquer forma de violência ou
coação.
Em uma perspectiva escolar, Aquino (1996) organizou um livro intitulado
“Indisciplina na Escola: alternativas teóricas e práticas”, visando abrandar a lacuna
bibliográfica que existia até então e contribuiu para o aprofundamento do debate acerca da
indisciplina na escola. Nesta obra ele aborda, principalmente, a relação professor-aluno.
Afirma que os relatos dos professores testemunham que a indisciplina é uma das dificuldades
fundamentais ao trabalho escolar, apresentando como obstáculos centrais: bagunça, tumulto,
falta de limites, maus comportamentos, desrespeito às figuras de autoridade, etc.
Apesar de o autor considerar a indisciplina como um inimigo do educador atual, ele
acredita que se trata de algo que ultrapassa o âmbito estritamente didático pedagógico e se
configura enquanto um problema interdisciplinar, transversal à Pedagogia. Ele acredita que as
práticas escolares são testemunhas das transformações históricas, ou seja, seu perfil adquire
diferentes contornos de acordo com as contingências sócio-históricas. A partir dessa
concepção, ele explica que a disciplina da “escola do passado” era imposta à base do castigo
ou da ameaça dele e, hoje, com a crescente democratização política do país, uma nova
geração se criou. Aquino (1996) acrescenta: “Temos diante de nós um novo aluno, um novo
sujeito histórico, mas, em certa medida, guardamos como padrão pedagógico a imagem
daquele aluno submisso e temeroso.” (p. 43)
26
Para ele, a escola de outrora tinha um caráter elitista e conservador, mas hoje a
educação é para todos. A Constituição garante que a educação é um direito de todos e dever
do estado e da família. Assim, a indisciplina também pode indicar
[...] o impacto do ingresso de um novo sujeito histórico, com outras
demandas e valores, numa ordem arcaica e despreparada para absorvê-lo
plenamente. Nesse sentido, a gênese da indisciplina não residiria na figura
do aluno, mas na rejeição operada por essa escola incapaz de administrar as
novas formas de existência social concreta, personificadas nas
transformações do perfil de sua clientela. (AQUINO, 1996, p. 45)
Além desses aspectos, Aquino (1996) apresenta o olhar psicológico em relação à
indisciplina. Segundo ele, numa concepção psicológica, a indisciplina está associada à idéia
de uma carência psíquica do aluno, mas adverte que o fenômeno não pode ser pensado como
uma predisposição particular (individual e patológica), pois deve ser analisado de acordo com
seus determinantes psicossociais e a partir da noção que o sujeito tem de autoridade.
27
Aquino (1996) afirma ainda que, sob esse ponto de vista psicológico, para que o
sujeito reconheça uma autoridade externa é necessário que ele tenha parâmetros morais
anteriores à escolarização, tais como: permeabilidade a regras comuns, partilha de
responsabilidades, cooperação, reciprocidade, etc. Este autor conclui que a gênese do
fenômeno da indisciplina acaba sendo situada fora da relação concreta entre professor e aluno.
Apesar de ele assumir que é impossível que a indisciplina se refira exclusivamente ao aluno
ou à estruturação escolar e suas circunstâncias sócio-históricas, ou ainda às ações do
professor, tornando-a unicamente um problema didático-pedagógico; ele considera que a
indisciplina é mais um dos efeitos do “entre” pedagógico, pois considera inadmissível ver a
instituição escola como algo aquém ou além da relação concreta entre seus protagonistas.
Assim, o autor afirma que a saída para a compreensão e manejo da indisciplina está “no
coração mesmo da relação professor-aluno, isto é, nos vínculos cotidianos e, principalmente,
na maneira com que nos posicionamos perante o nosso outro complementar.” (AQUINO,
1996, p. 50)
Aquino acrescenta que, na perspectiva dos alunos, ainda que eles apresentem uma
moral fragmentada, as propostas de trabalho com base no conhecimento podem fundar e/ou
resgatar a moralidade discente, pois todo o trabalho do conhecimento pressupõe a observância
de regras, de semelhanças e diferenças, de regularidade e exceções.
Nesse sentido a matemática é moralizadora; as ciências, as línguas, as artes
também o são, se entendermos moralidade como reguladora das ações e
operações humanas nas sucessivas tentativas de ordenação do mundo que
nos circunscreve. (AQUINO, 1996, p. 51)
28
Silva (2004), também reflete sobre o saber psicológico descrevendo a visão distorcida
desse saber. Ele atribui à postura dos profissionais da área de saúde mental a visão distorcida
do saber psicológico sobre os efeitos maléficos de uma educação extremamente repressiva e
violenta (crítica feita ao uso de castigos violentos, sobretudo corporais). “Com isso, vários
pais e mesmo educadores se consideraram no direito de não impor limites (leia-se: educar), a
fim de preservarem a felicidade dos filhos e dos alunos”. (p. 36)
Este saber, produzido no final do século XIX e início do XX acabou gerando uma
apologia da representação de que os limites são nocivos. “Assim, as crianças não deveriam ser
‘podadas’, pois com isso poder-se-ia correr o risco de que elas ficassem ‘doentes dos
nervos’.” (SILVA, 2004, p. 38) Silva (2004) explica que, sem a construção de limites e pela
defesa do puro deixar fazer, crianças e adolescentes ficam perdidos, sem saber o que lhes
pertence e o que lhe é alheio e, por isso, tornam-se transgressores das regras morais.
Outro saber que perpassa a questão da indisciplina é o olhar médico. Muitas crianças
indisciplinadas são diagnosticadas como portadoras de DDA (Déficit de Atenção) ou DA/H
(Déficit de Atenção e Hiperatividade). Dado este fato, consideramos importante relatar ao
leitor algumas idéias sobre essa concepção.
Cypel (2003) caracteriza o DA/H e suas sinonímias como um quadro sindrômico, e
sua conceituação compõem-se da descrição de um conjunto de sinais e sintomas:
Baseia-se na avaliação de manifestações relacionadas à desatenção, à
hiperatividade e à impulsividade, sendo o diagnóstico realizado até o
presente momento utilizando puramente o critério clínico. Como o conceito
é bastante genérico, pode dar margem a compreensões equivocadas. Até a
presente data, não existe qualquer método laboratorial, de neuroimagem ou
neurofisiológico entre os exames complementares, capaz de confirmar o
diagnóstico como se espera de praxe no estudo de doenças pediátricas mais
freqüentes. (p. 21)
29
Cypel (2003) diz que o déficit de atenção e, mais especificamente, o comprometimento
da atenção seletiva, necessitam ser significativos (os sintomas surgem por volta dos 7 anos de
idade e persistem por pelo menos 6 meses, em dois ou mais ambientes - casa, escola, locais de
lazer ) para que possam trazer prejuízo à aprendizagem escolar.
Consideramos importante diferenciar desobediência de inabilidade. Silva (2003), diz
que a desobediência é, por exemplo, uma criança não querer fazer uma tarefa (para qual teria
os recursos necessários) e se rebelar contra essa atividade; já a inabilidade pode ser percebida
quando a criança não consegue fazer a tarefa porque não consegue permanecer sentada ou
prestar atenção.
A criança DDA está freqüentemente recebendo punições e verbalizações
negativas por atos que ainda não aprendeu a controlar, sem muitas vezes ter
a intenção de ser desobediente ou opositora. Obviamente, essa criança
aprenderá a enxergar o mundo como um lugar punitivo, restritivo e
controlador. Daí, sim, poderá desenvolver comportamentos rebeldes e
desobedientes. (SILVA, 2003, p. 65)
Embora diferentes, desobediência e inabilidade corroboram para dificultar o processo
de aprendizagem. Se a criança se recusa a fazer ou se ela não é capaz de permanecer atenta,
concentrada, persistindo na atividade, certamente ela não entrará em contato com os desafios
da tarefa e não concluirá o aprendizado que aquela atividade propõe.
Sabemos que o DDA é um distúrbio amplamente estudado e polêmico, mas, para o
nosso estudo, limitamo-nos a considerar que crianças impulsivas, que não conseguem manter
a atenção e concentração em tarefas escolares, provavelmente serão prejudicadas no processo
de aprendizagem.
30
Como vimos, a questão da indisciplina perpassa por saberes sociológicos, escolares,
psicológicos, médicos (pelo diagnóstico de DDA ou DA/H) e por valores morais.
Acreditamos que todos esses fatores são interdependentes e influenciam nos comportamentos
de indisciplina/disciplina das crianças.
1.2 Nosso recorte
Como já anunciamos acima, o recorte considerado nesse trabalho é o de disciplina
como autodisciplina, ou seja, se o sujeito tem uma meta, ele compromete-se a ser disciplinado
(com ele mesmo) para alcançar esta meta. Ele se esforça por gerir (construir) sua disciplina
com a intenção de realizar algo.
Disciplina é, cada vez mais, autodisciplina. Um exemplo é a lição de casa.
Hoje em dia a maioria das famílias não tem um adulto com tempo
disponível para fiscalizar o dever. A própria criança aprende a administrar
essa tarefa e, se necessário, ela pede socorro. A autonomia é uma conquista,
um aprendizado complexo e longo pelo qual as crianças desenvolvem a
disciplina para dar conta de suas tarefas. (MACEDO, em:
<http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0183/aberto/mt_73655.shtml>
Acesso em ago. 2005)
No entanto, a construção da disciplina (como qualquer construção) é tecida em uma
rede de relações. “Trata-se, portanto de uma realização complexa que compreende muitos
elementos, que pode ser estruturada e desenvolvida de muitos modos” (MACEDO, 2005b,
p.151)
Assim, a construção da disciplina relacionada com autodisciplina, supõe autonomia,
supõe responsabilidade por suas ações e conseqüências, supõe autodeterminação. A
autonomia depende de um processo de desenvolvimento em seu favor. Este é um dos grandes
objetivos de uma educação que considera a perspectiva construtivista do conhecimento.
31
A autonomia expressa o nosso percurso e o do objeto ou acontecimento que
estamos construindo no sentido de que pouco a pouco algo ganha
independência, pode se realizar de uma forma plena, com
autodeterminação. Um texto, por exemplo, na medida em que chega ao fim
e se torna ou é publicado, ganha autonomia em relação ao seu escritor ou às
pessoas responsáveis por sua produção. Uma criança à medida que aprende
a andar ganha autonomia locomotora e pode, dentro de certos limites,
decidir seus movimentos por si mesma. (MACEDO, 2005b, p. 153)
Pode parecer estranho ao leitor essa concepção construtivista, talvez porque a idéia de
disciplina insiste em remeter-lhe a uma idéia de restrição exercida por um controle externo,
que tolhe a criatividade e reduz a produção.
Apesar de nossa idéia de disciplina estar relacionada à autodisciplina, ela considera
regras e limites como condição para sua existência: autodisciplina não é bagunça ou confusão,
muito pelo contrário, é uma disciplina autocentrada, por uma escolha pessoal interna. A
concepção de La Taille (2003) sobre limites, ou regras é correspondente à concepção de
disciplina aqui proposta. Ele acredita que sem limites
[...] não haveria real criatividade, mas exercício vazio de pensamento, meras
circunvoluções fantasiosas e sem valor. (...) Portanto, criar essa atividade
claramente associada ao exercício da liberdade, pede que se transponham
limites, mas também que outros sejam criteriosamente respeitados. E
ensinar essa prática às crianças não significa deixá-las ao léu, mas ensinar-
lhes métodos e técnicas. (LA TAILLE, 2003, p. 59, 60)
Durante o trabalho desenvolvido em uma oficina de jogos, esses “métodos” referem-se
às habilidades que as crianças precisam desenvolver para se favorecerem do processo de
aprendizagem.
Quando falamos que essas habilidades são desenvolvidas num contexto de oficinas de
jogos, não estamos restringindo sua utilização nesse contexto. Durante toda a nossa vida,
desde uma tarefa rotineira como tomar banho e escovar os dentes, até projetos profissionais,
essas habilidades são necessárias. Se tomarmos banho sem nos concentrar em nosso corpo,
32
podemos esquecer de lavar algumas partes; se não ficarmos atentos ao esfregar nosso pé, por
exemplo, ele pode continuar sujo; se não tolerarmos o fato de que nosso corpo está sujo e
precisa ser limpo, nem ao menos começaremos a ensaboá-lo; se não respeitarmos os limites
do nosso corpo, se esfregarmos muito forte ou colocarmos água muito quente, vamos nos
machucar. Este é um exemplo simples para percebermos que essas habilidades são
estritamente necessárias para termos sucesso em qualquer aspecto da nossa vida. É o conjunto
do uso dessas habilidades que chamamos de disciplina.
Antes de continuarmos discorrendo sobre o conceito específico de disciplina, vamos
explicitar nossa concepção a respeito de cada uma das habilidades que compõem este
conceito. Essas habilidades, a nosso ver, podem ser resumidas em capacidade de atenção,
concentração, persistência, respeito (às regras e aos colegas) e exigem coordenações
cognitivas e afetivas
O dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa descreve atenção como:
Ação de fixar o espírito em algo; concentração da atividade mental sobre um
objeto determinado; estado de vigília e de tensão que forma a base da
orientação seletiva da percepção, do pensamento e da ação;[É função
psicológica indissociável da consciência.]; concessão de cuidados,
gentilezas, obséquios etc.; ato ou efeito de se ocupar de (alguém ou algo);
cuidado, zelo, dedicação; boa vontade, disposição para ouvir o que alguém
tem para dizer. (Dicionário Eletrônico Houaiss. Disponível em:
<http://www.dicionariohouaiss.com.br>. Acesso em: 8 maio 2006).
A atenção é o meio que utilizamos para focar aquilo que integra o universo dos
possíveis, o necessário. Entretanto, o necessário é sempre relativo a um sistema; assim, no
jogo, a cada jogada, abrem-se novos possíveis, são necessárias novas coordenações – pois é
preciso estar concentrado ao novo que se abre – para, então, através da atenção, escolhermos e
focarmos o necessário desta jogada.
33
Do ponto de vista neurológico, segundo Cypel (2003), a atenção manifesta-se no
sistema nervoso central, incluindo o tronco cerebral, o sistema límbico e o cérebro
propriamente dito. Dentre os componentes do SNC, uma complexa combinação bioquímica é
desempenhada por neurotransmissores. O estágio inicial da atenção é o estado de vigília ou
alerta. Entretanto, estar alerta não significa estar atento; podemos estar despertos sem estar de
fato com a atenção dirigida.
Uma vez vígil, o indivíduo estará em condições de receber informações,
percebê-las e elaborá-las. Na seqüência o processo vai ganhando mais
complexidade, podendo ser feita uma seleção daquilo que lhe interessa e
uma exclusão da outra parte, caracterizando-se a chamada atenção seletiva.
A seguir, dentro dessa escolha feita, buscará seus objetivos principais,
constituindo-se a intenção seletiva. (CYPEL, 2003, p. 23- grifos do autor)
Segundo Cypel (2003), além desse conjunto de fatores biológicos, estar atento implica
uma participação de múltiplos fatores, como fatores emocionais (depressão, ansiedade, por
exemplo), motivação, entre outros. Um exemplo de motivação pode ser percebido quando
uma criança está jogando videogame. Os adultos, inclusive, inferem equivocadamente que a
criança está desligada, porque não atende ao ser chamada, mas, na realidade, ela está motivada
e com alto grau de atenção em relação aquilo que lhe interessa.
A atenção envolve fazer escolhas, ou seja, renunciar para tomar a melhor decisão.
Nessas escolhas, mantemos alguns pontos como figura e outros como fundo. É a atenção que
nos dá a direção para transformarmos esses pontos em figura, ou mantê-los como fundo.
No caso, se a atenção requer disciplina, a indisciplina da atenção é a desatenção (falta
de atenção). A criança desatenta mostra-se distraída e, conseqüentemente, comete erros com
freqüência. Muitas vezes, a criança desatenta nos transmite a impressão de descaso, descuido
em relação à tarefa, e não é difícil a julgarmos preguiçosa, desinteressada. São vários os
34
motivos pelos quais uma criança se mostra desatenta. Ela pode, sim, estar desinteressada pela
tarefa. Mas esse é apenas um dos possíveis motivos; a criança também pode ter medo de não
conseguir realizar a tarefa e esse medo a paralisa, reduz sua tolerância à frustração e ela,
mesmo sem perceber, não consegue focar seu olhar nos pontos que a tarefa exige.
A melhor definição que encontramos para o conceito de concentração, e que coincide
com a idéia de nossos estudos é: “ato ou efeito de agrupar o que se acha disperso ou separado”
(Dicionário Eletrônico Houaiss. Disponível em: <http://www.dicionariohouaiss.com.br>.
Acesso em: 05 maio 2006).
Para nós, concentração, neste contexto de aprendizagem escolar, refere-se à qualidade
de se levar em conta, de ter como consideração, todos os possíveis para se desenvolver uma
atividade. Quando uma atividade é proposta, há várias possibilidades de desenvolvimento e,
para que ela se realize, é necessário considerarem-se as variáveis em questão. Ou seja, é
preciso olhar, coordenar diferentes informações (concentração) para, depois, poder escolher a
melhor ação a ser realizada (atenção).
No caso do jogo, há diferentes aspectos para serem coordenados: objetivos, regras,
posição atual do jogo na perspectiva do jogador e do adversário, antecipação das possíveis
jogadas do adversário, considerar o tempo em uma partida, a alternância das jogadas (jogar e
aguardar a vez), o espaço (tabuleiro) e os sentimentos (reações afetivas) que as jogadas
despertam através dos resultados de ganhar ou perder (sensação de sucesso ou fracasso).
A dispersão, contrário de concentração, significa espalhar, desarrumar, enfim, manter-
se confuso, desorganizado na tarefa que se propôs a fazer. A criança dispersa não consegue
visualizar todos os possíveis e acaba escolhendo mal, pois vê como necessário o que é pseudo-
necessário.
Pensamos que a atenção e a concentração são elementos essenciais para aprendermos,
para tornarmos algo nosso. Visto que o conhecimento está sempre em desenvolvimento, é
35
dinâmico, atenção e concentração trabalham em ciclos: o sistema primeiro se abre (abre todos
os possíveis) chamando a concentração para observá-los e depois se fecha, convidando a
atenção para integrá-lo com o necessário (o único possível naquele momento).
Poderíamos imaginar que o silêncio é condição necessária para o sujeito atingir a
atenção e a concentração; entretanto, acreditamos que o silêncio não é imprescindível em
todos os momentos para se jogar ou para aprender. Sabemos que há momentos em que é
preciso compartilhar idéias, ou mesmo instantes em que o cotidiano das oficinas, assim como
o cotidiano da sala de aula, permite certa descontração: momentos em que as crianças contam
fatos de suas vidas, cantam, saem de seus lugares fazendo “barulho”, sem perder o foco geral
na situação proposta.
Admitimos que há momentos durante o desenvolvimento das atividades em que a
atenção e a concentração são imprescindíveis, e o silêncio é um meio para se alcançar esses
fins que possibilitarão a aprendizagem. No contexto de oficinas de jogos, consideramos
silêncio o estado de quietude muitas vezes necessário- mas não sempre- à atenção e
concentração no decorrer de uma atividade.
A maior dificuldade do sujeito em permanecer atento e continuar uma atividade –
concentrado e em silêncio, se necessário – é lidar com a frustração de, muitas vezes, ainda não
saber como fazer. Ele vislumbra possibilidades de fazer outras coisas diante das quais tem
mais facilidade (e encontra maior prazer) e decide, mesmo sem perceber, interromper a
atividade que lhe havia sido proposta. Podemos inferir que o sujeito apenas persevera quando
concebe como valor triunfar naquela tarefa. Esse valor pode estar ligado, por exemplo, a uma
concepção de que sua auto-estima se elevará quando ele conseguir completar a tarefa.
Para nós, a tolerância é uma das habilidades principais a ser desenvolvida para facilitar
o processo de aprendizagem. Tolerância à frustração remete- nos ao conceito de persistência,
ou seja, não interromper algo que se propôs a fazer, mesmo que a tarefa mobilize cansaço,
36
preguiça, falta de ânimo. Essa é uma qualidade importante para se aprender, pois a
aprendizagem é um processo de equilíbrio e exige que o sujeito invista na apreensão do
conhecimento, até que ele encontre um equilíbrio e apreenda (assimile) este como seu. Se o
sujeito interromper este processo, ele terá que voltar de onde parou, pois o conhecimento não
evolui sem perseverança.
Segundo Piaget (1932/1994), “os jogos infantis constituem admiráveis instituições
sociais. O jogo de bolinhas entre meninos, comporta, por exemplo, um sistema muito
complexo de regras, isto é, todo um código e toda uma jurisprudência” (p.23). As regras dos
jogos devem ser respeitadas para que o jogo prossiga com veracidade, para que se jogue certo,
mas, além disso, também é preciso respeitar o colega, a vez dele de jogar.
Diante das regras exigidas nos jogos, o sujeito pode sentir-se instigado a trapacear para
vencer. Fazer trapaças significa agir de má fé, com o intuito de lesar ou fazer com que o outro
acredite em algo que não é verdadeiro, enganar usando de dissimulação. (Dicionário
Eletrônico Houaiss. Disponível em: <http://www.dicionariohouaiss.com.br>. Acesso em: 05
maio 2006). Muitas vezes, o desejo de vencer está além do desejo de saber, envolve
tolerância à frustração, questões afetivas, socais, e a criança escolhe trapacear para ganhar o
título de vencedor, não percebendo que, ao desrespeitar o outro, está desrespeitando a si
mesmo, pois deixa de acreditar na sua capacidade de vencer com suas próprias estruturas
cognitivas.
A noção de respeito, segundo Piaget, é um dos pontos mais importantes deste estudo e
será melhor desenvolvida no próximo capítulo.
37
CAPÍTULO 2: Disciplina e Jogo
2.1 Definição de conceitos: disciplina e indisciplina
O conceito de disciplina pode ser entendido ora como meio, ora como fim. Como meio
seu papel é oferecer recursos, condições para realização de nossos desejos, necessidades,
canalizando nossas energias em favor de um objeto ou tarefa. “Se tivermos um ‘norte’, um
objetivo a cumprir, ter disciplina é se entregar nesta direção.” (MACEDO, 2005b, p. 146)
Como fim, é compreendida como o próprio aprendizado da ação de disciplina .
A disciplina permite uma entrega verdadeira do ser a um objetivo. Segundo Macedo
(2005b), em seu sentido primordial, disciplina refere-se a discípulo e expressa a relação entre
uma pessoa que sabe o que é importante para alguém ou para uma cultura e aqueles que
querem aprender com ela. Discípulo era aquela pessoa que se entregava aos ensinamentos de
um mestre. O mestre tinha conhecimentos importantes que, com o passar do tempo, foram
objetivados naquilo que hoje chamamos de disciplina (História, Geografia, Língua
Portuguesa, etc).
Se pensamos a disciplina na perspectiva da criança enquanto aluno, disciplina significa
não apenas a aprendizagem dos conteúdos escolares como também o modo como a criança se
relaciona com a aprendizagem destes conteúdos (com atenção concentração); ou seja,
expressa uma forma de relação com aquilo que se quer aprender.
Para Macedo (2005b), disciplina supõe generosidade em suas duas direções: na
perspectiva daquele que se entrega ou doa um espaço e um tempo de si em favor de uma
38
realização ou de uma pessoa ou grupo, que será dela beneficiário; e na perspectiva daquele
que recebe, que aceita deixar-se inscrever ou modificar-se por aquela pessoa ou tarefa.
Disciplina, assim, é o que se cultiva na relação entre um adulto e uma
criança, na qual algo vai ganhando forma, vai se modelando pelas atitudes,
reações, valores, informações e saberes, sobretudo práticos. Por isso
disciplina equivale à ação de instruir, educar, de dar ciência, de construir
uma ordem, princípio ou moral. (MACEDO, 2005b, p. 145)
Ao contrário, indisciplina é toda atitude que distancia o sujeito da realização da tarefa
a que ele se propôs. Significa proceder mal, afastando-se dos meios orientados à resolução
dos problemas e, como conseqüência, perturba o alcance das metas buscadas. Agir de modo
indisciplinado implica em perder o sentido ou a razão que justifica enfrentar e superar
desafios que interessam ao sujeito e que lhe confirmam, na prática, a aquisição de um
conhecimento significativo.
Silva (2004), diz que o termo indisciplina “quase sempre é empregado para designar
todo e qualquer comportamento que seja contrário às regras, às normas e às leis estabelecidas
por uma organização” (p. 21). Assim, na escola, toda vez que um aluno desrespeita uma regra
(imposta pelas autoridades ou elaborada democraticamente) será visto como indisciplinado.
Oliver (2000) propõe como solução para a indisciplina e violência nas escolas
transformar as brigas em jogo. Ele afirma que re-situar os jogos de combate (com regras), em
seu contexto institucional, contribui para o controle da violência, bem como para a
sublimação de sua agressividade e o reconhecimento do outro.
Para nós, o termo indisciplina significa mais do que transgressão de regras,
indisciplina refere-se a um termo com sentido negativo: são ações caracterizadas por confusão
ou desobediência.
39
Segundo o Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa (Disponível em:
<http://www.dicionariohouaiss.com.br>. Acesso em: 15 out 2007), confusão expressa
indistinção, equívoco ou mistura de uma coisa com outra, resultando em engano; conflito ou
desentendimento na realização de tarefas; discordância entre pessoas; dificuldade para
raciocinar e decidir, gerando hesitação e embaraço. Desobediência, também segundo o
mesmo dicionário, caracteriza-se por ações de insubordinação, violência e resistência na
consideração de regras e limites.
Macedo (2007) afirma que a indisciplina pensada sob a lógica da produção é
inaceitável, pois desestabiliza o sistema de relações que a sustentam. Ela conduz ao erro, e
este, segundo esta lógica, deve ser abolido. Em nossa sociedade, a lógica da produção não
permite o erro, pois erro e indisciplina são fatais. Por exemplo, se um consumidor compra um
aparelho e ele não funciona, ou se um trabalhador comete um erro ao produzir uma peça em
uma linha de montagem, gerando desperdício de materiais e atraso na produção. (informação
verbal)
2
.
Entretanto, o erro ou a indisciplina na lógica da formação é inevitável. Por exemplo, se
o sujeito está aprendendo, ele precisa ter direito ao erro. Se não, como é que ele aprende? Se
não considerarmos o erro como inevitável estamos numa teoria em que aprender é algo que já
se sabe de imediato e sabemos que isso não é verdade, exceto coisas que são muito
elementares. A escola e a vida freqüentemente propõem coisas progressivamente mais difíceis
onde é necessário esforço prolongado e aperfeiçoamento, pois, de imediato, o sujeito não
consegue aprendê-las.
Na formação, a indisciplina no sentido de confusão é permitida: o sujeito se confunde,
se atrapalha, mistura as coisas, desobedece, não necessariamente por deslealdade, mas por não
2
Comunicação feita por Macedo no VI Congresso Brasileiro de Psicologia do Desenvolvimento, em
Vitória, ES, 2007.
40
conseguir executar a tarefa, por insegurança ou outras inúmeras razões. Assim, na lógica da
formação o erro faz parte do processo, enquanto na lógica da produção, não.
Do ponto de vista da disciplina, como já dissemos no capítulo anterior, as crianças
precisam desenvolver, durante o trabalho em oficinas de jogos, certas habilidades para se
beneficiarem do processo de aprendizagem, tais como: atenção, concentração, persistência,
respeito às regras da oficina ou atividades e respeito aos colegas.
Selecionamos para esta pesquisa, três sentidos para o termo disciplina: 1) Disciplina
com referência à autoridade; 2) Obediência às regras (até mesmo sem uma autoridade
presente); 3) Autodisciplina- Idéia de projeto.
Em nosso estudo classificaremos disciplina de sentido 2: respeito aos colegas e
respeito às regras do jogo ou atividade, pois essas questões estão relacionadas ao conceito de
respeito, obediência à regras.
Classificaremos como disciplina de sentido 3: atenção, concentração e persistência,
pois são ações que beneficiam o projeto que o sujeito escolheu seguir, envolve autodisciplina.
No sentido 1 a indisciplina seria não seguir o que diz uma autoridade, por exemplo,
podemos pensar em um soldado indisciplinado. Aqui a indisciplina refere-se a desobediência
(desrespeito a uma autoridade).
No sentido 2 a indisciplina seria não seguir o conjunto de regras pré determinado.
Nesse sentido a indisciplina também se refere à desobediência (desrespeito às regras,
desrespeito aos colegas).
No sentido 3 a indisciplina seria o sujeito “trair” o “querer realizar” um projeto. Ou
seja, o sujeito quer realizar algo, mas por algum motivo não consegue executar a tarefa, se
atrapalha. Nesse sentido a indisciplina refere-se à confusão (desatenção, dispersão,
desistência).
41
Esses sentidos de disciplina serão mais desenvolvidos no item Discussão deste
trabalho.
Na perspectiva da autodisciplina, consideramos que a disciplina só é possível se o
sujeito tiver a intenção de realizar um projeto. Macedo (2006) diz que a idéia de projeto tem
como ponto central a perspectiva de futuro, isto é, o que regula a atividade do presente em
função daquilo que se almeja alcançar. Todo projeto exige disciplina para alcançar o sistema
de resposta traçado. Assim, consideramos jogo, projeto e disciplina complementares segundo
a visão dialética explicitada pelo autor:
[...] visão dialética como complementaridade ou cooperação entre coisas
irredutíveis, mas querem ou podem operar como partes de um sistema, o
desafio é demonstrar que, apesar de suas singularidades, elas podem se
constituir em um todo maior, no qual se diferenciam e integram como partes
dele, agora indissociáveis. (MACEDO, 2006, p. 30)
Ele propõe “ser e tornar-se” como possibilidade de se abordar um dos pares dialéticos
entre jogo e projeto. Assim, o jogo expressa o ser e o projeto expressa o querer tornar-se
aquilo que se constitui seu objetivo ou meta, com a condição de ser ou estar no presente
comprometido com este futuro almejado. É nesta perspectiva que consideramos o ser e o
querer tornar-se como complementares e indissociáveis à questão da disciplina.
Um aspecto importante a ser considerado é o “querer” como intenção. Para Rey
(2002), a intenção é um “querer ver”, um “querer conceber”, ele afirma que não existem
competências transversais e, sim, intenções transversais.
[...] o sujeito pode ter, sobre situações ou objetos novos, intenções que os
estruturam e que revelam os caracteres apropriados para por em prática
competências particulares (...) é possível ter uma intenção estética, uma
intenção emotiva, uma intenção imagética, etc. Cada um de nós passa, aliás,
sucessivamente, de uma a outra, em função dos momentos que vivenciamos.
São essas intenções que definem o enquadramento das situações. (REY,
2002, p. 179)
42
Outro aspecto a ser considerado quando nos referimos à disciplina/indisciplina é a
questão da moral. La Taille (1996), na obra organizada por Aquino, discorre sobre
disciplina/indisciplina no campo da moral. Ele apresenta como tese central que a indisciplina
em sala de aula é, entre outros fatores, decorrência do enfraquecimento do vínculo entre
moralidade e sentimento de vergonha (o sentimento de vergonha seria um dos reguladores da
moral).
La Taille (1996) define o sentimento de vergonha em sua forma simples como o
sentimento de ser objeto da percepção de outrem. Em sua forma mais elaborada, tal percepção
é associada a valores negativos. “Quando esse olhar for mais crítico, negativo, a vergonha
encontrará sua tradução mais freqüente: sentimento de rebaixamento,desonra, humilhação.”
(p. 12)
Ainda segundo este autor, a tendência natural da criança (assim como do adulto) é
buscar ter de si um valor positivo. Ele diz que essa tendência à afirmação do Eu, à construção
de uma imagem positiva de si é necessidade psicológica básica. Neste sentido o medo da
vergonha (negativa) é forte motivação para o agir moral. Porém, ele acredita que nem todos os
atos de disciplina são genuinamente morais, afinal, o que há de moral em fazer fila pra esperar
a entrada na classe?
Para La Taille (1996), se a imagem que as crianças têm de si inclui poucos valores
morais, é de se esperar que seus atos de desobediência não sejam sentidos como vergonha.
Para melhor explicitarmos o campo moral e ético, trataremos esse assunto um pouco
mais a frente relacionando-o com as questões de disciplina e jogo. Antes, porém,
apresentaremos algumas importantes contribuições de Piaget sobre jogos.
43
2.2 Piaget e jogo
Ao longo de sua extensa obra, Piaget utilizou-se de jogos para investigar diferentes
questões. Para esta dissertação nos interessa especialmente os estudos de Piaget sobre
desenvolvimento moral e jogos de regras. Faremos um breve resumo das idéias que Piaget
desenvolveu nos livros: “O juízo moral nas crianças” (Piaget, 1932/1994) e “A formação do
símbolo na criança” (Piaget, 1946/1978).
Na primeira parte de seu livro “O juízo moral na criança”, Piaget (1932/1994) faz uso
do jogo de “bolinhas de gude”, entre meninos, para estudar o respeito às regras do ponto de
vista da própria criança. Ele se pergunta: Como os indivíduos se adaptam pouco a pouco a
essas regras? Que consciência tomam da regra, ou que tipos de obrigação delas resultam?
Em outras palavras, Piaget (1932/1994) investiga no que concerne às regras do jogo
dois tipos de fenômenos:
1º) a prática das regras, isto é, a maneira pela qual as crianças de diferentes
idades as aplicam efetivamente. 2º) a consciência da regra, ou seja, a
maneira pela qual às crianças de diferentes idades se apresentam o caráter
obrigatório, sagrado ou decisório, a heteronomia ou a autonomia inerente às
regras do jogo. (p. 24)
Numa primeira etapa, ele interroga as crianças sobre como é o jogo de bolinhas (o
entrevistador se faz de ignorante e pede que a criança lhe explique o jogo para que ela
mencione as regras que conhece). A seguir, o interrogatório baseia-se na parte relativa à
consciência das regras onde o essencial é concluir se é considerada legítima a mudança das
regras e o que torna uma regra justa.
Nesta investigação, Piaget observou relações baseadas na coação e na cooperação. As
relações baseadas na coação implicam respeito unilateral, ou seja, um sujeito submete-se a
outro, numa relação de autoridade. As relações de cooperação supõe relações entre iguais,
respeito mútuo:
44
[...] a regra do jogo se apresenta à criança não mais como uma lei exterior,
sagrada enquanto imposta pelos adultos, mas como o resultado de uma livre
decisão, e como digna de respeito na medida que é mutuamente consentida.
(PIAGET, 1932/1994, p. 60)
Segundo Piaget (1932/1994), o jogo enquanto instituição social constitui ocasião
privilegiada de pesquisa, pois estabelece uma realidade social bem caracterizada, isto é,
independente dos indivíduos, transmitindo-se de geração a geração. Para ele, a natureza
psicológica das realidades morais é mais bem definida pelas relações entre a prática e a
consciência da regra.
Os resultados obtidos graças ao duplo interrogatório citado acima são, em sua maioria,
os seguintes.
Do ponto de vista da prática das regras, Piaget (1932/1994), distingue quatro estádios
sucessivos. O primeiro é puramente motor e individual, ainda não se pode dizer que há
respeito às regras, pois não há regras coletivas. As crianças deste estádio têm de zero a dois
anos. O segundo estádio é denominado egocêntrico (aproximadamente, de dois a cinco anos):
a criança joga sozinha, sem se preocupar se suas idéias são aceitas pelos outros, sem procurar
vencê-los ou uniformizar as formas de jogar, considerando as regras como exteriores e
individuais. O terceiro estádio é o da cooperação. A criança (com idade a partir de sete anos,
aproximadamente) apresenta necessidade de unificar as regras, controlá-las mutuamente para
vencer o outro (aqui os jogadores passam a ser considerados como adversários), ou seja, o
controle das regras é regulado pelo grupo. Entretanto, apesar de jogarem juntos, quando
interrogadas, dão informações diferentes e, muitas vezes, contraditórias sobre as regras do
jogo. O quarto estádio é o da codificação das regras (inicia-se aos onze, doze anos): as
crianças preocupam-se em regular os procedimentos e códigos do jogo, inclusive, consideram
a possibilidade de mudar as regras, desde que entrem em comum acordo.
45
Em relação à consciência das regras (o que a criança pensa e como se relaciona com a
regra), Piaget propõe três estádios (não coincidentes com os anteriores). O primeiro estádio
caracteriza-se pela anomia (pré-moral): a busca em seguir regras coletivas é desprezada, seja
porque a regra ainda é puramente motora (prazer funcional), “seja (início do estágio
egocêntrico) porque é suportada, como que inconscientemente, a título de exemplo
interessante e não de realidade obrigatória” (PIAGET, 1932/1994, p. 34)
O segundo estádio (situado entre o estágio egocêntrico e o da cooperação) inicia-se no
momento em que a criança, por imitação ou contato verbal, começa a querer jogar de acordo
com as regras recebidas do exterior. Este estágio caracteriza-se pela heteronomia: a regra é
considerada como sagrada e inatingível, com referência a uma autoridade e de essência
externa. Qualquer que seja, na prática, o egocentrismo do seu jogo, considera toda
modificação proposta, mesmo aceita como opinião geral, como transgressão.
O terceiro estádio é o da autonomia (relações de cooperação): as regras são
consideradas legítimas, obrigatórias e nascem a partir do consentimento mútuo, expressam um
acordo entre pessoas iguais e livres. A autonomia permite que a criança pense melhor e
escolha as regras que quer seguir responsabilizando-se por suas conseqüências. Ela aprende a
gerir a si própria e cria recursos internos para enfrentar qualquer situação.
Na autonomia, as leis e as regras são opções que o sujeito faz na sua convivência
social movido pela autodeterminação. Para Piaget, não é possível uma autonomia intelectual
sem uma autonomia moral, pois ambas se sustentam no respeito mútuo, o qual, por sua vez, se
sustenta no respeito a si próprio e no reconhecimento do outro como ele mesmo.
46
De fato, nossos estudos têm mostrado que as normas racionais e, em
particular, essa norma tão importante que é a reciprocidade, não podem se
desenvolver senão na e pela cooperação. A razão tem necessidade da
cooperação na medida em que ser racional consiste em 'se' situar para
submeter o individual ao universal. O respeito mútuo aparece, portanto,
como condição necessária da autonomia, sobre o seu duplo aspecto
intelectual e moral. Do ponto de vista intelectual, liberta a criança das
opiniões impostas, em proveito da coerência interna e do controle recíproco.
Do ponto de vista moral, substitui as normas da autoridade pela norma
imanente à própria ação e à própria consciência, que é a reciprocidade na
simpatia. (PIAGET, 1932/1994, p. 91).
Piaget entende que nos jogos coletivos as relações interindividuais são regidas por
normas que, apesar de herdadas culturalmente, podem ser modificadas consensualmente entre
os jogadores, sendo que o dever de respeitá-las implica a presença da moral por envolver
questões de justiça e honestidade.
Em sua obra, “A formação do símbolo na criança”, Piaget (1946/1978) mostra uma
classificação a partir de uma perspectiva estrutural do jogo. Analisa a gênese do jogo no nível
pré-verbal e depois propõe uma classificação para os diversos tipos de jogos didaticamente
dividida em três tipos de estruturas: jogos de exercício, jogos simbólicos e jogos de regras.
Esta classificação estrutural permitiu que Piaget considerasse os jogos em uma ordem
hierárquica, onde um jogo é superado pelo outro, mas não desaparece.
Os jogos de exercício são caracterizados por condutas lúdicas repetidas pelo simples
prazer funcional: repetição de gestos, movimentos e sons simplesmente pelo gosto de
exercitar determinadas funções adquiridas, ou seja, o sujeito executa determinadas ações sem
uma finalidade específica, “sem novo esforço de aprendizagem ou descoberta, pela simples
alegria de dominá-las” (PIAGET, 1946/1978, p. 208). Deste modo, a criança realiza
atividades que não pedem esforço adaptativo, pois não há ação para modificar: a assimilação
se torna repetitiva. Essas ações são predominantes no estádio sensório-motor e presentes,
como já citamos, em todos os outroS estádios, até na fase adulta, mas de forma menos
numerosa.
47
[...] esses jogos lúdicos que constituem a forma inicial do jogo na criança,
de maneira nenhuma são específicos dos dois primeiros anos (...)
Reaparecem, pelo contrário, durante toda a infância, sempre que um novo
poder ou uma nova capacidade são adquiridos, durante a sua fase de
construção ou adaptação atuais (em contraste com a adaptação consumada),
quase todas as condutas dão lugar, por seu turno, a uma assimilação
funcional ou exercício em vazio, acompanhados do simples prazer de ser
causa ou de um sentimento de poderio. Mesmo o adulto age freqüentemente
do mesmo modo: é muito difícil quando se acaba de adquirir pela primeira
vez, um aparelho de rádio ou um automóvel, que o adulto não se divirta
fazendo funcionar um ou passeando no outro, sem mais finalidade do que o
prazer de exercer seus novos poderes.” (PIAGET, 1946/1978, p. 149)
Nos jogos simbólicos a forma de assimilação é deformante, ou seja a criança exercita
a capacidade de evocar coisas, pessoas e sensações ausentes, graças à imagem mental, o
símbolo, principalmente por meio dos jogos de “faz-de-conta”. Esses jogos são
característicos do estádio pré-operatório (entre dois e sete anos de idade).
Segundo Piaget (1946/1978), o símbolo fornece ao sujeito os meios de assimilar o real
aos seus desejos ou aos seus interesses. Assim,
[...] o símbolo prolonga o exercício, como estrutura lúdica, e não constitui
em si mesmo conteúdo que seria exercitado como tal, à semelhança da
imaginação numa simples fabulação. Na prática, o critério de classificação é
simples: no jogo de exercício intelectual , a criança não tem interesse no que
pergunta ou afirma e basta o fato de formular as perguntas ou de imaginar
para que se divirta, ao passo que no jogo simbólico, ela interessa-se pela
realidades simbolizadas, servindo tão só o símbolo para evocá-las.
(PIAGET, 1946/1978, p.156)
Os jogos de regras iniciam-se entre seis e sete anos de idade (início do estágio
operatório concreto) e desenvolvem-se mesmo durante toda a vida (esportes, jogos de
tabuleiro, de cartas, etc). Para Piaget (1946/1978) o jogos de regra “é a atividade lúdica do ser
socializado” (p. 182), englobando características comuns aos jogos de exercícios (prazer
funcional, repetição) e aos jogos simbólicos (convenções adotadas, expressões verbais
próprias de cada jogo). A criança abandona seu egocentrismo e passa a ser social: pois as
regras impostas pelo grupo devem ser respeitadas.
Nos jogos de regras há a assimilação recíproca, ou seja:
48
[...] implica considerar o sentido de coletividade na medida em que o
sujeito está subordinado à regularidade e à convenções estabelecidas em
comum acordo, bem como considera as ações do outro em coordenação
com suas próprias ações” (PETTY, 1995, p. 35)
Piaget escreveu no artigo intitulado “Inconsciente afetivo e inconsciente cognitivo”
(In: Problemas de Psicologia Genética, 1973) que por meio do jogo a criança assimila o
mundo para atender seus desejos e fantasias. Como vimos, o jogo segue uma evolução que se
inicia com os jogos de exercícios, continua no desenvolvimento dos jogos simbólicos para se
aproximar, gradativamente, dos jogos de regras, que dão origem à lógica operatória. Segundo
o autor, este tipo de jogo revela uma lógica própria da subjetividade tão necessária para a
estruturação da personalidade humana quanto a lógica formal, advinda das estruturas
cognitivas.
Macedo (in MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997), comenta a proposta de
classificação de jogos feita por Piaget (1946/1978). Afirma que os jogos de regras contêm as
duas características herdadas das estruturas dos jogos anteriores (de exercício e simbólico).
Neles há a repetição de jogos de exercício corresponde à regularidade na medida que o ‘como
fazer’do jogo é o mesmo , até que se modifiquem as regras. Os jogos simbólicos
correspondem às regras do jogo: são convenções criadas pelo inventor do jogou seus
proponentes. O que há de original e próprio das estruturas dos jogos de regras é seu caráter
coletivo.
Ou seja, nessa estrutura só se pode jogar em função da jogada do outro. Por
exemplo, em uma partida de xadrez, os movimentos das peças de um
jogador são feitos em função os movimentos das peças do adversário.
(MACEDO, in: MACEDO; PETTY; PASSOS
, 1997, p. 134)
Sobre a importância dos jogos de regras, Macedo (no mesmo texto), afirma que, do
ponto de vista funcional, essa forma de jogo é muito importante pelo seu caráter competitivo.
Para ganhar é preciso ser habilidoso, compreender melhor, antecipar, ser ágil, coordenar
situações, estar atento, concentrado, ter boa memória, relacionar as jogadas o tempo todo.
49
“Desafio que se renova a cada partida porque vencer uma não é suficiente para ganhar a
próxima” (MACEDO, in: MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997, p. 135)
Macedo (in MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997) analisa um pouco a competição. A
competição caracteriza-se por uma estrutura assimétrica de diferença, no jogo de regras os
jogadores querem ganhar, mas apesar desse “querer” apenas um dos jogadores será o
vencedor. Assim, outro significado funcionalmente importante para a competição é a
competência: habilidade pessoal para enfrentar problemas e resolvê-los da melhor forma
possível. Nestes jogos onde as regras e condições são a mesma para todos, vence quem tiver
mais competência, ou se essa for a mesma, quem tiver mais sorte.
A competência é o desafio de superar a si mesmo. Nesse sentido o outro, a
quem vence, é apenas uma referência para o vencedor (...) Nessa
perspectiva ganhamos ou perdemos sempre de nós mesmos. (MACEDO,
in
MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997, p. 137)
Nesse sentido consideramos que para desenvolver competência é necessário ter
disciplina: quanto mais atento, concentrado e persistente um sujeito estiver, melhor ele poderá
resolver os desafios da tarefa.
Sobre a importância estrutural dos jogos de regras, Macedo (in MACEDO; PETTY;
PASSOS, 1997) diz que esta corresponde ao seu valor operatório. Nessa estrutura de jogos
fazer e compreender são complementares e implicam assimilação recíproca de esquemas. O
fim- ganhar dentro das regras- tem de ser coordenado com os meios (regras do jogo,
competência, etc). Quem conhece as regras do jogo e nunca vence, apenas conhece o jogo em
um sentido simbólico, mas não operatório.
Macedo, responde à pergunta: “Por que se joga?” destacando que os jogos são
importantes para a escola, para a psicopedagogia, mas antes de tudo, para a vida:
Joga-se para não morrer, para não enlouquecer, para sobreviver -com
poucos recursos pessoais, culturais, sociais- em um mundo difícil (...) No
jogo podem-se encontrar respostas, ainda que provisórias, para perguntas
que não se sabe responder (...) Existem assuntos que a ciência explica mas
que não temos competência ou formação para compreender. O jogo pode
preencher nas crianças esse vazio. Nos adultos também: o trabalho, o
50
esporte, a vida cultural não são, na verdade, complexos sistemas de jogos?
(MACEDO, in MACEDO; PETTY; PASSOS
, 1997, p. 139)
Por fim, Macedo defende o valor psicopedagógico do jogo porque este pode significar
para a criança uma experiência fundamental de construir respostas por meio de um trabalho
que integra o lúdico, o simbólico e o operatório; porque pode significar para a criança que
conhecer é um jogo de investigação (de produção de conhecimento) “em que se pode ganhar,
perder, sofrer com paixão, conhecer com amor; amor pelo conhecimento em que as situação
de aprendizagem são tratadas de forma mais digna, filosófica, espiritual, Enfim, superior”
(MACEDO, in MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997, p. 142)
2.3 Moral e ética: disciplina em situações de jogo
Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa On Line Priberam (Disponível em:
<http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx>. Acesso em: 10 out 2007), o termo moral (derivado
do latim morus), como substantivo feminino, refere-se a um conjunto de costumes e opiniões
que um indivíduo ou um grupo de indivíduos possuem relativamente ao comportamento;
conjunto de regras de comportamento consideradas como universalmente válidas; parte da
filosofia que trata dos costumes e dos deveres do homem para com seu semelhante e para
consigo; ética; teoria ou tratado sobre o bem e o mal, etc.
Vemos que um dos significados correspondente à moral é o termo ética. O mesmo
dicionário define ética (derivado do grego ethos) como “ciência da moral”. Deste modo,
percebemos que ambos os termos podem ser tratados como equivalentes.
Segundo La Taille (2006), moral e ética são conceitos habitualmente empregados
como sinônimos, ambos referindo-se a um conjunto de regras de conduta consideradas como
obrigatórias. Ele diz que tal sinonímia é perfeitamente aceitável, pois herdamos um vocábulo
51
do latim (moral) e outro do grego (ética), duas culturas antigas que assim nomeavam o campo
de reflexão sobre os costumes dos homens.
Apesar destes termos serem sinônimos, por convenção, vários autores os diferenciam
ao reservar o termo moral para o fenômeno social e o termo ética para reflexão filosófica ou
científica sobre ele. Como veremos adiante, La Taille (2006) também adota, por convenção,
essa diferenciação conceitual.
Para Piaget (1932/1994), toda moral é um sistema de regras e a essência de toda a
moralidade consiste no respeito que o indivíduo sente por tais regras.
O conceito de moral remete-nos ao conceito de ética. Para La Taille (2006) “Como
devo agir?” corresponde à uma indagação moral; “que vida eu quero viver?” a uma indagação
ética.
Para a definição de moral ele lembra que o verbo “dever” precisa ser entendido no seu
sentido de obrigatoriedade. Ou seja, o plano moral exige que os indivíduos sigam
determinados conjuntos de leis e regras que podem mudar dependendo da cultura, sociedade.
O conceito de disciplina engloba o plano moral. A questão moral “como devo agir”?
deve estar presente internamente antes que um sujeito disciplinado execute cada ação, pois só
assim poderá agir seguindo as regras exigidas.
No jogo podemos definir que a pergunta moral corresponde a “como devo jogar?”. A
moral refere-se às regras que o jogo determina: ao jogar certo. Por exemplo, nos jogos de
percurso as regras baseiam-se no “dever” de jogar o dado, ler o número que saiu no dado,
andar com o peão o número de casas correspondentes, executar o que a casa simboliza. Além
disso, deve-se aguardar a vez dos colegas.
52
La Taille (2006) diz que para dar conta de uma teoria energética das ações humanas,
portanto, de uma teoria da afetividade, deve-se diferenciar moral de ética.
O conceito de disciplina também engloba o plano ético. A questão ética “que vida eu
quero viver?” pode ser complementada pela questão “tenho vontade de ter uma vida
disciplinada?”, pois se existe uma relação direta entre respeito (moral) e disciplina também há
uma relação direta entre vontade (ética) e disciplina. Para que um sujeito seja disciplinado é
necessário que, consciente ou inconscientemente, ele queira ser assim.
La Taille (2006) elege algumas características ao plano ético: para que o sujeito aja
com ética é necessário que ele tenha passado por alguma experiência subjetiva, de alguma
forma de bem-estar (viver uma vida que faça sentido é condição necessária para a “vida
boa”). Ele define uma questão invariante ao plano ético: “como viver?” A resposta deve
permitir a “expansão de si próprio” (implica construir representações de si com valor positivo)
que também se relaciona à pergunta “quem ser?”, ou seja, coloca em pauta o tema da
identidade pessoal.
É nessa perspectiva que afirmamos que um sujeito é disciplinado quando ele constrói
representações de si relacionadas à disciplina com valor positivo. Ou seja, ele quer agir com
disciplina porque assim ele se sente melhor (expande a si próprio) e sua identidade se forma
repleta de valores disciplinados na medida que ele quer ter esses valores para se sentir melhor.
Esse “querer” depende de uma experiência subjetiva de alguma forma de bem-estar que ele já
viveu.
A ética pode, no jogo, ser relacionada com a autodisciplina. Ter autodisciplina é
controlar a si próprio, concentrar-se, persistir (ter paciência), desenvolver o hábito de observar
as regras e hierarquizar ações a partir da “força de vontade”, do "querer de fato". Seu
desenvolvimento é resultante do exercício da disciplina de respeito a si próprio e aos outros.
53
A questão de La Taille para ética “que vida eu quero viver?” pode ser traduzida, no
contexto do jogo, para “de que forma eu quero jogar?” e esta experiência acompanha a busca
de sentido para o jogar bem (jogar bem é condição necessária para ser um bom jogador). O
como jogar bem deve permitir a “expansão de si próprio” (ser um bom jogador) e, para tanto,
exige autodisciplina.
Vemos que a inteligência permite que as crianças compreendam as regras do jogo (ou
as regras para ser disciplinado) e mostrem-se capazes de diferenciar as condutas certas das
erradas; a afetividade é a energética que guia a criança a “querer superar-se” no jogo (ou na
vida), a partir da “força de vontade”.
No próximo item discutimos a dimensão afetiva explorada por Piaget em seu curso na
Sorbonne (1953-54), pois, o conjunto de interesses, esforços e afetos intra-individuais
(energética), juntamente com a inteligência (estrutura), determinam as ações do sujeito.
2.4 Afetividade na teoria de Jean Piaget
Segundo Piaget (1976/2001), o conhecimento não procede nem da experiência única
dos objetos nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de uma interação
entre ambos, que resulta em construções sucessivas, com elaborações constantes de estruturas
novas.
Assim como o conhecimento, a disciplina não nasce da experiência única dos objetos
nem de uma programação inata pré-formada no sujeito, mas de uma interação entre ambos, é
o “querer” vencer os desafios da tarefa que permite que o sujeito elabore estruturas novas de
disciplina (e conhecimento), que resulta em construções sucessivas.
54
Este “querer” equivale a um termo afetivo. Piaget o denomina como “vontade” (ou
melhor, força de vontade).
Piaget apresenta o desenvolvimento psicológico como uno em suas dimensões afetiva
e cognitiva. Segundo Piaget (1954/2001), a afetividade estimula ou perturba as operações da
inteligência, ou seja, é a energética da conduta: acelera ou atrasa o desenvolvimento
intelectual (mas não modifica as estruturas da inteligência). A energética da conduta vem da
afetividade e as estruturas vêm das funções cognitivas.
Souza (2003) comenta que, segundo Piaget, a evolução da afetividade vai dos
sentimentos instintivos, correspondentes às montagens hereditárias (reflexos), aos sentimentos
interindividuais (simpatias e antipatias) e, posteriormente, aos sentimentos seminormativos
(correspondentes às construções representacionais), para chegar aos sentimentos normativos,
pertencentes a uma escala de valores e a um sistema mais amplo.
Os sentimentos normativos, para Piaget, aparecem no quinto estádio de
desenvolvimento (inicia-se entre os 7,8 anos e vai até a adolescência- 11, 12 anos). Esses
sentimentos referem-se a vontade e aos sentimentos morais autônomos. Assim:
[...] los valores, primitivamente ligados a la situación momentánea,
comenzaban a conservarse desde el estadio anterior. Ahora, van a constituir
progresivamente sistemas coordinados e incluso reversibles, paralelos a los
sistemas operatorios de la inteligencia: serán entonces los sentimientos
morales o los afectos normativos. (PIAGET, 1954/2001, p. 268)
Dessa forma, o “querer” ser disciplinado depende da força de vontade do sujeito, de
como seu sistema de valores se organiza. Ou seja, para agir com disciplina é necessário ou
que ele tenha a disciplina como um valor, ou que a disciplina seja valorizada como meio para
se alcançar uma determinada meta.
A vontade é o instrumento de conservação de valores (é uma das características
afetivas do quinto estádio). Entretanto, Piaget explica que a vontade expressa aqui, não
corresponde a vontade que uma criança manifesta, por exemplo, quando mostra energia para
55
fazer “birra”. A vontade dessa criança ainda é unicamente ligada ao prazer e ainda não está
inserida em um sistema de valores.
Piaget (1954/2001) diz que os comportamentos do estádio dos afetos normativos
caracterizam-se pela existência de conflito entre duas tendências. A tendência inicialmente
fraca deve tornar-se mais forte através do ato voluntário.
Imaginemos como exemplo uma criança na oficina de jogos que ainda não terminou a
atividade proposta e vê seus amigos que já terminaram brincando. Neste momento, ela sente
vontade de ir brincar também. Se ela tem como valor maior “vencer os desafios das tarefas
para se sair bem na escola”, ela deve, através da força de vontade, tornar forte a tendência de
terminar a tarefa (inicialmente fraca) e escolher continuar a atividade. Essa atitude de escolha
é o que caracteriza esse sentimento como “moral autônoma”.
Segundo Souza (2003), para Piaget, a vontade é a responsável pela hierarquização do
sentimentos e valores, pois é essa vontade que permite a regulação das forças em jogo para
tomar decisões, julgar e estabelecer metas a serem atingidas.
[...] la voluntad es una regulación de segundo grado, una regulación de
regulaciones, así como la operación en el plano intelectual es una acción
sobre las acciones. En otras palabras, la expresión de la voluntad es la
conservación de los valores y el acto de voluntad consiste en subordinar la
situación dada a una escala permanente de valores. (PIAGET, 1954/2001, p.
277)
Se o campo afetivo é regulado pela força de vontade, convém explicarmos o que é
regulação para Piaget.
As regulações foram estudadas por Piaget ao longo de boa parte de sua obra.
Regulação é o termo que denomina o conjunto dos conceitos formadores de todo o processo
de equilibração. Queiroz (2000) reflete sobre o termo equilibração:
[...] uma pessoa que sofra uma perturbação qualquer pela alteração do
ambiente em que se encontra. Ela pode ou não reagir à perturbação. Na
56
perspectiva dela, se reage estará vivenciando processos que visem a
reequilibração do seu sistema e, neste caso, estará fazendo uma regulação.
Grifo o verbo para marcar a diferença entre fazer e sofrer uma regulação.
Fazer uma regulação pressupõe uma ação deliberada do sujeito, uma ação
que o conduza a um equilíbrio majorado. Tal equilíbrio é denominado
homeorrético. Ao contrário, sofrer uma regulação denota atitude passiva do
sujeito cujo organismo, de modo autônomo e biológico trabalha
simplesmente em busca do reequilíbrio. Isto constitui um processo de
regulação homeostásica. Por outro lado, não reagir a uma perturbação não se
constitui em regulação alguma, nem dos sistemas cognitivos nem do
organismo do indivíduo. (p. 93)
Em seguida, ele afirma que perturbação é todo fenômeno que provoca alteração no
ambiente. Mas, na perspectiva do sujeito, uma perturbação só se constitui como tal caso o
próprio sujeito possua a estrutura capaz de assimilar o objeto novo ou o elemento perturbador.
Quando surge um fato novo, este pode se constituir em uma perturbação ao esquema do
sujeito. Ele reage a essa perturbação buscando atitudes de compensação. No momento em que
o sujeito se depara com obstáculos frente ao processo de aprendizagem considerados, por ele,
grandes demais ou se simplesmente não tem como valor enfrentá-los, ele pode agir com
indisciplina.
A criança que reage às perturbações ocasionadas pelos jogos ou outras atividades da
oficina, com ações de indisciplina (desatenção, dispersão, desistência ou desrespeito),
dificilmente alcança o equilíbrio esperado na atividade em questão, equilíbrio este que é o
sucesso na realização do jogo ou tarefa (este sucesso não significa necessariamente ganhar o
jogo e, sim, jogar bem, fazendo todas as coordenações necessárias).
Entretanto, quando o sujeito se sente desafiado pela perturbação (no jogo, por
exemplo, quando se vê diante de uma situação-problema) e tem como valor superá-la, ele age
com disciplina (atenção, concentração, persistência, respeito) com o intuito de vencer. Nesta
perspectiva o sujeito reage à perturbação, com disciplina, visando a reequilibração do seu
sistema (regulação).
57
Como já dissemos, o objetivo desta pesquisa é analisar a questão da indisciplina/
disciplina em oficinas de jogos. O local de observação dessa pesquisa foi o Laboratório de
Psicopedagogia (LaPp) do Instituto de Psicologia da USP, integrante do Departamento de
Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do mesmo instituto.
Visto que esse laboratório configura o contexto específico escolhido para essa
pesquisa, julgamos importante descrever as características, estruturas metodológicas e teóricas
das oficinas de jogos e, sobretudo, descrever o referencial prático dessas oficinas.
Com o intuito de delimitarmos o campo conceitual que respalda essa prática,
entrevistamos três profissionais que atuam neste laboratório sobre os temas de disciplina e
indisciplina. Estas entrevistas foram importantes porque ao lado das considerações teóricas,
possibilitaram a construção de um marco de referência para a pesquisa realizada.
2.5 As oficinas de jogos
As oficinas de jogos do Laboratório de Psicopedagogia (LaPp) para crianças contam
com um grupo composto por, em média, doze sujeitos. Funcionam uma vez por semana,
durante uma hora e meia, o que totaliza de 12 a 15 encontros por semestre. As crianças
costumam freqüentar as oficinas por três semestres, ou seja têm, em média, 45 encontros. Elas
são dirigidas, geralmente, por uma dupla ou trio, formados por uma técnica ou por um
monitor (aluno de pós-graduação), um ou dois auxiliares (aluno de graduação) e
supervisionadas por um coordenador (Prof. Dr. Lino de Macedo, orientador dessa pesquisa).
Estas oficinas têm como objetivo principal propiciar o desenvolvimento de atitudes
favoráveis à aprendizagem, tais como atenção, concentração, respeito mútuo, respeito às
regras, interesse, cooperação, organização e autonomia, com a utilização de jogos e desafios
como principal instrumento.
58
Segundo Petty (1995) as oficinas do LaPp tem dois objetivos básicos:
Um deles é promover o desenvolvimento do raciocínio das crianças por
meio de situações em que jogos de regras são instrumentos para exercitar e
estimular um pensar com lógica e critério, porque interpretar informações,
buscar soluções, levantar hipóteses e coordenar diferentes pontos de vista
são condições para jogar (...) O outro objetivo consiste em oferecer uma
oportunidade para as crianças estabelecerem uma nova relação com a
aquisição do conhecimento, que poderá passar a se apresentar como
possibilidade.A idéia é modificar a imagem negativa (seja porque
assustadora, aborrecida ou frustrante) do ato de conhecer, tendo uma
experiência que o ato de aprender é uma atividade interessante, desafiadora
e prazerosa. (p. 2)
A autora a quem nos referimos acima é técnica do LaPp. Esses dois objetivos básicos a
que ela se refere também podem ser compreendidos sob a ótica da disciplina. No primeiro
objetivo percebemos que os jogos de regras como o próprio nome já sugere, exige que a
criança aja considerando regras e limites, obviamente isso desenvolve nela a noção de
disciplinada relacionada a regras (disciplina de sentido 2). O segundo objetivo das oficinas
(oferecer uma experiência em que a aprendizagem seja interessante) favorece o “querer ser
disciplinado”(disciplina de sentido 3): como a criança passa a querer aprender, possivelmente,
ela busca agir com disciplina para realizar as tarefas com sucesso.
Assim, as oficinas do LaPp promovem o desenvolvimento da disciplina de sentido 2
(obediência às regras) e de sentido 3 (autodisciplina).
Como vimos, a disciplina relacionada às regras refere-se à moral (disciplina sentido 2)
e a disciplina relacionada ao “querer” refere-se à ética (disciplina sentido 3).
As oficinas de jogos do LaPp são planejadas pelos profissionais com base no
Construtivismo de Piaget para orientação de suas práticas com o uso de jogos (e outras
atividades) como instrumentos de intervenção.
Nesta perspectiva teórica e prática, as crianças têm oportunidades de desenvolvimento
de autodisciplina para realização de tarefas, pois os jogos e outras atividades utilizadas
59
permitem ao sujeito refletir sobre regras, desenvolver autonomia (ter iniciativa,
responsabilidade e organização com as tarefas).
Segundo Petty (1995), as oficinas podem exercer ação “preventiva” com relação às
dificuldades de aprendizagem. A ação preventiva é trabalhada na medida em que as atividades
propostas nas oficinas estimulam a curiosidade, espírito de investigação e busca de soluções:
“posturas valorizadas na escola e, ao mesmo tempo, exigidas quando se joga”. (p. 3)
Nas oficinas, o jogo, por um lado, é material de exploração para a criança sobre o qual
ela é convidada a pensar, por outro lado, é material de reflexão e intervenção dos profissionais
que trabalham nas oficinas.
As oficinas de jogos promovem o desenvolvimento da ação física e mental da criança.
Ao jogar a criança adquire gradativa autonomia e responsabilidade para tomar decisões e
seguir regras com consciência. Segundo Petty (1995) o estímulo e o espaço para isto
acontecer são garantidos pelas atividades com jogos, pois eles incentivam a ação infantil:
“observar, questionar, discutir, trocar pontos de vista, interpretar, buscar soluções e também
analisar erros (partidas “ruins”), com o objetivo de aprender a identificá-los e superá-los
posteriormente.” (p. 5)
Além disso, no momento em que a criança joga, ela começa a perceber a importância
de valorizar a antecipação e o planejamento: aspectos fundamentais para se jogar certo e bem.
Quando a criança valoriza esses aspectos, ela começa a agir com disciplina, ou seja, ela age
preocupando-se em acertar e realizar bem a tarefa, com atenção, coordenando os possíveis de
cada jogada.
Entretanto, por que ela começa a valorizar esses aspectos? Provavelmente, como diz
Petty (1995), por sentir-se desafiada pelos jogos: ela aprende a persistir, aprimora-se e
melhora seu desempenho não mais como uma solicitação externa, mas, principalmente, como
um desejo próprio de superação, pois quer vencer. Com base nesse “querer” é que nos
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indagamos se, nas oficinas de jogos, crianças que agem com mais indisciplina podem começar
a agir com mais disciplina, por força de vontade.
Além de ser visto como instrumento para o desenvolvimento de autonomia, se
olharmos por outro prisma, o jogo também pode ser visto como elemento disciplinador,
quando há uma pessoa que estabelece e aplica a disciplina, exigindo esforço, vigiando e
punindo, como no caso dos esportes (no futebol, por exemplo), onde há um treinador
exigente.
Se as oficinas de jogos do LaPp valorizassem o jogo como elemento disciplinador, as
crianças poderiam agir com disciplina como uma exigência externa e não interna, de
autodisciplina. O olhar e o uso que se faz do jogo define se ele será um instrumento de
desenvolvimento de disciplina exógeno, disciplinador (heteronomia); ou endógeno, de
autodisciplina (autonomia). Nas oficinas de jogos oferecidas no LaPp o olhar que se faz do
jogo, como já dissemos, dirige-se para o desenvolvimento da autonomia.
As oficinas de jogos do LaPp propiciam o desenvolvimento da disciplina, pois como
vimos acima, os aspectos que as oficinas promovem- atenção, concentração, organização,
planejamento, respeito, autodisciplina, dentre outros- corroboram para que a criança aja
disciplinadamente.
Com o objetivo de termos uma referência prática realizamos uma entrevista com
alguns profissionais deste laboratório. Assim, pudemos conceituar melhor qual é a concepção
dos profissionais sobre disciplina e indisciplina nas oficinas de jogos do LaPp.
Entrevistamos três profissionais cujos nomes manteremos ocultos. Utilizaremos siglas
para nos referirmos a elas: E1, E2 e E3.
61
2.5.1 Entrevistas
As entrevistas foram realizadas para que pudéssemos construir um olhar sobre o que
pensam os profissionais que trabalham com oficinas de jogos sobre a questão da disciplina e
indisciplina. Essas entrevistas caracterizam nossa referência prática do trabalho realizado nas
oficinas de jogos do LaPp e nos permitiram ter uma base para categorizarmos as ações das
crianças (que foram observadas e registradas).
Optamos por realizar entrevistas semi – dirigidas com um roteiro de questões
previamente definido. Formulamos questões sobre categorias que, para nós, denotam ações de
disciplina e indisciplina em processos de aprendizagem.
As perguntas tiveram como base os seguintes temas: atenção/desatenção,
concentração/dispersão, perseverança/desistência, respeito/desrespeito aos colegas, às regras
das oficinas, aos profissionais e trapaça. O roteiro da entrevista encontra-se no Anexo A.
Cada entrevista foi realizada individualmente, com a presença da pesquisadora e da
entrevistada, em dias diferentes, sendo que duas foram feitas no LaPp e uma em consultório
particular da entrevistada por opção das profissionais devido a facilidade de acesso aos locais.
Convidamos as participantes, por e-mail, explicando sobre os objetivos de nosso estudo e
adiantando que faríamos questões relativas a definições e exemplos (no contexto do jogo, da
oficina) de atitudes de disciplina e, logo em seguida, do seu oposto, indisciplina. Já no
momento da entrevista, antes de iniciarmos as perguntas, retomamos a explicação sobre nosso
trabalho e, principalmente, nosso objetivo com a entrevista. Depois, solicitamos a todas a
autorização para gravarmos a conversa e elas pareceram desinibidas com o uso do gravador.
No Apêndice E encontra-se o modelo do “Termo de autorização para participação em
pesquisa acadêmica” utilizado.
62
Além de o contexto e o assunto serem-lhes familiar, procuramos deixá-las tranqüilas
para falar no tempo que quisessem. As entrevistas duraram, em média, uma hora.
Apresentamos as respostas das profissionais entrevistadas separadas por categorias:
atenção/desatenção, concentração/dispersão, persistência/desistência, respeito/desrespeito (aos
colegas, às regras da oficina e às regras das atividades- trapaça). Cada categoria é resumida
em uma narrativa e ilustrada com extratos da própria entrevista.
Como já dissemos, as profissionais entrevistadas foram caracterizadas com as siglas
E1, E2 , E3 para preservação da identidade das participantes.
Atenção/Desatenção
Com base nos extratos das entrevistas realizadas com as profissionais, apresentados a
seguir, pode-se resumir que, para elas: atenção é estar focado em uma determinada atividade,
trabalhar em prol desse foco e ao mesmo tempo, considerar outras coisas que estejam
acontecendo, mantendo-se aberto, receptivo para receber diferentes informações. Segundo
uma delas, atenção também pode estar relacionada a manter o foco em determinada coisa
deixando de lado, do ponto de vista cerebral ou neurológico, outros estímulos.
Ficar atento é focar o olhar sobre algo que precisa analisar, perceber, enfim, explicar sobre
(...) mas você pode estar atento a muitas coisas ao mesmo tempo, por exemplo: eu estou
atenta a conversa que estou tendo com você agora, mas eu também estou atenta ao ambiente
onde a gente está inserida, aos barulhos que tem na casa, à campainha que vai tocar (...)
então, eu acho que você pode estar atento a muitas coisas ao mesmo tempo, sendo que o
foco principal é aquilo que você está querendo analisar . (E1)
Atenção é um movimento em prol ao trabalho. Por exemplo, o Pega – Varetas, uma criança
pode estar atenta ao jogo e não ser sua vez de jogar, então ela não está completamente
focada, mas ela está atenta, ou seja, ela está sentada na roda, ela sabe o que está
acontecendo no jogo, ela sabe de quem é a vez, ela está observando as varetas que estão
espalhadas, percebe que a criança que está jogando mexeu uma vareta ou não, mas ela não
está completamente concentrada no que está acontecendo porque ela está atenta, mas não
concentrada na tarefa. Ela está vendo o que está acontecendo, ela conversa, ela vê que o
outro está jogando, vê de quem é a vez, espera a vez dela, vê se vai demorar... (E2)
63
Atenção é um processo que acontece quando a criança ou o adulto (pra mim tanto faz) tem
um foco sobre um determinado objeto, sobre uma determinada ação. Ou seja, ela tem a
possibilidade de, entre as várias informações que o ambiente está oferecendo, fazer essa
seleção. Então ela foca o olhar numa determinada coisa, deixando de lado, do ponto de
vista cerebral, neurológico, outros estímulos (...) você foca o olhar num determinado recorte
de uma realidade e despreza, vamos dizer, momentaneamente, outros recortes... por um
processo necessário, inclusive, e positivo pra que a gente possa aprender e compreender uma
série de coisas da realidade. (E3)
As entrevistadas entendem desatenção como não estar focado a elementos que
corroborem para a atividade proposta, ou seja, consideram desatenção, desviar a atenção para
coisas que não estejam no contexto da atividade. Para E1, além disso, desatenção refere-se a
um problema emocional, mais especificamente ao querer / não querer jogar e à baixa
tolerância à frustração. E2 considera difícil detectar a desatenção com base na simples
observação, pois o fato de a criança, por exemplo, estar olhando para a professora no
momento da explicação, não significa que está prestando atenção: ela pode estar pensando em
outra coisa. E3 explica que processos cognitivos, afetivos e sócio – afetivos, muitas vezes,
explicam a desatenção. Por exemplo, um aluno pode mostrar-se desatento porque vive,
naquele momento, muita ansiedade, angústia, pressão, sente falta de confiança em si ou ainda
não desenvolveu recursos cognitivos mínimos para resolver aquela tarefa.
A desatenção seria você não estar nem na sala. Então, o professor está dando aula e você está
prestando atenção no carro que buzinou, está pensando no seu namorado: você muda de ambiente,
você não está lá. Isso é uma coisa que é difícil de observar, não é? Porque eu não sei o que se passa
na cabeça da criança enquanto ela está pensando e eu explicando uma tarefa, por exemplo, se ela
está olhando pra mim é difícil eu saber se ela pensa no namorado... Isso você não pode impedir, mas
você pode impedir que crianças que além de estarem muito desatentas, não estão corroborando com o
projeto. Então a professora está dando aula e a criança cutuca o colega. A professora pergunta em
que página está ou qual é o assunto e ela não tem a menor idéia, está boiando... uma criança que está
atenta, não está necessariamente focada, mas ela sabe o que está acontecendo, ela está lá, está dentro
da sala de aula, ela sabe que o professor está dando aquele assunto. (E 1)
Desatenção é um desvio de assunto para coisas que não tem nada a ver com o contexto em que você
está inserido. Acho que você pode até falar casos que remetam a coisas que tenham alguma coisa a
ver com aquele assunto, mas você tem que ter a capacidade de voltar no assunto, então, estar atento
para mim não é que você não possa sair do assunto, mas é: “você pode até circular, dando exemplos,
notícias, enfim, coisas que estão meio paralelas e que aparentemente não tem nada a ver, mas que
você encontra uma relação e você traz de novo, você consegue afunilar de novo para aquilo que você
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está analisando (...) a criança fica mais atenta quando ela quer (...) se uma criança começar a
perder seqüencialmente ela talvez não tope jogar mais e a atenção dela cai. (E2).
Do ponto de vista cognitivo, você poderia até pensar em dois níveis: a criança que, por alguma razão,
ou porque ela ainda não tem os recursos cognitivos mínimos para entender aquele jogo, ou porque
aquilo, naquele momento, não desencadeou um interesse, não desencadeou uma necessidade de
solução. Ela pode, de repente, brincar com as peças, jogar no colega, etc... Estou citando a questão
do ponto de vista cognitivo. Seria assim, ela está desatenta, se ela permanece dispersa, porque faltam
aí alguns recursos cognitivos mínimos pra que aquela tarefa desencadeie nela a necessidade de
solução, ou essa tarefa está muito difícil para que ela possa alcançar minimamente (...) Você
também tem os aspectos que percorrem esses processos que são afetivos, que podem revelar, na
verdade, uma desorganização psicológica da criança, ou fatores do tipo, uma ansiedade muito
grande, uma angústia muito grande, que provocam essas situações de desatenção e de dispersão (...)
tem também a presença de questões mais sócio- afetivas vamos assim dizer, que são: a falta de
confiança em si, ausência de autonomia, falta de comprometimento com uma tarefa, o traço da
ansiedade, da angústia ( ...) É difícil que você tenha só o aspecto sócio-afetivo ou só o aspecto
cognitivo. Até porque, na teoria piagetiana, a questão do esquema cognitivo é, ao mesmo tempo,
afetivo, então não há essa separação. (...) A desatenção está presente, por exemplo, no momento em
que um grupo está ouvindo um conjunto de regras: o docente está apresentando as regras de um
determinado jogo e tem um certo aluno que está desatento, de forma que ele não consegue
minimamente reter as informações colocadas pelo docente. (E3)
Concentração/Dispersão
As entrevistadas definiram concentração como atenção sobre um determinado foco.
E1 e E2 disseram que a atenção possibilita considerar muitas coisas ao mesmo tempo. E3
explica que a palavra concentração significa co + centrar. Co é o mesmo que junto, ao mesmo
tempo e “centrar” significa dirigir a atenção. Assim, para E3 concentrar é considerar várias
coisas, ao mesmo tempo. Por exemplo, para resolvermos um problema, precisamos estar
atentos às várias informações que podem nos ajudar a solucioná-lo.
Seria um tipo de foco, então, você põe uma iluminação especial, como no teatro, você ilumina a
pessoa. O lugar está iluminado, mas você está dando mais um canhão de luz naquilo que você está
executando. A concentração seria uma atenção focada em um problema específico. (...) Então, por
exemplo, no Pega- Varetas, a criança é o jogador da vez, então além de ela ter que estar atenta aos
colegas, aos comentários, ao barulhos que tem em volta, ela tem que ter um foco para pensar:
“Qual é a vareta que eu vou pegar? O que eu vou fazer?” Ela tem que ter uma dedicação
exclusiva.”(E1).
Eu quero resolver esse problema de matemática e às vezes eu estou tão concentrada que a minha
atenção ao que está ao lado fica prejudicada (...) eu estou concentrada no que estou fazendo agora,
não estou concentrada no barulho da rua, no barulho do avião. (E2)
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Concentração envolve a atenção enquanto possibilidade de focar determinadas coisas (...) como a
própria palavra está dizendo: co + centrar significa eu me centrar simultaneamente em várias
coisas (...) se uma criança vai resolver uma situação-problema, precisa prestar atenção nas várias
informações e relacioná-las. Então tem os dois processos. Atenção e concentração têm a ver com a
questão do raciocínio (...) Poderia até dizer que essa criança consegue, por conta dos seus impulsos
cognitivos, centrar atenção numa única parte do problema, ela deixa de lado as outras informações,
portanto ela não tem mais a possibilidade da solução porque ela não tem as várias informações ao
mesmo tempo. (E3).
Segundo as entrevistadas, dispersão significa perder o foco, ou melhor, não suportar
olhar para uma mesma tarefa durante um longo tempo. E2 explica que dispersão é tentar fazer
várias coisas simultaneamente sem acabar nenhuma. E3 considera que é a perda da
capacidade de prestar atenção em várias coisas ao mesmo tempo e colocá-las em relação umas
com as outras.
É um pouco difícil você diferenciar dispersão de desatenção. A dispersão é no sentido do não foco, se
eu preciso focar na minha vez de jogar e eu fico prestando atenção no colega que cutucou, eu perco o
foco (...) você precisa ter uma atenção focada, estar concentrado, porque é a sua vez (...) a criança
desconcentrada, dispersa, seria, por exemplo, no momento em que ela for fazer uma tarefa, pegar na
vareta, prestar atenção no outro que está cutucando. (E1)
Dispersão é não agüentar focar o olhar sobre uma mesma tarefa durante muito tempo. Ser disperso
é falar três, quatro coisas ao mesmo tempo, tentar fazer várias coisas simultaneamente sem
conseguir acabar nenhuma. As crianças se dispersam muito na hora do jogo: às vezes olham coisas
fora da janela, às vezes se distraem com um barulho, às vezes lembram de um assunto na hora do
jogo: “sabe, esqueci de te contar!” aí já emendam um assunto no outro e o jogo sai de cena. (E2)
Você está explicando um conjunto de regras e esse aluno está voando, ele presta atenção na cortina,
no lustre, no colega que se mexeu, no barulho da cadeira, etc. Obviamente isso também provoca o
primeiro processo: a desatenção, pois ele também não foca em nada especificamente, por exemplo, se
ele está diante do jogo, ele olha as peças, mas não com a intenção de compreender o jogo.(...) O
dispersivo olha para muitas coisas ao mesmo tempo, mas não as coloca em relação umas com as
outras. (E3)
Persistência/Desistência
As entrevistadas disseram que persistência significa manter as ações dirigidas a um
objetivo, mesmo que seja necessário repeti-los, reformulá-los e não desistir apesar das
circunstâncias, ainda que demore muito tempo. Além disso, E2 esclarece que todos os jogos
trabalham a perseverança e o profissional deve, através do uso de jogos, desenvolver essa
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persistência. Para E1 persistência pode resultar em estereotipia quando se repete de uma
forma rígida, sem críticas.
É você não abandonar a situação, é você tentar seus melhores recursos para enfrentar um desafio,
para superar obstáculos, para resolver um problema (..) Uma coisa é assim, você quer abrir uma
tampa, você vai lá e abre, outra coisa é você tentar abrir a tampa e ela não abre... então você faz mais
força, você pega um paninho, dá uma batidinha na mesa (...) Tem criança que está jogando mal e
não pesquisa outras formas de ação, outros procedimentos. Então elas têm um comportamento de
persistência, só que usando sempre a mesma fórmula, a mesma ação e aí fica uma persistência sem
crítica (...) você tem que ter a crítica, porque se não fica numa coisa sem móvel, uma coisa
“emburrecida”... então tem que diferenciar. (E1)
O perseverar é quando você concorda fazer outra vez, jogar de novo, até em outros momentos (...)
todos os jogos desenvolvem perseverança (...) Existem jogos que são mais rápidos, como os de
percurso, por exemplo, jogo da velha, ta te ti, são jogos bem rápidos em que uma partida dura dois,
três minutos, . Na verdade, a gente vai desenvolvendo na criança esse tempo de latência, de agüentar
ficar sobre uma tarefa (...) Por exemplo o Tangran é um jogo que ensina a pessoa a ser perseverante,
quem não é perseverante é muito pouco provável que comece tendo sucesso no Tangran, porque você
faz de um jeito, faz de outro, vira as peças, analisa, descobre porque não coube, faz uma análise da
projeção das peças... existem vários jeitos para trabalhar...O Quatro Cores, por exemplo, eu acho que
trabalha a perseverança de um jeito um pouco diferente.... a figura de vinte, vinte e quatro regiões
(geralmente é o tamanho que a gente usa) são figuras que cansam (...) No Dominó do Quatro Cores
você vira a peça de um lado, vira pro outro, vai fazendo você recomeçar... envolve paciência sobre
um produto que ainda está inacabado, há um objetivo lá longe... eu sei onde eu quero chegar e eu vou
descobrir caminhos, mas eu não sei o caminho ainda, quer dizer, eu vou ter que construir esses
caminhos.” (E2)
Eu posso analisar, examinar porque eu errei, porque eu fracassei e pensar o que eu posso modificar
nesse sentido, o que eu posso transformar, portanto essa seria uma ação transformadora. (...)
Persistência é persistir, tolerar (...) é uma energia interior que apesar da frustração, apesar do
perder, apesar da auto – estima rebaixada, a criança não desiste.” (E3).
As entrevistadas definiram desistência como ação indicadora de falta de
continuidade. E3 relaciona desistência à baixa tolerância à frustração: quando um problema é
muito difícil, a criança coloca em dúvida sua capacidade de realização e desiste de tentar. E1
relaciona desistência com falta de atenção e concentração. Cita o exemplo de crianças com
tempo de concentração muito baixo para realizar uma tarefa. Afirma que as crianças pensam
que tentaram muito quando, na verdade, persistiram pouco. E1 complementa dizendo que a
desistência varia conforme a tarefa e a idade da criança. E2 considera que dispersão e
desatenção são ações que expressam indicativos de desistência.
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A persistência tem a ver com a questão da atenção, da concentração... por exemplo, existe criança
que tem o tempo de concentração muito baixo pra realizar uma tarefa, então elas tentam e elas
pensam que elas tentaram muito, quando na verdade, tentaram muito pouco tempo... então elas
persistem pouco (...) desistência é variável conforme a idade da criança, conforme a tarefa (tem que
avaliar), porque o professor pode planejar um jogo muito complexo pra idade da criança. (E1)
A dispersão e a desatenção mostram as ‘quebradas’ da persistência, ou seja, mostram desistência.
Eu acho que o desistente é insatisfeito porque ele está sempre precisando começar uma coisa nova. A
desistência se manifesta na hora do jogo, por exemplo, em crianças que jogam uma vez e não querem
jogar mais, crianças que chegam no meio da partida e dizem que estão detestando o jogo (o desafio
do jogo não “agarra”, não “ganha” a criança). Crianças irriquietas, agitadas são mais desistentes.
É difícil você ver uma criança plácida desistir de uma tarefa. (E2)
A desistência está muito relacionada à baixa tolerância à frustração. Às vezes uma criança antecipa
que vai perder antes de jogar e não joga: “eu não vou jogar porque sei que vou perder, eu sou
burro” (...) a criança vira e diz assim: “Ai, eu posso trocar de jogo?” Ou ela vira e fala: “Eu não
gosto desse jogo! Isso aqui é muito chato!” (...) tentativa de provocar um conflito no jogo: “Você
jogou agora e não era a sua vez! Era a minha vez”, começa uma briga para interromper a partida e
aí ela pensa: logo, eu não jogo mais. É uma forma de escapismo, a primeira e a segunda situação que
eu falei. Aí você tem outras formas que é: a criança até agüentar terminar a partida, mas aí
imediatamente ela quer fazer outra coisa, ou ela tem atitudes destrutiva em relação ao material; são
ações negativas onde ela joga o material, fala de maneira ríspida, ou simplesmente, fica emburrada,
aborrecida, chateada. (E3)
Respeito/Desrespeito aos colegas
As entrevistadas relacionam o desrespeito aos colegas com: manipulação das regras,
roubar, agressão verbal, ironia, sarcasmo e trapaça. Além disso, consideram desrespeito às
regras da oficina, desrespeito às regras do jogo e desrespeito ao ambiente social como formas
de desrespeito ao colega também.
Para E3, toda vez que um indivíduo não considera o outro, seja num sentido cognitivo,
seja num sentido sócio – afetivo, ele provoca uma situação de “desrespeito ao colega”. E2
divide o desrespeito em dois tipos: verbal (quando se diz algo que ofende o colega) e
atitudinal (quando se faz algo que invade o espaço do outro). E1 cita diferentes exemplos de
respeito ao colega na hora do jogo: respeitar as regras, ouvir o colega, não atrapalhar seus
deslocamentos.
68
Na situação do jogo o respeito seria: respeitar as regras, se você respeita as regras do jogo, você
invade menos o espaço do outro, ou seja, você desrespeita menos o colega. Quais são as regras do
jogo? Você joga os dados, você joga as varetas.... respeitar as regras do jogo é respeitar o ambiente
social, que é saber esperar a vez, ouvir quem está falando, não invadir a área alheia (...) no Pega –
Varetas o desrespeito seria: eu estou jogando, vem o outro e pisa, vem o outro e me empurra, a
vareta cai perto dele e ele não se move, não favorece o deslocamento do colega. (E1)
O desrespeito aos colegas pode ser do ponto de vista verbal: falar ofensas, falar coisas que são
pejorativas, fazer comentários que diminuam o outro e que procurem espezinhá-lo. Para mim, o
desrespeito tem a ver com espaço, ou seja, se você estuda em um mesmo lugar, você deve respeitar o
espaço da outra pessoa (seja a sala, o material, a mesa) é um desrespeito diferente, não é o verbal,
mas é o da ação. Acho que quando você não inclui o outro na sua vida cotidiana, não o considera,
de certa maneira você desrespeita o outro. (E2)
A trapaça, por conseqüência, é uma forma de desrespeito aos colegas. Toda vez que de alguma
maneira a criança não considero o outro, a perspectiva do outro, seja num sentido cognitivo, seja
num sentido social – afetivo, ela provoca uma situação de desrespeito (...) Não respeitar a regra do
jogo, não chegar no horário da oficina, não respeitar a vez de falar do colega, atrapalhar o
andamento das atividades, fazer brincadeira fora de hora, fazer barulho (arrastar cadeira) são
formas de desrespeito ao colega.” (E3)
Respeito/Desrespeito às regras da oficina
As entrevistadas explicam o respeito/desrespeito às regras da oficina através de
exemplos dos combinados feitos nas oficinas, da organização desta e do cuidado necessário
aos materiais.
Nós temos vários combinados aqui na oficina. Então quem chega marca presença, cumprimenta
quem está aqui, olha o quadro, visualizando as tarefas do dia. Há um jeito de distribuir material
que não é todo mundo se atropelando, tem uma organização... guardar as pastas no mesmo lugar.
(E1)
O desrespeito às regras da oficina seria quebrar combinados, desrespeitar o material, tirar os
materiais do armário e não ajudar a guardar, estragar os materiais. (E2)
O desrespeito às regras da oficina seria a criança quebrar algum tipo de combinado formulado
como regra para a oficina. (E3)
69
Respeito/Desrespeito às regras do jogo (ou atividade proposta)
A ação de desrespeito às regras do jogo (ou atividade proposta) é definida pelas
entrevistadas como roubar, tentar ir contra as regras estabelecidas pela atividade, não respeitar
a vez do colega, não se preocupar em conservar o material (tabuleiro, peças etc.) e atrapalhar
o andamento do jogo com brincadeiras.
E2 e E1 fazem uma relação entre o desrespeito às regras do jogo e a trapaça, pois
quando elas trapaceiam, burlam as regras do jogo para ter algum tipo de favorecimento. E1
diz que toda trapaça é uma forma de desrespeito às regras do jogo, mas nem todo desrespeito
às regras do jogo é uma forma de trapaça.
O desrespeito às regras do jogo às vezes sinaliza uma situação que a criança não sabe direito a
regra. Então a criança pode não estar agindo intencionalmente. Por exemplo, no jogo Quatro Cores,
a criança está pintando com quatro cores e, de repente, ela pinta duas regiões da mesma cor, mas ela
fez isso porque esqueceu que não podia pintar e, nesse momento, o professor deve intervir
perguntando para a criança o que é uma cilada e esclarecer a situação para ela. Eu acho que trapaça
é sempre desrespeito à regra do jogo, mas desrespeito às regras do jogo nem sempre é trapaça. (E1)
Desrespeitar as regras do jogo, por exemplo, é fazer trapaça. Estou lembrando de uma aluna que
tinha baixíssima tolerância à frustração, ao erro, etc., ela antecipava que em uma determinada tarefa
ela não ia se dar bem (em função de uma auto – estima baixa e etc.) e na hora do jogo, toda vez que
ela se via em uma situação que ela pensava que não iria conseguir, ela mudava as regras do jogo
para tirar vantagem, tirar proveito. Não é um erro estratégico, é uma trapaça, porque a pessoa está
consciente do que ela está fazendo. (E2)
Desrespeitar as regras do jogo é não respeitar as próprias regras do jogo, não respeitar a vez do
colega, não se preocupar em conservar o material (tabuleiro, peças etc.), atrapalhar o andamento
do jogo com brincadeiras, trapacear... (E3)
Trapaça
As profissionais consideram trapaça a tentativa de haurir um benefício através de
meios ilícitos. Explicitam que os motivos da trapaça podem indicar uma maneira de superação
70
de frustrações, ou seja a criança tenta, de alguma maneira, superar a baixa tolerância à
frustração pelos meios não convencionais, pelos meios mais fáceis, porque ela quer vencer
mesmo que seja fora das regras.
E2 diz que trapacear é um índice de inteligência. Segundo ela, para que uma criança
trapaceie, ela precisa ter percebido muitas coisas sobre a estrutura da partida. Ao dominar a
estrutura, a criança acha que existe algo que a atrapalha vencer, que está difícil e, então,
constrói outro caminho (a trapaça). Além disso, E2 considera que dominar a estrutura
significa um avanço cognitivo. Porém ela adverte que pode existir uma confusão, pois, às
vezes, as crianças não entenderam as regras e o profissional imagina que ela está trapaceando.
Trapaça é quando você sabe a regra do jogo e você tenta, de alguma maneira, burlar a regra do
jogo com o intuito de se beneficiar de uma situação. Por exemplo, você jogou o dado e tirou 5, mas
você queria ter tirado 2 porque você poderia avançar 6 casas depois, então (caso ninguém tenha visto
seu número) você diz que tirou 2. (E1)
A tentativa de trapacear é um índice de inteligência, porque para trapacear a criança já precisa ter
percebido muitas coisas sobre a estrutura daquela partida. E aí, dominando a estrutura, tem alguma
coisa que ela acha que é uma “pedra no sapato”, que está difícil e constrói outro caminho. A criança
não consegue trapacear se ela não dominar a estrutura e dominar a estrutura já significa um
avanço, para construir uma trapaça é necessário compreender muita coisa. Agora pode existir uma
confusão... porque às vezes as crianças não entenderam as regras, não sabem exatamente o que
estão fazendo, dão tiro no escuro e a outra pessoa acha que ela está trapaceando. Vou dar um
exemplo clássico no Quatro Cores: a criança precisa usar quatro cores, ela mistura as cores num
primeiro momento... pega mais que quatro. Bom, ou ela não entendeu a regra, ou ela não está
preocupada com aquilo, ou ela esqueceu, então isso não é exatamente trapacear (...) pode ser que a
pessoa use essa estratégia como se fosse uma malandragem... pode ser que por simples coincidência
ela use mais cores e isso a acalma por dentro. (...) Para mim, a trapaça só é trapaça de verdade se eu
investigar e perceber que a criança está fazendo aquilo como uma escapatória, como um escape de
uma situação que ela não consegue resolver ainda. (E2)
Às vezes uma criança antes de jogar, antecipa que vai perder e pensa: ‘eu não vou jogar, porque sei
que vou perder, eu sou burro...’ então ela trapaceia. Ela guarda a carta na manga, tenta fazer algum
artifício para tentar trapacear. O trapaceiro também revela uma baixa tolerância à frustração (...) a
criança tenta, de alguma maneira, superar isso (histórias de frustrações) pelos meios não
convencionais, pelos meios mais fáceis, porque ela quer sentir que joga bem, mesmo que seja fora
das regras, ela quer vencer mesmo que seja fora das regras. (...) então ela vai ter uma saída dessa
natureza. (E3)
Como já dissemos, essas entrevistas serviram como base para ajustarmos nosso olhar
ao observarmos as ações da crianças nas oficinas e categorizarmos suas atitudes como ações
71
de disciplina ou indisciplina. A partir de então, adotamos (tanto para a observação como para
a análise posterior) as categorias de disciplina como: atenção/concentração, persistência,
respeito aos colegas, às regras das atividades, às regras da oficina e de indisciplina como
desatenção/dispersão, desistência, desrespeito aos colegas, às regras das atividades, às regras
da oficina e trapaça.
72
CAPÍTULO 3 – MÉTODO
Nosso estudo teve como objetivo identificar ações de indisciplina em crianças em
situação de oficinas de jogos. Como já dissemos, escolhemos esse contexto porque inferimos
que a dimensão lúdica presente nos jogos e outras atividades propostas nas oficinas despertam
o interesse das crianças para aprender em meio a regras.
O tema indisciplina/disciplina é considerado fundamental para a aprendizagem escolar
e a vida em geral. Essa questão sempre esteve presente nas oficinas do Laboratório de
Psicopedagogia (LaPp), mas ainda não havia sido foco central dos estudos já produzidos. Foi
nesse sentido que buscamos contribuir com o presente trabalho.
3.1 Participantes
As três crianças escolhidas como sujeitos dessa pesquisa são provenientes de uma
entidade civil de natureza promocional, sem fins lucrativos que atende filhos de dependentes
químicos em horário contrário ao da Escola.
As crianças são oriundas de famílias com baixa renda e têm um ou ambos os
progenitores dependentes químicos. Elas freqüentavam o atual quinto ano de uma escola
pública do Ensino Fundamental da cidade de São Paulo, entretanto estudavam em salas de
aula diferentes. Duas tinham 10 (C2 e C3) e outra (C1) 11 anos de idade. Segundo a diretora
da ONG, as crianças tinham queixas de insucesso na aprendizagem escolar (assim como a
maioria das crianças que freqüentam o LaPp).
73
As três crianças foram escolhidas ao longo das cinco primeiras oficinas por
apresentarem maior número de comportamentos de indisciplina observados pela
pesquisadora.
O modelo do termo de autorização e do termo de colaboração em pesquisa acadêmica
que foram assinados pelos responsáveis das crianças, encontram-se nos Apêndices C e D,
respectivamente..
3.2 Local
O local de investigação da presente pesquisa foi o Laboratório de Psicopedagogia
(LaPp), do Instituto de Psicologia da USP, integrante do Departamento de Psicologia da
Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do mesmo instituto. Situa-se no bloco
B, 1
o
. andar, salas 250 e 252.
O LaPp funciona desde 1988. Ao longo desse período – até o momento desta pesquisa,
muitas oficinas de jogos foram oferecidas a crianças, adolescentes, adultos (professores,
profissionais) e idosos, com o objetivo de desenvolver habilidades cognitivas, afetivas e
sociais da população atendida, além de realizar estudos das relações entre o jogo, os
profissionais do laboratório, as crianças ou as habilidades adquiridas. Além das oficinas de
jogos, os profissionais deste laboratório ministraram diversos mini – cursos, grupos de
estudos e formação a professores e profissionais interessados, sempre com base na
epistemologia genética de Piaget.
A população atendida até o momento (final de 2006) divide-se em: 1071 crianças; 44
adolescentes; 28 idosos; 1153 professores, perfazendo um total de 2296 pessoas beneficiadas
74
com o trabalho oferecido no LaPp.
Como já dissemos, as oficinas para crianças contam com um grupo composto por, em
média, doze sujeitos. Funcionam uma vez por semana, durante uma hora e meia, o que
totaliza de 12 a 15 encontros por semestre, são dirigidas, normalmente, por uma dupla ou trio,
formados por uma técnica ou por um monitor (aluno de pós-graduação), um ou dois auxiliares
(aluno de graduação) e supervisionadas por um coordenador (Prof. Dr. Lino de Macedo,
orientador dessa pesquisa).
No ano de 2005, a oficina que é objeto de observação dessa pesquisa foi dirigida por
uma técnica, uma monitora (aluna de mestrado), dois auxiliares (alunos do terceiro ano de
Psicologia), supervisionada por um coordenador e ministradas a doze crianças que cursavam
o atual quinto ano do Ensino Fundamental da rede pública.
3.3 Instrumentos
Para realizar esta pesquisa, utilizamos o seguinte instrumento:
Registros de observação escritos e produzidos no decorrer do processo
de oficinas de jogos do LaPp (março de 2005 a julho de 2006)
3.4 Procedimentos de coleta de dados
3.4.1 Registros de observação
Ao longo do trabalho nas oficinas (três semestres) realizamos, regularmente, registros
de observações de ações indicadoras de indisciplina das crianças. Este instrumento constituiu
um espaço observacional dedicado à coleta de dados sobre cada sujeito desta pesquisa.
75
Não tínhamos um foco específico sobre o registro de suas atitudes em relação às
tarefas, professores, colegas, etc. Nosso olhar era voltado às crianças em todo o processo da
oficina e, quando percebíamos uma ação de indisciplina, a registrávamos.
Por meio desses registros pudemos extrair, além de ações indicadoras de indisciplina e
o conseqüente desenvolvimento atitudinal de cada uma das três crianças, informações sobre a
estrutura (metodologia e organização) do LaPp.
Esse instrumento também contribuiu para que avaliássemos nosso olhar frente às
ações indicadoras de indisciplina permitindo que ajustássemos nosso foco no decorrer das
oficinas.
Os conteúdos dos registros de observação foram sistematizados e analisados, de
acordo com a proposição de Bardin (1977/1995). O instrumento de investigação que ela
propõe denomina-se Análise de Conteúdo e difere daqueles que buscam rigor metodológico
através de saberes construídos. Este recurso lida com inferências e demonstra ser útil, pois
busca compreender os conteúdos das comunicações para além dos seus significados
imediatos. Segundo ela, Análise de Conteúdo é:
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter, por
procedimentos sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção / recepção (variáveis
inferidas) destas mensagens. (
BARDIN,1977/1995, p. 42)
Procuramos levantar os aspectos relativos aos sujeitos que convergiam para a
dimensão atitudinal de indisciplina, caracterizando, dessa forma, suas ações nessa perspectiva.
Dividimos as ações observadas em categorias: dispersão/desatenção, desrespeito (às regras do
jogo ou atividade proposta, aos colegas, às regras da oficina), desistência e trapaça. As ações
de disciplina (ações positivas) não foram foco de nossa observação nas crianças, pois
acreditamos que elas seriam um ponto de chegada. Comentamos sobre as categorias de
disciplina: atenção/concentração, respeito e persistência na Discussão desse trabalho.
76
CAPÍTULO 4 – RESULTADOS
A apresentação dos resultados consistiu no destaque de registros de observação em
três crianças (C1, C2 e C3), de modo a ilustrar ações de indisciplina em uma situação de
oficina de jogos. No final deste capítulo as observações foram reunidas em quadros sobre as
ações indicadoras de indisciplina em dois momentos significativos: jogos (e outras atividades
propostas) e reflexão. Por último, apresentamos quadros sobre a freqüência das ações de
indisciplina de cada criança ao longo dos três semestres observados.
Como mencionado, as crianças cujas ações foram analisadas receberam as siglas C1,
C2 e C3. As demais crianças foram referidas com as siglas X1, X2, X3...X9.
Como já citamos na metodologia deste trabalho, no ano de 2005 e 2006, a equipe de
professores da oficina observada foi composta por uma técnica, uma monitora (aluna de
mestrado), dois auxiliares (alunos do terceiro ano de Psicologia). Visto que esses professores
não são objetos de nosso estudo, optamos por mencioná-los sem diferenciação hierárquica
(técnica, monitora, auxiliares). Assim, substituímos seus nomes e cargos simplesmente por
P1, P2, P3 e P4.
4.1 Atividades realizadas ao longo das oficinas
A seguir serão apresentadas listas das oficinas com os jogos e atividades realizadas a
cada encontro. Descrevemos os instrumentos (jogos e outras atividades), utilizados no
momento em que estávamos registrando as ações das crianças, para que o leitor possa
compreender a dinâmica da oficina no instante em que a ação foi observada. Essa descrição
detalhada encontra-se no Anexo B.
77
Conforme já citamos, as oficinas de jogos seguem quatro movimentos: lista de presença,
atividade inicial, atividade principal (jogo ou outras atividades gráficas) e momento reflexão.
Abaixo seguem os quadros referentes às atividades realizadas ao longo dos três
semestres:
Encontro DATA ATIVIDADE
INICIAL
ATIVIDADE
PRINCIPAL
MOMENTO REFLEXÃO
14/03 Planejamento, arrumação de material
21/03 RECESSO
28/03 Planejamento, arrumação de material
04/04 Apresentações
(roda)
Imagem &
Ação
Entrevista com amigos
11/04 Auto - Retrato Imagem &
Ação
Descobrir quem é pelas
características descritas no Auto
– Retrato
18/04 Imagem &
Ação
Descobrir quem é pelas
características descritas no Auto
– Retrato
25/04 Jogo dos sete
erros
Imagem &
Ação
“Imagine que a professora pediu
silêncio, mas você já está
cansado. O que você faz?”
02/05 Figura- Fundo Qual é a
mensagem?
Quando as pessoas não te
entendem, o que você faz?
09/05 Caça
palavras
Qual é a
mensagem?
Feche a Caixa
“Você já ficou de castigo?
Como foi? Você achou justo?”
16/05 Forca Feche a Caixa
“O que você sabe ensinar”?
“Pra quem você já ensinou?”
23/05 Situações
problemas do
Feche a Caixa
Percurso
Gigante
“Quando as pessoas não
entendem algo que você está
explicando, o que você faz?”
30/05
REUNIÃO DE PAIS
10º
13/06 Senha de
nomes
(símbolos)
Cruzadinha
Cara- a- Cara Não houve tempo para a
realização dessa atividade.
11º
20/06 Torto de
sílabas
Cara a Cara
“Qual o professor (a) que você
mais gosta? O que ele fez pra
você gostar dele?”
12º 27/06 FESTA FESTA Desenho Coletivo
Quadro 1- Atividades realizadas no primeiro semestre de 2005
78
Encontro DATA ATIVIDADE
INICIAL
ATIVIDADE
PRINCIPAL
MOMENTO REFLEXÃO
13º
11/08 Par educativo
Sete Erros
Guerra dos
peões
Ficha de matrícula
14º
18/08 Matriz I do 4
Cores
Guerra dos
peões
Sobre desenhos do Par
Educativo: “Quem você
desenhou?”
15º
25/08 Matriz II do 4
Cores
Guerra dos
peões + torres
Invertendo as coisas: “Pense em
algo que você conquistou e
gosta. Agora diga, o que há de
ruim nisso?”
16º
01/09 Criar matriz
do 4 Cores
Guerra dos
peões + torres
Pense em uma coisa ruim que
lhe aconteceu. O que você
aprendeu nessa situação?”
08/09 Recesso
17º 15/09 Memorex Memória
(Xadrez)
Guerra dos
peões + torres
“Fale uma situação em que você
precisou de ajuda e contou com
um amigo.”
18º
22/09 Memória
(Xadrez)
Guerra dos
peões + torres
“Se você estivesse no nosso
lugar, que perguntas você
faria?”
19º
29/09 Dominó das 4
Cores
Guerra dos
peões + torres
+ bispo
Crianças inventam perguntas
para serem sorteadas nas
próximas oficinas
20º
06/10 Memorex
Figura –
Fundo
Guerra dos
peões + torres
+ bispo
“O que você faz quando seus
pais estão dormindo e você
acorda?”
21º
13/10 Dominó das 4
Cores
Guerra dos
peões + torres
+ cavalos
Não houve tempo para a
realização dessa atividade.
22º
20/10 Dominó das 4
Cores
Xadrez (papa
capim)
Qual é o esporte que você mais
gosta?”
23º
27/10 Dominó das 4
Cores
Xadrez
(Dama e Rei)
“No que seus pais trabalham?”
24º 03/11 Passa
Tempo dupla
– entrada
Situação –
Problema 4
Cores
“Qual é a coisa que você mais
gosta de fazer ou comer?”
25º 10/11 Caça
Palavras
Pega Varetas Quadro dos resultados do Pega
Varetas
26º 17/11 Sete Erros Pega Varetas
“Do que você mais gosta de
brincar?”
27º 24/11 Situação
Problema do
Pega Varetas
Pega Varetas Não houve tempo para a
realização dessa atividade.
28º 01/12 FESTA
Quadro 2- Atividades realizadas no segundo semestre de 2005
79
Encontro DATA ATIVIDADE
INICIAL
ATIVIDADE
PRINCIPAL
MOMENTO
REFLEXÃO
29º 13/03 Apresentações
(nomes nas
pastas)
Teia de Barbante
Desenho: “você
adulto”
“Como você se vê
quando adulto?”
30º 24/03 Trava – língua
(Caqui)
Labirinto
Quilles Questionário sobre
atitudes que cometem
nas oficinas.
31º
31/03 Trava – língua
(Tigre)
Caça Palavras
Quilles Escolha um item do
questionário para você
se comprometer a
melhorar.
32º
28/04 Trava – língua
(Tatu)
Seqüência
Temporal (chuva)
“O que você acha mais
difícil e mais fácil na
escola?”
33º
05/05 “Pense em um
número”
Tangran Título das construções
com o Tangran
34º
12/05 Construção do
Tangran
Tangran Conversa sobre o
Tangran
35º
19/05 Cruzadinha Tangran
“Foi difícil montar os
quadrados? Qual você
achou mais difícil de
montar?”
36º
26/05 Figura – Fundo Tangran
“Se você fosse dar uma
dica do Tangran, qual
você daria?”
37º
02/06 Trava língua Percurso Gigante
“A Figura de quem
você achou mais
difícil?”
38º
09/06 Trava língua
Figura - Fundo
Bingo
Fale uma palavra que
descreva o jogo Quarto
para você.
39º
23/06 Trava Língua Jogo Quarto
“O que você acha mais
difícil no jogo
Quarto?”
40º 30/06 FESTA
Quadro 3- Atividades realizadas no primeiro semestre de 2006
80
4.2 Ações de indisciplina das crianças
Apresentaremos a seguir as narrativas com extratos dos registros de observação,
ilustrando as ações de indisciplina dos sujeitos nas categorias de: desatenção/dispersão,
desistência, desrespeito aos colegas, desrespeito às regras da oficina, desrespeito às regras da
atividade proposta e trapaça.
Alguns extratos destes registros encontram-se em duas ou mais categorias, entretanto,
a ação destacada refere-se à categoria em que está inserida.
4.2.1 Desatenção/Dispersão
Foram feitas diversas observações em que C1 mostrou-se desatento, disperso,
desanimado, desinteressado ou agitado. Nesses momentos, ele olhou pela janela, deitou
na cadeira (embaixo da mesa) ou na mesa (colocando a cabeça entre o braço), cutucou o
crachá.
C1 olha pela janela e avisa: “estou viajando”. Deita na cadeira, embaixo da mesa. (5ª oficina,
Jogo “Qual é a mensagem?” , 02/05/05)
C1 e C3 ficam olhando pela janela. (5ª oficina, Momento Reflexão, 02/05/2005)
C1 hesita realizar a tarefa e começa a cutucar o crachá. P1 pergunta se ele não quer fazer e ele
responde que não. P1 se propõe a ajudá-lo e ele decide fazer. C1 continua a atividade. (6ª oficina,
Caça Palavras, 09/05/2005)
P2 sempre chama a atenção de C1 para que ele participe. Quando ela não faz isso, ele fica
“deitado” na mesa, desatento. (7ªoficina, Forca, 16/05/2005)
C1 não faz a atividade (fica inclinado sobre a mesa, debruçado em seu braço, olhando para o
seu pé). P3 se aproxima e pede para que ele faça, mas ele resiste. C2 pede para P3 deixar C1
copiar dele, mas P3 explica que assim ele não aprenderá, diz que é melhor, e mais divertido se ele
aprender. C1 se concentra para fazer a atividade (formar as palavras). Após um tempo, ele pára de
fazer a atividade, fica olhando para fora e P4 o ajuda. (...) Quando P4 saía de perto de C1, ele
ficava olhando para as sílabas, apoiava a cabeça no braço (e o braço sobre a mesa), parava de fazer
a atividade e não pedia ajuda a C2. (11ª oficina, “torto de sílabas” 20/06/2005)
81
C1 parece desanimar a cada jogada. P3 tenta ajudá-lo corrigindo-o, mas ele coloca a cabeça entre
o braço, debruçando sob a carteira. Aos poucos ele começa a se interessar, parece compreender
como se joga. (13ª oficina, xadrez (guerra dos peões),11/08/2005)
C1 “se cobre” com a blusa e não presta atenção na explicação... depois de alguns minutos volta
a prestar atenção. (19ª oficina, Xadrez (bispo), 29/09/2005)
C1 olha pela janela, olha as fotos do mural de cortiça. (20ª oficina, Momento Reflexão,
06/10/2005)
C1 desrespeitava as regras, muitas vezes, por desconhecê-las (...) C1 não conseguiu fazer os
últimos exercícios e não prestou atenção na correção, ficou “deitado” na cadeira, parecia
desanimado. (27ª oficina, “Situação – problema do Pega - Varetas”, 24/11/2005)
Nos momentos em que C1 parecia agitado, ele se desequilibrou e caiu em cima do
tabuleiro, jogou capoeira, fez “parada de mão”, pegou parte do jogo (Pegas Varetas) para
brincar e quase o quebrou.
C1 brinca, se desequilibra e cai em cima do tabuleiro. (8ª oficina, Percurso Gigante, 23/05/2005)
No início da oficina, as crianças ficam dispersas, C1 dá passos de capoeira junto com os
colegas (a sala está com muito barulho). (11ªoficina, 20/06/2005)
C1 começa a fazer “parada de mão” no meio da roda. (25ª oficina, “Pega – Varetas Gigante”,
10/11/2005)
Pega a tábua do pega-varetas e fica brincando, quase quebra. (27ª oficina, “Pega – Varetas
Gigante”, 24/11/2005)
Ficam batucando, dispersos e desrespeitando os colegas que querem prestar atenção na
explicação. (...) C1 brinca de brigar com um colega (dispersão), mas logo volta ao jogo (38ª
oficina, “Jogo Quarto”, 09/06/2006)
C2, também, mostrou-se disperso, desatento, agitado ou impaciente. Essa inquietude
foi percebida principalmente durante os “Momentos Reflexão” (5ª, 11ª, 17ª e 18ª oficina).
Ele saiu ou andou pela sala, levantou, brincou de luta, ficou de costas para a roda. Depois,
durante os jogos Quatro Cores (19ª oficina), Xadrez (21ª oficina) e Quarto (39ª oficina) ele,
juntamente com as outras crianças da oficina, mostrou-se agitado e, conseqüentemente,
disperso/desatento.
82
C2 vai ao banheiro mesmo P1 pedindo para ele não sair (...) C2 levanta da roda para olhar através
da janela. O tempo da oficina acaba e todos saem correndo ao mesmo tempo. (5ª oficina, Momento
Reflexão, 02/05/05)
(C2. 41) C2 e C1 ficam brincando de luta e brigam entre si. (11ª oficina, Momento Reflexão,
20/06/05)
Após C2 falar, ele fica impaciente, despede-se de P1 e ela avisa que ainda não pode sair. Ele fica
andando pela sala, disperso. (17ª oficina, Momento Reflexão, 15/09/2005)
P3 pede para as crianças sentarem na roda enquanto guarda as peças magnéticas. Entretanto, P2 e P4
não iniciam o momento reflexão e as crianças ficam dispersas pela sala. Na roda, C2 dá uma “chave de
braço” em C3 e ele fica de costas para roda. (18ª oficina, Momento Reflexão, 22/09/2005)
P3 tenta explicar o jogo. As crianças estão fazendo muito barulho, inclusive C2. Ela pede silêncio e
todos a atendem. (...) X9 e C3 ainda não terminaram de pintar e as outras crianças ficam sem instrução
para realizar alguma atividade. C2 corre com as figurinhas de X2 e este corre atrás dele. P4
intervém e C2 devolve. (19ª oficina, Quatro Cores, 29/09/2005)
P3 tenta explicar as novas peças do xadrez, mas as crianças estão muito agitadas (inclusive C2),
conversando, andando e não prestam atenção. P1 explica que eles vão aprender todas as peças. Eles
ficam em silêncio. P3 pede para alguém ir à lousa fazer o movimento do L do cavalo. C2 recusa o
convite de P3 (foi o único que não participou).(21ª oficina, Xadrez, 13/10/2005)
P4 pergunta: “Quem sabe as regras?”. X2 e X3 as explicam. Enquanto isso, C2 se dispersa
escrevendo na lousa com C3. P4 e P2 chamam a atenção pedindo para eles participarem do jogo.
Eles demoram a atendê-los, até que enfim, decidem ir para a mesa, mas ficam batucando, dispersos e
desrespeitando os colegas que querem prestar atenção na explicação. (...) C2 e C1 brincam de brigar
(dispersão), mas logo voltam ao jogo. Depois de um tempo, C2 bate figurinha (...) P4 elogia C2 e C3
dizendo que eles estão seguindo as regras: um dá a peça na vez do outro jogar. C3 ganha a primeira
partida de C2 e C2 diz que o jogo é chato. A dupla pára de jogar conforme as regras estabelecidas pelo
jogo Quarto e inventa outro jogo onde arremessam as peças. Estão dispersos. P4 pergunta o que eles
estão jogando e C2 responde: “boliche”. P4 questiona: “Vocês não estão jogando Quarto?” e C2
responde: “Não, é muito chato.” P4 pergunta se eles querem voltar a jogar o jogo dos pontinhos. C1
gosta da idéia e se dirige até o armário para pegar o jogo, mas ao chegar no armário, prefere pegar uma
folha sulfite para fazer bandeira do Brasil. P4 pergunta se eles querem ficar desenhando, C1 aceita e
responde que sim P4 autoriza que fiquem desenhando fala que tudo bem. (39ª oficina, Quarto,
23/06/06)
Ao longo dos três semestres de oficina, C3 apresentou diversas atitudes de
desatenção/dispersão que o levavam a interromper as atividades em que estava envolvido.
Na maioria das vezes, observamo-lo disperso durante o Momento Reflexão.
Suas atitudes de desatenção/dispersão estão resumidas e citadas abaixo em ordem
cronológica, com ênfase nos momentos da oficina que foram observadas (em qual jogo ou
atividade proposta).
83
Ele olhou pela janela (5ª oficina, Momento Reflexão), brincou com o crachá
dispersando-se. Levantou da roda, olhou pela janela (6ª oficina, Momento Reflexão). Andou
pela classe durante o jogo Fecha a Caixa (7ª oficina). Brincou de inclinar a cadeira no
momento da Lista de Presença (13ª oficina). Levantou da roda e olhou pela janela (14ª
oficina, Momento Reflexão). Falou durante a explicação da Criação de Matrizes 4 cores (16ª
oficina). Andou pela sala e mexeu no armário (parecia impaciente) durante o Momento
Reflexão da 17ª oficina. Deitou e colocou seus pés em cima de um colega na 18ª oficina,
durante o Momento Reflexão. Olhou pela janela no meio do jogo Guerra dos peões + bispo
(19ª oficina). Se dispersou durante as explicações (conversou com uma colega) do jogo
Xadrez: rei, dama, cavalo, (21ª oficina). Levantou do lugar quando não conseguiu êxito na
atividade (encaixava peças de cores vizinhas) e ficou brincando com um peão no Dominó
das 4 cores (22ª oficina). Não mantinha a atenção na explicação do jogo Papa – Capim (22ª
oficina). Jogou peão durante o Momento Reflexão (22ª oficina). Não prestou atenção na
explicação da atividade Passa Tempo junto com outros três colegas (24ª oficina). Batucou,
disperso (junto com outros dois colegas) e continuou desenhando, mesmo com os pedidos
dos professores para que se dirigisse até a roda para dar início ao Momento Reflexão (39ª
oficina, “Jogo Quarto”).
C3 e C1 ficam olhando pela janela. X1 avisa P1 e ela apenas confirma: “É... eles não querem
participar”. (5ªoficina, Momento Reflexão, 02/05/2005)
C3 brincam com o crachá. Falam na vez de X6. X1 interfere pedindo para C2 sentar na roda.(6ª
oficina, Momento Reflexão, 09/05/2005)
C3 se levanta da roda, olha pela janela e diz que acabou, que a perua já está lá embaixo. P1 pede
para que eles aguardem todos falarem. C2 e C3 ficam saindo da roda. P1 avisa que eles serão os
últimos a sair (eles ignoram, o que P1 falou). (6ª oficina, Momento Reflexão, 09/05/2005)
C3 anda pela classe. (7ª oficina, Feche a Caixa, 16/05/05)
C3 cai da cadeira (ele estava “brincando” de inclinar a cadeira): todos riem. P3 e P2 o socorrem e
ele reage explicando a todos por que ele havia caído. (13ª oficina, Lista de Presença, 11/08/2005)
84
C3 não quis sentar no chão (ficou na roda, mas em uma cadeira) mesmo P3 pedindo para ele se ele
sentar (...) C3 sai da roda para olhar pela janela. P3 se aproxima dele e pede para ele voltar para a
roda (14ª oficina, Momento Reflexão, 18/08/2005)
P1 começa a explicação, mas precisa pedir atenção de C3 e X8. X1 começa a falar no meio da
explicação e P1 pede pra ele não falar, não perguntar até que ela termine a explicação, diz que não
consegue explicar com eles falando. (16ª oficina, Criação de Matrizes 4 cores, 01/09/2005)
C3 fica andando pela sala, mexendo no armário porque será o último a falar (parece impaciente).
(17ª oficina, Momento Reflexão, 15/09/2005)
P3 contém C3 porque ele deita e coloca seus pés em cima de X2. (18ª oficina, Momento Reflexão,
22/09/2005)
P3 anota as jogadas de C3 e X4. C3 Parece não suportar ouvir as jogadas que ele perdeu e olha pela
janela. X4 abaixa a cabeça em baixo da mesa e C3 bate em sua cabeça, os dois brigam, bagunçam o
tabuleiro e ignoram a presença de P3 que continua tentando falar. (20ª oficina, Guerra dos peões +
bispo, 06/10/05)
X4 e C3 dispersam-se durante as explicações (conversam). Quando P3 intervém, X4 responde que
estava prestando atenção e falando sobre as jogadas. Eu falei: “sei... de certo que estava... eu estou
vendo tudo!” Eles voltam a prestar atenção, mas logo se dispersam novamente (C3 cutuca X4 com
uma peça de xadrez. P1 intervém pedindo atenção, mas eles continuam dispersos. P3 pega a peça da
mão de C3, dizendo que eles não estão prestando atenção. Precisei intervir: “Você não tinham que
estar sentados juntos... por que vocês estão juntos?” Ficam em silêncio. Depois de uns três minutos
C3 cutuca X4 novamente. (21ª oficina, Xadrez: rei, dama, cavalo, 13/10/2005)
C3 levantava do lugar quando não conseguia êxito na atividade (encaixava peças de cores
vizinhas) e ficava brincando com um peão que havia trazido. (22ª oficina, Dominó 4 cores,
20/10/2005)
C3 só consegue prestar atenção quando se dirige até o tabuleiro em que P3 está explicando ou quando
o professor o adverte (nesse momento presta atenção por uns 30 segundos, logo se dispersa). (22ª
oficina, Papa Capim, 20/10/2005)
C3 jogava peão. (22ª oficina, Momento Reflexão, 20/10/2005)
C1, X4, C2 e C3 não prestaram atenção na explicação e não conseguiam realizar a atividade. P2
passou mesa por mesa, um por um, explicando novamente a atividade. C1, C3 e C2 falam que é muito
fácil. Depois, concentraram-se na atividade e desenvolveram-na tranqüilamente. (24ª oficina, Passa –
Tempo, 03/11/2005)
C3 e 2 colegas se dispersam escrevendo na lousa. P4 e P2 chamam a atenção pedindo para eles
participarem do jogo. C3 fala que o card (uma espécie de figurinha que as crianças fazem coleção)
dele sumiu. P4 argumenta dizendo que eles não deveriam trazer esses cards para as oficinas, pede
várias vezes para eles se voltarem para a mesa do jogo (há uma mesa única onde todas as crianças
estão jogando (...) eles demoram a atendê-la, até que decidem ir para a mesa, mas ficam batucando,
dispersos e desrespeitando os colegas que querem prestar atenção na explicação. C3 descobre que o
card está com C1, os dois dão risadas, permanecem dispersos. P4 pergunta para C3 o que está
acontecendo com ele e ele volta sua atenção para o jogo, participando. (...) P4 pede para eles
guardarem os desenhos. C1 e mais dois colegas “ignoram” os pedidos de P4 e P2: continuam
desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento Reflexão. P4 explica que os
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professores os deixaram fazer os desenhos, mas que agora eles precisam parar. C1 pára. (...) Eles
guardam os desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda. (39ª
oficina, “Jogo Quarto”, 23/06/06)
4.2.2 Desistência
As ações indicativas de desistência de C1 apareciam quando ele hesitava ou
propriamente desistia de realizar determinadas atividades. Muitas dessas atitudes eram
seguidas de dispersão. Parece que C1 mostrou desistência quando uma atividade era
sentida por ele como difícil. Entretanto, ele aceitou ajuda e persistiu na realização das
atividades quando um profissional intervinha oferecendo auxílio.
C1 hesita em realizar a tarefa e começa a cutucar o crachá. P1 pergunta se ele não quer fazer e
ele responde que não. P1 se propõe a ajudá-lo e ele decide fazer. C1 continua a atividade.
(6ªoficina, Caça Palavras, 09/05/2005)
C1 joga apenas uma vez. Parece que, o fato de ele ter vencido a partida anterior o fez sentir medo
de arriscar jogar novamente e perder. P1 permite que ele não jogue e ele dá cambalhotas pela sala.
(8ª oficina, Percurso Gigante , 23/05/2005).
C1 não faz a atividade (fica inclinado sobre a mesa, debruçado em seu braço, C1 olha para seu
pé). P3 se aproxima e pede para que ele faça, mas ele resiste. C2 pede para P3 deixar C1 copiar
dele, mas P3 explica que assim ele não aprenderá, diz que é melhor e mais divertido se ele
aprender. C1 se concentra para fazer a atividade (formar as palavras). Após um tempo, ele pára de
fazer a atividade, fica olhando para fora e P4 o ajuda. (...) Quando P4 saía de perto de C1, ele
ficava olhando para as sílabas, apoiava a cabeça no braço (e o braço sobre a mesa), parava de
fazer a atividade e não pedia ajuda a C2. (11ªoficina, “Torto de sílabas”20/06/2005)
C1 se recusa a realizar a atividade, diz que é muito difícil. P1 conversa com C1, diz que ele tem
o direito de não fazer, mas fala que ele precisa escutar: explica novamente a atividade
exclusivamente para ele (rasga o papel em que ele estava executando a atividade e dá outro papel)
diz que é normal ele se confundir. Combina com ele de construírem a matriz juntos: ela fará um
risco e ele outro. Ele concorda e, assim, a figura é formada. (16ª oficina, “Criação de matrizes 4
Cores”, 01/09/2005)
C1 não quis continuar jogando quando faltava apenas 1 capim. Recusou-se a jogar outra partida
dizendo: “esse jogo irrita!” (22ª oficina, Jogo “Papa - Capim”, 20/10/2005)
C1 parou de jogar e foi “brincar” de capoeira com X4. Ele parou de jogar porque perdeu uma
partida, estava perdendo outra e quis parar. (23ª oficina, Jogo Xadrez, 27/10/2005)
C1 ficava reclamando, não realizava a atividade e dizia que não queria aprender. P4 foi até a
mesa dele para ensiná-lo. C1 olhava atentamente para P4 escutando as explicações e, então,
realizou a atividade. (27ª oficina, “Situação – problema do Pega - Varetas”, 24/11/2005)
C2 desistiu de desenvolver tarefas quando desrespeitava às regras da oficina ou
quando se mostrava desatento/disperso. Ele também desistiu de jogar quando estava perdendo
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o jogo “Guerra dos peões e torre” (18ª oficina) e recusou o convite da professora para ir ao
quadro fazer o movimento L do cavalo (21ª oficina).
Em geral, a sala está bem tranqüila. Todos estão atentos às jogadas buscando vencer. C2 desiste de
jogar porque está perdendo de C3. Vai para o banheiro (sai bravo, batendo a porta). P1 se oferece
para jogar com C3 ele aceita e a fala: “ele não agüenta perder!”As duplas revezam-se e as crianças
mostram-se tranqüilas e concentradas (os professores também revezam).Depois de dez minutos, C2
volta do banheiro e fica na porta os observando (nenhum professor intervém: todos os professores
estão jogando). Ele senta-se à mesa de C1 e P2 e diz que vai ajudar C1. P2 diz: “mas se você ajudar
ele, ele vai ganhar!” P1 convida C2 para jogar com X4, ele não aceita o convite e P1 complementa:
“nem de parceria comigo?” Ele responde fazendo um gesto negativo com a cabeça... ela responde: “tá
bom”... (18ª oficina, Guerra dos peões e torre, 22/09/2005)
P3 tenta explicar as novas peças do xadrez, mas as crianças estão muito agitadas (inclusive C2),
conversando, andando e não prestam atenção. P1 explica que eles vão aprender TODAS as peças. Eles
ficam em silêncio. P3 pede para alguém ir à lousa fazer o movimento do L do cavalo. C2 recusa o
convite de P3 (foi o único que não participou).(21ª oficina, Xadrez, 13/10/2005)
Geralmente C3 desistia de realizar uma atividade quando não se interessava por esta.
Na atividade de Auto – Retrato, não quis escrever suas características pessoais. Ele recusou-
se a jogar o Percurso Gigante, pois não quis jogar com o peão que lhe deram e não desenhou
uma matriz do 4 Cores para um colega, por ter considerado essa atividade uma “perda de
tempo” (19ª oficina).
C3 também desistiu de prosseguir em uma atividade quando a proposta lhe pareceu
ser algo além de suas capacidades. Na 11ª oficina, durante a atividade Torto de Sílabas, ele
apagou tudo que já tinha feito e desistiu de jogar dizendo que não conseguia. Durante a 22ª
oficina, no momento do jogo Dominó das 4 cores, reclamou que não conseguia realizá-lo e
levantou do lugar (22ª oficina).
Ele se mostrou disperso durante o jogo Papa – Capim (22ª oficina), mas conseguiu
prestar atenção quando se dirigiu até o tabuleiro em que a professora estava explicando ou
quando a mesma o advertiu (nesse momento prestou atenção por uns 30 segundos, logo se
dispersou).
P2 percebe que C3 já havia exposto seu trabalho e não tinha escrito suas características (as crianças a
avisaram). P3 tenta convencê-lo a escrever, mas ele não quis. (2ª oficina, Auto – Retrato, 11/04/2005)
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C3 reclama que vai precisar esperar a próxima jogada (chegou muito atrasado para jogar). (...) C3 se
recusa a jogar porque está com um peão que não é um bonequinho. Como C1 saiu do jogo, sobrou
um bonequinho que X9 pegou. P1 propõe que ambos disputem o boneco no par ou ímpar, eles
concordam e X9 vence. C3 agora concorda em jogar com o outro peão (8ª oficina, Percurso Gigante,
23/05/2005)
C3 “desiste” dizendo que não sabe. P3 incentiva-o mostrando o que ele já conseguiu fazer. Pergunta o
que aconteceu pra ele apagar tudo que já tinha feito já que estava tudo certo, bem feito (ele abaixou a
cabeça e fingiu chorar, rindo: estava brincando). (11ª oficina, Torto de sílabas, 20/06/2005)
As crianças dizem que não querem desenhar a matriz do Quatro Cores para um colega. C3 diz: “eu
não vou gastar meu tempo pra fazer isso!” P4 tenta explicar que eles não vão gastar muito tempo:
“é rapidinho, eu não gastei nem um minuto para fazer esse desenho na lousa”... (19ª oficina, Quatro
Cores, 29/09/2005)
C3 ficava reclamando que não conseguia. (22ª oficina, Dominó 4 cores, 20/10/2005)
C3 levantava do lugar quando não conseguia êxito na atividade (encaixava peças de cores
vizinhas) e ficava brincando com um peão que havia trazido. (22ª oficina, Dominó 4 cores,
20/10/2005)
C3 só consegue prestar atenção quando se dirige até o tabuleiro em que P3 está explicando ou quando
o professor o adverte (nesse momento presta atenção por uns 30 segundos, logo se dispersa). (22ª
oficina, Papa Capim, 20/10/2005)
4.2.3 Desrespeito aos colegas
As ações indicativas de desrespeito aos colegas foram pouco observadas em C1,
mas aumentaram ao final do segundo semestre de oficina. Observamos que ele
desrespeitou os colegas apenas em momentos de reações às zombarias ou às ações dos
colegas nas quais se sentiu lesado.
Na 6ª oficina ele puxou a lista de presença de X4, pois ela estava demorando para
assiná-la. Depois, na 16ª oficina, C1 foi ao bebedouro, ao retornar encontrou X2 em seu
lugar e sentou em cima dele. Na 25ª oficina ele zombou de C3 dizendo que a cara de
macaco dele o assustava. Durante o jogo Pega – Varetas (27ª oficina), C1 zombou de um
colega dizendo que ele mexeu uma vareta, mas o colega não havia mexido vareta alguma.
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C1 não suportou a demora de X4 ao assinar a lista de presença e puxou a folha no momento em
que ela estava assinando. (6ªoficina, Lista de Presença, 09/05/2005)
Quando C1 volta do bebedouro, vê que X2 está em seu lugar e senta “em cima” de X2, tenta tirá-
lo à força. (16ª oficina, 01/09/2005)
C1 zomba de C3 dizendo que a cara de macaco dele o assusta. (25ª oficina, “Caça – Palavras”,
10/11/2005)
C1 zomba de X8 dizendo que ele mexeu a vareta, mas X8 não havia mexido vareta alguma.
(...) pega a tábua do Pega-Varetas e fica brincando, quase quebra. (...) C1 quer ir para a perua e sai
da sala sem pedir autorização. Ele volta e fica em pé (não senta na roda). Às vezes observa o jogo.
(...) C1 fica zombando de X8: apaga sua pontuação. (27ª oficina, “Pega – Varetas Gigante”,
24/11/2005)
C1 conversa na vez dos colegas. (27ª oficina, Momento Reflexão, 24/11/2005)
C2 desrespeitou os colegas, principalmente, na hora do jogo: mexeu nas peças do
colega durante o jogo “Feche a Caixa” (6ª oficina), fala na vez dos colegas no “Momento
Reflexão” (6ª oficina), senta em cima da mesa atrapalhando os colegas que estão jogando
o jogo “Qual é a mensagem?”, zomba dos colegas que demonstram dificuldades
(principalmente de C1) com expressões depreciativas (11ª oficina, Cara a Cara e 25ª
oficina, Caça - Palavras) ou zomba tentando trapacear dizendo, por exemplo, no jogo Pega
Varetas Gigante, que a vareta do colega mexeu, quando, na verdade, não havia mexido
(27ª oficina).
Na última oficina observada (39ª oficina), ele desconsidera os colegas e professores
ignorando (junto com outros dois colegas) os pedidos dos professores para guardar o
desenho e ir para a roda (Momento Reflexão) e, depois, guarda o desenho assoviando,
atrapalhando os colegas que estão na roda.
No momento do jogo “Feche a Caixa”, C2 senta com C3 (P3 os supervisiona). C2 mexe nas peças
na vez de C3. P3 avisa que não é a vez dele e pede para que ele deixe C3 baixar suas próprias
peças. C2 ignora o comentário de P3 e continua fazendo (além de anotar os pontos de C3 também).
Na outra jogada ele mexe novamente e P3 não intervém (C3 perde). (6ª oficina, Feche a Caixa,
09/05/2005)
P1 pede para terminarem e para irem para a roda. C2 e C3 não querem parar. P3 pede desculpas e tira
o jogo deles. P1 explica as regras, mas C2 fala na vez dos colegas (X8, C3, X1). (...) C2 e C3 brincam
com o crachá. Falam na vez de X6. X1 interfere pedindo para C2 sentar na roda. C2 fala na vez de C1
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(responde por C1, inventando respostas). (...) C2 fala interferindo no que X4 está dizendo. (6ª oficina,
Momento Reflexão, 09/05/2005)
O jogo Feche a Caixa parecia já estar cansativo (X8 e X1 já estavam “roubando” e andando pela sala
“batendo um no outro”). Então, P2 achou melhor jogarem uma partida de “Qual é a mensagem”. (...)
C2 tenta ver a mensagem que está escrita em um papel na mão de P2. P2 pede para C2 sentar (fala
calmamente, tocando nele). Ele senta, depois levanta e senta em cima da mesa, com o apagador,
atrapalhando X2 e C1 que estão desenhando. (6ª oficina, Jogo “Qual é a mensagem”, 09/05/2005)
As professoras distribuem os tabuleiros, mas demoram pra começar o jogo. C2 distribui as cartas para
os colegas começarem (ele e C1 estão sem tabuleiro). P2 pede para C2 jogar com X6 para ensiná-lo,
mas ele não aceita. Ela pede para C1 ensinar, quando ele começa a ensinar, C2 senta e interfere,
atrapalhando a explicação de C1. C1 pede para C2 ajudar X6 a jogar apenas indicando as cartas que
devem ser baixadas, pede para que ele deixe que X6 abaixe as próprias cartas. (...) C2 não quer dividir
o tabuleiro, puxa-o para seu lado e abaixa as cartas de X6 (X6 não reclama). (11ª oficina, Cara a
Cara, 20/06/05)
P3 distribui os “papeizinhos” e P4 vai até a lousa, desenha um “papel”, e enumera-o de 1 a 15: pede
para as crianças fazerem o mesmo (...) X2 e C2 dão risada zombando que C1 não sabe contar. P3
diz que foi apenas uma falta de atenção e continua auxiliando C1.(...) P3 faz a primeira questão: “a
cerca está quebrada?” e todos respondem alto. P4 explica que eles não podem falar. Todos ficaram em
silêncio nas próximas questões. C2 é o único que ainda responde. P1 diz que a regra é para todos. C2
pára. (...) C2 “burla” suas respostas erradas e os colegas comentam. P1 diz que eles (professores) não
estão preocupados com isso, quem precisa se preocupar é a própria pessoa. (17ª oficina, Memorex,
15/09/2005)
Os professores pedem para as crianças sentarem em dupla, distribuem os tabuleiros e as peças. Cada
professor acaba sentando com uma dupla. A dupla C2 e C3 parece a mais “agitada”. Eles conversam
se desafiando e zombando um do outro a cada jogada. (P2 os supervisiona e ajuda a defender o
adversário quando o outro jogador faz um movimento errado). Além disso, os dois tentam “roubar”.
(18ª oficina, Guerra dos peões e torre, 22/09/2005)
C2 zomba de C1 porque ele não está enxergando na lousa. P2 escreve as palavras da lousa num
papel para ele. C2 pergunta por que ela fez isso e ela responde que ele não estava enxergando e
gostaria de ficar na mesa dele (não queria levantar para olhar de perto, na lousa). C2 responde: “Pra
que? Não nasceu grudado!” (...) C2 ri dizendo que C1 é “cegueta”. P4 pede para ele não zombar,
pois ele também não enxerga. C1 se defende dizendo que ele enxerga sim.(...) P1 elogia a pintura de
C1. C2 ri e diz que ela só está falando isso pra agradar ele, diz: “só porque eu sou cego” (e ri). (...) C2
zomba de C1 dizendo que o cabelo dele é à prova d água. P1 explica que todo mundo é à prova d
água se não seríamos como esponja. (25ª oficina, Caça - palavras, 10/11/2005)
C2 zomba de X6 dizendo que a vareta mexeu, depois também zomba da mesma forma com X1. (...)
C2 brinca batendo forte (socos) nas costas de C1. (...) C2 X1 e C1 não ficam em seus lugares enquanto
os outros jogam. P1 repreende dizendo que dará pontos a mais pra quem está jogando. (27ª oficina,
Pega – Varetas Gigante, 24/11/2005)
P4 pede para os três guardarem os desenhos. (...) C1, C2 e C3 “ignoram” os pedidos de P4 e P2:
continuam desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento Reflexão. (...) P4 sai da roda
e tira os materiais deles dizendo: “já deu!”. C2 diz que “ainda não deu” e dá risada. Eles guardam os
desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda. (...) C2 diz que
achou o jogo Quarto legal, mas não quis jogar. (39ª oficina, Momento Reflexão, 09/06/06)
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No primeiro semestre de oficina as atitudes de desrespeito aos colegas de C3 foram
poucas: observamo-lo zombando de um colega ao enfatizar a dificuldade deste em terminar
uma tarefa (6ª oficina, Caça - Palavras) e, ainda nessa oficina, falando na vez de outro colega
no Momento Reflexão.
Depois, ao longo das oficinas (da 17ª à 26ª oficina), observamos C3 zombando de
colegas, principalmente, quando esses demonstravam dificuldades para executar as atividades.
Muitas vezes, esses momentos de zombaria terminavam em brigas (agressões físicas leves).
Nos momentos em que C3 se encontrava mais “agitado” ele invadia o espaço do outro
batendo, gritando, cantando, batucando.
C2 e C3 zombam de C1 dizendo que faltam muitas palavras para ele encontrar. P2 e P4 (estão na
mesa com C1) defendem C1 dizendo que não falta muito pra ele terminar e, cada vez que ele acha uma
palavra, eles elogiam-no. Assim, ele não desiste (apesar de todos já terem terminado). (6ªoficina, Caça
Palavras 09/05/05)
Brincam com o crachá. Falam na vez de X6. X1 interfere pedindo para C2 sentar na roda.(6ª oficina,
Momento Reflexão, 09/05/05)
C3 zomba da resposta de C1 (ele falou que no prezinho ele não sabia fazer a letra S e o C2 fazia para
ele) e os dois brigam de tapa. (17ª oficina, Momento Reflexão, 15/09/2005)
Cada professor acaba sentando com uma dupla. A dupla C2 e C3 parece a mais “agitada”. Eles
conversam se desafiando e zombando um do outro a cada jogada (P2 os supervisiona e ajuda a
defender o adversário quando o outro jogador faz um movimento errado). Entretanto, os dois buscam
“roubar” (18ª oficina, Guerra dos peões + torre, 22/09/2005)
P3 contém C3 porque ele deita e coloca seus pés em cima de X2. (18ª oficina, Momento Reflexão,
22/09/2005)
C3 e C2 pegam novamente as figurinhas de X2 e por mais que os professores interviessem, C3
manteve as figurinhas escondidas. (19ª oficina, Xadrez: Bispo, 29/09/2005)
P3 anota as jogadas de C3 e X4. C3 Parece não suportar ouvir as jogadas que ele perdeu e olha pela
janela. X4 abaixa a cabeça em baixo da mesa e C3 bate em sua cabeça, os dois brigam, bagunçam o
tabuleiro e ignoram a presença de P3 que continua tentando falar. (20ª oficina, Guerra dos peões +
bispo, 06/10/2005)
C3 e X4 embaralham as peças antes do fim do jogo. P1 fala que a partida foi anulada. C3 fica
gritando umas dez vezes: “eu ganhei!” X4 fica com a cabeça baixa e chora. C3 fica gritando na
orelha dela. (21ª oficina, Xadrez: rei, dama, cavalo, 13/10/2005)
C3 vibra porque ganhou, mostra para P3 e grita umas dez vezes dizendo que ganhou, zombando de
X4 que perde. (23ª oficina, Xadrez, 27/10/2005)
C3 zomba de C2 dizendo que o pai dele é ladrão. (22ª oficina, Momento Reflexão, 25/10/2005)
91
C3 fica falando e rindo, zombando de C2, dizendo que ele gosta de pedir no farol. (24ª oficina,
Momento Reflexão, 03/11/2005)
C3 zomba de C1 dizendo que ele não vai conseguir. P2 diz que com força de vontade se consegue
tudo. C3 responde que não consegue não! (25ª oficina, Caça palavras, 10/11/2005)
C3 pega o lápis de C1 sem pedir emprestado. (26ª oficina, Caça palavras, 17/11/2005)
C3 e dois colegas se dispersam escrevendo na lousa. P4 e P2 chamam a atenção pedindo para eles
participarem do jogo. C3 fala que o card (uma espécie de figurinha que as crianças fazem coleção)
dele sumiu. P4 argumenta dizendo que eles não deveriam trazer esses cards para as oficinas, pede
várias vezes para eles se voltarem para a mesa do jogo (há uma mesa única onde todas as crianças
estão jogando (...) eles demoram a atendê-la, até que decidem ir para a mesa, mas ficam batucando,
dispersos e desrespeitando os colegas que querem prestar atenção na explicação. C3 descobre que o
card está com C1, os dois dão risadas, permanecem dispersos. P4 pergunta para C3 o que está
acontecendo com ele e ele volta sua atenção para o jogo, participando. (...) P4 pede para eles
guardarem os desenhos. C1 e mais dois colegas “ignoram” os pedidos de P4 e P2: continuam
desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento Reflexão. P4 explica que os
professores os deixaram fazer os desenhos, mas que agora eles precisam parar. C1 pára. (...) Eles
guardam os desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda.
(39ª oficina, “Jogo Quarto”, 09/06/2006)
4.2.4 Desrespeito às regras da oficina
No início (primeiras cinco oficinas), as ações indicativas de desrespeito às regras da
oficina eram freqüentes em C1. Ele se mostrou eufórico, gritava e corria entre o banheiro e
o bebedouro; mostrava-se impaciente ao esperar para assinar a Lista de Presença, levantava-
se, mexia no armário e não sentava na roda no Momento Reflexão. Depois, apenas
encontramos essa ação esporadicamente (na 16ª, na 21ª e na 27ª oficina) em momentos em
que ele parecia inquieto (não agüentou esperar a próxima atividade quieto: brincou de
“plantar bananeira”, mexeu no armário) e agitado (saiu da sala correndo sem pedir
autorização).
Depois de todos se apresentarem e conversar um pouco, a P1 perguntou ao grupo se eles conheciam
o bebedouro e o banheiro, aproveitou este momento para explicar sobre as regras de “beber água e ir
ao banheiro”, dizendo que sempre poderiam ir desde que fossem um de cada vez, então os convidou
para conhecerem o bebedouro e o banheiro. Neste momento C1 mostrou-se “eufórico”, todos
corriam e gritavam entre o banheiro e o bebedouro. (1ª oficina, Lista de Presença, 04/04/2005).
Quando os profissionais passaram a lista de presença, todos reclamaram, inclusive C1, porque
queriam jogar e pareciam inquietos. (2ª oficina, Lista de Presença, 1/04/05)
92
Enquanto P1 está na mesa de C1, ele e seus colegas se levantam e vão mexer no armário. (5ª
oficina, Lista de Presença, 02/05/2005)
No Momento Reflexão C1 não senta na roda. A professora da instituição pede para que C1 sente
na roda, mas ele não vai. P1 também pede e ele abaixa a cabeça, continua sentado e não vai. (5ª
oficina, Momento Reflexão, 02/05/2005)
C1, X7 e X4 brincam de “plantar bananeira”, e de rodar para “esperar” a próxima atividade.
(16ª oficina, Xadrez, 01/09/2005)
C3 e C1 saem correndo da sala, a professora da instituição sai atrás deles. C3 chega rindo e gritando:
“ele quer me matar”... enquanto P3 está explicando. Todas as crianças se desconcentram. P1 intervém.
C1 chega bravo e bate a porta no armário com força (ao abri-la), depois senta em seu lugar. P3
continua a explicação. (21ª oficina, Xadrez, 13/10/2005)
C1 zomba de X8 dizendo que ele mexeu sendo que X8 não havia mexido nenhuma vareta. (...) pega
a tábua do pega-varetas e fica brincando, quase quebra. (...) C1 quer ir para a perua e sai da sala sem
pedir autorização. A professora da Instituição o busca no corredor, pede para ele voltar. Ele fica em
pé (não senta na roda). Às vezes observa o jogo. (...) C1 fica zombando de X8: apaga sua
pontuação. (27ª oficina, “Pega – Varetas Gigante”, 24/11/2005)
A princípio, C2 desrespeitou as regras da oficina por ter sido contrariado em uma de
suas vontades: ele saiu da sala no meio do Momento Reflexão e disse que não voltaria mais ao
LaPp (4ª oficina). Depois ele demonstrou inquietação: levantou-se e mexeu no armário no
momento da “Lista de Presença” e, então, ameaçou sair para beber água junto com um colega
(5ª oficina); saiu para beber água enquanto outro colega ainda não havia retornado do
bebedouro, foi ao banheiro mesmo sem autorização de um dos professores (5ª oficina); saiu
para andar de elevador dizendo que iria ao banheiro (6ª oficina); sentou-se em cima da mesa
(7ª oficina); correu com as figurinhas de um colega (17ª oficina); ele e C3 saíram juntos para
ir ao banheiro, infringindo a regra básica onde só pode sair um por vez (19ª oficina);
continuou desenhando, enquanto todos já estavam em roda para o Momento Reflexão (36ª
oficina).
No início do primeiro semestre o desrespeito às regras da oficina em C2 era
freqüente, depois, C2 agiu dessa forma apenas em dois momentos: no meio do segundo
semestre e na última oficina observada (terceiro semestre).
93
No Momento Reflexão, C2 mostra-se chateado e sai da sala. P3 e coordenador do laboratório saem da
sala e vão atrás dele para verificar o que aconteceu. Enquanto isso, P1 fica na sala conversando com as
crianças, perguntando por que acham que ele ficou triste (eles não sabem responder). P3 entra na sala e
explica que C2 ficou chateado porque P1 permitiu que C3 guardasse o desenho do grupo em sua pasta,
quando, na verdade, ele (C2) quem gostaria de ter guardado. P1 pergunta para C3 se ele cederia o
desenho para C2 guardar na pasta dele. Ele diz que sim; então P1 leva-o para conversar com C2, mas
ele não aceita as desculpas e diz que não voltará mais ao LaPp. P1 diz que gostaria muito que ele
voltasse: pede pra ele pensar com calma e, se quiser, ela adoraria que ele voltasse. (4ª oficina,
Momento Reflexão, 25/04/05)
Todos chegam e P1 cumprimenta um por um com beijo. Ao cumprimentar C2, comenta que adorou o
fato dele ter vindo. (...) C1, X2, X5 e C2 se levantam e vão mexer no armário.P3 fica ao lado. X2
mexe nos jogos e P3 tira da mão dele. Eles acham os copos e querem beber água. P3 pede para irem
um de cada vez e X2 ameaça sair a todo instante P3 puxa-o. C3 e C2 ameaçam sair para beber água
juntos. (5ª oficina, Lista de Presença, 02/05/05)
Quando as crianças vão terminando a atividade “figura-fundo”, X2 e C2 pedem autorização para irem
beber água. P3 autoriza, mas pede para irem um de cada vez. X2 sai. Logo em seguida C2 sai
também (não aguarda X2 voltar). P3 percebe que ele saiu e vai atrás dele. P2 percebe e sai também.
P2 volta e P1 comenta: “a P3 não pode sair com as crianças”. Quando P3 volta com as crianças, P1
pede atenção e enfatiza as regras de “beber água”: as crianças ficam em silêncio. (5ª oficina, Desenho
Figura – Fundo, 02/05/2005)
C2 vai ao banheiro mesmo P1 pedindo para ele não sair C2 levanta da roda para olhar através da
janela. O tempo da oficina acaba e todos saem correndo ao mesmo tempo. (5ª oficina, Momento
Reflexão, 02/05/2005)
P1 começa a explicar o jogo “Qual é a Mensagem?” e C2 pede para ir ao banheiro. P1 comenta que
isso é “enrolação”, mas permite que ele vá (C3 avisa P1 que C2 gosta de sair pra andar de elevador:
P1 explica que eles não podem andar de elevador porque ele serve para transportar deficientes físicos).
(6ª oficina, Jogo “Qual é a mensagem?”, 09/05/2005)
P1 pede para terminarem e para irem para a roda. C2 e C3 não querem parar. P3 pede desculpas e
tira o jogo deles. P1 explica as regras, mas C2 fala na vez dos colegas (X8, C3, X1). (...) C2 e C3
brincam com o crachá. Falam na vez de X6. X1 interfere pedindo para C2 sentar na roda. C2 fala na
vez de C1 (responde por C1, inventando respostas). (...) C2 fala interferindo no que X4 está dizendo.
(6ª oficina, Momento Reflexão, 09/05/2005)
O jogo Feche a Caixa parecia já estar cansativo (X8 e X1 já estavam “roubando” e andando pela sala
“batendo um no outro”). Então, P2 achou melhor jogarem uma partida de Qual é a mensagem. (...) C2
tenta ver a mensagem que está escrita em um papel na mão de P2. P2 pede para C2 sentar (fala
calmamente, tocando nele). Ele senta, depois levanta e senta em cima da mesa, com o apagador,
atrapalhando X2 e C1 que estão desenhando. (7ª oficina, Jogo “Qual é a mensagem”, 16/05/2005)
Durante o Momento Reflexão, C2 e C1 ficam brincando de luta e brigam entre si. (11ª oficina,
Momento Reflexão, 20/06/05)
Em geral, a sala está bem tranqüila. Todos estão atentos às jogadas buscando vencer. C2 desiste de
jogar porque está perdendo de C3. Vai para o banheiro (sai bravo, batendo a porta). P1 se oferece
para jogar com C3 ele aceita e a fala: “ele não agüenta perder!” (18ª oficina, Guerra dos peões e torre,
22/09/2005)
P3 tenta explicar o jogo. As crianças estão fazendo muito barulho, inclusive C2. Ela pede silêncio e
todos a atendem. (...) X9 e C3 ainda não terminaram de pintar e as outras crianças ficam sem instrução
94
para realizar alguma atividade. C2 corre com as figurinhas de X2 e este corre atrás dele. P4 intervém
e C2 devolve. (19ª oficina, Quatro Cores, 29/09/2005)
P1 propõe que troquem de dupla (estão há muito tempo jogando e ainda faltam 20 min.). C2 fala que
vai “dar um role”. Ele e C3 saem juntos, infringindo a regra básica onde só pode sair um por vez
parar ir ao banheiro. P1 fala que não vai correr atrás deles. (20ª oficina, Xadrez, 06/10/2005)
P4 pede para os três guardarem os desenhos. (...) C1, C2 e C3 “ignoram” os pedidos de P4 e P2:
continuam desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento Reflexão. (...) P4 sai
da roda e tira os materiais deles dizendo: “já deu!”. C2 diz que “ainda não deu” e dá risada. Eles
guardam os desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda. (...) C2
diz que achou o jogo Quarto legal, mas não quis jogar. (39ª oficina, Momento Reflexão, 23/06/2006)
Nas primeiras oficinas, C3 desrespeitou as regras da oficina quando: saiu para beber
água ao mesmo tempo em que outros colegas, mexeu no armário com outros colegas e
continuou a jogar no Momento Reflexão (quando deveria estar sentado na roda).
Depois, suas atitudes de desrespeito às regras da oficina continuavam sendo
percebidas em momentos em que ele parecia agitado, inquieto: ele brincou de “plantar
bananeira” com outros colegas enquanto “aguardava” a explicação dos professores para o
jogo de Xadrez (18ª oficina); saiu da sala, correndo, com outro colega durante a distribuição
dos tabuleiros de xadrez (21ª oficina); iniciou a realização de uma atividade antes que a
professora o autorizasse (22ª oficina); brincou de brigar com um colega no momento da
confecção do Dominó das 4 Cores (24ª oficina). Entretanto, ao final do segundo semestre e ao
longo do terceiro semestre de oficina (exceto no Jogo Quarto, 39º oficina), não o observamos
desrespeitando às regras da oficina.
X2 e C3 vão beber água ao mesmo tempo. P2 vai até a porta e diz que precisa ser um de cada vez.
Grita para que C3 volte (chama-o várias vezes, mas ele não volta). P1 lembra que ele não estava na
semana anterior e decide ir lá fora explicar as regras para o C3. (2ª oficina, Auto – Retrato,
11/04/2005)
Todos chegam e P1 cumprimenta um por um com beijo. Ao cumprimentar C3, comenta que adorou o
fato dele ter vindo. (...) C1, X2, X5 e C3 se levantam e vão mexer no armário. P3 fica ao lado. X2
mexe nos jogos e P3 tira da mão dele. Eles acham os copos e querem beber água. P3 pede para irem
um de cada vez e X2 ameaça sair a todo instante P3 puxa-o. C3 e C3 ameaçam sair para beber água
juntos. (5ª oficina, Lista de Presença,: 02/05/2005)
P1 pede para terminarem e para irem para a roda. C3 e C3 não querem parar. P3 pede desculpas e tira
o jogo deles. (6ª oficina, Momento Reflexão, 09/05/2005)
95
Os professores demoram em organizar o jogo e começar a explicação. C1, X7, C3 e C2 brincam de
“plantar bananeira” (18ª oficina, Xadrez, 22/09/2005)
C3 e C1 saem correndo da sala, a professora da instituição sai atrás deles. C3 chega rindo e
gritando: “ele quer me matar”... enquanto P3 está explicando. Todas as crianças se desconcentram. P1
intervém. C1 chega bravo e bate a porta no armário ao abri-la, depois senta em seu lugar. P3 continua
explicando. (21ª oficina, Xadrez: rei, dama, cavalo, 13/10/2005)
C3 e X2 já estavam montando enquanto P3 explicava a atividade (indisciplina positiva, pois
demonstra interesse). (22ª oficina, Dominó 4 cores, 20/10/2005)
As crianças ficaram sem ter o que fazer enquanto P1 e P2 encapavam as peças e, quando elas
acabaram de pintar, começaram a brincar entre si. C1 e C3 brincavam de brigar (P4 interviu). P1 os
chama para ajudar a encapar as peças. Assim a sala fica mais silenciosa. (24ª oficina, Quatro Cores,
03/11/2005)
P4 pede para os três guardarem os desenhos. (...) C1, C2 e C3 “ignoram” os pedidos de P4 e P2:
continuam desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento Reflexão. (...) P4 sai
da roda e tira os materiais deles dizendo: “já deu!”. C2 diz que “ainda não deu” e dá risada. Eles
guardam os desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda. (...) C2
diz que achou o jogo Quarto legal, mas não quis jogar. (39ª oficina, Momento Reflexão, 23/06/2006)
4.2.5 Desrespeito às regras das atividades propostas
Inicialmente (na primeiras cincos oficinas e na oficina 17), C1 desrespeitou as regras
das atividades verbalmente: falou (na maioria das vezes com os colegas) em momentos em
que a atividade não exigia que se falasse. Depois, não observamos mais desrespeito às
regras da atividade em C1 até a última oficina, quando escreveu na lousa, batucou e brincou
de brigar na hora do jogo Quarto; desenhou (junto com outros dois colegas), ao invés de
sentar na roda para o Momento Reflexão.
Todos ficam em pé, inclusive C1, tentando adivinhar a palavra. P1 diz: “quem estiver em pé,
mesmo que fale certo, eu não vou prestar atenção na palavra dita.” (2ª oficina, Jogo “Imagem &
Ação” 11/04/05)
C1 e os colegas conversavam entre si e P2 pedia atenção. As crianças não atendiam seu pedido. (3ª
oficina. Jogo “Imagem & Ação”, 18/04/2005)
P2 tenta explicar as novas regras do jogo dos 7 erros, mas as crianças não a escutam: C1 continua
conversando. (4 ª oficina, “Jogo dos Sete Erros”, 25/04/2005)
Logo o barulho recomeça, P1 assovia para pedir atenção. Nesse momento C1 se assusta com o som
do assovio e fica em silêncio, entretanto, logo começa a reproduzir o assovio junto com as outras
96
crianças. P1 explica as regras do jogo “Qual é a mensagem?” e diz que não vai explicar nenhum
truque novo (assovio) se eles não se comportarem. (5ª oficina, Jogo “Qual é a mensagem?”,
02/05/2005)
P3 ajuda C1, pois ele “pula” os números. X2 e C2 dão risada zombando que ele não sabe contar. P3
diz que foi apenas uma falta de atenção e continua auxiliando-o. (...) C1 fala no momento em que
P3 faz as perguntas. P1 diz para C1 que ele está estragando a brincadeira. Pergunta se ele quer
estragar e ele responde que não. Ela fala: “eu sei que você não quer estragar, então não fale mais...se
falar a sua atividade será anulada.” (17ª oficina, Memorex, 15/09/2005)
C3 zomba de C1 e os dois brigam durante o Momento Reflexão. (17ª oficina, Momento
Reflexão,15/09/2005)
C1 e 2 colegas se dispersam escrevendo na lousa. P4 e P2 chamam a atenção pedindo para eles
participarem do jogo. (...) P4 pede várias vezes para eles se voltarem para a mesa do jogo (há uma
mesa única onde todas as crianças estão jogando), eles demoram a atendê-lo, até que decidem ir para
a mesa, mas ficam batucando, dispersos e desrespeitando os colegas que querem prestar atenção
na explicação. (...) C1 brinca de brigar com um colega (dispersão), mas logo volta ao jogo. (...)C1
pára de jogar com P2. Pega uma folha e desenha a bandeira do Brasil. Ele vai até o armário
buscar um pote de vidro cilíndrico que servirá de molde pra ele fazer o círculo da bandeira e, no
meio do caminho, bate em um colega brincando (os dois dão risada), ele pega o pote e tudo fica
“tranqüilo”. (...) P4 pede para eles guardarem os desenhos. C1 e mais dois colegas “ignoram” os
pedidos de P4 e P2: continuam desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento
Reflexão. os deixaram fazer os desenhos, mas que agora eles precisam parar. C1 pára. (...) Eles
guardam os desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda.
(39ª oficina, “Jogo Quarto”, 23/06/2006)
C2 desrespeitou diversas vezes as regras das atividades. Ele mexeu nas peças na vez
de C3 durante o jogo Feche a Caixa (6ª oficina); falou na vez dos colegas durante o
Momento Reflexão (6ª oficina); puxou o tabuleiro para seu lado e abaixou as cartas de X6
no jogo Cara a Cara (11ª oficina); falou as respostas para C1 na atividade Par Educativo (13ª
oficina); respondeu em voz alta, mesmo a professora avisando que ninguém deveria falar,
no jogo Memorex (17ª oficina); andou pela sala, impaciente, durante o Momento Reflexão,
deu uma “chave de braço” em C3 e ficou de costas para roda em outro Momento Reflexão
(18ª oficina).
Depois da 20ª oficina (quando novamente vemos C2 respondendo em voz alta no
jogo Memorex) não observamos mais C2 agir dessa maneira.
No momento do jogo “Feche a Caixa”, C2 senta com C3 (P3 os supervisiona). C2 mexe nas peças na
vez de C3. P3 avisa que não é a vez dele e pede para que ele deixe C3 baixar suas próprias peças. C2
ignora o comentário de P3 e continua fazendo (além de anotar os pontos de C3 também). Na outra
jogada ele mexe novamente e P3 não intervém (C3 perde). (6ª oficina, Feche a Caixa, 09/05/2005)
97
P1 pede para terminarem e para irem para a roda. C2 e C3 não querem parar. P3 pede desculpas e tira
o jogo deles. P1 explica as regras, mas C2 fala na vez dos colegas (X8, C3, X1). (...) C2 e C3 brincam
com o crachá. Falam na vez de X6. X1 interfere pedindo para C2 sentar na roda. C2 fala na vez de C1
(responde por C1, inventando respostas). (...) C2 fala interferindo no que X4 está dizendo. (6ª oficina,
Momento Reflexão, 09/05/2005)
As professoras distribuem os tabuleiros, mas demoram pra começar o jogo. C2 distribui as cartas para
os colegas começarem (ele e C1 estão sem tabuleiro). P2 pede para C2 jogar com X6 para ensiná-lo,
mas ele não aceita. Ela pede para C1 ensinar, quando ele começa a ensinar, C2 senta e interfere,
atrapalhando a explicação de C1.
C1 pede para C2 ajudar X6 a jogar apenas indicando as cartas que devem ser baixadas, pede para que
ele deixe que X6 abaixe as próprias cartas. (...) C2 não quer dividir o tabuleiro, puxa-o para seu
lado e abaixa as cartas de X6 (X6 não reclama). (11ª oficina, Cara a Cara, 20/06/05)
P3 explica a atividade. C2 fala as respostas para C1. P3 intervém dizendo que ele não deveria dizer
as respostas, poderia ajudar ele a achá-las... C2 ri. Os dois tentam ajudar C1. (13ª oficina, Par
Educativo, 11/08/2005)
P3 faz a primeira questão: “a cerca está quebrada?” e todos respondem alto. P4 explica que eles não
podem falar. Todos ficaram em silêncio nas próximas questões. C2 é o único que ainda responde.
P1 diz que a regra é para todos. C2 pára. (...) C2 “burla” suas respostas erradas e os colegas
comentam. P1 diz que eles (professores) não estão preocupados com isso, quem precisa se preocupar é
a própria pessoa. (17ª oficina, Memorex, 15/09/2005)
Após C2 falar, ele fica impaciente, despede-se da P1 e ela avisa que ainda não pode sair. Ele fica
andando pela sala, disperso. (17ª oficina, Momento Reflexão, 15/09/2005)
P3 pede para as crianças sentarem na roda enquanto guarda as peças magnéticas. Entretanto, P2 e P4
não iniciam o momento reflexão e as crianças ficam dispersas pela sala. Na roda, C2 dá uma “chave
de braço” em C3 e ele fica de costas para roda. (18ª oficina, Momento Reflexão, 22/09/2005)
P1 pede silêncio, explica que eles não devem falar nesse momento. Ela diz que quem estiver falando
ficará fora do jogo. P2 faz a primeira questão e C2 responde em voz alta (não é permitido
responder em voz alta). (...) Ele ri e continua falando as respostas (20ª oficina, Memorex,
06/10/2005)
C3 desrespeitou as regras da atividade proposta quando se mostrou inquieto: falou
durante a explicação atrapalhando a professora, invadiu o espaço de um colega, mexeu nos
peões do tabuleiro de demonstração, andou pela sala durante o Momento Reflexão. Também
desrespeitou quando parecia querer fazer valer apenas seus interesses. Por exemplo, pintou
um desenho quando o combinado não era pintá-lo, não sentou na roda no Momento Reflexão,
pintou seu próprio desenho ao invés de trocá-lo com um colega (conforme fora combinado),
terminou um jogo antes que este tivesse sido realmente terminado.
P1 fala sério com C3 explicando: “Você é novo e ainda não sabe nada”, estava falando junto com
ela, atrapalhando. (2ª oficina, Imagem & Ação, 11/04/2005)
98
C2 e C3 tentam descobrir a mensagem “grudados” em X8 (que está desenhando). (6ª oficina, Caça
Palavras 09/05/2005)
C2 e C3 invadem a lousa. C3 pega a caneta de C1. C1 “emburra” diz que não quer mais jogar.
(6ªoficina, Caça Palavras 09/05/2005)
C3 se revolta dizendo que não vai fazer porque quer pintar (as professoras deram, como instrução, não
pintar). P1 explica que nesse desenho não poderá pintar porque gasta muito tempo (...) Ele não se
conforma, busca outra saída (já que não tem lápis de cor disponível) e pinta com o lápis grafite. (13ª
oficina, Par Educativo, 11/08/2005)
C3 levanta e mexe nos peões do tabuleiro de demonstração. P3 pede para ele sentar (ele senta). (13ª
oficina, Xadrez: guerra dos peões,11/08/2005)
C3 não quis sentar no chão (ficou na roda, mas em uma cadeira) mesmo P3 pedindo para ele se ele
sentar (...) C3 sai da roda para olhar pela janela. (14ª oficina, Momento Reflexão, 18/08/2005)
C3 fica fora da roda apagando a lousa (P3 o chama, mas ele só vai para a roda quando termina de
apagar a lousa). (16ª oficina, Momento Reflexão, 01/09/2005)
C3 fica andando pela sala, mexendo no armário porque será o último a falar (parece impaciente).
(17ª oficina, Momento Reflexão, 15/09/2005)
P2 sorteia os nomes para que as crianças pintem o desenho de um colega.
C3 começa a pintar o dele (não aceita trocar). (19ª oficina, Quatro Cores, 29/09/2005)
P1 pede silêncio, explica que eles não devem falar nesse momento. C3 parece ignorar esse aviso e fala
alto os elementos do quadro. (20ª oficina, Memorex, 06/10/2005)
P3 anota as jogadas de C3 e X4. C3 Parece não suportar ouvir as jogadas que ele perdeu e olha pela
janela. X4 abaixa a cabeça em baixo da mesa e C3 bate em sua cabeça, os dois brigam, bagunçam o
tabuleiro e ignoram a presença de P3 que continua tentando falar. (20ª oficina, Guerra dos peões +
bispo, 06/10/2005)
C3 e X4 embaralham as peças antes do fim do jogo. P1 fala que a partida foi anulada. C3 fica
gritando umas dez vezes: “eu ganhei!” X4 fica com a cabeça baixa e chora. C3 fica gritando na orelha
dela. (21ª oficina, Xadrez: rei, dama, cavalo, 13/10/2005)
Um pouco antes de terminar o caderno, C3 levantou e ficou esperando para sair. (24ª oficina,
Momento Reflexão, 03/11/2005)
4.2.6 Trapaça
Registramos apenas uma ação de indisciplina relacionada à trapaça em C1. No
momento do jogo Papa – Capim (22ª oficina), ele tentou mudar os capins de lugar sem que
o colega percebesse.
C1 tenta trapacear mudando os capins de lugar. P4 percebe sua intenção e não permite. (22ª
oficina, Jogo “Papa - Capim”, 20/10/2005)
99
C2 trapaceou a partir da 7ª oficina: ele tentou ver a mensagem que estava escrita em
um papel (escondido) na mão da professora durante o jogo “Qual é a mensagem?”, tentou
ver a carta que C1 tirou no jogo Cara a Cara (11ª oficina), burlou suas respostas erradas no
jogo Memorex (17ª oficina), tentou enganar C1 durante o jogo “Guerra dos peões e torre”
(18ª oficina) e soprou as varetas de C1 durante o jogo Pega Varetas Gigante (27ª oficina).
Entretanto, no terceiro semestre de oficina, não observamos mais essa atitude em C2.
O jogo Feche a Caixa parecia já estar cansativo (X8 e X1 já estavam “roubando” e andando pela sala
“batendo um no outro”). Então, P2 achou melhor jogarem uma partida de “Qual é a mensagem”. (...)
C2 tenta ver a mensagem que está escrita em um papel na mão de P2. P2 pede para C2 sentar (fala
calmamente, tocando nele). Ele senta, depois levanta e senta em cima da mesa, com o apagador,
atrapalhando X2 e C1 que estão desenhando. (7ª oficina, Jogo “Qual é a mensagem”, 16/05/2005)
Quando o jogo acaba os professores demoram muito pra começar outra jogada e a classe fica
“barulhenta”. C2 diz que não quer jogar (está sem tabuleiro). P3 improvisa um tabuleiro e ele aceita
jogar. (...) C2 tenta ver a carta que C1 tirou e P3 intervém. (...) C2 não quis jogar com X1 ou X8
(outros vencedores). (11ª oficina, Cara a Cara, 20/06/2005)
C2 “burla” suas respostas erradas e os colegas comentam. P1 diz que eles (professores) não estão
preocupados com isso, quem precisa se preocupar é a própria pessoa. (17ª oficina, Memorex,
15/09/2005)
Os professores pedem para as crianças sentarem em dupla, distribuem os tabuleiros e as peças. Cada
professor acaba sentando com uma dupla. A dupla C2 e C3 parece a mais “agitada”. Eles conversam
se desafiando e zombando um do outro a cada jogada. (P2 os supervisiona e ajuda a defender o
adversário quando o outro jogador faz um movimento errado). Além disso, os dois tentam “roubar”.
(18ª oficina, Guerra dos peões e torre, 22/09/2005)
C2 fica soprando as varetas de C1 com a intenção de trapacear. (27ª oficina, Pega – Varetas Gigante,
24/11/2005)
Registramos apenas duas atitudes de trapaça apresentadas por C3: uma no início das
oficinas e outra no meio do segundo semestre. Na segunda oficina, ele tentou ver os
desenhos que estavam escondidos pela professora, no Momento Reflexão. Na 18ª oficina
buscou “roubar” de seu colega durante o jogo Guerra dos Peões.
No Momento Reflexão, P1 esconde os desenhos do Auto – Retrato e mostra um por um para que os
colegas tente adivinhar qual desenho é de quem. C3 tenta ver os desenhos que P1 esconde (2ª
oficina, Momento Reflexão, 11/04/05)
Cada professor acaba sentando com uma dupla. A dupla C2 e C3 parece a mais “agitada”. Eles
conversam se desafiando e zombando um do outro a cada jogada (P2 os supervisiona e ajuda a
100
defender o adversário quando o outro jogador faz um movimento errado). Entretanto, os dois buscam
“roubar”. (18ª oficina, Guerra dos peões + torre, 22/09/2005)
4.3 Ações indicadoras de categorias de indisciplina
Para organizar os exemplos de ações indicadoras das categorias de indisciplina
analisadas, apresentamos os quadros abaixo em dois momentos da oficina: jogos e outras
atividades e “momento reflexão”:
101
Nos jogos e outras atividades No momento reflexão
Exemplos de ações indicadoras de desatenção
¾ Olhar pela janela
¾ Cutucar qualquer objeto ou
partes do corpo
¾ Debruçar sobre a mesa
¾ Cobrir o rosto
¾ Fazer brincadeiras que não se
referem à atividade
¾ Pegar uma parte do jogo (vareta,
por exemplo) para brincar fora
das regras
¾ Andar (em atividades em que
essa atitude não é permitida)
¾ Levantar do lugar (em atividades
em que essa atitude não é
permitida)
¾ Conversar sobre outras questões
¾ Batucar
¾ Continuar a atividade anterior
¾ Olhar pela janela
¾ Olhar o mural
¾ Levantar da roda
¾ Cutucar qualquer
objeto ou partes do
corpo seu ou do
colega
¾ Brincar
¾ Andar
¾ Levantar do lugar
¾ Conversar sobre
outras questões
¾ Batucar
¾ Continuar a atividade
anterior
¾ Ir ao banheiro
¾ Ir ao bebedouro
¾ Permanecer de costas
para a roda
Quadro 4 - Ações indicadoras de desatenção
102
Nos jogos e outras atividades No momento reflexão
Exemplos de ações indicadoras de desrespeito ao colega
¾ Puxar a folha ou o tabuleiro do
colega no momento em que este
está realizando a atividade
¾ Zombar de características físicas
do colega
¾ Zombar de dificuldades do
colega
¾ Gritar, cantar, assoviar ou
batucar de forma que atrapalhe a
concentração do colega
¾ Pegar algo do colega sem sua
prévia autorização
¾ Bater no colega sem o
consentimento deste
¾ Zombar
¾ Conversar
(paralelamente) na
vez dos colegas
¾ Falar na vez dos
colegas
¾ Colocar os pés em
cima do colega
Quadro 5 - Ações indicadoras de Desrespeito ao Colega
103
Nos jogos e outras atividades No momento reflexão
Exemplos de ações indicadoras de desrespeito às
regras do jogo ou atividade proposta
¾ Mexer nas peças do colega
¾ Pintar um desenho quando o
combinado era não pintá-lo
¾ Mexer no tabuleiro de
demonstração sem autorização
¾ Falar durante a explicação
¾ Falar em momentos em que é
combinado não falar
¾ Brincar
¾ Brigar
¾ Não sentar na roda
Quadro 6 - Ações indicadoras de desrespeito às regras do jogo ou atividade proposta
Nos jogos e outras atividades No momento reflexão
Exemplos de ações indicadoras de trapaça
¾ Mudar as peças do jogo de lugar
sem que o colega perceba
¾ Tentar ver cartas que ainda não
devem ser vistas
¾ Tentar roubar do adversário
¾ Não há como
trapacear nessa
atividade.
Quadro 7 - Ações indicadoras de trapaça
104
Nos jogos e outras atividades No momento reflexão
Exemplos de ações indicadoras de desrespeito às regras da oficina
¾ Correr
¾ Mexer no armário sem
autorização de um dos
professores
¾ Sair da sala sem pedir
autorização
¾ Continuar a atividade anterior
¾ Bater a porta da sala com força,
propositalmente.
¾ Sair da sala para ir ao banheiro
ou bebedouro junto com um
colega
¾ Brincar de “plantar bananeira”,
jogar capoeira, etc.
¾ Brincar de brigar com um
colega
¾ Escrever na lousa sem
autorização
¾ Não sentar na roda
¾ Mexer no armário
¾ Sair da sala
¾ Sair da sala para ir ao
banheiro ou
bebedouro
¾ Brincar de luta
Quadro 8 - Ações indicadoras de desrespeito às regras da oficina
105
Nos jogos e outras atividades No momento reflexão
Exemplos de ações indicadoras de desistência
¾ Parar de realizar a atividade
antes do término desta
¾ Recusar-se a realizar a
atividade
¾ Sair da roda antes do
término desta
atividade
¾ Recusar-se a sentar
para realizar a
atividade
Quadro 9 - Ações indicadoras de desistência
4.4 Freqüência das ações de indisciplina
Apresentamos a seguir quadros da freqüência das ações de indisciplina observadas em
C1, C2 e C3 ao longo dos três semestres de oficina. Esses quadros tem o intuito de mostrar ao
leitor a evolução das ações de cada criança ao longo das oficinas.
Tabela 1- Ações de indisciplina de C1 ao longo das oficinas
C1 1º Semestre 2º Semestre 3º Semestre TOTAL
Dispersão 9 6 2 17
Desrespeito 12 11 4 27
Desistência 6 4 0 10
Trapaça 0 1 0 1
TOTAL 27 22 6 55
Tabela 2- Ações de indisciplina de C2 ao longo das oficinas
C2 1º Semestre 2º Semestre 3º Semestre TOTAL
Dispersão 2 5 4 11
Desrespeito 15 27 2 44
Desistência 0 4 0 5
Trapaça 2 3 0 5
TOTAL 19 39 6 64
106
Tabela 3- Ações de indisciplina de C3 ao longo das oficinas
C3 1º Semestre 2º Semestre 3º Semestre TOTAL
Dispersão 4 16 2 22
Desrespeito 8 28 3 39
Desistência 3 4 0 7
Trapaça 0 1 0 1
TOTAL 15 49 5 69
107
DISCUSSÃO
Para a realização desta pesquisa, observamos e registramos ações de indisciplina
praticadas por crianças em situação de oficinas de jogos. Foram selecionadas três crianças
(duas com 10 e uma, com 11 anos de idade), aqui designadas por C1, C2 e C3. Elas cursavam
o quinto ano de uma escola pública do Ensino Fundamental da cidade de São Paulo. As
observações foram feitas ao longo de três semestres consecutivos (início em março de 2005 e
término em junho de 2006) no Laboratório de Psicopedagogia (LaPp), do Instituto de
Psicologia, da Universidade de São Paulo. Esse período de observação (três semestres), em
geral, corresponde ao tempo que uma criança freqüenta as oficinas no laboratório, as quais
ocorrem semanalmente e duram 1 hora e 30 minutos.
O critério de escolher três crianças para a análise de dados se justifica pela
importância de, com isso, se poder ilustrar com mais detalhes os aspectos observados.
Também consideramos que descrever as ações disciplinares de três crianças favoreceria
algum reconhecimento de diferenciações nos aspectos estudados. Mais adiante, isso será
objeto de discussão.
As três crianças, sujeitos da pesquisa, foram escolhidas ao longo das cinco primeiras
oficinas (dentre as doze crianças) por apresentarem maior número de comportamentos de
indisciplina observados.
Nosso estudo teve como objetivo identificar ações de indisciplina em crianças em
situação de oficinas de jogos. Caracterizamos do ponto de vista conceitual os aspectos de
disciplina (atenção / concentração, respeito e persistência) e indisciplina (desatenção /
dispersão, desrespeito, trapaça e desistência) tanto numa perspectiva teórica (principalmente,
Piaget, Macedo e La Taille), como numa perspectiva prática (entrevistando profissionais do
laboratório).
108
Como já dissemos inicialmente, falar sobre indisciplina é falar sobre disciplina. Visto
que “in” é prefixo de negação, neste caso, ele nega o conceito de disciplina. Ou seja, as ações
de indisciplina são contrárias às de disciplina. Partimos da negação (indisciplina) para
dissertarmos sobre os prejuízos desta e sobre os benefícios de agir com disciplina.
Consideramos indisciplina uma atitude negativa, pois dificulta a realização bem
sucedida das atividades pretendidas. Os jogos são excelentes meios para se observar esse
prejuízo, de modo imediato e claro.
Uma situação de jogo qualquer apresenta o material, as regras e o objetivo
como informações para todos que irão dela participar. No entanto, as
estratégias e os meios definidos pelos jogadores para realizar suas ações ao
jogar os diferenciam e, desse modo, quem consegue pensar melhores
jogadas, trabalhar com hipóteses, levar em consideração suas possibilidades
e as do adversário, coordenado-as simultaneamente, tem mais condições
para vencer. (MACEDO; PETTY; PASSOS, 2005a, p. 24)
Um dos exemplos disso pôde ser visto no jogo Feche a Caixa (utilizado no primeiro
semestre de oficina). Este jogo é formado por um tabuleiro de madeira construído com
pequenas casas, enumeradas de 1 a 9, que são abertas e fechadas ao longo do jogo e dois
dados. O objetivo do jogo é ficar com a menor pontuação possível. O jogo se inicia com todos
os números das casas expostos. O primeiro jogador lança os dados e soma os valores obtidos
nos dois dados. Ele deve fechar uma ou duas casas que tenham números que sejam
equivalentes à soma do valor dos dados. Digamos que as faces sorteadas foram 2 e 6, o que
soma 8 pontos. O jogador poderá então fechar a casa 8, virando para baixo a face com o
número, ou fechar um par de casas cuja soma seja 8, por exemplo, 1 e 7, 2 e 6, ou 5 e 3.
Se o jogador se mostrar desatento nas jogadas, ele não conseguirá coordenar os
cálculos aritméticos com as necessidades de combinações que o jogo exige. Caso ele consiga
prestar atenção na soma dos dados, mas não consiga prestar atenção às diferentes
possibilidades de fechamento, ele não perceberá que em um primeiro momento é melhor, por
109
exemplo, fechar a casa 8, pois ele eliminaria uma casa de valor alto e sua soma final teria
mais possibilidades de ser menor.
O jogo Dominó das Quatro Cores foi utilizado nas oficinas (segundo semestre), e
também pode exemplificar situações onde a indisciplina acarreta prejuízos ao jogador. Este
jogo é composto por 18 peças retangulares de 4 cores diferentes que devem ser dispostas de
modo a formar um quadrado (há uma base quadrada de madeira onde as peças devem ser
colocadas), sem que se toquem as peças de mesmas cores, nem mesmo nos cantos. As
crianças das oficinas jogaram a modalidade individual e precisavam ficar atentas,
principalmente, para atenderam o desafio proposto pelo jogo. Além desse pressuposto básico,
se a criança prestasse mais atenção, ela também perceberia, por exemplo, que havia mais
peças azuis e trataria de dispô-las primeiro na base. A concentração beneficiaria as tomadas
de decisão da criança ao longo do processo.
Outro exemplo é o jogo Pega-Varetas Gigante (utilizado no segundo semestre). Ele é
composto de 41 varetas coloridas (amarelas, verdes, azuis e uma preta). O grupo de crianças
senta formando uma roda e decide a ordem de quem vai jogar. O primeiro jogador lança as
varetas sobre o chão da sala e tenta retirar o máximo de varetas possíveis sem mexer as
demais. Caso venha a movê-las, deverá ceder a vez ao jogador seguinte, que reinicia o jogo.
Vence aquele que conseguir o maior número de pontos atribuídos em função do valor da cor
da vareta.
Neste jogo a criança impaciente, desatenta, que não respeita os colegas, interrompe o
jogo ou joga mal. Ao contrário, a criança que age com paciência e calma realiza movimentos
tranqüilos e lentos ao retirar as varetas, uma a uma, sem mover as demais. Criança
impaciente, em geral, é impulsiva e tenta retirar uma vareta sem cuidados com as demais,
conseqüentemente, outra vareta pode mexer interrompendo sua jogada.
110
Além disso, jogar bem o Pega Varetas implica concentrar-se para observar, a cada
captura, todas as varetas antes de escolher a melhor para ser retirada. Estar dispersivo dificulta
a escolha da melhor vareta e a retirada fica regulada pelo acaso.
Uma das funções mais importantes do jogo de regras, segundo Piaget (1932/1994), é
exigir de seus participantes o respeito mútuo. De fato, respeitar o colega implica, por
exemplo, manter-se quieto, em silêncio, enquanto ele faz sua jogada. Caso a criança
desrespeite o colega, gritando na vez dele pegar as varetas, por exemplo, o jogo perde a
veracidade, porque esse desrespeito é considerado trapaça: “enganar usando de dissimulação”.
(Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Brasileira, 2006)
Em nossos registros encontramos um exemplo de situação de desrespeito ao colega no
jogo Pega – Varetas:
C1 zomba de X8 dizendo que ele mexeu a vareta, mas X8 não havia mexido vareta alguma.
(...) pega a tábua do Pega-Varetas e fica brincando, quase quebra. (...) C1 quer ir para a perua e sai
da sala sem pedir autorização. Ele volta e fica em pé (não senta na roda). Às vezes observa o jogo.
(...) C1 fica zombando de X8: apaga sua pontuação. (25ª oficina, “Pega – Varetas Gigante”,
22/11/2005)
Nesta perspectiva a indisciplina também promove prejuízo relacional: o sujeito
impede o colega de jogar. Por exemplo, no jogo de Xadrez não é suficiente um jogador fazer
sua parte se o outro não faz a sua. Se um mexe uma peça, o outro também precisa mexer outra
peça, seguindo ambos as regras comuns relativas aos movimentos permitidos a cada uma
delas.
Como vimos, uma criança indisciplinada (dispersiva, desistente, desrespeitosa)
prejudica a si mesma e prejudica os outros que estão interagindo com ela. Em situações de
jogos ela não consegue jogar o melhor que pode, pois não faz as coordenações necessárias,
isto é, relaciona insuficientemente os diferentes aspectos que caracterizam os desafios ou
problemas a serem enfrentados em dado jogo.
111
Uma criança indisciplinada não faz as coordenações suficientes para resolver os
desafios do jogo ou tarefa porque se dispersa e apresenta dificuldade para raciocinar,
antecipar ou prestar atenção, além de desrespeitar colegas e professores. A indisciplina em
uma oficina de jogos expressa o pior das ações de uma criança, isso porque traz prejuízos para
ela mesma.
O tema indisciplina é uma questão que aflige os professores na atualidade.
Recentemente (novembro de 2007) a revista Nova Escola publicou o resultado de uma
pesquisa onde ela e Ibope entrevistaram 500 professores de redes públicas em todas as
capitais brasileiras (GENTILE, Paola. A educação vista pelos olhos do professor.
(colaboração de Patrícia Cassi) In: Revista Nova Escola. Disponível em:
<http://revistaescola.abril.com.br/edicoes/0207/aberto/mt_256838.shtml>. Acesso em 15 nov.
2007.) Esta pesquisa mostrou, dentre outros dados, que os professores vêem os alunos como
desinteressados e indisciplinados. Esses temas são percebidos como os principais problemas
da sala de aula.
Dentre as ações de indisciplina que consideramos em nosso estudo (desatenção
desrespeito, trapaça e desistência), a desatenção apresenta uma particularidade quando
acontece na escola. Em uma situação de sala de aula é possível que a desatenção da criança
não seja percebida de imediato. Por exemplo, a criança desatenta, mas que não perturba o
professor ou colegas, pode passar toda a aula nessa condição sem ser notada. Os efeitos
negativos disso (ir mal nas provas, ter dificuldades de aprendizagem) aparecem
principalmente como resultado. O triste é que isso, às vezes, só acontece no final do ano.
Em sala de aula, desatenção é reconhecida como desinteresse e, ambos, são modos de
indisciplina. Quando um professor diz que um aluno é indisciplinado, geralmente, ele associa
esta conduta a “fazer bagunça”. Em contrapartida, a palavra disciplina carrega sentidos
historicamente negativos, muitas vezes ligados ao autoritarismo, como vimos, a disciplina na
112
época de Foucault (século XVIII) era imposta através do corpo: domesticando-o, treinando-o,
impedindo a liberdade, a criatividade e o desenvolvimento da autonomia. Entretanto, para a
criança conviver em uma sala de aula, onde se tem tarefas, propostas, expectativas, ela precisa
agir com disciplina (respeitar as regras da sala de aula, as regras das atividades, os colegas),
sem imposição desta. Consideramos importante que a disciplina seja resgatada e valorizada
em sua forma positiva – a começar pelos adultos – professores - e, como conseqüência, pelos
alunos -, pois como vimos nas situações de jogo, ela ajuda o sujeito a conquistar relações
construtivas.
A grande pergunta dos professores é saber como se livrar da questão da indisciplina.
Este aspecto não foi objetivo de nosso estudo, pois nele se preferiu identificar ações de
indisciplina com o foco que delimitamos: desatenção, desrespeito (trapaça) e desistência e
relacioná-las a uma das possíveis respostas a essa pergunta: a utilização de jogos para a
construção de atitudes de disciplina. Consideramos útil e produtivo o seu uso em sala de aula,
apesar de certos professores julgarem que jogos estimulam a dispersão, a desatenção. Para
eles, quando a criança entra em contato com jogos, ela se agita e se afasta dos objetivos
docentes; porém, segundo nossa concepção, o jogo pode estimular, “convidar” a criança a
prestar atenção, a se concentrar para vencer, estendendo esse valor para outras atividades
escolares.
[...] nossa experiência no LaPp (Macedo, 1996; Petty 1995; Macedo, Petty;
Passos, 1997, 2000) tem mostrado que as atitudes e as competências
desenvolvidas ao jogar vão tornado-se “propriedade” das crianças,
caracterizando um conjunto de ações adequadas à atividade proposta. Como
conseqüência podem ser transferidas para outros meios, e é isso que tem
acontecido com nossos alunos. (...) Mas a passagem não é automática: esse
posicionamento favorável à aprendizagem não é facilmente transposto para
cumprir tarefas escolares, já que estas nem sempre são tão divertidas ou
desafiadoras quanto as situações-problema que enfrentam jogando e sendo
questionados. (MACEDO; PETTY, PASSOS, 2005a, p. 25)
113
Talvez a excitação que a criança sente por querer vencer os desafios dos jogos faz com
que ela se agite, fale, vibre, mas isso não mostra necessariamente dispersão, e, sim, uma
intensa concentração. É importante lembrarmos que “ficar calado” nem sempre representa
uma atitude de atenção por parte da criança. Uma criança pode estar muda, apática, e
totalmente imersa em seus pensamentos, dispersa da tarefa proposta. O professor desatento e
que não se perturba pelo mutismo de seu aluno, não percebe que isso pode significar
dispersão.
A criança pode sim se mostrar indisciplinada em situações de jogos (apresentamos
alguns exemplos nos Resultados), no entanto, o jogo desafia a criança, pouco a pouco, a
vencer as dificuldades e, para obter essa conquista, a criança precisará agir com disciplina.
A intervenção profissional é importante para que o jogo se apresente como desafiador
para a criança. Por exemplo, o profissional precisa saber as regras do jogo e explicá-las com
clareza; precisa ser capaz de intervir (auxiliando, questionando) em momentos em que a
criança sentir dúvidas frente aos obstáculos.
Macedo (1994) diferencia leis de regras. Para ele, as leis fixam limites que valem para
todos. As regras, ao contrário das leis, ordenam relações, operam de modo que seus elementos
(pessoas, objetos) façam parte do mesmo todo. As leis são impositivas, as regras são
combinadas e demandam consentimento.
As leis são impostas no sentido de que uma criança, ao nascer, já se
encontra sob seu império. Por outro lado as leis são construídas e
transformadas pela sociedade. Em ambos os casos, sua dimensão é histórica
e motivada. As regras, ao contrário, mesmo que propostas, por exemplo,
pelo inventor do jogo, devem sempre ser atualizadas: sua dimensão é
espacial e arbitrária (combinada) (...) As leis são hetero-reguladoras, ou
seja, exigem um “fiscal” , alguém que, com sua autoridade, faça cumprir os
mandamentos da lei (...) As regras, ao contrário, são auto-reguladoras; ou
seja, o regulador é interno e os “fiscais” são os próprios participantes, como
no jogo, por exemplo. (p. 86)
Segundo Macedo (1994), os professores, muitas vezes, agem como “fiscais das leis”,
vigiando o cumprimento destas. Apesar de os professores representarem o saber constituído,
114
Macedo (1994) diz que as regras elaboradas pelos alunos podem não estar contidas neste
saber objetivado. Se um aluno faz uma conta de matemática, por exemplo, e não chega ao
resultado correto, os professores precisam sair do lugar de “fiscais das leis” e investigar quais
regras os alunos elaboraram para fazer esta conta. “Se o saber dos alunos não pode ser ouvido
ou levado em conta, permanece-se no discurso das leis, dentro dos limites fixados pelas
ciências, pelos adultos”. (p. 92) Esta postura investigativa do professor é orientada pelo
construtivismo: “o construtivismo propõe a análise funcional dos procedimentos adotados
pela criança ao resolver a conta; propõe a análise das inconsistências, se é assim, de seu
sistema de procedimentos”. (p. 92)
O professor tem o importante papel de servir como instrutor e exemplo para seus
alunos. Segundo Macedo (2005b), em seu sentido primordial, disciplina refere-se a discípulo
e supõe generosidade do professor e do aluno:
Expressa a relação entre uma pessoa que sabe e que é importante para
alguém ou para uma cultura e aqueles que querem aprender com ela. (...)
disciplina supõe generosidade em duas direções: naquele que se entrega e
doa um espaço e tempo de si em favor de uma realização ou de uma pessoa
ou grupo, que será dela beneficiário e na perspectiva daquele que recebe,
que aceita deixar-se inscrever por aquela pessoa ou tarefa. (p. 145)
Os jogos também são bastante utilizados na Psicologia Clínica. Estes profissionais
trabalham com jogos (e brinquedos) como instrumento para ludoterapia. A esse método,
Melanie Klein (1932/1997) deu o nome de playtechnique, ou técnica de brinquedo, ou ainda
ludoterapia, depois desenvolvida por outros psicanalistas da Escola de Londres, como D. W.
Winnicott e adotada por analistas de outras correntes.
A ludoterapia é uma prática de psicoterapia infantil onde o brincar é a forma pela qual
a criança se expressa; consiste na análise da criança através do brinquedo (jogo). Através das
brincadeiras a criança pode expandir e elaborar melhor seus sentimentos acumulados de
tensão, insegurança, frustração, agressividade, medo e confusão (Rocha, 1999). Uma vez que
115
a criança tem a oportunidade de expressar seus sentimentos, desloca para o exterior seus
problemas internos, dominando-os pela ação.
Como o brinquedo (jogo) é seu meio natural de auto-expressão, ao brincar (jogar), a
criança consegue mudanças nos seus esquemas mentais de forma a organizar-se. Esta nova
organização permite que a criança tome consciência de suas ações e, conseqüentemente,
consiga fazer escolhas com base em atitudes de disciplina, pois a confusão (indisciplina)
deixa de ser necessária ao seu esquema mental, visto que a organização se faz presente.
Assim, a ludoterapia também é um recurso que utiliza jogos como instrumentos e pode
contribuir, através da organização de sentimentos, para o desenvolvimento da disciplina em
crianças.
Na área da Psicopedagogia jogos são utilizados como principal instrumento de
intervenção frente às dificuldades de aprendizagem. Através do jogo, a criança pode pensar,
levantar hipóteses, antecipar, planejar, interpretar e criar. Macedo (in MACEDO; PETTY;
PASSOS, 1997) escreve sobre a importância do jogo para a Psicopedagogia. Ele explica que
os jogos de regras são instrumentos para se estabelecer inúmeras relações: espaciais (entre
peças e tabuleiro), sociais (entre os jogadores), lógicas (como no caso do jogo de Damas, por
exemplo, onde o sujeito deve articular as jogadas, evitando contradições), matemáticas (o
jogo de Damas implica relações matemáticas “na medida em que faz junções, separações,
bijeções, associações”, p. 150) e psicológicas:
Perder ou ganhar, competir, admirar o adversário (que foi capaz de pensar
melhor certa jogada), aprender com ele. (...) Quanto ao aspecto psicológico
o jogo de regras, por suas características, contribui também para o
desenvolvimento de uma relação professor-aluno ou cliente-psicopedagogo
baseada no respeito, na admiração, na aprendizagem. É a possibilidade de
aprender com o outro, de ‘fazer igual’, isto é, tomá-lo como referência e até
mesmo superá-lo; aprender que ganhar é tão circunstancial quanto
perder.(MACEDO in: MACEDO; PETTY; PASSOS, 1997, p. 150)
116
Talvez um dos aspectos mais importantes sobre o jogo é o fato de ele servir como
espelho às ações do sujeito. Assim como nos testes psicológicos o sujeito projeta seus
sentimentos através das histórias criadas a partir de dado estímulo, no jogo a criança projeta,
através de suas jogadas, elementos do seu mundo interno. Se a criança age com dispersão,
ansiedade, impulsividade, sabemos que esses temas fazem parte do seu mundo interno e
precisam ser trabalhados. A partir de suas jogadas (e das intervenções dos profissionais), a
própria criança vai tomando consciência de suas ações (as enxerga através do “espelho” do
jogo) e busca corrigi-las para ter êxito nessas.
Como já explicitamos, as entrevistas realizadas com as três profissionais (que
trabalham com crianças em oficinas de jogos segundo os moldes do Laboratório de
Psicopedagogia do Instituto de Psicologia da USP) tiveram como objetivo verificar o que elas
pensam sobre questões de disciplina e indisciplina. Estas entrevistas foram importantes
porque ao lado das considerações teóricas, possibilitaram a construção de um marco de
referência para a pesquisa realizada. Elas foram imprescindíveis, dada a ausência na literatura
de estudos empíricos analisando o problema da indisciplina em situação de oficina com jogos.
Por isso, os exemplos citados pelas profissionais nos permitiram focar o olhar sobre os
indicadores constitutivos das ações de indisciplina nas crianças. Sem essa contribuição,
dificilmente conseguiríamos categorizar essas ações. As concepções das profissionais sobre
disciplina e indisciplina permitiram-nos delimitar categorias de análise: atenção/concentração,
respeito, persistência e indisciplina: desatenção/dispersão, desrespeito (trapaça), desistência.
117
Como foi apresentado nos capítulos iniciais desta dissertação, indisciplina significa,
além de transgressão a regras, ações caracterizadas por confusão ou desobediência. Desta
forma, atitudes de indisciplina foram caracterizadas em três sentidos: 1) indisciplina com
referência à autoridade; 2) desobediência às regras; 3) confusão (desatenção, dispersão,
desistência).
Estes três sentidos de indisciplina foram separados apenas por uma questão de foco de
análise. Na realidade, os sentidos 1, 2 e 3 estão conjuntamente presentes quando uma ação de
indisciplina é cometida. Quem desobedece a regras, por exemplo, faz confusão e desrespeita a
autoridade, representada pelas regras do jogo, pelo respeito mútuo entre os jogadores e pelas
regras da oficina. Como sabemos, a indisciplina com referência à autoridade (sentido 1) es
presente, por exemplo, em uma ação de desrespeito às regras da oficina. Afinal, as regras da
oficina são apresentadas e dirigidas pelo professor. Se o aluno desobedece às regras da
oficina, ele está, ao mesmo tempo, desobedecendo a autoridade do professor, posto que foi ele
quem instituiu essa regra.
A indisciplina com sentido 2 refere-se à desobediência às regras, ou seja, ao
desrespeito às regras das atividades, das oficinas e ao desrespeito aos colegas. No desenrolar
das próprias atividades, há regras pré-estabelecidas pelas mesmas. Os jogos contêm regras
claras que devem ser respeitadas. Ao jogar Xadrez, por exemplo, deve-se respeitar o
movimento das peças, a alternância entre os jogadores, enfim, devem-se respeitar as regras do
jogo. Como desrespeito aos colegas (indisciplina de sentido 2) categorizamos ações onde um
colega desconsidera o outro. Por exemplo:
P1 pede para terminarem e para irem para a roda. C2 e C3 não querem parar. P3 pede desculpas e tira
o jogo deles. P1 explica as regras, mas C2 fala na vez dos colegas (X8, C3, X1). (...) C2 e C3 brincam
com o crachá. Falam na vez de X6. X1 interfere pedindo para C2 sentar na roda. C2 fala na vez de C1
(responde por C1, inventando respostas). (...) C2 fala interferindo no que X4 está dizendo. (6ª oficina,
Momento Reflexão, 09/05/2005)
118
Como desrespeito às regras da oficina (indisciplina de sentido 2) classificamos ações
onde as regras da oficina que são combinadas com as crianças já no primeiro dia de oficina e
reforçadas dia - a - dia não são respeitadas. Por exemplo:
P1 propõe que troquem de dupla (que está há muito tempo jogando e ainda faltam 20 min.). C2 fala
que vai “dar um role”. Ele e C3 saem juntos, infringindo a regra básica onde só pode sair um por
vez parar ir ao banheiro. P1 fala que não vai correr atrás deles. (19ª oficina, Xadrez, 04/10/2005)
As ações referentes ao desrespeito às regras da atividade proposta (indisciplina de
sentido 2) explicitam regras da própria atividade que são violadas. Por exemplo:
C3 se revolta dizendo que não vai fazer porque quer pintar (as professoras deram, como instrução, não
pintar). P1 explica que nesse desenho não poderá pintar porque gasta muito tempo (...) Ele não se
conforma, busca outra saída (já que não tem lápis de cor disponível) e pinta com o lápis grafite. (13ª
oficina, Par Educativo, 09/08/05)
Como dissemos, classificamos disciplina de sentido 3: atenção/concentração e
persistência. Estas ações que beneficiam o projeto que o sujeito escolheu seguir envolvem
autodisciplina. Neste sentido, a indisciplina refere-se à confusão. Ou seja, o sujeito, ao agir
com desatenção, dispersão ou desistência confunde-se, afasta-se da realização de seu projeto.
Quando o sujeito mostra-se desatento/disperso ele não consegue realizar a tarefa, se atrapalha
e isso o prejudica na realização da tarefa. Por exemplo:
C1 olha pela janela e avisa: “estou viajando”. Deita na cadeira, embaixo da mesa. (5ª oficina,
Jogo “Qual é a mensagem?” , 02/05/05)
As ações indicativas de desistência (indisciplina de sentido 3) explicitam hesitação ou
propriamente desistência de realizar certas atividades.
C2 desiste de jogar porque está perdendo de C3. Vai para o banheiro (sai bravo, batendo a porta).
P1 se oferece para jogar com C3 ele aceita e a fala: “ele não agüenta perder!”
As duplas vão revezando e as crianças mostram-se bem tranqüilas e concentradas (os professores
também revezam). Depois de dez minutos, C2 volta do banheiro e fica na porta os observando
(nenhum professor intervém: todos os professores estão jogando). Ele senta-se à mesa de C1 e P2 e diz
que vai ajudar C1. P2 diz: “mas se você ajudar ele, ele vai ganhar!” P1 convida C2 para jogar com X4,
ele não aceita o convite e P1 complementa: “nem de parceria comigo?” Ele responde fazendo um
gesto negativo com a cabeça... P1 responde: “tá bom”... (17ª oficina, Guerra dos peões e torre,
20/09/2005)
119
Agora, discutiremos as categorias de indisciplina: desatenção/dispersão, desrespeito
(aos colegas às atividades propostas, às regras da oficina), trapaça nos jogos e desistência (e
outras atividades) e no momento reflexão com base nos sentidos 2 e 3 que atribuímos às ações
de indisciplina.
Nos jogos e outras atividades as ações indicadoras de desatenção/dispersão são
relacionadas a momentos em que as crianças mostram-se distraídas, não conseguem focar seu
olhar nos pontos que a tarefa exige (indisciplina de sentido 3): olhar pela janela; cutucar
qualquer objeto ou partes do corpo; debruçar sobre a mesa; cobrir o rosto; fazer brincadeiras
que não se referem à atividade; pegar uma parte do jogo (vareta, por exemplo) para brincar
fora das regras; andar (em atividades em que essa atitude não é permitida); levantar do lugar
(em atividades em que essa atitude não é permitida); conversar sobre outras questões; batucar;
continuar a atividade anterior. No momento reflexão todas essas ações foram registradas
como indicadoras de indisciplina somadas a ir ao banheiro, ir ao bebedouro e permanecer de
costas para a roda.
As ações indicadoras de desrespeito ao colega demonstram atitudes onde a criança
desconsidera o outro (indisciplina de sentido 2) puxa a folha ou o tabuleiro do colega no
momento em que este está realizando a atividade; zomba de características físicas do colega;
zomba de dificuldades do colega; grita, canta, assovia ou batuca de forma que atrapalhe a
concentração do colega; pega algo do colega sem sua prévia autorização; bate no colega sem
o consentimento deste; conversa (paralelamente) na vez dos colegas; fala na vez dos colegas;
coloca os pés em cima do colega.
As ações indicadoras de desrespeito às regras do jogo ou atividade proposta
(indisciplina de sentido 2) são atitudes que prejudicam o desenrolar das atividades: mexer nas
peças do colega; pintar um desenho quando o combinado era não pintá-lo; mexer no tabuleiro
120
de demonstração sem autorização; falar durante a explicação; falar em momentos em que é
combinado não falar; brincar; brigar e não sentar na roda durante o momento reflexão.
As ações indicadoras de desrespeito às regras da oficina (indisciplina de sentido 2)
referem-se às regras das oficinas que são combinadas e quebradas: correr na sala; mexer no
armário sem autorização de um dos professores; sair da sala sem pedir autorização; continuar
a atividade anterior; bater a porta da sala com força, propositalmente; sair da sala para ir ao
banheiro ou bebedouro junto com um colega; brincar de “plantar bananeira”, jogar capoeira,
etc; brincar de brigar com um colega; escrever na lousa sem autorização.
As ações indicadoras de trapaça (indisciplina de sentido 2) são executadas com o
intuito de enganar o outro usando de dissimulação. As seguintes ações são caracterizadas
como trapaça: mudar as peças do jogo de lugar sem que o colega perceba; tentar ver cartas
que ainda não devem ser vistas, enfim, tentar roubar do adversário.
As ações indicadoras de desistência (indisciplina de sentido 3) sinalizam interrupção
da atividade antes do término desta ou recusa a realizar a atividade.
Como resultado da freqüência das ações de indisciplina de cada criança, podemos
verificar (nos quadros 11 e 12) que dois dos sujeitos observados (C2 e C3) agem com relativa
indisciplina no primeiro semestre, aumentam as ações de indisciplina no segundo semestre e
reduzem drasticamente essas ações no terceiro semestre. No quadro 10 vemos um sujeito (C1)
que praticamente mantém a mesma quantidade de ações indisciplinadas no primeiro e
segundo semestre, mas também as reduz drasticamente no terceiro semestre. Esse resultado
mostra que as crianças diminuem seus comportamentos de indisciplina ao longo das oficinas.
A atitude mais observada nos três sujeitos (ver quadros 10, 11 e 12) foi de desrespeito
(indisciplina de sentido 2) e a menos observada de trapaça (também indisciplina de sentido 2).
C1 praticou 24,55% (27 ações) das ações de desrespeito, seguido de C3 que realizou 35,45%
(39 ações) e de C2 que praticou 40% (44 ações) das ações de desrespeito.
121
É importante considerarmos que a ação da trapaça exige malícia e articulação de
várias informações ao mesmo tempo. Ou seja, a criança observa a estrutura da partida e tenta
ganhar desconsiderando o adversário, traindo a si mesmo, a ele e ao jogo. Segundo Macedo
(1994), a trapaça desvalida a vitória do jogador para ele mesmo e para o adversário:
Para o transgressor, a vitória não vale nada, porque ele sabe que é falsa,
sabe que seu jogo é outro. Além disso, se alguém passa a saber que o
adversário transgride, simplesmente deixa de jogar com ele, porque nas
regras o que seduz é justamente ganhar o jogo dentro de seu contexto
(regras). (MACEDO, 1994, p. 85)
Registramos, por exemplo, no jogo Pega -Varetas Gigante, C2 assoprando as varetas
de C1 com a intenção de trapacear. Para fazer esta trapaça, C1 quis prejudicar seu colega pois
este perde quando sua vareta mexe.
Atenção e concentração são conceitos complementares, que se articulam. Por isso,
os conceitos contrários a esses - desatenção/dispersão - foram incluídos em uma mesma
categoria para análise dos resultados.
Embora as ações de desatenção/dispersão (indisciplina de sentido 3) sejam o
segundo item mais freqüentemente observado nas crianças desse estudo (ver Quadros 10, 11
e 12), é preciso considerar que a ação de desatenção/dispersão é difícil de ser observada,
pois a criança pode estar fazendo a tarefa e pensando em outra coisa: não há como o
observador discernir o que o sujeito está pensando apenas observando-o. Já o desrespeito é
mais visível e, portanto, mais fácil de ser observado.
Ao longo do terceiro semestre de oficina, C1 parece estar mais concentrado nas
atividades, percebemos apenas algumas atitudes de desatenção/dispersão. Entretanto, ele não
é mais alvo de zombaria dos colegas e, inclusive, bagunça junto com eles quando encontra
“brechas”, mostrando que seu vínculo com os colegas se estreitou. Assim, ainda vemos uma
criança com dificuldades, porém, mais confiante em si, mais concentrado, mais persistente e
mais aceito pelos colegas.
122
C1 é o mais atrasado (é o último a terminar de cortar as figuras), mas persiste, parece interessado.
(33ª oficina, “Confecção Tangran”, 12/05/2006)
C1 não sabe ler, apenas repete o que P2 lê. (...) C1 não compreende a solicitação e pergunta, dizendo
que não entendeu. P2 explica novamente e ele fica quieto. P1. percebe que C1 ainda não compreendeu
e explica novamente, dessa vez ele parece ter compreendido, pois sorri (parece estar satisfeito com
a explicação) e realiza a atividade. (34ª oficina, “Lenda Tangran”, 19/05/2006)
No momento em que lhes é solicitado montar o quadrado de 3 peças, C1 persiste. P2 percebe que C1
está encontrando dificuldades e o ajuda. (...) P1. pergunta se todos conseguiram montar o quadrado de
7 peças. C1 chora (brincando). P1. o ajuda e ele persiste até conseguir.(...) No momento de
inventar uma figura e passar um traço, C1 é o primeiro a terminar e diz com entusiasmo:
“terminei!” (34ª oficina, “Montagem de figuras com o Tangran”, 19/05/2006)
As crianças vão sentando no chão (onde P1 colocou o percurso) conforme vão terminando a atividade
anterior. C3 demora para terminar porque capricha no desenho. P1 elogia-o dizendo que é o desenho
mais bonito e é o que mais vai aparecer na exposição. (9ª oficina, Desenho a partir traços, 06/06/05 )
C2 ficou em último lugar e C3 precisou voltar na última setinha, quando já estava quase vencendo o
jogo. Ambos xingaram o jogo (dizendo que o jogo era ruim), mas continuaram jogando. (9ª oficina,
Percurso Gigante, 06/06/05 )
No terceiro semestre de oficina, também observamos C2 mais persistente nas atividades.
No momento em que lhes é solicitado montar o quadrado de 3 peças, C2 persiste. P1 dá uma dica: são
os quadrados pequenos e um médio.(...) C2 permanece sozinho em sua mesa, concentrado e
persistente, mas ainda não conseguiu... P1 ajuda C2 ele consegue.(...) C2 é o primeiro a conseguir
montar o quadrado de 5 peças. Ele desmonta para que seus colegas não copiem. (34ª oficina,
Montagem de figuras com Tangran, 19/05/06)
C2 e X2 fazem juntos, tranqüilos, concentrados. P2 pergunta quem está ganhando e C2 responde:
“Eu, por enquanto!” (parece que C2 reconheceu suas limitações de numa forma tranqüila,
descontraída). P4 ri e diz: “vai começar a complicar, né?”Todos ficam, por uns vinte minutos,
fazendo essa atividade, em silêncio, persistindo, concentrados. (36ª oficina, Pontinhos, 09/06/06)
Vemos C3 especialmente interessado a realizar as atividades no terceiro semestre,
persistindo, concentrado:
Quando P1 propõe que façam animais, C3 se interessa pela proposta e persiste: desmonta o desenho
original buscando construir animais com as peças. (33ª oficina, Confecção do Tangran, 12/05/2006)
C3 finaliza escolhendo uma figura que P1 não gosta, ela diz que a figura está “zoada”, pede pra ele
integrar mais as peças e ele responde que arte é assim mesmo, que gostou e não vai refazer. C3, ás
vezes, cantava enquanto realizava a atividade. C3 capricha em seu desenho admirando-o, dizendo:
“muito louco, mano!” (33ª oficina, Confecção do Tangran, 12/05/2006)
123
C3 pede para ler (mas P2 diz que é a vez de X3). (...) C3 se perde na leitura e diz: “não sei onde
estou!” (rindo) e C1 responde: “ce ta na cadeira, ta sentado, mano!” (34ª oficina, Leitura da lenda
Tangran, 19/05/2006)
C3 se preocupa em terminar rapidamente a atividade quando X3 mostra que terminou. C3 mostra
sua atividade para P2 dizendo que também conseguiu, que é muito fácil. (34ª oficina, Leitura da
lenda Tangran, 19/05/2006)
C3 consegue montar o quadrado de 4 peças, mostra-se feliz por ter conseguido, diz: “consegui!” e
ri. (34ª oficina, Montagem de figuras com o Tangran, 19/05/2006)
C3 canta executando a atividade: “chutou na trave!”, mas continua concentrado. (...) C3 consegue
montar e sorri de satisfação. (34ª oficina, Montagem de figuras com o Tangran, 19/05/2006)
C3 é o primeiro a conseguir montar o quadrado de 7 peças, C1 fica observando o quadrado dele e
tenta imitar. C2 fica em sua mesa, tranqüilo, perseverando, concentrado, depois de muito tempo
ele consegue montar e P1 o parabeniza. (34ª oficina, Montagem de figuras com o Tangran,
19/05/2006)
Todos, inclusive C1, C2 e C3 ficam por uns vinte minutos fazendo essa atividade em silêncio,
persistindo, concentrados. (36ª oficina, Pontinhos, 09/06/2006)
Um fato interessante ocorre no terceiro semestre, pois revela um momento de
indisciplina. Quando o jogo Quarto é apresentado às crianças (39ª oficina) elas parecem
pouco interessadas nesse jogo e ações de indisciplinada podem ser observadas.
Talvez a complexidade desse jogo tenha influenciado para que as crianças se
desinteressassem por ele (não o consideraram um desafio a ser superado) e agissem com
desatenção/dispersão, desrespeito aos colegas e às regras da oficina:
C1, C2 e C3 se dispersam escrevendo na lousa. P4 e P2 chamam a atenção pedindo para eles
participarem do jogo. C3 fala que o card (uma espécie de figurinha que as crianças fazem coleção)
dele sumiu. P4 argumenta dizendo que eles não deveriam trazer esses cards para as oficinas, pede
várias vezes para eles se voltarem para a mesa do jogo (há uma mesa única onde todas as crianças
estão jogando (...) eles demoram a atendê-la, até que decidem ir para a mesa, mas ficam batucando,
dispersos e desrespeitando os colegas que querem prestar atenção na explicação. C3 descobre que o
card está com C1, os dois dão risadas, permanecem dispersos. P4 pergunta para C3 o que está
acontecendo com ele e ele volta sua atenção para o jogo, participando. (...) P4 pede para eles
guardarem os desenhos. C1 e mais dois colegas “ignoram” os pedidos de P4 e P2: continuam
desenhando, enquanto todos já estão em roda para o Momento Reflexão. P4 explica que os
professores os deixaram fazer os desenhos, mas que agora eles precisam parar. C1 pára. (...) Eles
guardam os desenhos assoviando, atrapalhando a conversa em roda. Enfim, sentam na roda. (39ª
oficina, “Jogo Quarto”, 23/06/06)
124
O jogo Quarto é mais complexo do que os jogos que haviam sido oferecidos às
crianças. O jogo compõe-se de um tabuleiro com 16 casas redondas (4 cm de diâmetro) e 16
peças, todas diferentes entre si, mas com características em comum.Cada uma tem quatro
atributos: clara ou escura, redonda ou quadrada, alta ou baixa, vazadas ou maciças. O objetivo
do jogo é formar um alinhamento, na horizontal, vertical ou diagonal, com quatro peças que
tenham, ao menos, um atributo em comum. A cada nova peça a criança precisa estar atenta
para antecipar a possível jogada seguinte de seu parceiro e, ao mesmo tempo, coordenar os
quatro atributos das peças para analisar a possibilidade de ela mesma formar um alinhamento
em uma das posições, ou seja, formar um “quarto”. Dessa forma, ela deve analisar todos os
possíveis da jogada e escolher a melhor peça para ser utilizada.
A criança precisa coordenar muitas informações ao mesmo tempo (atributos das
peças, alinhamento) e ter bem desenvolvida noções espaciais (para saber onde colocar as
peças e perceber os alinhamentos), temporais (para discernir o momento ideal de colocar
determinada peça).
Isso nos lembra que a questão do interesse e da vontade está intrinsecamente
relacionada com ações de disciplina. Assim, mesmo que cognitivamente a criança saiba agir
com disciplina, se ela não tem interesse em realizar a atividade, afetivamente ela “escolhe”,
ainda que muitas vezes de modo inconsciente, agir com indisciplina. Neste caso, percebemos
que as crianças estavam mais disciplinadas no terceiro semestre, mas agiram com confusão
(dispersão) e desobediência (desrespeito) quando encontraram uma tarefa que, aparentemente,
elas consideraram muito complexa e, talvez por isso, pouco mobilizadora dos seus interesses.
Como vimos, a afetividade é a energética que guia a criança a “querer superar-se” no
jogo (ou na vida), a partir da “força de vontade”. Esta é uma questão ética. Segundo La Taille
(2006) as escolhas éticas do sujeito dependem de uma experiência subjetiva de alguma forma
de bem-estar. No caso do jogo Quarto (apresentado no terceiro semestre), vimos que as
125
crianças não apresentaram vontade de superar este desafio. A vontade é um sistema de
conservação de valores e, nesse caso, as crianças não tinham como valor superar este desafio.
Na realidade, acreditamos que este jogo não chegou a ser considerado uma perturbação
(desafio a ser superado) para os sujeitos.
Segundo Piaget (1976/2001), uma perturbação só se constitui como tal caso o próprio
sujeito possua a estrutura capaz de assimilar o objeto novo ou o elemento perturbador. Pode
ser que o jogo Quarto tenha exigido estruturas que os sujeitos em questão ainda não possuíam
e eles agiram com indisciplina.
Vimos que quando o sujeito se sente desafiado pela perturbação e tem como valor
superá-la além de possuir os recursos cognitivos para tanto, ele age com disciplina (atenção,
concentração, persistência, respeito) com o intuito de vencer. Nessa perspectiva o sujeito
reage à perturbação, com disciplina, visando a reequilibração do seu sistema (regulação):
triunfar sobre o desafio, ampliando seus conhecimentos e seu sentimento de ser capaz.
No terceiro semestre, as crianças estão mais familiarizadas com o sistema de regras e,
de uma maneira geral, consideramos que elas passaram a atribuir valor ao fato de triunfarem
nas tarefas propostas. Desta forma, agem com menos indisciplina porque “querem” ser mais
disciplinadas, ou seja, têm mais força de vontade para superar os desafios das tarefas. Parece
que agora a disciplina é valorizada como meio para se alcançar uma determinada meta.
Entretanto, se lhes é oferecida uma atividade ou um jogo (o Quarto, por exemplo) que
elas considerem pouco interessante (ou por ser muito difícil de ser compreendido, ou pouco
desafiador, ou por ter sido mal explicado pelos profissionais) a vontade (instrumento da
conservação de valores) dessas crianças volta-se para outro foco: o jogo em questão não é,
para elas, uma meta a ser atingida.
126
Como vimos, as ações de desrespeito foram as ações mais observadas neste estudo. O
desrespeito em uma situação de jogo ocupa um lugar muito importante, pois os jogos
representam instituições sociais com regras. No livro “O juízo moral na criança”, Piaget
(1932/1994) valoriza a questão da regra como fundamental no processo de constituição da
autonomia em todo adulto, e que começa nas crianças. Na primeira parte deste seu livro,
como vimos, Piaget faz uso do jogo de “bolinhas de gude”, entre meninos, para estudar o
respeito às regras do ponto de vista da própria criança. Nessa perspectiva ele estuda a prática e
a consciência da regra. Para ele, “toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de
toda moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por essas regras.” (p.
23)
Como dissemos inicialmente, a autonomia baseia-se no respeito mútuo, nas relações
de cooperação e reciprocidade, onde as regras são as reguladoras das relações, sendo
constituídas em comum acordo. Dessa forma, o trabalho com jogos de regras pode ajudar a
desenvolver relações de reciprocidade.
A regra do jogo regula as ações determinando o que pode ou não ser feito,
com vistas a definir claramente os objetivos e dar condições iguais aos
oponentes como ponto de partida. Assim, vence aquele que desenvolve
melhores estratégias. (MACEDO; PETTY; PASSOS, 2005, p. 33)
Segundo La Taille (2006) as regras somente são cumpridas se no plano moral
psicológico o indivíduo experimentar o sentimento de obrigatoriedade, o sentimento do dever
moral. No jogo, a criança segue as regras do mesmo se sentir que deve fazer isso. Esse
sentimento de dever está diretamente relacionado com o desenvolvimento moral infantil.
127
Podemos dizer que a força do sentimento de obrigatoriedade é intensificada quando as
situações de cooperação são favorecidas. No caso dos jogos, isso ocorre necessariamente, pois
as regras são consideradas legítimas, obrigatórias e o sujeito escolhe segui-las caso aceite
jogar. Dessa maneira, em oficinas de jogos, o sujeito desenvolve autonomia para escolher
persistir (com atenção, concentração) no jogo, atividades propostas ou qualquer outra
situação.
A vontade (plano ético) para escolher persistir nas atividades está diretamente
relacionada com a “expansão de si próprio”. Ou seja, o sujeito escolhe agir com disciplina
porque assim ele se sente melhor (sente que pode expandir a si próprio).
Neste sentido, jogos de regras são excelentes instrumentos para que o sujeito sinta-se
desafiado a expandir a si próprio agindo com disciplina:
As regras, dentro de seus limites, são transformadoras, pedem-nos o tempo
todo a consideração do que se tornou possível no sistema. O gozo de um
jogador, por exemplo, é ganhar, ser melhor que o outro em um contexto de
regras; é sempre buscar ser melhor que o adversário e, o mais importante,
superar a si mesmo. (MACEDO, 1994, p.87)
Segundo La Taille (2006), o sentimento de vergonha incide sobre o ser (sente-se
vergonha do que se é) e pressupõe um auto-juízo negativo, ou seja, o sujeito julga
negativamente a si próprio. Entretanto somente a partir dos 9 ou 10 anos de idade a vergonha
moral é associada ao sentimento de obrigatoriedade (lembremos que nossos sujeitos têm 10 e
11 anos de idade): a vergonha moral é sentida como mais forte que as sanções expiatórias.
Assim, a transgressão moral é sentida como desvalorização de si.
As oficinas de jogos (do LaPp) são favoráveis ao desenvolvimento da moral: há regras
a serem seguidas dentro da oficina, (além das regras dos jogos e atividades propriamente
ditas). Valorizam, igualmente, o desenvolvimento da ética: as crianças ao jogar, ganham
possibilidades de desenvolver autoconfiança e podem interessar-se por melhorar seus
128
desempenhos e, aos poucos construírem representações de si com valor positivo (expansão de
si próprio). Além disso, vivenciam situações, durante os jogos, em que valores como respeito
e cooperação passam a ser assumidos, por cada um dos participantes, como necessários à sua
interação social.
Outro ponto importante a ser ressaltado é a estrutura das oficinas, pois verificamos que
ela favorece a rotina e o desenvolvimento das atividades: promove certa organização para
realização destas. Observamos que as oficinas de jogos seguem quatro movimentos: lista de
presença, atividade inicial, atividade principal (jogo ou outras atividades gráficas) e momento
reflexão. O momento da lista de presença desenvolve a paciência das crianças, sinaliza o
início dos trabalhos e o sentimento de responsabilidade e identidade.
As atividades gráficas e os jogos têm como objetivos implícitos desenvolver atenção,
concentração, organização, comunicação, descentração, respeito, leitura, escrita e/ou
raciocínio aritmético.
O Momento Reflexão é uma conversa em roda que estimula a percepção de si, a
reflexão, o respeito ao outro e ajuda desenvolver a noção temporal de que a oficina está
chegando ao fim.
Portanto, as oficinas constituem um espaço no qual, além de as crianças ampliarem
seus recursos cognitivos, são desenvolvidas atitudes favoráveis à aprendizagem: o que
julgamos ter podido ilustrar com nossa pesquisa, enfocando, dentre estas atitudes, a
construção de ações de disciplina. A estrutura das oficinas e os instrumentos (jogos e
atividades gráficas) favorecem atitudes de disciplina. Vimos que essas atitudes são
conquistadas pouco a pouco e diversos são os fatores que contribuem para essas ações: a
estrutura organizadora das oficinas, os instrumentos (jogo e outras atividades) lúdicos e
desafiadores, as intervenções dos profissionais, dentre outros. Esses fatores contribuem para o
desenvolvimento de autoconfiança nas crianças. Desta forma, elas buscam melhorar seus
129
desempenhos e expandir a si próprias (com valores positivos) porque querem isso,
conseqüentemente agem com menos indisciplina (mais disciplina).
A relação com o desconhecido é mais do que ter um objetivo ou propósito;
é mais do que aceitar uma tarefa ou proposta; é acreditar, ter vontade e
determinação. É poder criar, pouco a pouco, uma disciplina para um
caminho a ser percorrido, para a construção daquilo que queremos encontrar
ou produzir, é dispor de alguém que nos acompanha de algum modo nessa
realização. Mais do que isso é poder coordenar disciplina com confusão,
sabendo-as parte de um mesmo todo, e momentos de um ser que quer se
tornar ou realizar alguma coisa. (MACEDO, 2005b, p. 148)
130
APÊNDICES
131
APÊNDICE A - Roteiro de entrevista
1- O que é atenção? Como ela se expressa na oficina? Como você a reconhece na hora
do jogo? A desatenção é o oposto da atenção. Pra você, o que seria desatenção? Como ela se
expressa na oficina? Como você a reconhece na hora do jogo?
2- O que é concentração? Como ela se expressa na oficina? Como você a reconhece na
hora do jogo? A dispersão é o oposto da concentração. Pra você, o que seria dispersão? Como
ela se expressa na oficina? Como você a reconhece na hora do jogo?
3- O que é Baixa Tolerância à Frustração? Como isso se expressa na oficina e como
você reconhece, na hora do jogo, uma atitude de baixa tolerância à frustração?
4- O que é perseverança? Como ela se expressa na oficina? Como você a reconhece na
hora do jogo? A inconstância é o oposto da perseverança . Pra você, o que seria inconstância?
Como ela se expressa na oficina? Como você a reconhece na hora do jogo?
5- O que é desrespeito aos colegas? Como isso se expressa na oficina? Como você o
reconhece na hora do jogo? A respeito aos colegas é o oposto ao desrespeito. O que seria esse
respeito? Como ele se expressa na oficina? Como você o reconhece na hora do jogo?
6- O que é desrespeito às regras das tarefas? Como isso se expressa na oficina? Como
você o reconhece na hora do jogo?
7- O que é o uso de boas estratégias para a realização das atividades propostas? O que
seria, então, o uso de estratégias ruins para a realização das atividades propostas? Como isso
se expressa na oficina? Como você as reconhece na hora do jogo?
8- O que são tentativas de trapacear? Como isso se expressa na oficina? Como você as
reconhece na hora do jogo?
9- Existe mais alguma categoria que você gostaria de acrescentar?
132
10- Você tiraria alguma categoria que eu coloquei se você tivesse que observar os
comportamentos de indisciplina?
133
APÊNDICE B- Instrumentos utilizados nas oficinas de jogos
Descrevemos os instrumentos (jogos e outras atividades), utilizados no momento em
que estávamos registrando as ações das crianças, para que o leitor possa compreender a
dinâmica da oficina no instante em que a ação foi observada. Os jogos com tabuleiro foram
ilustrados com figuras para que o leitor possa visualizá-los e compreendê-los.
Dividimos a apresentação desses instrumentos em “atividades principais”, “atividades
iniciais” e “rotina estabelecida nas oficinas” (lista de presença, autorização para água e
banheiro, material na pasta e momento reflexão).
No final, descrevemos os jogos e outras atividades utilizados ao longo das observações
e não selecionados nos recortes dos registros de comportamento.
Atividades principais
Caça – Palavras
Esse jogo foi utilizado no LaPp, principalmente, para desenvolver habilidades de
atenção, concentração e organização.
É composto por várias letras distribuídas em um quadro, tal que as letras contíguas na
direção horizontal, vertical, diagonal e, inclusive, de trás para frente, formam palavras a serem
“caçadas” pelo jogador. O jogo escolhido neste primeiro semestre contém palavras escritas
apenas na horizontal ou vertical, pois se trata de um nível básico do caça - palavras.
A concentração é desenvolvida porque é preciso fixar a atividade mental aos possíveis
do jogo: é possível que as letras que compõe a palavras estejam em qualquer lugar do
tabuleiro.
134
A atenção consiste em focar o necessário: há várias letras soltas, é necessário ler as
letras soltas formando uma palavra em particular. Assim, é preciso formar uma palavra em
oposição a outras letras que não formam palavras.
Percebemos que, no início, as letras são todas iguais; entretanto, ao final do trabalho,
verificamos uma organização, pois as letras que compõe as palavras são grifadas e
transformam-se em figura (as outras permanecem no fundo, continuam soltas). Neste jogo a
organização pode ser espacial (palavras que se destacam como figura na horizontal ou
vertical) ou temporal (há uma seqüência de letras na formação de palavras)
Procedimentos
Cada jogador joga individualmente buscando encontrar as palavras. Ao encontrar uma
palavra, suas letras devem ser ligadas. O jogo termina quando todas as palavras são
encontradas.
Feche a Caixa
Neste semestre (primeiro semestre de 2005) o Feche a Caixa foi escolhido para
desenvolver a atenção e concentração na medida em que foram trabalhados cálculos
aritméticos coordenados às necessidades de combinações que o próprio jogo exige.
O jogo é formado por um tabuleiro de madeira construído com pequenas casas,
enumeradas de 1 a 9, que são abertas e fechadas ao longo do jogo e dois dados. O objetivo do
jogo é ficar com a menor pontuação possível.
135
Figura 1. Feche a Caixa aberto
Procedimentos
O jogo se inicia com todos os números das casas expostos. O primeiro jogador lança
os dados e soma os valores obtidos nos dois dados. O primeiro jogador lança os dados e soma
os valores obtidos nos dois dados. Ele deve fechar uma ou duas casas que tenham números
que sejam equivalentes à soma do valor dos dados. Digamos que as faces sorteadas foram 2 e
6, o que soma 8 pontos. O jogador poderá então fechar a casa 8, virando para baixo a face
com o número, ou fechar um par de casas cuja soma seja 8, por exemplo, 1 e 7, 2 e 6, ou 5 e
3.
Figura 2. Feche a Caixa 2 e 6 Figura 3. Feche a Caixa 1 e 7
136
F
F
Figura 4. Feche a Caixa 3 e 5 Figura 5. Feche a Caixa 8
Feito isso, o jogador prossegue até que não tenha opções para fechar (assim, somam-se
os pontos das casas que não puderam ser fechadas) e a vez passa para o outro jogador. Se o
jogador conseguir fechar todas as casas, não marcará pontos e passará a vez para o próximo
jogador. Se, por exemplo, só restar as casas 4, 5 e 9 abertas e o jogador tirar 1 e 2 nos dados,
não terá opções para fechar, pois tanto a casa 3 quanto as 1 e 2 já foram fechadas. Neste caso
ele perdeu a rodada e terá que somar as casas que ainda restaram abertas. Aqui ele ficaria com
4+5+9=18 pontos.
Todas as casas são abertas novamente e o jogador adversário faz sua jogada, lançando
dados e fechando casas enquanto isso for possível.
Cada vez que um jogador não conseguir fechar alguma casa, anota seu placar e passa a
vez. A cada jogada, o novo placar obtido é somado ao antigo. O tempo de jogo é estipulado
pela professora antes do jogo ser iniciado, por exemplo ela pode dizer: “hoje vamos jogar 30
minutos de Feche a Caixa” e, quando este termina, somam-se os pontos. O jogador que tiver
feito menos pontos é o vencedor.
Importante: quando as casas 7, 8 e 9 forem fechadas, o jogador pode passar a jogar
com apenas um dado, para evitar pontuações muito altas.
137
A concentração consiste em analisar todas as possibilidades de se fechar a soma das
duas faces dos dados, a atenção está em escolher uma das possibilidades (necessário).
Imagem & Ação
O jogo Imagem & Ação foi utilizado com intuito de promover a comunicação verbal e
representação gráfica da mesma, além de desenvolver a descentração: é necessário imaginar
como o outro está percebendo o desenho em desenvolvimento (considerar a visão do outro no
processo).
É um jogo fabricado pela Grow para crianças de 5 a 10 anos. O jogo é composto por
cartões vermelhos e azuis, cada qual com 4 palavras, numeradas de 1 a 4 (essa numeração
corresponde ao grau crescente de dificuldade, determinado pelo inventor do jogo).
Figura 6. Jogo Imagem & Ação
Antes do início de cada rodada, as professoras permitem que o jogador escolha a
palavra que prefere desenhar do cartão “sorteado” e avisa às outras crianças que número de
palavra ele escolheu. Neste semestre, as professoras optaram por trabalhar apenas com os
cartões azuis, pois seu nível de complexidade é menor. O objetivo é que uma pessoa, ou uma
138
dupla, represente uma palavra desenhando-a para as outras crianças que deve buscar descobri-
la em um espaço de tempo determinado pela ampulheta.
Procedimentos
Um jogador sorteia uma carta e lê silenciosamente as palavras ali escritas e escolhe
uma para desenhar. A professora avisa a sala qual número foi escolhido. Em seguida, vira-se a
ampulheta e ele busca representar a palavra por imagens (desenhos) em uma lousa que existe
no LaPp. Quem descobrir a palavra, será o próximo a desenhar. Se não for descoberta, o
jogador convida um ajudante que, junto com uma das professoras supervisionando a conversa,
dará novas idéias de como o jogador pode representar, de uma maneira diferente, a palavra
escolhida. O tempo começa a ser contado novamente, se a palavra não for descoberta em
tempo hábil, a mesma é revelada ao final do tempo e sorteia-se o próximo.
Qual é a mensagem?
Esse jogo foi elaborado tendo como base o jogo Imagem & Ação. O objetivo de ter se
recorrido a esse jogo, no primeiro semestre, foi justamente, dar continuidade ao
desenvolvimento da comunicação verbal e gráfica através da descentração que estava sendo
estimulado desde o jogo Imagem & Ação.
O desafio do jogo é representar uma frase em duas (no início da aprendizagem das
regras) ou três partes, por meio de imagens ou desenhos, procurando fazer com que as outras
crianças participantes descubram o conteúdo articulando as partes do desenho. Vence o
jogador que disser a frase mais semelhante à original.
139
Procedimentos
As professoras criam frases e as escrevem em tiras de papel que serão sorteadas a cada
jogada. A sala é dividida em grupos e cada dupla deve ler silenciosamente e planejar o que irá
desenhar numa folha de sulfite A4 antes de representar a frase, por imagens, na lousa.
NOME: _________________________________________ DATA: _____________
Frase:________________________________________________________________
Figura 7. Exemplo de matriz do Qual é a Mensagem?
As frases criadas pelas professoras têm conteúdos simples, com temas conhecidos pelo
vocabulário das crianças. Exemplos de frases que foram elaboradas:
- “O menino chutou a bola e quebrou o vidro”.
- “O palhaço subiu na cadeira e pulou”.
- “A menina pisou na banana e caiu”
Após planejarem o desenho, as duplas se dirigem até a lousa, uma por vez, e procuram
desenhar o planejado. Enquanto elas desenham, uma professora escreve as frases que vão
sendo ditas pelas outras crianças. Cada uma tem direito de dizer uma frase. Depois a
professora questiona com a dupla, frase por frase que foi dita, buscando reconhecer quais
possuem conteúdos semelhantes à frase original e finaliza combinando com a dupla qual é a
frase mais parecida. Caso não exista frase semelhante à original, é dada outra oportunidade
140
para a dupla representar a frase. Vence a dupla que tiver se aproximado mais da frase original.
Logo é a vez desta dupla ir ao quadro.
Cara a Cara
O Cara a Cara é um jogo fabricado pela Estrela e foi utilizado no LaPp para estimular
a concentração, a atenção e a interpretação gráfica através da comunicação verbal.
O jogo apresenta-se em dois tabuleiros, cada um composto por um conjunto com 24
personagens diferentes. Os mesmos 24 personagens estão ilustrados em cartões que deverão
ser sorteados para que cada jogador, através de perguntas, possa adivinhar o personagem que
foi sorteado. As perguntas devem ser feitas de modo que as respostas possam ser limitadas
entre sim ou não (Ex: Tem chapéu? Tem bigode?). A cada resposta, deve-se eliminar os
personagens cuja característica não faça parte do personagem escondido. Se, por exemplo, a
pergunta foi “Tem bigode?” e a resposta foi “Não”, deve-se eliminar (baixar) os personagens
que tem bigode.
Figura 8. Jogo Cara a Cara Figura 9. Tabuleiro do jogo Cara a Cara
É preciso estar atento a cada informação nova, comparar a resposta verbal com seu
correspondente gráfico e eliminar os personagens cuja característica não faça parte do
141
personagem escondido. Assim, é preciso estar concentrado aos possíveis do jogo: é possível
que o personagem a ser encontrado possa ser qualquer um dentre os 24 do tabuleiro. A
atenção consiste em focar o necessário: há vários personagens no tabuleiro, é necessário
encontrar o personagem sorteado em oposição aos que não foram sorteados.
Procedimentos
No LaPp foi distribuído um tabuleiro para cada criança e, primeiro, jogou-se
coletivamente : as crianças precisavam descobrir o personagem do cartão sorteado pela
professora (neste momento todas as crianças eram adversárias entre si). Depois, dividiu-se a
classe em duplas (as crianças eram adversárias na dupla em que estavam), cada uma sorteava
um cartão e precisava descobrir a personagem da outra.
Figura – Fundo
Este jogo foi escolhido para trabalhar habilidades de atenção, concentração e
organização.
É composto por uma paisagem onde o jogador deve encontrar objetos que estão
confundidos com o fundo. É necessário formar figuras que antes eram consideradas fundo em
relação ao contexto da paisagem.
A concentração é desenvolvida porque é preciso analisar todos os possíveis do jogo:
é possível que as figuras a serem encontradas estejam em qualquer lugar da paisagem.
A atenção consiste em focar o necessário: há vários desenhos no fundo, é necessário
encontrar o desenho solicitado em oposição a outros traços que não formam desenhos.
142
Percebemos que, no início, os traços não mostram nada além das figuras em
evidência, mas ao final do jogo, verificamos uma organização nos traços que antes apenas
faziam parte do fundo; assim, as figuras que antes eram fundo, são coloridas e destacam-se
em relação às outras. Neste jogo a organização é espacial (as figuras se destacam dentre
vários traços).
Procedimentos
As professoras escrevem, na lousa, as figuras que devem ser encontradas na imagem:
papai Noel, 2 cenouras, bota, machado, serrote, taco de golfe, canoa e passarinho. Conforme
as crianças encontram as figuras, pintam-nas.
Sete Erros
O jogo dos sete erros foi utilizado para estimular a concentração e a atenção.
Apresenta-se em forma de duas figuras (paisagens) semelhantes que representem uma
situação de fácil conhecimento das crianças. No caso, foi escolhido um jogo com paisagem
de uma árvore com um ninho com passarinhos e a mamãe pássara. Uma das paisagens contém
sete erros (diferenças em relação à outra figura, como incompletude dos desenhos, por
exemplo) que devem ser identificados.
É preciso estar atento aos erros, comparar cada parte da figura com seu correspondente
na outra e julgar se essa correspondência é exata ou se falta alguma coisa.
143
Procedimentos
O jogador precisa encontrar os sete detalhes que diferenciam as duas imagens. Quando
ele achar algum erro, deve marcá-los com uma caneta ou lápis de cor para não perder a conta.
O jogo será encerrado quando o jogador encontrar os sete erros.
Percurso Gigante
Este jogo foi criado pelos profissionais do LaPp e usado no primeiro semestre para
desenvolver o respeito às regras, respeito aos colegas, atenção e tolerância à frustração
Consiste em um tabuleiro de 1,45m de largura e 0,70m de comprimento onde foi
desenhado um percurso de 45 casas. Deve ser jogado com 2 dados e cada jogador é
representado por um peão. Dentre as casas, há algumas com desenhos que simbolizam algo
que o jogador deverá executar ou em seu benefício (avançar casas) ou em seu prejuízo (voltar
casas).
O respeito às regras é desenvolvido na medida em que se deve executar o que a casa
simboliza, além disso, é necessário aguardar a vez dos colegas. O respeito aos colegas
consiste exatamente em aguardar a vez de o colega jogar.
A tolerância à frustração é trabalhada quando se tira um número pequeno no dado,
quando um amigo lhe passa, quando é necessário voltar casas e, enfim, quando se perde o
jogo.
144
Figura 10. Percurso Gigante
Procedimentos
A professora solicita que a classe se divida em dois grupos e distribui os peões. As
regras são explicadas e combina-se quem iniciará a jogada (geralmente é escolhida a técnica
de cada participante colocar um número de dedos, a professora soma os números e conta até
que pare em um jogador, então começam a jogar, a partir desse jogador, em sentido horário).
O jogo termina quando todos os jogadores chegarem ao final do percurso apresentado.
Quatro Cores
O jogo “4 Cores” é composto por material gráfico: uma folha de papel A4, quatro lápis
ou canetas de cores diferentes. Caracteriza-se por uma figura composta de várias regiões
adjacentes. O objetivo é pintar, com quatro cores diferentes, as regiões de modo que regiões
vizinhas não possuam a mesma cor (a vizinhança é definida por uma linha ente as regiões).
145
Procedimentos
Há várias maneiras de se jogar o “Quatro Cores”. Neste semestre, o jogador deveria
colorir as subdivisões de uma figura individualmente. Foram oferecidas três matrizes que
evoluíram em grau de dificuldade: a primeira possuía 12 regiões, a segunda 17 e a terceira 23.
Além disso, as crianças criaram matrizes para que elas mesmas pintassem e depois criaram
uma para um colega pintar.
Dominó das Quatro Cores
O jogo Dominó das Quatro Cores foi utilizado nas oficinas (segundo semestre). Este
jogo é composto por 18 peças retangulares de 4 cores diferentes que devem ser dispostas de
modo a formar um quadrado (há uma base quadrada de madeira onde as peças devem ser
colocadas), sem que se toquem as peças de mesmas cores, nem mesmo nos cantos.
Ele pode ser jogado individualmente ou em dupla. Nesse semestre, foi escolhida a
modalidade individual, pois nesse momento também se tinha como objetivo desenvolver a
concentração de maneira individual, sem facilitar momentos de dispersão com interferências
de outro.
Figura 11. Dominó das Quatro Cores
146
Procedimentos
A professora explica as regras, distribui os tabuleiros quadrados que servem de base
para que as crianças montem o Dominó em cima e, então, as crianças jogam individualmente,
com o objetivo de formar o quadrado com quatro cores (usando todas as peças) que não sejam
vizinhas.
Quarto
Esse jogo foi proposto com a intenção de se trabalhar antecipação, atenção e
concentração. O jogo compõe-se de um tabuleiro com 16 casas redondas (4 cm de diâmetro) e
16 peças, todas diferentes entre si, mas com características em comum.Cada uma tem quatro
atributos: clara ou escura, redonda ou quadrada, alta ou baixa, vazadas ou maciças. O objetivo
do jogo é formar um alinhamento, na horizontal, vertical ou diagonal, com quatro peças que
tenham, ao menos, um atributo em comum. A cada nova peça a criança precisa estar atenta
para antecipar a possível jogada seguinte de seu parceiro e, ao mesmo tempo, coordenar os
quatro atributos das peças para analisar a possibilidade de ela mesma formar um alinhamento
em uma das posições, ou seja, formar um “quarto”. Dessa forma, ela deve analisar todos os
possíveis da jogada e escolher a melhor peça para ser utilizada.
Figura 12. Jogo Quarto
147
Procedimentos
Inicia-se o jogo sorteando (tirando par ou ímpar) entre os dois participantes, o jogador
que irá começar. O “sorteado” inicia oferecendo uma das 16 peças para que o adversário a
coloque em uma das casas. Depois, o outro jogador escolhe uma peça (dentre as 15 que
restaram) e a entrega ao primeiro jogador que escolherá uma casa para colocá-la.
As jogadas prosseguem assim, sucessivamente, até que um dos jogadores atinja o
objetivo de formar um alinhamento com, ao menos, um atributo em comum (não importa
quem tenha posto os outros três elementos) e diga a palavra “Quarto”.
Caso um jogador faça o alinhamento e não o perceber, prosseguindo oferecendo uma
peça ao adversário, ele perde a chance de fazer aquele “Quarto”; se o adversário perceber,
neste momento pode falar “Quarto!” e será o vencedor, entretanto, se ele não perceber, o jogo
continua até que um novo alinhamento seja construído e percebido.
A partida pode terminar sem vencedor se todas as peças são colocadas sem que um
dos jogadores construa e / ou indique um Quarto.
Tangran
É um jogo milenar, de origem chinesa, composto de sete peças: dois triângulos
grandes, dois pequenos e um médio, um quadrado e um paralelogramo. Há várias maneiras de
se jogar o Tangran. No terceiro semestre de oficina, os professores do LaPp optaram por
introduzir o Tangran primeiro lendo uma das lendas do Tangran, depois as próprias crianças
confeccionaram seu Tangran para que pudessem se apropriar melhor das peças, então, criaram
figuras com o Tangran. Foram solicitadas 7 figuras para serem montadas:
1) uma figura livre, com todas as peças;
2) um quadrado de 2 peças;
148
3) um quadrado de 3 peças;
4) um quadrado de 4 peças;
5) um quadrado de 5 peças;
6) um quadrado de 7 peças;
7) uma figura livre com um traço em volta para definir a forma da figura.
Figura 13. Tangran
Lenda do Tangran (lida pelas crianças):
“Era uma vez, uma linda princesa que tinha um espelho quadrado. Ela adorava esse
espelho e olhava-se nele todos os dias. Certo dia ele caiu no chão e quebrou-se em sete
pedaços. A princesa ficou muito triste, mas ninguém, no castelo sabia consertá-lo. Seu pai, o
rei, lançou um desafio: quem conseguisse montar um espelho igual ao original poderia casar-
se com sua filha. Então, um jovem viajante aceitou o desafio e foi capaz de reconstruir o
espelho para a princesa. Assim, casaram-se e viveram felizes.”
149
Xadrez
No segundo semestre de 2005, os profissionais do LaPp optaram por inserir o jogo de
xadrez como mais um instrumento de intervenção com o objetivo de trabalhar capacidades de
atenção, concentração, antecipação, coordenação e respeito às regras do jogo e aos colegas.
Como metodologia de ensino deste jogo, utilizou-se as idéias de uma das professoras do
LaPp que é enxadrista profissional. O objetivo dessa metodologia era desconstruir o jogo
para, depois, reconstruí-lo. Inicialmente, fez-se uma introdução histórica sobre o xadrez e
apresentou-se uma versão do jogo em que participam apenas os peões: a chamada Guerra dos
Peões. Nas oficinas seguintes, foi apresentada uma peça por vez, até que, por fim, montou-se
o xadrez e este pôde ser jogado em sua totalidade.
Guerra dos Peões
É lida a história do xadrez para a classe, depois se divide a sala em duplas, pois o jogo é
disputado por duas crianças. Cada criança caracteriza-se como adversária do outro que
compõe a sua dupla. O material é composto de um tabuleiro de xadrez (composto por 64
casas); 16 peões, sendo 8 brancos e 8 pretos. O objetivo desse jogo é atingir com um peão a
última fila do campo inimigo. Ou seja, as peças brancas deverão chegar com um peão na 8ª
fila e as pretas deverão chegar com um peão na 1ª fila (a referência sempre são as peças
brancas).
Sobre o tabuleiro de xadrez os jogadores colocam um peão por casa na segunda fila de
seu campo. Assim o jogador das brancas deverá ter os oito peões posicionados na segunda
fila e o jogador das pretas deverá ter os oito peões posicionados na sétima fila (a referência
150
são sempre as peças brancas). Os jogadores movimentam seus peões e capturam segundo as
regras do xadrez. Cada jogador pode mover um peão por jogada, sendo que os lances são
feitos alternadamente, ou seja, o jogador das brancas movimenta um de seus oito peões e, a
seguir, será a vez do jogador das pretas movimentar um de seus oito peões e assim por diante.
Vence o jogo o primeiro jogador que conseguir chegar com um de seus peões na 8ª fila do
campo do adversário.
A cada oficina, era introduzida uma nova peça (que era agrupada as que já haviam sido
ensinadas), até chegar à versão do jogo de xadrez. As peças foram inseridas nessa ordem:
peões, bispo, torre, dama, rei e cavalo.
Papa – Capim
Este jogo foi desenvolvido pelo Professor Dorly Eduardo Eller. O jogo tem por
objetivo treinar o movimento do cavalo.
Material:
- 25 quadradinhos de folha sulfite verde
- 1 cavalo branco
- 1 cavalo preto
Sobre o tabuleiro de xadrez espalham-se 25 quadradinhos (aproximadamente 1cm x 1
cm) de folha sulfite verde e os dois cavalos. Um jogador fica com o cavalo branco e o outro
com o cavalo preto. As jogadas acontecem alternadamente. Os jogadores deverão capturar os
“capim” (quadradinhos) com seus cavalos de acordo com as regras de movimento desta peça
no jogo de xadrez. Vence o jogador que capturar mais “capim”.
151
Pega – Varetas Gigante
Este jogo foi utilizado com o intuito de desenvolver nas crianças habilidades como
paciência, calma, concentração, tolerância à frustração e respeito aos colegas. Paciência e
calma porque o jogo exige movimentos tranqüilos e lentos para retirar as varetas, uma a uma,
sem mover as demais. Concentração porque é necessário observar a cada captura todas as
varetas antes de escolher a melhor para ser retirada. Tolerância à frustração para dominar os
impulsos de agitação e compreender suas limitações quando não puder retirar uma vareta com
sucesso. Respeito aos colegas, pois é preciso manter-se quieto, em silêncio, enquanto o colega
joga.
Ele é composto de 41 varetas coloridas (amarelas, verdes, azuis e uma preta) de
aproximadamente 1 metro de comprimento. Cada cor possui uma pontuação: amarela, 3
pontos; vermelha, 5 pontos; azul, 10 pontos; verde, 15 pontos; preta, 50 pontos.
Procedimentos
O grupo de crianças senta formando uma roda e decide a ordem de quem vai jogar. O
primeiro jogador lança as varetas sobre o chão da sala e tenta retirar o máximo de varetas
possíveis sem mexer as demais. Caso venha a movê-las, deverá ceder a vez ao jogador
seguinte, que reinicia o jogo. Vence aquele que conseguir o maior número de pontos
atribuídos em função do valor da cor da vareta.
152
Atividades Iniciais
Torto de Sílabas
Este jogo foi utilizado, principalmente, para desenvolver habilidades de atenção,
concentração e organização.
É composto por várias sílabas distribuídas em um quadro, tal que as sílabas podem ser
ligadas com as sílabas vizinhas para formar palavras que devem ser construídas pelo jogador.
A concentração é desenvolvida porque é preciso estar concentrado aos possíveis do
jogo: é possível que as sílabas que compõe uma palavra estejam em qualquer lugar do
tabuleiro.
A atenção consiste em focar o necessário: há várias sílabas soltas, é necessário ler
sílabas soltas (vizinhas) formando uma palavra em particular. Assim, é preciso formar uma
palavra em oposição a outras sílabas soltas que não formam palavras.
Procedimentos
Cada participante joga individualmente buscando encontrar as palavras. Sua busca
consiste em ligar sílabas vizinhas. Ao encontrar uma palavra, suas sílabas devem ser ligadas.
O jogo termina quando todas as possibilidades de formar palavras são encontradas.
Senha de Nomes
Esta atividade foi proposta com o intuito de mudar as crianças de lugar (para o lugar
que a professora preferir). Foi desenvolvida a habilidade de reconhecimento de rimas e
obediência às regras.
153
A senha consiste em uma frase criada que rime com o nome da criança:
VOCÊ JÁ VIU O SERENO? (por
exemplo, rima com Breno)
PALHAÇOS USAM PERUCAS?
QUEM VAI AO COMÍCIO?
O QUE SIGNIFICA “VIDE”?
VOCÊ ACREDITA EM DEUS?
QUEM GOSTA DE ÁGUA TÔNICA?
O QUE VOCÊ ACHA JUSTO?
QUE LIVRO VOCÊ VAI LER?
BEBÊS COMEM EM CUMBUCAS?
VOCÊ CONHECE O MAURO?
O OVO TEM GEMA?
Cada criança deve encontrar o seu lugar e sentar-se nele até o final da oficina
(obediência às regras). Assim, ela deve ser capaz de identificar qual senha rima com o seu
nome.
Procedimentos
Antes das crianças entrarem na sala, a professora distribui as senhas colando-as nas
carteiras, conforme seu interesse. Quando as crianças entram, a professora avisa que elas
devem sentar nos lugares em que a frase rime com seu nome. Então pergunta se as crianças
sabem o que é rima e, de acordo com que as crianças respondem, ela atualiza o conceito e
ensina-o às crianças. Conforme vão procurando seus lugares podem ajudar a identificar o
lugar dos colegas.
154
Auto – Retrato
Esta atividade foi utilizada no LaPp no segundo dia de oficina para que as crianças
conhecessem umas às outras e refletissem sobre si ao representarem no papel o conhecimento
de si mesmas (através da expressão criativa do desenho) e para que as professoras pudessem
conhecer melhor as crianças, verificar a percepção que estas têm de si, assim, também as
próprias crianças poderiam conhecer melhor seus colegas.
A atividade consiste em um desenho que a criança deve fazer que represente o seu
rosto, como se fosse uma fotografia. Atrás do desenho, a criança deve escrever três
características físicas e três não físicas. As físicas referem-se, por exemplo, a cor dos olhos,
do cabelo e as não físicas: sou agitado, calmo, etc. O material utilizado foi: papel A4, lápis
grafite, lápis de cores e borracha.
Procedimentos
A professora distribui folhas (A4), lápis de cor e pede que cada um pense em seu
rosto, desenhe e pinte um auto-retrato (mostra um desenho da turma do ano anterior para que
as crianças não se sentissem perdidas na atividade). Solicita que após o desenho finalizado,
escrevam três características físicas e três não físicas sem permitir que os colegas vejam o que
escreveram.
As crianças não devem mostrar, umas para as outras, o que escreveram sobre si, pois
após a confecção do desenho, todos sentam em roda e a professora lê as características de
cada desenho para as crianças tentarem descobrir quem é.
Então, sentam em roda, no chão. A professora lê o que escreveram, um por um, e as
crianças tentam adivinhar quem fez o desenho que ela está lendo. Caso não consigam
adivinhar, ela mostra o desenho, se mesmo assim, ninguém conseguir descobrir quem o fez, a
155
professora solicita que a criança que desenhou explique um pouco sobre seu desenho e suas
características.
Memorex
Como o próprio nome sugere, os professores do LaPp utilizaram esta atividade com o
objetivo de desenvolver, principalmente, a memória e a atenção das crianças. O material
utilizado é uma imagem impressa em folha de papel tamanho A2. Essa imagem é apresentada
às crianças durante um minuto. Neste tempo, as crianças devem prestar o máximo de atenção
possível em todos os detalhes da imagem, pois logo em seguida a professora faz questões que
se referem à imagem apresentada.
Procedimentos
As professoras distribuem papéis para as crianças e enumeram na lousa de 1 a 15 para
que elas copiem essa numeração no papel. Explica-se que haverá 15 perguntas e as respostas
deverão ser dadas apenas no papel com as palavras “sim” (em caso de resposta afirmativa) ou
“não” (em caso de resposta negativa), ou seja, as crianças não deverão falar as respostas em
voz alta. Depois, a professora mostra novamente a imagem, refaz as questões e cada criança
corrige suas respostas. No final, as crianças conseguem Analisar a importância da atenção
para se ter uma boa memória.
156
Rotina estabelecida nas oficinas
Lista de Presença
Há duas maneiras de se controlar a freqüência das crianças nas oficinas. Uma é
controlada pelas professoras, a outra, é a lista em que as próprias crianças marcam sua
presença.
Este procedimento foi criado por profissionais do LaPp com o objetivo de desenvolver
nas crianças o sentimento de responsabilidade e identidade. É passada uma folha grande
(tamanho A2) que contém o nome de cada criança e os dias das oficinas em um semestre.
Nesta lista, cada criança faz um desenho que represente sua assinatura a cada dia da oficina.
O sentimento de identidade é garantido pelo reconhecimento de que algo se conserva
mesmo sofrendo transformação, aquilo que se permite conhecer e reconhecer no outro
caracterizam e dão sentido ao que se é. A lista permite o desenvolvimento de
responsabilidade, na medida em que a noção espaço – temporal é estimulada, ou seja, as
crianças controlam sua freqüência ao longo do semestre e ficam responsáveis por suas faltas e
presenças.
Também percebemos o estímulo da criatividade, pois se exige um desenho
(assinatura) por dia. O respeito aos colegas é desenvolvido, pois é exigido que a criança
respeite o espaço da presença do seu colega e aguarde a sua vez de assinar.
Autorização água e banheiro
No LaPp a rotina estabelecida de autorização para beber água ou ir ao banheiro
consiste em pedir permissão, a qualquer momento. Entretanto, há regras para essa permissão:
157
pode-se ir apenas uma criança de cada vez e, no momento de explicação de alguma tarefa, é
vedada permissão para beber água.
No início existiram oficinas em que as crianças mostraram-se muito agitadas,
solicitavam, a todo instante, autorização para beber água ou ir ao banheiro; assim, no decorrer
da oficina, havia sempre uma criança para fora. Os profissionais combinaram de, em uma
oficina, oferecer às crianças água e banheiro antes do início das atividades, explicaram-lhes
que este procedimento estava sendo feito para que a oficina não ficasse tão agitada como a
anterior, mas ressaltaram que haveria possibilidades de ir ao banheiro posteriormente se
sentissem real necessidade, porém seria proibida a saída para beber água.
Após este procedimento combinado pelos profissionais, as crianças ficaram muito
mais tranqüilas com a questão de sair da oficina para beber água ou ir ao banheiro, apesar de a
autorização poder ser dada a qualquer momento.
Material na pasta
Cada criança tem sua pasta com uma etiqueta de identificação própria. As crianças
pintam ou fazem um desenho em sua etiqueta (e escrevem seu nome) para identificá-la.
Esta pasta tem a função de guardar as produções das crianças. Quando uma criança
deixa de participar das oficinas, ela tem, como possibilidade, levar sua pasta e suas produções
com ela.
A finalidade de permitir que cada criança tenha sua própria pasta consiste em
desenvolver a organização espacial e o sentimento de responsabilidade.
158
Momento Reflexão
Este é um dos procedimentos utilizados nas oficinas do LaPp com o objetivo de
promover a reflexão de si entre as crianças. Estimula-se a percepção de si, além da
cooperação, concentração, comunicação e o respeito ao outro. Este momento é programado
para ocupar 15 minutos finais da oficina. As professoras também podem comparar o que as
crianças dizem que fazem com o que costumam realmente fazer nas oficinas.
Procedimentos
As crianças sentam-se, no chão, em roda e são feitas perguntas (uma por encontro)
onde cada criança se imagina em uma situação e diz como agiria se estivesse nela. É regra
combinada que se fale uma pessoa por vez.
Jogos e outras atividades utilizados ao longo das observações e não
selecionados nos recortes dos registros de comportamento:
Forca
O jogo da Forca foi utilizado, no primeiro semestre, no LaPp, com o intuito de
desenvolver o trabalho em grupo e o interesse por descobrir a escrita. O espírito de equipe foi
trabalhado na medida em que se jogou em dupla, utilizando a lousa (como recurso) para que
as outras crianças pudessem descobrir a palavra (todas as crianças participavam de cada
jogada). O jogo traz em si o estímulo para se desenvolver a escrita, pois é necessário descobrir
159
as letras que ocupam os espaços vazios, fazendo relações, coordenado idéias no campo da
linguagem.
O objetivo do jogo é adivinhar a palavra antes do boneco ser todo desenhado (foram
estipuladas 7 chances pelos professores).
Procedimentos
As duplas de jogadores escrevem a palavra em um papel e, depois, vão até a lousa
desenhar o número de espaços (tracejados) que representam as letras da palavra.
Os jogadores podem dar uma pista se esse procedimento for combinado com o grupo.
A pista será alguma informação que a dupla criadora da palavra deverá oferecer aos jogadores
para que estes tenham uma orientação a respeito do contexto em que se insere a palavra a ser
adivinhada.
Durante o jogo, as letras que não fizerem parte da palavra escondida, são escritas
próximas à forca, pela professora. Cada letra que não possui representação na palavra
escondida faz com que o jogador desenhe uma parte do corpo do boneco. Quando palavras
são ditas, as professoras buscam relacioná-las com os espaços vazios e devolvem para a
criança se aquela palavra seria possível ou não. Podem ser desenhadas até sete partes do
corpo, ou seja, após os participantes informarem sete letras erradas (e / ou palavras) o jogo
termina.
O jogo será encerrado se a palavra for descoberta, ou, como mencionado acima, se já
tiverem sido desenhadas sete partes do corpo do boneco.
Desenho Coletivo
O desenho coletivo foi utilizado no dia da festa (final do primeiro semestre de
oficinas) com o intuito de simbolizar a integração dos alunos e desenvolver o sentimento de
160
identidade de cada um e do grupo.É realizado no espaço de um papel único (papel pardo),
com canetas hidrográficas. O papel é colocado em cima de um conjunto de mesas e as
crianças podem sentar-se onde consideram melhor para desenhar e, inclusive, são as crianças
que escolhem como e o que desenhar (desenho livre).
O sentimento de identidade das crianças pode ser reconhecido no desenho de cada um
e o sentimento de identidade do grupo é garantido com a união de todos os desenhos, com a
visão do todo. O reconhecimento de que algo se conserva mesmo sofrendo transformação,
aquilo que se permite conhecer e reconhecer no outro caracterizam o sentimento de
identidade, pois dão sentido ao que se é.
O desenho coletivo permite a simbolização da integração dos alunos, pois mostra
como o grupo expressa uma produção (desenho), num momento em que se encontra unido.
Procedimentos
Uma folha de papel pardo é colocada em cima de 8 mesas e são distribuídas canetas
hidrográficas para a realização do desenho. As crianças são instruídas a fazerem um desenho
coletivo livre. Elas podem escolher onde sentar e desenhar como preferir. Não é exigido que
façam um desenho único, assim, espera-se que a produção simbolize como as crianças se
expressam no coletivo.
Entrevista com amigos
Essa atividade foi realizada no primeiro dia de oficina com o objetivo de promover uma
proximidade entre as crianças e verificar o seu nível do desenvolvimento da lecto escrita.
161
Completar Figuras
Essa atividade foi proposta neste semestre para desenvolver a atenção, a concentração
e a criatividade.
A atividade apresenta-se em uma folha de sulfite onde se encontram distribuídos seis
traços, destes, três são iguais, mas em posições diferentes:
É possível que se desenhe qualquer coisa, entretanto, é necessário construir um único
desenho a partir de cada traço. A atenção é desenvolvida na medida em que é preciso focar a
atenção no desenho a ser executado.
O desenvolvimento da criatividade consiste na execução do desenho propriamente
dito.
Procedimentos
É distribuída uma folha de atividade para cada criança e lápis de cor. Segue-se a
instrução de que devem fazer, individualmente, um desenho a partir de cada traço, totalizando
seis desenhos.
162
APÊNDICE C- Termo de acordo para colaboração em pesquisa acadêmica
Eu, Francine Guerra de Luna, RG nº 28630543-4, psicóloga e pós – graduanda em Psicologia
Escolar e Desenvolvimento Humano, pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São
Paulo, doravante chamado pesquisadora, de outro lado, doravante chamado de responsável
pelo colaborador, firmam o presente ajuste de participação em pesquisa acadêmica, fazendo-o
nos seguintes termos:
1. O responsável pelo colaborador concorda expressamente em autorizar o
colaborador_________________________________________________________ a
participar da pesquisa a ser desenvolvida pela pesquisadora em seu curso de mestrado.
2. O responsável pelo colaborador está ciente de que a pesquisa tem por objetivo estudar os
comportamentos das crianças em seu processo de aprendizagem e verificar se, após
intervenções no LaPp (Laboratório de Psicopedagogia), as crianças apresentarão
comportamentos favoráveis à aprendizagem.
3. Pelo presente instrumento o responsável pelo colaborador dá seu pleno consentimento
para que a pesquisadora observe os comportamentos do colaborador nas oficinas do
LaPp e realize com este eventuais entrevistas que poderão ser utilizadas na análise da
pesquisa.
4. O responsável pelo colaborador dá também seu consentimento para que sejam
utilizadas, como material de pesquisa, eventuais entrevistas realizadas com ele mesmo.
5. O colaborador dá seu consentimento para que as entrevistas sejam gravadas, ressalvando
sua utilização para as estritas finalidades da pesquisa.
6. A pesquisadora se compromete a informar à criança colaboradora os objetivos de sua
pesquisa e responder a qualquer pergunta ou esclarecer qualquer dúvida relacionada à
pesquisa.
7. A pesquisadora se compromete, ainda, a esclarecer qualquer dúvida e responder
qualquer dúvida que o responsável pelo colaborador faça relacionada à pesquisa.
8. É direito do colaborador e de seu responsável não ser forçado a responder a quaisquer
perguntas que não deseje ou julgue prejudiciais à sua integridade pessoal e moral.
9. O responsável pelo colaborador pode, de forma unilateral e sem necessidade de
aprovação, retirar a qualquer tempo seu consentimento de uso do material
disponibilizado para a pesquisadora por ele ou pela criança por ele autorizada, assim
como, nas mesmas condições, negar que ele ou a criança colaboradora participem do
presente estudo.
10. A pesquisadora se compromete a cientificar ao responsável e ao colaborador, dos
resultados da pesquisa e do uso dado ao material coletado.
11. O presente pacto é elaborado em duas vias, ficando uma em poder de cada uma das
partes deste acordo de colaboração
São Paulo, 30 de Maio de 2005.
________________________ __________________________
Responsável pelo colaborador Pesquisadora
163
APÊNDICE D
TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA COLABORAÇÃO EM PESQUISA ACADÊMICA
Eu, __________________________________________________, R.G.
nº___________________, responsável por
________________________________________autorizo que o mesmo seja
colaborador, nas oficinas realizadas no LaPp (Laboratório de Psicopedagogia),
da pesquisa que Francine Guerra de Luna, RG nº 28.630.543-4 realizará como
pós – graduanda em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano, pelo
Instituto de Psicologia na Universidade de São Paulo.
São Paulo, 30 de maio de 2005.
_____________________________
Responsável pelo colaborador
164
APÊNDICE E- Termo de autorização para participação em pesquisa acadêmica
Eu,____________________________________________________________________, R.G.
nº___________________, autorizo minha participação na entrevista, para a pesquisa que
Francine Guerra de Luna, RG nº 28.630.543-4 realizará como pós – graduanda em Psicologia
Escolar e Desenvolvimento Humano, pelo Instituto de Psicologia na Universidade de São
Paulo.
São Paulo, 22 de junho de 2006.
_____________________________
Colaborador
165
APÊNDICE F- Termo de acordo para colaboração em pesquisa acadêmica
Eu, Francine Guerra de Luna, RG nº 28630543-4, psicóloga e pós – graduanda em Psicologia
Escolar e Desenvolvimento Humano, pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São
Paulo, doravante chamado pesquisadora, de outro lado, doravante chamado colaborador,
firmam o presente ajuste de participação em pesquisa acadêmica, fazendo-o nos seguintes
termos:
12. O colaborador concorda expressamente em autorizar sua participação na entrevista da
pesquisa a ser desenvolvida pela pesquisadora em seu curso de mestrado.
13. O colaborador está ciente de que a pesquisa tem por objetivo estudar as ações de
disciplina e indisciplina de crianças que freqüentam o LaPp (Laboratório de
Psicopedagogia).
14. Pelo presente instrumento o colaborador dá seu pleno consentimento para que a
pesquisadora relate as falas do colaborador nas entrevistas.
15. O colaborador dá seu consentimento para que as entrevistas sejam gravadas, ressalvando
sua utilização para as estritas finalidades da pesquisa.
16. A pesquisadora se compromete a informar ao colaborador os objetivos de sua pesquisa e
responder a qualquer pergunta ou esclarecer qualquer dúvida relacionada à pesquisa.
17. É direito do colaborador não ser forçado a responder a quaisquer perguntas que não
deseje ou julgue prejudiciais à sua integridade pessoal e moral.
18. colaborador pode, de forma unilateral e sem necessidade de aprovação, retirar a
qualquer tempo seu consentimento de uso do material disponibilizado para a
pesquisadora por ele, assim como, nas mesmas condições, negar que ele participe do
presente estudo.
19. A pesquisadora se compromete a cientificar ao colaborador dos resultados da pesquisa e
do uso dado ao material coletado.
20. O presente pacto é elaborado em duas vias, ficando uma em poder de cada uma das
partes deste acordo de colaboração
São Paulo, 22 de junho de 2006.
________________________ __________________________
Colaborador Pesquisadora
166
REFERÊNCIAS
3
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(Associação Brasileira de Normas Técnicas - 2002) NBR 6023 – Informação e
Documentação: Referência – Elaboração. documento eletrônico e impresso. São Paulo:
SIBi – USP, 2004.
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Citações no texto e notas de rodapé: adaptação do estilo de normalizar de acordo com as
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Orientador: Lino de Macedo.
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