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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Cecilia Neves Lima
A Formação de Professores no Distrito Federal: os cursos da Divisão
de Aperfeiçoamento do Magistério (DAM/CBPE/INEP) nos anos de
1955 a 1964
Rio de Janeiro,
Fevereiro de 2008
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Cecilia Neves Lima
A Formação de Professores no Distrito Federal: os cursos da Divisão
de Aperfeiçoamento do Magistério (DAM/CBPE/INEP) nos anos de
1955 a 1964
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Educação da
Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro como requisito parcial para a
obtenção do título de Mestre em Educação.
Orientador (a): Prof (a) Dr (a) Angela Maria
de Souza Martins
Rio de Janeiro,
Fevereiro de 2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - UNIRIO
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS - CCH
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Cecilia Neves Lima
A Formação de Professores no Distrito Federal: os cursos da Divisão de
Aperfeiçoamento do Magistério (DAM/CBPE/INEP) nos anos de 1955 a
1964
Aprovado pela Banca Examinadora
Rio de Janeiro, ______/______/______
_____________________________________________________
Professor(a) Doutor(a) Angela Maria Souza Martins
Orientador – UNIRIO
_____________________________________________________
Professor(a) Doutor(a) Ana Waleska Pollo Campos Mendonça – PUC-Rio
______________________________________________________
Professor(a) Doutor(a) Nailda Marinho da Costa Bonato – UNIRIO
Agradecimento
Primeiramente agradeço à CAPES pelo apoio acadêmico e financeiro concedido, o que
possibilitou a confecção dessa dissertação.
Agradeço também ao apoio acadêmico da UNIRIO, em especial a minha orientadora
Angela Maria Souza Martins pelo excelente trabalho de orientação, e aos membros da
banca examinadora que contribuíram para que esse trabalho tivesse a reflexão e o
aprofundamento dignos de uma dissertação de mestrado .
Um agradecimento especial à professora Maria do Carmo Marques Pinheiro pela entrevista
concedida que trouxe elementos inéditos ao trabalho, enriquecendo a análise do objeto de
estudo.
Agradeço a todos que de alguma maneira contribuíram para que este trabalho se realizasse,
em especial a meus pais Elvira e Dídimo e a meu companheiro Thiago, sem eles eu não
teria o incentivo e a perseverança para a conquista de meus sonhos.
A todos meu muito obrigada!
“A tarefa do historiador parece-me a mais difícil; ele precisa de
uma atenção constantemente voltada para mil objetos ao mesmo
tempo, devendo através das citações, das enumerações precisas,
dos fatos que ocupam uma posição apenas relativa conservar este
calor capaz de animar a narrativa”. Penso como ele: os fatos são
relativos; essencial, em compensação, é a “animação” e portanto
este “calor” que o historiador na realidade não conserva (pois
desapareceu completamente dos vestígios que ele examina), mas
desperta com seu hálito e deve constantemente reavivar. É esta sua
tarefa. (...) Pois o fato é que os historiadores não são detectores
inertes, lêem com olhos sempre novos os mesmos documentos,
baseando-se em questionários constantemente adaptados. A
maioria dos achados provém desse fermento de fantasia que leva o
historiador a afastar-se dos caminho muito batidos. (DUBY,1993,
p.57-58).
RESUMO
O presente trabalho analisa os cursos de formação continuada para o aperfeiçoamento do
magistério oferecidos pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) /Centro
Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), através das ações da Divisão do
Aperfeiçoamento do Magistério (DAM), no período de 1955 a 1964. Os cursos tinham
abrangência nacional, versavam sobre os principais temas educacionais e contavam com a
presença de docentes e profissionais da educação em geral de todo o país que se
deslocavam até o Distrito Federal para a realização dos cursos, que ocorriam na própria
sede do INEP, do CBPE, na escola experimental do INEP (escola Guatemala) e em outras
instituições adequadas a temática do curso, por meio de convênio. Através de um sistema
de bolsas, os professores denominados alunos-bolsistas tinham a oportunidade de entrar em
contato com as inovações pedagógicas e com os resultados de pesquisas desenvolvidas pelo
INEP/CBPE, além da troca de experiências com professores de outras regiões do país.
Buscamos analisar as fontes tendo em vista o aporte teórico metodológico da História
Cultural, de acordo com Le Goff, as fontes possuem no momento de sua construção um
caráter “monumental” no sentido de se deixarem impregnar neste momento pelas idéias,
intenções e sentidos dos atores/autores oficiais. As fontes documentais utilizadas referem-
se aos arquivos pessoais de Anísio Teixeira (CPDOC/FGV) e Lúcia Marques Pinheiro
(ABE). Dentre os documentos analisados destacam-se relatórios e súmulas de atividades do
INEP/CBPE, que nos apresentam uma visão global da abrangência e atuação desses cursos
na formação de professores, bem como de toda a política de valorização do magistério que
essas instituições tinham como seus carros-chefes de atuação e materiais relativos aos
cursos propriamente ditos como programas, ementas, avaliações, etc, que nos apontam
diretrizes e linhas norteadoras da ação pedagógica dos cursos, bem como sua coerência
epistemológica com as ações em nível geral do INEP/CBPE. Os resultados apontam para a
centralidade das ações da DAM no âmbito do projeto de renovação educacional implantado
pelas políticas do INEP/CBPE para a melhoria das condições de formação do professorado
brasileiro à época. Os cursos configuraram-se como importante estratégia de disseminação
do ideário pragmatista no cenário educacional brasileiro, tornando-se pólo irradiador do
projeto de formação continuada de em escala nacional do INEP/CBPE nos anos de 1955 a
1964. Dessa forma, pode-se dizer que os cursos oferecidos foram uma iniciativa de grande
valor à época, constituindo-se num grande pólo de formação docente no país.
PALAVRAS-CHAVE: formação de professores, história da educação, INEP/CBPE/DAM,
política educacional, educação e pragmatismo.
ABSTRAT
The present work analyzes the courses of continuous formation for the improvement of the
teaching offered by the Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) / Centro
Brasileiro de Pesquisas Educacionais(CBPE), through the actions of the Divisão de
Aperfeiçoamento do Magistério (DAM), in the period from 1955 to 1964. The courses had
national inclusion, they turned on the main education themes and counted on the presence
of teachers and professionals of the education in general of the whole country that they
moved to Federal District for the accomplishment of the courses, that happened in the
INEP, the CBPE, in the experimental school of INEP (school Guatemala) and in other
appropriate institutions the theme of the course, through covenant. Through a system of
scholarships, the teachers denominated student-scholarships had the opportunity to enter in
contact with the pedagogic innovations and with the results of researches developed by
INEP/CBPE, besides the change of experiences with teachers of other areas of the country.
Searched for to analyze the sources tends in view the methodological theoretical
contribution of the Cultural History, in agreement with Le Goff, the sources possess in the
moment of construction a "monumental" character in the sense of if let to impregnate at this
time for the ideas, intentions and senses of the official actors. The used documental sources
refer a personal files to Anísio Teixeira (CPDOC/FGV) and Lúcia Marques Pinheiro
(ABE). Among the analyzed documents stand out reports and abstracts of activities of
INEP/CBPE, that present a global vision of the inclusion and actuation of those courses in
the teachers' formation, as well as of the whole politics of valorization of the teaching that
those institutions had as their “carros-chefes” of performance and relative materials to the
courses properly said as programs, menus, evaluations, etc, that note theirs guidelines and
lines of directions of the pedagogic action of the courses, as well as theirs epistemological
coherence with the actions in general of INEP/CBPE. The results appear for the centrality
of the actions of DAM in the extent of the project of education renewal implanted by the
politics of INEP/CBPE for the improvement of the formation conditions of the Brazilian
faculty to the time. The courses were configured as important strategy of spread of the
pragmatism ideas in the Brazilian education scene, becoming irradiator point of the project
of continuous formation of in national scale of INEP/CBPE in the years from 1955 to 1964.
In that way, it can be said that the offered courses were an initiative of great value to the
time, being constituted in a great point of educational formation in the country.
KEY WORDS: teachers' formation, history of the education, INEP/CBPE/DAM,
educational politics, education and pragmatism.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 10
CAPÍTULO 1
Desenvolvimentismo e Educação no Contexto dos “Anos Dourados”
1.Os antecedentes da década de 1950 26
2.A década de 1950: o governo JK (1956-1960)
A ideologia desenvolvimentista 34
A política de governo 37
A política econômica: o Plano de Metas 40
O setor educacional 42
O custo do desenvolvimento 45
3.O governo de Jânio Quadros e João Goulart (1961-1964) 45
CAPÍTULO 2
Pragmatismo e Experimentalismo Pedagógico no Brasil nos anos de 1955 a 1964
1. A Filosofia Pragmática e o Experimentalismo Pedagógico de John Dewey
Principais Conceitos 49
O Papel da Escola 55
2. A Apropriação do Ideário Pragmático no Brasil nos anos de 1955 a 1964 58
CAPÍTULO 3
O Projeto do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e o Contexto do INEP
1. A Origem do INEP 63
2. O contexto do INEP na gestão de Anísio Teixeira 67
3. A criação do CBPE e CRPE’s 71
CAPÍTULO 4
A DAM e sua Estrutura: objetivos e ações
1. A Atuação 80
2. Principais Ações
A Política de Publicações 82
A Escola Experimental do INEP 85
Os Cursos de Aperfeiçoamento do Magistério 93
CAPÍTULO 5
A Anatomia dos Cursos de Aperfeiçoamento do Magistério: percorrendo seu interior
1. Principais Diretrizes e Linhas de Ação
Principais Diretrizes 102
Linhas de Ação 109
2. Pontos de Contato entre o Ideário Pragmático e a Ideologia Desenvolvimentista 117
CONSIDERAÇÕES FINAIS
121
REFERÊNCIAS 125
ANEXOS
Anexo 1 132
Anexo 2 141
Anexo 3 144
INTRODUÇÃO
A escolha do tema e do objeto de estudo da presente dissertação de mestrado tem
origem no início de minha trajetória acadêmica, ainda como estudante do curso de
pedagogia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Durante a graduação, participei como bolsista de iniciação científica da pesquisa
intitulada “Espaço Anísio Teixeira: referência para a pesquisa educacional no Brasil”,
relativa à localização e contextualização de obras pertencentes à coleção publicada pelo
INEP / CBPE nos anos de 1955 a 1965. Essa experiência foi muito interessante e produtiva,
pois me aproximou do trabalho de pesquisa com fontes históricas.
A pesquisa de iniciação científica mencionada era um dos desdobramentos de uma
pesquisa maior financiada pelo CNPq, do grupo interinstitucional de pesquisa PUC-Rio /
UFRJ intitulada “História das Idéias e Instituições Escolares”, cujo título do estudo era: “O
INEP no contexto das políticas públicas do MEC nos anos de 1950/1960”. Nesse trabalho
de pesquisa do qual fui colaboradora, pude entrar em contato com as discussões em torno
da temática do experimentalismo pedagógico e da apropriação do pragmatismo no Brasil
nos anos de 1950/1960. Dessa forma, houve uma reflexão sobre questões relativas à
formação de professores e planejamento e ação de um projeto educacional, que culminaram
na escolha do tema da dissertação.
A temática das estratégias de intervenção no sistema educacional nas décadas de 50
e 60, especificamente entre os anos de 1955 e 1964, foi eleita por mim como objeto de
estudo no sentido de perceber de que modo uma estratégia de ação pedagógica de formação
continuada de professores ocorreu nesse período e quais suas principais diretrizes político-
filosóficas e linhas de ação. Assim, foi eleito como objeto de estudo os cursos de
aperfeiçoamento do magistério ocorridos nos anos de 1955 a 1964 sob a chancela do
INEP/CBPE.
Para que possamos discorrer sobre os objetivos do estudo, a metodologia
empregada e os referenciais teóricos utilizados, vamos apresentar uma breve caracterização
do contexto histórico em que essas ações ocorreram.
A década de 1950 é um período de grande efervescência nacional, seja no âmbito
político-econômico e no âmbito educacional. No tocante ao aspecto econômico, tratava-se
do momento em que os países de economia periférica como o Brasil, se ajustavam à nova
lógica mundial do pós-guerra e a sociedade brasileira se mobilizava diante do desafio de
um efetivo desenvolvimento. De acordo com Cardoso:
(...) foi
uma época grandemente tumultuada, marcada ainda pela grave crise que
a antecedeu e que culminou com o suicídio de Getúlio. Os ânimos políticos,
embora abalados com o desfecho tão trágico, não se arrefeceram diante da
ascensão de um político do PSD-PTB à Presidência da República. As forças
políticas que combatiam Vargas não puderam encontrar sucesso com a sua
ausência, já que no candidato dos grupos getulistas é que conseguiu vitória nas
eleições. (CARDOSO, 1978, p. 157)
No âmbito das políticas, a educação expressava aproximações e distanciamentos em
relação ao contexto desenvolvimentista, pois esta ideologia pontuou o debate sobre a
reestruturação econômica, política e social do país. Atuando nesse projeto, podemos citar
no âmbito do Ministério da Educação e Cultura (MEC) o Instituto Superior de Estudos
Brasileiros (ISEB) e o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP). O ISEB
funcionou como um núcleo de excelência composto pela elite intelectual do país. Já o INEP
constituiu-se como órgão voltado à pesquisa educacional e formulação de políticas para o
ensino. Tanto o primeiro como o segundo podem ser tomados como órgãos institucionais
que exemplificam a aproximação do pensamento gestado no interior do MEC à época ao
ideário desenvolvimentista.
Como observamos em estudo anterior (MENDONÇA et ali, 2006) o debate em
torno da modernização do país, a superação da situação de dependência econômica e a
busca de emancipação social orientou um conjunto de ações no âmbito do debate
intelectual e da formulação de projetos de reorientação das políticas de Estado, que visavam
a articulação entre industrialização, desenvolvimento científico e renovação educacional.
O período constitui-se no momento de retomada e ascensão de Anísio Teixeira
frente à política educacional do país, atuando decisivamente no sentido de pôr em prática
seu projeto educacional.
É a partir de sua posse como presidente do INEP, em 1952, que o projeto de
formação de uma rede de conhecimentos com vistas ao aprofundamento da compreensão
dos problemas da educação brasileira e de intervenção na realidade educacional começa a
dar os primeiros frutos. Porém o terreno educacional ainda carecia de um aparato científico
que servisse de base para seu amplo desenvolvimento.
O contexto brasileiro, marcado pela crença no desenvolvimento da área educacional
em bases científicas, foi o solo fértil para a criação, em 1955, do Centro Brasileiro de
Pesquisas Educacionais (CBPE), juntamente com seus Centros Regionais (CRPEs), como
forma de se estruturar no Brasil uma rede de conhecimentos que pudessem dar conta das
necessidades do momento. O projeto tem como principal objetivo:
A - A pesquisa das condições culturais do Brasil em suas diversas regiões, das
tendências de desenvolvimento e de regressão e das origens dessas condições e
forças – visando a uma interpretação regional do país tão exata quanto possível;
A. 1 A formulação de uma política institucional, especialmente de referência à
educação, capaz de orientar aquelas condições e tendências no sentido do
desenvolvimento desejável de cada região do país:
B A pesquisa das condições escolares do Brasil, em suas diversas regiões, por
meio do levantamento dos seus recursos em administração, aparelhamento,
professores, métodos e conteúdo de ensino, visando apurar até quanto a escola
está satisfazendo as suas funções em uma sociedade em mudança para o tipo
urbano e industrial de civilização democrática e até quanto está dificultando essa
mudança, com a manutenção dos objetivos apenas alargados da sociedade em
desaparecimento
C À luz da política institucional formulada pela pesquisa antropo-social e das
verificações da pesquisa educacional:
1) elaborar planos, recomendações e sugestões para a reconstrução educacional
de cada região do país, no nível primário, rural e urbano, secundário e normal,
superior e de educação de adultos;
2) elaborar, baseado nos fatos apurados e inspirada na política adotada, livros de
texto de administração escolar, de construção de currículo, de psicologia
educacional
,
de filosofia da educação, de medidas escolares, de preparo de
mestres, etc.
D Conjuntamente com esse trabalho de pesquisa, interpretação e planejamento
e elaboração de material pedagógico e por meio dele o Centro treinará
administradores e especialistas em educação para abastecer os Estados e os
Centros Regionais de Estudos Pedagógicos, que estão sendo criados nos estados,
ligados ao master center do Rio de Janeiro e, se possível, os próprios
departamentos de educação das escolas de filosofia das universidades
brasileiras
1
.
Para Anísio Teixeira, a construção dos Centros objetivava promover uma série de
medidas no âmbito da pesquisa e planejamento que servissem de subsídio para a
reestruturação do campo educacional de modo que este dispusesse de um estatuto científico
e assim se inserisse no campo intelectual e de progresso da ciência.
Somente a partir do amplo desenvolvimento das ciências sociais no país é que a
educação se configuraria em objeto de investigação científica e esta é que embasaria as
políticas públicas para o planejamento educacional, a formação de professores e medidas de
melhoria do ensino, atuando diretamente na reconstrução do sistema educacional do Brasil
(TEIXEIRA, 1999).
O CBPE contava com ampla atuação no âmbito da política e planejamento, através
do desenvolvimento de pesquisas científicas em ciências sociais e em educação; no
treinamento e aperfeiçoamento do magistério, proporcionando aos professores o acesso a
novas metodologias de ensino; e no âmbito da escola propriamente dita a implementação de
escolas experimentais e de demonstração que funcionariam como espaço formal de
experimentação pedagógica. Sua estrutura organizacional, através de divisões autônomas,
permitia que o órgão tivesse mobilidade e dinamismo para a realização das ações.
Segundo Anísio Teixeira, cada uma das divisões com seu trabalho autônomo em
prol da construção de um estatuto científico à educação, compunha um projeto maior de
reestruturação do sistema educacional brasileiro, sendo o CBPE uma estratégia de
renovação do ensino no sentido de formar uma rede de conhecimentos que pudessem
superar os entraves postos pelo modelo administrativo burocrático vigente à época.
No projeto, a pesquisa em ciências sociais seria utilizada como instrumento de
intervenção na realidade educacional do país sendo subordinada ao campo educacional de
modo a dar o caráter científico aos estudos da realidade educacional, formando sua
identidade epistemológica. Assim, desse modo, garantiria ao mesmo tempo, a distinção dos
campos do saber e a união dos mesmos quanto à aplicação de conhecimentos.
Desse modo, o CBPE corresponderia à tentativa empreendida por Anísio Teixeira
de se formar no Brasil o espírito científico no âmbito do magistério, ou seja, ele pretendia a
1
TEIXEIRA, A. Carta à Cândido Mota Filho. Ver referências.
formação de um estatuto científico à educação, aliando a política e o planejamento e a
formação de professores para a mudança interna da escola, respeitando as diferenças
culturais de cada região e, dessa forma, garantindo o desenvolvimento do país através da
intervenção na realidade educacional.
Os Centros objetivavam promover medidas sistematizadas no âmbito da pesquisa e
planejamento que servissem de subsídio para a reestruturação do campo educacional de
modo que este dispusesse de um estatuto científico e assim se inserisse no campo
intelectual e de progresso da ciência.
Em nosso trabalho, pretendemos nos deter as ações desenvolvidas pela Divisão de
Aperfeiçoamento do Magistério (DAM) do CBPE / INEP, por ser esta a divisão
responsável pelo desenvolvimento de projetos ligados a formação de professores e
especialistas em educação (orientadores, administradores escolares), e professores de
escolas normais. Nosso principal objetivo é investigar como se dava a atuação dos cursos
de aperfeiçoamento do magistério desenvolvidos pelo INEP/CBPE no contexto das décadas
de 1950/1960, tanto nos seus aspectos mais internos como suas linhas de ação e diretrizes,
quanto em seus aspectos mais externos de sua inter-relação com o contexto mais amplo.
Com o objetivo de conhecer um período importante de nossa história educacional,
relacionado ao pensamento de Anísio Teixeira e seu projeto educacional no tocante ao
CBPE e às relações deste com o INEP, cabe questionar:
Até que ponto as ações da Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério (DAM)
estavam intervindo de modo eficaz na renovação do ensino brasileiro e na formação de
professores nas décadas de 1950-1960?
Esta questão de estudo nos fará refletir acerca dos objetivos e das funções da DAM,
pois esta tinha papel central no projeto do CBPE, à medida que as ações ali desenvolvidas
constituíam-se como o primeiro passo para a formação do chamado espírito científico nos
professores. Esperava-se que através de suas ações, entre elas os cursos de
aperfeiçoamento, os professores entrassem em contato com as pesquisas e as inovações
pedagógicas propostas pelo Centro e tornando-se multiplicadores dos novos métodos de
ensino, que a maioria dos cursos contava com a presença de alunos de outros estados e
regiões do país.
A relevância do presente estudo se deve ao fato deste período de nossa história
(anos 50 e 60) ter sofrido constante processo de apagamento da memória ao longo do
tempo por questões políticas, de modo a ocorrer certo esquecimento das ações
desenvolvidas. Além disso, poucos trabalhos na área da história da educação se detiveram
especificamente ao estudo de uma divisão de trabalho do CBPE (DAM), assim como do
experimentalismo pedagógico que esta pretendia implantar com ações no âmbito do
aperfeiçoamento do magistério, sobretudo primário.
Nosso estudo visa retraçar o percurso dos cursos de aperfeiçoamento do magistério
da Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério (DAM/CBPE/INEP), bem como seus
impactos para a formação docente, através do estudo de sua inter-relação com o Centro e
com a política mais ampla implementada pelo INEP à época.
Para tanto, o estudo pretende compreender como se davam as ações e relações
desses órgãos institucionais no tocante à formação docente continuada.
Assim, podemos compor um quadro da política de formação de professores à época,
demonstrando de que maneira a política de valorização do magistério se fazia presente no
pensamento educacional e nas políticas governamentais. Vale lembrar que esse período foi
o grande momento de expansão do ideário desenvolvimentista na área da política
econômica brasileira, seguindo uma tendência mundial de abertura dos mercados
econômicos dos países periféricos ao capital estrangeiro. Além disso, é o momento de
retomada e ascensão de importantes figuras do cenário educacional brasileiro, entre elas
Anísio Teixeira, que buscam implantar sua marca administrativa e pedagógica na
renovação educacional. Dessa forma, o país encontrava-se abarcado por duas correntes de
pensamento que tinham seus lugares reservados no espaço público e procuravam seus
pontos de conexão.
A partir dessa breve reflexão, inferimos sobre algumas questões de estudo que nos
ajudarão a uma visão ampliada do momento histórico a ser estudado para respondermos a
seguinte pergunta: Como os cursos de aperfeiçoamento do magistério, enquanto política
pública do INEP/CBPE,constituíram como estratégias de renovação do sistema educacional
brasileiro?
Com a finalidade de responder tal questionamento, elencamos alguns objetivos
específicos de modo a acurarmos nosso olhar ao objeto de estudo:
1. Apresentar de forma breve o contexto dos anos de 1950-1960 com ênfase na
ideologia desenvolvimentista que pautavam as ações do país principalmente no
âmbito político, ideológico e econômico;
2. Apresentar como o pragmatismo, em sua vertente norte-americana, foi apropriado
como filosofia norteadora de projetos e políticas educacionais no período;
3. Compreender como se deu o contexto de criação do CBPE, ressaltando seus
aspectos organizacionais e seus fins específicos enquanto órgão institucional
brasileiro de pesquisa e formação docente;
4. Analisar os cursos de aperfeiçoamento do magistério no período de 1955 a 1964,
explicitando suas principais diretrizes e linhas de ação;
5. Relacionar as ações da Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério (DAM) às
políticas mais amplas do INEP, percebendo como as ações de intervenção para a
melhoria do magistério eram efetuadas;
Em relação ao referencial teórico da pesquisa, pretendemos partir de alguns
pressupostos como forma de embasar teoricamente nossas reflexões e inferências acerca da
temática escolhida. São elas:
Desenvolvimentismo
Ideologia que pautou as ações sócio-política-econômica do Brasil nas décadas de 50
e 60. Para se compreender o desenvolvimentismo, tomaremos como base principal Cardoso
(1978) que dedica sua obra “Ideologia do Desenvolvimento – Brasil: JK-JQ” a discussão da
temática do desenvolvimento.
Basicamente, podemos afirmar que a política econômica implantada no país à época
era o “carro-chefe” desse ideário, sendo uma face visível da ideologia do desenvolvimento.
Assim, com uma política econômica voltada para o crescimento o país alcançaria sua
autonomia. Dessa forma, as ações governamentais do período tinham como princípio a
ideologia do desenvolvimento que, através do combate ao subdesenvolvimento da nação,
traria de forma harmônica e para todas as classes sociais os benefícios do desenvolvimento.
Para tal intento era necessário que o projeto fosse abraçado por todo o país e,
através da hegemonia das classes dominantes, foi eleito Juscelino Kubitschek, representante
máximo da ideologia e principal implementador das políticas de desenvolvimento pelo qual
o país passou.
O processo de desenvolvimento se inicia quando o país, através de seus
representantes, constata a situação de subdesenvolvimento e implementa ações em todas as
áreas para a erradicação de tal estado. Os principais temas nacionais que a ideologia (e
também o governo JK) busca para a supressão desse estado de desenvolvimento são
principalmente: segurança, soberania, desenvolvimento econômico, erradicação da miséria,
elevação do nível cultural, democracia, prosperidade e ordem.
Miriam Limoeiro Cardoso nos esclarece:
Desenvolvimento econômico e controle ideológico são os dois campos
privilegiados da ação governamental desenvolvimentista, conforme propõe a sua
ideologia; o primeiro muito mais absorvente do que o segundo, consumindo
mais atenção, mais tempo e mais recursos, embora visa permitir aquele controle
de modo mais eficaz, porque indireto e agindo em profundidade. (CARDOSO,
1978, p. 154).
É importante ressaltar que na ideologia desenvolvimentista a categoria Democracia
é fundamental para a superação do subdesenvolvimento. Nessa ideologia, a democracia é o
pilar político que sustenta as ações nas demais áreas. Assim: a causa da Democracia =
defesa do mundo democrático = segurança continental = guerra ao comunismo = combate
à miséria = luta pelo desenvolvimento” (CARDOSO, 1978, p. 151).
No campo social o desenvolvimentismo marcou graduais transformações na
América Latina, com a mobilização de técnicos, burocratas, políticos, economistas e
cientistas sociais em prol da crença no desenvolvimento (MENDONÇA et ali, 2006, p. 97).
Pragmatismo
Em sua vertente deweyana e da Escola de Chicago, o pragmatismo é entendido
como método científico que tem por base filosófica a experimentação, ou seja, corrente
filosófica que expressa uma visão de mundo baseada na experiência (na prática, na
realidade).
Para definir, em linhas gerais, o significado do termo pragmatismo, tomamos como
base os próprios estudos de Dewey (1973, 1976, 1979) e contribuições de Cambi (1999) e
Sucupira (1960).
Cambi (1999) caracteriza essa vertente pragmática como uma pedagogia (calcada
nas idéias de John Dewey) a partir de sua forma de construção do conhecimento. Segundo o
autor, Dewey construiu uma rigorosa filosofia da educação, contribuindo para a elaboração
de um eficaz projeto operativo radicalmente inovador no campo escolar e didático.
Assim, a filosofia de Dewey articula-se em torno de uma teoria da experimentação
que parte do pressuposto de que a construção do conhecimento ocorre do intercâmbio
entre sujeito e natureza, de modo que as relações de crise, desequilíbrio e reconstrução ao
qual o pensamento passa é que promovem a reconstrução de um novo equilíbrio, mais novo
e orgânico, e que por sua vez é submetido a novas crises e novas buscas, ou seja:
Assim, é ao homem e a sua inteligência criativa’ que é confiado o
desenvolvimento e o controle da experiência, mediante o uso da lógica, definida
como ‘teoria da pesquisa’ e caracterizada pelo método científico e pelos
princípios da experimentação, da generalização e da hipótese, da verificação;
(…) (CAMBI, 1999, p. 256).
Dewey (1976) nos esclarece o que significa o conceito de experiência e seu
princípio de continuidade:
(...) toda experiência modifica quem a faz e por ela passa e a modificação afeta,
quer queiramos ou não, a qualidade das experiências subseqüentes, pois é outra,
de algum modo, a pessoa que vai passar por essas novas experiências. (...) A
concepção ampla envolve a formação de atitudes tanto emocionais, quanto
intelectuais; envolve toda essa sensibilidade e modos de receber e responder a
todas as condições que defrontamos na vida (p. 26).
Os pilares de sustentação da filosofia educacional de Dewey são os conceitos de
experiência, democracia e progresso. Sobre eles falaremos mais detidamente no capítulo 2
deste estudo. Por ora, é importante ressaltar que a teoria da pesquisa proposta por Dewey
significa a organização racional e progressiva da experiência através do método científico,
caracterizando-se como pesquisa e que tem como ideal a ser alcançado a democracia
enquanto modo de vida associado. Progresso nesse contexto tem significado faseológico e
de evolução no sentido de que as ações e as relações sociais construídas que visam a
democracia estão sempre em consonância com a marcha do progresso que “anda para
frente”.
Para que o próprio método se caracterize como sendo a pesquisa, Dewey estabelece
os seguintes critérios: a) interação entre sujeito e natureza, ao qual fornecerão dados
materiais a serem utilizados no processo de investigação; b) continuidade numa perspectiva
de progresso e desenvolvimento, como forma de sistematização para que o processo de
aprendizagem tenha relação com toda a experiência pessoal do indivíduo.
Entende-se então que o espaço privilegiado para a disseminação desses valores e
ideais democráticos é a escola, que através de outra organização pedagógica permite que
valores culturais, morais, democráticos e pedagógicos sejam compreendidos pelos
indivíduos por meio da orientação das experiências obtidas.
Esse pressuposto teórico se faz presente em nosso estudo para compreendermos
como essas idéias estavam presente nas ações de experimentação e renovação pedagógica
implantadas pelo INEP/CBPE, em relação à política de valorização do magistério no
período de 1950 – 1960.
Além disso, de acordo com o objeto de estudo e os primeiros apontamentos
pertinentes ao tema, algumas categorias de análise emergiram como forma de melhor
compreendermos o objeto de estudo, em suas múltiplas dimensões e como forma de
focarmos o olhar na análise dos discursos construídos acerca do ideário do contexto
brasileiro e do ideário pragmático que circulava o interior do INEP/CBPE. São elas:
REDE conceito de Norbert Elias que nos permite compreender como as relações
entre os indivíduos de processam, estejam eles na posição social que for, de modo que essas
relações constituem-se em uma cadeia de atos interdependentes e interligados. Assim:
As funções interdependentes de indivíduos para outros indivíduos formam
longas cadeias de atos de modo que cada um cumpra sua finalidade. Dessa
forma, cada indivíduo está preso a essa cadeia de atos (rede), é um elo da cadeia
que se liga a outra pessoa, que por sua vez se liga as demais e assim por diante.
Mas, “cada pessoa parte de uma posição única em sua rede de relações e
atravessa uma história singular até chegar a morte” (ELIAS, 1994, p. 27).
Apesar da individualidade do sujeito, cada um traz consigo as marcas da vida social,
seja na profissão, na moradia, nos trajes, na linguagem, na renda, etc, que o faz estar ligado
a outras pessoas. É o que Elias chama de ordem invisível da vida, ou seja, mesmo não
percebida diretamente a vida social oferece ao indivíduo uma gama mais ou menos restrita
de funções e modos de comportamentos possíveis que interligam as pessoas no tecido
social.
Para o autor o arcabouço básico de funções interdependentes (que dão a sociedade
sua estrutura específica) não é uma criação de indivíduos particulares, mas representa uma
função que só é formada e mantida em relação a outras funções, entendidas em termos de
estruturas e tensões específicas do contexto total. Em outras palavras, as estruturas sociais
que determinam nossa conduta social é formada e mantida exatamente pelas relações que
esses indivíduos que a compõem mantêm entre si.
O autor nos apresenta a metáfora da rede de tecidos como forma de ilustrar o
conceito, mas como este mesmo diz é apenas uma tentativa de dar forma ao conceito não
expressando a dimensão total que o conceito apresenta. Então nessa rede:
(…) os fios isolados ligam-se uns aos outros. No entanto, nem a totalidade da
rede nem a forma assumida por cada um de seus fios podem se compreendidas
em termos de um único fio, ou mesmo de todos eles, isoladamente considerados;
a rede só é compreensível em termos da maneira como eles se ligam, de sua
relação recíproca. Essa ligação origina um sistema de tensões para o qual cada
fio isolado concorre, cada um de maneira um pouco diferente, conforme seu
lugar e função na totalidade da rede. A forma do fio individual se modifica
quando se alteram a tensão e a estrutura da rede inteira. No entanto essa rede
nada é além de uma ligação de fios individuais; e, no interior do todo, cada fio
continua a constituir uma unidade em si; tem uma posição e uma forma
singulares dentro dele. (ELIAS, 1994, p. 35)
Assim, Elias nos apresenta uma visão diferenciada sobre a relação entre indivíduo e
sociedade e propõe o conceito de REDE, como modelo explicativo da realidade. Rede
então, seria um conjunto de funções que as pessoas desempenham umas em relação às
outras, em relação ao que chamamos de sociedade. As estruturas dessa rede, ou seja, as
estruturas sociais ou as leis sociais ou as regularidades sociais como queiram chamar são as
leis autônomas das relações entre as pessoas individualmente consideradas.
ESTRATÉGIA conceito de Michel de Certeau que nos auxilia no entendimento
das ações que visam ocupar lugares sociais próprios e seus respectivos códigos de conduta
social. Dessa forma, uma estratégia configura-se como as relações de força que se torna
possível a partir do momento em que se pode gerir essas relações de força com
exterioridade. Assim, estratégia é:
(...) o cálculo das relações de forças que se torna possível a partir do momento
em que um sujeito de querer e poder é isolável de um “ambiente” e postula um
lugar capaz de (...) servir de base a uma gestão de suas relações com uma
exterioridade distinta (CERTEAU, 1994, p. 46).
De acordo com Certeau a estratégia procura distinguir seu lugar de poder e de
querer próprios. Para isso, alguns aspectos devem ser considerados: a) para se obter
independência em relação a variabilidade das circunstâncias, é preciso “a vitória do lugar
sobre o tempo”, ou seja, a categoria nos permite compreender como fazer a leitura de um
espaço social; b) as estratégias se instauram em um determinado contexto social a partir da
constituição de campos próprios de modo que o poder é a preliminar do saber, e não apenas
o seu efeito.
Assim, podemos distinguir o conceito de estratégia do conceito de tática (também
do mesmo autor) pela idéia de que a estratégia é organizada pelo postulado de um poder,
enquanto que a idéia de tática relaciona-se com a idéia de ausência de poder. As estratégias
então apontam para a resistência que o “estabelecimento de um lugar” oferece ao gasto do
tempo, enquanto as táticas apontam para uma “hábil utilização do tempo” (p. 102).
As estratégias são portanto ações que, graças ao postulado de um lugar de poder
(a propriedade de um próprio), elaboram lugares teóricos (sistemas e discursos
totalizantes), capazes de articular um conjunto de lugares sicos onde as forças
se distribuem (CERTEAU, 1994, p. 102).
Uma estratégia, portanto, considera as relações de força existentes e implica sempre
o exercício de poder.
Essas categorias mostraram-se imprescindíveis para entender o tipo de atuação
característico das instituições que Anísio Teixeira esteve a frente, ao longo dos anos em
estudo e compreender como se davam as ações estratégicas de uma instituição para a
constituição de uma rede de conhecimentos.
Cumpre ainda destacar que os referenciais citados, juntamente com as categorias
analíticas escolhidas, nos permitirão inferir acerca de como as ações do INEP/CBPE para a
melhoria e aperfeiçoamento do magistério se fizeram presentes e eficazes no âmbito do
contexto geral mais amplo. Assim, poderemos compreender como o desenvolvimentismo e
o pragmatismo se expressavam na temática educacional nos anos de 1955 a 1964.
Quanto à abordagem metodológica, nossa pesquisa apresenta um estudo de caráter
histórico, baseado na análise documental. O trabalho parte da perspectiva da História
Cultural e das principais pesquisas no campo da História da Educação contemporânea, que
possuem como principais características: a) o olhar voltado para as práticas culturais dos
atores sociais num dado período histórico; b) utilização de um conceito alargado do que se
entende por fontes documentais, incluindo desde documentos não-oficiais produzidos por
indivíduos ou instituições até outras modalidades de registro da ação do homem, tais como
grafismos e/ou utensílios utilizados pelos indivíduos num dado local e tempo (LE GOFF,
1985).
Tentaremos a todo momento analisar as fontes tendo em vista o fato de que estas
possuem no momento de sua construção, um caráter “monumental” no sentido de se
deixarem impregnar neste momento pelas idéias, intenções e sentidos dos atores/autores
oficiais (LE GOFF, 1985).
Esse conceito se encaixa em nossos objetivos metodológicos à medida que
analisaremos fontes documentais diversas que nos permitirão inferir acerca da construção
das idéias pedagógicas experimentais dos cursos da divisão já citada, no que tange a
formação e aperfeiçoamento do magistério.
Segundo Lüdke & André (1986) a análise documental constitui-se em uma forma de
identificação de informações factuais nos documentos de interesse e que podem ser
consultados, dando maior estabilidade aos resultados.
Além disso, o campo da história da educação no país tem se expandido
significativamente nos últimos anos, devido ao alargamento da noção de fontes
documentais, o que permite ao historiador da educação confrontar pensamentos
cristalizados, analisar fatos sob novos ângulos e ter uma visão multifacetada e poliédrica da
constituição da história da educação brasileira.
Diante desta perspectiva, que foi o fio condutor de nosso estudo, algumas questões
emergiram:
a) Que fontes documentais poderiam viabilizar a compreensão de nosso objeto de
estudo?
b) Como os cursos de aperfeiçoamento do magistério se ligavam ao contexto mais
amplo?
c) Até que ponto seria possível verificar como as ações promovidas pelo CBPE,
bem como os cursos de aperfeiçoamento atendiam seus objetivos?
Em busca de respostas a essas perguntas partimos para a identificação e seleção de
fontes documentais pertinentes a nosso estudo. Assim, as fontes documentais são de
extrema relevância ao estudo por serem oriundos de arquivos pessoais de atores que
tiveram participação direta tanto no projeto do CBPE quanto do INEP, trazendo
informações sobre o cotidiano dessas instituições de modo que podemos nos apropriar de
um aspecto da realidade no tocante a formação e aperfeiçoamento dos professores. Sobre os
arquivos pesquisados, são eles:
1. Arquivo pessoal de Anísio Teixeira (FGV/CPDOC) importante fonte documental,
por tratar do principal idealizador de todo projeto de renovação educacional e valorização
do magistério e, por ser no período, além do criador do CBPE, foi presidente dessa
instituição e presidente do INEP, sendo o articulador das ações integradas relativas ao
aperfeiçoamento do magistério, entre elas os cursos de aperfeiçoamento do magistério
(nosso objeto de estudo).
2. Arquivo pessoal de Lúcia Marques Pinheiro (ABE) fonte documental relativa as
ações técnico-administrativas e pedagógicas dos cursos citados, sendo ela a diretora da
DAM e técnica do INEP.
Além disso, detalharemos de forma breve algumas fontes documentais colhidas nos
arquivos pessoais citados e nas pesquisas bibliográficas feitas para a confecção desse
estudo. São eles:
Bibliografia específica sobre o período histórico estudado, com ênfase em estudos
que abordam o tema do desenvolvimentismo, pragmatismo e de análise das ações do CBPE
e INEP;
Relatórios oficiais de atividades realizadas pela DAM oriundos do arquivo pessoal
de Anísio Teixeira relativo ao INEP, CBPE e DAM no período, que nos fornecem pistas
sobre a atuação desses órgãos na política educacional da época;
Inquéritos e levantamentos sobre a formação docente e a situação do magistério
oriundos do arquivo pessoal de Lúcia Marques Pinheiro que nos permitem inferir, além da
situação do magistério à época, como a DAM / CBPE / INEP formulavam suas ações de
intervenção na realidade educacional;
Programas de cursos, trabalhos finais, apostilas relativas aos cursos de
aperfeiçoamento do magistério, que nos permitem verificar quais as principais linhas de
atuação e diretrizes filosóficas que esses cursos tinham para a melhoria e valorização do
magistério.
Entrevista com a professora Maria do Carmo Marques Pinheiro
2
, irmã de Lúcia
Marques Pinheiro, que foi docente da Escola Guatemala e atuou em dois cursos de
aperfeiçoamento do magistério (Formação de Professores Leigos e Formação de
Professores de Prática de Ensino). Sua contribuição se deu no sentido de se confrontar
alguns dados documentais com a memória viva de uma figura atuante desse contexto e que
nos forneceu informações relativas ao cotidiano dos cursos. Além disso, foi possível o
acesso a dados inéditos contidos em sua fala e a possibilidade de acrescentar ao estudo
fotografias do cotidiano de trabalho no INEP/CBPE nesse período, ilustrando as análises.
O cruzamento de fontes documentais de arquivos pessoais de importantes figuras
desse contexto e a entrevista, aliadas a estudos bibliográficos nos dão conta de explicar
2
A entrevista com a professora Maria do Carmo Marques Pinheiro ocorreu no dia 28 de novembro de 2007.
Baseada no modelo de entrevista semi-estruturada, esta foi gravada e encontra-se em anexo.
como era o contexto sócio-político-econômico da época. Além disso, nos permite que o
trabalho busque uma visão mais ampla do processo de constituição de idéias pedagógicas
experimentalistas nos anos de 1955 a 1964.
O presente texto foi organizado da seguinte forma:
Capítulo 1 um retrato do período nacional-desenvolvimentista, com ênfase
na política de governo, as ações econômicas dessa ideologia e suas repercussões no cenário
educacional da época. Destaque para os antecedentes da década de 50, o período do
governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960) e suas principais ações, tanto no campo
político-econômico quanto no campo ideológico;
Capítulo 2 análise da apropriação do ideário pragmatista na política
pública do Estado Brasileiro no período do estudo. Iniciamos com breve análise das
principais noções do pragmatismo (de vertente deweyana) e sua peculiar apropriação no
Brasil no período, enfatizando seus elos com a ideologia desenvolvimentista;
Capítulo 3 – histórico de criação do INEP e as condições políticas que
levaram este órgão à criação do CBPE. Destacamos nesse capítulo a peculiar organização
do CBPE e suas ações de melhoria da qualidade da educação brasileira;
Capítulo 4 Análise das principais estratégias de intervenção pedagógicas
implementadas pela DAM no período em estudo, com ênfase maior sobre os cursos de
aperfeiçoamento do magistério implementados por essa Divisão;
Capítulo 5 Análise mais aprofundada de nosso objeto de estudo, os cursos
de aperfeiçoamento do magistério, destacando suas principais linhas de ação e diretrizes.
Além disso, merece atenção as aproximações e tensões entre o ideário pragmatista (a
filosofia dos CBPE e dos cursos) e a ideologia desenvolvimentista (o contexto mais amplo);
Considerações Finais.
CAPÍTULO 1
Desenvolvimentismo e Educação no Contexto dos “Anos Dourados”
Para compreendermos as principais tendências, ideologias e ações do
desenvolvimentismo nas décadas de 1950/1960 é necessário que façamos um breve quadro
das décadas anteriores. Dessa forma, podemos entender o porquê do desenvolvimentismo
ter sido considerado um importante momento, não só econômico, mas também de
democracia política, visto que o país voltava de um longo período ditatorial. Este período
foi fundamental para a educação por ser o momento de volta e ascensão de intelectuais que
tiveram sua atuação pública cerceada nas décadas anteriores, como por exemplo Anísio
Teixeira.
De acordo com Gomes (1991, p. 03), “a trajetória de um personagem político
funciona como fio condutor para se repensar a trajetória de um ‘tempo’, de uma geração”.
Ou seja, compreender o desenrolar da história através da análise da trajetória de atores
sociais, nos permite inferir sobre a história recente do país sob a ótica das relações sociais
construídas.
1. Os antecedentes da década de 1950
Podemos começar nossa breve explanação a partir da Revolução de 30
3
, período
importante da história do Brasil que marca o fim da Primeira República (1889-1930), e
início de uma nova ordem política, cuja figura central foi Getúlio Vargas.
O movimento eclodiu simultaneamente no Rio Grande do Sul e Minas Gerais, na
tarde do dia 3 de outubro de 1930. Em menos de um mês a Revolução era vitoriosa em
quase todo o país, restando apenas São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Pará ainda sob
controle do governo federal. Finalmente, um grupo de militares exigiu a renúncia do
presidente Washington Luís e pouco depois entregou o poder a Getúlio Vargas. Num gesto
simbólico que representou a tomada do poder, os revolucionários gaúchos, chegando ao
Rio, amarraram seus cavalos no Obelisco da Avenida Rio Branco. Em 3 de novembro de
3
Movimento político-militar que determinou o fim da Primeira República (1889-1930) originou-se da união
entre os políticos e tenentes que foram derrotados nas eleições de 1930 e decidiram pôr fim ao sistema
oligárquico através das armas.
1930 chegava ao fim a Primeira República e começava um novo período da história política
brasileira, com Getúlio Vargas a frente do Governo Provisório. Era o início da Era Vargas.
Após a Revolução de 30, Vargas lança as bases de sua política econômica, social e
cultural. É o momento de construção da máquina administrativa do governo federal com a
criação de diversos órgãos públicos que subsidiariam as ações federais, e também de
disputas no âmbito do campo ideológico. É criado o Ministério da Educação e Saúde
Pública (1930), cujo primeiro-ministro foi Francisco Campos e, posteriormente Gustavo
Capanema (1934).
O debate educacional, nesse período, ainda estava atrelado a uma visão mais
ingênua da educação, em que a elite intelectual acreditava que podia “salvar” o país com a
reinterpretação do passado, a captação da realidade e a constituição do retrato do Brasil.
Interesses ficam expostos pelo monopólio ideológico das políticas públicas e ações
governamentais relacionadas ao sistema de ensino brasileiro que, neste momento, também
sofria modificações.
Em relação à educação, o ponto principal da década gira em torno da criação do
Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova em 1932 e de sua repercussão no cenário
educacional brasileiro. Gestado no interior a Associação Brasileira de Educação (ABE), o
Manifesto foi uma proposta educacional que trazia os anseios de um grupo de intelectuais
brasileiros que visavam a reorganização do sistema educacional e, conseqüentemente, a
melhoria do ensino. O Manifesto também foi uma resposta ao Ministro Francisco Campos e
ao Presidente Getúlio Vargas que, na palestra de abertura da IV Conferência Nacional de
Educação conclamaram os abeanos a encontrarem a “fórmula feliz” para a educação. Além
de constatar a desorganização do aparelho escolar, propunham que o Estado organizasse
um plano geral de educação e defendiam a bandeira de uma escola única, pública, laica,
obrigatória e gratuita.
Os preceitos escolanovistas do Manifesto levaram a reações, principalmente do
grupo católico que viam no documento a possibilidade de perda do controle ideológico da
educação.
Os debates em torno da defesa do ensino religioso foi o cerne da questão que, de um
lado tinha no grupo católico seus defensores e, do outro lado o grupo dos pioneiros que
defendiam a organização de uma escola pública, laica e gratuita. Na verdade estabeleceu-se
o embate doutrinário no campo pedagógico pelo controle do aparelho escolar. Carvalho
esclarece esse embate ideológico:
Nessa luta, a questão principal era ganhar a adesão do professor a preceitos
pedagógicos capazes de fazer da escola um instrumento eficaz de “organização
nacional através da organização da cultura” tal como diferencialmente
postulavam os dois grupos em confronto (CARVALHO, 2002, p. 18-19).
A constituinte de 1934 eleva os ânimos e as disputas. Nunes (2002) destaca os
principais temas prioritários no debate da Constituinte de 1934: a) a participação da União
em todos os ramos e níveis de ensino; b) o direito à educação; c) a ação supletiva da União
aos estados e municípios, d) a aplicação de recursos públicos em educação, e) o ensino
religioso. Sobre cada tema, cada grupo, através de suas entidades
4
, promoviam palestras e
estudos para embasar suas propostas. Mesmo com algumas propostas do grupo dos
pioneiros terem sido acatadas, de modo geral o grupo católico saiu fortalecido desse embate
de forças, pois a Carta de 34 abriu brechas para o financiamento público do ensino privado
e manteve o ensino religioso nas escolas e previu aplicação irrisória de recursos federais no
ensino elementar.
É importante ressaltar também os interesses do governo federal que tinha como
projeto administrativo e ideológico a centralização estatal dos serviços sociais e o
nacionalismo. A educação era vista como espaço estratégico de disseminação da ideologia
populista e nacionalista e o apoio católico se torna peça importante, pois a doutrina católica
era fundamental para combater as ideologias internacionalistas.
Com a eleição indireta de Getúlio Vargas para o cargo de presidente da República
pela Assembléia Nacional Constituinte em 17 de julho de 1934, terminou o período de
Governo Provisório iniciado em novembro de 1930. Mas o novo governo constitucional
não foi nem longo nem tranqüilo. O movimento social se tornou cada vez mais
efervescente, greves operárias e manifestações da classe média surgiram em diversos
estados do país e, gradativamente, a atividade política foi se radicalizando. O Poder
Legislativo abria mão de suas prerrogativas, enquanto o Executivo se tornava cada vez mais
4
O grupo dos católicos depois do episódio da IV Conferência de Educação que culminou na confecção do
Manifesto, se retiraram da ABE e criaram sua própria entidade com o nome de Confederação Católica
Brasileira de Educação. Dessa forma, o grupo dos pioneiros manteve-se a frente da ABE.
forte. Esse processo culminou em 10 de novembro de 1937 com o golpe de estado, dado
pelo próprio Vargas que implantou um regime ditatorial que foi chamado de Estado Novo.
Em 1937 foi outorgada uma nova constituição, redigida pelo Ministro da Justiça
Francisco Campos, incluindo ações autoritárias, semelhante as constituições de países
europeus que também viviam governos ditatoriais.
As bases políticas que sustentavam o Estado Novo eram apoiadas pelas classes
médias e por amplos setores das burguesias agrária e industrial que queriam tomar o lugar
das oligarquias rurais. Rapidamente, Vargas amplia suas bases populares recorrendo à
repressão e cooptação dos trabalhadores urbanos: intervém nos sindicatos, sistematiza e
amplia a legislação trabalhista. Sua principal sustentação, porém, são as Forças Armadas
que são reaparelhadas com modernos armamentos comprados no exterior e começam a
intervir em setores considerados fundamentais para a segurança nacional, como a siderurgia
e o petróleo. Outro ponto de apoio é a burocracia estatal que cresce rapidamente, abrindo
empregos para a classe média. Em 1938 foi criado o Departamento Administrativo do
Serviço Público (Dasp), encarregado de unificar e racionalizar o aparelho burocrático e
organizar concursos para recrutar novos funcionários.
Em relação à educação, a centralização administrativa, o autoritarismo, a
modernização e o nacionalismo eram os pilares de sustentação das ações governamentais,
sob a batuta de Gustavo Capanema. De acordo com Hilsdorf (2005), “o Estado Novo vai
desenvolver uma política educacional de molde autoritário e uniforme” (p. 100). Além
disso, a centralização se faz presente, pois a escola e os demais níveis e modalidades de
ensino são instrumentos de conformação e controle social para a disseminação do ideário
estadonovista. A modernização se dá através da implantação do aparelho burocrático-
administrativo do Estado no setor educacional.
Capanema foi o responsável por criar no setor educacional um sistema centralizado
e articulado, tanto das instituições públicas quanto privadas. Hilsdorf (2005) aponta suas
principais medidas frente ao ministério:
A reformulação dos currículos dos cursos elementares e secundários no
sentido de implantar nos alunos o “sentimento patriótico”, através da inserção
nos currículos de disciplinas como: educação sica, moral católica e cívica,
canto orfeônico, história e geografia do Brasil, além de festividades cívicas.
Criam-se prescrições e padronizações curriculares;
Implantação da burocracia estatal no setor da educação, com a criação de
órgãos federais que instalaram a estrutura administrativa definitiva do ensino e
passaram a estabelecer as regras a serem cumpridas em vel estadual. São
elas: Ministério da Educação e Saúde Pública (1931), Conselho Nacional de
Educação (1930), Instituto Nacional de Estatística (1934) que originou o
IBGE (1938), Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP (1938),
Comissão Nacional de Ensino Primário (1938), Fundo Nacional de Ensino
Primário (1942) etc;
A organização de todos os tipos de ensino no país, através de Leis Orgânicas:
ensino industrial (1942), ensino secundário (1942), ensino comercial (1943),
ensino primário (1946), ensino normal (1946), ensino agrícola (1946).
Dessa forma, as decisões no campo educacional tomadas no Ministério da Educação
visavam a educação profissional para as classes populares, de modo a suprir a falta de mão-
de-obra especializada frente ao processo de industrialização e, a manutenção do ensino
secundário acadêmico para as elites, com a intenção de cunhar o homem ideal do Estado
Novo: católico, de formação clássica e disciplina militar.
Sem dúvida, a Era Vargas marcou a educação brasileira e polarizou o pensamento
educacional em definitivo. Pode-se dizer que a tensão interna estabelecida no grupo dos
pioneiros devido a vitória do modelo conservados e centralizador Varguista é decisiva para
o enfraquecimento do grupo frente ao cenário político, visto que seus integrantes são
figuras públicas e intelectuais de diversas ideologias e os interesses políticos, bem como
suas ideologias são colocadas em primeiro plano.
Além disso, Vargas procura destituir seus ferrenhos opositores do cenário político,
com a adoção de medidas autoritárias. As figuras mais conflitantes do grupo pioneiro foram
afastadas e perseguidas, como é o caso de Anísio Teixeira, e outros foram incorporados ao
novo quadro institucional do Estado. Dessa forma, Vargas conseguiu neutralizar seus
adversários políticos e aglutinar em sua máquina estatal recém-montada intelectuais que
pudessem contribuir no âmbito pedagógico com a educação, sem interferir na ideologia de
governo nacionalista, racional e ditatorial.
Em 1945, o governo Vargas apresentava sinais de enfraquecimento e eleições
democráticas são marcadas para dezembro daquele ano. O receio de boicote às eleições por
parte dos militares fez com que Vargas fosse deposto do cargo em outubro. Seu substituto,
José Linhares, então Ministro do Supremo Tribunal Federal, ficou no cargo até dezembro
quando o General Eurico Gaspar Dutra vence a eleição e assume o Governo Federal, pondo
fim ao governo ditatorial de Vargas. Dutra fora Ministro da Guerra do Estado Novo e
durante a eleição recebeu apoio de amplos setores da sociedade, até mesmo da Igreja,
inclusive o próprio apoio de Vargas que continuava dando provas de seu poder e carisma
político.
Em meio à euforia da sociedade pela volta da democracia, o General Dutra assume
o governo federal e logo restabelece a ordem democrática interna através de eleições e a
aprovação da nova Constituição em 1946.
A nova Constituição aprovada em 18 de setembro de 1946 refletia a conjuntura
política do fim do Estado Novo e a volta dos princípios liberais relacionados
principalmente a economia.
Apesar do restabelecimento da ordem democrática e o alinhamento do país com o
eixo ocidental s Segunda Guerra Mundial, o governo Dutra começa dar sinais negativos.
A política econômica não ia bem e as pressões populares, principalmente dos sindicatos,
tornaram-se constantes. Para manter seu governo, Dutra assume uma nova postura: “passou
de uma posição inicial liberal-democrática, reflexo da redemocratização do pós-guerra, para
uma posição de liberal-conservadora no contexto da guerra-fria, marcada pelo alinhamento
automático com os Estados Unidos” (TEIXEIRA, 1993 a, p. 64).
Dutra aproximou-se dos setores conservadores, incluindo aqueles representados pela
União Democrática Nacional (UDN), através do chamado Acordo Interpartidário, o que
acarretou a marginalização de Vargas e do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que
acabaram por romper com o presidente. Os comunistas, que haviam obtido resultados
eleitorais expressivos nas eleições de 1945 e 1947, foram vítimas de uma ferrenha
perseguição por parte do governo, que se integrava ao contexto internacional da Guerra
Fria. Assim, o Partido Comunista foi colocado na clandestinidade.
O governo Dutra foi marcado, ainda, por uma política econômica conduzida a partir
de postulados liberais, pelo rápido esgotamento das reservas cambiais acumuladas durante a
guerra e por uma severa política de arrocho salarial.
As eleições presidenciais de 1950 marcam a volta de Getúlio Vargas à Presidência
da República que com carisma, apelo popular e muita articulação política, lançou-se
candidato pelo PTB e venceu a eleição.
É importante ressaltar que mesmo em um regime democrático, Vargas mantém suas
bandeiras políticas do populismo e do trabalhismo (marcas do governo autoritário). Suas
ações giravam em torno de alianças com a burguesia e forte apelo popular para as
realizações de seu novo governo:
Plano Lafer (Plano Nacional de Reaparelhamento Econômico) de
investimentos em setores da indústria de base, transportes e serviços
públicos, supervisionado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico (BNDE);
Criação do monopólio estatal de exploração e refino do petróleo;
Proposta feita ao Congresso de criação de Eletrobrás;
Inauguração da hidrelétrica do São Francisco;
Estímulo a sindicalização do trabalhador;
Criação do Ministério da Saúde (1953);
Reajuste do salário mínimo em 100%.
No âmbito da educação, o principal feito do período foi a criação da Campanha
Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES)
5
em 1951. Nesse
período, com os direitos democráticos estabelecidos e com o fim da perseguição a inimigos
políticos, muitos intelectuais voltam a cena política, entre eles, Anísio Teixeira que torna-se
diretor da recém-criada CAPES.
5
Optamos em utilizar a nomenclatura anterior da instituição por se tratar de um estudo histórico. Atualmente
a instituição, que tornou-se fundação pública em 1992, recebe o nome de Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior.
Sofrendo pressões internas e externas por suas posições nacionalistas, Vargas viu
seu governo frágil a partir de 1953. A crise causada pela nacionalização do petróleo e a
tentativa de controle das remessas de lucros eram os principais pontos nefrálgicos, levando
ao rompimento político com os liberais, com as empresas estrangeiras e com o governo
norte-americano que rompe o acorde de apoio econômico e técnico.
Pressionado, sofrendo campanha contraria dos políticos da UDN, o episódio chave
foi o atentado sofrido por Carlos Lacerda em agosto de 1954 (em que o Major Rubens Vaz
é morto), do qual Vargas foi responsabilizado
6
. Sofrendo pressões para a renúncia, Vargas
optou por “sair da vida e entrar para a história” e suicidou-se em 24 de agosto de 1954.
A comoção popular foi grande e, em meio a esse momento político seu vice João
Café Filho assumiu o governo de 24 de agosto de 1954 a 8 de novembro de 1955, mas por
motivo de saúde foi substituído por Carlos Luz - Presidente da Câmara dos Deputados
que foi acusado de conspiração pelo Marechal Lott e ficou no cargo por apenas três dias (8
a 11 de novembro de 1955). Finalmente Nereu Ramos, vice-presidente do Senado assumiu
a presidência entre 11 de novembro de 1955 e 31 de janeiro de 1956, a a próxima
sucessão presidencial , cuja eleição foi vencida por Juscelino Kubitschek (JK).
2. A década de 1950: o governo JK (1956-1960)
O período de um ano e meio desde a morte de Vargas até a posse de Juscelino
Kubitschek foi marcado por grande instabilidade política. Em 31 de janeiro de 1956, JK
tomou posse juntamente com seu vice João Goulart.
6
A oposição a Vargas se intensificou a partir de 1953 e teve na imprensa a liderança dos jornalistas Carlos
Lacerda, proprietário do jornal Tribuna da Imprensa, e Assis Chateaubriand, proprietário dos Diários
Associados. Indignado com a violência dos ataques pela imprensa, rádio e televisão (na TV-Tupi do Rio de
Janeiro) movidos por Carlos Lacerda contra seu patrão Getúlio Vargas, o chefe da guarda palaciana Gregório
Fortunato, contratou dois pistoleiros para executarem Carlos Lacerda. Na noite de 5 de agosto de 1954
quando o jornalista se aproximava do seu apartamento, na Rua Toneleros, foi vítima de um atentado. As balas
que mal o feriram no foram, no entanto mortais para o major Rubens Vaz da FAB que lhe fazia
informalmente o papel de segurança. Imediatamente todas as evidências voltaram-se para o Palácio do Catete,
sede do governo. Oficiais da FAB resolveram fazer um inquérito por conta própria visto que alegavam não
poder confiar na polícia de Vargas. Formou-se a chamada "República do Galeão", um inquérito dirigido por
integrantes da FAB a revelia das autoridades constituídas. Em pouco tempo os criminosos foram detidos e
Gregório Fortunato preso. A partir desse episódio deu-se a mobilização da imprensa, que de modo geral
manifestou-se em editoriais contra a permanência de Vargas à frente do governo. O poder de Vargas
esvaziou-se por completo. Antes de suicidar-se já estava politicamente morto.
É um período de grande instabilidade política e econômica que a figura de um
governante carismático poderia “acalentar o coração” da população brasileira, depois da
trágica morte de Getúlio Vargas.
Juscelino Kubitschek, através da adoção da ideologia desenvolvimentista ocupou o
“lugar no coração” da população brasileira deixado por Vargas e tornou-se uma grande
figura no quadro político do país.
A ideologia desenvolvimentista
Foi no Governo de JK que o vocábulo desenvolvimentismo foi consagrado através
de uma política econômica que visava o crescimento do país, principalmente da indústria,
associado a conceitos que subsidiavam a ideologia desenvolvimentista, que povoava o
imaginário popular com expressões como: “esperança”, “otimismo”, “identidade nacional”,
“país do futuro”, “ os dois brasis”, “superação do subdesenvolvimento” etc. De acordo com
Benevides:
(...) foi no governo Juscelino Kubitschek que se consagrou, definitivamente, o
vocábulo “desenvolvimentismo” (...). Antes de JK falava-se em “fomento” e em
“fomentar o desenvolvimento”; Juscelino teria sido o inventor da palavra, cuja
mística ficou, na história contemporânea, irremediavelmente vinculada ao seu
nome. Até hoje, qualquer sinal de modernidade” ou de “espírito realizador”
misturados a um certo otimismo e às virtudes da conciliação política costuma
ser identificado como traço de um “juscelinismo” revivido. (BENEVIDES,
1991, p. 9)
A proposta do governo era de que o desenvolvimento econômico caminhasse junto
ao desenvolvimento político, formando a idéia associativa do “Brasil Moderno” e “Brasil
Democrático”. Porém, o governo JK representava uma aliança política conservadora
reunindo interesses da burguesia comercial, oligarquia rural e da classe média tradicional,
por meio de uma posição inovadora em relação à industrialização e crescimento
econômico, baseado no capital estrangeiro.
Através da idéia de que a nação teria progresso se tivesse soberania frente as
demais nações desenvolvidas do mundo, todo um conjunto de pressupostos foram pensados
para o crescimento do país. Falar em progresso, nesse contexto, implica falarmos em
prosperidade da nação com a relativização da miséria e a preservação da ordem, rumo ao
tão sonhado progresso baseado em valores democráticos.
É ele [o desenvolvimento] o grande móvel da ação, é ele o grande objetivo
explícito dos reforços em todos os níveis o político, o ideológico, o social, o
cultural, o econômico (CARDOSO, 1978, p. 224).
Além disso, a noção ideológica de segurança se faz presente. Nesse contexto, falar
de segurança significa neutralizar as diferenças econômicas geradoras de insatisfação e,
potencialmente, levar a nação ao desenvolvimento e mantendo-a em segurança, entendida
aqui como ordem (regime democrático).
Dessa forma, ideologicamente os conceitos de desenvolvimento e segurança são
mútuos e determinantes. Ou seja, conter a miséria através do desenvolvimento econômico é
questão de segurança nacional, pois mantêm a ordem estabelecida e evita que a subversão
ocorra.
O Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) foi o principal órgão
governamental de elaboração da ideologia conhecida como nacional-desenvolvimentista.
Criado pelo Decreto 37.608 de 1955, como órgão do Ministério da Educação e Cultura
(MEC), tinha como objetivos o estudo, o ensino e a divulgação das ciências sociais, cujos
dados e categorias seriam aplicados à análise e compreensão crítica da realidade brasileira e
deveriam permitir o incentivo e a promoção do desenvolvimento nacional.
7
A idéia de nacionalismo é bem peculiar nesse pensamento. Pensar um ideal nacional
estava diretamente relacionado ao desenvolvimento econômico, visto que para o governo
JK o nacionalismo que convinha era o que colocava o país em posição privilegiada no
cenário internacional. Assim, essa particular caracterização de nacionalismo poderia ser
definida como a expressão de um povo (o brasileiro no caso). Note que a idéia de Nação se
apresenta como um estado da civilização, extinguindo os vínculos entre exploração e
subdesenvolvimento, e a associando a idéia de consciência. É exatamente nesse ponto que
as formulações do ISEB tiveram toda sua importância, a medida que situava a Nação num
7
Para saber mais sobre o ISEB consulte:
OLIVEIRA, M. T. C. de. A "Educação ideológica" no projeto de desenvolvimento nacional do ISEB (1955-
1964). Rio de Janeiro: PUC - Rio, 2006. (Tese de Doutorado).
TOLEDO, C. N. de. ISEB: fábrica de ideologias. São Paulo: Ática, 1977.
conceito faseológico de subdesenvolvido e que a tomada de consciência do povo através
das formulações dos cientistas do órgão (que eram os que possuíam condições de
interpretar os anseios do povo), levariam a superação do subdesenvolvimento.
Conseqüentemente, a interpretação dos cientistas do ISEB apontavam para a idéia de
desenvolvimento econômico, superação do subdesenvolvimento, manutenção da ordem,
etc. Assim sendo, a Nação brasileira precisaria superar sua condição subdesenvolvida
através do desenvolvimento econômico e para a manutenção da ordem.
Aliado ao bom momento do cenário interno, no cenário internacional era o período
de pós-guerra que toda a América Latina sofria transformações nos campos econômico,
político e social. Tratava-se do momento em que os países de economia periférica, como o
Brasil, se ajustavam à nova lógica mundial do pós-guerra e a sociedade brasileira se
mobilizava diante do desafio de um efetivo desenvolvimento, apoiado principalmente nas
análises econômicas da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). Portanto,
no Brasil:
(...) o projeto de desenvolvimento partia de temas nacionais que já vinham sendo
analisados desde a década de 1930, envolvendo questões voltadas a uma política
de autonomia nacional e a uma política de industrialização. Porém, no contexto
dos anos 1950, a retomada de antigas questões relacionadas com o
desenvolvimento do país acabaria resultando na formulação de um conjunto de
princípios que se materializavam num amplo projeto nacional de
desenvolvimento capitalista, definitivamente assumido e adotado como uma
estratégia política de governo do então presidente Juscelino Kubitschek
(1955/1959) (MENDONÇA et ali, 2006, p. 97).
O componente ideológico de “reconstrução da Nação”, da idéia do novo contra o
antigo modelo, de crença na superação do estado agrário para o estado urbano industrial, a
esperança no futuro e uma proposta concreta de mudança na administração pública do país
foram os ingredientes (internos) necessários para que o projeto desenvolvimentista
ganhasse apoio de diversas camadas da sociedade.
A política de governo
Característica importante do governo JK que precisa ser ressaltada era a forma
conciliatória de governar. Foi uma administração que conseguiu o equilíbrio (ainda que
frágil e instável vide as diversas crises que o governo conseguiu administrar) entre as forças
políticas e os setores da sociedade, através de mecanismos de compensações entre as
principais variáveis: a aliança entre PTB-PSD para a aprovação de orçamentos no
Congresso, a cooptação de militares para o governo através de cargos importantes, o
desenvolvimento do Programa de Metas que fixava as bases do crescimento econômico e a
administração paralela para burlar a administração formal mantida em bases técnico-
burocráticas rígidas. Dessa forma, o governo implementava uma política inovadora no
país sem tocar na administração fixada.
Em outras palavras, a conjuntura internacional
8
ditava um novo modelo de
administração econômica para os países emergentes e JK através de sua perspicácia política
e talento natural para agrupamentos e conciliações, conseguiu implantar no país um modelo
político-econômico que tinha apoio internacional e, ao mesmo tempo, despertou na
população brasileira através de suas ações sentimentos de esperança e otimismo.
Essa crença no futuro e esperança no progresso era o componente ideológico que
permeava o imaginário popular de que a política de JK traria o desenvolvimento. Aliado a
esse componente havia ões concretas do governo que tornavam a ideologia concreta e
palpável, por assim dizer.
A política de relações internacionais implementada por JK e a construção de
Brasília para abrigar a nova capital federal são bons exemplos de concretização de seus
projetos. A grande intenção do governo era transformar a economia brasileira de modo a
torná-la competitiva no cenário mundial.
A principal mola do projeto político-econômico do governo JK foi o
desenvolvimento do país através de investimentos privados (estrangeiros e nacionais) e
públicos. Para a operacionalização do projeto, o governo necessitava que o principal país
capitalista da América também investisse na formação de um bloco econômico do
8
Chamamos de conjuntura internacional os principais acontecimentos como a Guerra Fria e a corrida
imperialista dos países desenvolvidos, que ditavam para o mundo, sobretudo para os países de economia
periférica e subdesenvolvida como o Brasil, uma nova ordem mundial baseada em economias de mercado e
alinhamento ideológico entre dois blocos – o capitalista e o socialista.
continente americano em que os países cooperassem entre si de acordo com suas
possibilidades e, ao mesmo tempo, se consolidasse como um bloco coeso de economia
capitalista.
Foi baseado na idéia de que o subdesenvolvimento poderia contribuir para a
subversão da ordem capitalista, principalmente na América do Sul, que JK buscou apoio
financeiro no exterior, principalmente do governo norte-americano. Nesse pensamento, a
luta contra o subdesenvolvimento, visando o desenvolvimento das regiões era uma
colaboração dos países ricos para a manutenção da segurança do continente. Segundo
Cardoso:
Como resultado do conceito ideológico da segurança e da ampliação das
fronteiras a defender, que ele cria, tem-se que a segurança de qualquer dos países
que se qualificam como ocidentais passa a ser tarefa comum a todas as nações do
mundo democrático. Elas cooperam entre si: as mais poderosas ajudando as mais
fracas; as que possuem pontos ou elementos estratégicos, cedendo-os para a
defesa comum a fim de fortalecer politicamente o bloco para o qual todos os
países-membros devem contribuir, cada um de acordo com suas possibilidades.
(CARDOSO, 1978, p. 192).
Sua principal realização nesse sentido foi a criação da Operação Pan-Americana
(OPA). Lançada por JK em 1958, a OPA tinha um tríplice objetivo: a) captar recursos para
os projetos de desenvolvimento do país; b) assegurar boas relações com os Estados Unidos
e de certa forma garantir a fonte de capital estrangeiro público para o projeto de
desenvolvimento do país e, c) colocar o Brasil em posição de liderança entre os países
latino-americanos e inserir tais economias no cenário mundial. Porém, os planos da Casa
Branca eram um pouco diferente de modo que os planos de investimento estavam voltados
para a contenção do comunismo internacional, deixando a América Latina em estado de
latência nesse momento.
Além disso, a audaciosa iniciativa brasileira de arregimentar recursos materiais e
políticos em escala continental possuía formulações e objetivos gerais amplos e pecava pela
inoperabilidade. Entretanto o governo norte-americano e o governo brasileiro não chegaram
a propor uma política de ação clara e objetiva para a América Latina.
Posteriormente e devido a Revolução Cubana, a Casa Branca promoveu uma
política de ampla escala no continente visando conter o avanço socialista e, através da
Aliança para o Progresso promoveu diversas ações de cunho financeiro e social.
É importante observar que mesmo a OPA não tendo sido bem sucedida do ponto de
vista de promoção de um bloco financeiro e político forte, a iniciativa foi um esforço
brasileiro de inserção na política internacional como um líder continental que visava um
novo modelo de crescimento econômico para a região. Em relação aos investimentos
externos privados, esses chegavam em grande quantidade devido aos incentivos fiscais
oferecidos pelo Estado Brasileiro.
Outra característica da política de governo JK foi a chamada administração paralela.
Era a forma encontrada de evitar o imobilismo do sistema sem contestá-lo, visto que os
novos órgãos do governo funcionavam como centros de assessoria e execução, “enquanto
os antigos órgãos continuavam a responder aos interesses das clientelas políticas, sobretudo
regionais” (BENEVIDES, 1991, p. 12). De acordo com Leopoldi:
[a] mudança ocorreu fundamentalmente na estrutura do Estado, que criou
organismos burocráticos, de caráter neocorporativo, mudando a administração
sem fazer nenhuma reforma administrativa, portanto sem autorização legislativa.
(LEOPOLDI, 1991, p. 71)
Dessa forma, a administração pública criava órgãos executivos (vários deles eram
sugestões dos investidores internacionais) que não prejudicassem a ordem estabelecida,
mas que fiscalizavam as ações, principalmente relativas ao Programa de Metas e
propunham questões de interesse público sempre visando o desenvolvimento. Além disso,
através da criação de órgãos executivos o governo mantinha os setores médios da burguesia
empregados na máquina administrativa federal, por disporem de mão-de-obra qualificada,
obtendo assim seu apoio político. Para as camadas populares, o crescimento da indústria de
base, de transporte, alimentícia e de energia financiada pelo governo através do Programa
de Metas empregava tal mão-de-obra.
A política econômica: o Plano de Metas
O país possuía ainda nos anos 50 uma economia tenra e que tinha papel coadjuvante
no cenário econômico mundial. Por meio de uma política econômica baseada no
planejamento, concretizado pelo Plano de Metas, o governo JK pôs em prática suas
ambições no ramo econômico visando o “progresso”. A peculiaridade do Plano de Metas
consistia em promover o crescimento do país com mudanças estruturais e profundamente
dependentes de planos específicos de execução e prazos determinados.
O programa tem sua gênese nos trabalhos elaborados pela comissão mista Brasil -
Estados Unidos e em estudos e projeções econômicas conduzidas pela CEPAL. Nesse
momento, o Brasil entrava definitivamente para o cenário econômico internacional como
uma economia de mercado emergente. O modelo adotado para a escolha das metas a serem
alcançadas pelo governo estavam baseadas no conceito de bottlenecks (pontos de
estrangulamentos) que consistia em identificar os pontos frágeis da economia, ou seja, os
pontos que dificultavam o crescimento econômico, propondo medidas que eliminassem
esses obstáculos e melhorassem a qualidade de vida da população.
O Plano de Metas configurou-se como a concretização do projeto político de JK.
Sua intenção era que a nação brasileira superasse sua condição subdesenvolvida e passasse
a ser um país urbano-industrial.
É importante lembrar que o audacioso plano de crescimento econômico foi efetuado
por meio de investimentos estatais, sobretudo no setor de infra-estrutura e indústrias de
base, atuando como um grande fiador do todo esse processo. Assim, a política econômica
do período, baseada no investimento privado, tinha como fiador de todo o processo o
próprio Estado que através da captação de recursos externos subsidiava todo o programa de
desenvolvimento sob a égide de um plano geral. Os investimentos externos eram
provenientes principalmente de bancos de desenvolvimento estrangeiros, que faziam
empréstimos ao governo e atuavam na supervisão das metas governamentais através de
grupos executivos.
O Plano de Metas que tinha como principal estratégia a viabilização do crescimento,
sobretudo industrial, através da dinamização dos setores intermediários da produção
industrial do país.
Elaborado pelo Conselho de Desenvolvimento, o programa tinha como meta trinta
pontos considerados estagnados e que precisavam de amplo investimento, relativos a
diversos setores da economia. Os principais setores abarcados pelas metas eram
9
:
1. Setor de Energia;
2. Setor de Transportes;
3. Setor de Alimentação;
4. Setor de Indústria de Base;
5. Setor Educacional.
A intenção era que com o desenvolvimento desses setores considerados estratégicos
pelo governo a economia teria plenas condições de crescer e, conseqüentemente, r o país
definitivamente no cenário internacional como uma economia emergente e que buscava
superar sua condição de subdesenvolvimento.
A execução do programa estava baseada na adoção de uma tarifa aduaneira
protecionista, um sistema cambial que subsidiava a importação de bens de capital e
insumos e uma política monetária e fiscal expansionista. Dessa forma, com um programa
de industrialização deliberada, investimentos do capital estrangeiro foram atraídos para a
economia brasileira. O programa contava com grande investimento e tinha o apoio de
agências reguladoras que supervisionavam a execução das metas e corrigiam seus rumos
quando necessário.
Cabe mencionar que o Programa de Metas tem apenas uma medida relativa a setores
sociais, que é a meta 30 sobre o setor educacional, o que demonstra a clara intenção de
manutenção da ordem social estabelecida. Por outro lado, é exatamente com a inclusão do
setor educacional que o programa reserva recursos para a intensificação da formação
técnica para que os postos nos setores em crescimento sejam acupados. Sobre o setor
educacional, falaremos mais detidamente no próximo item.
9
O Programa de Metas fora apresentado de forma resumida nesse estudo, por não ser nosso foco principal.
Tivemos como base o artigo de Faro e Silva (1991) que consta em nossa bibliografia. O Programa encontra-se
em anexo.
Para finalizar, a construção de Brasília para abrigar a nova e moderna capital federal
pode ser entendida como a meta síntese do governo JK, a 31° que não estava contida nas
metas anteriores.
Brasília foi a concretização de um projeto de desenvolvimento do país, pensado e
implementado por JK. A construção da capital federal no interior levaria o progresso e a
integração da região com o resto do país, seu modelo arquitetônico se tornara símbolo do
desenvolvimento urbano, e toda sua máquina administrativa estaria montada sob a
perspectiva do planejamento. Em síntese, Brasília constitui-se no símbolo da modernidade
e urbanização do país, em dicotomia ao estado arcaico e rural que o país vivera antes do
projeto desenvolvimentista.
O setor educacional
Na área educacional, o momento político e econômico pelo qual o país passava
tinha na bandeira da educação um forte instrumento para inculcação ideológica. A ênfase
na racionalização do processo do desenvolvimento necessitava da adequação do sistema
educacional vigente a seus propósitos. As ações governamentais pautavam-se na formação
de pessoal especializado que pudesse suprir a demanda econômica em vários níveis, através
da ampliação, aparelhamento e diversificação do ensino superior e incremento do ensino
profissional. Cunha nos esclarece o papel da educação na ideologia desenvolvimentista:
(...) inclui-se na ideologia desenvolvimentista a idéia de que a educação seja
colocada a serviço do desenvolvimento econômico do país; uma vez atingido
esse patamar, toda a população seria beneficiada pelos frutos do bem estar assim
gerado. Apenas o ingresso do país na era moderna sinônimo de
industrialização traria os benefícios almejados pelo povo e, portanto, todos os
setores da vida nacional deveriam alinhar-se nessa direção. (CUNHA, 1991, p.
192)
Além disso, a superação da condição de subdesenvolvimento era ponto-chave para o
desenvolvimento e, para isso, era necessária que a educação formasse mão-de-obra
qualificada para atuar nos principais setores da indústria crescente. Ao analisarmos o
Programa de Metas, verificamos que o setor educacional foi contemplado no programa
(ainda que como a última meta), justamente para destinar recursos específicos para a
qualificação técnica. Essa orientação fica clara através da idéia contida no Programa de
Metas de “orientação da educação para o desenvolvimento”. De acordo com Cardoso:
A questão que se coloca para a reforma proposta é tornar mais prático o ensino,
fugindo ao academicismo, aproximando a escola da realidade nacional, no
sentido de que ela passe a formar o tipo de quadros exigidos pela transformação
por que se quer fazer passar a realidade (CARDOSO, 1978, p. 220).
A educação, nesse contexto, passa a ter uma base essencialmente cnica como
pressuposto para a superação da condição de subdesenvolvimento. No âmbito ideológico, a
educação profissionalizante passava a ser o ponto de integração do homem brasileiro com a
industrialização que proviria do desenvolvimento.
O nível médio técnico teve grande ênfase no governo JK como forma de manter e
controlar a formação de empregados qualificados que se destinariam às inúmeras vagas
abertas nos setores da produção industrial, sobretudo nas indústrias de base.
Em relação ao ensino primário, as ações governamentais eram pautadas na
necessidade de expansão das oportunidades de escolarização e na melhoria das condições
de preparação dos professores.
Foi também o período que as campanhas e programas ganharamm força no cenário
educacional, por serem uma estratégia de burlar o “engessado sistema educacional”
baseado na tecnocracia. Observe que em nenhum momento foi proposto a mudança ou a
reestruturação do sistema educacional pelo Estado. Toda a máquina administrativa foi
mantida, mas com ações que visam dinamizar esse sistema. Assim como na área
econômica, as campanhas desenvolviam o trabalho de executar ações que viabilizassem a
elevação do vel de escolaridade da população brasileira. Podemos destacar como
importantes exemplos dessa dinâmica a Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino
(CALDEME), a Campanha de Inquéritos e Levantamentos do Ensino Médio e Elementar
(CILEME) e a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo.
A CALDEME tinha como objetivo principal estabelecer as bases para a formulação
de manuais que funcionassem como guias para o professorado secundário, nas diferentes
disciplinas constantes do currículo do ensino de grau médio ou secundário. Suas
publicações visavam contribuir para a renovação da literatura pedagógica, mediante a
revisão de livros de leitura e a análise dos livros didáticos em uso nas escolas; a elaboração
e distribuição de guias de ensino, livros textos e manuais para o professorado da rede
pública de ensino, além de material didático para uso do aluno.
A CILEME pretendia dotar o MEC de um amplo quadro numérico, ao mesmo
tempo descritivo e interpretativo, do ensino médio e elementar em nível nacional, a fim de
que profissionais e usuários pudessem apreciar as deficiências e as dificuldades de uma
expansão levada a efeito, em muitos casos, com apreciável perda de padrões. As
publicações apresentavam o levantamento e análise de dados da situação do ensino médio e
elementar e visavam subsidiar o planejamento educacional junto às administrações
estaduais e municipais de educação.
Aliado ao movimento das campanhas, o Estado propõe a criação de cursos
complementares ao ensino primário, maior investimento no ensino técnico-profissional e
incentivo a cursos superiores que pudessem suprir o mercado interno com profissionais
ligados a atividades industriais e de planejamento. Note que essas estratégias visavam uma
educação muito ligada ao trabalho, com a formação de pessoal especializado que pudesse
atuar na sociedade e na economia rumo ao desenvolvimento.
A estratégia da administração paralela pode ser facilmente percebida na área
educacional, principalmente no que tange a criação do Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais (CBPE). Este órgão governamental criado em dezembro de 1955, mas com
sua atuação e funcionamento efetivo no início de 1956 (mesma época da posse de JK),
tinha suas atividades baseadas na execução de projetos educacionais, entre eles o
aperfeiçoamento do magistério. Ou seja, seu trabalho em parceria com o INEP (que fora
criado em 1938 e pode-se dizer que tem um caráter híbrido devido a sua flexibilidade e
variedade de ações) visava uma maior dinamização das ações relativa a pesquisas
educacionais e aperfeiçoamento do magistério, através de um órgão que possuía uma
estrutura organizacional diferenciada que favorecia assim a execução das ações. Sobre o
CBPE e INEP, falaremos de forma mais detida em capítulo posterior.
O contexto brasileiro da época - que Brandão (1997) denomina como um momento
de consenso (clima propício) - foi marcado pela crença no desenvolvimento da área
educacional em de bases científicas. Tal idéia se fazia presente frente às mudanças e
complexidades da sociedade à época, em que a educação, tal como ocorre hoje, deveria
“dar conta” do âmbito interpessoal, institucional, social e político.
O custo do desenvolvimento
O projeto desenvolvimentista do governo JK contou com inúmeras oposições ao
longo do período.
A prioridade dada ao fomento do desenvolvimento econômico contava
com uma larga base de apoio que incluía interesses empresariais, trabalhistas e militares,
irmanados pela ideologia nacional-desenvolvimentista. De outro lado, porém, enfrentava a
oposição de alguns setores internos e de organismos internacionais favoráveis a uma rígida
política de estabilização.
O modelo econômico adotado trouxe sérios problemas ao país. O aumento dos
gastos públicos com a execução dos programas previstos no Plano de Metas e com a
construção Brasília, a concessão de aumentos salariais e o alargamento das linhas de crédito
do Banco do Brasil associado a uma forte depressão no mercado internacional dos produtos
da pauta de exportações brasileiras, resultaram em um quadro de forte pressão inflacionária
e de expansão do endividamento do setor público.
Muitos foram os avanços, e muitas
foram as críticas à opção de JK pelo crescimento econômico com recurso ao capital
estrangeiro, em detrimento de uma política de estabilidade monetária.
O crescimento econômico e a manutenção da estabilidade política, apesar do
aumento da inflação e das conseqüências d advindas, deram ao povo brasileiro o
sentimento de que o subdesenvolvimento não deveria ser uma condição imutável, mas não
foi o suficiente para que o governo elegesse seu sucessor.
O candidato de Juscelino, o General Henrique Teixeira Lott, perdeu a eleição a
Presidência da República para o candidato da UDN, Jânio Quadros.
3. O Governo de Jânio Quadros e João Goulart (1961-1964)
Jânio Quadros (JQ) surge como unanimidade nacional e prega a volta do populismo
varguista com o lema de “varrer a corrupção”. Apesar de todo o apoio da sociedade civil a
seu governo, Jânio renuncia ao cargo, ficando no poder apenas 7 (sete) meses e alegando
não poder governar diante das pressões das “terríveis forças ocultas”.
A herança econômica de JK era pesada e o governo necessitava por em prática
medidas duras para a contenção da situação econômica. Foi criado o Programa de
Estabilização Econômica que previa a redução das despesas públicas, dos subsídios oficiais
e a compressão do salário dos trabalhadores. A reação contrária ao programa por parte dos
trabalhadores e empresários foi imediata.
Aliado a política econômica de contenção, Jânio começou a execução de uma
política externa independente de não alinhamento automático com o bloco capitalista
ocidental liderado pelos Estados Unidos da América. Para JQ o país deveria buscar
vantagens econômicas e culturais mundo afora e não apenas aceitar as determinações que o
alinhamento automático impunha.
O pensamento político de Jânio Quadros também é pertencente à ideologia
desenvolvimentista, porém suas principais diferenças em relação ao governo de JK estão na
idéia do desenvolvimento equilibrado e com bases nacionalistas, passando pelo setor social.
Para JQ, o desenvolvimento era necessário e até de certo modo irreversível (visto que o
processo havia iniciado e as conseqüências de um rompimento total eram enormes), mas
a ênfase deveria ser na elevação das condições culturais e sociais do povo e no
desenvolvimento sustentável da nação, sem a interferência do capital externo.
A integridade nacional e a formação do bloco subdesenvolvido eram os princípios
básicos para o desenvolvimento, conseguidos através da austeridade política, da eficiência
econômica e da elevação cultural e ampliação das bases sociais.
Em 25 de agosto de 1961, JQ renuncia ao cargo de Presidente da República e inicia-
se um delicado processo de transição até a posse de João Goulart (Jango).
Apesar de João Goulart ser herdeiro político de Vargas e do populismo, ele não
recebe apoio imediato dos setores conservadores e das Forças Armadas. A situação de crise
deixada por Jânio e a desconfiança interna e externa sofrida o obriga a aceitar a
implantação do parlamentarismo, visto que começavam a surgir indícios de um Golpe
Militar.
Através da busca da ampliação de sua base política, do apoio de outros partidos
políticos (PTB, PSD e da própria UDN), Jango consegue a adesão de congressistas e
militares e consegue abolir o parlamentarismo através de plebiscito. Além disso, neutraliza
a desconfiança norte-americana com uma viagem aos Estados Unidos em 1962.
Em nova fase, com o regime presidencialista restabelecido, no âmbito da política
econômica Jango acelera a execução do Plano Trienal de estabilização e a retomada do
crescimento econômico, mas esbarra em dificuldades.
Como outros planos anteriores, porém, este também esbarrou na enorme
dificuldade de combinar a austeridade econômica (que impõe sacrifícios e perdas
aos trabalhadores, aos empresários e ao governo) com a necessidade de
assegurar o apoio das massas populares e alguns outros apoios na própria
burguesia (TEIXEIRA, 1993a, p. 111).
Em outras palavras, a política econômica populista de Jango não conseguiu
conciliar os interesses dos setores econômicos com a mobilização das massas em prol do
projeto, visto que a massa trabalhadora nesse momento estava mais bem organizada, tinha
maior autonomia e maior poder de pressão sobre o Estado, exigindo mudanças mais
profundas.
Em meio à crise que se instaurava, Jango lançou o programa de Reformas de
Base. Era um programa de reformas institucionais a ser submetido ao Congresso Nacional
que versava sobre as seguintes temáticas:
Reforma agrária – com a democratização do acesso a terra;
Reforma tributária – menor desigualdade na divisão social dos encargos fiscais;
Reforma administrativa – desburocratização dos serviços públicos;
Reforma urbana – combate à pobreza, especialmente em relação à moradia;
Reforma bancária acesso mais amplo dos produtores, sobretudo os pequenos, ao
crédito;
Reforma educacional – valorização do ensino público em todos os níveis.
Ainda no âmbito das Reformas de Base, Jango promulgou o Estatuto do
Trabalhador Rural que estendia os principais direitos trabalhistas dos trabalhadores urbanos
aos trabalhadores rurais.
Na política externa, João Goulart aplicava de forma rigorosa a Lei de Remessas de
Lucros e defendia a nacionalização de empresas norte-americanas. Essa postura
desagradava diretamente os investidores estrangeiros, os setores conservadores da
economia e as empresas multinacionais aqui instaladas.
Na área educacional, o governo deu início ao Plano Nacional de Educação previsto
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 4.024, de 20 de dezembro de
1961). Suas principais medidas estavam ligadas a alteração do quadro atual e adaptação do
sistema educacional brasileiro às necessidades qualitativas e quantitativas do
desenvolvimento. Com a criação dos Fundos Nacionais de Ensino Primário, Médio e
Superior, o governo pretendia ter de forma permanente um dispositivo que regulamentasse
os investimentos em cada nível educacional.
Apesar de todas essas medidas, o governo de João Goulart sofreu inúmeras pressões
políticas. Pressão dos grupos populares organizados (sindicatos e ligas trabalhadoras) que
tinham posições político-ideológicas radicais e, pressão dos grupos conservadores que viam
nas medidas governamentais o medo da “ameaça vermelha”. Na realidade, a burguesia
nacional, os setores da classe média, a Igreja e as Forças Armadas, sentiam-se incomodados
pelo reformismo do governo e pela radicalização dos movimentos populares. Assim, o que
antes era oposição, tornou-se rapidamente conspiração e com o apoio de órgãos do governo
norte-americano preparou-se o golpe.
Sem saída, João Goulart investe em garantir apoio popular para seu programa de
reformas, mas a conspiração já havia sido preparada. Entre março e abril de 1964, o
governo é deposto e os Ministros Militares assumem o poder. É o fim da era democrática
no país e do pensamento nacionalista.
Iniciou-se no país o período de ditadura militar a partir do Golpe de Estado dado
pelos Militares em1964 que perdurou até 1985, com o fim do regime ditatorial e início da
redemocratização do país. De acordo com nosso objetivo de estudo e nosso recorte
temporal, limitamos nossas reflexões até o período do governo João Goulart (anterior ao
regime militar).
CAPÍTULO 2
Pragmatismo e Experimentalismo Pedagógico no Brasil nos Anos de 1955 a 1964
O capítulo tem por objetivo fazer uma breve análise da apropriação do ideário
pragmático no Brasil entre os anos de 1955 e 1964. É através do entendimento de como o
ideário pragmático se apresenta no cenário educacional brasileiro que o capítulo se
desenvolve, no sentido de nos fornecer dados que nos ajude a compreender como o ideário
pragmático se materializou nas ações pedagógicas do INEP / CBPE no período.
1. A Filosofia Pragtica e o Experimentalismo Pedagógico de John Dewey
Principais Conceitos
John Dewey, durante o século XIX e XX, foi considerado um dos grandes
expoentes do pensamento pragmático. Dewey é uma das três figuras centrais do
pragmatismo nos Estados Unidos, ao lado de Charles Sanders Peirce, que criou o termo e
William James, que o popularizou. Mas Dewey não chamava sua filosofia de pragmática,
preferindo o termo “instrumentalismo”.
A idéia básica do pensamento de John Dewey sobre a educação está centrada no
desenvolvimento da capacidade de raciocínio e espírito crítico do aluno e sua relação com a
sociedade. Dewey acreditava que a escola devia ensinar os alunos aprender a viver, a
pensar e a trabalhar cooperativamente com outras pessoas, em vez de simplesmente
aprender as lições sobre grandes quantidades de informação.
Nesse estudo, tomamos como base as noções de experiência, progresso e
democracia. Nosso objetivo é compreender como opera a teoria deweyana e qual o papel
da educação nesse processo. Para Dewey, somente a interseção dessas categorias através
do trabalho da escola poderia formar cidadãos conscientes de como viver em democracia.
Primeiramente, a noção de experiência pode ser sinteticamente apresentada por
Sucupira (1960):
a) na fase perceptual, a experiência é concebida num contexto amplo e genérico em
que tudo que é vivido, sentido, sofrido ou agido é ação humana advinda da experiência,
indicando tudo que é experimentado, confundindo-se com a própria riqueza da vida e sua
complexidade, ou seja, tudo que é dado é considerado enquanto emergido da interação das
coisas e organismos;
b) na fase conceptual de experiência os dados são vistos como materiais a serem
utilizados pelo homem para a solução de situações problemáticas. Os dados advindos da
experiência humana em seu modo mais amplo são selecionados no sentido da pertinência e
relevância através da ação cognitiva e reflexiva humana, conduzindo-nos à tomada de
decisão para a solução de um problema.
De acordo com Dewey (1976), a noção de experiência se baseia no princípio da
continuidade de processos tanto biológicos quanto sociais, de modo que “toda experiência
vive e se prolonga em experiências que se sucedem” (p. 16). Assim, o princípio da
continuidade de experiência significa que toda e qualquer experiência toma algo das
experiências passadas e modifica de algum modo as experiências subseqüentes.
Dessa forma, pensar no conceito deweyano de experiência aplicado na escola
significa pensar na qualidade dessa experiência, que passa por dois aspectos: a) o imediato,
ser agradável ou desagradável para o aluno; b) sua influência sobre experiências
posteriores.
Portanto, o conhecimento é uma forma distinta da experiência imediata surgida quando este
se torna problemático e conduz a uma solução, pois o que é imediato, para Dewey, não é
cognitivo nem reflexivo.
Porém, o conceito de experiência não se processa apenas dentro da pessoa, como
um processo apenas biológico, o conceito de experiência pode ser definido como um
processo cognitivo e social de aquisição de conhecimento em que o indivíduo parte de suas
experiências anteriores, a confronta com suas próprias dificuldades e, com o auxílio de
outras pessoas, a transforma em conhecimento, num processo contínuo de construção e
reconstrução da experiência. A experiência
deveria contribuir para o preparo da pessoa em experiências posteriores de
qualidade mais ampla ou mais profunda. Isto é o próprio sentido de crescimento,
continuidade, reconstrução da experiência (DEWEY, 1976, p. 41).
Em artigo publicado na Revista Educação e Ciências Sociais, por ocasião das
comemorações do centenário de John Dewey, Newton Sucupira (1960, p. 85-86) nos
apresenta sinteticamente o que significa a noção de experiência no pensamento deweyano:
Experimentar uma situação implica um modo de participar da mesma ou ser
afetado por ela onde o apreender cognitivo é apenas um de seus ingredientes.
(…) O imediato, isto é, estas experiências qualitativas primárias são apenas o
ponto de partida indispensável do conhecimento. (...) As idéias se tornam assim
instrumentos de reorganização da experiência pela qual seu caráter de
indeterminação e problematicidade se transforma em algo de determinado e
garantido. Por sua vez, os valores e ideais se definem em função da situação
concreta e vêm a ser os elementos de que o homem dispõe a fim de projetar
inteligentemente sua existência e sua ação.
O papel do educador nesse processo é muito importante à medida que seu principal
objetivo é direcionar as experiências dos alunos no ambiente escolar (da escola
progressiva), de modo que estas possam contribuir para o crescimento intelectual e de
valores democráticos dos alunos. Assim,
como educadores, ser capaz de julgar quais atitudes são conducentes ao
crescimento contínuo e quais lhes são prejudiciais. Deve, além disto, possuir
aquela capacidade de simpatia e compreensão pelas pessoas como pessoas, o que
habilite a ter uma idéia do que vai pela mente dos que estão aprendendo
(DEWEY, 1976 p. 30) .
A escola (e seus educadores conseqüentemente) se torna fundamental para que se
promova o progresso da sociedade, no sentido de que essa escola satisfaça os anseios da
sociedade, contribuindo para a consolidação de valores democráticos.
Outro conceito importante na teoria deweyana é o de democracia, no sentido de
ideal e não no sentido de sistema de governo, como o próprio Dewey chama a atenção. A
obra de Anísio Teixeira (e de certo modo a apropriação sofrida por este ideário pragmático
no Brasil) mostra que a democracia para este autor (e para John Dewey) era “a expressão
ética da vida”, ou seja, a estrutura em nível social, que seria a que mais corresponderia à
culminância do processo evolutivo em sociedade. Em resumo, um modo de vida, pois
encontra-se em todos os modos de associação humana em comunidade.
Para Teixeira (1956) democracia é “uma afirmação política, uma aspiração, um
ideal ou talvez uma profecia” (p. 15), podendo ser alcançada por meio da capacidade
humana de atingir uma vida associada em que todos compartilhem laços de cooperação e
solidariedade.
É importante destacar que o conceito de democracia proposta por Dewey é baseado
em um imperativo moral e não psicológico ou filosófico. A idéia de democracia é fruto do
desejo humano por uma sociedade mais cooperativa e solidária, independente de uma força
interna humana ou uma verdade incondicional do mundo, é um pensamento prospectivo de
melhoria das condições sociais reais.
Kilpatrick (1975) nos apresenta uma definição de democracia que reflete bem o
sentido atribuído por Dewey ao conceito:
Tal como deve ser concebida, a democracia é um esforço para fundar a sociedade
num princípio moral: a cada um deve oferecer-se oportunidade de
desenvolvimento e expressão individual simultânea, até o ponto máximo em que
isso seja possível (p. 28).
Deste modo, para Dewey somente em sociedades democráticas é que o indivíduo
terá liberdade para constituir e criar o espírito de solidariedade social e de
compartilhamento dos interesses comuns a todos.
Cabe destacar que o conceito de democracia de Dewey está desvinculado da idéia de
democracia como sistema político, podendo ser entendida como um ideal a ser seguido pela
comunidade e que tem em sua forma política um instrumento para se alcançar esse ideal.
Segundo Pogrebinschi:
A democracia é a solidificação das possibilidades inerentes à vida comunitária,
social; é um todo único em que se incluem as potencialidades e as capacidades
dos indivíduos que são desenvolvidas por meio de atividades cooperativas
levadas a cabo pela comunidade (POGREBINSCHI, 2004, p. 46).
O próprio Dewey (1979) nos define o que para ele é democracia:
Uma democracia é mais do que uma forma de governo; é, primacialmente, uma
forma de vida associada, de experiência conjunta e mutuamente comunicada (p.
93).
Assim, a proposição deweyana tem caráter dinâmico e diacrônico a medida que a
democracia e suas instituições democráticas só existirão se a sociedade como um todo se
empenhar para que isso aconteça, organizando o ambiente de maneira a que certas
características dos indivíduos e da civilização sejam mais desenvolvidas que outras,
alternando determinadas tradições do pensamento e ação contrárias à vida cooperativa
(CUNHA, 2001).
Desse modo podemos dizer que para Dewey a democracia é uma convicção na
capacidade humana de ter uma vida cooperativa em sociedade. Importante instrumento para
o desenvolvimento cooperativo do indivíduo é a escola que através do direcionamento das
atividades educativas na aquisição de experiências significativas, produz no indivíduo o
pensamento reflexivo e a capacidade de viver em sociedade de forma harmoniosa e
solidária.
Pensamento reflexivo está diretamente associado ao desenvolvimento dos métodos de
ensino e da própria marcha da ciência experimental, proporcionando a articulação de uma
nova ordem mundial. Assim:
Dizer que a educação é uma função social que assegura a direção e o
desenvolvimento dos imaturos, por meio de sua participação na vida em
comunidade a que pertencem, equivale, com efeito, a afirmar que a educação
variará de acordo com a qualidade da vida que predominar no grupo (DEWEY,
1979, p. 87).
Dessa forma, a educação e a escola adquirem papéis importantes na busca do ideal
democrático proposto por Dewey, a medida que é através do espaço escolar que se buscará
a internalização de valores sociais e do intelectual que propiciem a consolidação dos laços
de solidariedade e de cooperação presentes no projeto democrático. Sendo assim, a
educação então “é um processo social (...) e a construção educativa subentende um ideal
social determinado” (DEWEY, 1979, p. 106).
No tocante ao conceito de progresso, vemos que este é o cerne da própria filosofia
pragmatista, na medida em que o progresso vem a ser objetivo a ser perseguido pelos
indivíduos em sociedade, como o equivalente em nível social do que em biologia seria o
conceito de evolução na perspectiva de Charles Darwin. Seu caráter temporal e faseológico
conferem a esta categoria o aspecto instrumental ativo da sociedade e determinante do
modo de agir e de vida dos indivíduos em busca do progresso.
Ou seja, o progresso da mesma maneira que determina os rumos da sociedade de
maneira inexorável, é por sua vez determinado pelo modo como os indivíduos perseguem
este objetivo, verdadeira “teleologia social”. Para Dewey (1979) “a modalidade mais
importante de progresso consiste no enriquecimento dos objetivos anteriores e na formação
de novos fins ou objetivos” (p. 246).
Falar do conceito de progresso, nesse caso, nos remete a idéia de progresso da
ciência, pois através da evolução ciência experimental seria possível que a sociedade
pudesse forjar um projeto democrático que teria na escola o principal meio difusor dessas
idéias, hábitos e procedimentos.
Ciência experimental significa, nesse contexto, a possibilidade de se utilizar a
experiência passada e transforma-la em novos conceitos científicos, tornando a experiência
racional. Fica claro que a noção de progresso está diretamente ligada à evolução social que
tem como principal aliado o advento da ciência experimental.
Dewey nos resume bem a interligação entre as idéias de progresso e desenvolvimento
da ciência:
A ciência representa o papel da inteligência, no planejar e regular novas
experiências desenvolvidas sistemática e intencionalmente, e na escala permitida
pela emancipação das limitações do hábito. Ela é o único instrumento do
progresso consciente (distinto do acidental). E se a sua generalidade, seu
distanciamento das condições individuais, confere a ela certo tecnicismo e
segregação, muito diferem estas qualidades das especulações meramente teóricas.
As últimas estão em permanente divórcio da prática; as primeiras separam-se
temporariamente da prática para conseguir mais amplas e livres aplicações em
ulteriores atividades concretas. uma estéril espécie de teoria que é contrária a
prática; mas a teoria lidimamente científica influi na prática como fator de sua
expansão e de sua orientação, para novas possibilidades (DEWEY, 1979, p. 250).
Dessa forma, quanto mais os indivíduos se adequam à forma por excelência do
progresso - industrialismo, sistema político democrático, escola com ênfase no “aprender a
aprender” - mais rapidamente este elemento age e transforma a sociedade, constituindo
assim uma sociedade progressiva e em movimento perpétuo de avanço.
O Papel da Escola
A filosofia de Dewey inspirada no pragmatismo e aplicada à pedagogia tem como
ponto central o culto à liberdade e o desejo de promover uma organização social flexível
que permita o desenvolvimento do indivíduo em seu aspecto individual e coletivo.
A escola então passa a constituir-se como espaço privilegiado de promoção da vida
social. Nesta perspectiva, a experiência social (coletiva) cotidiana necessita de um espaço
em que possa ser planejada, organizada e conhecida pelos indivíduos, de modo que as
experiências (individuais) sejam conhecidas e sirvam de base para as experiências futuras.
Essa escola recebe a denominação de progressiva ou ativa.
Anísio Teixeira, na introdução do livro Vida e Educação de Dewey, nos define com
clareza o sentido da educação e o papel da escola:
(…) sendo a educação o resultado de uma interação, através da experiência, do
organismo com o meio ambiente, a direção da atividade educativa é intrínseca ao
próprio processo da atividade. Não pode haver atividade educativa, isto é, um
reorganizar consciente da experiência, sem direção, sem governo, sem controle.
Do contrário, a atividade não será educativa, mas caprichosa ou automática.
(Dewey, 1973, p. 22)
Dessa forma, podemos dizer que a escola é o meio organizado intencionalmente
para que as crianças possam conhecer e ampliar suas experiências relativas ao código social
existente.
Em tal perspectiva, a aprendizagem passa a ter a criança como o centro de sua
atividade, com as suas iniciativas, suas necessidades e seus interesses.
No que concerne à criança, esta constitui-se como um indivíduo social e, portanto,
seus interesses estão relacionados à dinâmica social que a circunda, de modo que a escola e
o currículo escolar devem possuir conceitos e valores práticos para que esta criança possa
praticar as atividades e as relações oriundas da própria sociedade, tornando a escola uma
espécie de sociedade embrionária na qual a criança mantém um contato estreito com o
ambiente e a realidade social do trabalho” (CAMBI, 1999, p. 550). Seu desenvolvimento
cognitivo se dará no momento de entrelaçamento entre o conhecimento teórico advindo do
progresso da ciência moderna e das pesquisas nas diversas áreas do conhecimento e do
conhecimento prático ao qual foi construído socialmente e que tem sua utilidade nas
sociedades modernas.
Para Dewey, a educação é entendida como o espaço em que ocorre a interseção da
ciência prática e teórica, de modo que os valores sejam vistos, experienciados e
sistematizados (apreendidos) em prol do progresso da vida nas sociedades modernas,
levando-as ao desenvolvimento social e econômico. É importante observar que a educação
sob a perspectiva deweyana não exclui a discussão sobre valores, pois estes tem na idéia de
democracia seu ponto de apoio. A escola progressiva trabalha a serviço da reconstrução
social, uma vez que as mudanças industriais, econômicas e as conquistas científicas
necessitam de constante revisão da ordem social. Sobre a importância da escola progressiva
nas palavras do próprio Dewey:
Cabe à educação progressiva tomar a lição dos inovadores e reformadores e
buscar, sob urgência maior e maior pressão do que qualquer dos renovadores
antigos, uma filosofia de educação fundada numa filosofia de experiência
(DEWEY, 1976, p. 18).
A escola então contribui para a formação do homem democrático
10
sendo capaz de
transformar as experiências individuais e sociais, de modo que estas caminhem para o
progresso. Assim, como observou Cambi:
Uma tarefa não secundária da escola renovada segundo os princípios da
‘educação progressiva’ é, de fato, também a de elaborar novos valores, capazes
de imprimir um desenvolvimento social na direção de um incremento dos
comportamentos inteligentes e dos intercâmbios comunicativos entre os vários
indivíduos que compõem a própria sociedade (CAMBI, 1999, p. 554).
10
Deve ser lembrada a influência evolucionista sobre o pragmatismo, pois tanto John Dewey quanto William
James (e, indiretamente Anísio Teixeira) sofreram grande influência das idéias filosóficas evolucionistas de
Spencer na formulação de seus constructos (PALMER, 2005).
Desse ponto de vista, a escola e todo o fenômeno educativo se constituiriam num
processo de construção e reconstrução das experiências, de modo que a criança possa estar
em contato com as atitudes sociais necessárias para a vida em uma sociedade democrática
rumo ao progresso. Assim, a escola tem o dever de “preparar a nova geração a crer que ela
pode e deve pensar por si mesma, ainda que, a respeito de certos pontos, seja para corrigir e
rejeitar nossas próprias conclusões” (KILPATRICK, 1975, p. 45)
É importante destacar que quando utilizamos a palavra escola não estamos falando
do modelo tradicional e livresco, extremamente criticado por Dewey. Para ele, a escola
deve dispor de algumas características relacionadas à sua filosofia, quanto à sua
organização interna, que a faça ser efetivamente um meio organizado intencionalmente para
a preparação da criança para viver em sociedade. A essa escola Dewey dá o nome de escola
progressiva ou ativa. Na Escola Progressiva, o objetivo pedagógico vai muito além da mera
transmissão de conteúdos ou da simples aprendizagem de temas, datas e outros elementos
pontuais e desconexos em relação à vida do indivíduo. Na Escola Progressiva ocorre uma
dupla gênese:
a) do modo de vida democrático, na medida em que as regras sociais são o mote
principal das regras de convivência professor-aluno e aluno-aluno;
b) da organização das experiências individuais, de modo que na Escola Progressiva o
aluno aprenderia as estruturas indispensáveis de organização do raciocínio e
autonomia que lhe possibilitariam no futuro, aprender a aprender, tendo em tais
estruturas uma “ancoragem” configurada em currículos escolares cujas atividades
educativas eram desenvolvidas tendo como elemento principal o aprendizado do
trabalho.
É no espaço escolar que se constroem experiências significativas para o indivíduo
melhor relacionar-se com a sociedade. Em outras palavras, no projeto de sociedade
democrática proposta por Dewey, a escola é instrumento de disseminação dos valores
democráticos e sociais da comunidade e, que, tem como base o advento da ciência
experimental para se alcançar o progresso em sentido amplo (progresso das instituições
sociais, da ciência que subsidia essas mudanças, progresso individual e coletivo de busca de
valores e laços comunitários).
2. A Apropriação do ideário Pragmático no Brasil dos Anos de 1955 a 1964
O período entre 1955 e 1964 foi de extrema discussão, tanto no âmbito internacional
quanto no âmbito nacional, sobre a pedagogia deweyana e seus efetivos resultados na
educação.
Segundo Mendonça et ali (2006), a apropriação do pensamento pragmático estava
inserido numa dupla polêmica: de um lado a polêmica internacional que girava em torno da
discussão da crise do modelo educacional norte-americano e seus impactos no contexto da
Guerra Fria, e, do outro lado as divergências nacionais entre o grupo católico e a figura de
Anísio Teixeira em torno da adoção da municipalização da educação, da defesa da escola
pública de qualidade, o controle do Estado sobre a qualidade do ensino, etc.
(...) o INEP, situou-se no centro de uma polêmica que, mais uma vez, confrontou
os intelectuais que propunham a transformação radical do sistema educacional e
a sua democratização através da escola pública com os defensores dos interesses
da iniciativa privada no campo educacional, ligados ao grupo católico, (...). É
significativo que, nessa mesma época, nos Estados Unidos, no contexto da
chamada “guerra fria”, o pragmatismo se encontrava no cerne de enorme
polêmica, sendo fortemente criticado à direita e à esquerda pelos seus pretensos
efeitos sobre a educação norte-americana em situação de “crise”. (MENDONÇA
et ali, 2006, p. 99)
Internacionalmente, o pensamento pragmático era acusado por seus opositores de
ser o causador dos principais males da sociedade norte-americana e de ser Dewey o
responsável pela crise que a sociedade norte-americana passava.
Ao mesmo tempo em que a discussão ganhava força no cenário internacional,
Anísio Teixeira sob a condição de diretor do INEP, promoveu uma série de iniciativas por
ocasião da comemoração do centenário de nascimento de John Dewey.
Além da realização de um ciclo de conferências sobre a filosofia educacional de
Dewey em 1959 e 1960, importantes nomes da educação nacional escreveram artigos
ressaltando a importância das idéias do filósofo para a educação nacional. Podemos
destacar, entre as tantas publicações, o ensaio de Anísio Teixeira intitulado “Filosofia e
Educação”, publicado na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Revista Educação e
Ciências Sociais
11
; o ensaio de Jayme Abreu intitulado “A Escola como Agente de
Mudança Cultural”, publicado na Revista Educação e Ciências Sociais, Revista Anhembi e
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos
12
, e, a publicação das conferências de Harold
Benjamim e John Brubacher em edição bilíngüe pelo INEP/CBPE
13
.
Em “Educação Não é Privilégio”, Anísio Teixeira ressalta que esta deveria ter um
caráter eminentemente pragmático, “voltado para as necessidades individuais e sociais”. O
caráter pragmático da educação escolar seria mediado pelo vínculo realizado pela proposta
de uma “escola progressiva”, ao qual seria um elemento de articulação entre a escola e o
mundo do trabalho, bem como pelo apoio ao ensino profissional nesse modelo de escola.
Ao propor que desapareçam as separações entre o prático e o racional, isto significaria que
o pragmatismo seria a força motriz da escola pública, mediado pela aplicação do método
experimental aos conteúdos escolares. Dessa forma: “O ensino se tem de fazer pelo
trabalho e pela ação e não somente pela palavra e pela exposição” (TEIXEIRA, 1999, p.
45).
A publicação citada, que foram conferências proferidas em Ribeirão Preto em 1956
e posteriormente incorporadas em livro, foi o estopim para a oposição a Anísio tornar-se
ferrenha. O grupo da Igreja Católica acusa Anísio de ser ateu e comunista, através de
manifestos e artigos difamando o educador.
Deste modo, percebemos a junção entre Pragmatismo e Experimentalismo
(Experimentalismo Pedagógico) na proposta de educação escolar pública do autor. Pode-se
dizer ainda que o pragmatismo se expressa na proposta de uma educação voltada para o
domínio de conteúdos relativos à realidade brasileira e às necessidades imediatas dos
indivíduos, formando e consolidando a dimensão social do caráter nacional do cidadão
11
Revista Brasileira de estudos Pedagógicos vol.32, n°75, jul/set, 1959; Revista Educação e Ciências Sociais
vol.6, n°12, nov.1959.
12
Revista Educação e Ciências Sociais vol.6, n°12, nov.1959; Revista Anhembi vol.40, n°118, set.1960;
Revista Brasileira de estudos Pedagógicos vol.34, n°80, out/dez, 1960.
13
BENJAMIM, H. A Educação e o Ideal Democrático. Rio de Janeiro: INEP, 1960.
BRUBACHER, J. A Importância da Teoria em Educação. Rio de Janeiro: INEP, 1961.
Vale observar que as ações de valorização e defesa do pensamento pragmático de
Dewey partiam do grupo de educadores que se articulavam em torno de Anísio Teixeira e,
que tinham espaço privilegiado para a difusão do ideário no interior do INEP e do CBPE. É
importante perceber que mesmo com os ecos dessa polêmica internacional chegando ao
país, o grupo de Anísio possuía além de espaço privilegiado de ação, conjuntura favorável
na política do Estado.
É que o Estado Brasileiro atuava como instrumento deliberado e efetivo do
desenvolvimento econômico por meio do qual se elevaria o padrão de vida da maioria da
população, seja pela geração de novos empregos, seja ao nível mais geral, pelo maior índice
de produtividade alcançado pela nação. A adoção de um novo estilo de vida urbano e
industrial justificou a demanda pela ampliação das oportunidades escolares e, como
conseqüência dessa demanda, a adoção de medidas mais diretivas não de ampliação das
vagas na escola pública, como também a mobilização de ações no sentido de orientar o
planejamento desse crescimento e, ao mesmo tempo, garantir a eficácia pedagógica da
escola.
A expectativa do governo JK era colocar o sistema escolar a serviço do
desenvolvimento da indústria e dos setores de serviços, ampliando a oferta de mão-de-obra
qualificada e formando quadros técnicos competentes para gerir a economia do país.
Naquilo que se refere à relação entre desenvolvimento e progresso, Anísio, assim
como os demais intérpretes dos conceitos de Dewey, defendia a idéia de progresso que se
encontra presente na proposta de uma escola progressiva que daria conta de uma escola
cujos conteúdos e métodos de ensino estariam em permanente adaptação às necessidades
individuais e sociais, acelerando o processo de integração social dos indivíduos.
Deste modo, através da escola progressiva seria criada uma “cultura do progresso”,
expressa nas atitudes dos indivíduos em nível sócio-político (desenvolvimento da
democracia representativa), e econômico (valorização do trabalho, especialmente em seu
caráter de constante transformação nas sociedades ditas modernas e industriais). Partindo
da premissa de que a escola iria formar a inteligência pronta a adaptar-se às mudanças
sociais, podemos entender como a partir da escola (pública) a sociedade se tornaria pouco
a pouco liberal” e “progressiva”. Pode-se inferir daí que ao conceber a “educação para
todos” como uma forma de construir uma sociedade justa, com integração social, a noção
de progresso estaria sendo aplicada à dimensão sócio-política e econômica da realidade
brasileira pela via da escolarização pública.
Para Anísio Teixeira, a escola tinha como pressuposto a idéia noção de trabalho
enquanto dimensão formativa do homem. Nessa perspectiva, a escola que Anísio defendia
deveria ser eficiente, adequada e bem distribuída a todos os indivíduos cobrindo as
necessidades do trabalho diversificado da vida moderna.
O desenvolvimento da escola pública (com caráter prático), manteria a ordem social
que estava sendo estabelecida com as mudanças econômicas implantadas. Assim, a escola
exerceria um rigoroso controle social legitimando e consolidando o status quo.
Desta forma, pode-se concluir que a noção de progresso se manifestaria
principalmente através da premissa de que a educação teria o objetivo de levar o indivíduo
a uma reflexão acerca das transformações pelas quais o Brasil deveria passar, tornando-o
adaptado às mesmas pelo desenvolvimento de uma “cultura do progresso” veiculada pelas
escolas públicas.
Aliado a todo o aparato econômico montado nos anos de 1950/1960 (período
desenvolvimentista), o pensamento pragmático de Anísio Teixeira e toda sua política de
ação em prol do progresso da ciência, sobretudo educacional, tinha como principal ponto de
contato a premissa de formação das camadas médias para o mercado de trabalho, bem como
da preparação permanente para a adaptação frente às mudanças do “mundo moderno”.
A idéia de progresso configura-se como o elo de ligação entre o pragmatismo e a
doutrina nacional-desenvolvimentista, pois o país alcançaria a condição de
desenvolvimento do mundo moderno (revolução tecnológica, industrial e democrática) se
tivesse suas ações planejadas em prol da superação do subdesenvolvimento, visando o
progresso. Nesse contexto, a reorganização da sociedade implicaria necessariamente na
reorganização da educação escolar pública, gratuita, e que preparasse o indivíduo para o
mundo moderno da industrialização – como pólo irradiador do pleno desenvolvimento
(criação das condições objetivas).
Assim, o ideário pragmático implantado e difundido no INEP/CBPE encontrou solo
fértil para sua atuação no cenário educacional brasileiro, pois apesar de os fins serem
distintos, tanto a apropriação do ideário pragmático no país, quanto a política
desenvolvimentista dos anos de 1950 e 1960, tinham como instrumento de ação a
racionalização e planejamento do sistema educacional e a formação de uma “consciência
comum” favorável ao desenvolvimento brasileiro.
Sobre a constituição do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e suas ações no
âmbito social e educacional, trataremos no capítulo posterior.
CAPÍTULO 3
O Projeto do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e o Contexto do INEP
1. A origem do INEP
O Instituto Nacional de Estudos e Pedagógicos (INEP)
14
é um importante órgão da
administração federal de pesquisa educacional. Sua atuação no cenário educacional passa a
ter grande importância, principalmente na formulação de estudos sobre a realidade do
sistema educacional brasileiro nos anos 50. É em 1952 quando Anísio Teixeira assume a
direção do INEP, devido à morte de Murilo Braga, que esse instituto expande sua função.
A instituição foi criada no período do Estado Novo, inicialmente sob o nome de
Instituto Nacional de Pedagogia (1936) e, posteriormente, passou a ser denominado
Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (1937).
Porém, a criação de um órgão nacional de estudos pedagógicos tem sua gênese em
idéias mais antigas, na Constituinte de 1823 em que já se pensava na criação de um
instituto encarregado da verificação dos resultados do ensino no país e na idéia de criação
do Conselho Superior de Instrução Pública, pertencente ao projeto do Ministro Paulino de
Sousa, em 1870. O órgão seria encarregado do controle e exame de questões gerais de
ensino.
Posteriormente, em 1882, o então deputado Rui Barbosa reformulou o Conselho
adicionando a idéia de um órgão específico de estudos educacionais inspirado no modelo
do Musée Pédagogique francês, sob o nome de Museu Pedagógico (posteriormente passa a
denominar-se Museu Nacional Escolar).
No período Republicano, pelo Decreto 667 de 16 de agosto de 1890, foi criado o
Pedagogium, órgão que seria o centro propulsor das reformas e melhoramentos de que
carecesse a educação nacional. A instituição se extinguiu em 1919.
É sabido que no período do Estado Novo toda a máquina estatal burocrática foi
montada e a partir da criação do Ministério da Educação e Saúde Pública em 1930, a
necessidade de um órgão de estudos pedagógicos e dos problemas educacionais se torna
14
Atualmente o instituto recebe o nome de Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira desde 2001 (Lei n° 10.269 de 29 de agosto). Optamos por utilizar a nomenclatura anterior por se
tratar de um estudo histórico.
evidente. Inicialmente essa função era atribuída à Diretoria Nacional de Educação que
acumulava as tarefas administrativas e de pesquisa.
Na gestão de Gustavo Capanema a frente do Ministério da Educação e Saúde foi
criado em 1936 o Instituto Nacional de Pedagogia, porém com a reformulação do
Ministério sob a Lei 378, de 13 de janeiro de 1937 este passou a ser Instituto Nacional
de Estudos Pedagógicos. Sua principal função era ser um órgão de estudos e pesquisas dos
problemas educacionais brasileiros que subsidiassem as políticas públicas.
Em 1938, pelo Decreto-Lei 580, o INEP define mais claramente seus objetivos:
fazer estudos educacionais e orientação e seleção de pessoal. De acordo com o Decreto, o
órgão passa a ter a competência de
a) organizar a documentação relativa a história e ao estudo atual das doutrinas,
das técnicas pedagógicas e das instituições educativas;
b) manter intercâmbio, em matéria de pedagogia, com as instituições
educacionais do país e do estrangeiro;
c) promover inquéritos e pesquisas sobre todos os problemas atinentes à
organização do ensino, bem como sobre métodos e processos pedagógicos;
d) promover investigações no terreno da psicologia aplicada à educação, bem
como relativamente ao problema da orientação e seleção profissional;
e) prestar assistência técnica aos serviços estaduais, municipais e particulares de
educação, ministrando-lhes, mediante consulta ou independente desta,
esclarecimentos e soluções sobre os problemas pedagógicos;
f) divulgar, pelos diferentes processos de difusão, os conhecimentos relativos à
teoria e prática pedagógicas.
(LEITE FILHO; SANTOS, 2006, p. 5129).
Além disso, o INEP ficou encarregado de cooperar com o Departamento
Administrativo do Serviço Público (DASP) nos trabalhos relativos à seleção,
aperfeiçoamento, especialização e readaptação do funcionalismo público da União.
Portanto, o INEP nasce com o objetivo de estudos educacionais e de orientação e
seleção profissional.
A primeira administração do órgão coube ao Professor Lourenço Filho, por
aproximadamente 7 (sete) anos, que organizou suas diferentes seções definiu suas funções e
iniciou suas atividades relativas à documentação educacional, intercâmbio e publicação de
resultados. A criação da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (RBEP) foi o grande
marco do INEP em relação à difusão e circulação de pesquisas e reflexões sobre problemas
educacionais. Aliás, a difusão de conhecimento sempre foi a grande preocupação do INEP.
Os primeiros assuntos e pesquisas versavam principalmente sobre processos de
ensino, linguagem infantil, vocabulário corrente, literatura infantil e infanto-juvenil, além
de aspectos quantitativos da educação.
Os estudos relativos à instituição do Fundo Nacional do Ensino Primário também
mereceram destaque. Foi o INEP, através de seus estudos, que encontrou os meios de
assegurar recursos para o fundo, bem como seus critérios de aplicação. O Fundo Nacional
de Ensino Primário foi criado pelo Decreto-lei n° 4.958 de 14 de novembro de 1942.
A administração posterior foi a de Murilo Braga. Podemos dizer que as marcas de
sua administração foram a construção de prédios escolares e os “primeiros passos” dos
cursos de aperfeiçoamento do magistério.
A passagem das atribuições da Diretoria do Ensino Primário e Normal (devido a sua
extinção) para o INEP, trouxe consigo a administração dos recursos do Fundo e de suas
aplicações, pois decorriam de convênio. Dentre essas atribuições estava a construção de
prédios escolares para as zonas rurais, de fronteira e de colonização estrangeira que o INEP
passou a estudar, planejar e fornecer critérios técnicos para localização e construção.
Além disso, o Fundo Nacional de Ensino Primário previa que uma porcentagem de
sua receita fosse aplicada no aperfeiçoamento de professores. O INEP criou um sistema de
cursos e de bolsas de estudos para professores que viriam ao DF freqüentar tais cursos.
De acordo com o Decreto-lei 8.583 de 8 de novembro de 1946, o INEP enfatiza
os principais objetivos dos cursos:
a) habilitar e aperfeiçoar pessoal para as funções de administração de serviços
educacionais, documentação e pesquisa pedagógica, da União, dos Estados, Territórios e
Municípios;
b) aperfeiçoar pessoal dos serviços de inspeção e orientação do ensino primário;
c) divulgar conhecimentos especializados sobre assuntos de educação;
d) incentivar o interesse pelo estudo objetivo da educação nacional.
É importante destacar que a criação de um sistema de cursos para o aperfeiçoamento
do magistério, na gestão de Murilo Braga, foi o primeiro passo dado pelo INEP para a
melhoria das condições do professorado brasileiro. Porém, o INEP não possuía condições
técnicas, naquele momento, para formar uma estrutura eficiente e dinâmica que abrangesse
o professorado brasileiro em nível nacional.
Em 1954, a Coordenação dos Cursos de Formação de Pessoal passou a ser feita pela
técnica do INEP Lúcia Marques Pinheiro que, através de relatório
15
, nos apresenta uma
visão clara das dificuldades encontradas pelo INEP para a realização dos cursos até aquele
momento.
De acordo com o relatório, entre 1947 e 1951 cerca de 500 professores concluíram
os cursos de Direção e Inspeção, Cursos de Administração, Cursos de Medidas e Testes,
Orientação Educacional e Desenho e Trabalhos Manuais. Porém, os professores
capacitados não tiveram o rendimento desejado por falta de equipe e infra-estrutura (falta
de espaço adequado para a formação dos professores); além disso, o sistema de avaliação
não teve boa receptividade por parte das Secretarias de Educação. Em 1952 e 1953, o INEP
procurou melhorar as condições efetivas dos cursos de aperfeiçoamento com a adoção de
estágios, através de convênios com diversas instituições como escolas primárias, escolas
normais, Sociedade Pestalozzi, Instituto de Pesquisas da Prefeitura, Senai, etc. A estratégia
melhorou a dinâmica dos cursos, pois permitiu aos professores maior aproximação com a
realidade. O fator negativo foi o pequeno número de orientadores de estágio capacitados e a
falta de escolas de demonstração do próprio INEP que pudessem subsidiar as ações do
órgão.
A administração de Lúcia Marques Pinheiro pode ser considerada como o início da
reestruturação dos cursos de aperfeiçoamento do magistério nos moldes da administração
de Anísio Teixeira. Uma de suas primeiras ações frente a coordenação dos cursos foi a
expansão das escolas de demonstração e o início da viabilização da criação do Centro
Experimental do INEP – a Escola Guatemala.
Sobre a gestão de Anísio Teixeira frente ao INEP, sua administração e a
reestruturação dos cursos, falaremos no próximo item.
15
Panorama de Aperfeiçoamento de Pessoal Realizado pelo INEP, s/d. Ver referências.
2. O contexto do INEP na gestão de Anísio Teixeira
Anísio Teixeira assumiu o cargo de Diretor do INEP devido à prematura morte de
Murilo Braga em 4 de julho de 1952. Além do INEP, Anísio também era diretor da CAPES
(Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), posto que ocupou
desde a criação do órgão em 1951, sob o decreto n° 29.741 de 11 de julho de 1951.
A gestão é marcada pela ênfase na pesquisa, especialmente no que se refere a sua
orientação geral de estudos, baseada na pesquisa de caráter aplicado. Anísio estava certo de
que o INEP podia contribuir com a política educacional do MEC através de estudos e
pesquisas que ampliassem as ações do Ministério.
Uma de suas primeiras ações frente ao INEP foi a produção de estudos, inquéritos e
levantamentos da situação educacional do país, desde aspectos mais internos das escolas até
dados quantitativos do sistema. A operacionalização do estudo de diagnóstico da educação
brasileira se deu através da criação de campanhas. A estratégia tinha por objetivo contar
com a cooperação de técnicos e especialistas de diversas áreas para o aprofundamento e a
amplitude necessária aos estudos e pesquisas sobre o sistema de ensino brasileiro. As
campanhas iniciaram-se pela CILEME (Campanha de Inquéritos e Levantamentos do
Ensino Médio e Elementar) e posteriormente pela CALDEME (Campanha do Livro
Didático e Manuais de Ensino).
Através da portaria 03 de 1 de abril de 1953, a CILEME foi aprovada e iniciou
suas atividades ainda no primeiro semestre do mesmo ano. O objetivo da campanha era
levantar e estudar todo o sistema de ensino primário e secundário do país, medindo sua
eficácia e apontando suas principais deficiências e dificuldades de modo que se conhecesse
a realidade da situação educacional do país. O desejo da equipe responsável e do INEP era
apresentar à opinião pública do país e à opinião especializada dos educadores o
conjunto de fatos e práticas educacionais existentes em suas escolas, o fundo
social em que se apóiam e as tendências de desenvolvimento que se
apresentam, para lhes indicar os possíveis rumos de um redireção ou
reconstrução desejáveis. (Revista Educação e Ciências Sociais, 1956, p. 20)
Em outras palavras, o objetivo principal da CILEME era a verificação objetiva da
situação do ensino médio e elementar e a avaliação da eficiência da rede de instituições
escolares e administrativas com a finalidade de melhorar a educação geral no país.
O trabalho da CILEME era realizado por uma série de projetos autônomos
(independentes do ponto de vista de suas conclusões), mas todos subordinados a uma
coordenação que estabelecia prioridades e orientava na busca de soluções aos problemas. A
estratégia de trabalho autônomo permitia aliar precisão nos objetivos e etapas a serem
cumpridas e flexibilidade nas ações, favorecendo a conclusão dos projetos em curtos
períodos de tempo e propiciando o conhecimento amplo dos problemas da realidade
educacional brasileira.
Os projetos versavam sobre alguns temas relevantes da realidade educacional do
país:
1. Levantamento de aspectos gerais da educação média e elementar;
2. Os sistemas estaduais de educação sob a ótica da organização administrativa e
técnica;
3. A organização da escola de grau médio;
4. O ensino das disciplinas nas escolas de ensino médio;
5. Conhecimento do professor de ensino médio, enfatizando suas condições sociais,
formação, condições de trabalho, etc;
6. Conhecimento do aluno do curso médio, especialmente suas condições sociais,
dificuldades, conflitos, capacidades, etc.
Entre 1953 e 1955, a CILEME preocupou-se em executar projetos relativos aos
temas acima e à publicação dos resultados dos projetos.
Uma formação mais qualificada do professorado brasileiro era uma das principais
preocupações do Anísio Teixeira. Já em seu discurso de posse, Anísio deixou claro que seu
objetivo maior frente ao INEP era a consolidação do órgão como principal centro de
referência para o magistério nacional:
(...) as funções do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos deverão ganhar
(...) amplitude maior, buscando tornar-se, tanto quanto possível, o centro de
inspirações do magistério nacional para a formação daquela consciência
educacional comum que, mais do que qualquer outra força, deverá dirigir e
orientar a escola brasileira (...).
(Discurso de Posse. In: Revista Educação e Ciências Sociais, 1956, p. 15)
Destinada a objetivar a assistência técnica ao professorado, foi criada a CALDEME
enquanto os planos de trabalho da CILEME se concretizavam. A campanha tinha como
principal objetivo prestar assistência aos professores através da produção de guias de ensino
e manuais que os orientassem em sua prática docente.
Pode-se dizer que a CALDEME era uma importante estratégia de fornecimento de
instrumentos básicos de trabalho. A campanha se aliava aos cursos de aperfeiçoamento do
magistério na prestação de assistência técnica aos professores, visto que os cursos nesse
momento ainda não tinham estrutura, recurso e pessoal especializado para atender a um
número grande de professores. Somente a partir de 1954, quando Lúcia Marques Pinheiro
tornou-se coordenadora dos cursos de aperfeiçoamento do magistério e com a criação do
Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) que a situação mudou. Sobre os
cursos falaremos mais detidamente no item posterior e no próximo capítulo.
A elaboração dos guias de ensino pretendiam que professores de todo o país
tivessem contato com as sugestões da Campanha e as aplicassem em sua prática docente.
Para isso, era necessário que os guias chegassem aos professores, porém devido ao alto
custo de distribuição. Inicialmente os guias foram distribuídos em certa quantidade aos
estados que deveriam repassá-los aos professores de acordo com seus critérios.
Os guias de ensino versavam sobre uma diversidade de temas, especialmente sobre
disciplinas do ensino médio (por se tratar do nível de ensino que as campanhas destinavam
atenção especial). São eles:
1. Zoologia;
2. Botânica;
3. Química;
4. Biologia;
5. Língua Portuguesa;
6. Matemática;
7. Física;
8. História Geral e do Brasil;
9. Francês.
Além disso, a CALDEME contava com uma coleção de obras sobre matérias de
ensino, princípios e métodos educacionais que subsidiavam os colaboradores da campanha
na confecção dos guias.
Outra realização de Anísio Teixeira foi a criação do Centro de Documentação
Pedagógica (CDP). Criada através da portaria 32 de 11 de novembro de 1953, o CDP
tinha como principal objetivo sistematizar os trabalhos desenvolvidos pelas campanhas e
por outros setores do INEP, de modo que aglutinassem documentação relevante às
pesquisas e estudos relativa às diversas temáticas educacionais e divulgassem os resultados
obtidos.
Através de seções, o trabalho do Centro consistia em organizar e acumular
documentação pedagógica, informações relativas à organização escolar, aos sistemas de
ensino, orientação educacional, publicação de material pedagógico, etc, de modo que todas
as pesquisas e estudos do INEP contassem com um espaço de socialização de informação.
Sua organização:
1. Seção de Documentação e Intercâmbio (SDI);
2. Estudos Especiais:
Seção de Inquéritos e Pesquisas (SIP);
Seção de Organização Escolar (SOE);
Seção de Orientação Educacional e Profissional (SOEP);
3. Biblioteca Pedagógica Murilo Braga (BP);
4. Museu Pedagógico;
5. Seção de Publicações.
Observando a estrutura do Centro de Documentação Pedagógica, podemos dizer que
o modelo organizativo é muito parecido com o do futuro Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais (CBPE), principalmente no tocante a autonomia das seções e, ao mesmo
tempo, sua integração frente a um objetivo comum.
Além disso, é importante destacar que ao longo do trabalho de Anísio Teixeira
frente ao INEP, ficou claro que para ele a educação brasileira necessitava de aparato
teórico-metodológico que embasasse de forma científica as políticas educacionais de
reestruturação do sistema de ensino brasileiro. Em sua visão, esse aparato era oriundo das
ciências sociais como forma de subsidiar as pesquisas e estudos educacionais e de
conhecimento da realidade brasileira. Seu intuito era criar condições objetivas para o
desenvolvimento científico, relacionando o conhecimento da realidade educacional com os
constructos teóricos oriundos das ciências sociais.
A operacionalização desse objetivo se deu através da criação do Centro Brasileiro
de Pesquisas Educacionais (CBPE).
3. A criação do CBPE e CRPE’s
Podemos dizer que a idéia de fundar a reconstrução educacional do país em bases
científicas era anterior a criação do próprio Centro e, desde a posse de Anísio Teixeira no
INEP esse desejo era perseguido. A semente de uma instituição de pesquisas educacionais
no Brasil aparece no discurso de posse de Anísio Teixeira como diretor do INEP em
1952.
Ainda em 1952, aproveitando-se das circunstâncias da visita do Dr. William Beatty,
Diretor do Departamento de Educação da UNESCO que esteve no Brasil sondando a
possibilidade de instalação de um centro latino-americano de preparação de educadores
rurais e especialistas em educação de base
16
, Anísio Teixeira em reunião com o mesmo
propôs a realização de um grande survey sobre a situação educacional brasileira feita por
especialistas da UNESCO e do país. O acordo de cooperação cnica entre a UNESCO e o
INEP estava criado.
A proposta foi aceita e as principais idéias são formuladas. Nesse momento, o
desejo de se criar uma instituição de pesquisa ganhou terreno. Em agosto de 1953, foi
16
A missão do Dr. William Beatty não foi bem sucedida devido ao fato de que no Brasil não foi encontrada
nenhuma instituição com os requisitos da UNESCO que pudesse abrigar o centro de preparação de
educadores rurais citado no texto.
redigido um relatório com sugestões sobre a organização e as finalidades da nova
instituição planejada. Em janeiro de 1954, o Dr. William Carter, chefe do UNESCO
Exchange of Persons Programme, veio ao país acertar medidas práticas sobre a vinda da
equipe estrangeira que atuaria na nova instituição que tinha o nome provisório de Centro de
Altos Estudos Educacionais. Em dezembro do mesmo ano, iniciou-se a aplicação do
convênio de cooperação técnica com a chegada do Dr. Bertrand Hutchinson, primeiro
cientista estrangeiro enviado ao país para cooperar na realização dos objetivos da
instituição que se criava.
A visita decisiva para a criação do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (a
partir de 1955 recebia esse nome em definitivo), foi do Dr. Klineberg, que em sua curta
visita ao país em abril de 1955, produziu um importante documento, chamado Documento
Klineberg, em que as principais finalidades, atividades, organização e objetivos do Centro
foram traçadas.
Assim, a partir de junho de 1955, o CBPE começou na prática suas atividades com o
planejamento de suas primeiras pesquisas, recrutamento de cientistas, organizando os
serviços administrativos e de biblioteca, instalação na sede provisória, etc.
Finalmente em 28 de dezembro de 1955 sob o Decreto n° 38.460, foi criado
oficialmente o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais
17
e seus respectivos Centros
Regionais. A instituição surgiu com a função de atuar na análise da estrutura social do país
em mudança. Sua principal característica era a aliança entre as pesquisas sócio-
antropológicas e educacionais num movimento de retroalimentação em que as ciências
sociais forneceriam as bases científicas de análise para a realidade educacional e esta se
incumbiria de utilizá-las como metodologia para a solução dos problemas, culminando
assim no desenvolvimento de ambas as áreas de conhecimento (XAVIER, 1999).
Sendo mais um braço de atuação” do INEP, o CBPE surgiu com a função de
desdobrar a atuação do órgão, assim como um viabilizador da função específica que o
INEP adquiriu com a direção de Anísio Teixeira: estudos e pesquisas educacionais
aplicadas ao aperfeiçoamento do magistério.
17
O Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) tinha sua sede localizada no Distrito Federal (DF) à
Rua Voluntários da Pátria, 107 em Botafogo. Atualmente o prédio é ocupado pela Faculdade de Direito da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).
O projeto do CBPE encaixa-se no idioma geral de uma época que se expressa na
temática educação/planejamento/desenvolvimento. Suas ações buscavam a reestruturação
qualitativa do nosso sistema educacional, em bases científicas.
A montagem dessa instituição tinha dois eixos gerais de atuação:
a) o primeiro, se refere à produção de um conjunto de procedimentos de pesquisa
que permitisse conhecer a real situação da realidade educacional brasileira, de modo a
subsidiar as ações do MEC/INEP no âmbito do planejamento e da reestruturação do sistema
de nacional de ensino;
b) o segundo eixo consistia em proporcionar aos professores o acesso aos resultados
das mais variadas pesquisas educacionais, além da possibilidade destes desenvolverem
estudos e experimentações pedagógicas, proporcionando uma nova visão educacional que
os levassem a uma auto-reflexão de sua prática.
O Centro Brasileiro tinha papel de extrema importância no projeto de Anísio
Teixeira, pois era uma instituição que trabalharia em constante integração com o INEP e,
por ser uma instituição nova e em moldes diferentes das demais, poderia atuar no campo do
planejamento e da ação educacional de forma mais “livre” devido ao fato de não ter uma
estrutura que favorecesse a burocracia estatal. Seu organograma nos permite visualizar uma
estrutura diferenciada:
INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS
18
Diretor
Centros Regionais de
Pesquisas
Educacionais
Centro Brasileiro de
Pesquisas Educacionais
Comissão Consultiva
DIREÇÃO DO PROGRAMA
Secretaria Executiva
Serviços Administrativos.
Assim, o CBPE correspondeu à tentativa empreendida por Anísio Teixeira de se
formar no Brasil o “espírito científico” no âmbito do magistério, ou seja, a formação de um
estatuto científico à educação, aliando política, planejamento e a formação de professores
para a mudança interna da escola, respeitando as diferenças culturais de cada região e,
dessa forma, garantindo o desenvolvimento do país através da intervenção na realidade
educacional.
Para que este projeto alcançasse o nível de abrangência nacional, foram criados
também os Centros Regionais
19
, que tinham a mesma estrutura organizacional e
18
Extraído de: Plano de Organização do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e Centros Regionais.
Revista Educação e Ciências Sociais. ano I, vol.1, nº 1, março/1956, p. 53.
Divisão de Estudos e
Pesquisas Educacionais
/ DEPE
Divisão de Estudos e
Pesquisas Sociais / DEPS
Divisão de Documentação e
Informação Pedagógica / DDIP
Divisão de Aperfeiçoamento
do Magistério / DAM
desenvolvia atividades e pesquisas regionais visando a melhoria das condições do
professorado em geral de cada uma dessas regiões.
Para Anísio Teixeira, a construção dos Centros objetivava promover uma série de
medidas no âmbito da pesquisa e planejamento que servissem de subsídio para a
reestruturação do campo educacional de modo que este dispusesse de um estatuto científico
e assim se inserisse no campo intelectual e de progresso da ciência.
Dessa forma, o CBPE precisaria contar com ampla atuação em diferentes níveis
para dar conta de seu objetivo principal que era o desenvolvimento das pesquisas
educacionais no país. Para isso o Centro teria sua atuação calcada em três níveis:
1. política e planejamento;
2. treinamento e aperfeiçoamento do magistério;
3. no âmbito da escola (caráter interno) “formação do espírito científico”.
No nível da política e do planejamento a atuação do CBPE estaria ligada ao
desenvolvimento de pesquisas científicas, seja no âmbito das ciências-sociais, seja no
âmbito educacional, de modo que estas fornecessem um panorama geral do país enfocando
as diferenças regionais de caráter social, educacional e econômico. A idéia era fazer com
que a pesquisa servisse de subsídio para o planejamento e formulação de políticas públicas
de atuação no sistema educacional como um todo, respeitando as particularidades de cada
região do Brasil.
No tocante ao treinamento e aperfeiçoamento do magistério, o CBPE teria uma
atuação referente ao que Anísio chamou de formação do espírito científico dos professores,
além de papel central na política do INEP. Tratava de proporcionar aos professores, através
de cursos oferecidos pelo INEP/CBPE, o acesso a novas metodologias de ensino, pautadas
nos princípios científicos das ciências sociais, de forma a contribuir para a melhoria da
prática docente. Era a tentativa de se estabelecer um estatuto científico à educação, sob a
perspectiva experimentalista do pragmatismo deweyano que propunha o rompimento com a
concepção intelectualista e defendia uma nova forma de promover a práxis educacional.
19
Os Centros Regionais de Pesquisas Educacionais foram criados em: Pernambuco, São Paulo, Rio Grande
do Sul, Minas Gerais e Bahia, além do Centro Brasileiro que estava localizado no Rio de Janeiro. (XAVIER,
1999)
No âmbito do ensino, os Centros Regionais e o Centro Brasileiro atuariam no nível
mais interno do processo educacional, com a implementação de escolas experimentais que
funcionariam como espaço formal de experimentação de novas metodologias de ensino,
testando novos programas, currículos e materiais didáticos, além de proporcionar cursos
aos professores, para habilitá-los a trabalharem com essas inovações.
Todos os Centros Regionais, e também o Centro Brasileiro, possuíam um conjunto
de divisões autônomas que atuavam em diversas instâncias educacionais, além de contar
com uma divisão que tratava exclusivamente dos estudos e pesquisas em ciências sociais.
Assim, sem contar com uma função diretora sobre os demais Centros, o CBPE era o
principal órgão do sistema de estudos e pesquisas em que se desdobra a atividade do INEP
por todo o país. São elas:
Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais (DEPE);
Divisão de Estudos e Pesquisas Sociais (DEPS);
Divisão de Documentação e Informação Pedagógica (DDIP);
Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério (DAM);
Cada Divisão tinha seu trabalho desenvolvido de forma autônoma, mas com
integração entre as pesquisas e temas de estudo, em prol da construção de um estatuto
científico à educação. O CBPE pode ser entendido como uma estratégia de intervenção na
realidade educacional do país para a renovação do ensino, no sentido de formar uma rede
de conhecimentos que pudessem superar os entraves educacionais que o Brasil vivia.
A DEPS e a DEPE tinham um papel importante nesta proposta, pois eram
responsáveis por desenvolver as pesquisas sócio-antropológicas e educacionais num
processo de integração entre os objetos de estudos e resultados de pesquisas. Deste modo,
as pesquisas realizadas em ciências sociais seriam utilizadas como instrumento de
intervenção na realidade educacional do país, sendo subordinada ao campo da educação
para dar cientificidade aos estudos da realidade educacional. Era a tentativa do Centro de se
formar uma identidade epistemológica à educação. Para ele, importava garantir ao mesmo
tempo a distinção dos campos do saber e a união dos mesmos quanto à aplicação de
conhecimentos. O Plano de Organização do CBPE comprova essa perspectiva ao
estabelecer que:
A pesquisa em ciências sociais realizada dentro do Centro deve
subordinar-se em princípio aos interesses e objetivos da ação educacional
(...) Em contrapartida, a pesquisa educacional deve ser explorada de
maneira que permita o aproveitamento regular dos resultados da pesquisa
em ciências sociais. (Plano de Organização do Centro Brasileiro de
Pesquisas Educacionais e Centros Regionais, 1956)
Entre as principais atividades dessas divisões cabe destacar as pesquisas relativas a
diversos temas educacionais, a preparação de inquéritos e levantamentos das situações
educacionais de diversas regiões, e, as atividades editoriais das divisões que publicavam
sob a chancela MEC/INEP/CBPE diversas obras relativas à didática, guias de ensino
secundário, livros-textos, livros-fontes de caráter sociológico e pedagógico para professores
e alunos do ensino superior, etc
20
.
O Centro também contava com a publicação da revista Educação e Ciências Sociais
e do Boletim do CBPE. A finalidade da publicação desse periódico era a divulgação das
atividades de pesquisa do Centro e a circulação de conhecimentos especializados sobre
diversas temáticas educacionais.
Dividida por seções, a revista era composta por: a) o editorial, b) a seção Estudos e
Pesquisas, em que trazia artigos e ensaios de pesquisas realizadas pelo Centro e sobre temas
importantes relacionados à educação, c) seção Documentação, em que eram divulgadas
notícias sobre as atividades do Centro e dos Centros Regionais, assuntos relacionados ao
cenário educacional brasileiro, reprodução de convênios e parcerias feitas entre o CBPE e
diversas instituições nacionais e estrangeiras. A revista teve uma vida curta, com a
publicação de 21 (vinte e um) números entre os anos de 1956 e 1962.
A DDIP tinha como principal atribuição a formação de um sistema de informação
pedagógica de modo a atender a demanda bibliográfica dos professores e profissionais da
educação como um todo.
20
Sobre as obras editadas pelo MEC/INEP/CBPE no período de 1955 a 1965 consultar o relatório de pesquisa
intitulado: “Espaço Anísio Teixeira: referência para a pesquisa educacional no Brasil”, sob a coordenação de
Libânia Nacif Xavier, PROEDES / UFRJ, 2004. Em anexo, a lista de livros publicados pelo INEP/CBPE ao
qual nos referimos.
Assim, o CBPE contava com uma biblioteca que no ano de 1963 possuía 41.691
volumes registrados entre livros, revistas nacionais, revistas internacionais e folhetos
21
.
Além disso, contava com a Seção de Documentação e Intercâmbio em que se
mantinham atualizações da legislação educacional vigente e resultado de pesquisas, em
convênio ou não, com instituições internacionais especializadas.
Havia também o Serviço de Bibliografia que, além do serviço de levantamento
bibliográfico de obras, artigos e documentos relativos a temas educacionais, elaborava a
Revista Bibliográfica Brasileira de Educação em que se divulgava o trabalho de
levantamento bibliográfico executado.
A idéia era que a biblioteca do CBPE fosse a maior sobre a temática educacional de
América Latina, contendo títulos nacionais, estrangeiros, resultados de pesquisas, trabalhos
universitários, relatórios ministeriais, etc.
A DAM era a divisão responsável pelo desenvolvimento de projetos ligados a
formação de professores, especialistas em educação (orientadores, administradores
escolares) e professores de escolas normais com cursos de aperfeiçoamento do magistério.
Também era a DAM que supervisionava as atividades das Escolas Experimentais
existentes, sendo responsável pela implementação de novas metodologias que
proporcionassem aos alunos dessas escolas uma educação eficiente e adequadas as suas
necessidades sociais
22
.
Acrescido a isso, a DAM também realizava estudos, inquéritos e levantamentos
relativos a temas específicos da educação no sentido se subsidiar suas ações de intervenção
no tocante ao aperfeiçoamento do magistério, seja no âmbito dos cursos oferecidos, seja no
âmbito da intervenção pedagógica direta através da Escola Guatemala
23
.
A Divisão também atuava em parceria com a CALDEME nos projetos de
publicação de guias de ensino, sobretudo aos professores primários, de modo a contribuir
na melhoria de sua prática docente.
21
Súmula de atividades em 1963. Ver referências.
22
Apenas o CRPE da Bahia e o CBPE no Rio de Janeiro mantinham escolas experimentais, sendo o Centro
Educacional Carneiro Ribeiro e a Escola Guatemala as escolas de cada Centro respectivamente.
23
Sobre a Escola Experimental do INEP – Escola Guatemala – iremos discorrer no próximo capítulo.
As ações da DAM tinham papel central no projeto do CBPE, à medida que as ações
ali desenvolvidas constituíam-se como o primeiro passo para a formação do que Anísio
chamava de espírito científico nos professores.
Esperava-se que através dos cursos os professores entrassem em contato com as
inovações pedagógicas propostas pelo Centro e se tornariam multiplicadores das inovações
e das práticas pedagógicas baseadas no arcabouço teórico metodológico da ciência, já que a
maioria dos cursos contava com a presença de alunos de outros estados e regiões do país.
Sobre a DAM e os cursos de aperfeiçoamento do magistério ministrados pela
Divisão, abordaremos no próximo capítulo a fim de se compreender como tal modalidade
de estratégia pedagógica se dava no âmbito da formação continuada do professor brasileiro,
sobretudo primário.
CAPÍTULO 4
A DAM e sua Estrutura: objetivos e ações
1. A Atuação
O projeto do CBPE buscava criar um estatuto científico para a educação
fundamentado no experimentalismo e possuíam papéis importantes. Nesse capítulo
discutiremos sobre as ações e objetivos da Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério
(DAM) para que, assim, possamos compreender seu papel estratégico.
A DAM era a Divisão responsável pelo desenvolvimento de projetos de
aperfeiçoamento do magistério, não apenas de professores de escolas normais, mas de
administradores, orientadores e especialistas em educação. Os projetos de aperfeiçoamento
do magistério tinham basicamente três eixos de atuação:
a) cursos de aperfeiçoamento do magistério oferecidos a professores (sobretudo
primários) e profissionais de educação;
b) política de publicações de livros e guias de ensino que auxiliassem os professores
de todo o país em sua prática;
c) manutenção de escolas e classes experimentais que servissem de espaço
privilegiado de produção e testagem de metodologias.
Aliado aos três eixos também havia dedicação a estudos e pesquisas com o
desenvolvimento de inquéritos e levantamentos sobre temas educacionais específicos de
modo a subsidiar as ações citadas
24
. Assim a circulação dos conhecimentos produzidos pelo
Centro e adquiridos pelos professores através da aquisição de livros e/ou da participação
em um curso, proporcionava ao professorado brasileiro contato com as inovações
pedagógicas e estudos científicos relativos às temáticas educacionais.
24
Os estudos e pesquisas citados tinham como principal objetivo subsidiar a DAM com dados da realidade
que dessem conta da demanda específica que surgia ao longo da elaboração e execução de suas atividades.
Esses estudos não possuíam caráter sistêmico, eram desenvolvidos apenas como forma de suprir as
necessidades da Divisão e não tinham interferência nos estudos das demais Divisões.
De acordo com Xavier (2000), a posição estratégica e de destaque que a Divisão
ocupava tanto no projeto do CBPE quanto nas políticas de intervenção educacional do
INEP se deve ao próprio contexto da época, pois naquele momento, promover a
profissionalização do magistério como um todo para lidar com a complexidade da
sociedade moderna e garantir o caráter globalizante da atividade educativa se fazia
necessário.
A Súmula de atividades do INEP e dos Centros Regionais
25
, publicada em 1963 e
assinada por Péricles Madureira de Pinho (então diretor substituto do INEP ao Ministro da
Educação), é um bom exemplo da atuação da Divisão, pois nos uma visão geral das
atividades desenvolvidas pela DAM:
a) Supervisão das atividades do 1º Centro Experimental de Educação Primária do
Estado da Guanabara (Escola Guatemala);
b) Cursos de formação de professores supervisores e de pesquisa em psicologia;
c) Estudos sobre programas de ensino primário, o professorado primário do Estado da
Guanabara, a psicologia necessária ao professor que se inicia na profissão, fatores
que influem na aprendizagem da matemática na escola primária;
d) Preparação de ficha básica de observação para o cadastro do professor;
e) Preparo do Guia de Ensino da Matemática na Escola Primária (2º e 3º anos),
Estudos Sociais (6º ano), Linguagem e Ciências Naturais;
f) Publicação sobre Ensino Dirigido na Escola Elementar, a qual consubstancia a
experiência realizada nesse setor no Centro Experimental de Educação Primária
do INEP;
g) Publicação da 2ª edição do Guia de Ensino de Matemática na Escola Primária, com
10.000 exemplares.
Destacamos que toda a atividade da DAM acima relacionada tinha como objetivo
influir na melhoria do ensino do país como um todo. Os cursos de formação e
aperfeiçoamento dos professores atuavam num esforço de produção e irradiação de
conhecimentos por todo o país.
25
Ver referências.
2. Principais ações
As ações da Divisão giravam em torno da melhoria do professorado brasileiro com
ações integradas que visavam promover a profissionalização do magistério, bem como sua
valorização frente à sociedade moderna e industrial que se formava no período.
Essas ações podem ser entendidas como estratégias de intervenção pedagógica
implementada pelo INEP/CBPE para a melhoria da qualidade docente no período.
Destacamos três ações que julgamos relevantes nesse estudo: a política de publicações, a
manutenção de escolas experimentais e os cursos de aperfeiçoamento do magistério.
A Política de Publicações
Apesar do CBPE contar com as divisões relativas aos estudos e pesquisas
educacionais e sociais, a DAM possuía também uma política de publicações de livros com
temática pertinente a prática de ensino e a orientação pedagógica do professorado em sala
de aula.
Suas publicações eram distribuídas aos professores gratuitamente, através de duas
formas:
1. distribuição às Secretarias de Educação dos Estados e Municípios, para que
fossem enviadas a escolas e/ou bibliotecas que cada unidade da federação
julgasse pertinente;
2. distribuição aos professores e profissionais da educação que concluíam os
cursos de aperfeiçoamento do magistério de uma coleção das obras
publicadas pelo INEP/CBPE, para que cada um se apropriasse do
conhecimento produzido pelo Centro e se tornasse multiplicador da
experiência em sua cidade de origem.
O documento intitulado Sugestões para o Programa de Publicações, em papel
timbrado pelo MEC e assinado por Lúcia Marques Pinheiro
26
, nos bem a medida da
importância atribuída ao programa de publicações como um instrumento de formação
docente:
26
Sugestões para o Programa de Publicações, s/d. Ver referências.
No momento em que o Governo Federal está empenhado no programa da
melhoria do ensino, parece essencial o estudo de medidas que venham permitir
que a ação supletiva que lhe cabe nesse sentido seja exercida com maior
plenitude. Sendo o livro um dos instrumentos que melhor podem contribuir para
esse objetivo, julgamos oportuno fazer sugestões para o encaminhamento do
problema das publicações de orientação do professor (s/p).
É interessante observar que a preocupação com a orientação do professor em sua
prática docente era um tema que se fazia presente na lista de prioridades de Anísio Teixeira.
Esse fato se confirma com a reedição de Guias de Ensino de 1934 e 1935 (quando Anísio
Teixeira foi Diretor da Instrução Pública do Distrito Federal) que o INEP/CBPE/DAM em
parceria com a CALDEME promoveram. São eles:
Linguagem na Escola Elementar;
Matemática na Escola Elementar;
Ciências na Escola Elementar;
Ciências Sociais na Escola Elementar;
Jogos Infantis na Escola Elementar.
Capa dos Guias de Ensino de 1934 e 1935 que foram reeditados pelo MEC/INEP/CBPE
27
27
Fonte: CD Rom da pesquisa “Espaço Anísio Teixeira: referência para a pesquisa educacional no Brasil”.
Rio de Janeiro: UFRJ, 2004.
Como forma de ilustrar o tipo de obras que a Divisão, em parceria com o INEP,
produziu podemos citar o Guia de Ensino Ensinando Matemática à Criança, o Guia Estudos
Sociais na Escola Primária – 1º ao 4º ano. Ambos são resultados dos estudos e das
experiências ocorridas na Escola Guatemala (1°Centro Experimental do INEP).
O primeiro se trata de um guia de orientação do professor primário nas atividades
do ensino de matemática. A nota prévia do livro (p. 5) nos resume com clareza o objetivo
da obra:
Publicação do CBPE (INEP) e elaborado pela Divisão de Aperfeiçoamento do
Magistério constituiu este volume o primeiro de uma série de três Guias de
Ensino que se destinam a orientar o professor primário nas atividades do ensino
de Matemática.
Acreditamos em sua utilidade para as Secretarias de Educação, especialmente na
parte relativa à organização de programas para o 1º ano, levando em conta as
diferenças individuais e permitindo a renovação do sistema de promoção,
indispensáveis à melhoria do ensino primário. (MEC/INEP/CBPE, 1963).
O segundo sugere recomendações ao professor, bem como a linha geral de
orientação da matéria nos vários anos escolares, e atividades que despertem o interesse das
crianças. As recomendações do livro foram testadas na Escola Guatemala e outras classes
experimentais em Minas Gerais e na Bahia.
A apresentação esclarece o objetivo do livro:
Além de indicar ao professor a linha geral de orientação da matéria nos vários
anos escolares, e também os recursos para isso necessários, procurou se, na
presente publicação, incluir informações mais precisas sobre o conteúdo a
desenvolver. Não com o intuito de conduzir os professores numa única direção –
pois que o cunho pessoal dado pelo mestre ao seu trabalho é o que torna,
realmente, educativo – mas no de mostrar como se podem correlacionar os
assuntos e as atividades sugeridas, no sentido de formarem um todo orgânico e
significativo, que possa atingir objetivos amplos, e que seja de interesse para a
criança. (MEC/INEP/CBPE, 1964, p. 7).
Pode-se dizer que a política de publicações feita pela DAM constituiu-se numa
importante estratégia de disseminação do ideário do Centro, pois se configurou como
importante instrumento formativo do professor, sendo uma forma de levar as inovações e
experimentações pedagógicas para todas as regiões do país.
A Escola Experimental do INEP
No Rio de Janeiro, a Escola Guatemala
28
, inaugurada pelo governo do Distrito
Federal, em abril de 1954, tornou-se Centro Experimental de Educação Primária do
INEP em 15 de maio de 1955 através de convênio com a Secretaria de Educação do Distrito
Federal. Seu objetivo primordial era a produção e testagem de metodologias experimentais
de ensino que contribuíssem para a melhoria do sistema escolar.
Localizada na Praça Presidente Aguirre Cerda, 55, no bairro de Fátima, centro do
Rio de Janeiro. A escola funcionava em horário integral para os alunos e professores que
além da regência nas classes, recebiam professores bolsistas de outros estados e
participavam de cursos de atualização e encontros de avaliação promovidos sob a
supervisão do INEP, acompanhando o trabalho pedagógico ali desenvolvido.
Administrativamente, a escola era subordinada a Secretaria de Educação com
responsabilidade sobre as matrículas dos alunos, relação de pessoal, avaliações, etc. A
cessão da escola ao INEP ocorreu apenas no âmbito pedagógico, já que
administrativamente mantinha-se sob a gestão da Secretaria de Educação.
28
Atualmente a Escola Guatemala faz parte do sistema de ensino da cidade do Rio de Janeiro, sem manter
nenhuma ação ou medida remanescente do período em que foi o 1° Centro Experimental do INEP (de 1955 a
1975).
Fachada da Escola Guatemala atualmente.
29
O experimento ocorreu sob a supervisão de Lúcia Marques Pinheiro, coordenadora
da DAM, que passou a ser a responsável por introduzir uma nova metodologia de
aprendizagem, pelo apoio pedagógico aos professores da escola e pela orientação dos
cursos do INEP/CBPE na escola, recebendo alunos bolsistas de diversas regiões do país.
No início das atividades da escola como experimental houve resistência por parte
das professoras regentes ali lotadas, antes da escola tornar-se experimental. Tal fato deveu-
se a não adaptação ao trabalho desenvolvido, provavelmente por não estarem preparadas
para atuar num experimento que requeria competências específicas e tempo disponível de
estudo. A maioria das professoras regentes da escola pediram transferência e, outras,
recém-formadas, foram convidadas a participar do experimento, dispostas a conhecer uma
nova forma de trabalho pedagógico.
Segundo Passos (1996), a escola necessitava de profissionais que endossassem a
proposta e demonstrassem interesse na implementação da mesma. Para isso, um grupo de
professoras fizeram a opção de participar de uma experiência inovadora: a prática
pedagógica através de pesquisa. Essa medida mais radical, por assim dizer, foi tomada
devido ao fato de que as professoras regentes da escola não se adaptaram ao novo modelo
de gestão pedagógica e a utilização de metodologia de ensino experimental.
A Divisão, juntamente com o INEP e através de parcerias com Secretarias de
Educação e órgãos internacionais, ofereciam cursos de aperfeiçoamento do magistério a
29
Fonte: Secretaria Municipal de Educação da cidade do Rio de Janeiro. Disponível em:
www.rio.rj.gov.br/sme.
professores de todo o país. Esses cursos contavam com professores bolsistas, escolhidos
por diversos critérios de seleção, que se deslocavam de suas regiões para os diversos
CRPEs e para o CBPE com o intuito de adquirirem conhecimento especializado em uma
determinada temática.
Esta atividade da escola estava diretamente relacionada à formação e
aperfeiçoamento do magistério, pois cada aluno-bolsista que ali estagiava, tinha a
oportunidade de estar em contato direto com uma experiência educacional nova,
experimental, que poderia servir de exemplo bem sucedido para a generalização em todo o
país.
Os alunos-bolsistas permaneciam na escola no período da manhã acompanhando as
turmas e as professoras. No início da tarde freqüentavam os cursos do CBPE e, no fim da
tarde, retornavam à escola para as reuniões conjuntas com os especialistas do INEP e as
professoras regentes. Os alunos bolsistas participavam intensamente do cotidiano da escola,
sem que os professores regentes tivessem receio de “mostrar” seu trabalho, pois toda a
atividade pedagógica era discutida, refletida, pesquisada e orientada pelas técnicas do
INEP.
As atividades artísticas e culturais tinham grande importância para a escola, com
várias salas destinadas a essas atividades e a utilização racional dos espaços para esse fim,
configurando-se numa filosofia de educação que pretendia o desenvolvimento global do ser
humano, em seu aspecto cognitivo, motor e social.
Com cerca de oitocentos alunos à época, a escola funcionava em horário integral
(7h30 min. às 16h), sendo que os alunos estudavam até às 15h, quando eram dispensados e
os professores permaneciam até às 16h para participarem de reuniões, cursos de
atualização, encontros de avaliação e palestras visando o aperfeiçoamento de seu trabalho
pedagógico. As turmas de e série estudavam apenas em um período, sem participar
das atividades complementares por ficarem cansadas com o período integral, experiência
incomum à época. O INEP fornecia alimentação (almoço) aos professores, funcionários e
alunos que não podiam ir para casa almoçar e a merenda era fornecida pelo Instituto Annes
Dias
30
.
30
O Instituto de Nutrição Annes Dias atualmente é o órgão normativo e regulador do município para ações de
alimentação e nutrição. È o órgão responsável pela elaboração, assim como a supervisão e execução de
procedimentos relativos a segurança alimentar das escolas do município do Rio de Janeiro.
Alunos da 4ª série assistindo uma apresentação cultural no auditório da Escola Guatemala
31
.
A estrutura organizacional apresentava-se da seguinte forma:
1 Diretora;
2 Subdiretoras;
1 Orientadora Pedagógica Geral;
5 Orientadoras, uma para cada série;
18 Professoras Regentes;
7 Professoras especializadas em atividades complementares;
4 Turmas de alfabetização;
3 Turmas de 1ª série;
3 Turmas de 2ª série;
3 Turmas de 3ª série;
2 Turmas de 4ª série;
2 Turmas de 5ª série.
31
Foto cedida a esse estudo e pertencente ao arquivo pessoal da professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro.
O efetivo de alunos era distribuído pelas turmas (com um número médio de 35
alunos por turma) levando em conta a faixa etária das crianças, sem haver nenhum teste de
nivelamento dos conhecimentos dos alunos, formando turmas heterogêneas,
multiculturais
32
.
A proposta pedagógica da escola partia do pressuposto de que a instituição escola
deveria preparar o homem para a vida do trabalho e para a vida social em geral, desde
aspectos relativos ao exercício da cidadania, desenvolvimento do espírito da vida
democrática, até a capacidade de usar bem as horas de lazer através de ações práticas que se
assemelhassem à vida cotidiana. Portanto:
Uma experiência é educativa quando dela decorre uma transformação da
maneira de ser de que o indivíduo é consciente. (XII Conferência
Nacional de Educação, 1956).
Assim, o projeto pedagógico da escola considerava o ser humano como um ser
global, não podendo pensar sua formação de maneira fragmentada e desconectada da vida
cotidiana, apenas com o trabalho pedagógico intelectualista e baseado na cópia e
memorização. Seu principal objetivo era a formação de hábitos, atitudes e gostos para uma
melhor integração na vida social, ou seja, o que chamamos hoje de cidadania. Note que o
objetivo principal do trabalho pedagógico da escola tinha forte semelhança com os
objetivos do INEP/CBPE e de todo o projeto pessoal de Anísio Teixeira, no que tange a
formação de bases científicas sólidas na sociedade para que esta estivesse preparada para o
progresso.
Portanto, a escola tinha como filosofia de trabalho o pragmatismo deweyano, cuja
noção de experiência para a construção do ideal democrático era fundamental.
O método ativo de aprendizagem utilizado na Escola Guatemala era o Método de
Projetos. Esse método atendia plenamente a filosofia da escola, baseado numa educação
32
A Escola possuía uma clientela de alunos oriundos do próprio bairro e suas adjacências, todos pertencentes
às classes populares e muitos vindos transferidos das escolas da área que estavam saturadas, num intuito de
proporcionar a essas crianças a oportunidade de participarem de um projeto experimental em que as mais
novas metodologias de ensino estavam sendo testadas, de modo a se obter uma escola pública de qualidade. A
experiência deveria ser generalizada para toda a rede de ensino posteriormente, porém com o fim do convênio
em 1975 o trabalho da Escola Guatemala caiu no esquecimento das políticas públicas, mas permaneceu vivo e
ativo nos que tiveram a oportunidade de participar daquela experiência. PASSOS (1996).
que visava o desenvolvimento global do ser humano para que este pudesse manter uma
atitude democrática frente à vida e a sociedade.
O método consiste basicamente na criação de situações e experiências pautadas na
vida social cotidiana. As escolhas de situações são derivadas do interesse das crianças,
levando-as a realizar o esforço necessário para que esta situação seja superada, ou seja,
levando-as a conhecer a situação, pensar e refletir acerca do assunto para se chegar a uma
conclusão e, conseqüentemente, a aprendizagem. Dessa forma, o objetivo é alcançado
levando a resultados como informações, habilidades, hábitos, atitudes e ideais, criando
nova motivação e interesse em novas situações cada vez mais complexas, passando por
sucessivos estágios de aperfeiçoamento através da reconstrução de suas próprias
experiências. Podemos dizer que projeto é uma atividade nascida de um problema e levada
à completa realização em seu ambiente natural. Então:
Os projetos, porque são situações naturais e complexas, oferecem
oportunidades para o ensino da Linguagem, da Matemática, dos Estudos
Sociais, Naturais, etc. A questão principal é selecionar a qualidade das
experiências a serem vividas pelas crianças. (O Método de Projetos na
Escola Experimental do INEP, 1956).
De forma breve, as principais características do Método de Projetos são:
Situação Problemática gera a curiosidade, apelando para os recursos das
experiências anteriores e para a capacidade de pensar;
Intenção, propósito – a vontade e o desejo sentido pelo aluno em solucionar a
situação problemática;
Realização dentro do ambiente natural local que seja o mais próximo da vida
social cotidiana do aluno.
As atividades num projeto decorrem da necessidade e do desejo sentido pela criança
em solucionar e experenciar uma situação, levando-a a ação. A ão decorre de um
planejamento e de objetivos bem definidos pelo professor de modo que a atividade seja
significativa para aquele grupo escolar.
Assim, as crianças adquiriam conceitos culturais e valores sociais através do trato de
situações problemáticas reais que surgiam nas discussões das prováveis soluções, na
cooperação, no senso de responsabilidade, na liberdade de ação, etc. Os conceitos se
estruturavam e se internalizavam sob a forma de atitudes e ideais de vida.
Podemos citar como exemplo de projetos ocorridos na Escola Guatemala: o Banco
do Estudante, a Lojinha de Doces, Papelaria Mirim, Correio Escolar, Jornal Quetzal.
O funcionamento do projeto Banco do Estudante na Escola Guatemala.
33
De acordo com a filosofia de trabalho da escola, o Método de Projetos apresentava
vantagens em relação às demais metodologias de aprendizagem utilizadas, pelo fato de
exigir do professor um planejamento consciente e seguro para atender as necessidades do
grupo.
Ao que tudo indica, a Escola Guatemala utilizou uma metodologia inovadora e
original em relação às demais escolas do país à época. Além de ser um centro experimental
onde se construíam e testavam metodologias de ensino até então inovadoras e originais, a
escola tinha a função de difundir a filosofia daquele projeto experimental, como pode ser
visto na citação abaixo, que justifica a escolha do Método de Projetos:
O Método de Projetos veio como uma reação ao trabalho formal da escola.
Pretende reconciliar a vida com a educação, a fim de trazer para a escola as
33
Fonte: GAUDENZI, L. C. Banco do Estudante, Método de Projetos. Rio de Janeiro: INEP/CBPE, 1974.
próprias situações que a vida oferece. É um processo de trabalho que favorece a
criação de situações reais ricas de experiência ou atividades estimuladoras do
interesse, fator de uma participação ativa e consciente. (O Método de Projetos na
Escola Experimental do INEP, 1956) [GRIFO DO TEXTO].
A citação reflete o pensamento pragmático que orientava todo o projeto educacional
de Anísio Teixeira e o pensamento impresso nas instituições que ele dirigiu e criou, como o
INEP e o CBPE. A própria Escola Guatemala exercia função estratégica na consolidação
desse projeto, sendo o elo de ligação entre a pesquisa educacional e a prática docente
calcada em bases científicas. Dessa forma, o professor não se configurava como um mero
transmissor de conhecimentos, mas um agente que produzia conhecimento partindo da
realidade escolar, levando em conta o interesse dos alunos numa integração rumo ao
aprendizado.
Assim, o funcionamento da Escola Guatemala, mantida pelo INEP/CBPE foi de
extrema importância para o momento educacional que o Brasil vivia nos anos de 1955 a
1964, pois servia como estratégia de renovação do ensino, a medida que cada professor que
por ali passava, seja como estagiário, seja como professor regente, assumia o papel de
multiplicador da experiência, pois muitos daqueles estagiários estavam em contato com
conhecimentos educacionais inovadores e experimentais, ou seja, o que havia de mais novo
resultante do trabalho científico dos técnicos do INEP/CBPE e de pesquisas realizadas na
própria escola, levando-os a formação e aperfeiçoamento de seu trabalho docente fundado
em bases científicas e, provavelmente, estas inovações ainda não estavam disponíveis em
suas regiões de origem.
Além disso, a singularidade do projeto de educação experimental da escola se deu
não só pelo fato da introdução de uma nova metodologia e uma estrutura organizacional do
trabalho pedagógico, mas pela manutenção uma política de valorização do magistério, o
que denota seu caráter de vanguarda educacional, frente ao cenário brasileiro à época.
Dentre suas ações podemos destacar:
a) sua função integradora em relação aos cursos de aperfeiçoamento ministrados pelo
INEP/CBPE que necessitavam de uma parte prática (por assim dizer) no sentido de
que as instituições (INEP/CBPE) contavam com um espaço de demonstração e
experimentação pedagógica coerente epistemologicamente com o projeto maior de
reestruturação do sistema educacional do país.
b) questões contemporâneas como a interdisciplinaridade e a utilização do horário
integral eram bandeiras defendidas pela escola, com a utilização de métodos e
estratégias de ensino que facilitavam seu pleno desenvolvimento e por entender que
a aprendizagem satisfatória não se dava de forma fragmentada com a segmentação
do conhecimento por disciplinas e pela manutenção do horário parcial. A educação
devia preparar o indivíduo para atuar em uma sociedade democrática e progressista
em que o ser humano é integral, global.
Em relação às ações integradas entre o INEP/CBPE e a escola, podemos destacar de
forma sucinta a produção de materiais de apoio ao professorado com o intuito de divulgar a
própria experiência e mostrar que a filosofia da escola baseada no espírito democrático e
progressista, assim como a metodologia de projetos tinham rendido bons frutos à escola,
podendo ser aplicada em outras instituições escolares. Citamos o Método da Abelhinha que
segundo Passos (1996), foi uma criação da Escola Guatemala, fruto do estudo do método
fônico trazido da Itália por docentes que haviam estagiado lá e que na Escola Guatemala foi
re-significado, dando origem a um método de alfabetização amplamente conhecido e
utilizado no Brasil principalmente nas décadas de 1960-70.
Dessa forma, podemos afirmar que a Escola Guatemala constituiu-se num lócus de
aperfeiçoamento do magistério, na medida que sua dinâmica girava em torno da pesquisa e
dos estudos para embasar a prática pedagógica (LIMA, 2004). Assim, sua atuação estava de
acordo com os objetivos do CBPE, através da supervisão da DAM, que fazia desta escola
um espaço real de reflexão sobre a prática pedagógica.
Os Cursos de Aperfeiçoamento do Magistério
Os cursos de aperfeiçoamento do magistério desenvolvidos pelo INEP/CBPE
podem ser compreendidos como espaço privilegiado de contato com uma proposta de
formação baseada em princípios científicos e filosóficos. Em carta ao então Ministro da
Educação, Cândido Mota Filho
34
(1954), Anísio Teixeira explicita a importância dos cursos
para a formação de quadros técnicos para atuação nos Estados e Centros Regionais:
D Conjuntamente com esse trabalho de pesquisa, interpretação e planejamento
e elaboração de material pedagógico e por meio dele o Centro treinará
administradores e especialistas em educação para abastecer os Estados e os
Centros Regionais de Estudos Pedagógicos, que estão sendo criados nos estados,
ligados ao master center do Rio de Janeiro e, se possível, os próprios
departamentos de educação das escolas de filosofia das universidades brasileiras.
O aperfeiçoamento do magistério tinha papel central no projeto de reestruturação
educacional pensado por Anísio Teixeira, pois era a partir da melhor formação do professor
calcada em bases científicas, que a educação poderia alcançar status de ciência e, assim,
promover a melhoria da qualidade do ensino e do sistema educacional como um todo.
A DAM, enquanto divisão executora das ações para o magistério, juntamente com o
INEP/CBPE e através de parcerias com secretarias de educação e órgãos internacionais,
ofereciam cursos de aperfeiçoamento do magistério a professores de todo o país. Esses
cursos contavam com professores bolsistas que se deslocavam de suas regiões para os
CRPEs e para o CBPE com o intuito de adquirirem conhecimento especializado em uma
determinada temática.
Dessa forma, os cursos de aperfeiçoamento do Magistério tiveram atuação em nível
nacional, graças a estrutura organizativa dos Centros, e contemplaram professores e
profissionais da educação de todo o país, inclusive com o oferecimento de cursos no
exterior.
Nosso estudo privilegia a análise dos cursos de aperfeiçoamento do magistério
ocorridos no Distrito Federal (DF)
35
entre os anos de 1955 e 1964. Cabe ressaltar que os
cursos também ocorriam nos Centros Regionais espalhados pelo país, aos quais citamos
anteriormente, e sua execução pelo INEP/CBPE não está limitada ao período analisado.
34
TEIXEIRA, A. Carta à Cândido Mota Filho. Ver referências.
35
O Distrito Federal (DF) manteve-se como tal até 1960. Após a construção de Brasília, a capital federal se
transferiu e o então DF tornou-se Estado da Guanabara a1975. A partir desse ano o Estado da Guanabara
foi incorporado ao Estado do Rio de Janeiro e passou a se chamar cidade do Rio de Janeiro (capital do
Estado).
O principal objetivo dos cursos era “beneficiar profissionais cuja atuação mais nos
parecia favorecer a melhoria do ensino primário brasileiro, por ocuparem postos-chave, nos
quais seria máximo o valor reprodutivo do aperfeiçoamento tentado”
36
(p. 1). Portanto, a
escolha dos profissionais, além dos professores, estava baseada no exercício de algum
posto-chave em seu estado ou cidade que pudesse ser reaproveitado pelo sistema vigente.
A escolha passava por 8 eixos de atuação:
I) Administradores escolares, especialistas em educação primária, supervisores do
ensino primário;
II) Supervisores, diretores e professores de escolas normais;
III) Diretores e professores de escolas de demonstração e experimentais;
IV) Supervisores, diretores de oficina e professores de Artes Industriais (previsto no
plano de extensão da escolaridade);
V) Professores especializados;
VI) Professores em geral;
VII) Aperfeiçoar pessoal para se encarregar dos cursos, estudos e publicações de
assistência técnica a professores e de atividades de demonstração de ensino nos
Centros Regionais;
VIII) Atender as solicitações dos Estados para o aperfeiçoamento de pessoal.
A seleção de profissionais fazia-se necessária devido a impossibilidade de
atendimento a todos os professores e profissionais da educação do país que no qüinqüênio
1956-1960 era cerca de 200.000
37
(p. 1). Portanto, “a oportunidade de aperfeiçoamento
oferecido pelo programa de aperfeiçoamento do INEP, no qüinqüênio foi de 240
[CURSOS], sendo 4.475 professores que receberam bolsas completas” (p. 51) [GRIFO
NOSSO].
A professora Maria do Carmo Marques Pinheiro, que atuou nos cursos de formação
de professores leigos e de prática de ensino, em entrevista
38
nos alerta para o fato de que
36
Relatório dos trabalhos realizados pela Coordenação de Cursos do INEP de 1956 a 1960. Ver referências.
37
Relatório dos trabalhos realizados pela Coordenação de Cursos do INEP de 1956 a 1960. Ver referências.
38
Entrevista concedida pela professora Maria do Carmo Marques Pinheiro a mim, Cecilia Neves Lima, no dia
28 de novembro de 2007, às 17h. A entrevista foi gravada em fita cassete, transcrita e teve o objetivo de
mesmo com toda a seleção dos alunos-bolsistas que iriam participar dos cursos feita pelo
INEP, o rendimento era considerado baixo:
(...) achavam que justamente o problema do ensino fraco era o fato que essa
parte da prática de ensino para formação era falha ... e então vinha gente de
outros lugares, por exemplo, veio gente de Manaus, tinha 2 meninas do Paraná,
tinha gente de Belo Horizon... de Minas Gerais,(...)
(...) eram professoras [ALUNAS-BOLSISTAS] consideradas boas, aptas.
Consideradas porque não eram (…) [GRIFO NOSSO] (PINHEIRO, 2007).
A afirmação da professora Maria do Carmo nos deixa claro que a qualidade da
formação dos professores em geram era deficitária. A observação acima nos aponta para a
importância de iniciativas como as do INEP/CBPE por todo o país, pois com a melhoria da
qualidade da formação docente era possível alcançar níveis educacionais elevados.
Em relação à dinâmica organizativa dos cursos, estes tinham em média duração de 1
ano e os alunos permaneciam na cidade todo o tempo do curso. De modo geral, os cursos
iniciavam-se e findavam-se no mesmo ano com o retorno dos alunos as suas cidades de
origem. É interessante observar também que o INEP/CBPE, através de sua estrutura
organizativa, proporcionava aos alunos bolsas-auxílio para a manutenção dos mesmos na
cidade, ou seja, o tempo de permanência dos alunos-bolsistas era subsidiada.
Além disso, durante a estada dos alunos, o INEP/CBPE destinava uma verba
especial para eventos culturais na cidade com a presença dos professores regentes dos
cursos acompanhando seus bolsistas. Podemos perceber que essa estratégia tinha como
objetivo principal, além do entretenimento e do fortalecimento dos laços cooperativos e da
troca de experiências entre os participantes dos cursos e os professores, que estes
adquirissem a maior quantidade de capital cultural possível durante o tempo de
permanência no DF.
A professora Maria do Carmo Marques Pinheiro confirma nossa afirmação:
contribuir com o trabalho de pesquisa para a confecção da dissertação com informações inéditas, visto que a
entrevistada era irmã de Lúcia Marques Pinheiro (diretora da DAM) e contribuiu com o CBPE primeiramente
no setor de publicações e como docente nos cursos de aperfeiçoamento do magistério para professores leigos
e no curso de prática de ensino.
Fim de semana era comum arranjar alguma coisa pra elas e tudo mais. (...) por
exemplo aquele espetáculo, lembro bem, do Sargento de Milícias que foi
bastante interessante, que o Pitanga fez justamente o sargento de milícias,
entendeu? (...) Então foi muito interessante, ali no Largo do Boticário. Então a
gente teve justamente (...) diversão, diversão mais cultural, etc. Depois teve uma
vez que se levou lá onde o Pascoal Carlos Magno tinha a tal casa dele de cultura,
tudo mais, elas passavam o fim de semana lá (PINHEIRO, 2007).
Os locais de realização dos cursos eram variados. Ocupando o terceiro andar da
sede do CBPE no DF, a DAM possuía uma ampla sala no mezanino do prédio
especialmente para as aulas dos cursos. Nesse espaço ocorriam cursos diversos e também
servia para a execução da parte teórica de alguns cursos que tinham sua parte prática e de
observação na Escola Guatemala ou em outra instituição especializada.
De modo geral, os cursos tinham aulas de disciplinas relativas ao conteúdo
pedagógico, de disciplinas relativas ao assunto específico do curso e, quando necessário,
eram inseridas disciplinas extras ao programa do curso. As aulas de cada disciplina tinham
em média uma hora de duração. Podemos citar como exemplo o caso do curso de formação
de professores de prática de ensino, comentado pela professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro:
(...) havia um trabalho de aglutinação que era justamente a orientação para o
estudo, e assim por diante, entendeu?
(...) Nós tínhamos aquela preocupação justamente de mostrar assim, o
importante era a responsabilidade. Então o trabalho era bastante importante e
tinha assim... mexia com as pessoas, mexia com o Brasil, mexia com tudo!
[durante o curso] na hora de estar ensinando o como ensinar, se ensinava os
próprios conteúdos que elas deveriam ensinar aos alunos porque senão não
né? Então nhamos aquela idéia, aquela responsabilidade nelas, elas próprias
procuravam as coisas, etc. Dr. Anísio também fazia muita questão (...) quando o
curso terminava, elas levavam uma série de livros, elas o iam de mãos
abanando! (PINHEIRO, 2007) [GRIFO NOSSO].
Cada curso possuía apenas uma única turma por ano. Essa estratégia tinha como
objetivo principal a manutenção da qualidade do curso oferecido, além de ser uma forma de
produzir maior integração entre professores e alunos, na tentativa de estreitamento dos
laços de amizade e identificação de objetivos pedagógicos.
Note que tanto a convivência dos alunos com os professores regentes em atividades
culturais quanto a convivência entre os mesmos na sala de aula propiciava a formação de
uma rede de conhecimentos, por esta ser formada por pessoas de diferentes regiões e com
diferentes experiências de vida que, naquele momento, compartilhavam de um objetivo
comum e que, ao mesmo tempo, seriam agentes multiplicadores da experiência adquirida
nessa convivência.
A seleção dos professores que ministravam os cursos ficava a cargo a professora
Risoleta Ferreira Cardoso, a responsável pela coordenação dos cursos de aperfeiçoamento
do magistério e subordinada a diretora da DAM, cia Marques Pinheiro. A escolha se
dava de forma subjetiva, visto que os professores eram convidados a participar do projeto
por sua competência profissional e por sua afinidade com a filosofia educacional do Centro.
De acordo com a professora Maria do Carmo Marques Pinheiro, essa forma de
escolha dos profissionais se constituía em vantagens para o trabalho à medida que todos os
profissionais ali envolvidos possuíam afinidades político-pedagógicas, o que favorecia o
trabalho e permitia que os cursos tivessem uma unidade filosófica.
Além disso, é importante destacar a importância da Escola Guatemala como espaço
de formação e experimentação pedagógica. Os alunos-bolsistas dos cursos que
necessitavam de observação e/ou estágios permaneciam na escola no período da manhã,
acompanhando as turmas e as professoras, e a tarde freqüentavam as aulas (ditas mais
teóricas) dos cursos na sede do CBPE e, no fim da tarde, retornavam a escola para as
reuniões conjuntas com os especialistas do INEP e as professoras regentes. Os alunos
bolsistas participavam intensamente do cotidiano da escola, pois toda a atividade
pedagógica era discutida, refletida, pesquisada e orientada pelas técnicas do INEP.
Podemos citar, como exemplo, alguns cursos que tiveram na Escola Guatemala
espaço privilegiado de observação e prática pedagógica. São eles:
1. Seminário de Sociologia para Professores de Escolas Normais, em 1957;
2. Cursos de Preparação de Professores de Linguagem na Escola Primária, de
Escolas Normais e Institutos de Educação, em 1958 e 1959;
3. Curso de Matemática na Escola Elementar, em 1958;
4. Estágios de Aperfeiçoamento de Professores Primários para Escolas de
Demonstração, de 1956 a 1960;
5. Curso de Especialização em Recreação e Jogos, em 1960;
6. Estágio de Preparação de Professores para Excepcionais, em 1958;
7. Cursos de Especialização em Arte Infantil, em 1956, 1958 e 1959.
Alunos na biblioteca da Escola Guatemala fazendo uma atividade em conjunto com uma bolsista (ao
fundo, de roupa escura, junto a estante).
39
Observe que as múltiplas dimensões das ações pedagógicas do INEP/CBPE tinham
ampla integração. O trabalho girava em torno da formação de uma nova postura pedagógica
dos professores e do contato com as inovações educacionais produzidas pelo INEP/CBPE e
pelos próprios professores bolsistas dos cursos.
Vale destacar que a preocupação com a melhoria da formação docente era estendida
também aos professores regentes da Escola Guatemala. Os professores da escola também
participavam de cursos de aperfeiçoamento em outros estados. O Relatório dos trabalhos
realizados pela Coordenação de Cursos de INEP de 1956 a 1960
40
nos apresenta alguns
dos cursos que os professores da Escola Guatemala participaram:
39
Foto cedida a esse estudo e pertencente ao arquivo pessoal da professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro.
40
Ver referências.
Estágios de Aperfeiçoamento de Professores Primários para escolas de
Demonstração
Em 1956, realizaram o Estágio, na Escola experimental do INEP do Rio, 15
professores de vários Estados nos quais já existiam ou se planejava a criação
próxima de escolas com as finalidades referidas: Paraíba, Pernambuco, Sergipe,
Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul e Goiás. Dezesseis professores, do então
Distrito Federal, em exercício na Escola, igualmente receberam orientação (p.
26).
Estágios de Aperfeiçoamento de Professores Primários de Escolas de Demonstração
Em 1959, sob a direção da professora Carmen Teixeira, 25 professores (12 de
Brasília, 11 da Escola Experimental do INEP do Rio e 2 de Pernambuco)
realizaram estágio na Escola Experimental da Bahia, observando todos os
trabalhos ai realizados (p. 29).
Estágio de Preparação de Professores para Excepcionais
Em 1957, o INEP colaborou financeiramente com a Sociedade Pestalozzi do
Brasil para a vinda da Professora Maria Irene da Costa, de Portugal, a qual
ministrou, durante os três meses de sua estada no Brasil, cursos sobre psicologia
de crianças desajustadas, das quais foram também seguidos por 5 professores da
Escola Experimental do INEP (p. 40).
Ainda em 1958, o INEP colaborou financeiramente com a Associação de Pais e
Amigos dos Excepcionais para a realização de um Curso sobre Educação de
Excepcionais, ministrado pelo professor Kenneth Lovell, da Universidade de
Leeds Inglaterra. (...) Incluiu também estágios em classes de crianças
retardadas, em Jardins de Infância e Escolas primárias comuns e na Escola
Experimental do INEP no Rio (p. 40).
Além disso, os docentes da escola também participaram de cursos no exterior:
Na mesma Universidade [Indiana], nos Cursos de 1957-1958 aperfeiçoaram-se
20 professores, sendo: 9 professores do Rio Grande do Sul, 6 professores de São
Paulo e 5 professores da Escola Experimental deste Instituto no Rio, em diversos
campos do Ensino Elementar, a saber: Administração Escolar, Psicologia
infantil, estudos Sociais, Aritmética, Ciências Naturais, Artes Industriais,
Educação Especial, Recursos Áudio-Visuais em Educação e Trabalho de Classe
(p. 49).
Para finalizar, destaco a importância da integração entre as Divisões em prol da
melhoria da qualidade educacional brasileira. Esse fato é confirmado pelo modo de escolha
das temáticas dos cursos de aperfeiçoamento do magistério a serem oferecidos. Sobre essa
integração, falaremos mais detidamente no próximo capítulo.
Professores e funcionários da DAM na sede do CBPE. Destaque para (da direita para a esquerda em
pé) a Professora Maria Wanir (de roupa estampada) e Professora Risoleta Cardoso ( de branco), e para
a Professora Maria do Carmo Marques Pinheiro (2ªsentada).
41
41
Foto cedida a esse estudo e pertencente ao arquivo pessoal da professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro.
CAPÍTULO 5
A Anatomia dos Cursos de Aperfeiçoamento do Magistério: percorrendo seu interior
O presente capítulo tem como principal objetivo “mergulhar” no interior de uma
ação de melhoria profissional do professorado brasileiro no período estudado - os cursos de
aperfeiçoamento do magistério. Para que possamos compreender de que modo essa política
do INEP/CBPE contribuiu para a melhoria da qualidade do ensino do país como um todo,
trataremos, nesse capítulo, de analisar as principais diretrizes e linhas de ação dos cursos,
bem como suas afinidades com o ideário pragmático e da ideologia desenvolvimentista.
1. Principais Diretrizes e Linhas de ação
Os cursos de aperfeiçoamento do magistério promovidos pela DAM no DF
possuíam algumas diretrizes e linhas de ação que norteavam o trabalho. Ao empreendermos
análise em diversas fontes documentais chegamos a algumas reflexões que merecem
destaque.
Principais Diretrizes
No contexto político e econômico do país era necessário que o Estado formasse
mão-de-obra especializada para suprir a demanda advinda da industrialização e da
urbanização. Para isso, foi importante o papel do INEP/CBPE na formação de especialistas
em educação e formação de professores qualificados para atuar nas mudanças que ocorriam
nesse período, como por exemplo, a extensão da escolaridade com a criação do e ano
primário. Além disso, o número de escolas aumentava consideravelmente no país e o INEP,
tendo consciência de seu papel de “cérebro pensante do ministério”, além de financiar a
construção dessas escolas também preparava professores especializados para suprir essa
demanda e planejar o modo como tais escolas se integrariam organicamente em um sistema
nacional de ensino. O parágrafo inicial do relatório A Ação do INEP e Centros de Pesquisa
no inqüênio 1956-60
42
, da Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, nos esclarece
sobre a função que o INEP/CBPE assumiram no contexto mais amplo do país:
42
Ver referências.
No cumprimento do programa que se impôs diante da realidade educacional
brasileira, a atuação do INEP nesse período fez-se notar, sobretudo, pela
organização dos Centros de Pesquisas Educacionais, pela assistência cnica e
pela assídua participação no exame, estudo e debate dos problemas brasileiros de
educação. Essa atuação estendeu-se a todos os setores da vida escolar, desde a
assistência financeira e técnica concedida às Secretarias de Educação, instituições
educativas e culturais, para construção de prédios, equipamento, instalação de
classes complementares, oficinas de artes industriais, distribuição de livros e
material didático até a reestruturação dos sistemas de ensino elementar e normal e
a assistência pedagógica do professor (Revista Brasileira de Estudos
Pedagógicos, 1961, p. 93)
Como exemplo ilustrativo da função desempenhada pelo órgão, podemos citar o
Curso de Formação de Professores-Supervisores realizado pelo INEP/CBPE no ano de
1963 em diversas cidades do país, curso este realizado com o objetivo de dotar o Brasil de
“um grupo de professores capazes de orientar regentes leigos do magistério primário, já em
exercício, em localidades que não dispõem de professores diplomados em número
suficiente para atender ao total de crianças em idade escolar” (Revista Brasileira de Estudos
Pedagógicos, 1964, p. 52). Este curso estava diretamente relacionado à formação de
profissionais especializados para suprir a demanda educacional que se formava e “os
Cursos de Formação de Professores-Supervisores foram previstos no Plano Nacional de
Educação e sua realização está disciplinada no Plano Trienal de Educação” (p. 52).
Com atuação marcante nos diversos setores educacionais, a principal diretriz dos
cursos estava relacionada à disseminação do ideário pragmático junto aos professores e
profissionais de educação, através do emprego de novas metodologias de ensino e cultivo
de atitudes e valores democráticos. Esperava-se por intermédio da estratégia de irradiação
do ideário pragmatista formar um novo “espírito” nos professores e em suas ações
pedagógicas, baseadas em pressupostos pragmáticos de construção da experiência,
valorização dos ideais democráticos, progresso individual e coletivo, e crença na ciência
experimental. Para o desenvolvimento desses pressupostos na área educacional, o
INEP/CBPE tinha importante ferramenta de disseminação desse ideário contida nos cursos
de aperfeiçoamento do magistério.
Ao analisarmos o documento intitulado Curso de Administração Escolar para
formação e aperfeiçoamento de diretores de escola primária
43
, verificamos que os
pressupostos do pragmatismo se faziam presentes nos conteúdos do programa do curso. O
programa de curso tinha como principais objetivos: a) discriminar as principais funções que
um diretor tinha que possuir, incluindo as relações interpessoais entre professores e
servidores, a comunidade, os pais, os alunos, as autoridades e pesquisadores; b) mostrar os
aspectos da política educacional relevantes a seu cargo; c) apresentar considerações sobre a
conservação de prédios escolares; d) fornecer noções aos problemas de saúde da
comunidade escolar; e) dar noções de estatística e registro de dados, organização e melhor
aproveitamento do tempo escolar.
As principais disciplinas do curso e seus respectivos tópicos de estudos eram:
Filosofia da Educação objetivos da educação (sobretudo primária), educação para
a democracia, caracterização do regime democrático, desenvolvimento das aptidões
individuais – respeito ao mérito, técnicas para atingir o público, regime de promoção
vigentes no Brasil, situação geral do ensino primário brasileiro, situação do Estado da
Guanabara (até 1957), critérios e instrumentos de promoção e seus critérios filosóficos e
psicológicos;
Prática de Ensino objetivos das atividades curriculares, manejo de classe, estudo
dirigido, trabalho em grupo, todos de ensino, aproveitamento do tempo, distribuição de
atividades, planejamento e flexibilidade;
Matérias de Ensino Recursos e material de ensino de linguagem, estudos sociais,
ciências naturais, matemática, orientação geral de atividades de recreação, artes industriais,
música;
Psicologia técnicas de entrevista, psicologia do adulto, da aprendizagem, da
criança, formação de atitudes disciplina, relações humanas, psicologia do líder, medidas
de inteligência e rendimento escolar, a idade, a maturidade e os interesses infantis, preparo
do professor para a observação da criança, características de um boletim satisfatório, provas
de diagnóstico, técnicas de organização de provas, desenvolvimento do espírito
experimental e objetivo do professor;
43
Ver referências.
Administração Escolar administração escolar democrática (técnicas), técnicas
modernas de supervisão às classes, reuniões, etc, sistema de promoção, política de notas,
organização de classes, horário, forma de contato com os pais (emprego de técnicas),
organização do sistema escolar, conhecimento das disponibilidades de serviços auxiliares
da escola, de órgãos existentes de aperfeiçoamento de pessoal, de estudos e divulgação de
experiências úteis, conhecimento dos recursos existentes em seu trabalho, atitudes com
relação a autoridades;
Pesquisa em Sociologia estudo de desejos, aspirações, opiniões dos pais sobre a
escola, composição da população escolar, problemas da comunidade e do país, dados sobre
a criança e a família, estudo das condições de vida da população escolar;
Pesquisa em Psicologia - direção da aprendizagem, atenção as diferenças
individuais, interesses infantis, observação do comportamento infantil, dificuldades de
aprendizagem e relações de desajustamentos, técnica de entrevista e aconselhamento,
conhecimento de técnicas de estudo das condições de vida da criança fora da escola,
organização de instrumentos de medida dos resultados escolares, criação de um clima de
controle, apreciação objetiva e espírito experimental (características, exercícios);
Pesquisa em Administração e Estatística atitude adequada relativamente a estudos
e pesquisas, capacidade crítica de aplicação, seleção de assuntos de importância, hipóteses,
condições a preencher numa pesquisa, instrumentos de medida, apresentação dos
resultados, características de estudos simples a serem realizados nas classes, características
de métodos e recursos de ensino e meios para aperfeiçoar o professor, características do
estudo sobre programas (colaboração dos professores nesse estudo), criação de um espírito
objetivo e experimental, interpretação de estudos realizados;
Educação Comparada – situação atual de educação no local, soluções dadas a
problemas existentes em sistemas mais evoluídos;
Higiene Escolar alimentação, doenças infantis (diagnóstico, período de contágio,
socorros urgentes, puericultura).
Notemos que a relação de disciplinas do curso e seus respectivos tópicos de estudo
privilegiavam a construção de valores e atitudes e tinham uma visão global do ato
educativo, visto que as funções do diretor se estendiam às habilidades de gestão e de
mediação frente às situações problemáticas da comunidade escolar. Fica claro que o
objetivo deste curso, bem como dos demais cursos de aperfeiçoamento do magistério, tinha
uma dupla função a ser alcançada: a) seu aspecto pragmático que contemplava o imperativo
de melhor formação do diretor de escola, visto que as mudanças estruturais do país se
processavam com rapidez; b) seu aspecto subjetivo de disseminação de uma visão
educacional baseada nos pressupostos do pragmatismo que, nesse contexto, também atuaria
como multiplicador desse ideário em todas as localidades brasileiras, já que o diretor
assumia papel de articulador entre os problemas escolares e os anseios da comunidade.
Outro importante eixo norteador da estratégia de intervenção pedagógica
implementada pelo INEP/CBPE foi o apoio ao desenvolvimento das ciências sociais no
país para que os professores desenvolvessem seu “espírito científico”, de modo que o
arcabouço teórico-metodológico das ciências sociais era “emprestado” para o
desenvolvimento das pesquisas em educação e para que, conseqüentemente, esta integração
provesse a área educacional de um estatuto científico. A idéia principal era a de que as
pesquisas, estudos e inquéritos desenvolvidos nas demais Divisões servissem também para
o estudo e aprofundamento das questões cotidianas da escola e, dessa forma, com o apoio
metodológico das ciências sociais os principais problemas educacionais teriam uma
reflexão maior, sobretudo nas propostas de soluções, numa retroalimentação entre as áreas
de conhecimento. Ficou clara tal integração ao analisarmos alguns documentos que nos
demonstravam, por exemplo, como se dava a escolha dos temas dos cursos e a contribuição
dessas pesquisas (chamadas sócio-antropológicas e educacionais) na construção dos
programas de curso e currículos.
A professora Maria do Carmo Marques Pinheiro nos esclarece como se dava essa
integração das Divisões na escolha dos cursos ministrados:
(...) era aquela questão assim: quais são os grandes problemas do Brasil? Então
eles [O INEP] não estavam pensando no local, porque achavam que não ia decair
tanto depois... Mas então, (...) muitos lugares que não tinham absolutamente...
bons professores nem nada. Então era preciso melhorar o professor para que dê
aulas, haja um ensino melhor, etc, etc. Então qual era o problema do Brasil?
Professores que não têm formação especial, específica. Então temos que dar isso,
dar consciência de que eles não eram meros instrutores, eram educadores! (...)
(...) então, resolveu-se que não mais ia haver esse curso [DE FORMAÇÃO DE
PROFESSORES LEIGOS] e sim, curso de formação de professores de prática
de ensino, porque eles achavam que justamente o problema do ensino fraco era o
fato que havia essa parte da prática de ensino para formação era falha (...)
[GRIFOS NOSSOS] (PINHEIRO, 2007).
O curso de Administração Escolar (citado anteriormente) traz em seus picos de
estudos algumas pistas dessa integração com o trabalho de pesquisa das demais Divisões,
bem como com a utilização do método experimental.
Como exemplo de tal integração podemos destacar: a) o tópico relativo ao
conhecimento dos órgãos existentes de aperfeiçoamento de pessoal, de estudos e
divulgação de experiências úteis uma clara menção ao conhecimento da estrutura do
INEP/CBPE, suas divisões de trabalho, seus materiais de auxílio ao professor (publicações
diversas), e o apoio que essa estrutura poderia dar ao estado e/ou município de origem do
professor-bolsista para resolver questões relativas à melhoria da qualidade educacional da
região; b) os tópicos sobre as atitudes adequadas relativas a estudos e pesquisas a serem
adquiridas nas diversas disciplinas de pesquisa com ênfase na capacidade de crítica e
aplicação dos estudos e seus resultados obtidos; c) tópicos com aspectos sobre o
desenvolvimento do espírito experimental e objetivo no professor ênfase nos principais
procedimentos de construção e análise, principais características e a colaboração dos
professores-bolsistas nos estudos analisados.
É importante frisar que a idéia de adquirir uma “atitude experimental” perpassa toda
a filosofia e os objetivos pragmáticos dos cursos em geral, como forma de se produzir uma
nova consciência educacional nos professores para que estes tivessem seu trabalho
pedagógico voltado para o desenvolvimento local da região, dando utilidade ao aprendido
na escola e contribuindo na formação do cidadão com a valorização de procedimentos
valores morais.
Alunas-bolsistas (sentadas) e professores dos cursos de aperfeiçoamento do magistério na sede do
CBPE. Destaque ao fundo para o Prof. João D’Andrade Leite (matemática), a Prof. Risoleta Cardoso
Ferreira (coordenadora dos cursos - de roupa escura) e Prof. Wanda Rolim (de bolsa).
44
Porém, disseminar os pressupostos pragmáticos não se limitavam às práticas
pedagógicas da escola, o que implica afirmar que tal disseminação também se estendia a
outros cargos da administração pública, visto que muitos profissionais recrutados a
participar dos cursos ocupavam cargos nas secretarias das cidades e dos estados. No
Distrito Federal, os cursos ocorridos no INEP/CBPE se destacavam principalmente nas
áreas de formação de supervisores, diretores e professores de escolas normais; diretores e
professores de escolas de demonstração e experimentais; professores especializados; e
pessoal para se encarregar dos cursos, estudos e publicações de assistência técnica a
professores e de atividades de demonstração de ensino nos Centros Regionais. Essa diretriz
adotada em relação a escolha das categorias profissionais que seriam abarcadas com cursos
no DF pode ser explicada pelo fato de que:
Aqui ficava o Instituto de Educação, escola de formação de professores que
nas décadas de 50 e 60 era considerada uma das melhores escolas de
formação normal do país;
44
Foto cedida a esse estudo e pertencente ao arquivo pessoal da professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro.
O Centro Experimental do INEP A Escola Guatemala permitia a
melhor formação desse tipo específico de profissional;
A cidade, por ser Distrito Federal, possuía uma série de institutos
especializados que podiam contribuir na melhor formação do professor.
Podemos dizer que os cursos de aperfeiçoamento do magistério tinham filiação
teórica direta com o pragmatismo deweyano, servindo como cus para a profissionalização
do magistério e instrumento para o suprimento da demanda do setor educacional por
profissionais especializados. As diretrizes principais dos cursos nos demonstram que seu
projeto possuía objetivos claros e sua ação era bem planejada, tanto em aspectos práticos
como na seleção de profissionais, por exemplo, quanto nos aspectos subjetivos de
disseminação de ideário pragmático.
Linhas de Ação
Sobre cada diretriz almejada pelo INEP/CBPE na formulação dos cursos de
aperfeiçoamento do magistério, linhas de ação eram traçadas para que seus objetivos
fossem efetivamente alcançados. As linhas de ação empreendidas pelo INEP/CBPE para a
execução de seus propósitos podem ser consideradas como estratégias de intervenção na
realidade educacional, uma vez que são entendidas como as ações concretas (propriamente
ditas) implementadas e executadas para que as diretrizes traçadas fossem executadas.
Para que as idéias experimentais baseadas no pragmatismo e no desenvolvimento da
ciência tivessem divulgação em nível nacional e estivessem presente no cotidiano das
escolas públicas do país, através da prática educativa dos professores e das ações de gestão
nos sistemas de ensino, a DAM, e, conseqüentemente o INEP, entendiam que era
necessário que os cursos fossem dirigidos a profissionais que ocupassem postos-chave nas
Secretarias de Educação dos municípios e por professores escolhidos de acordo com
critérios próprios de cada cidade ou estado de origem dos alunos-bolsistas.
Os cursos tinham a pretensão de formar profissionais que pudessem transmitir os
conhecimentos adquiridos a seus pares através, principalmente, do trabalho de pesquisa e
reflexão dos problemas educacionais com o uso de métodos e procedimentos de ensino
experimentais. Os professores-bolsistas, por exemplo, recebiam uma pequena coleção de
livros editados pelo próprio do INEP/CBPE para que esses conhecimentos circulassem
pelos espaços escolares de todo o país. Note que todo o planejamento e execução dos
cursos visavam a multiplicação da experiência. A professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro, em entrevista, comenta sobre esse efeito multiplicativo:
(…) Então quando o curso terminava, elas levavam uma série de livros, elas não
iam de mãos abanando! (risos) Elas iam justamente com livros doados. Levavam
uma pequena coleção justamente pra sua região para que elas pudessem continuar
estudando, melhorando, etc, e melhorando os outros. Então era aquela questão
assim de efeito multiplicativo (PINHEIRO, 2007).
Verifica-se também que a idéia de racionalização e planejamento se fazia presente
nesse contexto, uma vez que o INEP/CBPE traçavam programas de assistência técnica ao
ensino primário e normal visando sempre o máximo aproveitamento dos recursos públicos,
em prol da melhoria das condições do sistema educacional brasileiro. O relatório As
Atividades do INEP e dos Centros de Pesquisas Educacionais de 1958
45
nos detalha as
ações e iniciativas implementadas naquele ano e, especificamente sobre os cursos de
aperfeiçoamento do magistério, relata seu plano de trabalho:
a) concentrar esforços na formação e aperfeiçoamento de professores para os Institutos
de Educação e para Escolas de Aplicação renovadas, que sirvam a esses institutos;
b) aperfeiçoar pessoal para as Secretarias de Educação estaduais, no setor de
Administração;
c) preparar pessoal especializado para os Centros Regionais no INEP;
d) preparar pessoal para realizar, nos Estados, o aperfeiçoamento do professor primário
e para as escolas experimentais;
e) auxiliar os Estados que não possam preparar no local professores e orientadores
para setores de ensino primário já ali existentes;
f) atender a outros projetos de interesse para o desenvolvimento do ensino primário e
normal dos Estados, tais como estágios e cursos para professores e diretores de
Escolas Normais;
45
Ver referências.
g) finalmente, atender a pedidos de ajuda para realização de Cursos nos Estados, com a
finalidade de levar elementos de estímulo e esclarecimento, bem como de selecionar
elementos capazes de realizar cursos e estágios mais avançados.
Através do plano de trabalho do INEP/CBPE tomado como exemplo, é visível
perceber que o planejamento das ações, bem como a organização e logística dos cursos, era
o grande trunfo para a execução de seus propósitos. As diversas seções de trabalho
procuravam planejar as ações, orçar os custos, captar recursos e organizar grupos de
trabalho para que o plano fosse executado da melhor maneira possível. Para cada tópico de
trabalho cursos eram pensados, discutidos, organizados e postos em prática, mas nem
sempre o planejamento era executado de forma integral. O Curso de Formação de
Professores-Supervisores realizado pelo INEP/CBPE no ano de 1963 (já citado
anteriormente), por exemplo, estava programado “para a formação de 1500
[PROFESSORES] tanto, em conseqüência da redução de mais de 50% das verbas
destinadas ao INEP, somente se pôde proporcionar treinamento a 800 professores-
supervisores” (p. 52) [GRIFO NOSSO].
Em relação à diretriz do INEP/CBPE de formação do “espírito científico” nos
professores através da disseminação do advento da ciência experimental, foi necessário
uma linha de ação que privilegiasse a formação de atitudes e procedimentos de pesquisa
para que os professores-bolsistas pudessem entrar em contato com as inovações
pedagógicas propostas pelo Centro e pudessem, também, de forma autônoma, buscar
sempre seu desenvolvimento pessoal. O principal objetivo era que os professores SE
tornassem multiplicadores de uma nova atitude pedagógica baseada na ciência
experimental, tendo uma visão diferenciada do ato educativo.
Essa “atitude experimental” está presente nas declarações da entrevista da
professora Maria do Carmo Marques Pinheiro:
A gente ensinava o pessoal a aprender, quer dizer, saber onde procurar o material
e como fazer as coisas, etc, (...)
Então temos que dar isso, dar consciência de que eles não eram meros instrutores,
eram educadores! Essa idéia toda de educador, (…)
Nós tínhamos aquela preocupação justamente de mostrar assim, o importante era
a responsabilidade (...) (PINHEIRO, 2007).
Através da inserção de disciplinas relativas ao estudo de pesquisas e do aprendizado
de métodos, técnicas e procedimentos de pesquisa, o aluno-bolsista incorporaria ao seu
cotidiano de trabalho uma nova visão educacional baseada no progresso da ciência
experimental e nos pressupostos filosóficos do pragmatismo de John Dewey. A ênfase dada
à pesquisa, por exemplo, foi verificada no curso ocorrido na Escolinha de Arte do Brasil
que tinha como objetivo “estimular iniciativas e dar aos professores interessados em arte na
educação possibilidade de trabalho de pesquisa para entrosamento de novas experiências na
escola, (…)” (Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 1964, p. 57).
A integração com as demais Divisões objetivando a construção da rede de
conhecimentos tinha como principal linha de ação a circulação e divulgação dos trabalhos
por todos os setores do INEP/CBPE e através da circulação por meio de publicações,
seminários, periódicos, etc, desses trabalhos para a sociedade em geral. Especificamente em
relação aos cursos, a utilização dos resultados das experiências desenvolvidas nas demais
Divisões tinha o intuito de que as pesquisas contribuíssem entre si para a melhoria da
qualidade do sistema educacional brasileiro e elevassem a qualidade das pesquisas da
educação brasileira, com a utilização do aparato teórico-metodológico das ciências sociais.
Através de estudos, pesquisas e inquéritos desenvolvidos pelas Divisões procurava-
se perceber quais eram as áreas educacionais que deveriam ser estimuladas ou combatidas
para uma ampla melhoria da qualidade do ensino brasileiro. Podemos citar como exemplo o
inquérito intitulado Formação e Aperfeiçoamento do Magistério para Escolarização de
Emergência de 1961 (assinado por Lúcia Marques Pinheiro)
46
em que são diagnosticadas as
principais dificuldades na formação do professor primário brasileiro e são propostos alguns
cursos para suprir essas dificuldades.
O inquérito inicia com uma análise da importância da educação no “mundo
moderno” e a escola primária, as principais barreiras a serem derrubadas como a deficiência
de desenvolvimento social geral e a falta de planejamento das ações. Destaque para a
afinidade entre o ideário pragmático (que perpassa todo o projeto do CBPE e dos cursos) e
46
Ver referências.
a ideologia desenvolvimentista (com a ênfase numa educação prática que supra as
necessidades do desenvolvimento):
O desenvolvimento industrial veio tornar mais e mais urgente o
desenvolvimento da Escola Elementar, a que cabe uma nova e importantíssima
missão – a de preparar basicamente para o trabalho (p. 4).
O inquérito traça os principais objetivos do currículo da escola primária, analisa a
situação brasileira com destaque para os problemas diagnosticados em Recife e exalta as
experiências educacionais desenvolvidas na Escola de Aplicação do Centro Regional da
Bahia e no Centro Educacional Carneiro Ribeiro (também na Bahia). Além disso, chama
atenção para a importância da formação do professor e propõe, a partir dos resultados do
inquérito realizado no Estado da Guanabara, linhas gerais de ão e planejamento a serem
seguidas para a melhoria da qualidade do professor primário brasileiro. Alguns cursos de
aperfeiçoamento também são sugeridos visando “assegurar o desenvolvimento de atitudes,
interesses, idéias e/ou domínio dos instrumentos de trabalho para o ensino primário” (p.
28).
As publicações do INEP/CBPE (que eram em sua maioria resultado de pesquisas,
inquéritos e levantamentos) eram utilizadas como importantes fontes de estudos para os
alunos-bolsistas. O documento intitulado Bibliografia para o curso de Administração
Escolar do ITE da Guanabara
47
, assinado por Lúcia Marques Pinheiro e datado de 1963,
nos apontam algumas obras publicadas pelo INEP/CBPE e utilizadas nesse curso. Destaque
para “A Educação e o Ideal Democrático” de John Brubacher, publicado pelo INEP/CBPE
em 1960; “Projetos de Sala de Aula para o Curso Primário” de Taylor e Herrington,
traduzido e publicado pelo MEC/INEP em 1956; e inquéritos do CBPE relativos a: a)
Reforma do Ensino Primário (1957), b) Princípios Gerais para Agrupamento dos Alunos e
para a Avaliação da Aprendizagem (1963), c) Tabela de Determinação do Nível de
Escolaridade e de Classificação dos Alunos (1963), d) Contribuição do Professor para a
interpretação de quadros e Tabelas Relativas ao Aproveitamento dos Alunos de Acordo
com a Reforma do Ensino Primário (1963), e) Resultado da Pesquisa de Opinião Realizada
entre Professores sobre a Reforma do Ensino Primário da Guanabara (1963).
47
Ver referências.
Outro exemplo encontra-se no Plano de Curso de Orientadores de ano
Linguagem
48
, que nos aponta em termos objetivos os principais tópicos de estudos a serem
desenvolvidos durante o curso. O tópico 4 refere-se aos alunos-bolsistas conhecerem os
resultados do “Levantamento da Situação do Ano” e das pesquisas sobre as
“Dificuldades do Professor de 1ª Série” e da “Melhoria do Rendimento Escolar do 1° Ano”,
pesquisas estas realizadas pelo INEP/CBPE em suas divisões de estudos e pesquisas.
Para suprir a demanda social imposta pelo desenvolvimento econômico que o país
passava na décadas de 1950 e 1960, era necessário que a escola pudesse formar mão-de-
obra qualificada para ocupar os postos de trabalho criados com o advento da
industrialização e da urbanização do Brasil. Como dito anteriormente, o INEP assumiu o
papel de “cérebro pensante” do Ministério da Educação e seu trabalho girava em torno da
melhoria da qualidade educacional do país, com a construção de escolas, assessoria técnica
aos estados e municípios e formação de professores.
Dentre as estratégias de intervenção pedagógicas implementadas pelo INEP/CBPE
no período, os curso de aperfeiçoamento do magistério tinham importante função nesse
processo de melhoria e expansão da rede de ensino do país, pois atuavam diretamente na
formação de professores especializados que supririam a carência de profissionais diante da
demanda crescente por escolas e a extensão da escolaridade. A profissionalização do
magistério em sua dimensão técnica tinha apoio e recursos do governo federal através do
Programa de Metas. Em outras palavras, os objetivos do INEP/CBPE de melhor formação
do magistério através de ações pós-formação inicial caminhavam lado a lado com os
objetivos governamentais de formação técnica para a área educacional.
O relatório Ação do INEP e Centros de Pesquisas Educacionais no Qüinqüênio
1956-60
49
, publicado na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos em 1961, ilumina as
reflexões sobre o papel desempenhado de suprir a demanda educacional crescente, quando
comenta a criação do setor de Educação Complementar:
O Plano de Educação Complementar, em execução a partir de 1957, foi elaborado
tomando em consideração as exigências da atual estrutura social, quais sejam a de
uma escolaridade mais intensa e a necessidade de harmonizar a formação geral
48
Ver referências.
49
Ver referências.
com a preparação para o trabalho (Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos,
1961, p. 97).
A demanda crescente e a necessidade de articular as políticas públicas para o
suprimento das carências educacionais sinalizadas pelo Estado, necessitavam que os cursos
tivessem uma linha de ação voltada para uma formação prática e profissionalizante dos
professores e profissionais de educação.
O caráter prático da formação tem consonância com os pressupostos filosóficos do
INEP/CBPE e, conseqüentemente dos cursos, que era a filosofia pragmática. Nesse
contexto, o caráter prático tinha como principal objetivo proporcionar aos professores o
contato direto com a realidade educacional através do trabalho de cooperação entre as
partes envolvidas, em prol da construção de experiências significativas que transformassem
o olhar sobre a realidade educacional e empreendessem ações de mudança efetiva.
Podemos dizer que os cursos proporcionavam aos alunos-bolsistas o “aprender a aprender”,
para que estes pudessem adquirir procedimentos científicos e valores democráticos que,
internalizados, transformariam a prática educacional do país e constituiriam uma rede de
conhecimentos baseados no experimentalismo pedagógico e na filosofia pragmática. O
Programa de Prática de Direção de Escola – 2° ano
50
, assinado por Lúcia Marques
Pinheiro, nos exemplifica sobre a dinâmica dos cursos em relação ao seu caráter prático:
O curso deverá ser essencialmente prático, acompanhando as atividades
escolares. Assim, tratar-se-á, por exemplo, de início, dos problemas relativos ao
censo escolar e à matrícula, tendo os alunos a oportunidade de planejarem a
distribuição do trabalho pelos professores, coletarem dados sobre a comunidade,
etc.
Dar-se-á grande importância à observação de trabalhos diretores de vários tipos
de Escolas Primárias, para posterior crítica, seleção de problemas a estudar
planejamento da atuação adequada em cada caso, bem como à direção de
reuniões de professores e pais.
Serão estudadas, em particular, escolas de tempo integral, uma vez que é objetivo
da administração aumentar o dia escolar, e as escolas do Plano Ford (p. 2).
50
Ver referências.
No que se refere ao documento acima, é correto afirmar que a intenção era que os
cursos fossem dinâmicos no sentido de estarem em conformidade com as mudanças que
ocorriam na sociedade provindas do crescimento econômico, da crescente industrialização
e da urbanização. Para isso, os cursos pretendiam além do aperfeiçoamento da prática
docente, a profissionalização do magistério, visto que algumas mudanças estavam
previstas nos documentos reguladores da educação. Como exemplo, podemos citar o curso
de Artes Industriais que
iniciado o trabalho 10 anos, com a formação de professores e supervisores de
Artes Industriais, atividades da 5ª e séries primárias, o que, pela Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, terá amplo desenvolvimento, o INEP
programou, para o corrente ano, a formação de 97 professores de Artes
Industriais procedentes de vários Estados da Federação e que estão sendo
treinados no Rio e em São Paulo (Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos,
1964, p. 57)
Ficou claro, através das análises produzidas nesse capítulo sobre os cursos de
aperfeiçoamento do magistério, que as ações implementadas pelo INEP/CBPE para a
melhoria da qualidade do sistema educacional brasileiro tinham diretrizes e linhas de ação
bem definidas, além de contar com pessoal especializado contribuindo na execução das
ações. Para efeito didático, separamos em seções as diretrizes e as linhas de ação, mas
percebe-se que estas formam um conjunto conciso de ações planejadas visando um objetivo
maior, que era a reestruturação do sistema educacional brasileiro.
Lúcia Marques Pinheiro (no centro de chapéu) com as alunas do curso de Recreação ocorrido
no DF em 1957
51
.
É sabido que o projeto do INEP/CBPE de reestruturação educacional seguia
pressupostos do pragmatismo e da ciência experimental e o contexto político-econômico do
país tinha como base a ideologia desenvolvimentista. O encontro dessas linhas teóricas se
deu a partir de alguns pontos de contato que possibilitaram a execução e convivência de
projetos distintos.
2. Pontos de Contato entre o Ideário Pragmático e a Ideologia Desenvolvimentista
Á primeira vista pensar na convivência do ideário pragmático e a ideologia
desenvolvimentista num mesmo contexto social nos parece estranho, mas se acurarmos
nosso olhar verificamos que apesar de distintas as correntes de pensamento, possuem
alguns pontos de contato que permitiram ao Brasil entre os anos de 1955 e 1964 que as
correntes convivessem entre si e contribuíssem para o desenvolvimento educacional,
político e econômico do país.
Segundo Mendonça (et ali 2006), a filosofia pragmática expressa através das ações
do INEP/CBPE, encontrou solo fértil no contexto desenvolvimentista do país no período
51
Foto cedida a esse estudo e pertencente ao arquivo pessoal da professora Maria do Carmo Marques
Pinheiro.
estudado, pois ambos possuíam afinidades e modos semelhantes de atribuir as causas de
nosso atraso frente às nações mais desenvolvidas do mundo.
Podemos dizer que o aspecto prático e profissionalizante de formação de mão de
obra é um ponto de contato entre tais correntes. Para a ideologia desenvolvimentista a
profissionalização dos trabalhadores se fazia necessária, uma vez que o processo de
crescimento da economia implantado no governo de Juscelino Kubitschek, que possuía o
slogan 50 anos em 5”, necessitava que o setor educacional fosse dinâmico o suficiente
para “caminhar no mesmo passo” que os demais setores da economia. O ideário pragmático
via na prática importante ferramenta de formação, uma vez que seus pressupostos tinham
como base a idéia de “aprender a aprender” e de “aprender fazendo”. Além disso, a
educação baseada nos pressupostos do pragmatismo tinha no elemento prático a capacidade
de adaptação às realidades diversas e o elemento principal para a construção de
experiências significativas de melhoria da qualidade educacional.
A esse respeito, devemos lembrar que uma das premissas básicas do pragmatismo
deweyano é a de que o trabalho é o elemento mediador entre a instância racional e a
realidade empírica, correspondendo a um verdadeiro “vetor da práxis”. Tal idéia mostra-se
particularmente clara a partir da análise de iniciativas experimentais, como a Escola
Guatemala, que a partir das atividades desenvolvidas de modo aproximado em relação às
ocupações profissionais dos adultos, os alunos faziam suas aptidões evoluírem. Tal
preparação para o trabalho se coaduna perfeitamente com a ideologia desenvolvimentista,
servindo de suporte em nível educacional para a expansão dos postos de trabalho
qualificado que o processo de industrialização nacional demandava. O trabalho era
entendido como o elemento mediador da mentalidade do progresso, cuja premissa maior
seria o fato de que tornar-se-ia necessário romper com o modo conservador de pensar as
relações sociais dos indivíduos e a diretriz política da escola, encaminhando-se para uma
progressiva adequação aos pressupostos da democracia, bem como para uma visão mais
ampla dos saberes e conhecimentos necessários para o bom desempenho do papel da
cidadania.
O contexto histórico favoreceu o encontro dessas correntes de pensamento no
Brasil, uma vez que ambas percebiam a questão da formação de uma consciência comum
em prol do desenvolvimento como importante instrumento para obtenção de seus objetivos.
Outro fator relevante que uniu tais pensamentos foi a forma como ambos percebiam
os problemas brasileiros. As análises sobre as causas de nosso atraso frente as demais
nações do mundo e as alternativas para a superação dessa condição tinham aspectos
semelhantes, pois a semelhança das análises favoreciam a formulação de soluções nas áreas
da política, economia e educação baseadas no planejamento e na racionalização. Para
Mendonça et ali (2006):
Ambos os grupos estavam interessados na reconstrução da nação por meio da
criação de determinados mecanismos que propiciariam a autonomia nacional e a
fermentação de uma nova atmosfera cultural no país (p.111).
Tanto uma como outra formulação teórica se pautavam no aspecto racional do
planejamento administrativo. Neste sentido, é correto dizer que a ação pragmática se dava
no sentido de dotar a burocracia (mormente a da área de Educação) de um aspecto
funcional, ágil e irradiado. O desenvolvimentismo, por sua vez, propunha a idéia de que os
órgãos nacionais deveriam atuar de maneira eficiente no planejamento das questões
principais para o Brasil a partir de metas (sobretudo político-econômicas), facilitando assim
o que foi chamado de “cinqüenta anos em cinco” (conforme visto anteriormente).
Além disso, os intelectuais de ambos os pensamentos ocupavam cargos da
administração pública, o que facilitava a circulação de idéias e tinham grande influência na
elaboração das políticas públicas do Estado Brasileiro.
A presença desses intelectuais na máquina administrativa do país permitia que o
progresso científico fosse o grande ponto de contato entre tais ideários, à medida que
ambos os grupos entendiam a ciência como instrumento decisivo de progresso. O progresso
científico na ideologia desenvolvimentista aparecia nas ações governamentais,
principalmente na modernização do país e na industrialização, visando a superação da
condição de subdesenvolvimento brasileiro. No campo educacional, o ideário pragmático
seria a expressão da idéia de progresso da ciência, propiciando a área cientificidade.
A noção de progresso é fundamental às ideologias, pois para ambas toda a
sociedade caminha para um devir em que as suas fases sucedem-se progressivamente. No
que se refere ao pragmatismo, é possível dizer que tal progresso está associado à idéia de
democratização, enquanto que no ideário do desenvolvimentismo o progresso corresponde
ao desenvolvimento econômico. Para ambas as perspectivas, o progresso viria a ser a
própria essência do processo histórico, encarnada nas realizações desenvolvidas em
sociedade sob sua égide.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo teve como principal objetivo analisar os cursos de aperfeiçoamento do
magistério, privilegiando suas principais diretrizes e linhas de ação. Destacamos a
importância da iniciativa do INEP/CBPE, enquanto política pública, de planejar e executar
ações de intervenção pedagógica para a melhoria da qualidade do sistema educacional
brasileiro entre os anos de 1955 e 1964. Como projeto de (re)construção do sistema
educacional brasileiro, o CBPE atuou como principal órgão executor das formulações do
INEP e tinha Anísio Teixeira como grande idealizador, gestor e figura de destaque.
Especificamente sobre os cursos, sua importância se deu principalmente na
formação do professorado brasileiro, a medida que os professores, chamados de alunos-
bolsistas, recebiam formação específica sobre determinada temática educacional e todo o
apoio pedagógico e financeiro necessário para sua estada em outra cidade do país, no caso
de nosso estudo o Rio de Janeiro (antigo Distrito Federal).
A formação continuada permitia ao professor entrar em contato com inovações
pedagógicas e propiciava uma formação prática baseada nos pressupostos da ciência
experimental e do pragmatismo, o que significa dizer que foi uma experiência pioneira de
formação continuada de professores no país. Outro fator que deve ser levado em conta era
o tempo que os alunos-bolsistas passavam no DF, cerca de 1 (um) ano, o que proporcionava
ao professor uma formação completa, abarcando as diversas dimensões do trabalho docente
e da administração pública. O planejamento racional das ações levava os alunos-bolsistas a
um “mergulho” nos estudos e reflexões sobre a educação brasileira, à medida que estes
encontravam-se em outra cidade e com o pensamento focado em seu aprimoramento teórico
e prático. Ao retornarem, levavam em suas malas, além de todo o conhecimento
acumulado durante esse tempo e as experiências compartilhadas, o entusiasmo e a vontade
de mudar a realidade escolar de suas regiões de origem com novas formas de encarar os
problemas.
É importante destacar também que nesse período não havia pós-graduação no Brasil
e a partir dessa iniciativa os professores de todo o país tiveram a oportunidade de entrar em
contato com as inovações pedagógicas produzidas pelos Centros. Podemos dizer que a
estrutura de pesquisa montada pelo CBPE nas áreas de ciências sociais e educação,
juntamente com suas ações de intervenção pedagógica como os cursos de aperfeiçoamento
do magistério, foram profícuas ações que antecederam a institucionalização da pós-
graduação no país.
Infelizmente a partir de 1964, após o Golpe Militar, as ações foram rareando e seus
fins foram sendo diluídos por propostas educacionais centradas em outros paradigmas. Foi
com a saída de Anísio Teixeira da direção do INEP/CBPE que o projeto perdeu seu
idealizador e principal gestor, culminando na extinção do CBPE em 1975. A professora
Maria do Carmo Marques Pinheiro em entrevista (já citada anteriormente), nos esclarece
em poucas palavras o que significou a saída de Anísio Teixeira do INEP/CBPE:
(...) Vo sabe que o Dr. Anísio foi perseguido? Pois justamente, sabe que o
CBPE foi extinto, todas essas coisas. Em relação aos cursos, eles não
continuaram ocorrendo normalmente não! Acabou, acabou. Foi um negócio
assim, eu sei que o INEP foi decepado né? Então todas aquelas coisas que se
fazia perdeu-se. (PINHEIRO, 2007).
As experiências se extinguiram e suas memórias silenciaram-se ao longo do tempo.
O Golpe Militar de 1964 tratou de acabar com as ações de intervenção pedagógica do
INEP/CBPE. Assim como na década de 30, Anísio Teixeira foi obrigado a sair da vida
pública, deixando para trás seus sonhos de reorganizar o sistema educacional brasileiro.
Exonerado do INEP e da CAPES, Anísio foi privado de seus direitos elementares.
O legado das ações implementadas, principalmente em relação aos cursos de
aperfeiçoamento do magistério, se deram, principalmente, na forma como se pensou a
formação docente. Através de um projeto bem planejado, com objetivos traçados e que
atendiam às principais deficiências de formação docente e de demanda educacional, foi
possível a construção de cursos de aperfeiçoamento que visavam à melhoria da qualidade
da escola brasileira, possibilitando a formação de uma nova geração de professores com
talentos para modificar as bases sobre as quais se erguia a escola brasileira, altamente
seletiva e excludente, e, ao mesmo tempo, formando uma nova organização escolar baseada
nos pressupostos da teoria pragmatista.
Além disso, a formação continuada fazia parte de um conjunto de ações integradas
que visavam o mesmo objetivo, que era a (re)construção do sistema educacional brasileiro,
e contavam com uma rede de conhecimentos e de pessoas para por em ação o projeto de
forma integral.
O modelo adotado para a constituição dos cursos, pensado de forma integrada com
as demais ações de intervenção pedagógica e executado sob a base constituída pelo
INEP/CBPE, nos serve como modelo para pensarmos em que condições teóricas e práticas
a formação continuada ocorre nos dias de hoje em nosso país. Não pretendermos com isso,
fazer nenhum juízo de valor sobre como é pensada a formação continuada hoje, trazemos
apenas um estudo que pode contribuir na reflexão dos objetivos que a formação continuada
pretende atender, apresentando uma experiência que a nosso ver foi bem sucedida.
O estudo apresentado tomou como foco de análise apenas os cursos de
aperfeiçoamento do magistério oferecidos pelo INEP/CBPE nos anos de 1955 a 1964.
Optamos por esse recorte por dois motivos: a) essa temática nos ajuda a compreender como
uma iniciativa de formação continuada fez-se positiva em nossa história docente; b) devido
ao tempo do mestrado não seria possível aprofundar as análises relativas as demais
dimensões de trabalho do INEP/CBPE.
Os limites do estudo ficaram a cargo de algumas dificuldades encontradas ao longo
do percurso, como:
a) a dificuldade de localizar documentos relativos a essa temática, devido ao
processo de apagamento que esse período da história da educação brasileira
sofreu;
b) a falta de atores sociais que participaram dessas experiências implementadas
pelo INEP/CBPE e que pudessem contribuir com relatos e entrevistas.
Porém, outras análises e interpretações podem ser feitas sobre o mesmo objeto,
assim como outras visões podem refutar o que foi dito. Questões de estudos surgiram
durante a confecção dessa dissertação e podem ser estudadas em trabalhos posteriores.
Podemos citar como exemplo: o aprofundamento das relações entre as estratégias de
intervenção pedagógicas implementadas pelo INEP/CBPE; o estudo relativo ao trabalho
das demais Divisões; o estudo aprofundado de um determinado curso de aperfeiçoamento
do magistério em nível nacional; como se dava o processo de escolha de um determinado
curso no âmbito interno do INEP/CBPE; a memória dos cursos de aperfeiçoamento do
magistério através do recurso da história oral de atores sociais que participaram das
experiências; a análise aprofundada dos pressupostos teórico-filosóficos dos cursos; etc.
Muitas idéias surgiram e ainda podem surgir, pois o entrelaçamento das temáticas de
formação docente e o período nacional desenvolvimentista são ricos e inesgotáveis. Outras
análises serão feitas e outros objetos de estudo surgirão diante de tão importante período de
nossa história.
Para finalizar, este estudo é uma pequena contribuição ao campo da história da
educação que não se pretende definitiva acerca deste tema, mas sim um estudo que
esperamos, seja frutífero no sentido de lançar novas luzes à história da formação de
professores no Brasil.
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FONTES PRIMÁRIAS
Arquivo Anísio Teixeira (FGV / CPDOC):
Carta à Cândido Mota Filho, [Rio de Janeiro?], dez. 1954. Atc 54.12.00.
Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais no Primeiro Semestre de 1963. AT 52.06.04,
Fot. 0629-0632.
Escola Guatemala. AT 52.06.04, Fot. 0411-0434.
Panorama de Aperfeiçoamento de Pessoal Realizado pelo INEP, s/d. AT 52.06.04. F0478-
0495.
Relatório das Atividades Realizadas pela Divisão de Aperfeiçoamento do Magistério do.
Relatório dos trabalhos realizados pela Coordenação de Cursos do INEP de 1956 a 1960.
AT 52.06.04. Fot. 0496-0521.
Sugestões para o Programa de Publicações, s/d. ATt 52.06.04, Fot. 0142-0143.
Súmula de atividades em 1963. AT 1613.
Arquivo Lúcia Marques Pinheiro (ABE):
A Escola Experimental do INEP. XII Conferência Nacional de Educação, Salvador, Bahia,
1956.
Bibliografia para o Curso de Administração Escolar do ITE da Guanabara. INEP/DAM,
1963.
Curso de Administração Escolar – para formação e aperfeiçoamento de diretores de
escola primária. INEP, s/d.
Curso de Administradores Escolares Programa de Prática de Direção de Escola ano.
Instituto de Educação da Guanabara, 1964.
Curso de Orientadores de 1° ano – (Linguagem). INEP Ministério da Educação e Cultura
– DAM do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, s/d.
Curso de Professores de Prática de Ensino – GB 1963. Planejamento de Curso (parcial).
MEC-DAM-INEP, 1963.
Formação e Aperfeiçoamento do Magistério para a Escolarização de Emergência, 1961.
Inquérito sobre a Formação do Professor Primário. DAM do CBPE, INEP, 1961.
O Método de Projetos na Escola Experimental do INEP, 1956.
Reforma do Curso de Administração. INEP/DAM, 1964.
Relatório das Atividades do Primeiro semestre de 1957. Divisão de Aperfeiçoamento do
Magistério Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais do Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos, s/d.
Relatório das Atividades Desenvolvidas pela Professora Lúcia Marques Pinheiro no
Instituto de Educação, no ano de 1963.
Sugestão de Programa de Psicologia para os Cursos de Formação de Professores
Primários. INEP/DAM, 1964.
ENTREVISTA
PINHEIRO, M. do C. M. Rio de Janeiro, 2007. Entrevista concedida à Cecília Neves Lima
em 28 de novembro de 2007.
ANEXOS
Anexo 1:
Roteiro de entrevista com a Professora Maria do Carmo
Marques Pinheiro
Entrevista concedida pela professora Maria do Carmo Marques Pinheiro à Cecilia
Neves Lima no dia 28 de novembro de 2007.
Em quais cursos de aperfeiçoamento do magistério a senhora participou? Somente
como professora ou teve alguma outra função no INEP/CBPE?
Não, eu fui professora da... como é que se chama? Da Guatemala durante pouco tempo, uns
3 anos mais ou menos. Depois eu saí e voltei justamente para... naquela época era
município, não era estado, eu saí pelo estado. E acontece é o seguinte: mais tarde quando
começavam, a DAM começou com livros e tudo, guias de ensino, começou justamente...
como é que se chama?... Me chamaram para que eu ajudasse, fizesse parte do grupo que ia
fazer o guia de estudos sociais. A chefe era a Josephina Gaudenzi, que ainda está viva, mas
está...estou meio por fora. Então, aí eu voltei. Nisso, nós usávamos muito ali a biblioteca do
CBPE, você sabe onde é? Sei. Sabe, sabe tudo! Então nós fizemos isso, quer dizer, eu, a
Maria Glória Correa Lemos e justamente a chefe era a Josephina Gaudenzi. Mas na
Guatemala eu conhecia a... como é o nome dela?...ai meu Deus, gosto tanto dela...Risoleta
Pereira Cardoso que estava justamente, ...estava sendo encarregada justamente de ver
esses cursos, etc. Então eu fui chamada pra estudos sociais. estava a Lenir Werneck, e
eu fiquei 1 ano fazendo assim a parte mais prática e ela ficou assim.... na parte mais teórica.
Daí em diante eu fiquei com toda essa parte. E esse curso era curso de formação de
professores leigos porque era uma realidade. Nós somos contra trazer professores leigos,
mas era uma realidade do nordeste muito grande, então tinha que ser e tudo mais. Depois eu
fiquei numa situação assim de orientadora de estudos, quer dizer, então ensinava o pessoal
a aprender, quer dizer, saber onde procurar o material e como fazer as coisas, etc. Então
teve esse curso que foi justamente, foi durante 2 ou 3 anos, não me lembro, que era
formação justamente dessas moças. Depois então, resolveu-se que não mais ia haver esse
curso e sim, curso de formação de professores de prática de ensino, porque eles achavam
que justamente o problema, justamente do ensino fraco era justamente o fato que havia essa
parte do ... da prática de ensino para formação era falha ... e então vinha gente de outros
lugares, por exemplo, veio gente de Manaus, tinha 2 meninas do Paraná, tinha gente de
Belo Horizon... de Minas Gerais, tinha gente assim ... Alunos do Brasil todo? Sim, exato
então era mais diversificado e ... foi esse curso assim.
A senhora lembra em que anos esses cursos ocorreram?
Bem, Guatemala foi na época de 50. Esses cursos foram... como se chama? No final dessa
década e começo da outra.
Em média quanto tempo o curso tinha de duração?
Era de 1 ano mais ou menos, em média 1 ano. As meninas vinham no começo do ano e no
final do ano elas retornavam ... Às suas cidades de origem? Isso, retornavam.
E quantos alunos havia em média em casa turma?
Olha, eram trinta e tantas pessoas. Eram turmas grandes? Isso, eram turmas grandes.
Agora não eram turmas não, geralmente era 1 turma. Por isso a gente cuidava bem delas,
elas ficavam o dia inteiro e tudo, quer dizer, tinha 1 pessoa ... Clotilde e a Teresa Lopes
de Castro que viam como elas estavam, é ... alojadas ... então tinha essa coisa toda. Fim de
semana era comum arranjar alguma coisa pra elas e tudo mais. Quer dizer, assim ... por
exemplo aquele espetáculo, lembro bem, do Sargento de Milícias que foi bastante
interessante, que o Pitanga fez justamente o sargento de milícias, entendeu? Então ele é
preto e os brancos eram os escravos, esse negócio todo. Então foi muito interessante, ali no
Largo do Boticário. Então a gente teve justamente ... tinham aberto pra elas ... diversão,
diversão mais cultural, etc, etc. Depois teve uma vez que se levou lá onde o Pascoal Carlos
Magno tinha a tal casa dele de cultura, tudo mais, elas passavam o fim de semana lá.
Como era a dinâmica do curso? Era uma professora só que ministrava o curso
inteiro?
Não, eram algumas professoras, umas 4 ou 5 professoras. E havia um trabalho de
aglutinação que era justamente a orientação para o estudo, e assim por diante, entendeu? E
a senhora lembra, mais ou menos, que tipo de disciplinas eram ministradas no curso?
Aquelas mais ou menos normais, então filosofia da educação...essas coisas normais que são
necessárias. Nós tínhamos aquela preocupação justamente de mostrar assim, o importante
era a responsabilidade. Então o trabalho era bastante importante e tinha assim... mexia com
as pessoas, mexia com o Brasil, mexia com tudo! Então era uma questão assim de... Eram
matérias relacionadas à própria pedagogia? É exato. Não tinha nenhuma disciplina,
por exemplo matemática pura, alguma coisa assim não relacionada diretamente à
pedagogia?Tinha... Tinha porque se fazia assim porque senão não dava propriamente. Ah!
Isso era o professor João, como era o nome dele meu Deus? Ele era muito bom e
justamente... então havia... na hora de estar ensinando o como ensinar se ensinava os
próprios conteúdos que elas deveriam ensinar aos alunos porque senão não né? Então
tínhamos aquela idéia, aquela responsabilidade nelas, elas próprias procuravam as coisas,
etc. Dr. Anísio também fazia muita questão, quando chegava assim certo período, nós
usávamos muitos livros... Então quando o curso terminava, elas levavam uma série de
livros, elas não iam de mãos abanando! (risos) Elas iam justamente com livros doados.
Levavam uma pequena coleção? Levavam justamente pra sua região para que elas
pudessem continuar estudando, melhorando, etc, e melhorando os outros. Então era aquela
questão assim de multiplicativo.
Cada professor dava sua aula independente ou havia alguma recomendação especial?
De um modo geral nós fizemos, aliás quem trabalhou muito nisso foi aquela ... Wanda
Rolim Pinheiro por exemplo, mas então fizeram mais ou menos e a gente junto, etc, mais
ou menos uma coisa concatenada, não era a pessoa chegar e fazer o seu curso. Não, era o
curso que eles sentiam que estariam justamente ... tinha uma globalização. Mas tinha
alguma recomendação especial? Ah! Logo no começo do ano nós tivemos uma reunião
com a Lúcia que fez uma explanação do que tava acontecendo dentro dali, então quais eram
as idéias mestras, etc. Tivemos aquilo, então ... e nós tínhamos a nossa diretora dos cursos
que era a Risoleta Ferreira Cardoso. Viu? Então nós tínhamos assim.
Existia algum material didático nesses cursos? Que tipo de material era utilizado no
curso? Era Texto?
Olha, foi muito utilizado no curso de formação de prática de ensino um livro, como é que
se chama? É pratica de ensino...não! Como é que se chama... estava sendo preparado e nós
usávamos justamente os capítulos e tudo mais. Mas teve outros né, quer dizer, nós tínhamos
a bibliografia em que a Wanda Rolin por exemplo organizou muita coisa, etc. Então havia
aquela situação assim.... Prática de ensino como recurso...não! Daqui a pouco eu vejo, eu
tenho aí. Ta bom.
Como eram as avaliações dos cursos?
Vária maneiras, quer dizer, havia avaliação com o próprio aluno, havia avaliação... essas
avaliações todas e haviam provas também. Eles faziam provas? Faziam também, não era
nem o mais importante, mas havia todas essas coisas. Então era um conjunto de coisas que
você mais ou menos.... e depois ficava assim:era uma sala só... então a coisa ficava assim
muito perto.
Os alunos recebiam alguma verba pra vir pra cá?
Eles tinham, porque inclusive eles tinham o dinheirinho deles e tinham como é que se
chama? Estada também. Tudo era pago pelo INEP? Elas tinham uma quantidade né, é
possível que elas viessem com algum dinheiro dos Estados, é possível. Mas aqui eles
tinham justamente... uma coisa engraçada, quando elas chegavam aqui era um tal da gente
emprestar dinheiro a eles, porque eles vinham sem roupa de lã, viu? Precisavam comprar
roupas? É, precisavam comprar cobertor, num sei que, num sei que lá. Então a Clotilde e
aquela menina Teresa ajudavam muito nisso, pra escolherem as coisas, como as meninas
estavam. Então havia sim, como é que se chama? O NEP tinha uma verba pra isso e essa
verba era justamente dividida na manutenção delas, no material nosso e assim por diante.
Tinha tudo, quer dizer, cada programa tem uma verba viu?
Como eram escolhidos os professores que ministrariam os cursos?
Olha, esses cursos o que acontece é o seguinte: eu não estou sabendo por exemplo daqueles
cursos que existiam ... por exemplo que mandavam pessoas daqui, mas não era do INEP,
mandavam pessoas daqui dar aulas durante uns meses, que geralmente eram meses de
férias, então iam ao nordeste... então havia isso entendeu? Mas agora aqui se falando do
INEP, que o Dr. Anísio e,como é que se chama? E da DAM. DAM você sabe o que é? Sei.
Pois é, divisão do magistério. Então a questão era justamente essa. Agora quem conhecia
muito as pessoas e o ... apontava muito as pessoas que iam ser convidadas e tudo era a
Risoleta que tinha uma experiência muito grande no Departamento... do...naquela época
era Guanabara? Mas então o que aconteceu é isso. É... a pessoa... eram pessoas que ela
conhecia, etc, então havia aquela conversa toda, o que que se deseja fazer e tudo mais. Teve
gente muito boa lá, teve a Lúcia... a cia Leitão, a Maria Vanir (que morreu agora), a
Lúcia Larquet ... Teve, teve gente muito boa... a D. Juracy....
Em relação aos professores, era perceptível que eles tinham uma idéia comum em
relação ao curso ou alguns professores destoavam da idéia principal do curso?
Não porque de um modo geral os professores tinham sido escolhidos pela Risoleta e pela
Lúcia, então elas sabiam mais ou menos como eram as pessoas né? Elas escolhiam
então os professores que se adequariam aquele projeto? É, exato. Então pegavam
pessoas assim. E a Risoleta trabalhou muito tempo no Departamento de Educação, então
conhecia muita gente. Então ela escolhia esses professores? É escolhia assim: mesmo
na Escola Guatemala teve muita gente indicada pela Risoleta, por exemplo a Nilda da Silva
Oliveira ( depois casou com o Valadão) tinha trabalhado numa escola com a Risoleta, ela
ainda mocinha, e a Risoleta ficou encantada com ela porque ela era uma professora
excelente mesmo. Então teve assim várias que a própria Risoleta apontou, porque elas eram
convidadas né? Para o trabalho na escola. Isso foi uma coisa que ajudou muito, durante
bastante tempo foi assim né? Facilitava muito o trabalho porque as professoras tinham
umas idéias comuns e trabalhavam em prol de uma idéia e não destoavam. E essa
integração também aparecia nos cursos?
É, nos cursos também por causa da vinda delas, elas já vinham, como é que se chama?...
era avisada assim: fulano é muito bom, num sei que num sei que lá, tem as mesmas idéias
que nós. Então era nessa base, porque se fosse uma situação assim, não de convite, mas da
pessoa se apresentar e dizer eu quero, ficaria mais difícil. Mas como era uma questão de
convite, então facilitou muito.
E esses cursos especificamente que a senhora trabalhou, foi o INEP que escolheu?
É, eu creio que sim porque era aquela questão assim: quais são os grandes problemas do
Brasil? Então eles não estavam pensando no local, porque achavam que não ia decair tanto
depois... Mas então, quer dizer, eram os problemas, muitos lugares que não tinham
absolutamente...bons professores nem nada, era uma coisa assim. Então era preciso
melhorar o professor para que aulas, haja um ensino melhor, etc, etc. Então qual era o
problema do Brasil? Professores que não m formação especial, específica. Então temos
que dar isso, dar consciência de que eles não eram meros instrutores, eram educadores!
Essa idéia toda de educador, daquela necessidade justamente de ver aquela parte toda...
física e todas essas coisas né?.
Como era a relação dos professores que davam os cursos com a cúpula do INEP? E
com os professores da Escola Guatemala? Havia algum tipo de dificuldade na
execução do trabalho?
Olha, esses cursos não tinham relação direta com a escola Guatemala, nenhuma relação
direta. Eram coisas diferentes, distintas. Agora...os professores... como é que você
falou?Como era a relação dos professores com a própria cúpula do INEP? A ponte de
ligação era a Lúcia né, ela era a pessoa da ligação e que punha sempre Dr. Anísio a par de
todas as coisas. Quer dizer, então era essa ligação assim: se as coisas não estivessem muito
boas e coisa parecida, vinha de lá também. E essa relação com o INEP ou com a figura
da Lúcia era uma boa relação? Era tranqüila, era uma boa relação.
As alunas que participavam dos cursos eram apenas professoras ou ocupavam algum
cargo?
Não, elas eram professoras. Os primeiros eram professoras dos primeiros anos e essas eram
professoras consideradas boas, aptas. Consideradas porque não eram. Então, pra ter
justamente a parte prática do ensino... Então essas eram outro tipo. Mas elas eram
professoras? Eram só professoras da área de pedagogia. As leigas eram, como é que se
chama?... coisa... e essas não, eram direitinho, tinham alguma prática de pelo menos 5
anos, mas de um modo geral era numa base de 10.
Em relação às alunas, qual era a opinião delas sobre os cursos de um modo geral?
Era bom, era bom.Escreviam muito, as antigas mantinham uma correspondência grande.
Era bom, bastante bom...
E havia algum tipo de dificuldade na execução do trabalho?
As dificuldades normais né, inerentes, quer dizer, as meninas eram muito fraquinhas...
Então aquelas dificuldades. E em relação à infra-estrutura? Ao programa? Alguma
dificuldade maior? Não, não havia nada. Era um clima bom.
E valia a pena ser professor dos cursos de aperfeiçoamento financeiramente? Ou valia
a pena apenas como status, experiência?
As duas coisas né. Não era bem pago porque.... mas as pessoas reclamavam isso de vez
em quando. Reclamavam pra Risoleta: mas você quer que eu venha duas vezes aqui,
quando eu posso vir uma, podia vir uma vez só! ela disse: mas pedagogicamente...
(risos) o pessoal um dia reclamou, acho que foi ela, a Lúcia Larquet que não tinha
lógica, nós somos velhinhas! Aí ela ficou assim triste e disse assim: é muito triste ser, como
é que se chama? na.... dirigir, porque o chefe é o desmancha prazeres das comandadas.
ela me olhou e eu disse assim: e os comandados... eu fiz um negócio qualquer, e os
comandados, como é que se chama?... tem as suas coisas é... prejudicadas.
Sobre as verbas do INEP havia algum problema?
Não, não houve não! Reclamavam alguma coisa em relação às verbas? Não houve não
porque, como é que se chama? Então como eu disse o Dr. Anísio... por exemplo a verba das
crianças, então ele sabia que as coisas demandavam, tem que ter! Então era providenciado
isso. Nós tínhamos uma... nosso arquivo era um arquivo grande com todas aquelas coisas e
tudo. Então havia material. A infra-estrutura era boa? É, a infra-estrutura era boa. Na
Escola Guatemala também a infra-estrutura era boa. Também tinha uma boa infra-
estrutura em relação a todos os serviços? É, inclusive tinha alimentação porque eles
ficavam o dia inteiro. A alimentação era gostosa e todas essas coisas. Também era o
INEP que custeava? Era sim. Exato. Os professores não porque os professores eram do
coisa. Parece que no primeiro ano, parece que houve uma gratificação, mas depois
acabaram com a gratificação. E o que acontece é o seguinte: porque nós éramos daqui,
então nos estávamos justamente requisitadas pra aquilo, mas continuávamos como
professoras do Estado. Do Distrito Federal né? Não, foi Distrito Federal, mas ali era...
Estado da Guanabara? É...não! Ainda não era, era Distrito Federal ainda. Então o que
aconteceu é o seguinte, quer dizer, então nós tínhamos justamente... o vínculo não acabou
porque aquilo era, como é que chama? Era um projeto feito num espaço que não era deles.
Então era uma espécie de convênio num espaço do Distrito Federal, do governo. E havia
também os professores, havia merendeira, essas coisas todas que faziam parte da rede. Não
faziam parte do INEP, o trabalho do INEP era pedagógico ali. A organização da
escola no âmbito pedagógico. É, exato. Ali ele entrava em coisas assim: em negócio de
almoço, etc. É porque realmente ele tava com um horário diferente, etc, então isso era do
INEP. Não podia deixar as criancinhas morrerem de fome (risos). É, ainda bem né? Senão
não ficaria bem pro INEP nem pros professores! (risos). É gico! Nem para os
professores (risos). Então o negócio é esse. Mas o interessante nisso, por exemplo, são as
pessoas assim que... tinham... por exemplo, essa Helena que eu não me lembro o nome,
talvez a Arlette tenha dito a você, Moreira num sei de que. Ela tinha sido professora ou
diretora de uma escola de... do tempo do Pedro Ernesto, quando Pedro Ernesto foi prefeito
daqui. Dr. Anísio foi Secretário de Educação. Então tinha 4 colégios em que eles fizeram,
compreendeu? Experiências. Eu não sei direito o que é isso não. Eu sei que tinha o método
Winnetika, tinha o Dalton, tinha projetos e tinha um outro que agora eu não to me
lembrando. Então tinha 4 escolas, dessas 4 escolas, 1 era dirigida pela D. Juracy... Silveira.
D. Juracy foi trabalhar conosco depois. Aliás ela era muito amiga de Dr. Anísio. Outro
colégio era da... era dessa Helena que também foi chamada. Tinha outro colégio que era da
Josephina Gaudenzi que não trabalhou nem na Escola Guatemala nem nos cursos, mas
trabalhou nas publicações. E, esse outro eu também não me lembro, mas... isso é que eu
tenho pena que se perdeu por completo, entendeu? Quer dizer.... houve aquela confusão
toda.... E os trabalhos se perderam? É, se perderam. E a relação das pessoas nesse
mesmo espaço era boa também entre as várias divisões? Ou elas trabalhavam de
forma separada e não tinha muito contato entre elas?
Você sabe o que acontece é o seguinte: aquela casa facilitava a convivência porque aquilo
era assim tinha uns locais com os gabinetes que você tinha fechado, aquele negócio
todo.Mas as pessoas por exemplo, lá décima quando a gente ia lanchar ou coisa parecida, a
gente descia e atravessava como é que se chama? Os andares do prédio. Então por esse
motivo facilitava muito isso, entendeu?
Qual era o grau de interferência de Lúcia Marques Pinheiro na execução do trabalho?
De vez em quando ela aparecia por lá, etc. Ela ia sempre e o Dr. Anísio era muito
interessado, então ela estava sempre bastante informada, etc, então tinha aquela coisa... e
justamente ela dava assim o panorama, mostrava, etc. Então havia sempre aquela situação.
Um relatório diário de atividades? É, exato e sempre uma avaliação, como é que se
chama? Do professor com os alunos e s levávamos muito pra auto avaliação também, na
situação assim deles perceberem que estava havendo uma mudança neles, que eles
realmente estavam crescendo. Agora quanto a essa questão assim da supervisão sempre
houve, quer dizer, então a Risoleta tava sempre em contato com a Lúcia. Lúcia de vez em
quando ia lá também, contava o que estava acontecendo, então Dr. Anísio também sabia,
estava a par de tudo.
E depois de 64? Como é que ficou a relação das pessoas do INEP, o próprio INEP com
a questão do Golpe Militar? As ações continuavam as mesmas ou elas tinham alguma
diferença?
Por ai, isso... Você sabe que o Dr. Anísio foi perseguido? Pois justamente, sabe que o
CBPE foi extinto, todas essas coisas. Mas em relação aos cursos, eles continuaram
ocorrendo normalmente? Não! Acabou, acabou. Foi um negócio assim.... Depois de 64?
É... é, num sei perfeitamente não, mas eu sei que o INEP foi decepado né? Então todas
aquelas coisas que se fazia perdeu-se. A infra-estrutura foi piorando? eu não tenho
mais conhecimento né. Mas em relação a esses cursos que a senhora falou em 68,69,
como é que eles eram? Como é que eles ocorriam? Olha, eu dei a data de 69 porque em
69 meu pai adoeceu e isso fez com que eu saísse, mas eu não me lembro exatamente se foi
em 69 que eu saí não, mas... É, o curso continuou durante mais algum tempo... É, eles não
mexeram. De forma normal? Como ocorria antes? É, exato. E a questão dos recursos
eram os mesmos? Aí, enquanto Dr. Anísio tava em cima não houve problema. Dr.
Anísio era muito interessante porque ele dizia, por exemplo, na Guatemala quando você
entra, vode vez em quando encontra assim reproduções de quadros célebres, etc. Então
justamente tinha uma verba e ele disse o seguinte: nós temos que habituar as crianças
com as coisas belas. Então deu aquele negócio também que a escola tava em branco né?
Então puseram justamente os grandes pintores, etc. O pessoal ia assim que... quando saía da
escada e assim por diante. Inclusive havia traças de vez em quando. Quando o professor
quis fazer a... como é que se chama?... a biblioteca! A biblioteca era assim relativamente
pequena, Dr. Anísio disse: precisa fazer uma verba pra ter bastante livros pras crianças.
Então disseram a ele: não vai ter espaço pra eles pegarem. Ele disse: faz num canto do
refeitório. Saiu dali na visita e tudo mais. Aí, nós, as débeis mentais, dissemos pra ele: mas
os livros vão sumir! Ele disse: não, não. Não vão sumir não! Mas se sumir, uma criança
querendo um livro. Quer dizer, então ele era aberto né? Ele visitava muito a Escola
Guatemala, as crianças gostavam dele. Agora o CBPE por exemplo, havia muita coisa,
muitas outras coisas. Não era a DAM. Nós estávamos lá em cima, mas tinha uma
quantidade de coisas, etc, do INEP. Inclusive no andar tinha a biblioteca do INEP que é
uma maravilha. Era... parece que foi pra Brasília. Metade dela ficou aqui no Rio, ela fica
na UFRJ, parte dela ficou lá. Lá tem uma biblioteca separada chamada Espaço Anísio
Teixeira que ficou com parte do acervo do INEP e do CBPE. E a outra parte foi pra
Brasília, ficou no INEP mesmo em Brasília. Sei. Eles dividiram, o que é uma pena
né? É, exato. Dividir um acervo, você perde muita coisa. É, exato. Então tinha aquela
seção das revistas, que o pessoal recebia as revistas, estudavam aquilo... Eles faziam a
propaganda.... propaganda não, divulgação! De certas coisas. Tinha um série de coisas. E
tinha o grupo, como é que se chama? Estudos Sociais do Darcy Ribeiro. Da Divisão? Sim,
exato.
Em relação às publicações do INEP, como é que elas se processavam? A senhora sabe
alguma coisa, porque por exemplo a Escola Guatemala teve 2 publicações que foi
Ensinando Matemática à Criança e o guia de Estudos Sociais que foram experiências
que ocorreram na escola e viraram livro né? Como é que foi essa passagem para o
livro?
Era todo o problema da DAM, quer dizer, idéias do Dr. Anísio, etc. Antigamente havia os
Guias de Ensino, que o muito bons, também dessa época de 30. Da Instrução Pública
né? Isso, de 30, etc. É de 35 né? Eles o de 35. É. Eu sei então que havia essas coisas
todas, Dr. Anísio tinha sempre a preocupação de que houvesse justamente o material para
que as pessoas.... ensinassem melhor e todas essas coisas. Pudessem consultar? É,
consultar e... não! Assim ver como eles assim exatamente o que se deveria fazer, etc,
porque tinha umas verdadeiras receitas de vez em quando. Então era um desejo dele. Então
ele também fez isso por intermédio da DAM, então era nessa base assim viu? E Teve
alguma dificuldade na hora da publicação desse material? Olha.... Bem, houve umas
coisas né? O Lacerda deixou um tempo imenso, como é que chama? Não deixou circular
Estudos Sociais porque ele tinha mania que Dr. Anísio era comunista. Dr. Anísio não tem
nada de comunista, tanto que ele entrava nos Estados Unidos a vontade, etc. Uma vez D.
Juracy me contou,e disse até o nome do fulano que eu não me lembro, o fulano trabalhou
lá, um subalterno né? Então houve uma verba para ele escolher uns certos livros e ele achou
que tava tudo assim muito na base da democracia etc, e achou que não era justo, que as
pessoas tinham que... foi no colégio secundário aquele negócio todo. comprou uns livros
esquisitos e isso deu uma confusão tremenda com algumas pessoas. Então eu sei que
quando... ele no final, justamente que ele disse que havia... Estudos Sociais não podia...
matemática ele deixou né? Então o que acontece é o seguinte: ele fez aquele negócio,
aquela menina Arlette é que explicou a ele que ali não tinha nada de comunismo. E aí então
foi liberado, liberou porque estava naquela base... Então é umas coisas assim né? O
problema é esse.
E a senhora teve alguma notícia de como era a circulação desses livros?
Esses livros eram doados pras escolas. Pras escolas do Brasil todo ou do Distrito
Federal? Pro Brasil todo porque justamente eles aqui receberam, fazia parte daquela
coleção que os professores levavam. Mas justamente aqui o Lacerda.... teve receio né?
Quanto ao Dr. Anísio. Então ele brecou. Mas no Brasil todo o livro foi distribuído?
aqui teve esse problema? É, foi sim. Foi distribuído sim. Não, e foi o problema... foi só de
perder algum tempo porque foi resolvido, muita gente nem notou que domorou (risos).
E pra terminar D. Maria do Carmo, a senhora podia me contar um pouquinho como
foi a sua trajetória profissional até chegar a Escola Guatemala, aos cursos.
Eu não tenho nenhuma trajetória especial não. Eu fui do instituto, tinha um grupo grande e
nós devemos trabalhar...[PAUSA DA EMPREGADA OFERECENDO CAFÉ] nós
fomos trabalhar em Campo Grande porque antigamente havia esse negócio, quando você se
formava votinha que fazer a zona rural,depois acabou isso quando começaram as outras
escolas normais, terminou. Você tinha que ter ou 3 anos de...não era longa distância que
se chamava não. Não me lembro como se dizia, ou então 2 de médio e 1 de longa e assim
por diante. Nós fomos pra Campo Grande, depois dali eu passei pra Ilha do Governador,
escola Rodrim. Da Ilha do Governador eu vim pra Penha e da Penha eu fui pra Escola
Guatemala.E como foi sua chegada na Escola Guatemala?
A minha chegada na Escola Guatemala é o seguinte: eu sabia do projeto por causa da Lúcia
e não estava muito contente com a minha atuação, eu quis entrar. A Escola Guatemala
justamente pouco tempo de existência, tinha esse nome, etc, não fazia parte do projeto.
quando veio justamente o INEP (o convênio), começou a ser na base da requisição.
Então as pessoas diziam mais ou menos eu conheço fulano e tudo mais. Então eu fui
requisitada porque eu disse que gostaria de fazer parte, eu fui requisitada por isso.
Agora... Foi a Lúcia que lhe indicou para a escola?
É, eu nem sei direito....é foi.Então o que acontece é o seguinte:então na Escola Guatemala
quando nós chegamos lá havia algumas professoras que não faziam parte do grupo do
INEP, mas algumas ficaram depois e havia uma diretora que era D. Helena Mandroni.
Então nós convivemos e tudo mais. E as professoras...tinha uma professora Helena (não me
lembro, deve ter morrido há muito tempo) ela, Helena Marques não sei o que, mas ela dava
justamente...houve um período de adaptação, ela dava aula justamente sobre essa questão
do método de projetos e nós, nessa época, estávamos esperando começar propriamente né?
Férias, etc. Então tínhamos outros professores também de outras coisas para que houvesse
assim uma melhoria na gente. Depois então ficou naquela base assim, nós entrávamos cedo
e as aulas eram de 8h às 4h e cada série tinha uma orientadora que olhava como é que
estava fazendo, dava palpite, cobrava, porque todos os dias a gente preenchia uma ficha
com o que tínhamos conseguido e o que não tínhamos conseguido e qualquer problema.
Tudo isso a gente fazia uma ficha com a orientadora ali. Quando eram várias professoras da
mesma série esse trabalho era feito assim conjunto e era bastante bom pra pessoa se
desenvolver. Nós tínhamos como orientadora, por exemplo foi quando eu conheci a
Risoleta, depois ficamos amicíssimas né. Ela não foi minha orientadora. A Almira Brasil da
Silva...eu vou falar o nome das pessoas? Pode falar se a senhora quiser. Mas votem
o nome das pessoas? Eu conheço na documentação D. Almira, D. Risoleta, D. Juracy,
elas aparecem bastante.... Pois é porque elas justamente eram orientadoras Era esse
núcleo de técnicas do INEP que estavam na escola? É, exato.
Esse período que a senhora estava na escola como professora já havia os cursos
acontecendo na escola?
Não, esses cursos aconteceram logo, era assim pela manhã antes dos alunos chegarem. E a
relação era boa entre os professores e os alunos dos cursos? Era, era...de vez em quando
havia assim umas coisas. Onde existe gente sempre umas coisinhas e tanto que quando
eu saí de lá, eu saí porque eu tava muito a irmã da Lúcia. O pessoal dizia: Não, chama a
Maria do Carmo pra ela ver isso daqui! Então era um negócio assim, por isso eu saí. Mas lá
continuou o pessoal todo, eu tenho grandes amizades de lá daquela época.
Então D. Maria do Carmo eu quero agradecer a senhora pelasua entrevista, ela vai
ser muito útil pra minha dissertação de mestrado. Eu quero agradecer a senhora,
muito obrigada, pela sua disponibilidade de conceber essa entrevista e falar um pouco
de sua experiência.
Nada... não foi nada.
Anexo 2:
Programa de Metas
I.Setor de Energia
Meta 1 Energia elétrica: elevação da potência instalada de 3 milhões de kW para 5
milhões de kW e ataque de obras que possibilitassem o aumento para 8 milhões de kW em
1965.
Meta 2 Energia nuclear: instalação de uma central atômica pioneira de 10 mil kW e
expansão da metalurgia dos minerais atômicos.
Meta 3 Carvão mineral: aumento da produção de carvão de 2 milhões para 3 milhões
toneladas/ano de 1955 a 1960, com ampliação da utilização in loco para fins termelétricos
dos rejeitos e tipos inferiores.
Meta 4 Petróleo (produção): aumento da produção de petróleo de 6.800 barris em fins de
1955 para 100 mil barris de média de produção diária em fins de 1960.
Meta 5 – Petróleo (refinação): aumento da capacidade de refinação de 130 mil barris diários
em 1955 para 330 mil barris diários em fins de 1960.
II.Setor de Transportes
Meta 6 Ferrovias (reaparelhamento): com investimento de US$ 239 milhões de Cr$ 39,8
bilhões.
Meta 7 Ferrovias (construção): construção de 2.100 km de novas ferrovias, 280 km de
variantes e 320 km de alargamento de bitola.
Meta 8 Rodovias (pavimentação): pavimentação asfáltica de 5 mil km de rodovias até
1960.
Meta 9 Rodovias (construção): construção de 12 mil km de rodovias de classe até
1960.
Meta 10 Portos e dragagem: reaparelhamento e ampliação de portos e aquisição de uma
frota de dragagem com investimento de US$ 32,5 milhões e Cr$ 5,9 bilhões.
Meta 11 Marinha mercante: ampliação da frota de cabotagem e longo curso de 300 mil
toneladas e d frota de petroleiros de 330 mil toneladas (deadweight) dwt.
Meta 12 Transportes aeroviários: renovação da frota aérea comercial com a compra de 42
aviões.
III.Setor de Alimentação
Meta 13 Produção agrícola (trigo): aumento da produção de trigo de 700 mil para 1.500
mil toneladas.
Meta 14 Armazéns e silos: construção de armazéns e silos para uma capacidade estática
de 742 mil toneladas.
Meta 15 Armazéns frigoríficos: construção e reaparelhamento de armazéns frigoríficos
para uma capacidade estática de 45 mil toneladas.
Meta 16 Matadouros industriais: construção de matadouros com capacidade de abate
diário de 3.550 bovinos e 1.300 suínos.
Meta 17 Mecanização da agricultura: aumento do número de tratores em uso na
agricultura de 45 mil para 72 mil unidades.
Meta 18 Fertilizantes: aumento da produção de adubos químicos de 18 mil toneladas para
120 mil toneladas de conteúdo de nitrogênio e anidrido fosfórico.
IV.Setor de Indústria de Base
Meta 19 Siderurgia: aumento da capacidade de produção de aço em lingotes de 1 milhão
par 2 milhões de toneladas por ano em 1960 e para 3.500 mil toneladas em 1965.
Meta 20 – Alumínio: aumento da capacidade de produção de alumínio de 2.600 para 18.800
toneladas em 1960 e 42 mil toneladas em 1962.
Meta 21 Metais não ferrosos: expansão da produção e refino de metais não ferrosos
(cobre, chumbo, estanho, níquel, etc).
Meta 22 Cimento: aumento da capacidade de produção de cimento de 2.700 mil para 5
milhões de toneladas anuais em 1960.
Meta 23 Álcalis: aumento da capacidade de produção da álcalis de 20 mil em 1955 para
152 mil toneladas anuais, em 1960.
Meta 24 Celulose e papel: aumento da produção de celulose de 90 mil para 260 mil
toneladas e de papel de jornal de 40 mil para 130 mil toneladas, entre 1955 e 1960.
Meta 25 Borracha: aumento da produção de borracha de 22 mil para 65 mil toneladas,
com o início da fabricação da borracha sintética.
Meta 26 Exportação de minério: aumento da exportação de minério de ferro de 2.500 mil
para 8 milhões de toneladas e preparação para exportação de 30 milhões de toneladas no
próximo qüinqüênio.
Meta 27 – Indústria de automóveis: implantação da indústria para produzir 170 mil veículos
nacionalizados em 1960.
Meta 28 – Construção naval: implantação da indústria de construção naval.
Meta 29 Indústria mecânica e de material elétrico pesado: implantação e expansão da
indústria mecânica e de material elétrico pesado.
V.Setor Educacional
Meta 30 Pessoal técnico: intensificação da formação de pessoal técnico e orientação da
educação para o desenvolvimento.
Extraído de:
FARO, C. de; SILVA, S. L. Q. “A década de 50 e o Programa de Metas”. IN: GOMES, A.
de C. (org.) O Brasil de JK. Rio de Janeiro: FGV/CPDOC, 1991. (p. 56, 57,58)
Anexo 3:
Coleção dos livros publicados pelo MEC/INEP/CBPE entre os
anos de 1955 e 1965
Série I - Guias de Ensino
A. Escola Primária
1. Linguagem na Escola Elementar (1955)
2. Matemática na Escola Elementar (1955)
3. Ciências na Escola Elementar (1955)
4. Ciências Sociais na Escola Elementar (1955)
5. Jogos Infantis na Escola Elementar (1955)
6. Música para a Escola Elementar (1ª - 1955 e 2ª -1962)
7. Jogos para recreação na Escola Primária – E. B. Medeiros (1959)
8. Ensinando Matemática a Criança (2ª - 1963)
9. Estudos Sociais na Escola Primária – 1º ao 4 º ano (1964)
B. Escola Secundária
1. História Geral (Antiguidade) – D. de Carvalho (1956)
2. História Geral (Idade Média / T. I) D. de Carvalho (1959)
3. História Geral (Idade Média / T. II) D. de Carvalho (1959)
4. Botânica na Escola Secundária – Alairc Schiltz (1959);
5.Biologia na Escola Secundária Oswaldo Frota Pessoa (1960)
6. A Presença do Latim (3 tomos) – Vandik Nóbrega (1962)
7. Método Ativo de Francês Prático – Raymond Van Der Heagen (1962)
8. Introdução ao Curso de Geometria Plana – Lucas N. H. Bunt (1963)
9. História Geral (I. Contemporânea) - D. de Carvalho (1966)
Série II – Livros de Texto
1. Iniciação à Ciência (2 tomos) E.N.C. Andrade e J. Huxley (1956)
2. Física na Escola Secundária – O.H. Blackwood (1958)
3. Leitura na Escola Primária – Juracy Silveira (1960)
Série III – Livros Fonte
1. O Brasil no Pensamento Brasileiro – Djacyr Menezes (1957)
2. Panorama Sociológico do Brasil – Carneiro Leão (1958)
3. O que se deve ler para conhecer o Brasil – N.W. Sodré
4. Teoria e Prática da Escola elementar – J.R. Moreira (1960)
Série IV – Currículo, Programas e Métodos
1. Um quarto de século de Programas e Compêndios de História para o Ensino Secundário
Brasileiro (1931-1959) – Guy de Hollanda (1957)
2. Análise dos Programas e Livros Didáticos de Geografia para a Escola Secundária
James B. Vieira Fonseca (1957)
3. A Escola Secundária Moderna – Lauro de Oliveira Lima (1962)
Série V – Inquéritos e Levantamentos
1. Acreditação de Escolas Secundárias nos Estados da América do Norte - Thales Mello
Carvalho (1953)
2. A Educação em Santa Catarina - J. Roberto Moreira (1954)
3. A Educação no Paraná - Erasmo Pilotto (1954)
4. O Ensino por unidades didáticas: seu ensaio no Colégio Nova Friburgo - Irene Mello
Carvalho (1957)
5. A Escola elementar e a formação do professor primário no Rio Grande do Sul - J.
Roberto Moreira (1955)
6. O sistema educacional fluminense - Jayme Abreu (1955)
7. Introdução ao estudo do currículo da escola primária - J. Roberto Moreira (1955)
8. Estudos sobre o Ceará – Joaquim Moreira de Souza (1955)
9. A Educação Secundária no Brasil – Jayme Abreu (1955)
10. Município e Ensino no Estado de São Paulo – Carlos Correa Mascaro (1959)
Série VI – Sociedade e Educação
1. Os dois Brasis – Jacques Lambert (1959).
2. A era tecnológica e a Educação – Luiz Reissig (1959)
3. Regiões Culturais do Brasil – M. Diégues Júnior (1960)
4. Menores no Meio Rural – Clóvis Caldeira (1960)
5. Imigração, Urbanização e Industrialização – M. Diégues
6. Geografia Agrária no Brasil – Olavo Valverde (1964)
7. Professores de Amanhã – Aparecida Jolly Gouveia (1965)
Coleção O Brasil Provinciano
1. Família e Comunidade – Oracy Nogueira (1962)
2. Uma comunidade teuto-brasileira – Úrsula Albersheim (1962)
Coleção O Brasil Urbano
1. Evolução da rede urbana brasileira – Pedro P. Geiger (1963)
2. O sistema administrativo brasileiro – Mário W. V. Cunha (1963)
3. O Professor Primário Metropolitano – Luiz Pereira (1963)
Série VII – Cursos e Conferências
1. Educação para uma sociedade de homens livres na era tecnológica Georges S. Counts
(1958)
2. A Educação e o Ideal Democrático – Harold Benjamin (1960)
3. Importância da Teoria em Educação – John Brubacher (1961)
Série VIII – Pesquisas e Monografias
1. Mobilidade e Trabalho – Bertran Hutchinson (1960)
2. Estruturas Tensionais da Censura Familiar – G. Fernandes (1961)
3. Racionalização do Ensino Industrial – Moisés Brejon (1963)
Série IX. Levantamentos Bibliográficos
1. Fontes para o estuda da Educação no Brasil – Bahia (1959)
Série X – Publicações diversas
1. Recursos Educativos dos Museus Brasileiros – Guy de Hollanda (1958)
2. Oportunidades de formação do magistério primário – Eny Caldeira (1959)
3. Organização Social e Política do Brasil – Delgado de Carvalho (1963)
Série XI – Os Grandes Educadores Brasileiros
1. Sob as arcadas – Antônio Almeida Jr. (1965)
2. A Escola Pitoresca e outros estudos - Antônio Almeida Jr.(1966)
Extraído de:
Espaço Anísio Teixeira: referência para a pesquisa educacional no Brasil. Rio de Janeiro:
PROEDES / UFRJ, 2004 (relatório de pesquisa). (p. 19,20).
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