Download PDF
ads:
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
CLÁUDIA MARIA DO NASCIMENTO
CAPITAL SOCIAL E TRABALHO VOLUNTÁRIO:
UM ESTUDO SOBRE A PASTORAL DA CRIANÇA DE SANTOS/SP
MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
SÃO PAULO
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
CLÁUDIA MARIA DO NASCIMENTO
CAPITAL SOCIAL E TRABALHO VOLUNTÁRIO:
Um estudo sobre a Pastoral da Criança de Santos/SP
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
Mestre em Administração sob a
orientação do Professor Doutor Luciano
Antônio Prates Junqueira.
MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
SÃO PAULO
2008
ads:
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
_______________________________________
Dedico esta dissertação à minha mãe,
Dona Hilda, uma líder comunitária nata,
cuja história de vida e o seu trabalho
junto aos pobres mais pobres que nós,
como ela costuma dizer, me inspiraram e
deram forças durante essa jornada.
AGRADECIMENTOS
Para fazer justiça a todos que me acompanharam com contribuições, críticas,
apoios, conversas, questionamentos etc., eu precisaria de mais umas cem
páginas, mas como o espaço é reduzido, gostaria de agradecer a todas as
pessoas que conheci nesses últimos anos e a também todos os amigos mais
antigos que estiveram comigo, nesse período de transformação. Uma caminhada
que não foi fácil, mas que termina com um doce sabor de vitória. E divido com
todos vocês esse saboroso manjar.
Mais que o estudo que está sendo apresentado, este trabalho me trouxe um
presente muito especial, pois despertou em mim uma forma diferente de encarar
a minha religiosidade, graças aos exemplos que presenciei com as líderes da
Pastoral da Criança. Por isso, agradeço, principalmente, a Deus por ter me
levado por esse caminho e pela força e proteção em mais essa conquista.
Agradeço a meus pais Hilda e Manoel. A todos os meus familiares, em especial,
às minhas irmãs Inês e Fátima e à minha sobrinha Iara, que apesar do meu
afastamento nesse período, não deixaram que nossos vínculos enfraquecessem.
Agradeço, em especial, a meu orientador, Luciano Junqueira, por sua sabedoria,
amizade e carinho e pelas tantas horas de incentivo, dedicação e paciência
nesses últimos anos.
Agradeço aos amigos de sempre, que me acompanharam durante essa jornada,
Patrícia, Bueno, Edi, Juliana, Keli e Rubens. E à Regiane e ao Marcelo, amigos
que fiz durante a pesquisa que se tornaram amigos para sempre.
Agradeço à equipe de voluntários da Pastoral da Criança de Santos, em
especial, à Dejanira, Ana Maria e Yvone, que tão gentilmente me acolheram e
permitiram o acesso ao grupo.
Agradeço a todos os professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em
Administração da PUC-SP e do NEATS, com os quais aprendi muito.
Agradeço ao Professor Luiz Omir, do Departamento de Sociologia da PUC-SP,
que, gentilmente, me ajudou na tabulação dos dados e na análise estatística. E
ao Professor Edin Abumansur Sued, do Departamento de Teologia da PUC-SP,
que, quase no final dos trabalhos, me ajudou a esclarecer algumas dúvidas
sobre o capital social em instituições religiosas.
Por fim, agradeço à PUC-SP e à CAPES, pelas bolsas de estudos, pois sem as
quais não teria conseguido nem sequer começar curso.
RESUMO
NASCIMENTO, Cláudia Maria do. CAPITAL SOCIAL E TRABALHO
VOLUNTÁRIO: um estudo sobre a Pastoral da Criança de Santos/SP. São
Paulo, 2008. (Dissertação de Mestrado em Administração) – Programa de
Estudos Pós-graduados em Administração da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo.
Capital social é produzido e reproduzido por meio das relações interpessoais de
cooperação. Quando, em sociedade, são cultivados a cultura de cooperação e o
associativismo, os estoques de capital social tendem a aumentar
progressivamente. No Brasil, hoje, podemos dizer que há baixa participação
social, marcada mais pela ausência de uma cultura de ajuda-mútua e pela
herança histórica de clientelismo e familismo, do que pela falta de solidariedade.
O principal argumento dessa dissertação é que o trabalho da Pastoral da Criança
incentiva a produção e reprodução de capital social. A organização tem como
proposta a redução da mortalidade infantil em comunidades pobres, por meio de
líderes comunitários, acompanha gestantes e crianças de zero a seis anos.
Animado em rede, o objetivo do trabalho é a solução para o problema da
mortalidade infantil com o incentivo da solidariedade entre as pessoas. A
organização deixa claro para o voluntário sua missão e objetivos, bem como
quais os resultados esperados. A pesquisa aqui apresentada, de natureza
quantitativa e qualitativa, foi elaborada por meio de observação participante e de
aplicação de um formulário. Objetivou-se verificar, por meio do relato dos
voluntários da cidade de Santos, SP, como se dá a produção e a reprodução de
capital social entre os voluntários. Os resultados da pesquisa mostram que
dentre esses voluntários predominam mulheres acima dos 40 anos, que são
mães que já criaram seus filhos e que agora se dedicam a ajudar outras mães
nessa tarefa. A motivação para o desenvolvimento do trabalho está basicamente
em ajudar o próximo e na importância dos vínculos entre voluntários e famílias.
Fatores, esses, essenciais para a produção de capital social.
Palavras-chave: capital social, rede, trabalho voluntário, dádiva, vínculos,
Pastoral da Criança.
ABSTRACT
NASCIMENTO, Cláudia Maria do. SOCIAL CAPITAL AND VOLUNTEER
WORK: a study about Santos' Pastoral da Criança, in the state of São Paulo.
São Paulo, 2008. (Master of Administration Degree Dissertation) – Masters
Degree Program in Administration of Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo – PUC/SP – Brasil.
Social capital is produced and reproduced through interpersonal relationships of
cooperation, and stocks of social capital tend to increase when a given society
stimulates cooperation and association amongst its members. This thesis argues
that currently the Brazilian society displays low levels of social capital, mainly
because of two factors, namely, a lack of mutual support amongst Brazilians and
Brazil's historical legacy of familism and clientelism. The main argument of this
thesis is that the Pastoral da Criança stimulates the production and reproduction
of social capital. This dissertation looks at the experience of Pastoral da Criança,
an organization that aims primarily at reducing child mortality in poor communities
by providing services to pregnant women and children from zero to six years old.
The organization relies on community agents' services and its mission, objectives
and outcomes are made clear to all participants (agents and community) from the
beginning. Pastoral da Criança is structured in networks and stimulates solidarity
amongst community members. Through a qualitative and quantitative analysis
data obtained through observation, participation and a questionnaire conducted in
the municipality of Santos, state of São Paulo, the thesis examines how social
capital is produced and reproduced amongst the Pastoral' agents and community
members. The findings show that the vast majority of volunteers are women over
40-years-old who have already raised their children and help other mothers to
raise their children. These volunteers are primarily motivated by selfless
concerns for the well-being of others as well as concerns regarding the essential
role played by strong ties among volunteers and families in the community; these
features are essential to enhance social capital.
Key-words: social capital, network, volunteer work, gift, ties, Pastoral da
Criança.
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – AS PASTORAIS SOCIAIS E ORGANISMOS DA DIMENSÃO
SOCIOTRANSFORMADORA.................................Erro! Indicador não definido.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – ORGANOGRAMA DA PASTORAL DA CRIANÇA....Erro! Indicador
não definido.
FIGURA 2 – ORGANIZAÇÃO DA PASTORAL DA CRIANÇAErro! Indicador não
definido.
FIGURA 3 – MAPA DA DISTRIBUIÇÃO DO IPVS NO MUNICÍPIO DE SANTOS
................................................................................Erro! Indicador não definido.
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – GESTANTES, CRIANÇAS, FAMÍLIAS E LÍDERES
CADASTRADOS NA PASTORAL DA CRIANÇA – BRASIL – PERÍODO DE 2003
A 2007....................................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 2 – APLICAÇÃO DOS RECURSOS FINANCEIROS – PERÍODO DE
2006-2007 ..............................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 1 – DISTRIBUIÇÃO DOS VALORES ARRECADADOS PELA
PASTORAL DA CRIANÇA, EM RELAÇÃO À ORIGEM E SETOR DE ATUAÇÃO
DO DOADOR...................................................................................................... 62
GRÁFICO 4 – PIRÂMIDE ETÁRIA: MUNICÍPIO DE SANTOS......Erro! Indicador
não definido.
GRÁFICO 5 – PARTICIPAÇÃO DO PESSOAL OCUPADO E DO VALOR
ADICIONADO SEGUNDO SETORES DE ATIVIDADE ECONÔMICA – RMBS -
2001 .......................................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 6 – EVOLUÇÃO DA TAXA DE MORTALIDADE INFANTIL 2002-2006
– ESTADO DE SÃO PAULO E CIDADE DE SANTOS (‰ – POR MIL NASCIDOS
VIVOS) ...................................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 7 – INDICADORES QUE COMPÕEM O ÍNDICE PAULISTA DE
VULNERABILIDADE SOCIAL – IPVS – MUNICÍPIO DE SANTOS – IBGE 2000
...............................................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 8 - LÍDERES*, CRIANÇAS, FAMÍLIAS E GESTANTES
CADASTRADOS NA DIOCESE DE SANTOS – PERÍODO DE 2003 A 2007 Erro!
Indicador não definido.
GRÁFICO 9 – DISTRIBUIÇÃO DE LÍDERES* E CRIANÇAS NAS CIDADES QUE
COMPÕEM A DIOCESE DE SANTOS (2007).......Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 10 – LÍDERES*, CRIANÇAS, FAMÍLIAS E GESTANTES
CADASTRADOS NA CIDADE DE SANTOS – PERÍODO 2003 A 2007 .......Erro!
Indicador não definido.
GRÁFICO 11 – LÍDERES, FAMÍLIAS, CRIANÇAS E GESTANTES DA
PASTORAL DA CRIANÇA, DA CIDADE DE SANTOS, POR ÁREA – 1º
TRIMESTRE DE 2007............................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 12 – VOLUNTÁRIOS POR FAIXA ETÁRIA...........Erro! Indicador não
definido.
GRÁFICO 13 – VOLUNTÁRIOS POR ESCOLARIDADE.......Erro! Indicador não
definido.
GRÁFICO 14 – VOLUNTÁRIOS POR OCUPAÇÃO PROFISSIONAL...........Erro!
Indicador não definido.
GRÁFICO 15 – VOLUNTÁRIOS POR TEMPO DE ATUAÇÃO NA PASTORAL
DA CRIANÇA .........................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 16 – COMO O VOLUNTÁRIO CONHECEU A PASTORAL DA
CRIANÇA ...............................................................Erro! Indicador não definido.
GRÁFICO 17 – QUEM CONVIDOU O VOLUNTÁRIO PARA PARTICIPAR DA
PASTORAL DA CRIANÇA .....................................Erro! Indicador não definido.
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – VOLUNTÁRIOS ENTREVISTADOS POR ÁREA E CARGO OCUPADO
...........................................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 2 - LÍDERES COMUNITÁRIOS ENTREVISTADOS............Erro! Indicador não
definido.
TABELA 3 – VALORES MONETÁRIOS CAPTADOS PELA PASTORAL DA CRIANÇA
JUNTO AO SETOR PÚBLICO, POR ÓRGÃO GOVERNAMENTAL .Erro! Indicador não
definido.
TABELA 4 – VALORES MONETÁRIOS CAPTADOS PELA PASTORAL DA CRIANÇA
JUNTO À INICIATIVA PRIVADA, POR EMPRESA DOADORA........Erro! Indicador não
definido.
TABELA 5 – VOLUNTÁRIOS POR ÁREA E CARGO OCUPADO NA CIDADE DE
SANTOS.............................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 6 – PROPORÇÃO DE FAMÍLIAS E CRIANÇAS POR LÍDER E PROPORÇÃO
DE CRIANÇAS POR FAMÍLIA NA PASTORAL DA CRIANÇA DA CIDADE DE SANTOS
...........................................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 7 – VOLUNTÁRIOS POR ESCOLARIDADE E FAIXA ETÁRIA. Erro! Indicador
não definido.
TABELA 8 – VOLUNTÁRIOS POR RENDA INDIVIDUAL E RENDA FAMILIAR........Erro!
Indicador não definido.
TABELA 9 – MOTIVAÇÕES PARA O TRABALHO VOLUNTÁRIO (*) ..... Erro! Indicador
não definido.
TABELA 10 – MOTIVO DA ESCOLHA DO VOLUNTÁRIO PELA PASTORAL DA
CRIANÇA (*) ......................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 11 – OUTRAS ATIVIDADES VOLUNTÁRIAS (*) Erro! Indicador não definido.
TABELA 12 – DIFICULDADES VIVIDAS PELO VOLUNTÁRIO, EM RELAÇÃO A
RENDA FAMILIAR.............................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 13 – OS VOLUNTÁRIOS SÃO SOLICITADOS PELAS FAMÍLIAS PARA
AJUDAR EM QUESTÕES NÃO RELACIONADAS À PASTORAL DA CRIANÇA? (*)
...........................................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 14 – OS VOLUNTÁRIOS SÃO CHAMADOS PARA AS COMEMORAÇÕES
DAS FAMÍLIAS (*)..............................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 15 – COMO O VOLUNTÁRIO DESCREVE A PASTORAL DA CRIANÇA:
ANÁLISE DA PRIMEIRA FRASE DITA PELO VOLUNTÁRIO (*)......Erro! Indicador não
definido.
TABELA 16 – COMO O VOLUNTÁRIO CARACTERIZA O TRABALHO DA PASTORAL
DA CRIANÇA (*) ................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 17 – INDIVÍDUOS CITADOS PELO VOLUNTÁRIO NA DESCRIÇÃO DA
PASTORAL DA CRIANÇA (*) ............................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 18 – FATORES MATERIAIS PRESENTES NA DESCRIÇÃO DO
VOLUNTÁRIO SOBRE A PASTORAL DA CRIANÇA (*)...Erro! Indicador não definido.
TABELA 19 – FATORES SIMBÓLICOS PRESENTES NA DESCRIÇÃO DO
VOLUNTÁRIO ....................................................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 20 – FATORES DE SATISFAÇÃO E INSATISFAÇÃO DOS VOLUNTÁRIOS
COM A PASTORAL DA CRIANÇA (*)................................Erro! Indicador não definido.
TABELA 21 – MUDANÇAS PESSOAIS DEVIDO AO TRABALHO NA PASTORAL DA
CRIANÇA (*).......................................................................Erro! Indicador não definido.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIAÇÕES
AAPAC
Associação dos Amigos da Pastoral da Criança
ANAPAC
Associação Nacional dos Amigos da Pastoral da Criança
BNDES
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CEB
Comunidade Eclesial de Base
CEP
Comissão Episcopal de Pastoral
CEPAL
Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CNBB
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
FABS
Folha de Acompanhamento e Avaliação das Ações Básicas de
Saúde e Educação
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH
Índice de Desenvolvimento Humano
IDI
Índice de Desenvolvimento Infantil
ISEB
Indicadores Sociais e Educacionais Brasileiros
OMS
Organização Mundial de Saúde
ONU
Organizações das Nações Unidas
OPAS
Organização Pan-Americana de Saúde
PACS
Programa de Agentes Comunitários de Saúde
PNUD
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PRONAF
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PSF
Programa Saúde da Família
RMBS
Região Metropolitana da Baixada Santista
SEADE
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
SEBRAE
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SUS
Sistema Único de Saúde
UNESCO
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
Cultura
UNICEF
Fundo das Nações Unidas para a Infância
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
I - CAPITAL SOCIAL E TRABALHO VOLUNTÁRIO................ERRO! INDICADOR NÃO
DEFINIDO.
1.1
CAPITAL SOCIAL E REDE............................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
1.2
VÍNCULOS E DÁDIVAS................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
1.3
TRABALHO VOLUNTÁRIO ...........................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
II - METODOLOGIA DA PESQUISA ......................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
III - A PASTORAL DA CRIANÇA...........................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.1
AS PASTORAIS SOCIAIS NO BRASIL............................ ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.1.1 A influência das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) Erro! Indicador não
definido.
3.2
A PASTORAL DA CRIANÇA NO BRASIL........................ ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
3.2.1 Histórico.............................................................Erro! Indicador não definido.
3.2.2 Gestão da Pastoral da Criança .........................Erro! Indicador não definido.
3.2.3 Recursos financeiros.........................................Erro! Indicador não definido.
3.2.4 Organização dos voluntários.............................Erro! Indicador não definido.
3.2.5 Treinamento dos voluntários.............................Erro! Indicador não definido.
3.2.6 Desenvolvimento do trabalho comunitário ........ Erro! Indicador não definido.
3.2.7 Motivações do trabalho na Pastoral da Criança Erro! Indicador não definido.
IV - RESULTADOS DA PESQUISA .......................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
4.1
A CIDADE DE SANTOS/SP .........................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
4.2
PASTORAL DA CRIANCA EM SANTOS/SP.................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
4.3
PERFIL DO VOLUNTÁRIO DA PASTORAL DA CRIANÇA DA CIDADE DE SANTOS/SP...ERRO!
INDICADOR NÃO DEFINIDO.
4.3
A PRODUÇÃO E REPRODUÇÃO DE CAPITAL SOCIAL NA PASTORAL DA CRIANÇA DE
SANTOS/SP...................................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
BIBLIOGRAFIA ......................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.
ANEXO A - FORMULÁRIO DE PESQUISA
1
INTRODUÇÃO
Uma das expressões da pobreza no mundo é a presença de
quadros com altos índices de desnutrição e de mortalidade infantil. Segundo
alerta de um informe da Organização Pan-americana de Saúde e da Comissão
Econômica para a América Latina e o Caribe em quase todos os países da
América Latina observa-se um aumento das doenças não transmissíveis
crônicas associadas à alimentação e nutrição (CEPAL, 1998)
Conforme o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD, 2003), não somente os fatores ligados à posse de bens materiais são
indicadores de pobreza, mas também fatores ligados à falta de acesso à
educação, à saúde, aos problemas como a mortalidade, à curta longevidade, à
exclusão, à falta de dignidade e de liberdade. Às altas taxas de mortalidade
infantil se pode correlacionar outros indicadores que podem dizer se uma
localidade está com problemas de desenvolvimento social.
A mortalidade infantil é reconhecida como um dos mais sensíveis
indicadores de saúde, e é, assim, entendida:
a morte de crianças menores de um ano é diretamente
influenciada por condições de pré-natal, gravidez, história
materna, conduta e doenças maternas, ruptura precoce de
membrana, gemelaridade, idade materna, consangüinidade,
procedimentos perinatais, mortalidade perinatal, condições e tipo
de parto, síndrome da morte súbita, estado marital, intervalo
entre partos, fatores interpartais, diferenças raciais materna e
infantil condições socioeconômicas, prematuridade, baixo peso
ao nascer, más formações congênitas, mães portadoras do HIV
e de outras doenças infecto contagiosas e outros.
O coeficiente de mortalidade infantil é dividido tradicionalmente
em: mortalidade infantil neonatal e mortalidade infantil tardia que
ocorrem respectivamente antes e após 28 dias. (...) Outro
conceito importante é o de mortalidade perinatal que
compreende a mortalidade infantil neonatal precoce e a
natimortalidade. A natimortalidade é, por definição, a relação
entre o número de nascidos mortos e o de nascidos vivos em
2
determinada área e período (KOZU, GODINHO, MUNIZ e
CHIARIONI, s/d).
Segundo dados publicados em 2007 pelo IBGE, a taxa de
mortalidade infantil no Brasil, em 26 anos – entre 1980 e 2006 –, foi reduzida em
64,0%, ao declinar de 69,1‰, para 24,9‰ (óbitos a cada mil nascidos vivos). Em
2006, o Estado com a mais baixa taxa de mortalidade infantil era o Rio Grande
do Sul (13,9‰), seguido por São Paulo (16,0‰). Alagoas e Maranhão continuam
com as maiores taxas de mortalidade infantil do Brasil: 51,9‰ e 40,7‰,
respectivamente. Conforme a classificação internacional da Organização Mundial
da Saúde (OMS), o Brasil apresenta taxa de mortalidade infantil considerada
média (entre 20 e 49, por mil nascidos vivos). A OMS estabelece que a partir de
50 por mil as taxas são altas, e abaixo de 20 por mil são baixas. Índices de
mortalidade infantil baixos são encontrados não só no mundo desenvolvido, mas
também em países vizinhos ao Brasil, como Venezuela (18), Argentina (17),
Uruguai (12) e Chile (8).
A mortalidade neonatal é a que mais mata hoje, isso quer dizer que
os bebês morrem, principalmente, nos primeiros 27 dias de vida. Isso coloca o
Brasil com uma taxa muito alta de óbitos neonatais, de 64%, sendo que 55% das
mortes acontecem na primeira semana de vida do bebê. Considerada a
população como um todo, 33,5% das famílias brasileiras vivem em situação de
pobreza, ou seja, com renda per capita igual ou inferior a meio salário mínimo
mensal. Quando se separam os lares com crianças, a situação é ainda mais
grave, e o índice de pobreza alcança 45%. No Nordeste, esse percentual
ultrapassa 68%, sendo que em determinados municípios chega a 96% (UNICEF,
2005).
Influenciam, diretamente, os números de mortalidade infantil,
fatores como: baixa escolaridade dos pais, falta de saneamento básico,
dificuldade de acesso ao sistema de saúde, não realização do pré-natal.
Contudo, se a criança sobrevive ao primeiro ano de vida, mas não recebe a
alimentação correta – ou suficiente – para se desenvolver, a desnutrição lhe
acarreta atrasos no crescimento e no desenvolvimento cognitivo e psicológico.
Estudos do Fundo das Nações Unidas para a Infância identificam atrasos no
3
desenvolvimento psicomotor de uma amostra de crianças pobres a partir dos 18
meses de idade. Com cinco anos, metade das crianças da amostra examinada
apresentou atraso no desenvolvimento da linguagem, 40% em seu
desenvolvimento geral e 30% em sua evolução visual e motora, além de fatores
ligados ao crescimento físico, pois uma criança subnutrida, dificilmente,
alcançará o peso e a altura média das crianças que receberam alimentação
correta (UNICEF, 2005).
Dessa forma, as políticas públicas voltadas para a redução da
mortalidade infantil deveriam levar em consideração o papel fundamental
desempenhado pela família na prevenção de óbitos infantis. A atenção integral à
mulher e o fortalecimento das competências familiares ajudam a diminuir,
consideravelmente, o risco de vida das crianças. As competências familiares são
entendidas como o conjunto de conhecimentos, práticas e habilidades
necessário para promover a sobrevivência, o desenvolvimento, a proteção e a
participação das crianças. São competências que as famílias já possuem, mas
que, em muitos casos, precisam ser fortalecidas, como a preparação adequada
antes do nascimento, o estímulo psicossocial e do desenvolvimento cognitivo da
criança, a capacidade de identificar sinais de doença e tomar as providências
necessárias, assim como a promoção da paz e a prevenção da violência no
convívio familiar (UNICEF, 2003).
Existem, no Brasil, iniciativas governamentais e não-
governamentais que atuam no campo da saúde, trabalhando principalmente por
meio de ações educativas voltadas à promoção das competências familiares.
Três exemplos de grande abrangência são: o Programa Saúde da Família (PSF);
o Programa Agentes Comunitários de Saúde (Pacs); que são parcerias do
Governo Federal com as Prefeituras; e o trabalho da Pastoral de Criança,
parceria entre o Governo Federal e a sociedade civil. O PSF e o Pacs recrutam e
treinam agentes remunerados para atuarem nas comunidades pobres,
acompanhando famílias e a saúde de seus integrantes, de todas as idades. Por
sua vez, a Pastoral da Criança, por meio de líderes comunitários voluntários,
atua em contato direto com famílias pobres que possuem crianças de 0 a 6 anos
4
e gestantes, oferecendo orientações aos pais e aos familiares sobre os cuidados
necessários com as crianças, estimulando, assim, as competências familiares.
Fundada em 1983, por iniciativa da Dra. Zilda Neumann Arns,
pediatra e médica sanitarista e do então cardeal de São Paulo Dom Paulo
Evaristo Arns, a Pastoral da Criança é um organismo de ação social da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de atuação ecumênica, cuja
metodologia se sustenta na idéia de que a solução dos problemas sociais
necessita da solidariedade humana, organizada e animada em rede, com
objetivos definidos (PASTORAL DA CRIANÇA, 2007).
A Pastoral da Criança atua em duas esferas da sociabilidade
humana. Primeiro, no campo da sociabilidade secundária, quando mobiliza
voluntários de uma localidade em torno de um trabalho socioassistencial; e
segundo, no campo da sociabilidade primária, quando mobiliza a família nos
cuidados com a criança e com a gestante. Se de um lado a Pastoral da Criança
mobiliza uma comunidade para um trabalho de ajuda-mútua, por outro, desperta
o espírito de solidariedade dentro de famílias. A Pastoral da Criança procura
ensinar a comunidade e a família a cuidarem de si mesmas, alertando para a
importância do fortalecimento dos vínculos familiares e transmitindo
conhecimentos sobre nutrição, saúde, educação e cidadania.
Quando a família se preocupa com a saúde e a educação das
crianças, pode-se dizer que, além do simples fato de cuidarem de suas crianças,
os adultos estão cuidando uns dos outros também. Ao resultado dessas práticas
de ajuda mútua pode-se dar o nome de coesão social e familiar. Em situações
nas quais existe coesão social, nas quais são práticas comuns a cooperação, o
respeito, a confiança, entre outras virtudes sociais, de alguma forma, as pessoas
produzem capital social.
Capital social é uma espécie de moeda simbólica produzida a partir
das relações de cooperação e confiança entre as pessoas. O voluntariado pode
ser visto como um produtor de capital social, à medida que ele busca, não só
ajudar o próximo, mas também formar vínculos com as pessoas que estão
envolvidas na sua ação.
5
O trabalho de mobilização de comunidades feito pela Pastoral da
Criança vai muito além da redução da mortalidade infantil. Por meio de ações
aparentemente simples, como por exemplo, o cuidado com as crianças, a
instituição consegue aumentar o capital social em sua base: a família.
Concomitantemente, no exercício de mobilização de uma rede de
atores e organizações em prol da ajuda a mães e a crianças, a Pastoral faz com
que o raio de confiança das relações comunitárias seja ampliado. São chamados
a participar: voluntários, mães, vizinhos, comerciantes, religiosos, poder público,
iniciativa privada e outras organizações da sociedade civil.
Pessoas que fazem parte da rede que a organização consegue
mobilizar são incentivadoras de capital social. A organização multiplica
conhecimentos, desperta atitudes, utiliza competências pré-existentes, mostra,
por meio de exemplos de outras localidades, que o trabalho é viável e que a
cooperação e a atenção com o próximo proporciona um ambiente para
desenvolvimento social. No entanto, são as pessoas que decidem se mobilizar e
se transformar de sujeitos passivos para cidadãos ativos, transformadores de si
mesmos e de suas comunidades.
O trabalho voluntário é alvo de críticas no que se refere às suas
motivações, muitas vezes, individualizadas, pelo caráter assistencialista
historicamente posto e pelas fracas repercussões que sua ação contempla.
Contudo, fazem-se necessários estudos sobre o trabalho voluntário comunitário
de ajuda-mútua, no sentido de que essas atividades fortalecem tanto doador
quanto beneficiário, e que têm como fim último o fortalecimento das relações,
principal característica da dádiva e que, portanto, culminam em crescimento de
capital social.
Bourdieu (1980) alerta que o capital social se impõe como uma
forma de fundamentar as relações sociais. A Pastoral da Criança se apresenta
como uma organização da sociedade civil que, por meio de uma estratégia de
intervenção e manutenção de uma rede de solidariedade, incentiva o trabalho
voluntário de ajuda-mútua entre mulheres e mães preocupadas com o
desenvolvimento sadio de suas crianças. Não obstante, esse trabalho também
6
contempla uma série de ações que fortalecem a família e a comunidade, por isso
torna-se relevante o estudo sobre as repercussões das relações produzidas
nesse ambiente.
Aqui, busca-se entender como o trabalho voluntário fortalece
vínculos sociais, por meio da lógica da dádiva, e como pode ser uma ação
positiva, no sentido de produzir e reproduzir capital social
No primeiro capítulo, serão discutidos o capital social e o trabalho
voluntário, passando pela relação com as redes sociais e pela questão das
dádivas.
O segundo capítulo apresenta a metodologia utilizada e a maneira
como foi realizada a pesquisa.
O terceiro capítulo apresenta a Pastoral da Criança. Com o intuito
de compreender as bases da metodologia adotada pela organização, a primeira
parte do capítulo faz a apresentação do trabalho pastoral da Igreja Católica. Já a
segunda parte é dedicada à descrição organizacional da Pastoral da Criança, em
que são apresentados o trabalho, o histórico, a abrangência, alguns dados
financeiros e a organização do trabalho voluntário, bem como as políticas de
incentivo ao trabalho.
No quarto capítulo serão apresentados os resultados da pesquisa.
Inicialmente, faz-se uma breve apresentação do contexto socioeconômico da
cidade de Santos e como se dá a atuação da Pastoral da Criança na cidade. Em
seguida, apresentam-se os dados que compõem o perfil dos voluntários e,
depois, a análise que buscou entender, por meio do discurso dos entrevistados,
como é feita a produção e a reprodução do capital social na rede formada pelas
relações ‘voluntário-voluntário’ e ‘voluntário-família’. Além disso, o capítulo
aborda a influência do ambiente da Igreja Católica, a presença da dádiva, dos
vínculos, e como é a construção do interconhecimento e do inter-reconhecimento
entre os atores.
7
CAPÍTULO 1
CAPITAL SOCIAL E TRABALHO VOLUNTÁRIO
Qualquer sociedade humana retira a sua coesão de um conjunto
de atividades e projetos comuns, mas também, de valores
partilhados, que constituem outros tantos aspectos da vontade de
viver juntos. Com o decorrer do tempo, estes laços materiais e
espirituais enriquecem-se e tornam-se, na memória individual e
coletiva, uma herança cultural, no sentido mais lato do termo, que
serve de base aos sentimentos de pertencer àquela comunidade e
de solidariedade (DELLORS, 2001, p. 51).
Capital social é um ativo que traz benefícios sociais, econômicos e
políticos, produzido e reproduzido por meio das relações interpessoais de
cooperação. Quando, em sociedade, são cultivados a cultura de cooperação e o
associativismo, os estoques de capital social tendem a aumentar
progressivamente. O capital social terá sua produção aumentada dependendo da
quantidade e da qualidade dos vínculos sociais estabelecidos. Contudo, a
reprodução das relações deve ultrapassar o simples ‘conhecer o outro’: os laços
sociais devem ser cultivados e perenizados.
Ao interagir em sociedade as pessoas formam redes nas quais são
efetuadas trocas de bens materiais e imateriais. O ato de trocar bens, serviços
ou sentimentos, quando não está relacionado a questões mercadológicas, está
permeado pela dádiva. A dádiva seria o espírito dos relacionamentos, pois, na
lógica não-utilitarista, o mais importante não é a troca em si, mas os vínculos que
são estabelecidos ou fortalecidos por meio da troca.
A reprodução do capital social na sociedade moderna é prejudicada
por fatores como a separação entre as pessoas, provocada pela urbanização,
8
pela crescente cultura do individualismo, pela desconfiança generalizada, entre
outros. Contudo, apesar do contexto, a solidariedade ainda está viva e o fator
relacional, inerente ao ser humano, tende a superar essas adversidades. Para
tanto, apresentam-se algumas das possíveis soluções de incentivo ao
associativismo e à participação comunitária.
O trabalho voluntário é uma das expressões do comportamento
associativo nos dias atuais, utilizada para indicar uma ação gratuita, em prol de
uma coletividade, motivada por uma iniciativa pessoal de solidariedade. O
voluntariado compreende, não apenas a cooperação entre quem tem mais
doando para aqueles que têm menos, mas também a ajuda feita por agentes que
estão em situação igual ou muito parecida, como as que acontecem em grupos,
como os alcoólicos anônimos, comunidades de bairro, mutirões etc.
Nesse sentido, serão analisados os conceitos de capital social,
vínculos sociais e dádiva, de forma a entender como o trabalho voluntário, por
meio da lógica da dádiva, fortalece vínculos sociais e pode ser uma ação positiva
no sentido de produzir e reproduzir capital social.
1.1 Capital social e rede
O conceito de capital social pode trazer algumas explicações sobre
a importância das relações sociais, no que diz respeito ao desenvolvimento
social, político e econômico de uma sociedade. A forma como as pessoas
interagem e como elas se organizam caracterizará os grupos sociais e as
relações intergrupais. Nesse sentido, é que se pode entender o associativismo, a
participação, a cooperação, a ajuda-mútua, as redes, os vínculos familiares e
sociais entre outros, que auxiliam na produção e reprodução do capital social.
9
Em sociedade, as práticas e políticas de reciprocidade e de ajuda
mútua geram espécie de moeda simbólica, que pode ser usada pelos indivíduos
sempre que for preciso. Mas para ter direito a essa moeda – capital social – o
beneficiário deve fazer jus a ela, ou seja, deve cooperar também. Segundo
Bourdieu (1980) e Putnam (1996) este é o tipo de capital que só aumenta
quando é usado, ao contrário dos outros tipos de capital que são finitos e se
desgastam.
Usualmente, a linguagem econômica costuma indicar um conjunto
de estoques de capitais que condicionam o crescimento econômico composto
por capital natural, construído, financeiro, humano e, mais recentemente, social.
De acordo com a definição elaborada pelo Banco Mundial, há quatro formas
básicas de capital:
o natural, constituído pelos recursos naturais; o capital
construído, gerado pelo ser humano (como infra-estrutura, bens
de capital, financeiro, comercial, etc.); o capital humano
determinado pelos graus de nutrição, saúde e educação da
população; e capital social determinado pelo grau de interação e
de confiança entre os membros do grupo (KLIKSBERG, 2001, p.
112).
A expressão capital social foi utilizada pela primeira vez por Lydia
Judson Hanifan, em 1916, para descrever centros comunitários de escolas rurais
nos Estados Unidos. Jane Jabcobs, em 1961, usou a expressão em sua obra
clássica “The Death and Life of Great American Cities”, na qual explicou que as
densas redes sociais que existiam nas áreas urbanas constituíam uma forma de
capital social que encorajava a segurança pública. O economista Glen Loury e o
sociólogo Ivan Light usaram a expressão capital social nos anos 1970, para
analisar o problema do desenvolvimento econômico das áreas centrais das
grandes cidades nos Estados Unidos. Em 1980, o sociólogo francês Pierre
Bourdieu publicou, na revista Actes de la Recherche em Sciences Sociales, um
artigo sobre como o capital social é produzido em grupos sociais. Nos anos
1990, a expressão foi muito usada pelo sociólogo James Coleman (1994) e pelo
cientista político Robert Putnam (1996) que estimularam um intenso debate
10
sobre o papel do capital social e da sociedade civil na Itália e nos Estados
Unidos (FUKUYAMA, 2000).
A presente discussão sobre capital social trabalha as concepções
de Bourdieu (1980) e Putnam (1994). Bourdieu elabora sua discussão em torno
de conceitos como interconhecimento, inter-reconhecimento, trocas, rede,
mutualidade e colaboração, e apresenta caminhos que conduzem ao
fortalecimento de grupos e redes sociais. Putnam (op.cit.) fala sobre contribuição
da cultura associativista e do comprometimento cívico para o desenvolvimento
social, político e econômico de uma sociedade, por meio de um estudo
comparativo entre o norte e o sul da Itália.
Bourdieu (1980) afirma que a fonte de prosperidade de um
indivíduo ou comunidade estaria na quantidade dos diferentes capitais (cultural,
econômico, social etc.) acumulados por herança ou por esforço pessoal e grupal.
O autor constata que o capital social é a única forma de explicar os efeitos das
ações sociais. Em outras palavras, o capital social se apresenta como o
resultado das ações sociais: as pessoas interagem, se relacionam e realizam
trocas, cooperam, e, assim, geram um tipo de capital intangível, o capital social.
Putnam (op.cit.) fala a respeito da contribuição do associativismo e
da participação cívica para a construção de capital social. O autor afirma que “a
cooperação voluntária é mais fácil em comunidades que tenham herdado um
bom estoque de capital social sob a forma de regras de reciprocidade e sistemas
de participação cívica” (1996, p. 177). O autor explica que, em algumas
sociedades, a cooperação é intrínseca às relações sociais, e exemplifica:
no Japão, por exemplo, o ko é apenas uma das muitas formas
tradicionais de mútua assistência existentes nas aldeias
japonesas, incluindo-se aí a permuta de serviços, a troca de
presentes, o mutirão para construir e reformar casas, o amparo
da comunidade em caso de morte, doença e outros transtornos
(op.cit., p. 179).
Assim como Bourdieu (1980), Putnam (1996) comenta que o capital
social é gerado como subproduto de outras atividades sociais, como a confiança,
o respeito, a ajuda mútua, a cooperação, entre outras virtudes sociais. Os
11
estoques de capital social tendem a ser acumulativos e a se reforçar
mutuamente, e redundam em equilíbrios sociais com elevados níveis de
cooperação, confiança, reciprocidade, civismo e bem estar coletivo (PUTNAM,
1996).
O capital social, apesar de ter origem nas ações individuais, não
está reduzido ao conjunto de propriedades (materiais e imateriais) de um só
agente, mas sim, na forma como esse indivíduo atua em sociedade. As
propriedades individuais não implicam nas ações sociais, isto é, aquilo que um
indivíduo possui não garante que suas ações sigam um determinado
comportamento.
O acesso aos vários tipos de capital é diferente, entre os
indivíduos, em quantidade, intensidade e poder de mobilização. Isto é, uma
pessoa pode ter dinheiro, mas não ter capital cultural ou não ter influência,
enquanto outro que não tenha dinheiro pode ter poder de influência
(mobilização), e, com isso, possuir capital social. Por outro lado, mesmo que um
indivíduo tenha uma rede coesa de relações, isso não garante que ele tenha
acesso a outros tipos de capital. Contudo, o pertencimento a uma rede coesa
pode lhe garantir ajuda em momentos difíceis, que não, necessariamente, se
trate de uma ajuda financeira.
O ponto chave para o entendimento sobre capital social está na
definição formulada por Bourdieu (1980, p. 67), para quem o capital social é “o
conjunto de recursos que estão ligados à posse de uma rede durável de relações
mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento ou de inter-
reconhecimento”, rede na qual são trocados bens, serviços ou sentimentos entre
pessoas que nutrem relações úteis, perenes e contínuas. Nessa definição, são
colocados conceitos importantes que serão discutidos detalhadamente a seguir,
a saber: rede, interconhecimento e inter-reconhecimento, perenidade e utilidade.
A rede pode ser entendida como uma forma de ordem espontânea
que emerge como resultado das interações descentralizadas entre indivíduos
e/ou instituições. Sem ser criada por qualquer autoridade, a rede surge e se
12
mantém apenas pela vontade e interesse coletivo dos indivíduos que a compõe,
portanto, depende do capital social existente no grupo.
A principal característica para que uma rede esteja ativa é a
existência de trocas materiais e/ou simbólicas entre os indivíduos, que ocorrem
em espaços físicos ou virtuais, embora, é essencial salientar, que sempre há a
necessidade do encontro, para que as trocas se realizem, isto é, a troca está
vinculada à relação interpessoal.
A dificuldade para compreensão da organização em rede se dá
pelo fato de que hoje se inicia, de acordo com Dowbor (2002, p. 23), “uma
gradual e penosa transição de sistemas tradicionais verticais, complementados
por um volume moderado de acordos de cooperação horizontal, para
articulações policêntricas”. Na visão verticalizada, a tendência é arranjar os
sistemas menores e aninhá-los dentro de sistemas maiores, de forma
hierárquica, colocando os maiores acima dos menores, à maneira de uma
pirâmide. Conforme Capra (1996), esse tipo de organização é uma projeção
humana, pois na natureza, não há “acima” ou “abaixo”, e não há hierarquias:
mas sim, existem redes aninhadas dentro de redes, cujos indivíduos coexistem
de maneira cooperativa.
A rede envolve a transferência da função de coordenação das
regras burocráticas formais, para normas sociais informais. Nela, a autoridade
não desaparece, mas é interiorizada, permitindo, assim, a auto-organização e o
autogerenciamento.
Toda sociedade se caracteriza por sistemas de intercâmbio e
comunicação interpessoais formais e informais. Alguns desses sistemas são
horizontais, congregando agentes que têm o mesmo status e o mesmo poder.
Outros são basicamente verticais, agrupando agentes desiguais, em relações
assimétricas de hierarquia e dependência. Na realidade, quase todos combinam
ambas as características. O sistema vertical, por mais ramificado e por mais
importante que seja para seus membros, tem dificuldades de sustentar a
confiança e a cooperação (PUTNAM, 1996).
13
As pessoas pertencentes a uma rede devem se conhecer e se
reconhecer como iguais; portanto, faz-se necessário um objetivo comum entre
elas.
Para tanto, dentro da rede, os indivíduos cultivam semelhanças,
dentre as quais se podem mencionar as relações familiares, fundadas na
genética e as relações de amizade fundamentadas em afinidades. A família se
impõe como o primeiro grupo de socialização; quando os indivíduos começam a
ampliar as suas relações sociais, inevitavelmente, procuraram pessoas mais
parecidas consigo mesmos. A homogeneidade dos grupos está relacionada
também ao compartilhamento de idéias, de gostos, de etnias entre outras coisas.
O reconhecimento entre os indivíduos instaura e perpetua as
relações de capital social. Mas as relações não podem se resumir à “proximidade
física (geográfica)” ou a um “espaço econômico ou social” (BOURDIEU, 1980, p.
67). Isto é, o simples fato de conhecer seus vizinhos ou companheiros de
trabalho não indica que haja produção de capital social. Pode-se freqüentar uma
igreja, um clube, uma academia, uma faculdade ou pertencer a uma família e
não ter capital social nesses locais; isso pode até ser entendido como relações
freqüentes, mas não como relações úteis.
Bourdieu (1980, p. 68) problematiza a organização em rede com a
afirmação: “a existência de uma rede de relações não é um dado natural, nem
mesmo um dado social”. O autor considera a rede como o resultado da interação
entre os indivíduos em relações duráveis e úteis. Ainda segundo o autor, rede
não é um “dado constituído para sempre por um ato social ou por uma
instituição”. Uma rede só existe se estiver ativa; ela se faz durante a execução
das ações e quando cessadas as ações, deixa de existir. Portanto, a rede é o
“produto do trabalho de instauração e manutenção que é necessário para
produzir e reproduzir relações duráveis e úteis”.
Outra questão a ser discutida é a utilidade da rede, que se impõe
como característica indispensável para a formação de capital social, uma vez
que as relações, além de permanentes, devem possuir objetivos e metas
comuns, pois, dentro da rede, se as relações não trouxerem ganhos aos
14
indivíduos ou não propiciarem trocas úteis, a rede cairá em desuso e poderá
desaparecer. Enfim, um grupo gera capital social quando reúne um “conjunto de
agentes que não somente são dotados de propriedades comuns, [...] mas
também são unidos por ligações permanentes e úteis” (BOURDIEU, 1980, p. 67).
Uma rede pode ser entendida, também, como o conjunto de
“estratégias de investimento social”, que são orientadas para transformar as
relações contingentes em “relações necessárias e eletivas”. Essas estratégias
podem ser conscientes ou inconscientes, de curto ou de longo prazo, que visam,
sempre, transformar as relações contingentes (de proximidade, vizinhança ou até
mesmo de parentesco) em relações duráveis “que implicam obrigações de
mutualidade duráveis subjetivamente sentidas ou institucionalmente garantidas”,
que podem ser cumpridas por “sentimentos de reconhecimento, respeito,
amizade etc.” (BOURDIEU, op.cit., p. 68).
As relações circunstanciais ou contingentes são aquelas que
independem da vontade do indivíduo. Quando alguém vai morar em uma
vizinhança ou trabalhar em uma empresa tem que se relacionar com pessoas
com as quais não escolheu. Essas relações podem até ser freqüentes, mas não
podem ser vistas como duráveis e úteis. Quando se faz uso das estratégias de
relacionamento, as relações circunstanciais podem se tornar relações duráveis e
úteis.
A quantidade de capital social pertencente a um indivíduo “depende
da extensão da rede de relações que ele pode efetivamente mobilizar”
(BOURDIEU, op.cit., p. 67). Podem existir relações de cordialidade com as
pessoas próximas, mas quando se precisa mobilizar uma comunidade para fazer
algo, é que se consegue ver o quanto de capital social existe na rede. O objetivo
proposto para uma situação será atingido dependendo do número de pessoas
que irão trabalhar, e dependerá também da intensidade da ajuda que será posta
à disposição, ou do quanto dos diversos capitais acumulados individualmente
cada um propõe a disponibilizar coletivamente. Se não é possível fazer uma rede
trabalhar em prol de um objetivo, ela não é efetivamente útil.
15
Além do capital social construído pelas relações estabelecidas
entre os indivíduos, há o capital social herdado. Esse proporciona reputação e
credibilidade, mas que não é fruto do esforço pessoal do agente herdeiro. O
capital social que o herdeiro faz uso foi construído por seus antecessores.
Contudo, a manutenção desse estoque dependerá diretamente de suas ações.
A reputação pode ser herdada não só pelo pertencimento a uma
família, mas também pela inclusão em um grupo social. Um grupo constrói uma
reputação sólida e passa credibilidade àqueles que representam o seu nome. A
instituição, por meio de um processo de aculturação, capacita seus integrantes
para que tenham o direito de usar seu nome e também lhes dá o direito de usar
o capital social que ela construiu, assim como os pais fazem com seus filhos.
As relações de reciprocidade geram para os indivíduos lucros de
capital social. Os lucros proporcionados pelo pertencimento a um grupo estão
diretamente relacionados à solidariedade que faz com esse grupo exista.
Solidariedade e grupo não podem ser dissociados, pois ambos estão baseados
na confiança. Uma relação de solidariedade compreende mutualidade de
interesses e deveres e identidade de sentimentos, de idéias, de doutrinas. Se
não existir solidariedade e confiança, não há grupo nem rede. Ou ainda, se a
solidariedade acabar, o grupo enfraquecerá e dispersará.
A quantidade de capital social se apresenta como um facilitador das
relações de confiança, de forma que confiança e cooperação se retroalimentam.
Quanto mais elevado o nível de confiança, maior a probabilidade de haver
cooperação, sendo que a própria cooperação gera confiança. Contudo,
a confiança necessária para fomentar a cooperação não é uma
confiança cega. A confiança implica uma previsão do
comportamento de um ator independente. Você não confia que
uma pessoa (ou entidade) fará alguma coisa simplesmente
porque ela disse que irá fazer. Você só confia porque,
conhecendo a disposição dela, as alternativas que se dispõe e
suas conseqüências, a capacidade dela e tudo mais, você
espera que ela preferirá agir assim (DRAGPUTA apud
PUTNAM,1996, p. 180).
16
A não cooperação também é considerada como um fator de
organização de uma sociedade. Castells (1999) menciona que da falta de
confiança, surge a alienação entre os grupos e indivíduos. Um passa a
considerar o outro como estranho e, depois de algum tempo, como uma ameaça.
Nesse processo, a fragmentação social se propaga à medida que as identidades
coletivas se tornam cada vez mais difíceis de serem compartilhadas. Nesse
momento, a deserção, a desconfiança, a omissão, a exploração, o isolamento, a
desordem e a estagnação se intensificam, reciprocamente.
A desconfiança nas pessoas e nas instituições, bem como a cultura
do nepotismo e a corrupção presentes no poder público e no privado geraram
um sentimento involuntário que forçou as pessoas a reduzir ao mínimo a
amplitude do ‘raio de confiança’, e a desconfiar, inclusive, daqueles que tentam
ajudar. Outro efeito da falta de confiança é o detrimento das normas coletivas em
nome do interesse pessoal. O aculturamento dentro dos grupos sociais,
geralmente, é internalizado pela observação e repetição e pela aplicação de
sanções aos infratores. Se um comportamento aparentemente inocente, como
sonegar informações na declaração de imposto de renda ou ultrapassar um farol
vermelho, não for punido adequadamente, pode gerar uma reação em cadeia,
resultando num entendimento comum no qual os interesses pessoais passam a
ser mais importantes do que o bem estar coletivo.
Em grupos fechados a tendência é concentrar os lucros de capital
social, para, assim, obter pleno benefício do efeito multiplicador que o
pertencimento assegura. Isto é, os indivíduos tenderão a manter o grupo o mais
homogêneo possível para que o capital social não disperse. Mas a concentração
de capital social em grupos fechados representa um viés no desenvolvimento de
sociedades cooperativas, gerando uma aculturação de cooperação interna e a
não replicação desse comportamento nas relações fora do grupo.
Putnam (1994) afirma que toda sociedade possui algum tipo de
capital social. A diferença entre as sociedades está na amplitude do ‘raio de
confiança’. As famílias são fontes tradicionais de capital social, embora, em
17
alguns casos, parece haver uma espécie de relação inversa entre os laços de
confiança e reciprocidade dentro e fora da família.
Nas sociedades em que a cultura da cooperação é escassa,
geralmente, os círculos de amizade, respeito e cooperação são restritos à
família. Famílias fortes e fechadas produzem pouco capital social, pois existe
diferença entre o que se pratica dentro e fora do contexto familiar. Há produção
de capital social, mas sua produção e consumo se fazem somente dentro da
família. Fora do círculo familiar, os indivíduos não sentem a necessidade de
ajudar o próximo ou de respeitar regras.
Sobre as relações de poder dentro de uma rede, Bourdieu (1980)
alerta para o fato de que não há como concentrar o capital social nas mãos de
um só agente ou delegar o poder a um agente apenas. Esse poder de
mobilização de capital social está diretamente ligado à contribuição pessoal dos
agentes. Isto é, o poder (relacionado ao capital social) que um indivíduo possui
dentro do grupo está diretamente ligado à sua contribuição pessoal para o capital
coletivo.
O capital social não pertence a uma pessoa, mas sim à
coletividade. Inversamente ao que acontece com os outros tipos de capital
(financeiro, físico, cultural etc.), um agente, por si só, não consegue concentrar
capital social porque a acumulação depende da sua relação, isto é o
compartilhamento desse capital com os outros. “Cada indivíduo deve participar
do capital social coletivo na proporção direta da sua contribuição, isto é, na
medida em que suas ações, suas palavras e sua pessoa honrarem o grupo”
(op.cit., p. 69). Só existe capital social quando existem relações, ou seja, se um
indivíduo não se relaciona com outras pessoas ele não terá capital social.
Na organização em rede, o controle tende a ser descentralizado e a
responsabilidade difusa. A delegação institucionalizada, “tende a limitar as
conseqüências das falhas individuais [...]”, ou seja, cada indivíduo é “[...]
guardião dos limites do grupo [...]”, portanto, o indivíduo desviante será chamado
a voltar a agir de acordo com as normas institucionalizadas. “Cada membro do
grupo possui a caução do capital coletivamente possuído [...]”, mas a caução os
18
coloca a mercê da conduta – positiva ou negativa – de qualquer um dos outros
integrantes. O que implica na obrigação dos grandes ou os mais antigos em
emprenhar-se na defesa da “[...] honra dos membros mais desprovidos do seu
grupo” (BOURDIEU, 1980. p. 68, 69).
Assim, os grupos distribuem o capital social entre todos os
membros. Essa distribuição, no entanto, não é igualitária, pois existem
diferenças entre um simples leigo, um bispo e o papa, ou entre um militante de
base e um secretário-geral. Em casos como esse, o poder do grupo acaba sendo
concentrado em um agente singular, e, “embora esse agente tenha seu poder
oriundo do grupo, pode exercer poder sobre o grupo” (BOURDIEU, 1980, p. 68).
O poder que ele detém lhe foi concedido pelo grupo na forma de mecanismos
que lhe permitem concentrar o poder e agir em nome do grupo (um estatuto, um
código de normas, o direito canônico etc.).
Os mecanismos de delegação e de representação são, a princípio,
um desvio na acumulação do capital social. Isso pode levar o grupo a se tornar
uma associação verticalizada, sem cooperação solidária, que poderá ser
sobreposta pelas relações hierárquicas, que geram pouco ou nenhum capital
social. Contudo, mecanismos de representação e regulação são necessários à
medida que o grupo cresce, e “serão mais rigorosos quanto mais numeroso for o
grupo” (BOURDIEU, op.cit., p. 69).
Não que a delegação de poder a um agente seja ruim. As normas,
quando institucionalizadas e quando os agentes representantes são apenas
guardiões do grupo, fazendo como que o grupo se mantenha unido e atento aos
objetivos coletivos, representam uma ação positiva, que permite a união do
grupo. Assim, agentes “diversos e dispersos [podem] agir como único homem e
ultrapassar os efeitos da finitude que os liga a um lugar ou tempo” (BOURDIEU,
1980, p. 62).
Todavia, em estruturas sociais autoritárias ou totalitárias, o
indivíduo, muitas vezes, obedece à lei de forma mais estrita, do que as pessoas
pertencentes a sociedades democráticas. Contudo, não se pode afirmar que o
respeito ao sistema autoritário representa, necessariamente, uma abundância de
19
capital social, muito pelo contrário, o cumprimento das normas reflete o medo
das possíveis punições.
A diminuição do capital social acontece quando os indivíduos se
comportam de maneira não cooperativa, consumindo os estoques existentes.
Quando o grupo não consegue fazer com que o indivíduo transgressor volte a
agir de maneira cooperativa, a reprodução do capital social fica prejudicada, e se
o grupo não for coeso o bastante para se manter cooperativo, com o passar do
tempo, pode sair, gradativamente, do ciclo de reciprocidade/confiança, partindo
para outro de não-cooperação/desconfiança.
Outra forma de consumo de capital social sem reprodução está
presente nos contextos de solidariedade unilateral. Um exemplo disso é o que
acontece com grupos de voluntários que trabalham em comunidades carentes. O
grupo de voluntários possui estoques de solidariedade (ou capital social) e age
de forma que outras pessoas, com menos capital social, participem dele
também. Contudo, o grupo carente de capital social, não intencionalmente, o
consome sem participar da produção, apesar dos esforços feitos pelos
voluntários, no sentido de chamar a população carente para participar. Faz-se
necessário entender que essas famílias não são transgressores; são, apenas,
consumidores que não conseguem produzir.
Assim, a produção de capital social é feita em grupos que
emprestam seus estoques de participação para outros, na forma de ajuda
humanitária. Os recebedores da ajuda não conseguem produzir o capital, apenas
consomem. Dessa forma, fica difícil enxergar a produção e a reprodução do
capital social, pois a produção não é suficiente para todos, e a impressão é a de
que não há produção de capital social. Dessa maneira, as relações interpessoais
geram vínculos sociais muito fracos que não conseguem atingir a perenidade e a
utilidade necessárias para a reprodução do capital social investido.
Junqueira (2000, p. 39) ressalta a importância dos vínculos na
constituição das redes sociais, de forma a pensar e constituir novas formas de
convivência, que permitam gerar mudanças, assim:
20
as redes, no universo de mudanças, surgem como uma
linguagem de vínculos, das relações sociais entre organizações
que interagem mediadas por atores sociais que buscam entender
de maneira compartilhada a realidade social. São formas de agir
que privilegiam os sujeitos, de maneira interativa, apropriam-se
do conhecimento dos problemas sociais e de sua solução.
Segundo o autor, sendo a rede uma construção coletiva, ela se
define a medida que são estabelecidas parcerias entre os sujeitos.
1.2 Vínculos e dádivas
Em uma rede social, as pessoas são ligadas por vínculos. Na
produção do capital social, os agentes individuais nutrem vínculos não-utilitários,
isto é, que possuem normas e valores além daqueles necessários às transações
habituais de mercado. Os integrantes estão muito mais dispostos a se engajarem
em trocas recíprocas que vão além das relações contingentes. Por exemplo, os
membros de uma hierarquia formal não precisam dividir, entre si, normas e
valores, além dos estabelecidos pelo contrato de trabalho; entretanto, nas
organizações formais, as normas podem estar superpostas com redes informais
de vários tipos.
Rede social, assim como um tecido, é uma malha de
relacionamentos, cujos vínculos possuem densidades diferentes. Granovetter
(1973), ao falar sobre vínculos, diferencia a função dos laços fortes e dos laços
fracos para a eficácia das redes. Ele também observou que os vínculos
interpessoais fortes, como parentesco e amizade íntima, são menos importantes
para sustentar a coesão comunitária e a ação coletiva do que os vínculos fracos,
tais como conhecimentos e afiliação a associações secundárias. Assim, os
vínculos fracos têm maior probabilidade de unir membros em pequenos grupos
diferentes, do que os vínculos fortes, proporcionando a ampliação do raio de
confiança.
21
Granovetter (1973) afirma, também, que os laços fracos formam
uma ponte entre os grupos formados por laços fortes. Nesse sentido, para se
ampliar o raio de confiança de um grupo coeso, faz-se necessária a proliferação
de laços fracos. Contudo, sem primeiro formar uma base firme (com laços
fortes), como por exemplo, a família, para que depois se multipliquem os
vínculos fracos, a rede não será um todo eficiente, sem esquecer, também, que
ao se privilegiar os laços fracos, pode-se cair no individualismo, no atomismo
social. Assim, para que haja prosperidade em uma comunidade e que seus
estoques de capital social possam efetivamente aumentar, exige-se que haja
certa dosagem entre a prevalência de laços fracos e fortes, uma vez que,
quando se predominam os laços fortes tende-se ao familismo, e, por outro lado,
quando os laços fracos são privilegiados, acaba-se no atomismo social.
Putnam (1996) afirma que existem dois tipos de reciprocidade:
reciprocidade balanceada (ou específica) e reciprocidade generalizada (ou
difusa). A primeira diz respeito à permuta simultânea de itens de igual valor; por
exemplo, quando colegas de trabalho trocam seus dias de folga, ou políticos
combinam de se apoiarem mutuamente. A reciprocidade generalizada diz
respeito a uma contínua relação de troca que a qualquer momento apresenta
desequilíbrio ou falta de correspondência, mas que supõe expectativas mútuas
de que um favor concedido hoje venha a ser retribuído no futuro.
O intercâmbio contínuo ao longo do tempo, mesmo que seja
baseado na reciprocidade balanceada, costuma incentivar o estabelecimento de
uma regra de reciprocidade generalizada, que representa um componente
altamente produtivo de capital social.
Num sistema de reciprocidade, todo ato individual geralmente se
caracteriza por uma combinação do que se poderia chamar de
altruísmo a curto prazo e interesse próprio a longo prazo: eu te
ajudo agora na expectativa (possivelmente vaga, incerta e
impremeditada) de que me ajudarás futuramente. A
reciprocidade é feita de uma série de atos que isoladamente são
altruísticos a curto prazo (beneficiam outrem à custa do altruísta),
mas que tomamos em conjunto normalmente beneficiam todos
os participantes (TAYLOR apud Putnam, 1996, p. 182).
22
Além de fortalecer vínculos, a reciprocidade fortalece as
sociedades, pois estimulam a cooperação e a confiança social e reduzem os
incentivos à transgressão, diminui a incerteza e fornece modelos para a
cooperação futura (PUTNAM, op.cit.).
As trocas (de objetos, palavras, sentimentos, entre outros)
transformam as coisas trocadas em ‘signos de reconhecimento’. Em uma rede, a
troca funciona como meio de comunicação, e produz conhecimento e
reconhecimento mútuos, necessários para as estratégias de manutenção da
rede de relacionamentos (BOURDIEU, 1980).
Nas relações sociais, as trocas (materiais e simbólicas) podem ser
comerciais ou gratuitas, sendo as trocas comerciais fundadas na lógica do
mercado, e as trocas gratuitas baseadas na dádiva. O signo das trocas, aos
quais Bourdieu se refere, pode ser entendido como dádivas presentes nas trocas
entre as pessoas. A dádiva pode ser entendida como
toda ação ou prestação efetuada sem expectativa, garantia ou
certeza de retorno; por esse fato, comporta uma dimensão de
“gratuidade”, [...] tendo em vista a criação, manutenção ou
regeneração do vínculo social. Na relação de dádiva o vínculo é
mais importante que o bem (CAILLÉ, 2002, p. 192).
Para entender os ambientes onde as trocas não-instrumentais
ocorrem, Caillé (2002) e Godbout (2002) os diferenciam em sociabilidade
primária e secundária. Entende-se por sociabilidade primária os vínculos sociais
constituídos de forma espontânea, natural, algo que se fundamenta pelo desejo
intrínseco de estabelecer uma relação de proximidade com o outro. São
interações e relacionamentos que se estabelecem entre as pessoas,
respeitando-se e dando especial significância às suas individualidades, e estão
presentes, principalmente, nas relações familiares, comunitárias e de amizade.
Na sociabilidade secundária, a interação se estabelece pelos papéis e funções
desempenhadas, que se sobrepõem aos aspectos da personalidade dos
indivíduos, que, por sua vez, congrega estatutos e funções mais ou menos
definidos institucionalmente e que é representada pelas esferas do mercado e do
Estado.
23
A dádiva é algo que circula entre amigos, parentes e vizinhos em
forma de presentes, de hospitalidade e serviços; na sociedade moderna, circula,
também, entre desconhecidos, sob a forma de doação de sangue, de órgãos,
filantropia, doações humanitárias, benevolência etc. (GODBOUT, 2002). Assim,
como na reciprocidade generalizada, nos dois contextos, a lógica da dádiva
busca se afastar da equivalência. Assim, as dádivas são relações
desinteressadas e livres, que tem como função o fortalecimento dos vínculos
entre as pessoas e o estabelecimento de uma dívida positiva para com o grupo –
endividamento mútuo positivo – que serve, principalmente, para reforçar os
compromissos firmados (CAILLÉ, 2002).
Mauss (1950), precursor e fundador do conceito de dádiva, afirma
que ela, para ser completa, precisa obedecer a circularidade estabelecida pelas
ações de dar, receber e retribuir. Todavia, a dívida estabelecida pela obrigação
de retribuir não é uma dívida como a que se está acostumado a ver na lógica de
mercado – dívida negativa – na qual o receptor tem uma obrigação de retribuir o
que lhe foi cedido para o doador. A dívida contraída pela dádiva é uma dívida
positiva para com o grupo, desobrigando o receptor a devolver o bem recebido.
A retribuição a qual Mauss se refere é uma retribuição que não,
necessariamente, retornará para o doador, mas que pode ser entregue para
outro membro do grupo ou para a coletividade.
Segundo Etizione, existe liberdade na dádiva, não é a mesma
liberdade existente no mercado, é uma liberdade que se situa
dentro do laço social, consiste em tornar o laço social mais livre,
multiplicando os rituais que visam diminuir o peso da obrigação
da dívida. A dádiva é um jogo constante de liberdade e obrigação
(GODBOUT, 2002).
Um exemplo disso são as associações, consideradas por Caillé
(2002) como espaços públicos das relações de sociabilidade primárias, sendo a
dádiva, o meio pelo qual se estabelece o pacto associativo. Mesmo quando as
associações perseguem objetivos mercadológicos, as estratégias adotadas para
alcançá-los subordinam a lógica mercantil a um princípio de personalização,
recorrendo, assim, a modalidades típicas da sociabilidade primária.
24
Enquanto o mercado se apóia no princípio do interesse e da
liberdade dos particulares, enquanto a esfera político-
administrativa se baseia no princípio do interesse publico (ou
coletivo) e da imposição necessária para sua implantação, a
associação – assim como a dádiva – repousa em um princípio de
liberdade e de obrigação estreitamente misturados, através do
qual se realizam interesses comuns. Outra formulação: enquanto
a obrigação nos incita a quitarmos uma dívida, enquanto o
interesse comercial e instrumental nos impele a abandonar o
registro da dívida equilibrando em cada instante os direitos e os
deveres, o débito e o crédito, somos incitados pela dádiva e pela
ação associativa a adotar o ciclo da circulação da dívida
(CAILLÉ, 2002, pp. 198-199).
A dádiva é fundamental para se sentir as comunicações, para se
romper isolamentos, para se sentir as identidades. Daí o sentimento de poder, de
transformação, de abertura, de vitalidade que invade os doadores, que dizem
receber mais do que dão, pois com o objeto doado segue junto à própria pessoa.
O ato de se dar alimenta os laços sociais, fortalecendo, assim, a coesão grupal e
a cultura de ajuda-mútua.
A princípio, o conceito de capital social pode conflitar com o
conceito de dádiva, mas, na verdade, eles são complementares. Apesar do
conceito de capital social ser, à primeira vista, um conceito utilitarista, em que as
relações sociais são baseadas no interesse (individual ou grupal) de conquistas
materiais e de pertencimento, algo mais que o interesse econômico deve estar
em pauta nas relações associativas. Mauss (1950, p. 188) considera interesse
como “procura individual do útil” e uma forma de lucro. O autor afasta o conceito
da dádiva do interesse, pois o que está em pauta não é o indivíduo, mas as
relações, os laços, os vínculos. Por outro lado, o autor não conseguiu encontrar
em seus estudos sobre sociedades arcaicas, uma sociedade com uma dádiva
totalmente livre de interesse. Em consonância, Caillé (2002, p. 194), ao falar
sobre a questão do interesse nas relações de dádiva, questiona:
em certo sentido, a dádiva não é, de modo algum,
desinteressada; simplesmente, ela dá o privilégio aos interesses
de amizade e de prazer sobre os interesses instrumentais e
sobre a obrigação e a compulsão.
O autor problematiza dizendo que
25
a obstinação de religiões ou de numerosos filósofos em procurar
uma dádiva plenamente desinteressada não tem objeto; aliás,
toda a retórica sobre o assunto baseia-se em uma confusão
entre a gratuidade da relação e o desinteresse [...]. A dádiva não
deve ser pensada sem o interesse ou fora dele, mas contra o
interesse instrumental [...]. A dádiva é um movimento que, tendo
como objeto a aliança, ou a criação desta, subordina os
interesses instrumentais aos interesses não instrumentais
(CAILLÉ, 2002, p. 194).
Enfim, a questão não é negar o interesse, mas saber qual tipo de
interesse é benéfico e qual é prejudicial para a coesão do grupo social. É nesse
contexto que a dádiva se articula com a reprodução de capital social. Para que
uma rede social se perenize, traga prosperidade, algo além do interesse
instrumental deve ser considerado como o verdadeiro espírito dos grupos
sociais.
As relações horizontais são mais eficientes que as verticais. Isso
quer dizer que as relações mais eficientes são aquelas nas quais um algo a mais
figura como o verdadeiro motor das relações – aquilo que está além da
hierarquia, do contrato, do respeito às normas, da obrigação moral. Pode-se
dizer que esse algo a mais é algo imaterial e gratuito. E é nesse ponto que as
dádivas aparecem, tanto nas relações de amizade quanto no simples contato
interpessoal, nos quais as pessoas doam não somente coisas, mas doam,
principalmente, a si mesmas.
Outra questão é o fato de que o trabalho voluntário não pode ser
confundido com mão de obra gratuita, pois, no momento da motivação para o
trabalho, o que o voluntário dá ou recebe não pode ser medido. O gesto
dadivoso não está vinculado á lógica utilitarista do mercado. O voluntário não
está preocupado com os dividendos da sua ação, mas preocupado com o
problema que sua ação estará ajudando a resolver. Levando-se em
consideração que o trabalho remunerado é motivado pela venda da força de
trabalho, pela expectativa de retorno de ganho sobre o esforço cedido, o
processo circular da dádiva, inerente ao trabalho voluntário, tira do seu cerne a
possibilidade de ser considerado como trabalho gratuito ou não remunerado,
26
uma vez que o voluntário é motivado, principalmente, pelo ato de dar, e não pelo
de receber.
Nesse sentido, quando Bourdieu (1980) fala em relações úteis para
a formação do capital social, diz que nessas relações existe mais do que
interesse econômico, prestígio e visibilidade social, pois na articulação em rede a
utilidade figura como seu objetivo:
Nas redes os objetivos, definidos coletivamente, articulam
pessoas e instituições que se comprometem a superar de
maneira integrada os problemas sociais. Essas redes são
construídas entre seres sociais autônomos, que compartilham
objetivos que orientam sua ação, respeitando a autonomia e as
diferenças de cada membro (JUNQUEIRA, 2000, p. 39).
Entende-se, assim, a utilidade de uma rede como uma forma de
objetivo comum para as relações interpessoais, pois, sem um objetivo, a
cooperação entre as pessoas se torna vazia e faz com que a rede disperse ou
perca força. Nas relações de dádiva, a utilidade é meio, e não o fim,
diferentemente do paradigma utilitarista, que prega o interesse instrumental
como um fim em si mesmo.
No mundo contemporâneo, o voluntariado é uma das formas de
ação social na qual a dádiva está presente. Contudo, discutir a temática do
trabalho voluntário é discutir também os vínculos presentes nessas relações e as
trocas proporcionadas pelo contato entre as pessoas.
Dessa forma, o conceito de dádiva auxilia a discussão sobre as
motivações para o trabalho voluntário. Não importa se o objetivo último é o
desenvolvimento local ou o combate à mortalidade infantil; toda ação associativa
ou comunitária se apresenta permeada por vínculos formados por trocas
baseadas em dádivas e que, em geral, produzem capital social, pois são ações
que têm como fim último o fortalecimento de laços sociais.
27
1.3 Trabalho voluntário
Desenvolvimento começa com um passo de uma pessoa, ou
melhor: ele começa quando uma pessoa dá a mão a uma outra
pessoa. Quando uma pessoa toma a iniciativa e engaja-se em
uma atividade social, ela já entra no processo do desenvolvimento.
A miséria e a pobreza são feitas por pessoas e pode ser superada
por pessoas (Dirk Hegmanns - United Nations Volunteers).
A sociedade contemporânea está sendo desafiada a se reinventar
e a se reconstruir, no sentido de se tornar pró-ativa, tomando iniciativas para
resolver as questões sociais. Segundo Junqueira, o cidadão é responsável, não
apenas por seus problemas particulares, mas também pela resolução daqueles
problemas pertinentes à administração da cidade, da escola, do hospital, enfim,
dos equipamentos sociais, em prol do bem comum. Para o autor,
a ação social é uma tarefa compartilhada tanto pelo setor
governamental como pelo não-governamental, tendo em vista o
combate à pobreza e à exclusão social. Com isso a lógica
assistencialista, que permeava os programas sociais, deixa de
ocupar um lugar de centralidade, para fortalecer a capacidade
das pessoas e comunidades de satisfazer suas necessidades,
construindo uma vida com qualidade (JUNQUEIRA, 2002, p.
137).
As ações de voluntariado presentes em movimentos locais ou
comunitários são caracterizadas como grupos de entre-ajuda ou ajuda-mútua.
Nas ações de ajuda-mútua o contato, a proximidade, as relações interpessoais e
o inter-reconhecimento são fatores chave. Neles pode-se ver o processo de
produção e de reprodução de capital social e também o círculo das dádivas se
fecharem com mais facilidade. Assim, as relações comunitárias que privilegiam o
contato pessoal direto têm maior probabilidade de ativar o crescimento do capital
social e de gerar fortalecimento de vínculos sociais:
Nessa perspectiva, o trabalho voluntário ganha significado,
integra-se na construção de uma nova realidade social,
28
articulando com outros atores para construir uma sociedade mais
justa e equânime (JUNQUEIRA, op.cit.:139).
A discussão sobre trabalho voluntário se inicia com a apresentação
de algumas definições para termo. Segundo a ONU,
voluntário é qualquer pessoa que, movida por interesse pessoal
e espírito cívico, dedique parte de seu tempo, sem remuneração
alguma, a diversas formas de atividades, organizadas ou não, de
bem estar social ou outros campos (ONU, apud. COELHO, 2000,
p. 69).
A definição formulada em 1997 para o Programa Voluntários do
Conselho da Comunidade Solidária diz que voluntário é
aquele cidadão que motivado pelos valores de participação e
solidariedade, doa seu tempo, trabalho e talento, de maneira
espontânea e não remunerada, para causas de interesse social e
comunitário (LANDIN e SCALON, 2000, p. 10).
Em 1998, a Lei do Voluntariado trouxe a definição oficial do que se
considera serviço voluntário, entendido como
atividade não remunerada, prestada por pessoa física à entidade
pública de qualquer natureza ou instituição privada de fins não
lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais,
científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive
mutualidade (Lei nº 9.608, Diário Oficial da União, 18/02/98).
Landin e Scalon (2000), em uma pesquisa nacional sobre trabalho
voluntário, relacionam o trabalho voluntário a atividades que as pessoas fazem
de graça para ajudar instituições ou pessoas que não sejam parentes ou amigos.
Assim, entende-se por trabalho voluntário aquilo que é feito
gratuitamente, por iniciativa individual e que visa o bem estar de alguém ou de
uma coletividade. Segundo as definições apresentadas, o voluntário doa seu
tempo, trabalho, talento ou se presta a uma atividade. O voluntariado está
intrinsecamente ligado à participação, solidariedade e doação.
Casal (2005), ao abordar a dádiva entre desconhecidos no interior
de redes de solidariedade social, apresenta algumas formas de expressão de
solidariedade, bem como a dádiva oferecida pelos sujeitos doadores: a dádiva do
29
bom samaritano; a esmola; a filantropia; a doação de órgãos; a adoção; o
voluntariado e os grupos de entre-ajuda. Para o autor,
O filantropo dá dinheiro, o herói e o mártir dão ou arriscam a sua
própria vida, o samaritano oferece ajuda ou hospitalidade; qual a
dádiva do voluntário? A dádiva do voluntário é,
fundamentalmente, o seu tempo, uma coisa que, de acordo com
as sondagens ou as desculpas, falta muito aos modernos
(CASAL, 2005, p. 211).
Os grupos de entre-ajuda, por sua vez, são mais estruturados e
pressupõem uma mediação mínima entre quem dá e quem recebe:
As normas que regem a circulação das ajudas no interior destes
grupos têm origem nos princípios da associação dos “alcoólicos
anônimos” onde quem recebe a ajuda se transforma num doador
dessa mesma ajuda. São intercambiados bens, serviços e
saberes diversos. Esses sistemas e associações representam
uma nova forma de cidadania e de aprendizagem da democracia
(CASAL, op.cit., p. 212).
O apelo para o trabalho voluntário moderno está na promessa de
transformação cidadã, embutida no fato de que a ação voluntária gera cidadania
tanto para o voluntário quanto para o beneficiado pela ação. Mas, fortes críticas
são tecidas ao trabalho voluntário contemporâneo. As campanhas que
incentivam o trabalho voluntário usam valores subjetivos, que colocam o
indivíduo como eixo central. Nas campanhas de incentivo ao voluntariado,
geralmente, são valorizadas a melhoria da auto-estima e o crescimento pessoal,
sendo que pouca atenção é dada às relações entre os sujeitos e as
repercussões emanadas dessas ações.
Nos anos 80, surgiram organizações não governamentais e sem
fins lucrativos, com objetivo de combater carências socioeconômicas. Nesse
contexto, o combate deixa de ter caráter reivindicatório e discursivo para passar
para o plano operacional e propositivo. Surgem ações concretas de intervenção
da sociedade nas políticas públicas, agora, em um esforço conjunto com o
Estado, e não mais contra ele (GOHN, 2003).
30
Em 1993, uma campanha nacional, liderada pelo sociólogo Herbert
de Souza, chamou a atenção da sociedade para o trabalho voluntário. Nessa
campanha, qualquer tipo de ajuda ou manifestação era válido. Seu principal
apelo era a erradicação da fome: “Ação da Cidadania contra a Miséria e pela
Vida”. Essa campanha foi considerada por Landin e Scalon (2000, p. 13) como
um movimento paradigmático, no qual foram instaurados como centrais os
debates sobre antigas polarizações como “assistência/política,
caridade/cidadania, emergencial/estrutural”, trazendo novos elementos para o
imaginário político e para as formas de participação.
Essa campanha teve repercussões que podem ser vistas até hoje.
Houve uma espécie de despertar para o trabalho voluntário, pois as pessoas
foram chamadas a se preocupar com as demandas das camadas mais pobres
da população. Então, diversos atores da sociedade passaram a realizar
campanhas em prol, não só de ajuda contra a fome, mas também em questões
ambientais, sobre a reforma agrária, sobre políticas públicas de educação, saúde
e assistência social, de direitos civis, de direitos humanos etc. Não que estas
questões estivessem adormecidas, mas as discussões sobre essas temáticas
estavam limitadas aos grupos de interesse direto.
Em 1997, uma iniciativa da então primeira dama, Ruth Cardoso, o
Programa Voluntários da Comunidade Solidária, tinha por objetivo a implantação
de uma cultura moderna do voluntariado, preocupada, principalmente, com a
eficiência dos serviços e com a qualificação de voluntários e instituições. Sem
excluir as práticas e disposições preexistentes, o programa tinha como missão
contribuir para promoção, valorização e a qualificação do trabalho voluntário no
Brasil, abordando uma nova visão do trabalho voluntário, privilegiando o
desenvolvimento da cidadania participativa. Em todo o Brasil, foram realizados
seminários, debates, cursos (LANDIM e SCALON, 2000).
Contudo, o despertar de cidadania, anunciado nesse período, teve
sua base em formatos de países mais desenvolvidos, nos quais as sociedades,
historicamente, foram acostumadas à participação comunitária, conforme Gohn
(2003, p. 15), que afirma que
31
a doação e o voluntariado fazem parte de práticas e crenças
fundantes da cultura cívica norte americana, existindo e
orientadas por valores básicos nessa sociedade como a
liberdade e responsabilidade individuais, a idéia de que o
cidadão é responsável pelo bem estar de seus semelhantes e
pelo bem comum.
Aléxis Tocqueville, em sua Obra A Democracia na América, (1938),
analisa a sociedade norte americana da época e a forte presença do
associativismo. Segundo o autor, americanos de todas as idades, condições e
espíritos se uniam, não apenas em associações comerciais ou industriais, mas
também em associações religiosas, morais, sérias, fúteis, gerais, particulares,
para darem festas, construírem prédios, igrejas, casas, hospitais, escolas,
prisões.
A partir dos anos 1990, devido a esforços de organismos sociais
nacionais e internacionais, tem-se a inserção na sociedade brasileira da cultura
do associativismo, que hoje está passando por um processo de adaptação à
dinâmica social brasileira.
O associativismo predominante nos anos 1990 não deriva de
processos de mobilização de massa, mas de processos de
mobilização pontuais. Qual a grande diferença? No primeiro
caso, a mobilização se faz a partir de uma causa seguindo as
diretrizes de uma organização. No segundo, a mobilização de faz
a partir do atendimento a um apelo feito por alguma entidade
plural, fundamentada em objetivos humanitários (GOHN, 2003, p.
17-18).
Ainda é difícil dizer como será o formato do associativismo
brasileiro, pois muito trabalho ainda tem que ser feito para a desvinculação com
as raízes clientelistas de dependência e exploração existentes. Os movimentos
associativistas brasileiros contemporâneos realizam diagnósticos sobre a
realidade social e constroem propostas. Atuando em redes, articulam ações
coletivas que agem contra a exclusão social. Eles colocam em prática e
desenvolvem o chamado empoderamento de atores da sociedade civil
organizada, à medida que criam sujeitos sociais para essa atuação em rede
(op.cit.).
32
As mudanças no sentido de desvincular o trabalho social das
amarras clientelistas do passado, vêm desde a forma como o trabalho é
realizado, até a forma como o receptor encara a ajuda. Os dois lados têm que se
encarar como cidadãos e sujeitos de direitos e deveres e como indivíduos que
cumprem seus papéis sociais. Aquele que dá, não o faz porque ele é uma
pessoa bondosa e caridosa, mas porque é seu dever de cidadão ajudar o seu
próximo. E aquele que recebe, não recebe porque é pobre e necessitado, mas
porque ele é um sujeito de direitos, cuja ação a qual está sendo beneficiado é
uma necessidade de primeira ordem para seu desenvolvimento como ser
humano.
Contudo, a interiorização dessa dinâmica ainda não foi realizada:
ambos estão na mentalidade antiga. Tanto quem dá quanto quem recebe não
entenderam, ainda, os seus papéis sociais. Ainda hoje aquele que recebe encara
a ajuda como uma obrigação do outro, no sentido de que quem dá é um
substituto do Estado, outrora assistencialista.
Dentro desse contexto é que se torna importante o fomento das
organizações de base comunitárias, nas quais os indivíduos da própria
comunidade são chamados a trabalhar no cuidado e no desenvolvimento do seu
meio e de seus pares. O que se convencionou chamar de ajuda-mútua é
exatamente a dinâmica que sempre existiu nas comunidades pobres. Aquele que
tem um pouco mais (conhecimento, comida, dinheiro etc.) ajuda o que tem
menos. A ajuda entre mulheres e os mutirões são exemplos de dinâmicas já
presenciadas, analisadas, estudas nas sociedades primitivas e na própria
colonização dos Estados Unidos, por exemplo. A ajuda-mútua, o cooperativismo,
o associativismo são práticas sociais que fortalecem tanto sociedades quanto
economias. Todo movimento associativo é, também, um trabalho voluntário de
ajuda-mútua.
Quando o trabalho voluntário é exercido por pessoas iguais ou de
situação socioeconômica muito próxima, acaba recebendo outro nome que não
trabalho voluntário. Esses agrupamentos costumam serem chamados de
associações, clubes, sociedade de amigos ou, até mesmo, nem recebem uma
33
denominação. Esses são espaços públicos da sociabilidade primária, nos quais
vínculos são fortalecidos, o raio de confiança é expandido, há maior produção e
reprodução de capital social e os círculos de dádiva são fechados com mais
facilidade.
Segundo Caillé (2002), a solidariedade, em seu sentido moderno e
restrito, é considerada como uma redistribuição dos bens materiais ou
simbólicos, efetuada por aqueles que têm mais em favor daqueles que têm
menos. Tradicionalmente, a solidariedade se desenrolava no âmago da
sociabilidade primária, no registro do interconhecimento. Além disso, ela era
garantida pelos mecanismos próprios à dádiva partilhada ou sob uma forma ou
outra de dádiva assimétrica (caridade cristã ou liberalidades aristocráticas).
A aproximação das pessoas se torna importante quando se tenta
enxergar o círculo da dádiva – dar, receber e retribuir. Mas quando se tenta
perceber esse mesmo círculo em uma relação de doação de bens ou dinheiro, o
círculo, muitas vezes, não se fecha, ainda mais quando doador e beneficiário
não se encontram.
Na sociedade contemporânea, pode-se partir do princípio de que as
pessoas querem ajudar, pois se sentem incomodadas com a pobreza, a
destruição da natureza, a precariedade da educação, da saúde, entre outras
tantas mazelas da atualidade. Contudo, há um cerco feito por discursos que,
indiretamente, pregam o individualismo, a dessocialização e a dessolidarização.
Nesse contexto, as pessoas que querem ajudar se sentem confusas, pois de um
lado está a cultura individualista que diz que se deve privilegiar o ‘eu’, e por
outro, a percepção de que é necessário cuidar do ‘seu meio’. Então, as pessoas,
em sua individualidade, tentam ajudar da forma que podem, mas se esquecem,
ou perdem a consciência, do poder transformador existente nas relações
pessoais.
Atualmente, as campanhas de arrecadação de donativos mostram
que as doações são intermediadas por instituições, fazendo com que aqueles
que doam e aqueles que recebem não se encontrem. Esse problema foi
levantado por Casal (2005), quando analisa as organizações do terceiro setor,
34
em que o autor afirma que a intermediação empobrece as relações
interpessoais. A existência da troca sem o encontro prejudica o círculo da dádiva
e gera pouco ou nenhum capital social, pois se trata de uma relação pessoa-
instituição-pessoa e não de uma relação pessoa-pessoa, ou seja, interpessoal.
Além disso, a rede de solidariedade formada é momentânea, que se faz quando
a instituição pede o donativo e o entrega, o que torna a troca entre eles em
apenas uma dádiva unilateral, não possibilitando o alcance do objetivo da dádiva
que é o fortalecimento dos laços sociais.
Assim, tem-se, aqui, o dilema da necessidade de aproximação
entre as pessoas. O problema, nesse caso, está na dificuldade em mudar uma
cultura em que os brasileiros foram acostumados a receber do Estado a ajuda
necessária. Passaram-se anos, décadas, séculos e essas pessoas que hoje
precisam de ajuda ainda estão aguardando que alguém venha resolver seus
problemas. Então a sociedade, mobilizada em campanhas de arrecadação de
alimentos, roupas, remédios, brinquedos etc. tenta minimizar o sofrimento de
quem espera. Mas essa ajuda não tem caráter de transformação, não tem a
intenção de se criar uma relação entre voluntário e recebedor. Ela satisfaz
momentaneamente a necessidade de ambos: o doador sente como se estivesse
pagando pelas dádivas recebidas; e o recebedor, tem sua necessidade
fisiológica saciada naquele momento. Isso, porém, deixa o ciclo da dádiva
incompleto.
Muitas vezes, a culpa da dádiva unilateral não é somente do
doador, que não quer ou não sabe como se relacionar com outras pessoas, mas
pode ser também da falta de receptividade do recebedor da dádiva, da falta de
consciência do segundo ator de que a ajuda, se somada a uma forma de
relacionamento, pode ser mais do que uma ajuda material, pode trazer bens
imateriais importantes.
A discussão sobre o capital social pode ajudar a entender como a
energia de um voluntário pode ser potencializada e otimizada. O fato de uma
pessoa sair de sua individualidade e se propor a ajudar alguém já é o primeiro
passo para a produção de capital social, pois ela está começando a se relacionar
35
com pessoas de fora de seu círculo familiar ou do seu circulo de amigos. E se
esse voluntário se associar a outros com o mesmo objetivo estará produzindo
ainda mais capital social. As novas relações, a principio, são contingentes, mas
com o passar do tempo, essas relações vão se modificando, e, efetivamente,
produzirão capital social, se forem contínuas e tenderem à perenidade.
Pode-se dizer, a princípio, que o voluntário é alguém que é
motivado por interesses pessoais. Mas se a análise for aprofundada em suas
práticas, percebe-se que as intenções do voluntário, mesmo quando
personalizadas, estão permeadas por algo a mais, e, por mais distante que ele
esteja da realidade do beneficiário, alguma relação estará sendo gerada. São
objetos, dinheiro, conhecimentos, afetos entre outros que estão sendo trocados,
e levam consigo algo maior que a sua materialidade, pois estão permeados de
sentimentos, afetos, vontades, solidariedade, ajuda, compaixão. E a
transformação social, prometida pelo exercício do trabalho voluntário,
proporcionadas pelas dádivas que circulam entre as pessoas, dependerá do grau
de interatividade entre doador e receptor.
36
CAPÍTULO II
METODOLOGIA DA PESQUISA
A pesquisa, de natureza quantitativa e qualitativa, foi realizada junto
a voluntários da Pastoral da Criança, na cidade de Santos, no estado de São
Paulo. A pesquisa teve o intuito de apreender a dinâmica organizacional e os
reflexos sociais da intervenção da Pastoral da Criança, por meio do
desenvolvimento de duas fases: a primeira priorizou a observação participante, a
pesquisa exploratória, a formulação do instrumento de pesquisa e a realização
do pré-teste; enquanto na segunda houve a aplicação de formulários e análise
dos resultados.
A observação participante permite captar os comportamentos no
momento em que eles se produzem, sem a mediação de um documento. Na
interação com o entrevistado, o pesquisador atua como um facilitador na
obtenção das informações sobre a organização, e traz novos elementos para a
reflexão (QUIVY e CAMPENHOUDT, 1995).
Durante a primeira fase da pesquisa, de agosto de 2006 a junho de
2007, a observação participante objetivou a construção da problemática da
investigação. Conforme Quivy e Campenhoudt (1995:71) “esta fase tem como
função principal revelar determinados aspectos do fenômeno estudado em que o
investigador não teria espontaneamente pensado por si mesmo”. Para tanto,
priorizaram-se conversas informais com os voluntários, a participação, como
aluno, nas capacitações oferecidas aos voluntários, participação em reuniões do
conselho da Pastoral da Criança de Santos, e reuniões de Avaliação e Reflexão,
e diversas Celebrações da Vida.
37
Foram realizadas, também, visitas à Casa dos Conselhos
Municipais de Santos, onde se conversou com os conselheiros e se participou
das reuniões dos conselhos municipais de Saúde, Direitos da Criança e do
Adolescente e de Assistência Social, conselhos cujo trabalho está ligado
diretamente à Pastoral da Criança, e nos quais a instituição possui
representantes, participando com direito a voto.
Ainda na primeira fase, em julho de 2007, após a elaboração do
formulário, foi realizado o pré-teste, com entrevistas a quatro voluntários
escolhidos de maneira não intencional. A aplicação do pré-teste permitiu
aperfeiçoar o instrumento.
Na segunda fase da pesquisa, de agosto a outubro de 2007, foi
aplicado o formulário. A cidade de Santos possui 25 paróquias, sendo que em 15
delas existe equipe da Pastoral da Criança. Foram visitadas todas as paróquias
nas quais a Pastoral da Criança atua. Dos 200 voluntários atuantes na cidade, o
formulário foi aplicado a uma amostra não probabilística por conveniência de 55
voluntários (28%).
Priorizaram-se os voluntários que atuam, diretamente, com as
famílias: coordenador de diocese, coordenadores de área, coordenadores de
ramo, coordenador de comunidade e líder comunitário.
Na Tabela 1, o detalhamento da amostra é apresentado, levando-
se em consideração a quantidade de voluntários por área, ramo, comunidade e
cargo ocupado. A relação abaixo foi fornecida pela coordenação diocesana da
Pastoral da Criança. A listagem traz os números referentes ao primeiro trimestre
de 2007, que seriam enviados para a coordenação nacional em Curitiba, PR.
38
TABELA 1 – VOLUNTÁRIOS ENTREVISTADOS POR ÁREA E CARGO OCUPADO
Área
Cargo
Nº total de
voluntários
atuantes
Escolhidos
para a
amostra
%
- Coordenador de Diocese 1 1
100%
Coordenador de Área 1
1
100%
Coordenador de Ramo 6
1
17%
Coordenador de Comunidade 7
3
43%
Líder Comunitário 47
13
28%
2
(Orla)
total 61
18
30%
Coordenador de Área 1
0
0%
Coordenador de Ramo 6
2
33%
Coordenador de Comunidade 13
4
31%
Líder Comunitário 53
12
23%
3
(Morros e
Z.Noroeste)
total 73
18
25%
Coordenador de Área 1
1
100%
Coordenador de Ramo 3
1
33%
Coordenador de Comunidade 8
4
50%
Líder Comunitário 53
12
23%
12
(Centro)
total 65
18
28%
Total Geral
200
55
28%
Fonte: Pastoral da Criança de Santos
As entrevistas com os líderes comunitários foram distribuídas
conforme o número de comunidades e total de líderes atuantes em cada uma
delas, conforme Tabela 2.
39
TABELA 2 - LÍDERES COMUNITÁRIOS ENTREVISTADOS
Área ou
Setor
Paróquia ou Ramo Comunidade
nº total de
líderes
atuantes por
comunidade
Nº de líderes
entrevistados
por
comunidade
%
1 N. Senhora Aparecida 1 Vila N. Sra. Aparecida 9 2 22%
2 Núcleo do Estuário 5 1 20%
2 São Jorge Mártir
3 Santista 6 2 33%
3 São Benedito 4 São Benedito 9 5 56%
4 N. Sr. dos Passos 5 N. Senhora dos Passos 6 1 17%
5 São Paulo Apóstolo 6 São Paulo Apóstolo 9 2 22%
6 São Jose Operário 7 São Jose Operário 3 0 0%
2
(Orla)
Total Área 2 47 13 28%
7 Sta. Margarida Maria 8 Santa Maria 1 1 100%
9 Vila Progresso 7 2 29%
10 Nova Cintra 5 3 60%
8 São João Batista
11 Sant'Ana e São Joaquim 4 1 25%
9 N. Senhora Assunção 12 Morro São Bento 6 0 0%
13 Caminho São Sebastião 4 2 50%
10 Sagrada Família
14 Caminho São Jose 3 0 0%
11 Jesus Crucificado 15 Jesus Crucificado 5 0 0%
16 Jardim dos Anjos 2 0 0%
17 São Francisco de Assis 2 1 50%
18 Jardim São Manoel 6 0 0%
19 São Tiago 8 2 25%
12 São Tiago Apóstolo
20 Divino Espírito Santo 0 0 0%
3
(Morros e
Zona
Noroeste)
Total Área 3 53 12 23%
21 Vila Santa Casa 5 2 40%
22 Vila Mathias 7 2 29%
13
Imaculado Coração
de Maria
23 Vila Santa Casa II 6 2 33%
24 N. S. do Monte Serrat 8 0 0%
25 Casa João Paulo II 0 0 0%
26 Valongo 9 3 33%
14
Nossa Senhora do
Rosário
27 Santa Josefina Bakita 3 0 0%
15 São Judas Tadeu 28 Marapé 8 3 38%
12
(Centro)
Total Área 12 46 12 26%
Total Geral
146
37
25%
Fonte: Pastoral da Criança de Santos
40
Para o contato com os voluntários partiu-se das coordenações de
área, que informavam o telefone das coordenações de ramo, que, por sua vez,
passavam o contato com a coordenação de comunidade, que informava uma
forma de contato com os líderes comunitários. As entrevistas foram agendadas
por telefone e realizadas pessoalmente.
Os encontros para as entrevistas aconteceram em situações
diversas: visita à casa do voluntário; encontro na paróquia; encontro no centro
comunitário; na igreja antes ou depois da celebração de uma missa; ou no dia da
Celebração da Vida (pesagem das crianças).
O formulário aplicado pode ser separado em cinco partes, sendo
que somente a primeira é quantitativa: a primeira buscou identificar o perfil do
voluntário (sexo, estado civil, composição familiar, escolaridade, condição de
moradia, profissão, renda); na segunda parte perguntou-se sobre o trabalho na
Pastoral da Criança (há quando tempo trabalha, quem o convidou e porque
escolheu a Pastoral da Criança); a terceira parte explorou as motivações para o
trabalho voluntário em geral, as mudanças que ocorreram na vida pessoal e
familiar do voluntário e a dedicação a outras atividades voluntárias; a quarta
parte objetivou a identificação da percepção do voluntário em relação à Pastoral
da Criança (como ele descreve a organização, grau de satisfação e o papel
desenvolvido pelo voluntário); e na quinta parte, há uma pergunta sobre a
participação comunitária (se ele é chamado pela família para resolver assuntos
não relacionados à Pastoral da Criança).
Em outubro de 2007, fez-se a tabulação das entrevistas. Utilizou-
se, para tanto, o software estatístico SPSS, para fazer a tabulação e os
cruzamentos, tanto da parte quantitativa quanto da qualitativa, e o Microsoft
Excel para elaboração dos gráficos e tabelas. Os dados quantitativos
apresentaram o perfil do voluntário. Os dados qualitativos foram trabalhados com
base na análise de conteúdo. Algumas questões qualitativas puderam ser
trabalhadas com categorizações e verificadas por freqüência, enquanto outras
tiveram que ser transcritas, para análise do discurso e de conteúdo.
41
CAPITULO III
A PASTORAL DA CRIANÇA
A Pastoral da Criança é um organismo social da CNBB que
combate a mortalidade infantil, por meio de ações educativas. O trabalho
consiste na mobilização de líderes comunitários que irão acompanhar,
mensalmente, as gestantes e as crianças até seis anos, pertencentes a seu
bairro ou cidade.
A organização mescla trabalho voluntário de ajuda-mútua com a
força motivacional da caridade cristã. Segundo sua fundadora, a Dra. Zilda Arns
Neumann, a organização baseia suas ações na transformação e na participação
social e no compromisso entre as pessoas (NEUMANN, 2006). A metodologia da
Pastoral da Criança se fundamenta na cultura das Comunidades Eclesiais de
Base (CEBs) e nas Diretrizes da Ação Pastoral da Igreja Católica.
Para se entender como funciona o trabalho da Pastoral da Criança,
primeiro será apresentado o setor pastoral da Igreja Católica, um breve histórico
sobre o que consiste uma ação pastoral e quais as implicações e diretrizes
seguidas por esse tipo de trabalho.
Logo depois, será detalhado o trabalho da Pastoral da Criança,
levando-se em consideração os aspectos organizacionais, de financiamento e da
organização do trabalho voluntário.
Por fim, o trabalho do voluntário na Pastoral da Criança será
apresentado de forma a entender como este produz e reproduz o capital social,
formando vínculos entre os voluntários e as famílias.
42
3.1 As pastorais sociais no Brasil
O que significa a compaixão? Palavra composta de outras duas:
com-paixão. Estar com na paixão do outro, na cruz do seu
sofrimento. Sentir a dor do outro e, juntos, buscar soluções
alternativas. Estar com, não significa dar coisas, mas dar-se. Dar o
próprio tempo, colocar-se à disposição. Em síntese, significa
caminhar junto com aquele que sofre. Assumir sua dor e tentar
encontrar saídas para superar os momentos difíceis (BRAIDO,
2001).
No contexto religioso, pode-se dizer que pastoral, assim como o
agir de um pastor em relação a suas ovelhas, é também “o agir da igreja no
mundo” (LIBÂNIO, 1982, p. 11). Pastoral é a ação do pastor, sendo pastor,
dentro da Igreja Católica, aquele que recebe a missão de evangelizar e de guiar
os fiéis. Segundo o dicionário HOUAISS (2002), pastoral é “fazer circular
comunicação de conteúdo religioso e/ou moral, emanada do papa ou de um
bispo, e dirigida aos padres ou aos fiéis”.
Etimologicamente, a palavra pastoral está ligada à raiz “pastor”.
[...] A imagem do pastor entrou na teologia através da tradição
bíblica, na qual o povo de Israel encontrava no cultivo do
rebanho de ovelhas sua principal riqueza e total subsistência [...].
Além de alimento, as ovelhas forneciam a lã para a confecção
das roupas e das tendas, o excedente era usado na troca
comercial, sem esquecer que o animal era usado nos sacrifícios
religiosos [...]. O sangue dos cordeiros expiava pecados, limpava
culpas, instituía paz. Portanto, aquele que cuidava desse animal,
de tanta utilidade material e espiritual, tinha que constituir-se
num símbolo religiosos de primeira grandeza. (LIBANIO, 1982, p.
14 - 15).
Assim, o pastor é o guia e o povo são as ovelhas que estão sob
sua proteção e cuidado. O pastor, como figura religiosa, é uma pessoa que guia
o povo pelos caminhos tranqüilos designados por Deus.
43
A idéia tradicional de pastoral, vigente desde o século I até os anos
1960, estava ligada, intimamente, ao clero, como função exclusiva do mundo
oficial (papas, bispos, sacerdotes e pastores). A igreja clerical era entendida
como responsável pela verdade religiosa e pela moral da sociedade. Exercia,
portanto, posição tutelar nos campos religioso e moral, e naqueles que
confinavam ou se entrecruzavam com eles. Os agentes pastorais procuravam se
utilizar de meios de comunicação social para transmitir a verdade e os valores, e
não se importavam se fosse necessário o uso do poder coercitivo para
manutenção da doutrina católica e sua moral. Como exemplo disso, na igreja
medieval, a Inquisição funcionou como um instrumento pastoral extremamente
eficiente, pois, apesar de fazer uso de instrumentos de coerção, de medo,
divulgou e protegeu a doutrina e a moral cristã (LIBANIO, 1982).
A partir do Concílio Vaticano II, com a revisão da doutrina social da
Igreja Católica, a pastoral tradicional como compreensão de ação pastoral
centrada nas atividades quase exclusivas do clero foi superada. Conforme o
texto publicado pelo Concílio Vaticano II “sem a presença ativa dos leigos, o
Evangelho não pode penetrar bem dentro da mentalidade, dos costumes e da
atividade de um povo” (LIBANIO, op.cit., p. 82).
No Brasil, especialmente já a partir dos anos 1950, os jovens
secundaristas e universitários, operários e camponeses, entregaram-se à sua
missão apostólica de transformar o seu meio, de fermentar, de forma cristã, seus
próprios ambientes. O movimento recebeu o nome de Ação Católica e deu início
a uma nova pastoral, formada por leigos. No Início, considerava-se o leigo “o
braço estendido da hierarquia”, fazendo-se presente, em nome da Igreja oficial,
pelo mandato, onde ela não podia estar, como nas fábricas, (Juventude Operária
Católica), no meio de camponeses (Juventude Agrária Católica), no meio
estudantil secundário (Juventude Estudantil Católica) e universitário (Juventude
Universitária Católica) e independente (Juventude Independente Católica)
(LIBANIO, 1982, p. 71 - 72).
A pastoral tradicional, ainda nessa época, afirmava-se na força da
transmissão de uma doutrina dogmática e moral bem definida pela via da
44
autoridade do clero. Pouco a pouco, os leigos foram conseguindo espaço na
igreja, deixando de ser apenas ovelhas, para tornarem pastores também. A
necessidade de expansão da Igreja Católica trouxe o desenvolvimento das CEBs
e das pastorais sociais, que começaram a ter maior fôlego a partir dos anos
1970, quando “surge a pastoral libertadora que se realiza, principalmente, junto
às classes populares e marginalizadas” (LIBANIO, 1982, p. 109).
Segundo as diretrizes Pastorais da Igreja Católica no Brasil (CNBB,
1991), as ações pastorais se dividem em seis linhas (ou dimensões): comunitária
e participativa, missionária, biblio-catequética, litúrgica, ecumênica e do diálogo
religioso e sociotransformadora.
Ao se elaborar o conteúdo de uma ação pastoral, os agentes,
grupos ou organismos devem ter presente todas as dimensões de
evangelização, mesmo atuando numa área específica. A dimensão
sociotransformadora, na qual estão inseridas as pastorais sociais, afirma que “a
igreja, embora não seja do mundo, está presente no mundo, no meio das
sociedades humanas [...]” e, por sua vez, solidarizando com as aspirações e
esperanças da humanidade, é “[...] levada pela fome e pela sede de justiça,
especialmente, em ajuda aos mais pobres, denunciando as injustiças e
violências, para que possa surgir uma sociedade verdadeiramente justa e
solidária” (CNBB, op.cit., p. 55).
No Brasil, a dimensão sociotransformadora é formada pelos
seguintes setores: Pastoral Social, Educação, Comunicação Social, Ensino
Religioso, Pastoral Universitária, Pastoral da Cultura e Pastoral Afro-brasileira. O
Setor Pastoral Social, por sua vez, reúne, sob sua articulação, quatorze
Pastorais e quatro Organismos, conforme discriminados no Quadro 1.
45
QUADRO 1 – AS PASTORAIS SOCIAIS E ORGANISMOS DA DIMENSÃO SOCIOTRANSFORMADORA
Nome Fundação Objetivo
Pastoral Operária 1972 Presença evangélica junto ao mundo do trabalho
Pastoral do Povo de
Rua
1993 Atuação junto à população de rua e catadores de materiais
recicláveis.
Conselho Pastoral dos
Pescadores
anos 1970 Presença de Igreja Junto aos Trabalhadores do mar, dos rios e
dos lagos.
Pastoral dos Nômades - Acompanha o povo cigano e os trabalhadores de circo e
parques.
Pastoral da Mulher
Marginalizada
- Vive o evangelho junto às mulheres em situações de
marginalização
Pastoral da Criança 1983 Acompanha crianças e famílias carentes da gestação aos 6 anos
de idade
Pastoral do Menor 1977 Traduz o evangelho junto aos meninos e meninas de rua
Pastoral da Saúde - Atua na área da saúde, em três dimensões: solidária,
comunitária e político-institucional
Serviço Pastoral dos
Migrantes
1984 Acompanha o mundo das migrações, o universo da mobilidade
humana
Pastoral Afro-
brasileira
- Conscientização e militância de gerações de negros e negras,
que assumem viver sua fé e negritude.
Pastoral Carcerária 1984 Presença junto à população presidiária e contato com suas
famílias
Comissão Pastoral da
Terra
1975 Acompanha a realidade do campo - questões agrárias e
agrícolas.
Pastoral da
Sobriedade
- Prevenção e recuperação da dependência química.
Pastoral da Pessoa
Idosa
1999 Assegurar a dignidade e a valorização integral das pessoas
idosas, através da promoção humana e espiritual, respeitando
seus direitos.
Setor da Pastoral da
Mobilidade Humana
- Engloba:
- Apostolado do Mar
- Pastoral da Estrada (Rodoviária)
- Pastoral dos Nômades
- Pastoral das Migrações
- Pastoral dos Pescadores
- Pastoral dos Refugiados
- Pastoral do Turismo
Cáritas Brasileira 1956 “promover e animar o serviço da solidariedade ecumênica
libertadora, participar da defesa da vida, da organização popular
e da construção de um projeto de sociedade a partir dos
excluídos e excluídas, contribuindo para a conquista da
cidadania plena para todas as pessoas, a caminho do Reino de
Deus.”
IBRADES (Instituto
Brasileiro de
Desenvolvimento
Social)
- “unindo esforços a outras iniciativas, busca contribuir com a
formação de uma sociedade solidária, participativa e pluralista,
pela construção da cidadania e da ética, a serviço da
democracia e do meio ambiente preservado para todos”
CERIS (Centro de
Estatísticas Religiosas
e Investigações
Sociais)
1962 “a avaliação de projetos, pesquisa e monitoramento de
experiências populares e pastorais, assessoria a movimentos
sociais e eclesiais, financiamento e apoio a pequenas iniciativas”
CBJP (Comissão
Brasileira de Justiça e
Paz)
1968 Órgão de estudos e ação, subsidiário da CNBB assegurar a
presença dos cristãos frente à questão social, a partir da
perspectiva ética do Evangelho.
Fonte: http://www.pastoralsocial.org.br
46
A criação de uma Pastoral Social começa com a identificação dos
rostos ou categorias marginalizadas ou situações sociais de extrema carência.
Desse ponto, inicia-se a criação ou fortalecimento de uma equipe de base que
irá acompanhar, de perto, essa situação. Para isso, se faz necessário
desenvolver atividades de apoio e solidariedade, que, geralmente, é
caracterizada como uma ação lenta e persistente de conscientização,
organização e mobilização. Com isso, iniciam-se as trocas de experiências e
integração entre as pastorais.
No processo de trabalho de uma pastoral social é preciso superar
as dicotomias entre ‘os que só rezam’ e ‘os que só lutam’, ‘os que louvam e
celebram’ e ‘os que fazem política’. A fé cristã tem, necessariamente, uma
dimensão social (BRAIDO, 2001). Testemunho, denúncia e anúncio, serviço e
diálogo são as quatro palavras chaves que resumem o Objetivo Geral da
Pastoral Social, a saber:
a) uma presença (testemunho) junto aos setores mais
marginalizados da população;
b) um alerta (denúncia e anúncio) à Igreja e à sociedade civil que
é uma espécie de antena permanentemente sintonizada com o
clamor dos oprimidos;
c) uma ação social (serviço) que multiplica atividades de
conscientização, organização e transformação, as quais levam à
conversão pessoal, por um lado, e a mudanças concretas de
ordem social, econômica e política, por outro;
d) uma articulação-parceria (diálogo) com as demais igrejas,
cristãs e não cristãs, e com as forças vivas que contribuem para
transformar a sociedade em que vivemos (BRAIDO, 2001, p. 45).
47
3.1.1 A influência das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)
As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) eram pequenos grupos
organizados em torno da paróquia (urbana) ou da capela (rural), por iniciativa de
leigos, padres ou bispos. As primeiras surgiram por volta de 1960, e possuem
natureza religiosa e caráter pastoral. Explicando mais detalhadamente a
denominação, pode-se dizer que as CEBs
são comunidades, porque reúnem pessoas que têm a mesma fé,
pertencem à mesma igreja e moram na mesma região.
Motivadas pela fé, essas pessoas vivem uma comum-união em
torno de seus problemas de sobrevivência, de moradia, de lutas
por melhores condições de vida e de anseios e esperanças
libertadoras.
São eclesiais porque são congregadas na Igreja, como núcleos
básicos de comunidade de fé.
São de base, porque são integradas por pessoas que trabalham
com as próprias mãos (classes populares): donas de casa,
operários, subempregados, aposentados, jovens e empregados
dos setores de serviços, na periferia urbana; na zona rural,
assalariados agrícolas, posseiros, pequenos proprietários,
arrendatários, peões e seus familiares (FREI BETTO, 1981, p.
17).
As CEBs se orientam pelo método ver-julgar-agir. Ver: o agente
pastoral e os membros ouvem e observam os relatos dos outros membros.
Julgar: como Jesus agiria diante desse problema? Como os membros agiriam?
Agir: depois de refletir sobre o ‘agir-de-Jesus’ e o ‘nosso-agir’, vem o
planejamento da ação para enfrentar o problema (FREI BETTO, op.cit.). Esse
não é um método linear, mas dialético, que precisa, muitas vezes, de tempo e
amadurecimento para se conseguir fechar um bom planejamento.
Os agentes pastorais recebiam treinamentos e tinham a missão de
serem multiplicadores. Tinham a função de criar o espaço propício para que as
comunidades pudessem exprimir sua palavra, avaliar sua prática, analisar sua
caminhada e planejar sua ação.
48
Nas celebrações, os símbolos sagrados eram extraídos da vida da
comunidade. Nas comunidades rurais, era comum ver celebrações em que os
vasos litúrgicos eram simples cuias; a toalha do altar, uma rede ou manta sobre
mesa simples de uma casa; o ofertório era feito à base da oferenda de produtos
plantados e colhidos pelos participantes; por vezes, a hóstia era um pão ou um
cuscuz. Na mesa, viam-se ferramentas, jornais, abaixo-assinados, carteiras de
trabalho e outros objetos que simbolizavam a vida concreta da comunidade. Com
isso, a celebração do sagrado não corria o risco de se esvaziar num ritualismo
mecânico alheio a todo significado objetivo (FREI BETTO, 1981).
Na América Latina, é impossível pensar em alternativa social, sem
levar em conta a religiosidade do povo. Assim como acontece entre os povos
muçulmanos, a religiosidade é um dado da realidade social latino americana.
Assim, as CEBs partiam da premissa de que não basta negar essa tradição
cristã: era preciso descobrir como lidar com ela e em que medida a fé poderia
ajudar no combate à exclusão social. A necessidade de se aliar discurso
religioso ao trabalho social pode ser justificada pela seguinte afirmação de Boff
(1993, p. 17):
a ideologia pode mistificar a pobreza como quiser, ela não
conseguirá anular a sua dor. Só poderá, anestesiando-a, fazê-la
suportável. Mas fome é fome, doença é doença e morte é morte
[...]. A ideologia, como sistema de mistificação eficaz, não anula
nada. Não atua sobre o estado objetivo das coisas, externo ao
espírito. Atua somente sobre o espírito e sobre sua relação com
o mundo. Por isso mesmo, a realidade ameaça sempre a
ideologia. A realidade pode ser mascarada, mas não destruída
[...]. Anestesia nunca foi cura.
O cerceamento dos canais de crítica e oposição ao regime militar,
principalmente após o AI-5, fez com que a voz profética da Igreja, comprometida
com a pastoral popular, ressoasse hegemônica na defesa dos direitos humanos
e na denúncia das arbitrariedades cometidas em nome da segurança nacional. A
pastoral popular ganhou uma conotação fortemente política, e a política,
enquanto expressão das bases populares, passou a ser exercida junto às
comunidades cristãs e à pastoral operária urbana e rural (FREI BETTO, 1981).
49
Com a ‘abertura política’, a sociedade civil brasileira adquire uma
nova configuração. O movimento popular e o movimento operário se emancipam,
prescindindo de seus vínculos com a Igreja Católica. Nos anos 1980, ante a nova
conjuntura política, social e econômica, a pastoral popular se encontrava num
momento que exigia uma redefinição de seu papel e um melhor equacionamento
de suas relações com a prática política e social (FREI BETTO, 1981).
O trabalho pastoral da Igreja Católica manteve o caráter
comunitário tanto no discurso religioso quanto nas práticas sociais. No trabalho
desenvolvido nas CEBs, essa característica era muito forte, e a apreensão do
coletivo, a necessidade de participação e o sentimento de comunidade
trouxeram, para as ações das pastorais sociais, a percepção de que o problema
de um é o problema de todos, e de que, unidos, o peso da luta se torna mais
leve, e de que a fé cristã representa um ponto de união na diversidade.
Esse discurso soa utópico se transportado para o contexto urbano,
mas se resgatados o senso de comunidade e o trabalho do voluntário, tem-se
que, apesar do distanciamento moderno, a compaixão – estar na paixão, no
sofrimento, do outro – ainda está viva e presente no contexto atual.
Partindo dessa análise, será apresentado, a seguir, o trabalho
realizado pela Pastoral da Criança, que combate a mortalidade infantil,
acompanhando gestantes e crianças de 0 a 6 anos, em comunidades pobres,
usando o trabalho voluntário, com os chamados líderes comunitários, e muito do
que eles desenvolvem hoje – tais como os treinamentos, as reuniões, as formas
de inserção nas comunidades entre outros –, o que a igreja convencionou a
chamar de pedagogia das CEBs.
50
3.2 A Pastoral da Criança no Brasil
A missão da Pastoral da Criança é ver a realidade,
aproximar-se das pessoas para escutá-las e compreende-
las; missão de iluminar a realidade e com a luz da Palavra,
transformar sinais de morte em sinais de vida, criando um
ambiente de fé, de fraternidade e partilha. (folheto de
treinamento da Pastoral da Criança, Mimeo).
Fundada em 1983, a Pastoral da Criança é um organismo social da
CNBB, de atuação ecumênica, presente, especialmente, nas periferias das
grandes cidades e nos bolsões de pobreza e miséria dos pequenos e médios
municípios brasileiros, em áreas urbanas, rurais e indígenas, desenvolvendo
ações junto a famílias e comunidades. Seu trabalho consiste em capacitar
líderes comunitários, residentes da própria comunidade, para mobilização das
famílias nos cuidados com os filhos, na prevenção de doenças e na importância
do pré-natal. Por meio de um trabalho de prevenção e transmissão de
conhecimento, tem o objetivo de reduzir a mortalidade infantil.
A organização aproveita a capilaridade da Igreja Católica para
acompanhar, mensalmente, cerca de 2 milhões de crianças menores de 6 anos e
mais de 113 mil gestantes. Presente em todo o Brasil, a Pastoral da Criança
conta com um corpo de mais de 266 mil voluntários, organizados em 7,5 mil
equipes de coordenação e capacitação. Seus resultados são visíveis e o trabalho
está sendo estendido a outros países da América Latina e da África. A
organização conta com um orçamento anual de R$ 36 milhões e tem um custo
operacional mensal de, aproximadamente, R$ 1,70 por criança atendida.
Na Pastoral da Criança, o agente pastoral não é somente um
interventor, mas parte do processo de transformação. O voluntário é capacitado
e procura pessoas em sua comunidade, dentre as quais estão seus amigos,
familiares, conhecidos ou até mesmo desconhecidos, famílias que serão
visitadas mensalmente, e que se transformarão em pessoas próximas. A
51
proposta da organização é que o cotidiano de ambos, voluntário e família, sejam
compartilhados. Diante disso, pode-se afirmar, então, que, em resposta às
críticas feitas ao trabalho voluntário e à (falsa) promessa de cidadania, a Pastoral
da Criança consegue reunir pessoas para trabalhar voluntariamente, fornecendo-
lhes instrumentos (capacitações e suporte) que possibilitam que a pré-disposição
do voluntário transcenda a caridade, a benevolência e o altruísmo.
No dia-a-dia do trabalho dos voluntários, vê-se o capital social
surgindo e se multiplicando, quando a Pastoral da Criança pede ao voluntário
que saia por sua comunidade à procura de famílias que necessitam de
atendimento, que ele observe seus vizinhos, amigos, e que os ajude no cuidado
com seus filhos, o que faz com que a Pastoral da Criança também forme líderes
comunitários, cidadãos ativos, protagonistas, multiplicadores. Nas capacitações
e reciclagens, são fornecidos instrumentais para que o voluntário possa entender
melhor o seu contexto social e as dificuldades nele existentes, o que possibilita
que ele se aproprie do seu cotidiano e trabalhe para tentar mudá-lo.
Vale mencionar que o líder comunitário não conseguirá transformar
toda uma comunidade sozinho, e nem é essa a intenção da Pastoral da Criança.
Ao voluntário é ensinado que sempre se deve procurar auxílio, seja de outros
colegas, das coordenações e de outros integrantes da comunidade, com o
propósito de formar parcerias, ou melhor, que ele deve procurar construir uma
rede de relações com seus pares, que terá o objetivo de ajudar as famílias.
Assim, a Pastoral da Criança incentiva a multiplicação dos laços fracos à medida
que proporciona, ao voluntário, acesso a um grupo social formado pelos líderes
comunitários, coordenações e famílias, e que ensina o seu voluntário a formar
novos laços com pessoas da comunidade (com o comércio, postos de saúde,
escolas etc.).
Nota-se que a Pastoral da Criança não é uma organização física,
pois quando ela se instala em uma comunidade não constrói ou aluga prédios,
nem tampouco coloca placas com seu nome na fachada para se identificar; ela
aparece na ação das pessoas, na camiseta que veste o líder comunitário, na
mobilização dos voluntários e na visitação às famílias. Isto é, a Pastoral da
52
Criança se faz pela ação de seus integrantes, e cada vez que o grupo de
voluntários precisa de um local para se reunir ou pesar as crianças, eles utilizam
os espaços já existentes na comunidade (igrejas, centros comunitários, escolas,
praças etc.). O importante não é o espaço físico, mas o grupo, formado por
líderes comunitários, mães, crianças e gestantes, isto é, a rede e o capital social
que a mantém viva.
A transformação social é a proposta, não só das capacitações, mas
também de todo o trabalho da Pastoral da Criança, e se torna visível quando o
voluntário muda a sua forma de viver, de agir e de ver sua comunidade. Ele
recebe conhecimentos, se transforma, e vai trabalhar para transformar outras
pessoas da sua comunidade. O voluntário tem a missão de transformar pais e
mães em cuidadores e educadores, fortalecendo, assim, os vínculos
intrafamiliares.
3.2.1 Histórico
A idéia de criar uma ação de combate à mortalidade infantil surgiu
em maio de 1982, em uma reunião da ONU, na Suíça, sobre a paz mundial,
pobreza e desenvolvimento. O Brasil foi representado, entre outras pessoas, por
Dom Paulo Evaristo Arns, que é reconhecido, internacionalmente, por suas
atividades na defesa dos Direitos Humanos, especialmente, como liderança no
período da ditadura militar no Brasil, de 1964 a 1976, e no período que se
seguiu. James Grant, diretor executivo do UNICEF, sugeriu a Dom Paulo a
criação de um projeto da Igreja para combater as altas taxas de mortalidade
infantil no Brasil, provocadas, principalmente, pela diarréia. Dom Paulo,
apresentou a proposta para sua irmã, a Doutora Zilda Arns Neumann, pediatra e
médica sanitarista, que aceitou desenvolver o projeto.
53
Em 1983, foram iniciados os trabalhos, como um projeto piloto
implantado em uma paróquia do município de Florestópolis, norte do Estado do
Paraná. Nesse município, morriam 127 crianças para cada mil nascidas vivas.
Após um ano de atividade, esse índice caiu para 28 mortes para cada mil
crianças nascidas vivas.
A implantação contou com a ajuda de Dom Geraldo Majella Agnelo,
Arcebispo de Londrina. A cidade de Florestópolis tinha apenas uma paróquia,
São João Batista, que estava sob a administração de uma freira italiana, Eugênia
Pietta, que foi encarregada de liderar o processo, como coordenadora paroquial.
Houve também o apoio técnico das Secretarias de Saúde e Educação do Estado
do Paraná (GUIMARÃES, 2002).
Na época, a Doutora Zilda trabalhava como funcionária da
Secretaria de Saúde e Educação do Estado do Paraná. Sua vivência como
administradora de redes de postos de saúde, de clubes de mães de entidades
filantrópicas na periferia de Curitiba e como coordenadora da área de saúde
materno-infantil no Estado do Paraná a credenciava como uma interlocutora
privilegiada na concepção de um novo modelo de intervenção social, mais
colaborativo e não assistencialista (GUIMARÃES, op.cit.).
Logo no início, foi definido que o trabalho seria baseado na
fraternidade, na democratização do conhecimento, na formação para o exercício
da cidadania e na co-responsabilidade social. Por se tratar de uma ação
pastoral, promovida pela Igreja Católica, a missão da Pastoral da Criança foi
inspirada em um versículo do Evangelho segundo João: “Eu vim para que todos
tenham vida, e vida em abundância” (THOMPSON, 1995, p. 974).
Assim como foi descrito no capítulo sobre as pastorais sociais, os
trabalhos da Pastoral da Criança se iniciaram com reuniões com as lideranças
locais, para disseminar a metodologia que seria adotada. As lideranças foram
identificadas e capacitadas, e, assim, foi proposto o acompanhamento contínuo
das famílias, gestantes e crianças a que se tivesse acesso, especialmente, as
mais pobres.
54
Os materiais educativos da Secretaria da Saúde e do Ministério da
Saúde foram considerados de difícil compreensão para a maioria das líderes
voluntárias, então, a Doutora Zilda preparou apostilas sobre cinco ações básicas
de saúde e vigilância nutricional, com uma linguagem simplificada e com
indicadores de avaliação de fácil compreensão e acompanhamento.
No primeiro treinamento, 127 pessoas compareceram, de diversas
classes sociais e graus de escolaridade. A equipe achou melhor não dispensar
ninguém, pois acreditava que a seleção se faria naturalmente, no decorrer do
trabalho de campo, o que se confirmou com o tempo (GUIMARÃES, 2002).
Depois do treinamento, os voluntários declararam que a maior
mudança acontecera em suas próprias vidas. Ou seja, ao mesmo tempo em que
atuavam como agentes de transformação, eles se sentiam beneficiados com as
mudanças propostas, pois aplicavam os conhecimentos adquiridos nas suas
próprias famílias, sem contar o sentimento de estarem sendo úteis para alguém,
o que também os tornava diferentes.
O nome do trabalho foi escolhido em 1984, durante uma reunião da
Comissão Episcopal de Pastoral (CEP) da CNBB, em Brasília. Já existia a
Pastoral do Menor, que se dedicava aos meninos e meninas de rua e menores
infratores. Também havia a Pastoral da Saúde, como uma linha de ação
baseada na visita a enfermos e à promoção de ações preventivas de saúde. A
sugestão da denominação Pastoral da Criança partiu de Dom Geraldo e da
Doutora Zilda.
Nos anos de 1985, 1986 e 1987, o UNICEF foi a principal fonte
financiadora da Pastoral da Criança, o que possibilitou a expansão do trabalho
por várias dioceses no Brasil, com ênfase nas regiões Norte e Nordeste. O
crescimento, porém, demandou a necessidade de mais recursos financeiros.
Assim, em 1986, iniciou-se uma discussão interna da Igreja Católica sobre a
celebração de um convênio com o então Ministério da Previdência Social, que,
posteriormente, teve sua ação na área da saúde desmembrada e alocada no
Ministério da Saúde. As opiniões sobre a celebração do convênio divergiam
quanto à diminuição da liberdade de atuação da Igreja em relação às possíveis
55
intervenções do Governo. Mas, mediante acordo entre direitos e deveres das
partes envolvidas, após meses de debate intenso, a CEP autorizou a assinatura
do convênio, que vigora desde 1987, e prevê apoio financeiro para a realização
das capacitações, impressão de materiais educativos e despesas com o
acompanhamento dos líderes comunitários (GUIMARÃES, op.cit.).
Ainda em 1987, foi criado um sistema informatizado, que permitiu a
sistematização dos dados colhidos no campo e o acompanhamento dos
indicadores em nível local, regional e nacional, de forma confiável. O
instrumental criado, intitulado de FABS (Folha de Acompanhamento das Ações
Básicas de Saúde, Nutrição e Educação) foi adotado por todas as comunidades,
e é utilizado até hoje.
Em 1993, criou-se a Associação Nacional de Amigos da Pastoral
da Criança (ANAPAC), formada por empresários, profissionais liberais e
religiosos que se dedicaram a colaborar com seus conhecimentos a serviço da
organização, na busca de fontes alternativas de financiamento, bem como apoiar
convênios locais com secretarias municipais e estaduais, empresas e outros.
Desde então, a Pastoral da Criança vem firmando novas parcerias com o Estado
e com a iniciativa privada, com representatividade nos conselhos da Saúde, dos
Direitos da Criança e do Adolescente e da Assistência Social, nas esferas
federal, estadual e municipal.
3.2.2 Gestão da Pastoral da Criança
A Pastoral da Criança organiza seus voluntários de maneira
simples, e utiliza-se da capilaridade da Igreja Católica para distribuí-los. Segundo
seu estatuto, a organização se divide em cinco níveis – comunidade, ramo, setor,
estado e país –, tendo equipes de coordenação e conselhos em cada um deles,
56
com normas e estruturação determinadas pelo Regimento Interno, conforme o
organograma descrito na Figura 1, a seguir.
FIGURA 1 – ORGANOGRAMA DA PASTORAL DA CRIANÇA
Fonte: www.pastoraldacrianca.org.br
Os processos decisórios da Pastoral da Criança são exercidos
pelos seguintes órgãos: Assembléia Geral, Conselho Diretor, Coordenação
Nacional, Conselho Econômico, Conselho Fiscal e Conselho de Representantes
dos Beneficiários e Agentes Voluntários, nos seus diversos níveis. Os mandatos
do Conselho Diretor, da Coordenação Nacional, do Conselho Econômico e do
Conselho Fiscal são coincidentes e têm duração de quatro anos, sendo permitida
a recondução (PASTORAL DA CRIANÇA, 1995).
57
As divisões da organização acompanham a setorização da Igreja
Católica. Para melhor compreensão, pode-se ver a relação descrita na Figura 2,
que também apresenta um comparativo com as unidades federativas do país.
FIGURA 2 – ORGANIZAÇÃO DA PASTORAL DA CRIANÇA
Fonte: www.pastoraldacrianca.org.br
Para a região que compreende uma paróquia, a Pastoral da
Criança chamou de Ramo, relacionado ao espaço de um bairro ou de uma
cidade. Uma diocese, para a Igreja Católica, é um setor, para a Pastoral da
Criança, e compreende a área de vários municípios. As metrópoles, como São
Paulo, são divididas em mais uma diocese. As equipes de área e de núcleo
configuram como articuladores nos níveis de diocese e estado, respectivamente.
À primeira vista, a Pastoral da Criança pode ser vista como
possuidora de uma estrutura burocrática. Apesar se basear na estrutura da Igreja
Católica, a Pastoral da Criança mescla elementos da burocracia com a
organização em rede. A organização parece burocrática quando, por exemplo,
determina cargos, funções e campos de atuação, e padroniza material de
58
trabalho e procedimentos de abordagem e acompanhamento. Atua em rede,
porém, quando mobiliza instituições, órgãos públicos e privados, pessoas de
diversas áreas de conhecimento, moradores de uma comunidade, bairro ou
cidade e quando chama a atenção da família quanto ao cuidado com os filhos.
As delimitações de cargos e de áreas de atuação não têm cunho hierárquico,
mas figuram como lideranças cooperativas, nas quais aqueles que sabem mais
ajudam os entrantes, coordenam, ensinam, aconselham e acompanham.
O sucesso desse modelo de gestão pode ser entendido, quando se
recorre às tipologias organizacionais de Mintzberg (1995), em que o autor
apresenta um tipo de estrutura organizacional que mescla características de
diversas tipologias, a qual denominou Configuração Missionária. Nela, o
trabalho, geralmente, é simples e rotineiro, e, como na Burocracia Mecanizada,
os membros operam em células ou enclaves quase autônomos, e, como ocorre
na Forma Divisionada, estão preparados para cooperar uns com os outros, igual
aos membros da Adhocracia.
A Configuração Missionária, de Mintzberg (1995, p. 289), tem dois
mecanismos de coordenação característicos: a doutrinação e a ideologia. A
ideologia é como um sistema de crenças acerca da organização, que aplica uma
força em direção à missão, ou seja, “o impulso para evangelizar em nome da
organização”. No que diz respeito às normas, a Configuração Missionária é uma
forma de burocracia, pois coordena baseada em padronização de normas. O
controle não precisa ser acirrado, pois, ao contrário, é alcançado pelo controle
normativo e com base na lealdade. A estrutura é simples e quando ela atinge
dimensões maiores, tende a se agrupar em pequenas unidades administrativas
autônomas, mas unidas pela participação da ideologia em comum. Todas essas
características podem ser observadas na Pastoral da Criança.
A rede também é bem utilizada pela Pastoral, tanto na realização
do trabalho de campo, quanto na captação de recursos e na celebração de
parcerias. A organização consegue mobilizar as três esferas sociais. No âmbito
do Estado, recebe auxílio financeiro do Ministério da Saúde, por meio do Sistema
Único de Saúde (SUS) e de diversas prefeituras e governos estaduais, e também
59
mantém parcerias com o SEBRAE e o Ministério da Educação e Cultura. Junto à
iniciativa privada conseguiu parcerias fortes como a Rede Globo, por meio do
Programa Criança Esperança, com a Gol Linhas Aéreas, com a Gerdau, com o
banco HSBC, com a indústria farmacêutica Novartis, entre outros. E junto aos
pares da sociedade civil, além da Igreja Católica, conta também com a ajuda do
UNICEF, da Fundação Grupo Esquel, do Centro de Pesquisas Tecnológicas da
Universidade Federal de Pelotas, da Organização Pan-americana de Saúde,
entre outros. Tem, também, acento nos conselhos federais, estaduais e
municipais de Saúde, Assistência Social e de Defesa dos Direitos da Criança e
do Adolescente, além das parcerias formadas nas localidades com empresas,
comunidades e ONGs.
A dedicação de seus voluntários rendeu à Pastoral da Criança e a
sua fundadora, prêmios e distinções de centenas de organizações e instituições
nacionais e internacionais como: Rey de España de Derechos Humanos
(governo Espanhol/2005), Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (governo
Brasileiro e PNUD/2005), Direitos Humanos e Cultura e Paz (UNESCO/2000),
Prêmios Criança e Paz e Maurice Pate (UNICEF/1991 e 1993), entre muitos
outros. A doutora foi indicada pelo Governo Brasileiro ao Prêmio Nobel da Paz
nos anos de 2001 e 2004. A Dra. Zilda recebeu condecorações tais como:
Heroína da Saúde Pública das Américas (OPAS/2002), 1º Prêmio Direitos
Humanos (USP/2000); Personalidade Brasileira de Destaque no Trabalho em
Prol da Saúde da Criança (UNICEF/1988); Prêmio Humanitário (Lions Club
Internacional/1997); Prêmio Internacional em Administração Sanitária
(OPAS/1994); títulos de Doutor Honoris Causa das Universidades UFPR, PUC-
PR e UNESC, além torná-la cidadã honorária de 10 estados e 34 municípios; Ela
foi também homenageada por diversas outras Instituições, universidades,
governos e empresas (PASTORAL DA CRIANÇA, 2007).
60
3.2.3 Recursos financeiros
Hoje, 25 anos depois da fundação, a organização está em todos os
estados do Brasil, apresentando resultados como o acompanhamento mensal de
1.624.084 famílias, 2.095.756 crianças de 0 a 6 anos e 113.024 gestantes de
comunidades pobres. Esses números são frutos do trabalho de uma equipe
composta por 266.954 voluntários espalhados por 4.063 municípios do país
(dados de dezembro/2007, disponível no site www.pastoraldacrianca.org.br
acesso em 16/01/2008). Nos últimos cinco anos, pode-se perceber que o número
de crianças e de famílias cresceu, discretamente, e que o número de gestantes e
líderes se manteve estável, conforme demonstrado no Gráfico1.
GRÁFICO 1 – GESTANTES, CRIANÇAS, FAMÍLIAS E LÍDERES CADASTRADOS NA
PASTORAL DA CRIANÇA – BRASIL – PERÍODO DE 2003 A 2007 (EM 1.000 INDIVÍDUOS)
2.078
1.5 14
15 7
16 5
117
2.161
1.634
16 9
17 2
2.096
1.624
16 5
10 1
10 7
1.599
2.153
119
1.686
2.197
113
Gestantes Crianças Famílias deres
2003 2004 2005 2006 2007
Fonte: www.pastoraldacrianca.org.br
O atendimento em todo o Brasil conta com recursos financeiros
captados pela Pastoral da Criança, por meio de convênios com o setor público e
parcerias com o setor privado. A organização tem um custo de,
aproximadamente, R$1,70 (um real e setenta centavos) por criança ou gestante
atendida. Parte do dinheiro recebido pela instituição é investida em apoio mensal
às coordenações de ramo (ou paroquial), que recebem a ajuda de custo de
61
R$0,50 (cinqüenta centavos de real) por criança ou gestante cadastrada. Outra
parte do dinheiro é investida nas capacitações de líderes, coordenações e
capacitadores, na confecção do material de apoio do trabalho diário nas
comunidades, no apoio à alfabetização de mães e lideranças e no apoio às
iniciativas de geração de renda nas comunidades, e também na montagem dos
programas de rádio. O detalhamento de todas essas informações está divulgado
no site da Pastoral da Criança, assim como todas as informações financeiras
apresentadas a seguir.
GRÁFICO 2 – APLICAÇÃO DOS RECURSOS FINANCEIROS – PERÍODO DE 2006-2007
1
Fonte: Demonstrações contábeis e financeiras da Pastoral da Criança –
www.pastoraldacrianca.com.br
Dos mais de 140 milhões arrecadados pela Pastoral da Criança,
cerca de 73% (R$ 101.383.733,49) são provenientes de recursos não
1
(1) O valor de R$ 37.030.098,88 é referente ao total das despesas constados no relatório fluxo
de caixa.
(2) Fazem parte desse item despesas para capacitação de líderes, administração, treinamento e
acompanhamento das atividades das 27 equipes de Coordenação Estadual e 303 equipes de
Coordenações locais.
(3) Fazem parte desse item as despesas com transporte de material educativo às equipes de
estados e setores
(4) Fazem parte desse item as despesas com viagens, manutenção dos escritórios de Curitiba e
Brasília e serviços prestados em nível nacional e local.
(5) Capacitações dos Coordenadores de Estados, Setores e Paróquias.
* Percentuais comparativos entre os exercícios encerrados em 30 de setembro de 2006 e 2007.
62
monetários, e os outros 27% (R$ 36.056.844,21) representam recursos
monetários captados por meio de convênios com o poder público e parcerias
com a iniciativa privada.
Os recursos não monetários representam o valor que a instituição
pagaria pelo trabalho dos voluntários (líderes comunitários, equipes de apoio na
comunidade, coordenações de ramo, setor, núcleo e Estado
2
), pelo valor
estimado da locação do prédio da Sede Nacional e pelo trabalho desempenhado,
voluntariamente, pelas associações de amigos – ANAPAC (Associação Nacional
dos Amigos da Pastoral da Criança) e AAPAC (Associação dos Amigos da
Pastoral da Criança). Isso mostra o valor que a equipe tem para a organização,
pois, se não fosse pelo trabalho dos voluntários, de pouco adiantaria o dinheiro
do setor público ou do privado.
2
Considerando valores mínimos mensais de R$ 41,00 por líder (trabalho 24h/mês), R$ 7,00 por
pessoa da equipe de apoio na comunidade (4h/mês) e R$ 114,00 por coordenador de setor,
ramo e estado (média de 66h/mês). Valores proporcionais ao salário mínimo de R$ 380,00.
Fonte: Demonstrações contábeis e financeiras da Pastoral da Criança. Disponível em
www.pastoraldacrianca.org.br.
53,2%
10,4%
31,4%
5,0%
Ministério da
Saúde
Outros Setor
Público
Setor Privado Doações e
Aplicações
Financeiras
RECURSOS
MO NETÁR IOS
27%
RECURSOS
NÃO
MO NETÁR IOS
73%
GRÁFICO 3 – DISTRIBUIÇÃO DOS VALORES ARRECADADOS PELA PASTORAL DA CRIANÇA,
EM RELAÇÃO À ORIGEM E SETOR DE ATUAÇÃO DO DOADOR
Fonte: Demonstrações contábeis e financeiras da Pastoral da Criança 2006-2007.
Disponível em www.pastoraldacrianca.org.br
63
O maior financiador da Pastoral da Criança é o Estado; 63% dos
valores monetários que são usados vêm do SUS e de outras instâncias
governamentais. O convênio com o Ministério da Saúde, pois, prevê um repasse
mensal que, no exercício fiscal de 2007, somou R$ 20.048.213,00 (53,2% dos
recursos monetários). As verbas de outras organizações do setor público
somaram R$ 3.920.82,00 (10,4% dos recursos monetários) e foram fruto das
parcerias com, Estados e Municípios, Ministério da Educação, SEBRAE
(Programa Vencer Juntos), Ministério do Desenvolvimento, Ministério do
Desenvolvimento Agrário (PRONAF) e Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES).
TABELA 3 – VALORES MONETÁRIOS CAPTADOS PELA PASTORAL DA CRIANÇA JUNTO
AO SETOR PÚBLICO, POR ÓRGÃO GOVERNAMENTAL
Órgão Público Verba (em R$) %
Ministério da Saúde 20.048.213,00 84%
Parceiras Estados/Municípios 2.459.011,00 10%
Mistério da Educação 428.691,09 2%
SEBRAE – Vencer Juntos 728.290,07 3%
Ministério do Desenvolvimento 199.829,26 1%
Ministério do Desenvolvimento Agrário – PRONAF 71.930,00 0,3%
BNDES 32.330,90 0,1%
Total 23.968.295,32 100%
Fonte: Demonstrações contábeis e financeiras da Pastoral da Criança 2006-2007.
Disponível em www.pastoraldacrianca.org.br
As doações do setor privado representam 31,4% dos valores
monetários captados pela Pastoral da Criança, sendo que os maiores doadores
são os usuários do cartão HSBC Solidariedade, o Projeto Criança Esperança
(iniciativa conjunta da UNICEF, da UNESCO e da Rede Globo), e os usuários
das companhias de energia elétrica de 11 estados (PR, BA, MS, GO, MT, AL,
SC, PA, PA, TO e SP). As doações pontuais captadas pelas coordenações
nacional, estadual e de setor representam 14%. As pessoas jurídicas que
64
fizeram doações no ano de 2007 foram a Gol Linhas Aéreas, a Gerdau, a Tim
Sul, a Nestlé Brasil e a Kraft Foods do Brasil (11,03%).
TABELA 4 – VALORES MONETÁRIOS CAPTADOS PELA PASTORAL DA CRIANÇA JUNTO
À INICIATIVA PRIVADA, POR EMPRESA DOADORA
Doação (em R$) %
Usuários do Cartão HSBC Solidariedade 3.728.956,09 31%
UNICEF/UNESCO/Criança Esperança 2.719.197,15 23%
Doações dos Usuários das CIAS de Energia 2.354.739,00 20%
Doações via Coord. de Setor e Estado 1.115.319,55 9%
Doações em nível nacional 585.666,70 5%
GOL Linha Aéreas 541.667,00 5%
Gerdau Aços 500.000,00 4%
TIM Sul 160.000,00 1%
Nestlé Brasil 132.700,00 1%
Kraft Foods do Brasil 3.973,95 0,03%
Total 11.841.571,67
Fonte: Demonstrações contábeis e financeiras da Pastoral da Criança 2006-2007.
Disponível em www.pastoraldacrianca.org.br
Com a descrição acima, vê-se a importância do trabalho voluntário
para a Pastoral da Criança. Geralmente, esse ativo não é contabilizado por
organizações sociais, assim como também não são contabilizadas as isenções
fiscais oferecidas pelo Estado. A forma como a Pastoral da Criança presta
contas representa um exemplo a ser seguido.
É interessante notar que a Pastoral da Criança segue o perfil de
outras organizações sociais brasileiras, pois tem como principal financiador o
Estado. Apesar de haver programas governamentais da área da saúde que
realizam um trabalho muito parecido com o da Pastoral da Criança, ainda assim,
o Governo incentiva iniciativas da sociedade civil.
65
3.2.4 Organização dos voluntários
A Pastoral da Criança é composta, predominantemente, por
voluntários que assumem as funções de líderes comunitários, coordenadores,
multiplicadores, capacitadores e articuladores (Figura 1), cada qual com sua
função e campo de atuação bem definidos e discriminados no Estatuto e no
Regimento Interno da instituição (1995). A seguir, serão detalhadas, brevemente,
as funções de cada cargo, para que fique clara a análise da atuação de cada
voluntário, quando a Pastoral da Criança de Santos for apresentada. Os cargos
de coordenador de setor, área, ramo e comunidade, e de líder comunitário serão
explicados com mais detalhes, pois fazem parte da população de voluntários da
qual foi composta a amostra desta pesquisa.
Coordenação Nacional
Compete ao coordenador nacional a administração financeira. Este
coordenador conta com uma equipe técnica multidisciplinar, nacional e regional.
Suas funções são o planejamento estratégico, a articulação com a CNBB,
organismos governamentais e não governamentais, a produção do material de
informação, a promoção da participação da Pastoral nos Conselhos de Saúde,
de Educação, da Assistência Social e dos direitos da Criança e do Adolescente
em seus diversos níveis e outras instituições que possam influir nas políticas
públicas relacionadas com a criança e com a família.
Coordenação Estadual
A equipe da Coordenação Estadual é formada pelos
Coordenadores de Núcleo, Coordenadores de Setor, Coordenadores de Área e
Equipes. O Coordenador Estadual é um cargo eletivo, por meio da Assembléia
66
Geral, sendo que sua aprovação tem que ser ratificada pela Autoridade
Eclesiástica Local, e o mandato é de quatro anos, sendo permitida a recondução.
Suas atribuições são organizar, gerenciar e coordenar as ações no
nível estadual, representar os setores do seu Estado nos conselhos, formar
equipes de multiplicadores voluntários, que têm como missão capacitar os
setores e se articularem com as Pastorais Sociais, com os Conselhos e
Movimentos de Pastorais, em todos os níveis.
Coordenação de Setor (ou Diocese)
A equipe da coordenação de setor é formada pelos coordenadores
de área e equipes. O coordenador de setor é indicado, por meio de lista tríplice,
votada em Assembléia Geral, pelos coordenadores de ramo e coordenadores de
área, e a ratificação da escolha é feita pela autoridade eclesiástica, com mandato
de dois anos. A coordenação de setor está sempre vinculada a uma diocese e,
em algumas dioceses, poderá haver um ou mais setores.
Suas atribuições são organizar, gerenciar e coordenar as ações do
setor; gerenciar os recursos financeiros recebidos; implantar a Pastoral da
Criança em todas as paróquias e comunidades de seu setor; visitar, ao menos
anualmente, todos os ramos do setor; promover assembléia geral diocesana
anual; eleger o conselho econômico; descentralizar as atividades, ou seja,
formar, manter e acompanhar a equipe de coordenação do setor, dividindo e
distribuindo as diversas funções; formar equipes de capacitadores voluntários,
nas ações básicas de saúde, educação e nutrição, dentre outras; promover
articulações com autoridades públicas e dirigentes da iniciativa privada; articular-
se com as Pastorais Sociais, Conselhos e Movimentos de Pastorais, em todos os
níveis.
Coordenação de Área
O coordenador de área faz a articulação entre a coordenação de
setor e a de ramo, nos níveis dos municípios e/ou dioceses. Não tem relação
67
hierárquica na estrutura, pois é, apenas, um articulador. Esse cargo não é
eletivo, mas indicado pela equipe do setor e ratificado pela autoridade
eclesiástica local. São funções da coordenação de área: visitar os ramos e
comunidades da sua área, priorizando as que estão iniciando, ou que estão com
dificuldades, para animar a caminhada e orientar a prática das ações a serem
desenvolvidas com as famílias; promover encontros e reuniões com as
coordenações de ramo de sua área para auxiliar no planejamento das atividades;
participar das reuniões da equipe da coordenação de setor e colaborar na
organização e dinamização dos encontros e capacitações em nível de setor;
receber o apoio financeiro do coordenador de setor e repassar aos
coordenadores de ramo de sua área.
Coordenação de Ramo (Paróquia)
O coordenador de ramo é responsável pelo acompanhamento do
trabalho do líder comunitário, visitando, pessoalmente, a comunidade para
observar o líder em suas três atividades básicas. São funções do coordenador
de ramo: acompanhar as visitas domiciliares, do dia da Celebração da Vida, e as
reuniões para reflexão e avaliação; constatar as necessidades e promover as
capacitações; participar de reuniões para avaliação e planejamento e de
assembléias; promover a assembléia anual do ramo; formar equipes de apoio;
promover a articulação com o pároco, outras pastorais, movimentos e secretarias
municipais; implantar e ampliar a Pastoral da Criança.
Coordenação Comunitária
A coordenação comunitária atua diretamente com os líderes e tem
como funções: visitar e acompanhar as atividades dos líderes, estimulando e
orientando seu trabalho; acompanhar o líder nas visitas às famílias nos casos
mais graves, em que sua presença for necessária; promover e organizar,
juntamente com os líderes, o Dia do Peso, discutindo com antecedência as
68
tarefas de cada um; participar das reuniões e encontros de capacitação,
promovidos pela coordenação paroquial; articular-se com o pároco, com postos
de saúde e outros serviços da comunidade; participar do Conselho Pastoral de
Comunidade, como o elo entre a comunidade e a Coordenação de Ramo,
agendando reuniões, transmitindo avisos e fazendo comunicações; manter
contato com o posto de saúde, movimentos populares e religiosos e outros
serviços da comunidade, para garantir o atendimento às necessidades das
crianças, mães, gestantes e nutrizes acompanhadas pela Pastoral da Criança,
contribuindo para a melhoria dos serviços na sua comunidade; preencher e
interpretar os dados da folha de acompanhamento e avaliação das ações
básicas de saúde e educação (FABS); realizar um encontro mensal com os
líderes – Reunião de Reflexão e Avaliação – para o preenchimento e avaliação
das FABS, analisando, em conjunto com o grupo, cada item.
Líder Comunitário
O líder comunitário é convidado e selecionado pelos coordenadores
de ramo ou comunitário, dentre os moradores da própria comunidade.
Geralmente, são pessoas que já se destacam por ter espírito de liderança ou
pelo carisma. A capacidade em proceder às seguintes ações forma o perfil do
líder comunitário: ser capacitado pela Pastoral da Criança; ter disponibilidade de
tempo para desenvolver as atividades; possuir um perfil em que se destaquem
as características de saber ouvir, observar, acatar, sorrir e ter um bom coração,
além da vontade de participar na melhoria das condições de vida das famílias
pobres; ser alfabetizado ou contar com o apoio de um alfabetizado; morar na
comunidade ou muito próximo a ela; conhecer a realidade da comunidade; ter a
capacidade de somar esforços e compartilhar.
São atribuições do líder comunitário: identificar as crianças
menores de 6 anos e as gestantes da comunidade; cadastrar no caderno do líder
e acompanhar as crianças e famílias em ações básicas de saúde, nutrição,
educação infantil e cidadania; fazer visitas domiciliares mensais às crianças e
famílias acompanhadas; preencher os dados mensais do caderno do líder e
69
repassá-los durante a reunião de reflexão e avaliação, para que seja preenchida
a FABS da comunidade; organizar o Dia da Celebração da Vida, mensalmente.
Percebe-se que a organização dos voluntários em cargos, e a
delimitação da área de atuação não têm caráter hierárquico, mas de linhas de
cooperação. As articulações e representações em órgãos públicos ou em
conselhos, bem como com as instâncias da Igreja Católica, são distribuídas
evitando sobreposições. Da forma com que está posto no regimento da Pastoral
da Criança, as tarefas de cada voluntário ficam claras, o que evita a
desmotivação ou o não entendimento por parte dos voluntários sobre o seu
papel e sobre a amplitude do seu potencial de atuação.
As características da organização em rede estão presentes. Os
voluntários se vêem como pessoas iguais, e mesmo aqueles que ocupam cargos
de coordenação se consideram líderes comunitários, e que atuam como
facilitadores do trabalho na comunidade. Dessa mesma forma, o entendimento
dos procedimentos de trabalho diário e a correção dos desvios, são feitos de
forma informal e é de responsabilidade de todos do grupo, não apenas dos
coordenadores.
3.2.5 Treinamento dos voluntários
A Pastoral da Criança tem como estratégia principal multiplicar o
saber e a solidariedade, e, nos treinamentos, utiliza uma metodologia que
socializa conhecimentos sobre saúde, nutrição, educação e cidadania,
ampliando os laços de solidariedade e fortalecendo a rede de voluntários que
promove o autodesenvolvimento das famílias carentes. As capacitações ocorrem
segundo a demanda. Os interessados se cadastram junto à coordenação de
área e são capacitados de acordo com a atividade que se propõem realizar.
70
As bases da metodologia utilizada na Pastoral da Criança
congregam quatro dimensões:
evangelizadora: porque faz o trabalho a partir da mística cristã, que
é a união da fé e vida;
técnica: porque decodifica e incorpora os conhecimentos científicos
da área da saúde, nutrição e educação e cidadania, relacionados à
gestante e à criança;
popular: porque relaciona esses conhecimentos científicos com o
saber popular, para a construção de um novo saber que tenha
significado para os líderes e famílias acompanhadas;
cidadã: porque contribui para a conquista de direitos sociais
básicos para as crianças e suas famílias, explicitados na
Constituição Brasileira (cap. 2 art.6º) e no Estatuto da Criança e do
Adolescente (art.4º).
O fluxo das informações segue um caminho de multiplicação. A
equipe nacional formula os treinamentos e os aplica junto a multiplicadores (nível
estadual); estes, por sua vez, são responsáveis pela formação dos capacitadores
de líderes comunitários.
A equipe nacional de capacitação da Pastoral da Criança tem
treinamentos montados para todas as dimensões que estão presentes no
trabalho da organização, como: alimentação enriquecida, brinquedos e
brincadeiras, remédios caseiros, políticas públicas, espiritualidade, dentre outros.
Nos treinamentos, o conteúdo oferecido pelos capacitadores visa
desenvolver nos líderes a consciência de que não se trata de um trabalho
assistencialista, mas sim de transformação. Além das informações sobre as
ações básicas (saúde, nutrição, higiene, cidadania, entre outras) é ensinado ao
líder como reconhecer em sua vizinhança as pessoas que precisam ser
acompanhadas, como fazer a abordagem, como tratar a mãe, como manter o
vínculo com a família. O líder também fica conhecendo melhor a sua região, pois
71
ele toma contato com informações como atendimentos sociais, de saúde,
conselhos, onde pode obter informações que possam vir ajudar as famílias.
Também são contados casos de atendimentos passados e de como os
problemas foram resolvidos.
3.2.6 Desenvolvimento do trabalho comunitário
Nas comunidades acompanhadas, os voluntários da Pastoral da
Criança colocam em prática as ações voltadas tanto para a sobrevivência quanto
para a melhoria da qualidade de vida das famílias e das comunidades. Cada
líder acompanha, em média, 13 crianças e conhece bem as famílias e a situação
em que elas vivem, pois pertence à mesma comunidade. O trabalho
desenvolvido pelos líderes comunitários, em sua maioria, com as mulheres,
compreende três tarefas básicas: acompanhamento das gestantes;
acompanhamento das crianças menores de 6 anos; e promoção da dignidade da
pessoa, cidadania, espiritualidade e educação para a paz.
Todos os líderes comunitários passam por uma capacitação que é
baseada no Manual do Líder. Durante as 40 horas de treinamento, são
abordados temas sobre saúde, educação, cidadania, desenvolvimento infantil, e
são informadas, também, as funções que deverão ser desempenhadas pelo
voluntário. A capacitação é, apenas, uma iniciação ao trabalho da Pastoral da
Criança, sendo que o treinamento se faz, também, no decorrer das visitas, pois,
nos primeiros meses, o novo líder é acompanhado pelo coordenador comunitário
ou por outro líder mais experiente. O treinamento é ministrado pelos
capacitadores, que também são líderes comunitários.
Seguindo a ‘pedagogia’ das CEBs, as diretrizes do trabalho do
voluntário da Pastoral da Criança se resumem em cinco passos: ver, julgar, agir,
avaliar e celebrar:
72
VER e JULGAR como está a situação das crianças e gestantes
da sua comunidade. Isso torna possível planejar como AGIR
para tentar mudar essa situação. E também AVALIAR e
CELEBRAR cada progresso alcançado (PASTORAL DA
CRIANÇA, 2003, p. 253).
Quando inicia o trabalho em uma comunidade, o grupo de
voluntários, já capacitados, em forma de mutirão, vai de casa em casa
perguntado se há gestantes ou crianças até seis anos, e se a família aceita ser
acompanhada pela Pastoral da Criança. De tempos em tempos essa ação é
repetida.
Os líderes comunitários têm três encontros mensais: a visita
domiciliar às famílias, o Dia da Celebração da Vida (pesagem) e a Reunião de
Reflexão e Avaliação.
As visitas às famílias são feitas mensalmente. O líder, vestido com
a camiseta da Pastoral da Criança, e portando um crachá com foto e
identificação pessoal, leva consigo o material que a Pastoral da Criança lhe
fornece, que são o Guia do Líder, o Caderno do Líder, as fichas ‘Laços de Amor’,
entre outros. Esses instrumentos auxiliam o líder no acompanhamento e na
observação das crianças e das gestantes. No Caderno do Líder são anotadas as
informações sobre a criança e a gestante. Cada criança é registrada no caderno,
sendo que cada folha (registro) tem doze colunas, uma para cada mês. No
caderno estão as perguntas que vão monitorar o desenvolvimento da criança: se
a criança foi visitada; se mama no peito; se foi pesada, qual o peso dela; se
aumentou de peso; se está desnutrida; se teve diarréia; em caso de diarréia, se
tomou soro; se está com as vacinas em dia; quais foram os indicadores de
oportunidades e conquistas alcançados naquele mês; se ficou doente e se
conseguiu ser atendido pelo serviço de saúde.
Os líderes visitam as famílias sempre de dois em dois, pois, assim,
enquanto um conversa com a mãe, o outro pode observar a casa, o
comportamento das crianças e das outras pessoas que lá moram. Depois da
visita, os líderes comentam a situação que presenciaram, e decidem juntos se
73
alguma coisa deve ser feita. No dia da visita, o líder aproveita para lembrar a
mãe do dia da pesagem das crianças.
A camiseta da Pastoral da Criança funciona como um passaporte
para que o líder possa ter acesso a lugares considerados perigosos como
favelas, cortiços e também para que possam acelerar o atendimento de alguma
criança ou gestante em postos de saúde e hospitais, nos casos de emergência.
No dia da Celebração da Vida, além de serem pesadas, as crianças
podem brincar, comer um lanche ou um prato de comida, e os líderes chamam
todos para participar de uma roda onde é feita uma oração e uma reflexão sobre
os problemas da localidade. A pesagem é feita em um local próximo às casas
das famílias, geralmente, no salão da igreja, na associação de moradores ou em
um espaço cedido em uma escola. Na impossibilidade de um lugar coberto ou
fechado, a pesagem é realizada em qualquer espaço público e a balança, cedida
pela Pastoral da Criança a cada comunidade, pode ser pendurada em qualquer
lugar (em uma árvore ou em um poste).
A organização desse dia requer o trabalho de muitas pessoas, por
isso, alguns familiares são chamados para participar. A presença dos apoios
comunitários é muito importante. Existe trabalho na cozinha para preparar e
servir o lanche ou comida. Tem aqueles que ficam responsáveis por receber as
famílias e entregar uma senha que organiza a ordem de chegada. Existem
aqueles que ajudam a pesar e a tirar e colocar as roupas nas crianças. Tem os
que ficam responsáveis por organizar as brincadeiras com as crianças. Nas
datas comemorativas, como Natal, Dia das Crianças, Dia das Mães, Dia dos
Pais, Páscoa, é feito um esforço para entregar um presente para as crianças
e/ou pais. Os presentes são arrecadados na comunidade, por meio de doações
de comerciantes, pessoas físicas ou outras instituições.
A Coordenação Nacional da Pastoral da Criança envia uma ajuda
de custo para as comunidades, para a compra do lanche e para outras despesas
com as pesagens. O valor é equivalente a R$0,50 (cinqüenta centavos de real)
por criança ou gestante cadastrada. Não raro, esse valor é insuficiente, o que faz
com que as líderes e coordenações procurem parcerias em sua região, bairro,
74
comunidade, para comprar o lanche, assim como doações de materiais diversos,
de brinquedos, entre outras coisas. Algumas comunidades fazem chás, festas ou
montam barracas nas festas da Igreja para arrecadar dinheiro, o que muitas
vezes, supre as necessidades por todo ano.
O terceiro encontro, a Reunião de Reflexão e Avaliação, é realizado
uma vez por mês também. Dela, participam os líderes e o coordenador
comunitário e, quando necessário, o coordenador de ramo. Usando o método
Ver-Julgar-Agir-Avaliar-Celebrar, os presentes avaliam o trabalho do mês,
discutem os casos mais complicados e preenchem a FABS (Folha de
Acompanhamento das Ações Básicas de Saúde, Nutrição e Educação) que é
enviada para a sede, em Curitiba. Também são transmitidas as informações
sobre a Pastoral da Criança, sobre a paróquia e sobre a comunidade ou cidade.
As informações coletadas na comunidade, e colocadas na FABS,
são enviadas para a equipe de coordenação nacional. Essas informações
alimentam o banco de dados da Pastoral da Criança, disponível no site da
instituição. Um relatório com os resultados do trabalho comunitário é enviado
para os voluntários que atuam nos níveis de coordenação. No relatório, além dos
números do desempenho da sua equipe, constam, também, a evolução mensal e
um comparativo com outras comunidades, paróquias, cidades ou regiões. Os
números são apresentados de forma gráfica, de fácil entendimento, e, depois de
cada indicador, existe um aconselhamento para se melhorar a situação, ou uma
congratulação pelo alcance de uma meta. O relatório é apresentado e discutido
entre os voluntários nas reuniões de equipe.
3.2.7 Motivações do trabalho na Pastoral da Criança
Devido à diversidade de voluntários, na Pastoral da Criança, podem
ser identificadas diversas forças motivacionais: a caridade cristã, a ajuda ao
próximo, a ajuda-mútua, a solidariedade, a participação comunitária, a
indignação, a cidadania, entre outros. Cada uma destas motivações toca cada
voluntário de forma diferente. Como todas as características são importantes e
75
cada voluntário tende mais por um determinado motivo do que para outro, é a
integração de pessoas com motivações diversas que faz o trabalho ser eficaz.
É importante ressaltar que o cotidiano do trabalho é permeado por
uma religiosidade viva. As atividades da Pastoral da Criança fazem parte do
setor pastoral da Igreja Católica, mais especificamente, das Pastorais Sociais, e
isso denota que sua função principal é a de levar conteúdo religioso. O agente
pastoral é um ‘pastor de gente’ e sua função é cuidar para que os fiéis não se
distanciem, além de trazer novas pessoas para a Igreja. Assim como as outras
pastorais sociais, a Pastoral da Criança une o trabalho de evangelização a uma
ação social.
O trabalho social, sem um fator simbólico ou uma alma, torna-se
vazio, algo mecanizado, feito por obrigação. Cuidar do outro requer algo mais
que a finitude de uma ação; requer sentimentos, amor ao próximo e compaixão.
Por isso, muitos dos trabalhos sociais mais antigos estão ligados a algum tipo de
associação religiosa. A fé ajuda a caminhada de transformação. Muitas vezes, o
maior beneficiado é o próprio agente de transformação, assim como acontece
com os voluntários da Pastoral da Criança.
Por outro lado, o discurso religioso, por si só, é demasiado
ideológico e de difícil compreensão. Então, unindo os ensinamentos religiosos a
um trabalho social, as pessoas conseguem materializar o discurso religioso,
enxergando-se como protagonistas das histórias contadas. Segundo a Bíblia,
Jesus Cristo foi o maior pastor que já existiu, e isso aconteceu há dois mil anos.
Assim, cada voluntário que, ao seguir seus ensinamentos, realiza um trabalho
pastoral, seja ele social ou não, está fazendo a sua parte para que a história
continue viva. Somar o discurso religioso às atividades de ajuda humanitária faz
com que se viva o evangelho na prática.
Por isso, a Pastoral da Criança, em cada página do Guia do Líder,
coloca uma passagem do evangelho que é lido para a mãe, e isso serve para
animar tanto a família quanto o próprio líder. No dia da pesagem, depois de
pesar todas as crianças, líderes e mães se reúnem para fazer uma oração. As
76
reuniões e os locais de treinamento são preparados de forma a deixar os
símbolos religiosos sempre presentes.
Isso reflete o que o texto sobre as CEBs apresentou: as pessoas
têm que apreender os símbolos do sagrado. Assim como nos altares que eram
montados nas CEBs, as celebrações da Pastoral da Criança também usam os
objetos do local para montar seus altares. Neles, geralmente, são colocados uma
Bíblia, uma ou mais velas, o Guia e o Caderno do Líder, a balança, outros
materiais usados pelos líderes, e objetos que simbolizam o trabalho da região,
por exemplo, se for uma comunidade de pescadores, poderiam ser colocados
redes, varas, anzóis etc. Assim, se faz uma aproximação das coisas do sagrado
com o que faz parte do dia-a-dia das pessoas.
Além do fator religioso, existem as motivações individuais. Entre os
voluntários da Pastoral da Criança acontecem trocas constantes entre
voluntários e voluntários, e entre voluntários e famílias acompanhadas. Entre os
voluntários existe a cultura de ajuda mútua, a troca de conhecimentos, presentes
não só nos treinamentos, mas também nas reuniões mensais e no dia-a-dia, pois
os líderes, geralmente, moram na mesma vizinhança e freqüentam os mesmos
lugares. Entre as famílias e os líderes são trocados conhecimentos e
solidariedade. Essas trocas são bem mais que simples trocas de coisas
materiais ou a prestação de serviço socioassistencial. Elas estão permeadas de
sentimentos e afetividades, um espírito que explicita a presença da dádiva.
A proposta de trabalho da Pastoral da Criança proporciona nas
comunidades em que se insere um ambiente propício à produção de capital
social e incentiva comportamentos reprodutores desse ativo.
A Pastoral da Criança é organizada em rede e privilegia as relações
horizontais. O fato de o voluntário pertencer à mesma comunidade que as
famílias acompanhadas facilita o reconhecimento da identidade coletiva, e o
contato constante entre voluntários e famílias, proporcionado pela proximidade
física entre eles, auxilia na perenização das relações.
77
Ao ensinar para o voluntário como observar a sua comunidade e a
criar novos laços, seja com os outros voluntários, seja com as famílias
acompanhadas, a organização incentiva a ampliação do raio de confiança do
líder comunitário. Quando a família recebe o líder em sua casa, também age de
forma a ampliar seus relacionamentos. Assim, os voluntários da Pastoral da
Criança representam um grupo coeso que, permanentemente, trabalha na
ampliação do raio de confiança. Ainda nesse sentido, as dádivas, tanto dos
voluntários quanto das famílias, extrapolam o âmbito de sociabilidade primária
(família e amizade intima), transformando as relações contingentes em relações
úteis e, possivelmente, perenes.
A utilidade e objetivo da rede formada pela Pastoral da Criança
podem ser entendidos de diversas formas. A organização combate a mortalidade
infantil, cuida do desenvolvimento físico e psicossocial das crianças, fortalece
vínculos familiares e comunitários, incentiva o trabalho voluntário, trabalha por
meio de ações educativas, promove a cidadania, faz um trabalho de
evangelização, entre outras tantas coisas.
Dois desses objetivos proporcionam formação de capital social: as
questões ligadas ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários e o
trabalho voluntário. Esses são fatores intangíveis que são de difícil apreensão,
portanto a materialidade dos outros objetivos facilita o desenvolvimento das
atividades de transformação social.
A Pastoral da Criança construiu, durante seus 25 anos de
existência, uma credibilidade, e, por meio dos treinamentos, capacita, ao longo
dos anos, os voluntários a trabalhar em seu nome. Esse exercício é uma forma
de transmitir o capital social constituído nacionalmente para aqueles que
trabalham na comunidade. Essa credibilidade é somada à capacidade e ao
conhecimento que o líder já possui. A Pastoral da Criança também herdou a
credibilidade que Igreja Católica tem em trabalhos comunitários.
Os problemas na produção do capital social podem ser observados
quando uma comunidade pobre não consegue apreender a proposta da
organização, pois estão presos a uma dinâmica de solidariedade instrumental,
78
na qual esperam receber ajuda material (doações); e a Pastoral da Criança
fornece bens imateriais como informações sobre saúde e cidadania,
acompanhamento mensal e ajuda no entendimento do desenvolvimento das
crianças.
Nesse contexto é que a tripla obrigação da dádiva – dar, receber e
retribuir – fica prejudicada. A lógica utilitarista prejudica o entendimento de que
as relações pessoais e os vínculos são mais importantes que a ajuda material
que é entregue pela doação, tornando as coisas ofertadas pelo líder comunitário
– visita, pesagem, multimistura, lanche, entre outros – mais importante que os
vínculos comunitários.
Em resumo, estudar o trabalho voluntário na Pastoral da Criança
tem importância no que diz respeito às políticas públicas de saúde, quando
combate a mortalidade infantil e materna; e na área social, quando fortalece
vínculos intrafamiliares e comunitários, na resposta às críticas ao trabalho
voluntário e pela transformação social que a proximidade entre voluntário e
beneficiado proporciona.
79
CAPÍTULO IV
RESULTADOS DA PESQUISA
4.1 A cidade de Santos/SP
A cidade de Santos ocupa uma área de 280,9 km², e está
localizada no Litoral Sul do Estado de São Paulo, sendo a principal cidade da
região Metropolitana da Baixada Santista. Segundo a classificação do IBGE,
Santos é um município de grande porte, com 417.983 habitantes, e, como se
pode observar pela pirâmide etária, a maioria da população é adulta; a base
pequena e o centro maior indicam bom desenvolvimento social.
GRÁFICO 4 – PIRÂMIDE ETÁRIA: MUNICÍPIO DE SANTOS
Pirâmide Etária
15 10 5 0 5 10 15
0 a 9
10 a 19
20 a 29
30 a 39
40 a 49
50 a 59
60 a 69
70 a 79
80 e +
Faixa Etária (anos)
Percentual da População
Masculino
Feminino
Fonte: IBGE (2000)/Data SUS (2005)
A cidade é altamente urbanizada, com densidade demográfica de
1.488 hab./km², e taxa de urbanização de 99,47% (SEADE, 2000). Na área
80
urbana, 98,9% dos domicílios têm água encanada, 100% possuem energia
elétrica e em 99,6% existe coleta de lixo.
A renda per capita mensal é de R$ 725,42, que representam 4,8
salários mínimos de 2000. Em comparação com o estado de São Paulo (R$
441,56), esse valor é quase o dobro, e, em comparação em nível nacional, esse
valor é quase três vezes maior (R$ 247,06). Mas quando analisado pelo lado da
falta de recursos, percebe-se que há 2,85% da população que recebe até ¼ de
salário mínimo, e 4,62% que recebem até ½ salário mínimo. Se comparados com
os índices, esses são bons, pois representam cerca da metade dos índices
estaduais e federais (IBGE, 2000).
Entre os anos de 2001 e 2004, houve aumento na porcentagem da
população que vive em estado de pobreza. Em 2001 eram 6,38% (26.664
habitantes), que subiu 0,56 pontos percentuais (2.327 habitantes), e foi para
6,94% (28.991 habitantes) (IBGE, 2000).
A indústria de transformação e o setor terciário, baseados nas
atividades portuárias e no segmento de turismo, são hoje os principais setores
da economia da região, sendo a atividade na indústria a que gera maior valor
adicionado e a atividade no setor de serviços a que mais emprega (Gráfico 5).
GRÁFICO 5 – PARTICIPAÇÃO DO PESSOAL OCUPADO E DO VALOR ADICIONADO
SEGUNDO SETORES DE ATIVIDADE ECONÔMICA – RMBS - 2001
81
O município de Santos possui o maior porto do hemisfério sul, tanto
em movimentação de cargas, quanto em infra-estrutura, atendendo,
principalmente, os estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul,
Goiás, Paraná, além de alguns países do MERCOSUL (PAEP/SEADE, 2001).
A cidade também apresenta bons índices na área de educação. O
índice de alfabetização é alto, com 96,6% da população. Os dados do senso
IBGE de 2000 mostram que a taxa de analfabetismo da população maior de 15
anos é de 3,56%, e a média de anos de estudo é de 9,49 anos.
Alguns números, no entanto, apontam que algumas providências
devem ser tomadas nessa área, como por exemplo, 37,68% da população maior
de 25 anos têm menos de 8 anos de estudo e 57,76% dos que têm entre 18 e 24
anos não completaram o ensino médio. (INEP, 2004).
No período que compreende 1991 a 2000, a taxa de mortalidade
infantil do município diminuiu 27,63%, passando de 19,29‰ (por mil nascidos
vivos) em 1991, para 13,96‰ em 2000. Nos últimos cinco anos, a taxa de
mortalidade infantil se manteve estável e dentro dos padrões de baixa
mortalidade infantil. Contudo, apresenta-se acima da estadual (Gráfico 6).
GRÁFICO 6 – EVOLUÇÃO DA TAXA DE MORTALIDADE INFANTIL 2002-2006 – ESTADO DE
SÃO PAULO E CIDADE DE SANTOS (‰ – POR MIL NASCIDOS VIVOS)
15
14,8
14,3
13,4
13,3
14,2
18
15,5
14,9
16,2
15,9
14,8
2002 2003 2004 2005 2006 média
SP Santos
Fonte: Fundação Seade; Secretaria Estadual da Saúde; Secretarias Municipais da
Saúde. Base Unificada de Nascimentos e Óbitos.
82
Segundo dados de 2005, do Ministério da Saúde, na cidade de
Santos existem 15 hospitais (8 municipais, 1 estadual e 6 privados) e 22
policlínicas. Dados do SUS mostram que a razão entre população e número de
leitos é de 1,63 leitos por mil habitantes, sendo 0,55 leitos públicos e 1,09 leito
privado.
As informações apresentadas levaram a classificar o município de
Santos, em 2000, como uma cidade de alto
3
Índice de Desenvolvimento Social
(IDH-M 2000 = 0,871) e, em 2004, com alto Índice de Desenvolvimento Infantil
(IDI-M 2004 = 0,898), recebendo notas maiores que as do estado de São Paulo
e do país.
Dois índices estaduais, formulados pela Fundação SEADE,
apresentam mais detalhadamente a situação do município: o Índice Paulista de
Responsabilidade Social (IPRS) e o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social
(IPVS).
O IPRS, em 2006, classificou a cidade com o melhor indicador, o
Grupo 1. A síntese elaborada pela SEADE aponta que o município registrou
avanços nos indicadores de riqueza e longevidade, em oposição à queda do
indicador de escolaridade. Em termos de dimensões sociais, o escore de
longevidade ficou abaixo do nível médio do Estado, enquanto o de escolaridade
superou a média estadual.
Os resultados do IPVS mostram que a maior parte da população
(84,1%) não vive em situação de vulnerabilidade social (nenhuma
vulnerabilidade, vulnerabilidade muito baixa e baixa), números muito melhores
que a média estadual (Gráfico 7). Entre os outros 15,9% restantes que se
encontram em situação de vulnerabilidade estão aqueles que apresentam
características como: responsáveis pelo domicílio com renda mensal média de
R$ 430,00 e média de 5 anos de estudo, em relação aos R$ 1830,00 e 9,5 anos
de estudo dos que não estão em situação vulnerável. No grupo mais vulnerável,
3
IDH e IDI acima de 0,800 = desenvolvimento elevado; entre 0,500 e 0,799 = desenvolvimento
médio; e abaixo de 0,500 = desenvolvimento baixo.
83
os responsáveis pelo domicílio são mais jovens e há presença de crianças de 0 a
4, na composição familiar.
GRÁFICO 7 – INDICADORES QUE COMPÕEM O ÍNDICE PAULISTA DE VULNERABILIDADE
SOCIAL – IPVS – MUNICÍPIO DE SANTOS – IBGE 2000
6,9
23,3
22,2
20,2
17,6
9,8
12,5
64,0
7,6
3,2
7,5
5,1
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
1- Nenhuma
Vulnerabilidade
2- Muito Baixa 3- Baixa 4- Média 5- Alta 6- Muito Alta
Em %
Estado Santos
Fonte: Fundação SEADE
FIGURA 3 – MAPA DA DISTRIBUIÇÃO DO IPVS NO MUNICÍPIO DE SANTOS
Fonte: Fundação SEADE
84
Apesar da boa qualificação do município, pode-se observar, na
Figura 3, que distante da Orla, existem grandes áreas de vulnerabilidade média,
alta e muito alta, representada pelas cores amarelo claro, amarelo escuro e
vermelho. Nessas áreas estão localizados os Morros e a Zona Noroeste, onde
predominam as favelas, palafitas e moradias precárias. Já no centro da cidade e
na zona portuária, predominam domicílios de alta e altíssima vulnerabilidade,
pois lá se localizam muitos cortiços.
Assim, mesmo com um bom índice de desenvolvimento
socioeconômico, o município possui áreas de concentração de pobreza, onde a
incidência de criança e famílias em situação de vulnerabilidade social é elevada.
São estes seguimentos sociais que constituem objeto de intervenção da Pastoral
da Criança.
4.2 Pastoral da Criança em Santos/SP
No estado de São Paulo, a Igreja Católica está representada por 35
dioceses e 6 arquidioceses, sendo que a Pastoral da Criança está presente em
todas elas. A Diocese de Santos é composta por oito municípios da Baixada
Santista: Santos, Cubatão, Guarujá, São Vicente, Praia Grande, Itanhaém,
Peruíbe e Mongaguá. As subdivisões da Diocese de Santos respeitam o limite
geográfico dessas cidades. A Pastoral da Criança começou suas atividades na
região da Baixada Santista em 1984, na cidade de Santos. Hoje na diocese
trabalham mais de 600 voluntários que acompanham cerca de 9.600 crianças de
0 a 6 anos (Gráfico 8).
85
GRÁFICO 8 - LÍDERES*, CRIANÇAS, FAMÍLIAS E GESTANTES CADASTRADOS NA
DIOCESE DE SANTOS – PERÍODO DE 2003 A 2007
11.806
8.897
410
452
10.705
8.473
463
430
9.649
7.650
425
843
11.444
8.874
821
760 725
10.914
8.610
634
deres Crianças Famílias Gestantes
2003 2004 2005 2006 2007
*O números de líderes não consideram as equipes de coordenação.
Fonte: www.pastoraldacrianca.org.br
Dentre as cidades da Diocese de Santos, em número de
voluntários e beneficiários, a Cidade de Santos ocupa o segundo lugar em
número de crianças cadastradas: 1944, cerca de 20% do total da Diocese –, e o
primeiro lugar em número de líderes atuantes: 158, 25% do total da Diocese
(Gráfico 8).
GRÁFICO 9 – DISTRIBUIÇÃO DE LÍDERES* E CRIANÇAS NAS CIDADES QUE COMPÕEM A
DIOCESE DE SANTOS (2007)
14%
21%
4%
2%
3%
15%
20%
10%
15%
18%
2%
2%
3%
18%
25%
10%
Cubatão
Guarujá
Itanhaem
Mongaguá
Peruíbe
Praia Grande
Santos
o Vicente
crianças
deres
*O números de líderes não consideram as equipes de coordenação
Fonte: www.pastoraldacrianca.org.br
86
Em 2007, a Pastoral da Criança, na cidade de Santos,
acompanhou, em média, 1.944 crianças de 0 a 6 anos e 72 gestantes,
pertencentes a 1.566 famílias, resultado do trabalho de 158 líderes comunitárias,
das 3 coordenações de área, das 15 coordenações de ramo e 28 coordenações
comunitárias, e de 151 apoios comunitários (Gráfico 10).
GRÁFICO 10 – LÍDERES*, CRIANÇAS, FAMÍLIAS E GESTANTES CADASTRADOS NA
CIDADE DE SANTOS – PERÍODO 2003 A 2007
180
2.172
1.721
61
173
78
178
72
179
74
158
72
1.694
2.077
1.918
1.537
1.832
2.319
1.944
1.566
Líderes Crianças Famílias Gestantes
2003 2004 2005 2006 2007
*O números de líderes não consideram as equipes de coordenação.
Fonte: www.pastoraldacrianca.org.br
O Gráfico 10 também revela o número de voluntários da cidade nos
últimos 5 anos. Pode-se observar que houve uma ligeira queda no número de
famílias e crianças acompanhadas de 2003 a 2005. Por razão de uma campanha
de mobilização, em 2006, os números cresceram, aproximadamente, 17% em
relação às famílias e crianças acompanhadas.
Houve uma queda na quantidade de acompanhamentos em 2007.
Isso se deve à campanha de reciclagem dos voluntários para a capacitação do
novo Guia do Líder. A atenção deixou de ser a busca de novas famílias e passou
a ser a capacitação dos líderes, o que pode explicar a ligeira queda na
quantidade de crianças. Não explica, porém, a diminuição do número de
voluntários, pois, entre 2003 e 2006, o número de líderes se mostrou estável,
sofrendo uma ligeira queda em 2007. Considera-se que a queda tenha sido
decorrente da evasão natural de famílias, crianças e líderes.
87
Situando o trabalho da Pastoral da Criança com a realidade da
cidade de Santos, pode-se dizer que a organização está fazendo um trabalho
expressivo, uma vez que está presente em todas as regiões da cidade.
Traduzindo em números, cerca de 5,9% da população (28.991 habitantes) da
cidade de Santos vive em estado de pobreza (IBGE, 2000). A cidade possui
31.384
4
crianças de 0 a 6 anos, sendo que 4.613 (14,7%) pertencem a famílias
em estado de pobreza. A Pastoral da Criança, em 2007, acompanhou 1.944
crianças, o que equivale a 5% do total das crianças de 0 a 6 anos residentes no
município, e a 42% das crianças pobres. No entanto, para os padrões da
organização, esse valor é considerado mediano, pois a meta é acompanhar
todas as crianças pobres menores de seis anos, nos municípios em que atua.
No município, existem 25 paróquias, e a Pastoral da Criança está
presente em 72% delas (15 paróquias). O trabalho na cidade de Santos foi
dividido pela Pastoral da Criança em três áreas que, por sua vez, são divididas
em quinze paróquias. As 15 paróquias são divididas em 28 comunidades, cuja
divisão e denominação estão apresentadas na Tabela 2.
As 200 pessoas que compõem a equipe da Pastoral da Criança em
Santos estão distribuídas nas regiões e cargos como se pode visualizar na
Tabela 5.
TABELA 5 – VOLUNTÁRIOS POR ÁREA E CARGO OCUPADO NA CIDADE DE SANTOS
Cargo área 2 área 3 área 12
Nº de
voluntários
por cargo
% de
voluntários
por cargo
Coordenador de Diocese - - -
1
0,5%
Coordenador de Área 1 1 1
3
2%
Coordenador de Ramo 6 6 3
15
8%
Coordenador de Comunidade 7 13 8
28
14%
Líder Comunitário 47 53 53
153
77%
Nº de voluntários por área 61 73 65
200
100%
% de voluntários por área 31% 37% 33% 100%
Fonte: Pastoral da Criança de Santos (Julho de 2007)
4
IBGE. Indicadores Sociais Municipais 2000: Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2002
88
As divisões em áreas acompanham as divisões geográficas da
cidade – bairros e regiões – e as subdivisões em paróquias acompanham as
regiões de atuação da Igreja Católica. Na área 2, estão as igrejas da Orla
Marítima, na área 3 estão as dos Morros e da Zona Noroeste, e na área 12 as
paróquias do Centro e da Zona Portuária. As paróquias da área 12 pertenciam à
área 2, mas, devido ao crescimento do número de famílias e crianças, em 1995,
a área foi dividida em duas. Essa estratégia possibilitou a ampliação progressiva
do trabalho da Pastoral da Criança na cidade.
GRÁFICO 11 – LÍDERES, FAMÍLIAS, CRIANÇAS E GESTANTES DA PASTORAL DA
CRIANÇA, DA CIDADE DE SANTOS, POR ÁREA – 1º TRIMESTRE DE 2007
Número de líderes, famílias, crianças e gestantes da
cidade de Santos por Área
44
371
455
12
53
708
880
34
48
315
393
14
Nº de total de
deres
de Famílias de crianças de gestantes
área 2 área 3 área 12
Fonte: Pastoral da Criança de Santos
Na cidade, o número de crianças acompanhadas por líder varia
entre 5 e 21, devido à precariedade de cada região, que influi diretamente no
número de líderes, isto é, quanto mais precária a região, maior a quantidade de
crianças, contudo menor a paróquia e menor o número de líderes. Enquanto que,
quanto maior a paróquia, maior é a quantidade de pessoas disposta a ajudar. A
proporção de líderes por comunidade exemplifica isso: a menor proporção é da
área 3, com 4,8 líderes por comunidade, em média, seguida pela área 12, com
6,6 líderes; a maior é a área 2, com 7,3 líderes.
89
As regiões com maior índice de vulnerabilidade social e econômica
da cidade são o Centro, com a presença de muitos cortiços, e os Morros e a
Zona Noroeste, onde predominam as favelas, as palafitas, moradias precárias. É
nessas regiões (áreas 3 e 12) que a Pastoral da Criança tem o maior número de
famílias atendidas e o menor número de líderes, sendo que, em algumas
comunidades, a razão de crianças por líder é de 19 a 50 (19 em média). Nos
Morros e na Zona Noroeste, bem como nas comunidades do Centro (Nossa
Senhora do Rosário) a proporção chega a 20 crianças por líder. O número de
crianças acompanhadas por família é estável nas três áreas, oscila entre 1,1 e
1,4 por família (Tabela 6).
TABELA 6 – PROPORÇÃO DE FAMÍLIAS E CRIANÇAS POR LÍDER E PROPORÇÃO DE
CRIANÇAS POR FAMÍLIA NA PASTORAL DA CRIANÇA DA CIDADE DE SANTOS
Paróquia/Ramo Comunidade
famílias
por
líder
crianças
por
líder
crianças
por
família
1. Nossa Senhora Aparecida Vila Nossa Sra.
Aparecida
9 11 1,2
2. São Benedito São Benedito 7 9 1,2
3. São Jorge Mártir Núcleo do Estuário 9 12 1,3
Santista 8 10 1,2
4. Nosso Senhor dos Passos Nossa Senhora Dos
Passos
8 11 1,3
5. São Paulo Apostolo São Paulo Apóstolo 9 11 1,3
Área 2
Orla
8 10 1,2
1. São João Batista Vila Progresso 6 7 1,2
Nova Cintra 10 13 1,2
Sant'ana E São Joaquim 16 19 1,2
2. Nossa Senhora Assunção Morro São Bento 15 19 1,3
3. Sagrada Família Caminho São Sebastião 13 16 1,3
Caminho São Jose 14 18 1,3
4. São Tiago Apóstolo São Tiago 12 15 1,3
São Francisco De Assis 46 56 1,2
Jardim São Manoel 14 18 1,3
Jardim Dos Anjos 17 19 1,1
5. Jesus Crucificado Jesus Crucificado 12 15 1,2
Área 3
Morros e
Zona
Noroeste
16 19 1,2
1. Imaculado Coração de
Maria
Vila Santa Casa 4 5 1,1
Vila Mathias 4 5 1,3
Vila Santa Casa II 5 7 1,3
2. Nossa Senhora do
Rosário
Nossa Senhora Do Monte
Serrat
9 11 1,2
Valongo 7 7 1,1
Santa Josefina Bakita 14 20 1,4
3. São Judas Tadeu Marapé 8 11 1,4
Área 12
Cento
7 9 1,3
Fonte: Pastoral da Criança de Santos (julho de 2007)
90
No que diz respeito à integração com as esferas públicas da
cidade, a Pastoral da Criança tem acento nos conselhos municipais de Saúde,
Direito da Criança e do Adolescente e de Assistência Social, conselhos ligados
diretamente ao trabalho da Pastoral da Criança, e nos quais a instituição
participa e tem representantes com direito a voto, devido à atuação da AAPAC
junto às diversas esferas políticas e econômicas da cidade.
Na área da saúde, as policlínicas são as que mais indicam crianças
para a Pastoral da Criança, e que, também, colaboram com profissionais que
fazem palestras nas comunidades.
As pesagens são feitas, geralmente, no salão da igreja, mas em
alguns casos, em que a igreja fica longe das famílias, são realizadas em alguma
escola ou na associação de moradores. A estrutura das igrejas varia. Há igrejas
grandes, com espaço no salão de festas para comportar todas as famílias, e
outras bem pequenas com aproximadamente 40m
2
, que mal tem espaço para a
balança e para o lanche.
A análise da distribuição dos voluntários e das famílias da Pastoral
da Criança em Santos permitiu verificar as áreas onde estão situadas as
comunidades que constituem objeto de intervenção da Pastoral da Criança,
objeto desta pesquisa.
4.3. Perfil do voluntário da Pastoral da Criança da cidade de
Santos/SP
Durante a segunda fase da pesquisa de campo, foram visitadas
todas as áreas e paróquias da cidade de Santos que possuem equipe de
voluntários da Pastoral da Criança, nos quais foram entrevistados 37 líderes
91
comunitários, 11 coordenadores comunitários, 4 coordenadores de ramo, 2
coordenadores de área e 1 coordenador diocesano, totalizando 55 voluntários.
Dos 55 voluntários entrevistados, as mulheres representam 96% da
amostra, sendo que 84% têm mais de 40 anos. A grande parte é ou já foi
casada, sendo 69,1% (38) casado, 14,5% (8) viúvo, 3,6% (2) separado e 3,6%
(2) união estável, e, apenas 9,6% (5) solteiro. Entre os entrevistados, 93% (51)
têm filhos. Dos 4 voluntários que não têm filhos, 3 são solteiros e um é viúvo.
Quando perguntado para os solteiros se gostariam de ter filhos a resposta foi
positiva. Apenas 2 entrevistados são do sexo masculino, eles também são
casados e têm filhos.
GRÁFICO 12 – VOLUNTÁRIOS POR FAIXA ETÁRIA
4%
13%
20%
42%
18%
4%
de 20 a 29
anos
de 30 a 39 de 40 a 49 de 50 a 59 de 60 a 69 acima de 70
Quanto à escolaridade, apenas uma voluntária se declarou sem
escolaridade, mas afirma que sabe ler e escrever, apesar de nunca ter
freqüentado uma escola. 18 entrevistados têm apenas até a 4ª série
(Fundamental I), 10 completaram a 8ª série (Ensino Fundamental II), 14 têm o
Ensino Médio, e, destes, dois cursaram o Magistério. 14 entrevistados têm
Ensino Superior, porém as áreas de formação têm pouca relação com a atuação
da Pastoral da Criança. Na equipe existem 6 administradores, 2 contadores, 1
economista e apenas 2 pedagogos e 1 psicólogo. No início da pesquisa,
92
acreditava-se que predominariam pessoas da área da saúde, da educação e da
assistência social, mas a hipótese não se confirmou. Constatou-se, pela
amostra, que o trabalho do voluntário da Pastoral da Criança pode ser exercido
por pessoas de qualquer nível de escolaridade e formação profissional.
GRÁFICO 13 – VOLUNTÁRIOS POR ESCOLARIDADE
2%
33%
18%
25%
22%
Não tem Fundamental I Fundamental II Ensino Médio Ensino
Superior
Um dos motivos para a baixa escolaridade pode ser a idade dos
voluntários, pois há 40 ou 50 anos atrás, uma pessoa estava alfabetizada ao
completar o primário (atual Ensino Fundamental I), e aqueles que sentissem
necessidade poderiam continuar seus estudos. Na Tabela 7, pode-se verificar
que 40% dos entrevistados têm acima de 40 anos e cursou até o Ensino
Fundamental II.
TABELA 7 – VOLUNTÁRIOS POR ESCOLARIDADE E FAIXA ETÁRIA
Faixa etária
Escolaridade
Menos de 39
anos
de 40 a 49
anos
de 50 a 59
anos
60 anos ou
mais
Total
Não possui
10 0 0 1
% Total
1,8% 0,0% 0,0% 0,0% 1,8%
Ensino Nº
2 6 5 5 18
Fundamental I % Total
3,6% 10,9% 9,1% 9,1% 32,7%
Ensino Nº
2 1 5 2 10
Fundamental II % Total
3,6% 1,80% 9,1% 3,6% 18,2%
Ensino
3 3 4 2 12
Médio % Total
5,5% 5,50% 7,3% 3,6% 21,9%
Magistério Nº
00 1 1 2
% Total
0,0% 0,0% 1,8% 1,8% 3,6%
Ensino
1 1 8 2 12
Superior % Total
1,8% 1,8% 14,5% 3,6% 21,8%
Total Nº
9 11 23 12 55
% Total
16,4% 20,0% 41,8% 21,8% 100,0%
93
No que diz respeito à condição de moradia, todos dos entrevistados
declararam que possuem acesso a serviços públicos de distribuição de água, e
energia elétrica e de coleta de lixo. Apenas um entrevistado não tem acesso à
coleta de esgoto, pois reside na área das palafitas. 89,1% dos entrevistados
possuem casa própria, 3,6% deles residem em local cedido, e 7,3% pagam
aluguel. A maioria das moradias tem mais de quatro cômodos (87,3%). Nessa
questão, não foram considerados banheiro, quintal e área de serviço.
O tipo de moradia predominante é apartamento (47,3%), seguido
por casa de alvenaria isolada (29,1%). Dentre os entrevistados, apenas 7,3%
moram em favela. 16,4% dos voluntários moram em casa de alvenaria
frente/fundos, contudo, destes, 6 são proprietários da moradia, 2 pagam aluguel
e 1 declarou que a moradia é cedida.
Pode-se observar, no Gráfico 14, que grande parte dos voluntários
entrevistados (66%) não pertence à População Economicamente Ativa (PEA):
22% são aposentados ou pensionistas e quase a metade se declarou dona de
casa (44%). Dos entrevistados, 34% fazem parte da PEA, sendo que apenas 9%
são assalariados, com carteira assinada; 18% desenvolvem atividade
remunerada como autônomos; e 7% estão desempregados. Os voluntários
alegam que o trabalho da Pastoral da Criança requer tempo e dedicação, por
isso, para aqueles que trabalham em tempo integral é difícil desenvolver essa
atividade. Alguns fazem o treinamento e iniciam o trabalho porque têm tempo
livre, mas quando encontram trabalho têm que deixar o acompanhamento das
famílias.
94
GRÁFICO 14 – VOLUNTÁRIOS POR OCUPAÇÃO PROFISSIONAL
34%
44%
22%
Tem ocupação profissional Dona de casa Aposentado/Pensionista
Da Tabela 8, depreende-se que 43,6% dos entrevistados não
possuem renda individual, contudo a renda familiar, em sua maioria, é média
(66,7%) ou alta (20,8%). Isso deve estar relacionado à quantidade de donas de
casa que realizam o trabalho voluntário. Ademais, a maioria, sendo mulher, a
renda familiar sobe devido à ocupação do marido e dos filhos. Por outro lado,
apenas 12,7% possuem renda familiar baixa.
Desse modo, os voluntários entrevistados possuem renda familiar
média (72,7%), o que revela que os voluntários são pessoas que possuem certa
estabilidade, pois possuem casa própria e acesso a serviços públicos. Essa
situação de comodidade e conforto os tornam capazes de ajudar o próximo,
mediante a realização de um trabalho voluntário. Isso é característico da
dinâmica da dádiva, em que as pessoas, em um determinado momento, sentem
a necessidade de retribuir as dádivas recebidas. A retribuição não volta,
necessariamente, para quem lhe ofereceu, mas é oferecida para a geração
seguinte ou para pessoas que mais necessitam.
95
TABELA 8 – VOLUNTÁRIOS POR RENDA INDIVIDUAL E RENDA FAMILIAR
5
Renda Individual
1. Nenhuma
Renda
2. Renda
Baixa
3. Renda
Média
4. Renda
Alta
Total
1.
1 0 0 0 1
Nenhuma % rendfam
100,0% ,0% ,0% ,0% 100,0%
Renda % rendind
4,2% ,0% ,0% ,0% 1,8%
% total
1,8% ,0% ,0% ,0% 1,8%
2.
2 4 0 0 6
Renda % rendfam
33,3% 66,7% ,0% ,0% 100,0%
Baixa % rendind
8,3% 26,7% ,0% ,0% 10,9%
% total
3,6% 7,3% ,0% ,0% 10,9%
3.
16 11 11 2 40
Renda % rendfam
40,0% 27,5% 27,5% 5,0% 100,0%
Média % rendind
66,7% 73,3% 91,7% 50,0% 72,7%
% total
29,1% 20,0% 20,0% 3,6% 72,7%
4.
5 0 1 2 8
Renda % rendfam
62,5% ,0% 12,5% 25,0% 100,0%
Alta % rendind
20,8% ,0% 8,3% 50,0% 14,5%
Renda
Familiar
% total
9,1% ,0% 1,8% 3,6% 14,5%
24 15 12 4 55
% rendfam
43,6% 27,3% 21,8% 7,3% 100,0%
% rendind
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Total
% total
43,6% 27,3% 21,8% 7,3% 100,0%
O Gráfico 15 permite verificar que 74% faz parte da Pastoral da
Criança há mais de cinco anos. Segundo o relato de alguns voluntários, aqueles
que se identificam com o trabalho, dificilmente, desistem. Por outro lado, também
existem aqueles que, quando iniciam na organização, desistem logo no primeiro
ano, porque não conseguem desenvolver o trabalho ou, como já foi dito,
encontram uma ocupação profissional que acaba dificultando o trabalho
voluntário.
5
Renda individual: baixa: até R$ 760,00; média: de R$ 761,00 a R$ 1.900,00; alta: mais de R$
1.901,00 e Renda familiar: baixa: até R$ 760,00; média: de R$ 761,00 a R$ 3.800,00; alta: mais
de R$ 3.800,00, considerar salário mínimo de R$ 380,00 (2007)
96
GRÁFICO 15 – VOLUNTÁRIOS POR TEMPO DE ATUAÇÃO NA PASTORAL DA CRIANÇA
4%
22%
24%
50%
menos de 2 anos 2 a 4 anos 5 a 10 anos 10 anos ou mais
Assim, os voluntários da Pastoral da Criança de Santos formam um
grupo, principalmente, de mulheres acima de 40 anos, que têm filhos e situação
financeira relativamente estável. Esses voluntários, na sua maioria, concluíram o
ensino fundamental ou médio e são aposentados ou donas de casa, e, assim,
não estão inseridas no mercado de trabalho, o que permite dispor de tempo para
realizar o trabalho voluntário.
4.3 A produção e reprodução de capital social na Pastoral da Criança
de Santos/SP
A análise das entrevistas com os voluntários da Pastoral da Criança
constatou que a organização aproveita, com êxito, as solicitudes dos seus
integrantes e que se trata de um trabalho voluntário que apresenta as seguintes
características:
97
solidário, quando utiliza a solidariedade presente nas pessoas para
o combate à mortalidade infantil e para o desenvolvimento saudável
das crianças;
comunitário, ou de ajuda-mútua, quando mobiliza pessoas de uma
mesma comunidade no cuidado consigo mesmos;
cidadão, quando fornece conhecimentos para os voluntários e os
capacita a serem multiplicadores desses conhecimentos, e também
quando incentiva o voluntário a conhecer melhor a sua comunidade
e a participar da vida comunitária, como um sujeito ativo e agente
de transformação.
Como na Configuração Missionária descrita por Mintzberg (1995), a
Pastoral da Criança está representada em cada comunidade, como uma célula
quase autônoma, mas ligada à organização pela missão e objetivos. As
coordenações em cada comunidade são responsáveis por transmitir o que
ocorre no seu interior, para a coordenação nacional, que, por sua vez, é
responsável por processar e divulgar as informações recebidas para todas as
comunidades do país. Esse exercício recursivo proporciona que todos se sintam
parte de um todo. Assim, esse movimento vem ao encontro do que diz Bourdieu
(1980), pois os diversos agentes dispersos pelo Brasil têm condição de agir
como um único ‘homem’, e ultrapassam a finitude que os liga a um lugar e um
tempo.
Na cidade de Santos, essa característica pode ser também
observada. As comunidades são independentes, cada uma com suas famílias e
área de atuação. Algumas vezes, quando perguntado ao entrevistado se ele
conhecia o trabalho de outras paróquias, não raro a reposta era negativa, para
surpresa do pesquisador. Mas em cada entrevista, tinha-se a impressão de que
se estava conversando com pessoas da mesma equipe, que trabalhavam juntas
e que se encontravam constantemente. Essa percepção é o resultado da
eficiência da rede social que se formou. Cada indivíduo, apesar de estar preso a
um espaço e tempo, faz parte de um todo, unido pelo objetivo da Pastoral da
Criança. O voluntário também tem consciência de que faz parte de uma equipe
98
muito maior do que o grupo de voluntários de sua paróquia. Pode até ser que,
em outra cidade ou outro estado, onde haja equipe da Pastoral da Criança, a
percepção seja a mesma.
Para entender o que move o trabalho, foi perguntado ao voluntário
qual era a sua motivação para fazer trabalhos voluntários em geral, não
necessariamente o da Pastoral da Criança. Na Tabela 9, pode-se verificar que
ajudar foi mencionado por 58% dos entrevistados. Em seguida, ficou a busca ou
a importância dos relacionamentos com outros voluntários e com os atendidos. A
ajuda aliada aos relacionamentos são características do trabalho voluntário
comunitário ou de ajuda-mútua, o qual agrega contato pessoal permanente,
proximidade e relações interpessoais.
Quando os voluntários falam dos relacionamentos, dizem que
aprendem muito com as famílias e com os outros voluntários, e que quando
chegam para ajudar, muitas vezes, se sentem melhor, por isso, o terceiro fator
mais citado foi o bem-estar pessoal. Essa afirmação é o principal alvo das
críticas ao voluntariado moderno, mas, no caso da Pastoral da Criança, esse
bem-estar não é um fator isolado; ele é fruto de uma relação de ajuda-mútua na
qual os dois atores saem ganhando e a possibilidade de transformação é muito
maior, pois existe constância nos contatos e um inter-reconhecimento entre eles.
“A Pastoral pra mim foi tudo. Eu conheci gente nova. Eu não conhecia ninguém.
Eu não gostava de ter muita amizade com ninguém. Eu vivia dentro da minha
casa. Agora eu sou comunicativa, converso com todo mundo” (23)
6
.
Quando os entrevistados dizem que fazem trabalho voluntário,
motivados por algum fator religioso, tende-se, imediatamente, a considerar essa
afirmação como uma reprodução da caridade cristã. Contudo, o voluntário da
Pastoral da Criança tem uma visão diferente, pois aprenderam que, ao fazer um
trabalho como esse, está dando vida a sua religiosidade, e não simplesmente
cumprindo uma obrigação caritativa.
“Eu sempre confiei em Deus, mas antes de entrar na Pastoral estava sem
sentido de religião. A Pastoral me ajudou a buscar a minha fé. Foi uma
6
Os números, ao final do depoimento, se referem ao número da entrevista.
99
transformação de vida. Eu acho que todo mundo que está entrando na Pastoral
tinha que ver isso. Para mim, foi a certeza de um porto seguro em Deus. Eu
sempre tive adoração por Deus, mas não tinha essa busca”(9).
O resultado do trabalho também se torna fator motivacional na
medida em que o voluntário consegue ver que seu trabalho está dando frutos,
que ele consegue ver a transformação nas famílias e que ele está sendo útil para
alguém e para a sociedade. Na rede formada pelos voluntários e pelas famílias,
a utilidade pode ser considerada como um perenizador de relacionamentos, pois
à medida que a família percebe que o relacionamento com o líder comunitário
está sendo útil, ela vai querer manter o vínculo. E para o voluntário saber que
está sendo útil, por meio do crescimento saudável da criança, e que seu trabalho
está transformando alguém, é realmente uma grande motivação para que no
próximo mês ele volte a visitar aquela família.
“Esta é a minha função: incentivar a mãe para que ela busque melhorar de vida.
E ela consegue se for buscar” (8).
Alguns entrevistados (16%) fizeram menção ao reconhecimento
que o trabalho traz. Esse fator também considerou quando o voluntário entende
o trabalho como gratificante. A retribuição de dádivas foi citada por apenas 11%
(6) dos entrevistados, o que leva a entender que, para os voluntários, a ajuda
não está ligada a pagamento de dívidas, mas ao fato de ajudar sem esperar
nada em troca.
“Deus é tão bom pra mim, me dá tanto, que eu tenho que retribuir de alguma
maneira e eu acho que fazer trabalho voluntário, seria assim um agradecimento”
(8).
Apesar da maioria dos entrevistados ser aposentados ou donas de
casa e do trabalho com as famílias demandar muito tempo e dedicação, o fator
tempo livre foi considerado como motivação por apenas 5 entrevistados.
100
TABELA 9 – MOTIVAÇÕES PARA O TRABALHO VOLUNTÁRIO (*)
%
Ajuda 32 58%
Relacionamentos 15 27%
Religiosidade 11 20%
Resultados do trabalho 11 20%
Bem-estar pessoal 10 18%
Reconhecimento 9 16%
Doar-se 8 15%
Amor 6 11%
Retribuir dádivas 6 11%
Tempo livre 5 9%
Aprender 4 7%
Entrevistados 55
(*) Respostas múltiplas
A principal razão que levou o voluntário a escolher a Pastoral da
Criança é o gosto pelo trabalho que envolve crianças. Muitos já freqüentavam a
Igreja Católica a qual estão vinculados, e se envolver com algum trabalho na
igreja faz parte da dinâmica dos fiéis, por isso, o segundo maior motivo, entre os
entrevistados, foi o de, simplesmente, fazer um trabalho voluntário.
Nessa questão, o fator tempo livre foi mais usado do que na
motivação para o voluntariado, e está ligado a fatos como aposentadoria, a
independência dos filhos. Quando os voluntários declararam ter começado o
trabalho na Pastoral da Criança, porque foram convidados (15%), começa-se a
ver a importância dos laços na formação da equipe, uma vez que o convite,
geralmente, é feito por alguém do seu convívio.
A religiosidade citada por 11% dos entrevistados se relaciona com
o fato da Pastoral da Criança estar ligada a uma atividade da Igreja. Dentre
estes, dois entrevistados alegaram que começaram o trabalho porque fizeram
uma promessa.
101
Um dos pontos fortes da gestão da Pastoral da Criança é a
transparência, contudo, esse fator foi mencionado somente por 4% voluntários.
“Eu queria um trabalho que não envolvesse dinheiro, tudo que envolve dinheiro
dá problema, seja em qualquer situação que for” (22).
Esse depoimento reforça a prerrogativa não-utilitária da dádiva,
presente no trabalho da organização.
Apenas 11% afirmaram que já fazia esse tipo de trabalho em sua
comunidade. Esse fator pode ter duas explicações: ou demonstra a falta de
solidariedade que existe na sociedade contemporânea, pois se não é a
intermediação de uma organização social, dificilmente, as pessoas realizam
trabalhos comunitários por iniciativa própria; ou, na cidade de Santos, aqueles
que já atuam como líderes comunitários estão realizando outros trabalhos que
não o da Pastoral da Criança. Durante as entrevistas, não foi possível averiguar
essas considerações.
“Eu nasci para ser voluntária. Sempre fui de ajudar os outros, sempre cuidei dos
filhos dos outros de graça. Quando via um bichinho na rua sem casa eu trazia
para minha casa” (23).
TABELA 10 – MOTIVO DA ESCOLHA DO VOLUNTÁRIO PELA PASTORAL DA CRIANÇA (*)
%
Gosta de trabalhar com crianças 30 55%
Para fazer um trabalho voluntário 14 25%
Tempo livre 11 20%
Religiosidade 9 16%
Foi convidada 8 15%
Já realizava esse tipo de trabalho na sua comunidade 6 11%
Participar de um grupo 3 5%
Transparência 2 4%
Entrevistados 55
(*) Respostas múltiplas
Quando a Pastoral da Criança iniciou os seus trabalhos, ela utilizou
ou herdou capital social da Igreja Católica, cujo histórico é repleto de ações
102
sociais de luta contra a exclusão social e de trabalhos comunitários, além da
credibilidade que o discurso religioso denota para as suas ações. A Pastoral da
Criança, ao desenvolver ações sociais com transparência e efetividade,
conseguiu construir o seu próprio capital social e trouxe ainda mais credibilidade
para a Igreja Católica. Esta, por sua vez, quando mantém outros trabalhos
sociais, continua imprimindo mais credibilidade, não só para a Pastoral da
Criança, mas para as outras organizações que trabalham em seu nome (outras
pastorais, ordens religiosas, congregações cristãs entre outras).
O capital social da Pastoral da Criança é uma construção que
iniciou nos primeiros trabalhos na cidade de Florestópolis, PR. As ações que se
multiplicaram desde então só colaboram para o aumento desse capital. Mas é
importante ressaltar que o capital social que a organização propicia aos seus
integrantes configura como um investimento inicial. A sua reprodução só é
efetiva se as pessoas que dela fazem parte colaborarem na construção de um
capital social local.
Essa afirmação pôde ser constatada no treinamento de
coordenações, quando o capacitador pediu que os presentes levantassem
alguns problemas do cotidiano. Os mais citados foram ‘comunidades mortas’,
‘falta de líderes’, e ‘ausência das mães na pesagem’. Essas constatações estão
relacionadas à baixa participação dos atores, que desfavorecem a reprodução do
capital social. Isso comprova que a participação é o principal motor da
organização.
Ainda sobre a herança do capital social percebeu-se que
voluntários da Pastoral da Criança são tidos como pessoas confiáveis, inclusive
entre aqueles que não são acompanhados pela organização. Eles têm acesso a
áreas de risco como favelas e cortiços, áreas onde o poder local é paralelo e só
tem acesso os moradores e pessoas conhecidas.
A produção e o consumo do capital social são feitos pelos
voluntários e pelas famílias. Contudo, as famílias são as que mais consomem e
as que menos produzem. A família coopera quando aceita a presença do líder
comunitário, mas só isso não é o bastante para a reprodução do capital social.
103
Ela participaria, efetivamente, dessa rede de solidariedade caso se tornasse
também uma multiplicadora dos conhecimentos oferecidos pela organização. O
fato que comprova isso é o pequeno número de mães que se tornam líderes,
pois dentre os entrevistados apenas 16% tiveram filhos acompanhados pela
Pastoral da Criança, sendo que destas apenas três foram mães acompanhadas
antes de se tornarem líderes. O relato a seguir é de uma líder, uma pessoa
simples que veio do interior do Ceará aos 19 anos, com quatro filhos, e que foi
acompanhada pela Pastoral da Criança:
"Eu não sabia como cuidar dos filhos, não sabia sobre alimentação, meus filhos
viviam muito doentes, anemia, bronquite, rinite, um monte de coisa. Eu não sabia
por que tinha aquele monte de problema com as crianças.
Aí a Pastoral veio pra cá começou a fazer reuniões com as mães explicar que
tinha a multimistura com a folha da mandioca. Eu achei estranho porque lá no
Norte a gente dava farelo pros porcos e aqui dava pras crianças comer. Aí elas
disseram que esse farelo salvava muitas vidas de crianças que tinham
problemas como os dos meus.
Eu fui fazer os cursos, fui aprender a cozinhar a reaproveitar os alimentos, as
cascas, os talos. E isso foi bom pra mim, eu cresci. Meus filhos não ficaram mais
doentes, foi parando a bronquite, a anemia, não ia tanto para o hospital. Eu ia na
feira e pegava cabeça de peixe, talo de couve, batata, cenoura, chuchu e fazia
comida.
[...] Mudei o jeito de criar meus filhos, eu não tinha um exemplo de criação, eu
não tive mãe nem pai, então criei meus filhos que nem cria qualquer coisa, eu
não sabia criar mesmo, se tava doente, levava no médico se não tava doente eu
não queria nem saber. Na Pastoral eu fui reeducada a saber dar educação, a
saber lidar com a criança. Porque a coisa minha era bater, xingar, gritar. Na
Pastoral eu comecei a entender o problema deles e eles a entender o meu. Eu
também tinha muito atrito com o marido. A Pastoral me deu conselhos, me
ensinou a como sair daquelas situações.
[...] Do jeito que eu fui criada, era para eu ser uma prostituta ou uma traficante,
porque vivia nesse meio. Eu vim do Norte com 19 anos, eu já tinha quatro filhos.
Eu não sabia o que fazer com as crianças e a mais velha sofreu muito na minha
mão eu tinha 15 anos. Quando eu ganhei a mais velha eu não queria aquela
criança perto de mim, eu não queria saber dela. A minha sogra que cuidou dela.
Eu queria matar a menina. Não! Não! Não! Eu gostava do filho dos outros, mas
os meus, quando nasceu eu entrei em pânico, fiquei louca, com 15 dias dei arroz
pra ela, porque pra mim ela tinha que comer comida como eu comia. Ainda bem
que eu tinha a minha sogra, porque ela que tomou a frente, porque se não minha
filha tinha morrido.
104
Eu não sabia de nada, porque na época eles não ensinavam nada pras meninas,
o negócio da menstruação, por onde sai o neném, como faz neném. Quando eu
engravidei, eu não sabia por onde ela ia sair. Quando ela tava nascendo eu
entrei em pânico” (23).
De maneiras diferentes, outras líderes disseram que não sabiam
como cuidar dos filhos, que passaram por dificuldades e que se tivessem acesso
à Pastoral da Criança naquela época seria muito mais fácil. Assim, pôde-se
observar a importância de uma mulher mais velha na ajuda na criação dos filhos,
e, também, a transformação na vida da família quando a mãe consegue
apreender o que a Pastoral da Criança oferece.
A organização continua acompanhando a família, mesmo diante de
um comportamento pouco cooperativo. Uma explicação para esse fato é que a
Pastoral da Criança possui um estoque grande de capital social, e a presença de
pessoas com comportamento não-cooperativo não afeta a sua existência e
perenização, pois é esperado que a reprodução do capital social investido seja
feita pelos voluntários e não pelas famílias.
Todavia, se na comunidade não houver pessoas interessadas em
se tornar voluntárias da Pastoral da Criança, não haverá produção ou
reprodução de capital social e a comunidade se tornará ‘morta’. Com isso,
entende-se que a reprodução do capital investido pela organização está,
sobretudo, no trabalho dos voluntários, que redistribuem o ativo entre as famílias
acompanhadas. Entretanto, o trabalho será tanto quanto mais efetivo se as
famílias se tornarem, também, multiplicadoras e, portanto, produtoras de capital
social.
Os objetivos do trabalho da Pastoral são bem definidos tanto para
os voluntários quanto para as famílias. Ambos sabem que a atenção da
organização é o acompanhamento do desenvolvimento físico e social da criança
desde o ventre materno até os seis anos. Esse entendimento facilita as relações
entre eles. A família sabe que o líder está entrando em sua casa, não para trazer
doações ou para espionar, mas para cuidar das crianças. E o líder, por sua vez,
não se sente impotente por não conseguir resolver todos os problemas da
família, porque sabe que sua função é acompanhar as crianças.
105
Na medida em que as relações se tornam freqüentes, líder e mãe
acabam conversando sobre outras coisas, sobre os problemas que a família
acompanhada enfrenta (desemprego, fome, violência doméstica etc.). Nesses
casos, o líder é instruído a aconselhar a família e indicar possíveis caminhos
para solucionar o problema, a indicar quem pode ajudar e qual a melhor forma
de se chegar até o serviço. Conforme alguns depoimentos, muitas vezes, o
contato é feito com a mulher da casa (mãe, avó, tia), que se sente, às vezes,
impotente para resolver seus próprios problemas. É aí que a disposição do líder
pode transformar a atitude dessa mulher.
Os vínculos entre os voluntários puderam ser observados durante
as pesagens, as reuniões de avaliação e os treinamentos. Além de fazerem
parte da Pastoral da Criança, eles se reconhecem como moradores de uma
mesma comunidade, que freqüentam a mesma igreja e que compartilham de um
mesmo cotidiano.
Perguntou-se ao voluntário se ele realiza ou já realizou outra
atividade voluntária na Igreja, em outras pastorais, em escolas, creches,
hospitais, postos de saúde, entre outros. Na Tabela 11, verifica-se que apenas
13% se dedicam somente às atividades da Pastoral da Criança e que os 87%
restantes realizam outras atividades voluntárias. Notou-se, também, que 96%
das atividades mencionadas pelos voluntários estão ligadas ou fazem referência
à Igreja Católica: Igreja que freqüenta, Pastoral da Saúde, congregações de
Marianos, Vicentinos e Franciscanos.
Dentre as atividades voluntárias citadas desenvolvidas pelos
entrevistados na Igreja estão: a participação na organização das missas e outras
celebrações religiosas (36%), das festas (31%), das campanhas de arrecadação
(11%). Há ainda aqueles que assumem a responsabilidade de ser catequista
(36%) ou de coordenar grupos de jovens, de casais ou de orações (36%). 11
voluntários (31%) são, também, ministros de eucaristia.
Com isso, pôde-se verificar que as atividades na Pastoral da
Criança influenciam a maior participação do voluntário em outras atividades na
Igreja Católica, ou ao contrário: a participação na Igreja faz com que o fiel se
106
envolva em outras atividades. Assim, percebe-se que o voluntário também faz
parte de um grupo maior, que remete as atividades desenvolvidas no contexto
das paróquias da Igreja Católica a uma cultura associativista.
TABELA 11 – OUTRAS ATIVIDADES VOLUNTÁRIAS (*)
O voluntário realiza ou realizou outras
atividades voluntárias? %
Sim 48 87%
Igreja que freqüenta 36 75%
Hospital ou clínica 6 13%
Pastoral da Saúde 5 10%
Congregação religiosa 5 10%
Creche 3 6%
Sozinho 3 6%
Outros 2 4%
Não 7 13%
Total 55
(*) Respostas múltiplas
A forma com que o voluntário toma conhecimento da Pastoral da
Criança reforça a importância dos vínculos pessoais e comunitários dentro da
Igreja. Dentre os entrevistados, 60% disseram que conheceram a Pastoral da
Criança na Igreja, pelo padre ou por outro freqüentador; 20% conheceram por
algum parente ou amigo. Outros voluntários foram responsáveis por divulgar
entre 16% dos entrevistados, além das três voluntárias que primeiro foram mães
atendidas (Gráfico 16). É interessante notar que nenhum entrevistado disse ter
conhecido a organização pela TV, por outro meio de comunicação ou por outra
instituição. Isso mostra que as relações de vizinhança, à freqüência à Igreja e os
relacionamentos pessoais são importantes para a ampliação e manutenção do
trabalho e para a perenidade do grupo da Pastoral da Criança.
107
GRÁFICO 16 – COMO O VOLUNTÁRIO CONHECEU A PASTORAL DA CRIANÇA
60%
20%
16%
4%
Igreja, padre ou leigo Parente ou amigo der Primeiro foi mãe
atendida
Quando perguntado ao entrevistado quem o chamou para participar
da Pastoral da Criança, apenas 9% disseram que procuraram a organização
espontaneamente. Outros foram chamados pelo padre ou por outro freqüentador
da Igreja ou convidados por algum parente ou amigo. Entretanto, os principais
articuladores da Pastoral da Criança são os próprios voluntários, que têm entre
suas funções identificar na comunidade pessoas que podem se tornar líderes
comunitários (Gráfico 17). Isso reforça a importância dos laços na composição
do grupo. O padre e os leigos, representando a Igreja, anunciam durante as
celebrações, missas, rezas ou catequese, que a Pastoral da Criança está
precisando de voluntários, enquanto as líderes se responsabilizam por efetivar o
convite.
“Eu tinha muitas amigas e já tinha convencido várias delas a participar da
Pastoral, então as líderes acharam que como eu sou moradora daqui [favela],
que tinha condições de conversar e acompanhar as mães, mostrando meus
problemas, o que aconteceu com meus filhos então ia convencer melhor essas
mães a participar da Pastoral e foi isso que aconteceu” (23).
108
GRÁFICO 17 – QUEM CONVIDOU O VOLUNTÁRIO PARA PARTICIPAR DA PASTORAL DA
CRIANÇA
35%
29%
27%
9%
der Parente ou amigo Padre ou leigo Voluntariamente
Com essas últimas questões, percebe-se a importância da Igreja
Católica na formação e ampliação do grupo. Aqui a Igreja empresta, não só o
espaço, mas também a sua credibilidade, o seu capital social para a Pastoral da
Criança.
Outro ponto importante é a baixa participação de pessoas de uma
mesma família, atuando como voluntários. 74,5% dos entrevistados não
possuem parentes trabalhando na organização. Isso revela que, no grupo, a
solidariedade está no campo da sociabilidade secundária. Ainda nesse sentido,
pode-se considerar que, entre essas pessoas, o raio de confiança familiar foi
expandido. Isto é, o voluntário segue um caminho de reconhecimento
comunitário e de expansão de seus relacionamentos para fora dos círculos
familiares e de amizade íntima, característico da cultura associativista e que
proporciona aumento de capital social.
Pode-se inferir que os voluntários da Pastoral da Criança, em cada
comunidade, formam grupos coesos. A princípio, quando o voluntário entra, as
relações estabelecidas entre ele e os outros voluntários são contingentes, ou
seja, ele considera os seus pares como pessoas que estão trabalhando na
Pastoral da Criança e que têm, em comum, a freqüência à mesma Igreja e/ou a
solidariedade com o próximo. Com o passar do tempo, as relações são
estreitadas, devido à constância dos encontros e ao compartilhamento do
109
cotidiano. O tempo de atuação na organização também demonstra a coesão do
grupo, pois a maioria atua na organização há mais de cinco anos (Gráfico 15).
A coesão grupal na Pastoral da Criança não é um fator que torna o
grupo fechado, pois a própria dinâmica da organização impede esse movimento.
O fato de o grupo estar, constantemente, procurando novos líderes e pessoas
para serem acompanhadas, faz com que ele esteja sempre distribuindo o capital
social constituído e não guardando para si os lucros de pertencimento. A
constante renovação com a entrada de novas famílias e voluntários, por sua vez,
faz com que haja pessoas transitando e trazendo novas informações, fatores que
contribuem para a perenização e sustentabilidade do grupo.
Quanto ao relacionamento com as famílias, os voluntários
afirmaram que o vínculo formado ainda é muito fraco, sendo que apenas em
alguns poucos casos as mães desenvolvem um vínculo de amizade com o
voluntário. Dentre as que afirmaram que possuem relações de amizade com as
famílias estão aqueles que estão em situação socioeconômica muito parecida
com a das mães. Porém, como podem ser observadas na Tabela 12, estas
formam uma minoria (12,7%).
Como já foi observado, por ocasião da análise do perfil dos
voluntários, a maioria dos voluntários não vive as mesmas condições sociais
precárias das famílias atendidas. Para reiterar essa inferência, foi perguntado se
o voluntário passou ou ainda passa pelas mesmas dificuldades enfrentadas
pelas famílias acompanhadas. A separação entre ‘ainda passa dificuldades’,
‘passou dificuldades como pai/mãe’ e ‘passou dificuldades como filho(a)’ tentou
apreender se em algum momento a família do voluntário conseguiu mudar a sua
condição socioeconômica. Dentre os entrevistados, 50,9% disseram que nunca
passaram dificuldades, 27,3% passaram dificuldades para criar seus filhos, mas
hoje têm uma situação melhor, e apenas 16,4% ainda passam dificuldades.
Estes últimos alegaram que as famílias que acompanham vivem em uma
situação mais precária que a sua, o que demonstra que aquele que se dispõe a
ajudar é uma pessoa que já conseguiu superar, pelo menos em parte, as suas
dificuldades sociais e financeiras.
110
TABELA 12 – DIFICULDADES VIVIDAS PELO VOLUNTÁRIO, EM RELAÇÃO A RENDA
FAMILIAR
Renda Familiar
1. Nenhuma
Renda
2. Renda
Baixa
3. Renda
Média
4. Renda
Alta
Total
Não
0 0 22 6 28
passou % dificuldades
,0% ,0% 78,6% 21,4% 100,0%
dificuldades % renda familiar
,0% ,0% 55,0% 75,0% 50,9%
% of Total
,0% ,0% 40,0% 10,9% 50,9%
Ainda
1 4 4 0 9
passa % dificuldades
11,1% 44,4% 44,4% ,0% 100,0%
dificuldades % renda familiar
100,0% 66,7% 10,0% ,0% 16,4%
% of Total
1,8% 7,3% 7,3% ,0% 16,4%
Passou
0 0 3 0 3
dificuldades % dificuldades
,0% ,0% 100,0% ,0% 100,0%
como % renda familiar
,0% ,0% 7,5% ,0% 5,5%
filho/a % of Total
,0% ,0% 5,5% ,0% 5,5%
Passou
0 2 11 2 15
dificuldades % dificuldades
,0% 13,3% 73,3% 13,3% 100,0%
como % renda familiar
,0% 33,3% 27,5% 25,0% 27,3%
pai/mãe % Total
,0% 3,6% 20,0% 3,6% 27,3%
1 6 40 8 55
% dificuldades
1,8% 10,9% 72,7% 14,5% 100,0%
% renda familiar
100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%
Total
% of Total
1,8% 10,9% 72,7% 14,5% 100,0%
Entre os voluntários e as famílias, as relações estabelecidas, na
maioria das vezes, não superam a dinâmica utilitarista, como alertou Caillé
(2002) ao tratar sobre a solidariedade dos tempos atuais. Segundo depoimentos
dos voluntários, as mães vêem os líderes como facilitadores ou como
prestadores de um serviço assistencial, pois as famílias, muitas vezes, só estão
interessadas na multimistura ou no presente que é dado nas datas
comemorativas. Um fato constatado pelos voluntários é que, nos meses que
antecedem o Dia das Crianças e o Natal, o número de mães que comparecem
às pesagens aumenta por causa dos presentes que são oferecidos nessas
ocasiões.
“A gente fala para a mãe ir no final da feira para pegar o que sobra, mas ela não
vai às vezes por preguiça ou por vergonha mesmo” (1).
“O pessoal da minha comunidade [mães] é muito sossegado, está mais
querendo pegar o peixe pronto. A Pastoral dá oportunidade para as pessoas de
gerar emprego [cursos], mas tudo que você faz o pessoal não vai. Tem um
111
núcleo da Igreja lá em cima [morro]. No dia da cesta básica tem um monte de
gente, é lindo e maravilhoso. No dia de festa de arrecadação, no dia de
celebração [missa], ninguém aparece. Por quê? Porque não é de interesse deles
[famílias]. Tem gente que deixa de fazer a compra do mês porque sabe que tem
cesta básica lá” (9).
No dia da pesagem, os voluntários, geralmente, chamam algum
profissional da área da saúde, um nutricionista, ou alguém para falar sobre
políticas públicas para as mães. No entanto, segundo os relatos, há pouco
interesse por parte das mães nesse tipo de ação. Entretanto, eles não desistem,
pois sabem que mesmo que o alcance seja mínimo, alguém terá absorvido o
conhecimento.
O voluntário também ajuda a família em questões que não fazem
parte das ações propostas pela Pastoral da Criança. 73% dos entrevistados
disseram ser solicitados pela família em outros assuntos. Dentre estes, apenas
20% afirmaram que a família pede doações. 45% disseram que as famílias
pedem ajuda no que diz respeito a problemas de relacionamento familiar; 35%
perguntam sobre a saúde de outras pessoas da família (Tabela 13). Portanto,
observa-se que a ajuda simbólica prevalece sobre a material.
“Eu convido sempre elas para virem a missa, falo que tem uma creche ali que
tem vaga, que tem uma escola ali que também tem vaga. E também quando
alguém tem algum problema, já tem um que fala: ‘Chama a Neuma’” (53).
“Eu pareço psicóloga [...] às vezes ela não tem uma mãe, não tem um pai, uma
pessoa amiga, então ela vem conversar com a gente, e a gente faz o papel de
tudo isso” (23).
“Não que a gente seja chamada para resolver, mas você percebe, depois de um
tempo, com a afinidade com a mãe, você vai se entrosando, vai conhecendo
aquela mãe, você vai percebendo na carinha dela que ela não está bem. E ela
acaba se abrindo com você, não que você seja chamado para resolver, mas
acaba orientando” (1)
112
TABELA 13 – OS VOLUNTÁRIOS SÃO SOLICITADOS PELAS FAMÍLIAS PARA AJUDAR EM
QUESTÕES NÃO RELACIONADAS À PASTORAL DA CRIANÇA? (*)
%
Sim 40 73%
Problemas de relacionamento familiar
18 45%
Saúde de outras pessoas da família
14 35%
Diversos
8 20%
Doações
8 20%
Direitos civis
4 10%
Alimentação
38%
Celebrações católicas
13%
Não 15 27%
Total 55
(*) Respostas múltiplas
A interação dos voluntários com as famílias ocorre na participação
em festas e celebrações organizadas pelas famílias. Dentre as festividades mais
citadas estão os aniversários, os chás de bebês, e quando são chamadas para
serem madrinhas de batizado. Duas líderes declararam que uma das crianças
que acompanham freqüenta a sua casa, chegando, às vezes, a passar o final de
semana. Assim, pode-se afirmar que há uma boa receptividade das famílias em
relação aos voluntários, apesar de alguns líderes declararem que são chamados,
mas que preferem não ir (Tabela 14).
113
TABELA 14 – OS VOLUNTÁRIOS SÃO CHAMADOS PARA AS COMEMORAÇÕES DAS
FAMÍLIAS (*)
%
Sim
35 64%
Aniversário da criança
14 40%
Diversas
9 26%
Chá de Bebê
6 17%
Madrinha de Batizado
5 14%
As mães chamam, mas ele não vai.
4 11%
Batizado
4 11%
Casamento
4 11%
Uma das crianças dorme na sua casa
26%
Madrinha de Casamento
13%
Não
20 36%
Total 55
(*) Respostas múltiplas
O interconhecimento acontece quando o líder estabelece a relação
com a família. Eles se conhecem e passam a fazer parte de uma mesma rede. O
inter-reconhecimento surge à medida que os relacionamentos se tornam
constantes, por meio das visitas e pesagens, em que ambos se reconhecem
como moradores de uma mesma localidade, que ultrapassaram a barreira da
simples proximidade física. Assim, eles se reconhecem e se cumprimentam nos
espaços públicos, se relacionam. Isso também ajuda na melhora da auto-estima
da família, pois, dentro dessa rede, é quebrada a invisibilidade provocada pela
exclusão social. Entre os voluntários, o inter-reconhecimento surge quando
compartilham suas experiências, seu cotidiano, trocam conhecimentos, afetos e
são cultivadas semelhanças.
“As mães têm necessidade de afeto, de carinho, de atenção, de amigos [...] Se
você tocar, dar um beijo mais carinhoso, elas se tornam suas amigas. [...] Elas
são bem carentes de afeto e elas não tendo afeto, elas, muitas vezes, não
passam afeto para os filhos”(8).
A identidade coletiva no grupo da Pastoral da Criança de Santos é
construída, não só pela solidariedade e pela proximidade física, mas também
114
pelo fato de que, no grupo, predomina mulheres que são mães. Isso faz com que
o voluntário se coloque no lugar da mãe preocupada com a criação dos seus
filhos. Isso fortalece tanto o vínculo entre famílias e voluntários, quanto a
construção da identidade coletiva, apesar das condições socioeconômicas serem
diferentes.
Perguntou-se a uma líder se a função que ela exerce hoje não é o
papel que, usualmente, seria de responsabilidade das mulheres mais velhas de
uma família. Ela respondeu que sim, mas que a mulher acompanhada pela
Pastoral, geralmente, não tem sua mãe presente, ou, ainda, que a avó da
criança, muitas vezes, também não sabe como instruir a filha nos cuidados com
a criança, porque não aprendeu nada com a sua mãe. Isso leva a entender que
na Pastoral da Criança o trabalho é, predominantemente, de mulheres, porque
caracteriza uma dinâmica social que, historicamente, é exercida por elas. Assim,
devido ao enfraquecimento dos vínculos familiares, é necessária a presença de
alguém externo ao contexto familiar para reativar as competências familiares.
Desse modo, nas famílias acompanhadas, uma prática usualmente exercida no
âmbito da sociabilidade primária passa a acontecer no contexto da sociabilidade
secundária.
“Têm uma senhora [avó] que criticava muito a filha porque ela tem quatro filhos,
e hoje ela critica também a nora que está no segundo filho e essa moça chora...
[...] Elas não têm apoio da família para criar os filhos.” (1)
“Eu ajudo em tudo, acompanho o pré-natal, vou na assistente social, dou
enxoval, tem uma moça que monta e me dá todo mês. Quando ela não tem a
mãe para ajudar eu vou lá e dou o primeiro banho, cuido do umbigo e cuido dela”
(23).
A Pastoral da Criança forma uma rede de mulheres (mães e
voluntárias) que, em um processo de ajuda-mútua, trabalham para o
desenvolvimento sadio das crianças da comunidade. Na rede de voluntários e
famílias existem trocas materiais e simbólicas. Entre as trocas materiais estão o
serviço prestado, o acompanhamento mensal, a entrega da multimistura, os
dados enviados e recebidos da coordenação nacional, as doações em dinheiro
115
ou em espécie recebida pelos níveis comunitário, municipal, estadual e nacional,
a festa que é oferecida no Dia da Celebração da Vida, entre outras.
Entre as trocas simbólicas apresenta-se o cuidado que o voluntário
tem com a criança e com a família, as conversas, os saberes fornecidos pela
organização e multiplicados entre os voluntários, a experiência de vida tanto dos
voluntários quanto das famílias, as mensagens que apóiam e revigoram a
caminhada, todos esses, bens simbólicos permeados por solidariedade,
compaixão, amor (mãe e filho), amizades etc.
“Eu era muito calada e achava que não ia conseguir, com o trabalho fui me
soltando, fui vendo que era capaz e que era importante naquela família. A gente
acaba vendo que a família está se sentindo bem com você quando a gente faz a
visita. Isso levanta a auto-estima. É uma troca” (1).
As coisas e sentimentos são intercambiados, gratuitamente, sem
uma expectativa de retorno, e, por isso, podem ser reconhecidos como dádivas,
ainda mais quando o objetivo da organização está no fortalecimento dos vínculos
comunitários e familiares dos indivíduos que fazem parte dessa rede.
A comprovação está na resposta à questão sobre como o
voluntário descreve a Pastoral da Criança. Primeiramente, selecionou-se a
primeira frase que foi dita; a partir disso, verificou-se a recorrência no discurso
dos voluntários de ações como: acompanhar, cuidar, ajudar, ensinar, combater,
dar e transformar e aprender. Dentre os substantivos que acompanham esses
verbos têm-se maior recorrência das palavras criança, mãe, família, desnutrição,
alimentação, assistência, amamentação, saúde entre outras que foram citadas
apenas uma vez. Com isso, percebe-se o que é mais importante na organização,
na visão do voluntário. Tem-se, portanto, na visão dos voluntários entrevistados,
que acompanhar e cuidar são suas principais ações e que os objetos principais
dessas ações são as crianças, as mães, as famílias e a desnutrição (Tabela 15).
Ainda na análise da primeira fala dos entrevistados, fazendo uma
descrição mais detalhada sobre a questão do ‘dar’, observou-se que este estava
relacionado a coisas imateriais como dar amor, assistência, vida e recursos
humanitários.
116
TABELA 15 – COMO O VOLUNTÁRIO DESCREVE A PASTORAL DA CRIANÇA: ANÁLISE
DA PRIMEIRA FRASE DITA PELO VOLUNTÁRIO (*)
O que a Pastoral faz... ?
Nº %
Acompanhar
14 25%
Cuidar
10 18%
Ajudar
8 15%
Ensinar
6 11%
Combater
59%
Dar
59%
Transformar
59%
Aprender
24%
55
... para quem ou o que?
%
Criança
17 31%
Mãe
8 15%
Família
8 15%
Desnutrição
8 15%
Alimentação
35%
Assistência
35%
Amamentação
24%
Saúde
24%
55
(*) Respostas múltiplas
Na análise do discurso completo de cada voluntário, tem-se, na
Tabela 16, que 65% caracterizaram a Pastoral da Criança de alguma forma,
dentre os quais 41,7% consideraram o que fazem como um trabalho ou como um
trabalho voluntário; 22,2% consideraram a organização como uma ajuda ou
apoio. Termos como equipe, meio de comunicação e movimento apareceram
apenas uma vez.
117
TABELA 16 – COMO O VOLUNTÁRIO CARACTERIZA O TRABALHO DA PASTORAL DA
CRIANÇA (*)
Nº %
Caracterizou 36 65%
Trabalho ou trabalho voluntário 15 41,7%
Ajuda ou apoio 8 22,2%
Acompanhamento 5 13,9%
Entidade ou ONG 5 13,9%
Equipe 1 2,8%
Meio de comunicação 1 2,8%
Movimento 1 2,8%
Não caracterizou 19 35%
Total 55 100%
(*) Respostas múltiplas
A importância dos diversos atores que compõem a rede da Pastoral
da Criança pode ser observada na Tabela 17, na qual 85% dos entrevistados
citaram a figura da criança em seu trabalho; 53% falaram sobre a mãe; 29%
sobre as gestantes; a família e a comunidade foram citados por
aproximadamente 20%; e apenas 1 voluntário apontou a figura do pai.
TABELA 17 – INDIVÍDUOS CITADOS PELO VOLUNTÁRIO NA DESCRIÇÃO DA PASTORAL
DA CRIANÇA (*)
%
Criança 47
85%
Mãe 29
53%
Gestante 16
29%
Comunidade 11
20%
Família 11
20%
Pai 1
2%
Entrevistados 55
(*) Respostas múltiplas
Dessa forma, percebe-se que o trabalho desenvolvido é um serviço
quando o voluntário utiliza termos como acompanhar, ajudar, atender, monitorar,
tratar, visitar e observar, os quais representam fatores materiais, no
118
relacionamento entre voluntários e famílias. Já a questão da transformação, um
fator simbólico, começa quando o voluntário entende que, além do serviço, ele
está junto com a família para ensinar, orientar e incentivar, termos também
presentes no discurso dos entrevistados.
Ainda na pergunta sobre como o voluntário descreve a Pastoral da
Criança, todos os voluntários citaram um ou mais fatores materiais em seu
discurso, enquanto os fatores simbólicos do trabalho foram citados por 80% dos
entrevistados. Entre os itens materiais mais lembrados estão as pesagens, a
alimentação, a saúde, a desnutrição, a multimistura, o desenvolvimento das
crianças e os remédios caseiros. Entre os menos lembrados foram os cursos de
alfabetização, a higiene e as reuniões (Tabela 18).
119
TABELA 18 – FATORES MATERIAIS PRESENTES NA DESCRIÇÃO DO VOLUNTÁRIO
SOBRE A PASTORAL DA CRIANÇA (*)
%
Monitoramento 34 62%
Pesagens 23 42%
Desenvolvimento das crianças 11 20%
Recursos materiais 27 49%
Multimistura 13 24%
Doações 7 13%
Lanche 7 13%
Ações básicas 78 142%
Alimentação 20 36%
Saúde 15 27%
Desnutrição 13 24%
Remédios caseiros 10 18%
Amamentação 7 13%
Vacinação 5 9%
Brinquedos e brincadeiras 3 5%
Pré-natal 3 5%
Higiene 2 4%
Trabalho do líder 10 18%
Caderno 3 5%
Cursos 3 5%
Aprendizado mútuo 2 4%
Alfabetização 1 2%
Reuniões 1 2%
(*) Respostas múltiplas
Entre os fatores simbólicos mais citados estão os conhecimentos
oferecidos pela organização e/ou transmitidos pelo voluntário e a orientação
oferecida às famílias. Quando o voluntário fala que a Pastoral da Criança dá ou
120
fortalece a vida, está dizendo que o seu trabalho, não somente combate a
mortalidade infantil e materna, mas também ajuda no desenvolvimento das
crianças, para que elas possam ter uma vida adulta mais saudável, além de
ajudar a família a manter um ambiente saudável para que essas crianças
cresçam (Tabela 19).
“As pessoas aqui da comunidade acham que a Pastoral está ali para dar as
coisas e a gente mostra que é pró-vida mesmo. Que a gente está ali para
explicar que por mais simples que ele seja, pode ter uma alimentação adequada.
A Pastoral é a busca da vida” (9)
Fatores como espiritualidade, transformação, auto-estima, entre
outros, já foram comentados no contexto motivacional, e reaparecem, aqui, para
reforçar que o que motiva o voluntário está implícito, também, no trabalho da
organização, por isso, a identificação dele com esse trabalho (Tabela 19).
TABELA 19 – FATORES SIMBÓLICOS PRESENTES NA DESCRIÇÃO DO VOLUNTÁRIO
Fatores simbólicos %
Conhecimento 18 41%
Orientação 15 34%
Vida 10 23%
Espiritualidade 9 20%
Transformação 9 20%
Auto-estima 5 11%
Cuidado 5 11%
Incentivo 5 11%
Amor 2 5%
Dedicação 2 5%
Gratificação 2 5%
Ouvir 2 5%
Confiança 1 2%
Entrevistados 44
(*) Respostas múltiplas
121
O relacionamento entre famílias e voluntários favorece o
fechamento do círculo da dádiva proposto por Mauss (1950). No contato direto,
as dádivas são oferecidas, recebidas e retribuídas no mesmo momento. Por
exemplo, o líder chega para visitar a família (dar), logo que chega a criança já
corre para cumprimentá-la com um beijo e um abraço e a mãe também o recebe
bem (receber). O círculo se fecha quando o líder consegue observar o
desenvolvimento da criança devido aos cuidados da mãe (retribuir).
“Você pode ter mais estudo que elas, mas às vezes você vai numa casa, visita e
conversa com aquela mãe e quando você sai de lá, você pensa assim: ‘Puxa
vida, que lição de vida que ela me deu’, porque ela não tem estudo nenhum, mas
tem uma experiência de vida, ela tem uma bagagem que te deixa surpresa, ela te
ensina uma porção de coisas” (8).
Acredita-se que o grande diferencial da Pastoral da Criança é o
contato direto e constante entre os voluntários e as famílias, o que favorece a
circularidade da tripla obrigação da dádiva e também a manutenção da dívida
positiva entre eles: o líder leva conhecimentos e atenção à família e recebe das
crianças e dos adultos bens que não têm valor material como carinho, um beijo,
o ser reconhecido na rua, ou mesmo a transformação da mãe e o crescimento
saudável da criança. Conseguir ver os resultados do trabalho é uma forma de
retribuição que o líder recebe pela dádiva que ofertou.
“É bom ouvir: ‘que bom que a senhora estava comigo quando eu precisei de uma
força’” (1)
O relato de uma líder dizia que na primeira visita a um barraco em
uma das favelas da cidade, a casa estava desarrumada, suja e mal cheirosa e as
crianças também estavam sujas e desarrumadas. As duas líderes entraram,
conversaram com a mãe que aceitou ter suas crianças acompanhadas e foi
marcada a visita para o próximo mês. Na segunda visita, a mãe arrumou e
limpou a casa, deu banho nas crianças e até colocou uma flor sobre a mesa da
cozinha. A líder disse que era um vidro de maionese vazio com água e uma flor
dentro, mas tudo isso era para receber as líderes. Ora, isso já foi o início da
transformação dessa família. O fato de que as líderes fariam uma visita fez com
que a mãe, supostamente acomodada, recebesse um incentivo que a fez querer
se mostrar melhor. A líder concluiu a história dizendo que a transformação dessa
122
família aconteceu, pois essa mãe hoje trabalha, e mesmo as crianças que já
tinham passado dos seis anos estão se desenvolvendo melhor.
Na Tabela 20, observam-se os fatores que determinam a satisfação
do voluntário com a Pastoral da Criança. 71% se dizem satisfeitos, 18% estão
satisfeitos, mas têm algumas coisas que eles acreditam que podem melhorar, e,
apenas, 11% estão insatisfeitos. Os principais motivos são a satisfação com os
resultados do próprio trabalho e com o trabalho da equipe (45%), os
relacionamentos que o voluntário faz no dia-a-dia com as famílias e com a
equipe, o reconhecimento pelo seu trabalho e por ser reconhecido na rua pelas
famílias e pelas crianças nos espaços públicos. Esses motivos de satisfação
acabam sendo muito parecidos com as forças motivacionais que mantêm o
voluntário ativo. Acredita-se que estas se auto-reforçam, como num círculo
virtuoso, por exemplo, quanto mais o voluntário fica satisfeito com os resultados
do seu trabalho mais isso o motiva, e o mesmo vale para os relacionamentos,
para o reconhecimento, para as coisas que ele aprende e ensina.
Já dentre os fatores apontados por aqueles que estão insatisfeitos
e por aqueles que acreditam que a proposta da Pastoral da Criança pode
melhorar, têm-se a falta de pessoas para trabalhar, a falta de comprometimento
dos voluntários e a falta de comprometimento das mães. É interessante notar
que os principais motivos de insatisfação são fatores simbólicos como
participação e comprometimento.
“Tem voluntário que prefere ser apoio porque não tem tanto compromisso” (1).
Dentre os insatisfeitos, três acham que a Pastoral da Criança
deveria ter um espaço próprio em cada comunidade, para que as mães possam
procurar sempre que necessário. Outros dizem que a organização poderia ajudar
mais em outras áreas. Em uma das comunidades, uma líder reclamou que não
havia a mística (ou espiritualidade) na Celebração da Vida, na sua comunidade.
Apenas uma disse que estava insatisfeita porque não há dinheiro para trabalhar.
Outra diz que não vê resultado em seu trabalho.
123
A questão da pouca colaboração levantada por alguns voluntários
se deve ao fato de que, ao ingressar, as pessoas acham que o trabalho se
baseia apenas nas visitas. Mas na verdade, o trabalho é árduo, e a convivência
com as famílias, e a aproximação com as mazelas que elas vivem, muitas vezes,
fazem os entrantes desistirem. Com isso, pode-se ver que as pessoas hoje não
estão prontas para enfrentar a realidade vivida pelos mais pobres. Estes estão
escondidos em guetos, nas franjas das cidades e, muitas vezes, são
considerados invisíveis. A partir do momento em que o voluntário se aproxima
dessa realidade e da incapacidade de resolver problemas tão complexos, ele
começa a desistir.
“Ter humildade é muito importante, se você não chegar no nível da mãe, você
não entende ela de maneira nenhuma. Quantas vezes eu já me perguntei ‘Se eu
estivesse na situação dela eu não seria pior que ela?’” (8).
TABELA 20 – FATORES DE SATISFAÇÃO E INSATISFAÇÃO DOS VOLUNTÁRIOS COM A
PASTORAL DA CRIANÇA (*)
Fatores de satisfação %
Resultados
22 45%
Relacionamentos
11 22%
Reconhecimento
10 20%
Aprendizado
5 10%
Religiosidade
5 10%
Ajuda
36%
Transparência
12%
Entrevistados
49
Fatores de Insatisfação
%
Poucos voluntários 6 38%
Pouco comprometimento dos voluntários 5 31%
Pouco comprometimento das mães 4 25%
Não tem espaço próprio 4 25%
Poderia ajudar mais 3 19%
Pouco dinheiro 3 19%
Falta a mística 1 6%
Não está vendo resultados 1 6%
Não tem ajuda do padre da igreja 1 6%
Entrevistados 16
(*) Respostas múltiplas
124
Muitas vezes, a família não quer receber o líder comunitário, e
somente depois de muita insistência é que se começa o acompanhamento. A
desconfiança generalizada faz com que, inclusive, quem vem para ajudar seja
tratado com receio. Ciente disso, a organização privilegia a atuação de pessoas
da própria comunidade, pois, sendo conhecido na comunidade, o voluntário vai
ser recebido com mais facilidade pelas famílias, além do que, essas pessoas
estão mais próximas dos problemas das famílias, pois vivem na mesma
realidade.
“No começo elas [as mães] nem chamavam para entrar, a gente tinha que ficar
na porta” (1).
“Eu sou vizinha das mães. Eu divido meu arroz, eu divido meu feijão, se tiver que
dividir, eu divido com qualquer uma delas [...]. Aqui ninguém passa fome, mas
sempre precisa de uma cesta básica, tem que estar sempre ajudando. [...] Se
você ganha uma cesta básica, já tem o dinheiro para completar a conta de água
ou de luz, comprar um chinelo pro meu menino, uma calça pro outro, fralda
descartável pro outro (53).”
“Às vezes, as mães falam assim: “Eu não vou, porque vocês sabem tanto” e no
fim não é nada disso, porque aquelas que sabem menos vai fazer muito mais”
(8).
Em Santos, a maioria dos líderes não mora na mesma comunidade
que as mães, ou ainda, não tem a mesma situação socioeconômica das famílias.
Assim, no início, precisam identificar algum morador que possa guiá-lo dentro da
favela, ou que os deixe entrar no cortiço. Geralmente, o contato com a mãe é
feito na rua: o líder aborda o adulto que está com a criança e pergunta se
aceitaria ser acompanhado pela Pastoral da Criança. Depois de inserido na
comunidade, o voluntário tem passagem livre.
Outro problema encontrado e citado como fator de insatisfação é
quando as mães não se comprometem. Os voluntários ensinam sobre
alimentação, higiene, atenção com as crianças etc. e algumas mães não fazem
uma alimentação saudável para a criança, e, não raro na hora da visita, as
crianças estão sujas e, por vezes, doentes. Isso acontece, provavelmente, por
estar relacionado a outros fatores como desemprego, depressão, alcoolismo,
drogas, violência doméstica e na comunidade. O voluntário tem que estar atento
125
ao contexto familiar, antes de julgar ou recriminar a mãe. A presença de outro
líder na hora da visita ajuda a tomar conhecimento da situação e a auxiliar essa
família da melhor forma possível. Um exemplo disso está na história contada por
uma líder na qual a mãe, para não sentir fome, dormia até tarde e fazia com que
os filhos dormissem também, pois ficando menos tempo acordados comeriam
menos. Ela concluiu seu relato afirmando que aprendeu a primeiro analisar a
fundo a situação da família para depois fazer os julgamentos.
O grupo é de extrema importância na reanimação. Isso é feito nas
reuniões e nos aconselhamentos com as coordenações e com outros mais
experientes, o que ajuda a manter a caminhada. Estar na paixão do outro,
compartilhar seu dia-a-dia não é fácil. O trabalho voluntário comunitário de ajuda-
mútua transforma a vida do voluntário, como se pode observar na Tabela 21.
Apenas um número relativamente reduzido de entrevistados disse
não ter havido mudanças pessoais, depois do início do trabalho na Pastoral da
Criança. Dos 96% que apontaram alguma mudança, 43% disseram que o
treinamento e o contato direto com as famílias mudaram o seu modo de pensar e
agir. 38% se diz mais paciente e tolerante consigo e com os outros. Já os
conhecimentos oferecidos pela organização foram fator de mudança para 29%
dos entrevistados. Outros 31% acreditam que hoje são mais participativos, e
25% melhoram a auto-estima. A proposta do trabalho voluntário comunitário é a
potencialização da vontade de ajudar, e isso pode ser comprovado com a
resposta de 20% dos entrevistados que disseram que aprenderam a ajudar.
“Quando você vê os problemas das mães percebe que não tem problema
nenhum e que só tem que agradecer” (8).
“Quando eu chego em casa da pesagem estou muito cansada, porque dar
comida e pesar cansa muito, mas minha filha diz que eu estou com outra cara. A
gente vem bem porque gosta do trabalho” (1).
126
TABELA 21 – MUDANÇAS PESSOAIS DEVIDO AO TRABALHO NA PASTORAL DA
CRIANÇA (*)
Houve mudanças? %
Sim 53 96%
Modo de agir e pensar 23 42%
Mais paciente e tolerante 21 38%
Mais participativo 17 31%
Aprendeu sobre diversos assuntos 16 29%
Melhorou a auto-estima 14 25%
Aprendeu a ajudar 11 20%
Não 2 4%
Total 55
(*) Respostas múltiplas
Por meio das informações descritas neste capítulo, pôde-se
verificar que a rede de voluntários da Pastoral da Criança forma um grupo coeso
e produtor de capital social e que trabalha constantemente na distribuição desse
capital. O grupo amplia as suas relações comunitárias e fortalece as famílias
com as quais desenvolve o trabalho proposto pela organização. O grupo também
enfrenta problemas como a falta de pessoas e o pouco comprometimento das
famílias. Contudo, os voluntários seguem fazendo o trabalho, motivados,
principalmente, pela vontade de ajudar e pelo relacionamento com as famílias.
127
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A mortalidade infantil é um dos mais sensíveis indicadores de
pobreza. O combate eficaz a ela está ligado, principalmente, a ações preventivas
como incentivo ao pré-natal, a conscientização da mãe na importância da
amamentação, da alimentação saudável e da vacinação, entre outras coisas.
Quando, nos primeiros seis anos de vida da criança, ela recebe os cuidados de
saúde e alimentação necessários, ela, conseqüentemente, apresenta uma vida
adulta mais saudável também. Nesse contexto, o ambiente familiar é de extrema
importância.
A Pastoral da Criança combate a mortalidade infantil, por meio do
fortalecimento das competências familiares e do acompanhamento da saúde e
do desenvolvimento psicomotor das crianças. A ação social proposta pela
organização mobiliza voluntários e famílias para a participação social, gerando
fortalecimento da coesão familiar e ampliação do raio de confiança, fruto da
disseminação de vínculos para fora do ambiente da sociabilidade primária.
Portanto, proporciona um ambiente para produção de capital social.
Contudo, hoje, principalmente entre famílias de comunidades
pobres que convivem diariamente com falta de oportunidade, com violência, com
as drogas, com a miséria, com a fome, com o lixo, entre outros tantos problemas,
os vínculos intrafamiliares se tornam fracos, reproduzindo relacionamentos, tanto
internos quanto externos ao círculo familiar, ainda mais fracos. A pessoa em
situação de pobreza, muitas vezes, se sente isolada, por ser excluída
socialmente, e não consegue perceber os vínculos que possui e que podem dar
suporte e ajudá-la a superar suas dificuldades. Eles não conseguem se vir como
sujeitos de possibilidades, mas sim como reprodutores da miséria que os assola
há gerações. O trabalho de fortalecimento de vínculos familiares, desenvolvido
128
pelos voluntários da Pastoral da Criança, tenta reverter esse quadro. O
voluntário se relaciona com as famílias, forma novos vínculos, ou transforma as
relações contingentes em relações produtoras de capital social, isto é, relações
úteis para ambos, eletivas e, possivelmente, perenes.
Na análise sobre o trabalho dos voluntários, pôde-se observar que
os vínculos formados nas relações ‘voluntário-família’ ainda são fracos, e que
reproduzem uma dinâmica utilitarista, mas, mais pela pouca receptividade aos
conhecimentos trazidos pelo voluntário e da baixa cooperação do segundo ator,
do que pela disposição do voluntário. As famílias enfrentam problemas
estruturais como fome, desemprego e violência, e precisam, primeiro, ter
saciadas as suas necessidades fisiológicas, para que consigam assimilar o que a
Pastoral da Criança está trazendo, ou seja, o conhecimento.
Na rede formada pela Pastoral da Criança são efetuadas trocas
materiais e simbólicas. Dentre as trocas materiais estão as visitas, as pesagens,
a multimistura; entre as trocas simbólicas estão a orientação, as conversas, o
reconhecimento, a religiosidade entre outros. Todos esses elementos são
trocados, gratuitamente. Para o voluntário, os ganhos desse trabalho estão,
fundamentalmente, relacionados aos resultados dos seus esforços, que é o bem-
estar do outro, ou seja, o desenvolvimento da criança. Portanto, o objetivo da
dádiva – o fortalecimento dos vínculos sociais – está representado, quando se
percebe que o que é ofertado está sendo retribuído com o bem estar de quem
recebeu.
Verificou-se que o capital social é produzido mais pelos voluntários
do que pelas famílias, e que as famílias consomem mais do que produzem. Mas
o comportamento pouco cooperativo da família não afeta a perenidade da
organização, pois os voluntários são preparados para suportar essa carga de
trabalho extra, com informações das dificuldades que poderão enfrentar e pelo
recebimento de apoio dos mais antigos para suportá-las, superá-las e
transformá-las. Entretanto, o trabalho seria muito mais eficaz se as famílias se
transformassem também em multiplicadoras do conhecimento oferecido pela
Pastoral da Criança. Mas um passo importante está sendo dado para o
129
crescimento do capital social, quando a organização consegue mobilizar
voluntários para desenvolver o trabalho comunitário.
A motivação que mantém o voluntário ligado à organização é vista,
basicamente, no ajudar o próximo e na importância dos relacionamentos
voluntário-voluntário e voluntário-família, sendo que o que mais o satisfaz no seu
trabalho são os resultados e os relacionamentos proporcionados por ele, fatores
esses, essenciais para a produção de capital social.
O diferencial do trabalho da Pastoral da Criança, no que diz
respeito à prática de voluntariado, é determinado por diversos fatores. Primeiro
pela clara definição dos objetivos e dos resultados a serem alcançados pelos
voluntários e também porque a organização coloca o voluntário como o principal
responsável pelo desenvolvimento do seu trabalho. Desse modo, ele é
protagonista de sua ação e agente ativo em sua comunidade, e, assim, se sente
realmente útil e não apenas um coadjuvante, como acontece em outras
instituições, nas quais, geralmente são delegadas, aos voluntários, funções
secundárias como dar comida, brincar com crianças, contar histórias, em que o
voluntário não toma conhecimento do processo do todo, o que, não raro, o
desmotiva.
O contato direto entre voluntário e beneficiário também proporciona
à organização um diferencial. Muitas vezes, o voluntário tem pouco contato com
o seu público alvo ou até mesmo com outros voluntários. O trabalho na Pastoral
da Criança proporciona o contato direto e constante entre voluntários e famílias,
proporcionando, assim, um ambiente para a produção de capital social.
Outro fator de sucesso é a eficiente sistematização dos
treinamentos e do fluxo de informações proporcionados pela organização. Cada
comunidade envia suas informações para a coordenação nacional, em Curitiba,
PR, e essas informações são compiladas e divulgadas para todos. Isso faz com
que cada líder comunitário se sinta parte integrante de uma grande organização,
além de saber que seu trabalho está contribuindo para manter viva uma
solidariedade que percorre o Brasil todo.
130
A identidade coletiva dessa rede de solidariedade social, apesar
das diferenças socioeconômicas entre voluntários e famílias, está no fato de que
a maioria são mulheres e mães, que estão transmitindo conhecimentos sobre
como cuidar dos filhos e de sua família. Isto representa uma dinâmica histórica,
na qual as mulheres mais velhas de uma família eram responsáveis por ensinar
as mais novas nessa função. A relevância disso está no fato de que aquilo que
acontecia no contexto da sociabilidade primária – entre as mulheres de uma
mesma família – hoje está sendo feito em ambientes de sociabilidade
secundária, necessitando de pessoas de fora, como os voluntários da Pastoral
da Criança.
Apesar de ser uma organização ecumênica, a Igreja Católica tem
um papel importante na formação da equipe de voluntários, pois muitos dos
entrevistados disseram que conheceram a Pastoral da Criança na Igreja e que
foram chamados para participar por alguém, também, da igreja, além do fato de
que muitos dos voluntários que hoje atuam na Pastoral da Criança desenvolvem
outros trabalhos voluntários dentro da própria paróquia.
Muito do que é desenvolvido na Pastoral da Criança segue as
Diretrizes Pastorais da Igreja Católica e os exemplos das Comunidades Eclesiais
de Base, no que diz respeito à forma de inserção nas comunidades, à animação
das equipes, aos treinamentos, às formas de celebração, entre outras coisas.
No que diz respeito à herança de capital social, pôde-se constatar
que a experiência da Igreja em trabalhos comunitários transmite credibilidade à
Pastoral da Criança. Esta, por sua vez, ao desenvolver um trabalho eficaz,
reproduz o capital social herdado e infere ainda mais credibilidade, tanto para a
Igreja, quanto para outros trabalhos pastorais.
Verificou-se que a Pastoral da Criança é uma rede, e que para que
uma comunidade esteja ‘viva’ ela depende da constância das relações
estabelecidas entre voluntários e famílias. Mesmo se houvesse uma casa ou se
existisse uma placa na porta de uma igreja, se não fosse pelas visitas, pelas
conversas, enfim, pelos vínculos, não existiria Pastoral da Criança. Portanto, a
131
reprodução de capital social depende da constante ativação da rede, pelo
trabalho de cooperação entre voluntários e famílias.
Assim, todas as dimensões propostas por Bourdieu (1980) e por
Putnam (1994) puderam ser constatados nos trabalhos da Pastoral da Criança
em Santos: organização em rede, utilidade, participação, cooperação, ajuda-
mútua, interconhecimento e inter-reconhecimento. A dinâmica não-utilitária da
dádiva, por sua vez, ajudou no entendimento das trocas em rede, no contexto do
trabalho voluntário.
Concluindo, a Pastoral da Criança, por meio de suas estratégias de
atuação, pode ser considerada como uma incentivadora da base do capital
social, tanto quando incentiva o trabalho voluntário quanto quando fortalece os
vínculos familiares. A organização propõe objetivos claros e simples que
contribuem para a perenização dos processos de colaboração comunitária.
A Pastoral da Criança articula uma rede formada por famílias
acompanhadas, voluntários e outros atores da sociedade. Este trabalho verificou
a produção de capital social entre os voluntários, isto é, na perspectiva de quem
ajuda e não de quem é ajudado. Assim, deixam-se, aqui, duas propostas para
pesquisa futuras: abordar a produção de capital social entre as famílias
acompanhadas; e verificar a interação da Pastoral da Criança com diversos
atores da sociedade (poder público, iniciativa privada e sociedade civil),
mobilizados no cuidado com as gestantes e com as famílias que possuem
crianças de zero a seis anos.
132
BIBLIOGRAFIA
ACOSTA, Ana Rojas; VITALE, Maria Amália Faller (orgs) Família: redes, laços e
políticas públicas. 3ª edição. São Paulo: Editora Cortez e Instituto de Estudos
Especiais - PUC-SP, 2007.
BAQUERO, Marcello: CREMONESE, Dejalma (orgs.) Capital Social: teoria e
prática. Ijui: Ed. Unijui, 2006.
BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. Tradução de Luís Antero Retto e
Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 2002.
BAUER, Ruben. Gestão da Mudança: caos e complexidade nas organizações.
São Paulo: Atlas, 1999.
BOFF, Clodovis. Teologia pé no chão. 3ª edição. Petrópolis: Vozes, 1993.
BOURDIEU, P. Capital social. – Notas provisórias. In. NOGUEIRA, Maria Alice e
CATANI, Afrânio (orgs.) Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998. pp 67-
69.
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand, 1989.
BRAIDO, Dom Jacyr Francisco. O que é Pastoral Social? Cartilhas de Pastoral
Social nº 01. Brasília: s/ed., 2001.
CAILLÉ, Alain. Dádiva e associações. In: MARTINS, Paulo Henrique (org.) A
dádiva entre os modernos: discussão sobre os fundamentos e as regras do
social. Tradução de Guilherme João de F. Teixeira. Petrópolis: Vozes, 2002.
CAPRA, Frijof. A teia da vida: uma nova compreensão científica dos sistemas
vivos. São Paulo: Cultrix, 1996.
CARDOSO, F. M. C. B.; GUIMARÃES, L. de O. Cluster de Saúde de Ceres –
GO: um resgate do seu processo de formação e Expansão. Anais Enanpad,
2005.
CASAL, Adolfo Yáñez Entre a dádiva e a mercadoria: ensaio de antropologia
econômica. Lisboa: Edição do autor, 2005.
CASTELLS, M. A sociedade em rede: a era da informação - economia,
sociedade e cultura. Vol. 1. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.
CAVALCANTI, Marly (org.) Gestão social, estratégias e parcerias:
redescobrindo a essência da administração brasileira de comunidades para o
terceiro setor. São Paulo: Saraiva, 2006.
133
CEPAL. La brecha de la equidad. Santiago de Chile: CEPAL, 1998.
COELHO, Rejane Teixeira. Trabalho voluntário na favela: uma experiência
construída na relação entre ações, afetos e saberes. (2002) Dissertação de
mestrado apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia
Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
COLEMAN, James. S. Foundations of social theory. Cambridge: Belknap
Press of Havard University Press, 1994.
CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Diretrizes gerais da
ação pastoral da Igreja no Brasil (1991-1994). 4ª edição. São Paulo: Edições
Paulinas, 1991.
CRUZ, Renata da Conceição. Empreendedorismo social: uma abordagem
sobre a questão de gênero no Brasil (2007). Dissertação de mestrado
apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Administração da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
DELLORS, Jacques. Educação um tesouro a descobrir: relatório da UNESCO
da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 6ª edição. São
Paulo: Cortez/Unesco/MEC, 2001.
DOMEZI, Maria Cecília. A paróquia desafiada a ser comunidade de
comunidades. In: LONDOÑO, Fernando Torres (org.) Paróquia e comunidade
no Brasil: perspectiva histórica. São Paulo: Paulus, 1997. pp. 209-246.
DOWBOR, Ladislau. Parcerias e alianças: o bom senso na gestão social: Uma
abordagem conceitual das políticas para crianças e adolescentes (2002). São
Paulo: s/ed. Disponível em <http://dowbor.org/parceriasfinal.doc> Acesso em
22/11/2007.
DOWBOR, Ladislau. A reprodução social. Volume I. Petrópolis: Vozes, 2003.
_________. A reprodução social. Volume II. Petrópolis: Vozes, 2003.
_________. A reprodução social. Volume III. Petrópolis: Vozes, 2003.
DRUCKER, Peter Ferdinand. Administração em organizações sem fins
lucrativos: princípios e práticas. Tradução Nivaldo Montingelli Júnior. São Paulo:
Pioneira, 1994.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em
<http://www.mj.gov.br/sedh/dca/eca.htm> Acesso em 31/07/2006.
FALCONER, Andrés Pablo. A promessa do Terceiro Setor: um estudo sobre a
construção do papel das organizações sem fins lucrativos do seu campo de
gestão (1999). Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de
Administração da Universidade de São Paulo.
134
FAXINA, Élson. Participação e subjetividade em movimentos sociais: um
estudo de caso sobre as práticas culturais contemporâneas como espaço de
construção e legitimação do ser individual e ator sócia (2001). Dissertação de
Mestrado apresentada à Escola de Comunicação e Artes da Universidade de
São Paulo.
FRANCO, A. de. Capital social e desenvolvimento local (2004). Disponível em
<http://www.capitalsocial.org.br/v2/artigos/conteudo.php> Acesso em
06/08/2006.
FREI BETTO. O que é comunidade eclesial de base. Coleção Primeiros
Passos v. 19. 2ª edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.
FUKUYAMA, F. A grande Ruptura: a natureza humana e a reconstituição da
ordem social. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.
GADREY, Jean; JANY-CATRICE, Florence. Os novos indicadores de riqueza.
Tradução Assef Kfouri. São Paulo: Senac São Paulo, 2006.
GAUDEOSO, Erica. C. S. et al. Mapeamento do Terceiro Setor em Santos
(2004). Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao MBA em Administração
para Organizações do Terceiro Setor da FGV STRONG, São Paulo.
GODBOUT Jacques T. Introdução à dádiva. in Revista Brasileira de Ciências
Sociais, vol. 13 n. 38 São Paulo, Out. 1998
GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais na atualidade: manifestações e
categorias analíticas. In: GOHN, Maria da Glória (org.) Movimentos Sociais no
início do século XXI: antigos e novos atores sociais. Petrópolis: Vozes, 2003.
GOLDENBERG, M. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em
Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Record, 2003.
GRANOVETTER, M. The strenght of weak ties. In: American Journal of
Sociology, Vol. 78, No. 6, 1360-1380. May, 1973, Stanford, 1973.
GUIMARÃES, Luciano Sathler Rosa. Gestão dos fluxos de informação em
Organizações do Terceiro Setor: um estudo de caso da Pastoral da Criança
(2002). Dissertação de Mestrado apresentada ao programa de estudos pós
graduados em Administração., da Universidade Metodista de São Paulo, São
Bernardo do Campo.
HOUAISS, Antônio, Mauro Villar, Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa,
Versão eletrônica. Lisboa, Círculo de Leitores, 2002
JUNQUEIRA, Luciano A. Prates. Intersetorialidade, transetorialidade e redes
sociais na saúde. In Revista de Administração Pública, vol. 34 (6):1-236,
nov/dez 2000, pp. 35-46.
135
__________. Trabalho Voluntário e gestão de políticas sociais. In PEREZ,
Clotilde; e JUNQUEIRA, Luciano Prates (orgs.). Voluntariado e a gestão das
políticas sociais. São Paulo: Futura, 2002. pp. 136-147.
KLIKSBERG, B. Falácias e mitos do desenvolvimento social. São Paulo:
Cortez/Unesco, 2001.
KOZU, Kátia T.; GODINHO, L.T.; MUNIZ ; M.V.F.; CHIARIONI, P. Mortalidade
Infantil Causas e Fatores de Risco: um estudo bibliográfico (2007). Disponível
em <http://www.medstudents.com.br> Acesso em 30/11/2007.
LANDIM, Leilah. A invenção das ongs: do serviço invisível à profissão
impossível (1993). Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional e da Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
LANDIM, Leilah (org.). Ações em sociedade: militância, caridade, assistência
etc. Rio de Janeiro: NAU, 1998.
LANDIM, Leilah; SCALON, Maria C. Doações e trabalho voluntário no Brasil:
uma pesquisa. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2000.
MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva. Tradução de António Filipe Marques.
Lisboa: Edições 70, 1950.
MEDEIROS, Alessandra. Voluntariado: revisitando antigas práticas: a
concepção do Voluntário sobre sua ação (2002). Dissertação de mestrado
apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço Social da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
MILLANI, Carlos. Teorias do Capital Social e Desenvolvimento Local: Lições a
partir da experiência de Pintadas (Bahia, Brasil) In: Organizações &
Sociedade/Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia:
Salvador v. 11, Edição Especial, 2004, pp. 95-114.
MINTZBERG, Henri. Criando organizações eficazes: estruturas em cinco
configurações, trad. Cyro Bernardes. São Paulo, Atlas, 1995.
MONTAÑO, Carlos. Terceiro Setor e a Questão Social: crítica ao padrão
emergente de intervenção social. São Paulo: Cortez, 2002.
NEUMANN, Zilda Arns. Conhecimento e solidariedade que geram inclusão
social: o caso da Pastoral da Criança. In: Inclusão Social, v.1 n. 2, p. 88-97,
abr./set. 2006.
OLIVEIRA, L S S. Líderes da Pastoral da Criança: uma discussão sobre
informação, capacitação e formação em saúde pública, Águas de Lindóia:
ABRASCO/APSP/FSP-USP, 1997 p. 203 Congresso Brasileiro de Saúde
Coletiva, 5º Congresso Paulista de Saúde Pública Águas de Lindóia.
136
PASTORAL DA CRIANÇA. Estatuto da Pastoral da Criança (1995). Disponível
em <http://www.pastoraldacrianca.org.br> Acesso em: 31/01/2008
____________. Regimento Interno da Pastoral da Criança (1995). Disponível
em <http://www.pastoraldacrianca.org.br> Acesso em: 31/01/2008
____________. Guia do Líder da Pastoral da Criança. Curitiba: s/ed., 2003.
PINHEIRO, Romel e IRMAO, José Ferreira. A presença do capital social nas
comunidades atendidas pelos projetos de combate à pobreza rural (PCPR) em
Pernambuco. In: Organizações & Sociedade/Escola de Administração da
Universidade Federal da Bahia: Salvador v. 11, Edição Especial, 2004, pp. 115
a 128.
PNUD e IPEA. Atlas do Desenvolvimento Humano. Brasil, 2000.
PNUD. Relatórios de Desenvolvimento Humano de 1997 a 2005.
PONTUAL, Pedro de Carvalho. O processo educativo no orçamento
participativo: aprendizados dos atores da sociedade civil e do Estado (2000).
Tese de doutorado apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados em
Educação, História e Filosofia da Educação da Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo.
PRATA, Lívia. Trabalho voluntário: o desafio da gestão de recursos humanos
no terceiro setor (2005). Disponível em <http://www.rits.org.br> Acesso em
19/03/2006.
PUTNAM, Robert. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna.
3ª ed. Rio de Janeiro: FGV, 1996.
QUIVY, Raymond e CHAMPENHOUDT, Luc Van. Manual de Investigação em
Ciências Sociais. 3ª Ed. Lisboa: Gradiva, 2003.
SALAZAR, Clarissa Rocha da Silva. Gestão do voluntário e dádiva: reflexões à
luz do caso Obras Sociais Irmã Dulce (OSID) (2004). Dissertação de mestrado
apresentada ao curso de Mestrado da Escola de Administração da Universidade
federal da Bahia.
SAWAYA, Ana Lydia: SOLYMOS, Gisela Maria Bernardes. Vencendo a
desnutrição: na família e na comunidade. São Paulo: Salus Paulista, 2002.
SILVA, Jair Militão da (org.) Educação Comunitária: estudos e propostas. São
Paulo: SENAC, 1996.
SOARES, Maria Luisa Pereira Ventura. Vencendo a Desnutrição: abordagem
social. São Paulo: Salus Paulista, 2002.
STRAGLIOTTO, Pe. Orestes João. Perspectivas pastorais... É possível
recuperar a paróquia? In: LONDOÑO, Fernando Torres (org.) Paróquia e
137
comunidade no Brasil: perspectiva histórica. São Paulo: Paulus, 1997. pp.
248-278.
TELES, Vera S. Pobreza e cidadania. São Paulo: Itatiaia/Edusp, 2001.
THOMPSON, F. C. Bíblia de Referência Thompson. São Paulo: Vida, 1995.
TOCQUEVILLE, Alexis de. A Democracia na América. Livro II Sentimentos e
Opiniões; Tradução Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1835.
UNICEF. Um mundo para as crianças. Relatório da Sessão Especial da
Assembléia Geral das Nações Unidas sobre a Criança, Nova Iorque, S/ed, 2002.
UNICEF. Situação da Infância Brasileira, 2005.
UNICEF. Situação da Infância Brasileira, 2006.
UNICEF. Família Brasileira Fortalecida. Álbuns seriados v. 1, 2, 3, 4, 5. São
Paulo.
138
SITES RECOMENDADOS
Ministério da saúde: http://portal.saude.gov.br
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome: http://www.mds.gov.br
Sistema Único de Assistência Social: http://www.mds.gov.br/suas
Prefeitura Municipal de Santos: http://www.santos.sp.gov.br
Pastoral da Criança: http://www.pastoraldacrianca.org.br
Rebidia: http://www.rebidia.org.br
UNESCO: http://www.unesco.org.br
PNUD: http://www.pnud.org.br
IPEA http://www.ipea.gov.br/asocial
SEADE: http://www.seade.gov.br
IBGE: http://www.ibge.gov.br
ANEXO A - FORMULÁRIO DE PESQUISA
O VOLUNTÁRIO DA PASTORAL DA CRIANÇA DE SANTOS – SP
Solicitamos sua contribuição para responder as perguntas deste formulário que são
parte de uma pesquisa realizada sobre a gestão do trabalho voluntário da Pastoral da
Criança da cidade de Santos, SP. As informações serão utilizadas para elaboração de
Dissertação de Mestrado a ser apresentada ao Programa de Estudos Pós Graduados em
Administração da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
01. IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO
0101. Nome:
_____________________________________________________________________________________
0102. Sexo: ( ) 1 Masculino ( ) 2 Feminino 0103. Idade __________
fone: (013)___________________
02. FAMÍLIA
0201. Estado civil:
( ) 1 Solteiro
( ) 2 Casado
( ) 3 Viúvo
( ) 4 Separado
( ) 5 Divorciado
( ) 6 União estável
( ) 7 Outros _____________________
0202. Tem filhos? ( ) 1 Sim ( ) 2 Não
Se sim,
020201
N. Filho
020202.
Nome
020203.
Idade
020204.
Sexo
020205.
Foi acompanhada pela Pastoral da Criança?
1 1 (M) 2 (F) ( ) 1 Sim ( ) 2 Não
2 1 (M) 2 (F) ( ) 1 Sim ( ) 2 Não
3 1 (M) 2 (F) ( ) 1 Sim ( ) 2 Não
4 1 (M) 2 (F) ( ) 1 Sim ( ) 2 Não
0203. O sr(a). tem parentes que trabalham na Pastoral da Criança? ( )1. Sim ( )2. Não
2.3.1. Se sim, diga quantos são e qual o grau de parentesco e a função de cada um na Pastoral da Criança:
020301.Nº 020302. Nome 020303. Grau de parentesco 020304. Função
1
2
3
4
5
6
7
Nº _______
03. ESCOLARIDADE
0301 Qual a sua escolaridade?
( ) 1 Não tem
( ) 2. Fundamental I incompleto ( ) 3. Fundamental I completo
( ) 4. Fundamental II incompleto ( ) 5. Fundamental II completo
( ) 6. Ensino Médio incompleto ( ) 7. Ensino Médio completo
( ) 8. Ensino Técnico incompleto ( ) 9. Ensino Técnico completo Curso: ________________
( ) 10. Ensino Superior incompleto ( ) 11. Ensino Superior completo Curso:______________
( ) 12. Pós Graduação incompleto ( ) 13. Pós Graduação completo Curso: ________________
04. CONDIÇÃO DE MORADIA
0401. A casa que o sr(a). mora é:
( ) 1. Própria
( ) 2. Alugada
( ) 3. Cedida
( ) 4. Invadida
0402. Quantos cômodos tem a sua casa?
( ) 1. 1 Cômodo
( ) 2. 2 Cômodos
( ) 3. 3 Cômodos
( ) 4. 4 Cômodos
( ) 5. 5 Cômodos
( ) 6. Mais de 5 Cômodos
0403. Como é a sua casa?
( ) 1. Casa de Alvenaria Isolada
( ) 2. Casa de Alvenaria Frente/Fundos
( ) 3. Apartamento
( ) 4. Barraco Isolado ou Favela
( ) 5 .Cortiço
0404. A sua casa é servida por quais tipos de
rede?
( ) 1. Energia Elétrica
( ) 2. Abastecimento de Água
( ) 3. Coleta de Lixo
( ) 4. Esgotamento Sanitário
0405. Quem mora com o sr(a). em sua casa ? ________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
05. TRABALHO NA PASTORAL DA CRIANÇA
O que o sr(a). faz na Pastoral da Criança?
0501. Função/cargo: ____________________________________________________________________
0502. Local (comunidade, paróquia etc.): ___________________________________________________
0503. Seu trabalho é remunerado? ( )1. Sim ( )2. Não
0504. Há quanto tempo trabalha na Pastoral da Criança? ______________________________________
0505. Como o sr(a).conheceu a Pastoral da Criança? _________________________________________
___________________________________________________________________________________
0506. Por que o sr(a). começou a trabalhar na Pastoral da Criança?
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________
0507. Quem chamou a sr(a). para participar da Pastoral do Criança?
_____________________________________________________________________________________
06. ATIVIDADES PROFISSIONAIS
0601. O sr(a). possui alguma ocupação fora da Pastoral da Criança? ( )1. Sim ( )2. Não
060101. Se sim, qual?
( ) 1. Assalariado com carteira assinada
( ) 2. Assalariado sem carteira assinada
( ) 3. Funcionário Público
( ) 4. Autônomo regular
( ) 5. Autônomo irregular
( ) 6. Empregador
( ) 7. Outros (religioso, etc.)
( ) 8. Desempregado
( ) 9..Está procurando emprego
( ) 10 Não está procurando emprego
( ) 11. Autônomo Universitário
( ) 12. Dona de casa
( ) 13. Aposentado/Pensionista
( ) 14. Estudante
07. RENDA
0701. Qual o seu rendimento fora da Pastoral da Criança?
Salário Mínimo (SM) = R$380,00
( ) 1. Sem rendimento
( ) 2. Menos de ¼ de SM (menos de 95,00)
( ) 3. Mais de ¼ a ½ SM (95,00 a 190,00)
( ) 4. Mais de ½ SM a 1 SM (190,00 a 380,00)
( ) 5. Mais de 1 a 2 SM (380,00 a 760,00)
( ) 6. Mais de 2 a 3 SM (780,00 a 1.140,00)
( ) 7. Mais de 3 a 5 SM (1.140,00 a 1.900,00)
( ) 8. Mais de 5 a 10 SM (1.900,00 a 3.800,00)
( ) 9. Mais de 10 a 20 SM (3.800,00 a 7.600,00)
( ) 10. Mais de 20 SM (mais de 7.600,00)
0702. Qual o rendimento de todas as pessoas que trabalham na sua família? (soma)
Salário Mínimo (SM)
= R$380,00
( ) 1. Sem rendimento
( ) 2. Menos de ¼ de SM (menos de 95,00)
( ) 3.De ¼ a ½ SM (95,00 a 190,00)
( ) 4. De ½ SM a 1 SM (190,00 a 380,00)
( ) 5. De 1 a 2 SM (380,00 a 760,00)
( ) 6. De 2 a 3 SM (760,00 a 1.140,00)
( ) 7. De 3 a 5 SM (1.140,00 a 1.900,00)
( ) 8. De 5 a 10 SM (1.900,00 a 3.800,00)
( ) 9. De 10 a 20 SM (3.800,00 a 7.600,00)
( ) 10. Mais de 20 SM (mais de 7.600,00)
08. TIPO DE VOLUNTÁRIO
0801. O que motiva o sr(a). a ser um voluntário?
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________
0802. O sr(a). se identifica com as mães atendidas, ou seja, o sr(a). já passou (ou passa) por essa situação?
( )1. Sim ( )2. Não
080201. Fale um pouco sobre.
____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
09. MUDANÇAS NA VIDA DO VOLUNTÁRIO
0901. As capacitações da Pastoral da Criança, falam muito sobre transformação. Houve alguma mudança
em sua vida, depois que o sr(a). passou a participar da Pastoral da Criança?
( )1. Sim ( )2. Não
090101. Se sim, qual(is) foi(ram) as mudanças.
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
090102. Houve alguma mudança no seu relacionamento familiar?
( )1. Sim ( )2. Não
09010201. Se sim, qual(is) foi(ram) as mudanças.
_____________________________________________________________________________________
10. OUTRAS ATIVIDADES VOLUNTÁRIAS
1001. O sr(a). participa (ou participou) de outras atividades sociais/voluntárias (outras atividades na
paróquia/comunidade, outras pastorais, associações, escolas, hospitais, postos de saúde, ongs etc.)?
( )1. Sim ( )2. Não
Se sim:
010101.
100102.
Qual (is) instituição(ões)
(nome)?
100103
Que tipo de trabalho desenvolve
(ou desenvolveu)?
100104. Quanto
tempo o sr(a).
dedica/dedicou a
cada uma delas?
100105. Há quanto
tempo presta/prestou
serviços nesta(s)
organização(ões)?
(caso necessário, continue na última folha)
11. PERCEPÇÃO DA PASTORAL DA CRIANÇA
1101. Vamos imaginar que eu não saiba nada sobre a Pastoral da Criança, como o sr(a) explicaria para mim
o que é o trabalho da Pastoral da Criança?
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
1102. O sr.(a) está satisfeito com a Pastoral da Criança? ( )1. Sim ( )2. Não
110201. Por que?
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________
1103. Qual é o seu papel no desempenho do trabalho da Pastoral da Criança?
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________
12. PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA
1201. O sr(a). é chamado pela família para tratar assuntos que não são referentes à Pastoral da Criança?
(problemas ou festividades)
( )1. Sim ( )2. Não
1202. Se sim, em que situações o Sr(a) é chamado?Por que?
______________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
Data: _______/______/_______ Entrevistador _____________________________________________
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo