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O que você pensou com relação às possíveis reações dos seus amigos, dos
seus familiares, eles sabendo que você tinha diagnóstico de câncer de mama ?
Não, não me preocupei com isso não. Eu nunca escondi de ninguém, nunca,
assim, fiz, assim, usei “meio termos” pra dizer o que que era o meu problema,
entendeu? Então já, assim, quem são os... eu tenho poucos amigos, mas os
amigos que eu tenho são amigos pra sempre, é o que eu falo. Minhas amigas
são a mesma coisa. Não adianta[?] cê ter milhares sem você ter um que é real,
entendeu? (Hum, hum.) Então minhas amizades são todas amizades de 10
anos, de 15 anos, são amizades que... às vezes fica um ano sem se falar, mas,
sabe? Se reencontram, quando souberam, entendeu?
Nunca escondi, nunca. Desde o diagnóstico já todo o mundo já ficou sabendo.
Eu falo, assim, todo o mundo já... A minha mãe ainda falou, logo quando eu
falei: “-Ai, mãe, não conta pra ninguém!”, “-Não tem porquê não contar pra
ninguém.”, entendeu? Então, eu fui assim... meus amigos não... A única, por
parte de família mesmo, que me decepcionaram muito é a família do meu ex-
marido. Que era assim: eu só tinha eles aqui, de família. Minha irmã morava
no Nordeste. Não tinha mais ninguém. Eles e meus filhos. Então, o que que a
gente faz, a gente cria um vínculo, daí eu penso ........ Não, porque nas horas
boas, de bonança, de festas, “-Você é minha filha, você é parte da família!” Na,
na hora do, do aperto, o filho dela é filho deles, e eu não sou mais ninguém,
entendeu?
Então a decepção foi com eles, entendeu? Entre aspas, porque não foram
todos da família. Tem a irmã dele, que trabalha aqui, que acho que... não sei
nem se cê conhece, que é a Nádia, que trabalha no SVO. É Nádia Cristina. Ela
me... Nossa, é uma pessoa maravilhosa, me ajudou muito aqui mesmo, em
negócio de “inxame”, de correr atrás de biopsia, de mandar os negócio pra...
ela que... Até hoje, se eu precisar dela, “-Nádia, isso e isso.”, ela vai correndo.
Tem uma irmã dele que nunca foi me visitar, entendeu? “-Ai, porque você é
minha irmã, porque não sei o quê...”, sabe, aquele negócio? Então, nunca foi
me visitar. Eu operei já... né?... (Hum...) vai fazer um ano quase e nunca foi
visitar. A mãe dele foi me visitar uma única vez, entendeu? Quer dizer, se eu
tivesse morrido ou não, não teria feito diferença. É a sensação que eu tenho,
entendeu? Que, se eu tivesse... Aí, eu tô bem; hoje eu tô bem, todo o mundo
me vê na rua, aí chegam na Quilá[?], falam que eu tô bem. “-Ai, vai ter
aniversário de fulana, você vem?” Eu falo: “-Não, não vou.” “-Ai, mas por quê?”
Eu falei: “-Meu, na hora que eu precisei, na hora que eu estava aqui na minha
cama ninguém veio me visitar. Agora que eu tô bem e tal, aí...” Querem que eu
vá a festinha? Meu...
Então, deles eu tive aquela[?] decepção, agora, o resto dos meus amigos
pobres, como meu ex-marido fala, né? Porque eles não têm porcaria nenhuma,
mas se acham, sabe? Carro... Come ovo e arrota caviar, para falar o português
claro. ([risos]) É, anda de carro zero, mas não... não tem dinheiro no bolso –
que, eu eu prefiro ter dinheiro no bolso e andar de ônibus... Comigo funciona
assim, entendeu? Então ele fala assim, que as minhas amizade é tudo de
gente pobre, que não me acrescentava em nada. Mas são os meus amigos e
as minhas amigas de verdade, que eu trago desde lá detrás, entendeu? (Hum,
hum.) Que como eu, às vezes, muitas vezes eu jogo isso na cara dele, eu falo:
“-Eu tenho amigos, você não. Você tem colegas, do trabalho, mas eu tenho
amigos e eu tenho amigas que, se eu precisar amanhã, se eu precisar a hora
que for elas estão aqui do meu lado.”, entendeu? Então, quanto a isso... (E