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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Elizete Cardoso Ibrahim
A música na formação crítico - discursiva
do aluno de língua estrangeira: uma
pesquisa crítica de intervenção
MESTRADO EM LINGÜÍSTICA APLICADA E
ESTUDOS DA LINGUAGEM
São Paulo
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Elizete Cardoso Ibrahim
A música na formação crítico - discursiva
do aluno de língua estrangeira: uma
pesquisa crítica de intervenção
Dissertação apresentada à Comissão Julgadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
como exigência parcial para obtenção do título
de Mestre em Lingüística Aplicada e Estudos
da Linguagem, sob orientação da Profa. Dra.
Ângela Brambila Cavenaghi Themudo Lessa.
São Paulo
2008
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Banca examinadora
______________________________________________
______________________________________________
______________________________________________
São Paulo, ________ /________ /________.
Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos,
reprodução total ou parcial desta Dissertação por processo de
fotocopiadoras ou eletrônicos.
Assinatura: __________________________________ Local e data.
I carry your heart with me (I carry it in
my heart) I am never without it (anywhere
I go you go, my dear; and whatever is done
by only me is your doing, my darling)
I fear
no fate (for you are my fate, my sweet) I want
no world (for beautiful you are my world, my true)
and it's you are whatever a moon has always meant
and whatever a sun will always sing is you
here is the deepest secret nobody knows
(here is the root of the root and the bud of the bud
and the sky of the sky of a tree called life; which grows
higher than soul can hope or mind can hide)
and this is the wonder that's keeping the stars apart
I carry your heart (I carry it in my heart)
E. E. Cummings, I carry your heart with me
Dedico este trabalho a minha querida mãe (in memorian).
AGRADECIMENTOS
Ao meu marido, maior companheiro em todas as horas, por seu constante apoio aos meus
projetos; pela sua paciência nos momentos de ausência e pelo seu carinho nos momentos
de angústia e alegria.
À minha orientadora, professora Dra. Ângela Brambila Cavenaghi Themudo Lessa, pela
inspiração na investigação da prática docente e por acreditar em mim. Muito, muito
obrigada!
À Mariluce por sua natureza colaborativa. Todo o meu carinho.
A todos os professores do LAEL que contribuíram para esta investigação, em especial à
professora Dra. Maria Cecília Camargo Magalhães, pelas orientações preciosas durante
as aulas, pelos seus conselhos durante a qualificação e também por sua participação em
minha banca de defesa.
À professora Dra. Alzira Shimoura, por compartilhar seus conhecimentos e pelo prazer
que me concede ao participar de minha qualificação e em minha banca de defesa.
À Márcia e à Maria Lúcia, pela ajuda na resolução de questões burocráticas. Em especial
à querida Márcia, pelas conversas reconfortantes.
À professora Dra. Mona M. Hawi, pelo carinho e contribuições para esta pesquisa.
A meus irmãos, Douglas e Juliana, e a meu pai Durvalino, pelo carinho e incentivo.
À CAPES, pelo apoio financeiro que tornou possível o meu estudo.
RESUMO
O objetivo desta pesquisa é, a partir de aulas de LE nas quais se trabalha
com música, ver como se constroem novos sentidos em relação à
prática.
Esta investigação inclui a pesquisadora, uma professora-participante e uma turma de
alunos do segundo ano do ensino médio do EJA (Ensino de Jovens e Adultos) de uma
escola da rede pública estadual da cidade de Cotia. A pesquisa foi conduzida durante o
ano letivo de 2006 e o material coletado é composto por gravações em vídeo de quatro
aulas e gravações em áudio de três sessões reflexivas. A análise dos dados está
fundamentada nas seguintes categorias: (1) análise dos turnos e das relações de simetria
entre os participantes (Marcuschi, 2006); (2) análise dos conteúdos temáticos (Bronckart,
1999); e (3) observação do posicionamento enunciativo dos participantes (Bronckart,
1999). Duas questões nortearam este estudo: (1) “Qual é o objetivo das atividades com
música nas aulas analisadas?”; (2) “Como as sessões reflexivas contribuíram para a
mudança de atitude da professora em relação às atividades com música?”
O estudo está fundamentado nos conceitos vygotskianos de aprendizagem e
desenvolvimento, mediação e ZPD (Vygotsky, 1930, 1934), bem como na concepção de
linguagem desenvolvida por Bakhtin (1929, 1979) e nas ações da ação reflexiva
sugeridas por Smyth (1992). O presente estudo adotou, como metodologia, a pesquisa
colaborativa de intervenção (Magalhães, 1992), inserida no quadro da pesquisa crítica de
colaboração, em uma postura dialética diante do contexto de pesquisa.
A partir da discussão dos resultados, com base no quadro teórico, pude verificar que há,
no discurso da professora durante as sessões reflexivas, contradições no que diz respeito a
sua prática pedagógica, contradições essas apontadas e discutidas durante a terceira
sessão reflexiva. A pesquisa também aponta que a colaboração estabelecida durante essas
sessões reflexivas auxiliou na construção de um espaço coletivo de conhecimento,
propiciando modificações de postura tanto da professora participante quanto da
pesquisadora.
Palavras-chave: sessão reflexiva, formação de professores, colaboracão, ZPD.
ABSTRACT
The aim of this research is to verify how new meanings related to practice are built, based
on the music activities developed in foreign language (FL) classes.
This investigation includes the researcher, a teacher and a group of Junior students of a
public high school in the city of Cotia. The research was carried out during the school
year of 2006 and the material collected is composed of video recordings of four classes
and audio recordings of three reflective sessions. The data analysis is grounded on the
following aspects: (1) analysis of turn-taking and symmetry relations among the
participants (Marcuschi, 2006); (2) analysis of thematic content (Bronckart, 1999); and
(3) observation of how the participants place their enunciates (Bronckart, 1999). Two
questions guided this study: (1) “Which is the objective of the activities in the
analyzed classes?”; (2) “How the reflective sessions contributed to change the
teacher attitude face music activities?”
This study is grounded on vygotskian concepts of learning and development, mediation
and ZPD (Vygotsky, 1993, 1994), as well as on the conception of language developed by
Bakhtin (1929, 1979) and on the reflexive actions suggested by Smyth (1992). The
present study adopted, as the methodology, the interventional collaborative research
(Magalhães, 1992), inserted in the critical-collaborative research frame, in a dialectical
standpoint of the research context.
From the discussion of the results, based on the theoretical frame, I verified that there are
contradictions in the teacher’s speech during the reflective sessions, such as the
individual assessment of her own pedagogical practice. These contradictions are pointed
out and discussed during the third reflective session of the present work. This research
also indicates that the collaboration set during reflective sessions helped to construct a
collective environment of knowledge which can potentially generate significant changes
regarding the teacher and researcher stand.
Key-word: reflective-session, teacher education, collaboration, ZPD
SUMÁRIO
Introdução ..................................................................................................... 01
Capítulo 1 – Fundamentação Teórica
1.1. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio
(PCN-EM) ...................................................................................................... 06
1.2. A Concepção Bakhtiniana de Linguagem ...................................... 11
1.3. Os mundos de Habermas ................................................................. 19
1.4. Aprendizagem e Desenvolvimento, Mediação e ZPD ................... 21
1.5. A Prática Reflexiva ........................................................................... 25
1.6. Níveis de reflexão................................................................................28
1.6.1 Formas de ação da reflexão crítica..................................................29
Capítulo 2 – Metodologia de Pesquisa ........................................................ 32
2.1. A pesquisa Colaborativa de Intervenção ....................................... 32
2.2. O contexto da pesquisa ..................................................................... 33
2.2.1. A Escola ............................................................................................. 34
2.3. Os participantes da pesquisa ........................................................... 35
2.3.1. A Pesquisadora ................................................................................. 35
2.3.2. A Professora-participante ............................................................... 35
2.3.3. Os alunos ........................................................................................... 36
2.4. Instrumentos e procedimentos de coleta ....................................... 36
2.4.1. Descrição da primeira aula ............................................................ 37
2.4.2. Descrição da segunda aula ............................................................. 38
2.4.3. Descrição da terceira aula .............................................................. 38
2.4.4. Descrição da quarta aula ............................................................... 39
2.4.5. As sessões reflexivas ........................................................................ 40
2.5. Análise dos dados ............................................................................ 45
2.5.1. Categorias de Análise ..................................................................... 46
2.5.2. Procedimento de análise dos dados ................................................49
2.6. Garantia de Confiabilidade ........................................................... 51
Capítulo 3 – Análise e Discussão dos Resultados ....................................... 52
1ª. Etapa
3.1. Análise das aulas ................................................................................ 52
3.1.1. Introdução das aulas ......................................................................... 53
3.1.2. Desenvolvimento do conteúdo das aulas .......................................... 56
3.1.3. Os turnos ............................................................................................ 64
3.2. Análise das sessões reflexivas (SR) ........................................ ........... 68
3.2.1 Primeira SR. ....................................................................................... 68
3.2.2 Segunda SR. ........................................................................................74
2ª. Etapa
3.3. Terceira SR ........................................................................................ 83
3.4. Análise da quarta aula ...................................................................... 94
3.4.1. Introdução ............................................................................... .......... 95
3.4.2. Contextualização ..................................................................... .......... 96
3.4.3. A discussão do tema ................................................................ .......... 99
3.4.4. O conteúdo .......................................................................................... 101
3.4.5. O encerramento da atividade ............................................................104
3.5. Conclusão Final .................................................................................. 105
Considerações Finais ......................................................................... 111
Referências Bibliográficas .................................................................115
1
Introdução
Este trabalho está vinculado ao ILCAE, Grupo de Pesquisa de Inclusão
Lingüística em Cenários de Atividades Educacionais, coordenado pela Profa. Dra.
Ângela Brambilla Cavenaghi Themudo Lessa e pela Profa. Dra. Sueli Fidalgo. Este grupo
de pesquisa tem como ponto central a possibilidade de intervenção e mudança do status
quo daqueles que se sentem excluídos de atividades sociais, culturais e históricas da
escola brasileira.
Incluo esta pesquisa na área da Lingüística Aplicada, pois foca a necessidade de
pensar as formas de se comunicar e enfrentar os desafios da contemporaneidade na
construção da cidadania, a fim de que se possa entender o mundo em que vivemos e os
processos sociais, políticos, econômicos, tecnológicos e culturais em que a sociedade está
inserida, com vistas à transformação. A Lingüística Aplicada ocupa-se do estudo da
linguagem produzida nas atividades humanas e é a partir da linguagem que as pessoas
constroem suas representações. Essas representações resultam em intervenções guiadas
por ideologias e escolhas políticas. Segundo Moita Lopes (2006), as intervenções
precisam surgir a partir de reflexões críticas e éticas, objetivando promover
transformações em relação às situações de exclusão e à própria formação de cidadãos
críticos e conscientes de seu papel na construção do mundo, mediados pela linguagem.
Esta perspectiva aponta uma dimensão inclusiva, no sentido de criar possibilidades de um
ensino de qualidade que garanta igualdade de oportunidades.
Focando questões de linguagem, comecei minha pesquisa com o objetivo inicial
de investigar como uma professora trabalhava com músicas na aula de língua estrangeira,
visando a entender que contribuições as atividades que utilizam letras de músicas na aula
de LE podem oferecer. Para tanto, convidei uma professora de uma escola da rede
pública estadual de ensino que se localiza na cidade de Cotia, na região metropolitana de
São Paulo e que estava cursando o mestrado na mesma instituição que eu.
No decorrer da investigação, porém, os objetivos foram se transformando, como
resultado da interação entre pesquisadora e professora-participante. O que torna o
objetivo geral atual desta pesquisa diferente do objetivo inicial é que observar as aulas em
2
que letras de música são utilizadas passou a ter um papel secundário, responsável, neste
estudo, pela contextualização da prática. O foco principal passou a ser o próprio processo
formativo: verificar como e quanto a colaboração entre a professora-participante e a
pesquisadora contribuía na construção de novos sentidos relacionados à prática educativa.
Dessa forma, passei a registrar: (1) as ações da professora-participante quando utilizava a
música em sala de aula; e (2) as nossas discussões sobre sua prática, que ocorriam em
sessão reflexiva, sendo esta entendida como instrumento propiciador de mudança das
ações pedagógicas através da colaboração.
Este trabalho apresenta sua relevância na área de formação do professor crítico-
reflexivo, pois mostra que é possível criar contextos para que, segundo Magalhães (2004:
72) os professores aprendam a analisar a linguagem em sua materialidade para
entender o significado das escolhas feitas na sala de aula e os interesses a que servem”.
Dentre os trabalhos desenvolvidos nessa área, cito Shimoura (2005), Liberali (2003,
1998, 1994), Celani e Magalhães (2002), Magalhães (2004, 2002, 1996, 1994), Cardoso
(2000), Romero (1998), entre outros. Tais trabalhos abrangem aspectos referentes à
condução da reflexão crítica, à organização discursiva e lingüístico-discursiva e à função
dessas organizações na constituição de profissionais crítico-reflexivos.
Em minha experiência como professora de inglês, tenho me perguntado como as
aulas de língua estrangeira podem adquirir uma função social, contribuindo na formação
do pensamento crítico e não, somente, na formação lingüística dos alunos. Constatei que
existem poucos trabalhos sobre o uso da música em aulas de LE e os que existem
possuem um enfoque conteudista. Como exemplo, cito Bertoli-Dutra (2002), que faz um
estudo das letras de sica na produção de atividades pedagógicas. Nesse estudo, o
pesquisador utiliza um corpus composto por milhares de músicas disponíveis para que se
escolha a que melhor se adapte aos propósitos da atividade de língua inglesa que será
elaborada. A música escolhida é aquela que apresenta o maior número de ocorrências de
um determinado léxico referente ao assunto que se pretende abordar.
Dois fatores me levaram à escolha do tema desta investigação: primeiro, o fato de
eu mesma, em minha experiência como aprendiz, ter sofrido influência da música em
minha formação discursiva em língua inglesa. Isto porque, apesar de ter recebido
instrução formal durante meu aprendizado em instituições especializadas, foi a partir do
3
momento em que meus conhecimentos de inglês passaram a ser utilizados na
compreensão das letras de músicas com que eu tinha contato, que eles passaram a fazer
sentido em minha vida. Este foi um salto qualitativo considerável.
O segundo fator que norteou minha escolha foi a observação de que, apesar de os
professores utilizarem a música como instrumento pedagógico em suas aulas muito
tempo, ela acaba sendo usada de uma forma vaga e superficial: busca, por vezes, quebrar
a rotina da aula, propiciando um momento de entretenimento dos alunos; e, por outras,
reforçar conteúdos lingüísticos. Acredita-se que a música faça com que a aula fique mais
participativa, animada e agradável para o aluno. No entanto, o foco exclusivo nos
aspectos lingüísticos (morfológicos, fonológicos, sintáticos e semânticos) acaba por
transformar a aula de língua estrangeira com ou sem música num momento para se
memorizar normas e palavras de forma descontextualizada, sem oportunidades reais de
uso do idioma em um contexto natural, autêntico e relevante.
Pennycook (1998 apud
Magalhães, 2002: 44) critica o fato de
o ensino de língua estrangeira estar embasado em uma concepção
apolítica e a-histórica de linguagem, entendido como um sistema para
transmissão de mensagem ou para fazer coisas com as palavras em
lugar de um sistema de significação de idéias que desempenhem um
papel central no modo como significamos o mundo e a nós mesmos.
Segundo o autor, é necessário pensar a educação a partir de propostas que
considerem as subjetividades dos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem,
visando a desenvolver não o conteúdo, mas principalmente a formação crítica do
aluno.
O estudo da música, com propósitos pedagógicos fragmentados, ignora a
enunciação ali presente e deixa de lidar com toda a carga social, histórica e cultural que a
constitui. Segundo Lull (1987: 5), a música, em todas as culturas, tem o poder de
estimular o raciocínio e os ouvintes constroem através dela eventos sociais, pessoais e
culturais. Ela proporciona segurança em ambientes estranhos além de tópicos para
discussões sociais.
Partilhando, pois, da visão de Lull (1987) e considerando a visão dialógica de
linguagem (BAKHTIN, 1997), segundo a qual a importância do discurso do outro se faz
fundamental para a constituição do discurso individual, os discursos que estão presentes
4
nas letras de música são de fundamental importância na formação discursiva dos alunos
de LE. Segundo Bakhtin (1997: 147), “aquele que apreende a enunciação de outrem não
é um ser mudo, privado da palavra, mas ao contrário um ser cheio de palavras
interiores.
Considero importante ressaltar aqui que esta pesquisa não pretende minimizar a
importância dos aspectos sistêmicos no ensino de língua estrangeira. Ao contrário,
reconhece a importância do aspecto sistêmico, mas pontua que o ensino da gramática pela
gramática e do vocabulário pelo vocabulário não dão aos alunos a autonomia que
conhecer outro idioma deveria dar.
A partir dessas considerações, esta pesquisa buscou responder as seguintes
perguntas:
1. Qual é o objetivo das atividades com música nas aulas analisadas?
a) Que concepção de ensino-aprendizagem a atividade analisada revela?
b) Como são tratados os aspectos que levam ao desenvolvimento crítico?
2. Como as sessões reflexivas possibilitaram a colaboração entre professora-
participante e pesquisadora e contribuíram para a construção de novos sentidos em
relação a atividades com música?
A questão 1 investiga como a professora desenvolve atividades utilizando letras
de músicas na aula de língua inglesa e quais o seus objetivos. Com o propósito de
levantar todos os aspectos relevantes para melhor responder essa pergunta, foram
formuladas as duas micro questões acima apresentadas.
A questão 2 investiga como a colaboração se deu durante as sessões reflexivas e
quais foram os reflexos no agir discursivo e nas ações da sala de aula.
Com o propósito de responder tais perguntas, este trabalho se divide em três
capítulos. No primeiro, apresento e discuto as questões teóricas em que esta pesquisa está
embasada: (a) discussão dos PCN-EM de ngua estrangeira (BRASIL, 2002); (b)
conceitualização de linguagem (BAKHTIN, 1997); (c) os mundos discursivos
5
habermasianos (HABERMAS, 1987); (d) conceitos de aprendizagem e desenvolvimento,
mediação e ZPD (VYGOTSKY, 1993, 1994); (e) reflexão crítica (SMYTH, 1992).
No segundo capítulo, discuto a metodologia utilizada neste estudo, por meio de:
(a) definição da linha metodológica, com base nas concepções da pesquisa colaborativa
de intervenção (MAGALHÃES, 1994, 2004), inserida no quadro da pesquisa crítica de
intervenção; (b) contexto em que a pesquisa foi realizada; (c) descrição dos participantes
focais e não focais da pesquisa; (d) instrumentos de coleta, com o resumo das aulas,
entrevistas e sessões reflexivas; (e) procedimentos de categorização e análise dos dados,
fundamentados por Marcuschi (2006) e Bronckart (2007); (f) critérios de veracidade e
confiabilidade deste estudo.
No terceiro capítulo, descrevo e discuto os dados coletados com a gravação das
aulas, das entrevistas e da sessão reflexiva; e exponho os resultados revelados pela
análise.
A seguir, apresento considerações escritas pela professora participante, que
externa suas impressões e tece comentários acerca do trabalho de pesquisa realizado em
conjunto com esta pesquisadora. Apresento, também, minhas considerações finais a partir
dos resultados obtidos, minhas conclusões e avaliações pessoais acerca da investigação
realizada e das contribuições que este trabalho trouxe para o meu desenvolvimento
profissional, bem como questões que permitirão a continuação deste estudo.
Finalizo o trabalho com as referências bibliográficas. Os anexos encontram-se
gravados no CD afixado ao final deste volume.
6
CAPÍTULO I
Referencial Teórico
O presente capítulo apresenta o arcabouço teórico que sustenta esta pesquisa.
Inicialmente discorro sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais, focando o que
é previsto, institucionalmente, como desenvolvimento em língua estrangeira para alunos
do ensino médio.
A seguir, são abordadas questões de linguagem, discutindo-se especificamente a
concepção de linguagem, desenvolvida por Bakhtin/Volochinov (1995), que aponta o
dialogismo
1
, como instrumento para se compreender o mundo e seu sistema de signos. A
linguagem também é discutida na perspectiva da teoria dos três mundos de Habermas
(1987) e considerada como ferramenta psicológica, de acordo com o conceito
vygotskiano de mediação.
Na seqüência, este capítulo apresenta uma discussão sobre os elementos que
constituem a base para a reflexão crítica transformadora das práticas pedagógicas, sociais
culturais e históricas, defendendo a posição de que a finalidade maior da educação
escolar está associada a uma visão social transformadora. A escola deve, portanto,
desenvolver a consciência social do cidadão com vistas a modificar a sociedade, com
posturas mais justas e igualitárias.
1.1. Parâmetros Curriculares Nacionai
s do Ensino Médio
(PCN-EM)
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 2002) constituem um
documento oficial que apresenta diretrizes e abordagens metodológicas relacionadas à
reorganização curricular em áreas de conhecimento, com o objetivo de facilitar o
desenvolvimento dos conteúdos, numa perspectiva de interdisciplinaridade e
contextualização na formação geral do aluno. Nesta pesquisa, são consideradas,
especificamente, as orientações que se referem ao ensino da língua inglesa (LE).
1
A concepção dialógica é, na verdade, uma filosofia da linguagem examinada e estudada em suas
diferentes manifestações.
7
O documento institucional dos PCN acompanha o projeto de reforma do Ensino
Médio (PCN-EM), organizado pelo Ministério da Educação, por intermédio da Secretaria
de Educação Média e Tecnológica, como parte de uma política mais geral de
desenvolvimento social, que prioriza as ações na área da educação.
Segundo seus idealizadores, os PCN-EM (BRASIL, 2002) são resultado de um
trabalho realizado com a cooperação de educadores brasileiros em suas respectivas áreas
e apresentam um conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos
como necessários ao exercício da cidadania.
Em consonância com a LDB/96, os PCN-EM (BRASIL, 2002) orientam para que
a elaboração do currículo da escola média seja articulada em torno dos dois eixos básicos,
a partir dos quais deve ser feita a seleção dos conteúdos significativos, visando ao
desenvolvimento de competências e habilidades para esse nível de ensino. Esses dois
eixos seriam:
1. Histórico-Cultural: em que se passa a validade e a relevância social do que prevê
o Currículo, em relação aos conhecimentos selecionados;
2. Epistemológico: a necessidade de reconstrução dos procedimentos envolvidos no
processo do conhecimento; ou seja, a necessidade de uma revisão dos processos
de ensino-aprendizagem.
A interdisciplinaridade e a contextualização foram propostas como princípios
pedagógicos estruturadores do currículo, para atender ao que a LDB/96 estabelece quanto
às competências a serem desenvolvidas (BRASIL, 2002: 10), conforme segue:
vincular a educação ao mundo do trabalho e à prática social;
compreender os significados;
ser capaz de continuar aprendendo;
preparar-se para o trabalho e o exercício da cidadania;
ter autonomia intelectual e pensamento crítico;
ter flexibilidade para adaptar-se às novas condições de ocupação;
compreender os fundamentos científicos e tecnológicos;
relacionar a teoria com a prática.
8
O conceito de interdisciplinaridade, segundo os PCN-EM, sugere que todo
conhecimento mantenha um diálogo permanente com outros conhecimentos,
estabelecendo ligações que podem ser de questionamento, de confirmação, de
contemplação, de negação, de ampliação, e de iluminação de aspectos não distinguidos:
A interdisciplinaridade deve partir da necessidade sentida pelas
escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir,
mudar, prever, algo que desafie uma disciplina isolada e atraia atenção
de mais de um olhar, talvez vários (BRASIL, 2002:88).
Segundo os PCN-EM, a reforma curricular e a organização do ensino médio
devem contemplar conteúdos e estratégias de aprendizagem que capacitem o aluno para a
realização de atividades nos três domínios da ação humana: a vida em sociedade, a
atividade produtiva e a experiência subjetiva. Sendo assim, a escola adquire um papel
fundamental na formação de determinadas competências que o aprendiz precisa
desenvolver, tais como:
aprender a conhecer – construir conhecimentos;
aprender a fazer aplicar os conhecimentos adquiridos na prática
diária;
aprender a viver – trabalhar e conviver em equipe;
aprender a ser ser cidadão autônomo e crítico (BRASIL,
2002:29).
É fato que vivemos em um período de profundas e rápidas transformações na
maneira de receber a informação e de como transformá-la. O advento da internet fez com
que o volume e a velocidade das informações veiculadas ultrapassassem todas as
fronteiras. Para acompanhar tantas mudanças, as escolas precisam, também, passar por
grandes transformações, para serem capazes não de acompanhar esse
desenvolvimento, mas também de antecipá-lo, difundindo conhecimento e informações.
A mais nova das linguagens, a informática, faz parte do cotidiano e do mundo do
trabalho, e por isso, os PCN-EM preconizaram ser um direito social conviver com todas
as possibilidades de que a tecnologia dispõe:
A opção por integrar os campos ou atividades de aplicação, isto é, os
processos tecnológicos próprios de cada área de conhecimento, resulta
9
da importância que ela adquire na educação geral – e não mais apenas
na profissional –, em especial no nível do Ensino Médio. Neste, a
tecnologia é o tema por excelência que permite contextualizar os
conhecimentos de todas as áreas e disciplinas no mundo do trabalho
(BRASIL, 2002: 106).
Nesse contexto, o conhecimento de uma língua estrangeira moderna assume a
condição de parte indissolúvel do conjunto de conhecimentos essenciais que permitem ao
aprendiz aproximar-se de e integrar-se a várias culturas com autonomia, para fazer suas
próprias escolhas no mundo globalizado. É fato que a competência comunicativa em uma
língua estrangeira, em particular o inglês, facilita a imersão dos indivíduos na era dos
avanços tecnológicos, possibilitando o acesso à internet como fonte de pesquisa e de
conhecimentos de alguns fatos, praticamente no mesmo momento em que estes ocorrem.
Os PCN-EM destacam que, tendo em vista o papel que representa na construção
da nova ordem mundial, a língua inglesa é um instrumento essencial para operar no novo
capitalismo, inclusive para que se tenha acesso a modos contemporâneos de produção de
conhecimento, ou seja, em rede. Tal comunicação contribui para a elevação cultural do
estudante de línguas e para a cultura de outros povos.
Moita Lopes enfatiza que o aprendizado de língua estrangeira possibilita a
compreensão de vários discursos que circulam globalmente, permite a construção de
outros discursos alternativos e colabora na luta contra a hegemonia da globalização
excludente. Segundo ele, o ensino de inglês deve
... proporcionar autonomia ao aluno para que possa sair da situação de
inferioridade social, daqueles restritos a identidades locais; de fazer
escolhas e não serem manipulados diante das imposições do mundo
globalizado e criar anti-hegemonias, pautadas em princípios éticos de
modo a desconstruir o pensamento único e construir futuros melhores
(MOITA LOPES, 2003: 47).
De acordo com os PCN-EM, as propostas educativas no campo do ensino de
línguas tem a finalidade de promover uma abordagem de ensino comunicativa e
diversificada, que enfatize a questão social e permita que os alunos reflitam sobre quem
são, sobre a posição que ocupam no mundo e sobre sua própria realidade.
Destaco aqui, também, o caráter formativo intrínseco à aprendizagem de línguas
estrangeiras, conforme indicam os PCN-LE. Segundo o documento, além de capacitar o
10
aluno a compreender e a produzir enunciados corretos no novo idioma, o ensino de uma
língua estrangeira deve propiciar a ele um nível de competência lingüística que lhe
permita o acesso a rios tipos de informação, ao mesmo tempo em que contribua para
sua formação geral como agente crítico (BRASIL, 2002:148).
De acordo com Moita Lopes (2003), três aspectos importantes nos Parâmetros
Curriculares Nacionais de Língua Estrangeira de 2002, de cuja elaboração ele participou,
que colaboram na construção de um discurso anti-hegemônico:
a visão de que os PCN têm o objetivo central de construir uma base
discursiva que possibilita o engajamento discursivo do aluno;
o desenvolvimento de consciência crítica em relação à linguagem;
o tratamento dado aos temas transversais nos PCN-LE. (MOITA
LOPES, 2003: 54).
Nessa perspectiva, entendo que para ter o domínio de uma língua estrangeira, ou
melhor, possuir a competência comunicativa no idioma, não basta ser capaz de reproduzir
enunciados decorados, isolados e gramaticalmente corretos; é preciso relacionar,
transformar, recriar esses enunciados e aplicá-los num contexto adequado.
Todavia, percebo pela minha prática docente, que os professores em suas
unidades escolares deparam-se com a dura realidade das salas superlotadas. Esse é um
fator que dificulta a realização de um trabalho interativo de qualidade, pois inviabiliza
uma avaliação consistente das estratégias que os alunos desenvolvem e do conhecimento
que eles constroem, por meio de diferentes modos de interação entre os pares no processo
de ensino-aprendizagem. Tais dificuldades circunstanciais também dificultam ao
professor analisar, avaliar, revisar e reconstruir a sua prática pedagógica. Outros fatores,
como a carência de professores com formação lingüística e pedagógica adequadas, o
reduzido número de horas reservado ao estudo da língua inglesa, a falta de materiais
adequados e acessíveis, depreciam a qualidade do ensino como um todo.
Como podemos notar, os PCN têm base em uma concepção holística no que diz
respeito aos conteúdos a serem abordados para o ensino de ngua estrangeira no ensino
médio, destacando as competências comunicativas, que visam a propiciar o acesso a
vários tipos de informações, o que contribui para a formação geral do indivíduo. Além
disso, o documento restitui ao ensino médio seu papel formador. Cabe ressaltar que a
base curricular nacional não prega a desconsideração ou o esvaziamento dos conteúdos,
11
mas a seleção e a integração daqueles que são válidos para o desenvolvimento pessoal e
para o incremento da participação social, como mostra o trecho a seguir:
... deixa de ter sentido o ensino de línguas que objetiva apenas o
conhecimento metalingüístico e o domínio consciente de regras
gramaticais que permite, quando muito, alcançar resultados puramente
medianos em exames escritos. Esse tipo de ensino, que acaba por
tornar-se uma simples repetição, ano após ano, dos mesmos conteúdos,
cede lugar, na perspectiva atual, a uma modalidade de curso que tem
como princípio geral levar o aluno a comunicar-se de maneira
adequada em diferentes situações da vida cotidiana. (...) é
imprescindível restituir ao Ensino Médio o seu papel formador. Para
tanto, é preciso reconsiderar, de maneira geral, a concepção de ensino
e, em particular, a concepção de ensino de Línguas Estrangeiras
(BRASIL, 2002: 148-149).
Tal proposta, portanto, não elimina o ensino de conteúdos específicos, mas
defende que os mesmos devam fazer parte de um processo global com várias dimensões
articuladas.
1.2. A Concepção Bakhtiniana de Linguagem
Este estudo está embasado na concepção dialógica da linguagem
(Bakhtin/Volochinov, 1929), pois busca a reorganização das práticas pedagógicas através
da linguagem ressaltando a importância do outro. Ao considerar a incorporação do outro
no próprio texto que se está produzindo, cria-se a possibilidade de entender a noção de
enunciação como sendo polifônica, contendo a presença do outro de que se fala e do
outro silenciado”.
Em contrapartida, a concepção monológica da linguagem não contempla a
interação entre as vozes, “constituindo-se num ato puramente individual, como uma
expressão da consciência individual, de seus desejos, suas intenções, seus impulsos
criadores, seus gostos etc. Segundo Bakhtin/Volochinov (1995: 103):
a enunciação monológica fechada constitui, de fato, uma abstração. A
concretização da palavra só é possível com a inclusão dessa palavra no
contexto histórico real de sua realização primitiva. Na enunciação
monológica isolada, os fios que ligam a palavra a toda a evolução
histórica concreta foram cortados.
12
Através do dialogismo, Bakhtin procura compreender o mundo e seus sistemas de
signos. O dialogismo bakhtiniano implica sempre uma relação entre o falante e o ouvinte.
Com a progressão dessa relação, acontece por parte dos indivíduos envolvidos na
interação, a apropriação do discurso”. Dessa maneira, considera-se que a comunicação
se efetiva no momento em que os envolvidos compartilham um sistema de símbolos,
uma linguagem, que é testada através da busca da compreensibilidade de suas palavras
por parte dos outros integrantes da interação. Em geral, as palavras de um falante estão
inevitavelmente atravessadas pelas palavras do outro. O sujeito situa o seu discurso em
relação ao discurso do outro, historicamente construído. Entende-se, dessa maneira,
que a dialogia é uma idéia muito mais abrangente do que aquela associada tão
comumente à palavra diálogo. Segundo Bakhtin /Volochinov (1995: 123),
O diálogo no sentido estrito do termo, não constitui, é claro, senão uma
das formas, é verdade que das mais importantes, da interação verbal.
Mas pode-se compreender a palavra “diálogo” num sentido mais
amplo, isto é, não apenas como a comunicação em voz alta, de pessoas
face a face, mas toda a comunicação verbal, de qualquer tipo que seja.
O livro, isto é, o ato de fala impresso, constitui igualmente um elemento
da comunicação verbal. (...) Assim o discurso escrito é de certa
maneira parte integrante de uma discussão ideológica em grande
escala: ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as
respostas e objeções potenciais, procura apoio, etc.
Como podemos constatar na citação acima, a relação dialógica concebida por
Bakhtin não está circunscrita ao diálogo face a face, mas insere-se na dialogização interna
do discurso, ou seja, um discurso é o tempo todo atravessado por outros discursos
(MARKOVÁ, 1990). Isso demonstra a grande preocupação em evidenciar o ‘eu’ social,
em uma concepção que entende que cada indivíduo é constituído no coletivo, ou seja,
cada indivíduo se constitui a partir dos outros indivíduos, na multiplicidade das vozes dos
outros. Assim, o dialogismo vê a realidade social como uma rede de vozes, tendo o signo
como mediador entre o individual e o social. A voz do outro proporciona ao discurso do
ouvinte uma ressonância dialógica, pois de acordo com Bakhtin (1997: 320), “a mais leve
alusão ao enunciado do outro confere à fala um aspecto dialógico que nenhum tema
constituído puramente pelo objeto poderia conferir-lhe.
13
Aproximando tal discussão do objeto de estudo deste trabalho, ou seja, a música,
pode-se dizer que ao reproduzir as palavras de uma letra de música, quer seja para marcar
uma posição crítica, afetiva ou pedagógica, o falante lança mão de um discurso direto
(quando cita o texto e a fonte), ou de um discurso indireto (quando reproduz os dizeres de
outrem à sua maneira). Ou seja, é a palavra do outra tornada minha.
Bakhtin/Volochinov (1995: 144-145) salienta que o discurso do outro ou o
discurso citado é o discurso no discurso:
O discurso citado é visto pelo falante como a enunciação de outra
pessoa, completamente independente na origem, dotada de uma
construção completa, e situada fora do contexto narrativo. É a partir
dessa existência autônoma que o discurso de outrem passa para o
contexto narrativo, conservando o seu conteúdo e ao menos rudimentos
da sua integridade lingüística e da sua autonomia estrutural primitivas.
A enunciação do narrador, tendo integrado na sua composição outra
enunciação, elabora regras sintáticas, estilísticas e composicionais
para associá-la a sua própria unidade sintática, estilística e
composicional, embora conservando, pelo menos sob uma forma
rudimentar, a autonomia primitiva do discurso de outrem, sem o que
ele não poderia ser completamente compreendido.
O dialogismo não se refere somente ao diálogo das linguagens, mas também às
forças sociais, às etnias, às representações e aos tempos. Portanto, existe um dialogismo
não apenas da linguagem, mas das forças sociais, dos tempos e da evolução, atuando
diretamente na formação da consciência dos indivíduos. Sob a ótica desse pensador russo,
o dialogismo assume um papel ideológico que conduz a vida cultural, econômica e
política de uma sociedade. Vale ressaltar que, na perspectiva bakhtiniana, a palavra
ideologia é empregada para exprimir ou designar todo o universo dos produtos do espírito
humano, como a arte, a ciência, a filosofia, a política, a religião, etc. Para Bakhtin, a
ideologia é vista como espaço de contradição, é uma forma de representação do real que
está em constante transformação. Ele afirma que a esfera ideológica coincide com a
esfera dos signos, ou seja, tudo que é ideológico é um signo (BAKHTIN/
VOLOCHINOV, 1995: 31). Todos os produtos da mente humana, desde os instrumentos
mais simples aos mais elaborados, nascem no pensamento por meio de signos.
Acrescenta ainda, o autor, que todo o signo é um fenômeno do mundo exterior criado
14
pelo homem e que “não existe apenas como parte de uma realidade; ele também reflete e
refrata uma outra” (BAKHTIN/ VOLOCHINOV, 1995:32).
O signo, portanto, é um fenômeno do exterior criado no processo das relações
dialógicas de um com o outro; é uma manifestação de uma consciência responsiva, isto é,
a compreensão é uma resposta a um signo por meio de outro signo.Esta pesquisa utiliza a
definição bakhtiniana de enunciado, ou seja, como unidade real da comunicação, produto
da interação social, determinado pela situação imediata de sua produção e pelo contexto
sociocultural em que essa situação se dá. Os enunciados podem ser compostos por uma
oração ou por uma única palavra. Segundo Bakhtin, são irrepetíveis: a mesma sentença
torna-se um enunciado diferente a cada vez que é utilizada, pois cada situação contextual
em que esse enunciado é produzido é única.
De acordo com Bakhtin, toda enunciação é uma resposta a algo, dialogando
sempre com enunciados anteriores, encontrando-se numa situação de interação e, por
vezes, de contraposição de sentidos. A elaboração do enunciado tem natureza social e,
mesmo sozinho, todo indivíduo pertence a um grupo social, reflete sobre discursos
anteriores e articula discursos para outras pessoas. Bakhtin (1997: 262) define gênero do
discurso como “tipos relativamente estáveis de enunciado” produzidos por esferas
sociais.
Tendo o contexto desta pesquisa se desenvolvido em uma aula de língua
estrangeira, creio que cabe ressaltar que enunciados inseridos em contextos reais são
indispensáveis em uma análise de construção discursiva, pois como ressalta Bakhtin
(1997: 302), aprender a falar é aprender a estruturar enunciados, pois falamos por
enunciados e não por orações isoladas e, menos ainda, por palavras isoladas”. Tornar-
se autônomo em ngua estrangeira significa aprender a utilizar, oralmente e/ou de forma
escrita, os enunciados dessa língua, inseridos em um discurso determinado. Segundo o
autor, a intenção do ensino de línguas deve aproximar-se ao máximo do efeito provocado
na aprendizagem da língua materna, a qual “não aprendemos nos dicionários e nas
gramáticas, nós a adquirimos mediante enunciados concretos que ouvimos e
reproduzimos durante a comunicação verbal viva que se efetua com os indivíduos que
nos rodeiam(BAKHTIN, 1997: 302). Essa afirmação, quando trazida a nossa realidade,
nos leva a pensar que não o processo de ensino-aprendizagem de língua estrangeira,
15
mas também o de língua materna, ainda acontecem em muitas escolas seguindo um
modelo positivista. O dicionário e os exercícios gramaticais são, ainda, sistematicamente
utilizados sem nenhuma preocupação com questões contextuais e formativas dos
indivíduos. A respeito disso, Vygotsky (1993: 104) adverte:
a experiência prática mostra que o ensino direto de conceitos é
impossível e infrutífero. Um professor que tenta fazer isso geralmente
não obtém qualquer resultado, exceto o verbalismo vazio, uma
repetição de palavras pela criança, semelhante à de um papagaio, que
simula um conhecimento dos conceitos correspondentes, mas que na
realidade oculta um vácuo.
O processo de ensino-aprendizagem de língua estrangeira mediado por uma
abordagem exclusivamente conteudista empobrece a experiência do aprendiz e esvazia de
sentido a prática do professor. Isto porque não se lida com aspectos do universo dos
indivíduos nesse processo. A este respeito, Ellis (1994: 184) destaca que
quando uma língua é ensinada, é importante levar em conta o contexto
cultural, o conhecimento de mundo e as experiências prévias dos
alunos, de modo que eles sejam utilizados como meios enriquecedores
na aprendizagem e, em um processo a ser construído, negociado,
adaptado por eles próprios em conjunto com os colegas e com o
professor.
O uso de regras gramaticais e dicionário se justificariam nesse processo de ensino-
aprendizagem no papel de estratégia: no entanto, quando ocupam o eixo central dos
planos de aula, demonstram uma visão de linguagem mais pautada pelas estruturas
lingüísticas e, portanto, mais estruturalista. Deixa-se de lado, assim, uma visão dialógica
de construção de sentido para assumir uma visão fechada de linguagem, cujos
significados são fixos na estrutura lingüística. Ao professor, não restam muitas escolhas.
Isso porque a escola, cobrada pela sociedade, direciona seus planejamentos para atender a
necessidade de preparar os alunos para o vestibular, que orienta para um currículo
massivamente construído por blocos conteudistas. A escola acaba por se ocupar
basicamente disso, esquecendo-se de outros aspectos, mais importantes para a formação
dos futuros cidadãos. Essa pesquisa não tem, como explicitado, o objetivo de
desvalorizar ou marginalizar o conteúdo. Mas apontar que a atenção dada ao conteúdo
16
pela educação tem tomado o espaço de tantos outros saberes tão importantes quanto ele,
tais como o conhecimento do mundo das artes, a formação do pensamento crítico, o
desenvolvimento da autonomia, capacidades que a escola deveria desenvolver para que o
aluno conseguisse sempre aprender, mesmo quando já estivesse fora dela.
Na prática viva da língua, a consciência lingüística do locutor e do receptor não
têm nada a ver com um sistema abstrato de formas normativas, mas apenas com a
linguagem no sentido de conjunto dos contextos possíveis de uso de cada forma
particular. Como lembra Bakhtin (1997: 306), o locutor serve-se da ngua para suas
necessidades enunciativas concretas, para o locutor, a construção da língua está
orientada no sentido da enunciação da fala”.
Percebemos, contudo, que muitas vezes o conteúdo a ser “transmitido” é agrupado
e apresentado ao aluno como uma bula de remédio, como uma receita a ser seguida,
ignorando a significação que isso assume para o interlocutor. Como comenta
Bakhtin/Volochinov (1995: 95),
não são palavras o que proferimos, pronunciamos ou escutamos, mas
verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais,
agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre carregada de
um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que
compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que
despertam em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida.
O processo de compreensão da palavra é determinado pelo contexto, havendo
segundo Bakhtin/Volochinov (1995), tantas significações possíveis quantos forem os
contextos possíveis. Sob tal perspectiva, Celani (1984: 37) afirma que:
Os alunos deveriam ser auxiliados a entender e a assumir seu papel em
toda a operação de aprendizagem do inglês, sendo levados a descobrir
como aprendem melhor e que tipo de método de ensino e que materiais
preferem; identificar os passos dados para chegar a uma solução;
avaliar suas próprias experiências de estudo e a dividir a
responsabilidade pela organização da operação ensino-aprendizagem.
Na teoria bakhtiniana, a noção de enunciado está fortemente ligada à noção de
voz, que, apesar de levar em conta os problemas de entonação, não está reduzida a uma
mera análise de natureza vocal e/ou auditiva. Aplicada à comunicação verbal, escrita e
17
falada, o conceito de voz está relacionado a problemas mais amplos, de uma perspectiva
de sujeito, de crenças, intenção e visão de mundo (WERTSCH, 1991).
Todo discurso, para Bakhtin, é constituído por diversas vozes, por outros
discursos, dos quais nos apropriamos. O filósofo da linguagem postula que a
comunicação seria impossível se tivéssemos que criar novos gêneros discursivos a cada
interação. Apropriamos-nos da voz do outro e a utilizamos segundo nossos próprios
propósitos e intenções. Essa apropriação de vozes é o que Bakhtin chamou de
ventriloquismo, ou seja, o processo através do qual nos manifestamos usando a voz do
outro. Bakhtin (1997: 353) afirma que em cada palavra vozes, vozes que podem ser
infinitamente longínquas, anônimas, quase despersonalizadas (a voz das matizes,
lexicais, dos estilos, etc), inapreensíveis, e vozes próximas que soam simultaneamente”.
Segundo o autor, o ventriloquismo, ou o processo no qual uma voz fala por meio
de outra voz, envolve um tipo específico de polifonia:
A palavra da língua é uma palavra semi-alheia. Ela só se torna própria
quando o falante a povoa com sua intenção, com seu acento, quando a
domina através do discurso, torna-a familiar com a sua orientação
semântica e expressiva (BAKHTIN, 1997: 290).
Historicamente, a música tem sido usada tanto como forma de entretenimento,
como também de expressão afetiva, cultural, social, política e religiosa. A esse respeito
Bakhtin (1997: 214) aponta:
Na música, sentimos a resistência de uma possível consciência, viva,
que não dispõe de um princípio de acabamento em seu interior, e é
somente na medida em que lhe percebemos a força, o peso dos valores,
é que percebemos, em cada em dos graus subseqüentes que ela
transpõe, a vitória que ela obtém sobre o que lhe compete superar;
quando sentimos essa tensão (...), sentimos também a grandeza do
privilégio do acontecer, de ser o outro, de encontrarmo-nos fora da
outra consciência possível, sentimos nossa aptidão para conceder a
graça, para proporcionar a solução, somos detentores do princípio de
seu acabamento e estamos habilitados para realizar sua forma estética:
não criamos a forma musical num vazio de valores ou entre outras
formas, igualmente musicais (uma música dentro da música), nós a
criamos no acontecimento da vida, sendo apenas isso que lhe confere
seriedade, caráter de acontecimento significante e peso. [Grifos do
autor]
18
Neste trabalho, quando se analisam trechos de sessões reflexivas, a palavra que
reformula o pensar do professor e posteriormente sua ação, é produto de incorporação de
palavras alheias. É a voz do outro que cruza seu discurso. No que diz respeito à formação
de professores, ressalto aqui a fundamental importância do outro no processo de tomada
de consciência sobre suas ações. No curso de mudanças, faz-se necessária a presença e
atuação de mediadores que possam compartilhar suas vozes, auxiliando na construção de
sentidos que ainda não lhe pertencem. Durante esse movimento, os sentidos construídos
colaborativamente podem vir a ser incorporados às vozes de ambos os lados, professores
e mediadores, vindo a servir aos seus respectivos interesses.
Bakhtin considera que toda compreensão da fala viva, do enunciado vivo é de
natureza ativamente responsiva”. Com respeito ao conceito de responsividade, o autor o
apresenta da seguinte maneira:
... o ouvinte, ao perceber e compreender o significado (lingüístico) do
discurso ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição
responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente),
completa-o, aplica-o, prepara-se para usá-lo, etc.; essa posição
responsiva do ouvinte se forma ao longo de todo processo de audição e
compreensão, desde o seu início... (BAKHTIN, 1979: 271).
Segundo Wertsch e Smolka (2005: 131) os conceitos bakhtinianos representam
mecanismos concretos para ampliar as afirmações de Vygotsky sobre as origens sociais
e a natureza social do funcionamento mental humano. As enunciações, segundo os
autores, servem a uma função dialógica e seu propósito vai muito além da transmissão de
informações. Elas servem como estratégia de pensamento. (WERTSCH & SMOLKA,
2005: 142). Durante as interações, as enunciações dos participantes podem passar de um
pacote fechado de informações a estratégias de pensamento, tipo de matéria prima para
a criação de novos significados” (WERTSCH & SMOLKA, 2005: 146).
A teoria bakhtiniana se faz imprescindível para este estudo, uma vez que a
primeira pergunta de pesquisa investiga qual é o objetivo das atividades com música nas
aulas analisadas, ou seja, como a professora interage com as vozes presentes na música
que ela utiliza na aula analisada; e a segunda pergunta busca entender como as sessões
reflexivas possibilitaram a colaboração entre professora-participante e pesquisadora e,
19
ainda, se houve alguma contribuição para a construção de novos sentidos sobre a prática
da sala de aula.
1.3. Os mundos de Habermas
A teoria do agir comunicativo, que marca o rompimento de Habermas (1987) com
os antigos paradigmas sociais e filosóficos visando à restauração de uma sociedade mais
democrática, faz parte de uma corrente que tem como norte a análise das condutas
humanas em seu processo histórico de socialização, tendo em vista suas dimensões
discursivas. Para o filósofo, a modernidade ainda é um projeto em andamento e, com sua
teoria, tenta desenvolver um princípio unificador que auxilie a sociedade em uma
constituição mais justa e democrática.
A questão central do pensamento habermasiano é a de demonstrar como a
compreensão instrumental ou estratégica da racionalidade, desenvolvida pela sociedade
moderna, é de alguma maneira inadequada, pois apesar do sucesso ímpar e do crescente
desenvolvimento da ciência e da tecnologia, não houve a emancipação dos homens, a
liberdade imaginada pelos pensadores do iluminismo, mas, sim, formas de repressão
social.
Para que essa emancipação ocorra, Habermas considera a linguagem e o trabalho
elementos fundamentais, pois através deles o homem organiza-se socialmente para poder
agir sobre a natureza de maneira eficaz/efetiva. Para ele, a relação entre homem e
natureza se constitui como um processo instrumental, em que o homem se apropria dos
recursos disponibilizados pela natureza a fim de satisfazer suas necessidades básicas.
Habermas vê, no trabalho, um meio através do qual o homem realiza as ões
instrumentais. A atuação humana sobre a natureza, portanto, possui um caráter
transformador, social e comunicativo; e necessita de linguagem para a sua realização
(SIEBENEICHLER, 1989).
Habermas, então, aponta a existência de um sistema de interpretação em que os
participantes de uma interação iniciam e discutem suas operações interpretativas e
orientam sua ação social. Nesse movimento, conforme exposto por Bronckart (2007), a
ação comunicativa habermasiana pressupõe a linguagem como instrumento mediador
20
entre os envolvidos na interação social. Nessa perspectiva, Habermas elenca três
concepções diferentes de ação.
1. ação teleológica objetiva a intervenção no mundo, formando opiniões sobre o
estado de coisas existentes ou desenvolvendo intenções para modificar tal estado
de coisas existentes. Essa ação pressupõe um agente engajado em situação, no
intuito de alcançar um objetivo. Relaciona-se às configurações de um mundo
objetivo, que diz respeito à veracidade dos enunciados. As afirmações sobre fatos
e acontecimentos referem-se à pretensão da verdade, sendo voltadas para o
sucesso ou fracasso do agente na manipulação de sua ação;
2. ação regrada prevê a adequação das interações às normas estabelecidas.
Reporta-se ao mundo social, que diz respeito às regras estabelecidas no que
concerne aos atos da fala. Em sua concordância com o contexto normativo
vigente, as interações devem se conformar a fim de que possam legitimar as
regras socialmente reconhecidas;
3. ação dramatúrgica – consiste no interesse dos sujeitos de uma interação em
demonstrar algum aspecto de sua subjetividade, de modo a serem reconhecidos e
aceitos socialmente. Relaciona-se com o mundo subjetivo, que é organizado a
partir das carências e necessidades subjetivas de cada um e é formado pelas
experiências e representações sociais, que levam o indivíduo a agir nos mundo
objetivo e subjetivo.
Destas três formas de ação advém a articulação de, respectivamente, três mundos,
cuja relação é de complementaridade e não de exclusão. Para Habermas, tais mundos
correspondem, respectivamente, às tradições culturais, aos ordenamentos sociais e às
estruturas de personalidade. O autor considera que as crises e os problemas da sociedade
moderna são resultantes da fragmentação dos três mundos e propõe, em sua teoria crítica,
que se compreenda a sociedade como unidade constituída de sistemas e mundo de vida,
contemplando ao mesmo tempo os domínios da razão instrumental e da razão
comunicativa. Habermas explica que o mundo objetivo corresponde a um modo de
coisas em si, ou seja, está relacionado com um mundo externo; o mundo social regula as
21
ações humanas através de normas socialmente elaboradas; e o mundo subjetivo, refere-
se ao mundo em que as pessoas agem como sujeitos responsáveis pelos seus atos,
mediadas pela linguagem, em busca do entendimento, do consenso, mesmo que este seja
temporário.
A teoria do agir comunicativo de Habermas permite a transformação social, com
base em valores sólidos, como verdade, sinceridade e solidariedade. A linguagem é a
base desse entendimento, pelo seu caráter normativo universal, e a racionalidade está
presente no processo conversacional. Pelo agir comunicativo, o homem transforma o
meio em mundos representados, ou seja, a estrutura do conhecimento se forma com base
nos conhecimentos que os envolvidos possuem acerca dos mundos objetivo, social e
subjetivo que constituem o contexto específico em que se situam.
Os mundos representados, segundo Habermas, enfrentam constantemente o
conflito das interações verbais, alcançando o consenso por meio do processo de
negociação, o qual é guiado pela argumentação. Essa teoria é fundamental na elaboração
deste estudo, pois o mesmo aborda justamente a questão da negociação entre professora-
participante e pesquisadora durante sessão reflexiva, momento em que, através de um
processo reflexivo crítico, suas práticas pedagógicas são redimensionadas.
1.4. Aprendizagem e Desenvolvimento, Mediação e ZPD
Vygotsky, envolto nas idéias marxistas e em meio ao turbilhão de transformações
em que se encontrava a ssia pós-revolução de 1917, buscou compreender como os
aspectos sociais, históricos e culturais operavam na construção da natureza humana.
Opondo-se às tendências psicológicas dualistas da época, propôs uma abordagem monista
de psicologia, que implicava em abordar o objeto de estudo de maneira integral,
observando-o em sua totalidade e vendo-o como uma composição de uma mesma
unidade. Este princípio está presente na grande maioria de seus conceitos: pensamento e
linguagem, processos intrapessoal e interpessoal, sentidos e significados, conceitos
científicos e cotidianos.
Assim, Vygotsky aborda as questões de aprendizagem e desenvolvimento focando
sempre na maneira como esses processos se relacionam. Para ele não fazia sentido falar
22
da aprendizagem independentemente de uma etapa particular de desenvolvimento
ontogenético alcançada. O aprendizado adequadamente organizado resulta em
desenvolvimento mental. Nessa perspectiva, é o aprendizado que possibilita o
desenvolvimento. Tomando como ponto de partida a relação entre aprendizado e
desenvolvimento, Vygotsky elaborou um construto teórico conhecido como Zona
Proximal de Desenvolvimento (ZPD). Inicialmente determinou a existência de dois níveis
de desenvolvimento, para que se pudessem observar as relações existentes entre o
processo de desenvolvimento e a capacidade de aprendizado (VYGOTSKY, 1930). Esses
dois níveis foram chamados de vel de desenvolvimento real (operações que o aprendiz
é capaz de executar sozinho) e nível de desenvolvimento potencial (operações que o
aprendiz ainda não consegue fazer sem a mediação de outra pessoa, mas que realizará, de
forma independente, num futuro próximo). Na visão mais propagada de sua formulação
original, a Zona Proximal de Desenvolvimento (ZPD) é definida como a distância entre
esses dois níveis de desenvolvimento.
Concebendo relações dialéticas entre aprendizado e desenvolvimento, Vygotsky
aponta para a construção de ações que permitam criar espaços de mediação, através de
interação para a negociação com pares mais desenvolvidos, de forma a ocorrer a
internalização de novos conceitos.
A ZPD não deve ser vista como um instrumento operacional aplicável ao ensino,
mas como um espaço de negociação. A ZPD cria uma batalha psicológica interna e, ao
término dessa batalha, avança-se no desenvolvimento. Holzman (2002) refere-se à ZPD
como a “Zona do Devir” (vir a ser, tornar-se), sendo uma unidade revolucionária por
visar à transformação.
Vygotsky concebe o homem, tal como Bakhtin, como um ser histórico que se
constitui na interação com o outro, com o meio e consigo mesmo num processo dialético,
através das relações sociais, históricas e culturais experienciadas ao longo de sua
existência, fundamentais para construção de seu conhecimento. Devido à necessidade de
relacionar-se e comunicar-se, o homem evoluiu para produzir linguagem que, por seu
caráter simbólico, possibilita-lhe a criação de instrumentos essenciais no
desenvolvimento do conhecimento.
23
Partindo do pressuposto comum entre as teorias vygotskiana e bakhtiniana de que
o outro nos constitui, não como excluir o contexto social dos estudos de linguagem,
pois do contrário, inviabilizam-se os processos de negociação de significados através do
discurso. Do ponto de vista de Vygotsky (1993), aprender passa a significar estar no
mundo com alguém, uma forma de co-participação social. Dessa forma o objetivo da
interação na sala de aula desloca-se para a construção conjunta do conhecimento em um
processo de negociação que, segundo Magalhães (1996), é social e culturalmente
localizado.
Ao processo de interação está ligado o conceito de mediação, que é parte da
concepção vygotskiana de desenvolvimento. Baseando-se no pressuposto de que toda
ação é mediada (VYGOTSKY, 1993), a relação do sujeito com o objeto de conhecimento
não ocorrerá de forma direta, mas mediada por artefatos culturais que podem ser uma
música, um livro, um filme, um mapa. Como aponta Wertsch (1991: 141) somente como
partes de uma ação, podem os instrumentos mediadores adquirir sua existência e
desempenhar o seu papel”.
A esse respeito, a teoria vygotskiana pontua que a criação da cultura e da história
da humanidade se deu graças ao desenvolvimento e à organização da sociedade e do
trabalho, sendo este último o processo básico de ação transformadora do homem sobre a
natureza. Vygotsky afirma que as atividades coletivas, as relações sociais e a decorrente
criação e utilização de ferramentas
2
que ampliam o alcance e as possibilidades das
transformações humanas, são resultantes das relações de trabalho.
Baseada nessa constatação, a mediação constitui-se como processo de intervenção
de elementos que passam a fazer parte da relação do homem com o meio. O conceito de
mediação explica a afirmação vygotskiana de que o funcionamento intermental,
relacionado ao social, organiza o funcionamento intramental, (individual) utilizando a
linguagem como recurso. Durante o desenvolvimento humano, as relações mediadas
passam a predominar sobre as relações diretas. Como enfatiza Scribner (1990 apud
Pontecorvo, 2005: 67), todas as ações humanas, inclusive o ato de pensar, requerem a
mediação de objetos simbólicos, que são construídos culturalmente, determinados
2
Esse trabalho optou por usar o termo ferramenta para designar os meios mediacionais de ordem material
e por utilizar o termo instrumento para designar os meios mediacionais de ordem psicológica.
24
historicamente por um longo processo evolutivo e produzidos socialmente na sua
essência e conteúdo.
Para Vygotsky (1994: 33), a mediação está relacionada ao uso de ferramentas,
aqui consideradas como qualquer coisa usada para ajudar a resolver um problema ou
atingir uma meta. Contudo, que se observar a diferença entre uma ferramenta física,
material, de atividade prática, do instrumento psicológico, de atividade simbólica. A esta
atividade simbólica Vygotsky atribui uma função organizadora específica que invade o
uso do instrumento e produz formas fundamentalmente novas de comportamento”.
Vygotsky, assim como Bakhtin, considera a linguagem como um instrumento psicológico
de organização e constituição dos indivíduos. Segundo ele,
assim que a fala e o uso de signos são incorporados a qualquer ação,
esta se transforma e se organiza ao longo de linhas inteiramente novas.
Realiza-se, assim, o uso de instrumentos especificamente humanos,
indo além do uso possível de instrumentos, mais limitados, pelos
animais superiores (VYGOTSKY, 1994: 33).
Tanto na visão vygotskiana quanto na bakhtiniana, o sujeito é social e sua
compreensão está embasada em uma concepção monista, ou seja, esse sujeito é entendido
como um todo constituído por afeto, cognição, desenvolvimento, num contexto social e
histórico, onde suas ações são resultados da apropriação da cultura à qual tem acesso.
A linguagem, para Vygotsky, constitui-se um salto qualitativo na evolução
humana. É através dela que surgem os conceitos, as formas de organização do real, a
mediação entre o sujeito e o objeto do conhecimento. Segundo Vygotsky (1981 apud
Wertsch, 1991: 137):
ao ser incorporado a um determinado comportamento, o instrumento
psicológico altera o ritmo e a estrutura das funções mentais, através da
determinação da estrutura de um novo ato instrumental, da mesma
maneira que uma ferramenta técnica altera um processo natural
através da determinação de operações de trabalho.
As funções psicológicas superiores (FPS) são resultados de atividades mediadas
através de instrumentos psicológicos (língua falada, linguagem escrita, mapas desenhos,
diagramas, etc.) e através de relações interpessoais. Por serem atributos tipicamente
humanos, as FPS são social e culturalmente motivadas. Ou seja, o contexto histórico em
25
que se dá o aprendizado é de fundamental importância para o desenvolvimento, pois é ele
essencialmente que determinará a natureza das relações interpessoais que se
estabelecerão entre os diferentes sujeitos envolvidos no processo de desenvolvimento.
Para Vygotsky, em um primeiro momento o conhecimento se constrói de forma
intersubjetiva (entre pessoas) e num segundo momento, de forma intra-subjetiva (no
interior do sujeito). Em suas palavras:
Todas as funções psicointelectuais superiores aparecem duas vezes no
decurso do desenvolvimento da criança; a primeira vez, nas atividades
coletivas, nas atividades sociais, ou seja, como funções interpsíquicas;
a segunda, nas atividades individuais, como propriedades internas do
pensamento da criança, ou seja, como funções intrapsíquicas
(VYGOTSKY, 1993: 75).
Assim como as ferramentas (de natureza material: um objeto, uma pessoa, etc.),
os signos (também denominados instrumentos psicológicos) constituem-se recursos
mediacionais para a solução de problemas. Na visão vygotskiana, embora os signos
sejam meios psicológicos, eles são externos aos indivíduos e têm como função provocar
mudanças, organizar e controlar as ações humanas.
Nesse sentido, acredito que a música, enquanto instrumento psicológico, possa
desencadear uma função mental organizadora, operando uma transformação no
comportamento. A sica pode se constituir uma poderosa forma de mediação
pedagógica, pois através do estudo da letra, considerando o seu contexto de produção, os
alunos podem observar como os enunciados em língua inglesa se organizam e, dessa
forma, estabelecer um referencial para uma aprendizagem concreta, que os tornem
agentes de sua própria aprendizagem.
1.5. A Prática Reflexiva
Pensar é um ato inerente à condição humana, tornando o homem diferente dos
animais. Perrenoud (2002), diferenciando o refletir do pensar, afirma que pensar é uma
atividade permanente e espontânea do ser humano, enquanto a prática reflexiva
normalmente é instigada pelo aparecimento de um problema e requer método. Um ponto
que o autor estabelece e que deixa bem clara a diferença entre esses dois atos é que o
26
pensamento acompanha a ação, enquanto a reflexão pode interrompê-la, suspendê-la,
precedê-la, segui-la; enfim, a reflexão pode transformar a ação.
Ensinar é uma prática muito complexa, que exige que os profissionais busquem
estratégias pedagógicas para que seja estabelecida uma relação entre os conteúdos e o
contexto dos alunos. A prática reflexiva auxilia o professor na busca da compreensão do
que está em jogo e a como lidar com isso. Segundo Fullan e Hargreaves (2000), o
conceito de profissional reflexivo popularizou-se em educação como uma possibilidade
de conduzir a formação de professores para além do foco de treinamento, ou seja, para
um processo educativo e reflexivo que possa unir a reflexão à prática docente.
Compartilhando o mesmo pressuposto, Pérez Gómez (1992) explica que o ensino
reflexivo entra em oposição direta às concepções da racionalidade técnica, pois cada
situação de ensino possui características únicas, não podendo assim depender de uma
determinada teoria científica que objetive abranger problemas variáveis que são inerentes
à singularidade da experiência humana.
Contrariando a necessidade da prática reflexiva, o que encontramos muitas vezes
são professores que desenvolvem uma postura de rotinização. Dewey (1933) descreve o
ato rotineiro como embasado no impulso, na tradição e no hábito ou submissão à
autoridade, onde não questionamento do que é vivido, colocando-se o sujeito, dessa
maneira, em uma posição a-crítica frente á realidade. O autor ainda sugere que o único
caminho direto e eficiente para que sejam aperfeiçoados os métodos de ensino-
aprendizagem envolve a centralização de condições que estimulem, provoquem e
coloquem à prova a reflexão. Isso porque de nada adiantará o aluno ter desenvolvido seu
pensamento reflexivo se este não lhe proporcionar uma mudança na maneira de agir,
possibilitando que ele aprenda mais sobre si e sobre o mundo em que vive. Nesse sentido,
Bruner (2001: 89-90) pontua que não adianta “aprender por aprender, mas fazer com que
o que se aprenda faça sentido, seja inteligível para o aluno, assim como frisa o ensino
colaborativo”.
Perrenoud (2002) ressalta ainda que o ensino da prática reflexiva não pode se
limitar à resolução de crises, problemas ou dilemas atrozes; deve, sim, promover a
formação de um profissional que seja capaz de refletir sobre sua própria relação com o
saber, com as pessoas, com o poder e com as instituições.
27
Por sua vez, Giroux (1997: 124), inspirado em Paulo Freire (2002), discute a
problemática sobre como teorizar e desenvolver uma pedagogia crítica que incorpore
formas de experiências nas quais professores e alunos exerçam seu poder de agência . O
pesquisador argumenta que este é um desafio a ser vencido e para isso deve contar com a
formação de professores críticos, capazes de desenvolver um discurso cujo objetivo seja
questionar as escolas como corporificações ideológicas e materiais de uma complexa teia
de relação de cultura e de poder. Além disso, é papel da pedagogia crítica garantir locais
socialmente construídos para contestação, com base na produção de experiências vividas.
Compartilhando a mesma perspectiva, Fullan (1996) ressalta que é necessária
uma mudança radical nas formas como são criados espaços para que os professores
redefinam suas identidades, papéis e discursos, para que o desafio seja vencido.
McLaren e Giroux (2000) e Liberali (2003) também salientam que conhecer os
discursos que informam as ações de linguagem em contextos educacionais pode
possibilitar a ressignificação das práticas sociais e institucionais vigentes e a constituição
de professores e alunos crítico-reflexivos. Ao se tornarem conscientes dos interesses a
que suas práticas servem se para manter ou para transformar práticas de exclusão em
manutenção de desigualdades –, os professores podem reconstruí-las para favorecer a
constituição de alunos crítico-reflexivos.
Para pesquisadores como Schon (1987, 1992), Pérez Gómez (1992), Kincheloe
(1993), Magalhães (1996), entre outros, tanto o professor, como outros profissionais têm
tido uma formação herdada do positivismo, que privilegia a capacitação técnica, que
orienta a solucionar problemas da prática, baseando-se nas teorias e técnicas cientificas,
oriundas de investigações realizadas na escola ou no trabalho. A teoria é vista como uma
verdade inquestionável e a prática, como um local de aplicação de teorias.
Ainda de acordo com esses pesquisadores, o o relacionamento entre teoria e
prática, que não permite que ambas sejam vistas com igual importância nas ações
didáticas, é conseqüência do fato de se persistir na transmissão e devolução de
conhecimentos, padrão que tem dominado o contexto escolar, onde a teoria é valorizada
em detrimento da prática. Desse modo, ao professor cabe aprender o conteúdo para
depois aplicá-lo em sua sala. O professor é visto como aplicador de técnicas que são
vistas como verdades absolutas. Por outro lado, segundo Schon (1992) e Kincheloe
28
(1993), a ênfase na prática dissociada da teoria deixa o professor sem instrumentos para
entender e refletir sobre sua ação e/ou durante sua ação.
Conforme pudemos observar pelas discussões acima, uma emergente
necessidade de mudança de foco na formação de professores, para que esses profissionais
sejam capazes de agir, em contextos diversificados, com o objetivo de contribuir
significativamente com a promoção do desenvolvimento social. A perspectiva que
ressalta o contexto da mudança é a da formação de profissionais crítico-reflexivos que
possam desconstruir e reconstruir sua prática docente, com base na observação e análise
do discurso. Por essa abordagem, é essencial a compreensão da linguagem como um
instrumento que propicia uma leitura da própria prática e, a partir daí, permite a
transformação dessa prática.
Discuto, a seguir, a proposta de Van Manen (1977), tal como retomada por Smyth
(1992), Romero (1998) e Liberali (1998; 2003), para a promoção da reflexão crítica.
1.6. Níveis de reflexão
Baseado em estudos do filósofo Habermas (1987) sobre a construção do
conhecimento, Van Manen (1977) propõe uma divisão da prática reflexiva, na formação
de professores em três veis: reflexão técnica, reflexão prática e reflexão crítica. A
reflexão técnica baseia-se no conhecimento técnico, que enfatiza o controle sobre o
mundo natural e a teoria serve como meio para prever e controlar os eventos, ou seja,
como manter a disciplina na aula, como criar um propósito para uma atividade, como
manter a atenção e interesse dos alunos, como conseguir criar um propósito para uma
atividade, etc. Como salienta Romero (1998: 52), esse nível de reflexão estaria ligado às
necessidades das pessoas em obterem controle sobre o mundo natural focando como
objetivo principal a eficiência e a eficácia dos meios para atingir fins determinados. Van
Manen ressalta que a preocupação do educador técnico foca o alcance dos objetivos pré-
estabelecidos por outros que não ele próprio. Em geral, esse papel técnico é determinado,
pelas escolas, a diretores e coordenadores em forma de planos de ensino.
Por sua vez, a reflexão prática enfatiza o tipo de conhecimento que contribui para
a resolução de problemas nas ações rotineiras, ou seja, a reflexão prática revela a
29
preocupação com os pressupostos, predisposições, valores e conseqüências aos quais as
ações estão ligadas. Segundo Romero (1998: 52), esse nível de reflexão refere-se ao
entendimento interpessoal e à interpretação da prática social, focando o conhecimento
como facilitador do entendimento com outros. Van Manen aponta que a preocupação do
educador prático considera o conhecimento da prática educacional para justificar suas
ações e a qualidade dos objetivos alcançados.
Por fim, a reflexão crítica associa as reflexões técnicas e práticas na análise das
ações em contextos sócio-históricos, ou seja, a reflexão centra-se nos aspectos éticos,
sociais e políticos das ações, no contexto em questão; e na eficácia da prática docente.
Romero (1998: 52) ressalta que o interesse da reflexão crítica consiste em regular
possíveis conflitos entre ações anteriores, com o objetivo de assegurar uma utilização
adequada. Nessa perspectiva, o profissional, passa a ser mais autônomo e a considerar as
implicações éticas e morais do contexto sócio-histórico em que está inserido.
Compartilhando o mesmo pressuposto teórico de reflexão, Smyth (1992) propõe a
operacionalização do conceito de reflexão crítica com foco nas quatro ações que as
compõem: descrever, informar, confrontar e reconstruir.
1.6.1. Formas de ação da reflexão crítica
Com base no trabalho de Freire (1970), Smyth (1992) aprofunda a discussão
sobre reflexão crítica proposta por Habermas e discutida por Van Manen, propondo
quatro formas de ação, citadas acima, que propiciam ao professor refletir criticamente.
Conforme ressalta Romero (1998), a proposta do autor procura entender a prática docente
como um texto que é descrito e posteriormente estudado quanto aos seus significados por
meio da informação, confrontação, o que propicia a reconstrução das ações. Em suas
discussões sobre o desenvolvimento da reflexão, Smyth (1992) ressalta que, apesar de
não haver uma obrigatoriedade hierárquica quanto à realização das ões, conforme
indica a seqüência apresentada em seu trabalho (descrever-informar-confrontar-
reconstruir), elas não podem ser entendidas como separadas umas das outras. No entanto,
por motivos didáticos, pode-se destacá-las, pois maiores possibilidades e
oportunidades de reflexão se houver um trabalho consciente acerca da importância de
30
cada uma delas. Isto porque todas as questões levantadas pelo autor são responsáveis pela
reflexão crítica. Ao passar por esse processo, que envolve auto-conhecimento e
descoberta, o professor poderá renovar sua prática e envolver-se em atividades sociais
que digam respeito ao seu papel de educador, podendo assim estender essa transformação
a outras pessoas, como o aluno.
A seguir, discuto a definição de cada uma das quatro ações que constituem o
processo reflexivo-crítico, como pensadas e discutidas por Liberali (1998), em uma
tentativa de estabelecer um contexto para a reflexão crítica:
DESCREVER: implica em que o professor apresente sua ação sem valoração,
para que, posteriormente, procure compreender os eventos concretos de sua prática
docente. A descrição textual torna-se essencial para a compreensão da prática em curso,
pois o ensino é um tipo de atividade que só pode ser explicado e criticado após a
concretização das ações. Além disso, Magalhães (2002: 18) ressalta que esse é um espaço
fundamental em contextos de formação crítica, pois leva o agente a se distanciar de suas
ações e a se perguntar sobre as razões das escolhas feitas. A descrição abre portas para o
informar.
INFORMAR: consiste no professor buscar os princípios (quer eles sejam
conscientes ou não) que sustentam as ações descritas. Através desse movimento, torna-se
possível resgatar as teorias construídas ao longo de suas experiências, tornando possível
apontar e entender possíveis contradições presentes em sua prática. O informar relaciona-
se ao entendimento das teorias que sustentam as ações e ao entendimento dos sentidos
que estão sendo construídos nas práticas discursivas.
CONFRONTAR: é o questionamento sobre a autenticidade das visões que o
professor tem construído, resultantes de exposição a normas culturais que aos poucos se
incorporaram a sua prática docente, muitas vezes inconscientemente. Posicionando o seu
entendimento sobre as suas ações dentro de seu contexto histórico e refletindo sobre as
premissas culturais sociais e políticas que estão por trás do seu agir, o professor passa a
questionar suas visões, interrogando-se sobre os interesses que embasam suas ações e
suas escolhas. O confrontar envolve uma intensificação do conflito, que possibilitará ao
31
professor desenvolver-se por meio da observação das incoerências e das contradições que
permeiam sua prática.
RECONSTRUIR: relaciona-se com a proposta de emancipação do professor, pela
qual o professor passa a ter controle sobre suas próprias ações e decisões. Essa
emancipação parte do entendimento de que as práticas acadêmicas não são imutáveis e
que o poder de contestação precisa e deve ser exercido. A ação de reconstruir transparece
no modo de agir do professor, que passa a mostrar mais consistência e entendimento
sobre a sua prática.
As ações descritas acima constituem-se instrumentos do processo reflexivo e têm,
como objetivo, auxiliar os envolvidos (nesta pesquisa, professora-participante e
pesquisadora) a organizar seu discurso, possibilitando seu engajamento efetivo em
situações de reflexão crítica.
32
CAPÍTULO II
Metodologia de Pesquisa
Este capítulo tem por objetivo:
apresentar a escolha metodológica para a realização da pesquisa, justificando-a
com o devido embasamento teórico;
discorrer sobre o contexto do trabalho, detalhando os procedimentos utilizados
para a coleta de dados;
descrever os participantes da pesquisa;
apresentar as categorias de análise;
demonstrar a confiabilidade desta pesquisa.
2.1. A pesquisa Colaborativa de Intervenção
Esta pesquisa se insere no quadro da pesquisa crítica de colaboração
(MAGALHÃES, 1994), pois envolve uma formação crítica e reflexiva dos
participantes, propondo uma intervenção no contexto escolar a fim de transformar as
práticas vigentes. Relacionada à prática crítica, a colaboração permite que através da
interação, o conhecimento seja construído com a contribuição de todos os participantes
da pesquisa.
A participação dos envolvidos neste estudo não ocorreu de forma igual. No
entanto, mesmo tendo papéis diferentes, existiu uma abertura para que todos se
sentissem à vontade para abordar os pontos que achassem pertinentes, para colocar os
problemas a serem discutidos, refletir, negociar e tornar as suas visões e propósitos
claros” (MAGALHÃES, 1992: 72).
Sendo a pesquisa colaborativa de intervenção caracterizada pelo diálogo ativo
entre pesquisador e professor-participante, buscando a reciprocidade no entendimento e
na discussão dos significados envolvidos nas diferentes formas de pensar e agir dos
participantes (MAGALHÃES, 1996), considero adequada a escolha desta metodologia
para o meu contexto. O processo de mudança, decorrente ou não deste trabalho, supõe o
diálogo, troca de experiências e respeito à diversidade de ponto de vista. Assim, acredito
33
que será possível promover o engajamento dos participantes com a transformação
pretendida, se as ações se derem em um espaço democrático, com respeito às diferenças
e às competências de cada um dos envolvidos. Por intervenção, entendo a participação
do pesquisador na prática do professor-participante e também o movimento inverso.
Considero que essa relação entre os participantes, mediada pela teoria e pela prática,
com o intuito de organizar as ações pedagógicas, modificou a visão que eu tinha de mim
mesma como educadora e contribuiu deveras em meu processo de ensino-
aprendizagem.
Confesso que esta pesquisa não nasceu colaborativa ela tornou-se colaborativa
no seu desenrolar. Como mencionado na introdução deste trabalho, o objetivo inicial era
somente observar como a música era utilizada na aula de Língua Estrangeira (LE). No
entanto, a proximidade com a professora (que seria participante desta), propiciada pelas
disciplinas que cursávamos juntas no curso de mestrado, aliada à grande afinidade que
surgiu entre nós, fez com que a colaboração se tornasse possível. Eu não tinha
conhecimento de como a colaboração operava num trabalho de pesquisa quando iniciei
meu curso no LAEL. Tal conhecimento foi se construindo pouco a pouco através das
leituras e disciplinas cursadas. A professora-participante escolheu a turma cujas
atividades seriam gravadas e analisadas, decidiu os espaços e os recursos que seriam
utilizados, bem como o planejamento e o formato das aulas, mostrando-se
comprometida em dividir as responsabilidades e também os resultados desta pesquisa.
Quanto ao tema deste estudo e às perguntas de pesquisa, estes foram definidos e
discutidos durante os seminários de orientação e também em orientações individuais.
2.2. O contexto da pesquisa
Este estudo foi realizado em uma escola pública, vinculada à Secretaria Estadual
de Educação de São Paulo, localizada no município de Cotia.
Cotia é um município situado na Região Metropolitana de São Paulo,
microrregião de Itapecerica da Serra. Sua população estimada, em 2006, era de 179.685
habitantes e a área é de 323,89 km², o que resulta numa densidade demográfica de
554,77 hab/km². Localizada às margens do Rio Cotia, afluente do Rio Tietê, é
34
considerada área de expansão dos bairros residenciais da Grande São Paulo na direção
oeste.
1
Cotia se beneficiou com o êxodo de pessoas vindas do Norte e do Nordeste, e
também do próprio Sudeste, do Estado de Minas Gerais. A partir de 1910, o município
começou a se ligar intimamente à capital e às adjacências do estado, pois passou a
desempenhar o papel de fornecedora de alimentos, carvão combustível, madeira para
construção e tijolos.
2.2.1. A Escola
A escola focal fica situada numa região afastada do centro de Cotia, no bairro
Jardim Araruama. Nas proximidades da escola, um Posto de Saúde, onde a maior
parte da população é atendida em situações de emergência. A maioria dos alunos mora
no bairro ou em suas proximidades, sendo que também grande parte dos professores
reside em Cotia ou nos municípios vizinhos, como Carapicuíba e Itapevi. A escola
mantém uma boa organização por parte do diretor, que se preocupa com as questões
voltadas para cidadania, principalmente com a conscientização da comunidade quanto à
preservação do prédio escolar e dos materiais existentes.
A escola possui dez salas de aula, duas salas de vídeo, uma biblioteca, um
refeitório, uma sala de professores, uma sala destinada à diretoria, uma destinada à
secretaria e outra destinada à coordenadoria; uma quadra de esportes, que também é
utilizada pela comunidade; e seis banheiros, sendo dois deles utilizados apenas pelos
professores. Na escola em questão, salas de Educação Básica (1ª a série), Ensino
Fundamental (5ª a rie, regular e EJA
2
) e Ensino Médio (1º, e ano, regular e
EJA).
Os horários de entrada e saída dos alunos são precisamente estabelecidos e
um controle diário por parte de um funcionário para manter essa organização. A sala
dos professores fica situada em frente ao refeitório; enquanto a secretaria e a diretoria
ficam no mesmo pavimento das salas de aula.
1
Fonte: www.cotia.sp.gov.br
2
A sigla EJA significa Ensino de Jovens e Adultos. Esta modalidade foi criada para atender alunos com
atraso nas séries escolares.
35
De acordo com a professora-participante, o diretor é muito presente nas questões
educacionais e sociais e os coordenadores são sempre solícitos e atenciosos com
professores, alunos, pais e comunidade.
2.3. Os participantes da pesquisa
São considerados participantes desta pesquisa: (a) a pesquisadora; (b) a
professora (a quem essa pesquisa se refere como professora-participante); (c) os alunos
do 2º. Ano EM (EJA). Cada um dos participantes, focais (os dois primeiros) e
secundários (os últimos), serão apresentados no decorrer do presente capítulo.
2.3.1. A Pesquisadora
Sou licenciada em Letras pela Faculdade de Ciências Filosofia e Letras de Santo
André e estou concluindo o Mestrado no Programa de Lingüística Aplicada e Estudos
da Linguagem (LAEL) da PUC-SP, na linha de Linguagem e Educação. Lecionei língua
portuguesa e inglesa em escolas públicas estaduais durante oito anos, em classes de
ensino fundamental e médio. Após esse período mudei-me para Toronto, no Canadá,
onde aperfeiçoei meus estudos em língua inglesa. Durante o período em que morei no
Canadá, tive a oportunidade de participar de cursos livres na área de neurolingüística,
em que tomei contato com literaturas de vários campos da Lingüística e da Psicologia.
Através de tais leituras, conheci a Lingüística Aplicada, área que me despertou profundo
interesse. Após dois anos afastada de minhas atividades docentes, retornei ao Brasil e,
desde então, tenho trabalhado em escolas particulares, lecionando inglês para classes de
ensino fundamental I e II e também para o ensino médio. Logo que retornei ao Brasil,
busquei informações sobre programas de pós-graduação em Lingüística Aplicada,
decidindo-me pelo programa do LAEL, da PUC-SP.
2.3.2. A Professora-participante
A professora-participante da pesquisa é formada em Letras pela UFRN
(Universidade Federal do Rio Grande do Norte), com habilitação para lecionar Língua
Estrangeira (Inglês) e Língua Portuguesa; e atua como professora efetiva de Língua
36
Portuguesa no Ensino Fundamental (sextas e sétimas séries) e Língua Estrangeira
(Inglês) no Ensino Médio, (1º a anos), na escola em que se desenvolveu esta
pesquisa.
A professora-participante é aluna regular do curso de Mestrado do programa de
Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem (LAEL) da PUC-SP, na linha de
Linguagem e Educação, tendo participado em vários trabalhos de formação, dentre eles
o Programa Ação Cidadã (PAC)
3
, além de ser sujeito em outras pesquisas em
andamento no LAEL.
2.3.3. Os alunos
Os alunos não são participantes focais desta pesquisa, porém suas falas são
utilizadas para se investigar como as atividades com música, desenvolvidas pela
professora, influenciam o seu desenvolvimento crítico. Esses alunos fazem parte de uma
classe socioeconômica desfavorecida e estão matriculados em uma modalidade de
curso, específico para aqueles que não concluíram o ensino básico na idade regular:
Educação para Jovens e Adultos (EJA). A classe é composta de 35 alunos, que se
mostram muito participativos, com algumas exceções. Sua faixa etária varia entre 18 e
45 anos de idade, constituindo uma média de 29 anos. De acordo com a professora da
turma, nenhum deles estuda ou estudou inglês fora do contexto escolar.
2.4. Instrumentos e procedimentos de coleta
Para melhor compreensão de como as ações se deram durante este estudo, ele
está dividido em duas etapas:
primeira etapa: constituída das três primeiras aulas gravadas e das duas
primeiras sessões reflexivas
4
;
segunda etapa: constituída da terceira sessão reflexiva e da quarta aula gravada.
3
Programa de extensão realizado pelas professoras Dra. Maria Cecília Camargo Magalhães, Dra.
Fernanda Liberali e Dra. Ângela Brambilla Cavenaghi T. Lessa da PUC/SP, que teve início no ano de
2002 com a colaboração dos supervisores de Ensino da Diretoria Regional de Carapicuíba.
4
Esta pesquisa se referirá às sessões reflexivas pela sigla SR.
37
O quadro abaixo mostra a divisão das etapas, fonte de coleta, data e os objetivos
de cada uma das aulas e sessões reflexivas, que serão descritas e/ou comentadas a
seguir:
Quadro 1: Resumo da coleta de dados
ETAPA FONTE DE COLETA
DATA OBJETIVOS
1ª. aula (vídeo gravada) 16/03/2007
Levantar dados de como a
professora trabalhava com a
música na aula de LE.
1ª. SR (áudio gravada) 16/03/2007 Retomar as ações da 1ª. Aula
2ª. aula (vídeo gravada) 19/03/2007
Levantar dados (continuação da atividade
com a mesma música)
3ª. aula (vídeo gravada) 23/03/2007
Levantar dados (continuação da atividade
com a mesma música – encerramento)
1ª.
2ª. SR (áudio gravada) 23/03/2007
conceitos mencionados na 1ª. SR.
3ª. SR (áudio gravada) 26/09/2007
Retomar as aulas e SR da 1ª. etapa, buscando
apontar pontos a serem melhorados
2ª.
4ª. aula (vídeo gravada) 09/10/2007
Levantar dados que apontassem uma
mudança, ou não, no agir discursivo da
professora-participante.
2.4.1. Descrição da primeira aula
A aula em questão ocorreu em 16-03-2007 (anexo 1), na própria sala em que os
alunos costumam ter aulas regularmente, ocupando o segundo horário do período
noturno. Quando a professora adentrou a sala, o fez com mais seis alunos que acabavam
de chegar, valendo-se estes da possibilidade de entrar na segunda aula por trabalharem e
não conseguirem chegar no início do período. Havia muita agitação na sala: alunos
falando e circulando por entre as mesas. A professora posicionou-se à frente dos alunos
e pediu que se dirigissem aos seus respectivos lugares para que a aula pudesse começar.
Trazendo consigo um equipamento de CD player, a professora apresentou, aos
alunos, a pesquisadora, que falou brevemente sobre seu projeto e pediu autorização para
acompanhá-los durante a atividade a ser desenvolvida naquela e nas duas ou três aulas
seguintes, no que eles consentiram.
O recurso utilizado nessa aula foi um CD com a música Love of my life”, da
banda inglesa Queen. Primeiramente, os alunos ouviram a reprodução da música sem
interrupção. Em seguida, a professora foi retirando trechos da letra da música para
38
ilustrar as explicações sobre os tempos verbais. Os alunos não receberam nenhum
material impresso.
2.4.2. Descrição da segunda aula
A segunda gravação (anexo 2) foi realizada em 19/03/2007 na sala de vídeo e a
maioria dos alunos já estava ciente de que a atividade seria filmada.
No início da aula, os alunos começaram a chegar aos poucos, pois estavam vindo
da classe onde as aulas acontecem regularmente. Alguns justificaram o atraso dizendo
que estavam terminando de copiar os conteúdos da aula anterior. A sala de deo estava
com as cadeiras desorganizadas e encontrava-se trancado o armário onde os aparelhos
de áudio e vídeo estavam guardados. Enquanto a professora abria o armário e
encontrava os controles remotos dos equipamentos, os alunos foram se acomodando e
organizando as carteiras.
O recurso utilizado foi um DVD da banda inglesa Queen, com um clipe de
Love of my life”, mesma música utilizada na aula anterior, em áudio. Primeiramente, os
alunos assistiram ao vídeo clipe da música sem nenhuma interrupção. A seguir, a
professora tornou a passar o DVD. Porém, dessa vez, ia parando ao final de cada linha
cantada, para traduzir a letra da música.
2.4.3. Descrição da terceira aula
A terceira aula gravada (anexo 3) foi realizada em 23/03/2007 na sala onde as
aulas acontecem regularmente. Começou com dez minutos de atraso, pois a professora
encontrou certa dificuldade com o aparelho que seria utilizado para reproduzir o CD,
cujos fios estavam com mau contato.
Após a reprodução da mesma música, “Love of my life”, da banda inglesa
Queen, a professora iniciou um processo bem semelhante ao da aula anterior: cada linha
da letra da música foi sendo traduzida, porém com participação bem menor, por parte
dos alunos, do que nas aulas anteriores. Isso se deu pelo fato de que a maioria dos
alunos copiava a tradução que ia, pouco a pouco, sendo feita. Ficavam, dessa maneira,
distraídos com a cópia do que estava sendo traduzido, e interagiam menos.
39
2.4.4.
Descrição da quarta aula
A quarta aula (anexo 5) foi realizada em 09/10/2007 na sala onde regularmente
as aulas acontecem.
Após a reprodução, em áudio, da música Imagine”, na voz do cantor John
Lennon, a professora buscou relacionar o tema retirado da letra com a visão que os
alunos tinham do mundo de hoje. A aula foi dividida em etapas: os alunos puderam
interagir com a professora, com os colegas e também desenvolveram uma atividade em
grupo.
Os recursos utilizados nessa aula foram um CD e folhas mimeografadas com a
letra da música.
A seguir, apresento quadro com o resumo dos conteúdos abordados em cada
aula e os recursos utilizados pela professora-participante.
Quadro 2: Resumo dos conteúdos abordados nas aulas
Aula Recurso
utilizado
Conteúdos abordados
1ª. Aula
16/03/2007
(anexo 1)
- Equipamento
de áudio;
- CD da banda
Queen.
Atividade utilizando a música Love of my life da banda
inglesa Queen. Utilização de trechos da letra da música
para ilustrar a explicação sobre tempos verbais.
FOCO: ensino de regras gramaticais, com alguns
momentos para tradução das palavras da música.
2ª. Aula
19/03/2007
(anexo 2)
- Equipamento
de TV e DVD;
- DVD da
banda Queen.
Continuação da atividade com a músicaLove of my
life”. A letra da música é lida e traduzida, frase a frase,
enquanto a professora procura saber o que os alunos
pensam sobre o amor.
FOCO: tradução da letra da música.
3ª. Aula
23/03/2007
(Anexo 3)
- Equipamento
de áudio;
- CD da banda
Queen.
Encerramento da atividade com a música Love of my
life”. Tradução da letra da música. No final da aula os
alunos cantaram a música, acompanhando a legenda na
tela da TV.
FOCO: tradução da letra da música.
4ª. Aula
09/10/2007
- Equipamento
de áudio;
Atividade utilizando a música “Imagine”, do cantor
inglês John Lennon. Contextualização do tema trazido
40
(anexo 4) - CD do cantor
John Lennon;
- Folhas
mimeografadas
com a letra da
música.
pela música partindo da visão do aluno.
FOCO: estabelecimento da relação do tema com o
aspecto gramatical e vocabular, priorizando o aluno e a
interação dele na construção dos sentidos.
2.4.5. As sessões reflexivas
As SRs da primeira etapa desta pesquisa, como é possível observar no quadro 1,
aconteceram após a coleta de dados da primeira e da terceira aula. O quadro 3 mostra o
roteiro da primeira SR, cujas questões são relacionadas com os respectivos objetivos:
Quadro 3: Roteiro da primeira SR
Questões Objetivos
Com que freqüência você trabalha
com música na aula de inglês?
Como você escolhe a música que
será usada na aula?
Quando você trabalha com música
qual é o seu objetivo: gramatical...
Como você planejou as aulas em
que você vai trabalhar a música
que você escolheu? Como você
dividiu?
Você usa quais recursos nas aulas
em que você utiliza a música?
Entender como esse recurso é
considerado dentro do
planejamento da professora;
Investigar quais são os critérios
considerados pela professora-
participante ao escolher a música
para as atividades;
Estabelecer qual era o foco que a
professora tinha na atividade
planejada;
Compreender como os objetivos
para a atividade foram divididos;
Levantar quais eram os recursos
necessários para as aulas
planejadas.
O objetivo da primeira SR era entender a dinâmica de trabalho da atividade com
música elaborada pela professora. As perguntas não se aprofundaram, nem foram
questionadas as respostas dadas pela professora-participante. O formato desta SR
41
assemelha-se muito com o de uma entrevista. Mesmo considerando o caráter descritivo
desta primeira fase da pesquisa, necessário para se entender o contexto em que a música
era utilizada pela professora-participante, a pesquisadora perdeu uma grande
oportunidade de interação. Após transcrição e leitura dos dados da primeira SR, foi
possível observar que as perguntas trazidas pela pesquisadora limitaram as
possibilidades de troca de conhecimento.
O quadro 4 mostra o roteiro da segunda SR, relacionando as questões aos
respectivos objetivos:
42
Quadro 04: Roteiro da segunda SR
Questões Objetivos
Quantas aulas você costuma usar
numa atividade de música?
Como você desenvolve estas
aulas?
Você acha que o número de aulas é
suficiente, ou esse número é
limitado por algum outro fator?
Você toca a música em quantas
aulas?
Quais objetivos você estabeleceu
previamente e quais surgiram
durante a atividade?
O que você entende por dar voz ao
aluno?
Qual a sua estratégia para que as
interações entre os participantes da
aula aconteçam?
Como o ato de “dar voz” contribui
na formação discursiva dos alunos,
em sua opinião?
E o que é ensinar na aula de
inglês?
O que é aprender na aula de inglês?
O que é aprender inglês na sua aula
e como o aluno vai utilizar isso pra
vida dele?
Retomar o assunto da primeira
sessão reflexiva.
Buscar estruturar como o trabalho
com letras de música foi realizado.
Entender o que limita ou amplia a
possibilidade da elaboração de
aulas com música.
Entender como se a
operacionalização das atividades
planejadas.
Retomar a primeira sessão
reflexiva, quando a professora
falou sobre os objetivos; e
investigar se esses objetivos se
alteraram ao longo das aulas
analisadas.
Retomar a primeira sessão
reflexiva e entender o que a
professora entende por dar voz.
Observar como a professora,
através da mediação, direciona o
foco da aula.
Observar através do exemplo
citado pela professora se e como,
em sua aula, o que ela entende por
“dar voz” reflete na formação
discursiva do aluno.
Entender como a professora vê o
papel do professor no processo de
ensino-aprendizagem de inglês.
Entender como a professora vê o
papel do aluno no processo de
ensino-aprendizagem de inglês.
Entender como a professora
entende a relação dos saberes da
aula de inglês na constituição dos
indivíduos.
43
O objetivo da segunda SR era retomar a seqüência de três aulas que compuseram
a primeira etapa da pesquisa e também retomar alguns pontos que não foram
aprofundados na primeira SR. Nesta segunda SR, percebe-se uma mudança de atitude
da pesquisadora, que procura ouvir as respostas da professora-participante e, a partir
delas, formular a próxima pergunta. Há também um resgate de conceitos mencionados
na primeira SR e uma tentativa de entender quais são os sentidos construídos pela
professora em relação a eles. Apesar da mudança ocasionada pela percepção, por parte
da pesquisadora, em relação às oportunidades de interação perdidas na primeira SR,
ainda prevalece o formato do gênero entrevista, sendo que a participação da
pesquisadora é representada unicamente pelas perguntas formuladas.
A seguir, o quadro 5 mostra o roteiro da terceira SR, relacionando as questões
aos seus objetivos:
Quadro 05: Roteiro da terceira SR
Questões Objetivos
Perguntas em que peço que a profa.
aponte o que quer discutir:
você quer comentar alguma coisa
sobre as aulas, os alunos?
você leu as transcrições das aulas e
dos nossos dois encontros que eu te
enviei?
Você fez alguma anotação? Quer
comentar o que você achou das
suas aulas depôs de ler a
transcrição?
Perguntas em que aponto o que
considero pertinente discutir:
Eu fiz algumas anotações durante a
leitura das transcrições que eu
gostaria de comentar com você, o
que você acha?
Você acha que na aula 1 eles foram
levados a argumentar em algum
momento?
Qual você acha que foi seu papel
nesse momento que você falou que
Abrir espaço para que a professora-
participante teça comentários sobre
o que observou durante a leitura
das transcrições.
Tentar levar a professora-
participante a pensar sobre o papel
dos alunos e o seu próprio.
(descrever/informar)
44
eles argumentaram?
Você acha que eles estão nesse
momento de falar do amor da vida
deles eles estão exercitando a
argumentação?
Pensando nos elementos que
compõem a argumentação, aponte
qual seria o momento que eles
argumentam?
Em uma atividade semelhante,
num mesmo contexto utilizando a
letra de uma música, como você
poderia fazer diferente?
Você acha que esse tipo de
construção de interações, de
alguma maneira contribui na
formação crítica?
Você viu que assim, o que eles
falaram atendia perfeitamente ao
que funciona pra tradução, mas não
talvez pra fazer com que eles se
organizassem argumentativamente,
como você disse que pretendia?
Se você fosse reformular o
momento da tradução, como você
faria, se você fizesse uma escolha
de não trabalhar com a tradução,
que outra maneira você encontraria
pra trabalhar esse momento?
Se você tivesse que trabalhar o
contexto dessa atividade
novamente, quais ações você usaria
para aumentar a participação do
aluno?
Como você caracterizaria essa
seqüência de atividades que você
fez: como uma atividade focando o
global que seria o desenvolvimento
lingüístico e o desenvolvimento
crítico ou você acha que você de
alguma maneira mesmo sem
perceber privilegiou um ou outro?
Você acha que realmente esse
espaço para o que você havia
planejado foi estabelecido? Que
houve um espaço suficiente para
Tentar fazer com que a professora
reveja a própria prática.
Tentativa de levar a professora a
refletir na reconstrução de sua
prática pedagógica. (reconstruir)
Tentativa de levar a professora a
pensar na função social de sua
aula. (confrontar)
Pontuar as contradições entre o que
a professora descreveu como
objetivo pretendido e o objetivo
alcançado.
Tentativa de levar a professora a
refletir na reconstrução de sua
prática no que diz respeito à
tradução. (reconstruir)
Tentativa de levar a professora a
pensar na música como um gênero,
um texto com características sócio-
histórico-culturais,
Tentativa de levar a professora a se
posicionar frente a sua prática
45
que esse sentido se manifestasse?
Você acredita que quando você
escolhe uma música para uma
atividade, você olha pra essa
música pensando quais aspectos
gramaticais você vai poder
explorar nela?
Se fosse pra voestar escolhendo
uma outra música, como seria feita
essa escolha?
Quais outras formas de dar voz ao
aluno poderiam ser consideradas?
Você acredita que as atividades
com música na aula de inglês elas
podem ajudar o aluno no seu
desenvolvimento crítico-
discursivo?
Você acha que esse papel de
desenvolver o aluno criticamente
também é do inglês?
Tentativa de levar a professora a se
posicionar frente a uma outra
possibilidade de se trabalhar com a
música.
Observar se o conceito dialógico
foi bem compreendido pela
professora.
Observar se a professora acredita
que o uso de atividades com
música pode servir para propósitos
que vão além do estudo gramatical
e morfológico da língua inglesa.
Observar se a professora acredita
que a língua inglesa ocupa um
papel social dentro dos demais
saberes escolares.
2.5. Análise dos dados
Neste item, pretendo apresentar os procedimentos de análise dos dados
coletados. Como é possível observar no quadro 1, os instrumentos de coleta utilizados
foram as gravações em áudio e vídeo de:
- quatro aulas de 50 minutos cada, coletadas entre 16/03/2007 e 09/10/2007;
- três sessões reflexivas, coletadas entre 16/03/2007 e 09/10/2007.
Os dados referentes à primeira etapa do estudo buscam responder a seguinte
macroquestão:
1. “Qual é o objetivo das atividades com música nas aulas analisadas?”
Para melhor responder essa questão, utilizo ainda duas microquestões:
a) Que concepção de ensino-aprendizagem a atividade analisada revela?
b) Como são tratados os aspectos que levam ao desenvolvimento crítico?
46
As três primeiras aulas e as duas primeiras SRs, que constituem a primeira etapa
deste estudo, foram transcritas e entregues à professora-participante em 18/04/2007. É
importante esclarecer que no semestre de 2007, professora-participante e
pesquisadora cursaram, juntas, uma disciplina que tratava justamente da questão da
colaboração em pesquisa etnográfica crítica. Em 02/05/2007, as participantes tiveram
oportunidade de conversar, de maneira geral, a respeito das aulas gravadas. Essa
conversa não foi baseada nas transcrições dos dados, pois a professora-participante não
havia tido a oportunidade de ler todo o material. Durante rias semanas, continuaram
as conversas sobre os dados coletados, ancoradas no embasamento teórico que a
disciplina que cursávamos nos trazia a cada aula. As transcrições foram lidas pela
professora-participante e pela pesquisadora separadamente, sendo retomadas na ocasião
da terceira sessão reflexiva.
A segunda etapa deste estudo inicia-se com a realização da terceira sessão
reflexiva, que aconteceu na escola da professora-participante, tendo sido agendada com
antecedência de um mês, para que houvesse tempo suficiente de se retomar a leitura dos
dados.
A quarta aula foi elaborada pela professora-participante a partir da sessão
reflexiva realizada em 26/09/2007, com base nos apontamentos realizados na ocasião.
Os dados da terceira SR e da quarta aula visam responder a segunda macroquestão:
2. “Como as sessões reflexivas contribuíram para a mudança de atitude da
professora em relação às atividades com música”?
2.5.1. Categorias de Análise
Os dados desta pesquisa foram organizados e categorizados com o intuito de
responder as perguntas de pesquisa, de acordo com os seguintes critérios:
análise dos turnos ocorridos nas três primeiras aulas, referentes à primeira etapa
deste estudo e na quarta aula, na segunda etapa. A análise dos turnos busca um
maior entendimento das interações construídas em sala de aula, a fim de
verificar se essas interações propiciam oportunidades de desenvolvimento crítico
dos alunos. A qualidade das perguntas utilizadas pela professora também é
considerada nessa análise, a fim de observar se o tipo de participação que estava
sendo solicitada do aluno, no momento da aula, favorece sua constituição como
47
agente crítico. Para isso, baseio-me no chamado enfoque interacionista das
produções lingüísticas. Segundo Marcuschi (2006: 16), para produzir e
sustentar uma conversação, duas pessoas devem partilhar um mínimo de
conhecimentos comuns”. Desta maneira, o entendimento dos participantes em
uma interação face a face, resulta de um projeto conjunto dos interlocutores, em
atividades colaborativas e coordenadas de co-produção de sentido. O movimento
que emerge da atividade dialógica tem como pressuposto que os participantes da
interação, ou seja, os interlocutores, realizam atividades coordenadas na busca
recíproca de compreensão das ações, sendo o diálogo, portanto, constituído de
ações colaborativas dos envolvidos.
Nos dados transcritos, constantes na sessão de anexos deste estudo, considero
turnos todas as intervenções dos alunos, inclusive o silêncio entre um turno e
outro. Ou seja, este estudo considerará como turno, inclusive, os silêncios que
forem posteriores a perguntas e, também, os silêncios que precederem uma
expectativa de interação por parte do falante corrente, como no exemplo abaixo:
P6 (...) Então, por exemplo, quando você fala assim, and now you leave
me, o que é que ele diz aqui?
A7 - ...
P7 – Agora você me ...
A8 - ...
P8 – deixa. Agora você me deixa, ótimo. Qual o verbo deixar nessa frase?
Segundo Marcuschi (2006: 27-28), um silêncio após uma pergunta pode ser
sentido não como pausa, mas como o prefácio de uma despreferência. O falante
corrente pode inclusive retornar à palavra e inferir uma resposta negativa de
seu parceiro, o que revela que tomou aquilo como turno.A esses turnos, esta
pesquisa se referirá como turnos vazios.
Neste trabalho é realizada uma análise quantitativa e qualitativa dos turnos,
buscando-se observar o espaço que foi dado para a participação verbal dos
alunos em suas construções de discurso, bem como verificar como essas
participações foram gerenciadas.
análise dos conteúdos temáticos e das escolhas lexicais nas sessões reflexivas.
A utilização dos conteúdos temáticos, enquanto indicadores da orientação
declarativa de um texto, visa, nesta pesquisa, a auxiliar a análise do discurso da
48
professora-participante. O objetivo final é observar se e como a discussão
realizada nas sessões reflexivas contribuiu, ou não, para a mudança de atitude da
professora em relação às atividades com música. Segundo Bronckart (2007: 97),
o conteúdo temático funciona como o conjunto das informações explicitadas em
um texto, isto é, que são traduzidas no texto pelas unidades declarativas da
língua natural utilizada”. Essas informações constituem representações
construídas pela professora-participante e pela pesquisadora em função do
conhecimento que cada uma tem, da sua experiência e do seu desenvolvimento.
O objetivo do levantamento do conteúdo temático é organizar a conversação
entre pesquisadora e professora-participante em torno do assunto de interesse
para o presente estudo. Neste caso, busco através dos conteúdos temáticos
presentes nos enunciados da professora-participante responder a segunda
pergunta de pesquisa.
A partir dos temas levantados nos enunciados, foi possível relacionar as
representações da professora no que diz respeito a suas ações durante as aulas e,
com isso, foi possível auxiliá-la na compreensão do que efetivamente foi
realizado na aula, bem como confrontar com algumas questões pertinentes à
pedagogia crítica.
As informações do conteúdo temático são armazenadas pelos agentes, que as
reestruturam de forma linear e seqüencial no momento da produção do texto.
Essa reestruturação diz respeito ao plano de texto utilizado neste estudo e
descrito mais adiante.
Responsabilização enunciativa: esta categoria de análise permite analisar os
dados buscando quais sujeitos participantes assumem a responsabilidade de seus
atos enunciativos. Isto pode ser feito a partir do estudo das diferentes vozes
presentes nos textos (transcrições) e das marcas lingüísticas evidenciadas pelo
uso de modalizações. Segundo Bronckart (2007: 326) “as vozes podem ser
definidas como as entidades que assumem (ou às quais são atribuídas) a
responsabilidade do que é enunciado. Ao analisar o posicionamento
enunciativo no discurso produzido pelos participantes da pesquisa busca-se
encontrar marcas lingüísticas que confirmem, ou não, a implicatura do agente
produtor nasões que aparecem no texto; seu distanciamento, ou não, em
relação ao momento da produção e ao momento da ação.
49
2.5.2. Procedimento de análise dos dados
O objetivo desta seção é descrever os procedimentos utilizados na análise dos
dados coletados, bem como apresentar as questões teóricas a que serviu esta análise.
Os dados coletados para esta pesquisa foram transcritos, buscando que a análise
do discurso fosse feita com base em material empírico, ou seja, reproduzindo
conversações reais. A forma como foi realizada a transcrição das aulas e das sessões
reflexivas, gravadas em áudio e vídeo para a realização deste estudo, foi determinada
pelo objetivo de responder as perguntas de pesquisa. Como nos lembra Marcuschi
(2006: 9) “o essencial é que o analista saiba seus objetivos e não deixe de assinalar o
que lhe convém”.
Os excertos utilizados nesta pesquisa foram selecionados de acordo com o que
julguei relevante para que as perguntas de pesquisa fossem devidamente respondidas. A
transcrição dos dados coletados encontra-se na íntegra nos anexos deste volume.
Apresento, a seguir, as abreviações utilizadas para a referência dos turnos dos
participantes:
Quadro 6: Abreviações utilizadas nas transcrições
Participantes Abreviação
Pesquisadora Os
Professora P
35 alunos A
A título de sumarização, apresento o quadro de número 7, com os instrumentos e
procedimentos de análise, relacionados às respectivas perguntas de pesquisa:
50
Quadro 7: Resumo dos procedimentos e categorias de análise de dados
PERGUNTAS DE PESQUISA
INSTRUMENTOS DE COLETA
DE DADOS
CATEGORIAS DE
ANÁLISE DE DADOS
CATEGORIAS DE
INTERPRETAÇÃO
PRIMEIRA ETAPA
1. Qual é o objetivo das
atividades com música nas
aulas analisadas?
1.1. Que concepção de ensino-
aprendizagem a atividade
analisada revela?
1.2. Como são tratados os aspectos
que levam ao
desenvolvimento crítico?
Gravação de três aulas (16,
19 e 23/03/2007)
Gravação de duas
sessões reflexivas (16 e
23/03/2007)
Sistema de turnos e
Responsabilização
enunciativa
Conteúdo temático
(Bronckart, 2007)
Conceito de dialogismo e
responsividade (BAKHTIN,
1997);
Conceito de mediação, ZPD,
ensino-aprendizagem
(VYGOTSKY, 1930);
PCN-EM-LE (BRASIL, 2002);
Teoria do agir discursivo
(HABERMAS, 1987);
Reflexão crítica (FREIRE, 1970).
SEGUNDA ETAPA
2. Como as sessões reflexivas
possibilitaram a colaboração entre
professora-participante e
pesquisadora e contribuíram para a
construção de novos sentidos em
relação às atividades com música?
Gravação de uma sessão
reflexiva (26/09/2007)
Gravação de uma aula
(09/10/2007 ).
Conteúdo temático
(Bronckart, 2007)
Sistema de turnos
(Marcuschi, 2006);
Responsabilização
enunciativa
(Bronckart, 2007)
Conceito de dialogismo e
responsividade (BAKHTIN,
1997);
Conceito de mediação, ZPD,
ensino-aprendizagem
(VYGOTSKY, 1930);
PCN-EM-LE (BRASIL, 2002);
Teoria do agir discursivo
(HABERMAS, 1987);
Reflexão crítica (FREIRE, 1970).
51
2.6. Garantia de Confiabilidade
A confiabilidade desta pesquisa foi verificada, de maneira formal, em seminários
de orientação com o grupo de pesquisa ILCAE, apresentações em congressos e
encontros individuais com a professora orientadora, momentos em que pude rever e
esclarecer questões dúbias, bem como tornar o estudo mais abrangente.
Esta pesquisa foi apresentada nos seguintes eventos: XXII JELI, promovida
pela APLIESP, em maio de 2006 na UNIP/ Campus Magalhães Teixeira - Campinas; no
III Fórum do Programa Ação Cidadã (PAC) em maio de 2006 na PUC-SP; no Fórum
de Inclusão Lingüística em Cenários Educacionais (ILCAE) em outubro de 2006 na
PUC-SP; no Fórum de Linguagem em Atividades do Contexto Escolar (LACE) em
outubro de 2006 na PUC-SP; no I Congresso Latino-Americano sobre formação de
Professores de Línguas/ I Encontro Catarinense de Formação de Professores de Línguas
em novembro de 2006 em Florianópolis; no 16º Intercâmbio de Pesquisas em
Lingüística Aplicada (InPLA) em maio de 2007 na PUC-SP. Nesses eventos, recebi
contribuições que me ajudaram a desenvolver um novo olhar e me fizeram rever
procedimentos.
Este trabalho também foi submetido à debriefing (LINCOLN & GUBA, 1985,
apud LIBERALI, 1994) em 2007, quando apresentado no Seminário de Orientação
coordenado pela Professora Doutora Ângela Cavenaghi Brambilla Themudo Lessa. O
conceito de debriefing é discutido por Liberali, que esclarece se tratar de um dos
conceitos utilizados em pesquisa qualitativa, caso desta pesquisa, no sentido de garantir
que o critério de credibilidade seja respeitado. Moita Lopes (1996: 333) nos lembra que
a pesquisa deve ser metódica, sistemática, criticada pelo próprio pesquisador e
oferecida à crítica dos pares na comunidade científica”. Com efeito, os apontamentos
realizados durante o processo de debriefing contribuíram para o desenvolvimento da
pesquisadora, que buscou fortalecer suas argumentações, delimitar os objetivos e,
principalmente, os limites desta pesquisa.
Este capítulo discutiu a metodologia de pesquisa, discorrendo sobre o contexto,
os participantes, os instrumentos usados para a análise de dados, apresentando também
os quadros de categoria de análise e interpretação dos dados. O capítulo a seguir
abordará a discussão dos dados.
52
CAPÍTULO III
Análise e Discussão dos Resultados
Este capítulo tem o objetivo de apresentar a discussão da análise dos dados
desta pesquisa. Como já mencionado no capitulo metodológico, a análise divide-se em
duas etapas. A primeira etapa, constituída das três primeiras aulas e das duas
primeiras sessões reflexivas, busca responder a seguinte pergunta de pesquisa:
1. Qual é o objetivo das atividades com música nas aulas analisadas?
Na tentativa de melhor responder esta questão, utilizo ainda duas
microquestões:
a.. Que concepção de ensino-aprendizagem a atividade analisada revela?
b.. Como são tratados os aspectos que levam ao desenvolvimento crítico?
A segunda etapa deste estudo, composta pela quarta aula gravada e pela
terceira sessão reflexiva, busca responder a segunda pergunta de pesquisa:
2. Como as sessões reflexivas possibilitaram a colaboração entre professora-
participante e pesquisadora e contribuíram para a construção de novos
sentidos em relação a atividades com música?
Esta pesquisa passa a discussão dos resultados, a começar pela análise das
aulas.
1ª. ETAPA
3.1. Análise das aulas
Para que a compreensão de como a música era utilizada pela professora-
participante possa fornecer um contexto para a discussão das práticas em sala de aula,
esta pesquisa se propõe a apresentar uma análise dos aspectos comuns entre as três
53
primeiras aulas que constituem a primeira etapa. Estes aspectos são: a Introdução, o
Desenvolvimento do conteúdo e os Turnos. É importante lembrar que as três
primeiras aulas fazem parte de uma seqüência de atividades elaboradas pela
professora tendo como base a letra da música Love of my life da banda Queen.
3. 1.1. Introdução das aulas
Ao procurar os padrões presentes nas aulas, esta pesquisa observou que a
forma como a atividade de música foi introduzida em cada uma das aulas possuía
algumas marcas em comum. O excerto abaixo corresponde à maneira como se deram
as ações da professora-participante no momento da introdução da atividade.
Excerto 1 (aula 1 – anexo1)
P1 Pessoal, prestem atenção. Agora eu vou passar uma música desse
Cd e depois nós vamos trabalhar com os verbos dessa música e
com o vocabulário. Posso começar, estão prontos, né?
A1 – Pode passar, professora.
A2 – Precisa escrever alguma coisa?
P2 – Não, é só ouvir por enquanto.
A3 – Assim ta beleza!
O excerto 1 mostra que a professora parece assumir a posição de comando ao
iniciar a aula, chamando para si o papel de condutora das ações que viriam a seguir,
utilizando o imperativo ao se dirigir aos alunos como mostra o excerto acima: P1
(Pessoal, prestem atenção.).
Nessa seqüência introdutória, o posicionamento enunciativo da professora
parece demonstrar quem decide o momento em que as ações acontecerão, como
observamos no uso do pronome em P1 (Agora eu vou passar...) e, a seguir, parece
definir o que será feito na seqüência, usando desta vez o pronome ‘nós’, na tentativa
de que todos se sintam incluídos na atividade, como nota-se em P1 (depois nós vamos
trabalhar).
54
O primeiro turno utilizado pela professora encerra-se através de uma pergunta (P1:
... Posso começar, estão prontos, né?). No entanto, esta pergunta parece não buscar a
interação do aluno no sentido de decidir ou não o início da atividade, assemelhando-se
mais com uma pergunta retórica, parecendo buscar somente informá-los de que a
atividade começaria naquele momento.
O excerto 2, referente à Introdução da segunda aula, possibilita a observação de
uma postura semelhante:
Excerto 2 (aula 2 – anexo 2)
P5 É o seguinte (pausa). Como nós estamos... nós começamos esse ano com
um nível bem básico, né, eu falei para vocês que nós vamos estudar inglês
pelos níveis, não é isso? Do nível um até vocês alcançarem um nível bom.
Então como nós terminamos... que matéria nós terminamos na aula
passada, hein pessoal?
A5 Verbo to be.
P6 Verbo to be. Nós fizemos o diálogo com o verbo to be, interagimos, não é
isso? Aprendemos a falar algumas palavras em inglês e hoje para nós
fazermos uma ligação com aquilo que nós estudamos na aula passada,
para estabelecermos uma ponte com o conteúdo que nós estávamos
vendo, com a matéria que nós vimos, eu trouxe o vídeo clipe da música
da aula passada para ficar com... com uma... (pausa)
A6 É, já entendi!
P7 visão maior da matéria e para vocês não ficarem tão cansados com a
matéria exposta, então nós vamos ampliar o conteúdo dentro da parte
visual, do áudio visual que é o vídeo...
Num primeiro momento, a professora-participante recapitula as ações
relacionadas ao conteúdo trabalhado e à atividade com música, à qual será dada
continuidade na aula em questão. A participação dos alunos é solicitada através de
uma pergunta, como observamos no recorte: P5- “(...) que matéria nós terminamos na
aula passada, hein pessoal?”, ao que os alunos respondem: A5 Verbo to be.” A
partir desta resposta dos alunos, a professora faz um breve resumo do que foi feito,
como observamos no turno P6: Nós
fizemos o diálogo com o verbo to be,
55
interagimos, não é isso? Aprendemos a falar algumas palavras em inglês (...).” Neste
exemplo notamos que a professora faz uso da primeira pessoa do plural (nós),
provavelmente na tentativa de uma construção partilhada: ao se incluir como alguém
que está fazendo parte do processo de aprendizagem, talvez leve o aluno a fazer o
mesmo.
O excerto 3 refere-se à terceira aula e traz explícito o foco que a professora
pretende dar à aula:
Excerto 3 (aula 3 – anexo 3)
P1 Bom, hoje nós vamos retomar a última parte do nosso trabalho com
a música do Queen.
A1 – Ah, chega desse flash back, né professora?
P2 – Hoje nós vamos focar mais no vocabulário, OK gente? Então
vamos ver quem lembra. Love of my life significa...
A2 – Amor da minha vida.
O momento introdutório dessa terceira aula, em que o trabalho com a música
Love of my life será concluído, acontece com a professora verbalizando qual será o
foco buscado por ela, como observamos em P2 Hoje nós vamos focar mais no
vocabulário”. A seguir, é feita uma pergunta que parece ter um cunho retórico (“OK
gente?”), pois não é dada ao aluno a possibilidade de negociação. Pode-se apoiar esta
afirmação no turno que antecede o do exemplo: um aluno manifesta-se desfavorável à
proposta da professora de continuar a atividade com a música (A1 Ah, chega desse
flash back, professora?”). No entanto, a aula começa sem que seja considerada a
fala do aluno.
Como mencionado na introdução desta terceira aula, a professora retoma a
tradução da música a partir do título, como consta no turno P2 Então vamos ver
quem lembra. Love of my life significa...”. Ao perguntar quem se lembrava do
significado de Love of my life em português conteúdo trabalhado nas aulas
anteriores –, a professora parece demonstrar que a tradução ocupa um papel
importante em seu planejamento, o que podemos confirmar com o próximo padrão
encontrado nas três primeiras aulas que compõem a primeira fase deste estudo.
56
3.1.2. Desenvolvimento do Conteúdo das aulas
Conforme dito anteriormente, outro aspecto comum, encontrado nas aulas da
primeira etapa, diz respeito ao conteúdo abordado durante as aulas. Na primeira aula,
logo após a reprodução da música em áudio, a professora-participante informa os
alunos como será o prosseguimento da atividade, como observamos no próximo
excerto:
Excerto 4 (aula 1 – anexo 1)
P3 – Então nós vamos trabalhar com simple present, do e does, retirando
alguns exemplos da música que nós vimos. Qual foi a música que
nós acabamos de ouvir?
A4 - Love of my life.
P4 - Love of my life. Então, vocês perceberam que essa música ela está
relacionada, ela relaciona-se ao presente, ao passado e ao
futuro? Amor da minha vida, você me machuca. Passado,
presente ou futuro?
A5 – Passado
P5 - Oh, você me machuca e você partiu meu coração. Presente e...
A6 – Passado...
P6 - Passado. Eu vou trabalhar nessa aula alguns aspectos do presente
que nós vimos na aula, mas que vocês precisam entender, e
também a forma afirmativa, negativa e interrogativa do simple
present, do e does, tá? Então, por exemplo, quando você fala
assim, and now you leave me, o que é que ele diz aqui?
A7 - ...
P7 –– Agora você me ...
A8 - ...
P8 – deixa. Agora você me deixa, ótimo. Qual o verbo deixar nessa frase?
A9 – Leave ...
P9 Muito bem, quando ele fala You don’t know, o que significa you
don´t know?
57
A professora havia apontado os objetivos traçados por ela para aquela aula
no excerto 1, quando ela mencionou o tópico gramatical (verbos) e o vocabulário:
P1(vamos trabalhar com os verbos dessa música e com o vocabulário). No excerto 4,
a professora maiores detalhes sobre o assunto da aula, especificando quais tempos
verbais serão abordados, conforme observamos no turno P3 (vamos trabalhar com
simple present, do e does) e, mais adiante, no turno P6 (Eu vou trabalhar nessa aula
alguns aspectos do presente que nós já vimos na aula, mas que vocês precisam
entender, e também a forma afirmativa, negativa e interrogativa do simple present, do
e does, ). Com base nos trechos citados dos excertos 1 e 4, podemos dizer que a
professora tem um planejamento definido para a primeira aula, cujo foco é:
- Verbos (simple present);
- Revisão dos aspectos conceituais do simple present;
- Forma afirmativa, negativa e interrogativa do simple present;
- Uso de do e does;
- Vocabulário.
No excerto 4, após descrever quais serão os conteúdos nos quais a aula será
pautada, a professora chama os alunos a participarem, com a pergunta no turno P3 (...
Qual foi a música que nós acabamos de ouvir?). Depois da resposta esperada (A4 -
Love of my life.), inicia a atividade com a pergunta sobre o tempo verbal utilizado na
música: P6 (Então, vocês perceberam que essa música ela está relacionada, ela
relaciona-se ao presente, ao passado e ao futuro?). Notamos, nesse exemplo, que a
professora parece iniciar sua ação pedagógica pela tradução da letra da música e não a
partir de uma experiência concreta trazida pelos alunos.
Vygotsky (1930) aponta que o desenvolvimento global dos indivíduos
acontece através da organização das funções psicológicas superiores, que por sua vez
organizam-se a partir das transformações dos conceitos cotidianos em conceitos
científicos. Dessa maneira, o conhecimento prévio do aluno (adquirido em suas
interações sociais) e que, neste caso, seria a tradução trabalhada anteriormente,
através da instrução formal (na aula em si) transforma-se em conhecimento científico.
Aparentemente, a tradução configura-se como o conceito científico a partir do qual o
conteúdo será desenvolvido.
58
A abordagem semântica e fonológica descrita nos objetivos da aula é
observada abaixo.
A Gramática
Os aspectos gramaticais do texto foram tratados apenas na primeira aula. As
outras duas aulas da primeira etapa deste estudo tiveram foco lingüístico representado
pela tradução do texto.
A letra da música é, durante a primeira aula, utilizada para exemplificar os
tempos verbais e vai, aos poucos, sendo traduzida. A cada trecho lido, os alunos o
solicitados sistematicamente a encontrar o verbo, dizer se está na afirmativa, negativa
ou interrogativa e em que tempo esse verbo se encontra. No entanto, observamos no
excerto abaixo que a professora parece perceber a importância de uma
contextualização.
Excerto 5 (aula 1 – anexo 1)
P33 - Então nós temos também o presente do verbo, relacionado ao
passado É por isso que eu não trabalho o texto gramatical solto,
tem que ser contextualizado por que se não a coisa não presta,
trabalhar a gramática, é trabalhar o contexto da gramática, com
que relação, com que sentido, com que prática, etc. E quando ele
fala I love you, está em que tempo verbal?
Neste excerto, a fala da professora participante parece revelar que por parte
dela uma consciência da necessidade de contextualização dos elementos gramaticais
abordados durante a aula, tal como sugerido pelos PCN-LE (BRASIL, 2002). Nesse
documento, o ensino-aprendizagem de língua estrangeira é visto de forma holística,
visando ao desenvolvimento global do aluno. A professora parece concordar com tal
olhar. No entanto, suas ações revelam que seu objetivo principal é sistematizar o
aprendizado através de leitura, tradução e classificação das palavras presentes na letra
da música.
Com relação à teoria de ensino-aprendizagem que embasa as ações da
professora-participante, observamos que, em outro ponto desse excerto, ela parece
colocar-se na posição daquele que transmite o conhecimento (P33 - É por isso que eu
59
não trabalho o texto gramatical solto), posição esta marcada pela ausência de espaços
para que se estabeleça a colaboração: o aluno parece ser visto como aquele que
absorve o conhecimento, não tomando parte na construção das ações e permanecendo
numa postura de passividade diante do que é proposto.
O Vocabulário
Como mencionado acima, a professora trabalha a tradução da música no
decorrer da aula 1, enquanto localiza os verbos na letra da música. A tradução, nesse
contexto de aula, parece servir ao propósito de tornar mais claros os exemplos
retirados da música para demonstrar o uso dos verbos. Vejamos o próximo exemplo:
Excerto 6 (aula 1 – anexo 1)
P43 Lembrou? Ok. O que significa means... Quando você falou pra
mim...
A47 – Significa.
P44 Significa, ótimo. Muito bem. Depois eu vou fazer umas perguntas,
pra que vocês possam assimilar e não esquecer mais. Significa. O
verbo know vocês falaram que é o verbo saber ou conhecer. Nesse
contexto é saber né, porque você não sabe, não fica muito bem o
sentido que vai ser. E o verbo remember, o que significa
remember?
A48 – Lembrar.
P45 - Lembrar, ótimo. Muito bem. E por último o verbo love.
A49 – Amar
P46 Amar, amor, muito bem, I love, eu amo, eu te amo, I love, amor,
amar.(...)
No excerto 6, após uma seqüência de perguntas com o objetivo de traduzir
alguns verbos, a professora parece revelar em sua fala uma postura didática que
observa princípios estruturalistas, quando associa um exercício ao processo de
memorização do vocabulário: P44 (Depois eu vou fazer umas perguntas, pra que
vocês possam assimilar e não esquecer mais.). Desta maneira, o conhecimento (do
60
vocabulário) parece ser visto como o produto resultante de um estímulo (umas
perguntas – exercícios).
A tradução, aliás, parece ocupar um papel de suporte para as explicações dos
conteúdos verbais e pronominais presentes na aula, suporte esse que poderia ser feito
pela contextualização desses conteúdos. Isso parece demonstrar que a professora
acredita que, através da tradução, os alunos compreenderão as explicações acerca do
conteúdo gramatical.
A segunda aula também aborda a tradução da música. No próximo exemplo
podemos observar a professora-participante explicando como procederá quanto à
execução da música: deixará tocar um verso e apertará a tecla “pausar” para que seja
possível, como observamos em P72: “analisar a letra”. Vejamos o exemplo:
Excerto 07 (aula 2 – anexo 2)
P72 (...) Eu vou parando devagarinho para a gente analisar a letra.
Nós vamos analisar todas as legendas e vamos tentar traduzir, tá?
DVD Love of my life you’ve hurt me
P73 Pronto, aqui. Love of my life you’ve hurt me. O que é que essa
pessoa fez, o que é que essa pessoa fez com ele que ele está
falando aqui na música, Oh: Love of my life. Vocês falaram que
love of my life significa amor da minha vida
A94 Você me machucou.
P74 Você me machucou, muito bem. Amor da minha vida você me
machucou. Esse amor que machuca é um amor maternal,
paternal ou é um amor de uma outra pessoa, de uma outra
dimensão.
A95 De uma outra pessoa.
P75 De uma outra pessoa, né? Isso, muito bem. Vocês vão me ajudar a
traduzir aqueles que souberem. Nós vamos juntar um pouquinho
que um sabe com o pouquinho que o outro sabe e tentar entender,
tá bom gente?
Podemos perceber, no turno P73, que a professora busca interpretar o que o
autor da letra da música pretendia transmitir, usando para isso a tradução da letra:
61
Love of my life you’ve hurt me. O que é que essa pessoa fez, o que é que essa pessoa
fez com ele que ele está falando aqui na música”.
Outro ponto relativo a esse excerto é o fato de a professora buscar a interação
dos alunos através da compreensão deles do que foi traduzido, ou seja, após ter a
frase traduzida, a professora indaga sobre o que eles entenderam daquela frase,
aprofundando a compreensão da tradução, como observamos no turno P74 Amor
da minha vida você me machucou. Esse amor que machuca é um amor maternal,
paternal ou é um amor de uma outra pessoa(...)”, o que resulta num direcionamento
da participação dos alunos ao ato de responder as perguntas referentes ao vocabulário.
A forma como se configura a segunda aula parece mostrar uma abordagem
tradicional do ensino de língua estrangeira, pela qual os alunos são levados a aprender
os significados de palavras sem, no entanto, envolver uma discussão de valores
sociais, políticos ou culturais. Dessa maneira, a perspectiva adotada não tem por base
uma compreensão de aprendizagem colaborativa com vistas à formação global do
cidadão, na qual professor e alunos debatem, argumentam, posicionam-se, sobre
valores sociais, culturais e morais pertencentes à vida cotidiana dessas pessoas.
No próximo excerto observamos a opinião da professora a respeito do ato de
traduzir:
Excerto 8 (aula 2 – anexo 2)
P85 Você me deixa, ta no presente. E agora, olha aqui o now. Agora
você me deixa. Eu sei que traduzir não é nada bom. Só estou
fazendo isso para nós entendermos mesmo o sentimento do
autor. Nós vamos trabalhar vários dias a mesma música, todas as
expressões, as palavras e etc, bom? Então primeiro o amor o
machucou e depois partiu o que da pessoa?
Um aspecto que não se constituiu como um padrão entre as três aulas, estando
presente somente na segunda aula, é a abertura dada pela professora para a discussão
do tema presente na música. Sendo a música escolhida Love of my life, a professora
utiliza o título para levantar os sentidos dos alunos sobre os diversos tipos de amor,
como observamos no exemplo abaixo:
Excerto 9 (aula 2 – anexo 2)
62
P24 Amor da minha vida. Quem aqui desta sala teve um grande
amor da vida?
A30 Eu...
A31 Eu já...
P25 Pode falar quem teve um grande amor.
A32 Eu nunca tive.
A33 Eu também não, professora.
P26 Vamos lá, um de cada vez. Samanta...
A34 Eu não... não depois que encontrei Jesus.
A35 Ela ama Jesus.
A36 Eu amo meu Deus, agora.
A37 Eu já fiquei em depressão...
P27 Por que você entrou em depressão?
A38 Porque eu gostava dele, e ele ficou com outra no dia do meu
aniversário de 15 anos. Eu tava subindo pra ir na casa dele e ele
tava ficando com uma menina na viela. Fiquei um mês em cima da
cama.
P28 Já teve um grande amor também?
A39 Não aqui, professora.
P29 Ah, lá no Paraná?
A40 É
A professora, após traduzir o título da música, introduz o tema através da
pergunta em P24 Quem aqui desta sala já teve um grande amor da vida?”, ao que
os alunos reagem de maneira participativa, afirmando, como em A30 “Eu...” e em
A31 – Eu já...”; negando, como em A32 Eu nunca tive.e em A33 Eu também
não, professora.”; e por vezes comentando fatos que refletem o cotidiano e as
representações dos alunos, como em A34 –Eu não... não depois que encontrei
Jesus.No entanto, a professora não reage à maioria desses comentários feitos pelos
alunos, apesar de participar dessa interação utilizando frases que chamam a
participação de todos, como percebemos nos turnos P25 - Pode falar quem teve um
grande amor. e em P26 - Vamos lá, um de cada vez. Samanta...”. No excerto acima
temos um exemplo em que a professora, diante do comentário de uma aluna no turno
A37 (“Eu já fiquei em depressão...”), interage perguntando em P27 - “Por que você
63
entrou em depressão?”; no entanto, após a explicação da aluna, a professora não
considera a resposta e inicia turno com outro aluno (P28 teve um grande amor
também?”), continuando a distribuir os turnos. Não observamos, neste trecho,
questões que pareçam buscar a contribuição para a formação do cidadão, ou que
situem os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem em relação ao mundo
social. Não fica, pois, claro o que a discussão do tema acrescenta para eles e por que
isso os faz agir como melhores cidadãos.
De acordo com os PCN-LE (BRASIL, 2002: 15), o professor é responsável
por escolher instrumentos pedagógicos que sejam capazes de envolver o aluno na
construção de significados, auxiliando-o dessa forma no desenvolvimento de uma
consciência crítica capaz de entender como a linguagem é utilizada no mundo social.
Este exemplo parece mostrar que a tentativa de construir um espaço para que os
alunos argumentassem convergiu em um encadeamento de perguntas e respostas entre
professora e alunos e que o conteúdo não teve grande importância para a atividade.
Isso parece ter acontecido em decorrência do tipo de mediação exercida pela
professora, que age mais como uma organizadora da aula que como uma mediadora
na construção do conhecimento. Dessa forma, seus questionamentos pareceram
provocar uma participação superficial dos interactantes.
O tema escolhido parece ser desenvolvido de forma aleatória, sendo que as
intervenções da professora não revelam um fim especifico para a discussão, como
observamos no próximo exemplo:
Excerto 10 (aula 2 – anexo 2)
P61 É, muito bonito. vendo gente, tudo isso é importante. Tudo que
nós fazemos na vida é importante que vocês falem. Porque quando
o professor voz ao aluno, no inglês, na língua inglesa mesmo,
nas nossas outras aulas, vocês percebem que eu sempre dou voz a
vocês. E por que isso? Porque o aluno... o professor só pode
avaliar o aluno, ver como ele foi, de acordo com o que ele fala.
Se vocês não falam, não se manifestam, não pra saber o que
vocês sabem ou não. O que vocês sabem sobre o amor. É o tema
da nossa aula de hoje “Love of my life”... amor da minha vida.
Então, mas vocês acham que esse amor da minha vida pelo qual
64
o autor está falando aqui é referencia ao amor paternal,
maternal ou é o amor de alguém que ele gostou muito.
Outro ponto a ser comentado sobre o excerto 10 é que a professora parece
considerar o fato de os alunos falarem sobre o tema como o ato de se “dar voz”. Como
mencionado anteriormente, dar voz ao aluno o se refere ao aspecto vocal, sonoro
das interações. Nos exemplos retirados do excerto acima quando o professor voz
ao aluno”, o professor pode avaliar o aluno, ver como ele foi, de acordo com o
que ele fala.”, a professora parece buscar, no mundo social (HABERMAS, 1987), a
validação das suas ações pedagógicas. Porém, não se observa, nessa seqüência de
perguntas e respostas, preocupação por parte da professora com a construção de
conhecimentos por meio da argumentação.
O levantamento dos padrões presentes nesta seqüência de três aulas revela
informações importantes a respeito das ações da professora, dentre as quais destaco a
relação assimétrica estabelecida entre professora e alunos, que eu passo a tratar, por
meio da análise dos turnos.
3.1.3. Os Turnos
Em relação aos papéis desempenhados pelos interactantes em uma aula de LE,
os PCN propõem que o professor busque estratégias interacionais para tornar a aula
menos assimétrica. A assimetria é um fenômeno que pode ser identificado na análise
dos turnos, observando-se a maneira como a professora gerencia a participação dos
alunos na aula. O quadro abaixo mostra como se deu a distribuição dos turnos nas três
aulas analisadas:
Quadro 8: Resumo dos turnos
Aula a que se
refere
Distribuição de
turnos (em no.)
Distribuição de
turnos (em %)
1ª. Aula
Professora - 96
Alunos - 103
Professora – 48%
Alunos – 52%
2ª. Aula
Professora - 108
Alunos – 127
Professora – 46%
Alunos – 54%
3ª. Aula Professora - 66 Professora – 54%
65
Alunos – 56 Alunos – 46%
Com base em um levantamento quantitativo no sistema de turnos da fala dos
participantes da aula, observamos que, nas três aulas analisadas, a professora buscou
manter a distribuição de turnos equilibrada entre ela e os alunos. Isto aponta para uma
tentativa de construir uma aula dialogada com a participação verbal do aluno. Esta
atitude revela que, aparentemente, houve intenção de engajar os alunos como
participantes da aprendizagem (VYGOTSKY, 1993). O gráfico abaixo nos ajuda a
visualizar melhor como foi a divisão de turnos ocorrida em cada aula:
Gráfico 1: Distribuição dos turnos entre os participantes
Uma outra forma que esta pesquisa buscou para observar a interação durante
as aulas foi a quantidade de palavras utilizadas nos turnos pelos participantes das
interações. O quadro abaixo nos mostra o total de palavras utilizadas pelos alunos e o
total de palavras utilizadas pela professora-participante durante cada uma das aulas:
Quadro 9: Resumo do no. de palavras nos turnos
Aula a que se
refere
No. de palavras
nos turnos (em no.)
No. de palavras
nos turnos (em %)
1ª. Aula
Professora – 2.692
Alunos – 195
Professora – 93%
Alunos – 7%
2ª. Aula Professora – 2.707 Professora – 78%
AULA 1
52%
48%
0
20
40
60
80
100
120
ALUNOS PROFESSORA
AULA 2
46%
54%
0
20
40
60
80
100
120
140
ALUNOS PROFESSORA
AULA 3
46%
54%
0
10
20
30
40
50
60
70
ALUNOS PROFESSORA
66
Alunos – 763 Alunos – 22%
3ª. Aula
Professora – 1.154
Alunos – 227
Professora – 84%
Alunos – 16%
O quadro acima revela dados qualitativos, demonstrando que, apesar da
distribuição dos turnos ser equilibrada, os participantes apresentam uma grande
desigualdade na produção discursiva. Os gráficos abaixo demonstram visualmente
como essa assimetria se constituiu:
Gráfico 2: Número de palavras dos participantes nos turnos
Tais dados apontam que, nas três aulas analisadas, a professora teve maior
controle da organização textual oral da aula. Isso pode ser verificado no citado
excerto 4, pelo qual é possível verificar que os alunos apenas acompanham a
professora porque respondem ao que está sendo solicitado. Nesse exemplo
observamos também que, apesar da quantidade de palavras nos turnos dos alunos,
com apenas uma palavra nos turnos A5 (Passado), A6 (Passado), A9 (Leave), e
nenhuma palavra nos turnos A7 e A8, a professora considera que essa participação já
está configurada, não buscando uma maior participação dos alunos, com
questionamentos mais elaborados.
Durante a primeira aula, a interação professor-aluno se através do esquema
pergunta e resposta (P-R). Os turnos utilizados para estimular a participação dos
alunos, do tipo: P3 (
Qual foi a música
), P6 (
now you leave me, o que é que ele diz aqui?),
P8
AULA 1
7%
93%
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
ALUNOS PROFESSORA
AULA 2
78%
22%
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
ALUNOS PROFESSORA
AULA 3
16%
84%
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
ALUNOS PROFESSORA
67
(Qual o verbo deixar nessa frase?)
não abrem possibilidade de respostas argumentativas
por parte dos alunos, cuja participação é representada pelo ato de responder perguntas
fechadas.
Observa-se, nessa prática, que a professora-participante parece mediar o
conhecimento dos alunos, seguindo uma linearidade estanque. De acordo com os
estudos feitos por Newman e Holzman (2002) sobre o uso de instrumento, pode-se
dizer que a professora se utiliza de um instrumento (letra da música) para chegar a um
resultado (uso dos tempos verbais), em detrimento de uma prática na qual instrumento
e resultado são indissociáveis, ou seja, uma prática que propicie tanto o
desenvolvimento lingüístico do aluno quanto o engajamento discursivo.
Com relação à formulação das perguntas, observa-se que a professora-
participante privilegia questões que admitem uma resposta e, quando a resposta
esperada não é dada ou é dada de forma incorreta, ela mesma oferece alternativas,
como podemos verificar em P4 (
Passado, presente ou futuro?
). Se, mesmo assim, a
resposta for dada de forma incompleta A5 (
Passado)
, a professora continua diminuindo
as alternativas P5 (
Oh, você me machuca e você partiu meu coração. Presente e...
). Desta
maneira, a professora parece buscar aumentar as possibilidades de acerto, por parte
dos alunos durante a aula.
O modelo interacional aqui observado demonstra que uma alternância de
turnos, porém, a fala da professora é o elemento direcionador da interação.
Observamos também que a professora detém o maior tempo de fala, determinando
sobre o que se fala, como e quando, acabando por reduzir a possibilidade de
engajamento discursivo do aluno. Assim, não se promovem mudanças qualitativas nas
interações em sala de aula. Parece que está sendo priorizado o caráter
institucionalizado do papel do professor como aquele que tem a palavra. Esse papel
parece ser bem aceito pelos demais participantes do processo de ensino-
aprendizagem: os alunos. Os PCN-LE orientam que a mudança nesse quadro
implicaria na atitude do professor de sair de cena e deixar espaço para ser preenchido
com a fala do aluno, ou seja, não ocupar a posição de destaque que socialmente lhe foi
atribuída nas interações da sala de aula, para que o aluno possa colocar e fortalecer
seu discurso.
68
3.2. Análise das Sessões Reflexivas (SR)
Passo agora a analisar as SR referentes à primeira etapa desta pesquisa, usando
como categoria de análise o conteúdo temático, a partir das escolhas lexicais da
pesquisadora e da professora-participante.
3.2.1. Primeira SR
Como mencionado no capitulo metodológico deste estudo, a primeira SR
teve o objetivo de buscar entender a dinâmica de trabalho da atividade com música
elaborada pela professora. A primeira SR aconteceu logo após a primeira aula gravada
e as perguntas foram elaboradas pela pesquisadora com base nessa primeira aula.
A primeira pergunta feita pela pesquisadora Com que freqüência você
trabalha com música na aula de inglês?”, cujo objetivo era entender como esse
recurso é considerado dentro do planejamento da professora-participante, traz como
conteúdo temático a questão da responsividade. Vejamos como se configura o
conteúdo temático na resposta da professora-participante:
Quadro 10: Conteúdo temático 1 – Responsividade
TEMA
Responsividade
CONTEÚDO
TEMÁTICO
O professor é quem dá voz ao aluno
EXEMPLOS
Excerto 5
P1 Pelo menos umas 3 aulas por mês. Eles gostam,
participam, se empolgam mesmo, “cê” viu. É porque eu
dou voz a eles e eles não estão acostumados.
No exemplo acima, quando a professora-participante fala da freqüência que as
letras de música são utilizadas em suas aulas, observamos que por parte dela uma
aparente preocupação com as relações dialógicas (BAKHTIN, 1995) entre os
participantes do processo de ensino-aprendizagem. No entanto, essa relação
configura-se, aparentemente, sem quebrar a hierarquia tradicional, pois o sentido de
“dar voz” parece ligar-se a uma espécie de concessão feita pela professora-
69
participante, como nos mostra o trecho do exemplo É porque eu dou voz a eles”.
Nesse exemplo entendemos que a professora reconhece a necessidade de estabelecer
ações dialógicas durante a aula de inglês. No entanto, parece demonstrar, também,
que ela não chega a considerar esse processo de forma dialética. Ou seja, não parece
considerar a relação dialógica como um movimento recíproco entre os participantes
da interação, em que o papel de “dar” ou “tirar” a voz do outro não seria atribuição
específica de quem tem maior poder na interação.
Ao mencionar que os alunos não estão acostumados ao fato de alguém lhes
“dar voz”, a professora parece reconhecer que a atual estrutura educacional
desconsidera os alunos como capazes de participar, com suas vozes, do processo de
construção do conhecimento. Neste exemplo, a professora também parece reconhecer
o potencial motivacional das atividades com música, demonstrado na descrição feita
por ela da reação dos alunos: “(...) Eles gostam, participam, se empolgam mesmo
(...)”.
A segunda pergunta feita pela pesquisadora, “Como você escolhe a música que
será usada na aula?”, teve como objetivo investigar quais são os critérios
considerados pela professora-participante ao escolher a música para as atividades.
Observamos que parece haver certa preocupação por parte da professora-participante
no momento da escolha da música, no sentido de adequar o conteúdo da letra ao
conteúdo gramatical que está na seqüência do planejamento, como observamos no
exemplo que ilustra o próximo conteúdo temático:
Quadro 11: Conteúdo temático 2 – A música no ensino de gramática
TEMA
A música no ensino de gramática
CONTEÚDO
TEMÁTICO
A música serve para reforçar o conteúdo gramatical
EXEMPLOS
Excerto 5
P2 Eu já tenho muita experiência de trabalhar com música,
então pra mim é fácil. Eu vejo o que eu estou dando na
matéria e pego uma música para reforçar. Geralmente
eu uso duas aulas, por que numa eu levanto as idéias
deles, dou voz a eles e na segunda aula eu faço uma
conexão com a matéria gramatical, vocabulário, essas
coisas. Dependendo da matéria, eu chego a dar até em
70
três aulas.
Ps3 Quando você trabalha com música qual é o seu objetivo:
gramática, vocabulário...
P3 - Não, é tudo. É pegar uma parte da vida deles, é trabalhar
a vida deles pra trazer... pra fazer com que eles tragam
idéias sobre aquele assunto que eles têm, entendeu?
Então é um trabalho colaborativo. Eles trazem as idéias
deles e eu junto com outro colega pra trabalharmos
todas essas idéias novas, pra também analisar
vocabulário e fazer uma conexão também com as
próprias músicas. É uma junção de coisas, é trazer
aquilo que é conhecimento anterior também para que
eles argumentem em sala de aula, pra que eles também
melhorem o vocabulário de língua inglesa, também
trabalhar os conteúdos gramaticais em toda parte
gramatical. Os verbos que eles estão tendo, então eu
faço uma conexão.
No exemplo acima, no trecho Eu vejo o que eu estou dando na matéria e
pego uma música para reforçar.”, a professora descreve como é feita a escolha da
música para a atividade: ela parece priorizar o conteúdo lingüístico em detrimento do
conteúdo geral que a letra de música apresenta. Desta maneira, o eixo central da aula
passa a ser o conjunto de normas gramaticais (conteúdos lingüísticos) inseridos no
texto, enquanto os aspectos sociais, culturais e históricos (conteúdos gerais) passam
para um segundo plano e geralmente não cabem nos cinqüenta minutos de aula. Tais
questões acabam, muitas vezes, não sendo trabalhadas devido ao foco conteudista
que, em geral, os planejamentos possuem.
Podemos neste exemplo, também, apontar para a seqüência descrita pela
professora-participante. Como mencionado, a escolha da música, segundo ela, é
feita de acordo com a matéria que ela estiver dando no momento. A atividade com
música entra como instrumento de reforço de aprendizagem, como é possível observar
no trecho em que ela explicita a seqüência do seu planejamento: após a escolha da
música, baseada na matéria que está sendo dada e diante da necessidade de se reforçar
71
os conteúdos, a atividade se desenvolve em duas aulas (ou até três, dependendo do
conteúdo). Na primeira aula, de acordo com a professora, acontece a ação de “dar
voz” ao aluno e na segunda aula, faz-se a conexão da música com o vocabulário e
gramática.
Essa divisão das etapas da atividade parece apontar que a professora considera
os aspectos relacionados ao conteúdo programático dissociados dos aspectos
relacionados ao desenvolvimento discursivo. Dessa maneira, trabalhando os
conteúdos de forma isolada, a professora parece, como apontado na análise da
primeira aula, estar usando as atividades com música como um instrumento-para-
resultado (NEWMAN & HOLZMAN, 2002). Nessa perspectiva, o resultado que se
espera é que define a escolha do instrumento utilizado para alcançá-lo.
A terceira pergunta feita pela pesquisadora no turno Ps3 Quando você
trabalha com música qual é o seu objetivo: gramática, vocabulário... também
contribui na busca do entendimento do que a professora-participante colocava como
objetivos para as aulas analisadas. Observamos pela sua resposta no turno P3 Não, é
tudo.”, que ela demonstra considerar, em seus planejamentos de aula, diversos
aspectos. A seguir, a professora inicia a explicação dos seus objetivos, definindo-os
como sendo “(...) uma junção de coisas, (...)”,cuja contextualização “(...) é trazer
aquilo que é conhecimento anterior...”, com o propósito “(...) que eles argumentem
(...)”. No que se refere aos aspectos das normas gramaticais e aos aspectos
morfológicos, a professora aponta que o trabalho também busca “(...) que eles também
melhorem o vocabulário de língua inglesa, (...)” e que o planejamento da atividade
prevê “(...) também trabalhar os conteúdos gramaticais em toda parte gramatical.”
A descrição dos objetivos pela professora-participante parece mostrar algumas
contradições. Apesar de declarar que esse trabalho desenvolvido por ela “(...) é um
trabalho colaborativo.”, as escolhas lingüísticas utilizadas na descrição de sua
organização de aula parecem demonstrar que as interações no desenvolvimento da
atividade em si não privilegiam a construção colaborativa do conhecimento. Na
observação das escolhas lexicais destacadas no quadro dos conteúdos temáticos
acima, verificamos, em amarelo, todos os verbos que demonstram as ões da
professora (ou atribuídas a ela quando se refere ao planejamento); em rosa,
verificamos as ações que os alunos executariam dentro do planejamento dessa aula e,
em verde, o que seria feito de forma colaborativa. Observemos a síntese dessas
escolhas, no quadro abaixo:
72
Quadro 12: Verbos utilizados na descrição das ações
Verbos
relacionados ao
objetivo das aulas
(ligado às ações da
professora)
Verbos que ajudam
a entender qual é a
ação da professora
Verbos que ajudam
a entender o papel
dos alunos
Verbos que ajudam
a entender a
construção do
trabalho
colaborativo.
É pegar Eu já tenho (pra fazer com que)
eles tragam
pra trabalharmos
Trabalhar Eu vejo Eles trazem
pra fazer eu estou (para que) eles
argumentem
Analisar Pego (pra que) eles
(também)
melhorem
Fazer eu uso Eles estão tendo,
Trazer eu levanto
Trabalhar dou voz
eu faço
eu chego a dar
eu junto
eu faço
No quadro acima visualizamos o que, dentro da descrição dos objetivos da
aula, seria o papel da professora e dos alunos. Os verbos que refletem as ações da
professora e o objetivo da aula denotam uma situação de comando, de quem está em
uma posição de quem é responsável por dirigir (no caso a aula) e prover (no caso o
conhecimento). Os verbos que são ligados ao aluno são predominantemente ligados às
ações desempenhadas pela professora, ou seja, refletem que a ação dos alunos está
condicionada a uma ação anterior da professora. Dessa maneira, em nenhum momento
73
o aluno parece compartilhar a construção das aulas com a professora, que durante a
descrição dos objetivos só utilizou o discurso implicado
1
uma vez no trecho analisado.
A quarta pergunta: Como você planejou as aulas onde você vai trabalhar a
música que voescolheu? Como você dividiu?”, teve o propósito de compreender a
distribuição dos objetivos da atividade nas duas ou três aulas que a professora
declarou serem necessárias. O conteúdo temático que emergiu na sua resposta, que já
havia emergido ao final do turno P3 no exemplo anterior, foi o que a professora
entende por dar voz ao aluno. Vejamos o exemplo a seguir:
Quadro 13: Conteúdo temático 3 – Dar voz ao aluno 1
TEMA
Dar voz ao aluno
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Dar voz ao aluno é deixar que ele fale
EXEMPLOS
Excerto 6
P3 (...) Quando eu dou voz ao aluno, que eu ouço aquilo
que eles trazem também, é uma maneira de você fazer
com que o aluno perca a inibição, que ele fale um
pouco, que ele se organize, que ele argumente, tem tudo
isso quando você for pensar, ta? Então a proposta é esta:
que ele fale, que ele argumente, que o aluno consolide o
conhecimento que ele tem sobre aquele tema também e
que faça uma ligação também.
P4 (...) Depois eu vou na próxima aula fazer uma conexão
primeiro com todo histórico deles pra trazer pra poder ta
relacionando com a música. Daí é quando eu dou voz a
eles, eles vêem o que a música diz e relacionam com a
vida deles e falam o que aquilo tem a ver com a vida
deles.
1
O foco desta análise não está centrado nos tipos de discurso (BRONCKART, 2007). No entanto, faz-
se necessário essa menção do discurso implicado, para que se torne claro o exemplo aqui utilizado.
74
No exemplo acima, a professora esclarece o que ela entende por dar voz ao
aluno. Aparentemente, para a professora o “dar voz” ao aluno refere-se à produção
vocal e não à questão da responsividade (BAKHTIN, 1995).
Nesse sentido, a abertura de um espaço para o diálogo crítico na sala de aula,
em que alunos e professora podem se manifestar, seria uma maneira colaborativa de
conduzir os trabalhos. A professora menciona em certo trecho “Quando eu dou voz ao
aluno, que eu ouço aquilo que eles trazem também (...)”, demonstrando que ela
entende a necessidade de estabelecer uma atitude responsiva, de ouvir o outro.
Segundo Paulo Freire (1996: 80), a virtude necessária de um educador democrático
é saber ouvir. Mas ouvir o outro significa mais que captar os sinais sonoros emitidos
por ele. É necessário que o outro seja ouvido em sua totalidade, ouvir sua cultura,
sua linguagem, sua historicidade”. Para a construção desse movimento responsivo,
além de ouvir o outro se faz necessário ouvir a própria fala e entender o poder que o
discurso do professor possui.
Em relação a uma possível construção de colaboração entre a pesquisadora e a
professora-participante, percebe-se que, por esta SR ter sido basicamente estruturada a
partir de perguntas fechadas, as possibilidades para a ação foram muito reduzidas.
Ao reler a transcrição da primeira SR, a pesquisadora buscou orientação junto
ao grupo do seminário de pesquisa. A apresentação dos dados gerou importantes
contribuições dos colegas do grupo para o entendimento da pesquisadora acerca da
construção da colaboração.
3.2.2. Segunda SR
A segunda sessão reflexiva aconteceu após a terceira aula gravada referente à
primeira etapa desse estudo e foi elaborada com base no esclarecimento de alguns
pontos referentes à primeira sessão reflexiva e também nas anotações feitas pela
pesquisadora durante a gravação das três aulas.
O primeiro conteúdo temático selecionado refere-se a como a professora
contextualizou a seqüência de atividades em que utilizou a música Love of my life.
Vejamos os exemplos:
75
Quadro 14: Conteúdo temático 4 – A contextualização
TEMA
A contextualização como uma das etapas da atividade com música
CONTEÚDO
TEMÁTICO
A contextualização dos conteúdos nas atividades com música
EXEMPLOS
P2 Três aulas. Então primeiro eu trago o contexto cotidiano
pros alunos em relação ao contexto da música, depois eu
entro na parte do vocabulário depois eu faço a relação do
vocabulário com a vida deles, com aquilo que eles entendem,
aquele contexto que está na música que tem um significado em
toda a música, e em seguida eu trabalho os aspectos
gramaticais, eu completo a relação de presente/passado, ou
presente com o futuro, então não é aquela gramática
simples, ela tem relação com outros desdobramentos também.
No exemplo acima, observamos que a professora descreve como a atividade
planejada se desenvolveu nas três aulas que ela mencionou serem necessárias para se
trabalhar uma letra de música. Observemos como ela estabelece a seqüência:
Quadro 15: Descrição da professora acerca da ordem dos conteúdos
1ª. Aula O contexto da música. Exemplo: “(...) primeiro eu trago o
contexto cotidiano pros alunos em relação ao contexto da
música,(...)”
2ª. Aula O Vocabulário. Exemplo: “(...) depois eu entro na parte do
vocabuláriodepois eu faço a relação do vocabulário com a
vida deles,(...)”
3ª. Aula A gramática. Exemplo: “(...) em seguida eu trabalho os
aspectos gramaticais,(...)”
Nas três aulas analisadas, encontramos as partes que a professora menciona
acima, mas em uma ordem diferente:
76
Quadro 16: Como os conteúdos são organizados em cada aula
1ª. Aula Gramática (verbos, pronomes) e Vocabulário (tradução);
2ª. Aula Comentários sobre a banda; discussão sobre o tema amor,
referindo-se ao titulo da música e Vocabulário (tradução);
3ª. Aula Vocabulário (tradução).
A professora, ao descrever a forma como as aulas com letras de música
costumam se estruturar, utiliza sempre o pronome na primeira pessoa do singular,
parecendo colocar-se como detentora do conhecimento, como observamos na
seqüência de recortes a seguir: “(...) eu trago o contexto cotidiano pros alunos em
relação ao contexto da música (...)”, “(...) eu entro na parte do vocabulário (...)”,
“(...) eu faço a relação do vocabulário com a vida deles (...)”, “(...) eu trabalho os
aspectos gramaticais (...)”. Nesses exemplos, o posicionamento enunciativo da
professora parece demonstrar com quem ela acredita estar o conhecimento e a
autoridade para direcionar a aula, restando ao aluno um papel secundário e passivo na
construção das interações.
Podemos observar que o que a professora descreve, no quadro 14,
como sendo o contexto da música (colocado pela ordem de narração na primeira
aula), nas aulas analisadas nesta pesquisa surge como a discussão do tema amor
(referente à segunda aula). Nesse momento, a professora abre espaço para que os
alunos falem sobre a banda e sobre o tema relacionado ao título da música. Porém,
pela natureza das perguntas feitas pela professora e pela forma como ela administra os
turnos, esse espaço parece configurar-se de maneira restrita. Outro fato que chama a
atenção durante a segunda sessão reflexiva é que a professora menciona algumas
vezes que ela voz ao aluno. No exemplo abaixo, a professora fala qual é a sua
concepção sobre o que é dar voz ao aluno:
77
Quadro 17: Conteúdo temático 5 – Dar ao voz ao aluno 2
TEMA
O que é dar voz ao aluno
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Dar voz ao aluno é ouvir o que os alunos trazem da sua vivência
EXEMPLOS
Ps6 Na sessão reflexiva anterior, você mencionou a
importância de dar voz ao aluno. O que você entende por dar
voz ao aluno?
P6 Dar voz ao aluno, significa você estabelecer uma conexão
com ele, diante daquilo que você quer trabalhar, por
exemplo, eu acho assim, que o professor trabalha os
conceitos científicos, mas você não pode trabalhar os
conceitos científicos, ou seja, gramática, vocabulário, sem
ouvir aquilo que o aluno conhece da sua realidade, do seu
sócio-histórico-cultural, então, dar voz ao aluno é ouvir os
conceitos cotidianos que eles trazem da sua vivência do
seu contexto sócio-histórico-cultural, e com isso, você
trabalha os conceitos científicos, porque quando os alunos
falam ou mencionam aquele, as suas experiências, um
compartilha com o outro e vice-versa, e o professor também
compartilha com esses alunos. Então, dar voz ao aluno,
significa ouvir aquilo que eles trazem, compartilhar uns
com os outros e também com o professor, e através disso
você fazer um levantamento do que eles dizem para
trabalhar os conteúdos gramaticais, o vocabulário que são
científicos.
Vejamos a síntese composta pelos recortes do excerto, mostrando que para a
professora-participante dar voz é:
“(...) estabelecer uma conexão com ele, diante daquilo que vo quer
trabalhar (...)”;
“(...) ouvir os conceitos cotidianos que eles trazem da sua vivência do seu
contexto sócio-histórico-cultural, (...) ouvir aquilo que eles trazem,
compartilhar uns com os outros e também com o professor, (...)”
78
O que podemos perceber, pelo exemplo acima, é que a definição do que é “dar
voz ao aluno” para a professora não está relacionada à visão dialógica de linguagem
conforme concebida por Bakhtin; não se reconhece, aí, a atitude responsiva dos
envolvidos na interação, nem a construção partilhada da voz de cada um, perspassada
pela voz do outro. Dar voz através da responsividade é dotar o outro dos instrumentos
necessários para que ele consiga agir discursivamente no mundo. A proposta dos
PCN-LE (BRASIL, 2002: 15) é que o professor partilhe seu poder e dê “voz ao aluno,
de modo que este possa se constituir como sujeito do discurso e também da
aprendizagem.
O que a professora parece entender por “dar voz” aproxima-se do processo pelo
qual o professor busca conhecer quais são os conceitos cotidianos trazidos pelos
alunos. Através do levantamento dos conceitos cotidianos, aqueles que são
desenvolvidos informalmente como produto das experiências de cada indivíduo,
torna-se possível organizar formas que possibilitem a cientifização desses conceitos,
que deixam de ser cotidianos para tornarem-se conceitos científicos.
No excerto selecionado, encontramos indícios de que a significação dada pela
professora ao “dar voz” pode estar ligada à transformação de conceitos cotidianos em
científicos, como podemos analisar nos seguintes recortes:
(...) eu acho assim, que o professor trabalha os conceitos científicos, mas
você não pode trabalhar os conceitos científicos, ou seja, gramática,
vocabulário, sem ouvir aquilo que o aluno conhece da sua realidade, do seu
sócio-histórico-cultural (...)”;
(...) dar voz ao aluno é ouvir os conceitos cotidianos que eles trazem da sua
vivência do seu contexto sócio-histórico-cultural, e com isso, você trabalha os
conceitos científicos, (...)”;
(...) significa ouvir aquilo que eles trazem, compartilhar uns com os outros e
também com o professor, e através disso você fazer um levantamento do que
eles dizem para trabalhar os conteúdos gramaticais, o vocabulário que são
científicos.”
Nos exemplos acima, observamos que a professora cita os termos “conceito
cotidiano e científico” diversas vezes, fazendo menção ao levantamento do que eles
dizem para trabalhar os conteúdos gramaticais, o vocabulário”, que ela classifica
79
corretamente como conceitos científicos, pois fazem parte do aprendizado escolar.
Desta maneira, visualizamos, através desses exemplos, que a concepção tida pela
professora do que é dar voz ao aluno é, na verdade, parte do processo da formação de
conceitos (VYGOTSKY, 1994: 136).
Como mencionado no capítulo de Metodologia deste trabalho, a professora-
participante desta pesquisa é aluna do programa de Lingüística Aplicada e Estudos da
Linguagem (LAEL) da PUC-SP, o que justifica seu conhecimento teórico. Utilizando
o termo mencionado no excerto acima, podemos dizer que a professora teve contato
com uma série de conceitos científicos, porém a apropriação desses conceitos por ela
tem um sentido particular, que se revela quando ela associa a teoria com a sua prática.
No próximo excerto, o conteúdo temático selecionado diz respeito à função
que a professora-participante atribui ao ato de dar voz ao aluno:
Quadro 18: Conteúdo temático 6 – Reflexos de se dar voz ao aluno
TEMA
Os reflexos de se dar voz ao aluno
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Dar voz ao aluno auxilia na socialização, na organização do
pensamento e na capacidade de argumentação.
EXEMPLOS
P10 – Tá, você percebe na sala de aula que geralmente os
alunos são muito tímidos, eles não gostam de falar, eles
têm dificuldade de se organizar, de argumentar, dar sua
opinião. Quando você começa a dar voz ao aluno, fazer com
que eles interajam entre eles e com o professor, você
percebe que através dessa organização de pensamento,
dessa fala, ele consegue também se estruturar na escrita,
porque geralmente eu percebo dentro de todo o projeto de
trabalho que eu desenvolvo ... que os alunos eles têm muita
dificuldade de se socializar, então quando você voz ao
aluno e eles falam, às vezes você até ajuda em algumas
palavras que fujam aquele contexto, eles também conseguem
argumentar muito melhor em outros aspectos, até no social,
na vida com a família ou em outros contextos.
Observamos, no excerto anterior, que a professora cita algumas contribuições
que o ato de “dar voz” ao aluno propicia, como quando os “(...) alunos são muito
80
tímidos, eles não gostam de falar, eles têm dificuldade se organizar, de argumentar,
dar sua opinião. (...)”. Neste exemplo a professora aponta para a necessidade de o
aluno reivindicar sua participação na aula de modo “(...) que eles interajam entre eles
e com o professor, (...)” e através dessa interação, desse momento em que a professora
dá voz a eles, por meio “(...) dessa organização de pensamento, dessa fala, ele
consegue também se estruturar na escrita (...)”. A professora aponta para o fato de
que externar seus pensamentos ajuda os alunos a organizarem-se de uma maneira oral
e escrita, o que nos remete, mais uma vez, à teoria vygotskiana da formação de
conceitos, segundo a qual, através da interação, acontece a construção compartilhada
do conhecimento e a internalização dos conceitos.
No próximo excerto, a professora fala sobre o que é, em sua concepção,
ensinar e aprender, focando o papel do professor. Vejamos:
Quadro 19: Conteúdo temático 7 – O sentido de ensinar
TEMA
Qual o sentido de ensinar na aula de inglês
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Ensinar é um processo dialético entre professor e aluno
EXEMPLOS
P11 - Eu acho que ensinar é uma coisa muito ampla, eu acho
que ensinar está relacionado a educar, não é o professor
dar um conteúdo e o aluno ouvir. Ensinar envolve um
processo dialético, o aluno traz as suas experiências, seus
conceitos, e o professor está ali pra lhe suplantar, pra
mediar esse conhecimento, dentro da visão que ele tem,
mas num processo dialético, num processo que envolva o
professor e aluno numa situação dialética mesmo.
No exemplo acima, a professora apresenta o seu ponto de vista sobre o que é
ensinar e sobre qual é o papel do professor, dos quais eu destaco as seguintes frases:
(...) ensinar é uma coisa muito ampla, (...)”
(...) ensinar está relacionado a educar, (...)”
(...) Ensinar envolve um processo dialético, (...)”
(...) o aluno traz as suas experiências, seus conceitos, e o professor está ali
pra lhe suplantar, pra mediar esse conhecimento (...)”
81
Essas frases utilizadas pela professora nos mostram que a sua visão de ensino-
aprendizagem prevê a consideração do papel do outro numa construção dialética do
conhecimento, em que o papel do professor não é “(...) dar um conteúdo e o aluno
ouvir. (...)”. Ela pontua para a necessidade de o professor ser um mediador do
processo de ensino-aprendizagem.
Quanto ao conteúdo das aulas de inglês, a professora menciona que ensina
inglês por níveis, ou seja, mesmo que os alunos estejam no 2º. Ano do EM, se o
conhecimento deles não condisser com o que o planejamento dessa série prevê, ela
retoma os conteúdos básicos para que eles entendam as regras que regem a língua. Ela
refere-se a esses pontos básicos como conteúdos significativos. Vejamos, no próximo
exemplo, o que ela coloca como sendo significativo para alunos do nível básico.
Quadro 20: Conteúdo temático 8 – Conteúdo significativo
TEMA
Conteúdo significativo considerado para o nível básico de inglês
CONTEÚDO
TEMÁTICO
O uso dos verbos, frases prontas e assimilação de palavras pela
prática de diálogos
EXEMPLOS
P13 (...) Eu procuro trabalhar o inglês por estágios, por base, não
quero trabalhar muito conteúdo. Trabalho um conteúdo que seja
significativo pra que eles consigam se mobilizar, dentro do
contexto em que eles estejam inseridos.
Ps14 E quando você classifica o “conteúdo significativo”, qual é a
estrutura que você privilegia ou o que você costuma privilegiar?
P14 – No contexto significativo? Pra eles? Eu acho que o inglês
básico, pra que o aluno se organize, pra que ele se mova
dentro do contexto social, eu coloco o verbo to be, simple
present, present continuous, palavras que sejam básicas,
situações básicas, ou diálogos básicos como: How are you? I
am fine thank you. What’s your name? Where are you from?
Então eu uso situações de diálogos, situações, textos e músicas
que estejam relacionadas ao contexto deles, à vivência deles, que
não fujam muito à vivência deles, mas que também eles possam
aproveitar no dia-a-dia, em várias situações.
82
No exemplo acima, a professora coloca que (...) pra que o aluno se organize,
pra que ele se mova dentro do contexto social, (...)” ela faz uma seleção de conteúdos
de acordo com o nível, nesse caso para o nível básico ela destaca: (...) eu coloco o
verbo to be, simple present, present continuous, palavras que sejam básicas, situações
básicas, ou diálogos básicos como: How are you? I am fine thank you. What’s your
name? Where are you from? (…)”.
Esses conteúdos a que a professora se refere como significativos são
indiscutivelmente importantes. Entretanto, são os conteúdos que o ensinados
sistematicamente ano após ano. Daí surge um questionamento: se todos os anos os
alunos aprendem esses conteúdos, por que razão tem sido necessária sua retomada
constante?
Como mencionado pela professora participante no quadro 20, é preciso
levantar os conceitos cotidianos para que, a partir deles, se possam pensar maneiras
realmente contextualizadas com a realidade do aluno, de se formar os conceitos
científicos. A sistematização dos conhecimentos escolares faz sentidos se pensada
dessa maneira. O aprendizado escolar organizado e sistematizado deve existir para
servir de base para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores (FPS), tais
como relatar, organizar, narrar, comparar, diferenciar, classificar, discutir, dentre
tantas. No entanto, o que ocorre é a abordagem descontextualizada dos conceitos
científicos e um levantamento superficial dos conceitos cotidianos.
83
2ª. ETAPA
3. 3. Análise da Terceira Sessão Reflexiva
Passo, a partir de agora, a analisar a terceira sessão reflexiva, na qual
professora-participante e pesquisadora, após leitura cuidadosa das transcrições das
aulas e das SR da 1ª. etapa, buscaram pontos a serem repensados referentes às
escolhas e ações que permearam as três primeiras aulas. Para isso, utiliza-se aqui o
levantamento dos conteúdos temáticos. Como as aulas analisadas eram da professora-
participante, a pesquisadora dirigiu a discussão levantando questões que considerou
problemáticas.
O primeiro conteúdo temático que será abordado nesta análise é a
recapitulação :
Quadro 21: Conteúdo temático 9 – Recapitulação
TEMA
Recapitulação
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Recapitulação das ações pedagógicas descritas pela professora nas
sessões reflexivas anteriores
EXEMPLOS
Ps6 Ok, vamos lá. Eu observei na leitura da transcrição da primeira
sessão reflexiva que você fala bastante do que é dar voz ao aluno,
né? Você começa colocando como você escolhe a música, então
você descreve como é que nessa música você definiu o
objetivo, você disse também que o objetivo não é gramatical,
que o objetivo na verdade, por ser um trabalho colaborativo, ele
tenta englobar todos os aspectos na aula de inglês, a
gramática, o vocabulário, cruzar com a realidade deles, que é
trazer o conhecimento anterior, e fazer com que eles
argumentem. Você acha que na aula 1 eles argumentaram em
algum momento?
P6 – Não, realmente na aula 1 eles não argumentaram pra nada.
Ps7 - Onde então você acha que eles argumentaram, em qual
aula...
P7 Bom... na dois eles argumentaram, né? Aqui, olha, quando
eles relacionam os aspectos da música com a vida deles.
84
No excerto acima observamos, no turno Ps6, que a pesquisadora tenta
recapitular a descrição que a professora-participante havia feito dos objetivos da
atividade com música nas duas sessões reflexivas anteriores. São citadas as ações que
a professora mencionou: Você começa colocando como você escolhe a música, então
você descreve como é que nessa música você definiu o objetivo (...)”. A seguir, a
pesquisadora recapitula o que a professora participante havia colocado como sendo
seu objetivo: “o objetivo não é gramatical (...) ele tenta englobar todos os aspectos na
aula de inglês, a gramática, o vocabulário, cruzar com a realidade deles (...) trazer o
conhecimento anterior, e fazer com que eles argumentem.” A pesquisadora busca
ajudar a professora a comparar as ações pedagógicas pretendidas para que, baseada na
transcrição das aulas, ela pudesse entender quais pontos referidos em seu
planejamento haviam realmente sido alcançados.
Dos objetivos que a professora apontou para as atividades, a pesquisadora foca
em um ponto específico referente à aula 1: Ps6- Você acha que na aula 1 eles foram
levados a argumentar em algum momento?”. Dessa maneira buscou-se despertar na
professora um posicionamento frente a sua prática, ao que ela responde no turno P6:
Não, realmente na aula 1 eles não argumentaram pra nada.”, demonstrando ter
consciência de que seus objetivos não foram alcançados. Entretanto, quando a
professora diz que na aula 1 eles não argumentaram, fica subentendido que eles
argumentaram em algum outro momento das outras duas aulas.
Durante a primeira etapa deste estudo as duas primeiras sessões reflexivas
foram baseadas nas ações do descrever e informar sugeridas por Smyth (1992), no
sentido de nortear o processo de reflexão crítica. A terceira sessão reflexiva, baseada
nessa primeira ação, em que a professora descreveu seus objetivos, busca continuar o
processo reflexivo através de perguntas que ainda conduzam ao informar, mas que,
juntamente com o descrever, são a base da sustentação do confrontar, quando o
professor lança um olhar crítico sobre sua prática e revê seu objetivo de preparar o
aluno para agir no mundo.
A ação de informar baseia-se no descrever, pois através da descrição daquilo
que ele faz, o professor tenta situar suas ações no mundo. Com base na leitura das
transcrições das aulas e das duas sessões reflexivas anteriores, nas quais a professora-
participante descreve os objetivos pretendidos, a pesquisadora pede que ela aponte,
nas transcrições, o momento em que ocorreu a concretização do objetivo traçado por
ela de levar os alunos a argumentarem, como observamos em Ps7 Onde então você
85
acha que eles argumentaram, em qual aula...”. Como já apontado acima, na discussão
do turno P6, a professora deixa subentendido que seu objetivo de levar os alunos a
ações argumentativas aconteceu, não na primeira, mas em algum momento das outras
duas aulas. A professora aponta em P7 – na dois eles argumentaram, né? Aqui, olha,
quando eles relacionam os aspectos da música com a vida deles. A professora-
participante aponta, na aula dois, momentos em que os alunos utilizam estrutura
argumentativa para relacionar suas experiências pessoais com a música.
Como discutido na análise da segunda aula, tal ocorrência constituiu-se, na
verdade, em uma espécie de levantamento de informações acerca de quem havia
tido um grande amor, sem, no entanto, aprofundar-se na discussão.
O próximo conteúdo temático relaciona-se com a negociação do significado
do ato de argumentar, constituindo-se uma ação do confrontar, sustentada pelo
informar e pelo descrever. Busca-se, pois, lançar um olhar crítico sobre as práticas
pedagógicas, visando a fortalecê-las e direcioná-las para cumprir o objetivo de
preparar o aluno para agir no mundo.
Quadro 22: Conteúdo temático 10 - Argumentação
TEMA
Argumentação
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Os alunos argumentaram ao falar de suas experiências
EXEMPLOS
Ps9 - E isso seria aqui na aula 2 que você disse, né? (...) Num outro
trecho você fala “amor da minha vida, quem é que dessa sala
já teve um grande amor da vida” e em resposta os alunos
começam a descrever quem já teve o amor da vida. Como você
caracterizaria isso? Você acha que eles estão nesse momento
de falar do amor da vida deles, eles estão exercitando a
argumentação?
P9 Acho, porque eu estabeleço uma relação com aquilo
que eles trazem da vida deles pra entender a música, como
o tempo da música, fazer essa ligação, esse elo.
Ps10 - Mas assim, dos elementos que compõem a
argumentação, qual seria o momento que ele argumenta?
Aqui na seqüência de perguntas e respostas acabou que todo
mundo acabou contribuindo, mas contribuindo com
informações, então eles falam, eu amei alguém, eu sofri,
86
dialogando com você de uma maneira ...
P10 - Respostas diretas, né?
Aqui eu faço eles darem
respostas diretas mesmo, cada um fala um pouquinho. Eu
não fui adiante, né. Eu estou percebendo seu ponto. Eles
falaram, contaram coisas, realmente não argumentaram,
não.
No excerto acima, observamos que a pesquisadora parece buscar os sentidos
da professora sobre o que ela entende por “argumentação”. Vejamos o trecho do turno
Ps9: Você acha que eles estão nesse momento de falar do amor da vida deles, eles
estão exercitando a argumentação?”. Com essa pergunta, a pesquisadora parece
convidar a professora a refletir sobre a função social da aula apontada como exemplo
de exercício argumentativo. A professora-participante responde ao questionamento
parecendo demonstrar, inicialmente, certa convicção a respeito do momento em que
ela propicia as condições necessárias para que os alunos argumentem, como
observamos no turno P9 Acho, porque eu estabeleço uma relação com aquilo que
eles trazem da vida deles pra entender a música”. A pesquisadora insiste em que a
professora aponte quando, na aula mencionada por ela, os alunos argumentaram: Ps10
“(...) qual seria o momento que ele argumenta? (...) todo mundo acabou contribuindo,
mas contribuindo com informações”. Essa fala da pesquisadora aponta para o fato de
que faltam elementos importantes no trecho apontado pela professora-participante
para que eles possam se constituir como ões argumentativas. O que ocorre,
efetivamente, é a própria ação mediadora da professora nesses momentos, sem
conectivos de justificação e justaposição, não buscando que os alunos elaborassem
suas respostas de forma a refletirem sobre o tema abordado. Ao reler a transcrição
com o propósito de apontar para a pesquisadora o trecho em que havia argumentação,
a professora conclui: P10 “Aqui eu faço eles darem respostas diretas mesmo, cada um
fala um pouquinho. Eu não fui adiante, né. Eu estou percebendo seu ponto. Eles
falaram, contaram coisas, realmente não argumentaram, não.Da mesma maneira
que a professora utiliza, no início da análise desse excerto, o pronome pessoal eu
quando se coloca no papel de quem propicia as condições necessárias para que os
alunos argumentem, agora ela o usa numa demonstração de aparente auto-
responsabilização pelo fato de que a discussão sobre o tema da música não tenha
evoluído como ela esperava.
87
Liberali (2003) pontua que o confrontar organiza-se, essencialmente, pela
argumentação. a apresentação de pontos de vista relacionados aos assuntos
abordados, às ações descritas e aos conceitos discutidos e a colocação de razões
sociais, políticas e históricas para a avaliação da realidade dos alunos. Discutindo as
ações do confrontar, Celani (2000) aponta para o fato de que o professor trata da
formação do indivíduo no que se refere ao seu desenvolvimento de valores, de
posicionamento na sociedade e no mundo. Para a autora, durante o confrontar, o
professor percebe que ensinar não é uma atividade neutra. E, no caso do ensino de
língua estrangeira, ela lembra que a criticidade é particularmente importante para se
garantir que os valores da cultura estrangeira, que necessariamente fazem parte dessa
aprendizagem, sejam entendidos a partir de uma postura reflexiva, que tenha como
objetivo formar o cidadão brasileiro.
A busca da ação do confrontar nessa sessão reflexiva focou propiciar maior
desenvolvimento da reflexão crítica, conforme salienta Smyth (1992). No próximo
excerto temos mais um exemplo dessa busca do estabelecimento da ação do
confrontar:
Quadro 24: Conteúdo temático 11 – Tradução 1
TEMA
Tradução
CONTEÚDO
TEMÁTICO
As interações voltadas para a tradução do texto
EXEMPLOS
Ps15 - Dentro desse encadeamento de perguntas e respostas que
ocorreu na aula, por exemplo, eu separei alguns exemplos que
estão pintados em azul claro na sua cópia. Aqui a gente tem
assim: “pode falar quem teve um grande amor”, então um diz, “eu
nunca tive, eu também não, depois que eu encontrei Jesus”, então
assim, surgiram pessoas falando do amor pelos filhos, do amor
pelos pais, na verdade relatando os tipos de amor que eles tinham.
Você acha que esse tipo de construção de interações, de
alguma maneira contribui na formação crítica ou ele serviu
nesse momento pra informar algo que fosse um passo pra você
entrar num ponto gramatical ou serviu como um ponto para o
início da tradução?
88
P15 - Na verdade eu acredito que essas perguntas elas deveriam ter
sido mais elaboradas, mais discutidas, e que os alunos
argumentassem mais, que as informações não fossem tão diretas
que eu percebi que foram diretas, né, nesse sentido elas foram
mais ligadas à situação de texto, direcionados para a tradução
mesmo, na hora eu não percebi. Percebi então mesmo na hora
que eu li a transcrição, aí eu percebi.
Ps16 - Você viu que assim, o que eles falaram atendia
perfeitamente ao que funciona pra tradução, mas não talvez
pra fazer com que eles se organizassem argumentativamente,
como você disse que pretendia?
P16 - E refletissem sobre suas próprias formas de pensar... realmente
não ia chegar desse jeito no reflexivo.
No turno Ps15, após mencionar alguns exemplos que ilustravam as ações em
sala de aula, a pesquisadora questiona as decisões da professora-participante
(“(...)Você acha que esse tipo de construção de interações, de alguma maneira
contribui na formação crítica ou ele serviu nesse momento pra informar algo que
fosse um passo pra você entrar num ponto gramatical ou serviu como um ponto para
o inicio da tradução?”). Ao fazer tais questionamentos, a pesquisadora busca que a
professora-participante compreenda suas ações, pontue suas incoerências e reflita
criticamente sobre elas, procurando aspectos que sejam relevantes para a
transformação de sua prática, mas com compreensão das razões sociais para suas
ações.
Logo no início do turno Ps16, a pesquisadora chama a atenção da professora-
participante (“Você viu(...)”) para o fato de que as perguntas feitas pela professora
realmente buscavam respostas que não davam aos alunos a possibilidade de
argumentar, apontando que “(...) o que eles falaram atendia perfeitamente ao que
funciona pra tradução, mas não talvez pra fazer com que eles se organizassem
argumentativamente, (...)”. A professora demonstra entender que as formas como as
interações se constituíram na aula que ela apontou como sendo aquela em que os
alunos tiveram voz, na verdade não corresponderam aos princípios da responsividade
(BAKHTIN, 1995), constituindo-se como mais um momento da aula em que a
89
tradução teve o papel principal. Como a professora mesmo aponta, realmente não ia
chegar desse jeito no reflexivo”.
Ao observar suas ações e suas representações, a professora tem a chance de
perceber as inconsistências que estiveram presentes em sua prática. Nesse momento,
quando se busca transcender o contexto em que se encontra, é importante ressaltar a
importância do instrumento constituído pelas transcrições neste processo de
construção de conhecimento crítico-colaborativo. No turno P15 a professora-
participante expressa “(...) na hora eu não percebi. Percebi então mesmo na hora que
eu li a transcrição, aí eu percebi.
Os excertos a seguir exemplificam como se deu a busca da realização de ações
do reconstruir: baseando-se na leitura das transcrições e no apontamento e discussão
dos pontos e temas principais que permearam as aulas, buscou-se uma redefinição de
conceitos e práticas pedagógicas. Vejamos o próximo conteúdo temático selecionado:
Quadro 24: Conteúdo temático 12 – Tradução 2
TEMA
Tradução
CONTEÚDO
TEMÁTICO
A busca da construção do sentido sem o uso massivo de tradução
EXEMPLOS
Ps19 - Se você fosse reformular o momento da tradução, como
você faria, se você fizesse uma escolha de não trabalhar com a
tradução, que outra maneira você encontraria pra trabalhar esse
momento?
P19 - Eu estabeleceria relações, relações com figuras, por exemplo…
geralmente eu faço isso, estabeleceria relações de figuras com o
tema ... o trabalho que eu fiz no scanner, trabalharia o scanner,
trabalharia pelo contexto mesmo, essa é outra possibilidade,
né? Mas eu usei a tradução, porque eles estão em contextos
difíceis, eles trazem, eles têm muita dificuldade de traduzir, de
compreender e a gramática fora do contexto de tradução fica
meio vaga pra esse tipo de aluno, do EJA.
No turno Ps19 (“Se você fosse reformular o momento da tradução, como você
faria”), a pesquisadora buscou estabelecer um espaço em que a professora-
participante, através da compreensão de sua prática, pudesse fazer conexões
90
conscientes sobre suas ações, desenvolvendo dessa maneira a percepção de que a
realidade não é imutável e que o professor pode agir de forma diferente.
A professora-participante menciona, no turno P19, que estabeleceria relações
de figuras com o tema (...) trabalharia pelo contexto mesmo, essa é outra
possibilidade, né?”, mostrando uma outra estratégia para a construção dos sentidos
dos alunos acerca do vocabulário: recursos visuais como figuras associadas ao
contexto. Nessa parte da sessão reflexiva, a pesquisadora perde a oportunidade de
pedir que a professora participante exemplifique como seria composto o trabalho com
figuras sugerido por ela. A observação dessa explanação poderia mostrar se a
professora entendeu a necessidade das suas ações pedagógicas serem embasadas no
contexto cultural, político e social, conforme salienta Smyth (1992).
Nesse excerto também podemos observar que a professora busca justificar o
uso freqüente de tradução, como podemos ver no turno P19 Mas eu usei a
tradução, porque (...) eles têm muita dificuldade de traduzir, de compreender e a
gramática fora do contexto de tradução fica meio vaga pra esse tipo de aluno, do
EJA. Nesse trecho também é possível observar que a pesquisadora não busca
aprofundar o raciocínio da professora. Durante a análise das aulas, foi apontado que a
gramática e a tradução tiveram foco marcante nas aulas da professora; nesse exemplo
extraído da SR, a professora justifica que esse tipo de aluno, do EJA” possui muita
dificuldade em entender se não for através da tradução. Esse momento da sessão
reflexiva poderia ter convergido em uma rica discussão sobre as teorias de ensino-
aprendizagem, uso de ferramentas psicológicas, mediação, etc. No entanto, a
pesquisadora não aproveita a oportunidade de criação de ZPD, deixando passar o
momento e partindo para uma próxima pergunta.
O exemplo a seguir mostra que continua a busca pela constituição da ação do
reconstruir:
91
Quadro 25: Conteúdo temático 13 – Formas diferentes de agir
TEMA
Formas diferentes de agir
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Olhar para a própria prática no sentido de repensá-la
EXEMPLOS
Ps30 (...) Se você tivesse que reformular essa mesma aula, você
obedeceria a mesma seqüência? O que você não faria de novo e
o que você faria de novo?
P30 - O que eu não faria de novo é fazer perguntas diretas,
pergunta, resposta, pergunta, resposta. Eu estou me
organizando pra trabalhar aulas mais fazendo réplicas,
tréplicas, de maneira a fazer com que o aluno argumente
mais, trazer mais informações do aluno, de maneira que um
interaja com outro e vice-versa. Esse aspecto eu estou
melhorando muito, mudei a minha concepção de trabalho
porque eu percebi que as perguntas são muito diretas. Sabe
que é até também por causa deles mesmos, eles são muito tímidos,
eles não solicitam de você extrair respostas deles mesmos, mas eu
acho que uma maneira de melhorar as aulas onde eu uso
música seria fazendo essa organização, fazer com que eles se
organizem mais, falem mais, reflitam mais e etc....
Ps31 Sintetizando então: o que você não faria mais seria construir as
interações através de questões que exijam respostas únicas,
respostas sim, não; e o que você faria de novo seria estar
utilizando o conteúdo sistêmico pra cruzar essa parte de dar voz
ao aluno.
P31 - O conteúdo sim, não com tanta veemência, mas eu usaria sim
porque eu acredito que a relação gramática e contexto ela é
muito válida na aula que eu uso exercícios e textos e também na
aula que eu uso música, porque música na verdade é um gênero de
leitura, então eu faria isso, mas com menos veemência (...).
A pesquisadora faz uma pergunta parecida com a pergunta do excerto anterior,
quando buscava entender quais outras maneiras a professora-participante utilizaria
para abordar a construção dos significados que não fossem relacionadas à tradução.
Nessa pergunta que observamos em Ps30 Se você tivesse que reformular essa
92
mesma aula (...) O que você não faria de novo e o que você faria de novo?”, a
pesquisadora espera que a professora-participante olhe para a atividade com música
desenvolvida em três aulas, como um todo, apontando o que poderia ser diferente e o
que valeria a pena ser mantido, ao que a professora pontua em P30: O que eu não
faria de novo é fazer perguntas diretas,(...) Eu estou me organizando pra trabalhar
aulas mais fazendo réplicas, tréplicas, de maneira a fazer com que o aluno argumente
mais (...). Com este exemplo, a professora parece demonstrar ter compreendido que o
resultado da mediação exercida por ela através de perguntas de resposta única, como
as que ela utilizou nas aulas, empobrecem a construção das interações e não
propiciam o desenvolvimento discursivo dos alunos. No trecho em que ela declara
estar se organizando no sentido de estruturar as aulas de uma forma diferente, a
professora-participante mostra ter enxergado a necessidade de mudança e, mais
importante ainda, estar aberta a mudança de atitude, o que podemos constatar
claramente no próximo exemplo: Esse aspecto eu já estou melhorando muito,
mudei a minha concepção de trabalho porque eu percebi que as perguntas são
muito diretas. (...) eu acho que uma maneira de melhorar as aulas onde eu uso
música seria fazendo essa organização, fazer com que eles se organizem mais, falem
mais, reflitam mais e etc...”. Essa fala da professora mostra que ela refletiu sobre sua
ação, reconhecendo que havia dado pouco espaço em suas aulas para o aluno
contribuir na construção do conhecimento e prontificando-se a repensar sua prática
pedagógica no sentido de ampliar espaços para que ele se desenvolva
discursivamente. Percebemos, neste excerto, uma conversa em que uma
negociação de sentidos que propicia um avanço da compreensão da professora-
participante. No que diz respeito ao ensino das normas gramaticais a professora
afirma no turno P31: O conteúdo sim, não com tanta veemência, mas eu usaria sim
porque eu acredito que a relação gramática e contexto ela é muito válida na aula”.
Nessa afirmação da professora, podemos perceber que houve o reconhecimento por
parte dela de que suas aulas focavam excessivamente as normas gramaticais, deixando
de lado as oportunidades para o aluno experienciar seus conhecimentos. Ao
mencionar que o conteúdo não deverá ser mais abordado com tanta veemência, a
professora parece demonstrar que pretende reconstruir suas aulas, em busca de um
equilíbrio.
93
Durante toda esta pesquisa, a questão da responsividade, de “dar voz”, esteve
presente, não podendo ser diferente nessa última sessão reflexiva. Vejamos o exemplo
abaixo:
Quadro 26: Conteúdo temático 14 – Responsividade
TEMA
Responsividade
CONTEÚDO
TEMÁTICO
Formas de dar voz ao aluno
EXEMPLOS
Ps32 - Aqui você diz o seguinte: “quando eu dou voz ao aluno,
eu ouço aquilo que eles trazem, também é uma maneira de
fazer com que o aluno perca a inibição, que ele fale um
pouco, que ele se organize, que ele argumente”. Quais
outras formas de dar voz ao aluno poderiam ser
consideradas?
P32 - O que eu utilizaria? Eu até mudei também a minha
concepção de dar voz. Não se dá voz, que é uma maneira
autoritária, está mais para compartilhar vozes na
verdade, né?. Bom eu utilizaria trabalhando mais
réplicas, tréplicas, fazendo com que o aluno se organize
mais, contextualizando mais a vida deles com a música e
trazendo até pra historicidade deles, envolvendo a
história do aluno com a história da música, fazendo uma
relação sócio-histórico-cultural, traçando paralelos entre
eles mesmos.
Nas três primeiras aulas analisadas, um dos objetivos da professora-
participante era criar espaços para os alunos se expressarem, o que acabou se
estabelecendo como momentos em que houve um levantamento dos conceitos
cotidianos do aluno, a que a professora se referiu como momentos de dar voz ao
aluno”. Como já discutido, na visão dialógica de linguagem, a responsividade, ou seja,
a atitude responsiva dos participantes da interação é o que assegura que estes
participantes tenham ou não voz. É a partir do entendimento do que o outro fala que o
que eu falo ganha significado na interação. Nesse sentido, a pesquisadora no turno
Ps32 pergunta Quais outras formas de dar voz ao aluno poderiam ser
consideradas?”, buscando entender se a professora situou o conceito bakhtiniano em
94
sua prática de forma adequada, ao que a professora responde em P32 Eu até mudei
também a minha concepção de dar voz. Não se voz, que é uma maneira
autoritária, está mais para compartilhar vozes na verdade, né?”. Neste exemplo
observamos que a professora não se aprofunda na conceituação do termo, mas pontua
que o uso do verbo “dar” para voz pode carregar uma conotação de autoritarismo, pois
atribui a alguém o papel de “dar” e ao outro de “receber”. Para substituir o conceito de
“dar voz”, ela se refere a “compartilhar vozes”, mostrando uma forma de situar-se na
interação com os alunos.
Como forma diferente das utilizadas nas três primeiras aulas, a professora-
participante aponta um outro caminho para estabelecer um espaço em que as
interações se pautem pela responsividade: P32 Bom eu utilizaria trabalhando mais
réplicas, tréplicas, fazendo com que o aluno se organize mais, contextualizando mais
a vida deles com a música e trazendo até pra historicidade deles, envolvendo a
história do aluno com a história da música, fazendo uma relação sócio-histórico-
cultural, (...)”. No exemplo acima, a professora demonstra acreditar que dependendo
do tipo de mediação exercida por ela, do tipo de perguntas feitas por ela, as interações
possam adquirir um caráter mais responsivo. Outro aspecto apontado por ela é a
contextualização do tema trazido pelo texto da letra da música em uma relação com a
vida dos alunos. Neste aspecto, como vimos na análise da segunda aula, o risco
de esse momento de contextualização do tema da aula com a vida dos alunos se
transformar num grande espaço para se contar experiências pessoais. Esse momento
de contextualização com a vida dos alunos, a meu ver, deveria considerar os aspectos
sociais, históricos e culturais em que esses alunos estão inseridos. Ao abordar tais
aspectos se estará contextualizando o tema com a vida deles, com um ponto comum
que perpassa a vida de todos eles, ao invés de ouvir apenas relatos pessoais. Esse
aspecto está no discurso da professora, quando ela menciona “relação sócio-histórico-
cultural”, apesar de não ter emergido durante as aulas analisadas na primeira etapa
deste estudo.
3.4. Análise da quarta aula
Passo, a partir de agora, a tratar da análise dos dados referentes à quarta aula
gravada, que faz parte da segunda etapa deste estudo, tendo sido elaborada pela
professora-participante com base nas observações realizadas durante os encontros e
95
sessões reflexivas. Mais especificamente, após a terceira sessão reflexiva, em que
discutiu com a pesquisadora sobre suas ações, com base nas transcrições das aulas da
primeira etapa.
A análise da quarta aula busca responder a segunda pergunta de pesquisa que
norteou este estudo: “Como as sessões reflexivas contribuíram para a mudança de
atitude da professora em relação às atividades com música?”
Para essa aula, a professora-participante escolheu a música Imagine, na voz do
cantor John Lennon, utilizando, na atividade, equipamento de CD e cópias da letra da
música para os alunos. A análise dos dados será feita a partir do resumo das partes que
constituíram a aula e a distribuição dos turnos.
3.4.1. Introdução
Nesta quarta aula, o momento da introdução da atividade revela sinais de
mudança no agir discursivo da professora, como se pode observar no exemplo abaixo:
Excerto 29
P1. Então vejam. Nós vamos, vamos trabalhar com a música do John
Lennon chamada “Imagine”. Quem conhece essa música?
A1. Acho que todo mundo, teacher. Essa música é bem antiga, mas toca
bastante ainda.
P2. Que bom. Eu vou começar a aula tocando a música e entregando essa
letra para vocês. Eu gostaria que enquanto vocês ouvissem a
música, acompanhassem a letra e grifassem aquelas palavras que
vocês consideram que são importantes para a compreensão do que
o autor quis transmitir. Nós sabemos que, quando um autor escreve
uma poesia ou cria uma letra de uma música ele demonstra ter
algum tipo de preocupação relacionado ao tema. Hoje nós vamos
falar das preocupações do autor, mas também das nossas, certo?
Todos já tem a letra? Então vamos lá.
No excerto acima, podemos observar que a professora-participante, no seu
primeiro turno, informa aos alunos o que será feito: Nós vamos, vamos trabalhar
com a música(...), quem é o autor e cantor: ”(...) do John Lennon(...) e o nome da
96
música: “(...) chamada “Imagine”. Neste recorte, observamos que a professora utiliza
o pronome nós, incluindo a todos na atividade que se inicia. A seguir a professora
busca a interação dos alunos através da pergunta: Quem conhece essa música?”,
enquanto entrega uma folha com a letra da música para cada um.
Após informar que a aula começaria com a reprodução da música, a professora
orienta os alunos a como proceder na atividade, como observamos em P2 Eu
gostaria que enquanto vocês ouvissem a música, acompanhassem a letra e grifassem
aquelas palavras que vocês consideram que são importantes para a compreensão do
que o autor quis transmitir.” Essa instrução da professora é feita de maneira bem
modalizada (Eu gostaria) e parece direcionar o exercício, que está prestes a começar,
para um trabalho com vocabulário.
No turno P2 também é possível observar a forma como a professora-
participante, nesse momento introdutório, tenta conectar a atividade com o cotidiano
dos alunos: “(...) quando um autor escreve uma poesia ou cria uma letra de uma
música ele demonstra ter algum tipo de preocupação relacionado ao tema. Hoje nós
vamos falar das preocupações do autor, mas também das nossas, certo?”. Nesse
trecho a professora parece tentar recuperar o contexto de produção do autor, buscando
o motivo que desencadeou a composição dessa letra. Dessa maneira, a professora
orienta os alunos a interagirem com o autor da música, ou seja, a fazerem uma
‘recepção ativa’ (BAKHTIN, 1929) do texto ao invés de ver a letra da música como
um texto para se estudar as normas gramaticais. É o que Marcuschi (2006) chama de
enfoque interacionista das produções lingüísticas. A seguir nesse mesmo turno, a
professora acrescenta que essa aula tratará não só das preocupações do autor, mas
também das nossas”, reconhecendo e situando os alunos em uma relação dialógica
responsiva, pois eles o ouvirão as preocupações do autor presentes na letra da
música, mas terão um espaço para falar das suas próprias preocupações.
No excerto a seguir, observamos que a professora inicia, logo após a
reprodução da música, a contextualização da atividade. Vejamos:
3.4.2. Contextualização
Retomando a análise das aulas anteriores, pudemos observar que o movimento
de contextualização da atividade era protagonizado pelos conhecimentos da
professora, sem a participação dos conhecimentos cotidianos dos alunos. Nesta quarta
97
aula, notamos que a professora busca uma maior participação dos alunos, agindo
menos como professora organizadora e mais como professora mediadora:
Excerto 30
P3. Muito bem, eu observei que todos grifaram. Antes de começarmos a
falar da letra, do conteúdo dessa letra, eu gostaria de fazer uma
pergunta: quando vocês vêem o título da música “Imagine” o que é
vocês pensam? O que esse título traz à cabeça de vocês?
Neste trecho a professora utiliza uma pergunta para chamar os alunos a
participarem: quando vocês vêem o título da música “Imagine” o que é vocês
pensam? O que esse título traz à cabeça de vocês?”. Ela parece aproveitar o fato de o
título da música ser de fácil compreensão, para iniciar uma discussão baseada no que
essa palavra traz à mente dos alunos.
Outro ponto que esse excerto evidencia é o posicionamento enunciativo
mantido pelo discurso da professora: Antes de começarmos a falar da letra, do
conteúdo dessa letra, eu gostaria de fazer uma pergunta(...). O uso da primeira pessoa
do plural parece demonstrar que a professora quer que todos sintam-se fazendo parte
da discussão sobre o tema, enquanto o uso de modalização (gostaria de fazer) revela
uma tentativa de tornar as interações menos assimétricas.
A busca por simetria nas ações estabelecidas durante a aula também é
evidenciada pela divisão dos turnos. Vejamos a representação gráfica desse dado:
Gráfico 3: Distribuição de turnos da quarta aula
AULA 4
59%
41%
0
20
40
60
80
100
ALUNOS PROFESSORA
98
Através do gráfico acima podemos constatar que os alunos detiveram uma
porcentagem maior dos turnos da aula. De um total de 145 turnos, os alunos ocuparam
86 (59%), enquanto a professora ficou com 59 (41%). Em relação às três primeiras
aulas, esse quadro mostra um aumento na diferença entre os turnos ocupados pelos
alunos e pela professora.
Outro dado observado, que confirma a busca de simetria nas relações
dialógicas nessa quarta aula, é o número de palavras nos turnos. A análise das três
primeiras aulas havia mostrado que, mesmo existindo um certo equilíbrio no número
de turnos, quando se contabilizavam as palavras pronunciadas, as interações
apresentavam um intenso desequilíbrio: a professora havia dominado a interação,
dizendo o maior número de palavras em relação ao total. Vejamos, agora, o gráfico
que mostra a distribuição das palavras da quarta aula, entre os participantes:
Gráfico 4: Número de palavras dos participantes na quarta aula
AULA 4
55%
45%
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
ALUNOS PROFESSORA
Pela representação gráfica acima, podemos visualizar o equilíbrio no uso da
palavra, demonstrando que o aluno não ocupou mais os turnos distribuídos pela
professora, mas que teve a oportunidade de mover-se” dentro do seu turno. O
quadro, a seguir, resume o sistema de turnos da quarta aula:
99
Quadro 27: Sistema de turnos da quarta aula
Participantes Nº de turnos Nº de palavras
Professora 59 1303
Alunos 86 1595
TOTAL 145 2898
Passemos, agora, para a questão da reflexão crítica.
3.4.3. A discussão do tema
Assim como nas aulas que compuseram a primeira fase deste estudo, nesta
aula a professora direciona a aula para a discussão de um tema. Vejamos:
Excerto 31
P12. Como é esse mundo que ele imagina?
A14. É dele imaginar... sem guerra, sem violência
P13. Então o mundo que ele está vivendo é um mundo cheio de
violência
A15. Sim. Guerra, pobreza, violência...
P14. E de que mais?
A16. Desemprego
P15. Desemprego?
A17. Falta de solidariedade, de amor ao próximo principalmente.
P16. Esse mundo que o autor da letra se referiu era o nosso mundo
que na época que ele vivia. Pra vocês este mundo que nós vivemos
nos tempos de hoje é um mundo bom?
Após a introdução e contextualização, a professora-participante parece querer
buscar a compreensão que os alunos têm acerca do assunto tratado na letra da música.
Para isso ela utiliza perguntas, como podemos observar no turno P12 Como é esse
mundo que ele imagina?”, dando espaço para que os alunos falem a respeito das
impressões que tiveram do que a música está tratando.
100
Outra atitude da professora é repetir palavras dos alunos, na provável intenção
de levá-los a refletir e a acrescentar algo à sua fala, como podemos verificar na
seqüência de turnos a seguir. Em P13. Então o mundo que ele está vivendo é um
mundo cheio de violência”, a professora repete o que o aluno havia dito
anteriormente, levando-o a completar seu raciocínio com outros elementos diferentes
de violência, que havia sido citada em A15 Sim. Guerra, pobreza, violência...”. A
professora continua a estimular o aluno para saber se mais alguma coisa negativa
que possa ser atribuída ao mundo na época que o autor escreveu a música: P14 E de
que mais?”, ao que o aluno acrescenta: A16 “Desemprego”.
No exemplo acima, as respostas dos alunos parecem refletir como eles vêem o
mundo hoje, e não como era o mundo dos anos 70, época em que a música foi escrita,
como se pode observar em A17: Falta de solidariedade, de amor ao próximo
principalmente”. A professora-participante, numa atitude que pareceu ter como
motivação a percepção de que o foco estava saindo do contexto da música, tenta
estabelecer uma relação entre a atividade desenvolvida e a visão que os alunos têm do
mundo de hoje: P16 Esse mundo que o autor da letra se referiu era o nosso mundo
que na época que ele vivia. Pra vocês este mundo que nós vivemos nos tempos de
hoje é um mundo bom?”. Com essa colocação a professora consegue apontar que o
mundo de que a música fala é o nosso mundo, que em uma época diferente, mas
com alguns problemas e características que podem ser ainda comuns nos dias de hoje.
Assim, a discussão recomeça, mas direcionada para os problemas e possíveis
soluções, apontadas pelos alunos, agora referentes aos nossos tempos.
Através desses exemplos é possível perceber uma mudança expressiva no agir
discursivo da professora nesta quarta aula. Além de alterar os tipos de perguntas, ela
também diversificou a estratégia de participação do aluno na aula. É perceptível que
houve uma alteração nos questionamentos feitos pela professora e que essa alteração
exige do aluno maior atenção para a atividade proposta. Por algumas vezes os alunos
desviavam o foco da discussão, o que a professora, em seu papel de mediadora,
buscava retomar, como observamos no próximo exemplo:
Excerto 32
P29. Então vocês estão falando do que está ocorrendo, das causas que
fazem que o mundo não seja bom, mas eu falei como é que a gente
faz para melhorar? De que maneira? A gente pode protestar? O que
101
a gente pode fazer para amenizar essa toda violência, toda esta
dificuldade que a gente vive neste mundo?
Após alguns momentos de discussão sobre problemas do mundo de hoje, a
professora questionou os alunos sobre possíveis soluções para esses problemas. No
entanto, eles continuaram a apontar problemas. Para que a discussão pudesse manter
seu curso, evoluindo tematicamente, a professora retoma as palavras dos alunos e
também as suas próprias, como evidencia a parte negritada do exemplo. Além disso,
em sua mediação, a professora formula perguntas que podem re-orientar a discussão.
Isso parece demonstrar um empenho da professora em problematizar o tema, no
sentido de levar os alunos a refletirem sobre as questões levantadas.
Durante essa etapa da atividade, os alunos tiveram liberdade para mencionar
os problemas que eles viam no mundo em que vivem e apontar soluções, construindo,
de forma autônoma, os tópicos discursivos que permearam as interações nesse
momento da aula. A professora buscou, apenas, não deixar que outros assuntos
pudessem tirar o foco do assunto da aula. Essa flexibilidade demonstrada na relação
professora-alunos é de fundamental importância para se garantir o engajamento
discursivo dos alunos, conforme prevêem os PCN-LE (2002).
Esse momento, em que a professora abre espaço para os alunos revelarem suas
percepções acerca do mundo em que vivem, demonstra que a professora está levando
em consideração a proposta vygotskiana por buscar referências no conhecimento
cotidiano do aluno para a construção coletiva do conhecimento científico. Depois que
os alunos puderam compartilhar suas idéias sobre o mundo em que vivem, de uma
forma direcionada pela professora para relacionar-se com a letra da música, inicia-se o
trabalho lingüístico.
3.4.4. O Conteúdo: vocabulário
Uma das primeiras ações da professora, nesta quarta aula, foi orientar os
alunos a grifarem palavras no texto que eles julgassem ser importantes para a
compreensão geral da tradução. Após contextualizar a atividade, a professora
direcionou as ações no sentido de conhecer as palavras que os alunos grifaram durante
a reprodução da música.
102
Excerto 33
P37. Certo então. Nós iniciamos toda essa discussão baseando-nos no
título da música, não foi? Através dessa palavra “Imagine” nós nos
inspiramos para pensar como seria um mundo melhor. Agora eu
gostaria que vocês me falassem quais palavras do texto vocês
grifaram para que nós possamos chegar no mundo que John
Lennon imaginou como sendo um mundo melhor. Quem quer
começar?
Neste turno, a professora resume o que aconteceu na aula até o momento e
sinaliza, com a palavra Agora”, a progressão temática (BRONCKART, 1999). Em
seguida a professora, de uma forma modalizada (Agora eu gostaria), que demonstra o
cuidado que vem permeando seu discurso durante toda a aula, solicita que os alunos
falem quais palavras grifaram, para que através da compreensão dos seus significados,
se chegue ao entendimento de como é o mundo que John Lennon imaginou como
sendo um mundo melhor”.
Em decorrência dessa mudança nas ações da professora, os alunos tiveram a
oportunidade de participar mais ativamente do reconhecimento do vocabulário. A
análise das três primeiras aulas apontou o trabalho com vocabulário como um dos
eixos centrais da aula da professora-participante. No entanto, a professora
demonstrou, mais uma vez, ter repensado sua prática. Ao contrário das aulas
anteriores, em que os alunos apenas buscavam a tradução das palavras mencionadas
por ela, na aula em questão a professora deixa os alunos conduzirem a atividade. Eles
falam quais palavras grifaram, traduzem-nas quando sabem e abrem espaço para que
os colegas interajam e compartilhem conhecimento, buscando o apoio da professora
quando julgam necessário. Dessa maneira a professora sai, por alguns momentos, do
papel de condutora da atividade para que os alunos exerçam certa autonomia no
próprio aprendizado.
Como mencionado, o trabalho lingüístico durante esta quarta aula se deu com
o levantamento e a tradução das palavras grifadas pelos próprios alunos, o que em
minha opinião promoveu um salto qualitativo em relação às aulas anteriores, em que a
professora conduziu a tradução sistemática da letra da música ouvida, palavra por
palavra. Outro aspecto importante nesta etapa da atividade foi o encaminhamento para
a compreensão do significado global do texto através de um trabalho em grupo:
103
juntos, os alunos puderam discutir o que cada estrofe dizia. Vejamos no exemplo
abaixo:
Excerto 34
P51. Sharing é compartilhar, compartilhando. Ótimo, vocês grifaram
palavras que vocês localizaram como palavras chaves para entender
como era o mundo imaginado, sonhado pelo autor. Agora eu quero
que vocês se reúnam em grupos de quatro pessoas e discutam, o que
cada estrofe quer dizer. Não precisa traduzir ao pé da letra.
separem a idéia que cada estrofe transmite. Vou dar 15 minutos.
Cinco para cada estrofe, certo. Logo após eu vou chamar alguns
representantes dos grupos para que nós saibamos a que conclusão
cada grupo chegou. Podem começar.
Como podemos observar no exemplo acima, a professora solicita que os
alunos se reúnam em grupos para continuar a busca da significação das palavras do
texto. Um ponto muito importante nesse exemplo é o fato de que a professora orientou
os alunos para não se preocuparem em traduzir palavra por palavra (“Não precisa
traduzir ao da letra”), e buscarem a idéia central de cada estrofe (“separem a idéia
que cada estrofe transmite”). Essa atitude demonstra que parece haver, por parte da
professora, uma preocupação com a significação que vai além de saber o que cada
palavra significa e que busca atingir a compreensão global do texto.
Outro aspecto importante de ser mencionado, nesse excerto, é o fato de a
professora orientar os alunos no sentido de racionalizar o tempo (“Vou dar 15
minutos. Cinco para cada estrofe”). Dessa maneira, fica mais fácil para o aluno se
organizar dentro do seu grupo, podendo priorizar discussões sobre uma ou outra
questão, ao invés de discutir, por mais tempo do que seja necessário, aspectos de
compreensão comum do grupo. Esta atitude da professora contrasta com a das aulas
anteriores, quando ela tinha conhecimento do planejamento das atividades. Nesta
aula, ao iniciar uma nova etapa da atividade, a professora recapitula a anterior (“vocês
grifaram palavras que vocês localizaram como palavras chaves”) e informa o que
virá a seguir (Logo após eu vou chamar alguns representantes dos grupos para que
nós saibamos a que conclusão cada grupo chegou.”).
Na seqüência, a professora encaminha a atividade para o encerramento.
104
3.4.5. O encerramento da atividade
Demonstrando bastante coerência em suas ações, a professora-participante
prosseguimento à aula, solicitando a participação dos grupos:
Excerto 35
P52. Ótimo, vamos lá. Agora eu gostaria de chamar um de cada grupo
para falar para a classe a que conclusão vocês chegaram sobre o
que ele trata em cada estrofe. Esse grupo aqui. Na primeira estrofe o
que vocês colocaram como o que ele imaginou?
A80. Nosso grupo colocou que ele pediu para que as pessoas
imaginassem que não exista nem o céu nem o inferno e que elas
vivam o dia de hoje. Acho que ele quis dizer isso porque muita gente
faz as coisas pensando que vai para o céu e outras quando erram
acham que vão para o inferno. A gente conversou que nós devemos
fazer o bem pensando no próximo e não no céu ou no inferno.
P53. Muito bem. Os outros grupos querem acrescentar alguma coisa?
Neste exemplo a professora dá prosseguimento ao trabalho e sinaliza que cada
grupo terá espaço para falar sobre uma estrofe: P52 Agora eu gostaria de chamar
um de cada grupo para falar para a classe a que conclusão vocês chegaram sobre o
que ele trata em cada estrofe.”. Todos os grupos participaram da construção do
sentido da letra da música, sendo que nenhum grupo buscou traduzir palavra por
palavra. O tempo destinado para essa etapa do trabalho também foi suficiente, tendo
todos os grupos terminado a tarefa proposta.
A resposta dada pelos alunos no turno A80 evidencia que, mesmo não sendo
abordados os tempos verbais presentes na letra da música, os alunos não apresentaram
dificuldades no entendimento. Talvez porque a atividade desta aula tenha trabalhado a
língua em uso. Como nos lembra Bakhtin (1995: 108), os indivíduos não recebem a
língua pronta para ser usada”, dado o processo contínuo de evolução, lhes resta
penetrarem na corrente da comunicação verbal”.
105
3.5. Conclusão Final
Ao final da análise da 1ª. e da 2ª. etapas, retomo os dados a fim de verificar se
foram respondidas as perguntas que nortearam este estudo. O quadro a seguir resume
os aspectos principais das aulas analisadas:
Quadro 27: Resumo da análise das aulas da primeira e da segunda etapa
Aula a que
se refere
Conteúdos abordados
Distribuição de
turnos (em %)
Com quem
esteve a palavra
(em %)
1ª. Aula
Abordagem predominantemente
sistêmica da língua, com o
ensino de regras gramaticais e
com alguns momentos para
tradução das palavras da música.
Professora – 48%
Alunos – 52%
Professora – 93%
Alunos – 7%
2ª. Aula
Abordagem que misturou
aspectos sistêmicos da língua
(através da tradução) com o
levantamento do que os alunos
pensavam sobre o tema ‘amor’
(a que a professora se refere
como momento em que se “dá
voz” ao aluno)
Professora – 46%
Alunos – 54%
Professora – 78%
Alunos – 22%
3ª. Aula
Abordagem predominantemente
sistêmica do uso da língua,
através da tradução da letra da
música, com exceção do final da
aula, quando os alunos cantaram
a música acompanhando a
legenda.
Professora – 54%
Alunos – 46%
Professora – 84%
Alunos – 16%
4ª. Aula Abordagem partindo da visão do Professora – 41% Professora – 47%
106
aluno acerca do tema,
estabelecendo relação com o
aspecto sistêmico, focando o
aluno e a interação dele na
construção dos sentidos.
Alunos – 59% Alunos – 53%
Retomando a primeira microquestão Que concepção de ensino-
aprendizagem a atividade analisada revela?”, o que se pode observar é que os
alunos ocuparam, nessas três aulas, uma posição de passividade em relação à
aprendizagem e ao desenvolvimento discursivo. Parece que a base das ações da
professora é a transmissão de conhecimentos, na medida em que adota um formato de
aula que reproduz a tradição do ensino de língua estrangeira: levar os alunos a
aprenderem os significados de palavras, não envolvendo uma discussão de valores
sociais, políticos ou culturais presentes nos texto estudado.
Podemos apontar, com base no quadro-resumo, que o foco principal das aulas,
esteve sobre os aspectos sistêmicos da língua. A análise da segunda aula mostra uma
tentativa da professora-participante de trazer outros aspectos que não os semânticos e
morfológicos. No entanto, esta tentativa é sabotada: 1-) pela natureza das perguntas,
que buscavam respostas únicas e não se aprofundavam no tema; e, quando o faziam,
traziam relatos dos alunos sobre experiências pessoais, ao invés de visões e opiniões
sobre o tema da aula; 2-) pela compreensão equivocada da professora sobre alguns
conceitos (como responsividade, por exemplo), refletindo na forma como enxergava a
própria prática.
Outro ponto que parece confirmar o caráter tradicional das aulas analisadas é o
fato de a aula ser centrada na professora. Esta é responsável por transmitir o
conhecimento, o que reduz a colaboração dos alunos à tradução dos termos em inglês
indicados por ela. Assim, não fica claro, pelos dados destacados, qual é o papel social
das aulas de inglês.
Isso nos leva à segunda microquestão “Como são tratados os aspectos que
levam ao desenvolvimento crítico?”. Como a atividade de tradução não proporciona
uma ampliação do debate, também não contribui para uma formação crítica.
Retomando a análise dos turnos, observamos, por parte da professora-participante, a
intenção de buscar a participação dos alunos, o que é mostrado na relação de
107
equilíbrio da distribuição de turnos. No entanto, ao compararmos a quantidade de
palavras presentes nos turnos, pudemos observar que houve uma grande desigualdade
na distribuição de quem teve a palavra durante as aulas. Isso se deu pelo fato de que,
mesmo os alunos usando quase o mesmo número de turnos nas aulas, os momentos
em que tiveram voz foram direcionados pela professora para dizer o significado das
palavras e não para que refletissem sobre os seus sentidos possíveis e sua relação com
o mundo. Em função disso, a organização discursiva dessa aula não teve uma
orientação dialógica, na qual os sujeitos pudessem ter uma responsividade ativa
(Bakhtin, 1979; Bakhtin/Volochinov, 1995) e desenvolver-se criticamente.
Os dados referentes às duas primeiras SR, pertencentes à primeira etapa da
pesquisa, mostram que a professora-participante parece compreender que
necessidade de se observar a formação global do aluno mediante o ensino de língua
estrangeira, como podemos observar nos excertos da análise. Entretanto observamos
que sua prática pedagógica acontece de forma fragmentada. Percebe-se no discurso da
professora-participante, durante as duas SR, que ela busca relacionar sua prática com
a teoria. Não nos dados, porém, o aprofundamento necessário para uma melhor
compreensão de por que essas teorias aparecem tanto em seu discurso e não se
refletem em sua prática de sala de aula. Esse aprofundamento não ocorre devido ao
papel que a pesquisadora assume durante essas duas SR, limitando-se a formular
perguntas, de modo a instalar alguns conflitos; porém, à medida que a professora-
participante responde, a pesquisadora não apresenta contra-argumentos.
Conforme observamos nas respostas às duas microquestões acima, foi adotada
uma abordagem tradicional do ensino de inglês nas aulas analisadas, cujo espaço foi
ocupado pelo ensino de gramática e tradução do texto. Não houve, assim, criação de
um espaço onde os aspectos que pudessem levar ao desenvolvimento crítico-
discursivo fossem considerados. A partir de tal constatação, retomo a macroquestão
que norteou a primeira etapa deste estudo: “Qual é o objetivo principal das
atividades com música nas aulas analisadas?”
Considerando a análise dos dados, foi detectada alguma inconsistência no
discurso da professora-participante: os objetivos pensados por ela para as atividades
desenvolvidas não coincidiram com o objetivo revelado por suas ações, praticadas em
sala. Durante a primeira e a segunda sessão reflexiva a professora participante
declarou que o objetivo da atividade (composta por três aulas) era ensinar formas
verbais e trabalhar com o vocabulário, mas de uma forma contextualizada e
108
significativa para o aluno. No entanto, o que observamos durante a análise, foi a
utilização da letra da música como um pretexto para a transmissão massiva de regras
gramaticais e para a tradução sistemática do texto.
Mesmo na segunda aula, em que a professora abre um espaço maior para que
os alunos participem, essa participação se dá de forma fragmentada e não aponta para
um propósito de desenvolvimento de ações que levem o aluno a desenvolver
habilidades argumentativas.
Portanto, essa primeira etapa do estudo, cuja finalidade era compreender como
a música é utilizada nas aulas de LE, conclui que o uso da letra da música serviu, nas
aulas analisadas, como um grupo de sentenças, para o propósito de estudar os
elementos lingüísticos que constavam do planejamento.
Ressalto, aqui, que esta pesquisa não tem o propósito de afirmar que as ações
executadas pela professora-participante nas aulas analisadas são características suas,
inerentes. Ao longo deste estudo, pude reconhecer que, ao contrário do que revelou
sua prática, a professora tem conhecimento das teorias e possui uma visão clara do
que é a construção colaborativa do conhecimento. No entanto, cabe lembrar que os
professores tendem a criar formas para lidar com os conteúdos de seus planejamentos
frente à rotina esmagadora em que muitas vezes se vêem envolvidos.
No que diz respeito à ação da pesquisadora, observa-se que sua participação
não chegou a configurar um diferencial durante as duas primeiras SR, faltando o
questionamento que ajudasse a promover conscientização da necessidade de
transformações nas ações da professora-participante em sala de aula. As perguntas
não aprofundaram a discussão, não havendo uma negociação de significados, não
havendo criação de ZPD. No entanto, a leitura das transcrições das SR desencadeou
um processo de auto-questionamento, no qual a pesquisadora pôde olhar para sua
prática e buscar também transformar-se.
A segunda etapa deste estudo foi composta pela gravação de uma sessão
reflexiva e uma aula. A SR desta segunda etapa teve o objetivo de, a partir da leitura
das transcrições da primeira etapa, apontar e discutir pontos que pudessem ser
transformados dentro da prática da professora-participante, no sentido de tornar a aula
de inglês um espaço que buscasse a formação global do aluno, desenvolvendo
aspectos lingüísticos e crítico-discursivos. Para tratar da segunda etapa deste estudo,
retomo a segunda pergunta de pesquisa: “Como as sessões reflexivas possibilitaram
a colaboração entre professora-participante e pesquisadora e contribuíram para
109
a construção de novos sentidos em relação a atividades com música?” O primeiro
ponto que destaco é a mudança evidenciada pela qualidade das interações, quando os
alunos passam a participar de forma mais ativa, aproximando-se do papel que lhes
compete em uma concepção crítica de ensino-aprendizagem: o de protagonista de sua
aprendizagem. Nesta etapa, o aspecto morfológico também foi abordado, porém de
forma diversificada e dinâmica. A condução da atividade com música, pela
professora, levando em consideração o conhecimento prévio dos alunos, revela que
ela parece ter se apropriado da importância de agir colaborativamente com os alunos
na construção de conhecimento. As perguntas feitas durante a quarta aula também
constituem um fator que demonstra transformação, pois passaram a buscar uma
participação mais elaborada dos alunos, criando a possibilidade de um
desenvolvimento crítico-discursivo.
As sessões reflexivas, em minha opinião, tiveram um papel importante na
mudança de atitude da professora-participante. No entanto, não atribuo a elas o
crédito da transformação. As sessões reflexivas deste estudo se configuraram como
um instrumento a mais no processo de transformação da professora-participante, que é
mestranda do programa de Lingüística Aplicada e Estudos da Linguagem e é sujeito
de outras investigações. Portanto, fez, também, com seu grupo de pesquisa, reuniões
em que pôde ampliar sua reflexão. Acredito que todo esse contexto no qual a
professora-participante esteve imersa contribuiu para a transformação de sua prática.
As sessões reflexivas tiveram, certamente, um papel importante na
metodologia desta pesquisa no sentido de abrir um espaço para a reflexão tanto para a
professora-participante quanto para a pesquisadora. E foi por meio da leitura das
transcrições e das conversas e discussões ocorridas nas sessões reflexivas, que ambas
enxergaram pontos passíveis de mudança em suas respectivas práticas. Dessa forma, a
SR assumiu uma função organizadora nas transformações porque possibilitou uma
interação em que professora e pesquisadora compartilharam dados, discutiram,
manifestaram suas opiniões. Ou seja, construíram um espaço de construção do
conhecimento, de forma democrática, respeitando diferenças e competências mútuas.
Como resultado dessa colaboração estabelecida e da ZPD criada durante as sessões
reflexivas, pode-se dizer que a professora e a pesquisadora apreenderam mais sobre
como colaborar e interagir com vistas à criação de ZPDs.
Este estudo possibilitou-me, portanto, experienciar a ocorrência de três
processos distintos: o processo de transformação das práticas pedagógicas e
110
discursivas da professora-participante em sala de aula, a minha própria transformação
como pesquisadora e o processo de construção do espaço colaborativo, entre
professora-participante e pesquisadora, onde pudesse ocorrer a reflexão das práticas
em um nível crítico. A comparação entre as práticas pedagógicas da professora-
participante na primeira e na segunda etapa deste estudo me possibilitou observar que,
apesar de todas as aulas estarem delimitadas em um campo de conteúdo específico,
enfocando basicamente regras gramaticais e vocabulário, houve uma diferenciação
entre as aulas da primeira e da segunda etapa.
Este estudo conclui, por fim, que as sessões reflexivas propiciaram o espaço
necessário para que a professora-participante repensasse suas ações pedagógicas e
para que a pesquisadora, através da análise e discussão das práticas da professora,
apreendesse os passos da pesquisa colaborativa. Através das ações da reflexão crítica
desenvolvidas durante as sessões reflexivas, a professora-participante teve
oportunidade de olhar para a sua própria prática, buscando a compreensão do seu
papel como sujeito responsável pelo desenvolvimento da coletividade. Quanto à
minha transformação como pesquisadora, a realização deste trabalho permitiu-me um
aprofundamento teórico de questões do meu universo cotidiano, o que refletiu
profundamente em meu trabalho como professora de Língua Estrangeira. Acima de
tudo, as trocas proporcionadas durante esses dois anos de convivência acadêmica
fizeram de mim um ser humano mais atento ao meu papel de cidadã e uma
profissional mais reflexiva em meu papel de formadora.
111
Considerações Finais
Nesta seção apresento as considerações finais do ponto de vista da professora-
participante e da pesquisadora. Cumpre lembrar que este trabalho desenvolveu-se dentro
de uma perspectiva crítica de colaboração, que prioriza a construção de conhecimentos,
transformações e vozes de ambas. Assim, apresento agora as considerações da professora
participante, que, após ter participado de todo processo de pesquisa e de ter lido esta
dissertação, tece comentários sobre o processo.
Considerações Finais – Professora participante
“Como professora participante deste trabalho, que se apresenta com uma
preocupação voltada para um ensino de inclusão acerca das atividades sociais, culturais
e históricas da escola brasileira, sinto-me profundamente gratificada e realizada pelo
fato de conseguir perceber novas maneiras de condução do trabalho no que concerne à
música nas aulas de língua estrangeira (inglês). No início das atividades com a música,
não conseguia clarificar como ideal, a extrema importância da discussão temática da
música relacionada aos conhecimentos prévios dos alunos, sua inserção no mundo, sua
compreensão e pontos de vista; porém, a minha grande preocupação estava voltada
para o vocabulário, tempo verbal e recursos lingüísticos relacionados ao estágio em
que os alunos se encontravam, sem me ater ao ponto essencial desse trabalho
“interação da relação temática da música com os sentidos trazidos pelos alunos” que
propiciam o compartilhamento de significados e, assim, um processo de aprendizagem
em espiral.
Percebo, entretanto, que a maioria dos professores de inglês apresentam muitas
dificuldades quanto à estrutura e desenvolvimento de uma aula de ngua inglesa em
todos os aspectos metodológico, didático, estratégico, de conteúdo”, etc,
principalmente quando se trata de alunos do EJA (Ensino para Jovens e Adultos).
Esses por sua vez, geralmente vêm à escola com um limitado conhecimento da língua
inglesa e, em sua grande maioria, cansados de uma árdua rotina de trabalho.
Tendo em vista essas dificuldades no lidar estratégico da condução de uma aula
de inglês, os professores acabam dando mais ênfase aos aspectos morfológicos,
fonológicos, sintáticos e semânticos, transformando assim, a aula de língua estrangeira
num espaço de memorização de regras, de abstração de palavras, deixando de propiciar
momentos reais de uso do idioma, em situações naturais, autênticas e de criticidade.
No meu caso em particular, experenciei esses momentos cruciais de escolha,
exatamente pela dificuldade de perceber qual princípio seria essencial e norteador da
minha prática em sala de aula. Dessa forma, considerando que o trabalho colaborativo
112
seria de muita valia no meu desempenho profissional e percebendo o quão valioso
seria para o meu crescimento teórico-prático, convidei a professora pesquisadora deste
trabalho para desenvolver esta pesquisa em minha escola e o que era mais importante,
nas minhas aulas de inglês. Desta forma, após gravar as minhas aulas em uma das
séries do EJA, a professora pesquisadora pôde perceber como as aulas de inglês eram
conduzidas e, assim, promover uma discussão colaborativa no sentido de situá-las,
analisá-las e dar sugestões para uma nova estruturação. Nesse momento, percebi que
juntas, poderíamos direcionar o trabalho em outro campo metodológico. Dessa forma,
a professora pesquisadora passou a exercer o papel de colaboradora ativa desta nova
concepção de trabalho com sicas de língua estrangeira, e eu como participante,
situava-me em um contexto que precisava de um eixo norteador para empreender
novas situações de trabalho em sala de aula. Nesse processo, passamos a discutir
formas de trabalho, concepções renovadoras para o ensino de música, tendo como foco
principal, os aspectos metodológicos necessários à condução dessas aulas.
Durante todo o trajeto desta pesquisa, em nossas conversas e nas sessões
reflexivas, acredito que houve um ganho muito grande, pois comecei a enxergar minha
prática e a questioná-la. Numa das sessões reflexivas, a professora pesquisadora me
sugeriu algumas escolhas musicais que poderiam ser trabalhadas, bem como a
metodologia que poderia nortear esse trabalho. Nesse momento, percebi que poderia
desenvolver uma aula de ngua inglesa, estabelecendo relações da temática da música
em língua materna, já que os alunos demonstravam tantas dificuldades na apropriação
dessa nova língua. Essas conexões fizeram com que os alunos situassem o significado
da música com os seus conhecimentos anteriores, facilitando também, o aprendizado
da língua inglesa, numa concepção crítica e de formação cidadã.
Desta maneira, pude perceber que as experiências da professora pesquisadora, em
face do seu trabalho mediador do conhecimento no trato com a música, me fez ver e
conceber uma nova maneira de conduzir as aulas de língua inglesa, gerando momentos
interativos de crescimento e aprendizagem, designando o foco do trabalho em um
contexto significante para o aluno, propiciando assim, momentos de trocas relevantes,
valorização da aprendizagem num contexto histórico e político de linguagem em um
sistema mediador em que as idéias ganharam um papel principal no modo de significar
o mundo.
Nesta acepção, passamos a ter grandes momentos de troca e crescimento e todos os
participantes: professora pesquisadora, professora participante e alunos envolvidos, se
desenvolveram com múltiplas possibilidades de ensino-aprendizagem.
Considerações Finais – Pesquisadora
Passo a apresentar minhas considerações acerca do desenvolvimento deste
trabalho. O objetivo do presente estudo foi discutir, sob uma perspectiva crítica, as
transformações pelas quais pesquisadora e professora de inglês passaram durante o
113
desenvolvimento da pesquisa. Como sugere o tulo A música na formação crítico -
discursiva do aluno de Língua Estrangeira”, o foco inicial era, como mencionado na
Introdução, investigar como uma professora trabalhava com letras de música na aula de
inglês, visando a entender que contribuições as atividades que utilizam letras de sicas
na aula de LE podiam oferecer na formação crítico-discursiva dos alunos. No entanto, no
desenrolar do trabalho, o agente de mudanças deixou de ser o uso da música e passou a
ser a interação entre professora-participante e pesquisadora.
Este estudo, portanto, permitiu-me observar dois processos distintos: o processo
de criação de espaços coletivos de conhecimento durante as sessões reflexivas entre
professora-participante e pesquisadora e o processo de transformação nas práticas de
ambas, professora-participante e pesquisadora.
Algumas considerações são necessárias a respeito do processo reflexivo em si.
Uma das constatações que este estudo me permitiu fazer é que mais difícil que refletir é
levar o outro a refletir. As transformações buscadas por este estudo poderiam ter outro
alcance, não fosse pela superficialidade em que se mantiveram algumas de nossas
discussões. Apesar de estar consciente dos objetivos das sessões reflexivas, a ausência de
problematização fez, das duas primeiras sessões reflexivas, um instrumento mais para
veicular informações que para auxiliar no processo reflexivo.
No entanto, comparando as práticas de ambas no começo e no final do estudo,
pude verificar que, mesmo as sessões reflexivas em que eu como pesquisadora, por
inexperiência, não busquei a problematização das ações da professora, ainda assim essas
sessões reflexivas serviram como instrumento de transformação pessoal. Isto porque a
leitura das transcrições indicou que esse não era o caminho para se chegar à interação
crítico-reflexiva necessária para a transformação das práticas pedagógicas. Mesmo as
aulas em que a professora-participante sistematizou o ensino da gramática e do
vocabulário, reduzindo as interações a respostas curtas e desconectadas de uma
significação para o aluno, ainda assim, a leitura das transcrições dessas aulas serviu para
ilustrar, de forma incontestável, como acontecia realmente a prática da professora. E isto
serviu de instrumento para confrontar com sua prática, da forma como ela a enxergava.
A realização do presente trabalho permitiu-me, ainda, um aprofundamento teórico
que refletiu também em minha prática como professora de inglês. Através da observação
114
do posicionamento pedagógico do outro, consegui me enxergar como uma professora que
também precisa buscar melhorar as relações dialógicas com seus alunos. Pude constatar
que as ações da reflexão crítica podem auxiliar o professor a olhar para a sua própria
prática no sentido de entender o seu papel como sujeito responsável pelo seu
desenvolvimento, pelo desenvolvimento do aluno, e pelo desenvolvimento da
coletividade.
Espero, contudo, que esta pesquisa possa auxiliar outros pesquisadores nas áreas
de ensino-aprendizagem de LE, formação de professores, linguagem e educação.
Com relação ao processo reflexivo em si, concluo que a reflexão e a colaboração
andam lado a lado e que a dificuldade encontrada em ajudar o outro a refletir se pelo
fato de que a argumentação não faz parte dos aspectos privilegiados pela escola de
ontem, nem pela escola de hoje.
Ao pensar em estudos futuros, uma possível proposta envolveria um
aprofundamento no papel da argumentação durante a construção das relações de
colaboração entre professores, com o propósito de transformação das práticas educativas.
115
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