Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
MESTRADO EM ENFERMAGEM
AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS AÇÕES DE CUIDAR EM AMBIENTE
TECNOLÓGICO HOSPITALAR
CURITIBA
2007
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
PATRICIA JULIMEIRE CUNHA
AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS AÇÕES DE CUIDAR EM AMBIENTE
TECNOLÓGICO HOSPITALAR
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem, Setor de Ciências
da Saúde da Universidade Federal do Paraná,
como requisito parcial para a obtenção do grau
de Mestre em Enfermagem, Área de
Concentração: Prática Profissional de
Enfermagem.
Orientadora:
Profª. Dra. Ivete Palmira Sanson Zagonel
CURITIBA
2007
ads:
Cunha, Patrícia Julimeire
As relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar / Patricia Julimeire Cunha –
Curitiba, 2007.
x, 164f. : il.
Orientador: Profa. Dra. Ivete Palmira Sanson Zagonel.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem da Universidade Federal do Paraná.
1. Cuidados de enfermagem. 2. Relações Interpessoais.
3. Enfermagem Pediátrica I. Título.
NLM WY159
TERMO DE APROVAÇÃO
PATRICIA JULIMEIRE CUNHA
AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS AÇÕES DE CUIDAR EM AMBIENTE
TECNOLÓGICO HOSPITALAR
Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em
Enfermagem na Área de Concentração de Prática Profissional de Enfermagem, no
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Setor de Ciências da Saúde, da
Universidade Federal do Paraná pela seguinte banca examinadora:
Orientadora: ____________________________________
Profª. Dra. Ivete Palmira Sanson Zagonel
Pós-Graduação em Enfermagem, UFPR
____________________________________
Profª. Dra. Alacoque Lorenzini Erdmann
Departamento de Enfermagem, UFSC
____________________________________
Profª. Dra. Maria Ribeiro Lacerda
Departamento de Enfermagem, UFPR
Curitiba, 12 de fevereiro de 2007.
AGRADECIMENTOS
À Deus agradeço a vida e as bênçãos.
Ao Curso de Mestrado da UFPR o crescimento adquirido.
Ao Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Cuidado Humano de Enfermagem
(NEPECHE/UFPR) pelo convívio e compartilhar de experiências.
À Direção da Associação Hospitalar de Proteção à Infância Dr. Raul Carneiro, a
dispensa e o incentivo para a construção deste conhecimento.
Aos profissionais da equipe de saúde que participaram deste estudo.
Aos meus colegas de mestrado pelos momentos vividos juntos.
Ä minha querida orientadora, Professora Doutora Ivete Palmira Sanson Zagonel, que
conduziu a construção deste trabalho com paciência, competência, dedicação
respeitando meus limites e dificuldades.
Aos meus amigos pelo compartilhar desta caminhada.
Aos meus alunos a quem direciono minha prática de cuidar.
À minha família pelo amor, carinho, compreensão, incentivo, torcida.
E em especial dedico este trabalho ao meu amado esposo Amauri.
NÃO SEI...
Não sei... se a vida é curta...
Não sei... Não sei...
Se a vida é curta ou longa demais para nós.
Mas sei que nada do que vivemos tem sentido,
Se não tocarmos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita,
alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que sacia, amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo: é o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja
intensa, verdadeira e pura...
enquanto durar.
Cora Coralina
SUMÁRIO
RESUMO.............................................................................................................
viii
ABSTRACT.........................................................................................................
ix
1 INTRODUZINDO A TEMÁTICA.......................................................................
1
2 ESTABELECENDO A INQUIETAÇÃO............................................................
18
2.1 OBJETIVO.....................................................................................................
18
2.2 PRESSUPOSTOS.........................................................................................
18
3 EXPLICITANDO MINHA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL..............................
19
4 DESVELANDO O REFERENCIAL TEÓRICO.................................................
23
4.1 O AMBIENTE TECNOLÓGICO HOSPITALAR E O CUIDADO NA UTIP
CARDÍACA......................................................................................................
23
4.2 PATERSON E ZDERAD SUSTENTANDO O ESTUDO: A RELAÇÃO
DIALÓGICA.......................................................................................................
31
4.3 OS CONCEITOS QUE PERMEIAM O CUIDADO DE ENFERMAGEM EM
UTIP CARDÍACA..............................................................................................
37
5 DELINEANDO O REFERENCIAL METODOLÓGICO: CAMINHANDO EM
DIREÇÃO AO DESVELAMENTO DO FENÔMENO.......................................
44
5.1 A ESCOLHA DO CAMINHO........................................................................
44
5.2 LOCAL DE VIVÊNCIA DO FENÔMENO.....................................................
49
5.3 SUJEITOS SITUADOS NO FENÔMENO....................................................
51
5.4 INTERROGANDO O SUJEITO PARA A APREENSÃO DO
FENÔMENO...................................................................................................
52
5.5 ASPECTOS ÉTICOS...................................................................................
62
6 DIALOGANDO COM AS INFORMÕES: ANÁLISE
FENOMENOLÓGICA......................................................................................
64
7 DEMONSTRANDO A COMPREENSÃO APREENDIDA...............................
136
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................
146
REFERÊNCIAS..............................................................................................
151
APÊNDICES...................................................................................................
159
ANEXO...........................................................................................................
163
RESUMO
CUNHA, P.J. As relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar. 2007. 163f. Dissertação [Mestrado em Enfermagem] -
Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
Orientadora: Profa. Dra. Ivete Palmira Sanson Zagonel
O objetivo do estudo foi compreender como se estabelecem as relações interpessoais nas
ações de cuidar em ambiente tecnológico hospitalar. Para desenvolver este estudo, a
metodologia escolhida foi qualitativa através do método fenomenológico. A teoria
humanística de Paterson e Zderad (1979) que ofereceu suporte teórico ao estudo considera
as relações inter-humanas que se estabelecem no ato de cuidar como um diálogo vivo
preocupa-se com o potencial humano e salienta conceitos que permitem um olhar ao
cuidado como: encontro, relação, presença, chamado e resposta, objetos, tempo e espaço.
A instituição desse estudo é referência na saúde infantil, pois recebe crianças transferidas
de todos os estados do Brasil com patologias complexas que exigem alta tecnologia para
diagnóstico e tratamento da criança. Nessa instituição, escolheu-se a Unidade de Terapia
Intensiva Pediátrica (UTIP) Cardíaca, para a efetivação da entrevista semi-estruturada com
10 profissionais da equipe de saúde. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa
da instituição envolvida.Para a compreensão do apreendido foi utilizada a análise
fenomenológica proposta por Giorgi (1985) A análise compreensiva fenomenológica permitiu
a apreensão de onze Unidades de Significado: 1. Atitude humanística para efetivar o
cuidado: a percepção da equipe de saúde; 2. A humanização do cuidado como proximidade,
toque, olhar; 3. Estabelecendo as relações interpessoais entre os membros da equipe de
saúde: repercussões nas ações de cuidado à criança; 4. Comunicação como forma de
conhecer a si e ao outro na equipe; 5. O poder instituído nas relações inter-humanas entre
os membros da equipe de saúde; 6. A con-vivência do profissional e família no ambiente
tecnológico hospitalar; 7. O sentido da presença da família na recuperação da criança; 8.
Preparo da família para a permanência ao lado da criança durante a hospitalização; 9. A
precisão técnica necessária para o cuidado, tendo como norteador a complexidade do
estado de saúde da criança; 10. O ambiente tecnológico hospitalar com suas peculiaridades
para efetivar as ações de cuidar; 11. Aprimoramento da perspectiva humana e espiritual da
equipe para o cuidar.Os resultados mostram que o cuidado humano pode ser alcançado em
um ambiente tecnológico hospitalar sem romper com as necessárias tecnologias. Tornar o
ambiente tecnológico hospitalar da UTIP Cardíaca em ambiente de interação, humanização,
trocas intersubjetivas e estabelecer a relação dialógica pressupõe ultrapassar barreiras,
abrir caminhos que possam direcionar as mudanças necessárias para a prática do cuidado
solidário e resultar em ações benéficas e eficazes à criança, sua família e equipe. Assim,
faz-se necessário que, sendo complexo por exigência da situação vivida, seja muito mais
um ambiente onde acontecem relações dialógicas de sentimentos, pensamentos e atitudes
humanas, do que um local de desempenho simples de tarefas. A aplicabilidade de conceitos
humanísticos em ambientes complexos e de grande aparato tecnológico como a UTIP
Cardíaca modifica seres e fazeres com vistas à construção de vínculos afetivos e de
responsabilização sobre as ações que resultem em bem-estar dos envolvidos no sentido
existencial e melhoria das práticas de saúde.
Palavras-chave: cuidados de enfermagem, relações interpessoais, enfermagem
pediátrica.
ABSTRACT
CUNHA, P.J.The interpersonal relations in the actions of care in a technological
hospital environment. 2007. 163 p Thesis (Master degree in Nursing)- Federal
University of Parana (UFPR), Curitiba, Brazil.
Adviser: Profa.Dra.Ivete Palmira Sanson Zagonel
The objective of the study was to understand how the interpersonal relations are established
in the actions of care in a technological hospital environment. To develop this study, the
chosen methodology was qualitative through the phenomenological method. The humanistic
theory of Paterson and Zderad (1979) offered theoretical support to the study .The institution
of this study is reference in the infantile health, therefore it receives transferred children from
all the states of Brazil with complex pathologies that demand high technology for diagnosis
and treatment of the child. In this institution, the Cardiac Pediatric Intensive Care Unit (PICU)
was chosen for the realization of the half-structuralized interview with 10 professionals of the
health team. The project was approved by the Committee of Ethics and Research of the
involved institution. For the understanding of the apprehended data the phenomenological
analysis proposed by Giorgi (1985) was used and the phenomenological comprehensive
analysis allowed the apprehension of eleven Units of Meaning: Humanistic attitude to
accomplish the care: the perception of the health team; The humanization of the care as
proximity, touch, look; Establishing the interpersonal relations between the members of the
health team: repercussions in the actions of care to the child; Communication as a form to
know itself and the other in the team; The power instituted in the inter-human relations
between the members of the health team; The con-experience of the professional and family
in the technological hospital environment; The meaning of the presence of the family in the
recovery of the child; Preparation of the family for the permanence at the side of the child
during hospitalization; The necessary technique precision for the care, having as direction
the complexity of the state of health of the child; The technological hospital environment with
its peculiarities to accomplish the actions of care ; Improvement of the human and spiritual
perspective of the team to take care of. The results show that the human care can be
reached in a technological hospital environment without breaching with the necessary
technologies. To turn the technological hospital environment of the Cardiac PICU in an
environment of interaction, humanization, intersubjective exchanges and to establish the
dialogical relation, estimates to exceed barriers, to open ways that can direct the necessary
changes for the practical of the solidary care and to result in beneficial and efficient actions to
the child, its family and the health team. Thus, it becomes necessary that, being complex for
requirement of the lived situation, be either much more an environment of dialogical relations
of feelings, thoughts and human attitudes, than a place of simple performance of tasks. The
applicability of humanistic concepts in complex environments and great technological
apparatus as the Cardiac PICU modifies beings and dos with sights to the construction of
affective bonds and responsibility on the actions that result in well-being of involved in the
existential direction and to the improvement of the health practical.
Word-key: nursing care, interpersonal relations, pediatric nursing.
1. INTRODUZINDO A TEMÁTICA
Nas relações interpessoais que se estabelecem na prática cotidiana do
cuidar em ambiente tecnológico hospitalar, fica evidente que para efetivar a
compreensão do paciente e das pessoas que convivem mutuamente são
necessárias a escuta, a presença e a sensibilidade para ter a verdadeira dimensão
dos direcionadores existenciais de cada partícipe dessa relação. As relações
intersubjetivas dos profissionais de saúde manifestam-se de forma única com cada
membro da equipe e com os clientes. Nos relacionamentos, cada um coloca um
pouco de si, mostra-se em seu modo de agir e influencia o outro de forma positiva
ou negativa. Auxiliar a pessoa a organizar sua doença é papel da equipe de saúde
por meio da percepção, presença, compromisso, solidariedade e principalmente de
inter-ações humanas.
Destarte, exponho alguns enfoques que conduziram minha escolha para
realização deste estudo no contexto de atuação prática de enfermagem. A
experiência vivida diariamente no local e instituição do estudo, durante os últimos
oito anos, conduziram-me a refletir o quanto precisaria despender para realizar este
trabalho, pois durante este tempo, sempre cuidei de crianças em estado grave ou
crítico e em interação com a equipe. A inquietação surge ao questionar Como se
estabelecem as relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar?
A intersubjetividade se manifesta “como história relacional vivida, como
linguagens, intercomunicação, conhecimento, valores, crenças, emoções, desejos,
temores, perspectivas, projetos” como salienta Mandú (2004, p.669).
Para compreender a realidade, na qual estamos envolvidos é preciso
mergulhar na subjetividade e sua essência, sem desconsiderar a objetividade que a
permeia.
Nesse sentido, Terra et al (2006, p.673) estabelecem que,
a essência significa a possibilidade de leitura da realidade, do
fenômeno e da experiência vivida. E a subjetividade é aquela a partir
da qual emergem as características do sujeito, reforçando o seu
aspecto de ser humano único e singular. Das inter-relações
cotidianas entre os sujeitos surge a intersubjetividade, intensificando
as interações que cada sujeito estabelece com o outro
compartilhando visões de mundo, crenças e valores no cotidiano
social.
Para alcançar as respostas, a investigação foi direcionada às pessoas
envolvidas nesse processo de cuidar, pois entendo que o ser humano constrói o seu
processo vital baseado nas suas vivências e diferentes formas de compreender e
relacionar-se.
A instituição do estudo, por ser um centro de referência na saúde infantil,
recebe crianças transferidas de todos os estados do Brasil com patologias
complexas que exigem alta tecnologia para diagnóstico, tratamento e experiência no
cuidado à criança. A Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) Cardíaca,
contexto dessa investigação torna-se ambiente de constantes relações interpessoais
e profissionais, em que a minha permanência de oito horas colabora com os demais
profissionais envolvidos no processo de cuidar. Diante desta realidade, para com-
viver neste local necessitei desenvolver formas sensíveis de cuidar para visualizar
que apesar de serem todos profissionais, com saber e fazer próprios, cada indivíduo
traz ao desenvolver suas relações, além do seu contexto pessoal, a realidade
momentânea de suas atividades e sua história de vida.
A Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) surge na década de 60,
e a partir desse período, passa por rápido desenvolvimento tecnológico, aspecto que
atualmente possibilita uma melhor qualidade na assistência à criança criticamente
enferma. Dessa forma, nesse ambiente as atenções estão voltadas à tecnologia,
priorizando o funcionamento do aparelho em detrimento do ser humano. Esse
funcionamento engloba as diferentes dimensões que compõem o ser humano,
aquelas que exigem as habilidades técnico-científicas, mas também aquelas que
envolvem a sensibilidade e humanização.
É incontestável o papel relevante dos recursos tecnológicos para o
sucesso do tratamento e suporte parcial ou total da vida da criança criticamente
enferma, no entanto, deve ser perpetuada a subordinação tecnológica ao homem e
não de subordinação do homem. Nesse sentido, Vila e Rossi (2002) afirmam que
ninguém questiona a importância da existência da tecnologia, porque ela em si não
é benéfica nem maléfica, tudo depende do uso que se faz dela. E também não se
pode impedir que ela exista, nem ignorá-la, isto seria um retrocesso de
desenvolvimento.
A UTIP Cardíaca é considerada o ambiente tecnológico hospitalar para
fins desse estudo, em que conceituo como o local onde se estabelece o processo de
trabalho cotidiano do enfermeiro e equipe de saúde, junto ao cliente criança -
família, em que é exigido muito mais que a habilidade de perceber os sinais e
sintomas da criança, ou reconhecer uma situação que não vai bem. Impõe uma
atenção maior para que o profissional possa cuidar por inteiro na relação com o
outro, mobilizando sua experiência, conhecimento, referenciais de vida para
ultrapassar a rigidez da técnica e aderir ao modelo sensível e dialógico de cuidar.
Tornar o ambiente tecnológico hospitalar da UTIP Cardíaca em ambiente
de interação, humanização, trocas intersubjetivas e estabelecer a relação dialógica
pressupõe ultrapassar barreiras, abrir caminhos que possam direcionar as
mudanças necessárias para a prática do cuidado solidário e resultar em ações
benéficas e eficazes à criança, sua família e equipe. As experiências vividas por
cada sujeito envolvido oferecem significado à percepção das pessoas sobre o
fenômeno particular das relações interpessoais nesse ambiente tecnológico
hospitalar e cabe ao todo de pesquisa fenomenológica, percurso adotado nesse
estudo, descrever essa experiência vivida e as compreensões e interpretações que
cada ser percebe.
De acordo com Bettinelli (2002), somente com a interação das duas
correntes, a tecnológica e a humana, é possível prestar o cuidado solidário,
individual e qualificado e não deve ser negada ao enfermeiro a liberdade de
compatibilizar o conhecimento técnico-científico com a intuição, pela valorização da
afetividade e pelo respeito ao ser humano.
Pessini et al. (2004) apontam que os equipamentos têm seu valor, desde
que resguardados os princípios cnicos e humanos indispensáveis, tanto no
diagnóstico como no tratamento, na manutenção e, sobretudo, na valorização da
vida e que a tecnologia é imprescindível, mas deve ser questionada quanto à sua
utilização e o sentido do seu uso.
Ao longo de minha trajetória de cuidado à criança, percebo que a
criança internada em uma UTIP Cardíaca não tem apenas um corpo doente, mas
sim a totalidade da sua existência envolvendo seus valores cognitivos, afetivos,
fisiológicos, sociais e morais. Esse contexto torna-se um ambiente tecnológico,
carregado de significados para as pessoas que ali convivem, pois, a hospitalização
seja ela, para realização de procedimentos diagnósticos ou terapêuticos mobiliza a
criança, sua família com mudanças nos hábitos diários e também na equipe que
cuida. A sensibilidade é dimensão essencial no cuidado, pois diante de situações
estressantes é ela que abre o espaço para uma visão mais integral do ser humano,
que oferece a resposta que dá sentido ao acontecimento.
Uma nova rotina é imposta à criança hospitalizada como a separação,
contato com um ambiente adverso ao seu, exposição ao cuidado realizado por
pessoas que não são de seu convívio, alteração da auto-imagem devido à
necessidade de instalação de artefatos indispensáveis à terapêutica e alterações
que envolvem o crescimento e desenvolvimento físico e emocional da criança. A
família também se percebe doente, vivenciando o risco iminente da perda do filho, a
sensação de impotência, o sentimento de culpa, a impossibilidade de manter suas
tarefas diárias, a necessidade de desdobramento para atender os demais filhos. A
participação da família no cotidiano da UTIP Cardíaca é primordial para a realização
do cuidado na sua totalidade, sendo necessário não apenas repensar as relações
interpessoais próprias desse contexto, mas também, no acolhimento dessa família.
Barbosa e Rodrigues (2004, p.210) explicitam que “enquanto estamos
cuidando da criança sem envolvimento direto naquele momento com a família, torna-
se mais fácil a relação, mas quando a família está presente, alguma coisa muda
nessa relação”. Apontam ainda, o despreparo da equipe em lidar com a situação,
por lacunas na formação, educação continuada, empenho das chefias para melhorar
as relações humanas em ambiente de complexidade tecnológica, além do
despreparo emocional para atender demandas de afeto e sofrimento. Salientam que
nessa convivência “há um típico que não estabelece a interação nem reciprocidade
de perspectiva, mas um típico direcionado para o outro e não com o outro”. Nessa
inter-relação entre a equipe profissional e família as necessidades de intervenção
situam-se, ora no trabalho multiprofissional, ora no contexto de saúde da criança,
ora na reflexão para a implementação da assistência humanizada. Todos os
aspectos devem ser considerados para efetivar o cuidado solidário incluindo cliente,
família, equipe e instituição.
O cuidado faz parte da essência humana e não é apenas um ato pontual,
mas sim a forma como a pessoa humana se estrutura e se realiza no mundo com os
outros (BOFF, 1999). Nessa vertente de pensamento Guimarães (2005, p.328) ao
citar as palavras de Illich afirma que “a medicina atual, pautada no desenvolvimento
tecnológico, expropriou a saúde dos indivíduos, na medida em que delegou para si o
saber referente ao cuidado com a saúde [...] e deixando o homem moderno
despreparado para lidar com o adoecimento, o sofrimento e a morte”.
O cotidiano da prática de cuidado vivenciado por mim ao lado dos
membros da equipe de saúde desta unidade solidificou o entendimento de que
somos pessoas vulneráveis como qualquer ser humano, expostos ao sofrimento, dor
e estresse. No entanto, o domínio técnico confere aos profissionais da saúde o
estigma de donos do saber, auto-suficientes, insensíveis. Segundo Bastos (2002),
os profissionais da equipe de saúde desempenham um papel aparente de serem
capazes de vencer, de dominar a morte, por meio de um saber tecnológico que lhes
confere poder, status e prestígio, mas que, ao mesmo tempo, encobre os medos e
tensões que acomete qualquer ser humano. E então, passam a projetar uma
imagem errônea de pessoas frias, distantes, indiferentes, quando na verdade, o
próprio ambiente tecnológico e complexo da UTIP Cardíaca, que acolhe crianças
vulneráveis e lutando pela vida, que convive com situações de sentimentos
negativos, acaba moldando no profissional uma atitude insensível resultante, muitas
vezes, de uma questão, até mesmo, de sobrevivência.
O cuidado ao cuidador é apontado por Costenaro e Lacerda (2001) como
fundamental para cuidar do outro. No ambiente tecnológico hospitalar de UTIP
Cardíaca a exigência de diálogo, convívio, comunicação, compartilhamento de
situações torna-se mais intensa, pois as pessoas vivenciam a dor e sofrimento
cotidianamente. O estudo de Wolff (1996) estabelece o significado de ser cuidadora
de enfermagem em UTIP e apreende sentimentos de impotência face ao sofrimento
e solicitações das pessoas, dificuldades em encontrar pessoas disponíveis a ouvi-
las, a afinidade gerada com as mães das crianças hospitalizadas, demandas
tecnológicas complexas. referência também a sentimentos positivos, de
recompensa, satisfação pelo trabalho realizado. Não se percebem como objetos de
cuidado, dedicando pouco tempo ao cuidado de si. Essas comprovações refletem o
dia-a-dia de uma UTIP, em que pouca atenção é dada ao cuidador ou poucas
oportunidades são oferecidas para que se sinta cuidado.
O suporte às necessidades da família é disponibilizado através da
efetivação do vínculo com a equipe de saúde e a acessibilidade na comunicação
clara, compreensível, verdadeira e solidária. Ao entender que a família é um grupo
de pessoas agregadas, através do vínculo de amor, percebo que para cuidar de uma
criança em UTIP Cardíaca faz-se necessário o estabelecimento de uma relação
dialógica entre equipe de saúde-criança-família objetivando sempre o estar - melhor
desta tríade.
Em minha experiência profissional em UTIP Cardíaca, observo que apesar
dos avanços, das políticas e do empreendimento de cada profissional e gestor das
instituições de saúde, ainda é incipiente a motivação para tornar o ambiente
tecnológico hospitalar, naquele que realmente auxilia a prover o cuidado a todos os
envolvidos. Em muitas situações o próprio profissional não se percebe como
cuidador ou não consegue efetivar o cuidado de si.
Na UTIP Cardíaca, a família pode permanecer 24 horas por dia junto com
a criança, sendo esta uma das medidas para tornar o tratamento mais efetivo e
humanizado. No entanto, antes de entrar para permanecer na UTIP Cardíaca, o
familiar precisa receber da equipe de saúde informações sobre as normas gerais de
funcionamento, as medidas de controle de infecção e sobre os procedimentos
necessários para o cuidado à criança. As informações devem envolver
principalmente a ansiedade relacionada ao aspecto físico no qual o familiar
encontrará a criança (sedada, não responsiva, coloração e temperatura corporais
alteradas) e as dúvidas sobre os equipamentos e procedimentos (tubos, curativos,
fios e aparelhos conectados à criança).
Ferreira (2002, p.76) enfatiza que “no atendimento à criança, ressalta-se
uma concepção de cuidado cuja abordagem centra-se na família. Isto implica na
adoção de uma posição teórica determinada e determinante que orienta todo o
cuidado desenvolvido com a família e a criança, sujeitos daquele cuidado”.
Complementa afirmando que a complexidade está no próprio cuidado, fruto da ação
e objeto de trabalho do enfermeiro, compartilhado com um sujeito também
complexo. Destaca as vertentes técnica e tecnológica que “contribuem para a
materialização do cuidado na nossa prática cotidiana e que, se não forem aplicadas
de forma crítica, podem imprimir impessoalidade, distância e frieza, tornando o
cuidado desumano e o cliente desubjetivado”.
Acredito também, como afirma Gonzaga e Arruda (1998), que o
administrador que gerencia com conhecimento, habilidade, sabedoria e respeito,
vivenciando sua humanidade com os profissionais que estão sobre sua
responsabilidade, promove um ambiente de cuidado solidário. Ao cuidar da criança,
família e equipe de forma intersubjetiva, dialógica e humanista, o enfermeiro
desencadeia ações de sentido duplo entre os profissionais, em que ao mesmo
tempo em que cuida, busca estabelecer relações de cuidado no sentido de
compreender a si mesmo, o outro e o próprio ambiente.
Mesmo sendo o trabalho desenvolvido pela enfermagem e demais
membros da equipe de saúde neste ambiente, com muita competência, dedicação e
empenho, sinto que a rotina complexa diária, ainda aponta dificuldades nas relações
humanas e os profissionais sentem-se inseguros para gerenciar atitudes humanas
voltando-se para a complexidade tecnológica dos aparelhos, a qual, aparentemente
conseguem controlar.
Sobre esse aspecto, Ayres (2000, 2004, 2005) tem abordado questões da
humanização das práticas de saúde e salienta que nas relações de cuidado entre
profissional e cliente torna-se possível fazer surgir a demanda por arranjos
tecnológicos mais sensíveis às necessidades de saúde de indivíduos e
coletividades. Ayres (2000, p.119) afirma que “a intersubjetividade viva do momento
assistencial permite escapar a uma objetivação ‘desubjetivadora’ exatamente porque
ali se efetiva uma troca, um espaço relacional, que extrapola o tecnológico. Apóia-se
na tecnologia, mas não se subordina a ela, subverte-a”. Diz ainda, que a sabedoria
prática não cria objetos, mas realiza sujeitos diante dos objetos criados no e para
seu mundo. Explicita sobre o lugar privilegiado do cuidado nas práticas de saúde
como, atitude e espaço de re-construção de intersubjetividades, de exercício aberto
de uma sabedoria prática para a saúde, apoiada na tecnologia, mas sem deixar a
intervenção em saúde resumir-se a ela .
Merhy (2000) propõe uma reflexão sobre o encontro do médico e usuário
olhando-o sob a noção de valises que aquele profissional de saúde utiliza para agir
nesse processo de interação. Cita que para o médico agir utiliza três valises: uma
vinculada à sua mão e na qual cabe, por exemplo, o estetoscópio, entre vários
outros equipamentos, formada por ‘tecnologias duras’; outra esna sua cabeça, na
qual cabem saberes bem estruturados como a clínica e a epidemiologia, formada
por ‘tecnologias leve-dura’; e a última presente no espaço relacional trabalhador-
usuário, que contém ‘tecnologias leves’. Complementa que as tecnologias leves
permitem produzir relações, expressando como seus produtos são regidos [grifo
meu].
Nesse sentido, a situação vivenciada pela criança, família e equipe de
saúde necessita de uma forma diferenciada de cuidar em que a intersubjetividade
seja norteadora, enfocando o ser humano como princípio de toda ação. O caráter
relacional do cuidado implica em considerar a intersubjetividade que se estabelece
na relação interpessoal.
Esta forma de cuidar, posição que adoto como filosofia de vida, sempre
me pareceu muito clara e simples e hoje, é reforçada pelos conteúdos apreendidos
no Curso de Mestrado em Enfermagem da UFPR. Sei que o desenvolvimento deste
trabalho é um grande desafio, pois, pretendo ser uma semente na implementação de
um novo modo de cuidar, priorizando as relações interpessoais que se efetivam no
ambiente tecnológico hospitalar e mais especificamente na UTIP Cardíaca como
imprescindíveis para o sucesso das ações cuidativas. É necessário atentar para as
emoções, sentimentos, percepções e intersubjetividades que permeiam cada mente
humana desse simultâneo processo de adoecimento, hospitalização e longo período
em ambiente tecnológico hospitalar da equipe, criança e família.
Por esta convicção considero o referencial teórico de Paterson e Zderad
(1980) pertinente e adequado para conduzir este trabalho, pois para estas autoras a
relação dialógica é a categoria existencial por excelência, quando ajuda na
compreensão da realidade, por meio da experiência vivida (ação), da reflexão
(pensamento) e do relacionamento, porque permite abertura para que os seres
humanos experienciem o mundo e a si próprios de forma integral. A relação
dialógica para Paterson e Zderad (1980) é uma forma de diálogo que implica uma
esfera ontológica, uma forma particular de relação intersubjetiva mediante a qual é
possível ver o outro como ser distinto e único, em mútua relação.
A teoria humanista de Paterson e Zderad segundo Rolim, Pagliuca e
Cardoso (2005) contempla a prática da enfermagem humanística, o fenômeno da
enfermagem com o bem-estar, o potencial humano, a transação intersubjetiva, o
diálogo vivo desenvolvido pelo encontro, a relação, a presença e o fenômeno da
comunhão. Na prática esta teoria humanística, depende da experiência, concepção,
participação e do ponto de vista particular de cada enfermeiro em relação às suas
vivências no mundo e na enfermagem. A identificação com o conceito de relação
dialógica das autoras foi a responsável pela decisão de utilizar este referencial neste
estudo.
A partir dessas idéias, entendo o cuidado como uma atitude relacionada a
sentimento de um ser humano para com outro ser humano, para com algo, que
fundamentado num processo interativo, é realizado respeitando a dimensão
existencial do ser e valorizando a expressão da experiência de vida de ambos no
momento do cuidar. O cuidado ocorre nessa intersubjetividade humana, em uma
relação dialógica de encontro genuíno entre profissional e ser cuidado, em um
movimento de complementaridade de sentimentos, ações e reações. O cuidado se
realiza de forma humana, calorosa e atenciosa, em que as percepções dos
profissionais associam-se a emoções e conseqüentemente resultam em melhora no
estado do doente.
O processo de trabalho desenvolvido entre os profissionais que fazem
acontecer o movimento exigido desde o diagnóstico do agravo à saúde do cliente,
passando pelas ações cuidativas para obter resultados bem sucedidos, depende de
cada ser envolvido em um entrelaçamento relacional físico e emocional.
Considerar as pessoas como máquinas, como aparelhos é uma realidade
observada em ambientes de alta complexidade no cuidado à saúde das populações,
pois a exigência insere-se no funcionamento conforme as normas e ainda, conforme
os manuais de instruções. O uso prioritário dos instrumentos e aparatos tecnológicos
em detrimento do investimento em relações interpessoais torna a função de assistir,
aparentemente facilitada, pois não há interação pessoa a pessoa, não mobiliza
sentimentos, o despende energia e tempo humanos, simplesmente acontece de
forma automática. Resulta na falta de envolvimento e percepção do que está inter-
relacionado nesta importante e complexa rede de relações humanas que faz uso de
equipamentos como complemento para o estar - melhor do cliente. Porém, essa
facilidade é aparente, frágil e necessita investimento para capacitar as pessoas a
con-viver em um ambiente dessa natureza.
O cuidado realizado pela enfermagem tem sua história marcada pelo fazer
tecnicista, voltado ao paradigma positivista, em que o conhecimento da biologia era
suficiente para pautar as decisões sobre o cliente. As necessidades, vistas como
dimensões biologicistas, eram atribuídas apenas àquelas que emergiam das razões
corporais, fisiológicas, sendo destinada pouca importância aos sentimentos ou
emoções advindas da vivência do processo de saúde-doença.
A evolução secular do desenvolvimento do conhecimento da enfermagem
trouxe consigo a tecnologia inter-relacionada à dimensão humana que permeiam as
ações do cuidar. Atualmente, a literatura aponta para uma transição de modos de
cuidar em que o se permite um olhar apenas ao corpo biológico, mas ao corpo
existencial que carrega as nuances de cada etapa de vida, em que o indivíduo
experiencia no ciclo vital. O cuidar inclui e transcende a cnica, extrapola normas
rígidas e burocratizadas, exige a superação de tendências habituais colocadas em
prática no cotidiano. É necessário agir, pois é através dos atos que se estabelecem
as mudanças, pelas quais os clientes, profissionais, instituições almejam para
implementar modelos voltados a integração da tecnologia com a humanização.
Costa (2003, p.28) expressa que “o existente pode ser compreendido
na relação que estabelecemos com o mundo. Ele não é uma coisa entre as outras:
ele é aqui, num sentido autolocalizado e autoconsciente, numa relação constante
com objetos, pessoas e situações”. Assim, antes de explicar o que o paciente tem,
faz-se necessário perceber que ele existe. No cuidado a confluência de duas
subjetividades que influem uma na outra, enquanto relação profissional-cliente, e é
ai que se situa o grande desafio, o de conciliar a generalidade de conceitos teóricos
e técnicos com a singularidade do indivíduo. É o encontro com o paciente da doença
e não com a doença do paciente.
O homem não apenas é e está no mundo, mas se relaciona com este
segundo um modo de ser. O ser humano existe em co-naturalidade com os outros,
portanto, o eu nunca está só. O encontro com o outro é um elemento essencial e
integral nas relações recíprocas do ser e do mundo. Para Heidegger (1989, p.169)
“os outros não significa todo o resto dos demais além de mim do qual o eu se
isolaria”, significa sempre um mundo compartilhado com outros. Nesse sentido,
considero que pela reflexão é possível encontrar o caminho que leva ao ser de cada
um, ao compreender, captar as significações de cuidar em equipe e as nuances que
se estabelecem nas relações humanas.
Remen (1993, p.107) colabora com a reflexão ao estabelecer que “[...] os
doentes precisam não apenas da habilidade dos outros, mas também de sua
humanidade, seu calor, compaixão, compreensão e até mesmo seu humor”. O ser
humano é um todo vivo e não é apenas a sua matéria que adoece, como salienta
Buber (1974), ao dizer que o ser humano, não é uma coisa em meio a outras coisas,
mas um ser que preenche todo o horizonte e tudo vive à sua luz. Diante desta
percepção, a utilização da tecnologia deve ser permeada de atitude humana,
definida por Nigthingale (1989) como atitude de sensibilidade, de amor, de ternura e
compaixão. O cliente depende de outros para sua sobrevivência, ou seja, necessita
de relações inter-humanas no seu cotidiano e nas situações de doença, esta
necessidade de valorização como pessoa torna-se ainda mais evidente e
imprescindível.
Pela afetividade, o homem faz e deixa que os seres venham ao seu
encontro. Esse deixar e fazer vir ao encontro têm o caráter de ser atingido, é a
condição de poder tocar e ser tocado. Heidegger (1989, p.192) salienta que “na
afetividade subsiste um liame de abertura com o mundo, a partir do qual algo que
toca pode vir ao encontro”, pois, acredita que o homem sempre se encontra numa
situação afetiva. Portanto, a afetividade é uma dimensão constitutiva do ser. A
afetividade, a dedicação e a solicitude são existenciais básicos, que possibilitam ao
homem ser livre e, portanto cuidado, de acordo com Heidegger (1989).
Percebo pelas colocações dos diferentes autores que tratam da temática
de cuidado que a ênfase está na dimensão expressiva, muito mais do que a
dimensão instrumental.
Na visão de Roy e Andrews (2001), a pessoa ao desempenhar seus
diferentes papéis, assume comportamentos expressivos e instrumentais. Os
expressivos são baseados nos sentimentos e atitudes que a pessoa defende em
relação ao seu papel e desempenho dele. Os comportamentos expressivos são por
natureza emocionais e resultam de interações que permitem à pessoa expressar
estes sentimentos relacionados com o papel de uma forma adequada. O
instrumental é desempenhado no sentido do objetivo, a pessoa usa como parte
integrante de seu papel. São ações físicas e têm uma orientação a longo prazo.
Esses comportamentos, adotados pela pessoa que cuida e por aquela que
é cuidada, constituem a essência da enfermagem: o cuidado, pois, para efetivar as
ações, é necessário ativar ambas as modalidades de comportamento. Assim, o
cuidado expressivo é aquele que efetiva a aproximação, a interação com o outro,
envolve sentimentos, emoções, atitudes de disponibilidade. O cuidado instrumental é
aquele voltado a um alvo, um objetivo, geralmente surge das necessidades do ser
cuidado. Não é possível escolher ou excluir qualquer uma das modalidades, elas se
complementam, são simultâneas, em que o contexto e significado da situação são
levados em consideração. A arte de cuidar situa-se em compor, aliar, articular,
interligar as duas dimensões, expressiva e instrumental, para efetivamente alcançar
os objetivos de cuidado e conforto do cliente.
A compreensão dessas dimensões serve aos propósitos dos enfermeiros,
pois sua essência, o cuidar, visa primeiro o ser e depois o fazer. O ser humano
necessita do outro e, em ambiente de UTIP Cardíaca, cenário desse estudo, fica
clara a importância da interação da criança, família e a equipe.
Entendo que o início do processo de mudança, almejado em local de alta
complexidade tecnológica, como a UTIP Cardíaca, começa ao captar, perceber
como é este ambiente, para então, buscar as mudanças de forma consciente,
sabendo dos limites e desafios a serem enfrentados e superados, pois toda
mudança implica em romper paradigmas consolidados pelas práticas atuais. Os
profissionais por inúmeras razões ignoram a dimensão expressiva e tornam a sua
prática validada por modelos cartesianos e tecnicistas. Dessa forma, aliando minha
experiência profissional e a vasta literatura que aborda as maneiras de humanizar o
cuidado, pretendo através desta pesquisa, desenvolver com a equipe saúde da UTI
de um hospital infantil de grande porte de Curitiba a discussão e a reflexão sobre
como se estabelecem as relações interpessoais entre estes profissionais na sua
prática cotidiana de cuidar em ambiente tecnológico hospitalar.
Assim, é necessário um repensar e vislumbrar a possibilidade de delinear
um modo diferente de atuar permeado de relações humanas que privilegiem o
cuidado que, realizado em ambiente complexo por exigência da situação vivida,
esteja muito mais voltado à relação dialógica, com envolvimento de sentimentos,
pensamentos e atitudes humanas, do que ao exclusivo desempenho tecnicista de
tarefas.
Desta forma, apresento a questão norteadora deste estudo: Como se
estabelecem as relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar?
2. ESTABELECENDO A INQUIETAÇÃO
2.1. OBJETIVO
Compreender como se estabelecem as relações interpessoais nas ações de
cuidar em ambiente tecnológico hospitalar.
2.2. PRESSUPOSTOS
As relações interpessoais como encontro intersubjetivo que se processam na
efetivação do cuidado em ambiente tecnológico hospitalar colocam em cena
peculiaridades do universo afetivo, cultural e social dos sujeitos envolvidos;
As relações interpessoais estabelecidas no encontro dos profissionais com a
criança e família auxiliam no equilíbrio do cuidado, aliando a cnica e a
dimensão humana em ambiente tecnológico hospitalar;
A atitude dialógica, as relações interpessoais, a proximidade e o convívio
entre os membros que compõem a equipe de saúde no cuidado à criança,
fortalecem as ações de cuidado afetivas, solidárias e humanas;
As relações interpessoais no cuidar em um ambiente tecnológico hospitalar
requerem envolvimento das pessoas em uma relação dialógica de trocar e
compartilhar, em um movimento de mão dupla de dar e receber, para tornar
possível a prática de cuidar humanística.
3. EXPLICITANDO MINHA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Minha história de cuidado à criança iniciou-se muito cedo. Como filha mais
velha, foi na adolescência que desenvolvi os primeiros atos de cuidado a um irmão e
uma irmã, que na época tinham sete e dois anos. Minha mãe trabalhava e tínhamos
sempre alguma pessoa que “cuidava” de todos nós, mas ainda assim sempre me
senti responsável pelos meus irmãos e os cuidados básicos como trocar fralda,
encaminhar para o banho, alimentação era eu quem os realizava. Alguns anos mais
tarde, com a mudança de toda família para os Estados Unidos, passamos a viver
uma nova realidade cultural e social. Ficava na escola até as três horas da tarde e
logo após, como qualquer outro estudante da minha idade, trabalhava. Era baby-
sitter de três irmãos. Fui babá então durante os quatro anos do high school e, com
essa nova realidade, senti a necessidade de estudar um pouco sobre as
necessidades das crianças. Acredito que este tenha sido o momento mais
importante para a minha vida profissional, pois desde então minhas leituras e
estudos têm aprofundado meu conhecimento e tornado o meu cuidado à criança
especializado.
A escolha pela enfermagem foi decidida em 1993, ano que desenvolvi
atividades como membro do serviço de voluntariado do Hospital de Clínicas da
UFPR. Nesse período, pude observar muitas vezes enfermeiras cuidando de seus
pacientes e já, naquela época, percebia que existia algo diferente naquelas relações
de cuidado. Fazer enfermagem então, significou entender melhor o processo de
cuidar e assim, continuo trilhando o caminho de aprofundamento no tema. Durante
minha trajetória enquanto acadêmica (1994 a 1997) despertei-me para uma outra
inclinação: a pediatria. Foi então, que ainda como acadêmica do segundo ano do
curso de Enfermagem tive a oportunidade de ser contratada como estagiária no
Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) de um hospital pediátrico de
grande porte de Curitiba, permanecendo até o final do curso. Neste serviço, eu
acompanhava as enfermeiras e realizava tarefas que eram delegadas a mim.
Durante este período pude perceber como a presença das enfermeiras
neste serviço e a forma como desempenhavam suas tarefas fazia diferença no
cuidado à criança. Após a graduação, permaneci ainda um ano como enfermeira do
SCIH desenvolvendo atividades de controle de infecção, principalmente na UTIP
Cardíaca. Neste momento, fui despertando para uma nova paixão: a cardiologia
pediátrica. As crianças em situações de risco de vida requerem muitos cuidados
diretos da própria enfermeira e, ao observar muitas destas situações, senti que,
apesar de gostar muito da área de controle de infecção hospitalar, as atividades
mais burocráticas já não me preenchiam enquanto profissional, eu queria estar ali ao
lado do paciente, cuidando diretamente dele. Alguns meses se passaram, enquanto
me certificava desta decisão, quando surgiu uma vaga na UTIP Cardíaca. Fui
transferida para esta unidade como enfermeira assistencial do turno da noite.
Neste ano, enquanto enfermeira assistencial tive a oportunidade de cursar
duas especializações: Enfermagem Pediátrica, com ênfase em UTI e Controle de
Infecção. Estes estudos trouxeram o aperfeiçoamento exigido pelo ambiente
tecnológico hospitalar complexo, mas, ainda assim sentia que queria aprender mais.
Na verdade, sentia falta de um aprofundamento no estudo dos conceitos da
enfermagem. Dominava o aparato tecnológico, sabia realizar as técnicas,
coordenava a equipe de enfermagem e a unidade, mas, sentia necessidade de
ampliar e me instrumentalizar de forma mais complexa, para desenvolver o processo
de cuidar.
Em 1998 fui indicada para a Chefia da UTIP Cardíaca. Com o aumento
das funções e da responsabilidade constatei ao longo destes oito anos que muito do
cotidiano do trabalho precisava ser mudado para que pudesse por em prática a
sensibilidade que percebia dentro de mim e nas minhas ações relacionais. A minha
experiência de cuidar em Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica Cardíaca (UTIP
Cardíaca) sempre foi conduzida pelo valor que atribuo às relações humanas. No
entanto, no meu pequeno mundo de conhecimento, não entendia como poderia
desenvolver um modelo de cuidar que conquistasse outros profissionais que atuam
na mesma unidade, a ter a mesma valorização na intersubjetividade do cuidar.
Apenas reflexões a respeito já não causavam as mudanças necessárias e
esta realidade, aos poucos foi tornando-se uma inquietação constante no meu
cotidiano da prática de cuidado. Estas inquietações conduziram-me ao curso de
Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Paraná, o qual abriu
inúmeros e novos horizontes ao conhecimento da enfermagem.
Neste momento vivido no curso de Mestrado, interessei-me pelos
conceitos da Teoria Humanística de Paterson e Zderad, nos quais encontrei
explicação para o meu próprio processo de cuidar no ambiente tecnológico
hospitalar, pois sempre tive preocupação com as relações subjetivas do cuidar.
Juntamente com o estudo da teoria, aliou-se o entendimento da fenomenologia e
ficava fascinada, pois esta situação me inquietava e motivava a continuar me
preparando para desvelar o fenômeno desse estudo.
Exatamente neste momento, recebi um convite para deixar a UTI e
assumir a docência em uma instituição que pertence ao complexo hospitalar.
Primeiramente foram dias e noites pensando se aceitaria ou não. Depois, tomada a
decisão de assumir a docência, foram mais inúmeros dias e noites preparando-me
para deixar o local, no qual durante oito anos cuidei das crianças, das famílias, das
equipes, das pessoas, do ambiente. Entendi que aliar a docência à minha
experiência na prática de cuidado em UTI Pediátrica Cardíaca viria a contribuir de
forma semelhante ou em uma dimensão maior, pois agora cuidava também de
acadêmicos. Percebi que continuaria atuando nessa realidade, porém com um novo
papel, de troca de saberes e fazeres, de compartilha para auxiliar no processo de
ensino-aprendizagem de futuros profissionais de enfermagem.
Hoje, como docente na disciplina de Processo de Cuidar IV,
especificamente com a Criança em Situações de Complexidade, posso reafirmar
que meu caminhar direcionou-me a uma experiência profissional para a qual,
mesmo sem ter tido entendimento consciente, (o qual somente adquiri agora) me
preparei durante toda a minha trajetória no cuidado à criança e percebo ainda mais
claramente como foi importante este estudo.
4. DESVELANDO O REFERENCIAL TEÓRICO
Neste momento, aproprio o leitor aos temas que norteiam este estudo.
Inicialmente, discorro sobre o ambiente tecnológico hospitalar, para este estudo a
UTIP Cardíaca, e como nele acontece a prática do cuidado. Discorro sobre os
conceitos da teoria humanística de Paterson e Zderad e como estes sustentam este
trabalho. Em seguida, apresento os conceitos que permeiam o cuidado de
enfermagem em UTIP Cardíaca. Assim, faço o entrelaçamento entre o ambiente, as
pessoas que atuam nesse ambiente e os conceitos que considero pertinentes e
indispensáveis para as ações de cuidado se efetivarem com base científica, criativa
e envolvimento emocional.
4.1. O AMBIENTE TECNOLÓGICO HOSPITALAR E O CUIDADO NA UTIP
CARDÍACA
A história do avanço tecnológico na área da saúde mostra que a evolução
veio em decorrência da falta de condições adequadas de atendimento, conforme
demonstra Hayashi (2000), afirmando que durante situações de calamidades como
guerras, epidemias e incêndios o número de mortes era elevado em decorrência da
incapacidade de assistência adequada em tempo hábil.
A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) surgiu da necessidade de
aperfeiçoamento e concentração de recursos materiais e humanos para o
atendimento a pacientes graves, em estado crítico, mas com possibilidade de
recuperação e da necessidade de observação constante, assistência médica e de
enfermagem contínua, centralizando os pacientes em um núcleo especializado.
Durante a Segunda Guerra Mundial, iniciaram-se os primeiros atendimentos em
centros de terapia intensiva devido à necessidade de procedimentos cirúrgicos. No
Brasil, as primeiras unidades específicas foram criadas também na década de 50 e
as primeiras unidades pediátricas na década de 60 (VILA e ROSSI, 2002).
O progresso tecnológico está sendo fundamental para a resolubilidade dos
problemas e para a manutenção da vida das pessoas, conforme apontam Pessini e
Bertachini (2004), justificando porque diariamente o ambiente tecnológico vai
tornando-se mais complexo, com equipamentos e aparelhos de última geração,
mobiliários sofisticados e a necessidade dos profissionais procurarem na
especialização a aquisição de saberes estruturados. Bastos (2002) salienta que essa
tecnologia tem também influenciado não o significado do trabalho dos
profissionais da saúde, como também é vista como a solução para todas as
necessidades do paciente.
A tecnologia sobrepõe-se na UTI por ser um serviço cujo objetivo é
aumentar as chances de sobrevida do doente grave ou de alto risco, que direciona a
atenção do profissional para a doença, para sinais e sintomas, para os saberes
estruturados e para o manuseio de aparelhos e equipamentos (NASCIMENTO,
2003). Então, como nem sempre conseguem controlar sinais e sintomas, a melhora
e a cura dos pacientes, os profissionais, como afirma Bastos (2002), são expostos a
situações de sofrimento, dor e estresse e fecham-se para o lado humano do cuidado
passando a valorizar e relacionar-se com aquilo que podem controlar como a atitude
intervencionista, buscando construir sempre procedimentos eficazes que possibilitem
vencer e/ou dominar a morte, por meio de um saber tecnológico que lhes confere
poder, status e prestígio, mas que, ao mesmo tempo, encobre seus medos e
tensões. E dessa forma, numa busca incessante de dominação, acaba dominado
pela tecnologia num modo de vida que reverencia o tecnológico como se fosse à
essência do seu EU, em um paradigma tecnicista.
Orlando (2001) ilustra essa situação de forma concreta quando diz que os
intensivistas recém-formados mostram-se, em geral, exímios “tecnicistas”, o têm
grandes dificuldades na execução das técnicas, e no campo relacional profissional-
paciente demonstram a existência de uma lacuna nas suas formações. Pessini e
Bertachini (2004) afirmam que a atração pelo conhecimento e pelo manuseio de
equipamentos sofisticados é crescente e é repleto de valor mítico que, às vezes,
deslumbra o profissional, sobretudo se, somente ele sabe manuseá-lo, criando uma
imagem de profissional qualificado.
Assim, surge o mito de que a destreza manual e o conhecimento da
técnica dos profissionais que atuam em ambiente tecnológico são insuperáveis e faz
deles, profissionais mais valorizados e procurados, o que lhes confere maior respeito
profissional. O contexto deste mito demonstra que a ação do profissional passa a ser
dependente da tecnologia. Esta realidade é observada, conforme estabelece
Scantimburgo (1970), porque o homem se desorganizou e encontra-se perdido,
sucumbido através das idades, e ainda hoje, diante de tantos convites da técnica. Os
recursos tecnológicos são necessários em uma UTI e os profissionais devem
valorizar a tecnologia existente devido a seu relevante papel no sucesso do
tratamento e no suporte parcial ou total da vida do paciente criticamente enfermo, no
entanto deve ser perpetuada sempre a subordinação do conhecimento científico ao
homem e não o contrário.
Nesse sentido, Vila e Rossi (2002) acentuam que ninguém questiona a
importância da existência da tecnologia, porque ela em si não é benéfica nem
maléfica, tudo depende do uso que se faz dela. O uso incorreto conduz à idolatria,
dificultando a relação profissional-paciente, tornando-a apenas formal e burocrática.
É quando o profissional esquece que quem comanda a máquina é o homem e sendo
o homem soberano no universo, a tecnologia deve estar subordinada a ele. Neste
momento, a qualidade do cuidar é prejudicada, como justifica Nascimento (2003)
afirmando que, quando o profissional volta-se para o atendimento do que é objetivo
no doente e do que se mostra aparente, torna as relações distantes e frias, levando o
doente a sentir-se como receptáculo de cuidados físicos e não uma pessoa.
Para ultrapassar essas barreiras e melhorar os relacionamentos
envolvidos nos cuidados à saúde Remen (1993) propõe a conscientização dos
profissionais sobre o contexto de seu trabalho, vendo a si mesmos como
participantes de um relacionamento com as pessoas e com a doença. Os
profissionais de saúde em seu cotidiano de atuação se confrontam com a
vulnerabilidade humana, porém se não houver capacidade e habilidade para
enxergá-la, a vulnerabilidade pode se tornar esmagadora e dolorosa, fazendo com
que se afastem e se distanciem das relações na tentativa de se defenderem através
de atitudes que os tornam mais frágeis e menos atuantes. A vulnerabilidade torna os
profissionais esgotados, como afirma a autora, sem energia emocional, intuição,
sabedoria, imaginação, criatividade, fé e senso de propósito e significado.
Remen (1993, p.181) explicita ainda que “a imagem profissional é um dos
principais mecanismos através dos quais cada profissional perpetua práticas e
atitudes habituais”. A imagem profissional contemporânea ainda não estimula a
desenvoltura para explorar e manifestar a experiência interior ou uma resposta
honesta à experiência interior das outras pessoas. Manter um padrão profissional de
comportamento induz a acreditar que necessite ser habilidoso no uso da razão e da
técnica, além das qualidades de ter bom julgamento e ação rápida e decisiva. Da
mesma forma que desejamos um cliente ideal, os profissionais procuram manter e
perpetuar a imagem ideal para seu cliente. Nesse jogo relacional, é exatamente o
relacionamento que está prejudicado e por muitas vezes inalcançável.
Nesse sentido Remen (1993, p.184) acentua que,
O médico não é ativamente estimulado a aceitar e canalizar seus
próprios sentimentos, ou a procurar compreender os sentimentos do
paciente como elementos importantes e úteis para o restabelecimento
da saúde, em lugar de considerá-los inconvenientes e obstrutivos na
busca desse objetivo. Não é sugerido ao médico que toque o paciente
a não ser para obter informações clínicas, embora o toque carinhoso
possa ser uma forma importante de se oferecer o conforto que
somente um ser humano pode dar a outro ser humano, fazendo com
que o paciente se sinta menos solitário em sua doença.
O cuidado não pode ter como fundamentação apenas a técnica e estar
desacompanhado de qualquer sentimento humano. O paciente necessita também da
sensibilidade profissional e esta, somente o homem detém. Como retrata Boff (1999)
a relação de cuidado não é sujeito-objeto, mas sujeito-sujeito.
É fundamental que estando inseridos neste ambiente eminentemente
tecnológico, os profissionais não prescindam ao cuidado humano, por mais eficientes
e modernos que sejam os equipamentos. Assim, aliar a tecnologia ao cuidado
humano é uma atitude a ser percebida e assumida pelo profissional ao atuar em
ambiente tecnológico, em que busca a interface, a constituição do agir profissional
no cuidado para compreender, iluminar e transformar a realidade de vivência do
cuidar (LUCENA, 2000).
A tecnologia está a serviço do homem e, desta forma, pode ser utilizada
para facilitar o cuidado como um instrumento de trabalho e não para substituir as
emoções humanas. Assim, percebo como grande desafio dos profissionais que
atuam em ambiente tecnológico a promoção da pessoa humana, tanto daquela que
opera e manipula os artifícios tecnológicos, quanto daquela que necessita de
cuidados intensivos. Cuidar da pessoa inteira exige se colocar presente também de
forma inteira, utilizar todos os recursos humanos do profissional para atender e
favorecer o processo de cura e cuidado.
Remen (1993) acentua que embora a legitimidade da experiência subjetiva
do paciente esteja sendo cada vez mais aceita, para muitos a legitimidade da
experiência subjetiva do profissional ainda está em discussão. Essa talvez seja a
maior barreira ou influência nas relações de cuidado, pois colocar em prática algo
subjetivo, que não é ensinado na formação dos profissionais de saúde,
consequentemente os leva a sentir extrema dificuldade de praticar algo que não
dominam. Promover o crescimento do cliente é colocar a humanidade em ação, fazer
as emoções, intuições e a compaixão compartilharem o mesmo espaço e tempo que
é dedicado à utilização dos aparelhos indispensáveis ao cuidado do cliente. A autora
completa afirmando que “a emoção parece ser a maior ameaça à auto-imagem do
profissional, bem como a dimensão humana mais difícil de ser reincorporada aos
relacionamentos contemporâneos nos cuidados da saúde” (p.186).
O ambiente tecnológico hospitalar e especialmente a UTI Pediátrica
Cardíaca, contexto desse estudo, é lugar de tensão em que a objetividade das ações
e decisões se sobrepõe às ações subjetivas entre os envolvidos. A expressão de
emoções é pouco visível, a qual pode ser atribuída à falta de tempo, ou falta de
conhecimento para saber efetivá-la. Um dos principais efeitos provocados pela
repressão da emoção, como enfatiza Remen (1993), é o esgotamento psicológico
dos profissionais. Conhecer estas nuances que influenciam as relações de cuidado
em ambiente tecnológico hospitalar torna-se útil por auxiliar a desvendar o que está
por trás das aparências e porque a essência humana não se deixa desvelar em sua
totalidade, no momento de desenvolver o cuidado integral.
Outro aspecto que influencia os relacionamentos em ambiente tecnológico
hospitalar é o distanciamento, seja de si próprio, seja do cliente, seja dos
sentimentos. Não deixar os sentimentos influenciarem as ações parece ser mais fácil
de manejar, pois não há envolvimento afetivo e, portanto, ficam limitados às
exigências de desempenho técnico. Para aprender a ser sensível é preciso exercitar,
estando presente e sendo presença no ambiente de cuidado com o outro. Para
Filgueiras, citado por Kestenberg e Silva (2004), a construção do pensamento
científico na sociedade moderna e o avanço tecnológico provocaram um
distanciamento do profissional de saúde em relação à pessoa do paciente.
Cabe salientar como influência nas relações de cuidado, ainda, a posição
de Fernandes et al. (2003), que afirmam que, apesar de se reconhecer o modelo de
competências como elemento fundamental nas novas práticas e concepções
gerenciais e tecnológicas em saúde, não se observa por parte dos sistemas
organizacionais, um maior empenho em proporcionar aos seus trabalhadores
discussões ou investimentos que lhes permitam transcender a objetividade de suas
ações interpessoais. Essa posição deixa explícito que além dos profissionais
envolvidos no processo relacional, deve haver a preocupação dos gerentes para
implementar medidas que facilitem, estabeleçam e solidifiquem ações bem
sucedidas para que as relações humanas tornem-se realidade no cotidiano de
cuidado.
Fernandes et al. (2003) explicitam ainda que,
A dimensão interpessoal transcende os estreitos limites da
sofisticação tecnológica e deve se desenvolver através de
relacionamentos, interpretações, inferências, intuição e criatividade,
em suma, através de complexas operações mentais, cuja
orquestração pode constituir-se ao vivo, em função tanto do seu
saber e de sua experiência, quanto de sua visão da situação e das
condições organizacionais de trabalho.
Ainda, sobre a organização como colaborativa ou influenciadora das
relações humanas é importante expor a visão de Erdmann (1996, p.18) em que
afirma “a organização comporta uma ordem organizacional sempre instável através
da interação [grifo nosso] entre o subsistema estrutural e material e o subsistema
simbólico das representações individuais e coletivas dos indivíduos/grupos nas suas
atividades e relações [grifo nosso] de trabalho”. A autora conclui ainda que, para
apreender a realidade das organizações, é preciso passar pelo indivíduo, pela
interação, pela organização, pela sociedade e pelo mundo ao mesmo tempo. Esse
aspecto suscitado pela reflexão da autora coloca um ponto fundamental na
discussão, em que a prioridade deve ser dada ao indivíduo, que é ser de relações,
inserido na sua organização, no seu espaço de trabalho com o outro, na sociedade e
no mundo. Essa hierarquia é de extrema importância quando se trata de interações,
pois esse é o ponto de minhas inquietações e proposições desse estudo, uma vez
que acredito ser o caminho para alcançar mudanças e concretamente efetivar modos
existenciais de ser consigo e com o outro que façam a diferença no cuidado, portanto
concretizar as interações, relações humanas em ambiente tecnológico hospitalar.
Em ambiente tecnológico hospitalar são inúmeras as influências sobre as
relações/ interações de cuidado, porém fica evidente, pela revisão de literatura, que
muitas se situam na esfera pessoal mais que organizacional. forte influência do
relacionamento interpessoal para que a comum-unidade desse ambiente tenso e
estressante possa tornar-se harmônica, restauradora e confortadora. São
necessárias competências interpessoais, habilidades e atitudes na busca da
melhoria da condição humana no processo de vida. Nesse sentido, Moscovici (2003)
pontua que as interferências ou reações voluntárias ou involuntárias, intencionais ou
inintencionais constituem o processo de interação humana, em que cada pessoa na
presença de outra não fica indiferente a essa situação de presença estimuladora.
Todos nós temos a responsabilidade nos eventos interpessoais. Não existe processo
unilateral na interação humana, tudo o que acontece no relacionamento interpessoal
decorre de duas fontes: eu e outro.
Durante todo o texto, ao me referir aos profissionais de saúde, incluo-me
nesse grupo, e nele estão inseridos também os enfermeiros e a equipe de
enfermagem, portanto, todos estão envolvidos, todos fazem parte desse cenário.
4.2 PATERSON E ZDERAD SUSTENTANDO O ESTUDO: A RELAÇÃO DIALÓGICA
A relação dialógica de um grupo, suas relações interpessoais influenciam-
se recíproca e circularmente, caracterizando um ambiente agradável ou não. Em
situações de trabalho, compartilhadas por duas ou mais pessoas, há atividades
predeterminadas a serem executadas, bem como interações e sentimentos
recomendados, tais como comunicação, cooperação, respeito, amizade.
Sentimentos positivos de simpatia e atração provocarão aumento da interação e
cooperação repercutindo favoravelmente nas atividades e ensejando maior
produtividade. Sentimentos negativos de antipatia e rejeição tenderão à diminuição
das interações, ao afastamento, a menor comunicação, repercutindo
desfavoravelmente nas atividades com provável queda de produtividade
(MOSCOVICI, 2003). Esse ciclo atividades-interações-sentimentos o se relaciona
diretamente com a competência técnica de cada pessoa.
Sendo assim, percebo ser de relevante importância refletir sobre o
conceito da relação dialógica à luz da Teoria Humanística de Paterson e Zderad
(1979), pois acredito que por meio da implementação na prática dessa dimensão,
seja possível contribuir de forma efetiva na manutenção da vida, recuperação das
crianças, mas principalmente, no resgate das interações humanas. Entendo que a
teoria de Paterson e Zderad (1979), escrita por duas enfermeiras, com proposições
e pressupostos voltados ao trabalho do enfermeiro/ enfermagem, aplica-se
perfeitamente ao contexto desse trabalho. Aqui transponho para relações entre os
membros da equipe que compõem esse ambiente de cuidado, a relação dialógica
entre profissional enfermeiro e cliente a que as autoras se referem.
Mostrar as nuances teóricas para a reflexão conjunta com a equipe da UTI
Pediátrica Cardíaca continua sendo um desafio que busco desenrolar, fio a fio.
Importante salientar ainda, que vou utilizar a enfermagem humanística para manter a
fidelidade às autoras, porém o leitor pode transpor essa denominação à equipe de
profissionais de saúde, pois o ato de cuidar exige a presença de todos, sem
distinção.
A Teoria Humanística de Paterson e Zderad (1979) surge de uma base
fenomenológica existencial, inspirada em filósofos como Martin Buber, Gabriel
Marcel e Frederick Nietzch. Segundo Paula et al. (2004), o termo Enfermagem
Humanística foi escolhido pelas teóricas por significar, essencialmente, bases
humanas da enfermagem, a partir da exploração do encontro de cuidado e das
relações humanas.
O termo enfermagem humanística significa, essencialmente, bases
humanas da enfermagem a partir da exploração do encontro de cuidado e das
relações humanas. A teoria contempla a prática da enfermagem humanística, o seu
significado, a experiência existencial, a descrição fenomenológica, o fenômeno da
enfermagem com o bem-estar, o potencial humano, a transação intersubjetiva, o
diálogo vivido e desenvolvido pelo encontro, a relação, a presença e o fenômeno da
comunhão.
Oliveira (2001) afirma que a enfermagem humanística é um tipo particular
de situação humana, na qual a relação inter-humana está dirigida intencionalmente a
nutrir o bem-estar e o estar - melhor de uma pessoa com necessidades evidentes na
relação. A teoria humanística, considerada como um diálogo vivo, preocupa-se com
o potencial humano e traz novos conceitos que permitem um novo olhar ao cuidado
como: encontro, relação, presença, chamado e resposta, objetos, tempo e espaço.
O processo de cuidar requer um envolvimento que Paterson e Zderad
(1979) denominam de presença genuína, ou seja, o ser que cuida encontra-se
inteiramente presente no tempo e espaço vivido do ser que é cuidado. O encontro é
um tipo particular, porque é proposital. Há uma expectativa e um objetivo em mente
no encontro quando o enfermeiro está cuidando e o paciente necessitando cuidado.
Neste encontro, a presença não pode ser segurada como um objeto. Ela pode ser
apenas dada ou solicitada, bem-vinda ou rejeitada.
O enfermeiro está aberto e disponível revelando-se presente e o paciente
também é visto como uma presença, como uma pessoa e não um objeto ou um
caso. Esta é a presença genuína que envolve reciprocidade e sintonia, pois para
Paterson e Zderad (1979), cada ser humano sente a passagem dos minutos e
percebe o espaço diferentemente, de acordo com o que está acontecendo na sua
vida naquele determinado momento.
Na última década, muito tem sido discutido sobre a necessidade de
mudanças na área de saúde e também no ambiente tecnológico de UTI, em que as
pessoas começam a ressentirem-se das imposições tecnológicas e subtrações das
emoções, aspecto talvez conduzido, ainda, pelo predomínio do paradigma
positivista. Paradigma este conceituado por Nascimento (2003) como aquele que
norteia o modelo biomédico, biologicista, cuja atenção está voltada principalmente
para o órgão doente, para a patologia e para os procedimentos técnicos, em
detrimento dos sentimentos, dos receios do sujeito-doente e seus familiares e da
forma com vivenciam a situação saúde-doença.
Da mesma forma, necessidade de entendimento por parte dos
enfermeiros de UTI Pediátrica Cardíaca de que o cuidado de enfermagem
humanístico deve prevalecer visualizando a criança como um ser humano com
necessidades de cuidados integrais. Porém, apesar da reflexão sobre o cuidado
humano, ainda é preciso resgatar aspectos do sentido da existência humana e da
essência de enfermagem para então integrar à prática diária o relacionamento
intersubjetivo, pois somente através desta relação é que a enfermagem/ equipe
cuida percebendo a dimensão humana.
Para estar sintonizado com o paciente, o enfermeiro precisa conhecer o
paciente no “mundo do paciente” ou no espaço vivido, no aqui e agora. E este
conhecimento do mundo, em que o paciente é e está, facilitará também o
desenvolvimento de atividades que requerem o uso de objetos alheios ao
conhecimento do paciente, pois como afirmam Paterson e Zderad (1979), os objetos
também afetam e influenciam no acontecimento do diálogo de enfermagem. Para o
enfermeiro, os objetos podem ser suas ferramentas de trabalho, para o paciente eles
são estranhos, assombrosos e desconhecidos, ainda mais se pensarmos na criança
internada em um ambiente de alta tecnologia como uma UTI Pediátrica Cardíaca.
Castanha (2004) explicita que a sintonia constante e viva com os
sentimentos do cliente e da equipe solidifica a relação entre ambos. Nesta relação, é
importante que o enfermeiro tenha consciência da necessidade da
intersubjetividade, entendida como a interação entre o ser, o enfermeiro, a equipe e
o paciente, especialmente, em se tratando de UTI Pediátrica Cardíaca. Os
sentimentos de sucesso e insucesso, vida e morte misturam-se ao longo do dia,
permeando as horas de trabalho dos profissionais, dos pacientes e dos familiares
que ali podem permanecer durante as vinte e quatro horas. Ainda, tratando-se deste
ambiente de alta tecnologia é somente evidenciando-se a relação inter-humana que
a situação de cuidado pode acontecer, pois se não houver evidência das qualidades
humanas, corre-se o risco das tarefas tornarem o cuidado mecanicista e muitas
vezes improdutivo.
A relação inter-humana para Buber (1974) significa estar disponível para
uma convivência, ou seja, o homem vive em comunhão com os outros, e esta
comum-unidade humana autêntica existe quando se transcende a pura
objetividade no interpessoal. Esta é a relação dialógica, que Buber (1974) denomina
como a relação do “EU e do TU”, que levará o ser humano a experienciar o mundo e
a si mesmo, pois como pressupõe a teoria, a relação entre enfermeiro-equipe e
paciente não pode ser apenas tecnicamente competente, como uma relação do
sujeito com o objeto, mas sim, autêntica. Para o autor, a relação dialógica é a
categoria existencial por excelência, quando ajuda na compreensão da realidade,
por meio da experiência vivida (ação) e da reflexão (pensamento).
Para Paterson e Zderad (1979), o diálogo não é aquele da fala verbal, nem
o restrito à comunicação como mandar e receber mensagens, mas, como
comunicação em termos de chamado e resposta. Chamado e resposta que é
bidirecional em ordem para ser relacional. Ambos enfermeiro/ equipe e paciente
experienciam o diálogo complexo, o qual é simultâneo, ambos chamam e
respondem ao mesmo tempo, e é refletido em todas as formas de comunicação
humana, da verbal a não verbal. A relação dialógica é um estar olhando para o
outro, não só no corpo, mas também com os sentimentos.
Na contínua relação do enfermeiro/ equipe com o cliente é necessário que
cultivem sentimentos como a gentileza, a empatia, o respeito, o interesse e o amor
pelos outros. Através desta relação dialógica inter-humana, um ajuda o outro a ser
mais e melhor (CASTANHA, 2004). Desta forma, acredito que a intersubjetividade da
relação dialógica proposta por Paterson e Zderad (1979) dará subsídios na
sustentação deste estudo para desenvolver momentos de reflexão com a equipe de
saúde da UTI Pediátrica Cardíaca com relação às necessidades humanas em um
ambiente tecnológico e a partir da reflexão, junto aos saberes e fazeres dos vários
profissionais, estabelecer relações de cuidado solidário às crianças que valorizem o
ser humano.
4.3. OS CONCEITOS QUE PERMEIAM O CUIDADO DE ENFERMAGEM EM UTIP
CARDÍACA
Muitos são os conceitos de cuidado que têm sido amplamente discutidos
nas últimas décadas. Entre os quais se encontra assistir, vigiar, ajudar.
Considerando estas definições, é possível afirmar que cuidar não é
apenas uma ação, não é apenas um ato. Segundo Schmitt (2003), o cuidar é um
processo, pois o ser humano não pode ser definido em relação a ele mesmo porque
não é um sujeito isolado, vive em relação com os outros, com as coisas e com o
mundo.
Para Zagonel (1999) o ser e o cuidado estão relacionados um ao outro,
pois o ser não é sem o cuidado e o cuidado é pelo ser. Paterson e Zderad (1999)
explicam a relação de cuidado entre enfermeira-paciente como um ato humano, que
se dá a partir do momento em que a enfermeira e o indivíduo que necessita de
cuidados se encontram.
Em minha visão, o cuidado é vivenciado, sentido, ultrapassa o
conhecimento técnico-científico para enraizar-se na essência do ser, nas dimensões
humanas que permeiam o viver. O cuidado ativa o conhecimento do ser, o que
compõe sua existência em um processo que tem início bem determinado, mas não é
visível o ponto de completude, pois sempre necessita de atenção, zelo, carinho,
reciprocidade, comunicação. O cuidado é oferecido e recebido em via de mão dupla,
em que a troca torna-se complementar, nunca excludente, uma via alimenta a outra.
Nesse processo avanços e retrocessos, felicidade e tristeza, sucessos e
fracassos vivenciados juntos, apoiados e suportados com a mesma intensidade
entre o ser que cuida e o ser que é cuidado.
Dessa forma, cuidar envolve cuidar de si e do outro numa continuidade de
relações. Para Heidegger (1989), o cuidado es contemplado na presença que
engloba o ser no seu conjunto como existente no mundo, pois, o ser humano é um
ser-com, um ser de relação. Utilizando este conceito de ser humano é correto
afirmar que o cuidado deve ser relacional, pois onde não existem relações não
existe cuidado. Nesse sentido, Souza et al. (2005) estabelecem que o cuidado é
parte integrante do processo de sobrevivência da vida humana associada.
Para cuidar de alguém é preciso conhecer muitas coisas como aponta
Mayeroff (1971) precisa-se conhecer quem é o outro, quais os seus poderes e
limitações, quais as suas necessidades e o que conduz o seu crescimento: precisa
saber como responder às suas necessidades e quais são meus próprios poderes e
limitações. O cuidar envolve diversos aspectos, tantas quantas são as dimensões do
ser humano na sua totalidade.
Da mesma forma refletindo a respeito do ser ao qual é destinado o
cuidado, Paterson e Zderad (1979) afirmam que é preciso considerar o modo como
este ser vive seu mundo de experiências. E, quando o cuidado é destinado à
criança, é necessário saber que esta percebe o seu mundo de formas diferenciadas
de acordo com seu estágio de crescimento e desenvolvimento, de acordo com seu
momento existencial.
Pode-se dizer que a razão de ser da enfermagem, a maneira como
entende e se relaciona como o mundo é expressa por meio da ação de cuidar.
Para Paterson e Zderad (1979) a enfermagem é um modo dialogal de ser
em uma situação intersubjetiva e implica num tipo especial de encontro entre seres
humanos que posicionam-se em resposta a uma necessidade da própria condição
humana de saúde ou de doença. Não pode ser normatizado por regras e rotinas,
acontece como presença, encontro, diálogo, chamado e resposta.
Pelos anos de prática, entendo a enfermagem como uma profissão que,
ao cuidar, está envolvida pelas relações interpessoais no processo de saúde-doença
do ser humano em suas diferentes fases da vida, até a morte e também, quem sabe,
após. A enfermagem se insere em um contexto de relações profissionais para
realizar o cuidado, o qual é desempenhado por cada profissão de forma singular e
nos seus limites de atuação. Todos cuidam, o que difere o cuidado de cada
profissional é a forma de efetivá-lo. Colocar em ação a essência da enfermagem
mobiliza diferentes dimensões ou atributos do enfermeiro, como o conhecimento
empírico, ético, estético e pessoal. A enfermagem alia o ser pessoal do enfermeiro,
o ser profissional do enfermeiro e o ser de relações com as demais profissões de
saúde. É abrangente seu fazer, sempre tendo como foco o sujeito de cuidado, o
cliente, neste estudo, a criança.
Dessa forma, entender o que é o cuidado sob a ótica da enfermagem e
como ele se insere tem sido uma preocupação a qual leva à percepção sobre a
abrangência da extensa amplitude de o que é o cuidado humano, como refere
Lacerda (2000) pois,para a enfermagem, o cuidado é o atributo mais valioso que se
pode oferecer aos indivíduos, o que revela ser esta, a profissão cuja maior
habilidade está em manter o seu ideal de cuidado, tanto na prática quanto no
aprendizado, considerando seu compromisso com a humanização e a constante
busca na melhoria da qualidade da vida da sociedade.
Conceituo o cuidado de enfermagem como preocupar-se com o conforto
e bem-estar dos pacientes e, assim faz parte de um processo de inter-relações entre
o cuidador e paciente, por meio de ações e atitudes imbuídas de conhecimento
científico e potencialidades humanas. O cuidado de enfermagem se faz pela
coexistência entre cuidador e ser cuidado, que conduz à idéia de comunidade,
união, reciprocidade, solidariedade, irmandade, respeito mútuo, liberdade,
acolhimento, cidadania. É primordial a atribuição de sentido, fazendo aparecer a
essência do ser, os fenômenos vividos, reconstituição da gênese de sentido de sua
própria existência. Cuidado de enfermagem é relação solidária entre os seres
envolvidos no mundo vivido, a qual se constrói pelos laços afetivos, interativos e
estruturantes das relações interpessoais.
Para Moscovici (2003) as relações interpessoais desenvolvem-se em
decorrência de processo de interação. Dessa forma, acontecem em todos os
ambientes aonde duas ou mais pessoas realizam atividades. E, ainda, à medida que
as interações acontecem nas atividades, sentimentos positivos ou ruins são
despertados e, estes influenciarão as interações e as atividades. Ao realizar um
procedimento, o enfermeiro poderá apresentar e despertar sentimentos positivos ou
negativos que influenciarão na interação, repercutindo favorável ou
desfavoravelmente.
O relacionamento inter-humano e a intersubjetividade representam um
genuíno estar com um modo de presença essencial com o outro e constituem-se
elementos essenciais para o autêntico cuidado com e ao outro. Este relacionamento,
na teoria de Paterson e Zderad (1979), revela-se como uma espécie de fluxo, um
entre, ou seja, um momento existencial único e singular em que o ser que cuida e o
ser que é cuidado conseguem ampliar seu ângulo de visão a respeito do próprio EU,
bem como do outro (TU). O ser que cuida em enfermagem precisa redimensionar o
cuidado em meio às percepções e impressões do EU, do TU e do ISSO com o
desígnio de vivê-lo e experienciá-lo, autêntica e genuinamente.
Para estar sintonizada com a criança, o enfermeiro precisa conhecer seu
mundo e espaço vivido, no aqui e agora. Este conhecimento do mundo em que a
criança é e está, facilitará também o desenvolvimento de atividades de cuidado que
requerem o uso de objetos alheios ao seu conhecimento, pois os objetos também
afetam e influenciam no acontecimento do diálogo de enfermagem. Os objetos, para
o profissional são suas ferramentas de trabalho, para o paciente são estranhos,
assombrosos e desconhecidos e muito mais para a criança em um ambiente de
UTIP Cardíaca.
O ambiente de UTIP Cardíaca possui especificidades como o uso de
equipamentos e materiais de alto desempenho tecnológico, porém exige algo mais
além da destreza e habilidades cnicas, exige cuidado do ser, em que é possível
aproximar o desenvolvimento científico-tecnológico ao humanismo.O ambiente tem
sua importância pela constituição da rede de relações que existe para servir ao ser
cuidado e ao ser que cuida. O ambiente segundo Paterson e Zderad (1979) pode ser
considerado o espaço que pode ser medido ou aquele espaço que ambos,
enfermeira e paciente, experimentam no momento do cuidado e afirmam que os
objetos propriamente sozinhos ou as relações das pessoas com estes podem servir
para aprimorar ou inibir a transação intersubjetiva da enfermagem. O ambiente de
cuidar vai além da área física disposta de acordo com os seres que nela atua,
caracteriza a organização do cuidar, a ponto de a falha ou ausência de equipamento
poder gerar o desequilíbrio das ações no ambiente. Os equipamentos em UTIP
Cardíaca representam os utensílios que Heidegger (1989) cita como componentes
da relacionalidade ambiental, pois as pessoas e utensílios estão em constante
relação.
Para que o cuidado aconteça é necessário que a relação seja genuína ou
seja, uma relação de estar e ser com o outro, entre o ser que cuida e o ser que é
cuidado, segundo as teoristas Paterson e Zderad. Nesta relação, é importante que o
enfermeiro tenha consciência da necessidade da intersubjetividade especialmente,
em se tratando de UTIP Cardíaca, pois, no contexto vivido pela criança, as formas
de comunicação necessárias, exigem muito mais interação, pois dependendo da
faixa etária, os chamados serão através do olhar, da postura e das mímicas faciais
e, para que possa responder sensivelmente, o enfermeiro precisará estabelecer o
relacionamento interpessoal efetivo.
Diante desta realidade, cuidar da criança/ família no ambiente de alta
complexidade tecnológica e o envolvimento com toda a equipe resulta em um
encontro entre pessoas, valorizando-se a dimensão humana do cuidado. É um
processo relacional entre o sujeito que cuida, o sujeito que é cuidado, os sujeitos
que participam indiretamente, os objetos que fazem parte deste cuidado e o
ambiente onde o cuidado é realizado. Portanto, cuidar da criança/família no
ambiente de alta complexidade tecnológica da UTIP Cardíaca com o envolvimento
de toda a equipe de saúde, valorizando-se a dimensão humana do cuidado resulta
em um encontro intersubjetivo entre pessoas da equipe de saúde que vivenciam
experiências singulares em um mundo especial.
5. DELINEANDO O REFERENCIAL METODOLÓGICO: CAMINHANDO EM
DIREÇÃO AO DESVELAMENTO DO FENÔMENO
5.1. A ESCOLHA DO CAMINHO
Para desenvolver este estudo, escolhi a metodologia qualitativa através do
método fenomenológico. Para a coleta das informações utilizei a entrevista semi-
estruturada e para a compreensão dos discursos a análise fenomenológica proposta
por Giorgi (1985). As idéias de Paterson e Zderad (1979) forneceram o suporte
teórico.
A metodologia qualitativa é conceituada por Gomes (1987) como uma
descrição pormenorizada de situações, eventos, crenças, pessoas, interações,
comportamentos, experiências, atitudes. O objetivo é deixar emergir dos discursos
coletados um sentido vivenciado enquanto substância concreta de ação ou prática.
Esta conceituação e a concepção defendida por Turato (2003), de que o qualitativo é
o método que estuda o humano no seu contexto e que o pesquisador deve estar
envolvido emocionalmente com seu objeto, portanto deve misturar-se e identificar-se
com ele, conduziu minha escolha.
A investigação fenomenológica trabalha sempre com o qualitativo, como
acentua Bicudo (2000, p.74), “com o que faz sentido para o sujeito, com o fenômeno
posto em suspensão, como percebido e manifesto pela linguagem; e trabalha
também com o que se apresenta como significativo ou relevante no contexto no qual
a percepção e a manifestação ocorrem”. A investigação fenomenológica não se
reduz à descrição, trabalha com os dados fornecidos pela descrição e vai além,
analisando-os e interpretando-os.
Na pesquisa fenomenológica trabalha-se com a totalidade das descrições
em busca de sentido à luz da interrogação formulada. A interrogação indica a
trajetória a ser percorrida, definindo e apontando a direção da análise e respectiva
interpretação (BICUDO, 2000).
Como enfermeira e com o desejo de compreender como se estabelecem
as relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente tecnológico hospitalar
escolhi o método fenomenológico para este estudo, a fim de desvelar no contexto
hospitalar de UTIP Cardíaca, a teia das relações que institui a realidade humana
fundada na palavra, no significado, no modo participativo.
A fenomenologia como sentido formal de pesquisa significa “deixar e fazer
ver por si mesmo aquilo que se mostra a partir de si mesmo” como salientam Terra
et al (2006, p.673). A investigação fenomenológica é o que a pessoa experimenta
em relação a um fenômeno e como interpreta essa experiência. Para as autoras, a
fenomenologia representa um todo adequado ao estudo de fenômenos que
requerem um outro “modo de ver, de olhar” para além das concepções objetivistas
legadas pelo pensamento oriundo pela ciência tradicional.
O pesquisador fenomenológico busca retomar a experiência vivida com os
sujeitos nos movimentos de uma síntese de identificação, que também viveu a
intencionalidade dos objetos de sua pesquisa. A significação surge das nuances do
sentido do todo, no movimento de interpretação do pesquisador como pólo de
convergência de falas, gestos, fisionomias, compreensões intersubjetivas, entre
outros atos de expressão, como salientam Detoni e Paulo (2000).
O todo fenomenológico surge a partir da abordagem filosófica da
fenomenologia. Conforme Corrêa (1997), foi no século XVIII que o termo
fenomenologia foi usado pela primeira vez por Lambert que inicialmente, era
compreendida como teoria da aparência, visão falsa da realidade. No entanto,
Corrêa (1997) esclarece que foi no início do nosso século que a fenomenologia se
afirmou como uma linha de pensamento, ocupando uma lacuna e convocando à
retomada da preocupação com o sentido do ser, com a existência humana.
A fenomenologia tem a preocupação de descrever tudo o que se mostra,
se manifesta, se desvela no discurso para chegar ao significado do fenômeno. Um
bom começo para o estudo da fenomenologia é conceituar fenômeno. Do grego
phainomenon pode ser traduzido, segundo Graças (2000), como aquilo que se
mostra por si mesmo e logo vem do grego e significa palavra, uma narração ou
pronunciamento, verbo, conceito, idéia. Mas, não palavra como esta é falada ou
escrita, mas o significado dela.
Segundo Monteiro et al. (2006, p.298) “o fenômeno, para Husserl, não é
necessariamente coisas, mas qualquer fato, seja de natureza psicológica ou física,
desde que seja observado e contemplado por uma consciência”. E ainda, Husserl,
de acordo com Koivisto, Janhonen e Väisänen (2002), concluiu que as coisas que
fazem um fenômeno ser o que é, existem na experiência consciente, e que é através
da consciência que uma pessoa está presente no mundo.
Um dos seguidores de Husserl foi Martin Heidegger, filósofo alemão que
em sua obra mais importante Ser e Tempo estabelece que a palavra fenômeno
significa “trazer para a luz do dia, pôr a claro”. O fenômeno é entendido então como
“aquilo que se faz ver, assim como”. E a partir desta explicação, Castanha (2004,
p.31) expõe que “o domínio da fenomenologia ganhou proporções ilimitadas de uso”.
A fenomenologia é, então, um modo de pensar a realidade, que envolve a
percepção do fenômeno, que precisa ser olhado, para então passar de não
percebido para visível. Esta forma de ver o fenômeno é explicada por Bicudo (1994)
como um ver que necessita de uma consciência atenta de quem está vendo. Este
mesmo pensamento é confirmado por Crossetti (1997) ao escrever que a
fenomenologia propõe que o pesquisador investigue o que é realmente vivido e
descreva os fenômenos como eles são sentidos.
Na fenomenologia, o pesquisador valoriza a visão que o sujeito tem
daquilo que é. O objeto da pesquisa e seu alvo tornam-se a compreensão dos
significados que são ou estão sendo dados ao fenômeno pesquisado. O pesquisador
conforme Castanha (2004) tenta descrever o que está posto à sua frente como
experiência, sem pré-concepções ou especulações, a fim de compreender e
apreender o fenômeno e entender sua origem e direção.
A enfermagem, explica Moreira et al. (2006), encontra na fenomenologia o
caminho para investigar fenômenos que, a priori, não são de fáceis compreensão,
pois é o cuidar do outro repleto de aspectos singulares, subjetivos, autênticos.
Dessa forma, o todo fenomenológico possibilita dar sentido às vivências e às
atividades profissionais, tornando o desempenho mais atento e reflexivo sobre a
realidade e o modo de ser de outros.
Para Zagonel (1999), o método fenomenológico tem causado profundo
impacto e interesse entre os enfermeiros porque se mostra útil para buscar o sentido
da natureza do ‘ser no mundo’. Este método facilmente subsidia a busca da
compreensão dos fenômenos ligados à prática da enfermagem que, ao mesmo
tempo em que a capacidade de observar, deduzir, apreender, segundo Castanha
(2004), constituem base para o trabalho de compreensão do fenômeno, também
constituem a base do relacionamento do enfermeiro/ cliente/ equipe e então é neste
relacionamento, que se manifesta a apreensão da realidade. Para Heidegger (1968)
é apenas entre atividades humanas que o significado e o uso das atividades
humanas são revelados.
De acordo com Monteiro et al. (2006) o método fenomenológico nasceu no
começo do século XX na Alemanha com os estudos de Edmund Husserl. Husserl,
conforme narra Koivisto, Janhonen e Väisänen (2002), interessava-se primeiramente
pela questão: “O que sabemos como pessoas?”. Sua base enfatizava as descrições
do significado da experiência humana, sendo esses significados correlatos,
intencionais de atos ou conteúdos de atos conscientes. Moreira (2002) explica esta
consciência intencional como uma consciência que se tem de algo, explicando que a
fenomenologia tem como tarefa analisar as vivências intencionais da consciência,
para aí perceber o sentido dos fenômenos.
Assim, compreender como se estabelecem as relações interpessoais nas
ações de cuidar em ambiente tecnológico hospitalar, à luz da Teoria Humanística de
Paterson e Zderad, revela-se como ele se mostra, se manifesta e se apresenta, pois
acontece nas relações intersubjetivas, entre equipe/ paciente/ família em um
ambiente de cuidado. A experiência vivida deixa a marca do sentido percebido pela
pessoa e ao mesmo tempo a marca da história e da cultura por meio dos sistemas
constituídos de expressão. Pela análise fenomenológica, objetivo a analítica como
um conjunto infinito de significações e de possibilidades de significações. Entendo
como refere Josgrilberg (2002) que uma analítica como procedimento exploratório e
elucidatório, permanece aberta e não se fixa em uma única interpretação. A análise
das descobertas desse estudo favorece uma possível interpretação, mas não
pertence a ela de modo absoluto. O autor salienta que “todas as analíticas são
relativas ao objeto e estão a serviço da elucidação de estruturas e de seus
significados. Porém, nenhuma analítica é capaz de por si determinar o sentido
último do mundo ou do ser” (p.42).
O que busco é abrir caminhos para possíveis trajetórias interpretativas de
um mundo vivido de cuidado entre profissionais e crianças/famílias, circunstanciadas
pela história das condições fundamentais e estruturantes do comportamento
humano.
5.2 LOCAL DE VIVÊNCIA DO FENÔMENO
O local da vivência do fenômeno desta pesquisa foi em hospital infantil de
grande porte de Curitiba, na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica Cardíaca (UTIP
Cardíaca). Esta unidade atende crianças e adolescentes de ambos os sexos, de 0 a
18 anos, que necessitam de cuidados complexos e controles precisos. São admitidos
após cirurgia cardíaca, cateterismo cardíaco, exame eletrofisiológico ou situações
clínicas cardíacas que necessitem de cuidados intensivos. A unidade possui 21
leitos: doze leitos de alta complexidade, sendo dois destes, boxes fechados para
isolamento, e nove de médio risco, quatro para cateterismo cardíaco e estudo
eletrofisiológico e cinco para casos clínicos e pós-operatório tardio de crianças de até
três meses de idade.
Na UTIP Cardíaca a equipe de enfermagem é formada por auxiliares de
enfermagem, técnicos de enfermagem e enfermeiros totalizando 52 membros. Esta
equipe é coordenada pela enfermeira chefe do setor e hierarquicamente abaixo pela
enfermeira assistencial de cada turno.
Conta com a presença constante de um médico cardiologista e intensivista
pediátrico, um residente na especialidade de cardiologia pediátrica e, ainda, com a
atuação da equipe de fisioterapia e psicologia. As equipes cirúrgicas são duas, uma
composta por cinco e a outra por quatro cirurgiões. De acordo com as necessidades
apresentadas pela criança, avaliações e orientações de conduta de todas as
demais especialidades pediátricas.
As Unidades de Terapia Intensiva, de acordo com Nascimento (2004),
possuem características próprias como: a convivência diária dos profissionais e dos
sujeitos doentes com as situações de risco; a ênfase no conhecimento técnico
científico e na tecnologia para o atendimento biológico, com vistas a manter o ser
humano vivo; a constante presença da morte; a ansiedade, tanto dos sujeitos
hospitalizados quanto dos familiares e trabalhadores de saúde; as rotinas, muitas
vezes rígidas e inflexíveis e a rapidez de ação no atendimento.
Assim, a escolha da UTIP Cardíaca aconteceu por ter sido o ambiente de
vivência da minha prática profissional e também por ser um ambiente de alta
complexidade tecnológica, próprio para os propósitos do estudo.
Por tratar-se de investigação fenomenológica o próprio pesquisador
deverá ir a campo para a coleta das informações, em verdadeira relação, encontro
entre pesquisador e ser pesquisado. Nesse sentido Turato (2003, p.322) define
campo como “o espaço físico onde o pesquisador julga serem regulamente
encontradas, como sendo seu ambiente natural, as pessoas que poderão falar com
autoridade sobre o tema definido [...]”.
5.3. SUJEITOS SITUADOS NO FENÔMENO
Os sujeitos deste estudo foram os componentes da equipe de saúde da
UTIP Cardíaca, os quais foram convidados a participar do estudo após a explicitação
dos objetivos e abordagem metodológica. Ao definir sujeito, Turato (2003) afirma ser
qualquer pessoa que, no campo, pode ser ouvida quanto aos sentidos e
significações que atribui ao evento observado pelo pesquisador.
A escolha dos sujeitos, ou seja, da equipe de saúde deu-se por considerar
que todos os integrantes da equipe participam de forma ativa do cuidado ao cliente.
Nesse sentido, entendo que trabalhar com a equipe de saúde aumenta a
possibilidade de benefícios e da qualidade dispensada ao cuidado, uma vez que
todos têm a oportunidade de compartilhar as mesmas significações no momento do
estabelecimento do cuidado.
O trabalho com a equipe justifica-se pela intencionalidade do estudo, pois
visa desocultar, colocar à luz as significações da vivência do trabalho em equipe na
UTIP Cardíaca, no sentido de compreender como se estabelecem as relações
interpessoais nas ações de cuidar em ambiente tecnológico hospitalar?
Tendo optado por sujeitos que são integrantes da equipe de saúde, os
critérios de inclusão foram: concordância em participar da pesquisa e ser membro da
equipe de cuidado na UTIP Cardíaca. Como critérios de exclusão, não aceitar
participar do estudo ou ter menos de seis meses de atuação na Unidade. Não
distinção de sujeitos por idade, raça ou sexo.
O número de sujeitos que participaram do estudo foram 10 profissionais
da área de saúde, incluindo enfermeiros, médicos, técnicos e auxiliares de
enfermagem, e dependeu da saturação das informações. De acordo com Turato
(2003), antes da entrada em campo, ou mesmo no início da coleta das
informações, o pesquisador qualitativista, não pode dizer quantos sujeitos farão
parte do estudo, que a intenção é descrever o alcance das respostas dadas e não
um número estatístico representativo.
Importante salientar que o contato com os sujeitos, o encontro para iniciar
a pesquisa, é um diálogo fenomenológico, pois cada ser expressa sua forma de
ser e pensar, sua visão de mundo, seu modo de ser, momento em que o
pesquisador e ser pesquisado devem unir interesses para melhor captar as
significações.
5.4. INTERROGANDO O SUJEITO PARA A APREENSÃO DO FENÔMENO
Tendo a apreensão de fenômenos como objetivo nesta pesquisa, para a
coleta dos significados, para então chegar à compreensão utilizei a entrevista
fenomenológica semi-estruturada (APÊNDICE I).
A escolha pela modalidade semi-estruturada deu-se por combinar
perguntas estruturadas (fechadas) com não estruturadas (abertas), o que permite
flexibilidade e facilita a expressão, sendo a expressividade de intensa importância no
método fenomenológico para que se possa apreender a realidade vivida. Também
pela possibilidade de utilizar questões abertas, pois, segundo Zagonel (1999), a
entrevista fenomenológica exige questões abertas que não reduzam o ser a
métodos, mas que apelem para modos de compreensão mais sutis sobre o
fenômeno.
A entrevista para Turato (2003) é um instrumento precioso de
conhecimento interpessoal que facilita no encontro face a face à apreensão de uma
série de fenômenos.
Para a efetivação da entrevista fenomenológica com os membros da
equipe de saúde utilizei como forma sistematizadora, quatro das etapas propostas
por Paterson e Zderad (1979) do processo de enfermagem, pois entendo que é
possível fazer essa analogia, uma vez que as etapas são muito similares e
representam um momento de encontro para a apreensão de informações. Assim,
passo a explicitar as quatro etapas percorridas, sempre fazendo o paralelo com a
proposição das teoristas.
1. Preparando-me para conhecer os membros da equipe
Nesta fase, segundo Paterson e Zderad (1979), a enfermeira prepara a
mente para conhecer o campo da prática ou o campo da pesquisa com leituras de
literaturas que levem à reflexão sobre a prática da enfermagem e que estimulem a
reflexão crítica da enfermeira sobre a percepção que o ser humano tem de si mesmo
e de suas relações com o mundo.
Neste momento, preparei-me para o autoconhecimento. O caráter
transacional intersubjetivo da enfermagem não pode passar despercebido quando
se vive o fenômeno e durante a realização da entrevista ocorre um evento inter-
humano. Neste momento, refleti a respeito de como aconteciam minhas transações
intersubjetivas com o outro, ou seja, neste estudo, com os demais membros da
equipe. Ainda, foi possível a reflexão sobre a minha vivência e relações
estabelecidas enquanto ser humano e membro da equipe. Para Paterson e Zderad
(1979) como transação humana, o fenômeno de enfermagem contém todos os
potenciais e limitações humanas de cada participante. Por exemplo: a frustração, o
desânimo, a solidão, a agressão, a impaciência, o desespero, a dor, o sofrimento
são constituintes da enfermagem, assim como a ternura, o interesse, o carinho, a
confiança, a alegria, a esperança. Como a enfermagem é uma vivência humana, o
“conteúdo” da mesma inclui todas as respostas possíveis do homem em sua
situação, tanto daquele que necessita como daquele que ajuda em um determinado
momento.
E este é o verdadeiro potencial humano da enfermeira.
As leituras trouxeram ensinamentos, mas foram as reflexões acerca da
minha experiência vivida e do potencial humano
de ser e fazer enfermagem
que
facilitaram meu conhecimento interior e meu preparo para o prosseguimento.
2. Conhecendo intuitivamente os membros da equipe: a relação eu-tu
A enfermagem humanística, segundo Paterson e Zderad (1979), é dirigida
no sentido de incrementar as possibilidades de tomada de decisão responsável
dando-se a liberdade de aceitar ou não as alternativas possíveis.
Para a realização das entrevistas, contatei pessoalmente cada um dos
entrevistados e efetivar o convite para participar do estudo, quando aproveitei para
esclarecer os motivos da pesquisa e, quando aceitavam, agendar possíveis horários.
Os locais escolhidos foram, na grande maioria, ambientes externos ao da UTIP
Cardíaca, principalmente pela dificuldade de não ter um local de privacidade, em
que fosse possível manter o anonimato ou liberdade de expressão. Pelas
dificuldades de horários, o encontro com os profissionais foram sendo agendados de
acordo com a disponibilidade de cada um deles.
Nessa etapa, conforme acentuam Paterson e Zderad (1979, p.121), “a
enfermeira, responde à singularidade do cliente, não se impõe, mantém sua
capacidade de surpresa, questionamento e presença autêntica”. A capacidade de
estar presente autenticamente com o outro, permite a enfermeira participar com o
outro da experiência que vive.
Para os encontros, mantinha o pensamento de ser um diálogo vivido entre
pesquisador e pesquisado, pois envolvia encontro, relação, presença, chamado e
resposta. Em cada encontro agendado, primeiramente fazia-me presente
genuinamente conversando sobre vários assuntos para que pudéssemos
estabelecer uma relação de proximidade. Preocupava-me em saber como a pessoa
estava se sentindo naquele dia, o que tinha feito, se estava preocupado com alguma
questão. Depois, perguntava como tinha sido seu último momento de plantão, que
experiências tinha vivenciado demonstrando preocupação com o bem-estar e estar-
melhor da pessoa entrevistada.
Logo em seguida, repassava os objetivos do estudo, deixava claro que a
relação seria de respeito e de solidariedade, e que poderia concordar ou não em
participar. A atenção e a escuta foram marcantes nos momentos da narração de
suas percepções, crenças e idéias, que foram gravadas. Quando aconteciam os
chamados, aconteciam também as respostas para tornar mais clara uma inquietação
que não tinha sido bem compreendida.
Cada encontro aconteceu em uma relação diferente e levou-me a
experienciar uns dos conceitos de encontro da enfermagem humanística descritos
por Paterson e Zderad (1979): cada encontro indivíduo-enfermeira difere, pois cada
participante se apresenta como um indivíduo singular que é com suas próprias
expectativas e capacidades para dar e receber ajuda.
Identifiquei cada profissional entrevistado de acordo com a potencialidade
humana mais apresentada durante seu relato. O pesquisador fenomenológico deve
dirigir seu olhar também a outros modos expressivos além das falas: à fisionomia
dos gestos e dos olhares, às circunstâncias espaço-temporais em que cada sujeito
entra no discurso e enfim, a como ele vive os momentos desse discurso. Nesse
ponto, conforme pontuam Detoni e Paulo (2000), chegamos a olhar para a cena que
mostra o núcleo de significados, pois os sujeitos o atribuidores de significados e
permanecem nos significados atribuídos na experiência. A compreensão não se
no vazio, afirma Martins (1992). Para que ela se manifeste é preciso que haja algo
ou alguém que, intencionalmente, esteja tentando se comunicar, seja verbalmente,
por meio da escrita ou na maneira própria de se mostrar pedindo um significado.
Para melhor situar o leitor, explicito cada sujeito participante desse estudo,
utilizando os pseudônimos, na ordem como aconteceram as entrevistas.
Entrevista 1 - Amor, 23 anos, desde o momento do convite mostrou-se
bastante ansioso para a realização da entrevista e curioso sobre as perguntas.
Comunicativo, uma pessoa muito afetuosa. Quando definiu cuidado me disse que
para que este seja efetivado é necessário o amor.
Amor é uma das potencialidades humanas definidas como um sentimento que
predispõe alguém a desejar o bem de outrem.
Entrevista 2 - Espiritualidade, 38 anos, tivemos certa dificuldade para
agendar esta entrevista devido aos horários e rotinas do dia-a-dia. Muito alegre,
fazia brincadeiras o tempo todo. Ao conversarmos sobre o ambiente tecnológico
demonstrou sentir-se realizado por trabalhar ali naquele local. Percebi nesta pessoa
a espiritualidade como essência de vida. Contou-me que para que o cuidado seja
humanizado é preciso buscar a força interior de cada um.
Espiritualidade é a nossa dimensão divina em tudo que é humano.
Entrevista 3 - Sensibilidade, 34 anos, trabalhamos juntas durante muitos
anos. Muito bonita, alta. Tem um jeito rompante de dizer o que pensa que às vezes
confunde aqueles que se relacionam com ela, fazendo-os pensar que é uma pessoa
austera. Contou-me que quer se dedicar à docência daqui alguns anos. Afirmou que
muitas vezes sente-se mal compreendida pelos demais profissionais. Percebi nela
uma pessoa extremamente sensível e preocupada com as relações e os valores
humanos ali dentro da UTI. Ao falar sobre o ambiente, exteriorizou que a falta de
sensibilidade precisa ser melhorada. Sensibilidade é o conjunto de nossos
sentimentos e sensações e o modo como os experimentamos.
Entrevista 4 - Compreensão, 34 anos, trabalha muitos anos na
unidade. Muito amável. Grávida, me contou sobre os preparativos para a chegada
do bebê. Nos seus relatos, percebe-se muita preocupação em ser a porta voz da
equipe em várias situações até mesmo por estar mais tempo na UTI. Ao
compartilhar algumas percepções, enquanto membro da equipe, deixou clara a
importância que dá ao trabalho em equipe.
Compreensão significa reconhecer os fatores que influenciam nos sentimentos ou no
comportamento de uma pessoa.
Entrevista 5 - Empatia, 22 anos, comunicativo, bastante extrovertido.
Enquanto realizávamos a entrevista, uma das colegas ficou cuidando de seu
paciente e, ainda assim, foi preciso que interrompêssemos nossa conversa duas
vezes. Apresentou-se bastante inconformado com as condições de trabalho da
enfermagem. Acredita que para a UTI melhorar é preciso que ocorram mudanças em
relação ao treinamento de novos profissionais. Explicou que para ele tudo o que faz
é cuidado e que é necessário dar atenção para o paciente, porque não adianta tratar
o paciente como se fosse um robô, uma máquina. Ainda afirmou que humanização é
estar no lugar do paciente e não fazer aquilo que o profissional não gostaria que
fizessem com ele se estivesse ali.
Empatia é a vivência de uma pessoa que se coloca numa situação alheia, real ou
imaginária, objetiva ou subjetiva, de forma que sente como se estivesse dentro dela.
Entrevista 6 - Respeito, 38 anos, introvertida, fala calmamente e
baixinho. Estava chateada naquele dia por ter muitos conflitos da equipe para
resolver. Mostrou-se bastante preocupada com a dimensão intersubjetiva do
cuidado. Contou-me que percebe falta de respeito entre as equipes e que isso
dificulta muito as relações.
Respeito é valorizar o que e como o outro é, sem invadir e sem exigir que seja
aquilo que queremos.
Entrevista 7 - Carinho, 35 anos, expansivo, gosta de conversar.
Conversamos durante horas. Discutimos vários assuntos e conforme eu explicava os
objetivos do estudo apresentava-se maravilhado concordando com a necessidade
do mesmo. No seu relato, o que mais admirei foi a facilidade como este profissional
reconhece a competência dos demais profissionais envolvidos no cuidado naquele
ambiente e principalmente o carinho que demonstrou com a equipe de enfermagem.
Demonstrar carinho é ser amável, benevolente, terno, afável.
Entrevista 8 - Sinceridade, 32 anos, simpática, comunicativa. Estava de
plantão naquele dia, tivemos que conversar rapidamente. Ao contar sobre sua rotina
na UTI explicou que se sente muito sobrecarregada principalmente devido à
complexidade das crianças e ao aumento do número diário de cirurgias. Quando
relatou sobre o relacionamento com a família, disse que não se deve nunca
esconder o que está se passando como, por exemplo, quando a criança está grave,
é preciso ser realista e falar, explicar que a criança está grave e que tem risco.
Neste momento senti que para esta pessoa a sinceridade é muito importante nas
relações.
Sinceridade é autenticidade e significa permanecer verdadeiro consigo mesmo.
Entrevista 9 - Companheirismo, 34 anos, muito tranqüila, conversamos
bastante. Na sua fala foi aparecendo uma pessoa muito preocupada com o bem-
estar dos colegas e com a ajuda mútua no ambiente de trabalho. Manifestou que
acredita que falte um pouco de visão, um pouco de companheirismo até mesmo dos
colegas.
Companheirismo é estar presente sem se anular e compreender o que o outro sente
para poder compartilhar com ele.
Entrevista 10 - Tranqüilidade, 22 anos, muito calma, falava refletindo nas
suas palavras. Sua apresentação pessoal, muito caprichosa, chamou minha
atenção. Nossa conversa foi muito rápida, pois teve que retornar para a UTI para
ajudar numa emergência. Enfatizou que para realizar o cuidado além de
sensibilidade e carinho é necessário ter tranqüilidade.
Tranqüilidade é um estado de espírito equilibrado, calmo, sem se exaltar, nem se
deprimir. Descansado de corpo e espírito.
3. Conhecendo cientificamente o outro: eu - isso
Nesta etapa do processo, segundo Paterson e Zderad (1979), a
enfermeira, agora fora do local de estudo, resignifica e reflete o apreendido e
transcreve seu ponto de vista particular.
Os relatos revelam o modo de ser e agir da equipe de saúde em relação
ao mundo de coisas que os cercam no ambiente tecnológico hospitalar. Os
profissionais vêem-se rodeados por equipamentos, máquinas, instrumentos,
soluções químicas e robotizados por rotinas e protocolos. Experienciam
dialogicamente muitos sentimentos ambíguos como tristeza, medo, ansiedade,
desespero, dor e também esperança, alegria. Na prática diária parecem ter um fazer
atrelado ao tecnicismo e a racionalidade biomédica, com enfoque muito mais na
doença do que na subjetividade que permeia o sofrimento do ser doente.
Mas durante a apreensão dos depoimentos foi possível observar que os
entrevistados, quando comunicam sua vivência, evidenciam um conhecimento de
como realizar o cuidado de forma humanizada e solidificado nas bases da
solidariedade. Pude perceber uma enorme preocupação com a necessidade do
envolvimento emocional e, com a importância das relações subjetivas entre equipe/
criança/ família no processo de cuidar. Os relatos também demonstram uma vontade
iminente de mudanças na forma como acontecem hoje as relações de cuidado no
ambiente tecnológico hospitalar.
4. Sintetizando de forma complementar as realidades conhecidas
Diante das vivências com a equipe de saúde em ambiente tecnológico
hospitalar, refleti sobre o conhecimento intuitivo adquirido inicialmente e sobre o
modo como percebo agora, depois de vários diálogos vividos, análises e reflexões
efetivadas.
Os profissionais da equipe expressaram que, em alguns momentos,
sentiam-se tristes, cansados, desanimados e enfraquecidos, tentando administrar os
conflitos gerados pela rotina do ambiente estressante para que estas situações o
interferissem nas relações de cuidado entre equipe/ criança/ família. Em muitos
momentos, os entrevistados questionaram sobre a apresentação dos resultados do
estudo, demonstrando ansiedade com relação à data de término e esperança que a
apresentação das informações apreendidas norteie o processo de mudança que se
faz necessário.
Estes diálogos vividos permitiram a reflexão, conceitualização e descrição
de um fenômeno que revelou o ser-com e o fazer-com da enfermeira-pesquisadora
numa relação humanística com a equipe de saúde em ambiente tecnológico
hospitalar. Desenvolveu-se uma nova concepção, a intensificação do potencial
humano da enfermeira pesquisadora e equipe de saúde com vistas ao estar-melhor
para as vivências em ambiente tecnológico hospitalar.
5.5. ASPECTOS ÉTICOS
No Brasil, esclarece Goldim (1997-2005), os aspectos éticos das
atividades de pesquisa envolvendo seres humanos estão regulados pelas Diretrizes
e Normas de Pesquisa em Seres Humanos, através da Resolução 196/96 do
Conselho Nacional de Saúde, estabelecida em outubro de 1996.
Para que se cumpram estas diretrizes e normas da Resolução 196/96 do
Conselho Nacional de Saúde, o projeto de pesquisa, juntamente com o Termo de
Consentimento Livre Esclarecido, foi encaminhado ao Comitê de Ética e Pesquisa
da instituição envolvida (APÊNDICE II). O pesquisador tem como compromisso o
conhecimento e observação aos requisitos da Resolução 196/96 e suas
complementares, do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 1996).
Segundo Pegoraro (2002), a bioética é a disciplina ética que se formou em
torno de pesquisas, práticas e teorias que visam interpretar os problemas levantados
pela biotecnociência e pela biomedicina. Turato (2003) estabelece que os princípios
da bioética aplicados à pesquisa são quatro: autonomia, beneficência, não-
maleficência e justiça. Neste entendimento, esses princípios serão respeitados para
realizar o estudo no seguinte contexto: autonomia, o sujeito decidirá participar ou
não da pesquisa sem nenhuma coerção institucional ou psicológica, respeitando-se
o termo de consentimento pós-informação, assim como sebem informado quanto
aos objetivos, procedimentos e divulgação dos resultados da investigação;
beneficência, os sujeitos serão esclarecidos quanto às probabilidades de se
beneficiar da experiência; não-maleficência, este princípio será observado pelo
pesquisador requerendo que o mesmo não venha causar prejuízo aos sujeitos nos
seguintes âmbitos: garantia da não invasão da privacidade, não mobilizar fatores
emocionais advindos de antigas situações e preservar o anonimato dos sujeitos e
por último a justiça, em que o pesquisador compromete-se em respeitar sem
distinções os pesquisados, com a relevância social da pesquisa e sua contribuição
para voluntários e sociedade.
Os princípios da Bioética foram todos considerados na realização desta
pesquisa concordando com Araújo (2003) ao afirmar ser esse o caminho que
garante à sociedade que esta pesquisa teve a preocupação em preservar a
dignidade dos seres humanos.
6. DIALOGANDO COM AS INFORMAÇÕES: ANÁLISE FENOMENOLÓGICA
Na análise fenomenológica, tem-se por objetivo a busca da essência do
fenômeno através da descrição do "sujeito situado" e os significados emergidos do
diálogo vivido tornam-se o conteúdo de análise. Neste estudo, após o diálogo vivido,
seguiram-se as etapas de análise e descrição conforme modelo proposto por Giorgi
(1985) o qual estabelece quatro passos essenciais do método fenomenológico:
1. Apreender o significado dentro da estrutura global por meio da leitura atenta
do conteúdo total expresso de forma a identificar atributos ou elementos presentes;
2. Identificar as unidades de significado dentro da perspectiva do pesquisador
por meio da releitura do texto transformando as expressões do sujeito em linguagem
de pesquisador, para discriminar afirmações significativas;
3. Refletir intuitivamente para expressar aquilo que é significativo nas unidades,
tendo a questão norteadora como orientação;
4. Sintetizar todas as unidades através de análise compreensiva das
descrições.
Passo 1- Apreender o significado dentro da estrutura global por meio da leitura
atenta do conteúdo total expresso de forma a identificar atributos ou
elementos presentes
Nesta etapa, o pesquisador precisa sentir-se a vontade com o texto e ler
quantas vezes julgar necessário para obter o entendimento do todo. A intenção
nesta etapa é ter uma boa base para a próxima etapa da descrição das Unidades de
Significado.
Esse primeiro passo determina o contato inicial com os depoimentos, em
que após leituras sucessivas é possível apreender o sentido das expressões da
equipe de saúde que atua em ambiente tecnológico hospitalar. Esse passo está
intimamente relacionado ao passo seguinte, pois acontece de forma simultânea,
conformando a sistematização baseada na qualidade das descrições.
Passo 2 - Identificar as unidades de significado dentro da perspectiva do
pesquisador por meio da releitura do texto transformando as expressões do
sujeito em linguagem de pesquisador, para discriminar afirmações
significativas
Ao ler as descrições com o olhar atentivo dirigido pela interrogação
destacam-se as Unidades de Significado, analisadas individualmente. Na pesquisa
qualitativa fenomenológica essa leitura é sempre orientada pela interrogação, a qual
indica conforme a compreensão do pesquisador as Unidades de Significado. Não
trabalha com categorias elencadas a priori.
Os depoimentos para análise, considerados numa abordagem
fenomenológica, de acordo com Detoni e Paulo (2000), são as descrições dos
sujeitos, aquilo que nos permite compreender inteligivelmente o seu pensar.
As Unidades de Significado emergem como conseqüência do processo de
análise, as quais são discriminações espontaneamente percebidas dentro da
descrição do sujeito, tendo o pesquisador a postura de atitude adequada
tematizando o objetivo a ser alcançado na pesquisa. As Unidades de Significado são
numeradas, assinaladas, destacadas diretamente no texto durante a realização da
leitura. Para alcançar essa etapa é necessária uma leitura cuidadosa dos
depoimentos que permita ao pesquisador extrair os aspectos que o impressionam,
dentro de seu campo perceptivo, iluminado por sua interrogação e que apontam
como evidências da experiência vivida.
A seleção das Unidades de Significado está relacionada aos valores do
pesquisador e pode ser modificada se o texto for lido por outro pesquisador. Nesse
momento, a linguagem do discurso ainda não é modificada. Uma Unidade de
Significado é uma convergência de atos intervenientes, remetendo uns aos outros,
não sendo possível tomá-los numa linearidade. Sua delimitação explicita uma
compreensão assumida da perspectiva do olhar do pesquisador, que não é única,
visto que pertence ao horizonte de possibilidades aberto a compreensão, como
estabelecem Detoni e Paulo (2000).
Esta etapa não é cil ao pesquisador, pois necessita articular o
significado preciso do tema pesquisado ao discurso expresso pelo sujeito. Então, o
pesquisador transforma a linguagem do sujeito em uma terminologia mais precisa
que expresse, de maneira concreta, os conceitos adotados no estudo e que tenham
significado. A abordagem fenomenológica, no dizer de Detoni e Paulo (2000),
preocupa-se com o registro que permita a maior fidelidade possível, e isto significa
não se deixar ocultar as manifestações do fenômeno. Toda fala cabe dentro de um
todo de possibilidades que corre junto, como fundo estruturado e estruturante dos
significados, para quem fala e para quem ouve.
O que diferencia o método fenomenológico é o fato de ser permitida uma
espontaneidade disciplinada para o primeiro desvelamento das Unidades de
Significado ou suas categorias e, somente depois, com base na análise
subseqüente, explicita-se sua real essência. É a transformação da linguagem do dia-
a-dia do sujeito em linguagem apropriada com ênfase no fenômeno que está sendo
estudado. Essa transformação é necessária, uma vez que as descrições dos
sujeitos, que retratam as múltiplas realidades são elucidadas de forma científica, a
partir do fenômeno pesquisado, com profundidade para compreender os eventos.
Utiliza-se o sentido da linguagem comum, iluminado pela perspectiva
fenomenológica.
As Unidades de Significado discriminadas são constituintes e não
elementos como ressalta Giorgi (1985) explicando que constituintes são uma parte
determinada de forma que seja apoiada no contexto, enquanto que um elemento é
uma parte determinada de tal forma que o seu sentido seja o mais independente
possível.
As Unidades de Significado são anotadas diretamente na descrição
sempre que o pesquisador, lendo e relendo o texto, se torne consciente de uma
mudança de sentido da situação descrita. É essencial para o método que a
discriminação seja feia de forma espontânea e ocorra antes de qualquer tipo de
análise.
Explicito, abaixo, como se processa a numeração das Unidades de
Significado tomando como exemplo a Entrevista 1.
Amor – Entrevista 1
1. Como se estabelecem as relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar?
O cuidado no ambiente de hospital, antes de tudo, significa conhecimento
1
. O cuidado
engloba conhecimento, engloba a estrutura, amor. Com este conhecimento e este amor,
você consegue ser maleável para fazer tanto o técnico e tanto a parte humana, né? Você
consegue misturar as duas coisas
2
. Você não conhece quem tá ali, mas, está precisando de
cuidado
3
. As minhas atitudes de cuidado eu demonstro pela avaliação da criança da cabeça
aos pés, né? Pra ver como é que tá, né? Em que situação que está, em questão de
complexidade, em questão de estado
4
. você faz um balanço geral para ver o que você
pode efetuar [ações de cuidado] em questão de complexidade e idade da criança. Estipular
o que eu posso fazer e o que não posso
5
. você efetua [o cuidado] conforme vai o dia-a-
dia, conforme o plantão. Tem que ter um começo e tem que ter um fim
6
. Conforme sua
avaliação, observação é a mudança de decúbito, ver como está o paciente, um cuidado
grande com cânula, [...]
7
. Ver se a mãe esacompanhando ou não, ter uma relação com a
família é fundamental. Se a família acompanhando, você tem que ter uma relação além
do paciente, tem que ter uma boa relação, senão não tem como
8
. Estipular limites porque
como têm pessoas que entendem as coisas, como entrar e sair da UTI têm pessoas que
não tem essa noção em questão até de ambiente de UTI
9
. E você estipular se pode entrar
ou não [os familiares na UTI], avental de contágio, a higienização das mãos
10
. O que o
acompanhante pode fazer ou não. Tem que deixar bem claro o campo, até aonde a pessoa
pode ir ou não
11
. Para acontecer o cuidado, eu acho que é preciso trabalhar como uma
família mesmo, tem que ter a tua equipe com você. Tem que ter aquela equipe, como tua
família
12
. [...] porque a partir do momento que a criança agrava, você não vai trabalhar
sozinho, vai trabalhar com mais pessoas, então você tem que contar com outras pessoas
13
.
Querendo ou não, você passa mais tempo ali dentro [na UTI] com a equipe, do que com tua
família. Então, você tem que ter um ambiente bom, um ambiente que te proporcione como
se você estivesse em casa
14
. Não adianta ter uma equipe boa, se você não tem um material
bom. Não adianta excelentes profissionais e péssimo material. Até acontece, mas meio que
no milagre
15
. Um bom relacionamento interpessoal [entre os membros da equipe de UTI],
muito diálogo, a sinceridade, amor mesmo
16
. Tem que ter uma harmonia ali, com a equipe
em geral, todos que trabalham ali, tudo que engloba, desde a equipe médica até a
limpeza
17
. Tem que ter transparência, simplicidade, saber ouvir e falar
18
. A dificuldade para o
cuidado acontece a partir do momento que é passada alguma coisa errada ou não é
passada
19
. A criança chega à UTI e uma coisa que não foi passada ou foi passada errada
pode ser uma mínima coisa, a diluição que foi passada errada ou o médico prescreveu, uma
coisa trocada por outra e já complica
20
. O paciente chegou, a partir do momento que
chegou, não tem mais tempo de nada, tem que resolver
21
. que entra aquela, a tua
equipe, dificulta em um aspecto, um plantão passado errado, uma bolinha de ar no equipo
bomba dificulta. Porque a partir do momento que o pós-operatório chegou, e quando
chegou não tem como, você tem que resolver
22
. Tudo bem que antes do pós-operatório
chegar você vai verificar, mas sempre fica uma coisinha. Algumas coisas assim, a questão
dos materiais, meio difícil
23
.
2- Como é possível incorporar no processo de cuidar a atitude humanística? Quais as
exigências para essa incorporação?
Sim. Se não há, tem que haver. Partindo de todos. Não é uma coisa que se programe das
13 às 19 h, se autoprograme. Tem que estar embutido, tem que estar em você. O
profissional tem que ter e pronto. Se é um cuidado humanizado, tem que ter e pronto.
Ninguém coloca.
24
Se a pessoa é humanizada, é humanizada, se não é complicado, ela tem
que trabalhar isso. Não quer dizer que ela vai ser, mas pelo menos melhor
25
.
Automaticamente que ela está prestando um serviço, cuidando de alguém, ela tem que
trabalhar isso, moldar de acordo com o serviço.
26
Olha é complicado, você trabalhar com
um ser humano, tem que tentar mostrar a necessidade do cuidado humanizado. O ser
humano é insensível ao saber o que é que é o cuidado humanizado. Então mostrar o que é,
para que serve, como pode ser encontrado.
E ali ser colocado pra tua equipe ou para
pessoa...como...
27
Não é uma coisa fácil, é demorada, tem pessoa que pega rapidinho e vai
embora, tem pessoa que é mais devagar, complicada. É devagar, mas pega. Um bom jogo
de cintura e o negócio vai.
28
Na análise em pesquisa qualitativa fenomenológica anuncia-se um
movimento entre a linguagem falada (escrita) e a linguagem falante que surge pela
redução fenomenológica. Faz deslizar dos sinais ao sentido. Busca-se aquilo que se
refere à interrogação na linguagem do sujeito. Nesse momento é preciso que o
pesquisador amplie seu conhecimento sobre as palavras usadas, linguagem falada.
Ao ler o depoimento sob diversas óticas, confrontos vão se multiplicando e
podem levar o pensamento do pesquisador aonde ele nunca foi e nunca teria ido se
não tivesse tido o depoimento em suas mãos para ser lido conforme explicita Bicudo
(2000). O depoente e o pesquisador vivenciam o diálogo, um laço entre o falar e
o compreender.
No processo analítico fenomenológico, após concluir a numeração de
todas as Unidades de Significado passo a explicitar a decodificação da linguagem
ingênua, aquela da fala genuína do sujeito para a linguagem de pesquisadora. As
Unidades de Significado da Entrevista 1 totalizaram 28 unidades, as quais tomo
como exemplo.
Quadro 1- Ordenação seqüencial da transcrição das Unidades de Significado
numeradas da linguagem ingênua para a linguagem de pesquisadora.
LINGUAGEM INGÊNUA DO SUJEITO
LINGUAGEM DE PESQUISADORA
ENTREVISTA 1 - AMOR
O cuidado no ambiente de hospital, antes
de tudo, significa conhecimento
1
.
O cuidado engloba conhecimento, engloba
a estrutura, amor. Com este conhecimento
e este amor, você consegue ser maleável
para fazer tanto o
técnico e tanto a parte
humana, né? Você consegue misturar as
1. Infere que o cuidado no ambiente
hospitalar envolve conhecimento.
2. Enfatiza que além do conhecimento o
cuidado necessita de estrutura e amor para
aliar as dimensões técnica e humana.
duas coisas
2
.
Você não conhece quem ali, mas, está
precisando de cuidado
3
.
demonstro pela avaliação da criança da
cabeça aos pés, né? Pra ver como é que
tá, né? Em que situação que está, em
questão de complexidade, em questão de
estado
4
.
que você pode efetuar [ações de cuidado]
em questão de complexidade e idade da
criança. Estipular o que eu posso fazer e o
que não posso
5
.
dia-a-
dia, conforme o plantão. Tem que ter
um começo e tem que ter um fim
6
.
Conforme sua avaliação, observação é a
mudança de decúbito, ver como está o
paciente, um cuidado grande com cânula,
[...]
7
.
Ver se a mãe está acompanhando ou não,
ter uma relação com a família é
fundamental. Se a família
acompanhando, você tem que ter uma
relação além do paciente, tem que ter uma
boa relação, senão não tem como
8
.
Estipular limites porque como têm pesso
as
que entendem as coisas, como entrar e sair
da UTI têm pessoas que não tem essa
noção em questão até de ambiente de UTI
9
.
E você estipular se pode entrar ou não [os
familiares na UTI], avental de contágio, a
higienização das mãos
10
.
O que o acompanh
ante pode fazer ou não
[na UTI]. Tem que deixar bem claro o
campo, até aonde a pessoa pode ir ou
não
11
.
Para acontecer o cuidado, eu acho que é
preciso trabalhar como uma família mesmo,
3. Estabelece que mesmo não conhecendo
a pessoa que é cuidada, sabe que precisa
de cuidado.
4. Demonstra a atitude d
e cuidado pela
avaliação completa, integral da criança,
considerando a complexidade de seu
estado.
5. Salienta que para efetivar o cuidado é
necessário um equilíbrio entre as
necessidades e aquilo que pode ser feito à
criança.
6. Explicita que o cuid
ado depende da
evolução, sempre considerando a
finalização das ações iniciadas.
7. Declara que o cuidado envolve diferentes
aspectos, avaliação, observação, cuidados
complexos.
8. Afirma que para estabelecer o cuidado é
fundamental as relações interpes
soais com
a família, além do paciente.
9. Esclarece que as relações estão
permeadas pelos limites necessários e
impostos aos familiares que convivem no
ambiente de UTI.
10. Expõe que a equipe deve avaliar se a
família pode entrar ou não e quais as
normas a seguirem.
11. Refere que os familiares necessitam de
orientações para entrar e permanecer no
ambiente de UTI.
12. Relata que para a efetivação do
cuidado, os profissionais devem trabalhar
tem que ter a tua equipe com você. Tem
que ter aquela equipe, como tua família
12
.
[...] porque a partir do momento que a
criança agrava, você não vai trabalhar
sozinho, vai trabalhar com mais pessoas,
então você tem que contar com outras
pessoas
13
.
Querendo ou não, você passa mais tempo
ali dentro [na UTI] com a equipe
, do que
com tua família. Então, você tem que ter
um ambiente bom, um ambiente que te
proporcione como se você estivesse em
casa
14
.
Não adianta ter uma equipe boa, se você
não tem um material bom. Não adianta
excelentes profissionais e péssimo material.
Até acontece, mas meio que no milagre
15
.
Um bom relacionamento interpessoal [entre
os membros da equipe de UTI], muito
diálogo, a sinceridade, amor mesmo
16
.
Tem que ter uma harmonia ali, com a
equipe em geral, todos que trabalham ali,
tudo que engloba,
desde a equipe médica
até a limpeza
17
.
Tem que ter transparência, simplicidade,
saber ouvir e falar
18
.
partir do momento que é passada alguma
coisa errada ou não é passada
19
.
A criança chega à UTI e uma coisa
que não
foi passada ou foi passada errada pode ser
uma nima coisa, a diluição que foi
passada errada ou o médico prescreveu,
uma coisa trocada por outra e já complica
20
.
O paciente chegou, a partir do momento
que chegou, já não tem mais tempo de
nada, tem que resolver
21
.
como família.
13. Considera que com a piora do quadro
da
criança e aumento da complexidade dos
cuidados, ocorre a necessidade de dividir a
realização dos cuidados entre os membros
da equipe.
14. Expressa que o ambiente deve ser
similar ao da casa para proporcionar
sentimentos de bem-
estar, pois
permanecem, a
maior parte do tempo, no
trabalho.
15. Cita que além da excelência profissional
para que o cuidado aconteça
adequadamente, é necessário que os
materiais sejam de boa qualidade e
suficientes.
16. Manifesta que um bom relacionamento
interpessoal é alcanç
ado através do diálogo,
da sinceridade e do próprio sentimento de
amor.
17. Revela que é necessário existir uma
harmonia entre todos os membros da
equipe.
18. Exterioriza que é preciso saber ouvir e
falar sendo simples e transparente.
19. Expõe que se
uma informação é
passada de forma errônea ou se falta
alguma informação torna-
se um fator
dificultador para o cuidado.
20. Narra que na admissão da criança à UTI
um mínimo engano pode levar à
complicações .
21. Conta que a partir do momento que o
pacie
nte é admitido à UTI não mais
tempo para planejar, as situações precisam
de resolução imediata.
22. Evidencia que nos momentos em que a
em um aspecto, um plantão passado
errado, uma bolinha de ar no equipo bomba
dificulta. Porque a partir do momento que
o pós-
operatório chegou, e quando chegou
não tem como, você tem que resolver
22
.
Tudo bem que antes do pós-
operatório
chegar você vai verificar, mas sempre fica
uma coisinha. Algumas coisas assim, a
questão dos materiais, meio difícil
23
.
Sim. Se não há, tem que haver. Partindo de
todos. Não é uma coisa que se programe
das 13 às 19 h, se autoprograme. Tem que
estar embutido, tem que estar em você. O
profissional tem que ter e pronto. Se é um
cuidado humanizado, tem que ter e pronto.
Ninguém coloca.
24
Se a pessoa é humanizada, é humanizada,
se não é complicado, ela te
m que trabalhar
isso. Não quer dizer que ela vai ser, mas
pelo menos melhor.
25
um serviço, cuidando de alguém, ela tem
que trabalhar isso, moldar de acordo com o
serviço.
26
Olha é complicado, você trabalhar com um
ser humano, tem que tentar mostrar a
necessidade do cuidado humanizado. O ser
humano é insensível ao saber o que é que
é o cuidado humanizado. Então mostrar o
que é, para que serve, como pode ser
encontrado.
E ali ser colocado pra tua
equipe ou para pessoa como.
27
Não é uma coisa fácil, é demorada, tem
pessoa que pega rapidinho e vai embora,
tem pessoa que é mais devagar,
complicada. É devagar, mas pega. Um bom
jogo de cintura e o negócio vai.
28
resolução precisa ser imediata, a equipe
trabalhando unida facilita. E que por outro
lado, a equipe pode ser um dif
icultador
também caso aconteçam falhas de
comunicação ou falhas técnicas.
23. Diz que mesmo sendo tudo checado
antes da admissão do paciente em pós-
operatório à UTI, alguma falha ou falta ainda
pode acontecer e, um fator
dificultador é a
falha ou falta d
e materiais no momento da
admissão.
24. Infere que o cuidado humanizado deve
ser realizado por toda a equipe e não é
uma forma de cuidar que possa ser
programada. O cuidado humanizado é
próprio do ser humano que o realiza.
25. Explica que o profissi
onal que percebe a
humanização cuida de forma humanizada.
Se o profissional não tem essa percepção,
deverá desenvolver para melhorar.
26. Expõe que ao prestar um serviço, no
caso o cuidado, o profissional deve seguir a
filosofia da Instituição.
27. Exterioriza que alguns profissionais
são
insensíveis ao cuidado humanizado e para
este profissionais é necessário que os
princípios da humanização sejam
ensinados.
28. Afirma que ensinar os princípios da
humanização não é uma tarefa fácil porque
depende d
o tempo que o profissional
precisa para desenvolver. Para alguns pode
ser mais demorado, mas aprendem. É
necessária uma atitude facilitadora.
Passo 3- Refletir intuitivamente para expressar aquilo que é significativo nas
unidades, tendo a questão norteadora como orientação
A partir da transcrição das entrevistas para a linguagem de pesquisadora
é possível compreender o fenômeno. Inicia o agrupamento pelas suas
convergências ou aspectos comuns. o aspectos que devem ser decifrados,
analisados para captar a vivacidade das expressões, o sentido que busco pela
inquietação. Desvelar a significação expressa pela análise auxilia a delinear o
agrupamento das Unidades de Significado e as Categorias Convergentes.
É nesse passo que percebo o movimento fenomenológico de
pesquisadora, não tornando o sujeito como objeto do estudo, mas sujeito de
expressões significativas fazendo a ponte entre o pesquisar, analisar e sintetizar.
O procedimento aqui é descritivo e interpretativo. Martins e Bicudo (1994)
explicitam que os dados inicialmente são analisados, identificando os significados
atribuídos pelo sujeito e, posteriormente, o pesquisador os analisará tendo com
referencial a relevância para a pesquisa, para a prática, para a teoria.
Esse passo permite apreender a significação de cada entrevista, de cada
sujeito para então, passar à análise do todo, reunindo todas as entrevistas. Nesse
momento da análise é possível delinear o que Bicudo (2000) denomina de “Rede de
Significados”, pois na busca da essência ou estrutura do fenômeno, almeja
conseguir as representações do significado essencial das diferentes afirmações, por
meio de um sistema comparativo. É possível perceber se existe correspondência
entre as formas de representação e o conteúdo empírico.
Nessa etapa, após transcrever todas as entrevistas dos sujeitos, saliento
as etapas percorridas na análise fenomenológica para chegar à compreensão do
apreendido pelas falas dos membros da equipe de saúde em ambiente tecnológico
hospitalar.
QUADRO 2 Síntese das Categorias Convergentes na compreensão de
pesquisadora e Unidades de Significado apreendidas nas descrições dos
depoimentos
UNIDADES DE SIGNIFICADO APREENDIDAS
NAS DESCRIÇÕES DOS DEPOIMENTOS
CATEGORIAS CONVERGENTES NA
COMPREENSÃO DA PESQUISADORA
1. Atitude humanística para efetivar o cuidado:
a percepção da equipe de saúde
2. A humanização do cuidado como
proximidade, toque, olhar.
A. Compreendendo a atitude humanística
como mobilizadora das relações
interpessoais em ambiente tecnológico
hospitalar
3. Estabelecendo as relações interpessoais
entre os membros da equipe de saúde:
repercussões nas ações de cuidado à criança.
4. Comunicação como forma de conhecer a si
e ao outro na equipe.
5. O poder instituído nas relações inter-
humanas entre os membros da equipe de
saúde.
B. As relações interpessoais no ambiente
tecnológico hospitalar envolvendo a
equipe de saúde
6. A con-vivência do profissional e família no
ambiente tecnológico hospitalar.
7. O sentido da presença da família na
recuperação da criança.
8. Preparo da família para a permanência ao
lado da criança durante a hospitalização.
C. O sentido da presença da família nas
relações interpessoais com a equipe de
saúde
9. A precisão técnica necessária para o
cuidado, tendo como norteador a
complexidade do estado de saúde da criança.
10. O ambiente tecnológico hospitalar com
suas peculiaridades para efetivar as ões de
cuidar.
11. Aprimoramento da perspectiva humana e
espiritual da equipe para o cuidar.
D. A dinamicidade do cuidado permeando
a conduta a ser tomada em ambiente
tecnológico hospitalar
Para efetivar a análise fenomenológica utilizo agora todos os discursos, os
quais configuraram as Categorias Convergentes a partir das Unidades de
Significado.
A. COMPREENDENDO A ATITUDE HUMANÍSTICA COMO MOBILIZADORA DAS
RELAÇÕES INTERPESSOAIS EM AMBIENTE TECNOLÓGICO HOSPITALAR
1. Atitude humanística para efetivar o cuidado: a percepção da equipe de saúde
Os profissionais de saúde que trabalham em UTI convivem diariamente
com situações que se articulam diretamente com seus sentimentos, emoções e
defesas. No cuidado em ambiente tecnológico hospitalar complexo, a exemplo da
Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica Cardíaca (UTIP Cardíaca), os profissionais
de saúde desempenham suas ações munidos de seus sentimentos e emoções. Não
é possível realizar as atividades técnicas, de alta precisão, se as emoções não
estiverem lado a lado, acompanhando cada procedimento, cada momento no
desenvolvimento do cuidado.
Segundo Silva e Damasceno (2005), fazer enfermagem significa
demonstrar disposição para cuidar de outras pessoas por meio da valorização das
sentimentalidades humanas em harmonia com o pensar e fazer no cuidado de
enfermagem.
O relato de alguns profissionais expressa o entendimento da atitude
humanística no processo de cuidar como atitude própria de um ser humano que
cuida de outro com suas singularidades, potencialidades e limitações. Essas
expressões estão de acordo com o que acentuam Pessini e Bertachini (2004, p.3) de
que “o cuidar humanizado implica, por parte do cuidador, a compreensão da vida, a
capacidade de perceber e compreender a si mesmo e ao outro, situado no mundo e
sujeito de sua própria história” Exige compartilhar experiências e vivências que
resultem na ampliação do foco de suas ações.
Nesse sentido, Pessini (2004) afirma que ainda estamos longe de alcançar
o cuidado digno diante da dor e sofrimento humanos, muito a fazer em termos de
operacionalização, é urgente a necessidade de cuidado solidário que alie
competência técnico-científica e humana. Complementa que a dor e sofrimento do
outro, é uma chance preciosa para nos deixarmos tocar em nossa habilidade e nos
humanizarmos nesse processo.
A atitude humanística é condição para a efetivação do cuidado, a qual não
é conseguida com a vida, mas está no interior de cada ser humano que cuida, é
cultivada no cotidiano das ações cuidativas. A atitude humanística não é imposta por
meio de programas, normas ou rotinas estabelecidas pelas instituições, mas
acontece, é vivenciada por todos os envolvidos. Essa conscientização da
necessidade da atitude humanística para o cuidado da criança em ambiente
tecnológico hospitalar é explicitada pelos sujeitos, como mobilizadora das relações
interpessoais.
Sim, a atitude humanística se não há, tem que haver. Partindo de
todos. Não é uma coisa que se programe das 13 às 19 h, se
autoprograme. Tem que estar embutido, tem que estar em você. O
profissional tem que ter e pronto. Se é um cuidado humanizado, tem
que ter e pronto. Ninguém coloca. Se a pessoa é humanizada, é
humanizada, se não é complicado, ela tem que trabalhar isso. Não
quer dizer que ela vai ser, mas pelo menos melhor. Automaticamente
que ela está prestando um serviço, cuidando de alguém, ela tem que
trabalhar isso, moldar de acordo com o serviço (E1 – Amor).
Acho que atitude humanística para o cuidado tem que nascer com a
pessoa, isso não como implantar, ou você tem ou você não tem.
Não adianta você querer transformar um carrasco numa pessoa
humana, porque ele não vai ser, ou ele tem essa índole ou não tem.
Isso é uma coisa que você pode até tentar lapidar, né? Pode até
tentar melhorar isso. É individual de cada pessoa, isso vai da gênese
de cada pessoa, entendeu (E2 –Espiritualidade).
Em ambiente tecnológico hospitalar o profissional que demonstra atitude
humanística cuida com solidariedade, pois cuida com sentimentos e sensibilidade
que o demonstrados na relação com o outro. Paterson e Zderad (1979) explicam
que a possibilidade de um diálogo intersubjetivo acontece exatamente quando existe
essa relação de sentimentos e sensibilidade, ou seja, quando as pessoas se
encontram entre si como seres humanos, sujeitos com capacidades de
relacionamento interior.
[...] o psicológico é palavra de carinho, é sentar com palavras
simples, claras, pausadas, explicar o que acontecendo, explicar o
que você pode fazer né? O que é possível ser feito, né? Eu acho que
isso é mais importante que a parte técnica na UTI, acho que é mais
importante que a parte técnica, é ser humano (E2 – Espiritualidade).
Eu acho que tem que dar atenção para o paciente, porque não
adianta a gente tratar o paciente como se fosse um robô, uma
máquina (E5-Empatia).
Eu acho que é fundamental você ser humana porque todo mundo é
igual ali [na UTIP Cardíaca] (E2 –Espiritualidade).
Na realidade eu sinto uma realização pessoal por trabalhar numa
medicina de ponta, entendeu? Um local onde eu realmente me sinto
útil e eu faço a diferença (E2 –Espiritualidade).
A equipe que cuida e isso aí eu particularmente vejo ali, a equipe tem
um carinho muito grande pelas crianças, as crianças são muito bem
cuidadas, é uma opinião pessoal minha. Eu digo muito bem cuidada
no sentido da criança se sentir confortável. Muitas vezes da criança
chamar até mesmo pelo nome seja ele médico ou enfermeira, já com
o fisioterapeuta o contato não é tão intenso é mais rápido, mas quem
tem contato diário como o enfermeiro, a enfermeira, o médico que
vem mais vezes, a criança então tem esse vínculo. Então, isso é que
a gente pode chamar de humanização e ela já vem prevista no
cuidado (E7-Carinho).
2. A humanização do cuidado como proximidade, toque, olhar
A humanização dos cuidados em saúde, de acordo com Pessini e
Bertachini (2004, p.3), “pressupõe considerar a essência do ser, o respeito à
individualidade e a necessidade da construção de um espaço concreto nas
instituições de saúde que legitime o humano das pessoas envolvidas”. A
humanização está intrínseca ao ser humano, porém também necessita ser
objetivada, por meio de condições propícias ambientais para que o cuidado seja
completo. As expressões dos sujeitos deixam clara a compreensão da dimensão
humana ao realizar o cuidado, e que este não acontece em um vacuum, sem pré-
determinações, ele é pensado, refletido, estruturado e resulta em amor.
Esse aspecto é percebido pelos depoimentos da equipe pesquisada, em
que dão visibilidade à humanização no momento do cuidar, que diz respeito a
colocar-se no lugar do paciente/ criança, o desejo de fazer tudo pela criança, a
expressão do amor, solidariedade, conforto, auxílio, educação e também o
conhecimento. Os sentimentos de empatia, carinho, proximidade e vínculo permeiam
as ações de cuidar e são denominados pelos sujeitos como humanização.
A humanização em ambiente tecnológico hospitalar depende das pessoas
envolvidas nas ações de cuidado. O esforço é de todos para que a humanização se
estabeleça com suas diferentes interfaces, como conhecimento, comprometimento,
consciência, doação, compartilhamento resultando no cuidado. O cuidado envolve a
pessoa inteira com suas habilidades técnico-científicas e seus sentimentos,
motivação, o desejo de aliar o humano e técnico, torna-se existência viva.
A humanização ainda tem muito para melhorar. E com relação à
equipe médica, eu acho que depende de quem está aqui, né? Tem
pessoas que realmente são difíceis e isto depende da pessoa, mas
eu acho que tem humanização aqui dentro, eu acho que existem
lugares piores do que aqui, mas não é o melhor. Eu acho que teria e
poderia muito melhorar ainda (E8-Sinceridade).
Eu acho que tem pessoas que sabem o que é [humanização], mas
não vão pôr em prática nunca, porque é da pessoa, o motivo não sei,
mas que nunca vão por em prática (E8-Sinceridade).
Antes de tudo para a humanização é preciso conhecimento, o
cuidado engloba conhecimento, engloba a estrutura, amor. Você não
conhece quem ali, mas, está precisando de cuidado. Com este
conhecimento e este amor, você consegue ser maleável para fazer
tanto o técnico e tanto a parte humana, né? Você consegue misturar
as duas coisas (E1 – Amor).
Eu acho que falta [o cuidado humano]. Bem isso é da pessoa
mesmo, que pode até ter conhecimento, mas chega na hora da
prática e não coloca, não está nem ai, não se coloca no lugar dele
(E6-Confiança).
A desumanização não visa o paciente, visa a questão mais técnica,
não visa o outro lado do paciente, o outro lado da família, porque eu
acho que para levar os dois sabe, tanto o lado técnico como o
humano. Não vir aqui só mecanicamente (E6-Confiança).
Você vai saber tratar a dor do seu paciente se você puder, se
você passou por ela ou puder imaginar qual é a dor entendeu, e
humanizar tudo que envolve isso, tudo (E2 –Espiritualidade).
Para mim a humanização é eu estar no lugar do paciente. Eu não
vou fazer aquilo que eu não gostaria que fizessem comigo se eu
estivesse ali (E5-Empatia).
Ah, eu procuro fazer o que eu posso, ajudar e ensinar, muitas coisas
eu até nem posso fazer, até que eu gostaria de fazer mais às vezes.
Eu não posso fazer mais porque também não tempo de você
poder fazer (E9-Companheirismo).
De acordo com Gaiva (2006), a UTI não pode ser somente um ambiente
humanizado nos aspectos de estrutura física e funcional, mas um local em que o
lado humano, o afeto, a atenção aos familiares e a solidariedade estejam presentes.
Para Betinelli (2001), a solidariedade é um processo de construção
gradual, feito através do compartilhar de conhecimentos e de sentimentos, podendo
levar a uma aproximação mais autêntica e verdadeira entre o profissional e o
paciente. A solidariedade ocasiona maior valorização da vida no momento do
encontro para o cuidado.
Buber (1974) estabelece que na relação EU-TU cada um de nós é tocado
por algo além do nosso self e esse é o verdadeiro momento de encontro.
As falas mostram que os profissionais têm um olhar voltado para a
necessidade de envolvimento emocional nas suas relações de cuidado à criança em
UTIP Cardíaca, muito mais que o desempenho técnico. Demonstram que aliar as
dimensões expressivas às instrumentais auxilia na recuperação da criança. Um
depoimento aborda que essa interseção das dimensões é indiferente.
Cuidado humanizado é estar perto dele, não chegar ali perto e olhar
só equipamento e não tocar nele, não olhar para ele (E6-Confiança).
Cuidar para mim é estar perto do paciente, ver o que é que está
faltando, o que eu posso estar fazendo ali com ele. Com qual
cuidado eu vou deixar ele mais confortável, estar vendo um curativo,
ou se ele está sendo mudado de decúbito, se ele está recebendo as
medicações certas. Como é que está o cuidado com ele (E6-
Confiança).
Eu acho necessário o cuidado humanístico para o paciente, porque
através dele, a recuperação vai ser mais rápida (E6-Confiança).
Eu acho que tudo que a gente faz é cuidado (E5-Empatia).
Cuidar da criança aqui na UTI é o de ser humano mesmo, é a
sensibilidade que a gente tem que ter com o paciente, não é estar
tratando dele com medicações, os cuidados que a gente tem que
ter. É mais a sensibilidade como: carinho, tranqüilidade, poder estar
ali demonstrando que você está ali a favor dele cuidando mesmo
com o propósito de cuidar (E10-Tranqüilidade).
A humanização eu acho que até tem, sabe? Eu acho que faltam
algumas coisas assim, mas acho que o pessoal é bem bacana
quanto a esta parte. Não é ruim, não. Faltam algumas mudanças
no comportamento e acho que está bem assim (E9-
Companheirismo).
B. AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NO AMBIENTE TECNOLÓGICO
HOSPITALAR ENVOLVENDO A EQUIPE DE SAÚDE
3. Estabelecendo as relações interpessoais entre os membros da equipe de
saúde: repercussões nas ações de cuidado à criança
De acordo com Remen (1993) até recentemente, não se tinha uma idéia
nítida de como esse olhar dos profissionais de saúde à natureza humana afeta
profundamente seus atos e raciocínios, determinando suas atitudes frente às
situações da prática do cuidar. Hoje se tem como concepção cada vez mais
predominante em nosso meio, segundo o mesmo autor, que a relação mente-corpo-
sentimentos é dinâmica e interdependente. Para a teoria humanística de Paterson e
Zderad, explicam Persegona e Zagonel (2006), o indivíduo é um ser singular, único,
que enfrenta possibilidades de escolhas que culminam no direcionamento e no
significado da vida.
Portanto, como cada profissional é um ser único, vivendo momentos
diferentes e únicos, cada um tem a oferecer um significado em potencial e o cuidado
prestado é resultante da dimensão e da importância que a existência humana tem
para cada profissional como afirmam Bettinelli, Waskievicz e Erdmann (2004).
Complementam afirmando que é preciso a cada dia, a cada nova experiência, tentar
construir nossa própria identidade, sobre o pano de fundo de nossa missão, que é
cuidar da vida dos seres humanos.
Um dos depoimentos enfatiza [...] da gente não ter convencimento da
intensidade da interferência que isto faz no paciente, demonstra a preocupação em
ser um profissional diferenciado, com olhar dirigido para a criança que necessita de
cuidado.
Foi possível verificar, em algumas falas, que os profissionais têm
consciência do quanto a percepção da presença ou da lacuna de interação humana
interferem no processo de cuidar da criança em ambiente tecnológico hospitalar. As
relações interpessoais repercutem no cuidado à criança sob a ótica dos membros da
equipe de saúde, as quais estão entrelaçadas ao conhecimento, tempo, percepção
aguçada, conscientização da intensidade dessa repercussão, dessa interferência.
Eu acho que as relações não acontecem por falta de conhecimento e
de percepção. Eu acho que a falta de percepção cabe aos três
[enfermeiro, auxiliar e médico], mas como eu não quero discriminar
ninguém, mas como os auxiliares de enfermagem estão direto o
tempo todo com a criança, diretamente estão lidando com a criança o
tempo todo vão e mexem, fazem medicação. Eu acho que a falta
de percepção delas é mais acentuada e muito mais visível do que a
falta de sensibilidade dos outros (E3 – Sensibilidade).
Sem dúvida que o relacionamento interpessoal interfere no cuidado à
criança (E7-Carinho).
Entre a equipe e o paciente e entre equipe e equipe, eu acredito que
não seja plena [a relação humana], por falta de tempo, eu acredito
que não seja plena pela falta de conhecimento médico do que é uma
relação humanitária numa UTI, pela falta de ter essa lógica de que a
falta da relação humanitária faz diferença (E7-Carinho).
E não é por falta de consciência, mas, por não dar atenção na
repercussão que isto tem no paciente que está ali, da gente não ter
convencimento da intensidade da interferência que isto faz no
paciente (E7-Carinho).
A relação com o paciente, acho que ela poderia ser melhorada. Isto é
um princípio de humanização incontestável (E7-Carinho).
O fato dos profissionais demonstrarem este discernimento indica um
comportamento de abertura, pois de acordo com Souza (2003), ao admitirmos
sentimentos admitimos a potencialidade para transformá-los em situações de ser
mais. Ser mais para Paterson e Zderad (1979) é uma alternativa escolhida por cada
um dos profissionais porque a decisão de relacionar-se de forma autêntica e genuína
é individual, não se pode impor.
Foi possível perceber que os sentimentos/ qualidades vivenciados pela
equipe ao desenvolver as ações de cuidar estão intimamente relacionados ao modo
de ser de cada profissional, com ênfase na humanização, nas relações interpessoais
e na presença genuína. Bettinelli, Waskievicz e Erdmann (2004) salientam que o
cuidado está presente na vida humana, sempre que exercido por meio de processos
relacionais, interativos e associativos, na presença solidária do profissional.
É fundamental que o pai entenda que, ao estar dentro, ele faz
parte de uma máquina, de uma engrenagem. Que ele não tem
exclusividade. Que a equipe está andando e existem prioridades e,
que a gente tendo um pai que está chamando o tempo todo isto pode
ser prejudicial para as outras crianças (E7-Carinho).
Acho que quando se tem alguma richa ou algum recalque, alguma
coisa assim, acho que a coisa pro paciente é pior, sem dúvida.
Alguma coisa em algum momento vai acabar, deixar de ser vista que
poderia ser vista como um local mais tranqüilo (E2 – Espiritualidade).
Então por questões de situações pessoais pode acontecer de deixar
de ver a criança tornando-se extremamente prejudicial (E7-Carinho).
Se a equipe médica chega e começa a se exaltar assim né? Eu acho
que isso repercute no cuidado, isso acaba atrapalhando. Isso acaba
atrapalhando porque, por mais que eu para cuidar do paciente
tranquilamente acaba afetando, tanto a equipe de enfermagem
quanto os demais que estão ali ao redor (E6-Confiança).
Eu acho que conversar seria a melhor saída, conversar entre os
profissionais, com os familiares, e até muitas vezes com a própria
criança porque a criança é pequena, mas não é burra. Ainda mais
uma criança mais velha, de maior idade (E3 – Sensibilidade).
O ambiente de UTIP Cardíaca é bastante fatigante e tenso do ponto de
vista físico e emocional. O estímulo ao aprimoramento das relações entre os
profissionais que atuam neste local deve ser permanente, pois o resultado do
cuidado depende do trabalho em equipe.
Leite e Villa (2005) estabelecem que, em ambiente de UTI pela constante
expectativa de situações de emergência, da alta complexidade tecnológica e da
concentração de pacientes graves, sujeitos a mudanças súbitas no estado geral, o
ambiente de trabalho caracteriza-se como estressante e gerador de uma atmosfera
emocionalmente comprometida, tanto para os profissionais como para os pacientes
e seus familiares. Influenciam negativamente a qualidade da assistência.
Desse modo, é imprescindível reconhecer as necessidades dos
cuidadores profissionais em ambiente de alta complexidade tecnológica hospitalar,
que transitam pelas físicas, emocionais e relacionais. Os depoimentos apontam a
necessidade de diálogo entre os membros da equipe, sinceridade, amor,
desenvolver um trabalho como uma família, harmonização, motivação,
conhecimento, troca de informações, possibilitando um melhor fluxo das ações.
Os entrevistados exprimem ter ciência da necessidade de manter boas
relações no ambiente de trabalho:
Querendo ou não você passa mais tempo ali dentro com a equipe, do
que com tua família, então você tem que ter um ambiente bom, um
ambiente que te proporcione como se você estivesse em casa (E1-
Amor).
Um bom relacionamento interpessoal, muito diálogo, a sinceridade,
amor mesmo. Tem que ter a equipe em geral, todos que trabalham
ali, tudo que engloba desde a equipe médica até a limpeza, tem que
ter uma harmonia ali. Tem que ter transparência, simplicidade, saber
ouvir e falar (E1 – Amor).
Para mim, uma das exigências para a humanização é trabalhar como
uma família mesmo, tem que ter a tua equipe com você, porque a
partir do momento que a criança agrava, você não vai trabalhar
sozinho, vai trabalhar com mais pessoas, então você tem que contar
com outras pessoas tem que ter aquela equipe como tua família (E1
– Amor).
Eu acho que principalmente na relação entre a enfermagem e o
médico, quando existe um bom relacionamento entre as pessoas a
coisa flui muito melhor nos dois sentidos. É tanto no sentido do
médico confiar na informação, saber quando a pessoa tem
informação mais importante pra dar ou não e a enfermeira no caso,
que ela tem que também confiar na informação que o médico
dando. Acho que se você tem um relacionamento entre estes dois, o
trabalho flui muito melhor, entendeu (E2 – Espiritualidade).
Eu trabalhei em lugares onde a relação não era tão estável, e era
mais burocrática e minha experiência não foi boa no sentido de:
facilidade do ambiente estressante e humanização do ambiente, no
sentido de motivação profissional, no sentido de troca de
informações. Isso é muito importante e eu não consigo imaginar uma
situação na qual você trabalhe e você tenha uma completa
desarmonização entre as equipes (E7-Carinho).
Então, a harmonização entre as equipes, isto é, a troca de
informações, o trabalho em conjunto, o conhecimento, isto é
extremamente importante (E7-Carinho).
Apesar de saberem que a equipe precisa trabalhar unida e
harmoniosamente, os discursos revelam que os profissionais percebem dificuldades
de relacionamento. Apontam que, para o trabalho ser em equipe, são necessárias as
relações interpessoais, sem competição, sem restrições, sem confronto, com união,
comprometimento, compartilhamento.
Remen (1993, p.192) salienta que para os profissionais é valioso ter
consciência do significado que conferem a seu trabalho e experiência. Continua
afirmando que,
ao reconhecermos e re-experimentarmos o valor que damos à vida de
cada pessoa e a motivação para ajudá-las a adquirir o melhor nível de
bem-estar, transformamos essas tarefas em ações profundamente
significativas, um meio voltado a esse fim, um significado que elas não
possuem quando consideradas como um fim em si mesmas.
É preciso repensar criticamente as condições em que se planeja, organiza
e efetiva o cuidado, pois as relações interpessoais influenciam as ações de cuidar.
Ressentem-se da presença de competição, confronto, desunião, falta de
companheirismo, necessitando que todos trabalhem como equipe, pensando no bem
da criança. Existir com o outro é viver em comum-unidade, em que um age em
benefício do outro, para que o todo seja percebido e tenha os efeitos que se deseja,
como uma forma harmoniosa de ser e fazer as ações de cuidado.
Angerami-Camon (2003, p.50) enfatiza que somos um instrumento isolado
que sola acompanhado de uma orquestra, temos melodia e ritmos próprios,
possuímos timbre específico, mas “a nossa modalidade tonal sempre é atrelada ao
todo do qual fazemos parte, seja este todo uma orquestra ou uma instituição de
saúde”.
Eu acho que é completamente errado, eu acho que a gente deveria
trabalhar como um time e a gente trabalha como uma grande
competição. Eu não concordo com isso, não acho que seja certo, não
acho que seja bom, nem pra equipe médica, nem para a equipe de
enfermagem, nem para o paciente e nem para a família do doente
(E3 – Sensibilidade).
As relações aqui são bem complicadas. Já foram muito boas. Eu que
estou aqui tempinho, a equipe foi muito unida. Hoje cada um
trabalha por si, claro que quando você está com teu companheiro do
lado você se compromete a ajudar porque é tua função. Falta muito
companheirismo e, se uma pessoa está um pouco mais folgada, faz
vista grossa para quem está apurado (E4-Compreensão).
As relações humanas aqui dentro existem, mas são restritas (E5-
Empatia).
Eu acho que se a gente trabalhasse mais como equipe, muita coisa
iria mudar (E5-Empatia).
As relações, eu acho que é muito confronto, um querendo mais puxar
o tapete do outro (E5-Empatia).
Justamente as relações interpessoais que são poucas, muito poucas.
Eu acho que não existe isso, não existe porque é assim: vamos
operar, vamos tirar aquela criança como se tirasse um equipamento.
Tira dreno, cateter e vai pra fora, daí vem outro e não pensa no
paciente como que ele está. Se ele está pronto para ir para fora
(E6-Confiança).
A equipe não pensa nisso [nas relações interpessoais), não visualiza
esse outro lado. O que dificulta é a falta de conhecimento sobre o
cuidado humanizado do paciente. Falta conhecimento, falta porque
não são todos que pensam assim, mas a maioria (E6-Confiança).
Moscovici, citado por Vernier e Dall’Agnol (2004) ao tratar da dinâmica
dos indivíduos e de grupos nas organizações, enfatiza que os insumos que
compõem a cultura e desembocam nos resultados organizacionais compreendem
aspectos aparentes (luz) e aspectos subjacentes (sombra). Os aspectos aparentes
são os físicos, as formas do ambiente e da organização de trabalho, os aspectos
subjacentes compreendem aqueles reprimidos que se insinuam para ganhar lugar
na superfície iluminada.
Pode-se fazer uma analogia com as relações interpessoais que se
estabelecem em ambiente tecnológico hospitalar, em que a luz é tão intensa, que
não deixa ver as sombras que se fazem refletir com sua emissão. Assim, muitas
vezes nos deparamos com o excesso de luz, prejudicando as relações, reprimindo o
bem-estar da equipe e alterando o resultado do cuidado. Indicam como prioridade
para efetivas relações interpessoais na equipe de saúde, o respeito, apoio e a
compreensão dos limites profissionais de cada ser envolvido nas ações de cuidar.
E eu até procuro que respeite, procuro respeitar também e às vezes
a gente acaba se impondo com eles [com os médicos], pra eles
acabarem tendo respeito com a gente, porque se a gente ficar quieta
eles não têm, né? Então você acaba tendo que se impor pra eles
terem respeito com você, né? (E9-Companheirismo).
Acho que o maior problema aqui dentro ainda é o relacionamento,
porque tem aquela coisa assim de você se dar um monte, de você
pro paciente e até pro teu colega e na hora que você precisa não tem
aquele apoio, que você precisa, entendeu? (E9-Companheirismo).
Então, eu acho que está faltando um pouco de visão, um pouco de
companheirismo um pouco de até mesmo, dos colegas. Se tivesse
isso seria muito bom (E9-Companheirismo).
O médico acha que pode intervir em tudo e não pode. O médico tem
que ser da competência dele, o que é da alçada dele. E a enfermeira,
o cuidado é a parte dela e os dois têm que trabalhar em conjunto
para o bem-estar da UTI, do ambiente (E3 – Sensibilidade).
As chefes aqui dentro são muito boas, direto aqui dentro. Quando
não tem, a gente fica meio sem apoio. É complicado quando elas não
estão. Acho que isso é o necessário aqui para nós. Contar sempre
com as enfermeiras, a gente tem o respaldo delas e se sente mais
segura (E9-Companheirismo).
Quando o cuidado mais especializado é necessário, explicam Paterson e
Zderad (1979), surgem mais grupos de trabalhadores dedicados àquele e outros
muitos grupos se derivam destes e é assim que a transação intersubjetiva entre o
profissional e o paciente toma lugar em um ambiente intra-e-interdisciplinar de trocas
constantes de equipe, funções e rotinas. Nem todos os profissionais sabem ou
conseguem com-viver neste cenário dificultando um bom relacionamento. Leite e
Villa (2005) descrevem que um dos maiores estressores enfrentados pelos
funcionários é a falta de coleguismo e de compromisso com o outro.
Boemer e Corrêa (2003) estabelecem que transformar a relação com o
doente implica necessariamente conceber também os trabalhadores da saúde como
agentes que podem envolver-se com sua prática, tomada o apenas como tarefas
parcelares a serem racionalmente cumpridas, mas como um fazer essencial que se
integra no atendimento ao cidadão, exigindo além da competência técnica,
capacidade crítica, criatividade, sensibilidade e compromisso.
Os profissionais de saúde necessitam resgatar suas essências humanas,
seu caráter relacional, de compartilha com o outro. O profissional voltado à
objetivação das ações esquece das relações, justificando-se pela constante
sobrecarga de trabalho para oferecer o melhor ao cliente ou a buscar a normalidade
do agravo à saúde.
Os diferentes fazeres se entrelaçam quando harmonia no desempenho
profissional, com respeito ético a cada ser envolvido, com suas limitações e
progressos. Erdmann (1997) salienta que o cuidado permeia e é permeado em seus
limites, quanto aos diversos espaços de competência profissional. Essa afirmação
encontra ressonância nos depoimentos em que parece faltar a delimitação dos
espaços de competência profissional, é preciso avançar para além da simples
sobreposição de um saber em outro, de um conhecimento em outro, de um
profissional em outro.
As colocações de Boemer e Corrêa (2003, p. 268) contribuem quando
afirmam que “apesar de estarmos sempre imersos em meio às rotinas, normas,
técnicas, enfim, em modos esperados de fazer e ser, diluídos no impessoal
sempre a possibilidade de buscarmos sentido de nosso próprio fazer, de nos
angustiarmos e indignarmos com a negligência da condição humana, em que o
homem é reduzido a coisa, objeto”. O modo de ser de cada um auxilia a deixar a
inautenticidade, tendo sempre a autenticidade como possibilidade.
Estas falas comprovam a realidade vivida no dia-a-dia e ilustram como
esta vivência pode ser não colaborativa, inautêntica e repercutir nas ações de cuidar
neste ambiente.
Eu posso sair dali, ir tomar cerveja, brincar, não tem problema, ali eu
acho que a gente tem que ter um relacionamento de respeito, mais
de ajuda e infelizmente não tem ou é muito pouco (E3
Sensibilidade).
As equipes em si se relacionam bem, quando junta é que falta
respeito e confiança (E6-Confiança).
[...] a saída são duas formas: fingir que não está escutando, ou seja,
escutar o que é necessário, o que não é necessário finja que está
escutando porque senão você briga, e ficar calmo para não brigar,
porque brigas aconteceram aqui e hoje em dia a gente procura
deixar pra lá (E8-Sinceridade).
Para melhorar as relações, eu acho que o respeito tem que ter
respeito tem que ter confiança, chegar ao próximo e conversar
passivamente, não chegar gritando, que isso gera aquele
tumulto entre a equipe médica, a equipe de enfermagem, a família,
daí fica todo mundo desconsertado. Eu acho que tem que haver
confiança (E6-Confiança).
A relação humana eu acho que é perfeita quando existe respeito.
Existe respeito e admiração entre as várias equipes. Acho que a
relação humana, ela parte daí, está aí, em você respeitar a opinião
do colega que está ali dentro (E7-Carinho).
Foi questionado aos participantes como eles viam a possibilidade de
melhoria nas relações. Enfatizam que seguir os limites de cada especialidade é fator
facilitador para as relações humanas no ambiente de trabalho. Observa-se uma
dicotomia nas respostas, ao mesmo tempo em que consideram as relações boas,
relatos que muito a mudar nelas. Alguns profissionais percebem, outros não as
necessidades de melhoria das relações.
Essas colocações denotam a desarmonia presente, pelo fato que o
reciprocidade efetiva na execução das ações de cuidado. Ainda permanece
parcelado, cada um desenvolvendo a sua faceta, sem a preocupação com o fazer e
ser do outro. Bettinelli (2002) afirma que quando uma postura pouco comunitária
dos seres humanos, esta reflete nas relações e na convivialidade dos grupos.
Buber (1979) considera que o homem em comum-unidade tem
possibilidades para evoluir, ser e chegar a ser-mais. Uma comum-unidade, de
acordo com a teoria humanística de Paterson e Zderad (1979), pode ser constituída
por membros de uma família, por estudantes da mesma classe, pelo pessoal de um
determinado hospital, pelo pessoal de determinados hospitais e assim dentro de
cada realidade vivida, membros que com-vivem e se unem por uma determinada
causa.
No entanto, para que esta convivência seja bem sucedida ao encontro do
objetivo comunal, os seres humanos envolvidos precisam respeitar cada qual as
suas limitações e potencialidades e também as do outro. Paterson e Zderad (1979)
explicam que para que exista uma perfeita comum-unidade as diferenças precisam
ser valorizadas como estimulantes do pensamento, da evolução humana e do
avanço da própria comunidade.
Neste ambiente de alta complexidade o objetivo a que todos direcionam
sua prática é a melhora do estado de saúde da criança. Para isto, muitos e
diferentes saberes e fazeres intercalam-se e ao mesmo tempo caminham juntos e
torna-se exigível uma relação EU-TU autêntica.
Buber (1979) distingue quatro aspectos essenciais e indispensáveis para
uma relação EU-TU autêntica: a reciprocidade, a presença, a imediatez e a
responsabilidade. A reciprocidade é dialógica, pois, a palavra da invocação recebe a
resposta; a presença é justamente o momento, o instante da reciprocidade; todo
meio é obstáculo, então a relação é imediata, direta e a responsabilidade é o
contrato ético da autenticidade da relação quando, para cada chamado do EU, o TU
responde.
A maioria das pessoas aprendeu que dali não para passar, isso
tem facilitado as relações, então eu acho que não que cada um saiba
o que fazer, mas eu acho que a vontade de querer melhorar um
pouquinho tem aparecido na UTI, não sei se isso vai durar, se isso é
temporário, se isso vai resolver alguma coisa. Eu não sei (E3
Sensibilidade).
[...] eu estou achando que a gente está passando por uma fase muito
difícil, acho que a pior que a gente passou. Eu acho que o que
ameniza é porque é criança (E3 – Sensibilidade).
Se eu tivesse condições de mudar [...] É muito difícil. Eu venho
pensando e sempre fica um ponto de interrogação, não consigo
achar uma resposta. Eu sei que tem que mudar, mas eu não sei por
onde começar. pensei nisso e mesmo que eu tivesse todas as
questões financeiras, recursos humanos e materiais disponíveis seria
difícil estar trabalhando com essa equipe, essa equipe de saúde (E6-
Confiança).
4. Comunicação como forma de conhecer a si e ao outro na equipe
Os membros entrevistados identificarem a falta de comunicação como
fator dificultador para efetivar as relações interpessoais entre os profissionais. Silva
(1996) estabelece que os profissionais de saúde precisam se assumir como
produtores conscientes de linguagem e como elementos transformadores,
intérpretes de mensagens. A equipe necessita conhecer os mecanismos de
comunicação que facilitarão o melhor desempenho de suas funções em relação ao
paciente e entre os próprios membros da equipe.
E eu acho que muitas vezes fica de difícil compreensão o que a
gente quer falar. Muitas vezes a gente briga, a gente fala por uma
coisa que é para o bem do doente, mas não é pessoal, o problema
não é pessoal, e falam a doutora tem problema com a enfermeira,
com a auxiliar de enfermagem (E3 – Sensibilidade).
Então, o que mais falta é a comunicação e talvez um pulso mais forte
de chefia para poder passar porque, chega certa altura da manhã, a
gente está bem doida e não sabe o que está acontecendo mais
(E4-Compreensão).
O que dificulta é a falta de comunicação, tanto a equipe médica, a
equipe de enfermagem, a equipe de fisioterapeuta, a nutrição, falta
uma comunicação imensa (E4-Compreensão).
Acho que a comunicação e o fator chave (E4-Compreensão).
[...] tem umas pessoas que não se dão pelo simples fato de não se
conhecerem. Então você escuta algumas coisas que você fala puxa,
talvez se, se conhecessem melhor [...] (E4-Compreensão).
Como membro da equipe para ajudar eu sempre com o meu bocão
bem grande, fico dizendo não [...], a gente tem que conversar, tem
que fazer reunião, vamos conversar, não é bem assim, não é por aí,
poxa todo mundo tem que se unir [...] quero ser a porta voz e acabo
sendo mal entendida (E4-Compreensão).
As pessoas que atuam em ambiente tecnológico hospitalar são
competentes nos procedimentos técnico-científicos de sua especialidade, mas têm
dificuldades de se comunicar e transmitir os seus propósitos. Muitos problemas nas
relações interpessoais da equipe centram-se na falta de comunicação adequada, em
que não perfeito entendimento do que está sendo comunicado, do resultado que
espera e como alcançar tal resultado. Muitas vezes, subentende-se que as pessoas
da equipe compreendem a fala, o modo de agir, a forma de comunicar uma
informação, mas nem sempre esse processo comunicacional é claro.
Muitos dissabores poderiam ser abreviados, ou mesmo evitados se as
mensagens fossem validadas, pois a comunicação efetiva é bidirecional e contém
duas partes, o conteúdo (fato ou informação) e o sentimento (o que você quer
comunicar e como se sente a respeito desse fato ou informação) como enfatiza Silva
(1996).
Heidegger (1989, p. 223-224) salienta que, falar muito sobre alguma coisa
não assegura em nada uma compreensão maior. Ao contrário, os discursos prolixos
encobrem e emprestam ao que se compreendeu uma clareza aparente, ou seja, a
incompreensão da trivialidade”. Complementa afirmando que “o que escutamos em
primeiro lugar, são palavras incompreensíveis [...]. No escutar natural daquilo sobre
o que se discorre, podemos, sem dúvida, escutar também o modo de dizer”.
Somente onde se a possibilidade existencial de discurso é que alguém pode
ouvir. Quem ‘não pode ouvir’, e ‘deve sentir’ talvez possa muito bem e, justamente
por isso, escutar. Discurso e escuta se fundam na compreensão.
O que o autor quer dizer é que, muitas vezes, apenas ouvimos, e esse
ouvir é privado de compreensão. É preciso escutar, pois somente quem
compreendeu é que poderá escutar. O que ocorre no ambiente tecnológico
hospitalar é que são emitidos sons, ruídos, sem que estes sejam escutados. São
apenas ouvidos. Escutar é o estar aberto existencial da presença enquanto ser-com
os outros.
As expressões tanto eu, como a mãe, estamos totalmente perdidas’ e
‘Você fala uma vez, você fala duas vezes, três vezes e a pessoa não entende, você
acaba desistindo. Eu agora estou tentando falar a quarta e a quinta vez’ demonstram
a falta de compreensão no discurso emitido pela equipe. Heidegger (1989, p. 228)
explicita ainda que “o discurso que se pronuncia é comunicação. A tendência
ontológica da comunicação é fazer o ouvinte participar do ser que se abriu para o
referencial discursado no discurso”.
Hoje está acontecendo um caso em que eu estou com uma criança
para descer para o centro cirúrgico e um médico chega e fala, o outro
chega e fala. E tanto eu, como a mãe, estamos totalmente perdidas.
Enfim, então, falta muita comunicação (E4-Compreensão).
Você fala uma vez, você fala duas vezes, três vezes e a pessoa não
entende, vo acaba desistindo. Eu agora estou tentando falar a
quarta e a quinta vez. Tentando mostrar o ponto de vista e não ficar
zangada, quando não fazem em relação ao que eu quero. Eu estou
tentando me policiar mais (E3 – Sensibilidade).
Para Stefanelli e Carvalho (2005) a empatia, a confiança e o respeito-
mútuo são elementos chaves do processo comunicativo. Assim, a valorização dos
sentimentos humanos em um ambiente propicia o estabelecimento de relações
interpessoais autênticas. Nos seus relatos os membros da equipe apontam o
respeito, a confiança, a compreensão como componentes importantes para o
benefício dos relacionamentos:
O que facilita ainda é a compreensão de alguns plantonistas que
conseguem entender todo esse apuro que a gente passa e tem uma
visão mais ampla. Eles chegam direto para você e falam: olha agora
vai acontecer isso e isso e quando você puder, quando der ou, se é
uma emergência ele fala olha eu preciso que faça agora (E4-
Compreensão).
5. O poder instituído nas relações inter-humanas entre os membros da
equipe de saúde
A falta de definições de lideranças também foi apontada como obstáculo.
Segundo Merhy (2000), o universo das inter-relações engloba disputas permanentes
em torno de várias lógicas sociais, manifestações de interesse e interdições,
imposições e recusas, contendo, elementos ideológicos e de afetividade que
significam produtividade, direção e dinamicidade às relações.
Num ambiente de UTI para que sejam direcionadas e planejadas as
ações de cuidar, as chefias devem exercer os seus papéis de deres, caso contrário
as decisões ficarão à cargo daqueles que apresentarem maior poder sobre os
demais membros da equipe.
Hoje a gente vive um momento na UTI que todo mundo manda,
então é bem complicado. Você não tem uma pessoa a quem você
possa se reportar (E4-Compreensão).
A questão dos médicos está bem difícil até por causa dessa
liberdade de todo mundo mandar, eles estão vendo a gente cada vez
mais subordinados a eles (E4-Compreensão).
Eu acho que todo mundo quer mandar, na verdade, mandam os
médicos, tudo eles querem mandar, eu acho que hoje a enfermeira
aqui dentro ela não está tendo tanta autonomia como antigamente
que chegava aqui e dizia: não médico não vai falar nada para o
funcionário, é a enfermeira que vai falar. Agora não, agora deu uma
mudada assim. Eles chegam e falam e pronto. E não deveria ser
assim, deveria ser a enfermeira te chamar atenção, te falar e o
médico não, médico pra médico (E9-Companheirismo).
A expressão ninguém é melhor ou mais necessário que ninguém denota
essa preocupação. Somente a atribuição de significado às suas ações pode mudar o
rumo das relações entre os profissionais no processo de trabalho.
As relações interpessoais ali dentro, eu acho que é tudo que não tem
e tudo que precisa. Na verdade, assim o que eu acho de errado é
que as pessoas não conseguem entender que ninguém é melhor ou
mais necessário que ninguém. Na verdade é uma equipe que deveria
trabalhar como um time (E3 – Sensibilidade).
Em um ambiente de UTI pelas exigências da complexidade do paciente,
várias equipes articulam seus conhecimentos e habilidades. O sentido de
colaboração e respeito entre os vários membros da equipe firma o alcance do
objetivo comum que é a melhora do estado de saúde da criança. A luta conjunta
para um propósito comum é o que caracteriza, segundo Paterson e Zderad (1979), a
comum-unidade entre os seres humanos.
A imposição de poder, a falta de solidariedade nos relacionamentos
interpessoais é evidente, porém é perceptível nos diálogos como os profissionais
reconhecem e valorizam o trabalho da equipe interdisciplinar na UTIP Cardíaca.
Reconhecem o fazer de cada profissional como essencial, fundamental, importante,
com participação, troca de informações e que o maior tempo de atuação no setor,
tornam melhores as relações.
Entre as equipes de fisioterapia, psicologia, enfermagem, médica,
chefia médica e direção da UTI é uma relação muito boa. Eu acredito
que sim, eu realmente acredito que sim. uma troca de
informações grande. Existe uma participação, principalmente dos
auxiliares mais antigos. Eles têm uma participação importante. Eu
acredito que a relação entre os diversos segmentos ali dentro eu
acho que é uma relação muito boa (E7-Carinho).
O encontro intersubjetivo e a relação dialógica estão mais evidentes entre
os profissionais que atuam mais tempo em UTIP Cardíaca, que se conhecem,
que experienciam as mesmas situações de forma conjunta, compartilhada.
O desentendimento que aparece, a aparência que é percebia pelas
formas de agir em ambiente tecnológico hospitalar, como a UTIP Cardíaca, denota a
carência de entrosamento, de afinidades, de compartilha, de trocas de informações
efetivas, de compreensão do tempo e espaço do outro, da forma de agir de cada
membro da equipe, dos limites e domínio profissional de cada especialidade, da
forma de exteriorização dos sentimentos, emoções, afetos, da convivência cotidiana
com os familiares, da necessidade cada vez maior de manter abertura para o diálogo
e relações intersubjetivas.
Realizar as ações de cunho técnico-científico é mais fácil, basta ativar o
conhecimento instrumental, o treinamento, a capacitação de habilidades. Porém,
exercitar as relações intersubjetivas, o diálogo vivido, colocar-se com-o-outro, no
mesmo espaço e tempo, exige a abertura do ser, o desligamento de preconcepções,
de colocar-se como parceiro.
Para Bettinelli (2002) a solidariedade atua como um valor mediador nas
relações humanas e facilita a flexibilização das fronteiras individuais e coletivas,
favorecendo a cooperação/ complementaridade e possibilitando a aproximação e a
dialogicidade. Nesse momento, o cuidado solidário é aliado fiel e imprescindível.
Somente ativando as premissas do cuidado solidário é que se pode melhorar as
formas de atuar em conjunto, em equipe.
É interessante observar que alguns membros da equipe percebem
nitidamente as formas de relações humanas que se estabelecem no ambiente de
UTIP Cardíaca, sabem como manter e enaltecer essas relações conquistadas. Estes
profissionais estão dispostos, abertos ao crescimento e a compartilhar. Aquele que
não consegue exercitar, colocar em ação, movimentar suas peculiaridades de
relacionamento sente-se fora do processo.
A relação que envolve a totalidade do ser para Buber (1974) é uma
relação de plenitude, de sujeitos, de intersubjetividade. A intersubjetividade é um
determinante para que um homem se relacione com outro como presença genuína
como afirmam Paterson e Zderad (1979). Para oferecer uma presença genuína a
outros, primeiro deve existir dentro da pessoa uma convicção de que aquela
presença é valiosa e produz mudanças na situação. Pode-se concluir que para
alguns profissionais a transação intersubjetiva é valiosa e, por conseguinte tem
significado para eles na situação humana de cuidado conduzindo a abertura para
relações interpessoais autênticas. outros profissionais podem não reconhecer e
daí o apresentar abertura dificultando o encontro presença, visto que todas as
pessoas se relacionam, mas, é a intersubjetividade que substancia a relação com
potencialidades humanas.
Esse é um desafio permanente e progressivo, é preciso investir sempre,
para fortalecer o encontro intersubjetivo entre os membros da equipe de ambiente
tecnológico hospitalar.
C. O SENTIDO DA PRESENÇA DA FAMÍLIA NAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS
COM A EQUIPE DE SAÚDE
6. A con-vivência do profissional e família no ambiente tecnológico hospitalar
Para Paterson e Zderad (1979), o diálogo vivido é alcançado naquelas
relações em que existe a presença autêntica e genuína entre o ser que cuida e o ser
que é cuidado. Como cuidar de uma criança é cuidar também da família em todo o
contexto que os envolve, a relação com a família precisa acontecer através da
atitude humanística, pois só assim é possível cuidar da criança como um ser inteiro.
Muitas das forças humanas são subjetivas. A falta de atenção à esfera
subjetiva, como afirma Remen (1993), pode limitar seriamente nossa valorização e
compreensão das habilidades e forças que, de outra forma, poderiam nos ajudar a
solucionar crises de saúde. Quando as energias subjetivas são focalizadas e
utilizadas, tornam-se não parte do problema, mas parte de sua solução. Essa
afirmação é importante, pois fortalece a visão dos profissionais da equipe de saúde
ao afirmarem que a relação com a família é essencial para a evolução adequada da
criança em tratamento.
que se explicar para o familiar, não querendo ou exigindo que tenha
preparo e compreensão deste mundo de UTI. Leite e Villa (2005) pronunciam que
não é suficiente permitir a entrada da família na UTI. É preciso prepará-la,
identificando e esclarecendo suas dúvidas, observando as reações e
comportamentos e, ir além compreendendo seus sentimentos.
Como justificativa, os participantes expressaram que é a falta de
disponibilidade devido à complexidade dos cuidados e, também a prioridade que a
equipe a alguns cuidados perante as necessidades de orientação e
esclarecimentos da família, que dificultam a relação.
Cabe aos profissionais envolvidos no contexto da criança hospitalizada
procurar compreender a vivência da família e construir intervenções que auxiliem
durante a crise que pode representar a hospitalização no seu ciclo vital. Para Pinto,
Ribeiro e Silva (2004) cuidar dos pais é atividade não prevista no planejamento da
assistência, já que as enfermeiras reconhecem apenas a criança como seu paciente.
A equipe demonstra em alguns relatos ter esta visão:
Ver se a mãe está acompanhando ou não, ter uma relação com a
família é fundamental. Se a família acompanhando, você tem que
ter uma relação além do paciente, tem que ter uma boa relação
senão, não tem como (E1 – Amor).
No caso específico mais do que outras áreas, porque são crianças,
então, eu tenho que tratar da criança, da mãe, do pai, do responsável
pela criança, você tem que entender tudo isto e tem que dar um
apoio psicológico muito grande pra família (E2 – Espiritualidade).
[...] em adulto, a gente consegue ver que todas as vezes que você
conversa com a família e explica o que é sair cheio de tubo, sair
cheio de dreno, o pós-operatório normalmente costuma ser mais
tranqüilo (E3 – Sensibilidade).
E eu acho que na UTI a gente devia trabalhar [as relações], às vezes
com a criança é muito difícil, mas às vezes com a família seria muito
mais adequado se a gente conseguisse fazer isso (E3
Sensibilidade).
Eu acho que primeiro o cuidado com o paciente, depois a gente tem
que separar as coisas, primeiro o paciente e depois a família (E5-
Empatia).
Existem momentos que, na gravidade maior da criança a gente
precisa manusear muito a criança e a presença da família pode
prejudicar (E7-Carinho).
O Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (1990), ao preconizar que
os estabelecimentos de atendimento à saúde devem proporcionar condições para a
permanência em tempo integral de um dos pais ou responsáveis nos casos de
internação de crianças e adolescentes, assegura na lei o direito à criança de ter um
familiar presente. Na Instituição deste estudo, existe um programa que proporciona
condições adequadas para os familiares permanecerem 24 horas por dia ao lado de
seus filhos na UTI, por meio do Programa Família Participante.
O Programa Família Participante de acordo com Forte e Sato (2006),
implantado em 1991 no Hospital Pequeno Príncipe visa assegurar a presença do
familiar ao lado da criança internada. Essa presença exigiu alteração significativa
das relações entre pacientes e profissionais de saúde, da gestão hospitalar e da
própria inserção do hospital no contexto das políticas públicas de saúde e dos
direitos de crianças e adolescentes.
As autoras salientam ainda que muitos fatores podem ter contribuído para
o surgimento e a consolidação do Programa, alguns mais objetivos relacionados ao
histórico da instituição onde se desenvolveu e ao fortalecimento da sociedade civil
em relação aos seus direitos; outros mais difusos, e portanto mais difíceis de
sistematizar racionalmente, como a força do amor, a delicadeza do afeto, a
impotência frente ao sofrimento de uma criança doente. Com a implantação do
Programa começava um processo de mudança que rompeu conceitos arraigados,
democratizou conhecimentos e antecipou os novos tempos de solidariedade com
eficiência técnica e administrativa.
No entanto, mesmo com este entendimento sobre a participação da
família no cuidado, com a permanência da família garantida por lei e com a
existência de um programa na instituição que orienta a permanência dos pais em
UTI, alguns profissionais ainda apresentam resistência à presença da família dentro
deste ambiente complexo.
Assim, Barbosa e Rodrigues (2004) explicitam que são inúmeros os
motivos para justificar a dificuldade ainda presente em conviver com a família em
UTI pediátrica, como: falta de preparo para lidar com a situação, lacunas na
formação profissional, lacunas na educação continuada, falta de envolvimento das
chefias, desvalorização das famílias. Ressaltam a importância de conhecimento
abrangente, envolvendo o desenvolvimento infantil, importância de laços afetivos,
presença dos pais, das relações e interações com grupos, respeito às
individualidades, às diferenças, crenças, hábitos.
O apoio emocional da equipe é fundamental, pois necessitam atender e
aliar os sentimentos de acolhimento, afeto, diante do sofrimento a que a família está
exposta.
Ferreira (2002) enfatiza que na complexidade do cuidar e do cuidado
destacam-se as vertentes cnica e tecnológica que contribuem para a
materialização do cuidado na prática cotidiana e que, se não forem aplicadas de
forma crítica, podem imprimir impessoalidade, distância e frieza, tornando o cuidado
desumano e o cliente desubjetivado. A vertente humanista torna o cuidado essencial
e valoriza a presença do sujeito, com uma concepção centrada na família.
Foram selecionados alguns momentos em que os profissionais
exteriorizam sentimentos negativos em relação à presença da família ou como
percebem esses sentimentos nos demais membros da equipe. O despreparo da
equipe para lidar com a família é ainda presente, no que se refere ao
comportamento de que a família atrapalha, impede o bom andamento do serviço, faz
perguntas indevidas, todos são aspectos que necessitam de resignificação.
Das equipes alguns aceitam outras não aceitam [a permanência da
família], às vezes não tem procedimento perto, mas é para retirar a
mãe porque a mãe está fazendo algumas perguntas ali que não cabe
a ela ali e eles acham que já tem que tirar a mãe (E6-Confiança).
Se eu ficar conversando com o paciente ali, com a família, ele vai
atrapalhar minha concentração, pelo que eu vejo é assim, eles
acham que vão perder tempo se ficar ali conversando com a família,
confortando o paciente (E6-Confiança).
Com restrições [...] Muitas restrições presença da família]. (E7-
Carinho).
Uma coisa que eu acho que dificulta bastante o nosso trabalho aqui
dentro é a família participante. Tem umas mães que ficam que a
gente percebe que realmente ajuda a recuperação da criança, mas
realmente são poucas, a maioria atrapalha. Atrapalha o nosso
trabalho, às vezes a criança não está bem quando a mãe chega a
criança fica mais agitada, mais nervosa, porque a mãe está muito
ansiosa e passa aquilo para a criança. (E8-Sinceridade).
A resistência da equipe interdisciplinar da UTI acontece para Orlando
(2001) porque vê no familiar um fiscal implacável e incômodo e não um importante
elemento de ajuda no processo de recuperação do paciente crítico. Na visão de
Souza, Ribeiro e Eckert (2003) a participação dos pais em unidades de internação
tem assumido uma característica muito instrumental e tecnológica ou
essencialmente funcional.
Os profissionais cuidadores devem ter presente o seu papel de educador,
procurar despertar os familiares durante a hospitalização para novos modelos de
cuidado às crianças. Ressaltam ainda, que a re-significação do cuidado possibilitará
à família assumir uma relação renovada e comprometido com a equipe e criança.
Por ser hospital pediátrico, aonde as pessoas são mais, digamos,
suscetíveis à repreensão, o envolvimento da família ali dentro, num
momento de decisão que você precisa decidir ou intervir, ser mais
agressivo, se comporta pouco amistosa em relação à equipe, tanto
médica, quanto a equipe como um todo (E3-Sensibilidade).
A família participante, as mães estão totalmente perdidas, a gente
que tem que acabar fazendo esta orientação, mais uma sobrecarga
sobre a gente, elas ficam bem perdidinhas, esses dias uma mãe me
disse que não sabia que podia tomar banho e isso não é a gente que
tem que falar é a Família Participante que tem que orientar (E4-
Compreensão).
Eu acho que esta questão da Família Participante é marketing,
porque eu acho que é uma coisa que talvez não tenha sido bem
trabalhada para ser instituída aqui, entendeu? Essas questões que
só as mães do SUS fazem a escolinha, fazem aquela aulinha [...] Por
quê? As mães de convênio dão muito trabalho aqui dentro também,
como muitas mães que são esclarecidas já disseram que não é certo
a família participante, porque tem muita mãe que não está preparada
para estar aqui dentro (E8-Sinceridade).
Tem mãe que se preocupa com as outras crianças, se preocupa com
coisas que não precisa e acaba não cuidando do seu próprio filho e
se preocupa com o que está acontecendo com as outras crianças
para chegar lá fora e contar (E8-Sinceridade).
Em relação á família, eu tenho, dentro da medida do possível, como
a gente tem pouco contato, mas isso eu sempre tive, cuidado para
colocar as situações. Eu acho que a situação tem que ser colocada e
não se pode esconder absolutamente nada, mas eu acho que isso
exige maneiras e maneiras de dizer que o filho está grave, então eu
tento ser extremamente objetiva, mas, mais sutil, mais suave na
maneira de passar a informação (E3 – Sensibilidade).
Eu acho que a gente tem que dar carinho, atenção, não para ele
[para o paciente], tentar transmitir alguma coisa para a família. Eu
acho que aqui [nesta relação] poderia melhorar (E5-Empatia).
Tem algumas famílias que incomodam, mas a gente vai conversar,
conversa e melhora tudo. É conversar e explicar que tudo se
resolve. Não adianta chegar ali e gritar com a família e pôr a família
para fora e não explicar porque, né? Tem que conversar (E6-
Confiança).
Souza, Ribeiro e Eckert (2003) estabelecem que o ambiente familiar tem
diferenças marcantes em relação ao ambiente hospitalar, tanto em nível de estrutura
física, quanto dos atores envolvidos e na dinâmica vigente. Atitudes como conversar,
colocar-se disponível para escutar os problemas, mostrar-se receptivo diante da
solicitação de ajuda demonstram a capacidade empática dos profissionais de saúde
em lidar com o desconforto gerado pela situação de estar hospitalizada com seu
filho.
O tempo e a duração da internação afetam a estrutura e a organização
familiar levando-a a constantes ajustes no seu cotidiano. Os depoimentos reforçam
que a equipe reconhece a busca da família por informações precisas e que a
atenção cuidadosa pode minimizar o sofrimento vivenciado.
O Família Participante eu acho que é um projeto muito bacana e
ousado. Um projeto ousado! É um projeto muito maior do que a
presença física do pai ou da mãe ali. É um projeto que envolve toda
a condição emocional da família, a gente entende isso (E7-Carinho).
Como membro da equipe, eu com a família, procuro sempre explicar
para a família o que é um pós-operatório, as complicações. Ás vezes
a criança apresenta alguma complicação e eu procuro explicar que
aquilo é normal para aquela cirurgia, eu procuro ser bem clara,
assim, eu procuro explicar para deixar a família o mais por dentro
possível (E8-Sinceridade).
Nunca esconder o que está se passando, quando a criança está
grave. Infelizmente ser realista e falar a realidade, explicar que a
criança está grave que tem risco. Com a família mais ou menos
assim (E8-Sinceridade).
7. O sentido da presença da família na recuperação da criança
A família conhece seu filho, sabe de suas preferências e sua presença em
ambiente de hospitalização do filho diminui a ansiedade da criança e da mãe pela
sua participação conseguindo um resultado satisfatório no provimento das
necessidades. Não se pode separar a doença do contexto familiar de acordo com
Neman (2002) e, por ser um elemento tão imprescindível, a família deve ser
entendida como uma aliada da equipe de saúde na recuperação da criança.
Nesse sentido, Barbosa e Rodrigues (2004) estabelecem que devemos
respaldar as nossas ações no cuidar de crianças, valorizando a família como um
cliente em potencial, considerando como um participante ativo no processo de cuidar
de seu filho. As autoras enfatizam ainda que, em ambiente de UTI Pediátrica, a
convivência com a família pode ser culturalmente construída, aspecto que
representa um desafio a ser buscado e solucionado pelos profissionais por meio da
interação, do tornar-se humano, do diálogo, da presença, do amor, da paciência,
inerentes ao processo de humanizar.
Os relatos demonstram que a equipe de saúde entende esta aliança
relacional e a participação da família como fator coadjuvante no cuidado à criança
em UTIP Cardíaca.
A família eu acho que não atrapalha as relações, eu acho que ajuda
muito. Quando foi colocada a família participante na UTI eu fiquei
pensando, puxa a família vai ficar ali, a mãe vai ficar ali observando,
mas desse tempo para cá eu vi bastante mudança assim (E6-
Confiança).
Eu estou na instituição há muito tempo e então eu vejo que a família
perto da criança, a criança é outra, recupera mais rápido, a mãe
conhece o paciente, até muitas vezes, mais do que a gente porque a
mania que a criança tem a gente não sabe e a mãe diz ele gosta de
dormir assim, gosta disso [...] Até facilita para a gente, facilita o
cuidado ela estando perto (E6-Confiança).
O lado positivo é a melhora da ansiedade familiar, a curiosidade
familiar diminui, mas, de uma forma geral, mas positivamente a
família estando isto é muito importante no sentido até de diminuir a
ansiedade da criança que ela está num momento de medo, dor e
ansiedade [...] a presença da família é capaz de diminuir a ansiedade
da criança, diminui a ansiedade dos familiares que vivem e que
interrompem as atividades profissionais (E7-Carinho).
Eu acho que hoje a gente tem um resultado bom, mas eu vejo que a
presença da família ali é uma parte do resultado muito bom, e que a
família junto, ela supre essa necessidade, essa ansiedade, ela alivia
essa ansiedade que a criança sente nesse momento de mudança
radical de ambiente e de sensação de perda em maior ou menor
grau (E7-Carinho).
Existem pontos positivos extremamente fortes e alguns pontos
negativos que poderiam ser trabalhados para a gente chegar num
objetivo final [falando sobre a permanência da família na UTI] (E7-
Carinho).
8. Preparo da família para a permanência ao lado da criança durante a
hospitalização
Os familiares ao entrarem na UTI, principalmente nas primeiras visitas e
nos primeiros momentos de permanência ficam ansiosos, choram, desmaiam porque
não têm um preparo para entender porque o filho não responde, porque está lido,
porque tantos tubos e drenos.
Damião e Rossato-Abéde (s/d) estabelecem que para a família cuidar da
criança hospitalizada necessita ter informações completas sobre a doença e
tratamento. Salientam ainda que a família precisa manter um bom relacionamento
com a equipe de saúde para que tenha acesso não às informações necessárias,
como também a ter na equipe uma referência para o cuidado de sua criança.
A equipe deixa transparecer nos seus discursos que não é a permanência
da família em si que dificulta ou atrapalha as ações de cuidado, mas, alguns fatores
relacionados à orientação dos familiares, principalmente para a entrada em um
ambiente de UTI.
Agora a dificuldade maior é justamente o acesso da presença [da
família]. O entendimento da família do que é esta situação de uma
UTI, este é um ponto chave. As pessoas precisam estar preparadas
para estar dentro da UTI. É muito importante que as pessoas saibam
o que vão encontrar lá dentro (E7-Carinho).
É importante que a família entenda que não é ela entrar lá dentro,
mas que ela está dentro de um contexto e que ela faz parte de um
trabalho, ela é mais uma equipe dentro. Que existe a equipe de
fisioterapia, de enfermagem, de médicos, de fonoaudiologia, de
psicologia e a equipe de pais (E7-Carinho).
Os deveres e as obrigações e as limitações da família dentro. O
que pode e o que não pode ser feito dentro. A família não pode
entrar e fazer o que quiser, dormir, deitar na cama, falar ao celular
o tempo todo, manter a criança acordada ou interferir no andamento
da equipe. Então é fundamental que exista uma equipe de preparo
desta família, a família tem que entrar sabendo o que vai encontrar lá
dentro e porque que a família está ficando lá dentro (E7-Carinho).
Apesar da existência de programas que privilegiam a presença do familiar
no ambiente tecnológico hospitalar persistem as dúvidas em como receber, tratar e
confortar a família para enfrentar o sofrimento da doença e hospitalização do filho.
Nesse sentido Angerami-Camon (2003) argumenta que é necessária a empatia
genuína entre a equipe, os familiares e doentes. Define como aquela atitude em que
o profissional da saúde se envolve com o doente e família de uma forma singela sem
o estabelecimento de barreiras. Essa relação extrapola aquela apenas profissional,
pois o doente e a doença passam a ocupar a totalidade do imaginário emocional do
profissional. Age como conselheiro, amigo, ouvinte, pela presença e compreensão
da situação vivenciada. Um relacionamento pautado na sensibilidade reafirma os
vínculos afetivos entre a equipe e a família.
Preparar a família para permanência no hospital é tarefa da equipe de
saúde, em que cada um em seu exercício profissional aciona uma dimensão para
que o acolhimento, a compreensão e solidariedade se estabeleçam de forma
dinâmica e contínua.
Angerami-Camon (2003) diz que nos relacionamentos interpessoais da
equipe com a família e paciente é comum a associação de que o sofrimento do
paciente é algo que diz respeito apenas à sua pessoa e aos seus familiares,
cabendo ao profissional apenas o relacionamento com a doença. A postura do
profissional depois de anos de prática com o doente e com a doença adquire uma
indiferença total para a dor do paciente, uma calosidade que impede de ser tocado,
ainda que minimamente pelo sofrimento do paciente. Esse tipo de postura denomina
de calosidade profissional, ou seja, não se importa com o sofrimento emocional e
familiar que a doença imputa às pessoas envolvidas nesse processo.
Assim, é compreensível a expressão da equipe de saúde de que a
dificuldade nos relacionamentos interpessoais em ambiente tecnológico hospitalar é
afetada pela desinformação da família, pelo contato distanciado que se estabelece,
pela indiferença, pela transferência de responsabilidade no acolhimento, pela falta
de tempo.
Depende também de como esta família foi preparada para o que vai
enfrentar, porque o que muitas vezes a gente percebe é que a família
não tem preparo nenhum para estar aqui dentro. Não em relação
à Família Participante, mas em relação ao médico da criança
também, que talvez não tenha tido tempo ou sei o que, mas não
explicou direito para a família, o que a família iria encontrar aqui
dentro, então eu acho que isto dificulta bastante (E8-Sinceridade).
Então eu acho que essas mães precisavam ser mais bem
preparadas para estarem aqui dentro. Então, eu acho que a Família
Participante é importante sim, mas não é que eu ache que não deva
ter, eu acho que deve ter, mas as mães têm que ser mais bem
orientadas, não pelo médico, mas deveria ter uma psicóloga ou
uma enfermeira, não sei uma pessoa que fosse responsável por isso,
para orientar as mães na UTI. Eu acho que isso ajudaria bastante
(E8-Sinceridade).
Dificulta bastante o trabalho. Eu acho que não é toda a família que
está preparada para ficar aqui dentro direto (E8-Sinceridade).
Com os pais eu acho que também está faltando, eu acho que apesar
de ter a Família Participante, eu acho que deixou um pouco de lado
aquele trabalho que a gente tinha com os pais antigamente, quando
você chegava e conversava. faltando isso, de ser conversado
com os pais, os próprios funcionários aqui dentro ter uma conversa
com os pais, mas isso é muito devido ao trabalho, a gente não tem
tempo. Tempo para cuidar da criança você tem, mas não tem tempo
para sentar e conversar com os pais, para explicar ou qualquer coisa
parecida. Não tem tempo de fazer isso (E9-Companheirismo).
Um profissional de saúde, na visão de Remen (1993), é uma pessoa que
sofreu profundas modificações como resultado da especialização, do conhecimento
e da experiência; são pessoas diariamente expostas à dor, à doença e à morte, ou
seja, à vulnerabilidade humana. Porém, se não tiverem habilidade para enxergar
também as potencialidades para recuperação que o paciente apresenta, a
vulnerabilidade pode se tornar esmagadora e torturante.
A presença da família em um ambiente aonde se cuida de crianças em
estado crítico traz muitos momentos de tristeza, sofrimento, luto e, para alguns
profissionais, isto pode ser profundamente doloroso. Esses profissionais então,
apresentam um impedimento inconsciente de vivenciar estas situações e, afastam-
se e distanciam-se na tentativa de se defender. Remen (1993) explica que, como
justificativa, a primeira coisa que vem à mente são questões como limitações de
tempo e também econômicas, ainda que as razões possam ser mais profundas.
Para promover estas experiências positivamente, a enfermagem dialógica
apresenta-se como uma alternativa, onde o profissional numa relação transacional,
vive uma experiência existencial que permite o seu conhecimento e o do outro.
Entendendo que a presença genuína possibilita que o profissional e o familiar
ajudem-se reciprocamente determinando o bem-estar e o estar melhor de ambos. O
preparo da família envolve também as exigências de proteção individual, em que se
protegem e protegem o filho, necessitando de treinamento e preparo para
permanecer na UTIP Cardíaca.
E você estipular se pode entrar ou não, avental de contágio, a
higienização das mãos. O que o acompanhante pode fazer ou não
[...] Tem que deixar bem claro o campo, até aonde a pessoa pode ir
ou não (E1 – Amor).
E eu acho que o jeito com que se aborda a família, não vou dizer que
é errado, mas eu diria que eu não acho a coisa certa. A gente
deveria ter um espaço, que a gente sentasse com a família, a equipe
médica, com o cirurgião, com a enfermeira que está dando a
assistência, o fisioterapeuta e explicar como vai ser o pós-operatório,
o ambiente que vai ser feito. Com criança isso é complicado (E3
Sensibilidade).
Mas eu acho que deveria, eu acho que UTI deveria ser separado de
outros setores e pra conversar com os pais, pra um apoio dos pais
porque os pais quase não têm, e eu acho triste isso daí (E9-
Companheirismo).
Costenaro (2001) explica que a comunicação dos profissionais com os
familiares exige clareza, simplicidade e apoio tuo e deve estar inserida num clima
de empatia em que o profissional demonstra capacidade de escuta.
Nesta relação equipe/ criança/ família em um ambiente tecnológico o
profissional precisa buscar o cuidado indo além da execução técnica complexa,
estando aberto aos questionamentos para viver os sentimentos e compartilhar
experiências juntamente com a criança e os familiares.
D. A DINAMICIDADE DO CUIDADO PERMEANDO A CONDUTA A SER TOMADA
EM AMBIENTE TECNOLÓGICO HOSPITALAR
9. A precisão técnica necessária para o cuidado, tendo como norteador a
complexidade do estado de saúde da criança
"Se o homem não pode viver sem o ISSO, não se pode
esquecer que aquele que vive com o ISSO não é
homem" (BUBER, 1978).
A complexidade e a gravidade do estado de saúde da criança internada
em UTIP Cardíaca requerem um serviço de alta tecnologia em equipamentos,
materiais e terapêutica e depende de uma série de fatores ligados evidentemente e,
também, em grande parte, aos cuidados complexos contínuos realizados à beira do
leito pela equipe. Estes cuidados devem ser realizados com racionalidade, eficiência
e na grande maioria das vezes imediatamente.
Ao discorrer sobre a sua rotina diária na UTI os profissionais deixam claro
que todas as equipes utilizam ao cuidar instrumentos como a observação, a
avaliação e o planejamento. Ao utilizar estes instrumentos os profissionais tornam
suas intervenções mais adequadas e eficientes, pois, favorecem o replanejar do
cuidado dinamicamente, em função da complexidade dos cuidados e das
modificações constantes do estado de saúde da criança.
Importante salientar a preocupação com o estado geral da criança de
forma individualizada com avaliação minuciosa, atenta e constante, no sentido de
perceber o que pode ser modificado, para melhorar as condições e bem-estar da
criança. Esse zelo é cuidado, o qual exige a perspicácia, eficiência profissional,
conhecimentos, habilidades técnicas, mas principalmente o olhar atento de cuidador.
Eu cuido fazendo avaliação da criança da cabeça aos pés, né? Pra
ver como é que tá. Em que situação que está em questão de
complexidade, em questão de estado. você faz um balanço geral
para ver o que você pode efetuar em questão de complexidade e
idade da criança. você efetua conforme vai o dia-a-dia, conforme o
plantão (E1 – Amor).
Tem que ter um começo e tem que ter um fim. Estipular o que eu
posso fazer e o que não posso. Conforme sua avaliação, observação
é a mudança de decúbito, ver como está o paciente. Um cuidado
grande com cânula (E1 – Amor).
Depois disso e após pegar o plantão, o meu cuidado é num primeiro
passo examinar paciente por paciente, para ver a situação que cada
um se encontra ali, o mais grave e tal, depois numa segunda
reavaliação, ver se é possível fazer alguma coisa para mudar para
melhorar [...].(E2 –Espiritualidade).
Então, a gente passa e avalia todas as crianças do ponto de vista
clínico de pós-operatório, decide as drogas que vai tirar. São
avaliadas as crianças que podem ir de alta, que podem ser mexidas,
que pode tirar droga, colocar droga, tirar acesso, tirar dreno, fazer
algum tipo de procedimento que a equipe da cirurgia tenha que fazer,
que a equipe clínica não saiba ou não queira fazer. Decidir o número
de vagas e daí vou para o centro cirúrgico (E3 – Sensibilidade).
Primeira coisa que a gente faz, a gente toma conhecimento do plantão
[...] A gente pega os dados que a gente tem e pega de um plantonista
pra outro. É como se a gente tivesse uma idéia do plantão, quais são
as prioridades do plantão. Qual é a criança que precisa de cuidados
imediatos. Qual é a criança que a gente pode segurar mais um pouco.
O que a gente tem pra resolver imediatamente e, a partir daí a gente
vai fazendo os cuidados na criança, avaliando as condições clínicas
individualmente de cada uma e, tentando comparar com o que a gente
já tem de dados anteriores da criança, para saber se melhorou ou se o
estado geral dela está mantido, ou se piorou. Isso é primordial e daí, a
gente define qual é a conduta a ser tomada com cada criança durante
o plantão (E7-Carinho).
Como critério de avaliação mais importante expresso pela equipe de
saúde, está o exame físico da criança. Estabelecer prioridades, ter conhecimento do
estado da criança, sempre cuidando das intercorrências, situações que exigem um
repensar das ações estabelecidas para novamente encontrar o equilíbrio. É uma
rotina que se repete diariamente, porém é singular a cada ser cuidado. Essa
preocupação com a evolução da criança é visível nos depoimentos.
O critério de maior importância para cuidar da criança é o exame da
criança. É o exame físico da criança de beira de leito. Para mim é o
mais importante (E7-Carinho).
Ter um bom conhecimento do paciente, dele como um todo e, a gente
ter clareza no estado clínico também. Poder estabelecer as
prioridades. Acho que isso é o que facilita. E a passagem de plantão,
que a gente possa ter uma visão linear de todos os pacientes (E7-
Carinho).
Bem inicialmente a gente chega, pega o plantão, o plantonista que
estava de plantão à noite passa as intercorrências do dia anterior,
passa como a criança está, como esteve durante a noite e passamos
visita com o chefe da UTI. Discutimos quais são as condutas, o que
vai ser feito pela aquela criança naquele dia. a gente vai organizar
as vagas, que nem sempre é possível de manhã logo, né? Porque
aquela confusão, então arruma as vagas. Depois a gente vai
examinando as crianças e resolvendo as intercorrências de acordo
como elas vão acontecendo. Vai liberando as que estão de alta, vai
recebendo as que estão chegando. Mais ou menos isso porque daí
vai se repetindo (E8-Sinceridade)
Examinar as crianças, avaliar o estado que elas estão, de
hemodinâmica, o estado geral delas, daí vem a necessidade de usar
drogas, o desmame dessas drogas, o que precisa fazer, avaliar o
estado geral e ir instituindo o tratamento que for necessário dentro da
intercorrência que ela for apresentando (E8-Sinceridade).
De manhã a gente chega, primeiro os sinais vitais, como o
paciente está, é dado o banho, a medicação. Os médicos passam
visita, daí a gente fica sabendo mais ou menos como o paciente
está naquele dia, como ele passou o dia anterior. Bom, a gente
trabalha doze horas e faz tanta coisa nessas 12 horas [...] De manhã
eu acho que chegar e ver tudo que você tem para fazer dentro
daquele período, ver o que você tem que fazer naquelas 6 horas. A
gente sempre começa dando o banho, ajeitando o paciente deixando
confortável, dando as medicações. A rotina é essa, ela vai se
repetindo (E9-Companheirismo).
Ao cuidarem das crianças observando, avaliando e planejando, os
profissionais evidenciam um saber fazer (essencial em um ambiente tecnológico
hospitalar) pautado no valor do cuidado humanístico através da interação
profissional-paciente. É o “estar-com” explicado por Paterson e Zderad (1979) como
um tipo de fazer que na realidade implica na presença ativa do profissional. Em seu
sentido mais amplo, completam as autoras, o “estar-com” requer a fixação da
atenção ao paciente, estar atento a uma necessidade aqui e agora na situação e
comunicar-se disponível respondendo adequadamente.
Outro aspecto relacionado à complexidade do estado de saúde da criança
que aparece nos discursos é a preocupação com a precisão técnica, sendo para os
profissionais um dos requisitos para cuidar da criança em ambiente tecnológico
hospitalar. O profissional familiarizado com as situações características de uma UTI
tem um compromisso profissional demonstrado nesta preocupação com a correta
utilização dos recursos tecnológicos.
Paterson e Zderad (1979), ao referirem-se a arte e a ciência do encontro
relacional, explicam que o homem responde de acordo com o mundo cotidiano em
que vive, porém o que diferencia a resposta é a vivência do diálogo intersubjetivo
entre subjetividade-objetividade. Em uma UTIP Cardíaca muitos o os chamados
por procedimentos, técnicas, manipulação de equipamentos e materiais de acordo
com a situação de saúde-doença que a criança apresenta e para responder
adequadamente é necessário o conhecimento científico, entretanto, é na arte que o
profissional singulariza seu cuidado naquela determinada situação humana.
O paciente chegou. A partir do momento que chegou não tem mais
tempo de nada, tem que resolver. que entra aquela, a tua equipe.
Ela dificulta em um aspecto, um plantão passado errado, uma bolinha
de ar no equipo bomba dificulta, porque a partir do momento que o
PO [pós-operatório] chegou, tudo bem que antes do PO chegar você
vai verificar, mas sempre fica uma coisinha e quando chegou não tem
como, você tem que resolver (E1 – Amor).
Existe um dificultador do cuidado a partir do momento que é passada
alguma coisa errada ou não é passada. A criança chega à UTI e uma
coisa que não foi passada ou foi passada errada pode ser uma
mínima coisa, a diluição que foi passada errada ou o médico
prescreveu. Uma coisa trocada por outra e já complica (E1 – Amor).
Então, o cuidado seria este, conseguir passar a alimentação no
horário certo, você passar a dietinha no horário certo, enfim, conseguir
dar toda a assistência que ele precisa (E4-Compreensão).
Ah! Cuidado é tudo, né? Desde o banho, as medicações, conversar, a
família que também é muito importante pra eles, medicação (E9-
Companheirismo).
Em alguns relatos percebe-se que os profissionais vêem a complexidade
do estado de saúde da criança como um fator dificultador que sobrecarrega e afasta
o profissional do paciente, ou seja, conduz a uma mecanização do cuidado e assim
descaracteriza o cuidado como ação humana. O ambiente tecnológico hospitalar
exige além dos conhecimentos e habilidades técnicas, exige atenção, disposição,
comprometimento, responsabilidade. Os profissionais referem que cuidar nesse tipo
de ambiente, os tornam susceptíveis a erros pelo acúmulo de trabalho, sobrecarga
de pacientes, complexidades das ações, estresse pelas modificações constantes no
estado da criança, dificultando colocar em ação o verdadeiro cuidado.
Com o paciente sinceramente não tem mais vínculo porque é uma
troca diária. Hoje você está com um paciente e amanhã passou
dois naquele lugar e está o terceiro. A gente não consegue ter
vínculo. A gente cuida porque é função de cuidar, mas vamos dizer
vínculo, amorosidade não dá tempo, não dá tempo. Então, você faz o
necessário, você banho, medicamento e daí pede para a mãe
entrar para a criança ficar quietinha para você poder passar para o
outro. Então, assim vinculo eu acho que não existe mais, tanto até
porque o rodízio e muito grande. Às vezes você não lembra nem o
nome do paciente que estava ontem (E4-Compreensão).
aconteceram vários episódios, inclusive comigo de uma infiltração
bem grande, aonde eu tive que responder pela infiltração, mas foi um
plantão muito perturbado, eu mal conseguia ou conseguia fazer o
controle da criança, eu realmente não vi o extravasamento porque a
criança era pequena e estava bem cobertinha a mão, enfim foi um
erro meu, mas acabei não vendo pelo apuro, porque naquele dia
foram trocados no outro leito que eram de minha responsabilidade
também, seis crianças em uma manhã (E4-Compreensão).
O que dificulta para este cuidado acontecer [falando do cuidado
humano] é a sobrecarga de trabalho, a complexidade das crianças, e
atualmente está sobrecarregado para a gente que tem que assumir
os nossos pacientes e cuidar dos pacientes dos residentes também,
ter atenção com o que está acontecendo com os residentes (E8-
Sinceridade).
Conseguir aspirar sempre que necessário, mas como você cuida de
dois, e geralmente dois pacientes muito graves, principalmente ali no
PO isso não acontece (E4-Compreensão).
Para mim isto fica em falha. O cuidado dessa parte fica a desejar, eu
acho que não tem devido à alta complexidade do paciente. Fica a
desejar o cuidado com o paciente, com a família (E6-Confiança).
A precisão técnica necessária para o cuidado de alta complexidade,
necessita de modificações na rotina diária de UTI pediátrica, pois um profissional,
em particular de enfermagem, assume mais de uma criança, dificultando a
implementação de ações ditas humanas, como conversar com a família, dispor-se a
estar-com a criança. Pela gravidade das situações, exige pressa na tomada de
decisões, atenção técnico-científica, descuidando de atitudes que permeiam um
comportamento humano. Expressam que gostariam que a situação se modificasse,
para ter tempo de dedicação maior à criança e família, como conversar, escutar,
relacionar-se humanamente
Também o que ajudaria seria devido à alta complexidade, deixar um
profissional para cada paciente. daria tempo dele fazer o cuidado
mecânico e o cuidado humanizado, daria mais tempo, isso da parte
da enfermagem (E6-Confiança)
Eu acho que deveríamos mudar duas situações. A primeira situação
eu acho que se tivéssemos mais tempo para trabalhar essa relação
humana. Então, não adianta a gente pensar em relação humana se a
gente tem outras várias situações práticas para resolver ao mesmo
tempo. A gente não a relação humana, a gente vai resolver a
situação prática, vai resolver o problema (E7-Carinho).
Eu acho que assim, a gente como médico, eu não sei em relação à
enfermagem, a gente como médico pela sobrecarga de trabalho, eu
acho que esse lado humano a gente acaba deixando de lado, coisa
que eu percebi que antes não acontecia tanto, entendeu? Eu acho
que hoje é aquela coisa da gente ter mais que fazer as coisas, tem
que ser rápido porque vai internar outra, dar alta porque vai
chegar outro, a coisa fica mais mecânica por causa da sobrecarga de
trabalho. Mas também não é sempre que acontece às vezes a gente
consegue (E8-Sinceridade).
Para executar muitas das técnicas que são essenciais para o cuidado em
UTIP Cardíaca, a destreza manual é um instrumento valiosíssimo. Assim, Paterson e
Zderad (1979) explicam que a união da arte e ciência nestes momentos caracteriza
a atitude intersubjetiva e transacional porque o procedimento é realizado em um ser
humano e o profissional não pode interpretar apenas como a transformação e
manipulação de objetos físicos mas, sim como um fazer-com e estar-com.
10. O ambiente tecnológico hospitalar com suas peculiaridades para efetivar
as ações de cuidar
O processo de cuidar em um ambiente como de uma UTIP Cardíaca
possui características próprias como a necessidade de rotinas, a alta complexidade
tecnológica e a convivência constante com as situações de risco de vida. Os
profissionais da equipe salientam a necessidade de sistematizar as rotinas com
relação aos procedimentos, informações, horários e forma de repassar aos
familiares o estado e a evolução de seu filho.
O ambiente hospitalar difere do ambiente familiar e os limites e liberdades
de cada indivíduo devem ser respeitados, criando um ambiente de cuidado com
interações e interdependências dos seres humanos, promovendo um espaço
acolhedor e positivo. Ação e interação humanas para Oliniski (2005) são processos
contínuos de construção, desconstrução e reconstrução que os seres humanos
utilizam para definir para si mesmo e para os outros as suas condutas e atitudes
frente à determinada situação, para estabelecer diretrizes a serem seguidas, para
interpretar e perceber a si e ao outro mutuamente.
Percebe-se que em um ambiente aonde a prática do cuidar é também
sustentada pela excelência na capacitação técnica-científica, pela monitorização
constante das funções vitais das crianças e a rápida intervenção nas situações, as
rotinas e protocolos podem ser instrumentos que organizam e sistematizam o
cuidado.
Os membros da equipe da UTIP Cardíaca pesquisados apresentam esta
compreensão quando narram algumas dificuldades vivenciadas pela falta do
instrumento organizador.
E a única dificuldade é não ter um horário certo para fazer as coisas,
você não ter uma rotina. Você pode personalizar naquela UTI
especificamente [as rotinas]. Entram muitas pessoas [da equipe] e
querem a informação certa, ao invés de ter um horário, onde todo
mundo passasse e tomasse as suas decisões. Não tem (E2
Espiritualidade).
[...] vem fulano ao meio-dia, o ciclano às duas da tarde, o beltrano à
meia noite e quer a informação como o paciente, né? Então, são
as mesmas pessoas, são da mesma equipe, mas não estão
passando no mesmo momento. Isso é uma coisa que dificulta, você
tem que ficar dando mil informações para pessoas que têm opiniões
diferentes, entendeu? (E2 – Espiritualidade).
Precisa uma coisa mais agrupada, e eu acho um pouco
desorganizada a UTI neste sentido. Melhor do que ficar parando [as
atividades] e entra um, fala uma coisa, fala outra, aquela confusão
parece que [...] está sem governantes (E2 – Espiritualidade).
[...] ter uma visita geral, uma coisa organizada. É horário tal, quer
passar visita, quer saber informações, a visita é tal horário. Vamos
passar todo mundo junto, sem essa coisa de duas, três vezes por
dia, entendeu? Mas isso seria uma coisa [...] (E2 – Espiritualidade).
Da mesma forma estes profissionais pesquisados vão além do
conhecimento e observação às rotinas e protocolos propostos, e desenvolvem
modos individuais que utilizam para facilitar as ações de cuidar. A técnica, a
dimensão instrumental, facilita o desenvolvimento do trabalho, em que a equipe
utiliza com precisão determinados procedimentos para agilizar e melhorar a
qualidade do cuidado.
A primeira coisa que eu faço quando entro na UTI é [...], eu faço uma
anti-sepsia. (E2 –Espiritualidade).
Eu tenho uma rotina, chego cedo UTI às 7h, 7h30min por aí e
começamos visita de todo dia de manhã com a equipe da clínica que
pensa completamente diferente da equipe da cirurgia (E3
Sensibilidade).
A gente chega 7h, pega o plantão e várias coisas que ficaram
do plantão da noite para a gente arrumar. Aí a gente consegue
arrumar para começar a nossa rotina a partir das nove horas da
manhã, porque até então, com a visita médica eles mudam muita
coisa e a gente tem que ficar bem maluquinha assim trocando copo,
é respirador sem água, controle que não foi fechado certo, enfim (E4-
Compreensão).
A gente pega pós-operatório quando está na ponta do PO e ainda
fica responsável para preparar a cirurgia que está em sala,
arrumando leito, preparando a parede, as medicações que serão
usadas, a bandeja com material para coleta de sangue, e além do
PO você cuida de uma outra criança do lado (E4-Compreensão).
Então tem a passagem do plantão. Eu pego o plantão, verifico se
está tudo ok. Daí abro o controle, verifico medicação, verifico a
coleta de sangue para ver se tem hemograma ou alguma coisa mais.
Inicio o banho e assim por diante (E5-Empatia).
Eu chego e termino de pegar o plantão, porque eu chego 8h. A
seguir é ver quem vai permanecer na UTI porque eu preciso ver
vaga. Daí eu ligo para o internamento e verifico se tem vaga. Vou
à cardiologia [enfermaria] ver se tem vaga para deixar certo quem vai
sair e agilizar a vaga para o pós-operatório. Eu também tenho que
ver quem vai sair porque esse horário já tem cateterismo em baixo
e quase para subir [para a UTI] (E6-Confiança).
Cabe a toda a equipe a reflexão, na discussão e implantação de rotinas e
protocolos, a respeito da maneira como serão empregadas, não cabendo num
espaço de cuidados a rotinização do mesmo, tornando-o alienado de sentido. Aplica-
se aqui o pensamento de Pires (2005) ao afirmar que ao aprisionar o cuidar em
normas, rotinas e técnicas, estas alienam o cuidado de sua existência criadora e
reveladora. Assim, hão de ser empregadas respeitando-se o direito à criatividade, o
direito à apreciação e o conhecimento dos seres envolvidos tornando-as flexíveis e
permeadas de atitude humana.
Ao assumirem seu papel como membros da equipe argumentam em favor
da participação através de avaliações e opiniões para repensar as práticas e
relações envolvidas no processo de cuidar. É possível perceber o convívio de
diferentes profissionais com diferentes saberes ou especialidades atuando no
mesmo cliente e ambiente. Esse aspecto muitas vezes, é percebido pelos discursos
como dificultadores ao fluxo normal de ações de cuidado, pois não rigor nos
horários, e ainda prevalece o trabalho parcelado. Apontam como solução para
melhorar as relações no ambiente, a separação de crianças graves por box, manter
o prontuário próximo, limitar o número de pessoas circulando no mesmo espaço,
priorizar as ações de cuidado sem prejuízo do fazer de um profissional pelo de outro,
evitar a mudança de leito da criança, preparo de toda a equipe para atuar em UTI.
Estipular limites porque como m pessoas que entendem as coisas,
como entrar e sair da UTI têm pessoas que não têm essa noção em
questão até de ambiente de UTI (E1 – Amor).
Ah, eu acho que assim, que deveria ter uma melhor organização dos
pacientes em box, por exemplo, onde tivesse um espaço para você
chegar e poder examinar ele. Entre os boxes, eu acho que se
pudesse colocar os pacientes separados por box, com tudo separado
pros pacientes (E2-Espiritualidade).
Se as coisas pudessem ser organizadas mais individualmente entre
os pacientes, colocar tudo ali para ele, prontuário e tal, ficaria mais
fácil, o acesso ficaria mais fácil de você [...] Acho para mim muita
miscigenação das coisas ali dentro entendeu? Essa mistura ali
dentro eu acho meio confusa entendeu? Se torna um dificultador (E2-
Espiritualidade).
durante a manhã existem extubações, entubações e aspirações
que a Fisioterapia passa só uma vez de manhã e isso é o necessário
para as crianças. Então, a gente acaba tendo que fazer mais
aspirações durante a manhã (E4-Compreensão).
O pós-operatório quando chega, geralmente chega meio dia e meia,
meio dia ou bem na virada, gera um estresse porque você não
consegue entregar um plantão adequado, você não consegue fazer
tudo que é necessário para a assistência da criança e a única pessoa
que te ajuda é a enfermeira de plantão e a tua companheira do lado
(E4-Compreensão).
O que dificulta é quando essa visão, quando ela não é plena. O
indivíduo que vai uma vez por semana, muitas vezes ele fica sem ter
uma visão geral do paciente. Ele sabe o que aconteceu ontem e
sabe o que aconteceu no dia, mas não tem uma visão formada do
todo e isso acho que é o que dificulta (E7-Carinho).
Às vezes eu acho que é muita gente circulando dentro do setor, até
mesmo, com o mesmo paciente ao mesmo tempo (E9-
Companheirismo).
Acho que aqui dentro da UTI o que mais é mais problemático mesmo
que a gente acha é a troca de lugar e de criança que eu acho que
isso dá muito trabalho. A mudança de crianças de lugares aqui
dentro dificulta muito o trabalho da gente. Se a gente não precisasse
ter essa mudança de criança assim de repente, acho que seria
melhor. Isso é uma coisa bem difícil pra nós aqui dentro. Tem dias
que você consegue dar um banho meio dia (E9-Companheirismo).
Para Paterson e Zderad (1979), o diálogo vivido ocorre em um mundo de
homens e coisas no tempo e espaço, podendo ser este um mundo especial como
um mundo encontrado em uma UTIP Cardíaca. Para as mesmas autoras este
mundo especial é formado por inúmeras coisas e estas coisas estão abertas à
inspeção minuciosa do sujeito. Os membros da equipe ao serem detentores do
conhecimento da prática diária vivida neste mundo especial, precisam ter o direito de
participar nas decisões e contribuir de modo construtivo para melhoria nas relações
de cuidado. E assim a equipe valoriza seus próprios e diversos saberes.
A relação dialógica acontece em um mundo real de objetos conforme
Paterson e Zderad (1979). Estes objetos são os correntes da vida cotidiana e todos
os aparatos clínicos. Ainda na afirmação das autoras, ambos os tipos de objetos
influenciam as transações profissional-paciente e cada um deles pode experimentar
estas influências de modo diferente.
Para as crianças, os objetos da vida cotidiana podem ser os travesseiros,
cobertores, fraldas conhecidas como “cheirinhos”, aquela mamadeira especial com
desenhos, fivelas, a meia com desenho de cachorrinho, a boneca que ganhou da
madrinha, o carrinho que o Papai Noel trouxe. Estes objetos são tão familiares que a
criança os percebe como extensão de si e de seu mundo. Ao ser admitida em UTIP
Cardíaca vivencia um novo mundo, a criança se percebe em um mundo estranho e
com objetos novos que podem lhe causar medo, insegurança, dor, confusão.
Selecionamos abaixo alguns trechos de falas que refletem a inquietação
dos profissionais com a vivência da criança neste mundo de objetos novos. Apontam
que o ambiente deve ser alegre, aconchegante, confortável, para facilitar a
adaptação da criança ao aparato tecnológico de UTI.
Um outro aspecto que facilita o nosso trabalho em UTI é ter um
ambiente mais alegre também, sei lá, com mais carinha de criança
(E3 – Sensibilidade).
Para a criança, tudo nesse ambiente é novidade. Eu tornaria mais
aconchegante deixando a família com ele, fazendo alguma atividade
que ele pudesse ficar confortável até ele melhorar (E6-Confiança).
Situações em que a gente pode imaginar a ansiedade da criança
naquele momento, imaginar uma criança em idade pré-escolar 2
anos 3 anos. Ela acorda amarrada, acorda com um monte de cano e
acorda num ambiente totalmente estranho. É lógico que ela vai
chorar, é lógico que ela vai ter ansiedade. Claro que isso depende da
experiência e do preparo psicológico de cada um, mas, eu vejo que
se a gente pudesse ter mais tempo dedicado à criança, mais tempo
dedicado a tentar resolver estes problemas sem utilização
farmacológica a gente teria um resultado muito bom (E7-Carinho).
por outro lado, explicam Paterson e Zderad (1979), para o profissional,
os mesmo objetos são vistos de um modo diferente, podem ser instrumentos
familiares, ajudas valiosas, máquinas complicadas, equipamentos defeituosos ou
sem utilidade.
Os profissionais entrevistados também se referiram a outros aspectos
relacionados aos equipamentos e materiais como: a falta de materiais ou o não
funcionamento adequado dos equipamentos. Para eles, estes aspectos interferem
na atuação da equipe e na prática de cuidar em ambiente tecnológico hospitalar.
[...] para prescrever, uma mesa adequada, uma prancheta adequada
para cada paciente ficaria mais fácil assim, talvez evitaria confusão
entre os pacientes onde o prontuário, onde não tá (E2
Espiritualidade).
Se tivesse material também [as coisas iriam mudar] (E5-Empatia).
Algumas coisas que faltam também para o trabalho. Materiais que
faltam para o trabalho é ruim (E9-Companheirismo).
O processo de cuidar nestas condições, de acordo com Leite e Vila
(2005), torna-se frustrante porque ante a escassez de materiais e o funcionamento
inadequado de equipamentos, os profissionais acabam fazendo o melhor que
podem, mas isso culmina em prejuízo para a qualidade do cuidar.
Materiais bons. Não adianta ter uma equipe boa, se você não tem um
material bom. Não adianta excelentes profissionais e péssimo
material. Até acontece, mas meio que no milagre (E1 – Amor).
Quando pensamos em um ambiente de UTI, logo vem em mente um local
fechado, que possui muitos equipamentos e aparatos tecnológicos (que ao
funcionarem emitem estímulos sonoros), trabalho intenso de uma equipe
interdisciplinar dia e noite que leva à necessidade de luminosidade constante. Tudo
isso, para cuidar de crianças em estado crítico que necessitam de procedimentos
invasivos, diagnósticos e terapêuticos, que causam dor e desconforto e que sentem
a separação, o medo, a ansiedade e de seus familiares que sofrem sem ter controle
da situação.
Em algumas falas os entrevistados exteriorizaram a compreensão da
hostilidade do ambiente por suas próprias características e o impacto nas ações de
cuidar:
O que dificulta no cuidado em UTI, eu acho que primeiro, o próprio
ambiente, que é um ambiente extremamente estressante (E3
Sensibilidade).
Trabalha-se com patologias muito pesadas, que se vê. Se lida com a
morte o tempo todo e o risco da situação, estar bem, de repente
reverter e eu acho que o ambiente como um todo é muito ruim (E3
Sensibilidade).
Eu acho que no ambiente da UTI é muito ruim, no sentido de
ambiente físico, porque é tudo muito exposto, muito aberto e não se
tem privacidade. Os doentes não têm privacidade (E3
Sensibilidade).
Eu acho que o ambiente tem um peso importante, porque não
tempo de você parar e ir lá e confortar a família, confortar o paciente,
é tudo mais mecanicamente, mais mecânico (E6-Confiança).
Ainda é um ambiente muito turbulento, ainda é um ambiente que se a
gente medisse os decibéis ali dentro a gente ainda iria encontrar um
ambiente com muito estímulo, e luminoso, enfim também muito
estímulo doloroso toda hora tem um procedimento. Então, a criança,
ela não relaxa (E7-Carinho).
O estímulo luminoso, o estímulo doloroso, a sensação de estar
sozinho, a falta de comunicação, a dor, a ansiedade, o vazio, a
permanência no leito sem poder se levantar, enfim os conhecimentos
dos estímulos externos. Eu acho que tudo isso é um problema. São
problemas que estressam. (E7-Carinho).
Se reconhecemos que o ambiente de uma UTI é desagradável para o
paciente, devemos também, segundo AMIB (2004), reconhecer suas conseqüências
na equipe que diariamente atua. O mesmo autor explica que espera-se que a
equipe esteja treinada, com os profissionais exercitados para lidar com as situações
que o ambiente impõe. Então, se espera que o profissional saiba como responder
positivamente aos estímulos estressores, verbalizar que o ambiente causa abalos
emocionais ou físicos é exprimir que não está bem treinado ou que não tem
condições de trabalhar neste local. Está é uma realidade difícil de ser aceita pelo
profissional que atua em um ambiente que exige alta capacitação técnica e
científica. Este impedimento pode ser apreendido, pois dentre os dez entrevistados
nenhum falou das suas próprias limitações enquanto ser humano dentro deste
ambiente.
Os membros da equipe, explica AMIB (2004), não podem extravasar
abertamente seus sentimentos o que pode tornar insuportável o trabalho, então
utilizam mecanismos de defesa para se proteger (uso do humor, comentários
informais a respeito do paciente e equipe, indiferença às necessidades do meio).
Apenas um dos entrevistados mostrou-se sensível ao fato deste comportamento da
equipe impor mais prejuízos ao ambiente e também à criança,
Tem uma coisa que acontece aqui que particularmente acontece em
todas as UTI que eu não concordo, é que as pessoas esquecem que
é o nosso trabalho, mas é uma noite mal dormida para um doente.
Então é aquela algazarra (E3 – Sensibilidade).
O próprio estímulo que a UTI tem normalmente e a gente impõe
mais, por exemplo, o barulho do respirador, troca de plantão chega o
povo falando alto, brincando (E3 – Sensibilidade).
[...] fica, muitas vezes, aquela barulheira, aquela falta de percepção e
de que já escureceu e que as pessoas precisam dormir, que o
ambiente precisa ficar mais tranqüilo e que aquilo ali é um doente
grave para a gente, mas é o filho de alguém. Essa falta de
sensibilidade eu acho que a gente precisava melhorar (E3
Sensibilidade).
Para Bettinelli (1998) muitas vezes o paciente apresenta reações
inesperadas em função do ambiente de UTI. Na criança estas reações são bem
mais perceptíveis, uma vez que além das reações que se desencadeiam na
perspectiva de um ser humano, a criança apresenta alterações comportamentais
emocionais e físicas específicas a sua compreensão de acordo com a etapa de
crescimento e desenvolvimento.
Segundo AMIB (2004), tornar a UTI mais humana e adequada às
necessidades da criança, não envolve altos gastos, mas dependem do interesse,
vontade e criatividade por parte da equipe. A equipe aponta formas alternativas de
melhorar as relações no ambiente de UTI, como exercitar a paciência,
conscientização das diferenças individuais entre os profissionais atuantes no mesmo
ambiente, e implementar ações de lazer para as crianças. Nos relatos foi possível
compreender que a equipe está disposta a melhorar,
Eu melhorei um bocado quanto a isso, quanto à melhoria das
condições do ambiente. Digamos que eu estou desenvolvendo a
minha paciência. Eu fui obrigada mesmo que não querendo, a tomar
consciência que nem todo mundo tem o conhecimento que eu tenho
e, que nem todo mundo tem a vontade que eu tenho de trabalhar ali
(E3 – Sensibilidade).
Ali dentro a gente não pode dizer que tem um ambiente humanizado
ainda! A gente tem muito para avançar, para atingir um ambiente
humanizado ali dentro em termos de distração, em termos de
oportunidade de a criança ter distração e aliviar a ansiedade que tem
ali dentro (E7-Carinho).
Para atingir a plenitude [...] Está encaminhado, mas, eu diria que hoje
a gente tem muito a avançar neste campo de conhecimento de quão
intenso isto é para o paciente (E7-Carinho).
Ficou claro nos depoimentos que a equipe consegue propor medidas para
melhoria do ambiente visando o cuidado à criança:
Um ambiente que você visse a luz do dia, que a criança soubesse
que claro ou esescuro, não o tempo todo com a luz acesa, ou o
ar ligado (E3 – Sensibilidade).
Mesmo com o ambiente difícil, o que é ruim, mas acaba ajudando é
você lidar com criança. A criança sempre é mais alegre, é assim uma
coisa mais agradável. Acho que é até mais fácil de lidar por ser
criança, por ser uma coisinha mais meiga, mas acessível, eu acho
que facilita (E3 – Sensibilidade).
Como fazer isso melhorar, é preciso conversar, fazer as pessoas
entenderem que precisa mudar a visão de UTI, eu acho que não é
perder a objetividade, mas é melhorar e dar condição à objetividade
que a gente precisa. Eu acho que daria uma boa ajuda. Então assim,
eu acho que respeitar mais o horário de sono das crianças a noite,
tentarem ter um ambiente mais tranqüilo (E3 – Sensibilidade).
No ambiente eu mudaria assim: eles querem operar quatro crianças
por dia, teriam que diminuir esse quatro aí, duas ou três cirurgias por
dia, o ambiente não ficaria tão estressante. Daria para cuidar
destes pós-operatórios com mais atenção e os demais (E6-
Confiança).
Diminuiria o barulho do ambiente também (E6-Confiança).
No entanto, para proporcionar melhorias neste local é necessário que
cada membro da equipe perceba-se como parte integrante do ambiente e realize
suas ações de cuidar refletindo e observando esta intenção. Ao discorrer sobre esta
reflexão, os entrevistados avaliam as pessoas e demonstram que entendem que
este seja um trabalho em equipe,
Eu acho que não tem conhecimento técnico [sobre as questões de
harmonia no ambiente], eu acho que as pessoas não têm. É uma
parte que estou falando da parte médica, é uma parte que o médico
pouco se preocupa e eu tenho até tentado mudar neste sentido, mas
acho que é uma parte que o médico não está nem aí, que o médico
não liga (E3 – Sensibilidade).
Eu acho que fazer com que o grupo interaja de um modo mais
voltado ao bem-estar da criança, não aquela coisa é aonde eu
trabalho, vou para ganhar ou vou para operar, acabou, eu viro
as costas e vou embora. Eu acho que dava uma boa melhorada (E3
– Sensibilidade).
[...] eu acho que a equipe de enfermagem até tenta, as enfermeiras
até tentam [manter o ambiente tranqüilo], mas é uma situação
complicada e sinceramente eu acho que a equipe de auxiliares, elas
não tem conhecimento técnico, não tem vontade de aprender e
muitas vezes não tem percepção (E3 – Sensibilidade).
A psicologia, para te falar bem a verdade, é um serviço que não
existe mais, não vejo mais nem chamarem nas questões de óbito,
pelo menos de um ano para isso eu não vejo a psicologia aqui
dentro (E4-Compreensão).
Eu queria terminar falando que acho que num ambiente assim de alta
complexidade para eu estar implantando este objetivo que é a
humanização em UTI Pediátrica Cardíaca teria que estar a equipe
toda, a equipe de enfermagem, médica, nutrição, limpeza estar
passando por uma reciclagem de estar falando da importância deste
cuidado para o paciente. (E6-Respeito).
Segundo Bolela e Jericó (2006), enquanto o objeto de estudo for apenas
ao tema geral “humanização”, sem propor meios para que ela efetivamente
aconteça, serão continuamente encontradas dificuldades para sua efetivação. Ao
refletir nestes depoimentos dos membros da UTIP Cardíaca entendemos que ao
conseguirem sugestionar ações e estratégias viáveis, aproximam-se da
concretude de um ambiente mais humano.
As condições de trabalho dos profissionais em UTI muito tempo têm
sido consideradas inadequadas devido às especificidades do ambiente e das
atividades complexas que ali são realizadas, que impõem dupla e tripla jornadas e
ritmo acelerado de trabalho. Também a baixa remuneração que leva à necessidades
de vários vínculos empregatícios e o desprestígio que algumas equipes como a de
enfermagem sofrem.
Esses fatores têm sido associados ao abandono do trabalho em UTI e
conseqüentemente à alta rotatividade de profissionais. Os entrevistados identificam
esta realidade na UTIP Cardíaca e avaliam como um fator que dificulta o trabalho em
equipe e sobrecarrega os profissionais mais antigos, podendo conduzir ao
empobrecimento das relações e do processo de cuidar,
O que dificulta é a falta de equipe, porque eu acho que em todo o
lugar não aqui, ninguém está satisfeito com o salário, e daí acaba
sempre entrando gente nova e saindo. Assim, a gente acaba se
desgastando porque tem que ensinar gente nova e isso acaba até
prejudicando o paciente, sobrecarrega a gente muitas vezes (E5-
Empatia).
Recentemente a gente tem incorporado algumas pessoas novas e
inexperientes que é por conta da alta rotatividade recente que a
gente vê. Não fica prejudicado, mas, compromete um ótimo trabalho
que sempre existiu. A gente poderia manter a ótima qualificação em
termos de material humano de todos, não da equipe de
enfermagem, mas da equipe médica de plantão (E7-Carinho).
Para Anselmi, Duarte e Angerami (2001) é possível observar rias
repercussões no que se refere à eficiência, à eficácia, à efetividade e por
conseqüência, à qualidade dos serviços prestados a medida que estas reposições
intensificam-se, mediante as saídas do emprego onde a rotatividade ocorre. Os
mesmos autores reforçam que uma força de trabalho que permanece estável e
qualificada, além de sustentar o processo de cuidar, cria também possibilidades
efetivas de garantia da qualidade dos serviços ofertados em uma UTI.
Às vezes, as políticas organizacionais da instituição diferem entre
profissionais contratados e autônomos e isso pode ser percebido pelos
trabalhadores como desprestígio profissional. Fica clara esta interpretação na fala da
equipe de enfermagem,
Até o próprio hospital, porque o pessoal da enfermagem, da limpeza,
da lanchonete, tudo com bolsa transparente, e os médicos tudo com
bolsa fechada como se a enfermagem fosse roubar alguma coisa.
Isso é uma coisa que eu acho que é um desrespeito para com o
funcionário (E5-Empatia).
Fundamental para se alcançar boas condições de trabalho é também a
definição de papéis e funções neste ambiente multiprofissional. Um profissional
identificou esta problemática na UTIP Cardíaca através destes relatos,
Eu acho que a dificuldade que a gente tem principalmente no Brasil é
das pessoas entenderem o papel da enfermeira e o papel da equipe
de enfermagem. Infelizmente no Brasil, as pessoas não são
valorizadas e não te dão o devido valor. Então, a enfermeira muitas
vezes, não sabe o papel dela, a auxiliar muitas vezes não sabem e
querem passar por enfermeiro, não desmerecendo ninguém, mas os
auxiliares eu acho que são profissionais complementares (E3
Sensibilidade).
O médico não é melhor do que o enfermeiro, que não é melhor do
que o médico. E, infelizmente no Brasil não tem isso e aqui a gente
vê muito isso muito claro. As coisas lá não são definidas (E3
Sensibilidade).
Para que o trabalho seja harmonioso em um ambiente complexo aonde
diferentes equipes atuam é essencial que as funções e a hierarquia entre os
componentes das equipes sejam observadas. Paterson e Zderad (1979) corroboram
ao citar Buber que afirma crer em cada homem como um potencial singular
comprometido com seus semelhantes na luta progressiva e dirigida a uma
determinada meta. Cada equipe atuando em seu espaço conforme suas
competências e respeitando as dinâmicas de trabalho das demais e assim,
potencializando as ações de cuidar para o alcance do objetivo único.
A baixa remuneração é citada como elemento que conduz ao número
elevado de vínculos empregatícios (alguns profissionais trabalham em duas ou até
três instituições). Nestas condições o trabalho torna-se uma mera forma de atingir o
salário mensal desejado e cogente e faz com que o profissional sinta-se
desmotivado tornando dificultosas as relações e o ato de cuidar mecanizado.
Eu acho que delas [das auxiliares de enfermagem] é falta de
sensibilidade, falta de conhecimento, e eu acho que muitas vezes é
até por falta de vontade, por inúmeros fatores como estímulo,
problema em casa, falta de dinheiro. Acho que cada um tem um
problema e resolve como acha melhor. Mas eu acho que muita coisa
é levada para dentro da UTI que não tem necessidade (E3
Sensibilidade).
E, eu não vejo isso. Eu acho que é a dificuldade. Eu acho que as
meninas [as auxiliares de enfermagem], se é que a gente pode entrar
neste fato, eu acho que o estímulo financeiro é muito ruim para todo
mundo ali dentro, todo mundo ganha muito pouco (E3
Sensibilidade).
Muitas pessoas trabalham em outros lugares e acabam chegando
cansados para o serviço. E trabalham pelo dinheiro e não porque
gostam (E5-Empatia).
vêm para estressados, trazem problemas de outro ambiente
para e de uma coisa simples eles tornam mais dificultoso (E6-
Confiança).
Das outras equipes, a equipe médica de plantonistas, a equipe
cirúrgica também, um pouco, alguns visam e estão aqui para
cumprir horário, não visam este outro lado [o cuidado humanizado]
(E6-Confiança).
O conhecimento de fatores que propiciam desprazer e sofrimento no
trabalho abre novas possibilidades de mudanças para o trabalho da enfermagem e
demais membros da equipe de saúde, contribuindo para o envolvimento político de
todos na luta por condições de trabalho mais éticas e humanas em ambientes
tecnológicos hospitalares.
Nesse ambiente os membros da equipe de saúde encontram alento, paz
para agir em circunstâncias tão exigentes e complexas, por meio da fé. Um dos
participantes afirmou em seu discurso que considera uma exigência para a
humanização a crença em um ser superior, acreditar em alguma coisa, em um
“Deus”. Outro membro da equipe exteriorizou que busca ajuda em Deus para poder
superar as dificuldades de relacionamento na UTIP Cardíaca.
Para Souza (2006), o cuidar na dimensão espiritual é permitir que o ser
humano expresse sua necessidade de crer, de ter fé em algum potencial e visa
produzir apoio, conforto, segurança quando o ser humano experimenta situações
que transcendem a dimensão física.
Uma exigência para a humanização é invocar a Deus sempre, achar
que aquilo a mais que é necessário tá na força interior de cada um tá
dentro de um Deus qualquer, vamos dizer assim, não precisa ser o
Deus ou um Deus (E2 – Vida).
E, com os outros membros da equipe [falando das relações na UTIP
Cardíaca], eu rezo para Deus para eles também me ajudarem porque
está difícil (E3 – Sensibilidade).
A força que emana deste ser superior, fortalece os membros da equipe
para superarem suas limitações e as dificuldades encontradas ao cuidarem neste
ambiente de UTIP Cardíaca.
11. A capacitação técnico-científica e o aprimoramento da perspectiva humana
e espiritual para efetivar as ações de cuidar
Da mesma forma que não se pode curar os olhos sem a cabeça,
Ou a cabeça sem o corpo
Também não de deve tentar curar o corpo sem a alma.
Pois, a parte nunca pode ficar boa,
Se o todo não estiver bem
Platão
O homem, na concepção de Freire (1993), é um ser inacabado, como é
incompleta a realidade na qual vive e ele tem consciência disso. Assim, percebe-se
que a capacitação técnico-científica permeia as ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar. É imprescindível aliar a capacitação e aperfeiçoamento
técnico-científico à conscientização e aprimoramento da perspectiva humana do
cuidar.
Quando os entrevistados falam sobre as relações interpessoais, admitem
que, para alcançar melhorias neste ambiente tecnológico, primeiramente é
necessário conscientizar a equipe sobre o que é o cuidado humanizado, o que são
relações humanas. Um afirmou que seria até fácil conseguir outras inúmeras
benfeitorias que a UTIP Cardíaca precisa, porém mais difícil é desenvolver atitudes
de conscientização da equipe sobre o cuidado humano,
Olha, é complicado, você trabalhar com um ser humano, tem que
tentar mostrar a necessidade do cuidado humanizado. O ser humano
é insensível ao saber, o que é que é o cuidado humanizado. Então,
mostrar o que é, para que serve, como pode ser encontrado. E ali ser
colocado pra tua equipe. Não é uma coisa fácil, é demorada, tem
pessoa que pega rapidinho e vai embora, tem pessoa que é mais
devagar, complicada. É devagar, mas pega (E1 – Amor).
Eu pensei nisso, que eu acho que estar ali cuidando do paciente
ao lado, tendo todas essas benfeitorias que acabou de citar, isso é
fácil, o difícil é a equipe, trabalhar com a equipe esse outro lado aí.
Conscientizar que chegar aqui não é tecnicamente (E6-Confiança).
Para mudar é saber o que é relação humana. Isso eu acho que é
fundamental. Ou por meio de treinamento, por meio de auto-
questionamento, por meio de saber o que é relação humana dentro
de uma unidade de terapia intensiva. Primeiro ter tempo, trabalhar
isso e depois saber como trabalhar isso. O que é uma relação
humana. O que é uma humanização de um ambiente tecnológico
(E7-Carinho).
Para Paterson e Zderad (1979), é pela experiência vivida e também
através da educação que a força inata do ser humano faz com ele se mova para
atingir o conhecimento de seu mundo e do mundo dos outros.
Um participante enfocou em seu relato a dificuldade de aprendizado que o
funcionário encontra quando recém admitido na UTIP Cardíaca e afirmou acreditar
que treinar melhor estes funcionários novos seria um dos primeiros passos para
melhoria das relações neste ambiente.
Eu acho que o mais difícil quando você entra é a aprendizagem. Tem
que ficar perguntando, tal, tal. Com eu passei por isso e outras
pessoas que vão entrar (E5-Empatia).
Se eu tivesse todas as condições para melhorar [falando das
relações] eu acho que a primeira coisa era: entrou funcionário novo
eu daria um treinamento melhor, uma coisa assim mais para não cair
de pára-quedas aqui dentro (E5-Empatia).
As ações de cuidar em um UTI o tão intensas e absorventes e
requerem tanta atenção que fica muito difícil para os profissionais cuidarem da
criança e todo contexto requerido e ainda observar e ficar responsável pelas
atividades realizadas por funcionários novos que ainda não têm condições de
atuarem sozinhos. Sofrem os profissionais mais capacitados e treinados (geralmente
são aqueles que têm mais tempo de serviço) porque se sentem sobrecarregados e
frustrados por não conseguirem responder adequadamente às demandas de
cuidado de seus pacientes e de seus novos colegas e sofrem os que acabaram de
chegar porque ficam perdidos em um meio que na grande maioria das vezes ainda
não tem possibilidades de entender.
A educação empodera os profissionais para intervirem de forma crítica-
reflexiva e potencializa a capacidade do cuidar numa relação dialógica em um
ambiente tecnológico hospitalar.
7. DEMONSTRANDO A COMPREENSÃO APREENDIDA
A quarta etapa da análise fenomenológica proposta por Giorgi (1985)
inclui sintetizar todas as unidades através de análise compreensiva das
descrições. Integrar os insights contidos nas unidades de significado transformadas
numa descrição consistente da estrutura do fenômeno tal como sentido no evento.
Esta é a etapa mais difícil, em que o pesquisador sintetiza, a partir das unidades de
significado determinadas, a compreensão da totalidade das expressões dos sujeitos,
ou seja, realiza a análise compreensiva das descrições.
Para Paterson e Zderad (1979), a teoria da enfermagem humanística se
estrutura na interação dialógica das experiências articuladas e compartilhadas por
enfermeiras investigadoras que abstraem e conceituam. Assim, o método
fenomenológico sustentado na Teoria Humanística de Paterson e Zderad conduziu à
compreensão dos discursos a partir da vivência da equipe de saúde ao cuidar em
ambiente tecnológico hospitalar. O discurso desvela qual a significação de cuidado
para a equipe de saúde da UTIP Cardíaca.
É fundamental que a equipe de saúde que atua em um ambiente
eminentemente tecnológico não prescinda ao cuidado humano, por mais eficientes e
modernos que sejam os equipamentos. Tornar a tecnologia e a atitude humanística,
verdadeiros aliados é a forma mais indicada de cuidar, a qual deve ser percebida,
compreendida, assumida e implementada pela equipe neste ambiente.
Foi possível apreender nas falas que os profissionais de saúde
estabelecem relações interpessoais ao cuidar em ambiente tecnológico hospitalar e
denota que percebem que para cuidar é necessário muito mais do que a realização
de atividades técnicas vinculando a presença de sentimentos humanos nas ações
de cuidar. A enfermagem caracteriza-se por ter como princípio o critério do
humanismo e é possível estender essa forma de agir aos demais profissionais da
área de saúde que atuam de forma compartilhada em ambiente complexo hospitalar,
pois são profissionais que se compadecem com a dor e sofrimento da criança, que
compreendem a importância de suas ações, que definem claramente os seus limites
de atuação profissional.
As relações interpessoais o vivenciadas pelo diálogo, comunicação,
troca verbal de conhecimentos, experiências e opiniões, os quais permitem a
interação entre os seres humanos, unindo-os e contribuindo para a superação de
obstáculos impostos pela trajetória da vida. O ambiente de UTIP Cardíaca exige dos
profissionais, dedicação, conhecimento, atenção, discernimento, espírito
investigativo, curiosidade, reflexão, compartilhar de idéias, troca de informações
para que o diagnóstico da criança sob seus cuidados, seja preciso, certeiro e de
excelente resultado. Porém, para alcançar essa meta grandiosa é necessário lançar
mão dos atributos pessoais, emocionais aliados ao tecnicismo. Lembrar, que junto a
todas as exigências profissionais com-vivem com o ambiente estressante, exaustivo,
solicitador, exigente. Assim, resulta em um profissional que necessita ser muito bom
profissionalmente, equilibrado emocionalmente e saber administrar o ambiente
conturbado e exigente de UTI, mantendo a motivação, estímulo, comunicação eficaz
e o ambiente propício ao verdadeiro desenvolvimento de ações cuidativas.
Os discursos apreendidos denotam uma preocupação dos profissionais de
saúde em manter vivas as chamas de diferentes aspectos que permeiam as
relações interpessoais em UTI, estão conectados com as questões humanas das
relações. Têm consciência de que as exigências técnico-científicas imperam sobre
as humanas, mas almejam mudar, anseiam por ter um novo modo de com-viver
nesse espaço de comum-unidade.
Sidekum (1979, p.21), ao falar sobre a filosofia de Buber explicita,
O homem está em constante relação com o homem, é um
acontecimento histórico. O homem surge sempre como um ser
inserido no mundo e como um ser em relação. O homem
relaciona-se com os outros no mundo. O mundo não é apenas
um lugar, um dado fechado para o ser humano, mas é ai que
acontece a relação, a manifestação da intersubjetividade, a
história dos homens.
O homem está inserido no mundo e ao experienciar esse mundo torna-se
a realidade envolvente da existência do homem. A vida do homem é essencialmente
a ação do homem sobre o mundo. Por isso, o mundo não pode ser concebido sem a
presença do homem e nem o homem pode ser compreendido independentemente
do mundo. Dessa forma, é possível afirmar que o mundo da UTIP Cardíaca não
pode ser concebido sem a presença dos profissionais de saúde, crianças, familiares,
e que estes homens não podem ser compreendidos independentemente desse
mundo. O mundo, o ambiente, onde estão inseridos os homens é concebido, porém
os homens, os profissionais de saúde, são compreendidos a partir desse mundo.
Nesse sentido, o homem é ser de compreensão, é preciso compreendê-lo
inserido em um contexto (UTI), mas que este contexto tenha um sentido, um TU. A
palavra EU-TU fundamenta o mundo da relação, a palavra EU-ISSO fundamenta o
mundo como experiência. É com o outro e com o mundo que estabelecemos
relações, como salienta Sidekum (1979, p.26), “a relação com o mundo é de uma
dimensão como objeto apenas, enquanto a relação com o outro envolve uma
totalidade de ser, é uma relação de plenitude”.
Para AMIB (2004) numa inter-relação de pessoas pode haver
humanização se houver uma postura de respeito ao ser humano, de cordialidade e
constante diálogo. De acordo com Paterson e Zderad (1979), este diálogo é vivido
através de uma relação intersubjetiva.
Os profissionais de saúde ainda preocupam-se com a necessidade de
consideração pelo outro, fazer as ações de cuidar em equipe, relacionar-se
interpessoalmente pelo diálogo, o que é possível perceber através de diversos
depoimentos, eu faço a minha parte’, eu tenho falado para mudar, falei uma,
duas, três vezes, agora vou falar a quarta e quinta vez’. Esse chamado para a
mudança de atitudes, comportamento, formas de relacionamento, exige uma
resposta de todos os envolvidos.
Nessa perspectiva, Hycner (1995, p.22) explicita que “o termo dialógico
não se refere ao discurso como tal, mas ao fato de que a existência, em seu nível
mais fundamental é inerentemente relacional”. A ênfase excessiva no individual cria
uma separação não somente entre as pessoas e em nosso relacionamento com a
natureza, mas também dentro de nossa própria psique.
Hycner (1995), ao citar Buber, esclarece que o significado do inter-humano
não seencontrado em qualquer um dos dois parceiros, nem nos dois juntos, mas
somente no diálogo entre eles, no entre o que é vivido por ambos. O diálogo
genuíno somente pode emergir se duas pessoas estiverem disponíveis para ir além
da atitude EU-ISSO e valorizarem, aceitarem e apreciarem verdadeiramente a
alteridade da outra pessoa. Há diálogo genuíno, não importa se falado ou silencioso,
conforme afirma Buber, citado por Hycner (1995, p.68), “quando cada um dos
participantes realmente tem em mente o outro ou os outros, em seu ser presente e
único e se volta para eles com a intenção de estabelecer uma relação mútua e viva
entre ambos”. Continua dizendo, que há o diálogo técnico provocado exclusivamente
pela necessidade do entendimento objetivo.
O modo que cada indivíduo adota em seu mundo segundo Paterson e
Zderad (1979) depende de que aspecto deste lhe é mostrado e de como ele o
percebe. Assim, também a presença da família dentro da UTIP Cardíaca é vista por
alguns depoentes como um facilitador e coadjuvante para o restabelecimento da
saúde da criança e por outros profissionais é percebida como um dificultador.
Cuidar da criança envolve cuidar também de todo o contexto ao qual este ser
humano encontra-se inserido.
A presença da família em ambiente de UTIP Cardíaca é uma relação EU-
TU, portanto reciprocidade, autenticidade existencial, abertura total para o outro,
fidelidade, comunidade humana. Em gera,l é possível perceber as relações na
esfera superficial, portanto fixada no individualismo. Buber, citado por Sidekum
(1979), afirma que o homem possui um modo especial de ser, e que essa forma de
ser assume um duplo movimento, primeiro o distanciamento primitivo e o segundo,
entrar no relacionamento. Assim, é possível compreender porque um
distanciamento inicial com a família no ambiente complexo hospitalar, para então
haver a proximidade, acontecer a intersubjetividade. O intersubjetivo é uma esfera
em que o sujeito se defronta efetivamente com o outro, e nesse confronto, que não é
mera experiência psicológica, uma realidade em que os dois sujeitos convivem. A
família começa a ser considerada pelo que é e não mais como objeto. O EU é uma
pessoa, o TU é uma pessoa. As pessoas estão envolvidas pela comum realidade,
pela realidade de ser-com, o que fundamenta sua existência.
Em ambiente de UTIP Cardíaca muitas vezes predomina o diálogo técnico
em detrimento do diálogo genuíno.. Sentem-se amparados, protegidos pelo aparelho
que cuida, pelo bip que toca em qualquer anormalidade. Porém, essa segurança tem
por trás um ser humano, que colocou a máquina na criança, que ligou e regulou de
acordo com as necessidades complexas e que os resultados estão sob o comando
desse profissional. É o ser humano que cuida por meio do uso da tecnologia, a qual
está a serviço do homem, para fins humanos.
Consideram a como excelente a precisão técnica no ambiente tecnológico
hospitalar deste estudo, pois são pessoas preparadas, treinadas, capacitadas para o
cuidado especializado e complexo. Porém, ainda persiste uma lacuna na integração
efetiva entre os profissionais, em uma relação genuinamente recíproca de cuidado,
de troca, de proximidade relacional. Essa percepção denota preocupação, que
pode ser traduzida como cuidado, ou seja, enfatizam que o basta ser
tecnicamente capaz é preciso algo mais, é preciso a arte aliada à ciência.
Pelos discursos dos profissionais entrevistados, é possível perceber que
eles se ressentem da falta de materiais, de equipamentos, de soluções, de
resoluções técnicas. Porém, o ser humano que está faltando no ambiente é muito
mais que apenas uma mão de obra especializada, pois é ser de relações, se
comunica, sente, reage, se emociona, se frustra, se anima, se motiva, regozija o
sucesso.
Os depoimentos indicam que a equipe percebe claramente a necessidade
de maior número de profissionais atuando no cuidado direto à criança, porém
elevam o sentimento de reconhecimento pelo trabalho desenvolvido pelos atores
que compõem o cenário da UTIP Cardíaca. Falam, principalmente da equipe de
enfermagem como imprescindível, que consegue conhecer a criança como um todo,
que está muito próxima, mantém relações afetivas, diálogo com a criança e família.
O cuidado à criança em UTIP Cardíaca revela a ação de cuidar alicerçada
na arte, a qual, segundo Mendes (2001) é traduzida pela sensibilidade das pessoas
envolvidas que ultrapassa e vai muito além dos requisitos exigidos pura e
simplesmente pela razão. Esta sensibilidade pode ser expressa como a
intersubjetividade que permeia as ações de cuidar e pode ser facilmente
demonstrada quando o profissional que cuida está presente genuinamente ao
programar uma bomba, preparar uma medicação ou introduzir um catéter, pois a
presença genuína requer a percepção do outro como presença humana e não
apenas como um objeto, uma função ou um caso aonde se deposita uma ação.
Esta é a verdadeira relação dialógica em um ambiente de alta
complexidade. Para Paterson e Zderad (1979) a relação dialógica reflete o conjunto
de arte e ciência, uma vez que assim, compreende os mundos subjetivos e objetivos
do cuidado.
Os profissionais apresentam tentativas para possíveis mudanças na suas
práxis. Ao demonstrar preocupação com a capacitação técnico-científica, a equipe
demonstra entender que não basta apenas falar sobre relações interpessoais neste
ambiente, mas é preciso como ação primeira desenvolver com a equipe uma
filosofia de trabalho que priorize o aprimoramento humano nas relações.
Educar envolve relações humanas e a enfermagem humanística
substancia estas relações educativas neste ambiente tecnológico com valores
humanos e objetiva primariamente ajudar o ser humano a estar melhor e a superar-
se no meio que com-vive. Assim, a equipe poderá desenvolver um modelo de cuidar
que valorize a sustentação das potencialidades humanas, que responderá
adequadamente às necessidades da tríade equipe/ criança/ família e, segundo
Paterson e Zderad (1979), humanizará suas ações. Pois, deste modo, experiencia
uma situação transacional e intersubjetiva ao cuidar, cujo objetivo é fomentar a
participação máxima conjunta para a recuperação da criança.
Ainda a equipe revela nos discursos inquietação com o modelo utilizado
para capacitação técnica-científica dos profissionais que o admitidos para atuar
neste ambiente de alta complexidade.
Paterson e Zderad (1979) afirmam que a relação de chamado e resposta é
vivida nas transações enfermeira-paciente, desde as ações mais simples e básicas
como de higiene e alimentação até a ação mais complexa de reanimação. Neste
ambiente de alta complexidade não é suficiente treinar o profissional para manipular
materiais e interpretar os equipamentos. Neste mundo especial, o profissional
precisa entender e direcionar o seu fazer a uma experiência inter-humana, pois,
assim o significado do “ser” é sentido no ato de “fazer”.
A existência espiritual não pode ser reprimida, precisa emergir de
alguma forma. Hycner (1995) salienta que nós nos tornamos tão enamorados de
nossas atividades racionais e científicas que esquecemos do milagre mais primordial
de todos: nós existimos. E diz ainda, que uma grande necessidade na sociedade
contemporânea de redescobrir o sagrado, que não se refere a nenhuma crença
religiosa específica, mas a uma abertura para o que está além de nós.
Santos (2003, p.6) refere que:
O homem moderno ciente da certeza da razão, do seu poder
demiúrgico, da força dos instrumentos lógico-matemáticos que
construiu para dominar a natureza, não vendo nenhum
sustentáculo que pudesse comprovar a existência divina,
decretou a morte de Deus e revestiu-se de poderes de um
super-homem.
“A dimensão espiritual pode ser considerada transpessoal, refere-se
essencialmente à crença, de que nossa existência está fundamentada e permeada
pelo espiritual” (HYCNER, 1995, p.81). Para transcender é preciso se desenvolver
como pessoa. A equipe de saúde busca forças em Deus, em um ser superior. A
força que emana deste ser superior fortalece os membros da equipe para superarem
suas limitações e as dificuldades encontradas ao cuidarem em ambiente de UTIP
Cardíaca. Para Santos (2003) essas colocações dizem respeito ao homem como um
todo e não àquele interessado em religião ou teologia, pois na sua essência, faça
o que fizer, onde estiver, o homem ao se deparar com o obscuro, com o mistério
insondável que reveste os fenômenos básicos de sua existência como o nascimento,
a morte, o sofrimento, a angústia, buscará de uma ou outra maneira uma potência
para transcender sua condição.
Buber (1977) expõe que a união que sentimos com o outro no momento
EU-TU também nos une com o TU Eterno e que não é necessário que saibamos
quem é ou como é o TU Eterno. Nem tampouco saber os diversos nomes que
recebe em todas as culturas. Este entendimento emerge neste discurso: Uma
exigência para a humanização é invocar a Deus sempre, achar que aquilo a mais
que é necessário na força interior de cada um, dentro de um Deus qualquer,
vamos dizer assim, não precisa ser o Deus ou um Deus.
No ambiente de UTI, pelas suas características próprias, é mais fácil dar a
ênfase no EU-ISSO, na dimensão objetiva da existência, pois “coisificamos” a s
mesmos e as outras pessoas. A relação EU-ISSO é segura, porque exige um
mínimo de riscos emocionais. Porém, emocionalmente, pouco compensadora.
Para Buber (1977), na esfera do humano, o TU pode tornar-se um ISSO,
porém o TU Eterno não pode como alteridade absoluta, o eternamente outro da
relação, tornar-se um ISSO. Santos (2003), ao discutir sobre o diálogo de Tillich e
Buber, diz que Deus não está no céu ou no interior do homem e sim na inter-relação,
no encontro, no diálogo e que, sem esta relação com o sagrado nada seria possível,
nenhum conhecimento de si ou do outro, nenhuma perscrutação do mundo. O
mesmo autor explica que na perspectiva buberiana, no diálogo com outro homem
uma comunhão entre Deus, homem e mundo.
Deste modo, a perspectiva espiritual assegura a intensidade humana do
ser que cuida e do ser que é cuidado em ambiente tecnológico, pois, para Santos
(2003), é esse fundamento que coerência à existência, independente dos
percalços que a realidade nos coloca e do que os sistemas filosófico-científicos
afirmam.
A equipe de saúde da UTIP Cardíaca ao cuidar da criança estabelece
relações interpessoais nas suas ações, as quais, conduzem a equipe a refletir e
propor alternativas que possibilitem a transação intersubjetiva no momento de
cuidar.
8- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nos meus primeiros momentos no Mestrado, fazia parte da equipe de
saúde da UTIP Cardíaca e, desde o início foi um enorme desafio a escolha do tema
do estudo. Depois de algum tempo, entendi que foi a minha própria experiência e
vivência do cuidado à tríade equipe/ criança/ família que conduziu a minha escolha.
As exigências de leituras para a disciplina concepções teórico-filosóficas e
metodológicas para a prática profissional em enfermagem permitiram as primeiras
leituras sobre a enfermagem humanística de Paterson e Zderad. Estas me levaram a
entender que, na prática, preocupava-me e valorizava a subjetividade do cuidar
naquele ambiente e que havia experienciado como enfermeira ao cuidar da
criança, da família e da equipe muitos dos conceitos apresentados pelas teoristas
como o diálogo vivido, a presença genuína, a transação intersubjetiva e
principalmente a essência humanística da teoria reconhecendo cada ser cuidado
como singular.
Conseqüentemente minha inquietação de compreender como se
estabelecem as relações interpessoais nas ações de cuidar na UTIP Cardíaca surgiu
fundamentada na fenomenologia, pois, o pesquisador fenomenológico busca
retomar a experiência vivida com os sujeitos nos movimentos de fusão de
identificação, que também vivencia a intencionalidade dos objetos de sua
pesquisa.
O cuidado em um ambiente tecnológico como UTIP Cardíaca precisa ser
permeado de valores e sentimentos humanos que visem o bem-estar e o estar
melhor da tríade equipe/ criança/ família colocado em cena peculiaridades do
universo afetivo, cultural e social dos sujeitos envolvidos através da presença
genuína e autêntica estabelecida na atitude humanística ao cuidar.
A intencionalidade do cuidar é percebida pelas expressões, em que
estabelecem a espacialidade e a temporalidade, eu acho que falta [...] ou, ainda tem
muito para melhorar [...] esclarecendo que o tempo, ter o tempo, pode ser uma
forma de conseguir alcançar aquilo que imagina ser o necessário ao cuidado. A
espacialidade é percebida pelo dizer existem lugares piores do que aqui, mas não é
o melhor [...] em que reconhecem seu tempo e seu espaço para colocar a
humanização em prática, conduzem à reflexão sobre o ser, explicitando que esse
atributo da humanização ou ser humano é da pessoa e colocar em prática, depende
de cada um. Espaço e tempo tomam parte da ação. E a ação por sua vez, cria a
realidade, porque pode ser atualizada quando ocorrer uma ação que desencadeie o
acontecimento.
Neste momento do estudo, percebo que atingi o objetivo ao compreender
como se estabelecem as relações interpessoais nas ações de cuidar em ambiente
tecnológico hospitalar.
Acontecem com o entendimento pela equipe de saúde da atitude
humanística como mobilizadora das relações interpessoais neste ambiente. As
relações interpessoais envolvem a equipe de saúde na presença de sentimentos
humanos nas ações de cuidar, os quais, têm repercussões nas ações de cuidado à
criança; na comunicação como facilitadora para o conhecimento pessoal e
interpessoal e, no poder que institui-se entre os membros da equipe ao
relacionarem-se.
Também compreendi qual o sentido que a equipe de saúde apresenta
para a presença da família nas relações neste ambiente. Os profissionais com-vivem
com a família na UTI-P Cardíaca e, o preparo de ambos para relacionarem-se
refletem na recuperação da criança.
A dinâmica do cuidar neste ambiente está fortemente baseada nas
necessidades de cuidados complexos da criança que requerem precisão técnica;
está na compreensão da hostilidade do ambiente por suas próprias características e
o impacto nas relações interpessoais nas ações de cuidar e, na vontade de
melhorar. Os profissionais percebem que para as relações sejam humanas neste
local é imprescindível aliar a capacitação e aperfeiçoamento técnico-científico à
conscientização e aprimoramento da perspectiva humana e espiritual ao cuidar.
A compreensão deste fenômeno à luz da Teoria Humanística de Paterson
e Zderad revela-se como ele se mostra, se manifesta e se apresenta, pois as
relações interpessoais acontecem de forma intersubjetiva entre equipe/ criança/
família neste ambiente de cuidados complexos.
Assim acredito que a contribuição deste estudo para a enfermagem é a
demonstração que o cuidado quando permeado pelos conceitos da enfermagem
humanística de Paterson e Zderad, como relação dialógica, presença, encontro
genuíno, transação intersubjetiva e demais,respeita as relações interpessoais
estabelecidas no encontro dos profissionais com a criança e família; auxiliam no
equilíbrio do cuidado, aliando a técnica e a dimensão humana em ambiente
tecnológico hospitalar e,traduz-se em um cuidado solidário que ajuda, respeita,
vincula, acolhe e enobrece as qualidades humanas.
O processo de cuidar em um ambiente de alta complexidade comporta
diversos grupos humanos que apresentam variados perfis, conhecimentos, valores,
percepções e sentimentos que juntos identificam a equipe de saúde daquele local.
Com a equipe de saúde da UTIP Cardíaca vivenciei momentos permeados pelos
conceitos humanísticos da enfermagem fenomenológica e os discursos apreendidos
mostraram que os seres humanos que ali atuam preocupam-se com o com-viver
neste ambiente repleto de tecnologia e como esta convivência ecoa nas formas de
cuidar da criança naquele ambiente. Muitos dos profissionais sentem e vivem a
vontade de transformar a realidade e estes são o diferencial para que as
oportunidades se abram e a evolução aconteça na busca por melhores relações
interpessoais nas ações de cuidar. Despertar esta consciência na equipe de saúde
era um desejo meu, com a certeza de que a partir desta pesquisa, apesar das
dificuldades do cotidiano, o caminho começa a ser trilhado.
Este estudo não esgota o tema abordado, porque as maneiras de ver e
sentir um fenômeno são dinâmicas e relacionadas ao temporal. É possível, através
de novos estudos e pesquisas, progredir com o objetivo de refinar outras
compreensões de como a equipe de saúde estabelece suas relações interpessoais
ao cuidar em distintos ambientes tecnológicos hospitalares.
Recomenda-se que os resultados obtidos neste estudo, sejam
considerados na formação de novos profissionais que escolherem os ambientes
tecnológicos hospitalares para atuação e também no aprimoramento dos
profissionais atuantes. Este estudo é uma sugestão que serve como direcionador
aos profissionais do ambiente tecnológico do estudo e aos demais profissionais
destes ambientes que desejem aprofundar as relações interpessoais valorizando a
intersubjetividade ao cuidar.
A conclusão deste estudo foi uma experiência singular e valiosa em minha
vida, a qual conduziu à transformação do meu pensar e ao crescimento enquanto
enfermeira e ser humano. Sinto-me agora ainda mais estimulada para continuar
trilhando caminhos para que minha prática de cuidar seja cada vez mais solidificada
nos princípios humanísticos.
9. REFERÊNCIAS
AMIB. Humanização em Cuidados Intensivos. Associação de Medicina Intensiva
Brasileira. Rio de Janeiro: Revinter, 2004.
ANGERAMI-CAMON, V.A. Temas existenciais em psicoterapia. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning, 2003.
ANSELMI, M.L.; DUARTE, G.G.; ANGERAMI, E.L.S. Sobrevivência no emprego dos
trabalhadores de enfermagem em uma instituição hospitalar pública
.
Rev. Latino-
Am. Enfermagem Ribeirão Preto, v.9 n.4, p.13-18, 2001.
ARAÚJO, L.Z.S. de. Aspectos éticos da pesquisa científica. Pesqui. Odontol.
Bras. São Paulo, v.17, n.1, p.57-63, Mai. , 2003.
AYRES, J.R.C.M. Hermenêutica e humanização das práticas de saúde. Ciência &
Saúde Coletiva. São Paulo, v.10, n.3, p.549-560, 2005.
AYRES, J.R.C.M. O cuidado, os modos de ser (do) humano e as práticas de saúde.
Saúde e Sociedade. São Paulo, v.13, n.3, p.16-29, Set-Dez., 2004.
AYRES, J.R.C.M. Cuidado: tecnologia ou sabedoria prática? Interface Comunic,
Saúde, Educ. São Paulo, v.6, p.117-126, Fev., 2000.
BARBOSA, E.C.V.; RODRIGUES, B.M.R.D. Humanização nas relações com a
família: um desafio para a enfermagem em UTI Pediátrica. Acta Scientiarum.
Health Sciences. Maringá, v.26, n.1, p.205-212, 2004.
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1991.
BASTOS, M.A.R. O saber e a tecnologia: mitos de um centro de tratamento
intensivo. Rev. Latino-am Enfermagem. RJ 2002 março-abril; 10 (2): 131-6.
BETTINELLI, L. A. Cuidado solidário. Passo Fundo: Bertier, 1998.
BETTINELLI, L. A. A solidariedade no cuidado: dimensão e sentido da vida.
Florianópolis: UFSC/PEN, 2002. (Teses em Enfermagem, 41).
BETTINELLI, L.A.; WASKIEVICZ, J.; ERDMANN, A.L. Humanização do cuidado no
ambiente hospitalar. In: PESSINI, L.; BERTACHINI, L. (Org.) Humanização e
cuidados paliativos. São Paulo: Edições Loyola, 2004.
BICUDO, M.A.V. Sobre a fenomenologia. In: BICUDO, M.A.V.; ESPOSITO, V.H.C.
Pesquisa qualitativa em educação. Piracicaba: Unimep, 1994.
BICUDO, M.A.V. Fenomenologia: confrontos e avanços. São Paulo: Cortez, 2000.
BOEMER, M.R.; CORRÊA, A.K. Repensando a relação do enfermeiro com o doente:
o resgate da singularidade humana. In: GONZALES, R.F.; BRANCO, R. A relação
com o paciente: teoria, ensino e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.
BOGDAN, R., BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação: uma introdução
à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994.
BOFF, L. Saber cuidar: ética do humano, compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes,
1999.
BOLELA, F.; JERICÓ, M. de C. Unidades de Terapia Intensiva: considerações da
literatura acerca das dificuldades e estratégias para sua humanização. Es. Anna
Nery R. Enferm. Rio de Janeiro 2006 ago. 10 (2): 301-8.
BRASIL, Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Conselho Nacional de Saúde
(BR). Normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos.
Resolução n.196/96 – CNS. Brasília (DF): Ministério de Saúde; 1996.
BUBER, Martin. Eu e tu. São Paulo: Moraes, 1974.
CASTANHA, M.L. A (in) visibilidade da prática de cuidar do ser enfermeiro sob
o olhar da equipe de saúde. 2004. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) -
Universidade Federal do Paraná.
CORRÊA, A.K. Fenomenologia: uma alternativa para pesquisa em enfermagem.
Rev. Latino-Am. Enfermagem, Ribeirão Preto, v.5 n.1 jan. 1997.
COSTA, V.E.S.M. A fenomenologia como possibilidade de entendimento da relação
médico-paciente. In: GONZALES, R.F.; BRANCO, R. A relação com o paciente:
teoria, ensino e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.
COSTENARO, R.G.S.Ambiente terapêutico de cuidado ao recém-nascido
internado em UTI Neonatal. Florianópolis: Unifra,2001.
COSTENARO, R.G.S.; LACERDA, M.R. Quem cuida de quem cuida? Quem cuida
do cuidador? Santa Maria: Unifra, 2001.
CROSSETTI, M. da G O; ARRUDA, E N; SANTIN, S. Processo de cuidar: uma
aproximação à questão existencial na enfermagem. Florianópolis, 1997. 164f.
Tese (Doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina.
DAMIÃO, E.B.C.; ROSSATO-ABÉDE, L.M. Interação com a família da criança
cronicamente doente. Manual de Enfermagem. Disponível em www.ids-
saude.org.br/enfermagem. Acesso em 20 de dezembro de 2006.
DETONI, A.R.; PAULO, R.M. A organização dos dados da pesquisa em cena. In:
BICUDO, M.A.V. Fenomenologia: confrontos e avanços. São Paulo: Cortez, 2000.
ERDMANN, A.L. Sistema de cuidados em enfermagem. Pelotas:
Universitária/UFPel, 1996.
ERDMANN, A.L. Os limites nas relações/interações/associações do cuidado: é uma
determinação possível? Texto Contexto Enferm., Florianópolis, v.6, n.3, p.209-212,
Ser-Dez, 1997.
FERNANDES, J.D. et al. Competência interpessoal nas práticas em saúde: o
individual e o coletivo organizacional. Texto Contexto Enferm, v.12, n.2, p.210-5,
Abr. - Jun., 2003.
FERREIRA, M.A. As correntes teóricas e práticas das dimensões do cuidar na
infância: abordagem introdutória ao tema. Esc. Anna Nery R. Enferm., Rio de
Janeiro, v.6, n.Suplemento 1, p.75-78, Dez., 2002.
FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
FORTE, L.T.; SATO, C.M. Programa família participante do Hospital Pequeno
Príncipe: a humanização hospitalar como resgate da dignidade, exercício da
cidadania e transformação da gestão hospitalar. Curitiba: Associação Hospitalar de
Proteção à Infância Dr. Raul Carneiro/Hospital Pequeno Príncipe, 2006.
GRAÇAS, E.M. Pesquisa qualitativa e a perspectiva fenomenológica: fundamentos
que norteiam sua trajetória. Rev. Min. Enf. v.4, n.1/2, p.28-33, 2000.
GAIVA, M. A.M. O cuidar em unidades de cuidados intensivos neonatais: em
busca de um cuidado ético e humanizado.Cogitare Enfermagem,(UFPR), Curitiba,
2006, jan/abr;1191):61-66
GRAÇAS, E.M. Pesquisa qualitativa e a perspectiva fenomenológica: fundamentos
que norteiam sua trajetória. Rev. Min. Enf. v.4, n.1/2, p.28-33, 2000.
GIORGI, A. Phenomenological and psychological research. Pittsburg, USA:
Duquesne: 1985.
GODIM, J.R. Ética aplicada à pesquisa em Saúde. 1997-2005. Disponível em
http://www.ufrgs.br/bioetica/biopesrt.htm. Último acesso em 26/11/2006.
GOMES, WB. As aplicações sociais da pesquisa qualitativa. Psicologia: Reflexão e
Crítica, v.2, n.1/2, p3-14, 1987.
GONZAGA MLC, ARRUDA, EN. Fontes e significados de cuidar e não cuidar em
hospital pediátrico. Rev. Latino-am enfermagem 1998 dezembro; 6(5): 17-26.
GONZALES, R.F.; BRANCO, Rua A contribuição de Balint à relação entre o clínico
geral e seu paciente. In: GONZALES, R.F.; BRANCO, R. A relação com o
paciente: teoria, ensino e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2003.[
GUIMARÃES, M.B.L. Intuição, pensamento e ação na clínica. Interface Comunic,
Saúde, Educ., v.9, n.17, p.317-32, mar/ago., 2005.
HAYASHI, A.A.M. A prática do cuidado humano de enfermagem no CTI: da
reflexão à conscientização. 2000. Dissertação (Mestrado em Assistência de
Enfermagem) - Universidade Federal de Santa Catarina.
HEIDEGGER, M. Ser e tempo. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1989. Parte I.
HYCNER, R. De pessoa a pessoa: psicoterapia dialógica. São Paulo: Summus,
1995.
JOSGRILBERG, R. As analíticas fenomenológicas e o diálogo com as ciências. In:
CASTRO, D.S.P. et al. (Org). Existência e saúde. São Bernardo do Campo:
UMESP, 2002.
KESTENBERG, C.C.F.; SILVA, A.V. O cuidar em enfermagem: uma relação
terapêutica. In: SILVA, L.D.; PEREIRA, S.R.M.; MESQUITA, A.M.F. Procedimentos
de enfermagem: semiotécnica para o cuidado. Rio de Janeiro: Medsi, 2004.
KOIVISTO, K. JANHONEN, S, VÄISÄNEN, L.. Applying a phenomenological
method of analysis derived from Giorgi to a psychiatric nursing study.
Methodological Issues in Nursing Research. Journal of Advanced Nursing. 39 (3),
258-265,2002.
LACERDA, M. R.. As relações de poder e o cuidado terapêutico. Cogitare
Enfermagem (UFPR), Curitiba, v. 4, n. 1, p. 43-46, 1999.
LEITE, M. A.; VILA, V. da S. C.
Dificuldades vivenciadas pela equipe
multiprofissional na unidade de terapia intensiva. Rev. Latino-Am. Enfermagem.,
Ribeirão Preto, v.13, n.2, p.145-150, Mar-Abr, 2005.
LUCENA, A. de F. Significado do cuidar para as enfermeiras de uma unidade de
terapia intensiva. 2000. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
MANDÚ, E. N. T. Inter-subjectivity on the qualification of health care. Rev. Latino-
Am. Enfermagem., Ribeirão Preto, v.12, n.4, p.665-75, 2004.
MAYEROFF, M. On caring. New York: Harper Perennial, 1971.
MARTINS, J. BICUDO, M.A.V. A pesquisa qualitativa em psicologia;
fundamentos e recursos básicos. São Paulo: Moraes, 1989.
MARTINS, J. Um enfoque fenomenológico do currículo: educação como poíesis.
São Paulo: Cortez, 1992.
MENDES, I. A. C. Ação do enfermeiro frente às novas demandas do homem. Rev.
latino-am enfermagem, Ribeirão Preto, v.9, n.4, p.1-6, Jul., 2001.
MERHY, E.E. Um ensaio sobre o médico e suas valises tecnológicas. Interface –
Comunic., Saúde, Educ. São Paulo, v.6, p.109-116, Fev., 2000.
MINAYO, M. C. de S. Ciência, técnica e arte: o desafio da pesquisa social. In:
MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa social. Rio de Janeiro: Vozes,
2000. Cap. 1, p. 9-29.
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA e CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA
CRIANÇA: Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente Hospitalizados:
Resolução n.41,Outubro de 1995.
MOSCOVICI, F. Competência interpessoal. In: Desenvolvimento interpessoal:
treinamento em grupo. 13. ed. São Paulo: José Olímpio, 2003.
MONTEIRO, C. F. de S., ROCHA, S. S. da, P., Araújo, E. P.. Fenomenologia
heideggeriana e sua possibilidade na construção de estudos de Enfermagem.
Esc. Anna Nery, Ago. 2006, vol.10, nº.2, p.297-301.
MOREIRA, D.A. O método fenomenológico na pesquisa. São Paulo: Pioneira,
2002.
NASCIMENTO, E.R.P. Acolhimento no espaço das relações na UTI. 2003. Tese
(Doutorado em Enfermagem) - Universidade Federal de Santa Catarina.
NEMAN, F. Experienciando a hospitalização com a família: cuidando com
conforto.São Paulo:Fiúza,2000.
NEVES, E. P.; ZAGONEL, I.P.S. Pesquisa-cuidado: uma abordagem metodológica
que integra pesquisa, teoria e prática em enfermagem. In: I CIBRAPEQ, I
Conferência Internacional do Brasil de Pesquisa Qualitativa. Taubaté-SP: Centro de
Convenções Amácio Mazzaropi, 24 a 27 de março de 2004. Impresso em CD
ROOM, p.813-820. Produção do Editorial e Multimídia Ed.Tec. Art. Realização do
Núcleo de Pesquisa da Família Departamento de Psicologia da Universidade de
Taubaté.
NIGTHINGALE, F. Notas sobre enfermagem. São Paulo: Cortez, 1989.
OLINISKI, S.R. Ações e interações dos profissionais de saúde com o ambiente
de trabalho e o cuidado de si. Curitiba, 2005. Dissertação (Mestrado em
Enfermagem) Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade
Federal do Paraná.
OLIVEIRA, M. E. Vivenciando uma experiência amorosa de cuidado com mães e
seus recém-nascidos pré-termo. Revista Eletrônica de Enfermagem (on-line),
Goiânia, v.3, n.2, jul - dez. 2001. Disponível: http://www.fen.ufg.br/revista
ORLANDO, J.M.C. UTI: Muito além da técnica... a humanização e a arte do
intensivismo. São Paulo: Atheneu, 2001.
PATERSON, J.G., ZDERAD L. Humanistic nursing. 2ªed. New York: National
League for Nursing, 1979.
PATERSON, Josephine G., ZDERAD, Loretta. Humanistic Nursing. 2.ed. New
York: National League for Nursing, 1988.
PAULA, CC; et al. O cuidado como encontro vivido e dialogado na teoria de
enfermagem humanística de Paterson e Zderad. Acta Paul Enf, São Paulo, v. 17, n,
4, p. 425-31, 2004.2004.
PEGORARO O.A. Ética e ciência: fundamentos filosóficos da Bioética. In: Palácios
M, Martins A, Pegoraro AO org. Ética, ciência e saúde: desafios da Bioética. 1ª. ed.,
Petrópolis (RJ): [s.n.]; 2002. p. 46-61
.
PERSEGONA, K.; ZAGONEL, I.P.S. O cuidado do enfermeiro à criança com dor
pós-operatória: construção de um marco conceitual à luz de Paterson e Zderad.
Cogitare Enfermagem, América do Sul, 11 20 12 2006.
PESSINI, L.; BERTACHINI, L. (Org.) Humanização e cuidados paliativos. São
Paulo: Edições Loyola, 2004.
PESSINI, L. Humanização da dor e do sofrimento humanos na área da saúde. In:
PESSINI, L.; BERTACHINI, L. (Org.) Humanização e cuidados paliativos. São
Paulo: Edições Loyola, 2004.
PINTO, J.P.; RIBEIRO, C.A.; SILVA, C.V. Família da criança hospitalizada e suas
demandas de cuidado. Acta Paul. Enf., São Paulo, v.17, n.4, p.450-451, Out-Dez,
2004.
PIRES, D. E. P.; NOGUEIRA, V. M. R. Direito à saúde: um convite à reflexão;
Cadernos de Saúde Pública; 2004; Fiocruz; 20; 3;; 753; 760;
REMEN, R. N. O paciente como ser humano. São Paulo: Summus, 1993.
ROLIM, K.M.C., PAGLIUCA, L.M.F., CARDOSO, M.V.L.M.L. Análise da teoria
humanística e a relação interpessoal do enfermeiro no cuidado ao recém-nascido.
Rev. Latino-am Enfermagem. v.13, n.3, p.432-440, 2005.
ROY, S.C.; ANDREWS, H.A. The Roy adaptation model: the definitive statement.
Norwalk, Connecticut: Appleton e Lange, 1991. 472p
SCANTIMBURGO, J. A extensão humana. Introdução á filosofia da técnica. São
Paulo; Companhia Editora Nacional-USP, 1970.
SANTOS, G.T. Paul Tillich e Martin Buber: um diálogo. Revista Eletrônica
Correlatio, n.3,p.1-7, Mai., 2003.
Disponível em
http://www.metodista.br/correlatio/num_03/a_santos.pdf
SIDEKUM, A. A intersubjetividade em Martin Buber. Porto Alegre, Escola Superior
de Teologia São Lourenço de Brindes; Caxias do Sul, Universidade de Caxias do
Sul, 1979.
SILVA, M.J.P. Comunicação tem remédio: a comunicação nas relações
interpessoais em saúde. 5.ed. São Paulo: Editora Gente, 1996.
Silva LF, Damasceno MMC, (2006, May 15). MODOS DE DIZER E FAZER O
CUIDADO DE ENFERMAGEM EM TERAPIA INTENSIVA CARDIOLÓGICA–
REFLEXÃO PARA A PRÁTICA. Revista Texto & Contexto Enfermagem [On-
line]14(2).Disponível:http://www.textoecontexto.ufsc.br/viewarticle.php?id=88.
SOUZA, A.I.J.; RIBEIRO, E.M.; ECKERT, E.R. Dialogando com a equipe de
enfermagem sobre necessidades educativas dos acompanhantes de crianças
internadas: construindo caminhos para o cuidado à família. Texto Contexto Enferm,
Florianópolis, v.12, n.3, p.280-288, Jul-Set., 2003.
SOUZA, J.R. A dimensão espiritual no cuidado de enfermagem: vivência do
estudante de graduação. 2006. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) -
Universidade Federal do Paraná.
STEFANELLI, M.C.; CARVALHO, E. C. de. A comunicação nos diferentes
contextos da enfermagem. Barueri, SP: Manole, 2005.
TERRA, M.G. et al. Na trilha da fenomenologia: um caminho para a pesquisa em
enfermagem. Texto Contexto Enferm., Florianópolis, v.15, n.4, p.672-8, Out-Dez,
2006.
TURATO, E.R. Tratado da metodologia da pesquisa clínico-qualitativa.
Petrópolis RJ: Editora Vozes, 2003.
VAITSMAN, J.; ANDRADE, G.R.B. Satisfação e responsividade: formas de medir a
qualidade e a humanização da assistência á saúde. Ciência e Saúde Coletiva, Rio
de Janeiro, v.10, n.3, p.599-613, 2005.
VERNIER, E.T.N.; DALL’AGNOL, C.M. (Re)ações de uma equipe de enfermagem
mediante a permanência conjunta em pediatria. Acta Paul. Enf., São Paulo, v.7, n.2,
p.172-180, Abr-Jun, 2004.
VILA, V.S.C., ROSSI, L. A.. O significado cultural do cuidado humanizado em
unidade de terapia intensiva: “muito falado e pouco vivido’’”. Rev. Latino-am
Enfermagem. Ribeirão Preto, v.10, n.2, p.137-44, março-abril; 2002.
ZAGONEL, I.P.S. O ser adolescente gestante em transição sob a ótica da
enfermagem. Pelotas: Editora Universitária/ UFPel; Florianópolis:UFSC,1999.191p
(Série Teses de Enfermagem n. 20).
ZIMERMAN, D. E. et. al Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre, RS: Artes,
1997.
WALDOW, V.R. Cuidado Humano: o resgate necessário. Porto Alegre: Ed. Sagra
Luzatto. 1999.
WOLFF, L.D.G. Compreendendo a experiência em ser cuidadora de
enfermagem em uma unidade de terapia intensiva pediátrica. 1996. Dissertação
(Mestrado em Enfermagem) – Universidade Federal de Santa Catarina, 1996.
ZIMERMAN, D. E. et. al Como trabalhamos com grupos. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1997.
APÊNDICES
APÊNDICE I
ANEXO1-ENTREVISTA COMO OS MEMBROS DA EQUIPE
I) Dados sócio-demográficos
Nome:
Idade:
Profissão:
Tempo de formado (a):
Tempo de atuação no setor:
II)Questões de Pesquisa
1-O que significa para você o cuidado no ambiente tecnológico hospitalar em que
atua?
2-Você considera que é possível incorporar no processo de cuidar a atitude
humanística? Quais as exigências para essa incorporação?
APÊNDICE II
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado(a) a participar de uma pesquisa sobre
“A significação do cuidado em ambiente tecnológico hospitalar”, coordenada
por mim Patricia Julimeire Cunha, telefone: 41-84181374. Para poder participar, é
necessário que você leia este documento com atenção. Por favor, peça aos
responsáveis pelo estudo para explicar qualquer palavra ou procedimento que você
não entenda claramente.
O propósito deste documento é dar a você as informações sobre a pesquisa e, se
assinado, dará a sua permissão para participar no estudo. O documento descreve o
objetivo, procedimentos, benefícios e eventuais riscos ou desconfortos caso queira
participar. Você deve participar do estudo se você quiser. Vopode se recusar a
participar ou se retirar deste estudo a qualquer momento.
O objetivo desse estudo é:
-. Compreender a significação de cuidado para os membros da equipe de saúde em
ambiente tecnológico hospitalar
A entrevista será individual, em local que assegure a sua privacidade e possa
expressar suas idéias livremente. Não haverá nenhum custo a você relacionado aos
procedimentos previstos no estudo. Sua participação é voluntária, portanto você não
será pago por sua participação neste estudo.
A equipe de investigadores irá coletar informações sobre você. Em todos esses
registros um código substituirá seu nome. Todos os dados coletados serão mantidos
de forma confidencial. Os dados coletados serão usados para os fins deste estudo.
Os dados também podem ser usados em publicações científicas sobre o assunto
pesquisado. Porém, sua identidade não será revelada em qualquer circunstância.
Eu li e discuti com a equipe de investigadores pelo presente estudo os detalhes
descritos neste documento. Entendo que eu sou livre para aceitar ou recusar, e que
eu posso interromper minha participação a qualquer momento sem dar uma razão.
Eu concordo em realizar a entrevista, que meu depoimento seja gravado e que os
dados coletados para o estudo sejam usados somente para o propósito acima
descrito.
Eu entendi a informação apresentada neste termo de consentimento. Eu tive a
oportunidade para fazer perguntas e todas as minhas perguntas foram respondidas.
NOME DO PARTICIPANTE
ASSINATURA
DATA
NOME DO INVESTIGADOR
(Pessoa que tomou o TCLE)
ASSINATURA
DATA
ANEXO
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo