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R-Formalmente eu nunca tive carteirinha, mas eu nas reuniões, meu pai foi do PC, foi preso, foi
sindicalista...
P-E o CPC...
R-E aí no CPC eu tava no teatro, tava fazendo música, eu tocava violão, eu compunha música
para as peças ,fiquei nisso aí, não estudava muito, não tinha necessidade de estudar muito, mas
eu comecei a fazer um curso pré-vestibular, eu ganhei uma bolsa, naquele tempo, cursinho pré-
vestibular era novidade absoluta, eu ganhei uma bolsa neste cursinho e tava indo muito bem, ia
passar direto no vestibular para arquitetura, não tava interessado em ser engenheiro, eu achava
que era melhor ser arquiteto. Mas o teatro me engoliu e o Boal me convidou para ir para o
Arena de São Paulo, meu pai não deixou, porque ele disse- você tem que completar o seu curso
aqui, se eu tivesse ido para o Arena de SP a minha vida realmente teria mudado, eu teria virado
um ator. E continuei nessa vidinha, fiz duas UNE volantes viajei o Brasil inteiro, comecei a
conhecer o pessoal de cinema que viajava com a gente. O Eduardo Coutinho, que morou na
minha casa, Leon,que eu já conhecia da Mais Valia, porque ele montou o filminho da Mais
Valia, depois mais tarde o Leon vai ser o meu melhor amigo, vai ser a pessoa com quem eu
tinha mais conversa de cinema ,trabalhei muito com ele. Eu ia lá, via aqueles filmes, achava
tudo muito interessante, mas a minha área era música e teatro. Até que um dia eu briguei com o
Oduvaldo, a gente teve uma briga séria e aí eu disse- eu não vou mais fazer teatro. Aí teve uma
coisa engraçada – um dia eu desci para tomar um chopp no Kabanas que era do lado da UNE, e
o Cacá tava lá e a gente começou a tomar chopp e no meio dessa cabeça meio tonta, ele falou –
olha eu vou começar a filmar amanhã (Escola de Samba, Alegria de Viver do 5X favela) e eu
não tenho continuísta... e eu não tinha a menor idéia do que ele estava falando, e eu disse: não,
isso é uma bobagem, eu sei tudo de continuidade..., Pode contar comigo, mas eu não tinha a
menor idéia, foi uma loucura de momento...Brincadeira...Então ele disse, tá legal, então amanhã
às 5:30 aqui, eu falei: ta legal e fui embora pra casa, dormi e não acordei e não tinha a menor
intenção de acordar e ele me telefonou às 5:20 e disse: o que é que houve? Não, Cacá, era
brincadeira. Aí ele falou: não. Agora eu tenho você, eu preciso de você e você vem. Aí eu saí
correndo, cheguei lá a tempo de pegar o caminhão, a gente foi para o Cabuçu, aquele morro
distente, para começar a filmar Escola de Samba, Alegria de Viver, aí aos trancos e barrancos
fazendo continuidade, aprendendo o que que era, anotando umas coisas, principalmente fiquei
encantado com o Ozen Sermet, não tanto pela pessoa,mas pela atividade dele, ele era o
fotógrafo, e na realidade era o grande técnico, não havia som direto, era o grande técnico que
tava na área. Quem realmente ditava as regras do cinema, eles eram todos cineclubistas, tinham
mais ou menos uma idéia de como enquadrar, mas era muito aprendizado e todo mundo era
muito cru, não tinha ninguém da geração anterior de cinema, o único era o Ozen Sermet, que era
um tcheco, sei lá o que ele era.Que talvez tivesse vindo para a Vera Cruz,ele tava aqui no Brasil
e fez muito filme aqui no Brasil,fez muita chanchada,muita coisa.E ele fez todos os filme do
CPC,menos o filme do Joaquim Pedro,que tinha sido feito antes-foi o primeiro a ser feito,não
pertencia ao 5x Favela,foi incorporado e foi feito pelo Mario Carneiro,que eram amigos.Então
fiquei encantado e prestei atenção naquele negócio todo, mas também acabou o filme e eu voltei
a fazer o meu teatro.Mas quando eu briguei mais tarde com o Oduvaldo Viana Filho,aí eu
pensei,sabe o que mais?Eu vou passar para o cinema.E fui e encontrei com o Leon e disse
assim: Leon,eu quero fazer cinema.A gente já tinha um grau de amizade,mas muito pequeno.Ah
é?Então primeira tarefa:você vai fazer o curso do sueco.
P-Ah, foi o Leon que te levou?