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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Aparecida Gonçalves Pereira
Considerações sobre abordagens de linguagem oral e escrita e variação nos
livros didáticos voltados para o ensino fundamental ciclo I
MESTRADO EM LINGÜISTICA
SÃO PAULO
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Aparecida Gonçalves Pereira
Considerações sobre abordagens de linguagem oral e escrita e variação nos
livros didáticos voltados para o ensino fundamental ciclo I
MESTRADO EM LINGÜISTICA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para obtenção do
título de MESTRE em Lingüística Aplicada
ao Estudo da Linguagem, pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, sob
Orientação da Profª Drª Maria Francisca Lier
De Vitto.
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SÃO PAULO
2008
Banca Examinadora
____________________________________
____________________________________
____________________________________
DEDICATÓRIA
Dedico esta dissertação primeiramente a Deus
que criou tantas maravilhas no universo e dentre
elas está a minha Mãe que sempre me incentivou
e sempre nos mostrou (a mim e a meus irmãos)
que é necessário lutar para conseguirmos o que
desejamos sem nos deixar esmorecer, que sempre
mostrou seu amor incondicional pelos filhos e
netos. A minha orientadora Profª Drª Francisca
que me estendeu a mão quando eu muito precisei.
A meu marido, minhas irmãs, meu irmão e
sobrinhos que muitos dias foram privados de
minha presença por eu estar estudando.
1
RESUMO
As questões que costuram o pano de fundo desta pesquisa podem ser
apontadas nos seguintes termos: Nas reflexões sobre a língua oral no livro
didático de Português há consideração da variação lingüística? Este livro
propõe o estudo das relações entre as modalidades oral e escrita da
linguagem? Há exploração dos conhecimentos ortográficos
? Ao buscarmos
diferentes fontes para pensarmos estas questões, descobrimos muitos pontos
que nos esclareceram no entrecruzamento das diversas disciplinas que
focalizam tais tópicos, principalmente, a lingüística e a didática da língua
materna. Pensamos que estas sejam as áreas especializadas a quem se recorre
para distinguir o ensino da língua oral e escrita e em que cada uma vem se
adaptando aos processos históricos de mudanças e reformulações da própria
escola brasileira, contribuindo, por vezes, para a construção e fundamentação
de políticas públicas que sustentam tais mudanças.
Considerando ser o livro didático o lócus em que nos são apresentados,
de forma mais explicita, os resultados dos diversos ajustes e movimentos
inscritos na escolarização dos diferentes saberes, este trabalho tem por
objetivo: verificar se, na alfabetização e nas propostas de ensino-
aprendizagem da linguagem oral estabelecidas pelos livros didáticos de
Língua Portuguesa (LDP), a relação entre língua oral e língua escrita, a
variação lingüística e a ortografização estão sendo tomados como objetos de
ensino e como estão sendo tratados. Foi possível constatar que ambas as
coleções sugerem, várias atividades que podem conduzir a ampliação de
habilidades e de competência lingüística e discursiva dos alunos. A seleção de
conteúdos é apropriada, também deixam os textos em evidencia e apresenta
aspectos lingüísticos introduzidos em pontos pertinentes e circunstanciados.
2
Abstract
The present study focuses and discusses some pedagogic directions
which could be detected in Brazilian textbooks designed for the teaching of
the mother tongue, i.e., the so-called oral and written language. The following
questions guided the investigation carried on in the research:
(1) Are issues concerning language variation considered in the textbooks
under analysis?
(2) Is close attention paid to the complex relations held between oral and
written language?
(3) Do the textbooks carefully explore the trends followed in the students’
construction of orthographic learning?
The theoretical sources implied either to pose or to examine the
textbooks selected here were those which traditionally deal with topics which
underly the above questions, that is: Sociolinguistics, Applied Linguistics and
Language Teaching Pedagogy. Those areas of knowledge may help
understand and the critical moment of the Brazilian Education System and
also virtually affect it in a fruitful way since they have strong theoretical and
methodological resources to contribute to the building up of more solid public
educational politics.
In this study, textbooks are seen as the privileged loci of pedagogic
frameworks and didactic tendencies. One can thus easily grasp why this study
has chosen textbooks devoted to the teaching of oral and written language as
its empirical data to investigate the pedagogic proposals suggested. It could be
concluded that in the two textbooks, here analyzed, not only their specific
content matters and the themes approached were highly appropriate but also
the activities devised were not blind to the problems raised in this research.
3
Introdução
_________________________
QUESTÕES E DIREÇÕES
As questões que costuram o pano de fundo desta pesquisa podem ser
enunciadas nos seguintes termos - no Livro Didático de Português (LDP):
(1) há índices de considerações relacionadas à variação lingüística?
(2) há sinais de uma reflexão sobre as relações entre as modalidades oral e
escrita da linguagem e, ainda,
(3) há exploração de aspectos ortográficos?
Ao levantar algumas fontes que pudessem viabilizar o desenvolvimento
dessas questões, puderam notar que certos problemas aproximam disciplinas
já que, independentemente de os objetivos últimos sejam distintos, elas giram
em torno de tópicos que permitem avançar certas reflexões - refiro-me, no
caso desta dissertação, a Lingüística Aplicada e a Didática da Língua Materna.
Podemos pensar que estas sejam áreas especializadas necessárias a quem se
interesse pelos caminhos e descaminhos do ensino do Português falado ou
escrito, pelos processos de mudança e de reformulação da Escola Brasileira
ou, em última instância, a quem almeje participar e contribuir para a
estruturação e fundamentação de políticas públicas que venham a sustentar
outras mudanças.
O Livro Didático de Português será tomado, aqui, como espaço em
que estão inscritas e são apresentadas, de forma mais explicita, diversas
tentativas de ajustes referentes à escolarização dos diferentes saberes. Por essa
razão, ele adquire, neste trabalho, o estatuto de objeto empírico ou solo factual
4
para a reflexão que se pretende encaminhar. Desde os anos de 1930, quando
da caracterização do livro didático como produção editorial específica para
ensino, o crescimento e diversificação da produção editorial, bem como a sua
consolidação como material de apoio primordial para o professor (já não tão
especializado, devido à demanda e pressão pela democratização do ensino,
que se instalou a partir dos anos 1970), pode-se dizer que o livro didático de
língua materna passou por modificações substanciais, decorrentes das
diferentes visadas ideológicas e teóricas que motivaram re-elaborações (de
conteúdos e formais), que afetaram, não menos, o ensino das práticas orais e
escritas. Partimos do pressuposto de que a função principal da escola, na
área da linguagem, é introduzir a criança no mundo da escrita, para torná-
la um sujeito com plenas possibilidades de se desenvolver pessoal e
profissionalmente, de se inserir na sociedade.
Segundo Batista (2003: 42), as novas perspectivas para o ensino-
aprendizagem da língua materna, a partir de meados da década de 1990, têm
favorecido mudanças necessárias à democratização do ensino. Ele esclarece
que tais mudanças não ocorreram abruptamente, mas que foram propiciadas,
de um lado, pelo avanço das reflexões sobre a aprendizagem da linguagem,
introduzidas nos currículos de formação de professores a partir da década de
1960 e, de outro lado, por pressões sociais que, não raro, impõem ao campo
das práticas, uma revisão de paradigmas.
As “exigências sociais” a que se refere o pesquisador encontram-se
representadas, principalmente, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira (LDB) e nas Diretrizes para o Ensino Fundamental (DEF),
estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE). Da mesma forma,
essas demandas são apreciadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN/1998), propostos pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC), e
5
funcionam como elemento catalisador de ações, com vistas à melhoria da
qualidade da Educação Brasileira.
Todos esses elementos situam-se como orientadores da melhoria da
qualidade do ensino nas escolas brasileiras e devem, portanto, ser notados
quando se busca promover mudanças em processos voltados para o trabalho
da escola. É o caso do PNLD e, por esta razão, explicitam-se aqui, para servir
de instrumento de análise, os elementos da LDB, das Diretrizes Curriculares
Nacionais e do PCN que fundamentam as propostas de mudança na avaliação
do livro didático.
A LDB promove, no contexto educacional brasileiro, a valorização da
experiência extra-escolar pela escola e também cria instrumentos para que a
escola possa ter maior valor para o cotidiano do aluno, favorecendo a
atribuição de importância à dimensão social dos conteúdos do processo
educacional escolar.
Dessa forma expandem-se as possibilidades de aprendizagem dos
alunos por meio de:
Inclusão, dentre as incumbências da escola, da elaboração e execução
da proposta pedagógica própria;
Obrigatoriedade do estabelecimento de estratégias de recuperação para
os alunos com menor rendimento escolar;
Possibilidades de aceleração de estudos, para alunos com atraso escolar,
e de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação de
aprendizagem.
Merece destaques também na LDB o art. 32 que tem como objetivo
promover a formação básica do cidadão; o desenvolvimento da capacidade
de aprender, visando à aquisição de conhecimentos e habilidades e à
formação de valores e atitudes (Art.32, Inciso III); a flexibilidade que
6
permite sua organização em ciclos (Art 32: 1). Tais avanços permitem
maior fidelidade aos reais limites e possibilidades dos alunos, e favorecem
a criatividade na busca de soluções, principalmente no enfrentamento dos
índices de retenção que vêm gerando uma cultura do fracasso.
Essas novas orientações sejam da LDB, seja das Diretrizes Curriculares
Nacionais indicam revisões importantes que vêm se dando na legislação e
nas práticas escolares e que precisam, portanto, estar refletidas na
configuração dos livros didáticos.
Para que sua utilização se solidifique nas escolas reforçando o vínculo
dos conteúdos com as práticas sociais e atendendo às novas demandas das
escolas, é necessário que o livro didático seja um instrumento que favoreça
a aprendizagem do aluno, no sentido do domínio do conhecimento e da
reflexão na direção do uso dos conhecimentos escolares para ampliar sua
compreensão da realidade e incitá-lo a pensar em perspectiva, formulando
hipótese de solução para os problemas atuais.
Acredita-se que, na década de 90, teve início uma grande efervescência
no âmbito da escolarização, que favoreceu uma mudança profunda de
paradigma, que tem se refletido, desde então, no tratamento da questão da
abordagem da Língua Portuguesa. No que se convencionou chamar de “novo
desenho”, o modo de se conceber a linguagem oral como prática escolar
passou por transformações: de simples mediadora da interação entre professor
e aluno, sua relação com a escrita começou a ser tematizada (mais
precisamente sua relação com a escrita em circunstâncias formais e públicas)
1
.
1
Mesmo que historicamente essa questão tenha estado presente nas salas de aula (nos tradicionais seminários
e apresentação/exposição oral), ela não era questão destacada. Como disse, a linguagem oral ficava reduzida
ao seu aspecto de mediação das interações entre professor e aluno.
7
Talvez se possa dizer que devido à participação do Estado, através do
Programa Nacional de Livro Didático (PNLD), alguns conteúdos e aspectos
ali indicados acabaram sendo incorporados pelos livros didáticos de Português
(LDP) - a “linguagem oral”, conforme proposta no PCN (1998), foi um desses
aspectos. Essa inclusão não foi sem conseqüências – ela trouxe, inegavelmente
à baila, a necessidade de se refletir sobre a complexa relação entre linguagem
falada e escrita, assim como sobre a heterogeneidade presente em cada uma
dessas modalidades que, sem dúvida, impõe-se em seus encontros e
cruzamentos.
A relação entre fala e escrita pode, em certos casos, ser admitida como
sendo bastante estreita: essas modalidades parecem se sobrepor e se
miscigenar. Em outros casos, a distância entre essas modalidades pode ser
bastante acentuada. Ou seja, essa relação é complexa e as dificuldades dos
alunos em processo de alfabetização deixam esta complexidade exposta.
Entendemos que a relação entre fala e escrita é tensa e que ela se manifesta
num quadro de sobreposições e mesclas.
Marcuschi (2003), por exemplo, defende a idéia de que as relações entre
fala e escrita devam ser tratadas de forma dinâmica, uma vez que tal relação é
afetada pelas mudanças que ocorrem em cada uma (não se trata, como diz ele,
de uma relação estagnada e dicotômica). Sua proposta é a de que tais relações
sejam trabalhadas dentro de um quadro mais amplo (no contexto de práticas
comunicativas), segundo uma perspectiva funcional, que se empenha em
preservar o contínuo de variações, as gradações e as interconexões envolvidas.
Escanearei o gráfico que exemplifica. Não farei análise do texto como
ele faz.Vale a pena exemplificar.
8
Quanto à variedade lingüística, parece ser imperativo que a Escola
não se furte mais à realidade desse fato como fez durante séculos. Dois fatores
são indicados aqui como fortes participantes do impulso que acentuou essa
realidade na segunda metade do século XX, quais sejam:
(1) diferenças sociais ganharam o espaço escolar, sobretudo a partir da década
de 1960, com a chamada “democratização do ensino”;
(2) desenvolvimento da Sociolingüística, cujas investigações deram
fundamento empírico e teórico para o enfrentamento de uma pedagogia da
língua materna dirigida pelo ideal de correção de ocorrências (orais ou
escritas) que se distanciassem de uma norma-padrão idealizada e imposta aos
estudantes.
Podemos dizer que o binômio “erroÆcorreção” sustenta esse tipo de
pedagogia, que, embora ainda não tenha sido apagada do imaginário do
Professor e da Escola, ela não é hegemônica. Advoga-se com insistência, por
exemplo, ser necessário democratizar o ambiente escolar para torná-lo aberto
às multiplicidades das diferenças (lingüísticas, sociais, regionais, etárias,
profissionais, etc.), que qualquer cultura e uma língua viva apresentam.
Deve-se ainda dizer que a ortografia de uma língua deve ser respeitada.
Contudo um período relativamente longo até que ela seja alcançada e se
estabilize. Desse modo, a questão que se coloca para a Escola e para Professor
é a de como abordar esse processo (com maior ou menor tolerância ao erro).
Procuramos, neste trabalho, verificar se, na alfabetização e nas propostas de
ensino-aprendizagem, estabelecidas nos livros didáticos de Língua Portuguesa
(LDP), a relação entre fala e escrita; a variação lingüística e o processo de
ortografização serão aspectos tratados.
9
No Capítulo 1, faremos um apresentaremos considerações teóricas a
respeito da escrita, da alfabetização e da ortografização e abordaremos o modo
como esses processos ocorrem no contexto escolar.
No Capítulo 2, procuraremos discutir (a) alguns aspectos referentes à
linguagem oral, sua relação com a escrita (b) algumas abordagens
pedagógicas.
No Capítulo 3, que encerra a fundamentação teórica, buscamos explorar
a questão da variação lingüística e refletir sobre modos de sua implementação
prática num trabalho pedagógico.
No Capítulo 4, procuraremos desenvolver as questões de pesquisa deste
trabalho, bem como indicar procedimentos metodológicos que nos guiaram na
seleção dos livros didáticos a serem analisados. Importante sublinhar que este
trabalho está voltado para o Livro Didático de Português.
No Capítulo 5, apresentaremos os dados referentes à análise quantitativa
e qualitativa da abordagem da relação entre língua oral e escrita, da variação e
da ortografização nas coleções de 1º e 2º ciclos (1ª a 4ª séries), procurando
responder às questões de pesquisa enunciadas.
Entendemos serem importantes essas reflexões, que se inscrevem num
fluxo de discussões acerca da alfabetização e do papel da escrita e da
ortografização no ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, na medida em
que elas poderão contribuir na elaboração de produções didáticas – elas
representam um esforço na busca da qualidade dos livros didáticos.
10
Capítulo 1
__________________________
ESCRITA, ALFABETIZAÇÃO E ORTOGRAFIZAÇÃO
1. Uma breve passagem pela história da escrita
1.1 As escritas não-alfabéticas
Diferentes meios e formas de escrita foram criadas e evoluíram
lentamente ao longo do tempo. Na História Universal, a Antiguidade começa
ao redor de 4000 A.C. e esta marca não parece ter determinada ao acaso – ela
é referente ao período em que homem começou a escrever.
As primeiras escritas eram feitas através de figuras: uma para cada
objeto. Trata-se da primeira forma de escrita pictográfica, registrada em
paredes de cavernas
2
, e amplamente reconhecida como a fonte originária de
todas as outras formas de escrita.
2
Refiro-me aqui às pinturas rupestres como pinturas feitas nas rochas, que ficaram registradas ao longo de
muitos anos, feitas com ocre - “tipo de terra fina que contém argila e óxido de ferro hidratado e que apresenta
várias tonalidades pardacentas tirantes a amarelo ou a vermelho (cf. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua
Portuguesa 1.0.5ª), na maioria das vezes, ou com gordura vegetal e animal.
11
Apesar do grande número de símbolos que a compõem, acredita-se que esta
modalidade poderia ser utilizada por qualquer língua dado seu caráter icônico,
imagético. A escrita pictográfica passou por transformações e, num segundo
tempo, passou a ser indicar sons (e não figuras). Nesse salto, os caracteres,
além de continuarem a representar objetos e coisas da realidade, eram
utilizados para representarem segmentos sonoros de uma língua. Nesse passo,
portanto, para se entender um texto escrito era necessário conhecer a língua
em que havia sido escrito.
A escrita cuneiforme sucede os pictogramas e as pinturas rupestres
(que registrava objetos e/ou cenas vividas) – nela, desenhos e grafismos
mudam de função. Tem-se que a escrita cuneiforme nasceu na região de
Suméria (na Mesopotâmia, nos milênios IV e III AC) e registrava operações
comerciais:
12
... os pictogramas, representando esquematicamente
objetos (já como mercadorias), começam a ser utilizados
para registrar as trocas comerciais e se constituem como
signos-imagem dos objetos. Depois, os pictogramas
começam a ser combinados entre si para representar
idéias ou ações mais abstratas, compondo os ideogramas,
ou signos-idéias. (ROJO, 2006:16) (ênfases minhas)
3
.
A escrita cuneiforme é o mais antigo sistema de escrita documentada
que se conhece (HIGOUNET, 2003: 29) e foi, como disse acima, inventada
pelos sumérios. O termo cuneiforme significa “em forma de cunha”;
caracteriza-se pelo seu aspecto exterior anguloso. Suas marcas eram impressas
(mais que traçadas) em tabuletas de argila com um junco cortado
obliquamente segurado com a mão fechada - mais raramente gravadas em
pedra.
3
Os ideogramas, que representam coisas concretas (o sol, a montanha ); ações (comer, combater) ou
abstrações (Sul, velhice) foram vigorosamente mantidos e resistiram à decomposição em elementos fonéticos,
permanecendo como base desse sistema. Apenas por volta de 3000 AC, tanto os pictogramas, quanto
ideogramas adquirem também “valor fonético”.
13
A escrita cuneiforme, composta por cerca de seiscentos símbolos, propagou-se
por toda a Ásia, tornando-se forma de manifestação de línguas diversas.
Higounet (2003: 33) sustenta que a outra escrita – a egípcia - foi da
maior importância no mundo antigo. Sob sua forma mais característica e mais
arcaica, ela é designada como escrita hieroglífica. Os hieróglifos eram sinais
sagrados (do grego hieros, ‘sagrado’, e glyphein, ‘gravar’) porque
considerados como expressivos da fala dos deuses, que se manifestava através
dos faraós. Assim como a cuneiforme, esta era uma escrita de palavras,
porém, mais do que a escrita cuneiforme, ela conservou sinais simbólicos
(não-imagéticos).
14
15
A língua que esta escrita notava era aparentada com aquelas do grupo
semítico (árabe, hebraico, aramaico), o que parece ter favorecido sua
decomposição em elementos sonoros (dada a maior extensão relativa das
palavras). A escrita hieroglífica, em oposição à cuneiforme, não se difundiu:
ficou limitada à língua e ao Egito. Os hieróglifos eram, geralmente, gravados
em pedra, mas há caracteres, conhecidos como “hieróglifos lineares”, que
eram pintados em sarcófagos de madeira ou sobre papiro. Seu traçado era
bastante mais simplificado, contudo e curiosamente, os sinais podiam ser
dispostos tanto de alto a baixo, quanto horizontalmente, assim como da
esquerda para a direita ou vice-versa. Não havia restrição relativamente ao
ponto de início e posterior desenvolvimento da escrita sobre seu suporte
material, como se vê.
É freqüente estabelecer-se e a distinção entre três grandes sistemas de
escrita. De fato, lemos em Rojo (2006) que há:
Sistemas ideográficos ou logográficos - cada signo representa um objeto
(pictograma) ou uma idéia (ideograma ou logograma).
4
. Embora um
ideograma possa, teoricamente, ser compreendido por pessoas falantes
de diferentes línguas, cada povo criou registros próprios.
Sistemas silábicos – cada signo representa uma sílaba (o primeiro
desses sistemas foi o sumério, grafado em escrita cuneiforme – fenícios,
hindus e hebreus os sucederam). Os sistemas silábicos oscilam entre 80
e 120 signos.
4
A escrita ideográfica composta por incontáveis signos. Acredita-se que, por isso, ela é mais exigente que
outras e envolve longo aprendizado. No Japão, por exemplo, no Ensino Fundamental, leitura e escrita são os
segmentos mais importantes do currículo elementar. Além dos dois sistemas silabários japoneses (hiragana e
katakana), espera-se que o aluno aprenda pelo menos 1.006 kanjis (ideogramas) até o final da sexta série.
Portanto, em países com sistemas de escrita ideográficos, a alfabetização (parcial) leva pelo menos sete anos.
16
Sistemas alfabéticos – cada signo segmentos sonoros mínimos (sons ou
fonemas e não mais sílabas), que se combinam sob restrições impostas
por cada língua. Essas operações combinatórias permitem que apenas
cerca de 30 caracteres componham o alfabeto.
1. 2 As escritas alfabéticas
O alfabeto (ou abecedário) é o conjunto das letras de uma escrita,
colocadas numa ordem convencional. A palavra alfabeto é palavra composta
por alpha + beta, as duas primeiras letras do alfabeto grego correspondentes
ao nosso ‘a’ e ‘b’. Durante muitos séculos, a Antiguidade não conheceu uma
forma de registrar por escrito as palavras de uma língua. Vários povos
serviam-se de sistemas figurativos muito semelhantes, ou seja, pictogramas ou
ideogramas apoiavam-se na realidade (visível ou imaginada) e eram grafados
através de pinturas ou desenhos (estilizados ou não). Como vimos, há outros
sistemas, cujo aparecimento foi posterior (o silábico, como a escrita
cuneiforme da Mesopotâmia e hieroglífica do Egito - neles, os sinais,
independentemente de sua forma, adquiriram “valor lingüístico”, ou melhor,
silábico).
A escrita das consoantes isoladas, representando sílabas, apareceu entre
os egípcios
5
. Durante o segundo milênio, ela se propagou, talvez por
influência egípcia, entre os povos semíticos ocidentais das margens do mar
Vermelho e do Mediterrâneo. Surgiu, depois, uma forma prototípica de escrita
alfabética - a norte-semítica -, formada por vinte e dois símbolos, escritos da
5
Este acontecimento está relacionado ao período de Akhenaton, que, quando sucedeu seu pai, Amenófis III,
no poder, mandou destruir todas as imagens em que houvesse menção ao pai. Como a escrita comportava
figuras, elas foram destruídas, restando apenas marcas referíveis às consoantes.
17
direita para a esquerda. Trata-se de escrita consonântica, tida como o
antepassado direto das escritas hebráica, moabita, fenícia, aramaica e grega.
Ela instalou-se de forma em definitiva nos últimos séculos do segundo milênio
A.C., quando, de acordo com MOORHOUSE (1995: 99), Israel, Fenícia e
Aram conquistaram uma grande importância.
Certo é que, num período relativamente reduzido de tempo, o alfabeto
semítico do Norte ramificou-se em várias regiões (tanto no “solo pátrio” como
estrangeiro): datam de 1900 A.C., dezesseis textos escritos em língua semítica,
encontrados em Serabit-el-Khaden, na península do Sinai.
Nesses textos, foram reconhecidos vinte e sete sinais diferentes,
nitidamente alfabéticos. Sabe-se que o alfabeto fenício, por ter sido adotado e
adaptado pelos gregos, no início dos anos 900 A.C, tem sido assumido como
antecedente de todas as escritas alfabéticas ocidentais. O alfabeto fenício,
adotado pelos gregos, tomou feitio próprio no século IV A.C, quando tomou a
forma do alfabeto jônico, composto por 24 letras e que é utilizado até hoje
6
.
Na história escrita alfabética do Ocidente, atribui-se aos gregos um
papel de fundamental importância. Isso porque se entende que eles difundiram
a escrita alfabética, incorporada aos semitas. Embora tenha sido mais uma
adaptação do que uma invenção, os gregos sustentaram seu uso durante três
mil anos e fizeram dessa escrita um veículo incomparável de expressão e
comunicação. De acordo com Guerra (1998: 89), o grego é, de fato, uma das
mais flexíveis e harmoniosas das línguas ditas indo-européias
7
. O alfabeto
grego era composto por 24 letras (eram 22 as do alfabeto fenício) –
6
De fato, os alfabetos europeus têm forte relação com o alfabeto fenício. O alfabeto latino, derivado do grego
possuía apenas 16 letras (as letras g, h, j, k, q, v, x e y foram incorporadas em períodos posteriores).
7
O grego dividia-se em quatro dialetos muito semelhantes: o ático, o jônico, o dórico e o eólico.
18
inicialmente, os símbolos eram apenas maiúsculos. Somente no século II A.C,
surgiram os cursivos e, muito mais tarde, no século IX, é que aparecem as
letras minúsculas. As letras do alfabeto grego são ainda muito utilizadas nas
ciências. Vejamos abaixo:
NOME MAIÚSCULO
MINÚSCULO
TRANSCRIÇÃO
alfa Α Α a
beta Β Β b
gama Γ Γ g
delta d
épsilon Ε Ε e
zeta Ζ Ζ z
eta Η Η e
teta (theta) Θ Θ Th, t
iota Ι Ι i
capa (kappa)
Κ Κ k, c, qu
lamda Λ Λ l
Μ Μ m
Ν Ν n
csi (xi) Ξ Ξ x
ômicron Ο Ο o
pi Π Π p
ro (rho) Ρ Ρ Rh, r
sigma Σ Σ s
tau Τ Τ t
ípsilon Υ Υ y
fi (phi) Φ Φ Ph (f)
qui (chi) Χ Χ ch, c, qu
19
psi Ψ Ψ ps
ômega o
O Latim era, há 2500 anos, uma das línguas faladas na Itália central -
era a língua da região do Latium (o Lazio moderno) e Roma era uma de suas
cidades. As inscrições mais antigas nessa língua datam do século VI A.C., elas
realizaram várias versões do alfabeto grego, levado para a Itália por colonos
gregos. O latim era usado em todo o Império Romano como língua oficial: da
lei, da administração e como língua vernácula, que resultou um trânsito
literário fecundo entre os cidadãos romanos. Na verdade, os exemplos mais
antigos de literatura latina são as traduções das peças gregas e o manual de
agricultura de Cato (150 A.C.). Nesse tempo, no leste do Mediterrâneo, o
grego permanecia como língua franca e os romanos cultos falavam tanto latim,
quanto grego
8
.
Após o colapso do Império Romano Ocidental, em 476A.C., o latim
permaneceu como a forma mais corrente de linguagem literária em toda a
Europa central e ocidental. Um volume expressivo de obras de literatura
medieval em latim foi produzido nos mais diferentes estilos e, também, desde
trabalhos científicos de irlandeses e anglo-saxões até simples relatos ou
sermões. Durante o século XV, entretanto, essa língua perdeu posição
dominante entre estudiosos e religiosos e foi amplamente substituída por
versões escritas de línguas vernáculas européias, muitas das quais
descendentes ou fortemente influenciadas pelo próprio latim.
8
A linguagem usada na literatura latina, o latim clássico, era diferente do latim falado, conhecido como latim
vulgar. Alguns escritores, como Cícero e Petrônio, contudo, o latim vulgar em suas obras. Como sabido o
tempo, o latim vulgar acabou se transformando em línguas itálicas/românicas modernas – Italiano, Francês,
Espanhol, Português, Romeno, Catalão, entre outras.
20
Como se sabe, o latim foi utilizado pela Igreja Católica Romana até
meados do século XX e continua sendo, principalmente na cidade do
Vaticano, onde é uma das línguas oficiais. A terminologia latina é
extensivamente usada por biólogos, paleontologistas e outros cientistas para
dar nome a gêneros e espécies (também por médicos e advogados). No
alfabeto romano havia 23 letras e nós as conhecemos hoje: foi essa nossa
herança:
A B C D E F G H I K L M N O P Q R S T V X Y Z
Nesse alfabeto não havia letras minúsculas; I e V eram utilizadas tanto
como vogais, quanto como consoantes e K, X, Y e Z apareciam apenas na
redação de palavras de origem grega. As letras J (uma variante de I, U); U e
W (esta última variante de V e W, introduzida para fazer distinção entre os
sons [v] e [w]) foram, depois, adicionadas para escrever línguas diferentes do
latim. Dessa forma, o alfabeto ocidental atual, como se vê, é o alfabeto latino
com 26 letras:
A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V W X Y Z
A língua portuguesa, presente nos cinco continentes, figura entre as dez
mais faladas dos planetas. Acredita-se ter ela se estabelecido no século XII.
Na época das grandes navegações, a língua portuguesa ultrapassou as
fronteiras da Península Ibérica. Guerra (1998) informa que o português é
língua nativa ou materna para perto de 300 milhões de pessoas distribuídas em
sete países: República Popular de Angola, República Federativa do Brasil,
República de Cabo Verde, República de Guiné-Bissau, República de
21
Moçambique, República Portuguesa e República Democrática de São Tomé e
Príncipe. Frente a tal distribuição geográfica de uma língua, temos que
considerar, necessariamente, heterogeneidades fonético/fonológicas,
prosódicas e morfológicas internas ao que tem se sustentado e se sustenta
estruturalmente como língua portuguesa. O português é falado, ainda, em
pequenas comunidades - reflexo de povoamentos portugueses datados do
século XVI. É o caso de Zanzibar (na Tanzânia, na costa ocidental da África);
de Macau (possessão portuguesa na China); de Goa, Diu e Damão (na Índia);
de Málaca (na Malásia) e de Timor (na Indonésia).
O sistema ortográfico adotado no Brasil, aprovado pela Academia
Brasileira de Letras 18 de dezembro de 1971
9
, com 23 letras (dele não
participam K, W, Y que são utilizados em casos especiais – em nomes
próprios, por exemplo):
A B C D E F G H I J L M N O P Q R S T U V X Z
1.3 Escrita: a vida e o mundo no papel
A escrita está intimamente relacionada ao mundo de papel. O homem
registra, no papel, ações, sonhos, sinais de sua fé e conquistas, o que dá
permanência e extensão à vida sob a forma de cultura, literatura, ciência e
religião – esses são artefatos da escrita: eles dão visibilidade às suas idéias do
homem. Para OLSON (1997), a escrita tem forte relação com as propriedades
9
Esse alfabeto foi aprovado em sessão de 12 de agosto de 1943 e simplificado pela Lei nº 5.765.
22
especiais e peculiares que emanam desses artefatos (força e limitações, usos e
abusos) - com os tipos de competência e com as modalidades de imaginação,
pensamento e percepção que intervêm na exploração do mundo de papel.
Eventos significativos registrados, contratos são selados através de
assinatura; nomes das ruas e indicação de destinos viários e placas
informativas são realizados em texto escrito. De fato, a vida do homem é
circundada pela escrita. A rigor, o domínio da escrita é importante e
imprescindível. Pode-se dizer que o ingresso na escrita representa o acesso a
um direito humano: o de ser letrado. Para Diderot, sem a escrita, essa criação e
privilégio do homem, uma pessoa fica reduzida à sua própria experiência e
memória. Sem ela, o homem teria que recomeçar, a cada vez, a carreira de seu
antecessor (apud Martins, 1996). A escrita funda, pode-se dizer, a cultura
humana.
Durante séculos, em toda a Europa romanizada o latim era a língua da
escrita. Com o advento do cristianismo, ela língua permaneceu como tal: além
de se escrever através dela, traduções de textos de diferentes tipos foram feitas
para o latim. As línguas românicas, aquelas originadas da língua latina,
começam a ser escritas apenas no século IX D.C.. Quando, no final do
Império Romano do Ocidente (VI D.C.) desaparecem os sistemas de
transmissão da cultura no mundo antigo, uma nova instituição assumiu essa
tarefa: ordem monástica. Isso porque os monastérios concentraram a tarefa de
de escrever e de ensinar. Segundo Martins (1996), entre os laicos, poucos
dominavam a escrita. Os monges copistas não eram criativos nem poderosos,
limitavam-se, como o nome que levam explicita, a copiar algo escrito antes e
por outros e o faziam em rolos de papiro que, em latim, eram designados
volumini. Contudo, este tipo de material apresentava muitos inconvenientes,
23
pois era caro, frágil e somente utilizável em uma face. Além do que, era
trabalhoso de ser manejado e consultado.
O pergaminho, feito, em geral, de peles de animais (cordeiro, vitela,
cabra e, às vezes, gazela, antílope ou avestruz) sucede o papiro.
O termo pergaminho deriva do grego pergamene que significa “pele de
pérgamo”
10
. Seu uso ganhou rápida extensão devido à praticidade de poder ser
dobrado e costurado (o que levou à generalização dos codex, ancestrais dos
livros. Sendo os mosteiros e abadias locais os lugares responsáveis pela escrita
dos codex, cada um deles possuía seu próprio scriptorium, onde os
manuscritos (ou seja, os livros escritos à mão), eram copiados, decorados e
encadernados. Cada copista dispunha de um assento e de uma mesa, onde
escreviam, em média, em torno de quatro fólios por dia. Cada fólio media
entre 35 a 50 cm de altura e 25 a 30 cm de largura – tamanho equivalente ao
10
Pele de pérgamo: pele de ovelha preparada especialmente para nela se escrever ou ser utilizada em
encadernações.(Dicionário Houaiss da língua portuguesa, 2004)
24
de uma folha. Esse trabalho era lento e só interrompido nos momentos de
oração. Observam-se, nos manuscritos, lacunas e alterações ortográficas, o
que levou muitos estudiosos à conclusão de que os copistas trabalhavam pelo
método do ditado e que faziam, ao mesmo tempo, várias cópias
11
.
Até o final do século XII, a edição de livros se fazia por iniciativa de
nobres e clérigos: editavam-se missais e manuais de teologia para estes e obras
de luxo para aqueles. A partir desse período, os copistas laicos, que
colaboravam com os monges, organizaram-se em escritórios e associações e
11
De acordo com Martins (1996), apesar do zelo despendido pelos monges copistas, eram freqüentes os erros
cometidos na cópia ou no ditado (quando se desejava obter várias cópias simultâneas, um monge ditava vários
copistas o texto original).
25
passaram a redigir, além de livros, documentos oficiais da nova classe
ascendente: da burguesia comercial. Até a metade da década de 1450, só era
possível reproduzir um texto copiando-o à mão.
Antes disso, os chineses já conheciam caracteres móveis - a imprensa
foi, a princípio, um prolongamento da escrita manual. De fato, tem-se notícia
que os impressores rivalizavam com os copistas. Contudo, é inequívoca a
afirmação de que imprensa, ou seja, a técnica baseada na digitação de tipos
móveis e a prensa representaram uma revolução. Com a imprensa, reduz-se o
tempo de produção e reprodução do texto e, também, o custo do material
escrito. O alemão Gutenberg
12
foi quem mecanizou os procedimentos de
impressão.
1. 4 Do livro ao computador
Nas últimas décadas do século XX, impõe-se uma nova maneira das
pessoas se comunicarem. As correspondências pessoais, antigas missivas
manuscritas, assim como os textos datilografados, foram substituídos pelas
correspondências virtuais. A composição do texto se fazia, desde Gutenberg,
letra a letra. Por essa via, a composição de um texto decorria numa velocidade
entre 1200 e 1500 signos por hora. Em 1872, com o surgimento da linotipia, o
tempo foi encurtado porque era possível alcançar entre 6000 e 9000
signos/hora. A fotocomposição alterou mais profundamente ainda esse cenário
em meados do século XX. JEAN (1998: 89) assinala que Gutenberg ficaria
12
João Gutenberg ou Johannes Gensfleisch zur Laden zum Gutenberg (cerca da década de 1390 - 3 de
Fevereiro de 1468), foi um inventor alemão que se tornou famoso pela sua contribuição para a tecnologia da
impressão
e tipografia. Inventou uma liga para os tipos de metal e tintas à base de óleo, além de uma prensa
gráfica, inspirada nas prensas utilizadas para espremer as uvas no fabrico do vinho
26
surpreso se pudesse ver, constata-se que cinco séculos depois, o volume de
jornais, revistas e impressos comerciais que é muito superior ao de livros.
De volumini ao codex, do livro manuscrito ao livro impresso, muitas
foram mudanças. Também, a circulação do livro saiu do uso restrito a
determinados círculos mais letrados - ultrapassou limites. O livro é uma
instituição a qual a cultura pós-Gutenberg confiou a tarefa de armazenar e
fazer circular o conhecimento. O livro representa, na verdade, uma forma
notável de socialização porque institui valores comunitários, econômicos,
identidades grupais além de individuais. O homem que lê transita em espaços
não visitados, pode mudar de posição e pontos de vista.
QUEIROZ (2004) lembra que há cerca de vinte mil anos o homem
exprime o seu pensamento através de meios gráficos e que há mais ou menos
seis mil anos conhece as formas de escrita. A palavra escrita tem força
constitutiva da cultura humana e sua história indica possibilidade de uma
expansão maior, embora, atualmente, haja quem profetize o desaparecimento
do livro devido ao advento e difusão do computador. Na realidade, o
computador parece poder afetar a vida do livro de duas maneiras: a primeira,
que não envolve maior conseqüência, qual seja, sua simples reprodução no
meio eletrônico e visualização na tela (e não no papel); a segunda, é mais
grave porque pode implicar adulteração - a total liberdade para modificar, de
forma radical um texto, até transformá-lo em hipertexto
13
.
Trata-se de uma série de blocos de textos interligados por nós,
formando diferentes itinerários em rede para o usuário. O hipertexto não é
exclusividade do mundo virtual. QUEIROZ (2004) conta que Leonardo da
13
Hipertexto – é um texto com conexões. Cada vez que se escreve e se acrescentam referências, notas de
rodapé, índice, o leitor deixa de fazer uma leitura linear.
27
Vinci fazia anotações em seus textosos, o que possibilitava ao leitor transitar
por outros textos.
Para CHARTIER (1999: 58),
a inscrição do texto na tela cria uma distribuição, uma
organização ... que não é de modo algum a mesma com a qual se
defrontava o leitor do livro em rolo da antiguidade ou o leitor
medieval, moderno ou contemporâneo do livro manuscrito ou
impresso, em que o texto é organizado a partir de uma estrutura
em cadernos, folha e páginas.
O fluxo seqüencial do texto na tela carrega, sem dúvida, a possibilidade
de cruzamento de textos inscritos na mesma memória eletrônica: essas
qualidades indicam que a revolução do livro eletrônico remete a uma profunda
alteração do suporte material do escrito e às possibilidades abertas para a
leitura. Na contemporaneidade, fala-se de um mundo com limites
imprevisíveis e até “sem limites” porque assistimos a um instalar-se e
reinstalar-se de uma rede viva de memórias informatizadas. Admite-se que a
revolução provocada pela criação da imprensa, em 1450, é semelhante à que
ocorre a partir do computador. Mas, embora se fale de “morte do livro”, o que
ocorre parece menos radical ou mais sensato dizer é que cada instrumento
utilizado pelo homem para se comunicar atendeu às suas necessidades em
cada tempo: volumen, codex ou hipertextos refletem processos culturais da
humanidade.
A esse respeito, segundo CAGLIARI (1996: 87), em muitas bibliotecas,
livros viraram pó devido a métodos de reprodução que afetam negativamente
o suporte material da escrita. Ele imagina que somente gravações digitalizadas
28
poderão sobreviver e não haveria, em princípio, desvantagem nisso. O
computador seria, então, o único suporte e veículo da escrita em condições de
“salvar o livro” de sua extinção física e, conseqüentemente, cultural. Se
bibliotecas serão “museus climatizados”, que preservarão livros - esses
“objetos valiosíssimos” que conseguiram sobreviver -, os computadores,
acrescenta o autor, disponibilizarão acesso direto e imediato a todos os livros
disponíveis na rede. Essa previsão implica vantagens, se considerarmos que
ela implica a possibilidade de um acesso a todos os livros de todas as
bibliotecas de todos os tempos.
Parte dessa previsão se realiza diante de nossos olhos: os CDs divulgam
grandes obras, há enciclopédias disponíveis na Internet e usuários podem
acessar bibliotecas de todo o mundo. Os computadores re-inventam o livro
em formato eletrônico. Segurar uma caneta para escrever será, em tempo não
muito distante do nosso, um gesto desconhecido:
... a escola não passará de uma lembrança do passado, um pouco
triste, bastante misteriosa e totalmente incompreensível. Os do
futuro, acharão que, em nossas escolas de hoje, as pessoas são
escravizadas mentalmente, obrigadas a reproduzir modelos para
uma espécie de capataz do saber, sempre disposto a usar de
violência intelectual contra os que não correspondem às
expectativas de um jogo bastante cruel, chamado ensino
aprendizagem (Cagliari, 1993: 115)
As colocações de Cagliari, mesmo parecendo fortes e futuristas críticas
em relação à Escola e ao processo atual de ensino-aprendizagem, permitem
que apreendamos o cerne da revolução por que passamos – há mudanças
29
profundas em curso no que diz respeito ao suporte da escrita, seus efeitos e
possibilidades de uso e, necessariamente, na relação entre leitor-escrita.
Passo, abaixo (item 2), a tecer considerações sobre esses pontos.
30
Capítulo 2
__________________________
ALFABETIZAÇÃO E ORTOGRAFIZAÇÃO
2.1 Pressupostos teóricos essenciais.
Parto de uma assunção segundo a qual durante o processo de
alfabetização as crianças devem ser levadas a refletir sobre “o que é ler e
escrever” e sobre a questão: “para que serve ler e escrever” para que venham
a se envolver com a alfabetização como uma forma importante de inserção
no mundo humano - como modo de expressão e ação pessoal e de
comunicação. A esse respeito, “ser alfabetizado não é ser livre; é estar
presente e ativo na reivindicação da própria voz”(Giroux, apud Freire &
Macedo, 1990: 11).
Admitindo, com FREIRE & MACEDO (1990), que a reflexão, se
genuína, conduz à prática, torna-se importante incorporar a idéia de que toda
atividade proposta em sala de aula deva estar relacionada com a realidade
vivida pelos alunos. Quanto ao processo de alfabetização, estas atividades
deveriam envolver situações de uso real/efetivo da linguagem, ou seja,
situações em que a interlocução seja condição fundamental para que ocorram:
“é preciso que haja homens utilizando de forma real esta linguagem para que
ela se configure enquanto tal” (Klein, 1996: 100). Também, parece ser
necessário que as atividades escolhidas possam levar a criança a
apreender/aprender a escrita e a utilizá-la, de fato, com as funções sociais que
cumpre. Afirma Klein que “os primeiros conteúdos do processo de
alfabetização são, justamente, as funções sociais da escrita, ou seja,é
31
necessário, primeiro, que a criança compreenda por quê e quando se usa a
língua escrita” (1996: 101) (ênfases minhas).
Sustentar esse ponto-de-vista é dar suporte prático para afirmação de
que os alunos atingem o conhecimento ativamente, ou seja, incorporando a
utilidade social da escrita que inclui a comunicação com interlocutores
ausentes. Devemos entender, portanto, que o registro dos conhecimentos
adquiridos é suporte da memória (de informações, de laser e recreação, de
auto-conhecimento, colocação da palavra, etc) e que os usos e funções da
escrita só podem ser conhecidos através da prática das diversas faces de
escrita. Assim, a produção de textos espaço de expressão de funções sociais
da escrita deve ser o eixo do processo de alfabetização. Dito de outro modo,
textos devem ser produtos de uma prática discursiva que pressupõe
interlocutores (presentes ou ausentes) que sejam reconhecidos pelos alunos
enquanto tal.
Entende-se, sob essa ótica, que a riqueza da variação de interlocutores
permitirá à criança produzir diferentes textos com diferentes funções sociais.
Vejamos o que diz POSSENTI (1996: 78) sobre isso:
o professor deve propiciar ao aluno condições para que este
produza os diversos gêneros de textos como narrativos,
argumentativos, informativos, atas, cartas de vários tipos, entre
outros. As intenções comunicativas, como parte das condições de
produção dos discursos, geram usos sociais que determinam os
gêneros que dão forma aos textos (apud PCN, Brasil – Mec,
2000: 26) (ênfase minha).
32
O professor deve, portanto, envolver seus alunos na leituras de vários
gêneros de textos: textos jornalísticos, textos de divulgação científica, textos
técnicos e literários.
PAIXÃO defende a idéia de que a literatura deve estar inserida na
formação do cidadão. Ela é campo privilegiado para a refração do
conhecimento de si próprio e do mundo, na medida em que “todo leitor é,
quando lê, o leitor de si mesmo” (2000: 3). A obra literária é uma espécie de
instrumento óptico, oferecido ao leitor como possibilidade de discernimento
de/em situações que, sem ela, ele não poderia ter vivido. LAJOLO (1993: 106)
afirma que a literatura gerou e gera, alterou e altera, difundiu e difunde
comportamentos, sentimentos e atitudes. Sendo assim, diz ela, é a literatura
(como linguagem e como instituição) que condensa os diferentes imaginários,
as múltiplas sensibilidades, valores e comportamentos: através dela uma
sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses, seus desejos e
utopias.
Como já foi mencionado nesta dissertação, os temas da produção
escrita devem fazer parte do universo das crianças, podendo ser eles
sugeridos por elas ou pelo professor que deverá “ter escuta” para a realidade
das crianças – ele deve ser sensível ás ocorrências da sala de aula e estar
aberto à realidade que cerca os seus alunos. Como sustenta FREIRE, os
educadores devem “utilizar o universo cultural de seus alunos como ponto de
partida, fazendo com que sejam capazes de reconhecer-se como portadores de
uma identidade cultural específica e importante” (Freire & Macedo, 1990:
75).
Pode-se ver que o professor tem papel significativo no processo de
aprendizagem: ele não é passivo, nem neutro – suas decisões são importantes
porque afetam positiva ou negativamente o referido processo. Além disso, ele
33
é ali protagonista uma vez que cabe a ele problematizar, dinamizar, temas
introduzidos, provocando conflito e ampliando as relações dos alunos com o
texto e, conseqüentemente, com a sociedade. A função social da escrita é,
como procurei mostrar, constitutiva de identidades. Ela detém, igualmente,
força de instituição de pensamento crítico – de cidadãos participantes.
Há um aspecto, de particular relevância na aprendizagem da escrita, que
diz respeito ao assujeitamento da criança às convenções gramaticais – uma
questão que gera discussões e preocupações no âmbito escolar - não é fácil o
acesso a elas. Na perspectiva adotada nesta dissertação, aposta-se na direção
que vem sendo apresentada: entende-se que um intercâmbio de textos entre os
alunos e a produção conjunta de textos (em pares ou grupos maiores) sejam
atividades que permitem uma relação favorável à alfabetização, ou seja, ao
estabelecimento de uma relação criança-texto mais propícia à aprendizagem
14
- mais propícia ao reconhecimento da diferença e à (re)elaboração da escrita,
uma vez que a produção textual passa pelo crivo social do olhar do outro (do
colega, antes da avaliação do professor). GÓES & SMOLKA também
postulam que:
... a presença de pares é sempre muito significativa para a
criança. Mesmo quando escreve individualmente, ela busca
chance de comentar, indagar e pedir confirmações ao outro”
(1992: 63)
São processos interativos, segundo as autoras, que possibilitam não só o
direcionamento de sentidos, como também o refinamento da qualidade
14
A esse respeito, ver, também, OLIVEIRA, E. (1995) que aborda empiricamente e teoricamente o processo
de textualização conjunta, realizado por duas meninas em sala de aula.
34
ortográfica da produção escrita – um aspecto e outro dos textos elaborados
conjuntamente são discutidos entre os alunos. A “revisão textual” acontece em
ato, assim como a construção da idéia de que há condições para a realização
efetiva (comunicativa-social) de um texto, entre elas, a de que ele não fira as
convenções ortográficas de uma língua.
Neste contexto, diz FRANCHI, a função da correção, para o professor e
para o aprendiz, é afetada: ela passa a ser uma atividade que visa à reflexão
sobre os aspectos convencionais deste intercâmbio e a consciência da
atividade regrada que é a linguagem (1998: 172) (ênfase minha) e deixa de
ser a tradicional prática pedagógica alienada/alienante e ortopédica.
2.2 A aprendizagem da ortografia no contexto escolar.
Em um dado momento da vida, a criança começa a vivenciar situações
formais de ensino, que têm por objetivo inseri-la na aprendizagem da leitura e
da escrita. As propostas de alfabetização tem se assentado no pressuposto de
que a criança aprende algo sobre a escrita a partir da implementação
sistemática de um determinado método. De modo geral, revelam forte
influência de uma noção de gramatical sobre a linguagem (falada ou escrita)
segundo a qual escrever bem é escrever corretamente do ponto de vista
ortográfico. Sendo esse o caso, deve-se supor que os métodos elaborados
tendam sustentar essa perspectiva e a crença de que o ponto crucial da
alfabetização se reduza ao “ensino/aprendizagem de uma técnica” (Pommier,
1993), ou seja, ao desenvolvimento, pela criança, do domínio adequado de
uma “mecânica”: a de codificar sons em letras para ser escrevente e,
35
inversamente, decodificar letras em sons para poder ser leitor. Sob tal ótica, a
escrita tende a ser transformada, na e pela Escola, em mera transcrição da
fala. Nesse sentido, ganha relevo e força a idéia de que para escrever bem é
necessário falar bem (assim como ouvir bem para falar bem). Dessa
concepção pode derivar um preconceito nocivo sobre “o que é falar /ouvir
bem”, sobre “quem fala/ouve bem”.
Como aponta MAYRINK-SABINSON (1985), a Escola tende, de fato,
a alfabetizar a partir do pressuposto de que a escrita espelha a oralidade e, por
esta razão, estrutura as atividades escolares com o objetivo de levar as
crianças a desvendar o princípio alfabético de correspondências regulares
entre sons e letras. Esses métodos e as correções tomam como base a língua
escrita, ou melhor, a língua escrita ideal/idealizada como correta do ponto de
vista ortográfico e, por esse motivo, a visada na ortografia tem prevalecido,
assim como o produto sobre o processo de aprendizagem. De fato, a forte
preocupação com a ortografia, com a “escrita correta” parece ter se
transformado em ponto central desses métodos de alfabetização. Sua
implementação, do ponto de vista de quem ensina, deve respeitar uma
hierarquia: prosseguir do mais simples ao mais complexo – complexo e
complicado é antecipar o que é “mais fácil” ou “mais difícil” para a criança.
De todo modo, tende-se a tomar “mais fácil” como “mais regular”: procura-se
mostrar, de início, correspondências consideradas mais fortes ou transparentes
entre escrita e oralidade. Acompanho pesquisadores críticos deste método que
assinalam, entre outros comentários, que essa vertente metodológica tende a
tornar artificial a língua a ser aprendida – tende a desvitalizar a língua que a
criança fala. A crença de que ela seria facilitadora da aprendizagem da escrita
por parte das crianças também não é sustentável - não é bem esta a história
36
contada a partir do “fracasso escolar” e dos esforços de modificação desse
problema tão pungente da educação.
BARRETO et alli (1990) apontam para o fato de que a tradição
pedagógica de adotar métodos analítico-sintéticos chegou a formular, ao longo
do tempo, uma hierarquia de dificuldades na elaboração das cartilhas e essas
dificuldades são assumidas como norteadoras para o professor. Assim, a
alfabetização, que segue “do mais simples para o mais complexo” desfigura a
linguagem ao se empenhar na evitação do toma como “mais complexo”.
Conforme Da SILVA (1991), começa-se, em geral, por “palavras-chave”,
depois passa-se a “sílabas-chave” (famílias silábicas simples, ou regulares,
compostas de consoante e vogal)
15
. Passa-se, a seguir, para a tentativa de
ensinar uma certa lógica de formação de palavras e, finalmente, para a escrita
de frases que, via de regra, limitam-se a seqüências de sentenças isoladas, que
miram a fixação de padrões ortográficos. Freqüentemente, as chamadas
sílabas complexas (aquelas que não seguem um padrão regular de formação
consoante–vogal), são apresentadas mais tarde, como seria de se esperar neste
método. A automatização dos padrões ortográficos é acusada por FARACO
(1984: 78) de ser “uma das sete pragas” do ensino do Português, por não
levar o aluno a compreender como se organiza essa língua.
Nesse contexto pedagógico, torna-se clara a tentativa de controlar a
produção escrita da criança com o intuito de “evitar problemas” – que erros se
estabilizem – erros são vistos como desvios das normas gramaticais e
assumem, por isso, conotação negativa. ESTEBAN (1992: 69) assinala, a esse
respeito, que somente é aceita como demonstração de saber a escrita que
15
É bem conhecido o caminho que passa pelas “famílias silábicas simples”, formadas por consoante-vogal,
pelas palavras em que aparecem as mesmas sílabas duplicadas, como em “babá”, “vovó”, “nenê”. Elas
selecionadas com base na idéia de que promovem a “fixação” e “automatização” da escrita.
37
reproduz precisamente o que foi ensinado – aquela que falha ou contém erros,
é concebida como expressão de não-saber. É fato que a Escola tem resistido a
conceber o erro efeito inerente ao processo de aprendizagem e este é um
problema sério porque é cego ao processo de aprendizagem e à natureza da
relação criança-escrita. GNERRE & CAGLIARI (1985), CARRAHER (1986),
CAGLIARI (1989, 1990) PACHECO & LEME (1989), TEBEROSKY (1991)
e também ANDRADE (2007 – no prelo) procuram dar outra interpretação às
alterações ou erros ortográficos. Tais concepções, diferentes que possam ser
entre si, podem ser reunidas quanto ao afastamento que tomam do método de
ensino, acima apresentado e comentado, assim como na tentativa de
focalizarem o processo de aprendizagem (que fatalmente inclui os erros).
Os erros ortográficos são, de fato, uma das grandes preocupações
pedagógicas. Eles podem, ainda, ser assumidos como indícios de dificuldades
centradas na própria criança que, por razões cognitivas, emocionais ou
biológicas, não conseguiria associar ou fixar adequadamente a escrita. Nessa
perspectiva, portanto, em que a ela é vista como transcrição da oralidade e
ensinada através de princípios de memorização e automatização, errar tende a
ser uma falha – problema cognitivo ou psicológico de aprendizagem. Para os
que estão filiados a essa abordagem, processos sociais e interativos não são
considerados – assume-se que a criança age sobre a escrita com a finalidade
de se apropriar dela – processo, esse, que inclusive se iniciaria muito cedo,
antes mesmo da alfabetização (Ferreiro & Teberosky, 1979).
Em abordagem, bastante difundida desde os anos de 1990, a
escrita não é reduzida à transcrição da oralidade nem é, portanto, vista como
dependente de processos perceptivos (discriminação e memória). A escrita é
relacionada à representação simbólica, sendo sua aprendizagem concebida
como a de outra modalidade da língua e, potanto, implicando caminhos
38
particulares e diferentes daqueles da aquisição da linguagem strico-sensu..
Nessa linha, para KRAMER (1986), a escrita corresponde a uma construção,
no caso, de significados. Ele posiciona-se, igualmente, contra a prática escolar
voltada para exercícios visando à automatização e memorização de aspectos
formais/ortográficos. Sua crítica incide sobre uso meramente escolar que se
faz da escrita e sustenta que a prioridade pedagógica deve estar voltada para
os usos sociais da língua escrita.
A importância do trabalho com a ortografia não é negado, mas colocado
com muita freqüência. Faraco (1992: 85) afirma que conhecer mais
profundamente as relações entre a escrita e sua estrutura fonológica é
necessário para a alfabetização (para levar as crianças a uma aprendizagem
adequada). Também Cagliari diz ser preciso mostrar logo no início (...) as
relações variáveis entre letras e sons – que permitem a leitura. Enfim, é
preciso não camuflar a complexidade da língua (1989: 97). A aprendizagem
da ortografia, acreditam pesquisadores e professores, necessariamente exige
uma atividade reflexiva sobre a escrita. SALGADO afirma (1992: 29), por
exemplo que:
Escrever corretamente significa fazer um uso consciente e premeditado de
nossa língua; o erro não é mais do que o desconhecimento ou a não
consciência dessa arbitrariedade convencionald e um ponto de vista
educativo, ele é o que deve motivar a busca de metodologia mais adequada
para garantir a aprendizagem.
FERREIRO (1995), bem alinhada ao pensamento piagetiano, sustenta
que o processo é gradual (é uma construção cognitiva) e que as crianças não
são aprendizes passivos, mas sim ativos. Isto quer dizer que elas constroem
39
conhecimentos através de ações específicas – “específicas” no sentido de que
são estruturadas por restrições e resistências impostas à ação pelos objetos
sobre os quais ela incide. Os objetos são, também, construídos enquanto
“objetos cognitivos” pela ação prática exercida sobre sua matéria concreta. A
criança agiria, então, sobre a linguagem escrita, formularia hipóteses sobre ela
e acabaria por descobrir as propriedades que lhe são inerentes.
Conseqüentemente, aprender a escrever não se reduz, nessa abordagem, a
associar letras e sons ou a fixar a forma das palavras, mas é fruto de processo
construtivo e gradual, que culmina com a interiorização das propriedades da
linguagem.
Ainda, segundo Ferreiro (1979), a “tomada de consciência” das
propriedades a linguagem escrita envolve graus variados - podemos dizer que,
de usuário, que sabe como utilizar a linguagem, a criança passará a uma
espécie de analista que sabe sobre essa mesma linguagem. A oralidade, por
exemplo, quando ainda é referência inicial para a escrita, traduz-se numa
tendência da criança de escrever do modo como fala. Dessa forma, “cadei
ra” é
produzida como “cade
ra”; “comprar” como “compra”. A criança não se dá
conta da variação/diferença que há entre formas de falar e formas de escrever.
A tendência de escrever, apoiando-se na oralidade, pode ser acentuada pela
prática de ditados, que procuram levar a criança a ficar atenta à forma como as
palavras são pronunciadas para, depois, escrevê-las
16
.
CARRAHER (1989) sublinha o equívoco da insistência exagerada na
correção ortográfica, principalmente quando a criança está iniciando a
aprendizagem: dominar a escrita não se limita, diz ele, ao saber escrever
16
Quando se orienta a criança para que ela preste atenção no modo de pronunciar as palavras (para
que possa verificar que “calça” escreve-se com “l” e não com “u”, o que está sendo feito, na verdade, é
reforçar a idéia de que há uma correspondência estreita entre fala e escrita - o que é criticável)
.
40
palavras corretamente. Também para VARLOTTA (1990), a ortografia deve
ser vista apenas como um dos elementos a serem considerados num texto e ele
não seria o mais importante. Esta é a mesma direção assumida por BARRETO
et alli (1990). Todas essas pesquisadoras reforçam o fato de que escrever
sílabas, palavras e frases isoladas não é a melhor maneira de penetrar na
escrita porque fragmentos não têm o mesmo sentido, nem a mesma eficácia da
escrita de textos.
Uma língua falada (falada ou escrita) apresenta-se sob a forma de textos
– sua decomposição suas partes é atividade do lingüista e tem efeito positivo
para a análise da linguagem – esse não é o caso do falante leigo. Desintegrada,
a linguagem se transforma, como apontam SILVA et alli (1986: 27) e o ensino
da escrita adquire um exercício entediante: uma repetição sem fim de
atividades com fragmentos de linguagem, que não levam em consideração a
condição de já-falantes dos alunos. De fato, os exercícios tomam distância da
linguagem em uso e a destituem de sentido. A relação criança-linguagem é
agredida transformada numa relação pautada por lições e tarefas e se exige da
criança que se mantenha dento dos limites da “linguagem escolar”. Deseja-se,
sem dúvida, ensinar a ler e a escrever, porém sem se considerar que tal
objetivo só poderá ser atingido quando a criança puder apropriar-se dos usos
efetivos e dos valores culturais que a língua escrita tem. GERALDI (1985)
alerta para a importância de a Escola criar situações de produção de texto em
que o sujeito realmente “diga suas palavras”.
Enfim, podemos concluir, pelo exposto acima, que a aprendizagem da
língua escrita envolve, simultaneamente, múltiplos aspectos como os usos, as
funções e a própria natureza da escrita. Caso se assuma este ponto de vista,
deve-se dizer que aprender a escrever implica compreender os diferentes
usos que as pessoas fazem da escrita, que eles não se reduzem aos usos
41
escolares (cópias, ditados, redações, leituras em voz alta e assim por diante).
Diversamente, escrever deve envolver a compreensão das funções sociais da
escrita, ou seja, a noção de que as pessoas lêem e escrevem para dar ou
receber informações, para questionar, para convencer, para instruir, para se
organizarem no tempo e no espaço, assim como para o próprio lazer ou
diversão. Isso, sem esquecer que a escrita tem propriedades lingüísticas e que
elas são altamente restritivas: escrever é deixar-se assujeitar por elas. A escrita
envolve, sem dúvida, aspectos como:
relação entre modalidades (oralidade e escrita) e que essa relação
não é transparente ou biunívoca: letras representam sons, mas uma
mesma letra pode representar vários sons e um mesmo som pode ser
escrito por várias letras;
correspondência quantitativa entre letras e sons: cada palavra se
escreve com um certo número de letras, que nem sempre
corresponde ao número de fonemas que a compõem;
variações entre o modo de pronunciar as palavras e a maneira de
escrevê-las;
posição espacial da letra e direção da escrita. As letras mantêm
relações espaciais e temporais entre si, sucedendo-se umas às outras
da esquerda para a direita (característica de escritas horizontais).
linearidade – remete ao fato de uma letra ser escrita após a outra;
segmentação - ocorrências de pausas ou separações. Ou seja, a
linearidade é quebrada em função do caráter articulado e seqüencial
da escrita.
Essas características, que dizem respeito à natureza articulada e
alfabética da escrita, são marcadas pelo seu caráter convencional, mas tal
reconhecimento não significa a necessidade de adoção de posturas
42
pedagógicas que confundida restrição com imposição de regras de ortografia e
métodos pautados pela polaridade certo/errado. O trabalho com alunos pode
muito bem, diz SILVA (1986), ser guiado pelo entendimento de que “a
convenção (é) resultado de trabalho conjunto, que deve ser partilhado por
todos”. Pode-se reconhecer que é essa atividade que propicia ao sujeito o
acesso às convenções e não a imposição de normas pedagógicas que ignoram
a relação delicada entre criança/texto/professor.
43
Capítulo 3
____________________________________
Breves assinalamentos sobre a variação lingüística
O capítulo anterior foi dedicado à questão dos diferentes aspectos da
linguagem oral, sua relação com a escrita e as propostas de abordagem da
linguagem oral na escola. Neste capítulo, trataremos de questões relativas à
variação lingüística: nuances e diferenças da linguagem oral e da linguagem
de crianças. Sempre que alguém se dispõe a discutir o caráter convencional da
linguagem escrita, torna-se necessário incluir na reflexão a problemática da
variação lingüística como um dos fatores que mais intervêm na aprendizagem
e uso das regras ortográficas. Essa questão é relevante para o ensino da língua
materna, como tenho procurado mostrar.
3.1 Variação Lingüística: de quê falamos?
Segundo Camacho (1998), existem quatro modalidades específicas de
variação lingüística:
1. Variação Histórica – uma língua, no decorrer do tempo, transforma-se.
Gerações mais velhas tendem a sustentar a regularidade de formas de
expressão de décadas passadas e as novas gerações tendem a introduzir
“novidades”, afastando-se dos padrões mais estabilizados.
2. Variação Geográfica – formas que uma língua assume em diferentes
regiões em que é falada;
44
3. Variação Social – falantes da mesma comunidade podem apresentar formas
de expressão diferentes - nível socioeconômico, grau de instrução, idade e
sexo são fatores que afetam uma língua;
4. Variação Estilística – um mesmo individuo oscila entre registros de uma
língua, de modo bastante particular.
Fato é que é unânime (ou inquestionável) o assunção de que línguas não
são uniformes, que apresentam variações e nem a fala de um só falante é
uniforme - uma língua não é indiferente às circunstâncias culturais e
psicológicas de seus falantes. É preciso assinalar que a variação não é
decorrente de uma escolha de uma sociedade ou do falante: ele é “incorpora”
as marcas lingüísticas meio em que vive
17
.
A heterogeneidade lingüística no interior de uma só língua pode nos
levar à discussão da questão do preconceito, que é, sem dúvida, um problema
que pode ser sério no ensino-aprendizagem da língua materna: diferenças
lingüísticas, se tratadas como manifestações de “menor qualidade” dão
margem a julgamentos preconceituosos. Como tenho procurado enfatizar
nesta dissertação, a língua portuguesa (como qualquer língua) não é falada da
mesma forma por seus usuários
18
e essa realidade não deveria ser ignorada,
nem ser motivo de preconceito, especialmente na Escola. Uma variedade
lingüística reflete conflitos e diferenças numa comunidade lingüística e, como
17
Sob uma outra ótica classificatória, são chamadas de diatópicas as variações de uma região para
outra. Variações diastráticas referem-se a usos típicos de uma região (caso da gíria e do jargão) e
diafásicas indicam variações de uma situação para outra (formalidade/informalidade; polidez,
etc.).Finalmente, as variações diacrônicas dizem respeito arcaísmos e neologismos
17
(“toca-discoe
som”; “a vaca foi para o brejo” ou “ele ficou numa saia justa”).
18
E, além disso, é importante não esquecer que as línguas se transformam ao longo do tempo e adquirem
diversidade interna.
45
tal, reflete as facetas de poder e autoridade e das relações econômicas e sociais
19
.
Vários são os fatores que influenciam a instituição de uma variedade
lingüística como “língua-padrão”, a saber: sua associação à modalidade escrita
e à tradição gramatical; a consideração dessa variedade como portadora
legítima de uma tradição cultural ou de identidade nacional. Segundo muitos
sociolingüistas (BAGNO, 1997; por exemplo), os motivos que levam uma
determinada variedade a ser eleita a língua padrão não estão relacionados às
suas qualidades lingüísticas intrínsecas, internas: todas as variedades de uma
língua têm recursos suficientes para desempenhar sua função comunicativa ou
expressiva. Sustenta-se que em determinados momentos histórico-sociais, a
variedade lingüística que se torna padrão é aquela falada por falantes que têm
maior poder econômico e, conseqüentemente, maior prestígio social.
Deve-se, frente às considerações acima apresentadas, reconhecer que,
do ponto de vista científico, não há “língua padrão”; são aspectos ideológicos,
políticos e econômicos que instituem e fundamenta essa superioridade. Soares
(1986) alerta para o fato de que certas formas sociais de escrita tendem a se
aproximar de um estilo que é espelhado em normas gramaticais (leis e
contratos, por exemplo). A Escola, diz ela, pode caminhar na direção de
desenvolver estratégias para que alunos do meio mais popular incorporem a
“variedade padrão” de sua língua. Soares de fato acredita ser este um ideal
válido: para ela, a Escola deve promover o desenvolvimento de um
bidialetismo, mas não no sentido de mirar uma adaptação à sociedade e sim de
promover transformação de condições de marginalidade sócio-político e social
de grupos menos favorecidos.
19
Tais considerações são válidas, evidentemente, para variedades numa mesma língua (e não entre línguas).
46
Um dos trabalhos pioneiros nesta perspectiva (da reflexão bidialetal),
foi realizado por Franchi (1984), que teve como objetivo a conscientização das
diferenças dialetais. Esta pesquisadora buscou “valorizar o dialeto da
criança” porque, como disse ela, a criança entra na escola “já-falante”. Desse
modo, a imposição arbitrária de uma variedade lingüística tomada como sendo
a única correta, pode “calar a criança” ou barrar sua criatividade; pode
produzir pessoas alfabetizadas, mas “sem imaginação, sem linguagem”
(Franchi, 1984: 79). Mais de uma década depois, nos anos de 1990, Mattos e
Silva (1997) ressalta a grande divergência e contradições entre a língua que é
ensinada e a que é efetivamente falada (incluindo, nessa esfera, aquela
variedade que se supõe ser o “padrão culto”).
Não é infreqüente o ensino do padrão culto apoiado na gramática
normativa. Este preconceito lingüístico decorre, segundo Bagno (1999), da
confusão criada pela assunção de que bem-falar é sinônimo de falar conforme
a gramática, o que faz com que a fala de milhões de brasileiros seja
considerada “inculta” e “errada”. Cagliari nos ajuda a entender que:
A gramática normativa foi, num primeiro momento, a gramática descritiva de
um dialeto de uma língua. Depois, a sociedade fez dela um corpo de leis para
reger o uso da linguagem, que chegou até a chamar de “bom uso” da
linguagem. Por sua própria natureza, uma gramática normativa está
condenada ao fracasso, já que a linguagem é um fenômeno dinâmico e as
línguas mudam com o tempo (...) para continuar sendo a expressão do poder
social demonstrado por um dialeto, a gramática normativa deveria mudar
(1996: 38).
Nessa direção, Bagno assinala que:
47
Se tantas pessoas inteligentes e cultas continuam achando que “não sabem
português” ou que “português é muito difícil” é porque esta disciplina
fascinante foi transformada numa “ciência esotérica”, numa “doutrina
cabalística” que somente alguns “iluminados” (os gramáticos tradicionalistas)
conseguem dominar completamente. Eles continuam insistindo em nos fazer
decorar algumas coisas que ninguém mais usa (fósseis gramaticais), e a nos
convencer de que só eles podem salvar a língua portuguesa da “decadência” e
da “corrupção”
(1999: 35).
Neves (1990) não deixa de advertir: o ensino ainda se mantém fiel às
práticas centradas em análises sintáticas e morfológicas. Para Britto (1997) e
Bagno (1999), essa situação é mantida, em parte, por “formadores de
opinião”, como por exemplo, os livros didáticos e, principalmente, por
exames vestibulares e concursos. Para esses autores, estes têm sido os pilares
da preservação de preconceitos lingüísticos e da manutenção de práticas
cristalizadas e ineficientes de ensino da ngua materna. Para separar a “língua
ideal” da “língua real”, é necessário empreender a identificação e a descrição
de como uma língua é falada e escrita pelas classes cultas do Brasil, pois,
ainda segundo Bagno:
Sem essa gramática que nos descreva e explique a língua efetivamente falada
pelas classes cultas continuaremos à mercê das gramáticas normativas
tradicionais, que chamam erradamente de norma culta uma modalidade de
língua que não é culta, mas cultuada: não a norma culta como ela é, mas a
norma culta como deveria ser, segundo as concepções antiquadas dos
perpetuadores do círculo vicioso do preconceito lingüístico (1999: 112).
Como dito neste trabalho, esse esforço vem sendo realizado em
alguns projetos, entre os quais, o Projeto NURC, que visam a documentar e
48
descrever a norma urbana culta do português brasileiro. Freitas (apud Mattos
e Silva, 1997: 76) expõe, em documento de 1973, da VI Reunião Nacional do
NURC, realizada em Porto Alegre, que os objetivos do NURC eram seguintes:
1. Dispor de material sistematicamente levantado que possibilite o estudo
da modalidade oral culta da língua portuguesa em seus aspectos
fonético, fonológico, morfossintático, lexical e estilístico;
2. Ajustar o ensino da língua portuguesa, em todos os seus graus, a uma
realidade lingüística concreta, evitando a imposição indiscriminada de
uma só norma histórico-literária, por meio de um tratamento menos
prescritivo e mais ajustado às diferenças lingüísticas e culturais do país;
3. Superar o empirismo na aprendizagem e ensino da língua-padrão pelo
estabelecimento de uma norma culta real;
4. Basear o ensino em princípios metodológicos apoiados em dados
lingüísticos cientificamente estabelecidos;
5. Conhecer as normas tradicionais que estão vivas e quais as superadas, a
fim de não sobrecarregar o ensino com fatos lingüísticos inoperantes;
6. Corrigir distorções do esquema tradicional da educação, entravado por
uma orientação acadêmica e beletrista.
Como se lê, tais objetivos não divergem da indicação feita acima por
Bagno. Este pesquisador argumenta ainda que:
A pesquisa nos permite conhecer melhor a distância entre a norma-padrão
pregada pela tradição gramatical e as variedades cultas (e também as outras,
não-cultas) realmente empregadas pelos falantes brasileiros de português.
Com base nos dados coletados, poderemos refletir sobre essas diferenças,
tentar encontrar explicações científicas para elas e, assim produzir nosso
49
próprio conhecimento gramatical, que poderá entrar em sério conflito com a
tradição normativa (BAGNO, 2001: 58).
Observe-se que o autor utiliza a expressão variedades cultas devido aos
muitos problemas atribuídos, atualmente, ao conceito “norma culta”. Segundo
ele, o conceito de norma não é uniforme e, ressalta Bagno, se para os
lingüistas, norma culta é o conjunto de usos lingüísticos dos falantes cultos
20
de um país, de uma região ou de uma cidade, norma culta é, logicamente, uma
variedade de língua que pode ser descrita, analisada e estudada. Não seria
demais assinalar com ele que a “norma culta” não coincide, necessariamente,
com a linguagem dos textos literários, com a “bela língua” (SAUSSURE,
1916: 13).
Bagno prefere chamar de “norma padrão”, o que, para os
tradicionalistas, é “norma culta” pois, para ele, a língua é um padrão ideal de
comportamento lingüístico que, supostamente, deveria ser seguido por todos
os falantes do idioma toda vez que vão usar a língua para falar ou escrever
(BAGNO, 2001: 39). Frente ao uso ambíguo, impregnado de conotações
ideológicas e preconceituosas, o autor sugere o abandono do temo “norma
culta”. Assim, quando se tomar por base o “falante culto”, deve-se falar em
variedades cultas (sempre no plural) “tendo em conta o uso já amplamente
consagrado do termo variedade na literatura sociolingüística” (idem,
ibidem). Bagno designa, portanto, através de norma padrão “o conjunto de
prescrições tradicionais veiculadas pelas gramáticas normativas, pela prática
20
Bagno (2001) diz que a noção de falante culto pertence ao vocabulário da Sociolingüística e não deve ser
confundido com o uso mais amplo e corriqueiro dos adjetivos culto e inculto. Isto porque, para a
Sociolingüística, não há falante inculto, uma vez que todo falante está inevitavelmente inserido na cultura de
sua comunidade rural ou urbana. Trata-se de um conceito operacional que busca estabelecer critérios
objetivos para a realização de pesquisas. Muitas pessoas não têm formação universitária e nem por isso
deixam de ser cultas, no sentido mais corrente do termo, assim como, diz Bagno, alguns de nossos maiores
escritores não cursaram universidades.
50
pedagógica conservadora e pelos empreendimentos puristas da mídia”
(2001:40). Entende-se, então, porque o autor coloca de um lado a norma
padrão, que, “não existe concretamente, que não é falada nem escrita por
ninguém em sua integralidade: é só um conjunto de regras, de preceitos, que
servem de modelo”, e, de outro lado, “as variedades cultas da língua, que
existem de verdade, que são faladas pelas pessoas cultas do Brasil” (idem,
ibidem) (ênfase minha)..
A discussão referente à problemática da variedade lingüística parece
indicar que, para o desenvolvimento adequado das habilidades lingüísticas dos
alunos, é preciso “abrir a Escola” à pluralidade discursiva de uma
comunidade. De fato, aquele que falasse unicamente o “português padrão”,
idealizado e espelhado na gramática normativa, ficaria restringido porque não
conseguiria ajustar-se ou integrar-se na variedade de situações em que circula
uma língua. Portanto, a superação do preconceito lingüístico, acompanhando
Bagno (1999; 2000), assim como a ampliação da proficiência oral e escrita de
alunos, passa pela possibilidade de ser um falante capaz de enfrentar e de se
ajustar à pluralidade de variedades de manifestações de uma língua.
3.2 Variedades da “Linguagem Oral
De acordo com Bagno, Gagné & Stubbs (2002: 168), a fala, por
natureza e definição, heterogênea: ela está sujeita a numerosas variações, que
são mais consideráveis nos níveis lexical e fonológico – variações estruturais
(morfossintáticas) levariam a considerações sobre mudanças profundas
indicativas do aparecimento de outra língua, como foi o caso do nascimento,
por exemplo, das línguas românicas (português, espanhol, francês, etc.)
51
Os autores mencionados distinguem quatro modalidades de variação:
Æ variações socias,
Æ registros,
Æ variações por coerções lingüísticas e
Æ variações geográfica, mais conhecidas porque são apreensíveis na
experiência comum (sotaques que ocorrem (a) no interior de uma
mesma língua formam variedades dialetais ou (b) inter-línguas).
As variações sociais podem ser isoladas experimentalmente. Chambers
& Trudgill (1980: 90) mencionam, sobretudo, fatores como classe social,
sexo, grupo étnico, idade e diferenças individuais. As relações entre essas
variedades são complexas e elas extrapolam, sem dúvida, abordagens
dicotômicas da variação. Em geral, dizem os autores, numa mesma situação
comunicativa, grupos tenderiam a oscilar entre variantes, ou seja, falantes
possuiriam um repertório de formas lingüísticas concorrentes, que sofreriam
efeitos referentes à idade, ao sexo e à classe social. A emergência de uma
variante (e não de outra) não é indiferente, ainda, acrescentam eles, ao assunto
em questão, à sua relação com o interlocutor e à “percepção que tem [da
situação comunicativa]” (idem, ibidem). A esse propósito, Labov (1971: 169)
procurou mostrar que o contexto situacional constituía um fator de variação.
Tratam-se, no caso, de variações estilísticas, isto é, de variações devidas a
mudanças na situação de fala de um mesmo falante.
A distinção entre variações sociais e variações estilísticas permite
definir a noção de registro como o conjunto das variantes lingüísticas internas
a um determinado tipo de comunicação. Bagno, Stubbs & Gagné (2002)
52
sugerem limitar a idéia de “níveis” às variações de ordem estilísticas (e não
social). Segundo os autores:
Não é fácil determinar esses registros, pois uma tipologia das situações de
comunicação parece, por enquanto, impossível de realizar por causa da
complexidade da comunicação: falante, intenção, codificação, canal,
mensagem, decodificação, interlocutor, contexto e referente (Bagno, Stubbs
& Gagné, 2002: 170).
De fato, a realidade das variações lingüísticas orais indica fortemente a
existência de “várias normas” no uso lingüístico corrente de uma comunidade
lingüística e, também, que o que parece contar nas situações comunicativas de
fala é o fato dela ser reconhecida e compreendida
21
. Na linguagem em
uso, portanto, é equivocado supor a existência de “normas rígidas e
prescritivas”. Falantes tendem a respeitar, em seus discursos, os usos da
comunidade em que foram constituídos. As variedades de fala afetam os
falantes. Há, segundo Encrevé (1977):
Duas competências distintas, mas interligadas: a do entendido e a do
produzido. Uma das chaves da intercompreensão consiste justamente na
riqueza do repertório lingüístico passivo dos usuários de uma mesma língua.
Aliás, pode se pensar que a coexistência integrada de tão numerosas
variações é facilitada pela proporção importante de elementos comuns
partilhados pelos diferentes usuários quer sejam elementos de superfície,
quer de representação abstrata.
(1977: 51):
21
Para Bagno, Stubbs & Gagné (2002: 173), os desvios em relação ao código admitido implicitamente
correm o risco, em função de sua amplitude ou de sua conotação social, de conduzir ou a incompreensões, ou
a rejeições sociais mais ou menos explícitas.
53
Este pesquisador sustenta que quanto mais flexíveis forem as
habilidades do falante, mais ampla será sua competência lingüístico-
comunicativa, por entender que a competência
de um falante não se restringe
ao do registro considerado padrão: ela compreende a incorporação de
variedades e registros lingüísticos. Assim segundo o pesquisador,
“competência lingüística” é noção aliada à habilidade/possibilidade de um
falante para se expressar e se fazer compreender numa gama ampla de
situações interativas e subjetivas. Na mesma linha de reflexão, Stubbs (2002)
afirma que as funções comunicativa
22
e ideacional são as mais importantes
23
.
Uma decorrência importante e se considerar o aspecto relacionado às
funções da linguagem está relacionada ao fato de que variações de funções
podem pressionar a variação lingüística. De acordo com Valiquete (1979):
A função informativa, por exemplo, centrada nos ‘fatos’ e na expressão da
objetividade, tenderá (...) a produzir um discurso marcado pelo apagamento
do eu e por uma forte gama de torneios impessoais, de pronomes neutros, de
nominalizações (1979: 124).
3. 3 A linguagem das crianças
22
A função comunicativa garante a integração social através dos valores referenciais e culturais que a
linguagem veicula nas interações. Já a expressiva, garante o movimento de um falante na direção do outro.
Essas duas funções são interligadas.
23
Há outras funções: a expressiva, a função estética, a referencial, a e a metalingüística, por exemplo. Sobre
isso, ver Jakobson (1960).
54
É tradição na área de Aquisição da Linguagem buscar apreender os
passos da estruturação sentencial nas produções da criança, estruturação, essa,
compreendida como condição necessária à ampliação de suas habilidades de
compreensão e de uso da linguagem (Lier-DeVitto, 1998). Tais habilidades,
em crianças em idade pré-escolar, já estão bastante dilatas (de modo algum
dizem respeito exclusivamente a regras morfológicas ou morfossintáticas).
Halliday (1975), por exemplo, sustenta que o desenvolvimento da
linguagem na criança decorre, precisamente, do uso: de sua habilidade para
veicular “usar o código para realizar as funções de linguagem que são
importantes e significativas para ela” (1975: 89). É, acrescenta ele, no uso da
linguagem que a criança incorpora mecanismos e regras do código lingüístico,
mas não só: há apropriação das variantes lingüísticas privilegiadas pelo meio
social e geográfico em que a criança vive. Nesse enquadre, erros e diferenças
devem receber tratamento teórico “menos normativo”. Note-se que essa
vertente de pensamento sobre aquisição/aprendizagem da linguagem é bem
afinada com as discussões sobre variação lingüística, que apresentei acima.
Nessa direção, questões relativas à classe social, à faixa etária, à diferenças
individuais são prestigiadas.
Para Gagné, os desempenhos de ordem lingüística das crianças não
deixam de representar variações interindividuais, que estão, porém,
vinculadas a variáveis como idade e amadurecimento, nível de funcionamento
intelectual e escolaridade (1981: 65). Segundo Tough, o diálogo com as
outras crianças e sobretudo com o professor pode ser a experiência mais
importante para o desenvolvimento do pensamento e constitui, por
conseguinte, um instrumento precioso de ensino e aprendizagem (1979: 79) e
para Wells, a conversação fornece o contexto natural do desenvolvimento da
55
linguagem e a criança aprende ao explorar o mundo pelas interações verbais
que mantém com as outras pessoas (1981: 81).
Tendo no pano de fundo esses autores, pode-se dizer que a qualidade do
desenvolvimento e da aprendizagem da língua materna depende do jogo
interacional, que se estabelece entre adulto e criança, i.e., depende, em grande
medida das estratégias que os adultos utilizam para dar sustentação às
contribuições da criança ao diálogo
24
. Não se deve esquecer o que já afirmei
nesta dissertação: que o diálogo é meio de relação interpessoal entre o
professor e a criança. A qualidade dessa relação é fundamental porque é fonte
de motivação (ou de sua anulação) no processo escolar e sua importância não
negada como base do êxito dos aprendizes. Não parece ser fácil, contudo,
viabilizar uma dinâmica dialógica eficiente, como atesta o admitido “fracasso
escolar”.
Visando discutir a inserção dos alunos das séries iniciais (1º ciclo do
Ensino Fundamental) na escrita, naturalmente sem desprezar a relação entre
fala-escrita e outros aspectos que afetam o ensino-aprendizagem da linguagem
oral e da escrita, pensamos que a discussão, acima desenvolvida, sobre a
variação lingüística seria relevante para uma reflexão sobre o trabalho
pedagógico relacionado à língua materna na Escola. Entendemos ser o livro
didático um espaço adequado para a avaliação de se a variação lingüística é
(ou não) considerada nas propostas pedagógicas de seus autores.
Abordarei, no próximo capítulo, de forma mais detalhada, as questões
de pesquisa, o modo como são apresentados os dos livros didáticos
24
Embora a teorização seja diametralmente diversa da perseguida nesta dissertação, parece-me ético
mencionar a reflexão desenvolvida, sobre o diálogo e sobre a aquisição da linguagem, por Cláudia Lemos e
pesquisadores filiados à sua proposta. Recomendo a leitura, por exemplo, de seu artigo de 2002, que pode
situar o leitor em relação à sua proposta e, também, de outro de Lier-DeVitto em co-autoria com Glória
Carvalho, a sair em 2008.
56
focalizados nesta dissertação; farei uma análise e exporei os resultados de
minha pesquisa sobre os LDs do Ciclo I do Ensino Fundamental.
57
4 - METODOLOGIA
__________________________
Pode-se dizer que é na Escola, com o livro didático, que grande
parte das crianças brasileiras tem a oportunidade de penetrar certos espaços
discursivos. É ali, também, que todas têm a chance de analisar e refletir sobre
fatos lingüísticos, i.e., descobrir regularidades e elaborar conceitos. Crianças
são, de fato, inseridas num processo de produção de conhecimento sobre a
linguagem oral e escrita. Este trabalho visa a discutir propostas didáticas, para
alunos das séries iniciais (1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental), voltadas para
a introdução de crianças na escrita e, como disse, em foco estará a relação
entre oralidade e escrita, envolvendo as variedades padrão e não-padrão.
Pretende-se aqui refletir sobre como essas propostas podem afetar o processo
de ortografização.
Enfim, o objetivo é aprofundar avaliar, nos Livros Didáticos de
Português (doravante, LDP) de 1º e 2º ciclos, se as atividades propostas
consideram as complexas relações entre a modalidade oral e a escrita como
problema e, portanto, como objeto de ensino. A discussão apóia-se em análise
de variações presentes na modalidade oral e suas possíveis relações com a
grafia na modalidade escrita padrão. Frente a tais objetivos, pude levantar as
seguintes questões de pesquisa, que nortearam minha pesquisa:
1. Há, nos LDs, consideração sobre a variação lingüística (na oralidade ou
na escrita) no LDP?
Æ Qual é a natureza da abordagem da variação lingüística (se
houver)?
2. Há propostas efetivas de estudo das relações entre as modalidades oral e
escrita da linguagem?
58
Æ Qual é o tratamento dado a tal relação (se houver)?
3. Os livros didáticos favorecem a construção da ortografia pelos alunos?
- Por que meios?
Procuraremos, neste trabalho, delinear respostas a essas perguntas.
Entendemos que elas poderão oferecer elementos para uma melhor
compreensão das possibilidades e dos limites do trabalho com a linguagem
(oral e escrita) na sala de aula, que tem como ferramenta importante o LDP.
4.1. Os instrumentos de pesquisa
Com a finalidade de obter dados suficientes para melhor descrever e
qualificar o tratamento dispensado à escrita (norma padrão) nos livros
didáticos em circulação na rede pública buscamos, como fonte documental de
pesquisa, informações oficiais, apresentadas pelo Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD)
25
, na edição de 2004 e 2007, que compreendeu obras
destinadas às 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental. Estes livros didáticos, da
edição de 2004, estarão disponíveis na rede escolar até 2010 – fato, esse, que
confere atualidade aos dados aqui abordados e sustenta a relevância das
questões estudadas.
A escolha do Programa Nacional do Livro Didático está relacionada,
ainda, ao fato de que este concentra um grande número de obras – 42 coleções
no PNLD/2004; 48 coleções no PNLD/2007 –, o que já constitui um campo
bastante extenso para pesquisa. Além disso, o PNLD, através de sua
metodologia de análise das obras, acaba por produzir informações relevantes
para quaisquer pesquisas sobre o ensino da língua materna. Tratam-se de
25
Com a finalidade de assegurar a qualidade didático-pedagógica dos livros didáticos a serem adquiridos
, pelo Governo Federal para as escolas
públicas
, o Programa Nacional de Livros
D
idáticos
(PNLD) estabelece uma avaliação pedagógica das obras nele inscritas.
Coordenado pela Secretaria da Educação
sica
(SE
B
) do Ministério da Educação, o PNLD objetiva a aquisição e a distribuição, gratuita e universal, de livros didáticos – de Língua Portuguesa, Matemática,
Ciências, História e Geografia – para os alunos das escolas públicas do Ensino Fundamental brasileiro.
59
informações que vão desde características da produção editorial até
concepções correntes sobre texto, leitura, produção, conhecimentos
lingüísticos, oralidade, gêneros - enfim, tratam-se de temas estudados na
Universidade sob diversas óticas, o que pode propiciar discussões frutíferas e
favorecer a elaboração de práticas escolares
26
. Esta pesquisa abordará aspectos
relativos à produção, ao perfil e à circulação desses manuais - além de
oferecer, como já mencionado, uma reflexão sobre a didatização das
variedades da linguagem oral e de suas relações com a escrita, em especial, no
que tange à ortografização.
Para atender à primeira questão, uma análise quantitativa precedeu a
análise qualitativa dos documentos de pesquisa. Os dados serão recortados a
partir de dois tipos de documentos:
1. Base de Dados da Pesquisa Integrada relativas ao PNLD 2004 e PNLD
2007 (1ª a 4ª séries) sobre o perfil dos LDP; e
2. Duas coleções de 1ª a 4ª séries, que podem ser consideradas como
representativas do LDP, foram eleitas. Ambas foram avaliadas nos
PNLD/2004 e PNLD/2007.
Utilizaremos um outro conjunto de documentos: as resenhas
27
retiradas
do Guia de Livros Didáticos dos PNLD/2004 e 2007 para encaminhar análise
26
Esta pesquisa tem relação estreita com o Projeto de Pesquisa O livro didático de Língua Portuguesa no
Ensino Fundamental: Produção, perfil e circulação, coordenado pelos professores doutores Roxane Helena
Rodrigues Rojo (IEL-Unicamp), Antonio Augusto Gomes Batista (CEALE-UFMG) e Elisabeth Marcuschi
(UFPE). Na verdade, ele foi iniciado sob orientação da Profa. Roxane Rojo, a quem agradeço por grande parte
de sua elaboração.
27
Resenha: As resenhas constituem uma síntese elaborada pelos pareceristas do Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD/2004), nas quais são resumidas as qualidades e ressalvas das coleções de livros a serem
escolhidos pelos professores das escolas públicas. Para auxiliar a leitura e a escolha pelos professores, essas
resenhas estão subdivididas em blocos explicativos assim denominados: Por que – bloco onde se jusjtifica a
60
qualitativa. Nessa parte, nosso objetivo é esboçar um perfil das coleções
selecionadas no tocante a didatização dos aspectos em foco nesta investigação.
4.2. Sobre a “base de dados”
A base de dados é produto oficial da própria avaliação
28
que,
retrabalhado pela pesquisa integrada, gera informações sistematizadas através
das pontuações atribuídas a cada coleção, nos diferentes módulos de
avaliação, considerados pelo PNLD, em relação a Língua Portuguesa. Estes
dados visam a expressar um perfil das coleções, por meio de pontuações
gerais específicas para diferentes componentes. Nesses documentos serão
destacadas observações referentes às rubricas que tratam da modalidade oral
e escrita, assim como da ortografia e o critério adotado para sua seleção foi o
de considerar apenas as coleções aprovadas pelo PNLD.
Podemos adiantar, nesse momento, que a análise da base de dados
forneceu índices importantes para a seleção das obras para a análise
qualitativa. É importante ressaltar que, apesar de utilizarmos dados da
Pesquisa Integrada, não foi nosso objetivo validar a avaliação do PNLD, mas
unicamente aproveitar a riqueza das informações nele reunidas para a
discussão de nossas questões de pesquisa. Este procedimento é típico do
paradigma indiciário (Guinzburg, 1991) que nos mostra serem os dados
menção atribuída à coleção pela avaliação; A coleção – descreve a estrutura da coleção e o conteúdo de cada
volume; Análise – apresenta informações mais detalhadas e específicas sobre a coleção; Em sala de aula
aponta os cuidados que o professor deve adotar a coleção, bem como os recursos necessários para sua boa
utilização. No geral, trata-se de uma descrição sintética da seleção e organização dos conteúdos, das questões
metodológicas, das atividades, experimentos, dos aspectos gráficos-visuais e do Manual do Professor. Guia de
Livros Didáticos – PNLD/2004)
28
Avaliação - Para analisar se as obras apresentadas se enquadram nas exigências técnicas e físicas do edital,
é realizada uma triagem pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT). Os livros
selecionados são encaminhados à Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC), responsável pela avaliação
pedagógica.
61
marginais reveladores e que é possível, ao pesquisador, levantar indícios e
formular hipóteses para explicar aspectos da realidade.
4.2.1 A Base Geral de Dados do PNLD/2004 e PNLD/2007: as coleções.
A Base de Dados do PNLD/2004 e PNLD/2007
29
foi construída a partir
de informações fornecidas pelas Fichas de Avaliação Consolidadas
30
das
coleções avaliadas nesses PNLD. O processo de avaliação leva em conta, para
a composição das bases, os tópicos avaliados, que, nas fichas mencionadas,
foram agrupados por módulos, a saber:
- natureza do material textual,
- atividades de leitura e compreensão de textos escritos,
- atividades de produção de textos escritos,
- atividades com a compreensão e a produção de textos orais,
- construção do conhecimento lingüístico,
- manual do professor,
- aspectos gráfico-editoriais.
Como cada módulo avaliado (e cada edição do PNLD também) possui
um número diferenciado de rubricas, além de importância relativa aos
29
Utilizaremos os dados do PNLD/2007 para relacionarmos com a avaliação das coleções recebidas no
PNLD/2004.
30
Após a avaliação minuciosa feita por cada parecerista e pelo coordenador, faz-se uma avaliação conjunta da
Coleção de LDP, chamada “consolidação” para então ser aplicado um parecer final ou resenha. O processo de
avaliação leva em conta, para a composição das bases, os tópicos avaliados, que nas fichas foram agrupados
por módulos de avaliação, a saber: Natureza do Material textual, atividades de leitura e compreensão de textos
escritos, Atividades de produção de textos escritos, Produção e compreensão de textos orais, Construção do
conhecimento lingüístico, Manual do Professor, Aspectos Gráfico-editoriais. Como cada módulo avaliado (e
cada edição do PNLD também) possui um número diferenciado de rubricas, atribuíram-se pesos diferentes a
cada um, para equalização dos resultados.
62
diversos eixos de ensino de língua materna, atribuíram-se pesos diferentes a
cada um, com a finalidade de equalização e ponderação dos resultados. Para
este trabalho, interessam algumas rubricas – aquelas que dizem respeito à
modalidade oral e escrita, à variação e aos conhecimentos lingüísticos (fono-
ortográficos). Supormos que a nota final, atribuída às coleções para esses
módulos, possa ser um índice que melhor traduza, no conjunto das rubricas, a
suposta qualidade de tratamento dispensado à modalidade oral e escrita. A
título de ilustração segue um extrato da ficha de avaliação consolidada do
PNLD/2004, com suas respectivas rubricas:
Quadro 1 (abaixo)
Excerto do Guia de Livros Didáticos – PNLD 2004 (1º a 4º séries)
Æ COMPREENSÃO E A PRODUÇÃO DE TEXTOS ORAIS Å
63
64
O PNLD/2007 sofreu alterações na Ficha de Avaliação
31
dos LDP
nas rubricas de todos os itens componentes. No PNLD/2004 eles eram
os seguintes:
(1) A natureza do material textual;
(2) Atividades de leitura e compreensão de textos;
(3) Atividade de produção de textos escritos;
(4) O trabalho com a produção e compreensão de textos orais;
(5) O trabalho sobre os conhecimentos lingüísticos;
(6) Manual do professor;
(7) Aspectos gráfico-editoriais.
Em 2007, temos os componentes:
(1) Conhecimentos, capacidades e atitudes – leitura e compreensão
de texto;
(2) Produção de textos escritos;
(3) Compreensão e produção de textos orais;
(4) Conhecimentos lingüísticos;
(5) Contribuição para uma ética plural e democrática;
(6) Manual do professor;
(7) Proposta pedagógica efetivada no Livro do Aluno;
(8) Atividades;
(9) Avaliação e
31
No decorrer do programa de avaliação do livro didático, desde sua criação, algumas alterações têm se
estabelecido, objetivando o refinamento dos critérios de análise, na busca de melhor qualificar a avaliação dos
LDP.
65
(10) Projeto gráfico-editorial.
Para cada uma das rubricas, a Base fornece, horizontalmente, os valores
1 ou 0 (significando, respectivamente, SIM ou NÃO), totalizados, ao final, por
módulos e para toda a coleção. Verticalmente, a Base mostra a pontuação total
das coleções e um percentual de avaliações positivas na rubrica. Observamos,
portanto, quais coleções obtiveram as melhores avaliações na pontuação do
total geral de rubricas específicas. Tomo aqui aquelas que se referem ao
trabalho com a modalidade escrita ou oral e a ortografia.
Pudemos separar algumas coleções num conjunto de obras avaliadas
como tendo idealizado práticas adequadas para desenvolvimento da
linguagem oral e de gramática (ponto de vista dos avaliadores),
compreendendo estar incluído na segunda (gramática) sugestões de trabalho
com a ortografia. Segue o excerto da Base Geral de Dados do PNLD/2004,
relativo às coleções de 1ª a 4ª séries com as rubricas relacionadas à
modalidade oral e escrita e ortografia.
Quadro 2. Excerto da Base de Dados – PNLD/2004 -
Æ Rubricas relacionadas à modalidade oral e escrita e ortografia Å
66
PNLD/2004 -
RECOMENDADA
4 5 9 24 39 50 51 54 64 67
COL
MENÇÃO c f A b c a
Col 1 - 2352 REC
1 1 1 1 1
Col 2 - 4152 RD
1 1111111 1 1 1
Col 3 - 1361 RD
1 111 11 1
Col 4 - 3941 RR
1 1 1 1
Col 5 - 1319 RR
1 1 1 1
Col 6 - 1918 REC
1 1 1
Col 7 - 1426 RD
1 1111111 1 1 1
Col 8 - 2684 RD
111111111 1 1
Col 10 - 3571 REC
1 1 1 1 1
Col 13 - 2365 RR
1
Col 14 - 2009 RR
1 1 1 1
Col 15 - 3882 RR
1 1 1 1 1 1
Col 18 - 2202 REC
1 1 1 1 1 1 1
Col 20 - 2555 RR
1 1
Col 21 - 3993
RR 1 1 1 1 1
Col 22 - 2297 RD
1 1 1 1 1
Col 23 - 4154 RR
1 1
Col 26 - 981
RR 1
Col 28 - 3819
REC 1 1 1 1
Col 31 - 3524 RR
1 1 1
Col 32 - 2723 REC
1 1 1 1 1
Col 33 - 4033 RR
1
Col 34 - 2407
REC 1 1 1 1 1
Col 35 - 2736
REC 1 1 1
Col 36 - 1014
REC 1 1 1
Col 38 - 1540 RR
111 1 1
Col 40 - 1079
RR 1 1 1
Col 41 - 2228
RR 1 1
Col 42 - 3041
REC 1 1
TTAL: 42
12 22 21 12 3 9 4 6 1 6 26 8
%: 100% 28,6 52,4 50,0 28,6 7,1 21,4 9,5 14,3 2,4 14,3 61,1 19,0
Legenda:
Quanto às rubricas:
04 – Presença de dialetos lingüísticos diversificados
05 – Presença de registros lingüísticos diversificados
09 – Diversidade de contexto cultural (regional, local, urbano, rural, etc.)
67
24c – Exploração dos recursos lingüísticos quanto a: dialetos e registros
39f – Explicitação das condições de produção e de circulação de texto
50 – Exploração das diferenças e semelhanças entre:
a – as modalidades oral e escrita da língua portuguesa
b – as variedades da linguagem oral
c – os gêneros orais do discurso (cotidianos X formais/públicos)
51– Exploração dos traços da língua padrão relacionados aos gêneros
formais/públicos
da linguagem oral
54 – Diversidade de dialetos e registros
64a – Exploração de conhecimentos: fono-ortográficos
67- Consideração da variação lingüística nas reflexões sobre o uso
68
Quadro 3. Excerto da Base de Dados – PNLD/2007 -
Æ Rubricas relacionadas a modalidade oral e ortografia Å-
PNLD/2007
RECOMENDADAS
Total de
COL 5 6 12 38 66 67 69 81 CLASS
14616 1 1 1 1 0 0 0 1 RR
14773 0 0 1 0 0 0 0 1 RR
14710 0 1 1 0 0 0 0 1 RR
14635 0 1 1 0 0 0 0 1 RR
14706 0 1 1 0 0 0 0 1 RR
14777 0 0 0 0 0 0 0 1 RR
14653 0 1 0 0 0 0 0 1 RR
14632 0 1 0 0 0 0 0 1 RR
14648 0 0 0 0 0 0 0 1 RR
14716 0 1 1 0 0 0 0 1 RR
14758 0 1 0 0 0 0 0 1 RR
14636 0 1 1 0 0 0 0 1 RR
14715 0 1 1 1 0 0 0 1 RR
14712 1 1 1 1 0 0 0 1 RR
14711 0 1 0 0 0 0 0 1 RR
14637 0 1 1 1 0 0 0 1 RR
14759 0 1 1 0 0 0 0 1 RR
15013 0 1 1 0 1 0 0 1 REC
14779 1 1 1 1 1 1 1 1 REC
14697 0 1 1 1 0 0 0 1 REC
14664 1 1 1 1 1 0 0 1 REC
14695 1 1 1 1 0 0 0 1 REC
14674 0 1 0 1 0 0 0 1 REC
14647 0 0 1 0 0 0 0 1 REC
14631 0 0 1 0 1 0 0 1 REC
14738 0 1 1 0 0 0 0 1 REC
14645 0 1 0 0 1 1 0 1 REC
14689 1 1 1 1 0 0 0 1 REC
14610 0 1 1 1 1 0 0 1 REC
14659 0 1 1 1 1 0 0 1 REC
14667 0 1 1 1 0 0 1 1 REC
14740 0 1 1 0 0 0 0 1 REC
14707 1 1 1 1 0 0 0 1 REC
14766 1 1 1 1 0 1 1 1 RD
69
14739 0 1 0 1 1 0 0 1 RD
14646 1 1 1 1 1 0 0 1 RD
14622 1 1 1 1 1 0 1 1 RD
9 31 27 17 10 3 4 36
Legenda:
Quanto às rubricas:
05-Há presença de diferentes dialetos
06 -Há presença de diferentes registros
12- Há diversidade de contexto cultural (regional, local, urbano, rural, etc.)
38 - Há exploração dos recursos lingüísticos para a compreensão do texto
quanto a
dialetos e registros.
66 - Há exploração das diferenças e semelhanças entre as modalidades oral e
escrita da
língua
67 - Há exploração das diferenças e semelhanças entre as variedades da
linguagem oral
69 - Há exploração dos traços da língua padrão relacionados aos gêneros
formais/públicos da linguagem oral.
81- Há exploração de conhecimentos fono-ortográficos
As coleções que foram pré-selecionadas para a análise são aquelas que
estão iluminadas com a cor amarela e, conforme explicamos anteriormente,
elas foram as melhor pontuadas (de acordo com o PNLD/2004) e avaliadas
(conforme PNLD/2007), como eficientes na abordagem da linguagem oral e
da gramática (incluindo a ortografia). Nosso critério para a seleção das duas
70
coleções a analisar foi a de eleger aquelas que obtiveram a maior pontuação
32
(sempre em relação à linguagem oral e escrita) e que foram, portanto,
“Recomendadas com Distinção” (RD) porque julgadas “propostas didático-
editoriais com alto nível de qualidade” no que concerne à construção de
conhecimentos lingüísticos. Ambas as coleções exploram características da
fala e da “linguagem em uso”.
Devo esclarecer que as duas coleções eleitas não são as únicas “RD”.
Pelo critério utilizado restaram ainda 3 outras coleções de 1º a 4º séries, que
poderiam ter sido analisadas, mas não no espaço restrito desta dissertação.
Vejamos, a seguir, o excerto da Base de Dados PNLD/2004 com as cinco
coleções que obtiveram menção RD nas rubricas relacionadas à modalidade
oral e escrita.
Quadro 4. Excerto da Base de Dados – PNLD/2004
Æ Rubricas relacionadas a modalidade oral e escrita, coleções com
classificação
RD (Recomendadas com Distinção) Å
Total de
4 5 9 24 39 50 51 54 64 67
pontos
COL
MENÇÃO c f a b c A
Col 2 – 4152 RD
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
10,00
Col 3 – 1361 RD
1 1 1 1 1 1 1
7,00
Col 7 – 1426 RD
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 11,00
Col 8 – 2684 RD
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 11,00
Col 22 - 2297 RD
1 1 1 1 1
5,00
TTAL: 42
4 5 5 4 3 4 4 3 1 3 5 4
%: 100% 80.0 100,0 100,0 80,0 60,0 80,0 80,0 60,0 20,0 60,0 100,0 80,0
32
Foi feita uma Base de Dados Própria com as rubricas relacionadas a modalidade oral e que obtiveram
classificação RD (Recomendadas com Distinção)
71
Decidimos proceder a uma escolha por classificação da pontuação
obtida na Base de Dados de 2004 - Rubricas relacionadas à modalidade oral
e escrita. Optamos por escolher as duas coleções de RD com maior pontuação
na rubrica.
Quadro 5
Æ Coleções com maior pontuação e RD (Recomendada com Distinção) Å
4 5 9 24 39 50 51 54 64 67
pontos
COL
MENÇÃO c f a b c a
Col 7 -
1426
RD
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
11,00
Col 8 -
2684
RD
1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1
11,00
TTAL: 42
1 2 2 2 2 2 2 2 1 2 2 2
%: 100% 50,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 50,0 100,0 100,0 100,0
Assim, as coleções selecionadas foram as seguintes:
2684 - Português – Uma proposta para o letramento. Magda Becker
Soares, Editora Moderna, menção RD (Recomendada com Distinção)
1426 - Português na ponta do lápis ... e da língua. Rita de Cássia E.
Braga e Márcia A.F. de Magalhães, Editora Dimensão, menção RD
(Recomendada com Distinção)
Foram, então, realizadas as análises quantitativa e qualitativa das
atividades propostas pelas coleções. Recolhemos alguns exemplos e
procuramos, sempre, nos guiar pelas questões levantadas e pelas noções
trabalhadas nos capítulos teóricos desta dissertação. Optamos por realizar uma
análise da coleção, procurando esboçar o perfil de cada uma a partir da
72
tentativa de compreensão das possibilidades e dos limites do trabalho com a
linguagem oral e escrita (e suas variedades) em sala de aula – nossa
ferramenta foi o Livro Didático de Português.
4. 3 O perfil das coleções
Este tópico apresenta as duas coleções selecionadas, Português – Uma
proposta para o letramento, doravante PPL e Português na ponta do lápis ... e
da língua, doravante PPLL, de 1º a 4º séries de Livros Didáticos de Língua
Portuguesa. Inicialmente, introduziremos a resenha do Guia de Livros
Didáticos das coleções selecionadas, com o intuito de retirar informações que
possam expressar o tratamento neles dado à relação entre as modalidades
escrita e oral (e ortografia). Duas coleções de 1ª a 4ª séries (08 livros) nos
oferecerão uma pequena amostra de como têm sido abordada essa relação e a
ortografia nos livros didáticos de Língua Portuguesa. Para conhecermos
melhor as coleções que serão analisadas, vejamos, primeiramente, as resenhas
do Guia do Livro Didático PNLD/2004 e PNLD/2007. A descrição das
coleções será tomada como indício do trabalho realizado com a linguagem
oral e escrita nas diferentes propostas pedagógicas. A análise posterior poderá
confirmar (ou não) estas descrições. Vejamos alguns trechos.
73
4.3.1 Excerto de resenhas das coleções de 1º a 4º séries
PNLD/2004
Coleção Português: Uma proposta para o letramento.
Na coleção PPL as atividades de oralidade prevêem situações de produção de
textos orais não só em situações mais informais, como também – e mais
importante – em contextos formais, como discussões de pontos de vista e
exposição de dados obtidos em entrevistas. Além disso, a coleção examina
diferentes gêneros de textos orais, assim como explora as relações entre as
formas de expressão oral e a escrita, suas diferenças e semelhanças, suas
relações de complementaridade. A coleção destaca-se, por fim, pela adequada
e consistente análise da variação geográfica e social da língua portuguesa.
74
4.3.2 - Excerto de resenhas das coleções de 1º a 4º séries
PNLD/2004
Coleção Português na ponta do lápis ... e da língua.
Em todas as unidades, a coleção PPLL propõe
atividades que favorecem e
estimulam a oralidade em sala de aula, com orientações no sentido de que,
em situações formais, como debates e apresentação de trabalhos, é necessário
definir e respeitar regras de organização da fala. O tratamento dado a
caracterização da língua falada e à sua variação conforme as situações de
uso é informal e adequado a faixa etária dos alunos: eles são orientados, por
exemplo, a falar de “um jeito mais sério”, como se fossem adultos, ou como
alguém que ocupa determinada posição social (por exemplo: dono de
empresa). Também de modo informal, e um tanto incipiente, há sugestões de
avaliação da oralidade nas atividades de encenação e de leitura dramatizada ou
expressiva, no contar histórias. Além disso, o resumo retrospectivo
apresentado no final das unidades leva o aluno a observar que falar, assim
como escrever, faz parte do processo de como escrever, faz parte do processo
de aprendizagem.
75
4.3.3 Excerto de resenhas das coleções de 1º a 4º séries
PNLD/2007
Coleção Português – Uma proposta para o letramento.
Em relação à compreensão e produção de textos orais, a coleção PPL
apresenta uma proposta de trabalho que contribui para o desenvolvimento da
linguagem oral pelo aluno, na medida em que retoma e aprofunda as
atividades de uso da linguagem oral. Nesse sentido, o uso da língua falada é
favorecido na interação em sala de aula em três tipos de atividades: nas
propostas de leitura em voz alta pelo aluno; de escuta orientada da leitura em
voz alta pelo professor; e na produção orientada de gêneros orais formais,
como a discussão, a entrevista e a exposição. Esse uso, embora não esteja
acompanhado da exploração dos traços da língua padrão relacionados aos
gêneros orais formais, é acentuadamente favorecido, dada a presença, nos
dois últimos volumes, de reflexões quanto às exigências de planejamento e às
normas interacionais envolvidas nas práticas com esses gêneros.(...) No plano
dos conteúdos é dado maior destaque à exploração da relação entre fala e
escrita, particularmente no âmbito dos conhecimentos fono-ortográficos,
semânticos e discursivos, sem deixar de lado as variedades da língua
portuguesa.
76
4.3.4 Excerto de resenhas das coleções de 1º a 4º séries
PNLD/2007
Coleção Português na ponta do lápis ... e da língua.
Nas atividades de produção e compreensão de textos falados e escritos, a
coleção PPLL investe na distinção entre as modalidades escrita e oral da
língua, explorando gêneros textuais diversos e levando em conta os diferentes
usos da linguagem, que variam de acordo com a situação de comunicação e o
grupo de falantes (conforme a região, o grau de escolaridade e a faixa etária,
entre outros fatores). Nesta coleção a proposta de ensino de conhecimentos
lingüísticos articula a reflexão sobre fatos gramaticais às práticas de
linguagem configuradas na leitura e na produção de textos. Essa reflexão não
recai sobre conceitos gramaticais isolados, nem se organiza em função dos
níveis de estruturação da língua contemplados pela teoria gramatical
tradicional. Não há preocupação com memorização de fatos e definições nem
com classificações, como ocorre nas abordagens tradicionais. Os
conhecimentos lingüísticos – fonológicos, ortográficos, morfológicos,
sintáticos, semânticos, textuais e discursivos – vão sendo trabalhados a partir
do que os textos vão demandando e sugerindo.(...) Como se destina às quatro
primeiras séries do Ensino Fundamental, a obra dedica atenção especial aos
conhecimentos lingüísticos relacionados com o domínio do sistema de escrita:
ortografia, divisão silábica, emprego de maiúsculas e minúsculas, uso de letra
de forma versus letra cursiva, ordem alfabética, tonicidade das sílabas e
acentuação gráfica, e pontuação.
77
Os trechos destacados acima parecem apontar para o fato de que, nestas
obras, há, primordialmente, preocupação com a situação de uso da linguagem
(na leitura, na atividade de produção oral), o que deve propiciar a ampliação
da competência lingüística (nos lingüístico e discursivo, como discutido nos
capítulos teóricos). Nota-se, também, atenção dirigida ao aspecto da variação
lingüística (recomendação ao professor (a) quanto ao problema de estabelecer
juízo de valor - “certo” ou “errado” – frente às produções dos alunos e (b)
quanto a características relacionadas aos contextos/situações de fala (idade,
escolaridade, etc.). No que diz respeito aos conhecimentos fono-ortográficos,
há, sem dúvida, dedicação especial, mas sem que a preocupação fique
centrada na “memorização”, ou na nomeação e classificação de fatos
gramaticais. As atividades propostas favorecem, a nosso ver, a apreensão de
elementos lingüísticos, mesmo estando a ênfase colocada em usos sociais (em
funções textuais e discursivas nos diferentes gêneros) – o que é, afinal,
desejável.
Tendo feito um ensaio ilustrativo, procederemos à discussão das
atividades sugeridas nos LDs selecionados, tentando destacar os diferentes
modos de didatização que espelham diferentes concepções sobre a relação
entre as modalidades oral e escrita da linguagem.
78
Capítulo 5
ANÁLISE DAS COLEÇÕES
__________________________
Como indicado no capítulo anterior, os trechos-inícios recortados das
resenhas avaliativas dos PNLD de 2004 e 2007, parecem fornecer caminhos
que nos conduzem ao objetivo de verificar se os Livros Didáticos de Língua
Portuguesa abrangem incluem práticas de linguagem oral; escrita e de
ortografia. Tomamos, como se viu, as Bases de Dados e as Resenhas de dois
PNLD (2004 e 2007) como solo para o levantamento de indícios, rubricas,
referentes ao tema ‘trabalho com a linguagem oral e escrita e ortografia’ das
duas bases de dados (2004 e 2007). O primeiro excerto foi retirado do
PNLD/2004 - suas rubricas estão representadas pela numeração 4, 5, 9, 24, 39,
50a, 50b, 50c, 51, 54, 64a, 67. O segundo excerto, refere-se ao PNLD/2007 e
tem suas rubricas enumeradas 5, 6, 12, 38, 66, 67, 69, 81. Tomamos tal perfil
como “pistas” auxiliares para a eleição das coleções de Livros Didáticos a
serem analisadas. Os indícios levantados nas Resenhas e nas Bases de Dados
permitiram eleger as coleções. Fizemos um levantamento geral de todas as
atividades nelas propostas para apreender como e se elas abrangiam questões
fundamentais, a nosso ver, para o ensino da linguagem oral; escrita e
ortografia.
Nesse levantamento, encontramos no LDP, Português: uma proposta
para o letramento, atividades como: preparação para a leitura, interpretação
oral, leitura silenciosa, interpretação escrita, produção de texto, reflexão sobre
a língua, linguagem oral, vocabulário, sugestão, sugestão de leitura, leitura
oral, língua oral-língua escrita, interpretação pelo desenho. No LDP Português
79
na ponta do lápis ... e da língua, levantamos atividades separadas em seções
como: “bate-papo” (cujo objetivo principal é criar espaço para o uso da fala),
“de olho no texto” (a meta é dirigir o olhar do leitor aos mais diversos gêneros
de texto), “indo além” (sendo a característica principal a reflexão e estabelecer
ponte com a realidade do aluno), “mãos à obra” (parte voltada ao uso da
linguagem), “pense, use e abuse” (que enfatiza aspectos gramaticais e
ortográficos), “para ouvir e pensar” (parte que consiste na leitura de textos
longos e/ou sofisticados para a faixa etária a que se destina), e “vocabulário”.
Ao longo desse levantamento, pudemos notar que havia atividades
propostas, não em torno da compreensão ou produção de determinados
gêneros, mas voltadas para problemática da diversidade de produções orais
(de acordo com Dolz, Schnewly e Haller, 1998). Verificamos que as
coleções consideradas apresentavam uma diversidade importante de facetas da
linguagem oral e, dentre elas, índices consideráveis de propostas de trabalho
voltados para os gêneros.
5. 1 Considerações sobre a coleção Português: uma proposta para o
letramento (PPL)
Pudemos observar e concluir, também, quanto à abordagem da variação
lingüística nas reflexões sobre o uso da linguagem no Livro Didático de
Língua Portuguesa, que a coleção PPL apresenta atividades mais adequadas e
que poderiam levar o aluno, ao mesmo tempo, a ampliar suas habilidades e
conhecimentos na língua materna. Nele, leva-se sempre em consideração o
contexto de interação, ou seja, os interlocutores em relação, o gênero e a
função do texto; seu portador e o tipo de linguagem.
80
Para a linguagem oral são elaboradas propostas de trabalho que têm
potencial para o aprimoramento tanto da fala e da escuta para a variação
lingüística, quanto parecem oferecer a possibilidade de ser examinadas pelos
alunos.
Exemplo 1:
1. Você vai escrever dois classificados.
Escreva um classificado que poderia ser publicado num jornal de verdade. Anuncie
a venda de pipas ou use, se quiser, a palavra papagaios. Tome como modelo os
classificados de verdade que você leu:
VENDO pipas... ou VENDO papagaios...
Informe a respeito dos tamanhos, cores, formatos, papéis utilizados... Como ou
onde pode ser feita a compra...
Agora, escreva um classificado que o seria publicado num jornal de verdade.
Imagine que você encontrou a pipa desaparecida e, em vez de ligar para o jornal,
envia um classificado para ser publicado:
ENCONTROU-SE a pipa desaparecida...
Complete o classificado. Algumas sugestões:
Você pode dizer onde e como encontrou a pipa, em que condições ela está
(rasgada? Arrependida? Pedindo para não ser devolvida?...) e onde deve ser
buscada.
Ou você pode dizer que encontrou a pipa, mas ela pediu para não ser devolvida
porque...
Ou (esta é a melhor sugestão) invente você o que dizer no classificado.
Escreva seus classificados – que têm de ser curtos, como os classificados dos
jornais – cada um numa ficha de cartolina ou numa meia folha de papel.
2. Façam um mural na sala de aula, colando os classificados sobre folhas de
classificados de jornal (como fez o autor Nani com o classificado da pipa
desaparecida). Preguem, de um lado, os classificados que seriam publicados em um
81
jornal de verdade. Do outro lado, os que não seriam publicados em um jornal de
verdade.
3. Analisem o mural e discutam os classificados
Comparem os que seriam publicados em um jornal de verdade com os que
não seriam publicados: por que os jornais publicariam uns e não
publicariam os outros?
Entre os classificados que não seriam publicados num jornal de verdade –
os que anunciam que a pipa foi encontrada – identifiquem os mais
interessantes, os mais criativos, os que gostariam de receber, se fossem os
donos da pipa...
(Português uma proposta para o letramento – vol.2 , pág. 31)
Se este for o caso, ficamos, frente ao que, como vimos antes, sustenta
Encrevé (1977):
Há duas competências distintas interligadas: a do entendido e a do produzido
e uma das chaves da inter-compreensão consiste justamente na riqueza do
repertório lingüístico passivo dos usuários de uma mesma língua. Aliás,
pode-se pensar que a coexistência integrada de tão numerosas variações é
facilitada pela proporção importante de elementos comuns partilhados pelos
diferentes usuários, quer sejam elemento de superfície ou de representação
abstrata.
Esta dissertação alia-se ao pensamento de que quanto mais ampla e
dinâmica forem às habilidades lingüísticas de um falante, maior será sua
competência. Ou seja, essa competência não é inata, portanto, pode ser
expandida. A escola tem, portanto, responsabilidade nisso: na dilatação de sua
competência, que dizer, um falante deve reconhecer e poder transitar domínios
que não unicamente o dos registros considerados padrão: os livros didáticos,
82
estudados nesta dissertação, parecem caminhar bem. Neles, há franca
preocupação com a apresentação, aos alunos, de variedades e registros
lingüísticos. Nas atividades de linguagem oral mencionam-se situações de
produção de textos orais em contextos formais como, por exemplo:
Exemplo 1:
(1) Discussões de ponto de vista - Português uma proposta para o letramento –
Vol.4, pág. 176:
Vocês concordam com a brincadeira que o sapo (contextualizando: um sapo
qualquer se fingiu de príncipe transformado em sapo para ganhar um beijo da linda
princesa) fez com a princesa? Façam o julgamento do sapo:
a. O professor vai dividir a turma em seis grupos:
i. Um grupo representará o réu – o sapo: 3 ou 4 meninos;
ii. Um grupo representará a testemunha de acusação – a princesa: 3 ou 4
menina.
iii. Um grupo representará os advogados de defesa do sapo: 4 ou 5
meninos e meninas.
iv. Um grupo representará os advogados de acusação do sapo: 4 ou 5
meninos e meninas.
v. Um grupo representará o juiz dois ou três meninos e meninas.
vi. O restante da turma será o uri: aqueles que decidirão se o sapo é
culpado ou inocente.
b. O grupo que representa o juiz vai dirigir o julgamento: dar a palavra, cortar a
palavra de quem falar demais ou falar sem esperar a sua vez.
c. Primeiro, deve falar o grupo que representa a testemunha de acusação. A
princesa: os membros do grupo devem acusar o sapo, indicando o que é que ele
fez de errado.
83
d. Em segundo lugar, a palavra é dada ao grupo que representa o réu – o sapo.
Os membros do grupo devem apresentar a defesa do sapo, rebatendo as
acusações da princesa.
e. Em terceiro lugar, devem falar os membros do grupo que representa o
advogado de acusação, para reforçar o que disse o grupo que representa a
princesa, acrescentar novos argumentos, interrogar, se quiser, o grupo que
representa o réu.
f. Finalmente, devem falar os membros do grupo que representa o advogado de
defesa, para reforçar a defesa do sapo, rebater as acusações, acrescentar novos
argumentos, interrogar o grupo que representa o réu ou o que representa a
princesa.
g. O juiz deve agora suspender por alguns minutos a sessão, para que o júri se
reúna e resolva se absolve ou condena o sapo.
h. Membros do júri apresentam a decisão, justificando-a.
Exemplo 2:
(2) Exposição de dados obtidos nas entrevistas
- Português uma proposta para
o letramento – Vol.2, pág. 45:
Contextualizando: Adultos, hoje, já não reclamam de crianças que não param
quietas dizendo que elas têm bicho-carpinteiro. Será que os adultos que vocês conhecem
sabem que bicho é esse?
a. Entreviste algumas crianças de diferentes idades – alunos de outras turmas da
escola, vizinhos, parentes – e pergunte:
Conhece o bicho carpinteiro?
Anote quantas crianças você entrevistou, a idade de cada uma e a resposta que
deram. Você vai precisar dessas anotações para atividades de grupo.
b. Entreviste alguns adultos – da escola, de sua família – e pergunte:
Conhece o bicho-carpinteiro?
Se conhece, o que é um bicho-carpinteiro?
84
c. O professor vai organizar a turma em grupos. No grupo exponham uns aos
outros os resultados ds entrevistas feits, usando as anotações para lembrar as
respostas obtidas. Resumam os resultado do grupo.
d. Cada um expõe oralmente seus resultados para o professor e a turma, e ouve
com atenção os resultado dos outros grupos. O resumo escrito pelo grupo deve
ser usado, na exposição, só para lembrar o que o grupo obteve como resultado.
Não leiam o resumo. Confrontem os resultado apresentado e Discutam que
conclusões vocês podem tirar sobre o conhecimento que adultos e crianças têm,
hoje, do bicho-carpinteiro?
Exemplo 3:
(3) Dramatização
- Português uma proposta para o letramento – Vol.3, pág.85
Represente, como se fosse uma peça de teatro, a conversa entre Pedro, sua mãe e
sua avó, e a chegada do pai. Contextualizando: Pedro, filho único, conta como é a vida de
um filho único.
O professor vai organizar a turma em grupos de seis alunos: em cada grupo, deve
haver pelo menos dois meninos e duas meninas. Os outros dois podem ser menino ou
menina.
1. Cada grupo deve fazer o seguinte:
Escolher quem vai ser Pedro, quem vai ser a mãe, quem vai ser a avó de
Pedro, quem vai imitar os barulhos que o pai faz ao chegar e quem vai
ensaiar o grupo (o diretor da peça).
Ensaiar, diante do diretor da peça, que deve dar sugestões para que a
representação seja a melhor possível. Representem três cenas:
Primeira cena: Pedro, sua avó e sua mãe conversando. Cada um deve
decorar suas falas, mas representem com naturalidade, como se estivessem conversando
mesmo: atenção à entonação, aos gestos, à expressão fisionômica...
Segunda cena: O aluno escolhido para imitar os barulhos que o pai faz ao
chegar deve ficar escondido e “falar” as onomatopéias do texto – cuidado com o ritmo, o
tempo que deve haver entre um barulho e outro.
85
Terceira cena: O pai entra e diz: “Cheguei!” É preciso mostrar que ele
chega nervoso, como diz o texto.
2. Cada grupo vai representar a “peça” diante da turma, que discutirá as qualidades
e os defeitos de cada representação.
Exemplo 4:
(4) Conversações – Português uma proposta para o letramento - Vol. 1
pág.19),
Converse com seu professor e seus colegas:
1. O texto diz que o material escolar que os alunos levam para a escola muitas vezes
supera os cinco quilos. O que quer dizer superar os cinco quilos?
2. Cinco quilos é mais do que muitas crianças poderiam carregar sem comprometer sua
coluna. O que quer dizer comprometer a coluna?
3. Carregar mochila pesada nas costas é prejudicial por quê?
Que forma de carregar a mochila é ainda mais prejudicial?
Pudemos, também, em nossa investigação, observar nesse livro
didático, cuidado em assinalar a diferença entre a pronúncia de palavras numa
linguagem mais coloquial e a pronúncia dessas palavras numa linguagem
formal, como por exemplo, nas situações abaixo:
(...) 2. Veja como Lúcio agradece: Obrigadão!
Qual é o agradecimento mais forte:
Obrigada! Obrigadão!
86
Dê exemplos de pessoas a quem você poderia agradecer um presente dizendo
Obrigadão?
Dê exemplos de pessoas a quem você não teria coragem de dizer Obrigadão! Para
agradecer um presente?
3. Bocão também agradece com palavras que a gente só usa com pessoas com quem
tem intimidade:
Como Bocão agradeceria se, em vez de Maluquinho, fosse uma pessoa
desconhecida que lhe desse um adesivo (por exemplo, o dono de uma loja)?
(Português uma proposta para o letramento – Vol 4, pág.21)
A coleção, (PPL), tem como ponto bastante positivo a sugestão de
atividades que visam a favorecer o desenvolvimento de habilidades dos usos
da linguagem. Vejamos:
Exemplo 1:
Observe a relação entre o que você fala e o que você escreve:
1. Leia em voz alta:
HEITOR LEITOR
Se trocamos a letra H pela letra L, Heitor se transforma em Leitor.
(Português uma proposta para o letramento – Vol.1, pág.71).
Exemplo 2:
Discuta com o professor e com seus colegas:
1. Num poema, cada linha é um VERSO, cada conjunto de versos é uma ESTROFE.
Quantas estrofes tem o poema?
Quantos versos tem cada estrofe?
2. O primeiro verso do poema diz que a pipa está
Presa por um fio.
Valeu, Mano!
87
O primeiro verso da última estrofe diz que quem segura o fio é:
Cá embaixo, o menino-âncora.
Vocês sabem o que é uma âncora? Leiam o verbete do dicionário e observem a
ilustração:
Âncora: s.f. Peça pesada, geralmente de ferro, presa a uma corrente ou corda e ligada à
embarcação. A âncora é jogada no fundo da água, para segurar a embarcação e impedir
que ela seja levada pelo vento ou pela correnteza.
(Dicionário Aurélio Infantil da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989,
p.22.)
3. Lembrem-se: os papagaios do texto Papagaiada reclamavam dos fios que os
prendiam. Releiam o primeiro e o último verso do poema e concluam: o fio que prende a
pipa do poema tira a liberdade dela?
(Português uma proposta para o letramento – Vol.2, pág.26).
Exemplo 3:
1. Você conhece estes sinais:
ASPAS
Releia os seguintes trechos que, no texto, estão entre aspas, localize cada um e
descubra por que estão entre aspas:
“O meu preferido é o Léo (um lagarto de nome Leopoldo). Ele dorme comigo quase
sempre”, diz.
“No começo fiquei preocupada por Jorge criar esses bichos. Mas depois aceitei, pois ele
aprendeu a manuseá-los”, diz a mãe.
“Quero montar um serpentário”, diz ele.
“A vizinhança já se acostumou com essa bicharada. De vê em quando o lagarto foge para
a casa ao lado, mas a vizinha o devolve” diz ele.
88
2. Observe que, depois de todos os trechos entre aspas, uma mesma palavra sempre
aparece.
Que palavra é?
Escreva, em seu caderno, qual ou quais das palavras seguintes poderiam
substituir, em cada trecho, essa mesma palavra que você encontrou depois de
todos os trechos entre aspas:
Afirma pergunta declara explica
Exclama reclama grita
3. Em vez de usar aspas, a jornalista poderia ter usado o travessão. Observe como ficaria
o primeiro trecho:
- O meu preferido é o Léo (um lagarto de nome Leopoldo). Ele dorme comigo quase
sempre, diz.
Escreva os outros trechos entre aspas em seu caderno, fazendo as seguintes
modificações:
Substitua as aspas por um travessão.
Substitua a palavra que se repete depois de todos os trechos entre aspas por outra,
escolhida entre as que você escreveu em seu caderno respondendo ao exercício
anterior.
(Português uma proposta para o letramento – Vol. 3, pág. 119/120)
Exemplo 4:
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Local e data
Saudação
A carta
Despedida
Assinatura
1. Escreva o local e a data:
a. Da carta de Tagea. ______________________
b. Da carta de João Eduardo. ________________
2. Há várias formas de indicar o local e a data. Observe:
Forma com hífen Curitiba, 25-5-1936.
Forma com barra Curitiba, 25/5/1936.
Forma por extenso Curitiba, 25 de maio de 1936.
Se você estivesse escrevendo uma carta para alguém hoje, como escreveria o local
e a data? Escreva de três formas diferentes.
3. Escreva a saudação:
a. Da carta de Tagea. _______________________
b. Da carta de João Eduardo. ________________
4. Imagine três pessoas diferentes escrevendo carta para Monteiro Lobato – o nome
completo dele é José Bento Monteiro Lobato.
Leia as três saudações abaixo, identifique, no quadro da direita, quem escreveria cada
saudação e escreva a letra correspondente nos parênteses:
90
José Bento, (a) Um leitor dos livros de
Agradeço imensamente... ( ) Monteiro Lobato
Meu querido amigo: (b) Uma pessoa da família
Agradeço imensamente... ( ) do escritor.
Prezado escritor Monteiro Lobato: (c) Um amigo do escritor.
Agradeço imensamente... ( )
5. Escreva a saudação que você usaria:
a. Em uma carta para um grande amigo ou amiga.
b. Em uma carta para o prefeito de sua cidade.
c. Em uma carta para o diretor (ou diretora) de sua escola.
6. Escreva a despedida:
a. Da carta de Tagea. _________________________
b. Da carta de João Eduardo. ___________________
(Português uma proposta para o letramento – Vol.4, pág.76/77)
Note-se, nos segmentos acima o privilégio dado à interação discursiva e
à possibilidade de análise dos fenômenos lingüísticos, de forma articulada,
sem que o aluno tenha que se deter em definições gramaticais. Cagliari (1996)
nos ajuda a entender o porquê do cuidado em não se enfatizar definições
gramaticais:
A gramática normativa foi num primeiro momento a gramática descritiva de
um dialeto de uma língua. Depois, a sociedade fez dela um corpo de leis para
reger o uso da linguagem, que chegou até a ser chamada de “bom uso” da
linguagem. Por sua própria natureza, uma gramática normativa está
91
condenada ao fracasso, já que a linguagem é um fenômeno dinâmico e as
línguas mudam com o tempo; e para continuar sendo a expressão do poder
social demonstrado por um dialeto, a gramática normativa deveria mudar
(1996: 38) (ênfase minha)
Este livro didático deixa a critério do professor a decisão sobre o
momento da introdução da reflexão sobre categorias gramaticais (verbo, hiato,
ditongo, grupo vocálico, etc.). Esta decisão pedagógica não significa descaso
pelas questões gramaticais: considera-se importante que o aluno venha a
refletir sobre pontos que foram trabalhados em muitas atividades. Vejamos
abaixo:
Exemplo 1:
Observe o título do texto e do livro de onde ele foi tirado:
PAPAGAIADA
PAPAGAIO PAPAGAIADA
um papagaio um grande número de papagaios
Outro exemplo:
BICHO BICHARADA
Forme, com a terminação –ADA, a palavra que indica:
um grande número de meninos e meninas
um grande número de garotos e garotas
uma porção de crianças
um monte de papel
um montão de dinheiro
um grande número de rapazes
(Português uma proposta para o letramento – Vol.2, pág.21).
92
Exemplo 2:
Recorde o título do texto:
Menino cria animais assustadores
Os animais que Jorge cria tem uma característica: são assustadores, porque
causam susto nas pessoas.
Animais assustadores
Use você também palavras que em uma característica a animais, reescrevendo o título
da reportagem imaginando que os animais de Jorge tivessem outras características:
1. Se, em vez de causar susto, os animais de Jorge causassem medo, como seria o título da
reportagem?
2. Se, em vez de causar susto, os animais de Jorge causassem espanto, como seria o título
da reportagem?
3. Se, em vez de causar susto, os animais de Jorge causassem pavor, como seria o título da
reportagem?
4. Se, em vez de causar susto, os animais de Jorge causassem nojo, como seria o título da
reportagem?
5. Se, em vez de causar susto, os animais de Jorge representassem um perigo para as
pessoas, como seria o título da reportagem?
6. Se, em vez de causar susto, os animais de Jorge representassem uma ameaça para as
pessoas, como seria o título da reportagem?
(Português uma proposta para o letramento – Vol.3, pág.120).
Exemplo 3:
1. Recorde: No texto “O mar e a lagoa”, página 135, que sinal indica que o que está
escrito são palavras que as personagens falam?
2. Compare as palavras que anunciam as falas da galinha e do sapo:
93
- Chove só quando a água cai do telhado do meu galinheiro – esclareceu a galinha.
- Ora, que bobagem! – disse o sapo dentro da lagoa.
Qual é a diferença entre dizer e esclarecer?
3. Compare as palavras que anunciam as falas da lebre e da galinha:
- Como assim? disse a lebre.
- Viram? – gritou a galinha.
Qual a diferença entre dizer e gritar?
(Português uma proposta para o letramento – Vol.4, pág.150).
Segundo minha avaliação, apoiada nos pontos teóricos discutidos nos
capítulos prévios desta dissertação, os livros didáticos em pauta aqui,
permitem a ampliação das habilidades lingüísticas dos alunos e o
desenvolvimento de conhecimento sobre seu uso (e o gramatical). Além disso,
sendo os volumes organizados por temas, teve-se o cuidado de contextualizar
conteúdos não só tanto intra, como também intertextualmente. Os livros
didáticos da coleção Português uma proposta para o letramento trazem,
ainda, considerações sobre a variação lingüística, como exemplos:
Exemplo 1:
(1)
quando se aborda o gênero carta (e o grau de familiaridade com o destinatário); uso
coloquial e/ou formal também são trabalhados:
Observe:
94
Ângela,
Depois que você foi embora para Ribeirão Preto, eu fiquei um tempão andando pela casa
que nem barata tonta, achando tudo muito sem graça. Cada vez que eu pensava que ia ter
que esperar até as outras férias pra brincar outra vez com você, me dava vontade de sair
gritando de raiva. Mamãe me deu um picolé pra eu ficar mais contente, mas a raiva era
tanta que eu mastiguei toda a ponta do pauzinho, até fazer uma franjinha.(...)
Discuta com o professor e seus colegas.
1. observem que Marisa escreve como se estivesse conversando com Ângela. Se ela
estivesse falando com Ângela, e não escrevendo para Ângela, com certeza falaria assim
mesmo como escreveu.
Imaginem se Marisa tivesse começado sua carta assim:
Ângela,
Depois que você partiu, tudo aqui se tornou muito tedioso. Sinto-me muito frustrada por
ter de esperar as próximas férias para que possamos nos encontrar, de novo. Minha mãe
tentou consolar-me, mas foi em vão.
Vocês acham que Marisa conversaria assim com Ângela? Por que sim ou por que
não?
Vocês acham que Ângela gostaria de receber uma carta escrita assim? Por que sim
ou por que não?
2. Leiam esta carta que um menino enviou ao prefeito de sua cidade:
95
Oi Prefeito,
Tudo legal?
Aqui na nossa rua ta a maior confusão! Um monte de buraco! A gente nem pode mais
brincar na calçada! Outro dia, eu tava contente da vida voltando pra casa e quase caí
num buracão que os caras aí da Prefeitura abriram no meio da rua faz um tempão e
não fecharam até hoje. Ah, que raiva! Fiquei louco da vida! Aí resolvi escrever pra ver
se vocês dão um jeito nisto.
Vê se ajuda a gente, ta? Um abração do
Paulo dos Santos
a. Se Paulo não conhecesse o Prefeito, não poderia escrever assim. como deveria
escrever?
b. E se o Prefeito fosse um grande amigo da família de Paulo ele poderia escrever assim?
(...)
(Português uma proposta para o letramento – Vol.4, págs.82/85/86).
Exemplo 2:
(2) quando o uso das gírias é introduzido (e restrições ligadas à com quem se fala):
Discuta com o professor e seus colegas.
Lembrem-se da fala do Menino Maluquinho que vocês analisaram quando estudaram
gírias:
aneiro!
Na reportagem aparece a gíria descolar:
“Igor Strouto deu sorte e seus pais não só liberaram a janela como dão para ele os
adesivos que descolam”.
Outras gírias aparecem na reportagem:
“Colecionar adesivos na janela do quarto é um barato
Descolei
Um adesivo
M
a
n
e
ir
o!
96
“Clara Sampaio também tinha uma baita coleção de adesivos em sua janela”
Lembrem-se: a reportagem foi publicada num caderno infanto-juvenil de jornal – um
caderno para ser lido por crianças e jovens.
1. Quando vocês lêem um texto dirigido a crianças e jovens, acham natural encontrar
gírias, que, em geral, são usadas por vocês na língua oral?
2. Se a jornalista estivesse escrevendo um texto sobre uma coleção de adesivos recordista,
para o Livro dos Recordes, os leitores desse livro achariam natural encontrar gírias no
texto?
3. Revejam as frases em que aparecem rias na reportagem, e sugiram palavras e
expressões que poderiam substituir essas gírias, se o texto fosse aparecer no Livro dos
Recordes:
Que palavra ou expressão poderia ser usada no lugar de descolam?
Que palavra ou expressão poderia substituir é um barato?
Que palavra ou expressão poderia substituir baita, em “uma baita coleção”?
4. Concluam: é comum o uso de gírias na língua oral, mas podemos usar gírias também na
língua escrita – dependendo de quê?
Exemplo 3:
(3) diferença entre países:
Divirta-se com este poema, com que as crianças de Portugal costumam divertir-se, e
observe, nele, as vozes dos animais:
Lengalenga da velha
Era uma velha que tinha um gato
E debaixo da cama o tinha.
O gato miava e a velha dizia:
- Mal haja
o teu miar
que não me deixa dormir Maldito seja
nem tão-pouco
descansar
No Brasil se escreve: tampouco
97
Era uma velha que tinha um cão
e debaixo da cama o tinha
cão ladrava
o gato miava
e a velha dizia:
- Mal haja o teu ladrar
mal haja o teu miar
que não me deixam dormir
nem tão-pouco descansar (...)
(Português uma proposta para o letramento – Vol.4, págs.152/153).
Mais uma vez Cagliari (1989) nos ajuda em nossas observações porque
ele chama a atenção para o fato de que a variação não provém apenas da
evolução histórica das línguas e de suas raízes geograficamente delimitadas,
como vimos – ela tem fontes múltiplas e variadas. A Escola, deve, portanto,
considerá-las, como faz este livro didático em que é notável a ênfase dada à
variação geográfica e social da língua portuguesa. O aluno é, de fato,
convidado a refletir sobre a linguagem e sobre as formas alternativas de
expressão lingüística, tanto pela análise mais global, quanto de partes do texto.
Segundo nossa avaliação, a coleção Português uma Proposta para o
Letramento promove um trabalho de leitura e de análise de tipos textuais
diferenciados bastante adequado.
A ênfase no apoio em “gêneros discursivos” parece consolidar o
objetivo da coleção, que é o de aprofundar e refinar usos da linguagem para
promover maior trânsito interativo aluno em várias práticas sociais. Além
disso, no que tange às propostas de trabalho com as modalidades oral e escrita,
o aluno é induzido a escrever sobre situações funcionais de uso da escrita – a
ele é oferecida uma descrição clara do contexto da comunicação, uma
98
apresentação cuidadosa do(s) destinatário(s); o objetivo visado e o gênero em
que se deve escrever. Convém sublinhar que a proposta de “ensinar a falar”
não é a do PPL – essa meta não é considerada ser (nesta coleção) a função da
Escola:
Não se trata de ensinar a fala, mas de mostrar aos alunos a grande variedade
de usos dessa fala, dando-lhes consciência de que a língua não é homogênea,
monolítica, trabalhando com eles os diferentes níveis (do mais coloquial ao
mais formal) das duas modalidades – escrita e falada – isto é tornando-os
poliglotas dentro de sua própria língua (Fávero, 2002: 12).
As atividades didáticas indicadas para a oralidade prevêem situações de
produção de textos orais tanto em situações mais informais, quanto mais
formais. Além disso, a coleção disponibiliza diferentes gêneros textuais,
típicos da modalidade oral e explora, também, relações entre as formas de
expressão oral e escrita (diferenças e semelhanças e relações de
complementaridade). Vejamos:
(1) No PPL volume 1 página 103, encontramos indicações de como registrar,
na escrita, o discurso direto.
Aprenda a observar as diferentes maneira como falamos as palavras e frases.
Escolham, entre os colegas, algumas duplas: cada dupla deve ser formada por um
menino e uma menina.
Cada dupla lê em voz alta o diálogo entre Biba e Zequinha:
99
Biba (curiosa): Por que seu cachorro se chama Xícara?
zequinha (malcriado): Porque sim?
Biba (rindo): Porque sim não é resposta!
equinha (irritado): Por que você quer saber? Por que
um cachorro não pode se chamar Xícara? E por que
eles têm sempre que chamar Lulu, Totó ou outros nomes de cachorro?
(2) No PPL vol. 2 pág.22, abordam-se recursos na escrita para expressar
entonação e sons.
1. Você sabe representar com letras os sons das palavras que fala:
Fale em voz alta o seu nome, preste bem atenção nos sons que você pronuncia. Em
seguida, escreva seu nome, ao mesmo tempo em que vai falando-o de novo em voz
alta, observando como você escreve os sons que pronuncia.
Mas como representar com letras outros sons, que não são palavras? Veja como,
no texto, o som do vento é representado com letras na escrita:
Vrummmmmmmmmm...rummmmm...
Rummmmm... rummmmm... mmmm...
mmm... mm...
Imite o barulho que o vento fez, “lendo” em voz alta essas letras.
(3) PPL volume 2,, página 48 temos o trava-língua, percepção das relações
oralidade-escrita que é focalizada:
2. Quebra-língua, trava-língua: são textos de pronúncia difícil, por isso a gente se
atrapalha para falar sem tropeçar. É uma brincadeira com as palavras.
Leia em voz alta o poema – um trava-língua – depressa e sem tropeçar:
Bicho-grilo
(trava-língua)
José de Nicola
100
O grilo canta à noite
O grilo na noite
O grito do grilo
Outro grilo apareceu
Outro grito de grilo
(Será grilo?será grila?)
O grilo grilado!
A grila não grita
O grito do grilo
Por que não ser
Um grilo e uma grila?
(4) No PPL volume 3 página 154, verificamos a presença de atividades que
tematizam a questão de que “nem sempre se fala como se escreve” .... e
assim por diante.
Atividade 3 Lembrem-se daquilo que o Negrinho do Pastoreio disse ao capata,
antes de ser levado para longe pelo bando de passarinhos.
Alguns de vocês vão representar o Negrinho e dizer o que ele disse – sem consultar
o texto!
Agora, leiam no texto o que o Negrinho disse e tentem analisar as diferenças entre
o que foi falado pelos colegas e o que está escrito.
Concluam: nem sempre a gente escreve como fala, nem sempre a gente fala como
escreve.
101
Como vimos antes, neste trabalho, Marcuschi (2002) aconselha que
linguagem oral e escrita recebam o mesmo nível de tratamento nas salas de
aula. Nesse particular, posso dizer que espero ter podido apresentar indícios de
que os livros, por mim estudados, são impecáveis.
Os pressupostos implicados na proposta pedagógica desta coleção
fundamentam-se, sem dúvida, nos estudos sobre o letramento, que pode ser
assim enunciado:
Letramento é o estado ou condição de quem não só sabe ler e escrever, mas
que exerce as práticas sociais de leitura e de escrita que circulam na
sociedade em que vive, conjugando-as com as práticas sociais de interação,
que consideram a língua como comunicação ou interação e mostram como a
escrita e a oralidade ocorrem no cerne das diferentes práticas
sociais.(Kleiman, 2006:20)
Na verdade, pudemos verificar que a oralidade e a escrita não são
entendidas como “domínios estagnados e dicotômicos” no Português: uma
proposta de letramento: nele fica implícito, nas atividades sugeridas, que
escrita e oralidade se interpenetram. A linguagem escrita ou oral é
considerada, nesta coleção, como não sendo indiferente à interação, espaço em
que sentidos e textos particulares são constituídos, porque ligados às das
experiências/vivências de cada falante e ao contexto situacional em que a
interação ocorre. O livro, em análise aqui, mostra que o ensino da linguagem
oral em Língua Portuguesa pode ser realizado como um trabalho com as
variedades da linguagem oral na sala de aula
33
. Enfim, pudemos notar que a
33
Lembro que, numa proposta como esta, o trabalho com o aluno parte da valorização de suas características
lingüísticos (e culturais): inicia-se pela conversação. O ponto de chegada será a observação do conhecimento
102
coleção Português: uma Proposta para o Letramento não se prendeu em
explorações de noções e análises gramaticais ou ortográficas, embora no PPL-
V3 – 48, encontramos uma reflexão sobre a língua, mais particularmente,
sobre a acentuação. No PPL –V4 – 49, vemos uma exploração referente à
diferença entre a pronúncia de palavras “pra /pro” e a escrita das mesmas -
“para a /para o”. Há, vez por outra, sugestão para que se ofereça discussão
sobre os aspectos textuais e ortográficos. Note-se, porém: há sugestões e
recomendações – não imposição.Veja o exemplo:
Leia, mais uma vê, a frase do carta:
Entre pra turma que
Coleciona aventuras
Compare com:
Entre para a turma que coleciona aventuras.
O cartaz está “falando” com quem o vê e lê, dando um conselho – por isso, usa pra, que é
como pronunciamos para a, quando falamos.
Veja outro exemplo. Fale em voz alta esta frase, como se estivesse conversando
naturalmente com alguém, preste atenção em sua pronúncia:
Ele deu sua coleção de selos para o irmão.
Você falou para o irmão ou pro irmão?
1. Fale em voz alta estas frases, como se estivesse conversando com alguém. Observe bem
sua pronuncia e depois escreva a frase como você a pronunciou:
Eu tenho selos para trocar.
Ele é louco para ter uma coleção de selos.
Ele deu todos os seus selos para a irmã mais nova.
Ele comprou muitos selos em sua viagem para o exterior.
lingüístico “do outro”, expresso nos textos escritos de interesse prático (jornais, revistas de atualidades) e nos
textos literários.
103
O ideal é usar uma pinça para pegar os selos.
2.Agora, conclua: quando é que a gente pode escrever pra, pro, em vê de para, de para a,
de para o?
Cremos que a coleção Português uma Proposta para o Letramento vai
ao encontro do que Carraher (1986) aponta, ou seja, de que se deve ficar
alerta para evitar os perigos da insistência exagerada na correção ortográfica,
principalmente quando a criança está sendo alfabetizada. Nesse sentido, esta
coleção fica ao lado de quem afirma que a escrita não se limita a saber
escrever palavras corretamente. De fato, a ortografia é vista como um entre
vários elementos que compõem um texto (não o único ou o mais importante,
como disse Varlota (1990)). Barreto e outros (1990) insistem, igualmente, no
mesmo ponto. Assim, quando se advoga em favor da necessidade de a criança
compreender os usos e as funções da linguagem escrita, não se recusa a
importância de que a criança venha a dominar a forma de escrever as palavras
– a questão é que escrever não se resume a isso.
De acordo com Cagliari (1989), a Escola, contudo, embora deseje a
ensinar a escrita, tal desejo tem sido frustrado porque nada se esclarece a
respeito de sua relevância e singularidade em relação à oralidade. O autor faz
a seguinte indicação:
É preciso dizer, logo no início o que é a escrita, as maneiras possíveis de
escrever, a arbitrariedade dos símbolos, a convencionalidade... as relações
variáveis entre letras e sons – que permitem a leitura. Enfim, é preciso não
camuflar a complexidade da língua. (CAGLIARI, 1989: 97).
Se o processo de ortografização implica um “olhar para” a escrita, como
assinalam Carraher (1992) e Salgado (1992), devemos considerar que a
aprendizagem da escrita envolve, concomitantemente, múltiplos aspectos:
104
usos e funções da escrita (além de particularidades relacionadas à sua
natureza). Aprender a escrever envolve ser introduzido a diferentes modos de
escrever, usos, esses, que não se reduzem àqueles que a professora pede para
serem copiados ou ditados por ela. Escrever demanda que se penetre as
“funções sociais da escrita”, ou seja, o “por quê as pessoas lerem e
escreverem” (para dar ou receber informações, questionar, conversar, instruir,
assim como para o próprio lazer e diversão).
A partir de uma concepção como esta, concluímos que as noções e
informações básicas, sugeridas e trabalhadas na coleção PPL, são adequadas e
estão bem articuladas – outro ponto positivo da obra. Dito de outro modo,
noções e indicações são apresentados de maneira clara e coerente com os
pressupostos assumidos e que dão suporte ao trabalho do professor (eles estão
bem especificados nas áreas de atividades ou, então, subsumidos nos
objetivos). Os volumes apresentam, para leitura ou escrita, variação entre
gêneros, e favorece ao aluno, assim, o encontro necessário com aspectos
organizacionais/textuais desses gêneros e funcionais típicos dos gêneros
apresentados.
Esta obra, Português: uma proposta para o letramento, sugere, de fato,
várias atividades que podem conduzir à ampliação de habilidades e da
competência lingüística e discursiva dos alunos. A seleção de conteúdos e sua
exposição é, também, a nosso ver, apropriada à idade das crianças – o que é,
sem dúvida esperado e desejado.
105
5. 2
Considerações sobre a coleção:
Português na ponta do lápis ... e da língua.
Ao examinarmos a coleção Português na ponta do lápis... e da língua
observamos, quanto à consideração da variação lingüística, que ele também
busca estimular a reflexão sobre o uso da linguagem: há atividades voltadas à
produção de textos orais e de leitura e escrita. No vol 3 (pg. 218),
encontramos menção e apresentação de língua indígena (Guarani). Trata-se de
uma atividade importante não só pela abordagem da pluralidade cultural, mas
também porque, sabemos, muitas palavras dessa língua fazem parte de nosso
dia-a-dia (como “Itapetininga”, “Itapecerica” e muitas outras). No vol. 2 (pg.
46/47) aparece o dialeto regional-caipira e, no mesmo volume 2 (pgs. 18/19;
21/22), temos português de Portugal. As variações dialetais e de registro,
embora não sejam abordadas metodicamente na coleção, distribuem-se de
forma assistemática ao longo dos volumes. No vol. 1 (pg. 67), por exemplo, há
proposta de leitura oral dialogada, com orientação para o aluno “falar de um
jeito mais sério, como se fosse um adulto” – ao assumir este papel, os alunos
podem perceber a variação entre fala adulta e infantil.
Deve-se dizer que esta coleção orienta o professor a não emitir juízo de
valor (“certo” e “errado”) frente às produções dos alunos (Vol.2., pg. 48) . Na
seção “Pense, use e abuse” do Vol.2 (pgs. 54/57) há vários exercícios que
visam a exploração de variações regionais. Além disso, esporadicamente:
Exemplo 1:
(1) apresentação da língua indígena.
Observe o quadro. As palavras relacionadas na primeira coluna são todas de origem
indígena, originaram-se especialmente do tupi e do guarani antigos.
106
A palavra no
português é
A palavra na língua
indígena é
Ela significa É o nome de
Itajobi Ita-jub-y Rio da pedra
amarela
Cidade de São
Paulo
Itamaju Ita-mojuba Pedra pintada de
amarelo
Cidade da Bahia
Itaobim Ita-oby Pedra verde Cidade de Minas
Gerais
Itapecerica Ita-pyssyryca Pedra escorregadia Cidade de Minas
Gerais
Itapetim Itapé-tinga Laje branca Cidade de
Pernambuco
Itapetininga Itapé-tininga Laje seca Cidade de São
Paulo
Itapecuru Itapé-curu Laje ondulada Rio do Maranhão
Itapecuru-mirim Itapecuru-miri Rio itapecuru Pequeno rio do
Maranhão
1. Analisando as palavras indígenas do quadro é possível fazer descobertas interessantes:
a. Na língua indígena, o que significa Ita?
b. O que significa itapé?
c. A palavra mirim é de origem indígena. O que ela significa?
2. Rubem Braga Nasceu em Cachoeiro de Itapemirim.
a. A palavra Itapemirim é de origem indígena? Como você sabe?
b. O que significa essa palavra?
(Português na ponta do lápis e... da língua – volume 3, pág.218)
Exemplo 2:
(2) variação entre fala adulta e fala infantil
107
Exercício 7. Para ir à festa de Sofia, Michel pegou um ônibus. E você: tem o costume de
andar de ônibus?
Na terra do Faz-de-conta existe uma empresa de ônibus chamada Feliz Viagem, que deseja
atender melhor os seus passageiros. Por isso, a empresa resolveu entrevistar você e seus
colegas.
Em grupos, leiam as perguntas feitas a seguir e pensem no que vão responder. Depois
escrevam as respostas no livro.
Quando terminarem, escolham um colega para apresentar para a sala as respostas do
grupo. Ele vai falar de um jeito mais sério, como se fosse um adulto. Por isso, façam um
ensaio da apresentação.
Quando tudo estiver pronto, o professor Faz-de-conta que é um dos donos da empresa
Feliz Viagem e lê a pergunta da entrevista. Então, o seu colega de grupo responde como
foi ensaiado.
EMPRESA DE ONIBUS FELI VIAGEM
Entrevistados; ______________________________
a) Quem tem o costume de andar de ônibus?
b) Quanto custa a passagem de ônibus na sua cidade? Esse preço é igual para todos os
ônibus?
c) Aqueles que já andaram ou andam de ônibus acham esse transporte confortável? Por
que?
d) Aqueles que nunca andaram de ônibus usam que tipo de transporte?
e) As pessoas de sua comunidade costumam se levantar e dar o seu lugar na cadeira para
pessoas mais velhas ou grávidas quando o ônibus está lotado? O que vocês acham disso?
f) Que ônibus passa perto da escola de vocês?
(Português na ponta do lápis e... da língua – volume 1, pág.67 )
Exemplo 3:
(3) à distinção entre língua padrão x língua popular
O texto (A miiinha mãe) foi escrito na linguagem coloquial, isto é, na linguagem do dia-a-
dia, simples e despreocupada. Essa linguagem foi usada para deixar o texto mais parecido
108
com uma conversa de verdade entre pessoas conhecida. Imagine como ficariam as frases
abaixo se não representassem um jeito descontraído de falar. Depois, escreva no caderno
a nova redação.
a. Por isso que ela pode dar mais atenção pra mim e pro meu irmão.
b. E eu mesma só te contando porque sou sua amiga.
(Português na ponta do lápis e... da língua – volume 3, pág.30 – grifo meu)
Exemplo 4:
(4) jargão
Exercício 3. Releia:
Vendi meus troços que eu tinha,
O resto eu dei pra guardá
Por que o migrante se desfaz de suas coisas?
Exemplo 5:
(5) variação geográfica.
Atividade referente ao texto “Garantia de uma festa caprichosa” em referencia a festa
popular amazonense.
Atividade 2. Releia
É uma febre: a temperatura começa a subir, o volume das toadas se eleva, invade as ruas,
entra pelas casas, agita as lojas...
Dezenas de barcos começam a atracar, abarrotados de turistas que já passam toda a
viagem ao balanço das toadas.
Uma multidão de turistas invade as ruas que ganham ares de cidade praieira, com as
pessoas(...) caindo nos dois-prá-lá-dois-prá-cá das toadas.
Grupos de adultos e crianças, ao som dos acordes das toadas brincam de boi no meio da
rua.
109
Sem utilizar o dicionário, escreva em seu caderno uma definição para a palavra toada.
Para isso, observe o sentido dessa palavra nos trechos anteriores.
(Português na ponta do lápis e... da língua – volume 3, pág.223/224 )
De fato, o livro didático PPLL é enfático sobre a questão da variação e
das variedades lingüística e isso se nota mais explicitamente nas orientações
dadas ao professor: pede-se que ele considere que a modalidade oral não é
uniforme, mas que apresenta variação regional e de registro. Se admitirmos
com Touch (1979) que o diálogo com as outras crianças e, sobretudo com o
professor, pode ser uma das experiências escolares mais importantes para a
criança, o diálogo se transforma num instrumento precioso de ensino
aprendizagem. Pois bem, em todas as unidades desta coleção, há a sessão Bate
papo que o instiga. Ao final das unidades, encontra-se sempre um breve
resumo em que se pretende mostrar ao aluno que falar está em foco em sua
aprendizagem, tanto quanto escrever.
Parece-me justo afirmar que nesta coleção, o PPLL, o aluno é levado a
escrever sempre sobre gêneros mais relacionados à escrita (história, carta,
poema, artigo de revista, lista, lei, entre outros) e, geralmente, relacionados à
leitura. Nele, também, observa-se a diversidade de tipos de textos (narrativos,
expositivos, argumentativos e poéticos). Com freqüência, são indicados os
objetivos e o suporte em que o texto chegará ao leitor (livro, revista, jornal,
mural, etc).
Segundo Possenti (1996), a diversidade de interlocutores permite à
criança produzir diferentes tipos de textos com diferentes funções. O professor
deve, portanto, propiciar condições para que o aluno venha a ter contato e
produza diversos tipos de textos (narrativos, argumentativos, atas, cartas de
110
vários tipos, entre outros). No PPLL, o tratamento destinado à
caracterização da fala (e de sua variedade) é criterioso e propõe-se uma
reflexão sobre o funcionamento textual em que se ressalta a relação entre as
formas e sentido textuais
.
Exemplificando:
Na unidade Um dia na cidade, eu, _______________________
(escreva seu nome)
Li...
poemas de autores diferentes;
placas de trânsito;
textos expositivos;
pinturas;
desenhos;
cartuns;
histórias em quadrinhos;
convite de aniversário;
explicações do dicionário;
capa de livro;
mapa;
itinerário de ônibus que vem no
catálogo;
texto de revista;
resenhas;
Fi
z...
placas de vários tipos;
desenhos;
texto para uma história em
quadrinhos;
convite de aniversário;
ficha de anotações;
definições de palavras;
respostas em um questionário;
respostas em uma entrevista;
avaliações do meu trabalho e
dos colegas.
111
No vol.1 (pg. 111/115), há exercícios focalizando a relação entre as
modalidades da língua,
Exemplo 1:
Atividade 4 página 112.
Depois de fazer uma leitura silenciosa, leiam em voz alta os textos a seguir, como se
estivessem falando normalmente. Depois, dentro dos parênteses escrevam O, se tiverem
fala a letra destacada como O. escrevam U, se tiverem falado a letra destacada como U.
Exemplo;
( ) o sapo não lava o pé.
Se, ao ler a letra O da palavra SAPO, vocês falaram U em vê de O, escrevam U dentro dos
parênteses. Veja;
( U) o sapo não lava o pé.
( ) Cedinho o galo cantava no galinheiro.
( ) A pomba se remexia na terra, levantando muito pó.
( ) O pato nadava rápido, de um lado para o outro.
( ) O sapo descansava no lago cheio de peixes.
( ) O macaco se pendurava nos galhos e no cipó.
( ) A raposa caçava pequenos bichos no mato.
Atividade 10 página 115.
Leiam em voz alta, como se estivessem falando:
O garoto tomou tanto sorvete que ficou rouco.
Gostou muito de macarrão, mas comeu só um pouco.
A raposa roubou os ovos do bem-te-vi.
No dia a dia, na conversa entre amigos e parentes, as palavras destacadas são faladas do
mesmo jeito que são escritas?
( )SIM ( ) NÃO
112
Atividade 12 página 115.
Recortem palavras em revistas ou jornais e colem na coluna correspondente:
Palavras faladas
como GALO
(O com som de U)
Palavras faladas
como BAIXA (I
não é falado)
Palavras faladas
como TOMOU
(U não é falado)
Palavras faladas
como SENTAR
(R não é falado)
(Português na ponta do lápis e... da língua – volume 1 )
No vol.3 (pág. 228), há cuidado em assinalar a importância da
entonação, da expressão corporal e de outros recursos que podem tornar a
leitura uma atividade mais atraente para o aluno:
Exemplo:
Para ouvir e pensar.
O texto a seguir será lido pelos alunos escolhidos por seu professor para
representar as várias personagens.
Eles farão uma leitura dramática, ou seja, uma espécie de encenação na qual os
“atores” não precisam saber o texto de cor, não se movimentam pela cena e não há
cenário nem figurino.
Diferentemente da leitura comum, na leitura dramática os leitores-atores lêem
antecipadamente o texto, estudam as melhores entonações a serem usadas e ensaiam
alguns gestos e expressões faciais.
O texto referido acima é Auto da Compadecida.
(Português na ponta do lápis e... da língua – volume 3, pág.228 )
113
Pudemos notar que a coleção PPLL também não se prendeu na
exploração de conhecimentos ortográficos, nem de noções gramaticais. Nesta
coleção (PPLL), o enfoque teórico-metodológico deve favorecer, o
desenvolvimento de habilidades lingüísticas dos alunos, como procurei
mostrar. Kramer (1989: 76), criticando o uso meramente escolar que se faz da
escrita, afirma que a prioridade pedagógica deve estar voltada para os usos
sociais da língua escrita e não para exercícios estereotipados que visam
memorização de categorias e regras gramaticais. O PPLL está bem alinhado às
idéias de Kramer, portanto. Questões específicas de língua (gramaticais) são
trabalhadas, como já disse, mas no entremeio, “por entre” a lida da criança
com os usos da linguagem.
Concluímos, de nossa investigação, que ambas as coleções propõem
atividades centradas no texto - esse espaço relacionado aos usos da
linguagem. O texto fica em evidência e, em sua pluralidade, gêneros
diversificados são apresentados. Aspectos lingüísticos, em sentido estrito, não
são ignorados, mas, como disse, são introduzidos em pontos pertinentes e
circunstanciados.
114
CONCLUSÃO
115
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