Porém, seria um engano pensar que há consenso em relação a isso. Leffa (2006)
problematiza a questão da variedade a ser ensinada, principalmente com relação a
línguas multinacionais. O autor afirma que se deveria ensinar
(...) a variedade local da língua multinacional. No caso do ensino do
inglês no Brasil, por exemplo, não se preocupar se se deve ensinar inglês
britânico ou inglês americano; ensine inglês brasileiro como uma variedade
legítima da língua inglesa. Assim como existe o inglês dos Estados Unidos,
da Inglaterra, e mesmo da Nigéria, existe também o inglês de Gerard
Depardieu, com sotaque francês, o inglês de Antônio Banderas, com sotaque
espanhol, e pode existir, com toda legitimidade, o inglês do Brasil. Não há
razão para supor que os brasileiros devam falar inglês como falantes nativos
que, a propósito, são uma minoria entre os falantes da língua. Uma das
condições para que o inglês seja uma língua multinacional é aceitar a
diversidade da própria língua. (LEFFA, 2006, p. 70) [grifo do autor]
Leffa prevê o uso da L2 atendendo a modificações que uma comunidade falante
sinta a necessidade de fazer. Dessa forma, a língua multinacional adquire diferentes
características de acordo com o grupo que a fala, assim como os gaúchos atribuem
características diferentes dos cariocas ao uso da Língua Portuguesa – e nem por isso a
tornam incompreensível aos demais falantes dela. Por sua vez, o posicionamento de
Thomas (1983) aponta para a importância do compartilhamento de determinados
aspectos da língua:
(...) corrigir falhas pragmáticas derivadas de enganos
sociopragmáticos
2
é uma situação muito mais delicada para o professor de
língua que corrigir falhas pragmalingüísticas. Decisões sociopragmáticas são
sociais antes de serem lingüísticas, e enquanto aprendizes estrangeiros são
razoavelmente acessíveis em relação a correções consideradas lingüísticas,
são justificadamente menos abertos no que se refere a terem seu julgamento
social (ou mesmo político, religioso ou moral) colocado em dúvida.
3
(THOMAS, 1983, p. 104) [tradução nossa]
Não apenas no ambiente de ensino (presente na citação), certos usos da língua
por parte do aprendiz podem não corresponder ao socialmente esperado pelo
interlocutor, havendo a possibilidade de provocarem situações constrangedoras.
Naiditch (1998), por exemplo, comenta sobre o uso que uma aluna fez do enunciado
The cat is under the table ao ver o gato de uma família americana, que visitava na
2
Thomas faz a distinção entre fenômenos pragmalingüísticos, que se referem à materialidade lingüística,
e sociopragmáticos, ligados ao caráter social da língua.
3
No original: (...) correcting pragmatic failure stemming from sociopragmatic miscalculations is a far
more delicate matter for the language teacher than correcting pragmalinguistic failure. Sociopragmatic
decisions are social before they are linguistic, and while foreign learners are fairly amenable to
corrections which they regard as linguistic, they are justifiably sensitive about having their social (or even
political, religious, or moral) judgement called into question.