Download PDF
ads:
Selena Duarte Lage e Lage
A pertinência das Operações Urbanas
no Paradigma do Urbanismo Democrático e Includente:
Reflexões a partir da análise da regulamentação e aplicação do instrumento
em Belo Horizonte
Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil
Escola de Arquitetura da UFMG
2008
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, cheia de gratidão, à minha família querida, fonte de amor, exemplo e força para
seguir sempre em frente.
Agradeço também à família kistemann Chiodi, pelas conversas, apoio e carinho.
De coração, agradeço à minha orientadora, Profª. Jupira G. de Mendonça, que me mostrou
ser, além de excelente professora, orientadora e profissional, um exemplo de ser-humano a ser
seguido. Ao longo do meu percurso como mestranda, todos os professores e profissionais com
os quais tive a oportunidade do contato foram essenciais à minha formação e, apesar de o
citar nomes, gostaria de agradecer a todos eles.
Enfim, agradeço aos técnicos do Poder Público de Belo Horizonte, em especial à Flávia
Mourão e Valéria Braga, pela disponibilidade em ajudar na pesquisa. Espero que este trabalho
contribua não apenas para a discussão acadêmica, mas também para uma prática urbanística
em busca de cidades espacialmente e socialmente mais justas.
ads:
SUMÁRIO
Introdução 01
1. Contexto e Histórico do Instrumento das Operações Urbanas
13
Origem das parcerias público-privado na reestruturação de espaços urbanos 14
A introdução do Instrumento das Operações Urbanas no Brasil 22
O que muda (ou deveria mudar) com o Estatuto da Cidade 26
2. A Legislação Urbanística Belo-Horizontina Pós-Constituição de 1988
31
O processo de elaboração e aprovação do PD e da LPOUS/96 belo-horizontinos 32
As principais inovações e suas limitações 44
As Conferências Municipais de Política Urbana e suas contribuições 50
3. Operações Urbanas Paulistanas e Belo-Horizontinas: diferenças e semelhanças
53
As experiências de operações urbanas em São Paulo 54
As operações urbanas no contexto da gestão democrática: o caso de Belo Horizonte 61
Diferenças e Semelhanças 68
4. A Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque
70
Histórico da antiga Cervejaria Antárctica 72
A proposta de Operação Urbana 73
O posicionamento do COMPUR 77
O posicionamento da Câmara 79
O processo de licenciamento ambiental 83
A situação atual 90
5. Reflexões Finais
98
Função Social da Propriedade 98
Planejamento x Gestão 102
Gestão Democrática 105
Política x Técnica 107
Referências Bibliográficas 109
Anexos 118
LISTA DE ENTREVISTADOS
Assessora da Secretária da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana –
Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.
Secretária da Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente Prefeitura Municipal
de Belo Horizonte. Gerente Executiva do Conselho Municipal de Política Urbana
(COMPUR – Belo Horizonte) à época da discussão sobre a Operação Urbana do
Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque.
Supervisora de estudos de impacto da Gerência de Diretrizes Viárias – GEDIV /
Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte (BHTRANS) Prefeitura
Municipal de Belo Horizonte.
Arquitetos-restauradores da Gerência de Patrimônio Histórico / Secretaria Municipal
Adjunta de Regulação Urbana – Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.
Engenheiro civil-consultor da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH).
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
(em ordem alfabética)
ADE – Área de Diretrizes Especiais
ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade
ASVGO – Associação dos Voluntários do Bairro Guarani
BHBUS – Plano de Reestruturação do Sistema de Transporte Coletivo de Belo Horizonte
BHTRANS – Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte
CA – Coeficiente de Aproveitamento
CDPCM-BH – Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural - Município de Belo Horizonte
CEMIG – Companhia Energética de Minas Gerais
CEPAC – Certificado de Potencial Adicional de Construção
CNDU – Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano
CMBH – Câmara Municipal de Belo Horizonte
CMI – Câmara do Mercado Imobiliário
COMAM – Conselho Municipal de Meio Ambiente
COMPUR – Conselho Municipal de Política Urbana
CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito
CREA – Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura
EA – Entrevistada A. Assessora da Secretária da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação
Urbana – Prefeitura Municipal de Belo Horizonte
EB – Entrevistada B. Secretária da Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente –
Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Gerente Executiva do Conselho Municipal de
Política Urbana (COMPUR Belo Horizonte) à época da discussão sobre a Operação Urbana
do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque
EC Entrevistada C. Supervisora de estudos de impacto da Gerência de Diretrizes Viárias
GEDIV / Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte (BHTRANS) Prefeitura
Municipal de Belo Horizonte
EIA / RIMA – Estudo de Impacto Ambiental / Relatório de Impacto Ambiental
HIS – Habitação de Interesse Social
IAB – Instituto dos Arquitetos do Brasil
IPTU – Imposto Predial Territorial Urbano
LDU – Lei de Desenvolvimento Urbano
LI – Licença de Implantação
LOLicença de Ocupação
LP – Licença Prévia
LPOUS – Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo
MNRU – Movimento Nacional pela Reforma Urbana
PBH – Prefeitura de Belo Horizonte
PCA – Plano de Controle Ambiental
PD – Plano Diretor
PFL – Partido da Frente Liberal
PL – Projeto de Lei
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PT – Partido dos Trabalhadores
RIC – Relatório de Impacto na Circulação
RMBH – Região Metropolitana de Belo Horizonte
SEMPLA – Secretaria Municipal de Planejamento - São Paulo
SINDUSCON – Sindicato da Indústria da Construção
SMPL – Secretaria Municipal de Planejamento
SMMAS – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Saneamento Urbano
SMRU – Secretaria Municipal de Regulação Urbana
ZA – Zona Adensada (LPOUS/96)
ZAP – Zona de Adensamento Preferencial (LPOUS/96)
ZAR – Zona de Adensamento Restrito (LPOUS/96)
ZC – Zona Central (LPOUS/96)
ZCBH – Zona Central de Belo Horizonte (LPOUS/96)
ZE – Zona Especial (LPOUS /85)
ZEIS – Zona de Especial Interesse Social (LPOUS/96)
ZHIPZona Hipercentral (LPOUS/96)
ZP – Zona de Proteção (LPOUS/96)
ZPAM – Zona de Proteção Ambiental (LPOUS/96)
ZR – Zona Residencial (LPOUS /85)
LISTA DE FIGURAS
FIG. 1 - Vista parcial da Rua Oiapoque e da Antiga Cervejaria Antarctica em 2003 ____
71
FIG. 2 - Vista parcial da Rua Oiapoque e da Antiga Cervejaria Antarctica em 2003 ____
71
FIG. 3 - Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em 2003 _______________
73
FIG. 4 - Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em 2003 _______________
73
FIG. 5 - Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em 2003 _______________
73
FIG. 6 - Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em 2003 _______________
73
FIG. 7 -
Localização e Zoneamento dos empreendimentos envolvidos na Operação
Urbana do Conjunto da Av. Oiapoque _______________________________________ 76
FIG. 8 - Lotes que configuram o terreno do empreendimento Pátio Savassi __________ 87
FIG. 9 - Vista parcial do Pátio Savassi. Acesso pela Av. do Contorno _______________
90
FIG. 10 - Vista parcial do Pátio Savassi. Acesso pela Av. N. Senhora do Carmo ______ 90
FIG. 11 - Vista parcial do Pátio Savassi. Acesso pela R. Lavras ___________________ 90
FIG. 12 - Vista interna do Pátio Savassi ______________________________________ 90
FIG. 13 - Localização do Pátio Savassi, do Chevrolet Hall e da Casa do Whisky ______
93
FIG. 14 - Esquina das avenidas do Contorno e N. S. do Carmo ____________________
93
FIG. 15 - Esquina das avenidas do Contorno e N. S. do Carmo ____________________
93
FIG. 16 - Área de influencia do Pátio Savassi de acordo com RIC _________________
94
FIG. 17 - Área de abrangência das intervenções realizadas no trânsito no entorno do
Pátio Savassi ____________________________________________________________
94
FIG. 18 - Vista parcial da fachada do conjunto tombado e terminal de ônibus da Av.
Oiapoque ______________________________________________________________ 95
FIG. 19 - Vista parcial da fachada do conjunto tombado e terminal de ônibus da Av.
Oiapoque ______________________________________________________________ 95
FIG. 20 - Vista interna do Shopping Oi ______________________________________ 96
FIG. 21 - Vista interna do Shopping Oi ______________________________________ 96
FIG. 22 - Vista interna do Shopping Oi ______________________________________ 96
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Síntese do acordo estabelecido pela Operação Urbana do Conjunto
Arquitetônico da Av. Oipoque – no caso do imóvel tombado ______________________
82
QUADRO 2 – Síntese do acordo estabelecido pela Operação Urbana do Conjunto
Arquitetônico da Av. Oiapoque – no caso do empreendimento do Pátio Savassi _______
82
QUADRO 3 Síntese dos prazos e penalidades estabelecidos na Operação Urbana do
Conjunto Arquitetônico da Av. Oiapoque _____________________________________ 82
RESUMO
Entre as transformações econômicas, sociais e políticas vivenciadas pelo mundo a
partir do último quarto do século XX, estão as novas formas de relação entre os setores
público e privado. A partir da cada de 1970 começaram a se formar parcerias em que
agentes privados se envolvem no financiamento e/ou gestão de atividades antes tidas como de
competência da administração pública.
No que tange aos espaços urbanos, as parcerias entre os setores público e privado
surgiram primeiramente nos países da Europa e nos Estados Unidos, como meio de realização
de grandes intervenções relacionadas, principalmente, à re-territorialização das atividades
econômicas, face à reestruturação produtiva do capitalismo. Naqueles países, as parcerias
público-privado estão profundamente vinculadas à ascensão das políticas neoliberais, que,
reduzindo o papel do Estado e aumentando a participação e força da iniciativa privada, se
mostram mais comprometidas com as questões de ordem econômica em detrimento das
questões sociais.
No Brasil, as parcerias público-privado em intervenções urbanas surgiram a partir de
meados da cada de 1980. O Instrumento das Operações Urbanas, que se constitui em um
instrumento de implementação de projeto urbano por meio de parceria entre os setores público
e privado, foi instituído em vários planos diretores municipais, entre os quais o Plano Diretor
de Belo Horizonte, aprovado em 1996.
Apesar das parcerias público-privado no Brasil se espelharem nos exemplos europeus
e norte-americanos, e não obstante a ascensão de governos neoliberais no país desde sua
redemocratização, tais parcerias, aqui no Brasil, têm a particularidade de estarem imersas no
Paradigma do Urbanismo Democrático e Includente anunciado pela Constituição de 1988 e
reafirmado pelo Estatuto da Cidade.
Assim, este trabalho busca analisar a pertinência do Instrumento das Operações
Urbanas no novo paradigma do urbanismo estabelecido no campo normativo brasileiro.
Afinal, estaria o instrumento fatalmente alinhado à vertente do urbanismo comprometida com
as forças do mercado, sendo assim um equívoco da vertente que visa a uma maior justiça
social e à promoção da democratização do planejamento e da gestão das cidades? Parte-se do
pressuposto de que o instrumento não tem a propriedade, por si só, de estar alinhado a esta ou
àquela vertente do urbanismo; tudo dependerá da forma como os municípios regulamentam e
aplicam as operações urbanas, assim como da correlação de forças existentes nos mesmos.
Para essa discussão, o trabalho inicia-se contextualizando o surgimento das parcerias
público-privado na Europa, Estados Unidos e, especialmente, no Brasil, apresentando-se um
histórico do Instrumento das Operações Urbanas no país. Em seguida, por utilizarmos para
aprofundamento da discussão da experiência de regulamentação e aplicação do instrumento
no município de Belo Horizonte, discute-se a legislação belo-horizontina pós-Constituição de
1988, sendo explicitados seus princípios-base. Posteriormente, comparam-se as operações
urbanas belo-horizontinas com as paulistanas, uma vez que os principais estudos sobre o
instrumento no Brasil tratam destas últimas. Então, a partir do estudo mais detalhado da
“Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque”, em Belo Horizonte, e
também da análise das demais operações urbanas belo-horizontinas, são feitas reflexões e
sugestões para uma prática do instrumento em consonância com o paradigma anunciado pela
Constituição de 1988, a fim de contribuir para a construção de cidades mais justas e
democráticas.
Palavras-chave: parceria público-privado; política urbana; legislação urbana
1
Introdução
Especialmente a partir do último quarto do século XX, o mundo vem experimentando
mudanças econômicas, sociais e políticas. Face ao esgotamento do modelo fordista/taylorista,
reestrutura-se o sistema capitalista e os papéis dos seus atores. Surgem novas formas de
relação entre os setores público e privado.
Ainda na década de 1970, começaram a se formar na Europa e Estados Unidos
parcerias em que agentes privados se envolvem no financiamento e/ou na gestão de atividades
antes tidas como de competência exclusiva da administração pública. O cenário dessas
práticas tem como pano de fundo a crise do Estado de Bem-Estar Social (Wellfare State) e a
ascensão da ideologia neoliberal de redução do papel do poder público e aumento da
participação e força da iniciativa privada. Em relação aos espaços urbanos, as parcerias
público-privado naqueles países possibilitaram renovação de áreas decadentes
1
, gerando
oportunidades econômicas e otimizando a arrecadação tributária.
Nos anos 1980, quando já eram muitas as cooperações organizacionais e financeiras
estabelecidas entre os setores público e privado na Europa e Estados Unidos, o Brasil
encontrava-se em processo de redemocratização, numa conjuntura de crise econômica, estatal
e política (CARDOSO, 1997). A crise econômica se deu como conseqüência de anos de
endividamento sistemático através do qual a economia brasileira manteve um ritmo de
crescimento acelerado. Posto que o Estado se encontrava no centro das relações produtivas, a
crise da conjuntura econômica levou à crise estatal. Já a crise política é marcada pela
emergência de novos sujeitos políticos e sociais que forçavam a redemocratização do país.
Nesta conjuntura, surgem os movimentos sociais, os quais apresentavam demandas que
contrariavam a lógica de atuação do Estado autoritário, capturado pelos interesses capitalistas.
Em meio à eclosão de tais movimentos, estavam os grupos daqueles ligados à problemática
urbana no Brasil.
1
Nesses casos, referem-se como “áreas decadentes” aquelas que, em virtude da reestruturação econômico-
produtiva do capitalismo, foram abandonadas ou ficaram subutilizadas, algumas vezes ocupadas por população
de baixa renda, geralmente em péssimo estado de conservação. Trataremos do assunto mais detalhadamente no
capítulo 1 deste trabalho.
2
A urbanização brasileira iniciou-se principalmente nos anos 1930, como resultado do
processo de “substituição de importações”, acelerou-se nos anos 1950 e atingiu seu auge nas
décadas de 1960 e 1970, sob o regime militar. Foi durante este período que ocorreu a
institucionalização do planejamento urbano no Brasil, seguindo a matriz
modernista/funcionalista. “A concepção de planejamento urbano, então em vigor,
correspondia à idealização de um projeto de cidade do futuro, que seria executado ano a ano
até chegar a um produto final (o modelo de cidade desejada)” (ROLNIK, 2001, p.115). Foi
também durante o regime militar que as cidades brasileiras experimentaram enorme
crescimento populacional, que correspondeu a um processo crescente de exclusão social e
espacial. As manchas urbanas se espraiaram com grande quantidade de áreas subutilizadas,
enquanto imensa parte da população, mal localizada, não tinha (e ainda não tem) acesso aos
“privilégios” da urbanização.
O processo de urbanização brasileira seguiu um modelo econômico/industrial de
concentração de renda e forte desigualdade sócio-econômica. A década de 1980 enseja uma
mudança desse quadro. O Projeto da “Lei de Desenvolvimento Urbano” (LDU), cuja primeira
versão foi formulada ainda na década de 1970 no âmbito do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Urbano (CNDU), inovava ao estabelecer como base da política de
desenvolvimento urbano a questão social, além de definir instrumentos visando à
regularização fundiária e contenção da especulação imobiliária. Entretanto, tal projeto de lei
(que chegou à Câmara dos Deputados ganhando o número 775/83) não chegou a ser
aprovado.
No bojo do processo de redemocratização do país, a elaboração da Constituição
Federal em meados dos anos 1980 abriu possibilidade de apresentação de emendas populares.
Segundo Cardoso (1997, p.87-88), essa possibilidade foi o grande catalisador de
transformação da luta pela melhoria das condições urbanas (antiga, importante dizer) em
movimento nacional: o Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU). Ele começou no
Rio de Janeiro, onde um grupo de entidades profissionais e sindicais elaborou o núcleo da
proposta que, antes mesmo de ser concluída, foi aglutinando forças, principalmente em São
Paulo, e incorporando também os setores do movimento popular que lutavam por terra e
moradia. Pode-se dizer que a proposta final do movimento a “Emenda Popular pela
Reforma Urbana” se alinhava às idéias apontadas pela LDU. De acordo com Cardoso
(1997, p.89), a emenda se baseou nos seguintes princípios gerais: obrigação do Estado a
3
assegurar os direitos urbanos a todos os cidadãos; submissão da propriedade à sua função
social; direito à cidade (garantia de acesso de toda a população aos benefícios da
urbanização); gestão democrática da cidade.
Como resultado, o Congresso Constituinte aprovou um capítulo dedicado à política
urbana na Constituição Federal de 1988 (capítulo II, artigos 182 e 183). Em relação a tal
questão, três pontos da carta constitucional merecem destaque: a transferência de
responsabilidades à esfera municipal, a abertura de possibilidades da participação popular
(gestão democrática) e a reafirmação do princípio de função social da propriedade, assim
como a inclusão da idéia de função social da cidade (FERNANDES, 1998; CARDOSO,
1997). Não obstante grande parte das propostas da emenda popular não ter sido inserida no
texto constitucional
2
, sobre o resultado final deste, “pode-se dizer que, de maneira geral, os
setores chamados progressistas alcançaram vitórias expressivas, principalmente no campo
dos direitos e das políticas sociais” (CARDOSO, 1997, p.9).
Assim, a Constituição Federal de 1988 pode ser considerada um marco na construção
de um novo paradigma no urbanismo brasileiro. Nesse caso, referimos-nos como “urbanismo”
o conjunto de teorias (pensamentos, idéias, discursos) e também práticas que tratam do espaço
urbano, incluindo, portanto, o “planejamento urbano” e os projetos urbanos”
3
. Analisemos a
seguir por que a Constituição de 1988 faz despontar um novo padrão de se pensar a questão
urbana no Brasil.
Em primeiro lugar, ela reafirma o princípio da função social da propriedade. Apesar
de este princípio ter estado presente em todas as constituições federais a partir de 1934 isto
é, nas constituições de 1937, 1946, 1967/69 e 1988 segundo Fernandes (1998, p.216), até
1988 ele não tinha sido adequadamente definido. Além disso, a idéia de função social da
propriedade conflitava com a idéia individualista do direito de propriedade do Código Civil de
1916, de forma que “o crescimento urbano se deu sob inúmeras controvérsias jurídicas
acerca da possibilidade de intervenção estatal no domínio dos direitos individuais de
2
Um balanço entre o que foi proposto e o que foi efetivamente aprovado está explicitado em COSTA, 1988,
p.890-891.
3
Essa concepção de urbanismo é compartilhada por alguns autores, entre eles Ascher em “Métapolis, ou
l’Avenir des Villes” (1995, apud COMPANS, 2005), enquanto outros, como Souza (2004) acreditam que
planejamento urbano tem sentido mais amplo, englobando o urbanismo, que se constitui em um planejamento
meramente físico ou estético.
4
propriedade” (FERNANDES, 2001, p.20-21). Nesse sentido, o novo Código Civil de 2002
(Lei N° 10.406/02) apresenta avanços ao trazer uma concepção de direito de propriedade
menos individualista, que, segundo o documento, “deve ser exercido em consonância com
suas finalidades econômicas e sociais” (Art.1228, §1°).
Como são múltiplas as vertentes da função social da propriedade, permeando diversos
dispositivos legais, deve-se entendê-la como um princípio ou conceito. Tal princípio/conceito
nasceu da filosofia cristã - da qual Santo Thomas de Aquino é o maior representante - a partir
da idéia de que a propriedade não pode ser usada em detrimento da sociedade. Em meados do
século XIX, este pensamento começa a influenciar alguns juristas, sendo Auguste Comte o
primeiro a rever as idéias tomistas, seguido de Leon Duguit. Segundo Silva (2000, p.17),
“foram as necessidades coletivas diretas que vieram a impor a observância de tal princípio”,
de modo que não pode ser indiferentemente que a data de revisão dessas idéias pelos juristas
coincida com a do grande crescimento das cidades causado pela Revolução Industrial. As
idéias cristãs acabaram por se espraiar por diversas ordens jurídicas, recaindo principalmente
sobre o direito de propriedade, e se constitucionalizaram nas constituições do México de 1917
e da Alemanha de 1919. A pretensão dos juristas não era acabar com o direito de propriedade,
mas sim moldá-lo, adaptá-lo às exigências de ordem social, afinal, “porque o homem vive em
sociedade, sendo parte de um grupo, o Direito deve fundamentar-se na solidariedade social”
(SILVA, 2000, p.19).
No Brasil, pode-se dizer que mesmo depois da Constituição de 1988 e do Código Civil
de 2002 a idéia da função social da propriedade se mostra vaga, sem definições claras.
Somekh (2001, p.85), aludindo a Saule Jr., diz que “a função social da cidade estará sendo
atendida de forma plena quando forem reduzidas as desigualdades sociais, e promovidas a
justiça social e a qualidade de vida urbana”. Para Silva (2000, p.23), “a função social da
propriedade traduz-se numa não contrariedade a interesses sociais relevantes pelo titular do
direito de propriedade”. Silva (2000, p.24) também acredita que o princípio da função social
da propriedade ainda está por demandar operacionalidade por parte do legislador, do
administrador, do juiz e da sociedade civil. A Constituição de 1988, não definindo
explicitamente o princípio da função social da propriedade, transfere a responsabilidade do
cumprimento do princípio à esfera municipal, estabelecendo que “a propriedade urbana
cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação do plano
5
diretor” (Art. 182, §2°). Neste trabalho, a função social da propriedade será entendida como
nos propõe Di Sarno (2001, p.70): como uma exigência de que o imóvel “não realize as
expectativas de seu proprietário como as necessidades da coletividade na qual ele se insere”.
Além da função social da propriedade, um segundo princípio demonstrativo de um
novo paradigma do urbanismo brasileiro enunciado pela Constituição de 1988 é o da gestão
democrática. Em seu artigo primeiro, parágrafo único, o texto constitucional afirma: “Todo o
poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição”. Desde o final da década de 1980, vêm sendo instituídos em todo
o país canais de participação direta da população em complementaridade ao contexto da
democracia representativa. Dessa forma, coexistindo com o direito de eleger seus
representantes, os cidadãos passam a ter oportunidades de expressarem diretamente e, em
alguns casos, deliberarem sobre assuntos de seus interesses. De acordo com os chamados
setores progressistas, a participação popular direta, principalmente na esfera municipal, posto
que é a esfera governamental mais próxima da população, aliada à prevalência do princípio de
função social da propriedade e da cidade, seria a fórmula para o desenvolvimento de cidades
socialmente mais justas.
Os princípios da função social da propriedade e da gestão democrática nos abrem a
outras duas questões despontadas no novo paradigma do urbanismo brasileiro: a explicitação
da dimensão política do processo de urbanização em detrimento de sua dimensão puramente
técnico-científica, e a valorização da idéia de gestão urbana. A explicitação da dimensão
política do urbanismo está em não reduzir a problemática urbana apenas a uma questão de
ordem técnica. Entende-se que a produção e a reprodução do espaço urbano estão
intimamente vinculadas às relações de força e poder nas sociedades
4
. Como afirmou Benévolo
em As origens da Urbanística Moderna” (1981), a suposta separação entre urbanismo e
política não passa de ilusão, pois toda opção urbanística tem conteúdo político e, assim, a
urbanística é (e sempre foi) uma parte da política. Nesse caso, o termo “política” abarca uma
acepção ampla: não se trata (apenas) de política partidária, nem (apenas) da redução da
política ao Estado ou forma de organização de poderes. Na sua acepção abrangente, a política
4
Essa idéia chega ao Brasil sob influencia dos discursos de corte marxista, de origem na Europa e Estados
Unidos a partir do final da década de 1960. Como obras importantes nesse sentido, podemos destacar: “O direito
à cidade” (LEFEBVRE, 1969; 1.ed. francesa, 1968); “A revolução urbana” (LEFEBVRE, 2004; 1.ed. francesa,
1970); “A justiça social e a cidade” (HARVEY, 1980; 1.ed. americana, 1973); “A questão urbana”
(CASTELLS, 1983, 1.ed francesa, 1972).
6
pode ser entendida como elemento inerente ao homem enquanto ser social, envolvendo todo
tipo de relação e organização necessárias à vida comum.
Vinculado à concepção de urbanismo enquanto indissociável da política, ganha força o
conceito de gestão urbana em relação ao planejamento urbano estático, correspondente a um
projeto “ideal” imposto de cidade. Este tipo de planejamento remete-nos a uma visão
centralizadora e tecnocrática, a qual dominava o sistema de planejamento do país e se mostrou
ineficiente em produzir cidades justas e equilibradas. Num sentido contrário ao de imposição
e controle cnico-estatal, o conceito de gestão se fundamenta numa concepção de cidade
continuamente construída e transformada por todos os cidadãos que dela fazem parte. Nesse
sentido, o espaço urbano, atravessado pela política, passa a ser visto como uma
responsabilidade coletiva.
Os preceitos constitucionais estabeleceram as condições iniciais para uma reforma do
marco conceitual sobre a questão urbana no Brasil rumo aos ideais progressistas de justiça
social. Tais preceitos foram reproduzidos nas redações de legislações estaduais e municipais
(como as constituições estaduais, leis orgânicas e planos diretores) elaborados posteriormente
a 1988. O Estatuto da Cidade, Lei Federal N° 10.257 aprovada em julho de 2001, reafirma os
preceitos constitucionais; ela regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição e estabelece
diretrizes gerais da política urbana, oferecendo uma gama de instrumentos para o
cumprimento das mesmas. Entretanto, a consolidação dos preceitos reformistas na prática
urbanística brasileira tem se revelado frágil, vejamos.
Ao lado da vitória, pelo menos no campo normativo, da agenda progressista, o Brasil
também vem experimentando, desde sua redemocratização, a ascensão de governos
neoliberais, os quais se mostram mais comprometidos com a causa econômica, em detrimento
da causa social. Além disso, a mobilidade adquirida pelo capital com a globalização
financeira e a reestruturação econômico-produtiva fizeram aumentar a competição entre
estados e municípios pela atração de investimentos, negócios e empresas, introduzindo novas
“prioridades” na pauta da ação pública local.
Assim, no Brasil de hoje, observam-se duas vertentes (ou duas agendas, de acordo
com Compans [2004]), em muitos aspectos antagônicas, no urbanismo brasileiro. Uma delas é
mais comprometida com os problemas sociais, indissociáveis das questões políticas, a outra é
7
mais orientada para o mercado e as questões de ordem econômica. A primeira é composta
pelos setores participantes do debate em prol da reforma urbana. “Essa concepção [a
concepção progressista de reforma urbana] pode ser caracterizada como um conjunto
articulado de políticas públicas, de caráter redistributiva e universalista, voltado para o
atendimento do seguinte objetivo primário: reduzir os níveis de injustiça social no meio
urbano e promover uma maior democratização do planejamento e da gestão das cidades”
(SOUZA, 2006, p.158). A segunda vertente, estreitamente vinculada à emergência do
pensamento liberal, procura, através de intervenções (principalmente estéticas) localizadas,
atrair investimentos e inserir a cidade (ou região) no mercado global. A esta vertente se alinha
o chamado “planejamento estratégico” e sua principal ferramenta, o marketing urbano (city
marketing). Tal vertente do urbanismo vem sendo criticado por alguns autores brasileiros por
seu caráter não-democrático e excludente (ARANTES, 1998; VAINER, 2000) e também pela
sua importação de forma alheia às especificidades do Brasil (MARICATO, 1997 e 2000).
Apesar de guardarem objetivos divergentes, a agenda do planejamento estratégico
apresenta discursos semelhantes àqueles presentes na pauta dos movimentos urbanos
progressistas, como a defesa pela gestão descentralizada e pela participação da sociedade civil
no processo de planejamento e gestão urbanos e a ênfase numa abordagem mais efetiva e
menos discursiva.
Por precisar “gerar consensos” necessários à sua própria aceitação, o planejamento
estratégico insiste fortemente em questões como a gestão participativa e a importância
do chamado “terceiro setor”. Por outorgar um papel central e competitivo às cidades, o
planejamento estratégico especial ênfase aos governos locais. Por necessitar criar
“pólos geradores” da renovação urbana competitiva, o planejamento estratégico se
apropria de formas de planejamento que se apóiam na seleção de áreas especialmente
representativas das problemáticas existentes, elegendo-as para sofrer uma intervenção
exemplar (FERREIRA, 2007, p.121).
A defesa pela vertente “liberal” do urbanismo em favor de conceitos caros ao
movimento urbano progressista parece ter gerado certa confusão entre teóricos e
administradores urbanos. Tal confusão pode ser observada na gestão de algumas cidades
brasileiras: governos historicamente orientados para uma das vertentes ora se mostram
8
“deslumbrados” com a outra, sendo por vezes difícil tachar suas ações de “progressistas” ou
“neoliberais” (FERREIRA, 2007, p.121-123).
Também se percebe nos governos locais brasileiros uma tentativa de conciliação das
duas agendas. Em algumas cidades, a incorporação dos princípios da reforma urbana o
impediu que, ao mesmo tempo, se desenvolvessem estratégias competitivas, com intuito de
alcançar ou consolidar a posição da localidade como centro econômico regional, nacional ou
internacional (COMPANS, 2005, p.16). Em Belo Horizonte, experiências como as do
Orçamento Participativo e dos muitos conselhos que contam com participação popular, entre
eles o Conselho Municipal de Política Urbana (COMPUR), coexistem com práticas que visam
principalmente à promoção da cidade para atração de atividades econômicas
5
.
Para além da confusão ideológica apontada por Ferreira e da coexistência de práticas
urbanísticas de orientações divergentes, faz-se importante a questão da arbitrariedade na
aplicação das leis no Brasil, vastamente discutida nos textos de Maricato (1997 e 2000). A
história do urbanismo no Brasil mostra a existência de enorme distância e, às vezes, oposição,
entre sua retórica e sua prática: enquanto textos e discursos versam sobre direitos universais e
normatividade cidadã, na prática da gestão urbana observa-se cooptação, favor, discriminação
e desigualdade. Desse modo, textos legais e instrumentos urbanísticos não garantem o que
Maricato afirma ser principalmente resultado de correlação de forças.
É nesse complexo contexto que se desponta a polêmica a respeito do Instrumento das
Operações Urbanas no Brasil. Enquanto alguns estudiosos acreditam que o instrumento vem
servindo para criar maior espaço de atuação às forças do mercado (em consonância aos ideais
neoliberais) sem contribuir para a redução dos problemas sociais, senão agravando-os (FIX
2004 e 2001), outros consideram-no importante como forma de captação da valorização
imobiliária decorrente de decisões e investimentos públicos (DE AMBROSIS, 1999),
alinhado ao pensamento progressista de mais justa distribuição dos bônus e ônus da
urbanização. A polêmica a respeito do instrumento das operações urbanas aumentou ainda
mais desde que foi regulamentado pelo Estatuto da Cidade, documento considerado de cunho
progressista.
5
Em trabalho intitulado “Intenções Estratégicas no Planejamento Urbano de Belo Horizonte: Modernização
Espacial, Internacionalização e City marketing”, Pereira (1998) demonstra como algumas práticas na
administração belo-horizontina de intervenções físicas ou “construção” de imagens se revestem de forte intenção
“estratégica”.
9
Trata-se de um instrumento de implementação de um projeto urbano (e não apenas da
atividade de controle urbano) para uma determinada área da cidade, implantado por meio de
parceria entre os setores público e privado. Como na Europa e Estado Unidos, também no
Brasil a demanda pelo instrumento de parceria partiu principalmente da crise financeira do
Estado, que (supostamente) inviabiliza o financiamento puramente estatal de grandes
intervenções urbanas. Aqui no Brasil, a discussão sobre o Instrumento das Operações Urbanas
incorporou também a discussão sobre a recuperação de investimentos públicos, em debate no
país desde a década de 1970, quando começaram a ser propostos instrumentos como o Solo
Criado” e a “Contribuição por Melhoria”.
Muito da polêmica que gira em torno das Operações Urbanas se deve à maneira como
vêm sendo efetivadas em São Paulo. Neste município o Instrumento tem abrangido extensas
áreas da cidade e contabilizado grande soma de dinheiro, servindo, principalmente, para
alimentar os lucros do capital imobiliário. Afinal, seriam as Operações Urbanas um equívoco
no novo paradigma do urbanismo anunciado pela Constituição de 1988 e reafirmado pelo
Estatuto da Cidade? Estaria o Instrumento fatalmente alinhado à vertente do urbanismo
comprometida com as forças do mercado?
Essas questões nos levam a três hipóteses de respostas: a primeira, uma resposta
afirmativa às perguntas; a segunda, uma resposta negativa; a terceira, a qual nos parece mais
acertada, é que a orientação do Instrumento das Operações Urbanas dependerá da sua
formulação e implementação no nível municipal. Partimos do pressuposto de que o
Instrumento o tem a propriedade, por si só, de ser benéfico ou nocivo na construção de
cidades mais justas, ou de estar alinhado a esta ou àquela vertente do urbanismo. Assim é que
autores como Maricato e Ferreira (2002) e Souza (2006) o deixam de acreditar que o
instrumento pode gerar melhorias urbanísticas de maneira democrática e includente,
dependendo da maneira como é regulamentado e aplicado. Para estes autores, é
imprescindível o monitoramento pelos cidadãos como forma de garantia do cumprimento dos
interesses da maioria.
Em Belo Horizonte, município que vem sendo governado por coalizações de centro-
esquerda desde 1993, o Instrumento das Operações Urbanas foi inserido no Plano Diretor
sancionado em 1996 (Lei 7.165/06), cujo processo de elaboração e aprovação contou com
a participação da sociedade civil organizada. O Plano Diretor belo-horizontino estabelece que
10
cada operação urbana deve ser prevista em lei específica a ser aprovada na Câmara (Art.67).
As leis de operações urbanas em Belo Horizonte também devem passar pelo crivo do
Conselho Municipal de Política Urbana (COMPUR), instituído no Plano Diretor (Art.80), o
qual é composto por membros do Executivo, da Câmara Municipal e dos setores técnico,
popular e empresarial, mas de caráter apenas consultivo. Dependendo do tamanho e
complexidade dos empreendimentos construídos via operações urbanas, eles também
necessitam passar, para fins de licenciamento ambiental, pelo Conselho Municipal de Meio
Ambiente (COMAM) (Lei 7.277/97), que, assim como o COMPUR, conta com
representantes do Executivo, Legislativo e dos setores técnico, empresarial e popular (Decreto
9.330/97). Além disso, dependendo dos imóveis envolvidos nas operações, é necessária a
apreciação de outros dos conselhos existentes no Município, como o Conselho Deliberativo
do Patrimônio Cultural (CDPCM-BH).
Assim, entende-se que no caso belo-horizontino o instrumento das operações urbanas
está inserido num contexto de gestão democrática. A partir da avaliação da implementação
deste instrumento em Belo Horizonte, em especial da “Operação Urbana do Conjunto
Arquitetônico da Avenida Oiapoque”, este trabalho pretende avaliar a pertinência das
Operações Urbanas no discurso progressista, ou seja, se de fato têm sido utilizadas a favor do
interesse coletivo e o apenas do das classes dominantes. Mais que isso, pretende-se analisar
quais seriam os entraves e limites para o cumprimento de tal propósito, a fim de superá-los.
Trata-se de uma questão técnica, uma vez que está relacionada com a formatação técnica e
legal do instrumento, mas, acima de tudo, entendemos ser esta uma questão de ordem política,
pois se vincula profundamente à relação de forças presentes na sociedade.
Enfim, o trabalho tem a intenção de contribuir na discussão a respeito dos avanços,
assim como dos elementos e questões impeditivos na consolidação do Paradigma do
Urbanismo Democrático e Includente anunciado pela Constituição Federal de 1988.
11
Metodologia e estrutura expositiva
Como ponto de partida, o Capítulo 1 contextualiza o surgimento das parcerias público-
privado relativas à questão urbana. São discutidos primeiramente os casos europeus e norte-
americanos e, em seguida obedecendo-se a ordem cronológica dos acontecimentos
discute-se o surgimento dessas parcerias no contexto brasileiro. É feita uma análise de como
tais parcerias, vinculadas na Europa e Estados Unidos à emergência da ideologia neoliberal,
adquiriram no Brasil uma roupagem progressista. É apresentado o histórico do Instrumento
das Operações Urbanas no país, discutindo, por último, as mudanças trazidas pelo Estatuto da
Cidade referentes a tal instrumento.
No Capítulo 2 são discutidos os processos de elaboração e aprovação do Plano Diretor
e da Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo/96 belo-horizontinos (documentos que,
não por acaso, foram elaborados e aprovados juntos), os atores envolvidos nesses processos e
seus posicionamentos, tratando-se mais detalhadamente da inclusão e regulamentação do
Instrumento das Operações Urbanas. O capítulo apresenta as principais questões instituídas na
legislação urbanística belo-horizontina pós-Constituição de 1988, sobre as quais a prática
urbana do município incluindo-se a implementação das operações urbanas deve se
fundamentar.
O Capítulo 3 oferece uma comparação entre as operações urbanas paulistanas e belo-
horizontinas. A partir de um panorama sobre as operações urbanas implementadas em São
Paulo e em Belo Horizonte até o momento, oferecendo-se também uma contextualização das
mesmas, são apresentadas as principais diferenças e semelhanças entre elas. Uma vez que os
principais estudos brasileiros a respeito do instrumento das operações urbanas tratam das
experiências paulistanas, acreditamos que a comparação da implementação das operações
urbanas nessas duas cidades de contextos tão diversos nos permitirá avançar no estudo sobre o
instrumento.
O Capítulo 4 apresenta um estudo mais detalhado a respeito da Operação Urbana do
Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque, em Belo Horizonte. A escolha dessa operação
urbana como estudo de caso se deu pela complexidade da parceria que envolveu duas
importantes áreas da cidade e dois empreendedores privados, além do Poder Público e pelo
senso comum relativo ao seu “sucesso”. Para conhecimento aprofundado sobre a Operação
12
Urbana do Conjunto da Avenida Oiapoque, foram analisados documentos arquivados nos
processos da Prefeitura de Belo Horizonte e feitas entrevistas com técnicos do Poder Público
de alguma forma participantes da operação urbana em questão. Infelizmente os
empreendedores privados envolvidos na parceria o se dispuseram a prestar seu depoimento
sobre a questão, o que nos privou de uma análise da parceria sob o ponto de vista da iniciativa
privada. Por outro lado, a recusa em contribuir para um estudo sobre as operações urbanas
belo-horizontinas nos revela certo temor da parte dos empreendedores por revelações o
interessantes a eles.
Por fim, o Capítulo 5 - Reflexões Finais constitui-se em análises, comentários e
sugestões sobre a regulamentação e aplicação do Instrumento das Operações Urbanas, a
partir, principalmente, do estudo de caso da Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da
Avenida Oiapoque. As reflexões se dão sob o enfoque dos princípios apontados na
Constituição de 1988 - função social da propriedade, gestão democrática, política versus
técnica e gestão versus planejamento – também sendo demonstrada a inter-relação entre eles.
As parcerias público-privado, como propõe o Instrumento das Operações
Urbanas, têm ganhado muito espaço nas políticas públicas brasileiras e, por isso, é preciso
analisar seus limites e potencialidades na construção de cidades mais justas.
13
1.
Contexto e Histórico do Instrumento das Operações Urbanas
Sobretudo a partir da década de 1970, encontram-se os países, especialmente aqueles
do capitalismo central, num processo de reestruturação sócio-político-econômica. Os sinais
desse processo são modificações em sistemas de trabalho, hábitos de consumo, configurações
geográficas e geopolíticas, poderes e práticas do Estado, entre outros.
Autores como Harvey (1992 e 1995) e Sassen (1998) relacionam tal processo de
reestruturação, entre outras questões, aos avanços da tecnologia, ao esgotamento do sistema
de produção fordista/taylorista, à crise do Wellfare State e à subseqüente emergência das
políticas neoliberais. Em verdade, todos esses fatores estão relacionados entre si. O
esgotamento do sistema fordista, o qual estrutura-se a partir de um Estado forte e provedor,
levou à crise do Welfare State, que, entretanto, também está relacionada a uma forte
contestação política, cultural e moral (HARVEY, 1992). Por sua vez, a emergência de novos
padrões tecnológicos e organizacionais impulsionados também pelo surgimento e
concorrência do modelo japonês de produção, o chamado “toyotismo” tornou ainda mais
evidente a inadequação da lógica fordista/taylorista. Os avanços da tecnologia, especialmente
na área de transportes e comunicação, possibilitaram a superação das barreiras espaciais,
permitindo uma descentralização global das atividades de produção nunca antes vislumbrada.
No setor financeiro, os avanços tecnológicos aliados a decisões políticas
6
- permitiram uma
circulação mais fácil e rápida (senão instantânea) do capital pelo mundo, adquirindo o setor
maior “peso” na economia.
Dessa forma, surgem novos sistemas de produção e de marketing caracterizados por
processos de trabalho e mercados mais flexíveis, mobilidade geográfica e rápidas mudanças
de consumo. Entretanto, as regras básicas do capitalismo continuam a operar invariantes a
lógica regente é a obtenção de lucros. Ao contrário de abalar a estrutura econômica
6
“A recessão norte-americana levou o país a abandonar a paridade dólar/ouro em 1971, e a adotar políticas
de dinamização econômica de cunho essencialmente financeiro, e não industrial, (...). Além disso, deve-se
ressaltar o fim do controle do movimento de capitais e a liberação da taxa de juros pelo governo inglês no final
da década de 70 e, já nos anos 80, a liberação generalizada do mercado de ações” (FERREIRA, 2007, p.100).
14
capitalista, essas transformações, de acordo com Ferreira (2007), foram essenciais para a
garantia de sobrevivência da economia-mundo capitalista
7
.
Apoiando-se o capitalismo na necessária expansão constante do consumo, o marketing
e a publicidade adquiriram significativa importância no novo contexto de mobilidade e
flexibilidade exacerbados. Vender passou a ser tão importante, senão mais, do que produzir.
Nesse cenário, inicia-se (ou ganha mais fôlego) uma corrida pela atração dos fluxos
transnacionais do capital, o qual veio a desencadear, entre outras questões, um quadro de
competição entre cidades.
Origem das parcerias público-privado na reestruturação de espaços urbanos
A nova organização econômica e produtiva do capitalismo repercutiu na estrutura
espacial das cidades. Como dito anteriormente, as novas tecnologias de comunicação,
transporte, informática e robotização permitiram a reorganização do setor produtivo em linhas
muito mais compactas, flexíveis e de maior mobilidade geográfica, segmentando a produção
pelo mundo conforme os interesses de lucratividade das empresas. Tal fenômeno gerou uma
onda de “desindustrialização” que, além de minar as bases econômicas de várias cidades
(especialmente daquelas cujo forte era o setor de produção), provocou um abandono de
antigas áreas/zonas, principalmente das industriais e portuárias.
Ao lado do processo de dispersão da produção, novas formas de centralização
territorial despontaram-se. As cidades, não mais abrigando grandes complexos da produção
industrial, adquirem maior importância enquanto centros financeiros, comerciais, culturais, de
lazer e de eventos, passando o setor de serviços a predominar sobre o setor de produção em
muitos centros urbanos.
Nesse processo de reestruturação espacial das cidades, a demanda por serviços
públicos aumentou quantitativa e qualitativamente. Porém, também relacionado à
7
De acordo com argumentos marxistas, o capitalismo está fadado a periódicas crises de superacumulação. De
fato, as condições que prevaleciam nos anos 1930 (após a queda da bolsa de 1929) e que surgiram novamente
desde início da década de 1970 podem ser consideradas manifestações da tendência de superacumulação.
Segundo Ferreira (2007), a ruptura das barreiras espaciais pelos avanços da tecnologia aliada a um processo de
transformações político-ideológicas m possibilitado frentes mundiais de expansão do mercado, garantindo a
sobrevivência de um capitalismo “à beira da exaustão”.
15
reestruturação do capitalismo, iniciou-se na mesma época um processo de “falência” do
Estado: trata-se de dificuldades de ordem financeira e organizacional.
Pode-se dizer que o sistema fordista de produção – de origem no início do século XX e
ápice no pós-guerra foi mantido, e atingiu altas taxas de crescimento, devido a um sistema
de cooperação (ou parceria) entre os principais atores envolvidos: o capital corporativo, o
trabalho organizado e o Estado. O capital corporativo teve que se ajustar em certos aspectos, o
trabalho organizado teve de assumir novos papéis e funções, e o Estado, por sua vez, assumiu
uma variedade de obrigações (HARVEY, 1992):
Na medida em que a produção de massa, que envolvia pesados investimentos em
capital fixo, requeria condições de demanda relativamente estáveis para ser lucrativa,
o Estado se esforçava por controlar ciclos econômicos com uma combinação
apropriada de políticas fiscais e monetárias no período pós-guerra. Essas políticas
eram dirigidas para as áreas de investimento público em setores como o transporte,
os equipamentos públicos, etc. vitais para o crescimento da produção e do consumo
de massa e que também garantiram um emprego relativamente pleno. Os governos
também buscavam fornecer um forte complemento ao salário social com gastos de
seguridade social, assistência médica, educação, habitação, etc. Além disso, o poder
estatal era exercido direta ou indiretamente sobre os acordos salariais e os direitos dos
trabalhadores na produção (HARVEY, 1992, p.129).
Assim, a crise do Estado provedor contribuiu para a inviabilidade do sistema fordista
e, reciprocamente, a crise do sistema fordista levou à falência o Estado provedor. Os novos
padrões tecnológicos e organizacionais aumentaram a produção ao mesmo tempo em que
instauraram um processo de substituição de mão-de-obra viva pela máquina, crescendo o
desemprego, que, somado à desindustrialização, gerou crise fiscal e um alto custo de
manutenção do chamado Estado de Bem-Estar Social (Wellfare State), acarretando um
processo paulatino de déficit de arrecadação do setor público.
Do ponto de vista financeiro, dificultou-se o balanço entre “demanda” por intervenção
pública e “oferta” de meios financeiros. Do ponto de vista organizacional, Bernareggi (1992)
lembra-nos que a ação pública pode falir quanto ao objetivo de eficiência, entendida como
minimização dos custos por unidade de “produto”, e quanto ao objetivo da equidade,
entendida como redistribuição da renda real.
16
Paralelamente à crise do Welfare State, e como conseqüência desta, emergiram as
políticas neoliberais. A ideologia neoliberal defende a redução do campo de atuação do
Estado, destinando ao setor privado da economia papel mais significativo. A emergência de
tais políticas logicamente resultou numa maior abertura de atuação do mercado, inclusive na
execução de obras e prestação de serviços ao setor público.
Face a esse contexto, em que o complicado cenário econômico-financeiro-
organizacional do Estado alia-se à opção político-ideológica neoliberal, novas cooperações
entre os setores público e privado surgiram na Europa e Estados Unidos a partir,
principalmente, de meados da década de 1970. Trata-se agora de parcerias em que
envolvimento dos agentes privados no financiamento e/ou na gestão das atividades de
competência, a princípio, do setor público, fora dos instrumentos tradicionais de finanças
públicas, tais como a tributação.
Tais parcerias, entendidas como sustentáculo privado à atividade econômica pública,
podem se dar de muitas maneiras. A partir do texto de Bernareggi (1992), assim podemos
esquematizá-las:
a) a parceria pode se dar através de remuneração indireta do agente privado na
realização de atividades públicas, isto é, consistir não tanto dos lucros da
própria atividade, mas sim em encomendas ou facilidades de crédito obtidas
em conexão com esta, ou na redução de custos por ela proporcionados.
Tendo em vista essa rentabilidade indireta, o agente privado na iniciativa
mista pode considerar conveniente financiá-la mesmo que a rentabilidade
direta seja nula ou negativa para ele;
b) a administração pública pode fornecer uma contribuição não financeira,
oferecendo bens dos quais seja proprietária (por exemplo, áreas edificáveis),
ou vantagens em termos de regulamentação (por exemplo, concessões de
licenças ou modificações da lei de uso e ocupação do solo);
c) através da participação consultiva dos agentes privados nos processos
decisórios públicos;
17
d) através de estrutura jurídica-organizativa atribuída ao agente público, por
exemplo, na forma de sociedade por ações “gestão pública indireta com
estruturas de caráter privado”;
e) através de “entrega”da realização e ou gestão de atividades públicas a um
agente privado, que é remunerado pela própria administração pública ou
pelos usuários privados dos serviços realizados. Nesse caso, pode-se falar de
“privatização”.
Além dessas formas de parcerias, ainda as inúmeras possibilidades de combinações
entre elas. No entanto, enquanto nas duas primeiras formas citadas é fácil visualizar
possibilidades de intervenções empenhando-se menos recursos públicos, nas outras não
efeito direto de redução dos gastos da administração pública. Porém, segundo Bernareggi
(1992), estas formas de parceria também podem ser consideradas “remédios” para as
dificuldades financeiras do setor público na medida em que o agente privado consegue
produzir com custos menores em comparação com a administração pública devido à sua
maior eficiência gerencial e à possibilidade de remuneração via ganho de capital financeiro
(quando a atividade privada é organizada sob a forma de sociedade por ações, pois certos
investimentos podem gerar valorização de ações).
Entretanto, para além do suporte financeiro às atividades do setor público, as parcerias
público-privado devem ser entendidas enquanto convergência de objetivos distintos: parte-se
do pressuposto de que o Estado tem como meta o desenvolvimento social (às vezes de forma
indireta, a partir de desenvolvimento econômico), ao passo que os empresários visam maior
lucratividade ou, num raciocínio contrário, menor prejuízo ou, às vezes, segurança e
estabilidade. A lógica está na possibilidade de o Estado utilizar de incentivos que atraiam a
participação do capital privado em atividades/intervenções de interesse coletivo.
No que tange aos espaços urbanos, as parcerias público-privado surgiram na Europa e
Estados Unidos como meio de realização de grandes intervenções, especialmente aquelas
relacionadas à re-territorialização das atividades econômicas. Antigas estruturas industriais,
portuárias e ferroviárias, apesar de bem servidas de infra-estrutura e geralmente localizadas
em áreas centrais, perderam drasticamente sua função original. Muitas delas foram
abandonadas ou ficaram subutilizadas, ou, em alguns casos, ocupadas por população de baixa
18
renda em condições precárias de habitabilidade. Assim, as parcerias público-privado
possibilitaram a restauração e readaptação dessas estruturas e de seu entorno.
Nos Estados Unidos, construções de shoppings e de áreas de lazer funcionaram muitas
vezes como elemento catalisador do processo de “renovação” urbana. Como exemplo desses
empreendimentos, temos o “Faneiul Hall Marketplace”, que inclui “Quincy Market”, em
Boston, o “Ghirardelli Square”, em São Francisco, “South Street Seaport”, que inclui o
“Píer17”, em Nova York e “Haborplace”, em Baltimore. A natureza dos projetos desses
empreendimentos (uma parcela deles foi objeto de concurso público), assim como o grau de
participação dos investimentos privados na implementação dos mesmos, variou bastante. Em
alguns casos, para administrá-los formaram-se agências de desenvolvimento com participação
de empresários, grupos comunitários e poder público. Tais iniciativas alavancaram
oportunidades econômicas, sobretudo no setor terciário, gerando emprego e renda e
otimizando a arrecadação tributária.
Em Baltimore, a construção do Haborplace” fez parte de um amplo processo de
recuperação físico-econômica da cidade. Depois de longo tempo numa situação privilegiada
na economia regional e nacional devido a sua localização
8
e o seu porto, já na década de 1950
Baltimore se encontrava em declínio sócio-econômico. Desde então, programas e planos para
a cidade, especialmente nas áreas centrais, foram elaborados e negociados pelo Poder Público
junto à iniciativa privada. Sobre a recuperação do bairro histórico de Fells Point em
Baltimore, iniciada em 1984, relata-nos Vicente Del Rio
9
(DEL RIO, 1990) que foram
elaboradas no âmbito do “Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano” diretrizes
de uso e ocupação do bairro que, apesar de, pelo menos a princípio, não terem amparo legal,
foram acatadas e em parte financiadas pela iniciativa privada. Certamente a adesão por parte
do setor privado aos planos e diretrizes aconteceu porque estes se mostraram vantajosos ao
setor.
8
Baltimore se localiza ao fundo da baía de Chesapeak, junto ao rio Potomac, na costa leste dos EUA, a uma hora
de carro da capital do país, Washington.
9
Na época do desenvolvimento do trabalho de “recuperação” de Fells Point, Vicente Del Rio atuava como
visiting urban designer no Departamento de Habitação e Desenvolvimento Comunitário da Prefeitura de
Baltimore.
19
Na Europa, construções de ambientes de compras e lazer também configuraram como
uma das opções mercadológicas em projetos de renovação urbana. No entanto, diferentemente
dos Estados Unidos, onde as parcerias público-privado ganharam contornos mais liberais, nos
casos europeus o controle do Estado se manteve mais forte (MARICATO E FERREIRA,
2002; VARGAS e CASTILHO, 2006). Segundo Vargas e Castilho (2006), por causa do maior
controle do Estado sobre o desenvolvimento das cidades, foram conseguidos benefícios no
campo das políticas urbanas: as intervenções incluíram não apenas o comércio central, mas
a habitação de baixa renda, o sistema de transportes, os espaços públicos e o ambiente
urbano”(VARGAS e CASTILHO, 2006, p.24).
Um exemplo europeu que influenciou as discussões brasileiras sobre as parcerias
público-privado foram as Zones d’Aménagement Concerte - ZACs, instituídas na França no
final da década de 1960 e em vigência até os dias de hoje (Art.L311 do Code de
l’Urbanisme). Nessa iniciativa, áreas consideradas degradadas são adquiridas pelo Estado
(por direito de preempção ou por simples desapropriação), que decide novo uso para elas e
realiza melhorias de infra-estrutura, vendendo-as posteriormente com a mais-valia
produzida pela intervenção - a órgão públicos, para o caso de áreas destinadas a equipamentos
público, e à iniciativa privada, para áreas destinadas a escritórios ou estabelecimentos
comerciais.
Mais recentemente, um exemplo europeu paradigmático, bastante difundido no Brasil,
é o de Barcelona. Nesta cidade, em função da sua escolha como sede das Olimpíadas de 1992,
foi realizado um conjunto de intervenções urbanas, especialmente nas áreas portuárias, a
partir da combinação de grandes quantias de capital público e de empresas interessadas em
capitalizar com o evento e com a posição de destaque da cidade
10
.
Da experiência de reurbanização” de Barcelona montou-se o modelo teórico do que
vem sendo chamado planejamento estratégico”, o qual se fundamenta, principalmente, no
10
Não obstante todas as intervenções urbanas citadas fazerem parte de uma era “pós-fordismo”, em que novas
relações de cooperação entre os setores público e privado têm sido experimentadas, Vargas e Castilho (2006)
entendem as obras de Barcelona como inseridas num período (denominado por elas “Reinvenção Urbana”)
posterior ao estágio de intervenções urbanas em que antigas estruturas industriais transformaram-se em espaços
para comércio, atividades de lazer e cultura (denominado por elas “Preservação Urbana”), embora acreditem que
este último período tenha agido como embrião do primeiro. Segundo estas autoras, foram poucas as inovações de
um período para outro, “o que mudou foi a dimensão dos projetos, o foco da intervenção, a forma de gestão e a
propagação (...)”(VARGAS e CASTILHO, 2006, p.33).
20
conceito de marketing urbano (city marketing). Tal conceito, profundamente vinculado à
problemática da competitividade entre cidades, tem impulsionado, desde a cada de 1970,
grande parte das parcerias público-privado. Nas palavras de Harvey (1992, p.92), “dar
determinada imagem à cidade através da organização de espaços urbanos espetaculares se
tornou um meio de atrair capital e pessoas (do tipo certo) num período (que começou em
1973) de competição interurbana e de empreendimentismo urbano intensificados”.
Foi sob a égide dessas concepções que os empreendedores imobiliários e o poder
público tornaram-se grandes parceiros:
O primeiro [o capital imobiliário] foi capaz de criar localizações privilegiadas e
induzir a demanda por intermédio da oferta. O segundo [o poder público] buscou a
valorização positiva da imagem da cidade para a captação de investimentos externos
destinados ao desenvolvimento da economia urbana (VARGAS e CASTILHO, 2006,
p.32).
Assim, temos que o poder público local tem facilitado e mesmo apoiado frentes de
expansão do mercado, principalmente do setor imobiliário, além de permitir a
operacionalização de atividades de interesse público pela iniciativa privada, sempre com
intuito de recuperar a base econômica das cidades e, se tudo ocorrer bem, inseri-las no
circuito do capital global.
Uma das discussões acerca das parcerias público-privado é a respeito da transferência
das competências do setor público para o setor privado, que pode vir a gerar privatização de
espaços públicos e exclusão de grupos “indesejáveis”. Contudo, não se deve esquecer que é
intrínseca à concepção de parceria entre os setores público e privado a valorização de uma
participação mais ativa da sociedade nas políticas públicas, de forma que muitas das parcerias
público-privado em intervenções urbanas também têm incorporado, além dos empreendedores
imobiliários, a participação da sociedade civil organizada.
As intervenções urbanas via parcerias público-privado também têm sido discutidas
como marco de ruptura com o modelo de planejamento urbano modernista. Enquanto este se
fundamenta em planos urbanos de larga escala, tecnologicamente racionais, funcionais e
inflexíveis, os projetos urbanos “pós-modernos” (e nesse caso é mais pertinente o uso da
21
palavra “projetos” em vez de “planos” ou “planejamento”) têm se constituído em atuações
específicas para determinadas áreas da cidade, sendo por vezes prestigiadas por se prestarem
como alternativas a legislações de uso do solo rígidas e generalizantes.
Pode-se dizer que tanto o desprestígio do urbanismo modernista/funcionalista quanto o
crescimento do papel do mercado e a difusão do conceito de city marketing fenômenos no
âmbito dos quais despontam-se as parcerias público-privado européias e norte-americanas–
estão vinculados ao fortalecimento do pensamento neoliberal.
O ideário do urbanismo funcionalista correspondia (...) ao Estado provedor, regulador,
portador da razão. Esse Estado foi uma construção resultante da evolução (ou
adaptação) do capitalismo em confronto com as lutas dos trabalhadores durante todo o
período de industrialização. Seu desmonte em virtude do fortalecimento da ideologia
neoliberal determinou também a demolição daquele ideário urbanístico (MARICATO
e FERREIRA, 2002, p.221).
Por sua vez, o conceito de city marketing, e seu principal provedor, o planejamento
estratégico, podem ser entendidos como forças ideológicas para melhor aceitação (ou mesmo
criação de consenso) em torno das práticas mercadológicas neoliberais (VAINER, 2000;
FERREIRA, 2006). O conceito fundamenta-se no pressuposto contestável de que, no
cenário de competitividade face às novas dinâmicas econômicas e produtivas, as cidades
precisam ter capacidade de oferecer condições físicas, mesmo que às vezes superficiais ou
cenográficas
11
, para atrair o capital global. Trata-se de um raciocínio bastante conveniente à
expansão mundial do mercado e fortalecimento de grupos de interesses privados.
Embora seja visível que tenham promovido aquecimento das atividades econômicas e
melhorias estéticas no ambiente urbano, as parcerias público-privado européias e norte-
americanas têm gerado muita polêmica sobre o fato de que estariam beneficiando muito mais
as classes altas e médias, muitas vezes turistas, do que a população-cidaespacialmente e
socialmente excluída, além de ofuscarem com seu “espetáculo” conflitos e desigualdades
sociais.
11
Há muita discussão no âmbito do city marketing a respeito da criação de “cenários” ou “imagens” em
detrimento de espaços de “conteúdo real” (PEREIRA, 2001;VARGAS e CASTILHO, 2006).
22
A introdução do Instrumento das Operações Urbanas no Brasil
No Brasil, a emergência de novos modelos de relacionamento da administração
pública com o setor privado se origina dos exemplos europeus e norte-americanos. As
parcerias entre os setores público e privado em intervenções urbanas têm sido implementadas
nas cidades brasileiras a partir de meados da década de 1980, com nomenclaturas e
configurações variadas, às vezes respaldadas em leis, às vezes estabelecidas em projetos
realizados por acordos entre poder público e iniciativa privada.
Assim como na Europa e Estados Unidos, também no Brasil as parcerias público-
privado estão associadas à crise financeira do Estado, em especial no nível do poder público
local. A partir da Constituição Federal de 1988, muitas foram as responsabilidades
transferidas aos municípios brasileiros, sem que houvesse, entretanto, repasse fiscal
suficiente. Mesmo os ganhos de receita decorrentes da reforma tributária introduzida pela
Constituição de 1988 têm sido insuficientes à demanda dos municípios devido à crise mais
ampla do Estado brasileiro (FINGERMANN e LOUREIRO, 1992).
Aqui no Brasil, como nos casos dos países do capitalismo central, as parcerias
público-privado em intervenções urbanas também têm sido utilizadas para “renovar” áreas
consideradas degradadas e alavancar a economia através da dinamização do mercado.
Podemos citar como exemplos o projeto de restauração do Complexo das Docas, em Belém -
PA, em que antigos galpões de armazenamento em área portuária foram transformados em
espaços de lazer e compras; e o projeto Eixo Tamanduatehy”, em Santo André SP, que se
propôs a “requalificar”
12
o principal eixo de transportes da cidade com construções de
empreendimentos imobiliários como centros empresariais, shoppings e hotéis. As parcerias
brasileiras em intervenções urbanas têm se dado principalmente através de concessões pelo
poder público às legislações urbanas vigentes permite-se aumento da ocupação de terrenos,
instalação de atividades não previstas, etc em troca de contrapartidas financeiras ou por
meio de serviços/obras arcados por empreendedores privados.
12
Termos como “requalificação” ou “revitalização” em propostas de intervenções urbanas são na verdade
bastante ambíguos. Sabemos que muitas vezes tais termos foram utilizados para denominar, em eufemismo,
processos de gentrificação, ou seja, expulsão das classes mais baixas para reocupação de áreas por classes mais
abastadas.
23
Embora nos países europeus e nos Estados Unidos a emergência das parcerias público-
privado esteja claramente associada à ascensão dos ideais neoliberais, no Brasil as parcerias
entre os setores público e privado em intervenções urbanas adquiriram uma roupagem
progressista, pelo menos no campo do discurso. Vejamos por que.
Primeiramente, o Instrumento das Operações Urbanas está presente no Estatuto da
Cidade (Lei Federal Nº 10.257), documento que, no senso comum, carrega uma imagem
progressista (embora as Operações Urbanas não estejam incluídas no Projeto da “Lei de
Desenvolvimento Urbano”(LDU), documento-base de elaboração do Estatuto
13
).
Segundo, o princípio da separação do direito de propriedade do direito de construir,
que fundamenta a venda e a troca do direito de construir, vem sendo discutido no Brasil desde
a década de 1970 com vistas a uma melhor distribuição dos benefícios e custos da
urbanização pensamento alinhado aos princípios progressistas. O reconhecimento do valor
do direito de construir concedido pela legislação urbanística e a intenção de repartir os custos
e ônus da urbanização foram as motivações da introdução da idéia de outorga onerosa do
direito de construir, ou “Solo Criado”, no Brasil.
Uma das primeiras vezes que o instrumento do “Solo Criado” foi mencionado no
Brasil ocorreu em São Paulo em 1976, quando a prefeitura daquela cidade lançou a idéia de
estabelecer um sistema que assegurasse aos proprietários de terrenos o direito de se construir
uma área equivalente à área do terreno (coeficiente de aproveitamento igual a 1,0) e, para
aqueles interessados em construir além, a prefeitura poderia vender o direito de construção
(BRASIL, 2002).
A inspiração para o modelo proposto em São Paulo era o ‘plafond legal de densité’,
que foi instituída em 1975 para toda a França e a experiência da transferência de potencial
construtivo (development right transfer) instituída pelo Plano de Chicago em 1973
(BRASIL, 2002, p.66). Na França, a lei, que definiu coeficiente de aproveitamento de terreno
de 1,0 para toda Paris e 1,5 para o resto do país, visava a corrigir a enorme distorção dos
preços dos terrenos devido à diferenciação de coeficientes de aproveitamento; no caso de
Chicago, a possibilidade de transferência do direito de construir foi criada pelos conflitos
13
Dessa forma, o Instrumento das Operações Urbanas foi acrescentado ao Estatuto da Cidade durante o longo
processo de tramitação da Lei no Legislativo, que se arrastou por 11 anos.
24
existentes decorrentes da aplicação da legislação de tombamento de bens com valor
histórico
14
(BRASIL, 2002).
A proposta de Solo Criado baseia-se no entendimento de que, devido aos avanços da
tecnologia de construção, as múltiplas possibilidades de utilização do espaço aumentam a
demanda por equipamentos públicos e infra-estrutura, de forma que o direito de construir
deva ficar limitado a uma área proporcional à área do terreno, sendo a área que exceder este
limite considerada “solo criado”, o qual, nesse raciocínio, é justo que seja arcado pelo
empreendedor que o “criar”. Assim, uma construção com área superior à estipulada seria
possível pela aquisição do direito pelo poder público, através de compra em dinheiro ou pela
oferta de terrenos ou serviços. Caso o instrumento do Solo Criado fosse associado ao
instrumento da transferência de construir, a construção a mais do que a estipulada também
poderia ser permitida através da transferência do direito de construir de outro terreno, que,
nesse caso, precisaria ter área construída menor que a estipulada. A transferência poderia se
dar entre particulares ou o próprio poder público poderia comprar direito de construir de áreas
de interesse de preservação, ou seja, não construídas, revendendo-o posteriormente a
particulares. Além da justa distribuição dos custos provocados pelo adensamento, o
instrumento do solo criado também tinha como interesse um maior controle do uso do solo.
Durante as décadas de 1970 e 1980 o instrumento do solo criado foi discutido em
congressos e encontros de urbanistas e juristas. Algumas vezes, foi associado à Lei Federal
6.766/79:
(...) assim como o loteador é obrigado a entregar ao poder público áreas destinadas ao
sistema viário, equipamentos públicos e lazer, igualmente o criador de solo deverá
oferecer à coletividade as compensações necessárias ao reequilíbrio urbano reclamado
por solo adicional (O Solo Criado/Carta de Embu
15
, apud BRASIL, 2002, p. 67).
14
Embora ambos os exemplos fundamentem-se no reconhecimento do valor específico do direito de construir,
no caso da transferência do direito de construir, diferentemente do exemplo francês, e também da proposta de
solo criado, o direito de propriedade do terreno permanece garantindo o direito de construir, contudo este pode
ser realizado em outro terreno. Trata-se, assim, de dois instrumentos distintos, que podem ser utilizados
associados ou não.
15
A “Carta de Embu” foi resultado do Congresso sobre o Solo Criado realizado na cidade de Embu em 1977.
25
Foram esses mesmos princípios que fundamentaram a “Lei do Desfavelamento” e as
“Operações Interligadas”, instituídas em São Paulo em meados da década de 1980. Nestas
experiências, que podem ser entendidas como as principais antecessoras das Operações
Urbanas, eram concedidas modificações dos índices e características de uso e ocupação do
solo presentes nas leis em troca de habitações de interesse social para população favelada.
Nota-se que na lógica das operações interligadas, e também das suas sucessoras
operações urbanas
16
, há uma distorção conceitual em relação à versão original de “solo
criado”: a idéia de obtenção de recursos em função de área construída com o objetivo de sanar
a demanda ocasionada pelo próprio adensamento é transformada em possibilidade de
flexibilização da norma urbanística mediante contrapartida. Nestas iniciativas, o propósito de
repartir os custos e ônus da urbanização ou de controlar o adensamento adquire menor
dimensão que a geração de recursos para a prefeitura.
As parcerias público-privado por meio das operações urbanas surgem como proposta
no Brasil ainda nos anos 1980. De acordo com o “Guia para Implementação do Estatuto da
Cidade”:
a demanda pelo estabelecimento de um novo instrumento na experiência brasileira
partiu de quatro matrizes simultâneas nos anos 80: a falta de recursos públicos para
realizar investimentos de transformação urbanística das áreas, a convicção de que
investimentos públicos geram valorização imobiliária que pode ser captada pelo poder
público, a convicção de que o controle do potencial construtivo era a grande moeda’
que o poder público poderia contar para entrar na operação e as críticas às estratégias
correntes de controle de uso e ocupação do solo no sentido de sua incapacidade de
captar singularidades e promover re-desenho ou, em outras palavras, urbanismo
(BRASIL, 2002, p.80).
Por um lado, as operações urbanas m sido defendidas por integrantes dos setores
progressistas, que citam o caráter redistributivo do instrumento na medida em que permite a
recuperação pelo poder público da valorização que os imóveis adquirem com a elevação de
coeficientes de aproveitamento do solo, viabilizando obras com recursos provenientes do
16
As principais diferenças entre operações interligadas e operações urbanas serão discutidas no capítulo 3 deste
trabalho.
26
setor privado e liberando, assim, os limitados recursos do Estado para realizar benfeitorias em
áreas segregadas e carentes de infra-estrutura.
Por outro lado, a instituição e aplicação das operações urbanas no Brasil está também
vinculada ao avanço dos ideais neoliberais de maior autonomia e força do mercado, presentes
nos governos do país desde início da década de 1990. Alinhados a tais ideais, defensores do
planejamento estratégico e do marketing urbano citam as operações urbanas como um
importante instrumento para uma nova forma de gestão concertada, adaptada à nova
economia. Embora numa posição diferente daquela dos países centrais na nova fase
econômico-produtiva do capitalismo
17
, também as cidades brasileiras têm procurado se tornar
atraentes aos olhos do capital global através de intervenções físicas. Tais políticas mostram-se
mais comprometidas com a causa econômica, em detrimento da causa social.
A hipótese defendida neste trabalho é a de que o instrumento das operações urbanas
por si só o está alinhado a essa ou aquela orientação política, nem pode ser entendido como
maléfico ou benéfico na construção de cidades mais justas. Tudo dependerá da forma de
regulamentação e aplicação/uso do instrumento nos municípios, e, nesse sentido, trata-se o
apenas de uma questão de natureza técnica, mas também, e principalmente, de natureza
política.
Dessa forma, a participação e o controle social do instrumento, com intuito de
ampliar e dar transparência aos critérios adotados na sua regulamentação e aplicação, devem
ser entendidos como fundamentais para a garantia de que o instrumento das operações
urbanas seja formulado no sentido de assegurar os interesses da maioria e não apenas das
classes dominantes.
O que muda (ou deveria mudar) com o Estatuto da Cidade
O Estatuto da Cidade”, Lei Federal 10.257 aprovada em julho de 2001 (11 anos
depois da proposição de seu projeto de lei) regulamenta o capítulo da Política Urbana da
17
De acordo com Fix (2001), na medida em que todas as decisões relevantes que se referem à produção e
mercados, entendidos como globalizados,o tomadas por um conjunto restrito de empresas e bancos dos países
centrais, é apenas a economia desses países que de fato adquire mobilidade espacial no novo estágio do
capitalismo. “Os países periféricos aparecem, em princípio, apenas como ‘receptores de padrões de consumo
globais difundidos a partir do centro e, a depender de condições macroeconômicas conjunturais’” (FIX, 2001,
p.116).
27
Constituição Federal de 1988 (artigos 182 e 183). Seu conteúdo teve origem na Emenda
Popular pela Reforma Urbana apresentada durante o processo constituinte, que, por sua vez,
se inspirou no Projeto da LDU, ambos documentos que tinham como princípios norteadores a
função social da propriedade e a gestão democrática. Dessa forma, pode-se dizer que o
Estatuto da Cidade consolida o marco conceitual da Constituição Federal de 1988.
A partir de princípios de justiça, democracia, e sustentabilidade, o Estatuto da Cidade
disponibiliza e regulamenta uma série de instrumentos de política urbana a serem adotados,
ou não, pelos municípios brasileiros. Dentre tais instrumentos, estão as operações urbanas,
com o nome de “Operações Urbanas Consorciadas” (Seção X do Capítulo II). A instituição
das operações urbanas no Estatuto da Cidade, documento considerado de cunho progressista,
proporcionou maior legitimidade ao instrumento, reforçando os discursos em sua defesa.
A lei federal assim define o instrumento:
Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas
coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários,
moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar
em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização
ambiental (Lei Nº 10.257/01, Art.32, §1º).
A Lei institui em seu Artigo 32 que as áreas para aplicação de operação consorciada
devem ser previstas em leis municipais específicas, baseadas no Plano Diretor, e delineia
elementos mínimos de estruturação de uma operação urbana consorciada pelos municípios,
exigindo, na lei específica que aprovar a operação urbana, o plano de operação urbana
consorciada que deve conter, pelo menos, a definição da área a ser atingida, programa básico
de ocupação da área, programa de atendimento econômico e social para a população
diretamente afetada pela operação, finalidades da operação, estudo prévio de impacto de
vizinhança, contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores
privados e forma de controle da operação obrigatoriamente compartilhado com representação
da sociedade civil (Art.33).
Ao exigir forma de controle das operações urbanas obrigatoriamente compartilhado
com representação da sociedade civil, o Estatuto da Cidade reforça a participação popular na
28
gestão das operações urbanas consorciadas. Também a exigência do estudo prévio de impacto
de vizinhança é mais uma abertura à participação da sociedade, principalmente para aqueles
que serão diretamente afetados pelas intervenções.
Com relação aos recursos obtidos pelas contrapartidas em função dos benefícios
concedidos pelo Poder Público, o Estatuto da Cidade exige que sejam aplicados
exclusivamente na própria operação urbana (Lei Nº 10.257/01, Art.33, §1º), o que pode
prejudicar o potencial redistributivo do instrumento. Segundo Di Giuseppe (2001) e também
de acordo com o Guia para Implementação do Estatuto da Cidade (2002), a intenção dessa
exigência é proporcionar visibilidade à aplicação dos recursos e, conseqüentemente, seu
controle. Uma outra vantagem desse mecanismo é o vínculo que proporciona entre o
adensamento construtivo causado pelas operações urbanas em determinada área e o aumento
de sua capacidade de infra-estrutura.
Entretanto, este mecanismo praticamente obriga que operações em áreas de grande
interesse do mercado imobiliário somente possam investir nelas mesmas, perpetuando o
círculo vicioso da concentração das qualidades urbanísticas nas áreas mais exclusivas e
valorizadas (BRASIL, 2002, p.85).
Além disso, muitas vezes as conseqüências de sobrecarga resultante da aprovação de
operações urbanas podem abranger uma região muito maior do que o perímetro da aprovação.
Outro ponto polêmico do Estatuto da Cidade no que se refere às Operações Urbanas
Consorciadas, é a regulamentação do uso do Certificado de Potencial Adicional de
Construção CEPAC (Lei 10.257/01, Art.34). O CEPAC é um título financeiro que pode
ser convertido, na ocasião desejada por seus detentores, em quantidades de metros quadrados
de área de construção computável nas edificações a serem construídas dentro da área da
operação urbana.
A primeira idéia de utilização desse título financeiro surgiu na fase inicial de
implementação da Operação Urbana Faria Lima; mas, por falta de regulamentação federal, a
princípio a idéia não se viabilizou. Segundo Di Giuseppe (2001, p.338), os objetivos da
instituição dos CEPACs é a agilização de aprovação das propostas por meio de um
mecanismo automático de concessão de incentivos e, principalmente, a obtenção prévia de
29
recursos destinados a cobrir os custos de desapropriação e de obras públicas adicionais.
Entretanto, Fix (2004) acredita que um grave problema dos CEPACs é a desvinculação que o
título cria entre a compra do direito adicional de construir e a posse do lote, o que pode gerar
um novo tipo de especulação imobiliária “financeirizada”.
Para Pinho e Filho (2002), o risco de transformar a potencial especulação imobiliária
em efetiva especulação financeira através dos CEPACs pode ser evitado de várias maneiras,
estipulando, na lei específica municipal, por exemplo a possibilidade de que os títulos
sejam leiloados em lotes distribuídos ao longo do tempo, o que inclusive, pode evitar
impactos excessivos na infra-estrutura em fase de implantação. Ou, ainda, estipulando
prazos de conversão de tais certificados em área efetivamente construída, atentando-se
neste caso para o necessário ressarcimento dos certificados não convertidos em direito
de construir (PINHO e FILHO, 2002, p.228).
Como o Estatuto da Cidade consolida a competência municipal no planejamento e
gestão das cidades já afirmada pela Constituição Federal, em que pese a relevância dos
instrumentos jurídicos e urbanísticos regulamentados pela lei federal, o êxito dos mesmos na
construção de uma nova ordem urbana socialmente justa e includente dependerá da maneira
como os municípios deles se apropriarão, assim como da correlação de forças existentes nos
mesmos.
Em São Paulo, o Plano Diretor Estratégico”, aprovado em 2002, contempla as
exigências do Estatuto da Cidade. Em 2004, a redação da Lei da Operação Urbana Faria
Lima, datada de 1995, foi revisada, adequando-se à lei federal. No entanto, segundo
Montandon (2007, p.18), a segunda fase desta operação urbana
ainda não rompeu com o ‘modelo urbanístico’ que promove a elitização do espaço
urbano, através da combinação de incentivo ao adensamento construtivo (e o
exatamente ao adensamento populacional com usos e padrões diversificados), obras
viárias (mais imobiliárias do que viárias) e baixo investimento em produção de
habitações de interesse social.
Em Belo Horizonte, o Plano Diretor do Município é datado de 1996 e foi alterado uma
única vez em lei do ano 2000 (Lei 8.237/00), de modo que os instrumentos de política
urbana instituídos no Plano, entre eles o Instrumento das Operações Urbanas, ainda não foram
30
adequados ao Estatuto da Cidade. Em 2005, em conformidade com as decisões da II
Conferência Municipal de Política Urbana, foi proposto projeto de lei de alteração do Plano
Diretor e da Lei Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo belo-horizontinos (PL 655/05),
conforme as normas do Estatuto da Cidade. No entanto, por razões desconhecidas, o Projeto
de Lei foi suspenso pelo seu autor o Executivo - em dezembro de 2006
18
. Curioso é que em
relação ao Instrumento das Operações Urbanas, o projeto de lei atualmente suspenso
propunha modificações pouco significativas, propondo, no entanto, o acréscimo ao PD de
outro instrumento chamado Operações Urbanas Consorciadas”, que, este sim, contemplaria
as exigências do Estatuto da Cidade. Devido a uma pequena diferença de nomenclatura
ausência/presença da palavra “consorciadas” – caso seja mantida a redação original do PL
655/05, existirá em Belo Horizonte dois instrumentos muito parecidos, de mesmo objetivo,
mas um com maior abertura à participação da sociedade civil na sua gestão que outro. A
proposta de existência de dois instrumentos tão similares, porém diferentes quanto à abertura
à participação popular, soa como um certo receio à gestão participativa, pelo menos em certos
casos.
Não obstante, Belo Horizonte tem demonstrado avanços no desenvolvimento de uma
gestão aberta à participação. O Plano Diretor do Município, que instituiu as operações
urbanas, contou com participação da sociedade civil nos seus processos de elaboração e
aprovação. No capítulo seguinte, discutiremos como se deram esses processos, os atores neles
envolvidos e seus posicionamentos, tratando-se mais detalhadamente da inclusão e
regulamentação do Instrumento das Operações Urbanas. Também serão discutidos os
princípios assimilados pela legislação urbanística belo-horizontina pós-Constituição de 1988,
sobre os quais a prática urbana do Município deve se fundamentar.
18
Informação obtida no Centro de Atendimento ao Cidadão – CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte, em
20/11/07.
31
2.
A Legislação Urbanística Belo-Horizontina Pós-Constituição de 1988
Antes de avançarmos na discussão e no estudo sobre a legislação urbanística belo-
horizontina pós-Constituição, é importante avaliar as maneiras pelas quais o Direito tem se
relacionado com a questão urbana no Brasil. Analisando criticamente o assunto, Fernandes
(1998, p.222-228) argumenta que o Direito se relaciona com os processos urbanos em quatro
níveis principais, ainda que interelacionados:
Como instrumento de planejamento urbano: através de instrumentos para controlar o
processo de uso e desenvolvimento do solo. Entretanto, ao longo do processo de
urbanização brasileiro, a legislação urbanística somente funcionou quando atendeu a
interesses de grupos dominantes. Segundo Fernandes (1998), isso se deu devido à
marginalização da dimensão sócio-político do planejamento urbano.
Como um fator que contribui para a redução dos custos da força de trabalho: a
legislação urbanística, regulamentando o uso do solo urbano apenas quando surgem
desvantagens para o sistema econômico, ou então em situações nas quais o uso do solo
pode ser causa de conflito social, influencia as condições prevalentes muitas vezes,
extremamente precárias de acesso ao solo urbano e à moradia, reduzindo, assim os
custos da força de trabalho.
Como difusor de valores ideológicos dominantes: mesmo com todas as suas
limitações, na medida em que a legislação coloca limites ao abuso de poder
econômico, ela define uma ética” para o capitalismo sem alterar seus aspectos
básicos. As leis urbanísticas, mesmo provenientes dos movimentos populares, têm tido
a finalidade de garantir a sustentabilidade da economia capitalista e suas relações de
produção, e isto as insere numa contradição. O reconhecimento dessa dimensão
ideológica do Direito Urbanístico fatalmente o insere no campo da política.
Como fator importante na produção do espaço urbano: a legislação urbanística tem
uma significativa importância para a determinação do valor da terra urbana, guiando,
assim, a dinâmica de atuação do mercado imobiliário. O processo especulativo tem
32
dela se apropriado segundo suas necessidades, e, por conseguinte, tem estimulado o
processo de periferização dos setores menos favorecidos.
Não obstante, Fernandes (1998) acredita que os princípios da função social da
propriedade e da gestão democrática estabelecidos na Constituição de 1988 proporcionaram
as condições iniciais para uma reforma completa no marco conceitual sobre a matéria. Após a
aprovação da Constituição, os setores progressistas, ligados à Reforma Urbana, passaram a
lutar pela regulamentação e instrumentalização desses princípios no âmbito das legislações
estaduais e municipais.
A Lei Orgânica de Belo Horizonte, aprovada em 1990, introduziu no município o
preceito da administração democrático-participativa. Em 1996, foram aprovados em Belo
Horizonte Plano Diretor (PD) e nova Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo
(LPOUS), as quais contaram com participação direta da população durante seus processos de
elaboração e aprovação.
O processo de elaboração e aprovação do PD e da LPOUS/96
A elaboração do PD e da LPOUS/96 belo-horizontinos (Leis N° 7.165 e 7.166,
respectivamente) iniciou-se em 1993, no primeiro ano da gestão da Frente BH-Popular”,
liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Ao todo, foram dois anos de trabalhos
conduzidos pelo Poder Executivo Municipal e um ano de discussão e aprovação no Poder
Legislativo, sendo as leis sancionadas em 1996. A vinculação do PD e da LPOUS belo-
horizontinos durante todo o processo de elaboração e aprovação dos mesmos foi estratégica:
sendo o Plano Diretor documento básico de orientação do desenvolvimento urbano, contendo
princípios, objetivos e diretrizes da política urbana no município, pode-se dizer que a Lei de
Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo, que estabelece normas e condições para
parcelamento, ocupação e uso do solo urbano é instrumento de operacionalização do Plano.
No primeiro ano de elaboração do PD e da LPOUS não houve abertura à participação
popular, ocorrendo um processo de discussão interna no governo. Como ponto de partida, foi
formada a Comissão Municipal de Política Urbana, composta exclusivamente pelos
secretários e dirigentes dos órgãos do Poder Executivo relacionados à questão urbana. No
âmbito dessa Comissão foram constituídos dois grupos de trabalho de caráter técnico: o
33
Grupo Técnico do Plano Diretor e o Grupo Técnico de Legislação Urbanística. Esses grupos
foram encarregados da produção de documentos e propostas referentes ao PD e à LPUOS,
respectivamente, também resultando seus trabalhos em um abrangente diagnóstico sobre o
Município de Belo Horizonte, em complementação à base de dados erigida para a
elaboração do Plano BH-2010
19
. Cada um dos grupos tinha participação de representantes de
todas as secretarias e órgãos da administração belo-horizontina com alguma responsabilidade
relativa à questão urbana.
Sobre a fase de discussões internas, relata-nos Torre (2003, p.59) que merece destaque
a habilidade política do governo em envolver todos os órgãos do Executivo cujo escopo de
atuação fosse relacionado à questão urbana, numa tentativa de coesão de idéias, evitando
também propostas de PD e de LPUOS fragmentadas. Houve conflitos entre os diferentes
órgãos e entre os grupos de trabalho, mas eles eram processados e decididos (por voto) no
âmbito da Comissão Municipal de Política Urbana. No final, a redação das minutas dos dois
projetos de lei foi feita por duas pequenas comissões (uma responsável pelo PD, e a outra,
pela LPOUS) com assessoria de uma advogada.
Na Minuta de PD
20
, foram apresentados como princípios do Plano Diretor “garantir
as funções sociais da cidade e da propriedade e o uso socialmente justo e ecologicamente
equilibrado do solo urbano e assegurar a todos o direito à cidade e o pleno exercício da
cidadania” (Minuta do PD, Art. 2°). Esses princípios estavam acompanhados da definição do
que se compreendia por funções sociais da cidade: “as funções sociais da cidade são
compreendidas como o direito de todo cidadão de acesso a moradia, transporte público,
infra-estrutura e equipamentos urbanos, preservação do patrimônio cultural e do meio
ambiente” (Minuta do PD, Art. 4°) - e as funções sociais da propriedade estavam
condicionadas, de acordo com o documento, às funções sociais da cidade, às diretrizes de
desenvolvimento municipal e às demais exigências do Plano Diretor, sendo então enumerados
alguns requisitos para seu cumprimento.
Coerentemente a tais preceitos, a proposta apresentou uma importante inovação em
relação ao modelo de zoneamento funcionalista até então em vigência.. O novo modelo
19
A proposta de Plano Diretor que veio a receber o nome “BH-2010” foi elaborada na gestão dos prefeitos
Pimenta da Veiga / Eduardo Azeredo (1989-1992) e não chegou a ser aprovada na Câmara Municipal.
20
Documento não publicado, em arquivo pessoal da Profª. Jupira Gomes de Mendonça.
34
estabelecido pelo documento, denominado Macrozoneamento”, definiu macro zonas dentro
do Município diferenciadas segundo seu potencial de adensamento, a partir de diagnóstico de
disponibilidade de infra-estrutura, acessibilidade viária, condições geotécnicas e necessidade
de preservação de áreas verdes, numa linha de atuação bastante diferente daquela proposta
pelas antigas leis de uso e ocupação do solo belo-horizontinas
21
.
Antes da LPUOS de 1996, Belo Horizonte havia aprovado outras duas leis de uso e
ocupação, a primeira em 1976, e a outra em 1985, ambas de caráter funcionalista, ou seja,
dividiam o Município em zonas de acordo com os usos/funções permitidos. Tal modelo de
planejamento provocou distorções e especulações imobiliárias no interior da cidade em
função da valorização diferenciada de terrenos provocada pelo zoneamento proposto, e
confirmou o processo de periferização e suburbanização da população de baixa renda (COTA,
2002, p.67-74).
Em direção contrária, o macrozoneamento visa a promover descentralização e
desconcentração urbana e diminuição da capacidade ociosa de infra-estrutura, além de
permitir multiplicidade de usos em todo o território da cidade, desde que atendidos os
parâmetros da LPOUS.
Na Minuta do PD também foram definidas algumas “Áreas de Diretrizes Especiais”
(ADEs), as quais, por suas características específicas, exigem parâmetros urbanísticos
diferenciados que se sobrepõem e preponderam em relação aos do macrozoneamento.
Em relação aos mecanismos de participação popular na gestão urbana, a Minuta do PD
propôs a realização, a cada dois anos, da Conferência Municipal de Política Urbana, da qual
devem participar todas as entidades organizadas da sociedade civil interessadas na gestão
urbana do Município “com objetivos de avaliar a condução e os impactos da implementação
do Plano Diretor e propor alterações nas diretrizes do Plano(Minuta do PD, Art. 93). De
acordo com a Minuta, na Conferência Municipal de Política Urbana seria eleito o Conselho
Municipal de Política Urbana (COMPUR), com mandato de dois anos, com a seguinte
composição: 4 representantes do Executivo Municipal, 4 representantes da Câmara
21
Embora, ao permanecer com a proposta de zoneamento, mesmo que não mais funcionalista, o novo modelo
continue gerando a diferenciação de áreas na cidade em conseqüência dos parâmetros diferenciados para cada
área.
35
Municipal, 4 representantes do setor popular e 4 representantes do setor empresarial. As
atribuições do COMPUR propostas no documento se resumiam basicamente em monitorar,
opinar e propor atualizações e/ou alterações a respeito dos instrumentos utilizados na gestão
municipal, tendo possibilidade de deliberar apenas sobre os casos omissos na legislação
urbanística municipal.
Quanto aos instrumentos de política urbana, a Minuta do PD propôs seis, a saber:
Concessão do Direito de Criar Solo, Quota de Terreno por Unidade Habitacional,
Transferência do Direito de Construir, Parcelamento e Edificações Compulsórios, Consórcio
Imobiliário e Operação Urbana. A aplicação de tais instrumentos estava regulamentada na
Minuta da LPOUS
22
. A seguir discutiremos um pouco mais sobre cada um deles:
“Concessão do Direito de Criar Solo” - consiste na possibilidade de concessão por
parte do poder público de aumento do coeficiente de aproveitamento do terreno definido na
LPOUS, desde que haja uma contrapartida correspondente à concessão. O objetivo desse
instrumento é desvincular o direito de propriedade dos terrenos urbanos do direito de
construir, de modo que aumente a capacidade do poder público de interferir sobre o mercado
imobiliário.
De acordo com a Minuta do PD, os coeficientes de aproveitamento básicos definidos
por zonas o passariam de 1.5, ou seja, o proprietário de um terreno urbano teria direito de
construir, a princípio, apenas uma vez e meia o tamanho do seu terreno. Mediante
contrapartidas por parte da iniciativa privada, esses coeficientes poderiam ser aumentados
desde que não ultrapassando os índices máximos estabelecidos. Os recursos provenientes da
concessão seriam destinados ao Fundo Municipal de Habitação.
“Quota de Terreno por Unidade Habitacional”- a quota de terreno por unidade
habitacional é a relação entre a área do terreno e o número de unidades habitacionais a
implantar. O instrumento estipula quotas mínimas de terreno por unidade habitacional com o
objetivo de controlar o adensamento residencial.
22
Documento não publicado, em arquivo pessoal da Profª. Jupira Gomes de Mendonça.
36
“Transferência do Direito de Construir”- consiste na possibilidade de exercer em outro
local ou alienar o potencial de construção de imóveis “em situações especiais”. O principal
objetivo do instrumento é viabilizar a preservação de imóveis e/ou de áreas de importante
valor histórico ou ambiental.
De acordo com a Minuta do PD, poderia ser autorizada transferência do direito de
construir relativo aos imóveis tombados (total ou parcialmente), às edificações horizontais
inventariadas situadas na ZC (Zona Central), aos terrenos situados na ZEIS–2 (Zona de
Especial Interesse Social do tipo 2, correspondentes àquelas vazias ou sub-utilizadas), e aos
imóveis situados em áreas delimitadas pelo perímetro de projetos urbanísticos especiais.
“Parcelamento e Edificações Compulsórios” este instrumento estipula que os
terrenos urbanos sub-utilizados ou não utilizados sejam sujeitos a parcelamento e edificação
compulsórios. Dessa forma, a ocupação de áreas já dotadas de infra-estrutura é induzida,
evitando-se a expansão horizontal na direção de áreas não servidas de infra-estrutura ou
inadequadas ao povoamento. Assim, a principal intenção do instrumento é evitar ou
minimizar ao máximo a especulação imobiliária.
Na Minuta do PD, somente os terrenos situados nas ZAP (Zona de Adensamento
Preferencial) e nas ZEIS-2 estariam sujeitas à aplicação desse instrumento, desde que nessas
zonas houvesse a disponibilidade de infra-estrutura urbana ou viabilidade de sua implantação.
“Consórcio Imobiliário” Consiste em parceria entre o Poder Público e a iniciativa
privada para a execução de parcelamentos nas ZEIS-2. A principal intenção do instrumento é
viabilizar programas habitacionais de cunho social. Ele também possui um potencial
minimizador dos efeitos do parcelamento e edificação compulsórios para os proprietários de
imóveis situados nas ZEIS-2.
Por fim,Operação Urbana” que também consiste em parceria entre o Poder público
e a iniciativa privada, mas “com o objetivo de viabilizar projetos em áreas especiais
previamente delimitadas e situadas em locais estratégicos do Município” (Minuta do PD, Art.
40).
De acordo com a proposta da Minuta, o Instrumento das Operações Urbanas deveria
envolver duas ou mais das seguintes ações, entendidas como motivações:
37
I. tratamento urbanístico de áreas públicas;
II. abertura de vias ou melhorias no sistema viário;
III. implantação de programa habitacional de interesse social;
IV. modificação de parâmetros construtivos, de posturas, de uso e de ocupação do
solo;
V. regularização de edificações ou terrenos
VI. implantação de equipamentos públicos;
VII. proteção do patrimônio cultural;
VIII. proteção ambiental;
IX. reurbanização;
X. fomento de atividades econômicas.
Apesar do enfoque econômico e até desenvolvimentista” do instrumento,
diferentemente do enfoque social presente no Movimento da Reforma Urbana, segundo
técnico/participante do processo de elaboração do PD belo-horizontino
23
, o Instrumento da
Operação Urbana foi incluído na Minuta porque estava previsto no projeto de lei do atual
“Estatuto da Cidade” (que à época ainda não tinha sido aprovado), documento este
considerado de cunho progressista.
Em acordo com os princípios progressistas, na proposta da Minuta o instrumento da
Operação Urbana apresentava contornos democráticos, pois o documento estabelecia que as
operações urbanas deveriam ser definidas por leis específicas e geridas por um Comitê de
Gestão”, o qual contaria com a participação de representantes dos agentes envolvidos,
incluindo os moradores da área objeto da operação.
No geral, podemos dizer que a proposta inicial de PD e LPOUS elaborada pelos
órgãos do Executivo sugeriu inovações substantivas na política urbana de Belo Horizonte,
alinhando-a aos preceitos da Constituição de 1988. Nota-se a superação da lógica de
zoneamento funcional presente nas legislações urbanísticas anteriores, a incorporação da
participação de diferentes segmentos sociais na gestão do Município e a incorporação de
novos princípios e instrumentos urbanísticos visando a maior justiça social na cidade.
23
Atual Secretária Adjunta de Meio Ambiente; em entrevista oral concedida à autora no dia 12/06/07, às 14:30
horas.
38
A partir de meados de 1994 iniciou-se o processo de discussão das minutas do PD e da
LPOUS externo à Prefeitura. Para tal, foi realizado um trabalho de comunicação social no
qual foram elaboradas e distribuídas em locais públicos cartilhas explicativas. A fase de
discussão pública foi “inaugurada” com um seminário (também chamado “Fórum da Cidade”)
onde a proposta inicial de PD e de LPOUS do Poder Executivo, assim como os diagnósticos
sobre o Município, foram apresentados, além de terem sido realizadas palestras enfocando a
temática urbana. O Fórum da Cidade foi divulgado através de jornais locais, dio e televisão
(COSTA, s/d-a).
Antes mesmo desse seminário de abertura, já estavam ocorrendo assembléias nas
diferentes Administrações Regionais da cidade. O intuito dessas assembléias era difundir e
discutir as questões de caráter macro acerca do PD e da LPOUS, sem entrar no nível de
detalhes dos instrumentos e parâmetros a serem utilizados (TORRE, 2003, p.76).
Durante o Fórum da Cidade foi criada uma comissão para deliberação das propostas
relativas ao PD e à nova LPOUS, com a seguinte composição: 4 representantes do Executivo
municipal, 4 representantes do setor técnico, 4 representantes do setor empresarial, 4
representantes do setor popular, 4 representantes do Poder Legislativo (como observadores), 4
representantes dos religiosos (agregados posteriormente, a partir de reivindicação dos
evangélicos).
Nessa comissão, as propostas foram debatidas quase que artigo por artigo
24
durante
dez meses de discussão (com encontros inicialmente quinzenais e posteriormente semanais),
com intuito de serem elaborados os projetos de leis a serem encaminhados à Câmara.
“Avalia-se que, embora tenha havido participação, houve dificuldades para os setores
populares acompanharem o processo, ficando a discussão das propostas centrada nos setores
técnico e empresarial” (COSTA, s/d-a, s/p). Segundo esta autora, a participação tímida dos
setores populares foi devida à falta de capacitação técnica dos mesmos; no entanto, ela afirma
que eles identificavam e apoiavam as propostas e setores ligados aos seus interesses. Também
se observou que a participação dos setores populares se deu preponderantemente através
24
Trecho de entrevista com Márcio Cerqueira Batitucci, assessor do Departamento de Parques e Jardins da
Secretaria Municipal de Meio Ambiente (1993/1996), apud TORRE (2003, p.77).
39
daqueles grupos ligados à questão da moradia. o setor empresarial se mostrou bastante
coeso e organizado, participando das reuniões de uma maneira sistemática.
Em 1995, o Projeto de Lei do Plano Diretor (PL N° 314/95) foi enviado à Câmara,
juntamente com o Projeto da Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (PL N° 315/95)
25
.
Não apenas no que se refere aos princípios fundamentais, mas em toda a redação dos
projetos de leis elaborados, observa-se um refinamento ou certo amadurecimento em relação
aos textos das minutas. No entanto, comparando os documentos das minutas e os documentos
dos projetos de lei, também é possível observar significativas perdas nas diretrizes de caráter
mais redistributivistas e universalistas.
No texto do Projeto de Lei do PD, deixaram de constar como princípios do Plano a
garantia do uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado do solo urbano, assim como a
garantia ao direito à cidade, ficando os princípios do Plano reduzidos à garantia das “funções
sociais da cidade e da propriedade imobiliária urbana, assegurando a todos o pleno
exercício da cidadania” (PL 314/95, Art. 2°). Apesar de mantida no PL a citação das
funções sociais da cidade e da propriedade enquanto princípios, foi suprimida a definição do
que se compreendia por esses conceitos, o que os tornou vagos demais. Entretanto, houve um
aumento quantitativo de critérios relacionados ao ordenamento territorial necessários para o
cumprimento da função social da cidade. o cumprimento da função social da propriedade
urbana ficou vinculado ao atendimento das diretrizes do PD.
Quanto à conceituação e critérios do macrozoneamento estabelecidos na Minuta do
PD, o Poder Público os tinha como premissas e não aceitava alterações. Assim, apesar de
algumas modificações observadas no texto do PL em relação ao texto da Minuta, não houve
alterações significativas relativas ao modelo de zoneamento proposto pelo Executivo, nem
quanto aos objetivos fundamentais de tal modelo, como a descentralização e a
desconcentração.
Nas questões relacionadas à participação popular, foi mais bem detalhado no PL do
PD o funcionamento e as atribuições do COMPUR e da Conferência Municipal de Política
25
Documentos não publicados, em arquivo pessoal da Profª. Jupira Gomes de Mendonça.
40
Urbana, além de serem indicadas outras instâncias de participação, como os “comitês de
acompanhamento”, as “audiências públicas” e a “representação em comissões
administrativas”. De acordo com o PL, “a manifestação e a participação populares serão de
âmbito municipal, nas questões de interesse geral da cidade, e de âmbito regional e local, nas
questões de interesse localizado” (PL Nº 314/95, Art. 80, §2°).
A respeito da Conferência Municipal de Política Urbana, no texto do PL a proposta de
freqüência desta foi alterada para quadrienalmente. Nos seus objetivos foi acrescido “propor
cronograma de investimentos prioritários em obras estruturantes” (PL 314/95, Art. 83, inciso
III).
Em relação à proposta da Minuta, a composição do COMPUR manteve-se a mesma no
texto do PL. No entanto, diferentemente do que foi proposto na Minuta, os representantes de
cada um dos setores que o comporiam deveriam ser escolhidos pelas entidades daquele setor
que iriam representar e o mais eleitos na Conferência como propunha a Minuta. O Projeto
de Lei também abria a possibilidade de qualquer cidadão - e não apenas os componentes do
COMPUR - solicitar assunto em pauta nas reuniões deste Conselho.
Uma modificação interessante observada no PL foi a inclusão de um capítulo inteiro -
Capítulo IV - sobre o direito de construir. Neste capítulo foi explicitado que “o direito de
construir é inerente ao direito de propriedade, até o limite estabelecido pelo Coeficiente de
Aproveitamento Básico do Solo” (PL N° 314/95, Art. 54), o que nos parece ser uma tentativa
de melhor esclarecer questões delicadas de tensão entre os atores envolvidos no processo.
Em razão dos princípios estabelecidos no Capítulo IV do PL, o instrumento
“Concessão do Direito de Criar Solo” se “transformou” em “Outorga Onerosa”, instrumento
este em que os proprietários de imóveis situados em Zona de Adensamento Preferencial
(ZAP) poderiam adquirir do Poder Público Municipal, mediante outorga onerosa, o direito de
construir área líquida adicional. Nota-se que a mudança não foi apenas no nome do
instrumento, mas, principalmente, em seu princípio, uma vez que não se trata mais de
separação do direito de propriedade do direito de construir (pois, de acordo com o capítulo IV,
um é inerente ao outro), trata-se de uma possibilidade de compra de potencial construtivo
adicional, caso seja do interesse da iniciativa privada. De acordo com o PL, os recursos
41
municipais decorrentes da outorga do direito de construir seriam destinados em parte ao
Fundo Municipal de Habitação e em parte ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano.
No texto do PL, o instrumento “Parcelamento e Edificação Compulsórios” não sofreu
modificações significativas em relação à proposta da Minuta. O instrumento “Consórcio
Imobiliário” se transformou” em Convênio Urbanístico de Interesse Social”, mantendo os
mesmos objetivos daquele. A “Quota de Terreno por Unidade Habitacional” foi suprimida
enquanto instrumento de política urbana, aparecendo, porém, como parâmetro urbanístico na
LPUOS. Quanto à “Transferência do Direito de Construir”, houve restrição à utilização do
instrumento, não mais sendo permitido alienar o potencial construtivo não exercido, mas
apenas utilizá-lo em outro lote.
O instrumento de política urbana que mais sofreu modificações e complementações
em relação à Minuta foi a “Operação Urbana”. O instrumento de parceria público-privado
manteve-se no PL “objetivando viabilizar projetos urbanísticos especiais em áreas
previamente delimitadas” (PL n° 314/95, Art. 69), mas, uma novidade neste documento, foi a
introdução da exigência de que os recursos provenientes das operações urbanas fossem
aplicados na área do próprio projeto, proporcionando assim maior controle do gasto dos
recursos, reduzindo, porém, o potencial redistributivo do instrumento.
Das intervenções que poderiam ser envolvidas pelo Instrumento das Operações
Urbanas, foram excluídas no texto do PL: “regularização de edificações ou terrenos”;
“fomento de atividades econômicas”; “modificação de parâmetros construtivos, de posturas,
de uso e de ocupação do solo” (no entanto, esclarece-se que as intervenções das operações
urbanas poderão ter como conseqüência a utilização de novos parâmetros urbanísticos).
Conclui-se que foram eliminados tipos de intervenção que poderiam abrir espaço para
projetos de cunho particularistas ou clientelistas. Porém, diferentemente do que propunha o
texto da Minuta do PD, o PL não previa o envolvimento de no mínimo duas das motivações
para o estabelecimento de uma operação urbana.
As formas de controle democráticas propostas na Minuta relativas ao Instrumento das
Operações Urbanas foram mantidas no PL, sendo exigido que cada operação urbana fosse
regulamentada por lei específica e monitorada por um comitê de acompanhamento com a
42
representação do Poder Executivo Municipal, do setor empresarial envolvido e da
comunidade local.
No texto do PL do PD, dois outros instrumentos de política urbana foram introduzidos:
o “Imposto Predial e Territorial Urbano Progressivo” (antes presente na Minuta da LPUOS) e
a “Desapropriação”. O IPTU Progressivo prevê que “a propriedade imóvel não edificada,
subutilizada ou não utilizada, objeto de parcelamento e edificação compulsórios, estará
sujeita a IPTU progressivo no tempo” (PL N° 314/95, Art. 67); a propriedade sobre a qual
tenha havido a incidência limite das alíquotas de IPTU progressivo no tempo estará sujeita à
desapropriação com fundo de dívida pública, assim como poderá haver desapropriação com
fundo de dívida pública para fins urbanísticos. O parcelamento ou edificação compulsórios,
aliado ao IPTU progressivo e à desapropriação, foram sugeridos às administrações municipais
no artigo 182 da Constituição Federal de 1988.
Desde o envio dos projetos de lei à Câmara, em 1995, iniciou-se mais uma fase do
processo, a fase de apreciação dos mesmos pelo Poder Legislativo. Os projetos foram
encaminhados juntamente com uma carta do prefeito de Belo Horizonte ao presidente da
Câmara, a qual ressaltava a realização de inúmeras reuniões de discussão em todo o
Município para a elaboração do documento, assim como explicitava os princípios e objetivos
fundamentais do documento. Nesse ponto é importante destacar que o fato de ter havido
participação popular na elaboração do PD foi utilizado pelo Poder Executivo para legitimar o
documento e pressionar os vereadores a sua aprovação.
Devido à complexidade dos projetos de lei de PD e LPUOS, para uma tramitação mais
ágil dos mesmos foi solicitada a instalação de uma Comissão Especial de Câmara, que,
depois, por questões de incompatibilidade com o Regimento Interno da Câmara, veio a se
chamar “Comissão Extraordinária”, a qual teria entre suas atribuições apreciar
simultaneamente os dois projetos de lei
26
. Para o governo da Frente BH Popular era muito
importante que a aprovação do PD viesse a ocorrer antes do término de seu mandato, pois
nada garantiria sua aprovação nos governos posteriores (TORRE, 2003, p.92-93).
26
Caso cada um dos projetos de lei viesse a ser analisado separadamente, eles deveriam ser alvo de deliberações
de até sete das comissões permanentes da Câmara.
43
A Comissão Extraordinária da Câmara foi composta por um representante de cada
uma das comissões permanentes, um representante da mesa diretora e os três membros
efetivos da Comissão de Meio Ambiente, Política Urbana, Rural e Habitação, por ser esta
comissão mais afeita ao tema. Por questões práticas, a Comissão Extraordinária foi dividida
em três sub-comissões temáticas: I-Desenvolvimento Urbano, que ficou responsável pela
análise dos princípios fundamentais do Plano Diretor, assim como dos seus objetivos e
diretrizes de desenvolvimento urbano, econômico e social; II Ordenamento Territorial e
Gestão Urbana, que ficou com a atribuição de tratar as questões do Plano Diretor relacionadas
ao zoneamento e aos seus instrumentos de política e gestão urbanos; III Parcelamento, Uso
e Ocupação do Solo, a qual tratava do projeto de lei referente à Lei de Parcelamento, Uso e
Ocupação do Solo. Cada sub-comissão contava com um relator parcial responsável por uma
primeira “triagem” das emendas apresentadas relativas aos projetos de leis; os relatórios dos
relatores parciais das sub-comissões deveriam ser submetidos ao relator-geral da Comissão
Extraordinária para análise e proposição de novas emendas e subemendas, devendo o relator-
geral, por fim, submeter o seu parecer à deliberação da Comissão sobre a aprovação ou não
das emendas propostas. Tudo isso antes dos projetos de lei serem enviados à plenária final.
Além de ter sido a responsável pela tramitação dos projetos de lei do PD e da LPUOS,
a Comissão Extraordinária também foi responsável pela realização de audiências públicas de
consulta à população. No total, foram realizadas 16 Audiências Públicas internas e 5
Audiências Públicas externas à Câmara. Não havia exigência de quorum mínimo para a
realização dessas audiências e delas poderiam ser encaminhadas sugestões à Comissão
Extraordinária. No entanto, o horário no qual aconteceu a maioria delas – horário comercial -
dificultou a presença de grupos populares, enquanto a participação dos representantes do setor
empresarial foi constante, principalmente daqueles ligados ao SINDUSCON e CMI (TORRE,
2003).
Além de participarem das reuniões, alguns empresários agiram de forma isolada,
cooptando vereadores para que estes apresentassem emendas que lhes fossem convenientes.
Tal atuação fica explicitada com o depoimento de Flávia Mourão, participante do processo
como técnica da Prefeitura (apud TORRE, p.101), que diz que algumas emendas, contendo a
mesma redação, eram apresentadas por diferentes gabinetes de vereadores. Alguns vereadores
estavam alinhados com o setor empresarial por serem empresários da construção civil. Além
da participação ativa do setor empresarial, também se verificou uma participação bastante
44
significativa de representantes dos setores técnicos durante o processo, principalmente
daqueles ligados ao IAB e ao CREA.
Ao longo do processo de tramitação muitos foram os obstáculos e resistências para a
aprovação das leis de Plano Diretor e de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo. Nesse
ponto, é importante lembrar que a composição da Câmara Municipal à época era de maioria
de oposição ao governo. Como a sub-comissão de Desenvolvimento Urbano, que tratava dos
princípios fundamentais do Plano Diretor, assim como dos seus objetivos e diretrizes de
desenvolvimento urbano, econômico e social, ficou a cargo de vereador de partido do
governo, a concepção geral do PD foi assegurada. No que diz respeito ao macrozoneamento,
as alterações significativas se tornaram difíceis pela estratégica divisão do assunto em duas
sub-comissões. Enfim, o PD e a nova LPOUS foram sancionados em 1996.
As principais inovações e suas limitações
A seguir explicitaremos as principais questões instituídas no PD e LPOUS belo-
horizontinos aprovados pela Câmara e sancionados pelo Prefeito.
Quanto aos princípios fundamentais
A redação final do Plano Diretor belo-horizontino incorporou o princípio da função
social da propriedade, mas excluiu o princípio da função social da cidade. No texto, o objetivo
da política de desenvolvimento urbano do Município passou a ser “o ordenamento do
Município e o cumprimento das funções sociais da propriedade, assegurando o bem–estar
dos munícipes” (Lei 7165/96, Art. 2°).
O documento não especifica que tipo de propriedade está sujeita ao cumprimento da
função social e não explicação do que vem a ser de fato entendido por função social da
propriedade, tornando o termo muito vago, sem entendimento claro. O artigo 5° da Lei diz
que “para o cumprimento de sua função social, a propriedade deve atender aos critérios de
ordenamento territorial e às diretrizes de desenvolvimento urbano desta Lei”, de forma que
os critérios e diretrizes do PD ficam vinculados ao princípio da função social assim como a
função social fica vinculada aos critérios e diretrizes do PD, num raciocínio circular sem
escape, minimizando, desta forma, o alcance e as possibilidades do princípio.
45
Quanto ao ordenamento territorial
Ao longo dos processos de elaboração e aprovação do PD e LPOUS/96 o houve
modificações no princípio geral do macrozoneamento. Entretanto, ocorreram várias mudanças
nos parâmetros da LPOUS, as quais tornaram possível, principalmente, maior aproveitamento
do solo, especialmente nas ZAs (Zona Adensada) e ZAPs (Zona de Adensamento
Preferencial). Essas mudanças foram conquistas do setor empresarial.
Em que pese a multiplicidade de usos permitida pelo macrozoneamento, a localização
dos usos não-residenciais foi disciplinada na LPOUS pela conjugação da natureza e largura
das vias públicas com a classificação dada à atividade (as atividades não-residenciais foram
classificadas em 3 grupos, conforme a repercussão produzida pelas mesmas no ambiente
urbano).
Ainda em relação aos usos, na versão final da LPOUS foram instituídas algumas
ADEs com a finalidade de se manter usos exclusivamente residenciais em algumas áreas.
Pode-se dizer que, nesse sentido, o princípio original das ADEs mudou muito. Na Minuta do
PD e também no Projeto de Lei, as ADEs eram definidas segundo critérios genéricos, os quais
exigiam parâmetros urbanísticos especiais. Na lei aprovada, as ADEs se tornaram bastante
específicas, de acordo, principalmente, com interesses de grupos de classe média que
passaram a participar dos processos de elaboração e aprovação do PD e da LPOUS lutando
por seus interesses. Como exemplo, temos a criação das ADEs para uso exclusivamente
residencial conquistadas pelos moradores dos bairros São Bento, Mangabeiras e Belvedere.
Quanto aos mecanismos de participação popular na gestão urbana
Fica de fato instituído o COMPUR, que deve se reunir no nimo uma vez por s.
Na redação final do PD, a composição desse conselho passa a ser de maioria de membros
representantes do Poder Executivo, diminuindo assim a participação da sociedade nas suas
atribuições. Ficaram definidos como membros do COMPUR, com mandato de dois anos: 8
representantes do Executivo, 2 representantes da Câmara Municipal, 2 representantes do setor
técnico, 2 representantes do setor popular e 2 representantes do setor empresarial.
46
Além da restrita participação de representantes da sociedade civil, outra limitação para
uma efetiva participação popular é que as atribuições estabelecidas para o COMPUR
permaneceram de caráter eminentemente consultivo (é possível deliberar, em nível de recurso,
apenas nos processos administrativos de casos decorrentes do PD e da LPUOS).
Uma das atribuições definidas para o COMPUR é realizar, quadrienalmente (a cada
primeiro ano de gestão do executivo), a Conferência Municipal de Política Urbana (Lei
7.165/96, Art. 80, inciso I), cujos objetivos é avaliar a condução e os impactos da
implementação das normas contidas no PD e na LPOUS, sugerir alterações nas mesmas e
sugerir alteração no cronograma de investimentos prioritários em obras (Art. 82). Da
Conferência Municipal “poderão participar, debatendo e votando, representantes do
Executivo, de órgãos técnicos, da Câmara Municipal e de entidades culturais, comunitárias,
religiosas, empresariais e sociais” (Lei Nº 7.165/96, Art. 82, §1°).
Além do COMPUR e das conferências municipais, “podem ser criadas, no âmbito de
cada região administrativa, instâncias de discussão da política urbana, com composição e
regimento adequados à realidade regional (...)” (Lei Nº 7.165/96, Art.78). Não obstante
algumas limitações citadas, a criação de instâncias permanentes de participação popular na
cidade representa avanços na busca por uma gestão mais democrática, demonstrando um
entendimento de planejamento urbano enquanto processo contínuo e não fim a ser alcançado.
Importante mencionar que outra atribuição do COMPUR é monitorar a implementação
das normas contidas no PD e na LPOUS, sugerindo modificações em seus dispositivos (Lei
7165/96, Art. 80, inciso II). Assim, é função do Conselho monitorar a implementação dos
instrumentos de política urbana propostos no PD.
Quanto aos instrumentos de política urbana
De acordo com Torre (2003, p.113), “os instrumentos de política urbana foram alvo
da maior parte das emendas apresentadas à proposta de PD no decorrer de sua tramitação
no legislativo. Isto se deu em função de a eles estarem relacionados boa parcela dos limites e
das possibilidades de atuação de segmentos ligados à construção civil e ao mercado
imobiliário”. A maioria das emendas relacionadas ao tema se constituiu em tentativas de
47
potencializar os benefícios que poderiam ser alcançados pela iniciativa privada através de
alguns dos instrumentos ou de suprimir aqueles que não a agradavam.
No final do processo foram instituídos apenas 3 dos instrumentos de política urbana
propostos desde a Minuta: a “Transferência do Direito de Construir”, a “Operação Urbana” e
“Convênio Urbanístico de Interesse Social”.
Grande parte das emendas relacionadas à Transferência do Direito de Construir
procurou garantir que o instrumento pudesse vir a ser utilizado pela iniciativa privada, o
que de fato foi garantido no parágrafo único do artigo 61 da lei do PD. “Isto se deu em
função do temor de que uma intervenção direta no mercado, com a oferta de potencial
construtivo de imóveis públicos, pudesse promover uma queda generalizada dos preços de
lotes no Município” (TORRE, 2003, p.114). Também foi conquista da iniciativa privada a
supressão do §2° do artigo 60 do Projeto de Lei do PD, que vinculava a transferência do
direito de construir em caso de imóveis tombados à condição de o proprietário reparar ou
restaurar o bem. Outra modificação foi o retorno da possibilidade de ser alienado o potencial
construtivo que não pudesse ser exercido no imóvel de origem.
Quanto ao Instrumento da Operação Urbana, a principal alteração, a qual se constitui
numa perda em relação aos princípios progressistas, foi a supressão da exigência do comitê de
gestão com participação da sociedade civil para controle e coordenação das operações
urbanas.
Ficou definido no PD belo-horizontino que “Operação Urbana é o conjunto integrado
de intervenções, com prazo determinado, coordenadas pelo Executivo, com a participação de
entidades da iniciativa privada, objetivando viabilizar projetos urbanísticos especiais em
áreas previamente delimitadas”, podendo ser proposta ao Executivo por qualquer cidadão ou
entidade que nela tenha interesse (Lei 7.165/96, Art. 65). A lei então estipula, de forma
bastante genérica, as intervenções que podem ser envolvidas pelo instrumento.
Ficou estabelecido que cada operação urbana deve ser prevista em lei específica que
deve conter: o perímetro da área de intervenção, a finalidade da intervenção proposta, o plano
urbanístico para a área, os procedimentos de natureza econômica, administrativa e urbanística
necessários ao cumprimento das finalidades pretendidas, os parâmetros urbanísticos locais, os
48
incentivos fiscais e os outros mecanismos compensatórios previstos em lei para as entidades
da iniciativa privada que participem do projeto ou para aqueles que por ele sejam
prejudicados e o prazo de vigência da operação urbana (Lei 7.165/96, Art.67). Manteve-se
a exigência de que “os recursos levantados para a realização das intervenções somente
podem ser aplicados em aspectos relacionados à implantação do projeto relativo à operação
urbana” (Lei Nº 7.165/96, Art. 69).
Analisando todo o processo de elaboração e aprovação do PD e da LPOUS/96,
podemos entendê-lo como um processo de negociação e ajustamento político entre as “forças”
participantes, as quais, porém, não se mostraram simétricas. De acordo com os relatos
daqueles que participaram da experiência, as atuações dos setores empresarial e técnico se
sobressaíram em relação à atuação do setor popular
27
, a qual se mostrou tímida, apesar da
participação constante deste setor (principalmente dos grupos ligados a questões de moradia).
O setor técnico, representado principalmente pelo IAB e CREA, também teve uma
participação significativa no processo. Os representantes desse setor tiveram posições
progressistas, buscando avançar em instrumentos de política urbana dentro dos princípios da
Reforma Urbana.
O setor empresarial, representado, sobretudo, pelo SINDUSCOM e CMI, teve
presença em todos os eventos e se mostrou bastante articulado, muitas vezes contando com a
ajuda de consultores contratados. Essas entidades estavam de acordo com a realização de um
PD e de uma nova LPOUS, mas, obviamente, defenderam sempre maior permissividade
nessas leis. De fato, percebe-se a força da atuação desse setor nas muitas alterações
observadas nos textos das leis aprovadas em relação ao texto inicial, tanto no que diz respeito
a maior permissividade nos parâmetros urbanísticos e na utilização dos instrumentos de
política urbana, quanto em relação à diminuição dos espaços de participação popular na
gestão urbana. Sobre a participação da classe dominante na elaboração de planos diretores e
leis de zoneamento, Villaça (2005) lembra-nos que é prática corrente no Brasil. “Portanto,
quando se fala em Plano Diretor Participativo como sendo uma novidade e se referindo aos
planos diretores do presente, essa ênfase na ‘participação’ só pode se referir à maioria
27
O setor popular é aquele constituído pelas classes de mais baixa renda, representativo, assim, da maioria da
nossa sociedade.
49
dominada, já que a minoria dominante sempre participou, embora raramente de forma
ostensiva” (VILLAÇA, 2005, p.50).
Devemos lembrar que, além da recente participação direta da população em processos
decisórios, no Brasil também funcionam outras “formas de pressão”
28
sobre os encarregados
de decisão política, como as pressões diretas sobre os vereadores que ocorreram na fase de
aprovação do PD e LPOUS/96 belo-horizontinos. Nesta fase do processo, ficou bastante
explícita a assimetria de forças entre os diferentes segmentos participantes. Nesse sentido,
observa-se uma contradição existente no sistema misto de democracias direta e representativa,
pois é contraditório o fato de que algo que tenha sido decido diretamente pela própria
população (pelo menos teoricamente) tenha que passar posteriormente também pelo crivo dos
representantes desta população.
O processo de elaboração e aprovação do PD e da LPOUS/96 também contou com a
participação de grupos da classe média. Houve intensa mobilização de moradores do bairro
Santa Teresa, contrários à verticalização que estava sendo proposta para este bairro, e também
dos moradores do Mangabeiras, Belvedere e São Bento, contrários à flexibilização de usos em
seus bairros. Como resultado, foram criadas as ADEs-Santa Teresa e as ADEs de uso
exclusivamente residencial, de acordo com os interesses específicos desses grupos da classe
média. Dessa forma, podemos dizer que a participação desse setor da sociedade foi carregada
do que Santos (1993) chamou de “mentalidade corporativista”, que busca privilégios em vez
de direitos e impede a visão da cidade como um todo:
São interesses de classes de categorias profissionais, de bairros, de tipos de
proprietários, como os donos de automóveis, mas também de grupos étnicos, de
gênero ou de comportamento sexual que buscam a construção de sua identidade, mas
também o discurso de suas reclamações particulares e a melhor prática para sua
militância, destinada a obter, no plano jurídico ou material, compensações e vantagens
(SANTOS, 1993, p.109).
28
VILLAÇA (2005, p.50) cita como outras formas de pressão social as matérias pagas na imprensa, as pressões
diretas sobres os vereadores e sobre o próprio chefe do Executivo.
50
Para este autor, infelizmente a participação da sociedade civil brasileira em processos
decisórios de atuação do poder público ainda está impregnada dessa mentalidade
corporativista, dificultando o pleno exercício da cidadania e da democracia.
Dessa forma, o desafio de implantação de uma ampla e verdadeiramente democrática
gestão participativa no Brasil não passa apenas pela superação dos problemas sócio-
econômicos do país (desigualdade econômica, falta de boa educação para a maioria da
população, etc), nem apenas pela questão política (falta da cultura política participativa na
nossa sociedade), mas também pela superação de uma questão histórico-sociológica. De modo
que a participação popular em reuniões institucionalizadas pode acabar servindo
principalmente para legitimar interesses de grupos dominantes.
As Conferências Municipais de Política Urbana e suas contribuições
Desde a aprovação do PD e da LPOUS em 1996, foram realizadas sob a
coordenação do COMPUR duas Conferências Municipais de Política Urbana. Os objetivos de
tais conferências é avaliar a condução e os impactos do PD e da LPOUS, sugerir alterações
das mesmas, a serem aprovadas por lei, e sugerir alterações no cronograma de investimentos
prioritários em obras.
Para realização da Primeira Conferência, os órgãos da PBH com áreas de atuação
concernentes à temática urbana foram encarregados de produzir avaliações a respeito das
dificuldades na utilização do PD e da LPUOS. Após discussões internas à Prefeitura e
algumas reuniões públicas temáticas”, as avaliações iniciais foram transformadas em
relatórios, organizados por temas e utilizados nas discussões das chamadas Pré-Conferencias
Setoriais. Estas pré-conferencias foram providas por cada um dos setores participantes da
Conferencia - setor popular, setor empresarial, setor técnico, Poder Legislativo municipal e
Poder Executivo municipal sendo nelas eleitos delegados para representação de cada setor
na Conferência.
A Primeira Conferência aconteceu entre outubro de 1998 e fevereiro de 1999. Nela,
além das palestras oferecidas, grupos de trabalho de recorte temático deliberaram sobre as
propostas de alterações modificadas e/ou incrementadas nas pré-conferências. Por fim, em
51
plenária final, foram feitas análises e deliberações de todas as propostas (ressalvadas os
necessários ajustes entre propostas de igual teor), unidas em um relatório final.
Mais uma vez o setor empresarial participou de todo o processo de forma bastante
ativa enquanto o setor popular não estava tão bem articulado, mantendo a ênfase de sua
participação nas questões ligadas à habitação.
As deliberações resultaram em propostas de alterações no PD e na LPUOS, bem como
em recomendações ao Executivo. As propostas de alterações, uma vez submetidas ao plenário
do COMPUR e aprovadas na Câmara, se transformaram na Lei N° 8.237, sancionada em
dezembro de 2000. Segundo Costa (s/d-b, s/p), “apesar de um processo legislativo
conturbado, a lei incorporou cerca de 99% das propostas da Conferência”. No entanto,
como a Primeira Conferência ocorreu muito próxima à aprovação do PD e da LPUOS, não
houve alterações significativas nestas leis. As alterações no PD e na LPOUS observadas se
constituem em acréscimos e/ou supressões de incisos e parágrafos para alguns capítulos de
políticas (habitacional, meio ambiente e saneamento, desenvolvimento econômico),
flexibilização de alguns usos e regulamentação das medidas mitigadoras para redução de
impactos urbanísticos causadas por certas atividades específicas.
A Segunda Conferência Municipal de Política Urbana aconteceu de outubro de 2001 a
agosto de 2002. Antes de sua realização foram realizadas várias palestras abertas a todos os
interessados. Como na Primeira Conferência, aconteceram inicialmente pré-conferências
desta vez, 4 temáticas e 9 regionais - de onde foram eleitos os delegados dos setores que
participaram da Conferência - setor popular, setor empresarial, setor técnico, Poder
Legislativo Municipal e Poder Executivo Municipal.
A primeira fase da Conferência foi constituída por processo de capacitação dos
delegados, a qual teve duração de um mês com o objetivo de nivelar o conhecimento relativo
às questões urbanas. Na seqüência, as propostas das pré-conferências foram discutidas em
grupos de trabalho e votadas nas plenárias finais.
A respeito da II Conferência, Costa (s/d-b, s/p) comemora a “concepção de uma bem
elaborada metodologia de participação, com ênfase no processo de capacitação do
delegados, avaliado como um ponto de grande relevância no processo”. Os produtos finais
52
foram propostas de alteração do PD e da LPUOS, recomendações ao Executivo sobre a
condução da política urbana e subsídios para elaboração dos Planos Diretores Regionais.
As propostas resultantes da Conferência deram origem ao Projeto de Lei que
primeiramente tramitou no COMPUR, sendo encaminhado à Câmara Municipal em dezembro
de 2005. Entretanto, em dezembro de 2006, por razões desconhecidas, o Projeto de Lei foi
suspenso pelo próprio Poder Executivo
29
.
Não obstante todas as dificuldades enfrentadas, algumas delas explicitadas neste
trabalho, podemos dizer que a legislação urbanística belo-horizontina foi elaborada e tem sido
monitorada com abertura à participação de todos os setores da sociedade, em consonância
com os princípios democráticos da Constituição de 1988. É Nesse contexto de gestão
democrática que o Instrumento das Operações Urbanas foi instituído e tem sido implementado
em Belo Horizonte. Porém, interessa-nos saber se o instrumento de fato tem sido utilizado a
favor do interesse coletivo. Os principais estudos sobre as operações urbanas tratam das
experiências de São Paulo e nos revelam que, em tal município, têm servido principalmente
para alimentar os lucros do capital imobiliário.
29
Informação obtida no Centro de Atendimento ao Cidadão – CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte, em
20/11/07.
53
3.
Operações Urbanas Paulistanas e Belo-horizontinas: diferenças e semelhanças
São Paulo foi o primeiro município brasileiro a dispor do Instrumento das Operações
Urbanas em Plano Diretor aprovado em 1988. Desde a década de 1990, o município vem
implementando operações urbanas bastante significativas, tanto do ponto de vista espacial
quanto financeiro.
Talvez seja por essa razão que os principais estudos brasileiros a respeito do
instrumento tratam das experiências paulistanas. A partir da análise de tais experiências, a
opinião de estudiosos como Mariana Fix (2001 e 2004), Adauto Cardoso (apud SOUZA,
2006), Maricato e Ferreira (2002) é de que o instrumento das operações urbanas estaria
servindo mais à promoção do capital imobiliário e financeiro do que beneficiando a maior
parte da população, na medida em que justifica obras não prioritárias na cidade, que permitem
a expansão dos negócios imobiliários sem, no entanto, contribuir na redução dos problemas
sociais, senão agravando-os.
Entretanto, Maricato e Ferreira (2002) acreditam que o instrumento das operações
urbanas pode gerar melhorias urbanísticas de maneira democrática e includente; segundo eles,
isso se daria através de intervenções de menor porte, negociadas caso-a-caso por ampla
parcela da sociedade civil. Também para Souza (2006, p.278), “as operações urbanas não
precisam ser vistas, necessariamente, como um ‘equívoco’ da agenda da reforma urbana”,
contanto que não sirvam apenas aos interesses empresariais. Ou seja, para esses autores
outros “caminhos” de regulamentação e aplicação do instrumento.
Uma vez que a conjuntura belo-horizontina é bastante diferente da conjuntura
paulistana, entre outras razões, principalmente porque Belo Horizonte não apresenta as
mesmas dinâmicas econômicas e imobiliárias que São Paulo, a comparação da implementação
do instrumento das operações urbanas nestas duas cidades de contextos diversos,
identificando diferenças e semelhanças, nos permitirá avançar no estudo sobre o instrumento.
A intenção é de descobrir ou aperfeiçoar maneiras de utilização do mesmo na promoção de
cidades espacialmente e socialmente mais justas.
54
As experiências de operações urbanas em São Paulo
Desde a década de 1980, as operações urbanas no município de São Paulo têm sido
defendidas e implementadas por administrações ideologicamente bastante diferentes, desde
aquelas de cunho populista às mais afinadas aos ideais neoliberais ou aos ideais progressistas.
O instrumento estava incluído na proposta de Plano Diretor 1985-2000, do governo Mário
Covas (PMDB/PSDB), mas foi de fato instituído no Plano Diretor aprovado em 1988, no fim
da gestão de Jânio Quadros (PFL).
A inclusão das operações urbanas como instrumento urbanístico de parceria público-
privado na Lei Orgânica de São Paulo de 1989 reforçou a importância das mesmas no
Município. Como em Belo Horizonte, também em São Paulo exige-se que cada operação
urbana seja regulamentada em lei específica, que define perímetro para o qual são estipuladas
novas regras a serem “vendidas” aos proprietários dos lotes da região.
A primeira operação urbana paulistana iniciou-se na cada de 1990, no governo de
Luísa Erundina (PT), chamada Operação Urbana Anhangabaú (Lei 11.090/91). A partir de
então, já foram aprovadas em São Paulo as operações urbanas Faria Lima (Lei Nº 11.732/95),
Água Branca (Lei 11.774/95) e Centro (Lei 12.349/97)
30
. Mais recentemente foram
aprovadas as operações urbanas Água Espraiada (Lei 13.260/01) e Rio Verde Jacu (Lei
13.872/04), e a Operação Urbana Faria Lima teve sua lei revista em 2004 (Lei Nº
13.769/04). O Plano Diretor Estratégico de 2002 (portanto, pós-Estatuto da Cidade) instituiu a
possibilidade de aprovação de nove novas operações urbanas consorciadas
31
além das
existentes.
Mesmo antes de 1988, a cidade vinha realizando experiências análogas de parcerias
público-privado, especialmente aquelas promovidas pela “Lei do Desfavelamento” (Lei
10.209), sancionada em 1986, que depois foi readaptada, transformando-se naLei das
Interligadas” (Lei Nº 11.773), de 1995. Nas experiências regulamentadas por essas leis,
30
Esta última foi instituída para substituir e ampliar a Operação Urbana Anhangabaú, a qual teve duração de
apenas três anos.
31
O Plano Diretor Estratégico de o Paulo adequou o instrumento das operações urbanas às exigências do
Estatuto da Cidade. As nove operações urbanas propostas no documento foram: Diagonal Sul, Diagonal Norte,
Carandiru-Vila Maria, Vila Leopoldina, Vila Sônia, Celso Garcia, Santo Amaro, Pólo de Desenvolvimento Sul e
Amador Bueno.
55
chamadas operações interligadas”, eram permitidas aos proprietários de imóveis
modificações dos índices e características de uso e ocupação do solo previstos na Lei de
Zoneamento, desde que construíssem e/ou doassem ao Poder Público habitações de interesse
social (HIS). Enquanto na Lei 10.209/86 os recursos provenientes da parceria eram
necessariamente prestados em HIS, a Lei 11.773/95 ampliou a liberdade de atuação do
Poder Público quanto à destinação desses recursos, vinculando o valor da contrapartida ao
Fundo Municipal da Habitação (FMH), criado por lei em 1994.
.
As exceções de índices e usos concedidas via operações interligadas não eram
regulamentadas por leis específicas, e poderiam se dar para construções em qualquer região
da cidade (salvo em áreas de proteção ambiental). De acordo com depoimento de arquiteto da
Prefeitura de São Paulo
32
, as principais exceções solicitadas por empreendedores imobiliários
referiam-se a aumento do potencial construtivo do lote, aumento este que era limitado a
quatro vezes a área do terreno objeto da operação. O impacto da concessão desse e de outros
benefícios, eventualmente solicitados, era avaliado por um grupo de trabalho. Cabia à
Secretaria Municipal de Planejamento (SEMPLA), instruída pela análise do grupo de
trabalho, a aprovação de cada uma das propostas.
No ano de 1998, medida liminar do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
suspendeu os efeitos da Lei das Interligadas, em função de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADIN) proposta pelo Ministério Público de São Paulo. Devido a esta
medida liminar, todas as operações interligadas aprovadas e que se encontravam em
construção foram paralisadas. A ADIN foi definitivamente julgada em fevereiro de 2000,
tendo sido considerada procedente
33
(entretanto, todas as obras que se encontravam
paralisadas devido à medida liminar puderam dar continuidade em sua execução, bem como
todos aqueles pretendentes que possuíam Termos de Compromisso assinados com a
SEMPLA). Em 2001, instalou-se uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar
supostas irregularidades nas operações interligadas desenvolvidas no Município de São Paulo
32
Sr. Paulo Roberto Castaldeli, em depoimento prestado à Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar as
operações interligadas realizadas no município de São Paulo, realizado durante sessão pública do dia 29 de
outubro de 2001 (CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2002).
33
O Tribunal de Justiça de o Paulo julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei
11.773/95 por esta conferir legitimação ao ato de derrogação da Lei de Zoneamento sem qualquer consulta à
Câmara Municipal. A lei paulistana impõe a necessidade de quorum qualificado de 2/3 da Câmara Municipal
para as mudanças no zoneamento que, no entanto, foram obtidas por “vias transversas”.
56
desde 1986
34
. Ao final das investigações, a CPI de fato constatou várias irregularidades na
aprovação e implementação das operações interligadas, no tocante aos parâmetros de
construção, à avaliação das contrapartidas, à motivação dos atos administrativos que fixaram
as contrapartidas e à aplicação dos recursos arrecadados. Todo o material colhido e elaborado
foi então encaminhado ao Ministério Público e ao Poder Executivo para as medidas
administrativas e judiciais competentes.
Em verdade, as operações interligadas sempre foram rodeadas de muitas polêmicas.
Uma das discussões recorrentes era a de que os acréscimos permitidos às construções,
concedidos de forma pontual e casuística, poderiam não corresponder à capacidade de suporte
da infra-estrutura da cidade. Apesar de pontuais, as concessões à Lei de Zoneamento obtidas
nas operações interligadas vinham sendo utilizadas, majoritariamente, na região da cidade de
maior interesse para o mercado imobiliário, onde geravam maior lucro, no caso, o setor
sudoeste. No entanto, seu alcance era restrito aos lotes, limitando as ações dos
empreendedores e, conseqüentemente, a arrecadação dos recursos oriundos das
contrapartidas.
Nesse sentido, as operações urbanas expandiram tanto as possibilidades do mercado
como também a arrecadação de recursos, criando, por meio de suas leis específicas, extensas
regiões com novas regras e incentivos. De fato, uma das características das operações urbanas
paulistanas é a imensa extensão de seus perímetros, variando de 450 a 3.000 hectares
35
.
Quanto aos recursos arrecadados, diferentemente das operações interligadas, nas operações
urbanas eles se destinam a obras e serviços a serem realizados na própria região das
intervenções, medida justificada pela necessidade de suporte de infra-estrutura demandada
pelas próprias concessões à lei.
A prática do instrumento das operações urbanas em São Paulo vem se dando, de modo
geral, através de investimento inicial do Estado em determinada área para atrair o mercado
34
Nos termos do Artigo 93 do Regimento Interno da Câmara Municipal de São Paulo, a CPI foi constituída a
partir de requerimento do Vereador Antônio Goulart.
35
A Operação Urbana Anhangabaú abrangia um perímetro de 84 hectares (pode ser considerada a operação
urbana paulistana de menor área de intervenção), mas foi substituída pela Operação Urbana Centro, que abrange
600 hectares.
57
imobiliário e posterior recuperação deste investimento pela concessão onerosa
36
de
modificações à legislação de uso e ocupação do solo (FIX, 2004). Assim, uma outra
característica das operações urbanas paulistanas é a realização de “obras âncora” ou “projetos
motores” pelo poder público para estimular e atrair o capital privado. São investimentos
iniciais que criam uma perspectiva de valorização atraente para os investidores privados, mas
que não necessariamente precisam ser obras viárias. No caso da Operação Urbana Centro,
estão sendo feitos investimentos em equipamentos culturais. as operações urbanas Faria
Lima e Água Espraiada contaram com a execução de avenidas: o prolongamento da Avenida
Faria Lima e a construção da Avenida Água Espraiada, iniciados antes mesmo da aprovação
das leis de operação urbana.
Essas operações urbanas citadas localizam-se em áreas que se encontravam bem
servidas de infra-estrutura. As construções das “avenidas âncora” ou implementação de
“projetos motores”, num contexto de tanta desigualdade social, com enorme contingente de
população favelada sem infra-estrutura básica de sobrevivência digna, leva-nos a concordar
com Fix (2004, p.187) quando diz que “a operação acaba por justificar a maior importância
dada a obras não prioritárias, ainda que não necessariamente custeadas pelos
beneficiários”.
As operações urbanas Faria Lima e Água Espraiada se inserem numa das mais
dinâmicas regiões de São Paulo do ponto de vista do mercado imobiliário – o vetor sudoeste.
A Operação Urbana Faria Lima foi a que contabilizou o maior aporte de recursos oriundos de
contrapartidas a partir de concessões à legislação de zoneamento (MONTANDON, 2007),
sendo que a maior parte do montante arrecadado serviu para cobrir gastos com as
desapropriações necessárias para o prolongamento da Avenida Faria Lima
37
. Os números nos
permitem a constatação da ênfase dada à questão viária em detrimento a outras obras que
poderiam gerar maiores benefícios coletivos. Na prática, o prolongamento da Avenida Faria
Lima, assim como a construção da Avenida Água Espraiada, serviram principalmente para a
criação de novas frentes de expansão do capital imobiliário.
36
A concessão onerosa não precisa ser necessariamente financeira. A contrapartida do setor privado pode se dar
em obras públicas ou outros benefícios para a cidade.
37
Segundo dados de SEMPLA / Projetos Urbanos e Emurb, apud MONTANDON, 2007.
58
Não podemos deixar de dizer que na construção da Avenida Água Espraiada a
população favelada que ocupava os terrenos da região foi de expulsa, uma vez que não
foram desenvolvidas políticas específicas para mantê-la no local. À época da construção da
avenida, as únicas opções dadas aos favelados – os quais já tinham direito à usucapião de seus
lotes - foi o financiamento de casas em conjunto habitacional situado em longínqua periferia e
que ainda não estava construído, ou quantia em dinheiro insuficiente para adquirir imóvel no
mercado legal, o que levou a maioria deles a ocupar outras favelas da cidade
38
. De acordo
com Fix (2004, p.192), “a operação [Operação Urbana Água Espraiada] serviu para
valorizar a região da Berrini por meio de ‘limpeza social’”.
Para além dessas questões, devemos ressaltar que as obras-âncora” para atração do
interesse do mercado são investimentos iniciais arcados pelo Estado sem garantia certa de
retorno. Posto que a grande justificativa das parcerias público-privado é o ficit financeiro
estatal, os investimentos iniciais arcados pelo governo, sem garantia da sua recuperação, o
contraditórios à concepção original do Instrumento das Operações Urbanas. Afinal, mesmo
nos casos das operações urbanas viabilizadas por investimentos estatais prévios - as chamadas
“obras-âncora” - pagam contrapartidas os proprietários interessados em obter exceções à
legislação vigente, sendo que os proprietários que não o fazem têm seus imóveis valorizados
pelas obras públicas e nada pagam. Nesses casos, entendemos que um adequado instrumento
para a recuperação dos gastos públicos, os quais geraram valorização dos terrenos, é a
“Contribuição de Melhoria”
39
, que poderia ser utilizado em associação ao Instrumento das
Operações Urbanas.
Ainda em relação às “obras-âncora”, Fix (2001 e 2004) nos lembra que, mesmo que os
valores arrecadados pelo Estado nas contrapartidas sejam suficientes para arcar com as suas
despesas, muitas vezes esses valores não são suficientes para cobrir os impactos negativos dos
empreendimentos permitidos pela flexibilização da lei, pois esses impactos na maioria das
vezes se alastram por uma região muito maior do que o perímetro da operação urbana.
38
A respeito do processo de expulsão dos favelados para viabilização da Operação Urbana Água Espraiada, ver
FIX (2001).
39
A Contribuição de Melhoria é um instrumento que permite cobrar dos proprietários de imóveis a valorização
de seus imóveis decorrente de obras públicas. Ele está previsto no artigo 4º do Estatuto da Cidade.
59
Quanto às operações urbanas Água Branca, de 1995, e a mais nova aprovada, Jacu-
Verde, de 2004, estas têm a particularidade de não se situarem na principal frente de expansão
imobiliária da cidade (o vetor sudoeste), nem no Centro Antigo. “Fora do vetor de maior
valorização, talvez por isso [a Operação Urbana Água Branca] tenha contado com apenas
um empreendimento, um grande centro empresarial, que, por sinal, enfrentou muitas
dificuldades de comercialização” (FIX, 2004, p.190). a operação urbana Jacu-Verde,
pouco tempo aprovada, talvez tenha destino diferente, pois “estará articulada com o conjunto
de propostas e iniciativas relativas ao Programa de Desenvolvimento Econômico da Zona
Leste” (Lei N° 13.872/04, art. 1°, §2°).
À maneira como vêm sendo implementadas em São Paulo, as operações urbanas estão
servindo, principalmente, para desbloquear o potencial de negócios de determinadas áreas da
cidade e promover, conseqüentemente, a renovação das mesmas. As áreas das operações
urbanas Faria Lima e Água Espraiada hoje conformam novo eixo empresarial-comercial de
São Paulo que vai do centro da cidade em direção à marginal do Rio Pinheiros e daí se
expande na direção sudoeste conformando nova centralidade na cidade. Nessas áreas estão
sendo construídos grandes empreendimentos imobiliários - muitos deles associados a
empreendimentos financeiros - com projetos sofisticados e instalações de alta tecnologia, cuja
implantação exige uma infra-estrutura urbana também avançada e demanda a reordenação de
grandes áreas da cidade. Esses mega-empreendimentos têm abrigado, em sua maioria, as
atividades do setor terciário.
Nas últimas décadas, São Paulo vem experimentando uma expansão extraordinária do
setor terciário, principalmente dos serviços especializados e de finanças. Essa é uma tendência
das grandes cidades em todo o mundo e está vinculada à reestruturação econômica e
produtiva global (SASSEN, 1998). Para esta autora, o processo fundamental que alimenta o
crescimento do setor terciário é o uso cada vez maior dos recursos que ele oferece por parte
do setor produtivo, crescendo a importância daqueles serviços especializados, que exigem
forte conteúdo de informação e conhecimento. Sassen (1998) também ressalta o aumento do
“peso” do capital financeiro nas últimas décadas, o que contribuiu para a proliferação dos
serviços (e também instituições) ligados a esse capital. Também as famílias aumentaram o
consumo de serviços, afinal, serviços especializados incorporam trabalhadores mais
qualificados que, por sua vez, demandam outros serviços, os pessoais e de lazer (a maioria
deles de alto-padrão), num processo de expansão do setor nunca antes vivida.
60
A reestruturação produtiva do capitalismo também faz despontar outro processo: a
descentralização geográfica, em escala mundial, das atividades produtivas e econômicas (o
que não significa descentralização do poder econômico) (SASSEN, 1998; HARVEY, 1995).
A superação das barreiras espaciais permitiu maior mobilidade ao capital e gerou uma
“corrida” pela atração das atividades econômicas, bem como dos fluxos financeiros e de
consumo.
Assim, no ideário hegemônico atual, tornar o espaço urbano atrativo para as grandes
empresas e para o capital financeiro, em face de uma economia globalizada, passa a ser
imprescindível para a “sobrevivência” das cidades. Nesse sentido, a maior oferta de serviços e
infra-estrutura colabora na construção de uma “boa imagem” da cidade, ou seja, de uma
imagem atrativa aos olhos do capital global, cujo ápice seria a aquisição do título de “cidade-
global”, o que significaria estar de fato inserida na rede de comando da economia mundial. No
entanto, a reordenação urbana necessária para tal objetivo não se viabiliza apenas por meio do
livre jogo do mercado; para realizá-la, a atuação do Estado se mostra essencial, através do seu
papel normativo e, muitas vezes, indutor. É assim, à luz dessas concepções, que as parcerias
público-privado via operações urbanas têm sido firmadas em São Paulo.
De acordo com Ferreira (2007), as concepções difundidas de “globalização” e “cidade-
global” estão em verdade acompanhadas de uma forte carga ideológica que se alinha aos
ideais neoliberais de supremacia absoluta do mercado, permitindo a expansão (e
sobrevivência) da economia-mundo capitalista. Ferreira argumenta que, embora tenha havido
transformações mundiais concretas originadas do avanço do conhecimento tecnológico, que
suscitaram em alguns rearranjos na produção e na distribuição, assim como na dinamização
dos fluxos financeiros, uma outra face do mesmo processo resultante de uma construção
puramente ideológica, a qual impõe a expansão do mercado mundial por meio da adoção de
políticas neoliberais. Nas palavras do autor:se alguns processos de transformação são
inexoráveis e estão ligados ao próprio avanço científico da humanidade, os procedimentos
que se adotam a partir daí, isto é, as ações que estes avanços permitem, não são, por sua vez,
inexoráveis ou únicas” (FERREIRA, 2007, p.97).
No caso de São Paulo, a partir do respaldo do pensamento hegemônico face às
transformações da economia global, tem sido criadas “ilhas” modernas e “globalizadas”
envoltas por assentamentos urbanos abandonados pelo capital e pelo poder público, num
61
processo de acirramento da desigualdade social. Parece-nos que, mais uma vez em nosso país,
está o desenvolvimento social subordinado ao desenvolvimento econômico, desta vez com o
respaldo da ideologia neoliberal.
As operações urbanas no contexto da gestão democrática: o caso de Belo-Horizonte
O avanço dos ideais neoliberais no Brasil coincide com o processo de
redemocratização do país. A Constituição de 1988, marco deste processo, consagrou os
princípios da democratização, da participação e da função social da propriedade, os quais,
desde então, também estão presentes nas leis orgânicas e planos diretores municipais.
Entretanto, junto a tais princípios, afirmados no campo normativo brasileiro, coexistem
práticas políticas nem sempre condizentes.
No caso das parcerias público-privado, previstas pelo Instrumento das Operações
Urbanas, o desafio colocado ao Estado é de conciliar os interesses da iniciativa privada, ou
seja, do mercado, com o interesse público, visando à democratização dos benefícios da
cidade. Em Belo Horizonte, este desafio é reforçado, posto que desde 1993 o município vem
sendo governado por coalizões de centro-esquerda, cujo discurso se alinha aos princípios
progressistas.
A partir de 1993 novas experiências de gestão participativa vem sendo implementadas
no Município. Entre essas experiências, podemos citar o Orçamento Participativo, em prática
desde 1993, e a própria formulação do Plano Diretor (PD) e da Lei de Parcelamento,
Ocupação e Uso do Solo de 1996 (LPOUS/96). Atualmente, Belo Horizonte conta com mais
de 80 canais institucionais de participação popular; ligados diretamente à política urbana
existem 18 conselhos e comissões, com formatos e papéis variados (COTA, 2007). No que
tange ao Instrumento das Operações Urbanas, deve-se destacar o papel do Conselho
Municipal de Política Urbana (COMPUR) e das Conferências Municipais de Política Urbana.
O COMPUR tem como uma de suas atribuições monitorar a implementação das normas do
PD e da LPOUS, entre elas os instrumentos de política urbana
40
. As Conferências Municipais
de Política Urbana devem acontecer a cada quatro anos e têm por objetivo avaliar a condução
40
Sobre a composição e as atribuições do COMPUR, ver capítulo 2 deste trabalho.
62
e os impactos da implementação das normas contidas no PD e na LPOUS, bem como das
diretrizes estabelecidas e dos cronogramas de investimentos.
Desde que foram instituídas no PD, 10 leis de operações urbanas foram aprovadas em
Belo Horizonte: Operação Urbana “para permuta de imóvel” (Lei N° 7.280/97); Operação
Urbana “para construção de estações de ônibus(Lei N° 7.928/99, com alguns dispositivos
alterados pela Lei N° 8.067/00); Operação Urbana do Isidoro” (Lei N° 8.137/00); Operação
Urbana “da Casa do Conde” (Lei N° 8.240/01); Operação Urbana “Vila Silveira” (Lei N°
8.299/01); Operação Urbana “Fundação Furtado Menezes” (Lei N° 8.431/02); Operação
Urbana “do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque” (Lei N° 8.728/03); Operação
Urbana “Centros de Comércio Popular” (Lei N° 9.058/05); Operação Urbana “Capitão
Eduardo” (Lei n° 9.065/05); e a última aprovada até o momento, a Operação Urbana do
Edifício-Sede do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais” (Lei N° 9.366/07). Com
exceção da Operação Urbana do Conjunto da Avenida Oiapoque, originária de projeto de lei
assinado por vereador
41
, todas as demais operações urbanas são originárias de projeto de lei
de autoria do Executivo.
De acordo com Cota (2007, p.12), as operações urbanas belo-horizontinas podem ser
dividas em dois tipos, conforme o interesse que as originou:
1. aquelas cujo interesse público foi previamente definido pelo Executivo, que
busca, posteriormente, a iniciativa privada;
2. aquelas cujo interesse privado mobilizou o Executivo para a discussão de uma
proposta (não havia interesse público previamente definido).
Das 10 operações urbanas aprovadas, podemos dizer que metade delas estão inseridas
no primeiro grupo: Operação Urbana para permuta de imóvel”, Operação Urbana “para
construção de estações de ônibus”, Operação Urbana “do Isidoro”, Operação Urbana “da Casa
do Conde” e Operação Urbana “Centros de Comércio Popular”. As outras 5 estão inseridas no
segundo grupo: Operação Urbana “Vila Silveira”, Operação Urbana “Fundação Furtado
41
Sobre a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque, discutiremos mais
detalhadamente no capítulo 4 deste trabalho.
63
Menezes”, Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque”, Operação
Urbana Capitão Eduardo” e Operação Urbana “do Edifício-Sede do Tribunal de Justiça do
Estado de Minas Gerais”. Observa-se que as operações urbanas inseridas no grupo 1 - aquelas
cujo interesse público foi previamente definido pelo Executivo buscando a iniciativa privada
posteriormente foram as primeiras a serem aprovadas (com exceção da Lei N° 9.058/05),
enquanto as inseridas no grupo 2 – aquelas que, a partir de um interesse privado, mobilizou-se
o Executivo são as mais recentes, demonstrando certo “atraso” da iniciativa privada na
descoberta do uso do instrumento em seu benefício.
A primeira operação urbana belo-horizontina, Operação Urbana “para permuta de
imóvel” (Lei N° 7.280/97), inserida no grupo 1, foi utilizada pelo poder público para
resolução de um impasse: o Executivo pretendia transformar uma área de propriedade
particular, classificada como Zona Residencial-3 (ZR-3), em Setor Especial-2 (SE-2)
42
. Pela
lei da Operação Urbana, transformou-se trecho de via pública em imóvel de categoria
dominial (desafetado dos fins de uso comum) classificando-o como ZR-3, para que este fosse
permutado pela área de interesse do Executivo, que então passou a ser classificada como SE-
2. Os dois terrenos envolvidos na permuta localizam-se em mesmo bairro da Regional
Nordeste de Belo Horizonte. Como na troca o imóvel cedido pelo Executivo possuía maior
valor que o imóvel recebido por este, o proprietário particular participante da transação se
responsabilizou pela construção de uma escadaria pública e pelo pagamento ao Poder Público
de certo montante em dinheiro.
Outro exemplo de operação urbana que partiu de interesse prévio do Poder Público é a
Operação Urbana “para construção de estações de ônibus” (Lei N° 7.928/99). A Lei dispõe
sobre parceria público-privado para construção de 9 estações de integração de ônibus, de
acordo com o Plano de Reestruturação do Sistema de Transporte Coletivo de Belo Horizonte
BHBUS. Pela Lei, o suporte financeiro para construção e implementação das estações de
integração pelos empreendedores privados garantiria a eles, como contrapartida, o direito de
projetar, construir e explorar as estruturas empresariais das mesmas, as quais poderiam ser
42
Esta lei de operação urbana belo-horizontina tinha como referência o zoneamento funcionalista da Lei de
Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo de 1985, o qual dividia o território de acordo com os usos permitidos.
No caso da ZR-3 eram permitidas residências uni e multifamiliares, comércio e serviço local, comércio
atacadista de pequeno porte e micro indústria não poluente. O SE-2 compreendia espaços, estabelecimentos e
instalações destinados aos serviços de uso coletivo.
64
constituídas de áreas e edificações destinadas a usos residencial, comercial e de prestação de
serviços.
Das nove estações de integração previstas, apenas uma se viabilizou através da
parceria: a Estação Barreiro. Segundo informações da Gerência de Implantação dos
Corredores e Estações GECOR/BHTRANS
43
, os editais para construção e implementação
das outras oito estações nem chegaram a ser lançados (A lei da Operação Urbana [Lei N°
7.928/99] estabelece que a parceria público-privado a ser estabelecida deve ser objeto de
licitação, sob a modalidade de concorrência). Ainda segundo a GECOR/BHTRANS, o
adiamento do lançamento desses editais se deve a alguns impedimentos na consolidação do
sistema proposto pelo BHBUS, tendo sido citado o problema de ocupação das áreas previstas
para as estações.
A Lei N° 8.067/00 veio a modificar alguns dispositivos da lei de parceria para
construção de estações de ônibus, alterando o prazo de vigência de cada operação urbana de
que trata a lei para 5 anos contados do lançamento do respectivo edital (a lei anterior definia
prazo de vigência de 5 anos contados de sua publicação), de modo que ainda há possibilidade
de que outras estações de ônibus do BHBUS se viabilizem através da Operação Urbana, caso
haja interesse do setor privado.
A Operação Urbana do Isidoro (Lei N° 8.137/00) foi uma tentativa do Executivo de
implantação de trecho de via regional custeada pelo setor privado, em troca de concessões à
Lei de Uso e Ocupação do Solo. A região do Isidoro se localiza na periferia norte do
Município, em área de baixa densidade construtiva, com grande parte ainda não parcelada.
Assim, por enquanto a região não se apresenta interessante para o setor imobiliário, de forma
que apenas um dos proprietários de terra dentro do perímetro da operação se mostrou
interessado, o que inviabilizou a construção da via prevista pela Operação Urbana.
Diferentemente de São Paulo, os investimentos privados não foram estimulados por um
investimento público âncora”, provavelmente com a expectativa de que a própria lei fosse
suficiente para viabilização da parceria.
43
Informação obtida em 29/02/08.
65
A Operação Urbana da Casa do Conde (Lei N° 8.240/01) foi proposta pelo Executivo
para reestruturar/requalificar área adjacente à linha ferroviária na sua parte próxima à área
central da cidade
44
. A área era, até então, toda de propriedade da Rede Ferroviária, que
pretendia leiloá-la. Ela é composta de espaços vazios e alguns galpões, que à época estavam
praticamente inutilizados, além da edificação tombada da Casa do Conde de Santa Marinha,
que tinha sido cedida para realização de eventos. A idéia era de que toda a área fosse utilizada
para uso cultural e de lazer e, com esse propósito, a lei de operação urbana definia normas de
parcelamento, ocupação e uso do solo. À iniciativa privada caberia elaborar e implantar os
projetos de acordo com as normas da lei, enquanto o Município ficaria responsável pela
implementação das obras viárias necessárias devido a reparcelamentos propostos para alguns
lotes. Até o momento, a proposta não tem tido adesão dos investidores privados, mas a lei
estará em vigor a2011. O terreno da Casa do Conde continua funcionando como espaço de
eventos, enquanto outros galpões, adquiridos em leilão, têm abrigado funções diversas.
A seguir, trataremos das operações urbanas belo-horizontinas que, diferentemente dos
exemplos acima citados, partiram do interesse do setor privado, que então dirigiu sua
pretensão a órgãos da administração municipal. Entre essas, duas proporcionaram
regularização de imóveis a Operação Urbana Vila Silveira e a Operação Urbana Capitão
Eduardo - revelando-nos uma outra possibilidade do instrumento de operações urbanas: a
regularização de loteamentos e edificações em situação ilegal.
A Operação Urbana Vila Silveira (Lei N° 8.299/01) possibilitou a concessão de baixa
e habite-se a edificações situadas em 5 lotes de quarteirão da Vila Silveira a partir de alteração
do afastamento frontal mínimo estipulado pela LPOUS, em troca da implantação de praça
pública em dois lotes do mesmo quarteirão. Segundo a assessora da secretária da Secretaria
Municipal Adjunta de Regulação Urbana de Belo Horizonte, técnica participante da
negociação
45
, a Vila Silveira era extremamente deficiente de espaços de lazer e convivência,
tendo a Operação Urbana proporcionando um ganho para a população local. a Operação
Urbana Capitão Eduardo (Lei N° 9.065/05) estabeleceu-se numa parceria entre a Prefeitura e
a Associação dos Voluntários do Bairro Guarani ASVGO, com o objetivo de viabilizar e
44
De acordo com informação da assessora da secretária da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana,
em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/07, às 10:00.
45
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/07, às 10:00.
66
regularizar parcelamento de solo de interesse social. O Executivo se responsabilizou pela
execução de projetos e concessões à lei, enquanto as obras de infra-estrutura devem ser
financiadas pela ASVGO. A Operação Urbana está em andamento lento, parece que a
ASVGO se encontra com dificuldades financeiras para implementação das obras, mas a lei
tem prazo de vigência até 2015.
Tal possibilidade de regularização de loteamentos e edificações irregulares
proporcionada pelas operações urbanas pode ser muito útil na legitimação e recuperação de
vilas/favelas e bairros de periferia, que muitas vezes são desconsiderados nos projetos
urbanísticos, apesar de constituírem grande parte (senão a maior parte) das cidades brasileiras.
Com formato e propósito bastante diferente das operações urbanas Vila Silveira e
Capitão Eduardo, a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque (Lei
N° 8.728/03) pode ser considerada, até o momento, a operação urbana belo-horizontina de
maior complexidade. Ela envolveu dois empreendedores privados, além do poder público, e
dois perímetros de intervenção, se viabilizando com a combinação do Instrumento da
Operação Urbana com o Instrumento da Transferência do Direito de Construir.
A lei da Operação Urbana abriu concessões às normas de aplicação do Instrumento da
Transferência do Direito de Construir em Belo Horizonte, permitindo a proprietário de imóvel
tombado situado na Zona Hipercentral (ZHIP) venda do seu potencial construtivo para
imóveis inseridos na Zona Central de Belo Horizonte (ZCBH)
46
e Zona Adensada (ZA)
47
. De
acordo com o Plano Diretor, apenas os imóveis situados em Zona de Adensamento
Preferencial (ZAP)
48
ou em torno do imóvel protegido são passíveis de recepção da
transferência do direito de construir. Assim, em troca da concessão, o proprietário do imóvel
tombado responsabilizou-se por restaurá-lo e nele abrigar atividades de lazer, cultura ou
economia popular, ficando acordado entre as partes a implantação no imóvel de um “centro de
comércio popular” com a finalidade de relocar para a imensa quantidade de camelôs e
46
De acordo com a LPOUS/96, a ZCHB e a ZHIP são subdivisões da Zona Central (ZC), onde é permitido
maior adensamento demográfico e maior verticalização das edificações (Art. 11).
47
De acordo com a LPOUS/96, “são ZAs as regiões nas quais o adensamento deve ser contido, por
apresentarem alta densidade demográfica e intensa utilização de infra-estrutura urbana, de que resultam,
sobretudo, problemas de fluidez do tráfego, principalmente nos corredores viários”(Art.9º).
48
De acordo com o LPOUS/96, são ZAPs as regiões passíveis de adensamento, em decorrência de condições
favoráveis de infra-estrutura e topografia” (Art.10).
67
toreros
49
que à época “faziam ponto” na avenida do imóvel (Avenida Oiapoque). Ao segundo
empreendedor envolvido, o qual estava interessado em construir um mall na ZA, foi permitido
aumento do coeficiente de aproveitamento (o CA passou de 1,0 [§4º do art. 45 da Lei
nº7166/96] para 1,6) desde que o potencial construtivo adicional fosse resultado da aquisição
de potencial construtivo originário do imóvel tombado mencionado, ficando responsável,
como contrapartida, pela implantação de terminal de ônibus na Avenida Oiapoque e
tratamento urbanístico do entorno desta avenida, conforme projeto previsto pelo Executivo.
Dessa forma, os interesses do Poder Público de implantação de novo terminal de ônibus,
recuperação da área central de Belo Horizonte e retirada dos camelôs de logradouro público,
puderam ser conciliados com o interesse do empreendedor-proprietário do imóvel tombado de
restaurar o imóvel e nele abrigar alguma atividade lucrativa, e com o interesse do
empreendedor do mall, que pôde adquirir potencial construtivo em uma das áreas atualmente
mais valorizadas da cidade.
Em continuação ao projeto de retirada dos camelôs e toreros das ruas e calçadas, face à
proibição do exercício dessas atividades em logradouros públicos determinada pelo Código de
Posturas Municipal de 2003, foi aprovada a Operação Urbana “Centros de Comércio Popular”
(Lei N° 9.058/05). Na parceria vêm sendo concedidos potenciais construtivos adicionais (até
um limite máximo de 20% do permitido na LPOUS) aos empreendedores que implantarem e
mantiverem por dez anos boxes de venda em centros de comércio popular. Na troca, cada
destinado à instalação de box pode gerar 3 de potencial construtivo adicional em imóveis
situados em praticamente todas as macrozonas da cidade (com exceção daquelas classificadas
como ZPAM, ZP1, ZP2, ZAR ou ZEIS).
Segundo informações da assessora da secretária da Secretaria Municipal Adjunta de
Regulação Urbana
50
, tal parceria vem sendo aderida por muitos investidores imobiliários, que
têm utilizado o potencial construtivo adicional principalmente no vetor sul da cidade, o qual
vem experimentando crescimento acelerado nas últimas décadas com empreendimentos
voltados para as classes média-alta a alta. Apesar da lei de operação urbana demonstrar
preocupação com a questão da manutenção dos camelôs e toreros nos centros de comércio, ao
49
Tanto camelôs quanto toreros são vendedores de rua, no entanto, enquanto os camelôs têm pontos de venda
fixos, os toreros são ambulantes.
50
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/07, às 10:00.
68
exigir apoio dos empreendedores imobiliários a eles durante o período de 10 anos, não se sabe
o que poderá acontecer aos comerciantes ao término deste prazo, enquanto que a densidade
construtiva adicional e suas conseqüências certamente serão mais duradouras.
A última operação urbana aprovada em Belo Horizonte (Lei N° 9.366/07) se constitui
em uma parceria do Legislativo Estadual com o Executivo municipal. A lei concede potencial
construtivo adicional (o CA passou de 3,0 para 4,6) ao terreno onde será construído Edifício-
Sede do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, localizado na área central de Belo
Horizonte
51
; como contrapartida, o Poder Público Estadual promoverá recuperação da
edificação tombada existente no terreno, e melhoria da circulação para pedestres por meio da
criação de praça de uso público.
Diferenças e Semelhanças
A partir dos exemplos discutidos, podemos observar quatro principais diferenças entre
as operações urbanas paulistanas e belo-horizontinas:
Em Belo Horizonte, o monitoramento do uso e aplicação do instrumento das
operações urbanas é mais aberto à participação da sociedade civil a partir de canais
institucionais de participação, como o COMPUR e as Conferências Municipais de
Política Urbana.
As operações urbanas de Belo Horizonte, diferentemente de São Paulo, não contaram
com a execução de obras-âncora” ou “projetos-motor”, não tendo havido, assim,
investimento inicial do Estado sem garantia de retorno.
Em Belo Horizonte, as intervenções através de operações urbanas foram pontuais, ou
seja, localizadas em pontos (ruas, lotes, quarteirões) específicos na cidade, enquanto
em São Paulo o instrumento vem sendo aplicado em áreas extensas onde são definidas
novas regras de uso e ocupação do solo, promovendo transformações/renovações de
grandes setores da cidade.
51
De acordo com o PD, “entende-se por área central a delimitada pela Avenida do Contorno” (Art.7, §2º).
69
Pelo menos em discurso, as operações urbanas belo-horizontinas, diferentemente das
paulistanas, vêm sendo mais direcionadas a interesses sociais em detrimento de
interesses fundamentalmente econômicos. Porém, na prática, grande parte delas o
“vingaram”.
Assim, não obstante as diferenças, tanto no caso paulistano quanto belo-horizontino,
as operações urbanas que até o momento se viabilizaram (as que “vingaram”) se deram em
áreas onde já existia interesse prévio da iniciativa privada, e, dessa forma, promoveram
intervenções e melhorias em áreas já valorizadas e estruturadas da cidade. De forma que o
instrumento, à maneira que vem sendo implementado em ambas as cidades, não tem servido
para urbanizar áreas desprovidas de infra-estrutura ou redirecionar crescimento e expansão
urbana. Ou seja, as operações urbanas não têm servido como um instrumento de
reestruturação urbana.
Em Belo Horizonte, as operações urbanas de fato implementadas surgiram de
propostas da iniciativa privada que foi buscar no Executivo uma forma de viabilizar seus
interesses a partir de flexibilização da legislação. No caso da Operação Urbana do Conjunto
Oiapoque, o instrumento permitiu não apenas a flexibilização da legislação de uso e ocupação
vigente, como também a flexibilização das normas do Instrumento da Transferência do
Direito de Construir.
Com a combinação dos dois instrumentos Operação Urbana e Transferência do
Direito de Construir - a Operação Urbana do Conjunto Oiapoque envolveu duas importantes
áreas da cidade, que abrigam enorme fluxo diário de pessoas vindas de todas as partes não
apenas de Belo Horizonte, mas da sua Região Metropolitana: o Hipercentro - que corresponde
ao centro principal de Belo Horizonte, de abrangência metropolitana - e a Savassi - que desde
a década de 1980 se constitui num importante centro comercial e de serviços de Belo
Horizonte. Assim, uma análise mais aprofundada dessa operação urbana nos parece
importante, principalmente devido ao senso comum relativo ao sucesso da parceria.
70
4.
A Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque
Para análise aprofundada da Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque, é necessário conhecer a conjuntura em que se deu sua negociação. Pode-se dizer
que o início do processo remonta à aprovação do Código de Postura belo-horizontino (Lei
8.616/03), em 14 de julho de 2003. De acordo com este documento, “fica proibido o exercício
de atividade por camelôs e toreros
52
em logradouro público” (Art.118), responsabilizando o
Executivo por promover, de forma negociada, dentro do prazo de seis meses a partir da
vigência deste Código, a desocupação de camelôs e toreros dos logradouros públicos
(Disposições Transitórias, Art. 4º). Para tal, foi proposta a criação de locais específicos
destinados a abrigar as atividades exercidas pelos camelôs e toreros, localizados na Zona
Central de Belo Horizonte (ZCBH), na Zona Hipercentral (ZHIP)
53
ou em área de grande
circulação de pedestres (Disposições Transitórias, Art. 4º, § 1º ).
Naquela época, as calçadas da ZCBH e, principalmente, da ZHIP estavam repletas de
camelôs e toreros. A grande quantidade de barracas dessas atividades dificultava a passagem
dos pedestres, que, muitas vezes, acabavam circulando pelas ruas e avenidas junto aos
automóveis. No caso da Avenida Oiapoque, localizada na ZHIP, funcionava um grande centro
comercial de camelôs em frente ao antigo conjunto da Cervejaria Antarctica. Segundo a
Entrevistada A (EA)
54
, era um ponto de comércio de camelôs atacadistas, ou seja, o público
principal era constituído de outros camelôs que compravam seus produtos para depois
revenderem e, por isso, não era um ponto freqüentado pela população. Toda a área de entorno
da Avenida Oiapoque, assim como o antigo conjunto da Cervejaria Antarctica, imóvel
tombado pelo Município, se encontravam bastante degradados.
52
Tanto camelôs quanto toreros são vendedores de rua, no entanto, enquanto os camelôs têm pontos de venda
fixos, os toreros são ambulantes.
53
De acordo com a Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo (LPOUS/96), a ZCHB e a ZHIP são
subdivisões da Zona Central (ZC), onde é permitido maior adensamento demográfico e maior verticalização das
edificações (Art. 11). A ZHIP corresponde ao centro principal de Belo Horizonte, de abrangência metropolitana
(ver FIG. 7, p.76).
54
Assessora da Secretária da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana; em entrevista oral concedida à
autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
71
FIG. 1 – Vista parcial da Rua Oiapoque e da Antiga Cervejaria
Antarctica em 2003
Fonte: Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga Cervejaria
Antarctica – Gerência de Patrimônio Histórico
FIG. 2 – Vista parcial da Rua Oiapoque e da Antiga Cervejaria
Antarctica em 2003
Fonte: Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga Cervejaria
Antarctica – Gerência de Patrimônio Histórico
A exigência do Código de Posturas de retirada dos camelôs e toreros dos logradouros
públicos, especialmente no caso da Rua Oiapoque e do seu conjunto tombado, veio a somar
com as diretrizes expressas no Plano Diretor belo-horizontino (Lei Nº 7.165/96) relativas à
área central
55
:
Lei Nº 7.165/96, Art. 11:
(...)
Parágrafo único - São diretrizes de intervenção pública na área central estabelecer
instrumentos e incentivos urbanísticos e realizar obras que visem a:
I-preservar o traçado original do sistema viário;
I-promover a recuperação de áreas públicas e verdes;
III-preservar os exemplares e os conjuntos aqruitetônicos de valor histórico e cultural
IV-delimitar espaços públicos que funcionem como pólos de atividades culturais,
artísticas e educacionais, sem embaraçar o funcionamento de igrejas e locais de culto,
nos termos da lei;
V-construir abrigos nos pontos de ônibus;
VI-promover o restabelecimento dos passeios públicos e das áreas de circulação de
pedestres;
VII-estimular o aumento e a melhoria do setor hoteleiro;
VIII-criar condições para a preservação e a conservação de edificações particulares.
55
De acordo com o Plano Diretor, “entende-se por área central a delimitada pela Avenida do Contorno” (Art.7,
§2º).
72
Histórico da Antiga Cervejaria Antárctica
As fachadas do antigo conjunto de edificações da Indústria de Bebidas Antárctica
Minas Gerais S.A, situado à Avenida Oiapoque, 78, foram tombadas pelo Município em
1990, através do inciso XVIII do Art. 224 da Lei Orgânica de Belo Horizonte; tal iniciativa de
preservação foi ratificada pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de
Belo Horizonte (CDPCM-BH)
56
. A partir de 1998, o conjunto de edificações da Indústria
Antarctica passou a ser incluído no Conjunto Urbano da Rua dos Caetés e adjacências, este
tombado desde 1994.
As primeiras edificações do conjunto foram concluídas em 1910 para abrigar a
Cervejaria Rhenânia, do proprietário Carlos Fornaciari. O projeto é de 1908, de autoria do
arquiteto italiano Luiz Olivieri, bastante atuante na recém criada Belo Horizonte daquela
época. Em 1922, passou a funcionar no local a Cervejaria Polar, que em 1928 vendeu suas
locações para a Companhia Antarctica. Ao longo do tempo, o conjunto passou por diversas
reformas e acréscimos, especialmente nas décadas de 1930 e 1940. Entretanto, seus edifícios
ainda guardam a volumetria original e, presentes em sua maioria, as características do estilo
eclético com ênfase para os referenciais da arquitetura neoclássica, sendo um dos poucos
remanescentes da arquitetura para fins industriais do início do século XX
57
.
Não foram encontradas informações sobre quando o conjunto de edificações da
Indústria de Bebidas Antárctica ficou inutilizado. Em 2000, descobriu-se que o conjunto se
encontrava em avançado processo de demolição, principalmente de suas partes internas, tendo
sido retirada boa parte das coberturas dos prédios. Internamente o conjunto se encontrava
praticamente em estado de ruína. Como as demolições, de acordo com os pareceres técnicos,
não foram suficientes para implicar na perda das principais características arquitetônicas do
bem, em 2001 o CDPCM-BH deliberou o tombamento com diretrizes especiais de proteção e
projeto (Deliberação Nº 004/2001). As diretrizes de proteção constantes no Anexo I da
56
O CDPCM-BH, órgão administrativo e deliberativo, foi instituído pela Lei Municipal Nº 3.802, de 1984. À
época do tombamento do conjunto da Av. Oiapoque, ele era composto por 3 representantes do Executivo, 2 do
legislativo, 1 do judiciário e 9 do setor técnico (SPHAN, IEPHA-MG, UFMG, PUC-MG, IAB-MG, ANPUH-
MG e membros escolhidos pelo prefeito dentre profissionais de notório conhecimento da matéria). Desde então,
a composição do CDPCM-BH foi alterada duas vezes: pela Lei Nº 4.430, de 1998 e, por último, pelo Decreto Nº
11.981, de 2005.
57
Informações obtidas do Dossde Tombamento da Antiga Cervejaria Antarctica, em arquivo da Gerência de
Patrimônio Histórico.
73
Deliberação referem-se tanto às fachadas quanto aos volumes e à implantação dos edifícios do
conjunto. Quanto ao uso, o documento sugere algum de caráter público, “para que a
população possa ter acesso ao conjunto arquitetônico”. Em 2002, o imóvel foi arrematado
em leilão pelo empresário Mário Valadares, segundo EA
58
, a um preço bastante baixo.
FIG. 3 – Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em
2003
Fonte: Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga Cervejaria
Antarctica – Gerência de Patrimônio Histórico
FIG. 4 – Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em
2003
Fonte: Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga Cervejaria
Antarctica – Gerência de Patrimônio Histórico
FIG. 5 – Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em
2003
Fonte: Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga Cervejaria
Antarctica – Gerência de Patrimônio Histórico
FIG. 6 – Vista interna do Conjunto da Cervejaria Antarctica em
2003
Fonte: Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga Cervejaria
Antarctica – Gerência de Patrimônio Histórico
A proposta de Operação Urbana
Após comprar o imóvel tombado da Avenida Oiapoque, o empresário procurou o
poder executivo em busca de alguma forma de ajuda para a restauração do mesmo, uma vez
que, por ser tombado, era de interesse público. Ele ficou sabendo do Instrumento da
Transferência do Direito de Construir, previsto no Plano Diretor belo-horizontino. No entanto,
58
Em entrevista oral concedida à autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
74
no caso do imóvel da Avenida Oiapoque, alguns impasses dificultavam a aplicação deste
instrumento: como consta no Decreto Nº 9.616/98, que regulamenta a Transferência do
Direito de Construir em Belo Horizonte, a utilização do Instrumento a partir de imóveis
tombados está condicionada à comprovação do bom estado de conservação destes (Decreto Nº
9.616/98, Art.2º, §2º); porém, rio Valadares dizia não possuir recursos financeiros para
restauração do imóvel antes da venda do seu potencial construtivo
59
. Além dessa questão, os
imóveis receptores previstos no Decreto 9.616/98 são aqueles localizados na Zona de
Adensamento Preferencial (ZAP)
60
ou aqueles em torno dos imóveis de origem da
transferência (assim considerados quando localizados na mesma mancha contínua de
zoneamento), sendo o limite de recepção máximo de 20% do coeficiente de aproveitamento
do terreno de recepção. De modo que, como o imóvel da Avenida Oiapoque concentrava
grande área com potencial para transferência e, entre a zona do entorno e as ZAPs, a maior
demanda de compra estava nas ZAPs, que possuem áreas bem menos valorizadas que as da
ZHIP, seriam necessários muitos compradores para absorver todo o potencial de transferência
do imóvel e, desta forma, o processo de venda seria, nas palavras de EA
61
, “a conta-gotas”,
não sendo possível arrecadar em pouco tempo o recurso necessário para a restauração do
imóvel.
Paralelamente, estava em andamento, desde 2002, o processo de aprovação do
empreendimento denominado “Pátio Savassi” junto à Secretaria Municipal de Regulação
Urbana (SMRU)
62
, como também o processo de licença ambiental do mesmo junto ao
Conselho Municipal do Meio Ambiente do Município de Belo Horizonte (COMAM)
63
.
O empreendimento consistia em um centro integrado de entretenimento urbano, com
amplo leque de opções de lazer e consumo voltado para a classe média e média-alta
64
,
localizado na quadra entre as avenidas do Contorno e Nossa Senhora do Carmo e Rua Lavras,
59
Segundo relato de EA em entrevista oral concedida à autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
60
De acordo com o LPOUS/96, “são ZAPs as regiões passíveis de adensamento, em decorrência de condições
favoráveis de infra-estrutura e topografia” (Art.10).
61
Em entrevista oral concedida à autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
62
Após reestruturação organizacional da administração direta do Poder Executivo, realizada em 2005, a
secretaria correspondente à SMRU passou a se chamar Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana.
63
Discutiremos sobre o COMAM e sobre as licenças ambientais mais adiante.
64
Informações obtidas do Parecer Técnico 972/02, em arquivo da Secretaria Municipal Adjunta de Meio
Ambiente.
75
em zona classificada como Zona Adensada (ZA)
65
. De acordo com a Lei de Parcelamento,
Uso e Ocupação do Solo do Município de Belo Horizonte (Lei 7.166/96), nas ZAs o
coeficiente de aproveitamento (CA) é de 1,0 para as edificações de uso não-residencial
(Art.45, §4º), de forma que, para não extrapolar o CA permitido, o projeto inicial do
empreendimento consistia em um mall aberto”, apenas com algumas lojas e garagem
cobertos.
De acordo com EA
66
, um caso foi relacionado com o outro: o proprietário da
Cervejaria Antárctica querendo vender potencial construtivo e o empreendedor do Pátio
Savassi precisando de potencial construtivo. Assim, em função da transferência do direito de
construir, que promoveria condições financeiras para recuperação do imóvel tombado, em
conformidade com as diretrizes do Artigo 11 do PD belo-horizontino, o Poder Público
através da SMRU - propôs aos interessados uma parceria, sendo formulada uma primeira
formatação da “Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque”.
Importante dizer que o Decreto 9.616/98 admite como receptores da transferência do
direito de construir os imóveis integrantes de projeto específico de operação urbana (Art.3º,
inciso IV).
Na mesma época, a Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte (BHTRANS)
estava envolvida com as transformações do terminal de ônibus da Rua Aarão Reis, localizado
contíguo à Praça da Estação”, na ZHIP. Em virtude do projeto de requalificação da Praça da
Estação
67
, havia necessidade de implantação de novo terminal em área próxima à Rua Aarão
Reis para transferência de grande parte das linhas. Assim, após algumas reuniões junto à
SMRU ficou acordado que, em troca da autorização da transferência do direito de construir do
imóvel tombado da antiga cervejaria para terrenos inseridos na ZCBH e ZA, e aumento do
coeficiente de aproveitamento do terreno do Pátio Savassi (condicionada à aquisição de
potencial construtivo do referido imóvel tombado), as contrapartidas a serem exigidas dos
empreendedores participantes seriam, além da recuperação do conjunto arquitetônico da
65
De acordo com a LPOUS/96, “são ZAs as regiões nas quais o adensamento deve ser contido, por
apresentarem alta densidade demográfica e intensa utilização de infra-estrutura urbana, de que resultam,
sobretudo, problemas de fluidez do tráfego, principalmente nos corredores viários”(Art. 9º).
66
Em entrevista oral concedida à autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
67
A reforma da Praça da Estação faz parte do Programa Centro Vivo”, ainda em andamento. O programa se
constitui num conjunto de obras e projetos sociais que visam à recuperação da área central de Belo Horizonte.
76
Avenida Oiapoque, a implantação de terminal de ônibus na mesma avenida (Terminal
Oiapoque), assim como tratamento urbanístico do seu entorno.
Segundo EA
68
, desde então o empresário proprietário do imóvel tombado já estava
com o intuito de promover no edifício um shopping popular que absorvesse os camelôs da
Avenida Oiapoque.
FIG. 7 – Localização e Zoneamento dos empreendimentos envolvidos na Operação Urbana do Conjunto da Av. Oiapoque
Foto aérea: GoogleEarth; montagem da autora
68
Em entrevista oral concedida à autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
77
O posicionamento do COMPUR
Conforme estabelece o Plano Diretor de Belo Horizonte (Lei 7.165/06), as
propostas de operações urbanas, antes de serem encaminhadas à Câmara Municipal, devem
passar pelo crivo do Conselho Municipal de Política Urbana (COMPUR), que, importante
lembrar, é composto de representantes do Executivo, da mara Municipal, do setor técnico,
do setor popular e do setor empresarial. Dessa forma, depois de formulada sua primeira
formatação, a operação urbana referente à antiga Cervejaria Antárctica foi para discussão no
COMPUR. A respeito do posicionamento do Conselho sobre o assunto, de acordo com a
Entrevistada B (EB)
69
, ninguém questionava o objeto da operação urbana em questão, uma
vez que associava a recuperação de imóvel de interesse histórico com uma utilização do
mesmo para utilidade pública - um local para abrigar os camelôs. Segundo ela, o que se
questionava era a permissão da transferência de potencial construtivo para uma área
considerada adensada, situada fora das intermediações do imóvel gerador, apesar de se
localizar na mesma região administrativa (Regional Centro-Sul).
De fato, não encontramos questionamentos a respeito do objeto/objetivo da Operação
Urbana na Ata da 25º Reunião Extraordinária do COMPUR, reunião na qual se discutiu a
questão. Em relação à transferência de potencial construtivo para ZA, um dos conselheiros
solicitou esclarecimentos quanto aos critérios para definição do aumento do CA proposto para
o terreno do Pátio Savassi - de 1,0 (conforme estabelece a LPOUS) para 1,6, obtendo a
seguinte resposta da gerente executiva do grupo, encerrando-se assim a discussão:
(...) a definição do coeficiente do terreno junto à Savassi seguiu a proposta apresentada
pelos proprietários e que a SMRU havia considerado esse acréscimo viável, do ponto
de vista urbanístico, em função da localização desse terreno, ou seja, no limite legal
entre os zoneamentos ZA (de um lado da Av. do Contorno, com coeficiente de
aproveitamento igual a 1,0) e ZCBH (do outro lado da Av. do Contorno, com
coeficiente de aproveitamento igual a 3,0); isso significa que esse acréscimo pode ser
imperceptível para a região, que pode receber empreendimento de porte bem maior
do outro lado da Av. do Contorno (Ata da 25º Reunião Extraordinária do COMPUR).
69
Gerente executiva do COMPUR à época da discussão sobre a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da
Avenida Oiapoque; atual Secretária Adjunta de Meio Ambiente; em entrevista oral concedida à autora no dia
12/06/2007, às 14:30 horas.
78
O propósito da reunião era de que, a partir da proposta inicial do Executivo, fossem
definidos todos os parâmetros da Operação Urbana para a redação da minuta do projeto de lei.
No texto da ata da reunião percebem-se preocupações dos conselheiros com relação a prazos
(a BHTRANS tinha urgência para implantação de novo terminal), com relação a multas e
penalidades para o caso do descumprimento do acordado, e com relação à definição dos
valores das contrapartidas, assim como dos responsáveis por elas.
Foi esclarecido que as obras complementares do entorno da antiga cervejaria iam ser
definidas dentro de um orçamento, a partir do custo de implantação do terminal elaborado
pela BHTRANS, até um limite de referência “arbitrado a partir da estimativa da valorização
do terreno em decorrência da incorporação do potencial de construção adicional” (Ata da
25º Reunião Extraordinária do COMPUR). Os conselheiros então votaram por um valor de
referência um pouco superior ao valor sugerido pelo grupo de trabalho da operação, sendo
salientado que tal valor serviria apenas como referência, pois as contrapartidas se dariam pela
execução das obras explicitadas na lei e não pelo montante em dinheiro. Foi discriminado que
cabia ao proprietário do imóvel da Cervejaria Antárctica a recuperação do conjunto
arquitetônico, de acordo com projeto aprovado pelo CDPCM-BH (Deliberação 004/2001),
e destinação do mesmo a atividades de lazer, cultura ou economia popular e, ao empreendedor
do Pátio Savassi, a implantação das obras indicadas do terminal e das obras complementares
do entorno do mesmo. Entretanto, de acordo com EB
70
, uma vez definidas as contrapartidas,
não foi fiscalizado quem pagou o que, ficando os empreendedores livres para acordos entre
eles.
Na reunião também foi questionada a possibilidade de contrapartida para a região do
Pátio Savassi, sendo dito e acordado que as medidas mitigadoras na área deste
empreendimento seriam definidas por ocasião do licenciamento ambiental.
Assim, podemos dizer que a reunião do COMPUR não proporcionou alterações
expressivas em relação à proposta de operação urbana levada à discussão. Não obstante, a
reunião contribuiu para certo refinamento da proposta, esclarecendo algumas questões que
então foram explicitadas na minuta do projeto de lei. Ao final da reunião, a Operação Urbana
da antiga Cervejaria Antarctica foi aprovada por unanimidade.
70
Em entrevista oral concedida à autora no dia 13/02/2008, às 16:00 horas.
79
O Posicionamento da Câmara
Apesar da proposta da “Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque” ter sido formulada no âmbito do Executivo, o projeto de lei da mesma (Projeto de
Lei Nº 1.248/03) é tido como de autoria do Vereador Wagner Messias – Preto. Segundo EA
71
,
ao tomar conhecimento da Operação Urbana e entender que a proposta era boa, o vereador se
antecipou ao Executivo com a entrada do documento na Câmara, numa disputa de
“paternidade” da lei.
O projeto de lei original do Vereador Preto, datado de 7 de abril de 2003, apresentava
algumas semelhanças mas também diferenças em relação ao que vinha sendo discutido no
Executivo e no COMPUR. O projeto de lei do vereador dispunha sobre operação urbana com
finalidade de recuperar o conjunto arquitetônico tombado da Avenida Oiapoque e viabilizar a
implantação no local de Centro de Comércio Popular e, para tal, autorizava a transferência do
saldo de potencial construtivo do terreno do imóvel tombado para o terreno onde estava sendo
implantado o shopping Pátio Savassi, mediante a recuperação do imóvel tombado e sua
utilização como Centro de Comércio Popular, visando ao remanejamento de camelôs em
atividade na ZHIP. Apesar das semelhanças, diferentemente do que vinha sendo negociado no
Executivo e no COMPUR, o projeto de lei não previa contrapartida da parte do receptor do
saldo construtivo, permitia acréscimo de 0,8 no seu potencial construtivo desde que
proveniente do imóvel da Avenida Oiapoque (ou seja, o potencial construtivo do terreno do
Pátio Savassi passaria de 1,0 para 1,8) e não dispunha de multas ou penalidades para o caso de
descumprimento do acordo. Segundo EA
72
, o projeto de lei do vereador Preto coincide com a
primeira minuta da Operação Urbana elaborada pelo Executivo, antes mesmo da sua
discussão no COMPUR.
Conforme Regimento Interno da CMBH (Resolução 1.480/90), o projeto de lei foi
encaminhado para a Comissão de Legislação e Justiça e para as seguintes comissões
temáticas: Meio Ambiente e Política Urbana; Desenvolvimento Econômico, Transporte e
Sistema Viário. Conforme o procedimento, os relatores designados dessas comissões
71
Em entrevista oral concedida à autora no dia 10/05/2007, às 9:00 horas.
72
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/2007, às 10:00 horas.
80
deveriam elaborar pareceres a respeito, sendo que a Comissão de Legislação e Justiça deve
sempre ser a primeira a opinar (Resolução Nº 1.480/90, Art.107).
Numa análise preliminar de admissibilidade, face ao ordenamento jurídico vigente
73
,
a Comissão de Legislação e Justiça, em parecer de seu relator, manifestou-se favorável à
legalidade do Projeto de Lei da Operação Urbana.
Antes dos pareceres das comissões temáticas, o mesmo vereador Preto entrou com
emenda substitutiva ao Projeto de Lei Nº 1.248/03, com a justificativa de aprimorar o
projeto apresentado anteriormente, em consonância com os órgãos envolvidos na operação
urbana” (CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE, 2003a, s/p). O Substitutivo
apresenta uma redação mais elaborada da proposta da Operação Urbana, bastante semelhante
à que vinha sendo elaborada após discussão no COMPUR. EA
74
acredita que os
empreendedores participantes da Operação Urbana, a par das discussões no Executivo e no
COMPUR, entraram em contato com o vereador para que modificasse sua primeira proposta.
Ambas as comissões temáticas manifestaram-se favoráveis à aprovação do Projeto de
Lei da Operação Urbana, de modo que, em setembro de 2003, ficou concluso para votação e
discussão em primeiro turno. De acordo com o Regimento Interno da CMBH, apenas depois
de aprovada em primeiro turno, a proposição a que tiverem sido apresentadas emendas será
encaminhada às comises competentes para receber parecer em segundo turno (Resolução
1.480/90, Art. 110).
Também em setembro de 2003, o Executivo deu entrada na Câmara do Projeto de Lei
1.437/03, que tratava da mesma operação urbana do Projeto de Lei 1.248/03. O §1º do
Art. 99 do Regimento interno da CMBH estabelece que no caso de proposições idênticas ou
semelhantes prevalecerá a primeira proposição apresentada, sendo as proposições posteriores
anexadas à primeira por determinação do Presidente da Câmara, de ofício ou a requerimento.
Após requerimento do vereador Preto, são os projetos de lei anexados juntos, prevalecendo a
proposição deste vereador sobre a do Executivo. Em seguida, o vereador Preto propõe uma
73
Conforme explicita o texto do Parecer em Primeiro Turno sobre o Projeto de Lei 1.248/03 da Comissão de
Legislação e Justiça, em arquivo digital cedido pelo Centro de Atendimento ao Cidadão - CAC da mara
Municipal de Belo Horizonte.
74
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/2007, às 10:00 horas.
81
segunda emenda substitutiva do projeto de lei de sua autoria, com a mesma justificativa de
“aprimorar o projeto apresentado anteriormente, em consonância com os órgãos envolvidos
na operação urbana” (CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE, 2003d). Este
segundo substitutivo apresenta-se igual ao Projeto de Lei 1.437/03 do Executivo, com
algumas poucas mudanças de linguagem e forma em relação ao primeiro substitutivo
apresentado pelo mesmo vereador Preto. Pouco mais de 10 dias depois, a vereadora Neusinha
Santos, der do governo na CMBH à época, propõe uma terceira emenda substitutiva com a
mesma redação da segunda e do Projeto de Lei do Executivo, o que nos parece ter sido mais
um movimento na disputa pela “paternidade” da lei da Operação Urbana.
Além das três emendas substitutivas, houve outras duas emendas: uma delas propondo
um aumento de apenas 0,5 do potencial construtivo da área do Pátio Savassi e a outra
propondo o acréscimo de um parágrafo que restringia a destinação de atividade de economia
popular do imóvel tombado àquelas autorizadas pelo Executivo, bem como vinculava a
alocação de postos de comercialização de produtos a pessoas devidamente cadastradas pelo
Município.
No início de dezembro de 2003, o Projeto de Lei Nº 1.248/03 foi aprovado em
primeiro turno com 28 votos a favor e 8 ausências (nos termos do Art. 87 da Lei Orgânica, tal
proposição sujeita-se ao quorum de pelo menos 2/3 dos membros da Câmara). Para a
aprovação em segundo turno, foi designado relator da Comissão de Legislação e Justiça para
elaborar parecer a respeito das emendas apresentadas ao projeto, conforme Regimento Interno
da CMBH. No entanto, projeto recebido há sessenta dias ou mais, mesmo sem parecer, pode ser
incluído em pauta do Plenário (Resolução 1.480/90, Art. 136, inciso VII), e foi desta forma
que, em meados de dezembro, aprovou-se em segundo turno, com 33 votos a favor e 3
ausências, a Emenda Nº 2 (Substitutivo), prejudicados o Projeto e as demais emendas. Assim,
foi a Lei 8.728, que institui a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque, sancionada pelo prefeito em 30 de dezembro de 2003.
Os quadros a seguir apresentam uma síntese do acordo estabelecido pela Operação
Urbana:
82
No caso do imóvel tombado:
O que prevê a legislação O que foi concedido via
Operação Urbana
A contrapartida do
empreendedor
De acordo com a Lei Nº 7.165/96
(Plano Diretor) e o Decreto
9.616/98:
Imóveis tombados o
geradores da transferência
do direito de construir;
São receptores da
transferência do direito de
construir os imóveis
classificados como ZAP e
os em torno do imóvel de
origem;
0 limite máximo de
recepção da transferência
do direito de construir é de
20% do CA do terreno de
recepção.
Fica autorizada a
transferência do direito de
construir para terrenos
inseridos na ZCBH e ZA;
Fica autorizado o aumento
em 60% do CA de imóvel
receptor desde que esse
potencial construtivo
adicional seja resultado da
aquisição de potencial
construtivo originário do
imóvel gerador em
questão, contribuindo,
assim, para a venda de
quase 50% do saldo do
potencial construtivo do
imóvel.
Promover a recuperação
do conjunto arquitetônico
tombado
Destinar a edificação a
atividades de lazer, cultura
ou economia popular,
desde que em sintonia com
a política de requalificação
da área central, e oferecer
apoio a essas atividades
por meio dos serviços
necessários.
QUADRO 1 – Síntese do acordo estabelecido pela Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Av. Oipoque – no caso do imóvel
tombado
Elaborado pela autora
No caso do empreendimento do Pátio Savassi:
O que prevê a legislação O que foi concedido via
Operação Urbana
A contrapartida do
empreendedor
De acordo com a Lei Nº 7.166/96
(Lei de Parcelamento, Uso e
Ocupação do Solo):
Nas ZAs, o CA é de 1,0
nas edificações de uso não
residencial.
Fica autorizado o aumento
em 60% do CA do imóvel,
que passou de 1,0 para
1,6.
Implantar as obras do
terminal de ônibus na
Avenida Oiapoque;
Realizar o tratamento
urbanístico do entorno da
área, de acordo com o
projeto elaborado pelo
Executivo.
QUADRO 2 Síntese do acordo estabelecido pela Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Av. Oipoque no caso do
empreendimento do Pátio Savassi
Elaborado pela autora
Prazos e Penalidades
Multa no valor de R$100.000,00 no caso de não-implantação do terminal de ônibus em 3 meses ou no
caso de não-conclusão em 6 meses do tratamento urbanístico nos logradouros públicos adjacentes;
multa esta que poderá ser aplicada a cada 30 dias, até que sejam implantadas as obras;
Multa no valor de R$100.000,00 no caso de não-recuperação em 3 anos do conjunto arquitetônico
tombado; multa esta que poderá ser aplicada a cada 30 dias, até que seja concluída a recuperação;
Caducidade da Operação Urbana no caso de não-recuperação do conjunto arquitetônico no prazo de 5
anos;
O prazo estipulado para a efetivação das transferências de potencial construtivo do imóvel gerador é
de 10 anos;
O prazo para utilização do potencial construtivo nos lotes receptores é indeterminado.
QUADRO 3 – Síntese dos prazos e penalidades estabelecidos na Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Av. Oiapoque
Elaborado pela autora
83
O processo de licenciamento ambiental
A Lei Municipal 7.277/97, prevista no §3º do Art.74 da Lei de Parcelamento,
Ocupação e Uso do Solo, estabelece que “a construção, a ampliação, a instalação e o
funcionamento de empreendimentos de impacto ficam vinculados à obtenção prévia de
Licença Ambiental”(Art.1º), a ser outorgada pelo COMAM (Art.3º). O COMAM foi criado
pela Lei 4253/85 com funções consultivas e deliberativas e, à época da discussão da
operação urbana em questão, era composto de 5 membros do Poder Executivo, 1 membro do
Poder Legislativo, 1 membro do Poder Judiciário e 8 membros da sociedade civil, entre os
setores técnico, empresarial e popular (Decreto 5.362/86, Art.5º, alterado pelo Decreto
6.460/89)
75
.
Como a Lei 7.277/97 considera entre os empreendimentos de impactos aqueles
destinados a uso o residencial nos quais a área edificada seja superior a 6.000 (Art.2º,
§1º, inciso I), tanto o empreendimento do shopping popular quanto o do Pátio Savassi
deveriam passar pelo processo de licenciamento ambiental, submetendo-os, assim, a mais
uma avaliação com participação direta da sociedade civil.
Entretanto, segundo informações da Secretaria Municipal Adjunta de Meio
Ambiente
76
, o proprietário do shopping popular ainda o deu entrada ao processo de
licenciamento ambiental do empreendimento (mais de 4 anos depois do início de suas
atividades). Segundo EB
77
, mesmo que estabelecida parceria em operação urbana, em
momento nenhum a Prefeitura dispensou o licenciamento ambiental desse empreendimento,
mas, devido à urgência de retirar os camelôs da Avenida Oiapoque, ficou acordado entre o
Poder Público e o empreendedor que o licenciamento poderia ser feito posteriormente ao
início das atividades. Devido ao grande atraso no atendimento da exigência de licenciamento
ambiental, o proprietário já foi notificado e autuado.
O empreendimento do Pátio Savassi passou por todo o processo de licenciamento
ambiental, ainda hoje estando pendente o atendimento de algumas das condicionantes
75
Tal composição do COMAM foi alterada pelo Decreto Nº 11.944, de 14 de fevereiro de 2005.
76
Informações obtidas em fevereiro de 2008.
77
Em entrevista oral concedida à autora no dia 12/06/2007, às 14:30 horas.
84
exigidas pelo COMAM no requerimento da Licença de Operação do empreendimento, apesar
do mesmo já estar em funcionamento desde 2004.
O processo completo de licenciamento ambiental constitui-se de três licenças, todas
expedidas pelo COMAM (Lei Nº 7.277/07, Art.5º):
I- Licença Prévia (LP) obtida na fase preliminar do planejamento da atividade,
contendo requisitos básicos a serem atendidos nas fases de construção, ampliação,
instalação e funcionamento. É precedida da apresentação pelo empreendedor do
Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental
(RIMA).
II- Licença de Implantação (LI) autoriza o início da implantação do
empreendimento. Ë precedida da apresentação pelo empreendedor do Plano de
Controle Ambiental (PCA). Somente após a obtenção da LI, o Alvará de
Construção é outorgado.
III- Licença de Operação ou Licença de Ocupação (LO) autoriza o início da
atividade. Somente após a LO, a Certidão de Baixa e Habite-se é outorgada.
Ainda em 2002, antes de estabelecido o acordo da Operação Urbana, o empreendedor
do Pátio Savassi entrou com requerimento de LP. Naquela data, a idéia era de se construir um
mall quase completamente descoberto (com exceção das garagens e de algumas lojas). No
Parecer Técnico 972/02, documento elaborado pela Secretaria Municipal de Meio
Ambiente e Saneamento Urbano (SMMAS)
78
com o objetivo de subsidiar o COMAM em
relação à concessão da LP, a análise do EIA/RIMA apresentado revela, entre outras questões,
uma interação entre a população da região do empreendimento e o empreendedor – foi
realizada uma Pesquisa de Percepção
79
e uma Audiência Pública com aceitação positiva
desta população em relação ao empreendimento, tendo sido apresentadas pela comunidade,
porém, preocupações em relação à segurança, ao intenso fluxo de veículos e à poluição
sonora. Com intuito de atender estas e outras questões, o COMAM expediu a LP com 22
condicionantes a serem atendidas por ocasião do requerimento da LI. Tais condicionantes
78
Após reestruturação organizacional da administração direta do Poder Executivo realizada em 2005, a
secretaria correspondente à SMMAS passou a se chamar Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente.
79
Na Pesquisa de Percepção foram entrevistadas a presidente da Associação Comunitária do Bairro São Pedro e
a presidente da Associação dos Lojistas e Moradores da Savassi.
85
referiam-se a vários aspectos do empreendimento que deveriam estar de acordo com as
exigências dos órgãos do Executivo (como SMLU, SMRU, BHTRANS, CEMIG, etc.) e
também com as leis e decretos municipais relativos à questão.
Ainda antes de acordada a Operação Urbana, o empreendedor entrou com o
requerimento de LI. No PCA elaborado pelo empreendedor foram apresentadas propostas de
amenização dos impactos ocasionados pela implantação do empreendimento. Assim, o
Parecer Técnico elaborado pela SMMAS e enviado ao COMAM (Parecer Técnico
1.177/02) posicionou-se favoravelmente ao pedido, sendo a LI concedida pelo COMAM
acompanhada de 25 condicionantes a serem atendidas antes do requerimento da LO ou por
ocasião do requerimento desta (apenas uma das condicionantes deveria ser atendida após a
concessão da LO). Das 25 condicionantes, 15 eram relacionadas a questões viárias e de
tráfego tanto de veículos quanto de pedestres.
Em 2004 foi solicitado à SMMAS/COMAM a LO para funcionamento de parte do
empreendimento
80
. Nesta data, a obra do mall estava quase completamente concluída nos
moldes do novo projeto elaborado após o acordo da Operação Urbana, ou seja, com 60% a
mais de áreas cobertas. Em relação a esse pedido de LO, o Parecer Técnico elaborado pela
SMMAS e enviado ao COMAM (Parecer Técnico 428/04) foi contrário à concessão da
licença, uma vez que, das 25 condicionantes exigidas na ocasião da concessão da LI, das
quais 24 deveriam estar atendidas antes ou no requerimento da LO, 7 delas ainda o havia
sido cumpridas, 5 estavam parcialmente cumpridas e o atendimento de outras 2 não tinha sido
possível conferir devido ao estágio da obra. Como consta no Parecer Técnico:
entendemos que grande parte das condicionantes foi cumprida mas que algumas,
fundamentais para garantir o correto funcionamento do empreendimento, garantindo
segurança e atendimento adequado aos seus usuários e à população vizinha ainda não
foram entendidas (Parecer Técnico Nº 428/04).
Apesar de o estarem atendidas muitas das condicionantes, e não obstante o parecer
desfavorável da SMMAS, o COMAM concedeu a Licença de Operação Parcial. Na reunião
80
Conforme informações apresentadas pelo empreendedor à SMMAS, tratava-se do licenciamento para
funcionamento de todas as lojas, à exceção de 3 situadas no nível L3 e das 7 salas de cinema (Parecer Técnico Nº
428/04) .
86
do COMAM que deliberou sobre a licença - deliberação esta que havia sido adiada devido a
pedido de vista em reunião anterior do COMAM - o relator responsável informou ter sido
realizada uma reunião conjunta entre o empreendedor, o gerente da Gerência de
Licenciamento de Comércio e Prestação de Serviços - GELCP e os relatores, para fins de
verificação do porquê do parecer contrário da SMMAS à licença de operação parcial do
empreendimento enquanto o parecer da conselheira relatora da reunião anterior do COMAM
se mostrava favorável. O relator concluiu que, “na realidade, foi apenas um descompasso
entre o cumprimento das condicionantes e o momento da vistoria que a SMMAS realizou no
empreendimento” (Ata da
Reunião Extraordinária de 26 de maio de 2004), acatando assim o
parecer favorável à licença. Em seguida, o relator esclareceu que as 7 condicionantes ainda
não cumpridas ou parcialmente cumpridas, todas condicionantes da BHTRANS, deveriam ser
re-analisadas junto com o licenciamento do Colégio Dom Silvério e a casa de show Marista
Hall, outros dois grandes empreendimentos vizinhos ao Pátio Savassi, devendo tais
condicionantes estarem resolvidas até o início da operação integral do Pátio Savassi.
Aprovada por unanimidade, foi concedida a Licença de Operação Parcial ao empreendimento,
a qual ficou vinculada ao cumprimento de 13 condicionantes. Praticamente todas essas
condicionantes estavam presentes na LI de dois anos atrás e, em sua maioria, tratavam de
questões viárias e de tráfego.
De acordo com o Parecer Técnico 428/04, o não-cumprimento das condicionantes
se deu tanto por atrasos de entregas e falta de iniciativas do próprio empreendedor como
também por questões burocráticas e administrativas dos órgãos públicos. Assim, sendo os
próprios órgãos públicos, em muitas das vezes, os principais responsáveis pelo o-
atendimento das condicionantes dentro dos prazos estipulados, passou-se a admitir certa
flexibilidade nesses prazos, prorrogando-os à medida que permitido. Nota-se que a Lei
7.277/07 não estabelece penalidades para o não-cumprimento dentro dos prazos das
condicionantes vinculadas às licenças (tais condicionantes não são nem mesmo previstas na
lei). Aliás, a Lei 7.277/07 não dispõe de instrumentos de punição para o caso de
descumprimento do disposto em sua redação; a exigência de obtenção prévia das licenças
ambientais é reforçada apenas pelo vínculo das mesmas à outorga do Alvará de Construção,
que é concedida após as LP e LI, e à outorga da Certidão de Baixa e Habite-se, concedida
após a LO.
87
Sete meses depois de concedida a LO parcial, no final de 2004, a SMMAS constatou
que estavam sendo feitas obras de expansão do empreendimento sem prévia obtenção de
licença. Originalmente, o mall seria implantado num conjunto de 14 lotes com área total do
terreno perfazendo 13.200,42 m²; com a expansão foram englobados mais 2 novos lotes,
totalizando 14.588,81 m².
FIG. 8 – Lotes que configuram o terreno do empreendimento Pátio Savassi
Fonte: Arquivo da BHTRANS
Parêntese:
Na lei da Operação Urbana (Lei 8.728/03), a alteração do coeficiente de
aproveitamento de 1,0 para 1,6 foi permitida exclusivamente aos 14 lotes originais. De acordo
com o § 3º do artigo 4º da Lei, caso fossem incorporados lotes lindeiros ao terreno original da
Operação Urbana, o potencial construtivo adicional poderia ser a eles distribuídos desde que
“respeitada a área líquida total resultante da aplicação dos respectivos coeficientes de
aproveitamento” (ou seja, somente caso não fosse utilizado todo o CA de 1,6 no somatório
das áreas dos 14 lotes, o restante de CA não utilizado poderia ser distribuído nas áreas de lotes
lindeiros incorporados ao terreno). No entanto, no Diário Oficial do Município datado de 19
de agosto de 2004, encontramos uma retificação na Lei 8.728/03, efetuada nos termos do
Artigo 176 do Regimento Interno da CMBH, combinado com o artigo 325 do Regimento do
88
Senado Federal
81
. Na retificação foi suprimida a frase “respeitada a área líquida total
resultante da aplicação dos respectivos coeficientes de aproveitamento” do § do artigo 4º,
que passa a ter a seguinte redação: “O potencial construtivo adicional a que se refere o inciso
II deste artigo, decorrente da autorização, poderá ser distribuído a lotes lindeiros, caso
sejam incorporados ao terreno original”. A justificativa utilizada pelo Presidente da Câmara
época, vereador Betinho Duarte) para tal supressão foi que “área líquida total” é citação
sem similar no corpo da Lei Nº 7.166/96”(LPOUS/96), “algo que poderá terminar por
comprometer a inteligência respectiva e, por via de conseqüência, sua aplicação correta”
(CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE, 2004). A nosso ver, a nova redação do
parágrafo torna-o ambíguo, sendo possível um entendimento de que novos lotes lindeiros
englobados possam usufruir de CA de 1,6, como os 14 lotes originais da Operação Urbana.
Dessa forma, nos parece que a retificação foi uma conquista dos empreendedores do Pátio
Savassi, provavelmente alcançada por meio de “pressão” ao presidente da Câmara. Segundo
EA
82
, até o momento a retificação não repercutiu em modificações à implementação da Lei
(fim do parêntese).
Independentemente do CA utilizado nos novos lotes englobados, com base no artigo 1º
da Lei 7.277/97, o empreendedor foi autuado por implantar empreendimento de impacto
sem a devida licença ambiental. Em seguida à autuação, o empreendedor solicitou uma LO na
modalidade corretiva. O Parecer Técnico 420/05 da SMMAS não considerou pertinente a
concessão da Licença de Operação Corretiva ao empreendimento,
principalmente devido aos impactos negativos que o funcionamento do mesmo vem
provocando no sistema viário, em função do não cumprimento das condicionantes
estabelecidas anteriormente pelo COMAM e que deveriam ter sido implementadas
(Parecer Técnico Nº 420/05).
Continuando, concluiu-se:
81
O Regimento Interno da CMBH, em seu Artigo 176, admite que se importe de outros diplomas legais de igual
natureza o regramento sobre situação não regulada no documento. Como o referido regimento não possui
qualquer disciplina sobre o procedimento a ser seguido em caso de ocorrência de erro material, vale-se do Artigo
325 do Regimento Interno do Senado Federal, que prevê que o Presidente da Casa Parlamentar, diante da
ocorrência de inexatidão material de texto aprovado e com redação definitiva, providenciará a correção
correspondente – inclusive mediante publicação oficial – com prévia comunicação ao plenário.
82
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/2007, às 10:00 horas.
89
Entretanto, considerando que o empreendimento encontra-se em funcionamento sem
Alvade Localização e Funcionamento, com liminar concedida em 19/01/05 (...) e
inclusive com as obras de expansão executadas, sugerimos ao COMAM a
aprovação das medidas mitigadoras propostas no Anexo I deste parecer e a
determinação ao empreendedor de implementá-las nos respectivos prazos apontados
(Parecer Técnico Nº 420/05).
Observa-se que as concessões permitidas pelos órgãos públicos e, em última instância,
pelo COMAM, vão se dando também por causa do constante “atropelo” das ações do
empreendedor em relação às exigências do Poder Público municipal. Ou seja, o empreendedor
age/realiza antes das permissões dos órgãos públicos e, depois, a estes resta tentar
contornar ou minimizar os impactos decorrentes daquelas ações. Nota-se no trecho acima
transcrito do Parecer Técnico Nº 420/05 que, provavelmente como meio de se exigir o
cumprimento das condicionantes e mesmo frear as ações do empreendedor, o Poder Público
não havia concedido o Alvará de Localização e Funcionamento ao empreendimento, no
entanto este foi conseguido por meio do Poder Judicial, através de liminar de juiz.
Seguindo as sugestões da SMMAS, em junho de 2005 o COMAM deliberou que a
análise da LO para o empreendimento seria feita mediante o cumprimento de 17
condicionantes. Em fevereiro de 2007, o Parecer Técnico 177/07 analisou o cumprimento
destas condicionantes, das quais 3 não haviam sido atendidas e outras 5 estavam parcialmente
atendidas. O mesmo parecer concluiu que
as condicionantes ainda não atendidas e parcialmente atendidas não foram cumpridas
na sua íntegra por dependerem, na sua maioria, de soluções por parte do poder público
(desapropriação e regularização de terrenos, obras físicas de alargamento e
remanejamento de redes, aprovação de projetos, etc.),
sendo então favorável à concessão da LO. Em fevereiro de 2007, a Licença de Operação
Corretiva, com validade de 10 anos, é concedia pelo COMAM com 8 condicionantes, todas
elas relacionadas a melhorias para o tráfego de veículos e pedestres ou a intervenções no
sistema viário. Estas condicionantes deveriam estar cumpridas no prazo máximo de 180 dias.
90
A situação atual
Pátio Savassi
Segundo informações de EA
83
, o empreendimento apresenta-se com área total
construída superior ao permitido pela lei da Operação Urbana. Seus proprietários estão
tentando regularizá-lo através da chamada “Lei de Anistia” (Lei Nº 9074/05, a qual estabelece
normas e condições para a regularização de parcelamentos do solo e de edificações
comprovadamente existentes na data de publicação desta Lei, segundo alguns critérios). Ao
todo são seis níveis (dois deles no subsolo), nos quais se distribuem áreas de estacionamento,
área de administração, cinemas, lojas, restaurantes e áreas comuns. Os acessos à edificação
acontecem pelas avenidas do Contorno e Nossa Senhora do Carmo e pela Rua Lavras.
FIG. 9 – Vista parcial do Pátio Savassi. Acesso pela Av. do
Contorno
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 10 – Vista parcial do Pátio Savassi. Acesso pela Av. N.
Senhora do Carmo
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 11 – Vista parcial do Pátio Savassi. Acesso pela R. Lavras
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 12 – Vista interna do Pátio Savassi
Foto: Selena Lage / julho 2007
83
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/2007, às 10:00 horas.
91
As maiores reclamações dos usuários do entorno do Pátio Savassi referem-se ao
trânsito de veículos, que se apresenta lento e com formação de filas (engarrafamentos) nos
horários de pico, principalmente na Avenida do Contorno. As 8 condicionantes exigidas
relacionadas ao tráfego, que deveriam estar cumpridas em agosto de 2007, encontram-se na
seguinte situação em dezembro de 2007: 3 delas foram atendidas, 3 estão parcialmente
atendidas e 2 ainda não foram atendidas, apesar de estar em andamento o processo para o
cumprimento das mesmas.
Segundo a Entrevistada C (EC)
84
, o parcial cumprimento de 3 das condicionantes e o
não-cumprimento de 2 delas se devem a questões administrativas e burocráticas dependentes,
principalmente, de ões do Poder Público. As 2 condicionantes ainda não atendidas e uma
das parcialmente atendidas dizem respeito a uma mesma intervenção: a desapropriação de
edificação situada na esquina das avenidas do Contorno e Nossa Senhora do Carmo onde
hoje funciona a “Casa do Whisky” - para ampliação do raio de giro da conversão dos veículos
da Avenida do Contorno para a Avenida Nossa Senhora do Carmo.
O empreendimento localiza-se no vetor sul de Belo Horizonte, o qual nas últimas
décadas vem experimentando crescimento acelerado, “extravasando” para os municípios de
Nova Lima e Brumadinho, na Região Metropolitana (RMBH). A ocupação do vetor sul foi
potencializada pela construção, no final da década de 1970, do primeiro grande shopping em
Belo Horizonte, às margens da via de ligação da capital com o município de Nova Lima (BR-
040), e pela expansão da Avenida Nossa Senhora do Carmo e da própria BR-040. Além disso,
a criação, nos anos 1970 e 1980, dos bairros Belvedere I e II, no extremo sul de Belo
Horizonte, e, no final dos anos 1980, a modificação da LPOUS que permitiu a criação do
Belvedere III (todos os três direcionados a segmentos de alta renda da população) e, na
década de 1990, a proliferação dos condomínios fechados no município de Nova Lima
(também ocupados por população de renda elevada), foram determinantes para a consolidação
desse vetor (COSTA e PACHECO, 2006; BRITO e SOUZA, 2006).
A conclusão da primeira parte do Relatório de Monitoramento do Pátio Savassi
85
,
datado de agosto de 2007, admite problemas na operação do tráfego nos horários de pico,
84
Supervisora de estudos de impacto da Gerência de Diretrizes Viárias - GEDIV/BHTRANS; em entrevista oral
concedida à autora no dia 04/12/2007, às 15:00 horas.
85
Este documento foi solicitado pela BHTRANS ao empreendedor do Pátio Savassi.
92
causados, segundo o documento, por uma série de fatores que, no entanto, não foram
especificados
86
. Ao final do documento, salienta-se que o monitoramento será concluído
com pesquisas em um novo cenário, onde já terão sido implementadas as intervenções
(condicionantes) previamente acordadas com a BHTRANS; apenas após as conclusões das
pesquisas nessa segunda etapa serão feitas análises estatísticas que permitirão verificar se
houve e quais foram as alterações sofridas pelo tráfego no local após a implantação do
empreendimento.
De acordo com EB
87
, mesmo se tivesse sido implantado com CA permitido na lei, o
Pátio Savassi provocaria prejuízos ao tráfego. Ela não considera correto atribuir a
responsabilidade do trânsito caótico na região apenas a este empreendimento, pois, junto ao
Pátio Savassi a casa de show Chevrolet Hall
88
- outro grande empreendimento localizado
no mesmo quarteirão, com entrada pela Avenida Nossa Senhora do Carmo e, mais
importante, a região configura um “nó” viário por onde se a saída em direção à expansão
sul metropolitana, de modo que se trata de um problema estrutural, com o qual o Pátio Savassi
apenas contribuiu. Ainda segundo EB, mesmo que o empreendimento não tivesse concentrado
potencial construtivo, o se pode esquecer que todo um potencial construtivo por
acontecer na região em conformidade com a LPOUS/96, principalmente na área inserida no
limite da Avenida do Contorno, cujo CA máximo permitido é 3,0.
86
Dentre os fatores, o documento apenas destacou a demanda (altos volumes de tráfego) e a incapacidade dos
tempos de semáforo de atender a essa demanda aliada à baixa capacidade de armazenamento do link”.
87
Em entrevista oral concedida à autora no dia 12/06/2007, às 14:30 horas.
88
Inicialmente o empreendimento chamava-se “Marista Hall”.
93
FIG. 13 – Localização do Pátio Savassi, do Chevrolet Hall e da Casa do Whisky
Foto aérea: GoogleEarth; montagem da autora
FIG. 14 e 15 – Esquina das
avenidas do Contorno e N. S. do
Carmo
A edificação verde é a Casa do
Whisky
Foto: Selena Lage / julho 2007
O edifício que hoje abriga o Chevrolet Hall passou pelo processo de licenciamento
ambiental na mesma época do Pátio Savassi. Assim, de acordo com EC
89
, a BHTRANS
definiu que as intervenções no trânsito a serem realizadas para viabilização da casa de show
seriam mais ao sul da Avenida Nossa Senhora do Carmo, enquanto o empreendedor do Pátio
Savassi ficou responsável pela área mais de entorno da Avenida do Contorno. Essa
informação justifica a diferença entre a área de influência do empreendimento demarcada no
Relatório de Impacto na Circulação (RIC)
90
e as vias que de fato passaram por algum tipo de
intervenção sob responsabilidade do Pátio Savassi. As intervenções realizadas abrangem
desde implantação de sinalização estatigráfica e semafórica, melhorando também a segurança
da travessia de pedestres, à execução de faixas de alargamento (recuo de alinhamento)
lindeiras às avenidas do Contorno e Nossa Senhora do Carmo, destinadas a estacionamento de
táxis e embarque e desembarque de passageiros, até implantação de mão inglesa na Rua
Professor Moraes. Estão ainda pendentes as exigências relacionadas ao tratamento do passeio
na quadra do empreendimento e às faixas de alargamento da pista de rolamento da Avenida
89
Em entrevista oral concedida à autora no dia 04/12/2007, às 15:00 horas.
90
A BHTRANS solicita a elaboração do RIC dos empreendimentos de impacto quando do licenciamento
ambiental dos mesmos, com “o objetivo de oferecer um referencial sobre o empreendimento que permita aos
técnicos envolvidos conhecer, avaliar, quantificar e delimitar o alcance dos impactos da implantação do
empreendimento no sistema viário e, a partir dessa avaliação, determinar as medidas mitigadoras dos impactos
negativos, necessárias para garantir a qualidade urbana no local” (Roteiro Básico para elaboração de Relatório
de Impacto na Circulação – RIC, de autoria da BHTRANS).
94
do Contorno tanto junto ao acesso à Avenida Nossa Senhora do Carmo quanto entre a
Avenida Nossa Senhora do Carmo e Rua Grão Mogol.
FIG. 16 – Área de influencia do Pátio
Savassi de acordo com RIC
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 17 – Área de abrangência das intervenções realizadas no trânsito no entorno do
Pátio Savassi
Foto: Selena Lage / julho 2007
Os problemas de tráfego lento e engarrafamentos hoje vivenciados pela região centro-
sul de Belo Horizonte não se limitam nem à área de influencia demarcada no RIC nem às vias
que sofreram intervenções no entorno do Pátio Savassi. Conforme argumenta EB, trata-se de
um problema estrutural, que ainda podeser agravado caso seja utilizado todo o potencial
construtivo permitido pela LPOUS/96 para a região. EB utiliza tal constatação para justificar
a concentração extra de potencial construtivo no empreendimento do Pátio Savassi permitida
pela Operação Urbana, quando nos parece que a mesma constatação deveria servir como
alerta para a necessidade de não se permitir acúmulos de área construída na região e a
mesmo para a proposição de mudanças na LPOUS belo-horizontina.
Sendo a questão do trânsito na região um problema estrutural, as soluções demandadas
também são estruturais. Assim, acredita-se que as medidas mitigadoras exigidas pela
BHTRANS, mesmo depois de completamente implementadas, não serão suficientes para
sanar os problemas de tráfego. O que se percebe é que o licenciamento ambiental e suas
condicionantes visam a minimizar os impactos dos empreendimentos no entorno dos mesmos,
mas, por mais abrangentes e bem intencionados que sejam, prescindem de uma visão
compreensiva e integrada da cidade ou, como necessário nesse caso, da Região Metropolitana.
95
Shopping Popular
O shopping popular da Avenida Oiapoque, denominado Shopping Oiapoque,
(popularmente conhecido como Shopping Oi”) desde o início de suas atividades, em 2003,
tem abrigado movimento intenso de pessoas oriundas de todas as classes sociais. Nesse
aspecto, o empreendimento pode ser considerado um sucesso e de fato serviu para promover
acesso da população belo-horizontina ao conjunto tombado, conforme diretriz da Deliberação
do CDPCM-BH (Deliberação Nº 004/01, Anexo 1 – Das Diretrizes de Proteção).
De acordo com informações obtidas dos arquitetos restauradores da Gerência de
Patrimônio Histórico, o projeto de recuperação do conjunto prevista na Deliberação Nº 004/01
está praticamente finalizado, faltando alguns poucos detalhes
91
. Externamente, todas as
fachadas do conjunto receberam pintura, e a volumetria de seus edifícios, assim como a
relação de aberturas e vedações, foi mantida, preservando-se, dessa forma, a harmonia do
conjunto. O tratamento do entorno do imóvel também beneficiou o conjunto arquitetônico,
contribuindo para a sua recuperação.
FIG. 18 – Vista parcial da fachada do conjunto tombado e
terminal de ônibus da Av. Oiapoque
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 19 – Vista parcial da fachada do conjunto tombado e
terminal de ônibus da Av. Oiapoque
Foto: Selena Lage / julho 2007
Internamente, porém, o conjunto o foi pensado enquanto bem histórico: observa-se
uma despreocupação com a questão estética, além do fato de que a organização do layout
oferece péssimas condições de circulação e salubridade aos trabalhadores e freqüentadores do
91
Informações obtidas em março de 2008.
96
shopping. Segundo os arquitetos-restauradores da Gerência de Patrimônio Histórico
92
, a
restauração do conjunto seguiu as diretrizes e projeto da Deliberação do CDPCM-BH, que, de
fato, não continham exigências para a parte interna do conjunto. Segundo esses restauradores,
na época da formulação das diretrizes e do projeto, as condições do conjunto eram tão ruins
que se pensava que qualquer intervenção seria melhor do que mantê-lo como estava, não se
exigindo muito da sua restauração.
FIG. 20 – Vista interna do
Shopping Oi
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 21 – Vista interna do Shopping Oi
Foto: Selena Lage / julho 2007
FIG. 22 – Vista interna do Shopping Oi
Foto: Selena Lage / julho 2007
De acordo com informações da Secretaria de Administração Regional Municipal -
Centro-Sul
93
, o Shopping Oiapoque abriga 762 trabalhadores informais. O empreendimento
foi a primeira iniciativa de remanejamento de camelôs e toreros em Belo Horizonte.
Atualmente, só na região centro-sul da cidade, existem outros cinco shoppings populares além
do Shopping Oiapoque, abrangendo um total de 2.371 camelôs e toreros transferidos da área
central
94
. Todos esses shoppings o administrados pela iniciativa privada (a Prefeitura é
responsável pela administração de apenas uma parte de dois deles), o que comprova serem
tais empreendimentos lucrativos. O empresário/proprietário do Shopping Oiapoque também é
dono de mais um dos shoppings populares da Regional Centro-Sul, o Shopping Tubinambás.
Segundo informação da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana
95
, o
imóvel da Avenida Oiapoque ainda dispõe de potencial construtivo para ser vendido e
92
Em entrevista oral concedida à autora no dia 02/08/2007, às 10:00.
93
Informações obtidas em julho de 2007.
94
Contraditório no processo de remanejamento dos camelôs e toreros mediado pelo poder público é que a
atividade deles não deixou de ser ilegal.
95
Informação obtida em maio de 2007.
97
transferido. Esse potencial pode ser transferido para ZAP e ZHIP, conforme pre o
instrumento da Transferência do Direito de Construir, e, a 2013, de acordo com prazo
estipulado na lei da Operação Urbana, também para ZA e ZCBH. De acordo com EA
96
, o
potencial construtivo oriundo do imóvel tem sido utilizado principalmente no vetor sul da
cidade, reforçando-se, dessa forma, os problemas de trânsito e transporte da região.
96
Em entrevista oral concedida à autora no dia 18/12/2007, às 10:00.
98
5.
Reflexões Finais
A Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque, como boa parte
das operações urbanas belo-horizontinas, surgiu como meio de compatibilizar interesses
prévios dos setores público e privado. Ela envolveu dois empreendedores privados e duas
áreas o Hipercentro e a região da Savassi, viabilizando intervenções previstas pelo Poder
Público para a Área Central da cidade, a saber: preservação de conjunto arquitetônico de valor
histórico na Avenida Oiapoque e recuperação de áreas públicas do entorno, conforme
diretrizes do Artigo 11, parágrafo único, do Plano Diretor; retirada dos camelôs dos
logradouros públicos, de acordo com exigência do Código de Posturas do Município, em
conformidade com as diretrizes do Artigo 11 do PD; e implantação de estação de ônibus, em
virtude do projeto de requalificação de praça também localizada na Área Central. Em
contrapartida, o poder público permitiu mudanças na aplicação do instrumento da
Transferência do Direito de Construir do imóvel tombado da Avenida Oiapoque, tornando-o
mais permissivo e favorável à venda de potencial construtivo, assim como permitiu aumento
do coeficiente de aproveitamento para terreno inserido na Savassi, situado fora da Área
Central (condicionado à aquisição de potencial construtivo oriundo do imóvel tombado da
Avenida Oiapoque).
A partir do estudo da Operação Urbana do Conjunto da Avenida Oiapoque,
analisemos o Instrumento das Operações Urbanas sob o enfoque dos princípios progressistas
enunciados na Constituição de 1988, com o propósito de discutir a pertinência desse
instrumento no Paradigma do Urbanismo Democrático e Includente apontado pela
Constituição e, mais que isso, observar quais seriam os entraves para uma aplicação
progressista das operações urbanas, a fim de superá-los.
Função Social da Propriedade
Podemos dizer que os benefícios coletivos proporcionados pela Operação Urbana
foram muitos em relação à Área Central. Em se tratando de área utilizada por grande parte da
população, não apenas de Belo Horizonte, mas de toda a RMBH, garante-se a democratização
do acesso a tais benefícios. Não obstante, acreditamos que os benefícios coletivos alcançados
99
poderiam ser quantitativa e qualitativamente superiores. Afinal, pela transferência do direito
de construir atípica não foi definida nenhuma contrapartida para o proprietário do imóvel
tombado - este ficou responsável pela restauração do imóvel (que se limitou a sua parte
externa), sendo que o bom estado de conservação do bem se constitui numa condicionante
para utilização simples do instrumento da Transferência do Direito de Construir em Belo
Horizonte (de acordo com Decreto Nº 9.616/98).
No caso da segunda área envolvida, a Savassi, apesar de conquistas de alguns
benefícios promovidos pelo empreendimento do Pátio Savassi - como maior oferta de
emprego e aumento da sensação de segurança no local, assim como algumas melhorias físicas
e estéticas devido às exigências do licenciamento ambiental (quando estas não apenas
minimizaram problemas decorrentes do próprio empreendimento), ou até mesmo benefícios
particulares de valorização de imóveis na área - numa visão compreensiva e integrada não
somente da cidade de Belo Horizonte, mas também da RMBH, o empreendimento implantado
com coeficiente de aproveitamento superior ao permitido na lei gerou impactos negativos de
difícil superação no sistema viário e de transportes
97
.
Evidentemente, as operações urbanas, assim como as demais formas de parcerias
público-privado, justamente por se tratarem de parcerias, somente são aderidas pelos
empreendedores privados se for do interesse deles. Assim, no caso da Operação Urbana do
Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque, certamente os investimentos privados na
implantação da estação de ônibus e no tratamento urbanístico do seu entorno, assim como nas
intervenções exigidas no processo de licenciamento ambiental, somente foram
compensatórios aos empreendedores porque o potencial construtivo adicional permitido pelo
Poder Público se deu numa das áreas mais valorizadas da cidade, consolidada e, em termos
viários, saturada o vetor de expansão sul. É desse modo que o instrumento das operações
urbanas não tem servido para reurbanizar áreas desprovidas de infra-estrutura ou redirecionar
crescimento e expansão urbana; pelo contrário, têm privilegiado regiões da cidade
privilegiadas.
97
Claro que, e faz-se importante salientar, os problemas no sistema viário e de transportes na região não são
resultados apenas do empreendimento implantado, mas de todo um conjunto de políticas locais e de legislação
urbanística dos municípios de Belo Horizonte e Nova Lima (na medida em que neste município se situa eixo de
expansão contíguo à Zona Sul de Belo Horizonte) adotadas desde a década de 1970.
Para uma análise mais
abrangente sobre essa questão, consultar COSTA e PACHECO (2006).
100
É sabido que a desigualdade socioespacial existente no Brasil é enorme. A
dinamização do mercado gerada pelas parcerias público-privado, como vem acontecendo nos
países da Europa e nos Estados Unidos, aqui no Brasil tem beneficiado, na prática, apenas
uma pequena parcela da sociedade, sendo desconsiderados os enormes problemas vividos pela
maioria dos habitantes das cidades brasileiras, como a falta de habitação e infra-estrutura
urbana.
Assim, para uma aplicação progressista do instrumento, viabilizando as operações
urbanas em outras áreas que não apenas aquelas de grande interesse do mercado imobiliário, a
lógica do instrumento deve ser invertida. A iniciativa privada, em vez de aderir à parceria para
obter lucros, poderia a ela se associar para o obter prejuízos, ou prejuízos menores. Nessa
lógica, faz-se necessário combinar o instrumento das operações urbanas a outros instrumentos
urbanísticos, especialmente àqueles de caráter indutivo, como, por exemplo, o IPTU
progressivo no tempo, e o Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios, ambos
propostos pela Constituição de 1988 e regulamentados pelo Estatuto da Cidade. Dessa forma,
o instrumento das operações urbanas poderá de fato contribuir na promoção de uma melhor
distribuição da renda e terra urbanas e, nesse sentido, no exercício da função social da
propriedade.
No entanto, ao contrário disso, as parcerias têm proporcionado avantajados lucros ao
capital privado. Numa análise mais cuidadosa, percebe-se que as próprias obras e benfeitorias
executadas no perímetro das operações urbanas geram uma renda diferencial suficiente para
custear os gastos do setor privado na parceria e, no entanto, a essa renda diferencial ainda são
sobrepostas outras geradas pelas concessões à lei. O Poder Público brasileiro parece não
possuir informações, instrumentos ou disposição necessários para o cálculo correto do valor
das contrapartidas a serem oferecidas pela iniciativa privada.
Em Belo Horizonte, o cálculo atual para determinar o valor das contrapartidas do setor
privado nas operações urbanas é o seguinte: multiplica-se a área do terreno pelo CA permitido
pela operação urbana; o valor resultante dessa multiplicação dividido pelo CA permitido na
LPOUS fornece a área do terreno que o empreendimento precisaria ter, de acordo com a
LPOUS, para poder construir a área pretendida; a área desse “terreno fictício” subtraída da
área real do terreno resulta na “área extra” adquirida pela operação urbana; assim, chega-se ao
valor da contrapartida multiplicando-se a área extra pelo valor do metro quadrado do terreno
101
do empreendimento de acordo com cálculo do ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens
Imóveis por Ato Oneroso “inter vivos”)
98
. Apesar do cálculo acima descrito ser considerado
entre os técnicos do Poder Público de Belo Horizonte uma evolução na definição do valor da
contrapartida a ser ofertada pela iniciativa privada nas operações urbanas, de acordo com o
raciocínio explicitado anteriormente, o valor da contrapartida deveria se calculado pelos
ganhos da iniciativa privada devido às concessões à lei (que o cálculo utilizado atualmente
pela Prefeitura mensura) somados aos ganhos proporcionados pelas intervenções exigidas nas
próprias contrapartidas das operações urbanas (os quais, para que fossem determinados,
precisaria ser desenvolvido novo cálculo ou fórmula).
Entretanto, faz-se importante ressaltar que, para uma aplicação progressista, o objetivo
das operações urbanas não deve se limitar meramente à arrecadação financeira. O instrumento
deve ser utilizado, principalmente, para possibilitar a reestruturação de áreas das cidades a
partir de uma política de inversão de prioridades
99
, definida em planos compreensivos para as
cidades. Neste propósito inclui-se a utilização das operações urbanas para regularização de
vilas/favelas e bairros de periferia, na medida em que, legitimando-os e inserindo-os na malha
urbana da cidade, proporciona-se a recuperação urbanística dos mesmos, os quais se
constituem em lugar de moradia e também de trabalho de grande parte da população
brasileira. Visando à regularização de imóveis na periferia, temos os exemplos em Belo
Horizonte das operações urbanas Vila Silveira e Capitão Eduardo. No entanto, a Operação
Urbana Capitão Eduardo - em que o Executivo se responsabilizou pela execução de projetos e
concessões à lei enquanto as obras de infra-estrutura devem ser financiadas pela Associação
do Bairro Guarani - está em andamento lento devido a dificuldades financeiras da Associação.
Nesse caso, tal entrave talvez pudesse ser amenizado exigindo-se da Associação uma
contrapartida mais barata.
A definição de contrapartidas mais baratas também pode ajudar na viabilização do
instrumento em áreas pouco interessantes do ponto de vista imobiliário. Assim, para além da
definição do valor das contrapartidas, importa saber onde e como investir os recursos dessas
contrapartidas com vistas a uma aplicação do instrumento de acordo com interesses e
98
Esse cálculo foi explicitado em Reunião Extraordinária do COMPUR realizada no dia 14/12/2007, cuja pauta
era a discussão de três novas operações urbanas a serem aprovadas em Belo Horizonte.
99
Entende-se por inversão de prioridades a alocação de recursos de maneira a enfatizar as despesas sociais, em
detrimento daquelas de sustentação da reprodução do capital.
102
necessidades da maioria. Nesse sentido, o Estatuto da Cidade limitou a utilização do
instrumento das Operações Urbanas, prejudicando seu potencial redistributista, na medida em
que exige aplicação da contrapartida da iniciativa privada na própria área da operação urbana
(Art.33, §1º).
A partir do propósito da inversão de prioridades, o instrumento das Operações
urbanas, algumas vezes necessariamente aliado a outros instrumentos, poderá contribuir para
que os imóveis urbanos exerçam a sua função social ou seja, não apenas realizando as
expectativas de seus proprietários como também as necessidades da coletividade na qual ele
se insere. Dessa forma, parcerias público-privado através das operações urbanas atuarão não
no sentido de uma privatização dos espaços públicos, mas rumo a uma “publicização” dos
espaços privados.
Planejamento x gestão
Como já comentado, as intervenções na Área Central promovidas pela Operação
Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque estavam previstas no Plano Diretor
de Belo Horizonte. No entanto, contraditoriamente, a mesma operação urbana concedeu
potencial construtivo adicional para terreno localizado em zona classificada pela LPOUS (em
conformidade com as diretrizes do PD) de ZA - Zona Adensada. De modo que, no caso das
concessões ao terreno da Savassi, a operação urbana se opôs ao plano diretor pensado para a
cidade, o qual foi elaborado a partir de diagnósticos e diversos estudos. Assim, não é por
acaso que justamente nesta área m sido observados problemas relativos ao sistema de
trânsito e transporte em parte resultantes da implantação do empreendimento através de
Operação Urbana.
Na reunião do Conselho Municipal de Política Urbana (COMPUR) relativa à operação
urbana em questão, a discussão sobre os impactos do empreendimento na Savassi, incluindo-
se os impactos no trânsito, foi colocada como de responsabilidade do processo de
licenciamento ambiental. Entretanto, por se tratar de uma questão de ordem estrutural
(conforme vimos no capítulo 4 deste trabalho), acredita-se que esses impactos precisavam e
deviam ter sido discutidos no âmbito do COMPUR. Licenciamentos ambientais definem
intervenções isoladas como medidas mitigadoras, sem, no entanto, levar em conta um
planejamento abrangente do processo urbano.
103
Desde que o termo gestão adquiriu maior força no campo do urbanismo (no caso do
Brasil a partir da década de 1980), o planejamento urbano parece ter ficado em segundo
plano, quando não desconsiderado. As causas para a “crise do planejamento” no Brasil
100
podem ser atribuídas à sua associação com um Estado autoritário e tecnocrático, e também a
certo descrédito em relação ao seu papel, uma vez que desde a sua “disseminação” no país, na
década de 1970, não serviu para promover cidades equilibradas, fazendo aumentar o fosso
entre discurso e prática no urbanismo brasileiro (ROLNIK, 2001; SOUZA, 2004). Assim é
que na emenda popular pela reforma urbana, proposta pelo MNRU quando da elaboração da
Constituição de 1988, não menção a planos compreensivos para a cidade, os quais não
faziam parte das demandas dos setores progressistas com vistas à construção de cidades mais
democráticas e igualitárias. No entanto, talvez por uma visão conservadora dos elaboradores
da carta constitucional, nesta foi inserida a obrigação do plano diretor para cidades com mais
de 20.000 habitantes (Art. 182, §1º); o Estatuto da Cidade ainda abrangeu a exigência para
maior gama de cidades.
101
De fato, a institucionalização do planejamento urbano nas administrações municipais a
partir da década de 1970, sob o Regime Militar, visando à organização e suporte territorial
para o crescimento industrial e com o propósito de promover desenvolvimento integrado e
equilibrado às cidades brasileiras num contexto de “explosão” da urbanização no país serviu
principalmente para consolidar um processo de exclusão sócio-territorial: enquanto uma parte
das cidades é legal e dotada de infra-estrutura e de outros benefícios da urbanização, outra,
geralmente bem maior, manteve-se ilegal e com condições urbanísticas precárias. Em
contraposição a um planejamento urbano autoririo e alienado à realidade (plano-discurso), o
termo gestão parece trazer uma conotação mais democrática e eficiente (MARICATO, 2000).
No entanto, como administrar situações e recursos presentes (a isso estamos chamando
gestão), ou seja, optar entre diferentes caminhos, negar, afirmar ou impulsionar novas
100
Importante lembrar que o desprestígio do planejamento urbano não acontece no Brasil. No campo do
urbanismo, Harvey (1992, p.69) considera o pós-modernismo (que para ele iniciou-se no início da década de
1970) “como uma ruptura com a idéia modernista de que o planejamento e o desenvolvimento devem
concentrar-se em planos urbanos de larga escala, de alcance metropolitanos, tecnologicamente racionais e
eficientes (...). O pós-modernismo cultiva, em vez disso, um conceito do tecido urbano como algo
necessariamente fragmentado (...).”
101
De acordo com o artigo 41 do Estatuto da Cidade, o plano diretor é obrigatório para cidades integrantes de
regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; para municípios onde o Poder Público Municipal pretenda
utilizar os instrumentos de política urbana previstos na Constituição; para municípios integrantes de áreas de
especial interesse turístico; e para municípios inseridos na área de influência de empreendimentos ou atividades
com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.
104
possibilidades que surgem fragmentadas, sem prescindir de diretrizes gerais, abrangentes e
integradas do contexto urbano (a isso estamos chamando planejamento urbano)? Tais
diretrizes são importantes para orientar tanto as decisões da administração estatal quanto a
participação popular, num contexto democrático. Caso contrário, o que tende a predominar é
uma dinâmica de intervenções baseadas em políticas setoriais desconectadas (o que pode vir a
demandar mais recursos financeiros, humanos e de tempo, principalmente caso uma se
oponha à outra), e/ou intervenções baseadas em idéias de curto prazo (que também se
constituem, muitas vezes, em desperdícios de recursos), e/ou inspiradas na predominância de
interesses individuais.
Assim, em vez de serem entendidos como conceitos contrários ou excludentes, gestão
e planejamento precisam ser vistos enquanto conceitos complementares. As decisões da
gestão devem se fundamentar no planejamento, “pois o processo de gestão exige maior
clareza sobre a totalidade do que é para ser gerida” (COSTA e PACHECO, 2006, p.138).
Por outro lado, o planejamento deve sempre estar vinculado à gestão, ou seja, à ação, ao fazer.
A idéia é que o planejamento urbano compreensivo “renasça”, mas dessa vez entendido
enquanto um processo contínuo, que exige constantes análises e re-análises, embasado não
apenas na racionalidade técnica, e que, por isso, deva contar com ampla participação da
sociedade.
Nesse sentido, constitui-se num inegável avanço a participação da sociedade civil
organizada na elaboração e aprovação do PD e LPOUS belo-horizontinos, assim como a
criação e realização das Conferências Municipais de Política Urbana, que também contam
com participação da sociedade, com o objetivo de freqüentemente avaliar estas leis.
Entretanto, o instrumento das operações urbanas, proposto no próprio PD, permite alterações
nas determinações/diretrizes definidas no plano global para a cidade, como aconteceu no caso
da Operação Urbana do Conjunto da Avenida Oiapoque.
As possibilidades de flexibilização normativa promovidas pelas operações urbanas são
importantes na medida em que permitem lidar com especificidades espaciais, sociais e
ambientais localizadas (em oposição à rigidez da legislação modernista/funcionalista). No
entanto, tais possibilidades não devem ser usadas de forma circunstancial ou casuística.
Quanto a isso, Compans (2004, p.204) nos lembra que “quanto maior a flexibilidade
normativa, maior a centralização de poder nas mãos dos governos e dos funcionários
105
municipais”, os quais estão sujeitos a inúmeras pressões e influências políticas. Assim,
conclui-se que até mesmo a flexibilidade deve ser planejada, ou seja, deve estar presente em
um plano geral para a cidade. Nesse aspecto, é negativo o fato de que o Estatuto da Cidade
não exija que as leis de operação urbana sejam previstas nos planos diretores municipais.
Gestão democrática
Em relação à gestão democrática, defendida pelos setores progressistas como meio de
se assegurar o interesse da maioria e não apenas o da classe dominante, Belo Horizonte tem
experienciado muitos canais institucionais de participação popular. No caso da
implementação do instrumento das operações urbanas na cidade, podemos citar, entre outros,
a atuação do Conselho Municipal de Política Urbana (COMPUR), do Conselho Municipal de
Meio Ambiente (COMAM) e das Conferências Municipais de Política Urbana.
Entretanto, importante salientar que, apesar de muitos dos projetos a serem realizados
através de operações urbanas passarem pelo crivo do COMAM, não compete a este Conselho
o debate sobre a pertinência para a cidade das operações urbanas em questão; tal Conselho, a
partir de uma proposta formatada, discute os impactos dos projetos com a finalidade de
excluir ou minimizar seus impactos negativos. Em relação às Conferencias Municipais de
Política Urbana, estas têm como objetivo avaliar a condução e os impactos da implementação
das normas contidas no Plano Diretor e na Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo,
configurando-se, assim, em espaços de discussão mais abrangente da política urbana da
cidade. Assim, destaca-se o papel do COMPUR como principal meio de viabilização da
gestão democrática em relação à regulamentação e aplicação de cada uma das operações
urbanas propostas para a cidade
102
.
As operações urbanas belo-horizontinas, conforme institui o Plano Diretor do
Município (Art.65), podem ser propostas por qualquer cidadão ou entidade, devendo, no
entanto, sempre serem coordenadas pelo Executivo. Assim, todas as negociações relativas às
102
Embora o Estatuto da Cidade exija que da lei específica que aprovar a operação urbana consorciada deva
constar um plano contendo, entre outras coisas, “forma de controle da operação, obrigatoriamente
compartilhado com representação da sociedade civil”(Art. 33, inciso VII), em Belo horizonte, ainda não tendo o
PD do Município se adequado à lei federal, fica a critério das leis específicas das operações urbanas a existência
ou não de comissões ou comitês de acompanhamento e controle das operações urbanas. No caso da Operação
Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque, não foi prevista nenhuma forma de controle
compartilhado.
106
operações urbanas, num primeiro momento, são realizadas no âmbito do Poder Executivo,
para, somente depois de uma primeira formatação, serem enviadas às análises do COMPUR.
Este se constitui em um conselho composto de 16 membros, dos quais 08 são do Poder
Executivo, 02 do Poder legislativo e 06 são representantes da sociedade civil (setores técnico,
empresarial e popular)
103
.
Assim, como a proposta da parceria parte de uma negociação prévia no âmbito do
Poder Executivo, as discussões relativas à questão no COMPUR, cuja maioria dos membros
pertence ao próprio Executivo, ficam empobrecidas, não sendo raro a aprovação das
operações urbanas neste Conselho por unanimidade ou contando com pouquíssimas objeções
(COTA, 2007). Além disso, a atuação do COMPUR se mostra também limitada por ser um
conselho de caráter apenas consultivo, não sendo da sua competência deliberar sobre os
assuntos, mas apenas opinar.
Quanto às negociações diretas do Poder Executivo com a iniciativa privada, esta
última adquire força significativa pelo volume de capital de que dispõe, em face de um Estado
com poucos recursos financeiros. De fato, percebemos na análise das operações urbanas belo-
horizontinas, em especial da Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida
Oiapoque, grande poder de barganha dos empresários, tanto na negociação na Prefeitura
quanto durante o processo legislativo (como prenunciado no processo de elaboração e
aprovação do PD). Nesse sentido, observamos que, assim como os municípios se constituem
no lugar privilegiado da participação direta, posto que é a esfera de gestão mais próxima da
população, pelo mesmo motivo eles também podem ser constituir em lugar propício a práticas
clientelísticas e de manipulação do poder para favorecimento de interesses privados, caso não
haja um controle efetivo da sociedade. Se assim for, o COMPUR estará apenas servindo para
legitimar interesses do setor privado previamente acordados com o Executivo.
Além das “falhas” observadas na composição e no caráter do COMPUR, que
prejudicam uma verdadeira participação popular com vistas a uma regulamentação e
aplicação do instrumento das operões urbanas de acordo com interesses coletivos, não
podemos deixar de comentar sobre a auto-anulação da participação direta da população nas
reuniões do COMPUR, uma vez que estas são completamente abertas ao público. Acredita-se
103
Para mais informações sobre o COMPUR, ver capítulo 2 deste trabalho.
107
que isso se por falta de uma cultura política de participação. Afinal, a prática urbanística
brasileira foi marcada por anos de autoritarismo e exclusão, e nem a efervescência social e
política da década de 80 e o processo de organização da sociedade civil foram suficientes para
reverter a desconfiança na autoridade e o desencanto com a política (COELHO e DINIZ, 1999
p.117).
Política x técnica
Processos de mudanças envolvem sempre muitas dificuldades. Nota-se que, também
no caso dos técnicos da administração pública, a dimensão política do planejamento e gestão
urbanos ainda não foi completamente internalizada. Trata-se de uma idéia muito recente no
campo do urbanismo brasileiro. Ainda há muitos do corpo técnico da administração pública
que tiveram uma formação com enfoque tecnocrático e sob tal enfoque trabalharam durante
muito tempo.
Percebemos ao longo do processo de pesquisa, principalmente a partir das entrevistas
realizadas com os técnicos da prefeitura, que estes entendem a dimensão política como um
entrave à realização das suas propostas. Para eles, as discussões nos conselhos e o processo
legislativo acabam por distorcer suas boas intenções.
Ora, em sentido contrário a tal raciocínio, pelo menos duas questões podem ser
levantadas: a primeira é que, mesmo que cheios das melhores intenções, os técnicos possuem
uma racionalidade própria, muitas das vezes não coincidente com a racionalidade (e com os
interesses) daqueles que supostamente estão defendendo. Segundo, a inserção da participação
política nas questões urbanas auxilia na garantia do cumprimento daquilo que é
proposto/planejado, diminuindo a distância entre discurso e prática. Importante ressaltar que a
dimensão política no urbanismo não exclui de forma alguma a importância da sua dimensão
técnica; pelo contrário, os aparatos técnicos são muito importantes para orientar e embasar as
discussões políticas.
Vale destacar que a Constituição de 1988 definiu um novo paradigma de política
urbana e transferiu responsabilidades aos municípios sem que estes dispusessem de qualquer
experiência anterior de definição técnico-jurídica e nem democrática para exercer seu novo
papel. Assim é que os municípios, e isso inclui toda a sociedade que neles habitam e
108
trabalham, ainda estão se adequando ao novo modelo da política urbana. Faz-se necessário
tempo para o difícil processo de (re)aprendizagem social, rumo (quem sabe?) à construção de
cidades mais justas.
109
Referências Bibliográficas
ARANTES, Otília. Urbanismo em fim de linha. In: ______.Urbanismo em fim de linha e
outros estudos sobre o colapso da modernização arquitetônica. São Paulo: EDUSP, 1998.
p.131-142.
BELO HORIZONTE. Decreto n. 5.362, de 4 de julho de 1986. Aprova o Regimento Interno
do Conselho Municipal do Meio Ambiente do Município de Belo Horizonte. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 25 jun. 2007.
BELO HORIZONTE. Decreto n. 6.287, de 12 de julho de 1989. Altera o art. 5º do Regimento
Interno do Conselho Municipal do Meio Ambiente COMAM, aprovado pelo Decreto n.
5.362, de 04 de junho de 1986. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 29
nov. 2007.
BELO HORIZONTE. Decreto n. 6.441, de 21 de dezembro de 1989. Aprova alterações no
Regimento Interno do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo
Horizonte, a que se refere o Decreto n. 5.531, de 17 de dezembro de 1986. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 27 nov. 2007.
BELO HORIZONTE. Decreto n. 9.330, de 26 de agosto de 1997. Aprova o regimento interno
do Conselho Municipal de Política Urbana COMPUR do Município de Belo Horizonte.
Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 8 jun. 2006.
BELO HORIZONTE. Decreto n. 9.616, de 26 de junho de 1998. Regulamenta o Capítulo I,
Título IV, da Lei N 7.165, de 27 de agosto de 1996, que dispõe sobre a Transferência do
Direito de Construir. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 11 mai.
2007.
BELO HORIZONTE. Decreto n. 95.362, de 4 de junho de 1986. Aprova o regimento interno
do Conselho Municipal do Meio Ambiente do Município de Belo Horizonte. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 25 jun. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei 0, de 21 de março de 1990. Lei Orgânica do Município de Belo
Horizonte. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 3.802, de 06 de julho de 1984. Organiza a proteção do
Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 7.165, de 27 de agosto de 1996. Institui o Plano Diretor do
Município de Belo Horizonte. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10
dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 7.166, de 27 de agosto de 1996. Estabelece normas e condições
para parcelamento, ocupação e uso do solo urbano no Município. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
110
BELO HORIZONTE. Lei n. 7.277, de 17 de janeiro de 1997. Institui a Licença Ambiental e
dá outras providências. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 8 jun.
2007.
BELO HORIZONTE. Lei n. 7.280, de 30 de janeiro de 1997. Dispõe sobre desafetação de
trecho de via pública, autorização para permuta de imóvel e recebimento de contrapartida,
mediante operação urbana. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10
dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 7.928, de 28 de dezembro de 1999. Dispõe sobre operações
urbanas para implementação de estações de integração de ônibus do BHBUS. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 8.137, de 21 de dezembro de 2000. Altera as Leis 7.165 e
7.166, ambas de 27 de agosto de 1996 [Plano Diretor e LPUOS de Belo Horizonte] e
outras providências. Disponível em:<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 8.616, de 14 de julho de 2003. Contém o Código de Posturas de
Belo Horizonte. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 8 jun. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 8.728, de 30 de dezembro de 2003. Institui a Operação Urbana
do Conjunto arquitetônico da Avenida Oiapoque. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 9.058, de 14 de janeiro de 2005. Altera a Lei 8.137, de 21 de
dezembro de 2000, e outras providências. Disponível em: <www.pbh.gov.br/legislacao>.
Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Lei n. 9.065, de 17 de janeiro de 2005. Institui a Operação Urbana na
área denominada Gleba I da Antiga Fazenda Capitão Eduardo. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/legislacao>. Acesso em: 10 dez. 2006.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Minuta: Projeto de Lei do Plano Diretor; Projeto
de Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo de Belo Horizonte. Belo Horizonte: PBH,
[1994]. Não publicado. Arquivo pessoal da Profª Jupira Gomes de Mendonça - Núcleo de
Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Projetos de Lei: Plano Diretor e Lei de
Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo. Belo Horizonte: PBH, [1995]. Não publicado.
Arquivo pessoal da Profª Jupira Gomes de Mendonça - Núcleo de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente.
Parecer Técnico n. 1177, de 4 de novembro de 2002. Arquivo da Secretaria Municipal
Adjunta de Meio Ambiente, Processo n. 01.088512.02.70, p. 496-510.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente.
Parecer Técnico n. 177, de 7 de fevereiro de 2007. Arquivo da Secretaria Municipal Adjunta
de Meio Ambiente, Processo n. 01-153198/04-27, p. 28-36.
111
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente.
Parecer cnico n. 420, de 31 de maio de 2005. Arquivo da Secretaria Municipal Adjunta de
Meio Ambiente, Processo n. 01-153198/04-27, p. 168-184.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente.
Parecer Técnico n. 428, de 6 de maio de 2004. Arquivo da Secretaria Municipal Adjunta de
Meio Ambiente, Processo n. 01.088512.02.70, p. 802-814.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente.
Parecer Técnico n. 972, de 23 de agosto de 2002. Arquivo da Secretaria Municipal Adjunta
de Meio Ambiente, Processo n. 01.088512.02.70, p. 280-298.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Regulação
Urbana. Gerência de Patrimônio Histórico. Dossiê de Tombamento da Antiga Cervejaria
Antarctica, de novembro de 1990. Arquivo da Gerencia de Patrimônio Histórico, Processo n.
01.059.213.95.54.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal Adjunta de Regulação
Urbana. Gerência de Patrimônio Histórico. Projeto de Revitalização Arquitetônica da Antiga
Cervejaria Antarctica, de janeiro de 2003. Arquivo da Gerencia de Patrimônio Histórico,
Processo n. 01.059.213.95.54.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal da Coordenação de Política
Urbana e Ambiental. Conselho Municipal do Meio Ambiente COMAM. Ata da
Reunião
Extraordinária de 26 de maio de 2004, aprovada na reunião de 15/12/2004. Arquivo da
Secretaria Municipal Adjunta de Meio Ambiente, disponibilizado pelo Serviço de
Atendimento ao Cliente da mesma Secretaria.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal da Coordenação de Política
Urbana e Ambiental. Conselho Municipal de Política Urbana COMPUR. Ata da 25
a
Reunião Extraordinária do Conselho Municipal de Política Urbana, de 15 de maio de 2003.
Diário Oficial do Município, ano 9, n. 1.902, 03 de julho de 2003. Disponível em:
<www.pbh.gov.br/dom>. Acesso em: 25 jun. 2007.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal da Coordenação de Política
Urbana e Ambiental. Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município - CDPCM.
Deliberação n.004, de 25 de setembro de 2001. Diário Oficial do Município, ano 7, n. 1470,
03 de outubro de 2001. Disponível em: <www.pbh.gov.br/dom>. Acesso em: 01 jul. 2007.
BELO HORIZONTE. Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte S/A - BHTRANS.
Relatório de Impacto na Circulação do Pátio Savassi. Relatório Final, setembro de 2002.
Arquivo da Gerência de Diretrizes Viárias – GEDIV/BHTRANS.
BELO HORIZONTE. Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte S/A - BHTRANS.
Roteiro Básico para elaboração de Relatório de Impacto na Circulação. Disponível em:
<www.bhtrans.pbh.gov.br/bhtrans/bhtrans/licenciamento_ambiental.asp>. Acesso em: 15
nov. 2007.
BENEVOLO, Leonardo. As origens da urbanística moderna. São Paulo: Lisboa, 1981.
112
BERNAREGGI, Gian Maria. Falências do mercado e falências do Estado. Uma introdução.
In: FINGERMANN, Henrique (org. da ed. brasileira). Parceria público-privado. Cooperação
financeira e organizacional entre o setor privado e administrações públicas locais. v. 1 -
Teoria e prática. São Paulo: Summus, 1992 p.13-26 .
BRASIL. Estatuto da cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos: Lei
n.10.257, de 10 de julho de 2002, que estabelece diretrizes gerais da política urbana. 2. ed.
Brasília: Câmara dos Deputados, 2002.
BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em:
<www.planalto.gov.br>. Acesso em: 10 nov. 2007.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:
<www.planalto.gov.br>. Acesso em: 10 nov. 2007.
BRITO, Fausto R. A.; SOUZA, Renata G. V. A migração intrametropolitana e a mobilidade
pendular dentro do contexto da expansão urbana da Região Metropolitana de Belo Horizonte,
com ênfase na experiência de Nova Lima. In: COSTA, Heloísa S. M. (org). Novas Periferias
Metropolitanas A expansão metropolitana em Belo Horizonte: dinâmica e especificidades
no Eixo Sul. Belo Horizonte: C/Arte, 2006. p.125-139.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Projeto de Lei n. 655/05, de 2005. Altera
as Leis n. 7.165 e n. 7.166, ambas de 27 de agosto de 1996, em conformidade com as decisões
da II Conferência Municipal de Política Urbana, estabelece normas e condições para a
urbanização e a regularização fundiária da ZEIS, dispõe sobre parcelamento, ocupação e uso
do solo nas Áreas de Especial Interesse Social – AEIS, e dá outras providências. 2005.
Disponível em: <www.cmbh.mg.gov.br>. Acesso em: 8 mai. 2007.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Projeto de Lei n. 1.248, de 7 de abril de
2003. Dispõe sobre Operação Urbana na Zona Central do Município. 2003a. Arquivo digital
cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão – CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Projeto de Lei n. 1.437, de 2003. Institui
a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico da Avenida Oiapoque. 2003b. Arquivo digital
cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão – CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Resolução n. 1.480, de 7 de dezembro de
1990. Contém o Regimento Interno da Câmara Municipal de Belo Horizonte. 1990.
Disponível em: <www.cmbh.mg.gov.br>. Acesso em: 27 nov. 2007.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Substitutivo n. 1 ao Projeto de Lei n.
1.248/2003, de 11 de julho de 2003. 2003c. Dispõe sobre Operação Urbana na Zona
Hipercentral do Município. 2003. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão
CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Substitutivo n. 2 ao Projeto de Lei n.
1.248/2003, de 29 de setembro de 2003. 2003d. Institui a Operação Urbana do Conjunto
Arquitetônico da Avenida Oiapoque. 2003. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao
Cidadão – CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
113
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Substitutivo n. 3 ao Projeto de Lei n.
1.248/2003, de 16 de outubro de 2003. Institui a Operação Urbana do Conjunto Arquitetônico
da Avenida Oiapoque. 2003e. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão
CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Emenda n. 4 ao Projeto de Lei n.
1.248/2003. 2003f. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão – CAC da
Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Emenda n. 5 ao Projeto de Lei n.
1.248/2003. 2003g. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão CAC da
Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Parecer em Primeiro Turno sobre o
Projeto de Lei Nº 1.248/03 da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Transporte e
Sistema Viário. Relator: Vereador João Gualberto Filho. 2003h. Arquivo digital cedido pelo
Centro de Apoio ao Cidadão – CAC da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Parecer em Primeiro Turno sobre o
Projeto de Lei 1.248/03 da Comissão de Legislação e Justiça. Relator: Vereador Osman
Miranda. 2003i. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão CAC da mara
Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Parecer em Primeiro Turno sobre o
Projeto de Lei 1.248/03 da Meio Ambiente e Política Urbana. Relator: Vereador Tarcísio
Caixeta. 2003j. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão CAC da Câmara
Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Ato do Presidente. Presidente: Vereador
Betinho Duarte. 2004. Arquivo digital cedido pelo Centro de Apoio ao Cidadão CAC da
Câmara Municipal de Belo Horizonte.
CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO. Relatório Final da Comissão Parlamentar de
Inquérito para apurar as Operações Interligadas (Leis n. 10.209/86 e n. 11.426/93)
realizadas no Município de São Paulo desde a promulgação da Lei n. 10.209/86. Relator:
João Antônio. 2002. Disponível em: <www.camara.sp.gov.br>. Acesso em: 06 mar. 2008.
CARDOSO, Adauto L. 1997. Reforma urbana e planos diretores: avaliação da experiência
recente. Cadernos IPPUR, ano XI, nos. 1 e 2, Rio de Janeiro, p. 79-111.
CASTELLS, Manuel. A questão urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
CASTELLS, M.; BORJA, J. As cidades como atores políticos. Novos Estudos, n. 45. São
Paulo, CEBRAP, 1996. p. 152-166.
COELHO, Magda P.; DINIZ, Eli. Governabilidad, Gobierno Local y Pobreza en Brasil. In:
RODRÍGUEZ, Alfredo; WINCHESTER, Lucy (orgs). Ciudades y Gobernabilidad em
América Latina. Coleccion Estudios Urbanos. Santiago, Chile: Ediciones SUR, 1999. p.99-
152
114
COMPANS, Rose. Empreendedorismo urbano: entre o discurso e a prática. São Paulo:
Editora UNESP, 2005.
______. O Plano Diretor entre a Reforma Urbana e o Planejamento Estratégico. In:
SCHICCHI, M. C.; BENFATTI, D. (orgs). Urbanismo: dossiê São Paulo Rio de Janeiro.
Campinas: PUCCAMPI/PROURBE, 2004. (Edição Especial de Oculum Ensaios: revista de
arquitetura e urbanismo). p.199-210.
COSTA, Geraldo M.; PACHECO, Pollyanna D. Planejamento urbano no ambiente
metropolitano: o caso do Município de Nova Lima na Região Metropolitana de Belo
Horizonte. In: COSTA, Heloísa S. M. (org). Novas Periferias Metropolitanas A expansão
metropolitana em Belo Horizonte: dinâmica e especificidades no Eixo Sul. Belo Horizonte:
C/Arte, 2006. p.125-139.
COSTA, Heloísa S. de M. A reforma urbana e a busca de cidadania. In: Indicador, n.27,
out/dez 1988. Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais. p.889-893.
COSTA, Heloísa S. M. (coord). Banco de Experiências de Planos Diretores Participativos.
Município de Belo Horizonte (MG) - Tema de Destaque: Assembléias regionais, debates com
segmentos profissionais e acadêmicos e comissão de acompanhamento para a elaboração do
plano diretor. s/d-a. Disponível em : <www.cidades.gov.br/planodiretorparticipativo>.
Acesso em: 10 nov. 2006.
______. Banco de Experiências de Planos Diretores Participativos. Município de Belo
Horizonte (MG) - Tema de Destaque: Primeira e Segunda Conferências Municipais de
Política Urbana para discutir os rumos do planejamento e gestão do município. s/d-b.
Disponível em : <www.cidades.gov.br/planodiretorparticipativo>. Acesso em: 10 nov. 2006.
COTA, Daniela A. Parceria público-privado aplicada no contexto da gestão democrática: a
Operação Urbana em Belo Horizonte. In: XII ENCONTRO NACIONAL DA ANPUR, 2007,
Belém. Anais. 1 CD ROM.
______. Legislação Urbana e Capital Imobiliário na Produção de Moradias em Belo
Horizonte: um estudo de caso. 2002. Dissertação (Mestrado) Departamento de Geografia,
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2002.
DE AMBROSIS, Clementina. Recuperação da Valorização Imobiliária Decorrente da
Urbanização. In: O Município no Século XXI: Cenários e Perspectivas. São Paulo: Fundação
Prefeito Faria Lima – CEPAM, 1999. p. 275-284.
DEL RIO, Vicente. Introdução ao desenho urbano no processo de planejamento. São Paulo:
Pini, 1990.
DI GIUSEPPE, Diana. Operações Urbanas Consorciadas. In: FUNDAÇÃO PREFEITO
FARIA LIMA CEPAM. Estatuto da cidade, coordenado por Mariana Moreira. São Paulo,
2001. p.377-393.
DI SARNO, Daniela C. L. Função Social da propriedade. In: FUNDAÇÃO PREFEITO
FARIA LIMA CEPAM. Estatuto da cidade, coordenado por Mariana Moreira. São Paulo,
2001. p.70-81.
115
ESTATUTO da cidade: o jogo tem novas regras. Belo Horizonte: CREA-MG, [2002].
FERNANDES, Edésio. Direito e Urbanização no Brasil. In: FERNANDES, Edésio (org).
Direito urbanístico. Belo Horizonte: Del Rey, 1998. p.203-231.
______. Direito urbanístico e política urbana no Brasil: uma introdução. In: FERNANDES,
Edésio (org). Direito urbanístico e política urbana no Brasil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
p.11-52.
FERREIRA, João S. W. Globalização, ideologia e planejamento urbano. In: ______. O mito
da cidade global: o papel da ideologia na produção do espaço urbano. Petrópolis: Ed.Vozes;
São Paulo: Ed. Unesp; Salvador: Anpur, 2007. p. 91-127.
FINGERMANN, Henrique; LOUREIRO, Maria Rita. Mudanças na relação público-privado e
a problemática do controle social: algumas reflexões sobre a situação brasileira. In:
FINGERMANN, Henrique (org. da ed. brasileira). Parceria público-privado: Cooperação
financeira e organizacional entre o setor privado e administrações públicas locais. v. 1. Teoria
e prática. São Paulo: Summus, 1992. p.27-41.
FIX, Mariana. A “fórmula mágica” da parceria público-privada: operações urbanas em São
Paulo. In: SCHICCHI, M. C.; BENFATTI, D. (orgs). Urbanismo: dossiê São Paulo Rio de
Janeiro. Campinas: PUCCAMPI/PROURBE, 2004 (Edição Especial de Oculum Ensaios:
revista de arquitetura e urbanismo). p.185-197.
______. Parceiros da Exclusão: Duas histórias da construção de uma “nova cidade”em São
Paulo: Faria Lima e Água Espraiada. São Paulo: Boitempo, 2001.
GOOGLE. GoogleEarth. Disponível em: <www.baixaki.ig.com.br/dowload/Google-Earth>.
Acesso em: 3 jul. 2007.
HARVEY, David. A condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 1992. p.69-97.
______. A justiça social e a cidade. São Paulo: Hucitec, 1980.
______. Espaços urbanos na “aldeia global”: reflexões sobre a condição urbana no
capitalismo do final do século XX. Transcrão e tradução de conferência proferida em Belo
Horizonte no 1° semestre de 1995. Arquivo pessoal dos profs. Geraldo M. Costa e Heloísa S.
M. Costa Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Minas
Gerais.
LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2004.
______. Direito à cidade. São Paulo: Documentos, 1969.
MARICATO, Ermínia. As idéias fora do lugar e o lugar fora das idéias. Planejamento urbano
no Brasil. In: ARANTES, Otília; VAINER, Carlos; MARICATO, Ermínia. A cidade do
pensamento único – desmanchando consensos. Petrópolis: Vozes, 2000. p.121-189.
______. Brasil 2000: qual planejamento urbano? Cadernos IPPUR, Rio de Janeiro, ano XI,
n°1e2, 1997. p.113-130.
116
MARICATO, Ermínia; FERREIRA, João S. W. Operação Urbana consorciada: diversificação
urbanística participativa ou aprofundamento da desigualdade? In: OSÓRIO, Letícia M. (org).
Estatuto da Cidade e Reforma Urbana: novas perspectivas para as cidades brasileiras. Porto
Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. p.215-250.
MONTANDON, Daniel. Estudo da Operação Urbana Faria Lima: avaliação crítica e novos
rumos. In: XII ENCONTRO NACIONAL DA ANPUR, 2007, Belém. Anais. 1 CD ROM
MONTE-MÓR, Roberto L. Planejamento Urbano no Brasil: emergência e consolidação. In:
______. Espaço e planejamento urbano: considerações sobre o caso de Rondônia. 1980.
Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-Graduação em Engenharia,Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1980. p.11-53.
PEREIRA, Valnei. Intenções estratégicas no planejamento urbano de Belo Horizonte:
modernização espacial, internacionalização e city marketing. 2001. Dissertação (Mestrado em
Planejamento Urbano e Regional) – Instituto de Pesquisa de Planejamento Urbano e Regional
– IPPUR, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2001.
PINHO, Evangelina; FILHO, Fernando G. B. Seção X – Das operações urbanas consorciadas.
Artigos 32, 33 e 34. In: MATTOS, Liana P. (org). Estatuto da Cidade Comentado. Belo
Horizonte: Mandamentos, 2002. p.219-228.
ROLNIK, Raquel. Planejamento e gestão: um diálogo de surdos? In: FUNDAÇÃO
PREFEITO FARIA LIMA CEPAM. Estatuto da cidade, coordenado por Mariana Moreira.
São Paulo, 2001. p.113-11.
SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. São Paulo: Hucitec, 1993.
SÃO PAULO (Município). Lei n. 13.260, de 28 de dezembro de 2001. Estabelece diretrizes
urbanísticas para a área de influência da atual Avenida Água Espraiada, de interligação entre a
Avenida Nações Unidas (Marginal do Rio Pinheiros) e a Rodovia dos Imigrantes, cria
incentivos por meio de instrumentos de política urbana para sua implantação, institui o Grupo
de Gestão, e outras providências. Disponível em: <www.
prefeitura.sp.gov.br/servicos/cidadaos/cidadania/leis_municipais/index.php>. Acesso em: 10
dez. 2006.
SÃO PAULO (Município). Lei n. 13.430, de 13 de setembro de 2002. Plano Diretor
Estratégico. Disponível em: <www.
prefeitura.sp.gov.br/servicos/cidadaos/cidadania/leis_municipais/index.php>. Acesso em: 10
dez. 2006.
SÃO PAULO (Município). Lei n. 13.769, de 26 de janeiro de 2004. Altera a Lei n. 11.732, de
14 de março de 1995, que estabelece programa de melhorias para a área de influência definida
em função da interligação da Avenida Brigadeiro Faria Lima com a Avenida Pedroso de
Moraes e com as Avenidas Presidente Juscelino Kubitschek, Hélio Pellegrino, dos
Bandeirantes, Engº Luis Carlos Berrini e Cidade Jardim, adequando-a à Lei Federal
10.257, de 10 de julho de 2001 (Estatuto da Cidade). Disponível em: <www.
prefeitura.sp.gov.br/servicos/cidadaos/cidadania/leis_municipais/index.php>. Acesso em: 10
dez. 2006.
117
SÃO PAULO (Município). Lei n. 13.871, de 8 de julho de 2004. Altera a redação de
disposições da Lei 13.769, de 26 de janeiro de 2004. Disponível em: <www.
prefeitura.sp.gov.br/servicos/cidadaos/cidadania/leis_municipais/index.php>. Acesso em: 10
dez. 2006.
SÃO PAULO (Município). Lei n. 13.872, de 12 de julho de 2004. Aprova a Operação Urbana
Consorciada Rio Verde-Jacu. Disponível em: <www.
prefeitura.sp.gov.br/servicos/cidadaos/cidadania/leis_municipais/index.php>. Acesso em: 10
dez. 2006.
SÃO PAULO (Município). Lei n. 13.885, de 25 de agosto de 2004. Estabelece normas
complementares ao Plano Diretor Estratégico, institui os Planos Regionais Estratégicos das
Subprefeituras, dispõe sobre o parcelamento, disciplina e ordena o Uso e Ocupação do Solo
do Município de São Paulo. Disponível em: <www.
prefeitura.sp.gov.br/servicos/cidadaos/cidadania/leis_municipais/index.php>. Acesso em: 10
dez. 2006.
SASSEN, Saskia. As Cidades na Economia Mundial. São Paulo: Studio Nobel, 1998.
SILVA, Cristiane C. de F. A função social da propriedade urbana. 2000. Dissertação
(Mestrado) Faculdade de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,
2000.
SOMEKH, Nadia. Função Social da propriedade e da cidade. In: FUNDAÇÃO PREFEITO
FARIA LIMA CEPAM. Estatuto da cidade, coordenado por Mariana Moreira. São Paulo,
2001. p.81-88.
SOUZA, Marcelo Lopes de. Mudar a Cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à
gestão urbanos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.
TORRE, Fávio D. Aspectos da Dimensão Ambiental no Processo de Consolidação do Plano
Diretor de Belo Horizonte: Atores e interesses. 2003. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais Gestão de Cidades) - Faculdade de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2003.
VAINER, Carlos. Pátria, empresa e mercadoria. Notas sobre a estratégia discursiva do
Planejamento Estratégico Urbano In: ARANTES, Otília; VAINER, Carlos; MARICATO,
Ermínia. A cidade do pensamento único – desmanchando consensos. Petrópolis: Vozes, 2000.
p.75-101.
VARGAS, Heliana C.; CASTILHO, Ana Luisa H.. Intervenções em centros urbanos:
objetivos, estratégias e resultados. In: VARGAS, Heliana C.; CASTILHO, Ana Luisa
H.(orgs). Intervenções em centros urbanos: objetivos, estratégias e resultados. Barueri, SP:
Manole, 2006. p.01-51.
VILLAÇA, Flávio. As Ilusões do Plano Diretor. São Paulo: Mimeo, 2005.
118
Anexos
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo