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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ -UNIOESTE
CENTRO DE EDUCAÇÃOCOMUNICAÇÃO E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM LETRAS
NÍVEL DE MESTRADO EM LETRAS
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUAGEM E SOCIEDADE
UCRANIANOS EM CASCAVEL: A HISTÓRIA, A RELIGIÃO E A LÍNGUA
CASCAVEL -PR
2007
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ALBERTINA MEZAVILA
UCRANIANOS EM CASCAVEL: A HISTÓRIA, A RELIGIÃO E A LÍNGUA
Dissertação apresentada à Universidade
Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE
para obtenção do título de Mestre em Letras,
junto ao Programa de Pós-Graduação Stricto
Sensu em Letras, área de concentração
Linguagem e Sociedade. Linha de Pesquisa:
Linguagem e Ensino.
Orientadora: Profª. Dr.ª Clarice Nadir
von Borstel
CASCAVEL -PR
2007
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UCRANIANOS EM CASCAVEL: A HISTÓRIA, A RELIGIÃO E A LÍNGUA
Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do Título de Mestre em
Letras e aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em
Letras, nível de mestrado da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE em
13 de dezembro de 2007.
Prof.ªDr.ª Lourdes Kaminski Alves (UNIOESTE)
Coordenadora
A mesma foi apresentada à Comissão Examinadora, integrada pelos Professores:
Prof. Dr. Jürgen Heye (PUC-Rio)
Membro Efetivo (convidado)
Prof. Dr. Ciro Damke (UNIOESTE)
Membro Efetivo (da instituição)
Prof. Dr. Antonio Donizeti da Cruz (UNIOESTE)
Membro Efetivo (da instituição)
Prof. Dr. Paulino Vandresen (UFSC – UCPel)
Membro Suplente (convidado)
Prof.ª Dr.ª Clarice Nadir von Borstel (UNIOESTE)
Orientadora
Cascavel, 13 de dezembro de 2007.
A meus pais, Paulo e Izabel, pelo cuidado, apoio e
dedicação que sempre tiveram por mim;
A meu irmão, Ricardo, pelo companheirismo;
Aos amigos que acompanharam e apoiaram o meu
trabalho.
Expresso nesse momento meu profundo agradecimento àquelas pessoas que, direta
ou indiretamente, participaram na realização desse trabalho. Especialmente, agradeço:
A Deus por sempre manifestar sua presença na minha vida;
À professora-orientadora Drª Clarice Nadir von Borstel que conduziu com muita
sabedoria as orientações de leitura e solucionou dúvidas que contribuíram para um maior
amadurecimento intelectual;
À professora Drª Maria Ceres Pereira, por ampliar meus horizontes a ponto de
perceber outras possibilidades de pesquisa;
Ao professor Dr Ciro Damke, pelas valiosas sugestões, indicações de leitura durante
o curso de mestrado;
Ao professor Dr Antonio Donizeti da Cruz pela leitura e contribuições no exame de
qualificação;
Aos professores do Colegiado do Curso de Letras que contribuíram para a
disseminação do conhecimento;
Ao Padre Mario Lazoski que emprestou livros e solucionou muitas dúvidas acerca
da etnia ucraniana e da religião;
A Pedro Litvin pela paciência, compreensão, pelas traduções, entre outros favores;
À Bernadete Waligura que com muita compreensão soube entender e colaborar
para que os propósitos fossem alcançados;
À Lúcia por sua disponibilidade em ajudar quando os seus afazeres eram tantos;
Às famílias descendentes de ucranianos de Cascavel, participantes da pesquisa e
toda a comunidade ucraniana que confiaram em uma “estrangeira”. E que me
proporcionaram a oportunidade de conhecer um pouco da sua cultura, ao mesmo tempo, em
que me fez refletir sobre a minha própria formação cultural;
À família Cichoski, em especial ao meu namorado Valdecir Cichoski e à amiga
Beatriz Boff, pois eles foram essenciais para que esse trabalho pudesse se tornar um objeto
de pesquisa. Sem eles, não teria conhecido essa riqueza cultural;
À minha família, que sempre esteve presente, soube compreender a minha ausência
e me ajudou a cultivar e fortalecer meus sonhos e a minha fé;
Aos amigos, companheiros nessa caminhada de estudo.
A Ucrânia não morrerá jamais enquanto houver
um grupo jovem que dance suas danças típicas,
cante suas canções folclóricas e cultive as suas
tradições como uma chama sagrada. Os valores
ucranianos hão de passar de uma geração para
outra até o fim dos séculos.
Helena Kolody
RESUMO
MEZAVILA, Albertina. Ucranianos em Cascavel: a história, a religião e a língua.
2007. 180 páginas. Dissertação (Mestrado em Letras) – Programa de Pós-Graduação em
Letras, Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Cascavel, 2007.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Clarice Nadir von Borstel
Defesa: 13 de dezembro de 2007.
O presente estudo constitui-se em uma pesquisa sociolingüística, cujo foco de análise é a
história, a religião e a língua dos descendentes de imigrantes ucranianos residentes no
município de Cascavel, no Oeste do Paraná. Nesse contexto étnico e lingüístico, destaca-se
a cultura religiosa, através da Igreja Greco-Católica Ucraniana que, por sua tradição, possui
como marca o Rito Bizantino Ucraniano. Por assim ser, a comunidade apresenta uma
realidade bilíngüe, na qual os falantes fazem uso do ucraniano e do português de acordo
com as situações de interlocução. Através dessa pesquisa, de cunho etnográfico, objetivouse
analisar os fatores embrenhantes do bilingüismo situacional e o ensino de língua
estrangeira ucraniana, bem como verificar a ocorrência de estigma sobre a língua materna
vernácula étnica e as condições, os motivos que tornam a preservação e a manutenção da
língua e da cultura possíveis nesse grupo. Para isso, foram pesquisados os aspectos
históricos que envolvem a chegada dessa etnia ao Brasil, bem como ao Paraná e, sobretudo,
a Cascavel. Além disso, observaram-se aspectos relevantes com relação à história da Igreja
Católica Apostólica Romana e da Igreja Ortodoxa, pois as mesmas contribuíram para o
surgimento dessa forma diferenciada de ser igreja. O imaginário simbólico ucraniano
também é elucidado, pois o mesmo contribui para a perpetuação e a manutenção dos
aspectos simbólicos/culturais da identidade étnica desse grupo. O estudo evidenciou que a
religião é forte aliada na manutenção e na preservação da língua, bem como no imaginário
simbólico dessa etnia, por apresentar ritos que ainda são realizados na língua de origem.
Desse modo, é por meio dela que a identidade étnica e cultural se mantém, ao mesmo
tempo em que contribui para abrandar o estigma. Além disso, é possível comprovar que a
busca pela aprendizagem formal da língua ucraniana, pelos adultos, constitui-se como
forma de interagir com os membros da comunidade a fim de (re)constituir o passado para
compreender melhor o presente. Desse modo, a memória, a história e o passado de luta e de
resistência dessa etnia, também colaboram para a manutenção, pois o que era motivo de
humilhação, na atualidade passou a ser motivo de orgulho. Nesse sentido, as famílias e a
igreja são preponderantes na manutenção e na preservação da língua e da cultura ucraniana.
Ainda é possível afirmar que a identidade, a cultura e a língua constituem a força motriz da
comunidade. Por isso, é impossível refleti-las separadamente, do mesmo modo, que não é
imaginável o indivíduo dissociado desses elementos que o compõem. Para os ucranianos, a
religião é o alicerce dessa tríade, pois é ela que os aproxima.
Palavras-chave: Religião, identidade, bilingüismo.
ABSTRACT
MEZAVILA, Albertina. Ucranianos em Cascavel: a história, a religião e a língua.
2007. 180 páginas. Dissertação (Mestrado em Letras) – Programa de Pós-Graduação em
Letras, Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE, Cascavel, 2007.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Clarice Nadir von Borstel
Defesa: 13 de dezembro de 2007.
This study is made of a sociolinguistic research, whose focus of analysis are the history,
religion and the language of descendants of Ukrainian immigrants who live in Cascavel
City, western Paraná. In this ethnic and linguistic context, the religious culture is
outstanding, through the Ukrainian Catholic Greek Church which, because of its tradition
has as a mark the Ukrainian Byzantine Rite. Therefore the community has a bilingual
reality, in which the speakers make use of Ukrainian and Portuguese according to their
speech necessities. The aim of this paper was to analyze the causative factors of situational
bilinguism and the teaching of Ukrainian Language through an ethnographic research as
well as checking the occurrence of stigma on the vernacular ethnic mother language, the
conditions and the reasons that cause the preservation and maintenance of the language and
the culture that is present in this group. For that, it was researched the historical aspects that
are related to the arrival of this ethnic group in Brazil, as well as in Paraná, and mainly in
Cascavel. Besides, it was observed the relevant aspects in relation to the history of the
Roman Apostolic Catholic Church and the Orthodox Church, because they contributed to
the arousing of this different way of being a Church. The Ukrainian symbolic imaginary is
also elucidated, because it contributes to the perpetuation and the maintenance of
symbolic/cultural aspects of the ethnical identity of this group. The study evidenced that the
religion is a strong alley in the maintenance and the preservation of the language, as well as
in the symbolic imaginary of this ethnic group, by presenting rites which are still performed
in the original language. This way, it is through the language that the ethnical and cultural
identities are maintained, contributing to lessen the stigma at the same time. In addition, it
is possible to prove that the search for the formal learning of the Ukrainian language by
adults is a way to interact with the members of the community in order to reconstitute the
past to understand the present in a better way. Therefore, the memory, the history and the
past of struggle and resistance of this ethnical group, also collaborated to the maintenance,
because what was a reason for humiliation in the past, nowadays has become a reason to be
proud. This way, the families and the church are preponderant maintaining and preserving
the Ukrainian language and culture. It is also possible to affirm that the identity, the culture
and the language constitute the power movement of the community. So, it is impossible to
analyze them separately, in the same way that it is not imaginable people being dissociated
of these elements which compose them. For the Ukrainian people, the religion is the
foundation of this triad, because it is what brings them together.
Key words: Religion, identity, bilinguism.
SUMÁRIO
LISTA DE ILUSTRAÇÕES.................................................................................................xi
LISTA DE ABREVIATURAS.............................................................................................xii
INTRODUÇÃO...................................................................................................................01
CAPÍTULO 1 -UM OLHAR ETNOGRÁFICO PARA O CAMPO DE PESQUISA..09
1.1INSTRUMENTOS DE PESQUISA................................................................................11
CAPÍTULO 2 -O CENÁRIO ÉTNICO/RELIGIOSO DOS UCRANIANOS..............17
2.1 CONTEXTO BRASILEIRO...........................................................................................17
2.2 ENSEJO PARA IMIGRAÇÃO......................................................................................18
2.3 IMIGRAÇÃO NO PARANÁ.........................................................................................21
2.4 UCRANIANOS EM CASCAVEL.................................................................................24
2.5 O CENÁRIO SOCIAL: IGREJA, ASSOCIAÇÃO CULTURAL E ESCOLA..............29
2.5.1 A história da igreja.......................................................................................................30
2.5.2 A igreja e o rito............................................................................................................35
2.5.3 Associação cultural......................................................................................................41
2.5.4 CELEM: Centro de Estudos de Línguas Modernas....................................................44
2.5.5 A escola........................................................................................................................47
2.5.6 A Pêssanka: a arte de colorir ovos..............................................................................48
2.5.7 A religião, a fé e a linguagem.....................................................................................50
CAPÍTULO 3 -APORTES TEÓRICOS..........................................................................58
3.1 MONOLINGÜISMO X BILINGÜISMO.......................................................................58
3.2 BILINGÜISMO..............................................................................................................62
3.3 CULTURA......................................................................................................................69
3.4 IDENTIDADE E CULTURAS ÉTNICAS ....................................................................76
CAPÍTULO 4 -OS DADOS ÉTNICO/RELIGIOSOS E ESCOLARES DA
COMUNIDADE UCRANIANA EM CASCAVEL..........................................................91
4.1 A MEMÓRIA, A HISTÓRIA E A LÍNGUA..................................................................91
4.2 A LÍNGUA UCRANIANA............................................................................................95
4.3 LÍNGUA POLONESA E UCRANIANA: SEPARAÇÃO OU IGUALDADE?...........96
4.4 CASAMENTOS INTERÉTNICOS..............................................................................101
4.5 AS CRIANÇAS............................................................................................................105
4.6 AS MÃES E A LÍNGUA MATERNA...........................................................................110
4.7 A ESCOLA....................................................................................................................114
4.8 A IGREJA, A FAMÍLIA E SEUS PAPÉIS NA MANUTENÇÃO DA LÍNGUA
UCRANIANA.....................................................................................................................119
4.9 A PRESERVAÇÃO DA LÍNGUA E DA CULTURA UCRANIANA........................127
CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................131
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................134
APÊNDICE.......................................................................................................................142
ANEXOS...........................................................................................................................172
ANEXO I -ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA AS FAMÍLIAS DESCENDENTES DE
UCRANIANOS...................................................................................................................172
ANEXO II -ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA O PADRE.........................................173
ANEXO III -ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA AS IRMÃS......................................175
ANEXO IV -ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA O PROFESSOR DE LÍNGUA
UCRANIANA.....................................................................................................................176
ANEXO V -ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA OS PRESIDENTES DO GRUPO
FOLCLÓRICO SONHACHNECK......................................................................................177
ANEXO VI – AUTORIZAÇÃO PARA A UTILIZAÇÃO DOS DADOS..........................178
ANEXO VII -HROMADA – INFORMATIVO DA PARÓQUIA NOSSA SENHORA DO
PERPÉTUO SOCORRO.....................................................................................................179
ANEXO VIII – PERIÓDICO MISSIONÁRIO UCRANIANO NO BRASIL
(######### .
#
#
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
CAPÍTULO 2
Imagem 1 -Mapa da Ucrânia................................................................................................19
Imagem 2 -Mapa do Município de Cascavel situado no oeste do Estado do Paraná...........24
Imagem 3 -Mapa de Cascavel e municípios vizinhos..........................................................25
Imagem 4 -Antiga igreja – construída em 1969...................................................................33
Imagem 5 -Missões em Centralito – 1963...........................................................................34
Imagem 6 -Missões em Centralito – 1963...........................................................................34
Imagem 7 -Igreja moderna -construída em 2004................................................................35
Imagem 8 -Grupo Sonhachneck...........................................................................................44
CAPÍTULO 4
Imagem 12 -Alfabeto ucraíno..............................................................................................96
xi
LISTA DE ABREVIATURAS
AUVEL– Associação Ucraniana de Cascavel
CELEM -Centro de Estudos de Línguas Modernas
xii
INTRODUÇÃO
O Brasil, devido ao seu pluralismo lingüístico e cultural, é um país que apresenta
tradições e particularidades de línguas que interferem e que podem ser interferidas por
outras línguas, ou, ainda, podem se manter através das gerações como marca de uma
identidade de um grupo, ou como elemento importante para o acontecimento da interação
no mesmo. Nesta alternância de línguas, há a história de um povo que imigrou de seu país
de origem, nesse caso, os ucranianos, e que adotou o Brasil como sua pátria, mantendo a
língua, a cultura e a religião.
O contexto selecionado para a realização desta pesquisa é o município de Cascavel,
localizado na região Oeste do Estado do Paraná. Essa região, que por suas características
étnicas e lingüísticas, principalmente com relação ao contexto de línguas em contato e
ensino, é objeto de estudo de alguns pesquisadores, como Borstel (1992 e 1999), Pereira
(1999), Damke (1988), entre outros. Pereira e Borstel, ao pesquisarem minorias lingüísticas
nessa região, qualificam-na como sociolingüisticamente complexa. Essa colocação deve-se
a alguns fatores, dentre eles, a localização próxima às áreas de fronteira
Brasil/Argentina/Paraguai; a presença de comunidades indígenas nos municípios de São
Miguel do Iguaçu, Guaíra, Diamante do Oeste e outros; as (i)migrações de italianos,
alemães, poloneses e outras etnias. Nessa região, há uma diversidade lingüística muito
expressiva, pois além do português, muitas outras línguas são faladas. A modalidade oral é
a mais utilizada em diversas manifestações lingüísticas.
Toda esta complexidade é caracterizada por inúmeros conflitos que decorrem da
relação língua, identidade e cultura, ou seja, há um triângulo imbricado nesta relação
multilíngüe. É nesse cenário que se propõe este estudo, o qual tem por preocupação central
a temática do bilingüismo (ucraniano/português) em seu aspecto religioso, tendo em vista o
uso lingüístico, mediado por questões de comportamento e de atitudes em relação à língua.
“O falar bilíngüe está, pois, diretamente relacionado ao contexto sociopsicolingüístico no
qual transcorre a interação verbal” (MELLO, 1999, p. 71). Nesse sentido, o nosso estudo
está vinculado à forma com a qual os falantes dessa comunidade religiosa reagem às duas
línguas, mediante as questões étnicas, culturais e lingüísticas desse grupo, o que sugere um
estudo de cunho etnolingüístico. Por isso, decidiu-se realizar uma análise sociolingüística
dos aspectos da fala em situações de contato que envolva o uso, a manutenção ou a perda
da língua ucraniana.
Além disso, verifica-se que existem diversos fatores que atuam na formação de
comunidades étnicas, entre eles, a língua e a religião que,
desempenham um papel importante, talvez porque elas autorizam a
comunidade de compreensão entre aqueles que compartilham um código
lingüístico comum ou um mesmo sistema de regulamentação ritual da
vida. (POUTIGNAT, P.; STREIFF-FENART, J. 1998, p. 38).
Para determinar o grau de influência que a igreja possui na manutenção da língua,
neste caso o ucraniano, realiza-se alguns levantamentos do uso da fala bilíngüe com
falantes, estudando-se, assim, a situação de bilingüismo situacional e institucionalizado
(ucraniano/português) na Igreja Católica Ucraniana Nossa Senhora do Perpétuo Socorro de
Cascavel.
Toma-se como base o contexto paranaense de imigração ucraniana. Para melhor
conhecer as atitudes envolvidas na produção lingüística dos imigrantes ucranianos e, em
seguida, de seus descendentes, far-se-á um pequeno panorama da história dos ucranianos,
no seu país de origem, as causas que motivaram a sua emigração, e, também, de como foi a
chegada ao Brasil, especificamente, ao Paraná, apontando como foram os primeiros anos de
seu estabelecimento; e a trajetória dos descendentes, inclusive nas cidades de Curitiba,
Prudentópolis, Mallet, onde a maioria dos imigrantes ucranianos pesquisados moraram
primeiramente, antes de se estabelecer no município de Cascavel. Aborda-se, brevemente,
como ocorreu a separação entre a Igreja Católica Ortodoxa e a Igreja Católica Ucraniana.
Essa abordagem se explica pelo fato de se acreditar que os fatos históricos contribuem para
a compreensão das atitudes dos sujeitos escolhidos para esta pesquisa: imigrantes, filhos,
netos radicados no município de Cascavel/Paraná, assim como para explicar as
manifestações culturais e religiosas dos mesmos.
Interessa-se por levantar questões relacionadas às atitudes que envolvem a produção
lingüística de descendentes de ucranianos, verificando as expectativas em relação à busca
por esta língua, bem como identificando a ocorrência de bilingüismo (HEYE e SAVEDRA,
2003) e ao mesmo tempo, procura-se identificar os fatores que motivam os descendentes a
buscarem a aprendizagem formal dessa língua.
Para tanto, faz-se um trabalho com as pessoas que participam ativamente na
comunidade religiosa: o Padre, as Irmãs, o Presidente da AUVEL1, o Presidente do grupo
folclórico Sonhachnek e o professor de língua (CELEM)2. Também foram realizadas
entrevistas com cinco participantes das aulas de ucraniano (crianças, adolescentes e
1AUVEL-Associação Ucraniana de Cascavel é uma entidade que contribui para a divulgação das
tradições da
etnia ucraniana.
2O CELEM-Centro de Estudos de Línguas Modernas é um programa do governo do Estado do
Paraná, que
foi criado em 1986, embasado no artigo 7º da Resolução Secretarial nº 3546/86, e que foi posto em
prática a
partir de 1988. Este projeto visa contribuir na formação de alunos do Ensino Fundamental de
quintas a oitavas
séries e do Ensino Médio da rede estadual. Têm por finalidade desenvolver cursos de línguas e
culturas:
italiana, alemã, hispânica, francesa, árabe, japonesa polonesa e ucraniana visando estimular e
facilitar a
inclusão dessas línguas nos currículos plenos do Sistema Educacional do Estado do Paraná. Em
Cascavel há
vários cursos de Língua desenvolvidos pelo CELEM. O curso de Língua Ucraniana iniciou, no ano
de 2006,
no Colégio Estadual São Cristóvão.
adultos); cinco participantes do grupo folclórico Sonhachnek (jovens); cinco participantes
da igreja (adultos e idosos) e cinco famílias descendentes, sendo que duas vivem no
interior, e as demais no perímetro urbano da cidade.
Pretende-se pesquisar parte da complexidade lingüística existente na região (minoria
lingüística ucraniana), bem como sua organização política, étnica e religiosa, que se
manifesta por meio da AUVEL, Associação Ucraniana de Cascavel, que têm por objetivo
valorizar e cultivar as tradições ucranianas. A associação disponibiliza à comunidade vários
cursos, com a finalidade de proporcionar aos participantes maior aproximação com os
costumes e com os hábitos do país de origem, entre os quais estão a dança, a catequese e a
culinária. Também oferece cursos de língua ucraniana, como forma de manutenção e de
divulgação da língua.
Verifica-se que há o uso restrito da língua ucraniana, em algumas situações, pela
geração mais jovem, mesmo com todo o interesse dos pais em manter a língua, seja no
convívio familiar, seja no social. Por isso, há um forte apelo por parte da comunidade para
o incentivo à aprendizagem da língua no âmbito religioso, pois essa é fator importante para
a entrada na catequese. Nesse sentido, foi reivindicado, à Secretaria de Educação do Estado
do Paraná, o ensino de língua ucraniana no contexto escolar, no Colégio Estadual São
Cristóvão, que oferece curso de língua ucraniana para toda comunidade, através de um
programa do Estado do Paraná, chamado CELEM.
Para caracterizar o estudo das relações entre a linguagem e a identidade da
comunidade ucraniana, faz-se necessário apresentar, primeiramente, como a linguagem faz
parte da construção da identidade, na mesma medida em que essa é o alvo de
questionamentos do indivíduo e da própria comunidade. Para tanto, Hall (2003) afirma que
as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social,
estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o
indivíduo moderno, até aqui visto um sujeito unificado. A assim chamada
“crise de identidade” é vista como parte de um processo mais amplo de
mudança, que está deslocando as estruturas e processos centrais das
sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos
indivíduos uma ancoragem estável no mundo social (HALL, 2003, p.
07).
A identidade pode ser considerada dilacerada, pois é, ao mesmo tempo, social e
individual, características que mostram a natureza dupla da linguagem. Assim sendo, a
identidade lingüística, de acordo com Damke,
assim como a própria língua/linguagem, em parte (...) é trazida do
próprio berço e em parte ela vai se formando ao longo da vida, de acordo
com a realidade de vivência do indivíduo. A construção da identidade,
pois, é resultado de fatores individuais, mas também depende de fatores
coletivos, sociais (1998, p. 22).
Pretende-se, então, estudar os aspectos sócio-culturais e identitários observando
como ocorre o ensino-aprendizagem dessa língua na comunidade onde a igreja
permanece/existe. De acordo com Bortoni-Ricardo (1997, apud ERICKSON, 1987), é
necessário difundir uma pedagogia culturalmente sensível, em que se conscientize o aluno
em relação às diferenças, sem que ocorra uma visão negativa do estilo de comunicação das
crianças, o que pode provocar uma resistência por parte das mesmas. A autora ressalta
também a importância de os docentes aprenderem a identificar as características
sociolingüísticas e culturais de seus alunos, de forma sistemática, de modo que as
expressões culturais e lingüísticas diferentes das consideradas nacionais, e da variedade
institucionalizada (normativa) da língua portuguesa, sejam respeitadas e valorizadas pelos
professores, autoridades e, paulatinamente, pelos demais membros da sociedade.
Tendo em vista o proposto até aqui, este trabalho tem como objetivo: analisar as
situações de bilingüismo, bem como a rede de comunicação que acontece na comunidade
de fala, e o ensino de língua estrangeira ucraniana.
Para tanto, objetiva-se neste estudo:
Compreender e descrever os aspectos de uma pesquisa sócio-cultural, por meio da
qual, podem-se verificar os fatores embrenhantes do bilingüismo situacional e
ensino de língua estrangeira ucraniana;
Verificar se ocorre o estigma sobre a língua materna vernácula étnica, pois os
descendentes dificilmente utilizam a língua de origem étnica em lugares públicos,
com exceção da prática dos ritos da igreja;
Constatar as condições, os motivos que mantém e preservam a língua/cultura do
ucraniano nesse grupo, bem como os fatores sociolingüísticos que levam à
manutenção da língua.
Este trabalho se justifica pela complexidade etnolingüística existente na região, que
é evidenciada pelo grande fluxo imigratório proveniente das mais variadas partes do mundo
e, em especial, da Europa, destacando-se, dentre muitos, os imigrantes alemães e italianos.
E, em menor grau, há também os ucranianos que perpetuaram a língua de suas origens, de
geração a geração.
Ressalta-se que é preciso rever o mito do monolingüismo, pois no Brasil, país que se
vê monolíngue, há cerca de 200 línguas faladas, conforme dados de Maher (1998, p. 115).
A maior parte dessas línguas são indígenas, porém não é possível esquecer a contribuição
da língua de sinais e as línguas faladas por comunidades de imigrantes. Assim sendo, pode-
se compartilhar com a reflexão de Mello (1999, p. 23), para a qual “as línguas se mesclam,
se misturam em um mesmo território, sem obedecer aos limites geográficos de suas
fronteiras.” Sugere-se então a existência de inúmeras línguas, mesmo o país reconhecendo
apenas uma como sendo legítima (língua portuguesa).
Bagno (2001, p. 15) acrescenta que pensar na existência de uma unidade na língua
portuguesa falada é um dos maiores mitos lingüísticos existentes no Brasil. Mito este que
contribui para que a escola imponha a norma lingüística como se fosse a única conhecida
entre os 186 milhões de brasileiros3, sem considerar fatores como idade, situação
socioeconômica, grau de escolarização, origem geográfica, dentre outros aspectos.
Conforme o autor,
se empreendermos uma grande viagem pelo Brasil, de Norte a Sul e de
Leste a Oeste, recolhendo os modos de falar das pessoas de todas as
regiões, de todos os estados, das principais cidades, da zona rural, etc.,
vamos perceber que existem diferenças nesses modos de falar, diferenças
que podem ser fonéticas, sintáticas, morfológicas, lexicais, semânticas,
pragmáticas. Há muitas semelhanças, também, mas são as diferenças que
chamam mais atenção e que permitem classificar esses variados modos
de falar (BAGNO, 2001, p. 42).
O trabalho justifica-se ainda por somar-se às demais pesquisas realizadas na região
Oeste do Paraná, tais como as de Borstel (1992, 1999), Damke (1998), Pereira (1999),
Ribeiro (2006), Teis (2007), entre outras, que ao estudarem situações concretas de
bilingüismo, desmistificam a idéia da existência de uma só língua no Brasil, no caso, a
língua portuguesa.
A pesquisa está organizada em quatro partes assim delineadas: a primeira registra a
metodologia de pesquisa, a qual descreve o percurso da entrevistadora, desde a escolha do
corpus de pesquisa, bem como a escolha pela metodologia, até a descrição dos indivíduos
escolhidos. A segunda é dedicada à história da imigração ucraniana no Brasil, e as razões
que levaram esse povo a imigrar de seu país. Inclui-se, também, a continuação da imigração
desse povo para o Paraná e, mais precisamente, para Cascavel. Esboça-se ainda, neste
capítulo, algumas retomadas sobre a história da Igreja Católica Romana e a Igreja
3Estimativa IBGE, 2006. Fonte: www. wikipedia.org/wiki/ demografiadobrasil
Ortodoxa, das quais se forma a Igreja Católica Ucraniana. Na terceira, apresenta-se a
fundamentação teórica que norteia o desenvolvimento deste estudo, apoiada em estudos
sócio-culturais da construção da identidade lingüística, da identidade étnica, da cultura,
assim como em conceitos e reflexões sobre o bilingüismo e a bilingualidade. A quarta parte
é destinada à descrição e à análise dos dados recolhidos através de entrevistas com os
informantes. Por último são apresentadas as considerações e as reflexões sobre os dados
analisados.
Com base nos materiais coletados através das entrevistas e da observação de cenas e
de relatos, pode-se afirmar, a partir desta pesquisa empírica que a Igreja Católica Ucraniana
contribui fortemente para a manutenção da língua ucraniana na comunidade.
CAPÍTULO 1
UM OLHAR ETNOGRÁFICO PARA O CAMPO DE PESQUISA
Neste capítulo, descrevem-se os passos que serão seguidos durante a realização da
pesquisa junto à Igreja Católica Ucraniana de Cascavel. Inicia-se dizendo o quanto é
instigante para o pesquisador a escolha da metodologia norteadora de uma pesquisa, pois há
inúmeras decisões a serem postas desde a seleção do corpus à seleção dos indivíduos a
serem observados.
Este estudo situa-se no campo da sociolingüística, área que aborda a relação entre
sociedade e linguagem. Como afirma Calvet (2002, p. 28-31), a sociolingüística se firmou
em 1964 quando em Los Angeles, realizou-se um Congresso da Universidade da Califórnia.
Dele participaram John Gumperz, William Labov, Dell Hymes, o organizador William
Bright, entre outros. O organizador, na apresentação dos Anais do evento, intitulado
“Sociolinguistics”, afirma que o objeto central da sociolingüística é a diversidade
lingüística.
De acordo com Alkmim, a sociolingüística tem como objeto central,
o estudo da língua falada, observada, descrita e analisada em seu
contexto social, isto é, em situações reais de uso. Seu ponto de partida é a
comunidade lingüística, um conjunto de pessoas que interagem
verbalmente e que compartilham um conjunto de normas com respeito
aos usos lingüísticos. Em outras palavras, uma comunidade de fala se
caracteriza não pelo fato de se constituir por pessoas que falam do
mesmo modo, mas por indivíduos que se relacionam, por meio de redes
comunicativas diversas, e que orientam seu comportamento verbal por
um mesmo conjunto de regras (2003, p. 31).
A sociolingüística constitui-se “um espaço de investigação interdisciplinar, que atua
nas fronteiras entre língua e sociedade focalizando preciptuamente os empregos concretos
da língua” (MOLLICA, 1991, p. 116).
Esse trabalho é desenvolvido, como foi dito anteriormente, no campo da
sociolingüística, a partir de uma pesquisa etnográfica na qual o pesquisador, por meio de
uma observação participante em um determinado período de tempo, acompanha o modo de
ser dos sujeitos do grupo. Desse modo, de acordo com André (2003, p. 27), a etnografia é
um tipo de pesquisa desenvolvido pelos antropólogos para estudar a sociedade e a cultura.
É um conjunto de técnicas empregadas para coletar dados sobre os valores, os hábitos, as
crenças, as práticas e os comportamentos de um grupo social.
Para Pereira, a pesquisa etnográfica busca, a partir de uma realidade social,
responder à questão: “o que está acontecendo aqui?” Para tanto, faz-se necessário que o
pesquisador esteja atento para “captar a dinâmica das relações e interações do dia-a-dia”
existentes no grupo verificado (PEREIRA, 1999, p. 39).
Nesse caso, a relação entre a entrevistadora e o objeto pesquisado, a comunidade
ucraniana, originou o corpus da pesquisa. Desse modo, através de narrativas sobre as suas
histórias de vida, sobre a igreja, procurou-se obter material lingüístico e dados histórico-
culturais relacionados com as representações dos ucranianos na comunidade.
Necessitou-se ainda registrar como ocorreram os eventos de interação, os locais de
contato entre o pesquisador e o pesquisado, bem como a situação comunicativa, pois
buscou-se uma relação de confiança entre as partes, para que os dados obtidos fossem o
mais próximo possível da realidade. Porém, como expõe Geertz (1989, p. 33), os dados
obtidos em uma pesquisa etnográfica podem não ser os mais sólidos, os mais verdadeiros,
mas mesmo assim, podem ser produtivos.
Spradley (1979), citado por André (2003), salienta que
a principal preocupação na etnografia é com o significado que têm as
ações e os eventos para as pessoas ou os grupos estudados. Alguns desses
significados são diretamente expressos pela linguagem, outros são
transmitidos indiretamente por meio das ações. De qualquer maneira, diz
ele, em toda sociedade as pessoas usam sistemas complexos de
significado para organizar seu comportamento, para entender a sua
própria pessoa e os outros e para dar sentido ao mundo em que vivem.
Esses sistemas de significado constituem a sua cultura. Para Spradley a
cultura é, pois “o conhecimento já adquirido que as pessoas usam para
interpretar experiências e gerar comportamentos” (p.5). Nesse sentido a
cultura abrange o que as pessoas fazem, o que elas sabem e as coisas que
elas constroem e usam, explica ele. (SPRADLEY, 1979 apud ANDRÉ,
2003, p. 19).
A etnografia busca descrever a cultura, ajuda no trabalho de descobrir os significados
da mesma em um grupo, em uma comunidade, a partir da compreensão dos sujeitos
estudados, sem a inferência cultural do pesquisador. Apesar que, é praticamente impossível
ser totalmente imparcial. Porém, ao realizar uma análise consistente dos dados obtidos, das
evidências, bem como do discurso verbal dos sujeitos e de suas ações, é possível
estabelecer – por indução – hipóteses, conceitos e teorias acerca da cultura do grupo
estudado. Para tanto, “o etnógrafo encontra-se, assim, diante de diferentes formas de
interpretações da vida, formas de compreensão do senso comum, significados variados
atribuídos pelos participantes às suas experiências e vivências e tenta mostrar esses
significados múltiplos ao leitor” (ANDRÉ, 2003, p. 20).
Optou-se pela etnografia como prática metodológica, por essa possibilitar a
descrição e a interpretação das relações culturais, considerando os discursos e as ações
culturais.
1.1 INSTRUMENTOS DE PESQUISA
Inicialmente, pesquisou-se e qualificou-se o material relacionado ao tema e aos
objetivos pretendidos, para que após o levantamento de dados se pudesse ter um alicerce
teórico capaz de ajudar na análise e na reflexão dos mesmos. Posterior à leitura e à seleção
dos dados analítico-bibliográficos, procurou-se realizar a coleta de dados etnográficos
através da observação participante na comunidade ucraniana.
Segundo Pereira, o pesquisador precisa ter cuidado quando entra na comunidade
para dar início à pesquisa de campo, bem como quanto ao tempo de permanência nela, pois
a entrada de campo é um momento crucial para o desenvolvimento em
uma pesquisa de campo, sendo assim, cabe ao pesquisador valer-se de
sua intuição e sensibilidade para criar um contexto favorável ao seu
trabalho. Nessa negociação, um dos objetivos postos se relaciona com a
confiança a ser estabelecida entre as partes envolvidas. Por outro lado,
considerando a imersão prevista em etnografia, o tempo de permanência
no campo permite a apreensão mais próxima dos significados sociais do
grupo; em outras palavras, determinar o que está acontecendo no mesmo.
(1999, p. 103. Grifos da autora).
Em nossa pesquisa, embora a entrevistadora fosse informada da realidade cultural
diferente da sua, e estivesse acompanhada por pessoas que vivem na comunidade, e,
portanto, influentes, não se pode deixar de dizer sobre o estranhamento que sentiu quando
entrou no campo, e se deparou com uma cultura totalmente diferente da sua. Estranhar a
cultura do outro, conforme a etnografia, é o princípio da pesquisa. Nesse caso, o
pesquisador deve, segundo Pereira (1999, p. 316) “estranhar o familiar e tornar o familiar
estranho”. Porém, acredita-se que é preciso muito cuidado para que o estranho não seja
analisado pelo olhar da cultura do pesquisador. Assim sendo, a entrevistadora precisou se
conter várias vezes, para não fazer comparações entre a cultura analisada e a sua cultura.
Ao mesmo tempo sentiu-se à vontade com as famílias entrevistadas, pois as mesmas eram
conhecidas da família que a inseriu na comunidade. Esse fato facilitou bastante o trabalho.
Percebeu-se que o povo ucraniano é extremamente aberto para falar sobre sua cultura,
costumes, e outros, além de sentirem orgulho de expressar a sua origem étnica.
As entrevistas ocorreram a partir de um primeiro contato, com intuito de esclarecer
os reais objetivos da pesquisa, e de realizar o agendamento para não “atrapalhar” os
compromissos dos entrevistados, bem como de preparar o grupo para a coleta dos
depoimentos, que foram realizados no espaço do entrevistado, isto é, em seus domicílios,
na igreja, na escola (CELEM), ou no salão comunitário, nos ensaios do grupo folclórico
Sonhachnek .
A entrevista era orientada por um roteiro que era seguido pela entrevistadora. O
roteiro contribuía no sentido de se ater aos fatos que interessavam à entrevistadora (as
narrativas de experiências de vida dos entrevistados). Essas, por sua vez, auxiliavam no
sentido de amenizar o nervosismo expresso por alguns entrevistados, pois no transcorrer da
entrevista, o entrevistado passava a relatar os fatos históricos de sua vida com mais calma e
fluência.
Contar histórias, conforme Jovchelovitch e Bauer “é uma habilidade independente
da educação e da competência lingüística” (2000, p. 91). Desse modo, qualquer indivíduo,
independente de classe social, de idade, de etnia, de sexo, pode narrar histórias, partindo do
contexto vivenciado. E mais, as lembranças vivenciadas tornam o discurso proferido o mais
próximo do real, do cotidiano do entrevistado, ou seja, o envolvimento emocional com o
fato narrado revela aspectos importantes da cultura e da língua do participante da pesquisa.
Jovchelovitch e Bauer (2000) salientam que
a narrativa privilegia a realidade do que é experienciado pelos contadores
de história: a realidade de uma narrativa refere-se ao que é real para o
contador de história. As narrativas não copiam a realidade do mundo fora
delas: elas propõem representações/interpretações particulares do mundo.
As narrativas não estão abertas à comprovação e não podem ser
simplesmente julgadas como verdadeiras ou falsas: elas expressam a
verdade de um ponto de vista, de uma situação específica no tempo e no
espaço. As narrativas estão sempre inseridas no contexto sócio-histórico.
Uma voz específica em uma narrativa somente pode ser compreendida
em relação a um contexto mais amplo: nenhuma narrativa pode ser
formulada sem tal sistema de referentes (2000, p. 110. Grifos dos
autores).
Sugerir ao entrevistado a narração de fatos sobre a experiência pessoal dá ao
pesquisador a oportunidade de se tornar mais íntimo da realidade vivenciada, ao mesmo
tempo em que auxilia na resolução do “paradoxo do observador” (LABOV, 1972 apud
TARALLO, 2003, p. 20-23), pois o pesquisador, ao ter necessidade de coletar muitos
materiais através da participação direta na interação com o falante, utilizará meios que não
atrapalhem a naturalidade do evento, ou seja, que não comprometam o discurso.
Convém lembrar que, conforme André (2003, p. 59), “no estudo de caso etnográfico
o pesquisador é o principal instrumento de coletas e análise de dados. Haverá momentos em
que sua condição humana será altamente vantajosa, permitindo reagir imediatamente, fazer
correções, descobrir novos horizontes”. Para tanto, faz-se necessário não manifestar
preconceito diante daquilo que foi observado, para que a análise dos dados seja a mais
neutra possível.
A pesquisa realizada buscou a aproximação e a familiaridade, por meio de narrativas
pessoais, com a aquisição de um corpus representativo da comunidade de fala dos
ucranianos, o qual foi constituído pela mínima atenção dada à língua que compõe “o
material básico para a análise sociolingüística,” como afirma Tarallo (2003, p. 19).
Labov (1972, apud TARALLO, 2003, p. 23-26), sugere que o sociolingüista faça
uso de narrativas, principalmente, aquelas que abordem as experiências pessoais. Pois essas
apresentam a linguagem do indivíduo muito próxima ao seu cotidiano.
Certeau (2003), assegura que a narrativa expressa a cultura do indivíduo, bem como
a sua identidade. Conseqüentemente, é possível verificar a linguagem utilizada pelo
indivíduo, que o constitui como pessoa. Assim, em uma narrativa de vida, almeja-se que o
entrevistado dê indícios de traços lingüísticos e de sua cultura étnica.
Certeau (2003) sugere que o sujeito entrevistado, ao relatar a sua experiência,
exporá a sua versão em relação à própria trajetória de vida, sendo que esse relato é único
para aquela circunstância, ao mesmo tempo em que busca atender aos seus objetivos:
a “trajetória” evoca um movimento, mas resulta ainda de uma projeção
sobre um plano, de uma redução. Trata-se de uma transcrição. Um
gráfico “que o olho pode dominar” é substituído por uma operação; uma
linha reversível (que se pode ler nos dois sentidos) dá lugar a uma série
temporalmente irreversível; um traço, a atos. Prefiro então recorrer a uma
distinção entre táticas e estratégias. (CERTEAU, 2003, p. 46. Grifos do
autor).
As narrativas podem se constituir pelas práticas de fazer, ou seja, essas podem ser
narradas pelo indivíduo. Desse modo, “a narrativização das práticas seria ‘uma maneira de
fazer textual, com seus procedimentos e táticas próprios.” (CERTEAU, 2003, p. 152).
Para a escolha dos participantes da pesquisa, que são as pessoas influentes na
comunidade, e algumas famílias, partiu-se das seguintes variáveis:
1. A família devia ser descendente de ucranianos (pai ou mãe ou ambos) ou
imigrantes;
2. Ser bilíngüe (pelos menos os patriarcas);
3. A família deve estar enraizada na região onde se está realizando a coleta de
dados.
Para tanto, fez-se um trabalho com as pessoas que fizeram, e/ou que participaram
da história da comunidade, membros participativos da igreja e famílias descendentes de
ucranianos, ou seja, todos aqueles que foram mencionados na introdução.
A análise do material coletado deve ocorrer, de acordo com Erickson (1990), de
forma que “o corpus do material coletado no campo não constitui em si mesmo, dados mas
fontes para dados.” Para tanto, os materiais documentais podem construir dados através dos
meios formais de análise e de interpretação. Além disso, esse “processo de converter fontes
documentais em dados inicia-se com leituras múltiplas do conjunto inteiro de notas de
campo” (1990, p. 20).
CAPÍTULO 2
O CENÁRIO ÉTNICO RELIGIOSO DOS UCRANIANOS
Voz das raízes
Vozes de estranho som se alteiam em meu canto.
Vibram-se dentro d’alma almas que não são minhas.
Atrás de mim, vozeia e tumultua,
Anseia e chora, e ri, arqueja e estua
A imensa multidão dos ancestrais
Que me bate e rebate, inexorável,
Como o oceano em ressaca açoita o cais.
HELENA KOLODY4
A seguir apresentam-se alguns dados sobre a história da vinda dos imigrantes
ucranianos ao Paraná. História essa, em muitos momentos, apresentada na obra da poetisa
Helena Kolody, que tem como marca maior a sua descendência. Como o próprio título do
poema “A voz das raízes”, trata-se neste capítulo das origens da etnia ucraniana, bem
como sobre parte da sua história milenar, que até hoje provoca inúmeros sentimentos nos
seus descendentes. Essa volta ao passado da comunidade ucraniana nos auxilia na
compreensão de inúmeras atitudes perante a cultura, a língua e a constituição da identidade
ucraniana.
2.1 CONTEXTO BRASILEIRO
O período colonial de nosso país apresenta uma população brasileira composta
basicamente pela hibridização cultural de três raças: o índio, o negro e o branco
(português), sendo restrita a presença de outros grupos étnicos. Desse modo, conforme
4Poema de Helena Kolody. Luz infinita. Curitiba: Museu – Biblioteca Ucranianos em Curitiba da
União
Agrícola Instrutiva, Clube Ucraíno-Brasileiro, Organização Feminina (IVANCHICHEN, 2002, p.
26).
Simonsen (1978, p. 415 -416), a imigração no Brasil remonta ao Decreto de 25 de
novembro de 1808, o qual, com a abertura dos portos objetivava desencadear alterações
econômicas, sociais e políticas no país. A partir desse fato é que a imigração no Brasil foi
legalizada. Porém, nesta época ainda se estava no auge da escravidão, ou seja, era utilizada
a mão-de-obra escrava, o que dificultava a fixação de estrangeiros no país. Somente com o
declínio do regime escravocrata é que os imigrantes puderam se estabelecer. Desse modo,
conforme Cotrim (1995), a imigração no Brasil almejava trazer trabalhadores que
realizassem trabalhos na indústria, colaborando para o desenvolvimento do país, na mesma
medida em que substituía os escravos na agricultura.
2.2 ENSEJO PARA A IMIGRAÇÃO
Neste item apresentam-se alguns aspectos considerados relevantes acerca da
imigração ucraniana para o Brasil, com o intuito de detalhar com maior precisão aspectos
desta imigração para o Estado do Paraná e, sobretudo, para a cidade de Cascavel.
Faz-se uma breve explicação da etimologia do vocábulo UCRAÍNA5, que
conforme Wouk (1981), U-corresponde a junto de, e KRAI (n), a terra, país, região. Nesse
caso, o nome UCRAÍNA significa “a região, o país ou as terras de um Estado Político que
são o seu extremo e zona fronteiriça com outro Estado” (WOUK, 1981, p. 27). Ou seja, a
UCRAÍNA era uma região de limites com os territórios dos tártaros mongóis, moscovitas, o
quê, por assim ser, era palco de contínuas lutas entre russos, poloneses, tártaros e turcos.
Para o autor, a forma correta de chamar essa etnia, de acordo com a etimologia e a
5Para explicar a origem do vocábulo UCRAÍNA, Wouk (1981) escreve maiúsculo, porém após a
explicação o
autor passa a escrever em letra minúscula. No caso da nossa pesquisa optamos pelo vocábulo
ucraniano em
letra minúscula, pois, a maioria dos entrevistados, declaram ser ucranianos.
formação dessa palavra em português, é UCRAÍNO, em vez de UCRÂNIA e
UCRANIANO. No entanto, acredita-se que tanto ucraniano como ucraíno podem ser
utilizados sem nenhum problema, pois a própria etnia em muitos momentos se define como
ucraíno e, em outros como ucraniano.
Embora o território da Ucrânia tenha se alargado ou reduzido em diversas épocas,
“os ucranianos habitam hoje a mesma região da Europa, que os seus antepassados vinham
ocupando por mais de mil anos” (SIMPSON, 1953, p. 05). O país está localizado ao norte
do Mar Negro; os rios Dnipró e Dnister são limites geográficos importantes do território.
Há cerca de 40.000.000 de habitantes.
Mapa atual da Ucrânia6
Segundo Wouk (1981, p. 24) “as condições econômicas dos ucraínos em sua terra,
além da situação de insegurança na prática da religião e privação da liberdade política
obrigam-nos a se expatriarem.” Desse modo, a América era a salvação para pessoas que
viviam em situações feudais, em condições de submissão social e econômica. Para tanto, o
novo Mundo é reconhecido, de acordo com Andreazza (1999, p. 15) como o “Paraíso das
6Fonte:www.webbusca.com.br/Atlas/mapas/ucrânia. Consultado em 02/2007.
7
delícias”, ou seja, buscava-se, com o abandono da terra do seu berço, melhor qualidade de
vida.
A imigração ucraniana, conforme Horbatiuk (1989, p. 48) deu-se em três etapas,
ocasionadas por circunstâncias de vida daquele país. A primeira etapa, data dos fins do
século XIX, quando os lavradores de Galícia e Bucovina, sob o domínio da Áustria, com
problema de superpopulação, fraca industrialização e más condições econômicas,
procuraram outros países. Nesta fase, verificou-se a transferência em massa de camponeses
ucranianos para os Estados Unidos, Canadá, Argentina e Brasil. Nesses países, de acordo
com Wouk (1981, p. 48) “encontraram plena liberdade de religião e de associação, assim
como amplas possibilidades econômicas. Puderam iniciar vida nova, sem serem obrigados
a abandonarem os seus costumes e a sua língua”, o que pressupõe a conservação de traços
peculiares de uma cultura milenar.
A segunda etapa da imigração, segundo Horbatiuk (1989, p. 48), decorre da
Primeira Guerra Mundial quando, em 1923 foi reconhecida a soberania da Polônia sobre o
território da Ucrânia, após ter proclamado sua independência, entrevendo-se a possibilidade
de autodeterminação e de governo próprio.
A terceira fase, de acordo com Horbatiuk (1989, p. 48) ocorreu após a Segunda
Guerra Mundial, quando mais de 200 mil ucranianos se deslocaram para a zona ocidental
da Europa. Mas, muitos, devido ao tratado de Yalta, foram repatriados. Apenas em 1945,
quando foi abolida a cláusula da repatriação obrigatória dos refugiados, é que os ucranianos
conseguiram imigrar para a América.
Conforme SEEC8 (1989),
7Expressão utilizada por ANDREAZZA, M. L. Paraíso das Delícias: um estudo da imigração
ucraniana.
Curitiba: Aos Quatro Ventos, 1999, p. 16.
21
o maior êxodo dos ucranianos, deu-se, porém, após a Segunda Guerra
Mundial, (...) entre operários, prisioneiros de guerra, refugiados políticos,
soldados da primeira divisão ucraniana e de outras formações militares,
que lutaram contra os russos. Quanto aos operários, estes haviam sido
trazidos de várias províncias da Ucrânia pela administração alemã, para
trabalharem na Alemanha durante a guerra. Terminada esta, os
ucranianos tiveram que resistir ainda à forte opressão dos aliados
ocidentais que se comprometeram em Yalta a repatriar todos os cidadãos
soviéticos, porém nos fins de 1945, foi abolida a cláusula de repatriação
obrigatória. Sob a proteção da ONU que sustentou materialmente todos
os refugiados, conseguiram os ucranianos a sua imigração para o
continente americano (1989, p. 02).
Diante do exposto, é possível considerar que a imigração ucraniana, assim como
toda a história dessa etnia, é permeada por histórias de luta e resistência.
2.3 IMIGRAÇÃO NO PARANÁ
Há cem anos aproximadamente, chegavam os primeiros imigrantes rutenos9 ao
Brasil. Nos anos de 1876, 1884 e 1891 deu-se a chegada de algumas famílias e grupos
isolados de ucranianos, os quais se fixaram em sua maioria nos arredores de Curitiba.
A imigração em massa ocorreu no início do ano de 1895. Sendo que, em dois anos,
aproximadamente 15 mil pessoas vieram da Ucrânia Ocidental para povoar um Estado que
apresentava uma característica comum com a do seu lugar de origem: o clima. E fixaram-se
no planalto paranaense: Prudentópolis, Mallet, Dorizon, União da Vitória, Antônio Olinto e
Iracema (Santa Catarina).
Em 1908, ocorreu uma segunda etapa da colonização ucraniana, durante a
construção da Estrada de Ferro São Paulo -Rio Grande do Sul. Com a finalidade de atrair
8 SEEC – Secretaria de Estado e da Cultura. Curitiba, 1989.
9 Andreazza (1999) utiliza essa etimologia e explica que rutenos é uma designação regional e que
em sua
própria língua era chamado de rusyny. Sendo que ao final do século XIX, os rutenos galicianos e
bucovinos
passaram a favorecer a adoção de um novo nome nacional: ucranianos.
os interessados para essa grande obra, o governo brasileiro oferecia alguns incentivos (as
passagens de navio e as despesas com mantimentos) aos imigrantes. Para tanto, “a política
imigratória brasileira se insere nessa emergência e consolidação do capitalismo, uma vez
que os imigrantes ucranianos são chamados a criar uma agricultura de abastecimento e
fornecer trabalhadores para as grandes obras públicas” (BORUSZENKO, 1995, p. 06).
Muitos ucranianos imigravam por ter familiares estabelecidos na região. Assim
sendo, no período da Primeira Guerra Mundial já eram 45 mil. Na sua maioria, de acordo
com Wachowicz (1987, p. 115), pertenciam à religião ortodoxa, ou católica oriental.
Horbatiuk (1989, p. 31) afirma que, de 1871 a 1934, o Paraná recebeu 47.730
poloneses, 19.272 ucranianos, 13.319 alemães e 8.798 italianos. Além disso, o período de
1890 até o início da Primeira Guerra Mundial é conhecido como o período da “febre
brasileira10”.
Boruszenko, apud Horbatiuk (1989, p. 46), assegura que, em 1972, no Brasil havia
153.000 ucranianos residentes. Desses 130.000 viviam no Paraná, 14.000 em São Paulo,
5.000 em Santa Catarina, 3.000 no Rio Grande do Sul e 1.000 em outros Estados; sendo
10% estrangeiros nessa data.
Nas reflexões de Wouk,
imensas e ásperas foram as dificuldades com que depararam os primeiros
imigrantes. Sem assistência efetiva dos poderes públicos, desconhecendo
a língua do país, sem meios de transporte, sem estradas, sem ferramentas,
desprovidos de recurso, desbravaram regiões incultas, arrotearam terras e
fundaram cidades. Não podiam sequer pedir o apoio de seus cônsules e
embaixadores, pois tinham – filhos de uma grande nação, mas sem
governo próprio (1981, p. 25).
Faz-se relevante salientar que mediante inúmeras dificuldades, a mulher ucraniana
teve um papel importante nessa sociedade, pois não era apenas o homem que desenvolvia
10Período que antecede a Primeira Guerra Mundial, caracterizado por maior afluxo de imigrantes
para o
Brasil.
as atividades agrícolas, a mulher também colaborava nesse trabalho. E, além disso, atuava
na família no sentido de constituir e firmar a organização familiar herdada dos imigrantes.
Conforme Zaroski,
Ressalta-se a importância da mulher camponesa, que além de ajudar os
seus parceiros nas atividades gerais, ainda lhes era atribuído todos os
afazeres domésticos, do coser ao cozinhar, do fabrico do sabão ao tear.
Cabia também à mulher a ordenha das vacas, o feitio de queijos, de
requeijão, de manteiga e o trabalho nos quintais onde se produziam as
hortaliças. E, além disso, tinham como tarefa a confecção e o conserto de
roupas, bem como os trabalhos de bordados nos enxovais de cama e mesa
e nas roupas para as festividades (2001, p. 42).
Na comunidade Ucraniana de Cascavel, é possível verificar o papel que a mulher
assumiu em tempos difíceis, no início quando se enraizaram no município, como é exposto
na fala da entrevistada,
e eles veio vê, deixou eu sozinha e veio vê. Não tinha asfalto, não tinha
nada, só mato. Fiquei sozinha lá (Moema-SC) quatro meses e ele veio
fez roça e tudo, mas chegou lá e eu já tinha tinha feito roça tava grávida
com meu filho, Romão, e quando ele chegou eu não esperei ele eu fiz
roça, mas eu não roçava porque era muito difícil, meu Deus a gente
sofreu. (A.K. 02/2007, Grifos nossos).
A presença feminina é marcante na cultura ucraniana, e também o foi no contexto
paranaense de imigração. Há um enfrentamento dos problemas por parte da mulher, mesmo
que o esposo não esteja presente. Desse modo, se não há quem possa prover seu sustento e
dos filhos, ela mesma busca meios para que as dificuldades possam ser sanadas.
O Estado do Paraná, através das imigrações, tornou-se um cenário de várias
culturas. De acordo com Martins (1955), o Paraná é
o espetáculo da diversidade, da complexidade, o que o Paraná nos
oferece: não tem sentido, diante da realidade, falar em predomínio de
uma ou outra etnia, a não ser em pequenas regiões, nitidamente limitadas.
O Dr. Jayme Dormund dos Reis, ao estudar as ‘principais endemias e
epidemias de Curitiba’, aqui encontrou ‘brasileiros de todos os Estados,
europeus de todas as nacionalidades, asiáticos, africanos, americanos e
filhos da Oceania. Predominam, porém, o italiano, o alemão e o polaco’
(MARTINS, 1955, p. 143).
Atualmente, de acordo com o pasquim Observatório da Universidade Paranaense -
Unipar (set. 2005, p. 02), no Brasil há cerca de 500 mil ucranianos e descendentes, dos
quais, 90% vivem no Paraná. Sua maior concentração é em Prudentópolis.
2.4 UCRANIANOS EM CASCAVEL
Distante 514 Km da capital do Estado, Curitiba, Cascavel é uma cidade situada no
Terceiro Planalto do Estado, no extremo Oeste Paranaense, com uma altitude média de
800m e uma área de 2.100,11 Km, povoada, de acordo com o CENSO de 2000, por
245.369 habitantes.
Mapa do Município de Cascavel situado no Oeste do Estado do Paraná.11
O município de Cascavel, ao norte, faz fronteira com Tupãssi, Cafelândia, Corbélia
e Braganey; ao sul, com Boa Vista da Aparecida e Três Barras do Paraná; ao leste, com
11 Fonte: Revista Microrregião Oeste, 2001, p. 07.
Campo Bonito e Catanduvas; e, a oeste, com Toledo, Lindoeste e Santa Tereza do Oeste.
Em 20 de outubro de 1938, Cascavel tornou-se Distrito Administrativo de Foz do
Iguaçu através do Decreto-Lei n.7573. E, em 14 de novembro de 1951 foi decretada a
emancipação política do município.
Mapa de Cascavel e municípios vizinhos 12
Conforme Beltrame e Nath (2001, p. 28), a colonização de Cascavel está ligada ao
deslocamento de tropeiros caboclos, que ocorreu entre os anos de 1920 e 1930, quando já
existia, na estrada que ligava Foz do Iguaçu a Guarapuava, um razoável movimento de
carroças e de cargueiros das companhias de exploração de erva-mate. Então,
a partir de 1940, gaúchos e catarinenses, sobretudo os primeiros, vindos
do sul, penetram e se instalam na nossa região: o oeste paranaense. É a
‘frente sulista’.(...) Desta forma, podemos afirmar que o Oeste é sem
dúvida a região síntese do Paraná, isto é, foi aqui que se encontraram
migrantes das mais diversas regiões, não só paranaenses, mas de todo
território nacional (WACHOWICZ, 1982, apud CALLAI, 1983, p. 140).
De acordo com Wachowicz, a colonização no Oeste do Paraná foi
acompanhada pelas idéias de ocupação e de exploração da terra, que marcaram a
12 Fonte: www. cascavel.pr.gov.br/ mapasregiaooeste
colonização do estado do Rio Grande do Sul. Segundo o autor, o objetivo não era promover
a colonização, e sim explorar a riqueza existente:
nos primeiros anos da chegada dos homens da Maripá, o objetivo não era
promover a colonização e sim explorar a grande riqueza deixada em parte
pelos ingleses: a madeira. De 1946 a 1949, a Maripá teve por
preocupação básica a sua exploração. Adotou a política de tirar. Antes de
vender a terra ao colono era preciso retirar a madeira, riqueza que estava
na superfície. Para desencanto dos diretores da Maripá, constatou-se que,
de matas de pinhais (araucárias), só existiam manchas na região de
Toledo (...) vender a madeira existente no mercado brasileiro, era
impraticável (WACHOWICZ, 1987, p. 171).
Essa exploração é marcada, segundo Wachowicz, pelo incentivo dado pelos
diretores, acionistas da Maripá, que por serem “filhos e netos de imigrantes localizados no
Rio Grande do Sul” e, ainda, “capitalistas, negociantes e velhos conhecidos, inclusive no
serviço de colonização”, com muitas promessas, desencadearam a marcha para o Oeste.
Desse modo, a região Oeste foi colonizada “por colonos oriundos do excesso de mão-deobra
agrícola, detectado nas antigas colônias do Rio Grande do Sul” (WACHOWICZ,
1987, p. 167).
Além disso, a colonização da região Oeste é concretizada com a política Marcha
para o Oeste que, conforme Mezzomo,
é resultado da política varguista elaborada principalmente durante o
Estado Novo, preocupada em ocupar de fato a fronteira oeste criando o
imaginário da Nação em movimento e que, portanto, o sentido da
brasilidade consistia em ocupar geográfica e economicamente toda costa
oeste do Brasil na qual permanecia inerte (2002, p. 24).
Há que se ressaltar que a maioria dos livros que tratam da história do Oeste
paranaense, e mais objetivamente da colonização de Cascavel, em sua maioria, não citam a
chegada dos ucranianos a essa região. Apenas há o registro da vinda dos imigrantes
poloneses,
ainda na década de 1930, alguns colonos de Santa Catarina, descendentes
de imigrantes poloneses, que tinham pouca terra em suas regiões de
origem, vieram para Cascavel e ocuparam terra do Estado, formando as
chamadas colônias. Assim surgiram a Colônia Esperança e a Colônia São
João. Diversos desses poloneses se instalaram em pequenas chácaras
onde atualmente é a cidade de Cascavel. Eram ferreiros, carpinteiros,
marceneiros, seleiros, etc. (PALUDO & BARROS, 1993, p. 27).
Apenas Sperança, ao tratar sobre a imigração polonesa, cita a etnia ucraniana como
exemplo:
a imigração polonesa ao Paraná e Santa Catarina também se foi
desenvolver com maior fluência a partir de 1920. Os poloneses traziam
algum dinheiro, vinham por decisão própria e se dispunham a plantar
cereais principalmente o milho, e criar suínos. Sem qualquer auxílio ou
conhecimento do governo, acabaram, como outros eslavos – caso dos
ucranianos -impondo seu trabalho e seus costumes pelo interior da
região Oeste (1992, p. 78).
Em Beltrame e Nath (2001, p. 40), há a divulgação do grupo folclórico ucraniano
Sonhachneck, como uma marca dessa etnia no município de Cascavel.
Acredita-se que isso ocorra devido ao fato de que, tanto ucranianos, como poloneses
e russos, são de origem eslava. Por isso, pode não haver um discernimento, uma
diferenciação entre essas etnias, podendo assim, serem confundidas. Além disso, há que se
considerar que a colonização do povo polonês foi mais expressiva e numerosa que a
ucraniana.
Horbatiuk (1989, p.87) aponta esse aspecto quando afirma que o Brasil recebeu um
total de 5.072.489 imigrantes, no período de 1884 a 1973, nos quais estão inclusos os
ucranianos, denominados pelos brasileiros, também de russos, poloneses ou austríacos, pois
não houve uma preocupação por parte dos historiadores e dos documentos de distinguir as
etnias, principalmente no que se refere a poloneses e a ucranianos.
Ainda é possível se pautar em Portal (1968, p. 09), que salienta que, apesar da
origem comum e da analogia das línguas, os povos eslavos têm entre si mais diferenças que
semelhanças.
Conforme dados publicados no pasquim Observatório da Universidade Paranaense
(UNIPAR), Cascavel apresenta uma colônia ucraniana representativa.
Conforme Litvin (1998), o ano de 1945 é marcado pela chegada da família Kachuba
que, vinda de Santa Catarina, “buscavam construir vida nova.” Primeiramente se estabelece
na localidade de Centralito, “onde permaneceram até pouco tempo.” Depois desta, outras
famílias, oriundas de outras localidades, chegaram. Como afirma o pesquisador, “é o caso
da família Hotz, que chega por volta de 1949. Proveniente de Prudentópolis, PR. Já a
família do Sr. Nicolau Gilnek, também proveniente de Prudentópolis, se estabelece em
Cascavel em 1962” (LITVIN, 1998, p. 21).
Constata-se que a imigração ucraniana na região Oeste não ocorreu em um mesmo
período, e nem as famílias eram provenientes da mesma região de origem. Esse fato sugere,
de acordo com Litvin, uma “migração dispersa”, pois
diversos são os motivos que fizeram com que se deslocassem das mais
diversas localidades para o Oeste paranaense. Segundo Basílio Hotz as
terras daqui eram na maioria devolutas e na época do Governador Lupion
havia incentivos por parte do mesmo em povoar e colonizar estas terras
(LITVIN, 1998, p. 22).
Outro fator marcante na imigração ucraniana a Cascavel é o fato de que as primeiras
famílias, quando chegaram, sentiram-se sem o mundo religioso, ou seja, esse fazia parte
apenas da sua lembrança. Por isso, tornou-se indispensável trazer a tradição religiosa para o
novo local. Para tanto,
começa-se, então, um duplo empreendimento, a busca de um local
apropriado para a construção da Igreja e as negociações com os padres,
irmãs para a vinda destes para a região. Segundo Basílio Hotz, foi difícil
conseguir um terreno para construir a Igreja e o colégio das Irmãs. Além
do mais, segundo ele, a burocracia no setor público emperrava. Ele
mesmo foi várias vezes a Curitiba para conseguir o terreno. Depois de
muito vai-e-vem conseguiram o terreno: é o local do Colégio Sagrada
Família. O terreno onde se localiza a Igreja foi comprado pelo próprio
Basílio e depois barganhado com os padres. Essa troca é confirmada pelo
Sr. Nicolau Gilnek (LITVIN, 1998, p. 24).
É comprovado, então, o forte desejo por parte dos ucranianos em trazer a tradição
religiosa ucraniana para Cascavel, pois essa traz consigo um mundo sobre a crença
religiosa, que transmite segurança e tranqüilidade aos descendentes de ucranianos.
Não é possível, de acordo com o Padre da paróquia, Mario Carlos Lazoski, verificar
a quantidade de famílias descendentes de ucranianos que chegaram a Cascavel na época do
enraizamento desse grupo étnico. Atualmente há, aproximadamente, 250 famílias
participantes na paróquia. Dessas, 150 moram em Cascavel, e as demais nas colônias
pertencentes a outros cinco municípios: Comunidade de Ouro Preto (Toledo); Iza Cuê
(Cafelândia); Linha Mamona (Céu Azul); Rio das Antas (Braganey); Comunidade São José
(Corbélia); Sapucaia, Linha Skanagatta, Centralito (Cascavel) e Foz do Iguaçu (no
momento está sendo organizada). Além disso, conforme o Padre da paróquia, é difícil
verificar a quantidade de famílias cujos descendentes são fundamentalmente ucranianos,
pois já há uma hibridização cultural/étnica, ou seja, há muitos casamentos interétnicos entre
os descendentes ucranianos.
2.5 O CENÁRIO SOCIAL: IGREJA, ASSOCIAÇÃO CULTURAL E ESCOLA
Tratar-se-á sobre a história da Igreja Católica Ucraniana, e esboçar-se-á um
panorama da igreja na atualidade, bem como, da comunidade que a circunda. A partir desse
enfoque, pode-se verificar que a Igreja Católica Ucraniana tem uma organização, uma
prática cultural e religiosa que é peculiar, ou seja, apresentam idiossincrasias, que não se
encontram em outro meio cultural e religioso; e que por assim ser, consolidam a
manutenção, o resgate histórico-cultural e lingüístico.
2.5.1 A história da Igreja
Nesta subseção, expor-se-á fatos que enriqueceram a história da Igreja Católica
Ucraniana. Desse modo, narra-se alguns aspectos de uma história milenar que contribui
para o entendimento do que seja a Igreja Católica Ucraniana, na atualidade, na mesma
medida em que auxilia na compreensão de uma identidade étnica e cultural.
De acordo com Burko (1963), “o povo ucraniano, além de certas virtudes inatas,
como por exemplo, a lealdade, o amor à terra e ao trabalho”, caracteriza-se por ser
profundamente religioso, ou seja, há um sentimento arraigado, que o prende à sua religião
tradicional.
seu majestoso rito oriental, tão benquisto pela Igreja Católica como o rito
latino, foi transplantado pelos fiéis em toda a parte para onde imigraram,
e foi conservado intacto, com todas as suas pompas e particularidades,
vivo em cada um dos seus ofícios litúrgicos (BURKO, 1963, p. 59).
Há que se ressaltar que, conforme relatos atuais, o rito, embora, permaneça com
suas características principais intactas, já sofreu algumas mudanças. Como exemplo, pode-
se citar o tempo de uma missa pois, antigamente, era celebrada em três horas, e atualmente,
celebra-se em uma hora.
De acordo com Padre Mário, no início da Cristandade, a Igreja Católica era única,
ou conforme definição bíblica, era “una, santa, católica e apostólica”. No século IV, ela foi
dividida em cinco patriarcados: Roma, Constantinopla, Antioquia e Alexandria, e depois
Jerusalém. Desse modo, cada igreja local ou patriarcado tinha como chefe um patriarca,
segundo o rito particular. O rito, por sua vez, dependia da língua litúrgica, porém a Igreja de
Cristo continuava única, sendo que o Papa estava em Roma, a capital do Império Romano.
Porém, ainda no século IV, o Império foi dividido, em Império Romano Ocidental,
cuja capital continuou a ser Roma, e o Império Romano Oriental, com sua capital em
Constantinopla. Após a queda do Império Ocidental, surgiu um conflito entre a Igreja de
Roma, representada pelo Papa, e a Igreja de Constantinopla, representada pelo Patriarca.
Caracterizado, basicamente, por questões sociais e políticas.
O conflito traz por resultado o cisma de 1054, quando a Igreja de Cristo foi dividida
em Igreja Ocidental, sob a autoridade do Papa, com sede em Roma, tendo o rito romano (ou
latino), hoje conhecida como a Igreja Católica Apostólica Romana, e a Igreja Católica
Apostólica Oriental, de Bizâncio, sob a autoridade do Patriarca Ecumênico, com sede em
Constantinopla e rito grego, hoje chamada, Igreja Ortodoxa,
desde então, a Igreja de Roma se atribuiu a palavra ‘católica’, que quer
dizer ‘universal’ e a Igreja de Bizâncio passou a se auto-determinar com
a palavra ‘ortodoxa’, que quer dizer ‘autêntica’. Por isso, os católicos são
cristãos que estão ligados ao Papa e o admitem como chefe da igreja
universal. Os ortodoxos, por sua vez, são os cristãos que não são ligados
ao Papa e admitem que ele seja apenas chefe de precedência
(OBSERVATÓRIO, set. 2005, p. 04).
Os católicos e ortodoxos praticam os mesmos sacramentos, diferenciando-se,
apenas, no fato de que os ortodoxos não estão ligados ao Papa. Por isso, católicos não têm o
direito de se chamarem ortodoxos, e esses não podem se dizer católicos.
De acordo com Eliade (1979),
a religiosidade romana distingue-se pelo Pragmatismo, pela busca de
eficácia e, sobretudo, pela “sacralização” dos grupos organizados: família
e pátria. A disciplina da religiosidade romana tem a ver com a fidelidade
aos compromissos a dedicação ao Estado, o prestígio religioso do
32
Direito, traduzem-se pela depreciação da pessoa humana: o indivíduo
contava tão somente na medida em que pertencia ao grupo. Só mais
tarde, sob a influência da filosofia grega e dos cultos orientais da
salvação, é que os romanos descobriram a importância religiosa da
pessoa (1979, p. 132).
Levando-se em consideração as colocações de Eliade (1979), verifica-se que os ritos
orientais e, entre eles, o Rito Bizantino Ucraniano, valorizam o ser humano e, não apenas o
grupo religioso.
Conforme Wouk (1981, p. 36), no século X, “um dos maiores príncipes de Kêyv,
Volodomyr Magno, promoveu o batismo em massa dos seus súditos e oficializou a religião
cristã em seu reino.” Durante vários séculos, ou seja, até o ano de 1595, a Igreja Ucraniana
seguiu a orientação dos Patriarcas de Constantinopla. Porém, “naquele ano, os bispos
ucraínos, reunidos em um sínodo na cidade de Brest-Litovski, proclamaram a sua união
com a Sé de Roma” (WOUK, 1981, p. 36). Todavia, segundo Wouk (1981), somente a parte
ocidental da Ucrânia (Galícia) permaneceu fiel a essa união. A região oriental, a Ucrânia
propriamente dita, devido à situação política de submissão à Rússia, viu-se obrigada a
depender da Igreja Ortodoxa Russa.
De acordo com Burko (1963), a Igreja Ucraniana sofreu muito com perseguições.
No curso de um século (1772-1872), o catolicismo ucraniano foi quase aniquilado pelo
regime moscovita:
o Livro Branco sobre a perseguição religiosa na Ucrânia, fornece-nos os
traços da fúria bolchevista que liquidou os 2.950 sacerdotes seculares e
580 religiosas existentes em 1939, aprisionando-os ou obrigando-os a
refugiarem-se, ou aderirem ao cisma. 195 casas religiosas foram
confiscadas, fechadas ou ocupadas pelos cismáticos russos, tendo sido
dispersas as freiras e religiosas. 3.040 paróquias foram ocupadas ou
simplesmente canceladas, com o conseqüente fechamento de 4.400
igrejas e capelas. 9.900 escolas primárias católicas, 380 secundárias e 56
superiores transformaram-se em centros de doutrinamento marxista-ateu
(BURKO, 1963, p. 34).
Portanto, diante de tantas perseguições religiosas, o povo ucraniano católico sentiu
necessidade de sair de sua terra, e de manifestar a sua religiosidade em outros países menos
radicais, entre eles, o Brasil. Neste pôde instalar a Igreja Greco-Católica Ucraniana.
Em Cascavel, uma das maiores representações étnica/religiosa da cultura ucraniana
está no bairro São Cristóvão. É a Igreja Nossa Senhora Perpétuo Socorro, construída há
cerca de 40 anos, sendo que o monumento original foi inaugurado em janeiro de 1969.
Antiga igreja – construída em 1969 13
De acordo com entrevistas, a imigração ucraniana em Cascavel ocorreu muito antes
da construção da Igreja, na década de quarenta e, nesse período até a construção da igreja,
as famílias primeiramente se reuniam e rezavam nas residências de um dos membros da
religião. Após, “o aumento da comunidade as missas eram celebradas na capela das irmãs
de rito latino no Cascavel Velho” (LITVIN, 1998, p. 33). E, em 1966, foi celebrada a
Primeira Missa na capela das irmãs servas de Maria Imaculada. Assim sendo, “Os padres
basilianos14 atendiam espiritualmente a comunidade, vindos de Campo Mourão” (LITVIN,
13 Fonte: UNIPAR. Ucrânia. Observatório. Unipar: Setembro de 2005, ano 4, nº 26.
14 Os padres basilianos pertencem a ordem de São Basílio Magno que é o seu fundador na Ucrânia.
A maioria
dos padres da Ucrânia pertence a essa ordem.
op.cit., p. 33).
Porém, é interessante lembrar que, de acordo com Litvin (1998, p. 26), a
comunidade ucraniana de Cascavel teve seu início no Centralito, localidade a uns dez Km
de Cascavel, situada à margem da BR-277. Foi ali que rezaram a Primeira Missa, e que
também realizaram as missões de 1963.
Missões em Centralito-1963.15
Em 2004, foi inaugurada uma nova igreja, mais moderna. Tal construção foi alvo de
inúmeras críticas por parte dos historiadores, pois a demolição da antiga igreja era
15Implantação do Cruzeiro diante da capela Divino Espírito Santo com um apelo espiritual em
ucraniano
“space avoiu duchu” (Salva tua alma). (Coleção particular da família Kachuba, In: Litvin, 1998, p.
29)
condenada, devido ao fato de “que consideravam a estrutura um marco histórico importante
da cidade” (OBSERVATÓRIO, set. de 2005, p. 04). Porém, como a estrutura estava
deteriorada e apresentava riscos de desabar, colocando a vida dos fiéis em risco e, por
vontade da própria comunidade de ucranianos, o novo templo foi construído, preservando-
se todas as características e símbolos da Religião Católica Ucraniana em Cascavel.
Igreja moderna -construída em 200416
2.5.2 A igreja e o rito
O rito consiste em prescrever maneiras de agir diante de determinada situação, ou
seja, o rito nos “ensina” como se deve comportar nas cerimônias, sejam elas religiosas ou
não. Para Durkheim, os fenômenos religiosos estão divididos em duas categorias:
as crenças e os ritos. As primeiras são estados da opinião, consistem em
representações; os segundos são modos de ação determinados. Entre
esses dois tipos de fatos há exatamente a diferença que separa o
pensamento do movimento (1996, p. 19).
As crenças podem ser entendidas como representações do sagrado, e os ritos como
regras de procedimento que comandam o tipo de comportamento que o homem deve
realizar diante do sagrado:
16Fonte: UNIPAR. Ucrânia. Observatório. Unipar: Setembro de 2005, ano 4, nº 26.
as crenças religiosas são representações que exprimem a natureza das
coisas sagradas e as relações que elas mantêm, seja entre si, seja com as
coisas profanas. Enfim, os ritos são regras de conduta que prescrevem
como o homem deve comportar-se com as coisas sagradas.(...) o conjunto
das crenças e dos ritos correspondentes constitui uma religião
(DURKHEIM, 1996, p. 24).
Os ritos podem ser caracterizados, conforme Durkheim (1996), como uma
“tradução exterior, contingente e material” dos “estados interiores”, da essência, que na
verdade “seriam os únicos a ter valor.” Por assim ser, o rito é algo de muito valor na cultura
ucraniana, ou seja, além da língua, e de todo o imaginário simbólico construído pelos
descendentes, aquilo que mais os diferencia é o majestoso rito oriental que trouxeram
arraigado à religiosidade. Esse rito é muito apreciado pela Igreja Católica. A aceitação se
deve ao fato de que a variedade de ritos seguidos pelos fiéis, tanto no Brasil, como em
qualquer outra parte do mundo, em nada prejudica as características essenciais da Igreja
Católica: una, santa, católica e apostólica. Isto é, a heterogeneidade de ritos é derivada de
pensamentos, de mentalidades e de culturas humanas, o que para a Igreja Católica é algo
benéfico. Por isso, há diversas liturgias latinas e outras tantas orientais.
Burko (1963) afirma que quase todos os ritos orientais estão representados no
Brasil, da mesma forma que são praticados pelos fiéis imigrantes e seus descendentes.
Assim, têm-se o russo, o maronita, o romeno, o sírio, o armênio, o melquita e o ucraniano.
Além disso, o Papa Pio XII, no ano de 1952, criou no Brasil, para todos os católicos dos
ritos acima mencionados, o Ordinariato dos Ritos Orientais, nomeando como titular Sua
Eminência o Cardeal D. Jaime de Barros Câmara, Arcebispo do Rio de Janeiro. Em 1958,
foi criado o primeiro bispado para os católicos do rito ucraniano no Brasil, cuja sede
episcopal é Curitiba, capital do Paraná.
Com o desenvolvimento das diversas nações eslavas, o rito bizantino foi tomando as
características de cada nação. O Rito Bizantino Ucraniano, por sua vez, sempre permaneceu
fiel à Sé Apostólica de Roma, apesar de entre os ucranianos se ter também introduzido o
cisma bizantino.
Em 1596, no Sínodo de Berest, a maior parte da Igreja Ucraniana confirmou e selou
a sua fidelidade ao Papa de Roma, permanecendo católica. Até o Concílio Vaticano II, a
língua litúrgica no rito ucraniano era o paleoslavo, a antiga língua de Kiev; após o Concílio,
passou a ser a língua ucraniana.
No Brasil, o rito é celebrado em língua portuguesa naqueles locais onde as
circunstâncias o exigem, o que necessita da autorização expressa do bispo-eparca. Esse ato
torna a liturgia inteligível para os católicos do rito ucraniano, tanto para os que não
conhecem bem o português, quanto para os que não conhecem bem o ucraniano.
Conforme o Eparca Krevey, “não é na língua que está a importância de um rito, mas
no entendimento da palavra de Deus e da Oração Litúrgica que ele propicie a seus fiéis”
(1988, p. 07).
A liturgia bizantina, segundo Boruszenko,
da qual a ucraniana é um ramo, tem origem na de Jerusalém, de São
Tiago, reformada por São Basílio Magno e abreviada por São João
Crisostomo, no século IV. Foi logo aprovada pela Igreja, sendo seguida
até hoje por grande número de cristãos do Oriente e pelos fiéis do rito
ucraniano, o qual é todo celebrado em língua ucraniana (1981, p. 16).
Na Paróquia ucraniana de Cascavel, as missas são celebradas em língua ucraniana
todos os dias, com exceção de quarta-feira e domingo à noite, que é em português. O
motivo de se rezar dois dias na semana em português é porque, na comunidade, há
participantes e/ou membros da igreja que falam somente a língua portuguesa.
A opção por diversificar a língua do rito, de acordo com Litvin (1998), está
relacionada às mudanças culturais, ao esquecimento gradativo da língua entre os
descendentes de ucraniano, e também aos casamentos interétnicos, dentre outros fatores.
No entanto, essa “mudança traz consigo por um lado uma maior participação dos fiéis, por
outro a perda da riqueza do rito” (LITVIN, 1998. p. 46).
De acordo com o Boletim Informativo da Casa Romário Martins,
recentemente, a liturgia foi traduzida para o português com a permissão
do Eparca, e algumas missas são celebradas neste idioma em diversas
paróquias, para melhor participação dos fiéis que desconhecem o
ucraniano. Não obstante a praticidade da medida, inegável é o fato de que
o rito perde uma de suas mais importantes particularidades
(BORUSZENKO, 1995, p. 29)
Observa-se, segundo Litvin (1998), que há a preocupação por parte das “autoridades
eclesiais de adaptar-se as novas situações culturais”, a fim de conservar o patrimônio
religioso, mas que há também “um certo abismo entre as gerações” (1998, p. 48). Por isso,
conforme Hanicz
alguns costumes e crenças estão perdendo sua força, abrindo um abismo
entre as gerações. Outros, porém, estão sendo incorporados ao capital
religioso do grupo e de certa forma “preenchem” esse abismo. No fundo,
o que vem ocorrendo é uma enorme integração de costumes e culturas,
mas nem por isso o tradicional perde seu poder simbólico (1996, p. 123).
A igreja distribui um periódico cujo registro é em português. O motivo para a
escolha da língua portuguesa condiz com a necessidade de que todos os membros da igreja
precisam compreender o que está sendo divulgado, o que não aconteceria, de acordo com o
Pároco, se fosse na língua ucraniana. No entanto, a igreja dispõe aos fiéis assinaturas de
revistas, jornais, periódicos e calendários que possuem o registro nas duas línguas. Entre
eles, há o Jornal ####.
(Prácia), que data de 1912, e o periódico ##########.
#######.
(Missionário Ucraniano no Brasil). Esses materiais são produzidos em Prudentópolis e em
Curitiba, pois nesses lugares a influência da cultura ucraniana é bem maior que em
Cascavel. As famílias mais tradicionais os assinam para manter o vínculo com a língua e
com a cultura.
Convém lembrar que esses documentos trazem a marca da religiosidade, pois os
mesmos são produzidos e editados pela Igreja Católica Ucraniana.
Embora a maioria das celebrações seja rezada na língua ucraniana, a leitura da
bíblia, a homilia (sermão) e os avisos finais dessas celebrações são realizados pelo padre
em língua portuguesa. Ao ser questionado sobre o motivo pelo qual se opta pela língua
majoritária, o mesmo responde que “se faz em português para que a comunidade entenda o
que está sendo falado, principalmente os mais jovens e aqueles que não conhecem a língua
como as pessoas de outras etnias, porque nem todos que participam são ucranianos, nós
temos simpatizantes” (Padre M. L., 11/2006). Desse modo, pode-se afirmar que é
tradicional celebrar a missa na língua do rito, porém não há entendimento por todos os
membros da igreja o quê, de algum modo, obriga a igreja a utilizar a língua portuguesa em
alguns momentos, para que ocorra a interação de todos os participantes. Essa característica
é marcante na comunidade, pois quando há visitantes que falam apenas a língua ucraniana,
como ocorreu no início de 2007, quando a Igreja Católica Ucraniana realizou o Sínodo no
Brasil, e receberam a visita dos bispos representantes do Brasil, do Canadá, da Polônia e
dos Estados Unidos. Com exceção do Bispo do Brasil, os demais bispos não falavam a
língua portuguesa. A homilia foi proferida pelo bispo da Polônia que, ao perceber que a
comunidade não o estava compreendendo, pediu auxílio para que alguém fosse intérprete,
quando então uma das Irmãs presentes à missa se prontificou para sê-lo.
Conforme Wouk (1981, p. 38), a comunidade ucraniana no Brasil celebra as grandes
festas da cristandade com a pompa e o colorido característicos dos ritos orientais. As duas
celebrações máximas do ano, assim como para a Igreja Latina, são as do Natal e da Páscoa.
A Páscoa é vista de maneira mais especial pela comunidade ucraniana no país.
Ressalta-se que uma das diferenças existentes entre a Igreja Latina e a Igreja Grega
está no oferecimento do sacramento da crisma junto com o batismo, ou seja, as crianças são
batizadas e crismadas no mesmo momento, pois a Igreja, de acordo com o Padre Mário,
deposita confiança nos pais de que darão continuidade à vida cristã, confirmando a fé
quando os filhos ainda são pequenos. As crianças se preparam para a primeira comunhão,
que segue as mesmas linhas da igreja católica tradicional, porém a essa preparação são
adicionados a língua e os cantos em ucraniano.
O ritual religioso aparece como instrumento importante no processo de sustentação
do imaginário religioso ucraniano, pois as verdades religiosas, ao serem construídas e (re)
construídas no ritual, são vivenciadas no imaginário dos indivíduos, o que as torna
realidades inquestionáveis. Desse modo, “tanto os atos religiosos como as legitimações
religiosas, rituais, e mitológicas (...) servem juntas para relembrar os significados
tradicionais encarnados na cultura e nas instituições mais importantes” (BERGER, 1985, p.
53).
Na perspectiva de Durkheim, em todas as crenças há vários ritos que representam o
que há de eterno e de humano na religião:
na base de todos os sistemas de crenças e de todos os cultos, deve
necessariamente haver um certo número de representações fundamentais
e de atitudes rituais que, apesar da diversidade de formas que tanto umas
como outras puderam revestir, têm sempre a mesma significação objetiva
e desempenham por toda parte as mesmas funções. São esses elementos
permanentes que constituem o que há de eterno e de humano na religião;
eles são o conteúdo da idéia que se exprime quando se fala da religião em
geral (1996, p. X, Introdução).
Por assim se caracterizar, a religião expressa aquilo que há de humano e eterno em
si mesma, ou seja, sua significação é originada a partir daquilo que o homem busca no seu
âmago. Desse modo, embora haja uma diversidade de religiões e ritos, que deixam
transparecer muitas diferenças, essas desempenham as mesmas funções, ou seja, não
distinções entre elas. O que as diferencia são os ritos, que na verdade, são formas de
satisfazer o homem naquilo que o angustia. Em contrapartida, a igreja, através dos ritos,
reveste-se de poder e de autoridade, conferindo a si e aos indivíduos o espaço social que
condiz a cada um de acordo com a situação social.
Portanto, conforme Geertz (1989),
é no ritual – isto é, no comportamento consagrado – que se origina, de
alguma forma, essa convicção de que as concepções religiosas são
verídicas e de que as diretivas religiosas são corretas. É em alguma
espécie de forma cerimonial – ainda que essa forma nada mais seja que a
recitação de um mito, a consulta a um oráculo ou a decoração de um
túmulo – que as disposições e motivações induzidas pelos símbolos
sagrados nos homens e as concepções gerais da ordem da existência que
eles formulam para os homens se encontram e se reforçam umas às
outras. Num ritual, o mundo vivido e o mundo imaginado fundem-se sob
a mediação de um único conjunto de formas simbólicas, tornando-se um
mundo único e produzindo aquela transformação idiossincrática
(GEERTZ, 1989, p.82).
Assim sendo, segundo o autor as convicções religiosas por meio dos rituais surgem
no plano humano, modelando, “naturalmente”, a consciência espiritual de um povo.
2.5.3 Associação cultural
Como foi anteriormente elucidado, as manifestações culturais do povo ucraniano
estão intrinsecamente ligadas à religião. Preservar a cultura étnico/religiosa está
relacionado à preservação e ao resgate religioso e cultural. Por isso é tão importante para a
comunidade ucraniana manter a língua, pois esta é e está ligada ao patrimônio cultural
desse povo. Para tanto, a comunidade ucraniana de Cascavel criou alguns mecanismos que
contribuem para a manutenção e para o resgate cultural e lingüístico.
Entre os mecanismos de manutenção há a AUVEL (Associação Ucraniana de
Cascavel) que é uma entidade oficial sem fins lucrativos. Com mais de dez anos de
existência, objetiva valorizar e cultivar as tradições ucranianas. Para os descendentes, a
criação da associação foi uma das formas mais eficazes de se preservar uma parte da
origem dos imigrantes. O principal objetivo desse órgão é propagar a cultura de origem,
para que a mesma não se perca. Para tanto, a AUVEL oferece à comunidade vários cursos,
com a finalidade de aproximar os participantes, de costumes e hábitos do país de origem.
Entre eles estão a língua, a dança e a culinária.
O curso de língua é ministrado pelas irmãs da Escola Sagrada Família. Essas aulas
são disponibilizadas às crianças e aos adolescentes que estão na idade de freqüentar a
catequese. Desse modo, para realizar a primeira comunhão, a criança ou adolescente
precisa ter freqüentado o curso. Nesse, por sua vez, se ensina não somente a língua, como
todas as práticas relacionadas à cultura e à religião. Assim sendo, “os alunos” aprendem o
rito ucraniano, os hinos, o folclore como meio de manutenção da cultura.
A comunidade, assim como a AUVEL, também tem um grupo folclórico ucraniano
chamado Sonhachneck. Essa palavra em português quer dizer girassol. Não se encontra
nenhuma literatura que apresente o valor do girassol para o povo ucraniano. Sabe-se que a
flor símbolo da Ucrânia é a Barvinok (papoula), pela sua resistência, pois a mesma, na pior
adversidade climática, soterrada pela neve, consegue sobreviver. Ouviram-se inúmeros
relatos dos participantes da comunidade de Cascavel, tratando da importância do girassol
em suas vidas pois, para os descendentes, o girassol é o símbolo da riqueza, da gratidão e é
usado como símbolo pelo grupo, para preservar as riquezas da cultura do seu país de
origem, ao mesmo tempo, para expressar gratidão a Deus pelos dons recebidos. Desse
modo, o grupo tem a seguinte proposição,
para levar adiante o nosso trabalho, muitas vezes sem condições
financeiras e com os contratempos do dia-a-dia, deve-se colocar acima de
tudo a alma e o espírito, enfrentando com muita responsabilidade todas
as dificuldades e provando que a cultura eleva o conceito de um povo,
por mais simples que ele seja. 17
A dança popular da Ucrânia é a mais legítima expressão da cultura popular desse
país. Ou seja, conforme Boruszenko em Boletim Informativo da Casa Romário Martins,
a dança popular é uma das mais antigas expressões de um povo, e se
origina geralmente nas manifestações do antigo culto religioso, em
particular do ligado às mutações da natureza. As danças ucranianas
revelam tendências para o ar livre, próprio das planícies da Ucrânia, e
movimentos rotativos com formação de várias figuras, com freqüência de
linhas geométricas. Caracterizam-se essas danças pelo seu ritmo vibrante,
de coragem e confiança, e pela alegria exuberante (BORUSZENKO,
1995, p. 33).
O grupo folclórico Sonhachneck foi fundado em fevereiro de 1986, pela Irmã Lúcia
Chominski, na época coordenadora do grupo de jovens da comunidade. O objetivo é
preservar o canto, a dança, o artesanato e os costumes ucranianos passados de geração para
geração.
De acordo Litvin (1998), o grupo folclórico,
tem obrigação de preservar e mostrar as tradições culturais, que apesar da
proibição russa, na época de seu imperialismo na Ucrânia, tem
sobrevivido. É uma cultura milenar com uma dança milenar que não deve
ser esquecida. Na antiga Ucrânia dançava-se nas aldeias ao ar livre, hoje
os passos foram atualizados e adaptados para o palco (LITVIN, 1998, p.
54).
17 Lema do grupo folclórico Sonhachneck.
Para o vice-presidente do grupo, A. X. P., “é importante manter viva a cultura dos
antepassados.” Por isso que o grupo, atualmente, conta com oitenta componentes que
possuem a faixa etária mínima de cinco anos e vão até a idade adulta, apresentam um vasto
repertório de danças, que vão desde os Montes Cárpatos até o leste da Ucrânia, que é
comprovada, também, pela diversidade de trajes e movimentos das diferentes regiões do
território. O grupo realiza todos os anos um evento tradicional (a noite ucraniana18), no qual
se divulga a culinária, o artesanato e o folclore, para a comunidade cascavelense.
Grupo Sonhachneck19
2.5.4 CELEM (Centro de Estudos de Línguas Modernas)
O CELEM é um programa do governo do Estado do Paraná, criado para enriquecer
a formação de alunos do Ensino Fundamental, de 5ª a 8ª série, e do Ensino Médio, da rede
estadual de ensino no Estado do Paraná, através do ensino de línguas estrangeiras. Foi
criado em 1986, fundamentado no artigo 7º da Resolução Secretarial nº 3546/86, e posto
18 A noite ucraniana é um evento tradicional realizado sempre no terceiro sábado do mês de agosto.
Tem por
característica estrear todos os anos um repertório novo e divulgar a cultura ucraniana. Segundo a
diretora do
grupo, B. I. W., o evento começou de maneira singela, e neste ano realizou a 11ª edição,
consagrando-se
como uma das mais importantes festas da cidade.
19 Acervo de Bernadete I. Waligura – foto tirada em 2006, na noite ucraniana.
em prática a partir de 1988.
Os cursos, por sua vez, são ofertados nas escolas estaduais. Os projetos devem ser
aceitos e estruturados antecipadamente, com uma ou mais línguas, de acordo com a
capacidade e estrutura da escola.
O curso é oportuno ao considerar a variedade étnica do Estado. Logo, conforme
Auada (1993), o CELEM, ao considerar a composição étnica da população paranaense,
busca “desenvolver cursos de língua e cultura alemã, francesa, hispânica, inglesa, italiana,
japonesa, ucraniana, árabe, polonesa e hebraica, visando estimular e facilitar a inclusão
dessas línguas nos currículos plenos do Sistema Educacional do Estado do Paraná”
(AUADA, 1993, p. 20).
Para a diretora do CELEM, do Núcleo Regional de Educação de Cascavel, o curso
de língua ucraniana foi consolidado por priorizar a necessidade da comunidade. Ou seja,
observou-se uma comunidade bastante significativa de descendentes de ucranianos que
almejava estudar a língua ucraniana em seu contexto formal.
Em entrevista, o professor do CELEM declarou que o ensino de língua é importante,
pois além de oportunizar às pessoas a aprendizagem da língua ucraniana, ainda oferece a
comprovação disto através do certificado de língua. Conforme a declaração feita pelo
professor,
o CELEM, é... a importância dele é que ele além da... de oportunizar o
pessoal a aprender a língua ucraniana. É... ele traz é... um certificado.
Esse certificado de repente futuramente, de repente vai precisar, né? De
repente, um dia há ... a possibilidade a oportunidade de viajar à
Ucrânia, alguma coisa, né? Quem que eles vão escolher? Aquele que
sabe a língua e que possa apresentar um comprovante né, um
certificado de que ele realmente sabe a língua. É isso que leva o
pessoal, realmente a participar, estudar visando, objetivando isso no
futuro.20
Entre os alunos é confirmado que há busca pelo conhecimento da língua formal. Em
observações ocorridas na sala de aula, observou-se a preocupação pela aprendizagem da
língua ucraniana padrão. Como pode ser comprovado no fragmento abaixo,
Al 1: Professor, essa palavra no dicionário é escrita de outra forma.
P.: É que o dicionário traz a língua ucraniana falada em Kiev, né? E o
nosso ucraniano, que os nossos pais falam é o ucraniano do interior da
Ucrânia, dos agricultores. E, ainda, o ucraniano que eles falam é aquele
de 1890, 18 e(...) Lá na Ucrânia eles já não falam desse jeito mais, já
mudou.
Al.2:Então a gente tem de aprender o ucraniano que se fala na capital,
né? O que é mais atual. (Observação participante, em sala de aula, em
16/04/07).
Confirma-se que os alunos não buscam apenas conhecer a língua dos antepassados
mas, sobretudo, a língua que é falada na Ucrânia, na atualidade. Ou seja, é essa busca pelo
estudo formal da língua que os estimulou a estudar o ucraniano. Na reflexão de Mello,
quando se focaliza o bilinguismo individual na sua interface com o
social, dois fatores adquirem relevância especial – as atitudes das pessoas
em relação ao uso das línguas e aos seus falantes e a motivação do
indivíduo para a aprendizagem/uso da(s) língua(s) (...) a motivação está
relacionada ao desejo ou ao impulso que move a ação do
indivíduo/aprendiz para atingir um objetivo específico (2003, p. 239).
O que os incentiva é a língua dos antepassados, pois conhecer essa língua é
interessante, porém não é essa mesma língua que os reporta ao passado sofredor e
desolador que desejam estudar. Ao contrário, é a língua que marca a prosperidade da
Ucrânia atual.
Quando iniciou o CELEM de língua ucraniana em Cascavel, havia trinta alunos
20 Entrevista concedida por P. L., professor de Língua Ucraniana pelo CELEM no Colégio Estadual
São
Cristóvão em Cascavel.
matriculados. Porém, com o passar do tempo, aqueles que não eram descendentes de
ucraniano e, portanto, não se identificavam com a cultura, com a língua, e não faziam parte
da comunidade, desistiram. Isso é preocupante, pois 80% das vagas são destinadas a alunos
da rede estadual, e 20% aos demais membros da comunidade. No entanto, o CELEM de
língua ucraniana apresenta como interessados a comunidade ucraniana, em contraposição a
comunidade escolar, pelo fato de essa língua não ter incentivo empregatício ou
comercial.21
2.5.5 A escola
Apresenta-se a escola como um dos elementos que caracteriza a comunidade
ucraniana, pois além de estar voltada para a religiosidade, ainda é marcada pelos aspectos
educacionais, ou seja, onde há uma Igreja Católica Ucraniana, provavelmente, haverá uma
instituição de ensino. Desse modo, o povo ucraniano, mesmo diante das adversidades,
encontradas no Brasil, jamais deixou de se preocupar com a formação escolar, conforme a
afirmação de Wouk:
Os ucraínos imigrados para o Brasil não descuraram o setor de ensino.
Desde os primeiros anos, isto é, a partir de 1897, em todos os núcleos de
colonização, os sacerdotes-missionários, auxiliados pelas religiosas
vindas com eles da Europa, abriram escolas, instalando-as precariamente
em modestos barracões. Sentiram os colonos a necessidade de que fosse
ministrado a seus filhos o preparo intelectual indispensável e mínimo.
Compreendiam que a função básica da escola é a de transmitir o acervo
cultural do seu povo e ao mesmo tempo fornecer às novas gerações os
meios de adaptação à vida em meio estranho (1981, p. 46).
Surgiram então escolas ucraínas particulares, em cujo currículo constava o ensino
21 Há, atualmente, 22 alunos matriculados no CELEM de Cascavel. E, além de Cascavel, há o
CELEM de
língua ucraniana em Prudentópolis, Irati, Dorizon, Curitiba, Rio Azul.
de língua portuguesa, a história pátria, a história do Paraná, a geografia do Brasil, além da
língua materna, e da história nacional ucraína. As crianças eram alfabetizadas nos dois
idiomas, sendo que o ensino era ministrado em língua ucraína.
Com o passar do tempo, a escola passou a ser supervisionada pelo Estado, e por isso
passou a adotar o currículo comum às escolas públicas, e a submeter os seus alunos aos
exames, de acordo com as instruções da Secretaria de Educação e Cultura.
Em Cascavel não foi diferente, quando da chegada dos primeiros imigrantes e de
seus descendentes. Logo vieram as Irmãs Servas de Maria Imaculada, e elas, por sua vez,
fundaram a Escola Sagrada Família, em 1966. É uma escola particular que atua na
comunidade com a Educação Infantil e o Ensino Fundamental. Conta no momento com 350
alunos. Além disso, mantém o curso de idiomas de língua ucraniana aberto a toda
comunidade de Cascavel.
2.5.6 A Pêssanka: a arte de colorir ovos
Enfoca-se, nesta subseção, a representação simbólica religiosa da comunidade
ucraniana, baseada em um aspecto de sua cultura, a pêssanka, que contribui para a
manutenção dos aspectos simbólicos/culturais da identidade étnica desse grupo. Desse
modo, pode-se afirmar que o artesanato típico representativo colabora para a conservação
do imaginário religioso e cultural, pois os mesmos estão interligados.
O artesanato típico ucraniano é marcado pelos bordados coloridos mas, em especial,
caracteriza-se pela arte de colorir ovos, a pêssanka. Esta arte é caracterizada como um dos
símbolos mais expressivos da Páscoa, pois na quaresma, período que antecede as
comemorações da Páscoa, as pessoas colorem os ovos.
A pêssanka, assim como as demais tradições, envolvem muitos símbolos e lendas
que contribuem na composição das mesmas22. Assim, para Litvin,
a pêssanka é uma arte milenar de origem obscura. Praticada na Ucrânia
na era pré-cristã pelos pagãos. Estes utilizavam os ovos decorados para
saudar a primavera, para dar boas vindas ao sol, que com a luz trazia
poder e calor, fertilizando os campos, rebanhos e o próprio homem. Após
o batismo da Ucrânia em 988, a pêssanka passou a fazer parte da tradição
cristã como símbolo da ressurreição (LITVIN, 1998, p. 52, Grifos
nossos).
As pêssankas são oferecidas aos amigos e aos parentes, na manhã do Domingo de
Páscoa, como representação simbólica do desejo de saúde, de amor, admiração, e
principalmente de proteção, pois para os mais velhos, depois que as mesmas são
abençoadas, protegem a casa contra o fogo, e destroem os maus espíritos. Desse modo,
segundo Ivanchichen, a pêssanka “é para o povo ucraniano uma espécie de amuleto da
sorte e de proteção” (2002, p. 40).
Conforme Boruszenko (1981, apud CRUZ, 1993), a pêssanka é confeccionada por
meio de um trabalho artesanal, cujos traços, figuras e cores apresentam significados
especiais,
a pêssanka é toda desenhada à mão, donde vem o seu nome. Elas são
oferecidas na manhã de Páscoa, como presente aos amigos. Cada
província, cada vila, e mesmo cada comunidade na Ucrânia, tem os seus
próprios símbolos, significados e fórmulas, para a confecção destas
pêssankas, que são cuidadosamente guardadas e passam de mães para
filhas, através das gerações (BORUSZENKO, 1981 apud CRUZ,
1993, p. 21).
22Sol, a energia criadora; flores, renascimento, alegria, amor e felicidade; estrela, realização e
sucesso;
triângulo, as forças da natureza, água, fogo e ar; trigo, prosperidade, riqueza; linha quebrada,
proteção; linha
sem fim, eternidade. Cores: amarelo, sabedoria e prosperidade; laranja, energia; vermelho,
vitalidade; verde,
cura; azul, paz e harmonia; branco, pureza; preto, a noite dos tempos; lilás, transmutação; marrom, a
mãe
terra. (LITVIN, 1998, p. 52).
A pêssanka, assim como os demais símbolos e tradições, contribui para (re)lembrar à
etnia ucraniana a sua riqueza cultural, possibilitando ao imaginário o desejo de perpetuar
essa arte, bem como todas as demais manifestações culturais.
2.5.7 A religião, a fé e a linguagem
Neste momento faz-se uma breve análise do poder simbólico imposto pela Igreja
Católica Ucraniana, bem como, os meios utilizados pela mesma para se manter através de
práticas políticas/culturais.
Como foi exposto, anteriormente, a igreja é o cerne na vida do povo ucraniano, ou
seja, não existe a etnia ucraniana sem a existência da mesma, pois é em torno dela que a
comunidade é formada, organizada. Desse modo, a igreja é a mediadora entre os indivíduos
da comunidade e os preceitos religiosos. Logo, sem a igreja, sem a religião, a comunidade
não teria como sustentar o imaginário religioso ucraniano na comunidade cascavelense.
Primeiramente, é preciso explicitar que a religião é entendida, neste trabalho como
uma instituição social, ou seja, de acordo com Durkheim,
a religião é uma coisa eminentemente social. As representações
religiosas são representações coletivas que exprimem realidades
coletivas; os ritos são maneiras de agir que só surgem no interior de
grupos coordenados e se destinam a suscitar, manter e refazer alguns
estados mentais desses grupos. (1996, p. XVI – Apresentação)
A religião é um conjunto de práticas que estão relacionadas às coisas sagradas. Por
assim ser, conforme Durkheim, “uma religião é um sistema solidário de crenças e de
práticas relativas a coisas sagradas, isto é, separadas, proibidas, crenças e práticas que
reúnem numa mesma comunidade moral chamada igreja, todos aqueles que a elas
aderem.” (DURKHEIM, 1996, p. 32).
Não é possível separar o conceito de religião do conceito de igreja, o que sugere
que a “religião deve ser uma coisa eminentemente coletiva.” (DURKHEIM, 1996, p. 32).
A igreja como instituição possui uma carga simbólica. Bourdieu (1996), ao tentar
explicar o termo instituição, tenta unir os sentidos de ‘instituere’ e ‘institutio’, os
quais remetem,
a idéia de um ato inaugural de constituição, de fundação, e até mesmo de
invenção, levando através da educação a disposições duradouras, hábitos
e usos. A estratégia universalmente adotada para eximir-se
duradouramente da tentação de sair da linha consiste em naturalizar a
diferença e transformá-la numa segunda natureza através da inculcação e
da incorporação sob a forma de habitus.(1996, p. 102 -103).
Para tanto, a instituição se caracteriza como uma força simbólica sob uma forma de
habitus religiosos, pois a mesma tem por papel social “instituir, dar uma definição social,
uma identidade, é também impor limites.” Ou seja, a instituição consiste em marcar as
diferenças, “atribuindo propriedades de natureza social como se fossem propriedades de
natureza natural.” (BOURDIEU, 1996, p. 100 e 98).
Diante do acima posto, questiona-se então, como a Igreja Católica Ucraniana
conseguiu manter e preservar por tantos anos em terras estrangeiras as suas idiossincrasias,
mesmo ocorrendo inúmeras redefinições do espaço social, e mudanças nas relações
sociais?
Para obter a resposta desse questionamento é preciso primeiro observar que o povo
ucraniano tem plena crença de que sua religião está alicerçada em quatro pilares, os quais
são considerados fundamentais. Assim sendo, a religião católica ucraniana é forte por
preservar a tradição religiosa; por manter a religião na família; pelo trabalho assíduo dos
padres, das irmãs, dos missionários e das catequistas; e, ainda pela religiosidade “natural”
da etnia ucraniana. Essa “naturalidade” da religião é entendida como algo que por ter uma
tradição milenar, faz parte da cultura e que, por assim ser, a criança desde o berço recebe as
primeiras impressões. Ou seja, é cultural, mas está tão arraigada que não é mais cultural e
sim “natural”. Como é possível observar na fala de uma entrevistada,
me lembro que nós rezava o terço em casa desde pequeno. Minha mãe
ensinava. Depois que é que nós fomos a catequese...Faz 35 anos, mas
me lembro da primeira Pisni (canção) que as irmãs ensinaram para nós...
as famílias preservam a religião. (L.H., 11/2006).
A religião então, é algo que mantém a cultura ucraniana, mas que por sua natureza
cósmica, deve ser sempre relembrada, reforçada, para que a mesma possa se manter, e
assim, influenciar o viver, o pensar e a organização dos indivíduos. Para Berger (1985,
p.15-64), a religião é um meio legitimador muito eficaz, pois aos situar a instituição (igreja)
numa instância sagrada, num plano cósmico, se oculta a produção humana e histórica das
disposições sociais. A legitimação eclesial serve para elucidar e justificar a ordem social,
na mesma medida em que favorece a socialização, mediante o controle social, “em outras
palavras, as fórmulas legitimadoras precisam ser repetidas. Essa repetição será, é claro,
especialmente importante nas ocasiões de crise coletiva ou individual, quando o perigo de
‘esquecer é mais agudo.” (BERGER, 1985, p. 44).
A religião, então, “mistifica as instituições explicando-as como dados acima e além
de sua existência empírica.” (BERGER, 1985, p. 103). Busca-se através do religioso
explicar o arranjo social que ocorre por meio da fé ou da religião.
Ao considerar, de acordo com Bourdieu (1999), o capital simbólico como fonte
derivacional de noções de poder e autoridade, engloba-se nesse meio a igreja (os
integrantes), que apresentam e representam a visão que têm de si mesmos, ou que querem
transparecer, a fim de que possa mobilizar os demais para a causa. Ou seja, há os jogos de
poder (FOUCALT, 2000) que buscam, a todo momento, catolicizar e ucranizar a qualquer
custo. Busca-se, então, uma homegeneização na constituição das identidades a fim de
produzir indivíduos disciplinados, convidados a se portar de forma que satisfaça a norma
vigente, sendo que os mecanismos mais eficientes para a constituição desses sujeitos são a
escola e a Igreja. Desse modo, de acordo com Bourdieu,
os esquemas que organizam o pensamento de uma época somente se
tornam inteiramente compreensíveis se forem referidos ao sistema
escolar, o único capaz de consagrá-los e constituí-los, pelo exercício,
como hábitos de pensamentos comuns a toda uma geração. (1999, p.
208)
Do mesmo modo que os discursos religiosos de acordo com Foucault são
jogos estratégicos, de ação e de reação, de pergunta e de resposta, de
dominação e de esquiva, como também de luta. O discurso é esse
conjunto regular de fatos lingüísticos em determinado nível, e polêmicos
e estratégicos em outro. (1999, p. 09)
A legitimização e a significação de uma determinada ordem social, ou instituição
social, no caso da pesquisa, a Igreja é validada pelo poder simbólico, sendo que esse poder
é delineado por Bourdieu (2002) como
[...] poder quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que é
obtido pela força (física ou econômica), graças ao efeito específico de
mobilização, só se exerce se for reconhecido, quer dizer, ignorado como
arbitrário. Isto significa que o poder simbólico não reside ‘nos sistemas
simbólicos’ em forma de uma ‘illocutionary force’ mas que se define
numa relação determinada – e por meio desta -entre os que exercem o
poder e os que lhe estão sujeitos, quer dizer, isto é, na própria estrutura
do campo em que se produz e se reproduz a crença. O que faz o poder
das palavras e das palavras de ordem, poder de manter a ordem ou de
subverter, é a crença na legitimidade das palavras e daquele que as
pronuncia, crença cuja produção não é da competência das palavras.
(BOURDIEU, 2002, p. 14 -15, Grifos do autor).
Diante do exposto, é possível inferir que a crença e aceitação de uma determinada
ordem, ou mais especificamente, do discurso como uma verdade é determinada pela
credibilidade que se tem naqueles que proferem o discurso e, que por assim ser, constroem
identidades a partir de determinada organização social, no caso deste, a Igreja. Assim
sendo, aos imigrantes ucranianos são impostas definições de realidade que lhe asseguram o
caráter de serem imigrantes e descendentes de ucranianos, do mesmo modo que, aos
representantes de outras etnias, também é possível fazer parte deste imaginário social desde
que seja capaz de absorver todo o discurso institucionalizado. Este, possui o poder de criar
sujeitos, identidades e um imaginário social.
As representações religiosas se constituem através da linguagem, pois a mesma,
não é meramente o revestimento exterior do pensamento; é seu
arcabouço interno. Não se limita a traduzi-lo externamente depois que
ele se formou: serve para produzi-lo. No entanto, ela tem uma natureza
que lhe é própria e, conseqüentemente, leis que não são as do
pensamento. E já que ela contribui para elaborá-lo, não pode deixar, de
certo modo, de violentá-lo e de deformá-lo. É uma deformação desse
gênero que teria produzido o caráter singular das representações
religiosas. (DURKHEIM, 1996, p. 66)
O imaginário social da comunidade ucraniana é constituído em torno do imaginário
religioso, ou seja, é através das práticas sociais que o religioso continua a se manter,
mesmo diante de tantas adversidades. Logo, o imaginário religioso fortifica, na mesma
medida em que ampara a realidade, o cotidiano dos indivíduos e da comunidade como um
todo, ou seja, se expressa sob diversos modos e com múltiplas representações do real.
Assim sendo, “o imaginário faz parte de um campo de representação e como expressão do
pensamento, se manifesta por imagens e discursos que pretendem dar uma definição da
realidade.” (PESAVENTO, 1995, p. 15).
Faz-se necessário colocar que mais difícil que construir um imaginário socialmente
aceito pelos integrantes, é mantê-lo intacto, tendo um mundo que sofre inúmeras crises,
dentre elas, a de identidade. Por isso, há inúmeras formas de legitimação criadas pelo
homem como as instituições (igreja, escola, comunidade) que reforçam as representações,
isto é, estão presentes na sociedade, para reascender e sustentar o imaginário do povo. A
comunidade ucraniana, então, teve na religião um fortíssimo aliado na manutenção do
imaginário, pois conforme Berger (1985), a religião é a forma mais concreta de legitimação
que busca o sagrado como fundamento para a construção do mundo,
podemos descrevê-la dizendo simplesmente que a religião foi
historicamente o instrumento mais amplo e efetivo de legitimação. Toda
legitimação mantém a realidade socialmente definida. A religião legitima
de modo tão eficaz porque relaciona com a realidade suprema as
precárias construções da realidade erguidas pelas sociedades empíricas.
As tênues realidades do mundo social se fundam no sagrado
“realissimum”, que por definição está além das contingências dos
sentidos humanos e da atividade humana. (BERGER, 1985, p.45)
Faz-se importante observar que a legitimação, bem como todo o imaginário
social construído que tem por função criar e contribuir para a manutenção da ordem social
é algo que sempre fez parte da vida dos imigrantes ucranianos que chegaram ao oeste do
Paraná, pois foram os mesmos que sentiram necessidade da religião perto deles, ou seja,
para eles não seria possível viver sem a religião que é o mundo de sentidos e certezas
diante daquilo que é desconhecido (a região Oeste do Paraná). Neste sentido, é possível
afirmar que a sociedade, e em especial a instituição se constitui a partir das significações
que irão ampará-los na compreensão que se tem do mundo e de si mesmos, porque “o
simbolismo pressupõe a capacidade imaginária. Pois pressupõe a capacidade de ver em
uma coisa o que ela não é, vê-la diferente do que é.” (CASTORIADIS, 1991, p. 154).
Enfim, é possível afirmar que a religião exerce domínio por ser um instrumento de
respeito, conforme Durkheim expõe,
o domínio que ela exerce sobre as consciências deve-se bem menos à
supremacia física cujo privilégio detém, do que à autoridade moral de
que é investida. Se acatamos suas ordens, não é simplesmente porque
está armada de maneira a triunfar de nossas resistências; é antes de tudo
por ser objeto de um verdadeiro respeito. (1996, p. 212).
A religião por ter o seu caráter social, não ignora a sociedade. Ao contrário, pode-se
afirmar que aquela reflete essa, ou seja, tudo que há na sociedade, também se encontra na
religião,
a religião, portanto, longe de ignorar a sociedade real e de não levá-la em
conta, é a imagem dela, reflete todos os seus aspectos, mesmo os mais
vulgares e repulsivos. Tudo se encontra nela, e se, na maioria das vezes,
ela mostra o bem prevalecer sobre o mal, a vida sobre a morte, as
potencias das trevas, é que não poderia ser de outro modo na realidade.
(DURKHEIM, 1996, p. 464 -465).
A religião por refletir o real, estabelece relações motivadoras com os homens, o que
torna a religião, conforme Geertz (1989),
(1) um sistema de símbolos que atua para (2) estabelecer poderosas,
penetrantes e duradouras disposições e motivações nos homens através
da (3) formulação de conceitos de uma ordem de existência geral e (4)
vestindo essas concepções com tal aura de fatualidade que (5) as
disposições e motivações parecem singularmente realistas. (GEERTZ,
1989, p. 67).
Para Bakhtin (1982), os diferentes gêneros do discurso (o político, o didático, o
literário, o religioso, e outros) constroem a dinâmica social através do interdiscurso, como
um código cultural desenvolvido sócio-historicamente, ou seja, os indivíduos que fazem
parte da religião realizam ações com a linguagem e se constituem a partir dela. Logo, cada
grupo social possui um determinado conjunto de palavras que formam o seu discurso, a
partir dos conhecimentos adquiridos pela família, religião, comunidade, escola, entre
outros.. Nesse discurso manifestam-se os valores do contexto e da época em que os
indivíduos estão inseridos,
as palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e
servem de trama a todas as relações sociais em todos os domínios. É
portanto claro que a palavra será sempre o indicador mais sensível de
todas as transformações sociais, mesmo aquelas que apenas despontam,
que ainda não tomaram forma, que ainda não abriram caminho para
sistemas ideológicos estruturados e bem formados. A palavra constitui o
meio no qual se produzem lentas acumulações quantitativa de mudanças
que ainda não tiveram tempo de adquirir uma nova qualidade ideológica,
que ainda não tiveram tempo de engendrar uma forma ideológica nova e
acabada. A palavra é capaz de registrar as fases transitórias mais íntimas,
mais efêmeras das mudanças sociais. (BAKHTIN, 1982, p. 41).
Portanto, a religião trabalha para que o homem sinta-se motivado a acreditar,
verdadeiramente, nos conceitos e nas representações simbólicas estabelecidas por
ela, através da linguagem, de forma que esses possam apresentar uma simbologia
verossímil.
CAPÍTULO 3
APORTES TEÓRICOS
Neste capítulo é apresentada a literatura de apoio teórico que norteia e fundamenta o
desenvolvimento deste estudo. Constam os principais teóricos que orientam e alicerçam as
considerações acerca do monolingüismo, do bilingüismo, bem como sobre cultura e
identidade étnica.
3.1 MONOLINGÜISMO X BILINGÜISMO
Nesta seção registra-se uma breve contextualização e diferenciação entre os estudos
de monolingüismo e do bilingüismo. Para tanto, busca-se algumas teorias que refutam a
existência de monolingüismo no Brasil, pois esse país apresenta inúmeras situações de
bilingüismo, o que, muitas vezes, não diminui a crença na existência de uma única língua, a
portuguesa. Porém, independente da língua que o indivíduo usa, ela é, conforme os estudos
de Preti (1987), um elemento de interação entre o indivíduo e a sociedade em que ele atua.
É através dela “que a realidade se transforma em signos, pela associação de significantes
arbitrários, com as quais se processa a comunicação lingüística” (1987, p. 02).
Preti (1987) afirma também que é “na língua e pela língua que indivíduo e
sociedade se determinam mutuamente” (p. 02). Ou seja, os indivíduos, na interação,
constroem o discurso de acordo com o contexto em que estão inseridos, e com os interesses
pretendidos.
Ogliari (2001) contribui com essa reflexão, ao expor que ao se estudar os contextos,
bem como os eventos de fala, descobre-se que as línguas apresentam características que lhe
são inerentes, ou seja, “são dinâmicas e variáveis por natureza. Isso equivale a dizer que
não estão prontas, que a diacronia existe na vida de qualquer comunidade lingüística”
(2001, p. 59).
Essas características tornam a língua “um sistema intrinsecamente heterogêneo em
que se entrecruzam e são correlacionáveis fatores intra e extra-lingüísticos, ou seja, fatores
estruturais e sociais tais como idade, sexo, etnia, escolaridade, estilo” (MATOS E SILVA,
1996, p. 27). Desse modo, há inúmeros fatores que estão intrinsecamente ligados à língua,
ou seja, ela não existe por si só, pois ao estar inserida em contextos dinâmicos, é
predisposta à variabilidade.
No entanto, verifica-se que há no Brasil, de acordo com Cavalcanti (1999), o mito
do monolingüismo, o qual aceita apenas uma língua como oficial, a língua portuguesa.
Esquecendo-se dos cenários de fronteira, de imigração e, sobretudo, de várias línguas
indígenas que caracterizam o país como bilíngüe.
Diante desse monolingüismo aparente, o Brasil apresenta uma pluralidade
lingüística desde o descobrimento, pois conforme Teyssier, quando os portugueses
chegaram ao país, este era povoado por índios. Depois chegaram os escravos africanos.
Assim, o português, o índio e o negro, no período da colônia, constituíram as três etnias
(1984, p. 75).
No período colonial, os portugueses falavam o português europeu que, por ser
utilizado no Brasil, passou a apresentar marcas particulares que se definiram com o tempo.
Os povos de origem indígena, africana ou mestiça, aprenderam a língua portuguesa, porém
não a utilizavam na forma padrão.
Além da língua portuguesa, existia o tupi que se caracterizava como língua geral.
Desse modo, as línguas tupi e portuguesa, durante anos, foram usadas, mutuamente, para a
comunicação. Porém, a partir da segunda metade do século XVIII, o uso da língua geral
entrou em declínio, devido ao grande número de imigrantes portugueses que chegavam, e
sobretudo em razão do Diretório criado por Marquês de Pombal, entre 03 de maio de 1757
e 17 de agosto de 1758. Esse diretório proibia o uso da língua geral, obrigando a utilização
da língua portuguesa, oficialmente (TEYSSIER, 1984, p. 75).
A língua portuguesa passou a ser imposta novamente no período Vargas, entre 1930
e 1945. Houve, então, o estabelecimento de várias leis nacionalistas, que instituíam a
proibição de línguas estrangeiras no Brasil. Desse modo, muitas escolas de imigrantes
obrigaram-se a ensinar todos os conteúdos por meio da língua portuguesa. Ao exército,
como afirma, Canetti (1983, apud LENHARO,1986, p. 200 -201), foi conferido “o cuidado
e a vigilância das comunidades estrangeiras do sul”, que por apresentarem laços com os
países que estavam em guerra com o Brasil, deviam ser submetidos “a ação pedagógica” do
exército.
Aos ucranianos também foi imposta a proibição do uso de línguas, o quê, conforme
Ogliari,
provocou o esvaziamento ou a fragmentação da organização religiosa
basiliana. Muitas das atividades sociais estagnaram ou passaram a ser
exercidas na clandestinidade. Embora as igrejas ucranianas católicas não
tenham sido fechadas, era proibido freqüentar o culto católico-ucraniano.
Muitos padres católico-ucranianos foram presos e a imprensa ucraniana
local parou de funcionar (1999, p. 159).
A proibição do uso da língua marcou a vida de muitos membros da comunidade
ucraniana de Cascavel, que viveram esse período nas cidades natais como em
Prudentópolis/PR, e em Moema/SC; que pertencem à segunda ou à terceira geração de
descendentes de ucranianos e que, por assim ser, em muitos casos, freqüentaram a escola
até a quarta série, ou até mesmo não a freqüentaram. É raro o caso de descendentes que
aprenderam a ler e a escrever em ucraniano, em casa, com os pais. Esse fato se confirma na
enunciação de uma entrevistada, A.K., quando diz que “na roça não tinha escola. Depois
quando já vieram, veio um professor lá da Europa, e ele começou a dar aula sabe? Em
escola perto da Igreja em Santa Catarina e daí ele só dava aula em Ucrainsk ele dava aula, e
naqueles tempos era proibido dar aula Ucrainski, compreende? Tinha que ser fora da
aula.”23
Nas colocações de Hanicz, sacerdote basiliano, referenciado por Ogliari, o grupo
étnico ucraniano sofreu as conseqüências de sua nacionalidade,
de um modo geral, por ser um período de repressão, que sempre resulta
num corte no sistema produtivo de idéias de um grupo, o grupo ucraniano
em toda a sua estrutura social e religiosa ficou bastante afetado. Foi
quebrada a espinha dorsal e a comunidade perdeu o ritmo do embalo
anterior (HANICZ, 1996, apud OGLIARI, 1999, p. 161).
Salienta-se que a política de país monolíngüe é conseqüência, segundo Oliveira,
“da intervenção do estado e da ideologia da ‘unidade nacional’ que desde sempre, com
diferentes formatos, conduziram as ações culturais no Brasil” (2003, p. 08). Assim sendo,
muitas políticas implantadas em vários períodos no país cristalizaram a crença de que o
Brasil é o país de uma só língua, o português. Apagando-se assim os cenários multilingües
existentes, bem como a história da hibridização lingüística e cultural.
Atualmente é possível verificar que de maneira ainda tímida está se (re) descobrindo
o multiculturalismo e o plurilingüismo, evidenciado nas minorias lingüísticas, através das
pesquisas tais como as de Borstel (1999), Pereira (1999), Damke (1988), Ribeiro (2006),
em contextos migratórios; Cavalcanti (1999), Maher (1998), Teis (2007), em contextos
23 Entrevista concedida por A. K. em 02/2007
indígenas.
Nesta seção apresentaram-se algumas características inerentes à língua, bem como
um breve panorama histórico/lingüístico que auxilia na descaracterização da crença de que
o Brasil é um país monolíngüe. Na próxima seção, contrapondo ao mito do monolingüismo,
tecem-se algumas considerações sobre o bilingüismo, pois se trata de um princípio teórico
fundamental para este estudo.
3.2 BILINGÜISMO
Ao propor-se um estudo no qual trata-se sobre questões de bilingüismo e de falantes
bilíngües, é preciso elucidar alguns conceitos. Esses, por sua vez, estão “divididos” entre
teorias que se aproximam, e teorias que se contradizem. Essa aproximação ou contradição é
ocasionada, neste caso, pelo grau de exigência para considerar uma pessoa bilíngüe, ou
seja, há aqueles que exigem competência maior para considerar um indivíduo bilíngüe, e
aqueles que exigem competência menor.
Entre estudiosos que exigem a competência plena de um sujeito bilíngüe está
Bloomfield (1933, apud OGLIARI, 2001, p. 62). Assim, o indivíduo é considerado bilíngüe
quando possui habilidade de falante nativo em duas ou mais línguas, ou seja, o sujeito
precisa dominar dois códigos de forma natural. Se, isso não ocorre, a situação não seria de
bilingüismo.
Weinreich (1953, apud BORSTEL, 1992), menos exigente que Bloomfield (1933),
traz em sua definição que o bilingüismo se caracteriza pelo uso de duas línguas
alternadamente. O bilingüismo é um fenômeno de interferência, ou competência que resulta
de contatos lingüísticos. Ou seja, uma língua, a partir dos contatos que mantém com outra
língua, pode sofrer mudanças, interferências, ou seja, empréstimos lingüísticos. Refuta-se
então a necessidade de competência plena nas duas línguas, para a ocorrência de
bilingüismo.
Para Mackey (1968, apud BORSTEL, 1992, p. 09), “o bilingüismo é uma
característica individual que pode ocorrer em graus variáveis, desde uma competência
mínima até o domínio completo de mais de uma língua.” Desse modo, o bilingüismo passa
a ser considerado uma competência lingüística que sofre variações diferenciadas, de acordo
com o indivíduo, ou seja, é o bilingüismo relativo que envolve questões de grau,
alternância, interferência, função. A primeira é direcionado à proficiência, isto é, ao grau de
conhecimento e de habilidades do sujeito em relação às duas línguas. A segunda se refere à
passagem que o sujeito bilíngüe faz de uma língua para outra. A terceira condiz com a
maneira como o falante domina as línguas, de forma que pode usá-las separadamente, ou
combiná-las em seu discurso. A última está relacionada ao uso que o sujeito faz das línguas
que domina, onde e como as utiliza.
Portanto, segundo as colocações de Mackey (1968), para ser bilíngüe não é preciso
dominar as quatro habilidades básicas: falar, ler, escrever, entender. O que sugere que o uso
da língua pode acontecer em diferentes graus (da competência mínima ao domínio
completo de duas línguas).
Borstel (1999) sugere que ao considerar questões de grau, função, alternância e
interferência é preciso verificar,
a) Até que ponto o falante é bilíngüe e qual é o seu domínio sobre cada
uma das línguas usadas? b) Em que situações os falantes usam as duas
línguas e, em que situações usam uma língua e em que situações a outra?
c) Até que ponto os falantes trocam as duas línguas e sob quais condições
passam de uma para a outra? d) Até que ponto o falante emprega as duas
línguas separadamente? Qual é o momento em que se faz a fusão das
línguas num único sistema? Quais os fenômenos de interferência
manifestados pelo uso alternado das duas línguas? Como o uso de uma
língua influencia o uso da outra? (1999, p. 08).
De acordo, então, com as reflexões de Borstel (1999), todo e qualquer contato
lingüístico sugere a competência lingüística, as situações em que há a ocorrência de
bilingüismo, bem como, as interferências.
Skutnabb-Kangas (1988), ao citar Haugen (1956), diz que se pode considerar falante
bilíngüe aquele que, além de adquirir a língua materna na infância, também adquire outra
língua numa outra circunstância, de modo que seja competente lingüisticamente, isto é, que
domine a língua, tanto no grupo ocupacional como no grupo social ao qual pertence. O
falante bilíngüe é
alguém capaz de se comunicar em duas (ou mais) línguas, em ambas as
comunidades monolíngue ou bilíngüe, de acordo com as exigências de
competência comunicativa e cognitiva feitas por estas comunidades ou
pelo próprio indivíduo (de ser falante), ao mesmo nível de falantes
nativos, e que é capaz de se identificar positivamente com ambas (ou
todos) os grupos de língua (e culturais) ou parte delas (SKUTNABKANGAS,
1988, p. 90).
Grosjean (1982) caracteriza o bilingüismo pelo uso regular de duas ou mais línguas.
Mesmo que os sujeitos não façam uso da língua com fluência e desempenho de um nativo,
devem ser considerados bilíngües, pois não há um padrão ideal de bilingüismo quando se
refere a grau de alternância e interferência, bem como, não há falantes capazes de dominar
todos os aspectos da língua.
O autor ainda expõe que, ao se estar em uma circunstância de contato, o domínio da
língua será delimitado em muitas ocasiões por quem a conhece. Desse modo, há uma
relação de poder que condiciona a língua dominante a ser estudada por todos os membros,
sejam eles pertencentes ao grupo dominante ou ao grupo das minorias. Porém, é preciso
esclarecer que a língua das minorias é apenas apreendida pelos membros da minoria, pois
os dominantes não sentem necessidade de aprendê-la. Assim sendo, as línguas refletem,
muitas vezes, os modos de sua internalização pelos usuários. Isso sugere que as línguas
dominantes, são assim caracterizadas por representar determinado status social, enquanto
que as línguas das minorias são muitas vezes estigmatizadas, ao invés de serem respeitadas,
por representarem aquilo que não é aceito pelos dominantes. Desse modo, as línguas das
minorias são alvo de estigmatização pelos grupos dominantes.
Heye (2003) fornece contribuições importantes a esse respeito, ao expor que é
preciso relativizar o fenômeno bilingüismo, ou seja, é preciso considerar o ambiente e as
condições de desenvolvimento do bilingüismo, pois contextos diferentes nos quais os
sujeitos estão imersos sugerem domínio de duas línguas de forma diferenciada. Logo, “a
condição de bilíngüe se modifica na trajetória de vida dos indivíduos e assume diferentes
contornos em relação ao domínio e à variação de uso de ambas as línguas” (2003, p. 232).
O pesquisador Heye explicita que alguns fatores são responsáveis pela
caracterização de situações bilíngües: “comunidades lingüísticas, pelos papéis e as funções
sociais, o status relativo dos falantes e das línguas, o tópico e o domínio lingüístico e
social” (HEYE, 2003, p. 233). Isto posto, pode-se dizer que o bilingüismo sofre mudanças
de acordo com o contexto, com a idade de aquisição, bem como com a variação de uso da
língua durante a vida, pois os fatores sociais, familiares, escolares, comportamento e
trabalho podem contribuir para a diferenciação no decorrer da vida.
Ogliari, fundamentada em Savedra (1994), afirma que
o bilingüismo representa apenas o uso funcional das línguas, num
determinado estágio vivencial do indivíduo, não sendo, portanto, a
representação real do uso de ambas as línguas durante toda a vida do
falante. A condição de bilingüismo é estabelecida pelo contexto e forma
de aquisição, logo não permanece a mesma durante a trajetória de vida
dos indivíduos (2001, p. 63).
A reflexão de Ogliari (2001) permite considerar que um indivíduo, ao se ausentar
do contexto em que vive, ou até mesmo, ao continuar no contexto, pode mudar o seu estilo
de vida, como num casamento interétnico, por exemplo. Obrigatoriamente perderá ou
mudará o status de falante bilíngüe, pois ser bilíngüe ou não está intimamente relacionado
ao contexto em que vive, seja família, ou comunidade.
Com relação à ocorrência de bilingüismo na primeira infância ou em idade adulta,
ou até mesmo, com relação ao entendimento que se tem sobre a competência lingüística,
Pereira (1999), baseada em Grosjean (1982), conceitua que o termo bilíngüe pleno refere-se
ao falante que adquire “duas línguas simultaneamente entre zero e cinco anos”(1999, p. 62).
Em contrapartida, os bilíngües passivos, são os “indivíduos que falam uma determinada
língua e entendem uma outra.” A autora esclarece que, ao se tratar de bilingüismo infantil,
de acordo com Baker (1994), é possível distinguir o bilingüismo simultâneo do bilingüismo
seqüencial. O primeiro ocorre quando a criança adquire as duas línguas simultaneamente
em idade jovem. O segundo ocorre quando a criança, inicialmente, aprende uma língua, e
mais tarde, aprenderia uma segunda língua.
Schulz (2004, p. 19), a partir das reflexões de Damke (1997), explicita que a língua
materna é aquela com a qual a criança tem o primeiro contato, e é adquirida no seio
familiar, ou seja, é na primeira socialização da criança que a língua é aprendida. A segunda
língua, por sua vez, é adquirida, na maioria das vezes, em idade escolar ou em outras
situações de socialização.
Bakhtin (2003) expõe que a criança em processo de aquisição da língua, busca as
palavras das pessoas que lhe são próximas a fim de organizar as suas próprias palavras e
dar-lhes caráter peculiar, criativo. Logo, para Bakhtin,
as influências extratextuais têm um significado particularmente
importante nas etapas primárias de evolução do homem. Tais influências
estão plasmadas nas palavras (ou em outros signos), e essas palavras são
palavras de outras pessoas, antes de tudo palavras da mãe. Depois, essas
palavras alheias são reelaboradas dialogicamente em minhas-alheias
palavras com o auxílio de outras palavras alheias (não ouvidas
anteriormente) e, em seguida, [nas] minhas palavras (por assim dizer,
com a perda das aspas), já de índole criadora (BAKHTIN, 2003, p. 402.
Grifos do autor).
Essa interação da comunicação lingüística que o indivíduo está exposto em
comunidades de bilingüismo situacional como no caso deste grupo de falantes bilíngües
português/ucraniano, na comunidade de Cascavel. Sobre o uso do bilingüismo composto,
Weinreich (1953 apud BORSTEL, 1999, p. 39) define que o bilingüismo composto seria
similar ao monolingüismo. Desse modo, para cada significante, o bilíngüe teria um duplo
significado. Por assim ser, o bilíngüe composto “pode empregar as estruturas da outra, ou
seja, há uma interação entre os dois sistemas lingüísticos, ocorrendo interferências mútuas”.
Também Pandit (1975, apud RAJAGOPALAN, 1998), cita que em muitas
sociedades plurilíngües a criança desde pequena domina dois ou mais códigos lingüísticos:
uma criança num meio multilíngüe aprende muito cedo (entre a idade de
dois e três anos) que língua usar com quem e quando. Considere-se uma
situação (que é verdadeira e muito comum em Delhi) na qual os pais têm
línguas maternas diferentes: o pai fala panjabi e a mãe inglês; a mãe, que
é estrangeira (proveniente de uma comunidade monolíngue) fala apenas
inglês. O pai, que é escolarizado, fala panjabi, hindustani e inglês; a
língua usada com os serviçais da casa é o hindustani; os pais conversam
entre si em inglês; as visitas, se se tratar de parentes da família, passarão
constantemente do panjabi para o inglês e vice-versa; os grupos de
colegas do filho usam o hindustani na idade tenra; o inglês será
acrescentado quando o grupo atingir a idade escolar, numa comunidade
cosmopolita, porque a maioria das crianças freqüentam escolas de língua
inglesa (nesse caso, a comunidade é o campus universitário)
(RAJAGOPALAN, 1998, p. 25. Grifos do autor.)
Diebold (1964), citado por Romaine (2000, p.11), versa sobre o bilingüismo
incipiente, que trata dos estágios iniciais de contato entre duas línguas. Para ele, o sujeito
pode ser bilíngüe em alguns níveis. Desse modo, é bilíngüe aquele sujeito que, mesmo não
sendo capaz de produzir expressões orais, pode entendê-las. Há, então, uma proficiência
mínima que caracteriza o bilingüismo como sendo passivo ou receptivo. Porém, Romaine
(2000) expressa que Diebold (1964) apresenta uma “falha” em sua teoria, pois todos os
sujeitos de todo mundo podem ser considerados bilíngües incipientes pelo simples fato de
conhecer algum vocábulo em outra língua.
Heye (2003, p. 233) fala da existência de estágios distintos de bilingüismo, que são
conhecidos por bilingualidade. Nesse sentido, os indivíduos, “portadores da condição de
bilíngüe”, passam por esses estágios no transcorrer da sua vida. Conforme o autor, “os
estágios são vistos como processos situacionalmente fluidos, e definem de forma dinâmica
a bicompetência lingüística, comunicativa e cultural, nas diferentes épocas e situações de
vida.” Para o autor, é preciso avaliar a bilingualidade quanto à diferenciação que ocorre no
ambiente social, no ambiente profissional, no ambiente familiar, no ambiente escolar, pois a
tendência é sempre haver uma variabilidade de um ambiente para o outro.
Kulczynskyj (1987, apud OGLIARI, 2001) expõe que há os seguintes tipos de
contatos entre línguas: “contato direto ou indireto; casual ou temporário; permanente ou
instável; externo ou interno. Os contatos internos podem incluir a relação entre uma língua
dominante, isto é, majoritária, ou línguas dominantes e uma língua minoritária, ou línguas
minoritárias” (2001, p. 60).
Para Mello, “o falar bilíngüe, é talvez, o mais interessante porque diz respeito não
apenas ao uso da língua, mas também às atitudes e ao comportamento das pessoas em
relação ao meio social, às línguas e aos usuários” (1999, p. 17).
No entanto, a própria autora sugere que
o contato entre línguas e culturas diferentes não é suficiente para que
uma comunidade social torne-se bilíngüe ou multilingüe. Igualmente
importante são as atitudes que as pessoas têm em relação às línguas e aos
membros das comunidades minoritárias, bem como às políticas
lingüísticas a serem adotadas pela comunidade como um todo (MELLO,
1999, p. 35).
A atitude com relação às línguas das comunidades minoritárias é o ponto chave para
a valorização ou a estigmatização, bem como para a ocorrência de bilingüismo. Isto posto,
verifica-se na comunidade ucraniana uma tendência em priorizar o bilingüismo através das
práticas culturais e religiosas. A presença dos imigrantes ucranianos e dos descendentes, no
Brasil, configura momentos de monolingüismo em língua portuguesa, como momentos de
monolingüismo em língua ucraniana, já que a mesma é utilizada, na maioria das vezes, em
situações formais (igreja/escola). O bilingüismo é caracterizado, nos momentos em que as
famílias se encontram para festas ou comemorações.
3.3 CULTURA
Nesta seção, pretende-se fazer um breve comentário sobre o conceito de cultura, a
fim de articulá-lo a uma concepção discursiva de linguagem. Porém, convêm lembrar que
esse conceito, muito amplo, abrange diversas concepções. Primeiramente associa-se a
cultura à transmissão de conhecimentos e valores de uma geração para outra, de uma
instituição para outra, de um país para outro. Desse modo, a cultura carrega em si a idéia de
transmissão de valores e de conhecimentos. Assim, relaciona-a às produções mais
significativas do intelecto humano, como a música, as artes, a literatura, a matemática, a
física, a filosofia, entre outras. Porém, é preciso ressaltar que o termo cultura é muito mais
abrangente, pois as concepções de cultura acima relacionadas são mais amplas, isto é, não
conseguem abranger a cultura em sua totalidade.
Cavalcanti (2001, p. 50) afirma que cultura é “um termo polissêmico e impreciso”.
É “tanto parte do cotidiano da rua como da academia,” o que também sugere inúmeras
correntes filosóficas pensando esse termo nas mais variadas acepções.
Segundo Morin (2004, p. 19), cultura, de acordo com a sociologia alemã, é tudo que
é próprio de uma nação, de uma etnia, de uma comunidade “ou seja, seus usos, crenças,
hábitos, ritos, festas, deuses, mitos”. Assim sendo, o conjunto de costumes, de instituições e
de obras constituem o legado social de um grupo ou de uma comunidade. O fator social é
algo preponderante na manutenção da cultura, pois, a mesma não é transmitida
geneticamente, ou seja, nenhum ser humano nasce com a cultura definida. Ao contrário, o
sujeito a adquire à medida que interage com o mundo que o cerca. A cultura é algo que, de
acordo com Cavalcanti (2001, p. 50), está sempre em construção.
É preciso salientar que o sujeito considera, respeita ou estigmatiza a cultura do outro
de acordo com os padrões culturais vigentes no seu “eu”, ou seja, o homem interpreta o
mundo a partir de sua cultura. O que pode gerar depreciação da cultura do “outro” avaliada
como díspar. O etnocentrismo leva o ser humano a considerar todas as normas, valores da
própria sociedade ou cultura como parâmetro para todas as demais, gerando assim
cerceamento da cultura do “outro”. No etnocentrismo não há espaço para pensar a
diferença.
Conforme Rocha,
de um lado, conhecemos um grupo do eu, o ‘nosso grupo’, que come
igual, veste igual, gosta de coisas parecidas, conhece problemas do
mesmo tipo, acredita nos mesmos deuses, casa igual, mora no mesmo
estilo, distribui o poder da mesma forma, empresta à vida significados em
comum e procede, por muitas maneiras, semelhantes. (...) o ‘outro’, o
grupo dos ‘diferentes’ que, às vezes nem sequer faz coisas como as
nossas ou quando as faz é de forma tal que não reconhecemos como
possíveis. E, grave ainda, este ‘outro’ também sobrevive à sua maneira,
gosta dela, também está no mundo e, ainda que diferente também existe (
ROCHA, 2003, p. 08).
O autor trata sobre o “diferente”, ou seja, sobre aquele que não é “eu”, mas mesmo
sendo o “outro” vive bem. O “viver bem” do “outro” bem como tudo o que é diferente
torna-se intimidador. Sendo que nessa relação, a cultura do “eu” sempre será superior à
cultura do “outro”, independente de quem seja o “eu” e o “outro”. Assim sendo, “o grupo
do ‘eu’ faz, então, da sua visão a única possível ou, mais discretamente se for o caso, a
melhor, a natural, a superior, a certa” (ROCHA, op. cit., p. 09).
Adaptar-se ao “novo”, assimilar a “nova cultura” pressupõe que
homens de culturas diferentes usam lentes diversas e, portanto, têm
visões desencontradas das coisas.(...) A nossa herança cultural,
desenvolvida através de inúmeras gerações, sempre nos condicionou a
reagir depreciativamente em relação ao comportamento daqueles que
agem fora dos padrões aceitos pela maioria da comunidade (LARAIA,
2005, p. 67).
O indivíduo, a sociedade, então, age de acordo com aquilo em que acredita, de
acordo com a sua verdade, sendo esta única e insubstituível. Sendo assim, não é possível
pensar na assimilação da cultura do “outro” sem que ocorra o detrimento da sua “cultura”.
Adequando a realidade do etnocentrismo aos imigrantes ucranianos, pode-se inferir
que, de acordo com Martins (2006), os imigrantes ucranianos, quando chegaram ao Brasil,
escolheram isolar-se e separar-se da sociedade brasileira. Primeiro, para manter a cultura, as
normas e os valores, e em segundo lugar, para se proteger da realidade adversa e não
esperada. Por isso,
a saída escolhida pelos imigrantes foi criar uma sociedade de acordo com
aquela que eles conheciam, sem aproximação com as populações locais,
que já habitavam a região. Mas mesmo estando em seu grupo social, os
imigrantes estavam permanentemente confrontados com o outro, com o
brasileiro (MARTINS, 2006, p. 03).
Vê-se então que a diferença foi preponderante na construção da cultura e da
identidade étnica. O autor aponta que mesmo os ucranianos sendo provenientes de regiões
atrasadas da Europa, achavam-se europeus, superiores às populações encontradas no Brasil.
Assim, da forma como eram subordinados em sua pátria, reproduziam essa subordinação
nas terras alheias.
Horbatiuk (1989), por sua vez, expõe que os ucranianos, por não terem afinidades
com os brasileiros, passaram a se localizar nos mesmos povoados que os poloneses, “no
entanto mantiveram as distinções mais nítidas quanto à língua, culto religioso e convivência
em sociedade” (1989, p. 114).
Martins (1955) salienta as dificuldades que o grupo de imigrantes eslavos sentiu ao
tentar aprender a língua portuguesa,
minha impressão pessoal é absolutamente a mesma: há maior dificuldade
por parte dos poloneses e dos japoneses no aprendizado do português, do
que por parte de elementos de qualquer outra nacionalidade. Falo da
dificuldade real, da ‘apreensão’ do mecanismo da língua, e não do
sotaque ou da adulteração de vocábulos, que estudarei a seu tempo. Aqui
uma das causas principais será o extrato primitivo dos colonos poloneses,
e eslavos em geral, que sempre foi mais baixo que os das outras
nacionalidades, como esta diferença que os polonoses pouco o
modificaram, enquanto os demais, como vimos e veremos, demonstraram
maior capilaridade econômica e cultural, maior dinamismo de ordem
sociológica (1955, p. 152 – 153).
Cuche (1999) complementa o que foi explanado anteriormente, assinalando que “a
cultura permite ao homem não somente adaptar-se a seu meio, mas também adaptar este
meio ao próprio homem, a suas necessidades e seus projetos. Em suma, a cultura torna
possível a transformação da natureza” (1999, p.10), ao mesmo tempo em que surge das
relações sociais que, por sua vez, são sempre irregulares.
A cultura não é um legado imutável, e não cabe ao ser humano apenas, repassá-lo de
geração em geração. Ao contrário, cada comunidade, “no interior de uma situação dada”
poderá defender suas idiossincrasias, utilizando inúmeros argumentos e artifícios que
contribuirão “para convencer (e se convencer)” de que a sua cultura é original e lhe
pertence. De acordo com Costa (1958, p. 16), “a cultura permite ao homem compreender a
si mesmo, compreender seu tempo e o seu mundo.”
Giroux (2003) argumenta que “as indústrias que produzem a cultura ocupam um
lugar único e poderoso quando moldam a maneira como as pessoas ao redor do globo
vivem, dão significado para suas vidas e moldam o futuro, freqüentemente sob condições
que não criaram” (GIROUX, 2003, p. 19). Ou seja, a cultura exerce um forte controle sobre
aqueles que a seguem.
Hall (1997) afirma que
o domínio constituído pelas atividades, pelas instituições e pelas práticas,
que chamamos ‘culturais’, expandiu-se a ponto de se tornar
irreconhecível. Ao mesmo tempo, a cultura assumiu um papel de
importância ímpar na estrutura e na organização da sociedade moderna
tardia, nos processos de desenvolvimento do ambiente global e na
disposição de seus recursos materiais e econômicos. Em particular, os
meios de produção, circulação e trocas culturais expandiram-se
radicalmente com as novas tecnologias da mídia e da revolução da
informação. Diretamente, uma proporção muito maior dos recursos
humanos, materiais e tecnológicos mundiais, foi para esses setores. Ao
mesmo tempo, indiretamente, as indústrias culturais tornaram-se o
elemento mediador dos outros processos (1997, p. 209).
A cultura é o vetor em torno do qual todas as práticas sociais são produzidas,
circuladas e estabelecidas, ao mesmo tempo em que recebem significado e importância.
Desse modo, ela é política, pois concebe “um conjunto de práticas que representam e
empregam o poder, moldando assim identidades particulares, mobilizando uma variedade
de paixões e legitimando formas precisas de cultura política” (GIROUX, 2003, p. 18-19).
Woodward (2003) pontua que
cada cultura tem suas próprias e distintivas formas de classificar o
mundo. É pela construção de sistemas classificatórios que a cultura nos
propicia os meios pelos quais podemos dar sentido ao mundo social e
construir significados. Há, entre os membros de uma sociedade, um certo
grau de consenso sobre como classificar as coisas a fim de manter
alguma ordem social. Esses sistemas partilhados de significação são, na
verdade, o que se entende por ‘cultura’ (2003, p. 41).
Por cultura entende-se, então, toda a grandeza que compõe o conhecimento do
indivíduo e da comunidade em que se vive (SANTOS, 2003), sendo que o conhecimento
aqui delimitado não é apenas o científico, mas tudo aquilo que demonstra os modos de
viver, expressar e fazer de uma comunidade, de um povo. Portanto, conhecimento e cultura
são dinâmicos, históricos e sociais.
Certeau (2003, p. 37-53) acrescenta que a cultura popular, ou seja, aquela que é
estigmatizada, bem como repleta de senso comum, de conhecimento prosaico e
supersticioso, é muito relevante na nossa sociedade. Pois para Certeau, é no cotidiano, nas
práticas diárias que o indivíduo organiza o seu espaço a fim de transpor a barreira de
“assujeitado” a sujeito da história. Logo, é nos acontecimentos diários que os indivíduos
subvertem o poder, ou seja, é nesse cotidiano que é refutado ou aceito a ordem instituída.
Desse modo, é imprescindível analisar o indivíduo a partir de sua cultura que, mesmo sendo
considerada “inferior”, reflete inúmeras atitudes que enriquecem uma pesquisa.
Certeau (1995, p. 141) acrescenta ainda que, “para que haja verdadeiramente
cultura, não basta ser autor de práticas sociais: é preciso que essas práticas sociais tenham
significado para aquele que as realiza.” Para exemplificar, pode-se lançar mão da religião,
no caso deste estudo, a Igreja Católica Ucraniana, que consegue manter a língua, a cultura e
a religião, sobretudo, através de um conjunto de representações simbólicas. Essas
representações são muito significativas para a maioria dos membros imigrantes e
descendentes. Desse modo, a igreja perpetua o seu modo de ser de geração para geração.
Porém, há de se ressaltar que a partir do momento em que as práticas sociais deixarem de
ser significativas, perde-se a cultura, e com ela a religião e a língua. Logo, a religião e, em
especial a Igreja Católica Ucraniana, é uma instituição cultural. Assim sendo, a cultura
“consiste não em receber, mas em exercer a ação pela qual cada um marca aquilo que
outros lhe dão para viver e pensar” (CERTEAU, 1995, p. 143).
Pais (2003) defende que os detalhes contribuem para a revelação, para a decifração
do real. Desse modo, as descrições densas, microscópicas e decifrativas pressupõem uma
percepção aguda do detalhe, ou seja, as situações reais da vida cotidiana manifestam-se nas
pequenas relações, nas partes. Por conseguinte, ao estudar as partes consegue-se ter uma
clareza do todo, pois é a visão microscópica que nos dá a efetiva dimensão de como se
constitui a realidade humana, através do cotidiano
as pessoas querem compreender a sua vida quotidiana, as suas
dificuldades, as suas contradições, as tensões e os problemas que se lhes
impõem. Em conseqüência, exigem uma ciência das medições que
traduza as estruturas sociais em comportamentos individuais e
microssociais. (FERRARROTTI, 1982, apud PAIS, 2003, p. 72)
A cultura ucraniana pode ser caracterizada como um conjunto de usos e costumes
preservados e, entre eles, está a língua e a religião, conforme as palavras de Carlo Furno:
é uma herança que faz parte da vossa cultura, que abrange não só o
folclore, mas entra na parte mais profunda da vossa consciência,
portanto, do vosso ser humano. (...) Como é grande este Brasil, em que se
encontram pessoas de tão diversas culturas e todos se unem no amor a
esta pátria que para eles já se tornou “a Segunda Pátria”, mãe benévola,
que trata a todos com grande liberalidade e se enriquece com a
diversidade de sua gente. Terra de liberdade e progresso. Amai esta pátria
generosa e trazei os grandes valores inerentes à vossa cultura particular,
para que ela vos ame sempre mais e se sinta orgulhosa e altiva de ter
filhos como vós, ucranianos (EPARQUIA UCRANIANA DE S. JOÃO
BATISTA, 1988, p. 13).
Logo, a etnia ucraniana se caracteriza por apresentar uma cultura milenar que se
mescla aos valores inerentes à pátria que os acolheu.
3.4 IDENTIDADE E CULTURAS ÉTNICAS
Nesta seção, tratam-se de algumas reflexões a respeito da identidade e de sua
ligação com a formação da cultura, sobretudo da identidade étnica e da cultura étnica. Para
tanto, inicia-se com reflexões macro sobre identidade para, após, refletir no plano micro.
Por último, relaciona-se a identidade, as culturas étnicas à língua, que é um forte
instrumento de manutenção daquelas.
Os estudos sobre identidade têm sido enfatizados com muita intensidade nos últimos
anos, por muitos estudiosos. Expõe Moita Lopes (2003) que a identidade só se torna tema
de discussões, estudos, quando está em crise: “exatamente agora todo mundo quer
conversar sobre ‘identidade’ (...) a identidade só se torna uma questão quando está em crise,
quando algo entendido como fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da
dúvida e da incerteza” (MOITA LOPES, 2003, p. 15).
Hall (2003, p. 07) explicita que a crise de identidade que o homem moderno
enfrenta está associada ao declínio das “velhas identidades, que por tanto tempo
estabilizaram o mundo social,” mas agora “estão em declínio, fazendo surgir novas
identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito
unificado.” Esse descentralizar das identidades é decorrente da globalização econômica,
dos grandes movimentos migratórios. Logo, as sociedades modernas ou pós-modernas
vivem em constantes mudanças, o que sugere não apenas uma identidade, mas várias
identidades.
Woodward (2003) afirma que a crise de identidade está ligada às características das
sociedades contemporâneas ou da modernidade tardia. A crise só pode ser entendida nos
contextos das mudanças globais que têm sido definidas como características da vida
contemporânea: “globalização e os processos associados com mudanças globais, incluindo
questões sobre história, mudança social e movimentos políticos” (WOODWARD, 2003, p.
20).
Bhabha conceitua que “o afastamento das singularidades de ‘classe’ ou ‘gênero’
como categorias conceituais e organizacionais básicas resultou em uma consciência das
posições do sujeito – de raça, gênero, geração, local institucional, localidade geopolítica,
orientação sexual – que habitam qualquer pretensão à identidade no mundo moderno”
(2001, p. 19). Ou seja, o ser humano precisa constantemente definir em que categoria se
encontra, para ‘solidificar sua identidade que, conforme Hall (2003), apresentará inúmeras
facetas as quais provavelmente serão inquiridas a todo o momento.
Na perspectiva de Moita Lopes as práticas cotidianas sofrem questionamentos sobre
os modos de viver a vida social. Esses dificultam a compreensão da “classe social, do
gênero, da sexualidade, da idade, da raça, da nacionalidade” (2003, p. 15). Afetam a
concepção de quem somos e de qual o nosso papel na sociedade contemporânea.
Vê-se que a sociedade moderna, motivada por inúmeras mudanças, polemiza os
padrões tradicionais, ou seja, “muitos valores, éticas, ideologias e percepções da vida social
entendidos como verdades naturalizadas, estão sendo profundamente questionados”
(MOITA LOPES, 2003, p. 16).
As identidades do homem moderno, de acordo com Woodward (2003, p. 10), devem
ser idealizadas a partir de sua construção. Nesse sentido, “a construção da identidade” é
“tanto simbólica quanto conceitual”, o que coloca a linguagem como um de seus princípios
constituidores. Por isso, consideramos relevante estudar as relações existentes entre a
linguagem e a identidade na comunidade ucraniana, pois se acredita que as duas se influem
e são influenciadas; formam-se e são formadas, representam-se e são representadas, entre
outros aspectos.
Woodward (2003) estabelece que
a representação inclui práticas de significação e os sistemas simbólicos
por meio dos quais os significados são produzidos, posicionando-nos
como sujeito. É por meio dos significados produzidos pelas
representações que damos sentido à nossa experiência a aquilo que
somos. Podemos inclusive sugerir que esses sistemas simbólicos tornam
possível aquilo que somos e aquilo no qual podemos nos tornar (2003, p.
17).
A representação, entendida como parte da cultura, é aquela que atribui significados
às coisas, que estabelece as identidades coletivas e individuais, bem como os sistemas
simbólicos que podem ser ou não referências ao indivíduo. As identidades são produzidas a
partir dos sistemas de representação. Desse modo, a compreensão de uma comunidade a
partir da cultura contribui para a descoberta da identidade individual e coletiva de seus
participantes. A cultura na sua individualidade soma-se à cultura coletiva que, ao mesmo
tempo, estabelece as diretrizes para o eu individual, ou seja, a individualidade do sujeito é
diluída pela vontade coletiva.
Rajagopalan (2002) reforça esse ponto de vista, enfatizando que é através da
representação que surgem novas identidades, e que as mesmas são constantemente
afirmadas e reivindicadas, pois “só se têm identidades quando há quem as reivindique com
empenho e fervor contínuos” (2002, p. 86).
Para Silva (2003), a representação pós-estruturalista é entendida “como um sistema
de significação,” no qual, são rejeitados “os pressupostos realistas e miméticos associados
com sua concepção filosófica clássica.” Desse modo,
a representação é concebida unicamente em sua dimensão de
significante, isto é, como sistema de signos, como pura marca material.
(...) A representação não é, nessa concepção, nunca, representação mental
ou interior. A representação é, aqui, sempre marca ou traço visível,
exterior ( SILVA, 2003, p. 90 -91).
A representação, na perspectiva pós-estruturalista, congrega à linguagem
características como instabilidade, indeterminação e ambigüidade, quando a “representação
é, como qualquer sistema de significação, uma forma de atribuição de sentido. Como tal, a
representação é um sistema lingüístico e cultural: arbitrário, indeterminado e estreitamente
ligado a relações de poder” (SILVA, 2003, p. 91).
Woodward (2003) defende essa idéia ao definir que a representação é uma forma de
poder, no qual “todas as práticas de significação que produzem significados envolvem
relações de poder, incluindo o poder para definir quem é incluído e quem é excluído”.
Assim sendo, nenhum indivíduo é totalmente livre para situar-se frente às representações
sociais, pois a sua decisão poderá gerar satisfação ou conflito na sociedade.
a cultura molda a identidade ao dar sentido à experiência e ao tornar
possível optar, entre as várias identidades possíveis, por um lado
especifico da subjetividade (...) Somos constrangidos, entretanto, não
apenas pela gama de possibilidades que a cultura oferece, isto é, pela
variedade de representações simbólicas, mas também pelas relações
sociais (WOODWARD, 2003, p. 18 -19).
A identidade, segundo Woodward (2003), é marcada pela construção das diferenças,
ou seja, há uma “dicotomia do tipo ‘nós e eles’. Sendo que essa diferenciação é
importantíssima para a construção das posições de identidade, pois “é a base da cultura
porque as coisas – e as pessoas -ganham sentido por meio da atribuição de diferentes
posições em um sistema classificatório” (2003, p. 39). A marcação da diferença, por sua
vez, ocorre tanto por meio de “sistemas simbólicos”, como por meio “de formas de
exclusão social”. A identidade, conforme Woodward, “depende da diferença”, que pode ser
simbólica ou social (2003, p. 40).
A diferença é compreendida por meio de oposições binárias, ‘tais como a divisão
entre ‘locais (insiders) e ‘forasteiros’ (outsiders), ou ainda, pela afirmação ou negação. Esta
se caracteriza pela exclusão ou marginalização daqueles que são considerados “os outros”.
Aquela, se define por valorizar a diferença, ou seja, a diversidade, a heterogeneidade e os
hibridismos são reconhecidos como fatores enriquecedores.
Para Bhabha (2001), a hibridez, a mestiçagem, são fatores que contribuem para
sobrevivência e para a manutenção das coletividades, principalmente nos momentos mais
críticos da história:
é na emergência dos interstícios – a sobreposição e o deslocamento de
domínios da diferença – que as experiências intersubjetivas e coletivas de
nação [nationness], o interesse comunitário ou o valor cultural são
negociados.(...) Os termos do embate cultural, seja através de
antagonismo ou afiliação, são produzidos performativamente. A
representação da diferença não deve ser lida apressadamente como o
reflexo de traços culturais ou étnicos preestabelecidos, inscritos na lápide
fixa da tradição. A articulação social da diferença, da perspectiva da
minoria, é uma negociação complexa, em andamento, que procura
conferir autoridade aos hidridismos culturais que emergem em momentos
de transformação histórica (BHABHA, 2001, p. 20 -21. Grifos do
autor.).
A diferença, então, assume um papel preponderante na constituição da identidade,
pois oferece inúmeras probabilidades de escolha que conduzem à instituição de fronteiras
entre o politicamente aceito e o politicamente refutado:
as formas pelas quais a cultura estabelece fronteiras e distingue a
diferença é aquilo que separa uma identidade da outra, estabelecendo
distinções, freqüentemente na forma de oposições (...) no qual as
identidades são construídas por meio de uma oposição entre “nós” e
“eles”. A marcação da diferença é, assim, o componente-chave em
qualquer sistema de classificação (WOODWARD, 2003, p. 41).
A identidade é, por conseguinte, produzida pela diferença, sendo que o contrário não
ocorre. Por isso, conforme Silva (2003), torna-se necessário:
considerar a diferença não simplesmente como resultado de um processo,
mas como o processo mesmo pelo qual tanto a identidade quanto a
diferença (compreendida, aqui, como resultado) são produzidas. Na
origem estaria a diferença – compreendida, agora, como ato ou processo
de diferenciação (2003, p. 76).
Isto posto, é interessante expor que Woodward (2003) explicita que entre identidade
e subjetividade há uma sobreposição considerável, as quais, ao mesmo tempo, se
distinguem e se relacionam.
ASubjetividade” sugere compreensão que temos sobre o nosso eu. O
termo envolve os pensamentos e as emoções conscientes e inconscientes
que constituem nossas concepções sobre “quem nós somos”. A
subjetividade envolve nossos sentimentos e pensamentos mais
individuais. Entretanto, nós vivemos nossa subjetividade em um contexto
social no qual a linguagem e a cultura dão significado à experiência que
temos de nós mesmos e no qual nós adotamos uma identidade. Quaisquer
que sejam os conjuntos de significados construídos pelos discursos, eles
só podem ser eficazes se eles nos recrutam como sujeitos. Os sujeitos,
são, assim, sujeitados ao discurso e devem, eles próprios, assumi-lo como
indivíduos que, dessa forma, se posicionam a si próprios. As posições
que assumimos e com as quais nos identificamos constituem nossas
identidades (2003, p. 55).
A subjetividade é, então, a marca do indivíduo, no qual a inconsciência está inclusa.
Assim, a subjetividade projeta a pessoa para as tomadas de decisões que podem estar
associadas ao racional, ou ao irracional. E que, por assim ser, pode ter um caráter de
negação entre a opção escolhida e a opção desejada pelo indivíduo. Por isso a pessoa, em
muitos momentos, tomará as decisões impostas pelo grupo social em que vive.
Caminha-se para o entendimento da subjetividade e da identidade quando se
distingue o inconsciente vinculado aos desejos contidos do consciente, que alicerça as
forças sociais. Para tanto, conforme Woodward,
a idéia de um conflito entre os desejos da mente inconsciente e as
demandas das forças sociais, tais como elas se expressam naquilo que
Freud chamou de supereu, tem sido utilizada para explicar
comportamentos aparentemente irracionais e o investimento que os
sujeitos podem ter em ações que podem ser vistas como inaceitáveis por
outros, talvez até mesmo pelo eu consciente do sujeito (WOODWARD,
2003, p. 62).
Cuche argumenta que “a identidade se constrói, se destrói e se reconstrói segundo as
situações” (1999, p. 198). Desse modo, o sujeito, desde o seu nascimento, constitui a sua
identidade, a sua história, mas isto não o afasta das possibilidades de mudança, mediante
inúmeras circunstâncias.
Sarup (1996) elucida que a identidade é contraditória e fragmentada. Desse modo,
“o eu” é inacabado, incompleto, ou seja, está em processo, sendo que a identidade do
indivíduo é construída na e pela linguagem. Portanto, a identidade pode ser mudada, pode
ser híbrida ou múltipla. É constituída através da comunidade: família, religião, nação,
estado; atravessa os limites e as fronteiras, tornando-se um espaço multidimensional, no
qual uma variedade de escritos se misturam e se opõem. São citações de vários centros de
cultura, aparatos ideológicos e práticos: pais, família, escola, local de trabalho, mídia,
partidos políticos e Estado. A identidade é construída pela diferença, por aquilo que opõe,
por aquilo que é diferente, pelo outro, e esse outro se constrói a partir do cultural, que por
assim ser tem como alicerce os valores sociais e morais,
a identidade é contraditória e fragmentada. A identidade no pensamento
pós-moderno não é uma coisa; o eu é necessariamente incompleto,
inacabado, é o sujeito em processo. (...) a identidade é construída na e
através da linguagem. (...) é sempre dentro das representações que nos
reconhecemos. Ademais, a identidade está sempre relacionada àquilo que
alguém não é -o Outro. Devemos lembrar que só se pode conceber a
identidade na e através da diferença. (...) Um sentimento de diferença
pode fortalecer a solidariedade de um grupo minoritário especialmente se
está enfrentando ameaças de grupos dominantes (SARUP, 1996, p. 47.
Grifos de autor.).
Portanto, pode-se dizer que no momento vive-se uma forte crise de identidade,
sendo que há tentativas de extinguir esta crise através do resgate das culturas e de
identidades que em algum momento foram consideradas as únicas ou verdadeiras, como é o
caso da comunidade ucraniana de Cascavel que, a todo o momento, busca reafirmar a sua
identidade étnica e cultural por meio da língua e da religião. Ou seja, entre os imigrantes e
descendentes de ucranianos há sempre a preocupação em manter a cultura, visto que há
inúmeros fatores sociais, globalizantes que podem contribuir para a extinção de uma cultura
que, como os participantes da entrevista afirmam, é “milenar”.
Ao realizar-se uma reflexão sobre a identidade e a cultura étnica, surge um
questionamento sobre a língua, ou seja, até que ponto pode-se afirmar que a língua é
constituinte da identidade e da cultura étnica? Ou, até mesmo, até que ponto pode-se
assegurar que a identidade e a cultura étnica constituem a língua?
Longe de apresentar respostas para os questionamentos acima expostos, buscam-se
alguns aportes que auxiliam na compreensão dessa relação existente entre a língua, a
identidade e a cultura.
Desse modo, pretende-se comentar brevemente sobre a identidade relacionando-a a
língua. O termo língua tem várias definições. Sendo que a definição mais ampla é aquela
que trata a língua como um sistema de símbolos, o qual é flexível, pois sofre mudanças com
o transcorrer dos tempos. Segundo Bakhtin (1982, p. 90) a língua é um sistema de normas
mutáveis, o qual sofre mudanças constante e ininterruptamente.
A linguagem é parte integrante da vida do ser humano, pois é empregada como
meio de comunicação, o que a elege como sendo fator imprescindível nas relações sociais.
Ou seja, através dela o sujeito está inserido ao seu grupo social, como a toda sociedade. Ela
está relacionada à interação social que pressupõe ação, pois é através dela que o ser humano
age e interage em seu meio, mostrando e construindo o seu papel histórico-social em um
determinado tempo. O indivíduo produz o seu discurso a partir das representações que
possui sobre a realidade que o cerca. Dessa forma, o discurso está vinculado ao tipo de
situação que o produziu; o discurso caminha para a satisfação do interlocutor, ou seja, há o
jogo de interesse. E por isso, convencer o outro acerca de suas convicções, pensamentos,
ideologias é o seu principal papel, estabelecendo assim muitas relações.
Essas relações entre interlocutores, por sua vez, variam de acordo com o contexto
histórico em que se situam, pois conforme com quem se fala, o que se fala, para que se fala
e em que época, ou situação se fala, acontece a ação que sugere inúmeras reações do
¨ouvinte¨. Por isso, a fala não se desvincula do papel do sujeito, ao contrário, transparece
toda a sua subjetividade dos sujeitos.
A linguagem é viva, sofre mutações e pode transformar o mundo. Possui uma
natureza social, na qual está inserido o caráter dialógico e interacional da língua, pois tudo
o que se diz ou se escreve, dirige-se a interlocutores concretos que, numa relação dialógica,
trocam idéias sobre o mundo. Assim sendo, o conhecimento se constrói nesse processo de
interação.
Segundo Bakhtin (1982), a língua reflete as relações sociais dos interlocutores.
Logo, a língua carrega marcas de suas histórias, de quem a produz, do lugar onde é
produzida e em função de que(m) é empregada. A língua passa a ser conhecida pelos
enunciados concretos que ouvimos e (re) produzimos na interação com as pessoas que nos
rodeiam.
Bakhtin (1982), ao apresentar conceitos sobre as narrativas, enriquece a análise da
construção e reconstrução dos processos identitários, pois ressalta o quanto o diálogo faz-se
essencial na construção da consciência de cada indivíduo. Diálogo esse que é multivocal, e
que se produz na interlocução e interação de forças centrípetas, isto é, na necessidade de se
ligar ao outro, e de forças centrífugas, na necessidade da diferenciação do outro. Teoriza
ainda que a comunicação social “(...) se dá pela interação verbal realizada através da
enunciação ou das enunciações. A interação verbal constituiria a realidade fundamental da
língua” (1982, p. 123). Além disso, o autor salienta que a interação se constitui, também,
pelos fatores extralingüísticos (gestos, olhares, posturas), pois estes podem sugerir
inúmeros significados.
Para Rajagopalan (1998), a identidade de um indivíduo é construída na língua e
através dela. Para tanto, “o indivíduo não tem uma identidade fixa anterior e fora da
língua”, pois a língua, bem como as identidades, estão em constante evolução, ou seja,
“estão sempre num estado de fluxo” (1998, p. 41-42).
Portanto, é a partir da língua, do indivíduo e da sociedade que a identidade é
construída. Desse modo, o indivíduo se constrói na e pela língua. Ou seja, a língua, assim
como as identidades, são constituídas na interação com o outro. A interação é, então, fator
preponderante para o reconhecimento dos indivíduos em uma determinada prática social.
Segundo Loureiro (2004), a identidade não é imutável, estática, ao contrário é algo
em permanente mudança, “a identidade nunca é estabelecida como uma realização, na
forma de uma armadura da personalidade ou de qualquer coisa estática e imutável, é um
processo em permanente construção” (2004, p. 51).
A identidade deve ser vista como algo que vive uma constante evolução, (re)
criando novos significados, e que, por assim ser, nunca se completa.
Loureiro (2004), ao citar Erickson (1976), expõe que “o homem sempre precisou
sentir que pertencia a um grupo especial (nação, grupo étnico, família, ocupação), cujos
ideais e hábitos ele ostenta e defende contra outros grupos que forem sentidos como uma
ameaça – esta é uma necessidade evolucionária do homem. (...) a identidade de uma pessoa
ou grupo é relativa a de outras pessoas ou grupos, tendo portanto, uma significação étnica”
(2004, p. 53). Desse modo, o sujeito age de acordo com o contexto, com o meio em que se
encontra, buscando o entendimento com as pessoas com as quais interatua. Todavia, o
indivíduo não possui apenas uma identidade homogênea, mas inúmeras identidades que
convivem simultaneamente. Há uma complexidade de identidades, e nelas são
considerados: classe social, gênero e outros. Como afirma Moita Lopes (2002), “a natureza
fragmentada das identidades sociais se refere ao fato de as pessoas não terem uma
identidade social homogênea como se pudessem ser explicadas somente por sua raça”
(2002, p. 61).
A identidade é estruturada a partir da relação com o outro, isto é, é no convívio
mútuo que a identidade é “moldada”.
Damke (1998) expõe que quando falamos em identidade, bem como em a
língua/linguagem, estamos nos referindo a algo que é dual, ou seja, a língua é
ser individual, mas ao mesmo tempo ser também coletivo (...) Não se
pode falar em língua, variação lingüística, sem que esteja ligada à
identidade do próprio falante. Por outro lado, também não é possível falar
em construção do sujeito ou da identidade do indivíduo, sem se falar
também da identidade étnica, do aspecto cultural, e portanto também, da
própria identidade lingüística (1998, p. 19).
Goffman (2002, p. 11) enfatiza que a identidade se desenvolve através da interação,
ou seja, o interlocutor também influencia na constituição da identidade. Um sujeito em
sociedade, ao deparar-se com um grupo de pessoas, irá agir de tal forma que possa obter
informações que o ajudarão na sua interação com o grupo, bem como a favorecer na
concretização dos seus anseios com relação ao grupo, ou seja, “a informação a respeito do
indivíduo serve para definir a situação, tornando os outros capazes de conhecer
antecipadamente o que ele esperará deles e o que dele podem esperar” (GOFFMAN, 2002,
p.11).
Através desse acontecimento, pressupõe-se que todo ato social é, também, um
momento de representar, pois o ser humano de alguma forma é um ator que tem por
interesse, em um determinado ato, causar impressões, isto é, almeja projetar, implícita ou
explicitamente, um determinado tipo de personalidade, uma determinada impressão acerca
de sua pessoa, como forma de proteger-se do olhar subjugador da sociedade, o que sugere
que o sujeito utiliza inúmeras máscaras, conforme o ambiente social em que se encontra.
Essas representam
a concepção que formamos de nós mesmos – o papel que nos esforçamos
por chegar a viver – esta máscara é o nosso mais verdadeiro eu, aquilo
que gostaríamos de ser. Ao final a concepção que temos de nosso papel
torna-se uma segunda natureza e parte integral de nossa personalidade.
Entramos no mundo como indivíduos, adquirimos um caráter e nos
tornamos pessoas (PARK, 1950, apud GOFFMAN, 2002, p. 27).
Desse modo, o “eu social” numa situação interativa “é actuado como numa obra de
teatro, manipulado como num jogo estratégico (...). Quando surgem situações
desconcertantes, os participantes na interacção providenciam os concertos possíveis do que
aparece como desconcertante” (PAIS, 2003, p. 14).
A representação se refere “a toda a atividade do indivíduo que se passa num período
caracterizado por sua presença contínua diante de um grupo particular de observadores e
que tem sobre estes alguma influência.” Para que a representação aconteça, o indivíduo se
utiliza da fachada que é “o equipamento expressivo de tipo padronizado intencional ou
inconscientemente empregado pelo indivíduo durante sua representação” (GOFFMAN,
2002, p. 29).
Mendes (2002) salienta que a dinamicidade da identidade tem a ver com as
colocações de Goffman (2002), em que as identidades são múltiplas, flutuantes e
situacionais,
as ‘faces’ são construções sociais, derivadas das regras do grupo e da
definição da situação, o ato de manter a ‘face’ numa dada atividade
implica uma atenção ao lugar que o indivíduo ocupa na ordem social, aos
constrangimentos exteriores e à interação imediata. Para manter o auto-
respeito e o orgulho durante um encontro, o indivíduo deve ser capaz de
esconder ou evitar qualquer tendência para se envergonhar ou responder
inadequadamente, deve ter tato e discernimento (GOFFMAN, 2003,
apud MENDES, 2002, p. 507).
As representações sugerem a necessidade de o indivíduo ser aceito pela sociedade,
de ter o direito de pertencer a determinado grupo, de se “apropriar” do direito de pertencer
a determinada etnia.
Segundo Loureiro (2004), “no processo de identificação étnica, as pessoas se
identificam com características escolhidas dentre um leque de opções culturalmente
definidas, e que obedecem a um padrão que rege determinado sistema interétnico” (2004,
p. 71). Conseqüentemente, ao relacionarmos tal conceito com o nosso objeto de pesquisa
comunidade
de descendentes ucranianos -verificaremos que o processo de constituição de
identidades advém de várias formas, seja pela interação com amigos, igreja, família, grupos
sociais e estudos, como pela identificação com fatores ligados à modernidade (mídia,
tecnologia), que contribuem para a simultaneidade de várias identidades em um único
sujeito.
Convém ressaltar que, para os imigrantes e descendentes ucranianos, “a preservação
da identidade certamente deveria passar pelo rito e pela religiosidade do povo” (HANICZ,
1996, p. 14). Não é possível se falar em identidade e cultura ucraniana sem tratar sobre sua
religiosidade.
Hall (2005, p. 105-106) define que a identificação está acoplada ao reconhecimento
de uma origem comum, bem como as características compartilhadas por grupos ou pessoas
ou, até mesmo, a partir de um grande ideal dentro de um mesmo grupo. Por isso, pode-se
afirmar que a identificação é construída a partir daquilo que une o grupo, ou daquilo que
constitui a solidariedade e a fidelidade.
Mey (1998, p. 70) afirma que um dos fatores principais para o estabelecimento de
uma identidade étnica é a língua. Para tanto, um aprendiz de uma determinada língua
estrangeira, mesmo que se esforce para imitar o sotaque daquela comunidade, em algum
momento sofrerá a identificação de ser um sujeito estrangeiro: “um sotaque estrangeiro
será sempre comentado e, em ocasiões especialmente infelizes, será usado contra o falante”
(MEY, 1998, p. 75). Desse modo, pode ocorrer a exclusão das pessoas ao invés da
inclusão, pois a supervalorização da língua nacional, da cultura, deteriora a língua e a
cultura do outro, ou seja, pode ocorrer a relação entre o dominante e o dominado.
É preciso ressaltar que a identidade, de acordo com Fuller (2006), é caracterizada
pelo pertencimento socialmente construído a um grupo ou categoria. O que torna difícil, na
“análise da construção das identidades”, relacionar “as características associadas a este
grupo ou categoria, as normas culturais do grupo e as características de seus membros”
(FULLER, 2006, p. 27).
Diante desta reflexão, pode-se levantar a pergunta: quais características constituem
a identidade do sujeito falante ucraniano no contexto pesquisado?
No nosso estudo, a peculiaridade de um indivíduo está associada à religião, pois
sem ela os descendentes de ucranianos teriam perdido a língua e todo o legado cultural de
sua descendência.
Para concluir, é possível afirmar que a identidade, a cultura e a língua constituem
um triângulo, no qual não é possível refletir as três concepções separadamente, do mesmo
modo que não é plausível imaginar o indivíduo tripartido. Assim sendo, a identidade, a
cultura e a língua é o todo da pessoa. Sem elas não há indivíduo.
CAPÍTULO 4
OS DADOS ÉTNICO-RELIGIOSOS E ESCOLARES DA COMUNIDADE
UCRANIANA EM CASCAVEL
Na seqüência faremos a análise de aspectos lingüísticos, culturais e étnicos, que
formam o contexto bilíngüe do grupo pesquisado, e que são fatores que motivam a
manutenção ou não da língua ucraniana entre as pessoas do grupo.
Neste capítulo, apresentam-se os dados coletados através de um roteiro de
entrevistas que originou as narrativas. Foram entrevistadas cinco famílias, sendo duas do
interior do município, e três da zona urbana. Também foram entrevistadas pessoas que
fazem parte da comunidade religiosa: Padre, Irmãs, Presidente do Grupo Folclórico
Sonhachnek, Presidente da Associação Cultural Ucraniana de Cascavel, Professor do
CELEM. Total de quarenta e cinco entrevistados.
Serão expostos aspectos que caracterizam a língua ucraniana, bem como uma
análise contrastiva das etnias ucraniana e polonesa, pois as mesmas muitas vezes não são
percebidas, por outras etnias, como diferentes, como no próprio grupo, em que há um misto
de separação e igualdade.
Além disso, as redes de comunicação compostas pelas famílias serão apresentadas,
sendo que nessas há a ocorrência de casamentos interétnicos que desfavorecem a
manutenção da língua ucraniana.
4.1 A MEMÓRIA, A HISTÓRIA E A LÍNGUA.
Nesta seção, enfocam-se alguns aspectos relacionados com a memória dos nossos
entrevistados, como forte aliada para a manutenção da história da igreja e da língua, pois
não é possível separar, na nossa pesquisa, a história e a memória dos entrevistados, da
história da igreja, bem como, da língua ucraniana, já que toda essa complexidade atua no
sentido de preservar e manter as origens da etnia ucraniana, pois é através da memória que
se formam e se preservam a cultura e a identidade de um povo.
Na comunidade ucraniana, observa-se que a maioria dos membros que fundaram a
igreja, são pessoas idosas que gostariam de rememorar o passado, relembrar os fatos
vivenciados e, ao mesmo tempo, emocionar-se com os mesmos. Essas pessoas, então, são
aquelas que acreditam “nas próprias lembranças e interpretações do passado, na sua
capacidade de colaborar para escrever a história – e confiar também em suas próprias
palavras: em suma, em si mesmo”, conforme Thompson (1992, p. 40).
Pollack afirma que:
a memória, essa operação coletiva dos acontecimentos e das
interpretações do passado que se quer salvaguardar, se integra, como
vimos, em tentativas mais ou menos conscientes de definir e de reforçar
sentimentos de pertencimento e fronteiras sociais entre coletividades de
tamanhos diferentes: partidos, sindicatos, igrejas, aldeias, regiões, clãs,
famílias, nações etc (POLLACK, 1989, p. 08).
O que sugere que a memória, ou seja, a referência ao passado é uma forma de
manter a coesão dos grupos e das instituições que compõem uma sociedade. Nesse sentido,
a comunidade ucraniana e, em especial, os fundadores da igreja no município de Cascavel,
através dos fatos (re)visitados pela memória, conseguem manter a coerência do grupo, do
mesmo modo que impulsiona nos mais jovens o desejo de manter, pelo menos parte,
daquilo que foi vivenciado pelos antepassados.
Halbwachs (2004) enfatiza que, pela memória, o passado retorna, unindo-se às
noções imediatas, desarticulando-as, preenchendo todo o espaço da consciência. Afirma
também que a natureza da lembrança é social. Por isso, uma questão fundamental acerca da
memória coletiva seria a sua fundamentação para cada indivíduo, no sentido de conectar as
diversas memórias dos indivíduos que fazem parte do grupo aceito como proprietário
daquela memória:
para que nossa memória se auxilie com a dos outros, não basta que eles
nos tragam seus depoimentos: é necessário ainda que ela não tenha
cessado de concordar com suas memórias e que haja bastante pontos de
contato entre uma e outras para que a lembrança que nos recordam possa
ser reconstruída sobre um fundamento comum (HALBWACHS, 2004, p.
34).
A memória individual é, então, um ponto de vista na memória coletiva. Esse ponto
de vista varia de acordo com a posição ocupada na sociedade. Desse modo, “cada memória
individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva, (...) este ponto de vista muda
conforme o lugar que ali eu ocupo, e (...) este lugar mesmo muda segundo as relações que
mantenho com outros meios” (HALBWACHS, 2004, p. 51).
Ainda é possível afirmar, de acordo com Halbwachs, que a história inicia no
momento em que a memória social é apagada. Por isso, a história é algo que os livros e as
narrativas trazem de forma incompleta:
a história sem dúvida, é a compilação dos fatos que ocuparam o maior
espaço na memória dos homens. Mas lidos em livros, ensinados e
aprendidos nas escolas, os acontecimentos passados são escolhidos,
aproximados e classificados conforme as necessidades ou regras que não
se impunham aos círculos de homens que deles guardaram por muito
tempo a lembrança viva (2004, p. 80).
É preciso salientar que a memória é compreendida como algo de suma importância
para o convívio social, para a permanência e a sucessão das mudanças, já que “a memória
do indivíduo depende do seu relacionamento com a família, com a classe social, com a
escola, com a igreja, com a profissão, enfim, com os grupos de referência a esse indivíduo”
(BOSI, 1979, p. 04).
Na comunidade ucraniana, observa-se que as narrativas feitas sobre fatos
importantes que ocorreram na individualidade, formam um contexto maior, ou seja, as
particularidades definem as experiências vividas pelo grupo, em determinado espaço e
tempo. Além disso observa-se que, para os entrevistados, essas idiossincrasias são marcas
de sua cultura, ou seja, para eles toda a vivência histórico-cultural caracteriza-os como
“diferentes” das demais etnias, através da cultura. Como é evidenciado na fala da senhora
quando é questionada acerca da importância da cultura ucraniana, “##.
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As práticas culturais são mencionadas como algo que faz parte de uma tradição
histórica, porém entre os mais jovens, as mesmas estão desaparecendo. Desse modo, inicia-
se a fase do esquecimento, o qual é minimizado com as tentativas de relembrar, como é
exposto nesse fragmento:
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24 “Nada eu esqueço, nada, nada, o que as mulheres cozinhavam, o que assavam, o que... nada,
nada... tudo
pra mim estava bom... em ucraniano né... esta comida, isto que estava cozido...” (A.K., 02/2007)
25“Veja, a nossa cultura é milenar por isso, cuidar da nossa religião, da nossa igreja da nossa língua
é algo
É evidenciado, na comunidade pelas enunciações, o valor da religião para todos os
membros, bem como os valores culturais, sendo que as narrativas em sua maioria, citam as
particularidades, as idiossincrasias da religião dessa comunidade, a fim de mantê-las no
imaginário de todos, inclusive dos mais jovens.
4.2 A LÍNGUA UCRANIANA
O ucraniano, assim como o russo e o polonês, são línguas indo-européias
provenientes do ramo eslavo. Conforme Wouk, para muitos, a língua ucraniana “não
passa de um dialeto russo,” porém ao conhecer “as origens e evoluções dos dois povos,”
não é possível confundir “as aparências atuais com a realidade lingüística” (1981, p.30).
embora a língua ucraniana seja semelhante às outras línguas eslavas,
possui, no entanto, plena autonomia e é completamente distinta do russo,
por exemplo. Como toda a língua, ela sofreu, no decorrer dos tempos,
constante evolução e continua ainda a ser enriquecida de novas
expressões idiomáticas e termos técnicos modernos (EPARQUIA
UCRANIANA DE SÃO JOÃO BATISTA, 1988, p. 27).
O ucraniano e o russo, originariamente formas dialetais de idioma anterior comum,
chegaram ao grau de línguas por fatores políticos, culturais, históricos, portanto: tornaram-
se idiomas oficiais e nacionais dos respectivos corpos políticos – Grão–Ducado, Kêvy e
Moscóvia – e, posteriormente, instrumentos de culturas distintas (WOUK, 1981, p. 30).
A língua ucraniana é representada pelo alfabeto cirílico, que deriva do alfabeto
muito importante para nós. Eu vejo que nós estamos perdendo isso, pois os meus pais falam com a
gente que
é filho em ucraniano(...), mas com os netos é em português. Por que isso? Porque aos poucos as
nossas
características estão se apagando. O Yuri quando foi no Natal na casa dos avós quase ficou louco
quando
aprendeu a tradição de fazer a saudação“######.
####
#
.
Eles não conhecem mais isso, não faz parte da sua vida.” (Família H., 01/2007).
glagolítico.
O alfabeto cirílico surgiu no século X, sob influência bizantina. Esse alfabeto, na
atualidade, é usado num número variado de línguas eslavas (o russo, o bielorruso, o
ucraniano, o búlgaro, entre outros). Na língua ucraniana o alfabeto é composto por 33
letras, sendo que são 22 consoantes e 11 vogais e semivogais.
(Alfabeto ucraíno)26
4.2 LÍNGUA POLONESA E UCRANIANA: SEPARAÇÃO OU IGUALDADE?
Neste trabalho, foi possível constatar, através das entrevistas, uma aproximação e ao
26 Fonte: www. iltec.pt/divling/_pdfs/linguas_ucraniano.pdf. Disponível em: 02/02/2007
mesmo tempo uma separação entre as etnias polonesa e ucraniana, com base na língua. É
interessante verificar que entre os mais idosos, e inclusive, para o padre, essa separação é
bem marcada por aquilo que para tantos é tão semelhante. Ou seja, ao questionar o padre e
as senhoras acerca da pronúncia da palavra perohê ou pierogi (pastel), argumentaram que
perohê é ucraniano e pierogi é polonês, sendo que as diferenças não estão apenas no
léxico, mas também no modo de fazer e, mais especificamente, nos ingredientes. Como se
observa na fala do entrevistado M.L., “não, não, é diferente, não é igual, para os ucranianos
não é pierogi e sim perohê. Perohê é feito de... tem recheio de requeijão,né? já o pierogi
tem o requeijão e o purê de batata” (M.L.,11/2006).
Outros participantes da entrevista, pessoas idosas, afirmaram que não há diferença
entre perohê e pierogi no modo de preparar o alimento. A diferença consiste no léxico,
como afirma a entrevistada na enunciação “nenhuma...não tem diferença nenhuma. A
diferença de perohê e pierogi está no jeito de falá, no léxico” (A.H.,02/2007).
Porém, é interessante ressaltar que todos os que fizeram essa afirmativa conviveram
intimamente com os poloneses, antes de imigrarem para Cascavel. Como ilustra o
depoimento a seguir:
em Gonçalves Junior, em Irati. Tinha a nossa igreja aqui, subia aqui
virava a quadra tinha igreja ortodoxa, lá tinha a igreja polonesa. Três
igrejas juntas. E, mais um pouquinho pra frente tinha a igreja dos
alemães, tudo pertinho, nem duas quadras uma longe da outra. (A.H.,
02/2007).
Entre as gerações mais jovens, todos afirmaram que, mesmo tendo domínio da
língua ucraniana, não conseguem compreender o polonês: “Quem diz que polonês e
ucraniano é igual não sabe... nossa, é tão difícil o polonês. Quando tem dois polaco
conversando, eu não entendo nada, não sei o que eles estão falando. As origens são
diferentes, né?”(B.H., 01/2007).
Porém, é preciso enfatizar que, contrariando os jovens, duas senhoras e um outro
jovem afirmaram, na entrevista, que conseguem compreender a língua polonesa. Uma das
senhoras disse ser possível pelo fato de que, na sua juventude conviveu com muitos
poloneses: “Até polonês... entendo o polonês... lá em Moema tinha bastante polonês. A
gente falava, eu entendo... até o alemão, por causa da convivência, dos vizinhos” (A.K.,
02/2007).
A outra senhora disse que compreende a língua dos poloneses, mas que não a fala,
tendo dificuldade de compreender algumas palavras:
a maioria não, mas que eu entendo muita coisa do que os poloneses
falam, eu não sei falar, mas eu entendo muita coisa que eles falam. E
alemão também, muitas palavras o que eles falam, eu entendo porque a
gente tinha vizinha alemã a gente brincava lá com elas, então ainda
alguma coisa sobrou (A.H., 02/2007).
O jovem afirma que compreende o polonês pelo fato de não haver muitas diferenças
entre a língua polonesa e a língua ucraniana. Para ele, a diferença está apenas no léxico:
“consigo entender o polonês. Pra mim a diferença está ...é no sentido das palavras. Tem
palavras diferentes que tem outro significado, que quer dizer outra coisa. Não é difícil
entender o polonês, apenas algumas palavras.” (A.X.P., 03/2007)
Salienta-se que o jovem A.X.P. mora em Cascavel há apenas sete anos, vindo de
Prudentópolis/PR, onde reside sua família e onde conviveu com muitos poloneses. Ele tem
formação superior, e passou por várias localidades, por questões de trabalho, antes de viver
em Cascavel.
Une-se a essas diferenciações entre língua polonesa e ucraniana a entrevista do
professor de ucraniano que, ao enfatizar a diferença entre as duas línguas, salienta que a
língua polonesa é a única que não possui um alfabeto próprio, como o ucraniano e o russo
possuem. Ou seja, a língua polonesa utiliza o alfabeto latino, ao contrário das demais
línguas eslavas. Logo, de acordo com esse professor, “O polonês é diferente do ucraniano,
o polonês não tem um alfabeto próprio como o ucraniano” (P.L., 04/2007).
As diferenças entre o polonês e o ucraniano são mais marcadas pelos ucranianos,
quando questionados sobre as práticas culturais e religiosas, os quais enfatizam que a
cultura ucraniana, em especial as celebrações (ritos) da igreja, são bastante diferentes da
cultura polonesa, como se pode observar na interlocução comunicativa entre os
participantes da pesquisa,
E.H.: Uma tradição na nossa origem é o ‘Sviatei Vétchir (Santa ceia) que
os poloneses não tem. Que acontece na véspera do natal. Então é assim
nessa janta tem toda a comida ucraniana. Inicia-se com uma oração e
com ‘Kólhadas’ (canções natalinas). Todos sentam e provam as doze
comidas típicas.
A.H.: As canções de Natal, nós somos ricos nisso.
L.M.S.: Só os ucranianos que tem.
A.H.: Os poloneses tinham, mas devagarinho foi se apagando, se
perdendo. (Interlocução comunicativa que ocorreu na entrevista entre
A.H., suas filhas, e L.M.S., 02/2007).
Depreende-se, então, que embora os descendentes de ucranianos e de poloneses
sejam da mesma origem (eslava), os primeiros não gostam de ser comparados e igualados
aos poloneses. Há algumas hipóteses que podem explicar essa busca pela diferenciação,
pela caracterização de cada uma das etnias. Entre elas está o fato de que desde a imigração
dos ucranianos ao Brasil, bem como, dos poloneses, essas etnias não são vistas como sendo
diferentes pelas demais etnias. Talvez seja por isso que os descendentes de ucranianos
revelam minúcias de sua cultura que podem caracterizá-los como diferentes. A cultura e a
identidade étnica é marcada pela diferenciação, por aquilo que não é, ou seja, os
descendentes de ucranianos caracterizam-se por não ser o que são os descendentes
poloneses. Fuller afirma que “o grupo deve ver a si mesmo como distinto de outros grupos
dentro dessa categoria (grupo étnico)” (2006, p. 13).
Além disso, é possível pressupor que os descendentes ucranianos não gostam de ser
confundidos com os descendentes poloneses, por estes sofrerem inúmeros preconceitos
com relação a sua etnia, que é evidenciado, entre outros aspectos, quando recebem o
pejorativo “polaco”. Iarochinski (2000), remetendo-se a Wachowicz (1970), afirma que os
imigrantes poloneses e os seus descendentes foram bastante discriminados no Brasil, no
início deste século:
os estereótipos como polaco sem bandeira, polaco e colarinho não se
enquadram, polaco burro é pleonasmo, levaram alguns descendentes de
poloneses a adquirirem um complexo de inferioridade, em relação à sua
origem étnica. A constatação desse complexo de inferioridade ocorria
sobretudo em camadas sociais intermediárias, entre o camponês e os
indivíduos urbanizados, de cultura superior. O camponês não o possuía
porque os descendentes continuavam na própria classe de origem de seus
antepassados; as camadas urbanas mais cultas também não o possuíam,
devido à própria condição de poder avaliá-lo (WACHOWICZ 1970,
apud IAROCHINSKI, 2000, p. 77 -78)
Porém, ao mesmo tempo em que se percebe uma separação entre descendentes
ucranianos e poloneses, também ocorre uma união, pois há muito mais fatores que os unem
do que os que os separam.
Verificou-se, então, que na mesma medida em que há a separação, também há a
tentativa de unir, conforme a entrevista da senhora A.H., e do jovem A.X.P., que
aproximam a língua polonesa da língua ucraniana. Ao mesmo tempo é praticamente
impossível, nas famílias de descendentes de ucranianos, não haver um casamento
interétnico, ou seja, um dos filhos não ser casado com um descendente de polonês e que,
por assim ser, tenha adotado a religião ucraniana como sendo sua.
Diante do exposto, o questionamento que se faz é se há a busca pela manutenção
das duas etnias, o casamento interétnico seria uma forma de manter a cultura e a religião
vivas?
Em parte pode-se dizer que sim, pois para os descendentes de ucranianos é
importante a manutenção da religião, independente da etnia dos fiéis. Para aqueles é
essencial tornar a religião católica ucraniana “popular”, para que assim não se perca a
tradição. Popular, neste caso, é entendido como algo conhecido por todos. Mas de algum
modo, nessa nomenclatura subjaz a mudança do rito e das tradições religiosas.
Logo, há um misto de aproximação e de separação entre as duas etnias, bem como
de respeito. Porém, de modo algum se percebe a igualdade entre ambas as etnias, ou seja,
sempre há a supervalorização da etnia da qual os entrevistados são descendentes, em
detrimento da outra, à qual não se sentem pertencentes.
4.4 CASAMENTOS INTERÉTNICOS
Neste item abordam-se os casamentos interétnicos, pois se observa que todas as
famílias descendentes de ucranianos apresentam essa realidade. Do mesmo modo, é
extremamente difícil para a Igreja Católica Ucraniana verificar e distinguir quais famílias
não apresentam essa hibridização, ou seja, segundo o Padre da Paróquia, é difícil verificar
quais famílias são descendentes de ucranianos e quais não são, por ocorrer vários
casamentos interétnicos.
Litvin (1998, p.57), alicerçado no livro de registros de casamentos da Igreja Nossa
Senhora do Perpétuo Socorro de Cascavel, afirma que os casamentos interétnicos
começaram a serem realizados a partir de 1977. Uma das maiores dificuldades que a
entrevistadora encontrou foi justamente achar casais cujo casamento não fosse interétnico
pois, embora o livro de Registros datasse de 1977, muitos casais se casaram antes, como é
o caso da entrevistada O. T. C. (66 anos), descendente de italianos, que se casou com um
descendente de ucraniano, em 1961, na paróquia Nossa Senhora Aparecida em Cascavel:
“eu me casei em 1961, na Igreja Nossa Senhora Aparecida, na época era a igreja de
madeira...né ? Bem, depois é que foi construída a igreja... hoje é a catedral. Meu marido
ajudou...construir a igreja nova” (O.T.C., 10/2006).
E ainda há o casal, ela J. W. W., descendente de poloneses, e ele W.W., descendente
de ucraniano, que se casou em Cruz Machado/PR, no ano de 1956. Anos depois mudaram-
se para Cascavel, o que é comprovado no diálogo entre a entrevistadora e a afirmação da
filha do casal,
E.: Sua mãe não é descendente de ucraniano?
B.W.: Não, minha mãe é descendente de polonês, eles se casaram em
1956, em Cruz Machado – PR, e depois se mudaram para Cascavel
(Interlocução comunicativa entre a entrevistadora e entrevistada B.W.,
03/2007).
Verifica-se que há quase cinqüenta anos ocorrem casamentos interétnicos entre os
descendentes de ucranianos e outras etnias, sendo que a cada geração esse número aumenta,
ou seja, entre os mais jovens, com idade inferior a trinta anos, são quase inexistentes
casamentos em que ambos os cônjuges sejam descendentes de ucranianos.
Diante do exposto, é possível delinear o perfil das famílias entrevistadas: quatro
famílias caracterizam-se como pioneiros, têm idade superior a sessenta anos, participaram
da colonização e do desenvolvimento do município de Cascavel, bem como da história e da
solidificação da igreja e da cultura ucraniana em Cascavel. Os patriarcas têm filhos com
idade entre trinta e quarenta anos, cujos cônjuges, em sua maioria, são de outras origens,
principalmente da italiana e netos, com idade que variam entre oito e vinte e cinco anos.
A quinta família apresenta um perfil diferenciado, pois o marido tem 53 anos, e a
esposa 45 anos, sendo que os pais dele foram os primeiros descendentes de ucranianos a
chegarem em Cascavel. Foi através do esforço dessa família que a igreja foi construída
nessa cidade. A esposa nasceu em Rio Azul/PR, mudou-se para Cascavel na juventude,
casou-se e é professora. O casal tem dois filhos em idade de cinco e sete anos. O motivo
pelo qual se optou por essa família é pelo fato de que são participantes ativos da igreja, e
por terem vivenciado a história dos ucranianos em Cascavel, desde o início.
Esse espaço para a abordagem de casamentos interétnicos deve-se ao fato de que
esses casamentos podem induzir ao bilingüismo, como também ao monolingüismo. Fato,
esse, exemplificado por Grosjean (1982), na epígrafe de seu livro, na qual relata o fato de
que o autor, bilíngüe, casou-se com alguém que também era falante de duas línguas
(francês/inglês) e que, mesmo assim, criaram os filhos monolíngües.
Em relação aos casamentos interétnicos, uma senhora de descendência italiana,
casada com um senhor de descendência ucraniana, afirmou que falava com os filhos apenas
em português, pois se fosse ensinar o italiano, o marido teria que ensinar o ucraniano, e que
isso geraria uma confusão. Ela afirma na entrevista:
não ensinei o italiano porque o meu marido ia querer ensinar o ucraniano.
E, como é que eles iam entender tudo isso? Ia ser uma confusão. Como
que eles iam se virar na escola? Iam sofrer como eu sofri. Então,
chegamos a um acordo de que ele não ia ensinar o ucraniano e nem eu o
italiano ( O.T.C., 10/2006).
Pereira (2000, p. 15) afirma que as crianças são levadas ao monolingüismo quando
os pais são falantes de línguas minoritárias, sem status. Nesse caso, para obter
reconhecimento social, opta-se por não ensinar a língua materna à criança, e incentiva-se a
aprendizagem da língua majoritária.
Porém, os filhos mais velhos que tiveram maior convívio com a avó paterna, e que
freqüentavam a igreja diariamente, aprenderam o suficiente para compreender o rito e os
hinos da igreja e, atualmente, freqüentam a igreja assiduamente, além de terem educado os
filhos seguindo os mesmos padrões. Isto é comprovado nessa fala,
comecei a conviver com o ucraniano depois que eu me casei. O meu
marido era ucraniano, falava ucraniano e participava da igreja. Minha
sogra falava com os meus dois filhos mais velho em ucraniano, levava
eles pra igreja. Por isso, eles entende o rito, os hinos da igreja e
incentivaram os filhos para participar da comunidade, do grupo folclórico
(O.T.C., 10/2006).
Uma senhora descendente de ucranianos e casada com descendente de italiano,
cujos pais foram pioneiros em Cascavel, ao ser entrevistada, disse que quando os pais eram
vivos, eles falavam em ucraniano, porém, aos seus filhos ensinou apenas as orações, os
ritos, os hinos da igreja e, algumas palavras. Segundo ela, seus filhos vão à igreja, rezam,
cantam em ucraniano, porém não sabem a língua:
é muito complicado quando se é casada com uma pessoa de outra
descendência. Meu marido é descendente de italiano. Ele participa da
igreja junto comigo, fez parte da diretoria da igreja ucraniana. Mas não
sabe falar ucraniano comigo. Então, eu não tinha com quem falar
ucraniano. E, os meus filhos não aprenderam por causa disso. Eu,
também já esqueci muitas coisas que sabia (L.M.S., 11/2006).
É verificada, então, a dificuldade de se ensinar a língua ucraniana quando se é
casado com alguém que não é descendente da mesma etnia, o que induz os filhos ao
monolingüismo.
Ainda faz-se necessário expor que, para os descendentes de ucranianos, o que tem
contribuído para a manutenção da cultura e da religião ucraniana é a persistência das
famílias em fomentar, nos mais jovens, o desejo de manter essa marca identitária. Desse
modo, a família é o elo de manutenção entre a língua e a religião. Porém, verifica-se que
entre os mais jovens, o conhecimento da língua ancestral não é tão marcado quanto foi para
os seus pais, o que sugere que há um declínio no aprendizado da língua por parte dos
jovens. Constatou-se, na pesquisa nas famílias, que os jovens na faixa etária de 8 a 25 anos,
cujos avós são pioneiros no município de Cascavel, sabem rezar em ucraniano, ou seja,
conhecem o rito, os hinos da igreja, tem um vasto léxico, adquirido no convívio familiar ou
na catequese, porém os avós, afirmaram que não falam com os netos na língua ucraniana.
Se falarem, o que é raro, supõe-se que os netos responderão na língua portuguesa, como
fica evidenciado nessa seqüência: “meus pais falam com a gente que é filho em ucraniano
(...), mas com os netos é em português” (D.H., 01/2007).
O mesmo se comprova nesse trecho de entrevista: “com os filhos eu falo ucraniano,
mas com os netos eu falo em português. Eles sabe rezar, sabe algumas palavras em
ucraniano. Algumas besteira que essa aí ensina. (apontando para a filha), compreendem
alguma coisa, mas eu não falo ucraniano com eles” (A.H., 02/2007).
É interessante observar que em todas as famílias entrevistadas há essa característica,
ou seja, os patriarcas falam com os filhos em ucraniano, porém, os netos não falam com os
avós esta língua, ou seja, entre avós e netos houve a ruptura da língua por meio dos filhos.
Esse acontecimento pode ter ocorrido devido ao desenvolvimento da cidade, à exigência da
língua majoritária no trabalho, pois a língua portuguesa domina em todas as instituições
oficiais; bem como pelo aumento de casamentos interétnicos. Por isso, a língua ucraniana
permanece no espaço religioso e, de forma menos intensa, no espaço doméstico. Essa
língua é importante pelo valor simbólico de relação com o passado e, sobretudo, com a
religiosidade que, ao mesmo tempo, identifica e separa.
4.5 AS CRIANÇAS.
Atualmente, para os imigrantes ucranianos é imprescindível manter a língua para
manter o rito. Essa preocupação é salientada desde a chegada dos primeiros imigrantes,
como entende Burko, pois os ucranianos, quando chegaram ao Brasil, continuaram a falar
“sua bela língua”, sendo que “é a língua do rito próprio. Desejando pois, conservar o rito e
participar nos ofícios litúrgicos, deviam ‘forçosamente’ manter o idioma” (1963, p. 82).
Para isso, atividades são desenvolvidas, sendo que as mesmas são voltadas, em sua maioria,
para as crianças.
Conforme muitos relatos, na catequese, e até mesmo nas missas, é afirmado que a
cultura, a língua e a religião se manterão, se as crianças crescerem com o desejo de
preservar essa riqueza. Assim sendo, as crianças participam da catequese, a qual tem por
meta ensinar os hinos de louvor da igreja, a língua, bem como toda a cultura do povo
ucraniano.
Em uma catequese próxima da Páscoa, as irmãs, como de costume, distribuíram
cestas de páscoa às crianças, e propuseram a brincadeira popular ucraniana chamada
haílkas27, que significa o momento do ressurgir da vida, após a longa temporada de
inverno. Após a implantação do cristianismo na Ucrânia, esta passou a ser festejada em
comemoração à ressurreição de Cristo:
27(ZALUTSKI, apud IVANCHICHEN, 2002) explica que “as haílkas pertencem à criatividade
popular
antiqüíssima, e nela se reflete a alma do povo, a cultura, crenças, mentalidade de épocas
antiqüíssimas. Elas
constituem uma fonte valiosa para o estudo da nossa pré-história. Muitas idéias e palavras antigas
foram
substituídas por novas, mais acessíveis à mentalidade dos novos tempos. Porém, não há dúvida que
se pode
vislumbrar, do conjunto das canções e rituais primaveris ucranianos que chegaram até nós, a
estrutura e
muitos elementos antigos que, apesar de modificados, dão uma idéia geral sobre tempos antigos da
nossa
história” (2002, p.37).
O nome haílkas, bem como para muitos outros, no assunto, deduzem-no
de “hai” (háyi – bosque), onde se reunia a juventude para executar as
canções e apresentar rituais, que aconteciam muitas vezes à beira de um
rio ou em redor de árvores santas.
Entre os povos antigos, especialmente para os eslavos “a natureza age,
movimenta-se, tem sua linguagem, é viva, animada, penetra ativamente o
mundo do comportamento humano(...) Ela é inseparável do homem,
como o homem dela. Os fenômenos da natureza, suas mudanças e forças
causavam não somente admiração entre o povo, mas sentimentos de
veneração, respeito e reverência” ( ZALUTSKI, apud IVANCHICHEN,
2002, p. 38).
Primeiro as irmãs explicaram o significado que remete ao fato de que, na Ucrânia,
os jovens, moças e rapazes, reuniam-se no pátio da igreja para cantar e dançar músicas
populares que marcam a alegria e os namoros. Também é uma tradição milenar que remete
às festividades da chegada da primavera e da ressurreição de Cristo. Porém, em Cascavel,
de acordo com alguns relatos, essa tradição foi esquecida por alguns anos, sendo que há
cerca de dois ou três anos a comunidade tem incentivado o seu retorno. Geralmente ocorre
no primeiro domingo após a Páscoa. De forma bastante singela, tem-se atentado para o fato
de ser uma tradição milenar que ainda existe, e que faz parte da própria tradição ucraniana.
Tradição esta que, mesmo sendo milenar, sofreu tradução cultural que nunca se completa e
que permanece indefinida. De acordo com Hall (2003), grupos dispersos tendem a
preservar as tradições no convívio com outras culturas, pois
Essas pessoas retêm fortes vínculos com seus lugares de origem e suas
tradições, mas sem a ilusão de um retorno ao passado. Elas são obrigadas
a negociar com as novas culturas em que vivem, sem simplesmente
serem assimiladas por elas e sem perder completamente suas identidades
(HALL, 2003, p. 88).
Logo, há uma mescla de tradições na comunidade ucraniana, pois não se perdeu a
tradição milenar dos antepassados, mas essa já não é a mesma de outrora, sofreu mudanças.
Nesse sentido ocorreu e ocorre a hibridização da tradição cultural, que conforme Bhabha
(2001),
não é simplesmente apropriação ou adaptação; é um processo através do
qual se demanda das culturas uma revisão de seus próprios sistemas de
referência, normas e valores, pelo distanciamento de suas regras habituais
ou “inerentes” de transformação. Ambivalência e antagonismo
acompanham cada ato de tradução cultural, pois o negociar com “a
diferença do outro” revela uma insuficiência radical de nossos próprios
sistemas de significado e significação (BHABHA, apud HALL, 2003,
p.74 -75).
Convém ressaltar que ao tentar ensinar as canções e as danças populares às crianças,
na catequese, houve pouco interesse por parte destas. Por isso a Irmã, na tentativa de
convencer as crianças disse: “crianças vocês são o futuro da nossa Igreja. Se vocês não
aprenderem a língua e as tradições da nossa cultura, da cultura dos seus pais e avós, nós não
teremos continuidade dessa riqueza. Nossa cultura e nossa igreja morrerão” (Cenas da
catequese observadas em 04/2006).
Além disso, no início do ano de 2007, a Igreja Ucraniana realizou o Sínodo no
Brasil. Neste, houve a visita dos bispos ao Brasil, sendo que a primeira igreja que visitaram
foi a de Cascavel. Vieram quatro bispos: o representante do Brasil, do Canadá, da Polônia e
dos Estados Unidos.
Para essa recepção foi sugerido que as crianças sentassem nos primeiros bancos da
igreja. Após, a apresentação dos bispos, um deles, representante da Polônia, disse que
estava muito feliz por ver tantas crianças, pois as mesmas representavam a continuidade da
religião ucraniana, ou seja, essa conseguiria manter as tradições religiosas.
Observa-se então que há uma consciência por parte de todos, de que as crianças
serão as mantenedoras da cultura, da língua e da religião. E que caso isso não ocorra, a
igreja tende a sucumbir. Porém há muitas crianças que, devido às influências culturais, ou
até mesmo da modernidade, não estão interessadas em manter essa cultura. Participam das
atividades religiosas ou sociais, como do grupo Sonhachneck, porque os pais as incentivam
ou as obrigam a exercer essas práticas, mas não se identificam em muitos momentos com a
comunidade.
É interessante observar que em muitos relatos de crianças pertencentes à quarta
geração, no Brasil, afirma-se que todos sabem rezar as orações em ucraniano, seguem o rito
da missa, como se comprova na entrevista com a família H., cuja filha de sete anos rezou a
oração do Santo Anjo, “##$#'.
1#+##.
4#####*#'.
)#.
5.
&#.
(#.
)##.
#*##. ####,
!&####, &"##.
.
&####, 1!".
)##.
".
(#)###.
#*###+.
"!-.
.
*#'.
)#., &#".
)##.
".
+#**.
&####$#.
#)###”
28(I.H., 01/2007).
Porém, não se identificam do mesmo modo que os pais com certas expressões
culturais ucranianas. Conhecem o léxico referente a família: 1#*##.
(pai), Mama (mãe),
"#".
(Avô), # .
(avó), #*####.
(tio paterno), #*####.
(tio materno), &!##.
(tia paterna),
&!##.
(tia materna), #.#*#.
(irmã) e ##.
(irmão); o léxico que faz parte da culinária:
Kutiá – um preparo de grãos de trigo cozido, adicionado com mel, sementes de papoula e
passas; Borcth – uma sopa azeda à base de repolho, carne de porco defumada e beterraba;
Perohê – pastéis cozidos recheados de requeijão, que se come com nata, entre outras,
iguarias.
Porém, não utilizam a língua ucraniana com fluência, pois os pais não falam
cotidianamente a língua em casa, devido às influências, seja por o casamento ser interétnico
ou por influências do local onde vivem (escola, amigos, vizinhos), ou até mesmo pelo fato
de passar desapercebido. Tornou-se comum falar com os filhos na língua portuguesa.
28 Oração do Santo anjo: Santo Anjo do Senhor, meu zeloso e guardador, se a ti me confiou a
piedade divina,
sempre me rege, me guarde, me governe, me ilumine. Amém.
Um casal, ao ser questionado em que ocasiões falavam ucraniano, olharam-se e
chegaram à conclusão que por serem descendentes de ucranianos falavam pouco em família
na língua materna com os filhos. Na entrevista, afirmaram que “por nós dois sermos
descendentes de ucranianos, nós falamos bem pouco ucraniano em casa. A gente precisa
falar mais com as crianças” (Família H., 01/2007).
Percebe-se que entre os mais jovens e, principalmente, entre as crianças, os meios
de comunicação os influenciam na preferência pela língua portuguesa, mesmo que a
imprensa escrita ucraniana ofereça materiais, sobretudo para a leitura. Desse modo, as
gerações mais jovens são condicionadas à influência da língua majoritária, mesmo que a
comunidade possua meios para prolongar o bilingüismo na comunidade. Isso é verificado
quando toda a comunidade se encontra nas missas ou em festividades. A maioria dos jovens
não conversa com os idosos na língua minoritária. Desse modo, o que é verificado na
família, os netos conversam com os avós em português, e possuem um conhecimento de
léxico, é constatado, também na comunidade.
4.6 AS MÃES E A LÍNGUA MATERNA
Como foi exposto, a mulher assumiu um papel importante na constituição da
história de imigração dos descendentes ucranianos por isso, embora tenha críticas ao uso do
termo língua materna, neste trabalho optamos por utilizá-lo. Essa escolha deve-se ao fato de
que em nossa pesquisa constatou-se que as mulheres foram importantes para a imigração, e
como mães possuíram e possuem um papel muito importante na manutenção da língua
ucraniana. Skutnabb-Kangas (1988), ao acentuar a importância da língua materna,
questiona: quem vai descuidar da língua aprendida no seio maternal?
Ogliari (1999, p. 327) constata que as mulheres, em Prudentópolis, “foram as que
proporcionaram mais referências sobre a utilização da língua minoritária”, em Cascavel
também verifica-se que a mulher é responsável pela manutenção do universo simbólico
ucraniano, o que sugere que, neste universo, estão inseridos os fatores lingüísticos. A
mulher usa, com maior freqüência, a língua minoritária, em contrapartida à língua
majoritária.
Observou-se que nos casamentos interétnicos, cujas mães são descendentes de
polonês, italiano, ou outras etnias, os filhos não aprenderam a língua ucraniana de forma
proficiente. Os mesmos não se consideram falantes da língua. Em sua maioria, conhecem
apenas aquilo que os aproxima da Igreja Católica Ucraniana ou da culinária. Ainda, há
aqueles que declaram conhecer parte da língua por ter freqüentado colégio de freiras da
Congregação das Irmãs, Seminários, ou até mesmo porque mantiveram uma convivência
profunda com a avó paterna.
Por isso, a mãe na comunidade ucraniana é fator importante para a manutenção da
língua. Isso é comprovado por B.W., 40 anos, aluna do CELEM, filha de pai ucraniano e de
mãe polonesa, que sabe ler e escrever na língua ucraniana, declara que a aprendeu no
Colégio das Irmãs (Convento) em Prudentópolis. Porém, ao ser solicitada que relatasse
algum acontecimento de sua vida nessa língua, não o fez.
O contrário é verificado através da colocação do jovem, de faixa etária de 34 anos,
cuja mãe é descendente de ucranianos, e o pai, como o entrevistado mesmo declarou, “meu
pai é o mais brasileiro possível, não sei quais as raças que ele traz, ele é mineiro, veja pelo
meu sobrenome, não traz a marca da descendência ucraniana” (A.X.P., 03/2007). No
entanto, esse rapaz fala a língua ucraniana com muita propriedade. Isso se explica pelo fato
de que a mãe insistiu para que os filhos aprendessem a língua: “Aprendi a falar em casa
com minha mãe, no convívio com os amigos em Prudentópolis, e quando fui para a escola
lá se ensinava e falava ucraniano” (A.X.P., 03/2007).
Para mostrar o quanto é importante o papel da mãe na aprendizagem ou não da
língua ucraniana, menciona-se o caso de uma família, cuja matriarca não ensinou os filhos a
falarem esse idioma, eles não o aprenderam, mesmo tendo como pai, um imigrante, que
veio da Ucrânia com doze anos e que já havia freqüentado a escola no país de origem. Por
isso não se comunicam em ucraniano. Neste caso, há duas hipóteses para explicar o fato de
os filhos não terem aprendido a língua. A primeira poderia estar relacionada ao fato da mãe
não ter ensinado a língua, o que não é o caso dessa senhora, pois a mesma informa que
tentou ensinar; o outro é o fato de que os filhos não se interessaram em aprender a língua,
ou seja, não sentiram necessidade e nem valorizaram a língua de seus pais. Desse modo,
quando é questionada sobre quais os momentos em que usa a língua ucraniana, a mesma
responde que, “Sempre, sempre e eu gosto de usar. Só em casa que eu não uso, o filho ele
não compreende” (A.K., 02/2007). E ressalta que o filho estudou no Seminário, e que por
isso deveria ter maior proficiência da língua: “Você teve no seminário três anos, você podia
ensinar nós” (A.K., 02/2007).
Diante da resistência de algumas pessoas em aprender a língua, constatou-se que
algumas gerações não apresentavam interesse nisso, caracterizado pela não valorização da
mesma na sociedade como um todo. Assim sendo, não ocorreu a busca pela língua. Isso é
verificado em algumas enunciações de pessoas que fazem parte da terceira e da quarta
geração. Muitos desses explicitam que não se interessaram em aprender a língua, ou até
mesmo, que se interessaram, mas havia preconceito com aqueles que buscavam
aprendizagem da mesma. Como é explanado na enunciação, “(....) é que quando a gente é
criança a gente não valoriza” (L.M.S., 02/2007, na entrevista de A.K.). O preconceito é
verificado na fala: “Acredito que está se perdendo por não valorizar a cultura. Hoje não,
mas antigamente, aprender ucraniano era se rebaixar, era inferior. Então se perdeu parte da
língua” (Ir. L.B. em 02/2007). Nesse caso, a atitude lingüística de aprender, ensinar ou não
a língua dos antepassados pode ocasionar efeitos positivos ou negativos nos usuários de
determinadas línguas, de acordo com Grosjean (1982, p. 122). Desse modo, o estigma
social ligado a língua tende a caracterizar a aceitação ou não da aprendizagem da língua.
Para tanto, não aprender a língua para essas gerações, de alguma forma, conseguia
diminuir o preconceito, ou pelo menos servia para amenizar o estigma de ser descendente
de ucraniano. Além disso, pode-se afirmar que a língua ucraniana era “menos”
estigmatizada por apresentar uma função social (a religião), ou seja, aprendia-se e se
ensinava ucraniano para continuar com o Rito Bizantino nessa língua. A igreja é, então,
uma instituição que colaborou para que o estigma, em tempos difíceis, fosse minimizado.
Ao mesmo tempo em que contribuiu para que, na atualidade, os descendentes sentissem
orgulho de suas origens, e voltassem pelo menos a tentar cultivar a cultura e, sobretudo, a
língua. Por assim ser, “o status de língua da religião, atribuído à língua ucraniana, parece
predominar sobre o de ser símbolo de identidade étnica e delimitação interna e externa do
grupo” (OGLIARI, 1999, p.349). Desse modo, a língua ucraniana é a marca da religião que,
por sua vez, constitui a identidade étnica do grupo.
Constatou-se ainda que os homens possuem uma resistência em falar o ucraniano,
principalmente, diante de estranhos. Por isso, quando eram solicitados a narrar um fato de
suas vidas em ucraniano, os mesmos jogavam a responsabilidade para as esposas, alegando
que elas sabiam falar “melhor” em língua ucraniana. Como é confirmado nas falas: “Ela
pode falar, ela sabe mais que eu” (B.H., 01/2007); e “Você fala, sabe bem mais que
eu”(V.I., 02/2007).
Na atualidade, verifica-se que há a busca por essa língua, até mesmo por aqueles
que em algum período optaram por não aprendê-la. Ou seja, a língua ucraniana não carrega
o estigma que suportou durante anos. Hoje pode-se afirmar que é objeto de valorização
cultural e religiosa na sociedade. Além disso, evidenciou-se, nessa pesquisa, a importância
dos laços afetivos edificados com a língua ucraniana, através das mães e da religião.
4.7 A ESCOLA
É relevante destacar o papel da escola na manutenção da língua ucraniana pois,
desde a chegada dos ucranianos ao Brasil até os dias atuais, é visível o compromisso que
os mesmos apresentam com a instituição.
Nas escolas ucranianas, além dos conhecimentos estabelecidos por programas
oficiais, havia o ensino de língua ucraniana e, com ela, toda a cultura e a espiritualidade do
povo, conforme Horbatiuk (1989, p. 154). Por isso, desde o início da colonização ucraniana
no Paraná, houve um forte apelo por parte dessa etnia, para que todos tivessem acesso ao
ensino, na mesma medida em que continuassem cultivando a língua e a cultura nos âmbitos
escolares.
A preservação da língua e da cultura sempre esteve entre os objetivos principais das
escolas ucranianas. Conforme Bourdieu (1999), a instituição escolar tem o papel de criar
indivíduos que apresentem um conjunto de “esquemas inconscientes (ou profundamente
internalizados) que constitui a cultura.” Porém, a escola não deve ser vista como se
fosse um império dentro de um império e como se a cultura encontrasse
nela seu começo absoluto. Contudo, também parece ingênuo querer
ignorar que a escola, pela própria lógica de seu funcionamento, modifica
o conteúdo e o espírito da cultura que transmite e, sobretudo, cumpre a
função expressa de transformar o legado coletivo em um inconsciente
individual e comum (BOURDIEU, 1999, p. 211-212).
Desse modo, a cultura ucraniana não é encontrada na escola em seu estado absoluto,
mas é nesse ambiente que a mesma é (re)inventada para almejar aquilo que é imposto
numa determinada época. Nesse sentido, a escola trabalha para que a construção da
identidade, nesse caso, a ucraniana, aconteça num determinado tempo histórico, mediante
adaptações e alterações em sua significação. Por isso, através da escola pode-se “observar
melhor eficácia das representações, particularmente das palavras, das palavras de ordem, e
das teorias que contribuem para fazer a ordem social impondo os princípios de di-visão e,
de modo mais amplo, o poder simbólico.” (BOURDIEU, 1996, p. 119 -120).
A instituição escolar, através das práticas discursivas, assume um papel importante
na continuidade da língua ucraniana, bem como na manutenção da sua cultura, pois são
tentativas de construir uma identidade ucraniana, de instituir um imaginário social, de
nomear pessoas e de conceder significados à realidade conforme suas representações.
Entretanto, uma palavra pode se constituir em “práticas diferentes – fornece uma base para
a pluralidade de visões de mundo, também ela ligada à pluralidade dos pontos de vista. Ao
mesmo tempo, é uma base para as lutas simbólicas pelo poder de produzir e impor a visão
de mundo legítima” (BOURDIEU, 1990, p. 161).
A escola ucraniana é um fator significante na manutenção do imaginário social, pois
a mesma trabalha na (re)construção da identidade ucraniana, seja através da língua, seja
através da catequese que acontece no âmbito escolar pelas Irmãs, seja através do
(re)memorar a cultura. A escola é local onde a cultura ucraniana, bem como a língua,
podem ser estudadas e praticadas constantemente, como meio de preservação.
Observou-se que os entrevistados mais idosos não freqüentaram a escola,
regularmente. A maioria deles a cursava quando não havia trabalhos importantes na
lavoura. Porém, nota-se que todos aprenderam a ler e a escrever a sua língua materna, o
ucraniano, com os pais, e que foram aprimorando na catequese.
A escola passou a assumir parte do seu papel quando os filhos dos pioneiros
passaram a freqüentá-la. A escola ucraniana, por ser particular, tinha uma mescla de alunos,
ou seja, recebia filhos de imigrantes ou de descendentes ucranianos, bem como de outras
etnias. Por isso, algumas crianças falavam em português, e outras apenas em ucraniano.
Devido a essa característica, alguns entrevistados expressam a dificuldade que
sentiram ao ingressar na escola falando apenas a língua ucraniana, conforme consta nesse
depoimento: “Eu aprendi primeiro o ucraniano, sofri muito quando fui para a escola, pois
não sabia o português” (D.H., 01/2007). Isso também é comprovado na fala de outra
entrevistada, que ao ser questionada sobre qual teria sido sua primeira língua responde:
“Ucraniano, o português aprendemos na escola, foi difícil de se aprender” (C.G.I.,
02/2007).
Percebe-se em algumas narrativas que a escola, por sua característica (ucraniana) e
por ser coordenada por professores bilíngües, no caso, as Irmãs Servas de Maria Imaculada,
desde o princípio trabalhou para que as crianças não fossem e não se sentissem
estigmatizadas. Isso é evidenciado no trecho abaixo:
eu lembro que quando entrei ali no colégio eu não sabia falar em
português corretamente, meus amiguinhos tiravam sarro e eu pensava
que eles estavam falando mal de mim. Eu lembro que a Irmã Natália que
era ucraniana, que ela me incentivou mais, falava comigo em ucraniano,
explicava o que eles falavam, assim fui me adaptando melhor ao
português (E.H, 02/2007).
Para essa geração, principalmente para aqueles que não sabiam a língua portuguesa,
a educação escolar foi algo traumatizante. Uma das marcas desse trauma é a declaração de
que não sabe falar a língua portuguesa “corretamente”. Conforme se pode observar nesse
diálogo:
A.H.: Eu também quando fui para a escola a primeiro dia eu não sabia
uma palavra em português só que eu tinha umas coleguinhas que eram
vizinha nossa, ela estavam antes entraram no grupo escolar antes foi com
elas que eu consegui entender alguma coisa e começar falá, que até hoje
eu não aprendi
E.: A senhora não sabe o português?
A. H.: Corretamente, o português, eu não falo!
(Interlocução comunicativa que ocorreu na entrevista de A.H., suas
filhas e L.M.S., 02/2007).
Essas convicções acerca de não se falar a língua portuguesa “corretamente” são
observadas nas gerações em que a língua materna não era língua majoritária. Entretanto, na
atualidade, pode-se afirmar que as gerações mais jovens não sofrem esse preconceito, pois
os mesmos entram na escola com o domínio da língua majoritária, ou seja, não falam a
língua ucraniana, como é confirmado na fala da irmã, ao ser indagada acerca de qual é a
língua materna dos alunos que são matriculados na escola: “Não, antigamente tinha, mas
hoje nós não temos alunos que falam a língua ucraniana, desde o berço, apenas alunos que
sabem rezar, conhecem parte do léxico, algumas músicas. Eles dominam a língua
portuguesa” (Ir. L.B. em 02/2007).
Com relação ao CELEM, embora o tempo de implantação seja menor que dois
anos, as expectativas dos alunos em relação ao curso são satisfatórias, pois a busca pelo
mesmo é manifesta entre os adultos, pelo interesse em resgatar a cultura ucraniana, bem
como, a língua para que, através dela, possa haver uma maior aproximação com a
comunidade. Ou seja, é uma tentativa de buscar o (re)conhecimento da cultura.
Esse aspecto foi confirmado na entrevista, quando questionados sobre o motivo
pelo qual buscou-se o ensino de língua do CELEM: “Renovar a cultura, a língua, voltar à
cultura dos nossos antepassados. Ensinar aos filhos para que dêem continuidade a essa
cultura senão nós vamos perder” (M.M., aluno do CELEM, em 04/2007).
E, ainda, pela proposição, “Para me aproximar mais da comunidade e resgatar a
cultura, porque na família a gente já perdeu um pouco da tradição” (V.Z., aluno do
CELEM, em 04/2007).
No entanto, entre os jovens e adolescentes não se verifica o interesse de aproximar-
se da comunidade, de tornar-se “intíma” da mesma por meio da língua. Eles buscam a
aprendizagem da língua por reconhecer nela um determinado poder, ou seja, o fato de se
falar mais de uma língua, além da materna, no caso a língua ucraniana, confere-lhes o
caráter de falantes bilíngües, o que para eles é motivo de orgulho e emancipação social,
pelo menos na comunidade.
Isso é verificado nesse depoimento: “o fato de aprender uma língua que tem o seu
valor, quanto mais conhecimento sobre a língua eu tiver mais eu vou ter facilidade, se por
uma eventualidade viajar para outro país, ou vir pessoas de outros lugares visitar a
comunidade” (A.M., aluna do CELEM, em 04/2007).
Ressalta-se que as aulas do CELEM são ministradas de acordo com os princípios
norteadores da comunidade ucraniana, pois no ensino de língua sempre ocorrem as práticas
religiosas, ou seja, não há a separação entre a religião e o ensino de língua. Desse modo, é
prática dos alunos rezar a oração do Pai-Nosso na língua ucraniana, antes de iniciar as
aulas. Como afirma o professor em um diálogo informal, “rezamos o Pai-Nosso todos os
dias na língua ucraniana, antes das aulas, por sermos participantes da comunidade. Todos
aqui têm algum vínculo com a igreja.”29
Além disso, quando há celebrações diferenciadas na igreja, como as haílkas,
celebrações da Páscoa, ou até mesmo a presença de visitantes ilustres como os Bispos e
outros, os alunos se preparam e participam das mesmas.
Portanto, é possível afirmar que o ensino de língua é algo intrínseco à comunidade
ucraniana. Ele só existe pelo forte apelo lançado pela mesma, ou seja, é através da Igreja
Católica Ucraniana que a língua permanece, pois se ela não tivesse lançado seus alicerces
no Brasil, provavelmente, a língua dessa etnia teria desaparecido no país. Desse modo, o
ensino de língua existe porque há a preocupação da igreja em manter e preservar o rito. Não
há o mesmo interesse por parte das pessoas em aprender língua ucraniana no Brasil, como
ocorre com as línguas comerciais ou de prestígio, como é o caso do inglês, do alemão e
de outras. O objetivo que há em se aprender a língua é para utilizá-la nas
manifestações religiosas e culturais promovidas pela igreja. Para isso, a aprendizagem da
língua é fator importante.
Ressalta-se que a escola tem a função de colaborar para que exista o respeito e a
preservação da língua materna de todas as minorias lingüísticas como forma de manutenção
e respeito pelas diferenças. Além disso, precisa oferecer uma educação, cuja prática
pedagógica inclua a educação bilíngüe.
4.8 A IGREJA, A FAMÍLIA, E SEUS PAPÉIS NA MANUTENÇÃO DA LÍNGUA
UCRANIANA.
29Diálogo informal entre a entrevistadora e o professor de língua ucraniana do CELEM, em abril de
2007.
Nesta investigação é preciso abordar a teoria de redes de comunicação, pois as
mesmas colaboram “para o diagnóstico da manutenção e/ou a mudança de uma variedade
lingüística” (BORSTEL, 2002, p.11). Por assim ser, é possível verificar, por meio desta
pesquisa, as condições de bilingüismo no ambiente familiar, que favorecem a manutenção
ou não do ucraniano na comunidade ucraniana de Cascavel, pois “as redes de comunicação
social envolvem mais do que simplesmente a comunicação, elas formam a teia de ligação
que compõe a rede íntima da vida diária, e como tal envolve os indivíduos em direitos e
obrigações uns aos outros” (DOWNES, 1984, p. 97 apud BORSTEL, 2002 p.11). Assim,
as redes sociais são “as estruturas e as normas de comportamento social, incluindo a
linguagem, que envolvem o indivíduo em seu cotidiano” (OGLIARI, 1999, p. 244).
Bortoni-Ricardo (1989) aponta as atuais tendências para a inclusão das redes de
comunicação nos estudos sociolingüísticos:
os estudos sociolingüísticos de redes têm-se ocupado principalmente de
duas questões: a manutenção ou o deslocamento de línguas ou dialetos
em comunidades tradicionais que começaram a sofrer influências
modernizadoras, e a preservação de dialetos não-padrão de grupos
territorialmente definidos em áreas metropolitanas. Estes grupos
apresentam alto grau de coesão interna em virtude da polarização de
valores sociais, étnicos, religiosos ou políticos (1989, p. 170).
O fator de polarização dos valores enunciados por Bortoni-Ricardo (1989) também
é verificado na comunidade ucraniana de Cascavel, pois o elo de ligação das pessoas está
relacionado às práticas religiosas e familiares que são aglutinadoras e propagadoras da fé,
ao mesmo tempo em que contribuem para a manutenção do sentimento de pertencimento ao
grupo, o que caracteriza a identidade étnica/cultural.
Com relação aos estudos de análise lingüística bilíngüe, os pesquisadores Weinreich
(1953), Mackey (1968), Gumperz (1982) e Skutnabb-Kangas (1988) consideram que duas
línguas possuem função social diversa. Isso é comprovado na comunidade ucraniana de
Cascavel, que apresenta o bilinguismo situacional, no qual os falantes usam
alternadamente os dois códigos, língua ucraniana e língua portuguesa, de modo funcional.
Desse modo, as vivências particulares podem proporcionar as prováveis interações
em uma ou em outra língua, conforme as exigências funcionais da língua e do próprio
contato social. No microcosmo dessa pesquisa, a língua ucraniana é destinada às interações
na família e na igreja. A língua portuguesa é usada nas interações nas demais esferas
sociais.
Nas entrevistas constatou-se que, nas famílias entrevistadas, os membros
pertencentes, não passam da quinta geração, pois os pioneiros são da primeira geração e os
demais são da segunda, terceira, quarta e quinta. Apenas em uma família é diferente: a
matriarca era casada com um imigrante ucraniano que chegou ao Brasil com doze anos de
idade, morou em Santa Catarina, casou-se e após alguns anos, mudou-se para Cascavel,
sendo que ele é considerado o primeiro pioneiro ucraniano a chegar nessa cidade.
Mediante esses dados, procurou-se saber qual o contato que cada pessoa possuía
com a língua ucraniana. Para tanto, foi considerado apenas o falar da língua ucraniana, não
abrangendo a escrita e a leitura, pois conforme Grosjean (1982, apud MELLO, 1999, p. 4344)
não há “bilíngües verdadeiros (...) capazes de funcionar igualmente bem em duas ou
mais línguas em todos os domínios”. Desse modo, “ninguém conhece uma língua em todos
os seus aspectos, mesmo que esta língua seja a nativa, assim como é difícil comparar graus
de conhecimento entre as duas ou mais línguas de que um indivíduo dispõe” (MELLO,
1999, p. 41-42). Por isso, atentou-se para a possível relação/contato existente entre o
ucraniano e o português, e não para o grau de utilização do idioma.
A primeira geração declarou que a língua ucraniana foi a primeira língua com a qual
teve contato, ou seja, foi a sua língua materna, e que preferem utilizá-la para interagir.
Porém, que essa atitude em muitas ocasiões não é aplicada, pois não há interlocutores em
todos os ambientes da sociedade. Dessa forma, resta à primeira geração utilizar a língua na
comunidade ucraniana, especificamente, na família. No entanto, na família o uso da língua
ucraniana é restrito, pois as matriarcas dialogam com os filhos em ucraniano, mas com os
netos o mesmo não ocorre. Por isso, os ambientes religiosos, bem como as festas, os
momentos de encontro são excelentes ocasiões para interagir na língua materna.
É interessante verificar que os ucranianos da primeira geração não são monolíngües,
ou seja, não falam somente a língua ucraniana, mas falam, também, a língua portuguesa.
Isso pode ser explicado pelo fato de ter sido uma imigração não muito expressiva com
relação à demografia populacional, o que os levou à necessidade de aprender a língua
portuguesa, “língua majoritária”, a fim de serem ativos em todos os ambientes da
sociedade, e não somente no religioso, pois a aprendizagem dessa língua pode ser símbolo
de “status” ou símbolo de dominação, como prevê Ogliari (1999, p. 349).
Além disso, percebe-se nessa geração um certo saudosismo com aquilo que passou,
um pesar por aquilo que mudou e que não voltará a acontecer, como é observado na
interlocução comunicativa em que a entrevistada lamenta o fato de a língua, a cultura
ucraniana, bem como parte do imaginário social já tenha se perdido pelas mudanças da
sociedade, pelos efeitos da globalização, ou seja, essa senhora alega que a sua cultura já não
é a mesma de quando era jovem:
A.K.: Lembra. Eu também vou chorar muito, tudo... as coisas antes era
uma e hoje é outra
L.M.S: Mudou tudo
A.K.: Mudou tudo e agora que vai fazer? Abaixar a orelha e ficar quieto.
L.M.S.: Não tem jeito, acompanhar o dia-a-dia. (Interlocução
comunicativa, entrevista de A. K. e L.M.S., em 02/2007).
Na segunda geração, notou-se que a maioria dos falantes considera como língua
materna o ucraniano, porém percebe-se que ocorre, em algumas famílias, o apagamento
dessa língua, com a ascensão do português. Ressalta-se que essa geração, por estar imersa
em um ambiente de trabalho, de estudo, em que há a hegemonia da língua portuguesa, fala
a língua ucraniana apenas na família e na comunidade ucraniana.
Destaca-se que em uma família entrevistada, cuja matriarca é da primeira geração, e
o cônjuge possui nacionalidade ucraniana, os filhos que são da segunda geração por parte
de mãe não falam ucraniano, o que é motivo de grande desgosto para a mesma, como se
observa na fala da entrevistada: “meu filho andou no seminário e não sabe falar e agora ele
vai às vezes dizê porque a mãe não ensinou a falar. Mas meu Deus do céu, mas se isso não
é uma facada?” (A.K. em 02/2007).
Na terceira geração, há uma realidade muito heterogênea, pois ainda há falantes de
língua ucraniana, porém o grau de intensidade da utilização dessa língua diminui
sensivelmente, ou seja, os mesmos fazem uso da língua ucraniana com menor intensidade
que a língua portuguesa. Para eles, o uso da língua ucraniana relaciona-se, intrinsecamente,
com as práticas religiosas. Por isso, os sujeitos dessa geração, no seu cotidiano, por
necessidade ou pelo contato cada vez maior com o português, utilizam-no com maior
intensidade, o que sugere menor contato com o ucraniano.
Destaca-se nessa geração que aqueles que declararam utilizar a língua ucraniana no
seu cotidiano, são os que estão intimamente ligados à igreja, como o Padre e as Irmãs. Ou
seja, a língua ucraniana é parte do seu cotidiano, pois a igreja também o é, como se verifica
na enunciação, “A todo o momento, na hora que preciso dela eu a uso. Como posso dizer,
eu me levanto e faço as orações na língua ucraniana. É um uso diário, no cotidiano” (Irmã
L. B. em 02/2007).
Verificou-se ainda que essa geração é marcada pela aprendizagem das duas línguas,
(língua portuguesa e ucraniana), simultaneamente, ou seja, a maioria dos informantes, ao
serem questionados sobre qual era sua língua materna, responderam que aprenderam o
português e o ucraniano ao mesmo tempo, pois as mães os ensinavam desse modo,
prevendo uma melhor adaptação desses ao convívio com a família, por meio do ucraniano,
e uma socialização eficiente com os vizinhos e com a aprendizagem escolar, através da
língua majoritária. Isso é observado na fala de L.M.S.:
praticamente os dois juntos, porque a mãe tanto ela falava em ucraniano
como em português. Ela falava em ucraniano e em seguida falava em
português pra gente não ter dificuldade, porque já perto da nossa casa
tinha pessoas que falavam só português, brasileiro, né? Pra gente não ter
dificuldades com os vizinhos, a gente falava as duas juntas. Reza, essas
coisas, tudo que ela ia pedir para alcançar, era tudo em ucraniano, agora
falar com os outros ela ensinava em português (L.M.S., 11/2006).
Ou como afirma essa outra entrevistada: “aprendi as duas juntas, a mãe ensinava
isso em ucraniano e isso em português. Pra mim falar ucraniano é a mesma coisa que falar
português, não tenho problemas.” (Irmã L.B., 02/2007).
Desse modo, é possível inferir que as mães ensinavam as duas línguas aos
filhos, para que os mesmos não perdessem contato com a língua dos ancestrais, e sobretudo
com a linguagem religiosa, mas também para que não sofressem discriminação por não
saber a língua portuguesa ou, até mesmo para não chegar à escola sem esse conhecimento.
É evidente então que os descendentes de ucranianos tiveram a preocupação de usar a língua
de acordo com o interlocutor.
Na quarta geração verifica-se que há uma hegemonia da língua portuguesa sobre a
língua ucraniana, pois há interlocutores que sabem a língua ucraniana, porém declaram que
não a aprenderam, integralmente, em casa. Ou seja, falavam em casa em língua ucraniana,
mas no convívio com os amigos, com os vizinhos, a língua que se falava era a portuguesa.
Desse modo, a língua ucraniana foi assimilada na família, mas também em contextos
formais como em escolas e seminários. Aqueles que não tiveram esse acesso perderam
parte daquilo que aprenderam. Esse fato é observado nesse trecho: “Um pouco eu aprendi
com os pais. Geralmente eles falavam com a gente em ucraniano. Aprendi a falar em casa
com minha mãe, no convívio com os amigos em Prudentópolis, e quando fui para a escola
lá se ensinava e falava ucraniano” (P.L. em 04/2007).
No entanto, em uma única família, cujos pais são da quarta geração, a língua
ucraniana sobrepõe-se a língua majoritária, no contexto familiar. Uma das hipóteses que
explica a manutenção em alto grau da língua ucraniana é o fato de que essa família mora
em Cascavel há apenas 12 anos. E além do pouco tempo de residência, é procedente do
interior de uma cidade pequena, no Paraná, onde trabalhavam na agricultura. A família era
de tradição agrícola, e vivia num ambiente envolvido de parentes e vizinhos, descendentes
de ucranianos.
É possível afirmar, que além da religião da família, outro fator de manutenção é
verificado pela tradição agrícola da família, pois a agricultura possibilita uma rede menor
de interlocutores, ao mesmo tempo em que há uma busca pela identificação com as pessoas
daquele ambiente.
Além disso, com a exceção da família citada, as pessoas dessa geração afirmam, em
sua maioria, que a sua língua materna foi a língua portuguesa, como é observado na
proposição: “o português, primeiro foi o português. O ucraniano a gente só falava em casa
com os pais, vá buscar isso, vá buscar aquilo, era ucraniano, mas a convivência com os
vizinhos era em português, brincar a gente brincava em português” (P.L. em 04/2007). Isso
também é afirmado por outro entrevistado quando responde que é o “Português” (V.Z.,
aluno do CELEM, em 04/2007).
Para a quinta geração, com exceção de uma família, a língua ucraniana é
reconhecida por sua característica funcional, ou seja, ela é passaporte para o conhecimento
e o entendimento das práticas religiosas. Assim sendo, essa geração possui uma noção da
língua ucraniana que se manifesta por meio da igreja. Na verdade, a relação existente entre
a quinta geração e a língua ocorre em grande parte por meio da igreja, pois esses mantêm
contato com a língua através da catequese, da culinária, das práticas culturais com o grupo
folclórico Sonhachneck e, mais recentemente, com o curso de língua do CELEM.
A ocorrência da perda do idioma ucraniano pode ser favorecida pelo fato de que as
gerações mais jovens têm contato, tanto na escola como no trabalho, apenas com o
português brasileiro. Por isso, resta à língua ucraniana apenas o espaço da casa, da família,
ou somente o espaço da igreja, pois nesta ainda há programações nessa língua. Essa prática
de não falar a língua ucraniana traz por conseqüência a perda de palavras, expressões e
termos que, com o passar dos anos, são substituídos por outros termos da língua
majoritária, a língua portuguesa.
As famílias entrevistadas possuem ainda uma proximidade com a língua ucraniana,
principalmente entre os idosos. Já entre os mais jovens há a preferência de se usar a língua
portuguesa, mesmo sabendo que a sobrevivência da Igreja Católica Ucraniana depende da
manutenção da língua.
A língua ucraniana sofreu e sofre um processo de socialização, seja na rede familiar,
ou no meio religioso, tornando a prática de utilizá-la na fala, uma tradição. Assim sendo, o
grupo de identificação é o familiar e religioso, que conserva a fala ucraniana, o que resulta
num desempenho lingüístico bilíngüe.
Salienta-se que as famílias entrevistadas, em sua maioria, utilizam a língua
ucraniana, além do ambiente familiar, em manifestações religiosas e festivas da
comunidade, por não terem interlocutores em ambientes externos à mesma. Logo, a opção
de se falar a língua ucraniana ou a língua portuguesa é marcada pelo fator de se ter ou não
alguém com quem se possa interagir. Desse modo, embora haja aqueles que falam o
ucraniano, o predomínio é da língua portuguesa, pois os contextos da língua majoritária são
mais numerosos, ou seja, o campo de ação é maior, enquanto que o da língua ucraniana é
restrito a alguns poucos interlocutores.
A língua portuguesa é para a comunidade, a língua das relações extra-familiares e
formais, ou seja, possui um valor de negociação. Logo, para os falantes bilíngües
(ucraniano/português), a opção de se usar uma língua ou outra está relacionada à
interpretação ou papel dados a cada língua. Assim sendo, o uso da língua está
condicionado pela competência comunicativa que é empregada quando é necessário fazer
esse uso.
Para tanto, verifica-se que nas entrevistas realizadas, quando era sugerido aos
entrevistados que falassem na língua ucraniana, com raras exceções, os mesmos se sentiam
à vontade para se expressar, devido ao fato de que a entrevistadora não era da mesma
descendência, e por isso não conhecia a língua. O contrário ocorria se a entrevistadora era
acompanhada por alguém que conhecia a língua. Percebe-se que isso não ocorria por
resistência em se falar a língua minoritária, mas porque eles não entendiam o interesse da
entrevistadora por uma língua não compreendida pela mesma, e também pela vontade de
que ocorresse a interação. Por isso, desejavam falar e serem compreendidos. Para tanto,
ambos deveriam conhecer o mesmo código, o que não acontecia nesses momentos.
4.9 A PRESERVAÇÃO DA LÍNGUA E DA CULTURA UCRANIANA
Ao serem questionados sobre a importância da língua ucraniana na comunidade,
todos os membros, independente da faixa etária, da geração a que pertencem, ou do papel
que exercem na comunidade, foram unânimes em responder que a língua é fator
imprescindível para a manutenção das práticas sociais e/ou religiosas. Assim aprender a
língua é uma forma de conservar as tradições religiosas e, portanto, culturais. Desse modo,
para os descendentes ucranianos é importante falar a língua pelo fato de esta representar
uma cultura milenar, ou seja, a cultura dos antepassados. Ainda, é por meio da língua que é
possível sentir-se parte da igreja, isto é, a língua possui o papel de aproximar os iguais, no
caso, os ucranianos, e de distinguir os diferentes.
A necessidade da preservação da língua é manifesta na fala de um casal,
“precisamos manter a riqueza cultural da Ucrânia, isso é uma forma de preservar a riqueza
cultural da religião. É nossa, faz parte das nossas raízes, se nós não cuidarmos dela, daqui
há alguns anos nossos filhos e netos não terão mais” (Família H., em 01/2007).
A necessidade de preservar a língua, e com ela todas as manifestações sócio-
culturais, é defendida pelo Padre, quando questionado acerca do valor da língua ucraniana
para a comunidade. Além disso, ele reforça o papel da igreja no processo de manutenção da
língua e das demais práticas culturais,
primeiro lugar a cultura ucraniana, eu diria toda ela mantêm-se sim
devido à igreja, ou seja, nós temos toda centralização da nossa
manutenção da língua da cultura da igreja, devido já quando os próprios
ucranianos vieram, eles se reuniam aonde? Em casa, eles formaram um
núcleo, uma base, e isso se tornou a igreja onde eles despertando a parte
espiritual, bem como mantendo a língua, a cultura, os costumes ao redor
da igreja. É importante sim para que se possa voltar à base, para que se
possa ter os cantos, as danças ucranianas. Você pode até ter uma assim
imagem externa, mas quando consegue acompanhar o raciocínio, a
mentalidade ucraniana, a musica, a dança, ela tem todo um sentido
especial. É necessário, é indispensável ao menos ter uma base da língua
ucraniana, conhecer o alfabeto, ler e escrever era essencial para todos,
né? (Padre M.L. em 09/2007).
O professor de língua ressalta a influência da aprendizagem formal da língua como
forma de sua manutenção,
esses dias nós estávamos conversando na igreja, que ainda hoje nós
conseguimos acompanhar uma missa no rito ucraniano, mas se nós não
mantivermos a língua, não ensinarmos a língua, essa riqueza do rito
bizantino poderá se perder nas futuras gerações. Por isso que preservar a
língua é tão importante (P.L. em 04/2007).
A Irmã da comunidade enfatiza o valor da língua para a prática religiosa:
de suma importância. As nossas orações tudo é em ucraniano. Você sabe
toda tradução é uma traição. Traduzir o rito para o português, não tem o
mesmo sentido que na língua ucraniana. Falta alguma coisa. A língua
ucraniana é importante pelo fato da cultura, da tradição (Irmã L.B., em
02/2007).
Na comunidade, também é unânime que, para a preservação da cultura, e
principalmente da língua e, por conseguinte, da igreja, é preciso fortalecer o que já é
praticado pela comunidade, o ensino formal de língua (CELEM), entre outros. Além disso,
a igreja não pode deixar de realizar as práticas religiosas na língua ucraniana.
Percebe-se que no interior de Cascavel, como nas comunidades de Centralito e
Sapucaia, a língua ucraniana é usada intensamente, sendo que um dos elementos
responsáveis pela harmonia lingüística é a atividade agrícola, já que a maioria dos
moradores e dos descendentes são agricultores, fator que os torna mais próximos e, por
conseguinte, colabora para uma maior utilização da língua ucraniana. Ou seja, a rede de
comunicação no interior do município não é quebrada pela carência de interlocutores. Ao
contrário, enquanto se encontram em ambiente rural, a língua falada é a língua materna.
Essa rede só é desfeita, no momento em que os mesmos precisam deslocar-se para a cidade,
a fim de buscar recursos (Bancos, Cooperativas, hospitais, escolas, entre outros). Desse
modo, os serviços encontrados na zona urbana, de alguma forma, obrigam os agricultores
ucranianos a utilizar a língua majoritária.
Ressalta-se que as famílias do interior têm como lazer, basicamente, as atividades
religiosas da comunidade à qual pertencem. Porém, nessas comunidades, a missa e demais
celebrações são rezadas na língua de origem (ucraniano) e a na língua majoritária
(português). Ou seja, de acordo com as visitas se define em qual língua a missa será
celebrada. Mas com essas implicações, as redes familiares do interior do município são
mais densas, e utiliza-se a língua ucraniana de modo mais intenso, o que sugere que as
relações sociais (religião) e de trabalho (agricultura) garantem um espaço para a língua
marcante, pois a mobilidade social neste espaço é mais restrita.
Diante do exposto, é possível inferir que na cidade, pela convivência com
interlocutores que não sejam da mesma origem, o uso da língua portuguesa tende a ser
favorecido, o que pode sugerir no futuro a perda da condição de bilíngüe em
português/ucraniano. No entanto, no interior, por apresentar uma rede de comunicação mais
densa e fechada, há elementos que favorecem a manutenção da língua minoritária. Desse
modo, o bilingüismo tende a se prolongar por mais tempo. Há fatores que desfavorecem a
manutenção da língua ucraniana na zona urbana, e que a beneficiam no interior.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Reconstruir o percurso histórico-cultural e lingüístico desse grupo étnico de
Cascavel foi um trabalho árduo, principalmente por ser a entrevistadora alguém que
desconhecia essa realidade. Porém, neste estudo foi possível observar o processo de
formação desta comunidade bilíngüe: ucraniano/português.
Através da pesquisa etnográfica, pôde-se resgatar parte da história do município de
Cascavel, bem como, a importância da etnia ucraniana nesse contexto. Para tanto, os
aspectos históricos, religiosos e lingüísticos dessa minoria foram delineados.
Há a confirmação de que em Cascavel, uma cidade de médio porte, existem
indivíduos bilíngües, que fazem uso, neste caso, do ucraniano e do português em diferentes
situações, de modo significativo.
A existência da língua ucraniana, apesar de tantas adversidades, é marcada pela
existência da Igreja. Ou seja, a manutenção e a preservação da língua está relacionada à
fidelidade religiosa mantida pelos Padres, Irmãs e demais membros da Igreja, desde as
origens na Ucrânia. Por isso, o modo de ser do grupo, isto é, os aspectos lingüísticos,
culturais e étnicos são marcas importantes para caracterizar a identidade e o imaginário
simbólico daqueles que participam da igreja.
A igreja, nessa comunidade, é o meio mais eficaz de manutenção da língua. Sem
ela, a língua ucraniana, provavelmente, teria desaparecido. Por ser influente, atua nas
famílias, na educação dos filhos, na escola, e proporciona uma liturgia bilíngüe. Desse
modo, a igreja e a família trabalham unidas para a manutenção da língua dessa etnia, ao
mesmo tempo em que interferem na definição dos padrões de escolha ou não da língua
ucraniana, o que acarreta a interferência no uso, na preservação e na manutenção da
mesma.
Por assim ser, todos os entrevistados acreditam que a Igreja Católica Ucraniana,
para celebrar na língua de origem, e mais que isso, para que os membros se identifiquem
com o rito, é preciso que a língua dessa minoria se mantenha. Sendo assim, não basta
continuar celebrando as missas na língua ucraniana, é preciso que todos se identifiquem,
que se sintam parte dessa cultura, dessa religiosidade. Para isso, é preciso preservar a língua
no grupo, principalmente, entre os jovens, a fim de “criar” uma identidade cultural,
lingüística e religiosa. Caso isso não aconteça, a igreja tende a celebrar o seu imaginário
religioso a membros que desconhecem ou que não se identificam com o mesmo.
É possível afirmar que a religião é uma forte aliada para a preservação da história, e
sobretudo da língua.
Ao verificar que as identidades estão em constante mudança, pode-se considerar a
hipótese que as situações vivenciadas pela comunidade ucraniana, na atualidade podem-se
modificar. No entanto, é relevante esclarecer que há, para alguns, um envolvimento com as
práticas e padrões tradicionais, há o sentimento de pertencimento, o que não denota que
estes sujeitos não mudem de opinião. Conforme Hall,
as comunidades migrantes trazem as marcas da diáspora, da hibridização
e da difference em sua própria constituição. Sua integração vertical a suas
tradições de origem coexiste como vínculos laterais estabelecidos com
outras ‘comunidades’ de interesse, prática e aspiração reais ou
simbólicos. Os membros individuais, principalmente as gerações mais
jovens são atraídos por forças contraditórias. Muitos ‘estabelecem’ seus
próprios acordos ou os negociam dentro e fora de suas comunidades
(2003, p 83).
Para finalizar, recorre-se à epígrafe, em que a poetisa Helena Kolody, em poucas
palavras, soube expressar como ninguém a alma e a identidade da etnia ucraniana, pois ao
observar traços e particularidades dessa comunidade, e a forma apaixonante com que trata
aspectos da sua arte milenar, de modo que indivíduos de outras etnias venham a desejar e a
fazer parte das atividades do imaginário religioso desse grupo, pode-se dizer que Kolody é
pertinente quando diz que “A Ucrânia não morrerá jamais...”. Apenas ressalta-se que, para
ela, esta etnia não desaparecerá “enquanto houver um grupo jovem que dance suas danças
típicas”. Porém, é possível afirmar que “A Ucrânia não morrerá jamais enquanto houver”
uma Igreja Católica Ucraniana em que não se deixe esquecer, e em que se trabalhe para que
os membros não abandonem a riqueza cultural existente.
Por fim, conforme Grosjean, “quando o grupo étnico está emocionalmente ligado à
língua, tem orgulho dela e de sua herança cultural não mede esforços em mantê-la e passála
para seus filhos” (1982, p.110). Assim o é com as famílias de origem étnica ucraniana da
comunidade de Cascavel.
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APÊNDICE A ENTREVISTAS CONDUZIDAS COM AS FAMÍLIAS
1-Entrevistados: E. H.; A. H.; M.H., em 02/2007.
Contexto: Esta é a primeira entrevista em família. É o núcleo familiar A. H, cujas filhas são
E.H., M. H. Está presente uma das filhas, após chegaram mais uma filha e a matriarca.
Além da senhora que me acompanhou. O pedido de gravação deixa-as tímidas, mas pouco a
pouco, a conversa flui normalmente.
E: Nome e sobrenome?
E.H.: Elicéia Horinki
E: Idade?
E.:38 anos
E.: Grau de escolaridade?
E. H.: Somente o primeiro grau.
E: Primeiro grau.
E. H.: Daí comecei a trabalhar e a situação financeira era meia apertada muitos filhos, né?
E os pais não se interessaram muito em deixar a gente estudar né? Tinha emprego garantido
e tudo e... e assim né? Pra eles o salário tava vindo tava bom né? Com doze filhos né?
E.:Onde nasceu?
E.H.:Wenceslau Brás, Paraná fica no norte.
E.:Há quanto tempo está em cascavel?
E. H.:Ah! Eu vim com dois anos, então já faz 36 anos.
E.: Quais os motivos que o trouxeram essa cidade, pra Cascavel?
E. H.: Meus pais vieram por, sinceramente eles saíram de lá pensando numa situação
melhor aqui né? Que lá era uma terra de café, mas a produção do café não deu muito bem
né? e daí e muitos filhos, né? Quer desligar? (o gravador)
(A filha junto com a matriarca chegou)
E:Não eu continuo, depois eu continuo.
L.: Oii!!
A. H.:Tudo bem?
L.: Tudo. Tô eu aqui incomodando de novo a dona Ana.
A. H.: Ai que incômodo.Que bom que está. Tudo de bom?
L:Eu fico tão contente quando vejo ela cada dia melhor na igreja, né? Nossa! Que bom!!
Deus abençoe a senhora!
A. H.: A ti também!
E. H: Mama essa aqui é uma moça está aqui pra fazer uma entrevista sobre os ucranianos.
E.: Oi!
L: É pra escola, faculdade. Ela pediu pra mim quem eu poderia indicar, eu pensei nas duas
dona Ana. Daí eu conversei com a Dona Ana domingo eu falei com ela chegamos ali ela
tinha ido a igreja ela deve ter esquecido, né ?(...) ele conversou comigo, mas eu sou aquela
ucranik. Eu tava conversando com a Elicéia que vocês é uma graça, continuam
conversando em ucraniano em família, nós não para mim a pronúncia fica muito difícil.A
gente nunca mais conversou né? Em ucraniano. A língua enrola, não adianta, não sai. Daí
eu falei vamos lá.
A. H.:Nós até quando desentendemos, desentendemos em ucraniano.
L.: Então!
A. H.: É difícil acontecer, mas...
L: Acontece, como acontece.
A. H.: Eu nem lembro quando a gente tinha desavença. Graça a Deus.
E. H.: O mama ela pediu qual foi o motivo que trouxe nós de Wenceslau pra cá? O pai que
se empolgou, como é que foi?
A. H.: É , ele veio passear pra cá e achou que aqui seria melhor do que lá e a gente veio.
E: Em que ano que a senhora veio pra cá?
A.H.:Agora você me pegou com esse negócio de ano.
L: Você tinha dois aninhos?
E.H. : É, dois aninhos, né mãe? Quando eu vim pra cá?
L: Você é de? (ano)
E.H.: De 69.
L: Então eles vieram em 71.
E. H.: É 71.
E: E, antes de vir a cascavel passou por outros lugares?
A.H.: Nós morava, eu sou de Irati, município de Irati, fui morar em Wenceslau Brás até a
hora de mudar depois prá cá.
E:Você saiu de...nasceu em Wenceslau e depois veio pra cá?
E. H.: Praticamente vivi em cascavel.
E:Qual a descendência de vocês?
A. H.:Ucraniana.
E. H. : Ucraniana.
E.: Ucraniana? No caso a senhora é de que geração no Brasil?
A. H. Eu deveria ser já da...
E. H.: O Tito e a Baba eram da Ucrânia, quando vieram, mama?
L.: Então a senhora é da 1ª geração?
E. H.: 1ª geração.
A. H.: Eram eles vieram de lá? 1ª geração no Brasil eles vieram de lá
E.: No caso você é segunda, né?
E. H.: É.
E.: Há quantas gerações estão no Brasil? Bom, então ?
A. H.:Seria essa ela é segunda ou a terceira, não?
E: Tem os netos?
A. H.:Tem os netos.
E.:Tem bisnetos?
A. H.: Não, meus bisnetos disseram não por enquanto.
E.:Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
E. H.: Desde pequeno.
A. H.: Sempre!
E. H. : Desde pequeno, o pai conversava com nós.
E: Sempre?
A. H.: Antes, o que era mais difícil era aprender português, porque em casa a gente só
falava só ucraniano.
E. H. Desde pequeno, pois o pai conversava com nós.
E:A sua primeira língua então é ucraniano?
A.H.: é o ucraniano!
E.: A sua também?
E. H.: A minha também, eu lembro que quando entrei ali no colégio eu não sabia falar em
português corretamente, meus amiguinhos tiravam sarro e eu pensava que eles estavam
falando mal de mim. Eu lembro que até a Irmã Natália que era ucraniana, que ela me
incentivou mais flou que não falava comigo em ucraniano, explicava o que eles falavam,
assim fui me adaptando melhor ao português.
A.H.: Eu também quando fui para a escola a primeiro dia eu não sabia uma palavra em
português só que eu tinha umas coleguinhas que eram vizinha nossa, ela já estavam antes
entraram no grupo escolar antes foi com elas que eu consegui entender alguma coisa e
começar fala, que até hoje eu não aprendi.
E.: A senhora não sabe o português?
A. H.: Corretamente, o português, eu não falo!
E: Até quando a senhora estudou, até que série a senhora estudou?
A.H.: Até o quarto ano era uma sala só de 1ª a 4ª série.
E: É que morava no sítio era uma escola só e lá era assim uma sala de 1ª a 4ª série para
todas as turmas tinha uma professora pra dá pra todos os alunos.
E.: Vocês duas, então falam ucraniano direto?
A.H.: Em casa, sim
E.: E fora de casa?
A.H. : E fora de casa com quem a gente se entende e sabe que é ucraniano, por exemplo
como a velha Kachuba e mais alguém que a gente sabe, a gente se entende, agora quando
chega os netos.
E.: Com os netos a senhora conversa em ucraniano?
E. H. : Os netos já são mais largados.
A. H.: Eles não sabem, então?
A. H.: Por exemplo os do Dionísio e da Margarida
L.: Os dois são ucranianos eles podiam ter ensinado.
A. H. : Ao menos pra saber algumas palavras.
E.: Eles não sabem então?
A. H.: Não! O Dionísio fala, a Margarida não! O pai dela era polaco, polonês então falava
com a mãe enquanto tava viva, depois.Agora nós meio torto, meio...fala
L: Agora os netos a missa eles entendem inteira, algumas palavras se a baba fala eles
entendem.
E.: Entendem?
L: Entendem. Eles só não sabem falar, responder a baba.
E.H.: Algumas besteirinhas que não precisa, eles entendem.
A.H.: Ainda que essa ensina tudo, tem uma boca, ensina tudo. Com os filhos eu falo
ucraniano, mas com os netos eu falo em português. Eles sabe rezar, sabe algumas palavras
em ucraniano. Algumas besteiras que essa aí ensina.(apontando para a filha), compreendem
alguma coisa, mas eu não falo ucraniano com eles.
E.: Quais as palavras ou frases que lhe dá o sentido da cultura ucraniana? E, neste sentido
eu queria que vocês falassem em ucraniano? Quais os sentimentos que a cultura ucraniana
desperta em vocês?
A.H. : Falá!
E.H.:
L.: O que os cativa a preservar a cultura ucraniana?
A. H. : Ah, eu acho que pra mim, a gente sempre viveu entre os ucranianos? Porque lá em
Gonçalves Junior, município de Irati, lá era o berço dos ucranianos. A gente acostumou e
depois em casa a gente nunca mais nós falamos outra língua em português. Mesmo aqui eu
falo em português porque já tem os netos as noras que são de outra..
L.: Tente falar em ucraniano o que a senhora acabou de dizer.
A.h:
A.H.: Você não entendeu, mas eu vou te explicar. Disse eu nasci numa família ucraniana
meus pais me ensinaram uma língua, essa linguagem até hoje eu cultivo ela e cuidarei para
sempre.
E: E você?
E.H.: Eu me sinto orgulhosa em meus pais ter ensinado desde pequeno então que a gente
cultiva isso. Os pequenininhos têm aquela apresentação da vontade de chorar, tem aquela
emoção. Às vezes numa oração eu penso como foi bom meus pais desde pequeno ter
ensinado essa tradição. E uma tradição que minha mãe ensinou foi após as refeições foi
que isso significa Em nome do Pai do Filho, do Espírito Santo, Meu Jesus muito obrigado
pelo meu café, pelo meu almoço ou pela minha janta. Eu me sinto... fico até arrepiada só
em falá que foi uma coisa que meu pai me ensinou desde pequeno. Pra dá valor a que a
comida e agradece a Deus que nos deu esse alimento.
E.: Vocês poderiam narrar um fato importante da vida de vocês em língua ucraniana?
A.H.: O que será que você queria?
E.: Algo que tenha acontecido na vida de vocês e que foi importante?
A.H.: Eu nasci em uma família ucraniana amo a minha cultura, quando eu assisto ao grupo,
a uma apresentação do grupo de jovens fico, no mínimo, 30 anos mais nova.
E.: Quantos anos a senhora tem?
A.H.: 77 anos.
E.: Quantos filhos a senhora tem?
A.H.: 12 filhos.
E.: Todos estão vivos?
A.H.: Todos não, a Terezinha falecida e Mariano
E.H.: Tem Januário, a Bernadete e (...)
A.H.: Mas esses morreram de criança, Mariano morreu de acidente e a Terezinha morreu de
câncer.
E.: Todos moram aqui em Cascavel.
A.H.: Os outros moram, aqueles também moram, no cemitério, mas moram.
E.: Mas a senhora poderia narrar um fato em língua ucraniana?
A.H.: Mas o que você quer?
E.: Gostaria que vocês falassem em ucraniano.
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E.: Com quantos anos seu filho morreu?
A.H.: 19 anos.
E.: Que jovem!
E.: Isso faz quanto tempo?
A.H.: 27 anos.
E.: Qual a importância de preservar essa língua?
A.H.: Que nem pra mim que já estou de mais idade ela é muito valorizada. Que nem os
filhos do André que a mãe é brasileira. Ele vão dá o que? Veja que valor que eles vão dar?
Valor nenhum.
L.: É dona Ana quando eles crescer eles podem até se interessar, fazer curso de ucraniano.
Mas eu não sei dizer se daqui mais alguns anos os jovens vão conseguir falar, conversar um
com o outro em ucraniano.
E.H.: É porque a gente na Haílkas mesmo a gente vê que a maioria que cantou são os de
mais idade, os jovens não cantaram, ficaram tímidos. A haílkas é tradição que é feita após a
páscoa né mama? São cantos antigos, brincadeiras que fazem em volta da igreja.
A.h.: É a mesma coisa que alunos da escola quando vão pra escola e antes de entra pra aula
ficam fazendo roda, brincadeira.
E.: No caso vocês sabem escrever em ucraniano?
E.H.: Eu sei porque causa da escola.
A.H.: Eu sei. Aprendi com meu pai. Eu não fui um dia na escola ucraniana, mas meu pai
pegava, ele lia e eu sempre acompanhava ele. E, escrever depois de certa idade, já era
grande, no domingo quando a gente não tinha nada pra fazer a gente escrevia, aprendi
sozinha, meu pai já tinha morrido, e minha mãe não sabia escrever. Quando eu morava com
meus pais eu falava tudo em ucraniano. Depois eu casei com um meio ucraniano que falava
mais em português passei a falar mais em português.
E.: A senhora consegue entender o polonês?
A.H.: Algumas palavras sim, outras não.
E.: Não?
30E.H.: Como o Mariano morreu. A senhora não estava aqui e veio...
A.H.: Isto eu lembro...
E.H.: Lembra quando o Mariano morreu ele veio a fazenda e a senhora começou a chorar...
A.H.: Eu ainda hoje choro...
E.H.: Quando ele falou que iria trazer pra senhora de Curitiba uma lembrança e até hoje não trouxe.
A.H.: Ele falou assim: Eu mãe vou a Curitiba e trarei pra senhora um grande presente. O presente
seria que
ele viesse bem. Mas Deus sabe o que faz.
E.H.: Mas graças a Deus ele até hoje vos ajuda porque deixou pra senhora uma pensão.
A.H.: A maioria não, mas que eu entendo muita coisa do que os poloneses falam, eu não sei
falar, mas eu entendo muita coisa que eles falam. E alemão também, muitas palavras o que
eles falam, eu entendo porque a gente tinha vizinha alemã a gente brincava lá com elas,
então ainda alguma coisa sobrou.
E.: E qual a diferença de Perohê e Pierogi?
A.H.: Não tem diferença nenhuma, só a pronúncia.
E.: Nenhuma
E.H.: É a mesma comida.
A.H.: Nenhuma...não tem diferença nenhuma. A diferença de perohê e pierogi está no jeito
de falá, no léxico.
L.:É que nem holubtzi e glonde
A.H.: Holubtzi é ucraniano e glonde é polonês.
E.: E é o quê?
A.H.: O charuto de repolho.
E.: E eu posso dizer que a cultura, em relação a igreja é a mesma dos poloneses?
A.H.: Não, porque os poloneses é a mesma cultura dos portugueses que tem no Brasil. Os
ucranianos é tudo tradição antiga. Tudo é diferente.
E.: Na verdade, então, os poloneses seguem um outro rito, pode-se dizer?
A.H.: É.
L.: É diferenciado dos ucranianos.
E.H.:Uma tradição na nossa origem é o ‘Sviatei Vétchir (Santa ceia) que os poloneses não
tem. Que acontece na véspera do natal. Então é assim nessa janta tem toda a comida
ucraniana. Inicia-se com uma oração e com ‘Kólhadas’ (canções natalinas). Todos sentam
e provam as doze comidas típicas.
A.H.: As canções de Natal, nós somos ricos nisso.
L.M.S.: Só os ucranianos que tem.
A.H.: Os poloneses tinham, mas devagarinho foi se apagando, se perdendo.
E.H.: Na Páscoa que tem os cantos próprios pra esse mês. No Natal a gente fala “Hrestos
Razdaiêtcha’ que Cristo nasceu e na Páscoa ‘Xrestos Voskres” que Cristo ressuscitou e o
costume de nos cumprimentarmos uns com os outros durante todo ano é e no Natal é...... e
na Páscoa é.....
A.H.: É muito parecido, mas não é igual.
E: Tem igreja ucranianas ortodoxas no Brasil?
A.H.: Em Gonçalves Junior, em Irati. Tinha a nossa igreja aqui, subia aqui virava a quadra
tinha igreja ortodoxa, lá tinha a igreja polonesa. Três igrejas juntas. E, mais um pouquinho
pra frente tinha a igreja dos alemães, tudo pertinho, nem duas quadras uma longe da outra.
E.:Naquela época qual das igrejas tinha mais fiéis?
A.H.: A católica. Sempre.
2-Entrevistada: A. K., em 02/2007
Contexto: A entrevista transcorreu normalmente, estavam presentes A. K., a nora que é
descendente de polonês, e duas netas, uma que mora com a senhora e a outra que estava
visitando-a.
L: Dona Ana essa moça está aqui para fazer algumas perguntas para senhora sobre os
ucranianos, sobre as nossas origens de tudo. É pra escola, pra faculdade, nós fomos ali na
dona Ana fizemos ela chorar, se emocionar, porque lembra de tudo, né?.
A.K.: Lembra. Eu também vou chorar, muito tudo, as coisas antes era uma e hoje é outra
L.: Mudou tudo
A.K.: Mudou tudo e agora que vai fazer? Abaixar a orelha e ficar quieto.
L.: Não tem jeito, acompanhar o dia-a-dia.
A.K.:Meu filho andou no seminário e não sabe falar e agora ele vai as vezes dizê porque a
mãe não ensinou a falar. Mas meu Deus do céu, mas se isso não é uma facada?
L.: (....) é que quando a gente é criança a gente não valoriza.
M: Mas pra gente aprender os pais tem que estar todo dia falando com a gente. Minha mãe
e meu pai falava em português. Nós não aprendia polonês porque eles não falavam em casa,
então não aprende.
L.: É não aprende.
M.: E na escola você não consegue aprender.
L.: Porque na escola, você aprende a escrever a ler um livro, mas a pronunciar, não aprende
a fala.
M.: Quando meu pai e minha mãe casaram, minha era polonesa, meu pai não era, mas eles
falavam polonês porque que eles não falaram com a gente em polonês então nós não
aprendemos. Os meus filhos tiveram aula de ucraniano na escola, mas eles não aprenderam.
L.: As minhas meninas sim aprenderam a cantar a missa, em ucraniano, a rezam o terço,
A.K.: Rezam o terço?
L.: Mas falar, não falam.
A.K.: Como que nós ia rezar, lá tem muita ucraína, não é italiana. A maior parte é italiana.
Então, hoje Lúcia Pantinhá agora no meio do terço nós cantemos em brasileiro, né? E daí
quando nós terminemos nós cantemo a Haílkas Pantinhá em Ucrainski. E daí as mulherada
acharam bonito porque elas não compreende. É poucas que é ucraisnk. Só tem eu e a do
Bulak que é ucrainsk.
L.: É porque as outras que vão são a maioria brasileira, né?
A.K.: É poucas que é Ucrainski.
E.: Nome e sobrenome?
A.K.: Sobrenome Kachuba
M.: Nome e sobrenome baba?
A.K. Ana Kito Kachuba
E.: Idade?
A.K.: Como?
E.: Quantos anos a senhora tem?
A.K.: 88
M.: Não fez ainda, baba, vai fazer.
A.K.: Agora no outro mês estou fazendo, interando.
M.: Tem oitenta e sete.
E.: Grau de escolaridade? Até que série a senhora estudou?
A.K.: Muito pouco estudo porque no meu tempo filha não tinha escola, então o nosso
estudo era na roça, gente do céu, era enxada, foice. Você sabe o que é foice? Sabe o que
cambal?
E.: Cambal não, mas foice eu sei.
A.K.: Ferro?
L.: Acho que a senhora aprendeu a ler e a escrever, não chegou a fazer primário, ginásio,
nada?.
A.K.: Nunca só uma vez só que fui na aula,
L.: Só aprendeu a ler e a escrever.
A.K.:Eu aprendi um pouco em português e mais em Ucrainski, porque no nosso tempo lá
não tinha português, só ucraíno em casa. E na roça não tinha escola. Depois quando já
vieram veio um professor lá da Europa, e ele começou a dar aula sabe? em escola perto da
Igreja em Santa Catarina e daí ele só dava aula em Ucrainsk ele dava aula, e naqueles
tempos era proibido dar aula Ucrainski, compreende? Tinha que ser fora da aula. De
repente quando vieram os irmãos ele saiu, pois ele se mudou e ta em Guarapuava. Tia me
contou que ele tava por lá. Lá em Guarapuava tem essa família. Mas depois veio os irmãos,
eu já era mocinha, na roça, só quando chovia pai mandava pra escola.
L: A senhora é do Brasil.Seus pais vieram da Ucrânia?
A.K.: Da Europa. Eles vieram da Europa. Pai meu veio da Europa, minha mama veio da
Europa, compreende? Sogra veio depois. Minha vó Kothesa quando ela veio tava tudo
cheio de índio, compreende ? Ela veio com quatro filho, mas um já ficou em São Francisco
quando desembarcaram do navio, Em São Francisco. Porque ela já tinha um conhecido e já
se conversaram porque ele não sabia nem um bom dia, boa tarde.
L.: A senhora veio de lá ou nasceu no Brasil?
A.K.: Eu nasci no Brasil. Eu nasci maS a mãe, pai, tudo eram de lá.
Onde a senhora nasceu?
A.K.: Eu nasci na Moema – Santa Catarina. Primeiro tem Iracema depois tem Moema, fica
a quarenta quilômetros de Iracema.
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
A.K.: Quantos tempo eu nem sei. Eu não me lembro.
L.: Você lembra quanto tempo faz que ela veio pra Cascavel.
M.: Quando eu conheci eles já faz 25 anos.
E.: Vocês foram os primeiros a chegar?
L.: Eu acho que eles são os primeiros, já faz quarenta e poucos anos que eles chegaram.
M.: Mais, pois eu acho que eles chegaram em 1942. Que o Tito sempre falava que em
quarenta em dois ele veio ver as terras ou veio morar.
E.: A senhora veio com o marido ou com os pais?
A.K.: Não ele veio já era casado, eu vim com cinco filho já.
M.: O Tito quando veio da Ucrânia ele tinha doze ano.
A.K.: O meu quando veio tinha doze ano. Ele assistiu guerra e..
M.: Mas ele fez o documento aqui no Brasil.
A.K.: Ele contava como que era a guerra, ele assistiu guerra. O sogro tava na guerra e
depois como vieram. Aí disse vamos vender tudo e vamos pro o Brasil, né?. Mas ele sabia
contar tudo como que era.
E.: E, a senhora sabe os motivos trouxeram vocês para essa cidade, pra Cascavel?
A.K.: É propaganda, propaganda demais, porque lá vocês vão e..., os homens interessados
em pinheiro, madeira, tudo.
L.: Bem estar da família, né?
A.K.: Foi uma ilusão, escute. E depois quando o cara de Curitiba que trouxeram eles. E se
iludiram por causa da madeira. Temos que comprar tudo e pouco terreno. E eles veio vê,
deixou eu sozinha e veio vê. Não tinha asfalto, não tinha nada, só mato. Fiquei sozinha lá
quatro meses e ele veio fez roça e tudo, mas chegou lá e eu já tinha tinha feito roça tava
grávida com meu filho, Romão, e quando ele chegou eu não esperei ele eu fiz roça, mas eu
não roçava porque era muito difícil, meu Deus a gente sofreu. Aí ele veio e disse que íamos
pro Paraná, mas não podia vender o sitio, queriam de graça. Aí foi, foi,foi daí levou mais
dois anos que nós demoremos e vendemos algumas coisas, muita coisa a gente não vendeu,
gado ficou. O paiol ficou cheio de palha de centeio, porque nós aproveitava até palha de
centeio.
L.: Usava, né?
A.K. Sabe o que nós fazia nós cortava com Ucrainski, você sabe o que é?
L.: Eu sei!
A.K.: Você sabe o que é? Ela não sabe o que é? Mas de dia na roça e de noite chuep,
chuep, chuep, ensacava e levava pra Blumenau pros bois, italiano usava muito. Só
trabalhava com os bois. Era cortadinho, ensacadinho com milho e... nós fazia.
L.: Eles misturavam.
A.K.: Aproveitava até isso porque precisava ali não tinha comércio ainda. Sabe quando de
carroça levava pra levar? 18 dias. Pra ir e voltar. Em 18 dia tinha fazer o que? Trabalha!
Era duro. Eu chorei algum resto, mas não adiantava. Eu queria voltar porque a minha
herança tinha ficado, não tinha vendido. Eu escrevia pra mim mãe dizendo o quanto eu tava
sofrendo com esses meus filhos. Onde ele vai me levar? Debaixo do pau com certeza.
Caminhão chegou lá em Iracema. Veio nós e mais uma família. Nós tinha que trazer cinco
peão pra trabalhar, porque era mato e não tinha ninguém pra trabalhar. Nós trouxemos
cinco e outro trouxe cinco. Mas era sofrido, de Santa Catarina levou uma semana pra
chegar aqui. Sem asfalto, sem nada e de noite não viajavam, só de dia. Quando cheguemos,
comecei a chorar, pois lá eu tinha tudo. E, daí eu chorando com as crianças derrubaram
toda a mudança na grama. E eu que vou fazer? Vostes mesmos ele dizia e eu dizia não
voltes mesmos. Lá mais longe Miguel, depois foi pra casa buscar carroça, mas ele puxou
mudança só no paiol, porque a ponte tava estragada. Não podia levar até a casa dele, ele
puxou tudo a mudança de carroça para o paiol, ele tinha um paiosão grande, guarda ele já
veio antes daí ele puxou, e eu chorei. No outro dia puxamos a mudança no paiol. As
crianças choravam e eu junto, queriam ir pra casa.
L.: É as dificuldades que foram enfrentadas.
E: Antes de vir a Cascavel, a senhora passou por outros lugares?
A.K. : Não, eu morei muito tempo na colônia, no Centralito. Aqui Cascavel e lá Centralito.
E: Qual a sua descendência ?
A.K.: Ucraniana
E.: Há quantas gerações está no Brasil, a senhora é a primeira? E, quantas gerações faz?
A.K.: Eu tenho filho, neto, bisneto e tenho até tataraneto.
E.: Quinta geração, então?
A.K.: É, tataraneto, já; e quantas já porque as filha do piá da Olga tem dois ou três.
E.: E a senhora tem quantos filhos?
A.K.: Quantos?
E.: É.
A.K.: Treze. Eu tinha quatorze, mas um morreu pequenininho.
E.: Todos estão vivos?
A.K.: Todos. Agora não, a mais velha Olga morreu, e essa última morreu. Ficou doente e
morreu. Ela não podia morrer, eu sou mais velha e não morri, porque que ela tinha que
morrer. E daí a mais nova ficou doente que casou com o Basílio e tinha três filho, a mais
pequena tinha quatro aninho. Coitada, ela tinha no estômago, câncer. No começo eles
queriam operar e ele não quis ‘Não quero que mate a minha mué.’ E, depois eu fui, eu
ainda tava morando lá, e daí foi, foi, nós levava dum hospital pro outro e nada. Depois ele
quis operar, mas não deu mais, ai o medico disse “eu posso abri opero, mas não garanto”.
Eu esqueci quanto tempo ela durou.
M.: Três meses.
A.K.: Três meses
E.: Quando que a senhora aprendeu a língua ucraniana?
A.K.: No berço, desde pequeno, minha mãe falava e eu nunca esqueci.
E.: Você usa a língua ucraniana?
A.K.: Sempre, sempre e eu gosto de usar. Só em casa que eu não uso, o filho ele não
compreende. Você teve no seminário três, você podia ensinar nós.
L.: A senhora fala quando pode, com a dona Ana, com a Verônica, com o padre.
A.K.: Tudo a gente fala em ucraniano. Nós fala tudo em ucraniano. Eu não esqueci o
Ucrainski.
L.: Não esquece.
A.K.:Até polonês, entendo o polonês... lá em Moema tinha bastante polonês. A gente
falava, eu entendo... até o alemão, por causa da convivência, dos vizinhos.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
A.K.: né?
E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
E.: Para terminar, qual a importância da cultura ucraniana?
A.K.: O quê?
E.: A importância da cultura ucraniana?
A.K.: Para mim, é muito importante, eu não me esqueço da cultura, ##.
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E.: Terminamos, então.
A.K.: Está bom?
E.: Sim, está.
A.K.: Antigamente, era diferente. O respeito era diferente. E a agora o que vai fazer?
L.: Agora tem que acompanhar a evolução.
A.K.: Nunca volta isso.
L.: Só na lembrança.
A.K.: É, só.
3-Entrevistados: D. H, B.H. em 01/2007.
Contexto: A entrevista transcorreu normalmente, foi realizada na casa da família,
juntamente com as duas crianças.
32 Nada eu esqueço, nada, nada, o que as mulheres cozinhavam, o que assavam, o que... nada,
nada... tudo pra
mim estava bom... em ucraniano né... esta comida, isto que estava cozido...
E.: Nome e sobrenome?
Casal: Basílio Holtz e eu Dora Holtz
E.: Idade?
Casal: 53 anos, e eu tenho 42 anos
E.: Grau de escolaridade?
Casal: Nós somos graduados, faculdade.
E.: Formação?
Casal: Eu sou Técnico em Cooperativismo e agropecuária e ela é pedagoga. É professora.
E.: Onde nasceu?
Casal: Prudentópolis –PR, e eu em Rio Azul –PR
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
Casal: Eu vim morar com os meus pais quando era pequeno, há mais de quarenta anos. Eu
vim com as irmãs, era jovem, tinha 28 anos.
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
Casal: Eu vim com meus, eles tinham esperanças de melhorar de vida. Eu vim a trabalho.
Como as irmãs tem escola e eu trabalhava com elas então vim lecionar em Cascavel.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
Casal: Sim, Cascavel, Prudentópolis, no seminário, Ponta Grossa, Curitiba, e Cascavel de
novo. Eu morei em inúmeros lugares do Paraná devido a profissão. Rio Azul,
Prudentópolis, Curitiba, Irati, fui pra Santa Catarina e tantos outros no Paraná.
E: Qual a sua descendência ?
Casal: Ucraniana
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
Casal.: Eu sou a terceira geração e ela também é a terceira geração no Brasil.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
Casal: Eu aprendi ucraniano e português junto, não sei qual foi a língua que aprendi
primeiro. Eu aprendi primeiro o ucraniano, sofri muito quando fui para a escola, pois não
sabia o português.
E.: Qual foi sua língua materna?
Casal: As duas línguas português e ucraniano. E, a minha foi o ucraniano. Eu aprendi
primeiro o ucraniano, sofri muito quando fui para a escola, pois não sabia o português.
E.: Você usa a língua ucraniana?
Casal.: Sim
E.: Em que ocasiões você usa a língua ucraniana?
Casal.:Usamos na igreja, com as pessoas mais idosas, com os padres, com as irmãs, quando
vem visitantes na igreja,por exemplo, esses dias veio os bispos e nós conversamos com eles
em ucraniano.
E.: E, em outras ocasiões? Em casa?
Casal.: Em casa, falamos muito pouco. É verdade, por nós dois sermos descendentes de
ucranianos, nós falamos bem pouco ucraniano em casa. A gente precisa falar mais com as
crianças.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
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E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
B.H.: Ela pode falar, ela sabe mais que eu.
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E.: Qual a importância de manter a língua e a cultura ucraniana?
Casal: Precisamos manter a riqueza cultural da Ucrânia, isso é uma forma de preservar a
riqueza cultural da religião. É nossa, faz parte das nossas raízes, se nós não cuidarmos dela
daqui há alguns anos nossos filhos e netos não terão mais. Meus pais falam com a gente que
é filho em ucraniano (...), mas com os netos é em português.
E: Seus filhos sabem a língua ucraniana?
D.H.:Sabem rezar em ucraniano e algumas palavras.(Olhando para filha). Filha reza uma
oração.
I.H.:“&#
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E.: Que oração você rezou?
I.H.: Santo Anjo.
E.: Vocês entendem o polonês?
B.H.:Quem diz que polonês e ucraniano é igual não sabe... nossa é tão difícil o polonês.
Quando tem dois polaco conversando, eu não entendo nada, não sei o que eles estão
falando. As origens são diferentes, né?”
Entrevistada: C.G.I, V. I. em 02/2007
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, na casa da família entrevistada. Estava
presente o casal entrevistado e o acompanhante V.C. da entrevistadora.
E.: Nome e sobrenome?
C.G.I.: Cecília G. Ivanchichen
E.: E o senhor?
V.I.: Valdemiro Ivanchichen
E.: Idade?
C.G.I.: 53 anos
E.: E você ?
33 Veja, a nossa cultura é milenar por isso, cuidar da nossa religião, da nossa igreja da nossa língua
é algo
muito importante para nós. Eu vejo que nós estamos perdendo isso, pois os meus pais falam com a
gente que
é filho em ucraniano(...), mas com os netos é em português. Por que isso? Porque aos poucos as
nossas
características estão se apagando. O Yuri quando foi no Natal na casa dos avós quase ficou louco
quando
aprendeu a tradição de fazer a saudação“######.
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não conhecem mais isso, não faz parte da sua vida.
34O nascimento dos nossos filhos Isabele e Yuri foi algo muito importante em nossas vidas e é por
isso nós
agradecemos a Deus por nós ter abençoado com seres tão importantes na nossa vida.
V.I.: 54 anos
E.: Grau de escolaridade ?
C.G.I.: O meu é 2º incompleto.
E.: E o seu ?
V.I.: Primário, né ?
V.C.: Naquela época era tudo mais difícil, longe né ?
C.G.I.: Eu estudei aqui. Lá...
V.C.: É?
E.: Formação? O que vocês fazem?
C.G.I.: Iiii, eu sou diarista, né (riu)?
E.: E o senhor?
V.I.: Montador.
C.G.I: Não é colocador?
V.I.: Não, é montador.
E.: Onde nasceu?
C.G.I.: Eu nasci em Porto União – PR
E.: E o senhor?
V.I.: Mato Rico.
E.: Fica onde?
V.I.: Paraná.
E.: Paraná. Há quanto tempo está em Cascavel?
C.G.I.: Nós viemos em noventa e cinco, então tem 12, né? 12 anos.
E.: Então, vocês já vieram casados?
C.G.I: Sim, faz 33 anos que nós somos casados (risos).
E.: 33 anos.
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
C.G.I.: Por causa dos estudos dos filhos.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares, além dos lugares onde vocês
nasceram?
C.G.I.: Eu vim de lá de Porto União pra Mato Rico e lá casei (risos), e depois viemo pra
cá. E ele de lá pra cá.
V.I.: Nasci e em criei em Mato Rico e só saí de lá para vir para cá.
V.C.: Perto do que?
V.I.: De Roncador.
V.C.: Ahnn! Roncador.
V.I.: Mato Rico era município de Pitanga.
C.G.I.; Fica perto de Iretama, Roncador, Campo Mourão fica mais próximo.
E: Qual a sua descendência ?
C.G.I.: A minha é ucraniana. Tanto por parte de pai e mãe. A dele a mãe era polonesa e o
pai ucraniano.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
C.G.I.: Acho que o meu já, porque o meu, como que era ? O bisavô do meu pai que veio da
Ucrânia.
E.: No caso o seu tataravô.
C.G.I.: É. Tataravô, bisavô, vô, pai e eu. Então é quinta geração. A quarta no Brasil.
C.G.I.: A tua também é pra ser por aí, né?
V.I.: Não o meu avô veio da...
C.G.I.: O teu avô veio da, não é da Ucrânia, veio da...
V.I.: Polônia.
C.G.I.: Não, Austrália.
V.I.: Austrália.
E.: Mas ele era descendente de ucraniano?
V.I.: Não, polonês.
C.G.I.: Polonês, da parte da mãe dele.
V.C.: É que ali é quase todo mundo junto.
E.: Austrália, não. Austrália é Oceania. Ou é Áustria?
C.G.I.: É uma coisa assim. Sei que a Dete fez a pesquisa com eles.
V.C.: Minha vó é austríaca.
E.: Depende muito, Valdecir.
V.C.: Que é daquela região perto da Itália.
E.: Tem muitos que são da Áustria.
C.G.I.: Então e eles eram descendentes de polonês, eles vieram lá daquelas partes. Não sei?
E.: Sim. Se for próximo, é.
E.: Então, qual é a tua geração? Da parte ucraniana.
C.G.I.: Eu acho que é a quarta também porque tem que contar por parte do pai.
V.I.:Eu não lembro.
C.G.I.: É sim porque vieram junto, lembra o seu pai e o meu pai se criaram junto. É por aí
eu acho que deve ser quarta também.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
C.G.I.: Desde criança, o pai ensinava, desde criança.
E.: E o senhor?
V.I.: Também desde criança.
C.G.I.: O pouco que sabe né “dedo”, (risos) foi desde criança.
V.I.: A minha vó não falava um nada em português era tudo em ucraniano, era difícil
(risos).
E.: Aí teve que aprender a língua, né?
V.I.: Sim.
E.: Então qual a língua que aprenderam primeiro o português ou ucraniano?
C.G.I.: Ucraniano, o português aprendemos na escola, foi difícil de se aprender.
E.: Para o senhor também.
V.I.: Não, foi junto.
C.G.I.: A minha foi quando eu entrei na escola.
E.: Então no caso o senhor aprendeu as duas línguas juntas?
V.I.: As duas juntas.
E.:Vocês usam a língua ucraniana?
C.G.I.: Usamos, pra rezar, pra falar assim né? Agora mais, a gente usa mais o português,
mesmo, né? Porque Taí né? Todo mundo fal assim. Mas a gente usa canta a missa, reza, se
xinga (risos) né dedo? A gente sabe que a gente tem que faze. Relaxa, né? A gente não fala
por o porque a outra é mais fácil, né? Porque a ucraniana é mais difícil, né? E não tem com
quem só entre nós, né? Por isso não pratica muito.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
C.G.I.: Virgem Maria. O que dá mais assim é a missa que a gente pratica muito. Os hinos
do natal, mas você que fala em Ucraniano? Por que você quer assim?
E.: Por que eu quero saber se as famílias falam ucraniano.
C.G.H.: Ahnn! Então, vou rezar! ##
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E.: O que você rezou?
C.G.I.: A Ave Maria.
E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
V.I.: Você fala, sabe bem mais que eu.
C.G.I.:
APÊNDICE B ENTREVISTAS INDIVIDUAIS E CONDUZIDAS COM OS
MEMBROS ATIVOS DA COMUNIDADE
Entrevistada: B.I. W.
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, durante um ensaio do Grupo
Sonhachneck, no salão paroquial da comunidade, pois a entrevistada é presidente do grupo.
E.: Nome e sobrenome?
B. W.: Bernadete Inês Waligura
E.: Idade?
B.W.: 40 anos
E.: Grau de escolaridade?
B.W.: Segundo grau completo
E.: Formação?
B.W.: Técnica em oftalmologia e otorrinolaringologia.
E.: Onde nasceu?
B.W.: Cruz Machado – PR
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
B.W.: Há 39 anos, apenas nasci em Cruz Machado e após meus se mudaram para cá.
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
B.W.: Vim com meus pais, eles saíram do interior pra buscar novas perspectivas de vida.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
B.W. : Não, mas morei no interior de Cascavel por muito tempo.
E: Qual a sua descendência ?
B.W.: Ucraniana por parte de pai e polonesa por parte de mãe.
E.: Sua mãe não é descendente de ucraniano?
B.W.: Não, minha mãe é descendente de polonês, eles se casaram em 1956, em Cruz
Machado – PR e depois se mudaram para Cascavel
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
B.W.: Terceira geração por parte de pai e segunda geração por parte de mãe.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
B.W.: Aprendi a falar em casa com meu pai e a ler e escrever no colégio interno em
Prudentópolis (das Irmãs)
E.: Qual foi sua língua materna?
B.W.: Português, depois aprendi ucraniano e inglês.
E.: Você usa a língua ucraniana?
B.W.: Sim
E.: Em que ocasiões você usa a língua ucraniana?
B.W.: Atualmente, eu uso a língua ucraniana por meio da escrita, eu mando muitos e-mails
para os meus amigos em língua ucraniana.
E.: E, em outras ocasiões?
B.W.: Na igreja. Nas orações, nos ritos e nas aulas de ucraniano.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
É o poema de um poeta ucraniano
Estudem meus irmãos
Pensem leiam
Aprendam o que é dos outros
Mas nunca esqueçam o que é seu!
Evolua o teu interior e os teus conhecimentos, mas jamais esqueça as suas raízes, a sua
língua e os seus princípios porque a partir do momento em que esquecer você deixará de
existir.
E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
Obs:Ele não narrou nenhum fato na língua ucraniana.
E.: Qual a importância do grupo para a cultura ucraniana?
B.W.: Ajuda a manter viva as tradições e as suas raízes que são passadas de gerações em
gerações.
E.: Qual a importância de se preservar a língua?
B.W.: A língua é o legado de um povo. Esse é o principal motivo.
Entrevistado: A. X. P.
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, durante um ensaio do Grupo
Sonhachneck, no salão paroquial da comunidade, pois o entrevistado é vice -presidente do
grupo.
E.: Nome e sobrenome?
A. X.: Augusto Xavier Pereira
E.: Idade?
A.X..: 34 anos
E.: Grau de escolaridade?
A.X..: Pós -graduação
E.: Formação?
A.X..: Administração de empresas e pós-graduação em marketing.
E.: Onde nasceu?
A.X..: Prudentópolis – PR
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
A.X.: Há 6 anos, meus pais moram em Prudentópolis e eu moro sozinho aqui..
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
A.X..: Primeiramente, vim para estudar e acabei ficando por causa do trabalho.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
A.X. : Prudentópolis, Ponta Grossa, Curitiba, e Cascavel.
E: Qual a sua descendência ?
A.X..W.: Ucraniana por parte de mãe e meu pai é o mais brasileiro possível, não sei quais
as raças que ele traz, ele é mineiro, veja pelo meu sobrenome não traz a marca da
descendência ucraniana.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
A.X.: Terceira geração por parte de mãe e de pai eu não sei.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
A.X.: Aprendi a falar em casa com minha mãe, no convívio com os amigos em
Prudentópolis e quando fui para a escola lá se ensinava e falava ucraniano.
E.: Qual foi sua língua materna?
A.X.: Português, depois minha foi ensinando o ucraniano nas orações, no dia-a-dia.
E.: Você usa a língua ucraniana?
A.X..: Sim, sempre que posso.
E.: Em que ocasiões você usa a língua ucraniana?
A.X.: Eu uso a língua ucraniana na igreja, com as pessoas que falam ucraniano, com a
minha mãe quando a vejo, quando vou em cursos sobre o povo ucraniano e as pessoas
falam em Ucraniano. Esses tempos, fiquei muito orgulhoso porque veio ao Brasil, em Cruz
Machado – PR, uma dançarina do balé ucraniano da Ucrânia, dar um curso, e ela quis
visitar a cidade, então eu fui o interprete dela quando ela queria saber o preço das coisas,
conversar com os vendedores, pessoas que estavam na rua e assim por diante. Me senti
orgulhoso de conhecer a língua dos meus antepassados.
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E.: Qual a importância do grupo para a cultura ucraniana?
A.X.: O grupo é importante para manter viva a cultura dos antepassados, pois se nós somos
descendentes de ucranianos, nós temos que cuidar para que a nossa cultura não se perca,
que ela não seja engolida pelas demais culturas. É importante manter a cultura dos
antepassados.
E.: Qual a diferença entre Pierogi e Perohê?
A.X.: Não há diferença, a diferença é de léxico.
E.: Você consegue entender a língua polonesa?
A.X.: consigo entender o polonês. Pra mim a diferença está ...é no sentido das palavras.
Tem palavras diferentes que tem outro significado, que quer dizer outra coisa. Não é difícil
entender o polonês, apenas algumas palavras.
E.: Então você se comunica com facilidade com os poloneses?
A.X.: Sim, em Prudentópolis como há bastante polonês, eu os conheço e tenho facilidade
de interagir com eles.
35É por meio da dança que sinto o quanto a Ucrânia possui uma vasta riqueza cultural.
36 Para mim o mais importante foi ter tido a oportunidade de estudar, aprimorar os meus estudos,
viajar, morar
em lugares diversos, mas não perder a minha raiz. Nós somos em quatro irmãos todos foram
educados na
tradição ucraniana de acordo com a minha mãe. Eu e mais dois irmãos temos o orgulho e
participamos de
todos os eventos culturais que temos oportunidade. Porém, tenho um irmão que optou por não fazer
parte
desse grupo, ele não se identifica. Já eu me identifico, esse grupo, essa cultura é a minha alma.
Entrevistada: L.M.S. (11/2006)
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, na casa da entrevistada.
E.: Nome e sobrenome?
L.M.S.: Lucia Michlzeszen Sperandio
E.: Idade?
L.M.S.: 48 anos
E.: Grau de escolaridade?
L.M.S.: Eu fiz o primeiro completo, depois fiz a primeira série do segundo, mas não
terminei.
E.: Onde nasceu?
L.M.S.: Eu nasci na Colônia dos Rio das Antas, município de Corbélia.
E.: Formação? Onde você trabalha?
L.M.S.: Eu trabalho, sou registrada como serviços gerais.
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
L.M.S.: Pode por 25, não, 28 anos que eu vim pra cidade.
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
L.M.S.: A gente morava no sítio,né? no interior,daí pra estudar pra meus irmãos vieram pra
cá também daí o pai e mãe mandava a gente pra estudar um pouco, né?
E.: Você veio solteira, então?
L.M.S.: É, solteira, depois é que casei.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
L.M.S.: Não
E: Qual a sua descendência ?
L.M.S.: Ucraniana.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
L.M.S.: Terceira geração.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
L.M.S.: Desde que a gente começou a falar, o pai já ensinava a gente a falar em ucraniano,
né. Agora, é que a gente acabou esquecendo porque a gente não tem com quem conversar,
não tem dialogo. A gente falava com o pai e com a mãe praticamente apenas em ucraniano.
Depois a gente foi pra escola e amigos daí não tinha mais tantos ucranianos, eram mais
brasileiros que ucranianos, então a gente falava em português. Me lembro que nós rezava o
terço em casa desde pequeno. Minha mãe ensinava. Depois que é que nós fomos a
catequese...Faz 35 anos, mas me lembro da primeira Pisni (canção) que as irmãs ensinaram
para nós... as famílias preservam a religião.
E.: Quando você foi pra escola você falava somente ucraniano ou também falava
português?
L.M.S.:Os dois.
E.: Então você não teve dificuldade em aprender a escrever e a ler o português?
L.M.S.: Não, não, português foi fácil. Em casa, né? A gente aprendia o ucraniano, mas
também aprendia o português, também.
E.: Qual foi sua língua materna?
L.M.S.: Praticamente os dois juntos, pra começar a falar, porque a mãe tanto ela falava em
ucraniano com em português ela falava em ucraniano e em seguida falava em português pra
gente não ter dificuldade, porque já perto da nossa casa tinha pessoas, mais brasileiros, né?
que falavam só português, então daí, né? Pra gente não ter dificuldades com os vizinhos a
gente falava as duas juntas. Reza, essas coisas, tudo que ela ia pedir para alcançar, pra
chamar a atenção era tudo em ucraniano, agora pra fala com os outros ela ensinava em
português.
E.: Você usa a língua ucraniana?
L.M.S.: Agora não, a não ser quando vou na igreja, as quando encontro as babas que falam
em ucraniano, porque nem os tios que são mais novos, nem os irmãos ninguém falam,
ninguém mais fala ninguém conversa entre si em ucraniano.
E.: Na sua família ninguém mais fala em ucraniano?
L.M.S.: Ninguém porque a mãe faleceu faz tempo, já faz 19 pra 20 anos que morreu e o
pai já faz quase 14 anos, não nove anos. Então quando eu ia lá ela tentava ensinar as minhas
filhas. Quando o pai e mãe faleceu, não teve chance, né? Os irmãos do meu pai da minha
mãe não tem ninguém que converse. Praticamente, ficou no esquecimento a língua
ucraniana, o que é uma pena, só na rua quando encontro as babuchas. Porque elas,
geralmente, falam mais em ucraniano que em português então você tem que ouvir elas e
responder, agora já tenho dificuldades em conversar abertamente em ucraniano, que nem eu
conversava antes. Antigamente eu conversava tanto ou melhor em ucraniano do que em
português. Agora já não vai mais, muitas palavras já não consigo pronunciar, antes parecia
ser tão fácil e a pronúncia já não sai mais.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
L.M.S.:
E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
E.:Você é casada com descendente de italiano. Isso dificulta a manutenção da cultura?
L.M.S.: É muito complicado quando se é casada com uma pessoa de outra descendência,
né?. Meu marido é descendente de italiano. Ele participa da igreja junto comigo, fez parte
da diretoria da igreja ucraniana. Mas não sabe falar ucraniano comigo. Então, eu não tinha
com quem falar ucraniano. E, os meus filhos não aprenderam por causa disso. Eu, também
já esqueci muitas coisas que sabia.
E.: Qual a importância de se preservar a língua?
L.M.S.: Eu acho que a nossa comunidade deveria investir nisso, que nós ucranianos mais
velhos deveríamos, né? Que estamos nessa fase investir nisso, nos nossos filhos, batalhar
por isso, acho que as religiosas alguém que possa pegar uma sala de aula e ensinar os outros
a ler e escrever. As religiosas até na catequese elas dão aula, mas é assim, não é muito
detalhado, teria que ter uma pausa para que todas noites, alguém que as famílias se
juntassem e pagassem uma pessoa para ensinar, o padre ou uma religiosa. Acho que não
tem outra pessoa que consiga ensinar bem, uma pessoa que eu sei que fala é o Pedro, eu
nunca conversei com ele, então eu não sei se ele tem facilidade de lecionar, se ele tem
condições, que pode passar a língua ucraniana, pois ele entende bastante, mas eu conheço,
mas não converso com ele. As irmãs elas passam o ucraniano, pegam “3#
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pessoas, o vocabulário, mas tinham que pegar o dicionário em ucraniano para as pessoas
voltarem a ler, pegar uma bíblia e ler e não decorar. Por que na missa uma leitura em
ucraniano e outra em português? Muitas vezes eles cantam em ucraniano. Tinha que ser
levado bem a sério. Os nossos os filhos teriam que aprender porque é importante a língua
ucraniana, se não aprender ela vai fazer falta assim como o inglês, o espanhol, o italiano. Se
as outras etnias estão investindo, porque nós também não investirmos, também.
As pessoas tinham que lutar mais pela origem ucraniana, pela cultura. Eu na minha opinião
gostaria que meus filhos aprendessem a língua ucraniana, que conversassem comigo.Queria
poder aprender para poder ensinar mais para eles.Gostaria que meus filhos aprendessem
mais.
E.:Mas Você acha que sem a língua consegue manter o rito?
L.M.S.: Isso é o que me preocupa, porque nós vamos ali e eu consigo cantar uma missa. Eu
canto uma missa em ucraniano. A minha filha eu já não sei se quando eu faltar ela vai
chegar lá e saber cantar uma missa, porque ela aprendeu, mas decorou, ela não sabe ler. Ela
decorou, de tanto participar comigo, canta, reza em casa. Então tem muitas palavras que ela
lê, mas tem muitas palavras mais compridas que não, ela já não sabe lê, porque o alfabeto
ucraniano tem palavras bem difíceis até de pronunciar, quem dirá de ler. Então eu preocupo
por causa disso, porque eu não sei se os jovens vão chegar ali e vão cantar, é isso que me
preocupa. Quando eu era catequista e um outro senhor que já faleceu, a gente ensaiava eles
e ensinava . Eles decoraram , porque mesmo decorando era bom. Eu canto uma missa,
então nós pegávamos, a gente fazia uma missa, as crianças cantavam começavam a missa,
cantavam, eles cantavam, eles começavam, desde crianças, eu como fui catequista durante
nove anos, fico muito triste porque você não vê uma criança cantando, só vê os adultos,
jovens também não vão, praticamente não vão na missa da manhã, mais da noite. Tem
vários pais que é pai e mãe ucraniano, deveriam batalhar. Todo domingo eu falo para
minhas filhas vamos, porque eu não quero que vocês esqueçam. Tenha idade que tiver, vão
a cidade que forem vocês falam que eu sei rezar a missa em ucraniano. Eu sou descendente,
eu sei rezar o Pai-Nosso, uma Ave-Maria. Acho que pra mim seria muito gratificante. Que
eles falassem minha mãe casou com um italiano, uma pessoa de outra origem, mas ela
ensinou a gente e nós não esquecemos nunca mais.E que ela também ensinasse para a filha
dela que também o pai não é ucraniano, mas que ela tem como passar. Eu até comentei
esses dias eu gostaria de fazer alguma coisa, de batalhar. Tomara que a gente consiga, mas
ta muito parado. Muito parado.
E.: Como querer preservar a língua ucraniana quando se é casada com um descendente de
italiano?
L.M.S.: É muito complicado quando se é casada com uma pessoa de outra descendência.
Meu marido é descendente de italiano. Ele participa da igreja junto comigo, fez parte da
diretoria da igreja ucraniana. Mas não sabe falar ucraniano comigo. Então, eu não tinha
com quem falar ucraniano. E, os meus filhos não aprenderam por causa disso. Eu, também
já esqueci muitas coisas que sabia.
Entrevistado: P.L.
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, após a aula de ucraniano na Escola
Estadual, pois o entrevistado é professor de língua ucraniana.
E.: Nome e sobrenome?
P.L.: Pedro Litvin
E.: Idade?
P.L.: 42 anos
E.: Grau de escolaridade?
P.L.: Pós –graduação em história
E.: Formação?
P.L.: Sou professor, formado filosofia, pós-graduado em História, e cedido ao Núcleo de
Educação.
E.: Onde nasceu?
P.L.: Toledo -PR
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
P.L.: Há 10 anos.
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
P.L.: Concurso público. Toledo não tinha vaga na minha área, aí fiz por Cascavel e trouxe o
fundinho que eu tinha lá e daí fiquei com os dois padrões aqui.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
P.L. : Toledo,Prudentópolis, Ivaí Cauão, Curitiba, e Toledo de novo..
E: Qual a sua descendência ?
P.L: Ucraniana.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
P.L.: Eu sou já da quinta geração no Brasil. Meus pais são terceira geração, meus avós a
segunda e os pais deles é que vieram da Ucrânia.
E.: Então você é da quarta geração?
P.L.: É eu sou quarta geração.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
P.L.: Um pouco eu aprendi com os pais, geralmente, eles falavam com a gente em
ucraniano. Aprendi a falar em casa com minha mãe, no convívio com os amigos em
Prudentópolis e quando fui para a escola lá se ensinava e falava ucraniano.
E.: Qual foi sua língua materna?
P.L.: O português, primeiro foi o português. O ucraniano a gente só falava em casa com os
pais, vá busca isso, vá buscar aquilo era ucraniano, mas a convivência com os vizinhos era
em português, brinca a gente brincava em português.
E.: Você usa a língua ucraniana?
P.L.:Uso.
E.: Em que ocasiões você usa a língua ucraniana?
P.L.: Pra ministra aula aqui no Celem, conversa com os meus pais, parentes dos meus pais,
procuro falar com eles em ucraniano. Justamente para tentar fortalecer o ucraniano, né?
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
P.L. Seria os versos de um grande poeta ucraniano Tarás Chewtchenko que diz o seguinte
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um incentivo pra você estudar, aprender outras coisas, mas nunca esquecer a sua origem, a
sua cultura.
E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
Acho que um fato importante na minha vida é que desde pequeno eu gostava de estudar e
como eu fiz o primário lá perto de casa no interior, então não tinha oportunidade de dar
continuidade aos estudos aí essa oportunidade surgiu quando fui ao seminário em
Prudentópolis de ucranianos e lá então eu fiz o segundo grau e daí pra frente até faculdade.
E.: E você teve alguma dificuldade na escola?
P.L.: Não, eu sempre fui uma criança até acima do esperado. A gente até fazia competição.
Eu queria ser sempre o primeiro. Primeiro da turma.
E.: Eu pergunto pela questão da língua, do ucraniano?
P.L.: Não, não, porque o nosso círculo cultural era brasileiro. Quem tem muita dificuldade
é o pessoal de Prudentópolis porque o círculo cultural, com os pais é tudo em ucraniano.
Quando eles saem desse ambiente tem dificuldade. Nem eu nem meus irmãos tivemos essa
dificuldade.
E.: Qual é a importância do CELEM para a comunidade ucraniana?
P.L.: O CELEM, é... a importância dele é que ele além da.. de oportunizar o pessoal a
aprender a língua ucraniana. É... ele traz é... um certificado. Esse certificado de repente
futuramente, de repente vai precisar, né? De repente, um dia há ... a possibilidade a
oportunidade de viajar à Ucrânia, alguma coisa, né? Quem que eles vão escolher? Aquele
que sabe a língua e que possa apresentar um comprovante né, um certificado de que ele
realmente sabe a língua. É isso que leva o pessoal realmente a participar estudar visando,
objetivando isso no futuro.
E.: Qual a importância de ensinar a língua?
P.L.: Esses dias nós estávamos conversando na igreja, que ainda hoje nós conseguimos
acompanhar uma missa no rito ucraniano, mas se nós não mantivermos a língua, não
ensinarmos a língua, essa riqueza do rito bizantino poderá se perder nas futuras gerações.
Por isso, que preservar a língua é tão importante.
E.:Quantos alunos estão matriculados?
P.L: Nós começamos com 30 alunos, mas aqueles que não eram da descendência ucraniana
começaram a desistir. Esse ano foi matriculado 22 alunos, porém há dificuldade em manter
os alunos pela dificuldade da língua.
E.:Em quais lugares há o ensino de língua ucraniana pelo CELEM?
P.L.: Que eu sei é Prudentópolis, Irati, Dorizon, Curitiba, Rio Azul.
E.: Há diferença entre a língua polonesa e a língua ucraniana?
P.L.:O polonês é diferente do ucraniano... o polonês não tem um alfabeto próprio como o
ucraniano.
Entrevistado: A.M., M.M., A.Z., V.Z.
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, após a aula de ucraniano na Escola
Estadual, pois os entrevistados eram alunos do curso de língua ucraniana do CELEM.
E.: Nome e sobrenome?
A.N.: Ane Michalichen
M.M.: Moacir Michalichen
A.Z.: Adilson Zazula
V.Z.:Vanderlei Zazula
E.: Idade?
A. M.: 17 anos.
M.M.: 43 anos
A.Z: 12 anos.
V.Z: 30 anos.
E.: Grau de escolaridade?
A. M.: 2º ano.
M.M.:2º grau completo.
A.Z: 6ª série.
V.Z.: 2º grau.
E.: Formação?
A.M: Estudante
M.M:
A.Z.: Estudante
V.Z.:
E.: Onde nasceu?
A.M.: Cascavel.
M.M.: Vera Guarani, distrito de Paulo Frontin , é Paulo Frontin, distrito de Vera Guarani PR
A.Z.: Cascavel.
V.Z.: Ivaiporã.
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
A.M.: Nasci em Cascavel.
E.: Nunca saiu de Cascavel, né?.
E.: Você?
M. M.: 42 anos.
A.Z.: Também nunca saí de Cascavel.
V.Z.: 28 anos
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
M.M.: É sai da..., a família saiu da lavoura e procura novos horizontes.
V.Z.: É a minha família também saiu da lavoura, e eu vim com dois anos, então eu não
lembro.
E.:Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
M.M. : .
V.Z.:
E: Qual a sua descendência ?
A.M: Ucraniana.
M.M:Ucraniana
A.Z.:Ucraniana
V.Z.:Ucraniana
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
A.M.: 5ª geração
M.M: 4ª geração
A.Z.: 5ª geração
V.Z.: 4ª geração, no caso o pai do meu pai, não, pai do meu vô é que veio da Ucrânia
E.: Então?
M.M: É a quarta. O meu avô da parte da mãe veio da Áustria.
P.L.: Naquela época, muitos ucranianos vieram pela Áustria, Alemanha porque são
próximos, por isso que tem imigrantes que veio desses países.
M.M.: É?
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
A.M.: Aprendi na missa...,em cursos, na catequese.
M.M.: Eu quando pequeno, nós na lavoura a gente falava muito a língua, então quando eu
vim pra cá, praticamente não falava nada em português. Depois que a gente começou a
estudar aqui que mudou um pouco. Depois na participação na igreja, nas missa, que a
gente começa a volta pra cultura nossa.
A.Z.: Há quatro anos atrás.
E.: N a escola?
A.Z.: Não, na catequese.
V.Z.: Praticamente, no curso (CELEM).
E.: Qual foi sua língua materna?
A.M.: Português
M.M: Eu pra mim foi o ucraniano
E.: De berço.
A.Z.: Português
V.Z.: Português
E.: Você usa a língua ucraniana?
A.M.: a, eu...
M.M: pouco?
A.M. Bem pouco!
M.M.: Eu uso mais nas missas que é na língua ucraniana.
E.: Você?
A.Z.: Mais ou menos.
V.Z.: Tenho contato mais na igreja, comunidade ucraniana.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
A.M: (...)
M.M.: Sonhachneck, quer dizer girassol, é símbolo da Ucrânia.
A.Z.: Sonhachneck, hailkas, perohê, só.
V.Z.: Sonhanheck, símbolo da Ucrânia, grupo folclórico perohê, bortch.sopa, sonhanheck
são essas palavras que nos faz lembrar mais da Ucrânia.
E: Poderia narrar um fato importante de sua vida na Língua ucraniana?
A.M.: Todos os dias eu vou a escola (não conseguiu, pois ficou nervosa.)
M.M: Eu vou a igreja todos os domingos.
A.Z.: Aos sábados vou para a catequese
V.Z.:
A.M.:
M.M.:
A.Z.:
V.Z.:
OBS.: O professor de língua ucraniana estava presente e ajudou os alunos a pronunciarem
as frases.
E.: Quais os motivos que levou a fazer o curso de língua ucraniana?
A.M.: O fato de aprender uma língua que tem o seu valor, quanto mais conhecimento sobre
a língua eu tiver mais eu vou ter facilidade se por uma eventualidade viajar para outro país,
ou vir pessoas de outros lugares visitar a comunidade.
M.M.: Renovar a cultura, a língua, voltar a cultura dos nossos antepassados. Ensinar aos
filhos para que dê continuidade a essa cultura sem não nós vamos perder.
A.Z.: Aprender mais sobre a língua e a cultura
V.Z.: Para me aproximar mais da comunidade e resgatar a cultura, porque na família a gente
já perdeu um pouco da tradição.
Entrevistado: Ir. L. B.
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, na Escola Sagrada Família, local onde a
Irmã trabalha. Obs.: A entrevista não foi gravada a pedido da entrevistada.
E.: Nome e sobrenome?
L.B.: Luquia Banach
E.: Idade?
L.B.: 46 anos
E.: Grau de escolaridade?
L.B.: Eu tenho Mestrado em Teologia Oriental e Pós-Graduação em Gestão escolar.
E.: Formação?
L.B.: Teologia.
E.: Onde nasceu?
L.B.: Ortigueira -PR
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
P.L.: Cheguei em janeiro do ano passado.
E.: Dois anos?
L.B.: Não, um ano e meio.
Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
L.B.: O que vou dizer? Nós somos transferidos. E, vamos para onde nos transferem.
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
L.B. : Itália, onde fiquei 12 anos, União da Vitória e Prudentópolis.
E: Qual a sua descendência ?
L.B: Ucraniana.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
L.B.: Eu sou da terceira geração.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
L.B.:Desde o berço.
E.: Qual foi sua língua materna?
L.B.: Aprendi as duas juntas, a mãe ensinava isso em ucraniano e isso em português. Pra
mim falar ucraniano é a mesma coisa que falar português, não tenho problemas.
E.: Você usa a língua ucraniana?
L.B.:Uso.
E.: Em que ocasiões você usa a língua ucraniana?
L.B.: A todo o momento, na hora que preciso dela eu a uso. Como posso dizer, Eu me
levanto e faço as orações na língua ucraniana. É um uso diário, no cotidiano.
E.: Quais são as palavras ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
L.B.: Para mim, falar palavras ou frases não me dá muito sentido da língua, pois eu a
conheço.
E.: Então, vamos para a próxima pergunta. Poderia narrar um fato importante de sua vida
na Língua ucraniana?
L.B.:Há tantas coisas, bem eu fui para Ucrânia três vezes.
E.: Então narre uma dessas vezes.
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E: A escola ensina a língua ucraniana?
L.B.: Não, antigamente a gente ensinava. Hoje, ensinamos na catequese aos sábados.
E.: Na sua opinião, qual a importância da língua ucraniana para Igreja Católica Ucraniana?
L.B.: De suma importância. As nossas orações tudo é em ucraniano. Você sabe toda
tradução é uma traição. Traduzir o rito para o português, não tem o mesmo sentido que na
língua ucraniana. Falta alguma coisa. A língua ucraniana é importante pelo fato da cultura,
da tradição.
E.: O nosso estudo quer verificar a perda da língua ucraniana de geração para geração.
L.B.: Acredito que está se perdendo por não valorizar a cultura. Hoje, não, mas
antigamente, aprender ucraniano era se rebaixar, era inferior. Então se perdeu parte da
língua.
E.: Há algum aluno matriculado que ao ingressar na escola falava, apenas a língua
ucraniana?
L.B.: Não, antigamente tinha, mas hoje nós não temos alunos que falam a língua ucraniana,
desde o berço, apenas alunos que sabem rezar, conhecem parte do léxico, algumas músicas.
Eles dominam a língua portuguesa.
Entrevistado: Pe. M.C. L.
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, na Casa Paroquial.
37 Vou narrar a primeira vez. A primeira vez que fui para a Ucrânia foi em 1990. Fui da Itália
porque estava
morando lá. Naquela época a Ucrânia estava se abrindo, depois do Comunismo, da Queda do Muro
de Berlim.
Fui para lá para catequizar. Fui fazer esse trabalho e fiquei um mês e meio. A viagem foi de trem.
Viajamos a
noite, o dia e a outra noite. Chegamos ao meio-dia. A última noite foi uma tortura porque na divisa
com a
Ucrânia tinha que trocar os trilhos por causa do Sistema Comunista. Isso era uma segurança, pois
ninguém
podia entrar lá. Os guarda batiam nas portas do trem às duas horas da manhã pedindo documentos e
o que a
gente ia fazer lá. Eles se espantaram quando viu os documentos. Seis brasileiras, que falavam
ucraniano de
igual para igual. As irmãs que nos receberam eram todas da época da perseguição do Regime
Comunista. Não
se podia dizer que era Irmã, tudo acontecia escondido, no maior sigilo e se eram pegas tinham que
disfarçar.
E.: Nome e sobrenome?
M.L.: Mário Carlos Lazoski
E.: Idade?
M.L.: 48 anos
E.: Grau de escolaridade?
M.L.: Eu tenho Teologia, né? Que seria o que? 3ºgrau.
E.: Formação?
M.L.: Teologia.
E.: Vocês também se formam em filosofia?
M.L.: Sim, três anos de filosofia e depois quatro de teologia.
E.: Onde nasceu?
M.L.: Mallet -PR
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
M.L.: 6 anos e meio
Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
M.L.: A transferência do bispo (risos).
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
M.L.: Eu fiquei dois anos em Paulo Frontim, dois anos em Mallet, cinco anos em
Cantagalo, quatro anos nos Estados Unidos.
E.: Depois veio para cá?
L.M.: É. Não.Antes de vir pra cá, fiquei dois em Paulo Frontim, dois em Mallet, cinco em
Cantagalo e antes disso, tinha ficado quatro anos nos Estados Unidos.
E: Qual a sua descendência ?
M.L.: Ucraniana.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
M.L.: Minha é terceira geração. Meu vô veio quando era criança.
E.: Qual é o nome da paróquia a qual dirige como pároco?
L.M.: Nossa Senhora do Perpétuo Socorro.
E.: Como essa Igreja se classifica (Igreja Greco Católica Ucraniana /Igreja Ortodoxa
Ucraniana?
M.L.: Igreja greco católica Ucraniana.
E.: Há quanto tempo foi fundada em Cascavel?
M.L.: Desde 81 que foi elevada ao grau de Paróquia sabe? Como comunidade existe desde
1964, como comunidade. E como Paróquia desde 1981.
E.: Quantas famílias participavam nessa Igreja quando foi fundada em Cascavel?
M.L: Em 81, parece-me que era, hoje é em torno de 150 famílias aqui em Cascavel e mais
100 ao redor. Então o total em toda Paróquia em torno de 250, hoje. Então na época era
bem menor, em 81 era em torno de 80 famílias.
E.: Então as famílias aumentaram ou a imigração aumentou?
M.L.: A imigração, não. Na época era o casal, os filhos do casal e depois aumentou. Depois
veio outros do sul, de Santa Catarina.
E.:Qual é a procedência dessa Igreja?
M.L.:Ucrânia
E.:Todas as famílias eram descendentes de Ucranianos ou havia outras origens?
M.L.: Não, já havia casais mistos
E.:Há ainda, hoje, participantes que vieram da Ucrânia?
M.L.: Aqui nós temos duas famílias, a família dos Balan, mãe do Orlando e a família
Kachuba, ali a Dona Ana.
E.:Quantas famílias participam da Igreja hoje?
M.L.: No total aqui são 150 mais 100 nas oito comunidades. Digamos assim, Matriz mais
comunidades.
E.: Todas são descendentes de ucranianos?
M.L.: Não, a maioria são mistas, não são ucranianos.
E.: Pode-se dizer que é 50% ?
M.L.: Acho que sim, até mais que participa direto poderia dizer que sim, que estão inscritos
na Paróquia, até mais, acho 60%.
E.:Quantas famílias não são descendentes de ucranianos?
M.L.: É difícil saber porque a gente faz a missa na quarta-feira a tarde e a noite no domingo
é justamente para as famílias que não entendem ucraniano, mas vêm muitos que entendem.
Então é difícil dizer quantos são e quantos não são ucranianos.
E.;Quantas celebrações ocorrem semanalmente?
L.M.: Diariamente às 7:00 e Aqui aos domingos é as 8:30 da manhã e as 19:00. e nas
capelas é uma vez por mês ou a cada três semanas.
E.: E nas capelas o senhor reza em Português?
M.L.: Sim, geralmente é uma vez em Ucraniano e uma vez em português. Dois domingos
eu rezei em Sapucaia em português na próxima vez será em ucraniano. A gente vai
intercalando.
E.:Quando foi que aprendeu a Língua Ucraniana?
M.L.: Desde casa. Acho que a base é em casa. Depois com o seminário a gente aperfeiçoa,
né? E a própria necessidade obriga, né?
E.: Qual foi sua língua materna?
M.L.: Português. Já nasci num ambiente brasileiro. E meus irmãos não falam ucraniano,
entendem, mas não falam devido a falta de prática. Dois irmão são casados com não
ucraniana então fica mais complicado manter a língua, né?
E.:Quais são as celebrações mais importantes na Religião Católica segundo a cultura
ucraniana?
M.L.: Eu diria que é Páscoa e Natal que a base de tudo, né? Que mais se destaca, né? É a
base de tudo nè?
E.:Há algum informativo, jornal que seja distribuído ou tenha assinatura em
e pela Igreja na Língua Ucraniana? Se tiver qual é o nome e de onde
procede?
M.L.: Aqui na paróquia a gente tem o “Hromada”. Ele é de tiragem mensal. “Hromada”é
palavra ucraniana que quer dizer comunidade.
E.: Fora esse há mais algum?
M.L.: Não, tem de Prudentópolis, “#####” (Pracia) e o “##########.
########”
(Missionário Ucraniano no Brasil)
E.: Quais são as palavras e, ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
Não se fosse assim eu diria um dos grandes versos do poeta Tarás Chewtchenko que diz o
seguinte ###*##.
##*.
)##/,!)##*.
##*##*#/0!+#$.
##&###*###/#'#&.
#.
#!###*###! Que diz mantei e aprendei a cultura ucraniana. Agora não tem uma palavra
assim que representa a cultura ucraniana.
E.: Poderia narrar um fato importante de sua vida na língua ucraniana?
E.: Qual a importância da língua ucraniana para a Igreja Católica Ucraniana?
M.L.: Ta, primeiro lugar a cultura ucraniana, eu diria toda ela mantem-se sim devido a
igreja, ou seja nós temos toda a nossa centralização da nossa manutenção da língua da
cultura da igreja, devido já quando os próprios ucranianos vieram eles primeira aonde não
nas casas, eles formaram um núcleo uma base e isso se tornou a igreja onde eles
despertando a parte espiritual, bem como mantendo a a língua, a cultura, os costumes ao
redor da igreja. É importante sim para que se possa voltar a base e ... e os cantos, as danças
ucranianas, você pode até ter uma assim imagem externa, mas quando consegue
acompanhar o raciocínio, a mentalidade ucraniana vê-se que a musica, a dança ela tem todo
um sentido especial. É necessário, é indispensável ao menos ter uma base da língua
ucraniana, conhecer o alfabeto, saber ler e escrever seria essencial para todos, né?
E.: Você acha que a língua tende a se manter no contexto ou ela desaparecerá?
M.L.: Não, ela se manterá, inclusive agora, foi lançado o mais recente dicionário de
ucraniano/ português e português/ucraniano. (mostrou o dicionário). Então é sinal de que a
cultura ucraniana vai se manter sabe lá por quanto tempo. Além disso, tem o ensino de
língua na nossa comunidade, as irmãs dão aula na catequese, e tem também numa escola
pública, no São Cristóvão, nas segundas e quintas que é reconhecido pelo MEC.
E.: Observei que nas celebrações que são rezadas em ucraniano, a homilia, os avisos e a
leitura da Bíblia é feito em português. Por que isso acontece?
M.L.: Se faz em português para que a comunidade entenda o que está sendo falado,
principalmente os mais jovens e aqueles que não conhecem a língua como as pessoas de
outras etnias, porque nem todos que participam são ucranianos, nós temos simpatizantes.
Obs.: Chegaram algumas senhoras.
M.L.: Boa tarde.
S.1: Esses dias eu fiz bastante Perohê.
M.L. Ah, é?
E.: Não é pierogi?
M.L.: Não, não, é diferente, não é igual, para os ucranianos não é pierogi e sim perohê.
Perohê é feito de... tem recheio de requeijão,né? já o pierogi tem o requeijão e o purê de
batata.
Entrevistado: O.T.C..
Contexto: A entrevista foi realizada normalmente, na casa da entrevistada.
E.: Nome e sobrenome?
O.T.C.: Olga Tebaldi Cichoski
E.: Idade?
O.T.C.: 68 anos
E.: Grau de escolaridade?
O.T.C.: 4ª série
E.: Formação?
O.T.C.: Dona de casa
E.: Onde nasceu?
O.T.C.: Erechim-RS
E.: Há quanto tempo está em Cascavel?
O.T.C.: 50 anos.
E.: Quais os motivos que o trouxeram para Cascavel?
O.T.C.: Meus pais vieram para Cascavel para
E: Antes de vir a Cascavel passou por outros lugares?
O.T.C. : Morei em São Pedro, hoje é Distrito de Corbélia, mas antigamente de Cascavel e
depois nos mudamos para a cidade.
E: Qual a sua descendência ?
O.T.C.: Italiana.
E.: Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor qual é a sua geração?
O.T.C.: Terceira geração.
E.: Quando foi que aprendeu a língua ucraniana?
O.T.C.: Não aprendeu
Qual foi sua língua materna?
O.T.C.: Aprendi o português e o italiano juntos, mas depois não falamos mais.
E.: Você usa a língua ucraniana?
O.T.C.: Não.
E.: Em que ocasiões você usa a língua ucraniana?
O.T.C.: Comecei a conviver com o ucraniano depois que eu me casei. O meu marido era
ucraniano, falava ucraniano e participava da igreja. Minha sogra falava com os meus dois
filhos mais velho em ucraniano, levava eles para a igreja. Por isso, eles entende o rito, os
hinos da igreja e incentivaram os filhos para participar da comunidade, do grupo folclórico.
E.: Por que a senhora sendo de descendência italiana e sabendo a língua não a ensinou a
seus filhos?
OT.C.: Não ensinei o italiano porque o meu marido ia querer ensinar o ucraniano. E, como
é que eles iam entender tudo isso? Ia ser uma confusão. Como que eles iam se virar na
escola? Iam sofrer como eu sofri. Então, chegamos a um acordo de que ele não ia ensinar o
ucraniano e nem eu o italiano.
E.: Quando que a senhora se casou?
O.T.C.: Eu me casei em 1961, na Igreja Nossa Senhora Aparecida, na época era a igreja de
madeira...né ? Bem, depois é que foi construída a igreja... hoje é a catedral. Meu marido
ajudou...construir a igreja nova.
APÊNDICE C CENAS OBSERVADAS EM SALA DE AULA.(CELEM)
Al 1: Professor, essa palavra no dicionário é escrita de outra forma.
P.: É que o dicionário traz a língua ucraniana falada em Kiev, né? E o nosso ucraniano, que
os nossos pais falam é o ucraniano do interior da Ucrânia, dos agricultores. E, ainda, o
ucraniano que eles falam é aquele de 1890, 18 e(...) Lá na Ucrânia eles já não falam desse
jeito mais, já mudou.
Al.2:Então a gente tem de aprender o ucraniano que se fala na capital, né? O que é mais
atual. (16/04/2007)
APÊNDICE D CENAS OBSERVADAS NA CATEQUESE.
Irmã: Crianças vocês são o futuro da nossa Igreja. Se vocês não aprenderem a língua e as
tradições da nossa cultura, da cultura dos seus pais e avós, nós não teremos continuidade
dessa riqueza. Nossa cultura e nossa igreja morrerão (04/2006).
ANEXO I ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA AS FAMÍLIAS DESCENDENTES
DE UCRANIANOS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU – MESTRADO EM LETRAS
MESTRANDA: ALBERTINA MEZAVILA
Nome e Sobrenome
Idade
Grau de escolaridade Formação
Onde nasceu
Há quanto tempo está em Cascavel
Quais os motivos que o trouxeram para esta cidade
Antes de vir a Cascavel, quais os lugares por onde passou
Qual é descendência?
Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor, qual é a sua geração?
Quando foi que aprendeu a língua ucraniana
Qual foi sua língua materna?
Você usa a língua ucraniana?
Em que ocasião você utiliza a língua ucraniana?
Quais são as palavras e, ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
Poderia narrar um fato importante de sua vida na língua ucraniana?
Resumo
Qual a importância da língua ucraniana para a cultura ucraniana?
ANEXO II ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA O PADRE
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU – MESTRADO EM LETRAS
MESTRANDA: ALBERTINA MEZAVILA
Nome e Sobrenome
Idade
Grau de
escolaridade Formação
Onde nasceu
Há quanto tempo está em Cascavel
Quais os motivos que o trouxeram para esta cidade
Antes de vir a Cascavel, quais os lugares por onde passou
Qual é descendência?
Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor, qual é a sua geração?
Qual é o nome da paróquia a qual dirige como pároco?
Como essa Igreja se classifica (Igreja Greco Católica Ucraniana / Igreja ortodoxa
ucraniana)?
Há quanto tempo foi fundada em Cascavel?
Qual é a procedência dessa Igreja?
Quantas famílias participavam nessa Igreja quando foi fundada em Cascavel?
Todas as famílias eram descendentes de Ucranianos ou havia outras origens?
Há ainda, hoje, participantes que vieram da Ucrânia?
Quantas famílias participam da Igreja hoje?
Todas são descendentes de ucranianos
Quantas famílias não são descendentes de ucranianos?
Quantas celebrações ocorrem semanalmente?
Quando foi que aprendeu a Língua Ucraniana
Qual foi sua língua materna?
Quais são as celebrações mais importantes na Religião Católica segundo a cultura
ucraniana?
Há algum informativo, jornal que seja distribuído ou tenha assinatura em
e pela Igreja na Língua Ucraniana? Se tiver qual é o nome e de onde
procede?
Quais são as palavras e, ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
Poderia narrar um fato importante de sua vida na língua ucraniana?
Resumo
ANEXO III ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA AS IRMÃS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU – MESTRADO EM LETRAS
MESTRANDA: ALBERTINA MEZAVILA
Nome e Sobrenome
Idade
Grau de escolaridade Formação
Onde nasceu
Há quanto tempo está em Cascavel
Quais os motivos que o trouxeram para esta cidade
Antes de vir a Cascavel, quais os lugares por onde passou
Qual é descendência?
Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor, qual é a sua geração?
Quando foi que aprendeu a língua ucraniana
Qual foi sua língua materna?
Você usa a língua ucraniana?
Em que ocasião você utiliza a língua ucraniana?
Quais são as palavras e, ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
Poderia narrar um fato importante de sua vida na língua ucraniana?
Resumo
Qual a importância da língua ucraniana para a cultura ucraniana?
Há o ensino de língua ucraniana na escola?
Por que se ensina a língua ucraniana na catequese?
ANEXO IV ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA O PROFESSOR DE LÍNGUA
UCRANIANA
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU – MESTRADO EM LETRAS
MESTRANDA: ALBERTINA MEZAVILA
Nome e Sobrenome
Idade
Grau de escolaridade Formação
Onde nasceu
Há quanto tempo está em Cascavel
Quais os motivos que o trouxeram para esta cidade
Antes de vir a Cascavel, quais os lugares por onde passou
Qual é descendência?
Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor, qual é a sua geração?
Quando foi que aprendeu a língua ucraniana
Qual foi sua língua materna?
Você usa a língua ucraniana?
Em que ocasião você utiliza a língua ucraniana?
Quais são as palavras e, ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
Poderia narrar um fato importante de sua vida na língua ucraniana?
Resumo
Qual a importância da língua ucraniana para a cultura ucraniana?.
Qual é a importância do CELEM para a comunidade ucraniana?
Qual a importância de ensinar a língua?
Quantos alunos estão matriculados?
Em quais lugares há o ensino de língua ucraniana pelo CELEM?
ANEXO V ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA OS PRESIDENTES DO GRUPO
FOLCLÓRICO SONHACHNECK
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ – UNIOESTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU – MESTRADO EM LETRAS
MESTRANDA: ALBERTINA MEZAVILA
Nome e Sobrenome
Idade
Grau de escolaridade Formação
Onde nasceu
Há quanto tempo está em Cascavel
Quais os motivos que o trouxeram para esta cidade
Antes de vir a Cascavel, quais os lugares por onde passou
Qual é descendência?
Há quantas gerações está no Brasil, ou melhor, qual é a sua geração?
Quando foi que aprendeu a língua ucraniana
Qual foi sua língua materna?
Você usa a língua ucraniana?
Em que ocasião você utiliza a língua ucraniana?
Quais são as palavras e, ou frases que lhe dá um sentimento da cultura ucraniana?
Poderia narrar um fato importante de sua vida na língua ucraniana?
Resumo
Qual a importância da língua ucraniana para a cultura ucraniana?
Qual a importância do grupo para a cultura ucraniana?
Qual a importância de se preservar a língua?
ANEXO VI AUTORIZAÇÃO PARA UTILIZAÇÃO DOS DADOS
DECLARAÇÃO DE PARTICIPAÇÃO NA PESQUISA
Eu,.........................................................................portadora do CPF nº...........................e do
RG nº......................................................Órgão Expedidor..................UF................, declaro
para os devidos fins e a quem interessar possa, que estou ciente de minha participação na
pesquisa provisoriamente intitulada “UCRANIANOS EM CASACAVEL: A HISTÓRIA, A
RELIGIÃO E A LÍNGUA”, ligada ao Programa Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado
em Letras – da UNIOESTE (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), área de
concentração Linguagem e Ensino, na forma de concessão de entrevista gravada, bem como
dos meus direitos garantidos pelo Acordo Internacional sobre Direitos Civis e Políticos,
pela Constituição Federativa do Brasil de 1988 e da Legislação Brasileira Correlata,
sobretudo, no que tange à ciência de que as informações por mim fornecidas serão tornadas
públicas, tendo assegurado, no entanto, o absoluto sigilo quanto a minha identidade.
Por ser verdade, firmo a presente declaração.
Cascavel,______ abril de 2007.
Participante
ANEXO VII HROMADA –INFORMATIVO DA PARÓQUIA NOSSA SENHORA DO
PERPÉTUO SOCORRO
ANEXO VII – PERIÓDICO MISSIONÁRIO UCRANIANO NO BRASIL
(######### .
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