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A HEURÍSTICA DA DISPONIBILIDADE
E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA:
UM ESTUDO EXPERIMENTAL
Carlos Gustavo Pereira Lima Ciarelli
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-graduação em Administração do Instituto
COPPEAD de Administração da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários para a obtenção do grau de Mestre em
Administração (M.Sc.).
Orientador: Marcos Gonçalves Ávila, Ph.D.
Rio de Janeiro
2005
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Ficha Catalográfica
Ciarelli, Carlos Gustavo Pereira Lima.
A heurística da disponibilidade e a influência da mídia: um estudo
experimental/ Carlos Gustavo Pereira Lima Ciarelli. Rio de Janeiro:
UFRJ/ COPPEAD, 2005.
137f.: 31cm.
Orientador: Marcos Gonçalves Ávila
Dissertação (mestrado) - UFRJ/ Instituto COPPEAD de
Administração/ Programa de Pós-Graduação em Administração, 2005.
Referências Bibliográficas: f. 124-128
1. Influência da Mídia. 2. Heurísticas de Julgamento. 3. Heurística
da Disponibilidade. I. Ávila, Marcos Gonçalves. II. Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração. III. Título
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A HEURÍSTICA DA DISPONIBILIDADE E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA:
UM ESTUDO EXPERIMENTAL
Carlos Gustavo Pereira Lima Ciarelli
Dissertação de Mestrado submetida à Banca Examinadora do Instituto COPPEAD
de Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre em Administração
(M.Sc.).
Aprovada por:
Prof. Marcos Gonçalves Ávila, Ph.D. Orientador
Instituto COPPEAD de Administração UFRJ
Profª. Letícia Moreira Casotti, D.Sc.
Instituto COPPEAD de Administração UFRJ
Prof. Valdecy Faria Leite, D.Sc.
Faculdade de Administração e Ciências Contábeis UFRJ
Rio de Janeiro
2005
É natural que cada pessoa ache que sua própria mãe é a
melhor do mundo. Eu não fujo à regra. Tudo o que sou, tudo
o que tenho, devo à pessoa que não mede esforços e
sacrifícios para me ver feliz. Este trabalho, assim como todas
minhas conquistas, é dedicado à melhor mãe do mundo.
A minha mãe.
Agradecimentos
Este trabalho é resultado do apoio e da colaboração direta de várias pessoas, sem as
quais eu jamais teria conseguido escrever as próximas páginas. Apesar de quaisquer
erros e omissões encontrados nesta dissertação serem responsabilidade
exclusivamente minha, todo e qualquer mérito que ela porventura possua deve ser
dividido com aqueles cuja ajuda foi fundamental para que fosse concluída. Desta
maneira, gostaria de expressar aqui meus agradecimentos:
Ao professor Marcos Ávila, por ter me apresentado este campo de pesquisa tão
fascinante que é o estudo do julgamento e tomada de decisão e pela excelente
orientação durante a execução deste trabalho;
Aos professores Flávia Eyler da PUC, Almir Pita e Edmar Almeida do Instituto de
Economia da UFRJ e Sérgio da Escola de Comunicação da UFRJ, pela gentileza de
permitir que os experimentos deste estudo fossem realizados em suas salas de aula;
A todos aqueles alunos que cederam com boa vontade seu tempo (escasso) e intuição
para participar desta pesquisa;
Ao Professor Eduardo Saliby e aos amigos Bruno Maletta e Juliana Yonamine pela
ajuda fundamental com os métodos estatísticos usados na análise quantitativa dos
resultados;
Ao amigo Bruno Lino pela excelente ajuda na revisão do resumo deste trabalho e aos
amigos Aurore Wu, Nir Bar-Lev e Patricia Burgess pela revisão (e grande melhora) de
sua versão em inglês (thank you guys);
A todo o corpo docente e discente com o qual tive o prazer de conviver nestes dois anos
em que estive no COPPEAD. O contato diário com o material humano excepcional que
existe nesta escola torna ainda mais fácil perceber o porquê dela estar entre as
melhores do mundo em sua área. Considero um privilégio ter-me sido dada a
oportunidade de aprender, estudar e conviver com pessoas tão brilhantes e ainda mais,
no fim deste ciclo, poder ter várias delas como amigas;
Às equipes que trabalham na secretaria, biblioteca, Amea, cantina, xerox e todas as
outras áreas desta instituição, as quais são as grandes responsáveis por fazer tudo
acontecer. Muito, mas muito obrigado mesmo por toda a atenção e competência
demonstradas quando nós (alunos) precisamos da ajuda de vocês;
À minha família, pelo apoio incondicional em tornar meus objetivos realidade. À minha
avó, pelo suporte durante todos estes anos;
Aos meus amigos, pelo companheirismo ininterrupto e também pela paciência em me
ouvir falar, pela milionésima vez, em coisas “estranhas” como heurísticas, vieses,
framing effect, prospect theory etc, sem reclamar (muito);
À vida, por tudo isso. Prometo fazer meu melhor para estar a altura de todas as
oportunidades maravilhosas que me são dadas.
“I mean to say that objects of sense are of two kinds; some of
them do not invite thought because the sense is an adequate
judge of them; while in the case of other objects sense is so
untrustworthy that further enquiry is imperatively demanded”.
Platão (A República, Livro VII)
“The pure and simple truth is rarely pure and never simple”.
Oscar Wilde
Resumo
Ciarelli, Carlos Gustavo Pereira Lima. A Heurística da Disponibilidade e a
Influência da Mídia: Um Estudo Experimental. Orientador: Marcos Gonçalves
Ávila. Rio de Janeiro: UFRJ/ COPPEAD, 2005. Dissertação (Mestrado).
As heurísticas de julgamento têm uma grande influência no nosso processo de
tomada de decisão, sendo em geral muito úteis como atalhos mentais que facilitam e
tornam mais rápido este processo. Em algumas situações, contudo, estes mesmos
atalhos podem levar a uma visão distorcida da realidade, induzindo a erros de
estimativa de probabilidade e freqüência que, em última instância, podem nos fazer
interpretar o mundo de uma forma equivocada. Já foi constatado, através de
pesquisas empíricas estrangeiras, que os meios de comunicação têm preferência
por noticiar aqueles acontecimentos que são mais dramáticos e espetaculares e que
tenham relevância geográfica e cultural para sua audiência, além do conteúdo das
matérias sobre notícias com estas características ser bem mais detalhado e vívido
do que o daquelas sobre notícias que não as possuem. Esse comportamento da
mídia pode ter um efeito decisivo na disponibilidade de certos eventos em nossas
mentes, distorcendo nossa percepção a respeito de sua probabilidade e freqüência e
influenciando de maneira crucial nossa percepção daquilo que é real. Apesar da
importância do tema, não foi encontrado no Brasil nenhum estudo que busque
confirmar alguma preferência da mídia nacional por assuntos com essas
características mencionadas ou alguma influência das notícias veiculadas pela
mídia, em conjunto com os vieses da heurística da disponibilidade, no julgamento
dos brasileiros em relação ao mundo que os cerca. Visando preencher esta lacuna,
esta dissertação procura verificar, através de experimentos empíricos e pesquisa
secundária, se também no Brasil a facilidade de imaginar exemplos de um evento
afeta sua estimativa de freqüência (Tversky e Kahneman, 1974); se existe na mídia
nacional um viés em direção ao tipo de notícia descrito acima (Reiner in Maguire et
al., 2002; Wåhlberg e Sjöberg, 2000 e outros) e; se as notícias veiculadas pela mídia
influenciam, através da heurística da disponibilidade e seus vieses, a percepção de
freqüência e probabilidade dos brasileiros em relação a determinados eventos,
existindo portanto uma tendência das pessoas em estimar como mais freqüentes ou
prováveis aqueles que recebem mais destaque nos noticiários (Lichtenstein et al.,
1978; Slovic, Fischhoff e Lichtenstein, 1979; Combs e Slovic, 1979). Com este intuito
é primeiramente apresentada uma revisão bibliográfica sobre o tema, seguida da
descrição das hipóteses dos experimentos realizados e sua metodologia e
terminando com a análise e conclusões a respeito dos resultados observados. No
fim, os resultados do experimento são inconclusivos quanto ao efeito da facilidade
de imaginação na percepção de freqüência, porém confirmam tanto o viés da mídia
em relação às notícias “espetaculares” quanto a influência da mídia na estimativa da
amostra analisada em relação à probabilidade e freqüência de alguns eventos
específicos.
Abstract
Ciarelli, Carlos Gustavo Pereira Lima. The Availability Heuristic and the Media’s
Influence: An Experimental Study. Chairman: Marcos Gonçalves Ávila. Rio de
Janeiro: UFRJ/ COPPEAD, 2005. Dissertation.
The judgment heuristics have a huge influence in our decision making process, being
in general very useful as mental shortcuts that make this process easier and faster.
In some cases, however, these same shortcuts can present a distorted view of
reality, leading to mistakes in our assessment of frequency and probability that, in the
end, can make us interpret the world in an inaccurate way. It has already been
observed, by means of foreign (non-Brazilian) empirical researches, that the media
prefers to report on those events that are more dramatic and sensational and that
have a greater cultural and geographic connection with its audience, besides the fact
that the content of articles about news with these characteristics is much more
detailed and vivid than that of news without them. This can have a decisive effect on
the availability of certain events in our minds, twisting our perception about their
probability and frequency and influencing in a crucial way our perception of what is
real. In spite of the importance of the matter, no study was found in Brazil trying to
confirm some preference by the national media for subjects with those characteristics
mentioned above or the existence of some influence of the news shown in the media,
together with the availability heuristic biases, on Brazilians’ judgment of their
surrounding environment. To fill this gap, this dissertation seeks to verify, through
empirical tests and secondary research, whether also in Brazil the ease of
constructing instances of an event affects the assessment of its frequency (Tversky &
Kahneman, 1974); whether there is a bias in the national media toward the type of
news with the characteristics mentioned above (Reiner in Maguire et al., 2002;
Wåhlberg & Sjöberg, 2000; and others) and; whether the news shown in the media
influence, through the availability heuristic and its biases, Brazilians’ perception of
frequency and probability of some specific events, existing therefore a tendency to
assess as more frequent or probable those events that have more visibility in the
media (Lichtenstein et al., 1978; Slovic, Fischhoff & Lichtenstein, 1979; Combs &
Slovic, 1979). In order to do this a literature review about the topic is first presented,
followed by the description of the hypothesis of the realized experiments and their
methodology and finishing with the analysis and conclusions concerning the
observed results. In the end, the results of the experiment are inconclusive about the
effect of the ease of constructing instances of an event on the perception of its
frequency. On the other side, they confirm both the media’s bias toward “sensational”
news and the media’s influence on the analyzed sample’s assessment of probability
and frequency of some specific events.
Sumário
1 Introdução .................................................................................................
11
1.1 Introdução .................................................................................................
11
1.2 Importância do Estudo .........................................................................
13
2 Revisão Bibliográfica
........................................................................
15
2.1 A Teoria Econômica Neoclássica e a Tomada de Decisões
O Homo Economicus ...................................................................................
15
2.2 Racionalidade Limitada O Homo EconomicusRedux......
17
2.3 As Heurísticas e a Análise de Informações Introduzindo o
Homo Sapiens no Cenário Econômico .................................................
20
2.4 A Heurística da Disponibilidade e Seus Vieses ..........................
23
2.4.1 Viés Devido à Facilidade de Lembrança ..........................................
25
2.4.2 Viés Devido à Eficiência do Padrão de Busca ................................
26
2.4.3 Viés de Facilidade de Imaginação .....................................................
27
2.4.4 Correlação Ilusória ................................................................................
29
2.5 Aplicações Para o Mundo Real .........................................................
32
2.5.1 Percepção de Risco ..............................................................................
33
2.5.2 Políticas Públicas ..................................................................................
42
2.5.3 Egocentrismo ..........................................................................................
47
2.5.4 Julgamentos Sociais .............................................................................
52
2.6 Mídia e Disponibilidade ........................................................................
58
2.6.1 Escolhendo a Notícia ............................................................................
60
2.6.2 “Realidade Objetiva” versus “Realidade Simbólica”: A
Influência da Notícia .......................................................................................
65
3 Hipóteses do Experimento e Metodologia
...........................
72
3.1 Desenho e Hipóteses do Experimento ...........................................
73
3.2 Metodologia .............................................................................................
80
3.2.1 Amostra e Procedimento .....................................................................
80
3.2.2 Material
.....................................................................................................
82
3.3 Limitações do Estudo
..........................................................................
86
4 Análise dos Resultados
...................................................................
87
4.1 Pergunta 1 ................................................................................................
87
4.2 Pergunta 2 ................................................................................................
92
4.2.1 Super-Exposição versus Sub-Exposição das Causas de Morte:
Uma Análise Quantitativa das Notícias ......................................................
96
4.2.2 Relevância e Vividez: Uma Análise Qualitativa das Notícias ......
99
4.2.3 Análise das Exceções ...........................................................................
102
4.3 Pergunta 3 ................................................................................................
104
4.3.1 Geografia, Relevância e Exposição ...................................................
106
4.3.2 O Papel da Heurística da Representatividade na Percepção
dos Indivíduos Pesquisados: Uma Hipótese ............................................
110
4.4 Pergunta 4 ................................................................................................
111
5 Conclusões ..............................................................................................
114
5.1 Considerações Finais ...........................................................................
114
5.2 O Que Se Leva: Reflexões Sobre a Dinâmica Entre Mídia,
Sociedade, Julgamento, e Tomada de Decisão no Mundo
Contemporâneo .............................................................................................
118
6 Referências Bibliográficas .............................................................
124
7 Anexos
........................................................................................................
129
Anexo A Vieses na Freqüência Julgada de Morte .........................
129
Anexo B Questionário Aplicado ...........................................................
130
Anexo C População das Cidades Pesquisadas e PIB dos
Estados .............................................................................................................
137
Anexo D Termos Usados na Busca Por Notícias e Número de
Notícias Encontradas Para Cada Termo ..............................................
137
11
1 Introdução
1.1 Introdução
As ciências econômicas são, na maioria das vezes, reconhecidas apenas como o
estudo das diversas economias nacionais, seus mercados e como estes interagem
entre si. A macroeconomia, como é chamada a área de estudo que de fato trata
destes assuntos, corresponde efetivamente a grande parte das preocupações dos
economistas, desde a época de Adam Smith
1
, sendo chamada por Simon como o
“coração” (Heartland) da economia.
Apesar disto, o estudo de economia não diz respeito somente a análise de
agregados econômicos; ele decompõe-se também no estudo das unidades que
compõem estes agregados, indo do macro para o micro, passando por oligopólios,
conglom erados e empresas, até chegar no menor componente de um sistema
econômico: o indivíduo. Como escreve Marshall (apud Simon, 1978, p. 343), a
economia “é, por um lado, um estudo da riqueza; e por outro lado, mais importante,
uma parte do estudo do homem”.
Realmente, o estudo do agente econômico suas motivações, preferências, como
toma suas decisões, enfim, seu comportamento é absolutamente essencial para
que possamos entender os organismos maiores formados por eles (i.e. desde
empresas até economias nacionais). Assim como um arranha-céu é o que é sua
aparência, resistência, altura etc. devidos aos materiais com os quais é construído,
também os mercados e empresas nos diversos países são o que são devido em
1
Considerado o pai da economia moderna, cuja obra mais conhecida, não por um acaso, se chama A Riqueza
das Nações”.
12
grande parte às pessoas que os compõem, de forma que entendê-las é um dos
primeiros passos fundamentais para o entendimento de toda a dinâmica econômica.
Desta maneira, ao longo deste trabalho será feita uma tentativa de aprofundar a
compreensão de uma pequena parte do comportamento das pessoas e como é
formada sua visão do mundo que as rodeia. Tversky e Kahneman (in Kahneman et
al., 1982, p. 3) mostram que as “pessoas confiam em um número limitado de
princípios heurísticos os quais reduzem as complicadas tarefas de estimar
probabilidade e predizer valores a operações de julgamento mais simples”. No
mesmo artigo os autores identificam três destes princípios heurísticos
representatividade, disponibilidade e âncora e ajustamento e alguns de seus
vieses, que podem levar a erros severos e sistemáticos de julgamento. A discussão
deste trabalho será focada em apenas uma destas heurísticas, a da disponibilidade
e como seus vieses afetam nossa percepção de realidade, atuando na interpretação
que fazemos das informações que chegam através da mídia.
Com este intuito as próximas seções apresentarão, nesta ordem, um breve histórico
evolucionário da visão do processo de tomada de decisão do normativo para o
descritivo; uma descrição do que são as heurísticas de julgamento em geral, o que é
a heurística da disponibilidade em particular e quais os vieses de julgamento que
dela emanam; situações do cotidiano em que os indivíduos são influenciados por
estes vieses em seu processo de julgamento e tomada de decisão; como os meios
de comunicação escolhem quais notícias serão veiculadas e como estas escolhas
podem afetar nossa percepção de realidade e, no fim; uma discussão sobre diversos
experimentos que procuram mostrar a heurística da disponibilidade e seus vieses
em ação influenciando diretamente nossa forma de perceber e interpretar o mundo
13
checando se os resultados correspondem ao verificado por estudos anteriores
semelhantes realizados no exterior e às hipóteses sugeridas neste estudo e
comentando os resultados.
1.2 Importância do Estudo
A influência dos meios de comunicação em nossas vidas é cada vez mais relevante.
Em uma era que é chamada “da informação”, faz toda a diferença onde
conseguimos esta informação e a forma como ela nos é entregue.
Diversos estudos internacionais da área de comunicação e tomada de decisão
encontraram fortes evidências que a mídia jornais, rádio, televisão e, mais
atualmente, a Internet tem um papel fundamental na formação da nossa visão da
realidade, podendo influenciar, através das notícias que escolhe veicular, decisões
importantes da sociedade a respeito de suas prioridades e desafios.
Apesar da importância do tema, não só para o estudo da influência das notícias na
maneira como as pessoas enxergam o mundo, mas até mesmo para a discussão da
própria eficiência dos instrumentos utilizados para a manutenção do sistema
democrático, não foi encontrado no Brasil nenhum estudo que tenha procurado
detectar, sob a ótica do campo de julgamento e tomada de decisão, como o
processo de escolha das notícias e a forma como elas são transmitidas para o
público pode impactar seu julgamento a respeito do ambiente que o cerca e suas
conclusões sobre qual o melhor caminho a ser seguido.
Desta maneira, a importância deste estudo decorre exatamente da sua tentativa de
preencher esta lacuna, realizando no país alguns experimentos originais ou
14
inspirados em outros já realizados no exterior que tentam avaliar, sob a ótica da
economia comportamental, mais especificamente, das heurísticas de julgamento
relatadas originalmente por Tversky e Kahneman (1974), se também no Brasil há
uma diferença entre a realidade que nos é transmitida pela mídia e a realidade
objetiva (mensurada pelas estatísticas de freqüência das ocorrências) e, caso exista
esta diferença, qual seu impacto na percepção dos indivíduos sobre a probabilidade
e freqüência de certos eventos. A pertinência destas respostas para a vida prática
das pessoas é proporcional ao tamanho da influência que os meios de comunicação
adquiriram, desde já algum tempo, na escolha, quantidade e formato da informação
que elas recebem.
15
2 Revisão Bibliográfica
2.1 A Teoria Econômica Neoclássica e a Tomada de Decisão O
Homo Economicus
A visão econômica do que seria a natureza humana e os caminhos que o agente
econômico percorre no ato de tomada de decisão tem sua origem na própria
formação do sistema de mercado capitalista e no aperfeiçoamento de técnicas
administrativas e de controle gerencial que os protocapitalistas foram obrigados a
adotar, a fim de enfrentar uma concorrência intra-sistêmica que se tornava cada vez
mais acirrada. Como escreve Hunt (1989, p. 146):
Auferir lucros dependia de se conseguir certo grau de controle calculado,
racional e previsível sobre as matérias-primas, o trabalho, os gastos de
produção e de transporte e as vendas finais no mercado. A escrituração por
partidas dobradas, sistemas complexos de contabilidade, leis uniformizadas
e codificadas de propriedade privada, compromissos contratuais e leis
comerciais surgiram, de modo geral, no período inicial do capitalismo e
eram indispensáveis na busca, pelo capitalista, de controle dos processos
de produção e de troca.
Este aspecto do comportamento dos capitalistas inteiramente necessário
no sistema capitalista passou a ser visto pelos teóricos da tradição
utilitarista como o âmago de todos os processos decisórios humanos. O
comportamento humano nunca era explicado como meramente habitual,
caprichoso, acidental, supersticioso, religioso, altruísta ou, simplesmente,
emocional e não racional. Todos os atos humanos passaram a ser vistos
como conseqüência de decisões calculadas, racionais, nas quais o
indivíduo agia de modo muito parecido com um contador, ponderando todos
os lucros (prazeres) a serem obtidos com determinado ato, deduzindo todos
os custos (dor) a serem causados por este ato e, depois, escolhendo
racionalmente o ato que maximizasse o excesso de prazer sobre a dor.
Desse modo, nos modernos livros de teoria macroeconômica, todo o
comportamento humano se reduz a tentativas racionais e calculadas de
maximizar os lucros ou a utilidade.
2
Surgiu desta maneira o modelo econômico neoclássico do comportamento humano
o Homo Economicus o qual coloca os indivíduos como agentes racionais,
2
“... a teoria microeconômica ortodoxa contemporânea, tal como ensinada na maioria das escolas e
universidades, é a economia neoclássica”. (Hunt, 1989, p. 409)
16
calculistas e maximizadores de utilidade e que domina até hoje grande parte da
análise do julgamento em tomada de decisão. Dentro deste modelo o indivíduo
possui algumas características que são essenciais para que ele possa sobreviver no
mundo teórico neoclássico: ele tem preferências estáveis e bem definidas (sabe
exatamente o que quer e seus gostos não mudam com o tempo), tem como opções
de consumo insumos e produtos homogêneos e perfeitamente divisíveis, não possui
nenhuma incerteza quanto ao futuro, tendo perfeito conhecimento de todas as
alternativas possíveis de produção e consumo (ou seja, é onisciente, tendo acesso a
todas as informações existentes) e é perfeitamente racional, usando as informações
que possui para identificar, ponderar e ordenar todas as alternativas possíveis de
acordo com suas preferências, escolhendo no fim do processo aquela opção que
maximiza sua utilidade ou prazer. Estas premissas neoclássicas sobre o
comportamento de escolha racional do indivíduo predominam na análise resultante
de seus modelos.
Como escreve Varian (1994, p. 1), “O poder explicativo de um modelo se origina da
eliminação de todos os detalhes irrelevantes, o que permite ao economista [ou
qualquer outro analista] concentrar-se nas características da realidade econômica
que ele está tentando entender.” Apesar disto ser uma verdade para todos os
modelos (não só os econômicos), problemas aparecem quando um modelo, que
teoricamente descreve a realidade, ainda que simplificada, possui em seus axiomas
básicos alguns pressupostos que não correspondem a esta realidade empiricamente
comprovada.
3
No caso da análise decisória, estes pressupostos descritos acima,
apesar de continuamente refutados por experimentos e pesquisas comportamentais,
3
Apesar de vários economistas pregarem o contrário, escrevendo, por exemplo, que “A força da microeconomia
vem da simplicidade de suas estruturas implícitas e sua proximidade com o mundo real”. (Harberger, in
Henderson, 1993, p. 34).
17
continuam sendo ensinados como uma aproximação razoável da maneira como as
pessoas decidem sobre os mais variados aspectos de suas vidas desde o
consumo de roupas até para qual time de futebol torcerão e usados na análise de
diversas situações que envolvem uma reflexão sobre o processo decisório (e.g.
alocação de investimentos, comportamento do consumidor).
2.2 Racionalidade Limitada O Homo EconomicusRedux
A situação descrita acima, contudo, vem mudando progressivamente nas últimas
décadas, com a proliferação de pesquisas e experimentos que não apenas criticam
como não realistas algumas crenças da ciência econômica a respeito do
comportamento dos indivíduos, como também revêem seu modelo do
comportamento humano, apresentando descrições de qual maneira estes indivíduos
decidem de fato. Além disso, o surgimento e consolidação de cadeiras de
Comportamento Econômico e Julgamento e Tomada de Decisão em diversas
instituições acadêmicas e de pesquisa também favorecem a disseminação e
absorção, pela teoria econômica, de várias descobertas a respeito do
comportamento das pessoas.
Um dos pioneiros na crítica ao modelo de comportamento dos agentes econômicos
neoclássico foi Herbert Simon (1947; 1957). Apesar de seus trabalhos estarem
voltados principalmente para o processo decisório dentro da firma criticando o
modelo de maximização de lucros sua teoria pode ser estendida para abranger
também a tomada de decisão individual em situações externas às empresas.
Segundo Simon (1978, p. 349):
18
Pode até ser que a teoria clássica possa ser consertada suficientemente
para lidar com uma vasta gama de situações onde a incerteza e adivinhação
não tenham um papel central ou seja, lidar com o comportamento de
economias que são relativamente estáveis e não estejam muito distantes do
equilíbrio. Todavia, um forte argumento pró-substituição da teoria clássica
por um modelo de racionalidade limitada começa a aparecer quando
examinamos situações envolvendo a tomada de decisão sob incerteza e
competição imperfeita. Estas situações a teoria clássica jamais foi
preparada para lidar e nunca lidou satisfatoriamente. A teoria de decisão
estratégica, empregando a idéia de utilidade esperada subjetiva, por um
lado e teoria dos jogos, por outro, tem contribuído enormemente para a
clarificação conceitual destes tipos de situações sem fornecer descrições
satisfatórias do comportamento humano real, ou mesmo, para a maioria dos
casos, teorias normativas que sejam efetivamente aplicáveis face ao poder
computacional limitado de homens e máquinas.
Simon nos lembra da inutilidade de modelos decisórios infactíveis, onde as
entidades (individuais ou coletivas) têm certeza absoluta do que acontecerá e
conhecimento das distribuições de probabilidade de eventos incertos, argumentando
pela criação de modelos mais realistas, que levassem em conta as condições
existentes de capacidade de cálculo tanto de homens quanto de seus
computadores. Ele via dois caminhos para a solução do impasse do modelo do
individuo maximizador de utilidade: podia-se manter a hipótese de onisciência,
racionalidade e maximização de utilidade, desde que a computação desta situação
ótima (a utilidade máxima) fosse suficientemente simplificada para que se tornasse
possível o que implica na construção de um modelo de mundo também
simplificado, ou; formular modelos que não necessariamente encontrem uma
solução maximizadora, mas pelo menos uma que satisfaça a necessidade do agente
decisor, possibilitando decisões suficientemente boas a um custo computacional
razoável. Este tipo de modelo, naturalmente, possibilita uma representação do
mundo muito mais rica e realista. Simon (1978, p. 353) coloca desta maneira o
desafio de desenvolver um modelo mais descritivo da realidade:
O modelo clássico pede pelo conhecimento de todas as alternativas que
estejam abertas à escolha. Ele pede pelo conhecimento completo de, ou
pela capacidade de analisar, as conseqüências que se seguirão a cada uma
19
das alternativas. Pede pela certeza das avaliações, presentes e futuras,
feitas pelo decisor a respeito destas conseqüências. Pede pela habilidade
de comparar as conseqüências, não importando quão diversas e
heterogêneas, em termos de uma medida consistente de utilidade. A tarefa,
então, era substituir o modelo clássico por um que descreveria como as
decisões podiam ser (e provavelmente eram) feitas quando as alternativas
de pesquisa [de informações] tinham de ser procuradas, as conseqüências
de escolher alternativas em particular eram conhecidas apenas de maneira
muito imperfeita, devido tanto à capacidade limitada de análise quanto à
incerteza do mundo exterior e o decisor não possuísse uma função de
utilidade geral e consistente para comparar alternativas heterogêneas.
Em meados da década de 50 Simon propôs então, como alternativa à hipótese
neoclássica de onisciência do agente econômico (conhecimento pleno de todas as
informações), a Teoria da Racionalidade Limitada (Bounded Rationality), a qual,
apesar de continuar assumindo a hipótese de racionalidade do agente econômico,
possui algumas diferenças cruciais em relação ao modelo do Homo Economicus”:
não sustenta que estes agentes possuem pleno conhecimento de informações e
probabilidades de eventos futuros, argumentando que a decisão racional ocorre
apenas dentro dos limites da informação disponível a eles
4
e; insere na análise da
tomada de decisão o conceito de satisfação de necessidades. Este conceito, em
contraste com a noção anterior de maximização de utilidade, sugere que o decisor,
antes de fazer uma escolha, possui um nível aspiracional mínimo de quão boa deve
ser a alternativa a ser escolhida (que não necessariamente é a alternativa ótima) e,
ao fazer a análise das informações que estão à sua disposição, tão logo ele
encontre uma opção que se encaixe neste nível, ele encerra sua busca e a escolhe,
tendo satisfeito sua necessidade. Como exemplifica Carlson (1978):
Desde que estes decisores não podem escolher a melhor alternativa [devido
à informação imperfeita que possuem], como pode o empreendedor
clássico, eles têm que se contentar com uma alternativa satisfatória.
Companhias individuais, portanto, buscam não maximizar lucros, mas
encontrar soluções satisfatórias para problemas agudos.
4
Estes limites, por suas vez, podem ser tanto institucionais e.g. informações confidenciais do governo,
relatórios internos de empresas quanto financeiros o custo de se conseguir a informação.
20
2.3 As Heurísticas e a Análise de Informações Introduzindo o
Homo Sapiens no Cenário Econômico
Segundo Kahneman (1991, p. 142), “(...) Herbert Simon introduziu o conceito de
racionalidade limitada, o qual de fato define o problema que o campo [de julgamento
e tomada de decisão] tem tentado resolver desde então”. A hipótese de
Racionalidade Limitada de Simon teve como mérito mostrar que, no mundo real,
devido a variados restritores de sua capacidade analítica e acesso aos dados, o
agente econômico não é capaz na média das situações de analisar informações
da maneira descrita pela teoria neoclássica, de maneira que seu julgamento de
diversas alternativas e sua escolha final podem não corresponder aos critérios de
racionalidade (maximização de utilidade) estabelecidos por esta mesma teoria.
Não obstante esta quebra do paradigma econômico do decisor racional, a teoria da
Racionalidade Limitada possuía algumas lacunas na descrição do processo de
julgamento e tomada de decisão dos indivíduos. Como escreve Bazerman (2002, p.
5):
Apesar dos conceitos de racionalidade limitada e satisfação serem
importantes para mostrar que o julgamento se desvia da racionalidade, eles
não nos dizem como o julgamento será viesado. Estes conceitos ajudam os
decisores a identificar situações nas quais eles podem estar agindo com
base em informações limitadas, mas eles não ajudam no diagnóstico dos
vieses específicos, sistemáticos e direcionais que afetam nosso julgamento.
Essas lacunas começaram a ser preenchidas com o trabalho de Tversky e
Kahneman (1972, 1973, 1974) a respeito das heurísticas de julgamento, o qual,
juntamente com vários outros estudos que se seguiram, serviu para complementar o
modelo de Simon do processo decisório. O próprio Simon (1978, p. 362) reconhece
isto, escrevendo que:
21
Teorias de processamento de informação visualizam a resolução de
problema como que envolvendo uma busca muito seletiva através de
espaços de problema que são freqüentemente imensos. Seletividade,
baseada em métodos empíricos ou “heurísticas”, tende a guiar a busca para
dentro de regiões promissoras, de forma que soluções serão encontradas
após a busca em apenas uma parte minúscula do espaço total. O Critério de
satisfação encerra a busca quando soluções satisfatórias para o problema
tiverem sido encontradas. Desta forma, estas teorias de solução de
problemas claramente cabem dentro do framework de racionalidade por
mim exposto aqui (grifo meu).
Mas o que são as heurísticas, citadas por Simon, que possibilitam esta seletividade
das informações usadas na busca de soluções? Goldstein e Gigerenzer (2002, p.
75) colocam que, para diversos pensadores (Simon inclusive):
(...) heurísticas são estratégias que guiam a busca de informação e
modificam a representação de problemas a fim de facilitar [encontrar as]
soluções. De sua introdução na língua inglesa no início do séc. XIX até
cerca de 1970, o termo “heurísticas” tem sido usado em referência a
processos cognitivos úteis e indispensáveis para a resolução de problemas
que não podem ser manejados pela lógica e teoria da probabilidade.
Tversky e Kahneman (in Kahneman et al., 1982) mostram que as pessoas usam um
número restrito de princípios heurísticos para estimar valores ou a probabilidade de
eventos. Estes princípios, ou heurísticas, “reduzem as tarefas complexas de estimar
probabilidades e predizer valores a operações de julgamento mais simples”.
Sintetizando o conceito, as heurísticas são processos mentais que simplificam nossa
busca, seleção e análise de informações, de forma que possamos achar a melhor
solução possível para um problema seja ele estimar probabilidades, escolher um
emprego, ou qualquer outro considerando-se nosso acesso restrito às informações
e nossa capacidade limitada para retê-las e analisá-las.
Apesar de não nos darmos conta na maioria das vezes, usamos a todo o instante
algum tipo de heurística: para escolher nosso prato no restaurante (quando olhamos
primeiro a lista de pratos de carne ou massa, porque é o que mais gostamos),
estimar a probabilidade de chover no dia seguinte ou uma infinidade de outras
22
situações. Pode-se afirmar que, nos dias de hoje, com a grande quantidade de
informações de todos os tipos disponíveis ao indivíduo médio, o uso das heurísticas
é praticamente inevitável quando se pretende escolher em um tempo razoável
aquelas a serem usadas no processo de tomada de decisão ainda mais quando
consideramos como o tempo no mundo pós-moderno é um bem escasso (Harvey,
2003). Como escreve Bazerman (2002, p. 6) “os indivíduos usam heurísticas (...)
porque os benefícios de tempo economizado [em busca e análise de informações]
freqüentemente são maiores do que os custos de qualquer redução potencial na
qualidade da decisão”. Daí vermos exemplos do uso de processos heurísticos
quando empresas de recursos humanos restringem sua busca por jovens
profissionais a recém-formados de algumas poucas universidades consideradas de
“primeira linha”, potenciais consumidores concentram sua pesquisa por televisores a
algumas marcas mais conhecidas ou casais limitam suas opções de lazer sem pre a
aqueles lugares que já lhes são familiares.
Naturalmente, o fato de usarmos as heurísticas de maneira intuitiva, sem nos
darmos conta (como mencionado acima), pode gerar uma série de problemas
durante nosso processo de análise de informações. Tversky e Kahneman (1974)
descrevem três heurísticas de julgamento âncora e ajustamento,
representatividade e disponibilidade assim como diversos vieses na análise de
problemas que podem ocorrer devido a seu uso. As heurísticas são, na maioria das
vezes, muito úteis no processo decisório não é à toa que continuam sendo usadas;
entretanto, “algumas vezes elas podem levar a erros graves e sistemáticos” (Tversky
e Kahneman, in Kahneman et al., 1982, p. 3).
23
Contudo, estes erros, ou vieses heurísticos, como se convencionou chamá-los,
tornam-se previsíveis exatamente pelo fato de serem sistemáticos, e a
previsibilidade destes erros por sua vez, como lembra Bazerman (2002), significa
que, uma vez que identifiquemos as maneiras como eles atuam sobre as pessoas,
nós possamos evitá-los. Assim, o estudo destes vieses pode ser considerado tão
importante quanto o estudo das próprias heurísticas: primeiro, porque seu uso
permite controlar a percepção e opinião dos indivíduos a respeito dos mais diversos
fatos; segundo, porque só o seu conhecimento possibilita que uma pessoa se
proteja ainda que de maneira não completamente perfeita, como veremos abaixo
de uma possível manipulação mal intencionada (Ciarelli, 2003).
2.4 A Heurística da Disponibilidade e seus Vieses
Dentre as heurísticas identificadas por Tversky e Kahneman (1973, 1974), o foco
deste estudo encontra-se naquela que eles chamam de heurística da disponibilidade
(availability heuristics). Segundo eles, esta heurística é usada para estimar a
probabilidade ou freqüência de um evento de acordo com a facilidade e / ou clareza
com que este evento vem à nossa mente. Desta forma, “um evento que evoca
emoções e é vívido, facilmente imaginado e específico será mais disponível do que
um evento que é não emocional em sua natureza, insípido, difícil de imaginar, ou
vago” (Bazerman, 2002, p. 7) e esta diferença pode ter uma influência fundamental
quando forem estimadas as probabilidades, freqüências ou causas prováveis de um
e do outro.
Diversos exemplos do uso desta heurística podem ser citados, como quando um
aluno estima sua probabilidade de sucesso em uma prova, baseado na sua
24
lembrança de sucessos em situações semelhantes, um gerente de hotel calcula a
freqüência de turistas estrangeiros no estabelecimento em que trabalha, a
população de uma cidade avalia quão violenta ela é de acordo com a quantidade de
notícias de crimes veiculadas pela mídia ou um surfista discute com seus colegas as
chances de existirem boas ondas no dia seguinte. Como explicam Tversky e
Kahneman (in Kahneman et al., 1982, p. 166):
Nestes problemas como na maioria dos problemas de estimação o
sujeito não pode elaborar e enumerar todos os exemplos. Ao contrario, nós
sugerimos, ele tenta imaginar alguns exemplos e julga a freqüência total
pela disponibilidade, ou seja, pela estimativa da facilidade com a qual
exemplos podem ser trazidos à mente. Como conseqüência, grupos cujos
exemplos são fáceis de elaborar ou imaginar serão percebidos como mais
freqüentes do que grupos do mesmo tamanho cujos exemplos são menos
disponíveis.
A heurística da disponibilidade “é um guia útil para a estimação de freqüências ou
probabilidades, porque exemplos de grupos grandes são geralmente alcançados de
maneira melhor e mais rápida do que exemplos de grupos menores” (Tversky e
Kahneman in Kahneman et al., 1982, p. 11), de forma que esta heurística leva
geralmente a um julgamento acurado (Bazerman, 2002, p. 7). Todavia, como a
facilidade com que os pensamentos e exemplos vêm à mente é afetada também por
fatores diversos da freqüência e probabilidade de eventos e.g. sua proximidade
temporal os quais podem afetar a vividez, saliência e facilidade de imaginação
destes eventos, o uso instintivo e indiscriminado desta heurística pode gerar vieses
previsíveis no processo de busca de informações (Tversky e Kahneman, 1973, 1974;
Bazerman, 2002). Tversky e Kahneman (1974) identificaram quatro principais vieses
de julgamento relacionados a esta heurística: vieses devido à facilidade de
lembrança de exemplos, devido à eficiência do padrão de busca, facilidade de
imaginação e correlação ilusória.
25
2.4.1 Viés Devido à Facilidade de Lembrança
Quando a estimativa de um indivíduo da freqüência, probabilidade ou causa
provável de eventos é feita a partir da disponibilidade em sua mente de exemplos
destes eventos, aqueles que forem mais facilmente lembrados parecerão mais
numerosos (e, portanto, mais freqüentes ou prováveis) do que os que estão menos
disponíveis. Diversos fatores podem influenciar a disponibilidade de exemplos em
nossa memória (Tversky e Kahneman, in Kahneman et al., 1982), como a
familiaridade com os exemplos nos lembramos mais daqueles eventos com os
quais estamos acostumados; a saliência eventos marcantes como um desastre
aéreo ou um atentado terrorista ficam mais vividos na memória; ou a distância
temporal do acidente exemplos recentes são mais facilmente lembrados. Outro
fator importante que pode distorcer a disponibilidade de um exemplo na memória é a
superexposição de um individuo a determinada situação como uma veiculação
massiva de determinados eventos ou circunstâncias na mídia (Bazerman, 2002, p.
15) ou submeter-se à mesma rotina dia após dia. Como exemplifica Bazerman
(2002, p. 16):
Por causa de nossa suscetibilidade à vividez e proximidade temporal,
Kahneman e Tversky sugerem que nós somos particularmente inclinados a
superestimar eventos improváveis. Por exemplo, se nós realmente
testemunhamos uma casa pegar fogo, nossa estimativa de probabilidade de
tais acidentes inclina-se a ser maior do que se tivéssemos simplesmente
lido sobre o fogo no jornal local. Similarmente, Slovic e Fischhoff (1977)
discutem as implicações do mal uso da heurística da disponibilidade em
debates sobre os riscos percebidos da energia nuclear. Eles apontam que
qualquer discussão dos riscos potenciais, qualquer que seja sua
probabilidade, aumentará a saliência destes riscos e [conseqüentemente]
aumentará os riscos percebidos.
26
2.4.2 Viés Devido à Eficiência do Padrão de Busca
As pessoas medem a freqüência e probabilidade de determinadas estruturas de
acordo com a familiaridade destas em sua memória. Por exemplo, porque as
pessoas têm mais facilidade de buscar pelas palavras por sua primeira letra do que
por sua terceira letra “... a maior parte das pessoas julga que palavras que começam
com determinada consoante são mais numerosas do que palavras nas quais as
mesmas consoantes aparecem na terceira posição. Elas o fazem mesmo para
consoantes, como r ou k, que são mais freqüentes [na língua inglesa] na terceira
posição do que na primeira” (Tversky e Kahneman, in Kahneman et al., 1982, p. 12).
Assim, quando as pessoas estão mais acostumadas a determinada estrutura seja
ela uma estrutura semiótica, organizacional ou política do que a outra, elas irão
considerar esta estrutura mais “normal”, e tenderão a superestimar sua freqüência,
probabilidade, efetividade ou confiabilidade.
Este viés devido à eficiência do padrão de busca (biases due to the effectiveness of
a search set) pode, ironicamente, diminuir nossa eficiência na busca de informações
ou produtos em diversas situações de nosso dia a dia em que usamos a heurística
da disponibilidade (Bazerman, 2002, p. 17). Por exemplo, se alguém que freqüenta
uma grande biblioteca e costuma procurar sempre em uma estante específica um
livro de determinado assunto
5
(marketing, finanças etc.) não encontra o livro aonde
esperava, a tendência é que pense que o livro já foi emprestado, não estando então
disponível. Entretanto, é possível que este livro esteja disponível, mas não na
estante específica (foi retirado anteriormente e já devolvido, mas a bibliotecária
5
Aqui atua a heurística da disponibilidade, pois em sua mente está clara a estrutura de arrumação dos livros nas
estantes, divididos por temas e subtemas, o que faz com que procure determinados assuntos sempre nos mesmos
lugares.
27
ainda não o recolocou no seu lugar), ou simplesmente que tenha sido rearranjado
para outra sessão (como um manual de pôquer que saiu da seção de “jogos de
cartas”, sendo realocado na seção hobbies). Caso o individuo se atenha à
estrutura de buscas que está acostumado, ele não alcançará seu objetivo, pelo
menos naquele momento. O mesmo problema terá o cliente que não acha um
produto específico na prateleira que está familiarizado porque ele foi realocado
para a prateleira de “produtos em promoção”, ou o executivo que não consegue com
a urgência necessária a informação de custo por marca que precisa porque, como a
área de marketing que ele acha ser a responsável pelo dado não a possui,
acaba acreditando que a informação não existe apesar da controladoria poder
disponibilizá-la.
É importante ressaltar que o fato de termos estes caminhos de busca de
informações já estruturados em nossas mentes não é por si só prejudicial tal como
outras heurísticas, na maioria das vezes isto nos ajuda a tomar decisões boas em
um prazo de tempo razoável. Todavia, existem situações (como as que vimos acima)
em que o viés devido à eficiência do padrão de busca acaba engessando estes
caminhos, atrapalhando nossa busca de informações e podendo prejudicar
conseqüentemente a própria tomada de decisão.
2.4.3 Viés de Facilidade de Imaginação
Nem sempre podemos nos valer de exemplos passados para estimar as chances de
um evento. Quando estamos na fase de planejamento de um projeto, por exemplo,
tudo o que podemos imaginar, a partir de várias premissas pré-determinadas, é
quais são as várias situações que podem levá-lo a dar certo e as outras que podem
28
fazê-lo dar errado, estimando as chances de sucesso a partir destes “exem plos”
percebidos. É em situações como estas que atua um outro viés da heurística da
disponibilidade identificado por Tversky e Kahneman, o viés de facilidade de
imaginação (biases of imaginability). Segundo estes autores (in Kahneman et al.,
1982, p. 12):
Algumas vezes uma pessoa tem de estimar a freqüência de um grupo cujos
exemplos não estão armazenados na memória, mas podem ser gerados de
acordo com uma dada regra. Nestas situações, a pessoa tipicamente
formula vários exemplos e avalia a freqüência ou probabilidade pela
facilidade com que os exemplos relevantes puderam ser imaginados.
Contudo, a facilidade de formulação de exemplos não reflete sempre sua
verdadeira freqüência e este modo de avaliação é inclinada a vieses.
A facilidade de imaginação “tem um papel importante na avaliação de probabilidades
em situações da vida real” (id., ibid., p. 13). As situações em que temos que estimar
as probabilidades a partir de exemplos imaginados são inúmeras, desde o
planejamento de projetos como mostrado no exem plo acima até a definição de
prioridades para as políticas públicas, passando pela estimativa de risco ou
possibilidade de sucesso para vários outros eventos em nossas vidas. Como
exemplificam Tversky e Kahneman, (id., ibid., p. 176):
Cada ocorrência de uma recessão econômica, uma operação médica bem
sucedida ou um divórcio é essencialmente única, e sua probabilidade não
pode ser avaliada por um simples registro de eventos. Entretanto, a
heurística da disponibilidade pode ser aplicada para avaliar a possibilidade
de tais eventos.
Nestes casos, onde é necessário estimar freqüência e probabilidades a partir de
exemplos “formulados” pela mente, o viés de facilidade de imaginação pode ter uma
forte influência sobre a impressão final. Por exemplo, ao estimar a chances de um
acidente ao se saltar de pára-quedas, talvez seja muito fácil para um pára-quedista
em potencial, “de primeira viagem”, imaginar inúmeras situações de perigo onde o
seu equipamento não funciona, ventos fortes o fazem perder o controle do pouso
29
etc., de forma que possivelmente ele tenderá a superestimar o risco do salto. Por
outro lado, ao planejar determinado projeto, um analista pode ser vítima de sua
própria autoconfiança exagerada, que o levará a imaginar várias situações de
sucesso, porém menos situações de fracasso do que seria prudente, de maneira que
ele superestime suas chances de ser bem sucedido e subestime seu risco ou a
necessidade de tempo para a conclusão do projeto. Finalmente, a dificuldade ou
incapacidade de se imaginar determinado cenário e.g. o navio afundar devido a
um acidente com um iceberg; um acidente na fábrica dissipar uma nuvem de gás
tóxico em direção a uma cidade próxima pode levar à conclusão que tal cenário é
impossível ou altamente improvável (id., ibid., p. 177), impedindo que se façam
planos de emergência ou contingência necessários para a situação.
2.4.4 Correlação Ilusória
Segundo Peeters (1983, p. 454), a “correlação ilusória é a percepção de uma
covariância entre dois eventos a qual, na verdade, não existe”. Esta percepção
errônea pode ocorrer tanto devido a algum evento marcante ao qual presenciamos
ou tomamos conhecimento, o qual ficou fortemente marcado em nossa memória
(e.g. uma esquina em particular onde fomos vítimas de um assalto; uma praia onde
soubemos que alguns banhistas foram atacados por tubarões) como devido a uma
exposição a alguns exemplos onde dois eventos ocorrem conjuntamente (e.g. atores
de cinema americanos que são milionários; políticos que são corruptos).
Em ambos os casos, cria-se na mente do indivíduo uma forte correlação entre o
evento X (passar por determinada esquina, ir a determinada praia, ser ator de
cinema americano ou ser político) e o evento Y (ser assaltado ou atacado por
30
tubarão, ser rico ou corrupto), a qual por sua vez pode gerar vieses na estimativa de
probabilidade e freqüência destes eventos ocorrerem conjuntamente. Como colocam
Tversky e Kahneman (in Kahneman et al., 1982, p. 13):
O julgamento de quão freqüentemente dois eventos ocorrem
simultaneamente pode ser baseado na força da ligação associativa entre
eles. Quando a associação é forte, uma pessoa pode concluir que os
eventos têm acontecido freqüentemente aos pares. Conseqüentemente,
julgar-se-á que eventos fortemente associados ocorram freqüentemente
juntos.
No caso de uma pessoa ser assaltada em uma esquina, por exemplo, o evento X
passar por aquela esquina e o evento Y ser assaltada podem tornar-se
automaticamente associados em sua mente (durante algum tempo, pelo menos).
Nesta situação, sempre que esta pessoa precisar passar pela mesma esquina, ela
se lembrará do assalto, havendo para ela uma forte correlação. O evento estará
claramente disponível em sua mente, de forma que é provável que sua percepção
de quão perigosa é esta esquina será maior do que a de várias outras pessoas que
não sofreram nenhuma violência no local e possivelmente ela acabe superestimando
a probabilidade real do evento “assalto” acontecer novamente enquanto ela estiver
lá. Naturalmente, a situação não precisa ter ocorrido diretamente com um indivíduo
para que surja em sua mente uma correlação ilusória entre dois eventos basta que
ele tome conhecimento de um ou mais exemplos de dois eventos marcantes
ocorrendo simultaneamente, como no caso de banhistas sendo atacados por
tubarões em uma praia específica.
A mesma correlação ilusória pode acontecer quando uma pessoa é exposta seja
em seu ambiente de trabalho, através da mídia etc. a vários exemplos onde dois
eventos ocorrem simultaneamente. Diversas notícias ligando políticos a casos de
corrupção podem levá-la a correlacionar automaticamente políticos a subornos, por
31
exemplo, fazendo-a passar a acreditar que a maioria deles rouba dinheiro do povo.
Da mesma maneira, uma senhora que lê toda a semana em sua revista a respeito
da vida glamourosa de artistas de cinema americanos poderá associar
inconscientemente o trabalho de ator de cinema com alta remuneração financeira.
Estas pessoas, para estimar a freqüência destes eventos conjuntos, tentam
primeiramente se lembrar de diversos exemplos onde eles ocorrem
simultaneamente, para avaliar em seguida se eles são correlacionados ou não de
acordo com a facilidade que estes exemplos surgem em sua mente
6
(Peeters, 1983;
Bazerman, 2002). “Quando a probabilidade de dois eventos ocorrerem
simultaneamente é julgada pela disponibilidade de exemplos em nossas mentes,
nós geralmente alocamos uma probabilidade inapropriadamente alta que os dois
eventos acontecerão juntos novamente” (Bazerman, 2002, p. 18). Quanto mais alta a
exposição a determinado evento conjunto (e.g. indivíduos que são políticos e
corruptos), mais fácil será para as pessoas se lembrar dele e conseqüentemente
maior será sua freqüência estimada. Isto acontece porque o julgamento das pessoas
a respeito do grau de associação entre variáveis é, principalmente:
Uma função da freqüência absoluta de exemplos de um par X-Y em
particular, especificamente o par Xpresente, Ypresente [em que os dois
eventos ocorrem simultaneamente]. Assim, a freqüência da ocorrência
conjunta dos dois eventos sendo considerados (...) [é] a heurística principal
usada para julgar a relação entre as duas variáveis. Outros pares XY têm
pouco impacto no julgamento das pessoas (Peeters, 1983, p. 454).
Um exemplo do viés da correlação ilusória na estimativa de freqüência de eventos
conjuntos é dado por Bazerman (2002, p. 17) ao considerar questões como a
relação entre o uso da maconha e delinqüência e se pessoas que se casam jovens
tendem a ter famílias maiores. Ele diz que:
6
Caracterizando, portanto, o uso da heurística da disponibilidade.
32
Ao estimar a questão da maconha, a maioria das pessoas tenta tipicamente
lembrar de vários usuários de maconha delinqüentes e assume ou não uma
correlação, baseada na disponibilidade mental de dados. Contudo, uma
análise apropriada requereria que você se lembrasse de quatro grupos de
pessoas: usuários de maconha que são delinqüentes, usuários de maconha
que não são delinqüentes, delinqüentes que não usam maconha e não
delinqüentes que não usam maconha. A mesma análise se aplica à questão
do casamento. Uma análise apropriada incluiria quatro grupos: casais que
casaram cedo e tiveram famílias grandes, casais que casaram cedo e
tiveram famílias pequenas, casais que casaram tarde e tiveram famílias
grandes, casais que casaram tarde e tiveram famílias pequenas.
De fato, existem sempre pelo menos quatro situações separadas a se
considerar quando se estima a associação entre dois eventos dicotômicos.
Contudo, nossa tomada de decisão do dia-a-dia usualmente ignora este fato
cientificamente comprovado.
2.5 Aplicações Para o Mundo Real
Tendo já discutido o que é a heurística da disponibilidade em particular e quais são
seus vieses de julgamento, talvez seja interessante que este trabalho descreva
algumas situações do nosso dia-a-dia em que o julgamento e tomada de decisão
são afetados por eles. Como mencionado acima, em diversas situações cotidianas
usamos a heurística da disponibilidade para tomar as mais variadas decisões, seja
em nossas vidas profissionais, seja em nossas vidas pessoais; adiante
descreveremos algumas delas. Duas ressalvas devem ser feitas, contudo: primeiro,
não se propõe de maneira nenhuma esgotar nestas descrições todas as situações
em que a heurística da disponibilidade e seus vieses atuam em nosso julgamento e
tomada de decisão. Realisticamente, tal objetivo não apenas estaria fora do escopo
deste trabalho como talvez seja até mesmo impossível, já que, além das várias
situações detectadas em diversas pesquisas e experiências, provavelmente existam
várias outras as quais os estudiosos do assunto ainda sequer consideraram. Assim,
serão discutidas abaixo apenas algumas das situações relevantes identificadas em
que os agentes decisores usam a heurística da disponibilidade para auxiliar seu
33
processo de julgamento e tomada de decisão e nas quais existe a possibilidade de
desvio do julgamento chamado “racional” devido aos vieses que dela emanam.
Em segundo lugar, deve-se notar que nestas mesmas situações a serem descritas a
heurística da disponibilidade é na grande maioria das vezes apenas um dos
“atalhos” mentais usados para facilitar o julgamento. Na percepção de risco, por
exemplo, podemos citar a heurística da representatividade
7
e a própria maneira
como uma questão é colocada
8
como alguns dos outros fatores que ajudam e / ou
influenciam o decisor a formar esta percepção. O mesmo vale para diversas outras
situações, as quais também são influenciadas por vários fatores além da
disponibilidade. Contudo, como este trabalho se foca na heurística da
disponibilidade, apenas a sua influência em nosso dia-a-dia será levada em conta,
independente dos outros fatores. Uma análise mais aprofundada das situações
apresentadas seria interessante, mas está fora do escopo deste trabalho, devendo
desta maneira ser deixada para consideração em algum outro estudo.
2.5.1 Percepção de Risco
Em nossas vidas abundam situações onde estimamos, conscientemente ou não, as
possibilidades, ou a probabilidade, de acontecer determinado resultado. “Idéias de
risco, tanto no senso comum quanto técnico, envolvem nossos esforços para a
7
Uma pessoa que segue esta heurística avalia a probabilidade de um evento incerto, ou de uma amostra, pelo
grau o qual ele é: (i) similar em propriedades essenciais à sua população; e (ii) reflete as peculiaridades do
processo através do qual é gerado. Nossa tese é que, em muitas situações, um evento A é julgado mais provável
que um evento B sempre que A parecer mais representativo do que B. Em outras palavras, a ordenação dos
eventos por sua probabilidade subjetiva coincide com sua ordenação pela representatividade. (Kahneman e
Tversky, 1972, in Kahneman et al., 1982, p. 33).
8
Prospectos arriscados são caracterizados por seus possíveis resultados e pelas probabilidades destes resultados;
um mesmo resultado, contudo, pode ser enquadrado ou descrito [framed] de diferentes maneiras (e.g. ganhos ou
perdas). Apesar do princípio da invariância requerer que mudanças na descrição dos resultados não alterem a
ordem de preferência, isto não se observa: pode-se obter uma sistemática reversão na preferência através de
variações no framing de atos, contingências ou resultados. A este fenômeno se dá o nome de Efeito Framing.
(Ciarelli, apresentação em sala de aula).
34
aplicação dos estudos de decisão aos problemas práticos” (Connolly et al., 2000, p.
461). De fato, circunstâncias onde avaliamos nossas chances de sucesso versus
chances de não-sucesso são tão numerosas como, por exemplo, ter um acidente
de carro no trajeto para o trabalho ou não, ser aceito ou não ao abordarmos aquela
pessoa na qual estivemos “de olho” na festa durante as últimas horas, ou mesmo se
conseguiremos ou não ficar vivos durante mais um dia, além de incontáveis outras
que é difícil até imaginar quando não fazemos avaliações como estas.
Provavelmente por isto nossa percepção de risco ou, mais claramente, nossa
percepção das chances de determinado evento ocorrer afete nossas vidas das
mais diversas maneiras, desde o estabelecimento de prioridades de políticas
públicas até nosso planejamento de projetos. Também por esta razão é interessante
que a análise dos efeitos da heurística da disponibilidade no dia-a-dia das pessoas
comece por este tema significativo. Antes de continuarmos, contudo, é importante
definir de maneira acurada quais as situações serão abrangidas por esta análise,
distinguindo as diferenças entre situações de risco, incerteza e ignorância. Como
definem Zechhauser e Viscusi (in Connolly et al., 2000 p. 470):
Em uma situação de risco, nós sabemos quais resultados que podem
prevalecer (uma moeda atirada mostrará uma de duas faces) e a
probabilidade exata de cada resultado (cara e coroa são igualmente
prováveis). No caso de incerteza as probabilidades exatas não são
conhecidas. Com a ignorância, podemos não ser capazes nem mesmo de
definir quais resultados são possíveis. (grifo meu)
De acordo com as circunstâncias apresentadas em diversos trabalhos sobre a
heurística da disponibilidade ou nos quais ela é mencionada (Tversky e Kahneman,
1972, 1974 e Bazerman, 2002) e também em trabalhos sobre percepção de risco
(Slovic et al. in Kahneman et al., 1982; Fischhoff et al. in Connolly et al., 2000 e
Sherman et al. in Gillovich et al., 2002), parece que as ocasiões onde a heurística da
35
disponibilidade atua com mais força são aquelas definidas acima como de incerteza
ou ignorância, o que é de certa maneira previsível, já que é nestas situações que
mais precisamos usar nossa capacidade de lembrar de circunstâncias passadas e /
ou imaginar cenários futuros para estimar as chances de determinado evento. Desta
maneira, ao falarmos abaixo de como as pessoas adquirem sua percepção de risco
estaremos discutindo estas situações incerteza e ignorância especificamente, tal
como definidas acima.
Ao começar a discussão, talvez seja relevante falar sobre o próprio significado da
palavra percepção. Houaiss (1992, p. 640) define o termo como a “apreensão da
realidade ou de uma situação objetiva pelo homem”, definição esta que é
semelhante ao do Merriam -Webster (1995, p. 861), que diz que percepção pode
significar “uma imagem mental”, “cognição intuitiva, aguda e rápida” e “capacidade
de compreensão”. Podemos concluir então que o termo “percepção de risco” refere-
se à imagem que as pessoas formam em suas mentes ou seja, como elas
enxergam a realidade a respeito das chances de determinado evento ou cenário
9
acontecer no futuro.
Esta imagem mental a ser formada dependerá de vários fatores, inclusive, como
discutido acima, da maneira como as informações são apresentadas e das
experiências passadas do indivíduo que capta estes dados, variáveis as quais, entre
outras, podem gerar vieses no processo de análise das informações e posterior
alocação de recursos. Como colocam Slovic et al. (in Kahneman et al., 1982, p. 463):
“As pessoas respondem aos riscos que percebem. Se suas percepções são falhas,
9
Neste caso, um evento ou cenário não necessariamente prejudiciais, apesar do preconceito com a palavra
“risco”.
36
ações pessoais, públicas e de proteção ambiental serão provavelmente mal
direcionadas”.
Além disso, “quando se pede a leigos para avaliar riscos, eles raramente terão em
mãos evidências estatísticas. Na maioria dos casos, eles devem fazer inferências
baseados no que lembram de ter ouvido ou observado a respeito do risco em
questão” (id., ibid., p. 464). Primordialmente nestes casos se observa a importância
da heurística da disponibilidade na percepção e avaliação de risco. Como “as
pessoas estimam a freqüência de um grupo ou a probabilidade de um evento pela
facilidade com que exemplos ou ocorrências [destes grupos ou eventos] podem ser
trazidos à mente” (Tversky e Kahneman, in Kahneman et al., 1982, p. 11), elas
também estimarão a chance de determinado evento acontecer o que podemos
similarmente chamar de risco deste evento pela facilidade com que exemplos dele
podem ser recordados ou imaginados.
Como vimos, geralmente esta heurística é muito útil, porque eventos freqüentes são
de fato mais fáceis de lembrar e imaginar do que eventos mais raros (Tversky e
Kahneman, in Kahneman et al., 1982, p. 164; Slovic et al. in Kahneman et al., 1982,
p. 465). Poderíamos ver um exemplo da mesma em ação se pedíssemos a uma
recepcionista de hotel para calcular o número de turistas estrangeiros hospedados,
ou a um mecânico para avaliar as chances do próximo carro a entrar na oficina ter
um problema nos freios. Como estes eventos (turistas estrangeiros e carros com
problemas nos freios) são freqüentes e convencionais tanto para a recepcionista
quanto para o mecânico, respectivamente, nenhum dos dois provavelmente teria
problemas para estimar os percentuais com acuidade razoável. Contudo, problemas
para a estimação de risco podem ocorrer porque a freqüência real de classes e
37
eventos não é o único fator que afeta a disponibilidade. Como escrevem Tversky e
Kahneman (in Kahneman et al., 1982, p. 164):
(...) a disponibilidade também é afetada por vários fatores não relacionados
com a freqüência real. Se a heurística da disponibilidade é aplicada, tais
fatores afetarão a freqüência percebida de classes e a probabilidade
subjetiva de eventos. Conseqüentemente, o uso da heurística da
disponibilidade leva a vieses sistemáticos.
Desta forma, nossa compreensão da realidade e subseqüente percepção de risco
para variados eventos podem ser viesados regularmente das mais diversas
maneiras. Slovic et al. (in Kahneman et al., 1982) dão vários exemplos de fatores
que podem afetar a disponibilidade de eventos em nossas mentes e
conseqüentemente, nossa percepção das chances deles acontecerem assim como
de situações em que isto acontece. A cobertura das notícias pelos jornais, revistas e
televisão, por exemplo, pode gerar julgamentos viesados, pois “muitas das
informações as quais as pessoas são expostas provêem uma imagem distorcida do
mundo dos riscos” (id., ibid., p. 467)
10
.
O medo de acidentes de avião, por exemplo, serve muitas vezes como ilustração de
uma conseqüência deste tipo de viés no julgamento das pessoas. Como fala Bach a
respeito do medo de voar de um casal (apud id., ibid., p. 467): “Seu único
conhecimento de vôo veio através das manchetes de jornal, um conhecimento de
colisões, desastres e fatalidades. Eles nunca leram um único relato de um
aviãozinho decolando, voando através do ar e pousando de novo em segurança”. O
mesmo acontece para várias outras causas de morte reportadas. Slovic et al. (id.,
ibid., p. 468) comentam, a respeito das notícias de dois jornais pesquisados, que:
10
Ver também Epstein (in Melo et al., 2002, p. 99) para uma discussão complementar da dicotomia entre
comunicação jornalística e comunicação científica e sua possível influência na percepção dos indivíduos.
38
(...) muitas das causas de morte estatisticamente freqüentes (e.g. diabetes,
enfisema, várias formas de câncer), foram raramente reportadas por ambos
os jornais durante o período de estudo. Adicionalmente, eventos violentos,
freqüentemente catastróficos, como tornados, incêndios, afogamentos,
acidentes automobilísticos e todos os acidentes foram relatados muito mais
freqüentemente do que causas de óbitos menos dramáticas com
freqüências similares (ou mesmo maiores).
Possivelmente esta exposição desigual gera para as pessoas que recebem as
informações uma disponibilidade maior em suas mentes daqueles eventos violentos,
o que pode explicar o porquê de, em estudos nos quais os pesquisados julgavam a
freqüência de causas de mortes nos Estados Unidos, “em geral, causas raras de
morte [como tornados, acidentes automobilísticos, envenenamento por picadas etc.]
foram superestimadas e causas comuns de morte [como derrames, diabetes, asma
etc.] foram subestimadas” (id., ibid., p. 467)
11
. Naturalmente outro fator que favorece
a lembrança e superestimação destes eventos menos comuns é que, usualmente,
“causas superestimadas de morte foram dramáticas e sensacionais, enquanto
causas subestimadas tendem a ser eventos ordinários, que clamam uma vida por
vez e são comuns em situações não fatais” (id., ibid., p. 467). Isto provavelmente
torna os primeiros mais salientes e disponíveis em nossas mentes, fazendo com que
se tornem fáceis de serem lembrados e imaginados e, de maneira coerente com a
heurística da disponibilidade, considerados mais freqüentes do que de fato são.
Fischhoff et al. (in Connolly et al., 2000, p. 483) complementam este pensamento,
escrevendo, a respeito de outro experimento onde se pedia aos pesquisados que
estimassem o número de mortes causadas por determinadas doenças nos Estados
Unidos, que:
Em qualquer nível de freqüência estatística, algumas causas de morte
receberam estimativas maiores do que outras. Estas provaram ser causas
que são desproporcionalmente visíveis (e.g., reportadas na mídia, vividas
pelos pesquisados). Este viés parece refletir uma tendência geral a estimar
11
Ver tabela de causas mais superestimadas e mais subestimadas no anexo A.
39
a freqüência de eventos pela facilidade com que eles são lembrados ou
imaginados não se percebendo quão falível é um indicador como a
disponibilidade.
Como lembrado neste trecho, outro fator que aumenta a disponibilidade e a
percepção de risco de um indivíduo a respeito de um evento é a exposição a um
exemplo marcante deste evento, que permita a ele formar uma imagem vívida do
mesmo em sua mente. Bazerman (2002, p. 15) dá como ilustração o aumento
drástico na conscientização da população de Dallas
12
a respeito da prevenção à
AIDS, causado por uma única entrevista televisionada onde uma mulher falava de
sua intenção de espalhar a doença como vingança ao homem que a infectara. O
mesmo aconteceu com a indústria de filmes pornográficos estadunidense quando da
descoberta de casos positivos para HIV em dois de seus atores, o que causou uma
interrupção de 60 dias nas suas atividades para que aqueles que porventura
tivessem contracenado com eles pudessem ser testados e re-testados para verificar
exposição ao vírus
13
. Tversky e Kahneman (in Kahneman et al., 1982, p. 11)
acrescentam também que:
(...) o impacto de ver uma casa em chamas na probabilidade subjetiva
[percepção de risco] de tais acidentes é provavelmente maior do que o
impacto de ler sobre o incêndio no jornal local. Além disso, ocorrências
recentes são passíveis de serem relativamente mais disponíveis do que
ocorrências mais antigas. É uma experiência comum que a probabilidade
subjetiva de acidentes automobilísticos aumente temporariamente quando
uma pessoa vê um carro tombado na beira da estrada.
Adicionalmente, um evento marcante, como um desastre ecológico, por exemplo,
pode ter tamanho efeito na percepção de risco a ponto de chegar até a afetar a
12
Cidade do estado do Texas, EEUU.
13
“A indústria multibilionária nacional de filmes pornográficos praticamente fechou a si mesma esta semana
depois que produtores descobriram que pelo menos dois de seus atores foram infectados com o vírus que causa a
AIDS. A maioria das empresas dominantes da industria de filmes adultos, que produz cerca de 4000 filmes e
vídeos por ano, concordou em suspender as filmagens por 60 dias para que aqueles que trabalharam com os
atores infectados possam ser testados e re-testados para a exposição ao vírus HIV. (...) ‘Os americanos pensam
que a AIDS é uma moda, como a Disco, e que acabou’, disse o Sr. Connelly, (...), ‘Não é uma moda. Está aqui e
nós estamos conscientes dela na indústria de entretenimento adulto.’”. (Madigan, 2004).
40
análise de custo benefício da sociedade. “De fato, 80% das pessoas pesquisadas
após 2 meses do derramamento de petróleo do Exxon Valdez
14
indicaram um desejo
de buscar uma maior proteção ambiental ‘a qualquer custo.’” (Zechhauser e Viscusi
in Connolly et al., 2000, p. 475).
Ainda quanto a vieses na percepção de risco, outro exemplo deste fenômeno é o
comportamento daqueles investidores de “fim-de-semana” que, expostos durante
meses todos os dias a notícias de valorização acentuada das bolsas de valores pelo
mundo, passam a estimar, ignorando muitas vezes claros sinais contrários do
ambiente econômico, que o mercado crescerá no curto prazo da mesma maneira
que no passado, resolvendo assim aplicar em ações, não raramente imediatamente
antes do estouro de uma “bolha” de crescimento acionário.
O outro lado da moeda em relação à heurística da disponibilidade é que a falta de
notícias a respeito de certos eventos, em conjunto com a falta de experiências
pessoais marcantes, pode minimizar a disponibilidade de alguns riscos na mente dos
indivíduos, deixando-lhes com a idéia de que estão pessoalmente menos sujeitos a
certos riscos do que a média da população. A maior disponibilidade para elas das
próprias medidas preventivas e.g. usar protetor solar, correr duas vezes por
semana etc. pode aumentar ainda mais esta sensação de imunidade. Como
escrevem Fischhoff et al. (in Connolly et al., 2000, p. 484):
(...) a maioria das pessoas na maioria das situações percebe a si mesma
como sendo menos sujeita a risco do que a média das outras (o que pode, é
claro, ser verdade apenas para metade de uma população). Uma variedade
de processos pode ser creditada por tal viés, incluindo tanto os cognitivos
(e.g., a maior disponibilidade das precauções que uma pessoa toma) e os
14
O navio petroleiro Exxon Valdez, após colidir com recifes na costa do estado do Alasca (EEUU), derramou
257.000 barris de petróleo no mar (equivalentes a aproximadamente 125 piscinas olímpicas), os quais se
espalharam por uma extensão de 740 quilômetros da costa deste estado. O acidente ocorreu em março de 1989.
(Exxon Valdez Oil Spill Trustee Council).
41
motivacionais (e.g., pensamento positivo). À medida que tal viés existe no
mundo fora do experimento e da entrevista, ele pode resultar na aceitação
de um risco não desejado (e.g., porque os alertas parecem mais aplicáveis
a outras pessoas).
Ainda sobre este viés de “auto-imunidade”, a respeito da percepção de risco do ato
de dirigir especificamente Slovic et al. (in Kahneman et al., 1982, p. 465) colocam
que:
Apesar de dirigirem muito rápido, muito perto dos outros carros etc., maus
motoristas fazem viagem após viagem sem sofrer acidentes. Esta
experiência pessoal demonstra a eles sua perícia e segurança
excepcionais. Além disso, sua experiência indireta mostra a eles que
quando acidentes acontecem, eles acontecem com outros. Dadas tais
experiências enganadoras, as pessoas se sentem bastante justificadas em
se recusar a tomar medidas preventivas como usar cintos de segurança.
Além da exposição viesada a eventos (e.g. notícias de jornal) e da exposição a
eventos particularmente marcantes, outro fator relevante que influencia nossa
estimação de probabilidades é a facilidade para explicar ou imaginar um evento
hipotético (Sherman et al. in Gillovich et al., 2002). Efetivamente, a facilidade de
imaginação:
(...) tem um papel importante na avaliação de probabilidades na vida real. O
risco envolvido em uma expedição aventureira, por exemplo, é avaliado
imaginando-se contingências as quais a expedição não está equipada para
lidar. Se muitas dificuldades são vividamente retratadas, a expedição pode
vir a parecer excessivamente perigosa, apesar da facilidade com a qual os
desastres são imaginados não refletir necessariamente sua real
probabilidade. Por outro lado, o risco envolvido em uma empreitada pode
ser largamente subestimado caso alguns dos perigos possíveis forem
difíceis de se imaginar, ou então simplesmente não vierem à mente.
(Tversky e Kahneman in Kahneman et al., 1982, p. 13).
Sherman et al. (in Gillovich et al., 2002) testaram este efeito mediador da facilidade
de imaginação na percepção de risco de voluntários
15
em contrair ou não uma
doença. Seus resultados não apenas “sustentaram pesquisas passadas que
mostravam que imaginar eventos futuros hipotéticos tornava estes eventos
subjetivamente mais prováveis” como também demonstraram “que quando o evento
15
Recrutados para a pesquisa em uma universidade estadunidense.
42
a ser imaginado é difícil de imaginar e a imagem é conseguida com relativamente
grande esforço, a probabilidade subjetiva deste evento decresce em vez de
aumentar”. Este efeito da facilidade ou dificuldade de imaginação pode ser
percebido na nossa estimativa de probabilidade de diversos episódios de nosso dia-
a-dia e.g. acidentes de avião e acidentes de carro, acidentes em instalações
industriais e seu impacto na formulação de políticas públicas a respeito dos mais
diversos assuntos como energia nuclear, pesquisas genéticas, combate ao
terrorismo ou leis de segurança industrial, por exemplo é extremamente relevante
(como será discutido mais adiante). Com efeito, a simples introdução de um assunto
para discussão pela sociedade pode aumentar drasticamente sua percepção de
risco a respeito deste assunto. Como dizem Slovic et al. (in Kahneman et al., 1982,
p. 465): “Uma implicação particularmente importante da heurística da disponibilidade
é que a discussão de um risco de baixa probabilidade pode aumentar sua memória e
imaginação e, assim, seu risco percebido, o que quer que indiquem as evidências
[sobre este risco]”. Sherman et al. (in Gillovich et al., 2002, p. 102) complementam
dizendo que:
As descobertas atuais servem para mostrar os importantes efeitos de se
pensar sobre e considerar eventos e resultados futuros. À medida que as
pessoas são induzidas a pensar sobre o futuro e a imaginar eventos neste
futuro, julgamentos e até mesmo a direção que toma este futuro podem ser
alterados.
2.5.2 Políticas Públicas
O processo de definição e planejamento de políticas públicas, pelo potencial que
estas têm de afetar um número muito grande de pessoas, tem sido de especial
interesse para aqueles que estudam julgamento e processo decisório (Connolly et
al., 2000, p. 83). Isto acontece não apenas por causa de sua abrangência, mas
43
também porque a definição das prioridades destas políticas tem a característica de
que, por mais que a sociedade e os gestores da res publica tenham acesso a uma
grande quantidade de dados, em última instância esta decisão dependerá sempre
de julgamentos subjetivos a respeito de quais deles devem ser usados e qual o
significado destes dados. Como colocam Arkes e Hammond (1986, p. 95):
Políticas sociais surgem do julgamento humano; não existe outra forma.
Algumas políticas podem ser geradas primordialmente sobre bases
analíticas (e.g., preços a serem cobrados por serviços municipais), e
algumas podem ser geradas primordialmente sobre bases intuitivas (e.g., o
caso de se construir um centro de artes ou um ginásio para a comunidade).
Qualquer que seja a mistura entre intuição e análise, todas as políticas
sociais são o resultado do julgamento de alguma pessoa, ou pessoas, de
que uma certa linha de ação deve ou não deve ser seguida. Uma pessoa
pode adquirir informação, mas não “julgamento” em um livro, um programa
de computador ou um curso de “como fazer”.
Portanto, do ponto de vista de um teórico de julgamento / tomada de
decisão, o estudo dos processos de julgamento na formação de políticas
sociais oferece problemas importantes e fascinantes.
Fischhoff et al. (in Connolly et al., 2000, p. 479) escrevem, a respeito de decisões
que envolvem riscos, que “para tomar tais decisões sabiamente, as pessoas
precisam entender os riscos e benefícios associados com caminhos alternativos de
ação. Elas também precisam entender os limites de seu próprio conhecimento e os
limites dos conselhos dados por especialistas”. Da mesma maneira, para tomar
decisões relativas às alternativas para se investir recursos estatais, os responsáveis
pelas políticas públicas precisam analisar as diversas necessidades e procurar
entender os custos e benefícios associados com cada uma delas, optando então por
investir naquelas que provavelmente trarão os maiores benefícios em relação ao
investimento seja porque precisam ser feitas com urgência (e.g. políticas
antiterroristas após um ataque terrorista), seja por seus benefícios de longo prazo
(e.g. investimento em pesquisa e desenvolvimento).
44
Algumas circunstâncias, contudo, como por exemplo uma maior visibilidade de
determinada alternativa na mente da sociedade e gestores públicos, podem distorcer
esta análise, levando a decisões de investimento que nem sempre maximizarão a
utilidade. Por causa disto é que, como colocam Zechhauser e Viscusi (in Connolly et
al., 2000, p. 465):
(...) nós somos propensos a desperdiçar nossos esforços, por exemplo,
focando em riscos que chamam a atenção no processo político, como
cancerígenos recentemente identificados, ao invés de focar naqueles riscos
onde os maiores ganhos de bem-estar são possíveis, como nas escolhas de
estilo de vida individuais. (grifo meu).
Este raciocínio pode ser estendido também para outros fatores além do risco, como
investimentos sociais e políticas industriais. Por exemplo, havendo dois grupos na
sociedade precisando de incentivos fiscais, sociais etc. e sendo um deles mais
visível ou disponível na mente dos administradores públicos devido a campanhas,
lobby etc. aquele grupo que estiver em mais evidência como necessitando de
incentivos pode acabar levando o beneficio, devido ao fato de ser lembrado com
mais facilidade na hora de se analisar quem precisa dele, ao invés de um outro
grupo para o qual aquele incentivo poderia gerar um retorno maior para a sociedade,
mas que, por ser menos disponível, foi esquecido. Como exemplificam McCombs e
Shaw (apud London, 1993), “em um grau considerável a arte da política em uma
democracia é a arte de determinar quais assuntos são de maior interesse para o
público ou podem ser mais salientados [e.g., na mídia] a fim de ganhar o apoio
público”. (Grifo meu).
O mesmo pode ser dito para qualquer projeto que esteja sendo analisado: uma
alternativa de projeto público bem divulgada, cujas vantagens foram intensamente
difundidas para a sociedade, presumivelmente poderá gerar, com mais facilidade
45
vis-à-vis outros projetos alternativos com menos promoção um número maior de
cenários favoráveis como conseqüência de sua adoção, o que fará com que seja
provavelmente escolhido, pois para os analistas ele será a opção com maiores
probabilidades de gerar benefícios para a sociedade
16
. É por isto, naturalmente, que
grupos interessados em determinado projeto ou plano de ação e.g. usineiros em
relação ao carro a álcool e à mistura de álcool à gasolina fazem questão de
difundir amplamente as vantagens de suas opções.
As campanhas que alguns grupos fazem pró-causas específicas procuram
aproveitar, ainda que talvez de maneira instintiva, vieses da heurística da
disponibilidade para reforçar seus argumentos para a sociedade. O uso de imagens
fortes e.g. a imagem em ultra-som de um bebê sendo sugado para fora do útero,
um pássaro encharcado de óleo, soldados mortos etc. tem o efeito de tornar
determinada causa antiaborto, ecologista, pacifista etc. mais disponível na mente
das pessoas e, conseqüentemente, pode levá-las a tomar uma posição de
pressionar as autoridades a favor de determinada política, a qual pode ou não ser a
mais urgente ou a que melhor atenda no longo prazo os interesses da sociedade,
em comparação às alternativas possíveis. O mesmo fazem, de maneira mais
discreta, aqueles grupos de lobistas que enchem os legisladores de informações
escolhidas por eles e, portanto, nem sempre acuradas ou isentas a respeito de
determinada causa.
Outra circunstância que pode levar a um aumento da percepção da necessidade de
investimentos em determinada área, por parte da sociedade ou dos tomadores de
decisão, é a ocorrência de um evento especialmente marcante ou a discussão de
16
Vide viés de facilidade de imaginação.
46
um tema que permita a formação de imagens particularmente vívidas na mente dos
indivíduos
17
. Por exemplo, tanto o envio de cartas contendo o vírus Antraz
18
, que
aconteceu após o atentado de 11 de setembro de 2001, quanto a extensa cobertura
a respeito da epidemia de gripe asiática (SARS) que existiu na imprensa
estadunidense
19
aumentaram enormemente a disponibilidade destas ameaças na
mente das pessoas daquele país, e fizeram o governo dos Estados Unidos
incrementar substancialmente os gastos para combatê-las. Por outro lado, a falta de
cobertura a respeito de alguns problemas relevantes da comunidade, seja porque já
se tornaram relativamente comuns, seja porque aqueles que sofrem com eles não
possuem meios para os tornarem visíveis para sociedade e / ou suas autoridades
como a formação de grupos ativistas ou a compra de espaço publicitário pode
fazer com que estes problemas fiquem relegados a um segundo plano, recebendo
bem menos recursos ou atenção do que seria adequado e recomendado para um
aumento da utilidade pública geral. Esta questão de superinvestimento versus sub-
investimento em decorrência de maior ou menor exposição é discutida por Margolis
(in Newsweek, 05/04/2004, p. 41) a respeito de gastos com pesquisa de saúde:
A droga mais nova para combater tuberculose tem 30 anos e a maioria dos
pacientes é controlada pelo mesmo método aleatório usado há um século.
(...) Enquanto o bacilo ardiloso se dá bem em cima dos melhores remédios,
300.000 pacientes a cada ano já não respondem mais ao tratamento. Ainda
assim, para a consternação de Reichman
20
, o burburinho na medicina
pública é todo sobre pó branco em um envelope ou esporos no sistema de
ventilação. “Aqui está uma doença que pode ser prevenida que tira mais
vidas hoje do que tirava há um século”, diz Reichman, (...) “E tudo sobre o
que ouvimos falar é bioterrorismo e doenças das quais quase ninguém está
morrendo”. (...) Porque gastar uma fortuna com doenças que podem um dia
17
Como mencionado acima, a simples introdução de um assunto para discussão pela sociedade pode aumentar
drasticamente sua percepção de risco a respeito deste assunto.
18
O vírus Antraz matou cinco pessoas desde 11 de setembro de 2001 até hoje (fonte: Newsweek, 05 de abril de
2004, p. 41).
19
Somente no jornal “The New York Times” a palavra “SARS” (Severe Acute Respiratory Syndrome) foi citada,
de 1º de janeiro de 2001 até 23 de abril de 2004, em 962 artigos, sendo que em 243 deles a palavra estava
também no título do artigo (fonte: The New York Times on the Web, disponível em: <www.nytimes.com>).
20
Lee Reichman, professor da New Jersey Medical School, citado na entrevista.
47
se tornar armas, muitos médicos se perguntam, quando somente um
décimo dos gastos mundiais com saúde é direcionado para as doenças que
se sabe causam 90 por cento da miséria humana? (...) Por exemplo, o
congresso dos EEUU destinou US$ 5,6 bilhões por dez anos para o
superfundo de biodefesa... Pesquisadores pesquisando antraz, varíola e
outros agentes patogênicos prioritários têm sido inundados com quase US$
1,8 bilhões em verbas desde 2003. No mesmo período o setor não
relacionado com defesa do National Institutes of Health [Instituto Nacional
de Saúde] encarou um orçamento que mal acompanha a inflação até 2006.
Ainda sobre o problema de sub-investimento para aqueles problemas que não
conseguem suficiente atenção, McNamee (in BW Online, 2004) questiona sobre a
questão da cobertura médica universal nos EEUU:
Por que a nação mais rica do planeta não pode fornecer assistência médica
para todo seu povo? (...) A resposta: Não é que os americanos não querem
cobrir os 41 milhões de não segurados. (...) É somente que não existe
consenso... sobre a melhor maneira de se fazer isso. E porque a vasta
maioria dos eleitores possui seguro-saúde (85% da população está
segurada, mas 92% daqueles que participaram da eleição de 2000 estavam
cobertos), os líderes políticos têm pouco incentivo para superar este
impasse. (...) Blendon
21
vê pouco no cenário político ou de saúde pública
que sugira mudanças neste quadro. “Não há nenhuma Associação
Americana de Pessoas Não Seguradas emitindo relatórios sobre os
candidatos ou enfrentando a luta’’ ele observa. “O presidente Bush sabia
que não poderia concorrer à reeleição sem aprovar um plano de
medicamentos para os idosos. Ninguém acha que ele tenha a mesma
urgência em tomar conta dos não segurados.” (Grifo Meu).
2.5.3 Egocentrismo
Outro viés interessante causado pela heurística da disponibilidade é o chamado
“viés egocêntrico”, não citado nos trabalhos pioneiros de Tversky e Kahneman a
respeito das heurísticas e seus vieses (1972, 1973, 1974), mas descrito
posteriormente por Ross e Sicoly em seu artigo de 1979 (in Kahneman et al., 1982).
Os dois dão um exemplo hipotético que ilustra uma situação onde os indivíduos
envolvidos têm o julgamento afetado por este viés (id., ibid., p. 179):
Considere o seguinte: Você trabalhou em um projeto de pesquisa com outra
pessoa e surge a questão de quem deve ser o “primeiro autor” (i.e. quem
contribuiu mais para o produto final?). Freqüentemente, parece que ambos
sentem-se justificados a requerer a honra para si. Mais ainda, como você
21
Robert Blendon, da Harvard University School of Public Health, citado na entrevista.
48
está convencido que sua visão da realidade tem de ser compartilhada por
seu colega (pois só há uma realidade), você assume que a outra pessoa
esta tentando tirar vantagem de você.
Este exemplo pode ser estendido para várias outras situações do dia-a-dia: do filme
co-dirigido por duas pessoas que discutem quem teve maior influência artística sobre
o resultado final da obra ao trabalho de grupo do colégio onde os integrantes têm de
decidir quem participou mais e, portanto, deve apresentá-lo perante a classe. Harris
(1946, apud Bazerman 2002, p. 71) cita um exemplo real de co-ganhadores do
Prêmio Nobel de química de 1923 (pela descoberta da insulina) que mostra o viés
egocêntrico. Ele diz que “após receber o prêmio, Banting, um dos ganhadores,
argumentou que seu parceiro, Macleod, que era o chefe do laboratório, era mais um
empecilho do que uma ajuda. Por sua vez, em palestras descrevendo a pesquisa
que levou à descoberta, Macleod conseguiu esquecer de mencionar que ele tinha
um parceiro.” Ross e Sicoly (in Kahneman et al., 1982) demonstram, através de
experimentos, a existência de um viés egocêntrico também em relacionamentos que
ocorrem espontaneamente (não profissionais) no caso, relacionamentos entre
casais, onde verificou-se uma divergência na percepção quanto à alocação de
responsabilidades para cada um dos parceiros dentro do relacionamento
22
, e vieses
no julgamento de atribuição de responsabilidades ocorrendo no nível grupal
mostrando que para cada indivíduo as ações de seu próprio grupo ou time são mais
22
“Trinta e sete casais foram entrevistados a respeito de suas contribuições para as várias atividades que pessoas
casadas devem executar, tais como fazer café da manhã ou limpar pratos. Pedia-se a cada membro do casal que
indicasse se a atividade era executada primordialmente pelo marido ou primordialmente pela esposa. Cada
pessoa depois também se lembrava de exemplos específicos de como aquela pessoa ou o cônjuge contribuíram
para a atividade, uma medida planejada para filtrar a disponibilidade relativa de suas próprias contribuições
versus as contribuições do cônjuge.
Os resultados claramente indicaram que cada cônjuge acreditava ter contribuído mais para as atividades
conjuntas do que o outro.” (Taylor, in Kahneman et al., 1982, p. 196).
49
disponíveis do que as de outros times e que, assim, a tendência é que uma pessoa
atribua uma maior responsabilidade sobre um resultado a sua própria equipe
23
.
Vemos assim que o viés egocêntrico atua na percepção dos indivíduos a respeito de
sua própria contribuição no resultado final de um trabalho feito por uma equipe da
qual ele faz parte. Devido a diversos processos cognitivos, as pessoas tendem a
acreditar que são responsáveis por uma parcela maior do trabalho do que aquela
que os outros membros do grupo lhe dão crédito. Para Ross e Sicoly (id., ibid., p.
180) isto ocorre porque:
Ao alocar responsabilidades por um empreendimento conjunto, participantes
bem intencionados presumivelmente tentam se lembrar das contribuições
feitas por cada um para se chegar ao produto final. Contudo, alguns
aspectos da interação podem ser lembrados mais rapidamente, ou ser mais
disponíveis, do que outros. Adicionalmente, as características que são
lembradas facilmente podem não ser um subconjunto aleatório do todo.
Especificamente, uma pessoa pode se lembrar de uma proporção maior de
sua própria contribuição do que se lembrariam os outros participantes.
Um viés egocêntrico na disponibilidade de informação na memória, por sua
vez, pode produzir atribuições de responsabilidade viesadas para um
resultado gerado pelo grupo.
Segundo explica Bazerman (2002, p. 70), o viés egocêntrico, ou egocentrismo como
ele chama, diz respeito a “como pessoas que são expostas à mesma informação
interpretam -na de uma maneira que favorece a elas mesmas. O egocentrismo se
refere à interpretação de eventos mais do que avaliações a respeito de
características próprias”. De fato, Ross e Sicoly (in Kahneman et al., 1982, p. 179)
reconhecem que, certamente, existem eventos onde as pessoas agem de má fé ao
interpretarem algumas situações de uma forma tendenciosamente favorável a si
mesmas, mas afirmam que as variações nas percepções que os indivíduos têm em
23
O experimento foi feito com 74 mulheres e 84 homens, todos jogadores de times de basquete universitário.
Cada um deles respondeu individualmente, depois de determinado jogo, a um questionário cujas perguntas mais
relevantes (segundo os autores) eram: “Por favor descreva brevemente um momento ‘de virada’ [onde o jogo
teve seu rumo mudado] importante do último jogo e indique em que período ocorreu.” e “Nosso time
ganhou/perdeu porque...” (Ross e Sicoly, 1979, p. 186).
50
relação a certos eventos podem acontecer mesmo na ausência de intenção dolosa.
Expostas à mesma situação (e.g. uma tarefa ou projeto em equipe), diversas
pessoas podem, honestamente, analisar dados iguais (como a quantidade de
esforço de cada um para completar o trabalho) de maneira diferente, interpretando-
os em uma direção que as favoreçam. Evidentemente, esta situação pode gerar
problemas na hora de colher os frutos do projeto conjunto:
Em quaisquer negociações envolvendo a alocação de recompensas,
recursos e oportunidades, indivíduos ou grupos mostrando tais vieses auto-
intensificadores provavelmente sentirão que lhes tenham sido negados os
resultados a que têm direito e, desta maneira, negadas a gratidão e
reconhecimento que merecem por sua abnegação passada. (Pronin et al., in
Gilovich et al., 2002, p. 640).
Ross e Sicoly (in Kahneman et al., 1982, p. 180) identificam quatro processos que
podem agir no sentido de aumentar a disponibilidade de uma pessoa em relação à
suas próprias contribuições: codificação e armazenamento seletivos, recuperação
diferenciada, disparidades de informação e influências motivacionais. O primeiro
processo ocorre porque, por várias razões, as contribuições de uma pessoa podem
ser enfatizadas em sua mente tornando-se assim mais disponíveis através da
codificação e armazenamento seletivos de suas atividades. Por exemplo, ao focar
em seus próprios pensamentos e ações o que é comum quando se tem tarefas a
completar o individuo pode conseqüentemente dar menos atenção às
contribuições dos outros membros do grupo. Além disso, uma pessoa pode
constantemente refletir ou repetir suas idéias e ações seja para pensar em
argumentos a favor delas, porque sua tarefa exige, ou qualquer outro motivo
aumentando assim sua exposição às mesmas e facilitando sua retenção e
disponibilidade.
51
Outro processo que pode viesar a disponibilidade das contribuições de uma pessoa
vis-à-vis a de seus colegas é a maneira como ela se questiona a respeito das
mesmas. Como escrevem Ross e Sicoly (id., ibid., p. 180):
Ao alocar responsabilidade por um resultado conjunto, a pergunta primordial
do ponto de vista de cada participante pode ser: “Quanto eu contribuí?” Os
participantes podem, portanto, tentar se lembrar principalmente de suas
próprias contribuições e inapropriadamente usar a informação recuperada
desta maneira para estimar sua contribuição relativa.
Esta recuperação diferenciada de suas memórias pode também tornar as
contribuições de uma pessoa mais disponíveis para ela mesma do que a de seus
colegas, fazendo com que a freqüência relativa percebida por ela de suas
contribuições seja maior do que a freqüência real.
24
Como conseqüência, o individuo
acha que adicionou comparativamente mais em relação ao trabalho total do grupo
do que constataria, por exemplo, um observador externo neutro que avaliasse a
colaboração individual de cada membro.
As disparidades no acesso às informações das contribuições de cada membro do
grupo também podem resultar em uma percepção equivocada quanto às
contribuições relativas. Certos participantes podem não saber quão relevantes são
as tarefas de alguns de seus colegas, minimizando assim sua importância e adição
para o resultado final. Outra questão é que, apesar dos indivíduos terem acesso
perfeito à sua própria participação, o mesmo não ocorre quanto à participação
daqueles que trabalham com ele: uma pessoa está, obviamente, sempre presente
quanto pensa ou faz alguma coisa relacionada a atividade do grupo, o que
provavelmente não ocorre em relação aos pensamentos e ações de seus colegas.
Isto pode também aumentar o armazenamento e disponibilidade de suas
24
Como explicado acima, isto acontece porque a freqüência é estimada pela disponibilidade, ou facilidade, com
a qual um evento pode ser recuperado ou imaginado. Como complementam Ross e Sicoly, “(...) um julgamento
não pode ser feito apropriadamente sem que se considere também a contribuição dos outros [colegas]”.
52
contribuições em relação às contribuições do resto do grupo, viesando sua
percepção de quanto agregou proporcionalmente ao trabalho total.
Finalmente, as influências motivacionais de cada participante podem gerar um viés
egocêntrico na disponibilidade de informações que dizem respeito ao projeto. “A
auto-estima de uma pessoa pode ser aumentada focando-se, ou colocando mais
peso, em suas próprias contribuições” (id., ibid., p. 181). Novamente, esta maior
ênfase em suas contribuições gera um incremento da disponibilidade das mesmas
em sua mente, a qual por sua vez pode aumentar a percepção quanto à freqüência
e relevância de sua participação no projeto ou trabalho do grupo.
2.5.4 Julgamentos Sociais
Os julgamentos a respeito do nosso meio social e das pessoas que o povoam
podem mostrar-se tão complexos quanto aqueles em relação à quão arriscada é
uma situação, qual projeto deve ser escolhido ou quem é o maior responsável pelo
resultado final de um projeto em equipe. Em algumas situações, para julgarmos um
grupo, ou mesmo um indivíduo apenas, processamos uma infinidade de informações
que se disponibilizam a respeito dele, através de suas roupas, seus discursos, o
lugar onde nasceram e várias outras fontes das quais às vezes nem mesmo
estamos cientes; em outras circunstâncias, fazemos este julgamento dispondo de
um número limitado de dados, preenchendo as lacunas de acordo com nossas
experiências ou idéias pré-existentes. Em vários casos, fazemos inferências
momentos após colocarmos o olho em uma pessoa. Como descrevem Lavington e
Losee (1997, p. xii):
53
Entre em uma sala e já aconteceu. Três segundos e você foi avaliado por
todos que lhe viram, mesmo que tudo o que tenham feito tenha sido dar
uma olhada em você. Eles avaliaram suas roupas e penteado. Eles notaram
a forma como você anda. Eles julgaram sua apresentação e acessórios.
Eles observaram enquanto você cumprimentava alguém próximo à porta.
Três segundos se passaram e você já deixou uma marca indelével.
Da mesma maneira que usamos as heurísticas para simplificar nossa estimação de
probabilidade e freqüência em face de uma grande quantidade de informações ou de
um conjunto incompleto delas, também dispomos de alguns processos mentais que
nos ajudam na tarefa de julgar o outro aquele grupo de um ou mais indivíduos que
nos é estranho e posicioná-lo dentro de nossa concepção particular de mundo.
Segundo Robbins (2002, p. 122):
Costumamos utilizar diversas simplificações quando julgamos as pessoas.
Observar e interpretar o que os outros fazem é um trabalho penoso.
Conseqüentemente, desenvolvemos técnicas para tornar esta tarefa mais
facilmente administrável. Estas técnicas costumam ser valiosas elas nos
permitem chegar rapidamente a percepções precisas e nos oferecem dados
válidos para as previsões. Entretanto, elas não estão livres de erros. Elas
podem nos criar problemas, e freqüentemente criam. A compreensão destas
simplificações pode ser útil para reconhecermos quando elas podem
resultar em distorções significativas.
Se a descrição do autor para o que ele chama de “técnicas” nos parece bastante
parecida com o que vimos até agora como heurísticas, é porque é ambos os
conceitos são realmente próximos. Para julgarmos pessoas, da mesma maneira que
diversas outras coisas na vida, usamos “atalhos” mentais que facilitam e possibilitam
um julgamento com quaisquer dados à nossa disposição. Como afirma Taylor (in
Kahneman et al., 1982, p. 191):
Heurísticas são estratégias prováveis para fazer julgamentos sociais tanto
quanto não-sociais por diversas razões. Primeiro, a distinção entre
julgamentos sociais e não sociais é arbitraria, na medida que virtualmente
qualquer julgamento tem conseqüências sociais. Segundo, julgamentos
sociais envolvem o mesmo tipo de incertezas que caracterizam julgamentos
não sociais. Terceiro, julgamentos sociais envolvem novas fontes de
incertezas. Informações sobre pessoas são mais ambíguas, menos
confiáveis e mais instáveis do que informações sobre objetos ou eventos
não sociais, considerando-se que as pessoas não usam atributos em suas
faces da maneira que os objetos usam sua cor, forma ou tamanho. (...) A
54
impossibilidade de ter informações completas, confiáveis e preditivas sobre
as pessoas e as interações sociais sugere que os indivíduos adotam
heurísticas que lhes capacitam a fazer inferências e previsões a partir de
quaisquer dados insuficientes e não confiáveis que estejam disponíveis.
Uma destas heurísticas adotadas para se fazer tais julgamentos é a heurística da
disponibilidade. “Especificamente, vieses na saliência, vieses na recuperação e
vieses devido a estruturas cognitivas tais como esquemas, crenças e valores podem
levar a uma disponibilidade acentuada de informações incorretas ou não confiáveis
em tarefas de julgamento social” (id., ibid., p. 198). Taylor (ibid.) identifica algumas
situações onde processos de interação social podem ser afetados por vieses
derivados desta heurística. Por exemplo, uma pessoa que destoe do grupo na qual
está inserida seja por sua raça, nacionalidade, gênero, ou mesmo apenas pela cor
da sua roupa ou estilo de penteado, intercoetera acaba chamando a atenção dos
outros membros deste grupo para si própria; este viés de atenção devido à saliência
do indivíduo por sua vez pode fazer com que seu comportamento ou atributos sejam
avaliados de uma maneira mais “radical” tanto de uma forma positiva quanto
negativa do que seria o caso se ela estivesse incorporada dentro de um grupo
homogêneo. Nesta situação, uma pessoa “saliente” que tenha um comportamento
considerado negativo e.g. irritante, inconveniente, barulhenta etc. será percebida
de maneira ainda mais negativa pelo grupo; por outro lado, se ela for observada de
maneira positiva e.g. simpática, concentrada, inteligente etc. seu comportamento
ou atributos positivos também serão percebidos de maneira ressaltada. A autora
descreve esta circunstância (id., ibid., p. 193) citando uma situação que pode ser
vista em empresas:
As conseqüências sociais de um viés na saliência são ilustradas por
estudos examinando o impacto do status de único
25
ou de uma integração
25
No original, “solo status”.
55
simbólica
26
nas impressões das pessoas a respeito de indivíduos. Quando
uma companhia está a ponto de dessegregar [seus quadros] e incluir
membros de uma minoria, tais como negros, mulheres ou deficientes,
geralmente um passo intermediário ocorre anteriormente à integração total.
Neste passo, um ou dois membros deste grupo previamente excluído
podem ser inseridos no que antes tinha sido um grupo profissional de
homens brancos, criando assim exemplos de um status de único. (...)
Quaisquer que sejam as razões para uma integração simbólica, o indivíduo
único ou símbolo geralmente é tratado como um representante de seu
grupo social. Desta maneira, as avaliações que são feitas de sua
performance são geralmente usadas para predizer quão bem se sairão
outros membros deste grupo se eles vierem também para a organização. A
importância do status de único é a sua novidade. Em um ambiente em
outras circunstâncias masculino, uma mulher se sobressai, da mesma
maneira que um negro em um ambiente de brancos. Tal distinção promove
um viés na saliência.
Como sugerido por Taylor, o comportamento de um único representante da minoria
que se vê inserido em um grupo anteriormente homogêneo pode vir a ser
considerado comum a todos os membros de seu grupo social, gerando um efeito de
halo
27
que fará com que a maioria já estabelecida construa uma impressão geral dos
novos membros da minoria que chegarem baseados unicamente na característica
que para eles é mais marcante (raça, gênero etc.).
Outra fonte de vieses em relação ao julgamento de grupos sociais é a nossa
capacidade limitada de reter e processar informações (id., ibid., p. 194). Como não
conseguimos captar e analisar a conduta de uma quantidade muito grande de
exemplares de um grupo específico (ainda que tenhamos acesso a esta informação),
quando o comportamento ou característica de alguns poucos representantes
sobressai à massa (e.g. os funcionários daquela repartição pública são corruptos”;
as pessoas que fazem arrastão na praia são funkeiras”) a tendência é que o
comportamento de todo o grupo seja julgado de acordo com a forma que age esta
26
No original, “token integration”.
27
Construção de uma impressão geral de uma pessoa com base em uma única característica (Robbins, 2002, p.
123).
56
minoria cujas ações estão mais disponíveis
28
. Este viés pode, evidentemente, ter
conseqüências relevantes referentes ao relacionamento intersocial. Como notam
Rothbart et al. (apud id., ibid., p. 195), “a mídia está mais tomada de eventos
negativos do que positivos e de acordo com estes vieses pode favorecer a formação
de estereótipos negativos de grupos, [desta maneira, notícias adversas a respeito de
membros de determinada minoria podem gerar preconceitos em relação a todo o
grupo] particularmente se a associação ao grupo é saliente quando mencionada na
cobertura midiática” (e.g. todo o funcionário público é corrupto”; todo o funkeiro é
bandido”). Hamilton e Gifford (1976, apud Shavitt et al., 1999, p. 264) complementam
a este respeito escrevendo que:
A co-ocorrência de dois eventos pouco freqüentes chama particularmente a
atenção. Assim, estas co-ocorrências parecem ser mais acessíveis à
memória e melhor lembradas do que outros eventos quando julgamentos
subseqüentes são feitos. (...) Esta noção provê uma explicação cognitiva de
porque, por exemplo, membros de grupos minoritários podem ser
percebidos como sendo mais associados com comportamentos
relativamente infreqüentes (e.g., atos criminosos) do que membros do grupo
majoritário, ainda que tal correlação não exista.
Um terceiro determinante que pode viesar o julgamento social das pessoas é sua
própria história pessoal. Como escrevem Pronin et al. (in Gilovich et al., 2002, p.
636):
(...) legiões de pesquisadores demonstraram que, ao [tentar] esclarecer os
estímulos [que recebem do ambiente], as pessoas “vão além das
informações dadas”. Elas percebem as coisas da maneira que foram
levadas por sua experiência ou sugestão a esperar que elas sejam, e suas
percepções são ainda mais viesadas por suas esperanças, medos,
necessidades e estado emocional imediato
29
.
São estas características peculiares de cada ser humano suas experiências,
motivações, medos etc. que tornam determinadas nuances de uma situação
28
Por serem mais marcantes e, portanto, mais fáceis de lembrar. Isto é demonstrado por Rothbart et al. através
de experimento descrito por Taylor (in Kahneman et al., 1982, p. 195).
29
Para uma discussão mais detalhada de como os indivíduos formam suas percepções individuais da realidade
ver Wind et al. (2004).
57
seus detalhes, circunstâncias etc. mais ou menos salientes e disponíveis na mente
de cada um, fazendo com que cada caso seja único para cada indivíduo e que um
mesmo episódio, com as mesmas variáveis e os mesmos fatos sendo captados,
possa ser interpretado de maneira distinta por pessoas diferentes. Como esclarece
Loftus (in Connolly et al., 2000, p. 209): “Qualquer que seja a maneira que um
evento possa ser representado [na mente de uma pessoa], existem poucas razões
para acreditar que a representação é acurada; de fato, ela pode ser bastante
maleável devido a outras ocorrências além daquelas que o evento deve
representar”. Pronin et al. (in Gilovich et al., 2002, p. 636) complementam, dizendo
que:
Vieses cognitivos levam-nas [as pessoas] a ver e lembrar uma realidade
que é consistente com suas crenças e expectativas, enquanto vieses
motivacionais fazem-nas ver o que é consistente com suas necessidades,
desejos e interesse próprio. Através de tais vieses do processamento da
informação, dois adversários que encontram os mesmos fatos, relatos
históricos, evidências científicas, ou mesmo testemunham aos mesmos
eventos, podem encontrar suporte adicional para suas pré-concepções.
Como exemplificam os autores (id., ibid., p. 656), as diferenças de background entre
determinados grupos são às vezes percebidas como tão grandes que seus membros
acreditam que ninguém além deles mesmos podem captar sua experiência peculiar:
(...) membros de vários grupos étnicos algumas vezes sentem que só um
membro de seu próprio grupo realmente compreende as questões que lhes
afetam. Contudo, eles sentem que os membros de outros grupos étnicos
são desesperançadamente, se bem que compreensivelmente, viesados por
seu status e experiência particulares, e não podem receber “poder de veto”
sobre políticas que os afetem.
Naturalmente, os mesmos fatores particulares históricos, culturais etc. que levam
cada indivíduo a ter sua visão própria da realidade, podem também torná-lo
suscetível a estereótipos e / ou preconceitos em relação a determinados grupos
sociais vide relacionamento entre brasileiros e argentinos, árabes e judeus,
58
moradores do morro e moradores do asfalto, intercoetera. Esta visão pré-concebida
do comportamento do outro ocasionalmente pode, em uma análise ou interação
entre o indivíduo que a possui e um representante ou representantes daquele grupo
para o qual ela é direcionada, levar a uma saliência maior daqueles mesmos
comportamentos e características negativas do outro que ele espera encontrar,
aumentando assim a disponibilidade destas em sua mente, viesando sua percepção
e fazendo com que o estereótipo torne-se assim quase auto-realizável. Como explica
Taylor (in Kahneman et al., 1982, p. 197):
Esperar que uma pessoa vá empregar um comportamento em particular
pode levar a inferências de que a pessoa empregou tal comportamento.
Estereótipos são tipos particulares de expectativas que podem funcionar
para guiar e moldar a realidade, e eles podem fazer isto, pelo menos em
parte, através da heurística da disponibilidade. (...) Estereótipos, uma vez
formados, podem viesar a coleta e armazenamento de informações e as
impressões subseqüentes. Uma conseqüência [disto] é que inferências
injustificadas sobre grupos sociais ou indivíduos podem se perpetuar na
ausência de qualquer base empírica.
2.6 Mídia e Disponibilidade
Um ponto em comum nas situações discutidas acima é que em todas elas a
exceção talvez do egocentrismo uma fonte externa é necessária para fornecer as
informações que levarão o indivíduo a desenvolver percepções (viesadas ou não) a
respeito da realidade. Antigamente, esta fonte eram aqueles que o rodeavam,
fossem da família, do trabalho ou amigos apenas. Há algum tempo, contudo, como
colocam Wahlberg e Sjöberg (2000, p. 31), “os tempos mudaram e nós não
conseguimos mais a maior parte de nossas informações através de fontes
tradicionais (pessoas), de maneiras tradicionais (oralmente). Hoje recebemos um
monte de informação, sobre várias coisas, da mídia”. E é esta mídia, como pudemos
ver em diversos exemplos acima (Slovic et al. in Kahneman et al., 1982; Fischhoff et
59
al. in Connolly et al., 2000; Margolis, 2004) que nos traz notícias as quais às vezes
geram percepções distorcidas a respeito da realidade, seja dos riscos que corremos,
das necessidades públicas prioritárias ou julgamentos que fazemos a respeito de
determinado grupo, intercoetera.
Naturalmente, a mídia não é o único fator no mundo atual que pode distorcer nossa
visão da realidade
30
, mas, como constatado por alguns estudos empíricos
(Lichtenstein et al., 1978; Slovic, Fischhoff e Lichtenstein, 1979; Combs e Slovic,
1979), algumas vezes pode ter um papel fundamental para que isto aconteça. De
fato, ao analisar um estudo de Ericsson et al. sobre “desvios sociais e como os
jornalistas participam de sua definição e formação”, no qual tais desvios são
definidos como “o comportamento de coisas ou pessoas que foge do normal (...) não
somente (...) atos criminais mas também (...) fugas dos procedimentos
organizacionais e violações do senso comum”, Reiner (in, Maguire et al., 2002, p.
380) constata que, definido desta maneira, o desvio é “a essência da notícia; o
desvio é a característica que define o que jornalistas consideram como apropriado
para o noticiário’ (grifo meu)”. Dada esta preferência daqueles que geram as notícias
por eventos que “fogem do normal”, não chega a causar espanto que o mundo
representado pela mídia muitas vezes seja dissimilar a aquele que vemos através
das estatísticas da realidade. Mas por que afinal de contas isto acontece? Por que
os veículos de comunicação dão preferência por noticiar certos eventos em
detrimento de outros, podendo gerar no fim um viés em nossa percepção do mundo
que nos cerca?
30
Como já mencionado, presenciar um evento marcante ou tomar conhecimento de uma história impressionante,
entre outros fatores, também podem gerar um viés na percepção.
60
2.6.1 Escolhendo a Notícia
Para responder a estas perguntas, será útil que olhemos brevemente teorias a
respeito da comunicação de massa. Por exemplo, Katz, Gurevitch e Hass (1973)
mostram a mídia de massa como um meio usado pelos indivíduos para conectarem -
se ou desconectarem-se com o mundo (dependendo da situação). Eles listam
algumas necessidades que as pessoas buscam suprir através da mídia, listando-as
em cinco categorias: necessidades cognitivas (adquirir informação, conhecimento e
compreensão); necessidades afetivas (experiências emocionais, prazerosas ou
estéticas); necessidades integrativas pessoais (fortalecimento da credibilidade,
confiança, e status); necessidades integrativas sociais (fortalecimento de contatos
com a família, amigos etc.) e; necessidade de liberação de tensão (escapismo e
diversão).
Partindo-se do pressuposto que, como afirmado acima, os usuários de mídia de
massa (audiência, leitores etc.) procuram suprir algumas necessidades através de
seu “consumo”, pode-se dizer que é lógico argumentar que aqueles que são
responsáveis por produzir seu conteúdo (editores, repórteres, autores etc.),
interessados em atrair o maior público possível dentro de seu mercado alvo,
tenderão a, consciente ou inconscientemente, fornecer um produto que esteja dentro
das características procuradas por seus clientes ou seja, que supra uma ou mais
necessidades dentre aquelas descritas. Essencialmente, ao tentar “agradar o
cliente”, fornecendo, por exemplo, informação e conhecimento, ou escapismo e
diversão, os produtores de notícias podem ser levados a dar preferência pelos
eventos “fora do normal”, atitude que pode ser considerada mais “atraente” pela sua
audiência, mas que também, em última instância, pode levar a uma visão distorcida
61
do mundo real. Talvez por isso é que, como colocam Soumerai et al. (apud
Wahlberg e Sjöberg, 2000, p. 33), os “relatos da mídia tendem a se concentrar em
desastres raros, porém dramáticos, e freqüentemente falham em relatar perigos
sérios, porém mais comuns, como acidentes automobilísticos”.
Sobre os fatores que levam os jornalistas a dar mais cobertura a determinados
eventos específicos, Nerb et al. (2001) listam alguns critérios qualitativos usados
para a seleção de notícias. Primeiro, também segundo eles a excepcionalidade de
um evento é um fator que favorece sua menção em noticiários. Como escrevem os
autores:
Jornalistas cobrem mais freqüentemente eventos únicos agudos do que
riscos crônicos ou assuntos de risco abstratos. (...) Um risco raro é mais
noticiável do que um comum, sendo os outros fatores semelhantes; um risco
novo é mais noticiável do que um antigo um que mata muitas pessoas de
uma só vez, repentinamente ou misteriosamente é mais noticiável do que
uma interminável doença familiar. “Notícias ruins são boas notícias; notícias
boas não são notícias” é uma máxima jornalística que é especialmente
válida na cobertura midiática de risco (Cohn, 1989, p. 7). Tal negativismo é
conseqüência de um estilo jornalístico investigativo que evoluiu nas
sociedades ocidentais modernas. De acordo com seu papel na sociedade,
os jornalistas estão sedentos por controlar, expor e reconhecer processos
negativos em um estágio inicial ou ainda melhor, antes que surja um
problema mais sério. Desta forma, existe um motivo razoável por trás da
motivação jornalística de reportar eventos negativos.
Naegele (in Dines, 2001, p. 56) complementa, a respeito desta motivação para
noticiar eventos negativos, dizendo que:
...o escopo fundamental da mídia, especialmente no jornalismo, é o conflito,
a polêmica. O jornalismo tem um caráter asseverador e uma necessidade
de ser crível que não podem prescindir desse exercício quotidiano de
atribuir valor aos acontecimentos, de balizar conflitos. E um fato positivo já
sai perdendo, na definição da pauta, porque denota consenso,
unanimidade.
Um segundo critério citado é o valor de “entretenimento” da história, ou seja, fazendo
uma correlação direta com as necessidades listadas por Katz et al. (1973), o quanto
a notícia supre a necessidade do receptor de liberação de tensão escapismo,
62
diversão etc. Um estudo de McCartney (1997, apud Nerb et al., 2001) mostra que as
pessoas que selecionam as matérias que serão divulgadas baseiam suas escolhas,
pelo menos em parte, no potencial da notícia em “entreter”. “Tão cínico quanto possa
parecer (...) uma história sobre uma catástrofe é considerada mais cativante e
excitante do que um relatório sobre como uma catástrofe pode ser evitada” (Nerb et
al., 2001). Como coloca Reiner (in Maguire et al., 2002, p. 403):
O conteúdo da notícia é gerado e filtrado primordialmente através da
percepção dos repórteres de “valor da notícia”
31
: o que torna uma história
boa, da qual sua audiência quererá saber detalhes (...) Os elementos
principais disto são o imediatismo, a personalização, a excitação e a
novidade. O valor da novidade faz com que a maioria das notícias trate de
alguma forma de desvio.
Assim, pode-se perceber o por quê de, por exemplo, uma notícia sobre um desastre
de avião ser considerada imediatamente um “furo” de reportagem ainda mais se
for dada em primeira mão enquanto que uma matéria sobre o recorde de dias sem
acidentes em um aeroporto não ter tanto destaque, sendo possivelmente relegada a
uma posição menos nobre na programação afinal de contas, qual a emoção em
ver um aeroporto funcionando normalmente? Também a este respeito Fry (in
Newcomb et al., 2004) adiciona, dizendo que:
Já se argumentou que as pessoas são psicologicamente atraídas por
notícias de desastre porque elas alimentam uma tendência voyerística inata.
Sendo este o caso ou não, desastres naturais e tecnológicos são dignos de
serem noticiados porque são fora do comum, eles geram danos e,
particularmente importante na televisão, são a matéria prima de gravações
dramaticamente interessantes
32
. (Grifo meu).
O terceiro critério mencionado para a seleção de informações é o de identificação do
público alvo com a matéria. “A mídia cobre mais freqüentemente tópicos que são
geograficamente ou culturalmente relevantes para o receptor” (Nerb et al., 2001).
31
Newsworthiness” no original.
32
Naturalmente, pode-se complementar esta afirmação lembrando-se que mesmo em outras formas de mídia
(e.g., jornal, rádio etc.) este material também receberia destaque porque geraria relatos e fotos igualmente
interessantes.
63
Sobre isto, Fry (in Newcomb et al., 2004) fornece um exemplo, a respeito da
cobertura midiática estadunidense, mencionando que:
Os críticos também argumentam que as escolhas que determinam quais
desastres receberão destaque
33
freqüentemente dependem da conexão que
pode ser feita [entre o desastre] com os Estados Unidos. Aqueles desastres
nos quais americanos, ou interesses americanos, são prejudicados recebem
uma cobertura proeminente da imprensa estadunidense (...) enquanto
outros desastres [que não se enquadram neste perfil] recebem uma
cobertura minimizada ou são completamente esquecidos.
Provavelmente, aqueles que relatam as notícias tendem a dar mais ênfase a aquelas
informações que são mais próximas do receptor porque partem do pressuposto,
razoavelmente lógico, de que as pessoas se interessarão mais pelo que acontece
perto delas, afetando suas vidas diretamente, do que por um evento que só as
afetará, no máximo, de maneira marginal e.g., a violência urbana que acontece em
cidades de seu país versus a violência de cidades de outros países. Outro exemplo
deste fenômeno, desta vez em um nível regional, é dado por Sandman (2004):
Durante o período do estudo, Alabama, Louisiana, Mississipi e Virgínia
Ocidental tiveram aproximadamente o mesmo número de derramamentos
de óleo que a Califórnia, Massachusetts, Nova Iorque e Texas. Contudo,
quase três vezes mais histórias de derramamentos foram relatadas sobre
estes últimos estados (onde as redes [de comunicação] têm escritórios e
muitos espectadores) do que dos primeiros (onde elas não têm).
Um último ponto que pode ser comentado, diretamente relacionado com os
anteriores, que também influencia o que será noticiado e, principalmente, como o
será, são as próprias limitações, estruturais e psicológicas, tanto dos meios de
comunicação quanto daqueles que recebem sua mensagem. Os primeiros, sempre
pressionados por limites apertados e pela concorrência intra-indústria pela melhor
fonte ou história, acabam se concentrando em noticiar apenas eventos específicos
como discutido acima, geralmente marcantes sem se deter em análises mais
33
Air time”, no original.
64
aprofundadas sobre as causas ou conseqüências (processos causais, políticas,
problemas históricos etc.) destes eventos (Reiner, 2002; Fry, 2004; Nerb et al., 2001;
Souza e Fernandes, 2002).
Por outro lado, deve-se lembrar que qualquer meio de comunicação está restrito a
falar da maneira que atinge seu público alvo, sobre aqueles assuntos que o
interessam. Como observado em alguns estudos (Slovic et al., 1982; Konheim, apud
Wahlberg e Sjöberg, 2000), o público leigo não entende, ou tem interesse, nos
mesmos aspectos das notícias que os especialistas em determinados assuntos
34
e.g., segurança pública, energia nuclear etc. Sandman (2004) nota que “colocar
informações técnicas na mídia não somente é difícil; é também quase totalmente
inútil”. Nerb et al. (2001) por sua vez consideram que:
... o papel da mídia não é primordialmente fornecer informações técnicas. O
trabalho jornalístico é restringido pelas demandas dos receptores os quais
freqüentemente mostram somente um ralo interesse em detalhes técnicos e
discussões minuciosas, preferindo ao invés saber sobre as causas dos
desastres e das crises. Em particular, a audiência quer saber o que
aconteceu, como aconteceu, quem é culpado e o que as autoridades farão
depois de um acidente.
Desta maneira, ao buscar atingir de maneira mais efetiva sua audiência, atraindo
sua atenção para a notícia, talvez o jornalista ou editor deixe propositalmente de
focar alguns detalhes que poderiam levar a uma avaliação mais acurada da
realidade. Como Sandman (2004) exemplifica, a respeito de notícias sobre riscos
ambientais:
Enquanto cientistas, políticos e membros de grupos de interesse
demandam precisão da cobertura [das notícias], para os jornalistas o critério
mais importante para um bom artigo sobre riscos ambientais mostrou ser a
vivacidade da apresentação, ênfase no potencial de catástrofe e em
particular a atribuição de causa e designação de culpa.
34
“As pessoas não entendem ou escutam a medidas quantitativas, mas a afirmações qualitativas” (Konheim,
apud Wåhlberg e Sjöberg, 2000, p. 38).
65
2.6.2 “Realidade Objetiva” versus “Realidade Simbólica”: A Influência da
Notícia
Observados os critérios para a escolha daqueles eventos que serão noticiados
descritos acima torna-se mais fácil percebermos como a mídia pode influenciar a
disponibilidade de determinados aspectos da vida quotidiana como violência
urbana, visões políticas, preconceitos sociais, causas de morte etc. para aqueles
que recebem sua mensagem
35
. Tendo visto também os vieses derivados da
heurística da disponibilidade (seção 2.4), podemos discutir o potencial que a maior
disponibilidade destes eventos específicos tem de gerar vieses na visão de realidade
da população em geral.
Como já mencionado (seção 2.5.1), ao avaliar a “realidade objetiva”, i.e. como o
mundo ao seu redor realmente é, as pessoas geralmente não têm à sua disposição
evidências estatísticas com dados concretos que lhes ajudem a fazer um julgamento
acurado. Elas precisam chegar a conclusões baseadas exclusivamente naquelas
informações que se lembram de ter visto, ouvido ou lido em algum lugar. Como
atualmente grande parte senão a maioria destas informações é proveniente da
mídia (Gerbner et al., 1986; Wahlberg e Sjöberg, 2000), sua percepção de realidade
acaba sendo extremamente influenciada pelo mundo como é mostrado pelos
diversos meios de comunicação televisão, rádio, jornal, Internet etc. Seu mundo
“perceptual” deixa de ser então gerado pela “realidade objetiva” que as cerca,
passando a ser conseqüência direta da “realidade simbólica” midiática que elas
vêem através das notícias recebidas. London (2004) nos mostra como a mídia pode
35
O que, depois do surgimento e disseminação da televisão, significa praticamente todo mundo. Para uma
discussão a respeito da penetração e impacto da televisão na visão de mundo das pessoas, ver Gerbner et al.,
1986.
66
formatar percepção de realidade e conseqüentemente determinar as prioridades da
sociedade através da sua influência:
Will Rogers costumava dizer “Tudo o que sei é o que leio nos jornais”. (...)
[Iyengar] no seu livro descobre que a televisão determina o que os
americanos acreditam serem assuntos importantes, dando atenção a alguns
problemas e ignorando ou dando pouquíssima atenção a outros. “Nossa
evidência mostra um público americano com uma memória limitada para as
notícias do próximo mês e uma vulnerabilidade recorrente para as [notícias]
de hoje”, o autor escreve. “Quando as notícias de televisão focam em um
problema, as prioridades do público são alteradas, e [são] alteradas de novo
quando as notícias de televisão focam em algo novo”.
Vemos esta influência da mídia na percepção testada por McLeod et al. (1995). Seu
estudo encontrou fundamentos para a hipótese, chamada por eles de “refração da
notícia” (news refraction), que “a exposição a matérias sobre notícias locais pode ter
uma forte influência na percepção de assuntos como crimes, devido ao grande
realismo da mensagem (particularmente na televisão) e à ‘proximidade’ [em relação
ao receptor] do assunto”. Contudo, se considerarmos os critérios de seleção de
notícias que privilegiam a excepcionalidade, potencial de entretenimento e
proximidade do evento ao receptor, mais o fato das notícias não conterem uma
análise razoavelmente aprofundada das situações que retratam, devido às restrições
dos emissores e receptores supracitadas, podemos chegar à conclusão que talvez a
mídia muitas vezes não seja a melhor fonte para se basear uma interpretação dos
fatos, riscos ou mesmo das escolhas que podem ser feitas em certas situações. Por
exemplo, Reiner (in Maguire et al., 2002) relata que:
... dos primeiros estudos (e.g., Harris, 1932) em diante, análises das
reportagens têm mostrado que crimes de violência são mostrados
desproporcionalmente em comparação com sua incidência nas estatísticas
oficiais de crimes ou pesquisas com vítimas. De fato, uma conclusão geral
(...) tem sido a falta de relação entre padrões e tendências nas notícias de
crimes e as estatísticas de crimes (Davis, 1952, p. 383)
Outra descoberta consistente dos estudos de conteúdo é a predominância
de histórias sobre incidentes criminais, ao invés de análises de padrões
criminais ou das possíveis causas de crime. Como resumido em uma
67
pesquisa da literatura, “histórias de crimes nos jornais consistem
primordialmente de breves relatos de eventos discretos, com poucos
detalhes e poucos materiais para análise de causa. Existem muito poucas
tentativas de se discutir causas ou remédios para o crime, ou inserir o
problema do crime em uma perspectiva maior”. (id., ibid., p. 386)
Sandman (2004) amplia esta conclusão de Reiner sobre a falta de relação entre
padrões e tendências nas notícias e as estatísticas, citando um exemplo relacionado
à percepção de risco ambiental:
... fizemos uma análise do conteúdo da cobertura das notícias noturnas das
emissoras de janeiro de 1984 a fevereiro de 1986. (...) Durante o mesmo
período, as emissoras veicularam somente 57 histórias sobre o tabaco e
impressionantes 482 histórias sobre segurança de aviões e acidentes.
Baseado no número de fatalidades, deveria haver 26,5 minutos de
cobertura sobre o tabaco para cada segundo de cobertura de acidentes
aéreos. Ao contrário, a relação era de 7:1 na direção errada. Acidentes
ambientais agudos como Bhopal
36
receberam ampla cobertura (e
mereceram-na); problemas ambientais crônicos, como a contaminação por
asbestos, receberam muito menos, requerendo tipicamente um ‘furo’ de
notícia (informação nova e oportunista) na qual basear a história.
Proximidade geográfica também foi um fator preponderante.
Concluindo, podemos citar a discussão de Nerb et al. (2001) a respeito do viés na
percepção das pessoas causada por esta cobertura desproporcional de certos
eventos:
A mídia é importante na elaboração dos julgamentos de risco do público e é
freqüentemente acusada por sua cobertura viesada e seleção dos assuntos
de risco. Muitos representantes do governo e indústrias têm reclamado por
anos que a cobertura viesada das notícias sobre riscos ambientais reais ou
alegados gera uma preocupação pública ilegítima e encoraja gastos
governamentais em perigos selecionados, enquanto outros perigos, talvez
mais urgentes, são ignorados. (...) Como foi mostrado, as pessoas
tipicamente recebem informação na forma de reportagens curtas,
específicas e altamente vívidas consistindo da descrição de eventos únicos
(e.g., acidentes) ao invés de tratamentos de questões e problemas crônicos.
Desta maneira, a avaliação dos leigos a respeito de riscos ambientais é
freqüentemente baseada nas descrições da mídia de massa de eventos
únicos, freqüentemente desastrosos, ao invés de informações
probabilísticas de longo prazo sobre possíveis danos.
36
Refere-se ao acidente que aconteceu no dia 3 de dezembro de 1984, na cidade de Bhopal, Índia, quando um
dos tanques de gás metil isocianeto da fábrica de pesticidas da Union Carbide India Limited vazou, gerando uma
nuvem de gás venenoso que atingiu a cidade matando aproximadamente 3800 pessoas e causando danos em
aproximadamente outras 3000. (fonte: Bhopal, disponível em <www.bhopal.com>).
68
Dentro de um cenário onde certos fatos e eventos são constantemente mostrados,
não é realmente difícil perceber o papel que a heurística da disponibilidade e seus
vieses podem ter para cada pessoa na formação da imagem do mundo que a rodeia.
Como colocam Wahlberg e Sjöberg (2000, p. 44), “o meio mais fundamental da
mídia alterar a percepção de risco das pessoas é possivelmente através do número
de artigos / matérias”. A grande freqüência que determinados eventos são
anunciados na mídia principalmente quando comparados com sua freqüência real,
como visto em Sandman (2004) pode levar a uma maior disponibilidade de sua
ocorrência na mente das pessoas, através do viés da facilidade de lembrança,
aumentando para o público a freqüência percebida destes mesmos eventos. Um
exemplo deste fenômeno é achado quando analisamos a constante disponibilidade
na mídia de algumas causas de morte como acidentes de trânsito ou homicídios
e a superestimação que as pessoas fazem do número de indivíduos mortos por
estas causas em relação a causas menos divulgadas, mas causadoras de um
grande número de mortes como derrame ou diabetes (Slovic et al., 1979). Deve-se
ressaltar que estas primeiras causas não apenas aparecem mais na mídia como
também são mais salientes por matarem de maneira mais “marcante” do que as
últimas que matam de maneira silenciosa. Desta forma, cada notícia sobre estas
doenças que aparece na mídia afeta sua disponibilidade não apenas através do
aumento da freqüência relativa que elas são mencionadas para o indivíduo, mas
também através da fixação de sua imagem na mente dele.
A mídia, ao discutir e descrever constantemente determinados assuntos, também
pode facilitar a imaginação de eventos por parte das pessoas, afetando assim sua
estimação da freqüência destes eventos e percepção de risco. Simplesmente citar a
69
existência de um perigo, descrevendo-o detalhadamente, assim como suas
conseqüências potenciais, pode aumentar o medo das pessoas em relação a ele,
ainda que o risco real para elas permaneça praticamente inalterado. Wahlberg e
Sjöberg (2000, p. 40) mencionam que “mesmo uma cobertura positiva por parte da
mídia pode influenciar a opinião pública negativamente. (...) Esta previsão é
confirmada, por exemplo, por um experimento de Morgan et al. (1985) no qual os
participantes ficavam mais preocupados com certos perigos possíveis quando
recebiam mais informações sobre eles”. Slovic et al. (in Kahneman et al., 1982, p.
487) também exemplificam este fenômeno, desta vez em relação à percepção de
risco da energia nuclear:
Como mencionado anteriormente, a heurística da disponibilidade implica
que qualquer discussão pode aumentar sua facilidade de imaginação e
conseqüentemente seu risco percebido. Considere um engenheiro
argumentando sobre a segurança de se despejar lixo nuclear em um banco
de sal, lembrando da improbabilidade das várias maneiras que a
radioatividade pode ser liberada. Ao invés de convencer a audiência, a
apresentação pode levá-la a pensar, “Eu não sabia que havia tantas formas
disto dar errado”. Desta maneira, a confiança na facilidade de lembrança e
imaginação pode obscurecer a distinção entre o que é remotamente
possível e o que é provável.
Outra maneira da mídia afetar a percepção da realidade através da disponibilidade é
através da correlação ilusória. Ao focar sempre apenas em determinados aspectos
específicos de determinado grupo social ou região geográfica, por exemplo, os
meios de comunicação podem contribuir para que sua audiência automaticamente
correlacione todos deste grupo ou região apenas com estes aspectos, ignorando
uma possível diversidade existente. Fry (in Newcomb et al., 2004) ilustra este viés,
citando a cobertura das nações do terceiro mundo pela imprensa estadunidense:
Os críticos têm acusado a imprensa estadunidense de ter um viés
geográfico na sua cobertura de desastres do terceiro mundo. Seu
argumento, corroborado por uma detalhada análise de conteúdo das
notícias transmitidas nos Estados Unidos, aponta que muitas das
reportagens a respeito destas nações foca em desastres e instabilidades
70
políticas. Esta prática é percebida como que criando uma imagem distorcida
destas nações, como sendo caóticas e fadadas ao desastre,
representações estas que suportam e perpetuam relações de poder
desiguais entre nações dominantes e em desenvolvimento.
Herschmann (2000, cap. 5) também fala do poder da mídia em moldar a visão da
sociedade em relação a determinado grupo social no caso, o funk e os
freqüentadores de baile. Ele mostra como todo um grupo os funkeiros e os jovens
da favela em geral pôde ser estigmatizado devido comportamento violento de
alguns de seus representantes, intensivamente retratado no meio da década de
noventa, por toda a imprensa carioca e nacional, de uma maneira extremamente
gráfica e “espetacular”:
Se, no que se refere aos conteúdos apresentados pela mídia num primeiro
momento, rótulos como “terror”, “hordas”, “medo” e “pânico” parecem dar o
tom à descoberta do funk pela classe média da Zona Sul da cidade, no que
se refere à forma dos relatos, destacam-se na enunciação jornalística as
formas não-verbais de tratar os referidos acontecimentos. Ganham
destaque nas matérias dos jornais as fotografias e imagens que dão mais
credibilidade aos enunciados, e espetacularizam os acontecimentos.
... A utilização de tabelas e gráficos, contendo dados estatísticos que
divulgavam índices de criminalidade confirmando a “vocação criminosa”
destes jovens, e pesquisas de opinião que “fundamentavam” o medo da
população também tornaram-se bastante freqüentes. (...) Cada vez mais, o
funkeiro foi sendo apresentado à opinião pública como um personagem
“maligno/endemoniado” e, ao mesmo tempo, paradigmático da juventude da
favela, vista, em geral, como “revoltada” e “desesperançada”. (...) A mídia
problematiza e até certo nível e mesmo aponta as “causas” de fenômenos
sociais desta natureza; mas o que fica, em geral, para a população é a
espetacularização, o “encantamento” de práticas e discursos, produzindo
um clima de pânico e histeria. (Grifos meus).
Por fim, mesmo o viés devido à eficiência do padrão de busca pode ser em algumas
circunstâncias influenciado pela maneira que a mídia retrata determinadas situações.
Ao apontar sempre os mesmos culpados para diversos problemas que ocorrem no
dia-a-dia (e.g., população de rua pela violência urbana; imigrantes pelo desemprego;
islâmicos pelo terrorismo etc.), os meios de comunicação podem estar indiretamente
moldando uma “agenda política”, influenciando a sociedade a exigir sempre uma
solução imediatista, que pareça eliminar o “culpado” indicado, mas que no fundo não
71
resolve o problema (e.g., forçar os habitantes de rua a se realocar para áreas
distantes, menos nobres; expulsar os imigrantes ou dificultar a imigração;
bombardear e invadir países pretensamente hostis), em vez de levar a sociedade a
procurar alternativas que talvez não estejam tão disponíveis em sua mente por não
serem tão divulgadas e, portanto, menos óbvias mas que poderiam resolver o
problema definitivamente no longo prazo (e.g., políticas sérias de redistribuição de
renda; incentivo a investimentos que gerem desenvolvimento em determinadas
regiões ou países; investimento em programas de inspeção de armas apoiados pela
comunidade internacional, encorajamento do diálogo intercultural e estabelecimento
de sanções para o comércio de armas).
72
3 Hipóteses do Experimento e Metodologia
Diversos trabalhos
37
mostram que a mídia tem uma tendência por noticiar
acontecimentos “extraordinários”, excepcionais, que sejam relevantes culturalmente
ou geograficamente para o público receptor. Como visto, isto pode afetar a
disponibilidade de determinados episódios e viesar a percepção das pessoas a
respeito de sua freqüência e probabilidade.
Apesar da importância do tema e do tempo relativamente longo passado desde a
realização dos experimentos originais onde foram verificados tanto os vieses
perceptuais do público amostral em direção à freqüência das mortes resultantes de
causas mais “espetaculares” e o viés das notícias da mídia na mesma direção em
detrimento de causas de morte “silenciosas”, relativamente bem menos noticiadas
em comparação à sua freqüência real (Lichtenstein et al., 1978; Slovic, Fischhoff e
Lichtenstein, 1979; Combs e Slovic, 1979), não foi encontrada no Brasil nenhuma
investigação que buscasse confirmar esta influência das notícias veiculadas pela
mídia na percepção de freqüência e probabilidade de seu público. Visando suprir
esta lacuna, este experimento procurou corroborar empiricamente a existência de
dois fenômenos, ambos ligados à hipótese de que a mídia pode influenciar a
disponibilidade de eventos na mente de sua audiência:
1. Tornar mais fácil para uma pessoa imaginar exemplos de determinado evento
aumenta também sua estimação de freqüência para este evento, e;
2. Ceteris paribus, um evento que está mais presente na mídia é considerado
mais provável ou freqüente do que aquele que aparece menos.
37
Já discutidos na seção 2.6.
73
3.1 Desenho e Hipóteses do Experimento
A fim de examinar a existência dos fenômenos descritos acima no Brasil foi
concebido um formulário composto de quatro perguntas, todas independentes umas
das outras e buscando confirmar hipóteses próprias. Destas perguntas, duas 1 e 4
procuravam verificar se a facilidade de imaginação de exemplos de determinado
evento afeta a estimação de freqüência do mesmo e as outras duas 2 e 3
procuravam verificar se há uma correspondência positiva entre o número de notícias
sobre determinado evento na mídia e a estimação de freqüência e probabilidade do
mesmo.
A pergunta número 1 é original, não vista anteriormente em nenhum experimento
encontrado e é inspirada no viés da facilidade de imaginação, identificado por
Tvesrky e Kahneman (1974). Ela objetiva testar a hipótese de que estimular a
facilidade de imaginação de exemplos de certo evento ‘neutro’, que não é
espetacular ou especialmente marcante no caso, uso do filtro solar pode também
influenciar positivamente a estimativa de freqüência deste evento número de
pessoas que usa filtro solar. Para isto, duas versões da pergunta foram feitas
chamadas versão curta e longa. A versão curta tinha o seguinte enunciado:
Especialistas afirmam que o sol é o pior inimigo da pele. Ele pode causar
irritações, envelhecimento precoce e câncer. Os danos causados pelo sol
são provenientes tanto dos raios ultravioleta B (UV-B) quanto dos raios
ultravioleta A (UV-A). O primeiro tipo (UV-B), o qual acredita-se ser o mais
perigoso, causa queimaduras e câncer de pele. O segundo tipo (UV-A)
penetra mais profundamente na pele, danificando as estruturas de colágeno
e elastina que sustentam a pele e a mantém firme.
Considerando que a população da cidade do Rio de Janeiro é de
aproximadamente 6 milhões de habitantes, qual é, na sua opinião, o
percentual da população da cidade que faz uso do filtro solar regularmente?
74
A versão longa continha todas as informações da versão curta mais um parágrafo
(grifado abaixo) que buscava aumentar a disponibilidade na mente dos pesquisados
daquelas circunstâncias onde as pessoas usam filtro solar, não apenas na praia,
mas também em várias outras situações do dia-a-dia, incentivando sua imaginação.
A versão longa tinha o seguinte enunciado:
Especialistas afirmam que o sol é o pior inimigo da pele. Ele pode causar
irritações, envelhecimento precoce e câncer. Os danos causados pelo sol
são provenientes tanto dos raios ultravioleta B (UV-B) quanto dos raios
ultravioleta A (UV-A). O primeiro tipo (UV-B), o qual acredita-se ser o mais
perigoso, causa queimaduras e câncer de pele. O segundo tipo (UV-A)
penetra mais profundamente na pele, danificando as estruturas de colágeno
e elastina que sustentam a pele e a mantém firme.
Cada vez mais pessoas procuram se proteger destes efeitos danosos com o
uso constante do protetor solar. Elas usam o produto não apenas na praia,
que é o uso mais comumente lembrado, mas sempre que saem à rua, pois
pesquisas indicam que o sol pode causar danos à pele mesmo quando o
tempo está nublado ou estamos com o corpo coberto (a radiação ultravioleta
do sol pode penetrar muitos tipos de roupa). De fato, depois que
pesquisadores descobriram que o uso contínuo do filtro solar ajudava até a
recuperar parcialmente peles já danificadas pelo sol, várias pessoas
passaram a usar filtro constantemente mesmo em dias que não há luz solar
intensa (nublados, chuvosos etc.) ou simplesmente o usam enquanto estão
em casa.
Considerando que a população da cidade do Rio de Janeiro é de
aproximadamente 6 milhões de habitantes, qual é, na sua opinião, o
percentual da população da cidade que faz uso do filtro solar regularmente?
Ao fim de ambas as perguntas havia uma escala começando em “menos de 1%”,
aumentando de 3% em 3% e indo até “mais de 40%” onde os pesquisados
deveriam marcar a resposta que achassem mais adequada
38
. Cada pessoa
respondeu a apenas uma versão da pergunta. Caso exista um viés da heurística da
disponibilidade nesta situação, causado pela facilidade de imaginação induzida, os
pesquisados que tiveram acesso à questão longa deveriam em geral estimar um
percentual maior da população que usa filtro solar. Caso contrário, não haveria
38
Para ver a escala em detalhes ir ao anexo B.
75
variação significativa na opinião dos dois grupos a respeito do percentual da
população que faz uso do produto. Em termos de hipóteses nula e negativa teremos:
H
01
: Não haverá diferença significativa entre os respondentes das versões
curta e longa na estimação do percentual da população do Rio de Janeiro
que usa filtro solar.
H
11
: Os respondentes da versão longa estimarão, em relação aos
respondentes da versão curta, um percentual em média significativamente
maior da população do Rio de Janeiro como sendo usuária de filtro solar.
As perguntas 2 e 3 procuram verificar a percepção de freqüência e probabilidade
das pessoas a respeito de dois assuntos discutidos pela mídia causas de morte e
violência urbana. Ambas foram inspiradas pelos estudos clássicos de Lichtenstein et
al. (1979) e Combs e Slovic (1979). A pergunta 2 relaciona em duplas dez causas
de morte e pede para que os participantes escolham, dentro de cada dupla aquela
que é responsável pela maior causa de mortes no Rio de Janeiro. Seu enunciado é
o seguinte:
Abaixo estão relacionadas algumas causas de morte, organizadas em
duplas. Por favor, dentro de cada dupla escolha qual causa de morte no Rio
de Janeiro é responsável pelo maior número de mortes em comparação ao
seu par (marcando um X ao seu lado).
AIDS x Roubo Seguido de Morte
Acidentes de Trânsito x Ataque Cardíaco
Câncer x Homicídios
Câncer de Pulmão x Diabetes
Ataque de Tubarão x Atingido por um Raio
As causas de morte foram organizadas por critério de “dramaticidade”: aquelas com
maior potencial para gerar notícias e imagens impactantes fortes e sensacionais
foram emparelhadas com as causas de morte que tendem a ser “não-dramáticas” e
76
que também existem em formas não-fatais, controladas. Este critério foi estabelecido
devido ao fato constatado por diversos estudos discutidos acima que os meios
de comunicação dão preferência por notícias “excepcionais” e que gerem
“excitação”. Desta maneira, utilizá-lo possibilita verificar dois fenômenos: se as
causas mais “dramáticas” realmente recebem mais atenção da mídia e; se o número
de notícias de uma causa de morte tem uma associação com suas estimativas de
freqüência. As exceções a este critério são os itens “câncer de pulmão”, que talvez
devesse estar nas causas “não-dramáticas”, mas que foi emparelhado com uma
outra causa de morte “não dramática” (diabetes) devido à sua grande exposição pela
ligação ao tabaco e uma massiva campanha antitabagismo intensificada no Brasil a
partir do ano 2000
39
e os itens “ataque de tubarão” e “atingido por um raio”, ambos
os quais tem o potencial de “dramaticidade” mas que, por serem causas muito raras,
ficaram na mesma dupla para fins de comparação entre si.
A pergunta número 3 relaciona capitais de estados brasileiros, organizadas em
duplas, e pede que os pesquisados escolham, dentro de cada dupla, aquela cidade
onde os habitantes têm a maior probabilidade de sofrer uma morte violenta, em
comparação à outra ao seu lado. Seu enunciado é o seguinte:
39
Com diversos anúncios e propagandas na mídia sobre os malefícios do fumo, afirmando, implícita ou
explicitamente, que cigarro mata, e anúncios nos maços, inicialmente na lateral com os dizeres “Fumar causa
câncer de pulmão” e em uma etapa seguinte ocupando toda a contracapa do maço, com os dizeres “Fumar causa
câncer de pulmão” e foto de um pulmão necrosado.
77
Abaixo estão relacionadas, organizadas em duplas, dez capitais de estados
brasileiros. Por favor, dentro de cada dupla escolha qual a cidade onde os
habitantes têm a maior probabilidade de sofrer uma morte violenta, em
comparação ao seu par (marcando um X ao seu lado). Considere Mortes
Violentas como aquelas ocorrências que resultaram vítima fatal: homicídio,
acidentes de trânsito, roubo seguido de morte, morte suspeita e resistência
seguida de morte.
Aracaju x Brasília
Rio de Janeiro x Vitória
Recife x São Paulo
João Pessoa x Belo Horizonte
Curitiba x Porto Alegre
As capitais foram organizadas por critério de população e importância econômica do
estado (participação no PIB)
40
. As cidades maiores de estados economicamente
mais relevantes foram colocadas ao lado das cidades menores. Este critério foi
estabelecido devido à preferência da mídia por noticiar fatos geograficamente e
culturalmente relevantes para o receptor, que podem ser vistos como tendo algum
tipo de conexão com seu público ver estudos mencionados. Deduziu-se que
aqueles acontecimentos de cidades maiores e mais ricas onde, geralmente, há
escritórios e sucursais dos meios de comunicação teriam mais visibilidade na
dia do que acontecimentos semelhantes de cidades menores (ver Sandman,
2004). A exceção a este critério foi a dupla de cidades “Curitiba x Porto Alegre”:
apesar de Curitiba ter uma população maior, o Rio Grande do Sul é
economicamente mais relevante do que o Paraná. Contudo, por causa da
semelhança entre população e relevância econômica destas cidades e seus estados
(ver anexo C), elas foram consideradas como equivalentes em termos de potencial
de exposição na mídia, ficando na mesma dupla para fins de comparação entre si.
Tanto para a pergunta 2 como para a pergunta 3 pode-se prever, segundo alguns
vieses relatados da heurística da disponibilidade, que aqueles eventos que
40
Ver tabela com população das cidades e PIB dos estados no anexo C.
78
aparecerem mais nas notícias de jornal serão também, em média, aqueles eventos
considerados mais freqüentes ou prováveis pelas pessoas que responderem o
questionário. Desta maneira, as hipóteses nula e negativa para ambas as perguntas
serão:
H
02
e H
03
: Não existirá um viés significativo na estimação de probabilidade
e freqüência dos eventos em direção a estimar como mais prováveis ou
freqüentes aqueles eventos com um maior número de notícias sobre eles
veiculadas pela mídia.
H
12
e H
13
: Existirá um viés significativo na estimação de probabilidade e
freqüência dos eventos em direção a estimar como mais prováveis ou
freqüentes aqueles eventos com um maior número de notícias sobre eles
veiculadas pela mídia.
Por fim, a pergunta 4 procura reproduzir um experimento do estudo clássico de
Tversky e Kahneman (1973) sobre a heurística da disponibilidade e a influência do
viés da facilidade de imaginação. A pergunta (em uma versão adaptada para a
presente pesquisa) divide-se em duas versões, cada uma pedindo que se forme
subgrupos de duas ou oito pessoas, respectivamente, a partir de um grupo de dez
pessoas. Elas tinham o seguinte enunciado:
79
Imagine a seguinte história:
“Determinado país passava por grandes dificuldades devido tanto a
instabilidades do cenário externo quanto a uma severa recessão interna.
Muito preocupado com a situação que se apresentava, o presidente da
república convocou dez ministros e determinou que os mesmos formassem
sub-comissões entre eles para que pudessem discutir e apresentar soluções
para os diversos problemas que assolavam aquela nação.”
Considerando-se este grupo de dez ministros e assumindo que cada sub-
comissão seria formada por dois (oito) ministros, quantas sub-comissões
você estima, mais ou menos, poderiam ser formadas?
Naturalmente, cada pesquisado respondia a apenas uma das versões; ao fim do
experimento, os dois grupos são comparados.
Apesar da resposta para ambas as perguntas ser a mesma (C
10
2
= C
10
8
= 45), no
experimento original a amostra tendeu a superestimar o número de subgrupos de
duas pessoas e subestimar o número de subgrupos de oito pessoas. Segundo
Tversky e Kahneman (ibid.) isto acontece porque:
... comitês de dois membros são mais disponíveis do que de oito. Primeiro
[porque] o esquema mais simples para a construção de comitês é a partilha
do grupo em subgrupos distintos [sem membros em comum]. Assim, uma
pessoa prontamente vê que existem cinco comitês distintos de dois
membros, mas nem mesmo dois comitês distintos de oito. Segundo, comitês
de oito membros são muito menos distintos, por causa da associação
simultânea [dos membros]. Quaisquer dois comitês de oito compartilha pelo
menos seis membros. Esta análise sugere que comitês pequenos são mais
disponíveis que comitês grandes. Pela hipótese de disponibilidade,
portanto, os comitês pequenos devem parecer mais numerosos.
Assim, a expectativa é que este resultado de superestimação de grupos pequenos /
subestimação de grupos grandes se repita. Há, contudo, uma diferença significativa
entre o experimento original e a replicação que será feita: enquanto naquele a
amostra era composta por estudantes das 10ª e 11ª séries
41
de Israel, neste os
pesquisados são universitários de primeiro e segundo períodos. Tvesrky e
Kahneman não especificam se os alunos testados por eles tinham ou não algum
41
Equivalentes à 1ª e 2ª séries do segundo grau.
80
treinamento probabilístico, mas, no nosso caso, pode-se prever que estudantes
recém saídos do vestibular ainda conservem frescos alguns princípios de
probabilidade que tenham estudado para o concurso. Desta maneira, será
interessante verificar se os resultados do experimento original se mantêm mesmo
com uma amostra que teoricamente possui uma maior capacidade analítica para
resolver problemas deste tipo. Espera-se a princípio que o resultado do experimento
original se repita; de maneira que as hipóteses nula e negativa para esta pergunta
o:
H
04
: Não haverá diferença significativa na estimação média da amostra
para o número de subgrupos de duas e oito pessoas, formados a partir de
um grupo de dez pessoas.
H
14
: Haverá diferença significativa na estimação média da amostra entre
subgrupos de duas e oito pessoas, formados a partir de um grupo de dez
pessoas, sendo o número de subgrupos de duas pessoas
significativamente superestimado e o número de subgrupos de oito
pessoas significativamente subestimado, em relação ao resultado correto
para ambos de 45 subgrupos.
3.2 Metodologia
3.2.1 Amostra e Procedimento
Participaram do estudo 143 pessoas (57 homens, 86 mulheres; média de idade de
21,5 anos, variando entre 17 e 53 anos, mediana de 19 anos) dos cursos de
Economia e Comunicação Social da UFRJ e História e Pedagogia da PUC-RJ. Os
81
dados para o experimento foram coletados através da aplicação de um questionário,
composto de capa, contendo instruções e dados pessoais a serem preenchidos
(sexo, idade, curso e universidade) e quatro perguntas (descritas acima), distribuído
para os participantes em sala durante o horário de aula. O questionário, no seu
desenho original que foi aplicado para os participantes está disponível no anexo
B.
Os participantes eram abordados através de seus professores. Para cada professor
era explicado brevemente o objetivo da pesquisa, mostrado o formulário, e pedida
autorização para sua aplicação nas turmas. Após a resposta positiva, marcava-se
um dia para a realização do experimento. Os alunos eram avisados pelo professor
do que estaria acontecendo e aqueles que aceitavam colaborar ficavam em sala
para responder às perguntas. Não houve nenhum incentivo financeiro ou qualquer
outra recompensa para tomar parte do experimento.
Após a distribuição do questionário eram lidas as instruções presentes na capa,
enfatizando-se sempre que o experimento procurava verificar a percepção das
pessoas a respeito de algumas situações do quotidiano, sendo desta maneira
importante que:
Eles usassem a intuição para responder às perguntas não sendo necessário
o uso de calculadoras ou quaisquer métodos matemáticos;
Todas as perguntas fossem respondidas, ainda que não tivessem certeza
quanto à resposta correta;
Ninguém olhasse as respostas de outros participantes, enfatizando-se que
isto poderia viesar as respostas e prejudicar o experimento.
82
Também para evitar qualquer viés nas respostas, não era dada nenhuma explicação
sobre as hipóteses do experimento ou sobre a heurística da disponibilidade. Após a
leitura da capa e instruções adicionais, os participantes eram instruídos para que
fosse iniciado o preenchimento do questionário. O pesquisador permanecia na sala
durante toda a duração do experimento e os questionários lhe eram retornados á
medida que eram completados.
3.2.2 Material
A respeito dos dados sobre cobertura da mídia relativa a cada evento, necessários
para se estabelecer uma relação entre as repostas do formulário e os números de
notícias veiculados, foi preciso o estabelecimento prévio de um critério para a busca,
de forma a manter sua objetividade. Primeiro, como a amostra usada reside na
cidade do Rio de Janeiro, considerou-se razoável que a mídia pesquisada estivesse
também nesta cidade, pois o fator relevância geográfica pode ser um influenciador
importante na escolha das noticias veiculadas pelos agentes de cada meio
42
, como
exposto acima (Nerb et al., 2001). Desta maneira, decidiu-se usar o jornal “O Globo”
como exemplo da mídia carioca ele não apenas é o jornal de maior circulação da
cidade como também faz parte de um grande conglomerado de mídia que engloba
estações de rádio e televisão, podendo assim ser considerado uma fonte
representativa do total de notícias disponível para a população da cidade. A
pesquisa das notícias foi feita na ferramenta de pesquisa disponibilizada pelo jornal
em seu website.
42
Afinal de contas, notícias veiculadas em São Paulo, por exemplo, não refletem necessariamente aquelas que
estão disponíveis para o público carioca.
83
Outro fator a ser considerado é o período englobado pela pesquisa. Considerando-
se que exemplos mais recentes são lembrados mais facilmente dos que aqueles
mais antigos (Tversky e Kahneman, 1974) sendo assim mais disponíveis e,
portanto, mais relevantes para esta pesquisa optou-se por restringir o período de
busca ao semestre anterior à aplicação dos questionários 21 de dezembro de
2003 a 20 de junho de 2004, intervalo de tempo considerado suficientemente
próximo para influenciar a disponibilidade dos eventos na mente dos indivíduos e
conseqüentemente sua percepção de probabilidade e freqüência.
Por último, foram estabelecidos critérios para os termos usados na busca através da
ferramenta de pesquisa disponibilizada pelo website do jornal. Para as causas de
morte, como nem todas são necessariamente fatais e, conseqüentemente, nem
todas as notícias nas quais são mencionadas são sobre mortes causadas por elas,
optou-se por acrescentar nos termos de busca a palavra “morte” a fim de achar
notícias mais específicas sobre fatalidades relacionadas a cada causa. Assim, o
termo de busca usado para achar notícias sobre “câncer”, por exemplo, foi “morte
cancer”
43
. No caso das cidades, optou-se por uma abordagem menos específica, por
dois motivos: primeiro, pesquisar apenas pelo nome da cidade traria como resultado
uma quantidade enorme de notícias não relacionadas com mortes violentas. Por
outro lado, pesquisar por um termo específico ao lado da cidade, por exemplo, “sao
paulo morte homicidio” e “sao paulo morte roubo” poderia gerar uma duplicidade de
notícias afinal de contas, uma mesma notícia poderia falar sobre homicídios e
roubos seguidos de morte. Desta forma, optou-se por fazer uma busca utilizando o
nome da cidade ao lado da palavra “violência” e.g., “sao paulo violencia”.
43
Para uma lista completa dos termos usados nas buscas, assim como o número de notícias encontrado para cada
caso, ver anexo D.
84
Considerou-se que qualquer notícia que associasse o nome da cidade à violência
geraria uma maior disponibilidade para eventos violentos na mesma, aumentando
colateralmente também a percepção de probabilidade de seus habitantes serem
vítimas de mortes violentas.
Durante a análise das perguntas 2 e 3, também é feita, para fins de ilustração, uma
comparação entre as probabilidades e freqüências dos eventos descritos estimadas
pelos respondentes e aquelas encontradas nas estatísticas oficiais, a fim de se
comparar se há uma discrepância entre as elas. Para isso, era importante que
existissem estatísticas confiáveis sobre: as causas de morte listadas na pergunta 2
e; o número de mortes violentas das cidades listadas na pergunta 3. Conseguir estes
dados mostrou-se um desafio maior do que o esperado: há uma notável falta no
Brasil de estatísticas atualizadas sobre causas de morte (ao contrario, por exemplo,
de outros países, como Estados Unidos e Alemanha). De qualquer maneira, foram
usados os dados mais atualizados existentes desde que provenientes de fontes
consideradas confiáveis de maneira que as estatísticas objetivas refletissem da
forma mais fidedigna possível a realidade do momento da pesquisa.
Em relação às causas de morte
44
, os dados estatísticos
45
foram retirados da
publicação “Indicadores e Dados Básicos Brasil 2003” do DATASUS, disponível no
website do Ministério da Saúde. Os dados mais atualizados disponíveis nesta fonte
eram referentes a 2001. Em alguns casos os termos técnicos que designavam estas
causas foram substituídos por termos mais coloquiais
46
, usados no dia-a-dia
inclusive nas notícias veiculadas pela mídia para que não houvesse problemas de
44
A exceção de “Roubo Seguido de Morte”, “Ataque de Tubarão” e “Atingido por um Raio”.
45
Índice de mortes por 100.000 habitantes.
46
Os termos substituídos foram “doença isquêmica do coração”, substituído por “ataque cardíaco”, “neoplasias
malignas”, substituído por “câncer” e “latrocínio”, substituído por “roubo seguido de morte”.
85
reconhecimento por parte dos pesquisados. O dado sobre Roubo Seguido de
Morte” para o ano de 2001 foi encontrado no “Anuário Estatístico do Núcleo de
Pesquisa e Análise Criminal”, disponível no website do Instituto de Segurança
Pública do Rio de Janeiro e aquele sobre mortes por “Ataque de Tubarão” foi
retirado do website International Shark Attack File”, do Museu de História Natural da
Flórida, EEUU. Quanto ao dado sobre mortes “Atingido por um Raio”, não existem
estatísticas oficiais sobre o assunto no país, de maneira que duas fontes “não-
oficiais” foram usadas: o professor Osmar Pinto Jr., coordenador do Instituto
Nacional de Pesquisas Atmosféricas (ELAT) do Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais uma das maiores autoridades sobre raios do país, entrevistado por
telefone
47
e; uma reportagem do jornal “O Globo” de 21 de dezembro de 2003,
especificamente sobre mortes por raios na cidade do Rio de Janeiro
48
.
Finalmente, os dados usados na pergunta 3 sobre mortes violentas nas capitais
49
referentes a 2002 a exceção de “Acidentes de Trânsito” foram retirados do
website da Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça.
Aqueles referentes a mortes causadas por acidentes de trânsito foram encontrados
agregados no website do Departamento Nacional de Trânsito exceto para as
cidades de Aracaju, Rio de Janeiro e Vitória, os quais foram conseguidos
respectivamente em um artigo da Agência Sergipe de Notícias, no website da
Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro e no website do Departamento de
47
Entrevista realizada em 18 de maio de 2004.
48
Todos os dados de número de mortes encontrados fora da publicação “Indicadores de Dados Básicos Brasil
2003” estavam em números absolutos. Para o cálculo do índice de mortes por 100.000 habitantes para estas
causas (“Roubo Seguido de Morte”, “Ataque de Tubarão” e “Atingido por um Raio”) foi usada a estimativa para
a população do Rio de Janeiro em 2001 encontrada também nesta publicação, disponível no website do
Ministério da Saúde, de maneira a se preservar a consistência nos cálculos em relação aos índices das outras
causas de morte encontradas na mesma fonte.
49
Homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte, morte suspeita e roubo seguido de morte.
86
Trânsito do Espírito Santo
50
. Também neste caso, o termo “Distrito Federal”,
encontrado nas estatísticas, foi substituído por “Brasília”, para um melhor
entendimento por parte da amostra pesquisada.
3.3 Limitações do Estudo
Existem algumas limitações, tanto de escopo demográfico quanto geográfico,
inerentes a uma pesquisa deste tipo, que devem ser citadas antes de se proceder à
análise dos resultados.
Alguns críticos poderiam afirmar que, para uma melhor generalização dos
resultados, caberia uma maior variedade tanto da amostra pesquisada pessoas
que responderam os questionários quanto das fontes de pesquisa da quantidade /
qualidade das notícias a qual neste caso foi o jornal “O Globo” do Rio de Janeiro.
Apesar de se acreditar que tanto a amostra das pessoas quanto da mídia no caso,
alunos de graduação de faculdades do Rio de Janeiro e o jornal “O Globo”, também
do Rio sejam representativos de sua população
51
no caso específico das
perguntas deste estudo e permitam uma generalização de seus resultados para a
população brasileira em geral, isto pode ser naturalmente questionado, de forma que
a limitação das fontes nesta pesquisa deve ser mencionada para que seus
resultados possam ser ponderados de acordo com a discrição de cada um.
50
Os dados sobre o número de mortes em acidentes de trânsito foram agregados com os de outras causas para
uma idéia consolidada do índice de mortes por 100.000 habitantes para todas as capitais estudadas, a fim de se
facilitar a comparação entre elas. Foi usada a estimativa para suas respectivas populações em 2002 encontradas
no website da Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, de maneira a se preservar a
consistência nos cálculos em relação aos índices das outras causas de morte encontradas na mesma fonte.
51
Audiência e mídia nacionais, ou, em outras palavras, agentes receptores e emissores da informação midiática
no Brasil.
87
4 Análise dos Resultados
Os quadros abaixo resumem os resultados do experimento. Deve ser feita a ressalva
de que, apesar de solicitar-se aos participantes, durante as instruções, que todas as
quatro perguntas dos questionários fossem respondidas, alguns deles deixaram uma
ou mais das mesmas sem resposta. Como elas eram independentes, ignorar uma
não viesava de maneira nenhuma as que eram respondidas, de forma que todas as
perguntas respondidas foram aproveitadas. O número de respondentes para cada
uma pode ser verificado no tamanho da amostra especificado na análise individual
dos resultados.
4.1 Pergunta 1
A pergunta número 1 foi respondida por 143 pessoas, sendo que 73 delas
responderam a versão longa e 70 à versão curta. As freqüências e gráficos de
barras das respostas para ambas as perguntas podem ser vistos abaixo.
Versão Longa (n = 73)
< 1%
1%-
3%
4%-
6%
7%-
9%
10%-
12%
13%-
15%
16%-
18%
19%-
21%
22%-
24%
25%-
27%
28%-
30%
31%-
33%
34%-
36%
37%-
39%
40%>
5 7 13 6 14 8 3 3 3 3 4 1 0 2 1
0
3
6
9
12
15
< 1% 1%-3% 4%-6% 7%-9% 10%-12% 13%-15% 16%-18% 19%-21% 22%-24% 25%-27% 28%-30% 31%-33% 34%-36% 37%-39% 40%>
88
Versão Curta (n = 70)
< 1%
1%-
3%
4%-
6%
7%-
9%
10%-
12%
13%-
15%
16%-
18%
19%-
21%
22%-
24%
25%-
27%
28%-
30%
31%-
33%
34%-
36%
37%-
39%
40%>
6 8 7 6 12 6 4 6 3 4 5 0 1 1 1
0
3
6
9
12
15
< 1% 1%-3% 4%-6% 7%-9% 10%-12% 13%-15% 16%-18% 19%-21% 22%-24% 25%-27% 28%-30% 31%-33% 34%-36% 37%-39% 40%>
O primeiro passo para se conseguir comparar os dois grupos é avaliar se a média
estimada pelos respondentes da versão longa é significativamente maior do que a
média estimada pelos respondentes da versão curta. Para estimar qual é a média de
cada grupo o método usado foi:
totalfreqüência
segmentofreqüênciasegmentomédia
_
)_()_(
×
Neste caso, por exemplo, a média do segmento “7%-9%” é calculada por
%8
2
%9%7
=
+
, sua freqüência, em ambas as versões, é igual a 6 respondentes e a
freqüência total é igual ao n de cada versão (73 ou 70). Como o intervalo das
respostas possíveis era aberto ( ]1%, 40%[ ), foi estipulada para fins de cálculo uma
média de 0,5% para o segmento menor que 1% e uma média de 41% para o
segmento maior que 40%. Assim, seguindo estes parâmetros, pode-se definir que a
média e desvio padrão de cada grupo foi:
89
Média Desvio Padrão
Versão Longa
12,5822% 9,9181
Versão Curta
13,4000% 13,1104
A primeira vista parece não haver diferença significativa entre os dois grupos; para
verificar esta impressão foi necessária a análise estatística dos dados do
experimento. Inicialmente foram feitos testes para verificação de normalidade
(Gráfico Q-Q, Teste de Kolmogorov-Smirnov) nos dois grupos de respostas e
verificado que as respostas da versão longa não seguiam um padrão de distribuição
normal suposição necessária para o uso de testes paramétricos de maneira que
se optou por uma abordagem não-paramétrica para a comparação entre os dois
grupos. Foi escolhido o teste de Mann-Whitney para a análise estatística da
diferença entre os dois grupos. As principais estatísticas obtidas
52
podem ser vistas
nas tabelas abaixo:
Ranks
Versão N
Mean
Rank
Sum of
Ranks
Curta 70 73,75 5162,50
Longa 73 70,32 5133,50
Total 143
Estatísticas do Teste
A
Mann-Whitney U 2432,50
Wilcoxon W 5133,50
Z -,498
Asymp. Sig. (2-tailed)
,619
A aplicação do teste de Mann-Whitney mostra que, pelos dados da amostra, a
hipótese nula não pode ser rejeitada; em outras palavras, não parece haver uma
52
Através do software SPSS 11.0.
90
diferença significativa (ao nível de significância de 5%) nas respostas dadas pelos
respondentes da versão longa e da versão curta da pergunta 1 do experimento, o
que pode ser constatado pela significância assintótica
53
0,619 consideravelmente
maior do que o valor de referência de 0,05.
Constatamos então que, ao contrário do esperado, a média da estimação de
freqüência de uso de filtro solar do grupo que respondeu a versão longa da pergunta
1 não foi significativamente maior do que a do grupo que respondeu a versão curta.
Algumas razões possíveis para a percepção dos participantes não ter sido viesada
pela heurística da disponibilidade neste caso principalmente pelos vieses de
facilidade de imaginação e facilidade de lembrança podem ser sugeridas.
Talvez o parágrafo acrescentado não tenha sido suficientemente descritivo para
gerar imagens vívidas dos usos alternativos para o filtro solar, as quais serviriam
para ampliar a estimação da utilização mesmo por parte daquelas pessoas que não
seriam normalmente consideradas usuárias tradicionais do produto, como
freqüentadores da praia ou de atividades ao ar livre. Outra explicação plausível é
que possivelmente o uso do filtro solar per se seja um evento banal demais, ou seja,
cujo acontecimento não evoca fortes emoções, e que, portanto, não tem a força
necessária para criar na mente dos indivíduos imagens marcantes e vívidas o
suficiente para gerar um viés na facilidade de lembrança ou na facilidade de
imaginação.
Além disso, a própria situação socioeconômica nacional, juntamente com o fato de o
produto ser reconhecidamente caro para padrões brasileiros (em torno de R$ 20,00,
53
O nível de significância baseado na distribuição assintótica da estatística do teste. Tipicamente, um valor de
menos de 0,05 é considerado significativo.
91
de acordo com rápida pesquisa em farmácia local)
54
, possivelmente colabora para a
formação de uma imagem do filtro solar como sendo um produto primordialmente
usado pelas classes mais altas, criando uma visão pré-concebida do grupo e,
conseqüentemente, do número de pessoas que faz uso do produto. Esta situação
pode ter contribuído tanto para os percentuais médios semelhantes de seu uso
estimados por parte de ambos os grupos como também para tornar ineficaz a
tentativa de gerar uma maior estimativa do consumo do produto através do aumento
da disponibilidade de seus diversos usos possíveis.
De qualquer maneira, dois pontos devem ser ressaltados a respeito da influência das
imagens no aumento da estimação da freqüência de determinados eventos.
Primeiro, no mundo real as tentativas de aumentar a percepção de determinado
segmento da sociedade a respeito da freqüência e / ou probabilidade de um evento
raramente se restringem a apenas uma exposição a exemplos deste evento. Pelo
contrário, quando, um grupo de interesse ou uma empresa quer atuar sobre a
percepção das pessoas a respeito de certa conjuntura e.g., a probabilidade de se
pegar uma doença ou a freqüência de uso de certo produto dentro de um mercado
alvo o que se vê geralmente é uma campanha intensa, muitas vezes de
“saturação”, onde vários exemplos são mostrados seguidamente e de uma maneira
vívida e marcante, procurando evocar emoções fortes do receptor como o
depoimento de pessoas cuja vida foi duramente afetada por determinada doença ou
uma cena onde o uso do produto promove uma melhora na vida do consumidor,
ainda que temporária ou instantânea. Claramente a repetição das ilustrações e o uso
de meios mais “marcantes” pra transmitir a mensagem como fotos, filmes etc.
54
Versus, por exemplo, a um salário mínimo de R$260,00 em maio de 2004 (fonte: IPEAData, disponível em
<www.ipeadata.gov.br>)
92
podem ter um potencial muito maior de aumentar a facilidade de imaginação ou
lembrança do que uma exposição única através da leitura de um texto como a que
aconteceu no experimento.
Finalmente, em segundo lugar, a influência de se facilitar a imaginação de eventos
dramáticos (e.g., acidentes em usinas nucleares, mau uso da engenharia genética
etc.) no aumento da estimação da freqüência e probabilidade destes eventos,
mesmo sem uma exposição repetida dos exemplos, já foi relatada em alguns
estudos (ver, por exemplo, Slovic et al. in Kahneman et al., 1982, intercoetera).
Contudo, esta influência não foi verificada neste experimento, onde se procurou
aumentar a imaginação de um evento não dramático (uso de filtro solar). Se esta
diferença de resultados se deu devido a peculiaridades do experimento (seu
desenho, forma de aplicação etc.) ou acontece realmente devido a outros fatores
não detectados nesta pesquisa (e.g., grau de dramaticidade do evento) é uma
questão relevante para diversos campos de estudo como administração pública,
publicidade, intercoetera e pode ser abordada por pesquisas futuras sobre o tema.
4.2 Pergunta 2
A pergunta número 2 foi respondida por 134 pessoas. As escolhas consolidadas
dos respondentes podem ser vistas na tabela abaixo:
Respostas Respostas
AIDS 22 x 112 Roubo Seguido de Morte
Acidentes de Trânsito 108 x 26 Ataque Cardíaco
Câncer 39 x 95 Homicídios
Câncer de Pulmão 92 x 42 Diabetes
Ataque de Tubarão 62 x 72 Atingido por um Raio
Os dados por dupla são resumidos na tabela e gráfico de barras abaixo:
93
AIDS
Latro-
cínio
Aciden-
tes de
Trânsito
Ataque
Cardíaco
Câncer
Homi-
cídios
Câncer
de
Pulmão
Diabetes
Ataque
de
Tubarão
Atingido
por um
Raio
22 112 108 26 39 95 92 42 62 72
16,42% 83,58% 80,60% 19,40% 29,10% 70,90% 68,66% 31,34% 46,27% 53,73%
Para verificar se a hipótese nula (H
02
) é ou não verdadeira foi escolhido um teste
não-paramétrico, o teste
χ
2
(qui-quadrado), que serve para medir o grau de
desacordo entre os dados e a hipótese nula. Neste caso, como a hipótese nula é
que não existirá um viés significativo na estimação de probabilidade e freqüência
dos eventos, considerou-se para fins do teste que cada item de uma dupla deveria
ter aproximadamente o mesmo número de respostas, ou seja:
H
02:
p
1
= p
2
= 0,5; sendo p
1
a probabilidade de uma pessoa escolher o item da
esquerda da dupla e p
2
a probabilidade de uma pessoa escolher o item da direita da
dupla.
H
12:
p
1
p
2
16,42%
83,58%
80,60%
19,40%
29,10%
70,90%
68,66%
31,34%
46,27%
53,73%
AIDS Latrocínio Acidentes de
Trânsito
Ataque
Cardíaco
Câncer Homicídios Câncer de
Pulmão
Diabetes Ataque de
Tubarão
Atingido por
um Raio
94
Assim, se a hipótese nula é verdadeira e p
1
= p
2
= 0,5, o valor esperado do número
de respostas para cada item da dupla será dado por: E(n
i
) = np
i
= 134 x 0,5 = 67
respostas.
Para o cálculo do valor da estatística de teste para cada dupla foi usada a fórmula
(encontrada em McClave et al., 1998, p. 916):
2
χ =
)(
)]([
2
i
ii
nE
nEn
onde n
i
é o valor real (nº de respostas) encontrado para cada item e E(n
i
) é tal qual
definido acima. A estatística de teste para a dupla “AIDS x Roubo Seguido de
Morte”, por exemplo, foi calculada por:
2
χ
=
67
]67122[
67
]6722[
22
+
= 60,44776.
Finalmente, para podermos constatar que há um viés significativo devemos
comparar esta estatística de teste encontrada com um valor crítico. Se a estatística
de teste
2
χ
for maior que o valor crítico para determinado nível de significância e k
1 graus de liberdade (onde k é o número de escolhas possíveis),
2
α
χ , a hipótese nula
pode ser rejeitada. Para um nível de significância de 95% e grau de liberdade 1
55
temos
2
α
χ = 3,84146
56
. Este valor crítico será o mesmo para todas as duplas.
Concluindo o raciocínio para a dupla citada, como
2
χ
= 60,44776 >
2
α
χ
= 3,84146,
podemos constatar que, para este nível de significância, houve nas respostas um
viés em direção a uma das opções.
55
k 1 = 2 1 = 1.
56
id., ibid., p. 1031.
95
O cálculo da estatística de teste para todas as outras duplas foi feito da mesma
maneira descrita acima. O resultado pode ser visto na tabela seguinte:
Em todas as duplas, a exceção de “Ataque de Tubarão x Atingido por um Raio”, a
estatística de teste está acima do valor crítico para α = 0,05, observando-se então
para elas a existência de um viés em favor de uma das respostas.
Resta questionar se este viés encontrado é em direção a aquelas opções que são
mais noticiadas. Para fazer esta análise, podemos pesquisar a tabela abaixo:
As notícias foram pesquisadas de acordo com o método descrito na seção
específica. Observando-se o número de respostas versus o número de notícias para
cada item de uma dupla nota-se uma tendência clara das respostas em direção à
causa de morte mais noticiada. Isto ocorre em quatro das cinco duplas, sendo a
média das respostas e notícias dos itens mais escolhidos em cada dupla 95,8 e 58,
respectivamente, versus uma média de apenas 38,2 respostas e 18,2 notícias para
os itens menos escolhidos em cada dupla.
Desta maneira, podemos concluir que, neste experimento, as pessoas tenderam a,
na maioria das duplas, confirmar H
12
, viesando significativamente suas estimativas
AIDS x Roubo Seguido de Morte X² = 60,44776
Acidentes de Trânsito x Ataque Cardíaco X² = 50,17910
Câncer x Homicídios X² = 23,40299
Câncer de Pulmão x Diabetes X² = 18,65672
Ataque de Tubarão x Atingido por um Raio X² = 0,746269
Notícias Respostas Notícias Respostas
AIDS 25 22 64 112 Roubo Seguido de Morte
Acidentes de Trânsito 41 108 7 26 Ataque Cardíaco
Câncer 47 39 174 95 Homicídios
Câncer de Pulmão 3 92 9 42 Diabetes
Ataque de Tubarão 6 62 8 72 Atingido por um Raio
96
em direção a aquelas causas de morte mais disponíveis na mídia. As prováveis
razões para que esta hipótese tenha se confirmado para a maioria das duplas, assim
como possíveis causas para sua não confirmação em algumas delas, são analisadas
abaixo.
4.2.1 Super-Exposição versus Sub-Exposição das Causas de Morte: Uma
Análise Quantitativa das Notícias
Em primeiro lugar, é provável que o número de notícias per se tenha uma grande
influência na disponibilidade dos eventos na mente das pessoas e,
conseqüentemente, tenha também o potencial de gerar certos vieses no julgamento
dos indivíduos sobre a freqüência das causas de morte supracitadas, como
constatado em estudos já mencionados. Em um mundo em que a mídia tem cada
vez mais peso como fonte de informação sobre o ambiente que nos cerca sendo
mesmo, talvez, a principal fonte de informação é natural que aqueles eventos cuja
freqüência de notícias é maior acabem também sendo vistos como mais freqüentes
no mundo real. O problema é que, devido aos critérios para seleção de notícias,
citados anteriormente (seção 2.6.1), não existe necessariamente uma relação entre
o que aparece nos meios de comunicação e as estatísticas de freqüência real: a
tendência por noticiar eventos “fora do comum”, que causam impacto, leva a um
número maior de reportagens sobre causas de morte as quais, apesar de chocantes
e.g. homicídios, latrocínios, desastres etc. são responsáveis por um número
muito menor de mortes do que outras que matam de maneira menos “dramática” e
não violenta e.g., câncer, ataque cardíaco. Esta falta de conexão entre notícias e
freqüência real pode ser constatada no quadro comparativo abaixo:
97
Nº de
Mortes
Notícias Resp.
Nº de
Mortes
Notícias Resp.
AIDS 12,7 25 22 6,46 64 112 R. Seg. Morte
Acid. Trânsito 16,48 41 108 84,21 7 26 At. Cardíaco
Câncer 131,97 47 39 46,58 174 95 Homicídios
Cânc. Pulmão 18,52 3 92 38,58 9 42 Diabetes
Ataq. Tubarão 0 6 62 0,08 8 72 Atingido Raio
Nota-se no quadro que, em quase todas as duplas, aquela causa de morte com o
maior número de ocorrências
57
geralmente uma causa de morte “silenciosa”
recebeu uma cobertura menor do que seu par uma causa de morte que, apesar de
menos freqüente, é mais “espetacular” e, portanto, tem mais “valor de notícia”. O
número de respostas, por outro lado, não se guiou pela freqüência real dos eventos,
mas sim pela freqüência midiática, tendendo sempre a, como mencionado acima,
inclinar-se para o evento mais visível. Uma das explicações para este fato pode ser
encontrada na heurística da disponibilidade e seus vieses: é bastante factível sugerir
que um número maior de notícias sobre determinado assunto torne mais fácil para
as pessoas tanto se lembrar de exemplos sobre ele quanto imaginá-los, aumentando
assim, de maneira viesada, a percepção de freqüência daqueles eventos mais
noticiados.
Não obstante o número de notícias ser, per se, um fator considerável no reforço da
disponibilidade, existe ainda outro que também colabora fortemente neste sentido:
como a notícia é colocada para o leitor. A forma como a matéria é contextualizada, o
nível de detalhes e o destaque que lhe é dado são condições as quais, entre outras,
colaboram diretamente para uma maior im pressão de excepcionalidade e vivacidade
da informação, o que por sua vez influencia e pode viesar a disponibilidade dos
eventos e, conseqüentemente, sua estimação de probabilidade e freqüência. Para
57
Nº de mortes por 100.000 habitantes na cidade do Rio de Janeiro.
98
podermos fazer uma análise neste sentido foi montada uma tabela (abaixo) com a
localização das notícias dentro das editorias e cadernos no jornal usado na pesquisa
(O Globo), além do número de palavras total das notícias encontradas e o número
médio de palavras por artigo
58
:
O que primeiro chama a atenção nos artigos é a concentração de certos temas em
determinadas editorias: enquanto notícias sobre homicídios, latrocínio e acidentes
de trânsito se concentram nas editorias principais pelo menos 70% das notícias em
que cada um dos termos aparece estão nas editorias “O País” e “Rio”, que ficam nas
primeiras páginas do jornal e ganham geralmente mais destaque na capa (talvez por
terem uma maior relevância geográfica e cultural para o leitor; ver seção 2.6.1),
58
Como algumas das citações encontradas para os termos de busca (“morte ‘causa de morte’” e “violência
‘cidade’”) estavam em colunas de cartas, onde o número de palavras é muito grande mas não reflete realmente o
número específico das palavras usadas na carta onde foi encontrada a citação, para o cálculo do número de
palavras total das notícias encontradas e do número médio de palavras por artigo foram excluídas as palavras
encontradas em artigos achados na editoria “Opinião” e que não continham um autor específico.
O País Opinião Rio Economia O Mundo
Ciência
e Vida
Esportes
Segundo
Caderno
Homicídios 21,85% 4,60% 59,21% 0,57% 11,49% 0% 0,57% 0,57%
Roubo Seguido de Morte 12,50% 7,81% 71,88% 0% 0% 1,56% 0% 1,56%
Câncer 6,38% 10,64% 17,01% 4,26% 4,26% 6,38% 0% 14,89%
Acidentes de Trânsito 9,76% 14,63% 60,97% 2,44% 2,44% 0% 2,44% 0%
AIDS 12,00% 20,00% 4,00% 0,00% 16,00% 12,00% 0% 4,00%
Diabetes 0% 11,11% 0% 0% 0% 0% 0% 0%
Atingido por um Raio 25,00% 0,00% 12,50% 0,00% 12,50% 12,50% 25% 0,00%
Ataque Cardíaco 0% 0% 42,85% 0% 14,29% 0% 14,29% 28,57%
Ataque de Tubarão 16,67% 0,00% 16,67% 0,00% 0,00% 16,67% 0% 33,32%
Cancer de Pulmão 0% 0% 33,33% 0% 0% 0% 0% 0%
Jornal
da
Família
Revista
da TV
Jornais
de
Bairro
Megazine
Prosa e
Verso
Notícias
Palavras
Média
de
Palavras
Homicídios 0% 0% 0,57% 0,57% 0% 174 87486 518
Roubo Seguido de Morte 0% 3,13% 1,56% 0% 0% 64 33882 565
Câncer 25,53% 2,13% 4,26% 0% 4,26% 47 32211 767
Acidentes de Trânsito 2,44% 0% 4,88% 0% 0% 41 25646 693
AIDS 16,00% 4,00% 4,00% 4% 4,00% 25 18034 820
Diabetes 88,89% 0% 0% 0% 0% 9 10865 1207
Atingido por um Raio 0,00% 0,00% 0,00% 13% 0,00% 8 6965 871
Ataque Cardíaco 0% 0% 0% 0% 0% 7 3876 553
Ataque de Tubarão 0,00% 16,67% 0,00% 0% 0,00% 6 4196 699
Cancer de Pulmão 66,67% 0% 0% 0% 0% 3 2189 730
99
temas como AIDS, câncer e diabetes estão espalhados pelo jornal, tendendo a se
concentrar em editorias como “O Mundo” (que falam de outros países e que, por
isso, provavelmente são menos relevantes geográfica e culturalmente para o leitor) e
“Ciência e Vida” (cujas reportagens têm um tom mais científico), ou no caderno
“Jornal da Família”, que aparecia
59
apenas aos domingos.
4.2.2 Relevância e Vividez: Uma Análise Qualitativa das Notícias
O destaque dado para cada tema dentro das reportagens pesquisadas também
diferiu amplamente entre as reportagens sobre causas de morte violentas e as sobre
causas “silenciosas”. As primeiras freqüentemente estavam inseridas em artigos
sobre eventos específicos, os quais por sua vez tinham uma relação direta com a
própria causa de morte. Alguns exemplos de manchetes sobre mortes violentas são:
“CORPOS A 500 METROS DO PALÁCIO GUANABARA
60
”; “EMPRESÁRIO É
ASSASSINADO COM TIROS NA CABEÇA EM RICARDO DE ALBUQUERQUE
61
” e,
“MULHER MORRE E OUTRA É ATROPELADA EM DOIS ACIDENTES NA BARRA
DA TIJUCA
62
”. Enquanto isso, as mortes silenciosas geralmente foram citadas em
artigos genéricos, onde o destaque não é a causa da morte em si, mas sim um tema
sobre saúde, como por exemplo “CUIDADOS NO SALÃO DE BELEZA
63
” ou “A
CONQUISTA DO CORAÇÃO SAUDÁVEL
64
”. É por este motivo, inclusive, que um
dado da tabela que a primeira vista pode parecer positivo a média de palavras de
artigos em que aparecem termos relacionados a causas não violentas é
consideravelmente maior do que a de artigos em que aparecem termos relacionados
59
Deixou de ser publicado em julho de 2004.
60
O Globo, 16/06/2004.
61
O Globo, 02/06/2004.
62
O Globo, 26/05/2004.
63
O Globo, 29/02/2004.
64
O Globo, 15/02/2004.
100
a causas violentas na verdade simplesmente mostra que as causas de morte
“silenciosas” costumam estar com mais freqüência em artigos “genéricos” como
colunas sobre saúde onde o número de palavras é maior, porém o assunto fica
diluído entre vários outros. Não raro, quando estes termos aparecem em artigos não
relacionados à saúde, estes são na verdade obituários ou reportagens sobre
pessoas já falecidas, onde a causa da morte é simplesmente mencionada en
passant, sendo destacada obviamente não a doença, mas sim a pessoa levada por
ela.
Por último, não se pode deixar de mencionar as diferenças no teor dos relatos
encontrados entre artigos sobre causas de mortes violentas e dramáticas e causas
de morte não violentas. Os primeiros mostraram ser descritivos, fornecendo ao leitor
todos os ingredientes para formar uma imagem mental da cena em que ocorreu o
evento, com detalhes como a arma e local do crime, quem eram as vítimas, qual foi
sua reação (surpresa, pavor etc.) e sofrimento (detalhes da morte etc.) e quem foram
os culpados. Um exemplo representativo das notícias sobre mortes violentas pode
ser visto abaixo (editado):
Por não ter conseguido cobrar R$ 200 de um pedreiro, um foragido do
sistema penitenciário gaúcho, de 18 anos, pôs fogo na casa do suposto
devedor, matando queimados seus quatro filhos: duas meninas, de 12 e 6
anos, e dois meninos, de 11 e 9. A polícia suspeita que a mais velha tenha
sido estuprada antes de ser carbonizada e que as demais tenham sido
esfaqueadas. O crime ocorreu às 6h30m de ontem em Canoas, a pouco
mais de 15 quilômetros de Porto Alegre. O criminoso foi preso quatro horas
depois. Autuado em flagrante, foi levado para o Presídio Central, na capital
gaúcha.
(...) O pedreiro não pagou a dívida e Márcio ameaçou se vingar. Ontem, às
6h30m, voltou à casa disposto a matar o pedreiro, ou queimar a casa, ou
fazer as duas coisas. Em depoimento na Delegacia de Polícia, o criminoso
disse que, no presídio, fizera uma "promessa ao diabo", segundo a qual se
fosse ajudado a fugir e depois conseguisse se manter livre, iria lhe dar um
corpo.
101
(...) O pedreiro foi agredido com violência, amordaçado e amarrado antes de
Márcio pôr fogo na casa, toda de madeira. A seguir, segundo o criminoso,
ele pôs fogo em um colchão usando um isqueiro e o jogou sobre um bujão
de gás. A perícia, porém, encontrou nos escombros um galão de
combustível,.
- A perícia fez um levantamento na casa e vai apurar o que realmente
aconteceu. Não é possível tirar uma conclusão, porque as crianças estavam
carbonizadas.
O pai conseguiu se desvencilhar das amarras e escapou, mas, segundo o
delegado, não teve como salvar os filhos porque o foco principal do incêndio
era justamente no quarto das crianças. Os bombeiros foram chamados, mas
nada puderam fazer.
Depois da chacina, o criminoso fugiu e, segundo vizinhos, estava
comemorando.
Ele saiu gritando e dando gargalhadas pela rua - afirmou uma vizinha.
(Oliveira in O Globo, 06/05/2004).
Artigos sobre causas de morte não violentas, por outro lado, não se mostraram ser
sobre um evento específico e eram muito menos descritivos do que os anteriores.
Na verdade, quando um evento específico sobre elas é relatado, é mais comum que
seja a história de uma pessoa que conseguiu vencer “bravamente” à doença e.g.
uma celebridade que sobreviveu ao câncer fazendo quimioterapia ou então que se
relatem casos em que elas são controladas e.g., uma pessoa que convive há anos
com a diabete de maneira que a disponibilidade destas doenças aumenta não para
o número de mortes que elas causam, mas sim para as situações nas quais elas não
são fatais. Nos casos em que as doenças são citadas em artigos genéricos sobre
saúde, geralmente esta menção se dá em apenas um ou dois parágrafos dentro
de artigos grandes, que falam também de várias outras doenças e se fala mais das
maneiras de se controlar a doença do que das mortes causadas por ela, como por
exemplo, na citação abaixo:
Cerca de 50% dos pacientes precisam apenas de reeducação alimentar e
atividade física. Geralmente são as pessoas com excesso de peso sem
complicações como diabetes, colesterol alto ou hipertensão arterial. E cerca
de 40% vão precisar de medicamentos porque já têm um risco maior de
102
complicações. São aqueles com IMC entre 25 e 30 com diabetes, colesterol
alto ou hipertensão arterial, além das pessoas entre 30 e 40 de IMC.
(...) Para pacientes com IMC acima de 40 ou pessoas com 35 a 40 de IMC
com diabetes, hipertensão ou aumento de colesterol, recomenda-se a
cirurgia para emagrecer (bariátrica). As técnicas visam a limitar a
quantidade de alimento ingerida e a diminuir a absorção dos alimentos no
intestino. (Marinho in O Globo, 02/02/2004).
Conclui-se assim que não apenas a quantidade de informações disponível sobre
determinado evento, mas também a qualidade forma e conteúdo com a qual este
evento é transmitido, colabora diretamente para aumentar sua disponibilidade na
mente dos indivíduos, fornecendo (ou não) imagens que atuam diretamente sobre a
facilidade de lembrança e imaginação e que, como conseqüência, podem influenciar
sua estimativa de probabilidade e freqüência. Não é, de maneira alguma, a intenção
afirmar aqui que as notícias transmitidas pela mídia são as únicas responsáveis pela
visão deturpada a respeito das causas de morte encontradas dentre aqueles
participantes que responderam à pergunta 2. Contudo, os resultados do
experimento, juntamente com a importância cada vez maior do papel dos meios de
comunicação como disseminador de informações e as características das notícias
que são preferencialmente transmitidas pela mídia (discutidas na seção 2.6), nos
permitem argumentar que há indícios de que as notícias transmitidas influenciam de
maneira relevante a visão de realidade da população.
4.2.3 Análise das Exceções
Entretanto, permanece a pergunta do por quê duas das duplas “câncer de pulmão
x diabetes” e “ataque de tubarão x atingido por um raio” não terem confirmado H
12
.
Existem alguns fatores conjunturais que talvez possam explicar estas duas exceções
do experimento. Quanto à primeira dupla, foi verificado que, apesar de diabetes ter o
maior número de notícias, as respostas quanto à doença que causa mais mortes na
103
dupla foi significativamente viesada em direção a “câncer de pulmão”. Dois pontos
podem ser ressaltados para explicar este fenômeno: ambas as causas podem ser
classificadas como “não-violentas” ou “silenciosas” e, como tal, recebem
relativamente pouca atenção da mídia; na verdade, o número de notícias, no espaço
de um semestre, que contêm pelo menos um dos temas juntamente com o termo
“morte” é tão pequeno (3 para câncer de pulmão; 9 para diabetes) e estas notícias,
como discutido acima, são geralmente tão não específicas, que se pode argumentar
que elas neste caso tenham tido uma influência apenas marginal sobre a percepção
dos indivíduos. Desta maneira, uma explicação plausível para o que provavelmente
influenciou os participantes em direção a opção “câncer de pulmão” pode ser a
ligação, construída através de constantes campanhas antitabagistas de órgãos de
saúde, entre: cigarro e câncer de pulmão e; cigarro e morte. Hoje em dia frases
como “cigarro mata” e “cigarro causa câncer de pulmão”, juntamente com fotos de
um pulmão necrosado, são maciçamente divulgadas em maços de cigarro, outdoors,
anúncios e propagandas, obrigatórias por lei ou patrocinados pelo governo. Ao se
pesquisar o termo “morte cigarro” na ferramenta de busca do jornal para o mesmo
semestre das outras buscas usadas na pesquisa, consegue-se um resultado de 11
notícias; pesquisando-se o termo “cigarro câncer”, 15 notícias, ambos os resultados
bem maiores do que os conseguidos para câncer de pulmão. Desta maneira,
podemos sugerir que o desvio das respostas em direção a esta causa de morte pode
ter sido sim influenciado por um viés da heurística da disponibilidade, neste caso,
causado não pelas notícias veiculadas diretamente pelos meios de comunicação,
mas pelas campanhas que ligam cigarro a câncer de pulmão e morte.
104
Em relação ao caso da dupla “ataque de tubarão x atingido por um raio”, houve um
desvio das respostas em direção ao item com mais notícias, mas este viés não foi
significativo. Pode-se usar em relação ao número de notícias o mesmo argumento
da dupla anterior: a quantidade das mesmas sobre estes eventos pode ser pequena
demais para ter influência sobre a escolha dos participantes. Este fato, juntamente
com a extrema raridade de ambos os eventos, provavelmente colaborou para que a
atitude dos participantes em relação às duas causas de morte tenha sido neutra, não
havendo assim um viés significativo nas escolhas para nenhuma das opções.
4.3 Pergunta 3
A pergunta número 3 foi respondida por 135 pessoas. As escolhas consolidadas
dos respondentes podem ser vistas na tabela abaixo:
Os dados por dupla são resumidos na tabela e gráfico de barras abaixo:
Aracaju Brasília
Rio de
Janeiro
Vitória Recife
São
Paulo
João
Pessoa
Belo
Horizonte
Curitiba
Porto
Alegre
50 85 122 13 16 119 34 101 38 97
37,04% 62,96% 90,37% 9,63% 11,85% 88,15% 25,19% 74,81% 28,15% 71,85%
Porto Alegre 97
x
38 Curitiba
Belo Horizonte 101
x
34 João Pessoa
São Paulo 119
x
16 Recife
Vitória
13
x
122 Rio de Janeiro
Brasília
85
x
50 Aracaju
Respostas
Respostas
105
Devido à semelhança com o desenho da pergunta 2, na pergunta 3 é usado o
mesmo procedimento estatístico para verificar se a hipótese nula (H
03
) é ou não
verdadeira: o teste
χ
2
. A hipótese nula para ambas as perguntas, como descrito na
seção de metodologia, também é semelhante: que não existirá um viés significativo
na estimação de probabilidade dos eventos (sofrer morte violenta em determinada
cidade). Como o cálculo da estatística teste já foi descrito na análise anterior, é
desnecessário fazê-lo novamente. A única ressalva a ser feita é que, sendo o n
desta amostra igual a 135 (ao invés de 134, como na pergunta 2), neste caso o valor
esperado do número de respostas para cada item da dupla será dado por: E(n
i
) = np
i
= 135 x 0,5 = 67,5 respostas. O valor crítico para um nível de significância de 95% e
grau de liberdade 1 para a análise dos resultados também será o mesmo (
2
α
χ =
3,84146).
O resultado do cálculo da estatística de teste para todas as duplas pode ser visto na
tabela abaixo:
37,04%
62,96%
90,37%
9,63%
11,85%
88,15%
25,19%
74,81%
28,15%
71,85%
Aracaju
Brasília
Vitória
Recife
São Paulo
João
Pessoa
Belo
Horizonte
Curitiba
Porto
Alegre
Rio de
Janeiro
106
Aracaju x Brasília X² = 9,07407
Rio de Janeiro x Vitória X² = 88,00741
Recife x São Paulo X² = 78,58519
João Pessoa x Belo Horizonte X² = 33,25185
Curitiba x Porto Alegre X² = 25,78519
Em todas as duplas a estatística de teste está acima do valor crítico para α = 0,05,
observando-se então a existência de um viés em favor de uma das respostas em
todas elas. Para descobrir se o viés encontrado é em direção às opções que são
mais noticiadas devemos analisar a tabela abaixo:
Notícias Respostas Notícias Respostas
Aracaju 2 50 254 85 Brasília
Rio de Janeiro 419 122 3 13 Vitória
Recife 36 16 455 119 São Paulo
João Pessoa 37 34 57 101 Belo Horizonte
Curitiba 13 38 24 97 Porto Alegre
Em todas as duplas nota-se uma tendência das respostas em direção à cidade mais
noticiada, sendo a média das respostas e notícias destas 104,8 e 241,8,
respectivamente, versus uma média de 30,2 respostas e 18,2 notícias para aquelas
menos escolhidas em cada dupla. Podemos desta maneira concluir que o viés
detectado através do teste estatístico é em direção as cidades mais noticiadas,
sendo, portanto, confirmada H
13
para todas as duplas.
4.3.1 Geografia, Relevância e Exposição
Convém notar, todavia, que também na pergunta 3 não há, na maioria das duplas,
uma conexão entre a probabilidade real de se sofrer morte violenta nas cidades e as
107
respostas dadas. O quadro abaixo mostra o número agregado de mortes violentas
65
por 100.000 habitantes nas diversas capitais usadas na questão:
Nº de
Mortes Notícias Resp.
Nº de
Mortes Notícias Resp.
Aracaju 62,66 2 50 48,19 254 85 Brasília
Rio de Janeiro 70,69 419 122 75,16 3 13 Vitória
Recife 79,77 36 16 58,23 455 119 São Paulo
João Pessoa 53,47 37 34 43,55 57 101 B. Horizonte
Curitiba 35,33 13 38 41,06 24 97 Porto Alegre
Percebe-se que em todas as duplas a cidade com o maior número de notícias
encontradas na busca para o termo violenciacidade’” também foi aquela com o
maior número de estimativas dos respondentes a respeito da probabilidade de seus
habitantes sofrerem morte violenta, apesar de na maioria das vezes não ser a cidade
onde a probabilidade real de se sofrer este tipo de morte seja efetivamente a maior.
Dois questionamentos relevantes surgem a partir destas observações: por que,
como se vê pelo número de notícias encontrado, algumas cidades recebem uma
cobertura tão maior do que outras por parte da mídia e; se esta diferença de
cobertura é relevante na distorção da percepção de probabilidade encontrada entre
os respondentes.
Em relação à quantidade de notícias encontrada para cada cidade, pode-se deduzir
que o fator da diferença de cobertura entre tipos diferentes de eventos não seja tão
relevante na análise, já que o tipo de evento procurado “violência” foi o mesmo
para todas elas. Como descrito na análise da pergunta 2, havia uma diferença em
relação ao conteúdo e visibilidade das notícias sobre mortes violentas e não-
violentas; todavia, todos os eventos “violentos” (homicídios, roubo seguido de morte
65
Homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte, morte suspeita, roubo seguido de morte e vítimas fatais de
acidentes de trânsito.
108
e acidentes de trânsito) concentravam-se nas editorias com mais destaque no jornal,
no caso “O País” e “Rio” e os artigos a seu respeito possuíam as mesmas
características de detalhismo e vivacidade. É razoável se supor a partir destes
dados, juntamente com os estudos relatados na seção 2.6, que as notícias sobre
violência em geral possuam as mesmas características, não sendo, portanto, em
geral, qualidades do evento como “excepcionalidade” ou “valor de entretenimento”
os componentes determinantes na diferença entre a cobertura dada a diferentes
cidades.
Outros dois agentes, entretanto, podem ser factualmente sugeridos como
influenciando diretamente o número de notícias encontrado para cada cidade: a
relevância cultural e geográfica da notícia e a freqüência absoluta dos eventos
violentos. Sobre o fator relevância, já foi detectada em estudos a preferência da
mídia em relatar eventos com os quais sua audiência se identifica, tal como nos
exemplos citados acima
66
das matérias sobre derramamentos de óleo ou desastres,
onde os locais mais relevantes para o público receptor eram também os mais
citados. Ao observar a quantidade de notícias encontrada para cada cidade, uma
das coisas que mais chama a atenção é a que a grande maioria delas se concentra
nas quatro maiores cidades do país, principalmente nos seus três principais centros
político-econômicos, Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. É bastante provável que a
grande relevância que têm estas cidades colabore no sentido de que a cobertura
sobre todos seus eventos, não apenas os violentos, tenha muito espaço em relação
ao total das notícias veiculadas.
66
Ver seção 2.6.2.
109
O segundo fator que pode ter influenciado no número de notícias com os termos
violenciacidade’” encontradas é simplesmente o fato de que existem realmente, em
termos absolutos, muito mais ocorrências de eventos violentos em metrópoles do
que em cidades menores. Em relação a homicídios, latrocínios, e acidentes, por
exemplo, muito mais pessoas são vítimas destes crimes no Rio de Janeiro ou São
Paulo do que em Vitória ou Recife. Um número maior de episódios violentos pode,
naturalmente, gerar um número maior de notícias sobre eles.
Entretanto, o fato de existir um número absoluto maior de um mesmo evento em um
local não quer dizer, como pode confirmar qualquer pessoa com conhecimentos
básicos de probabilidade e estatística, que as chances deste evento acontecer com
um de seus habitantes seja maior em comparação a outra localidade onde o número
de ocorrências é menor. As chances de ocorrência podem ser analisadas somente
quando olhamos as freqüências relativas e.g., uma cidade de mil habitantes com
20 homicídios por ano pode ser plausivelmente considerada mais perigosa do que
uma metrópole de um milhão de habitantes com 100 homicídios. Paralelamente,
podemos dizer que as chances de se sofrer morte violenta em Recife, por exemplo,
onde o número de mortes por 100.000 habitantes é 79,77, é bem maior do que em
São Paulo, onde a mesma estatística é igual a 56,23. Recife é, em outras palavras,
uma cidade mais perigosa. Por que então a percepção das pessoas quanto ao
perigo das cidades, ou seja, as chances de seus habitantes sofrerem morte violenta,
foi constantemente viesado em direção às cidades da dupla com um menor número
de mortes por habitantes? Este é um bom momento para tratar do segundo
questionamento posto acima, se a diferença de cobertura encontrada é relevante
nesta distorção da percepção de probabilidade.
110
É justificável dizer que o número de notícias muito maior a respeito da violência das
grandes cidades a torne mais disponível na mente das pessoas do que a violência
das cidades pequenas. Como as pessoas geralmente não têm acesso a estatísticas
de um evento ao fazerem julgamentos sobre suas probabilidades como não
tiveram durante o experimento estes julgamentos se baseiam na facilidade com
que exemplos destes eventos vêm à mente. Examinando a tabela acima,
observamos que as notícias relativas às cinco cidades escolhidas nas duplas como
tendo maior probabilidade de seus habitantes sofrerem morte violenta
67
corresponde
a 93,0% do total de notícias. Com uma participação tão expressiva causada, como
já visto, por fatores como relevância cultural e geográfica e número absoluto de
ocorrências pode-se consistentemente esperar uma disponibilidade
significativamente maior na mente dos indivíduos das suas ocorrências de eventos
violentos e conseqüentemente uma maior percepção da probabilidade de uma morte
violenta acontecer com um de seus habitantes.
4.3.2 O Papel da Heurística da Representatividade na Percepção dos
Indivíduos Pesquisados: Uma Hipótese
Neste caso da avaliação das cidades, o uso de uma outra heurística de julgamento,
a da representatividade
68
, pode também ser considerado, além da heurística da
disponibilidade, como uma das possíveis influências na formação da percepção dos
indivíduos a respeito da violência existente em cada uma delas. É válido
especularmos se a própria imagem que as pessoas têm, em média, das cidades
grandes, não seja a de um lugar violento, relativamente a uma imagem das cidades
67
Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Porto Alegre.
68
Já definida na seção 2.5.
111
pequenas como um lugar mais calmo e seguro. Desta maneira, ao perguntar-lhes a
cidade na qual é mais provável que um dos habitantes sofra morte violenta,
oferecendo-se duas alternativas das quais elas não têm muitas informações para
basear suas respostas, seria mais provável que fosse escolhida aquela que fosse
para estas pessoas mais representativa de um lugar violento, no caso, a cidade
grande
69
. Na tabela percebe-se que as respostas foram quase sempre viesadas em
direção à maior cidade a qual também, diga-se de passagem, recebeu a maior
cobertura da mídia. Não foi encontrada na pesquisa bibliográfica para este trabalho
nenhuma literatura referente à imagem de cidades pequenas e grandes ou uma
possível diferença entre estas imagens que porventura exista na população
brasileira, não se podendo ir neste caso, portanto, além de suposições. Mas a
influência da heurística da representatividade na percepção das pessoas em uma
comparação cidade grande vs. cidade pequena é um tema relevante para estudos
sobre, por exemplo, políticas públicas, e talvez valha a pena abordá-la em pesquisas
futuras.
4.4 Pergunta 4
A pergunta número 4 foi respondida por 126 pessoas, sendo que 66 delas
responderam à versão que pedia para estimar sub-grupos de 2 pessoas e as outras
60 à versão que pedia para estimar sub-grupos de 8 pessoas.
A intenção de análise para esta pergunta era inicialmente determinar, através de
teste paramétrico ou não paramétrico, se havia uma diferença significativa na
estimação média dos respondentes entre subgrupos de duas e oito pessoas,
69
“(...) as pessoas consistentemente julgam o evento mais representativo como sendo mais provável, sendo ele
ou não.” (Kahneman e Tversky, 1972, in Kahneman et al., 1982, p.33).
112
formados a partir de um grupo de dez pessoas, e em uma segunda etapa analisar se
havia uma superestimação dos subgrupos de duas pessoas e uma subestimação
dos subgrupos de oito pessoas, tal qual a relatada por Tversky e Kahneman (1973)
em seu estudo sobre a heurística da disponibilidade.
As respostas conseguidas através dos formulários, todavia, não puderam ser
organizadas e trabalhadas para a efetivação destes testes, não sendo possível
chegar a qualquer conclusão razoável sobre as hipóteses de pesquisa através das
mesmas. Isto aconteceu devido a dois motivos principais: em primeiro lugar, apesar
de enfatizado durante as instruções iniciais que não era necessário o uso de
qualquer instrumento matemático, pedindo-se aos respondentes que usassem sua
intuição para chegar às respostas, várias pessoas reconheceram um problema
matemático subjacente na pergunta e tentaram utilizar fórmulas para respondê-la.
Muitas delas não conseguiram realmente se lembrar da fórmula correta (C
10
2
ou C
10
8
),
mas suas respostas foram de qualquer maneira viesadas pela tentativa de calculá-
las por meios matemáticos, tendo algumas até mesmo respondido à pergunta com
uma fórmula ao invés de um número. Este resultado mostrou que o treinamento
estatístico pode influenciar significativamente a resposta de algumas pessoas em
relação a certos problemas que lhe são colocados, fazendo com que as mesmas
raciocinem matematicamente sobre uma pergunta que, em outras circunstâncias,
seria possivelmente respondida de maneira intuitiva.
Em segundo lugar, não ficou claro para várias pessoas que cada integrante do grupo
de dez pessoas poderia participar de mais de um subgrupo. Assim, ao analisar a
pergunta para subgrupos de duas pessoas, por exemplo, a resposta encontrada por
113
alguns respondentes foi cinco”. Por outro lado, outros que leram a pergunta para
subgrupos de oito pessoas responderam “um” subgrupo.
Para pesquisas futuras, caso se opte por replicar novamente esta pergunta, podem -
se fazer duas recomendações através dos fatos aprendidos neste experimento: que
a amostra preferencialmente não deve ter tido um treinamento matemático, pelo
menos recente, de maneira a se assegurar respostas que sejam dadas da maneira
mais intuitiva possível, ao invés de através de racionalização matemática e; deve-se
durante as instruções enfatizar que os membros do grupo citado na pergunta podem
participar de vários subgrupos a serem criados, de maneira a evitar a repetição de
erros de interpretação como os que ocorreram durante este experimento.
114
5 Conclusões
O objetivo desta pesquisa foi verificar a influência da mídia e da facilidade de
imaginação sobre a estimativa dos indivíduos a respeito da probabilidade e
freqüência de eventos que ocorrem em seu quotidiano. Foi demonstrado que, para a
amostra usada na pesquisa, esta estimativa para determinados eventos específicos
(probabilidade de sofrer morte violenta em determinadas cidades e mortalidade
gerada por determinadas causas de morte) estava significativamente viesada em
direção a aqueles mais noticiados pela mídia (e.g., probabilidade de sofrer morte
violenta no Rio de Janeiro ou freqüência de mortes geradas por acidentes de
trânsito). O experimento contudo não conseguiu confirmar os resultados encontrados
em experimento anterior (Tversky e Kahneman, 1973) sobre a influência da
facilidade de imaginação de um evento em sua estimativa de freqüência.
5.1 Considerações Finais
A pergunta número 1, apesar de não confirmar a hipótese de que a maior facilidade
de imaginação supostamente causada pelo enunciado longo geraria uma maior
estimativa do uso do filtro solar, nos forneceu alguns questionamentos que serão
muito úteis para pesquisas futuras. Por exemplo, será que este resultado significa
que apenas eventos especialmente marcantes e / ou relevantes para as pessoas
e.g., acidentes de avião, desastres nucleares, assaltos etc. são afetados pelo viés
da facilidade de imaginação? Ou poderia ser o fato de uma única exposição aos
exemplos de vários usos do filtro solar um evento o qual, isoladamente,
poderíamos considerar pouco marcante e relativamente insignificante no curto prazo
115
insuficiente para incutir nos indivíduos uma maior estimativa de freqüência deste
evento?
Neste caso, talvez valha a pena verificar em uma pesquisa futura se há de fato uma
relação entre a relevância e / ou excepcionalidade de um evento e o efeito que o
viés da facilidade de imaginação tem sobre a estimativa de probabilidade e
freqüência do mesmo. Constatar a existência de tal relação poderia ser útil, para
citar apenas um caso, na estimação da eficácia e da necessidade de repetição de
campanhas de saúde pública que dêem exemplos sobre benefícios e / ou malefícios
de determinados comportamentos que possam ser considerados usuais ou não
urgentes como é o caso do uso constante do filtro solar.
A pergunta número 4, por sua vez, talvez tenha como maior mérito mais a questão
que gerou do que aquelas que respondeu ou confirmou. Como visto acima, as
respostas dos formulários não permitiram uma análise conclusiva que confirmasse
ou refutasse o resultado do estudo clássico de Tversky e Kahneman (1973) em seu
estudo sobre a heurística da disponibilidade. Contudo algumas delas conseguiram
gerar questionamentos que poderiam ser interessantes de se investigar em
experimentos futuros.
Por exemplo, certas respostas foram claramente viesadas pelo treinamento
matemático dos respondentes: por possuírem algum conhecimento estatístico, eles
se afastaram das respostas intuitivas em direção a respostas com um visível
raciocínio lógico, i.e., seu conhecimento e expertise influenciaram suas respostas de
maneira significativa e muitas vezes benéfica: muitas delas foram respondidas de
116
maneira correta e mesmo aquelas que não o foram pelo menos tendiam a apontar
um caminho próximo daquele que levaria a uma resposta correta.
Seria isto uma indicação concreta do que talvez já seja senso comum, de que um
mínimo de treinamento (com um custo muitas vezes marginal) tem um grande efeito
sobre a capacidade das pessoas em julgar determinadas situações? Talvez uma
pesquisa futura, onde grupos com e sem treinamento estatístico sejam comparados
ao fazer julgamentos sobre freqüências de eventos, nos ajude a detectar, mensurar
e esclarecer esta diferença, sendo útil também na medição do benefício potencial de
programas de treinamento para a população, intercoetera.
Quanto às perguntas 2 e 3, as quais procuravam verificar diretamente a hipótese da
existência de um viés na estimativa de freqüência e probabilidade da amostra em
direção a aqueles eventos mais noticiados pela mídia, pode-se dizer que ambas
foram bem sucedidas em seu intuito. As respostas para a pergunta 2 confirmaram
para o Brasil os resultados do experimento clássico de Combs e Slovic (1979),
detectando a existência clara de um viés na estimativa de freqüência de causas de
morte em direção a aquelas mais “espetaculares” ou “excepcionais”, que são, devido
a fatores analisados em seções anteriores (especialmente 2.6), exatamente as mais
noticiadas pela mídia.
De certa forma, as respostas para uma das duplas da pergunta também
possibilitaram verificar o que acontece no caso de nenhuma das causas de morte
ser muito noticiada: no caso da dupla “Ataque de Tubarão x Atingido por um Raio”,
onde ambas as causas são bastante raras e pouco noticiadas, pode-se constatar
que não houve viés em direção a nenhuma das duas, obtendo ambas um número
117
estatisticamente semelhante de respostas. Mas o que aconteceria se a amostra
tivesse sido exposta recentemente em relação à data da pesquisa a um exemplo
ou cena marcante deste evento (e.g., um filme sobre tubarões assassinos ou um
documentário sobre pessoas atingidas por um raio)? Teria este fato influenciado
suas respostas em direção a uma ou outra resposta? Estas são questões possíveis,
que podem ser respondidas por pesquisas futuras.
Finalmente, a pergunta 3 também indicou um viés sem exceções das respostas a
respeito da cidade na qual havia maior probabilidade de mortes violentas em direção
a aquelas cidades cujos eventos violentos eram mais noticiados pela mídia,
mostrando assim uma provável influência do grau de exposição à notícia na
percepção das pessoas a respeito dos riscos de se morar em determinadas cidades.
De certa maneira, a terceira pergunta também teve o mérito de ser original no
sentido de que não foi encontrada nenhuma outra pesquisa onde fosse feita esta
comparação direta entre diferentes cidades e medido o efeito das notícias
veiculadas pela mídia na percepção dos indivíduos a respeito de quão violentas elas
seriam.
Restam, contudo, algumas perguntas que podem ser respondidas, como qual o grau
de influência que as notícias possuem sobre a percepção dos indivíduos, versus
diversas outras fontes de informação como família ou localização geográfica (local
de moradia): talvez um estudo comparando notícias e percepções em diferentes
localidades pudesse esclarecer um pouco mais quão forte é a relação “exposição x
percepção”, o que poderia ajudar, entre outras coisas, a mensurar a eficácia e
retorno da publicidade sobre diversos públicos.
118
5.2 O Que Se Leva: Reflexões Sobre a Dinâmica Entre Mídia,
Sociedade, Julgamento e Tomada de Decisão no Mundo
Contemporâneo
Nos capítulos anteriores tivemos a oportunidade de analisar os fatores que levam às
escolhas das notícias que serão divulgadas na mídia e como estas podem viesar a
percepção da realidade que nos cerca, às vezes influenciando de maneira relevante
nossas prioridades e ações, não só como indivíduos, mas também enquanto grupo
sócio-político. Também foi demonstrada empiricamente, através de experimentos, a
existência deste viés na estimativa feita pela amostra estudada sobre a freqüência e
probabilidade de causas de morte no Rio de Janeiro e mortes violentas em diversas
capitais estaduais.
Estes são apenas alguns exemplos de como a cobertura dos meios de comunicação
às vezes altera a percepção de determinado público (seja ele um pequeno grupo de
trabalho, consumidores, ou toda a população de um país) a respeito de fatos do
quotidiano, podendo influenciar de alguma forma suas demandas e as aspirações
que comunicam a suas lideranças e também, conseqüentemente, como definem
quais são os principais desafios a serem vencidos seja na empresa, no país ou na
vida.
Como discutido acima, a mídia é parte importante de um processo de definição de
nossos modelos mentais a respeito do mundo que nos cerca, a ponto de duas
pessoas que se informam através de diferentes fontes poderem acabar com uma
idéia diversa a respeito de um mesmo cenário. Vimos também que a realidade
transmitida através dos meios de comunicação não corresponde totalmente à
119
realidade objetiva que vemos nas estatísticas: devido aos critérios de escolha das
notícias discutidos, podemos contar que, provavelmente, haverá proporcionalmente
muito mais mortes violentas, desastres, roubos etc. no mundo midiático do que no
mundo real.
Mas a influência de jornais, rádios, televisão, Internet, e outras mídias sobre a
percepção de seu público não fica resumida a este viés causado por esta tendência
“natural” à exposição de notícias “dramáticas”: na verdade, para cada fato mostrado,
seja ele sobre política, economia, sociedade ou até mesmo artes ou informática,
existe uma pessoa que escolhe esta notícia, a qual possui seu próprio modelo
mental a respeito do que é ou não importante, e acima dela uma instituição ou grupo
que possui seus próprios interesses e que também influencia na definição do que
deve ou não ser veiculado. Estes modelos mentais de outros nem sempre
corresponderão às prioridades daqueles para os quais as informações são
fornecidas e, ainda que correspondam, não necessariamente é benéfico ficar preso
a apenas uma visão da realidade. Aliás, pode-se dizer, com razoável grau de
certeza, que em um mundo onde tanto pensamentos quanto o capital viajam a
velocidade da luz, ficar preso a apenas uma percepção da realidade é perigoso,
igualmente para negócios como para nações. Boas idéias e soluções para
problemas urgentes estão às vezes onde menos esperamos; é importante saber
“sair da caixa” e procurá-las fora dos lugares comuns.
Não podemos esperar que a mídia mude seu processo de escolha da informação:
ele existe essencialmente porque supre as necessidades de seu público (descritas
na seção 2.6) e garante desta maneira os anunciantes que lhe são necessários para
sua sobrevivência (Herman e Chomsky, 1988). Além do mais, interferir de qualquer
120
maneira com a liberdade de escolha da imprensa a respeito daquilo que vai noticiar,
por mais bem intencionada que seja esta interferência, é essencialmente contrário
aos princípios de qualquer sistema genuinamente democrático, sendo portanto uma
atitude bastante questionável.
Dentro deste quadro, o que podem então fazer os líderes em uma sociedade (sejam
eles os chefes das corporações ou os políticos que nos governam) para garantir que
seus julgamentos e ações sejam os mais balanceados possíveis?
Quanto aos julgamentos, parece que o essencial é que se busque informação das
mais variadas fontes antes de se tomar qualquer decisão. Como foi demonstrado
pelo experimento, confiar em dados provenientes apenas de uma origem ainda
que esta tenha uma aparência diversificada, como é o caso da mídia pode levar a
vieses relevantes quanto à percepção da realidade objetiva. Talvez, se os
participantes da pesquisa tivessem acesso a outras fontes de informação policiais,
médicos, estatísticas etc., assim como interesse em seu uso, seu julgamento a
respeito das freqüências e probabilidades tivesse sido mais acurado.
Um paralelo pode ser facilmente feito em relação às decisões que são tomadas por
indivíduos em suas vidas pessoais e profissionais: diversas vezes estamos de tal
maneira presos a uma mesma forma “customizada” de ver o mundo que procuramos
as soluções para os problemas que surgem sempre nos mesmos lugares e através
dos mesmos caminhos habituais. Entretanto, em um ambiente de rápidas mudanças
como o que nos cerca, uma atitude como esta pode facilmente levar a um viés de
julgamento semelhante a aquele dos participantes do experimento: confiar em
apenas uma fonte de informação, ou em diversas fontes de informação com uma
121
mesma visão ou modelo de mundo, é um caminho quase certo para um
julgamento monocrômico e, provavelmente, viesado.
Mas como podemos minimizar nossos riscos de cair nesta teia mental que nos
prende a uma visão particular, evitando ao máximo que nossos julgamentos sejam
constantemente desviados em direção a uma psicorealidade específica? “Cultivar a
habilidade de ver as coisas diferentemente” (Wind et al., 2004) é essencial para se
alcançar este objetivo, e o caminho para isto é sem dúvida a diversificação de onde
buscamos informação e educação.
Ao crescermos dentro de determinado ambiente, ou mesmo mais tarde, envolvidos
por um habitat corporativo em particular, ficamos “viciados” a procurar idéias,
informações e soluções para nossos problemas sempre nos mesmos lugares (ver
item 2.4.2), acreditando que, se elas não forem encontradas onde estamos
habituados, é porque não existem, ou talvez não sejam confiáveis. Diversificar ao
máximo da onde tiramos nosso conhecimento, quebrando constantemente
paradigmas que nos prendam a determinados pontos de vista e julgamentos, é uma
boa maneira de prevenir desvios como os observados no experimento descrito, ou
diversos outros que poderíamos dar como exemplo que acontecem em decisões de
negócios ou política. A habilidade de ver o mundo sob diferentes pontos de vista,
evitando vieses que possam levar a julgamentos inacurados, é uma vantagem
competitiva importante em um mundo no qual diversidade é uma das principais
características.
Contudo, conseguir chegar a um julgamento ponderado é apenas parte do caminho
que um líder precisa percorrer para alcançar um ponto ótimo: após analisar dados
122
diversificados e visualizar as diferentes alternativas existentes, é preciso ter a
capacidade de esclarecer sua linha de raciocínio para seus superiores, pares e
liderados e, principalmente, a coragem necessária para tomar a melhor decisão
ainda que esta não seja inicialmente popular ou totalmente compreendida e seguir
para a ação. Porque a “habilidade” de diversificar suas fontes de informação e
buscar novos pontos de vista é ainda relativamente nova e pouco difundida, é
possível que aquele que assim o faça encontre resistência à mudança e até mesmo
antipatia por parte dos mais arraigadamente presos a antigos paradigmas. É por isso
que não basta apenas a capacidade de se fazer melhores julgamentos; é necessária
também a coragem para se tomar a melhor decisão, ao invés daquela que será a
mais popular ou mais fácil. Kennedy (1964, apud Nakashima, 1992, p. 113) resume
o dilema coragem vs. acomodação” na esfera da administração publica raciocínio
que bem pode ser estendido também para as esferas privadas e particular dizendo
que:
A nossa vida quotidiana esta se tornando tão saturada, com o tremendo
poder das comunicações que se destinam à massa, que qualquer posição
não ortodoxa ou impopular provoca uma tempestade de protestos (...).
Nossa vida política vai se tornando tão dispendiosa, tão mecanizada e tão
dominada pelos políticos profissionais e pelos agentes de relações públicas
que o idealista que sonha o trato independente dos negócios do Estado é
rudemente despertado pelas necessidades de eleição e realização. (...) Por
isso, nos dias que nos esperam, somente os muito corajosos estarão em
condições de tomar as decisões difíceis e impopulares...
Esta dissertação pretendeu dar uma pequena contribuição para um melhor
entendimento de como julgamos problemas e tomamos decisões e, principalmente,
qual a influência que fatores externos podem ter neste processo e em nossa própria
concepção da realidade que nos cerca. Compreender a dinâmica do processo
decisório e seus diversos vieses como são de fato não garante de maneira nenhuma
como discutido nos parágrafos acima que as possíveis decisões ótimas
123
encontradas serão efetivamente tomadas. Mas já é, de qualquer maneira, um
primeiro passo essencial para que aqueles com vontade e coragem para fazer as
melhores escolhas possam contribuir na realização de melhorias efetivas em todas
as esferas da sociedade.
124
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129
7 Anexos
Anexo A - Vieses na freqüência julgada de morte
Mais superestimadas Mais subestimadas
Todos os acidentes Vacinação de varíola
Acidentes de trânsito Diabetes
Problemas perinatais Câncer de estômago
Tornados Raios
Enchentes Derrame
Botulismo Tuberculose
Todos os cânceres Asma
Incêndios e chamas Enfisema
Picadas venenosas
Homicídio
Fonte: Slovic, Fischhoff e Lichtenstein, 1979
apud Slovic et al. in Kahneman et al., 1982
130
Anexo B Questionário Aplicado
o
Olá, em nome do Instituto COPPEAD de Administração
gostaria de agradecer sua participação nesta pesquisa.
o Esta pesquisa é para verificar a percep
ção das pessoas a
respeito de diversas situações do dia-a-dia;
o
Neste sentido, algumas perguntas serão feitas nas páginas
seguintes. Procure usar sua intuição para responder as
perguntas. Não é necessário o uso de calculadoras;
o As respostas devem ser indivi
duais. Responda todas as
perguntas, mesmo que você não tenha certeza quanto às
respostas. Conforme foi dito acima, o questionário é para
verificar a intuição das pessoas, não seu nível de
conhecimento.
o Preencha por favor os dados abaixo:
n Sexo: M ( ) F ( )
n Idade:
n Curso:
n Universidade:
131
Pergunta 1:
o
Especialistas afirmam que o sol é o pior inimigo da pele. Ele
pode causar irritações, envelhecimento precoce e câncer. Os
danos causados pelo sol são provenientes tanto dos raios
ultravioleta B (UV-B) quanto dos raios ultravioleta A (UV-
A).
O primeiro tipo (UV-B), o qual acredita-
se ser o mais
perigoso, causa queimaduras e câncer de pele. O segundo
tipo (UV-
A) penetra mais profundamente na pele,
danificando as estruturas de colágeno e elastina que
sustentam a pele e a mantém firme.
n
Considerando que a população da cidade do Rio de
Janeiro é de aproximadamente 6 milhões de habitantes,
qual é, na sua opinião, o percentual da população da
cidade que faz uso do filtro solar regularmente?
( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )
Maior
que
40%
37%
a
39%
34%
a
36%
31%
a
33%
28%
a
30%
25%
a
27%
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24%
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21%
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Menos
de 1%
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Maior
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36%
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Menos
de 1%
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Pergunta 1:
o
Especialistas afirmam que o sol é o pior inimigo da pele. Ele
pode causar irritações, envelhecimento precoce e câncer. Os
danos causados pelo sol são provenientes tanto dos raios
ultravioleta B (UV-B) quanto dos raios ultravioleta A (UV-
A).
O primeiro tipo (UV-B), o qual acredita-
se ser o mais
perigoso, causa queimaduras e câncer de pele. O segundo
tipo (UV-
A) penetra mais profundamente na pele,
danificando as estruturas de colágeno e elastina que
sustentam a pele e a mantém firme.
Cada vez mais pessoas procuram se
proteger destes efeitos
danosos com o uso constante do protetor solar. Elas usam o
produto não apenas na praia, que é o uso mais comumente
lembrado, mas sempre que saem à rua, pois pesquisas
indicam que o sol pode causar danos à pele mesmo quando
o tempo e
stá nublado ou estamos com o corpo coberto (a
radiação ultravioleta do sol pode penetrar muitos tipos de
roupa). De fato, depois que pesquisadores descobriram que
o uso contínuo do filtro solar ajudava até a recuperar
parcialmente peles já danificadas pelo
sol, várias pessoas
passaram a usar filtro constantemente mesmo em dias que
não há luz solar intensa (nublados, chuvosos etc.) ou
simplesmente o usam enquanto estão em casa.
n
Considerando que a população da cidade do Rio de
Janeiro é de aproximadamente 6
milhões de habitantes,
qual é, na sua opinião, o percentual da população da
cidade que faz uso do filtro solar regularmente?
( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )( )
Maior
que
40%
37%
a
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Menos
de 1%
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Maior
que
40%
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Menos
de 1%
133
Pergunta 2:
o
Abaixo estão relacionadas algumas causas de morte,
organizadas em duplas. Por favor, dentro de cada dupla
escolha qual causa de morte no Rio de Janeiro
é
responsável pelo maior número de mortes em comparação
ao seu par (marcando um X ao seu lado).
AIDS x Roubo Seguido de Morte
Acidentes de Trânsito x Ataque Cardíaco
Câncer x Homicídios
Câncer de Pulmão x Diabetes
Ataque de Tubarão x Atingido por um Raio
134
Pergunta 3:
o
Abaixo estão relacionadas, organizadas em duplas, dez
capitais de estados br
asileiros. Por favor, dentro de cada
dupla escolha qual a cidade onde os habitantes têm a
maior probabilidade de sofrer uma morte violenta, em
comparação ao seu par (marcando um X ao seu lado).
Considere Mortes Violentas
como aquelas ocorrências que
resultaram vítima fatal:
homicídio, acidentes de
trânsito, roubo seguido de morte, morte suspeita e
resistência seguida de morte.
Aracaju x Brasília
Rio de Janeiro x Vitória
Recife x São Paulo
João Pessoa x Belo Horizonte
Curitiba x Porto Alegre
135
Pergunta 4:
Imagine a seguinte história:
o
“Determinado país passava por grandes dificuldades devido tanto
a instabilidades do cenário externo quanto a uma severa
recessão interna. Mui
to preocupado com a situação que se
apresentava, o presidente da república convocou dez ministros e
determinou que os mesmos formassem sub-
comissões entre eles
para que pudessem discutir e apresentar soluções para os
diversos problemas que assolavam aquela nação.”
n Considerando-
se este grupo de dez ministros e assumindo
que cada sub-
comissão seria formada por dois ministros,
quantas sub-
comissões você estima, mais ou menos,
poderiam ser formadas?
Resposta:
Este é o fim do questionário. Muito obrigado pe
la sua
participação!
136
Pergunta 4:
Imagine a seguinte história:
o
“Determinado país passava por grandes dificuldades devido tanto
a instabilidades
do cenário externo quanto a uma severa
recessão interna. Muito preocupado com a situação que se
apresentava, o presidente da república convocou dez ministros e
determinou que os mesmos formassem sub-
comissões entre eles
para que pudessem discutir e aprese
ntar soluções para os
diversos problemas que assolavam aquela nação.”
n Considerando-
se este grupo de dez ministros e assumindo
que cada sub-
comissão seria formada por oito ministros,
quantas sub-
comissões você estima, mais ou menos,
poderiam ser formadas?
Resposta:
Este é o fim do questionário. Muito obrigado pela sua
participação!
137
Anexo C - População das cidades pesquisadas e PIB dos estados
Capital População Capitais
(2003)
Estado PIB Estadual (MMR$)
(2002)
Aracaju 479.767 Sergipe 9.496
Belo Horizonte 2.305.813 Minas Gerais 125.389
Brasília (Distrito Federal) 2.189.792 Distrito Federal 35.672
Curitiba 1.671.193 Paraná 81.449
João Pessoa 628.837 Paraíba 11.634
Porto Alegre 1.394.087 Rio Grande do Sul 104.451
Recife 1.461.318 Pernambuco 36.510
Rio de Janeiro 5.974.082 Rio de Janeiro 170.114
São Paulo 10.677.017 São Paulo 438.148
Vitória 302.633 Espírito Santo 24.723
Fontes: População das capitais: Secretaria Nacional de Segurança Pública Ministério da Justiça
PIB estadual: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE
Anexo D Termos usados na busca por notícias e número de
notícias encontradas para cada termo
Causas de Morte Termos Usados Nº Notícias
Acidentes de Trânsito morte acidente transito 41
AIDS morte aids 25
Ataque Cardíaco morte ataque cardiaco 7
Ataque de Tubarão morte tubarao 6
Atingido por um Raio morte raio 8
Câncer morte cancer 47
Câncer d e Pulmão morte cancer pulmao 3
Diabetes morte diabetes 9
Homicídios morte homicidio 174
Roubo Seguido de Morte morte roubo 64
Cidades Termos Usados Nº Notícias
Aracaju violencia aracaju 2
Belo Horizonte violencia belo horizonte 57
Brasília violencia brasilia 254
Curitiba violencia curitiba 13
João Pessoa violencia joao pessoa 37
Porto Alegre violencia porto alegre 24
Recife violencia recife 36
Rio de Janeiro violencia rio de janeiro 419
São Paulo violencia sao paulo 455
Vitória violencia vitoria espirito santo 3
Fonte: O Globo Online. Disponível em: <www.oglobo.com.br>
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