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criativo viabilizado através da escrita, não há como se justificar que ela seja concebida de
maneira fragmentada, como se fosse possível compor diretamente em partes cavadas.
Sabemos que os principais compositores do período colonial igualmente trabalhavam com
partituras, pois há partituras sobreviventes que provam o fato, entre outros, de José Joaquim
Emerico Lobo de Mesquita (17??-1805), como no caso de seu Tercio, composto em 1783
(Museu da Música da Arquidiocese de Mariana) ou de José Maurício Nunes Garcia, como
em suas cantatas cênicas compostas em 1808 (Palácio Ducal de Vila Viçosa, Portugal –
Microfilmes na USP de Ribeirão Preto), só para citar já exemplos conhecidos. Portanto, não
há como se justificar a hipótese de que compositores dos tempos coloniais não elaboravam
partituras, pois estas obras acima citadas e outras tantas confeccionadas por seus próprios
compositores a refutam definitivamente. Há até casos de partituras tardias confeccionadas
por copistas, como nos Motetos de Passos de Manuel Dias de Oliveira (Acervos de
Manuscritos Musicais da Biblioteca da ECA-USP).
E, no caso de Manuel José Gomes, pode-se perguntar: por que não sobreviveram as
partituras de sua pena, mas sim tão-somente os manuscritos dispostos em partes cavadas?
Por este motivo não deixa de ser uma questão relevante o fato de que também não há neste
folclórico-popular, manifestação singular de um determinado povo ou comunidade, cuja origem está neste
mesmo povo ou comunidade (daí o hip hop, funk ou o rap, por exemplo, de modo algum podem ser
entendidos neste universo); e a música mediana - que é num sentido polissêmico mediana em relação à mídia
e também em relação ao espírito consumista e subserviente do homem mediano e normal, não crítico nem
reflexivo, o homem ausente. Mediana também porque não chega a se consolidar como arte em sua plenitude,
pois essencialmente é efêmera e corresponde a um produto aprontado, e não a uma obra criada. A música
mediana é fruto da “Indústria Cultural”, estabelecendo e manipulando tecnicamente através de seu agressivo
marketing como disseminador de “Cultura de Massa” (conceitos de Adorno e Horkheimer). Se a música
grafocêntrica contempla a escrita em sua essência, por sua vez, a música folclórico-popular contempla a
tradição da oralidade próprio de um povo e a música mediana os fonogramas descartáveis na economia livre
de mercado do mundo globalizado. Há ainda hoje Universos Paralelos, como a música para cinema e igreja,
ambas com fortes interfaces com os três universos acima citados, mas em especial no contexto da Indústria
Cultural.