ducere, sua etimologia latina: conduzir para fora, fora do que é único, fora do
caminho traçado de antemão, fora do já dito, do já pensado, do já interpretado.
(LARROSA, 2003, p. 628)
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.
A atividade do leitor constitui-se, portanto, na realização de ligações e no
estabelecimento de suas relações, gerando sentidos que variam de acordo com o leitor e com a
natureza da interação, ou seja, a leitura exige do leitor um exercício de preenchimento dos
vazios deixados pelo autor e, no caso do texto narrativo, pelo narrador, que apela para as
reações do leitor para completar aquilo que iniciou, sendo o vazio constantemente ocupado
por projeções (ISER, 1979). Nessa perspectiva,
[...] cada momento da leitura representa uma dialética de protensão e retenção, entre
um futuro horizonte que ainda é vazio, porém passível de ser preenchido, e um
horizonte que foi anteriormente estabelecido e satisfeito, mas que se esvazia
continuamente, desse modo, o ponto de vista em movimento do leitor não cessa de
abrir os dois horizontes interiores do texto, para fundi-los depois (ISER, 1999, p.
17).
Muitas vezes, ainda, o essencial de um texto ou de um discurso está naquilo que ele
não diz, no seu suporte, formato, veículo, material. Jauss (1994) afirma, a esse respeito, que
uma obra apresenta “avisos, sinais visíveis e invisíveis, traços familiares ou indicações implí-
citas” (JAUSS, 1994, p. 28). Nesse sentido, é preciso instrumentalizar o leitor, a fim de ele
perceber aquilo que nem sempre está explícito, o que é processo, ou seja, é “algo que se ela-
bora, cresce, se enriquece, se trabalha com cada encontro” (PETIT, 1999, p. 185)
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.
Cabe destacar, ainda, Bordini e Aguiar (1993), para quem “a socialização do indivíduo
se faz, para além dos contatos pessoais, também através da leitura, quando ele se defronta
com produções significantes provenientes de outros indivíduos, por meio do código comum
da linguagem escrita" (p. 10). Ler é, assim, um ato de comunicação caracterizado pela relação
cooperativa entre o emissor e o receptor (RANGEL, 2005), sendo que a compreensão do texto
não depende apenas da identificação do significante isoladamente, mas do significado
inserido no texto como um todo; o que se compreende, por exemplo, não são as palavras em
sua disposição gráfica, mas o pensamento posto em movimento em campos semânticos pelo
jogo de várias sintaxes.
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Tradução livre da autora: “[...] La fidelidad a las palabras es no dejar que las palabras se solidifiquen y nos
solidifiquen, es mantener abierto el espacio líquido de la metamorfosis. La fidelidad a las palabras es reaprender
continuamente a leer y a escribirnos de um modo fijo, com um patrón estable. Sólo así se puede escapar, aunque
que sea por un momento, a los textos que nos modelan, al peligro de las palabras que, aunque sean verdaderas, se
convierten em falsas una vez que nos contentamos com ellas. [...] Sólo así la educación mantendrá su sentido
original, el que se deriva del ex-ducere de su etimología latina: conducir afuera, afuera de lo que uno es, afuera
del camino trazado de antemano, afuera de lo ya dicho, de lo ya pensado, de lo ya interpretado”. (LARROSA,
2003, p. 628).
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Tradução livre da autora: “algo que se elabora, crece, se enriquece, se trabaja con cada encuentro” (PETIT,
1999, p. 185).