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Renata Araujo Lobo
Comparação entre o contrato psicológico da média gerência e da base operacional:
um estudo de caso em empresa do setor de energia
Dissertação de mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Administração, Instituto Coppead de
Administração, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos necessários
à obtenção do título de Mestre em
Administração.
Orientadora: Ursula Wetzel, D.Sc.
Rio de Janeiro
2007
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FICHA CATALOGRÁFICA
Lobo, Renata Araujo L.
Comparação entre o contrato psicológico da média gerência e
da base operacional: um estudo de caso em empresa do
setor de energia/ Renata Araujo Lobo. Rio de Janeiro,
2007.xi, 251 f.: il.
Dissertação (Mestrado em Administração) Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de
Administração, 2007
Orientadora: Ursula Wetzel
1. Contrato Psicológico. 2. Reestruturações. 3. Administração.
Teses. I. Ursula Wetzel. II. Universidade Federal
do Rio de Janeiro, Instituto COPPEAD de Administração. III.
Título
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FOLHA DE APROVAÇÃO
Renata Araujo Lobo
Comparação entre o contrato psicológico da média gerência e da base operacional:
um estudo de caso em empresa do setor de energia
Rio de Janeiro, de de 2007
_________________________________________________
Ursula Wetzel, D.Sc COPPEAD/UFRJ
_________________________________________________
Adriana Victória Garibaldi de Hilal, D.Sc COPPEAD/UFRJ
__________________________________________________
Sandra Regina da Rocha Pinto, D.Sc. PUC - Rio
RESUMO
Lobo, Renata Araujo. Comparação entre o contrato psicológico da média gerência e
da base operacional: um estudo de caso em empresa do setor de energia.
Dissertação (Mestrado em Administração) Instituto COPPEAD de Administração,
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro,
2007.
O presente estudo tem como objetivo a comparação do contrato psicológico de dois
níveis hierárquicos de uma organização a base operacional e a média gerência
numa empresa em reestruturação. O estudo de caso realizado pretendeu fornecer
dados sobre como se compõem estes contratos e como eles são entendidos pelos
funcionários da empresa estudada. Estes dados foram coletados por meio das 39
entrevistas realizadas e posteriormente analisadas com o uso do software Atlas Ti.
Este estudo não teve intenções de produzir generalizações acerca dos assuntos
estudados, dada a complexidade do tema, mas de levantar questões que devem ser
consideradas ao serem estudados os contratos psicológicos. Os resultados
indicaram que os contratos psicológicos podem variar de um nível para outro e que a
média gerência pode influenciar diretamente a percepção da base operacional, por
funcionar como um filtro de informações. Além disso, na empresa estudada, o
contrato da média gerência parece ser bastante homogêneo enquanto que o
contrato da base operacional é mais variado, de acordo com a idade, o tempo de
trabalho na empresa, características pessoais e da trajetória do funcionário.
ABSTRACT
Lobo, Renata Araujo. Comparação entre o contrato psicológico da média gerência e
da base operacional: um estudo de caso em empresa do setor de energia.
Dissertação (Mestrado em Administração) Instituto COPPEAD de Administração,
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro,
This study aims at the comparison of the psychological contract between two
hierarchical levels in a organization the blue collars and the white collars at a
company in the middle of its restructuring process. The case study intends to provide
data about how these contracts are composed and how they are understood by the
employees in this particular company. The data was collected in 39 interviews that
were subsequently analyzed using the software Atlas Ti. The research didn’t intend
to produce general knowledge, specially considering the complexity of the theme, but
to raise issues that should be considered when studying the psychological contract.
The results show that the psychological contract can vary between two hierarchical
levels, that white collars can influence directly the perception of the blue collars, as
they represent a filter for the information. Besides that, in the studied company, the
white collars’ contract seems to be very homogeneous while the blue collars’ contract
can vary according to the age, the seniority, personal attributes and the professional
path of the employee.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho é dedicado à minha avó e ao meu avô (in memoriam), que
sempre acreditaram em mim, e me apoiaram incondicionalmente nas minhas
decisões.
À minha mãe, por ser quem eu sempre quis ser quando crescesse.
Ao meu pai, pelo amor distante, mas sempre intenso.
Ao Leonardo, que não lembra, mas é um dos grandes responsáveis pelo meu
ingresso no Coppead. Obrigado por fazer parte das nossas vidas.
À Tia Sonia, amiga, analista e revisora de plantão.
À Tia Lili, que me ajudou a alcançar equilíbrio para concluir esse trabalho.
Aos Tios Gerson e Moris, pelo apoio moral e relaxantes churrascos de família.
À minha orientadora, Ursula Wetzel, pelo carinho e apoio nas horas difíceis.
Não só na construção desta dissertação, mas também da nova fase que agora se
inicia.
Ao Carlos Gustavo e ao Marco Bruno, por serem meus interlocutores durante a
produção deste trabalho, e também por ouvirem meus choros, pelas tardes no
cinema e por tornarem o caminho mais prazeroso.
Às amigas que compreenderam as minhas ausências e agüentaram minhas
crises ao longo destes dois anos, Beta, Inêz, Alê e Inês. Aos amigos da Guarda
Municipal do Rio, em especial João e Carlos.
À Dinia, a hermanita que eu ganhei de presente do Coppead.
Aos amigos do Coppead e de MudBug. Sem o companheirismo deles, o
mestrado seria tarefa impossível: Carol, Bruno, Gui, Chris, Anica, Dado, Candy,
Wilson, Álvaro, Rômulo, Adriano, Camilo e, principalmente, ao Paulo, que além de
ser um companheirão, ainda me ajudou a desvendar os mistérios da Gerência
Financeira!
Às meninas da secretaria e da biblioteca. Como nós sobreviveríamos sem
elas?
Ao CNPq, pelo apoio financeiro à pesquisa, ficando logo atrás da Fundação
Fernandes Araujo neste quesito.
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 1 - Criação do contrato psicológico individual.......................................................46
Figura 2 - Criação do contrato normativo...........................................................................50
Figura 3 - Camadas da cultura e contratos normativos...................................................51
Figura 4 - Modelo de violação do contrato.........................................................................73
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1 Tipos de contrato ..............................................................................................35
Quadro 2 Tipos de contratos psicológicos segundo duração e especificidade........60
Quadro 3 As cinco dimensões de Janssens et al (2003).............................................95
SUMÁRIO
O problema_______________________________________________________10
Introdução _____________________________________________________________ 10
Objetivo_______________________________________________________________ 12
Delimitação do estudo___________________________________________________ 14
Relevância_____________________________________________________________ 15
Definição dos termos_______________________________________________17
Contrato Psicológico ____________________________________________________ 17
Revisão Bibliográfica_______________________________________________19
A organização __________________________________________________________ 20
Reestruturação Organizacional ___________________________________________ 22
Contrato Psicológico ____________________________________________________ 31
Os Contratos ____________________________________________________________________31
Tipos de Contratos Psicológicos ____________________________________________________34
Criação dos contratos Psicológicos__________________________________________________39
Os contratantes (contract makers) __________________________________________________52
Conteúdos e tipologias do contrato psicológico________________________________________57
Violação do contrato psicológico ____________________________________________________70
Mudando o contrato ______________________________________________________________80
Metodologia ______________________________________________________86
Tipo de pesquisa e seleção do método_____________________________________ 86
Seleção do caso ou unidade a ser pesquisada ______________________________ 89
Seleção dos sujeitos ____________________________________________________ 90
Coleta de dados ________________________________________________________ 91
Tratamento dos dados___________________________________________________ 92
Limitações do método ___________________________________________________ 93
O contrato psicológico da Média gerência _____________________________95
As promessas gerais da empresa _________________________________________ 96
Envolvimento de longo prazo_______________________________________________________97
Clareza dos termos do acordo_____________________________________________________101
Tratamento pessoal _____________________________________________________________104
Cuidado _______________________________________________________________________108
Tratamento equânime____________________________________________________________109
Os compromissos gerais dos funcionários ________________________________ 115
Lealdade ______________________________________________________________________116
Atitude aberta __________________________________________________________________124
Investimento pessoal ____________________________________________________________125
Flexibilidade____________________________________________________________________138
Respeito pela autoridade _________________________________________________________143
O contrato psicológico da base operacional___________________________147
As promessas gerais da empresa ________________________________________ 147
Tratamento pessoal _____________________________________________________________148
Envolvimento de longo prazo______________________________________________________160
Clareza dos termos do acordo_____________________________________________________167
Tratamento equânime____________________________________________________________170
Cuidado _______________________________________________________________________176
Os compromissos gerais dos funcionários ________________________________ 179
Investimento pessoal ____________________________________________________________181
Flexibilidade____________________________________________________________________194
Lealdade ______________________________________________________________________201
Atitude aberta __________________________________________________________________205
Respeito pela autoridade _________________________________________________________206
Contratos Psicológicos: média gerência versus base operacional_________209
Compromissos da empresa _______________________________________________________210
Compromissos do funcionário _____________________________________________________219
CONCLUSÕES ___________________________________________________231
Referências Bibliográficas _________________________________________240
Anexos _________________________________________________________244
10
O problema
Introdução
O mundo contemporâneo e a globalização das empresas apontam cada vez
mais para a necessidade da busca pelo aumento constante da eficácia operacional.
As tendências mundiais de descentralização, flexibilização e reestruturação dos
negócios têm se refletido muito fortemente nas empresas brasileiras, em especial
nas estatais, que vêm sendo privatizadas ao longo das últimas décadas, seguindo o
Plano Nacional de Desestatização implementado a partir de 1981. Isto se mostra
mais nitidamente em setores como os de telecomunicações e distribuição de energia
elétrica, que eram, até então monopólio do Estado.
Do ponto de vista fiscal, econômico e estratégico, a privatização de empresas
representava uma oportunidade única para entrada de grandes grupos
internacionais num mercado em ascensão e com pouquíssima concorrência. Para as
empresas que iriam competir no mercado aberto, restava alcançar uma eficiência
operacional que a tornasse competitiva e preparada para esta abertura. Uma das
formas mais utilizadas para atingir a tão desejada eficiência operacional é a
reestruturação de empresas que se desfazem de boa parte de seus quadros
funcionais em uma tentativa de diminuir seus custos. No entanto, estas medidas
podem provocar efeitos colaterais nas relações de trabalho estabelecidas entre as
empresas e seus funcionários e na forma como seus empregos são percebidos.
Estes efeitos não só poderiam como, efetivamente, colocaram em risco a
perpetuação de muitas empresas por se tratarem de questões relativas aos
contratos de trabalho de seus funcionários.
11
Um contrato de trabalho é um acordo firmado entre um funcionário e seu
empregador. O contrato de trabalho legal procura especificar o que é esperado de
cada uma das partes envolvidas neste contrato. Contudo, o limite da racionalidade
humana impossibilita a identificação e o mapeamento de todos os aspectos de um
contrato, especialmente porque nem todos estes aspectos aparecem sob a forma de
linguagem verbal, mas boa parte das expectativas dos empregados e empregadores
permanece em nível subjetivo (ou subliminar), sob a forma de um contrato
psicológico (Rousseau, 1995).
Em diversas empresas, o contrato psicológico de trabalho tem se modificado,
muitas vezes pegando os funcionários de surpresa, quebrando o acordo original e
submetendo-os a um contrato não negociado anteriormente. Essa incapacidade de
cumprir um acordo caracteriza uma violação que pode provocar diferentes reações,
tanto por parte de funcionários quanto das empresas.
Desta forma, a redução de custos amplamente clamada como a solução para
os problemas das empresas pode custar caro para aquelas que negligenciam seus
contratos psicológicos, não estabelecendo um planejamento prévio e uma estratégia
adequada tanto para os funcionários que deixam as empresas durante as
reestruturações, quanto para aqueles que permanecem.
Uma outra questão é a tendência observada por diversos autores da
possibilidade do estabelecimento, nos postos de trabalho, de diferentes vínculos
substituindo o contrato por tempo indeterminado (Cappelli, 1999; Harvey 1992 e De
Masi, 1999). Isto faz com que diferentes formas de negociação coexistam numa
mesma empresa, em especial aquelas que estão passando por períodos de
adaptação a mudanças muito drásticas no seu ambiente de negócios. A introdução
de novos funcionários trazidos sob diferentes circunstâncias faz com que estes
12
estejam mais próximos das novas estratégias da empresa já que estes são
contratados sob o novo contrato e os mais antigos muitas vezes apenas consideram
como contrato vigente aquele sob o qual elas foram contratadas (Rousseau, 1995).
A análise destes fatores na estratégia da empresa pode, portanto, definir o
sucesso ou fracasso de uma empresa na realização de mudanças percebidas como
necessárias para que ela encontre novos caminhos de desenvolvimento.
Objetivo
Alguns desafios se apresentam na reestruturação de empresas, tais como a
manutenção dos contratos psicológicos dos indivíduos que vivenciam mudanças
organizacionais radicais de forma a não comprometer a produtividade da empresa.
Cappelli (1999) aponta para as conseqüências da quebra do contrato de longo-
prazo, em especial a colapso na moral dos funcionários e seu impacto na
performance da empresa.
Estudar como estes contratos se estabelecem e se modificam ao longo da vida
das organizações e das trajetórias próprias de cada indivíduo se faz necessário não
só pela globalização mas também pelo aumento da complexidade dos mercados.
Estes fatores demandam que as empresas sejam cada vez mais flexíveis e que se
adaptem mais rapidamente às mudanças impostas pelo novo ambiente de negócios.
A maneira como as pessoas experimentam as alterações dos contratos estão,
em grande parte, subordinados à interpretação das circunstâncias que cercam estes
contratos e aos quadros de referência de cada indivíduo.
O caso estudado representa a experiência de uma empresa privatizada que
vem buscando continuamente aumentar sua produtividade e sua eficiência. A
13
reestruturação conseguinte à privatização da empresa não obteve resultados
expressivos na efetivação de práticas que atingissem a estes objetivos, visto que
não atingiu a estabilidade gerencial e estratégica. Um indício disto é que em seis
anos, seis diferentes presidentes ocuparam o cargo, todavia, sem resultados
satisfatórios para o grupo controlador da companhia.
Mostrou-se necessário realizar uma nova reestruturação que ajudasse a
administrar os processos de mudança da organização, implementada a partir do ano
de 2004 com a entrada de um novo presidente e a introdução de uma nova
configuração de empresa. Além das mudanças estruturais no organograma da
empresa, foram realizadas profundas transformações que visavam criar um novo
conceito para a empresa, incluindo um plano de gestão da imagem corporativa que
preconizava a mudança do nome e da marca da mesma.
De acordo com a espiral da performance exposta na apresentação do projeto
de reestruturação, propósitos comuns agregados a valores e a ações negociadas
levariam ao comprometimento necessário para a realização das mudanças
reconhecidas como indispensáveis pela nova gestão estratégica da empresa. Uma
das formas de atingir aos aspectos básicos da espiral da performance é a
contratação de novos funcionários. Ainda assim, é necessário rever os contratos
psicológicos dos remanescentes da reestruturação, em especial por conta dos traços
herdados pelas gestões estatais anteriores.
A percepção destes funcionários de que as reestruturações podem enxugar
níveis hierárquicos suprimidos pelo aumento da eficiência da comunicação interna
aliado ao reconhecimento de que as tendências globais de desburocratização,
flexibilização e descentralização colocam diretamente em risco seu emprego são
fatores que podem gerar desde falta de motivação para o trabalho até problemas
14
com a moral dos funcionários e a confiança necessária para sustentar um contrato
psicológico.
O papel da média gerência se mostra fundamental na efetivação e no sucesso
das práticas adotadas com o objetivo de promover uma transformação na cultura da
empresa e, conseqüentemente, nos contratos psicológicos de seus funcionários.
Boa parte da comunicação dos objetivos da empresa ocorre pela média gerência. No
entanto, este nível hierárquico é também afetado pela reestruturação e sua
compreensão acerca das mudanças no seu contrato psicológico podem resultar em
diferentes possibilidades para a base operacional. Assim, a principal questão deste
estudo tratará de comparar como a média gerência e os funcionários da base
operacional entendem as dimensões de seu contrato psicológico.
Delimitação do estudo
Reconhecendo a importância de enxergar a dinâmica de uma empresa a partir
de um paradigma de complexidade e que este mesmo paradigma impõe a
impossibilidade de se chegar a um conhecimento completo, este estudo não buscará
isolar os componentes dos fenômenos estudados. Um estudo sistemático de todas
as variáveis que influenciam nos contratos psicológicos dos funcionários de uma
empresa se tornaria um trabalho inexeqüível.
Assim, será necessário delimitar este estudo, de forma que não serão
analisadas diretamente a cultura da organização e a cultura do país. Estes aspectos
poderão aparecer indiretamente em entrevistas, mas não serão objetos de pesquisa
sistemática. Não serão analisados também o mercado de trabalho e as condições
econômicas em que o país se apresenta, fatores que podem influenciar diretamente
15
a percepção dos contratos psicológicos, tanto por parte dos entrevistadores, como,
principalmente, por parte dos entrevistados. O período específico de análise deste
estudo compreende o período posterior à reestruturação proposta pelo plano
iniciado na empresa estudada no ano de 2004.
Relevância
O crescente aumento não só de empresas que passam por reestruturações,
mas também da periodicidade pela qual estas empresas precisam passar por tais
processos podem comprometer a continuidade saudável das mesmas.
Associar os contratos psicológicos à estratégia da empresa se torna
fundamental para que se possa garantir que as constantes mudanças no ambiente
externo e interno da empresa não produzirão a degradação da força de trabalho.
Segundo Herriot et al. (1997), o conceito de contrato psicológico tem se tornado
proeminente nos discursos de gestão de recursos humanos em função das possíveis
explicações que ele fornece para as dificuldades observadas nas relações de
trabalho que são vividas pelas organizações.
Compreender como as renegociações de contratos psicológicos podem ocorrer
de forma menos traumática tanto para a empresa quanto para os funcionários pode
ajudar a diminuir o impacto das reestruturações e, ainda, gerar economias na
seleção e treinamento de novos funcionários.
Este novo ambiente de negócios é, portanto, mediador das expectativas dos
trabalhadores acerca de seu trabalho, suas necessidades e obrigações. Faz-se
essencial um estudo que atente para os fatores organizacionais que contribuem para
16
o bom desempenho do funcionário, de modo que estes processos radicais de
mudança sejam mais habilmente gerenciados (Kickul et al., 2002).
Cabe ainda ressaltar que muito pouco tem sido estudado no contexto brasileiro
acerca das renegociações de contratos psicológicos e das relações que se
estabelecem entre base operacional e a média gerência, que servem como colchão
que amortece o impacto das demandas da alta gerência e da base.
17
Definição dos termos
Contrato Psicológico
O termo foi utilizado pela primeira vez por dois psicólogos que trabalhavam em
diferentes áreas de conhecimento. Segundo Conyaw e Briner (2005), Argyris
Menninger realizavam pesquisas onde o tema era secundário e o utilizavam para
explicar diferentes fenômenos. Segundo os autores, o termo foi posteriormente
usado e redefinido para explicar ainda outros tipos de fenômenos.
No entanto, como para alguns conceitos em psicologia organizacional, ainda
não existe uma definição consensual amplamente difundida entre os pesquisadores
do assunto.
Conyaw e Briner (2005) ressaltam que apesar de existirem muitas similaridades
entre os conceitos, alguns aspectos ainda são alvo de discussão. Assim, de acordo
com as primeiras definições acerca do que constitui os contratos psicológicos, estes
são as expectativas daquilo que os empregados esperam receber do seu
empregador. Para Kotter (1973), o contrato psicológico entre o indivíduo e a
organização é implícito e especifica o que cada um espera dar e receber na relação.
Para Schein, o contrato implica ainda a existência de “um conjunto de expectativas
operando todo o tempo entre cada membro de uma organização e vários gerentes e
outros naquela organização” (1980, p.22).
Definições recentes estão mais ligadas ao aspecto promissor do contrato. Isso
se deve ao fato de que promessas envolvem expectativas enquanto o inverso não
necessariamente é verdade. Expectativas podem se basear apenas em crenças
18
probabilísticas sobre como eventos futuros podem se dar (CONYAW E BRINER,
2005).
Outro aspecto presente nas definições de contrato psicológico são as
obrigações, como descritos em Herriot e Pemberton (1997), que o definem como a
percepção que as partes da relação de trabalho, organização e indivíduo, têm das
obrigações implícitas nesta relação. Morrison e Robinson (1997) acrescentam ainda
a importância destas obrigações serem baseadas em promessas percebidas. Assim,
é necessário que estas obrigações sejam acompanhadas pela transmissão de uma
promessa. Se a percepção das obrigações nasce de outra fonte fora do contexto da
relação de trabalho na qual empregado e empregador se encontram, ela não faz
parte do contrato psicológico, pois perde sua característica de acordo entre as
partes.
A definição adotada neste estudo é a de Rousseau (1995) por sua importância
ao ser a primeira a considerar a necessidade do aspecto promissor no contrato e
sua relativa divulgação nos trabalhos acadêmicos pesquisados. Segundo Rousseau
(1995), o contrato psicológico são as crenças individuais moldadas pela organização
com relação aos termos de um acordo mútuo entre funcionários e empresas. Este
acordo tem como características a voluntariedade e o poder de profecia auto-
realizável.
19
Revisão Bibliográfica
A primeira parte desta revisão de literatura buscou definir a organização,
espaço no qual acontecem as reestruturações e se estabelecem os contratos
psicológicos. Isto foi realizado com base em obras fundamentais da teoria das
organizações.
A segunda parte buscou explicitar o que são as reestruturações
organizacionais, como e porque elas acontecem. Além da apresentação da literatura
normativa, é possível encontrar uma crítica a estes processos e ao modo como eles
vêm acontecendo nos últimos 20 anos.
Na terceira parte, buscou-se estabelecer o referencial teórico para apoiar o
trabalho de campo realizado no que se refere aos contratos psicológicos
engendrados nas empresas.
20
A organização
Do ponto de vista comportamental, a firma é um sistema de atividades
conscientemente coordenadas de forças de duas ou mais pessoas. A sobrevivência
da empresa depende da manutenção do equilíbrio do sistema interno e da situação
externa total. Internamente, é preciso que as pessoas estejam dispostas a cooperar
com um propósito que seja percebido como o propósito da organização. Este deve
ser conhecido pelos funcionários. A eficiência da organização é medida por sua
capacidade de manter o equilíbrio do sistema. Faz-se necessário descobrir quais os
incentivos corretos para que os empregados desejem colaborar, e, apesar de o
senso-comum apontar para incentivos econômicos, em geral isto não procede
(BARNARD, 1938).
Cyert e March (1963) vêem a firma como uma coalizão de indivíduos, muitas
vezes organizados em sub-coalizões. Dois problemas se colocam a priori na análise
dos fins destas coalizões: o primeiro é que, coletivamente, as pessoas não têm
objetivos comuns e o segundo é a necessidade de algo análogo aos objetivos
individuais no nível organizacional. Pode-se resolver este conflito estabelecendo os
objetivos gerais com base nos objetivos do empregador e adquirir a conformidade
com estes objetivos por meio de salários, premiações que informem ao staff os
objetivos da gerência ou identificando um objetivo comum em consenso. Neste caso,
os autores recomendam levar-se em conta a discrepância das coalizões e, além
disso, os membros das coalizões são diferentes uns dos outros, inclusive no poder
que têm de influenciar as decisões. Assim, apesar de reduzir substancialmente a
complexidade e o tamanho do grupo responsável pela determinação de objetivos,
ainda assim, existe um grupo que deve chegar ao consenso por meio de barganha.
21
Por conta da forma como se dá a barganha, os objetivos estabelecidos podem não
ser perfeitamente racionais, mas aspiracionais. E, ainda, quanto maior a empresa,
maior a possibilidade de garantir side payments, ou seja, pagamentos que não
necessariamente são monetários.
Em estudo que trata a natureza das organizações, March e Simon (1958)
oferecem um dos primeiros conceitos de contrato psicológico, em seus estágios
mais rudimentares. Assim, aos participantes em uma organização, que são
chamados empregados, são oferecidos diversos incentivos materiais e não
materiais. Estes incentivos, geralmente, não estão diretamente relacionado ao
alcance dos objetivos da organização e à retribuição por seus comportamentos
durante o período de seus empregos. Ao associar-se à organização, estes
empregados aceitam as relações de autoridade, como por exemplo, o fato de que
dentro dos limites definidos tanto implícita como explicitamente pelo contrato, eles
aceitarão como premissa de seu comportamento ordens e instruções providas pela
organização (MARCH E SIMON, 1958)
Neste contexto, entender como os contratos psicológicos se formam e seus
efeitos nos resultados de curto e longo prazo da empresa pode ser útil para garantir
a eficiência da mesma.
22
Reestruturação Organizacional
O mundo do trabalho vem passando por transformações em sua configuração
que são evidenciadas no dia a dia das empresas, entre outras coisas, na diminuição
de hierarquias administrativas e na terceirização de atividades que não representem
o core business da empresa (KANTER, 1997).
Para Handy (1996), estas mudanças não estão ocorrendo por conseqüência da
recessão, mas como uma tendência das organizações em adaptarem-se ao
ambiente de competição global. Esta tendência leva as empresas a diminuírem cada
vez mais seus custos e, muitas vezes, no caso do custo com pessoal, isto implica na
substituição de funcionários permanentes por terceirizados que dêem conta do
trabalho contingente enquanto a empresa mantém apenas um pequeno núcleo de
funcionários, especificamente ligados ao seu core business (HARVEY, 1992).
Segundo Cappelli (1999), quatro fatores podem ter desgastado os benefícios
das relações de longo prazo nas empresas em favor de uma empresa mais enxuta e
flexível. Primeiro, o aumento da competitividade nos mercados criou pressão para a
redução dos custos e do tempo para negociar e atender a nichos de mercado
diferenciados, tornando os investimentos fixos de longo-prazo inviáveis em função
do seu alto potencial de obsolescência. O segundo fator está relacionado à
tecnologia de informação que substituiu a média gerência em funções de
coordenação e controle permitindo a diminuição da utilização de membros do staff
na tarefa de gestão. Como conseqüência, foi possível que um grande número de
funções fosse terceirizada, muitas vezes deixando os empregados que
permaneceram na empresa central sob a constante ameaça de terceirização. Em
terceiro, novos arranjos possibilitaram que os interesses de aumento do valor para
23
os acionistas fossem considerados mais importantes do que os dos outros
stakeholders, comprimindo os custos, em especial os fixos. Por último, a
transferência da lógica do mercado para o trabalho dentro da empresa. Com isso
elas estão mais sujeitas às flutuações de oferta e demanda de empregos que
ocorrem exteriormente à empresa.
Wetzel (2000) aponta para o aspecto permanente dos programas de
reestruturação. As análises da profundidade e da extensão com que estes vêm
sendo aplicados na empresas indicam um fenômeno que não vem cedendo nos
primeiros anos do último século. Especialmente porque as motivações que levam às
reestruturações estão cada vez mais fortes em um mundo cada vez mais
globalizado.
As reestruturações são processos que mudam a forma das empresas visando
torná-las mais facilmente adaptáveis às transformações no mundo dos negócios e às
suas próprias estratégias. Estas mudanças podem ser defensivas em função de
mudanças no ambiente da empresa, mas a maioria envolve um esforço que a leve a
criar mais valor gastando menos, diminuindo os excessos e buscando sinergias
entre as partes da empresa (KANTER, 1997)
Pfeffer e Salancik (1978) partem do pressuposto de que as organizações estão
intrinsecamente ligadas às condições de seus ambientes. Para a sobrevivência das
organizações, é necessário que elas possam mudar suas atividades em resposta
aos fatores ambientais, conforme novas empresas surgem, e os recursos se tornam
mais abundantes ou mais escassos.
Para Cappelli (1999), as reestruturações se tornaram um meio de comprimir
custos e empregos para fora das organizações, maximizando o valor para os
acionistas. Assim, a reestruturação se tornou um esforço sistemático para
24
redesenhar trabalhos específicos nas organizações, em especial aquelas funções
tipicamente desenvolvidas por white collars.
Este movimento se dá, em parte, para que os empregadores possam contar
com uma força de trabalho mais flexível, facilmente adaptável aos sistemas de
produção demandados pelas novas circunstâncias econômicas, e a melhor forma de
se garantir isso é por meio de uma força de trabalho periférica. Assim, a instabilidade
que se impunha à força de trabalho permanente vai sendo, aos poucos, direcionada
para o quadro de funcionários flexíveis, representados pela força de trabalho
temporária (CAPPELLI, 1999).
Biasca (1995) indica algumas formas de reestruturação organizacional que
tomaram força especialmente a partir dos anos 80, quando as empresas buscavam
aumentar sua competitividade em termos de custos. Alguns motivos apontados para
isto são as crises do petróleo de 1973 e 1979; o super-dólar e a dívida externa no
período de 1981 a 1985; a recessão, a inflação e a concentração de empresas no
período de 1986 a 1989. Estes eventos causaram resultados desfavoráveis em
muitas empresas, muitas vezes levando-as à falência. As empresas que
sobreviveram tiveram que se adaptar a um novo ambiente de mercado, turbulento e
imprevisível, reestruturando suas organizações e sua forma de fazer negócios.
A substituição da força de trabalho permanente pela força de trabalho
temporária acontece, em geral, durante as grandes reestruturações das empresas.
Na teoria administrativa, estas reestruturações aparecem na literatura que trata das
mudanças organizacionais sob diversas formas e nomes, tais como terceirizações,
downsizing, outsourcing, reengenharia de processos, entre outros. Nestes casos, o
objetivo é promover as mudanças percebidas pela empresa como necessárias para
que esta sobreviva. Caracterizam-se, portanto, por mudanças deliberadas que
25
buscam fazer mais gastando menos. No entanto, Kanter, Stein e Jick (1992)
apontam para a possibilidade de que as mudanças não sejam tão facilmente
atingidas pelos gerentes mais otimistas. Em primeiro lugar, porque é difícil fazer com
que as mudanças tenham a aderência necessária para promover uma sobrevivência
saudável para a empresa. Em segundo lugar, porque que existem limites para as
ações gerenciais na promoção de mudanças. Estes limites podem ser impostos
pelas próprias forças do ambiente, que acabam afundando qualquer tentativa de
controle gerencial. Além disso, a crescente influência dos diversos stakeholders
interessados na organização faz com que a capacidade e autonomia do gerente
fiquem reduzidas. Quanto maior e mais estrutural for a mudança, maior o
envolvimento necessário e o esforço coletivo empregado para sua
operacionalização.
Kurt Lewin (Apud KANTER, STEIN e JICK, 1992) apresenta um modelo de
mudança organizacional simples que envolve três estágios: descongelar, mudar e
recongelar. No entanto, esta visão é extremamente simplista e não dá conta dos
aspectos fluidos da personalidade das entidades organizacionais. Assim, é mais
apropriado observar o movimento organizacional como onipresente e multidirecional.
Para Lewin, a mudança deliberada é uma questão de decidir-se por algum aspecto
do movimento e orientá-lo para uma direção em particular.
O aspecto sistêmico também deve ser levado em conta, e é outro motivo que
pode dificultar a implementação de mudanças. A realização de mudanças contínuas
por esforços individuais ignora que a empresa é um sistema e que mudar um
componente ou um subsistema pode levar à falência de outro. Ainda, quanto maior a
necessidade de mudança, mais difícil se torna realizar a mudança, já que situações
26
adversas dificultam a realização de idéias inovadoras (KANTER, STEIN e JICK,
1992).
Por último, algumas das melhores práticas em uma empresa podem mostrar
limitações em outras e líderes que executam mudanças em algumas áreas podem
demonstrar falhas que o tornam pouco efetivo em outras. Assim, o foco da
preocupação de gerentes sai da necessidade de se realizar a mudança e passa a
ser como realizá-la da melhor forma possível. (KANTER, STEIN e JICK;1992)
A reestruturação organizacional pode ser dar de diferentes formas. O
downsizing redução dos quadros da empresa é uma forma de mudança
organizacional, ora apontada como um processo que pode gerar perda de valor
(TOMASKO, 1992), ora definida como uma eliminação planejada de posições ou
tarefas (KETS DE VRIES e BALAZS, 1997).
A recolocação é uma medida que visa diminuir os impactos dos downsizings e
das reestruturações, já que estas significam basicamente demissões e mudança de
papel na gerência. Elas incluem incentivos para a antecipação de aposentadoria,
recolocação, retreinamento, trabalho parcial e reduções de salário (BIASCA, 1995).
O turnaround representa uma tentativa de reverter o desempenho declinante de
uma empresa para uma situação de recuperação de êxito (SCHMITT, 1990 apud
BIASCA,1995). Biasca apresenta dois grandes conjuntos de estratégias para
enfrentar estas situações: a) turnaround estratégico, realizado por um sério
replanejamento da estratégia da empresa b) turnaround operacional, com
possibilidades de atuação no aumento da receita, na redução dos custos, na
redução dos ativos e na combinação das variantes citadas.
O rightsizing visa adequar o tamanho da empresa às atividades desenvolvidas
por ela. Foi concebido como um meio de rever os erros cometidos em função da
27
limitação do conceito de downsizing, já que este acabou representando apenas uma
redução no tamanho da empresa (KANTER, 1997).
Similar ao rightsizing, o resizing influencia proativamente não só o tamanho,
mas a forma da empresa em relação ao desenvolvimento de seus nichos de
mercado e seus objetivos de longo-prazo. Assim, ela pode expandir áreas da firma
para atingir novas partes do nicho, pode diminuí-las de acordo com o abandono
consciente de outras partes bem como manter algumas áreas intactas para atender
partes do nicho que não se modificaram.
Essas reestruturações podem apresentar um resultado financeiro de curto
prazo bastante favorável, além de possibilitar reais ganhos organizacionais com a
diminuição da burocracia, aumento da velocidade do processo decisório e
comunicação mais fluida entre as áreas da empresa.
Uma reestruturação mal-formulada pode minar o valor preexistente nas práticas
originais e fazer com que a empresa não aumente seu valor após sua realização.
Haspenlagh e Jemison (1991), por exemplo, analisam as reestruturações
provenientes de fusões sob o ponto de vista da criação de valor para a empresa. A
percepção de criação de valor deve passar não só pelos acionistas da empresa, mas
por outros grupos constituintes. Assim, os gerentes precisam combinar resultados de
curto prazo com estratégias de longo prazo. O propósito da reestruturação influencia
na forma como o processo de integração acontece e ainda mais, a maneira como é
implementado faz diferença nos resultados (Haspenlagh e Jemison, 1991).
Biasca (1995) ressalta que reestruturar não significa reduzir o percentual de
funcionários sem um objetivo. Para que a reestruturação tenha sucesso, é preciso
avaliar com cuidado o que já existe na estrutura da empresa, sua funcionalidade e
repensar os campos que precisam ser cobertos pelas reestruturação, redesenhando
28
seus processos fundamentais em razão de um impacto favorável em sua vantagem
competitiva e repensando o modo como seus negócios devem ser feitos
(TOMASKO, 1992).
No entanto, em função destas reestruturações, ocorre o crescimento do que
Harvey (1992) chama de desemprego estrutural (em oposição a “friccional”),
complementado pela rápida destruição e reconstrução de habilidades, ganhos
modestos de salários reais e retrocesso do poder sindical.
Além disso, alguns efeitos colaterais atribuídos à reestruturação podem colocar
a perder a sustentabilidade do processo na empresa. Kanter (1997) aponta a
descontinuidade, a desordem e a confusão como subprodutos da reestruturação que
podem desviar o foco da atenção do processo de mudança organizacional para as
decisões mais urgentes. O gerenciamento inadequado da reestruturação pode gerar
depressão e letargia em função das incertezas enfrentadas pelos funcionários.
Kets de Vries e Balazs (1997) apontam a abordagem simplista como uma das
razões de muitos fracassos na implementação de downsizings. Sem que se repense
a forma como a empresa realiza seus negócios, a reestruturação acaba se
resumindo a mudanças superficiais que produzem resultados de curto prazo que não
garantem o aumento da produtividade no longo prazo. Muitas vezes, produzem,
inclusive, resultado oposto, já que os grandes destaques da empresa são os
primeiros a “abandonar o barco” em uma situação de risco eminente. Kanter (1997)
fala da possibilidade da ocorrência de uma crise de comprometimento e uma
necessidade de as pessoas reafirmarem sua condição de membros da equipe” (p.
50). A necessidade do recomprometimento todas as vezes que a base do
relacionamento funcionário-empresa muda indica a importância do estudo das
alterações no contrato psicológico após reestruturações.
29
Dentre as críticas feitas aos downsizings, Wetzel (2000) ressalta que não
apenas as vítimas do processo sofrem os “efeitos perversos” da dificuldade de
recolocação no mercado de trabalho, mas também os sobreviventes têm suas
cargas de trabalho aumentadas, suas tarefas ampliadas, sua confiança na relação
empregado-empregador diminuídas. Além disso, o medo da perda do emprego
também gera ameaças que podem transformar as reestruturações em drenos de
produtividade e manutenção do valor.
Kanter (1997) apresenta uma série de ameaças à manutenção de valor. O
primeiro aspecto diz respeito às perdas financeiras, custos da confusão física que
pode se instalar durante o processo. As informações incorretas ou falsas podem
disseminar boatos com um grande potencial destrutivo num momento em que é
difícil manter as pessoas bem informadas.
O segundo aspecto refere-se às perdas emocionais que são negligenciadas
pela ordem de prioridades de preocupações, mas que aparecerão em momento
posterior. A dispersão de energia provocada pela preocupação com a instabilidade
do momento e o sentimento de culpa em relação às pessoas que perderam alguma
coisa na reestruturação, afeta diretamente a moral dos trabalhadores e o clima
organizacional.
O terceiro aspecto envolve a perda de recursos-chave, podendo causar
prejuízo à manutenção de valor da empresa devido à falta de conhecimento e de
políticas apropriadas para selecionar quem são os funcionários que fariam diferença
na continuidade da empresa. A quebra da iniciativa gerada pela situação de espera
em que as pessoas são, em geral, colocadas durante os processos de
reestruturação fazem com que estas parem de agregar valor em atividades
realizadas anteriormente.
30
Por último, o enfraquecimento da credibilidade dos líderes no que diz respeito à
capacidade de cumprir sua parte no acordo renegociado com o funcionário faz com
que o comprometimento seja atingido criando uma força de trabalho cética em
relação às intenções da empresas.
31
Contrato Psicológico
Os Contratos
Os contratos são compromissos firmados voluntariamente que detalham as
expectativas de empregadores e empregados acerca de suas relações de trabalho
(ROUSSEAU, 1995). Eles descrevem um conjunto de percepções sobre a relação
de troca entre indivíduos e suas organizações (THOMAS et al., 2003). Esta relação
se estabelece como um acordo de troca de promessas e contribuições entre as duas
partes (JANSSENS et al., 2003).
No entanto, observa-se que as grandes reestruturações têm causado
mudanças radicais na forma como as empresas se relacionam com seus
empregados e na percepção de ambos sobre suas obrigações e direitos.
A percepção das obrigações mútuas de cada uma das partes numa relação
empregatícia pode ser resultado de contratos formais ou podem ser sugeridos pelas
expectativas destas partes que são comunicadas de várias formas, sejam elas sutis
ou não (HERRIOT et al., 1997).
Para Rousseau (1995), contratos típicos são incompletos devido à
racionalidade limitada, que restringe a coleta de informação do indivíduo e ao
ambiente organizacional em constante mudança, que torna impossível prever as
condições futuras.
Além do aspecto de incompletude dos contratos típicos, a possibilidade de
haver violações de contratos nas reestruturações está ligada à impossibilidade de
prever e assegurar o cumprimento de uma obrigação num ambiente de constante
mudança. Os contratos se tornam então auto-organizáveis, já que empregado e
32
empregador precisam, aos poucos, ajustar o contrato e preencher as lacunas que
ficam em aberto. Assim, o aspecto voluntário do contrato pode ficar comprometido,
ao ser alterado por mudanças impostas pelas reestruturações organizacionais e
downsizings que nem sempre correspondem ao que as partes desejariam e impondo
aos trabalhadores novos arranjos que eles não escolheram. (ROUSSEAU, 1995).
Análogo ao exemplo usado por Rousseau (1996) do procedimento “o cliente
tem sempre razão”, como uma forma de expressar que versão do contrato é a
correta na relação empresa-cliente, a máxima “manda quem pode, obedece quem
tem juízo” pode ilustrar a natureza do contrato empregador-empregado em muitas
empresas, tendo como parte correta o gerente, especialmente porque, em geral, o
corpo gerencial se percebe menos dependente dos empregados do que de seus
clientes.
Schein (1980) vê o contrato psicológico como um processo em contínua
operação que se desdobra através de barganha e renegociações constantes. Esta
continuidade da troca se refere aos ciclos repetidos de cada parte cumprindo suas
promessas com a outra.
Os contratos podem incluir termos escritos, comunicados orais e outros ligados
às expressões de comprometimento e intenções futuras.
É importante estudar como estes contratos se estabelecem e de que modo é
possível entender sua dinâmica.
De forma geral, se aceita que os contratos contêm tanto promessas explícitas
resultado de negociação entre as partes do contrato e promessas implícitas -
originadas em interpretações dos padrões de troca passados, aprendizado por
observação e outros fatores que cada parte toma como verdadeiro, como por
exemplo, boa fé ou justiça (CONYAW E BRINER, 2005). A questão colocada em
33
debate pelos autores é o quanto as promessas devem ser implícitas para que um
contrato seja considerado psicológico.
Para Schein (1965), a noção de um contrato psicológico implica que o indivíduo
tenha diversas expectativas acerca da organização e vice-versa. No entanto, as
expectativas que estão contidas no contrato psicológico não estão escritas em
qualquer contrato formal entre o empregado e a organização e operam
energicamente como determinantes do comportamento de ambos.
No entanto, Rousseau (1996) toma como premissa o fato de que todos os
contratos são contratos psicológicos. Isto se deve ao fato de que o acordo e a
manutenção de um contrato se deve à forma como este é percebido pelas partes
que o firmam. Assim, é a forma como gerentes e trabalhadores enxergam o contrato
que determinam o impacto em seu comportamento.
Daí podem surgir dificuldades de compreensão acerca do funcionamento do
contrato. Rousseau (1996) identifica uma confusão entre o pensamento legal e o
contratual. Enquanto um se refere a como as pessoas usam a lei para formar e
avaliar seus comportamentos, o outro se refere à forma como as pessoas fazem e
mantêm suas promessas e como confiam em promessas feitas (ROUSSEAU, 1995).
Ainda segundo a autora, esta visão legalista, voltada para os aspectos formais
e mensuráveis, fez com que o termo “contrato” assumisse uma conotação negativa,
como algo que devesse ser evitado, em parte porque esta tende a assumir a
constância dos contratos ao longo do tempo, encarcerando empregado e
empregador em comprometimentos que ficaram obsoletos, limitando as
possibilidades de promoção de mudanças oferecidas por um contrato (ROUSSEAU,
1995).
34
Uma vez que os contratos são criados para beneficiar as partes e são
resultados de acordos firmados antecipadamente, as mudanças podem gerar perdas
(ou a sensação de perda) para uma delas. Isto pode fazer com que os contratos
atuem como uma fonte de resistência à mudança. Além disso, os processos
automáticos que criam modelos mentais mais duradouros podem contribuir para o
aumento desta resistência (ROUSSEAU, 1995).
Cabe ressaltar que a coleta de informações que possibilita a estruturação de
um modelo mental consideravelmente confiável para os indivíduos é baseada numa
racionalidade limitada, que dificulta a consideração de todos os aspectos envolvidos
na questão (Rousseau, 1995).
Tipos de Contratos Psicológicos
Um ambiente competitivo requer contratos que sejam flexíveis o suficiente para
serem mudados sem que haja uma quebra no mesmo (ROUSSEAU, 1995).
O contrato psicológico é subjetivo não somente por causa das diferenças
cognitivas e perceptuais, mas porque existem múltiplas fontes de informação que
influenciam seu desenvolvimento e subseqüente modificação (SHORE & TETRICK,
1994 Apud THOMAS et. al., 2003)
O comprometimento de cada uma das partes com ações futuras é previsto pelo
contrato. No entanto, o que este contrato significa exatamente e o quanto existe um
real acordo nem sempre fica claro. Assim, para Rousseau (1995, p.6) o acordo
existe nos olhos do observador”.
35
Para Mc Neil (1985) todos os contratos, sejam eles escritos ou não, são
fundamentalmente subjetivos por serem inevitavelmente abertos à interpretação
subjetiva de cada indivíduo.
Assim como o uso do termo “contrato” pode cobrir uma grande variedade de
arranjos interpessoais e normas sociais, o observador pode assumir diferentes
perspectivas e níveis de participação nos contratos. Juntos, estes podem ajudar a
entender as muitas formas como o termo “contrato” pode ser usado e os diferentes
tipos de contratos apresentados por Rousseau (1995) conforme apresentado no
quadro 1.1.:
Quadro 1 Tipos de contrato
Nível
Indivíduo Grupo
Interna
Psicológico
Confiança que os indivíduos
têm acerca de promessas
feitas, aceitas e apoiadas e
fiadas entre eles e outra parte
(empregador, cliente,
gerente, organização).
Normativo
O contrato psicológico
compartilhado que emerge
quando membros de um
grupo social, organização
ou unidade de trabalho têm
crenças comuns.
Perspectiva
Externa
Implícito
Interpretações que terceiros
(juristas, empregados
potenciais, etc) fazem a
respeito dos termos
contratuais.
Social
Crenças abertas em
obrigações associadas com
a cultura de uma sociedade
Fonte: Rousseau, 1995
O Contrato Psicológico individual e de perspectiva interna tem o poder de
profecia auto-realizável e pode ajudar a criar o futuro. Este tipo de contrato faz com
que os compromissos firmados pelas pessoas possam ser antecipados e planejados
não só para os outros como para eles mesmos (ROUSSEAU, 1995).
36
Conforme as pessoas entendem os compromissos umas das outras ao longo
do tempo, um grau de previsibilidade é possível, tornando mais claro o que é
esperado de cada uma das partes que firmou o contrato. Este entendimento pode se
dar baseado na comunicação, costumes ou práticas passadas. Uma vez que a
previsibilidade é atingida, ela se torna um importante instrumento de coordenação de
esforços e planejamento (ROUSSEAU, 1995).
Cabe ressaltar que o entendimento do contrato pode não ser mútuo. O que faz
o contrato é o que cada uma das partes acredita como sendo sua parte no acordo
(ROUSSEAU, 1995).
Quando várias pessoas concordam nos termos de seus contratos psicológicos
individuais, ocorrem os Contratos Normativos. A concordância na interpretação
dos eventos é um aspecto central na criação e manutenção dos contratos. Contratos
normativos compartilhados são ainda mais fortes, porque representam um acordo de
um grupo de pessoas com o empregador, produto de interações sociais, discussões
comentários e interpretações similares (ROUSSEAU, 1995).
A crença compartilhada por um grupo em um conjunto de obrigações pode criar
pressões sociais para a adesão à estes compromissos e a institucionalização destes
como parte da cultura organizacional, tomando a forma de uma norma social
(ROUSSEAU, 1995).
Os Contratos Implícitos são as atribuições que as pessoas que não fazem
parte do contrato consideram a respeito de seus termos, aceitação e mutualidade.
Este tipo de contrato forma parte da reputação e da imagem pública da empresa
(ROUSSEAU, 1995).
Contratos Sociais são culturais e baseiam-se nas crenças coletivas
compartilhadas sobre o comportamento apropriado em sociedade. Uma norma
37
universal é a da reciprocidade, fazendo com que a pessoa que recebe uma ajuda,
deve se sentir grato até que possa pagar em retorno. Este pagamento pode variar
conforme a proximidade das partes, de forma que a distância social, usualmente,
conduz a uma reciprocidade mais rápida (ROUSSEAU, 1995).
Os Contratos Sociais podem ser facilmente percebidos nas noções de justiça
no tratamento. Os termos “boa fé” e “negociação justa”, por exemplo, podem assumir
uma variedade de significados, dependendo dos valores da sociedade na qual a
empresa está inserida. Os contratos não se formam independente da sociedade na
qual estão inseridos e são influenciados por esta, especialmente no que diz respeito
à interpretação das promessas feitas. O entendimento e a interpretação da
probabilidade do cumprimento de um contrato se molda no contexto do contrato
social (ROUSSEAU, 1995).
A compreensão das características de um contrato com maior probabilidade de
cumprimento pode ajudar a construir compromissos que sejam mais sustentáveis e
evitar mensagens equivocadas. Estas características são: tipos de promessas,
estrutura de referência, formas de acordo e confiança (ROUSSEAU, 1995).
As promessas podem ser garantias ou declarações de intenções futuras.
Garantias são declarações da realidade que quando quebradas geram uma forte
percepção de má fé, enquanto declarações de intenções futuras estão mais sujeitas
a ambigüidade e incerteza. Rousseau (1995, p.16) atenta ainda para o fato de que
no que se refere a promessas, “não se trata do que quem as faz pretende, mas do
que quem as recebe acredita”.
Transformar uma promessa num contrato implica que esta promessa seja
acreditável, aceita e confiável. A despeito da importância das promessas para o
contrato, manter as promessas feitas não é o ponto crítico dos contratos. A
38
criticidade reside na possibilidade de diminuição do impacto causado pela perda de
confiança no momento em que um contrato é mudado ou violado. O grande
problema é identificar as perdas, uma vez que aspectos emocionais e sociais podem
estar envolvidos nelas. O trabalho, em si, tem uma natureza não só econômica, mas
também simbólica, de forma que não é facilmente substituível nem mesmo com
dinheiro (ROUSSEAU, 1995).
Os contratos estão sujeitos às limitações das pessoas que os formulam. Além
de terem uma capacidade cognitiva limitada, as informações que estão disponíveis
são incompletas. A idéia da existência de um contrato que considere todos os
aspectos contingentes em detalhe se torna inviável. Logo, os acordos contratuais
são entendidos por cada uma das partes conforme suas próprias estruturas de
referência. Diferentes expectativas podem ser construídas por duas partes que
acreditam ter um acordo mútuo (ROUSSEAU, 1995).
Ainda que os contratos sejam incompletos, bons resultados podem ser
atingidos se as partes continuamente atualizam seus arranjos conforme as
circunstâncias mudam (ROUSSEAU, 1995).
A estruturação de um contrato depende da crença de que existe um acordo.
Para julgar até onde esse acordo existe, a comunicação tem um papel essencial na
promessa. O consentimento público por cada uma das partes promove não só o
acordo entre elas como também produz evidências para terceiros de que este
acordo existe. A aceitação dos contratos pode aumentar a confiança e reduzir os
testes de mutualidade e concordância (ROUSSEAU, 1995).
Ainda que haja concordância entre as definições acerca da relação de troca
entre empregado e empregador inerente ao contrato psicológico, a natureza desta
troca nem sempre é bem delineada. Assim, os incentivos organizacionais e as
39
contribuições dos empregados aparecem em grandes “pacotes”, sem que seja
possível indicar com exatidão como esta troca funciona e que incentivos
especificamente são trocados por cada uma das contribuições (CONYAW E
BRINER, 2005).
A natureza voluntária dos contratos faz com que a aceitação seja um fator
crítico para motivar os funcionários no sentido de validar e cumprir o contrato. A
percepção de que há alternativas é a base da voluntariedade de um contrato. É
arriscado supor a aceitação dos contratos pelos funcionários quando as condições
deste já mudaram desde a sua contratação. Caso os indivíduos não percebam
alternativas à seu emprego, a existência de um contrato psicológico pode ser
questionada devido à ausência de uma real aceitação (ROUSSEAU, 1995).
O que é certo sobre acordos entre as pessoas no curso de futuras ações é que
eles permitem o planejamento, a cooperação mútua, a gratificação adiada e a
organização efetiva dos recursos, inclusive criando estes recursos (ROUSSEAU,
1995).
Criação dos contratos Psicológicos
As pessoas mantêm suas promessas por muitas razões. Rousseau (1995)
aponta a aceitação das promessas como objetivo pessoal, a imagem e a valorização
da “palavra de honra”, a imagem criada pelo ato da promessa, a redução das
possíveis perdas, as pressões sociais e preocupação com a reputação, e os
incentivos. No caso dos incentivos, é preciso que eles existam tanto para que
pessoas se comprometam quanto para que os compromissos sejam mantidos
(ROUSSEAU, 1995).
40
Para Rousseau (1995), manter a promessa é um dos pontos mais importantes
da manutenção dos acordos contratuais. Sob determinadas circunstâncias, mantida
mais facilmente:
1. Quando as pessoas estão conscientes ao realizar uma promessa e são
comprometidas em mantê-la;
2. Quando as pessoas se sentirem capazes. Mais ainda, a quebrarão com
mais facilidade se sentirem que não têm controle para fazer diferente, tal
como em uma situação de crise econômica, por exemplo;
3. Em pessoas que têm personalidade com um locus de controle interno
muito alto ou fortes padrões éticos e morais, sendo mais resistentes a
pressões situacionais;
4. Se o indivíduo tem conhecimento dos efeitos da quebra do contrato
sobre a outra parte. Assim, é mais provável que mantenha a promessa.
Nos casos quando as partes estão distantes ou uma é invisível para a
outra, a quebra da promessa é mais factível;
5. Quando as normas sociais sustentam o compromisso com a promessa
como um comportamento apropriado, a promessa é mais facilmente
mantida. O mesmo ocorre para grupos estáveis e com normas intactas.
Grupos instáveis e com histórico de quebra de contratos podem corroer
as normas de manutenção das promessas.
Dentre as implicações práticas do quanto as promessas devem ser implícitas
para serem consideradas parte do contrato psicológico está o fato de que, segundo
Pfeffer e Salancik (1978) comprometimentos públicos e abertos exercem maior
influência na cognição e nos comportamentos do que os comprometimentos
41
privados e sutis. Assim, incluir promessas mais explícitas na definição de contrato
psicológico o torna um instrumento mais preciso na previsão do comportamento do
empregado (CONYAW E BRINER, 2005).
Alguns fatores podem influenciar na percepção dos empregados a respeito dos
contratos psicológicos. Em linhas gerais, quase todo tipo de comunicação ou
comportamento da organização ou do empregado pode ser interpretado pela outra
parte como informação sobre a natureza das promessas que existem entre eles.
Fatores fora da organização podem ser o primeiro passo para moldar as
expectativas dos empregados. As expectativas que estes já trazem quando
ingressam na empresa são formadas por numerosas experiências e contextos
prévios, tais como os relacionamentos empregatícios prévios e de outros membros
da família, socialização na escola e na comunidade local, contexto cultural, status
sócio-econômico e a exposição à mídia de massa. Também, experiências pessoais
que não estão relacionadas com o trabalho podem mudar a forma como as pessoas
enxergam suas promessas mútuas com seus empregadores. Eventos pessoais
como a paternidade (maternidade) podem fazer com que suas expectativas em
relação à empresa mudem. Ainda, fatores mais amplos, como a economia, a política
ou as mudanças legais atuam na percepção do contrato psicológico por
representarem mudanças mais gerais, a exemplo, a globalização e o aumento da
competição que acabaram por gerar programas de reestruturação com uma drástica
diminuição do nível gerencial (CONYAW E BRINER, 2005).
Internamente, a organização tem papel fundamental em estabelecer e
desenhar o contrato psicológico seja por meio de suas práticas de recursos
humanos e práticas de administração de pessoal, pelos termos implícitos ou
42
explícitos do contrato ou pela observação do comportamento e resposta de outros
empregados em relação aos contratantes (CONYAW E BRINER, 2005).
Fatores individuais e sociais são responsáveis pela variação do contrato
psicológico mesmo quando o mesmo quando o acordo proposto para os diversos
funcionários de uma organização é o mesmo. Eles são influenciados pela
personalidade, ideologia e tendências próprias de cada um. Coyle-Shapiro e
Neuman (2004) analisaram o impacto da ideologia de troca e do credor nos
contratos psicológicos já que estas são entendidas como uma orientação ligada a
disposição. Estes mecanismos se dão de forma similar ao da personalidade no
sentido de que são estáveis e fundamentais na forma como os indivíduos se
comportam.
A ideologia da troca se refere ao quanto cada empregado acredita que o modo
como eles são tratados pela organização deve refletir o esforço que estes colocam
em seus trabalhos. Enquanto alguns empregados se sentem confortáveis sendo
sobre-recompensados por um determinado esforço colocado na empresa, outros
buscam um retorno mais eqüitativo e justo em relação aos seus esforços e há ainda
um terceiro grupo que tolera bem o fato de serem sub-recompensados por seus
esforços.
Já a ideologia do credor está ligada à orientação de dar mais do que receber.
Pessoas que têm esta orientação se sentem desconfortáveis ao se sentirem em
débito e preferem que os outros estejam em débito com elas. Coyle-Shapiro e
Neuman (2004) descobriram que pessoas tolerantes ao serem sub-recompensadas
e com alta orientação para a ideologia do credor se sentem mais obrigadas a
cooperar com a organização e mais receptivas a responder aos incentivos dados.
43
Os contratos baseados em promessas sejam eles psicológicos, normativos ou
implícitos envolvem um modelo mental usado para enquadrar eventos como
promessas, aceitação e confiança. Como estes eventos envolvem percepções que
não são interpretações passivas da realidade, as pessoas podem criar seus próprios
significados para cada um deles. Assim, se a realidade não é criada completamente
na mente das pessoas, grupos que compactuam com significados para os eventos
ajudam a criar os contratos normativos (ROUSSEAU, 1995).
Como as mensagens do meio externo não entram no cérebro em estado bruto,
mas em forma de estruturas já interpretadas, é importante conhecer o modelo
mental que as pessoas usam para compreender como elas entendem seus contratos
de trabalho. Em especial porque estas estruturas podem mudar, mas podem
também ser fonte de resistência. Os modelos mentais só mudam quando novas
informações são discrepantes e não são prontamente interpretáveis usando o
modelo antigo (ROUSSEAU, 1995).
Isto pode explicar porque depois das reestruturações os funcionários podem ter
dificuldades em se adaptar ao novo contrato estabelecido. Da mesma forma,
funcionários que são contratados após as reestruturações podem demonstrar melhor
adaptação e, como conseqüência, melhores resultados. Para muitas pessoas, o
modelo mental sob o qual seu contrato foi entendido é o do momento da
contratação. Se este modelo resiste à mudança, contratos diferentes podem estar
vigentes durante um mesmo período na empresa (ROUSSEAU, 1995).
Esta resistência, segundo Rousseau (1995) ocorre porque o contrato pode ser
enxergado como um modelo mental. Este modelo mental está baseado no fato de
que os indivíduos são processadores de informação descontínuos. Isso significa
dizer que as informações relacionadas ao contrato são buscadas e processadas
44
ativamente em determinados momentos e o contrato tende a permanecer até que
um sinal perceptível indique uma quebra ou uma interrupção.
Os modelos mentais que são utilizados pelas pessoas para interpretar eventos
que influenciam em sua percepção são a base da estruturação do contrato
psicológico. Eles são criados a partir do processamento de informações distintas que
estão disponíveis. As pessoas processam as informações de duas maneiras. A
primeira é controlada sistematicamente e é utilizada para processar novas
informações, buscando obter o maior número de dados possível de forma
cuidadosa. Este tipo de processo decisório é geralmente chamado “racional”. Uma
vez que a experiência é processada, o processamento sistemático de informação dá
lugar à segunda maneira, que é automática e utiliza modelos mentais estabelecidos
e rotinas, dando origem a esquemas organizados pela experiência (ROUSSEAU,
1996).
Os modelos mentais que organizam o conhecimento de maneira sistemática
são esquemas. Eles não apenas organizam como tornam possível que as pessoas
lidem com a ambigüidade de formas já experimentadas e, ainda, que prevejam o que
vai acontecer em seguida. Os indivíduos não necessariamente mudam seus
esquemas, pelo contrário, tentam encaixar a experiência em esquemas já existentes.
De fato, por causa do processamento descontinuado de informações, geralmente as
pessoas vêem o que esperam, buscam informações apenas quando julgam
necessário e ignoram uma série de outras informações que poderiam indicar
mudanças no ambiente. A estabilidade dos esquemas contribui sobremaneira para
este efeito (ROUSSEAU 1995).
A busca ativa por informações tende a ser alavancada por eventos. Estes
eventos pontuam o contrato quando sinalizam (ou são interpretados como
45
significando) que um contrato está terminado, ou um novo contrato está sento
criado, ou ainda, que ambos estão acontecendo simultaneamente. (ROUSSEAU
1995)
Quando se trata de novos contratos, a entrada do indivíduo na organização é o
gatilho que alavanca a busca de informações. Um dos motivos pelos quais as
pessoas recorrem ao contrato do período em que foram contratadas é o fato de que
provavelmente este foi o único momento no qual elas procuraram informações
relativas a este contrato (ROUSSEAU 1995).
Assim, o contrato é um tipo de esquema criado pelo processamento controlado
de informações que se tornam automáticas com o tempo. Assim, não só é possível
que as pessoas tenham diferentes percepções de contrato num mesmo contexto,
mas também, muitas vezes, a mudança externas não sejam percebidas e,
conseqüentemente, os esquemas mentais não sejam repensados (ROUSSEAU
1995).
Mudanças organizacionais dão as pistas da necessidade de busca de mais
informações quando elas sinalizam mudanças legítimas e inevitáveis (ROUSSEAU,
1995).
Segundo Rousseau (1995), dois conjuntos de fatores influenciam na formação
dos contratos psicológicos: os fatores externos e mensagens da organização e
indicações sociais e a interpretações internas, predisposições e construções
individuais conforme a figura 1.1 (ROUSSEAU, 1995).
As mensagens externas são enviadas pela organização, colegas e grupos de
trabalho. Elas representam as intenções futuras da empresa. Podem ser
manifestadas durante ações pessoais com os funcionários ou durante
reestruturações de diferentes formas: declarações públicas, observação do
46
tratamento dispensado a outros percebidos como parte de um mesmo acordo,
políticas organizacionais e as pistas sociais.
Figura 1 - Criação do contrato psicológico individual
Fonte: ROUSSEAU, 1995.
Indicações sociais são as informações adquiridas com um colega a partir de um
grupo de trabalho. Estas indicações desempenham três papéis no processo de
contratação. O primeiro é fornecer mensagens para a criação do contrato. O
segundo é tornar conhecidas as pressões sociais para corresponder ao
entendimento do grupo sobre os termos do contrato e o terceiro, esquematizar a
forma como os indivíduos interpretarão as ações organizacionais (ROUSSEAU,
1995).
Pfeffer e Salancik (1978) chamam a isto de “Processamento de Informação
Social”, e ele acontece quando empregados escolhem e internalizam as atitudes e
comportamentos de outros indivíduos que o cercam por meio de pistas sociais.
do
contrato psicológico
individual
Contextua
-
lização da
mensagem
Codificação
Contrato
psicológico
Decodificação
Predisposição
Indicações
sociais
Processos
Individuais
Fatores
organizacionais
47
Os processos internos representam a forma como os indivíduos interpretam as
mensagens recebidas. Esta interpretação pode influenciar o contrato de forma mais
decisiva do que a mensagem que foi enviada (ROUSSEAU, 1995).
As diferenças nos perfis culturais de cada indivíduo na organização afetam não
apenas as características e a formação do contrato psicológico, mas também a
percepção de violação do contrato e as respostas comportamentais a estas
violações (THOMAS et al., 2003).
Indivíduos interpretam as ações e as promessas organizacionais pelo processo
de codificação de mensagens. Entender este processo auxilia a compreensão
daquilo que faz com que empregados interpretem as ações organizacionais como
promissoras e, ainda, como as organizações podem moldar suas ações para que os
empregados entendam o que é prometido. A forma como as pessoas recebem e
reconhecem a mensagem podem fazer com que o evento seja codificado como
promissor ou não. Para que as promessas tenham crédito, a pessoa que faz o
contrato deve ser reconhecidamente alguém que tem poder, autoridade e
capacidade para firmar um compromisso e mantê-lo. A situação em que ocorre o
evento também deve ser apropriada e sinalizar a necessidade de comprometimento
e planejamento para o futuro. Porque as pessoas tendem a não acreditar em
promessas gratuitas ou se sentem desconfortáveis em aceitar coisas que não
podem retribuir, o melhor momento para se fazer uma promessa a alguém é quando
se solicita algo em troca. Eventos que sinalizam comprometimento envolvem alguma
mudança entre o que foi e o que será, comunicando o conjunto de compromissos da
organização com o indivíduo e do indivíduo com a organização (ROUSSEAU, 1995).
A consistência da mensagem recebida facilita o entendimento das intenções de
quem faz a promessa. Conforme as mensagens apresentam consistência através do
48
tempo, elas acabam se internalizando até o ponto em que passam a ser assumidas
como verdadeiras. Ainda que a discrepância seja a chave para fazer com que uma
mensagem seja notada, quando se trata de novos contratos, faz-se necessário que
as promessas atinjam uma certa credibilidade para transmitir as intenções da
empresa em criar novos termos para o contrato (ROUSSEAU, 1995).
As características dos indivíduos podem produzir diferentes usos das
informações codificadas. As tendências cognitivas fazem com que as pessoas
lembrem-se melhor de informações que confirmem o conceito que elas têm de si
mesmas do que as que contradizem este conceito podendo afetar na percepção de
cumprimento da sua parte no contrato ou, ainda, fazendo-as recordar apenas dos
compromissos do contrato nos quais elas obtiveram sucesso. Os motivos pessoais
dos indivíduos também podem atuar como filtros das informações recebidas. O que
as pessoas buscam quando vão trabalhar em uma determinada organização afeta a
interpretação do que elas devem à esta organização e o que lhes é devido em troca
(ROUSSEAU, 1995).
O processo de decodificação reflete o modo como as pessoas julgam quais
devem ser os padrões de comportamento que devem ser alcançados para que os
compromissos, firmados tanto por eles mesmos quanto pela organização, sejam
atingidos. Ele consiste na interpretação das promessas realizadas e no seu
conseqüente desdobramento em comportamentos que possam ser monitorados
indicando que os indivíduos compactuam com o contrato. Como os contratos podem
ser um mecanismo de autocontrole, ambas as partes devem aderir a padrões de
comportamento para que o pacto firmado fique claro e encorajem as pessoas a
manter seus compromissos. Quando estes padrões são atingidos, eles acabam se
tornando uma meta a ser alcançada (ROUSSEAU, 1995).
49
Os três tipos de contrato se baseiam em aspectos distintos e, portanto, se
estabelecem de formas distintas.
Os contratos psicológicos são baseados nas interpretações que os indivíduos
fazem das informações disponíveis sobre a organização, os grupos de trabalho e
seus próprios motivos. Isto faz de cada contrato psicológico um contrato
potencialmente único. Se estes aspectos são compartilhados por mais de um
funcionário, podem ocorrer mudanças em sua natureza e seu significado
(ROUSSEAU, 1995).
Os contratos normativos são, em função de sua natureza essencialmente
coletiva, dominados pelas interpretações dos grupos acerca das mensagens
organizacionais e indicações sociais. As características individuais são menos
importantes do que as situacionais. A equiparação cognitiva entre as interpretações
dos empregados e empregadores é um ponto crítico na criação e na manutenção
dos contratos. É também uma função de fatores situacionais que modelam as
interações entre os membros da organização. Quando os funcionários concordam
com o empregador nos termos do contrato psicológico, este acordo se torna um
contrato normativo (ROUSSEAU, 1995).
Conforme ilustrado na figura 1.2, para que os contratos se sobreponham, os
indivíduos precisam interagir, compartilhar informações e dividir um ambiente social
comum. (ROUSSEAU, 1995).
Scheneider (1987) utiliza o modelo de Seleção Adaptação Exaustão para
detalhar como nas organizações, as pessoas adquirem valores e comportamentos
similares. A Seleção se dá no recrutamento dos funcionários, quando se buscam
pessoas que se adequem aos moldes da organização. Caso estas pessoas não se
encaixem, elas são socializadas pelo treinamento e gestão de desempenho, na fase
50
da Adaptação. Caso estas primeiras fases não apresentem resultados positivos, o
funcionário acaba deixando a organização ou ela mesma força essa saída a
Exaustão.
Figura 2 - Criação do contrato normativo
Fonte: ROUSSEAU, 1995.
Uma vez que os funcionários compartilham de crenças comuns acerca dos
termos do contrato o que devem ao empregador e o que lhes é devido em troca
este contrato normativo se torna parte das normas sociais do local de trabalho
(ROUSSEAU, 1995).
Este grupo social compartilha também um conjunto de valores e crenças que
são a cultura da organização. A criação de um contrato normativo é parte do
desenvolvimento de uma cultura estável. Quando as pessoas conciliam suas
crenças sobre o que se espera de seu comportamento, elas acabam se
comprometendo duplamente com este contrato: por sua responsabilidade pessoal e
Indivíduo
1
Decodificação da
mensagem
Indivíduo 2
Decodificação da
mensagem
Contrato
Normativo
Indicações
Sociais
Mensagens
organizacionais
consistentes
51
pelas pressões sociais de se enquadrar no modelo e de serem aceitas pelo grupo
(ROUSSEAU, 1995).
Rousseau (1995) propõe uma integração de diferentes abordagens para
explicar o conceito de cultura organizacional. Ele a descreve como um sistema
interconectado de camadas e experiências sociais. Para ele, as cinco camadas da
cultura variam de subjetivas para objetivas e representam as contribuições de cada
elemento da cultura organizacional para a criação do contrato normativo, conforme
figura 1.3.
Figura 3 - Camadas da cultura e contratos normativos
Fonte: ROUSSEAU, 1995.
Novo empregado utiliza uniforme
somente quando o treinamento
tenha acabado
Padrões
de
Comportamento
Normas
Comportamentais
Suposições
Básicas
Artefatos
Empregados
“permanentes”
Valores
Serviço
Família
Cooperar
Apoiar o chefe
Evitar conflito
52
Nas empresas que passam por reestruturações, é comum observar-se a
convivência de mais de um contrato normativo em diferentes grupos. Isto se deve,
em parte, ao fato de as empresas cada vez mais fazerem uso dos contratos de
trabalho flexíveis. Segundo Guest (2004) a individualização das relações de trabalho
podem estar associadas ao crescimento da flexibilidade nos contratos.
Por fim, os contratos implícitos são julgamentos externos feitos por cortes,
público e outros estranhos à relação na qual o contrato é criado. Estes estranhos
atuam como moderadores que julgam a existência do contrato, seus termos e se
este foi mantido ou violado. Terceiros, em geral, dão mais importância às crenças
mais difundidas acerca dos termos do trabalho do que às características das
relações, especificamente. Além disso, utilizam mais procedimentos padrões e se
preocupam com a justiça processual. Para garantir atualidade das práticas, também
podem adotar o benchmark de práticas estabelecidas na indústria (ROUSSEAU,
1995).
Os contratantes (contract makers)
As definições de contrato psicológico apontam para a existência de duas
partes, sendo elas empregado e empregador. A primeira o empregado é
facilmente identificável já que o contrato psicológico é visto como presente no nível
individual. Quanto a segunda parte o empregador alguns autores discutem a
possibilidade de grupos ou terceiros deterem a posição.
Enquanto alguns conceitos, especialmente os primeiros conceitos em contrato
psicológico, (LEVINSON, et al. 1962, KOTTER, 1973 e GUEST 1998) admitem que o
contrato psicológico consiste nas crenças de ambas as partes, sendo os agentes ou
53
as características do grupo ou da empresa os responsáveis por deterem a
perspectiva do empregado, Rousseau e McLeanParks (1993), consideram o contrato
basicamente do ponto de vista do indivíduo. Assim, para os autores, as
organizações são entidades abstratas, que não tem contratos psicológicos, ainda
que os agentes organizacionais possam estabelecê-lo com os empregados.
Para Rousseau (1995), qualquer pessoa que possa transmitir algum tipo de
comprometimento com outra para o futuro pode ser considerada um contratante em
potencial. No caso das organizações, estas pessoas podem ser diretamente os
dirigentes (principal), quando os donos da empresa se responsabilizam diretamente
por estabelecer os contratos ou podem, ainda, existir indivíduos que desempenham
o papel de agentes, comunicando as necessidades e expectativas nas quais o
emprego implica em nome da organização. O mesmo vale para os empregados, que
podem ser os agentes diretos ou podem ser representados por uma organização
como um sindicato (ROUSSEAU, 1995).
Dessa forma os contratos podem variar conforme o status das partes. Quando
o contrato se faz de dirigente para dirigente, a quantidade de filtros é bastante
pequena e a responsabilidade em caso de quebra ou mudança de contrato é bem
clara. Quando o acordo se faz do dirigente para o agente, caracteriza o modelo de
emprego de agência, aumentando a distância entre as partes e limitando o escopo
dos termos do contrato. Os acordos firmados entre os sindicatos e a gerência da
empresa caracterizam o contrato agente para agente, que geralmente apresentam
uma grande distância social entre as partes, intermediado por muitos filtros. Por fim,
o tipo mais comum é o contrato firmado de agente para dirigente; neste tipo de
contrato indivíduos representam a empresa em variados arranjos possíveis em
contato direto com o funcionário (ROUSSEAU, 1995).
54
Os filtros a que se referem Rousseau (1995) estão relacionados com o possível
descolamento entre as intenções reais do dirigente e as informações fornecidas pelo
agente. Pesquisas desenvolvidas pela autora indicam que a maioria dos casos de
quebra de contrato relatados por funcionários recém-contratados são casos em que
os gerentes que atuaram como agentes em suas contratações fizeram promessas
específicas não-relacionadas diretamente com os propósitos iniciais da organização.
Assim, quando não foi possível mantê-las, os funcionários não conseguiam
identificar se os gerentes estavam atuando como dirigentes ou agentes da empresa.
Esta confusão de mensagens e sinais pode aumentar a ambigüidade que
normalmente é esperada pelo caráter inerentemente subjetivo do estabelecimento
de contratos (ROUSSEAU, 1995).
Kotter (1973) chama a atenção para o risco de antropomorfizar a organização e
terminar por revogar o papel dos indivíduos na formulação dos contratos. Em função
das ações dos agentes da organização, empregados podem atribuir à organização
qualidades humanas capazes de reciprocidade (LEVINSON et al. 1962).
No entanto, Herriot et al. (1997), recorrendo ao conceito clássico de contrato
psicológico, argumenta que diferentes representações da organização, tais como
gerentes de linhas e gerentes de recursos humanos podem sinalizar diferentes
mensagens acerca de suas expectativas e obrigações.
Ao estabelecer um contrato, os funcionários podem ser influenciados pela
interação ou pela observação de gerentes, mentores, pares, alta gerência e
recrutadores. Os procedimentos e processos que transmitem intenções futuras das
organizações constituem um mecanismo secundário. Isto se deve, em parte, ao fato
destes artefatos serem usados para reforçar as mensagens daqueles que fazem os
contratos (ROUSSEAU, 1995).
55
Segundo Miles e Snow (1984), as práticas de gestão de recursos humanos
estão intimamente ligadas à estratégia de negócios da organização como
instrumentos que sistematizam os elementos que influenciam os contratos de forma
e apoiar o contrato predominante na organização. Estas práticas ajudam a modelar
as percepções dos funcionários acerca dos contratos. Na análise das práticas de
recursos humanos pode-se observar as mensagens transmitidas pelas atividades de
gestão de pessoal e as características contratuais que se associam e influenciam no
contrato. As promessas futuras, os padrões de comportamento, a multiplicidade de
contract makers, os diferentes contratos de cada um dos empregado e o quão
dinâmico o contrato pode ser são fatores que podem influenciar as políticas de
recursos humanos e a forma como as pessoas enxergam seus contratos
(ROUSSEAU e GRELLER, 1994).
A importância das atividades de recursos humanos se deve ao fato que, em
geral, a busca por novas informações sobre o contrato acontece pontualmente em
episódios que sinalizam mudanças ou revisões periódicas com um significado
especial. Dentre elas Rousseau e Greller (1995) apontam as atividades de
recrutamento, avaliação de desempenho, compensação, treinamento, adoção ou
revisão de benefícios e emissão de documentos tais como guias e manuais de
pessoal.
Os sinais estruturais podem, no entanto, gerar alguma ambigüidade no
estabelecimento dos contratos. Algumas inconsistências nestes sinais podem ser
amortecidas pela figura do gerente, fazendo com que as interpretações dos
indivíduos estejam diretamente relacionada à conformidade do processo ou à justiça
do resultado.
56
Quando existe uma desconexão entre os sinais transmitidos pela
interação/observação dos contract makers e os mecanismos administrativos, os
contratos firmados podem ter seu cumprimento comprometido. Isto se dá em parte
como um reflexo da especialização das áreas, que subdividem as funções, mas nem
sempre conseguem garantir a integração necessária para que não sejam enviadas
aos funcionários diferentes mensagens. (ROUSSEAU, 1995).
Nesse sentido, a cultura da organização pode promover a integração ou o
conflito entre as áreas, dependendo do quão consistentes e coerentes são os
valores e as normas da empresa. Quanto mais difundida for a cultura da empresa,
maior a possibilidade de geração de contratos individuais bem articulados e
contratos normativos compartilhados (ROUSSEAU, 1995).
Um dos contract makers mais importantes é o próprio funcionário. Nas diversas
oportunidades interação com gerentes e pares, funcionários novos e veteranos
modelam as especificidades do contrato pela busca e interpretação de novas
informações. No caso dos recém-chegados, estas informações podem ser técnicas,
referentes ou normativas. Estas informações geram feedbacks de seus
desempenhos e dão pistas do quão bem-sucedidos eles estão sendo em seu
processo de socialização (ROUSSEAU, 1995).
Quando existem muitos contract makers, a possibilidade de haver divergências
se amplia. Rousseau (1995) aponta como principal questionamento os limites da
responsabilidade da organização no que se refere aos compromissos assumidos por
seus agentes e fiado por seus membros. Se por um lado, na relação com clientes,
organizações orientadas para serviços acabam se guiando pelo contrato percebido
por estes e essa interpretação possa se estender para a relação com o funcionário,
por outro lado isso transformaria os contratos em um exercício de manipulação e
57
distorção. Os contratos são, de fato, uma tentativa de criar a mutualidade entre as
partes. Segundo Rousseau (1995) os três componentes principais da mutualidade
são previsibilidade dos comportamentos, o atingimento de objetivos que este
comportamento permite e a clareza dos esforços das partes. (ROUSSEAU, 1995)
O alinhamento das mensagens enviadas pelos contract makers é o que
viabiliza um contrato sustentável ao longo do tempo.
Conteúdos e tipologias do contrato psicológico
O conteúdo do contrato psicológico são as promessas que o empregado
acredita ter feito para a organização e o que esperam desta em retorno. Conhecer
estes conteúdos é importante porque a forma como se constituem os diversos tipos
de contrato, com diferentes conteúdos, pode levar a piores ou melhores resultados
tanto dos empregados quanto os organizacionais, tais como satisfação e
desempenho (CONYAW E BRINER, 2005).
Conforme Parks, Kidder e Gallagher (1998) ressaltam, é importante notar que o
conteúdo do contrato não é o que os funcionários efetivamente dão e recebem de
seus empregadores, mas as promessas implícitas e explícitas que envolvem essa
troca. Assim, duas questões são relevantes acerca do conteúdo do contrato: o que é
disponibilizado por cada uma das partes para realizar a troca e como essa troca
acontece. Conyaw e Briner (2005) apontam uma limitação na forma como as
pesquisas acessam aos conteúdos dos contratos psicológicos. Estas tem tratado as
contribuições dos empregados e incentivos da empresa como entidades
independentes, sem que haja preocupação entre estabelecer uma conexão entre o
que é feito e o que é esperado em troca.
58
Como o número de itens que podem compor um contrato psicológico é
potencialmente vasto, pesquisadores buscam simplificar estes itens em categorias
que podem refletir tipos particulares ou dimensões do contrato psicológico.
Na tipologia desenvolvida por Rousseau (1995) os contratos podem diversificar
suas formas conforme caminham pelas variáveis focos, inclusão, quadro temporal
(time-frame), formalização, estabilidade, escopo e tangibilidade - que definem o
cluster do qual ele mais se aproximará.
Em termos gerais, Rousseau (1995) entende os contratos como uma linha
contínua onde, de um lado, existe predominância de características transacionais e,
no outro extremo, de características relacionais.
Segundo Rousseau, os contratos contemporâneos podem ter emergido em
função de mudanças nos empregos, erosão de tipos de contratos [empresa]mente
difundidos ou questões organizacionais que reduziram a confiança entre
empregadores e empregados dificultando o estabelecimento de acordos.
(ROUSSEAU, 1995).
Para explicar como os contratos contemporâneos surgiram, Rousseau (1995)
remonta a história das relações de emprego nas organizações modernas e a divide
em três grandes fases: a emergente com contratos caracteristicamente
transacionais, a burocrática e os contratos relacionais e a adhocrática, onde os
contratos variam de acordo com a relação que a empresa estabelece com o
funcionário, podendo estes ser contratos transacionais, no caso de trabalhadores
flexíveis ou relacionais, no caso de trabalhadores ligados ao core business da
empresa.
Termos típicos de contratos psicológicos transacionais se caracterizam por uma
relação de curto prazo, envolvimento pessoal limitado e obrigações mútuas
59
precisamente especificadas com pouca flexibilidade. As habilidades disponibilizadas
para realização do trabalho já existem antes da contratação e os termos do contrato
são claros. Já os termos dos contratos psicológicos relacionais são caracterizados
por relações de longo prazo onde não é possível definir de forma clara as
obrigações mútuas. O envolvimento emocional e as relações pessoais fazem parte
dos termos do contrato. Os investimentos realizados tanto por empregador quanto
empregado, se constituem numa barreira de saída neste tipo de relação. A
complexidade deste contrato pode dificultar o entendimento de terceiros sobre as
condições do acordo (ROUSSEAU, 1995).
Além dos termos transacionais e relacionais, Rousseau (1995) leva em conta
duas outras importantes características dos contratos em sua tipologia: time-frame e
exigências de desempenho. A primeira se refere à duração da relação de emprego
(limitada/curto prazo ou ilimitado/longo prazo) e a segunda à especificação do
desempenho como condição do emprego (muito ou pouco especificada). Ao
organizar estas características em uma matriz 2 x 2, Rousseau (1995) introduz
quatro tipos de contrato que emergem com diferentes implicações para os
trabalhadores, conforme o quadro 2.2.
Os contratos relacionais e transacionais não se excluem. Em determinados
casos, dois arranjos intermediários podem acontecer: o balanceado, quando a
empresa busca uma relação mais próxima com o empregado, mas especifica a
exigência de desempenho e o transicional quando a empresa não consegue
manifestar termos claros para o contrato gerando instabilidade, como em alguns
casos de reestruturações organizacionais profundas.
60
Quadro 2 Tipos de contratos psicológicos segundo duração e especificidade
Desempenho
Específico Não-específico
Curto
prazo
Transacional
Baixa ambigüidade
Saída fácil e alto
turnover
Pouco
comprometimento
Liberdade para entrar
em novos contratos
Pouca aprendizagem
Baixa
integração/identificaçã
o
Transicional
Ambigüidade/incerteza
Alto turnover
Instabilidade
Duração
Longo
prazo
Balanceado
Altos níveis de
comprometimento
Alta
integração/identificaçã
o
Desenvolvimento
contínuo
Assistência mútua
Dinamicidade
Relacional
Altos níveis de
comprometimento
Alto comprometimento
afetivo
Alta
integração/identificação
Estabilidade
Fonte: ROUSSEAU, 1995.
Tipos específicos de relação de trabalho levam aos diferentes tipos de contrato.
Para Rousseau (1995) estas relações se estabelecem de acordo com duas
dimensões: time-frame (longo-prazo/curto-prazo) e grau de
internalização/externalização do empregado na organização. A combinação destas
dimensões leva a quatro possíveis arranjos de relações empregatícias:
1. Internos de longo-prazo são os empregados considerados principais
dentro da empresa. A vantagem competitiva desta reside nas
capacidades de habilidades destes funcionários, fazendo com que sua
retenção seja imprescindível para a estabilidade organizacional e o
aprendizado contínuo. A recompensa é dada não só pelo que é
produzido, mas também como o trabalho é realizado. Espera-se lealdade
61
e envolvimento, em um contrato tipicamente relacional, tanto por parte
do empregado quando por parte da organização.
2. Internos de curto-prazo são os empregados que ambicionam
desenvolver carreira em uma indústria e não em uma firma específica.
Apesar de monitorados pela organização, estes funcionários acabam
não assimilando a cultura da empresa e enxergam o trabalho como um
degrau para um emprego em outra empresa, promovendo crescimento
de carreira individual. Estes funcionários com contratos transacionais
suprem a parcela de flexibilidade necessária para que empresas
sobrevivam num ambiente caótico e imprevisível.
3. Externos de longo-prazo substitutos e outros empregados temporários,
muitos deles cooperativados (pooled) podem ter seu comprometimento
com prazos na empresa alterado por devido a fatores como
oportunidades educacionais e questões familiares. A maioria acaba se
tornando empregado de meio-período com horários irregulares. De
acordo com a percepção do funcionário de quem é o seu empregador
a organização ou ele mesmo, como um funcionário autônomo, os termos
de seu contrato podem ser bem diferentes. Seu arranjo contratual é
transacional, mas pode apresentar elementos relacionais dependendo
do tempo em que ele passe na mesma empresa.
4. Externos de curto-prazo empregados “periféricos” são contratados e
gerenciados pela organização individualmente ou por meio de agências.
Seus benefícios são bastante reduzidos e geralmente os funcionários
são muito jovens ou muito mais velhos e com pouca experiência. Além
disso, trabalhos e eles destinados podem apresentar menor
62
complexidade técnica e de informações. Apesar de representarem uma
estratégia de recursos humanos para atingir o nível de flexibilidade
necessária no mercado sem comprometer os custos envolvidos, o uso
contínuo deste tipo de mão-de-obra pode trazer problemas para o corpo
de empregados, que acaba sendo divididos em duas categorias de
funcionários. Apesar disso, do ponto de vista dos funcionários centrais
este uso pode ter ainda efeito positivo, aumentando sua possibilidade de
mobilidade em função da falta de pessoal preparado para atuar nas
áreas gerenciais. Um bom exemplo deste tipo de vínculo são os
estabelecidos com funcionários de empresas terceirizadas. Estas
exercem pela organização a função de controle diário e seus
funcionários não são aproveitados em funções críticas para a empresa
central.
Miles e Snow (1986) usam o termo networked employee para se referir a
pessoas que trabalham fora dos limites da empresa principal. Posteriormente,
Rousseau (1990), bem como Coyle-Shapiro e Kessler (2000), revelaram em estudo
empíricos duas listas de conteúdos do contrato psicológico separadas em dois
diferentes fatores que podem ser consideradas não como um continuum, mas como
dimensões particulares que podem variar independentemente uma da outra. É
possível, portanto, que um empregado tenha aspectos tanto relacionais quanto
transacionais no seu contrato.
Com base neste estudo, Rousseau (2000) desenvolve a idéia de um terceiro
tipo de contrato referido como contrato balanceado. Este apresentando uma
combinação entre elementos transacionais e relacionais. A autora aponta ainda a
existência de contratos que flutuam entre estes arranjos.
63
Apesar de haver suporte empírico para a os contratos relacionais e
transacionais, a distinção entre os dois ainda não é uma questão muito clara, devido
basicamente a três razões. A primeira é o fato de que certos itens podem ser
considerados tanto relacionais quanto transacionais, dependendo do contexto. A
segunda é que a troca entre os itens disponibilizados pelas partes do contrato pode
não ser tão elementar e itens relacionais podem ser trocados por itens transacionais.
Por último, os estudos desenvolvidos até então não têm o intuito de desvendar
especificamente este fenômeno, de forma que apesar de produzirem descobertas
interessantes, revelam também abordagens e resultados inconsistentes (CONYAW
E BRINER, 2005).
Para Herriot et al. (1997), a metodologia utilizada por Rousseau apresenta
inadequações que podem comprometer o resultado da pesquisa, já que seus
respondentes eram alunos de MBA’s e a percepção do conteúdo do contrato foi
apresentada a eles em escalas de avaliação e não trazidos pelos respondentes.
Como o contrato psicológico tem caráter individual, a metodologia escolhida deveria
permitir a explicitação das mudanças e violações possíveis nesta relação de
reciprocidade.
Em estudo que pretende explorar as obrigações percebidas pelas duas partes
de um contrato com o uso de incidentes críticos, Herriot et al (1997) identificaram
que no caso estudado, existe um nível razoável de entendimento acerca do que
consiste um contrato psicológico e, ainda, que a freqüência geral das diferentes
categorias resultantes do trabalho de pesquisa aponta para uma visão tradicional
dos valores do trabalho, sendo assim o input, e não o resultado, o que realmente
importa. A diferença entre a percepção dos contratos por parte do empregado e do
empregador aparece na freqüência com que são citados na pesquisa, o que pode
64
representar maior ou menor importância de determinada obrigação para cada grupo.
Enquanto empregados valorizam aspectos como pagamento justo pelas horas de
trabalho, boas condições de trabalho e segurança no emprego, empregadores
enfatizam o oferecimento de aspectos menos tangíveis, como humanidade e
reconhecimento. Assim, existe o perigo de a empresa construir mal o entendimento
do que os funcionários querem, em especial quando a gerência tenta manter um
contrato relacional quando, na verdade, os empregados esperam a transação básica
de pagamento e segurança por tempo e esforço. Isto pode se dever a falta de
confiança na gerência em função da quebra do contrato relacional anterior e sua
conseqüente sensação de insegurança no trabalho. Segundo o estudo, quando
ocorre uma violação de contrato, a parte ofendida abre mão de suas obrigações no
contrato, expondo assim a reciprocidade do contrato. É possível que a reciprocidade
e a confiança sejam usualmente perdidas durante uma seqüência de pequenas e
não tão pequenas violações (HERRIOT et al, 1997).
Guest (2004) ressalta a importância de não tratarmos os trabalhadores flexíveis
de forma homogênea. A princípio, existe uma diferença entre trabalhadores
temporários sem estabilidade e explorados e trabalhadores especializados que
buscam a flexibilidade nos contratos temporários.
Assim, se por um lado alguns percebem o trabalho temporário como
marginalizado e desfavorável outros buscam este tipo de vínculo para garantir a
autonomia desejada.
Para analisar o impacto dos contratos flexíveis no comportamento dos
funcionários é preciso identificar como o contrato psicológico atua nestas pessoas,
até que ponto as promessas são mantidas, o quanto elas são percebidas como
justas e seu cumprimento no futuro.
65
Van Dyne e Ang (1998) estudaram funcionários temporários e permanentes
com o objetivo de avaliar o comprometimento e os contratos psicológico destes dois
grupos. O estudo revelou que os trabalhadores temporários tinham maiores
limitações em seus contratos psicológicos em termos de expectativas em relação às
obrigações das empresas. No entanto, isto não influencia diretamente no
comprometimento dos funcionários porque o status do contrato é um moderador da
relação ente contrato psicológico e resultados. Assim, se os trabalhadores
temporários têm atitudes positivas sobre seu relacionamento com a empresa, eles
se tornam funcionários mais produtivos. O contrato psicológico pode ser uma
influência mais forte para os resultados dos temporários do que dos permanentes.
Outros estudos realizados acerca dos contratos temporários indicam que os
funcionários temporários percebem seus contratos como mais transacionais, ao
contrário de funcionários permanentes, que tendem a perceber seus contratos como
relacionais (MILLWARD e HOPKINS, 1998).
Shore e Barksdale (1998) definem os contratos psicológicos de acordo com o
grau de balanço entre as obrigações do empregado e do empregador e o nível
destas obrigações. Assim, o contrato é considerado balanceado se as obrigações
percebidas pelo empregado e pelo empregador são do mesmo nível, e ambos se
sentem obrigados a cumprir um determinado termo do contrato. Caso contrário, o
contrato é considerado desbalanceado. Os contratos podem, portanto, apresentar
quatro variações: duas balanceadas - alta obrigação mútua, quando ambas as
partes tem um alto nível de obrigações e baixa obrigação mútua, quando as partes
se sentem pouco obrigadas a cumprir o contrato e duas desbalanceadas
obrigação superior do empregado, quando o empregado percebe um alto nível de
obrigação e obrigação inferior do empregado, quando o empregado tem pouco
66
compromisso com o cumprimento dos termos do contrato. Segundo os autores, o
primeiro alta obrigação mútua - é o que atinge os melhores resultados e o último
obrigação inferior do empregado - os piores. Para Shore e Barksdale (1998), os
contratos desbalanceados são menos freqüentes e temporários, já que uma vez que
as partes se sentem automaticamente obrigadas a dar alguma coisa em troca pelo
que é recebido.
Janssens et al. (2003) refutam a idéia de que contratos desbalanceados são
temporários, pois esta afirmação pressupõe que os empregados tenham poder para
renegociar suas relações de trabalho ou até mesmo mudar os empregadores.
Apesar de considerarem que a tipologia de Shore e Barksdale (1998) traz pontos
importantes para pensar as características gerais do conteúdo do contrato, estas
mesmas características são muito gerais.
Apesar de ser um modelo bem aceito, Janssens, Sels Van den Brande (2003)
questionam a validade da tipologia de Rousseau (1995), visto que ela desconsidera
três das cinco variáveis consideradas importantes na diferenciação de contratos.
Não avaliar as dimensões de escopo, foco e estabilidade coloca em dúvida a
completude do estudo. Outro ponto destacado pelos autores é a inconsistência entre
os fatores estruturais estáveis nos diferentes estudos empíricos uma vez que
determinados itens que servem para interpretar o contrato podem ser entendidos
tanto como relacionais quanto transacionais por diferentes autores.
Como alternativa, em estudo que procura entender as relações de trabalho e a
difusão do new deal
1
por meio de contratos psicológicos, Janssens et al (2003)
expandem as dimensões utilizadas por Rousseau e propõem um modelo que
1
O new deal é a mudança dos termos das relações trabalhistas. A segurança e a oportunidade de
desenvolvimento de uma carreira de longo-prazo na empresa dão lugar à obrigação da empresa de prover um
ambiente de aprendizado e crescimento onde os empregados possam receber treinamento e ganhar a experiência
necessária para que sejam empregáveis em qualquer outra organização (CAPELLI, 1999).
67
apresenta seis tipos de contratos psicológicos através da análise de clusters. Além
das dimensões de time-frame e tangibilidade, os autores analisaram também o
escopo, a estabilidade, a simetria da troca e o nível do contrato na construção dos
clusters. Neste caso, time-frame refere-se à duração percebida da relação de
trabalho, tangibilidade ao quanto o empregado percebe os termos do contrato como
claramente definidos e explicitamente especificados, escopo refere-se à barreira de
permeabilidade da relação de trabalho e de outros aspectos da vida do empregado,
estabilidade ao quanto o contrato psicológico é limitado em termos de sua
capacidade de evoluir e mudar sem que envolva renegociação de seus termos. As
duas últimas dimensões derivam de estudos acerca das diferenças nos contratos
psicológicos em diferentes países. São elas a simetria da troca, ilustrada
basicamente pelos conceitos de hierarquia e desigualdade e o nível do contrato, que
se refere à distinção entre as relações de trabalho individualmente e coletivamente
reguladas. Segundo os autores, esta última dimensão pode dar insight interessantes
a respeito da natureza do contrato. A regulação individual indica a possibilidade de
negociação individual que leve a acordos específicos que não obedeçam a regra
geral. Quando a regulação é coletiva este espaço não existe, já que todas as
negociações são feitas coletivamente.
O resultado deste estudo é uma tipologia baseada em seis clusters que
apresentam perfis com tendências que podem ser avaliadas em função do
comprometimento afetivo e da empregabilidade. Entenda-se aqui o primeiro como o
quanto o funcionário se sente emocionalmente ligado à empresa e o segundo como
a facilidade percebida em movimentar-se no mercado de trabalho (Trevor, 2001). Os
seis clusters resultantes do estudo de Janssens et al. (2003) são:
68
1. Contrato psicológico instrumental Alta pontuação na escala de
obrigações do empregador em tratamento equânime e baixa em
investimento pessoal e flexibilidade nas escalas das responsabilidades
dos empregados indicam que eles têm expectativas muito altas acerca
da responsabilidade dos empregadores, mas se percebem como tendo
poucas obrigações em retorno.
2. Contrato psicológico fraco respondentes deste cluster obtiveram baixas
pontuações em todas as escalas, sejam elas a respeito das obrigações
dos empregados ou empregadores, caracterizando um contrato de
trabalho pouco consistente.
3. Contrato psicológico leal alta pontuação em tratamento equânime e
envolvimento de longo prazo combinada à obrigações dos empregados
de muita lealdade e pouco investimento pessoal flexibilidade apontam
para um tipo de contrato que se caracteriza pela troca do envolvimento
de longo-prazo pela lealdade.
4. Contrato psicológico forte altas pontuações em todas as escalas
indicam um contrato sólido.
5. Contrato psicológico independente baixas pontuações em todas as
escalas do empregados, mas em especial em envolvimento de longo-
prazo e alta pontuação nas escalas de envolvimento pessoal do
empregado indicam um contrato de curto-prazo e pouca lealdade.
6. Contrato psicológico de investimento alta pontuação nas escalas de
empregados de tratamento equânime e alta pontuação em escalas de
investimento pessoal dos empregados apontam um contrato onde estes
69
se percebem como tendo muitas obrigações em relação a empresa e,
mas mantêm suas expectativas num nível moderado.
Desta forma, o comprometimento afetivo tenderá a ser maior em clusters que
percebem como sendo de longo-prazo a relação estabelecida e que apresentem
altos níveis de investimento pessoal, flexibilidade e lealdade contratos psicológicos
fortes, leais e de investimento. Em relações desbalanceadas, o comprometimento
afetivo pode ser ainda maior do que nas balanceadas. Em relação à
empregabilidade, se espera que clusters nos quais os empregados estejam
dispostos a investir mais em suas carreiras e seu aprendizado, a empregabilidade
seja mais alta bem como em clusters com empregados com percepção da relação
de trabalho como sendo de curto-prazo, aumentando sua responsabilidade por suas
próprias carreiras contrato psicológico independente (JANSSENS ET AL. 2003).
Para Janssens et al. (2003) seu estudo apresenta paralelos com a tipologia de
Rousseau no que concerne à perspectiva de longo-prazo do contrato relacional,
tendo encontrado os mesmo aspectos deste nos contratos psicológicos leais, forte e
de investimento. Os pontos de contato com a tipologia de Shore e Barksdale (1998)
estão na observação de similaridades entre as formas de contrato encontradas nos
clusters e o balanço destas relações - contratos instrumentais parecem corresponder
ao contrato desbalanceado com a vantagem de os clusters indicarem em que
dimensão está o desequilíbrio.
Os conteúdos do contrato psicológico afetam os resultados dos empregados e
das organizações. Eles acabam fornecendo aos funcionários uma estrutura de
objetivos que especifica o desempenho esperado e as recompensas estabelecidas.
Se pensado em termos de longo-prazo, ele produz no funcionário a idéia de que
70
estes podem influenciar suas próprias carreiras e destinos na organização,
aumentando sua motivação pela percepção de controle e previsibilidade.
Violação do contrato psicológico
As violações dos contratos psicológicos podem variar de sutis
desentendimentos à total quebra de confiança. Para Rousseau (1995) apesar de as
violações poderem levar a diferentes reações das partes prejudicadas, acarretando
inclusive o término da relação, elas são comuns e muitas vezes é possível
sobreviver a elas.
Para Herriot et al. (1997), a violação de um contrato relacional pode resultar na
desistência de manter o comprometimento da parte ofendida.
Em termos gerais, a violação do contrato ocorre quando os termos do contrato
não são cumpridos. No entanto, a natureza subjetiva do contrato faz com que a
experiência da violação esteja diretamente ligada à interpretação que o indivíduo faz
das circunstâncias. Assim, quando ambas as partes pretendem cumprir o contrato,
mas interpretações diferentes dos termos fazem com que uma das partes não haja
de acordo com o que a outra esperava, se constitui uma transgressão inadvertida.
Um rompimento de contrato se dá quando ambas as partes pretendem cumpri-lo,
mas alguma circunstância imprevista não as permite cumprir o acordo firmado. A
renegação ou quebra do contrato ocorre quando uma das partes, apesar de capaz
de cumprir o acordo, não o faz, deliberadamente. A forma como os indivíduos
percebem as violações impactam nas respostas a estes comportamentos
(ROUSSEAU, 1995).
71
As violações inadvertidas são facilmente acomodadas pela parte prejudicada e
muitas vezes passam despercebidas, de forma que nem todas as falhas no
cumprimento dos termos podem ser consideradas violações. Rousseau sustenta que
a experiência da violação ocorre quando uma falha no cumprimento de um acordo
prejudica ou causa danos que o próprio contrato foi projetado para evitar”.(1995, p.
112)
Conway e Briner (2005) utilizam a distinção elaborada por Morison e Robinson
(1997), diferenciando uma quebra de contrato de uma violação do contrato
psicológico. Enquanto a primeira se refere à uma comparação cognitiva entre o que
foi recebido e o que foi prometido, a segunda trata da reação emocional extrema que
acompanha a quebra. Os autores argumentam que a utilização desta distinção
favorece a percepção da quebra e da reação a estas quebras, fenômenos que
podem ser facilmente confundidos, misturando causa e efeito. Outra vantagem é que
outras respostas à quebra do contrato, que não as reações emocionais extremas,
podem ser consideradas. Por outro lado, a maior desvantagem é que todas as
discrepâncias, sutis e implícitas ou extremas e explícitas, são tratadas da mesma
forma, como uma quebra do contrato psicológico.
Estas falhas podem acontecer por oportunismo, negligência ou falta de
cooperação (ROUSSEAU, 1995).
A percepção da quebra do contrato depende de quem o está considerando.
Lester et al. (2002) compararam como empregados e seus gerentes a enxergam e
descobriram que empregados são mais suscetíveis do que seus supervisores a
acreditar que a organização quebrou uma promessa em relação aos seus
empregados em termos de pagamento, oportunidades e relações de trabalho,
72
enquanto esta diferença não se confirma em termos de benefícios, recursos e do
trabalho em si.
Um dos desafios para o entendimento da violação dos contratos é decifrar
como alguns eventos aparentemente inofensivos podem ser considerados
ultrajantes para o contrato enquanto outros visivelmente estranhos a seus termos
acabam sendo considerados inexpressivos. Rousseau (1995) propõe um modelo,
representado na figura 4, para explicar a dinâmica das violações contratuais. O
processo se inicia com a percepção de um resultado discrepante do prometido pelo
contrato. O quanto esta discrepância será entendida como uma violação ou não
depende de três fatores:
1. Monitoramento é a busca indireta de informações por meio da
observação do comportamento de outras pessoas. Quando não existe a
possibilidade de comparação entre os tratamentos dispensados, existe
grande possibilidade de que a discrepância não seja percebida;
2. Tamanho percebido da perda grandes e pequenas discrepâncias são
percebidas de forma diferente, de forma que quanto maior o dano
causado à outra parte, maior a percepção de violação de contrato,
mesmo nos casos de violações inadvertidas;
3. Força da relação a violação pode causar um trauma que compromete
a relação no longo-prazo. A resistência e a história da relação ajudam a
definir a percepção da discrepância como severa ou suave. Quanto
melhor a relação, menor a possibilidade de pequena discrepâncias
serem entendidas como violações.
73
Figura 4 - Modelo de violação do contrato
Fonte: ROUSSEAU, 1995.
Conway e Briner (2005) apontam a falta de estudos empíricos acerca dos
antecedentes de uma quebra contratual, mas indicam alguns fatores que podem
desencadear este evento. Uma primeira possível causa está ligada à praticas
inadequadas de recursos humanos. Quando as práticas são consistentes e
conseguem boa permeabilidade nos diversos níveis da empresa, a probabilidade de
cumprimento do contrato é maior (GRANT, 1999).
Outra possível causa é a falta de apoio que os funcionários recebem de seus
supervisores ou da organização em si. Assim, quando a empresa demonstra
preocupação com o funcionário, ele tende a considerar que a empresa cumpriu suas
promessas. Uma possível explicação é que o apoio recebido da organização
Monitoramento
Discrepância no
resultado do
contrato
Tamanho de perda
percebida
Remediação
Violação
Voluntariedade
percebida
Explicações críveis
Justiça
processual
Força da
relação
-
+
+
+
-
+
+
-
-
-
74
predispõe os funcionários a deixarem passar despercebidas pequenas quebras ou
até perdoar as maiores como um evento único (TEKLEAB, TAKEUCHI e TAYLOR,
2005).
Ainda, outra possível causa de uma quebra de contrato refere-se aos eventos
que acontecem fora da organização ou previamente à contratação do empregado.
Para Robinson e Morrison (2000), os indivíduos percebem mais facilmente a quebra
do contrato por seus empregadores quando já a experimentaram com empregadores
anteriores ou quando sabem que possuem alternativas de emprego. Os empregados
que já experimentaram uma quebra de contrato tendem a confiar menos no
empregador e a monitorar mais a relação de trabalho.
Ho (2005) aponta a percepção de iniqüidade entre seu contrato e o contrato de
outros empregados como uma outra fonte de quebra contratual. Apesar de não
haver estudos empíricos que testem diretamente o impacto da comparação social na
quebra do contrato psicológico, pesquisas que comparam a forma como se
comportam funcionários que atuam na mesma função, mas com diferentes escalas
de horários suportam a idéia de que funcionários em tempo parcial e funcionários em
tempo integral têm diferentes níveis de contrato e percepção de cumprimento das
promessas por parte das empresas.
Por fim, Robinson e Morrison (2000), apresentam um modelo teórico com dois
caminhos que podem levar à quebra do contrato psicológico. O primeiro é a
renegação, quando por conseqüência de um desempenho ruim a empresa quebra
deliberadamente os contratos com seus funcionários. O segundo, chamado
incongruência, resulta da falta de informações na contratação do funcionário e das
dificuldades de socialização dos funcionários. Assim, estes percebem quebra de
75
contrato onde há, efetivamente, um descasamento nas mensagens transmitidas e
percebidas.
O resultado das violações de contrato psicológico é um assunto amplamente
estudado, e as conseqüências, embora muito variadas acabam se resumindo na
percepção de uma relação negativa com a empresa, e assim, menor se torna à
disposição de realizar tarefas por ela.
Segundo Conway e Briner (2005), não existem evidências para a relação de
causalidade entre a quebra do contrato psicológico e as sensações de raiva,
insatisfação, traição e retaliação propostas pelos modelos teóricos. No entanto,
algumas explicações foram sugeridas por pesquisadores como possíveis
manifestações para a quebra de contrato sejam elas de cunho afetivo, atitudinal ou
comportamental.
Para Wanous et al. (1992) as promessas implicam expectativas e a violação
indica expectativas não alcançadas. Expectativas não alcançadas, sabidamente,
afetam à satisfação com o emprego e o desempenho do empregado.
Robinson e Rousseau (1994) apontam a perda de confiança gerada pela
violação do contrato como um dos fatores que podem levar à diminuição do
investimento afetivo e comportamental para com a empresa. Isso se deve ao fato de
não haver mais credibilidade na troca que teoricamente estava estipulada pelo
contrato.
Robinson, Kraatz e Rousseau (1994) vêem estas conseqüências como
alternativa encontrada pelos empregados para tornar o contrato novamente
balanceado, ajustando suas contribuições ao input dado pelo empregador. Além
disso, quando contratos são quebrados, eles costumam envolver aspectos que são
76
importantes para os funcionários como fontes de satisfação e motivação, tais como
negociações salariais e promoções.
As violações de contrato podem gerar respostas de muitas naturezas, mudando
a forma como as pessoas se comportariam em interações subseqüentes. O modo
como as pessoas reagem à uma violação estão relacionados à fatores situacionais e
predisposição das partes. Rousseau (1995) aponta quatro tipos de reação
explorados em outros estudos saída, voz, lealdade e negligência que se refletem
nas dimensões ativo/passivo e construtivo/destrutivo. O aprendizado social também
pode ser uma fonte de indução de comportamentos, já que pessoas tendem a seguir
decisões que obtiveram sucesso com outros indivíduos em ocasiões anteriores. A
cultura organizacional também pode ajudar a modelar as resposta dadas às
violações (ROUSSEAU, 1995).
Combinando-se as dimensões apresentadas por Rousseau (1995) quatro
comportamentos são apresentados:
1. Passivo-destrutivo: A saída voluntária da relação ocorre com mais
freqüência em contratos com termos transacionais com custos
relativamente baixos. Por estes contratos serem muito claros, as
imperfeições na manutenção do compromisso ficam muito evidentes;
2. Ativo-construtivo: Se refere ao comportamento adotado pelas vítimas
para remediar a violação e dar continuidade à relação, reduzindo as
perdas e restabelecendo a confiança. Ela é viável quando existe uma
relação positiva e os canais de comunicação são abertos, fazendo com
que as pessoas acreditem que podem influenciar a outra parte do
contrato;
77
3. Passivo-construtivo: O silencio é uma forma de não responder e pode
ser interpretado como lealdade ou fuga. Ele reflete a disposição de
aceitar circunstâncias desfavoráveis e acontece quando os canais de
comunicação não estão disponíveis e não existe uma oportunidade
melhor para a vítima em outras organizações;
4. Ativo-destrutivo: A negligência é uma forma de resposta complexa que
se caracteriza pelo comportamento descompromissado da vítima com
suas obrigações. Acontece com mais freqüência quando existe uma
história de conflito e desconfiança.
Algumas das estratégias adotadas para diminuir o impacto da experiência da
violação passam basicamente por reduzir a perda propriamente dita e a percepção
da perda, seja por meio de substituição do que foi perdido, reconhecendo os
aspectos simbólicos do contrato ou ainda oferecendo uma explicação plausível para
as medidas tomadas (ROUSSEAU, 1995).
Remediar é uma das formas encontradas para honrar o espírito do contrato e
envolve substituir o resultado por outro que tenha valor percebido próximo ao do
original. Gerenciar a perda e si e a percepção da perda é uma forma de remediar o
dano causado à relação. O problema é comparar os valores especialmente os
simbólicos dos recursos. Estes podem se mostrar tão ou mais importantes que os
monetários quando se trata de substituições (ROUSSEAU, 1995).
Uma das formas de remediar a perda do emprego é o aviso prévio e o
pagamento de indenizações. Quanto mais inesperada for a perda, pior será a
possível reação do indivíduo. Avisos prévios permitem que as pessoas tenham
tempo para entender a inevitabilidade da perda e tentar reduzi-la, revendo seus
planejamentos (ROUSSEAU, 1995).
78
Conway e Briner (2005) que indicam que existem fatores que moderam os
efeitos da violação do contrato, Um deles é a importância da promessa na relação
entre empregado e empregador. Outro fator está relacionado ao motivo da violação.
Assim, quando existe a quebra do contrato mesmo em circunstâncias em que
ela poderia ser evitada, entra em jogo um aspecto importante na percepção da
violação. A voluntariedade é percebida como o quanto a parte que comete a quebra
do contrato tem o controle da situação. Da perspectiva da vítima, a linha que separa
a possibilidade da impossibilidade de honrar um contrato é tênue e o comportamento
adotado tanto antes quanto depois da perda pode ser determinante na interpretação
de sua quebra (ROUSSEAU, 1995).
Quando a interpretação das vítimas é de que a situação estava fora do controle
do violador, ela não resulta em violação. A percepção do quanto o violador do
contrato tem de controle das circunstâncias depende das informações disponíveis às
vítimas e quanto mais acreditável for a explicação do evento menos as pessoas
considerarão a quebra como culpa da empresa (ROUSSEAU, 1995).
Outro possível moderador da reação à violação de contrato é a percepção de
justiça no processo. Três tipos de justiça devem ser considerados segundo Conway
e Briner (2005). A distributiva (referente às recompensas recebidas pela contribuição
feita), a processual (relativa ao processo de alocação de recompensas,
transparência e consistência nos procedimentos) e a interacional (ligado ao
tratamento interpessoal que empregados recebem durante seus contatos com os
decisores). No entanto, existe pouca sustentação empírica para o efeito desses
moderadores de forma genérica. Estudos apontam que estes fatores moderam as
reações à violação quando relacionados a contextos específicos, tais como
79
determinados tipos de justiça apresentam correlação com determinados tipos de
promessas quebradas (KICKUL, LESTER E FINKL, 2002).
Após o gerenciamento do tamanho da perda, a atenção se volta para o
processo pelo qual as discrepâncias e disputas são resolvidas. Pessoas reagem
mais favoravelmente quando o processo de tomada de decisões é considerado
como justo, ainda que não atendam seus interesses pessoais. Isto o legitima e
tornam mais compreensíveis os resultados, mesmo os negativos. Seis regras
caracterizam um processo justo: a consistência das ações tomadas ao longo do
tempo e com diferentes pessoas; a eliminação do viés que pode indevidamente
beneficiar indivíduos em particular ou evidenciar formas de preconceitos; exatidão
das informações que servem de base para o processo de tomada de decisão;
oportunidade de corrigir possíveis erros gerados por inexatidão de informação;
representatividade do processo dentre os subgrupos e indivíduos importantes e
compatibilidade com os padrões morais e éticos predominantes (ROUSSEAU,
1995).
Quebras de contratos reincidentes podem fornecer justificativa para violações
subseqüentes. Uma vez que um determinado comportamento é visto com
complacência, o padrão esperado para o próximo contrato diminui e isto acaba
moldando o contexto moral de decisões subseqüentes (ROUSSEAU, 1995).
Aderir a processos que garantam justiça pode afetar a qualidade do tratamento
percebida por vítimas e testemunhas. Quando a vítima é tratada com respeito e
dignidade sua posição social é realçada. Caso contrário, cria-se a impressão de que
a pessoa não faz parte do grupo plenamente. Estes efeitos podem se mostrar ainda
mais ofensivos se públicos, tanto em suas perdas quanto na atribuição de “quem
cometeu o erro”, tornando-se, muitas vezes, humilhantes (ROUSSEAU, 1995).
80
A criação de processos justos tem como ponto principal a promoção de
consistência, precisão e oportunidade de correção de erros, em conformidade com
rotinas e procedimentos documentados. Em caso de medidas disciplinares,
Rousseau (1995) compara os procedimentos de justiça processual à “regra do forno
quente”: imediata (reação de tirar a mão do forno instantaneamente), consistente (a
qualquer momento que alguém o faça sofrerá as mesmas conseqüências) e
imparcial (vale para qualquer pessoa que se aventure a tocar um forno quente). Os
fatores positivos da adoção de mecanismos de justiça processual envolvem a
proteção das pessoas de quebras de contrato inadvertidas e tratamentos mais
dignos dispensado aos funcionários. O fator negativo está no aumento da
responsabilidade da empresa na percepção dos funcionários, fazendo com que
gerentes tenham que se adaptar a altos padrões de justiça e aumentando o
potencial para que se perceba a injustiça. Os mecanismos de justiça processual
protegem os interesses das partes do contrato fornecendo um meio de impingir
sanções (ROUSSEAU, 1995).
O cumprimento do contrato não é um evento de destaque no contrato. Suas
violações sim representam um ponto crucial. O contrato é contínuo moldado pela
qualidade da relação e o comportamento pós-violação da vítima e do violador
(ROUSSEAU, 1995).
Mudando o contrato
Apesar de os contratos terem sido criados como uma forma de prever o futuro e
garantir uma certa estabilidade, muitas vezes precisam ser mudados para que
possam sobreviver. Como os contratos são modelos do futuro baseados em
81
experiências passadas, muitas formas de contrato têm suas raízes em tempos de
relativa estabilidade e previsibilidade, requerendo uma revisão não só de seu
modelo inicial mas da forma como a mudança é gerenciada (ROUSSEAU, 1995).
As mudanças nos contratos podem ocorrer de diversas formas. Mudanças
internas levam ao desvio (drift) do contrato e mudanças externas levam à
acomodação evolucionária ou a transformação revolucionária dos termos do contrato
(ROUSSEAU, 1995).
O desvio no contrato pode ocorrer sem nenhum esforço formal de alteração de
termos e envolve mudanças internamente induzidas no modo como o contrato é
entendido. Este processo pode se iniciar por duas causas principais: as tendências
cognitivas e os efeitos maturacionais (ROUSSEAU, 1995).
Devido à imperfeição dos dados, o processamento de informações das pessoas
é fortemente influenciado por suas expectativas e interpretações. Algumas das
tendências cognitivas mais comuns estão ligadas à disponibilidade da informação a
respeito das contribuições de cada uma das partes do contrato, a inclinação em
acreditar que sua intenção de cumprir o contrato é maior que a da contraparte e a de
criar cenários otimistas irreais a respeito da capacidade de cumprir os acordos
firmados, já que as pessoas estão inclinadas a lembrar mais de seus sucessos do
que de seus fracassos e acreditar exageradamente no seu controle pessoal da
situação. A conseqüência disto é que as pessoas, em geral, acreditam ter cumprido
sua parte do contrato enquanto a outra parte não (ROUSSEAU, 1995).
A maturação é a mudança da forma como a pessoa enxerga o papel do
trabalho em função de mudanças na sua vida pessoal. Estas podem se dar por
demandas familiares ou crescimento pessoal, gerando uma nova definição de suas
responsabilidades no trabalho. O ciclo de vida, tanto do empregado quanto da
82
empresa, pode gerar mudanças no significado dos termos do contrato (ROUSSEAU,
1995).
Tanto empregados quanto empregadores podem mudar suas expectativas sem
que a outra parte experimente uma mudança no acordo. A zona de aceitação,
conforme proposta por Simon (1958,1976 apud ROUSSEAU, 1995), é a área em
que as organizações podem pedir novas atribuições aos funcionários sem que isto
seja percebido. Quando as mudanças ocorrem muito lentamente, elas acabam
criando desvios na zona de aceitação. Os desvios (drifts) acontecem com mais
freqüência quando as mudanças internas podem ser encaixadas em esquemas
antigos e quando existe uma boa relação entre empregado e empregado
(ROUSSEAU, 1995).
O tempo de duração de um contrato pode mudar seus termos de transacionais
para relacionais. Quanto mais tempo a relação dura, maiores são as barreiras de
saída, envolvendo custos econômicos e financeiros. A permanência de um
funcionário por muito tempo pode indicar desvios (drifts), se a empresa permitir que
o funcionário trabalhe da forma que considera mais adequada e torna tácitos seus
conhecimentos e experiências na empresa. Este contrato parece ser contínuo, mas,
no entanto representa um novo, diferente do inicial (ROUSSEAU, 1995).
Se por um lado os desvios (drifts) podem ser favoráveis por proporcionarem
uma flexibilidade que permite a adaptação aos ciclos de vida e às mudanças
organizacionais, por outro eles podem criar violações quando a percepção de desvio
de uma das partes excede a zona de aceitação da outra. Para alcançar um acordo
que seja mútuo e contínuo, Rousseau (1995) sugere conversas periódicas acerca
dos aspectos centrais do contrato, treinamentos que favoreçam a comunicação do
entendimento dos termos e atualizações que evitem a expansão do contrato e a
83
erosão dos acordos. Os desvios podem evitar os perigos de uma empresa estática e
ainda proporcionar o crescimento pessoal de seus funcionários (ROUSSEAU, 1995).
Mudanças externas, por sua vez, podem tornar inviáveis acordos estabelecidos
para o longo-prazo. Este fator pode ser ainda mais expressivo dependendo da
indústria na qual a empresa está inserida. Estas mudanças podem levar à sua
acomodação na estrutura do contrato existente ou à transformação na natureza da
relação entre as partes, redefinindo este contrato (ROUSSEAU, 1995).
Geralmente, a estratégia de mudança do contrato se dá via acomodação, já
que ela permite a continuidade do contrato, demonstrando que não há um
rompimento do mesmo e que diante da impossibilidade de cumprir o acordo, existe a
intenção de honrar o espírito do contrato, mantendo os mesmo esquemas mentais e
a integridade da relação entre as partes. Isto é possível principalmente quando o
bom relacionamento empregado\empregador amplia a zona de aceitação devido ao
seu aspecto relacional e não leva a uma busca ativa das violações (ROUSSEAU,
1995).
A acomodação é influenciada pela manutenção do status quo da relação.
Quanto mais justas forem as mudanças, maiores serão as possibilidades de redução
das perdas. Quando as ações geram ganho para uma das partes às custas da outra,
elas poderão ser mais facilmente reconhecidas como uma ameaça. Em três
situações, ganhos (e perdas) unilaterais podem ser aceitos: quando o ganho não
tem custo para a outra parte, quando a perda representa apenas a manutenção do
status quo e quando existem razões capazes de legitimar as ações. Elas são, em
geral, externas e fora do controle da partes (ROUSSEAU, 1995).
Outro fator que pode impactar no processo de acomodação é o nível em que a
mudança afeta o contrato. Mudanças nos termos considerados auxiliares que não
84
estão profundamente estabelecidos são consideradas mais facilmente
acomodáveis do que as mudanças nos termos principais. O mesmo acontece
quando os benefícios estão agrupados. Por ser mais difícil que as pessoas os
percebam como componentes individuais, a mudança no pacote pode gerar
percepção de perda (ROUSSEAU, 1995).
Além disso, a participação nos processos de mudança, a limitação do escopo
da mudança muitas vezes representando apenas refinamentos nos termos
contratuais iniciais e a clareza do término da mudança também são aliados do
processo de acomodação. Uma vez que muitas empresas não pontuam o término
das mudanças, as pessoas não conseguem confiar no aspecto de previsibilidade do
contrato, levando a insegurança, ansiedade e muitas das vezes, índices altos de
rotação de empregados em processos muito prolongados. A falta de continuidade
pode acarretar o fracasso da acomodação, bem como subestimar sua importância
pode gerar uma reação inesperada da outra parte (ROUSSEAU, 1995).
As transformações representam mudanças radicais, com o término do contrato
existente, pela sua quebra ou conclusão, e a conseqüente criação de um novo
contrato. Neste caso, existe uma possibilidade real, tanto de ganhos quanto de
perdas muito expressivas. O processo de transformação e a violação são separados
por uma tênue linha e a forma como esse processo ocorre pode determinar a
violação de fato ou a mudança da base do relacionamento entre as partes.
Mudanças na confiança, exigências de desempenho e distribuição do risco da
empresa entre os funcionários comprometem a essência do contrato psicológico
(ROUSSEAU, 1995).
Rousseau (1995) descreve um processo de quatro etapas na transformação
dos contratos. A primeira é desafiar os contratos existentes para entender e criar a
85
necessidade de mudança, a despeito da tendência ao conservadorismo e à
manutenção do contrato. A segunda passa pela preparação para a
recontextualização (reframing) através de estratégias para redução de perdas,
descongelando o contrato inicial e reconhecendo a importância do contrato vigente,
mas sinalizando a proximidade de um novo acordo. O uso de estruturas de transição
pode facilitar a comunicação das transformações, cuja falta é uma das causas mais
recorrentes na falha do processo. O terceiro passo é criar um novo esquema que
crie imagens do futuro. Mais do que um evento único, os contratos são criados pela
interação com outros membros e sense-making. Neste ponto, novos termos do
acordo são identificados, transmitidos e interpretados. Os agentes da mudança
precisam estar aptos a transmitir os eventos organizacionais e ambientais de várias
perspectivas, para além de seus quadros próprios de referência e os empregados
devem se comportar como novatos na busca ativa por informações. A última etapa
testa a confiabilidade e promove a aceitação do novo contrato, que é demonstrada
pela adoção de um novo quadro de referência, pela expressão de uma escolha, pela
transmissão do compromisso publicamente e pelo desenvolvimento de uma massa
crítica de pessoas com o mesmo contrato (ROUSSEAU, 1995)
86
Metodologia
Tipo de pesquisa e seleção do método
Em termos metodológicos, a pesquisa qualitativa foi desenvolvida para
possibilitar que pesquisadores das ciências sociais pudessem estudar fenômenos
culturais e sociais, opondo-se ao pressuposto de um modelo único de pesquisa para
todas as ciências, baseado no modelo de estudo das ciências naturais.
Pesquisadores que adotam esta postura metodológica declinam de legitimar seus
conhecimentos por processos quantificáveis que venham a se transformar em leis e
explicações gerais. (BOGDAN e BIKLEN, 1991).
Uma vez que as ciências sociais têm suas especificidades, o que pressupõe
uma metodologia própria, cientistas sociais que pesquisam os significados das
ações sociais de outros indivíduos e deles próprios são, ao mesmo tempo, sujeito e
objeto de suas pesquisas. Estes cientistas buscam compreender os valores,
crenças, motivações, significados e sentimentos humanos, compreensão que só
pode ocorrer se a ação é colocada dentro de um contexto de significados. Na
investigação qualitativa a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo o
investigador o instrumento principal. (Bogdan e Biklen, 1991).
Existem diversas formas de se desenvolver uma pesquisa qualitativa. Meyers
(1997) aponta como exemplo a pesquisa-ação, o método do estudo de caso, a
etnografia e a grounded theory.
Yin (2003) ressalta que cada tipo de estratégia a ser desenvolvida nos estudos
das ciências humanas tem seus prós e contras, que devem ser avaliados de acordo
com três condições essenciais: (a) o tipo de questão do estudo, (b) o controle do
87
pesquisador sobre os eventos pesquisados e (c) foco no aspecto contemporâneo,
em oposição à fenômenos históricos.
Seguindo as orientações de Yin (2003), no estudo em questão, quando se
pretende entender se e como os contratos psicológicos firmados na média gerência
da empresa e na base operacional diferem, ressaltando como os sujeitos envolvidos
em um contrato psicológico entendem as dimensões de um novo contrato, optou-se
pela utilização da estratégia que valoriza o fenômeno estudado inserido num
contexto contemporâneo real quando o pesquisador não tem controle sobre ele.
Trata-se do estudo de um evento que atende aos pré-requisitos do método de
estudo de caso.
Este método supõe que se pode adquirir conhecimento do fenômeno estudado
a partir da exploração intensa de um único caso. No estudo de caso não há uma
técnica específica, mas uma análise holística, a mais completa possível que
considera a unidade social estudada como um todo, seja o indivíduo, uma família,
uma instituição ou uma comunidade com o objetivo de compreendê-los em seus
próprios termos.
A realização deste tipo de pesquisa implica a busca pelo maior número de
informações detalhadas, por meio de diferentes técnicas de pesquisa, com o objetivo
de apreender a totalidade de uma situação e descrever a complexidade de um caso
concreto. Por meio de um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado, o
estudo de caso possibilita a penetração na realidade social, não conseguida pela
analise estatística (BOGDAN e BIKLEN, 1991).
Segundo a taxonomia proposta por Vergara (1990), esta pesquisa pode ser
classificada tanto exploratória quanto descritiva. Exploratória porque não existem, no
contexto brasileiro, muitos estudos sistematizados que tratem das diferenças nos
88
contratos psicológicos que se constituem nos diversos níveis de uma mesma
empresa em fase de reestruturação. Mesmo no contexto internacional, pesquisas
deste cunho não foram desenvolvidas (CONWAY e BRINER, 2005). Descritiva
porque expõe características de uma empresa e de um grupo de funcionários
específicos (base operacional e média gerência), podendo estabelecer ligações
entre as variáveis, mas sem definir relações de causa e efeito.
As fontes de dados qualitativos incluem a observação dos participantes,
entrevistas e questionários, documentos e textos, e as impressões e reações do
pesquisador. Para ampliar as fontes de informações acerca dos contratos
psicológicos dos funcionários neste caso específico, foram utilizados materiais
distribuídos pela própria empresa, internamente, além de entrevistas realizadas
previamente com a alta administração. Estas entrevistas faziam parte de um estudo
paralelo que buscava mapear a cultura organizacional da empresa.
O presente estudo irá basear-se em entrevistas qualitativas com funcionários
da empresa em questão. O uso das entrevistas qualitativas como conversas
direcionadas (RUBIN e RUBIN, 1995) se justifica pelo fato de que os tópicos de
interesse não estão centrados em pontos específicos, mas no estabelecimento de
padrões comuns entre tipos particulares de respondentes (Warren, 2003).
A entrevista é utilizada para recolher dados descritivos na linguagem do próprio
sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma idéia sobre a
maneira como ele interpreta aspectos do fenômeno pesquisado. Neste estudo, as
entrevistas se constituíram como a estratégia principal para obtenção de dados
(BOGDAN e BIKLEN, 1991).
Teoricamente, as entrevistas variam quanto ao grau de estruturação
(VERGARA, 1990. Em um extremo do contínuo estão as estruturadas e, no outro, as
89
não estruturadas. A estrutura da entrevista utilizada neste caso se encontra no meio
deste contínuo e, embora relativamente abertas, centram-se em tópicos
determinados ou são guiadas por questões gerais. Para Bogdan e Biklen (1991),
mesmo quando se utiliza um roteiro, as entrevistas qualitativas oferecem ao
entrevistador uma amplitude de temas considerável que lhe permite levantar uma
série de tópicos e oferecem a oportunidade de moldar o seu conteúdo.
A escolha por entrevistas semi-estruturadas tentou garantir a obtenção de
dados comparáveis ente os vários sujeitos, objetivo principal deste trabalho, sem
que se perdesse a oportunidade de compreender como é que os próprios sujeitos
estruturam o tópico em questão ou que aparecessem novos e interessantes aspecto
a serem incluídos nas análises (VERGARA, 1990).
Neste sentido, concordando com Kvale (1996), o design open-ended da
entrevista qualitativa está mais preocupado com a interação interpessoal do que com
a precisão do roteiro a ser seguido.
Seleção do caso ou unidade a ser pesquisada
Este estudo foi realizado com base numa pesquisa encomendada ao Instituto
Coppead de Administração por uma empresa que passou por um processo de
reestruturação visando transformar - conforme detalhado a seguir - a forma como a
empresa estava sendo vista por seus funcionários e investidores.
A história desta empresa remonta ao século passado, com a inauguração de
uma hidrelétrica, mas é no ano de 1996 que ela inicia sua história como empresa
privatizada, como muitas outras, na década de 90, após a sansão da lei que criava o
Programa Nacional de Desestatização. No entanto, após muitos anos sob a tutela do
90
Estado, tendo passado por diversas mudanças em sua estrutura, como fusões e
incorporações de outras empresas, sua direção, no ano de 2004, implementou um
plano de reestruturação que visava criar um processo de mudanças planejado por
meio de uma nova estratégia de gestão negócios. Era necessário dar uma direção
mais específica para a empresa após anos de gestão pública com reorganização
das metas e dos processos da empresa.
Assim, este estudo é complementar à pesquisa desenvolvida por Hilal, Wetzel e
Ferreira (2007) que buscou entender as relações entre a Cultura Organizacional,
Contrato Psicológico e Indicadores de Desempenho na empresa estudada. O intuito
é incluir um novo nível de cargos às análises o da base operacional, que não fora
contemplado na pesquisa inicial.
Na pesquisa supra-citada, foi realizado um mapeamento da média gerência,
utilizado aqui como base para estes estudos. No caso da base operacional, este
mapeamento não existia, tendo sido completamente realizado por esta
pesquisadora.
Seleção dos sujeitos
Os dados necessários para esta pesquisa foram fornecidos por funcionários de
uma empresa de distribuição de energia que têm passado por constantes
reestruturações de cunho físico e estratégico.
A seleção dos sujeitos foi realizada, principalmente, com relação aos cargos
dos entrevistados que fazem parte da base operacional e média gerência da
empresa em questão.
91
A partir daí, a seleção de cada um dos níveis se deu de formas diferentes. No
caso da média gerência, a seleção dos 21 entrevistados ocorreu por indicação da
área de Recursos Humanos, buscando entrevistados que atuassem em onze
diferentes localidades, como uma forma de diminuir as possibilidades de que fossem
captadas apenas as percepções de uma sub-cultura da empresa.
Para a base operacional optou-se por entrevistar funcionários restritos a duas
diferentes localidades também conforme indicação da área de Recursos Humanos.
A primeira localidade aqui denominada por A foi selecionada em 2005, portanto
cerca de um ano após o início da grande reestruturação da empresa. A segunda
localidade aqui denominada por P foi selecionada em 2006, cerca de 18 meses
após esta reestruturação. Em cada uma das localidades nove entrevistas foram
realizadas, totalizando 18 funcionários para a base operacional.
Consta do Anexo A o perfil de cada um dos entrevistados da base operacional
e no anexo B o perfil dos funcionários da média gerência.
Coleta de dados
Os dados utilizados neste estudo são provenientes, conforme relatado, de base
gerada no contexto de uma pesquisa realizada pelo Instituto Coppead de
Administração para a referida empresa. Tendo feito parte da equipe de pesquisa,
esta autora, esteve presente em parte das entrevistas realizadas, participou da
confecção dos roteiros, da transcrição de entrevistas e de suas revisões.
As entrevistas em profundidade tiveram duração média de uma hora e trinta
minutos. Todas foram realizadas nas dependências da própria empresa.
92
Como foi necessário gravar as entrevistas, foi obtido o consentimento dos
entrevistados e a confidencialidade lhes foi assegurada antes de sua realização.
Quanto aos roteiros utilizados, ressalta-se que para cada nível entrevistado,
estes foram diferentes, dado que no contexto da pesquisa realizada por Hilal, Wetzel
e Ferreira (2007), a base operacional foi utilizada como um piloto para a realização
das entrevistas da média gerência. No entanto, como as questões a serem
respondidas eram as mesmas, foi possível conseguir dados comparáveis entre as
entrevistas realizadas.
Um aspecto que pode ter influenciado a coleta dos dados é o fato de que estas
foram realizadas em diferentes momentos, sendo as da localidade A, o primeiro
grupo e as da localidade P, o segundo grupo, com a diferença de seis meses. Isto
pode ter influenciado a percepção que os funcionários tinham do plano de
reestruturação, que, no caso das primeiras entrevistas, havia sido recém-
implementado e que representou uma grande mudança em seus contratos
psicológicos. No entanto, o plano já apresentava mais solidez quando o segundo
grupo de entrevistas foi coletado.
Tratamento dos dados
As entrevistas foram transcritas em Word e posteriormente realizou-se revisão
com o objetivo de garantir a fidelidade do material a ser utilizado. É importante
ressaltar que a revisão foi feita por pessoa diferente daquela que transcreveu
inicialmente a fita.
A análise foi realizada com o uso do software Atlas Ti. 4.2. para que a
organização dos dados e das categorias se tornasse mais prática e facilmente
93
acessada. Trata-se de um software para análise de dados qualitativos, ajudando a
adoção de uma abordagem mais sistemática de dados pouco estruturados.
Limitações do método
A metodologia escolhida, apesar de adequada para o estudo, apresenta
também suas limitações intrínsecas. Por exemplo, o quanto as pessoas conseguem
se expressar durante uma entrevista e a interferência do próprio entrevistador
durante a entrevista podem afetar a qualidade da mesma. A própria percepção do
entrevistador acerca do sujeito da pesquisa pode influenciar na análise dos dados
coletados (BOGDAN E BIKLEN, 1991).
Além disso, a opção pela realização de um estudo de caso exploratório e
descritivo, ao invés de um estudo histórico, pode limitar o entendimento acerca das
questões que formaram a percepção de contrato psicológico destes funcionários.
Assim sendo, este trabalho não tem a pretensão de produzir generalizações,
mas de estudar a intrincada rede de variáveis que puderam estar em jogo durante a
negociação das transformações dos contratos psicológicos dos funcionários de dois
diferentes níveis na empresa para sua posterior comparação.
No caso do investigador qualitativo, a entrevista surge com um formato próprio.
Segundo Rubin e Rubin (1995), os tópicos de uma entrevista podem emergir de
variadas fontes, tais como as experiências de vida, a personalidade do pesquisador
e sua identidade étnica, racial ou sexual. Assim, Luff (1999) aponta a existência de
diferentes perspectivas e sugere que tanto pesquisador quanto respondentes
94
conversam não de um ponto de vista estável e coerente, mas de perspectivas que
podem variar de acordo com os papéis que ela desempenha e hierarquias sociais,
particularmente de gênero, raça e classe. Assim, ao entrevistar uma mulher, ela
pode falar do ponto de vista de funcionária da empresa, cliente, mãe, entre outros
possíveis. Ainda que situacionais, estas perspectivas desenham o fluxo das
entrevistas e, no caso das qualitativas, precisam ser levadas em conta pelo
pesquisador para que se possa compreender o processo de geração de sentido para
o entrevistado (WARREN, 2003). Neste estudo, não foi possível levar em
consideração sistematicamente estas perspectivas. Em primeiro lugar, por conta do
grande número de entrevistas realizadas. Em segundo lugar, porque, para tal, seria
necessária a utilização de outros recursos não disponíveis para registro apropriado
das diversas nuances que podem surgir em uma entrevista e que não podem ser
captados pelos gravadores.
95
O contrato psicológico da Média gerência
O contrato Psicológico da média gerência da empresa foi mapeado durante
projeto de pesquisa realizado em 2005/2006 e será utilizado como apoio para a
comparação com o contrato da base operacional.
Este mapeamento se baseou nos critérios utilizados por Janssens et al (2003)
para a construção do modelo de seis clusters e nas dimensões apresentadas por
Rousseau (2000) em sua tipologia de contrato psicológico.
Buscou-se identificar a dimensão mais importante e, a partir desta, a pesquisa
desenvolveu cinco dimensões, conforme proposto por Janssens et al. (2003) para
entender o contrato psicológico destes funcionários: (1) horizonte temporal da
relação; (2) tangibilidade; (3) Escopo; (4) Estabilidade; e (5) Nível do contrato no
caso das promessas da empresa ou Simetria da troca, no caso dos compromissos
dos funcionários.
Cada uma destas dimensões se reflete em diferentes aspectos, quando
analisadas do ponto de vista da promessa da empresa ou do compromisso do
funcionário segundo quadro a seguir:
Quadro 3 As cinco dimensões de Janssens et al (2003)
Promessa da Empresa Compromisso do
funcionário
Horizonte temporal
da relação
Envolvimento de longo prazo Lealdade
Tangibilidade Clareza dos termos do
acordo
Atitude aberta
Escopo Tratamento pessoal Investimento pessoal
Estabilidade Cuidado Flexibilidade
Nível do contrato Tratamento equânime _
Simetria da troca _ Respeito pela autoridade
Fonte: Janssens et al. (2003)
96
As promessas gerais da empresa
Dentre as promessas feitas pela empresa, Wetzel et al. (2007) encontrou como
mais importante as oportunidades na carreira. Esta foi a dimensão mais citada,
inclusive porque se remete às expectativas de auto-desenvolvimento dos
funcionários.
Na verdade, hoje eu acho que a empresa oferece mesmo, no meu ponto de
vista pelo que eu enxergo, mostrar as oportunidades que existem. Que a
empresa é uma empresa em transformação e que é uma oportunidade
muito grande para essa pessoa participar dessa transformação. [...] Quais
as oportunidades que [o funcionário] pode ter que só depende dele. Porque
uma coisa deve ficar bem clara: a questão de desenvolvimento. Hoje
depende muito mais do funcionário que da própria empresa, entre aspas. A
empresa facilita, mas se um funcionário não quiser aí já é complicado.
Então, para quem quer, as oportunidades estão ali. São muitas. (MG13)
A idéia do aumento das oportunidades de carreira, aliada ao auto-
desenvolvimento dos funcionários é reforçada pelo lançamento do mapa de carreira,
como uma forma não só de avaliar a evolução do funcionário no seu cargo, mas
também de tangibilizar a possibilidade de um crescimento efetivo na empresa.
Acho que o mais importante nisso ai é o mapa de carreira, é o profissional
saber onde é que ele está. E usar o mapa de carreira não só como fator de
avaliação mas também como desenvolvimento de competência. Eu acho
que a grande sacada de todo o trabalho dentro de recursos humanos, que
eu vejo que é muito positivo - e eu estou na companhia desde 2001 e havia
uma grande demanda por isso - é o mapa de carreira como instrumento de
desenvolvimento profissional. (MG14)
Além das oportunidades de crescimento interno, a visibilidade gerada por
trabalhar numa empresa reconhecida pelo mercado como uma empresa eficiente e
lucrativa deve gerar oportunidades externas. Isto se deve ao aumento da
empregabilidade do funcionário.
A promessa de crescimento profissional, como entendida pelos funcionários é,
ao mesmo tempo uma promessa de maiores ganhos financeiro, promoção em
cargos e aumento na complexidade dos desafios apresentados. Ela é vista como o
motor de mobilização e motivação para o grupo” (Wetzel et al. 2007) e a menos que
97
todos os seus componentes estejam presentes, ela não é suficiente para atender as
expectativas da média gerência da empresa.
Envolvimento de longo prazo
Quanto ao horizonte temporal da relação, a empresa sinaliza uma relação
duradoura e tendendo para o longo prazo. No entanto há uma ruptura com a noção
anterior de estabilidade, onde se acreditava que uma vez funcionário da empresa,
maiores esforços não eram necessários para a manutenção deste status.
O antigo sistema de senioridade é aqui substituído por um sistema
meritocrático que não tem interesse em premiar o desempenho e a lealdade
oferecida no passado. A possibilidade de desempenho qualitativamente inferior ao
longo do tempo não é aceita neste novo modelo. É preciso que os funcionários
façam jus ao salário que [...] recebem. Não adianta receber um salário agora por
aquilo que [...] fez há cinco anos atrás.” (MG8)
Sob este ponto de vista, o futuro de cada funcionário está em suas próprias
mãos e depende do cumprimento das metas estabelecidas. A sua permanência e
sucesso na empresa são, na verdade, uma conquista do colaborador. Quando
perguntado se, ao seu entendimento, a empresa faz alguma promessa de
segurança, este funcionário entende que seu emprego está diretamente ligado com
seu desempenho.
Prometer, não promete. Vamos dizer assim, eu confio no meu taco. Eu acho
que sou bom empregado. Então não é uma questão de prometer, é uma
questão de troca. Ela precisa do que eu estou fazendo e eu preciso da
empresa para sobreviver. E pretendo ficar muito tempo aqui, eu estou feliz.
(MG9)
Não existem maiores preocupações acerca da possibilidade de uma demissão
inesperada e o turnover é baixo, especialmente se comparada ao instável período
98
da privatização da empresa. A contra-partida do colaborador é que ele apresente
resultados.
Longevidade no trabalho. Não confundir com estabilidade [...]. Tendo
capacidade, tendo potencial, é um bom trabalhador, um bom colaborador,
não tem que ter medo de nada. Não tem porque ficar estressado com o
emprego. A gente está querendo gente boa para trabalhar bem. O cara é
bom, trabalha bem, tem lugar. Até num processo que possa, [...] por um
motivo qualquer, ser extinto [...], se o cara tem potencial, tem colocação
dentro das [outras] atividades. Gente boa tem que estar aqui dentro, tem
que ter oportunidade aqui dentro, tem oportunidade. (MG12)
Em situações de mudança organizacional, quando há mudanças nos processos
e na estrutura da empresa acabam sendo responsáveis por redundâncias e
conseqüentes demissões, a empresa sinaliza a possibilidade de reter os
funcionários, remanejando-os para outros setores ou outros processos.
Mesmo em situações hipotéticas, imaginando que os resultados da empresa
atinjam menores taxas de lucratividade, situação que diminuiria os efeitos de uma
provável violação de contrato, não existe a expectativa de demissões.
A impressão, o que eu acredito, é que a empresa vai continuar com essa
postura: procurando orientar e dar oportunidades, independente da questão
da lucratividade. Até porque para reverter uma situação financeira
desfavorável, você depende das pessoas. Então não teria porque estar
tirando pessoas. (MG13)
Nos casos em que os empregados não atingiram o desempenho esperado, o
papel da liderança é essencial. Como não é prática da empresa demitir empregados
que não atingiram suas metas, nestes casos específicos a liderança é responsável
por analisar cada caso e orientá-los individualmente. Neste ponto, os gerentes
atuam como principais contract makers tanto no estabelecimento do contrato quanto
em sua renegociação.
Na frente do [presidente da empresa] e da [gerente de recursos humanos],
eles não vêem quem está trabalhando comigo, eu é que vejo. Também sou
o canal, o meio de campo deles. Então eu sei que eu sou a pessoa para
falar esse aqui não serve para trabalhar na empresa, esse serve, pode
dar mais uma chance”, esse cara aqui, ele tem potencial, mas não está
nada bem, vamos direcioná-lo no caminho certo. Então isso existe na
empresa. Não é uma coisa não cumpriu a meta e está demitido”. Não é
isso. Só se for uma coisa muito séria. (MG6)
99
Cabe ressaltar que não se trata de uma promessa de emprego de longo prazo
incondicional. É necessário que os funcionários se comprometam com os resultados
da empresa e que somente sob estas circunstâncias a expectativa de relação
duradoura é válida. As reestruturações e as demissões não seriam, na perspectiva
dos funcionários, impulsionadas por aspectos exteriores às relações de trabalho, que
estariam fora do controle do funcionário (à óbvia exceção de uma crise realmente
grave).
Outra contrapartida esperada parece ser o auto-desenvolvimento. Segundo um
dos entrevistados, [a empresa] dá oportunidades de desenvolvimento e [o
funcionário] tem que buscar seu auto-desenvolvimento. Ela dá todas as ferramentas
para [isso]” (P7). As políticas apoiadas pela organização levam a crer que é
interesse da empresa manter os funcionários numa relação mais estável. O mapa de
carreira, as parcerias estabelecidas com as universidades e escolas e o auxílio da
empresa, seja ele financeiro ou por meio de flexibilização de horários significariam
um desperdício de recursos se houvesse a intenção de demitir estes funcionários
sem usufruir dos conhecimentos e experiências adquiridas.
Ela proporcionou, por exemplo, o curso de tecnólogo. Existe um convênio
com [uma universidade], em que a empresa paga parte dos estudos. Se ela
não quisesse desenvolver a longo prazo, ela não investiria dinheiro num
profissional que vai ficar lá dois ou três anos estudando, investindo e
aplicando dinheiro e inclusive tirando horário flexível [...]. Eu, por exemplo,
no meu cargo de líder, estou fazendo um MBA pago pela empresa. Então
você vê que a empresa não está pensando no imediatismo, ela está
querendo uma coisa a longo prazo, com certeza.” (MG16)
Neste contexto, a retenção de talentos é um ponto crítico para o sucesso da
estratégia da empresa. Os recursos desenvolvidos na empresa têm possibilidade de
ocuparem cargos maiores não só internamente como também em outras empresas
de seu grupo controlador, quando considerados talentos singulares. Isto torna a
tríade de expectativas relação de longo prazo, promoção e novos desafios - ainda
mais representativa no contrato psicológico estabelecido.
100
A empresa está preparando, no meu caso e de algumas pessoas gerentes
pessoas para ocuparem cargos até em outras empresas do grupo. Então
não é [a empresa], é o [grupo controlador da empresa]. Então a minha
perspectiva pelo menos, é alcançar depois, ou aqui no Brasil ou fora do
Brasil ou dentro do Brasil em outra empresa que eles comprem, uma
posição maior. (MG6)
Em alguns discursos há uma dissonância em relação ao comprometimento com
as relações de longo prazo. Este compromisso pode não ser enxergado como
extensivo aos funcionários da base operacional. Como, segundo Rousseau (1995)
os próprios funcionários são importantes contract makers, as interações entre os
pares e, mesmo gerentes são fontes de informações na modelagem do contrato
psicológico, alguns funcionários podem perceber esta limitação como uma violação
ao contrato ou podem influenciar a percepção dos contratos psicológicos dos
gerentes. Por ser esta uma empresa que tem a presença maciça de terceirizados, a
criação dos contratos pode se tornar mais complexa. Estes funcionários
Não sentem segurança. As pessoas não sentem segurança de falar para
você: Daqui a um ano, daqui a dois anos, eu estou me esforçando, corro
atrás, vou à luta, vou estar trabalhando”. Isso eu não sinto nas pessoas.
(MG10)
Outro grupo para o qual este compromisso parece não valer é o dos
funcionários pouco especializados, já que existe uma tendência clara de extinção
e/ou terceirização dos cargos que exigem menor qualificação. Estes funcionários
parecem entender que sua segurança está garantida pela legislação trabalhista e a
questão do auto-desenvolvimento se torna secundária em função da auto-
preservação na empresa. Nesse caso, não há investimento numa carreira
ascendente e, muitos deles, inclusive, pretendem apenas encerrar sua carreira na
empresa, sem maiores ambições de ganhos salariais ou promoções.
Existe aquela classe que empregados que tem um conhecimento técnico
menor, que são os eletricistas. Não que eles se sintam inseguros, mas eles
não têm aquela visão de que vão ficar muito [tempo]. [...] Eles até acham
que vão ficar, mas não tem essa certeza. A empresa sinalizou, ela é muito
dinâmica, há pouco tempo ela sinalizou assim: não tem no nosso mapa de
carreira, carreira para eletricista’ E até dispensou alguns eletricistas. Isso
foi colocado de forma bastante transparente para eles. (MG7)
101
Clareza dos termos do acordo
Outra dimensão da promessa percebida como tendo sido feita pela empresa
refere-se a tangibilidade e à clareza dos termos do acordo. Este aspecto diz respeito
ao quanto os empregados percebem o acordo como pouco ambíguo e
explicitamente definidos.
Existe uma forte percepção de que a empresa é muito transparente, não
apenas no que diz respeito às notícias cotidianas, mas também em relação aos
resultados da empresa como um todo.
Nós temos reuniões, apresentação do plano de reestruturação da empresa.
Elas são feitas em todas as áreas da empresa, mostrando onde é que a
empresa quer chegar e como ela está hoje. Nós temos pesquisas internas,
nós temos reuniões periódicas com os funcionários para analisar onde eu
quero chegar e onde estou hoje. O que depende da empresa e o que
depende do grupo. As metas são de conhecimento, os nossos resultados
são de conhecimento, os nossos gaps são de conhecimentos. E aquilo que
é preciso fazer para superar os gaps está na função de cada um de nós
líderes, mas ela é compartilhada. (MG11)
O período de implantação de um plano de reestruturação é um bom exemplo
de como as regras do jogo são claras. Tendo representado este plano uma parte da
grande renegociação dos contratos psicológicos da empresa, o esclarecimento de
seus objetivos e valores indica um comprometimento sério em manter a
transparência.
Nós temos nossos valores muito bem explícitos, no nosso crachá, a gente
tem nossos valores muito bem claros: foco nas pessoas, foco no cliente,
orientação ao negócio. Enfim, todos esses valores são muito claros. Então a
empresa mostrando, sinalizando isso, acho que isso é que ela está
esperando desses profissionais. É isso que ela espera. (MG16)
As entrevistas sugerem dois indicadores importantes que acabam atuando em
conjunto na percepção da clareza da relação empregado/empregador. O mapa de
carreira e a liderança. O mapa tem a função de esclarecer os objetivos de cada
funcionário, como deve ser seu desenvolvimento para aspirar outros cargos e que
tipo de promoções são possíveis para este ele. No entanto, o principal facilitador do
102
mapa de carreira é o gestor, que acaba sendo o responsável por seu entendimento
e, em parte, pela viabilização do seu conteúdo.
Tem um mapa de carreira que foi inaugurado ano passado, isso também
ficou claro [...], mas isso também depende do gestor, porque uma coisa é
apresentar o programa para toda a empresa, mas também existe
responsabilidade do gestor de transmitir maior informação ao empregado,
ao grupo de trabalho. Também porque existem pessoas que entendem
perfeitamente e existem pessoas que eu já falei, já conversei nos corredores
que não entendem, por que o gestor não é capaz de transmitir corretamente
a informação. Isso já não compete à empresa, a empresa está
apresentando, a empresa foi clara, mas o gestor joga um papel muito
fundamental nesse meio. (MG15)
A figura do líder como responsável pela manutenção/transformação do contrato
psicológico pode ser mais forte quando o setor fica distante da sede da empresa,
situação em que o líder personifica os interesses da empresa frente aos
funcionários.
Nessas localidade, eu acho, a empresa somos nós. Tem uma diferença. Eu
acho que nessas localidades é um pouco separado [das] pessoas que
trabalham no prédio central. Eu acho que nas localidades as pessoas
acreditam no queX fala, no que Y fala. Eles são a empresa, muito mais
do que possa sair na parte de comunicação. Isto é uma percepção diferente
do que devem ter as pessoas do prédio central. (MG3)
Muitas vezes, além de esclarecer e informar, o gestor é responsável por
acompanhar e dar suporte para o funcionário quando os compromissos não são
cumpridos, mais uma vez atuando como contract makers diretos, representando a
empresa.
Nas oscilações eventuais o que você faz é conversar com a pessoa para
tentar resolver. É obrigação nossa alertar. A pessoa às vezes nem sabe que
não está agradando. Só vai saber quando você vai lá e conversa com ele.
(MG8)
Ainda, a média gerência pode ser vista como o nível que detém o acesso mais
amplo às informações. Desta forma, isto poderia indicar que a transparência do
contrato é maior para estes gestores, tanto em relação às promessas quanto em
relação aos compromissos firmados em contrapartida.
Eu já tenho a vantagem de, por ser líder, ter mais facilidade de informações.
Então participo de muitas reuniões. Nosso próprio gerente, toda vez que
tem reunião de diretoria passa as informações para a gente, então você
acaba sabendo. (MG4)
103
A análise das entrevistas indica um alto grau de consciência do que é seu
compromisso no contrato e da necessidade de tangibilizar suas realizações, para
que a clareza seja uma via de mão-dupla. A manutenção do acordo precisa se dar
de forma clara e baseada em fatos passados. Isso pode ser percebido no relato de
um funcionário acerca de como se dá o processo de avaliação. Segundo ele, é
preciso “exemplos de situações onde você realmente teve a iniciativa de liderar
pessoas, e a pessoa vem e te traz um, dois exemplos” (MG7).
Embora os termos do contrato sejam entendidos pela maior parte da média
gerência, alguns aspectos não parecem bem definidos e geram dúvidas acerca do
que a empresa realmente espera. A introdução do mapa de carreira foi citada como
exemplo de uma iniciativa que embaraçou o entendimento dos empregados sobre os
termos da progressão profissional.
Eu acho que o que está escrito precisa melhorar. Por exemplo: “conhece
todos os processos da empresa”. Só pode passar para este nível quem
conhece os processos. Ao pé da letra? Eu digo assim: “conhece todos os
processos? Conhece o jurídico? Não.” [...] Mas como eu reconheço que
tudo é um aprendizado e pode evoluir, eu tenho uma esperança que eles
refaçam alguns itens lá. Informática: conhece tudo de informática? O que é
tudo de informática? (MG8)
Outro discurso dissonante em termos de clareza do contrato diz respeito às
entrevistas de contratação. Este momento que pode ser crucial na construção do
contrato psicológico, por ser ele um dos primeiros em que o funcionário adquire
informações acerca das promessas e compromissos que se estabelecerão dali em
diante, pode gerar expectativas que não se confirmam posteriormente podendo
causar decepção e sensação de violação do contrato no funcionário.
Eu acho que a gente tem que ser, a empresa tem ser super clara, na
medida do possível, quanto aos desafios que a pessoa vai encontrar aqui
dentro. [...] A pessoa que está entrevistando para aquele cargo tem que ser
muito clara e transparente. A gente não está tendo isso ainda [...] Mas, de
uma certa forma, os desafios que aqui chegam não são tão bons quanto
são vendidos. (MG1)
As evidências coletadas por gestores e funcionários e captadas nas entrevistas
demonstram que a tangilbilidade dos contratos é ponto pacífico para as partes.
104
Embora hajam algumas lacunas, elas são pontuais e de forma geral, as indicações
dadas pela empresa são bem entendidas pelos funcionários, como por exemplo no
caso das políticas salariais praticadas refletirem a intenção da empresa de investir
nas pessoas.
Eu acho que muitas coisas são claras e outras nem tanto, dependendo
também de cada um. De forma geral, eu acho que tem transparência. Claro
que, às vezes, aparece um ou outro, [...] falando que não sabia que tinha
direito a alguma coisa, mas acho que são coisas pontuais. De uma forma
geral, acho que se conhece os benefícios da empresa. Até porque em
relação a salário a [empresa] fez um esforço muito grande de dois anos
para cá. Os níveis dos salários aumentaram muito e isso acho que é uma
demonstração que a empresa realmente está apostando nas pessoas.
(MG3)
Tratamento pessoal
Esta dimensão se refere ao quanto os limites entre a relação de trabalho e os
outros aspectos da vida do empregado e o quanto estes dois temas são permeáveis
(Janssens et al, 2003). No caso da empresa, isso se reflete pelo tratamento pessoal
dispensado a cada um dos funcionários. Assim, está ligado ao reconhecimento por
seus esforços pessoais em oposição aos resultados finais quantificáveis e ao
sentimento de que a empresa apóia seus funcionários em situações mais
complexas, sejam elas pessoais ou profissionais.
Nesta dimensão observa-se o quanto o indivíduo é tratado como uma pessoa
ou meramente um recurso econômico (Janssens et al, 2003).
Demonstrações de que a empresa está preocupada em observar e legitimar o
bom desempenho dos funcionários se refletem no reconhecimento que os
empregados consideram obter periodicamente. Elas acontecem de forma coletiva
como nas reuniões realizadas pela alta administração para transmitir o desempenho
global da empresa e individualmente sob forma de promoções individuais.
105
Tudo que a empresa me forneceu não cheguei a explicitamente pedir,
nunca fiz isso. Ela por própria consciência chegou dizendo “Olha eu quero
você aqui, sua remuneração é essa agora, você vai para [outra localidade]
abrir um projeto novo” naturalmente isso foi acontecendo. (MG4)
Em situações nas quais trabalhar além do escopo estabelecido leva a empresa
a atingir resultados melhores do que os esperados o reconhecimento pode ser dar
tanto de forma material quanto simbólica.
Outro momento genuíno é que a empresa todo mês, volta e meia, põe na
linha direta, [...] dá um comunicado interno, de que alguém fez alguma coisa
legal. Como também, [...] a empresa está sempre premiando as pessoas
que fazem alguma coisa diferente. Eu acho legal isso, porque teve um cara
que criou um negócio ... ele fez um negócio muito interessante. Muito
simples mas a idéia foi muito legal, muito original. Ele ganhou uma grana,
uns mil reais. Então isso todo mês, é premiado. As pessoas que têm
atitudes diferentes. Isso é um reconhecimento que as pessoas têm, não só
pelo dinheiro, mas por estar ali no auditório, toda a empresa e o presidente
entregando para ela um reconhecimento. (MG8)
O próprio gerente, no papel de representante da empresa nas negociações
contratuais, mostra que existe a preocupação de reconhecer o desempenho de seus
funcionários. O entrevistado conta como, pessoalmente, buscou valorizar a atuação
de uma de suas funcionárias: “Cheguei lá, passei todo mundo, abracei ela. [...] ‘a
vendedora que vende melhor nesta loja!’ Dei um abraço nela, foi muito legal.” (MG1)
Quando confrontados o esforço para se atingir a meta e o atingimento da meta
em si, os depoimentos podem demonstrar algumas divergências. Alguns percebem
que a meta é importante, mas o esforço envolvido para realizá-la deve ser levado em
conta ainda que o objetivo final não seja atingido. Os fatores que estão fora do
controle do funcionário e que podem ter influenciado nos resultados devem ser
levados em conta em sua avaliação.
Às vezes cumpriu a meta, às vezes o administrador daquele conjunto [...] foi
maravilhosamente bem, mas, por exemplo, não choveu naquele pedaço
dele. Aí o outro que corre atrás pra caramba, faz e tal, caiu tempestade,
jogou a rede e o back do cara está horrível. Você não pode comparar, só
em função de posição de conjuntos, tem que analisar uma série de fatores
que vai chegar um número final. Isso que a gente procura fazer. Analisar só
com metas é um negócio muito perigoso.” (MG10)
Apesar disso, muitos ainda se sentem avaliados de forma impessoal, como se
cada funcionário não passasse de um número. Assim, o trabalho realizado não seria
106
considerado, a menos que as metas tenham sido atingidas. O que acontece no dia-
a-dia não fica registrado para análise futura.
Eu sou avaliado por um número, eu não sou avaliado pelo dia-a-dia. Sou
avaliado por um número. Então a gente é só um número, as pessoas vêem
a gente como um número. (MG7)
O tratamento pessoal revela o grau de flexibilidade admitido pela empresa na
aplicação das normas quando o funcionário passa por alguma situação mais
delicada.
A empresa sinaliza a possibilidade de arranjos, sejam eles de presença ou de
horário, sem que haja maiores prejuízos para as partes. Isto pode ser demonstrado
nas entrevistas, quando os funcionários relatam situações de doenças pessoais e
familiares. Estes acordos não são parte da política da empresa e dependem muito
mais da avaliação do gerente na situação em questão, sendo ele o responsável pelo
cumprimento do acordo dentro por parte empresa.
Olha, sinceramente não sei se é a política da empresa, é da minha política.
É aquilo que eu estou falando: Eu sou a empresa aqui [longe da sede]. Na
verdade eu tomo as diretrizes, eu faço o que eu acho que é certo. Tento me
basear, obviamente, no que a empresa dá de direcionamento para a gente,
mas eu faço o que eu acho que é certo. É claro que nesse tipo de situação
eu tenho que me preocupar em diferenciar se o funcionário é realmente um
funcionário bom e está tendo algum problema ou se ele está na verdade se
aproveitando e inventando algum problema. Mas se é um funcionário bom,
que a gente já conhece e acontece algum problema com ele, é dado todo
[apoio]. [...] Teve um funcionário nosso, [...] que teve um problema com a
mãe. que só era ele e a mãe e tinha que ficar cuidando da mãe. [Ele] não
tinha férias para vencer, eu dei férias para ele, [...] Aí marcamos as férias
para o período que poderia, e ele não tirou quando teve as férias. Então foi
um acordo cordial de cavaleiros que foi cumprido por ambas partes. (MG2)
Conforme relato anterior, a análise da situação e as concessões das
prerrogativas passam pelo julgamento da legitimidade da solicitação. O histórico
profissional do funcionário é avaliado e o comprometimento dele com a empresa é
que ajuda a definir se seu pedido será ou não atendido. Quando o funcionário não
tem um bom histórico profissional, a flexibilidade nos acordos pode soar como
privilégio para funcionários que não merecem. Este comportamento é evitado pela
gerência, como forma de manter a confiança na empresa.
107
Para que nenhuma das partes seja prejudicada, em geral a média gerência
exige que as horas flexibilizadas sejam trabalhadas em outros dias, como se fosse
um banco de horas informal, como uma forma de compensação.
Se um funcionário precisa faltar um dia, chegar mais tarde no outro, sempre
deixo, não tem problema nenhum. A única coisa que eu acordo com eles é
“olha, você precisou faltar qualquer dia, pode faltar; avisa a gente antes,
obviamente, ou liga de manhã se aconteceu algum problema. Pode faltar,
mas a gente vai pagar essas horas num sábado, ou depois da hora em
outro dia, o que for melhor para ambas as partes”. Mas não pode dar de
graça, senão, amanhã, está todo mundo se aproveitando. (MG2)
Foram encontrados nas entrevistas alguns outros aspectos de menor destaque
que refletem o tratamento pessoal dado ao funcionário, como por exemplo, a
disposição em ouvir o funcionário. Isso é observável, na coleta de informações, em
ações que dão aos funcionários a possibilidade manifestar suas opiniões acerca dos
negócios da empresa.
Entre eu e os supervisores existem os analistas e os especialistas; mesmo
assim eu tenho reuniões com os supervisores pelo menos duas ou três
vezes por mês. Eu estou batendo papo todo dia, independente de qualquer
reunião. E com os analistas e os especialistas eu tenho reunião semanal,
com os funcionários a gente está sempre conversando também. (MG2)
Quando os canais hierárquicos falham e o funcionário precisa de um canal
alternativo à sua chefia para fazer qualquer tipo de sugestão ou reclamação, a
ouvidoria pode ser utilizada evitando o filtro do funcionário hierarquicamente
superior..
A empresa tem uma ouvidoria onde qualquer pessoa, com sigilo total, pode
procurar [...] para conversar. Para levar alguns exemplos: “olha, eu tenho
um líder, mas a situação lá é incômoda, está acontecendo isso e isso, eu
tenho até provas”. Então há esse cuidado, não digo nem cuidado, há uma
atenção em sempre manter os colaboradores em um ambiente agradável e
seguro, onde ele tenha liberdade de se expressar, de colocar suas idéias.
(MG7)
O ajuste entre as capacidades, habilidades ou personalidade do funcionário às
tarefas que ele deve exercer são uma preocupação que reflete o tratamento pessoal
dispensado pela empresa. Para que o trabalho seja mais produtivo, é possível
remanejar um funcionário que apresente evidências de não ter se adaptado bem à
suas atividades.
108
Têm pessoas que tem facilidade para fazer [determinadas tarefas]. Mas o
perfil dele [pode ser] mais tímido. Então, em determinadas situações a gente
busca pegar esse profissional e adequar numa atividade que seja mais
compatível com o perfil dele.” (MG7)
O erro é encarado como parte do processo de construção do resultado. Se há
um incentivo à inovação e criatividade, a aceitação do erro parece ser a
contrapartida por parte da empresa:
Até porque aí cai numa coisa que eu estava pensando aqui. A gente tem
muito mais acertos que erros. Até, porque, senão a gente não estaria aqui,
acho que esses acertos, esse maior, esses 90, 80% de acertos acho
também que têm que ser levados em consideração em momentos que, de
repente, aqueles 5, 10% de erro existem. Uma coisa que tem que estar
clara também. Fundamental isso. (MG13)
Um aspecto que pode ser observado em todos as questões de tratamento
pessoal é a centralidade do gestor. No dia a dia, ele é o representante da empresa e
ele analisa a situação dos funcionários, seja para flexibilizar horários ou para avaliar
a adaptação do funcionário e a necessidade de remanejamento de uma pessoa.
Embora existam orientações e políticas institucionais, é a relação gerente/funcionário
que define a aplicação de ações mais específicas ou não.
Isso depende muito da forma de conduzir, da liderança desse funcionário. A
responsabilidade sobre esse funcionário, neste aspecto, está muito mais
com o líder, com o gerente dessa pessoa. Se acontecer isso na minha
gerência, eu ia conduzir da maneira que achasse mais adequada ao
momento. (MG12)
Cuidado
A estabilidade refere-se à possibilidade da evolução do contrato psicológico
sem implicar renegociação de seus termos. Reflete assim, o cuidado que a empresa
tem com os compromissos firmados com o funcionário e com seu cumprimento.
Inclui variáveis como (1) procurar manter acordos mesmo que a situação mude; e (2)
não apresentar distinção na aplicação e interpretação dos acordos.
109
Os relatos dos entrevistados sugerem confiança no propósito da empresa em
manter o cumprimento dos acordos, ainda que situações imprevistas afetem seu
cenário de atuação.
Nunca vi [a empresa] não cumprir um acordo. [...] O que ela faz é sempre
melhorar. Eu nunca vi ela piorar. Por exemplo, vamos dizer que na
conjuntura ela prometeu negativa. Infelizmente ninguém vai ter bônus, eu já
vi ela fazer, “mudou a conjuntura, e a gente percebeu que houve um esforço
de vocês, toma aqui meio salário de bônus”. Já vi acontecer isso, nunca vi
acontecer o contrário, “te prometi meio, vai ter zero”. Isso eu nunca vi. A
empresa é muito honrada com a palavra. Muito honrada. (MG1)
Alguns entendem que existe a possibilidade de a empresa não cumprir o
acordo, mas haverá sempre o cuidado de justificar e se comprometer com
compensações futuras, sem deixar que fique a impressão de que o contrato
psicológico foi violado. Isto parece ser, no entanto, uma hipótese, já que um dos
funcionários entrevistados é incisivo ao afirmar o cumprimento integral dos termos
do contrato.
Quando a empresa não pode atender o que se comprometeu a fazer em
função de alguma variável externa que ela não controla, ou mesmo, de uma
variável que ela controla e acha que naquele momento [não dá], ela procura
passar isso para a gente: “não podemos, nós nos comprometemos, ou
prometemos em fazer, mas infelizmente...”. Deixa muito claro - está
acontecendo isso, isso e isso, e não está levando a gente neste momento a
fazer [o prometido], mas no momento seguinte a gente vai buscar
compensar isso [...] Olha só, eu estou dizendo que tudo o que a empresa
prometeu até hoje ela cumpriu [...]. Talvez na época do racionamento não
tenha tido, não me recordo um exemplo concreto, mas tudo o que a
empresa, até hoje, disse que ia fazer, ela fez. [...] Isso dá uma credibilidade
a ela para com seus colaboradores. Não existiu uma coisa que salte aos
olhos, para dizer assim “a partir de agora nós vamos fazer um programa de
participação de resultados onde cada um vai levar, no mínimo, tantos
salários” e depois vir e pagar a metade, uma coisa irritante, “prometeu isso,
mas deu a metade” ou “não deu nada”. Por essa situação a gente nunca
passou. (MG7)
Tratamento equânime
A dimensão em questão trata da distinção entre a regulação individual e a
coletiva, definindo o nível do contrato. Está relacionada à questão da justiça na
aplicação dos termos contratuais sem que sejam percebidos privilégios de
110
determinadas classes. Trata-se de enxergar todos os funcionários do mesmo nível e
exigir os mesmos resultados, considerar os acordos como aplicáveis a um mesmo
grupo, departamento ou equipe e, ainda, conceder os mesmo benefícios a estes
empregados.
Esta é uma questão delicada, e apesar de parecer que existem esforços para
estabelecer políticas globais para a empresa, que garantam a percepção de justiça
nas relações, busca-se ao mesmo tempo uma flexibilidade que atenda os casos
especiais.
A princípio, é possível identificar nos relatos dos entrevistados a preocupação
de balancear o nível do contrato, expressa nas políticas de desenvolvimento de
pessoal.
Acho que em termos de política sim, hoje eu vejo que a gente tem uma
tendência a ter uma política que seja bem justa. Trabalha essa coisa da
igualdade. Agora, [...] ao mesmo tempo, a [empresa] atende o empregado
individualmente. [...] Um exemplo da minha área: a gente tem uma política
de como que a [empresa] pode financiar o estudo de um empregado, isso é
igual para todos, ela não abre exceção no sentido de que vai favorecer um
ou outro, a política é igual. Mas ao mesmo tempo, ela entende a
necessidade de desenvolvimento da carreira do empregado
individualmente, então ela tem um olhar individual para o empregado e eu
acho que isso em qualquer sentido. Eu dei um exemplo da área de
desenvolvimento, mas ela tem as políticas de pessoas em que ela segue
essas premissas justamente para ela não ficar desequilibrada. (MG17)
Apesar de existir uma ênfase em garantir que todos os empregados num
mesmo nível recebam igual tratamento, tanto por parte das empresas quanto por
parte dos gestores, alguns depoimentos ressaltam o fato que isto depende muito da
gerência direta e, assim, está sujeito à variações de localidade para localidade.
Tem muita relação com as lideranças, você tem as diferenças das
lideranças. Se você falar em [empresa], [ela quer], um tratamento igualitário.
Agora, você traduzir isso em realidade, cada liderança tem as suas
diferenças. A forma de um líder cobrar é diferente do outro, os resultados
almejados são os mesmos. (MG11)
Além da gerência direta, um outro fator pode influenciar as políticas de
tratamento igualitário: a categoria profissional. Por ser uma empresa de geração de
energia, não é raro encontrar relatos nas entrevistas apontando os técnicos, em
111
especial os engenheiros ligados ao furto de energia elétrica, como a categoria com
mais propensão a atingir maior crescimento profissional e status diferenciado.
Diria que seria a classe de engenheiros. [...] acho que [tanto a dos]
tecnólogos, como a dos engenheiros, [...] serão as privilegiadas.
Engenheiros de uma forma geral, não só engenheiro eletricista. Eu acho
que as pessoas que se desenvolverem nessa área, [...] essa classe, de
repente podem ter uma ascensão mais rápida porque abre um pouco sua
mente. Não que os outros não, mas de repente alguma coisa em
determinada área, economia, administração possa até ser também. Mas eu
acho que o forte é engenharia [...] seria bom ter um CREA. A minha
percepção é que sim, ajudaria. Foi o que te falei em determinadas áreas,
economia, administração pode até ser, de repente até mais importante. Mas
se a gente for falar de uma forma global, eu acho que engenharia, até
porque tem muito engenheiro que atua na parte administrativa e na parte
financeira da empresa. (MG16)
Na política de benefícios se evidencia a vontade de propiciar tratamento
equânime para todos os funcionários não entre os funcionários de um mesmo nível,
mas para toda empresa.
Eu acho que a [empresa] faz isso. Promete e faz. Uma das provas é que o
ticket do diretor - não sei nem se diretor ganha ticket - mas o ticket dos
níveis mais altos é igual ao ticket dos níveis mais baixos. Então entende-se
que o que come um, come o outro, está perfeito. Em nível de benefícios,
todos ganham participação nos lucros. É claro que os líderes e gerentes
acabam ganhando um percentual maior, natural. Mas todo mundo ganha,
todo mundo faz parte do processo. Eu entendo e vejo os funcionários
entenderem assim, nesse sentido, como um tratamento realmente igual.
(MG2)
No entanto, alguns benefícios são apenas aplicáveis a determinados níveis que
atendam condições específicas. O coaching é um exemplo de benefício aplicável
apenas para funcionários que são reconhecidos talentos na empresa.
Temos o coaching, que é inovador também. Não só para cargos de
liderança. Profissionais que são identificados como talentos, também estão
fazendo coaching e isso ajuda ao desenvolvimento individual. (MG14)
Ainda que muitos depoimentos indiquem a existência da busca de um
tratamento mais equânime, muitos relatos trazem indícios de sutis diferenças que
devem ser consideradas. Um ponto importante são as diferenças entre as áreas,
sejam elas geográficas ou de atuação. Alguns funcionários entendem que como a
maior parte dos projetos começa a ser implantado na sede, os benefícios ficam
restritos àquele grupo.
112
Esse ano senti um esforço um pouco maior. Ano passado eu acho que a
empresa pecou muito porque, por exemplo, tinha ações e benefícios que só
ficaram restritos no prédio central. Eu acho que, pelo fato de começar um
projeto no prédio central, já acho ruim. [...] Está chegando informação de
que esse ano mudou um pouco, aí isso demora um pouco para que as
pessoas percebam. Então também tenho a impressão de que muitas coisas
estão restritas ao pessoal do prédio-sede. (MG3)
Outra crítica às tentativas de equalização do tratamento na empresa surge
quando se faz a diferenciação entre funcionários operacionais e funcionários de
apoio ao negócio principal da empresa na fala a seguir representado pelo termo
“prédio central”.
Tem-se uma idéia que a empresa quer, mas tem coisas que a empresa
implementa mas que não pode ser aplicada nesse momento, nessas áreas
operacionais. Porque é realmente uma coisa que fica [...] “ah, porque o que
vale para um não vale para a gente?” Por exemplo, às vezes quando é
feriado na quinta a empresa enforca na sexta ou final do ano passado
deram uma tarde livre antes do Natal, uma coisa assim. Isso não pode ser
aplicado para a gente. É um problema que a gente tem na empresa, porque
são pessoas que trabalharam muito durante o ano e quando a empresa
quer dar um benefício [...] isso não é aplicado para a totalidade. Porque não
pode deixar de religar os clientes, a gente não pode deixar. Nós temos
prazos a cumprir. Então [...] eu acho que é uma coisa que está mal definida
na empresa. Porque tem benefícios que empresa dá e poucos podem
usufruir e aí começa a criar realmente uma separação dentro da empresa. O
pessoal que trabalha em operacional começa olhar para o pessoal que
trabalha no prédio central, [que] tem direitos que a gente não tem. (MG3)
Como essas diferenças de tratamento não são recentes tanto entre
funcionários de apoio e operacionais quanto funcionários da sede e de outras
localidades - pode-se perceber que a empresa tem procurado reduzi-las. Adotando
políticas que façam com que as informações cheguem à ponta da empresa, espera-
se que estas diferenças sejam reduzidas.
Sempre se notou que a administração central era um pouco mais
privilegiada, seja na informação - tinham acesso à primeira informação -
seja em algumas atitudes inovadoras da empresa, muitos focadas na
administração central [...]. Então, isso gerava um pouco de desconforto. [...]
As pessoas até da administração central não conseguiam enxergar as
dificuldades que existiam nessa localidade [mais afastada]. Primeiro porque
eles não iam lá. Segundo porque a informação, faltava uma conexão para
chegar ao local, se perdia. E isso foi detectado, e aí na época do plano [...]
isso foi sinalizado por diversos gestores. Então a empresa também
percebeu que em determinadas áreas existiam privilégios de informação [...]
de compensação salarial e promoções, e que não chegava na ponta e se
chegava, era de uma forma muito reduzida. [...] Então, de repente, não se
valorizava o funcionário da forma como deveria. E aí com essa parte de
percepção da empresa, claro que não dá para estar em todo momento, em
todo local. Como ela é muito centralizada ela criou esse papel de líder. Por
isso até foi criado esse papel de líder e de representante da empresa na
113
localidade. Então, a função dos representantes também é identificar isso.
[...] A gente tem que estar sempre com um termometrozinho ligado, com a
antena em pé para identificar onde está tendo uma incoerência de
determinada área. E se não conseguir [resolver] com a mediação, você
sinaliza lá pra baixo para a gente tomar uma ação mais rápida. Então, foi o
canal que a gente descobriu, de pelo menos, essas coisas chegarem mais
rápido e fluir a informação da administração central para a localidade.
(MG16)
No entanto existe a preocupação de as novas políticas da empresa possam
simplesmente mudar o lado de maior peso na balança sem que se atinja o equilíbrio
desejado.
Para cada nível um tratamento, acho que sim. Hoje uma coisa que
acontece, aqui na empresa, que eu particularmente ainda não tenho um
juízo formado se isso é ruim ou bom, é um foco que a gente faz. É nisso
[das áreas], o que é apoio e do que é operação [...]. Hoje ainda não tenho
essa minha opinião formada, mas é um campo que a empresa tem que ter
esse cuidado. Porque não adianta. Embora, [a gente fale] no foco, que é o
cliente, [...], que você tem que ter operação, [...] ter um bom call-center,
você tem que habilitar. Mas assim, [...] não dar a menor importância para o
apoio talvez possa estar criando uma certa - não é um desmerecimento - é
uma certa insatisfação ainda que calada, das pessoas do apoio. (MG5)
Sob uma outra ótica, garantir o tratamento equânime pode significar dar aos
diferentes tratamentos diferenciados. A concessão de benefícios variáveis em
função do desempenho sob uma lógica meritocrática deverá ser estabelecida sob
critérios bem definidos e transparentes para que garantam a percepção e justiça
para os funcionários.
Na verdade, hoje a idéia nossa é primeiro dar um tratamento igualitário para
todo mundo, e se é um comportamento igualitário você tem que medir força
de vontade, disposição, empenho, conhecimento e obviamente metas. Você
agrega uma série de fatores. Você não pode analisar a situação isolada.
(MG10)
Isto significa uma mudança profunda na empresa, já que a meritocracia não era
uma prática no passado de empresa estatal. Os próprios funcionários reconhecem
que subverter a lógica de estatal é tarefa difícil, já que ela está tão presente no
modelo mental dos funcionários.
Me cobra muito sim. Mas eu não posso ficar achando que é estatal. Não é
estatal. Tem uma lógica, tem uma coerência tenho que atender a
expectativa da empresa. (MG4)
O quanto o sistema meritocrático tem seus critérios bem estabelecidos na
empresa é uma questão que faz vir à tona discursos dissonantes do que foi
114
apontado. Um ponto delicado nas relações intra-organizacionais da empresa está na
forma como são tratados os funcionários das diferentes diretorias. Assim, apesar de
identificar o tratamento equânime como uma das promessas da empresa, para
alguns funcionários, isto ainda não acontece. Estes funcionários conseguem
perceber as diferenças nas áreas de atuação, mas consideram a diferença salarial
destas áreas como muito significativas para o quanto elas efetivamente fazem
diferença no resultado final da empresa.
O que a gente ouve falar, na verdade estou falando o que eu ouço. A
informação é que o pessoal de recuperação de mercado e o pessoal da
comercial têm um grande privilégio em relação ao pessoal técnico.
Principalmente com relação [...] não só dos subordinados, como meus pares
também, pessoas do mesmo nível meu. A gente tem informação que o
pessoal do comercial e de recuperação de mercado tem um tratamento
diferenciado principalmente com relação a salários [...] condições de
trabalho hoje está mais ou menos nivelado, a gente tem as mesmas
condições de trabalho só que o reconhecimento, ou a premiação, por
exemplo, é diferenciada, e não sei se é em função de ter muita gente. Não
sei qual é o motivo, mas a comercial e a recuperação de mercado tem uma
vantagem enorme com relação a nós. Não sei te dizer com certeza, que eu
nunca peguei contra-cheque de ninguém, mas é o que eu ouço. Até as
pessoas do mesmo nível, a gente tem reuniões quinzenais [na sede] e eu
ouço de alguns que vieram de lá, e os caras vieram com um salário bem
melhor do que o nosso, que estamos aqui. Aí a gente tem ganhar
periculosidade, ganhar isto e aquilo para poder chegar no patamar do cara.
E o cara tem esses salário sem periculosidade, por exemplo. Periculosidade
é 30% do salário, é muita coisa [...] Então, existem essas divergências que
precisam ser vistas, são coisas que precisam ser corrigidas. Se você tem a
mesma função, está fazendo a mesma atividade, às vezes num pólo maior
que tem mais problemas, mas se você tem a mesma função deveria ter [...]
variação menor, a diferença. Não todo mundo igual, mas que a diferença
seja menor. (MG10)
Alguns funcionários entendem que a diferença na forma como as diretorias são
tratadas se dá ao fato de que a nova visão da empresa acaba dando mais ênfase
para algumas áreas em detrimento de outras.
Trata mais ou menos igual. Mais ou menos, não. Trata igual. A questão é a
seguinte existem focos diferentes. Por exemplo, a redução de perdas hoje é
uma das coisas de que a empresa vem investindo muito. Então isso, no
meu ponto de vista, às vezes leva outras áreas, a se sentirem menos
valorizadas. Mas aí é uma questão de pensar, de visão. [...] Tudo o que se
planeja passa pela revisão das perdas. Tudo é muito bonito, ideal, muito
bom, mas se não reduzir as perdas nada disso acontece. (MG13)
Ainda assim, os funcionários percebem que a empresa tem conhecimento
deste problema e está buscando formas de diminuir esse impacto na percepção dos
115
funcionários. Assim, os próprios funcionários entendem e justificam a diferença de
tratamento entre as áreas.
Eu acho que atenuou bastante, mas até bem pouco tempo atrás eu diria
que existia, era uma percepção, inclusive geral, posso falar até em relação
aos funcionários, porque sempre foi questionado isso, que a [área que trata
do furto de energia], era uma área que era vista como privilegiada [...]
gerava mais oportunidades, as coisas aconteciam mais rápido, era mais
dinâmico o processo. [...] Até porque, na empresa, hoje, furto é o grande
câncer, vamos disser assim, e que a gente tem que eliminar. Então, de
repente, para os demais funcionários aparentava uma coisa ruim de que
outros funcionários eram mais privilegiados. [...] Também gerava um
interesse de ir [para a área que trata do furto de energia], tanto que houve
um êxodo grande. A gente sabe disso. [...] Aí eu posso dizer que [...], se
atenuou muito hoje, porque isso foi percebido pelos Recursos Humanos.
Mas a comercial e a [área que trata do furto de energia] eram os grandes
“filés”. [...] todo mundo queria ir pra lá. Eu posso dizer porque tenho grandes
funcionários que trabalharam na diretoria técnica e que foram para a
diretoria comercial, pessoas que tenho certeza que se estivessem na
diretoria técnica estavam rendendo muito, e viram que na diretoria técnica
não haveria uma possibilidade tão rápida de ascensão ou de oportunidades
e migraram para lá. Isso ocorreu com certeza, e atenuou bastante. As
coisas hoje estão mais equilibradas porque como existe esse papel efetivo
de Recursos Humanos e nós gestores que estamos aqui. (MG16)
Os compromissos gerais dos funcionários
Quando questionados acerca de seus compromissos com a empresa em
contrapartida às promessas feitas, o termo que aparece com maior freqüência é
comprometimento. É certo que o termo pode abarcar uma gama de significados
diferentes, no entanto, as opiniões dos entrevistados, captadas nas entrevistas,
convergem para questões como dedicação e interesse permanentes.
Casas Bahia, dedicação total a você... (MG9)
Eu acho que a primeira coisa: comprometimento. É fundamental porque se
não houver isso a gente não consegue ter êxito na nossa proposta. [...]
Comprometimento é o cara se dedicar efetivamente àquilo que a empresa
está colocando como proposta de trabalho e de vida mesmo, o cara se
dedicar é se integrar efetivamente no plano, [...], entender, já que a empresa
se preocupa tanto em passar a informação é entender e trabalhar com
vontade e com coração para chegar os resultados. (MG20)
A primeira palavra que vem na minha cabeça, quando você acabou de
terminar a frase, é comprometimento. Ela é muito forte. Ela pode sempre ser
prostituída. O que é comprometimento? Comprometimento é eu vir trabalhar
todos os dias, cumprir o meu horário de trabalho, isso é um tipo de
comprometimento. Mas o que a empresa está colocando é em sentido
amplo. (MG1)
116
Muitas vezes a visão de comprometimento extrapola estar disponível
integralmente e passa a ser uma questão de valores do trabalho.
Primeiro trabalho, trabalho de qualidade, transparência e respeito pelos
valores da empresa. E reconhecer o esforço que a empresa faz para ela
continuar uma empresa boa, reconhecida no setor. (MG15)
Para outros funcionários o comprometimento está diretamente ligado aos
resultados da empresa.
Então eu acho que a empresa espera de nós são resultados. Claramente
espera resultados. Não é só pela questão de querer. É uma questão de
sobrevivência. Financeiramente a empresa não tem perna para ficar tanto
tempo sem os clientes pagarem, e com os clientes nos furtando na
proporção que nos furtam. Então estão comprometendo a própria
estabilidade. [...] Então eu diria que é uma questão de sobrevivência. Não é
só que a empresa espera da gente resultados, é porque se a empresa não
tiver esses resultados ela vai cada vez até o ponto de ficar não sustentável.
Até o ponto de estar pagando para existir. Então acho que o que espera de
nós é isso, temos que dar conta das metas que são passadas para a gente.
Sem mais sem menos tem que dar conta. (MG4)
Alguns relatos aliam os resultados ao comprometimento, sendo o primeiro
conseqüência do segundo.
Acho que espera, primeiro, compromisso com a empresa, dedicação, e
colocar os conhecimentos de qualidade, os conhecimentos de experiência
de vida em função da empresa. [...] Para mim, é o seguinte, acho que existe
a meta aqui, mas o que se faz aqui é chegar à meta, se eu não tiver um
compromisso com a empresa, não colocar seu conhecimento em prol dela e
não tiver dedicação, aí você pode esquecer metas. Não existe meta mais. O
plano de reestruturação tem uma coisa clara, mas se ninguém fizer para
chegar nela, não tiver o pessoal da empresa e tudo mais, [não adianta].
Acho que é uma coisa tão clara, acho que está subentendido. Acho que os
meios para alcançar os fins que a gente tem, é isso” (MG6)
Lealdade
O horizonte temporal da relação, sob o ponto de vista do funcionário, pode ser
analisado tanto em função do quanto ele acha que deve permanecer na empresa
quanto pela sua disposição em aceitar transferências de função e geográficas, caso
seja necessário. A transferência geográfica assume um papel importante devido não
só a dispersão geográfica da própria empresa mas pelos lugares onde ela está
117
presente, muitas vezes cidades pequenas com poucas alternativas de lazer, estudo
para os filhos e oportunidades.
Quanto ao tempo que os funcionários acham que devem permanecer na
empresa, os relatos apontam para uma relação de longo prazo. No caso do excerto
abaixo, o funcionário relata que apesar de achar que nenhuma empresa pode
obrigar o funcionário a manter uma relação de longo prazo, ele mesmo se sentia
compelido a estabelecer essa relação como uma forma de gratidão pelo que a
empresa investiu nele.
Eu vou te falar por mim, vou te exemplificar, eu acho que eu devo isso à
[empresa] porque [ela] me dá todas as condições de trabalho, ela me paga
o que eu realmente acho que mereço e me faz trabalhar com amor. Então
eu acho que eu devo esse comprometimento à empresa, enquanto ela me
fornecer isso que são os pilares que eu te falei. (MG20)
No entanto, provavelmente em decorrência do processo de privatização que
veio acompanhado de um período de incertezas, as perspectivas de longo prazo
diminuíram e isto foi fortemente sentido pelos funcionários, até por conta da
estabilidade que existia na estatal. Aí, evidenciam-se também as diferentes
percepções entre gerentes e seus subordinados.
Falando pela equipe, eu diria que não tem como omitir que uma parte maior,
eu diria, não tem esse comprometimento. Se pintar alguma coisa melhor. Aí
vai aquilo que eu te falei [no início] que é a contrapartida. A empresa
quando fez umas palestras comentou que na média se fica só três anos e
meio, não sei o que, aí ficou confuso e posso ser mandado embora. (MG8)
Pessoas contratadas após a privatização da empresa tendem a ter menos
compromisso de longo prazo. Parte porque é tendência dos mais jovens no mercado
de trabalho construírem uma carreira que passa por diversas empresas, parte
porque esta pode ter sido a mensagem da privatização da empresa.
As pessoas mais novas, principalmente a garotada - garotada que eu falo é
na faixa de 30 anos - não existe muito essa conscientização de ter uma
carreira na empresa, ter um histórico de médio a longo prazo. As pessoas
são muito imediatistas, e às vezes trocam seis por meia dúzia na
expectativa de ter um ganho muito maior em uma outra atividade, numa
outra empresa. (MG10)
118
Os esforços de retenção de talentos na empresa, evidenciados especialmente
pelo investimento e formação dos seus funcionários, pode, muitas vezes, acabar
sendo visto como uma das fontes de saída dos funcionários da empresa. Altamente
capacitado, estes adquirem maior visibilidade no mercado e assim, atraídos para
outras empresas.
A percepção que eu tenho, atualmente, sinaliza algo em torno de curto
prazo para médio prazo, porque no momento que você começa a valorizar o
profissional, a mostrar para ele o seu papel e motivar o seu
desenvolvimento, no mercado que a gente está, [...] esse profissional fica
motivado a buscar novos desafios. Nessa perspectiva eu vejo a questão do
curto prazo, ao fazer isso a empresa vai perder profissional com certeza.
Por outro lado, com [plano de reestruturação] e a proposta da empresa de
valorização do profissional, ela cria aí uma bonificação, uma complicação
para o funcionário: quem ficar aqui vai estar com certeza envolvido com o
[plano de reestruturação] da empresa, com a mudança dela, com a melhoria
da empresa e com seus resultados. Então, isso é médio prazo. Longo prazo
eu não consigo enxergar nessa perspectiva o longo prazo. As pessoas se
investindo, desenvolvem, e aí vão buscar desafios novos. Existem desafios
aqui na empresa, mas também existem desafios no mercado. Eu fico na
dúvida na questão do longo prazo. (MG19)
Este relato, indica ainda que a relação de longo prazo com a empresa está
diretamente relacionada com a possibilidade de encontrar novos desafios. Os
funcionários esperam que a contrapartida para o seu compromisso de
desenvolvimento pessoal seja o oferecimento de novos desafios, que se não forem
encontrados dentro da própria empresa, serão buscados em outras.
Outra idéia encontrada é a de que a empresa tem funcionários que ela quer
manter, por serem essenciais para a operação da empresa, enquanto que aqueles
que podem ser percebidos como mais “substituíveis” acabam mais livres para buscar
novas oportunidades em outras empresas.
Ela já sabe os funcionários que são chave para empresa, agora esse
negócio de ficar muito tempo ou não, isso daí depende, se ela achar que
esse funcionário é um funcionário importante para ela, eu acho que sim.
(MG9)
Até tem metas na empresa de perda de funcionário chave, funcionários
especiais, vamos dizer assim, [...] mas é isso, tem metas. (MG6)
A área da atuação e a função exercida dentro da empresa podem ser
determinantes na visão de longo prazo. Em áreas diretamente relacionadas com o
119
negócio da empresa onde o número de funcionários altamente qualificados em
geração e distribuição de energia é alto (operações, furto de energia elétrica), é
possível perceber o compromisso de longo prazo, com a intenção de seguir carreira
dentro da empresa. Quanto menos relacionadas estas áreas estão do negócio final
(RH, finanças, comercial etc.), mais os funcionários têm possibilidade de mudar de
empresa sem maiores prejuízos para suas carreiras, atuando em outras indústrias.
O relato a seguir aponta a necessidade de esclarecimento acerca dos limites dos
desafios a serem enfrentados, já que os profissionais que trabalham em áreas
consideradas como suporte podem não reconhecer como desafios o que acontece
na rotina da empresa.
A empresa está botando no mercado, para eles, que quando chega aqui,
ela acha que vai achar grandes desafios. Estou me apoiando nisso no
marketing, por exemplo. O que eu já vi de gente entrar e sair do marketing é
uma coisa absurda. Porque, o que acontece? O cara vem atraído por uma
inovação, mas chega aqui, comparado com uma [empresa de varejo], ele
faz uma campanha por mês. Aqui uma campanha, lá ele faz quatro, dez,
doze campanhas por mês. Então esse profissional não vai ficar retido aqui,
nem por grana, vai ficar retido aqui por desafio. (…) Mas para certas
pessoas que têm visão de mercado, querem voltar para o mercado - na
verdade, estão aqui de passagem - o capital de curto prazo que eu chamo -
estão aqui de passagem, eles percebem isso e partem. (MG1)
Assim, alguns entrevistados pensam que pode ser saudável participar de
processos seletivos externos como uma forma de comparar suas qualificações e
seus relacionamento com a empresa.
O mercado de trabalho está ai, competição está ai. Eu por exemplo,
particularmente, acho super saudável a pessoa fazer entrevistas fora. É a
forma de balizar, - estou bem não estou bem - e de poder comparar. (MG14)
Isto não se dá desta forma quando se trata das chamadas áreas-fim. Em
função da necessidade de aquisição de experiência e da expectativa de resolução
de problemas no médio e longo prazo, estes funcionários conseguem estabelecer
um horizonte temporal na relação bem mais longo do que os da área de apoio.
Claro, com certeza, até por que nosso trabalho é um trabalho que não se
aprende do dia para a noite. É um trabalho que você precisa ganhar
experiência, você precisa de tempo para poder trabalhar. Porque é muito
diversificado, você lida com o cliente, você lida com cliente formador de
opinião, com cliente leigo, cliente que está querendo te prejudicar
120
intencionalmente, que está querendo furtar, que está querendo gerar
problemas. Cliente que não, que está querendo te ajudar. Então, isso tudo é
bastante complexo. Então, você formar pessoas para trabalhar nessa área,
você não tira da cartola, você não pega no mercado fácil. Tanto que, às
vezes a gente procura técnicos e é difícil. Você tem que passar por toda
uma seleção para ver se o camarada tem perfil para trabalhar, então é
complicado isso. (MG16)
Assim, é possível que existam diferentes compromissos acerca do tempo em
que os funcionários ficam na empresa, atendendo não só aos interesses da
organização mas às expectativas dos diferentes profissionais.
Eu acho que ela procura os dois. O que está acontecendo agora, é que
existem certas competências que ela precisa e ela não tem. Então ela busca
no mercado o melhor. Então, se esse desafio é de longo prazo, a pessoa
vai ficando aqui. Mas se é uma coisa mais de curto prazo, dois anos, três
anos, essa pessoa daqui a dois anos vai embora. Porque era especialista
naquilo. Então o que vai acontecer? A empresa vai absorver aquela cultura,
aquela competência vai entrar dentro da empresa de uma maneira ou de
outra, vai aprender com aquilo e essa pessoa vai depois dizer: “desculpa,
estou indo embora, estou indo para outro desafio, com outro salário”. (MG1)
No que diz respeito à disponibilidade para aceitar transferências, julgou-se
necessário considerar não só transferências funcionais mas também as que
impliquem deslocamento geográfico, em função da própria estrutura da empresa.
As transferências de função são bem vistas, e os funcionários a aceitam sem
restrições porque elas representam oportunidades de crescimento dentro da
empresa e de aumento do status do funcionário.
Se for importante pra empresa e isso está considerando todas as questões
da pessoa eu acho que sim, pode fazer parte [do compromisso]. A
[empresa] pode chegar e dizer olha, a sua missão agora é essa, vai ser
super importante para gente que você esteja na função em outra área.
(MG17)
Em casos em que não existe crescimento profissional na transferência, há
resistência até por parte da gerência, que não a considera legítima.
Desde que seja uma vaga que ele vai ter um crescimento profissional. Eu
falo, eu realmente tenho problema de liberar se ele vai sair técnico para ir
trabalhar em outro lugar como técnico ganhando a mesma coisa. Eu
realmente tenho problema, porque vou estar perdendo um funcionário e
tudo. E se ele quer sair - até hoje não teve nenhum caso desses - mas se
vier a acontecer pode ser uma falha minha. Porque um cara que quer sair
daqui para ir para outro lugar e ganhar o mesmo salário é porque não está
satisfeito aqui. (MG2)
121
No que concerne a visão da transferência como um degrau a mais na carreira,
é interessante notar que a despeito da percepção dos funcionários de que existem
políticas na empresa com o objetivo de valorizar o funcionário que está mais perto
do cliente, quando a movimentação ocorre de um trabalho externo para um trabalho
interno, ela é vista como uma promoção. Porém, se a movimentação se dá
inversamente, a saída de um trabalho interno para um trabalho externo não é bem
aceita e pode ser até percebido como uma punição.
Pois é, você tocou num ponto interessante. O contrário não aceita bem,
porque se tem a cultura, o pensamento - que eu acho errado - de achar que
quem trabalha no escritório é mais valorizado do quem trabalha no campo.
Então, se você pegar uma pessoa de campo e falar que venha para o
escritório, mesmo ganhando igual ou até menos, ela se sente mais
valorizada, mais importante. Ela tem computador, fica lá batendo e tal, mais
perto do chefe. Então essa pessoa se sente, é o status, questão do status.
Quando você faz o contrário, a pessoa acha que perdeu o status. Então,
pegar uma pessoa de campo para trabalhar internamente a pessoa sente
isso como uma promoção. Mesmo que ela não ganhe nada, pode até ter
perdido, porque quando trabalha em campo tem um adicional, mas ela se
sente mais valorizada: “Fui promovida”. Mas se você pega uma pessoa para
trabalhar em campo aí a pessoa não aceita bem. [...] Até porque a pessoa
de campo chega com uniforme e a pessoa de escritório, a pessoa do
escritório, ela vê a pessoa do escritório como chefe dela, você já tem a
primeira reação, olha diferente. O cara está aqui, todo arrumadinho. (MG3)
Alguns relatos mostraram que determinados funcionários não se sentem
obrigados a aceitar as transferências de função. Apesar de terem uma visão de
carreira, esta carreira se dá em um único campo, desprezando as tendências atuais
de multifuncionalidade.
Acredito que não. Vou dar um exemplo, vê se estou entendendo bem, eu
estou na organização centro, trabalho na área que trata de furto de energia
e de repente vão me mandar para o financeiro. E qual seria minha reação
se eu não quero ir para financeiro? Eu não quero ir para o financeiro,
porque não é meu perfil. (MG13)
A conseqüência disto é que o comprometimento de longo prazo de
determinados profissionais pode ser afetado pelo fato de que não aceitar
transferências funcionais pode representar o fim dos desafios para estes
profissionais, que acabam deixando a empresa.
Tem algumas pessoas que não gostariam de mudar de área para ter outro
desafio. Não é que a empresa não tenha desafio. Por exemplo, o cara de
122
marketing, ele não quer entrar na área técnica, porque o cara é de
marketing. Ele quer ser marketing. Então daí, eu acho que fica restrito o
negócio. A [empresa] tem uma cultura de você mudar para outras funções,
que é muito legal do meu ponto de vista. Mas [...] existe um grupo de
pessoas que foram recrutadas, para dentro da [empresa], que elas são
especialistas naquilo. Acabou o desafio, elas vão embora, não tem jeito.
(MG1)
No caso da transferência geográfica, o problema pode envolver não só o
deslocamento do funcionário, mas de sua família para outra cidade.
Eu acho, e acho que aí a empresa vai ter muito sucesso, quando todas as
áreas, quando houver uma transferência geográfica que se avalie se a
pessoa tem interesse, se isso vai ser um fator complicador para ela. Porque
por mais que a pessoa seja um excelente profissional se você colocar uma
determinada região que ela vai ficar longe da família, ela vai ficar longe dos
entes queridos dela porque ela não consegue que vá junto, por condição
financeira ou porque ela tenha uma situação estabilizada no seu município
anterior, isso vai gerar um descontentamento dos funcionários. Então essa é
uma coisa que tem que ser tratada com muita cautela. Com muito cuidado
com os funcionários para que não gere uma desmotivação. Mas em
algumas áreas a transferência existe, existe e há mesmo, e é rápido. [...] E
às vezes é uma coisa que você tem que ir, e você tem que levar teu aparato
(MG16)
Muitas vezes, o trauma de mudança de município pode ser tão grande que a
mudança de função passa a ser uma alternativa à transferência geográfica. Os
próprios gestores reconhecem persistir numa transferência indesejada pode causar
resultados ainda menos desejados para a empresa.
No período já que estava decidida a mudança, tive uma entrevista com
todos eles, conversei com todos eles, da disponibilidade do que tinha e o
que não tinha, do que podia e que não podia. Alguns excelentes
operadores, não vieram, ficaram lá porque eu sabia que se viessem pra cá
era o tempo deles arrumarem outro emprego. Então são pessoas que estão
trabalhando na manutenção ou nas lojas no mesmo local, dão resultados
excelentes, melhoraram o desempenho [daquele] pólo operacional, que era
problemático. Estão felizes, estão bem, a empresa melhorou. Infelizmente
eles não vieram para cá, mas se viessem também, com certeza, já não
estariam com a gente, já teriam ido embora (MG12)
Um discurso menos expressivo enxerga as transferências geográficas como um
crescimento profissional, assim como as transferências funcionais.
Não, não, não. Não enxergo como obrigação. Acho que na verdade que é
uma oportunidade de crescimento. (MG13)
Ainda assim, é bastante difundido o entendimento de que as transferências
geográficas são mais complicadas e traumáticas para os funcionários. Eles inclusive
123
reconhecem os esforços da empresa para minimizar seus impactos, por meio de
alternativas e compensações.
Mudou, essa situação muito, isso eu posso falar de cadeira. No ano de 1991
eu fui transferido para [a sede], era uma situação diferente, a empresa ainda
era estatal, era uma situação política você tinha que ter conhecimentos
políticos e tal. [...] Em dezembro de 2002, contra a minha vontade, eu
estava para casar, construindo casa e terminei com um elefante branco lá,
eu fui transferido para [outra localidade]. [...] Foi uma coisa que me
assustou. Na época não existia uma política de transferência, que hoje
existe. [...]. E o seguinte, ainda me deram uma carta e eu não assinei - isso
quase deu problemas para mim - que a transferência era do meu interesse.
Engavetei a carta e não assinei. Quando foi em 2004 me transferiram de [de
lá] para [a sede]. Eu já não queria sair de [de lá]. Eu já tinha casado, a
minha esposa é advogada, estava trabalhando lá, com um salário muito
bom. Estava muito bem, me tiraram de [de lá], foi contra a minha vontade,
mas aí já foi uma filosofia diferente “você vem, o preço do aluguel lá é X,
aqui é X mais 30%, você vai ganhar mais 30%, a gente paga tua mudança,
te dá todo o apoio”. Depois de um tempo [na sede] vim pra [cá]. A mesma
coisa, pagaram a minha mudança, aluguel [daqui] é igual [ao do local da
sede], mais 50%: “a gente dá mais 50% do valor do aluguel para que você
possa [se mudar]”. Hoje se você for transferido você tem um valor, acho que
mil reais, mais paga a mudança, tem uma política hoje. (MG7)
Quando questionados sobre a existência da obrigação em aceitar uma
transferência, dois discursos diferentes emergem: o primeiro entendendo que é
possível recusar sem maiores danos para a carreira e o segundo que esta recusa
pode representar o fim do relacionamento com a empresa, como uma violação de
contrato.
Ele pode dizer não. Isso não é uma obrigação. Ele tem que avaliar essas
oportunidades e pensar na carreira, como ele avalia uma oportunidade em
função do plano de carreira que ele traçou. E aí avaliar se aceita ou não.
(MG18)
Se sente obrigado porque quando você fala “não vou, não quero ir” você
está dando um tiro no peito, você não é uma pessoa que está querendo
ficar na empresa. (MG7)
A análise de alguns depoimentos indica que muitas vezes, não aceitar uma
transferência geográfica pode significar correr outros riscos maiores, ainda que a
pessoa não seja diretamente obrigada a aceitá-la.
Sinceramente isso que não é da empresa. É do estado de necessidade de
sobrevivência da pessoa. Porque quando você vira para um funcionário e
fala assim: “olha eu preciso que você seja transferido para não sei aonde”,
provavelmente é porque você já não está mais com aquela vaga ali para
ele. [...] Agora uma coisa é se eu tenho uma oportunidade [...] e viro para
uma funcionaria e falo: “eu tenho uma oportunidade em [outro lugar], que eu
acho que é muito legal para você. Você tem vontade?” E fala assim: “não,
124
não tenho vontade de ir para [outro lugar], porque minha vida esta toda
aqui”. Pronto. “Legal, você vai continuar aqui”. (MG5)
Uma solução para estes impasses aparece em outra entrevista. Trata-se de
clarificar, já no processo de admissão, a possibilidade da transferência geográfica,
evitando assim a surpresa do funcionário e a percepção de que seu contrato
psicológico foi violado.
A empresa não está focada em uma única região. Então o funcionário que
entra aqui, ele sabe que tem que atuar em todas essas frentes, mas eu
acho o seguinte: quem está aqui, quem já estava na empresa conhece isso,
isso é pacífico. Agora, quem entra, eu acho que na hora da seleção isso
tem que ser colocado para ela, se ela é vai atuar só num local fixo ou não.
(MG19)
Atitude aberta
A dimensão de atitude aberta do funcionário está relacionada ao quanto o
funcionário é claro e aberto acerca de todos os aspectos que afetem a relação de
trabalho.
Aos canais institucionais que favorecem a comunicação entre
empresa/empregado são importantes, mas também a relação direta com seu
superior é importante para avaliar esta dimensão. Assim, a facilidade de
comunicação, o grau de abertura e a formalidade das relações hierárquicas
provavelmente poderão influenciar a existência de uma atitude aberta.
Eu tento tornar nosso relacionamento aberto, transparente. A gente sai para
brincar, para beber chopp, para jogar bola, várias coisas, eu tento me tornar
uma pessoa tão amigável, tão amiga das pessoas, que essa é a maneira
que eu tenho de fazer com que a pessoa se sinta com liberdade realmente
de expressar o que sentem. Eu deixo que as pessoas brinquem comigo [...]
para justamente poder perceber que eu não sou um cara no altar. Então, eu
confio nessa relação. (MG20)
Quando um funcionário percebe que está sendo ouvido e que seus desejos,
opiniões e prioridades estão sendo consideradas, existe a possibilidade que ele se
sinta mais valorizado e, portanto, desempenhe melhor sua função. O quanto essa
125
postura se mostrará viável dependerá da acessibilidade proporcionada pelos
superiores, preferencialmente estimulando os funcionários a expressarem-se.
Postura, não é perfil físico não, quando eu cobro a meta de um funcionário a
primeira coisa que eu sempre friso é que [ele] tem que ter comigo é
liberdade de falar se ele tem condições de fazer aquilo ou não. Hoje se eu
chegar para um funcionário “eu preciso que você faça para mim esse
trabalho” a primeira coisa que eu cobro é “Eu não consigo fazer isso,
preciso de ajuda, eu só posso avançar até a metade”. E antes, até mesmo
eu errava, eu achava que a pessoa que trabalhava estava mentindo: “você
é capaz disso”. Achava sempre que o outro era capaz e hoje não. Hoje ele
tem a liberdade comigo, eu cobro dos outros, inclusive, que trabalham
comigo, que funcionário trabalhador tem que ter liberdade de falar “para
mim fazer isso nesse tempo eu preciso de ajuda ou eu não consigo fazer”.
Por isso alguns deles mudaram. Tem pessoas que trabalharam 20 anos
fazendo manutenção e no primeiro mês trabalhando com eles, [vi que] o
perfil dele era de fazer obras. Gostava do outro segmento e quem estava do
lado dele não tinha liberdade de pedir para mudar. Essas pessoas foram
todas remanejadas, se trabalhou o perfil das pessoas. Tem pessoas que
adoram, elas gostam de projetos, mas quando dá uma chuva voltam a
campo, então tem que aproveitar o potencial daquilo que ele gosta de fazer.
Eles têm o dia-a-dia deles, e no dia-a-dia deles estar muito mais próximos
do que gostam” (MG11)
A criação do mapa de carreira proporcionou uma boa oportunidade para que o
funcionário possa estabelecer um plano de desenvolvimento e comunicar isto aos
superiores, tangibilizando suas expectativas e desejos, se não em todos os aspectos
da relação profissional, ao menos nas questões relativas a sua carreira.
Estamos criando ferramentas para que ele deixe isso muito claro. Nós
temos aí o nosso mapa de carreira, que o leva a fazer um plano de
desenvolvimento individual [...]. O que a gente está pretendendo com isso?
Que ele nos diga para onde ele quer ir, como ele quer fazer essa carreira,
para que a gente tenha a possibilidade de orientá-lo e facilitar também.”
(MG17)
Investimento pessoal
O escopo do contrato psicológico é o que se busca captar nessa dimensão.
Assim, esta análise busca entender o que os funcionários estão dispostos a fazer
que se encontra fora do escopo original de sua função como forma de retribuição às
promessas da empresa.
As pessoas, quando vêm procurar emprego na [empresa], ou a gente está
querendo trazer um profissional, uma das questões que [a empresa] coloca
126
são questões pessoais, tipo, ela quer estudar ou quer ter tempo para
família, são questões outras, e a empresa também. Acho que, com essas
questões de responsabilidade social, não tem como, a empresa não é mais
ela, não acaba ali [...]. A tendência da [empresa], como a de qualquer
organização, é estar além das suas paredes. [...] Eu acho que a empresa é
o lugar onde [a pessoa] vive a maior parte do dia dela, é o lugar que está
trazendo condição para ela de vida, acho que isso tem que ter uma relação
mais amorosa com a empresa. Então se preocupar com a empresa é como
se preocupar com o futuro do filho, você investe no seu filho para que ele
tenha possibilidades no futuro, você investe na empresa seu tempo, sua
dedicação para que ela tenha futuro. (MG17)
A disponibilidade de realizar tarefas “extras” tem muitas variações e é
facilmente encontrada no nível gerencial.
São poucas as pessoas que extrapolam o seu setor. Estou tirando a
liderança, [...] estou falando de analista para baixo, porque a liderança é
isto, extrapola toda hora, eles ajudam para todos os setores. Fora disso,
muito poucas pessoas, no meu ponto de vista, ajudam uma outra área com
problema. (MG1)
Depoimentos sugerem que isto se dá, mais comumente, no trabalho de campo.
A [empresa] pelo menos vende isso, que espera sim que os funcionários se
preocupem, [...] não que entrem para fazer atividades de outro setor,
obviamente não. Mas que se preocupem em ajudar. E aqui acontece. Por
exemplo, a gente tem o pessoal que trabalha na manutenção da rede, então
acontecem os temporais. Quando tem temporais, a gente está sempre
emprestando alguma equipe para ajudar a repor a energia dos clientes e
vice-versa. Quando a gente precisa aqui eles também [emprestam], existe
este tipo de ajuda. [...] Os funcionários entendem isso perfeitamente.”
Assim, muitas vezes, os subordinados entregam apenas o que já era esperado,
sem que se supere as expectativas. Assim, esperar que se realizassem tarefas
extras, seria não ter senso de realidade.
Eles sabem que a empresa espera, percebem que a empresa espera, mas
nem sempre superam. Aliás, na maioria das vezes, não superam, na
maioria das vezes atendem. [...] Se começasse a superar a partir de
supervisor, supervisor para cima, se estivesse superando as expectativas,
eu já estaria muito satisfeito. Por causa das dificuldades que eu tenho aqui
de mão-de-obra, porque todo mundo que eu pego aqui nem atende à
expectativa, quanto mais superar. Então a gente está sempre trocando [...]
Então, em terra de cego, quem tem um olho é rei, é mais ou menos por aí.
Mas é claro que a idéia é que cada funcionário supere as expectativas.
(MG2)
A justificativa para isso, em muitos casos está relacionada com a carga já
pesada de trabalho, normalmente e a falta de tempo e oportunidade para realizar
tarefas extras.
Na minha área é um problema que a gente tem porque essencialmente tem
o esforço da empresa em querer fazer que as pessoas vejam outras coisas.
Tem um programa que você passa o dia fora da sua área, visitando pessoas
1
27
de outras áreas. Mas o fato e que já é tão grande o trabalho e o trabalho já
é tão especificado, entre eles, que realmente falta tempo para que as
pessoas possam fazer isso. (MG3)
Em outros casos, a justificativa está relacionada à excessiva fragmentação da
empresa, que já dificulta o atendimento das expectativas normais e inviabiliza
exceder o escopo original do trabalho.
Então o que eu vejo dentro da empresa hoje é uma empresa muito fatiada e
a gente tem muita dificuldade para trabalhar em relação a isso. Você tem
várias diretorias e varias gerências dentro de um processo. [...] Às vezes,
em determinadas situações, você tem que conversar com o cliente e tal. “Eu
vou ver lá, deixa comigo” Mas não é a sua área e você não pode nem dizer
o que vai fazer e prometer porque não depende de você. E se aquela outra
área entender que aquilo não é pertinente, ela não vai fazer. É uma situação
muito complicada. (MG7)
Assim, o conjunto de depoimentos sugere que embora esta demanda da
empresa seja entendida pelo conjunto gerencial, ela não está se materializando, na
prática.
Teoricamente, é para o empregado pensar na empresa como um todo e não
ver só o que você faz. Sempre buscar ver a atividade do outro, a dificuldade
que o outro tem, o que você pode, dentro das tuas atribuições, o que você
pode fazer para facilitar o outro, isso é colocado. Mas na prática não
funciona. (MG7)
Quanto a atenção e a disponibilidade para os negócios da empresa fora do
horário e local de trabalho, relatos indicam que este é um valor amplamente
reconhecido e praticado. Em geral, não foram observadas discrepâncias neste
discurso, já que os mesmos discursos foram observados tanto em funcionários de
áreas operacionais quanto de áreas administrativas.
A [empresa] espera isso. Eu espero também. [...] Na verdade isso eu chamo
de comprometimento, porque se o funcionário está fora do horário dele e
está vendo alguém fazer um gato, um furto de energia na rede, ele deveria
estar, mesmo estando fora do horário de trabalho, ligando para o
responsável, estar ligando para alguém que saiba que possa fazer. Ele não
vai meter a mão ali na hora - eu até meteria se fosse o caso - mas que pelo
menos ele esteja comunicando para alguém preocupado que seja resolvido
o problema, que pegue o cara que está fazendo o furto. Acho que não só a
empresa, eu acho também, que o funcionário deveria estar comprometido
nesse sentido. (MG2)
Alguns entrevistados imaginam que s funcionários das áreas operacionais
mantenham-se mais atentos à empresa.
128
Depende da função que ele tiver, creio que sim. Eu trabalho 24 horas, eu
falo. Então, eu acho, eu tenho uma visão, que passo inclusive muito de
manutenção. Quem trabalha em manutenção são 24 horas na empresa, se
não for isso vai trabalhar numa padaria porque termina às 5 horas e vai.
Quem está na empresa, quem está na emergência, quem está em
manutenção, acho que isso aí está no sangue (MG6)
Relatos indicam que a implantação do Plano de Reestruturação, com sua
massiva comunicação dos valores da empresa podem ter corroborado para que esta
visão fosse ainda mais difundida.
Do plano de reestruturação para cá, em função do trabalho que está sendo
feito, isso está mudando muito. As pessoas estão passando identificar os
pontos onde tem problemas. Passa na rua vê um gancho, manda e-mail
para o pessoal de [furto de energia]: “olha, fulano tem problemas em tal
lugar, você dá um pulo e dá uma olhada”. E as outras áreas, a mesma
coisa, passou na rua, viu um poste quebrado, um poste inclinado, uma rede
baixa, o pessoal manda e-mail: “fulano estou em tal lugar assim e assim,
está acontecendo isso, pede alguém para dar uma olhadinha aqui”, a gente
vai no local e verifica a situação aí. (MG10)
O cuidado que os funcionários têm aos negócios da empresa pode estar ligado
à visibilidade dos serviços prestados pela empresa. Isso porque apesar de ter sido
privatizada, a empresa presta um serviço público essencial e sua imagem está
constantemente na mídia.
As pessoas mais antigas, ainda que a gente não quisesse, ela já tem isso
no sangue dela, de prestação. Por exemplo, se eu estou viajando passa um
carro, da [empresa] que nem doido. Na verdade, eu acho que é uma coisa
que até a gente tem vontade [de ligar e avisar]. Ttem pessoas até que
fazem de qualquer carro que passe por elas. Mas talvez o que acontece, [...]
se passa um [carro] da [empresa concorrente] e não tenho contato com a
[empresa concorrente], fica só aquela coisa, tinha que ligar. Agora, na
empresa onde você trabalha, onde você vai voltar. Você tem esse carinho.
Até porque eu acho que isso é um pouco duma troca. Por exemplo, se saio
num feriado, sai uma notícia da [empresa] no jornal e você não leu o jornal,
alguém vai falar para você: “você viu o jornal saiu da [empresa] ontem?”
Ainda que o funcionário não deva ou não queira é algo maior porque as
pessoas pedem, porque as pessoas abordam. [...] É não tem jeito. No caso
de um serviço publico e a gente tem que ter essa noção que nosso serviço é
um serviço essencial, é um serviço sensível. Não dá para ser da [empresa]
de segunda a sexta, e sábado e domingo, pode ficar todo mundo no escuro
que eu não estou nem ai. Não funciona. (MG5)
E este cuidado não está relacionado apenas ao aspecto técnico-operacional.
Ele também abarca a questão ético-comportamental, porque ela reflete toda a
experiência do serviço prestado.
Vou te dar um exemplo, a gente tem viaturas e motoristas. Às vezes o
colega vê um carro, fim de semana. O carro só roda quando está
trabalhando e vê algum motorista um fim-de-semana dirigindo o carro aí. O
129
cara pega “fulano, vi um motorista seu dirigindo tal dia, tal hora, tal lugar. Ele
estava realmente trabalhando?” Podia estar usando a viatura para fazer
alguma atividade particular. (MG10)
Este compromisso está tão definido nas práticas da empresa que, segundo
alguns entrevistados, se torna um hábito. Este hábito acaba sendo mantido , mesmo
que involuntariamente e leva a situações que os próprios funcionários consideram
inusitadas ou exageradas.
Não sei porque, alguma coisa, tipo assim: eu estou indo para um
restaurante e eu não consigo entrar no restaurante sem antes olhar o
medidor dele. Parece meio paranóico. Você está no feriado, não está no
serviço. Não está, mas você não consegue entrar em um estabelecimento
desses, sabendo que é um potencial furtador, sem antes checar se o
medidor está girando, se está tudo bem, se não tem uma ligação direita.
Então não é uma cobrança, você se sente assim. [...] Até na [empresa
concorrente] quando tive que fazer cursos na área de concessão da
[empresa concorrente], estava olhando, é instintivo, “será que está legal?”, é
paranóico quase. Então não está escrito isso em lugar nenhum, não é
cobrado. Parece paranóico. [...] Minha esposa me critica às vezes porque
chego na casa dos amigos e fico olhando o medidor deles. (MG4)
Alguns depoimentos, inclusive, merecem atenção especial no que concerne a
esta atenção especial fora do trabalho. No caso dos entrevistados da área que trata
o furto de energia elétrica, as preocupações mais explícitas são as questões da sua
própria área. A forma como esses funcionários se colocam diante das perguntas
acerca deste tema sugerem que existe uma forte propensão a formarem “uma
empresa dentro de uma empresa”.
Vou falar como funcionário da [área que trata o furto de energia], não vou
dizer funcionário [empresa]. Normalmente quando a gente está [nesta área],
se sente [empresa] 24hs. [...] E acho que todo o mundo aqui se sente um
pouco isso. Pelo menos o pessoal que eu conheço de mais íntimo, de
amigo, é automático. Parece que você é [da área] 24h [...]. Eu
pessoalmente me sinto assim e posso falar que a maioria da equipe [...]
também sente de essa forma. O cara está combatendo a fraude 24hs.
(MG4)
Estes funcionários justificam este comportamento alegando que os outros
setores não oferecem canais adequados para a comunicação de determinadas
ocorrências.
Isso é uma coisa inclusive a gente vem discutindo com o pessoal da técnica
que realmente precisa avançar mais. Por exemplo, tem gente que mora na
localidade, falta muita luz na casa dele. Eu acho que falta criar mais meios
para que as pessoas possam informar esse tipo de coisas. Canais. Às
vezes o cara quer até contribuir, mas falta ter um canal. O cara chegou pra
130
mim e “ah não, na minha casa falta muita luz”. Tá bom, “você foi falar com
alguém?”. Fala com o cara. Mas acho que falta criar um canal para que a
pessoa possa trazer esse tipo [de problema] (MG3)
Uma vez que esta dificuldade não aparece em outros discursos, subentende-se
que talvez essa preocupação esteja mais presente no discurso do que na prática,
revelando diferentes posturas entre gerentes e subordinados. Como esse gerente
que hesitou em responder se seus funcionários sentem o mesmo comprometimento
que ele em relação à empresa.
Isso de forma geral não sei responder, porque é difícil. Claro que você está
ali conversando com todo mundo, todo mundo fala que está, mas fora do
horário de trabalho, acho que é uma coisa muito pessoal de cada um.
(MG3)
Outro indicativo do escopo da relação de trabalho é a disponibilidade do
funcionário em trabalhar fora de seu horário ou local de trabalho quando necessário.
A empresa, ela vê com muitos bons olhos aquele profissional, aquele
eletricista, que ele está na casa dele, e ele já conhece a região e sabe que
quando começa a trovejar em tal lugar, o temporal vem, ele sabe que vai ter
problemas e que ele já tome a iniciativa “já estou aqui, estou aguardando”.
A empresa vê com muitos bons olhos isso. (MG7)
Além disso, por ser uma empresa que presta serviços essenciais, muitas vezes
a disponibilidade do funcionário precisa ser permanente, não trabalhando
efetivamente, mas permanecendo de sobreaviso para qualquer eventualidade que
possa ocorrer.
A minha atividade ela requer que o meu celular fique 24 horas ligado.
Quando acontece alguma coisa logo já entro em contato com o centro de
operações [da sede]. [...] Então, em determinados níveis tem que ter essa
disposição. [...]. Por exemplo, carnaval fiquei por aqui. Esse final de semana
ia viajar, não viajei porque na sexta-feira sinalizaram que a contratada
poderia fazer uma greve, se essa greve cai num domingo, eu é que ia ser
procurado, ia ter que tomar todas as providências, de arrumar pessoas e tal,
de suprir aquela emergência. (MG7)
Apesar de parecer uma carga muito grande, o trabalho além do período normal
é aceito e até visto com certa naturalidade, independente da área de atuação do
funcionário.
Tem dia que acontece alguma coisa, atrapalhou, aí aquele dia precisou ficar
até mais tarde. E no caso do meu pessoal especificamente, ficam, ninguém
tem problema com isso, eles sabem que a tarefa é importante para a
empresa e que seja finalizada, porque no dia seguinte, teremos outras.
(MG2)
131
Olha, ele deve trabalhar para alcançar os objetivos que ele tem. Hoje, eu
percebo que as pessoas têm chegado antes do início do horário e saído
depois. Isso tem sido uma prática normal. [...] Freqüente. É rotina. É difícil
alguém cumprir somente o horário. (MG18)
A variação está na intensidade, na freqüência e nos motivos que levam a esta
sobrecarga.
Esse pessoal hoje trabalha de segunda a sábado e às vezes, alguns
domingos trabalham também. Quer dizer, aí está num ritmo muito forte. [...]
Se tiver um feriado na quinta e a empresa enforcar sexta, a diretoria vai
trabalhar igual. [...] Agora, o que eu sempre falo, se eu dobrar o número de
turmas ainda assim não vai faltar trabalho para ninguém. A quantidade de
pessoas que estão furtando é tão grande que sempre tem [trabalho]. (MG3)
Esses cargos que são mais exigidos, até o meu por exemplo, a gente tem
uma dedicação além do horário, às vezes, nem sempre, tá? Mas às vezes
precisa assim um pouco ficar além do horário de trabalho normal. O pessoal
mais da retaguarda, não. Cumpre o horário ali e raramente [fica além do
horário], só quando recebe uma ligação, se tem necessidade. (MG9)
[Nesta localidade] todos sabem que no verão o pessoal trabalha sábado e
domingo, e eles sabem isso o ano inteiro. Então eles programam as férias
durante o ano, a gente tem no meio do ano festas juninas, São João. Então,
a gente se programa e faz um rodízio das turmas. (MG15)
Além disso, existe algum consenso entre empregado/empregador acerca do
momento em que a sobrecarga vai ocorrer. A empresa tenta levar em conta os
compromissos pessoais de cada um.
Então quero saber quem pode e quem não pode. Você tem criança nova em
casa. [...] Mas a primeira pergunta é: quem quer ser avisado, quem quer que
eu ligue para, ser acionado fora do horário de trabalho? [...] A grande
maioria. Porque os que não aceitaram não podem porque boa parte está
fazendo faculdade. A gente compreende, aqueles a gente tenta evitar. Mas
são as pessoas que dizem, sábado e domingo podem contar comigo. (MG8)
A busca pelo equilíbrio faz com que seja necessário identificar a real
necessidade de se trabalhar fora dos períodos previstos, e alguns entrevistados
reconhecem o esforço da própria empresa para que isso seja uma prática.
Tem que ter bom senso, ele está de férias, né? É preciso mesmo chamar o
empregado naquela hora? (MG17)
Eu acho que aí a gente está recebendo aí todo o treinamento necessário
pra que a gente possa se organizar dentro do expediente. Eu acho que
trabalhar muito não é trabalhar até depois do horário todos os dias. A gente
tem que ter um momento pra investir na nossa carreira, investir nos nossos
estudos e ter lazer com a nossa família. (MG21)
A sobrecarga de trabalho exige sacrifícios da vida pessoal que podem fazer
com que os funcionários passem a enxergar a relação de trabalho como uma
relação desbalanceada.
132
Mais difícil ainda é dizer “olha, eu já cumpri o que eu tinha para cumprir
hoje, então hoje eu vou sair mais cedo para cuidar da minha vida pessoal”.
Isso daí, eu não tenho notícia de que isso tenha acontecido. Então, as
pessoas têm dedicado, sacrificado talvez, parte da sua vida pessoal para se
dedicar à empresa. (MG18)
Relatos apontam que esta é uma situação transitória, sobretudo pelas praticas
que vêm sendo adotadas pela empresa.
Eu avalio como sendo uma situação absolutamente momentânea. Em
função, inclusive, da própria necessidade de mudança, da necessidade de
transformação. A empresa tem muitos problemas para resolver, muitas
dificuldades para superar. Coisas sérias. Tem problemas de fluxo de caixa,
tem necessidade de recuperar receita, em função do furto. Tem
necessidade de melhorar a qualidade do fornecimento e isso é natural que
exija muito dos profissionais que estão aqui. Então, eu acho que as pessoas
têm que entender que é uma necessidade e têm que estar dispostas.
(MG18)
Trabalhar fora do horário pré-determinado representa uma contrapartida não só
no que diz respeito ao horizonte temporal da relação de trabalho e nas
possibilidades de manter um contrato de longo prazo- mas também uma
contrapartida imediata que dá aos funcionários a sensação de justiça.
Essa carga de trabalho na área de [furto de energia elétrica] é, de todo
mundo, é mais ou menos igual. Antes estava em [outra localidade], trabalhei
em corte, religação e furto, uma estrutura maior do que tem aqui hoje. Esse
processo lá [...] eu não era líder, era especialista, então a carga de trabalho
nossa é grande. É grande, mas aí cai naquilo que eu falei na questão do
comprometimento. Eu sou comprometido com isso. Sou comprometido e sei
que vou colher os frutos daqui a pouco disso, desse trabalho. Essa é minha
visão sem demagogia. (MG13)
Isto pode explicar a voluntariedade dos subordinados em permanecer no
trabalho mesmo após o horário do expediente, situação muito freqüente nos relatos
da média gerência.
Já tive caso até bacana, quer dizer, fiquei emocionado de ver projetos que
precisavam dar entrada na web, e estavam muito enrolado. Aí, só falou
assim: “está atrasado, mas pode deixar que não vai ficar assim”. O que é
que eles fizeram? Juntaram três ou quatro foram para lá sábado,
trabalharam. E não botaram hora extra não porque eles se sentiram
culpados porque atrasaram. Cada um tem um elo, cada um faz uma etapa.
Aí cada um, de alguma forma contribuiu para que ficasse atrasado. Uns três
ou quatro se juntaram. Eu achei muito legal. Agora então eles estão no
ritmo. (MG8)
Pensar em novas formas melhorar os processos, produtos e serviços da
empresa é uma das formas de demonstrar o investimento pessoal que se tem com a
133
empresa. Especialmente neste caso, onde a inovação é um valor bastante difundido
na média gerência.
Eu nunca vi na empresa nenhuma restrição à implantação de uma idéia que
traga resultado. Eu nunca vi isso na empresa. Eu já vi ter idéia legal, mas
não traz resultado. Isso eu já vi uma porção de vezes. Isso é muito
importante porque as pessoas imaginavam que as idéias delas não podiam
ser implantadas. A idéia é boa, mas tem também que trazer resultado para a
empresa. (MG1)
Quanto mais você conhece, quanto mais você convive com determinado
problema, a solução, a chance de você agregar é muito maior. Essa troca
eu acho que ela é essencial. A empresa incentiva muito isso. (MG5)
Inicialmente, os programas de incentivo à inovação apresentavam problemas
em sua estruturação e acabavam por gerar expectativas que não eram
correspondidas. A falta de feedback fazia com que os funcionários sentissem que
suas idéias eram simplesmente postas de lado.
Existe esse programa na empresa. No início, quando esse programa foi
criado, todo mundo começou a gerar idéias, gerar idéias, e na verdade o
programa não estava bem estruturado na época e a grande maioria não
estava tendo feedback da idéia que estava dando. Quer dizer, isso deu uma
esfriada no pessoal. Ninguém te responde se a idéia é boa, é ruim. Que
aconteceu? Não aconteceu nada. Então foi feita uma reclamação geral em
relação a isso. E agora, a partir do momento que as pessoas estão
passando a idéia, pelo menos passa um feedback: “sua idéia foi aprovada”;
“sua idéia não é boa”; “sua idéia já foi dada por alguém 6 meses atrás”.
Então, é importante para você valorizar, porque o cara tem a informação e o
que aconteceu com a idéia que passou. Se não, você cai no descrédito.”
(MG10)
O Plano de Reestruturação representou um incentivo à mais à inovação, unido-
se aos outros programas institucionais já existentes e tentando solucionar os
problemas identificados nos programas de inovação.
O plano de reestruturação entrou com [outro plano], de atualizar, de
empresa de tecnologia, de transformação, de agregar valor. Acho que o
plano de reestruturação rompeu com isso, de “eu sempre fiz assim, não sei
quanto a isso...” Isso acabou hoje um pouco. Existe um procedimento
básico, mas acho que o nosso lema está na criatividade, na inovação, no
crescimento, do desenvolvimento. (MG21)
Muitas vezes, o funcionário não só está comprometido com a inovação da
empresa como ele mesmo enxerga a possibilidade de dar idéias e melhorar
processos como uma das razões de sua permanência na empresa.
Não é à toa que a gente ganhou o premio de empresa inovadora, no setor
de energia elétrica. Acho que isso é fundamental [...]. Imagine você se tiver
sempre preso com medo de errar. Em projetos integrais então, o universo
134
de coisas criativas que você pode fazer é imenso. E toda vez que a gente
tem alguma possibilidade, implanta, testa. Testa micro primeiro, funciona,
expande. Isso é muito dinâmico. Eu diria muito mais: [na área que trata do
furto de energia], em linhas gerais, isso na parte comum, você tem a
possibilidade de criar, inovar, quebrar. Quebrar coisas que seriam
consideradas tradicionais. A própria rede [da empresa]. Para que vamos
continuar com aquela rede? Vamos quebrar paradigmas, fazer uma coisa
diferente, que me permita controlar o furto. No início pode parecer uma
loucura. Não, vamos fazer! E tanto é que hoje está aí e tem muita gente que
vem olhar. Isso jamais seria possível se as pessoas não tivessem esse grau
de liberdade. Podia dar errado? Podia. Ninguém estava pensando em errar.
(MG4)
Isto pode se dar pelo fato de que os próprios funcionários reconhecem que a
inovação pode ser fundamental na sobrevivência da empresa, não só pelas razões
óbvias mas especialmente porque ela faz parte de um mercado regulado que pode
sofrer desregulamentação e ter que competir com novos concorrentes em poucos
anos.
Isso aí é prática dos valores e como necessidade para se alcançar o que a
empresa quer. São necessidades de sobrevivência até da empresa no
mercado que a gente tem o monopólio, mas é um mercado agressivo, que
furta energia, que fica inadimplente e essas pessoas são muito criativas
para fazer essas irregularidades, então nós temos que ser mais criativos
ainda. (MG18)
Também neste aspecto, podem-se observar discursos divergentes, onde
apesar de a inovação e a criatividade serem reconhecidas como um compromisso
que deveria ser geral, são levantadas dúvidas quanto ao engajamento de todos
nestes valores. Assim, de acordo com o relato a seguir, o entrevistado pensa que,
apesar do apoio dado pela empresa, o quanto o funcionário participa dos programas
depende também das características pessoais de cada um.
Isso aí é uma briga, alguns sim, outros não. Características de cada um.
Alguns têm boas idéias são aprovadas, são incentivadas, acho até
interessante, no dia das nossas reuniões que é quarta-feira, citar. Incentivar
que os outros façam, tenham boas idéias, mas não são todos, é inerente a
cada um. (MG8)
Para tentar garantir que os funcionários participem mais não só dos programas,
mas também no dia-a-dia, com idéias criativas que possam minimizar custos e
melhorar as atividades da empresa, alguns gerentes acreditam que o incentivo à
135
participação em reuniões onde o grupo tenta discutir os problemas e encontrar as
melhores soluções.
Hoje, particularmente, a gente busca, tem um desafio maior: a gente tenta,
se reúne, conversa, troca idéias, dá sugestões, para tentar chegar num
denominador comum da melhor forma que você está tentando atingir esses
objetivos que são traçados. Seria mais o menos por aí. Nada imposto. Hoje,
por exemplo, está acontecendo isso lá agora, de redefinir nossa meta de
acordo com o orçamento. Então, as pessoas estão conversando lá, sobre
justamente isso. O que a gente vai ter que fazer para utilizar nossos
recursos. Então, o que acontece? Eu, particularmente, chamo desde o
supervisor até o especialista. Da última vez eu chamei até o cara do
almoxarifado, porque a questão dos custos passa pelo material. Ninguém
melhor para saber de custo do que o cara do almoxarifado. Hoje não pedi
pra ele ir, mas a gente tenta em conjunto, achar um denominador comum.
(MG13)
Assim, a capacidade e o compromisso de trazer para a empresa idéias
inovadoras acabam gerando um outro comportamento voltado para o auto-
desenvolvimento e que refletem o investimento pessoal dos funcionários: a vontade
de querer se desenvolver e a disposição para investir tempo e energia na empresa.
Sempre falo para eles: “quem vai dar promoção para vocês são vocês
mesmos”. Procurem, dêem idéias, oportunidades têm aos montes. Sempre
falo para eles: “cada quinta-feira sim outra não, ou a cada 3 semanas tem
uma reunião de diretoria, quem quiser mostrar um projeto, uma coisa, aí eu
venho aqui, a gente ajuda, faz uma apresentação, e vocês vão apresentar
isso para o diretor”. [...] Vocês é que vão apresentar isso, vão mostrar isso.
(MG7)
A pesquisa agrupou estes dois aspectos por considerar que eles apareciam
sempre intimamente ligados, formando o que se convencionou chamar de auto-
desenvolvimento, englobando tanto questões do relacionamento do entrevistado e
seus subordinados com a empresa como atitudes em relação ao aprimoramento
técnico, profissional e comportamental (WETZEL, et al .2007).
Assim, depoimentos que combinam o esforço e o interesse dos funcionários em
seu crescimento pessoal e o esforço e a vontade institucional de desenvolver seu
corpo de empregados se destacam como esclarecedores para este aspecto.
Acho que ela conta com isso, conta com a vontade de crescer e viabilizar
algumas oportunidades. Tem muitos desses técnicos que trabalham comigo
estão fazendo faculdade, através do convênio. Ela espera que as pessoas
queiram e façam seu desenvolvimento, mas também cria facilidades para
isso. (MG12)
136
A empresa dá todas as oportunidades, agora ela deixa o colaborador bem à
vontade. Ela diz: “eu quero pessoas que façam parte de uma organização
onde as pessoas procurem o tempo todo seu auto-desenvolvimento. Estão
aqui todas as ferramentas e todo o apoio para que vocês busquem seu auto
desenvolvimento”. É uma escolha, e ela não vê com bons olhos as pessoas
que são acomodadas, que não pensam em se desenvolver. (MG7)
Garantir as oportunidades de crescimento, na visão dos funcionários
entrevistados é uma iniciativa que deve partir de cada funcionário e não da empresa.
Se o esforço pessoal estiver articulado com os programas institucionais, a
convergência de interesses deverá gerar uma situação ganha-ganha.
No meu ponto de vista, acho que isso hoje é muito colocado nos
funcionários - os colaboradores os parceiros e tudo. A minha visão é o
seguinte: às vezes, eles mesmos por si só, não têm noção das
oportunidades que existem. Isso não é uma regra, mas acho que eles
deveriam ter um sentimento mais apurado de quantas oportunidades eles
têm e de repente não estão enxergando. De repente, por acomodação. Uma
das coisas que deixam bem claro nas cabeças como gestor, e eu prefiro
passar isso para as pessoas, é o seguinte: as oportunidades elas existem e
só dependem de cada um para galgar essas oportunidades. Não depende
da [diretora] do RH, do [presidente] Depende do seu trabalho, da sua
dedicação e seu esforço. A gente não pode atribuir, por exemplo, eu não
posso atribuir, por exemplo, eu estou com um curso de espanhol. “Ah, não
faço curso de espanhol porque a [empresa] não me deu”. Não, não faço
porque eu não procurei o curso, não corri atrás. Se eu sei de minha
necessidade. Essa questão do ser humano atribuir a sua deficiência ao
outro, isso sinceramente é uma coisa que me irrita um pouco. [...] Eu sou
responsável pelo meu desenvolvimento. Se a [empresa] não vai poder me
apoiar, eu não vou deixar de me desenvolver por causa disso. (MG13)
Essa sinergia de interesses pode gerar oportunidades de desenvolvimento até
mesmo em função de aspectos externos à empresa, demonstrando uma vez mais a
energia, a disposição e a atenção que alguns entrevistados procuram investir na
empresa.
Obviamente há riscos no estímulo ao desenvolvimento na medida em que os as
práticas de mercado podem levar outras empresas a procurarem empregados já
“prontos”, isto é, empregados que não impliquem custos de treinamento e
desenvolvimento. Este risco é tanto maior quanto mais dinâmico for o mercado de
trabalho na área geográfica em que o funcionário se encontra. Adicionalmente, o
sucesso da mesma e tende a aumentar a visibilidade da empresa e tornar seus
empregados mais atraentes aos olhos de outras empresas que necessitem contratar
137
pessoal capacitado. Neste sentido as políticas de retenção tornam-se vitais à
manutenção de um corpo de empregados qualificados.
Alguns entrevistados identificam resistência ao auto-desenvolvimento quando
os funcionários já têm mais idade e tempo de serviço. Como estes estão mais
próximos da aposentadoria, optam por investir em outras possibilidades, como por
exemplo a carreira de seus filhos.
A gente já tentou fazer esse trabalho - a grande maioria deles têm filhos na
idade escolar, entrando na universidade. O que eles colocam para a gente é
que eles preferem investir nos filhos do que investir na sua carreira que,
para eles, está assim com mais 4, 5, 6 anos. Então preferem investir na
carreira do filho. (MG7)
Já os mais jovens buscam o desenvolvimento contínuo e autônomo em relação
à empresa. O crescimento dentro da empresa pode, na verdade significar aumento
de visibilidade no mercado e novas chances de aumento de sua empregabilidade.
O que acontece é o seguinte: os que entraram há menos tempo na empresa
e que tem um nível de escolaridade mais elevado, eles estão procurando
seu auto-desenvolvimento. Vou te dar um exemplo, eu tenho 3 engenheiros
aqui [...] um terminou pós-graduação e tem 2 cursando pós graduação, um
até na área de projetos e ele coordena a área de projetos. Nós temos aqui
um eletricista que já é formado em técnico de segurança de trabalho e está
cursando faculdade, está fazendo a área ambiental. E temos alguns
técnicos que estão buscando junto à empresa uma forma de ajudá-los a
pagar a faculdade que estão fazendo, fazem curso de engenharia de
produção. [...] Sim, eles se qualificam buscando oportunidades na empresa.
Não posso afirmar, mas pela leitura que estou fazendo, não estão perdendo
de vista a oportunidade aí fora. (MG7)
Com relação ao investimento de energia, a metáfora “vestir a camisa” pode
adquirir um sentido mais palpável.
Meu guarda-roupa está cheio de camisetas [da empresa], tem vezes que
não sei qual escolher. Fatalmente eu amanheço no sábado com uma
camiseta [da empresa]. É sábado, o dia que não estou em serviço, não
porque é confortável, mas porque é legal mesmo. [...] Massivamente as
pessoas compram caneta, chaveiro, porta CD, florzinha [da empresa]. [...]
Enfim, uma loja inteira, que eu pelo menos uso com satisfação. (MG4)
Arranjos específicos possibilitaram a superação de metas. Eles envolviam
investimento de energia e disposição de todos, autonomia e iniciativa dos gerentes e
engajamento dos subordinados.
Para você ter uma idéia, nós tínhamos um problema, uma série de metas
para serem cumpridas e uma delas estava difícil de cumprir. [...] A gente em
138
conjunto achou uma solução e hoje nós temos primeiro lugar nesse mês,
com muito orgulho. Na reunião de ontem a gente comemorou isso aí,
tiramos o primeiro lugar e um dos que mais alavancou para tirar o primeiro
lugar foi esse [processo] que estava muito ruim. Todo o dia, por meio
período cada um deles, todos, se revezam [...] Eles saem da atividade deles
e vão para atividade de emergência, que é uma atividade que estava ruim.
E eles, com a capacidade técnica deles, conseguem fazer em meio período,
o que uma turma de emergência faz em um dia inteiro. E aí como você
agregou mais essa atividade, em meio período uma vez por mês, são 23, dá
para fazer rodízio, quase que uma vez por mês, melhorou a meta 120% só
nisso que foi uma mudança. E isso é mais um exemplo. (MG8)
O investimento pessoal extrapola o mero cumprimento das funções para gerar
a vontade de expansão de suas próprias obrigações.
Hoje é muito estimulado a expandir. Hoje, pelo menos da forma como eu
vejo, as pessoas não têm só que fazer o seu trabalho e entregar aquela
coisa pronta, já pré-determinada. Ela tem que ir mais além. Ela tem que
pensar, refletir o que ela está fazendo, e o que ela está empregando
também. Ela tem que empregar mais do que foi pedido, ela tem que superar
o companheiro que está do lado dela. (MG19)
Flexibilidade
A flexibilidade está associada à dimensão da estabilidade. No depoimentos de
um dos funcionários essa idéia é em expressa, como uma possibilidade de mudar os
termos do contrato psicológico sem precisar renegociá-los.
Foi um negócio engraçado. Meu chefe dizia assim para mim: “você precisa
vender 25 milhões de reais”. Nunca fui vendedor, acabei de ser naquele dia.
Já virei vendedor. Para botar uma meta dessas, virei vendedor. Foi muito
engraçado que teve um grupo de atendentes que eu estava - e você ia
implementar isso nas áreas e você percebe essas coisas - uma atendente
disse o seguinte: “desculpe, mas eu não sou vendedora”. Falei “você está
numa situação difícil e a tendência é ficar mais difícil ainda, eu preciso de
você atendente e vendedora”. Se só tem uma habilidade só, se você não é
windows, como eu chamo, com várias janelas abertas, olha, o mercado
infelizmente... “Você quer que eu te mande embora, para você ganhar os
40%? Porque, olha, não encaixa”. Respondendo à tua pergunta, eu sou
uma pessoa, vou falar de mim e vou falar das pessoas que trabalham do
meu lado: todo mundo da minha área aceitou isso de uma forma muito
simples. [Eu falei]: “olha gente, precisamos vender 25 milhões de reais em
produtos”. Ninguém nunca chegou, e isso é muito interessante, dos meus
líderes, ninguém chegou e falou comigo: “oh, não dá, eu não dou esse tipo
de coisa”. Eu até falei para ela, imagina só se meu diretor vira para mim e
fala: “você tem que vender 25 milhões”. [E eu respondo]: “desculpe, [...] só
atendo cliente, não vendo”. [Ele vai falar]: “por favor se encaminha aos
recursos humanos, tem uma carta de demissão para você lá”. [rindo] Não
existe isso, é um jogo que quando você entra aqui, você sabe do jogo.”
(MG1)
139
Este compromisso desdobra-se em dois comportamentos. O primeiro está
relacionado com a predisposição para se ajustar e acatar as mudanças no quadro
geral do trabalho. A segunda reflete a habilidade de lidar com fatos imprevistos.
Em uma empresa que está em constante clima de mudança, umas das
competências organizacionais mais valorizadas é exatamente a orientação para
mudança. Neste contexto, a predisposição para a flexibilidade é um traço muito
marcado da personalidade da empresa.
Como as nossas operações são muito mutantes. [...] Você pode fazer várias
coisas, em várias perspectivas. Acho que é quase natural ter essa
flexibilidade de adaptação. Não é uma condição que a empresa está
esperando. Nosso tipo de serviço exige quase que você seja assim, não só
de horário, mas de comportamento, de atitude, depende da estratégia que
está montando na hora. Você é flexível não porque a empresa espera, nem
porque a empresa exige, e sim pelo formato de nosso trabalho. São muitas
atividades, muito diferentes, todas interligadas. Então, se a gente toma a
decisão de fazer alguma coisa, impacta fatalmente em uma mudança de
rotina sua. Não tem jeito. Acaba impactando, e se não impacta na sua,
impacta no atendimento, por exemplo, que vai acabar repercutindo no seu.
Tudo hoje [...] está interligado. Ninguém pode dizer aqui: “eu estou do lado
de fora, isso é uma coisa de atendimento”, se o atendimento mudar o
procedimento dele por questão estratégica, pode contar que vai afetar todo
mundo dentro. (MG4)
Esta predisposição para adaptar-se a novos ambientes não é privilégio de um
ou outro nível ou um ou outro setor. Ela é mais a regra do que a exceção.
Todos nossos funcionários são muitos flexíveis. Que a gente vive num
processo dinâmico de mudança muito, muito intenso. (MG7)
O Plano de Reestruturação aparece como um evento que marca, seja de forma
direta ou indireta, um amplo processo de mudanças com resultados visíveis até
mesmo no curto prazo.
Eles se enxergam sim, têm que observar a mudança, você vê, a própria
mudança da marca foi uma mudança radical. Eu acho que a empresa
mudou muito em muito pouco tempo. Uma coisa que a gente vinha de uma
empresa que foi estatal, que depois foi privatizada e mantinha o nome de
[empresa quando estatal], tinha uma cultura. E em um ano teve 360 graus
assim. E que mudou muito e foi uma mudança muito grande, para muitas
pessoas, inclusive, foi pavorosa. Tem pessoas que saíram, que não
estavam enquadradas no perfil da empresa, não conseguiram ir na
velocidade da mudança, e com isso o processo para muitas pessoas foi
doloroso. Inclusive mudanças de layout, você vê, antigamente a gente tinha
uma estrutura que todo mundo tinha sua sala, todo mundo trabalhava com
divisórias, sala fechada, corredor. Hoje não, hoje é tudo amplo, tudo aberto,
não tem divisórias. Se há uma única sala com repartição é com vidro para
que as pessoas enxerguem os gestores e os gestores enxerguem as
140
pessoas. Então, você vê, isso tudo muda muito. Então, de repente aquela
pessoa que trabalhava e que dava resultado e tinha comprometimento
continua no papel dela. Agora, também, quem dava o nó, quem dava seu
jeitinho de dar uma escapulida, ela ficou, mas ficou numa situação um
pouco mais delicada. (MG16)
Mesmo quando as mudanças são sugeridas por pessoas externas ao setor, os
entrevistados percebem que há uma boa receptividade.
[Aprenderam] a mudar sim, eu acho que sim. Eles aprenderam muito nos
últimos anos a aceitar o tipo de mudança e abrir um pouco a mente para
aceitar idéias. E, sobretudo, idéias de fora, que às vezes a gente estando no
mesmo processo, a gente não vê o que outros olhos podem ver. E eles têm
que aceitar, aceitar idéias, aceitar comentários para melhorar também nosso
processo. (MG15)
Essa receptividade pode se dar porque muitos funcionários percebem que esta
condição não é específica da empresa, mas do ambiente empresarial em geral.
Assim, este compromisso pode ser válido não só para a empresa em questão mas
para todas as outras onde ele possa vir a trabalhar.
Com certeza que tem que ter flexibilidade. Com certeza, a questão da
flexibilidade eu acho que hoje tem que existir em tudo quanto é lugar em
todas as relações. O cara que não é flexível hoje está fadado a morrer daqui
a pouco. (MG13)
Quando as mudanças envolvem revisões nos acordos, os entrevistados
parecem não se preocupar, porque acreditam na palavra da alta direção e
compreendem que se mudanças estão sendo feitas, é porque elas realmente são
necessárias e inevitáveis.
Até porque acho que, se não me engano, já aconteceu isso, da gente ter
que rever algum acordo, deve ter acontecido, não lembro, mas é uma coisa
natural. Mas é obrigatório, a gente tem que ter a capacidade de estar
revendo acordos. Claro que de uma forma honesta. Ninguém faz um acordo
pensando em revê-lo no futuro só para aquele momento. Não é a idéia, a
idéia é fazer um acordo com o intuito de acertar. Se amanhã a gente tiver
que rever, ele tem que aceitar. (MG2)
O excesso de mudanças, no entanto, pode fazer com que alguns funcionários
se sintam mal, especialmente quando elas acontecem de forma brusca e com
objetivos pouco definidos. A idéia de que a mudança não terá fim pode provocar nos
funcionários a sensação de fracasso e instabilidade. Ainda que estas referências
141
sejam referentes ao período anteriores ao plano de reestruturação, fica a sugestão
de que esta situação ainda persiste.
A gente vive isso o tempo todo na empresa. Vou te falar de 97 quando a
empresa foi privatizada. De Novembro de 97 até agora nós já tivemos
assim, nós não podemos contar a quantidade de mudanças, mudanças
radicais. Mudanças que já tiveram. Aqui tudo era junto como é hoje, de uma
hora para outra falou “agora existe um processo de obras, um líder do
processo de obras, um processo de manutenção, um líder do processo de
manutenção, dentro da mesma diretoria e esses dois processos totalmente
independentes”. Eram todos juntos, de repente ficaram independentes e
voltaram a ser juntos. Agora a gente não sabe até quando. (MG7)
Assim, o esclarecimento dos motivos pelos quais ocorrem as mudanças levam
à redução de possíveis resistências dos funcionários.
Não, aqui não tem dificuldade nenhuma desde que a coisa seja boa e bem
explicada e mostrada o porquê. Tem que esclarecer que você faz dessa
forma e não está funcionando bem e se dessa forma que você vai fazer
nova não funcionar bem, a gente muda de novo para procurar uma idéia
melhor, se alguém tiver uma idéia melhor. (MG10)
Alguns relatos indicam não apenas que não há disponibilidade para mudar os
processos da empresa, negando a universalidade da dimensão da flexibilidade, mas
que, além disso, existe uma certa resistência a mudança, dado que ela pode
representar uma violação no contrato psicológico por parte da empresa.
No início foi uma situação muito resistiva. Aquele negócio que eu falei, de
você acompanhar um procedimento o tempo todo. Mas hoje, quando a
gente quer agregar melhoria dentro do processo, a gente tem que estar com
a mente aberta, porque as mudanças vêm para poder melhorar. Acho que o
grupo hoje já está conseguindo assimilar isso. Alguma resistividade ainda
tem em relação a isso, mas a mente do pessoal já está bem aberta para que
as mudanças estão vindo para melhorar o processo. [...] Já foi mais forte.
Eu estou aqui há um ano. Vamos dizer que quando eu cheguei aqui a
percepção que eu tive é que era muito forte, mas eu acho que como a
empresa hoje já vem fazendo isso e, aos poucos, as pessoas vêm se
conscientizando, eu acho que com a visão de que vem acontecendo em
outros lugares, as pessoas vêm perdendo um certo medo. Mas aqui é uma
área que a gente chama mais de área do interior, a resistência era bem
maior.” (MG21)
Essa mudança não tem dificuldade nenhuma. [...] Isso aqui funciona bem,
mas obviamente que num universo de 100% de pessoas sempre tem 10,
20% que tem uma resistência maior, uma barreira maior. (MG10)
Depende do profissional com que você está tratando, [...] o pessoal de
campo sempre é mais resistente, você tem que chegar aos pouquinhos e
convencer o pessoal que é bom para a organização. Já um nível mais alto o
pessoal aceita, e aceita porque vê isso como desafio, como coisa nova, que
mais pode fazer para agregar a organização, estruturar o processo, para ser
mais eficiente, ser os melhores. (MG15)
A tendência é manter o status quo. A tendência é comentar “sempre foi
assim, por que mudar?” Quer dizer, existe essa tendência não de todas as
142
pessoas, mas da maior parte delas. E aí a gente tem um trabalho grande de
mudar essa filosofia, essa cultura. (MG18)
Lidar com fatos imprevistos na realização do seu trabalho indica que o
funcionário está disposto a ter flexibilidade. Na empresa em questão, os funcionários
relatam que lidam com situações inesperadas constantemente e que as pessoas
estão sempre preparadas para estas situações.
Com certeza, é o que mais acontece diariamente. Você está planejando
alguma coisa pinta outra. Você tem que ter essa capacidade de estar
atuando em várias frentes, ter a multifuncionalidade, atuar em várias
situações e de diversas maneiras porque na realidade nós estamos, hoje,
servindo de bombeiro. É muita coisa acontecendo aqui nessa região
especificamente e você tem que estar preparado para tudo. (MG20)
Algumas competências são reconhecidas como indispensáveis para que se
possa atuar neste ambiente. A auto-motivação e o controle emocional seriam
necessários para evitar que o s funcionários fracassem em realizar suas tarefas.
Na verdade duas competências comportamentais que só tem na [área que
trata o furto de energia] são: controle emocional e auto-motivação. Controle
emocional até por esse inesperado. Você está cortando, você trabalha
cortando o dia inteiro, então o inesperado é o que mais acontece todo o dia.
A gente trabalha aqui com policiais como segurança, que é para estar
ajudando a gente aqui nesse tipo de situação. E acontece, o inesperado
acontece todo o dia. O outro dia tentaram quebrar a agência, tentaram
invadir. Então o inesperado, tem que estar preparado para isso, ou não vai
conseguir trabalhar não, vai pedir demissão rapidinho. (MG2)
Como para muitos funcionários a pressão que causa lidar com situações
imprevistas é uma nova experiência, muitos precisam de algum tempo para apurar
esta competência. Não por resistência, mas por um processo natural de adaptação à
nova realidade da empresa, esta promessa pode não estar sendo cumprida.
satisfatoriamente
A grande maioria nunca trabalhou sob pressão, o inesperado vem sob
pressão. Então, isso, a gente está trabalhando para ver se consegue uma
mexida aí, trabalhar sob pressão. Por ter sido oriundo da empresa estatal, o
tempo não era o fator determinante, então trabalhar sob pressão era um
negócio que não influenciava muito. E agora não, hoje, depois do plano de
reestruturação, e à medida que os dias vão passando, o tempo para você
desenvolver as atividades ou resolver algum tipo de problemas é
fundamental. (MG10)
A percepção de que as mudanças ocorrem em ritmos diferentes entre as áreas
está presente em algumas entrevistas. Assim, os entrevistados acham que, em sua
143
área de atuação, o ritmo das mudanças é superior ao de outros setores da empresa.
Esse fato independe do setor no qual o funcionário se encontra.
É porque no caso específico da atividade que faz na gerência isso é
intrínseco à atividade deles. Porque, na verdade, nenhuma diretoria tem
tanta relação quanto a gente. Nós somos a única diretoria que temos
pessoas [funcionários da empresa] que vão, que visitam mais o cliente. A
técnica tem muito menos porque a técnica tem o pessoal de emergência
que nem todo atendimento de emergência necessariamente a pessoa vai à
casa do cliente. (MG3)
Depende da área, na área [...] todo dia você lida com imprevistos. Porque a
gente lida com gente, então o imprevisto é um serviço. Não sei como uma
pessoa da área de engenharia responderia isso pra você, mas a gente que
lida com gente, cada um que chega na sua frente é um imprevisto. Então é
normal. (MG17)
Respeito pela autoridade
A dimensão de simetria da troca é avaliada pelo respeito que os funcionários
têm pela autoridade, ou seja, a percepção de proporcionalidade, relativa à posição
organizacional, nas relações e nas recompensas.
O tipo de relação hierárquica que é estabelecida e o grau de aceitação das
diferenças do status conferidas aos superiores refletem esta dimensão.
Mesmo após a adoção de políticas que pretendem diminuir a formalidade o
número de níveis hierárquicos, ainda se percebe muito distanciamento nas relações
hierárquicas, podendo inclusive prejudicar o fluxo de informações. Isto vem sendo
reduzido, mas ainda aparece muito fortemente nas entrevistas analisadas.
Aqui é bem claro o status do diretor, o status do gerente e o status do não
gerente. Isso é muito claro. Apesar de que o [presidente], há um ano e meio
ou dois anos, como ele se aproximou muito do chão de fábrica, a própria
empresa tirou, eliminou daqui, horizontalizou muito, isso diminuiu bastante.
Mas hoje a figura do diretor, a figura do gerente, elas são ainda muito
pesadas. Respeito é muito forte. Não estou falando nem no fato - esquece a
pessoa que está lá. Vamos supor que [você] agora é gerente, foi promovido
a gerente, com certeza as pessoas vão sentir aquele baque. Quer dizer,
ainda tem muito forte esse negócio de hierarquia. (MG1)
Acho que tem um respeito. Também o esforço que a gente faz para que
esse respeito não atrapalhe a atividade, no sentido de que as pessoas
tenham liberdade de trazer informação por respeito do chefe. É importante
que as pessoas não confundam. Uma coisa é respeitar a pessoa
144
profissionalmente, outra coisa é você ter medo da pessoa e isso impede a
comunicação. Isso é ruim porque as pessoas que trabalham em campo, tem
uma atividade [que] a princípio tem muita informação que eles precisam
trazer para a gente. A partir do momento que esse respeito [...] fica uma
coisa muito forte, o respeito passa a ser medo. Você um pouco que perde
essa informação. (MG3)
A percepção da questão da autoridade pode variar, estando intimamente ligada
com cada gestor individualmente.
Acho que a [empresa] é uma empresa como outra qualquer, que está
caminhando nesse processo, ela tem situações em que ela é muito
hierárquica, em que é importante o respeito, mas ao mesmo tempo tem
situações que ela é muito informal e está o presidente junto com todos os
empregados numa festa e dança junto, enfim. Tem um aspecto de
informalidade, mas também tem aspectos de hierarquia. Então ela vem num
processo, acho que ela está evoluindo. Acho que hoje isso está muito no
gestor, tem gestores que estão um pouco mais avançados, que são menos
hierárquicos, tem gestores que são mais hierarquizados. (MG17)
O respeito pela hierarquia pode não estar muito bem definido em alguns grupos
da empresa, sendo necessário assim, a imposição da autoridade.
Quando eu cheguei lá eu tive que me impor um pouco porque a liderança
ficava distante. Os mais próximos eram os coordenadores, vamos chamar
assim e o coordenador que estava lá, já não está. Logo que eu entrei quis
mudar, era muito paternal na manutenção e isso refletia no grupo. Aí
quando eu cheguei lá eu sofri um pouco, até porque eu estava acostumado
com o ambiente daqui, aí quando você vai para lá e tenta impor coisa se
sente um carrasco. Isso aqui é com determinação. Muita conversa. Muita
reunião foi tentar mudar isso. (MG8)
O uso enérgico da autoridade conferida aos gerentes pode ser necessário em
algumas circunstâncias, mas existe a preocupação em ser claro e objetivo na
aplicação de sanções disciplinares. Sem que haja margem para entendimentos
equivocados acerca da punição imposta.
A gente tem alguns problemas, não vou negar. Dois diretores de sindicato e
um diretor de cooperativa. Mas é de total sinceridade: um deles tomou uma
advertência agora, formal. Eu chamei, “vem cá”. Nesse sistema que te falei
de meio período, eles fazem em média seis atendimentos, aí ele que tem
uma alta produção fez duas só. Aí fui perguntar ao técnico porque que fez
duas. Falou que demorou muito nesses dois atendimentos. A gente tem
GPS, tem tudo, eu pesquisei, vi que era mentira aí chamei ele: “você mentiu
quando disse que demorou muito. Não demorou. Você atendeu rápido, você
poderia até atendido mais”. Aí eu fiz todo o feedback de porque estava
dando a advertência para ele. E foi dada. Não gostou, mas foi dada. Foi
dada com toda sinceridade. Primeiro puxou por tudo aquilo que fez errado.
[...] Ou seja ele se achou no direito de não obedecer o que foi determinado.
E foi dada uma suspensão, por não atender a determinação da chefia, por
ter mentido quanto à atividade e por haver desviado o caminho que foi pré-
determinado. Falei com toda clareza, não tenho o menor constrangimento
de ter dado para ele não. E as outras pessoas compreenderam. E estavam
todos envolvidos. Todos. (MG8)
145
Ainda assim, reduzir a formalidade hierárquica em favor de um melhor fluxo de
trabalho é um esforço coletivo de toda empresa, se estendendo inclusive para as
empresas parceiras.
Quando a gente tomou a decisão de pegar a gestão direta, [...] muitas
pessoas [que] trabalhavam em empresas parceiras eles chegaram com
medo, um respeito quase que medo. E realmente muito medo de se
aproximar do chefe. Porque era uma cultura que tinha na empresa inteira
que lá era capataz. O pessoal mesmo não fala nada, é capataz. Então
temos feito um trabalho, café da manhã juntos, reuniões semanais para que
eles percam esse medo e tragam a informação para aqui. E também
valorizar o trabalho deles, um trabalho importante. Não é só cortar e religar,
a gente quer saber como o cliente está percebendo isso. Qual é a sua
sugestão? A gente está fazendo bem o trabalho? A gente está distribuindo
bem o trabalho? Porque eles sabem quem está fazendo bem e quem está
fazendo mal. Então, acho muito importante ganhar a confiança deles e não
deixar que esse respeito exagerado afaste funcionário. Tive uma grande
dificuldade com esse pessoal da empreiteira, era realmente bicho do mato,
e tive que fazer um esforço para que tentar me aproximar mais dessas
pessoas. (MG3)
A gente tem muita liberdade. As pessoas que chegam ao cargo de diretor,
de gerente, de líder, são pessoas que tem que ter essa abertura para estar
sempre conversando com as pessoas, tirar aquela barreira do cara que está
lá. Eu até costumo falar com o cara que a gente não tem que ser chefe,
para mim é muito ruim, prefiro a gente trabalhar mesmo com autoridade.
Autoridade, que eu digo, não é “faz que eu mando”. Não, “a gente precisa
fazer isso aqui por isso, isso e isso”, as pessoas entendem e fazem. Então,
a empresa não tem essa cultura, muito pelo contrário, tem que ter, dar essa
liberdade, estar sempre conversando, sempre procurando sentar com as
pessoas para ter um feedback. [...]. Quando a gente incentiva e conversa e
tem esse tipo de contato. (MG7)
Muitos entendem o nível de informalidade suficiente para a realização de um
bom trabalho, especialmente se comparado com a situação no período pré-
privatização.
Hoje a gente saiu da extremamente verticalizada, no passado, a gente
tinha, as camadas eram bem segregadas. Existia, por exemplo, um respeito,
uma idolatria à Alta Administração. Eu digo até a nível de processos,
denúncias, departamentos. Acho que isso é dificultava a obtenção de
resultados pela empresa antiga. Hoje a gente está com uma estrutura
horizontal, hoje se tem uma relação muito curta agora entre o funcionário
normal técnico com a alta direção dele e tudo mais. Respeito sim, existe,
pela função que cada um exerce, mas tem uma liberdade bem acentuada.
(MG19)
Eu acho que esse mundo de hierarquia, ele existe. Mas não como uma
coisa imperativa. Acho que para tomar decisões, para poder apoiar algumas
decisões mais complicadas. Mas o respeito eu acho que é simplesmente
respeito, não é uma subordinação. Hoje eu acho que a visão de
subordinação ela não é tão existente, não é tão forte. É uma questão de
respeito, como apoio para que você possa desenvolver o seu trabalho em
algum ponto que, de repente, você não conseguiu. Está fora um pouquinho
da sua fronteira. Então a gente teria um superior para poder dar esse apoio.
146
[...] Se a gente ficar preso a uma hierarquia, a gente acaba criando um
gargalo, porque são muitos resultados importantes que a gente tem que
alcançar hoje. E com essa responsabilidade que a gente recebeu e com
autonomia, a gente consegue desenvolver bem. (MG21)
A questão do nível hierárquico você quebrou muito isso, de um tempo para
cá, houve uma redução considerável, muito grande. Outra coisa:
particularmente na diretoria que eu trabalho, existe mais ainda, existe uma
relação também hierárquica que, ela existe, porém você tem, as pessoas
têm acesso, por exemplo, no meu caso, a mim, um eletricista tem acesso a
mim, teria um supervisor, um analista, um especialista, para depois estar
falando comigo. Acho que a gente consegue conduzir ou minimizar bastante
essa questão com as parceiras e que acaba gerando um bem estar para
eles. (MG13)
Quanto a aceitação das diferenças de status entre os funcionários, aceita-se
bem que gerentes e diretores tenham status superior aos demais empregados.
Na verdade uma coisa que percebi já, é que a partir de líder você tem
alguns benefícios que outros não têm, mas eu vejo que eles não percebem
esses benefícios, eles não percebem que os líderes têm. Eles percebem
que os líderes ganham mais obviamente. Mas, por exemplo, não sei se
todos os líderes, mas tem, por exemplo, a assistência médica diferenciada
da deles. Eu quando não era líder não sabia que isso existia. [...] Claro, mas
também ninguém fica falando à toa. E a participação nos lucros dos líderes,
acho que eles sabem que é maior. É em percentual. Se eles ganham em
média um salário, o líder às vezes vai a três, quatro. Eu, por exemplo, não
tenho idéia de qual é a participação nos lucro de um gerente. Imagino que
seja até percentualmente maior que a nossa ainda, porque se a gente é
maior que a deles, a deles deve ser maior que a nossa. Mas eu não tenho
idéia. Então também não sei se o pessoal tem idéia. (MG2)
147
O contrato psicológico da base operacional
Para mapear o contrato psicológico da base operacional, foram utilizadas
dimensões semelhantes às utilizadas no mapeamento da média gerência, para que
seja possível gerar resultados comparáveis entre estes dois níveis.
É importante relembrar que apesar de as entrevistas não terem sido realizadas
com base no mesmo questionário, seus conteúdos eram semelhantes e puderam
gerar dados com a mesma qualidade.
Ainda, as entrevistas foram realizadas em períodos diferentes, tendo sido as da
base operacional as primeiras realizadas. Apesar de esta não ser uma pesquisa
longitudinal, como já explicitado na metodologia, esta diferença no período de
realização das entrevistas pode dar origem a quadros interpretativos diferentes.
As promessas gerais da empresa
Na percepção dos funcionários entrevistados, o maior compromisso da
empresa se resume no termo investimento. Para estes funcionários, para que os
resultados esperados sejam atingidos, é necessário que a empresa invista em seus
colaboradores.
Assim, quando um funcionário é contratado, a empresa reconhece que ele é
um recurso que deve ser desenvolvido para que seja capaz de ajudar a atingir as
metas da empresa.
Investindo do jeito que ela está, valorizando o quadro funcional dela, com
certeza ela vai ser a melhor empresa, tanto para funcionários, como para a
empresa e para a população em geral. (BP5)
Então, eu acho que quando uma empresa avalia tudo isso. Se ela te
contrata é porque ela vê um futuro para você, ela pretende investir em você.
A minha visão de hoje é essa, quer investir em você para que você cresça e
melhore, ajude a melhorar a imagem dela, entendeu? A melhor coisa que
148
tem, a melhor garantia que a empresa pode ter é uma qualidade em termos
de funcionários, ela ter uma garantia naquele funcionário que ela tem. [...]
Até esse plano de cargos, mapeamento que foi feito aí, que você tem lá,
que você necessita melhorar e tal, entendeu, acho que o compromisso que
a empresa tem é investir, investir na gente. (BP1)
O investimento é, na visão dos entrevistados, uma via de mão-dupla, na qual os
funcionários também têm sua parcela de contribuição. Assim, o investimento feito
pela empresa precisa se apoiar no investimento feito pelo funcionário.
A empresa me deu a oportunidade, mantém até hoje, para que eu cresça
junto com a empresa. Ela, eu acredito, que me confia essa posição, esse
cargo que eu estou hoje. Então, eu tenho que fazer jus a esse cargo, a essa
oportunidade e aos benefícios que ela me paga, entendeu?, dispensando
essa grande parte do meu tempo para a empresa. Então, tenho que correr
atrás, tenho que me desenvolver. (BP8)
Assim, este investimento está relacionado ao tempo dedicado à realização de
suas tarefas na empresa e ao compromisso do funcionário com seu
desenvolvimento pessoal.
Este investimento dos funcionários não só é reforçado nas próprias ações da
empresa, como também na preocupação com a manutenção do seu emprego, como
poderá ser observado adiante.
Tratamento pessoal
Uma das dimensões mais representativas no contrato psicológico da base
operacional é a do tratamento pessoal. Esta dimensão refere-se à que extensão com
que o funcionário é tratado apenas como uma pessoa e não apenas como mais um
número na empresa.
No caso da base operacional, o tratamento pessoal se reflete principalmente no
reconhecimento do empenho dos funcionários pela liderança.
O meu chefe, [...] ele demonstra verbalmente reconhecer o meu trabalho.
(BA4)
149
O aumento de responsabilidade, para alguns dos entrevistados, é sinal de
reconhecimento. Indica que a empresa tem cada vez mais confiança no seu trabalho
e dá indícios de crescimento profissional.
Hoje em dia estou acumulando, no mesmo emprego, a parte de obra e
manutenção. Acho isso muito importante porque mostra, também, que a
empresa confia em teu trabalho. [...] Eu principalmente procuro passar pro
pessoal que trabalha comigo. Muitas vezes a gente fica falando “eu não
recebo aumento há um ano”, vamos dizer assim. Eu falo: nem sei se um
aumento é tão importante assim. Eu acho que o reconhecimento, às
vezes, é muito mais [importante] no seu interior que o próprio aumento.
Claro que ninguém vive sem ter dinheiro, verdade é, mas não adianta
também você ganhar rios de dinheiro e acordar: puxa vida tenho que ir
trabalhar”. Isso ai com certeza. (BP6)
Ainda sobre a questão do reconhecimento, o relato a seguir explicita uma
situação que não parecia possível por não fazer parte da cultura anterior da
empresa: o reconhecimento do desempenho de um funcionário mais jovem.
Hoje a [empresa], ao meu ver, ela sabe identificar você como pessoa, ela
sabe identificar você como funcionário, sabe te valorizar. E eu sou exemplo
disso. Você vê, eu com a minha pouca idade, jovem, assumindo um cargo
de liderança, com responsabilidade, participando de seleção com outros
candidatos. [...] Então acho que essas coisa é que fazem a gente se sentir
bem dentro da empresa, [n]esse relacionamento. E, também, por outro lado
eu particularmente, me identifico com os desafios que são apresentados na
empresa. (BP9)
Com isso, a empresa aponta para a valorização do esforço individual e sinaliza
que este comportamento será recompensado. O interesse do próprio funcionário
pelas questões da empresa são, por outro lado, a contrapartida necessária.
Ainda no caso deste entrevistado, a natureza de sua função de líder - que
permite um contato mais próximo com a média gerência e a diretoria pode justificar
uma semelhança maior com o contrato psicológico da média gerênciaque aquele
como se verá adiante que se formou para os empregados da base operacional.
Ainda assim, a análise das entrevistas leva a crer que os funcionários
reconhecem que o tratamento a eles dispensado é especial, no sentido de que a
empresa os respeita tanto profissionalmente quanto no que diz respeito às suas
necessidades pessoais
150
Porque eu acho que hoje não existe mais só a [empresa] preocupada no
profissional; ela também se preocupa um pouco com o nosso lado pessoal
[...]. A gente está sempre fazendo palestras, cursos, a gente está sempre
indo pra [sede], a gente conhece novas coisas. Mas [...] quando eu entrei
para o direito, eu pensava da seguinte forma, eu vou me formar, fazer um
concurso público e vou ser, quem sabe, vou ser defensora e vou tentar
estudar para ser, digamos, aquela exceção, da pessoa que consegue
vencer a carreira de magistratura [...]. É complicado, [porque eu] penso em
fazer isso, mas eu não sei se eu vou querer, se eu vou, se eu vou estar feliz
fazendo isso, saindo da empresa. Porque a empresa me proporciona uma
satisfação pessoal, eu gosto de estar aqui, eu gosto de trabalhar. (BP3)
Essa percepção de que a empresa trata o funcionário em sua totalidade e não
apenas como um recurso produtivo, faz com que eles se sintam impulsionados a se
desenvolver para que possam atender às demandas da empresa e possam manter
seus empregos. Muitas vezes, chegam a mudar seus planos de carreira para que
possam permanecer na empresa, reconhecendo que lá é um lugar onde eles sentem
prazer em trabalhar. No entanto, como poderá ser visto mais à frente neste estudo,
algumas críticas são ainda feitas em relação à carga de trabalho dos funcionários, o
que pode indicar que o nível de satisfação não é tão alto assim.
A possibilidade de ter mais autonomia e de ter apoio da empresa, mesmo
quando não há ligação com o trabalho, faz com que as pessoas se sintam mais
respeitadas:
Eu me sinto respeitada quando me dão liberdade de ação e de expressão.
Além de estar realizando as tarefas em si, [que] me dêem também liberdade
de expressão. É assim que têm que me respeitar. Quando eu tenho um
problema, dentro do trabalho, eu posso ter liberdade de falar com o chefe,
dividir com ele e ter um apoio nele. E nesse caso, já que você falou se a
empresa me dá algum apoio, acho que é um respeito muito grande ela estar
preocupada com os problemas que os funcionários têm, mesmo fora do
trabalho. (BA9)
Quanto ao tratamento dispensado aos funcionários em termos de metas, o
relato a seguir supõe que estas são estabelecidas de acordo com as possibilidades
do funcionário, não estando, portanto, acima das possibilidades de cada um. Este
ponto parece ser importante para o entrevistado uma vez que uma seqüência de
metas inatingíveis poderia afetar a motivação dos funcionários até o ponto mesmo
do desejo de seu desligamento.
151
Então, acho que não noto que os desafios que são apresentados são
inviáveis, que não se podem atingir. Então eu consigo identificar que as
metas que a empresa propõe pra você hoje são coisas que você possa
conseguir. Você tem que trabalhar muito, arduamente, com afinco, mas
você tem como conseguir. Se a empresa pedisse que você fizesse coisas
de outro mundo e você sempre não conseguisse atingir sua meta e você
com isso também se sentisse derrotado, isso seria ruim. Eu pelo menos
sinto isso. Se o pessoal não se sente valorizado: poxa, eu não consigo,
então isso pode ser um fator desmotivador, de repente, para sair da
empresa. E, isso a empresa, com certeza, não faz. (BP9)
Um aspecto importante acerca deste entrevistado é que tem um papel informal
de liderança em um dos pólos afastados da sede. Assim, sua percepção pode estar
influenciada pela proximidade com a média gerência e com a diretoria, de forma
geral.
A dimensão Tratamento Pessoal parece, também, incorporar uma certa noção
de respeito (PIÑARANDA et al), como um princípio relacional de obrigação que se
configura em uma “troca justa”, que se compõe não apenas de condições e
instrumentos adequados às tarefas como também do reconhecimento e da
visibilidade como contrapartida ao esforço de trabalho.
Na nossa área, por exemplo, você tem um temporal, o camarada trabalhou
lá até 2, 3 horas da manhã, então, às vezes, o respeito para esse
funcionário [...] é que ele tenha um carro em condições, com ferramental,
com sua vestimenta perfeita e que você, de repente, possa estar lá pra vê-lo
trabalhando. De repente, um rapaz que esteja entre o líder e esse
operacional, [...] ele quer não só que você faça isso, mas que você mostre o
reconhecimento pela equipe: “tudo bem, a gente fez nosso papel, a gente
trabalhou, a gente fez o que deveria fazer, basicamente, para o que a gente
está aqui, o que a gente deve fazer”. Mas só que além disso o pessoal
solicita, e eu também faço, é recíproco isso com a minha gerencia, que a
gente identifique que a gente fez mas vamos dar os parabéns à equipe, que
não foi um, foi um time. Esse time conseguiu esse sucesso, então [...]
vamos divulgar, para as demais diretorias que foi um trabalho de excelência,
foi um trabalho feito em tempo recorde, coisas desse tipo[...]. Então a gente
entende algumas necessidades um pouco diferentes, às vezes a
necessidade de um pessoal mais operacional, as vezes está associado a
coisas menores. (BP9)
Esta entrevista enfatiza, portanto que, no nível operacional, o reconhecimento
além de necessário, pode assumir características peculiares, requerendo atenção
especial da liderança. Isto significa dizer que a recompensa financeira ou material é
importante, mas a divulgação do trabalho realizado é igualmente desejada. Isto
porque ela é vista como a possibilidade de aumentar a visibilidade do trabalho. O
152
reconhecimento público pode ser determinante na percepção de respeito destes
funcionários.
Isto pode explicar a alta incidência de referências às premiações realizadas
pelos programas institucionais de incentivo à inovação.
Estes programas premiam funcionários que buscam novas soluções para os
problemas da empresa. O reconhecimento por isso acontece durante grandes
eventos, que proporcionam aos funcionários premiados visibilidade em todos os
setores da empresa. A importância destas políticas pode ser percebida pelo
aumento da participação dos funcionários nestes programas.
Uma idéia que eu dei. [...]Eles gostaram da idéia, aí me premiaram. [...] [A
premiação] é uma cerimônia bacana. Eles juntam todas as pessoas que são
premiadas, aí passam os nomes das pessoas, eles fazem uma preparação.
Essa foi legal porque eles fizeram tipo um Oscar, com dois apresentadores
do RH vestidos em trajes formais de noite, de gala, e as outras meninas de
RH também, todas elas de roupa de gala. Aí você subia no auditório assim,
passava em frente a... essas são as pessoas premiadas por tal item, que
também é separado por item - melhorar a qualidade de fornecimento,
operatividade. São vários itens. Aí sobe aquele grupo de pessoas, eles
tiram fotos e aí depois cada um recebe um certificado de participação, aí
você tem uma premiação também, um bônus que a empresa dá, e aí depois
você desce e... A cerimônia, foi uma cerimônia mesmo, foi muito bacana, eu
gostei muito de participar. [...] Eles fizeram uma coisa assim do tipo:
idéia, você é importante para a gente. Isso é uma coisa que eu achei que
mudou, foi um impacto. Aí eu falei assim: mudei de empresa (BA2)
A ritualização deste evento, que a entrevistada inclusive compara com uma
premiação do cinema, indica que a empresa investe nestas cerimônias como uma
forma de suprir uma necessidade que aparenta ser específica da base operacional:
reconhecimento público.
Os programas de inovação acabam sendo também um canal de comunicação
entre empregado/empregador. Assim, o interesse que a empresa tem mostrado em
ouvir a opinião destes funcionários parece ter um impacto especial na forma como
eles entendem seus papéis.
Eu diria que hoje eu me identifico muito mais com a empresa porque hoje
ela me ouve, ela ouve os funcionários. Ainda que você não possa chegar
aqui a qualquer momento e dizer: vou ligar para o presidente da empresa,
existe um canal aberto para eu fazer sugestão para ele. Ele coloca o e-mail
153
dele a disposição. O que mudou hoje foi isso. Eu posso me expressar, coisa
que eu não podia, ela pode tirar de mim coisas positivas. Os outros
funcionários, a gente pode fazer diferença porque a gente está na ponta,
como eles dizem, e você conhece os problemas de sua região, você sabe
quem é seu cliente. Ele é o cliente de [localidades distantes], que é uma
empresa que atende várias cidades. E quem é que conhece esse cliente? É
o presidente? É o diretor que está lá distante? Não, somos nós. Então, hoje
eu me sinto mais livre, livre para poder opinar. A minha relação com a
empresa mudou nesse sentido. (BA9)
O relato mostra que as pessoas que trabalham na ponta da empresa e que se
sentiam desvalorizadas por estarem mais distantes do poder entendem agora suas
posições como estratégicas para o sucesso da empresa, já que é a relação com o
cliente que produz bons resultados e eles são os que melhor conhecem os clientes.
Além disso, os funcionários se sentem apoiados pela empresa quando
problemas maiores surgem e dependem do suporte de outras áreas da empresa.
Pelo menos, eu falo por mim, eu acredito que ela me escuta sim. Sempre
quando a gente tem um problema e a gente passa isso adiante ele é
resolvido. (BP3)
A demanda atinge os níveis gerenciais, mas também “descem” soluções para a
base operacional. Com isso, a empresa conseguiu não só fazer com que seus
funcionários se sintam mais motivados para gerar resultados, mas também para
superar a visão do erro como um problema e passar a vê-lo como parte do processo
de construção destes resultados.
Bom, ser valorizado pra mim é, por exemplo, assim, você tem a sua tarefa.
Se você faz bem ninguém percebe. Se você se equivocou em alguma coisa
rapidinho você entra em evidência [...]. Porque até há algum tempo atrás [...]
ninguém comentava nada, se você fazia certo não fazia mais que a sua
obrigação; se você fazia errado alguém achava o erro e, e você entrava em
evidência. Atualmente não.(BA4)
No entanto, alguns relatos indicam que o quanto os funcionários têm de
abertura, autonomia e tolerância ao erro ainda está bastante ligado com a figura do
gerente e depende muito do comportamento destes. Assim, ainda seria possível
encontrar gerentes que não propiciavam este clima de inovação e comunicação para
seus subordinados. O relato a seguir ajuda a entender como os funcionários
percebem as mudanças ocorridas na reestruturação.
154
Ele era um chefe que ele humilhava muito todo mundo, [...] ele fazia a gente
fazer as coisas pra ele cinco, seis vezes... porque que quando via o
relatório: “ah, você muda esse, esse e esse”. Não, ele fazia você ir diversas
vezes. Então eu me senti desrespeitada. É um desrespeito pra mim até, o
meu chefe. Tudo bem que ele não tivesse, não fosse formado em
administração mas ele tinha até experiência; mas aí ficar... é humilhante
uma situação assim. Várias vezes, eu me senti desrespeitada. Atualmente
não; porque tudo o que eu faço, o meu trabalho que eu tenho feito, eu tenho
recebido até elogios. Quando ele tem alguma coisa pra conversar comigo,
ele me chama; às vezes a gente faz reuniões e a gente conversa mais
tranqüilo. Então eu me sinto respeitada até por isso. (BA4)
Ainda que gradualmente a forma como os superiores se colocam esteja
mudando, a questão do reconhecimento, ainda está bastante centralizada no gestor,
dependendo, portanto, de suas características pessoais e de seu estilo de liderança.
Em contraponto ao tipo de tratamento relatado pela funcionária BA4, outro relato é
apresentado, mostrando a falta de homogeneidade na empresa, em se tratando
desta questão.
A menina que trabalha comigo, [...] eu trato com carinho, tenho amizade
como a mãe dela, é como se fosse uma filha pra mim[...]. Eu gosto muito de
conversar com as pessoas. Às vezes aqui as pessoas quando têm
problemas, elas vão pra minha mesa: Ai [BA4], hoje eu estou isso assim,
assim... Hoje mesmo [uma pessoa] chegou ali pra mim [e disse]: Puxa
[BA4] eu estou me aborrecendo tanto! [...]Se você souber de uma vaga pra
um lugar assim, assim, você me avisa? Então é pra mim que elas correm.
E quando eu posso ajudar, eu ajudo (BA4)
É, ele é ligado, ligadinho. Ele é uma das coisas da mudança, ele está aqui
há quase 3 meses, mas conosco ele está há 3 semanas. Eu acho que só
essa energia que ele trouxe, dele pessoa, acho que só essa energia que ele
trouxe você já tem uma motivação. Mesmo que não tenha motivação
salarial, motivação do que você quer almejado de cargo ... mas você tem
uma motivação operacional a gente tem que fazer, a gente tem que atingir
a meta, porque se a gente conseguir atingir a meta a gente vai melhorar a
situação [da localidade A], os clientes não vão mais ficar falando besteira
para a gente na rua”. (BA2)
Assim, pessoas que trabalham em diferentes localidades ou até mesmo em
diferentes setores podem ter percepções distintas acerca do reconhecimento que a
empresa entrega a seus funcionários, mas, em geral, esta percepção está
entremeada pela ação direta do gerente.
O relato anterior revela, ainda, outro aspecto concernente à questão do
tratamento pessoal: a conciliação dos funcionários e as vagas disponíveis de acordo
155
com as características individuais de cada um. Este papel, muitas vezes, também
está delegado ao gestor.
Olha, até a chefia já conversou comigo, que eu estava para me formar em
administração ano que vem, e agora estou fazendo direito. Também não é
uma coisa que vai demorar tanto assim, e a minha chefia falou, que se
aparecer um recrutamento interno, ou alguma coisa a qual vai me efetivar
como funcionária de terceiro grau, de nível superior, que ela abre total
espaço para me poder candidatar a esse cargo. (BP3)
Uma forma de diminuir o impacto do papel do gerente é ser a criação da
ouvidoria, uma iniciativa institucional que possibilita a chegada de informações da
base operacional à uma esfera maior, sem a intermediação do gerente direto.
Nos últimos anos, agora mesmo mais recente, o quê a gente vê muito é que
eles estão, assim, mais preocupados com o cliente lá fora e também com a
gente aqui dentro. Eles procuram dar mais valor pra gente. Criaram até a
ouvidoria interna. [Por]que, agora, qualquer problema, qualquer coisa que a
gente se sinta incomodado, nós podemos ir na ouvidoria, expor nosso
problema, conversar, sem que seja necessário estarmos nos expondo com
os colegas de trabalho. (BA7)
Uma outra forma de identificar o tratamento pessoal é analisando a aplicação
das regras da empresa no dia-a-dia da operação. Isso pode ser observado no
tratamento de uma das atuais preocupações dos funcionários. Ela está relacionada
ao fato de que estes enxergam uma tendência de que a empresa acabe com os
cargos técnicos de seu quadro e passar a utilizar funcionários terceirizados para
estas funções. Logo, muitos dos funcionários da base operacional que ainda não
cursaram o nível superior, mas sentem a necessidade de fazê-lo neste momento
para que possam manter seus empregos. A citação a seguir mostra essa
preocupação em relação à possível descontinuidade do seu contrato de trabalho
devido ao aumento da profissionalização na empresa.
Há quem diga que a empresa só ficará com esses funcionários. Com os
funcionários engenheiros. [...] Futuramente não vai haver mais técnico, os
técnicos, possivelmente, vão estar em empreiteiras. (BP2)
No entanto, a viabilidade para continuar estudando e, assim, atender às novas
demandas da empresa, pode ficar comprometida. O problema da falta de recursos
financeiros é minimizado pelos convênios firmados com instituições de ensino
156
superior. Mas ainda, a distância do local de trabalho de alguns funcionários pode
dificultar a sua freqüência às instituições de ensino com as quais a empresa mantém
convênio.
De manhã eu pegava sete e meia por eu sair meia hora mais cedo. Naquela
época o horário era de 8 às 5. Então eu conversei com o pessoal da minha
chefia aqui [...] e disse que eu estava fazendo a faculdade e que eu
precisaria sair meia hora mais cedo pra pegar o ônibus e eu entraria meia
hora mais cedo, que pra mim não teria problema. Aí pegava sete e meia
aqui. (BA7)
Assim, certas flexibilidades proporcionadas pela empresa facilitam a vida
destes funcionários. Estes arranjos podem ser negociados pelo próprio funcionário
de modo informal, ou ainda, pode fazer parte de uma política da empresa, como no
relato a seguir.
Eu tenho acesso a informação de que, por exemplo, as pessoas que saem
de [localidade P] e vão para a [faculdade], existe um carro à disposição. Não
sei como é que é feito o desconto, ou como é que é, mas é um carro à
disposição para levar na [faculdade] e ali a gente vê: vai gente da minha
idade como vai jovem também. Há desconto em faculdade para a área de
engenharia.” (BP2)
Muitas vezes o próprio funcionário reconhece que seu arranjo pode estar um
pouco fora dos padrões da empresa e acaba abrindo mão deste. Como caso do
entrevistado cujo relato se segue, que decide não dar continuidade ao curso
universitário, já autorizado pela gerência, por este tomar muito do seu tempo na
empresa,
Saindo daqui quatro horas da tarde! Mas, como nem sempre dava pra fazer
isso, porque lá o horário é sete, então quer dizer, eu sempre chegava
atrasado [na faculdade]. Sempre. [...] Então, tava me prejudicando muito e
eu vi que foi melhor trancar mesmo. (BA3)
Além de reconhecer que este era um investimento que poderia não apresentar
o retorno desejado, porque não havia tempo suficiente para dedicar-se aos estudos
apropriadamente, a conclusão de que trancar a faculdade foi a melhor opção pode
estar relacionado ao fato de que o funcionário é jovem e tem pouco tempo de
empresa. Assim, ainda que considere muito importante o desenvolvimento pessoal,
157
a opção por permanecer mais tempo na empresa e potencializar seus resultados
acaba se mostrando mais condizente com o momento pelo qual passa sua carreira.
Com tudo isto, alguns depoimentos indicam que ainda há o que ser feito em
termos de tratamento pessoal dos funcionários. Alguns relatos inclusive apontam
para a crença de que as mudanças já vêm sendo providenciadas pela empresa.
Ela tem que melhorar o plano de saúde, o plano odontológico, agora, que
antes ela mesma bancava por um critério administrativo e de gestão, agora
está passando para uma outra empresa, e que pelo jeito vai melhorar muito
mais. (BP7)
Vale ressaltar a importância que é dada ao fato dos funcionários poderem
entrar e sair no horário certo. Isto é visto como um ato de respeito à suas
individualidades.
Aí tem também essa parte que eu falei para você de você chegar no seu
horário, sair no seu horário, isso também é uma forma de se respeitar o
profissional porque ele tem a vida dele particular, e você ter um bom
ambiente de trabalho. (BA2)
Agora foi adotado aqui dentro o programa [saúde laboral]. É você conciliar
essa questão de horário, tanto em casa, como se ter uma vida relativamente
tranqüila também em casa, não ter atritos. Porque você acaba às vezes
trazendo estresse do trabalho pra casa e problemas de casa pro trabalho,
então para você dividir bem isso. [...] [A empresa] fez o projeto de 7 horas
para apagar a luz. (BP8)
E este tipo de relato não está presente somente em entrevistas de funcionários
casado, com filhos e muito tempo de empresa. Ele aparece também nos de
funcionários jovens e recém-contratados.
Pelo menos nunca ninguém questionou meu horário. “Você não podia ter
pegado dez horas”, por exemplo. Não nunca ninguém falou isso comigo
não. (BP2)
Isso pode indicar que a empresa, apesar de ter sido privatizada, é um lugar
onde os horários ainda são respeitados, em oposição à empresas privadas que
trabalham constantemente com horas extras e quadros de funcionários muito
enxutos.Apesar disso, ainda podem ser identificados pontos onde a atuação da
empresa em termos de tratamento pessoal é incipiente. Uma funcionária aponta a
deficiência no plano de saúde da empresa. Por ter uma filha com necessidades
158
especiais, a questão da cobertura do plano de saúde se torna um dos aspectos
principais do seu contrato psicológico.
A gente tem um plano de saúde que é muito bom só que ele [...] só cobre
psiquiatria e mesmo assim com consultas limitadas, uma vez por mês, e o
caso dela, ela precisa de psiquiatria e psicologia, e aí[...], nesse caso, a
empresa não tem. [...]. Eu acho importante que a empresa brigue por isso.
(BA9)
Uma vez que a necessidade social pelo plano de saúde foi atendida, uma
necessidade específica foi gerada. Demandas crescentes surgem quando
demandas anteriores foram satisfeitas e a junção das demandas específicas de cada
funcionário podem ser o impulso para um drifting no contrato psicológico.
No entanto, por ser uma empresa privada, os custos do plano de saúde são
calculados de forma a atender a maioria dos funcionários. Na fala, pode-se perceber
que a funcionária vê na empresa uma parceira na disputa pela melhoria do plano.
Talvez porque ainda tenha seu modelo mental a estrutura de uma empresa pública,
onde a administração precisava barganhar com o governo as condições de trabalho
e aumentos salariais. Isto pode sinalizar uma confusão acerca do contrato
psicológico firmado na época de empresa estatal e o estruturado depois da
aquisição e reestruturação da empresa.
Outro relato que corrobora com a idéia de que o tratamento pessoal dispensado
pela empresa pode estar distante do desejado pelos funcionários é o de um diretor
sindical.
Eu acho que ela tem que respeitar os parâmetros legais, é a primeira coisa.
Se ela fizesse isso já estava ótimo, todas as questões trabalhistas. Eu não
vou dizer que a [empresa estatal]
2
desrespeita, ela não desrespeita, mas
tem algumas coisas que é mais complicado para todas as empresas, que é
essa coisa que eu diria de você ter uma empresa mais humanizada, rever
essa relação de colocar mais gente trabalhando para a quantidade de
serviço que é. Eu acho que isso é um dever da empresa, porque ela
melhora a qualidade do serviço dela. Essa coisa de reduzir custo, é muito
focada em reduzir custo, reduzir custo, reduzir custo... É aquela coisa: às
vezes você tem que perder em algum lugar, não dá para você ganhar
sempre porque uma hora você acaba perdendo, entendeu? Isso é um
problema que eu acho que deveria ser um dever da empresa, ver esse lado
2
O funcionário sempre se refere à emp resa pelo nome que tinha no período pré-reestruturação
159
do trabalhador, mensurar essa coisa do equilíbrio, do alto volume do serviço
que as pessoas estão fazendo. Isso inclusive vai contra o próprio sistema
em que eles estão. Acho difícil eles fazerem isso porque na verdade a lógica
é você sempre acumular mais: você diminui custo e aumenta a carga de
trabalho para os trabalhadores. E aí tem vários problemas: o trabalhador
adoece... Tem várias coisas que o pessoal não vê, a gente vê várias
meninas aqui do atendimento com problema de LER que não está sendo
bem visto, você fica muito tempo de frente para o computador, porque não
adianta você ter cadeira apropriada se você está com um número excessivo
de horas ali trabalhando, não só no computador, mas pressionado e tal. Isso
também é uma coisa que a empresa tinha que ver. Acho que é um dever da
empresa. E tem algumas questões legais que a gente discute também que
eu acho que a empresa deixa falha, por exemplo, a questão das cifras, a
gente estava cobrando, inclusive a menina que trabalha comigo vai fazer
curso a semana que vem, é uma coisa que o sindicato está cobrando, que
as cifras não estão funcionando direito e tal. (BA1)
Sua condição de líder sindical e o seu histórico na empresa acabam fazendo
com que ele dê mais ênfase a aspectos mais legalistas da relação de trabalho. Ele
acaba denunciando um problema que surgiu com as mudanças atreladas a
privatização e que muitos não se sentem à vontade para enunciar: a sobrecarga de
trabalho. Os funcionários que se queixam disso podem acabar taxados como
funcionários que não se adaptaram às mudanças e que não deveriam, portanto,
permanecer na empresa. A questão da sobrecarga de trabalho será tratada com
mais profundidade na dimensão de investimento pessoal.
Com todas as ressalvas necessárias, a maioria dos funcionários se sente
satisfeita com o tratamento dispensado pela empresa. Para entender a que isso se
deve, pode-se reportar ao relato à seguir.
Mas isso, tudo isso é devido a que? A reuniões, a abertura que o presidente
[...]. A pesquisa de clima laboral, também muito boa. A gente teve
oportunidade de reclamar de pessoas que [...] implicavam; até porque a
gente trabalha com pessoas terceirizadas e existem pessoas que acham
que porque estão chefes podem menosprezar o terceirizado. (BA4)
Ele sugere que a atuação da alta gerência da empresa melhora o clima
organizacional e faz com que as pessoas sejam mais felizes em seu trabalho. Em
primeiro lugar porque a alta administração serve como um exemplo para a média
gerência, que acaba sendo o grupo com mais contato com a base operacional. Em
160
segundo lugar porque os funcionários se sentem mais valorizados quando têm mais
acesso à alta administração.
Os resultados destas ações podem ser percebidos nas pesquisas de clima
organizacional e podem influenciar o comportamento do funcionário.
Ultimamente foi o clima laboral da empresa, a preocupação da empresa
com o ambiente de trabalho e com o empregado. Eu achei isso muito bom.
Achei muito interessante. Espero que com essas pesquisas [...] a gente
tenha bons resultados. (BA4)
Envolvimento de longo prazo
Esta dimensão trata do horizonte temporal na relação entre
empresa/funcionário. Ela expõe as expectativas dos funcionários acerca do
envolvimento de longo prazo de seu empregador. Na base operacional, os relatos
apontam uma situação um pouco distinta da encontrada na média gerência.
A priori, a perspectiva de permanência de longo prazo na empresa é válida
também para a base operacional, já que a empresa oferece instrumentos de gestão
de carreira que levam a crer que este é o tipo de envolvimento por ela desejado. No
entanto, os funcionários parecem se preocupar mais com as contrapartidas
esperadas pela empresa, sejam elas em termos de desenvolvimento profissional ou
de resultados esperados.
Os funcionários entendem que o plano de carreira, sozinho, não os levará ao
reconhecimento e nem a manutenção do contrato de trabalho. Não existe a
percepção de que a empresa só demite em casos de crises sérias e que seus
empregos gozam de alguma estabilidade. Logo, o investimento dos funcionários da
base operacional parece ter que ser maior do que aqueles da média gerência.
A empresa diretamente assim não promete as coisas, mas a gente vê com
todos os planos que foram feitos, inclusive [um plano de desenvolvimento
pessoal] que foi feito, ela me mostra um horizonte. Ela me mostra “se você
161
fizer isso com certeza você vai chegar aqui”. Então eu já sei o que eu
preciso fazer para chegar onde a empresa precisa que eu chegue também.
Para chegar junto com ela lá, porque se não eu vou ser jogado fora do
barco. (BP5)
Esta preocupação com a sua empregabilidade é maior e o medo de perder o
emprego é justificado pela posição da base operacional. Em geral, estes
funcionários são menos estratégicos para o futuro da empresa, menos qualificados e
sua empregabilidade é menor. Associado a isso há também a tendência de
terceirização das funções mais técnicas na empresa.
Apesar da confiança de que a empresa está disposta a proporcionar
crescimento para seus funcionários, eles entendem que não existem promessas de
estabilidade na empresa e muito menos de promoção de cargo.
Hoje, eu não posso dizer pra você que eu me garanto que eu vou ficar
empregada aqui até me aposentar. Na empresa hoje você não pode esperar
isso, não espero, pode acontecer, mas não. (BP7)
Agora, quanto a prometer, acho que não há promessas e sim uma
expectativa de oportunidades, mas eu acho que o próprio funcionário junta
isso no pensamento. Ela não chega assim: “hoje é Maria, amanhã você vai
ser efetivada, vai aparecer uma vaga”. Não. Lógico, pode aparecer uma
vaga: “se aparecer eu vou abrir para os funcionários”. Quem tiver um bom
desempenho vai entrar quem não tiver fica pra próxima existem vários
outros. (BP3)
Uma particularidade pôde ser percebida no caso da base operacional: os
relatos trazem muito mais a preocupação com o auto-desenvolvimento como
contrapartida do que o cumprimento das metas estabelecidas, conforme o relato à
seguir.
A preocupação com o auto-desenvolvimento é valida não só porque existe a
política de que cada um vai chegar onde merecer, mas principalmente porque este
nível parece não ter ainda muita segurança sobre a estabilidade que possuem na
empresa.
Houve um período aí que não passava muito tempo, já tinha um boato: “Vai
haver demissão”. Volta e meia e isso aí mexia muito com o nosso ego, né?
Puxa, era coisa que chateava a gente. A gente já sabia, quem vai ser o
próximo e ultimamente parou um pouco. Realmente tem um tempinho que
não se ouve falar mais nisso, mas realmente, não faz muito tempo não.
Passava pouco tempo, havia um boato e havia demissão realmente. (BP2)
162
O relato a seguir indica que os funcionários percebem que do
comprometimento com o auto-desenvolvimento pode depender não só a sua carreira
e seu crescimento profissional, mas, principalmente, sua permanência na empresa.
Eu acredito que daqui a algum tempo vai haver um novo plano de
demissão. Quem tiver nível superior eu acho que tem muitas mais chances
de continuar na empresa... mas não [acredito] que de repente, eu vou me
esforçar, vou me formar em direito e que vou exercer a atividade na
empresa, não exatamente. (BP7)
A estabilidade parece ser um fator importante para esse grupo, talvez porque
sua empregabilidade seja menor.
Com certeza, a gente tem filhos, a gente tem um padrão de vida. Aí, de
repente, se você tem uma estabilidade você fica um pouco mais tranqüila
para cuidar dos seus filhos. (BA4)
Especialmente depois da privatização, alguns funcionários não esperam mais
fazer uma carreira sólida na empresa e seu único interesse é manter seu emprego,
mesmo que isso signifique que não haverá crescimento profissional.
Eu pretendo ficar mais dez anos na empresa, é o tempo que vai dar para eu
me aposentar. Eu, apesar de trabalhar na área de periculosidade, uma área
insalubre, eu poderia me aposentar com um pouco menos. Mas, eu acho
que isso não faria bem pra mim pessoalmente. A minha perspectiva de
futuro é trabalhar mais dez anos na empresa e para que eu fique dez anos
na empresa eu vou ter que fazer mais cursos, vou ter que aperfeiçoar, vou
ter que estudar. Vou ter que manter motivado como eu estou atualmente
para que eu possa chegar lá porque a gente sabe que ai começa a pesar
também o fator idade, espero que tenha saúde para chegar lá. (BP5)
Ainda assim, ele teme que parar de se desenvolver, poderá significará sua
demissão. Isso parece indicar que o auto-desenvolvimento não é necessário apenas
para viabilizar oportunidades de carreira, mas para garantir o emprego no médio e
no longo prazo.
Aparentemente, o discurso sobre o desenvolvimento pessoal se sobrepõe ao
discurso do cumprimento de metas. Apesar de não haverem dados que confirmem
estas hipóteses, algumas inferências podem ser feitas acerca do assunto: é possível
que as metas estejam mais claras para os gestores e a falta de clareza das metas
leve a base operacional a responder a demanda de resultados na forma de
desenvolvimento pessoal. Outra possibilidade é que as pessoas apenas estejam
163
respondendo à um discurso da alta administração, sem efetivamente acreditar nele.
A realização de pesquisas posteriores poderiam ajudar a elucidar estes aspectos.
Desta forma, os funcionários acreditam que existam sim, possibilidades de
crescimento e que só se confirmarão se os funcionários cumprirem sua parte no
acordo, que é o auto-desenvolvimento e um bom desempenho. Porém, entendem
que sua promoção depende de outros fatores, tais como a existência de vagas.
Um outro bom indicador de que a empresa pode pretender proporcionar um
envolvimento de longo prazo é o investimento que é feito em funcionários mais
jovens. Investir em jovens que começaram a carreira na empresa parece fazer com
que se sintam emocionalmente ligados à empresa e mantenham seus compromissos
com mais segurança. Além disso, indica que este comportamento é bem-visto, ao
contrário de empresas que adotam a política “up or out”
3
:
Eu senti que eu cresci como pessoa. Eu agradeço a [empresa] porque
quando eu entrei aqui eu era muito imatura desde o ponto de vista
profissional e um pouco também pessoal. [...] E de repente, é um choque: a
primeira bronca, primeiros, digamos assim, esporros, desculpa, a grosso
modo. É meio complicado. [...] Eu cresci como pessoa, eu acho que se hoje
eu sou uma pessoa melhor eu posso agradecer a [empresa]. Então, se um
dia eu sair da empresa eu nunca vou esquecer o que eu vivi aqui porque, eu
acho, que aqui eu cresci em todos os sentidos, e acho que como
profissional, pessoal, eu desenvolvi minha carreira, mostrei meu potencial.
(BP3)
Outra coisa também que eu achei legal, que eu falei: é, realmente a
empresa mudou, a festa de final de ano também foi uma festa legal, teve
premiações de, tipo assim, o prêmio para a pessoa que foi revelação, que
foi um rapaz que entrou como estagiário, depois ele acabou virando um
engenheiro da empresa e está aí com a gente até hoje. (BA2)
A possibilidade de ganhar experiência na empresa pode levar o funcionário a
ter condições de galgar melhores postos, como relatam os entrevistados.
E principalmente, que não tinha ainda, como a gente sabe uma pessoa
recém formada não tem muito mercado de trabalho; e você vê só que
começar a trabalhar numa empresa de grande porte, como já é aqui, achei
que tinha uma responsabilidade de ambas as partes. Então, tinha que
demonstrar meu trabalho, como já vinha demonstrando no meu período de
estágio, assim como a empresa também oferecer oportunidade para que eu
pudesse crescer dentro da empresa. Não é verdade? Eu tive oportunidade
3
Política praticada principalmente por empresas de consultoria, onde o funcionário tem um determinado tempo
para ser promovido ou ele é demitido.
164
de ser estagiário, eu tive oportunidade de ser contratado, ai tive
oportunidade de ser chefe do setor de obras. (BP6)
Eu me vejo, digamos a verdade mesmo, aqui, daqui a alguns anos, porque
é meu primeiro emprego mesmo, carteira assinada, que estágio não conta.
Eu me vejo aqui me aposentando, para dizer a verdade, mas não me
aposentando como o que eu sou hoje, preposto, eu quero mais. Mas eu
quero mais, ser um profissional melhor, mas não usar meios ilícitos ou bolar
qualquer tipo de coisas no sistema para ser isso, quero ir com as minhas
próprias pernas como tudo na minha vida. (BP3)
Assim, tanto a experiência dentro da empresa quanto a experiência na área
pode ajudar no crescimento profissional. Para os mais jovens, isso é possível porque
se espera que o relacionamento com a empresa não seja de curto prazo. Para o
funcionário (BP3), este pode ser o diferencial no seu crescimento na empresa:
Por eu ter uma experiência, apesar da minha pouca idade, eu já tenho
bastante experiência nessa área, eu acredito que ela possa me
proporcionar um cargo de coordenação, de analista, de gestora e assim
sucessivamente.Não acredito que seja uma coisa a curto prazo, mas sim a
médio prazo. (BP3)
Outra questão acerca dos funcionários mais jovens é que eles parecem
também ser os que mais entenderam a dinâmica de funcionamento da relação de
trabalho estabelecida.
A maioria dos colegas que tem na minha área são rapazes, pessoas mais
novas, e essas pessoas elas estão estudando, aqueles que não estão
fazendo já terminaram, a maioria são técnicos, estão fazendo curso
superior, a maioria engenharia. Ou outros colegas meus estão fazendo
outras áreas mas que envolve toda essa necessidade da mudança da
empresa.o que eu vejo é que, principalmente, os mais jovens estão muito
empolgados, estão com uma perspectiva de futuro muito grande na
empresa, que é uma coisa que eu não observava muito antes não. (BP5)
Isso pode ser conseqüência de contratos psicológicos firmados em um
momento diferente dos funcionários mais antigos. Até porque, os funcionários mais
jovens já entram no mercado obedecendo à uma nova lógica de capitalismo, que
prevê contratos mais transacionais e com a responsabilidade do desenvolvimento
recaindo sobre os funcionários.
Outro instrumento que ajuda a entender o horizonte temporal da relação
empregado/empregador nesta empresa, é a implementação de um plano de carreira.
A empresa está dando chance, condições de você ter um mapa de carreira.
(BP2)
165
O mapa de careira, como no caso da média gerência, tangibiliza o
compromisso de geração de oportunidades na empresa.
Ah, só em eles estarem nos ouvindo, isso é muito bom. Tem o plano de
carreira também, que [...] nós mesmos vamos fazer nossa carreira aqui
dentro. Nós é que vamos crescer aqui dentro, mediante o nosso talento.
Estão valorizando a gente e isso é bom. Porque antes a gente não tinha
plano de carreira não. Agora está bem melhor. (BA7)
O tema “carreira” é importante neste contexto, porque, depois da privatização,
não só as novas políticas de promoção como a aquisição da empresa por um grupo
internacional geraram a expectativa de carreira não só dentro da própria empresa,
mas dentro do grupo, presente em outros países.
Olha, eu gostaria de me formar porque a gente nunca sabe o amanhã. Eu
quero me formar, quero me desenvolver nessa carreira, eu quero fazer
mestrado, doutorado, pós. Quero fazer também comércio exterior. Eu
gostaria de trabalhar fora do Brasil, não por não amar meu país, mas eu
quero uma experiência e eu sei que a empresa pode me proporcionar isso.
Existe também esse novo canal que seria a “rotation” que eles fazem, que
seria migração, já aconteceu isso. Funcionários da [empresa] que vão pra
[grupo controlador] que é a empresa que é detentora da [empresa], da
[outra empresa do grupo] e de outras distribuidoras, eles ficam um ano lá e
pegam experiência. (BP3)
Assim, o funcionários têm outro horizonte de ascensão e novas expectativas,
que são políticas implementadas pela própria companhia.
Muitos funcionários reconhecem o esforço da empresa em favorecer esse
desenvolvimento através da realização de cursos e treinamentos, inclusive quando
são implementadas novas tecnologias nos processos realizados, conforme nos
mostram os relatos à seguir.
Quando tem uma tecnologia, ela banca um curso sim. Eu, por exemplo,
nunca fiz, porque o pessoal já fazia, eu vim, eles me ensinaram e tal. Essas
tecnologias novas a gente foi pegando com a gente mesmo e porque
também não era uma coisa assim tão difícil. (BA1)
Mudou muito, o foco hoje de nosso trabalho, que é o cliente, e a gente tem
que desempenhar um bom trabalho, e com isso a empresa está dando
treinamento, está dando esse apoio que nem uma faculdade. A gente está
estudando, eu estou estudando, tem gente que se inscreveu, que estuda,
para fazer um curso técnico. (BP4)
Os funcionários percebem que a empresa, apesar de estar investindo no
desenvolvimento dos seus funcionários, não o faz por mero ato de caridade, mas
porque têm planos para estes funcionários.
166
A empresa quando vai sinalizar que ela vai fazer um investimento para
você, você é mapeado antes. A empresa não chega sem critérios vou
investir em você, não. Ela observa as pessoas-chave através de
mapeamentos específicos, que a gente faz vários, e com certeza, ela deve
ter um critério para não perder uma determinada pessoa para o mercado,
que de repente vê que é ruim para ela. E depois que é identificado é que ela
investe nessa pessoa. Eu, por exemplo, estou fazendo esse curso de MBA
agora, com incentivo da empresa, eu fui mapeado para isso. (BP9)
Essa “despesa” com treinamentos e com o plano de carreira indica que a
empresa tem a intenção de se favorecer com isso, aumentando o horizonte temporal
da relação com os funcionários que foram alvo deste investimento.
No entanto alguns discursos não ratificam estas idéias. Apesar de reconhecer
que a empresa tenta se envolver nos treinamentos, um depoimento chama a
atenção de que eles podem estar sendo incipientes, sugerindo que eles não estão
ao alcance e entendimento de todos os funcionários.Este funcionário aponta este
fato numa comparação que faz entre os treinamentos atuais e os realizados no
período em que a empresa era uma estatal. Assim, a posição de sindicalista,
novamente, pode afetar a análise desta dimensão neste ponto de vista, pois a
própria importância do papel do sindicalista se reduziu após a privatização.
Isso vem acontecendo, a [empresa] entra, eles dão curso, com tecnologia
nova e tal. Inclusive agora eles estão com um plano de cursos; mas os
cursos deles, eu acho, são assim mais reduzidos: eles fazem uma semana,
dois dias, três dias, fazem com quem já domina aquilo da própria empresa,
fazem programa de intercâmbio. (BA1)
Em sua opinião, a empresa tem buscado diminuir o tempo de treinamento e
consequentemente o investimento necessário para preparar os funcionários.
Seguindo o raciocínio em que o investimento da empresa representa manutenção de
um envolvimento de longo prazo, neste caso a empresa estaria diminuindo também
o horizonte temporal de sua relação com os empregados, mesmo que treinados pela
empresa.
Um relato indica, ainda, que a percepção da intenção da empresa de manter
relações de longo prazo pode não ser compartilhada por todos os funcionários.
167
Pode ser, mas pode ser que não, que a empresa pode colocar uma
estrutura, no meu setor, que vai suprimir o que eu faço. Naquele momento é
uma relação de prestação de serviço, eu presto serviço à unidade. Se
depois de amanhã eu não for conveniente para aquele local e naquele
momento para ela, o meu serviço ela não precisar mais, às vezes, mesmo
sendo uma boa empregada, por que é que ela vai me manter? (BP7)
O questionamento, neste caso, é legitimado pelo fato de que a empresa é uma
instituição que visa o lucro, e para isso é necessário reduzir os custos. Deste ponto
de vista, nenhum funcionário que não seja altamente produtivo e necessário à
operação tem porquê continuar na empresa.
Além das políticas corporativas, o gerente tem um papel essencial na
manutenção do compromisso do contrato psicológico e no prazo da relação de
trabalho.
Sim, [...] às vezes tem que chamar a atenção. Porque se deixar uma falha
aqui, uma falha lá... Sempre tem que estar acompanhando mesmo,
orientando, chamando a atenção: “você errou nesse ponto, então precisa
melhorar nisso”; ou: “eu já percebi que tu errou três vezes nisso, presta mais
atenção, e tal...; tá precisando de um curso, não está?”. (BA3)
Este relato mostra que muitas das vezes é ele quem representa a empresa e,
de certa forma, escolhe quem serão os funcionários com os quais ela irá honrar o
compromisso de envolvimento de longo prazo, por meio principalmente do
desenvolvimento do profissional.
Clareza dos termos do acordo
Esta dimensão trata da clareza e da transparência dos direitos e deveres dos
empregados e das disposições mútuas no contexto da relação de trabalho.
Para alguns dos funcionários da base operacional, a relação anterior à
privatização da empresa parecia não ser muito clara. Esta conclusão pode ser tirada
principalmente dos relatos que apontam a mudança na forma como a comunicação
da empresa passou a ser percebida depois da privatização, sendo este o marco da
168
mudança da postura da empresa em relação à transparência de suas relações com
o empregado. O relato a seguir é um destes:
A [empresa], quando era [empresa estatal] era complicado. Aí, agora, eles
fizeram esse redesenho, digamos assim. É uma reengenharia também de
todo o processo de funcionário, de serviço, de execução de serviços, até
mesmo de estrutura de planta, que a gente diz, em relação a funcionário
efetivo. Hoje em dia essa ponta é muito mais [formada por funcionários da
própria empresa, ao invés de terceirizados] do que na época de [empresa
estatal]. Na época de [empresa estatal] era muito difícil você ser efetivado,
não por o funcionário não ser reconhecido, mas sim pelo processo seletivo
não ter, uma coisa, base. Não tinha uma base de como era feito isso, era
mais por indicação de chefia do que você fez mesmo por onde merecer.
Alguém viu seu serviço e você ir lá pra [sede], fazer diversos testes e ter
possibilidades de crescer, você fica naquela expectativa. (BP3)
Ainda, segundo algumas opiniões, o momento em que essa mudança ocorreu
não fica muito óbvio. Assim, segundo outros relatos, ela está relacionada com a
implementação do plano de reestruturação, como o do técnico, cujo relato se segue,
que, com alguns anos de experiência, só começou a realmente perceber a mudança
depois que a empresa passou por esta profunda transformação.
Hoje a empresa te mostra o rumo que ela está indo, ela te diz o que ela
quer. Antes ela basicamente queria as coisas mas essas coisas eram muito
soltas. Hoje a gente procura fazer, atender os mesmos objetivos. Só que
hoje [eles são] muito mais claros. Muito mais transparentes. Você hoje
trabalha sabendo realmente o resultado, e eles vêm e te trazem o resultado.
Então acho que isso é muito importante. Você tem esse retorno, você tem
esse feedback. (BA6)
E a empresa, ela solta todo tipo de informações pra gente, ela se tornou
uma empresa transparente, coisa que era uma cupulazinha que existia de
políticos, e que ali só os cabeças sabiam. Nós nunca sabíamos de nada. Só
sabíamos quando acontecia, agora não, a gente tem uma previsão
antecipada do que vai acontecer. De todo o processo. (BP5)
O que se pode ter certeza é que o plano de reestruturação, com a
implementação dos mapas de carreira, deu aos funcionários a sensação de que eles
têm, agora, controle sobre suas carreiras porque sabem o que é esperado deles e o
que devem fazer para melhorar seu desempenho e aumentar suas chances dentro
da empresa.
Eu dizia o seguinte: a empresa, esse [plano de reestruturação], veio pra
fazer isso com esse funcionário. Fazer um mapeamento dele, para que ele
possa ver em qual nível que ele está. Hoje eu sei em qual nível que eu
estou e o que eu posso, aonde eu posso melhorar. Existe tudo isso à minha
disposição. E cada um, [cada] funcionário, tem isso. Então, esse [plano de
169
reestruturação] é justamente para isso, pra a pessoa saber aonde pode
chegar, onde está mais fraco. (BP2)
O ponto principal é que os termos do acordo parecem mais claros acerca de
que expectativas os funcionários podem ter da empresa.
Mesmo essa pessoa que, de repente, exerce um papel operacional mas que
de repente tem o primeiro grau só, mas que por si só ela deseja crescer, ela
quer estudar, ela quer melhorar como pessoa, como profissional ai a
empresa identifica essa pessoa e com certeza ela vai tentar manter. Então
acho que tem uma transparência. (BP9)
O relato a seguir mostra que, ainda que possa haver questionamentos acerca
desta dimensão, este não seria um comportamento comum. Cabe lembrar que este
entrevistado assume uma posição de liderança, ainda que informal, o aproxima mais
do contrato da média gerência do que da base operacional. Especialmente porque a
média gerência parece ser seu próximo objetivo, e assim, a reprodução do contrato
se torna um instrumento aspiracional.
Ela tem uma confiança que eu vou ficar aqui, porque os mapeamentos que
nós fizemos, eu pelo menos fiz três, a empresa de alguma forma ela quer,
ela pergunta. Às vezes ela é clara e às vezes até não, às vezes ela é clara
no sentido de saber como é que você está se sentindo dentro da empresa,
que você espera dela, como você se situa no futuro. A empresa sinaliza
isso, por isso que eu falo, a empresa está muito transparente. Agora é claro
que pode ser mascarado e, de repente, sinalizar que você está querendo
uma coisa e de uma outra forma não, mas acho que é uma coisa fora de
acordo. Isso se ocorrer vai ser um, pode ocorrer uma pessoa sofre um
treinamento e saia da empresa e leve essa carga, essa bagagem, mas vai
ser um ponto fora de acordo não vai ser de forma massiva. (BP9)
Apesar da aparente clareza com que a empresa coloca os termos do contrato,
alguns funcionários enxergam a empresa ainda com muitos problemas de
comunicação e têm dificuldade em compreender quem deu determinada ordem em
um momento específico, como por exemplo no relato a seguir, sobre a definição de
como se dá o processo de escolha para uma promoção.
A mudança que teve, eu faço parte, eu me sinto aqui e eu vou dar de tudo
de mim para resolver. Agora o que eu fiquei decepcionada foi que eles não
[me deram uma promoção]. Eu não sei como é isso na empresa porque é
tudo meio escuro para a gente, eu não sei quem indica, eu não sei quem
pede a promoção, isso eu não sei. E o que eu sempre escuto aqui é que
eles não querem dar, mas ninguém me diz quem são eles. (BA2)
Este pode ser um dos motivos pelo qual relatos indicam que muitos boatos
ainda são difundido e causam confusões. Apesar da adoção de políticas que cuidam
170
da carreira dos funcionários, a política interna da empresa pode continuar exercendo
influência no sistema de promoções, gerando incerteza e insegurança, como nos
relatos a seguir.
Agora, como foi feito, quem apontou, essa coisa toda, a gente não tem
conhecimento. (BP2)
Não, isso é boato. Mas a gente fica sempre naquela [incerteza]. (BP2)
E há ainda a dúvida de como determinados processos da empresa vão se dar
no futuro.
Mas como vai ser depois, que a coisa se formar, aí talvez, nessa ocasião,
vá haver isso, talvez. Mas eu não posso afirmar isso. (BP2)
Deve-se levar em conta que a falta de comunicação acerca de determinados
assuntos pode acontecer porque estes são estratégicos para a empresa.
Tratamento equânime
Este dimensão trata das expectativas dos empregados a respeito do tratamento
igualitário, sendo portanto, uma indicação de tratamento pactuado por e dispensado
a todos os empregados.
A análise das entrevistas com a base operacional apresentou, como nas
entrevistas da média gerência, fatores que podem gerar a percepção de um
tratamento diferençado para determinados grupos. O primeiro está relacionado com
o tipo de trabalho realizado pelo funcionário. O relato à seguir surgiu quando um dor
funcionários fez referência ao programa de job rotation da empresa, quando pessoas
de diversos setores têm a oportunidade de conhecer outras áreas em sistema de
intercâmbio.
Eu achei até bom ter ido com esse cara de campo porque ele vai ter que
fazer um relatório. Então ele vai mudar a visão que muitas pessoas têm do
administrativo, porque eles acham que a gente fica só no ar condicionado
só atendendo telefone. E a [...] nossa pressão, [...] é mental, [...] a gente sai
dali com a vista cansada.[...]Porque a visão dele é que a gente fica no ar
171
condicionado, só digitando ali, ouvindo musiquinha, e atendendo telefone.
(BA4)
Segundo este relato, alguns funcionários acreditam que quem trabalha em
áreas administrativas ou as chamadas áreas de apoio ao negócio principal da
empresa acabam recebendo melhor tratamento.
Outro aspecto que já tinha sido identificado no mapeamento do contrato
psicológico da média gerência é a proximidade com a sede. Funcionários que
trabalham em outras localidades menos centrais percebem que as condições de
trabalho não são as mesmas das mantidas na sede da empresa.
Eu sinto muita organização de todo o trabalho no nosso prédio central. Nas
pontas, que são as regionais que eles chamam, essa organização não é
feita da mesma maneira. Vou dizer uma coisa simples para você: aqui a
gente está numa salinha um pouquinho melhor, mas você viu as condições
de trabalho que a gente tem aqui mais ou menos, né? Quer dizer, a gente
não tem uma mesa [...], você não tem os seus arquivos. Aqui é a sala de
arquivos [...], aqui é a sala do café [com] as mesas numa disposição um
pouco melhor para você até mesmo tirar uma dúvida com um colega do
lado, isso eu sinto falta aqui ainda. [...]As pessoas do RH quando vêm aqui
eu sempre falo a mesma coisa olha, nós ainda estamos abandonados, nós
ainda não estamos ‘dentro da empresa'. (BA2)
Assim, existe uma mística acerca do que ocorre no “Palácio de Cristal”
4
e de
como as pessoas acham que a sede da empresa é o melhor lugar para se trabalhar.
No entanto, em se tratando da equanimidade entre os funcionários de diferentes
localidades, estes percebem que na sede existe maior possibilidade de haver
discrepâncias entre as condições de trabalho e que em outras localidades isto não
acontece. Não por causa de políticas da empresa, mas por causa do próprio
ambiente de trabalho e do tratamento entre gerentes e subordinados e entre seus
pares.
No interior a gente não vê muitas, assim, muita diferença. Acho que aqui
[não]. Talvez eles sintam isso mais, assim, lá na central. Talvez, né? Porque
aqui todo mundo conhece todo mundo. Então todo mundo trata todo mundo
bem. Eu aqui, graças a Deus, não senti diferença em relação a tratamento.
(BA7)
4
Forma como os funcionários se referem à sede da empresa
172
Um novo fator encontrado nas entrevistas está relacionado à idade dos
funcionários. Este fator, que aparece tanto nas análises das entrevistas de
funcionários mais antigos quanto nas entrevistas dos funcionários mais jovens, pode
ajudar a explicar o entendimento dos contratos psicológicos na base operacional.
Na citação a seguir, é interessante notar que na percepção de alguns
funcionários, os funcionários mais jovens teriam mais oportunidades.
Então eu vejo o seguinte: quem ta estudando engenharia, igual você falou,
um jovem, ele tem mais campo para conseguir outras funções. (BP2)
Este ponto de vista é coerente com a avaliação anteriormente realizada de que
funcionários mais jovens tendem a compreender melhor o novo contrato psicológico
proposto pela empresa.
Assim, quando o funcionário é mais velho, existe a preocupação com sua
empregabilidade. Um funcionário explica que isso não é um problema isolado da
empresa, mas uma tendência que vem se concretizando com o passar dos anos.
Isto pode ser percebido principalmente nas entrevistas realizadas com os
funcionários que vieram da empresa estatal:
Não, da parte profissional não, mas em relação em idade, existe uma
discriminação, infelizmente, no Brasil. Eu acho que isso está se tornando
uma tendência mundial, [a] de discriminar as pessoas quando vão ficando
mais idosas. Eu não vou investir, um empresário não vai investir, num
homem de 50 anos, mesmo ele sendo bem capacitado, para aperfeiçoar
mais ainda ele, se eu posso investir num menino novo que está fresquinho
agora, com a mente mais clara, que vai me servir mais anos. Quanto a isso
eu sou um pouco pessimista. (BP5)
O problema não estaria, portanto, nas práticas da empresa, mas no contexto
empresarial em geral. As políticas da empresa talvez tentem minimizar o impacto
das externalidades, no entanto, a empresa está num contexto maior e deve,
portanto, assegurar a sua sobrevivência. Os funcionários com mais idade, ao
perceberem as mudanças no próprio mundo do trabalho, acabem enxergando com
mais desconfiança a promessa de um tratamento equânime em relação aos
funcionários mais jovens.
173
No entanto, outro entrevistado demonstra confiança nas políticas de
desenvolvimento da empresa e no tratamento igualitário que deverá ser a elas
dispensado.
Porque justamente ela não vai mapear as pessoas pela sua idade, e sim
pelo seu potencial, entendeu? Se a pessoa tem 40, 50 anos e está
exercendo um bom potencial, a gente observa isso que está dando
resultados. Eu acho que a gente tem que se balizar não pela nossa idade, e
sim pelos resultados que a gente conquista. Entendeu?. Então acho que a
empresa, o fator idade não vai ser limitador. Pode ser para determinadas
atividades de campo, operacionais, acredito que sim. Uma pessoa de 50, 60
anos não vai fazer a mesma coisa que uma de 20, está certo? Mas eu acho
que para um trabalho um pouco mais voltado para uma parte de gestão,
uma parte voltada para o planejamento, com certeza, não joga. E a gente
tem exemplos hoje na empresa com pessoas dessa faixa etária e que
exercem um papel ímpar. (BP9)
Outra preocupação quando o funcionário é muito jovem é a tendência a
imaginar que ele não tem experiência suficiente para assumir cargos que requerem
muita responsabilidade, como no relato a seguir.
Mostrei que uma pessoa nova também pode desempenhar bem um cargo
que as pessoas não acreditam. Que eu acho muito complicado hoje em dia,
que existe oito ou 80. ou você é novo demais ou você é velho demais. (BP3)
No entanto, diferentemente da preocupação das pessoas mais velhas, a dos
mais jovens parece não ter fundamento em se tratando da empresa em questão.
É difícil você dar credibilidade a uma pessoa muito nova hoje. Eu não digo a
[empresa], eu digo as pessoas. As pessoas à sua volta, a [empresa] não,
que ela acredita no funcionário novo porque ela procura no mercado, ela
contrata recém formados, entendeu? Ela te dá essa abertura. (BP3)
O relato anterior sugere que a empresa não tem problemas em aceitar as
potencialidades dos mais jovens, mas sim as pessoas dentro da própria empresa é
que acabam discriminando estes funcionários, sejam elas seus pares ou seus
gerentes. Importante lembrar que os gerentes, são, muitas vezes, responsáveis por
ajudar a moldar o contrato psicológico. E, nesse caso, eles representam a empresa
e seu comportamento acaba sendo tomado como o comportamento do empregador.
Lembrando que algumas entrevistas analisadas na dimensão de “clareza dos
termos do contrato” apontam falta de transparência nos processos de escolha do
funcionários que será promovido, na análise da dimensão de “tratamento equânime”
174
apareceram indícios de que a empresa realmente está preocupada em valorizar
seus funcionários, ainda que mais jovens, por meio de promoções. Um deles é o
relato deste entrevistado de como ocorreu a sua promoção. Ele considera que,
apesar de jovem, teve as mesmas oportunidades que qualquer empregado.
Ou seja não foi uma coisa pontual, não foi uma coisa direcionada para mim,
houve uma competição saudável interna e ela com isso está me
proporcionando a forma de eu crescer, [...] estudando, às vezes fazendo um
curso de línguas, entendeu? (BP9)
Um contraponto à este relato diz que a empresa, efetivamente, incentiva da
mesma forma funcionários que queiram se desenvolver. No entanto, os ganhos
futuros, ou seja, as promoções, não são garantidas ou há, no mínimo, incerteza
acerca das reais possibilidades de progressão na carreira.
Olha, o incentivo é igual, tanto para jovem ou a pessoa que tem mais idade.
Eu vejo assim. O incentivo que ela tem dado pros mais jovens é o mesmo
para quem tem mais idade. Então, agora, como vai ser a promoção futura,
talvez eles olhem para esse lado, mas eu não posso afirmar isso. Mas o
incentivo atual, por exemplo, aquele que está indo para faculdade hoje,
independente de idade o desconto é o mesmo, o incentivo é o mesmo.
(BP2)
Talvez os funcionários percebam que apesar de dar os mesmo incentivos à
todos os funcionários, quando se trata de realizar um investimento maior em uma
pessoa como por exemplo, uma promoção a empresa prefere os mais jovens. Os
funcionários mais jovens costumam ser mais baratos e seus contratos psicológicos
correspondem muito mais ao que a empresa espera atualmente.
Ainda sobre a relação da idade e na extremidade oposta da oportunidade, um
relato esclarece que as demissões não são influenciadas pelo fator da idade, mas
por outros fatores desconhecidos.
Teve também gente jovem que foi dispensado. Agora, como foi feito, quem
apontou, essa coisa toda, a gente não tem conhecimento. (BP2)
Assim, neste caso, o tratamento dispensado aos funcionários não teve base no
fator idade.
175
Há ainda o fator de tempo de serviço prestado para a empresa. Os mais
antigos, que ingressaram quando a empresa ainda não era privatizada, acreditam
que perderam oportunidades de crescimento de carreira para os novos funcionários
que ingressaram na empresa. No entanto, essas oportunidades foram dadas de
acordo com o mérito pessoal de cada funcionário e da avaliação de seu trabalho,
tendo sido reconhecidas pelo resto do grupo como legítimas:
Quando eu assumi esse cargo, tinha gente com muito mais tempo de casa
do que eu, que... falou assim: Poxa, BA3, eu estou aqui há cinco anos,
você está há dois nesse setor e já assumiu um cargo. Mas, eu tenho que
assumir que, realmente você é um cara mais capaz. Você faz coisas que eu
não sei fazer. (BA3)
Os funcionários reconhecem ainda a presença de um pedaço da empresa que
parece manter sua dinâmica própria em relação aos seus funcionários.
A [empresa], por exemplo, nós temos a área [que trata do furto de energia
elétrica] e temos a área comercial e nós temos a área técnica. Eu vejo muito
investimento eu sei que o retorno na área de [que trata do furto de energia
elétrica], cada um real que ela investir o retorno vai ser mais rápido. Então
ela investe muito na área de [que trata do furto de energia elétrica], investe
na área comercial, mas a área técnica em certo período aí, um período de
dois anos, eu estou vendo que foi esquecida. Houve um investimento maior
na ponta, mas aqui na retaguarda. Para que chegue lá na ponta a energia
para ser vendida, nós precisamos aqui na retaguarda manter uma boa
qualidade de serviços também, certo? E eu acho que deveria haver, na
minha opinião, deveria haver um equilíbrio em investimentos. (BP5)
Por último, estão as diferenças entre funcionários terceirizados e funcionários
da própria empresa. Apesar de, na teoria, os terceirizados não fazerem parte da
empresa e, portanto, não fazerem parte da análise, cabe lembrar que eles estão
muito próximos dos funcionários da empresa central. Assim, o tratamento
dispensado a estes funcionários pode ajudar a moldar as expectativas dos
funcionários da empresa principal.
Sempre a parte pior fica com a empreiteira. A parte que dá mais trabalho
está sempre com a empreiteira. Quer dizer, eu digo isso da parte comercial,
porque eu vejo ali do pessoal. Então a parte de gráfico tem mais gente da
empreiteira, a parte de leitura, as pessoas que, que estão ocupadas com o
cliente são terceirizadas. Eu acho que isso é a pior parte, no caso da
[empresa]. Porque você entrar numa parte com o cliente no dia a dia,
normalmente não é funcionário, é difícil funcionário da [empresa] fazer isso,
quem faz é o leiturista, é o eletricista que vai cortar. Então, é por isso que eu
digo que as vezes eles trabalham tanto ou mais, porque eles trabalham
direto com o cliente. E quem está aqui dentro não tem nem noção. (BA4)
176
Conforme o relato a seguir, a política da empresa de tratamento igualitário para
os iguais depende muito do entendimento de cada gerente, que, no final das contas,
acaba sendo o principal contract maker nesse sentido. Como neste caso, um dos
funcionários que atua numa posição de liderança, relata o que é esperado pela
empresa e pelos seus pares.
Isso eu entendo como respeito, porque ele poderia ser um funcionário de
alto padrão, de médio padrão, de baixo padrão, e eu tenho que ter num
momento desses um tratamento igualitário que seja a condição que ele
tiver, seja um funcionário muito bom ou médio. Acho que isso as pessoas
esperam da gente. (BP9)
Cuidado
Quanto ao cuidado da empresa em relação à manutenção dos termos do
contrato sem a necessidade de uma renegociação, os relatos da base operacional
apresentam duas fases bem distintas. A primeira é a da privatização da empresa e a
segunda a de sua reestruturação. A confusão entre estas duas fases pode se
explicar pelo fato de que as entrevistas da base operacional foram realizadas antes
das entrevistas da média gerência, e portanto, logo depois da implementação do
plano de reestruturação. Assim, não só o plano não estava fixado nos processos
cognitivos dos funcionários mas também a memória mais forte de renegociação de
contrato estava na privatização da empresa.
O relato a seguir mostra que, de forma geral, durante uma relação de mais de
dez anos, a empresa continua mantendo as promessas consideradas mais
importantes para este funcionário.
Eu tinha 22, 23 anos, por ai. Hoje eu tenho 37 anos. Você tem ticket, você
tem plano de saúde, estabilidade que você quer para você e para sua
família. (BA9)
No entanto, ao analisar as duas fases especificamente, existem discursos
dissonantes em relação à esta dimensão. Isso pode se dever à falhas na
177
comunicação durante o processo de recrutamento ocorrido depois da privatização.
Esta funcionária, admitida durante a transição da privatização, entende que a
empresa não cumpriu as promessas feitas quando ela foi contratada.
Eu não queria nem responder a essa pergunta porque eu já esperei tanto
nesses cinco anos e me frustrei tanto que hoje em dia eu não espero mais
nada, eu não espero nada da empresa. Eu não sei agora porque a gente
teve algumas mudanças aqui, mudanças de chefia, mudanças de atitudes,
mudanças até mesmo do que você faz: não, você não vai fazer mais isso
porque isso aqui você não tem que fazer, quem tem que fazer isso aqui é
outra pessoa. (BA2)
Enquanto esta funcionária aponta que as constantes mudanças na presidência
da empresa podem ter provocado diversas renegociações nos termos do contrato de
trabalho dos funcionários, este outro relata que as mudanças não foram sentidas no
contrato psicológico dos funcionários.
Era fazer com que eu tivesse um crescimento profissional. Eu acho que é
isso, continua sendo isso [...] não mudou. (BP6)
No caso deste funcionário, por exemplo, ao ser questionado especificamente se
as mudanças na empresa se refletiram em mudanças nos compromissos com ele
firmados, sua resposta indica que na essência, estes não foram alterados.
A resposta da empresa à falta de direcionamento da empresa, foi a
implementação do planejamento estratégico, ocorrida durante a reestruturação da
empresa. Assim, a presença de um plano estratégico explícito pode mudar uma
situação de renegociação constante e aumentar a estabilidade do contrato.
Olha, no início, [...] a gente não tinha aquela confiança justamente era um
processo longo, não um processo a curto prazo. Era um processo a curto,
médio e longo prazo. Então, no inicio a gente não tinha muita segurança,
diferente do que a gente vê. Agora, independente de se trocar uma diretoria
ou não, o plano já está traçado. Aqui, o diretor vai ter que se enquadrar
também para poder fazer com que a flecha chegue naquele lugar. Então,
nós temos a direção agora. Se muda uma peça ou outra não está fazendo
muita diferença na direção de onde a gente vai acertar não. É lógico que
uma pessoas podem somar mais, outras menos, isso ai no tempo da gente
alcançar isso. (BP5)
Contudo, alguns funcionários da empresa ainda entendem que a empresa não
consegue atender às expectativas geradas por seus próprios contract makers, que
acabam frustrando os funcionários. Assim, a permanência do contrato estaria mais
178
ligada à resignação dos funcionários, que não se sentem em condições de
renegociar o contrato sob seus termos, e não ao cuidado da empresa em manter
suas promessas.
Quando eles vêm a gente tenta acreditar, mas aí passam dois meses e eles
não fazem contato nenhum [...] e nem pegam o telefone e dizem assim:
olha, lembra aquele assunto que vocês falaram com a gente? A gente está
tentando mas ainda não conseguiu. Então eu sinto vazio, mas a gente
tenta acreditar. Eu costumo falar que o pessoal aqui tem uma fé muito
grande, porque veio a privatização e muitos aqui passaram por ela. Vieram
várias mudanças, a privatização foi a última, depois da privatização veio
essa mudança de vários presidentes e todo mundo passa, porque cada
presidente coloca sua linha, né? (BA2)
Um esforço da empresa em fazer com que os funcionários sejam
multifuncionais pode ser interpretado como uma renegociação dos termos do
contrato. Apesar do impulso inicial em aceitar essa renegociação, já que os
empregados não têm muita escolha, é possível perceber um sentimento negativo,
uma certa mágoa no relato a seguir, já que a renegociação não foi percebida como
justa pelo funcionário.
Eles querem que a pessoa tenha perspectivas, eles não querem mais
aquele empregado que, por exemplo, você fala: “olha, [fulana] sua função
aqui é jogar o lixo naquele cesto ali”. Aí coloco um lixo do lado de cá, todo
papel que cai do lado de cá eu deixo, não coloco dentro do lixo, vamos dizer
assim, é uma coisa bem específica que estou falando. Mas, eles querem
que o empregado seja um funcionário que consiga trabalhar em qualquer
área da empresa. Tanto que eles hoje fazem essa orientação de negócios,
por exemplo, a gente vai participar, por exemplo, passa um dia com um
outro empregado de uma outra área completamente diferente, para a gente
interagir, [...] saber a dificuldade que aquele empregado tem. Ele vem
também depois, passa um outro dia comigo para saber o que eu faço, quais
as minhas dificuldades. Depois que esses dois conseguiram ver, você faz
uma reunião. Tem uma reunião marcada com o presidente, num dia você
vai lá, ele te pergunta quais as dificuldades que você encontrou, o que eu vi
de bom no trabalho dela, o que ela viu de bom no meu, que dificuldades eu
tive, que dificuldades aquela pessoa teve. Então, existem várias
oportunidades que eles dão para a gente modificar porque antes aquela
visão estatal era muito [vaga]. Apesar que hoje o número de empregados
que trabalhavam na estatal e que hoje trabalham na empresa é bem
reduzido, a maioria foi mandado embora (BP7)
Assim, o longo discurso da funcionária acordando com a multifuncionalidade
que os funcionários estariam dispostos a empenhar, termina com uma fala que
indica muito mais a frustração da impossibilidade de ter voz na renegociação do
contrato, a insatisfação por ter que desempenhar papéis que não eram seus
179
inicialmente e uma simples adesão ao discurso oficial da empresa, que julga
necessária para a manutenção de seu contrato.
Os compromissos gerais dos funcionários
Como na análise realizada nas entrevistas da média gerência, o termo que
melhor define o compromisso dos funcionários da base operacional é
comprometimento. O discurso corrente está diretamente relacionado com o
cumprimento de prazos e metas estabelecidas, já que este é o oficial desde a
reestruturação da empresa.
O que ela esperava e o que ela espera é o meu comprometimento no
sentido que eu faça, exerça a minha função da melhor forma possível:
atendendo a solicitações, os prazos, explicando aos clientes da forma mais
clara possível. (BP1)
No entanto, como poderá ser observado durante a análise das dimensões
propostas, muitas vezes estas metas não estão muito claras para a base
operacional, gerando uma nova interpretação acerca de comprometimento muito
mais ligada com a idéia do desenvolvimento pessoal.
A questão dos valores, presente nas entrevistas da média gerência também
aparece na base operacional, talvez como resposta ao alto investimento realizado
na divulgação dos valores da empresa, com destaque, no relato a seguir, para a
conduta ética e a transparência como valores desejáveis.
Os deveres que eu tenho com a empresa é o que a gente está cumprindo,
porque a gente trabalha com muita ética. A gente trabalha eticamente
dentro do processo [e] eu sempre gostei de fazer isso, trabalhar no setor
elétrico. (BA1)
Muitas vezes, a percepção dos funcionários é que a empresa possibilita
chances de desenvolvimento pessoal antes mesmo de perceber resultados efetivos.
Logo, o comprometimento da empresa com o desenvolvimento dos funcionários
180
pode gerar um comportamento de reciprocidade, fazendo com que estes se sintam
obrigados a retribuir o que a empresa proporciona.
Os funcionários reconhecem que a expectativa da empresa não é apenas a de
realização de um bom trabalho, mas além disso, de garantir que seu investimento
está sendo feito em pessoas que realmente tenham a possibilidade de melhorar e
crescer dentro da empresa.
Eu acho que ela espera sempre isso do funcionário. Além de trabalho, uma
pessoa que ela possa ver um crescimento nela. (BP2)
Isso gera uma busca constante pela excelência dos serviços prestados por
parte dos funcionários:
Eu acho que eu ainda posso melhorar a minha forma de trabalhar, que
ainda posso otimizar meu tempo para que eu possa trabalhar de forma mais
objetiva, que for melhor para a empresa. (BA9)
A fala anterior traz também a internalização do controle que pode ser
decorrência de um contrato psicológico bem estabelecido. O funcionário, por ser em
geral a parte mais fraca do contrato, passa a ter um compromisso pessoal com o
resultado como resposta ao investimento por ela realizado, mesmo quando o
funcionário percebe que isto está fora de seu alcance. E sofre, portanto as
conseqüências do não cumprimento de sua parte do contrato.
O entrevistado a seguir mostra que estar comprometido se torna uma questão
de sobrevivência na empresa e questão de dignidade pessoal, já que reconhece que
a empresa tem buscado oferecer melhores condições de desenvolvimento pessoal,
aumentando o seu valor no mercado. É a contrapartida não só exigida pela
empresa, mas também oferecida de bom grado pelos funcionários em resposta ao
tratamento que têm recebido.
Se uma empresa cresce, eu estou crescendo junto com ela. Se eu não
crescer, [...] eu vou ser sacado dessa empresa e vou estar frustrado por
isso. Então, eu tenho a minha obrigação de fazer a minha parte bem feita.
Sou obrigado a fazer isso. É uma questão, até, de dignidade pessoal. (BP5)
181
Assim, ser comprometido significa atender às demandas da empresa e assumir
a visão da empresa, o comprometimento da empresa com o cliente final, como forma
de demonstrar alinhamento com estas expectativas.
Ser uma boa funcionária, mostrar qualidade no meu trabalho, atender bem o
cliente afinal é ele quem paga, a empresa também, mas quem paga é o
cliente. Então, acho que o cliente tem que ser bem atendido. (BP7)
Investimento pessoal
Dentre as dimensões pesquisadas, a que aparece com maior incidência é a
que trata do quanto os funcionários estão dispostos a contribuir particularmente com
a empresa. Pode-se analisar esta dimensão esta dimensão pelos relatos sobre as
tarefas realizadas, que estão fora do escopo da função. No caso da base
operacional, ficar mais horas dentro da mesma função, auxiliar diretamente os
subordinados em suas próprias funções, é mais comum do que fazer tarefas que
não pertencem à função. Isto pode sinalizar um problema na interdependência
departamental, já que os setores não estariam dispostos a realizar tarefas que não
fossem ligadas a seus próprios departamentos. Isto contraria um dos valores
expressos pelo plano de reestruturação, onde o espírito de equipe e a interação
entre funcionários e setores aparece com destaque.
A análise das entrevistas da base operacional mostrou baixa incidência de
relatos de funcionários que saem das atividades inerentes à sua função para realizar
as tarefas emergentes que comprometiam os resultados da empresa. No entanto,
este fragmento aponta um destes casos:
A chuva e o vento, aqui na [localidade P] é muito crítico por causa das
árvores. E aí cai muita árvore, barreiras, às vezes [há] pessoas que moram
em lugar de risco. [...] Então a gente, o que acontece? [...]Independente de
ter uma função mais graduada, a gente bota a camisa, bota a botina e sai
para atender na rua com chuva mesmo, a gente atende serviços. Hoje o
182
tempo está bom a gente está tranqüilo, mas se chover, tira essa roupa aqui
e cai dentro. (BP2)
Duas das possíveis razões para que este trecho tenha sido encontrado nesta
entrevista são o fato de se tratar de um funcionário que trabalha no campo, onde as
demandas por trabalhos emergenciais são mais altas e ainda, o fato de o funcionário
ter alcançado uma promoção três meses antes da entrevista, estando ainda num
período de adaptação ao cargo e à equipe. Um outro fator que pode, ainda, explicar
este relato é a possibilidade de haver um compromisso social com os clientes, já que
a natureza da empresa implica que toda vez que o serviço for afetado pelas
condições climáticas ou por outros fatores, os clientes ficam sem o fornecimento de
energia elétrica, como aconteceu com um dos entrevistados que trabalha em uma
região turística.
Lá o rapaz tinha uma pousada e ele ficou algumas hora sem energia. Ele
ficou por conta, com todo o processo. Então eu estive lá inclusive, para
poder energizar ele. (BP2)
Assim sendo, a forma de investimento mais encontrada nas entrevistas é a
alocação do tempo pessoal do funcionário em favor da empresa. Os dois relatos
apresentados a seguir introduzem a discussão.
Eu trabalho muito sim, das oito e meia [da manhã] às nove e meia da noite.
(BA5)
Às vezes tem que trabalhar sábado e a gente está sempre correndo, e com
dois filhos ... eu sou separada com dois filhos. (BA4)
Assim, o quanto isto se apresenta como um aspecto negativo ou positivo
depende da interpretação de cada funcionário.
Para alguns, o principal motivo encontrado para o aumento das horas de
trabalho na empresa está relacionada com o aumento da carga de trabalho, que
acaba fazendo com que algumas tarefas não sejam realizadas.
A gente faz o nosso trabalho. Agora, só que eu acho que é uma carga de
trabalho a mais do que a gente tem condição de dar resposta. (BA1)
O aumento da carga de trabalho pode ser explicado, em parte, pela
reestruturação, já que se percebe que houve uma diminuição no número de
183
funcionários da empresa. No relato seguinte, o funcionário nota que alguns setores
perderam mais da metade de seu efetivo.
Realmente, enxugou bastante. Hoje em dia a gente é até bem mais exigido.
Porque às vezes no setor que você trabalhava [com] cinco pessoas [e hoje]
tem duas pessoas. Então você tem um comprometimento bem maior. (BP1)
Para outro entrevistado, foi uma promoção que acionou o gatilho da
sobrecarga. O aumento da autonomia gerou mais cobranças, que gerou maior
necessidade de investimento pessoal para a manutenção do seu cargo. O
funcionário enxerga isso como positivo, porque representa a conquista de mais um
degrau alcançado em sua carreira.
Eu acho que você tem, sim, mais responsabilidade. A gente acaba
adquirindo certos juízos quando a gente pega, assim, um cargo de
coordenação, tem a empresa trabalhando nisso, apagando as luzes às 7
horas da noite, mas acaba tornando um vício pra gente. Porque [...] eu, por
exemplo, estou falando por mim, eu vejo o trabalho quero fazer, fazer, fazer.
Quando eu vejo já passou a hora e eu não fui embora. Mas não porque o
trabalho me prende é porque você está querendo sempre resolver as coisas
que já estão [pendentes]. (BP8)
Funcionários que foram promovidos na fase de reestruturação entendem que a
sobrecarga de trabalho e o aumento da cobrança se devem ao acréscimo de
autonomia e ao conseqüente aumento de responsabilidades, advindo da
reestruturação da empresa. O relato a seguir, de um funcionário que foi promovido
durante a reestruturação, mostra a posição de alguém que experimentou não só a
sobrecarga causada pela diminuição do número de funcionários, mas também pelo
aumento de responsabilidades que acompanha as promoções.
Eu tenho mais autonomia, sou mais cobrado também. Eu vejo assim: além
de ser mais cobrado, você tem mais responsabilidade no que faz. Isso aí é
impressionante como mudou. Então a gente agora tem que ter até mais
cuidado no serviço do dia-a-dia. Mas profissionalmente, para mim, foi bom,
não tenho dúvida disso. Me sinto gratificado porque estou na empresa há
esse tempo todo e busquei isso e consegui. (BP2)
Em outro caso, uma funcionária admite que permanece por mais tempo na
empresa apenas porque sente prazer no que faz e quer se dedicar para aumentar as
possibilidades de crescimento dentro da empresa.
184
Eu sempre me dediquei de corpo e alma aqui na empresa. Eu vinha sábado
e se precisasse vir no domingo, eu vinha. Mas eu vinha, não porque eu
queria mostrar serviço. Porque eu gosto. [...]Eu casei com a [empresa],
literalmente. Às vezes deixo até a faculdade de lado para me dedicar aqui.
(BP3)
No entanto, a naturalidade e o otimismo com o qual essa sobrecarga é
encarada pode adquirir novas formas se pensadas pela ótica de um sindicalista, que
atribui a conta do problema não à empresa específica, mas ao que chamou
“superexploração do trabalho” explicitada no relato a seguir.
Você tem um volume de trabalho que obriga as pessoas a ficarem até mais
tarde e acha que isso é normal porque tem que dar conta daquela meta. E
tem umas coisas que são terríveis porque, por exemplo, quando você liga
alguém ou quando você vai lá, resolve o problema, coloca a luz, corta uma
árvore que está interferindo no cliente, isto traz uma certa satisfação para o
trabalhador porque ele está executando o serviço dele e está ajudando a
população. Tem esse lado também. As pessoas gostam disso, os
trabalhadores gostam disso. Então eu acho que com um número reduzido
de pessoas para fazer o serviço, você tem mais gente fazendo mais
serviços, você tem um volume de serviço maior, e aí às vezes as pessoas
falam não, tem que resolver isso porque é urgente, porque se cair pode
causar um acidente. Ou então o fio está passando perto. Então a pessoa
automaticamente acaba se incumbindo de estar fazendo isso e, pelo medo
às vezes do desemprego, ela fica uma ou duas horas a mais e nem bota
hora-extra nem nada. (BA1)
Segundo ele, essa exploração é possível porque as pessoas sentem satisfação
pessoal em ver um trabalho cumprido, especialmente numa empresa que trabalha
com o fornecimento de um gênero de primeira necessidade, muitas vezes estando
exposto ao contato direto com o cliente, bem como suas satisfações e insatisfações.
Outro fator que favorece esta exploração é o medo do desemprego.
O seguinte relato de um líder reforça essa idéia, especificamente no contexto
da empresa tratada. Assim, o investimento pessoal, que muitas vezes parece ser
feito por prazer assume outras possibilidades de ser entendido.
Somos mais exigidos, mais cobrados [...]. Diminuiu o número de
funcionários. Ainda hoje, acho que todos se acham um pouco
sobrecarregados, isso eu não tenho dúvida. Agora, a gente tem feito de
tudo para poder dar conta do recado, manter a gente com o emprego
garantido também. Senão também, se a gente deixar a peteca cair e
bobear, a gente pode perder o nosso emprego. Mas assim nós vamos
levando, nós vamos tentando fazer o melhor possível. (BP2)
185
Muitas vezes, o horário de trabalho dos funcionários está subordinado ao
horário de funcionamento dos órgãos com os quais ele precisa interagir. Tomando-
se por exemplo o casa da entrevistada que não tem hora de terminar o expediente
porque depende dos horários de atendimento do fórum, é possível entender como
estes funcionários precisam acomodar as demandas do trabalho com suas
necessidades pessoais.
Aí nunca tem hora. O horário mais certo mesmo às vezes é aqui [na
localidade A]. Mas, eu já saí de [outros lugares] 8 horas da noite... fechei o
Fórum. (BA7)
Alguns funcionários sentem um pouco de dificuldade em colocar limites entre a
casa e o trabalho, fazendo com que o espaço da relação de trabalho seja cada vez
mais amplo.
Tenho que chegar aqui disposto a encarar todos os problemas e desafios
do dia-a-dia e tentar diferenciar, deixar os problemas, tudo num tempo, os
de casa, da rua. Tentar diferenciar, todo mundo sabe que isso é difícil.
Deixar os problemas de casa em casa e vir trabalhar. E deixar os problemas
daqui e não levar pra casa, isso ai é meio complexo, a gente sabe muito
bem disso. (BP6)
O relato a seguir mostra como os funcionários acreditam que não dedicar-se
integralmente pode influenciar negativamente em suas carreiras.
Na [localidade P] eu estava sozinho. Então eu vivia muito a empresa. Na
[localidade A], além da empresa, eu tinha minha família e recentemente
minha esposa e meu filho. E realmente, do ano passado pra cá a minha
vida mudou particularmente muito. Com isso fez com que na hora de
administrar muito bem as duas coisas, de achar o equilíbrio, eu deixei
alguma coisa aqui, por fazer [...]. Por exemplo, lá na [localidade P], por ficar
muito tempo na empresa, eu conhecia todo mundo, eu jantava com o
pessoal, almoçava com o pessoal, porque eles eram a minha família. Aqui,
por eu ter a minha família, eu sempre saía pra almoçar em casa, eu só
almoçava com o pessoal que vinha [da sede], às vezes com minha própria
equipe eu não saía pra almoçar. (BA6)
Este relato evidencia a percepção do funcionário de que a falta de dedicação
integral à empresa, inclusive de suas horas de descanso, pode ser prejudicial à sua
carreira, declarando-se culpado pela sua estagnação profissional, já que resolveu
dedicar um pouco mais de tempo à família.
186
Talvez por isso alguns funcionários incorporem as atividades da empresa ao
seu dia-a-dia, naturalmente, como um sinal de comprometimento com os objetivos
da empresa. Permanecem, portanto em constante sobreaviso para as questões
relacionadas ao seu trabalho, como demonstrado a seguir:
Então, quando envolvo minha vida, minha vida já envolve a [empresa], já
envolve esse dia-a-dia. Minha família já taca o pau não fala de [empresa]
no final de semana, pelo amor de Deus, senão BP3 começa e [não pára
mais de falar]. Talvez daqui a alguns anos mude isso e consiga ser um
pouco assim, como eu posso dizer, ser menos, digamos, empolgada. (BP3)
A atenção a imagem e as questões relacionadas à empresa, mesmo quando
fora do horário de trabalho é uma outra forma pela qual o investimento pessoal se
manifesta:
Aí hoje em dia... antes quando as pessoas falavam para mim: ah, você
trabalha lá naquela empresa?”. Eu não falava nada. Hoje em dia se alguém
falar eu falo: trabalho, trabalho sim naquela empresa. [E elas dizem:] “Ah,
mas aquilo lá...[é ruim]”. [E eu respondo]: Não, não é não. Não é bagunça
não, por causa disso, por causa disso. [Se elas argumentam]: “Ah, mas
quando a gente vai lá... [Eu digo]: “Mas você já ligou para o 0800? Você já
tentou acessar pela Internet? Quer dizer, você tem vários caminhos, mas
você não faz, você está reclamando sem saber. O que você quer resolver?
Me dá que eu resolvo para você”. E antes eu não fazia isso, porque agora
eu vesti a camisa, eu me sinto parte dessa empresa. (BA2)
Tanto que lá na minha rua, onde eu moro, eu sou ponto de referência,
acabou a luz eles gritam “BP3! acabou a luz!”. eu vejo o que aconteceu, a
gente tenta resolver para não resultar em processo. (BP3)
Nestes casos, os funcionários estão tão envolvidos com a empresa que se
sentem pessoalmente ofendidos quando esta é atacada. O comprometimento com a
empresa faz com que enxerguem as agressões como disputas pessoais.
A próxima entrevistada relata, inclusive, uma situação de estresse emocional, já
que trabalha representando legalmente a empresa acaba tendo que lidar com
clientes insatisfeitos e que denigrem a imagem da empresa. Esse estresse pode se
justificar, em parte, pelo sucesso do plano de reestruturação nessa questão
específica. A empresa, que antes era vista como uma estatal que não prestava bons
serviços, passou a ser uma empresa onde os funcionários genuinamente se
orgulham de trabalhar.
187
Cansa, às vezes cansa a gente sim, mais psicologicamente, não
fisicamente. Mas fica assim uma coisa um pouco ruim. Você fica se sentindo
um pouco mal. Porque você quer defender uma empresa. Às vezes te dá
raiva de ver as pessoas reclamando da empresa, a empresa tentando
melhorar e as pessoas tão enfiando no buraco. Aí você se sente mal. Não
gosto de ouvir. Às vezes você está lá esperando as audiências, aí você vê o
cliente conversando com outro: mas malha, malha, malha à beça a
[empresa]. Fica chato você ouvir. Eu não gosto não. (BA7)
Este comprometimento emocional que alguns funcionários têm com a empresa
é visto como positivo e esperado pela diretoria. A relação trabalhista passa a ser
afetiva, podendo até, quem sabe, levar funcionários a se sacrificarem mais do que
fariam sem esse apelo emocional, como já indicado pelo relato do sindicalista.
Um contraponto a este discurso é o do funcionário que vê na relação de
trabalho oportunidades de crescimento mútuo. Assim, a parte efetiva da relação se
torna insuficiente para explicar o comprometimento dos funcionários. Como indica o
próximo relato, ele é efetivamente uma troca de interesses, onde a empresa deseja
crescer e o funcionário contribui para este fim, porque vê no crescimento da
empresa a oportunidade para seu crescimento pessoal.
E hoje, acredito que nós sejamos a terceira melhor da região. Nós estamos
trabalhando, com certeza, que nós os funcionários, a maioria aqui, eu
conheço estão engajados, realmente em que [a empresa se torne a
primeira]. Não só pela empresa, [...] mas estamos visando o crescimento da
empresa para que a gente cresça junto. Porque seria hipocrisia eu gosto da
empresa, [só] para que ela cresça. Eu também quero crescer junto, a
minha visão é essa. (BP5)
Assim, os objetivos caminham juntos, mas as realizações não estão
relacionadas a um envolvimento afetivo com a empresa, mas sim ao fato de que os
objetivos do empregador e do empregado são complementares.
Outra forma de acessar o investimento pessoal dos funcionários é observando
o quanto eles estão dispostos a trazer idéias que melhorem os processos
empresariais. Isso indica preocupação com seus resultados. Os funcionários
entendem que a empresa espera este tipo de comportamento.
Ser criativo? [É] de repente: surpreender. Ter uma idéia diferente para
agilizar o serviço, porque a gente tem alguns programas aqui que são
[antigos], que já têm algum tempo. De repente ter uma idéia para fazer uma
coisa melhor, para atender melhor um fornecedor, ou um cliente. (BA4)
188
Neste contexto, é importante entender como o erro é percebido entre a base
operacional, já que inovar e ser criativo são processos que pressupõem uma
margem de erro no empreendimento de novas atividades.
Enxergar o erro como uma parte do processo de construção de conhecimento,
acaba favorecendo comportamentos que extrapolam padrões visando melhorar o
desempenho do funcionário e da empresa. A mudança do tratamento do erro pode
ser percebida no relato de uma das funcionárias, ao lembrar de um chefe
centralizador, que não propiciava a abertura necessária para que seus funcionários
inovassem:
Já era privatizada, mas esse não tinha entrado no esquema, tanto é que
uns três meses depois, [...] ele foi desligado da empresa. (BA4)
Trazer experiências e sugestões que pretendam melhorar os processos é uma
atitude encorajada pela empresa.
E a gente estimula isso, estimula pela divulgação quando tem alguma idéia
muito relevante. Antes a gente faz uma divulgação disso internamente. A
gente passa isso para nossa gerência, ou seja, através da comunicação
interna da empresa. Justamente com o intuito de valorizar aquele
empregado que teve aquela idéia. Então é feito, mais ou menos,dessa
forma. (BP9)
A própria modernização dos equipamentos abriu uma gama de possibilidades
para a inovação, conforme o relato a seguir. Provavelmente não só porque se
desperdiça menos tempo com tarefas rotineiras, mas também porque a
informatização da empresa favorece a adoção de novas técnicas e processos, como
os relatos a seguir demonstram.
O trabalho é mais intenso. Ao mesmo tempo que ele é mais intenso te
estimula mais a ser criativo. Agora, o equipamento, melhorou e melhorou
muito. A gente trabalhava com microficha, aquela coisa antiga, aquela
maquininha. Antes disso, trabalhávamos com listagens enormes. Hoje a
gente tem programas. Ainda há muita coisa para melhorar, na parte da
informática; precisa de dinamismo, a gente precisa de links melhores; mas
melhorou muito, muito mesmo, otimizou bastante o trabalho. Está faltando
agora é organizar, organizar mais. (BA9)
Eu sinceramente, eu visto a camisa da empresa. Eu visto a camisa da
empresa pelo seguinte: ela começou a entrar com uma tecnologia nova,
começou a se modernizar. Nós trabalhávamos até na parte de proteção com
eletromecânica, agora é tudo eletrônico. Nós agora temos tudo,
189
telecomunicação, temos fibra ótica, tudo que nós não tínhamos naquela
empresa. Então, ela se modernizou e proporcionou um crescimento, até em
conhecimento através de curso, palestra e outras coisas para que a gente
crescesse e abrisse nossa visão, aí a gente começa a adquirir uma visão de
futuro, de autodefesa. Ai você começa a ter uma outra perspectiva. Aí isso
também você recebe um incentivo. Nesse incentivo que você vê? Uma
empresa que ela está se preparando para um novo milênio e a [empresa]
ela está fazendo isso muito bem. (BP5)
No entanto, o depoimento de uma das entrevistadas pode indicar que quando a
empresa difunde a idéia de que os funcionários precisam ser criativos, pode ficar a
dúvida do que é “ser criativo” na opinião da diretoria. Se torna, portanto, um pouco
difícil tangibilizar essa demanda da empresa, ficando apenas como mais um de seus
valores, sem maiores conseqüências práticas devido à dificuldade de compreensão
de como esse valor pode ser demonstrado.
O que a [empresa] espera? Bom, que eu execute a minha função, que eu
seja [...] bastante criativa, e que, que faça além do que ela espera. Sei lá!
Eu procuro cumprir os prazos, não deixar atrasar. Eu trabalho assim com
fornecedores, pagamento dos fornecedores eu procuro até pagar, sempre
assim um dia antes. Nunca deixar as coisas pra cima da hora. (BA4)
Outro aspecto da dimensão do investimento pessoal é a necessidade dos
funcionários em desenvolver seus potenciais. Uma das funcionárias entrevistadas
está na empresa há mais de 15 anos e consegue identificar a mudança nas
exigências da empresa no que tange à escolaridade necessária. A mudança,
segundo seu relato, não é privilégio da empresa em questão, já que desde a sua
inserção no mercado até os dias de hoje, as pessoas têm tido maiores
oportunidades de prosseguirem seus estudos.
Quando eu entrei aqui tinha o segundo grau, aquele segundo grau era bem
valorizado, você entrava numa empresa estatal com segundo grau. E entre
as pessoas qualificadas entravam muito poucas. Como é hoje eu não vi
ainda, acho que tem melhorado muito isso, hoje o nível universitário é o
ideal, mas hoje se pede um doutorado, um mestrado. Está mais exigente
também. (BP7)
Os funcionários se sentem menos preparados não só porque os mais jovens no
mercado de trabalho têm mais formação acadêmica, mas também porque depois de
algum tempo, as informações ficam desatualizadas e os equipamentos podem
parecer desconhecidos mesmo aos especialistas da área.
190
Exige um conhecimento, sem o conhecimento é impossível você trabalhar, e
lógico, que eu não me sinto uma pessoa 100% habilitada para aquilo que eu
faço, mas eu estou procurando, cada vez mais, isso. Porque o cara que
achar que sabe tudo ele já está regredindo. Então, tem sempre
equipamentos novos, tem sempre processos novos para poder fazer. E tem
sempre defeitos novos que você nunca pegou, e você tem sempre que ter
um aprendizado mais aprofundado daquilo que você faz. (BP5)
Assim, os funcionários percebem que a busca pelo aprendizado é um caminho
sem fim e o desafio é manter-se atualizado para conservar a empregabilidade no
mercado de trabalho.
Acho que os desafios estão para serem alcançados. O crescimento a
gente tem que buscar todo dia, não adianta chegar e falar “eu já estou num
patamar” isso aí, o dia que a gente pensar isso, você com essa hipótese,
vem alguém e passa por cima. (BP6)
O relato a seguir mostra que parece haver um entendimento por parte dos
funcionários de que este é um compromisso do qual a empresa não abre mão, e que
as recompensas só serão entregues àqueles que souberem fazer um bom proveito
das possibilidades que ela tem proporcionado.
A gente constantemente tem que estar tentando melhorar e buscando uma
melhoria contínua. E a empresa mostra isso claramente para a gente. (BP6)
Ela te dá, mas eu acho que esse reconhecimento só vem a partir de você.
Eu acho que sim, que você tem que mostrar isso. (BP7)
Eu acho que é mais minha responsabilidade. Se a empresa me dá a
possibilidade, está mostrando o caminho e ainda oferece certos benefícios
de convênios com faculdades, com cursos. Eu acho que cabe pessoa, cabe
a mim, estar me esforçando também para alcançar esse objetivo junto com
a empresa. (BP8)
Eu vejo que, aquele que quer ainda estudar, aquele que quer ainda se
aprimorar no que faz, a empresa está dando chance. (BP2)
Assim se forma uma atmosfera de obrigação de contrapartida a um estímulo da
empresa. Embora a literatura aponte que as contrapartidas diretas são pouco
exploradas nas pesquisas (Conway e Briner, 2000), parece haver, aqui, uma
evidência da relação direta entre o compromisso da empresa em prover meios para
o envolvimento de longo prazo e a contrapartida dos funcionário na forma de
desenvolvimento pessoal e, consequentemente, trabalho de maior qualidade.
Então, ele vai ver a empresa, de uma certa forma. O que eu tenho que
devolver, já que ela investiu em mim, vai investir em mim em cursos, e tal,
essa coisa toda, meu dever é devolver isso com qualidade, eu estudar, me
aprofundar cada vez mais e devolver isso com qualidade. (BP1)
191
Isto parece fazer com que os funcionários acabem extrapolando a noção de
resposta ao investimento da empresa, e faz com que eles se sintam compelidos a
buscar o desenvolvimento fora da empresa também, como uma forma de mostrar
interesse.
Agarrar com vontade o que a empresa determina, estar ali ativo o tempo
todo, sempre investindo não só o que a empresa te proporciona, mas
também por si próprio. Digo, fazer cursos fora, não só aquele curso que a
empresa está te proporcionando, entendeu? Para você ter qualidade e
demonstrar para a empresa que você está aí porque você também é bom,
você está ali porque você sabe aquilo que você está fazendo. (BP1)
Este comportamento, segundo um dos entrevistados é reforçado pelo plano de
carreira que, em sua opinião, serve basicamente para evidenciar suas deficiências e
possibilitar que o funcionário procure se desenvolver por iniciativa própria, inclusive,
sem o envolvimento da empresa.
Acho que serve para inserir nos funcionários, nos colaboradores, essa
questão de que a pessoa tem que se desenvolver também. Não é uma
responsabilidade só da empresa, de estar colocando a pessoa pra cima ou
motivando com promoção. Acho que insere também esse contexto de que a
pessoa tem que se desenvolver; não estar só esperando que a empresa
coloque ela pra cima ou que vá dando promoção pra ela para, aí sim, se
atentar para se desenvolver. (BP8)
Esse movimento pode até ser visto como uma nova forma de “mostrar serviço”,
já se percebe que a empresa valoriza tanto o interesse do funcionário em se
desenvolver quando os resultados gerados. Para a empresa, isso se torna um bom
negócio, já que poderia se desprender da obrigação de investir no funcionário, sem
abrir mão de contar com funcionários mais qualificados e, ainda, levar os
funcionários a assumirem responsabilidades maiores para que sejam notados.
Se você investe em si próprio, se você tem segurança de você, não vejo por
que não chamar a responsabilidade para você. Se você confia na sua
capacidade, não pode não ser notado. (BP1)
Profissionais que são bem sucedidos nesta empreitada sentem muita
segurança em afirmar que suas carreiras estão prestes a deslanchar.
A tendência minha é continuar mostrando o potencial que eu tenho e ir
assumindo [outros cargos]. (BA3)
192
Os empregados percebem que, quando a empresa realiza um determinado
investimento, isso significa que ela reconhece no funcionário um potencial e que
isso, invariavelmente, levará à uma carreira de sucesso.
Eu acho, [que] a empresa aposta em você. Ela também não vai te dar
oportunidade, que você tenha uma responsabilidade, se ela não confia em
você. Então, se você é um cara coerente, um cara que demonstra saber
como é que está o processo da empresa [ela te dá oportunidades]. (BP6)
Eu tento executar meu trabalho da melhor forma possível e de acordo com
as metas da empresa. Porque não adianta também a empresa querer
apostar em você e você não cumprir aquilo que ela te passa. Por exemplo,
“você tem que carregar 100 tijolos durante uma hora”, e tu carregar um, não
há empresa que vá investir em você, entendeu?. Eu acho que a empresa
tem que saber investir, mas também saber investir, colocar recursos onde
acha que ela vai ter retorno. (BP6)
Novamente, esta suposição está apoiada na crença de que a empresa não
estaria desperdiçando tempo e recurso se não fosse em prol de um ganho maior no
futuro.
A empresa está disponibilizando cursos para os funcionários, ajudando a
fazer curso superior que acha que a empresa vai crescer muito com relação
a isso, entendeu? (BP6)
O funcionário que estiver no lugar certo, na hora certa e com a formação
adequada terá seu investimento reconhecido.
Nada melhor que eu estar formado com nível superior. [...] Porque, como eu
falei para você, a empresa está apostando em mim, e as perspectivas de
crescimento vão ser [...] para quem está buscando melhoria contínua, e
para ela que é que isso da melhoria contínua? É melhorar teu conhecimento
em relação a isso. E a perspectiva da empresa, acho que a empresa hoje
em dia, como eu falei para você também anteriormente, ela mostra
nitidamente que todos nós somos capazes de chegar aonde a gente almeja,
é só a gente demonstrar habilidade para aquilo. (BP6)
E os que já se sentem reconhecidos, acabam fazendo esse investimento como
uma forma de demonstrar gratidão pela oportunidade proporcionada. O relato a
seguir sinaliza sutilmente que o entrevistado percebe uma promoção atingida não
como um reconhecimento ao seu mérito, mas como um voto de confiança que a
empresa faz em suas potencialidades.
Ela está me dando, está ainda mantendo oportunidade, entendeu, para que
eu cresça junto com a empresa, a gente que visa “eu tenho que ser
reconhecido, eu tenho que ser” de repente melhorar de cargo, mas a gente
tem que ver também a parte da gente. Que a gente está fazendo, como
você falou, fez a pergunta, e tem que ver que é o que a gente está fazendo
193
também para fazer jus a essas oportunidades. A empresa me deu a
oportunidade, mantém até hoje, para que eu cresça junto com a empresa,
ela, eu acredito, que me confia essa posição, esse cargo que eu estou hoje.
Então, eu tenho que fazer jus a esse cargo, a essa oportunidade e aos
benefícios que ela me paga, entendeu? Dispensando essa grande parte do
meu tempo para a empresa.Então, tenho que correr atrás, tenho que me
desenvolver. (BP8)
Uma possível explicação para esta forma de entender a relação pode ser o
reconhecimento de que sua empregabilidade no mercado não é tão alta e que
encontraria dificuldades para se recolocar no mercado com as mesmas condições
oferecidas pela empresa em que trabalha.
Eu entendo que eu estou preparado para o mercado externo, mas não sei
se dentro da faixa de benefício de salário que eu recebo hoje. (BP8)
A despeito dos esforços, pessoais e da empresa, há os que acabam ficando
pelo caminho. Funcionários que não perceberam a mudança ou negaram seu
aspecto permanente. O relato a seguir é de um diretor sindical que se queixa da falta
de percepção da mudança. Sua condição de sindicalista pode, neste caso, ter feito
com que, apesar de enxergar sua proximidade, reagisse negando-a. Após perceber
que o discurso virou prática na empresa, ele sente que pode ter deixado para trás
uma oportunidade de crescimento profissional.
Se eu não suar a camisa, se eu não procurar com que a empresa progrida,
eu também vou estar achatando meu projeto, essa é a minha visão. Eu
acho que é uma visão que eu demorei muito a adquirir. Eu estou com 50
anos, eu demorei um pouco a adquirir essa visão. Mas, agora eu vejo a
globalização, eu vejo essa necessidade.[...] Eu sou obrigado a somar à
empresa. Não aquele negócio que todo mundo fala “que está puxando a
sardinha do lado da empresa, patronal”, nem nada. Eu sempre procuro o
equilíbrio entre duas coisas, como eu falei antes eu sou diretor sindical, eu
tenho que ver o lado da empresa e o lado do funcionário. (BP5)
Outro funcionário que sente ter perdido o bonde da mudança relata que, ainda
assim, vê esse fato como um desafio. Seu otimismo parece estar relacionado com o
fato de que, mesmo sem ter sido formalmente promovido, assumiu um cargo
informal como representante da empresa em uma das localidades mais afastadas.
Assim, sua oportunidade era mais tangível do que a do funcionário anterior.
Eu sinto que eu perdi essa oportunidade [de ser promovido]. Sinto não, eu
sei que eu perdi. Mas isso também não me deixa abalado, porque isso me
194
fez ver que eu achava que eu estava fazendo certo e não estava. Eu tenho
que fazer mais ainda, eu tenho que me superar. Então eu gostei disso,
desse desafio. Então eu [pensei]: Opa, eu estava meio acomodado, não é
por aí, tenho que mudar, tenho dar uma chacoalhada na minha carreira.
(BA6)
Um aspecto interessante é a percepção do investimento pessoal dos
funcionários terceirizados. Estes funcionários acabam tendo muito incentivo para
demonstrar um bom desempenho visando uma possível vaga na empresa principal.
A proximidade destes funcionários com os da empresa principal faz com que eles
assumam o papel de contract makers (Rousseau, 1995), pela intensidade de sua
interação. Assim, eles acabam ajudando a moldar o contrato da base operacional.
Imagina eles que trabalham todos os dias fazendo esse tipo de serviço?
Então é, a minha visão da empreiteira é isso, porque eu acho que as vezes
eles trabalham tanto ou mais [que os efetivos da empresa].(BA4)
A familiaridade entre os funcionários das duas empresas diferentes acabam
dificultando a distinção entre seus funcionários. Quando as regras que valem para
uma “classe” de funcionários não vale para a outra, apesar de desempenharem
papéis muito parecidos e com igual dedicação, pode-se gerar uma situação de
desconforto na qual a empresa principal acabará sempre sendo mais cobrada, já
que por ser maior, é a que tem poder para negociar os contratos.
Este líder aponta a necessidade de revisão das políticas com terceiros, já que
os resultados da empresa principal dependem diretamente do desempenho destes
funcionários.
A gente também lida com pessoas, como essas empresas que eu te falei
[referindo-se aos terceirizados]. Então, não adianta você ter uma política de
RH bastante tranqüila e ter uma política de ferro e fogo com terceiros. Você
também tem que levar isso pra empresa para ser conquistada. (BP9)
Flexibilidade
Esta dimensão trata do quanto os funcionários se sentem obrigados a tolerar as
mudança no seu contrato psicológico e a disponibilidade de lidar com situações
imprevistas.
195
Os funcionários percebem que a capacidade de adaptação é importante para a
empresa. Quando uma das entrevistadas foi questionada sobre o porquê de ter sido
mantida na empresa após a privatização, ela reconhece que um funcionário que não
se adapta bem à novas condições de produção acaba tendo seu desempenho
afetado.
Não sei, tal vez, eu acho que, por que é que eu fiquei? Uma boa pergunta
[...]. Eu acredito assim, eu sempre procurei prestar um bom serviço. [...]
Acho que adaptação à mudança é uma coisa que favorece. Porque quando
você não se adapta, no fundo, no fundo você se torna um problema porque
você não vai produzir com o tempo. (BP7)
Além disso, existe o fato de a empresa ser geograficamente espalhada e, de
tempos em tempos, precisar levar uma determinada pessoa com uma competência
específica para outras localidades. O próximo relato indica que o entrevistado
acredita ser parte da política da empresa transferir os funcionários como forma de
estimular a busca por novos desafios, privando-os da sensação de comodidade que
pode fazer com que o desempenho se estabilize em um determinado patamar.
Mas esse negócio, eu sei, é uma das coisas. A visão da [empresa] de tirar
as pessoas de sua área de conforto. Nós sabemos que tem pessoas, eu
tenho muitos amigos que já foram transferidos de um município para outro.
(BP5)
Analisar como os funcionários reagem a estas demandas ajuda a entender a
dinâmica desta dimensão do contrato psicológico nas relações de trabalho desta
empresa.
No que diz respeito às mudanças na forma de trabalhar, nos processos e até
em horários, os funcionários relatam que são bastante tolerantes. Neste ponto, cabe
ressaltar que o discurso da flexibilidade é amplamente difundido na literatura
gerencial (BOLTANSKI e CHIAPELLO, 2002) como uma qualidade a ser
desenvolvida por todas as empresas. Assim, pode ser que alguns funcionários
considerem a negação de um discurso tão forte como comprometedora para seu
futuro na empresa.
196
Eu sou a primeira, que se você pára e diz: “olha tenho um problema assim”,
vou tentar te ajudar da melhor forma a resolver teu problema. Eu sou o tipo
de pessoa, vamos dizer assim, pau pra toda obra, quando alguém precisa
de mim estou disposta a ajudar. (BP3)
Esta disponibilidade para aceitar as mudanças no dia-a-dia de trabalho é vista
como uma qualidade desejada pelos funcionários e empresas.
É porque eu me acho dinâmica. Eu estou aqui agora fazendo isso, ao
mesmo tempo em que eu estou aqui já estou pensando no relatório que eu
deixei lá, que eu tenho que fazer, mas também já estou pensando na minha
obra que eu estou em casa, que eu tenho que terminar de fazer, e também
eu estou pensando num compromisso que eu tenho, entendeu? Eu sou
muito multi, eu sou multi. (BA2)
As mudanças podem ocorrer no escopo do trabalho realizado. O funcionário
entrevistado relata que não só houve uma mudança na tarefa realizada, mas
também no alcance de suas tarefas, representando uma ampliação de
responsabilidades. A aparente aceitação pacífica deste fato pode estar relacionada à
satisfação do funcionário em ver as mudanças ocorrendo no campo, já que este
considerava que a inovações nunca chegavam à ponta da empresa.
[A função] se expandiu, se expandiu. A gente ficava específico, proteção era
só proteção, manutenção só manutenção, comunicação só comunicação.
Agora não existe isso, eu opero subestação, eu vou na usina, eu faço
reparos na usina, eu vou na subestação e faço reparos na subestação. Se
tiver problemas de proteção eu ajudo na proteção, montamos o escritório
ajudamos no escritório, nós dirigimos, nós fazemos, nós praticamente nos
desenvolvemos em todo o processo. (BP5)
Um ponto a ser ressaltado acerca desta valorização da flexibilidade refere-se
ao fato de que quanto mais versáteis forem seus funcionários, melhor eles podem
ser aproveitados em diferentes áreas, diminuindo custos com recrutamento e
treinamento.
Ela quer os funcionários dela mesma, não quer ir pro mercado. Para que ir
pro mercado se ela tem ali aquela mão-de-obra disponível?. É mais fácil ela
pegar uma pessoa que já está aqui dentro que já tem um conhecimento do
local, do serviço, que pegar uma pessoa do mercado, crua que vou ter que
treinar, selecionar, passar por aquele processo tudo que é bem complicado.
(BP3)
Políticas oficiais da empresa parecem reforçar essa visão de que os
funcionários devem ser aproveitados nos diversos campos da empresa.
Eles querem que a pessoa tenha perspectivas, eles não querem mais
aquele empregado que, por exemplo, você fala para mim “olha, BP7 sua
197
função aqui é [...] bem específica [...]. Mas, eles querem que o empregado
seja um funcionário que ele consiga trabalhar em qualquer área da
empresa. Tanto que eles hoje fazem essa orientação de negócios. (BP7)
Este é uma questão tão crucial para a empresa que, como pode ser percebido
na citação anterior, o próprio presidente aloca seu tempo para realizar reuniões que
tratam da questão. Sua presença dá a legitimidade necessária para este artefato
utilizado como forma de reforçar a mensagem da empresa (ROUSSEAU, 1995).
A normalidade com a qual são encarados os imprevistos faz pensar que os
funcionários são bastante flexíveis, especialmente em determinadas funções na
empresa. Como por exemplo o funcionário que depende dos relatórios dos
terceirizados que atendem ao cliente nas ruas. Seu horário de saída depende
diretamente do trabalho realizado por estes profissionais e da chegada do material
que precisa ser compilado antes do fechamento do setor.
E isso [seu horário de saída] varia porque tem pessoas que chegam cinco
meia até no máximo sete horas se acontecer alguma coisa inesperada, ou
ficar preso num engarrafamento [...]só saio daqui depois que o último chega,
técnico chega. (BA3)
Isso também pode ser aplicado aos prepostos que ficam dependendo do
horário do fórum. No caso da entrevistada a seguir, a flexibilidade atua para
favorecer tanto a empresa quanto o empregado, como uma forma de recompensa
pelo comprometimento deste.
Tem dia que a gente não almoça, porque não dá, né? Quando vai a [um
local mais afastado] mesmo de manhã, só volta de tarde. Aí você não tira
hora de almoço, não tem como. Aí ela entende e ficam elas por elas, né?
Compenso, o pessoal aqui é bem flexível também. (BA7)
Ainda, no caso da empresa específica, os contratempos podem se dar por
fenômenos naturais, afetando o fornecimento de energia elétrica e comprometendo
os resultados da empresa. Ainda assim, não parece haver resistência quando se
trata de flexibilizar o contrato psicológico do funcionário.
A gente corre atrás, a gente para sobreviver, a gente literalmente veste a
camisa mesmo, da empresa. A gente tem aí, como te falei, a gente usa um
termo. O pessoal aí usa “bacoada”. Que é isso?, Bacoada é quando chove
e dá aquele monte de problemas, aquele monte de falta de energia e que a
empresa se mobiliza para isso. Todo mundo se mobiliza. (BP6)
198
O relato que se segue indica que nem sempre os funcionários estiveram
dispostos a serem flexíveis como são atualmente.
Aí tinha uma turma de emergência lá cuidando de outros serviços. Aí o
cliente chegava até eles carro da [empresa], né [e perguntava] “Ah, você
poderia religar minha luz, porque eu já paguei”. [E o funcionário respondia]
“Ah não dona, isso aí não é meu serviço não. Eu não posso”. Hoje não é
mais assim. Hoje todo mundo trabalha pra fazer um serviço só. Então eles
tão valorizando tanto a gente aqui dentro como o cliente lá fora, dando mais
atenção. (BA7)
Essa disponibilidade pode ter aumentado não só depois da privatização, mas
também depois do programa de reestruturação, que buscou aumentar o foco no
cliente externo.
Independente de ser, é isso que a [empresa] espera. Por exemplo, chegou
um cliente, ligou para mim, vamos dizer é parte, ele vai me fazer uma
pergunta que não tem nada a ver com o meu trabalho na verdade,
entendeu? O que é que ela espera? Ela espera, que pelo menos, eu possa
direcionar ele, o cliente para a pessoa certa. Ou tentar resolver o problema
desse cliente. (BP7)
O outro dia ligou um senhor, falou para mim que estava desde 8 horas da
noite, até aquela hora que estava me ligando, sem luz. Necessariamente,
ele teria que ligar para o 800 fazer a reclamação dele, ele disse para mim
que tinha feito, aconteceu uma chuva muito forte. fui tentar de qualquer
maneira: você me dá seu endereço e seu nome, aquilo não tinha nada a
ver comigo, mas eu liguei, passei para o técnico responsável. Peguei o
telefone do cliente, anotei o telefone dele, anotei o endereço, pedi ao
técnico que ligasse para o centro operativo [da sede] para que mandasse
um carro pra lá porque o cliente estava há um tempão sem luz e assim não
podia ficar. Ele fez, foi feito direitinho. Depois, independente de qualquer
coisa fui lá, peguei o número do cliente, liguei para ele novamente e
perguntei se ele tinha sido atendido, se ele tinha ficado satisfeito com o
trabalho, e ele falou que tinha. Que logo depois que ele me ligou, meia hora
depois o carro foi lá. (BP7)
Apesar de perceberem o aumento da carga de trabalho, reconhecem também
que a empresa tentou facilitar a adaptação dos funcionários às novas regras,
tornando assim mais fácil a aceitação dos novos termos do contrato.
Mudou, como é que vou falar pra você? Eles deram mais condição de
trabalho. Por exemplo, antigamente se eu fazia uma quantidade de trabalho
e tinha uma outra pessoa para fazer outro. Hoje eu faço o meu e mais o da
outra pessoa porque a forma como é feita mudou, mas a quantidade de
trabalho, de serviço, não diminuiu. Então você vê a modernidade, você
acumulou maior quantidade de serviço, mas também te deram condições
para você se adaptar àquilo ali, a informatização. Não é que é muito fácil,
mas, essas adaptações. Teve pessoas que não se adaptaram, mesmo com
as condições melhor, mas eles não: “ah!, é muito serviço” (BP7)
Uma das provas da penetração do discurso da flexibilidade na empresa é o fato
de funcionários mais antigos apresentarem em seu depoimento a aceitação da
199
mudança dos termos de seu contrato no que diz respeito à forma como o
desenvolvimento profissional deve se dar.
Eu tenho que estar sempre propício a certas mudanças, eu tenho que estar
sempre propício a me aperfeiçoar principalmente meu aperfeiçoamento
profissional pessoal e me preocupar com isso. Por que? Se não todo mundo
vai avançar e eu vou ficando e daqui a pouquinho eu não sou mais
necessário na empresa, eu preciso. (BP5)
Interessante notar pelo depoimento a seguir que a empresa muitas vezes não
tem conhecimento da necessidade de fazer horas extras. Muitas vezes, isso é
identificado pela própria funcionária para que seja possível cumprir as metas
estabelecidas. No entanto, o analisar a dimensão do tratamento pessoal, os relatos
indicam que a empresa respeita as possibilidades de cada funcionário ao
estabelecer suas metas.
[Saio] a hora que dá, não que a empresa exija não, ela não fala: tem que
ficar depois do horário, não, a gente faz se tiver necessidade, identifica a
necessidade. Com a companhia natural, com quem trabalha, com a
realização daquilo, com a meta, que a meta da empresa é mas tem suas
metas pessoais também, você quer ver a coisa feita, entendeu?. Você quer
aquilo lá resolvido, lá identifiquei o problema quero aquilo pronto se não
ficar mais um pouquinho não consigo. (BA9)
Esta contradição pode ser explicada pela internalização do controle, já citada
anteriormente, que faz com que o funcionário absorva a responsabilidade por estar
trabalhando horas a mais. Tomando as metas como pessoais, resolve-se a aparente
incoerência entre metas viáveis e realização de horas extras.
A questão de se adaptar ou não às mudanças impostas pela empresa podem
ser, conforme indicado por uma das entrevistadas, um tabu para determinados
funcionários. A mudança se torna uma entidade que pode prejudicar ativamente os
funcionários. Interessante notar que ela acredita que quando uma pessoa não está
mais preparada para aceitar uma mudança, isso pode significar que seu papel
dentro da empresa acabou, como se a contribuição dada por este funcionário tivesse
se esgotado.
Essas mudanças que as pessoas não se adaptam. Eu acho que as pessoas
não gostam de mudanças, não só aqui, em qualquer lugar. [...] Existem
200
pessoas que não gostam de mudanças. Eu já, sempre gostei de mudanças,
não gosto quando a coisa fica muito parada .É o que eu falo: pode ser que
um dia a mudança vá me dar uma rasteira, não é? Mas aí, talvez, eu esteja
preparada também. Que vamos dizer, a minha participação acabou, sinal
que talvez eu esteja preparada para ir pra outra coisa, e aqui não é mais
onde eu tenho que ficar. Então, pode ser que a mudança não venha a me
afetar porque eu fiquei, sei lá, acho que essa adaptação às mudanças acho
que me ajudou bastante, e o trabalho também, acredito que sim. (BP7)
Para que fosse possível inculcar nos funcionários o conceito de flexibilidade, a
empresa se encarregou de definir os novos parâmetros da dinâmica de trabalho
flexível. Como nem sempre ela teve esta característica, o investimento em
treinamento pode ter sido fundamental na transição da empresa pública rígida e
engessada para uma empresa que busca o alto desempenho e a
multifuncionalidade.
Uma nova visão que foi passada para os funcionários. Nós passamos oito
meses, no caso sendo palestrados, fazendo cursos, todos nós empenhados
nessa nova idéia que a gente transformou em atitude. E hoje nós
trabalhamos em equipe mesmo. (BP3)
Os próprios funcionários reconhecem que é difícil mudar uma situação que tem
sido ao estável por tanto tempo. Hoje, os funcionários vêem com naturalidade a
demanda de flexibilidade da empresa, mas isso nem sempre foi assim. Até porque,
esta naturalidade é falsa.
É tão difícil quando você tem um funcionário com 15, 20 anos [de empresa]
mudar a mentalidade. Porque quando era estatal você não vislumbrava um
crescimento, com a [empresa], com a privatização, com a [empresa estatal]
você não vislumbrava. Hoje você pode crescer, hoje você é um
coordenador, amanhã você pode ser um gestor, você pode ser um gerente,
você pode ser um líder. (BP3)
Uma das possíveis explicações para que a flexibilidade tenha sido tão bem
aceita entre os funcionários é o histórico de demissões da empresa depois da
privatização. Uma vez que fica entendido que a alternativa flexibilização é a
demissão, isso diminui o poder de barganha dos funcionários nos termos do contrato
psicológico (ROUSSEAU, 1995). Além disso, aceitar e atender à estas demandas da
empresa significa a possibilidade de abrir portas para promoções e crescimento
profissional.
201
Lealdade
A dimensão da lealdade busca entender o quanto os funcionários se sentem
obrigados a permanecer na empresa por um longo prazo.
A princípio, os depoimentos indicam que os funcionários buscam um
envolvimento de longo prazo com a empresa.
Meu papel, no meu ponto de vista, é, assim pretendo ficar na empresa até
que ela desejar. (BP1)
Eu quero continuar com a [empresa] enquanto eu puder. (BP7)
Um aspecto que pode ampliar o horizonte temporal da relação de trabalho
nesta empresa é o fato, já comentado, de os funcionários desenvolverem uma
relação afetiva com a empresa.
Na época eram dois [funcionários], [e] não tinham ainda a estrutura jurídica
que hoje nós temos, e faziam tudo, era muito estressante. Eu chegava e
falava assim nossa, não agüento, eu quero sair, vou embora, não agüento.
Até me doía porque você cria um vínculo com as pessoas que estão aqui,
você cria um vínculo com o teu serviço e quando você cria um vínculo com
a empresa que você trabalha [é difícil abandonar]. Eu sempre tive orgulho
de estar na [empresa estatal] trabalhando.” (BP3)
Também a identificação com a natureza da função realizada contribui para que
os funcionários sintam vontade de estabelecer um vínculo de longo prazo com a
empresa. O relato a seguir mostra que o entrevistado encontrou na empresa sua
realização profissional e que poderia permanecer lá até a aposentadoria por gostar
do trabalho que desenvolve..
Eu almejo estudar, estou fazendo esse curso agora, até com incentivo da
empresa, eu pretendo permanecer na empresa. Eu sou uma pessoa que eu
acho que escolhi certo, o que eu faço hoje, eu gosto do que eu faço. [...] E
eu quero, se puder, um dia ter a minha estabilidade e me aposentar aqui
dentro, eu com certeza, eu pretendo isso. (BP9)
No entanto, o relato de um funcionário mostra que nem todos estão
interessados nesta relação de longo prazo. Estão sim, mais voltados para o mercado
de trabalho e utilizam a empresa como mais um degrau em sua carreira profissional.
Isso pode acorrer principalmente em áreas que não estão ligadas ao core business
da empresa, onde as oportunidades de crescimento parecem ser mais limitadas.
202
A gente nota o seguinte: existem pessoas que estão aqui para esquentar
currículo; a gente nota isso. Tem pessoas que trabalham em determinadas
áreas e a gente nota que vêm aqui, aprende, detém conhecimento e
realmente sai porque, ou não se identifica com o trabalho, ou realmente
quer ter no seu currículo um período dentro de uma empresa estatal de
grande porte, médio pra grande porte, [...] e com isso, de repente, tentar
conseguir uma coisa financeiramente melhor no mercado. [...]Mas eu vou te
falar que a grande maioria com que eu tenho contato -eu tenho contato,
bastante, com o pessoal da área operacional, o pessoal intermediário e o
pessoal de nível engenharia, nível superior - e eu vou te falar que a grande
maioria pretende continuar na [empresa], se identifica com a [empresa].
(BP9)
Um aspecto trazido por um funcionário, sindicalista, é a perda da estabilidade
que havia sido conseguida na empresa. Por enxergar esta perda como um aspecto
negativo, pensa na possibilidade de deixar a empresa caso apareçam outras
oportunidades.
Eu gostaria de continuar trabalhando na empresa, apesar disso tudo é um
ramo que eu gosto, [...] a gente fez aqui uma grande amizade, [...] tem os
companheiros e tal, mas não descarto ter que sair. Entendo que isso é um
processo. Até como sindicalista eu acredito que o dia em que eu perder o
mandato pode ser que eu não fique. Pode ser que eu esteja avaliando
erradamente, mas isso é o que acontece com várias pessoas. De repente
se tiver uma outra proposta melhor, que seja interessante também, a gente
pode estar saindo. Mas hoje, por exemplo, eu não tenho assim uma coisa
concreta, eu acho que dá para a gente continuar trabalhando dentro da
empresa. (BA1)
Pode-se perceber que o funcionário espera que a empresa proveja
estabilidade, mas este comportamento pode não ser recíproco. Duas situações
podem explicar o comportamento: o primeiro é a consciência de que ele é a parte
mais fraca do acordo, o que o faz buscar novas possibilidades de barganha se
existem outras oportunidades, ele fica menos dependente da empresa e aumenta
seu poder. A segunda é a crença de que seu emprego estaria garantido apenas pela
estabilidade sindical, e sua perda o leva a considerar outras possibilidades.
O relato do sindicalista aponta para um das possíveis razões para que a
lealdade fosse mantida: a necessidade se sentir estável em seu meio de vida. Uma
outra presumível razão é a possibilidade de construir uma carreira na empresa. A
lealdade produzida pela segurança pura e simples é substituída por uma relação de
interesses mútuos e o funcionário demanda, em troca de sua dedicação, a entrega
203
de alguns acessórios que indiquem que a relação de longo prazo é interessante
também para ele próprio.
Assim, se alguns funcionários fazem esforço para conseguir atingir os padrões
da empresa e manterem seus empregos, outros lembram que a empresa também
deve, em troca, promover um ambiente que seja desafiador e que gere outras
oportunidades, dividindo, portanto, a responsabilidade do cumprimento das metas e
da manutenção da relação de trabalho.
Eu acho que essa parte de desenvolvimento pessoal, minha, com relação a
estudo, a desenvolvimento pessoal, acho que concordo com a [empresa] no
sentido de desenvolvimento de oportunidades. Mas, a partir do momento,
que não tiver mais oportunidades da [empresa] de entender que não estou
dentro do perfil que a empresa deseja eu tenho que estar preparado para o
mercado externo, fora da [empresa]. (BP8)
Mas se a [empresa] não me proporcionar isso, vai me doer muito, mas eu
vou ter que sair daqui e ver um outro âmbito. Mas eu acredito que ela possa
me proporcionar isso porque abre as portas para todos os funcionários
crescerem como profissionais e como pessoas. (BP3)
Apesar do segundo relato indicar que o entrevistado têm confiança na empresa
e nas oportunidades por ela viabilizadas, ele fala, claramente, que está disposto a
deixar a empresa em busca do que acredita ser mais importante no mercado:
chances de crescimento.
Admitindo a possibilidade de trocar de empresa, outro funcionário faz algumas
ressalvas acerca das condições necessárias para que essa troca se efetivasse.
É, mas teria que ser alguma coisa que eu gostasse muito. Se fosse uma
coisa mais ou menos conforme a empresa aqui, eu acho que não iria me
interessar muito não. Só se fosse assim uma coisa que me chamasse muita
atenção. Se não, não iria. (BA7)
Outro ainda, justifica a ausência de comprometimento de longo prazo pelo que
ele acredita que será a conduta da empresa se o funcionário não se mostrar mais
útil.
A partir do momento em que eu não der resultados eu não sirvo mais.
Tenho plena consciência disso. (BA5)
Analisando a obrigatoriedade que os funcionários se impõem em aceitar uma
transferência, não parece haver um consenso acerca do quanto os funcionários
204
devem aceitá-las ou não. Um dos entrevistados atrela a dificuldade de mobilidade ao
fato de a mudança não compensar financeiramente. Este motivo só está presente
nas entrevistas da base operacional porque os funcionários da média gerência
recebem apoio financeiro.
Mudar de cidade, existe um monte de inconvenientes nisso.[...] Vamos
supor, eu tenho casa própria em [localidade P], meus filhos estudam, fazem
faculdade em [localidade P], minha esposa trabalha em [localidade P], ai eu
sou transferido, seria um grande inconveniente pra mim [...].E isso adquire
também um custo muito maior. Por exemplo, você sai daqui de sua casa e
vai para outro município, tem que pagar aluguel, se seus filhos não for você
vai ter que estar sempre se deslocando para cá, já tem um custo, isso para
mim seria inviável pelo nível de salário que eu ganho seria inviável. (BP5)
No entanto um dos funcionários que optou por efetivar a mudança, mostrou-se
bastante satisfeito com os resultados. Isso pode indicar que ceder às demandas da
empresa pode ser uma boa forma de ser reconhecido e recompensado.
Mas eu casei, eu falei: essa minha vinda pra [localidade A] foi uma
mudança na minha vida radical. Eu recebi a notícia, [e] do prazo que eu
recebia a notícia do meu chefe e a minha vinda pra cá, foi menos de um
mês isso. Eu conheci minha atual esposa, minha vida mudou por completo
na época, assim, foi uma viravolta muito grande [...] pra melhor! (BA6)
A empresa, no final das contas, é reconhecida como um bom lugar para se
trabalhar, por ser um local onde os funcionários se sentem valorizados.
Eu acho que a empresa, assim, é uma empresa excelente para se trabalhar,
eu falei isso, inclusive, no último mapeamento, falei com a minha gestora:
não tenho nada a reclamar da [empresa] em questão salarial, benefícios.
Sempre pagou [...]. Mas, muito difícil, então, acho uma empresa excelente
para trabalhar e que a gente tem que realmente vestir a camisa da empresa
para poder estar ainda prosperando junto com a empresa, segurando a
oportunidade que a gente tem com unhas e dentes. (BP8)
Especialmente para a base operacional, que reconhece que sua
empregabilidade é baixa, quanto maior for o horizonte temporal da relação, mais
segurança os funcionários sentem em continuar na empresa.
205
Atitude aberta
A dimensão de atitude aberta trata do quanto os funcionários são claros e
expõem suas expectativas, necessidades e disponibilidades em sua relação de
trabalho. Analisar as possibilidades e as situações em que o funcionário manifesta
suas idéias, dúvidas, expectativas e demandas, é uma forma de acessar esta
dimensão.
Ainda que, na base operacional, poucos relatos tenham trazido indícios desta
dimensão, a análise deste fragmento de uma das entrevistas indica que o superior
direto neste caso, a média gerência é o principal responsável por facilitar esta
comunicação. Isto influencia diretamente esta dimensão ao assumirmos que o
funcionário da base operacional é a parte mais fraca na relação de trabalho e que
muitas vezes só se sente à vontade para expressar como se sente em relação à
empresa. O superior direto é, portanto, peça-chave no fluxo da comunicação bottom-
up.
Hoje eu sinto, hoje eu acho que um líder, ele está mais aberto, ele te
escuta. [...]. Você chega no teu chefe abertamente “olha tenho um problema
assim, assim, assim e assim, aconteceu isso, a gente precisa resolver”. A
gente se empenha, corre atrás, a gente às vezes usa meios, assim, de,
preposto e ir junto acompanhar vistoria em campo, de área judicial para
tentar resolver, a gente tenta abordar tudo da melhor forma para poder
resolver. (BP3).
Isto influencia diretamente esta dimensão ao assumirmos que o funcionário da
base operacional é a parte mais fraca na relação de trabalho e que muitas vezes só
se sente à vontade para expressar como se sente em relação à empresa. O superior
direto é, portanto, peça-chave no fluxo da comunicação bottom-up.
As idéias que surgem nestas interações podem tornar o trabalho da empresa
mais simples e mais efetivo. Quando o gestor proporciona um ambiente que seja
propício para esta interação, acaba obtendo resultados satisfatórios.
206
O que a gente tem que fazer, aonde tem que trabalhar é muito claro e às
vezes você tem certos padrões, predeterminados, de como trabalhar de
como fazer. Então a gente usa, justamente esses padrões e essas
tecnologias [...]. Mas a gente pede que as pessoas mostrem, e muitas vezes
surgem idéias de fazer [...] de uma forma mais barato, de uma forma mais
simples, menos burocrática.” (BP9)
O relato de uma funcionária aponta que essa importância pode resultar tanto
em resultados positivos quanto negativos, como no seu caso. Isso pode indicar a
falta de um mecanismo de comunicação formal que atinja efetivamente a base
operacional ou que responda às demandas dos funcionários.
Eu já sugeri. O meu chefe uma vez disse numa reunião que ia mudar, que ia
tirar esse telefone ou então pedir pra colocar uma mensagem quando o
cliente usar o telefone da [empresa] direto pra cá, ia entrar a mensagem do
0800. Só que isso, ficou só [na sugestão]. De vez em quando eu lembro,
mas isso caiu, cai sempre no esquecimento. (BA4)
Quando estes mecanismos não funcionam, os funcionários sentem que estão
falando sozinhos, o que pode gerar desânimo e diminuição do desejo de conversar
sobre suas demandas e seus planos para a empresa.
Outro aspecto que influencia na abertura que o funcionário tem ao explicitar
seus desejos e pensamentos é a própria característica pessoal do indivíduo.
Com o amadurecimento, eu continuo crítica, sempre sou crítica é uma coisa
da minha personalidade, não conseguiria não ser, estaria me violentado há
coisa que não concordo, mas aprendi como fazer a crítica, entendeu? Isso
também fez diferença, acho que por isso é que eu me mantenho até hoje,
porque eu tenho encontrado esse equilíbrio. (BA9)
Respeito pela autoridade
Esta dimensão analisa o quanto os empregados demonstram respeito pelas
autoridades dentro da organização.
No caso da empresa analisada, alguns movimentos foram realizados no sentido
de diminuir a formalidade na hierarquia, pois se identificou que o fluxo da
comunicação na empresa estava prejudicado pelo longo caminho que a informação
207
deveria percorrer. Uma das principais demandas da empresa a presteza do
atendimento ao cliente final ficava comprometida e interferia nos resultados.
Devido a essa questão de hierarquia, antes da [reestruturação], tínhamos
vários cargos de chefia. Então passava por um, passava por outro, e outro
não concordava com outro, [...] e isso demorava. Principalmente eu, que
também trabalhei com atendimento, [...], notava essa questão de hierarquia
muito na parte comercial. Então para [...] atender bem ao cliente demorava-
se muito[...]. [Porque]: tem que passar pela análise de fulano, fulano não
está, está em reunião não sei aonde”. Então aquilo ficava pendente para a
outra semana, de repente. E hoje eu não sei, não trabalho no atendimento,
mas pelo menos na parte jurídica que eu tenho um contato direto [...] a
gente tem uma autonomia. Em [localidade P], em cada pólo a gente tem
uma autonomia, e dependendo, se ultrapassar essa autonomia a gente tem
contato direto, com as pessoas que podem resolver. Então, na semana
passada, [...] tive contato direto com o gerente do atendimento [...] que
comanda todas as agencias, essa parte de ouvidoria, cartas ao cliente. Ele
me deu prontamente a resposta, coisa que antes não tinha, antes do [plano
de reestruturação]. (BP8)
A diminuição dos níveis hierárquicos parece ter tido um bom impacto nos
processos da empresa, dando mais autonomia aos funcionários e tornando o
atendimento ao cliente final mais ágil.
Autonomia. Autonomia, mudou bastante porque acho que vinha mudando a
liderança. Hoje nós temos mais autonomia para resolver um problema em
campo, que é meu caso. O cliente precisa de uma resposta rápida, ele não
pode ter um problema e ele passar por um funcionário meu e um funcionário
passar para mim, eu para meu superior e meu superior passar para outro.
Então, isso mudou, hoje eu tenho uma autonomia para resolver. (BP4)
Um fato que merece destaque na análise da desta dimensão é a política de
portas abertas praticada pelo presidente da empresa, conforme pode ser notado o
trecho da entrevista apresentado à seguir:
Esse presidente ele tem um relacionamento assim mais aberto, então você
se sente mais valorizado. (BA4)
Talvez o comportamento do presidente tenha influenciado o comportamento
dos diretores; de fato, o relato de uma das entrevistadas mostra uma relação de
bastante proximidade entre os diretores e a base operacional.
O impulso mais forte para eu estar fazendo administração foi dado por um
diretor, durante uma reunião aqui, coisa que não havia antigamente, os
diretores eram super distantes da gente, não se reportava ao diretor, e hoje
com essa mudança da [empresa], inclusive o nome [empresa] veio junto
com um conjunto de medidas. Não pense que é uma mudança de nome,
uma jogada de marketing, não, isso vem acompanhado de uma série de
medidas positivas, objetivas inclusive, tentando melhorar a empresa. (BA9)
208
Esta proximidade pode, também, estar ligada com a atuação do RH que,
segundo um dos entrevistados, tem realizado um trabalho de treinamento para as
lideranças.
O RH hoje está mostrando que você tem que exercer uma liderança com
autoridade e não com poder, ou seja, você tem que conquistar as pessoas
naturalmente, entender as necessidades delas e elas se virem a servir com
uma relação harmoniosa, e não de poder de você impor as coisas. (BP9)
No entanto, para os funcionários, o fato de ter tido a possibilidade de conhecer
o presidente da empresa para o qual trabalham parece ter sido a ação de maior
impacto.
O que me marcou foi a relação das pessoas. Por exemplo, eu consegui
chegar e conhecer um diretor, um diretor da empresa. Eu conheci o
presidente da minha empresa, eu apertei a mão dele numa premiação que a
gente teve aqui em que eu fui premiada no final do ano passado. (BA2)
209
Contratos Psicológicos: média gerência versus base
operacional
O mapeamento dos contratos psicológicos dos dois níveis da empresa tornou
visível dois contratos psicológicos que diferem entre si em aspectos essenciais.
O principal deles é o fato de que a média gerência apresenta um contrato
psicológico mais homogêneo, o que não é verdade para a base operacional.
210
Compromissos da empresa
Da Perspectiva da Média gerência Da Perspectiva da Base operacional
Envolvimento
de longo
prazo
Horizonte temporal de longo prazo, com
crescimento baseado na meritocracia;
Baixa expectativa de turnover e de demissões;
Compromisso com a retenção de talentos;
Longo prazo subordinado ao comprometimento;
Os gerentes percebem que este compromisso de
longo prazo é menos extensivo à base e aos
terceirizados;
Plano de carreira como expressão do
compromisso de longo prazo.
Longo prazo evidenciado pelo plano de carreira, mas
com maior ênfase nas contrapartidas esperadas pela
empresa;
o Temor pela manutenção do contrato,
o Pouca estabilidade,
o Baixa empregabilidade.
Tentativa de estabilizar o contrato atendendo a
determinadas demandas da empresa. A falta de clareza
das metas leva ao investimento em desenvolvimento
pessoal;
Investimento nos jovens;
Percepção da valorização do auto-desenvolvimento e
aparente contradição com a percepção da diminuição do
investimento em treinamento.
Clareza dos
termos do
acordo
Plano de reestruturação como marco da
mudança da empresa em direção a tornar os
aspectos do contrato mais claros;
Mapa de carreira como instrumento de
esclarecimento dos termos do acordo;
Líderes como contract makers e filtros das
informação;
Mais acesso às informações, logo, maior clareza
do contrato que a base operacional.
Distinção entre o período pós-privatização com pouca
clareza dos termos e o período pós-reestruturação com
maior compromisso acerca da transparência do contrato.
Aumento do controle sobre as carreiras com o plano de
carreiras;
o Questionamento da clareza dos critérios de
promoção.
Falta de conhecimento dos termos do acordo devido à
confidencialidade estratégica de determinados assuntos
Tratamento
pessoal
Preocupação da empresa em reconhecer pública
e periodicamente o desempenho de seus
funcionários com promoções e simbolicamente;
Gerentes reproduzem o tratamento dado pela
alta administração aos funcionários, ajudando a
criar rituais de reconhecimento na empresa;
Percepção de que a empresa busca metas, mas
que caso os funcionários não as alcancem, pode
Reconhecimento do empenho pela liderança;
o aumento da responsabilidade
Recompensa pelo esforço individual;
Apoio nas questões não relacionadas como o trabalho;
Metas viáveis;
Uma característica peculiar: o reconhecimento público
pela alta administração;
Apoio ao auto-desenvolvimento;
211
reconhecer o esforço envolvido para atingi-las;
Possibilidade de arranjos para atender
demandas individuais em geral dependendo da
legitimação do superior;
Implementação de canais alternativos de
comunicação ouvidoria.
Alta administração como exemplo para os gerentes;
Criação da ouvidoria;
Respeito ao horário de trabalho.
Cuidado
Confiança no cumprimento dos termos do
acordo;
Comprometimento com compensações futuras
em caso de quebra do acordo.
Divisão em dois momentos:
o privatização falha no recrutamento e
constantes mudanças na direção
o reestruturação implementação do
planejamento estratégico e mais confiança
nos termos do acordo;
Permanência do contrato às custas da resignação dos
funcionários;
Aceitação do discurso da multifuncionalidade como
renegociação do contrato.
Tratamento
equânime
Políticas globais versus flexibilidade individual
os que merecem ou inspiram confiança conseguem
mais flexibilidade e tratamentos diferenciados
(meritocracia);
Centralidade do papel da gerência na dimensão;
Diferenciação de funcionários por:
o Áreas de atuação operacional x apoio ao
negócio;
o Área geográfica sede x demais
localidades;
o Diretorias financeira x operacional x furto
de energia
Diferenciação de funcionários:
o Áreas de atuação operacional x administrativo;
o Área geográfica sede x demais localidades;
o Diretorias financeira x operacional x furto de
energia;
o Funcionários mais jovens x mais antigos.
Funcionários recebem incentivos iguais, mas obtêm
resultados diferentes;
Oportunidades teoricamente baseadas em meritocracia;
Papel central do gerente;
Contradição entre a clareza dos termos do acordo e os
critérios de promoção.
212
O compromisso da empresa em manter uma relação de longo prazo parece
existir para os dois níveis, e a manutenção do contrato se baseia na meritocracia
para os dois casos. No entanto, enquanto a média gerência tem maior sensação de
segurança com expectativas baixas de turnover, a base operacional sente que tem
menor estabilidade e se considera privilegiada por trabalhar na empresa. Isto diminui
o poder de barganha destes funcionários quando se trata de realizar negociações
que envolvem os termos de seus contratos psicológicos.
A média gerência entende que em troca da relação de longo prazo, a empresa
deseja comprometimento com as metas estabelecidas e que para que o funcionário
alcance crescimento na empresa ele precisa se aperfeiçoar. Como para a base
operacional, o discurso é o mesmo, mas as metas não são claramente
estabelecidas, estes funcionários se apegam à questão do auto-desenvolvimento
como forma de mostrar interesse por permanecer na empresa, chegando ao ponto
de alguns funcionários realizarem cursos de extensão e de especialização que não
serão aproveitados ou que não desejam, apenas para demonstrar que gostariam de
manter sua relação de trabalho.
Enquanto a média gerência percebe que há esforço da empresa em reter os
talentos, a base operacional, notadamente a de eletrotécnicos cuja formação é
apenas de técnico pós ensino médio, percebe que seu espaço na empresa vem
diminuindo ao longo do tempo, até porque entendem que a empresa não pretende
manter esta categoria. Rumores de que este nível poderia ser terceirizado geram o
temor de serem desligados. Um dos indícios de que isso pode estar acontecendo,
conforme análise das entrevistas realizadas, é a diminuição do investimento em
treinamento, percebido pela base operacional, mas não pela média gerência.
213
A média gerência, inclusive, percebe que o compromisso de longo prazo se
aplica muito mais aos gerentes funcionários especializados do que à base
operacional e aos terceirizados.
A exceção percebida pela base operacional está no investimento realizado nos
funcionários mais jovens, o que pode significar uma renovação deste nível. Esta
seria uma forma de fazer com que a nova cultura desejada pela diretoria seja mais
facilmente impressa na base operacional, sem que sejam necessários maiores
esforços por parte da empresa. A baixa especialização exigida pelos cargos em
questão tornam os funcionários mais facilmente substituíveis. Como o esforço de
contratação de novos funcionários muitas vezes é menor que o esforço de
adaptação dos antigos às mudanças da empresa, este nível se torna especialmente
suscetível à este tipo de “reestruturação”.
No que diz respeito à clareza dos termos do acordo, a média gerência vê na
reestruturação o marco na orientação para a transparência da relação de trabalho. A
base operacional, que concorda que os termos do contrato ficaram mais claros, no
entanto, apresenta alguma confusão ao estabelecer em que momento essa isso se
deu se na privatização ou na reestruturação o que pode significar que neste
nível, apesar da percepção de que a empresa realmente adotou políticas que
pretendem diminuir a dubiedade da relação de trabalho, essas políticas tiveram
menor impacto.
Uma das razões para que isso ocorra é a própria utilização dos mapas de
carreira. Os dois níveis reconhecem que este instrumento deu maior tangibilidade ao
contrato e possibilitou que os funcionários tenham mais controle sobre suas
carreiras. No entanto, isso parece ser mais aplicável à média gerência do que à base
operacional, que ainda relata falta de clareza nos critérios de promoção. Este nível
214
parece perceber que apesar das políticas oficiais da empresa, ele ainda está
subordinado às políticas internas e ao poder discriminatório da média gerência.
Outro fator que diferencia os dois níveis é a proximidade natural da média
gerência com os criadores das políticas oficiais. Esse nível tem menos filtros de
informação e está menos propenso a receber informações inexatas. Além disso,
pode ter mais informações estratégicas do que a base operacional, aumentando a
distância entre os dois níveis.
Quanto ao tratamento pessoal, a média gerência e a base operacional relatam
que a empresa está preocupada em reconhecer o desempenho de seus
funcionários. No caso da média gerência o reconhecimento pode se dar de forma
simbólica, mas acontece principalmente pelas promoções. Já no caso da base
operacional, uma característica muito própria é a necessidade de reconhecimento
público. Essa diferença pode se apoiar na distância da base operacional das esferas
decisórias da empresa. Ainda que percebendo a diminuição desta, como foi possível
observar durante a análise das dimensões, o pouco esclarecimento acerca dos
critérios de promoção faz com que os funcionários se sintam compelidos a “mostrar
serviço” para que possam ser promovidos. Assim, estes funcionários acreditam que,
para que tenham possibilidade de crescimento dentro da empresa, é preciso que
seus sucessos cheguem à alta administração. Para estes funcionários, inclusive o
aumento da responsabilidade, mesmo sem a promoção de cargo, significa um
reconhecimento da liderança. Isto sugere a percepção de que não existe clareza nos
termos do acordo quanto aos critérios de promoção e pode ainda, demonstrar que
há um resquício da cultura herdada da empresa pública ainda na reestruturação.
A cultura do reconhecimento parece ser mais forte na base operacional, já que
neste nível existe uma grande valorização da ritualização alimentada pela empresa
215
nas premiações de pessoas que tiveram o desempenho acima da média. Este nível
acredita que o gerente direto está sendo influenciado pela alta direção para que
reconheça seus funcionários. O relato da média gerência confirma isso, já que além
de perceberem que a empresa tem esta preocupação com seu corpo gerencial, os
encoraja para também reproduzir este comportamento com suas equipes.
Uma questão importante é do que vale mais, se a meta ou o esforço envolvido
para atingir a meta. No caso da média gerência, não há acordo sobre o que é mais
importante. Na base operacional, esta questão sequer figura nos relatos colhidos, já
que os funcionários acreditam que todas as metas estabelecidas são viáveis. Isso
iria de encontro ao investimento em horas extras realizados por estes funcionários,
como veremos mais a frente. No entanto este estado de coisas pode ser resultado
de metas mal estabelecidas ou mal comunicadas para este nível.
A questão do esclarecimento das metas pode explicar o elevado número de
relatos que indicam o incentivo ao auto-desenvolvimento como uma questão de
tratamento pessoal. Se os funcionários entendem que o discurso da empresa é de
que o plano de carreira, aliado ao auto-desenvolvimento são a chave para o sucesso
e que o plano de carreira não está suficientemente esclarecido para eles, logo resta
o auto-desenvolvimento como forma de alcançar uma promoção. Se a empresa
facilita este processo significa que ela está tendo consideração com aquele
funcionário. No caso da média gerência, como as metas são melhor estabelecidas,
esta preocupação não aparece.
Os dois níveis reconhecem o esforço da empresa em apoiar questões não
relacionadas com o trabalho - demandas individuais - e entendem que isto está
diretamente relacionado com a legitimação de cada superior. Assim, é papel do
216
gerente direto indicar quando o funcionário merece ou não indulto para chegar mais
tarde ou sair mais cedo do trabalho, bem como julgar o mérito da situação.
Nos caso dos dois níveis, o papel do superior é importante na análise do
tratamento pessoal, já não existe muito controle em relação a isso e, para estas
questões, o superior acaba sendo a figura que mais representa a empresa. Assim,
ambos relataram a importância da criação da ouvidoria não só porque ela representa
o interesse da empresa em ouvir a opinião de seus funcionários, mas também
porque representa um canal direto de comunicação que diminui o impacto do papel
da gerência.
O respeito ao horário de trabalho aparece, para a base operacional, como um
ponto importante no tratamento pessoal. A ausência desta questão entre os
funcionários da média gerência pode ser em função da sensação de que devem a
empresa maiores esforços por terem tido a oportunidade de assumir um cargo de
liderança.
A questão do cuidado aparece de forma tranqüila no relatos da média gerência.
Os funcionários acreditam que os termos do acordo serão cumpridos e, do contrário,
haverá uma compensação que estará à contento. Para a base operacional esta
questão ainda é muito nebulosa. Em primeiro lugar porque nos relatos que
representam esta dimensão, ainda existem muitas situações da empresa antes do
plano de reestruturação, o que pode significar que “a nova empresa” pode não ter a
mesma adesão conseguida com os elementos da média gerência.
Ainda que existam relatos que indiquem o aumento da estabilidade do contrato,
outros mostram que a conformidade com os termos do contrato e sua suposta
estabilidade se baseia na incapacidade ou mais, na impossibilidade dos funcionários
para renegociar os termos do contrato, já que são ou se sentem a parte mais
217
fraca do acordo numa empresa com um grande histórico de demissões. Este
“incomodo” aparece, inclusive, na aceitação de um dos principais discursos da
empresa, que é o da multifuncionalidade. A adesão é, assim, a única alternativa para
manter seu contrato de trabalho.
Quanto à equanimidade do tratamento dispensado aos funcionários, a média
gerência percebe que a meritocracia instaurada faz com que sejam necessária
adaptações às políticas globais da empresa, de forma que seja possível atender às
demandas individuais dos funcionários. Mas ainda assim, a empresa garante
tratamento igualmente diferenciado para seus funcionários.
Porém, tanto a média gerência quanto a base operacional sentem que existem
diferenciações baseadas na área de atuação, nas áreas geográficas e nas diretorias.
Um aspecto novo, surgido nas entrevistas da base operacional é a diferenciação
entre os funcionários mais antigos e os mais jovens. De acordo com os relatos, estes
teriam mais oportunidades de carreira do que aqueles, corroborando a idéia da
valorização dos funcionários mais jovens quando tratada a dimensão do horizonte
temporal da relação. Como já dito anteriormente, essa valorização pode se justificar
no fato de que talvez estes funcionários entendam e se encaixem melhor no novo
contrato psicológico desejado pela empresa. Assim, muitas vezes os funcionários
mais jovens são discriminados não pela empresa, mas por seus próprios pares.
Outro desdobramento é a percepção de que apesar de haver incentivos iguais
para o desenvolvimento pessoal já que, entre outras coisas, os descontos em
faculdades, e os arranjos facilitados para a realização de cursos são válidos para
todos os funcionários a empresa tem preferência por funcionários mais jovens
quando precisa realmente investir em alguém.
218
Para a base operacional, as oportunidades que são, teoricamente,
meritocráticas podem ser influenciadas por fatores que estão fora do alcance e do
conhecimento dos funcionários. Teoricamente porque neste nível há um
questionamento do tratamento diferenciado, talvez em função da falta de clareza de
alguns termos do acordo.
A centralidade do papel do gestor se aplica para o caso de ambos os níveis e
este fator perpassa todas as outras dimensões estudadas, conforme discussão a ser
realizada na conclusão.
219
Compromissos do funcionário
Da Perspectiva da Média gerência Da Perspectiva da Base Operacional
Lealdade
Relação de longo prazo como
contrapartida pelo investimento realizado
pela empresa;
Em oposição, quando comparada com a
estatal, percebe-se a diminuição das
perspectivas de longo prazo em função do
aumento de incertezas especialmente após
a privatização;
Funcionários mais jovens tendem a ter
menos compromisso com o longo prazo, em
função do próprio contexto sócio-econômico
em que foram contratados;
Possibilidade de perda dos funcionários
treinados dentro da empresa para o
mercado;
Percepção de que existem funcionários
essenciais técnicos especializados- e
funcionários que podem ser substituídos
áreas de apoio;
Longo prazo em função da diretoria em
que atua;
Aceitação das transferências geográficas;
Reconhecimento dos esforços de
retenção de talentos por parte da empresa.
Envolvimento de longo prazo baseado na relação
afetiva e na identificação com a empresa;
Menor sensação de obrigação em aceitar
transferências do que entre os funcionários da média
gerência;
Possibilidade de utilização da empresa como um
degrau;
Compartilhamento da responsabilidade sobre a
manutenção do contrato: a empresa também é
responsável por manter os funcionários interessados no
trabalho realizado;
Reconhecimento de que a empresa é um bom lugar
para se trabalhar, logo a mudança de empresa deve ser
muito ponderada;
Reconhecimento de que a empresa não garante a
estabilidade, se comparada com a estatal insegurança
leva a falta de compromisso com a lealdade.
Atitude
aberta
Papel central do gestor como facilitador;
Plano de carreira tangibilizando
expectativas e desejos acerca da carreira do
profissional;
Papel central do gestor como facilitador;
Falta de resposta às demandas dos funcionários pode
gerar o sentimento de desânimo;
220
Possibilidade de expressão representa
valorização do funcionário.
Características pessoais.
Investimento
pessoal
Disponibilidade em realizar tarefas
“extras” no horário. Fora dos limites do setor,
ela é desejada mas não efetivada:
o Falta de mão-de-obra,
o Sobrecarga de trabalho,
o Excessiva fragmentação da empresa.
Atenção para os negócios da empresa
fora do horário e local de trabalho em função
da visibilidade dos serviços prestados pela
empresa;
Normalidade na realização de horas
extras;
Funcionários de determinadas áreas se
vêem mais dedicados do que os de outras;
Investimento pessoal como contrapartida
ao envolvimento de longo prazo
proporcionado pela empresa;
Comprometimento com a inovação;
Crescimento pessoal aliado à vontade
institucional de desenvolver talentos;
O auto-desenvolvimento deve ser
iniciativa dos próprios funcionários.
Disponibilidade de trabalhar mais tempo, mas não em
outros setores;
Compromisso social com o cliente;
Alocação do tempo pessoal em favor da empresa;
Atenção à imagem e às questões da empresa fora do
trabalho;
Oportunidade de crescimento mútuo;
Entende a inovação como comprometimento, mas o
que é “ser criativo”?;
Necessidade de investimento no auto-desenvolvimento
para a manutenção do emprego;
Percepção de que o auto-desenvolvimento leva ao
sucesso;
Investimento pessoal realizado em contrapartida à
oportunidade recebida;
Terceirizados influenciam os contratos da base
operacional.
Flexibilidade
Mudança dos termos sem necessidade de
renegociação e sem sensação de violação
de contrato;
Valorização da orientação para mudança;
Alta direção tem crédito para realização
de mudanças que julgue essenciais;
Excesso de mudanças pode gerar
Valorização da capacidade de adaptação;
Tolerância à mudanças em termos de tarefas e
amplitude das mesmas;
Reconhecimento do desejo da empresa por
funcionários multifuncionais;
Aumento da disponibilidade em função das políticas da
empresa;
221
sentimento de fracasso e resistência à
mudança;
Disponibilidade para lidar com o
imprevisível;
Áreas diferentes apresentam ritmos de
mudança diferentes.
Apesar de julgarem que as metas são viáveis, existe a
necessidade de realização de horas extras, podendo
indicar uma internalização do controle;
A mudança como uma instituição;
A naturalidade com que a flexibilidade é visa pode ser
um indicador de que os funcionários entendem que ela é a
alternativa à demissão.
Respeito
pela
autoridade
Ainda existe um distanciamento nas
relações, mesmo com as políticas para
diminuí-lo;
Gestores como principal atores;
Imposição da autoridade em certos casos;
Clareza na aplicação de sanções
disciplinares;
Equilíbrio entre informalidade e
formalidade, propiciando um bom ambiente
de trabalho.
Diminuição da formalidade;
Aumento da autonomia e conseqüente aumento da
agilidade dos serviços;
Influência direta da diretoria na base operacional;
Treinamento das chefias para que possam exercer o
papel de líderes de forma a favorecer o bom fluxo
processual da empresa.
222
No caso da dimensão que trata da lealdade dos funcionários, tanto a média
gerência quanto a base operacional dizem enxergar uma relação de longo prazo
com a empresa. Uma diferença é que esta relação, no primeiro caso, está baseada
na contrapartida do funcionário que reconhece o investimento realizado pela
empresa. No segundo caso, ela parece estar mais ligada à relação afetiva com a
empresa e à identificação dos funcionários com o trabalho realizado. Além disso, os
funcionários da base operacional reconhecem que a empresa é um bom lugar para
se trabalhar e que sua empregabilidade fora dela é baixa.
Algumas nuances podem ser percebidas neste compromisso de longo prazo
quando se trata da média gerência. Apesar demonstrar que pretende permanecer na
empresa por um longo tempo e que deseja retribuir à ela o que foi neles investido,
mesmo com os esforços de retenção de talentos, os funcionários mais jovens
parecem ter menos comprometimento com o horizonte temporal da relação. Isto
pode ser uma característica dos profissionais que se inseriram no mercado num
momento em que seguir carreira numa mesma empresa não só não é desejado
como pode também ser prejudicial para sua imagem. Para os funcionários mais
antigos, o momento seguinte à privatização, quando muitos foram demitidos, pode
ter gerado um certo grau de incerteza. Ainda assim, nos dois casos, isso pode ter
significado uma mudança de visão que ajudou a construir a meritocracia na
empresa, acabando com o paternalismo vigente na época da estatal. Isso diminuiu a
percepção do compromisso de longo prazo com a empresa sem esgotá-lo.
Outra nuance encontrada nas análises é entre os funcionários que trabalham
no core business da empresa. Os funcionários ligados diretamente à operação são
considerados essenciais e eles entendem que a empresa espera poder conta com
esses funcionários no longo prazo. Para os funcionários das áreas de apoio, esse
223
compromisso pode não ser o mesmo, já que são considerados substituíveis e
trabalhar na empresa não representa a mesma possibilidade de alavancar sua
carreira.
A percepção de que alguns funcionários são mais importantes que os outros
pode existir porque apesar de estar recuperando seu status no mercado e os
funcionários terem cada vez mais orgulho em trabalhar na empresa, isso é muito
significativo para os funcionários considerados essenciais para sua operação,
enquanto que para os funcionários que trabalham na área de apoio, os atrativos não
são os mesmo. Se, por exemplo, o funcionário pretende fazer carreira em marketing,
é melhor estar numa empresa de telecomunicações do que numa empresa de
distribuição de energia elétrica.
O investimento realizado no funcionário essencial como parte dos esforços da
retenção de talentos pode acabar sendo usado contra a própria empresa, que pode
estar preparando funcionários para o mercado de trabalho. Especialmente porque se
os funcionários não perceberem que estão sendo trazidos novos desafios, pode ser
que estejam dispostos a buscá-los no mercado.
No caso da base operacional, a lealdade não parece ser o ponto forte dos
funcionários. A estabilidade ainda menor do que a do corpo gerencial faz com que
os funcionários estejam dispostos a deixar a empresa se conseguirem trabalhar em
uma empresa que ofereça maior estabilidade. Isto se torna especialmente
significativo, já que estes percebem que sua estabilidade na empresa é pequena,
visto que seus cargos não são altamente especializados e, para os funcionários
operacionais, existe ainda a crença de que a empresa pretende terceirizar este nível.
224
No entanto, em função dos benefícios por ela proporcionados e pela baixa
empregabilidade dos funcionários deste nível, deixar a empresa é uma atitude que
deverá ser muito ponderada.
Estas decisões estariam subordinadas às condições do mercado de trabalho
local, pois a empresa atua em diferentes municípios.
Em determinadas localidades, a percepção de que o mercado é mais dinâmico
faz com que alguns funcionários cheguem a cogitar buscar outras vagas, fazendo da
atual empresa um degrau caso ela não se comprometa também com a manutenção
de seus contratos, provendo maiores desafios e possibilidades de crescimento. Isso
indica a exigência de uma contrapartida pela lealdade, apesar de aparentemente
estarem na base operacional os funcionários com menor poder de barganha no
contrato psicológico. Já nas localidades onde não existem muitas opções, os
funcionários mostram menor disponibilidade para buscar outras empresas.
No que diz respeito às transferências geográficas, a média gerência se sente
mais compelida a aceitar, talvez porque, em geral, elas estejam ligadas à uma
promoção e devem ser mais constantes. Além disso, a base operacional entende
que os atrativos para que estes aceitem estas transferências não são tão bons
quanto os atrativos para a média gerência. Isto faz sentido porque em geral neste
nível estão funcionários considerados menos ou nada estratégicos.
No caso da média gerência é preciso ainda considerar as transferências
funcionais. Assim, apesar de serem percebidas como uma oportunidade de
crescimento na empresa, quando elas acontecem de um setor que tem mais status
para um setor de menor visibilidade, elas podem ser consideradas uma punição. No
entanto, dependendo de onde este funcionário se encontra, ele se sente obrigado a
aceitá-la, enquanto que em determinados setores, este funcionário poderá ignorar a
225
tendência da multifuncionalidade e construir sua carreira em um único campo. Isto
pode se dar porque o campo é tecnicamente restrito ou porque certas partes da
empresa funcionam com maior autonomia.
Quanto à atitude aberta dos funcionários, os dois níveis concordam que o papel
da gerência é fundamental para concretizar uma comunicação bottom-up. Além
disso, o compromisso com a expressão de suas expectativas é desejável na relação
porque os dois níveis entendem que quando a empresa se preocupa em ouvir as
opiniões e desejos, ela esta, também, valorizando o funcionário.
No entanto, enquanto a média gerência não encontra problemas e usa o plano
de carreira para expor suas expectativas, a base operacional se sente desanimada
porque não vê respostas negativas nem positivas - para suas demandas, dando a
impressão de que elas caíram no esquecimento. Especialmente porque o plano de
carreira não parece representar para este nível o mesmo mundo de possibilidades
que representa para os gerentes.
Outro aspecto não levantado pela média gerência que aparece na base
operacional são as características pessoais de cada um dos funcionários.
Na questão do investimento pessoal, para a média gerência, esta parece ser a
contrapartida para o envolvimento de longo prazo e o compromisso de carreira
dentro da empresa. Já para a base operacional, o investimento pessoal pode
representar a contrapartida pela oportunidade recebida que muitas vezes significa
apenas a oportunidade de permanecer na empresa. Este diferença pode ser
explicada pela diferença de especialização que os cargos exigem e a conseqüente
empregabilidade de cada um dos níveis. Assumindo que quanto mais especializado,
maior a empregabilidade de um funcionários, a média gerência entende que pode
mudar de empresa caso não haja progressos significativos na empresa atual,
226
enquanto que a base operacional não vê alternativas de emprego e se satisfaz em
permanecer na empresa.
Os dois níveis parecem ter disponibilidade para realizar tarefas fora do seu
horário, mas não fora do seu setor. A média gerência justifica este fato pela falta de
funcionários, pela sobrecarga de trabalho e pela excessiva fragmentação da
empresa, que faz com que os setores fiquem muito distantes uns dos outros em
termos de processos. .No nível gerencial, uma possível explicação se deve à forma
como são avaliados, ou seja, tendo por base metas específicas de sua área.
Despender esforço e recursos para atender a demanda de outro departamento pode
significar incorrer em custos que pouco acrescem os seus índices de desempenho.
Portanto, o esforço extra tem normalmente relação com sua tarefa mas deixa de
contemplar possíveis necessidades de outras áreas. A exceção parece se aplicar -
para os dois níveis - na realização de tarefas emergentes ligadas ao trabalho de
campo. Especialmente no caso da base operacional, o compromisso parece ser não
com a empresa, mas com o cliente. Muitas vezes, esses funcionários têm contato
direto com a população e com suas necessidades, já que se trata de uma empresa
que provê um produto visto como gênero de primeira necessidade e se sentem no
dever de terminar um determinado trabalho para atender às necessidades de um
cliente. Além disso, muitas vezes os funcionários moram no mesmo local servido
pela empresa. Eles se tornam assim, seus porta-vozes junto à comunidade. E uma
vez que o envolvimento afetivo destes funcionários com a empresa é grande, eles
ficam contrariados quando sua imagem é degradada pelos clientes insatisfeitos.
Em termos de alocação do tempo pessoal em favor da empresa, cada um dos
níveis o realiza por diferentes motivos. No caso da média gerência, ele é visto com
uma certa naturalidade e, quem sabe, um certo glamour de gerente que precisa
227
atender às muitas demandas. Além disso, existe a crença, neste nível, de que se
trata de uma situação transitória a ser resolvida pelas políticas da empresa.. No caso
da base operacional, este tipo de atitude está relacionado com o temor de que a
falta de dedicação integral à empresa pode ser negativo para a carreira do
funcionário.
Assim, os dois níveis também parecem estar de acordo no que diz respeito à
atenção à imagem da empresa fora do espaço formal de trabalho. Para a média
gerência, em função da visibilidade dos serviços da empresa, é preciso ter muito
cuidado com a imagem que se quer passar para os clientes. Alguns setores se
preocupam especialmente com isto porque seus resultados podem ser visto nas
ruas diariamente como no caso do furto de energia elétrica. No caso da base
operacional, isto pode estar relacionado com o afeto desenvolvido entre empresa e
funcionário. Em ambos os casos isto pode ser uma resposta ao esforço da empresa
em envolvê-los mais nas questões que cercam a satisfação em trabalhar na
empresa. Antes, as pessoas se sentiam mal em fazer parte dela, fosse por causa do
serviço prestado ou por sua natureza. A percepção dos funcionários acerca desta
questão vem mudando e eles percebem que agora os serviços são melhores e se
sentem mais felizes por fazer parte desta empresa.
O comprometimento com a inovação é também compartilhado por ambos os
níveis. No entanto, a base operacional parece ter dificuldades em entender o que é
um comportamento criativo na avaliação da empresa. Isso poder ser conseqüência
do gestor como contract maker ou seja, cada gestor tem uma opinião diferente e
pode ser fruto da falta de clareza destas conceitos na comunicação para a base
operacional.
228
Quanto ao auto-desenvolvimento, a base operacional acredita que ele pode
levar ao sucesso, mas sua preocupação maior é com a manutenção de seu contrato
de trabalho. No entanto, a deficiência no estabelecimento de metas para esse nível,
pode fazer com que os funcionários se apeguem à outra ponta do discurso: a do
auto-desenvolvimento. Entretanto, para estes funcionários, a empresa deve auxiliar
neste empreendimento. Já para a média gerência, o auto-desenvolvimento deve ser
iniciativa dos próprios funcionários. Isto indica uma forte internalização do controle
atingida pela empresa nos contratos psicológicos deste nível gerencial. Por outro
lado, pode indicar também que os funcionários da base operacional ainda não
conseguiram se livrar completamente do paternalismo da época anterior à
privatização.
Alguns discursos apontam, tanto na base quanto na gerência, que existe a
visão de que o investimento pessoal gera, efetivamente, um crescimento mútuo
entre os partícipes do acordo. A idéia de que quando o empregado cresce, a
empresa cresce também e vice-versa se aproxima muito mais de um contrato
psicológico transacional do que do contrato relacional típico das empresas públicas
do período anterior à abertura dos mercados. (ROUSSEAU, 1995)
No caso da flexibilidade, os dois níveis reconhecem a valorização da orientação
para a mudança/adaptação. Isto pode se dever em parte ao discurso gerencial
amplamente divulgado (BOLTANSKI e CHIAPELLO, 2002) atualmente. Assim, esta
não seria uma questão específica da empresa, mas do contexto geral.
Na média gerência, muito crédito foi concedido à alta gerência para realizar as
mudanças necessárias em concordância com a dimensão de clareza dos termos
do acordo e existe uma grande disponibilidade para lidar com situações
imprevistas. No entanto, o excesso de mudanças pode ter gerado uma insatisfação e
229
até uma certa resistência às novas mudanças implementadas. Isto porque quando
os funcionários passam por um esforço muito grande e não conseguem perceber
que atingiram seu objetivo, pode-se gerar descontentamento e desmotivação
(BALOGUN e HAYLEI, 2004).
Já na base operacional a mudança aparenta estar fora do controle dos
funcionários e eles acabam enxergando-a como uma possível ameaça. As
mudanças para este nível ocorreram não só no escopo da tarefa, mas também em
sua amplitude, requerendo, na opinião dos entrevistados, maior tolerância.
Apesar de reconhecerem que a empresa buscou auxiliar na adaptação dos
funcionários aos novos termos do acordo, o discurso da flexibilidade amplamente
divulgado e repetido parece ainda não ter uma grande adesão.
Interessante notar que os funcionários da base operacional precisam fazer hora
extra mesmo declarando que as metas estipuladas foram exeqüíveis. Será que isso
demonstra que os próprios funcionários aceitam metas mais agressivas porque
contam que poderão trabalhar em regime de horas extras? É fácil perceber nessa
contradição a internalização do controle, outra vez, como uma forma de fazer com
que os funcionários se sintam obrigados a realizar tarefas que vão muito além de
suas responsabilidades. A naturalidade com que é tratada apesar de ter sido
mencionado anteriormente que este nível valoriza o respeito aos horários de
trabalho pode apontar para um problema ainda maior: a falta de poder de
negociação que faz com que o funcionário tenha que escolher entre aceitar a carga
de trabalho excessiva ou demitir-se.
Em termos de respeito pela autoridade, é interessante notar que enquanto a
média gerência ainda enxerga muito distanciamento nas relações hierárquicas, a
base operacional, muito pelo contrário, entende que houve uma diminuição na
230
formalidade que favoreceu o ritmo de trabalho. Isso pode ter se dado porque a
distância entre a alta direção e a base operacional era muito maior, devido aos
diversos níveis da empresa que foram eliminados com a reestruturação. No entanto,
como a média gerência já tinha uma proximidade maior com a alta direção, o
impacto destas ações não foram tão significativos.
231
CONCLUSÕES
Apesar deste estudo não se pretender conclusivo para as questões
relacionadas ao contrato psicológico, uma vez que reconhece não só a abrangência
do tema mas também sua complexidade, algumas considerações finais se fazem
necessárias.
A primeira, e mais importante, é que o contrato psicológico é dinâmico e sofre
constantes micro-alterações ao longo do tempo. Estas alterações acabam resultando
em mudanças nos contratos normativos, conforme elas começam a ser
compartilhadas pelos funcionários de uma empresa. Além disso, a complexidade na
qual está inserido o contrato psicológico, faz com que considerar todas as variáveis
que influenciam seu desenvolvimento seja uma tarefa de difícil realização.
Comparar os contratos psicológicos é, ainda, complicado e laborioso, porque é
preciso conhecer sua formação e seu desenvolvimento. Mesmo características que
se assemelham quando olhadas superficialmente, adquirem significados muito
específicos ao analisarmos sua história.
A empresa como um todo, tem especificidades que a tornam um difícil campo
de pesquisa. Um delas é sua dispersão geográfica. Apesar de estar presente em
apenas um estado brasileiro, cada filial, em cada região onde a empresa atua,
representa um microcosmo único que só pode ser entendido se estudado em seu
próprio contexto social, econômico e cultural. Apesar deste trabalho de pesquisa
tentar mapear o contrato psicológico de um nível completo por investigação de
localidades reduzidas devido à limitação de tempo e desenho do próprio estudo, o
mapeamento do contrato psicológico por região geográfica poderia ter revelado uma
foto um pouco diferente do que o que foi realizado. Ele também poderia ter dado
232
conta de envolver um maior número de funcionários, aumentando a abrangência do
trabalho de pesquisa realizado.
No caso da empresa estudada, o papel do gestor direto foi um dos aspectos
encontrados de maior importância. O nível imediatamente acima de cada um dos
dois níveis é responsável pela formação do contrato psicológico de seus
subordinados. No caso da média gerência, o contato se dá diretamente com a alta
administração. Já no caso da base operacional, entender o contrato proposto pela
direção da empresa e difundi-lo é papel da média gerência. Assim, eles são os
multiplicadores do contrato, mas ao mesmo tempo, estão tendo seus próprios
contratos alterados e passando por um período de ressignificação do seu papel na
empresa. A proximidade com a direção faz com que introjetem mais rapidamente o
novo contrato psicológico, mas sua propagação passa por filtros, incluindo o filtro de
sua personalidade e trajetória, que explicam suas respostas aos diferentes estímulos
e geram diferentes resultados para a base operacional.
Isto pode gerar uma percepção de violação de contrato quando os funcionários
de diferentes áreas ou localidades recebem diferente tratamento, dependendo do
gestor responsável. Principalmente com a difusão da idéia da meritocracia e do
aumento da autonomia dos gestores, muitas vezes a base operacional percebe que
não existem políticas estabelecidas sobre determinados assuntos.
Assim, a impressão de que a “nova empresa” teve mais adesão entre a média
gerência do que a base operacional se deve não só ao momento em que as
entrevistas foram realizadas, como também à proximidade deste nível com a
direção. A esta proximidade pode-se atribuir a maior homogeneidade deste nível.
No caso particular na média gerência, foi solicitado que os funcionários
falassem sobre seus contratos e a seguir, sobre os contratos de seus subordinados.
233
No entanto, estas perspectivas podem se confundir ao longo das entrevistas, já que
estes funcionários desempenham diariamente os dois papéis. Coube assim, à
pesquisadora o trabalho de garantir o rigor das análises das entrevistas em questão.
Diferente da análise do contrato psicológico da média gerência, a análise
realizada com a base operacional não conseguiu identificar a existência de contrato
uniforme vigente. A base operacional é mais heterogênea e talvez por isso, boa
parte tenha entrado no projeto com mais cautela. Para a base operacional, o
discurso da carreira e do auto-desenvolvimento parece não ter o mesmo apelo que
tem para a gerência. Este nível parecer ter outras prioridades, e a principal é a
segurança. É a estabilidade no emprego que faz com que as pessoas se adaptem
às novas regras da empresa e repitam o discurso da diretoria. Ele está sujeito não
só à insegurança própria de sua posição e de sua pouca especialização, mas
também às idiossincrasias da média gerência, o nível imediatamente superior ao
seu. Isso aumenta ainda mais a sensação de distância e as incertezas com relação
às políticas da empresa. Mesmo com a implementação da ouvidoria, percebe-se que
ainda existe receio, por parte dos funcionários, de que a liderança possa interferir no
curso de suas carreiras.
Conforme dito anteriormente, a preocupação da base operacional é a
manutenção de seu contrato.
É possível notar que os funcionários desta empresa têm muito cuidado ao
comentar fatos que lhes desagradem, sem que eles tomem tom de denúncia e sem
se comprometerem muito com o que está sendo dito, fazendo constante uso do
recurso de se referir à fala de outrem. Assim, apesar de reconhecerem o problema, o
funcionário não sai da empresa e nem faz retaliações. Isto pode ser um indicativo de
que eles realmente acreditam que estão passando por uma fase de renegociação de
234
contratos psicológicos e que a situação, apesar de apresentar inadequações, é
transitória.
No caso da base operacional, isso pode ilustrar a crítica de Janssens et al.
(2003) à temporariedade do contrato desbalanceado proposto por Shore e Barksdale
(1998), já que estes empregados não vislumbram possibilidade de realmente
negociar os termos de seu contrato e nem de trocar de empregador. A empresa,
sabendo-se a melhor opção, pode inclusive utilizar-se disto para dominar as
negociações dos termos do contrato psicológico.
Na base operacional foi possível entrevistar pessoas que atuavam em
diferentes áreas, com maior e menor contato com terceirizados e com diferentes
condições de trabalho, gerando diferentes percepções acerca de seus contratos. O
grupo apresentava aspirantes à gerente e diretores sindicais, com diferentes
histórias de vida e diferentes percepções da empresa. A história de vida de cada um
influencia e ajuda a moldar o contrato de cada um deles.
Um aspecto a ser considerado é a heterogeneidade deste grupo de
entrevistados. Como os cargos não são estratégicos, muitos funcionários não foram
substituídos depois da reestruturação, tendo o grupo mantido pessoas com mais de
15 anos de empresa e adicionado, ainda, pessoas contratadas após a
reestruturação. A tendência é que estes grupos apresentem contratos psicológicos
bem diferentes, ou, ao menos, diferentes percepções acerca deste.
Outro aspecto interessante deste estudo é notar o poder de previsibilidade
gerado pelos contratos psicológicos (ROUSSEAU, 1995). Para os funcionários desta
empresa, ele torna claro não só o que é esperado pela empresa como, ainda mais,
faz com que as pessoas internalizem o controle, não sendo necessária supervisão
para que façam não apenas seu trabalho, mas o que julgam ser sua parte no
235
contrato psicológico. Horas extras, realização de cursos nos horários que deveriam
ser direcionados para o lazer e o descanso entre outras atividades dos funcionários,
indicam que estes funcionários inconscientemente, podem ter adotado práticas de
autocontrole.
A internalização do controle pode ser decorrência de um contrato psicológico
bem estabelecido. O funcionário, por ser em geral a parte mais fraca do contrato,
passa a ter um compromisso pessoal com o resultado como resposta ao
investimento por ela realizado, mesmo quando o funcionário percebe que isto está
fora de seu alcance. E sofre, portanto as conseqüências do não cumprimento de sua
parte do contrato.
Parte da internalização deste controle pode ter se dado pela introjeção das
políticas da empresa. Mas outro fator pode ter influenciado ainda mais e de forma
mais objetiva: o discurso gerencial do chamado terceiro espírito do capitalismo
(BOLTANSKI e CHIAPELLO, 2002). Entre outras coisas, estes autores cunharam
este termo para explicar uma lógica de trabalho que obedece à uma lógica de
projetos. Assim, a carreira dos funcionários é substituída por uma sucessão de
projetos onde o sucesso obtido em um viabiliza a realização de outros, cada vez
mais interessantes do ponto de vista do crescimento profissional. Isso pode explicar
a percepção de que o empregado que recebe mais tarefas se percebe como tendo
sido promovido. A empregabilidade é, portanto, a capacidade da qual as pessoas
devem estar dotadas para que se possa contar com elas para novos projetos, e o
crescimento profissional se evidencia pela mobilidade da pessoa de um projeto a
outro, mesmo que estes projetos estejam contidos dentro da mesma empresa.
Assim, a gestão da empregabilidade é de responsabilidade de cada indivíduo.
236
O mapa de carreira é um instrumento que coloca, literalmente, nas mãos dos
funcionários a responsabilidade por suas próprias conquistas. E apesar de ser
percebido como um instrumento que tangibiliza a relação de longo prazo proposta
pela empresa, ele pode também representar a justificativa para que um determinado
funcionário não permaneça na empresa, de acordo com a gestão que ele mesmo
faz. Até porque, a promessa de que o oferecimento de oportunidades só depende do
auto-desenvolvimento dos funcionários, não se sustenta a longo prazo. Nesse caso,
a seleção natural poderá atuar já nem todos os funcionários tem o mesmo
interesse em crescer dentro da empresa e o impacto da corrida pela promoção
pode ser diminuído por este efeito. Mas ainda assim, muita insatisfação pode ser
gerada ao se perceber que este compromisso pode não ser honrado para toda a
empresa. Principalmente porque já existe uma percepção de que o compromisso de
longo prazo e de carreira não é igualmente extensivo à todos os funcionários.
Da mesma forma, quando se fala em critérios de promoção, para a média
gerência eles são muito claros. No entanto, para a base operacional esta idéia está
ainda um pouco difusa e os funcionários percebem que ainda é necessário que a
empresa aprenda mais com sua própria experiência para que o plano seja mais
satisfatório.
Neste contexto, negar a flexibilidade como um dogma é negar sua
empregabilidade e se declarar inadequado e inapto para a permanência na
empresa. Talvez por isso, o discurso da multifuncionalidade tenha sido tão
rapidamente absorvido mas sua prática seja considerada ainda incipiente,
principalmente pelos funcionários da média gerência. Estes funcionários tem, de
forma geral, mais possibilidades de realmente barganharem os termos de seus
237
contratos psicológicos e, consequentemente, se sentem mais à vontade para relatar
as limitações desta tentativa de tornar a empresa mais integrada.
No entanto, a diretoria parece já ter entendido o papel do reconhecimento
pessoal para os funcionários especialmente a base operacional e investe
fortemente seu tempo e seus recursos para, por meio de premiações e rituais, fazer
entender que se espera cada vez mais flexibilidade por parte dos funcionários. O
reconhecimento concedido pelo esforço dos funcionários, faz com que a troca seja
entendida como justa.
Estes se tornam fatos ainda mais peculiares porque se trata de uma empresa
onde as pessoas estiveram, por muito tempo, expostas à um tipo de organização
onde a segurança e a estabilidade no trabalho eram consideradas regras. A
adaptação destes funcionários não só a uma nova empresa mas também a uma
nova lógica, pode ser mais complexa do que se faz parecer ao ouvirmos os
entrevistados relatarem com tamanha naturalidade suas novas demandas, como se
fossem parte pacífica de uma renegociação de termos de seu contrato psicológico.
Este estudo também indica, bem como outros já realizados (CONWAY E
BRINER 2005), que existe a possibilidade de alguns termos do acordo firmados no
contrato psicológico, podendo corresponder diretamente a outros, especificamente.
Assim, conforme existem evidências de que os funcionários da média gerência desta
empresa sentem que devem comprometimento em troca das oportunidades de
carreira por elas proporcionadas, outras conexões poderão surgir em estudos mais
aprofundados. Assim, entender como se dá a intrincada rede de trocas entre uma
promessa percebida da empresa e um compromisso dos funcionários pode ajudar a
construir um contrato psicológico mais sólido e com maiores garantias de
cumprimento para ambas as partes.
238
Dessa forma, retornar à literatura pode ajudar a entender os sentidos das
trocas. Capelli (1999) aponta como possíveis conseqüências da quebra do contrato
de longo prazo o colapso na moral dos funcionários e seu impacto no desempenho
da empresa. Talvez porque os funcionários possam perceber que são cada vez mais
exigidos do que contemplados, já que a empresa pode os manter em seu quadro
apenas pelo período que lhe for conveniente. No geral, as empresas costumam
oferecer uma maior recompensa pelo desempenho da organização sem
compromisso de longo prazo com seus funcionários, mas estes percebem que parte
do risco da empresa acaba transferida para eles. Assim, ao imaginar estar
recompensando o funcionário e, consequentemente, mudando os termos e as trocas
estabelecidas pelo contrato psicológico, corre-se o risco de violar seu contrato de
forma definitiva.
Quando os funcionários não tem possibilidades de firmar novos acordos com a
empresa ou ainda, de procurarem novos empregadores, tendem a repetir a cartilha
da diretoria, sem no entanto, necessariamente, se comprometerem efetivamente
com as práticas adotadas.
Os funcionários mais jovens que fazem parte da base operacional parecem
desejar um contrato psicológico mais próximo ao contrato da média gerência, talvez
por uma característica própria das pessoas que ingressaram no mercado de trabalho
a partir de meados da década de 90, quando a lógica da empresa estatal já era
considerada ultrapassada para o contexto geral e não especificamente o desta
empresa. No entanto, ainda não se pode considerar que isso se aplique e pode
explicar a insatisfação de alguns funcionários com a relação estabelecida por eles
com a empresa. Muitos sentem que a empresa não cumpre a promessa de lhes
proporcionar o desafio que esperavam. Assim, sua seqüência profissional fica
239
comprometida, comprometendo também suas possibilidades de crescimento
profissional, já que eles não conseguem aumentar suas capacitações que os levarão
A novas empreitadas. Este fator pode sugerir que existe um campo para uma
pesquisa acerca das expectativas dos funcionários, com uma estratificação por
idade, ao invés de níveis operacionais.
Um estudo longitudinal poderia ajudar a entender melhor suas dialética e suas
negociações e a comparar os dois níveis estudados. Neste trabalho, foram
necessárias ressalvas da abrangência do período analisado, limitação esta que não
se aplicaria no caso de um estudo longitudinal mais aprofundado.
240
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244
Anexos
ANEXO A PERFIL DOS FUNCIONÁRIOS DA BASE OPERACIONAL
BA1
Sexo: Masculino
Idade: 39 anos
Situação familiar: Solteiro, sem filhos
Cargo: Manutenção
Tempo de empresa: 15 anos
Formação: Técnico
Entrada na empresa: Trabalhou como terceirizado de 88 à 90 e foi efetivado na
ocasião da abertura de uma nova planta da empresa.
O funcionário é diretor sindicato desde 1992.
BA2
Sexo: feminino
Idade: 33 anos
Situação familiar: Solteira, sem filhos
Cargo: Técnica
Tempo de empresa: 5 anos
Formação: 3º grau completo
Entrada na empresa: Processo seletivo
Apesar de ter nível superior, a funcionária trabalha numa função que exige
apenas segundo grau. Ela mostra grande ressentimento com a empresa por conta
da falta de reconhecimento e oportunidades.
BA3
Sexo: masculino
Idade: 23 anos
Situação familiar: Solteiro, sem filhos
Cargo: Analista de perdas
Tempo de empresa: 2 anos
Formação: Técnico cursando faculdade
Entrada na empresa: Foi estagiário na empresa, terceirizado e em seguida
efetivado.
Este funcionário é responsável por uma equipe de terceirizados. Por ser muito
jovem e já assumir um cargo com maior responsabilidade, seus depoimentos têm
uma ênfase muito grande nas oportunidades de desenvolvimento que a empresa
fornece, especialmente com os cursos e treinamentos.
245
BA4
Sexo: feminino
Idade: 39
Situação familiar: Separada, duas filhas
Cargo: Técnico
Tempo de empresa: 17 anos
Formação: 3º grau completo
Entrada na empresa: Foi estagiária na empresa no período de 1984 à 1988,
quando foi efetivada, tendo passado também por várias empresas terceirizadas.
BA5
Sexo: masculino
Idade: 50 anos
Situação familiar: Divorciado, 1 filha
Cargo: Não informado
Tempo de empresa: 28 anos
Formação: Engenheiro elétrico, pós-graduado
Entrada na empresa: Entrou para a empresa como engenheiro em 1977.
Este entrevistado leciona num curso técnico.
BA6
Sexo: masculino
Idade: 30 anos
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: Engenheiro
Tempo de empresa: 5 anos
Formação: 3º grau completo
Entrada na empresa: Foi estagiário, sendo efetivado em seguida
O funcionário atua como representante local da empresa junto aos órgãos
públicos, como um gerente local. Como este “cargo” é informal e não representa
uma promoção, este empregado sente que perdeu oportunidade de crescimento na
empresa e parece bastante envolvido com a nova visão da empresa.
BA7
Sexo: feminino
Idade: 39 anos
Situação familiar: Casada, 1 filho
Cargo: Preposto
Tempo de empresa: 17 anos
Formação: 3º grau completo
Entrada na empresa: Entrou como estagiária e foi efetivada em seguida
BA8
Sexo: masculino
246
Idade: 42
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: Eletrotécnico
Tempo de empresa: 17 anos
Formação: Técnico
Entrada na empresa: Após um ano trabalhando como terceirizado, prestou
concurso e foi efetivado pela empresa
Trabalha no campo, lidando diretamente com o cliente
BA9
Sexo: feminino
Idade: 37 anos
Situação familiar: Casada, 2 filhas
Cargo: Técnica em eletrotécnica
Tempo de empresa: 17 anos
Formação: Técnica cursando faculdade
Entrada na empresa: entrou como terceirizada indicada por uma irmã que era
funcionária e foi efetivada depois de três meses.
BP1
Sexo: masculino
Idade: 32 anos
Situação familiar: Casado, sem filhos
Cargo: Executivo de Contas
Tempo de empresa: 8 anos
Formação: cursando Instituto Politécnico em Transmissão e distribuição de
energia elétrica.
Entrada na empresa: fez estágio na empresa em 1992, teve dois contratos
como terceirizado e foi efetivado pela empresa depois da privatização, em 1997.
O pai de P4 foi funcionário da empresa por 31 anos. Seu irmão também é
funcionário da mesma empresa.
BP2
Sexo: masculino
Idade: 45 anos
Situação familiar: Casado, três filhos
Cargo: Técnico em Eletrotécnica
Tempo de empresa: 17 anos
Formação: Técnico cursando um segundo curso técnico
Entrada na empresa: á trabalhava como terceirizado para a empresa e foi
aprovado em uma das seleções para efetivar terceiros.
Há três anos assumiu a liderança de uma equipe de funcionários terceirizados.
A opção por cursar um segundo nível técnico veio da percepção de que o novo
modelo de empresa requer que o funcionário se atualize constantemente. No
247
entanto, este funcionário não percebe benefícios em cursar a faculdade, já que
faltam poucos anos para a sua aposentadoria e ele não se propõe a investir nesse
tipo de educação
BP3
Sexo: feminino
Idade: 21 anos
Situação familiar:
Cargo: Assistente jurídico
Tempo de empresa: 1 ano
Formação: cursando o 3º grau
Entrada na empresa: Foi estagiária por uma ano, sendo efetivada em seguida
Pelo tempo de empresa da funcionária, a entrevista apresenta muitos dados
posteriores ao Plano de Reestruturação. Existe a percepção de que seu contrato
psicológico esteja mais próximo do firmado depois da definição dos novos rumos da
empresa.
BP4
Sexo: masculino
Idade: 24 anos
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: Analista de inspeção
Tempo de empresa: 2 anos
Formação: Cursando Instituto Politécnico
Entrada na empresa: entrou como terceirizado e após três meses, foi efetivado
Apesar do pouco tempo na empresa, o funcionário já foi promovido três vezes.
BP5
Sexo: masculino
Idade: 50 anos
Situação familiar: casado, 2 filhos
Cargo: Técnico de manutenção
Tempo de empresa: 17 anos
Formação: Técnico
Entrada na empresa: Foi terceirizado por três meses e efetivado em 1988
O entrevistado trabalha no campo. Apesar de ter muito tempo na empresa, ele
parece ter uma visão positiva das mudanças mais recentes, já que mudanças
anteriores não pareciam atingir os funcionários que estavam trabalhando na ponta. É
diretor sindical.
BP6
Sexo: masculino
Idade: 26 anos
248
Situação familiar: Casado, 2 filhos
Cargo: Eletro técnico
Tempo de empresa: 7 anos
Formação: Técnico cursando Instituto Politécnico
Entrada na empresa: Entrou como estagiário em 1996 e após 2 anos foi
efetivado na empresa.
Tem um irmão e o pai trabalhando na empresa. Apesar de ter vivenciado as
diversas mudanças da empresa desde a privatização, parece confiar num futuro
promissor dentro da empresa.
BP7
Sexo: feminino
Idade: 42 anos
Situação familiar: Casada, 1 filha
Cargo: Técnica
Tempo de empresa: 23 anos
Formação: Cursando o 3º grau
Entrada na empresa: Entrou por concurso, quando a empresa ainda era uma
estatal
A funcionária tem buscado se atualizar, cursando uma faculdade, porque
entende que a empresa parece procurar funcionários cada vez mais capacitados
para seus quadros, mesmo estando próxima da aposentadoria.
BP8
Sexo: masculino
Idade: 40 anos
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: Técnico
Tempo de empresa: 10 anos
Formação: Eletrotécnico
Entrada na empresa: Entrou na empresa durante o período de estatal
O funcionário faz parte do quadro de diretores sindicais da empresa.
BP9
Sexo: masculino
Idade: 30 anos
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: líder de pólo
Tempo de empresa: 5 anos
Formação: 3º grau completo
Entrada na empresa: Entrou na empresa em 1998, como estagiário e foi
efetivado 2 anos depois
È o representante local da empresa. O “cargo” é informal.
249
ANEXO B PERFIL DOS FUNCIONÁRIOS DA MÉDIA GERÊNCIA
MG1
Sexo: Masculino
Idade: 36 anos
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: gerente de relacionamento com cliente
Formação: engenheiro eletricista, com MBA executivo
MG2
Sexo: Masculino
Idade: 31 anos
Situação familiar: Casado, sem filhos
Cargo: Engenheiro eletricista
Formação: Líder de projeto integral
MG3
Sexo: Masculino
Idade: 35 anos
Situação familiar: Solteiro
Cargo: Gerente de projeto integral
Formação: Engenheiro de produção
MG4
Sexo: Masculino
Idade: 34 anos
Situação familiar: Casado, 2 filhos
Cargo: Líder de projeto integral
Formação: Engenheiro eletricista
MG5
Sexo: Feminino
Idade: 31 anos
Situação familiar: Casada, 1 filho
Cargo: Líder de processo da unidade de negócio
Formação: Advogada
MG6
Sexo: Masculino
Idade: 32 anos
Situação familiar: Casado, sem filhos
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro elétrico
MG7
Sexo: Masculino
Idade: 40 anos
Situação familiar: Casado, 2 filhos
250
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro eletricista
MG8
Sexo: Masculino
Idade: 47 anos
Situação familiar: Casado, 3 filhos
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro eletricista
MG9
Sexo: Masculino
Idade: não informado
Situação familiar: Casado, dois filhos
Cargo: Gerente de atendimento comercial
Formação: Administrador de empresa
MG10
Sexo: Masculino
Idade: 41 anos
Situação familiar: casado, dois filhos
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro eletricista
MG11
Sexo: Masculino
Idade: não informado
Situação familiar: Casado, 3 filhos
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro eletricista
MG12
Sexo: Masculino
Idade: 44 anos
Situação familiar: Casado, dois filhos
Cargo: Gerente de operação
Formação: Engenheiro mecânico
MG13
Sexo: Masculino
Idade: 32 anos
Situação familiar: Casado
Cargo: Líder de normalização
Formação: Engenheiro eletricista
MG14
Sexo: Masculino
Idade: 48 anos
Situação familiar: Solteiro
Cargo: Gerente financeiro
251
Formação: Economista
MG15
Sexo: Feminino
Idade: 33anos
Situação familiar: Solteira
Cargo: Gerente de normalização
Formação: Economista
MG16
Sexo: Masculino
Idade: 31 anos
Situação familiar: Casado, 1 filha
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro eletricista
MG17
Sexo: Feminino
Idade: 43 anos
Situação familiar: Casada, 3 filhos
Cargo: Líder de gestão de pessoas
Formação: Psicóloga
MG18
Sexo: Masculino
Idade: 32 anos
Situação familiar: Casado, 1 filho
Cargo: Gerente de manutenção e obras
Formação: Engenheiro de produção
MG19
Sexo: Masculino
Idade: 34 anos
Situação familiar: Casado,sem filhos
Cargo: Líder de processo
Formação: Engenheiro eletricista
MG20
Sexo: Masculino
Idade: 32 anos
Situação familiar: Casado, sem filhos
Cargo: Líder de pólo operacional
Formação: Engenheiro eletricista
MG21
Sexo: Masculino
Idade: 29 anos
Situação familiar: Casado, uma filha
Cargo: Líder de normalização
Formação: Engenheiro de produção
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