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COMPORTAMENTO SÓCIO-ESPACIAL DE PESSOAS EM
MOVIMENTO: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO NO
CALÇADÃO DA AVENIDA ENGENHEIRO ROBERTO
FREIRE, NATAL-RN.
Orientadora: Profa Dra Gleice Elali
Aluna mestranda: Lis Barros Vilaça
Natal, março de 2008.
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Comportamento sócio-espacial de pessoas em movimento:
um estudo exploratório no calçadão da Avenida
Engenheiro Roberto Freire, Natal-RN.
Dissertação apresentada por Lis
Barros Vilaça, ao Programa de Pós-
graduação em Psicologia da
Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, em cumprimento às
exigências de defesa.
ii
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“Um passo à frente, e você já não está mais no mesmo lugar”
(Chico Science, 1996)
iii
Dedicatória
Dedico esse trabalho aos usuários do calçadão da Avenida Engenheiro Roberto Freire e
às pessoas que se locomovem pelas ruas dando vida às cidades. Além disso, também
dedico esse trabalho aos seres corajosos que habitam o terreno pantanoso da Psicologia
Ambiental. Corajosos, pois acreditam ser possível fazer pesquisa no Brasil e, ainda por
cima, em áreas interdisciplinares.
iv
Agradecimentos
Brindo à casa
(Universidade Federal do Rio Grande do Norte
e ao Conselho Nacional de Pesquisa e Qualidade)
Brindo à vida
(Deus)
Meus amores
(Minha orientadora Dra. Gleice Elali,
ao chefe do Grupo Estudos Inter-Ações Pessoa-Ambiente
Dr. José Pinheiro e meus demais amigos)
Minha família.
(Letra da música Mar de Gente. O Rappa, 2003)
v
6
Sumário
Lista de Siglas ________________________________________________________ 9
Lista de figuras e tabelas ______________________________________________ 10
Resumo_____________________________________________________________ 13
Abstract ____________________________________________________________ 14
A pré-trajetória: descrevendo antigos caminhos ___________________________ 15
O ponto de partida ___________________________________________________ 16
A trajetória _________________________________________________________ 19
1. Primeiros passos: o espaço extra-muros________________________________ 21
1.1. A calçada no cotidiano da rua ______________________________________ 21
1.2. A calçada: múltiplos olhares________________________________________ 23
1.3. O espaço urbano dos sentidos_______________________________________ 24
1.4. O espaço público e suas dualidades __________________________________ 25
1.5. Calçadão: uma calçada diferente ____________________________________ 27
2. Mosaico de pedras portuguesas_______________________________________ 33
2.1. Psicologia Ambiental e espaço urbano________________________________ 33
2.2. A Psicologia Ecológica de Barker____________________________________ 36
2.3. Comportamento sócio-espacial humano ______________________________ 38
2.3.1 Espaço Pessoal __________________________________________________ 39
2.3.2 Territorialidade _________________________________________________ 40
2.3.3 Privacidade_____________________________________________________ 41
2.3.4 Aglomeração____________________________________________________ 43
2.4 Percepção Ambiental ______________________________________________ 44
2.5 Mobilidade ______________________________________________________ 48
3. O calçadão ________________________________________________________ 53
3.1 O nascimento_____________________________________________________ 53
3.2 Delimitações______________________________________________________ 55
3.3 O entorno________________________________________________________ 56
3.4 Os componentes físicos _____________________________________________ 57
4. Percurso metodológico ______________________________________________ 62
4.1. Observação empírica e construção de diário de campo __________________ 63
4.2 Documentação fotográfica __________________________________________ 64
7
4.3 Análise de Behavior Setting _________________________________________ 64
4.4 Estrevista com os usuários __________________________________________ 66
4.4.1 O desafio da categorização ________________________________________ 66
4.4.2. Elaboração do roteiro de entrevista ________________________________ 67
4.4.3 Perguntando ao usuário___________________________________________ 69
5. Vários ritmos: apreciação dos resultados_______________________________ 72
5.1 Observando a realidade ____________________________________________ 72
5.2 Analisando Behavior settings no local _________________________________ 73
5.2.1 Delimitação de sinomorfos: buscando as similaridades _________________ 74
5.2.2 De sinomorfos a behavior settings __________________________________ 75
5.2.3 Formulação de perguntas a serem respondidas a partir do viés teórico ___ 76
5.2.4 Estudo das interdependências (Buscando BSs) _______________________ 79
5.2.5 Delimitação na quantidade de atividades/categorias ___________________ 88
5.2.6 Verificação de genótipos ambientais ________________________________ 89
5.3 Ouvindo os usuários: apresentação dos dados e discussões preliminares ____ 90
5.3.1 Perfil dos usuários entrevistados ___________________________________ 92
5.3.2 O que pensam sobre o CAERF_____________________________________ 94
5.3.3 Opções de uso ___________________________________________________ 96
5.3.4 Percebendo as demais atividades __________________________________ 101
5.3.5 Usuário sozinho versus usuário acompanhado _______________________ 105
5.3.6 Disputa pelo espaço: ciclistas e pedestres ___________________________ 107
5.3.7 Percebendo modificações no CAERF_______________________________ 108
5.3.8 Acessos, percursos e estratégias de locomoção _______________________ 109
5.3.9 A atenção______________________________________________________ 114
5.3.10 Vantagens e desvantagens no uso do CAERF _______________________ 118
5.3.11 Usuários sugerem alterações para o CAERF _______________________ 122
5.3.12 Motivação ____________________________________________________ 123
6. Enxergando o referencial teórico no objeto de estudo____________________ 125
6.1 Quem são, de onde vêm e o que pensam ______________________________ 125
6.2 Coleguismo de minuto: mobilidade gerando parcerias ao longo do tempo __ 128
6.3 Sentir-se seguro: a mobilidade como segurança _______________________ 129
6.4 Sozinho, acompanhado e a percepção nas/das diferentes velocidades______ 130
6.5 O balé e a previsão de comportamentos ______________________________ 133
8
6.6 As alterações promovidas pela mobilidade____________________________ 136
6.7 Bicicletas, cães, paradas de ônibus e estresse ambiental_________________ 140
6.8 Considerações sobre conceitos do CSEH no estado de mobilidade ________ 143
6.9 Behavior setting e mobilidade_______________________________________ 148
Considerações finais: a cotidianidade do movimento ______________________ 151
Linha de chegada ___________________________________________________ 153
Apêndice___________________________________________________________ 157
Bibliografia ________________________________________________________ 182
9
Lista de Siglas
BOPE = Batalhão de Operações Policiais e Especiais
BS = Behavior Setting
CAERF = Calçadão da Avenida Engenheiro Roberto Freire
CPFEM = Companhia de Polícia Feminina.
CSEH = Comportamento Sócio-Espacial Humano
MuSA = Morfologia e usos da Arquitetura
PPGAU = Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo
PPGPSI = Programa de Pós-graduação em Psicologia
RN = Rio Grande do Norte
ROCAM = Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas
UFRN = Universidade Federal do Rio Grande do Norte
10
Lista de Figuras e Tabelas
Figuras:
1 - Calçadão em Villach (Áustria), p.29
2 - Calçadão em Viena (Áustria), p. 29
3 - Calçadão na cidade de Nice (França), p.29
4 - Calçadão em Lisboa (Portugal), p.29
5 - Calçadão em Barcelona (Espanha), p. 29
6 - Calçadão da rua XV Novembro, Curitiba-PR, p.30
7 - Calçadão no Vale do Anhangabaú, São Paulo-SP, p.30
8 - Calçadão da Av. Boa Viagem, Recife-PE, p.31
9 - Calçadão de Copacabana, Rio de Janeiro-RJ, p.31
10 - Calçadão da Praia dos Artistas, Natal-RN, p. 31
11 - Calçadão e ciclovia da Via Costeira, Natal-RN, p. 31
12 - Calçadão do Bosque dos Namorados, Parque das Dunas, Natal-RN, p.32
13 - Calçadão da Av. Engenheiro Roberto Freire, Natal-RN, p. 32
14 - Diagrama de integração temática do comportamento sócio-espacial humano, p. 42
15 - Estrada de Ponta Negra (1995), p. 53
16 - Av. Eng. Roberto Freire após a construção do calçadão, p. 53
17 - Localização do CAERF, p. 54
18 - Mapa de localização do CAERF, p. 55
19 - Mapa com localização das duas fases do CAERF, p. 56
20 - Mapa de uso do solo do entorno do CAERF, p. 57
21 - Abrigo de ônibus em frente à uma pizzaria, p. 59
22 - Exemplar de bancos do calçadão, p.59
23 - Exemplar de placa e lixeira do calçadão, p.60
24 - Rampa com sinalização para portadores de condições especiais de locomoção, p. 60
25 - Vista geral do CAERF, p. 61
26 - Esquema de percurso multimetodológico escolhido, p. 63
27 - Categorias representativas do CAERF, viés observacional, p. 73
28 - Principais sinomorfos no CAERF, p. 74
29 - Behavior settings advindos dos sinomorfos observados no CAERF, p. 88
30 - Categorias pelo viés teórico, p. 90
31 - Quadro numérico de entrevistas por categoria, p. 91
11
32 - Sensações dos respondentes sobre o CAERF, p.95
33 - Uso dos bancos para ginástica e vendedor de coco, p. 103
34 - Passarela no CAERF, p.111
35 - Aglomeração nas paradas, p.113
36 - Vantagens no uso do CAERF, p.119
37 - Proximidade com o Parque das Dunas e local de encontro, p.119
38 - Desvantagens no uso do CAERF, p.121
39 - Desvantagens citadas pelos usuários, p.121
40 - Affordance: alongamento nos bancos e no poste, p. 123
41 - Esquema do foco de atenção (concentrado na atividade), p 137
42 - Esquema do foco de atenção (disperso), p. 138
43 - Ausência de ciclovia gera disputas, p. 141
44 - Usos polêmicos no CAERF, p.142
45 - Mecanismo de manutenção do setting, p. 149
12
Tabelas:
1 - Descrição dos sinomorfos experimentias, com variação do tipo de atividade, p. 77
2 - Comparação de sinomorfos, p. 79
3 - Comparativo de sinomorfos de “utilização dos bancos” do CAERF, p. 80
4 - Interdependência entre sinomorfos da tabela 3, p. 81
5 - Descrição dos sinomorfos experimentais de “Esperar ônibus em horários próximos e
em paradas diferentes”, p. 82
6 - Interdependência dos sinomorfos da tabela 5, p. 82
7 - Descrição de sinomorfos experimentais em “ Esperar ônibus em horários próximos
e na mesma paradas”, p.83
8 - Interdependência dos sinomorfos da tabela 7, p. 83
9 - Interdependência dos sinomorfos em “ Esperar ônibus em horários próximos e na
mesma paradas ”, p. 84
10 - Interdependência dos sinomorfos da tabela 9, p. 84
11 - Interdependência dos sinomorfos em “Esperar ônibus em horários diferentes e na
mesma paradas ”, p. 85
12 - Descrição dos sinomorfos em“ Esperar ônibus”, variando a quantidade de pessoas
presentes, p. 86
13 - Descrição para comparação de sinomorfos “dupla” e “grupo” dentro do ponto focal
de uma mesma atividade (caminhar), p. 86
14 - Interdependência dos sinomorfos “dupla” e “grupo” dentro do ponto focal de uma
mesma atividade (caminhar), p. 87
15 - Análise de genótipos ambientais, p. 88
16 - Quadro de entrevistas, p. 93
17 - Atividades percebidas pelo grupo dos caminhantes, p. 101
13
Resumo
A interação homem-ambiente, foco dos estudos da Psicologia Ambiental,
pressupõe que o espaço influencia o comportamento, e vice-versa. Apesar da
importância dessa reciprocidade dinâmica, são poucos os trabalhos que tratam da
condição de mobilidade do homem ao experimentar o espaço. O presente estudo
exploratório investiga o comportamento sócio espacial de usuários do calçadão da
Avenida Engenheiro Roberto Freire, um dos poucos locais para prática de atividades
físicas em Natal, no qual a maioria dos freqüentadores encontra-se em intenso e
contínuo movimento. Foram algumas perguntas de partida: De que modo o indivíduo
percebe o ambiente enquanto se movimenta? Como as relações recíprocas pessoa-
ambiente ocorrem no local, à luz do contexto de mobilidade? Quais as principais
dificuldades e facilidades na interação homem-ambiente sob essa condição? A busca
por respostas teve como base conceitos do comportamento sócio-espacial humano -
especialmente espaço pessoal, territorialidade, densidade e aglomeração – e
contribuições da Psicologia Ecológica de Barker. Como o espaço físico em questão é
multifacetado e que a percepção desses cenários é regida por múltiplos sentidos e
estímulos, foi definido um percurso multimetodológico: (i) observação participante in
loco; (ii) identificação dos principais behavior settings na área; (iii) categorização das
atividades do local; (iv) aplicação de entrevista semi-estruturada; (v) registro de
imagens e (vi) construção de um diário da pesquisadora. A percepção de si mesmo e dos
outros em movimento pelo ambiente, imersos numa intrincada rede de inter-ações, faz
com que as pessoas desenvolvam diversas estratégias de mobilidade com o intuito de
garantir a satisfação em suas atividades, muitas vezes de modo inconsciente. Sendo o
CAERF um equipamento público-urbano largamente utilizado pela população
natalense, estima-se contribuir para a reflexão sobre o efeito da mobilidade na
percepção ambiental de seus usuários, fornecendo sugestões para futuros trabalhos
nesse campo de conhecimento, tanto naquele local específico quanto no estudo de locais
semelhantes.
Palavras-chaves: Comportamento sócio-espacial humano; Behavior Setting;
Percepção Ambiental; Espaço urbano; Mobilidade.
14
Abstract
People-environment interaction, focus of Environmental Psychology studies,
presupposes that space influences behavior and vice-versa. Despite of the importance of
dynamic reciprocity, there are a few works that treat the mobility condition of the
people experimenting space. The present study investigates environmental perception of
users of the Engenheiro Roberto Freire Avenue sidewalk, one of the few places in Natal
for physical activities practicing, where most people are in intense and continuous
movement. A few questions for this study where made: In what way does the individual
realize the environment while he is moving? How do reciprocal man-environment
relations occur there, according to a mobility context? What are the main difficulties
and easiness in man-environment interaction under this condition? The search for these
answers is based on concepts of social-spatial human behavior - especially personal
space, territoriality, density and crowding – and contributions of Barker´s Ecologycal
Psychology. Considering that the physical space in this case is multifaceted and the
perception of theses scenarios is governed by multiples senses and stimuli, it was
defined a multi-methodological route: (i) observation participative in loco; (ii)
identification of the main behavior settings at the area; (iii) categorization of the
activities occurring at the place; (iv) application of a semi-structured interview; (v)
images registered and (vi) construction of the researcher’s log. The perception of
oneself and others in movement in the environment, immersed in a intricate web of
inter-actions, makes people develop mobility strategies, many times unconsciously,
with the aim of ensuring satisfaction in its activities. Since the Eng. Roberto Freire
Avenue sidewalk is an equipment public-urban largely used by the population of Natal,
the reflection of the mobility effectiveness in the users environmental perception is
expected, providing suggestions for future studies in this field of knowledge.
Keywords:
Social-spatial human behavior; Behavior Setting; Environmental Perception;
Urban Space; Mobility.
15
A calçada por si só não é nada. É uma abstração. Ela só significa alguma coisa
junto com os edifícios e os outros usos limítrofes a ela (…). Ao pensar uma
cidade, o que lhe vêm à cabeça? Suas ruas para comportar veículos, e suas
calçadas – a parte das ruas que cabe aos pedestres. Se as ruas de uma cidade
parecerem interessantes, a cidade parecerá interessante. (Jane Jacobs, 2000, p.
29)
A pré-trajetória: descrevendo antigos caminhos
Todo percurso tem um ponto de partida e um primeiro passo. Todo tema que nos
propomos a investigar sugere a necessidade de conduzir caminhos, traçando metas e
ultrapassando obstáculos que, porventura, venham a comprometer nosso ritmo. O ponta-
pé inicial, em geral, nasce de uma idéia que, quase sempre, amadureceu com o tempo.
Entendendo que todo estudo é fruto de uma trajetória pessoal de escolha, optei,
nesse primeiro momento, por introduzir a temática através da contextualização de seu
surgimento.
Ainda durante a formação como arquiteta-urbanista, interessei-me por estudar
outras fundamentações da área, em função do meu contato com o Laboratório de
Morfologia e Usos da Arquitetura (MuSA), do Departamento de Arquitetura e
Urbanismo da UFRN, coordenado pela Profª Drª Edja Trigueiro. Nessa mesma época,
entrei em contato com a obra de Jacobs
1
(2000), o que também me abriu novos
caminhos à compreensão do ambiente construído. Tendo freqüentado por dois semestres
o Programa de Pós-graduação de Arquitetura e Urbanismo (PPGAU-UFRN) como
aluna especial, e já tendo a intenção de desenvolver meus estudos de pós-graduação
1
Em “Morte e vida de grandes cidades”, escrito em 1961, Jane Jacobs critica o Urbanismo Moderno
norte-americano através de leituras do seu cotidiano. No livro, há um capítulo dedicados ao uso das
calçadas sob três contextos: segurança, contato e integração das crianças.
16
nesta área, percebi que necessitava aprofundar o contato com a Psicologia e o estudo do
comportamento humano. Lançando mão da iniciativa interdisciplinar peculiar à
Psicologia Ambiental – e já tendo contato anterior com a área através das disciplinas da
graduação e pós-graduação em Arquitetura –, ingressei no Programa de Pós-graduação
da Psicologia (PPGPSI) da UFRN.
Atualmente, meu interesse dirige-se, mais especificamente, ao comportamento
sócio-espacial de pessoas em movimento, estudo que se insere no foco da disciplina de
Psicologia Ambiental, ou seja, o relacionamento bidirecional homem-ambiente, inter-
ação que pressupõe que o espaço influencia o comportamento, ao mesmo tempo em que
a pessoa interfere no espaço, de modo que ambos estabelecem entre si um intercâmbio
dinâmico.
O ponto de partida (Apresentação do tema)
No estudo das ações recíprocas pessoa-ambiente, apesar da evidente importância
do ser humano vivenciar e explorar o espaço, ainda são poucas as investigações na área
de percepção ambiental que abordam a pessoa em movimento. Tendo em vista essa
necessidade, a seguir são apresentados os elementos trabalhados nessa dissertação a fim
de abordar essa temática.
Entendendo que as relações recíprocas pessoa-ambiente acontecem no espaço
físico mediante mobilidade (Günther, 2003), e que o modo como o usuário
percorre/experimenta esse espaço resulta em diversas formas de interações ecológicas, o
tema proposto para este estudo é investigar, de modo exploratório, o comportamento
sócio-espacial de usuários do calçadão da Avenida Engenheiro Roberto Freire
(CAERF).
Localizado no bairro de Capim Macio - Natal-RN, o calçadão da Avenida
Engenheiro Roberto Freire é largamente utilizado pela população para caminhar, correr,
17
pedalar, passear com animais domésticos, namorar, entre outras coisas. Ou seja, trata-se
de um espaço no qual a maioria dos freqüentadores se encontra em intenso e contínuo
movimento. Além das práticas que visam à atividade física, ainda há pessoas que
utilizam o espaço para namorar, conversar ou simplesmente aguardar a chegada dos
ônibus nas paradas, dispostas ao longo da via. Sendo freqüentadora do local, constatei
uma característica peculiar nesse tipo de espaço: a sua intensa utilização por pessoas
que se encontram em estado de deslocamento, nas mais diferentes formas de mobilidade
humana.
Além de fatores de caráter pessoal, a escolha do CAERF como local de
pesquisa visa contribuir para a ampliação do conhecimento dos fenômenos sensíveis da
percepção ambiental em um contexto de mobilidade intensa, tendo rebatimentos tanto
na realidade local, quanto na compreensão do comportamento sócio-espacial humano
em situações semelhantes.
Devido ao contínuo uso diário e à observação assistemática do local, passados
cinco anos desde sua inauguração, mais do que a proposta arquitetônico-urbanística em
si, chamaram minha atenção os modos como os freqüentadores utilizam esse local e as
diversas formas de mobilidade por eles desenvolvidas.
Minha vivência como usuária do CAERF tem mostrado que as atividades ali
desenvolvidas recorrem a diversos modos de interação pessoa-ambiente e que, na
grande maioria dessas atividades, as pessoas encontram-se em estado de mobilidade.
Portanto, pensando o ambiente como um elemento atrelado a um sistema social
(Ittelson, Proshansky, Rivlin e Winkel, 1974), seja ele natural ou construído (Fisher,
Bell & Baum, 1984) e tendo em vista que seus usuários estão em movimento, o estudo
tem como objetivo geral refletir sobre o comportamento sócio-espacial e a percepção
desses usuários, bem como as estratégias utilizadas por eles a fim de conseguir realizar
18
as atividades pretendidas. De modo geral, espero provocar a reflexão sobre o efeito da
mobilidade na percepção ambiental e no comportamento de seus usuários.
Os objetivos específicos desse estudo visam explorar as implicações e
influências na percepção ambiental dos usuários do CAERF, tendo por base a possível
implicação do estado de mobilidade nas interações humano-ambientais, em resposta a
perguntas como: De que modo o indivíduo percebe o ambiente enquanto se movimenta?
Como as interações pessoa-ambiente ocorrem no local, à luz do contexto de
mobilidade? Quais as principais dificuldades e facilidades na interação homem-
ambiente sob essa condição? Como convivem as diversas velocidades de deslocamento
ali presentes?
Além disso, é preciso enfatizar que, embora se tenha constatado a existência de
estudos na área de mobilidade, geralmente os mesmos visam compreender a diferença
de percepção entre o portador de condições físicas especiais e o não-portador. Este, no
entanto, não é foco dessa dissertação, que se propõe a discutir a percepção espacial
diante das diferentes velocidades que a pessoa utiliza para se locomover na área em
estudo.
A partir do estudo realizado, espero compreender alguns elementos que
influenciam o comportamento dos usuários do CAERF durante a realização de
atividades no local, bem como fornecer reflexões sobre o papel da mobilidade humana
nesses tipos de espaços públicos e sua influência em relação à percepção das pessoas,
através da identificação e descrição das características ambientais e comportamentais
relacionadas a essa mobilidade. O ganho advindo desse exercício poderá vir a fornecer
sugestões para futuros trabalhos nesse campo de conhecimento, evidenciando o papel da
mobilidade como elemento a ser considerado nos estudos do comportamento sócio-
espacial humano (CSEH), além de fornecer subsídios para a promoção de aplicações
19
urbanísticas e projetuais ecologicamente mais coerentes, tanto para a re-estruturação do
CAERF, quanto para a criação de outros espaços destinados à prática de atividades
físicas (e usos semelhantes), em cuja concepção seja valorizado o modo como as
pessoas utilizam esses locais e se locomovem neles.
A trajetória
Visando os objetivos anteriormente definidos e diante das expectativas expostas,
foi preciso traçar a trajetória que conduziria aos resultados esperados. Para tanto,
estruturou-se o presente estudo em capítulos temáticos, tendo sempre em vista o
norteamento da proposta inicial.
No primeiro capítulo, estão dispostos os contados iniciais com o local de estudo,
bem como a contextualização do elemento “calçada” dentro da ótica cotidiana das ruas,
com seus múltiplos olhares, visando criar referências concretas para a compreensão da
temática que será apresentada no segundo capítulo. Por se tratar de uma investigação
embasada na percepção ambiental, os primeiros passos já nos remetem à calçada como
um espaço dos sentidos humanos, de sensações mais diversas tão diversas que, por
vezes, apontam contradições, dualidades. A categorização do calçadão, como variação
da calçada vem logo em seguida.
Visando embasar a pesquisa em andamento, a fundamentação teórica é o mote
do segundo capítulo, tendo em vista a necessidade de referenciais teórico-conceituais
para dar prosseguimento à caminhada. Os temas abordados têm como ponto de partida
sua contextualização do espaço urbano a partir do ponto de vista da Psicologia
Ambiental e, mais especificamente, da Psicologia Ecológica, adentrando, pouco a pouco
no comportamento sócio-espacial humano, percepção ambiental e mobilidade.
20
No terceiro capítulo, a área onde foi desenvolvido o trabalho é descrita de forma
mais detalhada. A área de estudo reapresenta-se para o leitor, com mapas e fotos feitas
em várias épocas.
O quarto capítulo explica o percurso metodológico adotado e a opção pelo uso
de multimétodos, contendo especificações sobre as ferramentas adotadas: observação
empírica assistemática, construção de diário de campo, documentação fotográfica, os
meandros temáticos da dupla pré-categorização e a elaboração do roteiro de entrevistas
implementado com os usuários apontados pelas categorizações anteriores.
Os resultados começam a ser apresentados no quinto capítulo, no qual os dados
coletados são expostos e descritos, bem como os ganhos advindos das três fases do
trabalho de campo: a observação, a documentação (escrita e fotográfica) e as entrevistas
com os usuários.
O sexto capítulo está reservado à discussão dos dados, ou seja, ao esforço de
confronto/rebatimento das informações coletadas com a realidade observada e a teoria
anteriormente apresentada. Seguem a ele, as conclusões do estudo.
21
1. Primeiros passos: o espaço extra-muros
Antes de tecer comentários sobre o elemento urbano em estudo – o calçadão -, é
imprescindível que se tenha em mente o seu papel sócio-físico no conjunto da cidade.
Quando se faz uso de uma calçada qualquer, é preciso lembrar que a mesma encontra-se
às margens de uma rua, delimitada pelas vias, paredes das edificações contíguas e/ou
seus muros. Os ambientes intra-muros são as áreas privadas (ou semi-privadas), cujo
uso se restringe aos indivíduos ou grupos que ali se abrigam. A rua, por sua vez,
comunica-se com outras ruas, a fim de desempenhar seu papel de “artéria” na qual as
pessoas circulam, proporcionando o fluxo da cidade. Seu funcionamento depende disso.
As ruas são, portanto, elementos indispensáveis ao tecido urbano, sendo
impossível conceber uma cidade sem elas (Santos, 1988, p. 91). Tal entendimento nos
direciona à compreensão da calçada como um espaço semelhante e complementar à
elas, ou seja, enquanto a rua per se garante, ou deveria garantir, a circulação dos
veículos (carros, carroças, ônibus etc.), a calçada garante a circulação dos pedestres, ou
seja, das pessoas – pelo menos nas grandes cidades ocidentais contemporâneas.
1.1 A Calçada no cotidiano da rua
Tendo em vista que esse trabalho tem por finalidade o estudo exploratório do
comportamento das pessoas em um local público e que, ao mesmo tempo, engloba um
aspecto peculiar de sua vida diária, explicitam-se, nesta seção, considerações sobre a
calçada – anexada à rua – como local de convivência pública e comportamento
cotidiano, tal qual compreendido pela Psicologia Ecológica (Barker, 1968; Wicker,
1979).
22
A leitura acerca do nascimento das ruas, bem como sua função na sociedade e
para com o deslocamento humano, sugere sua compreensão como um fenômeno
atrelado ao nascimento do espaço público. Isto é, um dos lugares onde é possível o
exercício da vida pública cotidiana. O espaço público, no qual ocorre a livre circulação
de pessoas, pode ser compreendido em sua relação com espaço privado, no qual a
circulação é mais restrita. Tendo em conta uma análise das condições de existência
humana (Arendt, 1991), o espaço privado é aquele em que se realizam as práticas de
manutenção da própria vida, por exemplo, o cuidado com o próprio corpo. Por outro
lado, o espaço público é o lugar do exercício da liberdade humana, no esforço de estar
em coletividade, deslocar-se pelo espaço e realizar trocas com o meio e com as outras
pessoas. Por vezes, é no espaço público que cuidamos do nosso corpo, mediante
atividade física.
Enquanto a produção das condições de vida se fazia no interior da casa, e na rua
se praticava a política e o comércio, a distinção simbólica entre público e privado tinha
uma correspondência com a realidade física da casa e da rua (Da Matta, 1997, p 23).
Com a modernidade, as transformações tecnológicas e culturais têm contribuído para
mudanças, fazendo com que muito da prática política e comercial se exerça pela mídia,
que penetra no espaço intimo da casa, e não no espaço comum representado pela rua.
Mesmo assim, ainda é na rua que se realiza grande parte das práticas de manutenção da
vida: deslocar-se entre dois pontos, circular, festejar, protestar, entre outras coisas.
A rua é o espaço de mobilidade do cotidiano nas cidades, sendo compreendida
pela via de circulação de carros e pela calçada, que garante a circulação de pedestres,
tornando-se, portanto, um espaço legitimamente público (Yázigi, 2000, p. 341).
Ao longo do tempo, a rua passou a ter uma conotação individualizadora, a qual
se reflete, por exemplo, em expressões populares como “vá para o olho da rua”, ou
23
“estar na rua da amargura”, que expressam o isolamento de uma pessoa de um
determinado grupo (Cabral, 2005). Não obstante todas essas transformações, a rua
preserva algumas de suas características de espaço público e que comporta o que sai do
comum, sendo, portanto, o espaço onde se realizam “acontecimentos” como
movimentos sociais e festas populares. Dentro desse caráter, e para cada uma dessas
atividades, as pessoas imprimem um ritmo, determinando um tipo de deslocamento.
No âmbito da rua como local de encontro, surge a prática de atividade física nos
espaços livres de calçadas e praças, nos quais os modos de deslocamento variam
conforme a necessidade e a escolha das pessoas envolvidas. Em cada uma dessas
escolhas, imprime-se uma forma de mobilidade e um olhar ao redor.
1.2 A calçada: múltiplos olhares
O exercício de percorrer ruas e calçadas requer um “saber andar” por seus
caminhos, traduzir a solidez das edificações, discernir trajetos (Matias & Vilaça, 2006).
Além disso, usar tais ambientes e entendê-los como públicos significa compartilhá-los
com outras pessoas e atribuir significados tanto aos espaços, quanto a seus usuários.
Desde o seu surgimento até os dias atuais, a rua tem mediado as diversas formas
de interação social. Mais do que mero cenário, ela possui papel ativo nessas interações.
As formas de convivência entre os seus usuários e entre esses usuários e o espaço da
rua, de algum modo reflete a coexistência dos diferentes significados atribuídos a ela. A
busca por interações faz com que, enquanto espaço voltado à coletividade, a rua
possibilite o atendimento dessas necessidades interpessoais e pessoa-ambiente. Na base
dessa interação social, encontram-se as convenções sociais, o modo de agir em público
e a maleabilidade de opiniões. O mediador dessa interação é o próprio espaço-rua.
24
Não é à toa, portanto, que a rua assuma diferentes papéis, dependendo das
atividades que nela venham a acontecer. Em paralelo à história da rua, também é
possível tecer múltiplos olhares sobre o ambiente-calçada, uma vez que cada usuário
pode atribuir a ele diferentes funções, dependendo de sua necessidade.
Enquanto elemento de circulação humana, a calçada surgiu como espaço para
vendedores, vitrine para prostitutas, local de panfletagem e distribuição de brindes para
propaganda, espaço para lazer, faixa de trânsito entre dois lugares, lugar de encontro,
ponto de espera, pista de corrida, ciclovia, entre outros. Além disso, um desdobramento
da pluralidade dessas visões que mudam constantemente faz da calçada um possível
cenário popular para passeatas políticas. Em comum, para ocorrer de modo satisfatório,
a maioria dessas funções possui o viés da mobilidade, ou seja, dependem da
possibilidade das pessoas se deslocarem no espaço.
No âmbito urbano, a existência dos múltiplos olhares sobre o espaço das
calçadas exige, também, a compreensão de variáveis como o tamanho da cidade, a
porção do elemento em questão com relação à cidade na qual está inserido, o perfil de
seus usuários etc. Por outro lado, no âmbito humano, esses olhares enfocam a percepção
ambiental humana, pois para dar sentido ao uso que fazemos do espaço é preciso, antes
de tudo, ter como atribuir esse sentido. É aí que se tem a necessidade de lançar um olhar
sobre o que nos cerca. Estamos falando de percepção ambiental.
1.3 O espaço urbano dos sentidos
São diversas as maneiras de dar sentido à rua e às calçadas que percorremos, a
maioria das quais advém do sentido que damos ao seu uso. As ruas, e nelas as calçadas,
são o palco privilegiado onde se desenvolvem os dramas e representações da sociedade
(Santos, 1988, p. 91). Os espaços urbanos podem ser vistos por uma perspectiva
25
geográfica, em seus aspectos materiais, como espaços físicos, ou como inseridos em
uma atmosfera de atribuição de valor significativo (Gieryn, 2000). Essa última
característica, principalmente, advém da percepção ambiental e faz com que muitos
antropólogos, sociólogos, urbanistas, psicólogos e outros profissionais se dediquem ao
seu estudo. O espaço físico é, portanto, multifacetado, de modo que essa percepção não
somente passa por múltiplos sentidos, como registra múltiplos estímulos
simultaneamente (Günther, 2003). Ao longo do tempo, a rua, que nasceu como um lugar
de passagem, transformou-se num misto de significados diversos e muitas vezes
opostos, tendo em vista que todo espaço físico assume ora função de cenário, ora de
personagem participante. A calçada, atrelada à rua, seguiu os mesmos passos e, por ser
contraditória, às vezes torna-se território de ninguém, outras vezes de todos (Santos,
1988, p. 91).
1.4 O Espaço público e suas dualidades
A cidade é uma construção social (Ramirez, 1998)
Constatar o uso comum da rua e da calçada implica em agregar grupos diversos
num mesmo espaço urbano. Trata-se, portanto, de um chamado à coletividade, à vida
em grupos, o que implica na possibilidade de, ao mesmo tempo, suprir a necessidade de
quem transita e a função de quem comercializa, por exemplo. Quando a rua se
coletiviza, ela se desindividualiza e torna-se espaço de todos. Sob esse ponto de vista, as
regras que orientam a conduta humana tendem a tornar-se menos claras, de modo que as
pessoas podem diversificar ainda mais os usos de um espaço, individualizando suas
funções. Em um local que, ao mesmo tempo, é de todos e não é de ninguém, cada um
tenta tirar o maior proveito possível, focando sua atenção nas próprias necessidades e
26
esquecendo que outras pessoas utilizam o local. Provavelmente a depredação provém
daí.
Na medida em que a calçada se torna o lugar onde se radicaliza a pluralização
das experiências e, ao mesmo tempo, onde se encena o encontro das diferenças,
descobrimos que não se deve pensar na calçada sem levar em conta as suas diversas
representações sociais, pois são elas que nos contam sobre a vida do homem em seu
cotidiano (Matias & Vilaça, 2006).
A rua e a calçada fazem parte do imaginário social (Cabral, 2005). Por isso, é
preciso considerar a compreensão do seu trajeto na semântica social: as modalidades de
relações interpessoais que constituem o uso do espaço sócio-físico desse espaço
público, as regras de sociabilidade que lhe são peculiares e como os seus sentidos se
infundem sobre os seus usuários, produzindo percepções variadas, criando personagens,
identidades e encontros. Isso implica dizer que a rua e a calçada são compreendidas
como espaço simbólico e que o seu uso acontece sob influência dessa característica. O
estado de mobilidade compartilha dessa dimensão semântica, pois faz parte da
estruturação de como se utiliza o espaço. As relações interpessoais que se realizam em
determinado local são modeladas pelos significados construídos historicamente para as
possibilidades de estar no espaço público, entendidas aqui como programas
comportamentais, modos de se vestir, de andar, de falar, e até mesmo um conjunto de
regras morais para orientar os costumes.
As possibilidades de estar nesse espaço público também dão lugar a formas de
ser nesse mesmo espaço, porque os sentidos que a recriam como objeto da realidade
social compõem personagens ou tipos, que habitam o imaginário social (Matias &
Vilaça, 2006). O desafio é refletir esse estar no espaço público e este ser no espaço
público, levando em conta o contexto do percorrer o espaço público, ou melhor
27
dizendo, percorrer a calçada, mais especificamente. Além disso, os sentidos exercem o
seu efeito sobre as pessoas que, por algum motivo, fazem do espaço ao seu redor um
ambiente importante de seu tempo vivido. A calçada, assim, passa a ser entendida como
uma construção social a partir de uma realidade física. Utilizar a calçada e vive-la
ultrapassa o nível de percebê-la simplesmente como espaço geográfico. É, acima de
tudo, enxergá-la como esfera de ação social capaz de despertar emoções e reações (Da
Matta, 1997, p. 15). No entanto, não podemos perder de vista nosso horizonte de
análise, no qual a realidade física também é reconstruída a partir do sentido social que
vai ao encontro dos conceitos do comportamento sócio-espacial humano. Trata-se da
inter-relação homem-ambiente, no caso, usuário-calçada.
A calçada é o elemento que, na contemporaneidade, garante que as pessoas
utilizem as ruas. “É como um chão de fractais que, sendo uma fração de algo maior,
consegue refletir a imagem do todo” (Yázigi, 2000, p. 167). Assim, ela subsiste à
ameaça constante dos automóveis, contrapondo a vulnerabilidade dos encontros
públicos à sociabilidade ideal da boa convivência. O homem é “pedestre por natureza”
(Yázigi, 2000, p. 340), pois necessita transitar pelo espaço para percebê-lo, conquistá-lo
e dominá-lo. Essas ações são suas estratégias para perceber e lidar com o que o cerca,
ou seja, irão garantir a satisfação no uso desse espaço e sucesso na atividade que
escolheu desempenhar nele. E isso irá ocorrer enquanto esse homem estiver se
deslocando.
É imersa nessa realidade que encontramos a figura do calçadão.
1.5 Calçadão: uma calçada diferente
O código de trânsito brasileiro não define a palavra calçadão, mas conceitua
calçada como parte da via, normalmente segregada e em nível diferente, não destinada
28
à circulação de automóveis e outros veículos de maior porte, reservada ao trânsito de
pedestres (Gold, 2003, p.1).
Para efeitos desse trabalho, calçadão é uma faixa da via de circulação
pavimentada, mais larga do que uma calçada habitual, por onde as pessoas podem
trafegar em diferentes velocidades e experimentar várias formas de mobilidade. Em
geral, no Brasil, o calçadão é usado para práticas de atividades físicas e comerciais, e
sua manutenção fica a cargo do Sistema Nacional de Trânsito e da prefeitura da cidade
(Gold, 2003, p.1).
Gold (2003, p. 16) também aponta nove fatores determinantes da qualidade de
calçadas: largura mínima de 1,5m; pavimentação que gere fluidez, conforto e segurança;
largura entre o tráfego veicular e o de pedestres; inclinação de no máximo 5%; presença
de rampas de acesso a portadores de condições especiais de locomoção; colocação
adequada de obstáculos – como placas de sinalização – nos passeios, quando necessário;
iluminação adequada; drenagem; e mobiliário urbano (incluindo vegetação).
A presença de calçadões pode ser observada em diversas cidades. Muitos deles
foram projetados para a prática da atividade física (e a população os utiliza dessa
maneira), outros visam lazer/contemplação e/ou simplesmente tráfego de pedestres. Em
Villach, na Áustria, o calçadão é desenhado com paralelepípedo e mosaicos (Figura 1),
a velocidade das práticas desportivas é limitada e há placas com indicação para “não
correr”. No mesmo país, em Viena, há uma pista exclusiva para corredores, separada da
ciclovia (Figura 2). Em Nice, na França, faixas de locomoção foram pintadas ao longo
do calçadão para facilitar o fluxo das pessoas em suas diferentes velocidades de
deslocamento (Figura 3). Em Lisboa, Portugal, há um calçadão às margens do Rio Tejo
(Figura 4). Em Barcelona, na Espanha, há mão e contra mão para o trânsito de bicicletas
(Figura 5).
29
Figura 3. Calçadão em Nice (França)
FONTE: Rubia Vilaça (2006)
Figura 4. Calçadão em Lisboa (Portugal)
FONTE: Rubia Vilaça (2006)
Figura 1. Calçadão em Villach (Áustria)
FONTE: Rubia Vilaça (2006)
Figura 2. Calçadão em Viena (Áustria)
FONTE: Rubia Vilaça (2006)
Figura 5. Calçadão em Barcelona
(Espanha)
FONTE: Rubia Vilaça (2006)
30
O primeiro calçadão público do Brasil foi o da Rua das Flores, como é chamado
o trecho destinado aos pedestres da rua XV de Novembro, construído no início da
década de 70, na cidade de Curitiba-PR (Figura 6). A cidade de São Paulo-SP também
possui uma grande quantidade de ruas para pedestres na região central, dentre os quais
se destaca o calçadão do Vale do Anhangabaú (Figura 7). Muitas cidades à beira-mar,
como Recife-PE e Rio de Janeiro-RJ, possuem calçadões que seguem a orla marítima
(Figuras 8 e 9). Em outras cidades, como Curitiba-PR, os calçadões adentram em
parques urbanos. Nos centros de algumas cidades, antigas ruas são pavimentadas de
forma a ceder espaços aos pedestres, em detrimento dos automóveis, facilitando a
circulação por aqueles lugares.
Figura 6. Calçadão da rua XV Novembro,
Curitiba - PR
FONTE: http://www.parana.pr.gov.br/
Figura 7. Calçadão no Vale do
Anhangabaú, São Paulo-SP
FONTE: http://www.vivaocentro.org.br
31
Em Natal-RN, o calçadão da Avenida João Pessoa, no centro da cidade, foi a
primeira iniciativa de implementação de calçadões na cidade. cujo intuito era centrado
na circulação visando o comércio. Atualmente, dentre os calçadões da cidade de Natal,
alguns são destinados à práticas recreativas e desportivas, destacando-se: o da Praia dos
Artistas, Avenida Dinarte Mariz (Via Costeira – a qual, inclusive, conta com ciclovia), o
do Bosque dos Namorados e o da Av. Eng. Roberto Freire (Figuras 10 a 13). Destes,
observa-se que o último, CAERF, é o mais utilizado pela população, principalmente no
que tange a prática de exercícios, configurando-se como local de estudo dessa
dissertação.
Figura 8. Calçadão da Av. Boa Viagem,
Recife-PE
FONTE: Acervo da autora
Figura 9. Calçadão de Copacabana, Rio
de Janeiro-RJ
FONTE: http://www.rio.rj.gov.br/
Figura 10. Calçadão da Praia dos
Artistas, Natal-RN
FONTE: http://www.natal.rn.gov.br/
Figura 11. Calçadão e ciclovia da Via
Costeira, Natal-RN
FONTE: Acervo da autora
32
Figura 12. Calçadão do Bosque dos
Namorados, Parque das Dunas, Natal-RN
FONTE: http://www.natal.rn.gov.br/
Figura 13. Calçadão da Av. Engenheiro
Roberto Freire, Natal-RN
FONTE: Acervo da autora
33
2. Mosaico de pedras portuguesas
O presente trabalho, cujo objetivo é refletir sobre a percepção sócio-ambiental e
os comportamentos utilizados pelos usuários do CAERF para conseguir realizar as
atividades pretendidas, insere-se na ótica da Psicologia Ambiental. O estudo partilha da
abordagem da Psicologia Ecológica (Barker, 1968), visto que valoriza a análise da vida
em seu cotidiano real, obtendo conhecimentos a partir da análise de behavior settings. O
enfoque no estudo do comportamento sócio-espacial humano mediante mobilidade, e a
reflexão acerca da percepção ambiental dos usuários para avaliar as interações que
ocorrem no local de estudo solicitam esclarecimentos temáticos, justificando os itens a
seguir.
Tendo em vista essa opção teórica, serão explorados, como conhecimento
essencial à realização desse trabalho, os seguintes temas: Psicologia Ambiental e espaço
urbano, Psicologia Ecológica (com enfoque na análise de behavior settings),
comportamento sócio-espacial humano, percepção ambiental e mobilidade.
2.1 Psicologia Ambiental e espaço urbano
Ittelson, Proshansky, Rivlin e Winkel (1974) definem a Psicologia Ambiental
como sendo uma área de interesse pelo intercâmbio dinâmico entre homem e meio
ambiente. Em revisão a esse texto, quase trinta anos depois, Rivlin (2003) voltou a
discutir os pressupostos dessa disciplina, inserindo atualizações e reforçando seu caráter
multidisciplinar a partir de pesquisas mais recentes. Trata-se, portanto, de uma jovem
34
disciplina em expansão, na qual as pessoas são vistas como componentes do ambiente,
que possuem qualidades ambientais e características psicológicas individuais (Ittelson &
al., 1974, p.2).
Inter-ação. Essa é a palavra de ordem dessa disciplina que teve os estudos de
Kurt Lewin (1946) como pioneiros, e que tem como premissa a busca pela
aplicabilidade dos estudos realizados (Valera, 1996). Sob esse ponto de vista, o
comportamento é resultado de uma força interna, presente na pessoa executora da ação,
e de uma força externa ambiental, que afetaria o comportamento através das percepções
(Lewin, 1936 citado por Moser & Weiss, 2003, p.249). A relação recíproca entre pessoa
e ambiente também é a base da Psicologia ecológica, uma vez que ela estuda as
interdependências entre as ações instrumentais dos indivíduos e os locais onde os
comportamentos acontecem (Wicker, 1979).
A Psicologia fez seus primeiros estudos sobre cognição e percepção dentro do
laboratório, enquanto a Psicologia Ambiental volta-se para a visão mais aplicável,
através dos experimentos in loco (Gifford, 1997). Essa característica da área exige que
se reconheça a complexidade da disciplina e suas interfaces.
Em relação ao tema deste estudo, busca-se a interface entre a Psicologia
Ambiental e os estudos urbanos, uma vez que a calçada se conecta, ativamente, dentro
da composição da cidade como um labirinto com múltiplos significados (Lee, 1977).
Tal entendimento reforça a compreensão da Psicologia Ambiental como campo de
conhecimento intimamente relacionado a outros, em função de suas raízes internas à
Psicologia e externas à ela, relacionando-se com áreas como Geografia, Ecologia,
Arquitetura e Urbanismo (Bonnes &
Secchiaroli, 1995). Essa interdisciplinaridade é tão
marcante, que Sundstrom, Bell, Busby e Asmus (1996) classificam os estudos da
Psicologia Ambiental agrupando-os em função dos espaços físicos estudados. É
35
justamente esse aspecto que permite que se estabeleçam conexões entre os autores da
área e outras referências complementares.
Partindo dessa perspectiva, Sundstrom, Bell, Busby e Asmus (1996) apontam a
teoria do arousal como uma das seis teorias mais recorrentes da Psicologia Ambiental.
Tal teoria discute as influências de fatores ambientais, tais como propagação do som e
temperatura, sobre o comportamento humano, sendo possível encontrar conexões entre
os trabalhos desenvolvidos por psicólogos como Anderson, Mullingan, Goodman e
Rezen (1989) e idéias defendidas pela urbanista Jane Jacobs (1961). Os estudos dos
primeiros investigam relações entre locais com alta temperatura e a probabilidade de
ocorrência da violência. Jacobs (1961) também estabelece esse tipo de relação variável
ambiental-comportamento humano. Embora não recorra ao embasamento da Psicologia
Ambiental, a autora dedica um capítulo inteiro de seu livro à descrição de
comportamentos observados em calçadas, mostrando que, por exemplo, ruas desertas
favorecem a marginalidade, ruas movimentadas promovem uma vigilância coletiva.
Além disso, Jacobs defende que as pessoas costumam desenvolver mecanismos de
regulação da segurança nas calçadas, relacionando esse aspecto à presença de muitas
pessoas em um espaço pequeno ou estreitamento do passeio. Essa idéia, também
conectada aos conceitos de territorialidade e aglomeração, foi posteriormente explicada
a partir do mecanismo de regulação das agressões, mencionado por Valera e Vidal
(1998).
No contexto da Psicologia Ambiental, o presente trabalho ressalta duas
importantes contribuições, a da Psicologia Ecológica e a dos estudos do
Comportamento Sócio-Espacial Humano, marcos teóricos dessa dissertação, que serão
melhores explorados nos próximos itens, seguidas de explanação sobre o conceito de
mobilidade utilizado.
36
2.2 A Psicologia Ecológica de Barker
Saindo da pesquisa psicológica experimental - formulada em laboratório - e
dedicando-se ao estudo da vida cotidiana, em 1968, Barker publicou o livro Ecological
Psychology, no qual apresentava as características do comportamento de 100 crianças
em suas condições naturais, constatando que deveria haver outras influências geradoras
de comportamentos e ações nessas crianças, além das apontadas pela Psicologia
individual (Carneiro & Bindé, 2001). Esse tipo de trabalho conduziu Barker (1968) à
criação do conceito de behavior setting (BS): unidades ou conjuntos naturais,
delimitados no tempo e no espaço, nos quais certos comportamentos e/ou ações
acontecem sempre de forma semelhante.
Encarados como sistemas ativos, organizados, auto-regulados, e não meramente
como fundo passivo onde as pessoas desempenham ações que escolheram
livremente. (Wicker, 1979, p.11)
Quando Barker (1968) identificava as atividades que tinham potencial para
configurarem behavior settings, ele denominava essas ações de sinomorfos e,
posteriormente, os testava. Esse mesmo procedimento foi metodologicamente realizado
para o presente trabalho, com posterior identificação dos principais behavior settings
presentes na área e com o intuito de delimitar o universo das atividades que convivem
no CAERF.
Barker e Wright (1955) descreveram cinco dimensões mensuráveis dentro um
behavior setting: tempo de ocupação (que pode ser ocasional ou periódico); penetração
(hierarquia das posições que os componentes humanos ocupam dentro do BS); padrões
de ação (organizados nos programas do setting); mecanismos comportamentais
(padrões de ação, medidos em relação a sua freqüência, duração e intensidade); e,
riqueza (quantidade de comportamentos possíveis).
37
Em trabalho complementar ao anterior, Schoggen (1973) demonstrou que, para
um acontecimento da vida diária ser considerado BS, é preciso: localização geográfica;
delimitação temporal; elementos físicos e humanos participantes; modelos de ação
(atividade educacional, de administração, de alimentação, de saúde física etc);
programa
2
a ser seguido; mecanismos de comportamento; atribuição de papéis aos
participantes do setting (espectador, convidado etc); pressão para que determinados
componentes humanos participem ou não; independência com relação a outros
sinomorfos presentes no local; propiciar satisfação às necessidades dos participantes
(Schoggen, 1973).
Wicker (1979) indica que, para garantir o funcionamento de seus programas, os
BSs possuem sistemas auto-reguladores, ou seja, ao detectarem um problema de
funcionamento no BS, seus componentes atuam na tentativa de tornar a seqüência de
atividades do setting exeqüível, mediante o acionamento de mecanismos para a
regulação do programa. Para isso, os componentes envolvidos podem atuar como
mecanismo sensor (ou seja, identificando a fonte do problema) ou mecanismo executor
(lidando diretamente com a resolução do mesmo). Nessa última situação, o(s)
componente(s) responsável(is) pela resolução do problema poderá(ão) utilizar dois tipos
de mecanismos de manutenção: o contra-desviante (modificação da situação inadequada
através de ajustes que permitem a continuidade do programa, mas sem que ocorra a
exclusão de qualquer elemento); e o veto (eliminação de algum elemento indesejado a
fim de solucionar o problema).
Conforme identificado por Barker (1968), alguns desses problemas são
ocasionados pela ausência de sinomorfia, definida como a condição de adequação entre
componentes humanos e não-humanos em função do programa do behavior setting, de
2
Barker utiliza a denominação programa para designar as seqüências prescritas de interações ou
transações entre pessoas e objetos, consideradas apropriadas para um determinado local.
38
modo a possibilitar plena realização das atividades previstas, garantindo facilidade para
o desempenho das ações (Elali, 2002). Para haver sinomorfia é preciso, portanto, que as
ações das pessoas dentro do espaço estejam coordenadas com as características físicas
do setting e com os objetos existentes nele (Wicker, 1979, p.21). Quando a
correspondência entre ação e elementos disponíveis não ocorre, diz-se que ocorre uma
ausência de sinomorfia.
Em algumas ocasiões, para delimitar os BSs existentes em uma área é preciso
verificar as relações de interdependência entre eles, a fim de analisar modelos sócio-
espaciais e funcionamento de ambientes mais amplos (Pinheiro, 1986; Elali, 2002). Isso
ocorre em função da atribuição de valores a sete escalas de interdependência, as quais se
relacionam a: comportamentos, líderes, espaço/usos de áreas comuns, contigüidade
temporal, componentes humanos, componentes não-humanos e mecanismos
comportamentais.
No último capítulo de sua obra, Barker (1968) discute, ainda, a noção de
genótipo ambiental. Segundo ele, dois behavior settings pertencem à mesma “família”,
ou seja, têm o mesmo genótipo, quando possuem grande similaridade entre si, de modo
que seja possível permutar elementos entre eles sem modificar o programa. Isso envolve
semelhanças em termos de: estrutura dos programas; tempo para desenvolver as
atividades correlacionadas; itens transferíveis e não transferíveis de um BS para outro;
tempo diário de funcionamento que é ocupado na manutenção dos itens não
transferíveis, frente ao tempo das atividades comuns.
2.3 Comportamento sócio espacial humano
A diferenciação espacial se desenvolve em níveis crescentes de complexidade,
relacionando-se com formação de conceitos, linguagem, pensamento e
desempenho de papéis sociais. Nosso relacionamento com o mundo à nossa
volta tem por condição o domínio do espaço e a identificação de suas relações.
(Lee, 1977)
39
Analisando o uso do espaço como elemento da comunicação interpessoal, Hall
(1977, p.108) definiu quatro zonas espaciais que servem para regular as interações
sociais: a distância íntima, na qual se pode sentir o outro através dos cinco sentidos; a
distância pessoal, na qual as pessoas podem se tocar estendendo os braços; a distância
social, utilizada em comunicações públicas; e a distância pública, cuja conduta é mais
formal e distante. Uma condição peculiar da conduta espacial é que, em geral, ela se dá
sem verbalizações, ou seja, através da linguagem não-verbal, isto é, com
comportamentos não expressos por palavras, o que envolve desde o tom de voz ou o
jeito como as palavras são ditas, até olhares e expressões faciais, gestos que
acompanham o discurso, postura corporal, distância física que as pessoas mantêm umas
das outras, o que inclui ainda roupas, acessórios e características físicas dos indivíduos.
Tudo isso pode acontecer sem que o a pessoa se dê conta de seu comportamento dentro
do espaço.
De modo geral, os estudos do comportamento sócio-espacial humano propõem a
análise da comunicação interpessoal e o dos mediadores da inter-ação pessoa-ambiente
(Pinheiro & Elali, 1998, p. 2), com ênfase para alguns conceitos-chave na área, dentre
os quais considera-se indispensáveis ao presente estudo: espaço pessoal, territorialidade,
privacidade e aglomeração.
2.3.1 Espaço Pessoal
Definido por Sommer (1973) como uma área com limites invisíveis cercando o
corpo de uma pessoa, na qual intrusos não são admitidos sem permissão, o espaço
pessoal é uma zona emocionalmente carregada em torno do corpo de cada pessoa, às
vezes descrita como uma bolha de sabão (não necessariamente esférica), e que ajuda a
40
regular o espaçamento entre os indivíduos (Sommer, 1973). O autor esclarece que o
espaço pessoal é portátil, ou seja, acompanha o indivíduo em todas as situações, mesmo
quando está em movimento. O tamanho e a forma que essa área assume a cada
momento estão relacionados à história individual, às suas condições pessoais na ocasião
e à situação na qual se encontra.
O conceito de espaço pessoal assemelha-se com a noção de Hall (1977) para
distância íntima. Além disso, segundo Gifford (1997), ele teria duas funções básicas:
auto-proteção e comunicação/regulação da intimidade.
2.3.2 Territorialidade
Territorialidade é a associação contínua de uma pessoa - ou pessoas - com um
lugar específico, a respeito do qual experimenta-se sentimento de posse e exclusividade
no uso, cuja definição implica na necessidade de personalização e defesa do espaço
contra possíveis invasões (Sommer, 1974). Esse controle do acesso humano-espacial,
envolve, necessariamente, um espaço físico bem delimitado e marcado de alguma
maneira, com cercas e muros, ou mesmo com objetos facilmente percebidos como
pertencentes ao indivíduo. Por sua vez, essa defesa – que pode ser feita por uma ou mais
pessoas – parte da premissa de que a área é vista como exclusiva (Pastalan, 1982).
Sommer (1973) chama a atenção para as diferenças entre as noções de território
e espaço pessoal:
O espaço pessoal é portátil, acompanha a pessoa, enquanto o território é
relativamente estacionário.
As fronteiras do território são marcadas de algum modo, ao passo que as do
espaço pessoal são invisíveis.
41
O espaço pessoal tem o corpo da pessoa em seu centro, o território não
necessariamente.
No espaço público, Lyman e Scott (1967, citado por Valera & Vidal, 1998, p.
138) classificam os territórios em dois tipos: corporais, nos quais o próprio corpo é o
elemento a ser preservado de toques, agressões e intervenções dos mais diversos tipos; e
os de interação, que correspondem a áreas físicas temporariamente controladas por uma
pessoa ou um grupo.
2.3.3 Privacidade
Compreendido como controle seletivo do acesso a si mesmo ou ao seu grupo
(Altman, 1975), o conceito de privacidade é definido por Newell (1994) como a
regulação da separação física, psicológica, informacional e funcional entre o indivíduo e
os demais. Regulando as fronteiras interpessoais, a privacidade possui um caráter
dinâmico e representa a contínua mudança das forças sociais de aproximação e
afastamento entre o eu e o outro, que se desenvolve a partir de três dimensões: pessoal
(eu comigo mesmo), interpessoal (existência de outras pessoas e a possibilidade de
relacionar-se com elas) e ambiental (o ambiente modifica as percepções pessoais e
delimita parte das opções comportamentais disponíveis – a partir da interação entre três
fatores: contexto cultural, sócio-físico e o estágio no ciclo-vital individual e familiar).
Discutindo o conceito, Valera e Vidal (1998) indicam que a noção de
privacidade pode ser analisada a partir de quatro perspectivas (Figura 14): o modo como
é entendida (regulação da interação com os outros), o modo como se manifesta (que
varia da solidão à intimidade), a quantidade de pessoas envolvidas (indivíduo ou grupo),
e o modo para ser alcançada (através de múltiplos mecanismos para regulá-la). Para os
autores, qualquer que sejam as vertentes assumidas, o objetivo da pessoa ou grupo é o
42
PRIVACIDADE
Regulação da interação
Múltiplos mecanismos
Pode ser
entendida
Pode ser
alcançada
Verbal
Não verbal
Ambiental
Sócio-cultural
Pode se
Manis-
festar
Pode se
referir
Solidão
Isolamento
Anonimato
Reserva
Uma pessoa
Um grupo
Intimidade
Com família
Ou amigos
Através
Contato com
os outros
Informações
aos outros
Objetivo:
Equilíbrio
Privacidade desejada
X
Privacidade obtida
mesmo: equilibrar o nível de privacidade desejada com a obtida. Assim, quando o
obtido é inferior ao desejado, a pessoa passa a se sentir como se houvesse “perdido a
privacidade”. Por outro lado, quando o obtido é muito maior do que o desejado, a
pessoa se sente “excessivamente isolada”.
Esse tipo de entendimento evidencia a grande correlação entre os vários
conceitos aqui apresentados (espaço pessoal, territorialidade, privacidade e
aglomeração), os quais, na realidade, muitas vezes se apresentam mesclados, de maneira
que sua separação pode ser entendida como artificial, ou simplesmente didática
ressalva que também corroboro, embora, para efeito de escrita, também tenha optado
pela definição de diferentes itens.
Figura 14. Diagrama de integração temática do comportamento sócio-
espacial humano, tendo a privacidade como base.
FONTE: resumo produzido pela autora, a partir de Sergi Valera & Vidal(1998)
43
Nesse sentido, se considerarmos que a privacidade é um conceito tipo “guarda-
chuva”
3
, quase todas as ameaças de intrusão exemplificadas a partir de noções como
espaço pessoal e territorialidade também podem ser entendidas como ameaças à quebra
da privacidade.
Ressalte-se, ainda, que as condições de privacidade podem ser materializadas
pelo design e mediadas pelos elementos construtivos de uma edificação
(paredes/portas/janelas) encarados como fatores que propiciam a criação ou eliminação
de canais de contato entre pessoas, principalmente se facilmente controlados pelas
mesmas. Na ausência de barreiras físicas, as normas sociais (mais ou menos explícitas)
ajudam a limitar/regular o contato desejável com outras pessoas.
2.3.4 Aglomeração
O último conceito aqui comentado, a título de contextualizar o direcionamento
dessa proposta, é o de aglomeração, estado psicológico que provoca o estresse e que
pode motivar a pessoa a retirar-se de uma situação percebida subjetivamente como
densa. Estar numa situação de aglomeração subentende que o indivíduo sente-se
observado (Tuan, 1983, p. 69), e suas necessidades de espaço ultrapassam a quantidade
de espaço efetivamente disponível, não podendo, portanto, ser entendida como
equivalente à densidade física (número de pessoas por unidade de espaço). Em situações
de aglomeração indesejada obrigatória - como ônibus, elevadores e filas - comportamo-
nos de modo a compensar essa proximidade.
De acordo com Pinheiro e Elali, (1998), o termo aglomeração, corresponde a
crowding em inglês, ou hacinamiento em espanhol, em português sendo também
3
O termo “conceito guarda-chuva” é usualmente definido como um conceito que possui diversas
dimensões e, quase sempre, abarca muitos outros conceitos dentro dele.
44
traduzido como ajuntamento, superpovoamento (Almeida, 1981) e apinhamento (Hall,
1977; Tuan, 1980).
2.4 Percepção Ambiental
Quando alguém diz que vai “pensar” um espaço para alguma função ou situação,
na realidade está se referindo a buscar condições para possibilitar um comportamento
humano harmonioso. Nesse sentido, a Psicologia Ambiental fundamenta-se no
entendimento de que, do mesmo modo que modificamos o espaço à nossa volta, ele
também influencia o modo como agimos dentro dele. Ou seja, o ambiente é elemento
integrante das ações humanas. Não é um mero coadjuvante das situações, mas um
elemento que a integra e participa contínua e ativamente das mesmas.
Nesse contexto, o entendimento do modo como se percebe o ambiente ganha
especial interesse, uma vez que a troca pessoa-ambiente é mediada pelos processos
perceptivos. Nesse trabalho, o estudo da Percepção Ambiental tem como objetivo traçar
linhas gerais sobre esse tema, procurando inserir o contexto da mobilidade em sua
compreensão.
Antes de mais nada, é preciso ressaltar que Percepção é diferente de Sensação.
Sensação é o resultado da ativação de receptores sensoriais do organismo, da
intervenção do Sistema Nervoso Central que decodifica impulsos nervosos. Percepção é
um processo psicológico que integra, em unidades significativas, determinados
conjuntos de informações sensoriais (Gifford, 1997, p.17), permitindo a aquisição de
conhecimento a partir dessa vivência (Bueno, 1986). Além disso, a mente humana é
seletiva, ou seja, iremos “prestar atenção” naquilo que nos despertar interesse, tendo em
45
vista que não podemos jamais perceber o mundo em si, mas apenas o choque das forças
físicas com os receptores sensoriais (Kilpatrick, 1961 citado por Hall, 977).
Segundo Gifford (1997), nos estudos clássicos de Psicologia em laboratório, o
entendimento de estímulos complexos começa a partir de sua decomposição em
estímulos simples. O mesmo autor explica que, na área de Psicologia Ambiental, é
necessário que os pesquisadores enfrentem a enorme quantidade e complexidade dos
estímulos a nosso redor, trabalhando com as percepções do dia-a-dia em ambiente real.
Isso quer dizer, fora do laboratório, em condições não-simuladas, pois é assim que os
estímulos reais acontecem! Encontram-se todos juntos, mesclados por todos os tipos de
registros: perceptivos, afetivos, normativos...simultaneamente (Lévy-Leboyer, 1985, p.
53).
Para esse tipo de trabalho de campo, Gifford (1997) destaca cinco métodos de
estudo da percepção ambiental: amostragem do tempo (observação de uma mesma cena
a cada intervalo de tempo para perceber o que muda); inferência de comportamento
(prever futuros comportamentos a partir do que já foi observado/percebido); métodos
psicofísicos (estudar o que varia na percepção de acordo com alturas dos objetos,
larguras, texturas, medida física variando conforme o brilho etc); métodos
fenomenológicos (investigação na qual o objetivo é usar um único observador muito
cuidadoso que tente perceber a essência de um ajuste em uma maneira qualitativa) e,
por último, o método no qual se insere o presente trabalho: os auto-relatos (investigação
através de questionários, entrevistas, check lists).
Nem todas as pessoas possuem a mesma percepção sobre as coisas, estando tais
diferenças associadas a filtros pessoais (gênero, nível de educação, treinamento
profissional, familiaridade com o local), culturais (valores da sociedade, ambiente onde
se vive) e físicos relacionados às características corporais do indivíduo delimitando suas
46
possibilidades de decodificar o meio e usufruir de suas potencialidades). Além disso,
vários estudos mostram alternância desses fatores na percepção ambiental (Gifford,
1997; Okamoto, 1996). No entanto, as diferenças individuais, apesar de constituírem um
dos dados de observação nos estudos de Percepção Ambiental, não devem ser descritas
como variáveis dependentes na hora da análise, pelo contrário, os investigadores
precisam levar em conta essas diferenças do modo mais sistemático possível
4
(Lévy-
Leboyer, 1985, p. 55).
Gifford (1997) identifica quatro teorias da percepção: (i) Funcionalismo
probabilístico de Brunswik (a pessoa recebe constantemente sinais complexos e
enganosos sobre o ambiente, o que gera estimações probabilísticas da verdadeira
situação e a elaboração de “juízos” sobre o ambiente); (ii) Propriedades colativas do
ambiente de Berlyne (os estímulos ambientais se apresentam em uma determinada
proporção e combinação, despertando atitudes curiosas nas pessoas, cuja base são
conflitos perceptivos como complexidade, novidade e surpresa); (iii) Fenomenologia
(dedicada ao estudo dos fenômenos per se); (iv) Affordance de Gibson (os objetos têm
características que demandam ou provocam determinados comportamentos, de modo
que a percepção do entorno é feita através de uma série de alternativas ambientais que
nos permitem “negociar” com o ambiente e nos relacionarmos com ele).
Alguns estudos indicam a percepção ambiental como fator de medição da
qualidade do lugar. Appleton (1975, citado por Nasar, 1989) afirma que as pessoas têm
percepções diferenciadas sobre os mesmos espaços. Anderson, Mulligan, Goodman e
Rezen (1983) estudaram a influência do som na percepção de espaços abertos. Francis
(1987) descobriu que o modo como a pessoa percebe o espaço contribui para o uso do
espaço. Ulrich (1981) estudou a influência da vegetação na qualidade de vida em
4
Livre tradução do espanhol, feita pela autora.
47
espaços públicos. E Aoki, Yasuoka e Naito (1985) mediram a relação entre presença de
vegetação e satisfação dos usuários.
A percepção ambiental é, portanto, um processo mental sem o qual seria
impossível a consolidação da chamada “experiência ambiental”, e que, segundo Hall
(1977, p. 50) deriva de nosso aparelhamento sensorial, e ocorre a partir de dois tipos
receptores: à distância (que se relacionam com o exame de objetos que estão distantes
de nós, para o que usamos os olhos, o nariz e os ouvidos) e receptores imediatos
(empregados para examinar o mundo de perto, através do tato, das sensações na pele,
membranas e músculos).
Estudando especificamente o ambiente urbano, Lynch (1999) indica que a
percepção ambiental está diretamente relacionada ao modo como o espaço físico se
apresenta ao observador, não apenas quanto às suas formas, mas principalmente quanto
a sua carga de significados. Para esse autor, os lugares são mais facilmente
decodificados quando são legíveis, possuem identidade (elementos que o caracterizam,
que dão personalidade a ele) e trazem consigo a imageabilidade (qualidade que lhe
fornece a evocação de uma forte imagem no seu observador).
Como o ambiente está sendo continuamente avaliado por cada um de seus
usuários, e tendo em vista que o espaço e as pessoas, na maior parte das situações, não
se encontram estáticos, torna-se relativamente simples inferir a importância de levar em
consideração a mobilidade no processo perceptivo. Sadalla (citado por Okamoto, 1996),
por exemplo, mostra que a percepção do comprimento estimado de um trajeto cresce em
função do número das voltas e do número das interseções ao longo do trajeto.
Vários autores (Okamoto, 1996; Cullen, 1983, entre outros) indicam que, em
percursos semelhantes, quanto mais as cenas diferem, mais forte a influência do
48
ambiente na percepção, e quanto mais as cenas são similares, mais forte será a
influência de outros fatores (pessoais, sociais etc).
Nunes (1991, p.130) descreve que enquanto um pedestre se desloca pelo
ambiente, ele passa por um processo que vai desde a percepção e memorização daquele
espaço até o julgamento de qual percurso seria o mais adequado para transitar. Num
resgate evolutivo, a identificação de um ambiente, atrelada ao esforço em traçar
possíveis percursos comportamentais, é necessidade vital na locomoção de todos os
animais (Lynch, 1999). É essa estruturação que irá conferir a sensação de proteção e
satisfação de suas necessidades (Kaplan & Kaplan, 1989).
Saber traçar os melhores trajetos confere ao homem a possibilidade de se
locomover de forma eficaz. E essa locomoção perpassa a questão de deslocamento no
espaço ao longo do tempo.
Quando falamos em “aqui”, estamos falando em “agora”. Se colocarmos a ação
no passado ou no futuro, “aqui” transforma-se em “lá”, porque “agora” passa a
ser então” (Tuan, 1983).
Ou seja, essa conexão entre pessoa, espaço e tempo é tão estreita que, muitas
vezes se confunde. E, em muitas situações, quem intermedeia essa conexão é a
mobilidade.
2.5 Mobilidade
O tamanho de um parque é diretamente
proporcional ao modo como ele é usado.
Remando numa canoa a 5 km por hora, o
lago parece dez vezes mais comprido e
largo do que cruzando-o numa lancha a 50
km por hora. Sempre que uma estrada
toma o lugar de uma trilha ou uma lancha a
motor substitui um barco a remo, a área do
parque diminui. (Brooks, 1974 citado por
Sommer, 1979)
49
Mover-se corresponde a percorrer determinado espaço em um tempo, relação
que implica uma velocidade, e imprime ritmo às atividades humanas. Partindo desse
entendimento, o estudo do movimento no ambiente urbano tem sido identificado como
essencial à pesquisa em Percepção Ambiental, uma vez que “a velocidade do
movimento afeta o modo como o indivíduo percebe e reage ao que se encontra à sua
volta” (Nasar, 1989, p.49). Esse mesmo autor diz serem necessárias pesquisas que
investiguem a percepção ambiental sob a condição de mobilidade e indica esses estudos
como promessas futuras.
Segundo o geógrafo Balbim (2003), o conceito de mobilidade tem como
antecessor o de circulação, que surgiu em 1628, referindo-se ao movimento do sangue
no corpo. No século XIX, com as profundas alterações ocorridas nas cidades, a
circulação passou também a ser associada à idéia de movimento de ar (ou seja,
ventilação), entendido como o contrário de insalubridade. Assim sendo, a ventilação
passa a ser considerada fonte de purificação, de modo que as recomendações
urbanísticas da época sugeriam alargamento das ruas, noções de direção, continuidade e
perspectiva. Apenas depois desses momentos de revolução, circulação começou a ser
referenciada como deslocamento humano.
Atualmente a noção de mobilidade supera a idéia de simples deslocamento, pois
integra a ação de se deslocar e o conjunto de atividades a serem praticadas, de modo que
passa a relacionar-se às vontades e motivações dos envolvidos (Balbim, 2003). A partir
dessa afirmação, pode-se inferir que a mobilidade depende da condição de
deslocamento, mas o deslocamento per se, sem a identificação da atividade que se
executa, não constitui mobilidade.
Segundo Santos (1996, p.50), o espaço é um conjunto de fixos e fluxos em que
os elementos fixos, fixados em cada lugar, permitem ações que modificam o próprio
50
lugar, incitam fluxos novos ou renovados e/ou recriam as condições ambientais e sociais
que redefinem cada lugar. Os fluxos são um resultado direto ou indireto das ações e
atravessam ou se instalam nos elementos fixos, modificando a sua significação e o seu
valor, ao mesmo tempo em que também se modificam.
Complementando tal entendimento, o geógrafo Max Sorre (1952) define
mobilidade como a vontade presente no ser humano de se deslocar, explorar e conhecer
novos mundos, expandir fronteiras.
Por sua vez, Isaac Joseph (1984) identifica a existência de três mobilidades
básicas: uma própria do homem e de sua capacidade de locomoção; a mobilidade frente
ao ambiente no qual a pessoa vive, chamada mobilidade cotidiana; e a mobilidade sem
deslocamento, que configura uma versatilidade no viver (o passar da moda como tempo
de vida, por exemplo). O autor ainda indica que há quem defina outros tipos de
mobilidade, como a social, a geográfica, a profissional, a do trabalho, a ocasional, a
sazonal etc. Frente a tal diversidade é preciso esclarecer que, a mobilidade que se quer
tratar no presente trabalho é aquela referente à segunda categoria identificada por
Joseph (1984): mobilidade frente ao ambiente. Até porque, sendo essa mobilidade
“cotidiana”, é possível traçar paralelos com a Psicologia Ecológica.
Mobilidade cotidiana é aquela com temporalidades curtas, ritmos sociais da vida
cotidiana. É um tempo recorrente, repetitivo, que implica retorno cotidiano à
origem. Sua repetição forja hábitos e práticas espaciais. Esse é o termo mais
correto para se referir aos deslocamentos e suas estratégias, aos orçamentos
espaço-temporais, aos modos de transporte e às condições de acessibilidade. (...)
A mobilidade cotidiana tem duração máxima de uma jornada, circunscrita ao
espaço urbano e é, ao mesmo tempo, conseqüência da organização urbana,
quanto fator de reorganização da cidade. (Balbim, 2004, p. 5)
Portanto, a definição de mobilidade cotidiana assemelha-se à encontrada nos
dicionários críticos de geografia, como aquele editado por Brunet, Ferras & Théry (1993
51
citado por Balbim, 2004), que relaciona a noção de mobilidade com duas dimensões
articuladas, a espacial e a temporal, entendimento que gera as seguintes associações:
migração, mobilidade residencial, viagens e turismo e, finalmente a mobilidade diária.
Mais uma vez, é na mobilidade diária que se encontra a definição para a mobilidade a
qual se refere esse estudo.
Se essa mobilidade humana é tanto conseqüência quanto causa da organização
espacial de uma cidade, tem-se clara a relação que se busca para esse estudo: a
mobilidade como componente da relação pessoa-ambiente. Isso reforça a afirmação de
que o elo que possibilita a relação recíproca entre pessoas e espaços físicos nos estudos
pessoa-ambiente é constituído pela mobilidade (Günther, 2003).
Assim sendo, apesar dessa dissertação utilizar o conceito descrito por Balbim
(2004), para efeito de simplificação, a mobilidade cotidiana, abordada nesse estudo, será
a partir de agora indicada apenas pela palavra mobilidade.
A associação de percepção ambiental e mobilidade não é novidade. Ao definir
seu Método de Percursos, Thibaud (2001) estudou a percepção ambiental dos pedestres
através de seus relatos enquanto percorriam o espaço com o intuito de captar o maior
número possível de sensações estimuladas pelo ambiente. Por sua vez, Gunther (2003)
afirmou que as relações recíprocas pessoa-espaço físico acontecem no espaço físico
mediante mobilidade. Para o autor, territorialidade, espaço pessoal e privacidade são
conseqüências de acordos sociais, de modo que o movimento de uma pessoa (ou de um
grupo) no espaço afeta de maneira imediata e direta todos esses conceitos. Assim,
apesar do espaço pessoal ser portátil, o movimento altera a densidade do recinto e o
espaço pessoal do outro pode interferir (positivamente ou negativamente) no
deslocamento da pessoa. A “aparente” sensação de redução do espaço, advinda dessa
situação de deslocamento, pode modificar a noção de privacidade, tendo em vista que a
52
perda de território torna-se mais freqüente, pela percepção de dimensão alterada. Ou
seja, o estudo da percepção ambiental pode fornecer subsídios para que se entenda como
esses conceitos se modificam quando inserimos a variante mobilidade.
53
3. O calçadão
Figura 15. Estrada de Ponta Negra
(1995)
FONTE: http://www.natal.rn.gov.br
Figura 16.Av. Eng. Roberto Freire
após a construção do calçadão.
FONTE: arquivo da autora
Neste capítulo, segue-se uma livre apresentação do CAERF, seguido de um
breve apanhado histórico e da descrição dos aspectos físicos mais relevantes. O seu
objetivo é o de familiarizar o leitor com o espaço onde será desenvolvido o trabalho.
3.1 O nascimento
A avenida Engenheiro Roberto Freire – antigamente, conhecida como Estrada de
Ponta Negra – é a principal via de acesso entre o centro e a zona sul da cidade (Figura
15). O calçadão foi construído ao longo dessa avenida com o intuito de servir de local à
prática de atividade física. A obra foi iniciada em setembro de 2002 e finalizada em
dezembro do mesmo ano (Figura 16) e toda a área do calçadão se entende desde o
Conjunto dos professores, passando pelo bairro de Capim Macio, até Ponta Negra,
próximo ao mar (Figura 17). A área de estudo desse trabalho compreende dois
54
quilômetros e quatrocentos metros de extensão, no trecho que une a Via Costeira à Rua
Sólon Galvão.
Figura 17.Localização do CAERF (em vermelho): Perspectiva do Parque das Dunas e
oceano Atlântico.
FONTE: http://www.natal.rn.gov.br
A paisagem que o usuário presencia no calçadão possui um certo paradoxo: em
sua margem direita, encontra-se o Parque das Dunas – o segundo maior parque urbano
do Brasil - e em sua margem esquerda, encontra-se uma das avenidas de maior
movimentação da cidade, pois é também uma das únicas vias de acesso às praias do
litoral Sul do estado. Essa dicotomia de cenários à esquerda e à direita resulta numa
paisagem contrastante (Figura 18).
55
Figura 18. Mapa de localização do CAERF (em vermelho e sem escala)
FONTE: Anúncio publicitário dois.a (2008), adaptado pela autora
3.2 Delimitações
A área estudada não abarca a segunda fase do calçadão - localizada da Via
Costeira até a Rua Tivoli (Figura 19). Optei por delimitar a área de estudo à primeira
fase de construção, porque entendi que há usos diferenciados nas duas fases. Além
disso, os usuários da primeira fase, em geral, não fazem uso da segunda fase, e vice-
versa.
56
Figura 19. Mapa com localização das duas fases do calçadão
da Av. Eng. Roberto Freire; Desenho sem escala.
FONTE: Planta da CAERN (2004) adaptada pela autora.
3.3 O entorno
Como comentado anteriormente, em uma das margens da avenida Engenheiro
Roberto Freire está o Parque das Dunas, onde não é permitido construir, por se tratar de
uma zona de preservação ambiental. Na outra margem há muitas edificações, mas não
há residências horizontais ou verticais, somente estabelecimentos de usos institucionais
(escolas e universidades), para serviços (farmácias, bancos e postos de gasolina) e
comércio (shoppings, papelarias, lanchonetes, bares e restaurantes). Há apenas um
terreno vazio na avenida e três lotes com construções, conforme indica o mapa de uso
do solo (Figura 20). Salienta-se, no entanto, que imediatamente a seguir dessa faixa
lindeira está localizado o bairro de Capim Macio, predominantemente residencial
5
.
5
Essa é a configuração de uso do solo foi realizada no mês de novembro de 2007, época do término da
coleta de dados do presente trabalho. Essa área sofre alterações constantes.
57
Figura 20. Mapa de uso do solo do entorno do CAERF
FONTE: produção da autora
3.4 Os componentes físicos
O CAERF é composto por um passeio pavimentado com pedras portuguesas, em
mosaico formando figuras geométricas. Nos abrigos de ônibus, o passeio de 5 metros de
largura fica um metro mais estreito para dar lugar à baía de embarque e desembarque
dos ônibus. Durante os dois quilômetros e quatrocentos metros de extensão, o calçadão
dispõe de placas de sinalização com frases de incentivo à prática de atividade física e
lixeiras. Não há ruas cruzando o CAERF. O único acesso feito por sobre a calçada é
permitido apenas para os usuários/sócios do clube de aeromodelismo (pois a pista fica
dentro do Parque das Dunas) e para o Exército Brasileiro que, eventualmente, efetua
treinamento de seus soldados na reserva ecológica.
Paradas de ônibus e bancos
58
Existem seis abrigos de ônibus (Figura 21) dispostos na porção em estudo: dois
em frente a shoppings, um deles contendo universidade; outro diante de uma lanchonete
e padaria; um quarto abrigo fica em frente a um supermercado, onde foi construída,
recentemente, uma passarela; diante de um cursinho pré-vestibular e, por fim, um sexto
abrigo nas proximidades de pizzaria e churrascaria, próximo à rua Sólon Galvão, onde
recentemente foi construído um segundo supermercado. As paradas são largamente
utilizadas pela população que vai ao trabalho ou que utiliza os serviços presentes no
entorno, no entanto, possui apenas quatro assentos, o que faz com que muitos tenham de
ficar em pé, impedindo a circulação dos que cruzam pelo calçadão. Além disso, em uma
das laterais do abrigo, há um painel com anúncio publicitário.
A cobertura dos abrigos serve para proteger as pessoas do sol, mas em dias de
chuva, não impede que os que esperam se molhem. Isso se deve ao fato de que as
chuvas, na cidade de Natal, em geral, vêm acompanhadas por vento intenso, e as
paradas não estão adequadas a isso.
Nos locais onde há paradas de ônibus e em alguns pontos destinados a
estacionamento de veículos, foram projetadas reentrâncias no calçadão para que o
transito de veículos – intenso em alguns horários do dia – não ficasse prejudicado. Os
abrigos de ônibus são áreas mínimas, que possuem suas laterais destinadas à mídia.
Há 23 bancos (Figura 22) dispostos ao longo do CAERF. São feitos em madeira
e cimento. Os assentos não possuem encosto.
59
Figura 21.Abrigo de ônibus em frente à
uma pizzaria
FONTE: arquivo da autora
Figura 22. Exemplar de bancos do calçadão
FONTE: arquivo da autora
Lixeiras, placas e adequação a portadores de condições especiais de
locomoção
Ao longo do calçadão, encontram-se ainda 26 lixeiras, 12 placas
informativas/ilustrativas (Figura 23) e rampas rebaixadas de acesso para portadores de
cadeiras de roda com sinalização para portadores de deficiência visual (Figura 24).
Algumas frases ilustram atividades corriqueiras do calçadão, dando um enfoque no uso
da prática desportiva: cuidados com a pressão sanguínea, recomendações saudáveis e
frases de incentivo à prática de atividades físicas. A inscrição “Lazer é um direito de
todos” denota o papel de espaço público assumido pelo calçadão. E há ainda frases
educativas que pregam o caráter de formação do cidadão-usuário, como “cuide do nosso
calçadão, ele também é seu!” e “Quem ama a vida, ama o verde”.
60
CAERF: aspectos de seu cotidiano
A observação empírica ao longo dos últimos dois anos permitiu traçar de forma
superficial o cotidiano do CAERF, majoritariamente freqüentado por pessoas que
desenvolvem atividades físicas (caminham, correm e pedalam), usuários de paradas de
ônibus, turistas, casais de namorados e pessoas que passeiam com seus cães.
A movimentação no local começa por volta das quatro e meia, quando a
incidência solar é mais amena e perdura até por volta das nove horas da manhã. O vazio
demográfico ocorre primordialmente ao meio-dia, quando a falta de sombras dificulta a
permanência no local. Ao final da tarde, o movimento se intensifica novamente. O
horário de pico ocorre às dezoito horas, tanto do trânsito de veículos, quanto de pessoas.
Durante a madrugada, às vezes observa-se prostitutas na área, embora em pequena
quantidade, sobretudo quando se compara à incidência delas na margem oposta da via.
A segurança é feita por viaturas da Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas
(ROCAM), além de viaturas do Batalhão de Operações Policiais e Especiais (Bope) e da
Companhia de Polícia Feminina (CPFEM).
Sempre há pessoas transitando pelo CAERF, pois a busca pelo local para exercer
algum tipo de atividade física parece ter virado hábito, sobretudo para os que moram
Figura 23. Exemplar de placa e lixeira do
calçadão;
FONTE: arquivo da autora
Figura 24. Rampa com sinalização
para portadores de condições
especiais de locomoção;
FONTE: arquivo da autora.
61
nas proximidades. Dentre os usuários, há predominantemente pessoas que desenvolvem
diversos tipos de atividades físicas e os utilizadores de abrigos de ônibus (Figura 25).
Figura 25. Vista geral do CAERF.
FONTE: arquivo da autora
62
4. Percurso metodológico
Sendo meta do presente estudo provocar a reflexão sobre o efeito da mobilidade
na percepção ambiental e no comportamento dos usuários do CAERF, foi preciso traçar
um plano de percurso. Para tanto, optei por ferramentas que possibilitassem a
identificação e descrição das características ambientais e comportamentais relacionadas
a essa mobilidade a fim de lançar um olhar adequado sobre a percepção e o
comportamento sócio-espacial humano no local de estudo.
Devido ao caráter qualitativo e interdisciplinar da temática, e corroborando as
indicações da área de Psicologia Ambiental no que se refere à utilização de
multimétodos (Sommer & Sommer, 1986), a estratégia metodológica adotada explorou
as vantagens do uso de vários instrumentos para a compreensão dos fenômenos,
buscando propiciar a adequação das dimensões tempo e espaço, essenciais ao
entendimento da mobilidade
6
.
O percurso multimetodológico para o trabalho de campo, englobou: (i)
observação participante in loco, para afinar a inter-ação com o espaço estudado e
levantar as principais atividades desenvolvidas no CAERF, tendo em vista que o
comportamento está ligado ao local onde ele ocorre (Günther, Nepomuceno, Spehar &
Günther, 2003); (ii) identificação dos principais behavior settings presentes na área,
seguindo o roteiro de Wicker (1979), que consta no anexo 01; (iii) pré-categorização das
atividades que convivem naquele local, seguindo dois critérios diferenciados (gerados
em função das 2 etapas anteriores), e cujo objetivo foi limitar o universo dos
6
Essa associação foi articulada junto à fase de término de coleta dos dados, já tendo sido comentada no
capítulo 2.
63
entrevistados; (iv) realização de entrevista com os usuários do CAERF, com gravação
da voz do entrevistado e posterior transcrição do material coletado. Além disso, também
foram executados: (v) registro de imagens da ocupação da área em estudo e (vi)
construção de um diário da pesquisadora, para documentação do processo de abordagem
do problema e (re)conhecimento do objeto estudado (Figura 26).
Buscou-se, portanto, explorar as condições de uso do CAERF a partir do viés
teórico (Psicologia Ecológica) e da observação participante direta.
4.1 Observação empírica e construção do diário de campo
Sendo a aproximação pessoal com o local de estudo imprescindível ao trabalho
pretendido, o exercício de observação empírica no CAERF durou de dezembro de 2006
ao término de 2007.
A partir dessa observação foi construído um diário (ver trecho do diário no
apêndice 2.) das principais ocorrências verificadas no local, tendo por objetivo auxiliar
na identificação de behavior settings e nas interações pessoa-ambiente do local, de
Figura 26. Esquema do percurso multimetodológico escolhido.
FONTE: produção da autora.
Formulação de duas
categorizações: teórica (análise de
behavior settings) e observacional
Entrevistas com os usuários
Reconhecimento do local
Diário de campo
da pesquisadora
Registro de imagem
Ferramentas Complementares:
64
modo a promover uma tomada de consciência a respeito do processo de investigação a
ser utilizado. Diariamente, após o término da visita ao local, eram anotadas observações
consideradas relevantes, embora no início da construção dessa ferramenta não se tivesse
ainda a idéia do que seria abordado de forma definitiva. O diário foi, também, uma fonte
pessoal no rebatimento dos dados coletados com a realidade observada, recurso
metodológico complementar, mas não menos importante.
Foi através da observação empírica e das conversas informais que se pôde,
inclusive, iniciar o processo de categorizações dos usuários
7
, reduzindo o universo de
análise para as principais ocorrências no calçadão.
4.2 Documentação fotográfica
O registro de imagens também se fez necessário para ilustrar os modos de
interação identificados no CAERF, embora não seja proposta desse estudo fazer um
levantamento iconográfico exaustivo. O registro de imagem teve por objetivo auxiliar
na exposição de algumas análises, mas não se trata de um estudo imagético detalhado.
4.3 Análise de behavior settings
Metodologicamente, a Teoria de Barker serviu como ponto de partida para o
entendimento da dinâmica de ocupação do calçadão, começando pela compreensão dos
behavior settings existentes no local, analisados segundo roteiro adaptado a partir dos
exercícios 1 e 2 de Wicker (1979) que, tendo em vista as propriedades de um BS
(conceito explicitado no capítulo 2 dessa dissertação), anuncia elementos como:
condicionantes espaciais, temporais e de quantidade de componentes presentes em cada
atividade, identificação de programa e limitações.
Em termos seqüenciais, primeiro foram identificados os principais sinomorfos,
7
Essa categorização observacional será vista na p.71.
65
ao que se seguiu a identificação de behavior settings e análise de genótipos ambientais,
na seguinte seqüência:
a) Identificação dos principais sinomorfos, seguindo o roteiro de Wicker (1979)
b) Comparação de sinomofos dois a dois, segundo os critérios: interdependência de
comportamentos, de população, de líderes, interdependência espacial,
interdependência com base a contigüidade temporal, interdependência de
componentes não-humanos e semelhança nos mecanismos comportamentais. De
acordo com as indicações de Barker (1968), a cada um desses sete itens é
atribuído um valor-índice “K”. Somados esses índices, se o valor obtido for
superior a 21, indica que cada sinomorfo é um BS independente (ou seja, trata-se
de dois BSs). Se for inferior a 21, indica que os sinomorfos pertencem a um
mesmo BS. Para facilitar a compreensão da atividade e seus resultados, foram
construídas tabelas comparativas entre sinomorfos, algumas das quais são
apresentadas ao longo do texto.
c) Identificação de BSs complexos semelhantes e seu agrupamento em genótipos
ambientais (Barker, 1968), nos casos em que seus padrões ambientais eram
muito semelhantes. Os itens analisados dizem respeito aos percentuais de
semelhança/diferença no programa, no tempo de treinamento dos componentes
humanos para exercer esse programa, itens do programa que são intransferíveis e
tempo usado na manutenção dos itens não transferíveis. Pertencem a um mesmo
genótipo, dois (2) BSs cuja média dessas quatro porcentagens for inferior a 25%;
além disso, nenhum dos itens analisados pode ter obtido avaliação superior a
esse número (25%).
A análise realizada permitiu a identificação e classificação dos principais BSs
encontrados no calçadão em função do conceito de genótipo, tendo gerado uma
66
série de questionamentos ao serem trazidos à realidade do CAERF.
4.4 Entrevista com os usuários
A seleção dos entrevistados ocorreu a partir do cruzamento dos resultados de
dois estudos diferenciados: a análise de behavior setting, tendo em vista que o estudo
abrange a valorização da análise do cotidiano; e as observações realizadas pela
pesquisadora.
A elaboração do roteiro para a entrevista semi-estruturada
8
levou em conta o
modelo tópico guia desenvolvido por Bauer e Gaskell (2002), a partir do qual são
construídas perguntas abertas adequadas à investigação em questão, priorizando uma
estruturação que abarque praticidade, objetividade, eficiência e flexibilidade. Devido a
isso, foram realizadas várias entrevistas-piloto antes da ida a campo. Por questões de
ética científica, antes de cada entrevista, foi entregue ao entrevistado um documento
com explicações básicas relativas ao estudo, contendo um termo de consentimento
esclarecido, a ser assinado, caso o selecionado se dispusesse a participar da entrevista. O
número de entrevistas não foi pré-determinado antecipadamente, entendendo-se que a
coleta seria considerada terminada quando as respostas obtidas começassem se tornar
demasiadamente repetitivas.
4.4.1 O desafio da categorização
Mesmo sendo uma seleção qualitativa dos entrevistados, foi necessário elaborar
um critério para abarcar exploratoriamente o máximo da diversidade de atividades
representativas do CAERF. Diante de tal dificuldade e do tamanho do universo de
usuários, a escolha dos participantes teve como base o cruzamento de dois critérios: (i) a
8
Define-se como: formulação da maioria das perguntas previstas com antecedência e sua localização é
provisoriamente determinada (Colognese & Melo, 1998).
67
dinâmica da pesquisa social empírica, através da observação in loco, e que passou a ser
chamada categorização observacional; e (ii) a análise de behavior setting, tendo em
vista que o estudo abrange a valorização da análise da vida em seu cotidiano real,
doravante denominada caracterização através da teoria de BSs.
4.4.2 Elaboração do roteiro de entrevista
Para a elaboração do roteiro de entrevista individual ou tópico guia – conforme
defendem Bauer e Gaskell (2000) – foi feito, inicialmente, um tópico guia, buscando
construir perguntas adequadas à investigação exploratória. Entende-se o tópico guia
como parte vital do processo de pesquisa, planejado para dar conta dos fins e objetivos
da pesquisa (Bauer & Gaskell, 2000, p. 66). Para tanto, é necessário lançar mão dos
elementos identificados na observação de campo, além de inserir o contexto sobre o
qual se quer refletir, no caso, o enfoque do contexto da mobilidade na percepção do
usuário sobre o CAERF. Após a primeira elaboração do roteiro, foi feita uma entrevista
piloto, sob observação do grupo de pesquisa GEPA (Grupo de estudos inter-Ação
Pessoa-Ambiente) e, posteriormente, abriu-se a discussão a respeito do instrumento
investigativo. Após algumas sugestões, o roteiro de entrevista sofreu algumas
alterações, tais como melhoramentos no entendimento da pergunta formulada, alertas
sobre a conduta imparcial da entrevistadora, retirada de repetições e inclusão de alguns
pontos chaves.
Para embasamento metodológico, foram seguidas algumas recomendações de
Bauer e Gaskell (2000) para a elaboração do tópico guia:
Praticidade. Todos os tópicos a serem investigados deverão caber em uma
página;
68
Objetividade. Deve ser elaborado um conjunto de títulos de parágrafos e não
perguntas específicas;
Eficiência. O tópico guia deve ser um lembrete ao entrevistador;
Flexibilidade. O entrevistador não deve se tornar escravo do guia e sim usar
sua imaginação social científica para perceber quando temas considerados
importantes e que não poderiam estar presentes em um planejamento ou
expectativa anterior, aparecerem na discussão. Assim como alguns tópicos
que seriam centrais podem se tornar desinteressantes por razões teóricas ou
porque o entrevistado poderia ter pouco a acrescentar ao tema (Bauer &
Gaskell, 2000, p. 67).
Primeiramente, o quesito “número da entrevista” discrimina a ordem de
execução das mesmas, seguida da situação de entrevista, ou seja, em que local foi
aplicado o instrumento de coleta e sob quais circunstâncias o entrevistado se encontrava
fisicamente. Esse apontamento deve-se ao fato de que algumas entrevistas foram
realizadas no CAERF e, portanto, foram feitas no momento em que o entrevistado fazia
alguma atividade física percorrendo o espaço ou logo após esse momento. Tendo em
vista que essa condição física pode apresentar alterações da resposta, foi necessário
explicitá-la.
A caracterização do respondente foi outro tópico explicitado pela pesquisadora
antes do momento de perguntas abertas, assim como o local/situação de entrevista.
Características como gênero, idade, escolaridade, estado civil e bairro de moradia foram
descritos para compor os dados sócio-demográficos.
69
4.4.3 Perguntando ao usuário
Uma vez definidos os tópicos-guias, seguindo as indicações de Bauer e Gaskell
(2000, p.67), foram elaboradas 19 perguntas básicas para a entrevista, conforme consta
do apêndice 1 do presente trabalho. Entre essas perguntas pré-elaboradas havia espaço
para comentários mais específicos a respeito daquilo que era verbalizado pelo
respondente, com o intuito de investigar a precisão do discurso de cada um dos
entrevistados. A seguir, uma breve descrição do objetivo inicial das perguntas
formuladas.
Primeiramente, foram levantados os dados sócio-demográficos do respondente.
Em seguida, a primeira pergunta tinha como desafio fazer o respondente resumir o local
em algumas palavras para começar a inseri-lo no contexto daquele espaço e resgatar sua
percepção ambiental.
O primeiro grupo de perguntas visava adequar o respondente dentro das
categorias formuladas para o estudo: o número de vezes que vai ao calçadão, se vai
sozinho ou acompanhado, que atividade costuma e em que horário. Sempre mantendo
em vista as implicações secundárias que essas escolhas poderiam ter, por exemplo: a
freqüência com que o usuário acessa o espaço pode fornecer dicas sobre o nível de
conhecimento que o mesmo tem sobre o local estudado; ou saber se o entrevistado já
executou mais de uma atividade no local pode ajudar e identificar possíveis alterações
na forma como enxerga o espaço ao seu redor, dependendo da atividade que
desempenha. A hipótese é a de que isso forneça considerações sobre o tipo de
mobilidade ou características associadas a velocidade do(a) entrevistado(a),
modificando a sua percepção. Além disso, foi solicitado ao respondente que refletisse
acerca do porquê de suas escolhas, ou seja, se havia alguma outra opção disponível que
parecia menos interessante a ele e por qual motivo. Era o que acontecia, por exemplo,
70
quando pedia-se para o respondente refletir sobre o horário escolhido para fazer a
atividade física e nas possíveis influências desse horário em seu desempenho.
Após sensibilizar a percepção ambiental do respondente, o segundo bloco de
perguntas, a partir da questão 7, tentava inserir um outro contexto na conversa: o da
mobilidade. A definição do plano de trajetória do usuário traça seu grau de intimidade
com o local, aliando grau de observação com o meio de transporte que escolhe para
chegar ao calçadão, por exemplo. Medir o grau de atenção do usuário, enquanto se
move pelo espaço, foi outro desafio desse segundo bloco de perguntas. Uma vez que
o(a) respondente já refletiu sobre a atividade que desempenha e já teve de fazer o
esforço de se imaginar percorrendo o espaço, identificar a existência elementos que o
distraem se torna mais fácil.
As perguntas 9 e 10, do terceiro bloco de questões, poderiam ser invertidas, caso
o entrevistado demonstrasse, até o presente momento, indicações de que enxergava mais
aspectos negativos ou positivos no CAERF. A primeira pergunta a ser feita viria ao
encontro das demonstrações do entrevistado.
Após refletir sobre seu próprio movimento, começava a quarta etapa da
entrevista, onde o respondente era convidado a refletir sobre o movimento das outras
pessoas e elementos que compõe o calçadão, investigando sua percepção sobre o que o
cerca: o tipo de atividade dos outros, as modificações espaciais pelo fato de estarem
sozinhas ou acompanhadas, a capacidade do calçadão em comportar as atividades ali
existentes e possíveis problemas de convivência pública.
A partir da questão 12 iniciava-se a quinta e última etapa da entrevista, na qual
os respondentes era levados a pensar em como lidavam com os elementos atrelados à
atividade que desenvolviam: como se processava a percepção que desenrolava a ação de
driblar o outro? Como se dá a implicação do tempo nessas pequenas escolhas espaciais
71
do ir e vir? E quando há algo novo? Como lidar com isso?
As duas últimas perguntas do roteiro (18 e 19) possuem um viés de percepção
ambiental cruzando com conceitos do CSEH, principalmente no tocante à privacidade.
Tomou-se a idéia da privacidade para seguir a sugestão de Valera e Vidal (1998), que
utilizam a privacidade como base para o estudo dos demais conceitos.
Embora tenha sido traçado, aqui, um parâmetro das expectativas das perguntas
formulada, é importante que se diga que durante a aplicação das entrevistas – por se
tratarem de perguntas abertas – novas descobertas foram feitas, pois novos
levantamentos relevantes serviram para otimizar a investigação da percepção ambiental
do usuário entrevistado.
No tocante ao procedimento de entrevista seguiu-se a seguinte ordem: breve
explicação do estudo desenvolvido, pedido de assinatura do termo de consentimento
informado, aplicação da entrevista mediante tópico guia, solicitações de comentários
adicionais e esclarecimento de possíveis dúvidas dos entrevistados a respeito da
pesquisa da qual participaram.
72
5. Vários ritmos: apreciação dos resultados
Toda trajetória é traçada com o intuito de levar a algum destino. No entanto,
para chegar a esse lugar é preciso reunir alguns elementos a serem trabalhados até
atingir a reta final, em um processo semelhante a buscar pelo tênis adequado à nossa
caminhada. Também é assim que acontece com a coleta dos dados de uma pesquisa.
Este capítulo contém a apresentação dos dois processos de categorização
realizadas nesse estudo, a análise observacional, análise a partir de BS e, finalmente, os
desdobramentos do contato direto com os usuários, com alguns resultados das
entrevistas.
5.1 Observando a realidade (categorização observacional)
A pré-categorização observacional recorreu às informações coletadas pelo
contato cotidiano da pesquisadora ao CAERF e delimitou o universo de atividades
segundo as principais ocorrências no calçadão (Figura 27). O único critério foi a
velocidade do deslocamento e as categorias assim definidas foram:
Corredores. Todos os usuários que se locomovem a pé em ritmo maior do
que o da caminhada;
Caminhantes. Todos os que caminham como exercício, seja se modo leve,
moderado ou intenso;
Ciclistas. Todos os usuários de bicicletas.
Estáticos. Aqueles que não estão em estado de deslocamento, como as
73
pessoas que esperam no ponto de ônibus ou utilizam os bancos dispostos ao
longo do local.
5.2 Analisando behavior settings no local (categorização através da
análise de BSs)
Tendo como base o roteiro de Wicker (1979) – ver anexo 01 -, e buscando
explorar o máximo possível de sinomorfos
9
, elaborou-se uma lista inicial contendo as
principais atividades que convivem no local e a adição de condições adicionais, tais
como: horário em que a atividade é desempenhada (separados por turnos do dia, ou seja,
manhã tarde e noite), número de pessoas fazendo a atividade conjuntamente, presença
ou não de animal no desempenho da atividade.
Por configurarem um uso totalmente diverso do dedicado à prática de atividades
físicas, os usuários localizados nos abrigos de ônibus foram analisados separadamente
diante das condicionantes descritas anteriormente. Nos casos dos usuários dos bancos
(assentos), surgiram dois grupos para abarcar a utilização desse equipamento urbano: os
em atividade estática, ou seja, que possuem comportamento com menor movimentação,
tal como namorar, conversar, esperar, descansar; e os em atividade dinâmica, ou seja,
desempenhando atividades com mais movimentação do corpo, tal como alongamento,
abdominais e outros exercícios.
9
Ver apêndice 6
Figura 27. Categorias representativas do CAERF,
viés observacional.
Corredores
Caminhantes
Ciclistas
Estáticos
74
Segundo esses critérios, chegou-se aos 36 sinomorfos (Figura 28):
A partir desses sinomorfos, foram formulados sub-critérios ou perguntas visando
estabelecer o confronto entre sinomorfos para avaliar a possibilidade de corresponderem
a um mesmo BS, como por exemplo, a diferenciação de BS devido ao gênero ou idade
das pessoas envolvidas, ou ainda, horário efetivo em que a atividade se desenrolava.
Para cada análise, foram confrontados, dois a dois, sinomorfos com maiores
semelhanças de propriedades entre si, para o que, a fim de facilitar a apresentação dos
resultados, recorreu-se à construção das tabelas.
5.2.1 Delimitações de sinomorfos: buscando as similaridades
a) Delimitação por tipo de ocorrência. Alguns sinomorfos eventuais não fizeram parte
da análise por não corresponderem a atividades representativas do local:
Caminhando com carrinho de bebê;
Correndo com carrinho de bebê;
turistas caminhando na primeira fração do calçadão;
Pedalando em dupla, em grupo ou com cachorro;
Figura 28. Principais sinomorfos no CAERF
75
Transeuntes alcoolizados;
Portadores de condições limitadoras da mobilidade;
b) Delimitação por atividade:
Como as principais atividades daquele equipamento urbano são a atividade física
e a espera por ônibus justifica-se a escolha por esses dois principais tipos de eventos
para a análise do local.
c) Delimitação espacial:
Três espaços foram considerados na análise:
Para os sinomorfos de desempenho de atividade física, levou-se em consideração
todo o percurso do calçadão. Para as ações estática e dinâmica nos bancos, foram
considerados todos os bancos dispostos ao longo do calçadão. E, para os casos de espera
por ônibus, todas as paradas dispostas ao longo do calçadão.
d) Delimitação por término de programa:
Sinomorfos que se extinguem por ausência de um dos componentes humanos ou
por mudança de atividade/programa (pessoas caminhando que passam a correr, por
exemplo) não foram levados em consideração.
e) Delimitação por percurso
:
O percurso considerado para a análise de atividade física compreende toda a
extensão do calçadão, no trajeto de ida e volta, independente do número de vezes que
faz esse trajeto, pois é o percurso feito pela maioria dos freqüentadores.
5.2.2 De sinomorfos a behavior settings
Após as delimitações dos principais sinomofos (Figura 28), foi feita uma análise
para averiguar se os mesmos configuram um mesmo Behavior Setting. Para tanto, foram
elaboradas perguntas que visam esclarecer as possibilidades, diante das variáveis de
76
análise, como: espaço, turno do dia, tipo de atividade e quantidade de componentes não-
humanos.
5.2.3 Formulação de perguntas a serem respondidas a partir do viés teórico:
Pergunta 01: O calçadão, com todas as atividades que ali convivem, é um só behavior
setting, que pode ser denominado “desempenho de atividade física no CAERF”, ou são
vários?
Partindo da premissa de que, para avaliarmos a condição de um behavior setting,
há sete itens de análise que devem ser considerados, percebe-se que ali convivem
diversos behavior settings, pois em cada atividade física desempenhada, há diferentes
líderes, diferentes programas que não dependem um do outro para ocorrer – visto que
para uma pessoa caminhar, basta que ela se dirija ao local, sem necessidade de haver
uma outra pessoa correndo, por exemplo - diferentes horários do dia e mecanismos
comportamentais que variam de acordo com a necessidade da ação desempenhada,
concluímos que todos os tipos de comportamento não podem pertencer a um
behavior setting.
Pergunta 2
: Considerando que o espaço utilizado é o mesmo, será que, por si, essa
condição faz com que alguns sinomorfos consolidem-se como um mesmo behavior
setting?
Para responder a essa pergunta, foram descritos vários sinomorfos que variam
conforme o horário, a atividade física desempenhada e a quantidade de pessoas.
A título de ilustração desse processo, foram inseridas análises de sinomorfos que
possuem apenas o espaço em comum. As demais análises realizadas, delimitadas por
critérios diversos, podem ser vistas no apêndice 6 desse estudo.
77
Na análise (Tabela 1), o foco do estudo é a atividade física, considerando toda a
extensão do calçadão. Para tanto, foram estudados nove sinomorfos, observando-se o
cuidado em variar a quantidade de pessoas, a idade dos participantes, o horário do dia, o
tipo da roupa
10
, ações desempenhadas e objetos utilizados. Aqui, serão demonstrados os
primeiros exercícios dessa seqüência. Para efeito prático, os demais testes que
tencionam variar esses aspectos em sua totalidade, bem como as interdependências de
BSs e a verificação de genótipo ambiental poderão ser apreciados no apêndice 6 desse
trabalho.
10
Chamou-se de roupas A aquelas destinadas à prática de atividade física e de roupas B as demais
vestimentas utilizadas para o trabalho, lazer, compras etc.
78
S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9
Nome
Idosa
caminhando
sozinha de
manhã
Casal caminhando
de tarde
Duas amigas
caminhando
à noite
Homem
caminhando com
cachorro
de noite
Moça
correndo
sozinha
de manhã
Pai e filha
correndo
à tarde
Quatro
rapazes correndo à
tarde
Senhor correndo
com cachorro de
noite
Uma
adolescente
Pedalando
de tarde
Limite físico
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Calçadão,
percurso
completo
Limite temporal
8-9H 16-17H 18-19H 19:30-20:40 6-7:30 16:40-17:30 16-18H 20-21H 16-17H
Componentes
Humanos
1 mulher
idosa
Um homem e uma
mulher
2 mulheres 1 homem 1 mulher
1 homem e 1
moça
4 adolescentes 1 homem 1 moça
Componentes
não-humanos
Roupas A,
tênis,
bengala,
óculos
escuros
Roupas A, tênis,
toalha e óculos
escuros
Roupas A e tênis,
bola de borracha
Roupas A, tênis e
cachorro
Roupas A,
tênis, óculos
escuros e
walk man
Roupas A,
tênis, óculos
escuros e
monitores
cardíacos
Roupas A, tênis,
walk man, óculos
escuros e monitor
cardíaco
Roupas A, tênis e
cachorro
Roupas A,
tênis,
bicicleta e
óculos
escuros
Líder
único Compartilhado (2)
Compartilhado
(2)
Compartilhado
(homem/cachorro)
único
Compartilhado
(2)
Compartilhado (4)
Compartilhado
(homem/cachorro)
único
Ponto Focal
Exercício Exercício/conversa Exercício/paquera
Exercício/passeio
com o cachorro
Exercício Exercício Exercício/paquera
Exercício/levar
cachorro pra fazer
xixi
Exercício
Mecanismo
comportamental
Andar,
observar,
cantar,
sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir,
enxugar suor
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
sensação tátil,
ouvir, guiar
cachorro
correr,
observar,
cantar,
sensação tátil,
ouvir
Correr,
observar, falar,
sensação tátil,
ouvir, driblar,
monitorar
batimentos
Correr, observar, ,
sensação tátil, ouvir
e monitorar
batimentos
correr, observar,
sensação tátil,
ouvir, controlar o
cachorro
Pedalar,
observar,
ouvir
Descrição do
Programa
chega ao
calçadão;
anda 10
minutos;
senta-se 5
minutos;
anda
novamente;
acena para
conhecidos,
equilibra-se
com bengala
chega ao calçadão;
faz alongamento;
anda durante uma
hora enquanto
conversa, observa
as pessoas e fala
com conhecidos.
chega ao
calçadão;
caminha, ri,
conversa, observa
os rapazes, aperta
a bolinha de
borracha,
encontra outras
pessoas
chega ao
calçadão; ajeita
coleira do
cachorro, caminha
enquanto observa
pessoas e esquiva-
se com o
cachorro.
chega ao
calçadão; faz
alongamento;
corre
enquanto
observa, ouve
música,
cumprimenta
pessoas
conhecidas e
dribla as
pessoas.
chega;
corre;dribla
pessoas e opta
caminhos que
evitem a
separação dos
dois que correr
juntos, observa,
conversa e
monitora os
batimentos
cardíacos
chega ao calçadão;
corre enquanto
dribla pessoas e
opta pelos
caminhos que
menos evitem a
separação dos 4
que correr juntos,
observa, conversa e
monitora os
batimentos
cardíacos e ouve
música
chega ao
calçadão; corre
enquanto dribla
pessoas, observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas
chega ao
calçadão;
pedala
enquanto
dribla
pessoas,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas
Tabela 1. Descrição dos sinomorfos experimentais, com variação do tipo de atividades.
79
5.2.4 Estudo das interdependências (buscando BSs):
A fim de facilitar a tarefa, para analisar se cada par de sinomorfos descritos
pertenciam a um mesmo BS ou eram BS diferentes, procurou-se selecionar pares que
tivessem aspectos a serem comparados (diferentes e semelhantes): quantidade de
componentes (sozinho, em dupla, em grupo ou com cachorro), horário de utilização do
CAERF (manhã, tarde ou noite), tipo de atividade desempenhada (pedalar, correr,
caminhar, sentar nos bancos, ou esperar ônibus), além de confrontos a respeito do
gênero e idade do usuário. Chamou-se de “BS a ser averiguado” cada aspecto a ser
comparado.
Assim, analisar se a diferença de quantidade de componentes humanos, dentro
de uma mesma atividade influenciaria a denominação do BS foram comparados: S1
(idosa caminhando sozinha de manhã) x S2 (Casal caminhando de tarde), ou seja, com
variação de quantidade na ação caminhar. Em seguida faz-se o confronto, S5 (Moça
correndo sozinha de manhã) x S7 (Quatro rapazes correndo à tarde), ou seja, com
variação de quantidade na ação correr (Tabela 2).
Para a mesma análise com base na quantidade de componentes humanos (em
atividades diferentes) foram confrontados: S2 (Casal caminhando de tarde) x S6 (Pai e
filha correndo à tarde) (casais); e S4 (Homem caminhando com cachorro de noite) X
S8 (Senhor correndo com cachorro de noite), ou seja, atividades diferentes com uso de
cachorro. Depois, faz-se a investigação entre o sinomorfo S5 (Moça correndo sozinha
de manhã) X S9 (Uma adolescente Pedalando de tarde), a atividade pedalar versus
correr (Tabela 2).
80
Para investigar se dois sinomorfos que possuem a mesma atividade e mesmo
número de pessoas, mas que ocorrem em diferentes horas do dia, pertencem a um
mesmo BS, fez-se a investigação entre S3 (Duas amigas caminhando à noite) X S2
(Casal caminhando de tarde) (Tabela 2).
S1a X S2a S5a X S7a S5a X S9a S2a X S6a S4a X S8a S3 x s2
Itens
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC Índice K ESC
Índice
K
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De população
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De líderes
34-66 3 5-33 4
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1 34-66 3
Espacial
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
Contigüidade
Temporal
0 -4 7 0 -4 7 0 -4 7 50-74 2
50-
74
2 0 -4 7
Componentes
não-humanos
Mais
da 1/2
3
Mais
da 1/2
3
Mais
da
1/2
3
Mais
da 1/2
3
Mais
da
1/2
3
Mais
da 1/2
3
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
0-1
Quase
iguais
1
0-1
Quase
iguais
1 2-3 2 2-3 2 2-3 2
0-1
Quase
iguais
1
Total
29 36 27 23 23 29
RESUL TADO
BS diferentes BS diferentes BS diferentes BS diferentes
BS
diferentes
BS diferentes
Tabela 2. Comparativo de sinomorfos da tabela 1
Como todos os valores do índice K foram superiores a 21, o resultado dessa
análise é a de que os sinomorfos confrontados configuram BSs diferentes. Como o
estudo efetuado com S2a X S6a e S4a X S8a o resultado foi 23, ou seja, muito próximo
a 21, a teoria indicaria uma nova pesquisa para garantir a afirmativa. No entanto, como
o objetivo dessa aplicação é apenas fazer indicativos para as futuras entrevistas, optou-
se por considerá-los behavior settings diferentes, o que aumentaria o número de
entrevistas.
Reproduzindo o mesmo raciocínio para confrontar outros sinomorfos, foi
analisada a utilização dos bancos (Tabela 3). Esses sinomorfos (de S10 a S14) possuem
um aspecto novo diante dos sinomorfos já apresentados: a ausência de deslocamento.
Enquanto os sinomorfos que possuíam a ação de caminhada e corrida, por exemplo,
81
referem-se a ações de movimento, a utilização dos bancos, assim como a espera em
paradas de ônibus (Tabela 5) compreendem ações sem deslocamento no espaço.
Nesse confronto, os sinomorfos foram novamente descritos e posteriormente
fez-se o mesmo cálculo anterior de medição do índice K para determinar as
interdependências e averiguar quais pertencem a um mesmo BSs.
S10 S11 S12 S13 S14
Nome
Casal namorando no
banco
de noite
(A. estática)
Homem
fazendo alongamento no
banco de tarde (A.
dinâmica)
Dupla
conversando no
banco de manhã
(atividade
Estática)
Senhora fazendo
abdominal no banco de
tarde
(A. dinâmica)
Duas pessoas
esperando ônibus
e utilizando um
dos bancos à
noite
(A. Estática)
Limite físico
Calçadão, banco Calçadão, banco Calçadão, banco Calçadão, banco Calçadão, banco
Limite temporal
19:30-20H 17:15-17:30H 8:00 – 9:00 17:25- 17:37 18:00-18:15
Componentes
Humanos
1 homem e uma
mulher
1 homem 2 homens 1 mulher
Um homem e
uma mulher
Componentes
não-humanos
Roupas B, mochilas,
flores, banco
Roupas A, tênis, óculos
escuros, walk man, banco
Roupas A, tênis,
óculos escuros,
walk man, banco
Roupas A, tênis, óculos
escuros, walk man, banco
Roupas B, livros,
banco
Líder
Compartilhado (2) único
Compartilhado
(2)
Único Compartilhado
Ponto Focal
Namoro/Conversa Exercício/Alongamento Conversa Exercício/Abdominal Esperar ônibus
Mecanismo
comportamental
Namorar, conversar,
sensação tátil, falar,
ouvir, observar
Alongar, ouvir, sensação
tátil
conversar,
sensação tátil,
falar, ouvir,
observar
Fazer esforço, ouvir,
sensação tátil
Conversar,
observar,
sensação tátil
Descrição do
Programa
chega ao calçadão;
senta no banco,
abraça, beija,
conversa, observa
chega ao calçadão; senta no
banco, alonga as pernas,
braços, observa,
cumprimenta pessoas
conhecidas, ouve música,
canta, depois do
alongamento vai embora
para começar outra
atividade
chega ao
calçadão; senta
no banco,
conversa, observa
chega ao calçadão; deita
no banco, ouve música,
depois do exercício, vai
embora para começar
outra atividade
chega ao
calçadão; senta
no banco,
observa e espera
Estudo de interdependência:
Como o objetivo é encontrar possíveis behavior settings interdependentes,
analisaremos o confronto de sinomorfos dentro de uma mesma atividade dinâmica ou
dentro de um mesmo tipo de atividade estática.
A tabela 4 demonstra o confronto entre atividades dinâmicas no banco (S10 X
S12; S12 X S14; S10 X S14) e o confronto entre atividades estáticas no banco (S11 X
S13). Para efeito desse estudo, foi considerado que os diversos bancos do CAERF são
“espaços próximos” e, no máximo, “diferentes partes de um mesmo prédio”.
Tabela 3. Comparativo de sinomorfos de “utilização dos bancos” do CAERF
82
S10 X S12 S12 X S14 S10 X S14 S11 X S13
Itens
ESC K ESC K ESC K ESC K
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7
De população
0 7 0 7 0 7 0 7
De líderes
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
Espacial
(espaços
próximos)
5-9 4 5-9 4 5-9 4 5-9 4
Contigüidade
Temporal
0-4 7 0-4 7
50-
74
3 0-4 7
Componentes
não-humanos
Mais
da
1/2
3
Mais
da
1/2
3
Mais
da
1/2
3
Mais
da
1/2
3
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
2-3 2 2-3 2 2-3 2 4-6 3
Total
31 31 27 31
RESULTADO
BS
diferentes
BS
diferentes
BS
diferentes
BS
diferentes
Tabela 4. Interdependências entre os sinomorfos da tabela 3
Esse resultado nos leva a crer que, mesmo que os sinomorfos ocorram no mesmo
local e num mesmo horário do dia – conforme se observa no confronto do sinomorfo
S10 com o S14, eles serão behavior settings diferentes.
No tocante ao uso das paradas de ônibus, investigou-se se a variável de
localização da parada (Tabela 5 e 6) e, posteriormente, a variável horário de espera (ver
em apêndice 6). Ou seja, o interesse era saber se a espera em paradas diferentes
configuraria mais de um BS e se os usos da parada no turno da tarde e da noite
compõem um mesmo BS, mesmo quando, a luminosidade, a quantidade de pessoas
transitando pelo calçadão e outros fatores sofrem alterações.
83
S15 S16
Nome
Moça aguardando ônibus no fim da
tarde
Rapaz aguardando ônibus à noite
Limite físico
Calçadão, parada Calçadão, parada
Limite temporal
17-17:17H 17-17:10
Componentes
Humanos
1 moça Um rapaz
Componentes
não-humanos
Roupas B, bolsa, livros e óculos
escuros, parada
Roupas B, bolsa, livros e óculos
escuros, parada
Líder
único Único
Ponto Focal
Espera Espera
Mecanismo
comportamental
Esperar, observar Esperar, observar
Descrição do
Programa
chega ao calçadão; observa, espera
ônibus, fica atento ao movimento dos
ônibus, conversa (às vezes), cuida dos
pertences
chega ao calçadão; observa,
espera ônibus, fica atento ao
movimento dos ônibus, conversa
(às vezes),
cuida dos pertences
Tabela 5. Descrição de sinomorfos experimentais em “Esperar ônibus em horários
próximos e em paradas diferentes”
Interdependência:
Conforme os cálculos, se duas pessoas aguardam o ônibus no final da tarde no
CAERF, mas estão em paradas diferentes, cada uma delas vivenciará um BS diferente.
Diante disso, e tendo em vista que o presente esforço centra-se em aglutinar BSs, resta
averiguar se, num mesmo horário e na mesma parada (Tabela 7 e 8), cada pessoa
representa um BS ou se todo o ponto de ônibus congrega de um mesmo BS e, portanto,
podem ser considerados de uma mesma categoria para esse estudo.
S15 X S16
Itens
ESC K
De Comportamento
0 7
De população
0 7
De líderes
95-100 1
Espacial
(espaços próximos)
5-9 4
Contigüidade Temporal
50-74 2
Componentes não-humanos
Mais da 1/2 3
Semelhança de Mecanismos comportamentais
0-1 1
Total
31
RESULTADO
BS diferentes
Tabela 6.Interdependência dos sinomorfos da tabela 5
84
Interdependência:
Com esse resultado, conclui-se que num mesmo horário, cada parada é um BS
diferente. Todas as pessoas que estiverem numa mesma parada, num mesmo horário do
dia, farão parte de um mesmo BS.
Pergunta 03: Mas será que “Em horários diferentes, numa mesma parada de
ônibus, é um mesmo BS?”. Para isso, é preciso calcular o índice K – interdependência
de BS – entre os sinomorfos S19 e S20 (Tabela 9 e 10), onde há variação apenas do
horário.
S17 S18
Nome
Moça aguardando ônibus no
fim da tarde
Rapaz aguardando ônibus à noite
Limite físico
Calçadão, parada Calçadão, parada
Limite temporal
17-17:17H 17-17:10
Componentes
Humanos
1 moça Um rapaz
Componentes
não-humanos
Roupas B, bolsa, livros e
óculos escuros, parada
Roupas B, bolsa, livros e óculos
escuros, parada
Líder
único Único
Ponto Focal
Espera Espera
Mecanismo
comportamental
Esperar, observar Esperar, observar
Descrição do
Programa
chega ao calçadão; observa,
espera ônibus, fica atento ao
movimento dos ônibus,
conversa (às vezes), cuida
dos pertences
chega ao calçadão; observa,
espera ônibus, fica atento ao
movimento dos ônibus, conversa
(às vezes),
cuida dos pertences
Tabela 7.Descrição de sinomorfos em “ Esperar ônibus em horários
próximos e na mesma parada”
S17 X S18
Itens
ESC K
De Comportamento
0 7
De população
95-100 1
De líderes
95-100 1
Espacial
5-9 4
Contigüidade Temporal
50-74 2
Componentes não-humanos
Mais da 1/2 3
Semelhança de Mecanismos comportamentais
0-1 1
Total
19
RESULTADO Mesmo BS
Tabela 8. Interdependência dos sinomorfos da tabela 7
85
Agora, verificando a interdependência desses dois sinomorfos descritos apenas
com variação de horários, temos:
Resposta: Não. Se o horário variar, mesmo que seja numa mesma parada de
ônibus, serão BS diferentes.
De certo modo, é possível dizer que quanto mais tempo os sinomorfos
coexistirem, numa mesma parada, mais propensos eles serão de serem um mesmo BS.
Portanto, para efeito desse trabalho, ao investigar usuários de paradas, farão parte de
uma mesma categoria aqueles que utilizarem o mesmo abrigo e num mesmo horário do
dia.
S19 S20
Nome
Moça aguardando ônibus no
fim da tarde
Rapaz aguardando ônibus à noite
Limite físico
Calçadão, parada Calçadão, parada
Limite temporal
9 – 9:15 17-17:10
Componentes
Humanos
1 moça Um rapaz
Componentes
não-humanos
Roupas B, bolsa, livros e
óculos escuros, parada
Roupas B, bolsa, livros e óculos
escuros, parada
Líder
único Único
Ponto Focal
Espera Espera
Mecanismo
comportamental
Esperar, observar Esperar, observar
Descrição do
Programa
chega ao calçadão; observa,
espera ônibus, fica atento ao
movimento dos ônibus,
conversa (às vezes), cuida
dos pertences
chega ao calçadão; observa,
espera ônibus, fica atento ao
movimento dos ônibus, conversa
(às vezes),
cuida dos pertences
Tabela 9..Descrição de sinomorfos experimentais em “ Esperar ônibus em
horários próximos e na mesma parada”
S19 X S20
Itens
ESC K
De Comportamento
0 7
De população
95-100 1
De líderes
95-100 1
Espacial
5-9 4
Contigüidade Temporal
0-4 6
Componentes não-humanos
Mais da 1/2 3
Semelhança de Mecanismos comportamentais
0-1 1
Total
23
RESULTADO
BS diferentes
Tabela 10. Interdependência dos sinomorfos da tabela 9
86
Recapitulando: o que já foi descoberto até o presente momento:
O calçadão inteiro não é um BS apenas. Há vários dentro dele.
Quanto mais tempo os sinomorfos coexistirem (quanto maior a
sobreposição temporal), numa mesma parada, mais propensos eles serão
de serem um mesmo BS.
As pessoas são substituíveis, então não importa o gênero nem a idade,
como Barker (1968) já havia mencionado em sua teoria. Não importa
quem faz a ação. Características pessoais não interferem na definição do
BS. O que importa é cumprir o programa do BS.
Pergunta 04: A quantidade de pessoas que fazem parte do sinomorfo é
fundamental para a definição do BS?
Repetiu-se o mesmo procedimento utilizado até agora, confrontando duas
situações onde apenas a quantidade de pessoas varia (Tabela 11 e 12). Em S21
apenas uma pessoa exercendo a atividade e em S22 há duas pessoas na ação.
S21 S22
Nome
Moça caminhando
no fim da tarde
2 rapazes caminhando
no fim da tarde
Limite físico
Calçadão, parada Calçadão, parada
Limite temporal
17-18H 17-18H
Componentes Humanos
1 moça 2 rapazes
Componentes
não-humanos
Roupas A, óculos
escuros, walk man
Roupas A, óculos
escuros, walk man
Líder
único Compartilhado (2)
Ponto Focal
caminhada caminhada
Mecanismo
comportamental
caminhar, observar
Caminhar, conversar e
observar
Descrição do Programa
chega ao calçadão;
observa, caminha
chega ao calçadão;
observa, caminha,
conversa
Tabela 11. Descrição dos sinomorfos em “ Esperar ônibus”,
variando a quantidade de pessoas presentes
87
Interdependência:
Resposta: Sim, mas quando se compara um indivíduo com duplas ou grupos. No
caso da comparação de duplas com grupos (Tabela 13 e 14), o coeficiente K fica muito
próximo de 21 (22), pois a liderança vai ser compartilhada da mesma maneira. Além
disso, haverá conversas paralelas em ambos, o que faz com que os mecanismos
comportamentais sejam semelhantes. Desse modo, para esse trabalho, consideraremos
dois grupos de sinomorfos: caminhar sozinho ou acompanhado (por uma ou mais
pessoas), como se vê a seguir com os sinomorfos S23 (dupla) e S24 (grupo)
11
.
11
Entende-se por “grupo” a reunião de 3 ou mais pessoas
S21 X S22
Itens
ESC K
De Comportamento
0 7
De população
0 7
De líderes
34-66 3
Espacial
95-100 1
Contigüidade Temporal
95-100 1
Componentes não-humanos
2
Semelhança de Mecanismos comportamentais
2-3 2
Total
23
RESULTADO
BS diferentes
Tabela 12. Interdependência dos sinomorfos do ponto focal
“Esperar ônibus”, variando a quantidade de pessoas presentes
S23 S24
Nome
2 moças caminhando no
fim da tarde
4 rapazes caminhando no
fim da tarde
Limite físico
Calçadão, parada Calçadão, parada
Limite temporal
17-18H 17-18H
Componentes
Humanos
2 moças 4 rapazes
Componentes
não-humanos
Roupas A, óculos
escuros, walk man
Roupas A, óculos escuros,
walk man
Líder
Compartilhado (2) Compartilhado (4)
Ponto Focal
caminhada caminhada
Mecanismo
comportamental
Caminhar, conversar e
observar
Caminhar, conversar e
observar
Descrição do
Programa
chega ao calçadão;
observa, caminha,
conversa
chega ao calçadão; observa,
caminha, conversa
Tabela 13. Descrição para comparação de sinomorfos “dupla” e
“grupo” dentro do ponto focal de uma mesma atividade (caminhar)
88
Interdependência:
5.2.5 Delimitação na quantidade de atividades/categorias:
Devido a essas descobertas, foi possível reduzir o número de sinomorfos – a
partir desse momento, chamados behavior settings – a serem analisados. Dos 36
sinomorfos descritos por observação (ver figura 28, p. 73), passou-se a ter 29 BSs
(Figura 29).
S21 X S22
Itens
ESC K
De Comportamento
0 7
De população
0 7
De líderes
34-66 3
Espacial
95-100 1
Contigüidade Temporal
95-100 1
Componentes não-humanos
2
Semelhança de Mecanismos
comportamentais
0-1 1
Total
22
RESULTADO
BS diferentes, mas com K muito
próximo a 21
Tabela 14 Interdependência dos sinomorfos “dupla” e “grupo”
dentro do ponto focal de uma mesma atividade (caminhar)
1)Caminhar sozinho de manhã
2)Caminhar sozinho de tarde
3)Caminhar sozinho de noite
4)Caminhar com cia de tarde
5)Caminhar com cia de noite
6)Caminhar com cachorro de manhã
7)Caminhar com cachorro de tarde
8)Caminhar com cachorro de noite
9)Correr sozinho de manhã
10)Correr sozinho de tarde
11)Correr sozinho de noite
12)Correr com cia de manhã
13)Correr com cia de tarde
14)Correr com cia de noite
15))Correr com cachorro de manhã
16)Correr com cachorro de tarde
17)Correr com cachorro de noite
18)Pedalar sozinho de manhã
19)Pedalar sozinho de tarde
20)Pedalar sozinho de noite
21)Esperar ônibus de manhã
22)Esperar ônibus de tarde
23)Esperar ônibus de noite
24)Sentar nos bancos em atividade estática
(namorar, conversar, esperar, descansar) de manhã
25)Sentar nos bancos em atividade estática de tarde
26)Sentar nos bancos em atividade estática de noite
27)Sentar nos bancos em atividade dinâmica
(alongamento, abdominais, outros exercícios) de
manhã
28)Sentar nos bancos em atividade dinâmica de tarde
29)Sentar nos bancos em atividade dinâmica de noite
Figura 29. Behavior settings advindos dos sinomorfos observados no
CAERF
89
No entanto, esse número ainda tornava a categorização inviável para a análise
que se propõe nesse estudo. Era preciso agrupar mais. Diante desse desafio, foi utilizada
a verificação de genótipos ambientais
12
para agrupar BSs “primos” entre si.
5.2.6 Verificação de genótipo ambiental
Conforme foi dito anteriormente, para delimitar o universo dos usuários, foi
definido um plano de agrupamento dos BSs detectados em função da noção de genótipo
ambiental. Para tanto, a teoria de Barker (1968) indica a necessidade de utilizar a média
entre 4 itens (tabela 15), de modo que 2 BSs pertencerão a um mesmo genótipo se essa
média for menor que 25%, e se nenhum dos item avaliado for inferior a 25% (Barker,
1968).
Iniciou-se analisando BSs que possuem espaços em comum.
A partir dessa verificação de genótipos foi concluído que, se as ações de uma
mesma natureza (como “caminhar” ou “correr” ou “pedalar” ou “esperar ônibus”)
ocorrem num mesmo local serão de um mesmo genótipo, mesmo que o horário do dia
12
ver considerações sobre genótipo ambiental no capítulo 2, p. 38.
BS1a X
BS2a
BS5a X
BS7a
BS9a X
BS10a
BS2a X
BS6a
BS4a X
BS8a
ITENS
Diferença no
programa
20 20 20 50 50
Treinamento
comportamento
20 20 20 50 50
Itens não
transferíveis
0 0 0 0 0
Tempo para
manutenção
itens não-
transferíveis
0 0 0 0 0
Média 10 10 10 25 25
Resultado
Mesmo
genótipo
Mesmo
genótipo
Mesmo
genótipo
Mesmo
genótipo
Mesmo
genótipo
Tabela 15. Análise de genótipos ambientais
90
varie. Assim sendo, foi possível reduzir ainda mais as categorias de análise, para as
categorias apresentadas na Figura 30.
5.3. Ouvindo os usuários: apresentação dos dados e discussões
preliminares
Lançando mão das duas categorizações detalhadas nesse capítulo, foi iniciada a
etapa de entrevista com os usuários, terceira e última fase do presente trabalho.
Foram realizadas 20 entrevistas. A escolha dos entrevistados foi definida a partir
das categorias indicadas pela análise observacional (correr, caminhar, pedalar e usuários
em atividade estática) e pela análise de behavior setting, que detalha as categorias
anteriores pela indicação do número de participante e o tipo de atividade desempenhada
(Figura 31).
1) Caminhar sozinho
2) Caminhar com cia
3) Caminhar com cachorro
4) Correr sozinho
5) Correr com cia
6) Correr com cachorro
7) Pedalar sozinho
8) Esperar ônibus numa mesma
parada, num mesmo horário
9) Sentar nos bancos em atividade
estática
10) Sentar nos bancos em atividade
dinâmica
Figura 30. Categorias pelo viés teórico
91
Categorias viés observacional Categorias viés teórico
Caminhar sozinho 02
Caminhar com cia 02 Caminhar
Caminhar com cachorro 02
Correr sozinho 02
Correr com cia 02 Correr
Correr com cachorro 02
Pedalar Pedalar sozinho 02
Esperar ônibus
13
02
Usar bancos em atividade estática 02 Atividade estática
Usar bancos em atividade dinâmica 02
Total 20
Figura 31. Quadro numérico de entrevistas, por categorias
A transcrição das entrevistas foi feita de forma a manter a maior fidelidade
possível, levando em conta, inclusive, as reações dos entrevistados no momento da fala.
A entrevista com gravação de áudio facilitou a conexão entre as respostas e as
onomatopéias utilizadas a contento pelos respondentes, bem como os silêncios, gírias,
hesitações, sorrisos e os momentos em que o entrevistado precisava pensar no que
responder. Devido a isso e às diferentes lógicas de discurso, foi necessário ouvir
repetidas vezes as entrevistas até que a transcrição dos principais comentários
progredisse de modo satisfatório. Durante algumas falas, foi necessário interrogar ao
respondente o significado literal do que estava sendo dito para não prejudicar a clareza
do relato. Descrever seus comportamentos e suas percepções foi uma atividade difícil
para a maioria dos entrevistados, o que exigiu um esforço adicional no momento da
entrevista. Além disso, uma vez que o interesse era identificar o maior número de
sensações e percepções possíveis, fez-se necessário incentivar o entrevistado a ser
menos sucinto ao falar sobre alguns temas.
13
De acordo com a categorização prévia, pertencem a um mesmo BS os usuários de uma mesma parada,
que a utilizam num mesmo horário. O presente trabalho teve como preocupação entrevistar pessoas sob
essas condições. Para efeito prático, a categoria “esperar ônibus” será assim chamada sem a ressalva de
horários e localização, no entanto, é importante saber que se trata do BSs indicado pela análise.
92
As entrevistas foram realizadas nas mais diversas situações, propositalmente.
Por vezes, a conversa era marcada em outros espaços públicos distantes do CAERF. Em
outras ocasiões, após a execução de suas atividades habituais, as pessoas eram
convidadas a participar da entrevista no próprio calçadão ou próximo a ele - como na
residência do entrevistado, por exemplo. A opção por um local próximo, ao invés do
CAERF, foi tomada algumas vezes devido ao fato de que, no calçadão, a qualidade da
gravação ficava comprometida por ruídos, como já havia sido constatado em
entrevistas-piloto. Numa primeira análise, a memória a respeito do espaço do calçadão
parecia melhor preservada quanto mais próxima do CAERF a entrevista ocorresse. Essa
constatação surgiu da preocupação em escolher, propositadamente, locais diversos para
a feitura da entrevista. No entanto, no decorrer da aplicação das mesmas, foi percebido
que o fator com o qual estava lidando era mais temporal do que espacial.
De modo geral, as entrevistas realizadas com pessoas que haviam acabado de
utilizar o CAERF eram mais ricas em detalhes, tanto espaciais como comportamentais,
em detrimento às entrevistas realizadas com pessoas que, por exemplo, usaram o
CAERF no turno da manhã e estavam sendo entrevistadas à tarde ou à noite.
5.3.1 Perfil dos usuários entrevistados
A maioria dos respondentes reside em bairros vizinhos ao CAERF, como Ponta
Negra (60%) e Capim Macio e Conjunto dos Professores (20%). Apenas dois
entrevistados relataram morar no Bairro Latino (afastado cerca de três quilômetros de
uma das extremidades do CAERF) e um outro, ciclista, é morador do bairro de
Petrópolis, zona leste da cidade. Os usuários de paradas de ônibus entrevistados
dispõem do transporte para se afastar de seu local de moradia e ir ao local de trabalho e
não o inverso. Isso talvez indique o fator “praticidade” do equipamento urbano, ou seja,
93
conforme foi relatado, a proximidade do calçadão com o local de moradia e a
possibilidade de ir à pé até ele o transformam num ambiente atrativo. Essa proximidade,
inclusive, é reconhecida como vantagem pelos usuários, como será visto mais adiante.
A faixa etária dos entrevistados ficou entre 21 e 62 anos. Abaixo de 21 anos,
pelo que se observou, não há muitos usuários assíduos em práticas de atividades físicas
no CAERF. Talvez porque essa faixa etária da população prefira freqüentar academia
ou pratica esportes coletivos. Quanto ao uso dos bancos e paradas de ônibus pelos que
possuem menos de 21 anos, observou-se que ocorre, primordialmente, no início da
manhã, quando estudantes estão indo para o colégio. A maior parte dos entrevistados
tem entre 23 e 40 anos, mas pode-se dividir a faixa etária em dois principais grupos: os
que estão próximos dos 25 e os que estão próximos aos 55 anos. Apesar de não ter sido
preocupação do presente trabalho, a idade média das pessoas entrevistadas reflete o que
se observa no CAERF, em termos de proporção. Sendo a faixa etária dos 25 anos a
média dos usuários do turno noturno e 55 anos a média dos do turno matutino. No turno
vespertino, não se observa predomínio de uma faixa etária específica.
As oito mulheres e os doze homens entrevistados pareciam possuir bom
condicionamento físico, não apresentavam indício de limitação de locomoção e
demonstraram possuir boa condição econômica, compatível com o perfil dos moradores
da zona Sul da cidade, no qual se localiza o CAERF. Ou seja, tanto os homens quanto
as mulheres teriam condições financeiras de pagar pelo uso de um local privado para a
prática de exercícios, mas parecem optar pelo espaço público. A maioria dos
entrevistados possuem curso superior (65%), 25% estão na universidade e apenas 10%
possuem nível médio. As profissões variaram: dois médicos, um engenheiro civil, uma
dentista, dois engenheiros de computação, um profissional de educação física, três
94
militares, dois advogados, uma manicure, uma enfermeira, um cabeleireiro e cinco
estudantes. A tabela 16 mostra as informações pessoais dos usuários entrevistados.
Número
da
entrevista
Gênero Idade Profissão Atividade
predominante
Local de
entrevista
Estado
civil
Bairro de
moradia
1
Feminino 21 Estudante Corre - cia Outro solteira Capim Macio
2
Feminino 31 Dentista Caminha - só Residência solteira Ponta Negra
3
Masculino 26
Eng.
computação
Corre - cão
Próximo
CAERF
casado Conj.Professores
4
Feminino 30
Eng.
computação
Caminha - cão Residência casada Conj.Professores
5
Feminino 59 Médica Caminha - cia
Próximo
CAERF
casada Ponta Negra
6
Feminino 23 Estudante Caminha - só Residência solteira B. Latino
7
Masculino 28
Profissional
de
Ed. Física
Pedala Outro solteiro Ponta Negra
8
Masculino 61 Militar Caminha - cia Residência casado Ponta Negra
9
Masculino 27 Advogado Corre - só CAERF solteiro B. Latino
10
Masculino 23 Militar Corre - cia CAERF Solteiro Ponta Negra
11
Masculino 22 Militar
Corre – Cia +
Banco –
dinâmico
(abdominal)
CAERF Solteiro Ponta Negra
12
Masculino 26 Estudante
Banco –
estático
(namorar)
Residência Solteiro Ponta Negra
13
Masculino 27 Estudante Corre - só Residência solteiro Ponta Negra
14
Feminino 20 Estudante
Parada de
ônibus
Residência solteira Ponta Negra
15
Masculino 28 Médico Pedala
Próximo
ao
CAERF
solteiro Petrópolis
16
Masculino 55 Eng. Civil Caminha - cão Residência casado Ponta Negra
17
Masculino 38 Cabeleireiro
Caminha +
Banco
dinâmico
(alongamento)
Residência solteiro Ponta Negra
18
Masculino 25 Advogado Corre - cão Residência solteiro Ponta Negra
19
Feminino 27 Enfermeira
Banco estático
(medindo
pressão)
CAERF solteira Conj.Professores
20
Feminino 35 Manicure
Parada de
ônibus
CAERF solteira Ponta Negra
Tabela 16. Quadro de entrevistas.
5.3.2 O que pensam sobre o CAERF
A tarefa dada aos entrevistados de pôr em palavras uma sensação espacial gerou
as mais diversas respostas possíveis. Talvez por ter sido a primeira pergunta do roteiro
de entrevistas, os entrevistados paravam pra pensar um pouco antes de responder.
Diante da pergunta “O que lhe vem à cabeça em termos espaciais quando pensa no
CAERF?”, a opinião dos entrevistados divergiu (Figura 32). Dentre os respondentes,
95
O que vem à cabeça
(em termos
espaciais) quando
pensa em CAERF?
45% descreveram aspectos positivos do lugar, 40% relataram aspectos negativos e 15%
responderam de forma descritiva, sem posicionamentos favoráveis ou desfavoráveis.
Dos que relataram características negativas, em geral, as queixas eram sobre a largura
do calçadão, seja pela disputa entre pedestres, ciclistas e paradas de ônibus, seja pela
quantidade de pessoas transitando no local. Segundo um dos entrevistados, as pessoas
não sabem usar o espaço adequadamente. Aquelas que imediatamente se lembraram dos
aspectos positivos relataram fatores associados aos benefícios da atividade física para a
saúde, além de poder ver a cidade e encontrar pessoas. Houve quem descreveu o
CAERF como um espaço voltado para a prática de exercícios.
Figura 32. Sensações dos respondentes sobre o CAERF.
FONTE: produção da autora
“Muitas pessoas
desfilando e
poucas pessoas
fazendo
“Uma extensão de
2,5Km de calçada
favorável à prática de
exercícios.”
“Um contraste entre
o Parque das Dunas
e um transito
intenso do outro
lado.”
“Poderia ser
melhor. É
apertado e não
tem ciclovia.”
“Um
ambiente
para
caminhar,
correr e
passar.
Uma
calçada.”
“Um lugar
agradável pra
fazer exercício,
mas que as
pessoas não usam
adequadamente.”
“Um lugar
bom de
correr.”
“Acho o espaço
limitado para o uso
que está sendo feito”.
Poderia ter
sido melhor
projetado.
“Local onde tem várias
pessoas que estão
tentando cuidar da
saúde”.
“Um bom ambiente,
adverso para a
prática esportiva”.
“Calçadão estreito.
Incompatibilidade
entre exercício físico
e paradas de ônibus.
Indisponibilidade
para ciclovia.”
“Importante pra
comunidade e para a
prática de atividades
físicas”
“Falta de Infra-
estrutura”
“Como ando de
bicicleta, acho
muito pequeno
porque quase
atropelei
pessoas”.
“Um lugar
aprazível para
exercer a
qualidade de
vida.”
96
5.3.3 Opções de uso
A freqüência de uso do equipamento foi levantada com o intuito de selecionar os
respondentes. Só havia interesse de entrevistar pessoas que utilizassem mais de duas
vezes ao dia, pois se estima que quanto mais a pessoa freqüenta um espaço, mais
apurada fica a sua percepção a respeito dele e maior o grau de conhecimento da área.
Com o mesmo intuito de seleção, procedeu-se investigando o tipo de atividade que
desempenhada e o hábito de ir sozinho(a) ou acompanhado (a) ao CAERF. Foi
convencionado entrevistar o mesmo número de pessoas em cada categoria. Como
algumas delas eram definidas conforme a existência ou não de parceiro, a pergunta era
feita apenas para se ter a certeza da situação mais freqüente.
Como a atividade desenvolvida foi o fator que determinou as categorias para a
entrevista, não houve surpresas nesse quesito. No caso do respondente fazer mais de
uma modalidade física, era perguntado se ele observava diferença no modo de usar o
calçadão, dependendo da atividade que desenvolvia. Cerca de 65% dos entrevistados
relatou exercer mais de uma atividade no local. Desses, a quase totalidade disse
perceber diferenças em como executa as duas práticas, seja na forma como se comporta
ou como vê o espaço a sua volta.
É melhor quando eu caminhando porque você tem mais facilidade pra desviar
das paradas, dos cães e das bicicletas. (Entrevista 16)
Em relação aos horários escolhidos pelos usuários para utilizar o espaço, o fator
determinante parece ser, em primeiro lugar, a disponibilidade de tempo do usuário e, em
geral, relacionadas ao trabalho. Estima-se que pelo fato do calçadão ser um espaço
público “aberto 24 horas”, as pessoas optam por ele, em detrimento das academias que
possuem horários pré-definidos. Utilizar o espaço público e fazer “seu próprio horário”
97
faz da comodidade um dos principais atrativos. Em segundo lugar, estão os fatores
relacionados ao clima, especificamente à incidência do sol. Todos relataram optar pelo
horário em que faz menos calor e demonstraram saber que, nos horários mais quentes, o
desempenho da atividade física fica prejudicado, além dos efeitos nocivos que a
insolação pode conferir à saúde. Todos os respondentes reconheciam que o horário
interfere no desempenho da atividade.
No fim da tarde é mais agradável por causa do sol. Se você for correr de meio
dia, você chega em casa um carvão torrado! (Entrevista 04)
A temperatura amena facilita a corrida, mas eu não vou de noite porque tenho
que estudar. (Entrevista 13)
Talvez esses fatores apontados expliquem porque há maior quantidade de
pessoas transitando pelo CAERF no início da manhã e no final da tarde. Um
respondente, que caminha de manhã cedo e no final da tarde, disse preferir a manhã
porque sente o ar mais puro, devido ao volume de carros ser menor nesse horário.
A quantidade de pessoas também foi o terceiro fator mais apontado na escolha
do horário de uso do calçadão. As pessoas disseram se incomodar com o acúmulo de
pessoas, pois isso dificulta o fluxo harmonioso. No entanto, no decorrer da entrevista,
percebia-se que esse fator não era tão determinante do horário, pois grande parte dos
respondentes vê o maior número de pessoas como um benefício para segurança pública.
Eu vou de noitinha porque tem menos gente e por que o sol mais frio.
(Entrevista 09)
Há casos de usuários que não podem optar pelo horário que vai freqüentar o
CAERF, como aqueles que aguardam ônibus nas paradas ou usam o calçadão apenas
como caminho para ir a algum outro lugar. E também há casos de pessoas que possuem
muito tempo livre e vão ao calçadão de acordo com seu estado de motivação para a
prática da atividade física.
98
Durante o levantamento da freqüência de uso do CAERF, alguns dos
entrevistados disseram ser ex-usuários da Via Costeira, a Avenida Dinarte Mariz, via
que dá acesso às praias da zona Sul a partir do bairro de Ponta Negra. A Via Costeira,
construída na década de 70, possui um calçadão mais largo do que o CAERF e uma
ciclovia, e foi bastante utilizado pela população até a construção do calçadão da orla de
Ponta Negra e o CAERF. O motivo para a desistência de uso da Via Costeira, segundo
quatro entrevistados que são ex-usuários, foi o vazio demográfico que se estabeleceu
com a construção dos outros calçadões. Apesar do calçadão mais largo e da ciclovia, os
respondentes relataram não se sentir seguros no local devido à ausência de
movimentação de pessoas no entorno da Via Costeira, enquanto no CAERF, podem ir a
qualquer horário do dia sem se sentirem inseguros.
Dos entrevistados, 30% relataram levar walk man para o CAERF. Dentre eles, a
maioria pratica exercício físico, mas uma usuária de parada de ônibus disse recorrer à
música, pois assim o tempo passa mais rápido.
Sempre espero ônibus com walk man, porque quando espero ônibus ouvindo
música, fico mais tranqüila, menos impaciente. Sem música, o tempo demora
mais a passar. (Entrevista 14)
Todos os usuários de walk man entrevistados, inclusive ciclistas, disseram não
sentir diferença na forma como se comportam ou transitam pelo calçadão estando com
ou sem o aparelho. Apenas uma entrevistada constatou essa diferença. Os 70% que
responderam não levar walk man ao CAERF, em geral, vão acompanhados, não
possuem o aparelho ou optam por não utilizá-lo para não ficarem distraídos.
No entanto, todos os entrevistados que não levam walk man indicam que o uso
do aparelho muda o modo como a pessoa se locomove. Para eles, o walk man faz a
pessoa ficar mais concentrada na atividade que está desenvolvendo e aumenta o
99
rendimento físico, mas há uma queda na percepção do que acontece a sua volta e menos
interação com o ambiente.
Quem usa walk man parece estar numa academia. Quando as pessoas vão com
walk man, elas estão um pouco desligadas daquele ambiente. Elas parecem não
estar interagindo com aquele ambiente. Deixa eu me expressar melhor...O que
eu querendo dizer é que as pessoas que usam walk man geralmente tem mais
dificuldade de ver uma pessoa e conversar com ela, porque é como se o walk
man conseguisse...digamos assim....abafar os outros estímulos que estão ali
presentes. Entendeu?! (Entrevista 15)
Acho que a pessoa que está com walk man vive mais a música dela, o mundo
dela. Ela não muito ligada ao externo. Então não muito ligada às pessoas
que estão em volta, não vai olhar pra ninguém, não vai cumprimentar ninguém,
na maioria das vezes. Então acho que esse é o comportamento diferente das
demais pessoas que estão ali andando, observando, vendo pessoas, vendo os
carros... (Entrevista 11)
Apenas 20% dos entrevistados disseram levar telefone celular ao CAERF.
Desses, dois entrevistados (ou seja, 10%) praticam atividade física. Eles relataram
sentirem-se diferentes quando estão se locomovendo e falando ao aparelho ao mesmo
tempo.
Geralmente, uma das coisas vai ter uma perda. Se é na caminhada, você vai
diminuir o ritmo, porque você conversando...se você conversando tem o
barulho das pessoas que estão passando e do trânsito, mas...bom, uma das duas
coisas é afetada. Ou o telefonema ou a caminhada. Quando eu usando o
celular eu não percebo o que está acontecendo do meu lado. (Entrevista 6)
Dois entrevistados alegaram não levar o aparelho por medo de furtos. No
entanto, 100% dos entrevistados disseram ter visto pessoas portando telefone celular no
calçadão ou falando ao telefone durante o exercício físico. Os respondentes que não têm
o hábito de levar o aparelho para o CAERF não acham a prática saudável, seja porque
quem fala ao telefone fica distraído e isso interfere na forma como se locomovem ou
porque entendem que o aparelho interfere no rendimento da atividade.
Eu não levo celular porque eu vou pra lá pra caminhar e correr, não vou ficar
atendendo telefonema. Acho que elas não estão preocupadas com o exercício.
100
Não se desligam. Já observei pessoas usando e elas costumam ficar distraídas.
Não coordenam bem na hora de passar um pelo outro, além de falar alto e
incomodar as pessoas. (Entrevista 2)
Nos turnos da manhã e da tarde é comum encontrar pessoas caminhando e
correndo com cães. À noite é mais raro, tanto que uma das entrevistadas que corre a
noite disse nunca ter visto cães no CAERF.
Com exceção dos entrevistados que fazem atividade com cães, a maior parte dos
respondentes se incomoda com a presença dos animais. Três entrevistados disseram que
deveria ser terminantemente proibido levar cães ao CAERF. Alguns admitem sentir
medo, principalmente quando os cachorros são de grande porte.
Não levem cachorros para o calçadão porque as pessoas têm medo! Elas se
recuam. Outro dia, vi um cachorro enorme e um rapaz bem magrinho segurando.
Se aquele cachorro cismar com alguém, ele não segura o cachorro nem a pau!
Até porque se você tem medo, você atrai o cachorro. (Entrevista 17)
Já vi até Pit Bull! Eu me sinto ameaçado de ser atacado por aquele animal.
(Entrevista 20)
Os que disseram que a convivência é possível, fizeram ressalvas. Usar
estrangulador, focinheira, deixar a coleira bem curta, permitir apenas animais de
pequeno porte e levar saquinhos para apanhar os dejetos dos animais foram os cuidados
adicionais mais citados. Dois caminhantes que não foram categorizados como
portadores de cães disseram já terem tentado passear com seu animal de estimação no
CAERF, mas desistiram diante da demonstração de medo dos demais usuários. Segundo
eles, era estressante desprender tantos cuidados e atenção para deslocar-se pelo local.
Eu já levei meu cachorro, mas hoje eu não levo mais porque meu cachorro é
muito grande e incomodava os outros. Como o espaço é estreito, mesmo que eu
tentasse afastar, não dava. (Entrevista 2)
Eu ando com minha cachorrinha pequena. Eu pensei que ninguém nunca ia se
assustar, mas tem gente que não gosta. Eu também tenho medo que o povo pise
nela...e ainda tem os dejetos....tem que levar saquinho. Tem outro problema de
101
levar cachorro: tem gente que quer ver o cachorro de perto e a gente tem que
parar. Já que o objetivo é caminhar, eu não acho muito legal. (Entrevista 3)
Um dos portadores de cães disse não enxergar motivo para tanto medo, pois o
cachorro dele é manso. No entanto outro entrevistado relatou que não há como um
desconhecido medir essa grandeza.
Não me sinto bem porque não tem como evitar os cães porque não tem espaço.
Você fica no meio do “fogo cruzado”. Não há espaço para reajustes. Não é
conveniente levar cães para o calçadão, de nenhum porte. Mesmo que o cão seja
manso com você, as pessoas na rua não sabem disso e têm medo. (Entrevista 18)
5.3.4 Percebendo as demais atividades
De acordo com os entrevistados, quem caminha percebe melhor as demais
atividades no CAERF do que quem corre, pedala, usa os bancos ou espera nas paradas
de ônibus. Entre os que caminham, os que vão com cachorro relataram maior número de
atividades, seguidos dos que vão acompanhados e, por fim, dos que têm o hábito de
caminhar sozinhos. Em geral, os caminhantes prestam bastante atenção ao que acontece
ao seu redor e citaram uma média de 11 atividades identificadas. A Tabela 17 mostra as
atividades descritas pelos caminhantes, grupo que mais identificou modalidades no
calçadão.
102
Os corredores formam o segundo grupo a perceber mais atividades,
principalmente se correm sozinhos. A média de atividades relatadas para os corredores é
de oito modalidades. Nenhuma modalidade diferente das relatadas pelos caminhantes
surgiu dentre as descritas pelos corredores. Quem vai acompanhado percebe menos as
atividades presentes. E a quantidade de modalidades descrita reduz de doze para nove.
Já os ciclistas relataram uma média de seis atividades presentes no calçadão. As
pessoas que esperam nas paradas de ônibus possuem uma média ainda menor: quatro
atividades (esperar nas paradas, caminhar, pedalar e correr). Na verdade, algumas
dessas atividades poderiam ser desmembradas, como é o caso do relato dos caminhantes
que se alertaram ao fato de existirem pessoas correndo sozinhas e com cachorros. Mas,
14
Devido ao fato do grupo de caminhantes ter identificado mais atividades no CAERF e dos demais
grupos não terem identificado novas modalidades além das descritas na tabela 17, seria redundante
identificar, nesse quadro, as atividades percebidas pelos demais grupos.
Grupo do
respondente
Categoria Atividades percebidas
Número de
atividades
percebidas
Sozinho
Caminhantes; corredores; pessoas na espera
por ônibus; turistas; casais de namorados;
ciclistas; pessoas passeando com cachorro;
e usuários da pista de aeromodelismo
8
Acompanhado
Caminhantes; corredores; pessoas fazendo
alongamento e ginástica nos bancos;
ciclistas; crianças andando em velocípedes;
vendedores de coco; medidores de pressão;
pessoas descansando nos bancos; e pessoas
nos bancos observando os outros passarem
9
Caminhantes
Com cachorro
Pessoas fazendo alongamento nos bancos;
caminhantes; caminhantes com cachorros;
corredores; pessoas fazendo abdominal nos
bancos; ciclistas; vendedor de coco; pessoas
fazendo pesquisas de opinião pública;
equipe de medidores de pressão; pessoas
que esperam por ônibus; e prostitutas.
11
Tabela 17
14
. Atividades percebidas pelo grupo dos caminhantes
FONTE: produção da autora
103
diante do objetivo desse trabalho, entende-se que a falta desse detalhe pode representar
uma percepção menos apurada do que ocorre a sua volta, denotando que não haveria
diferença entre estar sozinho ou com um cachorro no CAERF, por exemplo.
No grupo dos que utilizam os bancos a média de atividades relatadas foi três, a
menor dentre os entrevistados.
Esse levantamento demonstra a dificuldade em reunir as categorias para a feitura
desse estudo, pois o primeiro desafio do respondente frente à pergunta “que atividades
acontecem no calçadão” é o de agrupar um misto de atividades em modalidades
caracterizantes do local. Nesse caso, as pessoas que trabalham medindo a pressão dos
usuários do calçadão, por exemplo, prestam um serviço esporádico e não representam
um uso caracterizador daquele local. O mesmo ocorre com os pesquisadores de opinião
publica e as pessoas que fazem panfletagem, que sequer foram lembradas nas
entrevistas.
A presença dos vendedores de coco quase sempre vista como prejudicial para o
espaço (Figura 33). Apenas um entrevistado relatou ser algo positivo, mas disse que não
costuma comprar.
Figura 33. Uso dos bancos para ginástica e vendedor de coco: duas atividades
citadas pelos usuários.
FONTE: arquivo da autora
104
Outra ocorrência importante de ser relatada foi a pequena quantidade de pessoas
que se lembrou de citar “namorar” como atividade praticada no CAERF. Um corredor
comentou que havia um tipo específico de usuários do calçadão: os que desfilam. Para
ele, a diferença entre quem está caminhando e quem está desfilando é que quem desfila
está menos comprometido com a atividade física e fica olhando pro Parque das Dunas e
para o pôr do sol, atrapalhando o fluxo.
Ninguém faz atividade física de mãos dadas, você já viu?! Aí pára no banco e
fuma um cigarro. É melhor ir pro shopping”. (Entrevista 13)
O entrevistado 15 também comentou a respeito de “desfiles”. Segundo ele,
“quem usa celular está desfilando”. Já o entrevistado 03 comentou que “ver as pessoas
desfilando é uma das vantagens de usar aquele espaço”.
Para 90% dos respondentes, o CAERF não comporta todas essas atividades. Os
dois entrevistados que responderam que o calçadão cumpre bem sua função fizeram
uma ressalva: “por enquanto está comportando seus usos, mas, no futuro, deve ser
tomada alguma providência para que as condições melhorem” (Entrevista 06). Isso
denota a crescente utilização do CAERF pelas pessoas, uma vez que quem está lá
identifica ou o seu inchaço populacional ou a tendência a esse sintoma.
Gostaria que ou se abrisse mais o espaço ou se estruturasse de alguma forma um
espaço próprio pra ciclistas e pra cachorros. Eu acho que ali complicado por
causa da parada...cria problemas. O corredor ou caminhante, o ciclista, quem vai
andar com cachorro e quem vai esperar nas paradas. São esses quatro grupos que
eu vejo. E eles estão se chocando! (Entrevista 9)
Os motivos mais citados para o calçadão não comportar todas as atividades, em
geral, dizem respeito ao estreitamento do espaço físico provocados pelas aglomerações
nas paradas e pela pavimentação em alguns trechos, bem como a falta de ciclovia. Um
dos entrevistados comentou que o calçadão deveria ser duplicado na largura. No
entanto, cerca de 45% dos entrevistados apontaram fatores relacionados a dificuldade de
105
locomoção pura e simples, ou seja, mais do que o estreitamento do espaço, seria a
presença de outras pessoas que dificultaria a locomoção no ambiente. Um dos
entrevistados chegou a chamar de “falta de solidariedade” a formação de paredões
15
e o
fato dos que esperam por ônibus não afastarem para dar passagem aos que trafegam. Ou
seja, na hora de indicar o porquê do CAERF não comportar todas as atividades, o
problema de funcionamento é visto como uma via de mão dupla: espacial e
comportamental.
O calçadão não comporta todas as atividades. Não tem respeito entre
caminhantes, ciclistas e pessoas com cachorro. É um problema do
comportamento das pessoas e do espaço não ser adequado”. (Entrevista 09)
Não comporta porque o projeto do espaço não foi bem feito. (Entrevista 11)
5.3.5 Usuário sozinho versus usuário acompanhado
Tanto no que se refere ao desempenho da própria atividade que exerce no
CAERF, quanto em relação às outras pessoas a sua volta, pouco mais de 80% dos
entrevistados relatou notar mudanças ao se locomover sozinho(a) ou acompanhado(a).
A grande maioria acha a diferença evidente. Segundo os usuários, quando estão
acompanhados, a conversa os torna mais distraídos e menos concentrados na atividade
que estão executando. Assim, quem vai sozinho alega possuir maior facilidade em
driblar as pessoas, melhor concentração no exercício e mais flexibilidade em estabelecer
rotas e ultrapassagens. Um ciclista, dois corredores e um caminhante identificaram a
formação de “paredões” como a pior conduta das pessoas que percorrem o CAERF em
grupos (mesmo pequenos), pois quando mais de duas pessoas andam lado a lado, a sua
ultrapassagem fica bastante difícil.
As pessoas que vão acompanhadas, geralmente vão fazer uma atividade e, junto
com essa atividade, elas conversam entre elas. Se você vai gastar calorias, vai
15
Configuração formada por pessoas que costumam percorrer o espaço andar lado a lado, dificultando a
passagem de quem cruza.
106
correr e tudo o mais, você não consegue fazer isso de uma maneira adequada se
ficar conversando. A diferença é essa. (Pensa). Quando as pessoas vão
acompanhadas, elas se tornam um pouco mais “espaçosas”. Sei lá, fica mais
difícil de conseguir ultrapassá-las, entendendo? (Entrevista 15)
A pessoa que vai sozinha tem noção de espaço mais limitada. Ela ocupa menos
espaço. Quando você acompanhado, você conversando, então não tem
muito esse cuidado de andar reto. Você tende a ser mais espaçoso. (Entrevista 9)
De modo geral, ir sozinho(a) parece ser o modo de prestar mais atenção a
atividade que se está fazendo. Quem vai sozinho usa mais walk man e se desliga mais
do que acontece à sua volta. Um dos entrevistados falou que vê benefícios nos dois
modos e que sempre permuta idas sozinho e acompanhado ao CAERF. Segundo ele,
embora sua velocidade de deslocamento na caminhada reduza quando ele vai
acompanhado, o fato de poder conversar torna a atividade mais prazerosa.
Gosto de ir dos dois jeitos: sozinho e acompanhado. Acompanhado você faz o
exercício, mas é quase um lazer porque você vai num ritmo menor. Sozinho levo
mais a sério o exercício, forço mais, presto mais atenção na respiração. Mas ir
acompanhado é melhor pra cabeça, distrai mais. (Entrevista 17)
Uma das entrevistas mais ricas nesse quesito foi a de número 10. O respondente,
na primeira pergunta, relatou não perceber tais diferenças, mas em outro momento da
entrevista disse que, correndo acompanhado, ele percebe menos o que está a sua volta
porque fica conversando e olhando para o rosto da pessoa, além de ficar mais
preocupado sobre como driblar as pessoas no calçadão, uma vez que fazer a
ultrapassagem estando com uma pessoa do lado é mais complicado do que estando
sozinho. Depois de alertado sobre a diferença entre as duas respostas, o respondente
mostrou surpresa e comentou que era uma adequação espacial tão natural que ele não se
dava conta. Foi o próprio entrevistado que voltou a pensar na pergunta e acrescentou
que, para ele, a velocidade de corrida também interfere na forma como ele usa o espaço,
107
porque, quando vai acompanhado de alguém que não corre tão rápido quanto ele, há
mais tempo para mudar sua trajetória ou a reagir a algum imprevisto.
5.3.6 Disputa pelo espaço: ciclistas e pedestres
Todos os entrevistados indicaram perceber problemas entre ciclistas e pedestres.
Quase sempre, delegavam a culpa ao fato de não haver ciclovias ou pelos ciclistas
insistirem em usar aquele espaço que, segundo os respondentes, é muito estreito. A
presença das pessoas nas paradas de ônibus agrava ainda mais esse estreitamento.
O risco de atropelamento por bicicletas parece ser constante no CAERF. Alguns
relataram ter sido vítimas, outros disseramter visto ocorrências de encontrões entre
ciclistas e pedestres. Para a maioria dos entrevistados, a culpa pelo risco de
atropelamentos é do ciclista, apenas uma das entrevistadas alegou ser do pedestre a
responsabilidade pelo cuidado. Segundo ela, o pedestre tem maior facilidade de mudar a
trajetória que descreve e cabe a ele verificar em que direção está vindo a bicicleta e
tentar driblá-la. Para todos os outros respondentes, “é o ciclista quem não respeita o
pedestre” (Entrevista 14). Segundo eles, o principal problema é a conduta dos ciclistas.
“Eles ficam “costurando” no calçadão. Acho chato” (Entrevista 17). “Já vi senhoras
caminhando bem tranquilamente, aí passa alguém na bicicleta gritando, pedindo
passagem e elas ficam aperreadas
16
” (Entrevista 1).
A ameaça das bicicletas parece estar ligada ao fato de que elas possuem uma
velocidade superior a do pedestre, ou seja, um possível choque entre essas duas partes
ocasionaria lesões mais graves no pedestre do que no ciclista. Para os entrevistados,
além da construção de um local apropriado para as bicicletas, a dinâmica de
deslocamentos entre as duas partes precisaria estar bem coordenada para que não
houvesse acidentes.
16
Regionalismo. “Ficar aperreada” significa mostrar-se nervosa.
108
Eu já vi problemas ali, porque a maioria das pessoas que estão ali, numa calçada
onde não há uma ciclovia, nunca espera que venha uma bicicleta, principalmente
quando ela vem por trás. Você vem andando descontraída e quando se dá conta,
tem uma bicicleta vindo. Eu já presenciei leves traumatismos, sustos, ciclistas
“tirando fino” (passando rente), pessoas cangueiras (que não sabem conduzir)
andando de bicicleta lá. E quando há crianças, é horrível porque a criança não
sabe pra onde deve correr se vier uma bicicleta. (Entrevista 4)
5.3.7 Percebendo modificações no CAERF
No momento de responder se percebem modificações no calçadão, metade dos
entrevistados disse perceber tanto alterações na paisagem (como novas construções),
quanto alterações mais pontuais, como acúmulo de lixo e aparição de buracos no
mosaico de pedras portuguesas do piso. Modificações no piso foram as mais citadas. Os
que mais alegaram perceber modificações foram os corredores, muitos dos quais se
autodenominam bons observadores ou atribuíam sua “percepção apurada” a sua
assiduidade no local.
Noto quando se apara a grama, quando plantam árvores, quando recolhem o
lixo, quando varrem. E nos arredores, eu observo sempre as novas construções.
Isso é muito comum entre as pessoas que freqüentam sempre lá....quando
começa a construção todo mundo fica querendo saber o que é. (Entrevista 8)
Sim, quando há alterações no piso, eu noto. E às vezes as pedras se soltam.
Quando chove, há locais no asfalto que juntam água e, vez por outra, a gente
vem passando, passa um carro e a gente toma banho de lama. Nos arredores
desse calçadão ta sempre aparecendo prédios e é muito agradável olhar.
(Entrevista 5)
Mesmo os que disseram não perceber modificações relataram algumas ao longo
da entrevista. Dois respondentes alegaram ficar com receio de responder que percebem
as modificações, pois não conseguiriam citá-las.
Não percebo, mas não sou muito observador, realmente. (Entrevista 15)
Foi notado que a percepção das modificações depende também do horário que os
usuários utilizam o calçadão, devido à luz do sol. Quem freqüenta o calçadão durante o
109
dia tem maior visibilidade do que quem freqüenta a noite e, em geral, percebe mais
modificações, principalmente em relação ao entorno no CAERF. Além disso, algumas
alterações citadas, como a presença de policiais e do posto de medição de pressão só
ocorre em determinado horário do dia.
5.3.8 Acessos, percursos e estratégias de locomoção
Além de pedir para descrever os acessos, os entrevistados tiveram de relatar de
que forma chegam ao CAERF e qual percurso costumam fazer. Nesse ponto, a maior
parte dos entrevistados parou para pensar por algum tempo, tentando descrever seu
percurso. A dificuldade parecia ser no tocante aos pontos de referência. Quase sempre,
eles usavam elementos presentes no outro lado da avenida para orientar a trajetória em
sua fala. O calçadão, nesse momento, transformava-se em um lugar de passagem, que
não comunica.
Eu chego no calçadão pela extremidade do Rede Mais (supermercado)...sei lá
como se chama. Perto do conjunto dos professores. (pensa um pouco) É porque
se eu disser que eu chegava pelo lado de cá e caminhava até o lado de lá, você
não vai saber do que eu estou falando, ? Então, entrava pelo conjunto dos
professores, ia até a extremidade de lá, caminhava até o outro fim e voltava pela
mesma extremidade que a gente entrou. (Entrevista 3)
Cerca de 80% dos entrevistados chegam ao CAERF a pé. Os outros 20% vão de
carro ou bicicleta. Desses últimos, todos estão envolvidos com outras atividades que
não incluem apenas o calçadão e, devido a isso, necessitam de um meio de transporte
mais rápido para se locomover. Apenas um entrevistado relatou que gostaria de acessar
o calçadão de carro, mas que não fazia isso por causa da falta de estacionamentos.
Em geral, todos possuem uma idéia de percurso na cabeça antes de começar a
utilizar o calçadão e costumam seguir esse trajeto sempre que o usam. Isso permitiu
confirmar a suspeita levantada na etapa de observação do local, de que a parte do
calçadão, onde foi feito o estudo, é dissociada – espacialmente e funcionalmente - da
110
outra parte do calçadão, não incluída no contexto desse trabalho, e que fica após a rótula
da Via Costeira (ver mapa da figura 19, no capítulo 3, p.55).
O modo como as pessoas descreveram seu caminho, esboça a percepção espacial
de começo, meio e fim que cada uma delas possui.
Meu percurso é todo o calçadão. Vou pelo início do calçadão...(pensa)...entro
por uma das extremidades...como é que eu vou dizer. O inicio! Para mim, o
início é o do Praia Shopping porque eu moro em Ponta Negra. (Entrevista 5)
Além disso, esse levantamento também permitiu apurar o que seriam os limites
(Lynch, 1999) daquele espaço para as pessoas. A surpresa foi a ausência de relatos que
trouxessem o Parque das Dunas como limite espacial. O ponto de referência mais
lembrado foi o Praia Shopping. Os limites foram a Via Costeira e a rua Solón Galvão,
que leva ao Campus universitário da UFRN.
Enquanto os dados estavam sendo coletados, sugiram modificações no entorno
do CAERF. Dois supermercados foram construídos, um na extremidade mais próxima
do Conjunto dos Professores e outro mais ou menos no meio do percurso de 2,4 km do
calçadão. Para dar acesso a esse último supermercado, foi construída uma passarela por
sobre a Av. Eng. Roberto Freire (Figura 34) e, no canteiro central dessa mesma avenida,
abaixo da passarela, foram colocados alguns metros de telas-divisórias, com intuito de
impedir os perdestes de atravessar a avenida por baixo da passarela. Antes da existência
do supermercado, quando perguntadas a respeito do trajeto que faziam no CAERF, as
pessoas relatavam irem até a “ponta” do calçadão e voltar. Após a construção, quando
ainda foram entrevistadas quatro pessoas, as pessoas relatavam ir até “o supermercado”.
111
Figura 34. Passarela no CAERF
FONTE: Arquivo da autora
As pessoas que utilizam os bancos para atividade estática relataram irem a pé, de
carro ou bicicleta, dependendo da proximidade de onde vinham, talvez pelo fato da
atividade física não ser o foco central de sua ida ao calçadão. Um deles relatou ir
namorar e a outra, auxiliar o posto móvel de assistência à saúde, onde são feitas
medições de pressão.
Uma das perguntas do roteiro de entrevista pedia para que os entrevistados
17
descrevessem como procediam para driblar os usuários em mais baixa velocidade. A
maioria dos entrevistados demonstrou surpresa com a pergunta, pois segundo eles, o
mecanismo é lógico. No entanto, muitas e diferentes formas de drible foram relatadas.
Alguns disseram driblar do jeito que dava, sem nenhuma tática de drible pré-concebida.
Tento sempre observar a melhor forma. Não tem uma técnica. Só me antecipar
ao que vai acontecer...e tentar causar o menor mal pra todos. (Entrevista 11)
17
Responderam a essa pergunta somente os praticantes de atividade física. Os usuários de paradas de
ônibus, obviamente, não precisam fazer dribles ou ultrapassagens, pois ficam paradas. Dos usuários de
bancos, todos eles já percorrem o calçadão como praticante de atividade física, por isso também
responderam a pergunta. Apenas um dos entrevistados que utiliza o banco do CAERF para namorar,
relatou nunca ter percorrido o calçadão e, por isso, também não respondeu a pergunta.
112
Para os que descreveram estratégias de drible previamente pensadas, a tática de
ajuste espacial é sempre a mesma e eles tentam reproduzi-la em cada necessidade de
drible. Quando a estratégia não obtém êxito, os “estrategistas” em geral atribuem a
responsabilidade do “encontrão” à outra parte envolvida, pois segundo eles, a estratégia
deveria ser conhecida por todos. A estratégia mais citada foi o mecanismo de drible e
ultrapassagem semelhante ao que os veículos fazem pelo código de trânsito brasileiro:
manter-se sempre do lado direto da “pista”-calçadão e, havendo necessidade, verificar
se há espaço para uma ultrapassagem segura (sem encontrões) e efetuar o drible. Cinco
entrevistados relataram usar essa tática e atribuem a responsabilidade pelo “encontrão”
àqueles que andam na “contra-mão”.
Não tem muito mistério. Pra ultrapassar, tem que cair pra esquerda. O ideal era
que o calçadão fosse orientado pra ter mão e contra-mão, porque as pessoas são
desorientadas e vêm nos sentidos errados. (Entrevista 5)
Outra forma descrita pelos usuários foi a de negociação espacial através de
linguagem não-verbal. Quando há disputa entre duas pessoas por um único espaço, os
respondentes demonstram ao outro a intenção de ocupação através do olhar ou
posicionam-se em direção à lacuna.
As pessoas não sabem andar à direita, como carro, por isso as pessoas se
trombam. Ai, pra driblar, eu olho pra pessoa pra ver se ela se toca e se afasta.
Senão, como é que vai ficar? E sempre dá certo, geralmente elas se afastam pra
eu passar. (Entrevista 12)
Um ciclista também relatou usar linguagem não-verbal para fazer
ultrapassagens. Ele afirmou não se sentir confortável em usar a buzina para pedir
passagem no CAERF, pois as pessoas se assustam com o barulho e encaram como falta
de educação. Portanto, para avisar que está chegando perto, ele precisa olhar e acenar.
Quando não dá tempo de indicar que quer passagem, ele precisa agir rapidamente para
verificar se há carros na avenida e efetuar o drible.
113
Segundo os entrevistados, sair do calçadão diante da necessidade de drible é algo
comum, principalmente quando se trata de passar pelas paradas de ônibus e pelos
“paredões”. Para o entrevistado 18, passar pelos abrigos de ônibus é muito difícil
porque o painel de propaganda que fica na lateral das paradas de ônibus (Figura 35)
impede a visibilidade de quem vem correndo e não se pode prever o comportamento de
quem está do outro lado. É aí que ocorrem os “encontrões”. Quatro entrevistados
alegaram precisar sair do CAERF para fazer ultrapassagens.
Figura 35. Aglomeração nas paradas: situação corriqueira da necessidade de drible,
agravada pela barreira visual nas paradas.
FONTE: produção da autora
Geralmente vou correndo pela margem da grama, porque é uma parte que
ninguém usa e não tem o risco de ser atropelado, se eu precisar driblar alguém
eu vou logo pra grama (Entrevista 18)
Quando eu correndo sozinho e tem um ônibus parado, eu corto pelo lado de
fora, vou até a rua pra passar. Eu não vou onde o pessoal embarcando, eu vou
pro meio da rua pra não perder o ritmo. Se não tem ônibus parado, mas tem
gente na parada, eu desço pelo lugarzinho reservado por ônibus parar e corro ali,
nunca vou pela calçada. (Entrevista 10)
O desafio, além da dificuldade de driblar as pessoas no CAERF, é manter a
velocidade. Alguns entrevistados comentaram que é a velocidade constante que garante
o sucesso da atividade física. Por isso, ter de reduzi-la traz aborrecimentos.
114
Às vezes, quando tem parada, se não vier ônibus, dá pra desviar pela pista sem
reduzir o ritmo. Quando eu no mesmo sentido que os outros e as pessoas não
me vêem, porque estão de costas pra mim, eu tento ir por um cantinho entre o
calçadão e o Parque das Dunas. Mas às vezes tem quatro mulheres conversando,
uma do lado da outra, aí elas não abrem (passagem) de jeito nenhum! Ai você
tem que parar, andar no sentido delas um pouquinho, até que elas se toquem que
tem gente atrás e abram espaço. O pior é nas paradas e do lado do
aeromodelismo, porque fica bem estreitinho aí você tem que dar uma parada. Pra
você manter a mesma velocidade tem que descer pra pista. (Entrevista 1)
5.3.9 A atenção
No intuito de avaliar os elementos e ocorrências que atraem a atenção dos
usuários, foi perguntado se algo “tira a sua atenção” da atividade que está
desempenhando.
O primeiro desafio do entrevistado era refletir sobre o que seria tirar a atenção.
Para algumas pessoas, isso significava reduzir a dedicação à atividade para perceber
outras coisas, enquanto para outras, significava aumentar percepções sobre outras coisas
para melhorar o desempenho da atividade. O uso do walk man ou encontrar com outras
pessoas no CAERF, para uns parece melhorar o rendimento, pois desconcentrar-se da
atividade “corrida”, por exemplo, faz com que o exercício seja menos sentido, o que
pode diminuir o cansaço “psicológico”. Nesse caso, a atenção retirada seria vista como
“distração positiva”, mas na grande maioria dos casos teve uma conotação negativa. A
diferença está no foco da atenção que foi retirada: se é na atividade desempenhada ou
no espaço ao redor do respondente.
Quando eu caminho, eu olho mais pro lado verde porque é mais agradável, mas
às vezes eu perco a atenção por causa dos veículos. É que tem a atenção boa e a
atenção ruim, né? Na boa, você olha porque quer, pra ver. É o que eu faço com o
Parque das Dunas. A ruim é quando passa um carro e tira a sua atenção por
causa do barulho. (Entrevista 09)
Por haver esse aspecto prejudicial, muitas pessoas utilizaram o momento de
resposta a essa pergunta para criticar alguns aspectos do calçadão. Precisar driblar as
115
pessoas nas paradas ou assustar-se com a movimentação e barulho dos carros foram as
duas ocorrências relatadas como as que mais tiram a atenção. E sempre que um desses
problemas era relatado, havia uma preocupação em fornecer possíveis soluções, como:
retirar as paradas de ônibus do calçadão e fazer um calçadão mais afastado da rua,
respectivamente
18
.
Um entrevistado relatou ter medo de que algum carro da avenida invadisse o
calçadão e o atropelasse. Outro comentou que temia somente os ônibus porque eles
andam sempre à direta da pista, rente ao calçadão, portanto. Em geral, esses fatores que
punham medo aos entrevistados eram citados como fatores de “atenção redobrada”. Do
mesmo modo, a presença de cães também foi referida como fator de perda de atenção na
hora de fazer exercícios no calçadão, tanto por quem transita com os cães, como por
quem freqüenta o CAERF sem animais.
O fato de eu caminhar com cachorro costuma tirar a atenção do povo.
(Entrevista 03)
Prestar ou não atenção em determinados aspectos foi descrito, na maioria das
vezes, como um mecanismo involuntário, não controlado pelo usuário. No entanto,
alguns relataram conseguir bloquear alguns desses estímulos que retiram a atenção. Ou
seja, uma redução proposital da percepção – por vezes bloqueando um dos sentidos –
com o intuito de não prejudicar o rendimento físico na atividade desempenhada.
O barulho dos carros e os odores são muito desagradáveis, mas você acaba
filtrando, ? (Entrevista 4)
No caso das pessoas que utilizam os bancos, todos relataram não haver grandes
fatores de retirada de atenção. Pelo contrário, em geral, estão muito concentradas em
suas atividades, seja um exercício de alongamento (atividade dinâmica) ou em
conversar com seu namorado(a) (atividade estática). Para quem aguarda nas paradas, o
18
Essas sugestões serão melhores descritas mais adiante
116
que os distrai são as pessoas que cruzam na frente do ponto de ônibus, tanto correndo,
quanto caminhado. Os entrevistados relataram que não é raro haver encontrões e, por
vezes, alguns xingamentos. A entrevistada 14 relatou que além das pessoas passarem
atrapalhando a visibilidade dos ônibus que estão vindo na rua – o que pode impedi-la de
tomar o ônibus -, também é desagradável estar arrumada para trabalhar, enquanto os
passantes que esbarram nela estão suados e sujos.
Para os ciclistas, a redução da atenção pode ser mais arriscada. Segundo eles,
são diversos os motivos que tiram a atenção, desde encontrar pessoas conhecidas a
driblar usuários “distraídos”. Um dos ciclistas relatou ter de prestar atenção a todo o
tempo no que está fazendo, pois já quase atropelou algumas pessoas no CAERF. De
acordo com os relatos, o fato de estar em maior velocidade confere ao “velocista” maior
responsabilidade pelo encontrão. Isso talvez aconteça, pelo tempo mais reduzido que as
outras pessoas têm para reagir, devido ao fato de que quem tem mais velocidade confere
maior choque na hora da colisão, ou porque a velocidade altera o grau de atenção do
desportista.
Quando você está correndo é mais difícil de prestar atenção nas coisas do que
quando está andando. Correndo você fica prestando mais atenção na corrida.
Caminhando dá pra prestar atenção nas coisas porque você fica mais
descontraída. (Entrevista 02)
Da maneira semelhante, segundo os relatos, estar sozinho ou acompanhado
também modifica a atenção que é dada pelo usuário àquilo que está ao seu redor. Uma
das entrevistadas relatou que “quem vai sozinho ao calçadão parece notar menos
atenção ao que está a sua volta”, porque fica mais concentrado no exercício,
principalmente se vai com walk man. Quem vai acompanhado presta mais atenção ao
redor, ou porque está mais distraído da atividade que exerce, pelo fato de estar
conversando ou porque o outro chama a atenção para o entorno durante a caminhada.
117
Umas das suspeitas também reside no fato de que, por se sentir mais segura
acompanhada, a pessoa está mais apta a olhar ao redor.
Freqüentar sempre o mesmo espaço, no mesmo horário, faz com que os usuários
do CAERF estabeleçam relações de cordialidade uns com os outros. Um hábito bastante
observado é o de cumprimentar as pessoas que se tornam conhecidas com o passar do
tempo. No entanto, 75% dos entrevistados relataram que, algumas vezes, o costumeiro
“bom dia”, “olá”, “boa noite” acaba não acontecendo. Falta de tempo ou falta de
atenção? Na verdade, quanto maior a somatória das duas velocidades de encontro
envolvidas, menor o tempo para agir. Quase sempre, quando não dá tempo de
cumprimentar, as duas partes vêm em sentidos opostos. Os que estão acompanhados
disseram ser muito comum deixar de cumprimentar alguém porque ficam conversando e
se distraem. Os que correm sozinhos e os ciclistas disseram que não dá tempo porque
passam muito rápido e, quando reconhecem a pessoa, já é tarde demais. Nesse caso, o
usuário parece ter duas opções ao se dar conta de que não teve tempo de cumprimentar
o outro: seguir em frente ou voltar para falar. Todos os respondentes alegaram optar
pela primeira opção. Para eles, mudar o sentido para a direção oposta é um esforço
muito grande, pois o que está em jogo é o sucesso da atividade que estão
desempenhando.
Muitas vezes, vejo alguém...mas ai ele está conversando, distraído e não dá pra
falar com ele. Às vezes dá pra fazer algum gesto rápido. Mas eu nunca parei,
parei (ênfase na ação) pra falar mesmo, senão atrapalha. (Entrevista 1)
Os caminhantes, seja sozinhos ou acompanhados, não atribuem somente à
velocidade o motivo de não terem tempo de cumprimentar os conhecidos. Segundo eles,
o ruído dos carros na avenida, o uso do walk man ou o fato de estarem “distraídos” do
mundo exterior e concentrados na atividade física os fazem não perceber o outro.
118
Às vezes, pelo fato de caminhar, você fica mais aéreo e não presta atenção. O
caminhar é quase uma terapia, é uma atividade reflexiva. Você caminha e fica
pensando na vida, bem mais do que quando está correndo. Ai a pessoa passa e
você nem viu, geralmente quando ela vem correndo. Caminhando dá tempo.
(Entrevista 9)
Entre os 25% que disseram sempre dar tempo de cumprimentar pessoas
conhecidas, estão os usuários de paradas de ônibus, os que utilizam os bancos do
calçadão e um caminhante que alegou que, quando não dá tempo, sempre volta para
falar com o outro. Obviamente, no caso dos usuários de paradas de ônibus e de bancos,
por estarem parados, a velocidade de encontro é mais reduzida, ou seja, há mais tempo
para agir. Por fim, os usuários demonstraram estar cientes de que a falta de atenção no
CAERF pode contribuir para problemas mais sérios, como o de pôr a vida de alguém
em risco.
Poderia acontecer coisas mais sérias se eu não tivesse atento. Uma vez, vinha um
ônibus e um cara na bicicleta vindo na avenida. Ai não dava pra eu passar pela
calçada porque tava lotado e eu fui cortar (ultrapassar as pessoas) descendo pela
avenida. Mas ai eu vi a bicicleta a tempo, porque se tivesse ido, só tinha espaço
pra um, ou seja, um dos dois iria ser jogado pra cima do ônibus. (Entrevista 10)
5.3.10 Vantagens e desvantagens no uso do CAERF
Os entrevistados, em geral, tinham mais facilidade em apontar as desvantagens
do local. Devido a isso, propositalmente, quase sempre a primeira pergunta era referente
aos pontos negativos do uso do CAERF, para que o respondente se sentisse mais a
vontade em explorar suas percepções. Por isso há maior variedade de respostas que
apontam desvantagens do que vantagens de uso do CAERF. Em seguida, os
respondentes eram levados a pensar nos pontos positivos na utilização daquele espaço
(Figura 36), 60% dos quais tendo indicado a proximidade entre o CAERF e o local de
moradia como a maior vantagem no uso do espaço. A segunda vantagem mais apontada
foi relativa à qualidade de vida (25%), pois, segundo os respondentes, o espaço
119
promove a possibilidade de exercer atividades que fazem bem a saúde. O fator
segurança veio em terceiro lugar (20%), seguido pela contigüidade do espaço (ausência
de ruas cruzando a calçada), a proximidade com o Parque das Dunas e o aspecto de
“local de encontro” do calçadão (vantagens apontadas por 10% dos entrevistados)
(Figura 37).
Figura 37. Proximidade com o Parque das Dunas e local de encontro: aspectos positivos
no CAERF.
FONTE: arquivo da autora
19
A soma das porcentagens apresentadas nesse quadro não totalizam 100%, pois era possível fornecer
várias respostas a esse quesito e cada entrevistado podia apontar quantas vantagens quisesse.
Figura 36. Vantagens no uso do CAERF
19
.
FONTE: produção da autora
Proximidade
(60%)
Qualidade
de vida
(25%)
Segurança
(20%)
Proximidade
com o Parque
das Dunas
(
1
0%)
Contigüidade
espacial
(10%)
Local de
encontro
(10%)
Vantagens no
uso do CAERF
120
Segundo os entrevistados, a presença dos carros na avenida, as paradas de
ônibus e a quantidade de pessoas transitando pelo calçadão são as três principais
desvantagens no uso no CAERF (Figura 38 e 39). Os carros incomodam 40% dos
entrevistados, tanto por causa do ruído que provocam, quanto pela emissão de gases
poluentes e o risco de atropelamentos. Outros usuários reclamam de ter de pensar em
como driblar as pessoas nas paradas de ônibus (40%), pois elas atrapalham a passagem
e prejudicam o desenvolvimento das atividades eles que estão desempenhando. A
quantidade de pessoas, embora alguns relatem ser positivo (devido à segurança e pelo
prazer de encontrar pessoas), também é visto como negativo, pois dificulta a
mobilidade, além de agravar outra desvantagem apontada pelos respondentes: a largura
do calçadão. No entanto, os 5m de largura do CAERF foram menos citado do que a
ausência de ciclovia e o tipo do piso empregado. Segundo os respondentes, as pedras
portuguesas no mosaico do piso se soltam com freqüência e os reparos não são feito
com rapidez, podendo gerar acidentes. Quando chove, o piso fica escorregadio e muitas
pessoas relatam que é impróprio para correr, pois tem muitas irregularidades. O mau
cheiro provocado pelo lixo e a presença de pessoas passeando com cães foram
desvantagens apontadas por dois entrevistados. Em relação aos cães, mais uma vez, o
problema parece ser a ausência de espaço físico para reajustes espaciais, o mesmo
desconforto gerado pela falta de um local apropriado para as bicicletas. O calor e a
necessidade de mais estacionamentos foram fatores lembrados por um entrevistado
apenas.
121
Figura 38. Desvantagens no uso do CAERF.
FONTE: produção da autora
Figura 39. Desvantagens citadas pelos usuários do CAERF:
paradas, quantidade de pessoas, estreitamentos no CAERF e
buracos (sentido horário).
FONTE: produção da autora
Carros
(40%)
Paradas
de ônibus
(40%)
Muitas
Pessoas
(30%)
Bicicletas
(25%)
Piso
(25%)
Estreito
(20%)
Cães
(10%)
Lixo
(
10%
)
Calor
(10%)
Falta de
estacionamento
Desvantagens no
uso do CAERF
122
5.3.11 Usuários sugerem alterações para o CAERF.
As cidades são um imenso laboratório de tentativa e erro, fracasso e sucesso em
termos de construção e desenho urbano. ( Jacobs, 2000, p. 5)
Apesar de não ter sido uma pergunta estabelecida previamente no roteiro de
entrevista, muitos respondentes, ao longo de seu relato, indicavam sugestões de
melhoria para o espaço do CAERF. Foi muito comum haver esse tipo de preocupação
no momento de apontar as desvantagens de uso do espaço.
É preciso valorizar mais essa área (o calçadão) porque ela é muito usada pela
população. E deixar aquele espaço só para as pessoas, sem ciclistas e sem
cachorro (Entrevista 16).
A sugestão mais citada foi a construção de uma ciclovia. Cerca de 35% dos
entrevistados alegou ser importante separar os ciclistas dos demais usuários do CAERF.
Outros 30%, quando se referiam à pouca largura do calçadão, reclamavam de não haver
espaço para desenvolver atividades como ioga, ginástica e alongamento, que segundo
eles, poderiam ser atividades oferecidas à população pela prefeitura. Os alongamentos,
inclusive, acabam sendo feitos nos bancos, lixeiras, placas e postes (Figura 40),
exemplos da teoria de Affordance de Gibson (Gifford, 1997).
Eu faço alongamento no meio do percurso. Aí eu me encosto num negócio lá
que nem é apropriado, uma barra lá, acho que era uma placa que caiu e ficou só
o bastão ou então eu faço alongamento nos bancos. (Entrevista 17)
Então as pessoas ficam utilizando os bancos (ênfase de admiração) pra fazer um
alongamento...quer dizer, não é necessariamente um banco que vai servir pra
essa utilidade. Era melhor um objeto apropriado pra isso. (Entrevista 8)
123
Figura 40. Affordance: alongamento nos bancos e no poste.
FONTE: arquivo da autora
Dois respondentes sugeriram a retirada das paradas e um terceiro disse que a
solução estaria em fazer um calçadão por trás dos abrigos de ônibus e não pela frente,
como é atualmente. Um dos entrevistados sugeriu alargar o calçadão na direção do
Parque das Dunas e fazer mais estacionamentos. Outro entrevistado disse que o ideal
seria que houvesse como separar uma faixa do calçadão somente para aqueles que
correm. A presença das motocicletas dos policiais da Rocam estacionadas por sobre o
CAERF incomodou um dos usuários de bancos. Segundo ele, isso atrapalha a
mobilidade das pessoas, pois o calçadão fica ainda mais estreito. Houve quem sugerisse
alongar o calçadão até um dos shoppings da cidade (O Natal Shopping) ou até o
Campus Universitário, ambos distantes cerca de três quilômetros de uma das
extremidades do CAERF. Um respondente chegou a reclamar que paga imposto demais
para ver apenas obras de maquiagem da prefeitura.
5.3.12 Motivação
Talvez o espaço mais apropriado facilitaria pra quem utiliza e incentivaria para
quem não utiliza. Então, quando você vê um espaço adequado pro uso da prática
124
esportiva, você se sente convidado/motivado a participar, estar lá, freqüentar.
(Entrevistado 11)
Embora não fosse preocupação desse trabalho, no decorrer das entrevistas,
algumas pessoas comentavam sobre fatores motivacionais à prática de atividade física
no CAERF. Muitos elementos ditos como vantagens apareceram nos relatos, mas
algumas pessoas mostraram se motivar justamente com uma desvantagem: a quantidade
de pessoas no local. O que parece ser uma contradição, na verdade, é uma ótica
diferenciada da percepção das pessoas sobre as coisas. Ou seja, é possível ter mais de
uma percepção sobre determinada coisa, dependendo do que está sendo julgado. Como
já foi visto, a quantidade de pessoas, quando observada pela ótica da mobilidade, é um
problema, no entanto, quando vista pela ótica da segurança, é um benefício aos
usuários. Isso também ocorre com a motivação. O relato a seguir é prova disso e esboça
também como se travam os primeiros contatos interpessoais entre pessoas
desconhecidas no CAERF.
Quando você faz uma coisa sozinho, parece mais chato. Você relaxa, não dá
vontade de fazer mais. Aí às vezes ali passa um colega, ai você cumprimenta. Já
é uma coisa que motiva, entendeu?! Tem uma pessoa que às vezes correndo
no mesmo ritmo que você, aí você diz ‘vou pegar esse cara’. Motiva pra
caramba! Teve uma vez que eu vim lá do início até aqui (apontando pra ladeira)
fazendo isso. E eu nem conhecia a pessoa. Ai eu o vi correndo e pensei ‘vou
aumentar o ritmo aqui pra ver se ele agüenta’, ele agüentou! Ai quando chegou
no final aqui da ladeira, ele puxou o ritmo e eu o acompanhei. Ai no final a
gente se agradeceu e fomos embora. Foi um coleguismo de um minuto.
(Entrevista 10)
125
6. Enxergando o referencial teórico no objeto de estudo
A soma desses contatos públicos casuais no âmbito local – a maioria dos quais é
fortuita, a maioria dos quais diz respeito a solicitações, a totalidade dos quais é
dosada pela pessoa envolvida e não imposta a ela por ninguém – resulta na
compreensão da identidade pública das pessoas, uma rede de respeito e
confiança mútuos e um apoio eventual na dificuldade pessoal ou da vizinhança.
(Jane Jacobs, 1961, pp. 60)
Este capítulo aprofunda a discussão do conjunto de dados apresentados no
capítulo anterior, à luz da teoria do comportamento sócio-espacial humano, além de
considerações acerca da Psicologia Ecológica. Essa fase final foi construída em
articulação com os dados adquiridos e busca relações com a fundamentação teórica.
Boa parte das idéias apresentadas aqui não são novas, mas são passos na direção
da aplicabilidade de conhecidos conceitos numa dimensão prática e cotidiana de um
espaço público, no qual pessoas estão em movimento constante.
Buscou-se fazer o que Okamoto (1996) identificou para investigações sobre
percepção ambiental: analisar como o homem vê, interpreta, convive e se adapta à
realidade do meio em que vive.
6.1 Quem são, de onde vêm e o que pensam
As pessoas são vistas como componentes do ambiente que possuem qualidades
ambientais e características psicológicas individuais (Ittelson & al, 1974, p.2)
Nem todas as pessoas possuem a mesma percepção sobre as coisas. Os fatores
associados a essa diferenciação foram vistos no capítulo de fundamentação teórica do
presente trabalho. São os filtros pessoais, culturais e físicos (Gifford, 1997; Okamoto,
1996). No caso dos usuários do CAERF, os valores culturais e físicos aos quais os
126
entrevistados estão submetidos variam pouco, o ambiente onde o comportamento
estudado se desenvolve é o mesmo para todos e não foram contatados entrevistados com
decréscimos de suas possibilidades em decodificar o meio ou gozar de suas
potencialidades. O fato de terem histórias de vida diferentes, profissões distintas e
viverem sob convivências sociais diversas, afeta o modo como descrevem o espaço.
Assim, no caso do CAERF, os aspectos pessoais muito valorizados, tendo em vista que
quanto mais as cenas são similares, mais forte será a influência desses fatores na análise
da percepção ambiental (Okamoto, 1996; Cullen, 1983, entre outros).
Desse modo, uma estudante do curso de Biologia entrevistada diz voltar sua
atenção às modificações observadas no Parque das Dunas e aos pássaros que sobrevoam
o calçadão, enquanto um militar entrevistado afirmou que corre próximo aos carros
quando vai acompanhado, para proteger a pessoa com quem está correndo do fluxo de
veículos. Isso indica que tanto na construção perceptiva, quanto na avaliação, aquele
que descreve o ambiente irá recorrer à bagagem de representações mentais e esquemas
cognitivos, confrontando-os com as normas sócio-culturais com as quais convive. Ou
seja, os registros perceptivos, afetivos e normativos são postos em jogo
simultaneamente (Lévy-Leboyer, 1985, p. 52 e 53), e o modo como essas pessoas
descrevem comportamentos no CAERF também indica suas percepções sobre o espaço.
Solicitadas a descrever o CAERF em poucas palavras, as pessoas,
freqüentemente, confiavam em sua memória perceptiva e usavam associações para
descrever o ambiente, corroborando os estudos de Moser e Weiss (2003, p. 124), o que
fez surgirem respostas muito variadas. A maioria desses relatos relacionava-se a duas
características apontadas por Lynch (1999) como fatores facilitadores da legibilidade
urbana: a identidade e a imageabilidade. Geralmente os entrevistados se esforçavam
para tornar aquele espaço legível ao descrê-lo, e como na lateral voltada para o Parque
127
das Dunas e na própria via calçada há pouca diversidade de elementos, alçaram placas
de sinalização com frases sobre o tema e indivíduos vestidos para fazer exercício ao
papel de elementos identificadores do local (relatos como “acho que é importante para a
prática de atividades físicas” e “é um lugar aprazível para a exercer a qualidade de
vida”, por exemplo). De maneira análoga, a imageabilidade faz o entrevistado evocar
imagens representativas do local. Respostas como “É um contraste entre o Parque das
Dunas um trânsito intenso do outro lado” ou “É apertado e não tem ciclovia”
exemplificam essa afirmação.
Essa carga de significados faz com que o espaço se comunique com o seu
usuário, embora em alguma situação o CAERF deixe de comunicar. Nas entrevistas
feitas fora do CAERF, quando os respondentes precisavam descrever localizações, o
calçadão assumia apenas função de local de travessia, sem muitos pontos de referências.
Por isso, comumente, eles recorriam a elementos do outro lado da avenida para indicar a
porção que queriam relatar do CAERF. Tal dificuldade, provavelmente, decorre da
escassez de elementos construtivos no local, principalmente quando se compara o
calçadão com a outra margem da avenida, na qual a diversidade de estabelecimentos de
comércio e serviço fornece uma grande quantidade de estímulos visuais que podem
servir como pontos de referência.
Já nas entrevistas realizadas no CAERF, a escassez de elementos construtivos
fez com que os respondentes apontassem para o local ao qual se referiam, ou
simplesmente indicassem “mais à frente”, “ali”, “lá” etc, quando estavam mais
distantes.
A experiência com o espaço, a partir de referências do tipo aqui, lá, acolá,
dentro,fora, é uma experiência de posição: posição de um objeto entre outros
objetos. A localização desses objetos no espaço se dá pela percepção visível e
por uma experiência motora. No âmbito do visível, o objeto torna-se claro ou
obscuro a partir da distância de um corpo que vê. Portanto, as relações de
128
proximidade com o objeto estão relacionadas à capacidade de deslocamento de
um corpo que observa e que depende, diretamente, da sua capacidade motora
(Reyes, 2005, p. 67)
O local de moradia dos respondentes também interferiu no modo como
indicaram referências espaciais no CAERF. O mesmo ponto que os moradores do bairro
de Ponta Negra chamam de início do calçadão, para os moradores do conjunto dos
professores, é o final dele, por exemplo.
Para mim, o início do calçadão é n Praia Shopping porque eu moro em Ponta
Negra (Entrevista 5).
6.2 Coleguismo de minuto: mobilidade gerando parcerias ao
longo do tempo
Os habitantes de uma cidade não preferem contemplar o vazio, a ordem e o
sossego palpável como os projetistas pensam. O prazer das pessoas de ver o
movimento e outras pessoas é evidente em todas as cidades. Quanto mais
estranhos houver na rua, mais divertida ela será. (Jacobs, 2000, p. 38 e 41)
Grande parte dos usuários do calçadão obedece a uma rotina de utilização do
espaço e costumam optar por percorrê-lo, diariamente, no mesmo horário. Isso acaba
criando uma familiarização entre as pessoas. A maioria dos entrevistados demonstrou
enxergar essa familiaridade como positiva. O entrevistado 10 relatou, inclusive, que se
sente estimulado quando, eventualmente, corre com pessoas que costuma encontrar no
calçadão, mas que não descreve como “pessoas conhecidas”. O “coleguismo de
minuto”
20
(como denominou) é uma situação proporcionada pela convivência no
calçadão, derivada da identificação estabelecida entre duas pessoas pelo fato de estarem
desenvolvendo uma mesma atividade. Enquanto perdura essa comunalidade, o novo
participante é aceito dentro do programa do setting e se estabelece uma inter-ação
20
O trecho dessa entrevista pode ser visto na página 123.
129
estimulante. Perceber a mobilidade do outro é o fator determinante para que se
estabeleça esse “coleguismo”, que também proporciona segurança.
6.3 Sentir-se seguro: mobilidade como segurança
Grande parte dos contatos na calçada é absolutamente trivial, mas a soma de
tudo não é nem um pouco trivial. A soma desses contatos públicos casuais no
âmbito local – a maioria dos quais é fortuita e dosada pela pessoa envolvida e
não imposta a ela por ninguém – resulta na compreensão da identidade pública
das pessoas, uma rede de respeito e confiança mútuos e um apoio eventual na
dificuldade pessoal (Jacobs, 2000, p. 60).
De modo geral os entrevistados demonstraram sentir-se seguros no CAERF, com
exceção de uma entrevistada, usuária de paradas de ônibus. Provavelmente isso
acontece, conforme já foi comentado, porque as pessoas pensam no fator segurança ao
escolher os horários que irão freqüentar o local, e os definem buscando momentos do
dia em que consigam ter alguma tranqüilidade para a prática de exercícios, mas não se
sintam em um local que considerem exageradamente isolado. Além disso, os ex-
usuários da Via Costeira entrevistados relataram ter deixado de utilizar aquele espaço
devido à ausência de movimentação de pessoas. Ou seja, quanto mais pessoas se
movem pelo espaço, mais a sensação de segurança do usuário do CAERF, constatação
que vai ao encontro do que Jacobs (2000) relata em seus estudos.
Uma rua movimentada consegue garantir a segurança; uma rua deserta, não
(Jacobs, 2000, p.35).
E eu me sinto seguro em relação a assalto também, porque eu acho que a chance
de ser assaltado ali é menor. Por conta da quantidade de pessoas que estão lá
naquele momento. (Entrevista 15)
Segundo a autora, para uma rua receber desconhecidos e ter como trunfo a
segurança são necessárias três características principais: que haja separação entre espaço
público e privado, que os moradores possuam janelas voltadas para a rua e a olhem
130
constantemente e, por último, que a calçada tenha usuários transitando
ininterruptamente, aumentando o número de olhos atentos, tanto na própria rua, quanto
dentro dos edifícios, observando as calçadas. Assim, um dos aspectos positivos para que
essa calçada permaneça movimentada é ter estabelecimentos comerciais que, de
preferência, permaneçam abertos à noite, como pôde ser comprovado no relato de um
dos usuários entrevistados.
A movimentação de pessoas no comércio do outro lado da avenida e a dos
próprios carros me faz sentir seguro no CAERF. (Entrevista 16)
No entanto, em várias situações, dizer o contrário também é verdade. Um dos
respondentes relatou que o esvaziamento de pessoas transitando pela calçada gera
insegurança.
Você fica com receio quando vê um lugar com poucas pessoas, ? Ou mal
iluminado. Mas o que incomoda mais é a falta de pessoas. (Entrevista 20)
Ou seja, a movimentação de pessoas pelas ruas é o que mantém a cidade viva,
embora elas nem sempre se dêem conta disso.
A ordem pública é mantida fundamentalmente pela rede intricada, quase
inconsciente, de controles e padrões de comportamento espontâneos presentes
em meio ao próprio povo e por ele aplicados. (Jacobs, 2000, p.32)
Quando se trata de estar em movimento, cercado por desconhecidos que
possuem seus próprios trajetos, os entrevistados enxergam benefícios, mas quando se
trata de mover-se acompanhado, dividindo uma mesma trajetória, as opiniões se
diversificam.
6.4 Sozinho, acompanhado e a percepção nas/das diferentes
velocidades.
De modo geral, quem vai sozinho se locomove de forma mais eficaz pelo
131
CAERF e ocupa menos espaço enquanto se desloca, não só pela da massa corpórea, mas
pelo distanciamento que os espaços pessoais exigem. Conforme foi visto na percepção
dos entrevistados com relação às outras atividades, quanto maior a velocidade menor a
percepção. E estar acompanhado reduz a percepção das pessoas em relação às demais
atividades que as cercam.
O grau de atenção também se modifica. Uma das entrevistadas relatou que quem
vai sozinho ao calçadão presta menos atenção ao que está a sua volta, porque fica mais
concentrado no exercício, principalmente se vai com walk man. Quem vai acompanhado
presta mais atenção no que está ao redor, ou porque está mais distraído da atividade que
exerce, pelo fato de estar conversando, ou porque a companhia chama a atenção para o
entorno. Uma das suspeitas também reside no fato de que, por se sentir mais segura
acompanhada, a pessoa está mais aberta a olhar ao redor.
Outra questão é a própria percepção nas/das diferentes velocidades, pois apesar
das diversas atividades terem sido agrupadas para o presente trabalho, é importante
destacar que esses eventos ocorrem paralelamente, mas de forma interligada.
A velocidade do movimento afeta o modo como o indivíduo percebe e reage ao
que se encontra a sua volta. (Nasar, 1989).
Mobilidade subentende a ação do deslocamento e o desempenho de alguma
atividade. Isso significa que cada uma das atividades no CAERF são geradas por
vontades e motivações distintas (Balbim, 2003), e possuem behavior settings com
necessidades e satisfações diferentes, conforme demonstrou a categorização realizada
pelo viés teórico.
Como ficou evidente nos relatos, a diferença de velocidade em cada atividade
altera o grau de responsabilidade pelo encontrão (quem vem em maior velocidade
costuma ser o responsável), conferem diferença na percepção do que está ao redor da
132
pessoa (quem caminha percebe mais) e apresenta importantes diferenciações também na
escolha de caminhos e no traçado de trajetórias. Isso acontece porque a diferença de
velocidade modifica as necessidades do espaço. Quem caminha anda pela calçada, mas
quando passa a correr, muitas vezes, tem de ir para a avenida porque a quantidade de
pessoas nos abrigos de ônibus passa a incomodar mais. Quanto maior a velocidade com
que o usuário transita ao passar pelas paradas de ônibus, maior a sensação de incômodo
pela quantidade de pessoas na espera. Quem pedala reclama que não há ciclovias que
promovam o rendimento de sua velocidade sem que isso represente uma ameaça aos
outros, mas quem namora nos bancos certamente não se dá conta dessa necessidade.
Dentro de uma mesma atividade há menos disputas pelo espaço e menos
dificuldade em negociar reajustes espaciais porque as velocidades variam menos e as
percepções de espaço são mais semelhantes. Dentro de um mesmo ritmo é mais difícil
que as pessoas se tornem obstáculos umas para as outras, pois elas passam a perceber
que existe um fluxo de continuidade do qual o comportamento delas também faz parte.
O caminhar é mais tranqüilo de fazer no calçadão porque a maioria das pessoas
está caminhando, então o fluxo é mais fácil. (Entrevista 19)
Diante dos relatos também se pôde verificar que a velocidade, por ser uma
variável dependente do tempo, relativiza o espaço. Um dos entrevistados relatou que, ao
caminhar, o calçadão se torna mais largo do que ao correr. Além disso, a velocidade
muda a percepção de perigo, altera o nível de cuidado com a locomoção e a fluidez do
caminho.
O fato de caminhar em si faz você ficar menos firme com o caminho que você
vai seguir. Quando você vai caminhar, como a probabilidade de você bater em
alguém é menor, ai você tem menos essa preocupação de saber por onde está
andando. Quando você ta correndo você tem mais cuidado ao se locomover
(Entrevista 9)
133
Se é a velocidade que altera as relações de percepção, então visível é só um
efeito de superfície gerado pelo excesso de velocidade. A aparência é retida cada vez
em menor tempo. A aparência é o que se move (Virílio, 1995, p.48 citado por Reyes,
2005, p. 79). Virílio (1995) possui uma visão da cidade onde o espaço passa a ser mais
do que uma extensão, ele é uma redução do tempo real. A visão em perspectiva advinda
do homem em movimento, diferentemente do estado fixo, possibilita apenas um olhar
da perspectiva e, esse olhar segundo Reyes (2005, p. 79) é reduzido, interrompido por
barreiras e desvelados pouco a pouco pela continuidade temporal.
6.5 O balé e a previsão de comportamentos
É preciso ter em mente, principalmente para efeitos desse trabalho, que a
mobilidade aqui está sendo tratada como importante mediadora da conexão entre
pessoa, espaço e tempo, reforçando a afirmação o papel da mobilidade como um dos
elos que possibilitam a relação recíproca entre pessoas e espaços físicos Günther (2003).
As estratégias desenvolvidas e descritas pelos entrevistados para a prática dos
dribles e ultrapassagens são provenientes da convivência em uma mobilidade cotidiana
que, muitas vezes, necessitam antever o comportamento dos demais usuários. A
liberação de espaço para ultrapassagem segue um processo de negociação não-verbal
que varia de acordo com a velocidade de encontro, tendo em vista que quanto maior a
somatória dessas velocidades, menor o tempo disponível para negociação. Quando
interrogadas sobre como fazem para executar suas ultrapassagens, as pessoas, em geral,
descrevem esse mecanismo de forma óbvia e rápida. No entanto, quando relatam
aborrecimentos advindo da falha dessa negociação, ficam surpresos por perceberem que
essa negociação não é tão clara para todos.
Sob a aparente desordem da cidade tradicional existe uma ordem surpreendente
que garante a manutenção da segurança e a liberdade. É uma ordem complexa
composta de movimento e mudança. Podemos comparar essa ordem com uma
134
dança, em que cada pessoa e os grupos têm papéis distintos, que por milagre se
reforçam mutuamente e compõem um todo ordenado. O balé da boa calçada
urbana nunca se repete em outro lugar, e em qualquer lugar está sempre repleto
de novas improvisações. (Jacobs, 2000, p. 52)
A inferência de comportamento consiste em um método de percepção ambiental
descrito por Gifford (1997). As táticas de linguagem não-verbal, bem como a aplicação
de regras de trânsito de automóveis a movimentação de pessoas, visam evitar a redução
da velocidade, que implicaria ausência de sinomorfia no setting.
A experiência da realidade cotidiana é uma experiência compartilhada. No
encontro face a face temos a apreensão do outro na sua quase total plenitude,
pelo menos no que diz respeito a seus sinais exteriores. Todos os sentidos estão
aí disponíveis à percepção do outro. (Reyes, 2005, p.21)
Ao descrever a própria percepção, os entrevistados indicaram que prestar ou não
atenção em determinados aspectos, muitas vezes é parte de um mecanismo involuntário.
Se tivessem esse controle, os respondentes certamente optariam por não prestar atenção
nem nas pessoas que precisam driblar, nem da presença dos carros, que foram os dois
fatores mais descritos como “focos de atenção”. No entanto, em alguns momentos isso
pode acontecer. Um exemplo é a entrevistada 4 que relatou “filtrar” o barulho dos
carros e os odores do lixo no CAERF. Isso só é possível porque a mente é seletiva e
podemos prestamos atenção naquilo que nos desperta mais interesse, conforme indica a
literatura. Se é assim, também seria correto afirmar que não prestamos atenção naquilo
que não nos desperta interesse, pois as diversas percepções do ambiente real são
decompostas em estímulos simples captados ou não por nossos receptores sensoriais.
Mas além da percepção ambiental variar de acordo com a atividade que está
sendo desempenhada e de acordo com os aspectos pessoais, foi observado que a
percepção ambiental também varia conforme a dimensão do tempo futuro considerada
pelos usuários para estipular a análise dos comportamentos alheios. O método consiste
em otimizar as escolhas pelos percurso mais adequado para transitar, estimando de que
135
forma os demais usuários do CAERF irão se locomover. Mediante a observação do
local e os dados extraídos dos relatos, foi possível classificar três tipos diferentes de
tempos futuros: imediato, próximo e cíclico. O futuro imediato, medido em segundos, é
aquele no qual estão imbuídas as reações mais curtas, quase instintivas. Um ciclista que
desvia de um pedestre desatento, segundos antes de um iminente atropelamento,
exemplifica esse breve espaço de tempo. Trata-se de um tempo em cuja dimensão
espacial coberta é diminuta, mas muito decisiva para a ação que está sendo empregada.
O futuro próximo, medido em minutos, é aquele no qual estão imersas as reações menos
imediatas, ou seja, há tempo para pensar no comportamento antes de realizá-lo. Para
exemplificar esse tempo mais delongado, basta imaginar a seguinte cena: um
caminhante passa por um abrigo de ônibus lotado e se dá conta de que a passagem por
aquele local está difícil. Para evitar reduzir o ritmo de sua caminhada, na parada de
ônibus seguinte, minutos após ter se dado conta da dificuldade de passagem, o usuário
vai para avenida e faz a travessia. Por último, o futuro cíclico é aquele tempo que
envolve as reações dos usuários intermediadas por dias. De acordo com as experiências
de locomoção acumuladas nas tentativas de ultrapassagem, ou na forma como os outros,
em geral, costumam se locomover, a pessoa infere suas decisões. É aí que nascem as
estratégias relatadas pelos entrevistados. Criam-se hábitos, como “correr sempre pela
grama porque quase ninguém descreve essa trajetória” (entrevistado 18) ou “ultrapassar
usando o mesmo conceito dos carros pelo código de trânsito” (entrevistados 5, 8 e 9).
Em cada porção do espaço do CAERF há uma configuração diferenciada de
pessoas e essa configuração é modificada a cada instante, pois a maioria das pessoas
está em movimento. Tendo em vista que cada pessoa pode vir a se tornar um obstáculo
para os outros, percebe-se que a configuração dos obstáculos mudará no segundo
seguinte. É por isso que a maioria dos entrevistados relatou formular estratégias para
136
locomover-se, estimando os trajetos que serão seguidos por cada um desses “obstáculos
com vontade própria” (as pessoas). Perceber o ambiente e tentar prever o
comportamento do outro dá mais chances de obter êxito e, embora os entrevistados não
se dêem conta, eles parecem agir dessa forma.
6.6 As alterações promovidas pela mobilidade
A mobilidade foi trazida, por definição, de movimento do ar, ou seja, com uma
conotação de fonte de purificação (Balbim, 2003). Portanto, o significado de
movimentar-se provém, por definição, de estar saudável. No CAERF, mais ainda,
move-se com esse intuito.
Estar em deslocamento no CAERF altera a sensação de “isolamento” mediante
uma possível privacidade. Cria uma condição nova em que pessoas em diferentes
velocidades estão isoladas uma das outras. Segundo Nasar (1989, p. 49), não há como
avaliar a variável colativa “surpresa” no ambiente sem considerar que a pessoa está em
movimento. Estar em movimento, distraído ou concentrado, também altera o foco das
atenções da pessoa. Elementos que também estão em movimento pelo espaço, assim
como aquele que observa, talvez pelo fato de necessitarem do esforço de previsão de
comportamento, costumam chamar mais atenção. Numa cena típica (Figura 41), com
um usuário do CAERF concentrado na atividade que está desempenhando, percebe-se
pelos relatos que os elementos localizados na linha de trajetória da pessoa merecem
maior atenção do que os demais que estão dentro do ângulo de visão, mas não podem
interferir na trajetória. Quando o possível obstáculo está em movimento e dentro desse
ângulo da linha de trajetória do observador, a atenção é redobrada. E isso ocorre com
freqüência no CAERF. A área que está fora do ângulo de visão do observador, não
137
possui visibilidade e só há atenção do observador quando existe algum tipo de estímulo
adicional como ruídos, emissão luzes e movimentos bruscos.
Em outra cena típica (Figura 42), com o usuário do CAERF distraído da
atividade que está desempenhando em deslocamento, a atenção desprendida no ângulo
da linha de trajetória é reduzida e outros aspectos passam a chamar atenção dentro do
ângulo de visão do usuário ou numa situação excepcional, como durante o uso do
telefone celular. A “distração” relatada como “falta de atenção” faz o rendimento de sua
atividade decrescer. Estar acompanhado e envolvido numa conversa também pode fazer
o usuário comportar-se dessa maneira, sem perceber. O sentido do deslocamento, em
casos no qual a falta de atenção é mais grave pode variar, pois estar distraído pode
modificar comportamento condicionamento deslocar-se de maneira reta. Se isso
ocorrer, o ângulo da linha de trajetória também muda.
Figura 41.Esquema do foco de atenção de usuário do CAERF numa cena típica
(concentrado na atividade).
FONTE: produção da autora
Ângulo de visão
Ângulo da linha de trajetória
Sem
visibilidade
Sentido do
deslocamento
Área do foco de atenção
LEGENDA
138
Pode-se traçar uma relação entre esse comportamento e o uso dos receptores do
aparelhamento sensorial do homem indicado por Hall (1977, p. 50). Para o usuário do
CAERF que está concentrado, a decodificação dos receptores à distância, referentes ao
exame de objetos distantes, e dos imediatos, referentes às sensações da pele, membranas
e músculos, é feita de maneira eficaz. No caso do usuário distraído, o controle dos
receptores à distância parece se encontrar deficiente e os receptores imediatos passam a
reger boa parte de seu comportamento. Devido à mobilidade, os receptores imediatos do
usuário distraído podem acabar não dando conta de promover reações perceptivas em
tempo hábil para evitar encontrões com outras pessoas ou obstáculos. Por isso há relatos
de pessoas que percebem mudanças entre quem está acompanhado ou sozinho, falando
ao celular, “desfilando” ou em diferentes atividades onde a velocidade varia.
Segundo Hall (1977, p. 16), há diversas formas de distorções da comunicação
derivadas do fato de nenhuma das duas partes estarem conscientes de que cada uma
Figura 42. Esquema do foco de atenção de usuário do CAERF numa cena típica
(disperso).
FONTE: produção da autora
1
Ângulo da linha de trajetória
Ângulo de visão
Sem
visibilidade
Sentido do
deslocamento
2
3
Possíveis focos de distração
1)Telefone celular
2)Lixo
3
)
Outro usuário
LEGENDA
139
delas habita um mundo perceptivo distinto. Para Hall (1977, p. 67) os olhos, além de
serem úteis para recolher informações do ambiente e facilitar a navegação, são um
importante agente da linguagem não verbal, pois transmitem informações de punição,
encorajamento e domínio, além do homem depender mensagens recebidas pelo seu
corpo para se locomover pelo espaço e estabilizar seu mundo visual.
Nesse sentido, quando era sugerido para os respondentes que descrevessem o
modo como driblava as pessoas no CAERF, muitos relatavam aborrecimentos advindos
de falha no entendimento não-verbal. O ajuste espacial da ultrapassagem, no mesmo
sentido ou em sentido contrário, foi descrito como uma negociação visual do
comportamento do outro.
Quando eu estou no mesmo sentido a minha preocupação é menor, porque é
mais difícil de eu bater nela. (Entrevista 09)
Os relatos indicam o desenvolvimento de um mecanismo social, no qual se
espera que os envolvidos no drible/ultrapassagem estejam aptos a fazer pequenos
cálculos mentais, tanto espaciais como temporais. Desse cálculo mental, deve-se extrair
um “veredicto de passagem”, no qual alguns fatores serão levados em conta, em frações
de segundos. Um desses fatores é a posição que ocupa na “faixa” do calçadão. Os
respondentes, em geral, relataram haver certa concordância das leis de trânsito de
veículos na rua com as “regras” de movimentação do calçadão.
Eu driblo as pessoas no calçadão igual como eu faço no volante. Eu chego bem
pertinho da pessoa, assim VUM! Aí passo bem pertinho correndo. Dou um freio
em cima e dou uma desviada. Porque às vezes eu vou correndo e me irrita um
pouco quando tem uma pessoa mais devagar na minha frente. (Entrevista 09)
Além disso, o fator quantidade de pessoas (quanto maior o grupo, maior a
preferência) e o tipo de atividade desenvolvida por cada um (em geral quem se desloca
com mais velocidade tem prioridade de passagem) também são levados em conta na
hora de fazer os cálculos mentais.
140
Por que a previsão está relacionada à velocidade. E também porque, na maioria
das vezes, quando você está caminhando, diferente de estar correndo, você é
ultrapassado e não ultrapassa. A não ser que seja frente a frente, mas ai tem um
tempo maior pra raciocinar (do que correndo) e todo mundo se vendo.
(Entrevista 11)
A falha desses mecanismos origina os chamados “encontrões”, aborrecimentos e
desvios de rota.
Às vezes não dá. Como é que você vai driblar pessoas que estão andando em
quatro, num espaço onde só cabe 4? 3 talvez? Então você vai ter de diminuir, ir
pra grama, sair do ritmo. Isso estraga o exercício, o batimento cardíaco, muda o
piso, diminui ou aumenta o impacto, muda tudo o que você utilizando.
(Entrevista 11)
Mas o desvio de rota nem sempre se deve a falhas de negociação. Algumas
vezes, a quantidade de pessoas no calçadão não permite que se façam ajustes espaciais,
principalmente devido ao posicionamento das paradas de ônibus.
Não tem espaço pra pessoa caminhar confortável lá! Quando você chega na
parada de ônibus tem que sair pro meio da rua. Além das bicicletas passando.
Você pode ser atropelado. (Entrevista 04)
Quando eu correndo, se não for possível desviar delas sem que eu empurre
ninguém, tudo bem. Mas tem horas que a pessoa tem que colocar o pé na rua
mesmo. Quando eu vou de bicicleta eu desço e subo por aquelas rampas pra
deficientes pra não ter de passar pelas paradas. Isso faz com que eu me arrisque
na rua com o trânsito. Se eu pudesse evitar todo o calçadão, eu evitaria.
(Entrevista 07)
Em geral, era nesse ponto em que as pessoas indicavam também o problema
existente entre ciclistas e pedestres.
6.7 Bicicletas, cães, paradas de ônibus e estresse ambiental
Passaram bicicletas perto de mim, os únicos insetos daquele minuto seco de
verão, inaudíveis, velozes, transparentes: pareceram-me os movimentos do ar
21
.
(Neruda, 1957)
A calçada é do pedestre. Essa é a opinião dos entrevistados e também é o que diz
o Código de Trânsito Brasileiro, artigo 69. A calçada é preferencialmente de uso dos
21
Livre tradução da autora do espanhol para português.
141
pedestres e ciclistas desmontados (Gold, 2003, p.11). Todos os ciclistas reconhecem que
o CAERF é destinado ao pedestre e, embora a presença incomode aos demais usuários,
alguns são solidários à classe por reconhecerem a inexistência de ciclovia no local, o
que faz com que muitos ciclistas tenham de se arriscar na avenida, junto aos carros
(Figura 43).
O desprezo urbanístico da cidade em relação às ciclovias não coloca outra opção
ao ciclista que se acha no direito de circular pela calçada. As bicicletas,
aparentemente inofensivas, causam transtornos diários aos pedestres, sendo
incontáveis os casos de acidentes. Sobre isso não há qualquer controle pois os
ciclistas costumam alegar que lhes é inconveniente circular junto aos
automóveis. (Yázigi, 2000, p. 284)
Figura 43. Ausência de ciclovia gera disputas: ciclistas versus demais
usuários do CAERF e ciclistas versos carros na avenida.
FONTE: Arquivo da autora
Assim como as bicicletas, as paradas de ônibus e a presença de pessoas
transitando com cães foram foco de disputas. Os abrigos impedem que os que transitam
mantenham a velocidade e também os obriga a sair do CAERF (Figura 44).
Eu acho até uma falta de consideração esse pessoal nas paradas. Incomoda. Eles
vêem que a gente passando e não saem do canto! (Entrevista 16)
142
Figura 44. Usos polêmicos no CAERF: caminhada com cães e paredões formados
pelos usuários de paradas de ônibus.
FONTE: Arquivo da autora
Os cães são uma ameaça a segurança física dos usuários, sujam o calçadão com
seus dejetos e atrapalham o fluxo de pessoas, dificultando a satisfação das pessoas com
o setting. Além disso, não há como o portador do cão dosar o espaço que o outro
necessita para ultrapassá-lo, pois isso só seria possível se houvesse como medir o medo
que o outro sente.
Sou contra animais no calçadão. As pessoas se assustam com o tamanho dos
cachorros, mesmo quando são ditos como mansos. Já vi gente atravessar pro
outro lado do calçadão com medo de cachorro. Quase esbarrando nas outras
pessoas. Tem gente que desce do calçadão e vai pra rua. (Entrevista 5)
“O medo dos cães faz as pessoas recuarem” (Entrevista 17) para fazer reajustes
espaciais, que são realizados, quando possível, numa situação de perigo iminente. Esse
entrevistado relatou julgar o grau de perigo pelo porte físico da pessoa que transita com
o cachorro. Isso representa uma tentativa de antecipação de comportamentos tanto do
animal quanto do seu portador (tema que será melhor explorado mais adiante) e
delimitação do espaço pessoal necessário para atravessar com segurança (outro tema
que também será melhor explorado mais adiante).
143
Situações como essas podem causar estresse ambiental nos usuários do CAERF.
Yazigi (2000, p. 478), após verificar ocorrências de acidentes e entrevistar pessoas na
cidade de São Paulo, mostrou que a presença de bicicletas sobre as calçadas reforça o
estresse do cidadão, forçando-o a desvios muito freqüentes e à vigilância constante.
Segundo Gary W. Evans e Sheldon Cohen (1987), o ruído, a aglomeração e a
poluição do ar podem aumentar o grau de ansiedade nos usuários de um espaço com
essas características estressoras. Alguns entrevistados descreveram essas características
no CAERF. Uma das queixas dos respondentes foi a respeito presença do tráfego é
intenso de automóveis na Avenida Engenheiro Roberto Freire. Segundo Lévy-Leboyer
(1985, p. 113 e 114), estudos comprovam que, além da poluição do ar, os altos níveis de
ruídos podem ocasionar decrescimento de atenção e perturbar o rendimento das
atividades desenvolvidas no local. A preferência pelo horário de uso do CAERF no
início da manhã e final da tarde, vista por essa ótica, é prejudicial. No entanto, quanto a
insolação, é benéfico. O horário de maior movimento de veículos e emissão de ruídos e
poluição coincide com a hora do dia em que há menos incidência solar no CAERF.
Lévy-Leboyer (1985, p.111) demonstrou que o calor afeta não só o rendimento da
atividade realizada como também a conduta social da pessoa. A sensação de
aglomeração, a perda de território e a ameaça de invasão do espaço pessoal também
podem gerar estresse.
6.8 Considerações sobre conceitos do CSEH no estado de
mobilidade
O conceito de espaço pessoal, pode ser contextualizado no transitar de pessoas
pelo CAERF, desde as relações pessoais estabelecidas nos abrigos de ônibus aos dribles
144
e ultrapassagens entre os usuários. O tamanho e forma dessa bolha variam de acordo
com história individual e condições pessoais, mas quanto mais rápido a pessoa se
locomove, mais deformada para frente fica essa “bolha”, pois a preocupação se volta a
eliminar possíveis obstáculos pelo caminho. Quando acompanhadas, as pessoas tendem
a ampliar mais seu espaço pessoal para incluir o interlocutor, pois há o distanciamento
necessário para estar junto à outra pessoa (que também varia dependendo da atividade
que ela está exercendo). Talvez daí derive a sensação de que acompanhadas as pessoas
ficam “espalhadas” (Entrevista 15). Ou seja, o espaço pessoal do outro pode interferir
positivamente ou negativamente no deslocamento da pessoa (Günther, 2003).
Tendo em vista o espaço pessoal como “zona emocionalmente carregada”
(Sommer, 1973), o vazio físico entre duas pessoas que conversam no CAERF contém
uma carga emocional, de modo que a reação da dupla à alguém que os ultrapasse por
essa área central pode ser agressiva, principalmente quando se trata de um casal de
namorados, pois o intruso está interferindo nas duas funções do espaço pessoal, auto-
proteção e regulação da intimidade (Gifford, 1997). Isso também ocorre nas paradas de
ônibus, quando desconhecidos regulam o grau de intimidade distancia entre eles. Hall
(1977) em suas investigações sobre intrusão, mostrou que quando um sujeito se
aproxima de outro em um lugar público, a pessoa que se sente invadida abandona o
lugar, podendo expressar sua insatisfação verbalmente ou através de linguagem não-
verbal. Quanto mais aproximada for a intrusão, mais rapidamente a pessoa se afastará.
Quando trafega acompanhada, a pessoa opta por se aproximar mais de seu
parceiro do que de outras pessoas. A aproximação entre duas pessoas que percorrem o
calçadão juntas, pelo fato de estarem em movimento, diferem um pouco em relação às
distâncias apontadas por Hall (1977). A distância pessoal, estabelecida para conversas
paralelas, pode aumentar se, na ocasião, as duas pessoas estiverem correndo, pois a
145
prioridade que determina essa distância é a ação “correr” e não “conversar”, além das
medidas de segurança física necessárias para não haver que esbarrões.
A noção territorialidade, enquanto conceito que confere ao usuário uma defesa
contra possíveis invasões, é observada no CAERF quando o usuário interpreta que
aquela área é de seu uso exclusivo – mesmo que momentaneamente –, numa tentativa
de “semi-privatizar” um espaço público. No caso das paradas de ônibus, o espaço físico
delimitado para a espera é disputado entre os que esperam e os que cruzam o espaço em
diferentes velocidades. Alguns entrevistados relataram se afastar ou ir para a avenida
quando a parada está muito cheia. No entanto, o problema é que parte do espaço
destinado à espera confunde-se com o passeio do calçadão, destinado a quem se desloca
exercendo suas atividades. Nesse caso, a disputa é por um território de interação, ou
seja, por uma área física temporariamente controlada por uma pessoa ou por um grupo
de pessoas (Lyman & Scott, 1967, citado por Valera & Vidal, 1998, p. 138)
Lévy-Leboyer (1985, p.130) indica que as relações interpessoais não se limitam
à comunicação verbal e que a possessão do espaço e sua defesa constituem uma
modalidade importante dos intercâmbios sociais. Como, no CAERF, as pessoas
normalmente estão de passagem, nem mesmo os usuários de paradas de ônibus
“demarcam seu território” utilizando objetos. Geralmente é o próprio corpo que assume
a posição do lugar disputado.
No tocante aos conceitos de aglomeração e densidade, observa-se que, nas
passagens onde há um estreitamento do passeio destinado ao calçadão, pode ocorrer
aglomeração, ou seja, um estado em que os aspectos restritivos de delimitação espacial
são percebidos pelos indivíduos a eles expostos (Stokols, 1978). De forma semelhante,
quando há um aumento da densidade física nas paradas de ônibus, por exemplo, os
usuários sentem-me muito mais propensos a encarar os caminhantes e corredores como
146
“invasores” do seu espaço (pessoal ou simplesmente geográfico). Nota-se, portanto, que
esses conceitos estão interligados.
O estresse causado pela aglomeração parece ser comum no CAERF, pois em
várias situações, a pessoa pode se sentir-se observada (Tuan, 1983, p. 69) por outras
pessoas no CAERF e pelos que passam nos carros pela avenida. Por outro lado, “estar
perdido na multidão” parece gerar um certo grau de não-notoriedade agradável, talvez
advinda de uma sensação de privacidade pelo anonimato, uma vez que é mais cômodo
realizar os exercícios em um espaço onde se pode ter mais liberdade com as suas
emoções e atitudes.
Lévy-Leboyer (1985, p. 106) relata que a densidade tem um aspecto subjetivo,
uma dimensão interpessoal e possui conseqüências moduladas pelas atividades dos
indivíduos. Ou seja, dependendo da ação que a pessoa desempenha, ela pode vir a sentir
que o espaço está mais ou menos denso. Essa sensação de densidade, entendida em
Psicologia Ambiental como aglomeração (Tuan, 1983; Hall, 1977; Valera & Vidal,
1998), independe da quantidade de pessoas por metro quadrado e varia em função da
atividade que está sendo desenvolvida, de modo que, no caso do CAERF, a mobilidade
afeta ainda mais essa sensação.
Nos espaços públicos, como o calçadão em questão, onde nem sempre há a
possibilidade de isolar-se fisicamente, a privacidade pode ser mantida evitando-se
estabelecer contato visual com as pessoas ao seu redor. De modo semelhante, uma
pessoa que opta por não estabelecer contato verbal com um dos rostos familiares, evita
que essa pessoa tente contatá-lo no futuro, evitando que haja uma interrupção da
atividade física para “bater papo”.Assim, a privacidade é mantida. Isso vai ao encontro
do que constataram Pinheiro e Elali (1998): ter privacidade é uma maneira das pessoas
refletirem sobre sua interação com as outras pessoas e ponderar sobre contatos futuros.
147
A privacidade desenvolvida na dimensão interpessoal, pela ausência de
elementos físicos que promovam essa separação no CAERF, ocorre através da
possibilidade de aproximar-se ou afastar-se das outras pessoas. O uso do walk man pode
sinalizar que a pessoa não pretende conversar com as demais e, portanto, reduzir o
acesso de outras pessoas. Trata-se de um afastamento ocasionada por uma barreira
invisível, mas bastante conhecida e relatada pelos entrevistados.
Seguindo o diagrama de Valera e Vidal
22
(1998), pode-se dizer que quando o
usuário do CAERF utiliza walk man, a privacidade é entendida através da regulação da
interação do contato com os outros, manifestada por uma pessoa (pois a pessoa
acompanhada dificilmente vai com o aparelho), no aspecto de reserva, e alcançada por
múltiplos mecanismos, incluindo o não-verbal e sócio-cultural.
A presença de um grande número de pessoas no CAERF, assim como o uso de
walk man, pode dar a sensação de redução do espaço e menor tempo para percorrê-lo.
Günther (2003) afirma que o movimento altera a densidade do recinto. No CAERF, a
densidade altera a sensação de tempo, pois distrair-se com os outros faz o tempo parecer
passar mais rapidamente.
Os usuários apontaram a ausência de ruas cruzando o CAERF como vantagem e
confirmaram que a percepção do comprimento estimado de um trajeto cresce em função
das interseções ao longo do trajeto Sadalla (citado por Okamoto, 1996). Quanto menos
interseções, maior a sensação de um tempo reduzido para percorrê-la.
A mobilidade cotidiana é circunscrita ao espaço urbano e, ao mesmo tempo,
conseqüência da organização urbana e fator de reorganização da cidade (Balbim, 2003,
p. 5). Ou seja, é por mover-se nesse espaço que os usuários podem inferir percepções,
22
Apresentado na p, 43.
148
identificando possibilidades espaciais (vantagens), problemas (desvantagens), e
sugerindo alterações.
6.9 Behavior Settings e mobilidade
Eu só quero andar
nas ruas do Brasil
Andar no mundo livre
Sem ter sociedade
Andando pelo mundo
E todas as cidades
Andar com os meus amigos
Sem ser incomodado
(Chico Science e Nação Zumbi, 1996)
Nos casos analisados no CAERF, o sucesso do programa do setting depende,
entre outros fatores, da manutenção da velocidade antecipadamente pré-estabelecida.
Isso também significa evitar os obstáculos, uma vez que pensar no melhor percurso para
transitar é o que confere a satisfação de suas necessidades (Kaplan & Kaplan, 1989). Os
fatores que causam aborrecimentos aos entrevistados, no CAERF, em geral, dizem
respeito a essas ausências de sinomorfia, como ter de reduzir a velocidade ao cruzar
com paradas de ônibus, driblar cães, bicicletas, paredões e pessoas desatentas no
calçadão. Diminuir o ritmo para falar com pessoas conhecidas não é uma prática
comum, pois interfere no rendimento do exercício, por isso muitos entrevistados relatam
não ter tido tempo de cumprimentar seus colegas.
Trafegando sozinho, o usuário é, ao mesmo tempo, o agente sensor e executor
no mecanismo de manutenção do BS. Ao atravessar um abrigo de ônibus lotado, o
caminhante ou corredor pode agir de diversas formas. Os que disseram pedir licença
para passar, usam o mecanismo contra-desviante. Mas quando o que está em jogo é
manter o ritmo de deslocamento, em alguns casos, é necessário ir para a avenida,
149
arriscando-se com os veículos em alta velocidade (Figura 45). Nesse caso, pode ter
havido uma interrupção momentânea do setting ou um mecanismo de veto.
Figura 45. Mecanismo de manutenção do
setting: corredor vai para a avenida para
facilitar o drible e manter o ritmo.
FONTE: Arquivo da autora
Não se deve descartar a possibilidade de haver, no CAERF, behavior settings em
movimento, ou seja, unidades que possuem todas as características que compõem um
BS, mas que, no entanto, apresentam uma variação da delimitação espacial que possui
um redimensionamento constante, ao longo do tempo de duração do programa. A
suposição se baseia no fato de que, uma vez feita a análise dos BS no local, pode-se
associar os programas desempenhados com as atividades desenvolvidas, que dependem
da mobilidade para ocorrer, ou seja, os programas só ocorrem enquanto o usuário se
desloca pelo espaço através do tempo.
Foi possível classificar os BS em genótipos ambientais por causa da semelhança
na estrutura dos programas, o que comprova que não importa quem executa a ação, pois
as pessoas são substituíveis, assim como os elementos não humanos.
150
A linguagem não-verbal é comumente utilizada como mecanismo contra-
desviante para pedir passagem ou demonstrar desaprovação em caso de intrusões.
Também existe a possibilidade da ocorrência de sobreposição de BSs no
CAERF. Um usuário que pré-defina em seu programa de exercícios uma caminhada
antes da corrida pode mudar de setting, mas duas pessoas que caminham separadas e se
encontram em determinado ponto do CAERF e então começam a caminhar juntas
podem partilhar um BS ou sobrepô-los, uma vez que o programa está sendo cumprido,
os componentes humanos foram somados, os itens não-humanos permanecem os
mesmos e o comportamento que rege o movimento também perdura.
151
Considerações finais: a cotidianidade do movimento
Licença poética
Amanhece na Zona Sul de Natal. Às quatro e meia da manhã, já há passos por
sobre o mosaico de pedras portuguesas, parte deles amortecida por tênis. Percebem-se
vozes que, por ainda não haver ruídos automotivos, são ouvidos à distância.
Trabalhadores humildes aguardam o transporte coletivo e observam os primeiros
caminhantes do calçadão. Há um distanciamento entre eles que delimita a intimidade de
suas relações sociais, mas eles nunca ouviram falar sobre isso. São poucos os que
correm. Os primeiros a circular por ali, em geral, são idosos, vestem roupas de cores
claras e têm o hábito de cumprimentar os ilustres desconhecidos, pois a soma da
velocidade de encontro deles fornece tempo hábil para isso. Transitar mantém viva a
cidade e seus usuários. Qualidade de vida. Os caminhantes não sabem, mas cumprem
programas de behavior settings semelhantes, buscando satisfações ambientais bem
parecidas.
O tempo vai passando, já são seis e meia da manhã. O número de usuários
aumenta rapidamente. Eles aproveitam o sol “frio” para exercer atividades físicas. Na
área lindeira ao Parque das Dunas, ainda se pode sentir o exalar do vento de temperatura
amena que a mata absorveu durante a madrugada. É agradável, no entanto, a
movimentação dos carros também cresce e há mais ruídos nas ruas. A quantidade de
pessoas transitando dificulta os ajustes espaciais. Tudo se move. Todos possuem
objetivos. Nos rostos de algumas pessoas nos abrigos de ônibus, o semblante sonolento
152
parece revelar aos que cruzam com as paradas: não quero te dar passagem!
Oito da manhã, o sol “já está quente” e calçadão, mais vazio. Os carros correm
apressados, levando pessoas atrasadas para o trabalho. Na parada de ônibus, poucos
retardatários. Onde não há sombra, poucas pessoas. Sol e movimento formando
equações inversamente proporcionais. E é o sol que rege o vazio das horas seguintes. A
circulação por sobre as pedras portuguesas limita-se a pequenos percursos de turistas
desavisados. Poucos. Raros são os praticantes de atividade física.
É a partir das quatro horas da tarde que eles retornam. Tênis, roupas leves, walk
man, cães, bicicletas...é o período no qual convivem o maior número de atividades.
Programas de setting diversos, sobrepostos ou não, mas em contínua mobilidade. Até
nove horas da noite, haverá esse balé, essa dança pública: a tentativa de privacidade
pelo anonimato, o afastamento necessário para não ameaçar o conforto do outro, o
cansaço, a motivação, o suor, a aglomeração dos estreitamentos e paradas de ônibus, os
contatos furtivos e eventuais, a necessidade de prever comportamentos, as estimativas
de tempo. O mundo em movimento percebido por quem trafega. Dinamismo de pessoas
e conceitos. Sozinhas ou acompanhadas, distraídas ou atentas, de todas as idades. Em
busca da satisfação, utilizam o espaço como lhes convém: bancos para fazer exercícios,
placas e lixeiras para fazer alongamento.
Seis e meia da noite, pico no trânsito de automóveis da avenida. A ingestão de
monóxido de carbono cresce entre os usuários do calçadão, mas o movimento de
pessoas não cessa. Eles se sentem seguros. O silêncio e a quietude do Parque das Dunas
contrastam com o rio de luzes vermelhas e brancas no asfalto da avenida. Idas e vindas.
Referências opostas. Nos bancos, os namorados distraídos, que nunca ouviram falar em
Lynch, formulam imagens mentais do calçadão. O vendedor de coco, localizado no
meio do percurso do calçadão, testemunha tudo. Ao menor sinal de redução de
153
velocidade daqueles que trafegam, ele estuda abordagens de venda. Rostos conhecidos
circulam quase sempre no mesmo horário. Acenos, sorriso, “boa noite”. Os usuários das
sete horas da noite possuem rostos mais jovens do que os de doze horas atrás. Falam
mais alto para vencer o ruído dos carros. Pena que conversar, algumas vezes, atrapalha
o fluxo.
É apenas por volta das oito da noite que tanto o trânsito de veículos como de
pessoas volta a se acalmar. Boa parte dos usuários do calçadão está correndo.
Lentamente, o calçadão vai ficando deserto outra vez. Dá-se voz novamente à coruja
branca que habita o Parque das Dunas. A madrugada chega. As prostitutas, que já
marcavam ponto do outro lado da rua desde o entardecer, eventualmente, atravessam o
asfalto e passeiam pelo calçadão deserto. Os tênis dão lugar aos saltos altos. Até que o
sol nasça de novo, as pedras portuguesas não sofrem grandes esforços, nem acomodam
os pés ligeiros. Mas, há de se esperar, pois logo será quatro e meia da manhã
novamente.
Linha de chegada
Diante do objetivo geral dessa dissertação, pôde-se refletir aspectos da
percepção sócio-ambiental dos usuários do CAERF, bem como os comportamentos
utilizados por eles para garantir a realização das atividades pretendidas. A mobilidade
afeta a percepção e a interação da pessoa com ambiente e sugere o desenvolvimento de
mecanismos que possibilitem a convivência social. Escolher os caminhos mais eficazes
e manter o ritmo de deslocamento faz o usuário necessitar focar sua atenção em
aspectos sócio-físicos específicos, dentro de um campo de visão que pressupõe a
antecipação de comportamentos, tanto de si mesmo, quanto dos outros à sua volta.
As diferentes condições de agrupamento dos usuários do CAERF (a partir do
viés teórico da Psicologia Ecológica e da observação participante direta), apesar de
154
possuírem semelhanças em relação às atividades desempenhadas, promoveram
resultados diferentes, o que comprovou a adequação do percurso metodológico
empregado. O extenso levantamento de sinomorfos para a aplicação da teoria de Barker
(1968) promoveu avanços. A presença do cachorro no desempenho da atividade física e
a companhia de outras pessoas demonstrou mudanças significativas no comportamento
e na percepção dos usuários, em relação aos que se locomovem sozinhos e sem
cachorro. Pelo viés observacional, todos os caminhantes e corredores, acompanhados ao
não, foram agrupados em uma só categoria, no entanto, essas diferenças comprovaram
que dentro de uma mesma atividade se obtém percepções ambientais diversas,
dependendo da configuração dessa mobilidade. Isso porque o ambiente físico do
CAERF é diferente do ambiente social. Além disso, a conduta espacial dentro de uma
mesma atividade pode divergir mediante a percepção que se tem da velocidade do outro
e das coisas ao redor das pessoas.
A percepção de si mesmo e dos outros em movimento pelo ambiente, todos
imersos em uma intrincada rede de inter-ações, faz com que as pessoas desenvolvam
estratégias de mobilidade e utilização do espaço das calçadas, muitas vezes de modo
inconsciente, com o intuito de garantir a satisfação em suas atividades, pois “o modo
como a pessoa percebe o espaço contribui para o uso que faz dele” (Zube & Moore,
1987, citado por Kaplan, 1985). Essa afirmativa encontra reflexo direto no estudo
realizado na CAERF, comprovando que a realização de estudos empíricos que levem
em conta o movimento das pessoas pode contribuir para o maior entendimento/
aprofundamento das teorias existentes na área.
No entanto, é natural que ocorram limitações em qualquer estudo. Se cada
pessoa percebe e reage de diferentes formas às ações do meio, é possível que, dentre os
usuários do CAERF, existam pessoas que percebam o local de modo diferente daqueles
155
que foram demonstrados nesse trabalho, cuja compreensão poderia contribuir ainda
mais para a análise da vida em seu cotidiano real. Por outro lado, a escassez de uma
legislação brasileira que defina e delimite a função de um calçadão, dificulta o
entendimento social dessa porção pública da cidade e o controle de seu uso.
A luz de uma solução sempre ilumina outras dúvidas. Algumas hipóteses, como
as da existência de behavior settings sobrepostos ou em movimento, merecem ser
averiguadas com mais profundidade em futuros estudos.
As recentes modificações físicas feitas no CAERF (existência de uma passarela
e de telas que impedem a travessia da avenida pelo asfalto), que coincidiram com a
época do término da coleta de dados, podem gerar impactos ambientais e mudanças nos
dados aqui apresentados. A existência de pessoas portando sacolas de supermercado
pode sinalizar uma nova categoria, pois elas possuem outro programa de setting a
cumprir. Isso pode alterar a dinâmica espacial, pois esse novo uso poderia interferir nos
outros usos do CAERF, assim como mudanças de trajeto e acessos oriundos dessas
modificações físicas no local.
Apesar dessas ressalvas, a realização desse estudo foi uma fase prazerosa e
enriquecedora para mim, representando um marco em meu desenvolvimento pessoal.
Além disso, espero ter a oportunidade de apresentar os resultados obtidos em diversos
fóruns, de modo a contribuir, não apenas com o aperfeiçoamento do CAERF, mas com
a realização e a avaliação de outros projetos semelhantes, e a consolidação de
metodologias de pesquisa voltadas para a valorização da percepção e comportamento
dos usuários como elementos imprescindíveis à intervenção projetual.
A interação entre o homem em deslocamento e ambiente que ele percorre é tão
dinâmica quanto o próprio homem e, portanto, precisa ser analisada mediante essa
mobilidade. Saber como o homem percebe o espaço que o circunda, estando em
156
diferentes velocidades e executando atividades diversas, pode tornar a interação
ecológica mais satisfatória, promovendo, ao mesmo tempo, bem estar às pessoas e
equilíbrio ao ambiente.
157
Apêndice 1 UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Roteiro de entrevista
Número da entrevista:
Situação/local de entrevista:
Caracterização do respondente: Gênero/Idade/Escolaridade/Estado Civil/Bairro de
Moradia
1. O que vem a sua cabeça - em termos espaciais - quando pensa no calçadão da
Avenida Engenheiro Roberto Freire (CAERF)?
2. Quantas vezes por semana freqüenta o CAERF? Tem dias da semana pré-
definidos?
3. O que costuma fazer no CAERF? (Se exerce mais de uma atividade). Acha que
diferença no modo de usar o calçadão dependendo da atividade?
4. Costuma vir só ou acompanhado(a)? (Se ambos) Qual a situação mais freqüente?
5. horário pré-definido para freqüentar o CAERF? Qual? Por quê?
6. O horário interfere no desempenho de suas atividades? (se a resposta for sim) Como?
7. Como chega ao CAERF (meio de transporte)? Qual o seu percurso no calçadão?
8. Algo tira sua atenção da atividade que está desempenhando? (se sim) O que? Em
que trecho?
* A ordem das próximas perguntas pode variar de acordo com a postura negativa ou positiva do
entrevistado ao uso do calçadão
9. Quais são as vantagens de usar o CAERF para realizar a atividade que
desempenha?
10. E quais as desvantagens?
11. Além do tipo de atividade que realiza, que outras atividades acontecem no
CAERF?
12.
O calçadão comporta todas essas atividades? Por quê?
13.
Acha que há diferença no modo de usar o CAERF, entre pessoas sozinhas x
acompanhadas? Quais? (Preparo sobre velocidade)
14. Descreva como dribla(m) as pessoas que estão em mais baixa velocidade.
15. Percebe algum problema entre pedestres e ciclistas? Quais? Como se deu conta
disso?
16. Já deixou de cumprimentar um conhecido porque não “deu tempo”? Como isso
acontece?
17. Costuma perceber modificações no calçadão? De que tipo?
18. Leva walk man? Leva celular ao CAERF?
(Se sim) Como procede ao falar nele?
(Se não) Por que não leva celular? Já observou alguém falando ao celular no CAERF?
(Para ambos) Algo muda na forma como percebe as coisas ao seu redor (com walk man e
ao falar ao celular)? O que?
19. Costuma levar animal ao CAERF?
(Se sim) Que tipo de animal?
Toma algum cuidado adicional quando sai com seu animal? Qual?
Sente mudança na forma como você lida com o que está ao seu redor de
quando está caminhando com o cachorro para quando está sem ele? Qual?
(Se não) Qual sua opinião sobre animais no CAERF?
158
Apêndice 2
Diário de Pesquisadora
Data: 26 de Setembro:
(Quarta feira)
Horário: 6:30 – 8:00
Fui pela manhã para variar o horário.
Sempre há mais idosos do que ao final da tarde. A idéia de passarela de desfile quase
não é sentida por mim. Há poucas pessoas correndo em comparação com a noite. –
acho que o perfil dos usuários muda.
Árvores que precisam ser cortadas viram obstáculo
Um amigo quase me atropela com a bike, fazendo com que um senhor que andava de
bicicleta no sentido oposto se assustasse – o cara chegou a xingar meu amigo, que não
se incomodou.
Data 30 de setembro
(Domingo)
(véspera de eleição – primeiro turno)
Horário: 18:00 – 19:30
Dia deserto. Domingo.
Mas havia uma passeata de Mineiro no calçadão, com bandeiras, cerca de 25 pessoas.
Percebi um tarado que anda com o poodle! – o que é aquilo? Só eu noto aquele homem?
Vi algumas mulheres passando afastada dele.
Observação: Nesse final de mês apareceu um vendedor de água de coco. Ele parecia
chegar no fim da tarde e ficava até as 20 horas. Com um suporte de carro cheio de coco
gelado. Vi algumas pessoas comprando.
Data: 1 de outubro
Horário: 18:30 – 20:00
(segunda)
Me toquei de que as placas dispostas ao longo do calçadão são a única prova de que
aquele é um local projetado para a prática de atividade física. “Cuida da sua pressão
arterial” e “exercício faz bem para o corpo e a mente”
Há uma outra placa que trás essa noção de qualidade de vida: “LAZER é um direito de
todos” Æ isso inclui bicicletas, caminhadas, corridas...etc?
Observações comparativas mensais:
Apelos comerciais no calçadão: panfletagem, distribuição/representação de brindes
(cremes, água e suco), vendedor de água de coco (ficou algumas semanas – do final de
outubro ao inicio de dezembro e depois foi embora); venda de cães Æ um cara trás o
casal de cães dele e vende. Os filhotes ficam dentro de uma caixa de papelão. A venda
parece ser discreta.
159
Apêndice 3
Transcrição da Entrevista 11 (modelo 01)
Gênero: masculino
Idade: 22 anos
Escolaridade: Superior completo ou correspondente
Estado civil: solteiro
Moradia: conj. Alagamar/ Bairro Ponta Negra
Situação da entrevista: residência da entrevistadora
O que vem a sua cabeça - em termos espaciais - quando pensa no calçadão da Avenida
Engenheiro Roberto Freire (CAERF)?
(Sorri) É um bom ambiente. Adverso para a prática de atividade física, mas tem suas partes
boas: com o comprimento do calçadão sem interrupções, que facilita a atividade, tanto da
corrida, quanto da caminhada; o ambiente do Parque das Dunas...embora seja um pouco
apertado, inapropriado para a prática.
Quantas vezes por semana freqüenta o CAERF?
Três vezes.
Tem dias da semana pré-definidos?
Não.
(Como é que você escolhe os dias?)
É de acordo com a minha atividade, disponibilidade e também de acordo com a minha
atividade física antes da corrida. Então, em virtude da academia ser em frente ao calçadão,
na hora que termina a atividade, de acordo com o grupos musculares malhados no dia, isso
se adéqua è corrida. Sendo que o ideal é que sejam três vezes utilizado a prática...duas ou
três.
Você só faz correr no calçadão? Ou faz outra atividade?
Não.
(Você nunca fez outra atividade no calçadão?)
Apenas a caminhada para anteceder a corrida ou pra desaceleração, mas somente como
componente da atividade.
Em termos de espaço, você nota alguma diferença de quando você está caminhando
pra quando você está correndo?
Creio que não. Creio que a visualização, o que eu consigo ver, seja muito semelhante.
Tenho a mesma percepção de tudo.
Costuma vir só ou acompanhado(a)?
Acompanhado. Dificilmente sozinho.
Há horário pré-definido para freqüentar o CAERF?
Não. É de acordo com a disponibilidade Normalmente no período noturno.
Então você já usou em outros horários o calçadão?
Não.
Como acessa o CAERF? Como é que você chega lá?
Carro.
Sempre de carro?
Sempre de carro. Às vezes, bem esporadicamente, a pé. Caminhando até o calçadão por ser
perto de casa.
Como é o seu percurso no calçadão? Descreva!
Atualmente, tem sido: sair da academia que fica mais ou menos no primeiro terço do
calçadão. Tomando uma referência. Tenho feito o percurso até o final do segundo terço, no
caso, os outros dois terços, né?! E volto completo o calçadão, dando duas voltas ali,
considerando 2,5km o calçadão, dá cinco km.
160
Então se você fala que começa no primeiro terço, você ta querendo dizer que o início
do calçadão fica onde?
No lado da via costeira. Na minha realidade é assim.
Algo tira sua atenção da atividade que está desempenhando?
Sim.
O quê?
Principalmente os pontos de ônibus.
Por quê?
Porque são totalmente inadequados pra prática. Por vezes tem que diminuir a velocidade,
alterar o percurso, sair do próprio calçadão e ir pra avenida. É o que mais atrapalha na
prática. Os pontos de ônibus são assim a coisa que mais distrai no calçadão, porque é um
acúmulo de gente que não ta envolvida com atividade física nenhuma, que ta ali por
necessidade também, mas que atrapalha quem ta ali pra desenvolver a atividade.
Então é isso que tira sua atenção, independente se você corre ou caminha?
Independente. Independente da atividade que eu faça, ta incomodando a minha prática. Da
mesma que eu devo estar incomodando eles correndo no meio enquanto eles estão
esperando ônibus pra ir pra casa.
Na sua opinião, o que deveria ser feito pra evitar isso?
Na minha opinião, se fosse possível, eu acho que o calçadão deveria ser aumentado pro lado
do Parque das Dunas, com o dobro do tamanho que ele ocupa hoje.
Todo ele? Toda a extensão?
Toda a extensão pelo menos. Que facilitaria, por exemplo, se houvesse uma divisão....por
exemplo, uma pista de asfalto, você poderia possibilitar a prática do ciclismo ou de outras
atividades...uma ciclovia. E isso facilitaria. Creio que não teria um impacto muito grande. E
nas partes onde se julgasse necessário, talvez criar outras áreas pra outro tipo de atividade,
como um alongamento, uma barra...como se fosse os parques normais que se têm aí nas
grandes cidades.
Então, voltando ao início da questão, o que mais tira a sua atenção no calçadão? Existe
mais alguma coisa?
O trânsito, mas é praticamente insignificante... assim...na maioria dos lugares onde você
possa correr...em outras cidades, sempre vai ter uma coisinha que tira sua atenção. Mas eu
acho que no calçadão, o mais crítico, são as paradas de ônibus.
Como você procede quando tem que passar pelas paradas e tem muita gente?
Aí eu altero a minha prática esportiva pra não interromper a vida das pessoas que estão ali,
que também não tem culpa nenhuma...
Como é essa alteração?
Passar por trás das paradas, na grama, que não é o local adequado pra corrida.
Diminuir...passar andando pelo meio das pessoas, que é totalmente nocivo a minha
atividade esportiva. Ir para o meio da avenida, que o normal que ocorre com a maioria das
pessoas. O pessoal se expõe aos veículos pra poder passar, não alterar a sua atividade, nem
incomodar as pessoas ali. Creio que sejam as três alterações.
Quais são as vantagens de usar o CAERF para realizar a atividade que desempenha?
A grande vantagem é o espaço contínuo, não ter uma interrupção. Por exemplo, eu não
posso correr em qualquer calçada da cidade porque ela tem ruas cruzando. O calçadão não.
É uma faixa contínua de 2,5Km, onde eu não tenho interrupção, a não ser as paradas de
ônibus ou um possível ambulante também.
O Parque das Dunas ali na lateral também favorece muito, pela questão de diminuir o calor
e proporcionar um vento maior...pelo menos no horário que eu freqüento. Isso também é
uma vantagem grande.
161
E também não se tem tantas pessoas quanto se tem no calçadão da praia. O calçadão da
praia tem mais ou menos o mesmo tamanho do da avenida. Creio eu. Entretanto, tem muito
mais gente andando: turista e ambulantes numa quantidade absurda que impede qualquer
tipo de prática. A não ser, na parte onde já não existe a avenida ali junto (antes da Erivan
França).
As pessoas que você fala que estão andando ali, no caso, não estão desempenhando
atividade física?
Sim. Elas não estão. Estão passeando.
Então você não utiliza aquele local por isso?
Também. Porque você vai ter que acabar ou indo pra areia em virtude de ter uma
quantidade de quadros espalhados no chão ou ter uma quantidade de pessoas de mãos dadas
andando...acho que isso vai te impedir. Você não vai atrapalhar a vida delas porque elas não
têm nada a ver com a sua atividade esportiva, mas você vai ter que ir pro meio da rua ou ter
que...então, no calçadão da praia isso é muito mais comum do que no da avenida. O que me
faz ir pro CAERF, porque a maioria das pessoas que vai pra lá, não vai pra ficar admirando
o Parque das Dunas, vai pra prática esportiva.
Se o uso que se atribui aos dois calçadões fosse o mesmo, qual você freqüentaria?
Continuaria freqüentando o CAERF, por causa da facilidade de ser em frente a academia
que eu freqüento. Mas creio que se os usos fossem iguais, não teria porque optar por um ou
por outro.
E quais as desvantagens?
A desvantagem é que o local não é apropriado. As paradas, eu sou contra. Não tem espaço
apropriado para fazer alongamento ou outra atividade que seja: Abdominal, barra...um
complemento. E não tem à disposição. Devia ter, já que tantas pessoas freqüentam o
calçadão pra prática esportiva. Isso é a desvantagem
Um ou outro ambulante (vendedor), menos do que no calçadão da praia, mas um ou outro
tem. Isso também atrapalha. Vendedor de água de coco e companhia.
Outra desvantagem são os estreitamentos que ocorre, por exemplo, naquela parte que tem
próximo ao Rede Mais, naquela pista de aeromodelismo, onde fica a passarela. Existe um
encurtamento do calçadão muito grande. E ali é uma região bem crítica, porque tem um
acumulo de pessoas maior do que no restante do calçadão. Não sei se é em virtude do
Supermercado ou...mas ali é onde tem maior problema. Atrapalha a atividade.
(Esclareço que a Rede Mais fica um pouco mais a frente e que o
encurtamento/estreitamento existe por causa do estacionamento)
Além do tipo de atividade que realiza, que outras atividades acontecem no CAERF?
Esportivas ou não?
Ambas.
As pessoas que caminham, correm. Alguns que, mesmo inapropriadamente, executam seus
exercícios físicos nos bancos. Creio que alguns namorados também. Pessoas que estão ali
pra pegar ônibus. E pessoas que aproveitam o calçadão pra fazer trânsito. Entre
supermercado e casa etc. Creio que também, justamente, por não ter ruas cruzando. E
vendedores de água de coco.
Percebe algum problema entre pedestres e ciclistas?
Sim. Existe. Justamente por tudo aquilo que a gente já falou. Eu creio que a quantidade de
ciclista seja até menor pelo espaço ser inapropriado. Se tivesse uma ciclovia, talvez muito
mais pessoas estariam dispostas à prática e talvez o conflito entre pedestre e ciclista fosse
menos. Porque teria uma faixa apropriada pro ciclista que uma faixa apropriada pra quem
deseja correr.
Por que você acha que existe esse conflito?
162
Por o local não ser apropriado. Quem pensou naquele local, pensou somente numa calçada.
Não pensou que a calçada pudesse ser o que ela é hoje.
Na sua opinião, quem tem o direito de ir ao calçadão? Ciclista ou pedestre?
Todo mundo. A legislação impede? Se impede, talvez o ciclista não possa estar lá.
O calçadão comporta todas essas atividades?
Não.
Por quê?
Não comporta, justamente pelas questões anteriores. O projeto incomoda. Tem a ver com o
espaço físico. Se ele fosse um pouco maior, seria melhor.
Você diz que sempre vai acompanhado, mas você já experimentou ir ao CAERF
sozinho?
Não.
Mas já observou pessoas que vão sozinhas e que vão acompanhadas?
Sim.
Acha que há diferença no modo de usar o CAERF, entre pessoas sozinhas x
acompanhadas?
Sim. Acho que as pessoas que estão sozinhas, na maioria das vezes, ela tem algum outro
meio de distração que não a pessoa que ta ao lado, com quem geralmente se conversa. A
pessoa que ta sozinha ta ouvindo um MP3, um som, alguma coisa. Ela ta, talvez observando
menos o que tem em volta e mais concentrada no seu mundo, ali, no momento.
Descreva como dribla(m) as pessoas que estão em mais baixa velocidade.
Eu observo antes que vai haver uma rota de colisão, que eu preciso ultrapassar, e tento
observar qual vai ser o melhor local pra passar. Que não prejudique ninguém e que não
prejudique minha prática esportiva. De preferência permanecendo no calçadão pra não
haver maior impacto com o joelho ou outras coisas...pra não me expor aos carros.
Tento sempre observar a melhor forma. Não tem uma técnica. Só me antecipar ao que vai
acontecer...e tentar causar o menor mal pra todos.
Independe do sentido que a pessoa vem?
Independe. Mas às vezes não dá. Como é que você vai driblar pessoas que estão andando
em quatro, num espaço onde só cabe 4? 3 talvez? Então você vai ter de diminuir, ir pra
grama, sair do ritmo. Isso estraga o exercício, os batimento cardíaco, muda o piso, diminui
ou aumenta o impacto, muda tudo o que você ta utilizando.
E tem diferença em relação esse drible de quando você está correndo pra quando você
está caminhando? Essa previsibilidade?
A velocidade, talvez. Por que a previsão está relacionada a velocidade. E também porque,
na maioria das vezes, quando você está caminhando, diferente de estar correndo, você é
ultrapassado e não ultrapassa. A não ser que seja frente a frente, mas ai tem um tempo
maior pra raciocinar (do que correndo) e todo mundo tá se vendo.
Por falar em tempo, já deixou de cumprimentar um conhecido porque não “deu
tempo”?
Não.
Costuma perceber modificações no calçadão?
Não. Só se for das pessoas, do espaço em volta. Do calçadão em si, não. Só dos arredores.
Estão construindo supermercado...Às vezes tem pessoas diferentes. Bom, isso é notável.
Você observa que em determinados dias tem mais gente. Fora isso eu não lembro de nada.
As paradas de ônibus e os buracos do calçadão continuam na mesma posição. Não houve
nenhuma mudança.
Você falou que a quantidade de pessoas é notável. Você conseguiria dizer quais são os
dias que tem mais pessoas no calçadão? Ou você só se dá conta disso quando você
163
chega lá?
Ah, quando chego lá. Nunca parei pra pensar qual é a relação existente. Mas é observável
que nas sextas feiras tem muito menos gente do que nos dias normais. Fim de semana não
corro, não sei. Mas com certeza a sexta é diferente dos outros dias porque as pessoas não
estão tão preocupadas com a atividade física.
Leva walk man?
Não.
Mas já observou pessoas usando?
Sim
Saberia dizer ou já prestou atenção na forma como as pessoas se comportam com e
sem walk man?
Acho que a pessoa que está com walk man vive mais a música dela, o mundo dela, o que ela
ta vivendo ali. Ela não tá muito ligada ao externo. Então não tá muito ligada às pessoas que
estão em volta, não vai olhar pra ninguém, não vai cumprimentar ninguém na maioria das
vezes. Então acho que esse é o comportamento diferente das demais pessoas que estão ali
andando, observando, vendo pessoas, vendo os carros...
Leva celular ao CAERF?
Não.
Mas já observou pessoas que atendem celular?
Sim.
A respeito da percepção dessa pessoa, na sua opinião, o que muda?
É...a atividade profissional dela deve ser bastante importante...rs. Ou familiar. E não ta
muito envolvido ou envolvida/preocupada com a atividade física.
Por quê?! Você acha que o rendimento cai?
Com certeza. Por que a atenção fica difusa, não está voltada pra prática esportiva, então
com certeza o rendimento cai. Ta mais preocupada com o celular do que...
Costuma levar animal ao CAERF?
Não. Não possuo.
Mas já observou alguém com cachorro no calçadão?
Sim, sim.
Qual sua opinião sobre animais no CAERF?
Não. O cidadão ta levando o cachorrinho pra passear. Então a atividade dele não é atividade
física...é outra atividade paralela ou coisa. Então ele não busca a mesma coisa que eu e as
pessoas que caminham e correm. Creio eu. Talvez não. Talvez eu esteja errado.
Ok. Mas qual sua opinião a respeito do fato deles levarem os animais para o calçadão?
Desde que esteja dentro da legislação em vigor lá....se tiver que usar focinheira, que use.
Desde que não esteja incomodando os demais...
E você já viu algum cão com focinheira no CAERF?
Não. Negativo.
Você não tem receio de passar próximo a um cão no calçadão?
Não
Você se sente seguro no calçadão?
Sim. Nunca senti insegurança. Embora ache que um policiamento é necessário...já cheguei
a ver policiais lá, uma vez ou outra. Não é sempre. Mas eu acho que isso seria muito
saudável. Porque hoje, talvez, a gente esteja com o calçadão seguro, mas não sabe o dia de
amanhã e a segurança está sempre envolvida com a questão de você impor um medo a
quem está pensando em fazer alguma coisa. Então, seria interessante um patrulhamento
constante no calçadão pra fazer prevenção.
Já vi policial de bicicleta...é legal, porque ele ta na prática esportiva, tem tudo a ver com o
164
local, com o ambiente. Se tivesse uma ciclovia era mais adequado ainda. E ele ta ali
patrulhando, observando. E o meliante ou quem quer que seja vai observar que a vigilância
ta ali, o Estado ta ali, então isso transmite mais segurança pra quem freqüenta.
Você fala que corre somente a noite e que viu o policiamento poucas vezes. E mesmo
assim nunca se sentiu inseguro no CAERF. O que é que existe no calçadão que te
passa essa sensação de segurança?
O ambiente. Nunca vi nada de anormal. Vejo que as pessoas que freqüentam, freqüentam
pra prática esportiva, na maioria das vezes, sei lá...80%...não sei...mas creio que a maioria
ta com esse intuito. As pessoas que estão pra pegar o ônibus estão lá só na fila, esperando o
ônibus. Talvez eles fossem até mais alvo do que eu que to na prática esportiva.
Por que eles seriam mais alvo?
Porque eu porto meu celular, relógio...não tenho bem nenhum pra oferecer. Afinal você só
se sente inseguro a partir do momento que você tem algo a oferecer. Então, no ponto de
ônibus tem pessoas com bens e bolsa, carteira, jóia.
A maioria das pessoas não correm de corrente de ouro ou objeto de valor. No máximo o
tênis, que seria o objeto de maior valor. Mas que também não significa muita coisa.
Você gostaria de fazer mais alguma colocação a respeito das suas percepções a
respeito do espaço CAERF?
Não. Acho que talvez, se o espaço fosse mais apropriado, facilitaria pra quem utiliza e
incentivaria para quem não utiliza. Então, quando você vê um espaço adequado pro uso da
prática esportiva, você se sente convidado/motivado a participar, estar lá, freqüentar. Isso
seria um diferencial grande. E um espaço que você vê que tem aquilo que você necessita,
que você quer. Hoje eu busco corrida, então pra mim o espaço é adequado. Talvez pra quem
queira fazer ciclismo, não seja. Não o atrai hoje. Pra quem queira outros complementos de
atividade física, talvez não valha a pena.
165
Apêndice 4
Transcrição da Entrevista 15 (modelo 2)
Gênero: masculino
Idade: 28 anos
Escolaridade: Superior completo
Estado civil: solteiro
Moradia: Petrópolis
Local da entrevista: proximidades do calçadão
Situação da entrevista: logo após o uso do equipamento urbano
O que vem a sua cabeça - em termos espaciais - quando pensa no calçadão da Avenida
Engenheiro Roberto Freire (CAERF)?
Como eu ando de bicicleta por lá, eu acho pequeno, porque eu já atropelei...aliás, eu quase
já atropelei algumas pessoas.
Pequeno como?
Deveria ter uma ciclovia lá. É estreito.
Quantas vezes por semana freqüenta o CAERF?
Duas vezes por semana, normalmente nos fins de semana. Sábado e domingo de tarde.
Você já exerceu alguma outra atividade lá, fora pedalar?
Já caminhei algumas vezes.
Acha que há diferença no modo de usar o calçadão dependendo da atividade?
Sim. Caminhar é bem mais fácil, porque ao caminhar o calçadão se torna mais LARGO.
Costuma vir só ou acompanhado(a)?
Quando vou pedalar sempre vou acompanhado...e quando vou caminhar também.
Há horário pré-definido para freqüentar o CAERF?
Entre 16 e 18 horas.
Por que você escolhe esse horário?
Porque é o horário que ainda tem um pouco de sol e não está tão quente assim...e como eu
sou muito branquelo não posso me submeter ao sol assim tão quente.
O horário interfere no desempenho de suas atividades, fora o sol?
Não...(pensa um pouco). Talvez a questão da segurança, porque assim, como eu venho de
Petrópolis, passo pelo calçadão e volto pela Via Costeira, eu não posso vir muito tarde, sob
pena de sofrer um assalto na Via Costeira...se bem que eu nunca sofri assalto lá...acho que
isso não existe.
Você se sente inseguro só na Via Costeira ou no Calçadão também?
No calçadão não. Tem muita gente lá. Acho pouco provável que eu seja assaltado lá.
É por causa da quantidade de gente que você não se sente inseguro lá?
É...é um ambiente onde, caso ocorro um assalto, acho que o ladrão vai acabar se
prejudicando, porque alguém vai pegar ele. É um ambiente muito movimentado,
principalmente nesse horário de pico.
Como chega ao CAERF (meio de transporte)?
De bicicleta...já saio de casa de bicicleta. Não venho de carro e paro ali perto, até porque eu
acho que é complicado de parar nas imediações, afinal, onde eu estacionaria?!
Qual o seu percurso?
Eu venho de bicicleta. Eu moro em Petrópolis, ai venho pelas avenidas, enfim...no final das
contas, eu pego a Rui Barbosa, depois pelo Campus, depois por aquela rua do conjunto dos
Professores até chegar no calçadão. Ai eu percorro todo o calçadão até chegar na via
costeira e chegar em casa.
Algo tira sua atenção da atividade que está desempenhando?
166
Não. Porque eu tenho que prestar muita atenção pra não atropelar ninguém com a bicicleta.
A única vez que eu perdi a atenção foi quando encontrei uma pessoa conhecida e andei com
a bicicleta para falar com ela e quase atropelo um senhor idoso por conta disso. Foi quando
eu fui conversar com ela.
Então, só quando você encontra pessoas conhecidas, você perde a atenção?
Exato. As desconhecidas não me interessam.
Quais são as vantagens de usar o CAERF para realizar a atividade que desempenha?
Na verdade, eu não vejo nenhuma vantagem, nem desvantagem porque ele serve apenas
como caminho pra mim. Se ali fosse o calçadão ou uma rua, pra mim seria a mesma
coisa....(pensa um pouco). Não, eu estou sendo radical. Porque o calçadão, de qualquer
maneira, como é um ambiente seguro, onde você não está disputando o local com carros,
então acaba sendo um momento, onde por exemplo, eu posso aumentar ou reduzir a
velocidade de forma mais segura...eu me sinto seguro lá. Me dá segurança pra andar de
bicicleta.
Te dá segurança em relação aos carros?
Exatamente. E eu me sinto seguro também em relação a assalto também, porque eu acho
que a chance de ser assaltado ali é menor. Por conta da quantidade de pessoas que estão la
naquele momento.
Então não seria correto dizer que se o calçadão fosse uma rua, seria a mesma coisa pra
você, né?
(O entrevistado sorri) É...eu radicalizei.
Afinal, se assim fosse, você viria pelo outro lado da rua, né?
É...exatamente. Mas eu não faço porque acho o calçadão melhor.
E quais seriam as desvantagens de usar o CAERF?
(Pensa bastante) Nenhuma. Assim...não é questão de desvantagem, mas eu acho que
poderia ter uma ciclovia. É um sugestão que eu faria.
Além do tipo de atividade que realiza, que outras atividades acontecem no CAERF,
que você já identificou?
Ah, tem vários tipos de atividades lá. Eu vejo pessoas caminhando, correndo...pessoas em
atividades pré-sexuais, pessoas que vão para aquela pista de aeromodelismo e ficam lá.
Várias atividades.
Como assim atividades pré-sexuais?
Pessoas que vão namorar lá....foi isso que eu quis dizer...só isso. Nada mais que
isso...(sorri). Amantes. Mas também tem pessoas que usam os bancos pra esperar o ônibus.
Aliás, também tem essa atividade de ficar esperando ônibus. O povo fica la e fica
atrapalhando a nossa pedalada. E tem pessoas que usam os bancos só pra ficar jogando,
conversando, lendo.
Como você se sente em relação às pessoas que esperam nas paradas de ônibus?
Elas incomodam, porque às vezes eu tenho que parar. Às vezes eu tô numa certa velocidade
e, quando eu vou passar pela parada, eu tenho que reduzir a velocidade.
Então aquela questão a respeito do que tira sua atenção no CAERF. Você acha que o
momento em que você passa pelas paradas é um momento que tira sua atenção?
É...quer dizer, não. (pensa um pouco) As paradas não tiram minha atenção, elas prejudicam
a minha caminhada ou o meu andar de bicicleta. Ela não tira minha atenção, pelo contrário,
ela prende a minha atenção, porque eu tenho de desacelerar, frear pra poder não fazer nada
com ninguém.
O calçadão comporta todas essas atividades?
Sim.
Acha que há diferença no modo de usar o CAERF, entre pessoas sozinhas x
167
acompanhadas?
Sim...as pessoas que vão acompanhadas, geralmente vão fazer uma atividade e, junto com
essa atividade, elas conversam entre elas. Ou seja, tipo, dependendo do tipo de atividade
que elas forem fazer, a atividade fica meio incompleta. Tipo, se você vai gastar calorias, vai
correr e tudo o mais, geralmente as pessoas não conseguem fazer isso de uma maneira mais
adequada quando ficam conversando. A diferença é essa. (Pensa). Geralmente quem vai
desacompanhado, vai mais pra fazer uma atividade física, regular e tal. Entendeu?
Mas em relação a como as pessoas se movimentam no espaço. Você acha que tem
diferença?
Aham...quando as pessoas vão acompanhadas, elas parece que se tornam um pouco mais
espaçosas”. Sei lá, fica mais difícil de conseguir ultrapassá-las, ta entendendo?
Por falar nisso, descreva como dribla(m) as pessoas?
Geralmente, eu freio e tento ver uma brecha pra eu poder passar. Como eu não tenho buzina
– e mesmo que eu tivesse, eu acho que eu não buzinaria, porque eu acho que ficaria um
pouco complicado de chamar a atenção das pessoas e acho um pouco de falta de educação
também -, eu prefiro reduzir a velocidade e, chegando perto, eu aviso que eu to ali. Ou
então, às vezes, já aconteceu também, de eu sair do calçadão e ir pela pista, porque não dá
tempo de eu frear ou então porque eu não estou com paciência de ficar freando. Por isso
que, novamente, eu falo da questão da ciclovia.
Então, se você fala que não tem paciência pra ficar freando, então é por que te
incomoda?
Incomoda. Mas assim...ao menos tempo que incomoda eu sei que elas estão no lugar certo e
eu estou no lugar errado, porque se é um calçadão, geralmente as pessoas que vão pro
calçadão, geralmente vão pro calçadão pra caminhar e não pra andar de bicicleta.
Então você acha que de quem é o direito de uso do espaço ali?
Do pedestre. O meu direito seria secundário ao deles.
Você identifica algum problema entre pedestres e ciclistas?
Aham.
Mas você já observou algo acontecendo de mais grave ou já aconteceu com você?
Já...eu já fui até xingado...pelo senhor que eu quase atropelei.
Já deixou de cumprimentar um conhecido porque não “deu tempo”?
Sim. Tipo, porque às vezes você vem na bike, ai você vê uma pessoa, aí você sabe que a
conhece, mas ai quando você lembra o nome dela, você já passou por ela. Você não vai
voltar pra cumprimentá-la. Passou passou. Ai fica naquela palhaçada.
Isso acontece só quando você está de bicicleta?
Hoje mesmo aconteceu e eu estava correndo. Eu estava correndo, ai eu vi uma moça –
inclusive vi duas vezes, na ida e na volta – e não a cumprimentei porque toda vez que eu a
via, depois que eu identificava, já tinha passado por ela e eu não ia voltar pra falar com ela.
Costuma perceber modificações no calçadão?
Em relação a que?
Espaciais
Não. Não, mas é porque eu não sou muito observador, realmente. A única modificação que
eu percebi foi aquela passarela que fizeram ali.
Leva walk man ou celular?
Não.
Já observou alguém usando walk man no CAERF?
Já.
Algo muda na forma como percebe as coisas ao seu redor com walk man?
É...elas parecem estar numa academia, por exemplo. Quando elas vão com walk man, elas
168
estão um pouco desligadas daquele ambiente. Elas parecem não estar interagindo com
aquele ambiente. Estão apenas utilizando o calçadão para fazer suas atividades próprias.
Deixa eu me expressar melhor. O que eu to querendo dizer é que as pessoas que usam walk
man geralmente tem mais dificuldade de ver uma pessoa e conversar com ela, porque é
como se o walk man conseguisse...digamos assim....abafar os outros estímulos que estão ali
presentes. Entendeu?! Ele abafa e você concentra tudo ali naquela musiquinha...e aí você
fica ali pensando em marte ou Nova Iorque.
Mas em relação a atividade que ela está desempenhando. O que você observa que
acontece?
Eu acho que ela faz mais adequadamente, porque como ela consegue socar tudo (os
estímulos) num canto só, ali ela se concentra mais.
E no caso do celular? Você já viu pessoas usando celular no calçadão?
Eu não me lembro, mas já devo ter visto. Eu não sei, né, porque assim, com o nível de
criminalidade que a nossa cidade passa, é muita idiotice andar de celular ali, né?
Principalmente aqueles muito chiques...
Mas você não comentou que o CAERF é seguro?
É seguro pra mim, por exemplo, porque eu vou com o tênis caindo aos pedaços, a minha
bicicleta jamais seria roubada porque os aros estão todos quebrados...ou seja, eu vou como
uma pessoa que não seria assaltada (rir muito)
Você saberia dizer se algo muda na forma como a pessoa se comporta quando está
falando no celular para quando não está falando?
Acho que mais ainda, porque você está entretido com a conversa. Você, além de escutar o
que está sendo dito, você vai ter de usar sua mente para formular uma resposta. Então, eu
acho que no caso do celular, você tem dificuldade tanto pra você interagir com o ambiente,
quando pra fazer alguma atividade que você estava disposto a fazer naquele momento. O
walk man não. Como o walk man concentra mais e você não precisa responder o walk man,
só se você for esquizofrênico, ele não prejudica a atividade que você está desempenhando.
Você costuma levar animais pro calçadão?
Não. Eu não tenho animais.
Mas você já observou pessoas com animais no calçadão?
Já. Até Pit Bull! Se eu pudesse eu matava os Pit Bulls. Eles matam, então é melhor matá-
los.
Qual sua opinião a respeito de levar animais para o calçadão?
É positiva, contanto que você não leve uma fera, não é?
Por quê?
Eu me sinto ameaçado de ser atacado por aquele animal.
Mas você já viu alguma ocorrência como essa no calçadão?
Não. Nunca vi não.
Você gostaria de fazer mais alguma colocação sobre o CAERF? Algo que você ache
relevante?
Não. Achei legal. Mas se pudesse distribuir água grátis lá, seria bom, né? Eu pago muito
imposto pra porcaria de cidade que eu vivo. Então nada mais normal que fornecer esse tipo
de serviço. Afinal, pra onde vai o IPTU que eu pago?! Eu não vejo nenhum resultado. Fora
as obras de maquiagem que a prefeitura e o governo fazem.
169
Apêndice 5
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Centro de Ciências Humanas Letras e Artes
Grupo de Pesquisa Inter-Ações Pessoa-Ambiente
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO
Meu nome é Lis Barros Vilaça, sou pesquisadora do Grupo de Pesquisa Inter-
Ações Pessoa-Ambiente da UFRN, e estou desenvolvendo um trabalho para
análise do uso do Calçadão da Av. Roberto Freire.
Por meio desse documento, estou convidando o(a) Sr.(Sra.) a contribuir com
esse trabalho, participando de uma entrevista gravada, na qual será solicitada
sua opinião sobre essa área.
O(A) Sr.(Sra.) foi selecionado(a) como possível participante dessa pesquisa, e
tem plena liberdade para aceitar ou recusar esse convite.
Caso concorde em participar, solicitamos que leia atentamente este documento
e esclareça possíveis dúvidas, antes de passar a responder às questões que
lhe serão formuladas.
Eu,
____________________________________________
(escreva seu nome completo), concordo em participar da
pesquisa sobre o uso do calçadão de Ponta Negra,
respondendo às questões que me serão formuladas e
aceitando que minhas repostas sejam gravadas, e
sabendo que quaisquer resultados da pesquisa serão
divulgados sem a identificação dos nomes dos
participantes.
Assinatura:
_____________________________________________
Natal, _____ de ____________ de 2007
170
Apêndice 6
Estudos adicionais com a teoria de Behavior Setting e
sinomorfos observados no CAERF
171
As análises seguintes, visam a checagem das análises prévias:
Análise de 14 Behavior Settings:
Unificação espaço e o tempo: todos usam o calçadão inteiro, mais ou menos no mesmo horário
BS1 BS2 BS3 BS4 BS5 BS6 BS7 BS8 BS9 BS10 BS11 BS12 BS13 BS14
Nome
Idosa
caminhando
sozinha de
noite
Casal caminhando
de noite
Três amigas
caminhando
à noite
Homem
caminhando com
cachorro
de noite
Moça
correndo
sozinha
de noite
Pai e filha
correndo
à noite
Quatro
rapazes correndo
à noite
Senhor correndo
com cachorro de
noite
Uma
adolescente
Pedalando
de noite
Casal
pedalando à
noite
Grupo de
ciclistas à
noite
Moça
aguardando
ônibus de
noite
Casal namorando
no banco
de noite
(A. estática)
Homem
fazendo alongamento
no banco de noite (A.
dinâmica)
Limite físico
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
parada
Calçadão, banco Calçadão, banco
Limite temporal
18-19H 19-20H 18-19H 19:30-20:40 18:30-20 19-19:30 18-20H 20-21H 20-21H 19-19:45H 20-20:30H 18-18:23H 19:30-20H 19-19:15H
Componentes
Humanos
1 mulher
idosa
Um homem e uma
mulher
3 mulheres 1 homem 1 mulher
1 homem e 1
moça
4 adolescentes 1 homem 1 moça
1 homem e 1
mulher
4 rapazes e 4
moças
1 moça
1 homem e uma
mulher
1 homem
Componentes
não-humanos
Roupas A,
tênis,
bengala
Roupas A, tênis,
toalha
Roupas A e tênis,
bola de borracha
Roupas A, tênis e
cachorro
Roupas A,
tênis, e walk
man
Roupas A,
tênis, e
monitores
cardíacos
Roupas A, tênis,
walk man, e
monitor cardíaco
Roupas A, tênis e
cachorro
Roupas A,
tênis,
bicicleta
Roupas A,
tênis e
bicicleta
Roupas A,
tênis e
bicicletas
Roupas B,
bolsa,
livros e
parada
Roupas B,
mochilas, flores,
banco
Roupas A, tênis, walk
man e banco
Líder
único Compartilhado (2)
Compartilhado
(3)
Compartilhado
(homem/cachorro)
único
Compartilhado
(2)
Compartilhado
(4)
Compartilhado
(homem/cachorro)
único
Compartilhado
(2)
Compartilhado
(8)
único
Compartilhado
(2)
único
Ponto Focal
Exercício Exercício/conversa Exercício/paquera
Exercício/passeio
com o cachorro
Exercício Exercício Exercício/paquera
Exercício/levar
cachorro pra fazer
xixi
Exercício Exercício Exercício Espera Namoro/Conversa Exercício/Alongamento
Mecanismo
comportamental
Andar,
observar,
cantar,
sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir,
enxugar suor
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
sensação tátil,
ouvir, guiar
cachorro
correr,
observar,
cantar,
sensação
tátil, ouvir
Correr,
observar,
falar, sensação
tátil, ouvir,
driblar
pessoas,
monitorar
batimentos
Correr, observar,
, sensação tátil,
ouvir e monitorar
batimentos
correr, observar,
sensação tátil,
ouvir, controlar o
cachorro
Pedalar,
observar,
ouvir
Pedalar, falar,
observar,
ouvir
Pedalar, falar,
observar,
ouvir
Esperar,
observar
Namorar, entregar
conversar,
sensação tátil,
falar, ouvir,
observar,
Alongar, ouvir,
sensação tátil
Descrição do
Programa
chega ao
calçadão;
anda 10
minutos;
senta-se 5
minutos;
anda
novamente,
acena para
conhecidos,
equilibra-se
com
bengala
chega ao calçadão;
faz alongamento;
anda durante uma
hora enquanto
conversa, observa
as pessoas e fala
com conhecidos.
chega ao
calçadão;
caminha, ri,
conversa, observa
os rapazes, aperta
a bolinha de
borracha,
encontra outras
pessoas
chega ao
calçadão; ajeita
coleira do
cachorro, caminha
enquanto observa
pessoas e esquiva-
se com o
cachorro.
chega ao
calçadão; faz
alongamento;
corre
enquanto
observa,
ouve música,
cumprimenta
pessoas
conhecidas e
dribla as
pessoas.
chega ao
calçadão;
corre enquanto
dribla pessoas
e opta pelos
caminhos que
evitem a
separação dos
dois que correr
juntos,
observa,
conversa e
monitora os
batimentos
cardíacos
chega ao
calçadão; corre
enquanto dribla
pessoas e opta
pelos caminhos
que menos
evitem a
separação dos 4
que correr juntos,
observa, conversa
e monitora os
batimentos
cardíacos e ouve
música
chega ao
calçadão; corre
enquanto dribla
pessoas, observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas
chega ao
calçadão;
pedala
enquanto
dribla
pessoas,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas
chega ao
calçadão;
pedala
enquanto
dribla pessoas
e tenta não se
separar do
companheiro,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas,
conversa
chega ao
calçadão;
pedala
enquanto
dribla pessoas
e tenta não se
separar dos
companheiros,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas,
conversa
chega ao
calçadão;
observa,
espera
ônubis, fica
atento ao
movimento
dos ônibus,
conversa (à
vezes),
cuida da
bolsa e
livros
chega ao
calçadão;senta no
banco, entrega
flores abraça,
beija, conversa,
observa
chega ao calçadão;
senta no banco, alonga
as pernas, braços,
observa, cumprimenta
pessoas conhecidas,
ouve música, canta,
depois do alongamento
vai embora para
começar outra
atividade
172
Análise de 14 Behavior Settings:
(Unificação do espaço e comportamento: todos usam o calçadão inteiro e desempenham a mesma atividade: correr, em horários variados)
BS1 BS2 BS3 BS4 BS5 BS6 BS7 BS8 BS9 BS10 BS11
Nome
Mulher
caminhando
sozinha de
manhã
Casal caminhando
de manhã
Três amigas
caminhando
de manhã
Homem
caminhando com
cachorro
de manhã
Moça
caminhando
sozinha
de tarde
Pai e filha
caminhando
à tarde
Quatro
rapazes
caminhando de
tarde
Senhor
caminhando com
cachorro de tarde
Uma
adolescente
Caminhando
de noite
Casal
caminhando
de noite
Grupo de 8
pessoas
caminhando
de noite
Limite físico
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Limite temporal
8-9H 8-9H 8-9H 8-9H 16:40-17:30 16:40-17:30 16-18H 16-18H 20-21:30H 20-21:30H 20-21:30H
Componentes
Humanos
1 mulher
Um homem e uma
mulher
3 mulheres 1 homem 1 mulher
1 homem e 1
moça
4 adolescentes 1 homem 1 moça
1 homem e 1
mulher
4 rapazes e 4
moças
Componentes
não-humanos
Roupas A,
tênis,
óculos
escuros
Roupas A, tênis,
toalha e óculos
escuros
Roupas A e tênis,
bola de borracha,
óculos escuros
Roupas A, tênis,
óculos escuros e
cachorro
Roupas A,
tênis, óculos
escuros e
walk man
Roupas A,
tênis, óculos
escuros e
monitores
cardíacos
Roupas A, tênis,
walk man, óculos
escuros e monitor
cardíaco
Roupas A, tênis,
óculos escuros e
cachorro
Roupas A,
tênis e
óculos
escuros
Roupas A,
tênis, óculos
escuros
Roupas A,
tênis, óculos
escuros
Líder
único Compartilhado (2)
Compartilhado
(3)
Compartilhado
(homem/cachorro)
único
Compartilhado
(2)
Compartilhado
(4)
Compartilhado
(homem/cachorro)
único
Compartilhado
(2)
Compartilhado
(8)
Ponto Focal
Exercício Exercício/conversa Exercício/paquera
Exercício/passeio
com o cachorro
Exercício Exercício Exercício/paquera
Exercício/levar
cachorro pra fazer
xixi
Exercício Exercício Exercício
Mecanismo
comportamental
Andar,
observar,
cantar,
sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir,
enxugar suor
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
sensação tátil,
ouvir, guiar
cachorro
Andar,
observar,
cantar,
sensação
tátil, ouvir
Andar,
observar,
falar, sensação
tátil, ouvir,
monitorar
batimentos
Andar, observar, ,
sensação tátil,
ouvir e monitorar
batimentos
Andar, observar,
sensação tátil,
ouvir, controlar o
cachorro
Andar,
observar,
ouvir
Andar, falar,
observar,
ouvir
Andar, falar,
observar,
ouvir
Descrição do
Programa
chega ao
calçadão;
anda 10
minutos;
senta-se 5
minutos;
anda
novamente;
acena para
conhecidos
chega ao calçadão;
faz alongamento;
anda durante uma
hora enquanto
conversa, observa
as pessoas e fala
com conhecidos.
chega ao
calçadão;
caminha, ri,
conversa, observa
os rapazes, aperta
a bolinha de
borracha,
encontra outras
pessoas
chega ao
calçadão; ajeita
coleira do
cachorro, caminha
enquanto observa
pessoas e esquiva-
se com o
cachorro.
chega ao
calçadão; faz
alongamento;
observa,
ouve música,
cumprimenta
pessoas
conhecidas e
dribla as
pessoas.
chega ao
calçadão;
dribla pessoas
e opta pelos
caminhos que
evitem a
separação dos
dois, observa,
conversa e
monitora os
batimentos
cardíacos
chega ao
calçadão; dribla
pessoas e opta
pelos caminhos
que menos
evitem a
separação dos 4,
observa, conversa
e monitora os
batimentos
cardíacos e ouve
música
chega ao
calçadão; observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas
chega ao
calçadão;
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas
chega ao
calçadão;
dribla pessoas
e tenta não se
separar do
companheiro,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas,
conversa
chega ao
calçadão;
dribla pessoas
e tenta não se
separar dos
companheiros,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas,
conversa
173
Análise de 14 Behavior Settings:
Unificação espaço, tempo e comportamento: pessoas diferentes, sozinhas, em dupla ou em grupo usam o calçadão inteiro, mais ou menos
no mesmo horário, para realizar a mesma atividade: caminhar.
BS1 BS2 BS3 BS4
Nome
Idosa
caminhando
sozinha de
noite
Casal caminhando
de noite
Três amigas
caminhando
à noite
Homem
caminhando com
cachorro
de noite
Limite físico
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão,
percurso completo
Limite temporal
18-19H 19-20H 18-19H 19:30-20:40
Componentes
Humanos
1 mulher
idosa
Um homem e uma
mulher
3 mulheres 1 homem
Componentes
não-humanos
Roupas A,
tênis,
bengala
Roupas A, tênis,
toalha
Roupas A e tênis,
bola de borracha
Roupas A, tênis e
cachorro
Líder
único Compartilhado (2)
Compartilhado
(3)
Compartilhado
(homem/cachorro)
Ponto Focal
Exercício Exercício/conversa Exercício/paquera
Exercício/passeio
com o cachorro
Mecanismo
comportamental
Andar,
observar,
cantar,
sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir,
enxugar suor
Andar, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir
Andar, observar,
sensação tátil,
ouvir, guiar
cachorro
Descrição do
Programa
chega ao
calçadão;
anda 10
minutos;
senta-se 5
minutos;
anda
novamente,
acena para
conhecidos,
equilibra-se
com bengala
chega ao calçadão;
faz alongamento;
anda durante uma
hora enquanto
conversa, observa as
pessoas e fala com
conhecidos.
chega ao calçadão;
caminha, ri,
conversa, observa
os rapazes, aperta a
bolinha de
borracha, encontra
outras pessoas
chega ao calçadão;
ajeita coleira do
cachorro, caminha
enquanto observa
pessoas e esquiva-se
com o cachorro.
174
Análise de 14 Behavior Settings:
Unificação espaço, tempo e comportamento: pessoas diferentes usam o calçadão inteiro, mais ou menos no mesmo horário, para realizar
a mesma atividade: esperar ônibus.
BS1 BS2 BS3 BS4
Nome
Moça
aguardando
ônibus de
noite
Casal aguardando
ônibus de noite
4 amigos aguardando
ônibus a noite
8 pessoas desconhecidas
aguardando ônibus a noite
Limite físico
Calçadão,
parada CDF
Calçadão, Parada
Praia Shopping
Calçadão, parada UnP
Calçadão, parada
Bereiana
Limite temporal
18-18:23H 19:30-19:40H 19-19:15H 20-20:05
Componentes
Humanos
1 moça
1 homem e uma
mulher
4 rapazes
8 pessoas
Componentes
não-humanos
Roupas B,
bolsa, livros
e parada
Roupas B, sacolas,
parada
Roupas B, mochilas,
parada, livros
Roupas B, bolsa, sacola,
parada, walk man
Líder
único Compartilhado (2) Compartilhado (4)
Único (cada um dos oito é
líder de sua atividade)
Ponto Focal
Espera Espera Espera Espera
Mecanismo
comportamental
Esperar,
observar,
cuidar dos
pertences
Espera, conversar,
cuidar dos
pertences, observar
Esperar, conversar,
observar e cuidar dos
pertences
Esperar, observar e cuidar
dos pertences, ouvir
música
Descrição do
Programa
Chega ao
calçadão;
observa,
espera
ônibus, fica
atento ao
movimento
dos ônibus,
cuida dos
pertences
Chega ao calçadão;
observa, espera
ônibus, fica atento
ao movimento dos
ônibus, cuida dos
pertences, conversa
Chega ao calçadão;
observa, espera ônibus,
fica atento ao movimento
dos ônibus, cuida dos
pertences, conversa
Chega ao calçadão;
observa, espera ônibus,
fica atento ao movimento
dos ônibus, cuida dos
pertences
175
Unificação espaço, tempo e quantidade de pessoas: pessoas diferentes, em duplas, usam o calçadão inteiro, mais ou menos no mesmo
horário, para realizar atividades diferentes.
BS1 BS2 BS3 BS4 BS5 BS6 BS7 BS8 BS9 BS10 BS11 BS12 BS13 BS14
Nome
2 Idosas
caminhando de
noite
Casal caminhando
de noite
Duas amigas caminhando
à noite
Dois homens caminhando
com cachorro
de noite
Duas moças
correndo
de noite
Pai e filha
correndo
à noite
Dois
rapazes correndo à noite
Dois homens
correndo com
cachorro de noite
Duas adolescentes
Pedalando de noite
Casal pedalando à
noite
Dois ciclistas à
noite
Duas moças
aguardando
ônibus de noite
Casal namorando
no banco
de noite
(A. estática)
Dois homens
fazendo alongamento no banc
o
de noite (A. dinâmica)
Limite físico
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão, percurso
completo
Calçadão,
parada
Calçadão, banco Calçadão, banco
Limite temporal
18-19H 19-20H 18-19H 19:30-20:40 18:30-20 19-19:30 18-20H 20-21H 20-21H 19-19:45H 20-20:30H 18-18:23H 19:30-20H 19-19:15H
Componentes
Humanos
2 mulheres idosa
Um homem e uma
mulher
2 mulheres 2 homens 2 mulheres 1 homem e 1 moça 2 adolescentes 2 homens 2 moças
1 homem e 1
mulher
2 rapazes 2 moças
1 homem e uma
mulher
2 homem
Componentes
não-humanos
Roupas A, tênis,
bengala
Roupas A, tênis,
toalha
Roupas A e tênis, bola de
borracha
Roupas A, tênis e
cachorro
Roupas A, tênis, e
walk man
Roupas A, tênis, e
monitores
cardíacos
Roupas A, tênis, walk man,
e monitor cardíaco
Roupas A, tênis e
cachorro
Roupas A, tênis,
bicicleta
Roupas A, tênis e
bicicleta
Roupas A, tênis e
bicicletas
Roupas B,
bolsa, livros e
parada
Roupas B,
mochilas, flores,
banco
Roupas A, tênis, walk man e
banco
Líder
Compartilhado (2) Compartilhado (2) Compartilhado (2)
Compartilhado (2
homens/cachorro)
Compartilhado (2) Compartilhado (2) Compartilhado (2)
Compartilhado (2
homens/cachorro)
Compartilhado (2) Compartilhado (2) Compartilhado (2)
Compartilhado
(2)
Compartilhado
(2)
Compartilhado (2)
Ponto Focal
Exercício/conversa Exercício/conversa Exercício/conversa/paquera
Exercício/coversa/passeio
com o cachorro
Exercício/conversa Exercício/conversa Exercício/paquera/conversa
Exercício/levar
cachorro pra
fazer
xixi/conversa
Exercício/conversa Exercício/conversa Exercício/conversa Espera/conversa Namoro/Conversa Exercício/Alongamento/conver
s
Mecanismo
comportamental
Andar, observar,
cantar, sensação
tátil, ouvir,
conversar
Andar, observar,
sensação tátil,
ouvir, enxugar
suor, conversar
Andar, observar, sensação
tátil, ouvir, conversar
Andar, observar,
sensação tátil, ouvir,
guiar cachorro, conversar
correr, observar,
cantar, sensação
tátil, ouvir,
conversar
Correr, observar,
falar, sensação
tátil, ouvir, driblar
pessoas, monitorar
batimentos
Correr, observar, , sensação
tátil, ouvir e monitorar
batimentos, conversar
correr, observar,
sensação tátil,
ouvir, controlar o
cachorro,
conversar
Pedalar, observar,
ouvir, conversar
Pedalar, falar,
observar, ouvir
Pedalar, falar,
observar, ouvir
Esperar,
observar
Namorar, entregar
conversar,
sensação tátil,
falar, ouvir,
observar,
Alongar, ouvir, sensação tátil,
conversar
Descrição do
Programa
chega ao calçadão;
anda 10 minutos;
senta-se 5
minutos; anda
novamente, acena
para conhecidos,
equilibra-se com
bengala, conversa
com a amiga
chega ao calçadão;
faz alongamento;
anda durante uma
hora enquanto
conversa, observa
as pessoas e fala
com conhecidos.
chega ao calçadão;
caminha, ri, conversa,
observa os rapazes, aperta
a bolinha de borracha,
encontra outras pessoas
chega ao calçadão; ajeita
coleira do cachorro,
caminha enquanto
observa pessoas,
conversa com
companheiro e esquiva-se
com o cachorro.
chega ao calçadão;
faz alongamento;
corre enquanto
observa, ouve
música, conversa
com amiga e
cumprimenta
pessoas
conhecidas e
dribla as pessoas.
chega ao calçadão;
corre enquanto
dribla pessoas e
opta pelos
caminhos que
evite a separação
dos dois que correr
juntos, observa,
conversa e
monitora os
batimentos
cardíacos
chega ao calçadão; corre
enquanto dribla pessoas e
opta pelos caminhos que
menos evitem a separação
dos 2 que correr juntos,
observa, conversa e
monitora os batimentos
cardíacos e ouve música
chega ao
calçadão; corre
enquanto dribla
pessoas, observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas e
conversa com
companheiro
chega ao calçadão;
pedala enquanto
dribla pessoas,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas e
conversa com
capanheiro
chega ao calçadão;
pedala enquanto
dribla pessoas e
tenta não se
separar do
companheiro,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas,
conversa
chega ao calçadão;
pedala enquanto
dribla pessoas e
tenta não se
separar do
companheiro,
observa,
cumprimenta
pessoas
conhecidas,
conversa
chega ao
calçadão;
observa, espera
ônibus, fica
atento ao
movimento dos
ônibus,
conversa, cuida
da bolsa e livros
chega ao
calçadão;senta no
banco, entrega
flores abraça,
beija, conversa,
observa
chega ao calçadão; senta no
b
anco, alonga as pernas, braços
enquanto conversa com amigo,
observa, cumprimenta pessoas
conhecidas, ouve música, canta
depois do alongamento vai
embora para começar outra
atividade
Interdependência Intra-Grupo: Espaço e tempo comuns
Análise de diferença de quantidade de componentes humanos (dentro de uma mesma atividade): BS1 x BS2 (variação de quantidade na
ação caminhar), BS5 x BS7 (variação de quantidade na ação correr), BS9 X BS10 (variação de quantidade na ação pedalar);
Análise de semelhança de quantidade de componentes humanos (em atividades diferentes): BS2 x BS6 (casais), BS5 X BS12 (sozinha)
Análise da presença do cachorro (atividades diferentes com uso de cachorro): BS4 X BS8
Outras associações: BS13 X BS 14 (porque ainda não tinham aparecido)
176
BS1b X BS2b BS5b X BS7b
BS9b X
BS10b
BS2b X BS6b
BS5b X
BS12b
BS4b X BS8b BS13bXBS14b
Itens
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De população
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De líderes
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
Espacial
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
Contigüidade
Temporal
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
Componentes
não-humanos
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
Total
>21 >21 >21 >21 >21 >21 >21
RESULTADO
BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes
Interdependência Intra-Grupo: Espaço e comportamento comuns
Análise de diferença de quantidade de componentes humanos (dentro de uma mesma atividade): BS1 x BS2 (variação de quantidade na
ação caminhar); BS2 X BS3
Análise de semelhança de quantidade de componentes humanos (em atividades semelhantes: caminhar): BS1 x BS5 (sozinho), BS2 X BS6
(dupla), BS3 X BS7 (Grupo),
Análise comparativa com e sem o cachorro: BS9 X BS8
Outras associações: BS10 X BS 11 (dupla x grupo, exercendo mesma atividade)
177
BS1c X BS2c BS2c X BS3c BS1c X BS5c BS2c X BS6c BS3c X BS7c BS9c X BS8c BS10cXBS11c
Itens
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De população
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De líderes
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
Espacial
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
Contigüidade
Temporal
Componentes
não-humanos
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
2-3 2 0-1 1 0-1 1 2-3 2 2-3 2 2-3 2 0-1 1
Total
>21 >21 >21 >21 >21 >21 >21
RESULTADO
BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes
Interdependência Intra-Grupo: Espaço, Tempo e Comportamento comuns
Análise de diferença de quantidade de componentes: BS1 x BS2; BS2 X BS3; BS1 X BS3
Análise comparativa com e sem o cachorro: BS1 X BS4, BS2 x BS4
178
BS1d X BS2d BS2d X BS3d BS1d X BS3d BS1d X BS4d BS2d X BS4d
Itens
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
ESC
Índice
K
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De população
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De líderes
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
Espacial
95-100 1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
Contigüidade
Temporal
75-100 2
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
75-
100
2
Componentes
não-humanos
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
0-1 1 0-1 1 0-1 1 0-1 1 0-1 1
Total
>21 >21 >21 >21 >21
RESULTADO
BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes
Interdependência Intra-Grupo: Espaço, tempo e comportamento comuns
(A espera do ônibus)
Todas as combinações
179
BS1e X BS2e BS22 X BS3e BS1e X BS3e BS1e X BS4e BS2e X BS4e BS3e X BS4e
Itens
ESC Índice K ESC Índice K ESC Índice K ESC Índice K ESC Índice K ESC Índice K
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De população
23
95-100 1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
De líderes
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
Espacial
95-100 1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
95-
100
1
Contigüidade
Temporal
24
75-100 1
75-
100
1
75-
100
1
75-
100
1
75-
100
1
75-
100
1
Componentes
não-humanos
2 2 2 2 2 2
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
0-1 1 0-1 1 0-1 1 0-1 1 0-1 1 0-1 1
Total
20 20 20 20 20 20
RESULTADO
BS
Interdependentes
BS
Interdependentes
BS
Interdependentes
BS
Interdependentes
BS
Interdependentes
BS
Interdependentes
Interdependência Intra-Grupo : espaço, tempo e quantidade de pessoas em comum
Ações no banco: BS14 X BS13
Ação pedalar: BS10 X BS 11
Ação correr: BS5 x BS7
Ação caminhar: BS3 X BS2
Variável cachorro: BS8 X BS1, BS8 X BS4
Esperar ônibus x caminhar: BS12 X BS3
23
Se todos na parada forem levados em conta, fora o dono do BS analisado
24
Considerando mesma parte do dia, com as ações ocorrendo simultaneamente. Dependerá do ônibus que estão esperando, mas em geral ninguém fica muito tempo
esperando na parada por um ônibus.
180
Itens
BS14f X
BS13f
BS10f X BS
11f
BS5f x BS7f BS3 X BS2 BS8 X BS1 BS8 X BS4 BS12 X BS3
De
Comportamento
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De população
25
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
De líderes
0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7 0 7
Espacial
Dif.esp.
Mesma
cid.
5 95-100 1 95-100 1 95-100 1 95-100 1 95-100 1
Dif.esp.
Msm
cid.
5
Contigüidade
Temporal
26
Mesma
parte
do
dia
2
Mesma
parte
do
dia
2
Mesma
parte
do
dia
2
Mesma
parte
do
dia
Mesma
parte
do
dia
2
Mesma
parte
do
dia
2
Mesma
parte
do
dia
2
Componentes
não-humanos
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
Total
>21 >21 >21 >21 >21 >21 >21
RESULTADO
BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes BS Diferentes
Análise inter-grupal:
Objetivo: verificar se a mesma senhora idosa caminhando da mesma forma, mas em outro horário do dia é o mesmo Behavior Setting.
25
Se todos na parada forem levados em conta, fora o dono do BS analisado
26
Considerando mesma parte do dia, com as ações ocorrendo simultaneamente. Dependerá do ônibus que estão esperando, mas em geral ninguém fica muito tempo
esperando na parada por um ônibus.
181
BS1a X BS1b
Itens
BS1a X BS1b
De
Comportamento
0 7
De população
27
95-100 1
De líderes
95-100 1
Espacial
95-100 1
Contigüidade
Temporal
28
0-24 7
Componentes
não-humanos
Idênticos
BS1a e
BS1b
1
Semelhança de
Mecanismos
comportamentais
0-1 1
Total
19
RESULTADO
BS Interdependentes
Conclusão: Se for a mesma pessoa, sob as mesmas condições, não importa a hora que
ela executa a atividade. Serão BS interdependentes ou o mesmo.
27
Se todos na parada forem levados em conta, fora o principal integrante humano do BS analisado
28
Considerando mesma parte do dia, com as ações ocorrendo simultaneamente. Dependerá do ônibus que
estão esperando, mas em geral ninguém fica muito tempo esperando na parada por um ônibus.
182
Bibliografia
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