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Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Centro de Ciências Sociais Aplicadas/Programa de Pós-
Graduação em Educação
Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens
Históricas, Educativas e Literárias
As mudanças na educação do RN nos idos de 1950 e
1960: a prática de Lia Campos
Daniela Fonsêca Vieira
Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais
NATAL – RN
2005
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Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Centro de Ciências Sociais Aplicadas/Programa de Pós-Graduação em
Educação
Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens Históricas,
Educativas e Literárias
As mudanças da educação do RN nos idos de 1950 e 1960: a prática de
Lia Campos
Daniela Fonsêca Vieira
Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais
NATAL – RN
2005
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3
Dissertação apresentada como exigência
parcial para obtenção de título de Mestre
em Educação, à Banca Examinadora do
Programa de Pós-Graduação em Educação
da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, sob a orientação da Profª Drª Maria
Arisnete Câmara de Morais.
4
As mudanças da educação do RN nos idos de 1950 e 1960: a
prática de Lia Campos
Dissertação defendida em ____/____/____
Mestranda: Daniela Fonsêca Vieira
Banca Examinadora:
______________________________________________________
Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais – Orientadora/ UFRN.
______________________________________________________
Profª Drª Maria Inês Sucupira Stamatto/UFRN – (Titular)
______________________________________________________
Prof Dr Charliton José dos Santos Machado/UFPB – (Titular)
______________________________________________________
Profª Drª Maria Lúcia da Silva Nunes/FUNDESCOLA/MEC-PB – (Suplente)
5
Agradecimentos
A Deus, fonte inesgotável de força, luz e sabedoria em todos os dias da minha
vida.
À professora e orientadora Maria Arisnete Câmara de Morais que muito me
ensina através de seus recados.
Ao Instituto Histórico e Geográfico e Arquivo Público do Rio Grande do Norte
pela disponibilidade do material pesquisado.
Aos meus queridos pais, José Vieira e Cícera, minha eterna gratidão pelo que
tenho e o que sou.
Ao meu irmão, Augusto César, que pela sua irreverência não me deixava
desanimar.
A Luiz José de Sant’Anna Neto, amor que me encoraja na perspectiva de um
futuro.
À amiga de todas as horas Amélia Cristina, em especial, pela divisão de
angústias passageiras e momentos de alegria.
Ao amigo Manoel Pereira da Rocha Neto, pelos esclarecimentos prestados e
disponibilidade.
Ao amigo Marcos Antônio Silva, pela amizade, compreensão e flexibilidade.
Aos que fazem o Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do RN, onde
trabalho e aprendo, a cada dia, a importância da vida.
Aos integrantes da Base de Pesquisa Gênero e Práticas Culturais pelo
companheirismo.
6
[...] sinto-me cada vez mais ligada,
afetivamente, à vida desse Estado, onde
tive a oportunidade de prestar a minha
modesta contribuição na sua área
educacional, contando com a colaboração
de educadores devotados, que muito
contribuíram, para a conquista das metas
programadas (Lia Campos, 1975).
7
Dedico este trabalho à memória da
professora Lia Campos.
8
RESUMO
O presente estudo investiga e analisa a participação da professora Lia
Campos, durante as décadas de 1950 e 1960, na organização educacional
norte-riograndense. A escolha do período justifica-se por ser esse o tempo em
que essa professora gaúcha permanece nas terras potiguares, trabalhando em
prol da educação. Na busca de dados que me informassem acerca de suas
ações, percorro acervos como Arquivo Público do Rio Grande do Norte,
Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e Centro de Estudos
Supletivos Professora Lia Campos, na tarefa de garimpar fotografias e relatos
orais de amigos e colegas de trabalho, jornais da época, leis e decretos.
Alicerçado no ensino primário, o trabalho de Lia Campos ressalta a relevância
da formação docente para esse nível de ensino e o modo como os que nele
trabalham podem conduzir suas concepções e fazeres da prática diária. Dessa
forma, constato que a referida professora promove, nesse Estado, uma série
de atividades como: levantamento e sistematização da rede escolar;
organização dos quadros administrativos das escolas; capacitações e cursos
de aperfeiçoamento para professores leigos, bem como implantação da Lei da
Educação nº 2.171/1957. Através dessa análise, mostro como essa professora
deixou impressa a sua marca na historiografia do Rio Grande do Norte por
meio das suas ações, sendo por isso lembrada pelos que acompanharam sua
experiência em terras norte-riograndenses.
Palavras-chave: Educação. Professora. Lia Campos. Rio Grande do Norte
9
ABSTRACT
The present study investigates and analyzes the participation of the teacher Lia
Campos, during the 50’s and 60’s years, in the norte-riograndense educational
organization. The choice of the period is justified because was at this the time
what this teacher remained in the potiguar lands, working in favor of the
education. In the search of data that informed me concerning her actions, I
cover quantities as the Public Archive of the Great River of the North, Historical
Institute and Geographic of the Rio Grande do Norte and the Center of
Supplementary Studies Teacher Lia Campos, in the task to obtain photographs
and verbal stories of friends and fellow workers, periodicals of the time, laws
and decrees. Based on the primary education, the work of Lia Campos shows
the relevance of the teaching formation for this level of education and the way
as the ones that in it work can lead their conceptions and daily practical tasks.
This way, I evidence that the cited teacher promotes, in this State, a series of
activities as: survey and systematization of the school net; organization of the
administrative stuff of the schools; qualifications and courses of improving for
lay professors, as well as implantation of the Law of the Education nº
2.171/1957. Through this analysis I show as this teacher left printed her mark in
the Rio Grande do Norte historiography by means of her actions, being
therefore remembered for that they had followed her experience in norte-
riograndense lands.
Key-words: Education. Teacher. Lia Campos. Rio Grande do Norte
10
SUMÁRIO
1. Traços de uma trajetória 12
2. Procedimentos metodológicos 23
3. Lia Campos 32
4. O Rio Grande do Norte no plano político-educacional 42
5. A prática de Lia Campos 78
6. Algumas considerações 94
Referências 99
11
Traços de uma trajetória
12
1 – Traços de uma trajetória
ste estudo investiga e analisa a participação da professora Lia
Campos, entre as décadas de 1950 e 1960, na educação norte-
riograndense quando sistematizou as bases da Secretaria de Educação. Tal
interesse desponta da minha trajetória no curso de Pedagogia da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, no qual ingressei no ano de 1999. Meus
primeiros passos na Universidade são tomados por expectativas, entusiasmos,
desejos e receios. O universo que ora se descortinava na minha presença
evidenciava-se como um espaço instigador de responsabilidades solitárias e de
buscas incessantes por respostas a questões que a cada aula surgiam.
E
Durante as aulas da disciplina Fundamentos Histórico-Filosóficos da
Educação, primeira disciplina com a qual tive contato, comecei a conhecer os
alicerces da História da Educação em vários lugares do mundo e que ficaram
de legado para a educação no Brasil.
Seguindo o caminho proposto pelo currículo do curso, em 2000,
matriculei-me na disciplina História da Educação, a grande responsável pelo
despertar de uma curiosidade a respeito de como se constituiu a educação no
Brasil e de que maneira os processos do passado se refletem no contexto da
educação atual. Essa disciplina apresentou-me também o movimento pela
educação a serviço da democracia, a Escola Nova, que reuniu personalidades
engajadas no propósito de colocar a educação em defesa da cidadania – uma
proposta que parece pertencer, aos menos avisados, tão somente a situação
educacional contemporânea. Os integrantes desse movimento, José Augusto,
13
no Rio Grande do Norte; Sampaio Dória, em São Paulo; Lourenço Filho, no
Ceará; Anísio Teixeira, na Bahia; Fernando de Azevedo, no Distrito Federal,
entre outros, partiam da suposição de que a educação brasileira,
tradicionalmente, dirigia-se a determinados segmentos da sociedade ou visava
exclusivamente à formação profissional. Com o ensejo de sobrelevar essa
realidade, conceberam reformas educacionais abrangentes, objetivando tanto
os diversos níveis de ensino, como os procedimentos didáticos (PINTO, 1986).
As discussões sobre a Escola Nova, aliadas às informações
apresentadas sobre o que acontecia em âmbito local, no contexto social e
educacional, moveram-me a estudar, a deter-me ainda mais sobre a história da
Educação no Brasil.
No entanto, só o ambiente de sala de aula não era o bastante. Nesse
mesmo ano, procurei integrar-me a uma Base de Pesquisa que trabalhasse
com o tema. Foi quando conheci a Base de Pesquisa Gênero e Práticas
Culturais: abordagens históricas, educativas e literárias coordenada pela
professora Maria Arisnete Câmara de Morais. A referida Base de Pesquisa está
vinculada ao Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Política e Cultura –
NEPEPC – sendo composta por professores pesquisadores, estudantes de
Pós-Graduação em Educação e de iniciação científica das mais diversas áreas
de estudo como Letras, Pedagogia, História, Jornalismo e Ciências Sociais.
Conduzida pela minha curiosidade e pela vontade de aprender, tornei-
me aluna de Iniciação Científica, participando do Projeto Integrado História dos
Impressos e a Formação das Leitoras, aprovado pelo CNPq, que pretende com
os estudos das relações sociais de gênero, com suas diferenças e
semelhanças compreender historicamente o papel da mulher na sociedade,
14
para melhor entender a interação homem e mulher, segundo valores e
interdependências historicamente constituídos (MORAIS, 2000-2004, p. 10).
A Base de Pesquisa objetiva, assim, contribuir para a história da
educação no Brasil, e em especial, no Rio Grande do Norte, através do Projeto
Integrado que se firma no seguinte tripé: 1 – história dos impressos e a
formação das leitoras; história do livro e das edições, sua circulação, maneiras
de ler, indicações de leitura para mulher; história das disciplinas escolares, 2 –
representações da mulher no romance; a visão que os escritores têm da
mulher; como as mulheres vêem as representações das suas imagens?, 3 –
participação de mulheres na construção de uma sociedade letrada brasileira,
especialmente a norte-riograndense; prática de professoras, literatas ou
participantes ativas na sociedade que associavam seus nomes ao esforço de
educar gerações.
Detendo-me no terceiro ponto deste tripé e através dos encontros
semanais realizados no seminário Gênero, Educação e Literatura, oferecido
aos alunos de Pós-Graduação em Educação, pude perceber que as mãos que
escreveram essa história não eram apenas masculinas e que as mulheres
tiveram uma participação efetiva na tarefa de executar e transformar o ensino,
bem como formar gerações. A partir dessas discussões, conheci autores, como
Roger Chartier, Michelle Perrot, Georges Duby, Jane Soares de Almeida, entre
tantos outros, que tratam de aspectos históricos, culturais e de gênero, os
quais fundamentam teórica e metodologicamente o estudo atual.
Roger Chartier (1990), em sua obra A história cultural: entre práticas e
representações, mostra a emergência de novos objetos no âmbito do fazer
histórico, repercutindo na entrada do historiador em novos territórios e, ainda,
15
desvia a atenção para a história dos homens e das mulheres comuns, na
intenção de compreender suas práticas culturais e as relações que estes
estabelecem com o mundo.
Da mesma maneira, Perrot (1998) no livro Os excluídos da história:
operários, mulheres e prisioneiros, evidencia que aqueles que por muito tempo
estiveram à margem da história podem ser analisados como objeto de
pesquisa. A autora demonstra como as mulheres, na sociedade ocidental do
século XIX, vão obtendo conquistas de oportunidades no espaço público.
A leitura do livro A história continua (1993) de Duby mostra e analisa os
caminhos trilhados por esse pesquisador, tratando de questões referentes às
fontes, metodologia de pesquisa e o exercício solitário da escrita do trabalho
historiográfico.
Nessa descoberta bibliográfica encontrei-me com Almeida em sua obra
Mulher e educação: a paixão pelo possível (1998). Este livro traça o percurso
profissional feito pelas mulheres desde os fins do século XIX, quando estas
ingressavam no mercado de trabalho como professoras primárias, fazendo de
seus desejos, coragem e esforço o primeiro passo pra adentrar em um território
imperado pelo poder masculino.
Merecem destaque, também, as pesquisas desenvolvidas pelos
componentes da Base de Pesquisa que auxiliam na reconstituição da
participação feminina na esfera pública, quer na literatura, no magistério ou em
quaisquer tipos de movimentação cultural ou social.
Exemplos a serem citados são as pesquisa de Morais (2001), Isabel
Gondim: educação enquanto prática de vida, e de Pinheiro (1998), Sinhazinha
Wanderley: o cotidiano do Assu em prosa e verso.
16
Morais (2001) analisa a produção textual e a prática educativa de Isabel
Urbana de Albuquerque Gondim. Esta mestra dedicou sua longa vida às letras,
à educação e à história. Foi também pioneira em quase tudo que se propôs a
fazer: escrever e publicar livros dedicados à educação e a primeira mulher a
tornar-se sócia efetiva do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do
Norte, em 29 de julho de 1928, “única mulher admitida em seu grêmio, por
força de seus grandes merecimentos” (2001, p. 14).
A Tese de Pinheiro (1998) aponta para uma professora que detinha
práticas modernas. Sinhazinha Wanderley aboliu o castigo corporal e fez uso
da música e do teatro como forma de representar o conteúdo por ela ministrado
nas aulas. Essa professora ainda contribuiu para o meio artístico-cultural, ao
compor hinos cívicos e religiosos; escrevendo artigos e poemas, colaborando
com os jornais e revistas.
Através dessas leituras percebi que as professoras são agentes sociais
que têm uma responsabilidade direta nos processos educativos. São elas que
propagam, discutem, indagam e corporificam todas as significativas teorias e
concepções sociais acerca da educação institucional. Por isso, a importância
da análise histórica de professoras se faz cada vez mais necessária em
pesquisas e estudos.
Continuando nesse percurso participei de eventos locais e regionais nos
quais tive a oportunidade de expor o que vinha produzindo, o resultado dos
estudos realizados enquanto aluna de iniciação científica.
O primeiro evento do qual participei foi o XI Congresso de Iniciação
Científica da UFRN, em 2000, juntamente com Hiltnar Silva Muniz, onde
apresentei o trabalho O desafio da reconstrução de uma época, que mostrava
17
a tarefa de ir e vir aos arquivos em busca das fontes que fornecem informações
acerca do trabalho a ser realizado.
Em 2001, na cidade de São Luís/MA, ao participar do XV Encontro de
Pesquisa Educacional do Norte e NordesteEPENN, apresentei um trabalho
que mostra como me constituí leitora, o que me levou por esse percurso, que
contribuições essas leituras me proporcionaram quanto à formação pessoal e
sócio-cultural e que obras se destacaram nesse caminho que até hoje percorro.
Posteriormente, com a organização desse texto mais aprofundado, ele é
publicado, com o título Minha vida de leitora, no livro Carrossel de leituras:
ensaios de vida (2003, p. 95-98), organizado pela professora Maria Arisnete
Câmara de Morais.
Com a sistematização desses estudos, tive a oportunidade de publicar
um artigo no periódico DaVinci: um suplemento de textos acadêmicos do jornal
Diário de Natal (2002), cujo título é Estudos de Gênero: uma construção social,
histórica e cultural, produzido juntamente com a também aluna bolsista, Amélia
Cristina Reis e Silva. Tal artigo divulga parte da produção realizada na Base de
Pesquisa, bem como mostra o referencial teórico que norteia os trabalhos nela
concluídos.
Esse constante movimento de estudos, discussões e pesquisas me fez
perceber, entre tantas outras coisas, que a literatura também exerce o papel de
fonte para as pesquisas históricas em educação e em outras áreas do
conhecimento. Ainda, não cabe ao pesquisador fazer o papel de juiz da
história, mas reconstituí-lo como lhe for possível, analisando os seus aspectos
culturais, econômicos, educativos, étnicos e outros. E o mais importante é que,
quando se trabalha com história, não se deve levar em consideração apenas a
18
história dos grandes homens e seus feitos, mas reconstituir os fatos, mostrando
a história dos excluídos, das minorias (BURKE, 1992).
Simultaneamente, prossegui desenvolvendo minhas atividades, ora
assistindo a aulas e apresentações de teses e dissertações, ora estudando a
bibliografia recomendada ou visitando os arquivos da cidade. Segundo Nunes
(1990), nessa trajetória de visitas, vivenciamos os dois lados da busca: o
angustiante e o encorajador. Angustiante, pois muitas vezes, diante dos
percalços impostos por essa tarefa, pensamos em desistir, em buscar outro
rumo. Encorajador, porque, na medida em que os documentos se mostram, e
que aparecem diante de nossos olhos, percebemos o quanto ainda existe para
ser descoberto, transpondo, dessa forma, todos os obstáculos impostos.
O contato com os arquivos mostrava, a todo o tempo, como se
configurava o Rio Grande do Norte e, mais especificamente, Natal: o que
acontecia no plano social, político, econômico e educacional.
A partir dessas atividades, tem início uma série de questionamentos: se
as mulheres tinham sua participação na construção das sociedades, como se
dava a sua educação? Como esse processo acontecia no Rio Grande do
Norte?
Enveredando pelo caminho que esses questionamentos me apontavam,
iniciei a pesquisa que resultou no meu trabalho monográfico concluído no
período letivo de 2002. Intitulado A educação da mulher na década de 1930: a
Escola Normal de Natal. Essa pesquisa teve como objetivo reconstituir uma
parcela da história da educação feminina em Natal, na década de 1930,
abordando a sua organização curricular, o seu conteúdo de formação, a
duração do curso, os métodos e a avaliação utilizados. A pesquisa revelou o
19
cotidiano da Escola Normal de Natal, sua organização enquanto instituição de
ensino, como eram formadas as futuras professoras; o regimento interno da
Escola e a relação que este tinha com os processos educativos vigentes na
época e com a dinâmica política do Brasil do período.
Seguindo os vestígios da década em estudo, 1930, no Instituto Histórico
e Geográfico do Rio Grande do Norte, deparei-me várias vezes nos jornais A
República e Tribuna do Norte com o nome da professora Lia Campos (1928-
1979), pela qual me interessei. A convite do então governador, Dinarte Mariz, e
do Secretário de Educação, Tarcísio de Vasconcelos Maia, Lia Campos veio ao
Rio Grande do Norte coordenar cursos de aperfeiçoamento para professores,
participando da sistematização da Secretaria de Educação e Cultura do
Estado. Nesse período, Lia Campos fazia parte da equipe de Orientadores da
Educação Primária do Centro de Pesquisas e Orientações Educacionais
(CPOE) da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul.
Compreendendo que pesquisas sobre mulheres representam um estudo
relevante para a percepção histórica das práticas femininas e educacionais no
Rio Grande do Norte, em especial, decidi que a atuação dessa professora seria
por mim explorada numa oportunidade futura. Com a finalidade de pesquisar
sobre essa professora, ingressei no Programa de Pós-Graduação em
Educação, na condição de aluna mestranda.
O objetivo deste novo estudo consiste em investigar e analisar a
contribuição da professora Lia Campos na organização educacional norte-rio-
grandense no período que compreende os anos de 1957 e 1964. Busquei,
através das suas iniciativas, reconstituir parcela da sua relação com a
20
educação, mostrando de que forma ela protagonizou todas as mudanças
educacionais.
A escolha do período de 1957 e 1964 se deve ao fato de ter sido esse o
tempo que Lia Campos trabalhou em prol da educação, inserida em um
contexto que não era tão favorável ao deslocamento geográfico feminino para
trabalhar em outros lugares que não o seu de origem. A exemplo dela, só tenho
conhecimento da professora norte-riograndense, Francisca Nolasco
Fernandes, mais precisamente Dona Chicuta, sua contemporânea e colega de
trabalho que, “em 1930 foi designada pelo Diretor do Departamento de
Educação, Dr. Francisco Ivo Cavalcanti, para atender ao convite do governo de
Pernambuco para a implantação de uma reforma de ensino no seu estado”
(MORAIS, 2002, p. 06).
Em contato com a equipe técnica que compõe o Centro de Educação de
Jovens e Adultos Professora Lia Campos, situado no bairro de Dix Sept
Rosado, e nas referências que os jornais ofereciam, obtive informações de que
a professora promoveu, nesse Estado, uma série de atividades como:
levantamento da rede escolar e organização dos quadros administrativos das
escolas. Foi ainda membro do Conselho Estadual de Educação; coordenou o
Programa de Treinamento de Professores Leigos
1
, foi diretora do Centro de
Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE) e presidiu a comissão que realizou
o I Curso Escolar do Rio Grande do Norte.
Lia Campos, situada no seu tempo e como entusiasta da educação,
percebeu toda a tendência de descentralização dos serviços educacionais pela
qual passavam Estados e Municípios no contexto da criação e aprovação da
1
Professores leigos, na época em estudo, eram aqueles que não tinham formação pela Escola
Normal.
21
Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº 4.024, em 20 de dezembro de 1961.
Em tal conjuntura, ela pôs em prática as modificações sugeridas por essa
legislação, em consonância com a Lei nº 2.171, de 6 de dezembro de 1957,
que organizava e fixava as bases da Educação Elementar e da Formação do
Magistério Primário do Rio Grande do Norte.
Pretendo submeter a prática dessa professora a apreciação pública para
reconstruir parte da sua história e da historiografia da educação do Estado do
Rio Grande do Norte, a qual foi perpassada, por quase uma década pelas
ações desta professora.
22
Procedimentos metodológicos
23
2 – Procedimentos metodológicos
ara investigar e analisar a participação da professora Lia
Campos, entre as décadas de 1950 e 1960, na educação norte-
riograndense, busquei respaldo nos conceitos utilizados pela História Cultural,
por se tratar de uma abordagem que abre espaço para novas perspectivas da
pesquisa histórica, ampliando o campo do historiador, os objetos de análise e
os tipos de fonte.
P
Desta forma, a realização da pesquisa histórica possibilita a análise da
multiplicidade de grupos sociais, sujeitos históricos e minorias.
Nessa mesma perspectiva, Pinheiro (1997, p. 288) afirma que:
Neste enfoque, a história tem sua atenção voltada para as
práticas culturais e experiências sociais trazendo, por exemplo,
alunos, professores, famílias, costumes e outros para o cenário
histórico. Os indivíduos são situados no centro da história sócio-
cultural, sendo dada uma atenção privilegiada às vivências e
recordações.
Assim, torna-se possível a reconstituição do cenário social e
historiográfico de grupos sociais, de instituições e de atores desse processo.
Dessa forma, as atividades humanas e os sujeitos comuns são considerados
objetos de análise histórica.
Morais (1996, p. 03) afirma:
Entende-se que os eventos, ou tudo que se refira à atividade
humana são considerados objetos de análise histórica.
Portanto, pequenos gestos, os sentimentos, os valores, a
mulher, a infância, a morte, a loucura, o corpo, a festa, a
fotografia, a pintura, a maneira de ler, escrever, por exemplos,
24
são práticas culturais que não estão perdidas para a história.
Esses objetos de análise são tão importantes no estudo
histórico quanto os tradicionalmente analisados, como por
exemplo, a luta de classes, as grandes revoluções, os grandes
homens, os modos de produção.
Dessa forma, pesquisas fundamentadas nesses conceitos vêm
contribuindo para a ampliação de novas áreas de estudo e novos objetos.
Galvão (1996, p. 20) afirma que, “de fato, objetos nunca pensados passam a
ser vistos como ‘historicizáveis’”. Exemplos desses objetos são estudos
historiográficos de práticas de leitura e escrita, de instituições educativas, de
histórias de vida de professoras, do cotidiano escolar.
Seguindo o mesmo pensamento, Nóvoa (1995, p. 19) enfatiza que o
estudo historiográfico da educação deve abranger a análise de práticas de
vidas de professores. Segundo o autor, tais estudos podem “produzir um outro
tipo de conhecimento, mais próximo das realidades educativas e do cotidiano
dos professores”.
Esse modo de fazer história mostrou-me a possibilidade de construir a
análise do meu objeto de estudo, esclarecendo o meu ensejo de registrar, por
meio da contribuição de Lia Campos, as configurações de uma sociedade,
chamando a atenção para a condição feminina e sua participação na
educação.
Pretendi trazer à tona o nome dessa professora e sua contribuição, o
que possibilitou reconstituir a participação feminina na historiografia da
educação norte-riograndense e suas ações enquanto sujeito histórico do
processo educacional e social.
Como iniciar a pesquisa histórica? O primeiro passo foi fazer uma
revisão bibliográfica que me levasse a compreender melhor o universo
25
diversificado das fontes. Nessa tarefa, dois autores se mostraram de grande
valia na minha compreensão: Peter Burke e Ana Maria de Oliveira Galvão.
Burke (1992, p. 13, 14) mostra que a história tradicional se fundamenta
nos documentos oficiais do governo e por ele arquivados. Porém, seguindo a
tendência da história cultural, faz-se necessário o entrecruzamento das fontes
oficiais com os diversos tipos de fonte que tal abordagem apresenta. Segundo
o autor, é relevante a análise das diversas informações que chegam às mãos
do pesquisador.
Os registros em geral expressam o ponto de vista oficial. Para
construir as atitudes dos hereges e dos rebeldes, tais registros
necessitam ser suplementados por outros tipos de fontes. De
qualquer modo, os historiadores estão mais preocupados que
seus antecessores com uma maior variedade de atividades
humanas, devem examinar uma maior variedade de evidências.
De acordo com Galvão (1996, p. 102),
o crescente interesse pela investigação da vida cotidiana leva,
necessariamente, à busca de novos tipos de fontes, capazes de
revelar aspectos das sociedades passadas pouco explorados
nos documentos oficiais escritos
.
Assim, a fotografia, a pintura, a literatura, a correspondência, os móveis
e objetos utilizados e os depoimentos orais ganham tanta importância quanto
os documentos oficiais.
26
Buscando agregar diversas fontes que informassem acerca do meu
objeto, percorri os arquivos de Natal, como o Instituto Histórico e Geográfico do
Rio Grande do Norte, o Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora
Lia Campos e o Arquivo Público do Rio Grande do Norte.
No Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia Campos,
através do seu diretor Klebson Roberto Saraiva Peixoto, tive acesso a algumas
informações que mostraram pistas sobre o trabalho desenvolvido por essa
professora, como o levantamento da rede escolar do Estado, a implementação
da Lei 2.171/1957, bem como as capacitações destinadas aos professores
leigos do Rio Grande do Norte.
No Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e no Arquivo
Público priorizei o levantamento de materiais que tratam da educação do
período, bem como da sociedade em questão, como: jornais A República e
Tribuna do Norte, das décadas de 1950 e 1960, reformas de ensino, registros
da Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte.
A investigação nos jornais possibilitou-me o encontro de indícios sobre a
atuação de Lia Campos. Através de uma leitura focada nesses registros que
me proporcionaram a descoberta do início e o desenvolvimento dos trabalhos
dessa professora na educação norte-riograndense, prossegui na compilação de
dados relevantes para a minha pesquisa.
No Arquivo Público deparei-me com uma realidade que é angustiante
para todo pesquisador: fontes em estado precário de conservação, páginas
rasgadas, recortadas e rabiscadas, além da mudança de local da instituição, o
27
que o fez permanecer por muito tempo com o seu acervo indisponível para
visita e consulta.
Nunes (1990, p. 38) fala da difícil tarefa de situar informações nos
arquivos.
Todos nós que nos dedicamos à pesquisa histórica já
passamos pela angustiante experiência de não encontrá-los
pelo descuido intencional, sistemático e criminoso com que os
acervos da História e da memória da Cultura e da Educação
brasileiras vêm sendo dilapidados em nosso país. No entanto,
paradoxalmente, poucos de nós viveram outra angústia: a de
vasculhar os arquivos existentes, organizados e disponíveis.
Seja por desconhecimento, impaciência, preguiça,
desinteresse, descuido ou até falta de oportunidade, muitos
pequenos grandes tesouros permanecem escondidos numa
vasta gama de documentação.
Essa documentação mal cuidada me levou a adotar apenas o Instituto
Histórico e Geográfico como único lugar de fácil acesso aos jornais da época
em estudo. Lá encontrei o livro Perfil da República no Rio Grande do Norte
(1889-2003), de João Batista Machado. O livro faz uma síntese das ações de
todos os governantes que administraram o estado no período de 1889 a 2003.
A partir desta obra, percebi como estava configurado o período em questão.
Dois governadores chamaram-me atenção: Dinarte de Medeiros Mariz
2
e
Aluísio Alves
3
, pois foi durante essas administrações que Lia Campos exerceu
a sua função na Secretaria de Educação.
2
Dinarte Mariz governou o Estado do Rio Grande do Norte de 1956 a 1960. Criou a
Universidade do Rio Grande do Norte, depois federalizada, bem como os Institutos de
Educação de Caicó e Mossoró, hoje denominados Centro Educacional José Augusto e Centro
de Educacional Jerônimo Rosado (LIMA, 2001).
3
Aluízio Alves governou o Estado do Rio Grande do Norte entre os anos de 1961 a 1966.
Construiu mil salas de aula, o Instituto Winston Churchill e o Instituto de Educação Presidente
28
Contei, ainda, com o apoio de Zilda Lopes do Rêgo
4
, contemporânea na
Secretaria de Educação e amiga pessoal de Lia Campos e de sua família, que
me concedeu, por várias vezes, entrevistas que enriquecem a produção deste
trabalho. Por meio dessas interlocuções, cheguei aos nomes das senhoras
Nanci Gomes dos Santos
5
e Anilda Menezes
6
, as quais entrevistei. Ambas
fizeram parte do quadro técnico da Secretaria de Educação.
Estabeleci contato também com representantes da família Campos, nas
pessoas de Léa Campos Lage, irmã gêmea de Lia Campos, bem como de sua
sobrinha, Nara Campos Lage. Esse contato ocorreu por telefone, uma vez que
a distância geográfica que separa Natal/RN e Porto Alegre/RS e a
disponibilidade de tempo impediram-me de interagir com elas pessoalmente.
Mesmo assim, informações e registros, como fotografias, notas e matérias de
jornais, falas e homenagens a ela concedidas chegaram-me às mãos.
Além dessas pessoas, tive contato, na ocasião de uma apresentação de
trabalho no I Encontro Regional da Associação Nacional de História (ANPUH),
evento que ocorreu na UFRN, com a professora e diretora do Núcleo de Arte e
Cultura (NAC), Sônia Maria de Oliveira Othon. Na ocasião, a professora
assistia às apresentações de trabalhos no Grupo de Trabalho História e
Educação. E qual foi a minha surpresa quando, ao final da minha
apresentação, intitulada A participação de Lia Campos no cenário educacional
Kennedy, promoveu o treinamento de quatro mil professores leigos e deu início à aplicação do
método Paulo Freire de alfabetização (ALVES, 2001).
4
Zilda Lopes do Rêgo é professora aposentada, foi Secretária de Educação na administração
do Monsenhor Walfredo Gurgel (1966-1971) e membro do Conselho de Cultura do Rio Grande
do Norte.
5
Professora aposentada do Departamento de Educação da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte.
6
Anilda Menezes integrou a equipe do CEPE e participou diretamente das ações educacionais
postas em prática por Lia Campos.
29
do RN (1957-1964), a professora Sônia disse que fora vizinha de Lia Campos
no período em que esta residiu em Natal. Surgiu, então, mais uma
colaboradora para a minha empreitada. No entanto, a pesquisa apontou-me a
necessidade de selecionar os entrevistados. Devido a questões de prazo de
conclusão e delimitação das informações necessárias à construção do
trabalho, não fortaleci o contato com a professora Sônia.
Objetivando perceber como se trabalha com relatos orais, busquei
contribuições em Thompson (1998). Na percepção do autor, as entrevistas
orais, quando bem conduzidas, se transformam em um instrumento eficiente
para diminuir a distância entre os informantes e o pesquisador e, por
conseqüência, o acesso aos documentos privados, como é o caso das
fotografias e correspondências.
Lopes e Galvão (2001, p. 90), por sua vez, chamam atenção para a
importância do cruzamento das fontes orais com outros tipos de registros.
A consulta a outras fontes serve, ainda, para melhor formular
as próprias questões das entrevistas e melhor compreender
suas respostas. Por outro lado, os depoimentos não podem
ser tomados como mera ilustração para reafirmar aquilo que já
se tem como verdade, construída principalmente a partir de
fontes consideradas mais confiáveis. Na verdade, as
entrevistas, no caso de muitas pesquisas em que os
testemunhos escritos são raros e esparsos, possibilitam a
visualização de rostos e a escuta de vozes de parcelas da
população muitas vezes consideradas de maneira homogênea
e que, embora expressem uma época, um pertencimento
social, de gênero, de etnia, de origem (rural ou urbana), são
compostas de indivíduos singulares.
30
Por serem muito extensos, muitas vezes os relatos escapam do que se
objetiva para o momento. Sendo assim, tomei o cuidado de selecionar as
informações que fossem de mais relevância para a composição dessa
pesquisa.
Do cruzamento de informações colhidas, procurei reconstituir o percurso
feito por Lia Campos, tecendo parte da sua biografia e estabelecendo relações
com o contexto social no qual estava inserida, pois no campo da historiografia
não se compreende um sujeito histórico desvinculado de uma configuração
social; muito menos que este se apresente de maneira estática.
Investigar e analisar a participação de Lia Campos na organização
educacional do Rio Grande do Norte, entre as décadas de 1950 e 1960, torna-
se uma pesquisa tão relevante quanto qualquer outro objeto histórico. Segundo
Cambi (1999), ao partirmos para uma análise da historiografia da educação
não podemos deixar de relacionar as diversas subdivisões da História da
Educação, como a história dos docentes, dos métodos, das regras e das
relações sociais.
O estabelecimento de relações entre essas ramificações permite ainda
configurar a participação da mulher na História da Educação do Rio Grande do
Norte e colocá-las no centro do processo educacional desse Estado, auxiliando
no entendimento da sua contribuição no espaço público e suas ações enquanto
sujeito histórico, datado e situado, do processo educativo e social.
31
Lia Campos
32
3 – Lia Campos
ia Campos nasceu em Encruzilhada do Sul, no estado do Rio
Grande do Sul, no dia 13 de maio de 1928. Filha de Albertino Campos, Exator
Estadual – atual Auditor de Finanças Públicas – e de Carlota Nunes Campos,
era a quinta filha do casal, juntamente com sua irmã gêmea Léa, e mais seis
irmãos, por ordem: Ruth, Evaldo, Jaime, Hélio, Renan e Dila.
L
A professora Lia Campos fez seus primeiros estudos em sua cidade
natal. Em 1935, concluiu o Curso Primário no Grupo Escolar Borges de
Medeiros e, em 1939, diplomou-se como aluna mestra
7
pela Escola Normal
Olavo Bilac, em Santa Maria/RS.
7
Segundo Louro (1997), aluna-mestre é aquela normalista que se dedica ao magistério
primário. O ensino era dividido em dois cursos: primário (com trabalhos de agulhas e prendas e
princípios de música); e o curso secundário, dividido em dois anos (1º português, ortografia,
francês, aritmética, até proposições, música e piano e 2º português, francês, noções gerais de
geografia, história sagrada e do Brasil, piano e canto).
33
Figura 1: Foto da formatura de Lia Campos na Escola Normal (1939)
Fonte: Acervo pessoal da família Campos
Aprovada em Concurso Público, iniciou suas atividades profissionais em
1941, no Grupo Escolar José do Patrocínio, sendo nesse mesmo ano removida
para o Grupo Escolar Miguel Couto, na cidade de Barra do Ribeiro/RS, onde
permaneceu até o início do ano letivo de 1943.
Sempre inquieta no que dizia respeito aos temas educacionais, Lia
Campos iniciou como bolsista, em 1949, um Curso de Especialização em
Administração e Supervisão no Instituto de Educação General Flores da
Cunha, no seu estado natal. Após a conclusão dessa especialização, foi
convidada a participar da equipe de Orientadores da Educação Primária do
Centro de Pesquisas e Orientações Educacionais (CPOE) da Secretaria de
Educação do Rio Grande do Sul.
34
Sua vida sempre dedicada à educação e à cultura a fez migrar –
trabalhar – para várias instituições de ensino e participar de diversos cursos de
especialização e aperfeiçoamento. Por isso, nas palavras de sua sobrinha e
afilhada Nara Campos Lage, “não hesitou em abdicar de constituir sua própria
família para fazer o que realmente a impulsionava, a educação” (2004, p. 02).
Entretanto, mesmo dedicada à educação a professora Lia tinha sua
atenção também voltada para a família. Em especial, aos seus treze sobrinhos,
aos quais incentivou a estudar e buscar satisfação profissional. Nara Campos
Lage (2004, p. 01), fala a seu respeito:
Até hoje agradeço a ela por ter despertado em mim o amor pela
leitura. A coleção O Mundo da Criança
8
, que tenho até hoje, foi
um dos primeiros presentes que recebi dela. Lembro com muito
carinho sua voz doce contando histórias que me faziam viajar no
mundo da imaginação. Outro legado seu foi o gosto pela
correspondência, pois mesmo antes de ser alfabetizada, já
recebia suas cartas que eram lidas por minha mãe; mais tarde
eu mesma passei a respondê-las.
Mesmo tendo a educação como alicerce da sua vida, Lia Campos não
se descuidava da aparência e de cultivar amizades. Seus familiares e amigos
que fez por Natal e pelo Estado confirmam este seu lado vaidoso, mas sem
extravagância.
Vaidosa e elegante, adorava comprar muitas roupas, sapatos e
bolsas; sua presença era sempre anunciada por perfumes
suaves, mas marcantes e inesquecíveis. Adorava viajar e tinha
8
Lançada na década de 1950 pela Companhia Editora Nacional, a coleção O Mundo da
Criança reúne contos populares de diversos países. Tem por objetivo estimular a iniciação à
leitura através de fábulas muito populares em várias regiões do mundo: A Galinha Ruiva
(Inglaterra), O Leão e o Rato (Grécia), O Menino e a Baleia (Japão) e Por Que o Sol e a Lua
Vivem no Céu (África). Ao final de cada capítulo existe um almanaque que trata a respeito dos
locais dos contos. Atualmente, tal coleção pode ser encontrada em formato multimídia.
(http://www.ibep-nacional.com.br/mundo/default.asp).
35
muitos amigos, a grande maioria ligados à cultura e educação
(Nara Campos Lage, 2004, p. 02).
Zilda Lopes do Rêgo também fala a esse respeito:
Ela se trajava muito bem, luxuosa, perfumada. Ela encantava
quando chegava. Pessoa extraordinária, tinha um papo muito
bom... Era muito religiosa. Ela era religiosa, a gente ia muito à
missa. Gostava muito de cinema, lia muito. Quando ela
desistiu, não veio mais... Porque ela foi convidada e não veio
mais. Eu tive que fazer toda a embalagem da bagagem dela.
Foi uma bagagem imensa...
A professora permaneceu nos quadros da Secretaria de Educação do
Rio Grande do Sul até 1957. Nesse mesmo ano, passou a coordenar Cursos
de Aperfeiçoamento para Professores do Ensino Primário, por indicação do
Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) /Ministério de Educação e
Cultura (MEC), no Estado do Rio Grande do Norte.
O jornal A República de 10 de janeiro de 1957 registra a instalação deste
curso e a aguardada presença da professora vinda do Rio Grande do Sul para
coordená-lo:
Ontem, às 8 horas, no Instituto de Educação, foi solenemente
instalado o Curso de Férias para professores primários do RN,
iniciativa que virá, sem dúvida, ampliar os conhecimentos
didáticos dos componentes do nosso magistério primário. (...)
Para coordenar o Curso de Férias, está sendo esperada hoje,
a professora Lia Campos, do INEP, quando serão
intensificadas as aulas as quais se prolongarão por um mês.
Lia Campos, que inicialmente veio a nossa terra para coordenar o curso
de um mês, permaneceu por quase uma década. Mais precisamente sete anos.
Tendo assim, a oportunidade de aplicar toda a sua experiência profissional.
36
De acordo com entrevista concedida ao jornal Tribuna do Norte de 21 de
outubro de 1979, a professora Maria Alexandrino Sampaio
9
, uma de suas
auxiliares, comenta que:
Lia Campos, com sua atuação inconfundível, despertou em
todo o magistério um grande entusiasmo de lutar e crescer na
profissão. Ela conclamava o professor a fazer da escola o
centro da comunidade e nela se projetar pela obra educativa.
Foi dessa maneira que Lia Campos imprimiu seu nome na História da
Educação do Rio Grande do Norte, trabalhando até 1964, quando a Secretaria
de Educação do Rio Grande do Sul reclamou a sua volta ao seu torrão natal.
Restou à Secretaria de Educação do Rio Grande do Norte consentir com o seu
regresso.
Em reconhecimento ao trabalho por ela desempenhado o Governador
Tarcísio de Vasconcelos Maia, no ano de 1975, concedeu a Lia Campos e a
outras nove personalidades, a medalha do Mérito Alberto Maranhão
10
, a mais
alta comenda potiguar destinada às pessoas que tenham se destacado nos
campos da cultura e educação.
9
Maria Alexandrino Sampaio concluiu o Ginásio Normal e tornou-se professora primária.
Coordenou o Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário (PAMP) do Rio Grande do
Norte, durante a administração do governador Dinarte de Medeiros Mariz, órgão responsável
pelo sistema de distribuição de bolsas de estudo para os componentes da Secretaria de
Educação e Cultura deste Estado. Foi proprietária de uma escola privada de ensino primário
que recebera o nome Escola de Ensino Primário Maria Alexandrino Sampaio, a mesma situava-
se no Centro de Natal, na rua Felipe Camarão. (NANCI GOMES DOS SANTOS).
10
Alberto Frederico de Albuquerque Maranhão nasceu em Macaíba, no dia 02 de outubro de
1872. Foi promotor público em Macaíba, elegeu-se governador do Rio Grande do Norte pela
primeira vez em 1899. Em 1908, retorna ao Governo do Estado, função na qual permanece até
1913. Foi responsável pela construção do Teatro Carlos Gomes (atual Teatro Alberto
Maranhão), criou o Conservatório de Música, o Hospital Juvino Barreto (hoje Hospital
Universitário Onofre Lopes), implantou a luz e o bonde elétricos em Natal.
(http://www.cabugi.globo.com/rnonline/personalidades.html).
37
Figura 2: Foto de Lia Campos recebendo a Medalha Alberto Maranhão das mãos de Tarcísio
Maia (1975)
Fonte: Acervo pessoal da família Campos
Na ocasião, em nome dos agraciados, o professor Edgar Barbosa
11
agradeceu com um discurso:
Movido pela simpatia de todo governante civilizado por aqueles
que aplicam seu esforço longe do gosto e da cobiça de
consagrações, Vossa Excelência distingue nesta hora
educadores, professores, cientistas, destacados pelo seu
devotamento ao progresso cultural do Rio Grande do Norte.
Assim fazendo, Vossa Excelência honra a memória de Alberto
Maranhão e legitima ainda mais os superiores objetivos de um
prêmio dante do qual nos curvamos com emoção e orgulho (A
REPÚBLICA, 18/12 de 1975).
11
Edgar Barbosa, nascido em Ceará-Mirim, em 1909, formou-se em Direito em Recife, em
1932. Trabalhou em alguns jornais, como: A República, O Debate, A Ordem. Fundou a
Faculdade de Filosofia e foi seu primeiro diretor. Foi também autor de alguns livros: História de
uma Campanha (1936), Três Ensaios (Recife, 1960), Imagens do Tempo (Natal, 1966).
Faleceu em Natal em 1976. (HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE, [199_?]).
38
A professora Lia Campos partiu desse mundo no dia 15 de outubro, por
coincidência, no dia do Professor. Em 1979, aos 51 anos, na cidade de Porto
Alegre/RS, morreu vitimada por um câncer.
O jornal Tribuna do Norte de 21 de outubro de 1979 noticia o seu
falecimento com o seguinte título na reportagem de página inteira: Morte de Lia
Campos encerra fase importante da história da educação do RGN. Ainda,
enaltece suas características físicas e sua personalidade:
Nem alta nem baixa, cabelos castanhos, olhos claros, traços
finos. Uma figura elegante e que poderia ter sido comum, mas
o sangue gaúcho que lhe corria nas veias, deixava aflorar uma
firmeza de espírito e uma sensibilidade que muitas vezes
surpreendia.
No ano seguinte à sua morte foi criado o Centro de Estudos Supletivos
Professora Lia Campos
12
, voltado para o ensino de 2º Grau, através do Decreto
nº 7.851 de 26 de fevereiro de 1980, estabelecendo que o Centro se
submeteria às normas da legislação em vigor, no tocante às disposições
pedagógico-administrativas, tendo também um regimento interno.
12
A escola atualmente exibe em sua fachada o nome Centro de Educação de Jovens e Adultos
Professora Lia Campos.
39
Figura 3: Foto da fachada do Centro de Educação de Jovens e Adultos Professora Lia
Campos (2005)
Fonte: Daniela Fonsêca Vieira
Na solenidade se fizeram presentes seus irmãos, Evaldo Campos, Léa
Campos Lage e Ruth Campos Magalhães, sendo esta última também
professora.
Seu irmão, Evaldo Campos, na ocasião proferiu um discurso no qual
lembra o apreço e desvelado carinho que Lia Campos nutria pelos norte-
riograndenses. Ela sempre se referia aos seus colegas e amigos do Rio
Grande do Norte com entusiasmo e orgulho.
Nos serões da família, quando havia a participação de amigos
menos identificados com as causas que faziam de Lia a
grande promotora deste Estado, alguns a interrogavam,
confusos, se ela era potiguar ou gaúcha, já que, como Sul
Riograndense, muitas vezes parecia Riograndense do Norte,
tal o carinho e o amor que caracterizavam as recordações de
sua passagem por aqui (CAMPOS, 1980).
40
Na mesma solenidade de homenagem póstuma a Lia Campos, o então
Secretário de Educação Arnaldo Arsênio de Azevedo
13
lembrou o trabalho da
professora, exaltando a sua dedicação e amor ao magistério. Para ele, nada
mais justo do que “o seu nome no frontispício de uma escola, é o mínimo que
se pode fazer em reconhecimento pelo seu trabalho a favor do nosso sistema
de ensino” (TRIBUNA DO NORTE, 25/03 de 1980).
É com a finalidade de mostrar quem foi esta professora que pretendi
evidenciar o modo como Lia Campos atuou no cenário educacional enquanto
esteve trabalhando no nosso Estado, observando e analisando de que forma
ela pôs em prática o que se pretendia para a educação no período de 1950 a
1960 e de que forma essas mudanças, principalmente a Reforma do Ensino,
repercutiram no território norte-riograndense.
13
Professor, formado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, foi diretor
da então Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte (ETFERN), no período de 26/03/1974
à 25/05/1979. Hoje, seu nome encontra-se gravado em uma escola estadual localizada no
município de Parnamirim/RN. (http://www.cabugi.globo.com/rnonline/personalidades.html).
41
O Rio Grande do Norte no plano
político-educacional
42
4 – O Rio Grande do Norte no plano político-educacional
s décadas de 1950 e 1960 foram marcadas por grandes
agitações nos âmbitos político, econômico e educacional no
cenário brasileiro. Até o ano de 1964, o Brasil vivenciou o populismo,
movimento político nascido nos idos de 1930, que tinha como característica a
política de controle das camadas populares quando o governo adotou medidas
para agradá-las em troca de seu apoio.
A
No início da década de 1950, Getúlio Vargas conseguiu eleger-se
presidente da República, tomando posse em 31 de janeiro de 1951. Era o seu
segundo mandato como presidente, mas o primeiro obtido com o voto popular
direto. Devendo o mandato estender-se até 31 de janeiro de 1956, o mesmo foi
interrompido drasticamente pelo seu suicídio, ocorrido em 24 de agosto de
1954.
Nos dezessete meses seguintes à morte de Getúlio Vargas, três
presidentes ocuparam o poder: João Café Filho
14
(de 25/08/1954 até
14
João Café Filho, nasceu em Natal, em 1899. Estudou na Academia de Ciências Jurídicas e
Comerciais do Recife, mas não chegou a concluir o curso. Apesar de não ter conquistado
qualquer diploma, foi advogado e jornalista. Como líder sindical, fundou e presidiu o primeiro
Sindicato dos Trabalhadores do RN. Foi eleito deputado federal constituinte em 1934. Em
1950, concorreu a uma vaga na Câmara dos Deputados e à vice-Presidência (em separado da
eleição para presidente). Vitorioso, optou pelo cargo de vice-presidente ao lado de Getúlio
Vargas. Assumiu a presidência com o suicídio do presidente e governou por pouco mais de um
ano, quando licenciou-se para tratamento de saúde e pelo golpe militar chefiado por seu
ministro da Guerra, o general Lott. Permaneceu na vida pública até 1960, quando foi nomeado
ministro do Tribunal de Contas da Guanabara. Publicou suas memórias no livro Do Sindicato
ao Catete. Café Filho faleceu no Rio de Janeiro, em 20 de fevereiro de 1970, aos 73 anos de
idade. (http://www.cabugi.com/rnonline/resultadopersonalidades.asp?codigo_personladade).
43
08/11/1955); Carlos Coimbra da Luz (de 08 até 11/11/1955) e Nereu de Oliveira
Ramos (de 11/11/1955 até 31/01/1956).
O nacionalismo e trabalhismo difundidos por Getúlio Vargas prometiam o
desenvolvimento do capitalismo no país e, como conseqüência, uma situação
de bem-estar social. Deveriam, ainda, fazer do Estado o maior responsável
pela distribuição de educação para as classes populares. Na tentativa de
efetivar essa tese, o governo Vargas procurou elevar as despesas públicas
com o ensino. Porém, houve um descompasso na distribuição de recursos para
os níveis primário e superior.
Segundo Ribeiro (2000), o ensino superior foi mais contemplado que o
ensino primário. Os problemas da educação pública continuavam claros, as
matrículas no ensino primário não sofreram grandes alterações, e a
alfabetização nesse período cresceu apenas 1, 79%. A autora afirma, ainda,
que a exclusão permaneceu como entrave principal do sistema escolar. No
terceiro ano da administração de Getúlio Vargas, 17% dos alunos matriculados
no primário conseguiram atingir o quarto ano do curso e apenas 3%
alcançaram o último ano. Essa situação não sofreu modificações significativas,
continuando, pois, a persistir no curto período de tempo em que o potiguar,
João Café Filho, assumiu a Presidência do Brasil.
De acordo com o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), o Rio Grande do Norte apresentava, na década de 1950,
um índice de 179.228 pessoas alfabetizadas e 365.314 analfabetos, não
apresentando um cenário tão divergente do que se observava no plano
nacional. Já na década de 1960, o Censo Demográfico registrou que a
população alfabetizada em terras potiguares era da ordem de 364.976
44
pessoas, enquanto que 586.688 pessoas não dominavam o conhecimento da
escrita e da leitura. Esses números confirmam, portanto, a desigualdade na
distribuição de vagas por nível de ensino, que também ocorria de maneira
desequilibrada no Rio Grande do Norte.
Em 31 de janeiro de 1956, Juscelino Kubitschek de Oliveira assumiu a
presidência do país, juntamente com o vice-presidente João Goulart. O então
presidente estabeleceu um plano ambicioso de realizações – Plano de Metas,
prometendo cinqüenta anos de progresso em cinco de governo.
O governo foi perpassado por medidas político-econômicas de grande
repercussão interna, como a concessão de facilidades para as multinacionais
montadoras de automóveis se firmarem no Brasil. Tais empresas, aos poucos,
passaram a substituir autopeças importadas por peças fornecidas pela indústria
nacional, que foi se desenvolvendo. Como precisavam de energia elétrica, o
governo construiu hidrelétricas para suprir essa necessidade. Foi o caso de
Furnas e Três Marias. Criou a Superintendência para o Desenvolvimento do
Nordeste (SUDENE) e fundou Brasília, a nova capital do país.
Em relação à educação, o Programa de Metas de Juscelino Kubitschek
vinculava o ensino às necessidades de institucionalização de uma educação
para o desenvolvimento. Isto é, o incentivo ao ensino técnico-profissionalizante.
O ideário da educação sugeria que tanto o nível médio quanto o básico
deveriam estar vinculados a educação para o trabalho (RIBEIRO, 2000).
Em decorrência dessa preocupação desenvolvimentista, houve uma
ênfase na escola formadora de mão-de-obra técnica, em nível médio, enquanto
as universidades destinavam-se a formar os filhos da elite intelectual. Por sua
45
vez, os conhecimentos básicos da leitura e da escrita não chegavam à metade
da população.
No mesmo período, o Rio Grande do Norte vivenciava um momento de
atenção aos problemas educacionais. No ano de 1955, Dinarte de Medeiros
Mariz elegeu-se governador do Estado, tomando posse no dia 31 de janeiro de
1956. Enquanto exerceu o seu mandato, deu ênfase especial à educação. Nas
suas falas afirmava que um país só é de fato independente através da
educação do seu povo.
Só acredito em independência econômica do Brasil com base na
educação do povo. [...] Uma nação só se realiza
democraticamente quando atinge um grau de legalidade e esta
só pode ser criada em um povo educado, o cidadão. O povo
educado sabe cuidar da sua saúde e da sua economia (MARIZ,
apud LIMA, 2001a, p. 69, 70).
Na sua administração, no ano de 1958, o Estado assistiu a criação da
Universidade do Rio Grande do Norte (URN), posteriormente federalizada,
além da criação dos Institutos de Educação de Caicó e de Mossoró, atualmente
denominados Centro Educacional José Augusto e Centro Educacional
Jerônimo Rosado, respectivamente. Na ocasião da criação da URN, Dinarte
Mariz lê a seguinte mensagem:
Ao enviar a exame e deliberação desta Augusta Assembléia o
projeto de lei da criação da Universidade do Rio Grande do
Norte, o faço com legítimo orgulho de norte-rio-grandense, certo
de que esta iniciativa, elevando-nos no julgamento de nossa
posteridade, será a semente fecunda da floração de conceitos
mais humanos e mais liberais, para a felicidade do estado e o
bem da pátria (MARIZ, apud LIMA, 2001a, p. 207).
46
Segundo a professora Zilda Lopes do Rêgo, foi na administração de
Dinarte Mariz que “o Rio Grande do Norte presenciou uma revolução no
ensino”. Isto, porque anteriormente ao seu mandato, o que existia era o
Departamento de Educação, órgão que foi extinto ainda no governo Silvio
Pedroza (1951-1956) quando foi criada a Secretaria de Educação. No entanto,
a mesma só iniciou suas atividades na administração seguinte.
Com o titular da pasta da Educação, Tarcísio de Vasconcelos Maia
15
,
iniciaram-se as estruturações das bases de funcionamento desse novo órgão.
Teve início a importação de técnicos de outros Estados do Brasil, pois havia
uma carência de recursos humanos devidamente capacitados no Rio Grande
do Norte para integrar essa nova estrutura.
Para tanto, o Secretário de Educação e Cultura do Rio Grande do Norte,
Tarcísio de Vasconcelos Maia, juntamente com o governador, Dinarte de
Medeiros Mariz solicitaram o apoio do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais (INEP) nessa empreitada.
De acordo com Nunes (2000), cabia ao INEP, segundo o Decreto-Lei nº
580, organizar a documentação relativa à história e ao estado atual das
doutrinas e técnicas pedagógicas; manter intercâmbio com instituições do
Brasil e de outros países; prestar assistência técnica aos serviços estaduais,
municipais e privados de educação, ministrando-lhes esclarecimentos e
soluções acerca de problemas pedagógicos. Esse Instituto tornou-se uma
15
Tarcísio de Vasconcelos Maia nasceu na cidade Catolé do Rocha, na Paraíba, em 1917.
Clínico e pediatra, atuou na cidade Mossoró, onde iniciou sua carreira política. Foi Secretário
de Educação na administração do governador Dinarte de Medeiros Mariz (1955-1960), sendo
eleito deputado federal logo em seguida. Relator da Lei de Diretrizes e Bases, também teve
destaque como presidente do extinto IPASE, Instituto de Previdência dos Servidores Públicos,
e conselheiro da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste, SUDENE. Em 1975
foi eleito governador do Rio Grande do Norte, juntamente com o vice-governador Genibaldo
Barros. Falece em 10 de abril de 1998, no Rio de Janeiro, aos 81 anos.
(http://www.assecom.rn.gov.br/pg_noticias.asp?NOI_id=673).
47
referência para a questão educacional no país. À época, o seu diretor-geral era
o professor Lourenço Filho.
Em 1944 o órgão lançou a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos
(RBEP), periódico direcionado à publicação dos escritos sobre educação,
produzidos por ele, sendo utilizados até hoje por pesquisadores e estudiosos
da área.
Em meio às mudanças trazidas pela década de 1950, o professor Anísio
Teixeira assumiu em 1952, a direção do Instituto, enfatizando o trabalho de
pesquisa, que tinha por objetivo, estabelecer centros de pesquisa como forma
de alicerçar em bases científicas a reconstrução educacional do país. Seu
pensamento foi concretizado com a criação do Centro Brasileiro de Pesquisas
Educacionais (CBPE), sediado no Rio de Janeiro e desmembrado nos Centros
Regionais, situados nas cidades de Recife, Salvador, Belo Horizonte, São
Paulo e Porto Alegre.
Segundo Nunes (2000), os Centros Regionais estavam articulados às
universidades locais, e ofereciam, através dos resultados das pesquisas,
subsídios para um planejamento educacional que eram realizados, em alguns
dos seus aspectos, por meio de convênio entre o INEP e as secretarias de
educação estaduais.
Tais convênios possibilitaram a aquisição de equipamentos para escolas
primárias, construção de centros de aperfeiçoamento docente e cursos
voltados para o objetivo de formar um profissional atualizado e competente,
intencionando, em última instância, contribuir para estimular a ampliação da
escolaridade nas escolas públicas e minimizar, quando possível, suas
deficiências.
48
Anísio Teixeira, simultaneamente a criação do Centro Brasileiro de
Pesquisa Educacional, empreendeu a luta pela escola primária e pelo controle
da formação docente. Sua meta era a emancipação do povo brasileiro pela
valorização da cultura popular, assim como pela sua transformação em meio
de construção da sua autonomia. Ele criticava as reformas educacionais
anteriores, como as dos Ministros Francisco Campos e Gustavo Capanema,
por serem, na sua essência, burocráticas e centralizadoras.
Através de cinco decretos, o ministro Francisco Campos procurou
estruturar o sistema de ensino nacional. A Reforma Francisco Campos
consistia então em criar o Conselho Nacional de Educação (Decreto nº
19850/1931); organizar o ensino superior do país adotando o regime
universitário (Decreto nº 19851/1931); organizar a Universidade do Rio de
Janeiro (Decerto nº 19852/1931); e o ensino secundário (Decreto nº
19890/1931); bem como, organizar o ensino comercial e regulamentar a
profissão de contador, além de consolidar as disposições sobre o ensino
secundário (Decreto nº 21241/1931). Entretanto, o ensino primário, o ensino
normal e os demais ramos do ensino técnico não foram incluídos nesta
reforma. Ainda quanto à Reforma, esta separou totalmente o ensino comercial
do secundário e equiparou as escolas estaduais e particulares ao Colégio
Pedro II, situado no Rio de Janeiro, mediante determinações a serem
cumpridas e monitoradas pelo sistema de inspeção federal (GONÇALVES,
1990).
As reformas empreendidas por Gustavo Capanema, por sua vez, ficaram
conhecidas como Leis Orgânicas do Ensino, responsáveis por ampliar o caráter
nacional da legislação educacional iniciado por Francisco Campos. As Leis
49
Orgânicas são compostas por oito Decretos-Lei que versam sobre a criação do
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI, a Lei Orgânica do
Ensino Industrial (Decreto nº 4073/1942); Lei Orgânica do Ensino Secundário
(Decreto nº 4224/1942); Lei Orgânica do Ensino Comercial (Decreto nº
6141/1943); Lei Orgânica do Ensino Primário (Decreto nº 8529/1946); Lei
Orgânica do Ensino Normal (Decreto nº 8530/1946); criação do Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC (Decretos 8621 e 8622/1946)
e Lei Orgânica do Ensino Agrícola (Decreto nº 9613/1946). Essas leis
mantinham o alto grau de seletividade que se observa na reforma anterior, bem
como aprofundou a elitização do ensino, uma vez que entre os ramos técnico e
entre este e o ensino secundário não havia nenhuma possibilidade de
passagem. O pensamento educacional norteador destes decretos acentuava a
tradição do ensino secundário acadêmico, propedêutico e aristocrático
(GONÇALVES, 1990).
Para Anísio Teixeira, essas reformas foram impressas pelo antiquado
ato educativo, que consistia no funcionamento da escola primária por meio de
métodos obsoletos de memorização e improvisação do fazer dos professores,
enquanto que a escola secundária transformava-se em um trampolim para a
mudança de classe social.
Nesse quadro sobremodo desqualificado da educação, o
magistério nacional tornou-se o problema máximo, a saber,
pela proporção de mestres desprovidos de preparo
pedagógico, tanto na escola primária quanto na escola média”
(TEIXEIRA, 1968, p. 22).
Dessa maneira, atendendo à solicitação do Governador Dinarte Mariz e,
ainda, cumprindo uma das funções do órgão que dirigia, Anísio Teixeira enviou
50
ao Rio Grande do Norte, em janeiro de 1957, a professora Lia Campos, com o
intuito de coordenar um curso de aperfeiçoamento oferecido aos professores
primários do Estado.
Inicialmente convidada para ministrar um primeiro curso de
aperfeiçoamento para professores leigos durante o mês de janeiro de 1957, Lia
Campos veio a Natal e permaneceu aqui por aproximadamente um mês. Nesse
mês, ela fez uma sondagem da situação da educação do Estado através do
contato com professores. Assim, a professora objetivou, no I Curso de
Aperfeiçoamento para Professores do Rio Grande do Norte, juntamente com as
professoras Maria do Carmo Vieira e Lucilda Jordão, ambas representantes da
Secretaria de Educação de Pernambuco, a ampliação dos conhecimentos
didáticos dos componentes do magistério primário norte-riograndense.
O Secretário de Educação, percebendo o entusiasmo dos professores
capacitados e a necessidade dessa capacitação para o sistema de ensino
estadual, decidiu organizar um segundo curso, no segundo semestre do
mesmo ano, para atender aos professores da região oeste do Estado, sendo
escolhida a cidade de Mossoró como sede. Assim, Lia Campos retornou ao Rio
Grande do Norte, em julho de 1957, para ministrar mais um curso de
aperfeiçoamento, preocupando-se, principalmente, com as atividades básicas
do currículo da escola primária.
A respeito de como ocorreram esses cursos e quais os procedimentos
utilizados, qual a metodologia adotada, enfim, como estavam organizados e se
o objetivo principal foi atingido, não obtive a resposta desejada. Em conversa
com Zilda Lopes do Rêgo, fui informada que a entrevistada não estava em
Natal nesse período, ficando então essa lacuna.
51
Pela inadequada manipulação dos documentos que informam sobre o
passado, não tive acesso aos planos dos cursos realizados pela Secretaria de
Educação. Nas visitas aos arquivos, encontrei apenas um Relatório de
Atividades realizadas pelo CEPE, compreendendo o período de maio de 1962
a julho de 1963. O documento contém informações acerca das ações daquele
órgão técnico, abordando aspectos da estrutura do CEPE; o número de
matrículas nas oficinas oferecidas pela Secretaria; objetivos de cursos; duração
e currículo dos mesmos; municípios que participariam das capacitações;
distribuição de provas e material didático.
Como exemplo, há o registro da oferta de vagas da Oficina de Artes
Industriais para a cidade de Caicó que, com uma oferta de 150 vagas para os
interessados, que logo foi preenchida completamente por 150 candidatos, que
freqüentaram o curso até o final. A matrícula para o mesmo curso em Natal e
em Mossoró, respectivamente, totalizou o número de 162 e 129 alunos,
perfazendo um total de 324 escolas envolvidas no projeto. Enfim, o documento
exibe todas as iniciativas de capacitar os professores potiguares no período
informado.
Os registros dão conta do envolvimento de um expressivo número de
municípios norte-riograndenses participantes das atividades, como, por
exemplo: Natal, Mossoró, Caicó, Tangará, Currais Novos, Campo Redondo,
Serra Caiada, Barcelona, São Tomé, dentre os 87 municípios percorridos. Este
aspecto revela a preocupação dos professores em repensar seus saberes e
seus fazeres docentes na escola primária.
Nesse período, Lia Campos deixou registrada, em uma entrevista ao
jornal A Republica de 01 de fevereiro de 1957, a sua concepção a respeito de
52
como desenvolveria essas capacitações. Em seu depoimento, mostrou o
compromisso em difundir os preceitos de renovação das práticas educacionais
e métodos de ensino pensados por Anísio Teixeira.
O método moderno de ensino adota, visando a formação em
cada espírito, a unidade social, o trabalho conjunto, o sentido de
equipe, para cuja média comparecem todos de uma classe ou
de uma turma. Se vivemos em um meio democrático e em uma
sociedade, achamos de muita importância o trabalho por equipe,
o que favorecerá o desenvolvimento desses princípios,
promovendo um crescimento individual e conseqüentemente
social.
Assim, a professora permaneceu no Rio Grande do Norte durante o
período deste curso, retornando ao Rio Grande do Sul logo em seguida a sua
conclusão. A professora Lia Campos havia plantando semente de trabalho fértil
no Rio Grande do Norte. Tanto, que retornou ao seu Estado de origem, mas só
por cinco meses, pois foi convidada pelo governador Dinarte Mariz para
retornar às terras potiguares, e assumir a direção do Centro de Estudos e
Pesquisas Educacionais (CEPE).
Esse órgão da Secretaria de Educação tinha como objetivo a
organização de toda a matriz curricular dos cursos, assim como a indicação do
material didático e das atividades que deveriam ser seguidos pelos
professores. Ela organizou uma equipe da qual faziam parte Zilda Lopes do
Rêgo, Maria Anilda Menezes, Maria Alexandrina Sampaio, Concessa Cunha de
Figueiredo e Maria de Lourdes Alves e que, juntas, desenvolveram atividades
voltadas para a educação no Rio Grande do Norte. Desempenhando suas
funções nesse setor, Lia Campos permaneceu durante 7 anos em Natal, de
1957 a 1964.
53
Figura 4: Foto de Anilda Menezes e Lia Campos [196_?]
Fonte: Acervo particular de Anilda Menezes
Em 1958 veio a autorização para que a professora Lia Campos
permanecesse no Estado por tempo indeterminado e recebeu
carta branca do governo do Estado para processar no sistema
de ensino as modificações necessárias ao processo educativo.
A criação de um órgão técnico na Secretaria de Educação foi
logo a sua primeira meta de trabalho e, assim, nasceu o Centro
de Estudos e Pesquisas Educacionais (TRIBUNA DO NORTE,
21/10 DE 1979, p. 04).
Iniciou-se, então, uma Reforma de Ensino, no governo Dinarte Mariz
(1956-1960), aprovada na forma da Lei de nº 2.171, datada de 06 de dezembro
de 1957. Essa lei tinha por finalidade organizar e fixar as bases da Educação
Elementar e da Formação do Magistério Primário do Estado. Considerada uma
Lei avançada e em consonância com os ideais de democracia vigentes na
época, determinava que a educação contribuísse para o desenvolvimento
integral do educando. Assim era dever do Estado:
54
a) ministrar sempre que possível, Educação integral,
considerando o aluno não só em função da estrutura escolar,
como também do lar e de toda a vida social, tendo em vista os
ideais e as tendências democráticas da sociedade moderna;
b) contribuir para a difusão da cultura por meio de serviços
apropriados às necessidades da população, desempenhando,
sempre que possível, a função do Centro de Cultura da
Comunidade;
c) observar em cada um dos seus níveis, os métodos mais
eficazes de organização, administração, currículo e cursos,
procurando sempre adaptá-los às condições locais e aproveitar
as experiências bem sucedidas no estado e em todo o Brasil;
d) prover os serviços especializados que, gradualmente,
venham permitir aos indivíduos suprir as deficiências inatas,
bem como as do lar e da herança social. (RIO GRANDE DO
NORTE, 1957, p. 01, Cap. I, Art. 1º).
O ideário educacional da época trazia uma concepção de democracia e
mudança social centrada na criança. Aspirava a incorporação de toda a
população infantil na escola que se renovava, oferecendo ao aluno situações
em que este, a partir da observação e da experimentação, elaborasse seu
próprio saber.
Segundo Vidal (2000, p. 498),
uma nova dinâmica impulsionava as relações escolares. O aluno
assumia soberanamente o centro dos processos de aquisição
do conhecimento escolar: aprendizagem em lugar de ensino. A
psicologia experimental dava suporte à cientificidade da
pedagogia e produzia no discurso da escolarização de massas
populares o efeito da individuação da criança: o recurso aos
testes e à constituição das classes homogêneas pretendia
assegurar a centralidade da criança no processo educativo e
garantir o respeito à sua individualidade em uma escola
estruturada para o ensino de um número crescente de alunos.
A fundamentação e os nortes que essa mudança assumia estavam
postos na infância. Surgia a importância na função social da educação e de seu
caráter democrático, entendida, segundo Nunes (2000, p. 27), como o
55
processo pelo qual os indivíduos desenvolvem interesse pessoal
pelas relações sociais, na sua direção e na formação de hábitos
que permitam mudanças sem que estas ocasionem desordens
sociais.
Isto, porque Anísio Teixeira e os renovadores defendiam a
regionalização do ensino; a adaptação da educação à cultura local, assim
como a descentralização do sistema educacional até o nível municipal. Assim,
se cada região apresenta sua peculiaridade cultural, a descentralização do
ensino permitia à comunidade tomar em suas mãos o controle do sistema
escolar e participar das decisões educativas.
Dessa forma, Anísio Teixeira (1999) concebia a escola como um espaço
real no qual a criança das camadas populares pudesse ter a experiência de
uma vida melhor. Ou seja, com acesso a revistas, livros, estudo, recreação,
saúde, professores bem preparados, ciência, arte. Ideário educacional
construído a partir da sua crítica do privilégio das elites.
Nessa perspectiva, as transformações educacionais do Estado
ocorreram. Lia Campos percorreu parte do interior do Estado. Nas cidades de
Natal, Mossoró, Caicó, Angicos, Pau dos Ferros, onde foram instaladas as
primeiras Inspetorias Regionais de Ensino. Segundo a professora Nanci
Gomes dos Santos, era provável também que tenha existido uma unidade na
cidade de Santa Cruz.
As Inspetorias de Ensino tinham, como função principal, a
responsabilidade de intermediar o contato entre o CEPE e as escolas
existentes no Estado. Eram responsáveis ainda pela distribuição de material
para as escolas, bem como de inspecionar o cumprimento da realização das
tarefas.
56
Ainda nesse período, Lia Campos realizou o levantamento da rede
escolar através da contagem de escolas existentes no Estado e da distribuição
de funcionários das mesmas, assim como o número de matrículas, bem como
a organização dos quadros administrativos das escolas e coordenando a
Elaboração de Programas Educacionais. Era necessário realizar uma
organização da estrutura educacional, a fim de que as práticas pedagógicas
consonantes com esse ideário rendessem bons resultados.
As escolas, seus diretores e equipes de apoio pedagógico teriam que
acompanhar esse processo. Segundo Zilda Lopes do Rêgo, Lia Campos e os
técnicos da Secretaria fizeram um levantamento junto às escolas, a fim de
sistematizar o funcionamento destas, tanto no aspecto administrativo quanto de
pessoal, bem como proporcionar atualização dos diretores e supervisores. De
acordo com a entrevistada:
Uma escola tinha três turnos, então ela precisava de um certo
número de merendeiras, de porteiro, de zelador. Para os
diretores foi oferecido um curso de administração e supervisão
escolar. Outra grande preocupação foram as semanas
pedagógicas.
Segundo o Relatório das Atividades do CEPE, para a realização deste
trabalho, a Secretaria de Educação contou com a participação de nove
pessoas do seu quadro, tendo sido recrutadas três pessoas do próprio CEPE e
seis do Departamento de Educação. A equipe designada para esta tarefa
percorreu seis regiões do Rio Grande do Norte: Zona Agreste e Litoral, Zona
Centro-Oeste, Zona do Seridó, Zona da Chapada do Apodi e Zona Serrana.
O trabalho de levantamento da realidade escolar durou cerca de quinze
dias e visava a coleta de informações sobre a situação educacional do Estado,
57
condições dos prédios e necessidade de construções, levantamento de pessoal
e matrícula, necessidade de equipamento e material didático (RIO GRANDE
DO NORTE, 1963b, p. 03)
A Lei 2.171/1957 instituiu diretrizes para o Magistério de Educação
Elementar e sua formação. Suas determinações estabeleciam de quem era a
responsabilidade pela formação dos professores; o ajustamento dos resultados
dos estudos por eles empreendidos; as orientações a serem seguidas durante
a formação; quem poderia exercer o magistério no Rio Grande do Norte e quais
os critérios de escolha dos diretores dos Grupos Escolares, entre outras
disposições.
Para exercer o magistério seria necessário que o candidato fosse
brasileiro, maior de 18 anos, apresentasse boas condições de saúde física e
mental e tivesse formação conveniente em cursos de formação pedagógica.
Em caso de professores não diplomados, a Reforma do Ensino fixava no
capítulo II, Artigo 15º:
§ 1 – Na falta de professores diplomados, o Magistério será
exercido por elementos locais, para o que será exigido exame
de habilitação.
§ 2 – Aos docentes não diplomados serão proporcionados
cursos de treinamento em serviço, e formação de emergência,
que os habilitem às funções do magistério.
Seguiram-se semanas pedagógicas nos municípios de Macaíba, Santa
Cruz, Currais Novos, Acari, Jardim do Seridó, Alexandria, Pau dos Ferros,
Mossoró, Areia Branca, Angicos, Caraúbas, Ceará-Mirim, São José de Mipibu,
Nova Cruz e Pedro Velho (TRIBUNA DO NORTE, 21/10 DE 1979, p. 04), a fim
de preparar os professores para melhor exercerem suas funções docentes.
58
Planejavam-se, também, cursos para diretores de escolas da capital e
do interior, de onde o professor saiu mais atento à significação social da escola
e capaz de ajudar na solução dos problemas da vida.
Coube, então, a professora Lia Campos, também, a função de estruturar
a equipe técnica da Secretaria de Educação. Ela e sua equipe ficariam
responsáveis por multiplicar as ações pensadas pelo CEPE nos municípios do
interior do Estado nas questões referentes à educação primária.
O jornal Tribuna do Norte em 21 de outubro de 1979, noticiava a respeito
da prática pedagógica de Lia Campos, afirmando que
Ela se arrojou com dedicação e muito preparo pedagógico ao
que se propôs, enfrentando todas as dificuldades advindas da
situação financeira do estado, procurando situar o CEPE na sua
verdadeira posição de órgão técnico. Planejou um programa de
atividades com valor educativo, de modo que contribuísse para
o desenvolvimento do educando e melhoria do preparo do
professor.
Pelos parâmetros legais o Capítulo II, Artigo 13º da Lei 2.171/1957
estabelecia que a formação do professor primário era de:
competência do Estado, cabendo, ao órgão competente da
Secretaria de Educação realizar o estudo contínuo da situação
elementar e do próprio processo de formação do professor, afim
de que este se adapte sempre a novas circunstâncias e a novas
necessidades.
A preocupação do governador Dinarte Mariz consistia em organizar e
aumentar a rede escolar, desde a estrutura física até a formação de pessoal
capacitado, mesmo que para que isso fosse necessária a saída dos
professores para se atualizarem fora do seu estado. Lima (2001a, p. 49) relata
em seu livro Solidão, Solidões, uma biografia de Dinarte Mariz, a afirmação do
59
governador a respeito da formação continuada dos docentes da rede estadual
através de cursos realizados fora do Rio Grande do Norte.
Disse-me que estimulava a saída de professores para estudar
nos grandes centros, e que fariam o inverso dele, ou seja,
voltariam para ensinar aqui o que aprenderam fora. ‘Tudo o que
eu sei aprendi aqui dentro. E fui ensinar lá fora’. Dinarte integrou
delegação do Senado à Conferência da União Interparlamentar
realizadas na Dinamarca, Alemanha, Suíça, Israel, China e
Itália.
Para preparar a equipe técnica, como previa a Lei 2.171/1957, foi
necessário que essas professoras se ausentassem do Estado, a fim de cursar
uma especialização nas diversas áreas da educação. Para isso, o então
Secretário de Educação, Tarcísio de Vasconcelos Maia, conseguiu bolsas de
estudos junto ao INEP, levando os professores para Estados como São Paulo,
Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
Araújo (2000) afirma que
Nos termos dos Acordos, a Secretaria de Educação e Cultura do
Estado do Rio Grande do Norte (SEC-RN), por um lado,
comissionava com bolsa de estudo, concedida pelo INEP, a ida
dos professores formados em escolas normais, para cursos de
longa, média e curta duração nos seus Centros de Pesquisa,
destinados a especializá-los em pesquisa educacional,
administração, supervisão, orientação educacional e ensino pré-
primário, entre outras especializações.
A intenção era incentivar investigações científicas sobre a realidade
educacional brasileira, lançando, então, as bases da ciência da educação.
Nesta perspectiva, os centros de pesquisa significavam um passo relevante
para o processo de renovação educacional desencadeado ainda nos anos de
1930.
60
De acordo com Cunha (2004, p. 117)
Para renovar a educação, era preciso, antes de tudo, olhar os
fatos escolares por intermédio da ciência, o que possibilitaria
planejar racionalmente as ações político-administrativas
voltadas à superação dos entraves nessa área.
O Estado não só mandava seus professores se especializarem fora
como também recebia professores e/ou especialistas em metodologia do
ensino da linguagem, ciências, matemática, história e outra matérias, além de
artes industriais, recreação e audiovisual, para ministrar cursos, ateliês e
oficinas práticas. Esses cursos eram oferecidos de maneira intensiva, nas
férias escolares, aos professores dessas disciplinas nos cursos normais do
estado, seguindo as proposições da pedagogia escolanovista.
Na concepção educativa de Anísio Teixeira, defensor dos preceitos
escolanovistas de democracia e educação para a democracia, o cerne das
reformas educacionais consistia no preparo dos professores e dos quadros
técnicos, devendo atribuir cientificidade ao trabalho pedagógico do professor e
da escola. Esse caráter descentralizador e regionalizante da escola primária
era tido como princípio comum pela sua equivalência cultural.
Anísio Teixeira (1999, p. 168), afirmava ainda que
É um problema profissional, a ser resolvido pelos educadores
e professores brasileiros, em um ambiente de liberdade e
responsabilidade, de experimentação e verificação, de
flexibilidade e descentralização, para que se crie a escola
brasileira, diversificada pelas regiões, ajustadas às condições
locais, viva, flexível, elástica, com a só unidade de se sentir
brasileira na variedade e pluralidade de suas formas.
61
A reconstrução da educação brasileira suscita um problema que
apresentava solução gradual e progressiva. Tal impasse consistia em uma
questão de adaptação profissional que conclamava os professores a
experimentar, ensaiar, verificar e progredir na escola brasileira.
Para tanto, a Lei 2.171/1957 fixava a formação docente considerando os
parâmetros regional e de experimentação de novas diretrizes.
A formação do professor será realizada em escolas de 1º e 2º
ciclos e obedecerá às seguintes diretrizes:
a) adaptação às peculiaridades regionais, quer sociais quer
econômicas do estado;
b) regime escolar que permita modalidades diversas de plano,
estrutura e processo a serem ensaiados, experimentalmente e,
gradualmente, pelos Centros de Formação de Magistério do
Estado;
c) o ano letivo de 200 dias, divididos em períodos iguais e
independentes;
d) planos gerais de estudos, elaborados pelo Centro de Estudos
e Pesquisas, da Secretaria de Educação, para as diversas
modalidades de formação do Magistério Primário e preparo de
Administradores escolares, supervisores de Ensino Primário,
orientadores educacionais e professores especializados para o
ensino primário;
e) a duração dos cursos não será inferior a cinco anos, o
primeiro ciclo e a 3 o segundo ciclo;
f) a admissão ao Curso Normal de 2º ciclo será feita mediante
conclusão do curso Normal de 1º ciclo, ou do curso Ginasial ou
ainda de outros a este oficialmente equivalentes (RIO GRANDE
DO NORTE, 1957, p. 06, Cap. II, Art. 14º)
Concluídos, portanto, os cursos de especialização, era papel dos
professores, administradores, especialistas e técnicos que freqüentaram os
cursos de aperfeiçoamento nos Centros de Pesquisa, assumir as novas
cadeiras professorais no Instituto de Educação de Natal. Eles também, tinham
a função de transmitir gradativamente o conhecimento geral e específico
recebido – tomado pelos preceitos de como ensinar, como organizar e como
62
transmitir – para os professores primários de Natal e cidades do interior do
Estado, com exceção dos professores leigos.
Ainda na administração de Dinarte Mariz, no ano de 1959, foram
construídos seis Grupos Escolares distribuídos no interior do Estado, através
de convênios entre o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) e
Governo do Estado. Essas obras foram levadas a efeito nos municípios de
Currais Novos, Afonso Bezerra, José da Penha, São Miguel, Luiz Gomes,
Canguaretama e Alexandria.
O jornal A República, 07 de fevereiro de 1960, enaltece esses feitos,
mostrando o empenho de Anísio Teixeira, através do INEP:
O Rio Grande do Norte pode louvar-se, nos dias de hoje, de ser
um dos Estados da Federação que vem recebendo maior
atenção por parte do Dr. Anísio Teixeira, Diretor do INEP. Dele
recebe o Governo do Estado todo o apoio necessário ao
programa de reorganização do sistema pedagógico, cuja
estrutura foi completamente reformada no sentido de adaptar-se
as exigências da Nova Escola.
No começo da década de 1960, com o professor Grimaldi Ribeiro à
frente da Secretaria de Educação e Cultura, a rede de ensino estadual sofreu
um aumento na sua estrutura física. Esse secretário mantinha constantes
contatos com autoridades educacionais do país, a fim de sustentar a
planificação elaborada para as questões educativas do Rio Grande do Norte.
Primeiros passos dados na direção de uma estruturação educacional do
Estado, encontrava-se a Secretaria composta de tais órgãos: Centro de
Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE), responsável pelo apoio
pedagógico às escolas da rede; Inspetorias de Ensino, órgão que intermediava
o contato entre as escolas e o CEPE; o Serviço Cooperativo da Educação do
63
Rio Grande do Norte (SECERN), setor responsável por administrar os recursos
financeiros e o Setor de Ensino Médio e de Planejamento. Contava também
com o Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário (PAMP), que
assistia pedagogicamente os professores leigos.
No âmbito da administração municipal, o prefeito Djalma Maranhão
(1956-1959 e 1960-1964) também demonstrava uma preocupação com a
realidade educacional de Natal. Tomou para si o reclamo popular de combater
o analfabetismo. Definindo a educação e a cultura como meta número um do
governo, no seu primeiro mandato introduziu o programa municipal de ensino,
por meio das escolinhas de alfabetização e do Ginásio Municipal de Natal.
No entanto, a situação da educação municipal não apresentava um
crescimento expressivo, pois a quantidade de escolas públicas diminuíra com o
passar dos anos. Os onze grupos escolares que funcionavam em Natal na
década de 1940 foram reduzidos a dez unidades no ano de 1961. Entre os
Grupos Escolares que funcionavam na cidade do Natal podemos citar alguns:
Augusto Severo, criado em 1908, na Ribeira; Padre Miguelinho, criado em
1913, no Alecrim; Isabel Gondim, criado em 1934, nas Rocas; Alberto Torres,
criado em 1934, em Petrópolis; João Tibúrcio, criado em 1934, no Alecrim; e
Áurea Barros, criado em 1946, no Tirol (CASCUDO, 1999). Outros Grupos
Escolares do mesmo período que não foram citados por Cascudo são:
Mascarenhas Homem, Grupo Escolar Clementino Câmara, Grupo Escolar
Professora Stela Gonçalves, Grupo Escolar Rêgulo Tinôco e Grupo Escolar
Nestor Lima.
Já as escolinhas mantidas pela prefeitura regrediram de 120 em 1958
para 86 em 1960. Segundo Moacyr de Góes (1991) as escolinhas se
64
destinavam ao ensino de ler, escrever e contar, foram criadas durante a
primeira administração do prefeito Djalma Maranhão entre os anos de 1956 e
1959.
O jornal A República de 16 de março de 1957 registra o funcionamento
dessas Escolinhas, localizando-as por bairros:
Já se encontram em pleno funcionamento as escolas Djalma
Maranhão (Rua Jundiaí), Rocas (Sede do Rio Grande F. C.),
Quintas (Sede dos Imperadores do Samba e Amplificadora São
José), Bairro da Conceição (Amplificadora Cruzeiro do Sul e
Sede do Irapuan F. C.), no bairro de Nova Descoberta e no
Alecrim (Sede da União dos Servidores Públicos do Rio Grande
do Norte).
Enquanto isso, Natal contava com uma população de 154.276
habitantes, de acordo com censo de 1960, e tinha mais de trinta mil
analfabetos, entre adultos e crianças, sem escolas (GERMANO, 1982).
A esse respeito o jornal A República de 10 de junho de 1950 traz uma
nota tratando do tema com o título O problema da educação, que mostra bem a
radiografia do ensino nessa década.
Quanto maior é o povo, mais dilatado deve ser o seu índice de
educação.
A cultura é sem dúvida, o ponto culminante da evolução social,
moral, política, espiritual e econômica do cidadão.
Alguém há que a supõe desvirtuadora dos hábitos e dos
costumes, e que acarreta com sérios prejuízos para o povo,
especialmente nesta fase de metamorfose artística que vem
sofrendo com o advento do existencialismo. Todavia, a
educação é o grande fator, o caminho mais curto por onde
podemos contornar e atingir o nosso grau de perfeição,
educando os brasileiros para que nos livremos da assombrosa
porcentagem de analfabetos que se multiplica por todo o país.
Os livros didáticos todos os anos são mudados, as matrículas e
mensalidades são aumentadas e a aprendizagem decresce, por
falta de meios financeiros dos pais de família para cumprirem as
suas obrigações com o sustento dos filhos nas escolas.
65
Os educandários mantidos pelo Governo estão superlotados e
quem quer aprender a ler tem que se subordinar a imposição
das escolas particulares, que usam e abusam do direito de
estipularem a tabela de preços a seu talente.
Diz-se comumente que, no Brasil, aprende a ler quem é rico. E
se precisamos da cooperação do pobre, porque o deixarmos
sem instrução?
Deste modo, não é possível o país livrar-se da porcentagem de
analfabetos. E é por esta razão que, apesar do eficiente e
patriótico combate dos governos contra o analfabetismo, com a
abertura de escolas rurais, grupos escolares, escola de
alfabetização de adultos e outros educandários gratuitos, ainda
perdura, em nosso, como em outros estados da Federação, um
clamoroso coeficiente de ignorantes.
Diante de todos esses problemas, o titular da Secretaria Municipal de
Educação, Cultura e Saúde de Natal, Moacyr de Góes, foi incumbido da missão
de coordenar e desenvolver um vasto movimento de organização educacional
e cultural. Nasceu a Campanha De Pé no Chão Também se Aprende e Ler,
lançada em 23 de fevereiro de 1961, tendo o bairro das Rocas como área-
piloto.
Figura 5: Acampamento da Campanha de Pé no Chão no bairro das Rocas
(1961)
Fonte: Diário de Natal - Educação de Jovens e Adultos, 2005.
O primeiro Grupo de Trabalho a comandar a Campanha foi presidido
pelo prefeito, Djalma Maranhão, na Secretaria de Educação e Cultura do
66
Município. Os primeiros professores convidados a participar do grupo foram:
Moacyr de Góes
16
, Omar Pimenta
17
, Severino Fernandes de Oliveira
18
, Herly
Parente
19
, entre outros nomes da educação local. Um grupo considerado de
vanguarda e que iria se engajar na batalha contra o analfabetismo; todos sob a
supervisão da professora Lia Campos que, na opinião de Moacyr de Góes
(2000, p. 98, 99), era “figura do mais alto gabarito nos círculos educacionais do
País”. Ainda, segundo o mesmo autor:
O curso foi orientado pela Diretoria do Ensino Municipal e
contou com a participação de professores da Secretaria de
Educação, Ginásio Municipal e de técnicos do Centro de
Pesquisas Educacionais.
Essa campanha visava a alfabetização de crianças e adultos que
precisavam aprender a ler e escrever e prosseguir nos estudos – a única forma
de elevar-se socialmente e não viverem na marginalidade. Para que a
campanha ocorresse, a escola seria a responsável pela promoção de
professores, carteiras, material escolar e merenda. Isso feito, deu-se o
crescimento da campanha, que passou por diversas fases: escolinhas
municipais, funcionando em salas doadas por particulares; acampamentos
escolares; escolas com chão de barro batido e teto feito de palha de coqueiro.
Para os adultos que se recusavam a estudar nos acampamentos, o ensino se
16
Moacyr de Góes foi Secretário Municipal de Educação de Natal na administração do Prefeito
Djalma Maranhão (1960-1964) quando coordenou a campanha De Pé no Chão Também se
Aprende a Ler. Foi professor do Ateneu e fundador das disciplinas de História da América e de
História Econômica das Faculdades de Filosofia e Ciências Econômicas da UFRN. Preso
político em 1964, esteve destituído de cargos e funções oficiais até a anistia em 1979.
Secretário Municipal de Educação do Rio de Janeiro no período de 1987-1988, voltando à
Secretaria Municipal de Educação de Natal na administração da Prefeita Wilma Maria de Faria,
em 1989. (EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS, 2005).
17
Omar Fernandes Pimenta era nesse período Diretor do Ensino do município de Natal.
18
Severino Fernandes de Oliveira, professor, desempenhava nessa época a função de Diretor
do Ginásio Municipal.
19
Joaquim Herly Parente foi Supervisor Administrativo do Centro de Formação de Professores
da Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler. (GÓES, 1991).
67
dava na sua própria casa. (HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE, 12.
[199_?]).
Figura 6: Imagem de divulgação da Campanha De Pé no Chão (1961)
Fonte: Diário de Natal - Educação de Jovens e Adultos, 2005
Não havia somente, por parte da Campanha, a preocupação em
alfabetizar e sim de também analisar a realidade educacional e cultural da
cidade, através de uma vasta pesquisa e questionamentos, divididos em planos
que seriam entregues a especialistas em cada assunto.
Foi programado então o I Seminário de Estudos dos Problemas da
Educação e Cultura do Município de Natal, que contou com a presença de
vários intelectuais da cidade. Entre os dias 03 e 08 de abril de 1961, o
Seminário contou com a participação da professora Lia Campos, responsável
por abordar o tema A Reforma do Ensino Primário do Rio Grande do Norte.
De acordo com Góes (1991), o Seminário foi centrado na realidade local,
e a fala da referida professora subdividiu-se em: 1- causas da reforma; 2-
pontos fundamentais; 3- aspectos da reforma; 4- classes regulares e de
68
recuperação; 5- atividades desenvolvidas pelo Centro de Estudos e Pesquisas
Educacionais da Secretaria de Educação do Estado a fim de preparar pessoal
docente para a experiência da reforma do ensino primário; 6- revisão dos
programas de ensino primário do Estado.
Mudança de governo. Aluízio Alves assumiu a administração do Estado
(1961-1966). Apesar de ser adversário político do governador anterior, Aluízio
Alves manteve a professora Lia Campos na sua função. O novo governador
elegeu a educação como uma das prioridades do seu mandato e deu
continuidade ao processo de organização e desenvolvimento do Sistema
Educacional do Estado, na forma como previa a Lei 2.171/1957. Aluízio Alves
lançou, então, o plano Fazer em três anos o que não se fez em três séculos.
Esse plano tinha como objetivo mudar o cenário norte-rio-grandense,
cuja realidade, revelava uma região subdesenvolvida e sem o preparo para
construir o desenvolvimento industrial. Nesse contexto foram criados órgãos de
prestação de serviços, como a Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande
do Norte (COSERN) e a Companhia Telefônica do Rio Grande do Norte
(TELERN).
Para implementar esses e outros projetos, Aluízio Alves contou com um
estreito relacionamento com o governo norte-americano, denominado Aliança
Para o Progresso, que consistia em conseguir empréstimos para realizar as
metas de seu programa de governo (LIMA, 2001b). Os recursos eram
destinados a projetos em diversas áreas, como: agricultura, construção de
casas populares (Cidade da Esperança, bairro situado na zona oeste de Natal),
pecuária, abastecimento de água, saúde e educação (GERMANO, 1982). Para
administrar os recursos recebidos, foi criado e estruturado, o Serviço
69
Cooperativo de Educação do Rio Grande do Norte (SECERN), cujo diretor
executivo era o Secretário de Educação, o jornalista Calazans Fernandes.
Figura 7: Aluízio Alves, ao centro e de pé, reunido com membros da Secretaria
de Educação [196_?]
Fonte: Acervo particular de Anilda Menezes
Para atender a demanda crescente de alunos e ampliar o número de
prédios escolares, a meta do governo era alfabetizar 100 mil pessoas acima da
idade escolar primária, ou seja, aquelas que tivessem idade acima de treze
anos. Segundo a Lei 2.171/1957, no seu Artigo 3º, a educação elementar
abrange quatro categorias de cursos relacionados a faixa etária:
a) pré-primária, para crianças de menos de sete anos;
b) primária, com duração de quatro anos, destinada a
crianças de sete a onze anos;
c) complementar, com duração de dois anos, destinada a
crianças de onze a treze anos;
d) supletiva, para adolescentes e adultos.
O governador Aluízio Alves pretendia, ainda, a extensão da escolaridade
a todas as crianças do Estado e, para tanto, seria necessária a construção de
1.000 salas de aula. Tomou as seguintes medidas: recuperação de prédios
antigos; construção de novos edifícios e funcionamento de cursos de 1º grau
70
nos prédios dos Grupos Escolares. Para o 2º grau, foram construídos três
prédios os quais funcionam, até hoje: o Instituto Padre Miguelinho, o Instituto
de Educação Presidente Kennedy e o Centro Educacional Winston Churchill.
Para educar um grande número de pessoas em um curto espaço de
tempo foi lançado, em Angicos-RN, o método do professor Paulo Freire
20
de
alfabetização de adultos em 40 horas. Segundo o pensamento de Paulo Freire
(2005), a educação devia fundamentar seu método no diálogo, no qual
professor e aluno aprendem juntos. Seria necessário acabar com a escola
autoritária e dar lugar a uma escola democrática, que desse voz e vez aos
educandos e que preparasse o homem para o mundo. Assim, o povo deixa de
ser objeto para ser sujeito. A isso, Paulo Freire chamava de consciência cívica.
Nesse sentido, formula duas concepções de educação assim denominadas:
educação bancária e educação problematizadora.
A educação bancária consiste no ato de depositar, transferir e transmitir
valores e conhecimentos aos educandos. Nesta visão bancária, os homens são
vistos como seres em adaptação, ajustamento. Isto é, quanto mais se realizam
depósitos tanto menos se desenvolverá a consciência crítica, fator que os
impediria de inserir-se como sujeitos no mundo, tendo a capacidade de
transformá-lo. Assim, o saber é uma doação dos que julgam saber mais aos
que nada sabem.
20
Paulo Reglus Freire nasceu em Recife/PE, em 1921. Trabalhou no Serviço Social da
Indústria (SESI) e no Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife. Foi professor da
disciplina História e Filosofia da Educação naquela universidade. Trabalhou na Universidade de
Havard e Consultor Especial das Igrejas (Genebra). Exilado político no Chile desenvolveu
trabalhos em programas de educação de adultos no Instituto Chileno para Reforma Agrária.
Escreveu muitas obras, entre elas: Educação: prática da liberdade (1967), Pedagogia do
oprimido (1968), Pedagogia da esperança (1992) e A sombra desta mangueira (1995). Falece
no dia 2 de maio de 1997, na cidade de São Paulo, vítima de infarto agudo.
(http://www.paulofreire.org.br/pfreire.htm).
71
No contra-fluxo da concepção anterior Freire (1987) aponta a educação
problematizadora. Nesta concepção, o conhecimento é um processo que se
realiza mediante o contato do homem com o mundo vivenciado. Desse modo, o
saber não se apresenta de forma estática, mas de maneira dinâmica e em
constante transformação. Estabelece-se, então, uma relação dialógica entre os
homens, na qual o diálogo pressupõe troca sempre mediatizada pelo mundo.
Portanto, o saber aqui constituído percebe a necessidade de transformar o
mundo, pois apenas assim os homens se percebem como sujeitos históricos.
De autoria do professor pernambucano, o método partia da pesquisa do
universo popular e temático do grupo a ser alfabetizado para selecionar
situações que servissem de instrumento não só para o aprendizado da escrita
e da leitura, mas também da discussão da realidade, relacionando o processo
educativo ao meio social do aluno. Através dessa pesquisa, o educador
identificava as palavras geradoras. Sem o uso de cartilhas, o monitor coletava
o universo vocabular que correspondia a situações sociológicas existenciais do
grupo. Partindo de uma palavra que fizesse parte do conhecimento de mundo
do indivíduo, por exemplo, tijolo, o professor apresentava ao grupo a imagem
de uma construção na qual se destaca o objeto e a palavra tijolo.
Progressivamente, as sílabas desta palavra eram usadas para a construção de
outras.
De acordo com o Relatório do Plano de Aplicação do SECERN, os
objetivos da Campanha de Alfabetização não se restringiam apenas a ensinar
a ler e escrever. O programa previa também:
1. dar ao adulto o domínio das habilidades fundamentais em
linguagem, leitura e aritmética;
72
2. promover o renascimento ou a criação de ideais e padrões
elevados de vida;
3. formar no homem a convicção da sua responsabilidade (e da
responsabilidade do Estado) em dar educação aos seus filhos;
4. habilitá-lo ao exercício da cidadania, como eleitor, como
membro de uma nação livre e como participante ativo do regime
democrático;
5. promover a elevação do seu nível de vida em casa, do ponto
de vista da higiene, do conforto e da alimentação;
6. habilitá-lo a administração equilibrada dos seus recursos
financeiros e da direção da sua própria vida;
7. despertar nele a noção de que ele, sua mulher, seus filhos,
têm direito a uma vida melhor.
(RIO GRANDE DO NORTE, 1963a, p. 27).
Para que estes objetivos fossem atingidos, a Secretaria de Educação
convocou voluntários para colocar em prática tal campanha. A Experiência de
Angicos, prática que ficou mais conhecida na campanha, contou com a
participação de estudantes universitários e ginasianos que se dispuseram
voluntariamente a testar o novo método de alfabetização de adultos.
A repercussão da campanha de alfabetização passou por duas
vertentes: a primeira, que tinha como objetivo a ativação da população no seu
próprio processo histórico, onde o homem agiria com e na sua realidade,
podendo se tornar politizada e conscientizada; e uma outra que a conotaria
como subversiva.
O método de alfabetização em larga escala desagradava tanto aos
partidários da UDN
21
e do PSD
22
quanto aos comunistas, pois ele ensinava não
apenas a ler e a escrever, mas também a admirar a democracia.
21
Na conjuntura final do Estado Novo foram criados os principais partidos políticos brasileiros
atuantes entre as décadas de 1940 e 1960. A União Democrática Nacional (UDN) foi fundada
no dia 7 de abril de 1945. Reuniu diversas correntes que nos anos anteriores haviam se
colocado contra a ditadura do Estado Novo. Foram representantes da sua fundação: Otávio
Mangabeira, Júlio Prestes, Artur Bernardes, José Américo de Almeida, Juarez Távora, Juraci
Magalhães e Flores da Cunha, entre outros. (http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos37-
45/ev_fim_ppn.htm).
22
O Partido Social Democrático (PSD) foi fundado no dia 17 de julho de 1945 sob o comando
dos interventores estaduais nomeados por Getúlio Vargas durante o Estado Novo, entre os
73
De acordo com Paiva (1980), esse método de alfabetização também
apresentava uma outra conotação, pois o mesmo vinculava-se ao
nacionalismo-desenvolvimentismo. Isso porque o programa de alfabetização
fora financiado com recursos da Aliança Para o Progresso, e ainda, a USAID
(Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional), e mais
precisamente os Estados Unidos, entendiam que a região nordeste do Brasil
era um problema de segurança internacional.
A campanha de alfabetização serviria, ainda, para garantir o eleitorado
do líder populista, Aluízio Alves, fortalecendo, portanto, suas bases eleitorais. O
lançamento do método oferecia vantagens para o governo do Estado e para a
agência financiadora por alfabetizar em poucas horas, sendo utilizado em larga
escala e com baixo custo e, ainda, pela posição cristã do seu criador e pelas
tensões surgidas entre Paulo Freire e os comunistas durante a campanha de
Miguel Arrais, na disputa do governo de Pernambuco, o que resultava em
confiança contra as suspeitas de subversividade do método.
No entanto, no transcurso do ano de 1963, “a imprensa inicia uma série
de denúncias a respeito do método e da USAID como sendo um ‘programa
intensivo de comunização do Nordeste’” (PAIVA, 1980, p. 25). Por este motivo
foi retirado o apoio financeiro da USAID, alegando, como razão oficial, a
inadequação dos procedimentos didáticos. Na verdade, o método era encarado
como uma fábrica de revoluções.
Mas, para Paiva (1980, p. 135), Paulo Freire se mostrava contraditório e
favorável ao projeto nacionalista-desenvolvimentista. De acordo com a autora,
no final de década de 1950, mais precisamente em 1959, Freire sabia
quais se destacaram Benedito Valadares, Ernani do Amaral Peixoto, Nereu Ramos e
Agamenon Magalhães. (http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos37-45/ev_fim_ppn.htm).
74
claramente onde deveria chegar à participação popular na vida política, de
forma que essa participação não oferecesse risco a estabilidade e a harmonia
da vida político-social. Desse modo, o professor desejaria “a conscientização
para facilitar a mudança, a modernização, dentro dos limites do modo de
produção vigente.”
Todavia, quando isto aconteceu, Paulo Freire e seu método já estavam
difundidos pelo país. O presidente João Goulart compareceu ao encerramento
da Campanha em Angicos e juntamente com o Ministro da Educação, Paulo de
Tarso, convidou Freire a realizar uma experiência em Brasília.
Nesse contexto, Lia Campos e sua equipe prosseguiam na tarefa de
capacitar os professores leigos dos municípios do Rio Grande do Norte. Essa
demanda de professores se devia ao fato de só existir no Estado as Escolas
Normais de Natal e Mossoró. Essas capacitações eram divididas em três
etapas que compreendiam o período das férias escolares.
Segundo a professora Nanci Gomes dos Santos, foram formados
centros de treinamentos de professores leigos, vinculados às Inspetorias, de
acordo com o número de professores que necessitassem de atualização. Os
professores se deslocavam da sua cidade e partiam para os locais que
sediavam os centros de treinamento para participarem das etapas dos cursos.
Nos meses de janeiro e fevereiro, acontecia a primeira etapa. Já no período do
recesso escolar de junho, ocorria a segunda etapa e, por fim, em dezembro
concluía-se a terceira e última etapa.
Os docentes também recebiam um auxílio financeiro, em forma de bolsa
de estudo, para custear sua formação e permaneciam nesses locais em regime
de internato, recebendo, inclusive, alimentação. O conteúdo dos cursos eram
75
divididos em disciplinas de formação geral e em disciplinas de formação
pedagógica. Esses cursos eram atrelados ao INEP/MEC, e supervisionados
aqui no estado pelo Programa de Aperfeiçoamento do Magistério Primário
(PAMP), coordenado pela professora Maria Alexandrino Sampaio.
Em parágrafo único a Lei 2.171/1957 afirma que:
Quanto à execução e ao ajustamento dos resultados desse
estudo contínuo, caberá aos Centros Educacionais de formação
do magistério, localizados em determinada região, assumir as
responsabilidades, procedendo, automaticamente, de acordo
com as diretrizes fixadas em regulamento (RIO GRANDE DO
NORTE, 1957, p. 05, Cap. II).
Segundo Germano (1982), a partir do quarto trimestre de 1963 a
remessa de recursos para a educação foi suspensa, sendo liberada apenas
depois de instaurado o golpe militar de 1964. O autor afirma também que o
SECERN, órgão executor do programa, passou a sofrer uma série de
intervenções quanto a ação administrativa por parte do governador e de outras
instâncias da administração estadual. Tal fato motivou a saída do então
Secretário de Educação, Calazans Fernandes.
Dessa maneira, por trás das interferências e restrições
administrativas impostas a Secretaria de Educação, escondia-
se, na verdade, uma divergência política entre facções do
governo, do que resultou uma crise, na qual a facção mais
“conservadora” conseguiu expurgar a facção “modernizadora e
progressista” (p. 60 e 61).
Ainda segundo Germano (1982, p. 61), o jornal A Ordem de 14 de
dezembro de 1963 veicula uma reportagem sobre o mesmo episódio.
76
[...] o governador Aluízio Alves subscreveu e divulgou no Diário
Oficial ‘um despacho em que declara dever o secretário de
Educação submeter à sua aprovação todas as decisões
relacionadas com a educação, inclusive despesas e nomeação
de professores’.
No ano de 1964, no advento da Ditadura Militar, o prefeito Djalma
Maranhão foi deposto, preso e deportado para a ilha de Fernando de Noronha.
Posteriormente, foi exilado no Uruguai, permanecendo lá até morrer, sozinho,
no dia 30 de julho de 1971.
O governador Aluízio Alves concluiu seu mandato em 1966,
conseguindo fazer seu sucessor, o Monsenhor Walfredo Gurgel, que governou
o Estado de 1966 a 1971.
Ainda no ano de 1964, a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul
solicitou a volta de Lia Campos. Portanto, é até 1964 que pretendo analisar as
questões educacionais das quais Lia Campos participou, seja na esfera
estadual ou municipal da educação.
77
A prática de Lia Campos
78
5 – A prática de Lia Campos
a experiência vivenciada na Campanha De Pé No Chão Também
se Aprende a Ler, como supervisora do 1º Curso Intensivo para o
Magistério Primário (1961), Lia Campos pôs em prática os objetivos e critérios
do programa do curso. O Curso Intensivo para o Magistério Municipal, segundo
Góes (2000, p. 168), tinha como objetivo,
N
verificar o nível de preparo das professoras, a fim de realizar o
treinamento baseado nas deficiências do domínio dos conteúdos das
matérias do primário e no conhecimento dos princípios da técnica
pedagógica.
Seu critério básico para funcionamento era que as participantes fossem
professoras efetivamente integradas ao ensino municipal. Isto, porque havia
urgência em reduzir o índice de analfabetismo que existia no município de
Natal, cujo indicador apontava para mais de trinta mil analfabetos.
O passo inicial consistia em planejar um curso de férias para as
professoras primárias da capital e arredores e candidatos ao ingresso no
Magistério Primário Municipal. Lia Campos pretendia elaborar e pôr em
andamento um programa de formação docente que mantivesse as práticas
pedagógicas em consonância com a vida de uma escola que estava se
modificando.
Neste curso seriam matriculadas as professoras que já integravam o
quadro, havendo margem de vagas para matrícula de novos componentes a
serem aproveitados progressivamente, à medida que se estendesse a rede
escolar municipal, a exemplo de outros cursos oferecidos pela Secretaria de
79
Educação do Estado. Com o intuito de capacitar professores leigos, este
também acontecia no período das férias escolares, tendo uma duração de um
mês e meio.
Era importante proporcionar às professoras a noção dos objetivos
visados na realização do curso, levando-as a uma formação continuada de
forma específica para o trabalho que desempenhavam, bem como revisar os
conhecimentos que possuíam sobre as principais matérias do curso primário.
Assim, elas compreenderiam as finalidades da escola primária municipal e
estabeleceriam critérios para a organização das classes e do material didático
mínimo necessário a ser utilizado nas aulas.
O curso seria desenvolvido através de aulas, palestras, debates,
apresentação do material didático e jogos a serem confeccionados pelas
professoras e, ainda, contaria com aplicação de questionários para
levantamento de problemas existentes no decorrer do curso.
Ao final, as professoras seriam submetidas a uma avaliação na forma de
prova ou trabalho. As candidatas, cujos exames apresentassem resultados
insuficientes, continuariam a capacitação, reservando-se um dia na semana
para que, no período de quatro horas, pudessem assistir às aulas de
preparação das matérias em que apresentassem baixo rendimento.
O programa do curso fixava as matérias e os limites de conteúdos a
serem vencidos. As disciplinas trabalhadas com as professoras eram: Língua
Portuguesa, Matemática, Conhecimentos Gerais – que compreendia História e
Geografia, e ainda, Ciências Físicas e Naturais.
As aulas de Língua Portuguesa se dividiam em seis pontos básicos:
redação de cartas, telegramas e recibos; ofícios; relatórios; ditado; leitura
80
(leitura silenciosa com interpretação escrita, leitura oral, considerando altura da
voz, expressão e pronúncia e interpretação oral, destacando as idéias
principais e secundárias do texto lido); gramática com exercícios escritos e
orais, com destaque para os seguintes assuntos: categoria gramatical,
elementos principais de uma sentença, conjugação de verbos regulares,
irregulares, auxiliares e defectivos, emprego da crase, sinônimos, antônimos e
homônimos e acentuação gráfica. Esta deveria obedecer ao vocabulário
vigente a partir de 1943 (GÓES, 2000, p. 169).
Em relação às aulas de Matemática, estas se dividiam em cinco pontos
que contemplavam: operações com números inteiros e decimais; cálculo
mental; multiplicação e divisão de inteiros e decimais por 10, 100 e 1.000;
frações, nas suas operações, redutíveis e irredutíveis, redução de fração ao
mesmo denominador e, por fim, sistema métrico, envolvendo operações, área,
reduções, perímetro e metro cúbico.
As demais disciplinas do curso também estavam divididas por assunto,
ressaltando que a elaboração desse currículo se deu com o objetivo de, pelo
menos, amenizar as deficiências das professoras em relação aos conteúdos
ministrados no ensino primário.
As orientações oferecidas durante a realização deste curso consistiam
em nortear as professoras nos seus fazeres em sala de aula. Na área da
Linguagem, seriam trabalhados os seguintes aspectos: como iniciar a leitura; a
leitura nas diferentes séries; ditado; cópia; composição e escrita. A orientação
metodológica para o ensino da Matemática compreendia os seguintes pontos:
como iniciar o ensino da matemática; fatos fundamentais – a tabuada;
aprendizagem das operações fundamentais; frações e problemas.
81
A equipe supervisora esperava que ao término do curso as professoras
estivessem preparadas para trabalhar os conteúdos em sala de aula de uma
forma integral, de modo que pudessem realizar os seus fazeres pedagógicos
relacionado-os com as necessidades dos alunos, enquanto sujeitos de uma
sociedade dinâmica e que se pretendia democrática.
Figura 8: Diploma de participação na Campanha de pé no Chão [196_?]
Fonte: Acervo particular da família Campos
No ano de 1962, o CEPE contava com apenas treze funcionários, em
sua maioria, professores primários recrutados nos Grupos Escolares do
Estado, que eram cedidos para este órgão.
As atividades desenvolvidas em maio desse mesmo ano estavam
voltadas para o setor de Artes Industriais, com o planejamento dos trabalhos
para o funcionamento de oficinas em Natal, Caicó e Mossoró. Essas cidades
82
foram escolhidas como sede, por serem pólos das regiões a que pertenciam,
apresentando também a possibilidade da vinda de pessoas dos municípios
vizinhos para participar das aulas.
Em parceria com a Secretaria de Educação e Cultura, foram concluídas
as obras das oficinas de Artes Industriais de Natal e equipadas as de Caicó e
Mossoró. Em Natal, contou com uma matrícula geral de 240 alunos, sendo que
deste total de alunos inscritos apenas 162 participaram efetivamente.
Na cidade de Mossoró o início ocorreu em setembro, com a matrícula de
129 alunos; seguindo-se por Caicó, em novembro do mesmo ano, com uma
matrícula efetiva de 150 alunos.
Essa oficinas tinham como objetivo levar os alunos a desenvolverem
habilidades técnicas nos trabalhos com cerâmica, cestaria, couro, madeira,
cartonagem, fantoche tapeçaria, encadernação e desenho. Através desses
novos conhecimentos adquiridos, os aprendizes poderiam assegurar uma
forma de se inserir no mercado de trabalho. Para isso, segundo o Relatório, foi
montada uma exposição de Artes Industriais, em Natal, mais precisamente na
Lagoa Manoel Felipe. No evento, estiveram presentes os alunos de 324
escolas das regiões atendidas pela iniciativa.
Segundo a Lei 2.171/1957, no seu Artigo 1º,
a educação elementar, posto que acentuadamente geral e
comum, procurará, sempre que possível constituir uma
iniciação ao trabalho, assumindo o aspecto rural ou urbano
neste seu caráter de escola pré-vocacional.
Posteriormente às oficinas de Artes Industriais o CEPE organizou, nos
meses de junho e julho, um curso de Recreação, cujo objetivo consistia em
preparar recreadores para as escolas primárias da capital, Caicó e Mossoró,
83
tendo um total de 41 professores participantes. Para os educadores advindos
do interior foi assegurada uma bolsa no valor de dez mil cruzeiros para custear
as despesas.
Com a duração de um mês esse curso tinha seu programa formado pela
seguinte estrutura curricular: Psicologia, Jogos, Linguagem, Fundamentos da
Recreação, Danças, Músicas (bandinhas), e Atividades Dramáticas (teatro
fantoches, teatro sombra e atividades artísticas).
De acordo com o pensamento educacional que perpassava a época, as
escolas tinham que renovar suas práticas educacionais e métodos de ensino.
Isto requeria do professor uma formação mais ampla, que não fosse restrita
apenas às disciplinas do currículo comum, introduzindo no currículo de
formação de seus educadores novos conhecimentos advindos de disciplinas,
como Psicologia, Recreação, entre outras que foram integradas aos cursos
oferecidos, pois, não haveria uma renovação no ato educativo se também não
fosse renovada a maneira como seriam formados os educadores.
No segundo semestre do mesmo ano, a professora Lia Campos
estabeleceu, como meta pedagógica, difundir novos processos de ensino para
os professores leigos do interior do Estado, tendo sido realizado o curso na
cidade de São José de Mipibu no período de 1 a 7 de julho, beneficiando 126
professores dos seguintes municípios: São José de Mipibu, Nísia Floresta,
Monte Alegre, Januário Cicco (atual Boa Saúde), Goianinha, Arês, Parnamirim
e Vera Cruz. Esse curso estava direcionado aos professores da rede estadual
que vinham de diversas instituições de ensino, não existindo, portanto, escolas
especificamente selecionadas para enviar docentes para formação.
84
O curso tinha uma duração de oito horas diárias, com o intuito de
contemplar o currículo que era composto pelos conteúdos de: Administração,
Língua Pátria, Aritmética, Estudos Sociais, Estudos Naturais, Clube Agrícola,
Artes Industriais e Religião. Os conteúdos dessas disciplinas serviriam tanto
para o aprofundamento do conhecimento dos professores quanto para serem
ministrados, de acordo com o nível da turma, nas escolas em que eles
lecionavam, sendo necessário a adaptação dos assuntos às séries atendidas.
Isto, porque ficou constatado que os professores, pela própria dinâmica da
educação, necessitavam estar sempre se atualizando em relação a tais
disciplinas. Sendo, dessa forma, necessária uma capacitação para construir e
reconstruir os saberes em estudo.
Como forma de verificar o rendimento da aprendizagem desses
conteúdos nas escolas primárias, no segundo trimestre de 1962, o Centro
elaborou e distribuiu provas objetivas. Para aplicação das mesmas foram
realizadas reuniões com os diretores de Grupos Escolares do Estado (os
documentos encontrados não especificam quais foram esses Grupos
Escolares) com o objetivo de orientar sobre a aplicação das referidas provas.
As provas foram distribuídas para aplicação da 1ª a 5ª séries primárias num
total de 28.802 provas distribuídas em todo o Estado (RIO GRANDE DO
NORTE, 1963b, p. 04).
A execução desse procedimento não atendia a nenhuma norma
específica. O intuito principal consistia em verificar o andamento das atividades
escolares, o que vinha sendo realizado e como os alunos estavam se
apropriando dos conteúdos ministrados.
De acordo com a professora Nanci Gomes dos Santos,
85
O CEPE era responsável por irradiar, era o efeito multiplicador
do que se fazia dentro da Secretaria de Educação em termos
pedagógicos para as escolas. Por exemplo, apostilas... Qual era
a função do CEPE? Através daqueles técnicos elaborar
apostilas de Ciências, de Língua Portuguesa, de Matemática...
O material didático e as provas eram elaboradas pelo CEPE e
distribuídas já prontinhas, o pacotinho pronto era entregue nas
escolas através dos órgãos intermediários que eram as
Inspetorias de Ensino.
Obtidas as informações e mapas do exame fez-se a avaliação do
rendimento escolar, com os seguintes resultados:
1. Escolas que aplicaram provas 94
2. Matrícula geral 29.141
3. Matrícula efetiva 25.093
4. Comparecimento ao exame (número de alunos) 21.057
5. Considerados suficientes ou aprovados (número de alunos) 15.451
6.Considerados insuficientes ou que não lograram promoção à serie seguinte
(número de alunos)
9.642
7. Percentagem de promoção 61,61%
(RIO GRANDE DO NORTE, 1963b).
Fica evidente na análise dos resultados obtidos que o trabalho
empreendido pela Secretaria de Educação, apesar do muito que percorreu,
ainda estava apenas no início. Muitas ações ainda estavam por fazer para que
as benesses de uma formação continuada para professores se irradiassem
pelo Estado e pudessem transformar professores e alunos em indivíduos mais
ativos e participativos na escola e na sociedade. Aluno e professores como
sujeitos de seus próprios atos de criar e recriar o mundo, conforme análise de
Paulo Freire.
De acordo com o Relatório das Atividades do CEPE desse período, a
justificativa para que somente 94 escolas participassem da avaliação era a de
que as provas não chegaram a atingir os 106 Grupos Escolares do Estado,
porque alguns deles ainda não aceitaram ou não se prepararam para este tipo
86
de trabalho, em virtude de falta de professores ou ainda, embora contém com
dedicados regentes, estes são leigos. Também a carência de recursos
financeiros e a falta de supervisores impediram a remoção dos fatores citados.
Para dar continuidade ao processo de formação dos professores leigos,
a professora Lia Campos viabilizou, em parceria com o Ministério da Educação
e Cultura (MEC), a especialização do pessoal que compunha os quadros
técnicos da Secretaria de Educação, a exemplo de professoras como: Dione
Moreira, Vilma Tinoco, Iracema Coutinho, Francisca Ivaíta
23
. Através de uma
seleção, alguns professores se deslocaram para outras cidades do país, de
acordo com a área de interesse e necessidades de trabalho. A Lei 2.171/1957
assegura esse direito aos professores, quando expressa no Artigo 19º que a
rede de escolas de formação de professores do Estado compreende:
Instituto de Educação de Natal, com caráter experimental em
seus Cursos de Pesquisas, destinados à melhoria do ensino
normal do Estado, mantendo, na medida de suas
possibilidades, Cursos de Especialização e Aperfeiçoamento,
para o que poderá procurar a cooperação de técnicos
nacionais ou estrangeiros.
23
Todas as professoras citadas fizeram parte da Secretaria de Educação no período citado, e
após a conclusão dos cursos de aperfeiçoamento, foram encaminhadas para as Inspetorias de
Ensino.
87
CURSO LOCAL 1962 1963
Artes Industriais Guanabara 4 __
Artes Industriais São Paulo 1 17
Artes Industriais Salvador 2 __
Especialista em Educação São Paulo 1 1
Pesquisador em Educação São Paulo __ 2
Recursos Áudio-Visuais São Paulo __ 8
Metodologia da Matemática Belo Horizonte 1 3
Aperfeiçoamento em Currículo e
Supervisão
Belo Horizonte 1 1
Ciências Naturais Belo Horizonte __ 5
Língua Pátria Belo Horizonte __ 4
Estudos Sociais Belo Horizonte 1 5
Arte Infantil Guanabara 1 __
Jardim de Infância Guanabara 2 __
Regência de Classe Guanabara 2 __
Supervisor educacional de Ensino
Primário
Guanabara __ 11
TOTAL DE BOLSAS NOS ANOS DE 1962 E 1963 73
(RIO GRANDE DO NORTE, 1963b).
Estavam previstas, ainda, a concessão de 63 bolsas de estudo para o
segundo semestre de 1963, ficando a professora Lia Campos aguardando
somente a autorização do MEC.
Nanci Gomes do Santos, selecionada para estudar em Belo Horizonte,
relata como ocorria o processo:
Antes de 1963 eu comecei a ensinar. Naquele tempo não tinha
Universidade, tinha a Fundação José Augusto. Aí eu fiz
vestibular para fazer História.Quando eu estava acomodada,
aparece Lia Campos nas escolas escolhendo professores. Ela
olhou para mim e disse:
_ Tu não queres fazer um curso em Belo Horizonte?
_ Eu disse: -não, não quero não porque eu estou terminando o
meu curso, vou fazer licenciatura.
_ E ela disse: -ah, mas preenches o formulário, só para arriscar,
não tem problema.
Eu preenchi o formulário e com menos de uma semana chegou
a resposta. Não tinha entrevista, era só preencher o formulário e
saber uma língua estrangeira.
A Inspetoria da qual a professora Nanci Gomes fazia parte tinha sua
sede aqui em Natal e inspecionava, segundo ela, aproximadamente 34
municípios; entre eles: Macaíba, Parnamirim, São José de Mipibu, Ares,
88
Goianinha, Monte Alegre, Nísia Florestan entre outros. Esse órgão tinha como
função básica multiplicar, para os municípios por ela assistidos, as
deliberações educacionais sugeridas pelo CEPE, como por exemplo: a divisão
dos conteúdos a serem trabalhados pelas escolas, as atividades propostas,
bem como as provas.
Ao concluírem os Cursos de Especialização os professores seriam
absorvidos pelos seguintes setores e instituições da educação estadual:
SECERN, CEPE, Oficinas de Artes Industriais, Inspetorias de Ensino, Escolas
Normais de 2º ciclo, Escola de Aplicação de Natal e Caicó e Jardim de Infância
Modelo.
A professora Nanci Gomes relata o seu processo de volta ao Estado,
quando assumiu uma função na Inspetoria de Ensino de Natal:
Quando eu voltei, junto com mais dez pessoas, depois de seis
meses, eu não fui mais para a escola. Eu tinha concluído o
curso de Jardim de Infância e ocupei um cargo em uma
Inspetoria de Ensino. As outras pessoas ficaram distribuídas nos
órgão da Secretaria de Educação.
Em relação ao material didático utilizado pelas escolas, este era
remetido pelo MEC e distribuído nos municípios do Rio Grande do Norte
através da ação das Inspetorias de Ensino de cada região do Estado e pelo
SECERN.
Esse material era composto pelas cartilhas Upa cavalinho
24
e Sarita
25
e
seus amiguinhos, lápis, cadernos, coleções e Atlas. As coleções de Atlas
24
A cartilha Upa Cavalinho! é de autoria de Lourenço Filho e tem ilustrações de Oswaldo
Storni. Sua primeira edição data de 1957, cuja tiragem foi de 1.000.000 de exemplares.
(http://www.ufrgs.br/faced/extensao/memoria/cartilhas_imagens/upa_2.htm).
25
A cartilha Sarita e seus amiguinhos tem como autoras Cecy Cordeiro Thofehrn e Jandira
Cárdias Szechir. No ano de 1961 estava na sua 69ª edição.
(http://www.ufrgs.br/faced/extensao/memoria/cartilhas_imagens/sarita_4.htm).
89
denominadas A biblioteca da professora foram distribuídas apenas com as
regentes de classes diplomadas. As Escolas Normais de 2º ciclo
26
e os
Ginásios Normais também foram incluídos na distribuição de material
27
.
Figura 9: Cartilha Sarita e seus Figura 10: Cartilha Upa, Cavalinho!
Amiginhos Fonte: Faculdade de Educação
Fonte: Faculdade de Educação da UFRGS
da UFRGS
Alguns critérios foram adotados para distribuição do material didático. A
professora Lia Campos levou em consideração, ao remetê-los às escolas, os
seguintes aspectos: número de matrícula das escolas; priorização das Escolas
Públicas do Estado, seguidas pelas Escolas Municipais da capital e pelas
Escolas Municipais do Interior.
Quanto à distribuição dos livros, cartilhas e Atlas, esta era de
responsabilidade do SECERN, setor responsável por administrar os recursos
financeiros e o Setor de Ensino Médio e de Planejamento, dirigido pelo próprio
26
Por Escola Normal de 2º ciclo entende-se aquela que ministrava curso de formação de
professores primários em três anos.(LOURO, 1997).
27
Não encontrei o material citado, o que me impossibilitou de realizar uma análise do mesmo.
Segundo alguns funcionários do Arquivo Público do Rio Grande do Norte, o material da
Secretaria de Educação e Cultura da década de 1950 e parte dos documentos da década de
1960 foram incinerados por uma funcionária da Secretaria de Educação.
90
Secretário, que considerou como critério de recebimento a necessidade das
escolas em utilizar esse material. Para tanto, foi realizado um levantamento
para comprovação desse dado.
A culminância do trabalho de capacitação de professores, realizado pela
professora Lia Campos se deu com a abertura do Curso de Orientação
Pedagógica. Este tinha por objetivo levar novas técnicas de ensino aos
professores e realizar uma experiência com classes de 1º ano primário, tendo
em vista diminuir a repetência. A nova forma de abordar os conteúdos desse
nível deveria considerar as experiências da criança, pois se pensava que desse
modo a aquisição do conhecimento se tornaria algo significativo. Razão que
levaria o educando a deter-se na apreensão dos conteúdos trabalhados.A esse
respeito, a Lei da Educação Estadual de 1958 no seu Artigo 1º fixa que se faz
necessário aos serviços de educação e cultura do Rio Grande do Norte:
Ministrar sempre que possível, educação integral,
considerando o aluno não só em função da estrutura escolar,
como também do lar e de toda a vida social, tendo em vista os
ideais e as tendências democráticas da sociedade moderna.
Realizado na capital deste Estado, o curso atendeu a professores dos
Grupos Escolares e das Escolas Reunidas e Isoladas da Capital. O período de
aulas se estendeu por dois semestres, sendo o primeiro realizado entre os dias
20 de abril e 20 de junho de 1963, e o segundo, compreendendo os dias 20 de
julho a 31 de dezembro do mesmo ano. As aulas ocorriam sempre aos
sábados, no horário da manhã, divididas em quatro períodos de 40 minutos
cada um. As disciplinas ministradas foram: Linguagem na Escola Primária,
Matemática na escola Primária, Estudos Sociais e Ciências Naturais.
91
As aulas que aconteceram no 1º semestre foram divididas em três
postos de funcionamento sob a coordenação de técnicas da Secretaria de
Educação. Tais postos agrupavam um determinado número de professores,
ficando assim organizados:
¾1º posto: Escola de Aplicação – professores de 2ª e 3ª séries primárias.
Coordenadora: Ana Djanira van der Linden.
¾2º posto: Colégio Marista e posteriormente Associação de Professores –
professores de 1ª série. Coordenadora: Maria da Costa Oliveira.
¾3º posto: Instituto Padre Miguelinho – professores de 4ª e 5ª séries.
Coordenadora: Maria Anilda de Menezes.
Finalizando as atividades do CEPE no ano de 1963, foram enviados aos
Grupos Escolares e Escolas Reunidas do Estado, três planos de estudo para
serem desenvolvidos por estas unidades de ensino. Tais planos abordavam os
seguintes assuntos: Dia das Mães, Festas Juninas e Plano de Eletrificação do
Estado.
O tema Eletrificação do Estado surgiu em decorrência de que 1963 foi o
ano em que o governador Aluízio Alves criou, através da Lei 2.721/1961 a
Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte – COSERN,
trazendo energia elétrica de Paulo Afonso/BA para o Rio Grande do Norte. Tal
feito acarretou o desenvolvimento industrial do Estado e, mais tarde, o
crescimento do setor agroindustrial, tendo em vista que no ano de 1960 apenas
14% da população se beneficiava dos serviços elétricos, passando, em 1965,
para 39% da população com acesso a luz elétrica.
92
Lia Campos, sempre atenta à realidade local buscou integrar os
conteúdos escolares com os acontecimentos do Estado que lhe acolheu e que
foi acolhido por ela. Desse modo, esta professora foi traçando o seu percurso
na educação em Natal e no Rio Grande do Norte, seja coordenando cursos,
percorrendo municípios do interior do Estado ou empreendendo reformas
educacionais.
Enfim, a professora Lia Campos imprimiu uma marca na historiografia do
Rio Grande do Norte através de suas ações educativas, sendo por isso
lembrada pelos que foram expectadores e companheiros da sua experiência
em terras potiguares, e ainda pelos que não a conheceram, mas que ouviram
falar da sua prática como diretora do CEPE.
Foto 11: Lia Campos, a terceira da esquerda para a direita, com professoras da
Secretaria de Educação [196_?]
Fonte: Acervo particular de Anilda Menezes
93
Algumas considerações
94
6 – Algumas considerações
Foto 12: Lia Campos momentos antes de uma reunião com a equipe do CEPE [196_?]
Fonte: Acervo particular da família Campos
B
usquei no decorrer desta pesquisa analisar a atuação da
professora Lia Campos nas questões educacionais desta capital e
deste estado, nas décadas de 1950 e 1960. Na tarefa de garimpar os arquivos,
procurei dados acerca da referida professora, da cidade de Natal e dos fatos
95
ocorridos no Rio Grande do Norte, da organização educacional e de que forma
essa professora desempenhou suas funções.
À medida que encontrava indícios dos passos percorridos por Lia
Campos, eu visualizava um universo de acontecimentos entrelaçados:
educação, política. E para que esse cenário se mostrasse mais claro era
preciso que eu o ajustasse na minha visão do período, de modo que nele
houvesse resquícios de vida em atividade. Dessa maneira, consegui
estabelecer conexões entre como se pensava a educação, à época, e de que
forma esse ideário seria concretizado.
Atividade. Penso ser esta a palavra que mais expressa a atuação dessa
professora, uma vez que ao chegar neste Estado empreendeu visitas aos mais
distantes rincões potiguares em busca de promover uma melhoria no
funcionamento das instituições de ensino que permitiriam um vislumbrar de um
futuro.
Tomando conhecimento do seu desempenho, transportei-me, por vezes,
para o período em estudo. Percorri algumas estradas de barro batido,
empoeiradas, circundadas por vegetações secas. Pude ver também o
entusiasmo da população de municípios como Santa Cruz, Caicó, Mossoró,
Macaíba, Currais Novos, Pau dos Ferros, entre outras por ela visitadas.
Em um espaço social que buscava transformações e modernizações, em
consonância com os acontecimentos nacionais, a educação não poderia ficar
relegada a um plano posterior. Surgiu então a necessidade de criar uma
universidade, diminuir os índices de analfabetismo, capacitar e formar docentes
comprometidos com o ato de educar e todas as implicações que este traz.
96
Para realizar tais ações, o governo do Estado estabeleceu convênio com
INEP. O Rio Grande do Norte, a partir daí, procurou manter intercâmbio com
diversos Estados da Federação, a fim de garantir o bom andamento das ações
multiplicadoras de conhecimento para professores leigos. Ainda, através de um
ordenamento legal, a Lei 2.171/1957 fixa as bases da educação elementar e da
formação do Magistério Primário. Com isso, imprimiu na educação do Estado a
consideração pelo aluno de forma integral, não apenas em função da estrutura
escolar, mas também em relação a sua vida doméstica e social. O governo do
Estado, através da força de vontade da professora Lia Campos que, a exemplo
de Anísio Teixeira – o escolanovista – procurou organizar uma escola
condizente com o mundo que o aluno conhecia, respeitando suas
necessidades e dando acesso a livros, recreação, saúde e professores melhor
preparados.
Ao longo dos anos da década de 1960, o poder público também almejou
uma educação sistematizada, de abrangência e de qualidade. Deu
continuidade aos cursos de férias para professores leigos; objetivou ampliar o
conhecimento dos mesmos de acordo com os preceitos escolanovistas,
fiscalizando o cumprimento das ações determinadas pela Secretaria de
Educação e pelo CEPE, ampliou a rede escolar, lançou uma campanha de
alfabetização de adultos, da qual obteve bons resultados.
Inserida nesse contexto como participante ativa das mudanças
educativas, Lia Campos deixou marcada na historiografia norte-rio-grandense e
na memória dos que com ela conviveram, enquanto professora e coordenadora
de um órgão técnico da Secretaria de Educação, as suas ações de
disseminação de ideais e concretização dos mesmos. Fica claro, em sua
97
prática, aspectos que se mostram tão atuais hoje, quanto eram para o tempo
passado. Alicerçado no ensino primário, o trabalho de Lia Campos ressalta a
relevância da formação docente para tal nível de ensino e o modo como os que
nele trabalham podem conduzir suas concepções e fazeres da prática diária.
Como jovem professora iniciante na carreira do magistério e nos escritos
da historiografia da educação, percebo que o “passado é inacabado, no sentido
de que o futuro o utiliza de inúmeras maneiras. Daí a possibilidade, e para nós
exigência, de que cada geração reescreva a ou as histórias daqueles que a
antecederam” (NUNES, 1990, p. 38).
98
Referências
99
Referências
Entrevistas
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