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AS TERRITORIALIDADES FLEXÍVEIS DO
TRANSPORTE ALTERNATIVO NA CIDADE DO RECIFE:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a
Avenida Caxan e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-graduação em Geografia do
Centro de Filosofia e Ciências Humanas
d a U ni v e r si d a d e Fe d e ra l de
Pernambuco, sob a orientação do Prof.
Dr. Cláudio Jorge Moura de Castilho,
como parte dos requisitos para
obtenção do título de Mestre em
Geografia.
Recife, Julho de 2006.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
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As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
SUMÁRIO
RESUMO .............................................................................................................. I
ABSTRACT ........................................................................................................... II
AGRADECIMENTOS ............................................................................................ III
LISTA DE SIGLAS .................................................................................................. IV
LISTAS DE ILUSTRAÇÕES .................................................................................... VI
LISTA DE APÊNDICES .......................................................................................... VIII
LISTA DE ANEXOS ............................................................................................... VIII
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 09
1. APONTAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS.......................................... 14
1.1. Discutindo a Noção de Território no Âmbito de uma Geografia do
Movimento ................................................................................................... 15
1.2. Transporte Alternativo: Despindo-se da Concepção Dualista Transporte
Formal versus Transporte Informal ................................................................ 25
2. TRANSPORTE COLETIVO NO RECIFE: DO BONDE AO ÔNIBUS E A
INSERÇÃO DO ALTERNATIVO ........................................................................ 38
2.1. Transporte Coletivo no Recife: Uma Breve Trajetória ..................................... 39
2.2. Um Esboço do Transporte Alternativo na Cidade do Recife: Os Atores Sócio-
Espaciais e os seus Conflitos ........................................................................... 59
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
3. AS TERRITORIALIDADES FLEXÍVEIS DO TRANSPORTE ALTERNATIVO NA
CIDADE DO RECIFE: OS FLUXOS DAS KOMBIS E VANS ENTRE A AVENIDA
CAXANGÁ E O BAIRRO DE BOA VIAGEM ...................................................... 87
3.1. Desvendando Caminhos entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem 88
3.2. Espacialização das Rotas do Transporte Alternativo ....................................... 106
3.3. Territorialização de Práticas de Organização
e Atuação do Transporte
Alternativo ................................................................................................... 139
CONCLUSÕES ..................................................................................................... 153
REFERÊNCIAS E BIBLIOGRAFIA ........................................................................... 162
APÊNDICES .......................................................................................................... 170
ANEXOS ............................................................................................................... 175
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
I
RESUMO
Nos anos de 1990, intensificam-se os fluxos de transporte de passageiros realizados
através de veículos de pequeno porte (kombis, vans, motocicletas) nas grandes e
médias cidades brasileiras. Tal atividade suscitou polêmicas na sociedade diante das
ambivalências entre o atendimento a uma demanda reprimida e os impactos gerados
pela circulação dessas micro-unidades de transporte no espaço urbano. As análises
empreendidas sobre a temática tenderam a abordá-la na escala do país ou da cidade,
não privilegiando suas peculiaridades nos eixos urbanos. Emerge, assim, a necessidade
de apreender o fenômeno em escala local, partindo do pressuposto de que a
“apropriação” destes eixos se apresentava condicionada pelas especificidades dos
fluxos de passageiros e pelos diferentes usos e ocupações que caracterizavam a
dinâmica e o funcionamento desta atividade, cujos atores esboçavam suas
territorialidades ao atuarem nas “brechas” do transporte coletivo convencional. Nesta
assertiva, o transporte realizado por kombis e vans, no âmbito deste trabalho, é
apreendido enquanto uma alternativa aos deslocamentos da população diante da crise
do chamado transporte formal ou regulamentado e, em certa medida, uma alternativa
de emprego face ao contexto de crise cio-econômica. No anseio de apreender esta
realidade, analisa-se as territorialidades flexíveis do transporte alternativo, através dos
fluxos das kombis e vans entre a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem, áreas que
se caracterizam como pólos de produção e atração de intensos fluxos de pessoas na
cidade do Recife. A partir da observação direta, realizada através das viagens ao longo
das rotas das kombis e vans, e das impressões colhidas acerca desta atividade na
perspectiva de seus operadores e usuários, pôde-se apreender a forma como os atores
do transporte alternativo (motoristas e cobradores) esboçavam suas territorialidades,
estabelecendo estrategicamente suas rotas, sobrepondo-as, em parte, aos trajetos dos
ônibus e condicionando-as aos fluxos de passageiros. Atuando segundo uma lógica de
mercado, esses atores ofereciam atrativos aos usuários, sobretudo maior rapidez aos
deslocamentos, visando a partir do desenvolvendo destas práticas garantir a
permanência desta forma de transporte na cidade.
Palavras-chaves: Transporte, Transporte Alternativo e Territorialidades Flexíveis.
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
II
ABSTRACT
In the years of 1990, the flows of transport of passengers realized through small
transport vehicles (kombis, vans, motorcycles) in the great and medium Brazilian cities
is intensified. Such activity had excited controversies in the society ahead the
ambivalences between the attendance to a repressed demand and the impacts
produced by the movement of these micron-units of transport in the urban space. The
analyses undertaken on the thematic had tended to approach it in the scale of the
country or the city, not privileging its peculiarities in the urban axis. It emerges, thus,
the necessity to apprehend the phenomenon in local scale, starting from the
presupposition that the ”appropriation” of these axis presented itself conditioned by the
specifities of the passengers’ flows and by the different uses and occupations that
characterized the dynamics and the functioning of this activity, whose actors sketched
its territorialities acting in breaches of the conventional collective transport. In this
assertive, the transport did by kombis and vans, in the scope of this research, is learned
as an alternative to the population displacements as a result of the regular or formal
transport crisis, as it is called, and, in certain measure, a job alternative face to the
context of social-economic crisis. In the yearning to apprehend this reality, it is
analyzed the flexible territorialities of the alternative transport, through the kombis and
vans flows between the Caxangá Avenue and the suburb of Boa Viagem, areas that are
characterized as production and attraction poles of intense people flows in the city of
Recife. From the direct observation, realized through trips along the kombis and vans
routes, and the catched impressions about this activity in the perspective of its operators
and users, it was possible to apprehend the way the actors of the alternative transport
(drivers and collectors) sketched its territorialities, establishing, strategically, their
routes, overlapping to buses courses and conditioning them it the passengers flows.
Acting according to a market logic, these actors offered attractive to the users, over all
bigger rapidity to the displacements, aiming at from development of these practices to
guarantee the permanence of this transport form in the city.
Key Words: Transport, Alternative Transport and Flexible Territorialities.
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
III
AGRADECIMENTOS
No processo de desenvolvimento de um trabalho acadêmico muitos são aqueles
que direta ou indiretamente contribuem em diferentes escalas e momentos.
À minha mãe, Cecília, e aos meus irmãos o meu agradecimento pelo afeto e
estímulos constantes a mim dispensados rumo a esta conquista. A Clélio Santos, meu
companheiro, sou grata pela contribuição intelectual através das inúmeras discussões
durante todo o processo de elaboração desta pesquisa e pela participação na
elaboração da parte iconográfica do trabalho. A ele agradeço também o carinho e a
paciência, mostrando-se sempre disposto a me apoiar, sobretudo nos momentos mais
ansiosos.
Meus agradecimentos a Cláudio J. M. de Castilho, meu professor e orientador,
pela contribuição ao meu crescimento acadêmico durante as orientações para a
realização desta pesquisa. Ao longo desse processo de aprendizado, reservo grande
admiração pela professora Edvânia T. A. Gomes, agradecendo suas valiosas sugestões
nas etapas preliminares de desenvolvimento deste trabalho. Junto à professora Edvânia
pude dar início às minhas experiências no âmbito da pesquisa, em 1997, quando, sob
sua tutoria, integrei o Programa Especial de Treinamento PET, no Departamento de
Ciências Geográficas, tornando-se um referencial para a minha formação como
pesquisadora. Neste ensejo, gostaria de registrar também o meu reconhecimento aos
demais professores, seja da Graduação ou do Mestrado em Geografia, aos quais minha
formação acadêmica é devedora.
Por fim, gostaria de agradecer aos técnicos e funcionários das diversas
instituições pela atenção e disponibilidade em fornecer-me documentos e informações
necessárias, subsidiando a análise da questão proposta, e registrar meus
agradecimentos também a todos aqueles que torceram e me incentivaram no
transcorrer das etapas de elaboração deste trabalho.
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IV
LISTA DE SIGLAS
AMUPE Associação Municipalista de Pernambuco
ANTP
Associação Nacional dos Transporte Públicos
BPTran
Batalhão de Policiamento de Trânsito
CEAGEPE Companhia de Abastecimento e Armazéns Gerais do Estado de
Pernambuco
CEASA
Central de Abastecimento Sociedade Anônima
CEFET/PE
Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco
CTU/Recife Companhia de Transportes Urbanos do Recife
CTTU/Recife Companhia de Trânsito e Transporte Urbano do Recife
DER/PE Departamento de Estradas de Rodagem de Pernambuco
Detran Departamento Estadual de Trânsito
EMTU Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos
EBTU Empresa Brasileira de Transportes Urbanos
FIDEM Fundação de Desenvolvimento Municipal
IBOPE Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística
IBRATEC Instituto Brasileiro de Tecnologia
MTA Movimento do Transporte Alternativo
MTL Movimento Terra, Trabalho e Liberdade
PCR Prefeitura da Cidade do Recife
OTAN Organização do Tratado do Atlântico Norte
PETROBRÁS Petróleo Brasileiro S/A
RMR Região Metropolitana do Recife
RPA Região Político-Administrativa
SABE Sistema Automático de Bilhetagem Eletrônica
SEI Sistema Estrutural Integrado
SindRecife Sindicato do Transporte Alternativo do Recife
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V
Sindkombi Sindicato dos Condutores Autônomos em Transportes
Alternativos de Passageiros do Estado de Pernambuco.
SINPRF/PE Sindicato dos Policiais Rodoviários Federais do Estado de
Pernambuco
STCP/Recife Serviço de Transporte Complementar de Passageiros do Recife
STCM Sistema de Transporte Complementar Metropolitano
STM/Recife Sistema de Transporte Municipal do Recife
STPP Sistema de Transporte Público de Passageiros
SUDENE Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste
TIP Terminal Integrado de Passageiros
UFPE Universidade Federal de Pernambuco
ZEIS Zonas Especiais de Interesse Social
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VI
LISTAS DE ILUSTRAÇÕES
Mapas
01 Ambientes Naturais do Recife ..................................................................... 40
02 Evolução da Ocupação Extensiva da Cidade do Recife ............................... 49
03 Mancha Urbana e Eixos Viários da Região Metropolitana do Recife ............ 51
04 Divisão Político-Administrativa da Região Metropolitana do Recife ............ 53
05 Trajetos das Kombis e Vans ao Longo dos Bairros entre a Avenida Caxangá
e o Bairro de Boa Viagem ............................................................................ 89
06 Divisão do Recife em Regiões Político-Administrativas ............................... 90
07 Itinerário da Linha CDU/Boa Viagem/Caxangá na Cidade do Recife ........... 108
08 Itinerário da Linha CDU/Caxangá/Boa Viagem na Cidade do Recife ........... 109
09 Itinerários da Linha
Shopping
/CDU na Cidade do Recife ............................. 110
10 Espacialização da Rota Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem .............................. 114
11 Espacialização da Rota Caxangá/Aeropoprto/Boa Viagem ........................... 117
12 Espacialização da Rota
Shopping
/ Caxangá ................................................. 120
13 Espacialização das Paradas do Transporte Alternativo em Bairros da RPA 4 127
14 Espacialização das Paradas do Transporte Alternativo em Bairros da RPA 5 128
15 Espacialização das Paradas do Transporte Alternativo em Bairros da RPA 6 130
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VII
Figuras
01 Planta do Recife - 1870................................................................................ 44
02 Pontos de Bloqueio nos Acessos ao Centro Expandido do Recife ................ 75
03 Bloqueios e Pontos de Controle para Impedir a Circulação de Kombis e
Vans na Cidade do Recife............................................................................ 83
04 Locais de Lotação de Veículos nas Imediações da Avenida Caxangá ........... 94
Quadros
01 Linhas do Serviço de Transporte Complementar de Passageiros do Recife .. 70
02 Rede Básica Proposta para o Transporte Complementar na Região
Metropolitana do Recife .............................................................................. 71
Fotos
01 Protesto dos kombeiros na Av. Mal. Mascarenhas de Morais no dia 02 de
junho de 2003 ............................................................................................. 72
02 Protesto dos kombeiros no centro da cidade do Recife no dia 11 de junho
de 2003. No conflito, o presidente do SindRecife chegou a rolar no chão
com um soldado ......................................................................................... 73
03 Protesto dos kombeiros no dia 15 de julho de 2003 no centro do Recife ..... 78
04 Kombeiros em protesto, no dia 15 de julho de 2003, na Avenida Conde da
Boa Vista ..................................................................................................... 78
05 Kombis ao longo da Avenida Prof. Moraes Rego ......................................... 107
06 Concentração de kombis na Rua Emiliano Braga. Ponto de lotação dos
veículos próximo à Avenida Caxangá .......................................................... 112
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Diana Cecília de Souza
VIII
07 Terminal de ônibus da linha
Shopping
/CDU na Rua Emiliano Braga, depois
que as kombis deixaram de circular entre a Av. Caxangá e o bairro de Boa
Viagem ........................................................................................................ 112
08 Parada do transporte alternativo na entrada da Rua Jack Aires, via de
acesso ao
Shopping Center
Recife ............................................................... 132
09 Vista da parada na entrada da Rua Jack Aires a partir da Avenida
Domingos Ferreira ....................................................................................... 132
10 Ao fundo, desembarque de passageiros pelas imediações do Aeroporto, em
frente à Rua Barão de Souza Leão ............................................................... 133
11 Parada das kombis e vans no cruzamento da Rua Barão de Souza Leão
com a Av. Visconde de Jequitinhonha ......................................................... 133
12
Desembarque de passageiros embaixo do viaduto da BR 101, próximo à
Avenida Caxangá ........................................................................................ 136
13 Ponto de lotação das kombis pelas imediações da Avenida Caxangá .......... 143
14 Ponto de lotação das kombis na Rua Visconde de Jequitinhonha, próximo
ao
Shopping Center
Recife .......................................................................... 143
LISTA DE APÊNDICES
01 Modelo de Formulário para Usuários .......................................................... 171
02 Modelo de Entrevista para os Operadores do Transporte Alternativo ........... 174
LISTA DE ANEXOS
01 Folheto ........................................................................................................ 176
02 Verso do Folheto do Anexo 1 ...................................................................... 177
03 Sistema de Transporte Complementar de Passageiros do Recife .................. 178
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9
INTRODUÇÃO
Durante a década de 1990, especialmente a partir de 1995, intensifica-se
significativamente, nas grandes e médias cidades brasileiras, o transporte de
passageiros realizado através de veículos de pequeno porte: kombis (ou peruas), vans,
bestas, topics, motocicletas (moto-táxis) e até mesmo automóveis particulares.
A expansão desenfreada dessas micro-unidades de transporte gerou muitas
polêmicas na sociedade, dentro dos órgãos públicos, das empresas de transporte
coletivo por ônibus e no âmbito acadêmico. Em geral, esta atividade foi encarada
como um delito, sobretudo por não se enquadrar nas normas regulares do transporte
coletivo convencional, exercendo junto a este uma concorrência acirrada, e por
ocasionar uma série de problemas nos centros urbanos.
Decerto, a proliferação desse tipo de transporte gerou sérios problemas nas
cidades tais como a insegurança no transporte de passageiros, o incremento ao
congestionamento nas principais vias do tráfego, a exploração do trabalho de menores,
a utilização de mão-de-obra sem registro e sem qualificação etc. Por outro lado, esta
atividade passou a oferecer algumas vantagens aos deslocamentos urbanos como
rapidez, freqüência, flexibilidade na definição de itinerários, tarifas, paradas etc,
oferecendo uma alternativa de circulação no espaço urbano a uma demanda que hoje
é bastante diversificada e que necessita de inovação nos serviços de transportes.
Com efeito, o uso deste transporte passou a representar uma alternativa aos
deslocamentos das pessoas, diante da crise do chamado transporte formal ou
regulamentado e, ao mesmo tempo uma alternativa de emprego, uma vez que tal
atividade se insere num contexto de crise sócio-econômica, cujos aspectos mais
visíveis no mercado de trabalho são as elevadas taxas de desemprego e o surgimento e
intensificação de diversas atividades denominadas de “informais”, que passam a
ampliar as estratégias de sobrevivência de muitos indivíduos.
A exemplo de outras áreas metropolitanas, esta atividade se intensificou em toda
a Região Metropolitana do Recife - RMR, chegando a apresentar cerca de 7.000
veículos em circulação, cuja maior atuação se dava na cidade do Recife. Assistiu-se, na
última década, a um crescimento extraordinário de vans e, predominantemente, de
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10
kombis, que passaram a ocupar os principais eixos viários da capital e demais
municípios metropolitanos, estendendo-se para além destes limites.
No âmbito metropolitano, a expansão deste transporte ocorreu sem controle por
parte do órgão gestor do sistema de transporte intermunicipal na Região Metropolitana
do Recife - a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos EMTU -, a qual, na
verdade, ignorou a atividade e, na prática, adotou posturas repressivas para coibi-la,
sem, no entanto, solucionar a questão.
Na esfera municipal, algumas prefeituras autorizaram muitas kombis a operarem
como veículos de aluguel dentro dos limites territoriais do município. Entretanto, os
motoristas de kombis ultrapassavam estes limites, passando a ocupar os principais
corredores do tráfego da RMR, percorrendo não o espaço intramunicipal, como
também o intermunicipal.
Decorridos mais de dez anos, o transporte por kombis e vans se incorporou à
dinâmica metropolitana, sem que houvesse propostas efetivas do Poder Público, tanto
Municipal quanto Estadual, que visassem definir o papel desta atividade nas cidades.
Somente em 2003, a Prefeitura do Recife, juntamente com o Governo do Estado,
executam um conjunto de medidas para implantar um sistema complementar de
transporte através de veículos de pequeno porte na cidade, instituindo o Serviço de
Transporte Complementar de Passageiros do Recife STCP/Recife. Em paralelo, a
EMTU também institui o Sistema de Transporte Complementar Metropolitano – STCM.
No bojo das discussões sobre a temática aqui em análise, verifica-se a existência
de estudos realizados sobretudo pelas associações das empresas de transportes e
algumas análises feitas pelos órgãos públicos. No âmbito acadêmico, destaca-se uma
ampla literatura sobre a temática no campo da Engenharia dos Transportes, cujas
análises têm predominantemente uma característica mais funcional do transporte, com
abordagens que privilegiam aspectos como o custo, a regulamentação etc. Em outras
áreas acadêmicas e, em especial, na Geografia, o referencial bibliográfico se restringe a
uma reduzida quantidade de trabalhos acadêmicos, constatando-se uma incipiente
contribuição relacionada à temática
1
.
1
Dentre estes, destaque-se, no âmbito da Geografia, O transporte informal em Uberlândia: forma de
atuação das peruas e vans” – (BERNARDINO - 2000) e, na área de Economia, Uma caracterização do
mercado do transporte alternativo e sua importância cio-econômica na Região Metropolitana do
Recife“ (CAVALCANTI - 1997).
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Tanto na esfera das associações e dos órgãos públicos quanto no mundo
acadêmico, em geral as análises tenderam a abordar as características deste transporte
na escala do país ou da cidade, não privilegiando as peculiaridades desta atividade em
cada área ou em cada eixo urbano onde atores do transporte alternativo esboçavam
suas territorialidades ao se “apropriarem” desses espaços. Neste sentido, questiona-se:
Em que medida a “apropriação” de eixos urbanos pelo transporte alternativo refletia
e/ou se diferenciava dos aspectos que caracterizavam esta atividade na escala da
cidade? Dito isto, parte-se do pressuposto de que a “apropriação” dos eixos urbanos na
escala local era condicionada pelas especificidades dos fluxos de passageiros e pelos
diferentes usos e ocupações que caracterizavam a dinâmica e o funcionamento do
transporte alternativo e a forma com que seus atores esboçavam suas territorialidades,
atuando nas “brechas” deixadas pelo transporte coletivo convencional.
A partir desta compreensão, visando dar uma maior visibilidade à atividade na
escala local, este trabalho tem como objetivo central a análise das territorialidades
flexíveis do transporte alternativo, buscando entender como se esboçavam a dinâmica
e o funcionamento desta atividade, através dos fluxos das kombis e vans ao longo de
eixos urbanos compreendidos entre a Avenida Caxangá, a partir do viaduto da BR-101,
e o bairro de Boa Viagem, no período anterior à implantação do STCP/Recife.
A importância da escolha destes eixos como objeto de estudo pauta-se no fato
destas áreas se destacarem no contexto da cidade: a primeira, as imediações do viaduto
da BR 101 com a Avenida Caxangá, caracteriza-se como um local de convergência
de fluxos advindos de municípios da Zona da Mata e do Agreste, de municípios
metropolitanos situados a oeste da cidade, de bairros adjacentes e da BR –101; e a
segunda, o bairro de Boa Viagem, configura-se como um pólo de atração da cidade,
que comporta um conjunto de comércios e serviços diversificados, onde se destacam
grandes equipamentos de atração como o
Shopping Center
Recife e o Aeroporto
Internacional dos Guararapes, estabelecendo-se entre estas duas áreas da cidade um
intenso e constante fluxo de pessoas. Entre estas duas áreas da cidade, pôde-se
observar uma expressiva concentração de kombis e vans, cuja organização nas áreas
de lotação, a quantidade de veículos e operadores caracterizavam a atividade ali
existente como significativa no contexto da cidade.
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12
No anseio de apreender esta realidade, a pesquisa pautou-se no levantamento
bibliográfico e de dados acerca da temática, bem como no acompanhamento
sistemático de reportagens veiculadas nos principais jornais da cidade a respeito do
transporte alternativo. Com o intuito de identificar as territorialidades flexíveis do
transporte alternativo entre a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem, organizou-se
também pesquisa de campo fundamentada na observação direta, realizada a partir de
deslocamentos ao longo das rotas das kombis e vans em diferentes dias e horários da
semana, escolhidos aleatoriamente. A pesquisa de campo também objetivou colher
impressões de alguns usuários sobre a atividade e ainda obter informações acerca da
organização e atuação deste transporte, tanto através destes usuários quanto pelos
indivíduos (cobradores e motoristas) envolvidos na atividade.
Neste sentido, foram aplicados cerca de 30 formulários a usuários de kombis e
vans (Apêndice 1, p. 171), distribuídos aleatoriamente nos pontos de lotação dos
veículos e em algumas paradas de ônibus ao longo dos trajetos. Estes usuários se
caracterizaram como pessoas de idades variadas entre 20 e 45 anos, de ocupações
diversas e com grau de escolaridade predominantemente de nível médio. Quanto aos
operadores, realizou-se, junto a cobradores e motoristas, em torno de 20 entrevistas
(Apêndice 2, p. 174) com questões abertas nos pontos de lotação, além de conversas
informais nestes locais de lotação e no transcorrer das viagens nas rotas do transporte
alternativo. Saliente-se que a aplicação destes formulários e entrevistas junto aos
usuários e operadores não teve uma expectativa quantitativa, não se delimitando,
portanto, uma amostra ao universo considerado.
Esta dissertação se estrutura em três capítulos, discutindo-se inicialmente, no
primeiro capítulo, o conceito de território e as relações sócio-espaciais a ele associadas
as territorialidades, privilegiando-as para a análise do objeto em estudo e, em
seguida, busca-se despir-se da concepção dualista – transporte formal
versus
informal,
encarando o transporte de passageiros por veículos de pequeno porte como uma
alternativa aos deslocamentos da população, bem como uma alternativa de emprego
diante do quadro de crise sócio-econômica das grandes cidades.
No segundo capítulo do trabalho, procura-se traçar uma breve trajetória do
transporte coletivo em Recife, para depois contextualizar a inserção do transporte
alternativo na cidade e as propostas implementadas pelos Governos no sentido de
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controlar a atividade no âmbito da capital e na perspectiva do transporte
intermunicipal.
Por fim, no terceiro capítulo, visa-se inicialmente desvendar os caminhos entre a
Avenida Caxangá, nas imediações do viaduto da BR-101, e o bairro de Boa Viagem,
caracterizando-os a partir dos usos e ocupações que os permeiam e identificando os
potenciais fluxos no transcorrer dos trajetos. Posteriormente, busca-se espacializar as
rotas do transporte alternativo ao longo dos eixos viários, bem como traçar outras
características da organização e da atuação dos atores do transporte alternativo,
permeando, nestas duas últimas partes do terceiro capítulo, as opiniões dos usuários
acerca das condições do serviço prestado.
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CAPÍTULO 1
APONTAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
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1. APONTAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
1.1 – Discutindo a Noção de Território no Âmbito de uma Geografia do Movimento
Face ao objetivo de estudar as territorialidades flexíveis do transporte alternativo,
faz-se necessário contemplar categorias e conceitos que forneçam o aporte teórico-
metodológico necessário à análise do objeto em estudo. Neste sentido, dentre as
categorias-chave da Geografia que possibilitam a análise da sociedade, privilegiou-se a
categoria território, bem como as relações espaciais a esta associadas, as
territorialidades.
A expressão território sempre foi utilizada no âmbito das ciências naturais e
sociais. Nas primeiras, o território seria a área de influência e dominação de uma
espécie animal que exerce o domínio da mesma, domínio este que se dá de forma mais
intensa no centro, perdendo intensidade à medida que se aproxima da periferia, na
qual a referida espécie passa a concorrer com domínios de outras espécies (BRUNET
apud ANDRADE, 1995). Nas ciências sociais, a expressão território remonta ao século
XIX, sobretudo a partir das obras de Friedrick Ratzel, que a associava à organização,
gestão e controle do território nacional pelo Estado.
Etimologicamente a palavra território é oriunda do latim territorium, e significa
“pedaço de terra apropriado”. Ao vocábulo se associam três idéias: dominação, que
compreende a expressão de força e/ou poder dos indivíduos ou grupos sociais, área
dominada, ou seja, recorte espacial onde se projeta a dominação, e limites, que podem
ser materializados ou imaginários.
A apropriação não se vincula necessariamente à propriedade da terra, podendo
assumir um duplo significado, conforme enfatiza Corrêa (1996, p. 251): “De um lado
associa-se ao controle de fato, efetivo, por vezes legitimado, por parte de instituições
ou grupos sobre um dado segmento do espaço.” Este conceito de território encontra-se
vinculado à Geografia Política e à Geopolítica. Por outro lado, esta apropriação pode
assumir uma dimensão afetiva, derivada das práticas espacializadas por grupos
distintos definidos segundo renda, raça, religião, sexo, idade ou outros atributos. Neste
sentido, a apropriação passa a associar-se à identidade de grupos e à afetividade
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espacial. O território, nesta perspectiva, está atrelado a uma geografia que privilegia os
sentimentos e simbolismos atribuídos aos lugares, conceito que tem sido considerado
pelos geógrafos humanistas.
Corrêa ressalta ainda que, a primeira e a segunda acepções podem combinar-se,
definindo territórios plenamente apropriados, de direito, de fato e afetivamente. “O
território é o espaço revestido da dimensão política, afetiva ou ambas.” (CORRÊA,
1996, p. 251)
Importa destacar que, território e espaço são termos com significados distintos.
O conceito de território está subordinado ao conceito de espaço, que é mais
abrangente. A expressão espaço é dotada de múltiplos significados, sendo utilizada
tanto pelo senso comum como pelas diferentes ciências. No concernente à Geografia,
a noção de espaço é objeto de discussões entre as diferentes correntes do pensamento
geográfico, possuindo, assim, múltiplas acepções.
No âmbito desses debates, a partir da compreensão do espaço em sua
totalidade
1
, Milton Santos (1997, p. 51) afirma que “O espaço é formado por um
conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e
sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único no
qual a história se dá”. Segundo este autor, os objetos representam tudo o que existe na
superfície terrestre, toda a herança da história natural e todo resultado da ação humana
que se objetivou, ao passo que as ações são resultantes de necessidades, naturais ou
criadas, que conduzem os homens a criar e utilizar os objetos. A dinâmica e a
transformação do espaço se dão a partir da interação dos sistemas de objetos, que
condicionam a forma como se dão as ações, com os sistemas de ações, que criam
objetos novos ou se realizam sobre objetos preexistentes.
A partir desta concepção de espaço, retorna-se ao conceito de território,
afirmando que este último inclui uma relação de poder sobre o primeiro. O espaço,
portanto, pré-existe ao território, sendo a sua necessária base material.
1
A noção de totalidade, no âmbito da filosofia clássica, remete-se à idéia de que todas as coisas
presentes no Universo formam uma unidade. Cada coisa nada mais é que parte da unidade, do todo. No
entanto, a totalidade não é uma simples soma das partes, pois as partes que a formam não bastam para
explicá-la. Ao contrário, é a totalidade que explica as partes. Quando a sociedade muda, o conjunto de
suas funções muda em quantidade e em qualidade.
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Souza (1995, p. 111) ressalta que “Todo espaço definido e delimitado por e a
partir de relações de poder é um território, do quarteirão aterrorizado por uma gangue
de jovens até o bloco constituído pelos países-membros da OTAN.” Nesta perspectiva,
esse autor enfatiza que o conceito de território deve abarcar infinitamente mais que o
território do Estado-Nação.
A acepção de território enquanto Estado-Nação está vinculada à abordagem da
Geografia Política clássica, na qual o território surge como uma noção fundamental:
[...] expressão concreta das unidades políticas no espaço, o território define a
existência física da entidade jurídica, administrativa e política que é o Estado.
É o espaço próprio a um Estado, área onde exerce sua soberania, e implica
uma noção de limite, pois que o seu tamanho é conseqüência da relação de
poder entre Estados (BECKER, 1983, p. 01).
O conceito de território sempre esteve associado ao recorte do Estado Nacional,
no âmbito da Geografia Política clássica, cujo primeiro grande autor foi Ratzel. Este
autor formulou uma concepção geográfica que correspondia aos anseios expansionistas
da Alemanha. Tal como descreve Andrade (1992), Ratzel buscou explicar a evolução
da humanidade a partir dos postulados de Darwin, encarando o homem como uma
espécie animal e não como um elemento social. Baseando-se nos princípios de que a
evolução se processava através da luta entre as várias espécies, vencendo as mais
capazes de se adaptarem ao meio natural, Ratzel formulou leis gerais que explicassem
as relações entre o homem e o meio natural, ressaltando que as diferenças existentes
entre povos e civilizações resultaram deste relacionamento através dos tempos.
Assim, no âmbito de sua Geografia Política clássica, Ratzel passou a estudar o
Estado, considerado-o como um instrumento mediante o qual a sociedade se organiza
e domina o território. Desta forma, a dominação do território caracteriza o Estado, cuja
importância dependeria da extensão e da situação do território ocupado. O progresso e
a decadência de um Estado dependeriam de sua capacidade de expansão ou de
redução do território dominado. Neste sentido, justificam-se as guerras de conquista e a
dominação dos povos fracos pelos fortes. A partir dessas proposições, Ratzel
desenvolveu o conceito de espaço vital, que compreenderia a relação entre a
população de um Estado e a capacidade de utilização do seu território.
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Nas formulações de Ratzel, a concepção de território sempre esteve associada,
no âmbito de um discurso evidentemente ideológico, ao recorte do “território
nacional”, ao Estado-Nação. A Geografia Política clássica quase sempre esteve
dominada por uma orientação em direção ao Estado enquanto o poder por excelência,
estando mesmo comprometida com discursos legitimadores do mesmo (SOUZA, 1995).
Tal característica permitiu a Raffestin (1980) identificá-la como uma “Geografia do
Estado”.
Raffestin (1980), ao fazer uma crítica à Geografia Política clássica, sobretudo às
formulações de Ratzel, aponta limites nessas formulações no que concerne ao
entendimento de poder. De acordo com o autor, Ratzel elaborou sua teoria (sobre
Estado, Território e Espaço Vital) como se o Estado fosse o único núcleo de poder e,
que, assim, concentrava todo o poder. Esta concepção limita a capacidade de análise
geográfica, uma vez que se baseia numa Geografia unidimensional, não considerando
os múltiplos poderes que se manifestam nas estratégias regionais ou locais.
Para Souza (1995), Ratzel identificava o território ao substrato material,
restringindo a acepção ao “solo pátrio”. Também ao levantar questões sobre alguns
pontos da análise de Raffestin, Souza ressalta que, em que pese a sua crítica à
unidimensionalidade do poder na Geografia Política clássica, Raffestin não chega a
romper com a velha identificação do território com o substrato material, mostrando que
a diferença entre Raffestin e Ratzel é que o primeiro não se limita ao “solo pátrio”.
Decerto, o território pode ser entendido à escala nacional e em associação com
o Estado como grande gestor. Ressalte-se, entretanto, que, diante do processo de
globalização ele se torna um gestor cada vez menos privilegiado. Todavia, o território
não precisa necessariamente vincular-se a esta escala ou associar-se à figura do Estado.
Neste sentido, concorda-se com Souza (1995) quando este enfatiza que
territórios existem e são construídos (e desconstruídos) nas mais diversas escalas, dentro
de escalas temporais as mais diferentes (séculos, décadas, anos, meses ou dias);
territórios podem ter um caráter permanente, mas também podem ter uma existência
periódica, clica. É a esta riqueza de situações, dentro de uma perspectiva de
flexibilização da visão do que seja o território, que o autor designou de territorialidades
flexíveis, afirmando que os territórios são antes relações sociais projetadas no espaço
que espaços concretos.
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[...] o território
não
é o substrato, o espaço social em si, mas sim um campo de
forças,
as relações de poder espacialmente delimitadas e operando, destarte,
sobre um substrato referencial
(SOUZA, 1995, p. 97).
Desta forma, existem diversos territórios recobrindo a superfície terrestre,
entretanto não uma exclusividade de um poder em relação a um dado território,
como se territórios fossem entidades que se justapõem contiguamente, conforme
estivera implícito na abordagem da Geografia Política clássica, que considerava o
território como o espaço concreto em si. Quase sempre uma superposição de vários
territórios, que podem ter formas variadas e limites não-coincidentes, bem como
podem existir contradições entre as diversas territorialidades devido às contradições e
aos atritos entre os respectivos poderes (SOUZA, 1995).
Ao se analisar uma territorialidade flexível, a exemplo de um lugar ocupado
numa cidade por determinados segmentos marginalizados, faz-se necessário lançar
mão do domínio como influência, o que permite o entrecruzamento de diferentes
domínios em um mesmo substrato material referencial e não como apropriação efetiva
do território.
Neste sentido, Souza (1995) destaca, dentre os variados exemplos de tais
territorialidades flexíveis, os territórios da prostituição feminina ou masculina
(prostitutas, travestis, michês), onde os “outros” tanto podem estar no mundo exterior
em geral (de onde vêm os clientes em potencial) quanto, em muitos casos, em um
grupo concorrente, com os quais se pode entrar em conflito. Estes territórios são
“apropriados” pelo respectivo grupo apenas à noite, uma vez que, durante o dia, são
tomados por transeuntes que trabalham ou fazem compras em estabelecimentos
comerciais, ou por moradores que residem nas adjacências. Tal exemplo mostra o
caráter cíclico deste tipo de territorialização, com uma alternância habitual dos usos
diurno e noturno dos mesmos espaços.
Os territórios da prostituição podem ser também móveis, que seus limites
tendem a ser instáveis, apresentando grande mobilidade. Esta é, do mesmo modo, uma
característica de outros grupos sociais como gangues de rua, formadas por adolescentes
e jovens.
Destaque-se ainda os territórios do tráfico de drogas, que se apresentam
altamente pulverizados. Tal como relata Souza (1995), a territorialidade de cada facção
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ou organização do tráfico de drogas, apresenta-se como uma rede complexa, unindo
nós irmanados pelo pertencimento a um mesmo comando. Entretanto, no espaço
concreto, estes nós de uma rede se intercalam com nós de outras redes, todas
superpostas ao mesmo espaço e disputando a mesma área de influência econômica, o
mercado consumidor, formando uma malha bastante complexa.
A territorialidade, enquanto relações sócio-espaciais associadas ao território:
[...] refere-se ao conjunto de práticas e suas expressões materiais e simbólicas
capazes de garantirem a apropriação e permanência de um dado território por
um determinado agente social, o Estado, os diferentes grupos sociais e as
empresas (CORRÊA, 1996, p. 251-252).
Estes agentes, produtores e consumidores do espaço da cidade, desenvolvem um
conjunto de práticas espaciais
2
que visam a permanência de seus territórios. E é no
espaço urbano da cidade onde grande parte da população se concentra atualmente e
desenvolve um conjunto de práticas espaciais cada vez mais complexo. Este espaço é
um substrato referencial, onde diversos agentes produzem, consomem, lutam e vivem,
expressando, assim, múltiplas territorialidades, com temporalidades distintas, em
escalas as mais diversas.
De acordo com Corrêa (1995b, p. 09) o espaço urbano é “[...] fragmentado e
articulado, reflexo e condicionante social, um conjunto de símbolos e campo de lutas.”
O espaço urbano é constituído por um complexo conjunto de diferentes usos da terra
justapostos entre si, que definem áreas como o centro da cidade, áreas industriais,
residenciais, de lazer e, entre outras, aquelas reservadas para futura expansão,
caracterizando-se, assim, como um espaço fragmentado (CORRÊA, 1995b). Esta
justaposição de diferentes usos da terra representa diferentes formas de apropriação,
isto é, de territorialização por parte de distintos grupos sociais, que se encontram
vinculados a estes usos direta e indiretamente.
Cada um destes usos da terra pode ser visto como uma forma espacial onde se
realizam uma ou mais funções vinculadas aos processos sociais. Assim, a organização
2
Segundo Corrêa (1995a, p. 35), as práticas espaciais compreendem ”[...] um conjunto de ações
espacialmente localizadas que impactam diretamente sobre o espaço, alterando-o no todo ou em parte
ou preservando-o em suas formas e interações espaciais.”
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espacial
3
é resultado de processos sociais, que tornam o espaço urbano um reflexo da
sociedade, apresentando-se fortemente dividido em áreas residenciais segregadas, as
quais refletem a complexa estrutura social em classes. Desta forma, este espaço
simbólico, que envolve as crenças, valores e mitos, projetados, em parte, nas formas
espaciais, expressa-se profundamente desigual, tornando-se, por isso, o palco e o
objeto das lutas sociais que visam obter o direito à cidade, um campo de lutas onde os
diversos atores que nele vivem, esboçam diversas territorialidades, até mesmo aquelas
exercidas por grupos marginais a partir de atividades tidas como ilícitas, a exemplo dos
territórios da prostituição feminina ou masculina e do tráfico de drogas, como também
do transporte de passageiros realizado por meio de veículos de pequeno porte, cujos
operadores passaram a se “apropriar” dos principais eixos viários das cidades, não se
enquadrando nas normas regulares do transporte coletivo convencional.
O espaço não é reflexo de ações que se realizam no presente, mas também
daquelas que se realizaram no passado. As formas espaciais do passado são herdadas
pela atual organização espacial. Neste sentido, ele é também um condicionante social,
visto que, as obras fixadas pelo homem, as formas espaciais, desempenham um
importante papel na reprodução das condições de produção e das relações de
produção. A estas formas espaciais herdadas do passado e cristalizadas no presente,
Milton Santos (1978) denomina de “rugosidades”.
A partir de relações sócio-espaciais, o espaço urbano, que num primeiro
momento de sua apreensão se mostra, como dito antes, fragmentado, é, ao mesmo
tempo, articulado, visto que cada uma das partes que o compõe mantém relações entre
si, configurando redes de diferentes espessuras. Tais relações se dão através de fluxos
de veículos e de pessoas atrelados às operações de carga e descarga de mercadorias,
aos deslocamentos cotidianos como casa-trabalho, aos deslocamentos menos
freqüentes para as compras no centro da cidade ou nas lojas do bairro, às visitas aos
parentes e amigos, e às atividades religiosas e de lazer, bem como por meio das
relações espaciais que envolvem a circulação de decisões e investimentos de capitais,
considerando ainda a prática de poder e da ideologia.
3
A organização espacial compreende “[...] o conjunto de objetos criados pelo homem e dispostos sobre
a superfície da Terra,.... [...] é expressão da produção material do homem, resultado de seu trabalho
social.” (CORRÊA, 1991, p. 55)
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Neste sentido, Santos (1996) ressalta que a organização espacial se revela, de
um lado, a partir de elementos fixos e, de outro, através dos fluxos que garantem as
interações entre os fixos. Segundo Santos (1996, p.77): “Os fixos nos dão o processo
imediato do trabalho. Os fixos são os próprios instrumentos de trabalho e as forças
produtivas em geral, incluindo a massa dos homens.” E os fluxos “[...] são o
movimento, a circulação e assim eles nos dão, também, a explicação dos fenômenos
da distribuição e do consumo”. Assim, os lugares da cidade estão articulados de
alguma maneira, estabelecendo-se redes de padrões, intensidades e naturezas distintas
de fluxos.
Ressalte-se que a importância dos fluxos, da circulação, no processo de
produção do espaço geográfico, mereceu um capítulo especial no âmbito da Geografia
Clássica, que se intitulou de Geografia da Circulação, inserindo-se como parte da
Geografia Econômica. Inicialmente, a circulação foi abordada por Vidal de la Blache,
considerado o fundador da Escola Regional Francesa de Geografia que, no âmbito da
corrente possibilista, introduziu vários conceitos novos à geografia e, dentre estes, o
conceito de circulação: “[...] o movimento que põe em contato as diferentes partes do
mundo, especialmente as desenvolvidas, relacionando-as.” (FERREIRA e SIMÕES, 1986
p. 74).
Jean Brunhes, em seu livro “Geografia Humana”, abordou a circulação
oceânica, a continental, a aérea, a circulação rápida do pensamento (telecomunicações
circulação imaterial), a circulação geral e regional e as relações da circulação com a
produção e o povoamento, denominando esta parte da Geografia de Geografia Geral
da Circulação.
Da mesma forma, Max Derruau também trata a circulação de uma forma mais
abrangente, propondo estudar, no livro intitulado “Geografia Humana II”, as vias
terrestres, os cursos de água interiores, a circulação marítima, distinguindo em cada um
desses três meios a circulação pré-industrial da circulação moderna, o avião e as
telecomunicações, como os transportes criam fenômenos humanos e como as vias
terrestres se combinam para criar diferentes tipos regionais de redes. Por sua vez, Pierre
George traz no âmbito de suas discussões a Geografia dos Transportes, definindo-a
como o estudo dos fluxos de mercadorias e de passageiros.
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No contexto brasileiro, ressalte-se Josué de Castro que, em seu livro “Ensaios de
Geografia Humana”, define a Geografia da Circulação como o estudo dos meios de
transporte e das estradas e caminhos, e ainda, Moacir Silva, que aborda a Geografia
dos Transportes no Brasil, cuja obra datada de 1949, assim define a circulação:
“Circulação, – ou realização de
transportes
propriamente ditos, - é a movimentação de
massas econômicas
por um conjunto de vias (caminhos, estradas, rios, canais etc.),
utilizando-se os vários
meios
adequados (animais, veículos, sistemas).” (SILVA, 1949,
p.69)
Na história da Geografia, portanto, a questão do movimento, da circulação, no
espaço, tem sido tratada sob o “rótulo” de Geografia da Circulação ou Geografia dos
Transportes, que sempre foi um capítulo da Geografia Econômica. A nova importância
adquirida pelo fenômeno geral da movimentação na vida do espaço geográfico, seja de
mercadorias, de pessoas, de ondas eletromagnéticas ou de informações, cuja raiz está
na maior intensidade da divisão territorial do trabalho, parece exigir da Geografia um
novo conjunto de conceitos que conta dessa realidade atual, conforme ressalta
François Plassard, citado em Contel (2002).
Neste sentido, Contel (2002, p. 357) concebe a idéia de sistemas de movimento,
definido como “[...] o conjunto indissociável de sistemas de engenharia (fixos) e de
sistemas de fluxos (materiais ou imateriais) que respondem pela solidariedade
geográfica entre os lugares”. Estes sistemas o classificados em quatro principais tipos,
a exemplo do que se conhece por modais dos transportes: o sistema de movimentação
rodoviário, o ferroviário, o aquaviário e o aeroviário. Tal classificação privilegia os
deslocamentos dos fluxos materiais no território, uma vez que a movimentação dos
fluxos informacionais (como ondas de rádio e televisão, ligações telefônicas,
transmissão de dados binários) requer um estudo à parte.
Ao abordar a questão do movimento no espaço, Santos (1997) ressalta que, com
a produção do meio técnico-científico-informacional, os círculos de cooperação
instalam-se em um nível superior de complexidade e numa escala geográfica de ação
bem mais ampla, não bastando apenas produzir, mas indispensável colocar a produção
em movimento, visto que, agora é a circulação que preside a produção.
Nesta perspectiva, Santos e Silveira (2002), enfatizam a necessidade de uma
Geografia do Movimento, tendo em vista que os fluxos existentes são cada vez mais
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intensos, mais extensos e mais seletivos. No período contemporâneo, a criação de fixos
produtivos leva ao surgimento de fluxos que, por sua vez, exigem fixos para balizar o
seu próprio movimento, tais como a construção e modernização dos aeroportos,
portos, estradas, ferrovias e hidrovias.
Entretanto, interessa aqui abordar, dentre as diversas redes que articulam o
espaço, mais especificamente o espaço urbano, a rede de transporte
4
coletivo, meio
fundamental que propicia a circulação de pessoas, permitindo a realização das demais
atividades urbanas: trabalho, educação, lazer, compras etc. E, em particular, o
fenômeno do transporte de passageiros realizado através de veículos de pequeno porte,
costumeiramente chamado de “transporte informal”, que se intensificou nas grandes e
médias cidades brasileiras nos últimos anos.
Neste contexto, sob o ângulo da concepção da categoria território,
anteriormente abordada, busca-se, neste trabalho, analisar as territorialidades flexíveis
deste transporte, através dos fluxos das kombis e vans entre a Avenida Caxangá, a partir
do viaduto da BR-101, e o bairro de Boa Viagem na cidade do Recife. Nesta, a partir de
meados da década de 1990, iniciou-se um processo de intensificação extraordinária
dos veículos de pequeno porte realizando o transporte de passageiros, com a ocupação
dos principais eixos viários da cidade, que perdurou até o ano de 2003.
Estas territorialidades se esboçavam a partir da “apropriação” de eixos urbanos
por um determinado grupo de atores que, através do estabelecimento de uma rede de
relações e da forma de organização e atuação, procuravam garantir e legitimar os eixos
percorridos como territórios para a prática de tal atividade, passando a exercer uma
concorrência direta às empresas do transporte coletivo por ônibus, sobrepondo-se em
alguns trechos as suas linhas, e uma competição entre os próprios operadores deste
transporte ao longo dos trajetos.
4
A rede de transporte configura-se como uma rede geográfica, que se define como “o conjunto de
localizações sobre a superfície te+rrestre articulado por vias e fluxos” (CORRÊA, 1999, p. 65).
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1.2 Transporte Alternativo: Despindo-se da Concepção Dualista Transporte Formal
versus Informal
As cidades, que abrigam atualmente cerca de 50% da população mundial,
possuem fluxos cada vez mais intensos em função de necessidades as mais diversas.
Inicialmente, os fluxos que articulavam o espaço urbano, desde as primeiras cidades
até o início do século XX, caracterizavam-se pelos deslocamentos realizados
predominantemente a pé. Posteriormente, estas caminhadas passaram a ser
complementadas pelo uso de veículos a tração animal. Surge, então, uma demanda de
serviços públicos de transporte, suprida por cocheiros, que em charretes ou em
carruagens maiores cobravam para levar passageiros onde estes quisessem.
Depois, descobriu-se que era mais fácil puxar veículos com rodas de ferro que
andavam sobre trilhos, o que deu origem aos primeiros bondes. E, posteriormente, com
o aprimoramento da máquina a vapor, surgem os primeiros trens.
No século XIX, a transformação tecnológica propiciada pela eletricidade, tendo
sua aplicação ao transporte público a partir de 1880, fez com que as cidades
aposentassem definitivamente o uso da tração animal nos deslocamentos urbanos.
Durante este século, o bonde permitiu às cidades, após a Revolução Industrial,
consolidarem a sua expansão e a sua própria estrutura, cujas novas funções possuíam
características notadamente urbanas.
O Brasil, embora ainda não estivesse inserido neste processo de
industrialização no final do século XIX, adota este transporte e os ideários da cidade
industrial como meios de promover a sua própria modernização. Em 1892, inaugurou-
se, no Brasil, a primeira linha de bondes elétricos da América do Sul (STIEL, 1984).
Nesta época, as cidades brasileiras de grande e médio portes começam a substituir os
bondes puxados por burros por bondes elétricos. Estes eram compostos por um ou dois
carros e operavam em baixa velocidade, percorrendo os trilhos nas ruas e avenidas em
meio a outros veículos e pedestres.
Assim, o bonde foi instalado em capitais brasileiras, contribuindo para
consolidar a urbanização tão cobiçada no país. Muitos dos serviços de bondes foram
aqui implantados por companhias estrangeiras que, sujeitas inicialmente a controles
tarifários, não auferiram grandes lucros com a operação deste transporte, levando-o à
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degradação. Posteriormente as companhias privadas se retiraram e os serviços
passaram a ser geridos pelo Poder Público, que herdou sistemas obsoletos e em mau
estado de conservação (WRIGHT, 1988).
Aos bondes elétricos, seguiram-se os trólebus, os quais, entretanto, não tiveram
a mesma abrangência daqueles. Os trólebus, também conhecidos como “bondes sobre
pneus” ou “ônibus elétricos”, similares aos bondes elétricos, recebiam energia elétrica
de cabos aéreos, ligados ao veículo por uma haste. Segundo Silva [2002?], a partir da
segunda década do século XX o sistema de transporte público sobre pneus, que se
encontrava em desenvolvimento, passou a experimentar a aplicação da eletricidade
como nova forma de tração. Em 22 de abril de 1949, inaugura-se, na cidade de São
Paulo, a primeira linha de trólebus no Brasil.
Paralelamente ao serviço de bondes, expandiam-se também no Brasil os serviços
de táxis, lotações e ônibus. O automóvel juntamente com essas modalidades, que
surgem no início do século XX nas suas formas motorizadas, diferentemente do bonde,
que se encontrava preso aos trilhos e, por isso oferecia pouca flexibilidade,
possibilitaram a criação de um número infinitamente maior de opções de rotas e, por
conseguinte, de alternativas de moradia e de atividades industriais, comerciais e
sociais.
Na década de 1950, o país ainda não tinha uma estratégia para os seus
transportes públicos. Neste período, funda-se a PETROBRÁS e se implanta no país a
política de criação de uma indústria automobilística, visto que o aumento nas
importações de veículos e petróleo no pós-guerra gerou problemas com a balança
comercial.
A indústria automobilística nacional na verdade dominada por empresas
multinacionais passou a representar progresso e desenvolvimento para o país. Neste
sentido, governantes e técnicos priorizaram o uso do automóvel no espaço urbano.
Assim, procurou-se adaptar as cidades para receberem um mero cada vez maior de
automóveis, construindo-se vias expressas, túneis e viadutos.
Nesta conjuntura, os bondes, que se encontravam em situação decadente, foram
sendo gradativamente extintos em todas as capitais brasileiras e substituídos pelos
ônibus, ou mais especificamente, pelo automóvel. Os bondes passaram da condição de
moderno a símbolo do atraso e do obsoleto.
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A este respeito Vasconcelos (1988) enfatiza que, na cidade de São Paulo, nas
décadas de 1960 e 70, o Estado direcionou a política de circulação urbana no sentido
de privilegiar o papel do motorista, ou melhor, da classe média enquanto motorista,
conforme explicita:
[...] a política de circulação vai privilegiar o papel da classe dia enquanto
motorista, em detrimento do papel do proletariado enquanto passageiro de
ônibus, mostrando que nem todas as mercadorias em trânsito tiveram o
mesmo tratamento. (VASCONCELOS, 1988, p.44)
No âmbito desta política, os bondes foram se extinguindo para ceder lugar ao
automóvel. Nas palavras de Stiel (1984), a extinção do bonde elétrico “[...] foi
habitualmente forçada pela crescente e devastadora presença do transporte individual,
admitido na década de 1960 como a solução definitiva da mobilidade urbana”.
Segundo este autor, os bondes foram se extinguindo por serem um entrave para a
indústria automobilística e petrolífera. Havia também a preocupação em se inutilizar
todos os serviços e incutir na população a crença de que estes veículos causavam
congestionamento de trânsito e impediam o livre fluxo dos automóveis e ônibus.
Neste contexto de extinção dos bondes, passou-se a combater também outras
formas de transporte coletivo, tais como microônibus, lotações e kombis, que nesta
época realizavam de forma rudimentar o transporte de passageiros. Exigia-se o uso
de ônibus grandes para o transporte coletivo, passando as autoridades a licenciar
apenas empresas que tivessem muitos ônibus, que ganharam o direito de exclusividade
nas suas linhas ou áreas, ou seja, um monopólio. Convenientemente determinadas para
as empresas, estas linhas de ônibus, entretanto, nem sempre correspondiam aos
percursos que os usuários necessitavam e/ou desejavam seguir.
Antes da crise do petróleo, o Brasil, que havia exterminado sua rede de
bondes, prosseguia eliminando os poucos sistemas de trólebus existentes no país.
Entretanto, no início dos anos de 1970, com os problemas do congestionamento do
tráfego e da poluição urbana e, sobretudo diante da crise do petróleo, a prioridade
oferecida ao automóvel, no sistema viário, retorna ao transporte coletivo.
Neste contexto, de acordo com Silva [2002?], na segunda metade da década de
1970, o Governo Federal passou a estimular diversos municípios a elaborarem
programas de implantação de novos sistemas de trólebus, que o país não dispunha
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de petróleo e contava com eletricidade abundante. Atualmente, os trólebus ainda
circulam em algumas cidades brasileiras.
Hoje, configura-se, nas cidades brasileiras, um sistema de transporte coletivo de
passageiros, constituído pelas modalidades ônibus, metrôs e trens, sendo a primeira
modalidade a sua espinha dorsal. Este sistema se caracteriza como um serviço público,
cuja gestão compete ao município, podendo ser operado diretamente por este último
ou de forma delegada a particulares (entidades controladas pelo Estado ou empresas
privadas), que o exerce através de concessão
5
ou permissão
6
.
O transporte coletivo de passageiros destaca-se por sua importância na vida
urbana atual, uma vez que, as atividades dependem cada vez mais da possibilidade
que o cidadão tem de se deslocar dentro da cidade e, grande parte da população
depende do transporte público para realizar os seus deslocamentos. Tal atividade
compõe, portanto, o conjunto da infra-estrutura básica estratégica ao funcionamento da
cidade, devendo proporcionar a interligação entre os diversos componentes da
estrutura urbana, garantindo a mobilidade das pessoas para que estas exerçam as suas
diversas atividades sociais: trabalho, educação, comércio, lazer etc.
O transporte coletivo de passageiros, que se estabeleceu nas cidades brasileiras,
sempre coexistiu com o transporte realizado através de veículos de pequeno porte dito
informal, clandestino. Entretanto, na década de 1990, especialmente a partir 1995, este
último intensifica-se significativamente, nas grandes e médias cidades brasileiras por
meio de kombis (ou peruas), vans, bestas, topics, motocicletas (moto-táxis) e até mesmo
automóveis particulares.
A expansão desenfreada dessas micro-unidades de transporte gerou grande
polêmica dentro dos órgãos públicos, nas empresas e no âmbito acadêmico dada a
complexidade que envolve a questão. Em geral, esta atividade foi encarada como um
delito diante da série de problemas que ocasionou nas áreas urbanas e, sobretudo por
5
O termo concessão refere-se à “[...] delegação da exploração de serviços, formalizada mediante ato
administrativo bilateral, gerando direitos e obrigações para ambas as partes, podendo ser alterado ou
rescindido pelo poder concedente, quando o concessionário desatender aos requisitos do serviço.”
(PERNAMBUCO, 1991)
6
O termo permissão refere-se à “[...] delegação da exploração de serviços, formalizada mediante ato
administrativo unilateral e precário, que não gera direito à continuidade na exploração dos serviços,
podendo ser revogado ou alterado sem indenização ao permissionário, no interesse da coletividade.”
(PERNAMBUCO, 1991)
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29
não se enquadrar nas normas regulares do transporte coletivo convencional, fazendo-
lhe uma concorrência acirrada.
No âmbito das discussões sobre o assunto, costumou-se colocar o problema de
forma dicotômica: de um lado encontra-se o transporte dito informal, considerado
concorrente desleal e prejudicial ao transporte dito oficial; de outro, o transporte
convencional, dito formal, regulamentado.
Dentro das empresas do transporte coletivo por ônibus evidentemente
predomina esta lógica dual, visto que, devido à intensificação dos veículos de pequeno
porte, estas empresas tiveram prejuízos com a perda de passageiros e receitas. Daí
considerarem a atividade como opositora, passando a pressionar o Poder Público para
que este coíba a ação da mesma.
Na verdade, o empresário não encara o transporte coletivo como um serviço
público, como uma delegação do Estado para que preste um serviço. Ele se considera
“proprietário” do sistema. Desta forma, quem quer que passe a concorrer com ele está
errado e deve ser reprimido. O Poder Público deve atuar no sentido de evitar uma
concorrência “na linha dele”. Dentro dessa concepção existe, evidentemente, uma
dicotomia: um é o formal, o outro é o informal, o clandestino, o pirata, o ilegal. Esta
mesma óptica não tem predominado nas empresas do setor como também na
perspectiva do Poder Público e numa grande parte dos técnicos da área de transportes.
Nos relatórios técnicos das associações de empresas de transporte esta visão
dual expressa-se claramente através da contraposição de um ao outro. No bojo das
discussões sempre se ressaltam as características negativas deste transporte chamado de
informal: não recolhe impostos, não paga encargos trabalhistas, não assegura
benefícios aos usuários, como descontos e gratuidades, vem apresentando alto índice
de acidentes devido à inobservância das regras de trânsito, contribui para o aumento
da poluição e do congestionamento nas principais vias do tráfego.
Nesta perspectiva, este transporte representa uma grave ameaça ao sistema de
transporte público, enfatizado como um serviço público de caráter essencial, que não
se configura como atividade de livre iniciativa e, portanto, sua operação possui uma
série de pré-requisitos: é regulada, segue exigências legais e arca com encargos sociais
específicos. Neste setor, opera-se em determinadas situações, por vezes, não rentáveis,
para cumprir determinações dos órgãos de gerência. Assim, qualquer tipo de operação
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que não siga as exigências legais se caracteriza como concorrência desleal e
predatória. Tomando por base estas proposições, o transporte por veículos de pequeno
porte geralmente é visto como opositor, informal, representando uma ameaça ao
sistema de transporte público urbano do país.
A partir desta visão de contraposição de um transporte ao outro, o gestor
público, na maioria das vezes, ignorou a atividade, não a reconheceu oficialmente e
adotou posturas repressivas para coibi-la. Saliente-se, entretanto, que, em escala
municipal, emergiram várias iniciativas parlamentares em prol da legalização ou
regulamentação deste serviço, cuja aceitação nas Câmaras e Executivos Municipais foi
se ampliando
7
.
Tendo como pressuposto esta dicotomia entre “formal” e “informal”, buscou-se
enfrentar o problema pautando-se quase sempre na repressão à atividade através de
fiscalização, apreensão e multa dos veículos com o intuito de erradicá-la, ou na
regulamentação desta atividade, de forma a restringi-la às linhas periféricas, aos bairros
populares ou às periferias da cidade, impedindo-a de entrar nos eixos principais da
cidade. Todavia, tais medidas se mostraram ineficientes para solucionar a questão,
visto que, este transporte trabalha segundo uma lógica de mercado, não se restringindo
àquele espaço que lhe foi concedido e, assim, geralmente ocupa os principais
corredores viários. O fato é que ao ter como pressuposto esta dicotomia, não se
conseguiu apontar as alternativas de soluções do ponto de vista prático.
Despindo-se desta abordagem predominante de oposição entre o transporte
“formal” e “informal”, ao invés de encarar este último como opositor, não se poderia
ver esta forma de transporte como uma alternativa de circulação para a população?
Uma alternativa aos deslocamentos da população? Sua expansão, na década de 1990,
não estaria atrelada às necessidades dos usuários em ter um sistema de transporte mais
rápido, freqüente, com maior flexibilidade de itinerários, paradas, com tecnologias
7
Convém salientar que, muitas vezes, esta aceitação seria a contrapartida do apoio político que muitas
associações, especialmente de kombeiros, concedem a candidatos em períodos eleitorais. Este apoio se
expressa sobretudo em termos de propaganda e transporte de eleitores. A mobilização de muitos
políticos locais a favor da atividade se deve também ao fato das empresas de ônibus terem uma imagem
desfavorável junto à população. Desta forma, as alianças entre aqueles e estas últimas tornam-se menos
provável dadas as implicações negativas da imagem formada. Tais alianças também se expressam através
da assistência dada pelos políticos aos que operam a atividade quando os órgãos de gerência e/ou a
Policia Militar fazem apreensões e aplicam multas às kombis e vans.
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diferenciadas? Aliado a isto, esta intensificação também não estaria relacionada à
necessidade de indivíduos excluídos do mercado de trabalho conseguirem uma
alternativa, uma oportunidade de emprego, atuando nos espaços e de forma que o
transporte coletivo convencional não consegue mais abarcar?
Ao tratar a questão da oposição entre uma e outra forma de transporte, Brasileiro
questiona-se: “Será mesmo que a oposição transporte informal
versus
formal é a
questão central? A análise sob esta óptica dual contribui para a busca de melhorias da
qualidade do serviço oferecido à população?” (BRASILEIRO, 1999, p. 33). O autor
argumenta que esta oposição é uma falsa questão, porque um não existe sem o outro,
um é relacionado diretamente ao outro. Em diversos países e cidades, observa-se a
coexistência e a articulação entre múltiplas formas de transportes coletivos. Assim,:
[...] não se poderia analisar os transportes informais como um modo
complementar e integrante de um sistema em que poderiam coexistir distintas
formas de transportes, operadas por veículos de diversas capacidades,
atendendo a uma demanda diversificada, que necessitaria também de serviços
diferenciados? (BRASILEIRO, 1999, p. 33)
Cavalcanti (2002) ressalta que o sistema de transporte público deve centrar-se na
integração dos seus serviços e na diversificação das tecnologias ofertadas para o
transporte de passageiros.
É preciso considerar que o mercado de transporte não é mais aquele que se
contentava com um único tipo de serviço ofertado através de um único tipo de
veículo, e sim é um mercado que cada dia se torna mais independente,
exigente e capaz de absorver os custos de serviços diferenciados.
(CAVALCANTI, 2002, p. 32)
Para Brasileiro (2002), a expansâo do transporte de passageiros por veículos de
pequeno porte encontra-se inserido num contexto de crise econômica urbana e social,
mas sobretudo de crise do chamado transporte formal ou regulamentado. O autor
ressalta que, do final dos anos de 1970 até o início dos anos de 1990, os
deslocamentos eram tipicamente pendulares, ou seja, eram deslocamentos casa-
trabalho. Decorre disso a construção de grandes radiais, de grandes eixos para
deslocamento do transporte público, segundo uma lógica centro-periferia.
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Entretanto, a crise econômica dos anos de 1990 alterou profundamente a forma
dos deslocamentos. Esta crise redefine as atividades econômicas, passando a haver
uma predominância das economias de serviços, das economias terciárias. Neste
contexto, redefinem-se também os padrões de mobilidade, as necessidades de
deslocamento da população. Estes deslocamentos são de uma outra natureza porque a
maioria das atividades não são mais serviços para a fábrica, mas de caráter terciário.
Estas necessidades se tornam completamente diferentes daquelas dos anos de 1970,
exigindo-se que se insira no sistema de transporte tecnologias diferenciadas de diversos
portes, que possibilitem maior rapidez nos deslocamentos.
No entanto, grande parte do segmento técnico, treinado sobretudo nos anos de
1970 dentro de uma visão fortemente estatal de construção de grandes corredores de
transportes para ligar o trabalho à casa, não percebem que, com as crises dos anos de
1990, os padrões de deslocamentos se modificam, surgindo novos hábitos, novas
necessidades de deslocamentos, novas possibilidades ofertantes de transporte para que
a população possa se deslocar. Há, assim, segundo Brasileiro, uma necessidade de se
mudar a cultura em torno da qual se construiu uma rede de transporte que não
atende mais aos deslocamentos, porque se baseia na programação do sistema de
transporte em grandes eixos para fazer deslocamentos tipicamente casa-tabalho.
Neste sentido, Brasileiro (2002) ressalta que, o grande desafio é pensar uma rede
de transporte no espaço metropolitano, buscando uma articulação, uma integração,
uma coexistência entre múltiplas formas de transportes, com tecnologias diferenciadas,
desde a bicicleta ou a van até o metrô, com regulamentos diferenciados, em função de
tecnologias, de horários, etc., com um modo de gestão diferenciado, com uma forma
de organização diferenciada. Esta rede deve ser concebida e planejada pelo Poder
Público, podendo ser operada pelo setor privado, quer seja pelas empresas, quer seja
pelos operadores de veículos de pequeno porte, porém associados em cooperativas,
em formas de organização mais avançadas que não o indivíduo em si.
Ao tratar o fenômeno por esta dimensão, das novas formas de deslocamentos
urbanos, dos novos serviços, observa-se que as empresas do setor de transporte
coletivo perderam a capacidade de prestar um bom serviço, devido, sobretudo, a duas
razões: primeiro, porque os empresários não percebem que o usuário não é mais cativo
e, segundo, porque estes empresários se consideram “proprietários do sistema”.
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A concepção de um espaço funcional, através de um planejamento de um
sistema de transporte organizado segundo uma lógica centro-periferia, cujos
deslocamentos são tipicamente pendulares, atendia inicialmente a uma demanda
cativa, que, com o passar do tempo foi se diversificando e necessitando de novos
serviços em função das mudanças ocorridas na estrutura e funcionamento das cidades.
Com o crescimento das cidades, com surgimento e crescimento de outros núcleos,
com a intensificação das atividades de comércio e serviços, os deslocamentos além de
se intensificarem, modificaram-se.
Com o passar do tempo as empresas do setor de transporte não foram
melhorando e nem ampliando os serviços prestados, acomodadas que eram com uma
demanda praticamente cativa anos, e o órgão gestor de transporte coletivo também
não o priorizou. Assim, a falta de pontualidade, os grandes intervalos entre as viagens
muitas vezes, o passageiro espera por um ônibus cerca de 50 minutos e até uma hora
a superlotação, a lentidão nos deslocamentos, a falta de conforto, as altas tarifas, têm
caracterizado o serviço de transporte público nas últimas décadas.
Neste contexto, a atividade prestada por veículos de pequeno porte passa a
atuar de forma complementar ao transporte convencional, delineando-se como uma
alternativa de circulação para a população porque passa a atender uma demanda que o
transporte coletivo convencional, tal como se configura, não consegue mais abarcar.
Saliente-se que, nos anos de 1970 e 1980, quando o transporte coletivo
convencional se delineava nas cidades da forma tal como se apresenta hoje, já existia o
embrião desta atividade preenchendo os espaços que aquele não preenchia. Nos anos
de 1990 o que houve foi uma massificação, uma intensificação desta atividade, que
passa a ocupar os centros das cidades e a percorrer os grandes corredores viários.
Se por um lado, a intensificação do transporte coletivo por veículos de pequeno
porte se encontra vinculada à crise do transporte convencional, por outro, é preciso
destacar que esta atividade também se insere num contexto de crise sócio-econômica,
cujos reflexos no mercado de trabalho são as elevadas taxas de desemprego e o
surgimento e intensificação de diversas atividades denominadas de “informais”, que
passam a representar a sobrevivência de muitos indivíduos.
Milton Santos, no final dos anos de 1970, buscava interpretar a realidade do
desemprego, subemprego e miséria urbanos, sem derivar de concepções dualistas.
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Segundo este autor, o processo de modernização tecnológica sobre a economia
subdesenvolvida gera um número limitado de empregos, acarretando a criação de
atividades de pequenas dimensões. Estabelece-se um sofisticado padrão de consumo
para uma minoria convivendo com uma massa de pessoas com salários muito baixos
ou vivendo de atividades ocasionais, gerando na sociedade urbana uma divisão entre
aqueles que podem ter acesso permanentemente aos bens e serviços oferecidos e
aqueles que, tendo as mesmas necessidades, não têm condições de satisfazê-las.
Desta forma, criam-se diferenças quantitativas e qualitativas no âmbito do
consumo, que seriam a causa e o efeito da existência de dois circuitos na economia: o
“superior” e o “inferior”. O circuito superior compreenderia bancos, comércio e
indústria de exportação, indústria urbana moderna, serviços modernos, atacadistas e
transportadores, e o circuito inferior seria constituído por formas de fabricação não-
“capital intensivo”, pelos serviços não modernos fornecidos “a varejo” e pelo comércio
não-moderno e de pequena dimensão (SANTOS, 1979).
Para Milton Santos, as relações entre os dois circuitos são “hierárquicas”,
relações simples de complementaridade” e “relações de complementaridade
recíproca”, elos que se estabelecem via demanda de insumos (“inputs”) de um e outro
circuito e aproveitamento mútuo de “economias externas”. Desta forma:
Os dois circuitos não são sistemas isolados e impermeáveis entre si, mas ao
contrário, estão em interação permanente. De um lado a própria existência de
uma classe média impede de se falar em circuitos fechados. Seu consumo
dirige-se a um e a outro circuito com freqüências variáveis. De outro lado, o
funcionamento de cada circuito compreende uma articulação interna ou
horizontal com diferentes graus de integração e uma articulação vertical que
se realiza pela comunicação entre atividades dos dois circuitos (SANTOS,
1979, p. 204).
A partir desta leitura, pode-se apreender o transporte coletivo realizado através
de veículos de pequeno porte no âmbito do circuito inferior da economia urbana. Esta
forma de transporte passou a atuar de forma complementar ao transporte coletivo
convencional à medida que atende a uma demanda que aquele não consegue abarcar,
apresentando algumas vantagens comparativas como maior flexibilidade de itinerários,
tarifas, paradas, e não estando dissociado da oferta de transporte como um todo. Entre
ambas as formas de transporte, os ditos informal e formal, há, portanto, uma
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interdependência e uma complementaridade e não uma oposição, uma dualidade, uma
vez que um depende do outro e se complementam.
À medida que o circuito inferior constitui uma estrutura de abrigo para aqueles
desprovidos de capital e de qualificação profissional, o transporte coletivo por veículos
de pequeno porte representa uma alternativa de emprego. Diante do processo de
globalização, expõe Milton Santos:
[...] certas atividades ou empresas, ocupam o território a partir de lógicas
globais, outras operam segundo lógicas que não ultrapassam as fronteiras
nacionais, mas incluem vastas áreas do território, enquanto ainda outras,
como as atividades do circuito inferior da economia, são limitadas a áreas
menores, freqüentemente intra-urbanas (SANTOS, 2002, p. 290).
No âmbito destas últimas, pode-se citar aqueles atores que produzem
localmente e conseguem sobreviver porque atuam no que Chesnais chamou de
“brecha”. Segundo Chesnais, o espaço da pequena produção, no ambiente da
globalização, está sendo recriado e é constituído basicamente por três tipos de atores
que produzem localmente: primeiro, aqueles atores que irão sobreviver articulados às
firmas-redes (pequena produção integrada); no segundo caso, os oportunistas, aqueles
que conseguem acessar o mercado global sem estarem articulados; e, finalmente, o
terceiro bloco formado por pequenos projetos e pequenas empresas que são
constantemente desafiados pela globalização sem participarem desse movimento. Essas
concorrem em mercados locais, regionais ou nacionais. Sobrevivem nesse plano de
competitividade exatamente por atuarem nas “brechas” (CHESNAIS
apud
ARAÚJO,
2000).
A idéia de “brecha” é a de que se pode encontrar atividades pelas quais os
atores globais ainda não têm interesse, tornando-se um local de sobrevivência para as
iniciativas locais. Atividades que estes atores globais não podem competir, seja por um
determinado nível de concorrência, seja por uma característica do produto. Apenas
quem conhece o lugar, quem vive aquela experiência, é capaz de oferecer certos
serviços.
Neste sentido, o transporte coletivo realizado por veículos de pequeno porte
representa o que François Chesnais denominou de “brecha”. As brechas aparecem
como oportunidades de emprego no mercado de trabalho. Os atores desta atividade
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encontraram “brechas“ para atuarem, uma vez que conheciam bem o local onde
operavam e devido às características flexíveis de sua operação, no que tange à rapidez
nos deslocamentos, freqüência na oferta e por disponibilizar um serviço porta-a-porta,
estes atores conseguiam abarcar uma demanda que o transporte coletivo convencional
não consegue abranger. E isto não é novo, visto que, nas décadas de 1970 e 1980,
existiam áreas onde o transporte convencional era precário, sendo preenchidas pelo
chamado transporte informal.
A intensificação desta atividade, nos anos de 1990, insere-se num contexto de
crescimento de atividades no circuito inferior da economia urbana, que se encontram
relacionadas à intensificação do processo de globalização, cujos reflexos no mercado
de trabalho são as elevadas taxas de desemprego.
Os efeitos negativos desse processo, conforme ressalta Castilho (2001), são mais
contundentes nos países subdesenvolvidos. Nestes, os efeitos da crise econômico-
financeira no mercado de trabalho expressam-se pelo crescente contingente de
desempregados/excluídos das atividades tradicionais (no setor secundário) do sistema
sócio-econômico, os quais, muitas vezes, não dispõem do tempo suficiente para se
(re)qualificarem a fim de se (re)inserirem no sistema.
Há, entretanto, autores que refutam a idéia de que esta atividade possa
representar uma alternativa no mercado de trabalho, visto que sua intensificação gerou
uma crise financeira dentro das empresas que operam o transporte coletivo, levando-
as, muitas vezes, a demitir funcionários, como menciona Cavalcanti (1998, p. 05-06):
[...] o argumento de alívio do desemprego não suporta uma investigação mais
detalhada. Para cada veículo informal utilizado no transporte urbano gera-se,
em média, um emprego de tempo integral (considerando que apenas o
motorista assim se ocupa do trabalho, coadjuvado por outros atores de
atuação parcial ou esporádica). Este emprego resulta em queda de demanda
do transporte por ônibus e, consequentemente, perda de receita, redução dos
serviços e a inevitável liberação da mão-de-obra empregada, com agravante
de que, nesta circunstância, não o efeito multiplicador dos empregos
indiretos gerados no setor informal.
Certamente a proliferação dos veículos de pequeno porte gerou uma queda na
demanda do transporte convencional e, por conseguinte, perda de receita, o que
possivelmente acarretou a demissão de alguns trabalhadores do setor. Entretanto, ao
abordar a questão do desemprego de um ponto de vista mais amplo, num contexto de
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crise sócio-econômica que assola as grandes cidades, a atividade do transporte coletivo
através de veículos de pequeno porte passou a representar uma alternativa de emprego,
a sobrevivência de muitos indivíduos não qualificados de se inserirem no mercado de
trabalho, a despeito de haver, entre estes indivíduos, aqueles que estavam
complementando renda, ou ainda, aqueles que possuíam uma frota de veículos para a
realização da atividade.
Decerto, a maneira pela qual operava o transporte coletivo realizado por
veículos de pequeno porte, fez surgir uma série de problemas no quadro urbano, não
podendo tal atividade delinear-se definitivamente da forma como se apresentava.
Evidentemente, é preciso que se estabeleçam regras, que se defina o papel desta
atividade no quadro urbano. A ausência de uma definição, de uma política por parte
do Poder Público em relação a este transporte favoreceu a sua expansão desenfreada e,
por conseguinte, os vários problemas a ele relacionados.
Isto posto, no bojo deste trabalho, procura-se despir-se da visão predominante
de oposição entre o transporte “formal” e “informal”, ressaltando que tal transporte é
visto como complementar e possível de coexistência com o transporte convencional
desde que seja bem definido o seu papel no quadro urbano. A partir desta visão, da
possível coexistência, de alternativa aos deslocamentos da população e de emprego,
denominou-se aqui esta atividade de transporte alternativo, referindo-se este ao
transporte coletivo de passageiros realizado por veículos de pequeno porte, que mesmo
não se enquadrando nas normas regulamentares do transporte coletivo urbano
convencional, apresentavam algum tipo de estrutura legal no âmbito municipal, como
também àqueles veículos que operavam sem nenhum tipo de estrutura legal até o ano
de 2003.
Nesta perspectiva, no âmbito da implantação do STCP/Recife, concebeu-se este
serviço de transporte, realizado através de veículos de pequeno e médio porte, como
um sistema complementar ao transporte por ônibus, passando a coexistir junto a este.
Partindo destas proposições, busca-se analisar as territorialidades flexíveis do
transporte alternativo na cidade do Recife, através dos fluxos das kombis e vans ao
longo de eixos urbanos compreendidos entre a Avenida Caxangá, tomando como
referencial o viaduto da BR-101, e o bairro de Boa Viagem, no período anterior à
implantação do STCP/Recife no ano de 2003.
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CAPÍTULO 2
TRANSPORTE COLETIVO NO RECIFE: DO BONDE AO
ÔNIBUS E A INSERÇÃO DO ALTERNATIVO
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2. TRANSPORTE COLETIVO NO RECIFE: DO BONDE AO ÔNIBUS E A INSERÇÃO
DO ALTERNATIVO
2.1 - Transporte Coletivo no Recife: Uma Breve Trajetória
A cidade do Recife está situada no litoral oriental da região Nordeste, no estado
de Pernambuco, assentada numa área de 220km
2
, onde se concentra atualmente cerca
de 1.500.000 habitantes. Entrecortada por rios e canais, o espaço da cidade se
assemelha a um anfiteatro, marcada pela presença dos morros, estendidos a norte, a
oeste e a sudoeste, que circundam uma área de planície flúvio-marinha na sua porção
central. (Mapa 1)
A formação e estruturação da cidade iniciaram-se no século XVI a partir de seu
núcleo central, cujo porto natural se tornou a porta econômica da região e em torno do
qual a metrópole começou a crescer. A estrutura urbana inicial do Recife era definida
pelo porto e pelos engenhos, onde, aos arredores, os povoados foram se formando e se
adensando, passando posteriormente a ocupar os caminhos de ligação dos engenhos
com o centro principal (o porto). Caminhos estes que foram configurando o traçado das
vias de penetração.
A partir de seu núcleo central, a cidade do Recife foi se expandindo ao longo
das vias de circulação. Melo (1978) observa que, havia uma ocupação suburbana
rarefeita, de feição linear, partindo do núcleo urbanizado e disposta ao longo das
principais vias de circulação, como um esboço de expansão tentacular. Assim, na
segunda metade do século XIX, configura-se uma forma urbana tentacular, com o
estabelecimento dos caminhos ligando a área urbana, constituída pelos bairros de
Recife, Santo Antônio e São José, às povoações suburbanas e aos engenhos na área
rural do município.
Neste contexto de ocupação da cidade, a partir das vias de circulação, ressalta-
se a importância dos transportes urbanos no Recife, cuja trajetória remonta à origem
das diligências, carruagens puxadas a cavalos que serviam para o transporte de
passageiros. Segundo Stiel (1984), este transporte surgiu no Recife em 1841, sendo a
diligência puxada por quatro cavalos e às vezes com dois andares, que operava o
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MAPA 1
AMBIENTES NATURAIS DO RECIFE
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MARANHÃO
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BAHIA
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PLANÍCIE
CURSOS DE ÁGUAS
MORROS
FONTE: PCR, 2002
ELABORAÇÃO: Diana Souza
Clélio Santos
DATA: Julho, 2003
1,2 Km
1,2
2,4
3,6
4,8
0
ESCALA APROXIMADA
O
S
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41
transporte de passageiros para Monteiro, Olinda, Casa Forte, Mangabeira, Apipucos,
Caxangá e Jaboatão.
Registre-se também, conforme observa Melo (1978), ao lado da influência das
vias terrestres a influência exercida pela hidrovia, sobretudo, representada pelo
Capibaribe. Subindo este rio, foi surgindo e se alongando o cordão de subúrbios mais
importantes do Recife no final do século XIX: Capunga, Ponte d’Uchoa, Santana, Casa
Forte, Poço da Panela, Monteiro e Apipucos. Em relação a estes lugares e também aos
subúrbios da margem direita do Capibaribe, Madalena e Torre, é que se tornaram
importantes o papel do transporte fluvial e a função exercida pela canoa e pela barcaça
até certa fase da evolução do espaço urbano.
Dada a importância deste alinhamento de subúrbios, este passaria, com o
tempo, a ser servido também por transportes terrestres. A ligação destes subúrbios ao
núcleo urbano da cidade dá-se a partir da implantação das chamadas
“maxambombas”, locomotivas que percorriam pequenas estradas de ferro, quando se
construiu a Estrada da Ponte d’Uchoa e se assentaram os trilhos da maxambomba de
Apipucos. Conforme relata Stiel (1984), a construção desta via férrea do Recife à
povoação de Apipucos, por volta de 1863, marca o início do serviço de transporte
coletivo sobre os trilhos na cidade.
De acordo com o contrato que concedia a operação do serviço, esta linha
deveria ter como ponto de partida o Largo do Capim (Praça da República), ou Mundo
Novo em Santo Antônio, seguindo pela Rua Formosa (ao lado da rua Aurora), pela Rua
Projetada em frente ou Esperança, saindo no Manguinho e indo daí pela Ponte
d’Uchôa, Santana, Casa Forte, Monteiro até Apipucos (SETTE apud STIEL, 1984).
Surge, assim, a empresa “Trilhos Urbanos do Recife e Apipucos,” que inaugura
oficialmente o serviço em 5 de janeiro de 1867, com o trem inaugural partindo da Rua
Formosa. Posteriormente, a estação inicial passou a ser no largo do Capim, quando a
ponte sobre o Capibaribe, entre este largo e a Rua Formosa, foi concluída.
1
Os trens partiam da Praça da República, passando pelo Largo do Entroncamento
e seguiam até Apipucos. A partir daí, os trilhos foram estendidos até Encarnação (Dois
Irmãos) e posteriormente, em 1870, até Caxangá. Neste mesmo período, surgem duas
1
Havia cinco máquinas, nove carros de primeira classe fechados e sete abertos; nove de segunda classe,
quatro de transportes de materiais e um de carga aberto (STIEL, 1984).
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novas extensões à linha principal. A partir do largo do Entroncamento, onde havia uma
estação com várias plataformas, partiam os trens dos ramais da Várzea e de Aflitos.
Inaugurado em dezembro de 1871, o ramal de Aflitos passou a ser conhecido
como “linha do Arraial”, pois se dirigia à Casa Amarela, de onde voltava a se ligar à
linha principal no Monteiro. O ramal da Várzea, por sua vez, atravessava a Capunga,
passando pelas Ruas das Creoulas e Rua Joaquim Nabuco, até tomar a Estrada Nova
(Avenida Caxangá), próximo ao lugar do Zumbi, seguindo até a povoação da Caxangá.
Uma nova companhia obteve concessão para instalar uma linha de trilhos
urbanos de Recife à Olinda. Assim, em 1870, inicia-se um tráfego experimental diário
entre Recife e Varadouro, com uma linha de 12 Km de extensão e uma bitola de
1,32m. A estação central foi construída na Rua Visconde de Rio Branco (Rua da
Aurora) e foi aberta ao público em 1873.
2
Na segunda metade do século XIX também surgem os bondes a burro. Segundo
Stiel (1984), o primeiro projeto para instalação deste serviço em Recife inicia-se em
1870, quando é assinado um contrato que previa a instalação da linha de carris a partir
do Largo do Arsenal da Marinha, passando pelas Pontes Sete de Setembro e da Boa
Vista para terminar na passagem da Madalena, ramificando-se para os Afogados,
Fernandes Vieira e Santo Amaro, este último com passagem pela Ponte Santa Izabel.
Tinha-se como objetivo ligar o Recife com seus subúrbios, para os quais não estivessem
já estabelecidos trilhos urbanos, e unir os demais pontos limítrofes da capital.
No ano de 1870, a Companhia Pernambuco Street Railway, depois Companhia
Ferro Carril de Pernambuco, recebe autorização para funcionar no Império. Desta
forma, em setembro de 1871, abre-se ao público a linha de Madalena e, em novembro
do mesmo ano, inaugura-se a segunda linha: a de Afogados, que possuía um ramal
pela Duque de Caxias, Afogados-Caxias, e um ramal pela rua Marquês do Herval,
Afogados-Herval. Em janeiro do ano seguinte, inaugura-se a linha Santo Amaro e, em
21 de setembro, a linha da Capunga, que terminava em Fernandes Vieira. O tráfego
desta última havia se iniciado em 1
o
de setembro, fazendo inicialmente o percurso
pela Rua da Conceição, tendo, posteriormente, outro ramal pela Rua do Hospício. No
2
Em 1872, existiam seis locomotivas, 18 carros de primeira, seis de segunda e seis de terceira classe
(STIEL, 1984).
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ano de 1872, a companhia mantinha também um serviço de diligências entre o ponto
final de Afogados e a vila do Jaboatão.
O percurso total das linhas da Companhia Ferro Carril de Pernambuco
compreendia 23km, além das linhas duplas que partiam da estação central, na Rua
Barão do Triunfo, e terminava em Afogados, Madalena, Capunga e Santo Amaro.
3
As linhas de bondes se expandiram, tendo sido inaugurada, em 1898, a linha
para o Derby e, em 1906, corriam bondes para Jiquiá e hospital D. Pedro II. Instala-se,
posteriormente, três linhas circulares: Ponte Santa Izabel, Ponte da Boa Vista e Cinco
Pontas e um ramal para a Estação Central.
Nas últimas três décadas do século XIX, Recife lançou tentáculos linhas de
trens e de bondes a burro - em rias direções pela planície: ao norte, em direção à
Olinda; a oeste, por Santo Amaro e por Campo Grande, rumo à Apipucos, Dois Irmãos
e Caxangá; ao sul, para Afogados e Jiquiá. Esses primeiros corredores ferroviários,
caminhos e estradas de rodagem serviram como articuladores dos primeiros núcleos de
povoamento urbano com os povoados dos engenhos de cana-de-açúcar, que iriam se
transformar nos futuros bairros da cidade (GOMES, 1997), funcionando, assim, como
fatores estruturadores da organização do espaço urbano. Uma planta da cidade de
1870 reflete esses primeiros tentáculos de penetração do território, conforme se
observa na Figura 1.
Passados dez anos da inauguração da Companhia Ferro Carril de Pernambuco,
esta não mais abarcava a demanda de passageiros, pois o número de veículos
diminuía. Esta diminuição se devia, em parte, ao atravancamento nas ruas centrais da
cidade, com veículos de carga constantemente interrompendo o trânsito de bondes,
parando para carga e descarga, sobre os trilhos, o que motivou também o abandono
de horário no serviço. Os bondes circulavam superlotados, com passageiros espalhados
pelos estribos e plataformas. A eles atribuía-se a morosidade do transporte.
No início do século XX, surgiu uma outra companhia de bondes a burro, a
Companhia Ferro Carril Boa Viagem, fazendo um percurso de Recife a Boa Viagem,
mas que não durou muito tempo. Em 1901, também circula o primeiro automóvel nas
ruas da cidade recifense.
3
Em 1881, a companhia transportou 13.937 passageiros em 1276 viagens. Possuía 48 carros, dos quais
25 se achavam em reserva ou conserto e nove diligências (STIEL, 1984).
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44
Figura 1
Os bondes a burro vão sendo gradativamente extintos para cederem lugar aos
bondes elétricos. Enquanto em outras capitais já havia sido implantada a eletrificação
dos serviços de bondes, Recife, apesar de seu espírito pioneiro, demorou para instalar
este serviço. Segundo Stiel (1984), algumas propostas surgiram, entretanto, não foram
concretizadas, a exemplo da empresa inglesa Bruce Peebles Company Limited que, em
1905, propôs a compra da empresa de carris para eletrificar seu sistema. Embora sua
proposta tenha sido aceita pela companhia dos bondes a burro, logo depois, anula-se o
negócio. A companhia de bondes a burro, talvez com o intuito de amenizar o impacto
diante do povo, instala lâmpadas elétricas abastecidas por acumuladores em seus
bondes, que passaram a ser chamados pela população de “eletroburros”.
PLANTA DA CIDADE DO RECIFE - 1870
Fonte: COSTA, F. A. P. da.
Arredores do Recife
. Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife,
1981 (apud VERAS, 1999, p. 112).
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O serviço de bondes elétricos em Recife, inicia-se com a empresa Pernambuco
Tramway & Power Company Ltd., que inaugura a primeira linha em 13 de maio de
1914, entre Recife e a Praça Maciel Pinheiro e outra linha até Cabanga. Em julho do
mesmo ano, iniciou-se o tráfego na nova linha elétrica de Soledade e, em outubro,
inaugura-se a do Jiquiá e a linha de bondes a vapor entre Recife e Olinda é eletrificada.
O bonde elétrico para a Ponte d’Uchôa é inaugurado em abril de 1915 e, em
maio, abre-se a linha da Torre. Com a construção desta última, desaparecem
totalmente os bondes a burro na cidade. Em setembro inaugurou-se a linha do Zumbi
e, em outubro, o bonde corria até a povoação de Caxangá e para a Várzea, quando os
bondes elétricos substituíram a estrada de ferro suburbana “Brazilian Street Railway”.
A linha de Casa Amarela foi inaugurada em novembro de 1916 e, em dezembro
deste mesmo ano o bonde chegou à Casa Forte. No início do ano de 1917, inaugurou-
se a linha elétrica para Dois Irmãos. Uma rota para Jaboatão também havia sido
planejada, mas nunca foi construída, indo o bonde somente até Tejipió.
As linhas de bondes elétricos para Beberibe e Tejipió foram inauguradas em
junho de 1922 e, no ano seguinte, iniciam-se os trabalhos de assentamento da linha
mais extensa do Recife, a de Boa Viagem, cuja inauguração ocorreu em outubro de
1924, com uma linha que partia do Recife, atravessava o Pina e percorria toda a vasta
extensão da Avenida Beira-Mar. Em novembro de 1924, inaugurou-se a linha da
avenida da Ligação, com ponto final na curva da avenida Beira-Mar e, em 1925,
finalizou-se o assentamento dos trilhos nas linhas Singella e Pará.
Inicialmente, circulavam no Recife bondes abertos de 12 bancos, similares aos
que trafegavam no Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. Depois vieram os carros
fechados, com apenas uma entrada, aos quais a população denominava de “gigolôs”.
Na década de 1930, surgem os chamados “zepelins”, bondes grandes e prateados.
Existiam ainda aqueles de segunda classe, que eram conhecidos como “lorés”. Recife
possuía, entre 1930 e 1940, junto com Porto Alegre, os melhores serviços de transporte
coletivo urbano sobre trilhos do país.
Na década de 1940, ocorreu a ruptura da forma tentacular da cidade, onde, ao
sul, configurava-se uma forma com os tentáculos e, ao norte, a mancha urbana se
estendia na planície, subindo os morros. Os bairros se interligaram com a ocupação
das áreas vazias entre os tentáculos, ao norte, tornando-se uma mancha contínua e
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compacta de quadras, ruas e edificações, abrangendo os bairros do Recife, Santo
Antônio, São José, Boa Vista, Santo Amaro, Graças, Encruzilhada, Beberibe, Casa
Amarela e Poço. Os lugares entre os tentáculos, antes marcados pela paisagem natural,
vão se transformando em ambientes construídos, comportando múltiplas atividades e
deslocamentos. Ao lado dos deslocamentos radiais (centro-periferia), assegurados pelas
vias existentes, passaram a existir deslocamentos perpendiculares e transversais,
advindos das novas ruas.
Neste contexto, o fluxo dos automóveis e ônibus se intensificavam. O bonde
circulava decadente, superlotado, em meio ao trânsito congestionado devido à
intensificação daqueles veículos. Culpava-se, entretanto, os bondes por todo o atraso e
congestionamento, desejando-se a extinção desses “incômodos concorrentes” aos
ônibus e automóveis, vistos como solução para o problema.
Este quadro marcava o período a partir do final da Segunda Guerra Mundial,
quando o sistema de bondes, cujo apogeu foi atingido em 1942, começou a declinar
rapidamente. Neste período, a exportação de peças de reposição havia sido proibida e
o país não possuía indústrias desse ramo, encontrando-se o sistema de bondes em
processo de deterioração.
Desta forma, nos primeiros anos da década de 1950, existia apenas algumas
linhas em funcionamento, que foram sendo extintas. No ano de 1951, termina-se o
tráfego de bondes da área insular do Recife até Santo Antônio. Em 1953, existiam
quatro linhas em operação: Dois Irmãos, Beberibe, Campo Grande/Peixinhos e Olinda.
Em meados de 1955, o serviço de bondes elétricos da cidade é extinto. Finda-se, assim,
no Recife, a trajetória dos bondes, transportes que contribuíram para o
desenvolvimento da área portuária e do centro da cidade, como também para a
consolidação de uma estrutura urbana crescendo ao longo das vias de circulação.
No início dos anos de 1950, a oferta de transporte coletivo era assegurada pela
operação privada realizada através de veículos de pequeno porte, operados por
condutores autônomos
4
. Este transporte se desenvolveu em paralelo à deterioração e à
4
Conforme Brasileiro (1999), no ano de 1953, 128 proprietários operavam 501 veículos e, 50% destes
proprietários possuíam apenas um veículo. Em 1961, este percentual era de 58%, dentre os 124
condutores, que operavam um total de 400 veículos.
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extinção dos serviços de bondes, marcando a fase de transição destes últimos aos
ônibus.
Nesta fase de transição, ressalte-se a presença da empresa Pernambuco
Autoviária, que foi criada, em 1947, a partir de um contrato de concessão de dez anos
para a operação de ônibus na cidade, marcando um momento especial da evolução
dos transportes em Recife. Esta empresa deveria cumprir duas exigências: sua frota
deveria ser composta exclusivamente por ônibus e cada linha deveria possuir um
mínimo de quatro veículos. No ano de 1953, a Pernambuco Autoviária possuía uma
frota de 81 ônibus, operando em 16 linhas. Face a dificuldades de renovação da frota,
a empresa se dissolve no ano seguinte (BRASILEIRO, 1999).
Recife continuava em seu processo de expansão espacial, expresso através do
alargamento dos seus tentáculos, perdendo aos poucos a configuração linear primitiva.
Os bairros e subúrbios foram se ampliando e se soldando uns aos outros e ao espaço
central, delineando uma massa de construções contínuas. Os nódulos periféricos foram
se expandindo, alongando-se e emendando-se uns aos outros e aos bairros e subúrbios
(MELO, 1978).
A partir da década de 1950, as áreas vazias entre os tentáculos ao sul foram
sendo ocupadas, com o prolongamento da mancha urbana em quase toda a extensão
territorial da cidade, inclusive, formando-se novos bairros como Imbiribeira, Jordão e
Ibura. Os tentáculos ou avenidas continuaram a existir, entretanto, os lugares ocupados
dilataram-se, incorporando novas áreas além daquelas limítrofes a essas vias. Assim, ao
longo dos anos de 1950, outra configuração urbana surgiu na cidade, delineando a
fisionomia urbana do Recife na atualidade (PONTUAL, 2001).
Nesta época, a cidade é marcada pelo acelerado crescimento demográfico
devido tanto ao crescimento vegetativo quanto aos fluxos migratórios. As populações
de baixa renda, advindas do interior do estado e de outras capitais do Nordeste,
concentravam-se nos bairros mais afastados do núcleo central. Para atender a estas
áreas, a estratégia do novo serviço de transporte, que se começou a esboçar, foi a de
ampliar o serviço para além dos bairros próximos ao centro histórico, através de
veículos sobre pneus, mais flexíveis e rápidos.
Desta forma, no âmbito do efervescente ambiente de planejamento urbano e
regional, marcado por uma forte intervenção dos prefeitos no sentido de reorganizar a
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oferta privada de transporte nas cidades nesta época, Recife, que era pioneiro em
planejamento urbanístico, buscou reorganizar o serviço, reduzindo o número de
operadores e incutindo a formação de empresas de ônibus. Com este intuito, o prefeito
José do Rego Maciel (1954-1957) adotou um regulamento, no qual se sugeria a
extinção dos veículos de pequeno porte em três anos; a definição de um número de 40
lugares em cada ônibus; a substituição do motor à gasolina pelo diesel e a
padronização das características técnicas do ônibus (BRASILEIRO, 1999).
Nos anos de 1950 e início da década de 1960, similarmente ao que ocorreu em
várias cidades do país, em Recife, os trólebus surgiram como novo tipo de transporte
coletivo, com o objetivo de substituir o bonde e suprir as deficiências da oferta de
transportes, tanto de bondes quanto dos operadores dos veículos de pequeno porte.
Assim, projetaram-se várias linhas de trólebus: Beberibe, Campo Grande, Casa
Amarela, Caxangá, Córrego do Euclides, Engenho do Meio, Mustardinha, Peixinhos,
San Martin, Tejipió, Várzea, Vasco da Gama, Vila do Ipsep. Algumas foram desativadas
posteriormente. A inauguração desse novo serviço ocorreu no ano de 1960 pela
Companhia de Transportes Urbanos CTU.
Na década de 1960, o sistema de transporte coletivo operava com 38 ônibus
elétricos, não havendo nenhum ônibus a diesel. Após cinco anos de instalação desse
serviço, em Recife circulavam 80 ônibus a diesel e 65 trólebus. Na década seguinte
estes últimos eram em mero de 115, contra 343 ônibus a diesel (GOMES, 1997).
poucos anos atrás, estes veículos ainda circulavam em Recife, tendo sido
posteriormente extintos.
5
A forma e o processo de crescimento da cidade do Recife se repetiam agora em
escala metropolitana, com o crescimento ao longo das vias de circulação efetivado, em
parte, de modo contínuo e, em parte, através de nódulos separados, mas com
tendência a emendarem-se uns aos outros e à área nuclear, marcando a fase do
processo de metropolização (MELO, 1978). Este processo de ocupação extensiva da
cidade é expresso através do Mapa 2.
5
No final da década de 1980, quando o sistema de trólebus se encontrava em colapso, com a ajuda da
EBTU passou a ser reorganizado, havendo o remanejamento de várias linhas e reforma e compra de
novos veículos. Reinicia-se, assim, o tráfego de trólebus, sendo o serviço inaugurado em 13 de setembro
de 1981 na linha da avenida Norte. No ano seguinte, foram inauguradas as linhas da Caxangá a da Cruz
Cabugá. No ano de 2000, os trólebus ainda circulavam em três linhas no Recife – Caxangá/Várzea, Av.
Norte/Macaxeira e PE 15 , quando foram totalmente extintos da cidade.
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Guabiraba
Afogados
Caxang á
Iputinga
Várzea
C idade
Universitária
Engenho
do Meio
Torrões
Curado
San Ma rtim
Jardim
São Paulo
Jiquiá
Estância
Areias
Ipsep
Imbiribeira
Ibura
Boa
Viagem
Caçote
Pina
Recife
Santo Am aro
Bo a Vista
Santo
Antônio
São José
Campo
Grande
Encruzilhada
Arruda
Graças
Dois Unidos
Pa ssarinho
Dois Irmãos
Cordeiro
Ma dalena
Torre
tio
dos Pintos
Vasco
da
Gama
Água Fr ia
Apipucos
Casa Am arela
Brasília
Teimosa
Pe ixinhos
Be beribe
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO EXTENSIVA
DA CIDADE DO RECIFE
Fonte: PCR, 2003
Adaptação: Diana Souza
Clélio Santos
Data: Agosto, 2003
MAPA 2
N
O
S
E
SÉCULO XVII
SÉCULO XX
SÉCULO XIX
SÉCULO XVIII
1,2 Km
1,2
2,4
3,6
4,8
0
ESCALA APROXIMAD A
49
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As décadas de 1960 e 1970 marcaram a fase inicial desse processo nas grandes
cidades brasileiras, e entre estas, em Recife. Essas cidades passaram por um intenso
processo de crescimento, fruto da expansão populacional e industrial, caracterizadas
por um modelo de crescimento urbano baseado na existência de um centro e uma
periferia tentacular em permanente expansão, que em geral seguiu os eixos viários. A
posterior conurbação do núcleo original em expansão com os núcleos urbanos
vizinhos completou este processo de metropolização (LACERDA; ZANCHETI; DINIZ.
[2000?]).
Este direcionamento da ocupação urbana do território através das antigas
estradas de penetração no território regional a partir do Recife, configurou a atual
mancha urbana da RMR, com seus grandes ramos de urbanização (Mapa 3). A esta
morfologia urbana tecem-se analogias como a que a compara à forma de um “leque
aberto”, ou “mão espalmada”, dado o traçado radioconcêntrico, a partir do porto e em
torno dele, ou ainda a uma estrutura foliar principal que, superposta ao espaço urbano
construído da RMR, apresenta uma forte semelhança estrutural. Se o Recife
Metropolitano houvesse crescido organicamente deveria hoje possuir uma morfologia
semelhante à da referida folha (GADÊLHA, 1997).
Na RMR, especificamente, o transbordamento urbano, decorrente do fenômeno
de metropolização, manifestar-se pela extensão do Recife segundo os corredores
formados pelas vias principais do tráfego inter-regional. Este processo dá-se ao norte
até Igarassu, ao sul até o Cabo e a oeste até Jaboatão e São Lourenço da Mata
(GADÊLHA, 1997).
Em 1973, o governo federal, na busca da integração regional, no âmbito da
perspectiva desenvolvimentista do Estado brasileiro, institui as Regiões Metropolitanas
no País e, no que tange à Região Metropolitana do Recife, esta passou a ser
inicialmente composta pelos municípios de
Recife
,
Cabo de Santo Agostinho
,
Igarassu
,
Itamaracá
,
Jaboatão
,
Moreno
,
Olinda
,
Paulista
e
São Lourenço da Mata
. Em 1982,
foram acrescentados os municípios de
Itapissuma
, emancipado de Igarassu,
Abreu e
Lima
, emancipado de Paulista, e
Camaragibe
, emancipado de São Lourenço da Mata.
Em 1994 e 1995, respectivamente, foram acrescidos também à RMR os municípios de
Ipojuca
e
Araçoiaba
, este último desmembrado do município de Igarassu. Atualmente
14 municípios compõem a RMR:
Recife
,
Cabo de Santo Agostinho
,
Igarassu
,
Itamaracá
,
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Jaboatão dos Guararapes
,
Moreno
,
Olinda
,
Paulista
,
São Lourenço da Mata
,
Itapissuma
,
Abreu e Lima
,
Camaragibe
,
Ipojuca
e
Araçoiaba
- (Mapa 4).
Neste contexto, os deslocamentos ultrapassam os limites da capital, passando a
assumir um caráter metropolitano. Fazia-se necessário conceber um sistema de
transporte que abrangesse todo o aglomerado urbano, o que ocorreria na segunda
metade dos anos de 1970.
Nos anos de 1960, assim como em diversas cidades brasileiras, no Recife
também predominou a política de circulação urbana no sentido de “adaptar a cidade
ao automóvel”, privilegiando a classe média em ascensão. Os investimentos públicos
voltaram-se para a construção da malha viária em detrimento dos transportes coletivos,
que se deterioravam.
Nestes anos, intensificava-se, no Brasil, o processo de industrialização,
impulsionado pela produção de bens duráveis. Em Recife ocorreu uma diversificação
da economia local, com a criação de distritos industriais, transferindo-se as indústrias
para as áreas periféricas e desocupadas da aglomeração urbana. Os estabelecimentos
industriais localizados nos bairros do núcleo primitivo da cidade foram cedendo lugar
para o adensamento das atividades comerciais, financeiras e administrativas. Acentua-
se o crescimento urbano periférico devido às migrações e ao porto de onde parte a
malha rodoferroviária que liga a capital pernambucana ao resto do país. Os
deslocamentos assumiam uma escala metropolitana.
Em função disso, ocorreu uma crise no sistema de transportes coletivos, visto
que o modelo em vigor era inadequado ao contexto urbano em transformação. Além
disso, a Companhia de Transportes Urbanos - CTU, que exercia a tutela sobre as
empresas privadas de ônibus, encontrava-se em processo de deterioração, com
veículos operando em linhas deficitárias em todo o Recife, e no âmbito metropolitano,
o Departamento de Terminais Rodoviários, que controlava as linhas intermunicipais
(40% do total das linhas da aglomeração), não dispunha de meios para programar ou
fiscalizar a operação (BRASILEIRO, 1999).
Predominava, então, uma oferta baseada em pequenas empresas privadas, de
caráter familiar, a maioria delas possuindo de um a cinco veículos, trafegando em
linhas que não eram hierarquizadas, com itinerários traçados de forma aleatória,
dirigindo-se ao centro da cidade, com baixa velocidade operacional. Este cenário
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começou a mudar na segunda metade dos anos de 1970, diante da intervenção do
governo federal nos transportes coletivos, colocando em prática o modelo centralizado
de planejamento neste setor.
Nos últimos anos da década de 1970, época de regime militar, marcada por
uma cultura brasileira de planejamento centralizado, com a implementação e a
construção de uma política metropolitana baseada nas regiões metropolitanas e
baseada nas fundações metropolitanas, passa-se a se conceber o sistema de transporte
dentro de uma visão metropolitana.
Assim, a partir do modelo de planejamento de transportes urbanos preconizado
pelo governo federal, fundamentado na Empresa Brasileira de Transporte Urbano
EBTU e nos organismos metropolitanos, criou-se a Empresa Metropolitana de
Transportes Urbanos EMTU, instituída legalmente em 1979, com o objetivo de
estruturar, gerenciar e fiscalizar o Sistema de Transporte Público de Passageiros da
Região Metropolitana do Recife STPP/RMR, que foi instituído no mesmo ano.
Neste âmbito, ressalte-se a importância da criação da EMTU, que,
historicamente se constitui na única experiência bem sucedida de gestão metropolitana
de transporte no Brasil, conforme ressalta Brasileiro (2002, p. 11):
Se de um lado a EMTU é fruto de uma política centralizadora e autoritária do
governo federal, por outro lado a construção político-institucional e técnica da
EMTU foi, não só muito bem engenhosa, como obedeceu a história e a cultura
da cidade. Daí a razão do sucesso da EMTU ao longo da sua história e do seu
reconhecimento como um organismo de alta capacitação técnica ter muito a
ver com respeito a sua história...
A EMTU passava a responder à necessidade de se pensar o transporte dentro de
uma visão metropolitana dadas as características da cidade do Recife, cuja
configuração física, urbanística e político-institucional sempre tiveram uma
característica metropolitana. Esta empresa surgia num momento importante, uma vez
que, aliava um crescimento populacional e uma necessidade de superar o
artesanalismo predominante nas empresas da época e de superar as deficiências que
existiam no sistema de transporte.
Segundo Brasileiro (1999), no período de criação deste órgão havia 37 empresas
operadoras de ônibus, que atuavam de forma desordenada, funcionando em regime de
concorrência, sem nenhum controle dos custos operacionais, com itinerários
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superpostos e deixando muitos locais sem atendimento, sobretudo aqueles de baixa
renda. Na área central da cidade, para onde convergia a totalidade das linhas, as
condições de operação eram precárias, com baixa velocidade operacional e com
terminais espalhados, dificultando os deslocamentos.
Com o intento de reorganizar as empresas de ônibus e racionalizar as linhas e
terminais, a EMTU elaborou um documento, denominado “Zoneamento da Região
Metropolitana do Recife”, que dividiu a aglomeração em 16 áreas, cada uma a ser
operada por uma empresa ou consórcio de empresas, através de termo de permissão.
Através deste documento foram discutidos os processos de redefinição das linhas, de
fusão de linhas, de criação de novas linhas, de diminuição das empresas através da
fusão das mesmas e de redução da grande quantidade de tarifas que existia.
Ressalte-se também que, no final dos anos de 1970, devido à urbanização
acelerada das cidades periféricas e à configuração radioconcêntrica, os problemas da
cidade do Recife se agravaram, sobretudo na sua área central, marcada por um
expressivo inchaço das atividades, por congestionamentos, poluição e grande
especulação fundiária sobre os terrenos ao longo dos eixos de transporte.
Com o intuito de resolver estes problemas, a Fundação de Desenvolvimento
Metropolitano - FIDEM, atual Fundação de Desenvolvimento Municipal, buscou
desobstruir o centro, propondo um crescimento urbano da aglomeração a partir de
quatro nucleações, cuja consolidação deveria ser grandemente induzida pelos
transportes. Estas nucleações compreenderiam: 1. Centro tinha como objetivo
consolidar as atividades financeiras e terciárias, englobando o núcleo central histórico
do Recife, constituído pelos espaços conurbados do Recife e de Olinda e do distrito de
Prazeres, em Jaboatão, a qual se agregariam, ao longo da BR-101, as nucleações norte
e sul; 2. Norte ao longo da referida rodovia, integrando os espaços em vias de
urbanização de Paulista à Igarassu, através da construção de distritos industriais; 3. Sul
também ao longo da BR-101, integrando a sede do município do Cabo ao complexo
industrial-portuário de Suape; 4. Oeste previa-se uma nucleação que deveria
promover a integração entre as sedes dos municípios de São Lourenço da Mata,
Camaragibe, Jaboatão e Moreno, ao longo da rodovias BR-232 e BR-408, através da
implantação de grandes equipamentos públicos: terminal rodoviário de passageiros
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(inaugurado em 1987), trem metropolitano (implantado em 1985), central de
distribuição de cargas e centro administrativo.
A partir dessas nucleações, o Plano Diretor de Transportes de 1982 propunha
uma estrutura do sistema de transportes compreendida pela rede viária principal e pela
rede viária complementar. A primeira interligava as nucleações entre si, prevendo-se,
ao sul e a oeste, a utilização do sistema ferroviário existente e, ao norte, o trólebus. A
segunda era formada pelas vias coletoras e alimentadoras, cujo objetivo era atender aos
deslocamentos no interior da nucleação, sendo utilizadas pelos ônibus diesel. Nos anos
seguintes, porém, sob efeito da crise econômica, a implantação das nucleações não
ocorreu no tempo previsto nem no ritmo desejado. Algumas ações foram colocadas em
prática com alguns anos de atraso. Todavia, ressalte-se que, o modelo de
desenvolvimento proposto pela FIDEM teve o mérito de pensar uma proposta de
crescimento para a aglomeração a longo prazo.
O atual sistema de transporte público de passageiros se delineou, portanto, a
partir da criação da EMTU, com a instituição do STPP. Este, composto pelo metrô, trem
e ônibus, tem como espinha dorsal esta última modalidade, cabendo à EMTU a sua
gestão. Este órgão se caracteriza como uma empresa pública de direito privado,
responsável pelas linhas de ônibus intramunicipais do Recife e intermunicipais do
aglomerado metropolitano. Os sistemas intramunicipais de transportes dos demais
municípios que compõem a RMR são geridos pelas respectivas prefeituras.
O sistema de transporte coletivo por ônibus na RMR é operado por 17
empresas, através de uma frota de mais de 2.700 veículos, que percorrem 369 linhas,
realizando mais de 24.000 viagens por dia e transportando cerca de 1.500.000
passageiros diariamente (EMTU, 2006a).
Saliente-se ainda, nos transportes coletivos da aglomeração, o Sistema Estrutural
Integrado - SEI, concebido pela EMTU em 1985 e 1986, que começou a ser implantado
em 1994 e continua em expansão. Este sistema é uma rede de transporte público
composta de linhas de ônibus e metrô, integradas através de nove terminais,
possibilitando uma multiplicidade de ligações de origem-destino, através de viagens
modais ou multi-modais.
O SEI apresenta uma configuração espacial constituída por eixos radiais e
perimetrais, ficando situados, no cruzamento destes dois eixos, os Terminais de
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Integração. O acesso do subúrbio a esses Terminais de Integração se dá através das
linhas alimentadoras. Esse sistema possui 12 empresas operadoras, responsáveis por 64
linhas, das quais 41 são alimentadoras, 9 perimetrais, 9 radias, 4 interterminais e 1
circular, atendendo dez dos quatorze municípios da RMR. Os tipos de linhas são
representadas pelas cores dos ônibus: 1. Amarelo – linha alimentadora, aquela que leva
o usuário da sua comunidade para o terminal de integração; 2. Azul linha
radial/troncal, leva o usuário do terminal integrado para o centro do Recife; 3. Verde
linha interterminal, liga um terminal integrado a outro; 4. Vermelho linha perimetral,
corta os grandes corredores sem passar pelo centro (EMTU, 2006b). Este Sistema
Estrutural Integrado se apresenta como a espinha dorsal do sistema de transporte
público que se pretende expandir e consolidar.
Atualmente se discute um novo modelo de gestão para o sistema de transporte,
que hoje é gerido pela EMTU. O transporte público metropolitano passará a ser
gerenciado através do Consórcio Metropolitano de Transporte, que se pauta num
modelo de gestão compartilhada entre o Governo do Estado e os 14 municípios
metropolitanos, cujo objetivo é propiciar uma rede de transporte mais integrada e
revitalizar os sistemas de transporte municipais. Segundo a EMTU, no ano de 2003, o
consórcio seria uma empresa estadual, ficando o Estado com 51% das ações, a
Prefeitura do Recife com 30% e os demais municípios metropolitanos com 19%.
Isto posto, delineia-se aqui sumariamente a forma como se estruturou o atual
sistema de transporte coletivo convencional na RMR, onde atualmente se concentra
uma população de mais de 3.000.000 de habitantes, em torno de 42% da população
pernambucana, e grande parte das atividades econômicas do estado, apresentando
uma malha viária marcada por intensos fluxos de mercadorias e de pessoas, tanto na
modalidade de transportes públicos como na de privados de passageiros. No tocante a
este último, saliente-se o acelerado crescimento do número de automóveis em
circulação na RMR, principalmente no Recife.
Nos anos de 1990, em paralelo ao sistema de transporte coletivo convencional
que se configurou na RMR, intensificou-se o transporte de passageiros operado por
veículos de pequeno porte, saltando aos olhos o expressivo fluxo de kombis, bestas e
vans no traçado viário metropolitano, onde circulavam cerca de 7.000 veículos, com
maior atuação no Recife.
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Se, por um lado, a circulação indiscriminada dessas micro-unidades alternativas
de transporte gerou uma série de problemas para o espaço urbano, por outro lado,
essas unidades passaram a atender uma parcela significativa da população, que adotou
uma postura positiva diante da atividade, dadas as características de flexibilidade,
rapidez e freqüência por ela apresentadas, além de gerar uma oportunidade de
emprego para muitos indivíduos que passaram a operá-la.
A presença marcante do transporte alternativo na dinâmica metropolitana,
suscitou inúmeras reflexões acerca do transporte coletivo na cidade, envolvendo
posicionamentos bastante controversos, tanto por parte dos técnicos desta área como
pelo Poder Público municipal e estadual, que em geral tenderam a considerá-lo como
opositor e clandestino, devido à concorrência predatória que passou a exercer junto às
empresas de ônibus e aos impactos gerados pela circulação de suas micro-unidades.
Dada a importância do fenômeno em questão e o objetivo deste estudo, a seguir
será abordado como o transporte alternativo passou a se apresentar na cidade do Recife
e quais as propostas para uma definição do papel deste transporte tanto na capital
quanto no âmbito do transporte intermunicipal metropolitano.
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2.2 - Um Esboço do Transporte Alternativo na Cidade do Recife: Os Atores Sócio-
Espaciais e os seus Conflitos
A exemplo de outras cidades brasileiras, durante os anos de 1990, em paralelo à
organização espacial do sistema de transporte coletivo convencional, o transporte
alternativo se intensificou significativamente na cidade do Recife. Esta atividade não
se expandiu na capital, mas em todo o tecido urbano metropolitano e em algumas
cidades do interior do estado. Assim, assistiu-se, na última década do século XX, a um
crescimento extraordinário de vans, bestas e, predominantemente, kombis realizando o
transporte de passageiros na capital e demais municípios metropolitanos, um aumento
do número de toyotas e carros particulares e a presença de kombis, partindo do Recife
para municípios das Zonas da Mata e Agreste, tais como Paudalho, Carpina,
Serinhaém, Limoeiro e, destes à capital, bem como uma intensificação de motocicletas,
as chamadas mototáxis, em cidades do interior, como Vitória de Santo Antão e
Timbaúba, por exemplo.
No âmbito metropolitano, a expansão deste tipo de transporte, realizado
principalmente por kombis e vans, ocorreu de forma “desordenada” e sem controle por
parte do Poder Público Estadual, que, na verdade, ignorou a atividade, não propondo
nenhuma resolução efetiva para a questão durante os anos de 1990. Na esfera
municipal, algumas prefeituras autorizaram muitas kombis, através da concessão de
alvarás de licença, a operarem como veículos de aluguel dentro dos limites territoriais
do seu município. Entretanto, os motoristas de kombis ultrapassaram estes limites,
passando a ocupar e, em certa medida, a se apropriarem dos principais corredores do
tráfego na RMR, percorrendo não o espaço intramunicipal, como também o
intermunicipal. Além dos veículos de aluguel, passou a circular também em toda a
Região Metropolitana uma grande quantidade de veículos particulares e veículos
licenciados em municípios fora da RMR e até mesmo em outros estados da região
Nordeste.
De acordo com uma pesquisa realizada em 1999 pela Associação Nacional dos
Transportes Públicos ANTP (2000), cerca de 6700 veículos circulavam na RMR e,
dentre estes, em torno de 4000 tinham como destino a cidade do Recife. Segundo
Machado (2000), em reportagem do Jornal do Commercio, esta pesquisa, realizada
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pela ANTP, aponta que, de 1994, quando foi feito um levantamento pelo IBOPE, para
1999, o mero de kombis na RMR aumentou mais de 200%, enquanto a quantidade
de usuários subiu apenas 170%. Segundo a pesquisa, o transporte alternativo
transportava cerca de 163.000 pessoas por dia e movimentava aproximadamente R$ 3
milhões por mês.
Um diagnóstico realizado pela companhia de Trânsito e Transporte Urbano
CTTU (2001) sobre o transporte alternativo no Recife, aponta que aproximadamente
1200 veículos atuavam no âmbito da capital, transportando o equivalente a 20% da
demanda do sistema de transporte municipal.
Segundo alguns técnicos do setor de transporte e notícias veiculadas nos
principais jornais locais, a expansão das micro-unidades alternativas foi tão expressiva
a ponto de ameaçar a viabilidade econômica do STPP devido à concorrência acirrada
que passou a exercer junto a este, sobretudo ao transporte por ônibus, absorvendo
uma significativa parcela de passageiros do transporte coletivo.
De acordo com Margarette (2000), em reportagem do Diário de Pernambuco, o
sistema convencional deixava de arrecadar R$ 4,5 milhões por mês, ou R$ 54 milhões
por ano face ao crescimento do transporte alternativo, cuja expansão vinha
provocando uma queda no número de usuários do STPP há dez anos.
Reportagens do Jornal do Commercio, no início do ano de 2003, apontavam
que, nos últimos anos, as empresas de ônibus da Região Metropolitana passaram por
uma crise financeira, agravada pela concorrência das kombis. A atividade também
causou uma redução do número dos usuários de táxis. Segundo o presidente do
Sindicato dos Taxistas de Pernambuco, com a invasão das kombis, bestas e vans ao
centro da cidade, os taxistas perderam metade dos passageiros.
De acordo com matérias do Jornal do Commercio, em 2003, os empresários do
transporte coletivo estavam demitindo funcionários e reduzindo a frota de ônibus,
alegando descompasso entre receitas e despesas, em função do aumento dos insumos e
da concorrência com as kombis. Diante disso, os empresários afirmavam que era
preciso haver uma redução da frota de ônibus para se conseguir um equilíbrio no
sistema, pressionando a EMTU para retirar linhas deficitárias do sistema.
No início de 2003, a EMTU autorizou que as operadoras retirassem 120 ônibus
de circulação, mas os empresários continuaram a pressionar aquele órgão gestor para
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uma redução ainda maior do número de veículos. Entretanto, a Empresa Metropolitana
afirmava que não ia ceder às pressões porque as linhas eram de grande interesse social
e não podiam deixar de serem operadas e que as mesmas são bancadas por outras
linhas que dão lucros.
Diante da proliferação do transporte alternativo no espaço urbano do Recife, as
empresas operadoras do transporte coletivo inicialmente apenas pressionavam a EMTU
para que esta coibisse a ação dos kombeiros, alegando que estes últimos exerciam uma
concorrência desleal ao transporte por ônibus devido ao seu crescimento sem controle
e à ausência de regras para operarem. E a única medida adotada pelo Estado para este
tipo de transporte, a princípio, foi a restrição da atividade através de pontos de
bloqueio sob a fiscalização do Departamento Estadual de Trânsito de Pernambuco -
Detran/PE, cujo objetivo era impedir ou pelo menos restringir o acesso dos kombeiros
ao centro do Recife. Porém, restringir a ação dos kombeiros não resolvia o problema,
visto que, as kombis continuavam a se expandir em toda a RMR.
De um lado, os empresários do transporte coletivo, muitas vezes, mais
preocupados em garantir os seus lucros que propiciar um transporte de melhor
qualidade à população, pressionavam o Poder Público Estadual para que este atuasse
no sentido de reprimir o transporte alternativo. Estes empresários, em geral, não
encaram o serviço de transporte como uma delegação do Estado para que prestem um
serviço. O empresário se considera “proprietário” do sistema, “proprietário” de uma
determinada linha porque está atuando nela cerca de cinqüenta anos e, portanto,
quem quer que passe a concorrer “na linha dele” no seu território - está errado e deve
ser reprimido.
De outro lado, o transporte alternativo, que foi se fortalecendo em toda a Região
Metropolitana, pressionava os governos municipal e estadual para continuar atuando.
Seus atores se organizaram através de associações, cooperativas e sindicatos para
reivindicar a legitimação da atividade. Em 1994 foi criado o Sindicato dos Condutores
Autônomos em Transportes Alternativos de Passageiros do Estado de Pernambuco -
Sindikombi, o qual, desde então, passou a reivindicar a regulamentação do serviço na
Região Metropolitana. No âmbito da cidade do Recife, criou-se o Sindicato do
Transporte Alternativo do Recife - SindRecife, com o objetivo de regulamentar a
atividade na capital. Em alguns municípios da RMR, os kombeiros também passaram a
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se organizar em associações e/ou cooperativas, visando ao reconhecimento da
atividade.
Assim como em outras cidades brasileiras, o crescimento desenfreado deste tipo
de transporte trouxe inúmeros problemas, como o congestionamento nas principais
vias do tráfego urbano, que também sofre com o crescimento acelerado do número de
automóveis particulares, sobretudo no Recife, a imprudência no trânsito e, por
conseguinte, a insegurança no transporte de passageiros devido ao não cumprimento
da legislação de trânsito por parte de muitos dos trabalhadores que atuavam nesse
serviço: circulação com porta aberta, deslocamentos em alta velocidade, excesso de
lotação, falta de equipamentos obrigatórios e precariedade dos veículos sob o ponto de
vista de conforto e segurança. A forma como a atividade se delineava demonstra o
descompromisso que muitos trabalhadores desta atividade tinham com o serviço que
realizavam e com os usuários que transportavam.
Além disso, este transporte não assegurava aos usuários que dele se utilizavam
benefícios como isenção de tarifa para idosos e para pessoas portadoras de deficiências
físicas e mentais, e meia tarifa para estudantes. Saliente-se ainda que, esta atividade
não recolhia impostos, não pagava encargos trabalhistas e, muitas vezes, utilizava mão-
de-obra sem registro e sem qualificação, e explorava o trabalho de menores (muitos
cobradores de kombis têm idade abaixo de 18 anos).
Todavia, se por um lado este transporte tal como acontecia, provocava sérios
problemas nas cidades, por outro lado, ele também propiciava aos usuários do
transporte coletivo uma alternativa de circulação, trazendo algumas vantagens no que
tange aos deslocamentos no atual quadro urbano, tais como freqüência, menor tempo
gasto no percurso da viagem, adequação de suas rotas e paradas à conveniência dos
passageiros, flexibilidade na definição de itinerários e tarifas (estas são negociáveis
entre o condutor e o usuário), prática de seccionamentos tarifários para trechos
intermediários do percurso. Os dois primeiros fatores, tempo de viagem e freqüência,
eram os mais considerados pelos usuários.
Ressalte-se que a aceitação de bilhetes do sistema de transporte convencional
(vales-transporte) para o pagamento da passagem no transporte alternativo, foi também
um meio que facilitou a operação da atividade. A este respeito, vale assinalar que,
existe na RMR um mercado secundário do vale-transporte, que viabiliza a utilização do
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mesmo como moeda, permitindo, assim, a compra de bombons, picolés, pães, entre
outros produtos, e o financiamento do transporte alternativo tal como acontecia até
2003. O vale-transporte funciona como um título que pode ser convertido em moeda,
desde que negociado com um desconto sobre o seu valor da face. Entretanto, este vale-
transporte de papel está sendo gradativamente substituído por bilhetes eletrônicos
diante da implantação do Sistema Automático de Bilhetagem Eletrônica SABE, cujos
validadores foram implantados tanto nos ônibus da capital recifense quanto nos do
sistema de transporte metropolitano.
Para Brasileiro (1999), conforme exposto na primeira parte deste trabalho, o
fenômeno do transporte alternativo encontra-se atrelado a um contexto de crise
econômica e social, mas sobretudo de crise do transporte convencional. Este, não
atende mais aos deslocamentos, visto que, baseia-se na programação de um sistema de
transporte em grandes eixos para a realização de deslocamentos tipicamente
pendulares (casa-trabalho), que predominaram do final dos anos de 1970 até o início
da década de 1990. A crise econômica desta última década, alterou profundamente a
forma dos deslocamentos face à redefinição das atividades econômicas, com a
predominância das atividades de serviços e terciárias. Assim, as necessidades de
deslocamento da população, como dito anteriormente, são completamente diferentes
daquelas dos anos de 1970, exigindo-se que se insira no sistema de transporte
tecnologias diferenciadas de diversos portes, que possibilitem maior rapidez nestes
deslocamentos.
Desta forma, a expansão do transporte alternativo na RMR durante a década de
1990, encontra-se atrelada à crise do sistema de transporte público convencional que
não conseguiu mais abarcar a demanda de passageiros, deixando brechas para a
atuação deste transporte, que passa a ser uma alternativa de circulação, oferendo maior
rapidez e flexibilidade aos deslocamentos.
Saliente-se que, desde os primeiros anos de 1980 se registrava a presença de
kombis realizando o transporte coletivo nas cidades periféricas (BRASILEIRO, 1995).
existia, portanto, o embrião desta atividade em algumas cidades, havendo uma
massificação deste serviço na década de 1990. Em algumas áreas, onde o transporte
convencional era precário, o transporte alternativo atuava, pouco a pouco,
preenchendo as brechas deixadas por aquele. Posteriormente este transporte se
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incorporou à dinâmica metropolitana, sendo ingrediente novo para outros espaços. Este
tipo de transporte não era novidade para alguns municípios da RMR como Paulista,
Jaboatão dos Guararapes, Moreno, onde existia. Entretanto, essa atividade era nova
para Recife e Olinda, que antes este transporte não chegava ao núcleo central destas
cidades.
Aliado ao fato de ser uma alternativa de circulação, este transporte também
passou a representar uma oportunidade de emprego no competitivo mercado de
trabalho urbano diante do agravamento da crise sócio-econômica nos anos de 1990,
cujos rebatimentos no mercado de trabalho se fazem sentir pelas elevadas taxas de
desemprego. De acordo com Cavalcanti (1997), a expansão deste serviço na RMR está
associada ao cenário adverso da economia pernambucana nos anos de 1980 e início
da década de 1990, quando as transformações no mercado de trabalho e as elevadas
taxas de desemprego favoreceram o crescimento do circuito inferior da economia.
No período de 1980 a 1994, a economia brasileira entra em crise, repercutindo
no espaço nordestino e, por conseguinte, no estado de Pernambuco e na RMR. Nesta,
de 1982 a 1994, as elevadas taxas de desemprego são o principal resultado da
desaceleração do crescimento da economia pernambucana (ARAÚJO apud
CAVALCANTI, 1997, p. 39). Além dos altos índices de desemprego, o mercado de
trabalho apresentou ainda uma redução gradativa do número de trabalhadores com
carteira assinada e paralelamente um aumento do percentual daqueles sem carteira
assinada e dos que trabalham por conta própria.
Este aspecto econômico aponta como um fator preponderante para o avanço e o
fortalecimento do circuito inferior da economia urbana, representado por diversos tipos
de serviços e de comércio, personificado na figura do ambulante, que oferece diversos
produtos como frutas, produtos importados, gelados, no centro do Recife, e do
motorista de Kombi, entre outros. Neste contexto, dados os reduzidos níveis de
educação e especialização existentes na RMR e sendo a atividade do transporte
alternativo relativamente simples e com exigência de pouco capital, a atividade se
expandiu e passou a atrair mais pessoas dispostas a investir no negócio. Decerto, não
pessoas desempregadas se voltaram para a atividade, como também muitos
indivíduos passaram a complementar a renda, seja dirigindo um veículo próprio ou
através de arrendamento do mesmo a terceiros, ou ainda formando frotas de kombis.
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Assim, estruturou-se na Região Metropolitana, o mercado de trabalho do
transporte alternativo, subdividido em quatro categorias, conforme expõe Cavalcanti
(1997): motoristas de aluguel (ou simplesmente motoristas), motoristas-proprietários
(aqueles que detinham a posse do veículo e o conduzia diretamente no dia-a-dia na
realização da atividade), proprietários (a participação destes resumia-se ao
arrendamento do(s) veículos(s) a terceiros, mediante o pagamento de renda diária por
parte dos motoristas) e cobradores (aqueles que cobravam as passagens dos usuários).
O fenômeno do transporte alternativo se tornou bastante polêmico dadas as
ambivalências encerradas por esta atividade entre o atendimento a uma demanda
reprimida e o impacto gerado pela circulação de suas micro-unidades de transporte no
espaço urbano. Embora urgindo a necessidade de uma definição quanto ao papel deste
transporte na cidade do Recife articulado ao contexto metropolitano, durante a década
de 1990 até 2003, a questão fora deixada de lado, sem propostas efetivas que visassem
solucioná-la. Não havia uma articulação nem no âmbito municipal, em que algumas
prefeituras autorizaram a realização da atividade enquanto outras eram contrárias a ela,
nem no âmbito estadual, no qual a atividade foi ignorada.
Nos últimos anos, algumas estratégias passaram a ser adotadas para combater a
atividade: em 1999, a EMTU introduziu no sistema de transporte público micros e
mini-ônibus climatizados e, em 2001, a frota começou a ser renovada, adquirindo-se
ônibus com ar-condicionado e mais confortáveis. Medidas estas que, no entanto,
pouco ou nada refletiram na dinâmica do transporte alternativo. No ano de 2003, em
vias de concretizar-se uma proposta de regulamentação para a atividade, fora realizado
uma forte campanha através de propagandas veiculadas na televisão e de folhetos
distribuídos à população, que procurava alertá-la sobre os riscos deste transporte,
sempre considerado como opositor e clandestino, conforme demonstra o Anexo 1, na
página 176.
Os sinais para uma definição de fato para a questão do transporte alternativo são
dados a partir de uma parceria entre a EMTU, prefeituras da RMR e Polícia Militar,
cujas propostas começam a repercutir no início do ano de 2003. Em março do referido
ano, com o apoio do governo estadual, a Prefeitura do Recife apresentou um projeto de
lei que regulamenta o transporte de passageiros por veículos de pequeno porte na
capital, reconhecendo-o como transporte complementar aos ônibus, tendo sido o
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mesmo aprovado pela Câmara dos Vereadores em 15 de abril. Assim, institui-se, de
acordo com a Lei Municipal N
o
16.856/2003, o Serviço de Transporte Complementar
de Passageiros do Recife STCP, sendo este considerado parte integrante do Sistema
de Transporte Municipal do Recife STM/Recife, instituído pela Lei Municipal N
o
16.837/2003, de 14 de janeiro de 2003, e definido como complementar ao transporte
público convencional por ônibus, em termos geográficos, temporais e econômicos,
com planejamento, controle e política tarifária definida pelo Município.
De acordo com o projeto, os fatores geográficos considerados se remetem às
áreas fora do centro expandido do Recife, com dificuldades de acesso para veículos de
grande porte e/ou não atendidas pelo serviço de transporte coletivo convencional por
ônibus. Com relação aos fatores econômicos, estes se referem às linhas do serviço de
transporte por ônibus que se apresentem economicamente deficitárias. Consideram-se
como fatores temporais para a inserção do Sistema Complementar as variações de
demanda e a adequação da oferta de serviço, de maneira a suprir as deficiências
operacionais relativas aos intervalos e horários do sistema de transporte por ônibus no
Recife, restrito ao período de 22:00h às 04:00h, bem como aos domingos e feriados.
Portanto, diante das condições previstas para a operação deste Sistema
Complementar, os operadores que passam a integrá-lo não podem operar linhas radiais
(aquelas que vão para o centro da cidade), nem circular pelo centro expandido (da
Avenida Agamenon Magalhães até o bairro do Recife) e nem nos principais corredores
dos ônibus, tal como faziam kombis e vans até 2003. Estes operadores realizam o
serviço apenas em linhas de ligação entre bairros e alimentando os ônibus, ou seja,
levando passageiros de comunidades até os terminais, podendo circular em pequenos
trechos dos corredores usados pelos coletivos quando não houver outra possibilidade.
A exploração do serviço é de caráter contínuo e permanente, delegada pelo
Poder Público Municipal, sob regime de permissão, em caráter pessoal e intransferível,
através de contrato de adesão, pelo período de seis anos, prorrogável por igual período.
A delegação da permissão deu-se através de licitação. Ao contrário do sistema de
transporte por ônibus, no qual somente no ano de 2003 se cogitou uma licitação e que
ainda não aconteceu, o novo sistema foi criado sob concorrência pública, o que
abriu espaço para que qualquer pessoa participasse do processo, não para aqueles
que circulavam na cidade. Cada permissionário pode possuir um veículo e operar
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apenas uma linha. Esta regra acabou com as possíveis frotas de kombis que podiam
existir no Recife, visto que algumas pessoas compraram veículos para serem dirigidos
por terceiros.
Quanto aos critérios da operação do sistema proposto pela Prefeitura,
estabeleceu-se que: a) Frota, itinerário, intervalo, tempo de operação, tarifa e locais de
embarque e desembarque serão definidos pelo Poder Público Municipal. b) Será
permitido ao permissionário o cadastramento de um cobrador (es), sendo exigida idade
mínima de 18 anos, embora não estando contemplado(s) na planilha tarifária. c) Os
benefícios e gratuidades instituídas por lei deverão ser asseguradas pelo serviço. d)
Serão cobrados pelo Prefeitura impostos, taxas necessárias aos serviços de
credenciamento e recadastramento, bem como o gerenciamento da operação
Durante o planejamento de operacionalização do Sistema Complementar, foram
adotados critérios de julgamento na concorrência, tendo preferência de escolha os
motoristas que não tivessem cometido infração de trânsito nos últimos doze meses
anteriores à licitação e os que tivessem veículos mais novos (com idade máxima de três
anos), com maior capacidade (mesma pontuação para veículos de 16 a 20 lugares),
com ar-condicionado, com corredor interno e adaptado para deficiente físico.
Desde o início da tramitação do projeto começava a se delinear na cidade um
conflito entre a Prefeitura e os kombeiros, cujas entidades representantes no Recife o
SindRecife e o Sindkombi - passaram a exigir do Poder Público Municipal alterações
em vários itens da lei que instituiu o Sistema Complementar. O SindRecife inicialmente
manifestou apoio ao resultado, embora exigisse que a prefeitura excluísse os itens que
tratavam das infrações cometidas no trânsito para concorrer ao projeto e os que
proibiam a operação de linhas que iam para o centro do Recife, mesmo que os
veículos fizessem o percurso por fora dos grandes corredores, bem como exigia que a
Prefeitura permitisse concorrer ao processo os condutores que rodavam na cidade
há pelo menos um ano.
Por sua vez, o Sindkombi, manifestou-se contrário ao projeto, declarando que o
mesmo representaria o fim do transporte alternativo na cidade. Além de não aceitar
deixar de operar em linhas radiais, também exigia passar pelos grandes corredores de
ônibus e que fossem reconhecidas as 35 linhas que existiam na capital. Os kombeiros
afirmavam que não iam realizar as linhas alimentadoras e as de ligações entre bairros,
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caso a exigência de passar pelo centro da cidade não fosse aceita. Quanto a estes dois
modelos de linhas, os kombeiros exigiam que estas fossem definidas a partir do
reconhecimento das 35 linhas que já existiam.
Esses kombeiros também solicitavam a autorização para que 1200 veículos de
pequeno porte circulassem no Recife; que a permissão não fosse precedida de uma
licitação pública; que o planejamento da operação do sistema tivesse a participação
deles no que diz respeito à frota, itinerário, intervalo, tarifa e locais de embarque; bem
como a permissão para que 940 veículos que rodavam na Região Metropolitana,
operando em linhas intermunicipais, entrassem no Recife, desembarcando passageiros
no Cais de Santa Rita e retornando com outros usuários para seus municípios de
origem.
Kombeiros ligados ao Sindkombi acionaram o Ministério Público para solicitar
uma ação de inconstitucionalidade contra a lei, argumentando que esta privava a
população do direito de escolher em qual tipo de transporte público deseja andar e
denunciando que o projeto foi votado às pressas na Câmara sem ter sido discutido com
a população. Entretanto, o Ministério Público argumentou que a lei que regulamenta o
Sistema de Transporte Complementar de Passageiros do Recife é constitucional,
frustrando a expectativa dos kombeiros de ver impugnados os artigos da legislação que
impedem a livre concorrência entre ônibus e alternativos.
A tensão entre os kombeiros e a prefeitura ficou maior, quando esta, no mês de
maio de 2003, divulgou o número de veículos e de linhas do Sistema Complementar, o
que não havia feito antes, quando da apresentação do projeto. Assim, de acordo com a
proposta inicial apresentada, dos 2.000 veículos que circulavam na capital, apenas 207
seriam regulamentados e integrariam o sistema, o que representava 11% dos veículos
que estavam em circulação. Estes veículos operariam em 23 linhas, cujos itinerários
foram criados para o novo sistema, realizando exclusivamente a ligação entre bairros e
alimentando os ônibus. A espacialização destas linhas e a quantidade de veículos
foram definidos a partir da divisão da cidade em três áreas: a) Norte – onde se previa a
operação de 112 veículos de pequeno porte em 12 linhas interbairros e três linhas
alimentadoras; b) Oeste Nesta área deveriam circular 75 veículos em seis linhas
interbairros; c) Sul A operação dar-se-ia através de 20 veículos, realizando apenas
duas linhas interbairros.
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Posteriormente, a prefeitura definiu que 252 veículos iriam integrar inicialmente
o Sistema Complementar proposto para o Recife, cuja operação realizar-se-ia em 26
linhas, conforme explicitado no Quadro 1 e espacializadas no mapa do Anexo 2, na
página 178. Estabeleceu-se ainda que a tarifa a ser cobrada seria baseada no anel A do
STPP, que, na época, custava R$ 1,30.
A prefeitura contou com o apoio do governo do estado de Pernambuco, o qual
também elaborou um projeto para regulamentar um sistema complementar no âmbito
metropolitano. A proposta de criação de um Sistema Complementar de Transporte
Metropolitano foi apresentada pela EMTU em maio de 2003, sendo este sistema
instituído pelo Decreto Estadual N
o
25.654, de 15 de julho de 2003. Similar ao plano
da Prefeitura do Recife, o projeto concebe o sistema operado por veículos de pequeno
porte como complementar ao sistema convencional. De acordo com a proposta, estes
veículos não deverão utilizar as faixas e vias exclusivas para ônibus, sendo criadas
paradas diferenciadas para os mesmos, sempre que se fizer necessário, não entrarão
nos Terminais Integrados, terão tarifas variadas p-estabelecidas pela EMTU e deverão
assegurar benefícios como a gratuidade a idosos e pessoas com deficiência bem como
a meia passagem aos estudantes. Neste sistema deverão operar exclusivamente
veículos de pequeno porte, com capacidade entre 16 e 20 passageiros sentados,
inclusive o cobrador, e com idade máxima de três anos. A escolha dos operadores dar-
se-á através de licitação.
As linhas farão ligação entre municípios adjacentes, exceto Recife (Centro
Expandido e Corredores, conforme estabelecido na Lei 16.856/2003) e linhas do
STPP/RMR com demanda compatível para equipamento de pequeno porte. A definição
dessas linhas levou em consideração a compatibilidade do veículo com a demanda de
cada área e a viabilidade operacional, econômica e social desse novo sistema. De
acordo com o projeto, o transporte de passageiros em linhas intermunicipais será
realizado através de 112 veículos, operando em oito linhas, conforme explicitado no
Quadro 2.
As propostas de regulamentação da atividade deixaram bastante insatisfeitos os
kombeiros, que vinham, desde o início do processo, pressionando o Poder Público
Municipal para que fossem atendidas as suas reivindicações. Os operadores do
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Quadro 1
TIPOS DE LINHAS
FROTA
PREVISTA
Linhas Interbairros N.º Veículos
Alto do Caeté / Casa Amarela (Via Av. Norte) 08
Alto Jardim Progresso / Casa Amarela (Via Av. Norte) 06
Alto Buriti / Casa Amarela (Via Nova Descoberta) 08
Córrego do Comissário/ Casa Amarela (Via Vasco da Gama)
06
Córrego do Boleiro / Casa Amarela (Via Vasco da Gama) 06
Alto Nossa Senhora de Fátima / Casa Amarela 06
Campo Grande / Casa Amarela 14
Dois Unidos/ Torre (Via Casa Amarela) 17
Campo Grande/ Jaqueira 10
Campo Grande/ Afogados
18
Cajueiro/ Entrocamento 12
Torreão/ Cordeiro 10
Vila São Miguel/ Afogados 06
Jardim São Paulo/ Santa Luzia 14
Engenho do Meio/ Afogados 16
Torre/ CDU 16
Jardim Uchôa/ Boa Viagem 16
San Martin / Coqueiral 16
Lagoa do Araçá/ Boa Viagem 14
Shopping Recife/ Setubal
11
UR7/ CDU 10
TOTAL 240
Linhas Alimentadoras N.º Veículos
Alto do Rosário (Via Córrego do Curió) 03
Alto do Rosário (Via Alto da Esperança) 02
Sítio dos Macacos/ Macaxeira 03
Dancing Days / Pinheiros 02
Conjunto Residencial Jardim Primavera/ Jordão Baixo 02
TOTAL 12
Fonte de Dados: www.recife.pe.gov.br/pr/servicospublicos.html Acesso em: 25-05-2003
Elaboração: Diana Souza
LINHAS DO SERVIÇO DE TRANSPORTE
COMPLEMENTAR DE PASSAGEIROS DO RECIFE
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Quadro 2
transporte alternativo, que esperavam, no mínimo, a regulamentação de 600 veículos,
ficaram indignados com a definição do mero de veículos e linhas propostos pela
prefeitura. O presidente do SindRecife, José Gonçalves da Silva, que desde o início do
processo vinha apoiando a prefeitura e contendo os ânimos dos kombeiros contra
possíveis protestos, afirmou ter sido traído, argumentando que os técnicos da prefeitura
não consideraram nenhuma das 19 linhas interbairros onde os kombeiros já operavam.
Por sua vez, o presidente do Sindkombi, Amauri Soares, também se manifestou contra
a decisão da prefeitura, ressaltando a necessidade de uma negociação.
A partir da definição do número de linhas e veículos do novo sistema, delineiou-
se também um conflito entre ambos os sindicatos, acirrado pelas divergências entre os
seus diretores. De um lado, o presidente do Sindkombi acusava o presidente do
SindRecife de traição, afirmando que este fez acordos indevidos com a prefeitura,
traindo o interesse da maioria. Do outro lado, o presidente do SindRecife afirmava que
o presidente do Sindkombi o acusava de traição injustamente, que o traído foi ele,
visto que apoiou o projeto, entretanto, não teve as linhas que já existiam, reconhecidas,
conforme havia sido prometido. Estas divergências dificultaram a tomada de decisões,
enfraquecendo os kombeiros quanto às estratégias a serem realizadas por estes para
contestar a decisão da prefeitura quanto ao número de veículos e de linhas do Sistema
Fonte de Dados: www.emtu.pe.gov.br/index_transporte.htm
Elaboração: Diana Souza
LINHAS
EXTENSÃO
(Km/vg)
INTERVALO
ENTRE
VIAGENS
(Em minutos)
TEMPO DE
ROTAÇÃO
(Em minutos)
FROTA PREVISTA
(N.º de Veículos)
Ipojuca/Cabo 43,46 05 80 16
Ponte dos Carvalhos/Barra de Jangada 15,45 05
32
07
Igarassu/Nova Cruz 37,42 10 80 08
Caetés/Paulista 26,20 05 85 17
Chã de Cruz/São Lourenço/Camaragibe
45,66 10 136 14
Moreno/Jaboatão 23,14 05 66 13
Abreu e Lima/Araçoiaba (via Estrada do Café) 82,00 15 170
12
Tiúma/Camaragibe 39,68 05
124
25
TOTAL - - -
112
REDE BÁSICA PROPOSTA PARA O TRANSPORTE COMPLEMENTAR
NA REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFE
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Complementar, não havendo um discurso coeso e uma única estratégia de ação dos
kombeiros, cujo sentimento não se refletia nas declarações das lideranças.
Contudo, com o intuito de fazer a prefeitura rever a lei, os kombeiros
desencadearam vários protestos na cidade. Na primeira manifestação, no dia 02 de
junho de 2003, com o objetivo de mostrar a necessidade deste transporte na cidade e
colocar a população contra a prefeitura, os kombeiros realizaram uma paralisação da
atividade, ocupando uma das suas principais avenidas, onde houve confrontos entre
aqueles e a Polícia Militar, com a prisão de alguns manifestantes. De diversos pontos
da RMR partiram comboios de veículos em direção à Avenida Mascarenhas de Morais,
na Imbiribeira, local de concentração do protesto (Foto 1). Os kombeiros montaram
ainda bloqueios em pontos estratégicos da cidade para impedir que outras kombis
circulassem transportando passageiros.
Durante a manifestação, os kombeiros, que haviam passado a circular na cidade
com faixas pretas afixadas na traseira dos veículos, com frases contra o prefeito do
Recife, João Paulo, demonstraram indignação através de gestos e protestos, cartazes,
faixas e pinturas com frases contra ele, a quem chamavam de traidor, conforme retrata
algumas frases:
João Paulo, nós éramos clandestinos, agora somos desempregados.
Foto: Rodrigo Lobo. JC OnLine ,04-06-2003.
FOTO 1: Protesto dos kombeiros na Av. Mal. Mascarenhas de
Morais no dia 02 de junho de 2003.
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PT – Partido dos Traidores.
Prefeitura do Recife: trabalhando por um desemprego maior.
(Esta frase faz
alusão ao
slogan
da Prefeitura da cidade: “Prefeitura do Recife: Ação por uma
vida melhor”, na primeira gestâo (2001-2004) do prefeito João Paulo.
A imprensa notificou ainda que, durante o protesto ocorreram em algumas áreas
da cidade depedrações de ônibus e o lançamento de bombas caseiras em alguns desses
veículos, não se identificando, no entanto, se os indivíduos que realizaram esta ação
eram ou não kombeiros.
Dias depois, o SindRecife arrependeu-se do primeiro movimento e decidiu fazer
uma manifestação isolada, provocando o segundo protesto na cidade, no dia 11 de
junho, quando os kombeiros interditaram com pneus em chamas vários eixos viários
do Recife, como a Avenida Caxangá, a Avenida Recife, a Avenida José Rufino (em
Tejipió) e a II Perimetral (em Peixinhos), confrontando-se com a Polícia Militar (Foto 2).
Algumas kombis também se instalaram no centro da cidade, na Ponte Princesa
Isabel, interditando a Rua da Aurora e a Rua Princesa Isabel e, depois seguiram em
carreata até a Prefeitura do Recife, onde pretendiam fazer uma negociação, para tentar
reverter a posição da Prefeitura quanto à limitação do número de veículos (252) que
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poderiam circular na capital, enfatizando que o mero estabelecido deixaria muitos
deles desempregados e exigindo uma regulamentação de no mínimo 800 veículos.
Durante a manifestação, a imprensa registrou vários atos de vandalismo, com a
radicalização de alguns kombeiros, que queimaram ônibus, furaram pneus e
apedrejaram janelas e pára-brisas destes veículos. A partir da apreensão de rádios
interlocutores usados pelos manifestantes, a Secretaria de Defesa Social divulgou a
gravação de um diálogo entre kombeiros, no qual um dos interlocutores dava a ordem
para que se começassem a “explodir os ônibus”. A fita foi encaminhada ao Instituto de
Criminalística para ser submetida a uma perícia de identificação de vozes, tendo como
principais suspeitos lideranças dos kombeiros, o presidente do SindRecife e o diretor de
comunicação do mesmo sindicato. Estes, no entanto, negaram as acusações de que
estariam incitando os kombeiros a queimar ônibus na cidade durante o protesto.
As manifestações, entretanto, foram contidas pela Polícia Militar, que dispersou
os vários focos de protesto na cidade e monitorou constantemente os kombeiros em
frente à Prefeitura, impedindo-os de entrar na sede do Governo Municipal. Acuados, os
kombeiros, que esperavam uma resposta da Prefeitura, não foram atendidos.
Apesar dos dois protestos realizados na cidade, os kombeiros não conseguiram
reverter a posição da Prefeitura do Recife quanto ao número de veículos e linhas do
Sistema Complementar, cujas etapas de implantação iniciaram-se no mês de julho de
2003. Assim, de acordo com a lei que implantou este novo sistema, no qual os veículos
não podem circular no centro expandido – área compreendida entre a Av. Agamenon
Magalhães e o Marco Zero - e nem nos principais corredores de ônibus, a prefeitura,
com o intuito de retirar as kombis e vans em circulação na cidade, adotou como
estratégia a implantação de bloqueios, que foram gradativamente se ampliando e
fechando o Recife, e depois outros municípios metropolitanos à realização da atividade
do transporte alternativo.
Inicialmente, a partir do dia 14 de julho de 2003, as kombis e vans foram
proibidas de circular no centro expandido do Recife. Para impedir a entrada destes
veículos à área restrita, foram instalados nove pontos de bloqueio nos acessos ao
centro expandido, em sete bairros da cidade, conforme explicita a Figura 2, onde havia
em cada um deles técnicos da EMTU e da CTTU e policiais militares.
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Figura 2
Nestes pontos de bloqueio, realizou-se, inicialmente, de 12 a 14 de julho de
2003, durante um final de semana, uma campanha educativa, que consistia em parar
as kombis e vans e entregar panfletos aos motoristas e passageiros, informando-os sobre
PONTOS DE BLOQUEIO NOS ACESSOS AO CENTRO EXPANDIDO DO RECIFE
01 - Av. Domingos Ferreira com a Av. Herculano Bandeira
02 - Av. Sul com a Rua Nicolau Pereira
03 - Av. Abdias de Carvalho (Girador do Sport)
04 - Rua Benfica com a Av. Visconde de Albuquerque
05 - Av. Rui Barbosa com a Rua Amélia
06 - Rua do Espinheiro com a Rua 48
07 - Av. Norte com a Rua Marques do Paraná
08 - Rua Odorico Mendes com a Av. Agamenon Magalhães
09 - Complexo de Salgadinho (em frente ao Classic Hall)
Fonte: www.emtu.pe.gov.br/index_transporte.htm Acesso em: 16-09-2003
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a proibição da circulação deste transporte pelo centro da cidade, campanha esta
também realizada nos terminais de ônibus do Recife. Depois, estes pontos de bloqueio,
a partir do dia 15 de julho, serviriam como barreiras para impedir o acesso das kombis
e vans ao centro, sendo estes veículos obrigados a retornarem ou desviarem a partir
desses locais, com a apreensão e multas àqueles que os ultrapassassem.
A partir destes pontos de bloqueio, o passageiro que desejasse continuar o
percurso ao centro da cidade era encaminhado por um dos fiscais da EMTU para
pegar ônibus, que transportavam o passageiro até o centro gratuitamente, sejam
aqueles disponibilizados para realizar tal operação como aqueles do próprio sistema
convencional. A operação se estendeu do dia 14 a 26 de julho. Depois deste período,
aqueles que viessem de kombi até os bloqueios, se desejassem seguir a viagem, teriam
de pagar mais uma passagem no ônibus. A estratégia da prefeitura e da EMTU era a de
vencer o usuário das kombis pelo bolso e, na seqüência, afetar ainda mais a renda dos
operadores do transporte alternativo.
Revoltados com o fechamento do centro expandido do Recife às kombis e vans,
os presidentes do Sindkombi e do SindRecife organizaram o terceiro protesto na
cidade, ocorrido no dia 15 de julho. Neste dia, foram organizadas duas passeatas em
direção ao centro da cidade, lideradas, respectivamente, pelo SindRecife e pelo
Sindkombi: uma saía da Praça Oswaldo Cruz, no bairro da Boa Vista, e a outra, saía do
Complexo de Salgadinho, em Olinda, seguindo pela Avenida Cruz Cabugá até a
Avenida Conde da Boa Vista. Nesta avenida, pelas imediações da Rua do Hospício, as
duas passeatas se uniram e os manifestantes, gritando em coro: “Aha uhu, a cidade é
nossa!”, dirigiram-se para a Ponte Duarte Coelho. Enquanto as lideranças pretendiam
seguir com todos para o Palácio do Campo das Princesas, com o intuito de abrir uma
negociação com o Governo do Estado, os kombeiros queriam permanecer no local e
enviar apenas uma comissão para tentar negociar, interditando a ponte e duas
principais avenidas do centro do Recife durante meia hora, para depois seguir com as
lideranças.
Ao tomarem conhecimento de que a comissão de negociação não seria mais
recebida pelo Governo, os kombeiros voltaram à Ponte Duarte Coelho, interditando
mais uma vez a Avenida Conde da Boa Vista e uma das faixas da Avenida Guararapes,
que, na tarde do dia 15 de julho, transformaram-se num palco de confronto direto entre
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os kombeiros e a Polícia Militar, que, de um lado, disparava tiros para o alto e bombas
de efeito moral para conter os manifestantes, e os kombeiros, de outro lado, jogavam
pedras nos policiais e ainda paravam os ônibus, obrigando os passageiros a descerem
(Fotos 3 e 4).
Os protestos resultaram num dia de caos no trânsito da cidade do Recife e de
municípios situados ao norte da Região Metropolitana, com grandes
congestionamentos, além dos transtornos no centro da cidade, provocando pânico nas
pessoas que trabalhavam ou passavam pela área do confronto e causando o
encerramento do expediente na maior parte do comércio. Embora as passeatas tenham
sido organizadas, a falta de sintonia entre os líderes e os kombeiros ficava explícita,
tendo em vista que as lideranças apelavam para que não houvesse confronto com a
polícia, ao passo que parte dos kombeiros parecia estar disposta a tudo, demonstrando
não possuírem liderança.
A despeito do protesto dos kombeiros, a Prefeitura do Recife e o Governo do
Estado não cederam às pressões. Pelo contrário, reforçaram ainda mais a fiscalização,
acrescentando mais uma hora ao trabalho dos fiscais nos pontos de bloqueio, que
alguns kombeiros estavam entrando no centro expandido após às 19:00h, horário em
que estes bloqueios estavam sendo retirados, e iniciaram uma operação móvel,
sobretudo à noite, na área restrita para flagrar e multar aqueles que estivessem
realizando o transporte remunerado de passageiros.
E novamente, os kombeiros, depois de sucessivas demonstrações de desunião e
desorganização das últimas manifestações, voltaram a protestar na cidade pela quarta
vez. Desta vez, buscando o apoio na estratégia de luta dos sem-terra e dos sem-teto,
permitindo que o Movimento Terra, Trabalho e Liberdade MTL - assumisse
praticamente todo o comando da manifestação, dando-lhe uma forte conotação
política. Assim, no dia 23 de julho, os kombeiros se instalaram em frente ao prédio da
Prefeitura do Recife, interditando-o, pretendendo ficar acampados até que o Governo
Municipal decidisse cancelar os bloqueios ao centro expandido e ampliar de 252 para
1200 o número de veículos a serem regulamentados.
Os manifestantes começaram a chegar à sede da prefeitura na madrugada do dia
23 de julho e, depois, lentamente, kombeiros de diversas áreas do Recife e Região
Metropolitana foram chegando e se instalando na Avenida Martin Luther King, onde se
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situa a sede da prefeitura, fechando as duas pistas desta via. Durante a manhã, o
protesto transcorreu pacificamente, sem haver confrontos entre os kombeiros e a
Polícia Militar, como ocorrera nos últimos protestos. À tarde, o movimento foi
reforçado com a chegada de kombeiros da Zona da Mata e de municípios do Grande
Recife e por integrantes do MTL. Embora os kombeiros parecessem preparados a
permanecerem no local, na madrugada do dia 24 de julho, foram retirados
pacificamente da Prefeitura, o que representou mais uma manifestação fracassada em
menos de dois meses.
Durante o dia de protesto, em outras áreas da cidade ocorreram algumas ações
isoladas, com a prisão de pessoas ligadas ao transporte alternativo. Registraram-se
casos em que indivíduos interceptavam veículos do transporte alternativo, obrigando
passageiros, motoristas e cobradores a descerem e esvaziavam os pneus destes
veículos; alguns ônibus tiveram os vidros das janelas e pára-brisas quebrados por
pedradas. No decorrer do mês de julho, vários atos de vandalismo foram registrados,
amedrontando, de certa forma, a população, que geralmente estava contrária à
radicalização dos kombeiros e, por isso, muitas vezes, não os apoiando.
Transcorridas duas semanas de bloqueios instalados na cidade para impedir o
acesso de kombis e vans ao centro, a nova realidade estava consolidada.
Gradativamente, a demanda de passageiros nas barreiras foi ficando cada vez menor,
assim como o número de veículos do transporte alternativo também diminuía.
Estrategicamente, a EMTU reforçou a frota de ônibus para acompanhar o crescimento
da demanda a partir da retirada das kombis. Apesar disso, os usuários do transporte
alternativo, obrigados a descerem das kombis e embarcarem em ônibus para seguir
viagem, ficaram revoltados com a medida. A ausência das kombis no centro causou
transtornos não aos usuários que costumavam usar este transporte, quanto àqueles
que utilizavam o transporte por ônibus. A estratégia da EMTU provocou reclamações
por parte da população, que se queixava dos ônibus lotados e da demora nas paradas,
embora a EMTU houvesse reforçado a frota e disponibilizado ônibus gratuitamente
para quem ficasse nos bloqueios. Entretanto, se por um lado, a maior parte da
população usuária de transporte coletivo reprovava a restrição ao transporte
alternativo, por outro, os motoristas de carros particulares comemoravam os bloqueios
às kombis e vans ao centro.
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Mesmo diante da medida, muitos kombeiros ainda insistiam em circular até as
barreiras, readaptando as suas rotas aos pontos de bloqueio, levando passageiros que
ficassem por estas imediações. Assim, muitas kombis que vinham de municípios e
localidades a oeste da cidade, como Camaragibe e outros bairros do Recife, por
exemplo, terminavam suas rotas no bairro da Madalena, onde havia se instalado um
dos pontos de bloqueio. Os kombeiros, no entanto, foram migrando para outras áreas
da cidade e para outros municípios metropolitanos como Olinda e Jaboatão.
Diante do fracasso dos quatro protestos realizados contra a regulamentação do
Sistema Complementar, os kombeiros decidiram bombardear a Prefeitura do Recife
com ações judiciais para inibir as determinações desta quanto ao novo sistema. As
lideranças também tentaram se fortalecer, criando um comando único de luta para
acabar com as divergências entre si e intensificar o movimento para derrubar a lei que
regulamenta o Sistema Complementar. Neste sentido, os presidentes do Sindkombi e
do SindRecife, buscando mais forças e uma maior articulação para pressionar o Poder
Executivo, criaram o Movimento do Transporte Alternativo MTA, reunindo além
destes dois sindicatos, associações da Região Metropolitana e do interior num
movimento.
Sabendo que a Prefeitura do Recife cogitava oferecer um serviço de transporte
feito por microônibus, o MTA ainda apresentou na Câmara de Vereadores uma
proposta de um novo sistema de transporte de luxo, cujo serviço seria direcionado às
classes média e média-alta, intitulado Serviço de Transporte Público Seletivo Urbano
do Recife, que seria realizado apenas por microônibus, teria tarifa 20% superior à
cobrada pelo sistema convencional e circularia nos principais corredores viários da
cidade, podendo este transporte ser operado por operadores que realizavam o
transporte alternativo. No entanto, a proposta dos kombeiros fora refutada, visto que, o
Governo Municipal estuda a proposta de implantação de um serviço de transporte feito
por microônibus, no entanto, este sistema deverá ser realizado pelas empresas de
ônibus. Destaque-se que, este serviço ainda não foi implantado.
Todas as tentativas dos kombeiros para reverter as posições da Prefeitura do
Recife e do Governo do Estado quanto ao Sistema Complementar foram frustradas. Eles
não conseguiram abrir nenhum canal de negociação com os Governos Municipal e
Estadual. Na verdade, durante todo o processo de implementação do novo sistema, os
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kombeiros demonstraram que não estavam preparados para planejar estratégias de
manifestação, havendo uma falta de sintonia tanto entre as próprias lideranças quanto
entre estas e os operadores da atividade.
Enquanto os kombeiros tentavam se articular para traçar novas estratégias a fim
de reverter o processo de regulamentação, a Prefeitura do Recife dava prosseguimento
às etapas de implantação do novo sistema, iniciando, no começo do mês de agosto, o
processo de licitação para selecionar os operadores que nele operariam. Apenas 213
pessoas levaram suas propostas para serem avaliadas. A baixa procura de candidatos
levou a prefeitura a abrir outra concorrência pública para tentar preencher as 252
vagas do novo sistema. As lideranças dos kombeiros ainda tentaram articular um
boicote à licitação, sugerindo que fossem queimados os editais e os documentos dos
licitantes. Entretanto, não houve mobilização suficiente para levar o boicote adiante e,
saliente-se que, a presença da Polícia Militar, inclusive do Batalhão de Choque, e da
Guarda Municipal intimidou qualquer iniciativa de protesto.
No mês de setembro de 2003, a Prefeitura do Recife e o Governo do Estado
realizaram uma força-tarefa, envolvendo agentes da Companhia de Trânsito e
Transporte Urbano do Recife CTTU, do Batalhão de Policiamento de Trânsito
BPTran, do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) e da EMTU, com o intuito de
impedir que os veículos do transporte alternativo utilizassem as paradas de ônibus para
embarque e desembarque de passageiros. A ação, que tinha caráter educativo,
denominada “Operação Parada Limpa”, iniciou-se no dia 18 do referido mês, pelo
Largo da Paz, em Afogados, uma das áreas de expressivo comércio da cidade, e seria
estendida posteriormente para outras localidades: Avenida Caxangá (próximo ao
viaduto da BR - 101), Boa Viagem (
Shopping
Recife e Clinical
Center
) e Encruzilhada
(Largo da Encruzilhada e Avenida Norte), locais que receberam um maior mero de
veículos do transporte alternativo depois que foram instalados os pontos de bloqueio
nos acessos ao centro expandido do Recife.
A “Operação Parada Limpa”, entretanto, não surtiu o efeito desejado no Largo
da Paz, já que os kombeiros, em sua maioria, deixaram de fazer terminal ao lado das
paradas de ônibus, passando a ocupar o lado da praça do Largo que não possuía
paradas instaladas. Dias depois, enquanto a operação era transferida para o bairro de
Boa Viagem, os kombeiros voltaram a fazer embarque e desembarque de passageiros
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nas paradas dos ônibus, visto que parte da fiscalização não permaneceu no local nos
dias úteis.
O próximo passo para a implantação do novo sistema foi dado quando se
ampliou a área de restrição à circulação das kombis e vans para toda a cidade do
Recife, instalando-se, conforme exposto na Figura 3, seis pontos de bloqueio em
corredores localizados nos limites da capital com os municípios de Jaboatão dos
Guararapes, Olinda e Camaragibe, funcionando com barreiras fixas para impedir a
passagem de kombis e vans, e onze pontos de controle em locais estratégicos, cuja
função era a realização de uma fiscalização móvel, com agentes circulando pelos
principais corredores da área. Inicialmente, realizou-se uma campanha educativa
durante um final de semana, nos dias 01 e 02 de outubro de 2003, similar a que foi
realizada quando da restrição do transporte alternativo ao centro, e, a partir do dia 03,
aqueles veículos que realizassem a atividade na cidade seriam apreendidos e multados.
Para garantir tal operação foi colocado nas ruas um efetivo de 272 homens da Polícia
Militar.
Simultaneamente, parte do Serviço de Transporte Complementar de Passageiros
entrou em operação de fato no dia 03 de outubro, na Zona Norte da cidade, cujos
veículos seriam escoltados pela Polícia Militar para garantir que os operadores se
sentissem seguros, que haviam sido ameaçados por operadores do transporte
alternativo, quando iniciavam a atividade no dia primeiro de outubro.
Embora a EMTU tenha aumentado parcialmente a frota de ônibus, colocado
novos veículos em circulação e reforçado algumas linhas existentes, além de criar
algumas novas linhas para o sistema coletivo por ônibus, isto não demonstrou ser
suficiente para suprir a demanda, sobretudo nos horários de pico. A população
continuou reclamando da longa espera pelos ônibus, os quais ainda passavam muito
cheios.
Na realidade, a dinâmica de funcionamento do transporte alternativo é outra,
diferente da dos ônibus. Aumentar a frota de ônibus para substituir as kombis e vans
não foi o suficiente para atingir aos anseios daqueles que utilizavam estas micro-
unidades de transporte: rapidez, freqüência, pequenos deslocamentos e, mesmo que
não fossem tão confortáveis, os passageiros em geral iam sentados.
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
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Figura 3
Fonte: http://jc.uol.com.br/jornal/noticias/ler.php?codigo=70596&canal=10&dth=2003-11-01#
BLOQUEIOS E PONTOS DE CONTROLE PARA IMPEDIR A CIRCULAÇÃO
DAS KOMBIS E VANS NA CIDADE DO RECIFE
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Apesar das informações que circulavam nos principais jornais locais a respeito
da implantação do Sistema Complementar no Recife, a população, ficou surpresa
quando as kombis e vans deixaram de circular pelo centro da cidade e pelos principais
corredores viários. Esta medida foi contestada por grande parte da população.
Isto se deve ao fato de a população se referir à regulamentação do transporte
alternativo, pensando numa legalização da atividade, com algum tipo de organização,
assim como muitos kombeiros reivindicavam a regulamentação da atividade, ainda que
pensassem em legalização. Esta é encarada apenas como um alvará de autorização
que, a partir da data de sua emissão, evita apreensões e multas relativas à operação
praticada. Não se pretende, com a mesma, promover mudanças no tipo de operação
ou criar maiores responsabilidades fiscais. Em geral, os operadores do transporte
alternativo tinham como objetivo o simples reconhecimento da atividade, para que a
mesma operasse tal como se apresentava até 2003.
Quanto à questão do emprego, no âmbito da realização do projeto foram
discutidas algumas formas de inserção daqueles que não fossem absorvidos pelo novo
sistema. Neste sentido, a Prefeitura do Recife e o Governo do Estado, em uma iniciativa
conjunta, realizaram um cadastramento dos operadores da atividade, com o intuito de
criar um banco de oportunidades, verificando a possibilidade para a abertura de linhas
de crédito, postos de trabalho e a realização de cursos de capacitação, para garantir
alternativas de emprego e renda a estas pessoas.
Segundo a Prefeitura do Recife, a regulamentação do transporte complementar
foi uma primeira fase de um amplo projeto que visa melhorar a qualidade do transporte
público, sendo precedida de uma série de exigências às empresas do setor. Uma destas
exigências, resultado de um acordo entre o Governo do Estado e a Prefeitura do Recife
com os empresários de ônibus, é a de que estes se comprometeram a aproveitar
aqueles operadores do transporte alternativo que não foram absorvidos pelo Sistema
Complementar, à medida que fossem surgindo novas vagas nas empresas de ônibus.
Apesar das iniciativas dos Governos Municipal e Estadual para os que não
conseguissem emprego no Sistema Complementar terem a opção de serem
requalificados para outras atividades, ou participarem do programa de microcrédito do
Governo Estadual, ou Banco do Povo, da Prefeitura do Recife, ou ainda serem
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absorvidos pelas empresas de ônibus, o fato é que, a questão do desemprego foi
bastante veemente face à implantação do STCP/Recife.
De acordo com Soares (2003), em matéria do Jornal do Commercio, segundo os
sindicatos dos kombeiros cerca de 7500 pessoas ficariam sem ocupação na RMR
devido à regulamentação do Sistema Complementar. No Recife, estimou-se quase 3500
pessoas sem ocupação, entre motoristas e cobradores, e, considerando o Grande Recife
e a Zona da Mata, contabilizando os veículos que operavam linhas para a capital, o
número poderia chegar a 4000 desempregados.
Dificilmente os operadores do transporte alternativo serão absorvidos pelo
chamado setor formal da economia, tanto porque a qualificação desses indivíduos é
insuficiente, quanto pelo próprio setor, que está sufocado pelo baixo crescimento da
economia brasileira. A perspectiva para estes operadores é a de que eles vivam de
subempregos, seja como camelôs, vendedores de frutas, de água mineral entre outros
artigos. Vale salientar ainda que, uma rede de segmentos ligada à atividade também foi
prejudicada indiretamente, tais como postos de combustíveis, sobretudo os de gás
veicular, lojas de pneus, oficinas e borracharias, além do comércio de lanches e
almoços.
Algumas experiências no sentido de controlar a atividade já haviam ocorrido em
alguns municípios da RMR, a exemplo de Paulista e Jaboatão dos Guararapes. No
primeiro, o Poder Público concedeu permissões, que entraram em vigor em junho de
2002, para 580 veículos entre kombis, bestas e vans circularem no município.
Entretanto, a delimitação das linhas para este sistema não era cumprida pelos
kombeiros, que continuavam a circular nos trajetos dos ônibus. Havia ainda cerca de
400 veículos que circulavam na cidade sem integrarem este sistema.
Em Jaboatão, vigora desde 1998, o Sistema Complementar de Transporte
Público de Passageiros SCTPP, composto por 232 veículos. Similarmente ao que
ocorria em Paulista, no município de Jaboatão as regras estabelecidas para o sistema
complementar não eram cumpridas pelos kombeiros, que circulavam nos corredores
dos ônibus e operavam linhas sem controle por parte do Governo Municipal. Em torno
de 1400 veículos ainda circulavam sem estarem inseridos neste sistema complementar.
Embora, algumas experiências anteriores, como as mencionadas, não tenham
resolvido a questão do transporte alternativo em alguns municípios metropolitanos,
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decerto, no Recife, nunca houve uma proposta efetiva para este transporte, muito
menos articulada aos demais municípios metropolitanos e à EMTU.
Sob forte fiscalização, a Prefeitura do Recife e a EMTU conseguiram, do mês de
julho a novembro de 2003, retirar kombis e vans que até então circulavam na cidade.
Os operadores do transporte alternativo, desde a proibição de circular no centro
expandido, foram migrando para outros municípios metropolitanos, a exemplo de
Olinda, onde o número de veículos da atividade duplicou e os kombeiros criaram mais
de dez itinerários. Entretanto, consolidado o fechamento da cidade do Recife às micro-
unidades alternativas, o cerco a estes veículos também foi se ampliando a outros
municípios metropolitanos, através de pontos de bloqueio e fiscalização, como ocorreu
em Olinda e Camaragibe. A Prefeitura de Olinda também fez licitação pública para
implantar um Sistema Complementar, a exemplo do Recife. Paulista, entretanto, apenas
concedeu autorizações para que os veículos operem.
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CAPÍTULO 3
AS TERRITORIALIDADES FLEXÍVEIS DO TRANSPORTE
ALTERNATIVO NA CIDADE DO RECIFE: OS FLUXOS
DAS KOMBIS E VANS ENTRE A AVENIDA CAXANGÁ E
O BAIRRO DE BOA VIAGEM
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3. TERRITORIALIDADES FLEXÍVEIS DO TRANSPORTE ALTERNATIVO NA CIDADE
DO RECIFE: OS FLUXOS DAS KOMBIS E VANS ENTRE A AVENIDA CAXANGÁ E O
BAIRRO DE BOA VIAGEM
3.1 – Desvendando Caminhos entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Com o intuito de analisar as territorialidades flexíveis do transporte alternativo
na cidade do Recife, tomou-se como referencial de análise eixos urbanos que, a partir
das imediações do viaduto da BR-101, na Avenida Caxangá, seguem cortando a cidade
no sentido oeste-sul, estendendo-se até o bairro de Boa Viagem, compreendendo
trajetos com extensão aproximada de 10 km (Mapa 5).
Buscando desvendar os caminhos entre a Avenida Caxangá, a partir do viaduto
da BR-101, e o bairro de Boa Viagem, nos quais se delinearam as rotas estabelecidas
pelos operadores do transporte alternativo, objetiva-se, nesta parte do trabalho,
caracterizá-los a partir dos usos que os margeiam, que identificam os potenciais fluxos
no transcorrer dos trajetos, ressaltando os bairros que os mesmos cortam, as vias que a
eles se relacionam e os grandes equipamentos comerciais, institucionais e residenciais
que os permeiam.
De acordo com a divisão do Recife em Regiões Político-Administrativas RPA’s
instituídas nas décadas de 1980 e 1990, a partir da Avenida Caxangá, os trajetos
cortam três das seis regiões em que atualmente se divide a cidade. Cada uma dessas
seis RPA’s é nomeada por um mero, dividindo-se ainda em três microrregiões,
compostas por um ou mais bairros. A partir dessas divisões, iniciando os trajetos pelas
imediações da Avenida Caxangá, segue-se, no sentido oeste–sul, pelas RPA’s 4, 5 e 6,
passando, mais especificamente, entre as microrregiões 4.1(
Iputinga
) e 4.3 (
Várzea
) e,
entre esta última (já na
Cidade Universitária
) e a 4.2 (
Engenho do Meio
e
Torrões
),
seguindo entre as microrregiões 5.1 (
San Martin
) e 5.3 (
Jardim São Paulo
), cortando a
microrregião 5.2 (
Jiquiá
,
Estância
,
Areais
e
Caçote)
e passando entre as microrregiões
6.1 (
IPSEP
,
Imbiribeira
,
Boa Viagem
) e 6.2 (
Ibura
). (Mapa 6)
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Os trajetos se iniciam no cruzamento da Rua Emiliano Braga com a Avenida
Prof. Moraes Rego, via marginal à BR-101, que se liga à Avenida Caxangá. Este ponto
de partida se situa no bairro da Várzea, próximo aos limites deste com o da Iputinga.
Tanto estes bairros quanto aqueles a eles próximos, como o da Caxangá, por exemplo,
surgiram e se consolidaram a partir de um dos eixos radiais que ligava os agrupamentos
urbanos mais afastados ao centro da cidade: a Estrada Nova de Caxangá, atual Avenida
Caxangá, que teve seu primeiro trecho construído em 1842, compreendendo um
percurso que partia do bairro da Madalena e terminava na povoação da Caxangá.
As áreas a que correspondem estes bairros eram originariamente ocupadas por
engenhos de cana-de-açúcar, como o Barbalho, o Poeta, entre outros, que, com o
passar do tempo, foram cedendo lugar à construção de moradias. Hoje estas áreas
caracterizam-se pela predominância do uso habitacional, com destaque para
equipamentos comerciais e de serviços, instalados às margens da Avenida Caxangá.
Esta avenida, com uma extensão de aproximadamente 6,5 km, destaca-se no
tecido urbano da cidade, caracterizando-se como uma via de comércio e de serviços,
apresentando várias áreas atrativas. Dentre estas, saliente-se aquela situada nas
imediações de sua extremidade oeste, entre os bairros da Caxangá e Várzea, onde se
destacam estabelecimentos como motéis, posto de gasolina, escolas, terminais de
ônibus etc. Nesta área havia uma concentração de kombis e toyotas que se destinavam
a municípios da Mata e Agreste. No bairro da Várzea, situa-se o terminal de ônibus da
linha UR-7, e no da Caxangá, encontra-se um terminal de integração de transporte
metropolitano, onde há a presença marcante de pequenos estabelecimentos comerciais
ligados ao circuito inferior da economia, tais como barracas de lanches, fiteiros, entre
outros. Esta área é identificada como uma das “Portas da Cidade”, onde se
desenvolvem comércio e serviços para atender a uma demanda que extrapola os
limites da cidade.
As áreas do bairro da Várzea foram as primeiras a se repartirem por diversos
colonos, datando sua ocupação da primeira metade do século XVI. Como o próprio
nome alude, o bairro é assim chamado por encontrar-se numa área de várzea, que se
caracteriza como plana, baixa e ribeirinha. Nele ainda algumas áreas livres, que
correspondem a remanescentes de mata atlântica, compreendendo a chamada Mata da
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92
Várzea
1
. Nesta mata encontra-se situado o
atelier
de Francisco Brennand, um dos mais
importantes artistas contemporâneos, que desenvolve trabalhos em cerâmica, bem
como o Instituto Ricardo Brennand, onde existem um museu, uma pinacoteca e uma
biblioteca, funcionando como um centro cultural de referência na cidade.
Uma outra concentração de comércios e serviços ao longo da Avenida Caxangá,
-se nas confluências dos bairros da Várzea, Caxangá e Iputinga, próxima ao viaduto
da BR-101, onde se destacam, às margens desta avenida, equipamentos de atração, tais
como hospitais e clínicas, supermercado (Hiperbompreço), farmácias, posto de
combustível, lojas de revenda de automóveis, que caracterizam esta área como um
espaço metropolitano de comércio e serviço de grande fluxo. Estas redondezas
representam também um ponto de convergência de transporte coletivo da BR-101 com
a Avenida Caxangá.
Esta avenida, de acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo do Recife de
1997, compõe um dos corredores de transporte metropolitano por integrar o sistema
arterial principal da cidade, cuja principal função é atender ao tráfego no âmbito
metropolitano e regional. Nela o volume de tráfego médio diário é de 70 mil veículos,
divididos em cinco categorias: 76% de auto-passseio, 7% de táxis, 6% de veículos de
carga e 10% de ônibus (GOMES, 2002).
A Avenida Caxangá comporta o maior corredor de transporte coletivo em linha
reta de todo o estado de Pernambuco, possuindo, em seu canteiro central, faixas
exclusivas para ônibus, onde circulam 38 linhas de ônibus, atendendo a uma demanda
média de 163.575 passageiros/dia útil (GOMES, 2002).
Além do expressivo fluxo do transporte coletivo por ônibus, salienta-se ainda o
intenso fluxo de veículos particulares e até 2003 a presença marcante do transporte
alternativo ao longo desta via. Este transporte circulava tanto no sentido “subúrbio-
cidade” quanto “cidade-subúrbio”, fazendo suas paradas ao longo da avenida e, muitas
vezes, ocupando os corredores exclusivos para ônibus.
Nas imediações do viaduto da BR-101 com a Avenida Caxangá, que se
configura como um centro de convergência e de dispersão de fluxos, um intenso
fluxo tanto de pessoas advindas de municípios da Mata e Agreste, como de municípios
metropolitanos e de bairros próximos a estas imediações e daqueles localizados ao sul
1
Esta mata é uma das Unidades de Conservação da cidade, segundo a Lei Municipal 16.176/96.
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da cidade. Nesta área, estabeleceu-se vários pontos de concentração do transporte
alternativo, com um expressivo mero de kombis e algumas vans e toyotas, cujos
operadores se “apropriavam” deste local para fazer ponto de parada para embarque e
desembarque de passageiros (Figura 4).
Por estas redondezas, uma das concentrações do transporte alternativo ocorria
no cruzamento da Avenida Caxangá com a BR 101 Norte, na área de um posto de
gasolina, de onde kombis e toyotas partiam, transportando passageiros para municípios
da Mata e Agreste Setentrional, tais como Paudalho, Carpina, Limoeiro, Bom Jardim,
Surubim etc. Algumas kombis também faziam ponto de parada em frente ao referido
posto, realizando o transporte de passageiros com destino a municípios metropolitanos,
como Camaragibe e São Lourenço da Mata e para outras localidades do Recife, a
exemplo da UR-7, no bairro da Várzea.
Duas outras concentrações do transporte alternativo por kombis encontravam-se
em paralelo ao viaduto da BR-101, no início da Avenida Prof. Moraes Rego, próximas à
Avenida Caxangá. A primeira destinava-se aos conjuntos habitacionais (Curado I II –
III - IV) situados no bairro do Curado e, a segunda, cujos veículos estavam mais
presentes nos horários de pico ao longo da semana, destinava-se a municípios
setentrionais das regiões da Mata e Agreste, como Carpina, Limoeiro. Havia também
neste trecho um alinhamento de alguns automóveis que também transportam
passageiros para o interior do Estado, para os municípios de Aliança, Timbaúba, por
exemplo, e ainda a presença de alguns táxis.
Outra concentração, como apontado anteriormente, ocorria no cruzamento
da Rua Emiliano Braga com a Avenida Prof. Moraes Rego, através de kombis e algumas
vans, sendo este o local de partida das kombis que faziam lotação para seguir ao bairro
de Boa Viagem através de duas rotas: Caxangá/
Shopping
/Boa viagem e
Caxangá/Aeroporto/Boa viagem. É a partir desta concentração do transporte alternativo,
que se busca caracterizar os caminhos compreendidos entre Avenida Caxangá, nas
imediações do viaduto da BR 101, e o bairro de Boa Viagem, nos quais se
estabeleceram as rotas do transporte alternativo para atender deslocamentos entre estas
duas áreas da cidade.
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Partindo da Rua Emiliano Braga, seguindo no sentido oeste-sul, toma-se a
Avenida Prof. Moraes Rego, que se estende paralelamente a BR-101, separando os
bairros da Várzea e Iputinga, situando-se o primeiro ao lado direito desta via e, o
segundo, ao esquerdo. Deste lado, a ocupação que margeia aquela avenida é marcada
pela presença de estabelecimentos comerciais e de serviços, com destaque para
motéis, escola de informática (IBRATEC), e ainda pequenos estabelecimentos
comerciais fixos como barracas de lanche e almoço, de bebidas, um quiosque de
vendas de passagens para o interior do Estado, que ocupam as calçadas no entorno da
avenida.
Na margem direita da Avenida Prof. Moraes Rego também é marcante a
presença de pequenos comércios, no entanto, com características ambulantes. A partir
do cruzamento da Avenida Caxangá com a Avenida Prof. Moraes Rego, seguindo-se
por esta via, destacam-se, ao longo das calçadas, barracas de frutas, de venda de
espetinhos, de lanches (caldo-de-cana, água de coco), fiteiros, entre outros. Seguindo o
trajeto, neste mesmo lado até as proximidades do bairro da Iputinga com a Cidade
Universitária, as ocupações que o margeiam são marcadas pelo uso habitacional, com
alguns pontos comerciais como posto de combustível e lava-jato.
Adiante, quando a Avenida Prof. Moraes Rego começa a cortar um trecho da
Cidade Universitária, nas proximidades desta com o bairro do Engenho do Meio,
encontram-se dois grandes equipamentos: o Hospital das Clínicas, situado ao lado
direito da avenida, e o prédio da Superintêndia para o Desenvolvimento do Nordeste –
SUDENE, assentado à esquerda. Nas calçadas do hospital, instalaram-se pequenos
estabelecimentos comerciais como barracas de lanche, fiteiros, ligados às atividades do
circuito inferior da economia. Mais adiante, do lado esquerdo do percurso, tem-se a
reitoria da Universidade Federal de Pernambuco e, no entorno desta, estão instaladas
agências bancárias.
Nestas imediações, as áreas que margeiam a referida avenida apresentam uma
ocupação predominantemente institucional, que se estende a todo o campus da Cidade
Universitária. Esta designação deve-se ao fato de terem sido instaladas nesta área várias
faculdades da Universidade Federal de Pernambuco, cuja construção se deu na década
de 1950. No final desta década e início dos anos de 1960 o local começou a receber
as primeiras faculdades. Esta área e as outras adjacentes a ela, que correspondem ao
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bairro da Várzea, formam um dos pólos de atração da cidade, caracterizando-se pela
presença de atividades como educação e cultura, atraindo e consolidando novas
atividades de comércio, serviços e lazer.
Retomando o percurso, depois de cortar um trecho da Cidade Universitária, o
trajeto continua pela Rua Visconde de São Leopoldo, que passa entre a Cidade
Universitária, situada a sua margem direita, e o bairro do Engenho do Meio, assentado
à margem esquerda. No entorno desse trecho, algumas ocupações comerciais e
residenciais e o terminal de ônibus do Engenho do Meio, situado em frente à Rua Prof.
Luiz Freire, via que se liga à Rua Visconde de São Leopoldo. À medida que se penetra
no bairro, vê-se uma predominância do uso habitacional, destacando-se a presença de
vilas, como a Vila do Engenho do Meio e a Vila Redenção. Esta última compõe uma
das Zonas Especiais de Interesse Social
2
da cidade.
15
Próximo ao terminal de ônibus do Engenho do Meio, também havia uma
concentração de kombis, que partiam do referido bairro ao centro do Recife. Quando
não se permitiu mais a entrada destes veículos ao centro expandido, estas kombis se
destinavam apenas até o bairro da Madalena e, depois, deixaram de circular devido à
proibição das mesmas em todo o Recife.
Nas adjacências do bairro do Engenho do Meio com a Cidade Universitária e o
bairro do Curado, encontram-se alguns equipamentos de uso institucional e
educacional, que se destacam ao longo do trajeto à margem direita. Um destes
equipamentos é a Escola Técnica Federal de Pernambuco, implantada na década de
1970, e que hoje é o atual Centro Federal de Educação Tecnológica de Pernambuco -
CEFET-PE, localizado entre os limites da Cidade Universitária e os do Curado, ao
adentrar-se pela Rua Prof. Luiz Freire. Os outros equipamentos são a 7a Divisão do
Exército, o Colégio Militar do Recife, ambos situados no bairro do Curado, limitando-se
ao Engenho do Meio, na Rua Visconde de São Leopoldo, onde se destaca, ainda, um
posto da Polícia Rodoviária Federal, situado mais à frente.
Ao findar da Rua Visconde de São Leopoldo, o trajeto continua por um trecho
da BR –101, e logo, pela Avenida Recife, nas proximidades da BR-232 e Avenida
2
“As
Zonas Especiais de Interesse Social
(ZEIS) surgiram como uma designação da legislação urbanística
para localidades desprovidas de oferta básica de infra-estrutura e serviços urbanos, ocupadas por uma
população pobre, normalmente ameaçada pela instabilidade de uma posse da terra precária”
(MARINHO, 1999, p. 13)
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Engenheiro Abdias de Carvalho, vias que se ligam ao adentrar-se pela BR 232, à
margem esquerda do caminho, constituindo um dos corredores de transporte
metropolitano, integrando uma das artérias principais da cidade.
À margem direita, à medida que se adentra pela BR-232, via que corta toda a
extensão do bairro do Curado, destacam-se equipamentos militares, bem como vastas
áreas que representam amenidades preservadas pela legislação urbanística, localizadas
no ambiente de morros: Reserva Ecológica Mata do Curado e a Reserva Ecológica Mata
Jardim Botânico, e ainda, o Distrito Industrial do Curado, onde se situam algumas
indústrias de grande porte, e o Terminal Integrado de Passageiros TIP. Embora no
Curado se destaquem estes grandes equipamentos de uso não residencial, o uso
habitacional predomina no bairro, com destaque para os conjuntos habitacionais
citados anteriormente.
Pela margem esquerda, ao introduzir-se pela BR 232, esta via corta todo o
território do bairro de Torrões, indo ligar-se mais à frente à Avenida Engenheiro Abdias
de Carvalho. Ao longo da referida rodovia, tem-se alguns estabelecimentos comerciais,
mas em todo o bairro predomina o uso habitacional, destacando-se do lado esquerdo
da BR-232 um núcleo de habitações, situado próximo aos limites dos bairros de
Torrões com o do Engenho do Meio, que recebeu o nome de Roda de Fogo, em alusão
a uma novela da Rede Globo de televisão assim intitulada, que integra a maior parte da
ZEIS Torrões, e, do lado direito, a ocupação do Vietnã, que também é uma área ZEIS.
Seguindo pela Avenida Recife, à sua margem direita se encontra o Sindicato dos
Policiais Rodoviários Federais do Estado de Pernambuco SINPRF/PE, e mais adiante, a
Associação Municipalista de Pernambuco - AMUPE. Nestas imediações, ressaltam-se
dois grandes equipamentos urbanos que margeiam a Avenida Recife em meio a
“espaços vazios”: a Companhia de Abastecimento e Armazéns Gerais do Estado de
Pernambuco - CEAGEPE (antiga Central de Abastecimento Sociedade Anônima -
CEASA), que recebe gêneros agrícolas de todas as partes do Estado, negociando-os para
a área do Grande Recife, situada às margens da BR-101, no bairro do Curado, e, mais
adiante, o prédio da Justiça Federal, situado à margem esquerda da avenida, no
bairro de San Martin.
Por estas redondezas, o trajeto continua pela Avenida Recife, eixo que se
estende por aproximadamente 7km de extensão até as imediações do viaduto Tancredo
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Neves, no bairro da Imbiribeira. As áreas no entorno desta avenida se caracterizam por
serem de planície, cuja ocupação, tal como ocorrera em toda a planície do Recife,
iniciou-se a partir do século XVI, com o surgimento de alguns engenhos como o
Curado, o Tejipió e o Ibura, que seguiam as várzeas dos rios Tejipió e Jiquiá. Esta área
de planície era ocupada por canaviais e aglomerados ligados à agricultura até o século
XIX, quando se iniciou o seu processo de urbanização. A partir da década de 1940,
com a implantação da Base Aérea do Recife, posteriormente Aeroporto Internacional
dos Guararapes, iniciou-se uma nova dinâmica ocupacional ao longo da chamada
Estrada Perimetral, atual Avenida Recife. A influência desse equipamento condicionou
o surgimento das primeiras aglomerações urbanas ao longo desta via: a Vila da
SUDENE, ocupada por funcionários desta instituição, e a Vila do IPSEP, cuja ocupação
se deu por funcionários públicos estaduais.
Nas décadas de 1980 e 1990, iniciou-se um processo de adensamento
populacional, impulsionado, sobretudo pelo governo, através da implantação de
conjuntos habitacionais, tais como o Ibura, a Vila Cardeal e Silva e o Conjunto
Residencial Ignez Andreazza. Ao longo deste eixo também se instalaram uma série de
estabelecimentos e prédios, com destaque para o comércio atacadista, lojas, autopeças
e motéis (SANTOS, C., 2002).
A Avenida Recife representa o principal eixo de ligação entre a zona sul e a
zona oeste do Recife, sendo, portanto, uma das principais artérias da cidade, também
compondo um corredor de transporte metropolitano. Esta via possui um volume de
tráfego médio diário de 47 mil veículos, divididos em cinco categorias: 82% de auto-
passseio, 6% de táxis, 9% de veículos de carga e 1% de ônibus. O transporte público
de passageiros por ônibus realiza-se através de oito linhas de ônibus, que atendem a
uma demanda média de 24.974 passageiros/dia útil (GOMES, 2002). Havia também,
nesta avenida, um intenso fluxo das kombis e vans do transporte alternativo, que
partiam das imediações do viaduto da BR-101, próximo à Avenida Caxangá.
Retornando às imediações da Justiça Federal, ao seguir pela Avenida Recife, esta
via passa entre os bairros do Curado e San Martin e, mais adiante, entre este último e o
de Jardim São Paulo. Estes últimos bairros possuem características predominantemente
habitacionais, com destaque para equipamentos comerciais e de serviços ao longo do
trajeto, tais como unidades da Fábrica Royal.
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À direita do percurso, a Rua Senador Alberto Pasqualine acesso ao bairro de
Jardim São Paulo e, à esquerda, situada quase que opostamente àquela via, encontra-se
a Avenida João Cabral de Melo Neto (III Perimetral), que se liga à Avenida Recife,
cortando o bairro da Estância e se estendendo pelo bairro do Jiquiá para se conectar
mais à frente com a Avenida General San Martin, no bairro de San Martin. Ao adentrar-
se pela Avenida João Cabral de Melo Neto, encontra-se, no bairro do Jiquiá, próximo
aos de San Martin e Estância, o Parque do Jiquiá, uma ampla área desocupada, que,
por sua importância histórica, foi protegida pela Lei 16.176/96, compondo uma das
Unidades de Conservação da cidade. Nesta área, instalou-se, na década de 1930, uma
torre para a atracação dos dirigíveis, que ficou conhecida como “Torre do Zeppelin”,
sendo hoje a única existente no Brasil.
Voltando à Avenida Recife, um importante componente da estrutura viária da
cidade passa por essas imediações: o ramal do metrô, que se estende
perpendicularmente a esta avenida, passando por baixo desta, cortando os bairros de
Jardim São Paulo, Areais, Estância e Jiquiá, respectivamente, no sentido oeste-centro.
A partir desses arredores, o trajeto continua pela Avenida Recife, tomando o
viaduto Ulisses Guimarães, construído para facilitar o escoamento do tráfego no
cruzamento desta avenida com a Avenida Dr. José Rufino, via que integra o sistema
arterial principal da cidade, compondo também um dos corredores de transporte
metropolitano, e, onde também se destacava a presença das kombis e vans. Após
passar sobre aquele viaduto, na margem direita da Avenida Recife, já no bairro de
Areias, avista-se o Makro, um grande equipamento comercial implantado na década de
1990.
Nas áreas que compreendem os bairros do Jiquiá, Estância, Areias e Caçote,
pelas quais se passa agora, a tipologia habitacional predominante é de casas e vilas,
tais como a Vila Cardeal e Silva e a Vila Tamandaré, no bairro de Areias, apresentando
também alguns assentamentos populares, dentre estes, Zonas Especiais de Interesse
Social, a exemplo de Jardim Uchôa, Beirinha e Capuá, em Areias, Rua do Rio/Iraque,
no Jiquiá, e Caçote, no bairro de mesmo nome.
Em meio a esta tipologia, destaca-se, à margem esquerda da Avenida Recife, no
bairro de Areias, um grande conjunto habitacional, que contrasta com as ocupações do
entorno: o Conjunto Residencial Ignêz Andreazza. Este conjunto ocupa praticamente
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100
um quarteirão, espraiado num terreno de 300.000m
2
, com seus 2464 apartamentos,
onde residem aproximadamente 10.000 pessoas (SANTOS, C., 2002).
Próximos a este grande conjunto habitacional, destacam-se, também, ao longo
da avenida, outros equipamentos urbanos de grande porte: um grande depósito de
mercadorias desativado, de uma cadeia de supermercados, localizado à frente do
conjunto, e o hospital público Pan de Areias, situado ao lado. Nas calçadas que
margeiam o conjunto, próximo àquele hospital, saliente-se a presença de bares,
lanchonetes e hortifrutigranjeiros, pequenos estabelecimentos cujas atividades estão
vinculadas ao circuito inferior da economia.
Ressalta-se, ainda nestas proximidades, à esquerda da avenida, o Habib’s, loja
que compõe uma rede de
fast-food
, e a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana
EMLURB, no bairro do Caçote. Por estas imediações destacam-se ainda motéis e outros
estabelecimentos comerciais de pequeno porte.
No transcorrer do trajeto pela Avenida Recife, segue-se agora pelas redondezas
dos bairros do IPSEP e Ibura, passando entre estes, estando o primeiro situado à
margem esquerda da avenida e, o segundo, à direita. Deste lado, um trecho próximo à
avenida é marcado por algumas ocupações residenciais, assentadas numa área de
preservação ambiental, que se prolonga por todo o norte do bairro do Ibura, limitando-
se com os bairros de Areias e Caçote. Esta área apresenta alguns remanescentes de
mata atlântica e manguezal, compondo uma das Unidades de Conservação da cidade,
de acordo com a Lei 16.176/96, onde se encontra a Mata do Jardim Uchôa.
Adiante, tem-se a Avenida Dom Hélder Câmara, conhecida como a “Entrada do
Ibura”, cuja construção facilitou o acesso ao bairro a partir da Avenida Recife. Um
pouco mais à frente desta avenida, encontra-se instalado um equipamento comercial
de uma rede de supermercados: o Bombreço, se avistando por trás deste
equipamento as áreas que compreendem o Aeroporto Internacional dos Guararapes.
À margem esquerda da Avenida Recife, no bairro do IPSEP, a ocupação dá-se
por atividades ligadas ao comércio, que segue ao longo da avenida até a Rua Jean
Emile Favre, importante via de articulação entre aquela avenida e o bairro do IPSEP,
sendo conhecida, nas imediações em que se liga à Avenida Recife, como “Entrada do
IPSEP”. Esta rua se estende por toda a extensão do IPSEP, indo conectar-se à Avenida
Marechal Mascarenhas de Moraes, no bairro da Imbiribeira. Ao longo da Rua Jean
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Emile Favre, destacam-se equipamentos comerciais tais como restaurantes, padarias,
armazéns de construção, farmácias, e serviços como escolas, cursos de línguas,
delegacia, consultórios e clínicas médicas, entre outros.
Ao adentrar-se pela Rua Jean Emile Favre, avista-se, à sua margem esquerda,
uma ocupação por comércio e, por trás, encontra-se a Vila do IPSEP. À direita,
predomina uma tipologia habitacional composta por prédios, que integram um
conjunto habitacional, ao qual vulgarmente se denominou de “Chico City”, em alusão
a um programa humorístico de televisão. À medida que se adentra pelo IPSEP, vê-se
que todo o bairro é marcado pela presença de vilas, destacando-se ainda a Vila Maria
Lúcia e a Vila Mauricéia.
Retornando por aquela rua à Avenida Recife, ao longo desta, até os limites do
bairro do IPSEP com o da Imbiribeira, destaca-se ainda o comércio e, avista-se, por trás
deste, os prédios que integram o conjunto habitacional Vila da SUDENE. O trajeto
segue pela Avenida Recife, cortando esta vila e, em seguida, passando por um trecho
do bairro da Imbiribeira, onde, à margem esquerda, destaca-se um grande
estabelecimento comercial, que imprimiu à avenida características modernas: o
Shopping Outlet
.
Por estas redondezas, já nas proximidades do viaduto Tancredo Neves, segue-se
ao bairro de Boa Viagem por duas ramificações: uma se estende, através de um
pequeno tentáculo a partir da Avenida Recife, indo tomar a Avenida Marechal
Mascarenhas de Moraes até imediações do Aeroporto Internacional dos Guararapes,
um dos principais equipamentos de atração desta avenida, localizado no bairro do
Ibura, mais especificamente nas confluências deste bairro com os da Imbiribeira e Boa
Viagem, e a outra, segue passando sobre aquele viaduto, cortando a Avenida Marechal
Mascarenhas de Moraes, tomando a Rua Ernesto de Paula Santos e, em seguida, a Rua
Visconde de Jequitinhonha, para chegar ao
Shopping Center
Recife, grande
equipamento de atração da cidade, situado no bairro de Boa Viagem.
Tomando a primeira ramificação para chegar ao Aeroporto, passa-se por um
trecho da Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes. Esta avenida é composta por
duas pistas, cada uma com quatro faixas, com fluxos nos sentidos Centro-Jaboatão e
Jaboatão-Centro, e possui aproximadamente 6,5 km de extensão, que se prolonga, no
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sentido centro-sul, por todo o bairro da Imbiribeira e passa entre os bairros do Ibura e
Boa Viagem pelas imediações do Aeroporto.
Esta avenida se caracteriza predominantemente pelo uso comercial e de
serviços. Nela ressaltam-se principalmente os setores automobilístico e alimentício, e
ainda se fazem presentes estabelecimentos de lazer, saúde, educação, lojas, financeiro,
construção e religioso. Neste contexto, destacam-se grandes lojas de material de
construção, lojas de móveis de fábrica, autopeças, concessionárias, galpões, bancos e
faculdades, e grandes equipamentos como o ginásio de esportes Geraldo Magalhães
(“Geraldão”) e o próprio Aeroporto Internacional dos Guararapes.
Ao longo desta via encontram-se ainda, de forma espaçada, pequenos
comércios como bancas de jogo do bicho, fiteiros, chaveiros, entre outros, com
destaque para uma concentração de barracas de lanche em frente à praça do
Aeroporto.
As ocupações de uso habitacional no entorno da avenida são muito espaçadas,
quase inexistentes, o uso industrial é pouco expressivo, embora os existentes ocupem
grandes espaços, e o institucional é marcado pela presença da Justiça do Trabalho e
pelo Departamento de Estradas de Rodagem – DER/ PE.
A Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes também representa uma das
principais artérias da cidade, compondo um dos corredores de transporte
metropolitano. Ela se configura como uma dupla porta de entrada do Recife, dada a
presença do Aeroporto e porque esta via recebe o fluxo da BR-101 sul. Nela, o volume
de tráfego médio diário é de 37 mil veículos, que se dividem em cinco categorias: 79%
de auto passeio, 5% de táxis, 9% de veículos de carga e 7% de ônibus, atendendo a
uma demanda média de 152.006 passageiros/ dia útil (GOMES, 2002).
Nesta avenida havia também um expressivo fluxo das kombis do transporte
alternativo, que faziam ponto de parada no giradouro que propicia a ligação desta
avenida com a Rua Barão de Souza Leão, próximo ao Aeroporto, e também em frente a
praça deste equipamento, que se destinavam às cidades ao sul da Região
Metropolitana. Em geral, as kombis que no giradouro faziam ponto de parada eram
aquelas advindas das imediações da Caxangá, de onde se inicia o trajeto percorrido,
que seguiam a partir da Rua Barão de Souza Leão pelo bairro de Boa Viagem para
retornarem ao ponto de partida.
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Nestas redondezas, o Aeroporto e a Rua Barão de Souza Leão, via de transporte
urbano secundária, que se liga à Avenida Marechal Mascarenhas de Morais, próximo
ao Aeroporto, estendendo-se pelo bairro de Boa Viagem, constituem uma das áreas de
atração da cidade. Nesta rua se destacam, entre outros estabelecimentos comerciais,
bares e restaurantes, e estabelecimentos de serviço, com destaque para hotéis e bancos.
As instalações do Aeroporto também abrigam diversas lojas e serviços. Este
estabelecimento passou por uma grande reforma, com o intuito de ampliar a pista,
modernizar o terminal de passageiros e os seus equipamentos, criar mais
estacionamentos, além de propiciar uma integração com o metrô, quando este tiver
suas obras concluídas.
A expansão do metrô em paralelo à Avenida Marechal Mascarenhas de Morais,
cortando o bairro da Imbiribeira e seguindo entre este e o de Boa Viagem, integrando-
se com outros sistemas de transporte, será fundamental para estas áreas,
proporcionando a ligação com outras localidades da cidade.
Retornando às imediações do viaduto Tancredo Neves, a segunda ramificação
se estende por este viaduto, tomando a Rua Ernesto de Paula Santos, e depois a Rua
Visconde de Jequitinhonha em direção ao
Shopping Center
Recife. Na Rua Ernesto de
Paula Santos e a sua paralela, Rua Ribeiro de Brito, concentram-se comércio e serviços
diversificados, ressaltando-se hotéis e edifícios empresariais.
No transcorrer do trajeto pela Rua Visconde Jequitinhonha, destacam-se, no seu
entorno, pequenos estabelecimentos comerciais e de serviços ligados ao circuito
inferior da economia tais como salões de cabeleireiro, lanchonetes, fiteiros fixos nas
calçadas, comércios ambulantes, entre outros. Aqui havia uma expressiva
concentração de kombis, que lotavam e partiam, em sua maioria, para a Avenida
Caxangá e também para os bairros do Ibura e Totó.
Este trecho do percurso, na Rua Visconde Jequitinhonha, corta um assentamento
popular denominado vulgarmente de ’’Entra Apulso’’, uma ZEIS que contrasta com a
ocupação residencial de alto padrão construtivo nas adjacências do
Shopping
, padrão
este que é predominante no bairro de Boa Viagem. Além da ZEIS ’’Entra Apulso’’, um
outro assentamento popular, denominado ’’Ilha do Destino’’, também considerada uma
ZEIS, assenta-se neste bairro.
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104
Em Boa Viagem, encontram-se áreas com ocupação verticalizada, densidade
construtiva elevada e alto padrão imobiliário, com expansão para o Pina e imediações
do
Shopping
Recife, e dotadas de qualidades ambientais e paisagísticas de potencial
para atividades de lazer e turismo.
Neste bairro, concentra-se um grande número de importantes eixos viários de
transporte metropolitano, como Avenida Boa Viagem, Avenida Engenheiro Domingos
Ferreira, Avenida Visconde de Jequitinhonha, Avenida Conselheiro Aguiar, além das
vias de transporte urbano secundárias, como a Avenida Antônio Falcão e a Rua Barão
de Souza Leão. Ao longo destes eixos se concentram variados tipos de serviços e
comércios, que os tornam pontos atrativos, a exemplo da já citada Rua Barão de Souza
Leão, situada próxima ao Aeroporto.
Na Avenida Engenheiro Domingos Ferreira, destacam-se grandes equipamentos
comerciais, como supermercados, bares e restaurantes, comércios especializados a
exemplo de lojas de móveis, docerias, entre outros. Nas imediações desta avenida com
a Avenida Antônio Falcão e a Rua Félix de Brito Melo, pelas proximidades do
Shopping
, uma concentração de estabelecimentos institucionais como escolas,
colégios, cursinhos, universidades e cursos de línguas.
A Avenida Boa Viagem se caracteriza como uma via predominantemente
residencial, possuindo um alto índice de verticalização. Entretanto, nesta avenida se
encontram comércios e serviços de alto e médio padrão, destacando-se comércios
especializados, hotéis e restaurantes de luxo.
No bairro de Boa Viagem, a existência da praia e a presença de um conjunto de
comércios e serviços de qualidade e diversificados, em que se destacam o
Shopping
Center
Recife (que por si mesmo representa um relevante centro de distribuição e
consumo), o Aeroporto (este, embora esteja situado mais especificamente no bairro do
Ibura, possui uma dinâmica voltada para o bairro de Boa Viagem), supermercados 24h,
hotéis, e ainda bares, restaurantes, feira de artesanato, faz deste bairro um local para
várias atividades de lazer, gastronômicas e turísticas, tornando-o uma área de atração
bastante significativa não apenas para as áreas do entorno como para toda a cidade.
Este bairro encerra, assim, os caminhos pelos quais se delinearam as rotas das
kombis e vans, partindo de uma das áreas da cidade, onde uma convergência de
diversos fluxos e uma concentração de atividades, nas imediações do viaduto da BR-
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105
101 com a Avenida Caxangá, para a zona sul da cidade, na qual se destacam diversas
atividades de comércios e serviços, ressaltando-se, neste contexto, como
mencionado, os dois grandes equipamentos de atração: o
Shopping Center
Recife e o
Aeroporto Internacional dos Guararapes.
A partir da caracterização dos caminhos entre a Avenida Caxangá, às
imediações do viaduto da BR-101, e o bairro de Boa Viagem, buscar-se-á, a seguir,
desvendar a espacialização das rotas das kombis e vans ao longo dos eixos viários nos
quais os operadores do transporte alternativo esboçavam suas territorialidades flexíveis,
condicionando suas rotas aos intensos fluxos de passageiros entre estas duas áreas da
cidade.
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3.2 – Espacialização das Rotas do Transporte Alternativo
Percorrendo as rotas do transporte alternativo
Como visto, a inserção do transporte alternativo na dinâmica metropolitana do
Recife se de modo mais intenso a partir de meados da década de 1990, quando se
intensifica os veículos de pequeno porte realizando o transporte de passageiros, com
uma ocupação dos principais eixos viários metropolitanos pelos atores (motoristas e
cobradores) que passaram a atuar nesta atividade. Esta passou a representar uma
alternativa aos deslocamentos da população e ao mesmo tempo uma alternativa de
emprego diante da crise econômica e seus reflexos no mercado de trabalho.
É neste contexto que se verifica uma “apropriação” dos eixos tomados como
referencial de análise, compreendidos entre a Avenida Caxangá, a partir do viaduto da
BR-101, e o bairro de Boa Viagem, duas áreas onde o transporte alternativo
apresentava grande expressão. A primeira se caracteriza como um pólo metropolitano
de comércio e serviços de grande fluxo, configurando-se como um centro dispersor e
de convergência de fluxos. A segunda, o bairro de Boa Viagem, representa um pólo
atrativo que extrapola os limites da cidade, dada a existência da praia e a presença de
um conjunto de comércios e serviços diversificados.
O transporte alternativo foi se delineando, portanto, entre estas duas áreas, e
seus operadores foram estabelecendo uma rede de relações, de adoção de símbolos,
expressões e gestos que garantiam e legitimavam os trajetos como territórios para a
prática do transporte de passageiros através de veículos de pequeno porte,
representados sobretudo pelas kombis. Estas micro-unidades alternativas de transporte
passaram a disputar passageiros com o transporte por ônibus, sobrepondo-se a este em
alguns trechos do percurso, porém, apresentando trajetos mais curtos, proporcionando
maior rapidez e flexibilidade aos deslocamentos entre a Avenida Caxangá e o bairro de
Boa Viagem. (Foto 5)
Estes deslocamentos, do ponto de vista do sistema de transporte coletivo
convencional, seriam contemplados pelas seguintes linhas de ônibus:
Shopping
/CDU,
CDU/Boa Viagem/Caxangá e CDU/Caxangá/Boa Viagem. Estas duas últimas linhas
partem de uma concentração de terminais de ônibus, situados na Avenida Acadêmico
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Hélio Ramos, entre a Cidade Universitária e a Várzea. A linha CDU/Boa
Viagem/Caxangá segue inicialmente para o bairro de Boa Viagem, voltando ao seu
ponto inicial pela Avenida Caxangá, enquanto a linha CDU/Caxangá/Boa Viagem
segue por quase toda a extensão desta avenida para depois tomar o bairro de Boa
Viagem e retornar à Avenida Acadêmico Hélio Ramos. Os Mapas 7 e 8 apresentam a
espacialização dos itinerários destas linhas. Se comparado às rotas antes realizadas
pelo transporte alternativo, conforme se verá adiante, estas linhas possuem trajetos
mais longos, de forma a abranger mais amplamente o bairro de Boa Viagem e poder
transportar o maior número possível de passageiros.
A linha
Shopping
/CDU possuía, inicialmente, seu terminal próximo à Avenida
Caxangá, nas imediações do viaduto da BR-101, com um itinerário que também se
alongava pelo bairro de Boa Viagem, conforme se observa no Mapa 9. Posteriormente,
diante da intensificação do transporte alternativo entre a Avenida Caxangá e Boa
Viagem, esta linha passou por algumas mudanças para poder competir com as kombis
e vans, passando a ter o seu ponto terminal no mesmo local das duas primeiras linhas
mencionadas e um itinerário mais curto, que seguia para Boa Viagem através do
viaduto Tancredo Neves, chegando logo ao
Shopping
, de onde retornava para o
terminal, realizando um percurso similar a uma das rotas feitas pelo transporte
alternativo
Foto: Diana Souza. Janei ro de 2003
.
FOTO 5: Kombis ao longo da Avenida Prof. Moraes Rego.
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111
Após a retirada das micro-unidades alternativas de transporte dos principais
eixos viários da cidade, esta linha passou novamente por reformulações.
Estrategicamente, para inibir um possível retorno do transporte alternativo ao local
onde havia a concentração de kombis que lotavam a partir da Avenida Caxangá ao
bairro de Boa Viagem, bem como dissociar a imagem deste local ao transporte
alternativo e, principalmente, tentar causar um menor impacto junto à população, que
estava habituada às kombis e vans, o terminal da linha
Shopping
/CDU passou a se
situar na Rua Emiliano Braga (Fotos 6 e 7).
Em paralelo a este transporte convencional, os operadores do transporte
alternativo encontraram uma brecha para atuarem à medida que passaram a oferecer
trajetos mais curtos, viagens mais rápidas, passagem relativamente mais barata, maior
freqüência, flexibilidade das rotas, dos pontos de retorno e flexibilidade de paradas
para embarque e desembarque de passageiros. Estabeleceu-se, assim, um intenso fluxo
de kombis e vans, que passaram a se organizar espacialmente entre as imediações do
viaduto da BR 101, na Avenida Caxangá, e o bairro de Boa Viagem, através de três
rotas relativamente pré-definidas, que, no entanto, apresentavam uma certa
flexibilidade em seus trajetos, redirecionando-os a partir dos fluxos de passageiros,
condicionados ainda pelos horários e dias da semana, conforme se pôde observar em
campo.
As micro-unidades alternativas de transporte se estabeleceram estrategicamente
pelas proximidades da Avenida Caxangá porque neste local uma confluência de
diversos fluxos que se destinam ao bairro de Boa Viagem. Além disso, aos operadores
do transporte alternativo não convinha se estabelecerem nas imediações da Avenida
Acadêmico Hélio Ramos, ponto de partida das linhas do transporte convencional que
percorrem itinerários passando pelo bairro Boa Viagem, uma vez que, os fluxos que
dali partem são predominantemente de estudantes, que geralmente pagam meia tarifa
nos ônibus e ainda utilizam o passe eletrônico para pagar a passagem, o que não era
possível nas kombis e vans.
Tendo como referência os caminhos percorridos pelo transporte alternativo entre
a Avenida Caxangá e Boa Viagem, bem como a forma com que os operadores desta
atividade em geral anunciavam as rotas, convencionou-se aqui, assim denominá-las:
Caxangá/
Shopping
/BoaViagem, Caxangá/Aeroporto/ BoaViagem e
Shopping
/Caxangá.
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Foto: Diana Souza. Dezembro de 2003
.
FOTO 7: Terminal de ônibus da linha
Shopping
/CDU na Rua
Emiliano Braga, depois que as kombis deixaram de circular
entre a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem.
Foto: Diana Souza. Janeiro de 2003
.
FOTO 6: Concentração de kombis na Rua Emiliano Braga.
Ponto de lotação dos veículos próximo à Avenida Caxangá.
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Estas rotas eram realizadas, segundo informações daqueles que nelas operavam, por
cerca de 200 veículos, dos quais 50 lotavam na Rua Emiliano Braga, nas imediações do
viaduto da BR 101, próximo à Avenida Caxangá, realizando as duas primeiras rotas,
50 veículos faziam lotação numa das ruas de acesso ao
Shopping
, perfazendo a rota
Shopping
/Caxangá, e os outros 100 veículos apenas circulavam entre a Avenida
Caxangá e o bairro de Boa Viagem, sem terem um ponto fixo para lotação.
As duas primeiras rotas partiam da Rua Emiliano Braga, tomando a Avenida Prof.
Moraes Rego, a Avenida Visconde São Leopoldo, um pequeno trecho da BR 101, e
mais adiante a Avenida Recife, seguindo os mesmos percursos até as imediações do
viaduto Tancredo Neves, onde se bifurcavam. A rota Caxangá/
Shopping
/BoaViagem
passava por este viaduto, tomando a Rua Ernesto de Paula Santos e, em seguida, a Rua
Visconde de Jequitinhonha para chegar ao
Shopping Center
Recife, de onde prosseguia
pela Rua Bruno Veloso (Saída Leste do
Shopping
), depois pela Avenida Prof. João
Medeiros, Rua Félix de Brito Melo, Avenida Engenheiro Domingos Ferreira e por um
trecho da Avenida Visconde de Jequitinhonha para tomar a Rua Barão de Souza Leão,
depois a Avenida Marechal Mascarenhas de Morais e, mais adiante, fazia o retorno
nesta avenida, pelas imediações do viaduto Tancredo Neves, para prosseguir pela
Avenida Recife, voltando para a Avenida Caxangá, tal como se vê no Mapa 10.
Embora fosse, de certa forma, pré-definida a partir do percurso exposto
anteriormente, a rota Caxangá/
Shopping
/BoaViagem apresentava algumas
flexibilidades no tocante à realização do itinerário em função da maior ou menor
intensidade dos fluxos de passageiros. Sendo assim, até aproximadamente às 9:00h, as
kombis que circulavam nesta rota, faziam seu trajeto sem entrar na Rua Visconde de
Jequitinhonha, via que dava acesso ao
Shopping
. Esta pequena alteração do percurso
devia-se ao fato do
Shopping
começar a funcionar a partir das 10:00h. Assim, as
kombis quando vinham da Rua Ernesto de Paula Santos, adentravam na Avenida Prof.
João Medeiros, prosseguindo pela Rua Félix de Brito Melo e, depois pela Avenida
Engenheiro Domingos Ferreira e por um trecho da Avenida Visconde de Jequitinhonha
para seguir pela Rua Barão de Souza Leão, realizando o percurso até a Avenida
Caxangá, conforme descrito anteriormente.
Freqüentemente, estabelecia-se a Delegacia de Boa Viagem como ponto final de
desembarque para os passageiros que vinham da Avenida Caxangá através desta rota.
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As kombis, ao saírem do
Shopping
, vinham desembarcando passageiros até às
imediações da Delegacia e, ao mesmo tempo, embarcando passageiros que se
destinavam à Avenida Caxangá. Quando estes veículos estavam relativamente ou
totalmente lotados, os kombeiros, ao invés de seguirem em frente pela Avenida
Engenheiro Domingos Ferreira para posteriormente tomar a Rua Barão de Souza Leão,
retornavam pelas imediações da Delegacia, passando por trás desta, pela Avenida Prof.
João Medeiros e, em seguida, pela Rua Ribeiro de Brito para seguir pelo viaduto
Tancredo Neves em direção à Avenida Caxangá.
Por vezes, sobretudo nos horários de menor demanda na Avenida Engenheiro
Domingos Ferreira, os operadores do transporte alternativo alteravam a rota próximo ao
Shopping
, saindo pela Rua Bruno Veloso (Saída Leste do
Shopping
) e tomando a Rua
Fernando Simões Barbosa para chegar logo à Rua Barão de Souza Leão, visando uma
eventual demanda a partir desta rua e da Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes
para a Avenida Recife e para a Avenida Caxangá.
Embora o ponto final de desembarque para o passageiro que vinha da Avenida
Caxangá pela rota Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem fosse geralmente a Delegacia de Boa
Viagem, como dito anteriormente, por muitas vezes, estabelecia-se o fim do itinerário
no
Shopping
ou no restaurante “Edmilson da Carne de Sol”, ou ainda nas proximidades
do Colégio Atual, na esquina da Rua Félix de Brito com a Avenida Domingos Ferreira,
pontos que se situavam antes da Delegacia. Isto ocorria sobretudo nos horários de
maior demanda, principalmente no final da tarde, quando havia um grande fluxo de
passageiros a partir da Avenida Domingos Ferreira para a Avenida Caxangá, não
interessando aos operadores do transporte alternativo ainda desembarcarem
passageiros ao longo desta avenida.
A rota Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem, por sua vez, pelas adjacências do
viaduto Tancredo Neves, seguia por um tentáculo a partir da Avenida Recife, indo
tomar a Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes para passar nas imediações do
Aeroporto, de onde seguia por um pequeno trecho da Rua Barão de Souza Leão,
tomando a Rua 20 de Janeiro e, depois, a Rua 10 de Julho e a Rua Capitão Zuzinha,
passando pela Avenida Visconde de Jequitinhonha e depois pela Avenida Engenheiro
Domingos Ferreira, seguindo nesta última até as imediações da Delegacia de Boa
Viagem. A partir deste ponto, as kombis faziam um pequeno retorno, passando pela
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Rua Dom José Lopes e, depois, por um trecho da Avenida Conselheiro Aguiar e pela
Rua Prof. Aloísio P. de Araújo, para voltar à Avenida Engenheiro Domingos Ferreira,
pegando o sentido oposto desta avenida, prosseguindo pela Avenida Visconde de
Jequitinhonha até a Rua Barão de Souza Leão, percorrendo toda a sua extensão e, em
seguida, tomavam a Avenida Marechal Mascarenhas de Morais, fazendo o retorno
nesta avenida, próximo ao viaduto Tancredo Neves, para seguirem por este e voltarem
ao local de partida, conforme se observa no Mapa 11.
Semelhantemente a rota anterior, embora a rota Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem
apresentasse este percurso relativamente pré-definido, também possuía algumas
flexibilidades em função da maior ou menor intensidade dos fluxos de passageiros.
Uma destas flexibilidades se dava quando os kombeiros, ao passarem pela Rua 20 de
Janeiro ou Rua 10 de Julho, indo para Boa Viagem, anunciavam o itinerário para o
Shopping
, na expectativa de pegarem passageiros que fossem até aquele
estabelecimento comercial e/ou aqueles que porventura estivessem na Avenida
Engenheiro Domingos Ferreira que se destinassem à Avenida Caxangá ou às
localidades que a antecedem. Assim, as kombis, ao saírem daquelas ruas, passavam
pela Avenida Engenheiro Domingos Ferreira, fazendo aquele retorno mencionado -
Rua Dom José Lopes, Avenida Conselheiro Aguiar e Rua Prof. Aloísio P. de Araújo -
para tomar o sentido oposto desta avenida, seguindo por trás da delegacia de Boa
Viagem pela Avenida Prof. João Medeiros, deixando algum passageiro que fosse ao
Shopping
no cruzamento desta avenida com a Rua Jack Aires, prosseguindo até a altura
da Rua Félix de Brito Melo, voltando à Avenida Engenheiro Domingos Ferreira para
depois seguir pela Rua Barão de Souza Leão e, a partir desta, seguir o trajeto mais usual
em direção à Avenida Caxangá.
Uma outra flexibilidade ocorria, caso as Kombis estivessem quase ou
totalmente cheias de passageiros quando chegassem às proximidades da Delegacia de
Boa Viagem na Avenida Engenheiro Domingos Ferreira, tal como acontecia na rota
Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem. Assim, ao invés de seguirem pela Rua Barão de Souza
Leão, retornavam a partir daquela avenida, tomando a Avenida Prof. João Medeiros e,
em seguida, a Ribeiro de Brito, encurtando o percurso e se dirigindo à Avenida
Caxangá pelo viaduto Tancredo Neves.
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
118
Algumas vezes, ao virem da Avenida Caxangá, os operadores, quando
chegavam às imediações do Aeroporto, ao invés de seguirem pela Rua Barão de Souza
Leão, encurtavam o trajeto, retornando pela pista oposta da Avenida Marechal
Mascarenhas de Moraes, a partir do giradouro que acesso à Rua Barão de Souza
Leão, para pegar passageiros que iam a partir daqui em direção à Avenida Caxangá.
Isto também ocorria caso estes operadores desejassem retornar logo ao ponto de
lotação próximo à Avenida Caxangá, quando havia um grande fluxo de passageiros
deste ponto para Boa Viagem.
Similarmente ao que ocorria na rota Caxangá/
Shopping
/BoaViagem, embora o
ponto final de desembarque para o passageiro que vinha da Avenida Caxangá fosse
comumente a Delegacia de Boa Viagem, na rota Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem, nos
horários de expressiva demanda, geralmente por volta das 16:30h até cerca de 19:00h,
ao saírem da Avenida Caxangá, os operadores estabeleciam que o final do percurso
seria o Aeroporto. Geralmente, isto acontecia quando havia um grande fluxo para a
Avenida Caxangá a partir da Rua Barão de Souza Leão em diante.
No tocante às flexibilidades das rotas, saliente-se ainda que, no transcorrer do
percurso, as rotas Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem e Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem
podiam seguir uma o itinerário da outra, dependendo do fluxo de passageiros. Desta
forma, se uma kombi que lotasse próximo à Avenida Caxangá com destino ao
Shopping
Recife chegasse às imediações da Avenida Recife sem passageiros, poderia
seguir em direção ao Aeroporto, caso o primeiro passageiro a pegá-la indicasse ir a este
equipamento, as suas imediações ou ainda às ruas percorridas por este veículo pelo
bairro de Boa Viagem depois de passar pelas proximidades do Aeroporto. Também
podia ocorrer desta kombi seguir uma ou outra rota dependendo da quantidade de
passageiros que desejasse um ou outro destino. Se uma kombi estivesse sem
passageiros e chegasse a um local do percurso onde a quantidade de passageiros fosse
maior para o Aeroporto do que para o
Shopping
, evidentemente esta kombi se dirigiria
ao Aeroporto. Geralmente estas flexibilidades aconteciam fora dos horários de
rush
,
quando a demanda era menos expressiva e possuía destinos mais diversificados.
Quanto à rota
Shopping
/Caxangá, o seu ponto de partida era a Rua Visconde de
Jequitinhonha, bem próximo a uma das entradas do
Shopping
, onde os veículos
entravam e faziam uma pequena volta pela Rua Bruno Veloso, para tomar a Saída Sul,
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Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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119
seguindo pela Rua Tenente Domingos de Brito, e depois pela Rua Jorge Couceiro Costa
Eiras e Rua General Americano Freire, para tomar a Rua Ribeiro de Brito e seguir pelo
viaduto Tancredo Neves, indo para a Avenida Caxangá, até as imediações do viaduto
da BR-101, de onde retornavam para o bairro de Boa Viagem, conforme se observa no
Mapa 12.
As flexibilidades da rota
Shopping/Caxangá
davam-se, em geral, quando as
kombis chegavam às localidades que se aproximavam da Avenida Caxangá. Muitas
vezes, em determinados trechos do percurso, se não houvesse mais passageiros, as
kombis, retornavam. Este retorno ocorria, por exemplo, próximo ao bairro de Jardim
São Paulo ou ainda nas imediações da Cidade Universitária, locais de onde estes
veículos retornavam ao bairro de Boa Viagem, voltando ao
Shopping
para lotar
novamente.
Por várias vezes, quando uma kombi chegava a determinadas localidades do
percurso com apenas um ou dois passageiros que iriam até à Avenida Caxangá, seus
operadores negociavam com outra kombi que vinha com uma quantidade maior de
pessoas que se destinavam àquela avenida, passando aquele(s) passageiro(s) para esta
última, a qual, geralmente, recebia a passagem deste(s) passageiro(s). Nem sempre esta
prática agradava aos passageiros, no entanto, sem muita hesitação, freqüentemente
passavam de uma kombi para a outra.
Uma outra eventual flexibilidade desta rota se dava quando as kombis, ao
retornarem das redondezas da Avenida Caxangá, tomavam a Avenida Marechal
Mascarenhas de Moraes a partir da Avenida Recife, seguindo por um pequeno trecho
da Rua Barão de Souza Leão, tomando a Rua 20 de Janeiro e, depois, a Rua 10 de
Julho e a Rua Capitão Zuzinha, seguindo pela Avenida Engenheiro Domingos Ferreira
até as imediações da Delegacia de Boa Viagem. Tal trajeto era realizado quando
durante o percurso de volta da Avenida Caxangá, estas kombis pegassem passageiros
que desejassem ir ao Aeroporto ou às localidades que se seguiam pelo bairro de Boa
Viagem até às proximidades do
Shopping
, tal como acontecia na rota
Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem em seu percurso mais usual e em suas flexibilidades.
A partir da Avenida Engenheiro Domingos Ferreira, para voltar ao
Shopping
, as
kombis da rota
Shopping
/Caxangá podiam fazer um retorno, passando pela Rua Dom
José Lopes e, depois, por um trecho da Avenida Conselheiro Aguiar e pela Rua Prof.
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Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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121
Aloísio P. de Araújo, passando por trás da Delegacia pela Rua Prof. João Medeiros e
seguir pela Rua Ribeiro de Brito até a Rua Visconde de Jequitinhonha.
O ponto final de desembarque para os passageiros que vinham do
Shopping
era
embaixo do viaduto da BR-101, próximo à Avenida Caxangá. Todavia, embora se
tenha convencionado este local como ponto final de desembarque, quando existia uma
grande demanda, por muitas vezes, os cobradores de determinados veículos diziam
que iriam até a entrada do bairro de Jardim São Paulo, pegando passageiro que
fosse até estas imediações. Isto ocorria, sobretudo a partir das 18:00h, quando estes
veículos saíam rapidamente do local de lotação, com intervalos de aproximadamente
três minutos entre uma e outra kombi e os operadores sabiam que muitos usuários
desceriam antes de chegar à Avenida Caxangá. Os operadores queriam voltar logo ao
ponto inicial, dada a expressiva quantidade de passageiros que partia do
Shopping
neste horário. Esta prática, no entanto, era coibida pelo fiscal que controlava a saída
das kombis, alertando que as mesmas deveriam ir até àquela avenida para depois
poderem retornar e lotar novamente.
A partir da espacialização das rotas do transporte alternativo, é possível perceber
que, as linhas CDU/Boa Viagem/Caxan e CDU/Caxangá/Boa Viagem do transporte
convencional, se comparadas a estas rotas antes realizadas pelas kombis e vans,
possuem itinerários mais longos, que se adentram pelo bairro do IPSEP e se alongam
pelo bairro de Boa Viagem. Os operadores do transporte alternativo estabeleceram
estrategicamente suas rotas de forma a atender uma grande demanda de passageiros,
cujos deslocamentos se realizavam para localidades ao longo das adjacências da
Avenida Recife, para o
Shopping
Recife e/ou para o Aeroporto e suas imediações, não
estando estes deslocamentos totalmente atrelados aos roteiros dos ônibus.
Esta assertiva vem ser ratificada pelos usuários das kombis e vans ao opinarem
sobre o transporte coletivo convencional e sobre as vantagens do transporte alternativo
realizado entre a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem. Muitos entrevistados
enfatizaram a questão dos ônibus perfazerem trajetos mais longos e demorados, além
de apresentarem irregularidades quanto aos horários e grandes intervalos entre as
viagens, o que gerava longos períodos de espera e atraso, ao contrário das kombis e
vans, cuja oferta de veículos era grande e a freqüência era constante. Nas três linhas -
Shopping
/CDU, CDU/Boa Viagem/Caxangá e CDU/Caxangá/Boa Viagem saliente-se
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122
também que os ônibus circulavam sempre superlotados nos horários de pico. Segundo
os usuários, mesmo a linha
Shopping
/CDU, que possuía um trajeto mais curto que as
outras linhas de ônibus, não proporcionava deslocamentos mais rápidos tendo em vista
os longos intervalos e as irregularidades nos horários. Além disso, esta linha não
funcionava aos domingos.
Isto posto, delineia-se aqui a forma como os operadores do transporte alternativo
ocupavam os eixos entre a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem através de rotas
estrategicamente definidas a partir dos itinerários dos ônibus, sobrepondo-se à parte
das linhas do sistema convencional. Estas rotas, embora se sobrepusessem a trechos
dos percursos dos ônibus, apresentavam trajetos mais curtos, uma das características do
transporte alternativo que possibilitava deslocamentos mais rápidos entre estas duas
áreas da cidade.
Apesar de apresentarem uma certa regularidade em seus trajetos, estas rotas
possuíam algumas flexibilidades, que se davam com mais freqüência no bairro de Boa
Viagem, sendo expressas sobretudo pelas mudanças de percurso e encurtamento dos
trajetos, a exemplo do que se expôs anteriormente. Estas flexibilidades geralmente
ocorriam em virtude dos operadores do transporte alternativo atuarem segundo uma
lógica de mercado, procurando sempre captar a maior quantidade possível de
passageiros. O que não é concebível no transporte convencional, que este segue
itinerários definidos, independente da demanda de passageiros.
As flexibilidades do transporte alternativo também ocorriam em relação às
paradas, embora se tenha delineado ao longo dos eixos viários estudados algumas
paradas de desembarque de caráter mais freqüente deste transporte e dos operadores
da atividade quase sempre se “apropriarem” das paradas de ônibus para embarque e
desembarque de passageiros.
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123
Características dos fluxos nas rotas
A dinâmica das micro-unidades do transporte alternativo ao longo das rotas era
constante durante todo o dia e em todos os dias da semana, com menor intensidade
aos domingos. De segunda a sábado, por volta das 6:00h até cerca de 9:00h, os fluxos
destes veículos que partiam da Rua Emiliano Braga pelas rotas Caxangá/
Shopping
/Boa
Viagem e Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem pelas imediações da Avenida Caxan eram
mais intensos devido à expressiva demanda de passageiros para o bairro de Boa
Viagem, caracterizando-se, sobretudo pelos deslocamentos casa-trabalho. Durante
estes dias e entre estes horários, além dos 50 veículos que neste local faziam lotação,
cerca de 25, daqueles outros 100, que apenas circulavam entre a Avenida Caxangá e o
bairro de Boa Viagem, ainda reforçavam a frota para a lotação.
Conforme se pôde observar, os fluxos de passageiros que partiam por volta das
6:00 até umas 8:00h, pela rota Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem eram daquelas pessoas
que em geral trabalhavam pelas imediações do
Shopping
ou nos estabelecimentos
instalados nas suas adjacências, a exemplo daqueles situados na Avenida Engenheiro
Domingos Ferreira. Depois deste horário, os fluxos de passageiros convergiam mais
para o
Shopping
, caracterizando-se por serem de pessoas que neste equipamento
trabalham e por pessoas que se deslocam motivadas pelas compras ou em busca dos
serviços oferecidos, tais como o cinema, a praça de alimentação etc.
Pela rota Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem, os fluxos de passageiros que se
dirigiam ao bairro de Boa Viagem, a partir das 6:00 até umas 8:00h, eram constituídos,
sobretudo, por pessoas que trabalhavam tanto no Aeroporto, quanto nos
estabelecimentos situados no seu entorno, como aqueles localizados na Rua Barão de
Souza Leão e na Avenida Marechal Mascarenhas de Moraes. Destaque-se ainda
aqueles fluxos de pessoas que o tomavam como ponto de partida em direção aos
bairros e municípios situados ao sul da RMR, a exemplo do bairro de Prazeres, em
Jaboatão dos Guararapes, e do município do Cabo de Santo Agostinho, e aqueles em
busca das atividades de comércio e serviços instalados neste equipamento e em suas
adjacências.
Durante o horário de pico, pela manhã, estes fluxos de passageiros convergiam,
em geral, para Boa Viagem, embora também houvesse um fluxo para localidades ao
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124
longo da Avenida Recife, antes do viaduto Tancredo Neves. Neste horário de
rush
, as
kombis que vinham da Avenida Caxangá geralmente passavam lotadas pela Avenida
Recife, onde, até aproximadamente 8:00h, era mais difícil se conseguir pegar uma
kombi para Boa Viagem. Os ônibus, a esta altura, passavam superlotados.
Depois do período de
rush
da manhã, ao longo do dia, os fluxos das kombis
ainda eram constantes a partir da Avenida Caxangá, embora diminuíssem um pouco de
intensidade, estando atrelados aos maiores intervalos entre um veículo e outro, que
variavam a partir da demanda de passageiros no ponto de lotação, demanda esta
também constante durante todo o dia. Após o horário de pico, esta demanda se
caracterizava por fluxos de passageiros que passavam a ser mais freqüentes e mais
diversificados partindo da Avenida Caxangá para o bairro de Boa Viagem e para
localidades e estabelecimentos situados ao longo da Avenida Recife. A partir desta
avenida, os fluxos também eram constantes tanto entre as localidades do seu entorno
quanto para o bairro de Boa Viagem, podendo-se observar que grande parte destes
fluxos convergia para o
Shopping
.
Nas proximidades da Avenida Caxangá, os fluxos das kombis e vans voltavam a
ser mais intensos no período da tarde, por volta das 17:00h, havendo uma maior
concentração dos veículos no local de lotação na Rua Emiliano Braga, transportando
passageiros para a Avenida Recife e para Boa Viagem e, ao mesmo tempo, trazendo os
fluxos de pessoas deste bairro para a Avenida Caxangá, que, neste horário, tornavam-se
mais intensos a partir do bairro de Boa Viagem. Estes fluxos de passageiros se
caracterizavam pelos deslocamnetos trabalho-casa em direção à Avenida Caxangá e
pelos fluxos que saíam do
Shopping
para localidades ao longo da Avenida Recife e
imediações da Avenida Caxangá.
As kombis e vans que seguiam pela rota Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem,
voltando pela Avenida Engenheiro Domingos Ferreira, traziam passageiros que vinham
desta avenida, pelas imediações do
Shopping
, e depois seguiam pela Rua Barão de
Souza Leão, onde convergiam com os veículos que realizavam a rota
Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem. A partir da Rua Barão de Souza Leão, as kombis e
vans que vinham pelas duas rotas atendiam a um fluxo de passageiros vindo desta rua,
da Avenida Domingos Ferreira e da Avenida Mascarenhas de Morais em direção à
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125
Avenida Caxangá, fluxos estes que eram menos expressivos no horário de pico da
manhã.
Aos domingos, entretanto, com uma demanda menos expressiva, o fluxo de
kombis era menor e o mero de veículos que lotava na Rua Emiliano Braga diminuía
para aproximadamente 25, seguindo alternadamente pelas duas rotas durante todo o
dia, com uma intensificação à tarde para o
Shopping
. No entanto, em torno das
19:00h, dificilmente se encontrava uma kombi que seguisse a rota
Caxangá/
Shopping
/BoaViagem, indo para Boa Viagem pelo viaduto. Acredita-se que,
devido ao menor fluxo de pessoas que se dirigiam tanto ao
Shopping
quanto ao próprio
bairro de Boa Viagem, os kombeiros procuravam seguir pela rota Caxangá/Aeroporto/
BoaViagem para depois passar pelo
Shopping
, perfazendo as diversas flexibilidades das
rotas com o intuito de pegar a maior quantidade possível de passageiros.
A rota
Shopping
/Caxangá, que partia da Rua Visconde de Jequitinhonha, em
Boa Viagem, possuía uma dinâmica diferente das rotas anteriores. O funcionamento
desta rota se iniciava em torno das 10:00h, horário em que o
Shopping
começava a
funcionar. A partir deste horário, durante todo o dia havia um fluxo constante de
kombis saindo deste local em direção à Avenida Caxangá, com maior intensidade por
volta das 16:00h em diante, quando a demanda de passageiros ficava mais expressiva.
Em geral, os fluxos de passageiros atendidos por esta rota eram caracterizados
sobretudo pelo contingente de pessoas que partiam do
Shopping
para imediações da
Avenida Recife. Ao retornarem pelas proximidades da Avenida Caxangá, os veículos
que faziam a rota
Shopping
/Caxangá também trazia um fluxo que convergia para o
Shopping
, juntamente com as kombis e vans que lotavam na Rua Emiliano Braga e
faziam a rota Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem.
De segunda a sábado, a partir das 16:00h até umas 20:00h, e pelas 22:00h,
horário de fechamento do
Shopping
, havia uma grande demanda de passageiros, seja
das pessoas que trabalhavam no
Shopping
até as 16:00h, que retornavam para casa,
seja das pessoas que iam passear ou fazer compras neste estabelecimento. No
Domingo, porém, os fluxos eram menos expressivos, com maior intensidade entre
18:00 até umas 20:00h, sendo este último o horário de fechamento do
Shopping
.
Os fluxos de passageiros pelas kombis e vans possuíam uma regularidade ao
longo das três rotas, sobretudo nos horários de
rush
, conforme se de observar em
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126
campo e a partir de entrevistas com alguns usuários. A maioria destes usuários utilizava
as kombis e vans todos os dias, principalmente pela manhã, entre 6:00h e 9:00h, e no
final da tarde, entre 16:00h e 18:00h.
Flexibilidade das paradas ao longo das rotas
Um outro aspecto relevante à espacialização das rotas do transporte alternativo
diz respeito às paradas das kombis e vans para embarque e desembarque de
passageiros. Assim como os operadores da atividade sobrepuseram as suas rotas a
trechos das linhas de ônibus, habitualmente também utilizavam as paradas do
transporte coletivo convencional, estabelecidas em pontos estratégicos no transcorrer
dos itinerários. Todavia, embora utilizassem as paradas de ônibus, ao longo das rotas,
os motoristas freqüentemente paravam os veículos em qualquer lugar, caracterizando
uma grande flexibilidade das paradas do transporte alternativo.
Apesar destas flexibilidades, observou-se ao longo das rotas uma certa
regularidade de algumas paradas, condicionadas pelos usos e ocupações, os fixos, no
transcorrer dos trajetos, que eram identificadas tanto pelos operadores quanto pelos
usuários deste transporte, que lhes atribuíram nomes e convenções. Os passageiros
geralmente as denominavam a partir dos equipamentos instalados ao longo do
percurso, para os quais desejassem ir ou que ficassem mais próximos aos seus locais de
destino. Estas paradas eram estabelecidas sobretudo para o desembarque de
passageiros, visto que, normalmente o embarque poderia ocorrer em qualquer lugar do
percurso, ou ainda nas paradas do transporte convencional, onde as pessoas podiam
optar por embarcar num ônibus ou numa kombi.
Partindo das rotas que se iniciavam pelas proximidades da Avenida Caxangá
(Mapa 13), cujo trajeto era comum até o viaduto Tancredo Neves, além das paradas de
ônibus utilizadas, ao longo deste trecho do percurso foi possível observar paradas
como a identificada como “CEASA”, cuja menção faz referência à atual CEAGEPE,
onde comumente as kombis desembarcavam passageiros próximo a um caminho
trilhado entre a Avenida Recife e a BR - 101, que seguia para esta central de
abastecimento (Mapa 14).
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129
Mais à frente, ocorria freqüentemente o desembarque de passageiros pelas
proximidades de uma faixa de pedestres, parada identificada como “Faixa”, que se
situava antes do trevo do viaduto Ulisses Guimarães, próximo a um acesso da Avenida
Dr. Jo Rufino (antes do Makro), um dos corredores de transporte metropolitano da
cidade, que possui, por estas imediações do viaduto, um fluxo bastante intenso de
pessoas. Depois do viaduto, estabeleceu-se uma parada na esquina do Makro e,
adiante outra em frente à rua que acesso à Vila Cardeal e Silva, conhecida como
“Entrada da Cardeal”. Os fluxos aqui convergiam tanto para os arredores desta vila
próximo à Avenida Recife quanto para o conjunto Ignez Andreazza, situado do outro
lado da avenida. Embora a parada de ônibus se situasse pouco depois desta parada
convencionada pelo transporte alternativo, usualmente os passageiros preferiam descer
nesta última, por ficarem mais próximos à rua de acesso à Vila Cardeal e Silva e a uma
das entradas do conjunto. Costumava-se ainda descer pelas imediações da esquina da
Rua Aurora Caçote com a Avenida Recife, local onde se situa o
Habib’s
”, que fica
mais próximo às comunidades do Caçote, da Beirinha e da entrada do Hospital Pan de
Areias.
Mais adiante, freqüentemente também se parava na esquina da Avenida Dom
Hélder com a Avenida Recife, mais próximo do acesso ao bairro do Ibura, cuja parada
era identificada como “Entrada do Ibura”. Uma outra parada freqüente era a conhecida
como “Entrada do IPSEP”, onde geralmente as kombis e vans desembarcavam
passageiros em frente à Rua Jean Emile Favre, do outro lado da avenida, porque para
esta rua convergia um intenso fluxo de pessoas tanto para os estabelecimentos de
comércios e serviços nela instalados como para os prédios da Vila do IPSEP (Mapa 15).
próximo ao
Outlet
, vindo através da rota Caxangá/
Shopping
/BoaViagem, era
freqüente o desembarque de passageiros na pista central da Avenida Recife, na subida
do viaduto Tancredo Neves e, nestas mesmas imediações, através da rota
Caxangá/Aeroporto /BoaViagem, os veículos do transporte alternativo sempre paravam
no tentáculo da Avenida Recife que dava acesso à Avenida Marechal Mascarenhas de
Morais. A maioria dos passageiros que aqui desciam se destinavam ao
Outlet
.
A partir do viaduto Tancredo Neves as rotas que partiam da Avenida Caxan
seguiam por caminhos diferentes ao bairro de Boa Viagem, destacando-se ainda
algumas outras paradas do transporte alternativo. Ao seguir por aquele viaduto, na rota
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131
Caxangá/
Shopping
/BoaViagem, observou-se que era comum desembarcar passageiros
em frente a uma padaria, na Rua Visconde de Jequitinhonha, onde havia diversos
serviços e comércios nos arredores, cuja parada era conhecida como “Padaria”.
Mais à frente, na mesma rua, a próxima parada era a do
Shopping
”, e, seguindo
pela Avenida Prof. João Medeiros destacava-se a parada do “Hiper”, na esquina desta
avenida com a Rua Félix de Brito. Nesta última rua, destacava-se ainda a parada do
“Contato”, situada em frente ao Colégio Contato. Na esquina da Rua Félix de Brito com
a Avenida Domingos Ferreira também se estabeleceu uma parada, e, prosseguindo
nesta última avenida havia ainda uma parada próxima à Rua Jack Aires (Fotos 8 e 9),
onde os operadores paravam os veículos por alguns minutos, na expectativa de pegar
algum passageiro, outra próxima ao restaurante Edmilson da Carne de Sol e, mais à
frente, uma parada às proximidades da Delegacia de Boa Viagem.
Na rota Caxangá/Aeroporto/Boa Viagem, pelas imediações do viaduto Tancredo
Neves, ao seguir pelo tentáculo da Avenida Recife, era comum as kombis e vans
desembarcarem passageiros no cruzamento da Avenida Recife com a Avenida
Mascarenhas de Morais. Habitualmente, a parada que se seguia a esta era a do
Aeroporto, situada no giradouro que dá acesso à Rua Barão de Souza Leão (Foto 10).
Ao entrar pela Rua Barão de Souza Leão, seguindo pelas Ruas 10 de Julho e 20
de Janeiro, comumente as paradas do transporte alternativo eram as mesmas dos
ônibus. Mais adiante, estabeleceu-se uma parada na esquina da Avenida Engenheiro
Domingos Ferreira com a Rua Dom Jo Lopes, em frente à Delegacia de Boa Viagem,
situada do outro lado da avenida.
A partir da Delegacia de Boa Viagem, ambas as rotas que partiam da Avenida
Caxangá, voltavam pela Rua Barão de Souza Leão. No cruzamento desta rua com a
Avenida Visconde de Jequitinhonha, freqüentemente alguns operadores também
passavam alguns minutos, com o intuito de pegar algum passageiro (Foto 11).
Ao longo da Rua Barão de Souza Leão, comumente os motoristas das kombis se
utilizavam das paradas de ônibus. Era comum, entretanto, os operadores
desembarcarem passageiros na esquina da Rua Barão de Souza Leão com a Avenida
Marechal Mascarenhas de Morais, parada conhecida como “Posto”, por se situar em
frente a um posto de gasolina. Freqüentemente, alguns passageiros que aqui desciam,
vinham da Avenida Engenheiro Domingos Ferreira e da própria Rua Barão de Souza
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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132
Foto: Clélio Santos . Janeiro de 2003
.
FOTO 8: Parada do transporte alternativo na entrada da Rua
Jack Aires, via de acesso ao
Shopping Center
Recife.
Foto: Clélio Santos . Janeiro de 2003
.
FOTO 9: Vista da parada na entrada da Rua Jack Aires a
partir da Avenida Domingos Ferreira.
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133
Foto: Diana Souza. Janeiro de 2003
.
FOTO 10: Ao fundo, desembarque de passageiros pelas
imediações do Aeroporto, em frente à Rua Barão de Souza
Leão.
FOTO 11: Parada das kombis e vans no cruzamento da Rua
Barão de Souza Leão com a Av. Visconde de Jequitinhonha.
Foto: Diana Souza. Janeiro de 2003
.
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134
Leão e se destinavam a localidades ao sul da cidade. D por diante, a próxima parada
do transporte alternativo era a do giradouro que acesso à Avenida Recife a partir da
Avenida Mascarenhas de Morais.
Retornando do bairro de Boa Viagem à Avenida Caxangá, as rotas
Caxangá/
Shopping
/BoaViagem e Caxangá/Aeroporto /BoaViagem, que vinham pela
Rua Barão de Souza Leão, bem como a rota
Shopping
/Caxangá, que seguia do
Shopping
pelo viaduto Tancredo Neves para a Avenida Caxangá, convergiam pelas
adjacências deste viaduto, de onde prosseguiam pelos mesmos caminhos até o viaduto
da BR 101, às proximidades da Avenida Caxangá. Os fluxos de passageiros que
vinham através das duas primeiras rotas convergiam em grande parte para a Avenida
Caxangá, e aqueles advindos da rota
Shopping/
Caxangá, freqüentemente se destinavam
às localidades no transcorrer da Avenida Recife. Contudo, nas três rotas, pode-se
observar paradas comuns.
A partir do viaduto Tancredo Neves, na Avenida Recife, as kombis e vans
costumavam parar no
Outlet
. Mais adiante, usualmente se estabelecia parada em frente
aos prédios da Vila da SUDENE (Grade), e depois, na esquina da Rua Jean Emile Favre
com a Avenida Recife, cuja parada era conhecida como “Padaria”, estabelecimento
situado na esquina destas duas vias. Adiante, costumava-se desembarcar passageiros
em frente a um posto de gasolina, na esquina de uma rua que acesso à Vila do
IPSEP, em frente à Entrada do Ibura, sendo a parada denominada de “Posto” ou
“Esquina”, como se vê no Mapa 15, na página 130.
Destaque-se ainda, ao prosseguir pela Avenida Recife, a parada conhecida
como “Sinal” ou “Pan”, na entrada do Hospital Pan de Areias, com fluxos que se
destinavam tanto a este hospital como às comunidades da Beirinha, do mesmo lado, e
do Caçote, do lado oposto, e as paradas identificadas como “Primeiro Portão”-
primeiro acesso ao conjunto Ignêz Andreazza vindo de Boa Viagem, e “Segundo
Portão” segundo acesso ao mesmo conjunto e a chamada de “Posto”, parada em
frente a um posto de combustível, situado na esquina da Rua Tapajós com a Avenida
Recife, ainda às proximidades do conjunto e da Vila Tamandaré, conforme se observa
no Mapa 14, visto na página 128.
Prosseguindo pela Avenida Recife, geralmente as kombis e vans paravam
próximo à subida do viaduto Ulisses Guimarães, parada conhecida como “Trevo”, que
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Diana Cecília de Souza
135
dava acesso à Avenida Dr. José Rufino bem como à comunidade do Iraque e ao bairro
da Estância e à Avenida Estância.
Mais à frente, estabeleceu-se uma parada perto da linha do metrô, conhecida
como “Escadaria”, cujo acesso ao ramal do metrô era feito através de uma escada que
descia para a estação a partir da Avenida Recife. Adiante, havia ainda outra parada na
esquina da Avenida João Cabral de Melo Neto com a Avenida Recife, próxima à
entrada do bairro de Jardim São Paulo, que ficava do outro lado da pista. Era comum
também desembarcar ou embarcar passageiros em locais como a entrada do Tribunal
de Justiça, parada comumente identificada como “Tribunal” e, pelas proximidades da
CEAGEPE, do outro lado da avenida, parada mais conhecida como “CEASA”. Adiante,
costumava-se ainda parar no acesso à Avenida Abdias de Carvalho a partir da Avenida
Recife, cuja parada era identificada como “Entrada da Abdias”.
Seguindo pela Avenida Visconde São Leopoldo, freqüentemente se parava perto
da passarela do bairro do Engenho do Meio, às proximidades do terminal de ônibus
deste bairro, cuja passarela também dava acesso, do outro lado ao CEFET, ao Colégio
Militar. Geralmente as esquinas das ruas transversais à Avenida Visconde São
Leopoldo, no bairro do Engenho do Meio, constituíam pontos de embarque e
desembarque de passageiros. Numa dessas ruas, estabeleceu-se, uma parada
conhecida como “Beco”, entrada que acesso aos bancos e outros estabelecimentos
situados às imediações da Reitoria da UFPE, de acordo com o Mapa 13, exposto na
página 127.
Prosseguindo o percurso, se aproximando da Avenida Caxangá, havia ainda
uma parada bastante utilizada para o desembarque de passageiros que se situava em
frente à passarela de acesso ao Hospital das Clínicas. No transcorrer do trajeto havia
algumas paradas mais flexíveis e, mais adiante, encontrava-se o ponto final do percurso
embaixo do viaduto da BR 101 (Foto 12).
Embora se tenha delineado algumas paradas ao longo do percurso, salvo
algumas exceções, estas paradas freqüentemente estavam próximas às paradas de
ônibus. Todavia, estas paradas mais freqüentes das kombis e vans eram mais
convenientes aos destinos dos passageiros, pois encurtavam o deslocamento entre a
parada convencional e o local de destino do passageiro, que geralmente estava com
pressa ou carregava bagagens, ou enfrentava um tempo chuvoso, além de oferecer,
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136
sobretudo à noite, uma relativa segurança ao passageiro, desejoso de chegar logo em
casa ou ao trabalho.
Por outro lado, esta flexibilidade das paradas do transporte alternativo
atrapalhava o trânsito e colocava em risco a segurança dos passageiros, visto que,
muitas vezes, as paradas ocorriam em locais inadequados para embarque e
desembarque, como nos sinais de trânsito, nas entradas de ruas muito movimentadas e
no trevos dos viadutos. Quando utilizavam as paradas dos ônibus, freqüentemente os
operadores das kombis e vans também dificultavam o acesso destes veículos às
paradas, parando em frente a estes ou cortando-os abruptamente nestes locais, ou
ainda aglomerando os veículos próximos a elas. Por conta disso, observou-se que havia
uma certa hostilidade entre os operadores do transporte alternativo e os motoristas de
ônibus, que, por vezes, chegavam a se agredir através de palavras e puxavam os
veículos aos solavancos ao partirem. Os motoristas de ônibus, na verdade, não
disputavam passageiros com os operadores do transporte alternativo, até porque a
lógica do transporte coletivo por ônibus não é esta, mas, por vezes, disputavam o
espaço nas proximidades das paradas de ônibus, ficando indignados com a ocupação
destes locais pelos motoristas e cobradores das kombis e vans.
FOTO 12: Desembarque de passageiros embaixo do viaduto
da BR – 101, próximo à Avenida Caxangá.
Foto: Cl élio Santos. Janeiro de 2003.
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137
Ainda a respeito da flexibilidade das paradas, é interessante notar que, ao se
perguntar aos usuários do transporte alternativo se este deveria ter paradas fixas,
embora alguns desses usuários tenham apontado a flexibilidade das paradas das
kombis e vans como bastante conveniente ao embarque e desembarque de passageiros,
a maioria dos entrevistados afirmou que estes veículos deveriam possuir paradas
estabelecidas. Na opinião dos usuários, em particular daqueles que identificaram
problemas na atividade, um dos principais problemas das kombis e vans estava
relacionado às imprudências de vários operadores da atividade no trânsito, expressas
principalmente pelo excesso de velocidade e pela forma como estes operadores
ocupavam as paradas de ônibus e paravam ao longo dos trajetos, conforme se observa
nas expressões citadas por alguns entrevistados ao identificarem problemas ou
afirmarem que as kombis e vans deveriam ter paradas fixas:
Desorganizados. Param em todo lugar, atrapalhando o trânsito
. (Usuária
entrevistada próximo à Avenida Caxangá)
Muita concorrência entre eles. Agonia.
(Usuário entrevistado numa parada de
ônibus dentro do
Shopping
)
Atrapalham o trânsito. Às vezes quero pegar um ônibus, param na frente. São
imprudentes.
(Usuária entrevistada numa parada de ônibus da Av. Eng.
Domingos Ferreira)
Deveria ter paradas fixas] [...]para não atrapalhar os ônibus e [os] passageiros.
(Usuária entrevistada próximo à Avenida Caxangá)
[Deveria ter paradas fixas pois] [...] atrapalham os fluxos de carros e ônibus.
(Usuário entrevistado numa parada de ônibus dentro do
Shopping
)
[Paradas fixas] [...] mesmo sendo ruim para os usuários, mas organizaria [o
transporte alternativo]
(Usuária entrevistada numa parada de ônibus dentro do
Shopping
)
[Deveria ter paradas fixas para] [...] evitar choques com os ônibus.
(Usuário
entrevistado numa parada de ônibus dentro do
Shopping
)
Não respeitam as regras [de trânsito]. Correm muito.
(Usuária entrevistada
numa parada de ônibus da Av. Eng. Domingos Ferreira)
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[Deviam] [...] evitar paradas em qualquer lugar. [Deveriam ter] [...]
paradas para kombis, afastadas dos ônibus.
(Usuário entrevistado numa parada
de ônibus da Av. Eng. Domingos Ferreira)
Para os usuários que identificaram aspectos negativos na atividade, o
estabelecimento de paradas fixas proporcionaria mais organização a este transporte,
melhoraria o trânsito como também seria mais seguro para os passageiros. Mesmo
muitos daqueles entrevistados que a princípio não identificaram problemas associados
às kombis e vans, afirmaram que o transporte alternativo deveria ter paradas fixas.
Por outro lado, estes últimos usuários, embora identificassem, ao menos
indiretamente, algum problema na atividade, quando indagados se o transporte
alternativo era seguro, tendiam a afirmar que sim, seja por não vivenciarem nenhum
fato de risco ou por considerar a atividade melhor que o transporte convencional,
conforme se observa nas frases citadas:
Detesto ônibus. Ando há dez anos nas kombis. Entro quando quero, a
passagem é menor, vou sentada [...] Digo a velocidade que quero andar [...]
(Usuária entrevistada próximo à Avenida Caxangá)
Utilizo este transporte [há] 4 ou 5 anos. Nunca me aconteceu nada.
(Usuária
entrevistada próximo à Avenida Caxangá)
Todos [os transportes] oferecem riscos.
(Usuário entrevistado próximo à
Avenida Caxangá)
É igual a qualquer outro.
(Usuário entrevistado próximo à Avenida Caxangá)
Posto a espacialização das rotas do transporte alternativo entre a Avenida
Caxangá e o bairro de Boa Viagem, bem como as características das paradas para
embarque e desembarque de passageiros, buscar-se abordar em seguida outros
aspectos relativos à forma como os operadores da atividade se organizavam e atuavam,
exercendo as suas territorialidades ao longo dos eixos.
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139
3.3 – Territorialização de Práticas de Organização e Atuação do Transporte Alternativo
Conforme exposto anteriormente, as “territorialidades flexíveis” do transporte
alternativo se esboçavam, a princípio, a partir do estabelecimento de três rotas
relativamente regulares que se sobrepunham, em parte, às linhas do transporte coletivo
convencional, apresentando ainda algumas flexibilidades, e também através da
utilização das paradas de ônibus e da delimitação de locais onde se foram delineando
paradas flexíveis de embarque e desembarque de passageiros ao longo das rotas. Estas
territorialidades se expressavam não a partir da espacialização destas rotas, como
também por outras práticas de organização e atuação que visavam garantir a operação
da atividade ao longo dos eixos.
Desta forma, a partir de observações em campo e de entrevistas realizadas junto
aos usuários e aos operadores da atividade, busca-se, nesta parte do trabalho, analisar
as características de organização e atuação dos operadores do transporte alternativo
nos eixos tomados como referencial de análise, permeando, nestas características, as
opiniões dos usuários acerca do serviço prestado.
Organização
Para a operacionalidade da atividade existia uma lógica de organização atrelada
às regras criadas pelos próprios operadores e pelo sindicato ao qual se encontravam
vinculados - o SindRecife, que estabeleceu um conjunto de símbolos para identificação
dos veículos, das rotas e dos locais de lotação, bem como a fixação de taxas mensais e
fiscalização da atividade.
Conforme informações dos operadores da atividade, circulavam entre a Avenida
Caxangá e o bairro de Boa Viagem cerca de 200 veículos, entre kombis e vans, que
eram cadastradas no sindicato, sendo identificados por um adesivo vermelho, cuja
numeração indicava o mero de ordem dos mesmos. A este sindicato, os operadores
da atividade pagavam uma quantia mensal de R$ 20,00
3
.
1
3
Depois da definição do número de veículos e linhas do Sistema de Transporte Complementar de
Passageiros no Recife, em meados de julho de 2003, os atores que operavam no eixo deixaram de pagar
ao SindRecife, por considerarem que o presidente deste sindicato fez acordos indevidos com a
Prefeitura, traindo o interesse da maioria dos kombeiros.
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140
Deste total de veículos, 50 “faziam praça”, para usar a expressão empregada
pelos motoristas e cobradores da atividade, na Rua Emiliano Braga, situada próximo à
Avenida Caxangá, sendo identificados com um adesivo, no qual havia um desenho de
um coco na cor verde. Outros 50 lotavam numa das ruas de acesso ao
Shopping
Recife, na Rua Visconde de Jequitinhonha, cujo adesivo de identificação era também
um desenho de um coco, mas na cor amarela, e os outros 100 veículos restantes
apenas circulavam entre a Avenida Caxan e o bairro de Boa Viagem, sem possuírem
ponto fixo de lotação. Os veículos que lotavam na Rua Emiliano Braga não podiam
lotar próximo ao
Shopping
, e os que faziam lotação nas proximidades deste
equipamento não podiam lotar naquela rua. Geralmente este local de lotação das
kombis e vans era chamado pelos operadores que as operavam de “bandeirada” ou
“bandeira”, expressão comumente utilizada por taxistas.
Esta forma de lotação representou um avanço na organização dos kombeiros,
visto que, a princípio, as kombis apenas circulavam entre a Avenida Caxangá e o bairro
de Boa Viagem, parando próximo ao viaduto da BR 101, na Avenida Prof. Moraes
Rego, próximo à Avenida Caxangá, onde disputavam acirradamente os passageiros e
esperavam lotar os veículos para poderem partir.
Além do adesivo de identificação que indicava o local no qual estes veículos
podiam fazer lotação, existiam ainda outros adesivos que identificavam se estes
veículos podiam lotar durante o dia ou à noite, ou em ambos os horários, e/ou no
domingo. Estes adesivos eram compostos por meros e desenhos que representavam
os dias e os horários de operação. No entanto, estas regras nem sempre eram seguidas
pelos kombeiros, que operavam indistintamente dos dias e horários estabelecidos,
obedecendo apenas o adesivo que indicava o local de lotação.
Considerando o número de 200 veículos cadastrados em operação, pode-se
apreender que para os mesmos haveria 200 motoristas, entre proprietários e não-
proprietários dos veículos, cerca de no mínimo 200 cobradores, que geralmente um
motorista trabalhava com mais de um cobrador, pois freqüentemente havia uma
rotatividade dos cobradores entre os motoristas, e cerca de quatro fiscais, dois atuavam
nas proximidades da Avenida Caxangá, e outros dois próximo à entrada do
Shopping
.
Tendo em vista estes números, pode-se dizer que, cerca de 450 pessoas ou mais, entre
motoristas, cobradores e fiscais, estariam envolvidas diretamente na operação desta
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atividade entre as imediações do viaduto da BR-101, na Avenida Caxangá, e o bairro
de Boa Viagem, sem considerar aqueles que se inseriam sem estarem cadastrados,
circulando entre estas duas áreas, e os possíveis donos de frota que não atuavam
diretamente com o transporte de passageiros.
Saliente-se que, quando se proibiu o acesso das kombis e vans ao centro
expandido da cidade, a quantidade de veículos circulando entre a Avenida Caxan e
o bairro de Boa Viagem chegava a dobrar após as 18:00h durante os dias úteis,
apresentando em torno de 400 veículos em circulação, segundo os operadores da
atividade. Havia, depois deste horário, uma invasão promovida por outros kombeiros
advindos de diversas áreas da cidade, que também se “apropriavam” dos eixos para
exercerem a atividade, comungando do mesmo espaço, disputando passageiros ao
longo dos percursos. Isto ocorria sobretudo durante a noite, quando se tornava mais
difícil a fiscalização por parte deles para controlar a entrada de outros veículos nas
rotas. Entretanto, estes “invasores” não se “apropriavam” dos locais de lotação, situados
nas proximidades da Avenida Caxangá e próximo ao
Shopping
, apenas circulavam
entre as duas áreas.
Entre estas, assim como era predominante em toda a cidade, a maioria dos
operadores, tanto motoristas quanto cobradores, eram do sexo masculino. Em relação
aos cobradores, observou-se que não havia, ou não foi possível perceber, menores de
18 anos trabalhando nesta função e, ressalte-se ainda a presença de uma ou outra
mulher na atividade.
De acordo com algumas entrevistas e conversas informais junto aos operadores
do transporte alternativo, a maioria dos entrevistados, entre cobradores e motoristas,
exercia o transporte de passageiros entre a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem
mais de seis anos e, segundo estes, a inserção nesta atividade devia-se à falta de
oportunidade no mercado de trabalho.
Indagados sobre possíveis desvantagens na realização da atividade, os
entrevistados, em sua maioria, não as identificaram. Apenas um ou outro entrevistado
ressaltou o fato da atividade não propiciar benefícios trabalhistas e comentários sobre o
comportamento de alguns operadores, conforme se observa nas frases citadas:
Não assina a carteira.
(Cobrador de kombi entrevistado próximo à Avenida
Caxangá)
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Alguns trabalham. Outros perturbam, bagunçam, avançam sinal, desrespeitam
as leis de trânsito [...]
(Cobrador de kombi entrevistado próximo ao
Shopping
)
Falta de organização. muito mau elemento rodando. Gente que não pode
trabalhar.
(Cobradora de kombi entrevistada próximo ao
Shopping
)
Segundo os entrevistados, “esta linha”, para usar a expressão empregada por
eles em relação às rotas que percorriam entre a Avenida Caxan e o bairro de Boa
Viagem, era uma das melhores da cidade para a operação da atividade devido à
expressiva demanda de passageiros entre estas duas áreas. Destaque-se, entretanto que,
quando do fechamento do centro expandido do Recife às kombis e vans, ouvia-se
alguns motoristas reclamarem de outros kombeiros que passaram a circular nos
trajetos, disputando passageiros.
Como posto anteriormente, os operadores do transporte alternativo
estabeleceram dois locais fixos de lotação dos veículos para realizar a atividade,
estabelecendo ainda algumas regras para o processo de lotação destes veículos. Pelas
imediações da Avenida Caxangá, estes atores ocuparam um trecho da Rua Emiliano
Braga, no cruzamento com a Avenida Prof. Morais Rego, onde os veículos ficavam
enfileirados, lotando de dois em dois para sair de forma alternada entre as rotas
Caxangá/
Shopping/
BoaViagem e Caxangá/Aeroporto /BoaViagem (Foto 13). Esta era a
concentração mais expressiva do transporte alternativo dentre outras que se situavam
nas proximidades da Avenida Caxangá com o viaduto da BR - 101.
O outro local de lotação ficava próximo ao
Shopping
Recife, na Rua Visconde
de Jequitinhonha, onde geralmente em meio a um trânsito conturbado, de um intenso
fluxo de veículos que se dirigia ao
Shopping
, tanto de carros particulares como de
ônibus e daqueles veículos que lotavam nas proximidades da Avenida Caxan e que
por aqui passavam como de outros que aqui também lotavam para outras localidades,
as kombis e vans se enfileiravam, “apropriando-se” de um trecho da rua para
realizarem o transporte de passageiros. Dentre outras concentrações de kombis que
aqui existiam, cujos destinos eram os bairros do Ibura, do Jordão, do Totó, a que se
destinava à Avenida Caxangá era a mais significativa. Neste local, os veículos lotavam
um de cada vez, fazendo a rota
Shopping
/Caxangá (Foto 14).
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143
Foto: Diana Souza. Janeiro de 2003
.
FOTO 13: Ponto de lotação das kombis pelas imediações da
Avenida Caxangá.
FOTO 14: Ponto de lotação das kombis na Rua Visconde de
Jequitinhonha, próximo ao
Shopping Center
Recife.
Foto: Diana Souza. Janeiro de 2003.
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144
Em ambos os locais de “bandeirada”, as kombis e vans partiam quando
completassem a lotação. O veículo que estivesse atrás de um outro no ponto de
partida, esperando lotar, não podia abrir as portas para os passageiros entrarem,
enquanto o da frente não estivesse lotado e saísse. Esta prática se dava
independentemente de haver uma grande demanda ou não de passageiros, sendo
constantemente controlada pelo fiscal que atuava no local. Este fiscal procurava
observar se as regras estabelecidas para a lotação estavam sendo cumpridas, organizar
os veículos, dar o sinal de partida às kombis e vans e impedir que outros veículos não
cadastrados fizessem lotação no local.
Nos horários de demanda menos expressiva, como se observou no local de
lotação próximo à Avenida Caxangá, os motoristas das vans, veículos que por serem de
maior capacidade demoravam mais a lotar, eram pressionados por outros operadores a
saírem do ponto de partida assim que os veículos tivessem uma quantidade de
passageiros equivalente à lotação das kombis.
Interessante notar que, nos locais de lotação, enquanto fora dos horários de
pico, os cobradores das kombis e vans costumavam abordar o passageiro ou anunciar a
rota para poder lotar os veículos, nos horários de demanda mais expressiva, durante a
manhã, por volta das 6:00h até aproximadamente às 7:00h, próximo à Avenida
Caxangá, por exemplo, eram os passageiros que disputavam as kombis que iam para
Boa Viagem através das duas rotas, “acotovelando-se” em direção a elas quando se
aproximavam para lotar.
Similarmente, na rota
Shopping/
Caxangá, naqueles horários de demanda mais
expressiva, neste caso, no final da tarde, muitas vezes, havia uma disputa pelas kombis
entre os passageiros, que corriam, empurrando uns aos outros para subir no veículo à
medida que este se aproximava do ponto de lotação. Havia mesmo passageiro que
fosse em pé, se assim desejasse, ou que aceitava a proposta do cobrador de ir nesta
situação até determinado trecho do percurso em que descesse outro passageiro.
Geralmente descia alguém pelas imediações do bairro do IPSEP ou do Ibura na
Avenida Recife.
Nas kombis, aquelas não modificadas em sua estrutura interna, transportava-se,
atrás, oito passageiros mais o cobrador, que viajava em pé, meio envergado, encostado
na porta. Na frente, freqüentemente, além do motorista, comportava-se duas pessoas e,
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às vezes, três, dependendo da demanda. Alguns passageiros reclamavam desse excesso
de lotação. As kombis geralmente transportavam de 10 a 11 pessoas, além do cobrador
e do motorista. Nas kombis adaptadas, este número era ainda maior, chegando as
mesmas a transportarem cerca de 14 a 15 passageiros, além dos operadores. Também
ocorria das kombis levarem outros operadores do transporte alternativo que
trabalhavam na rota, geralmente cobradores. Estes não pagavam a passagem e
viajavam em pé, ficando “espremidos” e envergados no canto da janela, para não
ocuparem o lugar de um passageiro.
Nas bestas e vans, veículos com maior capacidade que as kombis, nos horários
de maior fluxo de passageiros, freqüentemente se excedia a quantidade de lugares
disponíveis, conforme observado no local de lotação próximo ao
Shopping
. Os
cobradores geralmente colocavam quatro passageiros no lugar de três, cinco no lugar
de quatro, colocava-se até passageiros sentados por trás dos bancos dianteiros numa
pequena plataforma. Tanto nas vans como nas kombis adaptadas, era comum levar
mais um passageiro sentado na divisória entre os bancos de dois ou três lugares e o
banco adaptado. Poucos eram aqueles que se negavam a ir nesta posição. Houve casos
em que de tanto o cobrador insistir para que uma pessoa viajasse neste lugar, fizesse
com que um ou mais passageiros, que estivessem sentados, ficassem irritados e
descessem da kombi.
Do ponto de vista do conforto, a forma de lotação dos veículos não era muito
agradável aos passageiros. Embora estes fossem sentados nas kombis e vans,
geralmente viajavam “colados” um ao outro. Nas vans e nas kombis adaptadas para
comportar um maior número de pessoas a situação parecia ainda mais desconfortável,
visto que, como antes mencionado, colocava-se cinco passageiros assentados em
bancos de quatro lugares, quatro em bancos de três lugares e ainda assentados nas
divisórias entre estes bancos.
Mesmo nas kombis não modificadas em sua estrutura interna havia desconforto,
que freqüentemente nelas se transportava cerca de dez passageiros, além dos
operadores. Junto à porta, no banco traseiro de uma kombi, por exemplo, a situação do
passageiro era bastante desconfortável. A porta se abria constantemente, enquanto o
veículo não estivesse lotado, para o embarque e desembarque ou para que o cobrador
anunciasse a rota ou abordasse as pessoas nas paradas de ônibus e ao longo do
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percurso. Quando fechada, à frente do passageiro estava o cobrador, encostado na
porta, envergado sobre o banco dianteiro do veículo, entrecruzando as suas pernas às
do passageiro. Ressalte-se ainda, nos horários de pico, o fato de uma ou outra pessoa,
além do cobrador, ir em pé dentro do veículo.
Em relação aos veículos, cumpre destacar que, alguns usuários apontaram como
um dos aspectos negativos do transporte alternativo a falta de conforto. Todavia, ainda
que parte dos entrevistados tenha relacionado a questão do conforto aos veículos do
tipo besta, van e
sprinter
, por estes possuírem mais espaço interno, ar-condicionado –
embora os veículos que circulassem nas rotas não possuíssem ar-condicionado -,
supostamente oferecendo mais conforto e mais segurança que as kombis, em geral,
estes usuários tendiam a afirmar que os veículos do transporte alternativo podiam ser
qualquer um, desde que proporcionasse rapidez nos deslocamentos. Alguns usuários
ressaltaram que as kombis eram até melhores, uma vez que, comportavam um menor
número de pessoas, e, por isso, lotavam mais rápido tanto nos pontos de lotação
quanto ao longo do percurso, favorecendo ainda mais a rapidez nos deslocamentos,
como se observa nas opiniões dos entrevistados:
Qualquer um. O importante é chegar rápido.
(Usuário entrevistado próximo à
Avenida Caxangá)
Tanto faz. Se tiver tudo em dia, tiver manutenção [...]
(Usuária entrevistada
próximo à Avenida Caxangá)
[Kombi] cabe menos [passageiros], lota rápido e sai.
(Usuária entrevistada
próximo à Avenida Caxangá)
No tocante ao custo da passagem das kombis e vans, este era estabelecido a
partir da tarifa do ônibus, sendo o valor cobrado sempre um pouco mais barato que a
tarifa do sistema convencional. Saliente-se que, se houvesse aumento tarifário no
sistema convencional, este aumento também ocorreria no preço da passagem do
transporte alternativo. Nas três rotas, em 2003, o custo estabelecido era de R$ 1,00
contra R$ 1,30 da tarifa do ônibus, correspondente ao anel A. Este valor da passagem
foi apontado por alguns usuários do transporte alternativo como uma das vantagens das
kombis e vans.
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Para o pagamento da passagem, aceitava-se também vales-transporte do sistema
convencional. Os cobradores costumavam ainda vender vales aos passageiros, bem
como utilizá-los para passar o troco da passagem, caso o usuário assim o desejasse. Por
muitas vezes, o usuário pagava a passagem e comprava um vale, que, na época,
custava em média R$ 1,15 ou R$ 1,20, para usar no ônibus. Além disso, os operadores
do transporte alternativo repassavam os vales transportes em postos de gasolina para
comprar combustível.
Havia ainda negociações do valor da passagem entre os passageiros e o
cobrador para pequenos deslocamentos, em que se cobrava em média R$ 0,70 ou R$
0,50. No entanto, estas negociações, às vezes, não ocorriam, pois o cobrador não
reduzia o valor da passagem e, caso o passageiro se irritasse ou desistisse da viagem,
muitas vezes, o cobrador, em tom sarcástico, dizia-lhe: “Pega um ônibus!”.
Ao contrário do que se podia fazer nos ônibus, onde o passageiro, se desejasse,
percorria todo o itinerário da linha, voltando ao ponto de partida com uma passagem,
nas kombis e vans isto não acontecia, visto que, estabelecia-se um ponto final para o
desembarque dos passageiros, que, se quisessem seguir adiante no mesmo veículo,
teriam que pagar outra passagem.
Em relação ao uso de vales-transporte, destaque-se que, no último dia do mês
corrente a que correspondia estes vales, por volta das 18:00h, as kombis e vans não
os aceitavam mais, visto que era necessário repassá-los ao mercado paralelo do vale
transporte para que pudessem ser inseridos no sistema convencional. No último dia do
mês, freqüentemente os usuários possuíam os vales do mês seguinte, podendo pagar
a passagem com estes, coisa que não era permitido no sistema convencional, em que
estes só eram aceitos no primeiro dia útil do mês vigente.
Com relação a este aspecto, observou-se, durante uma viagem de kombi, que
dois passageiros insistiam em pagar a passagem com um vale no último dia do mês,
após aquele horário. Os passageiros reclamavam e perguntavam porque não podiam
pagar a passagem com o vale, que este valia até às 24:00h. Irritado, o motorista
parou a kombi e exclamou: “Desce do meu carro! Eu sou autônomo. não tenho
patrão pra não agüentar chatice. Desce os dois do meu carro!”. Ambos desceram da
kombi, que ao partir, ainda com a porta aberta, o cobrador gritou xingando-os:
“Otários!”.
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Tal fato demonstra que muitos operadores do transporte alternativo não
encaravam a atividade enquanto uma prestação de serviço, que, no caso do transporte
de passageiros tem em sua essência a característica de ser um serviço público. A noção
de “propriedade privada” do veículo ultrapassava o princípio da obrigação de se
prestar um serviço de qualidade à sociedade. A impressão que se tinha era a de que
muitos operadores atuavam como se estivessem prestando “um favor” à população, a
qual, por vezes, era destratada caso não comungasse de algumas práticas para a
realização da atividade.
Abordagem aos passageiros
Diferentemente dos ônibus, as micro-unidades alternativas de transporte não
possuíam letreiro indicando os itinerários que iriam percorrer. Além disso, as kombis e
vans tinham ponto de partida, mas o itinerário e o final do percurso apresentavam uma
certa flexibilidade, estando condicionados pelos fluxos de passageiros e pelos horários.
Conseqüentemente, os operadores desta atividade desenvolviam estratégias para situar
os passageiros no trajeto, atraí-los e informá-los dos pontos finais das rotas. Assim, os
cobradores costumavam anunciar os itinerários em voz alta, como também lançavam
mão da prática de anunciá-los a partir de alguns pontos de referência, que se sucediam
no transcorrer do percurso. Esta prática, ao mesmo tempo em que se configurava numa
das estratégias para atrair os passageiros e indicar o itinerário aos usuários deste
transporte, também limitava-os aos percursos estabelecidos.
Na rota Caxangá/
Shopping
/Boa Viagem, os cobradores, enquanto esperavam
para fazer a lotação na Rua Emiliano Braga, costumavam, em voz alta, assim anunciar
o itinerário: “Caxangá-
Shopping
-Edmilson-Delegacia!”,
Shopping
-Contato-Edmilson-
Delegacia!”, ou ainda “Av.Recife-
Shopping
-Boa Viagem!”. Depois de passar pelo
Shopping
, o Colégio Contato marca a Rua Félix de Brito Melo, pela qual passavam as
kombis para seguir pela Avenida Domingos Ferreira, onde se situam o restaurante
“Edmilson da Carne de Sol” e a Delegacia de Boa Viagem, esta adotada geralmente
como ponto final de desembarque. Pela manhã, até cerca de 9:00h, os cobradores
costumavam dizer em voz alta: “Boa Viagem pelo viaduto”, visto que as kombis ainda
não se dirigiam ao
Shopping,
que só abre às 10:00h.
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149
Por sua vez, os cobradores, que circulavam na rota Caxangá/Aeroporto/Boa
Viagem, costumavam anunciá-la em voz alta: “Aeroporto-Boa Viagem pela Barão” ou
“Av. Recife, Boa Viagem pela Barão”, e aqueles que faziam a rota
Shopping/
Caxangá,
anunciavam: “Caxangá!” ou “Avenida Recife – Caxangá!”.
A forma de anunciar a rota ia mudando à medida que se aproximava dos pontos
referenciais, como também, evidentemente, mudava a partir de algumas alterações no
trajeto a ser percorrido. Desta forma, uma kombi que vinha da Avenida Caxangá para
Boa Viagem, passando pelo Aeroporto, quando se encontrava na altura da Avenida
Recife, o cobrador costumava dizer o destino aos passageiros citando este
equipamento: “Aeroporto!”, e quando nas imediações deste, costumava dizer: “Boa
Viagem até a Delegacia”. Nesta rota, pelas imediações da Rua Capitão Zuzinha, o
cobrador, em acordo com o motorista da kombi, podia anunciar uma eventual
mudança no percurso, dizendo: “
Shopping
!”.
Ao longo do trajeto, pelas imediações da Avenida Recife, os cobradores também
costumavam usar gestos para indicar o percurso do veículo. Estes operadores, quando
ainda se aproximavam da parada de ônibus, erguiam o braço para fora da janela,
direcionando-o para o
Shopping
ou para o Aeroporto ou ainda erguiam-se à porta do
veículo em movimento fazendo a mesma gesticulação.
No entanto, como se não bastasse anunciar as rotas para atrair os passageiros,
freqüentemente os cobradores das kombis e vans abordavam as pessoas, perguntado-
lhes sobre seus destinos. A forma de abordagem ao passageiro variava de acordo com
os locais de lotação e no decorrer do trajeto.
Na Rua Emiliano Braga, para levar o passageiro aos veículos que faziam lotação,
os cobradores freqüentemente costumavam abordar qualquer pessoa que se
aproximasse da parada de ônibus, próximo a este local de lotação, ou que estivesse
na parada, perguntando-lhe se esta iria a um ou a outro destino.
Com o intuito de lotar o veículo, fora dos horários de pico, quando as kombis
demoravam mais um pouco a sair, para atrair alguns passageiros, os cobradores
costumavam dizer que a kombi sairia logo. Muitas vezes, o motorista da kombi ou da
van mantinha os motores ligados para atrair o passageiro ou para manter quieto aquele
que estivesse dentro do veículo, que desejava partir logo do local. Entretanto, a
kombi sairia quando estivesse lotada. Por vezes, alguns passageiros pressionavam o
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motorista para iniciar a viagem ou ainda algum passageiro irritado descia para pegar o
ônibus. Havia, no entanto, a consciência por parte de muitos usuários de que o veículo
saía quando lotado, sobretudo daqueles usuários mais habituados a utilizar este
transporte.
Neste local de lotação não havia uma abordagem insistente dos operadores aos
passageiros, como ocorria em outras áreas da cidade, a exemplo daqueles kombeiros
que se concentravam num posto de gasolina, situado nas proximidades do viaduto da
BR – 101 com a Avenida Caxangá, que lotavam para o interior do estado e disputavam
acirradamente os passageiros. Neste posto, existia uma abordagem bastante enfática e
até um tanto agressiva. Freqüentemente, três cobradores ou mais cercavam uma pessoa
quando esta se aproximava do posto, perguntando-lhe repetidamente o seu destino, ou
se dirigiam até à parada de ônibus, no canteiro central da Avenida Caxangá, em frente
ao posto de gasolina, para abordar os passageiros. Muitas vezes, estes cobradores
corriam afobados em direção às pessoas que ainda estavam do outro lado da avenida,
cercando-as e abordando-as inúmeras vezes sobre os seus destinos. Por várias vezes,
quando a pessoa carregava pacotes, o cobrador tirava-lhe das mãos, dirigindo-se ao
veículo para que a pessoa o acompanhasse. Houve casos em que, os cobradores
arrancavam sacolas das mãos de uma única pessoa, levando-as para veículos
diferentes.
No local de lotação das kombis que saíam das proximidades da Avenida
Caxangá ao bairro de Boa Viagem, observou-se que não havia uma disputa acirrada
por passageiros, visto que a lógica de organização destes veículos para lotar não
permitia esta disputa. Muitas vezes, o cobrador do veículo que seria o próximo a fazer
a lotação, ajudava o outro cobrador de uma kombi que estivesse no ponto de partida,
chamando os passageiros, visando acelerar o processo de lotação para que chegasse
logo a sua vez, mas sem disputar passageiros.
No local de lotação dos veículos que faziam a rota
Shopping/
Caxangá, os
cobradores, algumas vezes, dirigiam-se às pessoas, perguntando-lhes o destino.
Geralmente as pessoas que saíam do
Shopping
e iam a este local, procuravam pegar
uma kombi. Embora, próximo ao local de lotação existisse uma parada de ônibus, as
pessoas que para essa área se dirigiam, preferiam pegar uma kombi ou van a um
ônibus. Poucas pessoas saíam do
Shopping
e iam a estas imediações pegar o ônibus da
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151
linha
Shopping
/CDU, que ainda entraria no
Shopping
para depois seguir para a
Avenida Caxangá.
Segundo os usuários, nos locais de lotação, a abordagem era tranqüila, que
não havia uma disputa pelos passageiros. Os usuários entrevistados próximos à
Avenida Caxangá, por exemplo, não apontaram, em geral, nenhum aspecto negativo
em relação à abordagem dos operadores das kombis e vans aos passageiros. Entretanto,
fora das localidades de lotação, ao longo dos trajetos, a abordagem chegava a ser
ofensiva, desagradando a muitos passageiros, conforme explicita as frases de alguns
entrevistados ao se referirem não aos trajetos entre a Avenida Caxangá e Boa
Viagem, mas a outras áreas da cidade:
Nesta área [local de lotação próximo à Av. Caxangá] eles chamam. Para o
interior, Carpina, por exemplo, eles puxam as pessoas.
(Usuária entrevistada
próximo à Avenida Caxangá)
Aqui [local de lotação próximo à Av. Caxangá] é bom. No Aeroporto,
disputam um com o outro.
(Usuário entrevistado próximo à Avenida Caxangá)
Neste local [local de lotação próximo à Av. Caxangá] não competição.
Abrem a porta e dizem o itinerário.
(Usuária entrevistada próximo à Avenida
Caxangá)
Nos embarques é bom. No caminho é ruim. Saem sem a pessoa sentar.
(Usuária entrevistada próximo à Avenida Caxangá)
No terminal é melhor. No caminho é péssimo. Obrigam [-nos] a entrar.
(Usuária entrevistada no local de lotação próximo ao
Shopping
)
No terminal acho bom. Nas paradas, lhe puxam pelo braço.
(Usuária
entrevistada no local de lotação próximo ao
Shopping
)
Na rua, os cobradores são agressivos. Precisa capacitá-los.
(Usuária
entrevistada no local de lotação próximo ao
Shopping)
[Os cobradores são} [...] chatos, insistentes.
(Usuário entrevistado numa
parada de ônibus dentro do
Shopping
)
Esta forma de abordagem aos passageiros ao longo dos percursos devia-se ao
fato das disputas entre os operadores por passageiros se darem mais no transcorrer das
viagens. Nas disputas por passageiros, no decorrer dos trajetos, os motoristas das
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kombis e vans também costumavam ultrapassar um ao outro para pegar passageiros
mais a frente ou paravam em frente de outro veículo que estivesse em uma parada
de ônibus.
No transcorrer do trajeto, as kombis, ao se aproximarem das paradas de ônibus
ou das pessoas nas calçadas, iam parando, e o cobrador, com o veículo ainda em
movimento, erguia-se e perguntava aos passageiros, freqüentemente aos gritos:
Shopping
?”, “Aeroporto?”, “Boa Viagem?”. As kombis paravam ao longo do percurso
e, geralmente o cobrador descia do veículo para abordar o passageiro na parada ou
aquelas pessoas que estavam ainda do outro lado da rua. Por vezes, o cobrador se
dirigia à pessoa ainda do outro lado da rua para ajudar-lhe com pacotes ou com
crianças. Costumavam esperar pelo passageiro que vinha do outro lado ou que vinha
de alguma rua em direção à avenida pela qual passavam. Prática esta que nem sempre
agradava os passageiros que já estavam dentro do veículo.
Em relação à abordagem, saliente-se ainda que, havia alguns cobradores que
costumavam abordar mulheres mais jovens com um certo tom de paquera ao longo do
percurso, chegando a serem inconvenientes: “Vai morena?!”, “Vai galega?!”.
Como visto, para que o passageiro embarcasse, as estratégias dos operadores das
kombis e vans era expressa através da forma de anunciar a rota e da abordagem direta
às pessoas nos pontos de lotação e no transcorrer dos trajetos.
Quanto ao desembarque, os passageiros, ao se aproximarem de seus destinos,
costumavam dizer ao cobrador onde iam descer e este, por sua vez, avisava ao
motorista. Uma das formas utilizadas pelo cobrador para indicar a descida de um
passageiro, como também o embarque, era a batida na parte superior do veículo.
Alguns passageiros, às vezes, também usavam esta estratégia para lembrar ao motorista
que iriam descer. Em relação ao desembarque, grande parte dos entrevistados não
apontava nenhum problema, apesar de alguns ressaltarem que certos motoristas das
kombis, por vezes, “arrancavam” o veículo com o passageiro ainda descendo.
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CONCLUSÕES
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CONCLUSÕES
A partir da análise das territorialidades flexíveis do transporte alternativo através
dos fluxos das kombis e vans entre a Avenida Caxangá, nas imediações do viaduto da
BR-101, e o bairro de Boa Viagem, apreendeu-se a forma como os atores envolvidos
diretamente nesta atividade (motoristas e cobradores) desenvolveram práticas de
atuação para garantir a realização deste transporte entre estas duas importantes áreas
da cidade do Recife, atendendo parte de uma expressiva demanda de passageiros.
A “apropriação” dos eixos urbanos, compreendidos entre estas áreas, pelos
operadores do transporte alternativo, deu-se a partir das “brechas” deixadas pelo
transporte convencional, expressas por problemas a este inerentes: grandes intervalos
entre as viagens, superlotação, lentidão nos deslocamentos e longos itinerários que
caracterizam as linhas do transporte por ônibus no que tange aos deslocamentos entre
a Avenida Caxangá e o bairro de Boa Viagem.
As rotas estabelecidas estrategicamente pelos operadores do transporte
alternativo proporcionavam deslocamentos mais rápidos entre estas duas áreas da
cidade à medida que seus trajetos eram mais curtos que aqueles das linhas dos ônibus.
Estas rotas se sobrepunham, em parte, às linhas do transporte coletivo convencional,
passando a percorrer uma parte dos itinerários destas linhas. Assim, as micro-unidades
de transporte passaram a atender a uma demanda, cujos deslocamentos não estavam
totalmente atrelados aos itinerários dos ônibus ao adentrarem pelo bairro do IPSEP e/ou
se estenderem pelo de Boa Viagem, embora se reconheça a necessidade da realização
destes trajetos, haja vista também os deslocamentos para as áreas adjacentes a estes
trajetos, onde se destaca, no bairro do IPSEP, a Rua Jean Emile Favre, com comércios e
serviços, além do uso habitacional no seu entorno, bem como o próprio bairro de Boa
Viagem, no qual, ao longo das suas vias, destacam-se comércios e serviços, para onde
converge um grande fluxo de pessoas.
Os roteiros dos ônibus tornavam a viagem mais longa e mais demorada para
aqueles passageiros que, a partir da Avenida Caxangá, próximo ao viaduto da BR-101,
ou pelas imediações da Avenida Recife se destinassem ao bairro de Boa Viagem,
sobretudo para aquelas pessoas que se dirigiam às imediações do Aeroporto, já que
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155
para o
Shopping
a linha
Shopping
/CDU passou a perfazer um itinerário similar à rota
das kombis e vans que se dirigiam àquele equipamento na época em que essas micro-
unidades alternativas circulavam.
Entretanto, entre 2002 e 2003, mesmo que esta linha tenha passado por
reformulações no seu itinerário para poder competir com as kombis, a dinâmica das
micro-unidades do transporte alternativo ainda, assim, proporcionava deslocamentos
mais rápidos que os ônibus, seja porque estas micro-unidades eram bem mais
freqüentes que estes, seja pela própria capacidade de lotação desses veículos. As
kombis e vans, por serem veículos de pequeno porte, comportam um menor número
de passageiros. Por isso, completavam a capacidade de lotação bem mais rápido que
os ônibus, o que também favorecia deslocamentos mais rápidos. Saliente-se que,
devido à menor capacidade destes veículos, estes possuíam mais agilidade que os
ônibus em meio ao trânsito. As características dessas micro-unidades de transporte
faziam com que estas passassem a atender também aos pequenos deslocamentos
realizados entre as localidades ao longo das rotas, proporcionando mais rapidez e
flexibilidade a estes deslocamentos.
Mesmo diante de algumas estratégias das empresas de ônibus, como a da
implantação de ar-condicionado e assentos mais confortáveis nos veículos que faziam
as linhas cujos itinerários eram mais longos, a dinâmica das kombis e vans continuava
a mesma. Isto porque o que mais atraia o usuário da kombi ou da van não era o
conforto, já que não o tinha nem nos ônibus nem nas kombis, mas a rapidez que estas
últimas podiam proporcionar aos seus deslocamentos. A freqüência e o menor custo da
passagem eram alguns aspectos atrativos para os usuários, mas o principal destes
aspectos era a rapidez. Isto pôde ser observado, por exemplo, quando grande parte dos
entrevistados enfatizaram que o tipo de veículo podia ser qualquer um, desde que
fossem mais rápidos.
Além disso cumpre destacar que, mesmo com algumas melhorias no sistema
convencional de transporte, nos horários de pico, os ônibus ainda continuavam
superlotados. A questão do conforto proporcionado pelo ar-condicionado tinha, muitas
vezes, o efeito contrário, quando estes ônibus estavam lotados. A sensação de um
ônibus lotado com ar-condicionado se torna pior do que sem esta tecnologia.
Embora nas kombis e vans geralmente os passageiros viajassem sentados, do
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ponto do vista do conforto, estas também deixavam a desejar, haja vista a grande
quantidade de pessoas transportadas. Entretanto, o desconforto era menor que nos
ônibus lotados. Mesmo que muitas kombis não fossem confortáveis, ainda assim era
melhor viajar no desconforto por um menor período de tempo, que nos ônibus
superlotados, com viagens longas e demoradas. Nesta perspectiva, percebe-se que as
kombis e vans passaram a se configurar, portanto, como uma alternativa aos
deslocamentos da população em função da necessidade de maior rapidez nos
deslocamentos, da necessidade de maior fluidez entre estas áreas da cidade.
Desta forma, diante de uma expressiva demanda de passageiros e das “brechas”
do transporte público convencional, os operadores do transporte alternativo foram
incorporando e conhecendo a dinâmica dos fluxos entre estas duas áreas da cidade,
passando a estabelecer suas práticas de atuação ao longo dos trajetos.
A exemplo do que ocorria em toda a cidade, estes operadores atuavam segundo
uma lógica de mercado, que se expressava pela concorrência que faziam às empresas
do transporte coletivo por ônibus à medida que se sobrepunham a parte dos seus
itinerários e utilizavam as suas paradas, bem como pela disputa pelos passageiros entre
estes operadores no transcorrer das rotas e pelas eventuais flexibilidades destas rotas de
acordo com a maior ou menor intensidade dos fluxos de passageiros.
Esta “apropriação” de trechos dos itinerários e das paradas dos ônibus pelos
operadores do transporte alternativo, dava-se, em geral, de maneira pacífica, não
havendo um conflito direto entre estes operadores e os motoristas de ônibus, embora
existisse uma certa hostilidade entre estes, visto que, muitas vezes, os motoristas das
kombis e vans dificultavam o acesso dos ônibus às paradas.
As disputas pelos espaços próximos a estas paradas eram mais acirradas entre os
próprios operadores das kombis e vans ao longo das rotas, sobretudo nos eixos viários
e paradas do bairro de Boa Viagem, onde estes veículos se misturavam a outras micro-
unidades do transporte alternativo vindos de outras áreas da cidade em meio a um
fluxo intenso de carros e ônibus.
O espaço ocupado ao longo das rotas e nos pontos de parada apresentavam
menor rigidez de controle pelos operadores da atividade, uma vez que se tornava
difícil controlar a entrada de outros veículos do transporte alternativo que não eram
cadastrados para realizarem o transporte de passageiros ao longo destas rotas e não
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havia uma fiscalização por parte daqueles que atuavam na área para impedir a
“invasão” de outros kombeiros nos eixos percorridos. Entretanto, nos locais de lotação
havia uma maior rigidez de controle pelos operadores do transporte alternativo, dada a
forte presença tanto desses operadores quanto de fiscais nestes espaços, que impediam
o acesso de outros kombeiros que não fossem cadastrados na área. Nestes locais,
também não havia uma disputa entre os operadores que atuavam entre a Avenida
Caxangá e o bairro de Boa Viagem, já que a forma de lotação por eles estabelecida não
permitia estas disputas.
No tocante a realização da atividade, verificou-se que vários operadores
demonstravam um descompromisso com o transporte que realizavam e com os
usuários que transportavam, sobretudo quando faziam deslocamentos em alta
velocidade, excediam a capacidade de lotação dos veículos e circulavam de porta
aberta.
Os usuários das kombis e vans tinham noção dos problemas ocasionados por
este transporte. De acordo com alguns entrevistados, os problemas mais corriqueiros
estavam relacionados sobretudo às imprudências de vários motoristas da atividade no
trânsito, expressas principalmente pelo excesso de velocidade e pela desorganização e
disputas nos locais das paradas de ônibus. Estes problemas, segundo os entrevistados,
estavam associados também ao desconforto dos veículos, visto que sempre se excedia
a capacidade de pessoas, e à falta de manutenção dos mesmos.
Todavia, é interessante destacar que, quase a metade dos usuários entrevistados,
quando questionados sobre os problemas deste transporte, não identificou nenhum
problema. Isto pôde ser observado principalmente naquelas pessoas que utilizavam as
kombis assiduamente. No entanto, independentemente de reconhecer ou não os
problemas relacionados à atividade, os entrevistados, em sua maioria, sempre
ressaltavam a necessidade de uma maior organização da atividade não nos eixos
entre as duas referidas áreas, mas em toda a cidade. Um exemplo nítido da percepção
destes usuários quanto à necessidade de organização da atividade, expressava-se, por
exemplo, quando estes, em sua maioria, afirmavam que as kombis e vans deveriam ter
paradas fixas.
Quando indagados sobre o projeto da Prefeitura do Recife para a implantação
de um sistema complementar através de veículos de pequeno porte, os usuários
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costumavam ter uma postura favorável ao projeto, acreditando que tal iniciativa traria
mais organização ao transporte alternativo na cidade. Em geral, os entrevistados não
tinham noção de que ao se implantar o novo sistema, as kombis e vans deixariam de
circular nos principais eixos viários e, em particular, entre a Avenida Caxangá, nas
proximidades do viaduto da BR-101, e o bairro de Boa Viagem. Ao tomarem
conhecimento de que os veículos do Serviço Complementar não poderiam circular nas
áreas em que habitualmente as kombis e vans circulavam, os usuários temiam o grande
impacto que isto poderia causar, visto que, segundo estes, o sistema convencional é
deficiente. É interessante observar que, a maioria dos entrevistados também ressaltava a
questão do desemprego como um dos aspectos negativos da implantação deste novo
sistema, reconhecendo a atividade do transporte através das kombis e vans como um
meio de sobrevivência para os seus operadores.
A implantação do Serviço de Transporte Complementar de Passageiros do Recife
- STCP/Recife, tem a sua importância para a cidade, haja vista a necessidade de uma
definição do Poder Público Municipal quanto ao papel do transporte de passageiros
através de veículos de pequeno porte, cuja atuação, de fato, causava vários problemas,
sobretudo relacionados à insegurança no transporte de passageiros e aos impactos
causados no trânsito.
O STCP/Recife, operado por veículos de pequeno e médio porte, é parte
integrante do Sistema de Transporte Municipal do Recife STM/Recife e como tal
passou a cumprir regras imprescindíveis ao transporte de passageiros, estabelecidas
pelo Poder Público Municipal. Este sistema assegura aos usuários benefícios como
isenção de tarifas para idosos e pessoas portadoras de deficiências físicas e mentais e
meia passagem para estudantes; apresenta uma regularidade nos horários; possui tarifas
baseadas no anel A do transporte coletivo por ônibus, uma vez que não é mais
concorrente deste último e sim complementar; recebe os vales transportes de papel e,
assim como ocorreu nos ônibus do sistema convencional por ônibus, nos quais foram
implantados validadores (equipamentos de leitura de cartões eletrônicos) do Sistema
Automático de Bilhetagem Eletrônica - SABE, recentemente, no STCP/Recife esses
equipamentos também vêm sendo implantados nos veículos, o que dará acesso tanto
aos usuários que utilizam o vale transporte eletrônico quanto aos estudantes que usam
o Passe Fácil (cartão eletrônico de estudantes), que o STCP/Recife recebia vale
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transporte de papel e meia passagem paga com dinheiro; possui veículos de maior
capacidade que as kombis, com pintura externa e comunicação visual padronizados, e,
em algumas linhas, os veículos são do tipo mini-ônibus, equipados com ar-
condicionado.
Em que pese as regras estabelecidas pelo Poder Público Municipal quanto ao
Sistema Complementar, é interessante destacar que, algumas práticas usadas pelos
operadores de kombis e vans antes da implantação desse sistema ainda permanecem.
Isto se verifica, por exemplo, quando vez ou outra, os operadores do transporte
complementar abastecem o veículo durante o itinerário, com passageiros no interior do
mesmo, o que é proibido pela legislação que rege esse sistema; o cobrador do
transporte complementar costuma chamar o usuário para o veículo, sobretudo nos
pontos de retorno das linhas; os operadores flexibilizam os locais de parada do
complementar, atendendo aos pedidos dos usuários. Apesar dessa flexibilidade de
paradas, convém ressaltar que em determinados lugares, nos quais antes kombis e vans
costumavam parar, como nos chamados “trevos”, os operadores do transporte
complementar não param para descer ou subir passageiros. Isso demonstra um maior
compromisso que esses operadores têm com o serviço que estão realizando.
Ressalte-se também que as linhas originalmente criadas para o STCP/Recife vêm
passando por mudanças em seus itinerários, cujas causas suscitam outros
questionamentos: Pressões da demanda? Ajustes dos operadores do Sistema
Complementar ou do órgão gestor de transporte municipal?
No tocante aos eixos em análise, compreendidos entre a Avenida Caxangá e o
bairro de Boa Viagem, o Sistema Complementar não contempla deslocamentos
realizadas especificamente entre essas duas áreas, tal como faziam as kombis e vans
até 2003, visto que, pelo regulamento do STCP/Recife os veículos desse serviço não
podem circular nesses eixos. Atualmente, com mudanças nos seus percursos originais,
observa-se a existência de duas linhas do STCP/Recife que, vindas dos bairros Jardim
Uchôa e Jardim São Paulo, chegam à Avenida Recife e, nas imediações do Makro,
seguem por esta avenida para o
Shopping Center
Recife em Boa Viagem.
Se por um lado, a implantação do STCP/Recife foi importante para a cidade, por
outro lado, também teve seus efeitos controversos tanto para os operadores do
transporte alternativo por kombis e vans, que muitos destes não foram absorvidos
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nem por esse sistema e nem pelas empresas operadoras do transporte coletivo por
ônibus, e principalmente, para a população dependente do transporte blico. Foram
mais de dez anos de incorporação das kombis e vans à dinâmica da cidade e, em
poucos meses do ano de 2003, estes veículos foram retirados completamente dos eixos
viários onde circulavam, sendo substituídos por um número bem menor de veículos do
atual sistema complementar, cujas linhas são diferentes daquelas realizadas pelas
kombis e vans.
Decorridos mais de dois anos da implantação do STCP/Recife, percebe-se que o
usuário do transporte coletivo não foi o mais contemplado nesse processo de
regulamentação, uma vez que continua sem um transporte público eficiente e
abrangente. Em relação aos eixos em análise, por exemplo, observa-se que, apesar do
reforço na frota de ônibus e de menores intervalos entre as viagens, uma expressiva
demanda de passageiros que andam em ônibus superlotados, sobretudo nos horários
de pico, passam por longos períodos de espera e percorrem longos itinerários até
chegar aos seus destinos.
E isto não acontece no sistema convencional por ônibus, como também no
Sistema Complementar, visto que, neste os veículos também superlotam,
principalmente, nos horários de pico, e, embora sejam veículos de maior capacidade e
mais confortáveis que as kombis e vans, a questão do conforto também deixa a desejar,
considerando a superlotação dos veículos, assim como a sua oferta parece não suprir a
demanda de passageiros de forma satisfatória.
Ressalte-se ainda que há uma expressiva demanda do
Shopping Center
Recife
para a Avenida Caxangá, próximo ao viaduto da BR 101, que não é atendida
satisfatoriamente pela linha de ônibus
Shopping
/CDU, haja vista o grande contingente
de pessoas que disputam acirradamente para entrar nos ônibus dessa linha, que
freqüentemente trafegam lotados, principalmente, pela manhã, no sentido Boa Viagem,
e durante a noite ao saírem do
Shopping
em direção à Avenida Caxangá para as
imediações do viaduto da BR 101. Similarmente, o mesmo também ocorre nos
veículos do STCP/Recife quando esses retornam do
Shopping
às imediaçôes do Makro
na Avenida Recife indo tomar os bairros de origem.
Vale salientar ainda que a linha de ônibus
Shopping
/CDU passou por novas
reformulações, tendo seu itinerário ampliado antes de entrar no
Shopping
, e não
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funciona nos feriados quando este equipamento encontra-se fechado. Portanto, aquelas
pessoas que precisam se deslocar às imediações desse estabelecimento têm de se
submeter aos longos itinerários de outra linha para chegar ao seu destino.
Convém lembrar que, em 2001, no intuito de competir com as kombis e vans, as
empresas de ônibus começaram a renovar a frota, inserindo no sistema ônibus mais
confortáveis e climatizados. Hoje, numa grande parcela dos ônibus que possuem ar-
condicionado, este aparelho está desativado e, quando em funcionamento, a
manutenção deixa a desejar. Percebe-se ainda que muitos dos veículos novos inseridos
no sistema já são comprados sem ar-condicionado.
Uma outra medida tomada para fazer frente às kombis e vans foi a implantação
de micro e mini-ônibus climatizados pela EMTU já em 1999, como os chamados
“Geladinho”, “Ligeirinho”. Entretanto, essas unidades de transporte não garantiam e
ainda não garantem benefícios como a meia tarifa para estudantes e a gratuidade para
idosos e deficientes físicos e mentais, além de não possuírem o sistema de bilhetagem
eletrônica, aspectos estes que eram bastante criticados no transporte alternativo das
kombis e vans.
A população usuária do transporte público continua sem um transporte de
qualidade, passando a ser refém dos interesses dos empresários do transporte por
ônibus, os quais não têm mais a forte concorrência das kombis e vans no espaço
viário da cidade, cujo serviço também não era de qualidade e não podia se configurar
da forma como se apresentava. O Poder Público precisa estar atento aos anseios deste
usuário, que quer viajar sentado, com conforto, ter passagens mais baratas, esperar
menos nos pontos de parada e, principalmente, chegar mais rápido ao seu destino.
Isto posto, tendo em vista as ambivalências e os reflexos do transporte de
passageiros por veículos de pequeno porte na organização sócio-espacial das cidades e
as propostas até hoje implementadas do STCP/Recife e do STCM, cujos
desdobramentos se fazem sentir, esta pesquisa pretende contribuir para as reflexões
em torno da necessidade de se (re)pensar e se (re)ordenar o atual sistema de transporte
coletivo urbano, o qual deve atender satisfatoriamente, e realisticamente como um
serviço social de qualidade, às necessidades da população, bem como promover
condições para o desenvolvimento das cidades.
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
REFERÊNCIAS E BIBLIOGRAFIA
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
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Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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APÊNDICES
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171
1. N.º do Form.: _______
2. Local:
01 - Caxangá
02 - Entrada do Shopping
03 - Dentro do Shopping
04 - Avenida Eng. Domingos Ferreira
3. Utiliza kombis/vans entre a Av. Caxan e o bairro de Boa Viagem ?
01 - Sim
02 - Não
4. Com que freqüência utiliza este transporte:
01 - Todos os dias
02 - Quase todos os dias
03 - Apenas em dias úteis
04 - Apenas nos finais de semana
05 - Esporadicamente
06 - Outros
5. Em que horios costuma utilizar este transporte?
01 - Qualquer Horário
02 - Manhã
03 - Final da tarde
04 - Noite
6. Horários: ____________________
7. Por quê neste(s) horário(s)? _________________________
10. Acha que é um transporte seguro?
01 - Sim
02 - Não
8. Quais o as vantagens que este transporte oferece? ____________________
APÊNDICE 1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CURSO DE MESTRADO EM GEOGRAFIA
9. Quais o os problemas e/ou desvantagens deste transporte? ________________
As territorialidades do Transporte Alternativo no Recife: Os Fluxos das Kombis e Vans
entre a Av.Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Formulário para Usuários do Transporte Alternativo
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Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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172
11. Se
sim
, por quê? __________________________________
12. Se
o
, por quê? __________________________________
01 - Sim
02 - Não
18. Qual a sua opinião sobre este projeto? ______________________________
19. Na sua opinião, o transporte alternativo deveria ter paradas fixas? ___________
01 - Sim
02 - Não
20. Se
sim
, por quê? __________________________________
21. Se
o
, por quê? __________________________________
01 - Kombi
02 - Sprinter
03 - Besta
04 - Outros
23. Se
kombi
, por quê? __________________________________
24. Se
Sprinter
, por q? __________________________________
25. Se
Besta
, por q? __________________________________
14. Quanto ao serviço prestado, como avalia a forma de cobrar as passagens:
________________________________________________________________
15. Quanto ao serviço prestado, como avalia a forma de desembarque de passageiros:
___________________________________________________________________
16. Qual a importância deste transporte para aqueles que o operam (kombeiros, cobradores)?
_____________________________________________________
17. Conhece o projeto da Prefeitura do Recife para regulamentar o SCTP?
22. Qual seria o tipo de veículo mais adequado para realizar o transporte alternativo?
13.
Quanto
ao
servo
prestado,
como
avalia
forma
de
abordar
os
passageiros
para
embarque:
______________________________________________________________________________
26. Como avalia o transporte coletivo por ônibus entre a Av. Caxangá e o bairro de Boa Viagem ?
_____________________________________________________
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Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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28. Sexo:
01 - Masc.
02 - Fem.
01 - 15 a 25 anos
02 - 26 a 35 anos
03 - 36 a 45 anos
04 - 46 a 55 anos
05 - mais de 55 anos
30. Escolaridade:
01 - Analfabeto
02 - Alfabetizado
03 - Nível Fundamental I
04 - Nível Fundamental II
05 - Nível Médio
06 - Nível Superior
31.
Profiso: __________________
Observações: ___________________________________________________________
29. Idade:
27. Que sugestões você daria para melhorar o transporte coletivo por ônibus neste percurso?
_________________________________________________________
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Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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174
1. N.º da Entrevista.: _______
2. Que fuão desempenha na atividade do transporte alternativo?
01 - Motorista
02 - Cobrador
3. Há quando tempo exerce esta atividade? _______________________
4. O que o levou a exercer esta atividade? ______________________
5.
Em que linha(s) trabalha ? ______________________
6. Há quanto tempo atua nesta(s) linha(s)? ______________________
7. Quais as desvantagens da atividade? ______________________
8. Quais as vantagens? ______________________
9. Esteve ou es vinculado a alguma organizão de Kombeiros?
01 - Sim
02 - Não
10. Se
o
, por q? ______________________
11. Se
sim
, desde quando? ______________________
12. Se
sim
, que tipo de organização?
13. Se
sim
, qual o nome da entidade? ______________________
01 - Sim
02 - Não
15. Qual a sua opinião sobre este projeto? ______________________
Observações: ____________________________________________
APÊNDICE 2
14. Conhece o projeto da Prefeitura do Recife para regulamentar o SCTP?
01 - Sindicato
02 - Cooperativa
03 - Associação
04 - Nenhuma
As territorialidades do Transporte Alternativo no Recife: Os Fluxos das Kombis e Vans
entre a Av.Caxan e o Bairro de Boa Viagem
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CURSO DE MESTRADO EM GEOGRAFIA
Entrevista para Motoristas e Cobradores
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
Diana Cecília de Souza
ANEXOS
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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ANEXO 1
As Territorialidades Flexíveis do Transporte Alternativo na Cidade do Recife:
Os Fluxos das Kombis e Vans entre a Avenida Caxangá e o Bairro de Boa Viagem
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ANEXO 2
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