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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
MESTRADO EM ENFERMAGEM
EXPERIÊNCIA DAS DOULAS NO CUIDADO À
MULHER EM UMA MATERNIDADE PÚBLICA DO
RECIFE-PERNAMBUCO.
JOÃO PESSOA – PB
2007
KARLA ROMANA FERREIRA DE SOUZA
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
MESTRADO EM ENFERMAGEM
KARLA ROMANA FERREIRA DE SOUZA
Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública
do Recife-Pernambuco.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem - nível Mestrado do Centro
de Ciências da Saúde da Universidade Federal da
Paraíba, em cumprimento às exigências para a obtenção
do tulo de Mestre. Linha de pesquisa: Políticas e
Práticas de Saúde e Enfermagem.
Orientadora: Prof
a
Dr
a
Maria Djair Dias
João Pessoa – PB
2007
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KARLA ROMANA FERREIRA DE SOUZA
Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do
Recife-Pernambuco.
Aprovada em ____ / ____ / 2007
BANCA EXAMINADORA:
Prof
a
Dr
a
Maria Djair Dias - UFPB
Prof
a
Dr
a
Maria Ferreira de Oliveira Filha - UFPB
Prof
a
Dr
a
Rosineide Santana de Brito - UFRN
Prof
a
Dr
a
Lenilde Duarte de Sá - UFPB
João Pessoa – PB
2007
S
731e
Souza, Karla Romana Ferreira de.
Experiência das doulas no cuidado à Mulher em uma
maternidade pública do Recife / Pernambuco. / Karla Romana
Ferreira de Souza. – João Pessoa, 2007.
133 p. : il.
Orientadora: Maria Djair Dias
Dissertação (mestrado) – UFPB/CCS
1. Enfermagem. 2. Saúde da mulher. 3. Parto Humanizado.
UFPB/BC CDU: 616-083 (043.2)
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho ao meu Senhor
Jesus por sua infinita misericórdia e amor para comigo.
“Tudo é do Pai toda honra e toda glória é dele a vitória alcançada em minha vida.”
AGRADECIMENTOS
A Deus fonte de inspiração e força nos momentos de cansaço;
À minha mãe Zenilda e meu pai Oswaldo Haroldo por terem me dado a vida;
Ao meu marido João Batista que durante a realização deste trabalho tentou entender as
minhas ausências ao seu lado. Eu te amo;
Aos meus irmãos Rogério, que intercedeu por mim na aquisição da carta de aceite para a
seleção do mestrado, e Leonardo pelo incentivo;
Ao meu tio Germano e sua esposa Giuliana que carinhosamente me acolheram em sua casa;
À minha orientadora Prof
a
Dr
a
Maria Djair Dias pelos seus ensinamentos. Aprendi muito
com suas conversas e orientações;
Agradeço à Pré-Banca, com suas valiosas contribuições para a construção deste trabalho:
Prof
a
Dr
a
Lenilde Duarte de (UFPB), Prof
a
Dr
a
Maria Ferreira de Oliveira Filha
(UFPB) e à Prof
a
Dr
a
Rosineide Santana de Brito (UFRN);
Aos meus familiares e amigas do Hospital das Clínicas de Pernambuco Andréa Dourado,
Jaqueline Faierstein e Elda Soares pelo apoio e incentivo;
À Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, na pessoa da Prof
a
Dr
a
Maria Ferreira de Oliveira Filha, pelo o apoio durante o curso;
Às colegas do Mestrado Ana Luiza, Luciana Dantas, Rafaela Gerbasi, em especial à
Alynne Mendonça pela amizade e força nos momentos mais difíceis;
Aos professores do Mestrado que por meio de suas aulas pude ampliar minha visão de
mundo;
Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, pelo atendimento
dedicado que sempre me dispensaram;
Às doulas, anjos que também iluminaram a minha vida;
A todos que contribuíram direta ou indiretamente para a realização desta dissertação, com
idéias, leituras, sugestões, críticas... Enfim, meu muito obrigada e que Deus abençoe suas
vidas.
EPÍGRAFE
“Todas as pessoas podem ser grandes porque todas podem servir. Não é
preciso ter um diploma universitário para servir. Não é preciso fazer
concordar o sujeito e o verbo para servir. Basta um coração cheio de graça. Uma
alma gerada pelo amor.”
(Martin Luther King)
SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRACT
1 Reflexões Iniciais....................................................................................................................1
1.1 Definição do objeto de estudo e motivação pelo tema......................................................2
1.2 Objetivos..............................................................................................................................5
2 Marco Referencial..................................................................................................................6
2.1 O processo de nascimento: do âmbito domiciliar para o hospitalar..............................7
2.2 A política de humanização do parto e nascimento.........................................................13
2.3 Doulas no contexto do cuidado à mulher........................................................................20
3 Delineando o Caminho Metodológico................................................................................31
3.1 A escolha do paradigma metodológico: a História Oral à Luz de Meihy....................32
3.2 A entrevista........................................................................................................................35
3.2.1 Etapas da entrevista.......................................................................................................37
3.2.2 O momento da entrevista..............................................................................................37
3.3 Aspectos éticos-legais....................................................................................................... 40
3.4 Tratamento do material empírico...................................................................................41
4 A Prática das Doulas no Cuidado à Mulher em Processo de Parto e Nascimento.........42
5 Mulheres que Cuidam de Mulheres: as histórias e seus significados..............................81
5.1 Acolhendo e criando vínculo............................................................................................82
5.2 Um caminho para a humanização...................................................................................88
5.3 A necessidade de reconhecimento e aceitação das doulas.............................................97
6 Reflexões Finais..................................................................................................................104
7 REFERÊNCIAS ...............................................................................................................108
APÊNDICES.........................................................................................................................117
APÊNDICE A - FICHA TÉCNICA....................................................................................118
APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO..........119
APÊNDICE C - CARTA DE CESSÃO ..............................................................................121
ANEXO..................................................................................................................................122
ANEXO A – CERTIDÃO DE APROVAÇÃO...................................................................123
RESUMO
SOUZA, K.R.F.de. Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade
pública do Recife/Pernambuco. 2007. 133f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) –
Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa - PB.
A institucionalização do processo de parto e nascimento vem provocando, ao longo do tempo,
mudanças significativas no modelo de assistência à saúde. A substituição da casa pelo
hospital e da parteira pelo médico transformaram uma área de domínio feminino de atenção
em campo de universo masculino. A incorporação de tecnologias serviu para consolidar a
transformação do parto e do nascimento em “atos médicos” e não em um momento da mulher,
do recém-nascido e da família. A introdução das doulas, nesse processo, pode ser considerada
como uma proposta de resgatar práticas antigas no cuidado. Doulas são mulheres voluntárias
da própria comunidade próxima à maternidade, treinadas e dispostas a ajudar as parturientes.
O Ministério da Saúde criou o Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias, como mais
uma estratégia para viabilizar a melhoria da assistência à mulher, durante o processo de parto
e nascimento. Diante dessas considerações, houve a necessidade de investigar essa nova
figura e sua participação no momento do parto, por meio de um estudo de natureza
qualitativa, que teve como objetivo revelar os motivos que levaram as mulheres a se tornarem
doulas, conhecer suas atividades desenvolvidas no contexto do cuidado à saúde da mulher, em
ambiente hospitalar, e identificar os desafios que encontram na sala de pré-parto. A pesquisa
foi realizada em uma maternidade pública municipal na Cidade do Recife-Pernambuco, onde
o Programa encontra-se institucionalizado 4 anos. O material é empírico, produzido por
meio das entrevistas, utilizando-se a História Oral temática como referencial metodológico.
Os resultados dos depoimentos foram discutidos e apresentados na forma de narrativa. Desse
processo, emergiram três eixos temáticos que traz o cuidado prestado pelas doulas, centrado
no acolhimento e vínculo, um caminho para a humanização e a necessidade de
reconhecimento e a aceitação desse trabalho. A pesquisa revelou que as doulas oferecem um
cuidado que envolve uma escuta ativa, alicerçada em atitudes de respeito, acolhimento,
conhecimento técnico e amor. O desejo de ajudar e a preocupação com o bem estar do outro
foram os principais motivos que levaram essas mulheres a se tornarem doulas. As doulas,
colaboradoras deste estudo, relatam dificuldades no cenário das relações (doula/profissionais
de saúde), no qual diz respeito à compreensão de suas atribuições e por fim não se percebem
em movimento de inclusão como parceira do cuidado à mulher. Entretanto, para que suas
atividades sejam plenamente exercidas, se faz necessário promover espaços de diálogos, na
instituição, com os profissionais de saúde esclarecendo a importância das doulas na
perspectiva de estabelecer parcerias no cuidado à parturiente.
Palavras-chave: Enfermagem; Saúde da Mulher, Parto Humanizado.
ABSTRACT
SOUZA, KRF de. Experience of doulas in care to women in a maternity public of Recife-
Pernambuco. 2007. 133 f. Dissertation (Master of Nursing) - Center for Health Sciences,
Federal University of Paraíba, Joao Pessoa-PB.
The institutionalization of the process of delivery and birth is causing, over time, significant
changes in the model of health care. The replacement of the house by the hospital and the
midwife by the doctor turned an area of female domain of attention in the field of male
universe. The incorporation of technology served to consolidate the transformation of
childbirth and the birth in "medical acts" and not in a moment of women, the newborn and the
family. The introduction of doulas, in the process, can be considered as a proposal to redeem
old practice in care. Doulas are women's voluntary community next to motherhood, trained
and prepared to help the parturientes. The Ministry of Health has established the Program of
Doulas Community Voluntary, as a strategy to further facilitate the improvement of assistance
to the woman, during childbirth and birth. Given these considerations, there was the need to
investigate this new phenomenon and its participation at the time of childbirth, through a
study of a qualitative nature, which aimed to reveal the reasons that led women to become
doulas, knowing their activities in context of women's health care in a hospital environment,
and identify the challenges they encounter in the living room for pre-birth. The survey was
conducted in a maternity municipal public in the City of Recife - Pernambuco, where the
program is institutionalized for 4 years. The material is empirical, produced through
interviews, using Oral History is the theme as a benchmark methodology. The results of
testimonials were discussed and presented in the form of narrative. This process, emerged
three thematic axes that brings the care provided by doulas, focusing on the host, a way for
the humanization and the need for recognition and acceptance of this work. The survey
revealed that doulas provide a care that involves an active listening is rooted in attitudes of
respect, reception, technical knowledge and love. The desire to help and concern for the
welfare of the other were the main reasons that led these women to become doulas. The
doulas, collaborating this study, reported difficulties in the backdrop of relations (doula /
occupational health), which relates to the understanding of its mission and ultimately did not
realize the moving of inclusion as a partner of care to women. However, that its activities are
fully exercised, whether it is necessary to promote spaces for dialogue, the institution, with
health professionals, explaining the importance of doulas in the perspective of establishing
partnerships in caring for parturiente.
KEYWORDS: Nursing; Women's health; Humanized childbirth.
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
1
“Começar é a parte mais importante
de qualquer trabalho.”
(PLATÃO)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006
.
______ 1Reflexões Iniciais
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
2
1.1 Definição do objeto de estudo e motivação pelo tema
No cenário mundial, o cuidado prestado à mulher e ao recém-nascido, durante o
processo de parturição, vem sofrendo mudanças significativas ao longo dos tempos. Até o
século XIX, o nascimento de uma criança ocorria em casa, onde a gestante era assistida por
uma parteira, acompanhada por familiares e amigas. Nesse cenário, a parteira tinha a função
de assistir o processo do parto, enquanto a acompanhante ajudava a mulher, dando-lhe
suporte físico e emocional, durante todo o tempo necessário.
Entretanto, o processo de hospitalização e medicalização da assistência ao parto, que
teve inicio no século XIX, afastaram das mulheres o apoio constante de seus familiares,
pessoas amigas e o aconchego do seu lar, durante o processo de parto e nascimento. Além
disso, foi adotada a posição horizontal exigindo que a mulher fosse deitada e deslocada da
sua situação de centro, no processo de parto e nascimento, perdendo a autonomia da sua
própria experiência. Dessa maneira, passaram a ter seus filhos(as) em um ambiente hospitalar
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
3
A OMS ainda recomenda modificações nas rotinas hospitalares, consideradas
desnecessárias, geradoras de risco e excessivamente intervencionistas no parto, como a
episiotomia (corte realizado no períneo da mulher, para facilitar a saída do bebê), amniotomia
(ruptura provocada da bolsa que contém o líquido amniótico), enema (lavagem intestinal),
tricotomia (raspagem dos pelos pubianos) e particularmente nos critérios de indicações das
cesáreas (TORNQUIST, 2002). Esses procedimentos são utilizados com a alegação de
proporcionarem benefícios para a parturiente e feto, no entanto vários estudos aponta-os
como danosos e ineficazes, devendo ser evitados por serem invasivos e aumentarem os riscos
de infecção.
Nessa discussão, em busca de um atendimento ao parto humanizado, experiências
institucionais, como o Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias do Ministério da
Saúde, é realidade em algumas maternidades públicas, em vários estados do país. Doula é
uma palavra de origem grega cujo significado é aquela que serve semelhante às mulheres que
antigamente ajudavam outras a dar a luz (FADYNHA, 2003). Nos dias de hoje elas são
voluntárias, geralmente da própria comunidade próxima à maternidade, são treinadas e
mostram disposição para acolher e ajudar as parturientes a vivenciarem o processo de parto e
nascimento, oferecendo-lhes apoio, orientando os acompanhantes, criando um ambiente de
confiança e segurança.
A presença da doula, no contexto do cuidado humanizado, é uma atividade recente e
inovadora nas maternidades públicas brasileiras. É um Programa criado pelo Ministério da
Saúde que visa fortalecer e resgatar práticas tradicionais do cuidado à parturiente, centrada na
família e no interesse da mulher. Dessa maneira, este estudo revelou significativa
participação dessa mais nova personalidade no cenário da parturição, em nível hospitalar.
Foram realizadas reflexões sobre as ações desenvolvidas pelas doulas à mulher, em processo
de parto e nascimento, que se revelaram através do diálogo, da formação de vínculo e do
acolhimento. Tiveram como aspecto norteador os valores da interpretação das experiências
das doulas nos cuidados às parturientes.
Sou enfermeira, formada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com
residência na área de saúde da mulher pelo Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP)
e especialização em saúde pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Atualmente
exerço atividades assistenciais em uma maternidade pública municipal na cidade de Recife-
Pernambuco.
Construí toda a minha trajetória profissional preocupada com a assistência oferecida à
mulher, em especial, durante o processo de parto e nascimento. Os trabalhos de conclusão da
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
4
graduação, bem como da residência e especialização foram direcionados à área de saúde da
mulher. Em busca de conhecer melhor o universo das doulas, concluí o X Curso de Formação
de Doulas ministrado pelo Grupo de Apoio à Maternidade Ativa (GAMA), realizado em São
Paulo no período de 02 a 05 de dezembro de 2006.
Sempre fui motivada pelo desejo de conhecer novas práticas de cuidado humanizado à
mulher que pudessem articular o conhecimento científico a uma percepção ampliada e
integral, a qual consiste em tomar a vida como fonte de valor, onde as intervenções do
cuidado sejam apoiadas numa relação de cumplicidade. Assim, o cuidado, para mim, tem um
valor ético, cultivado de responsabilidades coletivas e individuais.
A minha prática como enfermeira obstetra atuando em uma maternidade pública da
rede municipal de saúde da cidade de Recife, me aproximou do objeto deste estudo que é a
relação do trabalho das doulas com a política nacional de humanização do parto e nascimento
do Ministério da Saúde. Parti do pressuposto que a presença das doulas no pré-parto contribui
para uma melhor qualidade na assistência à mulher, no momento especial de sua vida, como
o nascimento do seu filho.
Esta Dissertação está inserida no Projeto de Práticas de Cuidados na rede formal e
informal de saúde, vinculado à linha de pesquisa de Políticas Públicas em Enfermagem.
Como mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem (PPGEnf) e participando
deste projeto, senti a necessidade de trabalhar com esta temática, pois percebi no cenário do
cuidado à mulher, em processo de parto e nascimento, a presença das doulas que se
emocionavam, se envolviam e criavam vínculos com as parturientes.” Tinham atitude de
promoção à vida e práticas que valorizavam a capacidade inata das mulheres em dar à luz.
Diante deste propósito, foram elaboradas as seguintes questões norteadoras: por que
essas mulheres se tornaram doulas? Que práticas as doulas desenvolvem no cuidado à
mulher, durante o processo de parto e nascimento no contexto hospitalar? Quais os desafios
que as doulas encontram na maternidade para desenvolver suas atividades?
Para responder a essas questões e com o desejo de dar maior visibilidade a esse
Programa, para a sociedade, e consolidar as doulas comunitárias voluntárias como uma nova
proposta no cuidado à mulher, na perspectiva da humanização, foram definidos os seguintes
objetivos:
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
5
1.2 Objetivos
Revelar os motivos que levaram as mulheres a se tornarem doulas em uma
maternidade pública municipal na cidade do Recife-Pernambuco;
Conhecer as atividades desenvolvidas pelas doulas no contexto do cuidado à saúde da
mulher em ambiente hospitalar;
Identificar os desafios encontrados pelas doulas para desenvolver as suas atividades.
As respostas a esses questionamentos possibilitaram uma compreensão da prática de
cuidado das doulas, que pode contribuir para melhorar a qualidade da assistência às
mulheres, no processo de parto e nascimento. As atividades desenvolvidas no pré-parto, por
essas cuidadoras, possibilitaram uma maior divulgação do Programa de Doulas Comunitárias
Voluntárias, em meio acadêmico, e pode também oferecer aos profissionais de saúde
elementos que forneçam subsídio para uma prática mais humanizada.
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
6
“A principal tarefa do ser humano
nesta vida é dar a luz a si mesmo.”
(Erich Fromm)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006.
____ 2 Marco Referencial
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
7
2.1 O processo de nascimento: do âmbito domiciliar para o hospitalar
Na história da humanidade, mulheres de diferentes sociedades apoiavam e cuidavam
de outras, no momento do parto. As mais experientes, que acumulavam conhecimentos
tradicionais, eram responsáveis em atender as gestantes em processo de parto e nascimento e
transmitiam a arte de partejar de uma geração à outra. Assim, as parteiras têm o seu
reconhecimento histórico e social registrado ao longo do tempo (DIAS; DESLANDES,
2006).
Sendo assim, a assistência à mulher em processo de parto, nascimento e puerpério era
exercida tradicionalmente por mulheres de inteira confiança da comunidade, também
conhecidas como “aparadeiras” ou “comadres” (LARGURA, 2000). Elas detinham um saber
empírico e assistiam as mulheres em seu domicilio, durante a gestação, parto e pós-parto.
Nesse sentido, Dias (2002, p.11) esclarece que
historicamente as mulheres vivenciaram o processo de nascer isoladamente,
sem nenhuma interferência externa, semelhante aos animais. Mais adiante,
surge a necessidade de uma ajuda de maneira compartilhada e solidária entre
as mulheres, para vivenciarem essa experiência. Assim, surgem mulheres
denominadas de mulheres parteiras, dispostas a ajudar outras mulheres na
experiência do parto e nascimento. É a primeira personalidade a estar
presente no cenário do parto.
Existiu uma fase, na história da humanidade em que as mulheres se isolavam para dar
à luz. Em seguida surge a necessidade de parir próximas às suas mães, avós, tias, vizinhas ou
uma mulher de experiência da comunidade, a parteira. Na definição de Nagahama e Santiago
(2005) parteiras são mulheres de confiança da gestante ou de experiência reconhecida pela
comunidade. Desenvolvem suas atividades como um sacerdócio, são familiarizadas com as
manobras externas para facilitar o parto, conhecem a gravidez bem como o puerpério e se
encarregam de confortar a parturiente com alimentos, bebidas e palavras agradáveis. Por esta
razão as parturientes preferiam à sua companhia, pois se sentiam acolhidas e seguras.
Tal é a importância das parteiras que, na bíblia sagrada, encontram-se relatos sobre
parto e nascimento acompanhados por elas, como descrito em gênesis “Em meio às dores do
parto disse-lhe a parteira: não temas, pois ainda terás este filho” (GÊNESIS, p.43). Portanto,
a arte de partejar é uma atividade que acompanha a história da humanidade. De tradição
feminina, as parteiras são apoiadas na sua própria experiência com a gravidez, o parto e o
nascimento. Para elas o momento do parto é vinculado à natureza e à cultura (DIAS, 2002).
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
8
As parteiras não atuavam no momento do parto, como também organizavam o
local, cuidavam da alimentação e da roupa da parturiente, participavam com outras mulheres
dos preparativos para a realização dos rituais com amuletos, ervas, encantamentos, preces,
enfim, faziam uso de recursos mágico-religiosos, pois acreditavam que ajudavam no parto e
afastavam todo o mal. Após o parto, continuavam ajudando as puérperas até que estivessem
em condições de retornar as suas atividades domésticas (MARTINS, 2004).
As parteiras são mulheres preocupadas em cuidar de outras mulheres e famílias; são
geralmente de origem camponesa e conhecedoras de remédios à base de ervas. O cuidado que
prestavam à mulher por meio dos rituais e o conhecimento e manejo no uso das ervas, as
tornavam menos dependentes do poder e domínio da igreja. Por isso, foram perseguidas,
combatidas e caluniadas, durante sua trajetória de vida, pelos representantes da sociedade que
possuíam algum poder dos sacerdotes e médicos.
No século XVI, governo e igreja, preocupados com os aspectos morais e religiosos da
prática das parteiras, procuraram regulamentar esses cuidados, obrigando-as a fazer exames
prestados à Comissão Municipal ou Eclesiástica, com o objetivo de garantir ao Estado e à
igreja que não seriam mais praticados abortos nem infanticídios. Também foi exigida a
profissão da católica, batizar o recém-nascido moribundo, terem moral e reputação
ilibadas. Essa época coincidiu com a inquisição, com a “caça às bruxas” e feiticeiras, nas
quais, as parteiras eram alvos. Perdendo a sua autonomia, passaram a chamar os físicos e
cirurgiões em caso de emergência, ou quando houvesse a necessidade do uso de instrumentos
(VIEIRA, 2002).
Nessa relação com os cirurgiões e as parteiras, ocorreram inúmeros conflitos para o
exercício e domínio da prática obstétrica, pois o ensino médico na Idade Média não aceitava
qualquer conduta contrária à doutrina da igreja. Deu-se início a uma luta política e religiosa
com o objetivo de acabar com o poder dos adivinhos, feiticeiros, encantadores, curandeiros e
em especial as parteiras, detentoras de um patrimônio do conhecimento, sobre o cuidado que
as tornaram alvos da repressão da igreja. Todo esse desejo de caça às bruxas continha a
vontade implícita de exterminar aquelas mulheres depositárias das crenças e conhecimentos
populares, que ameaçavam o poder da igreja (COLLIÈRE, 1999).
Na realidade, o saber construído pela experiência tornava as parteiras personagens
importantes no lugar onde moravam, desfrutando de poder, prestígio, que ameaçavam o
domínio da igreja como também da classe médica. O período de “caça às bruxas” não
conseguiu acabar com as parteiras e curandeiros(as), porém transformou suas práticas em
atividades suspeitas e maléficas. Esse movimento deve ser analisado como um mecanismo de
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
9
exclusão das mulheres no campo da saúde como um meio da igreja e do Estado monopolizar
o saber de cura das enfermidades, legitimando-o como saber médico destinado aos homens,
adquiridos através das universidades (VIEIRA, 2002).
As parteiras representavam um conjunto de conhecimentos populares, que vinham
sendo desqualificados pelos médicos para impor os seus conhecimentos, com a finalidade de
construir o poder médico, no qual não aceitava outros saberes e práticas concorrentes. Dessa
maneira, a entrada dos médicos na cena do parto foi mais um resultado de uma relação de
forças do que a superação do obscurantismo pelo progresso do conhecimento médico
(MARTINS, 2004).
A prática da nova medicina durante um longo período foi exclusiva dos homens
ligados à igreja. Primeiro foram os monges, depois os padres e cléricos, seguidos dos monges
médicos que foram os primeiros estudantes das escolas de medicina na França. A medicina
européia torna-se ciência e profissão. O movimento de profissionalização dos cuidados
desconsidera o saber empírico das mulheres e proclama qualquer mulher que ouse
dispensar cuidados sem ter feito estudos médicos seria declarada feiticeira e deveria
morrer” (grifos da autora) (COLLIÈRE, 1999). Sobre a entrada dos médicos nesta prática,
Capra (1982, p. 119) destaca que
na história da medicina ocidental, a conquista do poder por uma elite
profissional masculina envolveu uma longa luta que acompanhou o
surgimento da abordagem racional e científica da saúde e da cura. O
resultado desta luta foi o estabelecimento de uma elite médica quase que
exclusivamente masculina e a inclusão da medicina em setores que eram
tradicionalmente atendidos por mulheres, como o parto.
Assim, as parteiras foram deixando o cenário de cuidado ao parto e a presença
masculina foi ganhando espaço e se fortalecendo. No final do culo XVI, foi iniciado o
período moderno da obstetrícia, com a invenção de instrumento como o fórceps, pelo médico
inglês Peter Chamberum, marca a era da intervenção cirúrgica no atendimento ao parto. Com
a presença cada vez mais freqüente dos médicos ao lado das parturientes, foram tornando-se
especialistas não do parto, mas da gravidez, do puerpério, da saúde e das doenças dos
recém-nascidos, associando a experiência aos conhecimentos científicos produzidos nas
principais faculdades de medicina européias, formando um novo especialista, o obstetra
(MARTINS, 2004).
A Obstetrícia moderna teve origem na França, no século XVII, através do surgimento
das cirurgias e anestesias diminuindo assim o prestígio da parteira. Esse período foi marcado
pela entrada dos médicos nas salas de parto, assumindo o papel tradicional das parteiras. Foi
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
10
exigido das mulheres, pela primeira vez, que dessem à luz deitadas de costas, para facilitar o
emprego do fórceps pelos médicos (ODENT, 2002).
Definitivamente a prática médica se consolida como exercício monopolizado pelos
médicos, legitimada pela disputa entre médicos e parteiras. O desenvolvimento das técnicas
cirúrgicas, anestésicas e o uso da assepsia colaboraram para efetivar o domínio dos médicos
na prática de cuidado à mulher. A institucionalização do parto contribuiu de maneira decisiva
para a apropriação do saber e do ensino médico. O corpo da mulher ainda hoje sofre intensa
medicalização em meio ao discurso de valorização da maternidade.
Historicamente, o processo de institucionalização do parto ocorreu primeiramente na
Europa, nos séculos XVII e XVIII. Enquanto no Brasil, em 1808, foi implantado o ensino
oficial da medicina, com a chegada da Corte Portuguesa. A primeira escola de medicina e
cirurgia inaugurada foi na Bahia e a segunda no Rio de Janeiro. O curso de obstetrícia
inicialmente foi especulativo e abstrato, pois não havia enfermaria para mulheres grávidas e
parturientes em que se pudesse realizar o ensino prático (BRENES, 1991).
A formação médica dos séculos XVII e XVIII ocorre fora do ambiente hospitalar. A
medicina era praticada em qualquer lugar e a intervenção do médico dava-se em torno da
doença. Os hospitais eram lugares necessários para os pobres, doentes sem família e para
proteção das pessoas sadias contra as doenças contagiosas de difícil cura pela medicina. A
maioria dessas instituições era mantida por ordens religiosas destinadas à salvação espiritual,
com base na caridade cristã e não para a cura do doente (TANAKA, 1995).
O hospital, nessa época, buscava a anulação dos efeitos negativos causados pelas
doenças que disseminavam, ameaçando as populações das cidades. Era considerado um lugar
de agrupamento dos excluídos, pedintes, vagabundos e desamparados. Os médicos tanto
exploravam, como tratavam as doenças identificadas por sinais clínicos exteriorizados,
buscando interpretá-los. Assim, os cuidados provenientes das descobertas empíricas foram
substituídos pelos cuidados médicos ou científicos, fragmentado e separado da dimensão
social (COLLIÈRE, 1999).
Em meados do século XVIII, surge a obstetrícia como ramo da medicina. O seu
desenvolvimento encontrou dificuldades e conflitos. Havia fortes resistências das mulheres
em aderir à assistência hospitalar sob o olhar masculino, além da desvalorização como
disciplina médica, pois a prática obstétrica era considerada de menor valor e poderia ser
deixada aos cuidados femininos (VIEIRA, 2002).
A falta de instalações adequadas também prejudicava o ensino da obstetrícia, as quais
impediam o aprendizado prático. As atividades deveriam ocorrer nos hospitais da Santa Casa
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
11
de Misericórdia de Salvador e do Rio de Janeiro, o que não aconteceu por causa da ausência
de enfermarias para gestantes e puérperas. Em 1847, no Rio de Janeiro, funcionava no
Hospital de Caridade da Santa Casa uma enfermaria de partos destinada às mulheres pobres,
sob cuidados das irmãs de caridade. Embora fosse um espaço para o ensino prático, os
provedores e as irmãs da Santa Casa não aceitavam a entrada dos alunos nessa localidade.
Somente no final do século XIX os estudantes de medicina começaram a ter aulas práticas de
obstetrícia (MARTINS, 2004).
Os hospitais, como instituição terapêutica e lugar para desenvolvimento da
experiência prática dos médicos, surgiram por volta de 1780. Esse espaço era disciplinado, o
médico surge como uma figura autoritária normatizadora. Ele determinava as necessidades
do doente, agrupava as doenças por ordens, gênero e espécie. Essa nova forma de concepção
do hospital e da clínica médica é responsável pelo o processo de “medicalização do hospital”
(FOUCAULT, 2006).
Nesse sentido o hospital é comparado a um quartel, pois a disciplina é a sua regra
mais importante. Como instituição vinculada ao Estado, o poder é mediado por um saber
soberano, um conjunto de técnicas, normas e rotinas. Portanto, através de um processo de
formação ideológica e um conjunto de práticas institucionais médicas, que medicaliza e
institucionaliza o paciente, o hospital pode ser considerado como parte de uma estratégia do
exercício de dominação médica (NAGAHAMA; SANTIAGO, 2005).
Foi no século XIX que os médicos assumiram definitivamente o papel de partejar,
propondo e efetivando a hospitalização do parto e a criação de maternidades, como
instituições hospitalares destinadas para sua realização. O discurso médico defendeu a
hospitalização do parto e a construção de maternidades, colocando em dúvida a competência
das parteiras. Com isso, o parto deixou de ser privado, íntimo e feminino, passando a ser
vivido publicamente, com a presença e intervenção de outros atores sociais.
O processo de institucionalização e medicalização da assistência ao parto, iniciada no
século XIX, através da incorporação da obstetrícia pela medicina e da difusão da atenção
médica hospitalar, afastou a tradição de familiares principalmente as mulheres que
participavam do nascimento. As parturientes passaram a ser atendidas nos hospitais, por
profissionais de saúde, permanecendo sozinhas durante todo o trabalho de parto (LEÃO;
BASTOS, 2001). Com o parto agora institucionalizado, as mulheres deveriam parir
conscientes, imobilizadas com as pernas abertas e levantadas, assistidas por pessoas
desconhecidas, separadas de seus familiares e pertences. Além da inclusão da episiotomia
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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(abertura cirúrgica da musculatura do períneo) e a aplicação do fórceps alto, como
procedimentos de rotina (DINIZ, 2005).
No Brasil, o parto institucionalizou-se após a segunda guerra mundial, período no
qual normas e rotinas foram estabelecidas para o tratamento e comportamento das mulheres.
A incorporação à medicina de novos conhecimentos e habilidades nos campos da assepsia,
cirurgia, anestesia, hemoterapia e antibioticoterapia diminuíram, os riscos hospitalares e
ampliaram as possibilidades de intervenção, resultando em aumento progressivo no número
de cirurgias cesarianas (TANAKA, 1995).
Essa nova maneira de ver o parto aumentou as possibilidades de intervenção no corpo
da mulher, através do uso das técnicas em decorrência do avanço da tecnologia. O
nascimento que antes ocorria em espaço exclusivamente feminino, passou a ser de domínio
masculino, no contexto hospitalar. A Rede Nacional Feminista de Saúde no Dossiê de
Humanização do Parto (2002), atribuiu a medicalização a um modelo médico dominante, na
área de saúde, em que esses profissionais tendem a oferecer soluções biomédicas e técnicas
em momentos considerados fisiológicos, inerentes à vida, como a gravidez e o parto.
A medicalização se refere às relações de poder, ao conhecimento médico, à prática
clínica e ao encontro do profissional de saúde com o cliente. Na área da saúde da mulher, essa
realidade é uma forma de manter a dominação e o controle masculino sobre o corpo das
mulheres (GILBERT; CARDOSO; WUILLAUME, 2006). Dessa maneira, o corpo feminino
se transformou em objeto de saber e prática da medicina, num contexto histórico de formação
da sociedade capitalista (NAGAHAMA; SANTIAGO, 2005). Sendo assim, medicalizar o
corpo feminino é uma questão de reprodução, fundamental para uma sociedade controlar as
populações, diante do sistema capitalista, mostrando que para o controle social das
populações e da força de trabalho, o investimento deve ser sobre o corpo (VIEIRA, 2002).
O saber médico dominante cita o fator de risco como a legítima preocupação com a
segurança da mãe e da criança, para justificar a medicalização do parto, desacreditando na
capacidade inata que as mulheres têm de dar à luz e em qualquer alternativa que tenham uma
abordagem diferente da tradicional (ODENT, 2002). No entanto, não se pode negar que o
desenvolvimento da tecnologia permitiu a redução dos índices de morbidade e mortalidade
materna e fetal, num momento em que a vitalidade e a saúde eram fundamentais para a
reprodução social (REDE NACIONAL FEMINISTA DE SAÚDE, 2002).
Dentre os avanços na qualidade da assistência obstétrica, destaca-se a operação
cesariana, que passou de um procedimento antes realizado apenas em mulheres mortas para
salvar a vida fetal, hoje proporciona em algumas situações segurança à vida da mãe e do
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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filho. Porém, esse procedimento está sendo usado sem justificativas obstétricas adequadas,
gerando uma medicalização excessiva de um processo natural e fisiológico como é o parto
(LEÃO; BASTOS, 2001).
Vale ressaltar que a medicina contemporânea valoriza as especialidades médicas, na
qual o médico se detém em alguma parte do organismo humano. O ser humano deixou de ser
visto em sua totalidade nas investigações diagnósticas e nas práticas intervencionistas,
gerando um desamparo na sociedade que nem sempre está relacionado, exclusivamente, com
os cuidados médicos tradicionais. Assim, novas práticas terapêuticas surgem nas instituições
de saúde, como formas de cuidado integral. Nessa perspectiva, é necessário ampliar o espaço
de cuidado, a fim de que outras “visões de mundo” contribuam para a construção de uma
política de saúde integral, que tome a vida como fonte de valor (MACHADO; PINHEIRO;
GUIZARDI, 2006).
Não se trata de desprezar a tecnologia científica nem os avanços do conhecimento
médico, mas perceber o limite do conhecimento abrindo espaço para o afeto, a compaixão a
solidariedade nas relações entre profissionais de saúde e usuários. Para tanto é preciso
redefinir os modelos de atenção à saúde, organizar práticas centradas no acolhimento dos
indivíduos em suas necessidade (LACERDA; VALLA, 2007).
2.2 A política de humanização do parto e nascimento
As elevadas taxas de morbi-mortalidade materna, perinatal e a assistência
intervencionista prestada à mulher, durante o processo de parto e nascimento, além dos
elevados índices de cesáreas, tornaram o parto alvo de preocupação dos profissionais e
entidades que atuam na promoção da saúda da mulher. Visando reverter não apenas as
estatísticas de morbi-mortalidade materna e perinatal no país, mas principalmente promover
mudanças no modelo assistencial, o Ministério da Saúde propôs, em 2000, o Programa
Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar e o Programa Trabalhando com
Parteiras Tradicionais, instituído em março desse mesmo ano, com o objetivo de melhorar a
assistência ao parto domiciliar realizado por parteiras (BRASIL, 2006).
O Programa Trabalhando com Parteiras Tradicionais foi uma parceria do Ministério
da Saúde com a Organização Não Governamental (ONG) Grupo Curumim Gestação e Parto,
que articulou Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde. Buscou-se sensibilizar os
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Gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) para reconhecerem as parteiras como parceiras e
desenvolverem ações de apoio e qualificação do seu trabalho, através de capacitações,
garantia de materiais sicos para a realização dos partos domiciliares e um sistema de
referência e contra referência (BRASIL, 2006).
Com o surgimento de uma assistência hospitalar ao parto, houve a construção de uma
cultura institucional que se impôs através da organização das práticas de saúde e a
valorização de uma racionalidade científica, com ênfase na técnica (FERREIRA, 2005). Na
tentativa de aperfeiçoar a qualidade da assistência ao parto tanto nos países desenvolvidos
como nos em desenvolvimento, levaram a adoção de intervenções inapropriadas,
desnecessárias, dolorosas e arriscadas. O descontentamento com esse modelo tecnocrático da
assistência à mulher, baseado na super valorização das técnicas, contrapondo a relação entre
profissionais de saúde e paciente”, pode ser explicada por um olhar reducionista e
maniqueísta, onde os profissionais não são comprometidos e as mulheres são consideradas
coitadinhas” (SERRUYA, LAGO; CECATTI, 2004) (grifo da autora).
A introdução da tecnologia médica, propondo o alívio das dores do parto e uma maior
segurança do processo de parturição, foi um fator decisivo para determinar a medicalização
do parto e nascimento. Esse processo é responsável por tornar o parto de ordem médica,
caracterizado por inúmeras intervenções no corpo da mulher. Dessa maneira, o que antes era
visto como fisiológico e natural tornou-se potencialmente perigoso, devendo por isso ser
submetido às técnicas provenientes do avanço tecnológico da obstetrícia moderna.
Nas décadas de 30, 50 e 70, os programas desenvolvidos destinados à saúde das
mulheres com a denominação de materno-infantil, traduziam uma preocupação estritamente
biológica da mulher e do seu papel social de mãe, doméstica, responsável pela criação dos
filhos e com o cuidado da família. Essa concepção provocou fortes reações da sociedade civil
organizada, que lutava pelo direito da mulher controlar o seu próprio corpo e conquistar a
cidadania.
Em 1980, surgiu uma enorme insatisfação e questionamentos, no interior dos
movimentos sociais, sobre a visão estritamente reprodutiva, fragmentada da mulher, com
excesso de intervenção no parto e os elevados índices de cesáreas. Esses fatores culminaram
com a sedimentação de um movimento de mulheres, surgido publicamente no século XIX, na
França, com o objetivo de promover a igualdade entre os sexos. No Brasil, o feminismo se
constituiu como movimento político organizado, somente na segunda metade da década de
70, com a finalidade de ampliar a luta pela liberdade reprodutiva (COELHO; FONSECA;
GARCIA, 2001).
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O período de 1976 a 1985 foi declarado pela Organização das Nações Unidas (ONU),
a Década da Mulher, quando finalmente no Brasil criou-se o maior espaço de discussão sobre
as questões da sua saúde. Esse espaço foi fortalecido com a convenção sobre a eliminação de
todas as formas de discriminação, considerada o instrumento jurídico internacional mais
significativo em todo o mundo. Tais acontecimentos contribuíram para a construção dos
direitos humanos das mulheres, legitimado nas Conferências Internacionais, na cada de 90
e na Conferência sobre direitos humanos, realizado em Viena em 1993, quando passaram a
ser consideradas sujeitos de direitos. As Conferências Internacionais sobre população, no
Cairo em 1994 e Mulher, em Beijing 1995, definiram os Planos de ão contendo propostas
de política em prol da igualdade dos gêneros (COELHO; GARCIA, 2004).
Nas décadas de 70 a 80, organizou-se também o movimento da Reforma Sanitária,
cuja concepção de saúde superava os limites do saber e da prática médica, trazendo um
entendimento da saúde e doença como processos sociais. Em 1983 foi elaborado com a
participação efetiva do movimento feminista o Programa de Assistência Integral à Saúde da
Mulher (PAISM), com propostas norteadas por princípios éticos e o compromisso com a
assistência à mulher, em sua integralidade.
O PAISM rompia com a percepção reprodutiva da mulher, ampliando o olhar para a
vivência de todas as fases do ciclo vital, através das ações educativas, preventivas, de
diagnóstico, tratamento e recuperação. Incluindo o atendimento em clínica ginecológica,
climatério, planejamento familiar, pré-natal, atenção ao parto, puerpério, câncer de colo de
útero, de mama, tratamento das infecções por doenças sexualmente transmissíveis e outros
problemas que afetam a saúde da mulher (BRASIL, 2004).
Portanto, pode-se considerar que desde a década de 80 ocorre um movimento social
pela humanização do parto e nascimento no Brasil. Época marcada pela criação de
associações do tipo não-governamental e redes de movimentos identificadas com a crítica ao
modelo hegemônico de atenção ao parto e nascimento, como a Rede de Humanização do
Parto e do Nascimento – Rehuna (TORNQUIST, 2002).
Os movimentos sociais principalmente os de caráter não-governamentais, propuseram
políticas públicas e utilizaram o termo humanização da assistência à gravidez e ao parto.
Atualmente, reivindicam as dimensões emocionais e sociais da maternidade, alegando que a
gravidez não acontece apenas na barriga da mulher. O modelo médico que trata o parto como
um evento patológico e arriscado que utiliza uma tecnologia agressiva, invasiva e
potencialmente perigosa é questionado, quando utilizado inadequadamente (REDE
NACIONAL FEMINISTA DE SAÚDE, 2002).
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O modelo medicalizado do parto trouxe inúmeras discussões ganhando impulso
quando no ano 1985, em Fortaleza-Ceará, representantes e convidados da Organização
Mundial de Saúde (OMS), da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), reuniram-se e
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também a prática do alojamento conjunto e o incentivo ao aleitamento materno sobre livre
demanda (UNICEF... 2007).
No Brasil, em 1995, lança-se o Projeto Maternidade Segura vinculado ao Ministério
da Saúde, a Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASCO),
a OMS, UNICEF e OPAS, com o objetivo de melhorar a qualidade da assistência obstétrica e
reduzir a mortalidade materna e perinatal. São propostos oito passos para atingir esses
objetivos (BRASIL, 1996), descritos abaixo:
Garantir informações sobre saúde reprodutiva e direito da mulher;
Garantir assistência à gravidez, parto, puerpério e ao planejamento familiar;
Incentivar o parto normal e humanizado;
Ter rotinas escritas para normatizar à assistência;
Treinar toda a equipe de saúde para implementar estas rotinas;
Possuir infra-estrutura adequada de atendimento;
Possuir arquivo e sistema de informação;
Avaliar, periodicamente, os indicadores de saúde materna e perinatal.
Essa corrente, a favor de uma nova prática obstétrica, teve um importante reforço
político e técnico no ano de 1996, quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou
um guia para a assistência ao parto normal. As recomendações preconizadas são baseadas em
evidências científicas com o objetivo de garantir os direitos das mulheres, diminuir as
intervenções desnecessárias e de promover partos e nascimentos saudáveis, prevenindo a
mortalidade materna e perinatal. Esse guia foi traduzido para o português configurando o
manual técnico do Ministério da Saúde com o tulo de Assistência ao parto normal, um guia
prático (SERRUYA; LAGO; CECATTI, 2004).
Em 2000, nessa mesma direção, surge o Programa de Humanização do Pré-Natal e
Nascimento (PHPN), instituído pelo Ministério da Saúde pela portaria nº. 569, que
regulamenta a humanização na assistência e prevê o direito ao acompanhante, 24 horas, na
rede hospitalar. Outras estratégias também estão em andamento com o objetivo de promover
a melhoria da assistência obstétrica, dar melhores condições de acesso ao serviço e maior
cobertura e qualidade da atenção, com vistas a reduzir a morbidade e mortalidade materna e
perinatal (BRASIL, 2001 b).
As propostas
da humanização do parto pretendem torná-lo como sendo da natureza
fisiológica e cultural da mulher. Nesse momento, ela necessita mais de um apoio afetivo do
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que intervenções médicas, resgatando a posição central da mulher no processo de parto e
nascimento. Para isso é necessário promover a democratização das relações de poder entre os
profissionais de saúde e usuários, através do acolhimento e do cuidado integral, atendendo às
necessidades psíquicas, culturais e sociais das gestantes, por meio da comunicação nas ações
de cuidado (PEREIRA, et al, 2007).
É importante dizer que o Ministério da Saúde e a sua equipe técnica utilizam o termo
humanização, com o propósito de melhorar as condições do atendimento, levar o profissional
a valorizar não apenas o que viu e palpou, mas o que ouviu da mulher e reconhecer a
importância da participação da família durante a gestação, o parto e pós-parto (CASTRO;
CLAPIS, 2005). Assim, uma assistência humanizada depende de uma boa comunicação
estabelecida por meio de uma relação empática, entre o profissional de saúde e a gestante,
meios pelos quais necessidades, anseios, temores e dúvidas podem ser identificados.
Nesse sentido, a humanização depende da capacidade de falar e de saber ouvir. O
diálogo não é apenas uma técnica de comunicação verbal, mas um meio de conhecer e
compreender o outro. Dessa maneira, humanizar a assistência implica em escutar o usuário,
profissionais de saúde, construindo uma rede de diálogo que promova uma relação de
confiança através do acolhimento para que as mulheres se sintam seguras, favorecendo as
ações de humanização (OLIVEIRA; COLLET; VIEIRA, 2006). O acolhimento como
estratégia do SUS busca reorganizar o processo de trabalho nas unidades de saúde,
melhorando o acesso dos usuários aos serviços de saúde e humanizando as relações entre
profissionais e clientes, numa abordagem que contemple não apenas a dimensão biológica,
mas também a psicológica, social e cultural.
A partir da transformação das relações entre os sujeitos é que as práticas de saúde
efetivamente podem ser alteradas, com a utilização das “tecnologias relacionais”, do emprego
da escuta, do acolhimento, do diálogo e da negociação para a produção e gestão do cuidado,
que irá favorecer a relação pessoal (DESLANDES, 2005). No entanto, para mudar as práticas
de saúde é necessário cuidar de quem cuida, através da valorização dos profissionais,
promovendo educação permanente, luta por melhores condições de trabalho, melhoria dos
salários, modificações das intervenções cristalizadas e não democráticas ou de pouca
responsabilidade e a exclusão da manutenção dos privilégios a algumas categorias. Isso
envolve mudanças comportamentais que quase sempre geram medo, insegurança e
resistência (BENEVIDES; PASSOS, 2005).
O processo de humanização depende do aperfeiçoamento do sistema de gestão
compartilhada, estratégias que aumentem o poder do usuário perante a autoridade do saber e
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das práticas médicas, valorização da presença do acompanhante, modificação das normas dos
hospitais, garantindo os direitos dos usuários e a aplicação de medidas preventivas que
dificultem o abuso de poder nas instituições. Nessa perspectiva, a humanização propõe
mudanças estruturais e organizacionais nos serviços de saúde, como também nas atitudes dos
profissionais, fazendo-os reconhecer que trabalham com pessoas e, assim como eles,
possuem desejos e interesses que devem ser respeitados. Reforma na tradição médica e
epidemiológica se faz necessário, para que consiga combinar objetivação científica no
processo saúde-doença e na intervenção com a participação do indivíduo como sujeito e não
como objeto (CAMPOS, 2005).
A política de humanização tem um grande desafio, produzir práticas humanizadas
numa sociedade fortemente marcada por profundas formas de injustiças sociais e de violência
urbana, na qual a população brasileira está submetida em seu cotidiano (GASTALDO, 2005).
Sem dúvida existe um longo caminho a ser percorrido até chegar a uma assistência de
qualidade, tanto no que se refere à adequação da técnica como na questão da relação pessoal.
Esse caminho passa pelos direitos de cidadania dos usuários dos serviços de saúde e pelas
condições de trabalho dos profissionais (RATTNER, 2005).
O movimento social pela humanização pretende transformar o modo de pensar e de
fazer no campo da prática da saúde. São as universidades os espaços sociais responsáveis pela
produção, reprodução e transformação dos modos de pensar e de fazer. Por isso, a formação
dos profissionais de saúde deve resgatar o respeito à vida humana, considerando os aspectos
sociais, culturais, éticos e emocionais dos clientes (PEREIRA, et al, 2007). A atuação do
profissional de saúde é fundamental, pois é importante que ele respeite a fisiologia feminina,
que as intervenções sejam utilizadas somente quando necessárias, bem como a garantia do
direito da mulher em ter um acompanhante de sua escolha ao seu lado durante todo o trabalho
de parto (DIAS; DOMINGUES, 2005).
O conceito de humanização na assistência ao parto envolve questões relacionadas à
mudança na cultura hospitalar, no sentido de oferecer uma assistência que realmente atenda
às necessidades das parturientes e de sua família. Isto implica em modificações na estrutura
física, tornando o ambiente hospitalar mais acolhedor e favorável à realização das práticas
que humanizem os cuidados. Nesse cenário, as doulas criam espaço de escuta, proporcionam
interação e acolhimento, contribuindo para o parto humanizado, para que a experiência
natural do parto fora do contexto domiciliar seja um ritual mais próximo do familiar,
integrado aos recursos tecnológicos e de competência humano-científico, com acolhimento e
respeito (REIS; PATRÍCIO, 2005).
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Portanto, para uma política de atenção integral à saúde da mulher, o Ministério da
Saúde utiliza como princípios básicos a humanização e a qualificação da assistência para que
as ações de saúde sejam traduzidas no atendimento das suas necessidades, na capacidade de
resolutibilidade e satisfação na promoção da saúde. Nesse sentido, a mulher deve ser
considerada como um ser único, complexo, com sentimentos e autonomia, enquanto isso os
profissionais de saúde devem informar e dividir as decisões bem como as responsabilidades
junto a ela, equilibrando a tecnologia e o humanismo, abertos a outras práticas que enfoquem
a prevenção (SERRUYA; LAGO; CECATTI, 2004)
2.3 Doulas no contexto do cuidado à mulher
A Política de Humanização foi instituída como política pública com o propósito de
promover a integralidade das ações de saúde nos serviços de assistência da rede do Sistema
Único de Saúde (SUS), através da valorização de novas tecnologias, associação de saberes e
práticas acolhedoras. Uma dessas propostas para humanizar o parto e nascimento, surge nas
maternidades brasileiras com o Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias, mulheres que
dão suporte físico, psicológico e afetivo as parturientes.
O parto é um momento esperado pela gestante e seus familiares. É repleto de
significado construído culturalmente. As mulheres constroem suas expectativas em relação a
este acontecimento a partir de experiências anteriores, por meio de informações vinculadas
nos principais veículos de comunicação e principalmente nas conversas com outras mulheres.
Por isso, o apoio afetivo é muito importante, pois a parturiente ao chegar à maternidade traz
uma história cultural, familiar, pessoal e única que influenciará no curso do seu processo de
parto e nascimento. Por isso, o primeiro contato com alguém da instituição que transmita um
olhar amável, um sorriso, palavras e gestos terão um efeito positivo no seu parto (ODENT,
2002).
Dada à importância cultural, as meninas crescem atemorizadas com a idéia do parto,
pois ouvem diversos comentários de suas mães, tias, vizinhas e avós, sobre o grande
sofrimento deste acontecimento. Este medo a acompanha, freqüentemente, até o momento do
seu parto, podendo dificultar o nascimento da criança ou trazer-lhe complicações. Assim,
esse sentimento que carrega pode ser amenizado com a presença do companheiro, de uma
pessoa querida ou de uma doula transmitindo paciência, carinho e força, ajudando-a a relaxar
e a viver esta experiência como um momento de amor. Dessa maneira, parir não é apenas um
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acontecimento fisiológico, existem aspectos que não são controlados cientificamente. Mesmo
com toda a evolução da tecnologia, um momento no parto em que a mulher deve se
entregar, viver seu medo de morrer e morrer para renascer” (grifos do autor)
(RODRIGUES, 1997).
Alguns fatores podem aumentar a percepção da dor durante o processo de parturição
entre eles o medo, o estresse, a solidão, o desamparo social e afetivo, a desinformação sobre
o que está acontecendo, o início das contrações e o ambiente estranho em que a mulher se
encontra. Buscando minimizar essa situação e incentivar o processo de humanização do
nascimento, nas maternidades brasileiras, os órgãos responsáveis têm publicado, nos últimos
anos, diversas portarias e manuais de orientações. Essas publicações incluem incentivo ao
parto natural, presença de familiares com a parturiente durante o processo de parto e
nascimento, adaptação do ambiente hospitalar próximo do ambiente familiar, estímulo ao
alojamento conjunto, acompanhamento da parturiente pelas doulas que oferecem apoio físico
e emocional (LEÃO; OLIVEIRA, 2006). É importante ressaltar que auxiliar uma mulher em
situação de parturição envolve empatia, intuição e amor, pois as parturientes se encontram
num estado físico e emocional bastante vulnerável e facilmente tornam-se dependentes da sua
assistente de parto por algum tempo (ODENT, 2002).
Para atender essa necessidade, em 17 de março de 1999, foi promulgada a Lei nº.
10.241 que no seu parágrafo XVI, assegura a presença do companheiro nos pré-natais e no
momento do parto (BRASIL, 2007 b). Finalmente, em 7 de abril de 2005, a Lei n°. 11.108
altera a lei 8080, de 19 de setembro de 1990, que determinou aos serviços de saúde do
Sistema Único de Saúde (SUS) e da rede própria ou conveniada, permitir a presença de um
acompanhante com a parturiente durante o processo de parto, nascimento e pós-parto
imediato. A mulher, nessa fase importante de sua vida, pode ser acompanhada não pelo
parceiro ou qualquer pessoa de sua confiança, mas também por uma doula (BRASIL, 2007
a).
O apoio oferecido pelo acompanhante de escolha da parturiente e pela doula se
complementa. Quando esta pessoa compartilha um laço emocional é mais difícil manter-se
calmo e alheio aos desconfortos sentido pela mulher. Neste momento, uma doula experiente e
cuidadosa pode calmamente ajudar esta mulher a lidar com o seu parto, ensinando-a como
ficar confortavelmente relaxada. Representa também uma presença tranqüilizante ao
acompanhante. A doula oferece um nível de apoio diferente da pessoa que está intimamente
relacionada com a mulher em processo de parto e nascimento (KLAUS, Marshall;
KENNELL, John; KLAUS, Phyllis, 2002).
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A palavra "doula" vem do grego, "mulher que serve". Mundialmente este nome aplica-
se às mulheres que dão suporte físico e emocional a outras mulheres, antes, durante e após o
parto. No Brasil, chegou a ser cogitado chamá-las de comadres, porque na maioria das vezes,
quem exercia a função de doula eram as comadres, dispostas a auxiliar a mãe de seus
afilhados durante o parto e nascimento. Esse nome não foi adotado, pois poderia causar
confusão (FADYNHA, 2003). Sobre esse apoio Leão (2000, p.09) esclarece que
em nossa cultura facilmente identificamos a atuação da doula.
Tradicionalmente, sempre que uma mulher tem filhos, outras mulheres, que
geralmente já são mães, ajudam a nova mãe a desempenhar seu papel. Essas
mulheres são mães, avós, irmãs, sogras ou vizinhas e amigas.
Na opinião de Odent (2003, p.142) “a doula pode ser vista como uma figura materna
em que a futura mãe se apóia durante todo o trabalho de parto”. O mesmo autor afirma ter
sido na década de 70 que esta palavra, de origem grega, apareceu como a presença de uma
companheira no momento do parto e nascimento. No entanto, a palavra doula foi resgatada,
primeiramente, por Dana Raphael, antropóloga americana, estudiosa da prática do
aleitamento materno, para referir-se a uma experiente companheira de parto que fornece à
mulher, ao seu marido ou acompanhante suporte emocional e físico durante todo o processo
de parto e nascimento inclusive no puerpério (KLAUS, Marshall; KENNELL, John; KLAUS,
Phyllis, 2002).
A Organização Mundial de Saúde, no guia de Assistência ao Parto Normal: um guia
prático (1996), se refere à doula como uma prestadora de serviços que recebeu um
treinamento básico sobre parto e que está familiarizada com uma ampla variedade de
procedimentos de assistência. Fornece apoio emocional, medidas para proporcionar o
conforto materno, contato físico, esclarecimentos sobre o que está acontecendo durante o
processo de parto e nascimento, uma presença amiga, constante.
O Ministério da Saúde em sua publicação, Parto, Aborto e Puerpério Assistência
Humanizada à Mulher (BRASIL, 2001 a), define doula como uma acompanhante treinada
que além do apoio emocional, deve fornecer informações à parturiente sobre todo o
desenrolar do processo de parto e nascimento, esclarecendo-a quanto às intervenções e
procedimentos, para que a mesma possa participar de fato das decisões acerca das condutas a
serem tomadas neste momento.
É importante ressaltar que não se deve confundir a função da doula com a da equipe
de enfermagem ou da enfermeira obstetra. Essas profissionais estão preocupadas com várias
mulheres em situação de parturição, acontecendo ao mesmo tempo. Assim, a doula ajuda no
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processo de cuidar melhorando o conforto físico e emocional das parturientes (GRUPO DE
APOIO À MATERNIDADE ATIVA, [2006?]).
Entretanto o papel da doula e da enfermeira obstetra se complementam no sentido de
que ambas podem fornecer informações sobre a evolução do parto. A doula é uma parceira
dos profissionais no cuidado à mulher durante o processo de parto e nascimento. Ela recebe
treinamento sobre o processo de parto e nascimento, desenvolve uma relação mais íntima
com a gestante, criando e fortalecendo vínculos com seus familiares e a comunidade,
enquanto a enfermeira, preocupada com os procedimentos, rotinas e protocolos do hospital,
tem dificuldade de manter um vínculo afetivo e duradouro com as parturientes.
Deve-se deixar claro que a doula não executa qualquer procedimento técnico, nem
realiza exames, não interfere na atividade médica ou da equipe de enfermagem, não discute
procedimentos com as equipes ou questiona decisões, não cuida da saúde do recém-nascido e
nem substitui o pai ou acompanhante escolhido pela mulher. A sua função é estar ao lado da
parturiente cuidando do seu bem estar físico e emocional.
No Brasil, alguns estudos comprovam a importância das doulas, ao lado da mulher,
durante o processo de parto e nascimento. Leão (2000, p.34) em seu trabalho etnográfico,
sobre parturientes acompanhadas por doulas, conclui que “o suporte intraparto é considerado,
no modelo holístico de assistência ao parto, um elemento fundamental para a saúde emocional
da mulher, contribuindo para o alívio da dor e intervenções obstétricas desnecessárias”.
De acordo com Leão; Oliveira (2006), as doulas atendem às necessidades e carências
das parturientes. Desenvolvem suas atividades acalmando, transmitindo segurança e
confiança às mulheres em processo de parto. Esses benefícios da assistência prestada pelas
doulas se justificam pelo fato delas não terem que assumir decisões e nem prestar cuidados a
outras mulheres, podendo dedicar todo o seu tempo para uma única parturiente.
Durante o parto, a doula funciona como uma interface entre a equipe de saúde e o
casal. Fala em uma linguagem acessível das técnicas, dos procedimentos hospitalares e
atenua a eventual frieza da equipe num dos momentos mais vulneráveis da vida da mulher.
Ela ajuda a parturiente a encontrar posições mais confortáveis para o processo de parto e
nascimento, mostra formas eficientes de respiração e propõe medidas naturais que possam
aliviar as dores, como banhos, massagens nas costas, relaxamento e ao segurar na mão da
parturiente oferece confiança e carinho (GRUPO DE APOIO À MATERNIDADE ATIVA,
[2006?]).
A presença da doula no cuidado à mulher em situação de parturição significa alívio da
dor, apoio, coragem amor e paz. Desenvolve uma escuta ativa, aprende a ser mais receptiva e
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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deixa a mulher falar quando sente necessidade, ela fala com o toque, com as atitudes, com o
olhar e principalmente com o cuidado. Assim sendo, promove autoconfiança, estimula a
auto-estima da mulher, fazendo-a acreditar na sua capacidade. Para isso, a doula se amolda
ao momento, estando plenamente integrada com os sentimentos da parturiente e respeitando a
vontade de cada mulher. Este clima de acolhimento e respeito representa segurança e
coragem para a parturiente (FADYNHA, 2005).
Essa mudança do modelo de assistência ao parto, instituído com o conceito de parto
humanizado incentiva à participação da comunidade para exercer o controle social nos
serviços de atenção à saúde da mulher (RECIFE, 2005). A expressão controle social é tratada
na sociologia como sendo a influência da sociedade sobre o indivíduo. Na política de saúde
brasileira foi o resultado do processo da democratização do país e pressuposto para a
consolidação dessa democracia. Controle social é a intervenção da sociedade nas ações do
Estado e a participação da comunidade nos serviços públicos de saúde garantido na
Constituição Federal Brasileira como diretriz do Sistema Único de Saúde (SUS) (CORREIA,
2000).
A presença das doulas, nos serviços de saúde, representa a participação popular no
SUS, assegurado pela Constituição Federal. Inserida na perspectiva do controle social não
como uma fiscal das condutas e procedimentos realizados pelos profissionais, mas na
condição de participar de um espaço público, democrático contribuindo e ajudando para
modificar as políticas de assistência à saúde da mulher.
As doulas no pré-parto criam espaço de escuta, interação, construção de vínculos que
promove o acolhimento. Essa postura acolhedora que desenvolvem é mantida por uma
abordagem integral, a partir de parâmetros humanitários. A relação de cuidado que elas
estabelecem com a mulher, durante o processo de parto e nascimento, é guiado pela
confiança e respeito. Segundo Boff (2001), o mundo é construído a partir dos laços afetivos
entre os seres humanos, fazendo com que as pessoas e algumas situações tenham sentido e
valor. Esse significado desperta o sentimento de cuidar. O cuidado pode ser expresso numa
atitude de solicitude, de atenção, dedicação e preocupação para com o outro.
Portanto cuidar é mais do que um ato é uma atitude. É um momento de atenção, zelo e
dedicação. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, responsabilidade e
envolvimento afetivo com o outro. É um modo de ser fundamental, em que a pessoa sai de si
e concentra-se na outra com desvelo e solicitude. O cuidado sempre acompanhará o ser
humano, pois este nunca deixará de se preocupar e de amar alguém (BOFF, 1999).
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Nesse contexto, o maior desafio para os profissionais de saúde é oferecer um cuidado
humano, ético e solidário às pessoas, ou seja, cuidar do ser humano na sua integralidade,
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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cartesianas, apreendidas ao longo de sua formação profissional, que dificulta o entendimento
da interação entre corpo e mente (WALDOW, 2004). Na história do “Pequeno Príncipe”
encontramos a celebre frase “Só se bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos”
(SAINT-EXUPÉRY, 2006 p.72).
No Brasil, existem dois tipos de acompanhantes de parto, a doula profissional
contratada individualmente pela gestante e a doula voluntária ou comunitária que poderá ter
qualquer profissão. As voluntárias geralmente pertencem à comunidade próxima as
maternidades, são selecionadas através de uma entrevista e capacitadas por uma equipe
multiprofissional da unidade. Submetem-se a estágio probatório por um período de 30 dias,
podendo ser integrada efetivamente, ao Programa, depois de cumpridas todas as etapas. Elas
recebem vale transporte, alimentação durante as 1.20151(a295585(n)-0.585(r)2.804.3911 0 Td[hp)-0.295585(o)-0.295585(r)2.80439(a)3.74(s)-1.2312( )-80.1938(d)-0.295585(e)3.74( )-80.1938(p)-0.295585(l)-2.16436(a)3.74(n)-0.295585(t)-2.16436(ã)3.74(o)-10.3015( )-80.1938(s)-1.2312(e)3.74(m)-12.4659(a)3.74(n)-0.295585(a)3.74(l)-2.16436(,)-0.146571( )-80.1938bnata e crach
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Assim, a sociedade passa de agente passivo a agente transformador, que através de
pequenas ações cotidianas pode melhorar a qualidade de vida dos mais carentes. Esse novo
voluntariado também oferece a oportunidade de novas experiências, de aprendizado, criação
de vínculos e o prazer de sentir-se útil. No entanto, é uma realidade pouco visível e
valorizada no país, que precisa criar condições para aproveitar este potencial de
solidariedade, transformando necessidades sociais em oportunidades de ação voluntária
(IDAC-VOLUNTARIADO, 2007).
O trabalho voluntário é entendido como uma doação de tempo, trabalho e talento com
finalidade de desenvolver ações de interesse social e comunitário. Sempre esteve presente na
sociedade brasileira, porém historicamente ficou restrito ao ambiente religioso e motivado
pelos valores da caridade, compaixão e amor ao próximo. Atualmente, este conceito passa
por um processo de transformação e revalorização. O voluntariado de hoje é resultado do
encontro da solidariedade com a cidadania, porém não substitui o Estado no seu
compromisso público, nem vai de encontro ao trabalho remunerado (IDAC-
VOLUNTARIADO, 2007).
A solidariedade é um valor próprio da pessoa humana, independe de crenças,
religiões, nível de escolaridade ou condição social. Podendo realizar mudanças políticos
sociais por meio de grupos organizados, voluntários preocupados em construir uma sociedade
comprometida com o bem-estar de seus membros e um Estado com maior participação dos
cidadãos nas decisões de interesse coletivo. O voluntariado é uma forma de apoio às
atividades relacionadas com a organização e o bem-estar social (SELLI; GARRAFA, 2006).
O ato solidário é uma virtude orientada para o bem de todos e presente nas atividades
existentes do voluntariado. É uma expressão de grande gratuidade e de consciência para com
o outro carente, financeira ou emocionalmente, visto como último na escala social e cultural
(BARONIO, 2003). Promove a reintegração dos excluídos por meio de estratégias públicas
ou privadas, motivando as pessoas a participarem da vida social. Mobilizam sentimentos,
produzindo força, vontade e determinação para enfrentar os desafios culturais, raciais, sociais
e religiosos que surgem no caminho para a construção de uma sociedade mais justa e
solidária (CACCIARI; MARTINI, 2003). Utilizam os conhecimentos da informação, da
tecnologia e dos meios de comunicação, como instrumentos para a construção de um novo
saber, onde os conhecimentos científicos e populares unem-se para transformar a realidade,
criando novas experiências (BAVARESCO, 2004).
No Brasil, o trabalho das doulas voluntárias foi iniciado no Hospital Sofia Feldman,
em Belo Horizonte, no ano de 1997, referência para a capacitação de doulas. No hospital
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Santa Marcelina, em São Paulo, no ano de 2000, e nas maternidades públicas do Rio de
Janeiro com o surgimento do grupo Amigas da Luz, em 2002, quando as voluntárias deste
grupo atuaram na maternidade Leila Diniz (FADYNHA, 2003).
Na Cidade de Recife, no Estado de Pernambuco, a Prefeitura implantou nas três
maternidades municipais o Programa Doula Comunitária Voluntária. Em 2002, na Policlínica
e Maternidade Professor Barros Lima, pioneiro na região Nordeste. Em 2003, na
Maternidade Professor Bandeira Filho e em 2004, na Policlínica e Maternidade Professor
Arnaldo Marques. Essa implantação ocorreu através de uma articulação entre o Ministério da
Saúde e a Prefeitura, juntamente com a Secretária de Saúde, por intermédio da Diretoria
Executiva de atenção à Saúde da Mulher, em parceria com a Coordenação do Voluntariado.
O Programa é de caráter voluntário e foi instituído pelo Decreto nº. 20.652 de 22 de setembro
de 2004, amparado pela Lei Municipal do Voluntariado n º 16.683/2001. O objetivo do
Programa é facilitar o processo de humanização da assistência durante o processo de parto,
nascimento e puerpério imediato (RECIFE, 2005).
Nesse decreto, que institui o Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias na cidade
de Recife-Pernambuco, em seu artigo segundo define as principais atribuições das doulas,
como sendo:
I - orientar os futuros pais e mães quanto ao parto;
II - monitorar, assistir e acompanhar as gestantes nas maternidades da rede pública municipal
de saúde;
II - cuidar do bem-estar físico e emocional das parturientes;
IV - relatar o acompanhamento que vem dispensado às mulheres por elas assistidas.
Os valores que norteiam o Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias, inserido
como proposta da Política de Humanização do Parto e Nascimento, visam promover a
autonomia e o protagonismo da mulher, estimular a responsabilidade compartilhada entre
profissionais e parturientes bem como o estabelecimento de vínculos solidários.
Recentemente, algumas revistas de vinculação nacional estão publicando artigos sobre
doulas, contribuindo para a divulgação dessa experiência na sociedade. Em 2003, na revista
Crescer em Família, foi dado destaque à participação da doula no momento do processo de
parto e nascimento, como uma nova personagem sem ser o médico ou a enfermeira obstetra,
para ajudar a parturiente, ensinando as melhores posições, realizando exercícios respiratórios,
massagens e ajudando com banhos. não executa procedimentos técnicos (BRANDÃO,
2003).
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Na revista Pais e Filhos, de março de 2007, uma matéria com o título “senhora do
parto” relata depoimentos de mulheres que procuraram as doulas com o objetivo de evitar
uma cesariana desnecessária. Propondo que investir nas doulas significa redução do número
de cesarianas, menor tempo de processo de parto e nascimento, menos pedidos de anestesia,
menor utilização de hormônios para induzir as contrações e redução no uso de fórceps,
segundo pesquisas desenvolvidas na Guatemala, Costa Rica e Canadá (TREVIZAN, 2007). A
revista Radis comunicação em saúde, publicou em abril de 2007 um artigo que descreve a
participação da doula como mulheres treinadas que ficam ao lado da parturiente solitária nas
maternidades que adotam a filosofia da humanização (UM MOMENTO..., 2007, p. 30-31).
No entanto, o maior desafio para a efetiva implantação desta atividade, nas salas de
pré-parto, se encontra ao nível do profissional de saúde, responsável direto pela assistência à
mulher em processo de parto e nascimento. Dessa maneira, esse espaço é considerado uma
arena de disputa de poderes entre médicos, enfermeiras, doulas e acompanhantes das
parturientes. Por essa razão, deve-se promover uma integração na atuação destes diferentes
profissionais e acompanhantes através do respeito entre as diversas práticas e saberes. Isso
seria uma das etapas para a qualificação da assistência. Como estratégias de sensibilizar os
profissionais os serviços deveriam estimular discussões sobre gênero, práticas rotineiras e as
preconizadas pela medicina baseada em evidências, bem como a visão de risco sobre o
evento fisiológico do parto (DIAS; DESLANDES, 2006).
Vale salientar que introduzir práticas terapêuticas não convencionais nos serviços de
saúde, centradas no indivíduo e seu cuidado com a perspectiva de promover a integralidade
na assistência, faz emergir valores sociais baseados na solidariedade e na fé. Contudo,
conquistar um espaço com tais práticas, num setor como o da saúde, em que a visão médica
técnico-científica é dominante, não é uma tarefa fácil. Os serviços de saúde são um cenário
vivo onde atuam diferentes atores sociais, desenvolvendo suas práticas e gerando diferentes
percepções sobre o cuidado. Para humanizar a assistência é preciso qualificar a atenção,
aprender a compartilhar saberes e reconhecer direitos. Nesse sentido é necessário mudar as
relações de poder entre profissionais, mulheres, acompanhantes, doulas, democratizando o
processo de trabalho na organização dos serviços de saúde, horizontalizando os saberes e as
práticas relativas aos cuidados, em particular, à mulher durante as fases do processo de parto
e nascimento (PINHEIRO; LUZ, 2003).
Promover a desconstrução de paradigmas hegemônicos na formação dos profissionais
de saúde consiste em modificar práticas e gicas culturais cristalizados num processo de
trabalho direcionado ao biológico e nas necessidades das instituições. As experiências de
____________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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humanização nos serviços de saúde, encontros científicos, trabalhos de pós-graduação, são
meios de fomentar o debate sobre a inclusão da necessidade de humanização, para garantir
uma assistência de qualidade centrada nas necessidades das mulheres (DIAS; DESLANDES,
2006).
O resultado do trabalho das doulas é que as parturientes sentem-se acolhidas por
estarem recebendo apoio, massagens, atenção e carinho, atitudes que não estão acostumadas
a receber, deixando lembranças positivas do parto. O papel principal da doula é ajudar a
resgatar o parto normal. A sua função é a mais antiga e presente desde os primórdios da
humanidade. Mesmo assim, não é fácil convencer o homem do século XXI, a incorporar o
antigo papel dessas mulheres nos ambientes hospitalares. Para auxiliar na mudança de
opinião, é indispensável que estudos sejam desenvolvidos para comprovar os benefícios do
trabalho das doulas.
As doulas praticam a humanização, pois oferecem carinho, amor, colocam a
parturiente para movimentar-se, que comprovadamente auxilia no processo de parto e
nascimento e ajudam à mulher a encontrar uma posição mais confortável, proporcionando
mais liberdade, dignidade e afeto. As parturientes são acolhidas pelas doulas, que são pessoas
que percebem o parto e nascimento como um momento único e como a expressão do mais
puro amor. Para Odent (2002, p. 82),
a maneira que nascemos têm conseqüências ao longo do tempo. Hoje em dia,
podemos afirmar que as civilizações são determinadas, moldadas pelas
condições de nascimento. Por isso, melhorar o primeiro contato que as
pessoas têm com as outras, no princípio de suas vidas, é um meio concreto
em que podemos agir para a humanização do mundo.
Existem várias razões para acreditar na assistência humanizada ao nascimento, tanto
do ponto de vista dos indicadores de morbidade e mortalidade como também nos aspectos
emocionais das mulheres que recebem apoio, segurança e amor, melhorando o seu bem-estar
durante o processo de parto e nascimento. Ao nível social contribui para a promoção da
cultura da paz, pois os nascimentos ocorrem num ambiente com respeito e acolhimento.
Culturalmente é uma possibilidade de resgate ao parto normal.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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“Na vida, como na caminhada, definimos a nós
mesmos pelas escolhas que fazemos.”
(Malcolm Montgomery)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006.
___3 Delineando o Caminho Metodológico
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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3.1 A escolha do paradigma metodológico: a História Oral à Luz de Meihy
Para revelar os motivos que levaram as mulheres a se tornar doulas, conhecer suas
atividades no contexto hospitalar, bem como identificar os desafios que encontram durante o
desenvolvimento de suas atividade em uma maternidade, optou-se pela abordagem
qualitativa.
A pesquisa qualitativa preocupa-se essencialmente com os significados e percepções
motivos, valores, atitudes e crenças, ou seja, privilegia os aspectos subjetivos das doulas,
contribuindo para uma reflexão crítica de suas atividades (MATHEUS; FUSTINONI, 2006).
Esses significados manifestaram-se por meio das produções verbais das experiências pessoais
das doulas, tendo o ambiente natural como fonte direta da construção do material empírico e
o pesquisador como instrumento-chave da pesquisa (TRIVINÕS, 1987).
A abordagem qualitativa também busca aprofundar o caráter social, os atos e as
relações que envolvem construções humanas, que se encontram no plano subjetivo
(MINAYO, 1993). Por esse motivo, houve a escolha dessa abordagem, visto que se explora o
universo de significados, aspirações, motivos e atitudes das doulas. Este interesse pela
pesquisa social deve-se à natureza do problema e o aprofundamento da temática. Tendo em
vista que a pesquisa social se preocupa como as pessoas, espontaneamente, se expressam e
falam sobre o que é importante para elas, o que pensam sobre suas ações e as dos outros
(BAUER; GASKELL, 2004).
Para valorizar esse universo qualitativo o caminho metodológico que guiou a pesquisa
foi a História Oral Temática, uma das modalidades da História Oral. Para Meihy (2005), a
História Oral é um processo sistêmico de uso de depoimentos, vertidos do oral para o escrito,
para serem recolhidos testemunhos, analisarem-se processos sociais, favorecendo estudos de
identidade e memória cultural. Oferece também a possibilidade de compreensão de
fenômenos na perspectiva da doula inserida no seu contexto de vida e em sua realidade
(DIAS, 2002).
A História Oral é um caminho de pesquisa que visa o estudo e o registro de
acontecimentos, experiências vividas, história de vida, de temas históricos e contemporâneos.
Tem como principal técnica de coleta para a construção do material empírico, a entrevista.
Na opinião de Brêtas (2006, p. 67-68),
história oral é um método utilizado para a formulação de documentação
histórica e para a reflexão social. A fonte de dados da história oral é obtida
do ser humano, mas o se esgota nele, uma vez que aponta para a
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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sociedade, pois através da narrativa do indivíduo sobre a realidade por ele
vivenciada, podem-se apreender as relações sociais em sua totalidade.
Nesse sentido, a história oral é construída a partir das pessoas. O que possibilita novas
versões da história, ao dar voz a diferentes narradores. Assim, a história oral não é neutra é
então o resultado das contradições e conflitos de classe social, geração, gênero, raça / etnia,
entre outros fatores da experiência da vida humana (BRÊTAS, 2006). Segundo Caldas (1999,
p.69), “história oral como método é um meio de incorporar, decompor, sintetizar,
compreender, criar, interpretar, destruir e recriar criticamente uma determinada realidade”.
Desse modo, proporcionam uma orientação para a criação, conhecimento e
consciência do presente. Portanto, esse método não é dogmático, ou de aplicação geral, ou
universalmente como um sistema mecânico, técnico ou científico, mas, apresenta uma
perspectiva de estabelecer um diálogo, apreensão, compreensão, reconstrução, imaginação,
criação de realidades, políticas, experiências, falas e vida.
Para Meihy (2005, p. 17), “é difícil estabelecer um conceito fechado de história oral,
pois essa prática, além de renovada pelo uso dos aparelhos eletrônicos é dinâmica e criativa”.
O autor destaca que a história oral é uma prática de apreensão de narrativas feitas através do
uso de meios eletrônicos destinados a recolher testemunhos, promover análises de processos
sociais do presente e facilitar o conhecimento do meio imediato.
Existem três modalidades de História Oral, dependendo do conteúdo que será
trabalhado nas entrevistas. Sendo assim é classificada por Meihy (2005), em História Oral de
Vida, que constitui a narrativa do conjunto de experiência de vida de uma pessoa; Tradição
Oral, a qual trabalha com a permanência dos mitos e com a visão de mundo das comunidades
que têm valores filtrados por estruturas mentais, asseguradas em referências ao passado
remoto e a História Oral Temática, cujo compromisso é esclarecer a opinião do narrador
sobre algum evento definido.
Esta pesquisa insere-se na perspectiva da História Oral Temática, que se trata de
um tema específico com o compromisso de revelar o motivo pelos quais as mulheres se
tornaram doulas, conhecer as suas atividades no cuidado à mulher em trabalho de parto e os
desafios que encontram na maternidade.
Dessa maneira, por ser considerada a narrativa da versão de um fato, pretende,
portanto buscar a verdade de quem presenciou um acontecimento ou que dele tenha alguma
opinião que seja possível estabelecer uma discussão. Essa é a característica que a diferencia
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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da história oral de vida, pois os detalhes das histórias pessoais do narrador só interessam caso
revele aspectos que sejam úteis à informação temática central (MEIHY 2005).
Ainda para Meihy (2005), na história oral temática é admitido uso de uma ficha
técnica contendo questões de coorte consideradas fundamental para a descoberta dos detalhes
procurados, podendo ser diretos e indutivos ou indiretos e dedutivos. O colaborador pode
solicitar essa ficha com antecedência, não nenhum problema em fornecê-la, desde que
esse procedimento seja realizado com todos os participantes.
Para a construção do documento oral, o método da história oral preconiza uma série
de procedimentos seqüenciados, como a elaboração do projeto, definição dos depoentes, a
coleta do material empírico utilizando a técnica de entrevista seguida das fases de transcrição,
textualização, transcriação, conferência e discussão do material produzido.
Os depoentes que fizeram parte do estudo foram selecionados a partir da colônia e da
formação de rede. A colônia é definida segundo elementos amplos que marcam a identidade
cultural do grupo a ser estudado, relacionado com o tema do estudo. Enquanto que a rede é
uma subdivisão da colônia com a finalidade de estabelecer parâmetros para decidir sobre
quem deve e quem não deve entrevistar (MEIHY, 2005).
Nesta pesquisa, a colônia foi constituída das doulas que fazem parte da equipe de uma
maternidade pública municipal na cidade de Recife-Pernambuco, que cuidam das mulheres
durante o processo de parto e nascimento na sala de pré-parto. A rede foi composta pelas
doulas que aceitaram participar do estudo. Em princípio, a maternidade contava com 13
doulas voluntárias, sendo que duas saíram do Programa, restando 11 na unidade em que o
estudo foi desenvolvido.
O termo colaborador(a), segundo Meihy (2005), é dado ao depoente, considerado o
individuo primordial, com plena liberdade para dissertar, o mais livremente possível, sobre a
sua experiência pessoal. Na definição de Dias (2002), colaborador(a) é um termo empregado
ao depoente, que tem o papel ativo na história oral, deixa de ser mero informante, ator ou
objeto da pesquisa, tornando-se o sujeito principal. Essa definição é importante para
estabelecer uma relação de compromisso entre o entrevistador e o entrevistado.
Como pesquisadora, ao trabalhar com história oral, houve um grande respeito pelas
colaboradoras, por suas opiniões, atitudes, posições e visão de mundo. Para Alberti (2005), é
esta visão a de mundo que norteará o seu depoimento e produzirá os significados dos fatos e
acontecimentos narrados. O depoimento é individual e particular àquela pessoa, mas
constituirá também elemento fundamental para o entendimento da história do grupo.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Este estudo foi realizado em uma maternidade pública municipal, situada na Cidade
de Recife, no Estado de Pernambuco, fundada em 14 de outubro de 1945. Considerada de
médio e baixo risco, pioneira no serviço de assistência humanizada à mulher, detentora do IV
Prêmio Professor Galba Araújo e considerado Hospital Amigo da Criança. Que atende uma
população residente no grande Recife e região metropolitana.
A pesquisa foi orientada pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que
dispõe sobre as diretrizes e normas que regulamentam as pesquisas envolvendo seres
humanos. Inicialmente, o estudo foi submetido ao Colegiado do Programa de Pós-Graduação
em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba e, após sua aprovação, encaminhado à
Comissão de Ética e Pesquisa para apreciação e emissão da certidão de aprovação (Anexo
A).
Meihy (2005), propõe que os projetos de história oral sejam guiados por perguntas de
coorte, definidas como questões norteadoras que perpassam todas as entrevistas e devem
estar relacionadas ao grupo analisado.
As entrevistas foram conduzidas pelas seguintes perguntas de coorte, que
acompanharam este estudo: Como a senhora se tornou doula? Como a senhora cuida da
mulher durante o processo de parto e nascimento? Quais os desafios que a senhora encontra
na maternidade para desenvolver sua prática?
Para a construção do material empírico, foram utilizadas as entrevistas individuais
com o auxilio de um gravador e de um caderno de campo. Segundo Meihy (2005), é no
caderno de campo onde se registra as observações do andamento do projeto e das entrevistas,
contribuindo para a construção do material empírico.
3.2 A entrevista
O método da história oral utiliza a técnica da entrevista para dar voz à memória dos
colaboradores. É por meio dos depoimentos que se constrói e preserva a memória coletiva.
Entrevistar é a arte de saber ouvir.
Essa técnica constitui uma maneira privilegiada para obtenção de informações, pois,
possibilita a fala como reveladora das condições estruturais de sistemas de valores, normas e
símbolos. Podem ser únicas ou múltiplas; estimuladas ou não; diretivas ou não (com
perguntas, questionários ou sem); breves ou longas. Além disso, no ato da gravação deve
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ficar registrado que haverá uma conferência e que nada será publicado sem a autorização
prévia da colaboradora.
No intuito de serem alcançados os objetivos propostos, foram realizadas onze
entrevistas cujas perguntas tiveram como base as questões norteadoras. Depois de transcritas,
algumas entrevistas, sentiu-se a necessidade de retomar e realizar entrevistas de
aprofundamento, com a finalidade de viabilizar e esclarecer temáticas que surgiram na
primeira entrevista. Esse processo contou com a participação de nove colaboradoras. Assim
sendo, duas não fizeram parte do corpo empírico do estudo, pela impossibilidade de
participarem dessa fase de aprofundamento.
As entrevistas foram realizadas na própria maternidade, quando as colaboradoras
estavam de plantão em um ambiente reservado, como a sala das doulas, para que existisse
privacidade e pudessem manter uma relação mais estreita e de confiança. Assim, puderam
expor e expressar seus sentimentos livremente, sem serem interrompidas por outras pessoas
que não faziam parte da pesquisa.
Meihy (2005, p. 178), sugere que a primeira entrevista, a mais rica em elementos da
história em destaque, seja chamada de “ponto zero”, segundo esse autor
entende-se por ponto zero um depoente que conheça a história do grupo ou
com quem se queira fazer a entrevista central. Deve-se depois de tomar
ciência do que existe escrito sobre o caso, fazer uma ou mais entrevistas em
profundidade com esta pessoa, que é depositária da história grupal ou a
referência para história de outros parceiros.
Neste estudo, a entrevista ponto zero foi realizada com a colaboradora mais antiga no
serviço que tem o conhecimento da história do Programa desde sua implantação. O nome
fantasia escolhido para essa doula foi do anjo Zedekiel.
O limite do número de entrevistas foi estabelecido à medida em que os argumentos
começaram a ficar repetitivos. A participação do entrevistador, conforme Meihy (2005) deve
ser sempre estimuladora e nunca de confronto. O processo da entrevista consta de três etapas:
a pré-entrevista, a entrevista propriamente dita e a pós-entrevista.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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3.2.1 Etapas da entrevista
A pré-entrevista: corresponde ao preparo do encontro para a entrevista. Nessa etapa,
houve o encontro com as colaboradoras para que tomassem conhecimento do projeto, dos
objetivos, do tipo de técnica utilizada para a construção do material09()5.05337.80439(u)-0.293142()5.0531568()0.173186()0.173186(95(a)3.74(t)-2.16436(e)-.3.67518()3.53663()-1.11568().05702()-1.522()5871( 967518((e)-.3505702()-1.57-.3505702()-1.5759(o)-0.294974(u)-0.294974(v)-0.294974(e59(o)-0.290.29.11568()0.175009()5.34141(.4T95585(o)-0.295585( )-10255.271 0 Td[(t)-2.16436(85(o)-0.295585( )-102()8.27189()-6.6)-143g585(n)-0.295585(t)n585(n)-0.29d585(n)-0.29(s)]TJ237.1429972997(t)7.840-2.16558(i)-2.16558(p)-2997(t)7.8403.74(r)2.80( )-150.235-6.2659(a)3.741891(c)3.74(o)-0.295580.295585(o)-0.27(e)3.74(v)3.74(i)-2.167(d)-0.295585(o)85(u)-10.301539(a)3.740.29558.0531568( 3505702()-h1.2312( )-140.229(p)-10.3015(2997ás)]TJ237.142997i.74(r)2.80( )16558(i)-2.1655027 3505702()-v)3.74(i23(c.80439(u)-05702()-.0531568(9(a)3.74( )-70.1879(a)3.74( )-70.-80.1938(N)1.57564(e)3.74(s)-1.274(c)3.70.294974(o)-0.294 )-7974(e)3.74( )-140.230 0-6.66-0.29558-150.235(r)2.80439(e)3.74(p)-10.3015(a)3.7(e)3.74( ( )16558(i)-)-0.295585(d)-0.295585(e)-70.[(t)-2.1643es)]TJ237.14 0 T()0.173186(95(a)12.1703(r)2.80439(u)-0.293142g)9.713955237.14 0 Td[(t)-v29(t)-2.16436(o)-ç0531568()-2.16436(e)-6.265.(o)-0.2955)-140.2198.59794974(o)-0.29E)74(o.18610.301539(a)0.301539(a)10.1537(u)-0.29558146571( )-140.229(2997i.74(r)2.80585( )-140.229(p)-i.74(r)2.80s)-1.22997( )-140.)-2.16436(c)3.7-0.295585(m)-2.45995( )-150.236(a)-6.2659(167(d)-0.295585(o)( )-140.)-2.16436(c)3.7-0.295585(m)-2.4599(v)-0.294974(e59(o)-0.85(u)-10.3015(e)3.74(2.80439(i)-2.16436(a)3.74(l)-2.5(a)3.74( )-l)0.173186(95(a)0.3015(e)3.74(2.80439( )16558(i)-)-0.295585(d)-0.295585(e)-70.[(4( )-70.-80.193u )-140.)-2.16436(c)439(i)-2.16436(u85(d)-0.295585(e)-70.a0531568(9(a)3.70255.293142()5.0312(s)4.9195585(o)-0.36(c)439u5(m)-2.4599(v)-0.29497.80439(u)-0.293142[(4( )-70.-80.193u )-140.)-2.)-2.16558(i)-2.16558(z)t)-2.16436(e)-6.2659(r)2.80439585( )-140.229(p)-0.216558(i)-2.16550286(95(a)3.74(t)-2.16436(e)-.3.(i)-2.16436(a)3.74(l)-2.16436(09143g59.71276( )-10.1525(m)-2.45995(85( )-102554141(.4T95585(o)-0.2259(a)3.70255a053156346.295585( )-1905187)8.27189()-675009(229(167(d)-0.295585(o)es)]TJ237.145)n585(n)-0.29i.74(r)2.80v)3.74(i)-2.167(d)-)3.74(p)-10.3015(a))-0.295585(s5(o)0.2913.74-8.402910.299(a)3.74239(a)0.301539(a)10.1537(u)-0.2913.229(p)-0.216558(i)-)-0.295585-150.235(r)2.80-2.36(a)-6.2659(s)-1.22997( )-140(o.8-0.295585(o)-0.290.2913.h1.2312( )-140.229(p)-10u )-140.)-2.v3.74(p)-10.3015(a)0.290.29127.80439(u)-00.2913.-2.16558(z))3.74(p)-10.3015(a)9(a)3.74( )-70.1879(a)3-2.16558(z)f22()5871( 967518((e)-.3505-0.294 )-7ç0531568()-2.1643500333 0 0 887( )-RG887( )-r)-6.66218()8.27189()-6.66218()8.2.56 Tm[(3)-6.3339(7)50339 595.76 Tm[(3)-0.2Tm[()-6.66218()8.27189()-6.66218()8.2.56 Tm[(3)-6.3339(7)50341 85.595.76 [0v)3.74(i)-2.167(d)-0.3015(e)3.74(0.2913.(i)-2.16436(a)3.74(l)-2.5(a)3.74( )-l)0.173186(95(a)0.3015(e)3.74(0.2913.q)3.74(l)-2.5(a)3.74( )-3015(a)0.290.29127)3.74(p)-10.3015(a)585( )-140.(ã)3.74(o)-0.295585( )-10.74(c)3.70.294974(o)237.14 0 Td[(t)-237.14 0 Td[(t)-(v)-0.294974(e50.29127( 967518((e9(a)3.70255.293142()5.071 0 Td[(4( )-70.-80.19 Td10.3015(e)3.74(c)3.74253156346.295585( )-151899294974(o)-0.293015(a)585( )229(r)-1.22997(e)3.74(-0.29(s)]TJ237.142-10.1525(p)-0.295585(a)c29(p)-i.74(r)2.80(n)-0.295585(s)]TJ237.1429972991.22997(( )-10.1525(c)3.74(o)-1.22997(e)3.74(v)3.70.299(a)3.74239(a)q)3.74(l)-2.5(a)3.74( )-1891(c)3.74(o)-0.29558c)3.74122(o)-1.22901-3015(a)0.21.22997(u5(m)-2.4599(v)-0.294970.21.22997(a(i)-2.16558(l585(d)-0.295585(e)-70..295585(t)-2.16436(r)2.80439(o)-0.2(n)-0.295585(s)]TJ23t)-2.16436(85(o )-70439(o)-0.2q)3.74(l)-2.5(a)3.74( )-3015(a)0.25(i)-2.16436(s)0.3015(e)3.7401 -20.76 312(s)8.39595585(o)9(a)3.74( )-70.1879(a)3.74( )-70.-80.1938(N)1.57564(e)3.74(s)-1.274(c)3.70.294974(o)-0.294)0.3015(e)3.7401 -20.7( 967518((e9(a)3.7439(e)3.74(p)-10.( 967518((e8(N)1.57564(e)3.74(s)-1(i)-2.16436(u85(d)-0.295(a)3.741891(c)s)-1.274(c)3.7.7401 -289)f22()5871( )16558(i)-2.16550e)3.74(c)3.74244(i)-2.16460493.7401 -20.7[(4( )-70.-80.19 Td6(85(o)-0.l0.1879(a)3-2.16558(z)z253156346.6(85(o)-0.4974(j)-2.16a80.19 Td10.3015(e)295585( )-151839598.27189()-6n585(n)-0.295585(s)-1.220.301539(a)3.730150.3.(i)-2.1-0.29i.74(r)2.8085(u)-10.301539(a)3.730150.3.(i)-2.14( )-3015(a)0.230150.3.0.301539(a)10.1537u )16558(i)-2.165539(a)3.730150.3.(n)-0.295585)2.80439(a)3.74(s)(t)-2.16436(a)3.74(.235õr)2.80-2.360.299(a)3.74239(a)3.730150.3.n )-10.1525(c)3.74(o)-30150.3.75009()5.339(u)-0.293142()5.0531568()0.173186)-2.16558(i)-2.16558(z)v)3.74(i)-2.167(d)-)3.74(p)-10.3015(a))-0.2952()-1.53-1503(t)-8.40)0.12.16550e)3.74(c2875585(o)-0.295585( )6j)--.3505702()-1.530150.4)f22()5871( 585(n)8.44.295585(o237.14 0 Td[(t)-(v)-0.294974(e30150.4)3.74(s)(t)-2.16436(o(a)3.74( )-70.1879(a)374(r)2.80439(a)3.74( )16558(i)-2.1655002974(e30150.4)(o)-0.2971)10.1537u )16558(i)-2.1655)3.7.7430150.4).293142()5.071 0.l0.1879(a)3.071 0.f22()5871( )1655-2.16n)-0.29497-80.19 Td10.3015(e).7430150.4)85( )-10255.271 0 Td[(t)-2.16436(85(o)-0.295585( )-1)8.44.24974(o)-0.2916558(l585(d)--0.29n585(n)-0.29f37.142-i.74(r)2.80s)-1.229(v)-0.29497.80439(ç0531568()-2.16436(e)-6.2650.27(e)3.74(v)3.74(i)-2.436(e)-6.2650.27(e)3.74(v)3.74(i)-2.i.74(r)2.8085(u)-12997(t)7.84032(a)-02997(t)7.840h1.2312( )-140.-150.235(q)-70.1879á)3.74122(237.142997i.74(r)2.80( )16558(i)-0.27(e)3.74(v)3.74(i)-2.436(e)-6.2652.16558(p)-2997(t)901295585(t)n585(n)8(i)-)-0.295585(d)-0.2959(a)3.74( )-70.1879(a)3.74( )-70.1879(e)3.74(10.3015(e))-0.29555)--(p)-0.295-e.27189()-6-0.295585(a0.295187(:)]TJ/R29 12 Tf83.8094 0 Td[( )-70.1891(c)3.74(o)-0.295585(r)2.80561(r)-7.20029(e)7.142997293.74(s)-11.235957.874195585(o)85(u)-1(n)-0.295585ó36(e)-6.2652.16558(p)-29936(c)3.7( )-140.)-2.16436(c)3.7eva237.142997í.74(r)2.80( 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)-o)-20.2972-g)9.713955237.142997d[(t)-v29(t)-2.16436(o)-(i)-2.16436(a)3.74(l)-2.237.142997.3505705(o)-0.220.2972-85(u)-1(n)-0.295585[(4( )-70.-80.193(o)-0.2971)10.15379(a)3.74( )-70.1879(a)3436(o)-(i)-2.1623(c.80439(u)-20.2971c.80439(u)-20.2971cf22()5871( 967518((e)-.3505hi)(t)-2.16436(o)-o)-20.2971c70.1879(a)3é(585(n62.29595585(o)16558(l)-2.16558(i)-2.16558(z)-6.2659(a)3.74(d)20.2971c(22()5871A4244(p)-1(n)-0.295585ê6558(l)-2.16558(i)v)3.74(i)-2.i.7.295585(-6.2659ea)3.74(d)20.2971cA4244(p)-1)(t)-2.1643(d)20.2971càa)3.74(d)20.2971c295585(o)-10.3015(r)2.8043(a)3436(o)--1.2312( )-140.229(-2.16237.14 0 Td[(t))-0.4974(j)-2.1640.229(-2.16237.14 0 Td[(t))-0.(d)20.2971c4253156346.295585( )-162.29598.27189()-6.6)-143aacnoitioeno.18610.299(a237.142997585( )-140.(ã)3.74(o)-0n)-a ua585(d)-0.2959(a)3.7-2.360.301539(a)10.15375( )-150.236(a)-6.2659(i.74(r)2.80585( )-140.229(p)-9(a)3.74( )-70.1879(a)3(ã)3.74(o)-0n)-L505(( 967518((e8(N)1.57564([(4( )-70.-80.193(u)-2.2917.-80.193(u)-2.2917.E)74(o.18610.3015)3.7)-53156525)2.8043192(167(d)-s)-1.2-70.-80.193c29(p)-i.585(n69.40995585(o)(i)-2.16436(a)3.74(l)-2.16432.2917.(22()5871A4244(p)-1(n)(t)-2.16ê6558(l)-2.16558(i)v)3.74(i)-2.i.716558(z)-6.2659-80.193(u)-33.723(B)6.613951)(2()5871)-0.2952()-1.5-33.723(74244(p)-10.299(a)3.74243(,)-0.146571( )]TJ.16432.2917.f37.14 0 Td[(t)-(o)-0.2971)10.153.294974(e)3.74( )-432.2917.4974(j)-2.1610.153.294(m)-2.45995(97(t)--70.3.74(c)3.74244(i.294)-140.2n69.40994974(o)-0.291891(c)3.74n585(n)-0.29í.74(r)2.80c29(p)-i.74(r)2.80585(d)--0.293.74(d)-0.àa)3.74(d)95187( )-140.23(c)-150.236(a)-6.2659(237.142997-80.1938(N)1.57564(e)3.74(3.74(o)-0.295585(r)2.80561(r)31568( 3595187( 146571( )-140.229(2997a)3.74(l)-2.146571( )-140.229(2997i.7.74(.235c)3.74122(585( )-140.229(p)-9(a)3.74( )-70.18795(o)es)]TJ 3595187(4(v)3.74(i)-2.i.74(r)8(z)0.294974(o)-0.294 )-7974(e)3.74( )-4(b)-0.29ni)(t)-2.16436(o)-o)-(b)-0.29q)3.74(l)-2.5(a)3.74( 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)-o)-061 2497585( )-140.(ã)3.74(o)-0m.709()5.310.153.24(9(a)3.70255.293142()54141(.4T95585(o)61 24974974(j)-2.16a80.19 Td295585( )-159.47398.27189()-616558(l585(d)--0.29n585(n)-0.29f37.142-es)]TJ23t)-2.1 Tê6558(l)-2.16558(i)c29(p)-i.74(r)2.80)-2.45995(a)]TJ6)es)]TJ 3595187(6)-2.16558(i)167(d)-( )-10.1525(c)3.74(o)-05187(60.301539(a)10531568()0.172997i.74(r)2.80(r)31568( 3595187-0.146571( )-145(a)3.74( )-b0.229(p)-103.74(r)2.80439(a)3.74(-6.2659(a)3.74(i)-2.16436(o(a)3.74( )-o)-05187-0.3.74(c)3.74244(i)-2.16436(m)-2.45995(e)436(o)-o)-(b)-0.293.74(c)3.75(a)3.74( )-(a)3.74-2.45995(e)436(o)-u.295585(r)2.804391840-2.16558(i)-s)-1.2-70.(85(n60.07395585(o)z253156525(a)3.74a)3.74(t)-2.16436(e)-6.265)-0.2952()-1.5-5995(e)T)74(o.1861d[(t)-(v)-0.29497b0.229(p)-10é244(i)-2.16436(m)-2.45995(e)f22()5871( )16558(i)-()0.17318-2.45995(e).0531568(9(a)3.74( )-f37.14 0 Td[(t)-10.1525(a)3-2.16558(z)z253156525(a)3.74( )-10.1525(11568()0.1o)-(b)-0.29q)3.74(-2.165(a)3.75995(-80.19 Td5(o)5187( 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38
Ao término da entrevista, foram anotadas no caderno de campo as impressões sobre as
colaboradoras e o desenrolar das entrevistas, que contribuíram significativamente para a
construção do material empírico.
A Pós-entrevista: é considerada a etapa que segue a realização das entrevistas. Nessa
fase, foi mantido um contato sempre informando as colaboradoras sobre o andamento do
trabalho, a fim de incluí-las no processo de construção do material empírico.
Após a gravação, o relato oral precisa ser transformado em texto para torná-lo
disponível ao público. Para isso, são necessárias as seguintes etapas indicadas por Meihy
(2005) transcrição, textualização e transcriação.
Transcrição: destina-se à mudança do estágio da gravação oral para o escrito, depois
de escutar todo o material repetidas vezes. Deve ser realizada de maneira fiel aos
acontecimentos, incluindo as perguntas de coorte.
A transcrição foi realiza logo após a entrevista. Alguns vícios de linguagem, erros
gramaticais e palavras repetidas foram retirados, para que houvesse a fluência do texto, sem
perder a identidade da colaboradora. Os períodos longos pensativos foram expressos, no
texto, por reticências e as emoções que emergiram, durante as entrevistas, estão registradas
de forma manuscrita, quais sejam as anotações de choro e risos. Sendo assim, o que se
apresenta ao público é um relato trabalhado no qual a interferência do autor foi dirigida à
melhoria do texto.
Por fim, trabalhar uma entrevista equivale a algo como tirar os andaimes de uma
construção quando ela está pronta. Com isso, a tradição de que a transcrição de palavra por
palavra corresponderia à realidade da narrativa, deve ser desconsiderado. Como uma
gravação não abriga lágrimas, gestos, o contexto do ambiente é impossível pensar que a mera
transcrição traduza tudo o que se passou durante o encontro (MEIHY, 2005).
Textualização: é a etapa seguinte, em que foram suprimidas as perguntas de coorte,
que se fundem as respostas gerando um texto mais claro e liso com caráter narrativo. Nessa
fase, extrai-se o tom vital da entrevista que correspondeu à frase utilizada de epígrafe para a
leitura da entrevista. Sobre o tom vital Dias (2002, p. 56) considera como tema de maior
força expressiva que guia a narrativa, pois caracteriza uma síntese da moral do texto. E ainda
reúne eixos temáticos que ganham força e contornam o significado. Na opinião de Meihy
(2005), a frase escolhida funciona como um farol a guiar a recepção do trabalho, organizando
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o critério de percepção do leitor. O tom vital de cada narrativa norteará a análise do material
empírico produzido, fundamentado na literatura pertinente.
Transcriação: é a última fase da transcrição, na qual foi recriado o texto em sua
plenitude, ou seja, ordenado os depoimentos em parágrafos, retirando ou acrescentando
palavras ou frases de acordo com as observações e anotações do caderno de campo. Utilizou-
se os elementos de pontuação para tentar reproduzir o clima das sensações que compõem o
texto.
Todo o material produzido foi encaminhado para a conferência junto às colaboradoras.
Nesse momento, um diálogo com base na flexibilização permitiu estabelecer as correções no
texto. Neste estudo o texto foi aprovado pelas colaboradoras, na íntegra, sendo corrigido
algumas palavras que não foram entendidas durante as transcrições. A conferência ocorre
quando o texto trabalhado, em sua versão final, é entregue ao colaborador para ser autorizado
na carta de cessão, documento fundamental para definir o uso da entrevista e a publicação do
texto final produzido (MEIHY 2005).
O momento da conferência serviu também para aprofundar alguns temas. O encontro
ocorreu individualmente, quando as doulas estavam de plantão na maternidade. Durante a
leitura do material, elas observavam atentamente a sua própria narrativa, repetiam alguns
trechos da história com movimentos afirmativos de cabeça em sinal de confirmação.
Quanto ao uso, os textos autorizados podem ser usados no todo ou em parte, uma ou
mais vezes, conforme os parâmetros definidos na carta de cessão (Apêndice C). Existem duas
formas de uso das entrevistas em textos escritos, publicação na íntegra ou parte dela. Todo
material produzido é de inteira responsabilidade da autora deste trabalho e encontra-se
arquivado em CD-ROM.
Com o texto final elaborado preparou-se, carinhosamente, um encontro como uma
maneira de agradecer e homenageá-las. Houve também a permissão para que fossem
discutidas as questões éticas em relação ao aparecimento dos nomes das colaboradoras no
trabalho de pesquisa. Ficou decidido que seria conveniente usar nomes fantasia, mantendo-as
no anonimato, pois as colaboradoras não aceitaram revelar seus nomes civis, devido aos
depoimentos. Foram sugeridos nomes de anjos, pois algumas mulheres por elas assistidas as
consideram-nas verdadeiros anjos em suas vidas. Os anjos ajudam a restaurar e revigorar o
nosso ser, também nos conforta e nos dão força. A bíblia sagrada apresenta diversas histórias
em que os anjos dão conforto e força aos homens (DOADORES..., 2007, p. 61). Eles se
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aproximam da nossa dimensão material como energia que irradia paz, tranqüilidade e
segurança, dando força e amor (CAFÉ, [2007?]).
Para a escolha do nome fantasia, em um encontro com todas as colaboradoras,
ficaram todas sentadas, em círculo, e com o auxilio de um pequeno livro, que trata de anjos
seguidos de palavras que representam qualidades dos seres celestiais, cada uma escolheu o
anjo de maior afinidade pessoal. Durante todo esse momento, um aparelho de som em um
canto da sala entoava cânticos angelicais que envolvia o ambiente. Os anjos, para Café
([2007?], p. 147) também são chamados de
grandes seres da música da palavra, razão pelas quais algumas palavras são
associadas aos seus nomes: Metatron (propósito e poder); Ratziel (síntese);
Tzaphkiel (confiança); Zedekiel (serenidade e humildade); Kamael
(espontaneidade e entusiasmo); Michael (expectativa); Uriel (entrega);
Raphael (compreensão, flexibilidade e equilíbrio); e Gabriel (alegria e
graça).
Ao final do encontro, foi servido um lanche que ocorreu em um clima de alegria e
descontração. Nesse momento, cada uma delas recebeu um anjinho de lembrança e uma
bíblia para que ficasse na sala das doulas, servindo de alimento para o espírito através das
palavras de sabedoria e amor, renovando suas esperanças diante das dificuldades e
adversidades da vida.
3.3 Aspectos éticos – legais
As colaboradoras da pesquisa aceitaram, voluntariamente, participar do estudo.
Concordaram com o uso de entrevistas como técnica de coleta do material empírico,
conforme está disposto na carta de cessão (Apêndice C), e no Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido (Apêndice B). Desse modo, as observâncias éticas contempladas na Resolução
196/96, de 10 de Outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde - CNS, que dispõe sobre
a pesquisa com seres humanos foram respeitadas.
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41
3.4 Tratamento do material empírico
As reflexões do material empírico foram realizadas com base nos pressupostos
adotados por Meihy (2005), após cumprimento das etapas de transcrição, textualização,
transcriação do texto e das repetidas leituras. Foram identificados os eixos temáticos ou
idéias de maior significado que estiveram relacionados com as experiências das doulas, no
processo de cuidar, servindo para elaborar e caracterizar suas atividades. As idéias centrais
construíram o “tom vital” das entrevistas, considerado o eixo norteador da leitura, guiando a
discussão e a compreensão através de um diálogo estabelecido pelos autores que compõem o
referencial teórico da pesquisa.
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“A ternura é maior
que a técnica.”
(Michel Odent)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006.
4 A Prática das Doulas no Cuidado à
Mulher em Processo de Parto e Nascimento
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ANJO ZEDEKIEL
Tem 32 anos de idade, é solteira, natural de Recife, completou o ensino médio, fez
curso de contabilidade e no momento não está trabalhando. Sua religião é testemunha de
Jeová. Atua como doula na maternidade, há 3 anos, e foi uma das primeiras doulas do serviço.
Para ela, a atividade de doula surgiu em um momento muito difícil de sua vida, quando
descobriu que ajudando outras pessoas diminuía suas dores, assim conseguia superar seus
problemas e ser mais forte.
Antes de encontrá-la, foi feito um contato telefônico para uma colega que estava de
plantão na maternidade. Era uma quarta-feira à noite e estava chovendo muito, talvez ela não
estivesse lá. Para a surpresa da autora deste estudo, que foi ao seu encontro, a doula estava na
sala de pré-parto, conversando com a técnica de enfermagem. Em seguida, na sala das doulas,
iniciou-se a entrevista.
Demonstrou ser uma pessoa muito introspectiva, solitária e carente. De voz calma com
um comportamento sereno e um olhar que expressava tristeza. Foi bastante cooperativa
durante a entrevista. A princípio muito retraída, mas no decorrer da entrevista foi ficando
mais à vontade. Identificou-se com o anjo Zedekiel, que representa a humildade e a
serenidade.
O que quero é a amizade das pessoas, fazer o bem, e não estou aqui para criticar [...].
(ANJO ZEDEKIEL)
Meu nome é Zedekiel e conheci o Programa de doula voluntária
através de uma colega que trabalhava aqui no departamento de
enfermagem. Ela me falou sobre o Programa e como estava passando
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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por um momento difícil, na minha vida, aceitei. Ela me convidou e fui
conhecer como era este trabalho. Quando conheci o Programa, amei e
gostei muito do que aprendi para ser uma doula.
Para que pudéssemos trabalhar como doulas, houve um
treinamento de três dias, sobre parto e quais as melhores posições que
deveríamos adotar para ajudar a diminuir a dor no parto. Nesse
treinamento, teve vídeo, palestras com médicos e com especialistas em
voluntariado. Estamos sempre recebendo novas capacitações como o
curso de massagem, que é importante na nossa prática diária.
Quando me tornei doula, a minha atitude com as pessoas mudou
muito, por ser retraída sentia dificuldade de me relacionar. O que quero
é a amizade das pessoas, fazer o bem, e não estou aqui para criticar
ninguém. A atitude da doula de se doar e se colocar no lugar do outro foi
muito bom para mim, pois aprendi a não julgar tanto as pessoas. Isso
para mim foi gratificante. Estou aprendendo a cada dia, a cada plantão
e pretendo demonstrar o que aprendi.
Na verdade, não posso dizer que desejei ser doula. Tudo
aconteceu por curiosidade, mas depois do treinamento o desejo floriu.
As mulheres ficam muito frágeis nessa hora e poder dar um pouco de
atenção é importante. As pessoas ainda ficam perdidas e não tem a
noção de como é um parto normal ou uma relação sexual. Aprendi a
passar para as pessoas confiança e tranqüilidade, a doar-me mais e a
olhar o meu semelhante de forma diferente. A vida é tão cheia de
interesses e ser doula é amar e ajudar o próximo, sem interesses. Então,
nesta função me aproximei das pessoas e sou mais solidária.
Realmente, ser doula é um ato de doação, é ajudar alguém que
você nunca viu. Às vezes, estamos passando por momentos difíceis e
sempre existem pessoas que nos deixam ainda mais para baixo. Então, a
doula ajuda as gestantes a pensar de maneira positiva, aumentando a
sua auto-estima e transformando momentos difíceis em momentos
felizes.
Desenvolver esta atividade, mesmo sendo um trabalho voluntário,
que não é remunerado, não tem preço e não tem dinheiro que pague.
Sinto-me bem e é muito gratificante, só a doula sabe. Fazemos boas
amizades, recebemos carinho e agradecimentos das pessoas. Também
ficamos agradecidas, você transpira e vive o amor. Venho com o maior
prazer, mesmo hoje que está chovendo (risos), vim na chuva e me molhei
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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todinha. As pessoas disseram: ‘Menina, você saiu da sua casa, em vez de
ficar dormindo na sua cama, para vir aqui ver as mulheres gritando,
chorando e aperreando, colocando na bola, no cavalinho e ainda vai
dormir num sofá!’ Respondi: ‘isso mesmo, nem sempre é possível
repousar (risos).’ Esse trabalho é uma coisa que aprendi a gostar, sei
que a vida da gente é difícil, as pessoas estão mais preocupadas com os
bens materiais e em ter boas condições financeiras. Nem tudo que o
dinheiro traz é felicidade. Não pretendo ficar rica, o pouquinho que
tenho para viver muito bem. Estou feliz, fazendo o que gosto, sem
muitas preocupações e ajudando os outros.
As mulheres quando chegam ao pré-parto, principalmente as
adolescentes, estão desesperadas e muitas vezes sem o pai da criança,
sem mãe, sem ninguém na vida. Nesta ocasião, pretendo passar o
máximo de conforto emocional, mostrando um caminho mais fácil de
tudo que está se passando naquele momento. Tento ajudar para que
fiquem mais fortes e se sintam aliviadas emocionalmente.
O desafio que encontro está no relacionamento com a equipe de
saúde, às vezes, é a equipe de enfermagem, outras os médicos. Muitos
não aceitam o nosso trabalho. Acham que vamos interferir no seu
trabalho. Eles deveriam ver em que realmente nos envolvemos, acho que
de pouquinho em pouquinho isso vai mudar um dia (risos).
A minha mãe teve sete filhos, fui a primeira. Foi um trauma
muito grande porque ela era muito nova e tinha 17 anos. Veio do
interior e sem experiência. Quando foi levada ao hospital, ela disse que
se sentiu a pior das pessoas, pois estava sozinha em um lugar
desconhecido. Naquele momento, não fazia força e o que vinha em sua
mente era gritar, pedindo socorro para ver se alguém iria ajudá-la.
Todos os seus filhos nasceram de parto normal no hospital, foram todos
traumáticos. Para ela, nenhum parto foi bom, aprendeu a conter mais a
dor e a fazer força para sair logo o bebê.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ANJO RATZIEL
É católica, tem 50 anos de idade e trabalha nos afazeres domésticos. É casada e mãe
de três filhos, depois que se tornou doula, há 3 anos, retornou aos estudos e hoje está
concluindo o ensino médio.
Na maternidade, no dia do seu plantão, ela se encontrava na sala de pré-parto,
conversando com uma parturiente. Foi quando ficou ciente que a autora deste estudo a
esperaria na sala das doulas. Percebeu-se, então, que esta doula estava um pouco apreensiva.
Porém, após uma conversa informal, deu-se início à entrevista.
É uma mulher muito tímida, de voz mansa e tranqüila, se expressa com poucas
palavras e respondia às perguntas com frases curtas e breves. Dos anjos apresentados,
escolheu Ratziel que é o anjo da síntese.
[...] gosto de ajudar é importante levar luz às pessoas, principalmente em horas de
dificuldades
[...].
(ANJO RATZIEL)
Sou Ratziel e quando mais jovem não terminei o 2º grau, fiz até a
séria. Mas depois que entrei no Programa de doula, recomecei os
estudos. Estou no ano e ao terminar, quero fazer um curso de
geriatria. Pretendo ter mais garra.
Vim ser doula porque gosto de ajudar. Se tiver alguém da
família doente ou uma vizinha, logo me chamam. Foi através da minha
irmã que conheci o Programa de doula comunitária voluntária. Ela é
agente de saúde e me disse que havia esse Programa, aqui na
maternidade. Ela me inscreveu em outra maternidade, mas o
treinamento foi aqui.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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O treinamento teve duração de três dias. Aprendemos a cuidar
das mães em trabalho de parto. Ensinou como trabalhar com ética que é
respeitar os limites das mulheres, os nossos e das enfermeiras.
Ser doula, para mim, é uma pessoa que passa carinho para as mães e
que orienta as acompanhantes para não ficarem tão ansiosas.
A importância do meu trabalho como doula é dar atenção e
carinho, como aprendi no treinamento. No começo, fiquei muito
insegura, mas hoje estou melhor. Quando não venho, fico doente. Às
vezes, quero vir aos domingos, mas não posso, meu menino trabalha e
tenho que cuidar também das coisas dele. Quando estou trabalhando
como doula me sinto muito bem.
O trabalho é de graça, mas o importante não é o dinheiro e, sim,
a luz que você passa para as pessoas que as fazem se sentir bem, por isso
gosto de vir.
Quando a mulher está em trabalho de parto, converso muito com
ela, oriento, coloco-a no cavalinho, na bola, de cócaras na cama, dou
massagem para ajudá-las a não ficarem sofrendo. Às vezes, elas chegam
e ficam deitadas pensando que estão doentes, dificultando a evolução do
parto. Esses exercícios estimulam o trabalho de parto, pois ajudam o
bebê a chegar mais rápido.
Estou aqui nesse trabalho há mais ou menos três anos. Na minha
relação com os profissionais de saúde nunca tive problemas, graças a
Deus. Quando cheguei ao pré-parto, um profissional disse: ‘eita, ainda
bem que chegou uma doula’ (risos).
Esse trabalho me faz lembrar do meu nascimento que é uma
história muito complicada. Segundo minha mãe, foi um parto muito
difícil. Ela conta que por ser do interior, sem muita informação e o
primeiro filho, tudo foi mais difícil. Ela perdeu a mãe aos 11 anos e o pai
aos 17, por isso teve que trabalhar. Como ela não queria depender de
irmão foi embora morar em São Paulo, onde conheceu o meu pai. Ele
também saiu daqui de Recife. Quando ela ficou grávida, voltaram para
Recife. Na volta, ela sentia muita dor do primeiro parto, que foi o meu.
Isso porque não sabia que estava na hora de ter o neném e quando vinha
a dor, ela tomava chá e prendia as pernas. Quando chegou ao hospital,
faltavam apenas alguns minutos para eu nascer. Nasci toda pretinha e
ainda levei umas palmadas. Ela disse que minha cabeça estava toda
amarrotada de tanto ela prender as pernas na cama. Ela disse que
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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sofreu muito. Nasci pequenininha com 2.700 kg. No total foram 8 filhos,
ela disse que não sofreu tanto nos outros partos, no primeiro, que fui
eu (risos).
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ANJO TZAPHKIEL
É casada, tem 36 anos, é natural de Recife e possui o ensino médio completo. Sua
religião é espírita e trabalha nos afazeres domésticos. Quando foi dar à luz ao seu único filho
recebeu todo o apoio da sua mãe. Esna unidade como doula um ano e seis meses. O
encontro da autora deste trabalho com esta doula foi no dia de seu plantão, na maternidade.
Ela estava na sala de pré-parto, sorridente, conversando com uma técnica de enfermagem.
Então, na sala das doulas, iniciou-se a entrevista. Disposta em ajudar e com olhar confiante e
decidido, respondeu as perguntas. Expressou segurança, propriedade e consciência do seu
trabalho voluntário. Ficou emocionada ao falar dos seus sentimentos, quando está
desenvolvendo suas atividades de doula. Dos anjos apresentados, escolheu Tzaphkiel, que tem
como qualidade principal a confiança.
[...] estar perto de alguém que você não conhece e poder si doar para esta pessoa [...].
(ANJO TZAPHKIEL)
Sou Tzaphkiel e o meu interesse pelo trabalho das doulas
começou por minha curiosidade de querer saber qual o papel da doula.
O que mais me chamou a atenção foi o fato de estar perto de alguém que
você não conhece e nunca teve contato e de repente si doar para esta
pessoa. Foi através da minha mãe, que trabalha aqui na maternidade,
que conheci o trabalho das doulas. Quando abriram novas inscrições,
para o curso de doula, me inscrevi e fui selecionada. Depois que fiz o
curso me apaixonei e estou gostando do que faço.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Para se trabalhar como doula necessita de um treinamento. O
curso tem duração de três dias e foi ministrado por pessoas competentes
que tiraram todas as nossas dúvidas. Ensinaram como usar a bola, a
massagem, o cavalinho, como ajudar a mulher a respirar melhor, no
momento das contrações, e orientar quanto à posição do lado esquerdo,
que é melhor tanto para paciente como para o bebê. Aprendemos muito.
Recebemos sempre novas capacitações pela prefeitura. Isso enriquece e
ajuda na nossa prática.
Ser doula é um conjunto de forças e de energias positivas. Exige
muito sentimento e amor, gostar do que está fazendo e dar o melhor
para o seu próximo. A importância de uma doula é muito grande, chega
até em alguns momentos a ser pessoal. A parturiente precisa de você
naquele momento porque está muito carente. No meu primeiro, dia
estava tremendo como nunca, havia uma menina acompanhada por sua
irmã, mas ela preferiu que eu ficasse ao seu lado. Isso aconteceu porque
a irmã da gestante estava deixando ela muito agitada. Durante o curso
aprendemos a lidar com as acompanhantes, por isso fui conversar com
sua irmã. Não vou esquecer disso nunca. Foi Deus quem a colocou no
meu caminho. Fiquei com essa paciente o tempo todo e na hora de
entrar na sala de parto, a levei até a porta, ela segurou minha mão e
disse: ‘eu queria tanto que você entrasse comigo’. Como estava em
trabalho de pato adiantado, não houve tempo para me preparar e
assistir ao seu parto.
Sei que é um trabalho voluntário, mas recebi muito apoio do
meu marido e o meu filho foi a primeira pessoa que chegou pra mim e
disse: ‘mainha tu vai ganhar quanto?’ (risos) Olhei para ele e respondi:
‘financeiramente nada; espiritualmente, tudo’. Independente do que as
pessoas falam, está sendo muito bom poder estar aqui fazendo alguma
coisa por alguém. Um simples obrigado dos familiares das pacientes que
dizem: ‘você foi um anjo que Deus colocou hoje pra minha filha’. Então,
só de ouvir uma coisa dessas já ganhei o dia.
Presenciei um parto normal, todinho, é muito lindo não tem
explicação. O nosso sentimento, nesse momento, quando olhamos para
aquela mãezinha, que passou por toda aquela dor, todo aquele sufoco,
porém quando nasce o bebê é uma bênção. O meu filho nasceu
prematuro de parto cesariano, no mês, porque minha gravidez foi de
alto risco.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Trabalhar como doula mudou muito a minha vida. Cresci como
ser humano. Quando vou me aproximar de uma mulher em trabalho de
parto, procuro chegar de mansinho. Apresento-me e digo: ‘sou doula e
vou passar o dia aqui com você’ e começo o contato com a paciente.
Eu tive todo esse apoio da minha mãe e sei como é difícil para uma
mulher que não tem ninguém, principalmente, as adolescentes. Procuro
dar atenção a todas, mas sempre tem uma que você mais atenção,
geralmente as que não possuem acompanhantes.
Quanto aos desafios, acho que estão melhorando, aos
pouquinhos. Estamos engatinhando, mas a intenção é que melhore.
Desde que entrei, foram quebradas muitas barreiras (risos). A maior
dificuldade é quanto ao relacionamento e ao espaço para se trabalhar
com a gestante. Se as pessoas não entendem o nosso trabalho, não dou
muita importância. Sei que sou capacitada para dar assistência às
parturientes. Se eles acham que é bom ou não é problema deles,
independente de qualquer coisa estou aqui para ajudar as pacientes.
Acredito que se essas pessoas tivessem a oportunidade de conhecer as
propostas do Programa, compreenderiam melhor o nosso trabalho.
A resistência quanto ao nosso trabalho é generalizada. São
poucas as pessoas que nos apóiam e valorizam o nosso trabalho. O que
importa é que estou aqui para fazer alguma coisa por alguém. Se
acharem que é bom ou não, não me interessa. Quero que seja bom para
a paciente. É ela que precisa.
A minha mãe conta que o meu parto foi tranqüilo e bem
rapidinho. Nasci de sete meses, fui muito apressada e por isso acho que
sou agitada (risos). Foi um parto normal no hospital e ela teve a benção
de ter ao seu lado a sua irmã que era enfermeira, na época, hoje minha
madrinha. Ela teve todo o apoio da família. Tenho três irmãos homens e
só eu de mulher. Todos nasceram de parto normal.
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ANJO METATRON
Tem 57 anos de idade, é viúva, aposentada, católica, formada em sociologia.
Trabalhou em diversas organizações não governamentais, tem três filhos adultos e é doula
mais ou menos um ano. A sua história de vida é marcada por perdas importantes que até hoje
as fazem chorar.
Houve o encontro desta doula com a autora deste trabalho que chegou na maternidade
e a encontrou na sala de pré-parto, massageando as costas de uma parturiente no cavalinho. A
autora, então, a informou de que ela poderia ficar à vontade, pois não estava com pressa e a
aguardava na sala das doulas. Depois ela chegou sorrindo e disposta a ajudar com a pesquisa.
Para ela, é uma maneira de divulgar o trabalho das doulas. Sentadas, iniciou-se a entrevista.
Durante todo o momento da entrevista, percebe-se, em seu olhar, um poder de
liderança muito expressivo, argumentou com muita consciência política, fez uso das palavras
com propriedade, definição e conceito. O anjo escolhido foi Metatron, anjo do propósito e do
poder.
[...] ser doula é saber ser útil, ajudar, dar apoio e amor na hora da necessidade [...].
(ANJO METATRON)
Sou Metatron e conheci o Programa de Doula Comunitária
Voluntária através de um convite que recebi da Coordenação do
Programa de Saúde da Mulher da Prefeitura de Recife. Foi quando
tomei conhecimento do curso de doula. Como eu era voluntária da
Prefeitura, mais de três anos, fiquei interessad
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Este tipo de carência é muito abrangente e envolve tudo, o
conhecimento, a família, a saúde, o financeiro. É importante quando
sabemos que temos condições de ajudar essas pessoas. Por isso, achei
interessantíssimo ser doula. Como eu gosto da área de saúde e tinha
trabalhado, nesta área, bastante tempo, achei fantástico! Foi uma
oportunidade que a vida me deu de estar junto dessas pessoas, fazendo
alguma coisa de concreto e de verdadeiro. É muito gratificante ser
doula.
Quis ser doula porque gosto realmente de me sentir útil,
principalmente para aquelas pessoas mais carentes e desassistidas. É
muito gratificante porque você tem a oportunidade de se doar de uma
maneira que resultado para uma pessoa que precisa de você, num
momento importante, para todas as mulheres, que é o nascimento do seu
filho. Independente de cor e de classe social, nesse momento todas as
mulheres são iguais. O nascimento de um filho é muito importante, por
isso deve ser cercado de carinho, de compreensão e de muita paciência.
Decidi ajudar as mulheres, principalmente nesse período em que a
sociedade está passando por tantas transformações. As pessoas pensam
que elas não são carentes, mas todas são. Mesmo as que têm boas
condições sociais passam por momentos de carência. Existem as que
querem alcançar um objetivo melhor na sociedade e em suas vidas, mas
não tem condições. Então quis ajudar as mulheres, principalmente as
mais jovens. As adolescentes estão perdidas e quando engravidam ficam
ainda mais inseguras. É importante que as mulheres que já tiveram
filhos orientem as gestantes dando-lhes informações, apoio e segurança.
Por ser voluntária da Prefeitura do Recife, três anos, a
coordenadora desse Programa na Prefeitura, me ligou e perguntou se eu
gostaria de me tornar uma doula. Nunca tinha ouvido falar em doula,
até estranhei, achei o nome meio exótico. Ela explicou o que significava
doula, que eram mulheres que cuidam de outras mulheres. É um
programa social que deu certo e vem dando certo nas cidades de Belo
Horizonte, São Paulo e se expandiu até o Rio de Janeiro. Fiquei muito
surpresa e adorei saber disso.
Houve um treinamento aqui na maternidade. O curso foi dado
em três dias e a nossa coordenadora realmente é uma pessoa muito
envolvida com o social da maternidade. Para nós, doulas, é muito
gratificante ter uma coordenadora como ela. Fiz o curso e depois
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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começamos a treinar. Tivemos um estágio no pré-parto e trabalhamos
em dupla tanto no plantão noturno como no diurno. Cada doula um
plantão de 12 horas, por semana, é muito bom e gratificante. O nosso
trabalho é real e as parturientes sentem-se seguras com a nossa
presença. Estamos sempre fazendo novos treinamentos para melhorar o
nosso conhecimento e ajudar na nossa prática. Tivemos, recentemente,
um curso de Reik.
Ser doula é compreender a necessidade de uma outra mulher
num momento de dor, como o trabalho de parto. É gratificante! O nosso
interior fica preenchido porque nos doamos para uma pessoa carente,
que talvez não tenha tido a oportunidade que tivemos. A importância de
uma doula é sair de sua casa, naquele dia, para desempenhar seu papel,
levando algo de bom da sua vida para alguém. Então, quando nos
tornamos doulas, temos o propósito de passar adiante tudo de bom, de
positivo que temos para alguém que não conhecemos.
As adolescentes chegam inseguras, medrosas, sem conhecimento
do que é o parto. Muitas chegam até sem acompanhante, essas são ainda
mais inseguras. É nesse momento que nos aproximamos e damos todo o
apoio. Damos uma segurança emocional, que é importante para a
mulher, independente de raça e classe social. É muito importante para a
mulher que está sendo mãe, quer seja pela primeira ou segunda vez. Por
isso, quanto mais apoio ela receber, melhor para esta criança, que nasce
mais tranqüila e rodeada de carinho e amor. É assim que eu encaro ser
doula, é esse suporte emocional que posso dar à mulher.
Trabalhar como doula trouxe mudanças muito gratificantes
para mim, pois quando chego à maternidade, me desligo de qualquer
outra preocupação. Posso aperfeiçoar o meu ponto de vista
acrescentando aspectos positivos com relação ao ser humano, à mulher
jovem e às famílias carentes. Fiquei mais humana.
Os profissionais, hoje em dia, estão aceitando mais a nossa
presença no pré-parto, diferente de algum tempo atrás. Algumas equipes
sentem a nossa falta, às vezes perguntam: ‘o que houve com as doulas
que não estão aqui?’, então estamos sendo necessárias pela nossa
atuação. Por incrível que pareça, não encontrei nenhuma dificuldade,
mesmo sendo uma maternidade pública, nunca tive nenhum
desentendimento.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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É um trabalho que faço com amor, dedicação, sem pressa, com
tranqüilidade e desprendimento. Penso que se fosse remunerado, não
teria tanta importância. Talvez não tivesse tanto valor para mim. É um
valor humano que o voluntariado tem me dado, é esse o sentido que dou
as minhas atividades.
A história do meu nascimento é muito interessante. Nasci de
parto normal, numa maternidade. Os meus pais eram muito carinhosos,
sou a última da família. Nasci com amor e rodeada de muitos mimos.
Acho que é por isso que eu não esperei nem os nove meses pra nascer.
Naquela época, não existia tantos meios para cuidar de crianças
prematuras, mas os médicos que me atenderam tiveram muito cuidado
comigo e minha mãe, sobrevivi. Cada dia que passa gosto mais da vida e
de tudo que me rodeia. É muito bom viver e tenho a agradecer a meu
Deus, aos meus pais e à família que tenho. Hoje, infelizmente, não tenho
mais meus pais, estou apenas com as minhas irmãs que me rodeiam de
muito carinho. A mais velha é como se fosse uma mãe para mim. Tanto
que no dia das mães eu não posso deixar de vê-la e nem de cercá-la
também de carinho, em retribuição a tudo que ela tem me dado. Sou
muito grata por tudo isso, então posso dizer que sou uma pessoa bem
nascida.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ANJO URIEL
Tem 50 anos de idade, é natural de Recife e católica. É formada em letras, mas não
exerce a profissão. Atua como doula aproximadamente 1 ano. Vive em união estável e não
teve filhos.
O encontro desta doula com a autora deste estudo se deu numa sexta-feira, pela
manhã, dia do seu plantão na unidade. Ela estava na sala de pré-parto, massageando as costas
de uma parturiente que se encontrava no cavalinho. Após algum tempo à sua espera, na sala
das doulas, ela chegou com um sorriso de felicidade e uma enorme satisfação com o que
acabara de fazer. Sentadas, deu-se, então, o início à entrevista.
Em meio à conversa, expressou durante todo o seu relato muita emoção e uma
capacidade de entrega muito presente na sua história de vida. Muito emocionada, tentava
organizar as suas idéias. Deixou evidente que ajudando uma mulher a parir estaria colocando
no mundo o filho que não teve. O seu anjo foi Uriel, que tem como principal qualidade a
entrega.
[...] fazer o bem sem olhar a quem [...]. (ANJO URIEL)
Sou Uriel e me tornei doula por causa da minha experiência de
vida, tenho acompanhado pessoas da família e conhecidos, para
hospitais e maternidades. Acompanhei uma paciente numa maternidade
da prefeitura do Recife e me convidaram para participar do curso de
doula. Levei uma segunda e novamente me convidaram. Como gosto de
praticar o bem, então me interessei e deixei meu telefone na
maternidade. Quando chegou o dia de fazer a inscrição vim e me
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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inscrevi. Fiz o curso e adorei. Gosto muito de fazer o bem sem olhar a
quem, pode ser gestante, pode ser idoso, idosa, quem for. Vou pro
hospital e faço tudo que estiver ao meu alcance, nas minhas condições,
porque também sou limitada.
Hoje estou com tempo disponível e querendo trabalhar sem
ganhar nada, dedicar minha vida à caridade. Procurei uma creche mais
não me identifiquei. Preferi acompanhar mulheres gestantes a terem
seus bebezinhos, que não tive filhos e isto me gratifica. Por isso optei
em ser doula, queria ver vidas nascendo e não morrendo. Sou um
instrumento que gosta de fazer o bem e não ver a quem.
Para trabalhar como doula, houve um treinamento de três dias
com muitas aulas teóricas e palestras maravilhosas que ensinaram como
usar o cavalinho, a bola e o massageador. Sempre estamos recebendo
novos cursos, como o de massagem e Reik, para serem acrescentados em
nosso trabalho. No meu primeiro dia de prática nasceu um bebezinho,
fiquei muito feliz e radiante, graças a Deus. Nesse momento, fiquei mais
apaixonada pelo trabalho.
Ser doula é dar um pouco de mim para quem não tem nada.
Graças a Deus tenho a agradecer, não me falta nada, um
pouquinho de saúde é o que quero.
O momento do parto envolve muita dor, nunca senti mais sei que
dói muito. Ter uma doula ao lado desenvolvendo um trabalho de apoio
psicológico é muito importante, pois, às vezes, o acompanhante
atrapalha. Damos uma mão amiga e uma conversa bonita (risos). Por
isso a doula é importante neste momento frágil, delicado e singelo da
vida de uma mulher. Existe uma grande dúvida sobre o nascimento, se
ela vai parir normal ou cesárea ou se vai demorar muito. As mulheres
que vem para são carentes de amor, carinho e afeto. Ter uma de nós
ao seu lado pegando em sua mão é grande coisa. É uma maravilha
poder ficar junto delas, dou o melhor de mim e elas dizem: ‘Se não fosse
você; você é meu anjinho; você é a minha salvação!’ Ficam como
crianças.
Desenvolver esse trabalho me deixa muito bem e vitoriosa.
Agradeço a Deus por mais um dia que pude ajudar alguém. Entro no
meu plantão agradecendo a Deus e saiu com o sentimento de missão
cumprida. Sempre agradeço a Deus pelo plantão maravilhoso e porque
teve um final feliz, deixei tudo bem e deu tudo certo (risos).
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Trabalho como doula não por dinheiro, quero fazer o bem e
ajudar quem está precisando, num momento de muita d
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três partos, em casa, e três partos na maternidade. Sendo que um deles
nasceu com problema no coração e morreu com quinze dias de vida e
outro nasceu deficiente na coluna, mas é casado e tem um bebezinho
lindo que é meu afilhado (risos), é meu lindinho. Essa é a história da
minha vida.
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ANJO RAPHAEL
Tem 51 anos, é evangélica, natural de Recife, desenvolve trabalhos assistenciais na
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gente e vo tem todo jeito, porque você gosta de conversar com as
pessoas e de dar apoio’. Eu disse: bom’!. Ela me trouxe aqui na
maternidade e fiz a inscrição no curso e gostei muito. Aprendi a ser mais
humana, a ver a dor do outro como se fosse a minha. No início fiquei
muito tensa quase desisti na primeira semana, pois era uma coisa nova
pra mim. Sentia também uma diferença no relacionamento com as
pessoas na sala de pré-parto. Alguns médicos e enfermeiras não me
olhavam com bons olhos e não me davam atenção. A gente dava bom dia
e eles não respondiam. Quando eu me aproximava eles se afastavam de
mim. Chegou um dia em que vim dizendo que seria o último, mas depois
pensei melhor. Talvez aquela doutora tenha me entendido mal. Não vou
me deixar levar por uma atitude de uma pessoa que talvez, naquele dia,
não estivesse de bem com a vida. Também temos os nossos momentos de
fraqueza, por isso relevei aquilo e fui outra vez. Essa pessoa continuava
do mesmo jeito. Não vou mudar ninguém é o jeito dela. Ela pode até ser
uma boa pessoa e essa seja a maneira dela agir. Então mudei o meu dia.
Quando essa pessoa chegava ao pré-parto eu fazia de tudo pra sair e
deixá-la sozinha. Achava que estava ajudando ficando ao lado das
gestantes, mas sentia que atrapalhava o que a doutora fazia. Ficava até
com pena de ter que deixar a paciente, pois estava numa conversa tão
boa com ela. Como não era bem aceita, então, saía. E foi assim, graças a
Deus mudei o meu dia e já tem um ano que estou aqui.
O motivo pelo qual resolvi ser doula foi primeiro por que fiquei
viúva, depois meus filhos casaram-se e fiquei só. Então quis preencher o
meu tempo. Segundo, sempre gostei de ajudar. Na minha igreja,
trabalho na parte de ação social, distribuindo alimentos. Trabalho
sempre ajudando as pessoas. Gosto de me emocionar com elas porque
chegam chorando, caídas e arrasadas. Uma, o marido deixou, outras os
pais abandonaram. Vivem na casa da sogra, na casa de um ou de outro.
Chegam sem acompanhante, doentes, com problemas relacionados com
a gravidez. Tento passar conforto para elas, às vezes, estão chorando e
quando começo a conversar elas param de chorar, ficam mais quietas e
com o coração mais calmo. Pergunto para elas: ‘por que está chorando?
Tudo isso aqui vai passar e você vai ter o seu bebê’. Eu sempre converso
com jeitinho, com boas maneiras, e sei que tem dado certo. Tenho
gostado. Mantenho um bom relacionamento com cada uma delas. À
tardinha, vou visitá-las na enfermaria para saber como estão. tirei
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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tantas fotos. Teve até parentes de uma delas que veio de Fernando de
Noronha tirar foto comigo para levar de lembrança, porque fiquei com a
filha dela. Agradeceu-me dizendo: Deus te pague’ e respondi: ‘é um
dever, uma obrigação minha.’ Temos obrigação com o ser humano.
Infelizmente, no mundo está faltando amor, por isso a violência está tão
grande. Tem que ter amor... vou morrer tentando praticar o amor,
porque só ele é capaz de mudar o mundo.
Quando não venho, por motivo de doença ou algum problema
que tenho para resolver, sinto falta. Nesse mundo, temos que ser útil
para as pessoas. Não podemos ser boa para todo mundo, é impossível!
Mas podemos fazer caridade. Dar uma palavra, um apoio. Não vamos
consertar o mundo, mas uma coisinha aqui, outra acolá, já ajuda.
Identifico-me muito como doula, gosto demais! Se não fossem os
problemas que existem de relacionamento dos profissionais e da
distância das pessoas... Procuro entender, mas isso é que afasta a gente
do trabalho de doula. É esse relacionamento de enfermeira e de médico
que afasta a gente. Não são todos, tem uns que são ótimos, pelo menos
dão um sorriso, porque quando não riem, a impressão de que
estamos atrapalhando. Como não somos médicos, talvez não olhem para
a gente com o mesmo olhar que olhamos para uma paciente. Eles
deveriam nos olhar como pacientes também, porque a gente olha para o
paciente com tanto amor. Por sermos voluntárias, nos sentimos como
uma penetra que não é bem vinda. Muitas são fracas e saem, não ficam
porque não tem domínio da situação. Quero é fazer a minha parte,
atender as gestantes, ajudar, pois cada dia que venho volto realizada
para casa e agradeço ao meu Deus por ter sido útil a alguém hoje. A vida
é uma passagem, ninguém vai ficar aqui para sempre. Então, se você
puder fazer um ato de amor para alguém, faça independente de raça, da
situação financeira ou social. Fazer o bem é a minha meta. Se eu puder
fazer o bem a um inimigo melhor ainda, para que ele veja quem eu sou.
Ajudar um amigo, um parente é muito fácil, quero ver fazer por quem
não gosta de você. Tem gente que não nem um bom dia. eu vou e
digo: ‘bom dia doutora!’. Se Maomé não vai à montanha a montanha
vai a Maomé e peço a Deus sabedoria.
Procuro tirar um aprendizado para a minha vida, em cada lugar
que vou revendo o que é bom e o que não é e sempre perguntando para
Deus. Então, escolhi ser doula porque me faz bem. Gosto de ajudar os
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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outros, ser útil, fazer o bem, mesmo para aquelas pessoas que não sabem
o que é ser acolhida e acolher. Quando não venho sinto falta, porque é
um ato de amor que posso fazer, naquele dia, e que talvez nos outros não
tenha feito. Esta foi minha oportunidade de ajudar as pessoas, por isso
me sinto realizada.
Ajudar as pessoas carentes é difícil e nem todo mundo tem
tempo, mas quando ‘arrumar’ um tempinho vá fazer o bem ao próximo,
porque é tão bom quando estou precisando de uma palavra de conforto
e alguém liga pra mim e dar esta palavra. Por isso, temos que ajudar o
outro, pois não somos diferentes. Então vivo desta maneira e graças a
Deus tem dado certo. Fui casada há 10 anos com o meu primeiro marido
e era terrível. Divorciei-me, ‘arrumei’ o segundo e esse também bebia,
morreu de cirrose. Bebia muito, mas era bom pra mim. Havia momentos
difíceis em nossas vidas, mas eu conseguia dominar a situação. Ele
morreu em minhas mãos e deixou tudo pra mim. Recebo a pensão dele e
fiquei com algumas coisas que administro, por isso não preciso
trabalhar. No tempo livre que tenho vou ajudar ao meu próximo,
porque Deus me deu saúde e condições financeiras. Antes ia ao hospital
do câncer, mas era tanto sofrimento que ficava nervosa. Aqui até que
estou mais calma. Quando vi um parto a minha pressão até baixou,
fiquei suando, mas agora mudou, já estou acostumada com a situação.
Desejei ser doula porque queria dar um pouco de amor às
pessoas carentes. Acho que no hospital público existe uma carência
muito grande e sempre tive vontade de ajudar. Se fosse uma enfermeira
talvez trabalhasse nessa área, como não tenho nenhuma formação na
área de saúde, o papel de doula se encaixa muito bem para mim. Tem
que ter muito amor, atenção, carinho. Tendo isso já é um passo para ser
uma doula. Cuidar com paciência e amor num momento de tanta dor me
faz sentir realizada em ser doula, me identifico. Tive um momento em
que fiquei indecisa, pensei em sair, não por causa do trabalho que faço,
mas por conta do relacionamento que havia. Gosto muito do meu
trabalho, às vezes estou com dor na coluna, mas mesmo assim eu venho.
Tomo remédio para não faltar e as pessoas dizem: ‘é gostar demais,
trabalhar de graça e com dor’, mas é o amor que chama a pessoa, a
gente não escolhe, é da índole, você já nasce com ela. Dar amor às
pessoas é muito importante, só sabe disso quem já precisou de uma
palavra amiga. Já precisei de palavra amiga, quando perdi a minha
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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mãe, o meu pai, o primeiro e o segundo marido. Nesses momentos, tive
uma amiga que me ajudou. Agora chegou a minha vez de retribuir tudo
que recebi. As coisas boas devem ser repassadas, principalmente para as
pessoas que estão para baixo. Quando você chega com o seu testemunho
ela se levanta, pois vê que o seu problema não é o pior. É hora de
glorificar a Deus pelo que se tem. Temos que tomar o sofrimento como
testemunho para as nossas vidas.
Para trabalharmos como doula tivemos três dias de curso. Foi
muito bom, gostei muito, foi bem elaborado e sempre que posso
participo de outros. Estou participando de um curso sobre o idoso que
tem aumentado o meu conhecimento. Não sei quando vai ter outro curso
de massagem aqui na maternidade. Quero participar de tudo que sirva
para o meu crescimento, para amenizar a dor do meu próximo. A minha
filha fala assim: ‘mainha você quer curar todo mundo, ninguém pode
dizer que estar com uma dor que você passa um remedinho caseiro’.
É verdade, gosto de fazer o bem e ser útil às pessoas nos momentos de
dificuldade.
No treinamento, foram ensinados os exercícios de agachamento
que é bom para o períneo, como usar a bola e o uso do cavalinho que
diminui o stress. A massagem lombar é bastante usada para alívio das
dores. Os exercícios ajudam, adiantam e facilitam o trabalho de parto.
Ser doula é servir a uma outra mulher. Doula é uma palavra que
vem do grego e significa mulher ajudando outra mulher, na hora do pré-
parto até na hora do parto. A doula não faz procedimentos médicos, mas
ajuda emocionalmente, fisicamente. Dá palavras de conforto e apoio.
A doula é muito importante dentro de uma maternidade porque a
gente se doa bastante a gestante. Elas ficam tão apegadas que não
deixam a gente sair. Por causa do cuidado sentem segurança de estar
com a gente. Mas temos que dar assistência a várias. Ficam mais seguras
com a gente por perto do que com a família delas. Elas dizem: sai
mamãe! Deixe que ela fique comigo aqui’. Quer dizer, ela mandou a mãe
sair para ficar comigo. Quando digo que vou almoçar, ela diz: vem
logo’ e eu respondo: ‘tá eu volto’. Quando chego dou massagens e elas
perguntam: ‘será que está longe?’ eu digo: ‘não se preocupe com a
hora, se preocupe com o bebezinho que vai nascer com saúde e perfeito’.
Elas ficam preocupadas com a hora do nascimento do bebê, pois muitas
chegaram no dia anterior. Tento explicar de acordo com o que ouvi do
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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médico: ‘o seu colo ainda não dilatou’. Fico conversando com ela e isso
ajuda muito, porque são assuntos que, às vezes, o médico e a enfermeira
não m tempo de explicar, por causa da demanda que é muito grande.
Eles correm demais e, às vezes, falta material, tudo isso estressa, pois
também são seres humanos. Cada um tem a sua função. Chegamos
naquele horário e ficamos preenchendo tudo naquela pessoa. Na
verdade não preenchemos, mas ela pensa que preenche. Às vezes,
chamam a gente de enfermeira, de doutora e eu digo: ‘não, a gente é
doula’. Estamos aqui para ajudar você fisicamente e emocionalmente. O
médico chega daqui a pouco e a enfermeira é aquela ali. Quando ele
chega vou perguntar sobre a paciente. Tem uns que tratam a gente bem,
que até para perguntar, mas têm outros que nem respondem, nem
olham pra gente. Ficamos desmoralizadas perante a paciente que espera
uma resposta. Então eu falo: ‘ele é médico e examinou você, agora
tenha paciência e obedeça ao médico’. Acho que os médicos deveriam
dar um pouco de valor a gente também. Antes de fazer qualquer
exercício eu pergunto a enfermeira para ver se tem alguma coisa no
prontuário delas, porque às vezes não podem fazer exercícios por estar
com uma dilatação avançada. Também pergunto ao doutor e quando
eles autorizam os exercícios, as pacientes ficam mais seguras e quando
não fazem isso, elas não querem fazer os exercícios. Ficam com medo,
principalmente com a bola, morrem de medo de cair, mas se o médico
mandar ir para a bola elas aceitam melhor. Eles podem nos ajudar nessa
hora. É até bom para eles também, pois elas ficam mais calmas.
É gratificante trabalhar como doula, mesmo sendo um trabalho
voluntário. Quando termina o expediente e vou visitá-las, elas e suas
famílias me abraçam e me beijam. Isso pra mim é muito importante, não
tem preço. Saio daqui com muita alegria no coração e o sentimento de
dever cumprido. O calor daquela sala de pré-parto é muito grande, é
desgastante para a gestante também. Chego cansada em casa e uma
amiga me disse: eu que não queria esse trabalho nem que fosse para
ganhar muito’. Então eu disse para ela: ‘você diz isso porque nunca
precisou de uma doula, mas no dia que você precisar, vai ver o quanto
temos valor’. Tenho pena de quem pensa assim: ‘é melhor ficar em casa
dormindo ou passeando na praia do que ajudar os outros de graça’. Os
bens materiais passam, nascemos nus e vamos voltar nus. O que conta é
o bem que fazemos às pessoas, por isso faça o bem sem olhar a quem.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Hoje temos uma paciente de 19 anos e outra com 17, todas carentes. A
maioria, o marido deixou ou nem sabem quem é o pai da criança.
Nesse momento, temos que passar muito amor, falar muito de Jesus
para elas para que entendam que nem tudo está perdido e que Deus está
com elas.
Quando uma mulher está em trabalho de parto, primeiro vou
trabalhar o seu lado emocional, porque influi muito. Nesse momento,
estão desesperadas, chorando, agoniadas e com muito sofrimento. Às
vezes, se sentem abandonadas. Os médicos têm os horários para
examiná-las. Elas pensam que eles e as enfermeiras têm que ficar do
lado delas o tempo todo, mas não podem porque têm outras funções.
Como eles não podem ficar junto delas, nós ficamos. Então, tento dar o
apoio emocional primeiro e depois vou para a parte física. Gosto de
fazer massagem durante uns 5 minutos. Agora que temos o
massageador, tem sido melhor, pois estávamos com tendinite. As
pacientes gostam porque relaxam e sempre conversamos com elas. Dou
esse apoio todinho, mas ainda não entrei na sala de parto, pois não
deixaram. Talvez eles não saibam que agente possa entrar. Por isso não
devemos condená-los.
Sou apenas um veículo. Falo com o médico sobre a paciente, vou
ao serviço social entregar o número do telefone da família da paciente e
procuro os seus parentes para entregar o número do telefone da
maternidade. Graças a Deus tenho um bom acesso na maternidade. Uso
uma tática quando vejo que a auxiliar de enfermagem está meio grossa
com a gente, tenho muito cuidado.
Este trabalho trouxe muitas mudanças na minha vida, me
ensinou a ser mais humana e aprendi a passar mais segurança para o
meu próximo. Também tenho as minhas fraquezas, por isso tenho que
perdoar as fraquezas dos outros. No início, foi uma barra muito pesada,
mas pedia sabedoria ao meu Deus. A gente pensa que por ser médico ele
não passa por dificuldades, mas pode estar com problemas. Agradeço a
Deus por ter-me ensinado a entender melhor o outro. Passei a entender
melhor e a amar mais o meu próximo.
O problema que encontramos está no relacionamento com a
equipe de enfermagem e de médicos, o que dificulta nossas atividades.
Não são todos os profissionais. Tem uns que realmente gostam da gente,
mas têm outros que nem nos olham. Outras vão passando pelo mesmo
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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problema que passei e vai desestimulando o grupo. Não ganhamos nada,
somos apenas voluntárias e ainda somos mal tratadas. Dessa maneira,
terminamos indo procurar ser voluntária em outro serviço que nos trate
bem. Acho que deveria haver uma reunião com enfermeiras, médicos e
auxiliares de enfermagem esclarecendo a importância das doulas na
maternidade e seus direitos como voluntárias. Talvez eles se sintam
incomodados com a nossa presença e com receio que possamos comentar
fatos ocorridos no setor. Quando sou bem aceita fico no pré-parto.
Glorifico a Deus, pois tenho me dado muito bem. Viver é uma arte, é ter
sabedoria.
Uma vez a paciente queria que eu entrasse na sala de parto e
quando ia chegando à porta do bloco cirúrgico a médica disse assim:
‘não pode, você não pode entrar aqui!’. Eu sabia que podia, mas como
ela não tinha essa informação, não insisti. Agradeci e disse a paciente:
‘você está bem assessorada com os médicos’. Por isso, a reunião seria
importante para repassar ao médico o que eles não sabem, porque, às
vezes, a gente passa por muita vergonha.
Deveria existir uma relação melhor com os voluntários, porque
estamos aqui por amor. O que acontece de bom e de ruim repercute
fora, se existe este Programa de Doula aqui, então deveria existir
reuniões para que eles entendessem o nosso trabalho e nos olhassem com
mais carinho.
Depois que mudei de plantão ficou melhor, pois gosto do pessoal
do meu plantão e do médico. Ele é uma pessoa que nos respeita e nos
trata bem e sempre tem um sorriso no rosto. Também tem algumas
técnicas de enfermagem que são excelentes e dizem: ‘que bom que vocês
chegaram! Quando estão no plantão, vocês ajudam muito’. Porque, às
vezes, elas nos pedem para buscar lençol e auxiliar no banho. Estamos
aqui para somar e não para tomar o lugar de ninguém. Seria muito bom
se todas as unidades de saúde tivessem voluntárias. Existem, em alguns
lugares, mas não o em todos. Você vai por amor e se faz por amor,
tudo sai bem feito. Não esperamos nenhum pagamento. Quando você
trabalha por dinheiro chega o final do mês fica com a cara feia e mal
humorada porque o dinheiro é pouco. O que não acontece com a
voluntária, pois não ganhamos nada, amor. Vou para casa muito feliz
e agradecendo a Deus pelo dia, por ter sido útil a alguém, porque é
melhor servir do que ser servido. Ajudar alguém a levantar de uma
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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cama, dar um banho, um carinho, passar a mão na cabeça, isso é
importante e me sinto muito bem. Se não fosse aqui seria em outro
lugar. O que quero é ser útil enquanto viver, que agora Deus me deu
condições de sobreviver sem trabalhar, pois sempre trabalhei no
comércio. Meus filhos estão casados, ajudo minha filha e tenho tempo
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ANJO MICHAEL
Tem 46 anos, natural de Recife, católica, completou o ensino médio e fez o magistério.
Nasceu de parto normal, em casa, pelas mãos de uma parteira e é mãe de dois filhos. Com o
marido desempregado, ela ajuda no orçamento doméstico cuidando do bebê da sua vizinha. É
doula na maternidade há cinco meses.
A entrevista foi realizada à noite, pois trabalha no plantão noturno devido a suas
atividades diárias como babá. Ao chegar à unidade, ela estava na sala de pré-parto ao lado de
uma parturiente. Quando terminou os cuidados que prestava, foi à sala das doulas. Foi
explicada a proposta da pesquisa, pela autora deste trabalho, no dia da entrevista, pois a
mesma não compareceu à reunião prévia de preparação para os encontros. Demonstrou
preocupação, não queria arranjar confusão no serviço. Então foi dito que a diretoria e a
coordenadora das doulas estavam sabendo do trabalho e que a sua identidade seria preservada.
Na sua narrativa, apresentava muita fragilidade emocional e sensibilidade. Em todo o
seu discurso, se emocionou ao falar das dificuldades que encontrava no serviço,
principalmente na sua relação com a equipe de enfermagem. Deixou clara a vontade de fazer
o curso técnico de enfermagem. Dentre os anjos apresentados escolheu o anjo Michael, que
tem como qualidade a expectativa.
[...] eu já era doula sem saber [...]. (ANJO MICHAEL)
Meu nome é Michael, conheci o Programa de Doula Comunitária
quando estava com o meu marido procurando emprego na Prefeitura de
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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Recife. Quando cheguei perguntei se havia alguma vaga, me disseram
que não, mas que iria começar um treinamento para ser doula. Então,
disse que queria e me mandaram procurar a coordenadora do
Programa na maternidade para fazer a inscrição. Foi aqui na
maternidade que fiquei sabendo como as doulas cuidam das
parturientes, dão força e consolam, pois muitas mulheres ficam sem
acompanhante. Fiquei interessada e gostei.
Quando as minhas sobrinhas iam ter nenê mandavam me
chamar para ficar com elas, porque sou uma pessoa calma e sempre dei
força, mesmo sem saber o que era doula. As pessoas me chamavam para
ir à maternidade, ficava conversando e passando a mão em seu cabelo.
Ser doula é fazer isso, então eu já era e agora vou aprender como ajudar
melhor. Cuidar de uma gestante que está com dor ou uma pessoa com
algum problema de saúde, dando-lhe carinho e amor é muito
gratificante.
Então eu era doula mesmo sem saber, pois sempre gostei de
ajudar as pessoas. Quando as minhas irmãs pariam, eu dava banho no
bebê, trocava as fraldas, fazia tudo, e na época só tinha 17 anos. O parto
de uma delas tinha sido cesárea e os pontos infectaram. Fiquei cuidando
do bebezinho e quando ela melhorou, ia trabalhar e deixava-o comigo.
Cuidei de todos eles e sempre gostei de cuidar.
Para ser doula houve um treinamento de três dias. Teve rias
palestras e DVDs, mostrando como cuidar das parturientes. Está sempre
tendo outros treinamentos como o curso de Reik, mas não fico sabendo
de nada porque estou sem telefone, mas sempre que entro na sala da
doula procuro no quadro de avisos algum recado.
Este trabalho de doula já sabia que era voluntário, que não
ganhava nada, e teria direito ao vale transporte, mesmo assim fiz o
treinamento e estou aqui. A minha irmã disse um dia: ‘você está
desesperada mesmo, não tem juízo! Mãe disse que você é doula na
maternidade que fica de plantão das 19 às 7 da manhã e não ganha
nada’. Respondi que faço com o coração e amor. Está sendo ótimo para
mim e agradeço toda noite que estou lá, pois estou dando conforto às
pessoas e também estou sendo confortada, é uma troca. Iria ser
voluntária no hospital do câncer porque a minha menina tirou um
tumor benigno lá, mas aqui é pertinho da minha casa. Caso arrume um
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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emprego não vai atrapalhar porque é uma quinta-feira à noite que estou
aqui.
A importância da doula para a mulher é muito grande, pois
quando as parturientes chegam ao pré-parto algumas ficam deprimidas,
converso com elas dando força, carinho e se acalmam. Passam a confiar
mais na gente. Esse apoio, a convivência que temos no pré-parto com as
pessoas, as pacientes e a equipe que está no plantão é um trabalho
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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pessoas até saem da sala de pré-parto quando estou lá e uma delas
trocou até o plantão por minha causa. Essa pessoa é da equipe de
enfermagem, nem procurei saber o seu nome, conheço todas as
auxiliares de enfermagem. Aqui é difícil por conta disso. E às vezes não
acreditam muito na gente.
As dificuldades são essas, as auxiliares não aceitam muito o nosso
trabalho, mas vim bem preparada porque no treinamento, a
coordenadora falou muito a respeito das indiferenças que iríamos
encontrar. Quando chego em casa, converso um pouquinho com o meu
marido e desabafo com meus filhos. Temos as nossas capacidades, não
temos o conhecimento da medicina, mas também ajudamos. É mais
difícil lidar com o auxiliar de enfermagem, pois o médico quase não fica
no pré-parto. Tenho muita vontade de fazer enfermagem, mas não tenho
condições, fico perguntando a um e a outro se conhecem algum lugar
baratinho para que eu possa fazer o curso, muitas dizem que não
conhecem, outras nem falam comigo. Dou boa noite e não responde, ela
amarra o cabelo, pega uma revista e sei que não quer muita conversa.
Então, fico conversando com as pacientes e a noite passa que nem sinto.
A dificuldade é mesmo na área de enfermagem.
Trabalhar como doula trouxe muitas mudanças para a minha
vida, eu era muito agitada, preocupada e hoje estou mais calma e
tranqüila. Vejo tantas coisas aqui que me fizeram aprender muito, pois
tudo que acontece lá fora é pequeno. Cada dia eu venho com mais
vontade de ajudar, deixo todas as preocupações na minha casa e me ligo
só aqui.
As mudanças que aconteceram na minha vida foram boas pra
mim. Quero completar a minha atividade de doula com um curso
técnico de enfermagem. Às vezes, tenho vontade de ser autoritária, mas
aprendi, como doula, a ser mais calma e a ter paciência, aprendi a lidar
com as pessoas e estou tentando melhorar.
Quando estou ajudando alguém fico emocionada, seguro a mão
dela e converso para acalmá-las. A dor é grande, mas digo para elas que
tentem se controlar e fico com o coração partido porque também já senti
essa dor. Peço a Deus que me força e fico ao seu lado, angustiada e
com vontade de chorar.
A minha mãe teve cinco filhos, só dois nasceram na maternidade,
porque ela teve dificuldade. Nasci de parto normal, pelas mãos de uma
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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parteira, em casa. Para ela, os partos mais difíceis foram os da
maternidade, os que aconteceram em casa foram melhores. Ela não
tinha nada, o menino nascia e ela já estava boa, fazendo tudo.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ANJO GABRIEL
Tem 31 anos de idade, natural de Recife, católica. É e de um filho e concluiu o
ensino médio. Fez o curso técnico de enfermagem, mas no momento não exerce a profissão.
Há quatro meses é doula na maternidade.
No dia do seu plantão, na unidade de saúde, ela estava na sala de pré-parto
conversando com uma parturiente. No encontro, com a autora deste trabalho, que estava à sua
espera na sala das doulas, ela chegou disposta a ajudar, com muita alegria e um sorriso no
rosto. Deu-se início, então, à entrevista.
Durante toda a sua narrativa, estava muito emocionada e chorou ao falar da
experiência traumática, que passou em uma maternidade, quando foi ter seu filho. Por isso,
decidiu ser doula e hoje pretende ajudar as gestantes, em processo de parto e nascimento, a
terem uma experiência positiva. Nesse momento, houve uma emoção mútua, pois a autora
deste estudo, exerce suas atividades de enfermagem, na mesma maternidade onde esta doula
deu à luz e tomar conhecimento dos seus traumas a deixou muito triste.
Esta doula se identificou melhor com o anjo Gabriel, que representa a alegria e a
graça.
[...] estou fazendo pelas pessoas o que não tive [...]. (ANJO GABRIEL)
O meu nome é Gabriel e sempre gostei de ajudar as pessoas e de
fazer caridades. Conheci o Programa de doulas através de uma amiga
que trabalha aqui com a assistente social. Ela disse que estava havendo
inscrição para doula. Disse isso, porque fiquei com tios e vizinhos.
Gosto muito de ficar em hospitais ajudando as pessoas. Fiz a inscrição e
fui conversar com a coordenadora responsável, pelo Programa na
maternidade. Ela me explicou sobre o Programa e mandou que eu viesse
nos três dias de treinamento para conhecer melhor.
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A hora do parto é um momento em que a mulher fica muito
fragilizada e sensível. Nem todas têm acompanhantes, outras não têm
marido e as mães não podem ficar ou não querem. Por isso, ter um
trabalho voluntário para essas pessoas é muito importante.
O treinamento que recebemos, de três dias, teve palestras sobre
como cuidar das parturientes. Participaram várias pessoas
especializadas na área. Uma doutora nos ensinou como usar os materiais
como a bola, o cavalinho e a fazer massagens nas pacientes. Ficamos
capacitadas para ajudar as parturientes, mas o controle emocional se
adquire com o tempo. Ainda continuamos recebendo outros
treinamentos como o de Reik, que ajuda bastante em nossa prática.
Neste curso, aprendemos algumas técnicas de como cuidar da paciente,
quando estiver com dor.
Trabalhar como doula mudou muito a minha vida. Eu era uma
pessoa muito agitada e estressada, porque vivia dentro de casa o tempo
todo nos afazeres domésticos. Depois desse trabalho cresci como ser
humano. Senti na pele que existem pessoas fora precisando da nossa
ajuda. Quando você entra no pré-parto e interage com as mulheres, elas
passam a confiar em você como se fosse membro da sua família. Conheci
muitas pessoas na maternidade com as mesmas necessidades que tenho e
poder ajudá-las é muito importante pra mim. Antes, não sorria como
hoje. Agora estou sorrindo, mais alegre e confiando mais nas pessoas.
Converso com todos os funcionários, desde os da limpeza ao Doutor.
Gosto muito do meu trabalho. Se pudesse estaria aqui todos os dias.
Quando fui ter o meu filho, minha mãe não pôde entrar na
maternidade e fiquei só. Havia a equipe médica e as auxiliares de
enfermagem, mas estava me sentindo sozinha, pois todas essas pessoas
eram estranhas para mim. Se existisse a doula naquele momento tinha
me sentido muito mais segura. Por isso, fiquei com trauma de
maternidade e não quero mais ter filhos.
O momento do parto que é tão esperado pelas mulheres, para
mim, não foi legal, porque tive algumas complicações. me senti bem
quando fui pra casa. Então, depois que conheci esse trabalho das doulas,
graças a Deus, o trauma passou.
Desejei ser doula por conta de tudo isso. A minha mãe fala dos
seus partos e da emoção de trazer uma criança ao mundo. Toda mulher
fica muito frágil, na hora do parto. Não são todas que têm o privilégio de
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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ficar acompanhada do marido ou da sua família. Infelizmente, isto não
ocorreu comigo. Quando soube que doula significa mulheres cuidando
de outras mulheres, então decidi me doar para as mulheres que
precisassem de mim do jeito que um dia eu precisei e não tive.
Ser doula é se doar por inteiro. Muitas pessoas que chegam aqui
dizem: você não recebe nada pra fazer isso?’ As funcionárias também
falam que não viriam trabalhar se não recebessem. Não recebo nada,
mas isso pra mim é gratificante. Porque estou fazendo pelas pessoas o
que não tive.
O papel da doula, no pré-parto, transforma a vida daquela
paciente que está em trabalho de parto sofrendo, com dor e sentindo-se
sozinha. A presença da doula, neste momento, conversando, dando
carinho e fazendo massagem tranqüiliza a parturiente. Gosto muito de
visitar as puérperas. É uma visão totalmente diferente, antes era a dor e
sofrimento, agora o alivio e a alegria ao lado do seu bebê.
Quando estou trabalhando como doula, me sinto mais humana e
realizada como pessoa, em poder ajudar a meu próximo. A respeito de
remuneração, nem lembro. Receber dinheiro é uma coisa que nem passa
pela minha cabeça. Quando vou dormir oro a Deus e peço para me
abençoar e que amanhã eu tenha forças e palavras para aquelas
mulheres que estiverem precisando de mim. Dinheiro é uma coisa que
não cabe nesse contexto.
O cuidado que tenho com as mulheres é passar para elas o que
não passaram pra mim. Digo assim: ‘tenha calma você não está só, estou
aqui com você, tenha paciência que o seu bebê vai chegar e daqui a
pouco você vai ver o rostinho dele’. Apesar de todo aquele sofrimento
que passei, depois que vi o rostinho do meu filho, foi emocionante (ela
chorou!). Foi a coisa mais importante da minha vida. A gente passa por
tanta dor e por problemas em casa, mas depois quando olhamos para o
rostinho do nosso bebê, tudo aquilo passa e a gente não sente mais nada,
só queremos estar ao lado dele. Um toque de mão e o alisar no seu cabelo
as deixam mais tranqüilas.
O nosso maior desafio é com a equipe médica e, às vezes, da
enfermagem. Têm pessoas que adoram nosso trabalho, mas têm outras
que não gostam. Quando o pré-parto está lotado, têm médicos que
mandam a gente sair. As pacientes ficam exaustas por causa da dor,
estão cansadas, estressadas e, às vezes, não querem a gente por perto.
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Queremos nos aproximar para aliviar a dor, pois parece que estamos
sentindo também. Temos que saber respeitar a vontade delas.
Desde que era pequena, a minha mãe conta que sempre foi ótima
para ter filhos. Todas as suas gestações foram maravilhosas. A chegada
do primeiro filho foi encantadora. Nasci de parto normal e o que ela não
gostou foi a demora para eu nascer. Ela chegou à maternidade pela
manhã e no outro dia foi que nasci. Foram quase 24 horas. Ela teve 3
filhos e o último foi cesárea, por conta da laqueadura.
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78
ANJO KAMAEL
É m
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apaixonei pelo trabalho. Desejei ser doula para me completar. É bom,
completa a gente totalmente.
Para tornarmos doulas, houve um treinamento de três, dias aqui
na maternidade, foram dias agradáveis. Tivemos palestras sobre: o
voluntariado, a enfermagem, a história das doulas e alguns vídeos.
Assistimos a um vídeo de parto normal de cócoras e uma cesárea.
Explicaram os exercícios e uma doula mostrou como sentar na bola e no
cavalinho. Tudo isso é importante para sabermos como cuidar das
pacientes.
Estamos sempre fazendo outros treinamentos como o de Reik,
que é muito importante. Fico até arrepiada quando falo. É bom
aprender a passar toda essa energia para quem está precisando. O
Programa de Voluntariado da Prefeitura, sempre nos convida
oferecendo novos cursos. Neste momento, está acontecendo um
seminário sobre envelhecimento ativo que nos enriquece, não como
doula, mas como cidadã.
A doula é muito importante para a gestante que está na
maternidade, porque existe alguém que pergunta o seu nome, vai à
recepção procurar o seu acompanhante. Fico emocionada quando falo. É
muito bom, é divino, me completa (chorou). Quando estou no pré-parto
saio para almoçar e para ir ao banheiro. No final do dia, agradeço a
Deus e vou para casa. Trabalhando como diarista, de segunda a sexta,
rezo para chegar o sábado. Fico feliz, pois vou ajudar alguém. Uma vez,
dentro do ônibus, uma pessoa me perguntou se estava indo trabalhar e
respondi que sou voluntária aqui da maternidade em afogados. Ela não
acreditou que eu estava saindo do Janga, um bairro distante da
maternidade, para trabalhar de graça e ficou impressionada (risos).
Quando vejo uma mulher em trabalho de parto o meu primeiro
passo é ver se ela está bem, se tomou banho e se está calma. Se não
estiver procuro acalmá-la, ensinando a respirar corretamente e faço
uma massagem. Levo ela para o cavalinho, coloco ela na bola, na barra,
sempre conversando. Nessa conversa, ela vai me contando toda a sua
vida e quantos filhos têm. Procuro passar muita calma e tranqüilidade.
O que sinto em relação ao meu trabalho, como doula, é poder
ajudar. Ser doula é você se preocupar com o outro ser humano. São
pessoas voluntárias que estão dispostas a ajudar. Se um dia eu chegasse
num hospital e encontrasse uma pessoa que me desse à mão e ficasse ao
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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meu lado, seria muito bom. É gratificante, porque ocorre uma troca boa
de energia. Ela passa energia pra você e você para ela. É bom, completa
a gente totalmente. Sei que é um trabalho voluntário, mas pra mim não é
um trabalho é um presente. Sinto-me realizada por ter feito alguma
coisa boa.
Este trabalho mudou a minha vida, pois fiquei ainda mais
sensível. Trabalhar como doula completa tudo em mim, renova as
minhas energias e me abastece. Estou mais calma e durmo ainda mais
tranqüila. Depois de ser doula passei a enxergar melhor as coisas e
aprendi a não ter preconceito com ninguém. Procuro aceitar as pessoas
como elas são, brancas, pretas, ricas, pobres, magras, gordas, me ajudou
muito.
No momento, não encontro dificuldade para exercer as minhas
atividades, no serviço. Quando chego ao pré-parto o meu sorriso é maior
que a minha boca. Talvez por trabalhar aqui tenha facilitado às coisas,
pois conhecia os médicos. Quando se quer fazer alguma coisa com
amor, não existem obstáculos. Você arruma um jeito e supera as
dificuldades. O amor transforma, é a maior essência da vida.
Sobre o relacionamento com os profissionais tive um
desentendimento até agora. Uma médica disse para fazer de um jeito,
mas aprendi como doula que não deveria ser como ela queria. Não
discuti, procurei trabalhar de acordo com o trabalho dela, mas não
deixei o meu jeito, como havia aprendido. Achava o mais correto, pois os
profissionais que me ensinaram tinham muita segurança. Depois que ela
me viu trabalhando, como tratava as pacientes, sorriu para mim.
Trabalhei naquele dia satisfeita. Foi só um mal entendido.
Minha mãe sempre foi uma boa dona de casa e o meu pai
motorista. Ela teve 14 filhos, vivos só têm 7. Fui à sétima filha de um
bom casamento, graças a Deus. Nasci de parto normal, tranqüilo em
casa, pelas mãos da parteira. Só os dois caçulas nasceram aqui, em
Recife, numa maternidade, os outros foram de parto normal, em casa.
Nunca vi a minha mãe parir. Quando cuidava dela doente, com 66
anos, foi que tive o prazer de vê-la do jeito que nasceu.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
81
“A verdadeira viagem da descoberta
não é achar novas terras, mas ver o
território com novos olhos.”
(Marcel Proust)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006.
5 Mulheres que Cuidam de Mulheres:
as histórias e seus significados
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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A avaliação do material empírico permitiu revelar os motivos que levaram as
mulheres a se tornarem doulas em uma maternidade pública municipal na cidade do Recife-
Pernambuco, conhecer suas atividades no contexto do cuidado à saúde da mulher, em
ambiente hospitalar, e identificar os desafios que encontram durante o desenvolvimento de
suas atividades na sala de pré-parto.
A discussão foi guiada a partir do tom vital encontrado na narrativa de cada
colaboradora, indicando as temáticas relevantes juntamente com os depoimentos acerca dos
elementos que contribuíram para identificar a prática do cuidado e os desafios enfrentados,
durante o desenvolvimento de suas atividades.
Os elementos identificados, durante a análise, foram agrupados em três eixos
temáticos: acolhendo e criando vínculo; um caminho para a humanização e a necessidade de
reconhecimento e aceitação. A partir dessas expressões fortes, foi estabelecido um diálogo
com a literatura pertinente.
5.1 Acolhendo e criando vínculo
A gravidez e o parto são processos únicos e marcantes na vida da mulher. As
sensações experimentadas durante o parto irão permanecer para sempre na construção de suas
memórias, sejam negativas ou positivas. Assim, todos os envolvidos têm responsabilidade
nesse processo, são responsáveis por tornar esse momento agradável. As doulas, neste estudo,
têm mostrado como reconhecem a importância do parto para a mulher, a sua fragilidade nessa
hora e as suas necessidades de um apoio emocional, como expressa as seguintes falas:
A hora do parto é um momento em que a mulher fica muito fragilizada,
sensível e nem todas têm acompanhantes, não tem marido e a mãe não
pode ou não quer ficar [...]. A presença da doula, neste momento,
conversando e dando carinho tranqüiliza a parturiente. (Anjo Gabriel).
O momento do nascimento de um filho é muito importante, por isso
deve ser cercado de carinho, de compreensão e de muita paciência.
(Anjo Metatron).
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O parto é uma etapa importante do ciclo gravídico-puerperal, revestido de sentimentos
que suscita cuidados e atenção no intuito de aliviar as tensões presentes nesta fase. Trazendo
as concepções dos autores como Rodrigues (1997, p. 13 e 51), que considera o parto “um
momento lindo e doloroso, dignificante, inesquecível para todas as mulheres, quer estejam
preparadas ou não”. Para Meira (1993, p.16), o parto é visto como “uma experiência
fundamental, profunda e marcante que deixa marcas na vida da mulher”. Na concepção de
Maldonado (1997) “é um processo psicossomático, determinado pelo contexto sócio cultural,
da individualidade física psicológica da parturiente e do contexto assistencial.” Ainda
segundo Diniz e Duarte (2004, p. 09), “é uma oportunidade que se vivencia um milagre, no
próprio cotidiano cercado por fortes emoções”. Sendo assim Barreto (2005, p.193) afirma ser
o parto “um dos momentos mais críticos da vida que configura a saída do mundo intra-uterino
para entrada no mundo das interações entre os seres”.
Dessa maneira, Odent (2002, p.82) diz o quanto “é importante acolher esse ser e
melhorar o seu primeiro contato com os outros no início de sua vida, pois é um meio de agir
para a humanização do mundo”. Nesse sentido, receber essas crianças envolvidas num clima
de amor e carinho por meio de um parto feliz e tranqüilo é contribuir para serem pessoas
amorosas que poderão estabelecer relações potencialmente mais harmônicas no contexto
global. Isso é um passo importante para promover a cultura de paz e a não-violência nas
relações.
O reconhecimento do parto como um processo importante para a mulher, implica em
um cuidado que considera a totalidade de suas necessidades, ansiedades, expectativas e não
apenas os aspectos fisiológicos. Nessa perspectiva, as doulas desenvolvem um cuidar no saber
escutar, na formação de vínculo e respeito às dimensões psicológicas, biológicas e sociais do
ser humano.
Tem-se conhecimento que a gestante traz para a experiência do parto, componentes
fisiológicos, psicológicos, sociais e culturais. A influência dos fatores psicológicos no parto
tem sido estudada vários anos. Atualmente, estudos comprovam que a ansiedade e os
temores relacionados ao nascimento contribuem para um parto prolongado ou distócico em
que não se verificam causas mecânicas ou médicas (MALDONADO, 1997).
A compreensão integral da mulher como um ser biopsíquico e social permite
identificar uma determinada situação, como o processo de parto, a partir de uma visão e de
um entendimento completo do seu contexto. Essa é a abordagem sistêmica, que para Barreto
(2005), é uma maneira de abordar, ver, situar e de cuidar de uma pessoa levando em
consideração o ambiente que está inserida.
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Abordar, em Ferreira (1993, p.03), quer dizer “aproximar-se” de alguém, “tratar de”.
Essa atitude implica estar com alguém e é nesse sentido que a doula ao se aproximar da
mulher, em processo de parto e nascimento, trata de observá-la e através do diálogo que
estabelece, cria laços afetivos que permite conhecer as suas necessidades para acolher e
assistir integralmente a parturiente, atendendo às suas necessidades físicas, emocionais e
socioculturais. Nesse sentido as colaboradoras afirmam:
Quando vejo uma mulher em trabalho de parto o meu primeiro passo é
ver se ela está bem, se já tomou banho e se está calma. (Anjo Kamael).
Quando vou cuidar de uma mulher em trabalho de parto,
peço
iluminação a Deus,
converso com ela e pergunto o seu nome, se é o
primeiro ou segundo filho,
como ela está se sentido,
se está tudo bem.
(Anjo Uriel).
Esses depoimentos expressam o modo de abordagem, de aproximação utilizada pelas
doulas deste estudo. É uma concepção que busca a integralidade do ser no processo de cuidar
holístico, reconhecendo a interconexão entre mente, corpo e espírito. Sendo assim, não é
possível cuidar dos sintomas físicos que envolvem apenas uma das fases do processo do
parto, sem levar em consideração os outros diferentes componentes que envolvem a
experiência da mulher e da família. As emoções de uma mulher grávida influenciam na
evolução do seu processo de parto e nascimento e a presença da doula orienta, explica e
suaviza esse momento.
De acordo com o trabalho realizado por Leão; Bastos (2001), o primeiro estudo com o
objetivo de investigar os efeitos da presença de uma acompanhante treinada ao lado da
parturiente, durante processo de parto e nascimento, foi na década de 1980. Tratava-se de um
ensaio clínico randomizado com 136 parturientes no Hospital da Previdência Social da
Guatemala. Um segundo estudo, na mesma instituição, agora realizado com 465 primigestas
saudáveis; outro nos Estados Unidos com 412 primigestas, no Hospital de Ensino e no
México com 724 nulíparas, no Instituto de Seguros Sociais. Estas pesquisas concluíram que
as atividades desenvolvidas pelas doulas proporcionaram melhores resultados obstétricos e
contribuíram para o bem estar emocional das mulheres.
No Brasil, o modelo holístico vem se ampliando nas últimas décadas proporcionado
novas possibilidades de cuidado integral, que estão sendo resgatadas pelos movimentos de
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mulheres e políticas nacionais de saúde, como uma maneira de abranger aspectos emocionais,
culturais e sociais das mulheres na promoção e recuperação da saúde.
Maldonado (1997) refere que estudos nas áreas da psicologia, sociologia,
antropologia, evidenciam a presença do componente emocional em todo o período do ciclo
gravídico-puerperal. Portanto, espera-se que esta descoberta resulte em melhores e novas
possibilidades de atenção à saúde da mulher, nas distintas fases do ciclo vital, respeitando as
suas especificidades.
Na opinião de Capra (1982), a mudança da concepção fragmentada do ser humano
para uma visão que busca a integralidade, pode ser percebida em diferentes áreas, sendo
possível esperar transformações profundas na sociedade em todos os campos. Essa nova visão
acarretará profundas modificações em nossas estruturas sociais e políticas.
Como enfermeira obstetra acredito que a grande arte do profissional ao assistir a
mulher, durante a gestação e o parto, está em assumir uma visão integral, fazendo uso de
tecnologias apropriadas, buscando incessantemente o conhecimento científico, respeitando,
compreendendo e valorizando o conhecimento baseado na experiência e na vivência da
mulher.
A doula atua em uma abordagem integral no cuidado e pretende mostrar as mulheres
suas potencialidades, a capacidade do seu próprio corpo de reagir no parto e assim encontrar
estratégias de enfrentamento do desconforto. Nessa perspectiva, as doulas trabalham
orientando as parturientes quanto à atitude, posições, movimentos que poderão contribuir para
diminuir o desconforto, a dor e como abreviar o tempo do processo de parto e nascimento,
criando e fortalecendo vínculos nessa relação. Estimulam a posição verticalizada, durante o
período de dilatação, favorecendo a descida do bebê, através do uso de objetos disponíveis no
pré-parto, como a barra, o cavalinho e a bola. O aspecto dessa prática de cuidado, com base
numa relação de responsabilidade e compromisso, tem como objetivo principal diminuir o
desconforto da parturiente, como está colocado nas falas a seguir:
Queremos nos aproximar para aliviar a sua dor [...]. (Anjo Gabriel).
Quando a mulher está em trabalho de parto, converso muito com ela,
oriento, coloco ela no cavalinho, na bola, de cócoras na cama e dou
massagem para ajudá-las a não ficarem sofrendo. (Anjo Ratziel).
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Assim, percebe-se que a doula, acompanhando a mulher em situação de parturição,
utiliza vários recursos naturais na perspectiva de facilitar o processo de parto e nascimento e
minimizar os seus desconfortos. A relação de carinho e o amor contribuem para que as
parturientes vivenciem essa fase de forma mais tranqüila, resultando em uma experiência
positiva e feliz. Segundo Fadynha (2005), as dores envolvidas apresentam componentes
orgânicos e psíquicos, por isso é que a mulher amedrontada bloqueia a ocitocina, hormônio
liberado no processo de parto e nascimento e, quando protegida, ela libera esse hormônio,
melhorando evolução do parto.
Nesse sentido, o trabalho das doulas se desenvolve na perspectiva do acolher a
parturiente e o seu desconforto, criando um vínculo que contribui para uma vivência do
processo de parto e nascimento de maneira positiva e agradável. A formação do vínculo,
estabelecida por meio das relações e interações, diminui o medo, atenua o sofrimento,
tranqüiliza a mulher em situação de parturição e cria um ambiente de confiança e segurança,
como pode-se observar nas falas abaixo:
Tento passar conforto para elas. À vezes, estão chorando e quando
começo a conversar elas param de chorar, ficam mais quietas e com o
coração mais calmo. (Anjo Raphael).
A doula no pré-parto transforma a vida daquela mulher que esem
trabalho de parto, sofrendo, com dor e sentindo-se sozinha [...]. A nossa
presença, neste momento, conversando e dando carinho tranqüiliza a
parturiente. (Anjo Gabriel).
As falas dessas colaboradoras retratam a postura acolhedora que representam no pré-
parto por meio de uma escuta ativa e na produção de vínculos. Esse acolhimento promovido
por uma boa escuta favorece a construção de vínculo, colocando a mulher como sujeito ativo
no processo de parturição. Acolher, em Ferreira (1993, p.08), significa dar agasalho ou
acolhida a; hospedar; atender; receber; tomar em consideração. Sendo assim, acolher quer
dizer: “dar atenção a”; “preocupar-se com”; “cuidar de”. Dessa maneira, as doulas tecem
laços de confiança e solidariedade. Utilizam o acolhimento como técnica de encontro e o
diálogo como principal meio de comunicação. Ela estimula a participação, a reciprocidade,
favorece a criação de espaços de acolhimento, atitudes compartilhadas de idéias e a vivência
de sentimentos e emoções. Para Aguiar (2002, p. 53),
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acolher é encontrar significado para a própria existência humana, é colorir o
cotidiano com a beleza mais singela dos gestos amorosos, é o lenitivo doce
para os momentos de dor e sofrimento, é o cálice da esperança que nos
reacende o sorriso quando tudo parecia perdido.
Ainda de acordo com Aguiar (2002), a convivência e o compartilhar do mesmo espaço
físico faz desenvolver o acolhimento. Viver é viver com os outros. Quando a mulher confia na
pessoa que está ao seu lado, o processo de parto e nascimento acontece com mais facilidade.
A dor, a tensão e o medo são substituídos por sentimentos de coragem e força, atributos de
uma atenção integral à saúde. Para Pinheiro e Guizardi (2006), uma ação integral é entendida
como efeitos e repercussões de interações positivas, por meio de atitudes de tratamento com
qualidade, acolhimento e vínculo. O acolhimento promove uma rede de confiança e
solidariedade entre as pessoas, como se pode ver nos depoimentos a seguir:
Quando você entra no pré-parto e interage com as parturientes, elas
passam a confiar em você [...]. (Anjo Gabriel).
Esse apoio, a convivência que temos no pré-parto com as pessoas, com
as pacientes e a equipe que está no plantão é um trabalho importante e
gratificante para mim. (Anjo Michael).
Nestas falas, as doulas revelam formar vínculos pessoais e sociais, através das relações
que estabelecem por laços afetivos, nos momentos de aprendizado, de escuta e respeito. Nessa
perspectiva, o Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias está inserido na Política
Nacional de Humanização, pois produz e promove a formação de vínculos gerando o
acolhimento no serviço de saúde. No entanto, a fragilidade desse vínculo construído com a
parturiente é percebida na fala do anjo Raphael:
Uma vez a paciente queria que eu entrasse na sala de parto com ela e
quando ia chegando à porta do bloco cirúrgico a médica disse assim:
“não pode, você não pode entrar aqui!” Eu sabia que podia, mas como
ela não tinha essa informação, não insisti [...]. (Anjo Raphael).
Essa atitude de não permitir a presença da doula no momento do parto, dando
continuidade à relação de cuidado com a mulher iniciada no espaço de pré-parto, assume o
sentido contrário à humanização e cria uma condição de violação dos direitos da mulher. As
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recomendações do Ministério da Saúde, em seu manual de parto, aborto e puerpério
(BRASIL, 2001a), definem a doula como mulher treinada capaz de oferecer apoio emocional
e informações à parturiente, durante os diferentes momentos do processo de parto e
nascimento. A Secretaria de Saúde da Cidade de Recife atribuiu às doulas a função de acolher
e assistir integralmente a gestante e seu bebê, antes, durante e após o parto (RECIFE, 2006).
Estas publicações oficiais sobre a institucionalização das doulas nas maternidades
públicas, levam ao entendimento que no momento do parto elas estão autorizadas a continuar
a desenvolver suas ações de cuidado. Para tanto, se faz necessário criar no interior das
instituições espaços de diálogos entre as equipes de saúde, com a finalidade de sensibilizar,
envolver e transformar práticas de cuidado, utilizando as doulas como parceiras nesse cuidado
à mulher, durante o processo de parto e nascimento institucionalizado.
No parto, ela tem a contribuir. O apoio emocional oferecido neste momento pode
amenizar a provável frieza dos profissionais envolvidos com as rotinas dos serviços e
preocupados com as condutas a serem tomadas. Sua presença vem a acrescentar neste
processo de nascimento, tornando-o uma experiência positiva para a mulher. A doula
visualiza a mulher, em situação de parturição, de uma maneira diferente da tradicional, pois
não valoriza apenas o processo fisiológico do parto, mas um conjunto de fatores envolvidos,
principalmente no contexto emocional, contribuindo para um atendimento integral.
5.2 Um caminho para a humanização
O material empírico comprova que a prática das doulas fortalece os mecanismos de
participação social, garantindo os direitos à saúde e à cidadania, promovendo o
empoderamento individual e coletivo. A característica principal deste grupo é que possuem
interesses em comum e são movidas por vínculos de solidariedade. A maioria destas mulheres
encontrou no voluntariado, nas redes de apoio, sentido e significado para as suas vidas.
O sentimento de poder ajudar e ser útil às pessoas revela um ser humano altruísta e
preocupado com o seu semelhante. Mariotti (2002, p.118), afirma que o altruísmo conduz à
socialização, à participação, à competência do conviver, ao diálogo e à inclusão, o que
observa-se nas seguintes falas:
[...] gosto muito de ajudar as pessoas. (Anjo Michael).
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Vim ser doula porque gosto de ajudar [...]. (Anjo Ratziel).
[...] gosto de ser útil às pessoas, principalmente as mais carentes.
(Anjo Metatron).
Essas falas revelam os motivos que levaram as mulheres a tornarem-se doulas,
evidenciando que os sentimentos como: a vontade de ajudar, de sentir-se útil e de fazer algo
para promover o bem, tem sido a motivação dessas colaboradoras.
A motivação do tipo assistencialista expressada no desejo de ajudar o próximo,
entendido como alguém carente de afeto, de bens materiais, de informação e de conhecimento
é responsável por mobilizar os conceitos de necessidades e de utilidade. Para Silva (2004), os
motivos que impulsionam a vontade de ajudar podem ser diversos, no entanto o maior
interesse e preocupação são com o “outro” e não com o “eu”. Sobre esse assunto Boff (2001,
p. 15) diz que “a atitude de priorizar àqueles que mais sofrem ou os mais penalizados pela
vida, contribui para a construção de uma sociedade includente e integradora, onde a
cooperação tem mais valor que a competição”. De modo geral, as doulas demonstram possuir
interesses comuns “o desejo de ajudar” formando nculos de solidariedade, construindo uma
rede de apoio, que funcionam como suportes sociais que servem como recurso terapêutico
coadjuvante para ajudar as mulheres em processo de parto e nascimento, promovendo
também a inclusão social.
As histórias de vida de algumas colaboradoras revelaram pessoas com práticas de
solidariedade ao longo de suas vidas, essas práticas é que as moveram para o Programa, pois
mesmo antes de se tornarem doulas, a atitude de cuidado já fazia parte de suas relações com o
mundo e com as pessoas, o que se percebe nos seguintes depoimentos:
[...] na minha igreja eu trabalho na parte de ação social [...] trabalho
sempre ajudando as pessoas [...]. (Anjo Raphael).
[...] quando uma pessoa, uma vizinha está doente, sempre me
chama [...]. (Anjo Ratziel).
[...] me tornei doula por causa da minha experiência de vida [...] as
pessoas me chamavam para ir à maternidade, ficava conversando e
passando a mão em seu cabelo. (Anjo Uriel).
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Com base nestes depoimentos o cuidar é a arte de levar esperança, coragem, de nutrir
a fé, superar e enfrentar as dificuldades. Assim, a atitude de cuidado se insere na história de
vida dessas colaboradoras. Portanto a vontade de ajudar das doulas é movida por profundas
motivações conscientes ou não, que as levaram a cuidar do outro, pois mesmo sem perceber é
nessa relação de cuidar do outro que cuidamos de nós mesmos (BARRETO, 2005).
Para Boff (1999, p. 33), “o cuidado faz parte de essência humana não é apenas um ato
pontual, representa uma atitude de ocupação, de respeito, preocupação e responsabilização e
de envolvimento afetivo com o próximo”. É através do cuidado que o ser humano se
aproxima da sua essência. Nesse sentido, Heidegger (1987) afirma que a noção de
humanidade do homem é algo que diz respeito à sua própria natureza, à sua essência. Dessa
maneira é importante voltar o olhar sob uma perspectiva humanística, para que o homem seja
verdadeiramente humano e não desumano.
A religiosidade e a família aparecem como influências fundamentais para o
desenvolvimento de atitudes de cuidado com o outro. O sentimento universal de amor e
caridade, ao próximo, faz parte do comportamento das pessoas, que são estimuladas por uma
motivação humanitária (SILVA, 2004).
A experiência marcada pela falta de cuidado, vivenciada em algum momento da vida,
como a solidão, a dificuldade e a busca da realização pessoal, foram responsáveis pela
vontade das colaboradoras de ajudar, resultando em sentimentos positivos em suas vidas, tais
como superar traumas, problemas, preencher o vazio deixado pela saída dos filhos e de se
sentirem completas e realizadas. As falas seguintes fortalecem essa afirmação:
Quando fui ter o meu filho minha mãe não pôde entrar na maternidade
[...]. Tinha a equipe médica e as auxiliares de enfermagem, mas estava me
sentindo sozinha [...]. Por isso, fiquei com trauma e não quero mais ter
filhos. (Anjo Gabriel)
[...] como estava passando por um momento difícil na minha vida, aceitei
ser doula [...]. (Anjo Zedekiel).
[...] primeiro fiquei viúva, depois meus filhos casaram e fiquei só. Então
quis preencher o meu tempo. (Anjo Raphael).
[...] como não tenho filhos, vou ajudar as mulheres a terem seus bebezinho
[...]. (Anjo Uriel).
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Esses relatos trazem fragmentos das histórias de vida das colaboradoras que revelam
os motivos que as levaram a se tornarem doulas. A perda de vínculo, dificuldades na vida, a
identificação do “outrocomo representante de si mesma, reconhecendo nela parte do seu
passado, de sua dor ou de sua realização, foram motivações pessoais que transformou seus
sofrimentos em fonte de competência, assumindo um lugar terapêutico de auto-ajuda na busca
de um retorno emocional.
Esse clima de querer servir espontânea e gratuitamente diminui o egoísmo e aumenta a
solidariedade, também conhecida como altruísmo e amor. O sentimento de amor é resultante
da experiência de vida que envolve a alma, coração, mente e corpo. O amor favorece o
encontro de um ser que é capaz de participar da experiência do outro, gerando felicidade
(ROHDEN, 2006).
Histórias de perdas, abandono, sofrimento, podem produzir traumas, perda da
confiança e dependência, que quando superadas se transformam em sensibilidade e
capacidade, gerando ações reparadoras de outros sofrimentos. Nesse sentido, cada vez que a
doula cuida das mulheres é dela mesma que está cuidando e dessa maneira diminui o seu
sofrimento.
[...] perdi o meu marido, não tenho meus pais, estou apenas com as
minhas irmãs [...]. (Anjo Metatron).
O momento do parto que é tão esperado, para mim não foi legal.
(Anjo Gabriel).
As falas dos anjos Metatron e Gabriel retratam momentos de suas vidas que se
transformaram em necessidade de fazer alguma coisa por alguém, no sentido de preencher um
vazio e superar trauma, confirmando a afirmação de Barreto (2005, p. 103)
o que fazemos aos outros estamos fazendo a nós mesmos. Nesse sentido
ajudar o outro é prazeroso e nos permite ser solidários. Não podemos
esquecer que o objeto de nossa ação, na realidade, é um parceiro que nos
ajuda a nos conhecermos melhor e a crescermos.
De modo geral, o desejo de ajudar expresso através das motivações assistencialista,
humanitária e pessoal, foi responsável para que as doulas desenvolvessem o seu trabalho.
Assim, o desejo tem o poder de transformar, de unir, de dar sentido à vida, atingindo o ser
humano de maneira significativa.
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As mudanças na vida pessoal das colaboradoras, depois de se tornarem doulas, foram
evidenciadas através dos depoimentos que expressaram aprendizado, crescimento pessoal e
aumento da auto-estima, como mostram as falas a seguir:
[...] aprendi a não julgar tanto as pessoas [...]. (Anjo Zedekiel).
[...] cresci como ser humano,
sou uma pessoa bonita e feliz
[...].
(Anjo Tzaphkiel).
[...] estou sorrindo e mais alegre[...] confio mais nas pessoas [...].
(Anjo Gabriel).
Os depoimentos acima conduzem a inferir que a relação estabelecida pelas doulas com
as parturientes, através do cuidado, resultou na formação de vínculo e no acolhimento. A rede
de apoio formada nesse processo permitiu compartilhar dessa relação que transforma e liberta.
Segundo Waldow (1998), o cuidado humano é uma atitude ética em que os seres
humanos reconhecem os seus direitos e deveres, se relacionam, se emocionam e se envolvem.
É um processo de crescimento e aprimoramento para os envolvidos.
O resultado dessa interação para Waldow (2004) é um crescimento mútuo, entre ser
que cuida e ser que é cuidado. Dessa maneira, o cuidado se inicia por nós, com a preocupação
com o outro e o seu bem-estar. Portanto, cuidar significa praticar a conviviabilidade, o
respeito e a solidariedade. A pessoa que cuida de algo ou de alguém, sempre se sente afetada
pelo o outro. Por isso, ao cuidar de alguém também estamos cuidando de nós mesmos.
Quando o ser humano adquire uma consciência de servir ao outro é no serviço
voluntário que ele se enche de uma profunda felicidade e tranqüilidade, resultando em
aprendizado e crescimento pessoal.
Geralmente as propostas de humanização têm um caráter assistencialista, filantrópico
e apresentam-se através do trabalho voluntário. Para as colaboradoras, o trabalho voluntário é
uma atividade que não é vista como um trabalho, mas como fruto da solidariedade e da
coesão social, o oposto ao modelo de trocas mercantis hegemônicas da sociedade, como pode-
se identificar através dos seguintes relatos:
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Sei que é um trabalho voluntário, mas pra mim não é um trabalho é um
presente. Sinto-me realizada por ter feito alguma coisa boa.
(Anjo Kamael).
[...] recebemos carinho e agradecimentos das pessoas. (Anjo Zedekiel).
[...] não recebemos dinheiro [...] só amor. As mulheres e seus familiares
me abraçam, me beijam e isso para mim é muito importante [...].
(Anjo Raphael).
Fica claro nas falas dessas colaboradoras que o trabalho voluntário é entendido como
a ausência de um salário, porém se conta com um salário afetivo, que é a satisfação do fazer.
Conforme Barreto (2005), no voluntário o salário é afetivo. As universidades e os cursos
técnicos conferem um diploma que legitima uma identidade profissional e garante um salário
financeiro, enquanto as ações reparadoras aprendidas pela escola da vida, conferem um
salário com base no afeto.
A atividade das doulas configura-se como redes sociais. Segundo Braga (2006) é uma
teia de interações entre os indivíduos envolvidos em ações pautadas no respeito e na
alteridade. Funcionam como um suporte, que pressupõem confiança e reciprocidade. É
participativa, pois nessa relação existe compartilhamento de apoio, fundamentais na produção
de cuidados humanizados.
O apoio social para Lacerda; Valla, (2007) é uma possibilidade de enfrentamento das
dificuldades, por meio de ralações solidárias entre os sujeitos. Esse apoio envolve uma
relação de trocas e de envolvimento entre as pessoas, resultando na formação de nculo,
permitindo que os recursos de apoio se firmem. É, portanto uma prática de promoção da
saúde que estimula a autonomia e retoma o papel dos sujeitos como atores das ações e
intervenções.
Essa rede de apoio é organizada através das relações pessoais acolhedoras, que
envolvem trocas afetivas, cuidados mútuos e comunicação entre as pessoas, gerando
sentimentos de proteção e apoio que repercutam na promoção da integridade física e
psicológica dos indivíduos envolvidos.
A rede de apoio estabelecida entre doula e parturiente, familiares e trabalhadores da
saúde favoreceu o acolhimento, ações de proteção e promoção à saúde, diminuindo o efeito
estressante do processo de parto e nascimento, garantido pelo espaço de escuta das mulheres
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quanto às suas necessidades. Esse espaço permitiu que as parturientes expressassem seus
medos e temores.
O acolhimento e formação de vínculo fazem parte da estratégia da humanização que é
fundamental no ato de cuidar. O cuidado humanizado, evidenciado nas riquezas das
interações, nos diálogos que as doulas estabelecem com as parturientes, é fortemente marcado
pelo apoio emocional oferecido, como se pode ver a seguir:
[...] damos uma segurança emocional naquele momento tão importante
para a mulher [...]. (Anjo Metatron).
[...] procuro passar o máximo de conforto emocional [...].
(Anjo Zedekiel).
[...] dou apoio emocional primeiro, depois vou para a parte física,
fazendo massagens e sempre conversando [...]. (Anjo Raphael).
Humanizar a assistência ao parto e nascimento é dar condições para que o movimento
natural da vida possa fluir com soberania. Nas falas acima é possível identificar que o apoio
emocional e físico oferecido pelas doulas permite uma melhor condução do processo de parto
e nascimento.
O suporte social na concepção de Valla; Guimarães; Lacerda, (2006) pode ser
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As relações de cuidado que as doulas estabelecem com a parturiente, criou um
ambiente de confiança e segurança. De modo geral, os cuidados durante o processo de parto
além de transformarem o ambiente, harmonizaram as relações, sensibilizaram o ser humano e
forneceram energia para ajudar as parturientes a encontrar potencial para suportarem os
desconfortos do processo de parto e nascimento. Dessa maneira empoderam a mulher, dando-
lhe coragem e esperança, além de se sentirem valorizadas e respeitadas.
Nesse espaço de confiança e segurança, favorecido pela escuta e responsabilidade,
tendo o diálogo como uma técnica de encontro que promove a construção de vínculo e de
compromisso, as doulas utilizam os espaços relacionais como ambiente terapêutico,
introduzindo os cuidados físicos e dando força e coragem às parturientes, na perspectiva da
ética do cuidar, como é evidenciado nas seguintes afirmativas:
[...] converso muito com elas, oriento,coloca no cavalinho, na bola, de
cócoras na cama e dou massagem [...]. (Anjo Ratziel).
[...] fico conversando com ela, dando uma força. (Anjo Michael).
Tento ajudar para que fiquem mais fortes e sintam aliviadas
emocionalmente. (Anjo Zedekiel).
Aprendemos a trabalhar com ética, que é saber orientar as mães,
respeitar seus limites, os nossos e das enfermeiras [...]. (Anjo Ratziel).
Consoante estes depoimentos, as colaboradoras demonstram uma disponibilidade e
envolvimento com as parturientes, durante o desenvolvimento de suas atividades, com
respeito e dignidade. Essas concepções são influenciadas pelos princípios da humanização da
assistência que valoriza o respeito, a dignidade e bem estar das mulheres durante o processo
de parto e nascimento.
Segundo Teixeira (2007), a conversa é a atividade principal do serviço de saúde.
Sendo assim, todo o diálogo que a doula mantém com as parturientes na sala de pré-parto visa
buscar um maior conhecimento das suas necessidades e dos modos de satisfazê-las.
O conhecimento técnico que as doulas adquirem no treinamento é utilizado num
ambiente acolhedor promovido pela escuta e respeito. O resultado dos exercícios, da atenção e
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do apoio, faz com que a gestante se sinta segura, pois não está acostumada a receber atitudes
acolhedoras, muito menos durante o processo de parto e nascimento, no ambiente hospitalar.
O Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias é uma fragmentação do cuidado, um
arranjo de solidariedade que constitui em redes de apoio. Atuam pela interferência direta da
população, da sociedade civil organizada e tecem estratégias práticas de cuidado cujo objetivo
principal é fornecer apoio emocional, aumentando a autonomia das mulheres diante da
experiência do processo de parto e nascimento.
O cuidado ético que as doulas prestaram, implica em acolhimento, interação e
comunhão. No lugar da intervenção a companhia afetuosa, estar ao lado e junto com o outro
em vez da dominação. Essa relação fez surgir o ser humano sensível e solidário, preocupado
com o social e contribuindo para melhorar a qualidade da atenção à mulher, durante o
processo de parto e nascimento. Segundo Boff (1999), o amor é a grande força de agregação,
de simpatia e de solidariedade. Ele é responsável pela ternura, carícia, cordialidade,
convivialidade e compaixão, garantindo a humanidade dos seres humanos. Sendo assim, o
cuidado para as doulas representa viver o amor como relata as seguintes falas:
[...] você transpira e vive o amor [...]. (Anjo Zedekiel).
[...] é um trabalho que faço com amor [...]. (Anjo Metatron).
[...] tem que ter muito amor, atenção e carinho [...]. Cuidar com
paciência e amor. (Anjo Raphael).
De acordo com esses depoimentos é possível afirmar que as colaboradoras são
movidas pelo o amor. As doulas fazem uso da tecnologia da afetividade nos cuidados com as
parturientes e o amor é o sentimento responsável por conduzir suas atividades. Os cuidados
simples que elas oferecem como escutar, demonstrar atenção e paciência são atitudes que
promovem o bem estar e conforto na tentativa de fortalecer os direitos da mulher em processo
de parto e nascimento, conferindo-lhe uma melhor qualidade na assistência, contribuindo para
a promoção da saúde integral.
A presença das doulas na sala de pré-parto é uma atividade nova no cenário do
cuidado, tem por objetivo humanizar a atenção às mulheres, em situação de parturição,
entretanto, as falas das colaboradoras revelam características do processo biomédico de um
cuidar fragmentado e focalizado na doença.
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[...] falo com o médico sobre a paciente [...]. (Anjo Raphael).
[...] faço massagem nas pacientes. (Anjo Gabriel).
[...] é melhor para paciente e para o bebê. (Anjo Tzaphkiel).
Esses depoimentos mostram a presença da concepção do parto medicalizado em que a
mulher não participa ativamente do processo de parto e nascimento. Nessa situação, ela é
considerada como uma paciente. No entanto, a humanização da assistência diz respeito à
adoção de valores de autonomia e protagonismo dos sujeitos, de co-responsabilidade entre
eles, solidariedade dos vínculos formados, direitos dos clientes e participação coletiva no
processo de gestão (BRASIL, 2005).
Os profissionais de saúde responsáveis pelo o treinamento de formação das doulas
ainda não entenderam ou não se apropriaram do significado da humanização em sua
totalidade, pois a mulher vista como paciente participará passivamente das ações de saúde,
contrariando os princípios básicos da humanização. Com a finalidade de se tornarem ativas,
durante o processo de parto e nascimento, as doulas devem ser tratadas pelo primeiro nome,
resgatando a sua autonomia e participação através da co-responsabilidade das ações propostas
na assistência.
5.3 A necessidade de reconhecimento e aceitação das doulas
O terceiro eixo temático ressalta os desafios encontrados pelas doulas no
desenvolvimento de suas atividades. Nessa perspectiva, os trabalhadores da saúde não
conseguem reconhecer a doula como uma parceira na relação de cuidado à mulher, durante o
processo de parto e nascimento.
Esses desafios são percebidos pela maioria das doulas, traduzidos nos depoimentos
abaixo. É inerente à sociedade marcada por injustiças, desigualdades e exclusões sociais. No
entanto é fundamental fazer das dificuldades encontradas algo produtivo. Nesse sentido, não
impedir a participação das doulas no parto e valorizar o seu cuidado, que é gratuito,
acolhedor, é importante para construção de uma cultura de paz e da não violência.
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O nosso maior desafio é com a equipe médica e, às vezes, de enfermagem.
Tem pessoas que adoram nosso trabalho, mas têm outras que não
gostam. (Anjo Gabriel).
O desafio que encontro está no relacionamento com a equipe de saúde, às
vezes é a equipe de enfermagem, outras os médicos. Muitos não aceitam
o nosso trabalho. (Anjo Zedekiel).
Essas falas traduzem a dificuldade que o trabalhador da saúde apresenta para
desenvolver suas atividades em rede, em equipe, construindo vínculos fortes e saudáveis no
processo de cuidar. Trabalhar em equipe precisa ser entendido como um trabalho de parcerias,
onde todos os envolvidos na prestação da assistência à parturiente têm uma função
importante.
Na opinião de Dias; Deslandes (2006), os profissionais de saúde responsáveis direto
pela assistência à mulher em trabalho de parto, com formação profissional, orientada pelo
modelo biomédico, levam a não aceitar essa nova proposta de cuidado. As práticas
assistenciais usando bolas de fisioterapia, massagens e principalmente apoio emocional
recebem inúmeras críticas dos profissionais de saúde. Além disso, eles não estão habituados a
lidar com as mulheres em situação de autonomia e que não estejam restritas ao leito. Mesmo
negando a medicina baseada em evidência, não acreditam que tais práticas possam trazer
benefícios à evolução do processo de parto e nascimento.
Um outro aspecto importante, para Lacerda; Valla (2007), é que a racionalidade
biomédica pouco valoriza as relações pessoais como recurso terapêutico, a sua preocupação é
com o diagnosticar e curar a doença, em vez de curar e cuidar dos doentes. A justificativa para
esse comportamento deve-se ao período de formação profissional, pois no ensino médico não
existe a preocupação com o cuidado na qualidade “humanizado”, os ensinamentos são em
torno da valorização da técnica e na utilização da tecnologia. Segundo Silva Jr.; Merhy;
Carvalho (2007), o conhecimento é adquirido com ênfase sobre as doenças e agravos,
deixando uma lacuna de formação no campo relacional. Por isso, é necessário recuperar
conteúdos da cultura humanística, através de estratégias educacionais.
As experiências não acolhedoras e excludentes do nosso cotidiano também repercutem
no ambiente de trabalho. Conforme Grupo de Estudos sobre Nascimento e Parto, (2005) essa
situação reflete nas instituições de saúde, nas relações de autoridade, jogos de poder
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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caracterizado pela demarcação de território dos profissionais e o desprezo de algumas
categorias com os outros integrantes do serviço de atenção ao processo de parto e nascimento.
Nos encontros com as doulas e os trabalhadores, sentimentos de não acolhimento estão
presentes como se pode perceber nas falas seguintes:
Alguns médicos e enfermeiras não me olhavam com bons olhos e não me
davam atenção [...] dava bom dia e eles não respondiam. Quando eu me
aproximava eles se afastavam de mim [...]. (Anjo Raphael).
[...] têm auxiliares de enfermagem que passam a noite toda e não falam
comigo. Dou boa noite e não respondem [...]. Algumas até saem da sala
de pré-parto quando estou [...]. (Anjo Michael).
Nestes depoimentos fica claro o clima de não aceitação e quando isto acontece reina
no espaço de trabalho sentimentos de desvalorização e isolamento, gerando sensações de
incapacidade e frustração. Essa situação dificulta o crescimento do Programa de Doulas
Comunitárias Voluntárias, na instituição.
A humanização é um processo complexo, pois suas propostas pretendem modificar
padrões de atitudes, comportamentos e valores, que exige conscientização, sensibilização e
um maior empenho dos trabalhadores, gestores e sociedade. Nesse sentido, Ferrari; Prado
(2002), afirmam que qualquer tentativa de mudança desperta resistência, mesmo que as
modificações sejam em busca de uma prática diferente. Resistir, não ceder, faz parte da
condição humana. A dificuldade não está nas novas idéias, mas em abandonar as antigas,
trocar o velho pelo o novo traz sempre o medo e a desconfiança. Algumas colaboradoras
tentam justificar a falta de acolhimento com os seguintes argumentos:
Talvez eles se sintam incomodados com a nossa presença, porque às
vezes acontece alguma coisa no pré-parto e eles devem ficar com receio
que a gente saia criticando ou falando o que aconteceu.
(Anjo Raphael).
Acham que a gente vai interferir no seu trabalho. (Anjo Zedekiel).
A doula deve ser vista como uma parceira, forte aliada no sentido de proporcionar um
cuidado de qualidade e não como uma fiscal. Ela complementa e facilita as atividades dos
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profissionais, pois proporciona um ambiente harmonioso, deixa a parturiente mais tranqüila,
cooperativa com a equipe e o parto. Dessa maneira, o Grupo de Apoio à Maternidade Ativa
[2006?], propõe que o profissional pode concentrar os seus cuidados e atenção para os
aspectos fisiológicos do processo de parto e nascimento, deixando o conforto físico, técnicas
de relaxamento e respiração serem oferecidos pelas doulas.
De modo geral, as doulas participam do momento íntimo e especial na vida das
mulheres. O seu maior objetivo é ajudar as parturientes, transformando as emoções,
envolvidas no processo de parto e nascimento, em experiências vividas de maneira positiva.
As falas abaixo refletem esse desejo:
O que quero é a amizade das pessoas, fazer o bem e não criticar ninguém
é o que aprendi aqui [...]. (Anjo Zedekiel).
[...] quero fazer o bem e ajudar quem está precisando num momento
de muita dor. (Anjo Uriel).
O que importa é que estou aqui para fazer alguma coisa por alguém [...].
Quero que seja bom para a paciente, pois é ela que precisa.
(Anjo Tzaphkiel).
Isso mostra que as atividades das doulas vêm contribuindo para uma parceria com os
profissionais de saúde que beneficia as mulheres. Elas sabem que sua função é ajudar as
parturientes a suportar a dor e o desconforto do processo de parto e nascimento.
Uma equipe trabalha bem quando cada um de seus membros é capaz de integrar o
papel desempenhado, na perspectiva de construir uma relação saudável e confiante. Para
promover a integração da doula, junto com a equipe de trabalhadores de saúde, foi sugerido,
por uma das colaboradoras, que fossem realizadas reuniões com os profissionais envolvidos,
na assistência, com o objetivo de esclarecer o papel da doula na instituição:
Acho que deveria haver uma reunião com enfermeiras, médicos e
auxiliares de enfermagem esclarecendo a importância das doulas na
maternidade, nossas dificuldades e os nossos direitos como voluntárias.
(Anjo Raphael).
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Esse depoimento afirma a necessidade de diálogo e de respeito entre as pessoas que
trabalham juntas. É um dever de todos contribuir para que o ambiente de trabalho seja
agradável e cada um se sinta acolhido. Por isso o Grupo de Estudos sobre Nascimento e Parto
(2005), reconhece que os serviços de saúde devem criar oportunidades de discussões para os
envolvidos com o atendimento à parturiente possam trabalhar efetivamente em equipe, com
respeito mútuo e reconhecimento da importância do papel desempenhado por cada um. Para
tanto, Mariotti, (2002), comenta que introduzir uma cultura de acolhimento é preciso
mudanças na organização dos serviços por meio de um desenvolvimento pessoal, uma visão
comprometida e compartilhada no sentido de alcançar um objetivo comum, qualificar a
assistência.
No discurso das colaboradoras foi encontrado como estratégia de enfrentamento das
dificuldades do dia-a-dia de suas atividades. A confiança em Deus, o ato de orar, pedir forças
e sabedoria ao Divino, proporcionando equilíbrio emocional e bem estar. A crença em Deus
permite que tenham força e esperança, como exemplificadas nas falas seguintes:
[...] peço a Deus sabedoria. (Anjo Raphael).
Peço a Deus que me dê força. (Anjo Michael).
[...] oro a Deus e peço para me abençoar e que amanhã eu tenha força
e palavras para aquelas mulheres [...]. (Anjo Gabriel).
Essas narrativas mostram que a espiritualidade ocupa um lugar de destaque na vida
das pessoas e pensar no cuidado, na perspectiva da integralidade é entender o ser humano, em
todas as suas dimensões, inclusive biológica e espiritual. A é um elemento que promove
alívio para as preocupações e ajuda na superação dos problemas. Para Vasconcelos (2006),
entender a espiritualidade é uma dimensão importante no cuidar e na compreensão das formas
de enfrentar os problemas cotidianos.
A busca da espiritualidade é uma experiência individual, de importante significado
social. É responsável por profundas transformações na percepção de vida, dando-lhe novo
significado e gerando novas condutas.
Na opinião de Boff (2006), com fé, a vida torna-se mais leve, transforma-se em
encantamento. As dificuldades nunca deixam
de existir, mas não conseguem apagar os sinais
deixados pelo amor e pela fé.
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Portanto, a expressa pelas doulas é um instrumento que mobiliza forças e energia
interior para atuarem com maior firmeza e confiança. É uma importante estratégia de
resistência às dificuldades encontradas no desenvolvimento das suas atividades. A fé em Deus
dá sentido à vida e não deixa a esperança morrer.
Apesar das dificuldades, uma das colaboradoras vem percebendo que ultimamente
estão sendo necessárias, conforme relato abaixo:
Os profissionais hoje em dia estão aceitando mais a nossa presença no
pré-parto, diferente de algum tempo atrás. Algumas equipes já sentem a
nossa falta. Às vezes perguntam: ‘o que houve com as doulas que não
estão aqui?’ Então estamos sendo necessárias pela nossa atuação.
(Anjo Metatron).
De acordo com o anjo Metatron a presença da doula no ambiente do parto e
nascimento, ao lado da parturiente, ouvindo suas queixas e compartilhando suas emoções,
proporciona uma atmosfera confiante e tranqüila que pode ser percebida pelos profissionais.
O Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias, assim como a garantia da acompanhante, é
mais uma estratégia para viabilizar experiências positivas em um momento especial da vida
da mulher e familiares, como o parto e nascimento.
As doulas não recebem salário ou remuneração que configure vínculo empregatício,
alguns serviços oferecem uma ajuda de custo, como o vale transporte e direito às refeições
durante seu período de expediente. Geralmente não possuem qualquer formação na área de
saúde, porém recebem treinamentos básicos pelas equipes das maternidades, como noções de
processo de parto e nascimento, posições que favoreçam o parto, técnicas respiratórias,
massagens, banhos mornos e de como se colocar na sala de parto. Enfim, são mulheres
dispostas a doar o seu precioso tempo para ajudar, em geral, mulheres desconhecidas,
oferecendo apoio, carinho e palavras de encorajamento às parturientes.
A concepção de humanização volta-se para uma atenção que valoriza a qualidade do
cuidado, associado ao reconhecimento dos direitos das mulheres, sua subjetividade e das suas
crenças e valores. Quando todos os envolvidos no cuidado à mulher, durante o processo de
parto e nascimento, perceberem a importância de estabelecer uma parceria com as doulas, as
mulheres estarão, certamente, com uma possibilidade real de tornar esse momento, em uma
experiência positiva e humanizada. Nessa perspectiva, as doulas podem contribuir com essa
experiência.
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O Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias, dada a sua importância no cenário
do cuidado humanizado, carece de mais incentivos para a sua implementação nos serviços de
atenção à saúde da mulher. Assim, com a valorização do trabalho das doulas, o Programa se
amplia se fortalece e a ação atinge o seu objetivo que é contribuir de maneira efetiva com a
humanização do cuidado à mulher, à família e à comunidade. A sua presença fará a diferença
nas maternidades públicas.
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“Para mudar a vida é preciso
primeiro mudar a forma de nascer.”
(Michel Odent)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006
________ 6Reflexões Finais
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A motivação que levou a autoria deste estudo a realizá-lo foi o interesse de conhecer
práticas humanizadas de cuidado à parturiente e investigar as contribuições das doulas
comunitárias voluntárias, para uma atenção integral e de qualidade à saúde das mulheres e
familiares que vivenciam o processo de parto e nascimento.
As doulas contribuem com a valorização de criação e estabelecimento de vínculos,
oferecendo um cuidado que privilegia a escuta ativa, alicerçada em atitudes de respeito,
acolhimento, conhecimento técnico e amor. Conhecer as experiências das colaboradoras no
cuidado às mulheres, em trabalho de parto, é reconhecer que nas suas histórias de vida
encontramos desejo e prazer de ajudar o outro. As relações que essas mulheres estabelecem
com o mundo e com as pessoas são de compaixão, solidariedade, atenção, preocupação e
desvelo. Enfim, atitudes de cuidado.
As suas ações se concentram no período que antecede o momento de preparação para
o nascimento, quando a mulher vivencia momentos de dificuldade, insegurança, ansiedade,
desconforto e dores. No entanto é importante que seja discutido com os profissionais de
saúde, a possibilidade da sua participação também no momento do parto, visto que o nculo
construído entre parturiente e doula deve ser respeitado, pois conseguem estabelecer uma
relação íntima, profunda e de confiança com a mulher em um momento especial de sua vida.
A presença da doula é de caráter voluntário, instituído pelo Decreto 20.652 de 22 de
dezembro de 2004, amparado pela Lei Municipal 16.683/2001, constitui uma ação de
política de humanização da atenção à saúde da mulher durante o processo de parto e
nascimento (PERNAMBUCO, 2004).
O cuidado desenvolvido pelas doulas durante o processo de parto e nascimento,
necessita ser entendido como uma possibilidade de encontro, de interação e de diálogo com o
outro no universo do cuidado da sua prática diária. Essa relação viabiliza uma escuta
qualificada, um olhar diferenciado e um toque cuidadoso, permitindo à mulher expressar suas
angústias, seus medos e sofrimentos. Nessa perspectiva o cuidado não é apenas um ato, mas
uma atitude, que significa acolhimento, respeito pelas diferentes histórias de vida. Assim
sendo as atividades que as doulas desenvolvem visam promover o bem estar emocional da
parturiente, ajudando-a a enfrentar os desconfortos do processo de parto e nascimento,
diminuindo o medo, a tensão e a dor, e conseqüentemente aumentando a possibilidade do
parto ser uma experiência positiva para a mulher e sua família.
Sobre esse assunto Brüggemann; Parpinelli; Osis (2005), estudando o suporte à
mulher durante o processo de parto e nascimento, observaram os efeitos deste apoio à
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parturiente. Os resultados encontrados foram reduções da taxa de cesariana, do uso de
ocitocina, diminuição na duração do processo de parto e nascimento, do uso de analgesia/
medicamentos para o alívio da dor e aumento da satisfação materna com a experiência do
nascimento.
Assim, o trabalho desenvolvido pelas doulas contribui com a humanização do cuidado
à mulher, pois é uma ão que articula o saber da sua própria experiência de vida com o
conhecimento técnico recebido durante os treinamentos, aliados a atitudes simples, sensíveis e
acolhedoras. O Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias também possibilita uma
participação ativa e voluntária da comunidade, na assistência hospitalar às mulheres, durante
o processo de parto e nascimento e colabora com o controle social da atenção à saúde
institucionalizada. As doulas contribuem, de maneira significativa com a transformação das
relações que se estabelecem com as parturientes, familiares e comunidades. Valorizam
práticas centradas na vida, privilegiam o acolhimento, às relações de afeto, de respeito às
diferenças e mostram que o território no qual se tem experiência, a vida é ampla e rica de
diferentes possibilidades, de transformação e construção, de um cuidado novo.
Portanto, pensar em humanização envolve uma relação entre sujeitos de um processo
que cria e fortalece vínculos. Dessa maneira, possibilidades como o Programa de Doula
Comunitária Voluntária, iniciativa responsável por um cuidado acolhedor, digno e solidário,
necessita ser expandido e ampliado para as diferentes regiões do país, pois é uma ação que
traz benefícios para a mulher, família e comunidade, fazendo com que o processo de parto e
nascimento ocorra em um ambiente de harmonia e satisfação.
Vale ressaltar que ações como essas contribuem com a humanização do cuidado à
saúde, por tratar-se de uma prática construída com o outro e com o mundo. O encontro do
profissional de saúde com o usuário quase sempre extrapola os protocolos estabelecidos para
a humanização do cuidado, pois o universo das relações carrega inúmeros desafios a serem
enfrentados. Nesse sentido, as doulas afirmaram ter vivenciado situações de falta de
acolhimento e não reconhecimento das suas atividades. Esses achados levam a se considerar
que a convivência insituição-comunidade, profissionais-usuários, familiares e doulas são um
desafio para as nossas maternidades, acostumadas a não aceitar acompanhantes e o contexto
cultural das mulheres assistidas. Enfrentar este desafio faz com que mães, pais, bebês,
profissionais de saúde, familiares e sociedade sejam beneficiados.
Os encontros realizados com as doulas colaboradoras, deste estudo, foram marcados
por profundas reflexões sobre a prática principalmente da enfermeira cuidadora da saúde da
mulher, pois percebe-se que é possível contribuir com uma experiência positiva na vida das
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mulheres. Além disso, percebe-se, ainda, que os profissionais de saúde, são capazes de
contribuir, de maneira significativa, para tornar o processo de parto e nascimento, em um
momento especial para a mulher e família. É tempo de transformação, é tempo de construção
de uma prática nova de cuidar, é um tempo novo.
Os depoimentos que compuseram o material empírico deste estudo foram marcados
por emoções e diferentes histórias de vida, de superação. A cada palavra elas expressavam
aspectos da experiência da mulher, em processo de parto e nascimento, que muitas vezes não
são valorizados pelos profissionais da saúde, preocupados com os serviços burocráticos e
envolvidos numa rotina que quase sempre endurece as relações e os corações. Ao falar das
suas dificuldades, principalmente quanto à aceitação pelas equipes de saúde, percebe-se que
vivemos em uma cultura de violência e desrespeito nas relações humanas. Por tudo isso, é
possível perceber que para humanizar a relação e o cuidado faz-se necessário entrar no
movimento de reflexão-ação-reflexão desta prática, na perspectiva de uma possibilidade real
de transformação, inovação, dessa própria prática.
Espera-se que os resultados desse estudo contribuam para a ampliação, implantação e
divulgação do Programa de Doulas Comunitárias Voluntárias, em serviços de maternidades,
em diferentes cantos deste país, para que as mulheres possam ter o seu direito garantido de ter
junto de si seu(sua) acompanhante, a presença da doula e, conseqüentemente, poder ser
assistida de maneira humanizada. Acredita-se que esses resultados possam estimular a
realização de novas pesquisas, produzindo maiores conhecimentos sobre a temática. Enfim,
este trabalho mostrou que é possível lançar-mão das potencialidades das pessoas, na relação
de cuidar do outro, para uma perspectiva de cuidar de si também, pois a relação de cuidado é
um caminho de dois sentidos, cuido do outro me cuidando (BARRETO, 2005).
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“Quando você quiser começar alguma coisa, Comece!
Pelo início e o princípio será qualquer
lugar onde você começar.”
(Wolber de Alvarenga)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006
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________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
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“O pensamento só começa com a dúvida.”
(Roger Du Gard)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006
________ ________ Apêndices
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
APÊNDICE A - FICHA TÉCNICA
I – IDENTIFICAÇÃO:
1. Idade: _________________________ anos:______________________________________
2. Estado civil: ________________________
3. Escolaridade: ________________________
4. Formação / ocupação: ________________
5. Religião: ______________________________
6. Há quantos anos atua no Projeto Doula Comunitária: ______________________________
II – QUESTÕES DE COORTE
1. Como a senhora se tornou uma doula?
2. Como a senhora cuida da mulher durante o processo de parto e nascimento?
3. Quais os desafios que a senhora encontra na maternidade para desenvolver seu papel?
III–QUESTÕES DE COORTE PARA A ENTREVISTA DE APROFUNDAMENTO
1. Porque a senhora desejou ser doula?
2. Para você qual é a importância de uma doula?
3. Como você se sente realizando esse trabalho?
4. Que mudanças essa atividade trouxe para a sua vida?
5. Houve algum treinamento para que você se tornasse uma doula?
6. O que é ser doula para você?
7. Como foi o seu nascimento?
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
MESTRADO EM ENFERMAGEM
Convido o senhor (a) para participar do estudo realizado pela pesquisadora Karla
Romana Ferreira de Souza, aluna de Pós-Graduação de Enfermagem, nível Mestrado pela
Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Sob a orientação da professora Dr (a): Maria Djair
Dias, na dissertação intitulada: Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma
maternidade pública do Recife-Pernambuco.
O objetivo deste estudo é Revelar a experiência das doulas no cuidado à mulher em
uma maternidade Pública Municipal na Cidade do Recife - Pernambuco.
Solicitamos a sua contribuição para participar com a pesquisadora através de uma
entrevista individual, utilizando o sistema de gravação (gravador), para obter informações
necessárias para elaboração do estudo. É oportuno destacar que esta pesquisa não apresenta
riscos previsíveis.
Este estudo pretende divulgar o trabalho das doulas e sua contribuição para a melhoria
da assistência à mulher em trabalho de parto em nossas maternidades.
A sua participação sevoluntária, enfatizamos que o senhor (a) poderá desistir de
participar deste estudo em qualquer momento sem nenhum prejuízo para sua atuação nesta
unidade, não haverá nenhuma forma de compensação financeira pela sua participação, visto
que a mesma é de livre e espontânea vontade, podendo haver desistência em qualquer fase da
realização da pesquisa.
Além do seu consentimento, pedimos permissão para a divulgação dos resultados
desta pesquisa, em eventos científicos e publicações em revista ou outros veículos de
comunicação, deixando claro que sua identidade será mantida em sigilo, respeitando a sua
privacidade.
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
Antecipadamente, agradecemos pela confiança depositada e por sua fundamental
colaboração para a realização deste estudo. Estaremos à sua disposição para qualquer
esclarecimento, durante todo o desenvolvimento da pesquisa.
Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecida e dou o meu
consentimento para participar da pesquisa e para publicação dos seus resultados.
Recife, ______/_______/_______
__________________________________________
Assinatura do Colaborador da Pesquisa
__________________________________________
Assinatura da Pesquisadora Responsável
No caso de dúvidas ou maiores esclarecimentos entrar em contato com:
Coordenação do Programa do Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal da
Paraíba / João Pessoa (UFPB). Centro de Ciências da Saúde. Campos Universitários I.
CEP: 58059-900 - Telefone (83) 3216-7109.
Telefone para contato com a professora responsável: Dr
a
Maria Djair Dias
(83) 8847.3348 João Pessoa - PB
Telefone para contato da aluna responsável: Mestranda Karla Romana Ferreira de
Souza (81) 9945.8992 - Recife - PE
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
APÊNDICE C - CARTA DE CESSÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
MESTRADO EM ENFERMAGEM
Recife, ________ de ____________________ 2007.
Colaborador (a): ____________________________________________________________
Eu, ______________________________________________________________________.
Estado civil ___________________ documento de identidade nº ___________________
Declaro para os devidos fins que cedo os direitos de minha entrevista, transcrita e
autorizada para leitura na data __________________ para a pesquisadora Karla Romana
Ferreira de Souza, podendo ser usada integralmente ou em partes, sem restrições de prazos e
citações, desde a presente data, em favor da realização da sua dissertação de mestrado,
denominada: Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública
do Recife-Pernambuco.
Da mesma forma, autorizo a sua audição e o uso das citações a terceiros, ficando
vinculado o controle á referida pesquisadora.
Abdicando direitos meus e de meus descendentes, subscrevo a presente, que terá
minha firma reconhecida em cartório.
_________________________________________
Assinatura do Colaborador da Pesquisa
__________________________________________
Assinatura da Pesquisadora Responsável
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
"Não basta conquistar a sabedoria; é preciso usá-la."
(Marcus Tullius Cicero)
Fonte: Curso de Formação de Doulas, 2006
________ ___ ________ Anexo
________________________Experiência das doulas no cuidado à mulher em uma maternidade pública do Recife-Pernambuco.
ANEXO A – CERTIDÃO DE APROVAÇÃO
Carta de aprovação do projeto de pesquisa pelo COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA da
Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco - Hospital Agamenon Magalhães
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