Resumo
Faz-se prática constante em nossas salas de aula o estudo desarticulado entre uso e
reflexão da língua, o que acaba por promover no aluno uma visão equivocada de
independência entre o uso real da língua e os conteúdos de gramática. Partindo dessas idéias,
interessava-nos descobrir, com esta pesquisa, como uma professora de 6ª série de uma escola
particular, empenhada em transformar sua prática pedagógica de ensino de gramática,
procederia, em sala de aula, ao tentar se afastar desse ensino tradicional. Mais
especificamente, a pesquisa teve como objetivos: a) identificar e descrever o objeto de ensino
construído nas aulas de Língua Portuguesa pela professora-pesquisadora; b) identificar e
descrever os instrumentos semióticos mediadores da construção do objeto de ensino “adjetivo”
nas aulas selecionadas para análise. Buscando, então, ir além da identificação dos problemas
que permeiam o ensino tradicional de gramática, compreendemos que a produção da inovação
no ensino de gramática refere-se à adoção de uma abordagem de Língua Portuguesa com foco
na articulação entre texto, gênero e gramática como sugerem os documentos oficiais. Para
tanto, dispusemo-nos, pois, a construir atividades que integrassem essas noções, na tentativa
de substituir a prática de uso do texto como pretexto por um tratamento funcional de aspectos
lingüísticos. Desse modo, mobilizamos referenciais teóricos de diferentes abordagens (sócio-
discursiva, sistêmico-funcional, e a própria gramática), na tentativa de não reduzir e não
fragmentar nosso objeto de investigação; e utilizamos a metodologia qualitativo-interpretativista
de natureza etnográfica, para a geração e análise dos dados. Além disso, por compreender a
inovação como uma reconfiguração, impulsionada por demandas institucionais, dos modos
rotineiros de agir em questões de estudo e de ensino de língua, fizemos uma rápida revisão das
propostas de inovação no ensino de gramática apresentadas pela produção acadêmica e pelos
documentos oficiais (PCN). Como resultado dessa revisão destacamos a imprecisão das
prescrições dirigidas ao professor pelos documentos oficiais, constituídos por uma amálgama
de abordagens teórico-metodológicas, bem como a solidarização de noções teórico-
metodológicas vindas da tradição gramatical e da teoria lingüística. Quanto ao trabalho
efetivamente realizado na sala de aula, constatamos, de um lado, que os diferentes modos de
inovação produzidos nas aulas analisadas são constituídos por uma inter-relação de atividades
e práticas múltiplas e heterogêneas; de outro lado, que a professora que está tentando inovar
sua prática de ensino de gramática produz algumas respostas comuns às demandas de
inovação: desenvolve a análise lingüística com as categorias da gramática tradicional, da
gramática funcional ou lingüística de texto, amparadas pela teoria dos gêneros textuais; e, para
o estudo de categorias da gramática tradicional, lança mão de modos de descrição/análise
disseminados pela lingüística, focalizando sobretudo a dimensão semântica da língua.
Acreditamos que o presente trabalho pode contribuir para a discussão sobre a natureza e o
funcionamento das práticas de sala de aula, particularmente, as que envolvem a produção da
inovação no ensino de gramática.
Palavras-chave: inovação em sala de aula; ensino de gramática; saberes do professor.