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No texto “Os níveis de análise lingüística”, Benveniste (1962/1995, p. 140)
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, ao
trazer a sua preocupação com a aquisição da linguagem, pontua que, quando o homem
aprende a falar no exercício incessante de sua atividade de linguagem em todas as situações, é
a frase
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o segmento do discurso que se constitui como unidade completa, pois evoca ao
mesmo tempo sentido e referência; sentido porque é enformada de significação, e referência
porque se refere a uma determinada situação. Assim, o semanticista continua a sua reflexão
acerca da aquisição da linguagem, enfatizando que é pela língua em uso através do discurso,
percebido, inicialmente, em segmentos analisáveis - frases – que o locutor constrói a
estrutura de sua língua. O que se torna mais ou menos sensível para ele é a diversidade de
conteúdos transmitidos, em contraste com o pequeno número de elementos empregados. Daí,
destacará ele, inconscientemente, à medida que o sistema se lhe tornar familiar, uma noção
empírica de signo, que se define no seio da frase. Para Benveniste, o signo é a unidade
mínima da frase suscetível de ser reconhecida como idêntica num meio diferente ou de ser
substituída por uma unidade diferente num meio idêntico. O locutor, assim, toma consciência
do signo sob a espécie de “palavra”. Nesse percurso, já “fez um início de análise lingüística a
partir da frase e no exercício do discurso” (Benveniste, 1962/1995, p. 140). O locutor parte
das unidades maiores para as menores; já o lingüista, para ele, faz a operação inversa, porque
parte das unidades elementares para chegar à frase. Desse modo, “é no discurso atualizado em
frases que a língua se forma e se configura. É aí que começa a linguagem” (Benveniste, op.
cit. p. 140). Parece-nos, assim, importante observar, nesse processo, a apropriação da palavra
pela criança a partir da escuta da frase do “outro”.
A aquisição da noção de signo, através do uso da palavra na frase pela criança nos
remete ao texto “Forma e sentido na linguagem”, em que Benveniste (1967/1989), ao dividir
a língua em dois níveis, o semiótico e o semântico, traz a idéia de sintagmatização. Há,
conforme Benveniste, duas maneiras de ser língua: na forma (nível semiótico) e no sentido
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Publicado originalmente em Proceedings of the 9th International Congress of linguists, Cambridge, Mass.,
1962, Mouton & Co., 1964. A publicação brasileira integra o livro Problemas de Lingüística Geral I
(1966/1995), em seu capítulo 10.
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Cabe lembrar que, para Benveniste, a frase liga-se ao uso da língua, porque implica referência à situação de
discurso e à atitude do locutor. Desse modo, sua definição de frase não se relaciona àquela conhecida
tradicionalmente pela terminologia gramatical. Tal definição tradicional apóia-se na sintaxe, enquanto a noção de
frase de Benveniste baseia-se na semântica, uma vez que considera o sentido de uma frase como a “idéia” que
exprime, realizada pelo agenciamento de palavras, por sua organização sintática e pela ação que umas palavras
exercem sobre as outras. Uma frase, para Benveniste, participa sempre do “aqui e agora”. Nesse sentido, “a
idéia só encontra forma num agenciamento sintagmático (...) uma condição primeira, inerente à linguagem”
(Benveniste, 1966/1989, pp. 230,231). Por isso, enfatiza que o sentido de uma frase é a sua idéia e de uma
palavra o seu emprego, já que, a cada vez particular, o locutor utiliza palavras que neste emprego têm um
“sentido” particular. Assim, a frase, nessa perspectiva, está vinculada à própria noção de enunciação, que,
conforme as palavras do autor, é “um acontecimento que desaparece” (op. cit, p. 231).