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RAFAEL ALENCAR FURTADO
ESPAÇO MARX DA UFPR E A
CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA
CLASSE TRABALHADORA
Dissertação apresentada como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em Educação,
Programa de Pós-Gradução em Educação da,
Setor de Educação da Universidade Federal do
Paraná.
Orientadora: Profa. Dra. Orliney M. Guimarães
CURITIBA
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RAFAEL ALENCAR FURTADO
ESPAÇO MARX DA UFPR E A
CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA
CLASSE TRABALHADORA
CURITIBA
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DEDICATÓRIA
Aos trabalhadores e trabalhadoras
que constroem alienadamente, reivindicatoriamente
ou revolucionariamente,
o caminho para a chegada da época
em que a humanidade será possível.
3
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, a todos os companheiros e companheiras do Espaço Marx que
durante os últimos três anos e meio, contribuíram incisivamente na minha formação
política. Esse é um trabalho escrito por nossas mãos, com suas semelhanças e diferenças.
Às pessoas que compõem parte fundamental dessa formação e cotidianamente
estenderam-me a mão e o coração para que eu pudesse continuar. Em especial à Mieko,
Ana e Maria Luiza, três mulheres, três gerações, três amores.
Aos demais companheiros e companheiras de outros espaços de militância, por em
tempos tão sombrios se proporem a continuar construindo a saída da pré-história da
humanidade.
E finalmente à professora Orliney Maciel Guimarães, pela paciência e pela
autonomia concedida ao desenvolvimento desse trabalho.
4
EPÍGRAFE
O mar vem do mar
morre nascendo
simulacro de deus
baba do céu
vem do mar o mar
mar de si mesmo
deserto sem memória
e sem esquecimento
o mar chega ao mar
mas à noite
as ressacas não retornam
para o horizonte
Mario Benedetti
Não importa que doa: é tempo
de avançar de mão dada
com quem vai no mesmo rumo,
mesmo que longe ainda esteja
de aprender a conjugar
o verbo amar.
É tempo sobretudo
de deixar de ser apenas
a solitária vanguarda
de nós mesmos.
Se trata de ir ao encontro.
( Dura no peito, arde a límpida
verdade dos nossos erros. )
Se trata de abrir o rumo.
Os que virão, serão povo,
e saber serão, lutando
Thiago de Mello
5
SUMÁRIO
RESUMO..........................................................................................................................vi
ABSTRACT.....................................................................................................................vii
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................09
PARTE I
2.O PROCESSO DE CONSCIÊNCIA: UMA ABORDAGEM MARXISTA.............11
2.1 - Consciência de Classe: o processo de sua constituição........................................17
2.2 - Formação Política na Formação da Classe...........................................................27
PARTE II
3. HISTÓRICO DO ESPAÇO MARX/UFPR: CAMINHOS QUE LEVAM A SUA
ORIGEM..........................................................................................................................35
3.1 - Antes de Espaço Marx, Florestan Fernandes........................................................41
3.2 - Espaço Marx, porquê?...........................................................................................44
3.3 - O vínculo com a instituição UFPR.......................................................................46
3.4 - A Definição da Metodologia Inicial.....................................................................47
3.5 - Assim inicia-se o Espaço Marx da UFPR............................................................52
3.6 - Para Além do Capital, sem abandoná-lo..............................................................53
3.7 - Aumenta a demanda: O que fazer?.......................................................................54
3.8 - O Espaço Lênin, revoluções e conjuntura............................................................57
4. OS PARTICIPANTES DO ESPAÇO MARX: QUEM SÃO E O QUE
AVALIAM?.....................................................................................................................59
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS: ESPAÇO MARX UM INSTRUMENTO DE SEU
TEMPO ............................................................................................................................82
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................90
7. ANEXOS.......................................................................................................................94
6
RESUMO
ESPAÇO MARX DA UFPR E SUA CONTRIBUIÇÃO NO
PROCESSO DE FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DE CLASSE DA
CLASSE TRABALHADORA
A fundamentação teórica é vista como um dos instrumentos de desenvolvimento da
consciência de classe. Lênin afirmava que os processos de lutas reais coadunados com o
processo de formação teórica, são elementos essenciais para o desenvolvimento da
consciência da classe trabalhadora no seu processo de libertação. No momento atual do
sistema capitalista, de aprofundamento da ofensiva do capital sobre o trabalho nas relações
sociais de produção, expressa pela depreciação das condições de trabalho, aumento do
exército industrial de reserva e aumento acentuado da miséria em uma grande parte da
população, faz-se necessário não somente entender, interpretar a consciência social
sintetizada nesse cenário, mas essencialmente perceber possibilidades de contribuir para a
sua transformação. Este trabalho teve como objetivo analisar o grupo de estudos que ocorre
na UFPR, denominado Espaço Marx, procurando entender sua concepção metodológica,
contextualizar seus limites, avanços, contradições e possibilidades enquanto um
instrumento possível de desenvolvimento da consciência de classe. Através de uma revisão
de literatura sobre o processo de consciência e mais especificamente sobre o processo de
consciência de classe e da participação das etapas iniciais do curso de formação de
monitores do Núcleo de Educação Popular 13 de maio de São Paulo, buscamos
fundamentar a análise sobre o trabalho desenvolvido no espaço Marx. O trabalho de campo
constituiu-se de entrevistas previamente estruturadas com os fundadores do Espaço Marx
da UFPR, aplicação de um questionário aos participantes deste espaço, de uma
apresentação e conseqüente debate com esses membros sobre as considerações iniciais e da
participação do autor no grupo de estudos pelo período de três anos e seis meses. Nesse
processo realizado concluímos que o Espaço Marx da UFPR tem como objeto prioritário
de trabalho o aprofundamento teórico para militantes que passam ou realizaram o
rompimento com a fase de consciência reivindicatória e que consegue avançar
significativamente nesse aprofundamento desses participantes. Por outro lado, constatou-se
também a necessidade de se avançar na discussão estrutural e metodológica desse espaço,
na perspectiva tanto de possibilitar a construção de um programa de estudos mais
sistematizado como de conseguir contemplar outros objetivos a que se propõe como:
produção e divulgação da ciência marxista e interação com outros espaços de estudo do
marxismo.
Palavras-chave: Espaço Marx, formação da consciência, classe trabalhadora.
vi
7
ABSTRACT
UFPR MARX CENTER AND THE CONTRIBUTION ON THE
PROCESS OF CLASS CONSCIOUSNESS FORMATION OF WORKING
CLASS
The theoretical formation is seen as one of the class consciousness development
instrument. Lenin affirmed that the real fight processes combined with the theoretical
formation process, are essential elements to develop the working class consciousness on its
process of liberation. On this actual moment of the capitalism system, the deepen of the
offensive capital over work upon the social relations of production, makes necessary not
only understand, interpret the social consciousness within this scenery, but specially feel
the possibilities of contributing for its transformation. This assignment had as objective
analyze the study group that takes place in UFPR, called Marx Center, looking forward
understanding its methodological conception, contextualizing its limits, advances,
contradictions, and possibilities as a possible instrument of class consciousness
development. Throughout a review on the literature about the consciousness process and
more specifically about the class consciousness process and about the participation on the
initial stages of the curse for monitors formation from the Núcleo de Educação Popular 13
de maio (May 13th Popular Education Center) from São Paulo, we looked for substantiate
the analyze about the work developed in the Marx Center. The fieldwork was based on
interviews previously structured with the Max Center founders, the application of a
questionnaire to the Center participants, presentations and consequently debate with those
members about initial considerations and the author participation in the group of studies
for the period of three years and six months. On this made process we concluded that the
UFPR Marx Center has as prior object of work the carefully study of theoretical for
militants that are passing or have already broken up with the stage of consciousness
claimed and are able to advance significantly on the deepen of those participants. On the
other hand, it was also seen the need of advancing on the Center structured and
methodological discussion, under the perspective of making possible the construction of a
more systematized study program as well as being able to contemplate other objectives
such as: the Marxism science productions and divulgation and interaction with other
Marxism study centers.
Key words: Marx center, consciousness formation, working class
vii
8
1 - INTRODUÇÃO
A fundamentação teórica é vista como um dos instrumentos de desenvolvimento da
consciência de classe. Lênin afirmava que os processos de lutas reais coadunados com o
processo de formação teórica, são elementos essenciais para o desenvolvimento da
consciência da classe trabalhadora no seu processo de libertação enquanto classe
1
.
O Espaço Marx da UFPR, existente mais de seis anos, procura realizar um
trabalho de fundamentação da teoria marxiana e de experiências revolucionárias,
propondo-se a ultrapassar os limites da simples interpretação desses temas em seu sentido
academicista, com o objetivo de propiciar um espaço de fundamentação teórica para a ação
militante.
Durante essa existência o espaço que foi fundado também com os objetivos de
elaboração de textos, divulgação das idéias marxistas e interação com outros Espaços
Marx, passou por diversas mudanças quantitativas e qualitativas no que se refere à
metodologia, aos conteúdos trabalhados e aos participantes do processo. Atualmente, esse
espaço conta com a participação constante de aproximadamente 40 pessoas que se
encontram semanalmente para estudar a obra O Capital, de Marx e um conjunto de
experiências revolucionárias socialistas e burguesas, em encontros onde se alternam estas
duas temáticas.
Esta pesquisa tem como objetivo analisar essa formação histórica e o
desenvolvimento desse projeto de fundamentação teórica, procurando entender e verificar
sua concepção metodológica, contextualizar seus limites e avanços, contradições e
possibilidades enquanto um instrumento possível de desenvolvimento da consciência de
classe na atual conjuntura do desenvolvimento do capitalismo e da luta de classes.
A importância dessa pesquisa parte da necessidade da classe trabalhadora em
sistematizar, analisar e avaliar os instrumentos construídos por ela para a contribuição do
processo de emancipação da humanidade em suas diversas dimensões, prática, teórica e
organizacional. No caso do presente trabalho, buscamos efetuar esse processo de pesquisa
em um espaço que trabalha fundamentalmente com o aspecto da formação teórica, com a
intenção de contribuir para a compreensão e desenvolvimento desse instrumento.
Para analisar esse espaço de fundamentação teórica que pretende contribuir no
processo de formação da consciência de classe de seus participantes, o caminho
metodológico adotado é o de se iniciar a exposição com base na teoria marxiana sobre a
1
Lênin, Que Fazer? As Questões Palpitantes do Nosso Movimento. Editora Hucitec - São Paulo, 1979.
9
formação e o desenvolvimento da consciência humana. Essa discussão inicial estabelece
princípios gerais que nos subsidiaram na análise posterior sobre o processo de consciência
de classe da classe trabalhadora, onde buscamos delimitar os momentos desse processo em
que a fundamentação teórica atua de forma mais efetiva, bem como o que é e como se
compõe um processo de formação política.
Com esse conjunto teórico inicialmente traçado, partimos para a construção do
relato da história e desenvolvimento do objeto de estudo, bem como para o processo de
análise crítica desse material. Essa análise teve como fontes as entrevistas realizadas e os
documentos recolhidos junto aos fundadores, questionários aplicados aos participantes, a
sistematização da apresentação e do debate da pesquisa realizada no Espaço Marx para
fundadores e participantes em uma das sessões de estudo e a própria participação por parte
do pesquisador nos últimos três anos e seis meses de existência do Espaço Marx da UFPR.
Nas considerações finais procuramos sistematizar essa análise em seus pontos
centrais, bem como apontar nossas conclusões sobre a pesquisa.
10
PARTE I
2. - O PROCESSO DE CONSCIÊNCIA: UMA ABORDAGEM MARXISTA
“¿Que necesita un ser humano
para no apartarse de si?”
(Silvio Rodriguez)
Entender o caminho que o ser humano percorreu e percorre para a construção de
sua consciência, faz-se necessário para perceber os fatores fundamentais que determinam
esse processo. Para tanto, o percurso inicial a se desenvolver para tal compreensão, deve
centrar-se em como o homem
2
constrói sua história e como é por ela construído, que
relações estabelecem com a natureza e com os outros homens e qual o significado dessas
relações para a constituição de seus processos cognitivos, para a formação da sua
consciência.
Na construção desse percurso devemos, mediante o princípio da totalidade, incorrer
em abstrações que nos levem à categoria fundante do objeto analisado e reconstruir esse
caminho delineando as relações entre essas abstrações até chegarmos de novo ao todo,
não mais caótico e sim uma totalidade concreta pensada (Marx, 2005). Como pretendemos
analisar a formação da consciência humana, devemos partir da história da sociedade
humana e perceber qual a categoria fundante desse processo, que caracteriza o homem
enquanto espécie, que o diferencia essencialmente das outras espécies e confere a ele uma
posição de destaque perante a história e a natureza.
O homem na sua caracterização enquanto ser genérico, ou seja, ser humano, é
produto da natureza e essencialmente é um produto da história humana e de seu
desenvolvimento. É um produto da natureza, pois é dela uma parte, enquanto organização
corporal, em sua vida física e espiritual (Marx, 2002). Um elemento integrante,
indissociável e somente nela consegue buscar os elementos para a satisfação de suas
necessidades e para consecução de sua existência. E um produto da história humana,
porque é no desenvolvimento e reconhecimento dessa história que se percebe enquanto
humano, configura-se enquanto espécie, acumula conhecimentos e os desenvolve.
O homem mediatiza então sua relação com a natureza, pela relação que possui com
a sociedade humana. Por sua vez, a relação que estabelece com os outros seres humanos é
impulsionada pela necessidade de produzir as condições que garantam sua sobrevivência,
esse processo de interação com os outros de sua espécie acontece mediatizado pelo
2
Utilizaremos no decorrer da pesquisa a terminologia homem para nos referir ao gênero humano.
11
trabalho. Portanto, o trabalho é a atividade que significado ao gênero humano, que o
inaugura enquanto espécie, o trabalho enquanto atividade socialmente construída e
elaborada.
É através do trabalho, da produção de sua existência, que passa pela produção dos
meios que a garantam, que o homem primeiramente atua sobre a natureza e interage com
os outros homens. Essa é a sua atividade vital, seu primeiro ato histórico (Marx, 1987)
atividade pela qual se constrói enquanto espécie, que se posta perante a natureza como uma
força que não se adapta simplesmente a seus limites ou características naturais, mas que
agindo sobre ela a modifica, a reelabora enquanto fonte de riqueza, enquanto lugar de onde
busca os elementos que o possibilitam viver enquanto ser humano, onde imprime sua
marca e transforma a natureza em natureza humana. Nessa ação, o homem não transforma
unilateralmente a natureza, o homem modifica sua própria constituição, sua própria
percepção da realidade, suas próprias relações. Transforma então seu próprio modo de
vida, suas necessidades e possibilidades (Marx, 1987).
Na relação que esse homem genérico estabelece com a natureza, através do trabalho
social é que ele se constrói, inclusive em sua organização corporal:
“O olho tornou-se um olho humano, no momento em que o seu objeto se transformou em
objeto humano, social, criado pelo homem para o homem. Por conseqüência, os sentidos
tornaram-se diretamente teóricos na sua prática. Relacionam-se à coisa por ela mesma,
mas a própria coisa já constitui uma relação humana objetiva a si mesma e ao homem, e
vice-versa. A necessidade ou o prazer perderam portanto o caráter egoísta e a natureza
perdeu a sua mera utilidade, na medida em que a sua utilização se tornou utilização
humana.”(Marx, 2002, p.142)
O mundo passa de sua condição natural, sensível e estranha ao homem, para a
condição de mundo objetivado, na qual o homem reconhece o objeto enquanto produto de
sua intervenção na natureza, ou seja, “descobre nas coisas propriedades até então
desconhecidas, penetra na sua essência, abstrai suas características e capta as relações nas
quais se inserem, rompendo as fronteiras da experiência sensível” (Klein, 2005, p.02).
Torna a realidade sensível para ele como a realidade objetivada, construída pelo trabalho
social.
Nessa objetivação do mundo e de suas relações é que o ser humano começa a
abstrair, a representar e reelaborar no pensamento sua realidade concreta. E aqui nesse
12
ponto, cabe colocar que “o surgimento da linguagem é a segunda condição que leva à
formação da atividade consciente de estrutura complexa do homem” (Luria, 1979, p.77).
Por isso, ao considerarmos o trabalho como o ponto inaugural da existência humana
propriamente dita, temos que entender a linguagem como um processo e um produto dessa
atividade especificamente humana (Klein, 2005). Parece-nos importante também entender
que assim como o trabalho, as raízes da linguagem não podem ser procuradas ou
designadas a um indivíduo isoladamente, qual seja sua forma de expressão ou de
formulação ela pertence a um grupo social, ao ambiente social desse indivíduo (Bakthin,
2004). Ainda segundo esse autor “o componente verbal do comportamento é determinado
em todos os momentos essenciais do seu conteúdo por fatores objetivos-sociais” (Bakthin,
2004, p.86).
Entende-se nessa perspectiva a linguagem atuante primordialmente tanto nas
funções de comunicação e intercâmbio das experiências e pensamentos entre humanos,
como para o desenvolvimento do próprio pensamento, é a interiorização do diálogo
exterior que faz com que o instrumento da linguagem atue decisivamente no fluxo de
desenvolvimento do pensamento (Vigotski, 2003). Permitindo ao ser humano a
conservação das informações recebidas do mundo exterior, a construção interior de
representações desse mundo e a análise e classificação dos objetos pré-existentes na
natureza e dos desenvolvidos ao longo do processo histórico, abstraindo-os e
generalizando-os (Luria, 1979). “Deste modo, o pensamento e a linguagem, embora
distintos, mantêm entre si uma unidade indissociável. Nessa unidade, não é a atividade
mental que organiza a expressão, mas é a linguagem, enquanto expressão, enquanto signo,
enquanto material semiótico que organiza a atividade mental” (Klein, 2005, p. 02).
A linguagem, portanto, media o processo de trabalho e em concomitância tem
papel fundamental no desenvolvimento da consciência, a partir da linguagem de cada
um, é possível julgar da maior ou menor complexidade da sua concepção de
mundo”(Gramsci, 1989, p.12).
A consciência, nessa perspectiva, aparece então como um produto social, ou seja, o
caminho desse processo não é do indivíduo para as relações que ele estabelece e sim, ao
contrário, das relações estabelecidas para o indivíduo. Somente nessas relações sociais, da
produção dos meios de sua vida, é que o homem se estabelece enquanto homem. Nessas
relações mediatizadas pelo trabalho que por sua vez é mediado pela linguagem é que ele se
coloca e se reconhece como espécie. Reconhecer que esse caminho parte inicialmente das
relações sociais estabelecidas, não nos coloca em uma posição mecanicista ou unilateral do
13
desenvolvimento da consciência, essa definição afirma fundamentalmente um princípio
determinante na construção desse processo.
As suas possibilidades e limitações de avançar nesse processo de consciência são
datadas historicamente pelas condições materiais, determinadas por sua vez,
essencialmente pelo grau de desenvolvimento das forças produtivas da sociedade na qual
este ser humano está inserido. Por isso, não se pode partir do que os homens pensam ou
falam de si em uma determinada época para entendê-los em suas relações, em seu
processo de vida real. O caminho é ao contrário, parte-se dessa concretude material para
compreender suas relações sociais e suas representações que ressoam em suas mentes”
(Marx, 1987).
Neste mesmo ponto, ao situar o grau de desenvolvimento das forças produtivas
como base do desenvolvimento da história humana e conseqüentemente da consciência
humana, Marx assinala na carta a Annenkov:
“...os homens não dispõem livremente de suas forças produtivas – que constituem a base
de toda a sua história, pois toda a força produtiva é uma força adquirida, produto de
uma atividade anterior. Assim, as forças produtivas são o resultado da energia posta em
prática pelos homens: essa energia, porém, é determinada, ela própria, pelas condições
em que os homens se encontram, pelas forças produtivas alcançadas, pela forma
social que lhes é anterior, que eles não criaram e que é o produto da anterior geração.
Graças ao simples fato de que toda nova geração se encontra face a forças produtivas
adquiridas pela geração precedente e que lhe servem de matéria-prima para a nova
produção, surge um encadeamento na história, surge a história da humanidade, a qual é
tanto mais a história da humanidade quanto mais se desenvolverem suas forças
produtivas e, em conseqüência, suas relações sociais”. (Marx, 1846)
Essa determinação econômica não significa que esse se constitui no único fator que
determina o desenvolvimento do processo, mas que é a base determinante da sociedade
humana. Estabelece desse modo o princípio de determinação econômica e não de
determinismo econômico conceito empregado por críticos dessa teoria. Engels em sua carta
a Block aborda essa questão colocando que “em última instância, o que determina a
história é a produção e a reprodução da vida real. Nem Marx nem eu afirmamos, uma vez
sequer, algo mais que isso. Se alguém o modifica, afirmando que o fato econômico é o
único fato determinante, converte aquela tese em uma frase vazia, abstrata e absurda”
(Engels, 1961).
14
E mais adiante argumenta:
“nós mesmos fazemos nossa história, mas isto não se dá, em primeiro lugar, de acordo
com premissas e condições muito concretas. Entre elas, as premissas e condições
econômicas são as que decidem, em última instância. No entanto, as condições políticas
e mesmo a tradição que perambula como um duende no cérebro dos homens, também
desempenham seu papel, embora não decisivo.(Engels, 1961)”
Esse ser humano então é um produto histórico, um produto do desenvolvimento da
história da humanidade que o antecedeu. Por isso, não se pode estabelecer comparações de
homens de diferentes épocas históricas, como se estivéssemos analisando o mesmo
homem. As possibilidades concretas para que a sociedade humana desenvolva-se,
incluindo sua consciência que tem sua origem nas relações sociais estabelecidas no
trabalho social, estão determinadas também por esse desenvolvimento das forças
produtivas.
Como nos aponta Marx na obra O Capital, “os meios de trabalho não são
medidores do grau de desenvolvimento da força de trabalho humana, mas também
indicadores das condições sociais nas quais trabalha” (Marx, 1988, p.144). O que por sua
vez, fornece ao seres humanos dessa época, a base material para o desenvolvimento de sua
consciência.
Esse desenvolvimento das forças produtivas constitui-se de uma relação centrada
no ser humano, no desenvolvimento de suas potencialidades físicas e intelectuais, com os
instrumentos de trabalho que esse ser humano é capaz de construir/elaborar e pelos
recursos naturais disponíveis no meio ambiente. Uma relação de interdependência e de
interdesenvolvimento desses três fatores.
Com o desenvolvimento do processo de trabalho, aperfeiçoamento dos
instrumentos, das técnicas empregadas, o homem além de suprir suas necessidades, passa a
produzir diferentes necessidades, de produtos sociais, que não existiam anteriormente. Essa
produção crescente de novas necessidades faz com que a partir de determinado momento
esse homem não consiga produzir todos os produtos que necessita para sua existência e
torne-se cada vez mais orgânico a essa sociedade, pois necessita cada vez mais desse
trabalho social para prover sua existência. Aprofundando também a divisão social do
trabalho e o intercâmbio social dos produtos do trabalho.
15
Esse desenvolvimento das forças produtivas apesar de não ser linear, seja por sua
própria destruição, parcial ou total (guerras, catástrofes naturais), ou por insucesso de
novas técnicas e instrumentos que não contribuam para o seu desenvolvimento, tende a ser
crescente. Conseqüentemente, a divisão social do trabalho e a criação de novas
necessidades também.
Ao analisar as formas de sociedade e como elas organizaram o processo de
produção, Marx coloca que:
quanto mais recuamos na história, mais o indivíduo - e portanto o produtor individual -
nos aparece como elemento que depende e faz parte de um todo mais vasto; faz parte, em
primeiro lugar, e de maneira ainda inteiramente natural, da família e dessa família
ampliada que é a tribo; mais tarde, faz parte das diferentes formas de comunidades
provenientes do antagonismo entre as tribos e da fusão destas. no século XVIII, na
"sociedade civil", as diversas formas de conexão social aparecem face ao indivíduo
como simples meios para alcançar os seus fins privados, como uma necessidade exterior
a ele. Contudo, a época que gera este ponto de vista, esta idéia do indivíduo isolado, é
exatamente a época em que as relações sociais (universais, segundo esse ponto de vista)
alcançaram o seu mais alto grau de desenvolvimento”.(Marx, 2005)
Dentro de uma sociedade capitalista, uma sociedade de classes, não somente
distintas, mas antagônicas, onde uma detém a propriedade privada dos meios e dos objetos
de trabalho capazes de produzir os bens necessários à existência humana e a outra não
possuidora desses meios possui a sua força de trabalho para prover a sua existência, os
produtos sociais do trabalho acabam sendo também propriedades privada daquela classe. O
que torna a classe trabalhadora alienada não somente no processo de trabalho, por não
possuir os meios de produção e não participar efetivamente da elaboração desse processo,
como alienada do produto de seu próprio trabalho.
Essa alienação da classe trabalhadora caracteriza-se por uma mutilação das
potencialidades desse homem que não m mais o significado do trabalho como princípio
fundante de sua espécie, que a diferencia dos outros animais, mas sim como simples meio
de prover a sua existência. Uma mutilação de suas potencialidades de consumo dos
produtos sociais do trabalho sejam eles produtos do desenvolvimento em alimentos, em
vestuários, em moradia, em meios de transporte, de comunicação, de arte, de tecnologia em
informática enfim, de todas as áreas que são fundamentais para o seu reconhecimento
enquanto ser humano de sua época.
16
O homem alienado dos produtos sociais do trabalho de sua época sente-se estranho
a seu momento histórico, não se reconhece na história da qual faz parte. Poderíamos dizer
que ele é a sombra ou um esboço do homem de sua época histórica, por suas
potencialidades estarem mutiladas. Pois é sobre essa base material de relações sociais de
produção que determina a participação desse indivíduo no consumo, entendido aqui como
usufruto dos bens sociais, frutos do trabalho social, que esse homem pode desenvolver sua
maneira de se relacionar com os outros de sua espécie.
E é nesse terreno, das condições materiais de garantir sua existência é que o homem
insere-se na sociedade, estabelece suas relações. É essa base econômica que determina em
última análise as possibilidades desse ser humano realizar-se enquanto ser humano de seu
momento histórico.
O desenvolvimento de sua consciência evidentemente não fica imune a esse
processo, sendo ele um produto social é essencialmente determinado também por essa base
econômica. Nesse sentido “a produção de idéias, da abstração, de representações, da
consciência partem, estão imbricadas, derivam das atividades materiais, concretas do
homem, das relações que estabelecem com outros homens e com a natureza” (Marx,
1987). Ou seja, o processo de consciência deve ser entendido dentro do momento histórico
da sociedade humana, ao qual está inscrito.
O processo de consciência então que partimos agora para analisar, traz seus
princípios de determinação que o definem enquanto produto social das relações sociais que
os homens estabelecem para garantir sua existência. Porém, situando sua inserção nas
relações capitalistas de produção, buscaremos traçar os aspectos centrais de seu
desenvolvimento dentro desse momento histórico.
2.1 - Consciência de Classe: o processo de sua constituição
“A realidade da relva
cresce em sonho no sereno
para não ser relva apenas,
mas a relva que se sonha”
(Thiago de Mello)
Situando então esse processo de consciência dentro da sociedade capitalista, vamos
tentar perceber o processo pelo qual se desenvolve a consciência de classe. E não de
qualquer classe, mas da classe trabalhadora, que dentro do conjunto dessa sociedade se
17
coloca enquanto classe que pode superar esse sistema pela posição que ocupa em seu
processo de produção (Marx, 1988).
Então, nessa parte da pesquisa, tentaremos estabelecer uma visão mais aprofundada
sobre esse processo de desenvolvimento da consciência de classe que pode levar a uma
consciência de classe revolucionária. Para tanto, recorremos à discussão realizada no
tópico anterior que situa o processo de desenvolvimento da consciência como um produto
social e determinado pelas relações sociais de produção estabelecidas por sua vez, pelo
grau de desenvolvimento das forças produtivas. Ressaltamos ainda que esse processo não é
unilateral, que essa mesma consciência que é determinada primeiramente pela estrutura
econômica, atua sobre essa base e pode em determinadas conjunturas atuar inclusive como
determinante na luta de classes, mas sem deixar de ser determinada pela mesma base
econômica.
O ser humano então nasce dentro dessas relações sociais construídas pelas gerações
anteriores, em nosso caso de análise relações sociais capitalistas. Nesse cenário, a classe
que nos propomos a analisar, nasce expropriada dos meios de trabalho que podem garantir
sua existência imediata e histórica. Tendo que se submeter aos que possuem esses meios
como única forma de garantir o caráter de existência imediata e que permita algum acesso,
mesmo que mutilado, na existência histórica enquanto espécie humana.
Por necessariamente ter que se submeter para garantir o primeiro fato histórico
3
torna-se uma classe subordinada pela força de suas necessidades materiais “sejam elas da
barriga ou da fantasia” (Marx, 1988) à outra classe, dos capitalistas. Essa subordinação no
terreno concreto do cotidiano de reprodução da vida também se reflete em um domínio das
idéias e da consciência da classe que ocupa a posição privilegiada no processo de
produção.
Concordamos também nessa discussão com Marx, quando aponta que:
“Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras coisas, também
a consciência e, por isso pensam; na medida em que dominam enquanto classe e
determinam todo o âmbito de uma época histórica, é evidente que o façam em toda sua
extensão e, conseqüentemente, entre outras coisas, dominem também como pensadores,
como produtores de idéias; que regulem a produção e a distribuição das idéias de seu
tempo e que suas idéias sejam, por isso mesmo, as idéias dominantes da época.”(Marx,
1987, p.72)
3
Conceito utilizado por Marx na obra A Ideologia Alemã para conceituar a existência humana em si.
18
As idéias então dessa classe dominante, como acontece em qualquer processo de
desenvolvimento do pensamento, emergem da realidade vivida por essa classe. Das
relações que estabelece no seu cotidiano imediato e da realidade social mais abrangente em
que está inserida, que por sua vez são determinadas pela estrutura econômica construída
historicamente.
Germer aponta que:
“...as idéias (o conhecimento) constituem um reflexo, na mente, da realidade que
circunda o ser humano, isto é, são as expressões mentais dos fenômenos reais. Mas as
idéias não são geradas como reflexos mecânicos na mente de um ser humano passivo e
contemplativo, como o reflexo de um objeto no espelho, mas resultam da atividade
prática do ser humano sobre a realidade circundante.(Germer, 2003, p.64)”
Então as idéias de uma classe que domina outra no que é essencial para a produção
e reprodução da vida não se constituem em meros reflexos da realidade, mas
fundamentalmente “em qualquer época histórica, as classes sociais detentoras de
privilégios têm todo interesse em manter estáveis as relações sociais de seu tempo, sob as
quais garantem tais privilégios. Por conta desse interesse, elaboram, defendem e
consolidam uma visão de mundo que legitima, justifica e explica aquela organização
social.” (Klein, 2005, p.05)
Nessa sociedade então, cindida em classes antagônicas, o aspecto da superestrutura
apontado por Marx no Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política, como
consciência social, como a forma ideal da sociedade real, aparece na forma de ideologia.
Entendemos que “o termo ‘ideologia’ está em Marx inseparavelmente ligado à necessidade
de esta consciência justificar determinada relação de dominação, e, portanto, de velamento,
inversão e naturalização de relações sociais que marcam o domínio de uma classe sobre
outra” (Iasi, 2002, p. 95).
Ou ainda como nos coloca o próprio Marx, “as idéias dominantes nada mais são
do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, as relações materiais
dominantes concebidas como idéias; portanto, a expressão das relações que tornam uma
classe a classe dominante; portanto, as idéias de sua dominação” (Marx, 1987, p.72).
A consciência social, que constitui o conjunto de idéias e teorias provenientes da
realidade concreta e por tanto reveladoras e aprofundantes dessa mesma realidade, torna-se
19
um conjunto de idéias e de teorias que também provém da realidade concreta, mas que
buscam prioritariamente naturalizar, legitimar, preservar e aprofundar a dominação
exercida pela classe hegemônica.
Sendo então, a consciência social formada hegemonicamente pelas teorias da
ideologia da classe dominante, na sociedade capitalista essa ideologia se expressa através
das idéias e valores burgueses. É esse ideário burguês
4
, de justificação e perpetuação do
sistema social, que permeia a sociedade hegemonicamente como “verdade” construída pelo
seu conjunto e portanto reveladora da realidade.
A classe dominante primeiramente no processo de produção e reprodução da vida,
necessita que essa dominação estenda-se ao terreno da superestrutura da consciência social,
para que a classe dominada, vivendo a realidade concreta e cotidiana, tenha aonde buscar
em “seus” pensamentos as justificativas e respostas para continuarem expropriadas e
mutiladas enquanto seres humanos. E “ao progredir a produção capitalista, desenvolve-se
uma classe trabalhadora que por educação, tradição e costume aceita as exigências
daquele modo de produção como leis naturais evidentes” (Marx, 1988, p.854).
E é nesse cenário de dominação material e ideológica que a classe subjugada no
processo de produção, a classe trabalhadora forma sua primeira forma de consciência, a
alienação (Iasi, 2001). Através de “instituições como a família, como socialização
primária, e outras instituições de socialização secundária, como escola, trabalho, e outras
inserem os indivíduos em relações que são a base sobre a qual eles constituirão suas
concepções de mundo” (Iasi, 2002, p. 108). Essas instituições por sua vez, também estão
imersas dentro das relações capitalistas e portanto, hegemonicamente, às reproduzem.
O trabalhador necessariamente estabelece suas relações, imerso nessa dominação
ideológica, e acaba assumindo como seus os valores construídos pela classe que o domina
e que são valores hegemônicos na sociedade. Essas idéias trazem a ele a sensação de que a
realidade que vive está devidamente explicada, encontram nesses pensamentos explicações
que se por vezes não agradam, justificam sobremaneira as relações às quais está submetido
no seu cotidiano, situando-as como naturais ao seres humanos.
Generalizar uma forma particular de organização da sociedade, e tomá-la como
universal e única, é sentar-se sobre a linha da história do gênero humano. Desconsiderar
4
Podemos resumir esse ideário como sendo os da revolução burguesa: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Esses valores tidos como “universais” devem estar subordinados às leis capitalistas, de direito à propriedade
privada dos meios de produção e à exploração da força de trabalho mediante um salário. Ou seja, por
exemplo, na questão da liberdade, os trabalhadores devem ser livres para vender sua força de trabalho para
quem quiserem (?) e do outro lado, os burgueses devem ser livres para comprá-la também de quem quiserem.
Dessa forma, estão bem colocados os limites da liberdade burguesa.
20
seu longo processo de desenvolvimento precedente por um lado e por outro considerar que
essa linha não continua mais sua trajetória de transformações e que, portanto na vida nada
se muda, nem se transforma tudo continua na mesmice que enxergamos por nossa janela.
Ou ainda, como bem argumenta Iasi:
“Esse fato faz com que o indivíduo assuma como sua uma concepção de mundo que se
origina no outro; pode naturalizá-la imaginando, por captar uma relação particular
como se fosse o todo, que sempre foi assim, e portanto sempre será. Desta forma, o
indivíduo constitui uma visão de mundo particularista e apartada do movimento
histórico de sua entificação, por isso podemos chamar essa primeira forma de
consciência, típica de indivíduos novos que se inserem numa sociedade determinada, de
alienação, ou consciência alienada.” (Iasi, 2002, p.112)
Nessa primeira forma de consciência a classe trabalhadora comporta-se então como
a classe ideal à classe dominante, ela está subordinada materialmente e ideologicamente
quase que por completo. Porém, esse ideário burguês que é assimilado de forma
hegemônica como natural, universal e eterno não tem a possibilidade concreta de se tornar
absoluto.
Por ser reflexo da base econômica social o conjunto das idéias burguesas não pode
fugir da contradição inerente a essa base, não pode fugir ao choque constante provocado
pela forma em que se organiza. Nessa base existe um choque irremediável dentro do
sistema capitalista, que também se expressa na realidade imediata dos seres humanos, que
é o choque das relações sociais de produção capitalistas com o desenvolvimento das forças
produtivas.
Como nos aponta Marx nesse trecho:
“Ao chegar a uma determinada fase de desenvolvimento, as forças produtivas materiais
da sociedade se chocam com as relações de produção existentes, ou, o que não é senão a
sua expressão jurídica, com as relações de propriedade dentro das quais se
desenvolverem até ali. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas
relações se convertem em obstáculos a elas” (Marx, 1961).
O desenvolvimento das forças produtivas então, é um processo que, como
pontuamos, não é linear, mas tende a ser crescente e dentro do sistema capitalista ele
acentua-se constantemente por ser a produção baseada na competição entre os capitalistas
21
por consumidores. E nessa sociedade ele chega a um grau de avanço nunca antes visto pela
humanidade, porém as relações sociais de produção, baseadas na propriedade privada dos
meios de produção e na exploração assalariada da força de trabalho, que na época do
rompimento com o sistema feudal, foram impulsionadores de seu desenvolvimento, hoje se
constituem em contendores desse processo.
Essa contradição do processo de produção por sua vez, se expressa diariamente
para a classe trabalhadora, que alienada no processo de trabalho e em conseqüência do
fruto dele, fica com um sentimento ainda não sistematizado de incômodo, de insatisfação
com sua realidade cotidiana. A contradição do sistema não se sistematiza de imediato na
consciência dessa classe, mas antes são sentidas pelas condições de vida a que essa classe
está submetida. O ideário hegemônico começa incomodar por não corresponder com a
realidade vivida por essa classe. A realidade a toda hora fornece elementos concretos que
desmentem partes desse ideário. Nesse sentido Iasi (2001) exemplifica que alguém, por
exemplo, que acreditasse que trabalhando se consegue tudo o que se quer, mas passa a
viver uma situação onde, apesar de trabalhar muito, não consegue o mínimo para viver,
vivencia uma contradição que pode levá-lo à revolta. Essa revolta se expressa ainda de
forma individual, esse ser humano situa essa contradição com sua vida pessoal, sofre e
expressa individualmente sua indignação.
Por estar mutilado materialmente da grande maioria das possibilidades de consumo
produzidas pela humanidade, começa a questionar e refletir sobre esse paradoxo castrador.
Esse choque entre o que acredita e o que vive pode se expressar em diversas reflexões
como nos mostra Fernando Pessoa nesse trecho de “Passagem das horas” recolhido do
livro que tem o sugestivo nome de “O Eu profundo e os outros Eus”:
“Não sei se a vida é pouco ou demais prá mim.
Não sei se sinto de mais ou de menos, não sei [...]
Seja o que for, era melhor não ter nascido,
Porque, de tão interessante que é a todos os momentos,
A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger, [...]
Tenho a alma rachada sob o indicador curvo que lhe toca...
Que há de ser de mim? Que há de ser de mim? (Pessoa, 1980, p.239)”
E mais adiante:
22
“Torna-me humano, ó noite, torna-me fraterno e solícito.
Só humanitariamente é que se pode viver.
Só amando os homens, as ações, a banalidade dos trabalhos,
Só assim – ai de mim! - , só assim se pode viver.
Só assim, ó noite, e eu nunca poderei ser assim! (Pessoa, 1980, p.240)”
Essa contradição ainda constitui-se em um problema “seu” e, portanto, encontra
ressonância somente na sua individualidade. Esse é o limite de sua revolta. Agora, esse
sujeito tem possibilidades reais, por desenvolver relações com outros trabalhadores, de
entender que a “sua” contradição, não se limita ao plano individual e sim se estende a um
grupo determinado dessa sociedade. Ao denotar a sua condição primeiramente individual
esse caráter coletivo, ele reúne condições reais de avançar para a segunda forma da
consciência, a consciência de classe em si (Iasi, 2001).
Isso torna-se possível quando esse indivíduo estabelece relações sociais com
outros indivíduos que sofrem a mesma contradição específica. Portanto, o indivíduo não
fica limitado a uma indignação individual, ele consegue se enxergar no grupo e
conseqüentemente, enxerga essa indignação como sendo não dele, mas
fundamentalmente ao grupo ao qual pertence. “A injustiça vivida como revolta é
partilhada numa identidade grupal o que possibilita a ação coletiva” (Iasi, 2001).
Essas lutas coletivas circunscrevem-se ainda dentro dos limites do sistema
capitalista, são reivindicatórias. Possuem a percepção de uma das conseqüências das
relações sociais de produção capitalista e se organizam para melhorar as condições desse
fator pontual e específico. No caso, por exemplo, de trabalhadores de uma fábrica que
sentem uma defasagem salarial, insegurança no trabalho e excesso de carga horária, sua
luta centra-se na melhoria dessas condições de trabalho. Possuem então, a consciência de
que formam uma classe e reivindicam melhorias de condições para essa classe. Não
rompem com o capital, pelo contrário nesse confronto com o capital enquanto classe,
acabam por afirmar a necessidade do capital, suas exigências limitam-se a melhorar as
condições de sua exploração dentro dos limites colocados pela outra classe.
Sua consciência agora de classe em si, o leva então a se organizar junto aquela
parcela da sociedade que sofre da mesma mazela que o atinge individualmente, porém suas
lutas consistem basicamente por melhores condições de serem explorados. Essa
consciência pode levá-lo até a entender que esse é um processo que acontece com pessoas
de todo o mundo e não somente ao seu grupo de relações imediatas, porém o que ele não
23
consegue compreender ainda é que esse processo somente pode ser rompido com a
superação do modo de produção capitalista.
Existe ainda nesse momento, um sério julgamento moral e valorativo sobre as
causas dos contrastes vividos. As responsabilidades são destinadas e personificadas tanto
em personagens que possuem um modo de vida privilegiado baseado na ostentação quanto
na falta de valores “éticos” e “justos”. Existe um julgamento acentuado nas questões
superestruturais, mas a estrutura econômica permanece inquestionável em seus limites
capitalistas.
Os indivíduos que se encontram nessa fase do processo de consciência de classe,
lutam então reivindicando melhorias setorizadas dentro do contexto social mais amplo.
Porém, nesse processo de lutas esses indivíduos entram em choque mais direto com a
legalidade burguesa e podem perceber seus limites mais claramente. Seja no atendimento
parcial de suas reivindicações ou até completa, esses indivíduos podem entrar em
contradição com essa forma de consciência de classe, pois como não resolveram as
questões estruturais que provocam as contradições vividas, essas contradições imediatas
resolvidas ou parcialmente atendidas ressurgem num processo histórico cíclico com fases
de agudização.
Por exemplo, em no caso anterior de trabalhadores que lutam por melhores
condições de trabalho, mesmo que essas reivindicações sejam atendidas por completo, o
que é raro, a própria lógica do sistema de produção capitalista, centrada no
desenvolvimento tecnológico para diminuição do valor necessário para produção da
mercadoria para entrar na competição intercapitalista do mercado de forma constante,
provocará novamente as mesmas e algumas novas dificuldades nas condições de trabalho.
O que pode levar o trabalhador a entender que enquanto persistir esse modo de produção,
as condições de seu trabalho estão subordinadas e por isso mutiladas à lógica capitalista.
Para superar essa forma de luta reivindicatória e de consciência de classe em si, é
preciso que esses indivíduos superem a compreensão vivida pela personagem do livro “A
Mãe” de Máximo Gorki que, ao acompanhar de perto a luta e a transformação de
consciência de classe de seu filho, em determinado momento de sua fase reivindicatória
“se pôs a pensar nessa ‘causa’ que os homens defendiam, dia após dia, com obstinação e
serenidade. Sentiu-se perante eles como diante de uma montanha à noite” (Gorki, 2000,
p.234).
Chega-se a um ponto desse processo de consciência de classe no qual o
questionamento então se expressa na seguinte formulação feita por outro personagem da
24
obra “Ensaio sobre a lucidez” de José Saramago que ao discutir sobre o processo de
manifestação realizada pela população da capital de seu país, expressa: “Nascemos, e
nesse momento é como se tivéssemos firmado um pacto para toda a vida, mas o dia pode
chegar em que nos perguntemos Quem assinou isto por mim” (Saramago, 2004, p.285).
A passagem então dessa forma de consciência de classe em si para a consciência de
classe para si
5
, revolucionária, depende do entendimento desses indivíduos da necessidade
de se romper com o sistema capitalista de produção em suas leis fundamentais
6
. Somente
com esse entendimento é que o indivíduo compreende a necessidade de transformação da
sociedade em seu conjunto, propondo-se então a uma tarefa que não se limita somente aos
interesses de sua classe, mas sim que se apresentam enquanto necessidade da própria
sociedade humana.
Ao assumir essa tarefa de rompimento com um sistema que oprime a grande
maioria dos seres humanos, ele coloca para si a tarefa de emancipação não somente de sua
classe, mas de toda a humanidade. Seus interesses e sua luta, pelo lugar que ocupa no
processo de produção dos valores necessários à existência humana, tornam-se valores e
objetivos a serem alcançados pelo conjunto dessa humanidade.
A luta até então reivindicatória vai além desse ponto e torna-se revolucionária. O
que não nos pode levar ao equívoco de imaginar que essa classe agora não utiliza mais as
lutas reivindicatórias como instrumento de sua luta. A diferença é que esses objetivos
imediatos agora estarão coadunados com objetivos históricos de transformação de toda a
sociedade. O que na fase anterior do processo de consciência era um fim em si mesmo,
agora é um meio para o alcance de transformações mais profundas.
Essa consciência revolucionária, assim como todo esse processo, não é linear ou
irreversível. Não nenhuma “receita infalível” ou “garantia absoluta” de que os
indivíduos avançarão nesse processo naturalmente e que ao avançarem, os mesmos não
voltarão a assumir formas anteriores de consciência. Ter consciência da necessidade da
transformação social não proporciona necessariamente o comprometimento em contribuir
com ela
7
, porém somente com esse passo isto se torna uma possibilidade.
5
Iasi trabalha muito bem na definição desses termos: “uma consciência de classe em si indicaria uma classe
que ainda se define pela sua simples existência no conjunto das relações capitalistas, e no interior destas
expressa seus interesses imediatos (ou numa síntese pouco precisa: econômicos); ao passo que uma classe
que adquire uma consciência além de sua posição imediata, mas de seu papel histórico para além da ordem
estabelecida, assumiria, assim, uma consciência para si.” (O Dilema de Hamlet, 2002, p. 131)
6
Propriedade privada dos meios de produção e exploração da força de trabalho mediante um salário.
7
Um exemplo aprofundado dessa reversibilidade no processo de consciência de classe encontramos na tese
“A mediação particular e genérica da consciência de classe (O Partido dos Trabalhadores entre a negação
e o consentimento)”, de Mauro Iasi ao analisar a conformatação paulatina do Partido dos Trabalhadores à
ordem capitalista e a conseqüente perda de seu posicionamento contestador dessa mesma ordem.
25
Ao chegar nessa fase de contradição e rompimento com a forma de consciência de
classe reinvindicatória, um elemento novo até esse momento torna-se essencial para que
esses indivíduos avancem ainda mais em sua consciência revolucionária, esses
trabalhadores devem apropriar-se da teoria revolucionária (Lênin, 2005c). As contribuições
das relações imediatas que os trabalhadores estabelecem chegam ao seu limite no que diz
respeito ao avanço dessa consciência de classe sem ter como instrumentos aliados o
conhecimento e o aprofundamento teórico. O limite é o entendimento da necessidade de se
romper com o sistema capitalista, mas o que ela não fornece de forma sistematizada é o
porquê dessa necessidade de forma mais aprofundada, para além das relações imediatas, e
o como construir esse rompimento.
O que estamos dizendo então, é que existem graduações de níveis dentro das
mesmas fases, na fase revolucionária do processo de consciência também. Para avançar em
sua consciência de classe que rompeu, mesmo que ainda de forma não sistematizada,
com os limites da ordem burguesa o trabalhador necessita instrumentalizar-se teoricamente
para que sua luta torne-se cada vez mais calcada na racionalidade e não incisivamente em
juízos valorativos. A transformação da sociedade é essencialmente necessária por
determinações concretas, pelo próprio desenvolvimento da base econômica, e não por
determinações morais ou éticas, mesmo que essas estejam presentes no desenvolvimento
da própria transformação.
Ao traçar uma tendência histórica sobre o processo de acumulação capitalista,
Marx, no capítulo 24 de O Capital, coloca as linhas gerais das necessidades concretas para
a superação das relações capitalistas de produção:
“O modo de produção capitalista de apropriar-se dos bens, decorrente do modo
capitalista de produção, ou seja, a propriedade privada capitalista é a primeira negação
da propriedade privada individual baseada no trabalho próprio. Mas, a produção
capitalista gera sua própria, com a fatalidade de um processo natural. É a negação da
negação. Esta segunda negação não restabelece a propriedade privada, mas a
propriedade individual tendo por fundamento a conquista da era capitalista: a
cooperação e a posse comum do solo e dos meios de produção gerados pelo próprio
trabalho.( Marx, 1988 ,p.881)”
Admitir as necessidades estruturais de superação do modo de produção capitalista,
não significa entender que ela acontecerá naturalmente. Significa principalmente
26
reconhecer essa tendência histórica e concreta da superação. Tendo essa tendência como
um dos fatores fundamentais que impulsionam a superação, devemos incluir também que
outro fator essencial é a luta que a classe trabalhadora, portanto, a classe revolucionária
desenvolve para transformar essa tendência em realidade.
E novamente, entendermos que para assumir essa tarefa enquanto classe para si, o
desenvolvimento dessa consciência revolucionária deve ser aprofundada com a
apropriação da teoria revolucionária, a teoria marxiana.
Realizado esse primeiro estudo sobre o processo de desenvolvimento da
consciência de classe da classe trabalhadora e de suas fases, passaremos agora para o
entendimento dele dentro do processo de formação política também dessa classe.
2. 2 – Formação Política na Formação da Consciência de Classe
“Era extraño aquel hombre,
o por tal lo tomaron,
porque besaba todo
lo que hallaba a su paso
Un día , sin aviso ,
murió aquel hombre extraño ;
y muy naturalmente ,
en tierra lo sembraron.
En ese mismo instante,
desde el cielo , los pájaros
descubrieron que al mundo
le habían nacido labios.
Era extraño aquel hombre...”
(Silvio Rodriguez)
Nessa discussão sobre o processo de formação política, estaremos tentando traçar
os elementos que compõem determinado processo de formação: a formação política da
classe trabalhadora para o desenvolvimento de sua consciência de classe revolucionária,
entendo este como um momento possível do movimento da classe e não como uma
característica inata. Ou seja, como os trabalhadores formam-se politicamente para na luta
de classes na qual estão imersos, conscientes ou inconscientes dela, atuarem na perspectiva
de superação do capitalismo.
Marx em sua obra Contribuição para uma crítica da Economia Política, coloca que
“o homem é, no sentido mais literal, um zoon politikon (animal político); não é
simplesmente um animal social, é também um animal que na sociedade se pode
27
individualizar” (Marx, 2005). Esse fato de considerar o ser humano como um ser
necessariamente político, nos leva a compreensão de que a formação política de todos os
seres humanos se justamente nas relações que estabelece com a sociedade. Nessa
relação da sociedade com o indivíduo é que ele relaciona-se com a genericidade de sua
espécie.
Esta sociedade encontra-se determinada, como dissemos antes, pelas relações
sociais estabelecidas no processo de produção que por sua vez, estão determinadas em
última instância, pelo grau de avanço das forças materiais necessárias à produção da
existência humana. E em nosso caso de análise, o modo de produção capitalista. Essas
relações que os indivíduos estabelecem, possuirão características comuns conforme à
posição que ocupam nesse modo de produção específico e diferentes também, na medida
de suas singularidades.
Relações que primeiramente se constituem nas imediatas, estabelecidas em seu
cotidiano por esse indivíduo e as relações estabelecidas com o conjunto dos produtos
produzidos pela humanidade, que na sociedade capitalista tomam forma de mercadorias.
Claro também fica que as possibilidades e profundidades dessas relações, estão
circunscritas à posição ocupada pelo indivíduo no processo de produção. Delimitação que
não se consiste como absoluta, mas que se torna hegemônica na sociedade.
A classe que pretendemos analisar em seu processo de formação política ocupa um
espaço determinado na produção da existência humana. Expropriados dos meios de
produção, condicionados a vender suas forças de trabalho, alienando-se tanto do processo
quanto do produto de seus trabalhos, a classe trabalhadora que num primeiro momento
encontra-se num grau mais ampliado, em relação a sua classe antagônica, de mutilação
frente às possibilidades humanas de sua época, torna-se também a classe capaz de tomar
para si o processo de libertação do conjunto da humanidade. Justamente por se
encontrarem expropriados dos meios de produção, por serem os produtores das condições
para a existência humana, e por ocupar essa posição fundamental no processo de produção
da vida, a classe trabalhadora constitui-se como a classe revolucionária (Marx, 1988).
Porém, essa classe não se constitui ontologicamente revolucionária como tão pouco
ontologicamente reformista. Para que essa classe venha a desempenhar seu papel histórico
que decorre do modo de produção atual que a genericidade humana construiu durante seu
desenvolvimento, é necessário que ocorra também um processo de desenvolvimento de
uma consciência revolucionária.
28
Esse não é o único fator que possibilita uma superação do modo de produção
capitalista, porém sem ele tão pouco essa superação torna-se possível. Vimos no capítulo
anterior o processo pelo qual os trabalhadores podem desenvolver essa consciência de
classe revolucionária de uma forma quase inteiramente “espontâneo, isto é do que existe
'no momento presente' (Lênin, 2006b) através das contradições vividas em sua própria
realidade cotidiana circunscrita pelo capitalismo. Esse processo espontâneo, é um elemento
essencial dentro do processo de formação política da classe trabalhadora, porém
permanecendo somente com essa forma, parece-nos que acontece não uma
simplificação como uma superficialização desse processo de formação. Seria acreditar que
o barco da história vai levar inevitavelmente a classe à revolução.
Podemos dizer que esse barco mais do que leva, traz elementos concretos e
imediatos que servem de base para o desenvolvimento do processo de consciência de
classe, ao mesmo tempo em que traz elementos que justificam a manutenção do sistema
social vigente e que, portanto, atuam como ideologia. Fatores que atuam
contraditoriamente na formação política desses indivíduos.
Como afirmamos anteriormente, ao trabalhar o processo de desenvolvimento da
consciência de classe, as próprias relações sociais capitalistas fornecem subsídios
constantes dos elementos de sua contradição, visíveis principalmente nas desigualdades
sociais provocadas pelo processo de acúmulo de riquezas e sentidas cotidianamente pelo
conjunto dos trabalhadores. O próprio desenvolvimento do capitalismo oferece em
determinadas conjunturas condições objetivas para sua superação, o que Lênin chama de
situação revolucionária
8
. Momentos históricos em que as contradições inerentes ao sistema
chegam a determinado ponto conjuntural que fazem da revolução uma possibilidade real.
Nesses períodos, decorrentes da combinação e da construção histórica dessas
condições objetivas, ocorrem uma determinada inversão no comportamento dos
trabalhadores “que se deixam pilhar tranquilamente nos períodos ‘pacíficos’, mas que,
num período tempestuoso, são impelidos, tanto pela crise no seu todo como pelas próprias
cúpulas, a uma ação histórica independente.” (Lênin, 2006a).
Condições objetivas que se constituem em três fatores fundamentais: a)
determinada crise política da elite dominante, aonde parte dela percebe a necessidade de
mudanças, mesmo que parciais, no modo de organização da sociedade e a outra continua
8
Como nos coloca Lênin: “Sem essas mudanças objetivas, independentes da vontade de tais ou tais grupos e
partidos ou mesmo de tais ou tais classes, a revolução é, de maneira geral, impossível. É o conjunto dessas
mudanças objetivas que constitui uma situação revolucionária.” (A Falência da Segunda Internacional,
internet).
29
na convicção de manutenção da mesma ordem econômica, política e social. Ou seja,
mesmo sendo fundamental “não é suficiente que ‘a base não queira mais’ viver como
antes, mas é importante também que ‘as cúpulas não consigam mais’ viver como antes.”
(Lênin, 2006a); b) as condições sociais da maioria dos trabalhadores chegam a um ponto
de degradação e de acentuamento da miséria extrema que necessariamente os levam a uma
perda da ‘esperança’, ou seja, uma condição social que os façam não esperar mais como
‘cordeiros pacíficos’ da ordem burguesa. Ou ainda como apontou Marx é preciso que a
própria miséria torne-se “consciente de sua miséria espiritual e física, a desumanização
que, consciente de sua desumanização, supera por isso a si mesma” (Marx, 1987) e; c)
esses fatores acima traçados levam à intensificação da mobilização e da ação independente
das massas que procuram intensamente solucionar as contradições extremas às quais estão
submetidas.
Por outro lado, se são necessárias essas condições objetivas construídas pelo
próprio desenvolvimento da história, para que a possibilidade de uma revolução do modo
de produção da sociedade se torne real, somente elas não são capazes de operar essa
transformação. A história fornece situações revolucionárias, porém “nem toda situação
revolucionária tende à revolução” (Lênin, 2006a).
Nesse desenvolvimento ‘espontâneo’ da história, decorrente do próprio
desenvolvimento do modo de produção, do avanço das forças produtivas e do seu choque
com as relações sociais de produção, ocorre também o que chamamos anteriormente de
formação política ‘espontânea’. Essa formação de modo geral, estabelece limitações dentro
da ordem capitalista, atinge um grau avançado de consciência de classe reivindicatória ou
até promove um rompimento com essa forma de consciência chegando à consciência de
classe revolucionária, porém ainda não de forma sistematizada.
Produz uma inconformidade com o sistema capitalista, uma necessidade mais
‘sentida’ do que ‘racionalizada’ de sua superação. É fundamental que esse sentimento, essa
indignação manifestada ainda de forma caótica adquira uma forma mais sistematizada e
ordenada para que atue intencionalmente numa situação revolucionária.
Atentamos agora ao fato de que essa mesma realidade, que oferece determinada
formação política pelo seu próprio desenvolvimento, mantém a classe trabalhadora muito
aquém de suas potencialidades humanas, alijada do acesso de grande parte dos produtos
produzidos pela humanidade, limitando também dessa forma esse processo de formação
política aonde “o 'elemento espontâneo', no fundo, não é senão a forma embrionária do
consciente” (Lênin, 2005c). Deter-se somente a esse processo seria não levar em
30
consideração quetodo culto da espontaneidade do movimento operário, toda diminuição
do papel do 'elemento consciente', do papel da social-democracia significa - quer se
queira ou não - um reforço da influência da ideologia burguesa sobre os operários
(Lênin, 2005c).
Dentre esses produtos temos os conhecimentos historicamente construídos,
possibilitadores de uma compreensão maior sobre a realidade que vivemos e que
contrariamente a uma ideologização da realidade, buscam um aprofundamento da análise
crítica da mesma. A classe trabalhadora encontra-se, amplamente em sua maioria,
expropriada também do acesso desse conhecimento, dentre eles um em especial que é o da
teoria revolucionária.
Porém, esse não é o único fator que deve se combinar ao processo de formação
política ‘espontâneo’ da classe. Lênin ao determinar as condições objetivas de uma
situação revolucionária e de traçar os motivos pelos quais nem toda situação leva
necessariamente à revolução, aponta o seguinte fator:
“... a revolução não surge de toda situação revolucionária, mas somente nos casos em
que, a todas essas mudanças objetivas acima enumeradas, vem juntar-se uma mudança
subjetiva, a saber: a capacidade, no que concerne à classe revolucionária, de conduzir
ações revolucionárias de massas bastante vigorosas para destruir completamente (ou
parcialmente) o velho Governo, que não ‘cairá’ jamais, mesmo em épocas de crises, se
não for forçado a sucumbir”(Lênin, 2006a).
Para a condução dessas ações revolucionárias vigorosas, não basta somente a
vontade de transformar, mesmo sendo ela essencial, é necessário que a classe
revolucionária seja capaz de formular um plano estratégico e tático para a superação do
capitalismo, bem como ser capaz de construir uma organização capaz de aplicá-lo (Lênin,
2006a).
Esse processo de formulação torna-se somente possível com a apropriação da teoria
revolucionária e através da construção de uma organização que seja a expressão política da
classe. De qualquer forma, essa apropriação não se de forma absoluta, por todos os
indivíduos da classe.
Esses dois elementos a teoria e a organização revolucionária tornam-se
fundamentais para esse salto qualitativo no processo de formação política que pode
contribuir com o desenvolvimento da consciência de classe revolucionária. Nesse sentido,
31
Germer aponta o elemento organizativo como fator aglutinador dos outros dois fatores,
como fator que possibilita uma situação revolucionária tender à revolução:
“O partido socialista pretende fundir estes dois movimentos ou correntes em uma
organização, de tal modo que as lutas práticas do proletariado possam ultrapassar os
limites das reivindicações econômicas e das lutas sindicais, meramente paliativas, e
converter-se em um poderoso movimento social de luta por uma nova sociedade livre da
exploração, ou seja, uma sociedade socialista. Constituindo-se deste modo, o partido
socialista realiza, na prática, a união entre a teoria e a prática, indispensável para o
desempenho consistente da missão, que pretende desempenhar, de dirigir as lutas do
proletariado na direção da tomada do poder e da transformação socialista da sociedade,
para que as energias transformadoras, que são ativadas nos momentos de crise e revolta
de massas, não sejam desviadas para objetivos meramente reformistas por intermédio de
lideranças oportunistas.” (Germer, 2006, cd)
Entendemos então que o processo específico, para além do espontâneo, de
formação política por qual essa classe deve passar para desenvolver uma consciência de
classe revolucionária torna a combinação desses três fatores fundamentais. A coadunação
das experiências e das lutas práticas vividas nas relações sociais imediatas estabelecidas
pelos trabalhadores, a sua apropriação da teria revolucionária e a construção de seu
elemento de organização de classe, decorrente de diferentes estágios desses dois processos
anteriores.
Dessa forma, o processo de formação política adquire uma concepção
qualitativamente superior ao traçado anteriormente. Assim como ele ultrapassa os limites
das experiências práticas cotidianas, espontâneas, não se limitando aos aspectos
reivindicatórios trazidos com maior ênfase pelo imediatismo, ele não se refugia no outro
lado da balança, no aprofundamento teórico, isolado da práxis humana, o que o tornaria
puramente ‘escolástico’ (Marx, 1987).
Nesse sentido, Marx aponta a necessidade de se estabelecer a “importância da
atividade ‘revolucionária’, ‘prático-crítica’(Marx, 1987). E mais adiante afirma que a
questão de saber se cabe ao pensamento humano, uma verdade objetiva não é uma
questão teórica, mas prática. É na práxis que o homem deve demonstrar a verdade, isto é,
a realidade e o poder, o caráter terreno de seu pensamento” (Marx, 1987).
Essa combinação entre a prática e a teoria revolucionária é potencializada dentro de
uma organização também revolucionária. Lênin ao discutir as condições para o
32
funcionamento e para a disciplina dentro de um partido revolucionário volta à discussão
desse tema apontando que “sua formação é facilitada por uma acertada teoria
revolucionária que, por sua vez, não é um dogma e se forma de modo definitivo em
estreita ligação com a experiência prática de um movimento verdadeiramente de massas e
verdadeiramente revolucionário.” (Lênin, 2005a)
Temos então o processo de formação política como um processo não mais
simplesmente espontâneo, mas sim como um processo que demanda ações também
planejadas e formuladas, tendo como base uma teoria revolucionária e como fator
executador uma organização revolucionária. Processo esse que combinado com as
condições objetivas de uma situação revolucionária podem fazer tende-la à revolução.
Lênin ao analisar o processo de formação política da classe trabalhadora russa e de
sua expressão política, nos oferece uma ótima síntese da multiplicidade de fatores que
devem interagir espontânea e intencionalmente para o desenvolvimento da consciência de
classe revolucionária. Diz ele:
“Se o bolchevismo pôde elaborar e levar à prática com êxito, nos anos de 1917/1920, em
condições de inaudita gravidade, a mais rigorosa centralização e uma disciplina férrea,
deve-se simplesmente a uma série de particularidades históricas da Rússia. De um lado,
o bolchevismo surgiu em 1903, fundamentado na mais sólida base da teoria do
marxismo. E a justeza dessa teoria revolucionária - e de nenhuma outra - foi
demonstrada tanto pela experiência internacional de todo o século XIX como, em
particular, pela experiência dos desvios, vacilações, erros e desilusões do pensamento
revolucionário na Rússia. [...] A Rússia tornou sua a única teoria revolucionária justa, o
marxismo, em meio século de torturas e sacrifícios extraordinários, de heroísmo
revolucionário nunca visto, de incrível energia e abnegada pesquisa, de estudo, de
experimentação na prática, de desilusões, de comprovação, de comparação com a
experiência da Europa.” (Lênin, 2005a)
E mais adiante complementa:
“Por outro lado, o bolchevismo, surgido sobre essa granítica base teórica, teve uma
história prática de quinze anos (1903/1917) sem paralelo no mundo, em virtude de sua
riqueza de experiências. Nenhum país, no decurso desses quinze anos, passou, nem ao
menos aproximadamente, por uma experiência revolucionária tão rica, uma rapidez e
uma variedade semelhantes na sucessão das diversas formas do movimento, legal e
33
ilegal, pacífico e tumultuoso, clandestino e declarado, de propaganda nos círculos e
entre as massas, parlamentar e terrorista. Em nenhum país esteve concentrada, em tão
curto espaço de tempo, semelhante variedade de formas, de matizes, de métodos de luta,
de todas as clames da sociedade contemporânea, luta que, além disso, em conseqüência
do atraso do país e da opressão do jugo czarista, amadurecia com singular rapidez e
assimilava com particular sofreguidão e eficiência a "última palavra" da experiência
política americana e européia.” (Lênin, 2005a)
Através desse processo de formação política, que para atingir esse grau de avanço
na formação da consciência de classe revolucionária, deve passar pela combinação da
prática, da teoria e da organização revolucionária, torna-se possível então que diante de
uma situação revolucionária, a classe trabalhadora possa atuar de acordo com seu papel
histórico de emancipação da sociedade.
34
PARTE II
3. HISTÓRICO DO ESPAÇO MARX/UFPR: CAMINHOS QUE LEVAM A SUA
ORIGEM
O espaço Marx foi fundado em 1999, por um grupo de mestrandos em educação do
Programa de Pós-graduação da UFPR, pela professora Lígia Klein, vinculada a esse
programa e pelo professor do Departamento de Economia da mesma instituição Claus
Germer. O que levou esse grupo a se reunir e a pensar em formar um grupo de estudo
sobre a teoria marxiana? Que caminhos em comum foram percorridos por essas pessoas
que produziram essa necessidade? Essa é uma história que começa a ser contada.
O primeiro fato que nos chama atenção, na entrevista com os fundadores do espaço
é que todos os que participaram dessa construção atuavam enquanto militantes socialistas,
ou seja, eles estavam vinculados a alguma organização que se propunha não somente a
lutas reivindicatórias ou econômicas na terminologia utilizada por Lênin em O que fazer,
mas que empreendiam uma luta pela superação do modo de produção capitalista e
construção de uma sociedade socialista.
muito haviam superado a fase da consciência reivindicatória e em sua
consciência revolucionária, construída através de suas histórias, de seus processos
específicos de formação política, procuravam aprofundar seu entendimento não da
sociedade capitalista, mas fundamentalmente da teoria socialista de superação desse
modelo.
A maioria dos fundadores era vinculada ao Partido dos Trabalhadores (PT), que
embora nessa época não se colocasse mais como contrário ao sistema capitalista e nem
propusesse a sua superação
9
, possuía em sua composição, correntes internas pertencentes
ao denominado campo da esquerda do PT. Estas correntes defendiam abertamente, em seus
programas e em suas deliberações de encontros e congressos, o socialismo e a via
revolucionária como estratégia de sua viabilização. A esse campo é que majoritariamente o
grupo de fundadores estava vinculado ou próximo. Também um de seus fundadores era
militante do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU).
9
Como nos aponta Iasi analisando as resoluções do 10
o
. Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores
(1995): “o centro do argumento refere-se à necessidade de uma reelaboração da ‘estratégia de poder’ do
partido para que fosse possível um novo projeto para a ‘sociedade brasileira’, um projeto ‘alternativo ao
neoliberalismo’ que fosse capaz de articular ‘amplas forças sociais’. O que fica evidente, e na seqüência se
torna explícito, é que esta reelaboração se no sentido de um projeto claramente fundado na moderação do
programa e na ampliação do leque de alianças, assim como o caráter ‘socialista’ da meta é substituído por um
projeto ‘nacional’ de desenvolvimento” (p.417). Iasi, Mauro. A mediação particular e genérica da
consciência de classe (O Partido dos Trabalhadores entre a negação e o consentimento)
35
Desse primeiro retrato, pode-se constatar que todos os fundadores da proposta do
Espaço Marx eram militantes socialistas que, por boa parte de suas histórias vinham se
dedicando à construção, mesmo que com diferenças programáticas, estratégicas e/ou
táticas, de um processo de superação da sociedade capitalista e construção do socialismo.
Através então da experiência das relações sociais imediatas e das lutas práticas, de
determinado aprofundamento teórico e da construção de uma organização, que mesmo com
suas limitações, constituía-se enquanto expressão política da classe, foram construindo sua
consciência de classe revolucionária.
Porém, esse fator político-partidário não é o único em comum e relevante a
considerarmos dessa história. Sendo todos militantes socialistas, e de uma trajetória, à
época do início do espaço, de militância que variava entre 15 a 30 anos de militância, o que
os leva depois de tanto tempo de luta, de disputas em sindicatos, partidos, de estudos
realizados, mesmo que individualmente, da teoria marxiana, a sentir a necessidade de
constituir um grupo de fundamentação dessa teoria? Aqui a resposta possui dois caminhos
que levam à constituição do Espaço Marx.
O primeiro é um fato apontado por todos: a inconsistência de suas fundamentações
teóricas. Uma fragilidade de estudo e de conseqüente compreensão da teoria marxiana. Ou
seja, apesar de todos os anos de militância e de estudos contidos nos membros desse grupo,
houve uma constatação paulatina durante essa história de um desconhecimento acentuado
da teoria marxiana, de seus fundamentos e método. Constatou-se que a grande maioria não
dos fundadores do espaço Marx, mas dos companheiros com os quais militavam e dos
críticos da teoria marxiana dominavam-na com visível superficialidade, o que fazia por
muitas vezes, que as discussões e debates ficassem baseados em argumentos rudimentares
e beirando a impressões do conteúdo.
Durante as suas trajetórias de militância isso vinha sendo constatado, o que gerou
por parte desses militantes uma primeira tentativa de formação de um grupo de estudo em
1995. Nessa primeira tentativa, também o foco das discussões era a teoria marxiana,
porém, ainda muito imbuídos de um ativismo político, de “carregar o piano”, abriram mão
desse espaço em detrimento de demandas mais imediatas e concretas, principalmente as
eleições municipais e estaduais de 1996 e as eleições internas do Partido dos
Trabalhadores. Assim o que era um dos elementos prioritários, apontados sempre em suas
análises ou balanços sobre a organização da militância, a fundamentação teórica, ficou
destinada novamente ao ostracismo.
36
Essa experiência, apesar de sua impressão negativa, fez parte do processo de
amadurecimento desse grupo, na medida em que produziu mais um saldo reflexivo sobre
como os militantes socialistas em geral, inclusive eles mesmos, acabavam por relegar a
fundamentação teórica a um plano secundário, uma atividade política que podia esperar
“épocas mais calmas”. Embora em todas as suas colocações e deliberações de congressos e
encontros situasse a fundamentação teórica enquanto aspecto fundamental para a
orientação de suas práticas.
Outro aspecto significativo, também desse período onde o grupo dedicou maior
tempo às demandas imediatas e pontuais, foi a compreensão mais clara da inflexão à
direita da organização na qual a maioria militava, qual seja, o Partido dos Trabalhadores.
Inflexão essa, não casual ou inovadora, mas sim já experimentada pelos partidos socialistas
europeus, cuja experiência encontra significativa análise no livro de Adam Przeworski “O
capitalismo e a social-democracia
10
”.
O embate travado nas instâncias do partido e as conseqüentes deliberações e
encaminhamentos pelos campos majoritários tanto das forças políticas do campo da
esquerda quanto do partido em geral, faz com que esse grupo sinta, mais uma vez, a
necessidade de se aprofundar teoricamente para compreender a conjuntura pela qual estão
passando e concomitantemente para aprofundar a teoria marxiana que acreditavam, devia
ser a base de suas ações e formulações.
Se é verdade que em tempos de crise a humanidade é levada a refletir sobre si
mesma, podemos constatar que para essa pequena parcela da humanidade a crise pela qual
passavam a maioria desses militantes não era pequena, portanto sua necessidade de
reflexão também se expandia. O instrumento de ação e formulação política pelo qual
militaram nas décadas de 80 e 90 não estava correspondendo as suas convicções
políticas. Porquê? Existiam contradições internas que demonstravam uma inflexão de
princípios socialistas no sentido de se limitar a uma reivindicação de humanização dentro
do próprio capitalismo. O que explicava tais contradições e tamanha inflexão? Algo que,
longe de ser o motivo central, mas que saltava aos olhos de todos esses militantes era a
superficialidade com que se tratavam os debates internos, programáticos e de concepção de
sociedade.
O pragmatismo eleitoral coadunado com a adoção da política de resultados,
denotava nas falas inclusive dos dirigentes mais expressivos, um profundo abandono da
10
Nessa obra o autor analisa a história em comum dos partidos socialistas europeus que optaram pela
priorização da via eleitoral enquanto via para a tomada do poder de estado, sua conseqüente adequação aos
limites do estado burguês e abandono da luta pela construção do socialismo.
37
teoria marxiana, que se não tinha sido em nenhum momento pautada nas resoluções e
deliberações partidárias, permeava aberta e/ou implicitamente as falas, documentos e
materiais impressos internos do partido ao se assumir como objetivo estratégico o
socialismo
11
.
Então, se por um lado essa inflexão de princípios socialistas estava cada vez mais
sendo assumido pelos campos majoritários, repetimos não do partido em geral, mas das
correntes que se colocavam à esquerda, do outro lado, nos campos minoritários, havia
também um abandono dessa fundamentação teórica. Fato este que impossibilitava
intervenções mais qualificadas nos debates que, se por sua vez não mudariam os rumos que
estavam sendo adotados, pelo menos conformaria um campo mais nítido e aprofundado
das diferenças e divergências de concepção de organização e atuação do e no partido.
Diferenças que ultrapassam o limite de táticas adotadas para o alcance do objetivo
estratégico ou do embate mais clássico sobre a via estratégica
12
, e que se colocavam
fundamentalmente na mudança desse próprio objetivo.
Claro está também, que não foi simplesmente ou principalmente a falta de
fundamentação da teoria marxiana para que tanto as inflexões dos princípios socialistas
como a falta de oposições mais organizadas que alterassem a correlação de forças perante
essas inflexões ocorressem. Não cabe aqui fazer essa análise de forma mais profunda, mas
somente deixar indicado a existência de todo um cenário de desenvolvimento econômico
do sistema capitalista, de reestruturação produtiva e de adoção do neoliberalismo como
saída da crise de superprodução do final da década de 70, que corroborou para um
aprofundamento da correlação de forças desfavorável do trabalho perante o capital. E
também de uma reconfiguração da correlação de forças internacionalmente estabelecida e
desfavorável aos socialistas do mundo inteiro, pela derrocada do bloco socialista do leste
europeu e pelas conseqüentes denúncias de crimes e da situação deixada pelo antigo
regime na então União Soviética
13
. O que em última análise, constituem elementos que
11
Como fica claro nesse trecho do discurso de Lula na 1
a
. Convenção Nacional do PT em agosto de 1981:
“Nós, do PT, sabemos que o mundo caminha para o socialismo. Os trabalhadores que tomaram a iniciativa
histórica de propor a criação do PT já sabiam disto muito antes de terem sequer a idéia da necessidade de um
Partido. (...) Os trabalhadores são os maiores explorados da sociedade atual. Por isso sentimos na própria
carne e queremos, com todas as forças, uma sociedade que, como diz, o nosso programa, terá que ser uma
sociedade sem exploradores. Que sociedade é esta senão uma sociedade socialista?” In: Iasi, Mauro. A
mediação particular e genérica da consciência de classe (O Partido dos Trabalhadores entre a negação e o
consentimento), p. 313.
12
Nos referimos ao debate sobre reforma ou revolução, que os militantes socialistas vem pautando de longa
data, mais acentuadamente após a II Internacional.
13
Anderson, Perry. In: GENTILI, P.; SADER, E. Pós-neoliberalismo: As políticas sociais e o Estado
democrático. São paulo, Paz e Terra, 4ª edição, 1998.
38
agiram mais determinantemente na conformação das ações da esquerda brasileira
hegemonicamente, no seu abandono paulatino do socialismo como objetivo estratégico do
que somente a carência de fundamentação teórica.
Enfatizamos esse ponto, o da fundamentação teórica, em nosso trabalho, por ser um
importante fator dentro de um processo de formação política para o desenvolvimento de
uma consciência de classe revolucionária e também por ser o objeto de concentração de
nossos esforços. Mas, não ignoramos o fato de que a falta desse elemento, por parte da
militância socialista tem, além de uma opção política realizada pela esquerda brasileira de
forma majoritária, toda uma base material nas relações sociais de produção que atingem
determinantemente as expressões políticas de sua época. Determinações não absolutas, mas
que é a base de onde emergem essas expressões políticas, no caso específico o PT, e que
conforme o momento desse desenvolvimento estrutural, determinam, em última análise,
suas possibilidades históricas. Ou seja, construir uma revolução socialista não depende
somente do fator subjetivo, mas sim da combinação desse fator subjetivo com fatores
objetivos fornecidos pelo próprio desenvolvimento da história
14
.
Portanto, a fundamentação de uma teoria científica revolucionária, em nosso caso a
teoria marxiana, é parte importante desse processo, porém parte interdependente de outros
processos, tanto conjunturais como estruturais. “Sem teoria revolucionária, não
movimento revolucionário”, nos diria Lênin em O Que Fazer.
O que estava colocado então para esses militantes era a necessidade de um
aprofundamento da teoria na qual acreditavam serem baseadas suas ações, para melhor
compreendê-las, reformulá-las e elaborar outras, calcadas mais firmemente em uma
fundamentação. Se por um lado, foi na militância, principalmente dentro de uma
organização partidária que essa necessidade foi se constatando e delineando, não foi nessa
instância que ela se concretizou. O surgimento do espaço Marx não foi uma deliberação a
priori de uma corrente pertencente ao PT e muito menos do partido em geral. Ele somente
concretizou-se quando esta constatação e a necessidade de aprofundamento teórico
esbarrou na dificuldade de elaboração e discussão teórica por parte desses militantes em
outro espaço, nesse caso, em suas relações sociais imediatas, no desenvolvimento de suas
dissertações de mestrado e no embate dentro da academia com agrupamentos que se
contrapunham à teoria marxiana.
Esse é o segundo caminho que leva à constituição do Espaço Marx da UFPR, a
necessidade acadêmica, uma forma de aprofundamento teórico que não está
14
Lênin, O Oportunismo e a Falência da Segunda Internacional.
39
necessariamente ligada à militância. Por estarem a grande maioria em um momento de
qualificação acadêmica, um programa de s-graduação em Educação, seja como
educando ou educador, decorrente da posição que ocupam no processo de produção,
acabam por convergir a necessidade de aprofundamento teórico tanto pela necessidade
imediata, cotidiana como pela necessidade construída durante seus anos de militância
político-partidária.
Essa necessidade dentro do meio acadêmico por sua vez, delineou-se no decorrer da
disciplina ministrada pela professora Lígia Klein, a qual os fundadores com exceção do
professor Claus Germer, cursavam. Nessa disciplina, com a discussão de textos marxistas e
com o debate com outros colegas de mestrado e com outros professores, percebeu-se que
na academia também havia uma fragilidade tanto por parte dos defensores quanto dos
opositores da teoria marxiana em relação ao seu conhecimento aprofundado. Críticas e
defesas que segundo a professora Lígia Klein, “apresentavam somente rudimentos da
teoria” e empobreciam a discussão ao invés de elevá-la.
Ou seja, apesar de todos os fundadores estarem constatando essa falta de
fundamentação mais aprofundada sobre a teoria marxiana, ao longo de suas histórias de
militância, somente no momento em que se encontra em um processo mais específico de
elaboração teórica, um “curso de mestrado” é que o grupo decide formar um espaço
sistemático de discussão sobre essa teoria. Ou seja, quando essa necessidade se torna mais
concreta e imediata, pois sem satisfazê-la outras ações concretas e imediatas se tornam
impossibilitadas, no caso principalmente a elaboração de suas dissertações e da construção
de posicionamentos mais qualificados nas discussões com outras perspectivas teóricas.
Esses dois caminhos, que não se constituem enquanto paralelos, mas ao contrário
possuem vários momentos de interfaces vivenciados pelos fundadores, fazem com que a
origem do Espaço Marx da UFPR surja de uma necessidade de duplo caráter, que não
necessariamente são excludentes ou divergentes: o da militância político-partidária e o da
elaboração acadêmica, uma forma de fundamentação teórica, caminhos constitutivos da
história desses militantes.
3.1 - Antes de Espaço Marx, Florestan Fernandes
Nos referimos até aqui, ao espaço de fundamentação teórica construído por esses
militantes como Espaço Marx, mas temos que lembrar que sua primeira denominação foi
Grupo de Estudos Florestan Fernandes (GEFF). Essa idéia parte dos fundadores como
40
forma de propor na própria nomenclatura, a necessidade do estudo também de marxistas
contemporâneos. Esse grupo então lança, no segundo semestre de 1996, um folder de
divulgação do espaço aonde um dos pontos expostos procura conceituar no que consiste
esse grupo:
“O Grupo de Estudos Florestan Fernandes, organizado por alunos do Mestrado
em educação da UFPR, é um espaço aberto à comunidade, que objetiva desenvolver
estudos sobre a Teoria Marxiana e as Tendências Marxistas contemporâneas. Pretende
constituir-se como um ponto de convergência pluralista, aberto e unitário de entidades,
movimentos políticos e sociais e de todas as pessoas que se identificam com a teoria e as
propostas de Marx, reivindicando sua atualidade e validade na luta pela supressão das
relações capitalistas de produção e por uma nova ordem social em que o livre
desenvolvimento de cada um seja a condição para o livre desenvolvimento de todos.
Para tanto, atuará como um espaço de reflexão, debate e intercâmbio, na perspectiva da
geração de iniciativas e propostas.”(GEFF, material impresso)
Analisando o conteúdo expresso nessa passagem, fica claro que esse é um espaço
que procura alcançar aqueles que romperam ou estão em fase de rompimento com a
consciência de classe reivindicatória. Isso fica evidenciado no momento em que se começa
a delinear os objetivos gerais, aonde se adota desde o princípio a teoria marxiana como o
objeto de estudo e quando se identifica para quem esse espaço é construído: “todas as
pessoas que se identificam” com a “luta pela supressão das relações capitalistas de
produção”. Propõe-se a realizar um trabalho de base então, de fundamentação teórica, com
aqueles que já estão nessa fase de amadurecimento do processo de formação política.
Colocado esse parâmetro de público a ser atingido, percebemos nesse texto ainda,
uma acentuada ênfase no aspecto “aberto” do espaço, como um lugar onde os militantes
socialistas independentemente de qual organização estivessem vinculados ou ainda que não
possuíssem essa vinculação com nenhuma organização, pudessem debater sobre a teoria
marxiana e sobre o marxismo contemporâneo. Aqui teríamos então, a proposição de uma
espécie de campo de discussão e fundamentação teórica aberto, aonde militantes socialistas
independente das diferenças táticas e/ou estratégicas das organizações nas quais militavam
ou ainda mesmo na ausência dessa militância, pudessem debater as questões teóricas
marxianas de fundo.
Somam-se a esses aspectos o leque amplo de ações a que esse grupo se propõe e
que nesse texto ainda aparecem de maneira imprecisa, focando somente aspectos gerais
41
como “espaço de reflexão, debate e intercâmbio, na perspectiva da geração de iniciativas e
propostas”, mas que no ponto seguinte do folder, que definem os objetivos se especificam
e se ampliam:
“Promover: a) estudo da obra marxiana (fundamentalmente O Capital) e a
produção marxista contemporânea; b) a difusão das idéias marxianas; c) a divulgação
de informações do mundo inteiro relacionadas com o marxismo; d) o debate e a
discussão de idéias e pontos de vista e a reflexão na busca de novas propostas e
estratégias e a troca de experiências; e) a ação unitária de todas as forças políticas e
sociais comprometidas com a transformação da sociedade.” (GEFF, material impresso)
Ao traçar seus objetivos o grupo, ainda então Florestan Fernandes, reivindica como
suas ações, não só o estudo da teoria marxiana, como a difusão e divulgação dessas idéias e
pretende formular “propostas e estratégias”, mas não indica sobre e/ou para quê. Em
conversa com os fundadores eles apontam que seria sobre as estratégias e propostas
socialistas para a contemporaneidade, mas também têm dificuldade de sinalizar como isso
funcionaria. Essa dificuldade nos remete ao próprio caráter de constituição do grupo, um
“espaço aberto” a todos militantes socialistas para seu aprofundamento teórico. A
proposição de formular estratégias e propostas nos parece mais vinculada à militância
desenvolvida por estes militantes, em suas organizações, o que dificultaria sua realização
dentro de um espaço eminentemente “plural” com militantes que possuíam como
dissemos divergências táticas e/ou estratégicas e que por isso não militavam em uma
mesma organização.
Relembrando Lênin (2005c) e Germer (2006) o partido é o fator aglutinador das
experiências práticas e da fundamentação teórica, nele é que se encontra a possibilidade
mais concreta de se formular e executar a luta socialista. Por exemplo, se pegarmos
grandes teóricos marxistas veremos que a grande maioria de suas formulações políticas de
elaboração estratégicas estava diretamente ligada aos papéis que desempenhavam em seus
partidos e às necessidades das lutas a que eles se impunham
15
.
Outro ponto que nos chama muito a atenção principalmente por sua generalidade é
o de promover uma “ação unitária de todas as forças políticas e sociais comprometidas
com a transformação da sociedade”. Aqui parece transparecer ainda a necessidade, ainda
15
Como por exemplo, Marx e Engels “Mensagem do Comitê Central à Liga dos Comunistas”; Marx “Crítica
ao Programa de Gotha”; Lênin “O que fazer?”, “Esquerdismo, doença infantil do comunismo”, “Estado e
Revolução”; Rosa Luxemburgo “Reforma ou Revolução”.
42
que não sistematizada desse grupo, de fazer com que esse espaço eminentemente de
aprofundamento de seus estudos, mesmo não sendo este descolado de suas ações, se
transforme em um espaço de articulação prática da luta travada pelos socialistas na
atualidade.
Esse objetivo, ainda mais que o anterior, toma para si uma das funções principais de
um partido revolucionário:
“essa ampla agitação política será conduzida por um partido unindo em um todo
coerente a ofensiva contra o governo, em nome de todo o povo, da educação
revolucionária do proletariado, salvaguardando, ao mesmo tempo, sua independência
política, a direção da luta econômica da classe operária, a utilização de seus conflitos
espontâneos com seus exploradores, conflitos que levantam e conduzem sem cessar, para
o nosso campo, novas camadas do Proletariado!” (Lênin, 2005c)
O que nos parece essencialmente um reflexo da necessidade desses militantes de
buscarem respostas às crises de suas organizações, mesmo que fora delas, do que da
intenção de substituir ou de construir uma outra organização a partir do grupo de estudos.
Para iniciar esse trabalho de discussão e aprofundamento teórico, mesmo com todas
estas outras variantes mais gerais de ações e objetivos, o grupo propõe um encontro
introdutório sobre o marxismo que teria como texto a ser debatido “Considerações sobre o
Marxismo Ocidental”, de Perry Anderson (1989). E no próximo encontro, o início do
estudo de O Capital de Marx, discutindo-se a mercadoria e teoria de valor, tendo ainda
como texto de apoio “Teoria Marxista do Valor” de Isaac Rubin (1980).
O saldo desse estudo inicial foi a percepção da necessidade de mais e de outros
elementos teóricos para iniciar a discussão de O Capital e para além disso que deveriam
antes de ler e debater textos de marxistas contemporâneos, buscar os elementos centrais da
teoria marxiana no próprio Marx, em outras obras do autor, que pudessem permitir uma
aproximação mais exata ao seu pensamento. Começa a sair de cena então Florestan
Fernandes.
Durante as discussões e encaminhamentos posteriores os fundadores começam a
redesenhar esse espaço de estudo, desde seu nome até objetivos, metodologia e
bibliografia. Porém, não sistematizaram esse redirecionamento em nenhum documento, o
que nos leva a dialogar novamente com o relato dos fundadores.
43
O que é apontado como central para essas mudanças, é a dificuldade de debater o
marxismo, ou melhor, “os marxismos”, por exemplo, o marxismo ocidental na
contemporaneidade sem dominar as categorias centrais do pensamento marxiano. O grupo
então, enfatiza ainda mais o aspecto ortodoxo da formação proposta, no sentido em que
prioriza o estudo de Marx no próprio Marx.
Essa priorização de redefinir com maior aprofundamento o caminho a ser tomado
para o trabalho de fundamentação teórica, reforça esse como objetivo principal da
constituição do grupo, fazendo com que as outras variantes expressas no primeiro folder de
elaboração sobre o grupo fiquem em segundo plano.
A mudança na bibliografia a ser estudada, vem acompanhada de mudanças na
metodologia, nos objetivos e na nomenclatura, que serão abordadas nos pontos seguintes.
Os dois primeiros no tópico A Definição da Metodologia Inicial e o terceiro no ponto a
seguir.
3.2 - Espaço Marx, porquê?
À primeira vista essa pergunta nos parece uma tautologia, pois se o que esses
militantes pretendiam era o estudo da teoria marxiana, nada mais coerente do que
denomina-lo pelo nome do autor que a elaborou. Essa explicação evidentemente constitui
um dos motivos principais da denominação, porém não é a única. Devemos atentar
também ao fato da priorização do aspecto ortodoxo da formação teórica, estudar Marx pelo
próprio Marx em detrimento da intenção inicial de trazer para o debate e estudo marxistas
mais contemporâneos. Portanto, não acontece somente uma mudança simples de
nomenclatura, essa mudança traz em si, uma mudança significativa do conteúdo a ser
priorizado pelo desenvolvimento do grupo.
Outra explicação apontada também como importante foi o fato de que no ano de
1998 realizou-se o Encontro Internacional de Paris para comemorar os 150 anos do
Manifesto Comunista, publicado primeiramente em 1948.
Esse encontro foi estruturado por uma organização francesa chamada Espaços
Marx, subsidiada por “um grupo de quase duzentos intelectuais e lideranças políticas
sindicais de diferentes concepções e sensibilidades, formou-se uma rede de comitês
nacionais, de modo geral não-governamentais e apartidários, que atingiu todos os
continentes: 16 na África, 10 na América Latina, 2 na América do Norte, 11 na Ásia, 23 na
Europa e 3 na Oceania.” (Filho, 2005)
44
Esse encontro contou com a participação de cerca de 1500 pessoas provenientes de
mais de 60 países, com mesas de debates e apresentações de trabalhos que abrangiam
principalmente uma leitura contemporânea sobre o sistema capitalista e discussão de
possíveis alternativas marxistas para esse sistema.
Dentre as questões mais significativas abordadas no encontro nos valemos do relato
do professor de história contemporânea Daniel Aarão Reis Filho, da Universidade Federal
Fluminense (UFF), um dos 60 participantes brasileiros:
“...o elenco impressionante de desafios: a conjugação da proposta internacionalista, única
alternativa à globalização atualmente em curso, com o respeito pelas particularidades regionais e
nacionais. A investigação sobre a configuração do político numa sociedade socialista. A
reabilitação da utopia como invenção, mas ancorada no cotidiano vivido pelos comuns dos
mortais. As metamorfoses do trabalho (o capitalismo enterrou seus coveiros?), as incertezas do
progresso, os desafios ecológicos, a chamada exclusão de parcelas crescentes da humanidade dos
benefícios possíveis da nossa época (visto de um outro ângulo, não seria esta uma forma,
perversa, é verdade, de inclusão destas parcelas?).”
Sendo que a deliberação concreta e consensual desse encontro foi a de estimular e
de criar espaços de discussão sobre a teoria marxista nos países participantes do encontro,
os Espaços Marx, como forma de solidificar esse espaço comum de discussão para
possíveis encontros posteriores e de fomentar o debate da teoria marxista com as questões
colocadas aos socialistas da atualidade. Fortalecendo dessa forma, a construção de uma
associação entre os Espaços Marx mundialmente.
Percebemos através desse depoimento que uma questão em especial refletida no
folder inicial do grupo de estudos àquela época denominado Florestan Fernandes, aparece
também nesse encontro mundial: a necessidade de se formular uma ação conjunta, nesse
caso internacional, para superação do modo capitalista de produção. Através de grupos de
estudos que debaterão e formularão propostas sobre diversos temas? Temos nesse espaço,
uma pluralidade ainda maior de objetivos.
Ressaltamos que esse encontro constituiu-se de grande importância na medida em
que proporcionou um espaço com significativa representação mundial de socialistas para
debates sobre problemas com os quais nos defrontamos. Porém, vemos que esse espaço
refletiu também um momento, que perdura e se aprofundou até atualmente, a partir da
degeneração das organizações socialistas partidárias ocorrida primeiramente na Europa
16
.
16
Adam Przeworski, O capitalismo e a social-democracia.
45
Processo esse que faz com que funções do partido revolucionário dentre elas a
principal, como apontamos, de aglutinador das lutas socialistas, diluam-se em outros
espaços, mais fragmentados e específicos, como principalmente movimentos sociais de
área e em menor escala em grupos de estudos ou de elaboração simplesmente intelectual.
A contribuição que prevaleceu concretamente deste encontro foi a fomentação dos
grupos de estudos. Tendo em vista esse fato, os fundadores do Espaço Marx da UFPR,
optaram por essa denominação para o seu grupo de fundamentação teórica, também com a
intenção de poder começar a se relacionar com esses outros e precursores Espaços Marx de
forma sistemática.
Esta possível inter-relação debate com outros espaços de diferentes perspectivas e
localidades, participação de um movimento de nível mundial de discussão da teoria
marxista, objetivo também traçado inicialmente, foram juntamente com os da teoria
fundante e do caráter privilegiado da ortodoxia na formação, objetivos centrais da
denominação do grupo.
3.3 - O vínculo com a instituição UFPR
Outro fator importante levantado pelos fundadores nesse início é sobre o vínculo
que o Espaço Marx manteria com a instituição UFPR. A decisão tomada foi a de se ter uma
vinculação com o programa de pós-graduação do setor de educação da UFPR, porém não
uma vinculação formalizada. Optou-se então em se vincular o Espaço Marx como um
grupo de estudo do Programa de Pós-Graduação da instituição, porém optou-se também
em não se formalizar essa vinculação. Na utilização do espaço físico institucional e da
produção científica, reivindica-se o Espaço Marx como um espaço da instituição.
Os motivos que levaram a esse encaminhamento se tornam bem claros no
depoimento da fundadora Lígia Klein, professora do programa de pós-graduação “nós não
fizemos o atrelamento administrativo à instituição, por várias razões, primeiro porque no
momento em que ele se institucionaliza, adquire o formato da instituição e nós tínhamos
medo que isso pudesse levar em desvios da finalidade original”. Outro ponto importante
citado pela mesma fundadora é de que o objetivo do Espaço Marx era o de atrair militantes
socialistas e não pessoas que viessem “atrás de carga horária, para receber certificados ou
créditos”, mas sim de atrair pessoas que quisessem “aprender rigorosamente o marxismo
porque isso é um instrumento que orienta minha ação prática”.
46
Essa decisão aparentemente simples acarreta algumas conseqüências importantes,
não formalizar essa vinculação garante a autonomia de organização e funcionamento do
Espaço Marx frente não somente à instituição como às políticas públicas implementadas
paulatinamente no Brasil. Em nosso caso de análise especialmente na área da Educação e
Pesquisa Científica, que resumidamente baseou-se em uma constante diminuição dos
recursos financeiros aplicados nessas áreas e em uma aplicação da lógica empresarial de
produtividade ao Ensino Superior de forma geral bem como aos seus programas de pós-
graduação e pesquisa científica.
Se isto torna-se possível com essa autonomia, por outro lado percebe-se que esse
fato não permite a esse espaço maiores possibilidades de reivindicar direitos que outros
grupos vinculados formalmente à instituição possuem, no que tange principalmente a
questão de recursos financeiros para seu funcionamento ou para eventos mais amplos que
sejam necessários realizar.
Essa opção inicial demonstra também a opção por uma não institucionalização
burocrática ou demasiadamente acadêmica que vai se acentuar no decorrer dos anos.
3.4 - A Definição da Metodologia Inicial
Com a definição de se formar um grupo de estudos que debatesse com
profundidade a teoria marxiana elaborada, as questões que aparecem é por onde e como
começar? Qual a obra de Marx ou tema por ele abordado que deve iniciar a discussão?
Estudar todas, algumas ou uma obra? Como esse grupo vai funcionar, qual a metodologia
que se vai utilizar para que o objetivo central de fundamentação teórica se alcance?
Com relação às obras ou temas o grupo fundador tinha um consenso, O Capital
deveria ser a obra central a ser estudada, por ser a obra na opinião de todos que mais
possibilitava esse aprofundamento da teoria marxiana. Porém, mesmo tendo esse consenso
outra questão que aparecia era: vamos direto ao estudo dessa obra, ou precisamos de outros
instrumentos teóricos para melhor entendê-la e estudá-la? Aqui também, todos pontuaram
que deveriam percorrer um caminho na teoria marxiana inicial que os preparassem para a
leitura e estudo da obra O Capital.
Essa opção justifica-se, pelos fundadores, pelo fato da necessidade de se ter uma
visão mais ampla do conjunto da teoria elaborada por Marx, entender conceitualmente
como ele entendia o ser humano e o desenvolvimento de sua história para depois se
debruçar no estudo da obra central. Discutir anteriormente as categorias centrais do
47
pensamento marxiano que dessem conta de delinear sua concepção de entender, interpretar
e transformar o mundo.
Para tal, o fundador Claus Germer elaborou um roteiro de textos ou partes de textos
que considerava essencial para que esse caminho inicial fosse percorrido de maneira a dar
conta de sintetizar a concepção de mundo de Marx.
Bem importante enfatizar aqui, que essa proposta de realizar esse caminho prévio
de maneira aprofundada e sistemática para o estudo do Capital foi considerado essencial
por todos para que a discussão, inclusive as iniciais, da obra central pudesse ser mais
proveitosa no sentido que permitissem não uma melhor compreensão do texto, mas do
próprio método aplicado por Marx na sua elaboração.
Por que a obra O Capital? Como apontamos todos os fundadores a consideram
como a obra que mais permite um aprofundamento da teoria marxiana. Mas, a pergunta
qualitativamente diferente, mas que ainda persiste é: porquê? Na opinião dos fundadores
essa obra além de fazer uma análise profunda e consistente do sistema capitalista, de suas
leis, de seu funcionamento e de suas conseqüências contém em sua elaboração o método
materialista dialético aplicado. Nessa obra, Marx ao proceder a análise do sistema
capitalista aplica seu método de forma consistente e coerente, fazendo o que propõe no seu
texto “Para uma crítica da economia política”:
“Parece correto começar pelo real e o concreto, pelo que se supõe efetivo; por exemplo,
na economia, partir da população, que constitui a base e o sujeito do ato social da
produção no seu conjunto. Contudo, a um exame mais atento, tal revela-se falso. A
população é uma abstração quando, por exemplo, deixamos de lado as classes de que se
compõe. Por sua vez, estas classes serão uma palavra oca se ignorarmos os elementos
em que se baseiam, por exemplo, o trabalho assalariado, o capital, etc. Estes últimos
supõem a troca, a divisão do trabalho, os preços, etc. O capital, por exemplo, não é nada
sem o trabalho assalariado, sem o valor, sem o dinheiro, sem os preços, etc. Por
conseguinte, se começássemos simplesmente pela população, teríamos uma visão caótica
do conjunto. Por uma análise cada vez mais precisa chegaríamos a representações cada
vez mais simples; do concreto inicialmente representado passaríamos a abstrações
progressivamente mais sutis até alcançarmos as determinações mais simples. Aqui
chegados, teríamos que empreender a viagem de regresso até encontrarmos de novo a
população - desta vez não teríamos uma idéia caótica do todo, mas uma rica totalidade
com múltiplas determinações e relações.”(Marx, 2005)
48
Portanto, os fundadores por esse motivo principal, escolheram o estudo de O
Capital, por ser, nas palavras da fundadora Lígia Klein, “a obra fundamental do
pensamento de Marx”.
em relação ao funcionamento e organização dos encontros, optou-se por utilizar
a metodologia trabalhada pela fundadora Lígia Klein em sua disciplina do mestrado. Esse
formato consistia basicamente em: uma leitura individual e anterior ao espaço de discussão
por parte dos participantes, com a tarefa de se levantar questionamentos, no mínimo um, e
pontos importantes do texto lido; uma breve exposição de um dos participantes,
determinada anteriormente, levantando os principais pontos abordados no texto;
levantamento das questões e pontos importantes feitos pelos participantes seguido do
debate dos mesmos; e fechamento por parte do professor Claus Germer das questões e
dúvidas trabalhadas na discussão.
Essa metodologia foi adotada pelo entendimento de que ela proporcionaria um
encontro baseado no debate, onde os participantes pudessem dialogar sobre suas dúvidas,
questionamentos e pontos importantes e que ao mesmo tempo não abrisse mão da figura de
um professor, não em seu aspecto formal, mas no sentido de ser aquele que possui um
nível mais aprofundado do conhecimento e que por isso conseguiria sistematizar a
discussão desenvolvida e a categorizar com maior precisão os conceitos trabalhados no
texto.
Estes dois aspectos são considerados muito importantes pelos fundadores. A
questão da abertura efetiva do diálogo e discussão sobre o texto seguido de um fechamento
mais aprofundado corrobora para que os participantes não assumam um papel passivo no
processo do desenvolvimento de seu conhecimento, não se portem como simples ouvintes
das “boas novas”. A questão de verbalizar seus pensamentos, de colocá-los em discussão
com outras pessoas, de confrontá-los com outras formas de entendimento, no processo de
desenvolvimento do próprio pensamento faz com que sua reelaboração, apreensão de
conceitos e desenvolvimento da argumentação solidifique-se ainda mais.
Assim como, manualmente o ser humano constrói e opera com objetos,
mentalmente opera e constrói através das categorias, de conceitos, abstrações de elementos
da realidade concreta. “Deste modo, o pensamento e a linguagem, embora distintos,
mantêm entre si uma unidade indissociável. Nessa unidade, não é a atividade mental que
organiza a expressão, mas é a linguagem, enquanto expressão, enquanto signo, enquanto
material semiótico que organiza a atividade mental” (Klein, 2005, p.02).
49
Essa importância da fala para o desenvolvimento do pensamento coaduna também
com a intenção dos fundadores de que o Espaço Marx fosse um espaço para que os
militantes pudessem aprofundar seus conhecimentos sobre a teoria marxiana e que
pudessem com esse aprofundamento, qualificar mais a sua atuação na militância. Sem
esquecer que, como afirma Lígia Klein, o Espaço Marx é aonde “se exerce a militância
estudando”. Para essa qualificação era entendimento de que os participantes tivessem que
se colocar nas discussões, deveriam opinar, divergir, questionar, enfim, expor suas
análises, mesmo que a princípio parciais ou superficiais, para que no decorrer do processo
essas intervenções fossem se qualificando.
A figura de um professor, no sentido citado, também foi priorizada pelos
fundadores, na procura de manter um rigor científico sobre o assunto, ou seja, para que não
se caísse nos chamados “achismos” ou “autoditatismos”, a figura de alguém que detivesse
o conhecimento com maior profundidade era essencial para que as categorias científicas
trabalhadas no texto pudessem ser apreendidas pelo grupo de forma mais sistematizada,
superando o entendimento e a compreensão senso-comum, acentuadamente presente no
grupo nesse início de trabalho.
Outro ponto apontado como importante era a autogestão do grupo, entendendo a
autogestão aqui como o processo que permitia aos próprios participantes do Espaço Marx a
definição do andamento de seus estudos. Essa autonomia do grupo era considerada
fundamental para que os próprios participantes tivessem a responsabilidade de decidir
como estava o andamento dos estudos. Por exemplo, se o grupo achasse que precisaria de
mais duas sessões para discutir com profundidade determinado capítulo, pois ainda
persistiam muitas dúvidas ou questionamentos, esse era o procedimento adotado.
Esse aspecto serviria também como uma certa avaliação do aprendizado por parte
dos participantes. Ao determinar o prosseguimento ou não da continuação do texto,
poderia-se perceber nas suas colocações, as dificuldades ou avanços com o estudo. Além
de atribuir funções e responsabilidades específicas a determinados participantes, que
deveriam apresentar determinadas partes no próximo encontro.
Embora existisse essa autonomia do grupo em relação ao ritmo do estudo, havia
também a preocupação de manter esse ritmo com o ritmo social estabelecido. Não era
possível, caso que nunca aconteceu, mas que se acontecesse tinha um encaminhamento,
de permanecer demasiadamente em um capítulo ou em uma parte do texto por mais tempo
que o considerado socialmente necessário, caso isso acontecesse denotava algum ponto
falho da metodologia empregada que não estaria dando conta de seus objetivos.
50
Essa preocupação de se estabelecer um ritmo que mantivesse a sua autonomia, mas
que não se deslocasse da realidade de um ritmo socialmente estabelecido foi uma
preocupação pontuada com ênfase pela fundadora Lígia Klein, no sentido de que o grupo
não esquecesse que deveriam exercer essa autonomia dentro de certos limites cronológicos
mesmo, como por exemplo, os prazos estabelecidos pelos seus estudos formais. Mais
adiante, como veremos, essa autonomia será exercida com maior flexibilidade.
No aspecto de sistematização e da elaboração teórica, pretendia-se ainda elaborar
cadernos contendo textos dos próprios participantes onde estes pudessem expor reflexões
feitas a partir das discussões realizadas. Nessa proposta não existia uma preocupação
excessiva com a qualidade ou aprofundamento dos textos, mas principalmente com a
possibilidade de realizar elaborações teóricas iniciais onde os participantes estariam mais
do que procurando elaborar teoricamente, expondo idéias que seriam debatidas no próprio
grupo.
Esse instrumento serviria como mais uma forma de aprofundar o desenvolvimento
dos estudos e do pensamento dos participantes, na medida em que primeiramente todos
seriam convidados a elaborar cientificamente a partir do estudo inicial de O Capital, e
posteriormente o grupo poderia debater essas sistematizações em conjunto, apontando
incongruências ou mesmo levantando aspectos a serem aprofundados, bem como avanços
percebidos na compreensão dos textos. Este caderno ficou apenas como um projeto a ser
desenvolvido.
Então agora, temos um quadro com as principais pontuações na determinação da
metodologia inicial, do funcionamento do Espaço Marx feita por seus fundadores.
Propostas baseadas na realidade concreta do grupo inicial, cinco alunos do mestrado e dois
professores da Universidade Federal do Paraná, que mesmo com todas as limitações
delineadas, possuíam, mesmo que de forma não sistemática e aprofundada, determinada
leitura da teoria marxiana e uma formação política construída mais fortemente na luta
cotidiana de pelo menos 15 anos de militância.
3.5 - Assim inicia-se o Espaço Marx da UFPR
Então, depois desse percurso inicial, começa efetivamente o Espaço Marx. Um
espaço então caracterizado prioritariamente como um espaço de fundamentação
sistemática da teoria marxiana, com ênfase na ortodoxia do estudo, estudar Marx por Marx,
e na busca ainda de concretizar outros objetivos como o da interação com os outros
51
Espaços Marx, da produção de textos e da divulgação do pensamento marxista. Objetivos
iniciais tais como o da formulação estratégica para os socialistas na contemporaneidade e a
busca pela união das ações dos militantes socialistas deixam, pela própria limitação de um
grupo de estudo, de serem abordados como funções do espaço.
Como vimos, o espaço Marx da UFPR surge de uma combinação de necessidades
da militância exercida pelos fundadores e por uma necessidade acadêmica que passam a
vivenciar em seu curso de mestrado. E no decorrer dos três primeiros anos, o perfil de
quem permanece, tanto dos fundadores como dos novos participantes, no grupo de estudos
predominantemente começa a tender mais para aqueles participantes que enxergam no
espaço Marx uma ação de militância, no que diz respeito a sua fundamentação teórica. Isso
aparece no relato de um dos fundadores, Armenes Ramos Jr, ao dizer que “fica claro que
quem encara o espaço Marx como uma ação de sua militância persiste por mais tempo no
grupo do que aqueles que encaram como uma atividade simplesmente acadêmica”.
O que nos chama a atenção, é que mesmo tendo nascido com um para fora da
instituição ou da academia, no decorrer desses primeiros anos, essa necessidade que
impulsionou a construção do espaço vai perdendo sistematicamente sua importância e seu
peso dentro da formatação do grupo. E aqui vários fatores corroboram para isso: o término
do mestrado por parte de seus fundadores e a saída, por motivo de mudança residencial, de
alguns fundadores que tinham mais esse interesse.
Outro fator que colabora com a ênfase nesse perfil de militância é a própria
deliberação dos militantes ligados ao campo da esquerda do PT, de colocar como uma ação
obrigatória de seus militantes a participação nesse espaço de aprofundamento teórico,
acarretando no ingresso e a permanência de novos participantes no espaço Marx por serem
militantes socialistas, cumprindo uma ação deliberada por consenso de sua organização.
Nesses três anos iniciais então o fato que mais caracteriza, com relação às
mudanças, o Espaço Marx é esse, o fato de se constituir mesmo continuando, como aponta
o fundador Claus Germer, um “espaço aberto a todos que queiram estudar Marx”, um
espaço onde os militantes socialistas, pudessem buscar o aprofundamento da sua
fundamentação teórica. Ou seja, os participantes majoritariamente constituíam-se de
militantes que estavam desenvolvendo nas três principais dimensões, lutas concretas,
aprofundamento teórico e construção de uma organização revolucionária, o seu processo
de formação política.
52
Esta mudança de perfil torna-se uma mudança qualitativa da característica do
grupo, sem juízo valorativo, mas fundamental para a escolha dos caminhos a serem
percorridos.
3.6 - Para Além do Capital, sem abandoná-lo
No final desse período de aproximadamente três anos, o grupo com um perfil de
militantes de uma mesma organização, começa a sentir a necessidade de ampliar seus
estudos, de ir além do estudo de O Capital, sem abandonar o estudo sistemático dessa obra.
A primeira proposta é a de realizar alguns eventos de celebração de algumas datas
importantes da história, principalmente para os socialistas como Guerra do Vietnã, 11 de
setembro (morte de Allende), e eventos sobre temas mais contemporâneos, Conjuntura
Brasileira com a participação do Professor Osvaldo Coggiola da USP, eventos estes que
chegaram a reunir mais de 100 pessoas para o debate.
Com esses eventos, os participantes do Espaço Marx perceberam que deviam
ampliar seus estudos não somente em forma de eventos pontuais, mas de estudo
sistemático também sobre outros aspectos fundamentais para a luta pelo socialismo. Nessas
discussões e em outros momentos em conjunto, na militância concreta ou mesmo no
próprio Espaço Marx, percebeu-se uma falta de conhecimento, no mesmo sentido da
percepção sobre a teoria marxiana, sobre as experiências de lutas pelo socialismo na
história mundial.
Por ter o grupo esse caráter mais vinculado à militância mais concreta de luta pelo
socialismo; conhecer, discutir e refletir sobre as experiências históricas evidenciou-se
como fundamental. E essa discussão começava a acontecer sob um domínio mais
qualificado da teoria marxiana, de um grupo que vinha estudando em conjunto e de forma
sistemática há aproximadamente três anos, em sua maioria, essa teoria.
Surge então, a proposta de formar o Espaço Lênin, que teve esse nome por ser
considerado pelos participantes como o maior teórico de uma revolução socialista, a
revolução russa. Esse espaço funcionaria com uma metodologia bem parecida com a do
Espaço Marx, sendo em algumas vezes mais expositivo no início da sessão dependendo da
necessidade ou viabilidade de alguém que dominasse mais o conteúdo. A partir de então,
se alternariam os encontros entre Espaço Marx e Espaço Lênin, semanalmente.
Para a definição do cronograma dessa proposta ficou estabelecido como obra inicial
o estudo de “O Dezoito Brumário” de Marx, que analisava a revolução burguesa na França.
53
Ficou indicado também um conjunto de doze revoluções, vitoriosas e não vitoriosas, no
sentido da tomada do poder do estado, para o prosseguimento dos estudos.
Pode-se constatar que a proposta primeiramente traçada para o estudo das
revoluções, centrava-se no estudo das mesmas, sem que acontecesse a definição de
categorias centrais a serem analisadas. Tinha-se um esboço de um programa de estudos
sobre revoluções, porém não se havia estabelecido um roteiro de quais seriam as categorias
centrais a serem debatidas e compreendidas em cada ou em todas as revoluções a serem
estudadas.
3.7 - Aumenta a demanda: O que fazer?
Nesse primeiro período então, em relação ao número de participantes constantes,
ocorreu uma oscilação entre sete e quinze no máximo, porém o grupo que permaneceu,
mesmo não iniciando ao mesmo tempo, constituiu-se de nove pessoas e dessas, seis
estavam organizadas no campo da esquerda do PT, duas eram próximas dessa organização
e uma somente não tinha proximidade considerável. Como pontuamos, nem todos os
fundadores permaneceram no grupo de estudos e outras pessoas ingressaram durante esses
três anos.
Como era feito para que essas pessoas que entraram em um intervalo de até um ano
após o início do Espaço Marx pudessem se inserir no grupo de modo a acompanhar o ritmo
e o nível de aprofundamento das discussões que vinham acontecendo? O grupo decidiu
fazer alguns módulos de equivalência dos conteúdos passados, que consistiam em agrupar
os conteúdos e trabalhá-los de forma mais sucinta, procurando evitar a perda dos conceitos
centrais, mas também não permitindo o prolongamento das discussões como acontecia nas
sessões ordinárias.
Tal procedimento foi considerado como suficiente para que os novos participantes
pudessem ingressar no grupo sem terem seu processo de aproximação e aprofundamento
com a teoria marxiana abreviado, ou melhor, superficializado.
Porém, depois de três anos torna-se praticamente impossível fazer essa
aproximação da forma inicialmente pensada. O intervalo entre o início e o ponto do estudo
aonde se encontrava o grupo era considerado muito grande para que fosse possível esse
certo nivelamento dos novos participantes. O que fazer?
A solução proposta é a abertura de um novo grupo, um grupo que percorresse
basicamente o mesmo caminho do grupo inicial no estudo da obra central de Marx. Na
54
verdade a demanda era tanta que se decidiu organizar mais dois grupos, um que
funcionaria no mesmo dia e horário do grupo inicial e outro que por condições
principalmente de impossibilidade de comparecer no dia indicado, se reuniria no sábado.
Uma das questões iniciais especificamente foi levantada novamente: torna-se necessário
um processo de aproximação com a teoria geral de Marx, como preparação para a leitura
do Capital. Decidiu-se utilizar para isso, um texto produzido pelo professor Claus Germer:
“A relação abstrato/concreto no método da economia política”, que abordava, como
indicado pela nomenclatura, a questão do método desenvolvido por Marx no processo de
desenvolvimento do pensamento. Esse texto debatido em uma ou duas sessões
proporcionaria uma aproximação suficiente da teoria marxiana no entendimento dos
participantes do grupo inicial.
Porém, a constituição desses dois grupos acarretou em outras situações, que se por
um lado não se consistiam enquanto problemas por ser esse um objetivo inicial do próprio
espaço, eram situações que obrigatoriamente colocavam necessidade de reorganização do
grupo inicial, principalmente na questão da figura do professor, no caso em questão o
fundador Claus Germer, que possibilitava por seu acúmulo teórico, um aprofundamento
maior das discussões. Para essa situação as alternativas encontradas, foram a de garantir a
presença do fundador Claus nos grupos novos prioritariamente nos três capítulos iniciais e
na seqüência ocorreria uma alternância de sua presença entre os grupos em cada sessão,
sendo que os grupos novos sempre teriam a figura de um outro professor, de preferência a
fundadora Lígia Klein, que exerceu essa função durante curto espaço de tempo, ou por
outros participantes do grupo inicial que dominavam, pelo menos em um nível superior aos
novos, os conteúdos trabalhados. Nas palavras do fundador Armenes Ramos Júnior
“sempre tinha uma supervisão, seja a mais qualificada do Claus ou uma mais de segunda
mão como a dos outros participantes antigos”.
Esses dois grupos novos, carinhosamente alcunhados de “lobinhos” pelos antigos,
em referência à terminologia utilizada por grupos de escoteiros novos, começaram com
cerca de 35 participantes aos sábados e 45 na segunda-feira. Este número perdurou por
aproximadamente duas a quatro sessões, quando começaram mais acentuadamente as
desistências. No caso do grupo que se reunia aos sábados o caso foi mais grave e ele findou
ainda no decorrer desse primeiro ano, sendo que aqueles participantes que não queriam
parar seus estudos tiveram que fazer um esforço para se reunirem na segunda-feira, dia de
encontro do outro grupo novo.
55
Esse grupo então, chamado hoje de grupo 2, o inicial evidentemente é denominado
grupo 1, e que completou três anos no final de 2005, permaneceu seus estudos também
com várias baixas e algumas inclusões, estabilizando-se em um número de participantes
que mantém determinada constância de 12 pessoas.
Percebe-se aqui também um fator semelhante ao grupo inicial, existe uma inclusão
de novos participantes depois de certo período de existência do grupo, sendo feito da
mesma forma algumas sessões de equivalência do conteúdo trabalhado. Sendo uma
diferença o período dessas sessões, que no grupo 2 delongou maior tempo.
Após dois anos da existência desse grupo ocorre também, o distanciamento
acentuado do conteúdo trabalhado com essa possível forma de integração de novos
participantes no grupo. A solução para a presente demanda também se repetiu, a criação do
grupo 3 para o estudo da teoria marxiana.
Esse grupo também começa com um número de participantes próximo aos 45 do
início do segundo grupo e atualmente tem um número aproximado de 18 participantes que
mantém uma determinada constância nos estudos.
Agora, com três grupos de estudos a questão da orientação realizada pelo fundador
Claus complica-se mais um pouco. A solução para esta situação é encontrada na medida
em que se ajustam os horários dos três grupos para que se possibilite a permanência, de
pelo menos uma hora, em cada grupo, do professor Claus Germer. E quando da
impossibilidade disso acontecer, o grupo 1 estaria exercendo essa função nos outros
grupos.
Outro fator importante de mudança provocada também pela formação de dois
novos grupos e principalmente pelo número efetivo de participantes destes em relação ao
grupo inicial, foi a da metodologia empregada para a discussão do conteúdo. A
metodologia antes empregada permaneceu em sua totalidade, sendo que um espaço a mais
foi criado dentro dela para que se permitisse uma maior participação e verbalização dos
participantes nas discussões.
Após a exposição inicial do conteúdo feita por um dos participantes, o grupo agora
era subdividido em outros grupos de 4 a 5 pessoas, dependendo do número de participantes
na determinada sessão, que discutiriam os pontos mais importantes que cada um pontuou
em sua leitura individual, bem como as questões nas quais teriam dúvidas, devendo então
esse pequeno grupo sistematizar a discussão feita e apresentar ao grande grupo tanto os
pontos principais discutidos como as questões que consideravam de maior importância.
56
Então, as discussões ocorridas nos pequenos grupos é que iriam fomentar o debate no
grupo geral.
Essa mudança na metodologia foi adotada, como dissemos, pelo aumento dos
participantes efetivos desses grupos e por uma dificuldade de vários participantes de se
colocarem nas discussões, o que não possibilitava um dos passos fundamentais aqui
colocados no processo de aprendizagem, que é a da verbalização do pensamento. Esta
observação e proposta de reformulação foram feitas por alguns participantes do grupo 2 e
por alguns do grupo 1 que por algumas vezes exerciam o papel de “professor” nos demais
grupos.
3.8 - O Espaço Lênin, revoluções e conjuntura
Nesses três anos de existência do Espaço Lênin como uma proposta intrínseca ao
Espaço Marx, procurou-se desenvolver as discussões pré-estabelecidas na proposta inicial.
Porém, algumas outras discussões que não estavam no eixo traçado previamente, de se
discutir experiências revolucionárias anteriores, foram incorporadas principalmente a partir
do segundo bimestre de 2004.
Antes de levantar essas discussões, vamos pontuar algumas características
específicas do espaço Lênin, relevantes para as análises posteriores.
O espaço Lênin passou a constituir-se então em um espaço comum para todos os
participantes do Espaço Marx, um momento em que esses participantes se reuniam em
conjunto para discutir um assunto. Além desse momento em comum com os demais
participantes era um momento também aberto para demais pessoas que se interessassem
pelo tema a ser debatido. Como a discussão se dava por um tema, no caso uma revolução,
subsidiado por uma bibliografia colocada a disposição previamente, isso facilitava a
participação para quem não participava do Espaço Marx.
As sessões do Espaço Lênin, principalmente quando pautaram revoluções,
contaram na maioria das vezes com um número maior de participantes do que os que
estavam constantemente no Espaço Marx. Aqui algumas hipóteses que não se excluem,
mas sim ao contrário compõem um quadro significativo, são levantadas pelos fundadores
que ainda atuam constantemente no espaço, Armenes Ramos Júnior e Claus Germer, em
suas entrevistas para que tal fato acontecesse. Uma delas é de que o tema era mais atrativo
para a discussão por parte das pessoas novas no espaço e/ou na militância. Afinal discutir
experiências “mais concretas” da luta pelo socialismo “sempre” despertou um maior
57
interesse por parte dos militantes para a discussão. Outra hipótese é de que esse tipo de
atividade não exigia um comprometimento a médio e longo prazo por parte do militante,
por ser temporalmente bem mais reduzido do que a discussão específica do Espaço Marx.
Cada tema durava no máximo de uma a duas sessões.
Uma grande positividade apontada do Espaço Lênin foi o fato de que da mesma
forma que aconteceu no Espaço Marx, estes militantes não possuíam experiência de estudo
sistemático e coletivo das experiências de lutas concretas pela superação de formas de
organização da sociedade, neste caso, mais acentuadamente a superação da forma
capitalista de organizar a sociedade. O Espaço Lênin começa então a proporcionar essa
discussão sistemática e coletiva.
Nesse primeiro formato da discussão procurava-se debater as revoluções em seu
processo pré-revolucionário e revolucionário como um todo, ou seja, simultaneamente. O
que para os fundadores permitia uma aproximação da discussão, mas não dava conta de
traçar os elementos fundamentais e comuns para que essas revoluções fossem realizadas.
As discussões ficavam pontuais também na compreensão das condições objetivas e
subjetivas para a construção de uma revolução, ficando aos que tinham maior acúmulo
de leitura e de discussões sobre o tema, a oportunidade de aprofundá-lo. Para a grande
maioria dos participantes o espaço possibilitava então uma aproximação com o tema, mas
não oportunizava, principalmente por essa metodologia aplicada, um aprofundamento
teórico maior.
Durante esse trajeto do Espaço Lênin foram discutidos os seguintes processos
revolucionários: Revolução Francesa; Revolução Russa; Revolução Chinesa; Revolução
Cubana e o processo no Chile, que teve como liderança Salvador Allende.
58
4. OS PARTICIPANTES DO ESPAÇO MARX: QUEM SÃO E O QUE AVALIAM?
“Faça perguntas sem medo
não te convenças sozinho
mas vejas com teus olhos.
Se não descobriu por si
na verdade não descobriu.”
(Bertold Brecht)
A partir dessa história relatada principalmente pelos fundadores e através da
observação participativa, aprofundaremos a pesquisa sobre o espaço Marx, através da
análise dos dados recolhidos em forma de questionário realizado, em sua maioria, em
junho de 2005. Bem como, contaremos no que diz respeito principalmente à metodologia,
funcionamento e organização do espaço com a sistematização de uma apresentação e
debate da pesquisa em uma das sessões do espaço Marx em dezembro do mesmo ano.
Nessa busca de aprofundar a análise do Espaço Marx da UFPR então, nos parece
fundamental partir agora para uma análise de seus participantes atuais e de como esses
participantes compreendem-no. Para tal análise, aplicamos questionários separando em
dois grupos os participantes: o primeiro reunindo os grupos 1 e 2, menos os fundadores,
que chamaremos de grupo A, portanto mais antigos e o segundo que reúne os participantes
do grupo 3, que teve seu início em março de 2005 e que denominaremos de grupo B.
Essa divisão baseia-se no tempo de participação no espaço. Consideramos que os
participantes que estão no espaço mais de dois anos podem avaliá-lo com maior
profundidade em relação à metodologia, funcionamento, organização e transformações, do
que aqueles que estavam, na época de aplicação do questionário, somente há três meses, no
caso o grupo 3. Contamos com a resposta de 12 integrantes de um total de 18 pertencentes
ao grupo A, o que corresponde a aproximadamente a 67% da amostra possível e com 18 de
um total de 25 do grupo B, correspondente a 72% do total de integrantes do grupo.
Quem são esses participantes? A primeira característica a analisar é como estes
participantes estão desenvolvendo suas relações concretas e imediatas, qual a posição
ocupada por eles dentro do processo de produção, fator esse que nos possibilita um maior
entendimento das experiências práticas que vivenciam e que contribuem para o
desenvolvimento de sua consciência de classe. Para essa análise vamos trabalhar com a
combinação de três perguntas: a) Qual a profissão dos participantes (figuras 1, 2 e 3); b) Se
estudam formalmente ou não (tabela 1) e c) Se trabalham (tabela 2). Com a combinação
59
desses três fatores teremos um quadro mais elucidativo sobre o universo de suas relações
cotidianas.
41,66%
33,33%
25%
Estudantes
Professores
P.Liberais
Figura 1 – Profissão dos participantes do grupo A do Espaço Marx da UFPR
62,50%
12,50%
13%
Estudantes
Professores
P.Liberais
Funcionário Público
Analista de sistemas
Figura 2 – Profissão dos participantes do grupo B do Espaço Marx da UFPR
60
53,42%
21,42%
7,16%
18%
Estudantes
Professores
Profissionais Liberais
Outras profissões
Figura 3 – Profissão dos participantes dos grupos A e B do Espaço Marx da UFPR
Temos então, nesse primeiro aspecto, no grupo A 41,6% dos participantes tendo
como atividade principal serem estudantes, 33,3% como professores e 25% como
profissionais liberais. no grupo B 62,5% são estudantes, 12,5% professores e
profissionais liberais e 6,25% funcionários públicos e analistas de sistemas. Se somarmos
os dois grupos temos 53,4% de estudantes prioritariamente, 21,4% de professores e 18% de
profissionais liberais e o restante 7,16% em outras profissões. O que nos fornece alguns
dados interessantes para análise: a) a forte presença de participantes estudantis no espaço;
b) ao somarmos percentual de estudantes com o de professores constatamos um total de
74,8% de participantes que possuem na área da educação sua atividade principal; c) apesar
de não termos abordado a questão da idade desses participantes, constatamos por
observação e participação durante mais de três anos no espaço que 82,14% dos
participantes têm idade inferior a 30 (trinta) anos.
A combinação desses dados nos fornece um primeiro retrato da composição do
espaço Marx: um grupo com expressiva participação estudantil e de jovens ligados
principalmente à área educacional.
o segundo ponto abordado pretende constatar se mesmo no caso dos
participantes que não tem como atividade principal o estudo, existem aqueles que também
estão desenvolvendo formalmente um processo educacional, conforme podemos observar
na tabela 1.
Tabela 1 – Percentual de participantes do Espaço Marx que estudam
GRUPO DE PARTICIPANTES Estudam Formalmente Não estudam
A 83,3% 16,7%
B 68,7% 31,3%
A + B 75,0% 25,0%
61
Nessa ampliação parcial da análise para aqueles que também estudam além de
desenvolverem outra atividade profissional, esse percentual sobe, no caso do grupo A, de
41,66%, que tinham como atividade principal o estudo, para 83,33% e de 62,5% para
68,75% no grupo B. O que fortalece ainda mais o perfil estudantil do grupo.
Esse perfil dos participantes pode, nesse primeiro momento, ser justificado pela
localização de funcionamento do espaço Marx que ocorre no campus da Reitoria da
Universidade Federal do Paraná, o que facilita à participação dos estudantes dessa
instituição, tanto de graduação como de programas de pós-graduação. No cruzamento dos
dois grupos temos então que 75% dos participantes estão em algum processo de educação
formal enquanto que 25% não estão.
No terceiro aspecto componente dessa tríade que forma as atividades principais às
quais estão vinculados os participantes em sua realidade cotidiana, procuramos saber
quantos estão trabalhando, tendo por critério a venda da sua força de trabalho mediante o
recebimento de um salário. Os resultados estão apresentados na tabela 2.
Tabela 2 – Percentual de participantes do Espaço Marx que trabalham
GRUPO DE PARTICIPANTES Trabalham Não trabalham
A 33,3% 66,7%
B 43,7% 56,3%
A + B 42,8% 57,2%
Nesse terceiro aspecto, observamos que a maioria dos participantes do Espaço
Marx não está trabalhando, segundo o critério estabelecido, sendo a produção de sua
existência garantida através principalmente por familiares. Somando-se os dois grupos
temos então uma minoria de 42,8% que trabalham e uma maioria de 57,2% que não estão
vendendo ainda sua força de trabalho.
Completamos esses primeiros dados com outro que a nosso ver também é
significativo: no grupo A todos participantes eram estudantes de graduação à época de sua
entrada no espaço Marx, sendo essa sua atividade principal desenvolvida.
Ao analisarmos o conjunto desses três aspectos, conseguimos traçar um perfil mais
depurado da composição dos participantes atuais do espaço Marx: um grupo com
expressiva vinculação à realidade estudantil universitária e também à área educacional,
setor do processo de produção responsável atualmente principalmente pela formação de
trabalhadores. Soma-se a isso ainda o fato desse grupo ser na sua maioria de jovens e
62
estudantes e de não estarem vendendo sua força de trabalho diretamente, o que limita sua
formação política proveniente da luta direta entre capital-trabalho ao processo ‘espontâneo’
economicista das lutas práticas, principalmente vinculadas às conseqüências do
desenvolvimento do capitalismo na área educacional universitária. Temos também por
conseqüência dessa composição uma parcela minoritária, perto de 15% de trabalhadores
produtivos
17
. Atentamos também, que essa é uma característica importante, porém ao
mesmo tempo momentânea, pois em sua totalidade esses participantes tendem a ocupar nas
relações sociais capitalistas de produção a posição de trabalhadores. Fato esse que vem
acontecendo com os participantes do grupo A que inicialmente tinham por atividade
principal, em números absolutos, o estudo e que agora se encontram em um processo
crescente de venda direta da sua força de trabalho.
Temos então um processo que atinge principalmente uma parcela da classe
trabalhadora que pela situação econômica familiar pode dedicar-se momentaneamente aos
estudos com maior facilidade de tempo e de espaço, que trabalhadores que estão
vendendo sua força de trabalho.
Buscaremos agora acrescentar a esse aspecto mais imediato das relações sociais dos
participantes o fator da militância, considerando como critério para tal, militante aqueles
que estão inseridos em alguma organização que atue na luta concreta seja ela
reivindicatória ou revolucionária, conforme podemos observar na tabela 3.
Tabela 3 - Participantes do Espaço Marx e o fator militância nas suas relações sociais
GRUPO DE PARTICIPANTES Militantes Não militantes
A 83,3% 16,7%
B 93,7% 6,3%
A + B 89,3% 10,7%
No grupo A, encontramos um total de 83, 3% de participantes que estão de alguma
forma militando e no grupo B esse total sobe para 93,7%. O que nos coloca que somente
16,7% do grupo A e 6,3% do grupo B não militam em organizações, sejam elas específicas
ou gerais. Ao cruzarmos os grupos observamos que a grande maioria, cerca de 95% dos
participantes atuam na militância de uma forma concreta.
Constatamos então que a grande maioria desse grupo está vinculada a alguma
organização, seja ela reivindicatória ou revolucionária. Ao detalharmos ainda mais esse
17
Conceito de Marx para trabalhadores que estão submetidos diretamente a um capitalista, vendendo sua
força de trabalho como capital variável e produzindo diretamente mais-valia.
63
dado da militância pudemos identificar que desses militantes, que formam um total de 25,
18% estão inseridos em uma organização somente reivindicatória e 72% estão em uma
organização de característica revolucionária.
Com esse quadro podemos aprimorar o perfil primeiramente traçado, se
anteriormente definimos que esse grupo era formado majoritariamente por jovens
estudantes e que mesmo entre os trabalhadores tínhamos uma forte vinculação à área
educacional, podemos incluir um outro aspecto fundamental para análise: uma forte
característica de militantes socialistas que atuam em alguma organização, sendo que em
sua maioria em uma organização revolucionária.
Podemos constatar uma mudança qualitativa dos participantes atuais em relação ao
grupo inicial, composto principalmente pelos fundadores ao lembrarmos que todos àquela
época tinham pelo menos 15 anos de militância, sendo que no caso atual temos militantes
em sua grande maioria ‘novos’ que se encontram em seus primeiros anos de militância
principalmente no caso do grupo B. Fato esse que se repete também no grupo A aonde
mesmo com uma maior experiência de militância prática os participantes não ultrapassam
os 10 anos de militância. Não pelo tempo quantitativo, mas também pelo tempo visto
qualitativamente percebemos que o grupo inicial pode aprofundar seu processo de
formação política teórica, prática e organizatoriamente mais do que os participantes atuais.
Esses militantes vivenciaram em uma militância socialista, enquanto grupo, o
processo de lutas da classe trabalhadora a partir da década de 60. Podendo acumular
experiências de diversas formas de organização trabalhadora, legal e ilegal, pacífica e
armada, construção de sindicatos, de movimentos sociais, de partidos, enquanto expressão
política da classe. Bem como puderam vivenciar nessa militância como os capitalistas
reagem a essas diversas formas de organização e mobilização da classe trabalhadora,
através de seu “comitê executor” o estado burguês (Lênin, 2005b) e passaram por diversos
momentos de organização de greves, em especial no final da década de 70 início dos anos
80, verdadeiros processos educativos da consciência revolucionária (Lênin, 2006b). Além
desse aspecto, todos os fundadores vendiam sua força de trabalho e aqueles que não eram
professores, nesse caso da Universidade Federal do Paraná, estavam no programa de pós-
graduação em educação na mesma instituição. Possuíam em seu conjunto então, uma
experiência socialista de prática, teoria e organização na luta de classes que possibilitou um
avanço maior na consciência de classe revolucionária quando em comparação ao dos
participantes atuais.
64
Essa mudança do perfil nos parece importante para o aprimoramento de análises
que faremos nos próximos pontos, porém ela não anula um perfil em comum entres esses
participantes, o de serem em sua maioria militantes socialistas e ligados à área educacional.
O que ela nos aponta é a diferença quanto ao grau de avanço no processo de formação
política entre eles.
Junto a esses fatores de características de composição do Espaço Marx, vamos
agora abordar elementos que trabalhem a questão da aproximação e da inserção inicial no
grupo, tentando perceber as relações possíveis com o perfil de composição até agora
traçado. Trabalharemos com duas questões: a) qual o instrumento de aproximação e
conhecimento inicial do espaço e, b) quais os objetivos principais dessa aproximação e
inserção. Os resultados encontrados estão apresentados na tabela 4.
Tabela 4 – Instrumento de aproximação dos participantes do Espaço Marx da UFPR
Grupos participantes Instrumento de aproximação
Amigos/Militantes Professores Cursos/Palestras
A 83,3% 16,7% -
B 87,5% - 12,5%
Esses militantes que em sua maioria estudam, colocam que seu conhecimento
inicial do Espaço Marx ocorreu através principalmente de amigos/militantes, no grupo A
83,3% relatam esse fato enquanto no grupo B é apontado por 87,5%. Ou seja, através de
suas relações principalmente de militância é que tomaram conhecimento desse espaço de
aprofundamento teórico. Na soma dos participantes dos grupos A e B, temos um total de
85,7% de aproximação através das relações de militância. O aspecto que aparece como
segundo fator de aproximação são atividades ou espaços acadêmicos, relações com
professores em suas aulas e cursos ou palestras, que atingiram 14,30% dos participantes.
sobre os motivos que levaram ao ingresso no Espaço Marx, as figuras 4 e 5
mostram os resultados encontrados para o Grupo A e B, respectivamente.
65
83,33%
83,33%
32,75%
50%
Fundamentação teórica
Fundamentação teórica para
militância
Compreensão maior do
Capitalismo
Fund. p/área espefica
Figura 4 – Principais motivos que levaram o grupo A, a ingressar no Espaço Marx
100,00%
56,25%
31,25%
Fundamentação teórica
Fundamentação teórica para
militância
Debate coletivo da teoria
marxiana
Figura 5 – Principais motivos que levaram o grupo B a ingressar no Espaço Marx
Vemos então que o principal motivo que levam ao ingresso constitui-se no
aprofundamento teórico tanto no grupo A como no grupo B e que essa fundamentação
teórica ligada à prática militante aparece também na maioria dos integrantes dos dois
grupos. Como outros aspectos significativos, temos outros três elementos: compreensão
maior do sistema capitalista; fundamentação teórica para a área específica de formação e a
possibilidade de discutir a teoria marxiana de forma coletiva.
Esses dados nos mostram que a maioria expressiva dos participantes no Espaço
Marx um espaço para seu aprofundamento teórico e deseja utilizar esse aprofundamento
teórico como base de sua ação militante, o que coaduna com um dos objetivos colocados
pelos fundadores o de atrair pessoas que desejassem “aprender rigorosamente o marxismo
porque isso é um instrumento que orienta sua ação prática”, nas palavras da fundadora
Lígia Klein. Esse aspecto da relação da fundamentação teórica com a prática militante é
66
fundamental tanto na origem quanto na compreensão por parte dos fundadores de que esse
espaço não poderia constituir-se enquanto espaço escolástico, interpretativo apenas da
realidade, mas que procuraria contribuir com sua transformação através da ação dos
militantes que participassem dele.
Então, para ter uma visão geral ainda mais detalhada, cruzando os dois grupos,
vemos que o aprofundamento teórico ligado à prática militante, lembrando que a maioria
dos participantes estão vinculados a organizações revolucionárias, aparece como sendo
fundamental para 67,87% dos participantes, restringindo esse fator aqueles que militam em
uma organização revolucionária vemos que aparece para 100% desses integrantes.
Com esses dados, podemos também procurar constatar em que fase do processo de
desenvolvimento da consciência de classe esses participantes estavam no momento de seu
ingresso e por conseqüência enxergar com maior clareza em qual parte desse processo o
espaço Marx tem atuado com maior incidência.
Apontávamos até aqui, que esse processo de aprofundamento da teoria marxiana
atuaria de forma mais efetiva na fase de rompimento da consciência reivindicatória ou
na fase da consciência revolucionária. Enfatizávamos nossa afirmação no sentido de que
esse processo é mais efetivo e não exclusivo dessas fases, podendo com menor incidência
atuar nos processos de consciência que denominamos como alienação e reivindicatória.
Com o quadro acima traçado podemos constatar essas afirmações. Em sua grande
maioria os participantes no momento de seu ingresso mesmo, estavam vinculados em
uma organização que pretende contribuir para a construção de um processo revolucionário
socialista. No caso desses participantes constatamos que se encontram na fase de
consciência revolucionária, com diferenças de profundidade nessa fase, mas com o
parâmetro de rompimento e superação do modo de capitalista de produção, como fica claro
na resposta de um dos participantes:
...os dois elementos citados (interpretar a realidade através do pensamento marxista e a
apropriação do método materialista dialético) são requisitos para o desenvolvimento do
que entendo como meu projeto de vida: contribuir para a extinção da sociedade
capitalista e para a construção de uma sociedade sem exploração do homem pelo
homem, que em meu entendimento, é o socialismo.” (participante do grupo A )
com relação aqueles participantes que estão na fase de rompimento com a
consciência de classe e que compõem a maioria dos militantes vinculados somente a
67
organizações reivindicatórias vemos que esse conceito de superação ainda está em uma
formação mais inicial, não sistematizada, tomando como exemplo as seguintes respostas:
“pensar em uma transformação da sociedade, para isso era necessário conhecer a
sociedade em que estamos inseridos”, “conhecer a teoria que da base à vários
movimentos sociais” e, “necessidade de uma base teórica e expansão dos conhecimentos
referentes às questões sociais”.
Não encontramos nenhum participante que estivesse nas fases de alienação ou
reivindicatória simplesmente, o que nos confirma que o Espaço Marx, não se constitui em
regra geral, como espaço de aproximação de novos militantes que ainda não romperam ou
que não estão em rompimento com o entendimento reivindicatório de sua consciência e
sim como um espaço de consolidação e aprofundamento teórico de militantes que se
encontram nesses momentos. O que caracteriza com maior precisão os limites e as
possibilidades desse instrumento.
Chegamos até o momento com as seguintes características majoritárias do Espaço
Marx e de seus componentes: um espaço de fundamentação teórica que atualmente é
composto por militantes socialistas, em sua maioria também, jovens e estudantes que
através de suas relações de militância descobrem esse espaço e ingressam nele com o
objetivo principal de subsidiar, aprofundar e reformular teoricamente suas ações na
militância.
Essa é a análise possível para o grupo B, considerando o ainda curto tempo de sua
existência. Os demais dados que estaremos considerando a partir de agora na análise, se
restringem aos participantes do grupo A que estão pelo menos dois anos no espaço
Marx. Com os participantes desse grupo procuraremos avançar na discussão sobre a
metodologia de estudo utilizada no espaço, bem como analisar como esses participantes
qualificam sua participação nesse processo e como avaliam os impactos do grupo de
estudo em seu processo de formação política.
Partindo agora para a metodologia, funcionamento e organização do espaço,
estaremos incluindo na análise a apresentação e debate sobre a pesquisa realizada com o
conjunto dos participantes. Na questão da metodologia abordamos o tema com as seguintes
questões: a) você acha que ela é adequada; b) consegue atingir seus objetivos; c)
aconteceram mudanças nessa metodologia, quais; d) o que essas mudanças proporcionaram
em sua opinião.
Para 100% dos participantes do grupo A, a metodologia utilizada no Espaço Marx
da UFPR é adequada.
68
Essa adequação da metodologia empregada é principalmente apontada como
coerente pelos participantes por proporcionar um espaço efetivo de debate coletivo e de
rigor conceitual, o que consequentemente proporciona um avanço significativo no
aprofundamento da teoria marxiana. Porém, mesmo com a concordância geral sobre esses
itens anteriores, vemos na figura 6, que 25% dos participantes colocam que esse objetivo
de aprofundamento teórico ainda é parcial, citando como principal argumento a dificuldade
de assimilação dos conteúdos trabalhados e sua conseqüente aplicação.
75,00%
25,00%
Sim
Parcialmente
Figura 6 Opinião dos participantes do Grupo A se os objetivos do Espaço Marx são
atingidos
Já na questão sobre as mudanças ocorridas na metodologia inicial, 100% apontaram
que houve uma modificação feita na metodologia inicial, com a inclusão da divisão em
pequenos grupos precedendo o debate no grupo geral. Sendo consenso que os impactos
dessa mudança foram positivos. Principalmente pelo fato de, na opinião dos entrevistados,
proporcionar um aprofundamento teórico ainda maior dos debates (83,3%) e na
participação dos membros na discussão (75%), dois pontos fundamentais da proposta
inicial dos fundadores, conforme podemos observar na figura 7.
69
83,33%
75,00%
Maior aprofundamento nas
discussões
Maior participação nas discussões
Figura 7 – Conseqüências da mudança da metodologia nos estudos no Espaço Marx
Considerando agora os pontos negativos apontados pelos participantes sobre o
funcionamento do grupo e podendo eles indicar mais de um aspecto, vemos que dois deles
se destacam pela sua freqüência de citações: a fragilização do direcionamento do estudo
(58,3%) e a falta de um processo sistematizado de avaliação (75%).
58,33%
75,00%
Fragilização do direcionamento
do estudo
Falta de um processo
sistematizado de avaliação
Figura 8 – Pontos negativos da metodologia apontados pelo grupo A
Esses problemas assinalados pelos entrevistados possuem ressonância na análise
feita sobre o aumento da demanda do espaço Marx e da forma não sistematizada utilizada
para resolver as situações que surgiram com essa nova conjuntura, não conseguindo com
que alguns pontos considerados como essenciais, principalmente nesse caso o do
direcionamento do processo educativo, fossem garantidos com a mesma ênfase dos
primeiros quatro anos. Mesmo assinalando esses problemas, os participantes são unânimes
em avaliar positivamente o processo que vêm vivenciando dentro do espaço Marx
enquanto o aprofundamento teórico que ele proporciona por suas características. A crítica
70
aqui situada faz a relação de quem vivenciou o processo quando era possível o
acompanhamento do professor durante toda a sessão e de quem vem vivenciando o
processo com o acompanhamento parcial. Lembramos também que sobre esse ponto, todos
os fundadores entrevistados foram também unânimes em reconhecer que esse
direcionamento do processo educativo está fragilizado comparado ao período inicial, ainda
que consiga garantir esse aprofundamento teórico com determinado rigor conceitual.
Sobre a avaliação, os participantes apontam-na como um ponto deficiente da
metodologia do espaço. A principal crítica a esse processo é a da falta de sua elaboração
sistemática enquanto parte do processo educativo, limitando-se a algumas avaliações
realizadas de forma esporádica e não sistematizada para fundamentar possíveis
encaminhamentos e mudanças. Os fundadores por sua vez, também apontaram em suas
entrevistas que a avaliação estava muito “subjetiva”, nas palavras do fundador Armenes
Ramos Júnior “baseada num certo ‘olhômetro’ dos participantes com maior acúmulo
teórico” que se reduzia somente a tentar perceber os avanços dos mais novos na
apropriação do conhecimento em suas intervenções e/ou produções realizadas.
Temos então um quadro inicial que aponta uma aprovação da metodologia
empregada nos estudos desenvolvidos com ressalvas importantes para dois aspectos
fragilizados: o direcionamento do estudo e o sistema de avaliação. Agora existe um outro
aspecto da metodologia que abordaremos agora e que além de abranger as questões
trabalhadas, traz elementos novos, nos permite uma visão maior do conjunto do espaço
Marx e aparece com ênfase no debate realizado junto aos participantes. A inexistência de
um programa de estudos sistematizado que leve em conta o acúmulo desses 6 (seis) anos
de história, os acúmulos individuais de seus participantes em seus processos de formação
política, que possibilite uma relação maior entre objetivos e caminhos propostos para
alcançá-los e que dê conta dessa conjuntura nova de composição referente aos
participantes. A formulação de um programa de estudos que abranja os pontos acima
mencionados torna-se necessário, na avaliação do debate realizado, para que o espaço
Marx avance tanto no objetivo central de aprofundamento teórico marxiano e do estudo
das revoluções, como em outros objetivos ainda presentes, que estão em direta
dependência do anterior, de produção e divulgação das idéias marxistas.
Trabalharemos agora com as partes constatadas como frágeis, após esse processo de
análise, da metodologia: a) processo de aproximação para a leitura de O Capital; b)
processo de categorização para a discussão das revoluções; c) falta de um sistema de
avaliação e; d) fragilização do direcionamento do estudo.
71
Em relação à preparação para a leitura do Capital que na proposta inicial consistia
em um conjunto de textos e de sessões de estudos que trabalhavam questões como o
método materialista dialético, concepção de Estado e revolução, atualmente limita-se a um
texto sobre o método do fundador Claus Germer e a no máximo dois encontros. Encontra-
se então atualmente restrito, não possibilitando que esse tema seja devidamente
aprofundado. Ao não priorizar esse debate sobre o método em Marx, as dificuldades de
compreensão do texto do Capital também aumentam, pois nessa obra como pontuamos
anteriormente, o autor aplica diretamente esse método de análise para descrever os
fundamentos e desenvolvimento do sistema capitalista de produção.
Constatamos também que essa aproximação em nenhum momento foi sistematizada
ou mesmo formulada como um conjunto de estudos e discussões necessários para
proporcionar um processo de aproximação efetiva, mesmo que teoricamente, os fundadores
tivessem essa compreensão, principalmente no que diz respeito ao objetivo central que é a
discussão do método materialista dialético elaborado por Marx, para compreensão e análise
da realidade.
Principalmente se considerarmos a composição atual e que vem se repetindo nos
últimos anos, de militantes jovens e estudantes, que estão em fase de rompimento com a
consciência de classe reivindicatória ou em um grau inicial da consciência de classe
revolucionária. Muitos desses militantes têm sem primeiro contato com a teoria marxiana
nesse espaço, o que demanda que esse caminho inicial seja mais extenso e aprofundado e
mesmo aqueles que têm determinado acúmulo anterior o possuem de forma ainda não
sistematizada. Se o espaço Marx não se constitui enquanto um espaço prioritário de
trabalho de base, no que diz respeito aos indivíduos que estão nas fases do processo de
consciência de classe como alienação e reivindicatória, ele vem se constituindo como um
espaço de formação teórica inicial e aprofundada para aqueles que estão rompendo com os
limites da sociedade capitalista ou para aqueles romperam e procuram aprofundar não
esse rompimento, seus conhecimentos sobre o funcionamento dessa sociedade e sua
superação.
Parece-nos coerente para a formulação desse programa de estudos do Espaço Marx
que ocorra essa priorização do espaço inicial de estudos, na perspectiva de construí-lo de
forma a coadunar uma primeira aproximação com a teoria marxiana e seus fundamentos
com um conseqüente aprofundamento do tema.
Outro aspecto sobre o método também nos chama à atenção. Mesmo na proposta
inicial quando o método tinha uma ênfase maior nessa preparação, no decorrer dos estudos
72
pouco se retornava a ele ou se construía o caminho metodológico percorrido por Marx na
elaboração da obra O Capital. Esse é um ponto que incide diretamente na metodologia de
funcionamento das discussões. Entendemos que após esse trabalho inicial, deve-se partir
para a discussão do Capital procurando perceber em sua exposição o método aplicado e
enfatizar durante os estudos esse ponto do caminho e do porquê desse caminho percorrido
por Marx, além da ênfase já existente de apropriação das categorias.
em relação ao segundo ponto, de categorização do estudo dos processos
revolucionários no espaço Lênin, traçaremos um quadro do acúmulo de experiências
ocorridas principalmente no decorrer do ano de 2005 para que possamos analisar e
formular, tendo em conta também o debate realizado junto aos participantes, mais
nitidamente uma proposta para o desenvolvimento desse espaço.
No ano de 2005 então, desenvolveu-se uma tentativa inicial de estabelecimentos de
categorias fundamentais para o desenvolvimento dos estudos sobre as revoluções. Essa
tentativa consistiu no estudo inicial de dois textos bases: “Prefácio à contribuição à crítica
da economia política” de Marx e o tópico “Situação revolucionária” do texto “A falência
da II internacional” de Lênin. O primeiro com a intenção de se trabalhar as condições
apontadas por Marx que caracterizam uma época revolucionária e o segundo
principalmente para se debater as condições objetivas e subjetivas que conformam uma
situação revolucionária, segundo Lênin.
A avaliação consensual dessa experiência foi positiva pelos participantes que
colocam como um avanço real na metodologia de discussão das revoluções. Porém, essa
categorização permaneceu somente nesse estudo inicial, não conseguindo com que nas
discussões posteriores dos processos revolucionários elas exercessem um papel de base
para os estudos ou que pelo menos aparecessem como fator importante a ser entendido e
analisado.
Além desse estudo inicial outra experiência considerada importante foi o
estabelecimento da discussão sobre as experiências revolucionárias analisando-as em seus
processos pré-revolucionário, revolucionário e pós-revolucionário. Considerado também
consensualmente, como um salto qualitativo na metodologia, pois permitiu uma visão mais
ampliada de um processo revolucionário em sua extensão mais geral, possibilitando dessa
forma um aprofundamento maior nas discussões.
Tendo feito esse quadro do acúmulo ocorrido no espaço Lênin, significativamente
no ano de 2005 e sistematizando o debate sobre esse tema, consideramos que dois pontos,
73
que precisam interagir, são importantes de trabalharmos com o intuito de avançar no
aprofundamento teórico desses estudos.
O primeiro deles é o acréscimo de algumas categorias que serviriam como um
roteiro para o estudo dos processos revolucionários, mantendo-se sua divisão em períodos
pré-revolucionário, revolucionário e pós-revolucionário. Esse roteiro procuraria analisar
esses períodos em seus seguintes aspectos: a) a estrutura econômica, procurando delinear
em que grau se encontra o desenvolvimento das forças produtivas em seu conjunto e
relacionar esse quadro específico à situação mundial do desenvolvimento capitalista; b) um
estabelecimento de um quadro da composição de classes, como as classes estão
organizadas e divididas para a produção da condições da existência humana; c) como o
estado está organizado politicamente nesse cenário e d) como os trabalhadores estão
organizados, quais suas expressões políticas construídas significativas para esse período.
Dialogando com esse roteiro, consideramos primordial também que diante desse
quadro melhor delineado e sistematizado, retome-se e procure-se também delinear as
categorias inicialmente trabalhadas, principalmente as que compõem uma situação
revolucionária, segundo o texto de Lênin, ou seja, as condições objetivas e a condição
subjetiva. Para que essa análise do estudo de processos revolucionários consiga
proporcionar também um exercício de análise de conjuntura e não de estudo de um caso
específico.
Essa categorização da discussão junto ao estabelecimento desse roteiro nos parece
pertinente também para a metodologia, na medida em que ela pode proporcionar uma
discussão mais sedimentada em fundamentos e na correlação entre as diferentes
experiências revolucionárias, avançando no perfil episódico em que o estudo vinha
acontecendo em anos anteriores.
Além dessa construção metodológica, consideramos que seria importante a
elaboração de um programa de estudos que estabeleça principalmente as seguintes
questões: a) o conjunto de revoluções a serem estudadas; b) bibliografias que subsidiem o
debate; c) possíveis debatedores para os temas e e) possíveis espaços para outros temas,
principalmente conjunturais.
Outra proposição é a incorporação programada da exibição de filmes relacionados
aos temas trabalhados. Essa experiência ocorreu também durante o ano de 2005 e foi
denominado de Cine Marx, porém não ocorreu de forma sistemática, o que dificultou sua
concretização enquanto uma atividade dentro desse espaço de formação. Porém, os
participantes avaliam que as experiências que foram realizadas, principalmente após as
74
discussões realizadas nas sessões ordinárias do espaço Lênin baseadas em textos,
permitiram debates pós-filmes que conseguiam proporcionar um aprofundamento de
pontos centrais da experiência estudada e o surgimento e análise de outros pontos que nos
estudos dos textos não haviam aparecido.
Sobre o ponto da avaliação devemos considerar primeiramente que o espaço Marx
não é, como pontuamos, um espaço de aprofundamento da teoria marxiana e do estudo
dos processos revolucionários, dimensão importante do processo de formação política e
que, mesmo sendo um espaço aberto para qualquer indivíduo que queira participar, procura
atingir principalmente militantes socialistas. Sua constituição tem por objetivo contribuir
para a construção de um processo revolucionário, através do estudo sistemático e
aprofundado da teoria revolucionária. Portanto, um sistema de avaliação desse processo
deve se constituir enquanto um elemento importante que procure contribuir na construção
desse objetivo central.
Para que isto ocorra, analisamos que não é o caso de se aplicar instrumentos
avaliativos, tais como provas ou trabalhos, no sentido de “quantificar” o “progresso
obtido” em relação aos conteúdos trabalhados. Consideramos mais pertinente que esse
sistema de avaliação consista em breves e sistemáticas auto-avaliações verbais, que
ocorriam no início do espaço, feita pelos próprios participantes no final de todas as sessões
aonde expunham sua opinião sobre o desenvolvimento da discussão ocorrida e sobre suas
dificuldades. Combinando-se a essas auto-avaliações, avaliações periódicas feita pelos
participantes que desempenham o papel de professor nos grupos, para avaliarem de forma
mais sistemática suas impressões dos estudos.
Partindo agora para o último ponto levantado nos questionários e no debate junto
aos participantes vamos procurar sistematizar os principais aspectos sobre a fragilização do
direcionamento do estudo e através dessa análise procurar os avanços possíveis.
Temos um quadro então de grande demanda, três grupos que necessitariam da
figura de um professor. Porém, não podemos considerar esses três grupos como
homogêneos em relação ao aprofundamento teórico acumulado e a autonomia decorrente
nas discussões. O grupo mais antigo estará completando 7 (sete) anos desse processo
sistemático de discussão da teoria marxiana em agosto de 2006, todos os participantes
desse grupo estão pelo menos há mais de 5 (cinco) anos nesse processo de estudo. Por esse
acúmulo, concluímos que sua possibilidade de autonomia frente a figura de um professor é
muito maior do que a dos outros grupos. Para além dessa capacidade maior de exercer seus
estudos autonomamente enquanto grupo, concluímos também que esses participantes
75
podem começar a exercer de forma planejada e periódica o papel de 'professor' nos demais
grupos. Mesmo considerando a colocação feita por alguns membros do grupo de que não
possuem o mesmo acúmulo do que o professor Claus Germer, que exerce mais
constantemente esse papel ou do que a professora Lígia Klein, também está claro que não
seria aconselhável que esses participantes esperassem obter integralmente esse acúmulo
para a partir daí, começar a desempenhar essa função.
Ao colocar-se ativamente e constantemente nesse papel, esses participantes
estariam também aprofundando sua formação enquanto educadores socialistas, pois não
somente iriam reler e rediscutir conteúdos estudados, como estariam com a função de
colaborar na mediação e sistematização desses conhecimentos com os grupos mais novos.
O que não descarta a participação dos professores citados, mas sim provoca um aumento
de possibilidades de ampliação para esse espaço e de formação de educadores socialistas a
curto, médio e longo prazo.
Em relação aos outros objetivos do espaço que são a produção de textos e a
divulgação das idéias marxistas, os participantes reconhecem-no como algo com que o
espaço Marx se preocupa. Porém, unanimemente também consideram que essa produção
ocorre de forma esparsa e individual. Sendo que os próprios participantes têm pouco
conhecimento inclusive dessas produções, com exceção do texto do fundador Claus
Germer sobre o método, que faz parte do programa de estudos. Apontam que essa deveria
ser uma atividade melhor direcionada pelo espaço de forma que começasse a ocorrer como
atividade do coletivo e não de alguns participantes apenas.
A dificuldade principal aqui, em nosso entendimento, é a falta também de um
planejamento e coordenação dessas produções. A proposta a se desenvolver é a proposição
de temas que o conjunto dos participantes considerem pertinentes para pesquisa e produção
e que se estabeleçam períodos para que elas se efetivem. Essa produção se daria por
participantes que possuíssem proximidade profissional e/ou científica com a temática ou
por aqueles que se propusessem a desenvolvê-las. Essa produção individual poderia passar
depois por debates internos com os demais participantes, com o intuito de coletivizar a
produção e conseqüentemente aprofundá-la.
Com esse processo mais delineado de produção, a possibilidade concreta de se
produzir propostas iniciais de divulgação como o caderno de textos e a revista do Espaço
Marx tornam-se mais provável de se realizar.
A produção de textos tem importância acentuada também no processo de avanço
no grau de consciência de classe, pois sendo uma forma de linguagem, ela proporciona um
76
processo de sistematização e ordenação das idéias que ajudam a reelaborar e reorganizar o
próprio pensamento.
Esse processo também contribui para o avanço no terceiro objetivo principal do
Espaço Marx da UFPR que é a interação com outros espaços Marx. Através dessa
produção e divulgação científica a aproximação pode se realizar também através do debate
desses textos ou das temáticas desenvolvidas nos materiais de divulgação. Outra
possibilidade considerada é a realização de eventos em comum com outros espaços Marx
que busquem a discussão de temáticas pertinentes aos marxistas contemporâneos e a troca
de experiência sobre os processos internos de cada espaço.
Feita essa análise sobre a metodologia desse instrumento de formação, partiremos
agora para a compreensão de como os participantes avaliam sua participação no Espaço
Marx e as mudanças promovidas por essa participação.
Em relação à participação dos integrantes, analisamos dois fatores importantes para
o processo de aprofundamento teórico: a) tempo dedicado e qualidade da leitura
prévia dos temas propostos e, b) participação efetiva nos debates dos temas, tendo
por critério que o participante considere efetivar intervenções com determinada
freqüência nas discussões. Os resultados obtidos para a primeira questão se
encontram na figura 8.
75,00%
25,00%
Razoável
Pouco/Insatisfatório
Figura 8 – Avaliação do grupo A em relação ao tempo dedicado a leitura dos textos
Observamos que 75% dos participantes acreditam que dedicam tempo suficiente a
essa tarefa de leitura considerando-o como razoável, porém insuficiente para aprofundar o
estudo individual para além de uma primeira leitura. Sendo que os outros 25% consideram
pouco o tempo que dispensam para a leitura dos textos, considerando que até essa primeira
leitura fica prejudicada. Esse ponto também é importante para a avaliação do espaço na
medida em que essa tarefa é essencial tanto para o desenvolvimento das discussões como
77
para a apropriação do conhecimento. Sem realizá-la de modo satisfatório, a participação
dos membros nas discussões e o conseqüente aprofundamento ficam comprometidos.
Podemos evidenciar na figura 9 que os mesmos participantes que colocaram sua
dedicação de tempo à leitura como insuficiente, apontam também dificuldades em suas
participações nas discussões.
75,00%
25,00%
Regular/Razoável
Pouca/Insatisfatória
Figura 9 – Participação efetiva do Grupo A nas discussões do Espaço Marx
Constatamos até o momento algo que se pode observar em qualquer processo de
formação e que aparece na própria realidade da prática do espaço Marx: quem efetua sua
parte individual para participar do estudo coletivo, nesse caso a leitura prévia, tem mais
facilidade, por saber previamente o que vai ser estudado, de participar das discussões.
Porém, essa não é a única conseqüência decorrente desse fato, relativamente óbvio,
analisaremos outros no próximo ponto de análise.
Considerando as mudanças promovidas pelo espaço na vida de seus participantes,
propomos coletar e expor dados sobre determinadas dimensões das relações sociais que os
participantes estabelecem: a) Acadêmica, b) Profissional, c) Pessoal e d) Militância, sendo
que nesse último aspecto não consideraremos as respostas de 2 (dois) participantes, pois os
mesmos, não atuam em nenhuma organização, seja reivindicatória ou revolucionária.
Essa divisão dos aspectos de vida tem por finalidade somente enfatizar momentos
em que estes estão mais presentes, entendemos sim que existem consistentes relações entre
eles, utilizamos essa separação momentânea como um recurso didático para melhor
detalhar os impactos promovidos pela inserção dos participantes no Espaço Marx.
78
Em relação ao impacto provocado por esse processo de estudo nas 4 (quatro)
dimensões de suas vidas explicitadas, os participantes posicionam-se unanimemente em
avaliar que aconteceram mudanças significativas.
Em sua vida acadêmica os entrevistados afirmam que essa mudança se deu
principalmente no fato do conteúdo trabalhado no espaço Marx passar a servir como base
de sua fundamentação teórica para o estudo de outros conteúdos mais específicos.
Em sua vida profissional conseguem uma percepção maior das posições de classe
colocadas nas discussões e atuações em sua área, como fica claro nessa resposta de um dos
participantes: no campo profissional, fez eu ter a consciência e a possibilidade de revelar
questões ideológicas colocadas diariamente em minha profissão, bem como a
possibilidade de estabelecimento de relações mais generalizadas tanto do campo político
como econômico.”
Em sua vida pessoal os participantes apontam mudanças profundas no modo de
compreender e de se posicionar perante a realidade em que estão inseridos, pois “nos
apresenta um método de interpretação da realidade que nos capacita a atuar de maneira
mais eficiente para enfrentar os problemas do cotidiano”. Proporcionando uma “visão
mais crítica” sobre o cotidiano, ou ainda na exemplificação de um outro entrevistado “não
consigo olhar na rua ao andar e me manter com a mesma postura, fico indignado com
tanta desigualdade e esta indignação serve como combustível político para todas as ações
de minha vida.”
Em sua militância os participantes apontam uma mudança qualitativa de sua
atuação na militância que, mesmo considerando algumas dificuldades que serão apontadas
no ponto de análise seguinte, pois as discussões desse processo de estudo “transformaram-
se na base teórica de minhas atuações enquanto militante.”
Esses apontamentos são significativos para a constatação de que o Espaço Marx, ao
trabalhar o aprofundamento teórico marxiano, promove mudanças substanciais de seus
participantes no sentido de consolidação de sua opção de classe na totalidade dos aspectos
que compõem suas vidas. Aprofundando a consciência revolucionária de seus participantes
inclusive no aspecto da necessidade organizativa para a ação.
em relação à aplicação dos conteúdos trabalhados no espaço Marx, nestas outras
dimensões da vida dos participantes, os resultados obtidos se encontram na figura 10.
79
91,66%
Sim
Não
Figura 10 – Capacidade de aplicação da teoria marxista em outros espaços
Constatamos que a grande maioria, 91,66%, acreditam que conseguem aplicar a
teoria nos outros espaços, sendo que mesmo com essa constatação positiva, 50% dos
participantes indicam que encontram certa dificuldade em aplicá-la na sua militância.
Outro fato observado é que a porcentagem de 8,34% de incapacidade de aplicação da
teoria, deve-se a um participante que apontou anteriormente, dificuldade em participar
efetivamente nas discussões e que destinava pouco tempo para as leituras prévias.
Concluímos então que para aqueles que estão participando com maior dedicação e
ênfase ao Espaço Marx, os impactos qualitativos tendem a ser maiores do que aqueles que,
mesmo tendo uma freqüência semelhante, não se dedicam a suas tarefas individuais. Ou
seja, não basta 'participar' do Espaço Marx, é preciso que o 'como' se participa também seja
qualificado.
Como último aspecto analisado, temos as perspectivas apontadas pelos
participantes com relação ao espaço Marx e seu desenvolvimento, conforme resultados
apresentados na figura 11.
33,33%
33,33%
8,33%
25%
Autonomia frente a um
coordenador
Maior facilidade na utilização da
teoria na milincia
Ampliação do espaço (público e
conteúdo)
Maior preocupação com
publicações
80
Figura 11 – Perspectivas do Grupo A para o próximo período de estudos
Vemos pelo gráfico que a continuidade do desenvolvimento da autonomia dos
estudos torna-se um anseio presente nas perspectivas dos participantes. Fato que corrobora
a análise feita anteriormente, da necessidade dos participantes, que vão paulatinamente
persistindo em seus estudos sistemáticos no grupo, e que possam se formar enquanto
educadores socialistas. No sentido de poderem exercer essa função, tanto na possibilidade
de ampliação desse espaço, fato também apontado como perspectiva pelos participantes,
como em outras instâncias de formação.
Também constatamos novamente o anseio de coadunar o acúmulo teórico com sua
utilização na prática militante, o que fortalece juntamente aos outros aspectos desse perfil
militante, o caráter não escolástico e puramente interpretativo da realidade, na
terminologia empregada por Marx, nas Teses sobre Feurbach, desse grupo de estudos, mas
que procura contribuir concretamente na transformação da sociedade, porém com aquilo
que realmente é o objeto de seu trabalho, a formação teórica.
81
5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS: ESPAÇO MARX UM INSTRUMENTO DE SEU
TEMPO
Em nossas considerações finais estaremos trabalhando no sentido de sistematizar o
quadro traçado pela análise do espaço Marx, referendados pela discussão teórica inicial,
pontuando sobre os aspectos que consideramos centrais na análise do objeto como: a) sua
caracterização dentro de um processo de formação política; b) o perfil de seus participantes
e a metodologia adotada nos estudos e; c) seu papel frente à conjuntura atual da luta de
classes.
Temos acumulado então, que o processo de formação política para o
desenvolvimento da consciência de classe deve ser compreendido como um processo em
sua totalidade de momentos, dimensões e mediações, não desprezando sua interelação
enquanto aspectos constituintes de um mesmo processo, bem como não ignorando suas
características singulares e específicas.
Partindo dessa concepção de totalidade temos por conceito de formação política a
formação do militante composta pelas diferentes dimensões de sua vida e das mediações
entre elas. Um processo por qual esse militante passa na luta concreta, cotidiana
reivindicatória e/ou revolucionária frente ao capital, no seu aprofundamento teórico e na
construção de sua organização política enquanto classe. Processos que possuem um caráter
mais determinante em suas constituições específicas, mas que possuem também estreita
ligação. Entendemos, portanto, que esse processo de formação política se de forma
plena na medida em que o militante esteja envolvido nessas três esferas do processo de
formação.
Com esses pressupostos consideramos que o Espaço Marx é um espaço que
possibilita mais acentuadamente uma parte desse processo de formação política, qual seja,
o da formação teórica. Parte importante e constituinte do processo de formação política
para o desenvolvimento da consciência de classe revolucionária. Assumir essa identidade
de formação teórica implica em reconhecer o seu papel dentro desse processo de formação
política, que consiste fundamentalmente em aprofundar os estudos e a educação dos
militantes na teoria marxiana e nas experiências revolucionárias, como forma de subsidiar
suas ações nas lutas práticas, tanto as econômicas e reivindicatórias quanto às de
construção de uma organização revolucionária.
Sendo um espaço de aprofundamento teórico, claro também fica que seu trabalho é
mais eficiente junto aos militantes ou indivíduos que não se contentam mais somente com
82
posições frente ao capital, específicas e limitadas, ou economicistas e reivindicatórias. Ou
seja, atua principalmente com aqueles que estão rompendo ou que romperam com as
barreiras limítrofes da ideologia burguesa e mesmo que ainda não consigam desenhar ou
elaborar uma outra forma de organização da sociedade, ‘sentem’ mais ainda do que
formulam que a forma atual deve ser superada.
Se a formação política ‘espontânea’, das relações concretas estabelecidas pelos
trabalhadores frente ao capital, é capaz de contribuir fundamentalmente no processo de
formação da consciência de classe reivindicatória e até para o início de rompimento com
essa fase da consciência, para que essa se desenvolva e sistematize esse ‘sentimento’ de
superação do capitalismo, é necessário que esses trabalhadores conheçam e se aprofundem
teoricamente.
Ou ainda como nos coloca Lênin, ao analisar o impacto ‘espontâneo’ da formação
política, coloca que “os operários, perdiam sua crença costumeira na perenidade do
regime que os oprimia; começavam... não direi a compreender, mas a sentir a necessidade
de uma resistência coletiva, e rompiam deliberadamente com a submissão servil às
autoridades” (Lênin, 2005c). Porém, para que essa compreensão se tornasse possível era
necessário que a teoria começasse a fazer parte do processo de formação política desses
operários.
O desenvolvimento da história do Espaço Marx até o presente momento e em nossa
avaliação conseguiu avançar significantemente nessa característica central de
aprofundamento teórico e no desenvolvimento do processo de consciência de classe
revolucionária, tanto no amadurecimento do rompimento com a fase reivindicatória quanto
no amadurecimento da fase revolucionária da consciência.
Mesmo com esse avanço, essa transição e amadurecimento do processo de
consciência de classe, não podem ser considerados como que obedecendo a uma lógica
linear e muito menos como consistindo-se em um processo sem retorno. Mesmo
avançando na análise da sociedade capitalista em que vive e da necessidade de sua
superação, o ser humano é um ser humano primordialmente de seu tempo histórico e em
conseqüência sua consciência também.
Ou como ainda nos coloca Iasi:
“Ela é, antes de tudo, uma consciência social herdada, inercial, resultante de uma certa
ordem social de relações que se instituíram em forma de valores, juízos, concepções de
mundo, partilhados em comum por aqueles que convivem numa certa época, mas é mais
83
que isto, é a expressão ideal de uma substância que corresponde à essência das próprias
relações que constituem uma sociedade dada, e, neste sentido, é uma singularidade, ou
seja, uma singular visão do mundo própria de uma forma singular de vida” (Iasi, 2004,
p.427).
Por tanto a representação social que os indivíduos fazem em suas mentes da
realidade vivida, mesmo superando a concepção social hegemônica idealmente, em última
análise ainda encontra-se determinada pelas relações materiais as quais os mesmos estão
submetidos. Não basta uma consciência revolucionária para que se construa a revolução.
Ou ainda, desenvolver a consciência revolucionária da luta de classes dentro do
capitalismo, não leva necessariamente a optar pela atuação efetiva na luta pela
emancipação da humanidade. E mesmo que se faça essa opção de lutar, esses indivíduos
ainda podem posteriormente optar por se “retirar” das lutas ou ainda escolher ir lutar no
lado oposto ao da trincheira da classe trabalhadora.
Todavia, mesmo entendendo essa possibilidade sobre a reversibilidade do processo
de consciência e dos limites do papel dessa consciência no processo revolucionário
concreto, compreendemos também que sem avançar para essa consciência de classe
revolucionária um processo de superação do capitalismo tampouco se torna possível. O
Espaço Marx tem sua contribuição na construção de um instrumento que tem possibilitado
esse avanço da consciência que transpõe os limites da sociedade burguesa, dentro do
processo de formação política de seus participantes.
Com essa sistematização das características centrais de seu papel dentro de um
processo de formação política, constatamos que atualmente o perfil daqueles que
participam do grupo de estudos é majoritariamente composto de jovens militantes
socialistas ligados à área educacional. Participantes que mesmo estando em sua maioria na
fase de consciência de classe revolucionária, ainda estão, também em sua maioria, num
grau inicial desse momento do desenvolvimento do processo de consciência de classe.
Sendo esse o perfil da expressiva maioria dos participantes, e que vem se repetindo
nos últimos três anos de sua existência, cabe-nos entender que o trabalho de
fundamentação teórica proporcionado pela metodologia de estudo do grupo deve priorizar
primeiramente a aproximação à leitura da teoria marxiana. Por trabalhar com militantes
novos que pouco ou nada leram de Marx antes de sua entrada no grupo, esse trabalho
inicial deve ser considerado como essencial, inclusive para o desenvolvimento posterior do
84
aprofundamento teórico, principalmente no que diz respeito ao método de análise e
interpretação da realidade.
A importância desse aspecto da teoria marxiana aparece inclusive no texto
produzido pelo fundador Claus Germer e que subsidia atualmente essa discussão inicial:
“O método de Marx constitui tema de relevância especial para o desenvolvimento da
teoria marxista. Não me refiro ao caráter genérico da relevância do método como
momento essencial de toda pesquisa científica, mas ao caráter específico da sua
relevância atual para o marxismo, devido às consequências da acentuada diferença da
base filosófica do marxismo em relação à base filosófica da ciência não marxista, que é
dominante. A base filosófica do marxismo é o materialismo, entendido como corrente da
filosofia, que se contrapõe ao idealismo, base filosófica da ciência não marxista, e o seu
método é a lógica dialética, em oposição à lógica formal dominante. Dado o domínio
absoluto do idealismo e da lógica formal no establishment científico das sociedades
capitalistas, projetando-se ademais nos modos de pensar do senso comum em geral, e
dada a inferioridade numérica do materialismo e dos pesquisadores marxistas nestes
meios, compreende-se não a dificuldade de apreensão das particularidades da
filosofia e do método marxistas, mas também a possibilidade da sua apreensão
distorcida pela influência dominante de um modo de pensar em tudo oposto a eles”
(Germer,2003).
Mesmo com essas considerações o Espaço Marx tem, principalmente também nos
últimos três anos, construído esse caminho de forma ‘abreviada’ e ‘aligeirada’, por ainda
se basear fundamentalmente no trabalho em poucas sessões, nos últimos três anos as
sessões destinadas a essa discussão se restringiram somente a duas, e baseado centralmente
na discussão do texto citado “A relação abstrato/concreto no método da economia
política”, do fundador Claus Germer, que já no início do texto pontua:
“Devido às limitações inerentes à forma artigo, a cobertura do tema não pode ser
completa, não tendo sido possível, por exemplo, explorar em toda a extensão os textos
citados. Também ficaram sem aprofundar - ou foram apenas mencionados - aspectos
importantes do método de Marx e suas implicações, como por exemplo a dialética e o
sentido do seu polêmico caráter lógico-histórico, entre outros. Também não pude incluir
referências a passagens metodológicas importantes presentes em outras obras de Marx,
com destaque para o próprio O Capital e Teorias da Mais-Valia, bem como obras
essenciais de Engels e outros autores marxistas. Por prudência e método, o presente
85
artigo explora basicamente os textos metodológicos iniciais de Marx (e
Engels)”(Germer, 2003).
Com esses apontamentos feitos e levando em consideração também o perfil
predominante dos participantes dos últimos três anos, ponderamos sobre a necessidade do
Espaço Marx voltar a realizar esse caminho com maior consistência teórica e com maior
tempo para seu aprofundamento. Principalmente para que essa necessidade atual, apontada
no texto base de discussão, possa ser mais eficientemente atendida.
Ao considerarmos que sem o conhecimento e aprofundamento teórico torna-se
praticamente impossível o avanço na consciência revolucionária, não podemos ignorar o
fato de que sem a apreensão correta do método que baseia e constrói essa teoria sua
compreensão e aplicação tornam-se também mais difíceis e/ou limitadas. O que pode
explicar a dificuldade de parcela significativa dos participantes em aplicar a teoria em sua
militância prática.
Podemos seguir esse raciocínio para o estudo dos processos revolucionários, onde
mesmo com todo o processo em avanço na organização dos estudos, da categorização e do
estudo do processo em seu movimento, sem essa compreensão do método de análise
científico, o seu aprofundamento fica também limitado.
Fazemos essa ponderação sobre a importância de se intensificar o estudo do método
materialista dialético, sem perder de vista os avanços no desenvolvimento metodológico do
Espaço Marx. Acentuamos esse ponto também aqui nas conclusões no sentido de
perspectivar um aprofundamento ainda maior no desenvolvimento do programa de estudos
desse espaço.
Para concluirmos nossa análise do Espaço Marx, iremos abordá-lo diante da
conjuntura atual da luta de classes, tendo a compreensão de que iremos somente trabalhar
com alguns elementos, principalmente os que compõem a luta política, mas que não
conseguiremos aprofundar essa temática em sua totalidade nessa pesquisa.
Procuraremos então minimamente delinear a importância de um espaço de
aprofundamento da teoria revolucionária na luta política atual. Essa luta por sua vez passa
por um momento de reorganização dos socialistas. A expressão política da classe
trabalhadora brasileira, construída como resultado das mobilizações e da efervescência da
luta de classes ocorridas a partir da década de 70 desembocando na construção do Partido
dos Trabalhadores como instrumento classista, contra-hegemônico e de objetivo
86
estratégico socialista, ruiu, formatando-se dentro da ordem e dos limites burgueses (Iasi,
2004).
A reversibilidade do processo de consciência de classe encontra um exemplo
emblemático não da forma individualizada como apontávamos até agora, mas como uma
construção da própria classe em seu processo de formação política.
“Novamente a classe trabalhadora viu o produto de sua ação distanciar-se, objetivar-se
em algo que se tornava cada vez mais estranho a ela.[...] Da mesma forma que os
produtos do trabalho convertidos em mercadoria se afastam daqueles que os produziram
e voltam como uma força estranha, de modo que os produtos dominam os produtores, na
ação histórica do ser social convertido em classe, primeiro em si e depois para si, são
produzidas e objetivadas organizações e instituições que em um momento
corresponderam ao movimento livre da práxis, expressaram a fusão de classe e deram
guarida ao seu juramento, mas que podem igualmente se distanciar e se estranhar
novamente, condenando de novo aqueles que as construíram à serialidade estranhada,
transformando os sujeitos da história novamente em objetos.”(Iasi, 2004, p. 464)
Essa inflexão primeiramente moderada e posteriormente conservadora, acompanha
também o movimento real da classe em sua luta frente ao capital, como continua
argumentando Iasi:
“O PT representou o ascenso do movimento e expressou sua radicalidade no corpo de
suas formulações, mas igualmente passou a simbolizar e incorporar, paulatinamente, o
amoldamento de fato que se operava na classe no universo de suas formulações
políticas. Em vez de ser a consciência possível que mantinha a meta estratégica apesar
do momento prático de derrota, se converteu na consciência política correspondente à
derrota prática” (Iasi, 2004, p. 437).
Uma expressão política que não possuindo firmeza em sua formulação estratégica e
que não assumia a teoria revolucionária como base de seu programa, acabou por tornar-se
uma presa mais dócil e fácil às intempéries da luta de classes.
Em conseqüência da derrocada desse principal instrumento erigido pela classe,
compreendida em diferentes momentos pelos socialistas organizados e ainda em boa parte
não compreendida pelos trabalhadores enquanto classe, assistimos a uma fragmentação
87
desses socialistas na procura de se reorganizar ainda que de forma predominantemente
pulverizada.
Nesse momento do processo de reorganização da classe trabalhadora, que
entendemos ainda como pertencente a uma fase inicial, visto a falta de uma organização
capaz de unificar o grande número de ‘fragmentos organizados’ que se posicionam
enquanto socialistas revolucionários e que se encontram separados atualmente, a
fundamentação teórica nos parece ainda mais essencial.
Existe a necessidade de se refletir sobre os caminhos que estão se apresentando aos
socialistas e onde seremos convocados não somente a opinar, mas principalmente a
construir. Para que essa construção possa se formar com maiores chances de evitar os
desvios cometidos não pela experiência dos Partidos dos Trabalhadores, mas pelo
conjunto dos partidos que se construíram historicamente como expressões da classe em sua
consciência revolucionária, é preciso que o planejamento e a formulação dessa construção
se realizem tendo a teoria revolucionária como um de seus alicerces principais.
Para que não repitamos os mesmos erros ou para que não sejamos “ecos”
emprestando as palavras de Mario Benedetti “o pior do eco é dizer as mesmas
barbaridades”.
O Espaço Marx cumpre determinando papel nesse atual momento da luta de
classes: o de fomentar a criticidade revolucionária qualificando teoricamente seus
participantes na perspectiva da transformação efetiva da sociedade capitalista e da
construção do projeto socialista de sociedade que passa fundamentalmente pela análise e
atuação da e na realidade em que vivem.
Com a certeza de suas limitações enquanto um grupo de estudos e conhecendo
paulatinamente também as suas possibilidades podemos dizer que o Espaço Marx tende a
se comportar como o poeta Thiago de Mello que em sua poesia “Para os que virão”
pondera “como sei pouco e sou pouco, faço o pouco que me cabe me dando por inteiro.”
A revolução com certeza não começa no Espaço Marx da UFPR, mas também
certamente passa por espaços como esse. Nos tempos em que vivemos vale concluir com
as palavras de Brecht:
“Nossos inimigos dizem: a luta terminou.
Mas nós dizemos: ela começou.
Nossos inimigos dizem: a verdade está liquidada.
Mas nós sabemos: nós a sabemos ainda.
88
Nossos inimigos dizem: mesmo que ainda se conheça a verdade
ela não pode mais ser divulgada.
Mas nós a divulgaremos.
É a véspera da batalha.
É a preparação de nossos quadros.
É o estudo do plano de luta.
É o dia antes da queda de nossos inimigos”(Brecht, 2005).
89
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_______. Sobre as Greves. Disponível em:
<http://www.marxists.org/portugues/lenin/1899/sobresasgreves.htm> Acesso em: 14 mar.
2006b.
LÚRIA, A.R. Introdução Evolucionista à Psicologia. Tradução Paulo Bezerra. São
Paulo: Civilização Brasileira, 1979.
MARX, K. Contribuição à Crítica da Economia Política. Disponível em:
<http://www.marxists.org/portugues/marx/1859/contcriteconpoli/index.htm> Acesso em:
20 set. 2005.
_______. Manuscritos Econômico-Filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2002.
_______. Marx a P. V. Annenkov. s/d.
_______. O Capital. Volume I. Os Economistas. São Paulo: Nova Cultural, 1988.
_______. O Capital. Volume II. 12
a
ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil S.A., 1988.
_______. Prefácio à contribuição à crítica da Economia Política. In, Marx e Engels,
obras escolhidas. 2ª ed., RJ: Vitória, 1961.
MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã. 6ª Ed. São Paulo: Hucitec, 1987.
MELLO, T. Vento Geral, Poesia 1951-1981. Civilização Brasileira, Rio de Janeiro 1981.
3a edição, 1990.
92
PESSOA, F. O Eu profundo e os outros Eus. 10ª Ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1980.
PRZEWORSKI, Adam. O Capitalismo e a social-democracia. São Paulo: Cia. das
Letras, 1989.
RUBIN, Isaac. A Teoria Marxista do Valor. Ed. Brasiliense, 1980.
RODRIGUEZ, S. Lo que quisieste ser. Descartes. Ojalá (Cuba), EMI Odeon; Lúcio Alfis
Produciones, Buenos Aires, Argentina, 1998.
_______. El hombre extraño. Silvio en Chile vol.1. Ojalá (Cuba), EMI Odeon; Lúcio alfil
Producciones, Buenos Aires, Argentina, 1992.
SARAMAGO, J. Ensaio sobre a lucidez. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
VIGOTSKI, Lev S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins
Fontes, 2001.
93
Anexos
94
Anexo I - Roteiro para entrevista com os fundadores do Espaço Marx
Perfil
Qual sua formação acadêmica?
Qual sua profissão atual?
Sua história de militância?
Participação
- Quando surgiu? Quem participou dessa construção?
- Quais os principais motivos/necessidades que levaram a construção do Espaço
Marx?
- Por quê da sua participação nessa construção?
- Como foi definida a proposta inicial do espaço? Objetivos, metodologia,
periodicidade, público alvo. Breve histórico.
- Por que a construção de um espaço próprio e não a participação em outros espaços
de formação?
- Quais as perspectivas com a relação ao ingresso de novos participantes? Qual o
instrumento de aproximação, divulgação com /do espaço?
- Quais as metodologias utilizadas no desenvolvimento do espaço Marx?
- Aconteceram mudanças referentes à metodologia do projeto inicial? Quais? Por
quê?
- Quais as características principais dos participantes do espaço?
- Ocorre muita rotatividade dos participantes?
- Os objetivos iniciais sofreram mudanças? Por quê?
- Há registro da freqüência dos participantes, das discussões e do trabalho
desenvolvido?
95
Avaliação
- Com relação aos objetivos iniciais e os que foram estabelecidos posteriormente,
qual o saldo?
- Com relação as metodologias utilizadas, quais as mudanças mais significativas? O
que tais mudanças proporcionaram?
- Com relação aos participantes do espaço, quantos permaneceram, quantos saíram?
Existem contatos ou registros?
- Desses dois grupos (permanecentes e que saíram) o que fazem com a formação que
construíram no espaço?
- O espaço tem a preocupação de sistematizar, publicizar, produzir materiais
referentes às discussões desenvolvidas? Quais? Qual a utilização desse material?
- Como se dá atualmente a organização do espaço? Já foi diferente?
- Quais as suas perspectivas para o espaço no próximo período? Objetivos,
metodologia, resultados, continuação.
- Existe a preocupação em formar formadores? Como?
- Existe diálogo com outros espaços de formação? Quais?
- De acordo com o trabalho desenvolvido, a metodologia utilizada no espaço está de
acordo com o método marxista?
96
Anexo II - Questionário para os participantes dos grupos 1 e 2 do ESPAÇO MARX
Perfil
1) Profissão:_________________________________________________________________
2) Estudante: Sim ( ) Não ( )
Graduação:________________________________________________________________
Pós- Graduação:____________________________________________________________
Instituição:________________________________________________________________
3) Trabalha: Sim ( ) Não ( )
Função ou cargo que
ocupa:___________________________________________________________
4) Participa atualmente de algum Sindicato de representação de classe, Movimento Social ou
Partido político: Sim ( ) Não ( )
Qual?____________________________________________________________________
5) participou/participa de outros Espaços ?
Quais?____________________________________________
6) Como conheceu o Espaço Marx?
( ) através de amigos
( ) através de cursos ou palestras
( ) através de professores
( ) outros
(especifique):______________________________________________________________
7) Há quanto tempo freqüenta este espaço? _______ anos _______ meses
Participação e avaliação
8) Quais os principais motivos que o levaram a ingressar no Espaço Marx?
I. ____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
II. ____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
III. ____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
IV. ____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
97
9) Quando se deu a formação do grupo que você participa?____________________________
10) Com que freqüência você participa das reuniões?
( ) semanalmente
( ) quinzenalmente
( ) mensalmente
( ) outra periodicidade:
_____________________________________________________________________
11) Em relação à metodologia de estudo:
a) Você acha que ela é adequada? Sim ( ) Não ( )
Por quê?_____________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
b) Consegue atingir os seus objetivos?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
c) Já ocorreram mudanças na metodologia de estudo desde a sua entrada no espaço?
( ) Sim Não ( )
Quais?_______________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
d) O que estas mudanças proporcionaram em sua opinião?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
12) De que forma as discussões no Espaço contribuem com a sua vida profissional, acadêmica
ou em seu cotidiano?
Profissional:__________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
Acadêmica:___________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
98
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
Vida pessoal:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
13) Você utiliza outras fontes bibliográficas (livros, textos, sites) e/ou outros autores para
complementar seu entendimento sobre os textos trabalhados no Espaço Marx: ?
( )Não ( ) Sim. Quais ?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
14) Como você avalia o trabalho desenvolvido no Espaço Marx?
( )ótimo ( )bom ( ) suficiente ( ) ruim
Por quê?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
15) E sua avaliação em relação:
a)aos textos trabalhados:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
b) à profundidade das discussões:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
c) ao tempo para as discussões:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
16) Como você avalia a sua participação no espaço Marx em relação:
99
a) ao tempo dedicado a leitura dos textos propostos:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
b) à participação nas discussões:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
c) às dificuldades encontradas:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
d) à profundidade das discussões:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
17) Com relação aos seus objetivos iniciais quando ingressou no espaço Marx, vc acredita que
eles têm sido atingidos ? Sim ( ) ou não ( )Por quê?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
18) O espaço tem a preocupação de sistematizar, publicizar, produzir materiais referentes às
discussões desenvolvidas? Quais os materiais produzidos pelo espaço que você conhece ?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
19) Em relação à organização do espaço, cite pontos positivos e negativos.
a) Pontos Positivos:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
100
b) Pontos Negativos:
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
20) Já ocorreram mudanças na forma de organização do espaço? Quais?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
21) Existe alguma forma de avaliação do trabalho desenvolvido no espaço Marx ? Qual?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
22) Qual sua opinião sobre essa forma de avaliação?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
23) Em relação aos conhecimentos trabalhados nas discussões, você se sente capaz de trabalhá-
los em outros espaços? Por quê?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
24) Quais as suas perspectivas para o espaço no próximo período? Objetivos, metodologia,
resultados, continuação.
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
101
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
25) Existe algum outro ponto que você considera importante e que não foi apontado durante
esse questionário? Escreva sobre ele.
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
Obrigada pela sua colaboração !
102
Anexo III - Questionário para os participantes do grupo 3 do ESPAÇO MARX
Perfil
9) Profissão:___________________________________________________________
10) Estudante: Sim ( ) Não ( )
Graduação:__________________________________________________________
PósGraduação:_______________________________________________________
Instituição:__________________________________________________________
11) Trabalha: Sim ( ) Não ( )
Função ou cargo que ocupa:____________________________________________
12) Participa atualmente de algum Sindicato de representação de classe, Movimento
Social ou Partido político: Sim ( ) Não ( )
Qual?______________________________________________________________
13) Já participou/participa de outros?
Quais?_____________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
14) Como conheceu o Espaço Marx?
( ) através de amigos
( ) através de cursos ou palestras
( ) através de professores
outros(especifique):___________________________________________________
__________________________________________________________________
15) Quais os principais motivos que levaram a sua aproximação e ao seu ingresso no
Espaço Marx?
I. ______________________________________________________________
______________________________________________________________
II. ______________________________________________________________
______________________________________________________________
III. ______________________________________________________________
______________________________________________________________
103
Livros Grátis
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