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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA
DANIEL VIEIRA
A Fuga da Sonata para Piano de Camargo Guarnieri:
uma análise retórico-estrutural
.
Porto Alegre
2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA
DANIEL VIEIRA
Fuga da Sonata para Piano de Camargo Guarnieri:
uma análise retórico-esttrutural
Artigo submetido como requisito parcial
para a obtenção do título de Mestre em
Música; área de concentração Práticas
Interpretativas.
Orientação: Professora Dra. Any Raquel Carvalho.
Porto Alegre
2008
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Agradecimentos
Á minha mãe, por ser mãe... e mãe é mãe...
...à Gigi, por surgir com um elo de união e servir como esperança por tempos melhores...
...ao senhor Henrique Vieira...
...aos colegas Alfonso e Jeanine, por estarem sempre presentes e apoiando mutuamente diante aos
desafios dessas etapas...
...à “Gordona”...
...à Fátima Brandão, secretária do Programa...
À Professora Dra. Luciana Del Ben, coordenadora deste programa...
...à Professora Cristina Gerling...
...ao Professor Ney Fialkow, pela orientação artística...
...à Professora Any Raquel Carvalho, pela orientação acadêmica e por me ajudar a reconhecer os
meus próprios interesses ao compreender a música...
...à Thaís Lubrani Amato, pelas dicas finais na formação deste trabalho...
...à Camila Vianna Leão, por mostrar-me o belo da vida...
...pela Vida...
...pela Água...
...à Música...
...a DEUS.
Laços e punhais
Ambivalentes como nós, [as] palavras preparam armadinhas ou abrem portas de sedução.
Embalam ou derrubam, enredam em doces laços ou nos matam dolorosamente – como punhais.
(Lya Luft, Pensar é transgredir, 2004)
Não sei distinguir no céu as várias constelações:
não sei os nomes de todos os peixes e flores,
nem dos rios nem das montanhas:
caminho por entre secretas coisas,
a cada lugar em que meus olhos pousam,
minha boca dirige uma pergunta.
Não sei o nome de todos os habitantes do mundo,
nem verei jamais todos os seus rostos,
embora sejam meus contemporâneos.
Não, não sei, na verdade, como são em corpo e alma
todos os meus amigos e parentes.
Não entendo todas as coisas que dizem,
não compreendo bem de que vivem, como vivem,
como pensam que estão vivendo.
Não me conheço completamente,
só nos espelhos me encontro,
tenho muita pena de mim.
Nem penso todos os dias exatamente
do mesmo modo.
As mesmas coisas me parecem a cada instante diversas
Amo e desamo, sofro e deixo sofrer,
ao mesmo tempo, nas mesmas circunstâncias.
Aprendo e desaprendo,
esqueço e lembro,
meu Deus, que águas são estas onde vivo,
que ondulam em mim, dentro e fora de mim?
Se dizem meu nome, atendo por hábito.
Que nome é meu?
Ignoro tudo.
Quando alguém diz que sabe alguma coisa,
fico perplexa:
ou estará enganado, ou é um farsante
- ou somente eu ignoro e me ignoro desta maneira?
E os homens combatem pelo que julgam saber.
E eu, que estudo tanto,
inclino a cabeça sem ilusões,
e a minha ignorância enche-me de lágrimas as mãos.
(Cecília Meireles, O estudante Empírico, 1960)
Ao
Dan, que me mostrou que a vida também pode ser vivida...
Sumário
Introdução
1. Referencial teórico
2. Análise da fuga daSonata
3. Abordagem retórico-musical
O Inventio e Exordium
O dispositio
O Narratio
O Confutatio
O Stretto e o confirmatio
Contagem numerológica e a retórica musical
Conclusão
Referências bibliográficas
Anexo
RESUMO
Este trabalho analisa retoricamente a fuga do terceiro movimento da Sonata para piano de
Camargo Guarnieri. Para tal, utilizei uma combinação de autores dentre eles Harrison (1990), Lester
(2001) e Hindemith (1970). Neste trabalho considero a natureza retórica da fuga como sugerido por
Harrison (1990). A determinação de um status gera um conflito interno para a fuga funcionando
como plano para a sua estrutura, a resolução desse plano conflitante é demonstrada como
argumentos retóricos, todos oriundos do status. Também, como reflexo desse status, a
representação de um simbolismo numerológico e divisão de seção áurea é denotado, tendo partido
de uma ação especulativa. A fuga, dessa maneira mostra-se num relacionamento de unidade
temática com relação à sonata como um todo, demonstrando maestria e domínio técnico por parte
do compositor.
Palavras-chave: Fuga no século XX, retórica musical, Camargo Guarnieri.
ABSTRACT
The purpose of this study is to present a rhetorical analysis of the third movement of Camargo
Guarnieri’s Sonata for piano, with the use of three authors as the theoretical framework: Harrison
(1990), Lester (2001) and Hindemith (1970). Determining the status of a work generates an internal
conflict in this fugue and acts as a plan for its overall structure. The resolution of this conflict is
demonstrated by rhetorical arguments, all drawn from its status. As a reflection of this status, I have
pointed out a representation of numerical symbolism and the golden section as speculative, though
interesting aspects. The Sonata for piano thus shows the composer’s understanding of thematical
unity in the piece as a whole, as well as a wealth of technical knowledge.
Key words: Fugue in the XX century, musical rhetoric, Camargo Guarnieri.
Introdução
A presente pesquisa investiga, como exercício analítico, a natureza retórica da fuga da
Sonata para piano (1972) do compositor brasileiro Camargo Guarnieri (1907 1993), sem a
pretensão de abordar qualquer tipo de projeção comunicativa da obra para com o público. A
literatura comenta que, assim como compositores de sua geração, Guarnieri destaca-se pelo uso
constante de polifonia e condução estrita de vozes (ABREU, 2001, p. 154; SANTIAGO, 2002, p.
162; entre outros). Nesse aspecto, vale citar as palavras do próprio compositor em carta à Maria
Abreu, datada de 02 de dezembro de 1986, relatando mesmo com bom humor, sua opinião sobre o
uso de contraponto:
Fui muito amigo de Portinari. Todas as vezes que ia ao Rio de Janeiro almoçava na casa
dele. Nós nos entendíamos. Ele era feroz na crítica aos outros pintores, e dizia em altos
brados: pintor que não sabe desenhar não é pintor. Eu concordava acrescentando:
compositor que não sabe contraponto não é compositor (ABREU, 2001, p. 154).
Se para Guarnieri o contraponto é a base para a composição, a música no século XX, da
mesma forma, pode ser caracterizada por sua naturalidade contrapontística, tendo Stravinsky,
Hindemith e Shostakovitch como expoentes no desenvolvimento dessa técnica (RIBAS, 2002, p. 3).
Da mesma maneira, os autores Searle (1954) e Graves, Jr. (1962) afirmam que a Era Moderna
1
na
música é contrapontística por tratar-se de uma fase de transição vinculada ou não à tonalidade e
expansão ou não dessa (SEARLE, 1954, p. 2). Se a harmonia constrói vozes que não são
necessariamente independentes, o contraponto, através da condução estrita de vozes, pode produzir
harmonias convencionais ou não, servindo-se de maneira absolutamente coerente à experimentação
harmônica da música moderna (SEARLE, 1954, p. 3). Nesse ínterim, menciono o comentário de La
Rue (1970) sobre fuga como procedimento composicional:
A fuga representa o desenvolvimento final e mais sofisticado do contraponto [...], o fim de
uma longa evolução e inclui etapas de heterofonia, polifonia, Stimmtaush, contraponto,
imitação, cânone e alteração rítmica [...] pode ser mais esclarecedor como uma cadeia de
processos contrapontísticos livremente selecionados, uma disposição flexível de escolhas
dentre um repertório estereotipado
2
de mecanismos aplicados a uma ou duas idéias iniciais
ou sujeitos (LA RUE, 1970, p. 176 – 177. O segundo grifo é meu).
Incluo, nesse contexto, Camargo Guarnieri e sua geração que demonstraram na música
nacional, como o uso dessa técnica pode conferir coerência e equilíbrio à obra musical, mesmo que
os recursos sonoros utilizados pelo compositor estejam sendo experimentados. Destaco as palavras
de Gerling (2005) sobre o interesse de Guarnieri pela música de seu tempo:
1 Aqui os autores se referem ao período que vai de 1910 até 1945, descrevendo os procedimentos de alguns
compositores: Stravinsky, Bartók, Hindemith, Schoenberg, entre outros.
2 Esse estereótipo pode ser considerado a própria manipulação natural do material utilizado, por meio das diferentes
técnicas de abordagem para aquele material, como a produção de figuras musicais utilizadas ou geradas, como
adiante se comentará.
[...] em São Paulo, o jovem compositor Camargo Guarnieri, num aparente distanciamento
dos acontecimentos políticos e sociais [pois a década de 1930, no Brasil, é marcada pelo
início do Estado Novo e da Era Vargas], dedicava-se com afinco ao estudo de seus
contemporâneos europeus [Schenberg, Berg, Hindemith, entre outros] (GERLING,
2005, p. 102. Grifo meu).
A obra escolhida como objeto de trabalho nessa pesquisa é o terceiro movimento da Sonata
para piano composta em 1972. Essa sonata em particular, na produção composicional de Guarnieri,
possui algumas peculiaridades instigantes. A pianista Laís de Souza Brasil (1998), a quem a obra é
a dedicada, relatou como a obra fora possivelmente inspirada, quase como um desafio ao
compositor:
No segundo semestre de 1972, perguntei mais uma vez a Camargo Guarnieri por que ele
não escrevia sonatas para piano. Desde 1930, esse gênero tinha sido por ele abordado
nos repertórios para violino, viola e violoncelo com piano, enquanto que, para o seu
próprio instrumento, ele havia composto “apenas” sonatinas (sete).
Em vez de me responder e como quem topa um desafio, ele me pediu pra tocar duas
notas. Dedilhei uma sétima descendente (sol# - lá). Ele disse qualquer coisa como “tudo
bem”.
Dois ou três meses depois, eu recebia a Sonata pelo correio. Aquele intervalo de
sétima havia se transformado na cabeça do único tema do primeiro movimento e o nutria
magicamente, de irradiante vitalidade. A doçura envolvendo o segundo e a picardia do
terceiro movimentos, acrescentados à tensão sempre crescente do primeiro, falavam de um
Guarnieri em fecunda transformação aclamada pela crítica.
Essa foi a única resposta do compositor à minha pergunta. Depois desse sucesso,
Camargo Guarnieri viveu mais vinte anos, escreveu (entre outras obras) mais uma sonatina
para piano e sonatas para duos de piano com violino e violoncelos. Sonata para piano
nunca mais! (BRASIL, 1998, p. 3).
O gênero dessa obra é único”, conforme Verhaalen (2001), a qual aponta como o
compositor a considerava em sua produção composicional. Afirma também, como em seus 65 anos
de vida, com um catálogo de aproximadamente 600 abras, como o compositor aplica o título
“Sonata” para uma peça para solo de piano (VERHAALEN, 2001, p. 171). O próprio compositor
afirma como preponderante o fato dele, Camargo Guarnieri, ter esperado 44 anos para “... escrever
essa sonata...” (GUARNIERI, 1998, p. 4).
Verhaalen (2001) ainda mostra como Guarnieri pretendia dedicar essa obra a Lamberto
Baldi, que fora professor do compositor durante sua juventude, porém,
A memória de Baldi parecia continuar a despertar os maiores esforços de Guarnieri e a
intenção de lhe dedicar essa peça parece atestar que ele escrevera uma obra realmente
merecedora desse título, digna do seu mestre (VERHAALEN, 2001, p. 172).
Outro fator que destaco dentro desse contexto é como essa obra, conforme o próprio
compositor menciona, demonstra um desenvolvimento de estilo com um rompimento com as
“amarras da forma”, “grande liberdade no discurso musical” e “completamente liberto de todos os
conceitos harmônicos e tonais” a favor de uma “intensidade [na] expressão emocional”.
(VERHAALEN, 2001, p. 172; MENDONÇA, 2001, p. 412; GUARNIERI, 1998, p. 4).
Não raro, ao procurar um aprimoramento técnico, diversos compositores buscam por
elementos que figuram em artes afins, sendo uma delas a arte da retórica (SACHS & DALHAUS,
1980, p. 833). Procedimento característico da renascença musical e do período barroco na música
(BARTEL, 1997, p. iv; BUELOW, 2001, p. 261; LIPPMAN, 1992, p. 39; WALKER, 1999, p. 159,
entre outros), a retórica tem motivado pesquisadores a compreender essa arte a da persuasão em
música quer de maneira prática, como na performance (TARLING, 2004), ou até mesmo num
entendimento analítico específico de obras do repertório tradicional (ROBERTS, 2004, NODA,
2006). Partindo dessa motivação e considerando fuga como um procedimento composicional
imitativo e de natureza retórica
3
para o estudo acadêmico da música do século XX, quando os
compositores se utilizaram de técnicas antigas em suas obras modernas (MESSING, 1996), a
investigação do uso de recursos como a retórica musical, por exemplo, levantou pressupostos
preponderantes. Dessa maneira motivei-me por uma investigação em obras mais recentes, do século
XX, estabelecendo como tema desta pesquisa uma análise retórica da fuga da Sonata para piano de
Camargo Guarnieri (1972).
As questões que levantei para esta investigação foram: 1) Como a retórica musical é
representada nessa fuga, além da própria figuração imitativa? Ocorre alguma recorrência? 2) A
3 Buelow (2001) apresenta uma classificação de sete categorias de figuras de retórica musical sendo a imitação fugal
uma dessas categorias. Adiante comentarei mais a respeito.
caracterização de sujeito, contra-sujeito, sucessivas entradas do tema e da resposta, stretti, por
exemplo, refletem alguma representação retórico-musical? 3) Como a retórica é representada na
estrutura da fuga? 4) Alguma relação entre qualquer elemento de simbolismo como gerador de uma
ênfase para com o conteúdo expressivo da fuga ocorre com a devida função retórica?
A utilização de recursos retóricos na música resiste a uma tradição que remete aos gregos
antigos. Quer medieval ou renascentista, a retórica opera dentro de um sistema social integrado
onde passa a ser o meio interlocutor entre o artista e o público alvo (BUELOW, 2001, 261). Em
meados do século XVI, os compositores sentiam-se livres para explorar novas relações de uma
trama musical mais flexível, inteiramente original e completa, estabelecendo fortes laços entre o
estilo polifônico e os procedimentos ciceronianos
4
(BUELOW, 2001, 261). Contudo, a maturação
dessa liberdade, no final da renascença e princípio do barroco, relaciona a utilização do
“argumento retórico” como caráter de súplica afetiva (BUELOW, 2001, p.262), invocando o poder
da metáfora quando se aproximam de figuras musicais ou ornamentação. Pesquisas atuais mostram
como as figuras conferiam não apenas um caráter estrutural às obras que propunham (motetos,
sobretudo), mas também um intenso caráter expressivo percebido através de análise (LIPPMAN,
1992, p. 39).
Contudo, até então, fuga e retórica podem ter se desenvolvido de maneira um pouco
distantes uma da outra, sendo que os componentes da fuga desenvolveram-se de maneira
independente dos recursos emprestados da retórica. Uma analogia entre fuga e retórica de maneira
geral não se caracterizaria como preponderante visto que a técnica contrapontística ainda é soberana
ao significado metafórico que a composição poderia vir adquirir (WALKER, 1999, p. 169). Na
segunda metade do século XVII, readquire-se o entusiasmo pelo uso da retórica em fugas e essa
passa a ser considerada, inclusive, como uma das figuras que poderia ser utilizada para uma obra ou
estrutura, e o seu desenvolvimento continuou puramente técnico, tomando emprestado da retórica
clássica o design tripartido do dispositio: exordium, medium e finis (WALKER, 1999, p. 171).
Posteriormente, o uso desses recursos tornou-se mais recorrente a ponto de vir a ser a meta de um
compositor de fugas, entretanto,
4 Referente ao orador e pensador Cícero (106 AC – 43 AC) e sua teorização a respeito do decoro retórico na oratória.
Não meramente deslumbrante ou com o intuito de impressionar, mas também persuadir e
convencer, em termos puramente musicais, nós podemos dizer que a mera presença de
artifícios contrapontísticos [referindo-se às figuras de retórica musical] não garante o
sucesso artístico de uma fuga [...] [mas] a retórica pode dar a sua contribuição [...]
(WALKER, 1999, p. 173. Grifo meu).
Meu trabalho, contudo, não tratará do ato de comunicação retórica, nem de uma busca
exaustiva descritiva por figuras de retórica, mas sim, por estruturas tópicas e sua mutualidade
estrutural, a força latente exercida entre elas próprias, sendo natural e próprio da fuga em sua
abordagem retórico-estrutural.
Interessante notar como os compositores do final da renascença buscaram uma nova
liberdade e para tal, partiram para o uso de recursos emprestados da retórica, recursos esses que se
tornaram característicos pela recorrência usual. Do mesmo modo, no século XX, a liberdade a qual
os compositores expuseram-se e “forçaram” a si próprios, justifica preliminarmente a presente
investigação, no que condiz a pesquisa sobre o uso de recursos retórico-musicais em obras
modernas.
Apesar de a retórica estar quase sempre vinculada à música antiga, o movimento neoclássico
na música do século XX, revalorizou as técnicas e os procedimentos de períodos anteriores
(renascimento e barroco) e gerou um novo entusiasmo àquelas maneiras de se fazer música
(MESSING, 1996), incluindo a música composta por Guarnieri e outros de sua geração no Brasil.
Assim, a pesquisa que realizei adquiriu um novo valor ao procurar demonstrar como a utilização de
determinados procedimentos e o domínio técnico no repertório brasileiro conferem a essa música
um novo patamar de coerência e elegância (GERLING, 2005, p. 108).
Outro item relevante deste trabalho foi referente à escolha do repertório para análise e
discussão. A fuga escolhida, datada de 1972, pertence à fase de amadurecimento do compositor,
onde, como ele mesmo menciona, estava “completamente liberto das amarras da tonalidade”
(GUARNIERI, 1998, p. 4). Esse fato, o de se tratar de uma obra com características tão próprias da
música da século XX, mesmo admitindo a proximidade entre o procedimento composicional
utilizado fuga determinou, para mim, a razão de não se buscar por uma retórica figurativa, mas
sim de natureza estrutural, como mencionado, que é a natureza própria da fuga. Essa obra
também é a única do gênero sonata para piano na sua produção. Esses fatores permitiram-me notar
uma interação social do compositor para consigo mesmo e sua técnica propriamente dita, assim
como a interação para com o “espírito do tempo” em que foi composta (a estética
moderna/modernista). Daí a importância da utilização, manifestação e percepção de conceitos e
recursos retóricos, para a manutenção constante dessas obras no decorrer da história e persuasão do
ouvinte, ou mesmo interesse por parte do intérprete.
O objetivo geral desta pesquisa foi analisar a fuga da Sonata para piano de Camargo
Guarnieri para demonstrar como a retórica, como estudo do argumento musical, pode ser percebida,
visto que uma série de outros fatores estiveram atuando na composição dessa obra. Para atingir tal
objetivo, foi necessário determinar o centro musical da fuga em questão, estabelecer o tema/sujeito
da fuga, a resposta, o contra-sujeito, os “centros tonais” e a força que cada um exercia sobre si e
sobre os outros dentro da composição. Os conceitos Lester (2001) e Hindemith (1970) serviram de
base nessa busca. No que diz respeito à retórica, utilizei, a articulação dos artifícios retóricos
explanados por Buelow (2001) e por Harrison (1990). Outro aspecto interessante que partiu também
de uma especulação, foi a relação entre algum tipo de simbolismo numerológico sugerido na fuga.
Isso, para uma mais apurada compreensão retórica, foi extremamente válido, servindo como outro
elemento colaborador para o cumprimento da meta principal desta pesquisa.
Por meio dos referenciais escolhidos, se foi possível estabelecer parâmetros delimitadores
para a presente pesquisa, Harrison (1990), por exemplo, elenca duas categorias de retórica (primeira
e segunda retórica, como será adiante definido e demonstrado) e como por meio de uma ou de outra
se pode chegar a razões opostamente diversas. Com isso Harrison admite que a persuasão é o fator
mais preponderante da retórica e em fugas, a proximidade retórica é como na oratória. Valendo-se
reafirmar a postura analítica que esse autor admite e como referencial utilizado neste trabalho, as
características são próximas. Não sendo objetivo meu nesta pesquisa tratar da comunicação
performática que a retórica barroca, no caso, poderia admitir.
Se então, para Harisson (1990), a fuga aproxima-se retoricamente com a oratória, sua
sugestão é delimitar um status oriundo do sujeito da fuga e esse status será característico para a
fuga, porém, não é sinônimo de afeto da fuga. No barroco o poder comunicativo da música residia
quase exclusivamente, de maneira genérica, sobre essa teoria, que com o decorrer da história foi
perdendo seu apelo de “suplica afetiva” devido a vários recursos que foram se acoplando à música
entre outros fatores (GROUT & PALISCA, 1997, p 312). O status, como sugerido por Harisson
(1990) é um recurso artificial criado ou gerado pelo compositor, ou pelo analista para a resolução
retórica da fuga. O status, nesse sentido, difere sobremaneira de qualquer tipo de afeto, em sua
origem discursiva, visto que o afeto é natural ao teor do discurso e o status é um recurso artificial
apesar de também ser um fator determinante ou participar da construção do caráter da fuga.
Como metodologia para a pesquisa, segui as seguintes etapas: 1) análise musical
propriamente dita, delimitando sujeito, contra-sujeito, stretto, etc; 2) análise da retórica musical dos
elementos da fuga, e 3) busca de conclusões retórico-analíticas, a partir do material utilizado na
fuga e considerações estruturais dentro do padrão imitativo e desenvolvido pela própria fuga. Para a
realização dessas etapas, os seguintes procedimentos foram preponderantes: 1) determinar o centro
musical da fuga, amparando-me nos conceitos estabelecidos por Graves, Jr. (1962); 2) analisar os
procedimentos retóricos utilizados por Camargo Guarnieri, ampliando definições figurativas pré-
estabelecidas, ou buscando elementos conflitantes de status
conforme mencionados por Harrison
(1990); 3) analisar a relação entre o simbolismo e a natureza retórico-composicional da fuga, como
exposto por Graves, Jr. (1962), onde elementos esotéricos podem atuar como artifícios
contrapontísticos em uma fuga, vinculando esse simbolismo à retórica musical. A numerologia,
nessa fuga em particular, assumiu um significado especulativo preponderante.
Para finalizar essa etapa, concluo com uma citação utilizada por Carvalho (2002),
valorizando fuga como uma arte e um procedimento expressivo:
O teórico Cherubini, em seu tratado de contraponto Cours de conterpoint et de la fugue,
publicado em 1833, afirma: “... a fuga é a perfeição do contraponto... pode ser considerada
como a transição entre o contraponto estrito e a composição livre”(Nalden, 1969, p. 13).
Procter (1957, p. 138) cita que “nenhum conceito de contraponto é completo sem o
conhecimento e a compreensão da fuga, a qual é provavelmente a mais perfeita forma
contrapontística que já existiu!” (CARVALHO, 2002, p. 123).
1. REFERENCIAL TEÓRICO
O referencial teórico escolhido para este trabalho terá como suporte os trabalhos de Lester
(2001), Harrison (1990). Nesses trabalhos os autores combinam técnicas analíticas tradicionais
aplicadas na análise de fugas cotejando a compreensão do ritmo e da polifonia propostos por Lester
(2001), além de aplicar os conceitos de retórica discutidos por Harrison (1990). Também utilizei
uma outra fonte teórica, a fim de embasar algumas especulações analíticas, que foi Hindemith
(1970).
Lester verifica que o ritmo, em obras de Bach, torna-se um elemento influente na formação
da estrutura da obra, isso é abordado no artigo Heightening Levels of Activity and J. S. Bach's
Parallel-Section Constructions” publicado no Journal of American Musicological Society (Vol. 54,
1, 2001). Os exemplos demonstrados nesse artigo, por Lester, são em sua maioria de gêneros
instrumentais, somente no final do trabalho é abordado, a fim de demonstrar o processo histórico
das seções paralelas
5
como elemento de teor estrutural, o primeiro e o segundo Kyrie eleison da
Missa dies sanctificatus de Palestrina. O autor afirma que a recorrência do preceito das seções
paralelas “parece ser baseado totalmente em princípios idiossincráticos” (LESTER, 2001, p. 50).
Essa situação pode ser constatada em grande parte da música do período clássico e do século XIX.
Dessa maneira, Lester aponta como no século XIX a música de Bach assumiu um lugar no
repertório canônico e como a estrutura de suas composições foram tratadas de acordo com o
relacionamento entre a presença ou ausência do gênero que naquele momento era análoga ao o que
era realizado naquele século. As fugas eram partes de uma tradição em separado, documentando
uma volta aos primeiros tratados em que a forma estereotipada era mais do que uma simples
sugestão (LESTER, 2001. p. 52).
O autor propõe três princípios que se aplicam para as seções de abertura (início) da maioria
das obras de Bach (LESTER, 2001, p. 52 – 53):
5 Seções paralelas são aquelas em que a organização do material exposto é equivalente a reutilização em outra seção da
música. Essa reutilização pode ser realizada de diversas maneiras, como o artigo demonstra, utilizando técnicas de
imitação ou de desenvolvimento (LESTER, 2001, p. 52 - 58).
A abertura de uma peça de Bach estabelece um centro de material que será, então,
trabalhado no decorrer da composição;
A recorrência de material, quase invariavelmente, exibe um aumento de nível de atividade
do mesmo ou em todos os elementos musicais;
A freqüente organização do material utilizado em seções paralelas confere ao material
utilizado uma maior atividade musical.
O autor acredita que esses três princípios provêem para a música de Bach uma espécie de
perspectiva unificada que articula fraseado em conjunção com áreas de estabilidade temática,
contraste, desenvolvimento (2001, p. 53). Mais adiante no artigo, o autor comenta como a
intensificação do material utilizado é realizada com finalidade de satisfação retórica (LESTER,
2001, p. 69). Assim, o primeiro princípio destacado pelo autor pode relacionar a idéia musical
central ao inventio
6
, enquanto o segundo relaciona-se ao dispositio
7
. O terceiro princípio também
pode ser relacionado ao dispositio, contendo, ainda a função de estruturação formal gerando e
intensificando a ocorrência ou recorrência dos elementos musicais produzindo o equilíbrio próprio e
característico de cada obra como um todo. Lester (2001, p. 53) reafirma que “todos os três
princípios e suas interseções [na música de Bach] são consonantes com as idéias de estrutura
musical retóricas (inventio e o dispositio) que eram comum no tempo de Bach”.
De fato, os exemplos utilizados pelo autor comprovam como o primeiro princípio (inventio)
é enfatizado durante o decorrer da composição e como a ocorrência de seções paralelas, além de
outros artifícios composicionais, foi e continua sendo utilizada a fim de construir uma estrutura
sólida a partir de uma única idéia, de um único inventio.
Harrison (1990) introduz o assunto retórica musical e fuga afirmando quão próxima a
textura polifônica de uma obra (de Bach em particular e como exemplo) é delineada da mesma
forma em que as palavras são articuladas na arte oratória, de maneira que ouvimos a um discurso da
mesma maneira ou com a mesma atenção que ouvimos a uma obra musical. O artigoRhetoric and
Fugue: an Analytical Application”
8
traz a análise da fuga da Toccata em Mi bemol Maior (BWV
6 Referente a idéia que serviu de gênese para toda a composição.
7 De acordo com o princípio da subdivisão do design da retórica clássica.
8 In: Music theory Spectrum, v. 12, nº 1, 1990.
915) de Bach. Harrison (1990) nesse artigo comenta sobre o clássico trabalho de Butler (1977),
repudiando o trabalho daquele, mas não negando seu valor na história por um relacionamento
autoritativo e completo, considerando ainda que o trabalho de Butler é válido por depositar uma
atenção detalhada sobre os autores antigos como Burmeister, Mattheson e Berardi, que são teóricos
importantes para a retórica musical, porém, considera que
para o moderno analista, a pesquisa de Butler oferece pouco significado, pelas idéias que
ele organiza e avança, bem como as aplicações que ele propõe, não garantindo grandes
insights como os oferecidos por outras implicações analíticas na atualidade
(HARRISON, 1990, p. 1).
Harrison (1990) afirma ainda, sobre o artigo de Butler, que para os tratadistas clássicos da
retórica musical a retórica em si era percebida como um modelo perfeito, “(...) escolástico e um
sistema constrito de figuras, tópicos e regras para serem memorizadas (...)” e não como uma arte
viva e elástica (HARRISON, 1990, p. 2). Esse autor também aponta como os tratadistas antigos se
concentravam mais no entendimento do estilo do que na arte do inventio, crendo que o estilo fora
primeiro ensinado aos jovens e que seria necessário ensiná-los apenas as figuras de retórica, pois
essas colaboravam para a formação do senso de invenção que seria requerido depois em uma
composição. O mérito de Butler (1977), de acordo com Harrison (1990), foi, justamente de
ressuscitar o termo retórica musical e a aplicação tópica (a busca pelas figuras de retórica) mais
até que de uma transfusão de “historicismo” para o assunto.
Harrison propõe que a retórica seja compreendida primeiramente como um item de
persuasão, e que música e fuga em particular seja como a oratória (HARRISON, 1990, p. 3). E
assim, urge um dos pontos de maior destaque em sua perspectiva sobre a retórica musical,
particularmente em fugas. O autor cita o filósofo literário George A. Kennedy (1928 -) que faz uma
distinção entre a retórica da persuasão e a retórica do artifício literário, denominando-as como
primeira e segunda retóricas. Segundo Kennedy, citado por Harrison (1990), a retórica foi
primeiramente uma arte de persuasão e, assim, a primeira retórica envolve um ato de enunciação,
uma ocasião específica e, por si só, é um ato e não um texto, embora possa ser tratada como texto
posteriormente (KENNEDY apud HARRISON, 1990, p. 3). A segunda retórica, por outro lado, é o
aparato das técnicas retóricas ao redor do discurso ou das formas de arte quando não foram
utilizadas com tais propósitos. Na segunda retórica, o ato do discurso não é o centro de importância,
pois a importância reside no próprio texto, e essa é manifestada por meio de clichês, figuras de
linguagem tópica (figuras de retórica musical, no caso da música), em obras escritas. A segunda
retórica contribui para o orador ou escritor (para o compositor, na música), porém em um nível
secundário (KENNEDY apud HARRISON, 1990, p. 3). Harrisson acrescenta que o próprio
Kennedy afirma que “tem sido uma característica persistente da retórica clássica, em quase todas as
fases, desde a antiga até a moderna história, progredir da primeira para a segunda forma de retórica
(IDEM).
Harrison, então, aponta como, na música, a busca por uma ou outra retórica pode direcionar
de maneira oposta qualquer tipo de consideração nesse sentido. Aplicando a segunda retórica,
aquela do interesse por figuras, à fuga, Harrison parece possuir uma perspectiva pouco tolerante:
[...] esse tipo de análise pelas figuras de retórica - que Butler acredita fazer da fuga
“excitante e vital” - torna a estrutura obscura em grande escala e rouba da fuga o interesse
musical. Esse resultado é precisamente aquilo que a fuga não necessita; a análise
tradicional brutalmente atomiza a estrutura da fuga, e a fuga tem sempre sido suspeita
de favorecer veículos acadêmicos pedantes e tediosos (HARRISON, 1990, p. 4).
Sua visão da compreensão analítica através da compreensão da segunda retórica é muito
mais positiva e entusiasta:
Se, apesar da ênfase contemporânea na segunda retórica, a música for concebida em
termos da primeira retórica, onde a persuasão e não a beleza superficial são os objetivo da
arte, o relacionamento entre retórica e música é mais interessante e mais sugestivo. Assim,
uma atitude honrosa à percepção daqueles artifícios de retórica enquanto também
introduzir a possibilidade de técnicas analíticas que guardam coerência e unidade à
estrutura da fuga (HARRISON, 1990, p. 4).
Harrison argumenta ainda sobre a questão da utilização das figuras e a persuasão, própria da
retórica, afirmando que a “persuasão total de uma audiência é o único valor da primeira retórica. As
figuras, nesse caso, não são usadas por causa de sua beleza, mas por sua utilidade” (HARRISON,
1990, p. 4).
A seguir, Harrison cita Kennedy a fim de afirmar como a performance torna-se uma questão
importante para a retórica e como o pré-conhecimento da hora, do lugar e a reação imediata da
audiência são fatores preponderantes para a sua completa persuasão. Introduz, então, Quintiliano
que afirmava que o único fator que unia a música e a retórica, dentre as artes antigas, era a
performance. Para Quintiliano o dever do performer incluía também o design musical e delinear os
artifícios retóricos, tornando-os efetivos na performance. Seguindo o raciocínio de Quintiliano,
dentro do conceito de locus classicus, Harrison questiona e argumenta:
Como a fuga, em particular, manifesta qualidades associadas com a primeira retórica? Se a
tarefa da oratória é persuadir uma audiência da validade do ponto de vista de um orador, a
tarefa de uma fuga é persuadir uma audiência de que o material musical utilizado pode
tornar convincente e bem sucedida uma composição, e que o compositor tenha suficiente
técnica, controle e maestria para criar uma peça musical interessante tendo em vista os
vários obstáculos que a fuga, por natureza, imponha no caminho (HARRISON, 1990,
p. 5).
Harrison prossegue declarando que outra afinidade entre a primeira retórica e a fuga é o uso
de sujeito como base para o seu discurso, essa afinidade é facilmente entendida e, entretanto,
comumente citada por vários comentaristas de fuga e retórica (HARRISON, 1990, p. 6). Sendo
assim, algumas concepções de retórica e fuga permanecem, por exemplo, a estrutura formal da fuga
desenvolve-se conforme um discurso, onde as divisões estruturais são sugeridas, baseadas naquelas
da retórica clássica: exordium, narratio, divisio, confirmatio, confutatio, e conclusio. Quanto a essa
subdivisão, o autor menciona o fato de que os teóricos do período barroco eram muito interessados
no relacionamento entre o dispositio retórico e a estrutura da fuga e assim, tentaram desenvolver
correspondências compreensivas e detalhadas entre as duas, criando uma concepção de dispositio
formal e não de procedimento (HARRISON, 1990, p. 7).
Outro ponto interessante da discussão levantada por Harrison é aquele sobre a utilização das
figuras onde as mesmas possuíam, no passado, um valor análogo à estrutura, e eram partículas
manipuladas, muitas vezes com funções de movimento tonal. Hoje essas mesmas figuras podem ser
reconhecidas não com aqueles nomes, mas em escala semelhante, como é o caso do gradatio para
Burmeister, que é definido como um fragmento melódico que se repetia em seqüências de segundas
ascendentes (HARRISON, 1990, p. 7). Hoje, a análise compreende o sentido desse movimento,
independente de se reconhecer o nome da figura (gradatio).
Outro ponto de destaque no artigo de Harrison segue no início da análise, onde ele propõe
que a composição seja um discurso persuasivo em si mesmo e não uma coleção de ornamentos
como reflexo de um entendimento puramente estético. A análise deve trabalhar com as notas “do
discurso”, mas tendo em mente a realização musical dessas notas. Um status para a fuga deve ser o
cerne da análise, contudo, chamar o sujeito da fuga como o status da fuga, seria, segundo Harrison,
uma tomada de decisão “terrivelmente simplista”, pois a própria definição trazida por Harrison,
citada a partir de Quintiliano, reza que o status é um conflito conceitualizado gerando uma
necessidade de persuasão, além de determinar o caráter do discurso que será construído
(HARRISON, 1990, p. 10). Assim, a fuga torna-se uma espécie de argumento musical que
responderá, desenvolverá, ou trará a resolução para o status que foi gerado, produzido ou
organizado. Esse tipo de abordagem, para Harrison, valoriza sobremaneira a composição e a fuga
tomada em análise (HARRISON, 1990, p. 9).
A fim de se definir o status da fuga o autor sugere que se façam perguntas para a fuga e essa
por sua vez deve responder às questões: Qual o propósito persuasivo? Qual o significado efetivo
expressivo proposto? A resposta, de fato, dessas questões depende da natureza do sujeito, o
contexto em que a fuga aparece, assim como o momento da composição em que se julga tal
aparição (HARRISON, 1990, p. 9). Interessante lembrar que o status é um recurso artificial, pois
um problema ou conflito é criado pelo compositor a fim de encontrar uma solução para sua própria
composição. Também é preponderante citar que o status é uma abstração, ou seja, a música em si
não é o status, mas esse é estabelecido a fim de revelar soluções para a análise. Após o
estabelecimento desse, o analista pode concentrar-se em buscar soluções, dentro da própria estrutura
da fuga com o auxílio da análise tradicional e por meio dos processos usuais da retórica clássica
9
(HARRISON, 1990, p. 14). Foi devido a esse avanço do conceito de retórica musical em fugas
estabelecido por Harrison (1990), em oposição à idéia de Butler (1977), que sugere o abandono de
métodos de análise tradicional em fugas, que o escolhi como fundamentação para este trabalho.
9A teorização com relação ao decoro ao se proferir um discurso público que inclui os teóricos gregos antigos: Cícero e
Quintiliano, entre outros. Uma de suas categorizações é referente ao design de um discurso.
Assumindo a posição de Harrison (1990) na análise da fuga da Sonata para piano de
Camargo Guarnieri (1972), admito que outros recursos analíticos podem ser úteis para a
compreensão da obra, da fuga e para o estabelecimento do status. Partindo de uma situação
especulativa, ao estudar a vida do compositor, uma situação que muito me chamou a atenção foi o
fato de Guarnieri ter estudado, durante sua juventude e como constante em sua vida, a música e a
obra de seus contemporâneos (Schoenberg, Berg, Hindemith, entre outros) (GERLING, 2005, p.
102). Barros (2002) desenvolve um trabalho onde compara o Gradus ad parnassum de Fux e o The
Craft of musical composition de Hindemith e concluiu que o método de composição de Hindemith
“não é exatamente um substituto do Gradus, é no mínimo, um clássico moderno do gênero”
(BARROS, 2002, p. 88). Sendo assim, se Hindemith foi um dos músicos estudados por Guarnieri, e
sua teoria tenha sido comparada ao trabalho sistemático de Fux, procurei compreendê-la e aplicá-la
na fuga em questão.
Em seu livro, The Craft of Music Composition
10
, Hindemith procura ser íntimo, intercalando
comentários e opiniões pessoais. Logo de início, afirma que, a fim de conferir coerência para sua
obra o compositor deve escolher a escala que será utilizada na obra ou trecho e, essa escala pode ser
maior, menor, modal, cromática ou ainda, ser uma escala artificial que lhe seja útil (HINDEMITH,
1970, p. 25). Um ponto preponderante para a teoria de Hindemith, como outros tratadistas do século
XX, todas as suas demonstrações procuram ser embasadas por intermédio da série harmônica, a
origem dos intervalos, a sobreposição das tríades e a formação das tétrades. Com relação à
classificação dos intervalos, Hindemith inicia com os conceitos de consonância e dissonância, assim
como compreendidos por Fux. Mais adiante, esses conceitos são expandidos e o contexto de cada
ocorrência é considerado para a classificação (p. 37).
Para o autor, todos os compositores hoje fazem uso de alguma harmonia estendida e de
relações melódicas que resultam de material oriundo da escala cromática e não simplesmente de um
super abarrotamento das funções tonais da escala diatônica (p. 47). Assim, a adoção da escala
cromática permite entender a harmonia e a melodia em uma ininterrupta série de semitons e, tudo o
que pode ser expresso na escala diatônica, pode ser melhor compreendido por meio da escala
10 Este livro foi editado em 1941 e reeditado em 1970.
cromática (p. 48). Outro ponto estabelecido pelo autor é que todo intervalo é formado pela conexão
de duas notas, sendo essa conexão a unidade básica para a construção musical (p. 57). A respeito
das inversões dos intervalos, Hindemith postula que, exceto a e a 5ª, todos os outros intervalos
carregam uma carga de peso e de força, produzido por intermédio da série harmônica que os gerou
(p. 64). Assim as combinações de notas representam relações obscuras ou situações de acréscimo de
peso para a passagem. Isso não chega a ser tão exagerado que se necessite suprimir qualquer nota.
Em cada sucessão de intervalos a carga dos predecessores é adicionada produzindo um acúmulo de
energia, peso e força atrativa (p. 65).
Nesse tratado de composição Hindemith descreve como todos os intervalos, as tríades e as
tétrades são naturais e oriundos da série harmônica, a partir de cálculos conhecidos pelos meios
físicos. A partir da compreensão das relações entre as série 1 e 2
11
(p. 84) com as superposições de
séries, as segundas e as sétimas maiores tornam-se mais ouvidas mas não mais familiares e essa
aquisição não está dentro do ambiente natural dos intervalos propriamente ditos (p. 86). Portanto,
para o autor “os intervalos não são como o barro, que recebem uma impressão e fielmente a
preservam até que uma próxima [impressão] a torne obsoleta e a apague”; eles são elásticos, mas
não completamente flexíveis, por exemplo, uma sétima sempre será uma sétima (p. 86). Ao usar
um ou outro intervalo, o compositor deve ter em mente a força latente neles, além de uma
determinada prevenção, por meio de uma atitude simples de escolha livre “não que possamos
colocar a principal força selada e crua no material e em sua forma, sem considerar a elasticidade
estrutural natural” (p. 86 – 87).
Existem muitas possibilidades de combinações de harmonias, e as graduações entre elas
são inumeráveis. A grande quantidade de material ordena a consideração do compositor,
“inspiração” e a invenção pode ser efetiva somente como muito para um adequado
conhecimento técnico (p. 87)
Harmonia e melodia são elementos complementares quase mutualistas, grupos melódicos
movimentam-se em vagarosas massas de harmonias para que nenhuma progressão harmônica possa
11 A série harmônica 1 é a real, produzida a partir de um som gerador. A série harmônica 2 é produzida através de cada
som gerado, isto é, cada nota dentro de uma série produziria um a outra série que entraria em relacionamento com
aquela “série matriz”.
ser realizada exceto através da melodia, a qual é formada pelos intervalos, sendo que esses
organizam as ondas da melodia (p. 87).
Quanto à análise dos acordes, esses revelam um novo sistema de análise, segundo
Hindemith, seguindo um determinado fator e criticando a convencional teoria da harmonia: 1) a
construção por terças não deve ser a grande base para a formação dos acordes; 2) deve-se converter
todos os acordes para o princípio da inversibilidade; e 3) abandonar a idéia de que os acordes são
suscetíveis a várias interpretações (p. 94). Depois de elencar esses três princípios básicos,
Hindemith estabelece justificativas para cada princípio, afirmando que três sons simultâneos nem
sempre formam uma tríade ou um acorde, pois se dois desses sons forem uníssonos, eles
continuarão a formar apenas um intervalo. Acordes são simultaneidades de intervalos diversos,
gerados a partir da série harmônica, quer da série 1 ou da 2, daí sua natureza de não depender da
sobreposição de terças, visto que o trítono é encontrado a partir da série 2. Assim, uma
categorização entre os acordes pode ser estabelecida por meio de dois grupos, o Grupo A,
incluindo acordes que não possuem o trítono e, o Grupo B acordes com o trítono (p. 96). Ao
considerar que os acordes são suscetíveis à inversão, Hindemith deixa claro que um número
surpreendentemente maior de acordes passa a ser considerados e que, ao se trabalhar com os
acordes, sua fundamental deve ser determinada por intermédio de uma hierarquização entre a força
dos intervalos (p. 99). Nesse aspecto a teoria de Hindemith, no meu entender, é passiva à percepção
natural dos intervalos, visto que quase nunca se dispõe de aparelhos para medir a capacidade
atrativa entre uma e outra nota. O autor estabelece que a série harmônica ainda é o fator de maior
relevância. Assim, uma justa é mais forte que uma 3ª, por exemplo, porém essa é menos
atrativa que uma 4ª, e a torna-se igual ao uníssono. Para Hindemith, os acordes que se encontram
invertidos, isto é, cuja fundamental não é igual à nota de base para esses acordes, são subordinados
aos acordes que se encontram na posição fundamental, visto que esses são mais estáveis que aqueles
(p. 100). Ao considerar a natureza de cada intervalo como base para a formação de um acorde, a
força exercida por sua fundamental e a subordinação ou não deste em uma progressão, não há como
considerá-lo de maneira variada (p. 100), visto que as notas que formam um acorde vão formar,
naquele arranjo, somente aquele acorde.
A tabela que segue é encontrada no final do livro de Hindemith e contém uma lista dos
acordes considerados, suas subordinações e o lugar como e onde se encontram hierarquizados. Os
dois grupos, A e B, são constituídos por acordes distintos e os níveis de tensão entre os acordes,
quer das subdivisões, ou dentro de cada grupo, são notadas e ouvidas de maneira clara e perceptível.
(HINDEMITH, 1970, p. 224)
(HINDEMITH, 1970, p. 225)
2. Análise da fuga da Sonata
A fuga analisada compõe o terceiro movimento da Sonata para Piano de 1972 de Camargo
Guarnieri. Como obra, a Sonata, em si, representa um marco na literatura para piano no catalogo do
compositor, a fuga aqui tomada em análise, como parte de uma obra constituída por vários
movimentos “atesta muito claramente seu triunfo pessoal sobre as vicissitudes da vida”
(VERHAALEN, 2001, p. 177).
'Triunfante Enérgico (Fuga a 3 partes) Triunfante' são os subtítulos do terceiro
movimento dessa sonata, assim a fuga encontra-se como centro do movimento, como corpo e em
posição de destaque. O Triunfante, composto por onze compassos de introdução para a fuga, é
constituindo por “acordes violentos” de acordo com Guarnieri (1998), intercalados por acordes
súbitos, etéreos, em pianíssimo. O exemplo 1, traz o trecho do movimento. Não me detendo a essa
introdução, menciono como o encadeamento desses acordes é realizado por sucessão seqüencial de
blocos, ou pilares, com a mesma formação. Esses blocos possuem, apesar de serem organizados de
diferentes maneiras, os mesmo intervalos, resultando em sonoridades formadas pela mesma razão
intervalar, entre si.
Ex. 1. Introdução, c. 1-11.
As sucessões, como sugeridas por Hindemith (1970) compreendidas sob a luz da força
exercida pelos intervalos entre si (HINDEMITH, 1970, p. 101), podem ser compreendidas como um
movimento de segundas sobrepostas e justapostas articuladas e manipuladas de maneira a
demonstrar quão flexível pode ser o som que, de fato, virá a ser projetado na relação
densidade/tempo (HINDEMITH, 1970, p.102,107), organizados em grandes compassos de 2/4, 3/4,
4/4 , como o exemplo 2 se mostra.
Ex. 2. Organização dos acordes, c. 1-4.
Certamente a força exercida pela construção desses acordes e sua posição estrutural para
com a fuga é grande e determinadora e um caráter enérgico que é atribuído, pelo compositor à fuga.
O fato dessa introdução ser construída por segundas empilhadas acarreta em um clima e tensão
estrutural que será aguardado no decorrer da fuga. Visto que o intervalo gerador da sonata toda foi o
de sétima e, aqui, nessa introdução a segunda torna-se a inversão da sétima.
A essa introdução segue a fuga, que é a 3 vozes e pode ser visualizada, de maneira geral,
pela seguinte tabela
12
:
Tabela 1. Quadro de ocorrências no centro musical da fuga.
O sujeito dessa fuga apresenta a extensão de oito compassos e um direcionamento melódico
12 Carramaschi (1987, p. 107) divide a fuga em Introdução (c. 1-11), Exposição (c. 12- 47), Episódio (48-95), Stretto
(c. 96-104) e Coda (c. 105-112), Triunfante (113-130). Guarnieri, no prefácio da sonata, menciona três exposições e
um “stretto”. No meu entender, as divisões de Guarnieri podem incluir subdivisões, como demonstro neste trabalho.
apoiado por intervalos de 4ª justa e 5ª justa, permitindo enquadrar essa melodia naquilo que Graves,
Jr. (1962) considera como sujeito atonal diatônico livre (GRAVES, JR., 1962, p. 2) e, ritmicamente
algumas síncopas são enfatizadas, por isso, a meu ver, o próprio compositor afirma que o caráter
desse tema é “...rítmico e lembra o gingado pernóstico carioca” (GUARNIERI, 1998, p. 5). Assim,
o compositor a fim de enfatizar esses caráter rítmico e percussivo dessa melodia insere a expressão
rude, além de acentuar cara nota com o sinal > (marcato).
Estruturalmente, as notas melódicas desse tema são intercaladas por pausas. Essas pausas
sugerem agrupamentos que permitem a formação de acordes baseados a partir de cada um dos
agrupamentos, considerando cada uma e todas as notas com valor e peso harmônico, delimitados,
dessa maneira, destacados no exemplo 3:
Ex. 3. O sujeito da fuga e suas divisões, c. 11-19.
Noto como o sujeito dessa fuga é iniciado com um intervalo de quarta e encerrado também
com um intervalo de quarta, mantendo uma distância de sétima, entre um intervalo para com o
outro. Com essa possibilidade de estruturação, o tema apresenta-se claro, marcante e auto-suficiente
em sua capacidade expressiva, sendo essa uma das principais características e exigências para uma
melodia de tema para fuga, como aponta Carvalho (2002) (CARVALHO, 2002, p. 130), prevendo,
com essas características um plano a ser cumprido ao longo da fuga.
Lembrando que essa fuga é um movimento dentro de uma obra maior, o tema pode ser
percebido como uma ênfase ao intervalo de sétima que fora utilizado no primeiro movimento da
sonata (sol# - lá). Agora, na fuga, como afirma Graves, Jr. (1962), não interessando a utilização de
bemois ou sustenidos, representando uma liberdade na notação e o direcionamento podendo ser
variado (GRAVES, Jr., 1962, p. 7), ao selecionar as primeiras notas de cada grupo que fora
caracterizado no exemplo anterior, obtem-se outras sétimas que, como destacadas no exemplo 4,
por sua vez, colaboram para manter a unidade motívico-temática da sonata, agora, projetado, em
outra escala, na fuga. Essa projeção ainda acarretará em outras considerações a serem observadas no
decorrer da fuga.
Ex. 4. Unidade temática da Sonata no sujeito da fuga, c. 11-19.
Sendo uma fuga com caráter harmônico atonal, com uma textura à 3 vozes, o tema inicia
com a nota Ré, na voz intermediária. A seguinte entrada, como destacada no exemplo 5, é realizada
na voz inferior e imita o sujeito a uma quinta. A imitação acontece de maneira real, conforme o
costume em fugas no século XX (GRAVES, Jr., 1962, p. 16).
A voz intermediária segue o seu curso acompanhando a resposta, constituindo o
contra-sujeito (Exemplo 6). Esse é colocado estruturalmente em momentos de pausa da resposta,
assumindo, também uma função de preenchimento, além de sua função original de contrapor-se ao
tema.
Ex. 6. Resposta e contra-sujeito, c. 19-29.
Ex. 5. O sujeito e a resposta, c. 11-26.
O material melódico desse contra-sujeito possui um direcionamento mais oscilante que o do
sujeito, onde intervalos de e de são utilizados, intercalados com fragmentos de escalas
cromáticas, formando padrões escalares artificiais
13
, delimitando oitavas como extensão para esses
padrões, o exemplo 7 traz três padrões escalares denotados no contrasujeito dessa fuga. Hindemith
(1970) sugere como dever do compositor escolher ou criar, no momento necessário, a escala a ser
utilizada no trecho da obra (HINDEMITH, 1970, p. 26).
Uma questão importante ao se afirmar que o material utilizado caracteriza-se do contra-
sujeito é o fato de se utilizar contraponto duplo. Graves Jr. (1962) afirma que o padrão da antiga
regra, para o emprego de consonâncias e dissonâncias, de contraponto continua valendo, e que o
padrão mais comum é o à oitava (GRAVES, Jr., 1962, p. 18) porém, padrões especiais, podem,
13Escala artificial é aquela criada pelo compositor, que não esteja de acordo com os padrões escalares “naturais”
(maior, menor, pentatônico, hexatônico, ou modal)
Ex. 7.Tipos de escalas no contra-sujeito.
consideravelmente provocar mudanças nessas relações: 1) grande liberdade na manipulação e 2)
liberdade tonal ou rítmica na inversão tomada (GRAVES, Jr., 1962, p. 18). Aponto, também, como
o conceito de consonância e dissonância, na música moderna ou do século XX torna-se um conceito
amplo e flexível (GRAVES, 1962, p. 34). Guarnieri, nessa fuga segue a regra do contraponto duplo
a sua maneira, dentro do contexto “diatônico livre” de sua obra. A sétima e a nona, são intervalos
fortes e característicos desta composição, sendo mantidos e utilizados para enfatizar o caráter
estrutural (de tensão) como sugerido no plano da fuga. O exemplo 8, abaixo, porcura demarcar a
coeerencia e manutenção da tensão estrutural mantida ao longo da exposição dessa fuga:
O caráter desse contra-sujeito é, sem dúvida, mais melódico que o do sujeito, devido ao uso
de ligaduras, que enfatizam essa condição. A sonoridade sugerida pelo compositor é piano. Assim,
a característica desse elemento, do contra-sujeito, é melódico-legato e piano, contrastando
diretamente com o sujeito que era, e é mantido na resposta, forte, rítmico e marcato.
O tema é apresentado pela terceira vez na voz superior, enquanto a voz inferior realiza o
EX. 8. Pontos de projeção no contraponto duplo, c. 27-34.
contra-sujeito. A voz intermediária apresenta um contraponto livre que é um misto do material que
fora apresentado anteriormente pelas outras duas vozes com um caráter mais cromático. Ao mesmo
tempo, esse cromatismo dá origem ao primeiro episódio que segue (c. 35).
O primeiro episódio (c. 36 47) é compreendido a partir do último fragmento do sujeito
com um cromatismo proveniente do contra-sujeito. De fato, apontando especificamente par as vozes
externas, utilizam-se quartas oriundas do sujeito e as síncopas enfatizadas pontualmente no sujeito,
enquanto a voz intermediária adota um cromatismo proveniente do contra-sujeito que dera origem
ao contraponto livre que ocorrera durante a terceira entrada do tema na exposição. Todo esse
episódio ocorre como uma continuação imediata ao final da exposição, com a mesma fluência de
modo a ser mantida a fim de atingir um nível mais elevado de tensão. A textura mantida entre a
exposição e esse episódio é de construção de uma trama à três vozes e manutenção dessas,
terminando o trecho com uma seqüência de acordes com quartas (na mão direita) e intervalos de
nonas (na mão esquerda), gerando uma aglomeração de sons, seguidos por uma fermata de silêncio
(c. 46 47). O exemplo 9 traz apontado as sícopas oriundas do sujeito o cromatismo do
contrasujeito e finaliza com os acorde de quartas e nonas, como descrito anteriormente.
Ex. 9. Final do 1º episódio, c. 42-47.
A primeira reexposição ocorre em Mib (c. 48 55) e inicia com uma drástica mudança de
textura, uma vez que a voz intermediária desaparece, além da distância entre as vozes aumentar em
uma oitava. O tema aparece uma única vez, na voz superior, com o contra-sujeito acompanhando na
voz inferior. O caráter dessa passagem, embora seja constituída por uma transposição exata dos
elementos melódicos da fuga ocorrendo uma diferença de distância intervalar na imitação entre as
vozes (agora o intervalo de é mantido entre as entradas do tema e do contra-sujeito), é em
pianíssimo jocoso, com uma refinada articulação em stacato para a mão direita. O exemplo 10
contém o trecho extraído da primeira reexposição.
O material que segue poderia fazer parte dessa exposição já que as vozes são invertidas, mas
no meu entender deve ser chamado de episódio, pois logo em seguida uma dissolução do sujeito
e do contra sujeito em seqüências (c. 60 69). Por isso, denomino o compasso 56 como início de
um novo episódio. Nesse episódio, que se mantém à duas vozes, a voz inferior é duplicada por
Ex. 10. 1ª Reexposição, c. 48-55.
oitavas na mão esquerda e uma seqüência é realizada enfatizando a síncopa, característica do
sujeito, essa progressão realizada ocorre em quartas seguindo uma progressão ascendente e
resolvendo com o trítono descendente Sib Mi no compasso 69. A mão direita, nesse momento,
parte de seu motivo cromático oriundo do contra-sujeito expandindo esse intervalo para a distância
de segunda e sétima, realizando uma seqüência com esse material em movimento descendente, até a
parte central do piano.
A próxima reexposição (c. 69-95) ocorre com elisão com término do episódio anterior, no
compasso 69 com a nota Mi. O movimento que antecedeu a reexposição foi um grande movimento
contrário o que, a princípio sugere uma mudança de voz intermediária na mão esquerda com o tema
completo. Com a volta da voz intermediária (c. 77) a textura passa a ser de três vozes numa
construção paulatina de uma textura cada vez mais densa. O sujeito ocorre na voz inferior (c. 69) e
o contra-sujeito na superior. O contraste de articulação entre as vozes retorna como no início da
fuga e de maneira contrária ao da reexposição anterior (c. 48), essa articulação mais incisiva
colabora com o aumento da tensão textural e sonora.
O contra-sujeito, nessa reexposição, é abandonado e um prenúncio de stretto é realizado (c.
77). A voz superior realiza o tema quase completo e muito marcato como na exposição do tema. A
voz intermediária reaparece em fragmentos melódicos. A voz inferior realiza um contraponto livre
onde elabora, sobremaneira, as quartas que foram omitidas no final dessa reexposição do tema.
Como mencionado, o tema não ocorreu totalmente nessa reexposição, provavelmente, devido ao
prenuncio do stretto que é realizado, assim como a eliminação do contra-sujeito (c. 77-83).
A partir do compasso 84 o tema retorna, ainda incompleto, na voz inferior agora iniciando
com a nota b. As vozes superiores realizam um contraponto livre derivado do material melódico
do sujeito. O exemplo 11 mostra a segunda reexposição e o inicio da terceira reexposição.
Com uma super intensificação da textura (c. 89 95), ocorre o próximo episódio, onde cada
voz realiza um movimento completamente independente das demais. A voz superior desenvolve as
síncopas enfatizadas no tema. A voz intermediária contém uma progressão nova e livre, numa
rítmica que ainda não havia sido utilizada. O desvio rítmico usado nessa vez caracteriza um artifício
comum em fugas do século XX afim de não comprometer a fidelidade da condução das vozes
(GRAVES, Jr., 1962, p. 21). A voz inferior realiza uma seqüência com o fragmento cromático que
outrora caracterizara o contra-sujeito. Essas três vozes sobrepostas, movendo-se em movimento
contrário, conferem uma tensão de grande nível de estruturação, pois logo a seguir virá o Stretto (c.
96) em fortissimo. O exemplo 12 mostra toda a elaboração que constitui o esse último episódio que
antecede ao stretto.
Ex. 11. 2ª Reexposição, c. 69-78.
Com esse stretto a textura é simplificada, ou reduzida a duas vozes, mas enfatizadas
por dobramento com oitavas. O stretto também é realizado à oitava sendo artifício comum à música
do século XX a fim de manter a densidade textural em uma trama com menos vozes
(CARRAMASCHI 1987, p. 100; SEARLE, 1954, p. 32)., assim, a tensão estrutural é mantida e até
mesmo acrescentada.
Ex. 12. Superintensificação do episódio, c. 89-95.
A última reexposição do tema (c. 105) inicia na nota Ré, assim como na exposição da fuga,
agora estreitado (sem as pausas) dobrado em oitavas na mão direita e um acompanhamento
contraponteado baseado em quartas que são movimentadas de maneira ascendente, da região grave
do piano até a região central. Uma pequena ponte liga o final dessa reexposição (que não apresenta
o tema completo) conduz para a coda que possui uma estrutura semelhante à aquela que foi
utilizada na introdução. O exemplo 14 apresenta a última reexposição. Antes porém, de comentar
sobre a coda, é interessante perceber como a última reexposição junto com essa ponte conduzem
para a coda. Uma projeção da sétima inicial da sonata é sugerida mais uma vez de maneira sutil,
extremamente elaborada com coerência e equilíbrio.
Ex. 13. O stretto, c. 96-103.
A coda do movimento possui o mesmo material cordal que fora empregado na introdução, a
indicação 'Triunfante' é mais um vez utilizada e agora, sobre aqueles 'acordes violentos' ouve-se em
uma sonoridade etérea e em ritmo fragmentado o tema da fuga com uma articulação em stacatto,
como visto no exemplo 15. Podendo demonstrar quão único pode ser considerado material utilizado
na composição desse movimento como um todo, como afirmado anteriormente.
Ex. 14. Última reexposição, c. 104-112.
Ex. 15. Coda, c. 113-115.
Um rallentando por extenso é utilizado, por Guarnieri, nos últimos compassos do
movimento, visto no exemplo 16, que dessa maneira prevê uma rarefação da sonoridade, após uma
pausa de semínima a nota Mi é atacada, a tempo, em fortíssimo crescendo para muito fortíssimo.
A maneira como Guarnieri organiza o material utilizado nesse movimento demonstra um
total controle do material utilizado. Todos os elementos utilizados na composição e que se
caracterizam na fuga remetem-se à sétima que originou o primeiro movimento (e como
conseqüência os demais, em particular essa fuga), sugerido no tema da fuga do terceiro movimento
e com projeção na fuga como um todo e em elementos mais pontuais da fuga. Um exemplo dessa
projeção é a estrutura de sétimas formada por notas permeadas. Após a exposição da fuga, as
primeiras reexposições podem ser compreendias relacionando-se voz à voz formando pares de
sujeito e resposta, em relação de terça, como mencionado por Graves, Jr. (1962) sobre a liberdade
possível em fugas do século XX. Da seguinte maneira:
Ex. 16. Rarefação sonora dos acordes, c. 123-130.
Em elementos pontuais na fuga, a projeção do sujeito ainda pode ser notada, por exemplo,
na concatenação entre a última reexposição e a ponte que conduz para a coda do movimento, como
observado no exemplo 14.
Ex. 17. Relação de terça – voz à voz nas reexposições do sujeito da fuga.
3. Abordagem Retórico-Musical
Como proposto anteriormente, utilizei Lester (2001), Harrison (1990) e Hindemith (1970)
como fundamentação para a abordagem central deste trabalho. Porém, acho válido mencionar que o
sentido da persuasão, pertinente à retórica, não é um conceito pré-estabelecido, e qualquer tentativa
de persuasão é condicionada, pelo menos, a mais de uma pessoa.
O ato de persuadir pressupõe um destinatário que compreenda e saiba avaliar os respectivos
argumentos, o que implica em reconhecê-lo como centro das suas próprias decisões (SOUSA, 2003,
p. 47). Adiciono a esse sentido, o de não persuadir passivamente, mas com uma interação, uma
citação sobre o pensar persuasivo:
Não basta por isso falar fluentemente, colocar bem as palavras, fazer um discurso que
emocione e cative o auditório. Mais do que construir frases de grande efeito, mais do que
dominar as técnicas do dizer, é preciso saber pensar, articular as razões ou os argumentos,
perceber as eventuais objecções, decidir sobre a sua pertinência, acolhê-las ou rejeitá-las,
segundo se mostrem ou não passíveis de enriquecerem as respectivas propostas. E acima
de tudo, é necessário ter sempre presente que o falar faz sentido se for a expressão de
um raciocinar. É esta competência argumentativa que se assume como requisito da
retórica a um tempo eficaz, racional e livre (SOUSA, 2003, p. 4).
Dessa maneira, o interesse de Harrison (1990) sempre continuará atual, por mostrar como o
pensar ativo sobre a obra estudada é o que realmente leva a persuasão e não uma apreciação ou
percepção passiva de um assunto ou obra musical em questão. Harrison sugere que se questione:
Qual o propósito persuasivo? e Qual o significado efetivo proposto? E que as respostas dessas
perguntas estariam no status que foi definido como elemento de geração de tensão argumentativa.
Em uma fuga esse status representa uma condição inerente ao sujeito, que vem a ser o inventio da
composição e como proposto por Lester (2001). Esse admite que o inventio será mantido e
projetado durante toda a composição a fim de lhe garantir unidade, coerência e equilíbrio.
A seguir, passo propor uma visão retórico-analítica estrutural para a fuga da Sonata para
piano de Camargo Guarnieri. O padrão de divisão em seções será similar ao utilizado por Harrison
(1990), que segue padrão de design da retórica clássica.
O Inventio e Exordium
Na fuga da Sonata para piano (1972) observo como algumas interações entre elementos e
como esses se articulam durante a composição. O sujeito da fuga não caracteriza nenhuma
tonalidade, mas aparece em um atonalismo com diatonicismo livre, como afirmado anteriormente.
Divisões hierárquicas do sujeito podem ser realizadas como demonstrado anteriormente. Na busca
por um status para esse sujeito, esses elementos foram preponderantes conforme comento adiante, e
visto no exemplo 18.
A partir dos intervalos das notas do sujeito foi possível construir acordes que, analisados de
acordo com Hindemith (1970), possuem e mantém uma hierarquia, gerando um determinado ciclo
de tensão. Como já exposto, as notas inicias de cada grupo de acordes mantém, entre si, a relação de
sétima, a qual gerou o primeiro movimento da Sonata, além de representar uma figura de retórica,
em uma utilização e representação moderna palindrome
14
. Guarnieri faz esse tipo de elaboração
com esse tema mostrando um pensamento ousado, além de procurar uma total liberdade com
relação as “amarras” da forma.
14 A repetição em espelho.
Ex. 18. Arco de tensão do status.
Essas duas ocorrências caracterizaram, para mim, um determinado status para o sujeito e as
questões sobre o qual seu real significado persuasivo levaram-me a procurar por sua projeção ao
longo da fuga. Um movimento de tensão relaxamento tensão é o tipo de movimento realizado
no sujeito, e a insistência no intervalo de sétima é uma característica peculiar a essa obra.
Com a determinação do status, o inventio, caracterizado pelo enunciado do sujeito a seção
de abertura da fuga começa a apresentar elementos de ordem retórica. A sua resolução como
argumentos persuasivos podem tomar projeções ao longo da fuga, tornando-se elementos de
Ex. 19. Palíndrome.
Ex. 20. Contorno melódico do segundo grupo do sujeito - ênfase para as sétimas.
unidade estrutural para a fuga. A exposição da fuga, por exemplo, pode ser considerada uma outra
repartição de design, designo como exordium.
Tabela 2. Primeira repartição retórica – Exordium.
A tabela 2, acima, mostra a demarcação da primeira subdivisão retórica dessa fuga.
Demonstrando, como mencionado anteriormente como a retórica pode ser articulada à outras
mameiras, também pertinentes, de análise, nesse caso, para a música do século XX.
A interação do sujeito com o contra-sujeito, na entrada seguinte ao enunciado, mantém as
mesmas características com um acréscimo de tensão, visto que existem duas vozes combinadas
nesse momento. Além do mais, o contra-sujeito é construído sobre combinações de escalas
cromáticas onde a mais características delas dividida pelo trítono e agindo como elisão para a
unidade da melodia. Assim, a escala cromática assume um papel preponderante nessa
contextualização.
De fato, com a entrada da terceira voz, a soma do resultado sonoro obtido pela sobreposição
de sujeito, contra-sujeito e mais um contraponto livre derivado do cromatismo do contra-sujeito,
assim como a ênfase intervalar do sujeito, resulta em uma textura bastante densa sem nenhum
centro definido. Articulando, somente, a continuação da exposição inicial da fuga, com a relevância
de garantir maior coerência através da utilização dos materiais mencionados. A densidade dessa
textura eclodirá em um episódio totalmente vinculado à exposição e como derivação absoluta dessa.
Ex. 21. Projeção do status no sujeito e no contra-sujeito.
Tabela 3. Design da fuga para a exposição.
A tabela 3 mostra as seções retóricas compreendidas no exordium (exposição da fuga) e
primeiro episódio dessa fuga.
O dispositio
Denomino a posição estrutural desse episódio como o início do dispositio, pois repartições
caracterizadoras de forma podem ser delineadas. Dessa maneira, as funções formais estruturais, em
cada trecho ou seção da fuga, recebem uma força persuasiva dentro de sua própria estrutura, além
de manter a coerência dentro do plano discursivo da própria fuga. A tensão, dentro desse episódio,
está sempre aumentando até que acordes são vigorosamente percutidos em um aglomeramento de
tensão, que formará uma figura de retórica musical, o abruptio
15
.
15 Uma interrupção por meio de silêncio para quebrar a textura quando isso não é esperado (BUELOW, 1980, p. 800).
A reexposição que segue ao abruptio (c. 47) ocorre como resultado da quebra de textura
drasticamente movida pelas pausas sobre o silêncio. Pode-se argumentar que essas pausas poderiam
ser geradoras de tensão, mas a meu ver, isso não ocorre, pois a música que segue, a reexposição,
ocorre em um caráter jocoso e num clima em pianíssimo. Aquele aglomeramento sonoro (c. 43-47)
teve a sua função estrutural realizada, ou seja, houve persuasão. Uma expectativa sem par, até então
na fuga, fora ouvida, como reflexo da primeira parte do sujeito da fuga.
Ex. 22. O dispositio, c. 36-47.
Tabela 4. O design geral da fuga.
Ex. 23. Abruptio e Narratio, c. 46-49.
O Narratio
Após esse relaxamento da textura (c. 48), duas vozes são mantidas em uma articulação leve
(staccato) com pianíssimo, com uma distância de duas oitavas separando as vozes envolvidas.
Silenciando toda a tensão sonora que fora ouvida anteriormente, agora, como se um novo inicio
estivesse sendo, estruturalmente, realizado, por isso, destaco como um novo design, por narratio. A
seqüência construída logo a seguir (c. 56) mantém essa mesma tensão na textura como
desenvolvimento para a fuga. A música prossegue seu plano, agora com uma inversão de
movimentos entre as duas mãos (c. 56) e, uma aproximação de registros entre as vozes é realizada
até que um ponto de elisão entre o final dos movimentos seqüenciados e o início de uma nova
reexposição é atingido (c. 69).
O Confutatio
É justamente neste momento que o confutatio inicia-se. A elisão traz em si uma nova carga
de capacidade persuasiva e uma nova categoria de elementos de tensão podem ser notados. A carga
de tensão atraída pelo movimento contrário, torna-se, estruturalmente oposta ao movimento que
fora realizado anteriormente. A carga expressiva da passagem começa a se “auto” questionar. Por
isso denomino de confutatio.
A textura se mantém a duas vozes com uma distância menor entre essas vozes (apenas uma
oitava as separa). No entanto, o mais interessante é a questão do registro utilizado. A voz mais
grave deste trecho passa a percorrer o registro usado pela voz intermediária (c. 69). No entanto, ela
é a voz mais grave propriamente dita. As pausas pertencem à voz inferior e com isto, as vozes
começam a se aproximar através de um adensamento gradativo. Porém, ao iniciar a próxima
reexposição, a textura passa novamente a três vozes (c. 76), sendo que as duas vozes ouvidas até
esse momento mantêm seus planos e cursos livremente, com uma nova voz permeando-as. Esse
adensamento entendo como uma maneira de criar um crescendo de tensão no resultado para o final
do trecho, como o arco de tensão planejado pelo status do sujeito previa.
A terceira reexposição do tema (c.77) ocorre com uma intensificação dos elementos. A
escala cromática torna-se soberana na linguagem e no “tom” do discurso. O sujeito retoma a
articulação percussiva da exposição e nesse ponto, o contra-sujeito é abandonado. Um prenúncio de
stretto é ouvido, como destacado no exemplo 24, porém o tema não é ouvido na sua íntegra. As
quartas do final do sujeito são omitidas, mas aparecem justamente na voz inferior, visto no exemplo
25, sobrepondo-se ao stretto, sendo realizada uma polifonia rebuscada. As três vozes tecem esta
polifonia com apenas o material do sujeito.
EX. 25. Valorização do sujeito através das quartas e prenúncio do stretto, c. 77-78.
Ex. 24. Valorização do sujeito através das quartas e prenúncio do stretto, c. 77-78.
Outra reexposição é iniciada com o tema em b (c. 84), mostrado no exemplo 26, onde as
três vozes enfatizam as quartas e segundas, ou seja, inversões das sétimas presentes em toda a
Sonata, sobretudo no primeiro movimento e como unidade temática nessa fuga.
Se esta reexposição do tema (c. 84) suprime as quartas do final da melodia, essas são
ouvidas, como anteriormente citado, por sobreposição, no exemplo 27, formando agora intervalos
de quartas harmônicas, quer aumentadas, quer justas, desembocando em um novo episódio (c. 89).
EX. 27. Quartas harmônicas, c. 88.
Ex. 26. Projeção do status e intensificação da unidade temática, c. 84-88.
O último episódio (c. 89) eclode como o primeiro (logo após a exposição). O grau de tensão
agora, operado texturalmente ou por razão intervalar, é grande, e uma profusão de sétimas (maiores
e menores), nonas (menores) e quartas são ouvidas: sobrepostas, justapostas e contrapostas. Um
acúmulo de tensão é erigido junto a essa massa sonora e a dinâmica utilizada é um crescendo de
forte para fortíssimo. Os três princípios destacados por Lester (2001) menciona como as seções
paralelas e a interseção entre os elementos utilizados e construídos são consonantes com as idéias
de retórica musical (inventio e o dispositio). De fato, considero que esse episódio esteja articulado
em oposição àquele que segui a exposição, pois naquele momento ocorreram três entradas do tema,
gerando uma tensão tal, eclodindo em um episódio de alta gama de tensão, proporcionando uma
expectativa. A tensão foi interrompida através do abruptio (c. 47) quebrada por uma figura de
silêncio
Agora, o episódio (c. 89) segue três entradas do tema e, de maneira livre, sem a preocupação
com a relação intervalar de imitação, um nível semelhante de tensão é gerado através de sétimas e
quartas. O stretto resolve a tensão e ao mesmo tempo prepara o ouvinte para a última reexposição
da fuga.
EX. 28. Intensificação maior atividade no último episódio, c. 89-95.
O Stretto e o confirmatio
O stretto (c.95) é duplicado por oitavas e sofre um encurtamento, as pausas que eram de
certa forma estruturais, na exposição, e ao longo da fuga como um todo, são extraídas permitindo
que uma aproximação maior entre as entradas do tema seja realizada. Percebo duas funções tópicas
desse estreitamento do tema, uma sendo a geração de uma ênfase par ao intervalo de quarta e a
outra como processo para enfatizar a natural necessidade de se ouvir o tema após uma grande soma
de tensão sonora. A dinâmica em fortíssimo e uma ênfase dada ao primeiro intervalo de quarta do
tema, argumentam a favo de uma resolução prévia antecipando o final da obra tornando esse stretto
parte do confirmatio como resolução final para a fuga.
A posição desse stretto vem a caracterizar mais um item da abordagem retórica como
resolução para um aglomeramento de tensão. Uma resolução que, de maneira alguma, relaxa em sua
própria condição estrutural gera sua intensificação. A duplicação de oitavas, juntamente com a
dinâmica corrobora com essa reexposição do tema, além dessa mesma reexposição em stretto estar
vinculada ao status planejado no sujeito da fuga. A esse respeito Harrison (1990) comenta sobre
como esse procedimento pode “preparar a audiência para o final do discurso” (HARRISON, 1990,
p. 33) buscando por pontos para uma resolução mais intensa dos argumentos prévios da fuga.
A textura da reexposição final é de duas vozes, cada qual duplicada com oitavas, mantendo
Ex. 29. O stretto, enfatisando as quartas. Funcionando como Confirmatio.
dessa maneira, a intenção geral de resolução total para todas as vozes. O intervalo de quarta justa,
proveniente do início do tema e fora enfatizado no stretto é agora o material de base para essa
última reexposição. Demonstrando como o valor inerente ao próprio locus que é de alta tensão
como previsto no plano e no status da fuga. Resolvendo com argumentos claros e pertinentes ao
contexto o conflito gerado pelo status e intensificado ao longo da fuga, e resolvido com o
confirmatio com foi anteriormente mencionado.
Antes de encerrar essa abordagem, é importante mencionar outras projeções do sujeito e do
status no decorrer da fuga. O status prevê um plano de tensão que articula várias categorias de
elementos. Antes disso, porém, lembro que uma palíndrome é realizada com as notas do início de
cada grupo subdividido do sujeito. Uma relação intercalada pode ser observada, como demonstra o
exemplo:
Como o exemplo acima aponta (a linha estrutural com as subdivisões retóricas) como o
dispositio e o confutatio comportam as reexposições do sujeito, observando a importância do
intervalo de sétima como unidade temática para essa fuga. A distância intervalar entre os extremos
estruturais da fuga mantém o mesmo padrão de sétima com os processos de variação contínua. A
exposição é com a nota Ré; a primeira reexposição é com a nota Mib, que é uma segunda menor
Linha estrutural com divisões retóricas.
ascendente (uma inversão/variação da sétima unificadora). O stretto é realizado a partir da nota Réb
que é, da mesma maneira, uma segunda menor da nota Ré, agora em sentido descendente (o mesmo
processo de variação é notado), unificando o caminho desenvolvido pela fuga em suas várias
reexposições como um outro argumento de persuasão da fuga. Hindemith (1970, p. 26) aponta
como o intervalo de sétima possui uma peculiaridade muito grande. Guarnieri entende as
características desse intervalo e o projeta com sutileza unificadora em toda a sua composição.
Interessante notar como toda a Sonata é concebida, retoricamente, como uma projeção da
sétima do inicio da obra. E como isso tem sido demonstrado como fator de unificação para esse
movimento e projetado ao longo da fuga analisada neste trabalho. O primeiro movimento da sonata
está centrado sobre a nota lá. o segundo sobre a nota bemol (sol #) que é uma sétima
ascendente a partir de e o terceiro movimento sobre a nota mi. Destaco, porém que a fuga que
assume posição central no último movimento da sonata é centrada sobre a nota ré, o confirmatio é
sobre a nota ré, então a relação projetada na fuga também vem a ser de uma sétima visto que a
distância entre as notas mi e ré, numa direção ascendente também é de uma sétima. Caracterizando
como ambiente “tonal” da sonata: Lá – Sol # - Mi.
Contagem numerológica e a retórica musical
Williams (1989) afirma que o simbolismo na música de Bach parece ser justificado por uma
natureza complexa inerente àquela obra e de tempos em tempos tem servido como base para
revelações que não pretendem demonstrar os reais intentos do compositor (WILLIAMS, Ano, p.
65). A contagem numerológica foi uma área muito expandida no século XX, principalmente na
música de Bach. Essa contagem toca em dois aspectos que são encontrados na música: de
arquitetura (números de compassos, notas e elementos do gênero) e clareza de proporções. Na
música, essa preocupação com a precisão numerológica remota à Renascença com Ockeghem,
Dunstable e Obrecht até a música atual com Ligeti, além de estudos dos mais importantes tratados
de teoria da musical relatam o interesse pelas relações numéricas por mais de vinte e cinco séculos
destacando, por exemplo, proporções áureas na música brasileira o Rudepoema de Villa-Lobos
(SANTIAGO, 2002, p. 152). Santiago (2002) desenvolve um trabalho de pesquisa em que
proporções e representações mentais são estudadas nos 50 Ponteios de Camargo Guarnieri. Assim, a
autora completa seu trabalho afirmando que a forma na música de Guarnieri é um elemento
identificador de seu estilo e destaca o mesmo tipo de proporção áurea em vários ponteios.
Guarnieri considerava-se livre das “amarras” da forma ao compor essa Sonata. Porém, notei
uma recorrência gradual ao analisar a fuga aqui demonstrada. Meu trabalho não busca por elaborar
representações mentais, mas sim, uma busca argumentativa para a persuasão retórica. Toda a
história ao redor da composição dessa Sonata, a lembrança do maestro Baldi, mencionada por
Verhaalen (2001, p. 172), sugerem um clima quase místico para sua composição. Não que com isso
a obra torne-se mais importante dentro da literatura pianística ou venha assumir um outro status
retórico, apenas seu interesse como objeto de análise é mais instigante e relacionando à retórica
musical. Isso, para mim, torna a criação de um argumento persuasivo mais tendencioso, mesmo
para o próprio compositor.
Como em algumas obras de Bach
16
é possível encontrar sugestivas assinaturas, por meio de
somas de valores aplicáveis às letras do nome do compositor, por exemplo, A= 1, B= 2, etc.
(WILLIAMS, Ano, p. 76). Com o nome de Camargo Guarnieri ocorre a seguinte relação:
C +A+M+A+R+G+O
3+1+13+ 1+18+7+ 15 = 58 → 5+8 = 13 → 1+3= 4
G+U+A+R+N+I+E+R+I
7+21+ 1+18+14+9+5+18+9 = 70 → 7+0 = 7
C +A+M+A+R+G+O G+U+A+R+N+I+E+R+I = 4+7= 11
Na Sonata para piano (1972) o intervalo gerador é o de sétima, que por sua vez possui uma
medida de 11 semitons. Nos demais movimentos, a mesma relação é mantida e, neste trabalho
menciono como o intervalo de sétima torna-se o elemento de unidade temática. Durante a
16 Com o nome de Bach ocorre o seguinte resultado: B+A+C+H= 14, por exemplo o sujeito da fuga nº 1 do Cravo
bem Temperado possui 14 notas.
construção da obra o intervalo sofre variações contínuas, mas sempre presente a sua cor e o seu
efeito: quer invertido como segunda, ou ampliado como nona.
Ademais, a título de especulação, os nomes de Mário de Andrade e do Maestro Lamberto
Baldi, vinculam-se a essa contagem de valor para as letras que compõe os seus nomes:
M+Á+R+I+O
13+1+18+9+15= 56 → 5+6= 11
De
A+N+D+R+A+D+E
1+14+4+18+1+4+5= 47 → 4+7= 11
M+Á+R+I+O A+N+D+R+A+D+E = 11+11= 22
L+A+M+B+E+R+T+O
11+1+13+2+5+18+20+15= 85 → 8+5= 13
B+A+L+D+I
2+1+11+4+9= 27 → 2+7= 9
L+A+M+B+E+R+T+O B+A+L+D+I = 13+ 9=22
Assim, a soma das letras do nome de Camargo Guarnieri resulta no número 11, os resultados
dos nomes de Mário de Andrade e de Lamberto Baldi, cada um deles resulta em 22 que é o dobro
de 11. Lembro que esses dois nomes exerceram grande influência na formação de Guarnieri e se o
compositor pretendia dedicar a obra a um de seus mestres, por não fazê-lo, por meio de símbolos
implícitos à própria obra? No entanto, Guarnieri acabou dedicando esta sonata à pianista Laís de
Souza Brasil, cujo nome, coincidentemente, também está vinculado ao número 11 (Laís Brasil =
11). Certamente essas questões são de cunho especulativo e quem poderia respondê-las não está
entre nós hoje. Mas de fato, estas coincidências não deixam de ser instigantes, gerando
autenticidade à obra.
A introdução da fuga da Sonata para piano possui 11 compassos. Além do mais, o material
é a soma de acordes formados pela sobreposição de segundas, sendo o intervalo de segunda a
inversão da sétima, conseqüentemente, a sétima possui uma medida de 11 semitons.
O sujeito da fuga apresenta uma extensão de oito compassos e dentro desses, trinta e oito
notas são articuladas. A soma destes algarismos (3 + 8 = 11) é igual a 11. Esse resultado acontece
repetidas vezes em cada padrão de entrada do sujeito da fuga durante a exposição.
Além da especulação em torno do algarismo 11, observei a ocorrência da proporção áurea.
O cálculo da seção áurea simplificando muito sua demonstração matemática pode ser
demonstrado a partir de duas medidas de tamanhos diferentes, uma medida maior Z e uma medida
menor z. Se dividirmos Z por z, o resultado é equivalente à divisão da soma de Z+z por z.
Algebricamente,
Z / z = (Z + z) / Z
O número resultante de tal divisão é aproximadamente a 1,618. Isto é, para cada unidade de
z, correspondem 1,618 medidas de Z
17
. Assim, a região de seção áurea, tomando como medidas o
número de pulsos totais no terceiro movimento, é encontrada em torno do final do primeiro
episódio, na região da figura abruptio, no c. 47 (4+ 7 = 11). Justamente onde o conflito
estabelecido através do status é refletido, mais uma vez, na estrutura da fuga, ao observarmos a
localização da seção áurea e, também, como uma reflexão do resultado da contagem numerológica.
17 Disponível em www.gelonezehpg.com.br , acesso em 08/02/2008.
CONCLUSÃO
Considerando a fuga como um procedimento retórico imitativo e articulando os avanços
conceituais pressupostos por Harrrison (1990), combinado com os princípios sugeridos por Lester
(2001), seguem as conclusões para a fuga da Sonata para piano de Camargo Guarnieri.
Linha estrutural e relacionamento retórico com seções paralelas.
Os elementos da fuga, sujeito, contra-sujeito, as entradas do sujeito na reexposição, função e
resolução do stretto, além de conduzir e preparar para a última reexposição do sujeito, caracterizam
eventos de ordem retórica. A imitação, nesse caso, foi passiva à questão estrutural, além de manter a
precisão técnica que o procedimento exige, sendo mantida coerentemente durante toda a
composição. Nesse caso, se a imitação é característica de um procedimento retórico composicional,
de maneira independente, a retórica na fuga da Sonata não depende dessa imitação. Depende,
porém, da força atrativa e complementar de um elemento para com o outro. O sujeito da fuga está
inteiramente ligado ao contra-sujeito, aparecendo sempre juntos, com exceção no caso das
passagens em stretto. Os episódios estão são intimamente intrínsecos às exposições que os
antecederam que a fluência com que o discurso é mantido, tecido e organizado reflete ainda mais o
plano de tensão tanto textural quanto de expectativa pura em todo o decorrer da fuga.
O status gerado a partir do sujeito da fuga cria um arco de tensão que é retoricamente
projetado ao longo da composição, cumprindo todas as etapas que poderiam ser previstas no
discurso. Percebo como, mesmo sendo um discurso previsto a priori, de maneira alguma se torna
monótono, demonstrando assim, a maestria do compositor ao admitir tal plano para sua obra
18
.
Dessa maneira, o status serviu como um guia para a busca por características próprias na
composição e validou o avanço conceitual proposto por Harrison (1990).
Ao se articular os princípios propostos por Lester (2001), sobre as seções paralelas e sua
intensificação ao longo da composição, nessa fuga o status comportou a perspectiva das
intensificações previstas, ao resolvê-las quando os primeiro e último episódios mostraram ter
funções semelhantes e resoluções opostas. Assim, a energia contida no status, que é de fato um
elemento artificial, como afirmado por Harrison (1990), é viva e pertinente à própria fuga,
caracterizando-se como outra arma persuasiva e retórica.
Algumas figuras de retórica musical foram mencionadas ao longo da análise e discussão.
Harrisson (1990) comenta como as figuras não exercem uma função estrutural, mas uma função de
decoração e embelezamento. Nessa fuga, as figuras surgem com funções tópicas atuantes. A figura
18 Harrison menciona que essa é uma das tarefas do compositor ao pretender persuadir uma audiência ao lidar com um
procedimento que oferece tantos obstáculos, como é o caso da fuga (HARRISON, 1990, p. 5)
palíndrome, encontrada no sujeito, é projetada no dispositio. O abruptio é utilizado a fim de
quebrar a tensão gerada e de maneira a ceder ao previsto pelo status. Nessa fuga, as figuras
possuem, naturalmente, uma função decorativa, porém exercem outras funções que também são
próprias do locus retórico em que se encontram. A opção por seguir a um padrão retórico na
subdivisão das seções seguiu ao padrão utilizado por Harrisson (1990) e mostrou que é possível,
sim, articular técnicas modernas de análise com as repartições oriundas da retórica clássica. Nesse
sentido, sua proposta e avanço continuam mais pertinentes e mais atuais.
Na minha especulação a respeito da relação numérica nessa obra, percebi como Guarnieri,
mesmo utilizando métodos e procedimentos semelhantes aos seus contemporâneos, como
Hindemith, torna-se autêntico dentro do seu tempo. A total liberdade no uso da tonalidade e das
“amarras” da forma da obra é ampliada dentro de sua própria estética, não necessitando de padrões
ou modelos a serem seguidos
19
. A projeção das considerações numéricas na seção áurea pode atestar
ou servir de afirmativa para a especulação de que Guarnieri estava criando um modelo próprio.
Evidentemente, ou se ouvir a fuga da Sonata, essas conclusões a respeito da simbologia
numérica não atuam como fator persuasivo passivamente, contudo, lembro a citação de Sousa
quando afirma que o ato de persuadir pressupõe um destinatário que compreenda e saiba avaliar os
respectivos argumentos, e como um pensar deve refletir a expressão de um raciocinar (SOUSA,
2003, p. 4). Essa intensão especulativa, oriunda da minha convivência com a obra, reflete outra
faceta da retórica e persuasão que a obra pôde exercer ao procurar compreender e raciocinar sobre
os elementos ali presentes, ou seja, como a obra me persuadiu.
O início do artigo de Harrison (1990) relata como a polifonia e a oratória têm uma grande
familiaridade, sobretudo em obras de Bach. O meu trabalho, contudo, demonstrou-me, que retórica
e a oratória possuem familiaridades naturais com a fuga, com a música e com arte em geral,
independente de seu período ou da estética proposta. Assim, os demais movimentos dessa Sonata
também poderiam ser abordados à luz dos mesmos referenciais, buscando elementos de ordem
retórica, completando o ciclo da Sonata para piano de Camargo Guarnieri. Isso realizado, além de
19 Gerling (2005) mostra como, em um trabalho de juventude, Guarnieri utiliza um modelo de Bach para compor uma
fuga, e como isso, de maneira alguma, desmerece-o como compositor, nem o valor de sua obra.
contribuir para o entendimento da arte musical, poderia demonstrar como a forma em música é um
conceito flexível e que o que ocorre, de fato, é uma preocupação com a coerência e o equilíbrio a
fim de se persuadir o ouvinte.
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<www.gelonezehpg.com.br> Acesso em 08/02/2008
Partitura:
GUARNIERI, M. Camargo. Sonata para Piano. São Paulo: Irmãos Vitale, 1998.
ANEXO
Partitura da Fuga da Sonata para Piano (1972) de Camargo Guarnieri
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