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Fernando Luiz Vale Castro
Pensando um continente:
A Revista Americana e a criação de um projeto cultural
para a América do Sul
Tese de Doutorado
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação
de História Social da Cultura do Departamento de
História da PUC-Rio com como parte dos requisitos
parciais para a obtenção do título de Doutor em
História.
Orientador: Prof. Marco Antonio Villela Pamplona
Rio de Janeiro
Junho de 2007
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0310348/CA
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Fernando Luiz Vale Castro
Pensando um continente:
A Revista Americana e a criação de um projeto cultural
para a América do Sul
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História
Social da Cultura do Departamento de História da PUC-Rio como
parte dos requisitos parciais para obtenção do título de Doutor em
História.
Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada.
Prof. Marco Antonio Villela Pamplona
Orientador
Departamento de História - PUC-Rio
Prof. Ilmar Rohloff de Mattos
Departamento de História – PUC-Rio
Prof. Ricardo Henrique Salles
Departamento de História – FFP/UERJ
Profª. Ângela Maria de Castro Gomes
Pesquisadora-CPDOC/FGV
Profª. Maria Elisa Noronha de Sá Mäder
Departamento de História-PUC-Rio
Prof. João Pontes Nogueira
Vice-Decano de Pós-Graduação do Centro de Ciências Sociais
PUC-Rio
Rio de Janeiro, 15 de junho de 2007
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0310348/CA
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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou
parcial do trabalho sem autorização da universidade, do autor e
do orientador.
Fernando Luiz Vale Castro
Graduado em História (bacharelado e licenciatura)
pela Universidade Federal Fluminense em 1996. Mestre em
História Social pela mesma universidade em 2001.
Ficha catalográfica
CDD: 900
Castro, Fernando Luiz Vale
Pensando um continente: a Revista Americana e a
criação de um projeto cultural para a América do Sul /
Fernando Luiz Vale Castro; orientador: Marco Antonio Villela
Pamplona. – 2007.
232 f; 30 cm
Tese (Doutorado em História)–Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007.
Inclui bibliografia
1. História Teses. 2. História social da cultura. 3.
Revista Americana. 4. América do Sul. 5. Diplomacia. I.
Pamplona, Marco Antonio Villela. II. Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro. Departamento de História. III.
Título.
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Para Marcelle com todo meu amor
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Agradecimentos
Terminada a Tese, chega a hora de colocar um ponto final agradecendo às pessoas
que são importantes e, de alguma maneira, participaram dessa longa caminhada.
o período do doutoramento em si, somando com o tempo dedicado à elaboração do
projeto, são quase cinco anos. Pensando em toda minha formação, são 14 anos.
Quase uma vida. Uma vida de dedicação, de muitas leituras, de aprendizado
constante, de crescimento pessoal e profissional, de amadurecimento intelectual.
Em primeiro lugar, não posso deixar de lembrar as várias instituições que
colaboraram com a minha formação. Gostaria de agradecer a UFF, seus professores
e funcionários, local onde fiz minha Graduação e meu Mestrado, e que despertou a
paixão pela pesquisa e o ensino de História. À PUC, um especial agradecimento
pelo carinho pelo qual fui recebido, bem como pelo ótimo ambiente acadêmico que
me possibilitou desenvolver plenamente meu doutoramento. Um muito obrigado
aos funcionários, Edna, Cleuza, Anair e Cláudio, aos meus colegas de turma e aos
professores, em especial aqueles com os quais tive a oportunidade de ter aulas:
Ricardo Benzaquen; Francisco Falcon e Marcelo Jasmin e Don Doyle
Agradeço ao CNPq, à FAPERJ e à PUC- Rio pelas bolsas concedidas.
Igualmente, agradeço ao Colégio São Vicente de Paulo, em especial ao seu
Diretor, Padre Lauro Palú, pela licença que me permitiu dedicar integralmente ao
Doutorado.
Aos professores Ricardo Salles e Ilmar Mattos agradeço as sugestões quando do
Exame de Qualificação as quais busquei incorporar à minha pesquisa.
Ao meu orientador Marco Antonio Pamplona eu devo muito mais que um
obrigado. Além de leitor competente e criterioso, tive um amigo que soube me
estimular na hora certa, estando pronto para escutar minhas angústias, sempre com
uma palavra amiga e motivadora. O convívio com ele me fez crescer muito como
pessoa e como historiador.
Agradeço à Monique de Oliveira pelo auxílio, no segundo semestre de 2005, na
coleta de fontes.
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Em tão longa jornada, de tamanho envolvimento físico e emocional, é impossível
não contar com inúmeros amigos que acabaram por dividir angústias e alegrias.
Para essas pessoas eu devo um insuficiente, muito obrigado.
Mesmo correndo o risco de esquecer alguém não posso deixar de citar alguns
amigos que, como diz a canção, estarão sempre do lado esquerdo do peito. A eles
agradeço do fundo do meu coração, pelo apoio afetivo, carinho, e amizade, durante
a elaboração desta Tese. Um grande abraço para: Bira, Fred, Gabriela, José Carlos,
Luiz Sérgio, Marcelo, Mônica, Renata, Roberto e Wolney.
À Juliana um muito obrigado pela força sempre presente, desde a minha
graduação, fundamental para eu ter chegado até aqui.
À Edgard Pêcego um agradecimento especial pelas conversas sobre diplomacia,
verdadeiras aulas que muito me ensinaram.
À Bárbara Bravo um obrigado muito especial. Primeiro pelo auxílio fundamental
com algumas “teses distantes”. Em segundo, e mais importante, pelas conversas que
muitas vezes invertiam a “ordem natural” das coisas, colocando-me na posição de
aluno e não de professor.
À minha família, minha irmã Anna, meus pais Washington e Tânia um beijo pela
presença constante, pelo carinho, pela torcida, enfim, por tudo. Ao meu querido
sobrinho Chris, mais do que um beijo, vai toda minha esperança em um futuro
melhor e um pedido de desculpas pelas ausências, muitas vezes constantes, nas suas
partidas de futsal.
Para Marcelle qualquer coisa que eu escreva será insuficiente. Um obrigado junto
com um pedido de desculpas, devido às ausências, e um mau humor constante, é
muito pouco para expressar o que eu sinto. Na verdade, certas coisas não são para
serem escritas ou faladas, são para serem sentidas. À Marcelle eu dedico todos os
meus melhores sentimentos, ontem, hoje e sempre. Por essas razões esta tese é
dedicada somente à ela.
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Resumo
Castro, Fernando Luiz Vale ; Pamplona, Marco Antonio Villela. Pensando
um continente: A Revista Americana e a criação de um projeto cultural
para a América do Sul. Rio de Janeiro, 2007. 232p. Tese de Doutorado,
Departamento de História, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Esta tese tem como objetivo analisar, enquanto uma comunidade
argumentativa, a Revista Americana publicada pelo Itamaraty, com algumas
interrupções, entre os anos de 1909 e 1919. Nesse sentido o pilar central do
trabalho pautou-se na análise dos debates, dos atos de fala formulados, acerca da
compreensão do papel a ser exercido pela diplomacia no novo concerto
internacional, valorizando a discussão sobre temáticas relacionadas ao
posicionamento da América do Sul no contexto mundial. É possível notar a
valorização, nas páginas da Revista, de determinados aspectos da história sul-
americana, com o objetivo de se construir um ideal continental. Tal valorização
possibilita pensá-la como um espaço no qual se refletiu sobre um projeto para a
América do Sul, baseado na construção de uma identidade, marcada por
características próprias e específicas construídas ao longo de sua história e que
teriam, sobretudo, por meio da ação de sua diplomacia a possibilidade de
concretização.
Palavras Chaves:
Revista Americana; Itamaraty; América do Sul; Diplomacia.
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Abstract
Castro, Fernando Luiz Vale ; Pamplona, Marco Antonio Villela. Planning
about a Continent: The “Revista Americana” and a culture project to South
América. Rio de Janeiro, 2007. 232p. Phd Dissertation, Departamento de
História, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
The objective of this thesis is to analyze, as an argumentative community, the
“Revista Americana”, that has been published by the Itamaraty, with some
interruptions, from 1909 to 1919. The scope of this thesis was based upon some
debates’ analyzes and the perception and understanding of diplomacy’s new role
at the international scenario, pointing out some arguments about South America’s
position in the world’s panorama. It is possible to perceive on the pages of the
Revista the appreciation of some aspects of South America’s History that
clearly express the intention to establish a new idealism for the continent. This
appreciation has brought up the idea that the Revistawas a space to reflect a
new project to South America in which a new identity would be built with some
very specific characteristics that have been shaped through out History and that
would be established by diplomatic action.
Keywords:
“Revista Americana”; Itamaraty; South América; Diplomacy.
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Sumário
1. Introdução 11
2. O contexto de criação da Revista Americana
2.1.Uma época de mudanças 16
2.2.Fronteiras e limites: a importância da questão territorial na
construção de um Estado Nacional 23
2.3.O Itamaraty no período Rio Branco 35
2.4.O Brasil e as Américas: buscando uma aproximação 40
2.5. Elaborando uma estratégia: a diplomacia cultural
e a criação da Revista Americana 48
3.O Pan-americanismo nas páginas da Revista Americana
3.1.Um início de conversa 59
3.2.Pressupostos para a análise: o pan-americanismo
dos primórdios à hegemonia norte-americana 63
3.3.O primeiro momento do pan-americanismo na Revista Americana:
os defensores do monroismo nas páginas do periódico 82
3.4.A visão dos críticos 97
3.5.O segundo momento: a consolidação de uma determinada posição 103
3.6.Em busca de uma síntese 114
4. O papel da diplomacia na construção de um projeto para a América do Sul
4.1.Nova ordem, novas questões 121
4.2.Em busca de virtudes: a importância da narrativa histórica
na formação das fronteiras nacionais 134
4.3.Soberania e hegemonia: uma (re) leitura para a América do Sul 146
4.4.Propondo uma moral diplomática sul-americana 163
4.5.Em busca de uma síntese 178
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5.Conclusão 183
6.Bibliografia e Fontes 189
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1
Introdução
Esta Tese tem como objetivo analisar a Revista Americana, publicação
oriunda das fileiras diplomáticas brasileiras, que circulou entre 1909 e 1919,
tornando-se local de divulgação, dentre outros aspectos, da política, da cultura
e da história sul-americana.
As escolhas de temas e colaboradores, bem como as ausências existentes
nos fornecem elementos importantes para a análise acerca dos objetivos,
explícitos e implícitos da Revista. Nada arbitrárias tais escolhas vinculam-se
às tradições e raízes que marcaram as histórias do país e do continente.
Como toda construção cultural, a Revista pode ser entendida pela
dialética entre a produção e a recepção da mensagem, em que coexistem
sempre rias formas de apropriação pelos vários grupos e subgrupos que
formam uma dada comunidade de leitores. Optamos, nesta nossa tese,
entretanto, por uma interpretação que valoriza mais a ótica dos produtores da
mensagem, que no caso dos editores e colaboradores da Revista Americana
eram, na sua esmagadora maioria, intelectuais, brasileiros e sul-americanos
com inserção na vida diplomática do continente. Nosso objetivo passa pela
compreensão dos discursos, dos “atos de fala”, que fizeram, em nossa opinião,
da Revista Americana uma “comunidade argumentativa”.
Ao se observar uma revista como local onde se realiza uma prática
social de produção de sentido sobre a experiência coletiva, torna-se
fundamental observar a questão da produção do discurso. Para uma melhor
análise dos textos da Revista Americana nos aproximamos de alguns
pressupostos da “virada lingüística”.
1
Nesta perspectiva é fundamental
1
Estamos pensando nos pressupostos da “Virada Lingüística”, em especial as perspectivas
desenvolvidas por Q. SKINNER e J.G.POCOCK. Sobre isso ver: Quentin SKINNER.
“Meaning and Understanding in the History of Ideas” ; Motives Intentions and Interpretation
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recuperar a identidade histórica das obras intelectuais, por meio de uma
metodologia histórica e intertextual, ou seja, que apresenta como objetivo
alcançar o sentido do texto em seu tempo, afastando-se, portanto, de visões
anacrônicas e reducionistas.
Perceber o texto inserido no seu contexto reconstrói sua historicidade,
ao mesmo tempo em que lhe atribui o caráter de ação, isto é, o texto entendido
como ato de fala. Nesse sentido é sobre a idéia de discurso e não sobre a
individualidade dos autores, que a abordagem se baseia. Por essa trilha
podemos afirmar que a análise do historiador deve priorizar as “linguagens do
discurso”.
Estas se tornam objetos para o historiador quando é possível observar a
relação entre diferentes atos de fala, isto é, textos nos quais os autores
compartilham vocábulos, imagens retóricas e pressupostos, respondendo uns
aos outros. A possibilidade de reconstituição de uma comunidade
argumentativa ou de discurso é o que assegura o caráter de fenômeno
histórico.
Para os fins da nossa pesquisa consideramos que com a análise do
contexto intelectual, político e econômico que informam os atos de fala da
Revista Americana torna-se possível perceber os projetos da Revista, o
significado de suas estratégias, bem como os objetivos do Itamaraty com essa
publicação. Outrossim, relacionar os atos de fala da Revista nos permitirá
delimitar melhor a “comunidade argumentativa”.
Buscando sintetizar nossa proposta metodológica, estamos considerando
os articulistas da Revista Americana como enunciadora de atos de fala em
resposta a determinadas questões em discussão no período. Nesse sentido os
of texts” e Reply to my critics, todos se encontram em James TULY. Meaning and Context:
Quentin SKINNER and his Critics Princeton, Princeton University Press, 1988. Quentin
SKINNER. As Fundações do Pensamento Político Moderno São Paulo, Cia das Letras, 1996.
Ver também: Francisco FALCON. “História das Idéias”. In: Ciro CARDOSO e Ronaldo
VAINFAS. Domínios da História. Rio de Janeiro, Campus, 1997; Richard TUCK. “História
do Pensamento Políticoin Peter BURKE. A Escrita da História. São Paulo, UNESP, 1992.
e Introdução: o estado da arte ; o conceito de linguagem e o metier d´historien. Todos
encontrados em J.G. POCOCK. Linguagens do ideário político. São Paulo, EDUSP, 2003.
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autores que fizeram parte da Revista contribuíram para a criação de uma
determinada “comunidade argumentativa”, elaborando e emitindo “lances
2
específicos. Para se compreender tal construção, cabe investigar a
historicidade da sua produção associada à intencionalidade da sua escrita.
Assim, entender os atos de fala presentes na Revista Americana a fim
de percebê-la como uma comunidade argumentativa de uma determinada
época e referida a um determinado locus social, político e cultural, nos remete
à reflexão sobre a visão diplomática do Itamaraty presente na Revista
3
. Esta
última se construiu a partir da estratégia riobranquiana, para uma diplomacia
do continente, e de alguns de seus conceitos, abordados sistematicamente nas
páginas do periódico, a saber: o Pan-americanismo, a arbitragem na formação
do território, e a defesa de um Direito Internacional Público de viés
americano. Este último estabeleceria uma nova perspectiva para as questões
relacionadas ao arbitramento internacional, abrindo espaço, inclusive, para o
debate de temas como soberania, alianças e hegemonia, inseridos no processo
de discussão da delimitação das fronteiras sul-americanas dentro de uma
perspectiva de manutenção da paz e do equilíbrio político no continente.
Temos consciência que tais escolhas implicam em renúncias, porém ao
considerarmos a cooperação e o intercâmbio cultural e intelectual entre as
Américas, com especial destaque para a América do Sul, como sendo o
principal objetivo da Revista, a perspectiva do nosso estudo passou a ser
compreender como os intelectuais que escreveram no periódico pensaram o
papel da ação diplomática na construção de uma identidade brasileira e sul-
americana. Trata-se, principalmente, de uma reflexão sobre o papel que a
diplomacia brasileira deveria assumir no continente e este no novo concerto
das nações que vinha sendo redefinido na Europa quando do momento da
circulação do periódico.
2
J.POCOCK. Linguagens do ideário político. Op cit. A perspectiva do lance nos remete,
segundo Pocock, a um processo no qual um ato de fala é enunciado e de certa forma busca
inovar o contexto lingüístico, permitindo ao historiador observar o que um autor (ou grupo de
autores) estava fazendo no momento de elaboração de seu discurso.
3
Essa visão diplomática teve no Barão do Rio Branco seu principal artífice, com veremos no
nosso primeiro capítulo.
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14
Dentre os objetivos que nos norteiam nesta tarefa, destacamos o
reconhecimento da importância da contribuição da Revista Americana como
instrumento de compreensão do projeto político e cultural do Itamaraty. Trata-
se de pensar a Revista como parte integrante de uma estratégia de formulação
de um objetivo que consistia em estabelecer parâmetros acerca da função a ser
exercida pelo corpo diplomático, associada ao papel que caberia à América do
Sul na ordem mundial que se forjava nos primeiros anos do século XX.
Dividimos nossa análise sobre a Revista Americana, de acordo com os
objetivos propostos, em dois momentos: um primeiro referido ao debate sobre
o pan-americanismo e um segundo ao debate sobre o que estamos
denominando aqui de viés diplomático da política externa do continente e que
tem como lógica central a apresentação dos assuntos ligados ao direito e
arbitragem internacionais.
A Revista Americana, deve ser compreendida como uma comunidade
argumentativa, possuidora de opiniões divergentes, e de um sentido geral
para a sua publicação, sentido este relacionado com à possibilidade de
execução de um “lance” importante, a saber: a valorização da diplomacia
como norteadora de um processo, o que passaria por uma aproximação
cultural cujo objetivo último seria indicar os caminhos para o Brasil e a
América do Sul no cenário internacional. Tais caminhos teriam como
premissa pensar o continente sul-americano, a partir de uma moral e uma
cultura próprias, apresentá-lo como um exemplo a ser seguido em uma época
que se anunciava como altamente belicosa. Essas premissas, na nossa
concepção, aproximam a proposta da Revista com aquilo que, décadas mais
tarde convencionou-se chamar de Diplomacia Cultural.
4
Finalmente, nossa tese se apresenta dividida em três capítulos. O
primeiro mais de contextualização, no qual buscamos mapear as principais
questões da época referentes às preocupações com o contexto mundial e com
os paradigmas que informavam a diplomacia do período. O Itamaraty, o pan-
4
Veremos esse conceito no nosso primeiro capítulo.
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15
americanismo e a questão da delimitação das fronteiras são abordados nessa
parte da tese.
O segundo capítulo em que nos detemos nos artigos que trataram sobre
o pan-americanismo com o intuito de perceber as diferentes formulações sobre
o tema, os diálogos estabelecidos entre os argumentadores, e os “lances”
eventualmente enunciados ao longo do debate.
O terceiro e último capítulo onde serão trabalhados os textos de caráter
mais diplomático, com especial atenção para a perspectiva de elaboração de
um certo “ideal americano”, pautado na valorização do seu corpo diplomático
com o objetivo de nortear o novo posicionamento da América do Sul no
cenário mundial e a construção de um projeto continental que lhe deveria
servir de modelo e exemplo.
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2
O contexto de criação da Revista Americana
2.1
Uma época de mudanças
A época na qual surgiu a Revista Americana foi caracterizada, tanto no
plano nacional quanto no internacional, por uma perspectiva de mudança e
afirmação fruto das transformações ocorridas no seio do mundo capitalista. Nas
artes, na cnica, nas ciências, nas relações de trabalho observava-se a
aceleração do tempo e a diminuição das distâncias – marcas de uma nova era.
Nas últimas décadas dos oitocentos e início do novecentos viveu-se um
efetivo crescimento na base geográfica da produção industrial que chegou à
regiões como a Rússia e o Japão. Tal fato reforçou a perversa gica da Divisão
Internacional do Trabalho, em perfeita sintonia com os avanços imperialistas a
dividir o mundo em grandes áreas de influências e de possessões coloniais.
Essas transformações estiveram diretamente ligadas ao extremo avanço
tecnológico marcado, entre outros, pelo telefone, o telégrafo sem fio, o
fonógrafo, o cinematógrafo, ferrovias que cortavam a Europa e os EUA,
automóveis, etc, bem como o grande desenvolvimento na área médica que
representou um aumento claro na expectativa de vida. Nesse sentido, podemos
afirmar que surgia uma nova era que mexeu no imaginário popular de forma
inequívoca.
“... o que mais forte impacto causava nas pessoas do mundo desenvolvido e industrial
à época era, mais até que a evidente transformação de suas economias, seu ainda mais
que evidente êxito. Vivia-se, obviamente num tempo de prosperidade. [...] no caso dos
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europeus ricos ou mesmo da mais modesta classe média. Para estes, a belle époque foi
de fato o paraíso que seria perdido após 1914.”
1
A intelectualidade americana de então não ficou imune a tais
transformações. O período no qual a Revista Americana circulou foi
extremamente fecundo no debate intelectual brasileiro e sul-americano, tendo
marcado profundas transformações nos campos político e cultural, fato que faz a
época ser uma das mais privilegiadas pela historiografia nas análises acerca dos
inúmeros projetos desenvolvidos pela intelectualidade do continente. No Brasil,
desde a segunda metade do século XIX houve o surgimento de vários grupos de
intelectuais, preocupados em construir uma nova identidade nacional.
Nesse particular destacamos a chamada geração de 1870
2
, para muitos
autores, considerada a primeira a pensar um projeto modernizador para o Brasil,
que, através da assimilação e difusão de idéias evolucionistas e cientificistas
objetivou levar o país ao mais alto nível de civilização, procurando universalizar
os problemas nacionais. Segundo Roque Spencer de Barros os homens dos anos
1870 e 80 tinham o objetivo central de “ilustrar o país” por meio da ciência e da
cultura buscando transformar as raízes da nação
3
. Nesse sentido essa geração
valeu-se da ciência moderna, vista como norteadora da administração pública e
base do caminho para se alcançar o progresso, fato que fortaleceria a crença de
que sem a presença dos intelectuais a sociedade dificilmente se beneficiaria das
conquistas alcançadas
4
. As idéias baseadas no cientificismo, especializado e
1
Eric HOBSBAWM . A Era dos Impérios. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988. p 85
2
Temos um grande número de trabalhos que enfocam esta geração, dado o fato dela ter sido a
primeira a procurar “acertar” a nossa produção cultural com a Europa, buscando inserir o país
no que se definia como Modernidade. Não sendo nosso interesse, não convém nos determos
nesta temática. Esta pode ser vista em: Nicolau SEVCENKO. Literatura como Missão. São
Paulo, Brasiliense, 1995; Michael HERSCHMANN. A Invenção do Brasil Moderno. Rio de
Janeiro: Rocco, 1995; Roberto VENTURA. Estilo Tropical. São Paulo: Cia das Letras, 1991;
Lilia SCHWARCZ. O espetáculo das Raças. São Paulo, Cia. das Letras, 1992; Wilson
MARTINS. História da Inteligência Brasileira. São Paulo, Editora Civilização Brasileira, 1966.
Francisco Foot HARDMAN. O trem fantasma: a modernidade na selva. São Paulo, Cia das
Letras, 1991.
3
Roque Spencer Maciel de BARROS. A Ilustração brasileira e a idéia de Universidade. São
Paulo, EDUSP, 1986.
4
Silvio ROMERO realiza no ensaio “O Brasil social de Euclides da Cunha” uma bela
radiografia do período: “O decênio que vai de 1868 a 1878 é o mais notável de quantos no
século XIX, constituíram nossa vida espiritual. Quem não viveu nesse tempo não conhece por
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universalizante, se enquadraram aos interesses dos setores dominantes na
medida em que impregnaram os diagnósticos e as formulações dos projetos de
construção da nação, que, no caso brasileiro, funcionaram como um poderoso
mecanismo de fortalecimento do Estado
5
. Nesse sentido os intelectuais
buscaram criar um saber próprio sobre o Brasil, partindo de matrizes
estrangeiras, principalmente européias.
Em fins doculo XIX, a burguesia européia desfilava com orgulho os êxitos
de seu projeto civilizatório merecendo destaque: o cristianismo, o industrialismo, a
tecnologia etc. A noção de progresso naturalizava a repartição do mundo criada
pelas práticas imperialistas. Civilização de um lado, barbárie do outro. Nas últimas
cadas dos oitocentos, novas condições de dizibilidade estabeleceram um projeto
de uma ciência geral da ordem, explicitamente evolucionista na qual classificavam-
se animais, homens e mulheres estabelecendo etapas históricas ou estágios
civilizatórios a serem percorridos pelos grupos de homens. A Europa teria como
missão civilizar, expandir o progresso, construir a felicidade do mundo. Este saber
constituiu-se na base teórica para a posição a partir da qual a civilização ocidental
encarava o seu relacionamento não com as culturas e civilizações que a
precederam, mas, também com as queo contíguas no tempo e no espaço
6
.
Essa geração
7
de intelectuais brasileiros da virada do século XIX para o
XX, independente das interpretações diversas, que conseqüentemente levavam à
ter sentido diretamente em si as mais fundas comoções da alma nacional. [...] um bando de
idéias novas esvoaçou sobre s de todos os pontos do horizonte [...] Positivismo,
evolucionismo, cientificismo, na poesia e no romance, folk-lore, novos processos de crítica e
história literária, transformação da instituição do Direito e da política, tudo então se agitou.” In:
Realidades e Ilusões no Brasil. Parlamentarismo e Presidencialismo e outros escritos.
Petrópolis, Vozes, 1979. p 162
5
Helana BOMENY “Novos Tempos, Vícios Antigos, os Renovadores da Política Educacional”.
In Estudos Históricos. Rio de Janeiro, FGV, v. 6, nº 11, 1993.
6
Hayden WHITE.
A meta-história: a imaginação histórica no século XIX.
o Paulo: Edusp, 1995. p.18.
7
Estamos considerando "geração", compreendendo-a a partir da fusão entre memória e história,
ou seja, da existência de uma memória comum, um testemunho de como um conjunto de
homens viveu uma determinada época. Nesse sentido, devemos ligar gerações aos marcos, aos
eventos fundadores, mas com o cuidado de não nos determos somente neles, pois não devemos
datar uma geração apenas pelos fenômenos sociais ocorridos, na medida em que estes podem ser
apreendidas de várias maneiras. Sobre isto ver: Cleudine Attias-Donfut. La Notion de
Generation : usage sociaux et concept sociologique”. In: L’ Homme et la Societé Paris. L
HARMATTAN (90), 1988. JEAN-FRANÇOIS. SIRINELLI. Le Genération: la construction
du temps historique Paris, Histoire au Present, 1991.
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19
disputa entre os vários grupos intelectuais formados, tinha um ponto em
comum, o de pensar a realidade brasileira como parte integrante do concerto
cultural estrangeiro, vinculando o Brasil a esse projeto civilizador para, a partir
daí, estabelecer a construção de uma identidade nacional.
A Proclamação da República, porém, não representou uma possibilidade
concreta de construção de uma nação moderna civilizada como desejavam os
intelectuais da Geração de 1870.
Nessa época, vários pensadores se engajaram na discussão sobre o
passado e o futuro do Brasil e por extensão da América do Sul que passou a
ganhar relevo nesse momento histórico. Esses intelectuais assumiram o papel de
colocar esta América na “Grande Narrativa” da civilização ocidental passado
e no caminho de um “futuro necessário ao ritmo da humanidade”
8
o que
significava assumir o dever de revisar historicamente o passado colonial e de
definir a originalidade, entendida, muitas vezes como nacionalidade, desses
países ante o espelho, inicialmente europeu, e posteriormente, norte- americano.
Esses intelectuais começaram a “ler” seus países através dos modelos de
conhecimento e civilidade estrangeiros
9
tendo sido estabelecidas especificidades
entre uma América Inglesa e uma Latina, e entre aquela e o continente europeu.
A intelectualidade se esforçou em explicar as razões do atraso e em procurar
formas de superá-lo. Como o objetivo principal seria entrar no círculo da
modernidade, as elites e os intelectuais da “República das Letras”
10
procuraram
construir imagens do país que ora o diferenciasse, ora o aproximasse, das
demais repúblicas sul-americanas ao mesmo tempo em que procuravam a
gênese da nação. Em última análise a intelectualidade desse período desejava
inscrevê-la na tradição do progresso e da civilização, herdadas do Iluminismo.
Destacou-se, durante a Primeira República, a participação do Itamaraty,
instituição de relevo no contexto político e cultural brasileiro, com seus
membros assumindo, desde a época Imperial, papéis de destaque no cenário
8
Ernest MARTINENCHE Prefácio à Edição Francesa de Oliveira Lima
Formação Histórica da
Nacionalidade Brasileira
..
9
Lilia SCHWARCZ
O espetáculo das raças.
Op cit p.30.
10
Conceito formulado por Angel RAMA
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nacional e internacional. Cabe salientar que os diplomatas se notabilizaram,
necessariamente, pelo viés da construção de um projeto de nação ligada ao
Estado brasileiro, portanto tinham como função buscar mecanismos de
elaboração de um afinamento ideológico com os outros setores da elite
brasileira.
Devemos ter em mente que o Itamaraty acabou por assumir um papel
bastante claro nesse momento de elaboração de um determinado projeto
nacional, fato que justifica a importância de se estudar os intelectuais em torno
da Revista Americana, na medida em que sua publicação partiu da alta cúpula
do Ministério das Relações Exteriores. Logo, ao se propor desenvolver pesquisa
sobre esses intelectuais é condição sine qua non lançar luz sobre a atuação do
Itamaraty e de seu corpo diplomático no debate intelectual da época, questões
pouco trabalhadas na historiografia sobre a intelectualidade nacional.
Uma análise acerca do Itamaraty nos permite afirmar que ele se tornou
uma instituição privilegiada nas primeiras décadas da República, apesar da
presença de uma certa herança imperial entre os diplomatas que, no entanto, não
representou um afastamento da ordem republicana. A diplomacia, mesmo
aparentando um determinado tipo de saudosismo da Monarquia, assumiu suas
funções de agente do Estado Republicano, tanto interna, quanto, e
principalmente, externamente.
Ao se refletir sobre a ão diplomática desta ou de qualquer outra época
histórica, faz-se necessário termos em mente que a política externa de uma
nação corresponde aos interesses, às aspirações da facção política representante
dos grupos sociais, políticos e econômicos dominantes ao nível nacional.
11
Com as oligarquias no poder, o fomento da agroexportação e a "promoção" da
imigração tornaram-se dois dos pilares da diplomacia brasileira, aproximando
esta dos interesses da elite dominante.
O novo regime, porém, não se preocupou apenas com as relações
comerciais agroexportadoras, fato que nos permite observar que a Chancelaria
11
P. RENOUVIN & J.B.DUROSELLE. Introdução à História das Relações Internacionais.
São Paulo, DIFEL, 1967.
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21
brasileira se voltou também para uma conjuntura mundial que perpassava entre
o Imperialismo e a luta entre imperialismos. Pensar essa questão conjuntural é
premissa básica para a compreensão do projeto do Itamaraty, na medida em que
o Brasil, no quadro geral do sistema capitalista, desfrutava de pouca autonomia,
apresentando, nos primeiros anos republicanos, grande fragilidade econômica
diante da Europa (principalmente a Inglaterra). Esse contexto gerava uma clara
dependência em relação ao centro do capitalismo mundial.
12
.
Diante dessa situação ficava claro para os vários segmentos da elite
brasileira que a ação diplomática do Brasil não apresentava, naquele momento,
inicio do período republicano, um projeto definido e, por conseguinte, o país
não conseguia estabelecer uma diretriz consciente na sua política externa, fato
que nos auxilia na compreensão das constantes mudanças na chancelaria, o que
agravava, ainda mais, a ausência de uma política externa coerente e
continuada
13
. Nas palavras de Bueno e Cervo:
"Faltou um projeto. Resolviam-se os problemas à medida que iam surgindo [...]
Assim, até o governo de Rodrigues Alves, inaugurado em 15 de novembro de 1902 e
que teve Rio Branco na gestão dos negócios exteriores, a República não teve uma
política exterior claramente definida - falava-se em conceitos gerais como
'americanização', 'confraternização' - hajam vistos os inúmeros ministros que
responderam pela pasta respectiva num espaço de tempo realmente curto."
14
12
Acerca desse tema faz-se mister assinalar que, na primeira década republicana, o Brasil sentiu
duas manifestações claramente imperialistas, que afetaram diretamente a sua soberania nacional,
a saber: a ocupação da Ilha Trindade e o arrendamento do Acre, pela Bolívia, ao consórcio
capitalista anglo-norte-americano, o Bolyvan Sindicate Sobre isso ver entre outros: Clodoaldo
BUENO e Amado Luiz CERVO. História da Política Exterior no Brasil. Brasília, Ed UnB,
2002. ; José Honório RODRIGUES. Interesse nacional e política externa. Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 1966. ;José Honório RODRIGUES & Ricardo SEITENFUS. Uma
História diplomática do Brasil, 1531-1945. Rio de Janeiro, Civilização brasileira, 1995.
Demétrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. São Paulo, Moderna/UNESP, 1997
13
"O mais notável na inauguração da diplomacia da República Velha é a instabilidade, que se
expressa no número elevado de Ministros que se sucederam na direção da pasta das relações
exteriores no período dando aparência de falta de uma diretriz na política externa. Foram 11
titulares, sem contar os que a exerceram interinamente. A estabilização se dá no governo
Prudente de Moraes, que nomeia dois chanceleres em quatro anos, e Campos Salles, que todo o
tempo trabalha com Olyntho de Magalhães. Em seguida, Rio Branco seria chanceler por dez
anos" . Sérgio DANESE. Diplomacia Presidencial. Rio de Janeiro, Topbooks, 1999. pp 250 e
251.
14
Clodoaldo BUENO & Amado Luiz CERVO. História da Política Exterior no Brasil. Op cit.
p 143
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22
Em 1902 observamos o principal divisor de águas da História diplomática
brasileira com a nomeação para Chanceler de José Maria da Silva Paranhos
Júnior, o Barão do Rio Branco, que alcançou inquestionável legitimidade junto
às elites brasileiras. Essa legitimidade esteve diretamente relacionada, entre
outros fatores, com a questão das fronteiras. De acordo com Magnoli, a figura
do Barão do Rio Branco está indissociavelmente vinculada à produção de uma
imagem geográfica e cartográfica da pátria. A sua ação na questão das fronteiras
“colocou-o no cume do discurso ideológico nacional”.
15
Convém salientar que esse período ficou conhecido como o da
“diplomacia do Barão”, um “marco na História das relações internacionais do
país: verdadeiro ponto de inflexão”
16
, coincidindo com o apogeu da Primeira
República, conforme veremos adiante.
Ao se analisar, ainda que bastante brevemente, a trajetória política de Rio
Branco, desde o período imperial, fica clara a importância dada à questão das
fronteiras, tanto no que tange as dimensões continentais brasileiras, quanto à
centralização alcançada durante o Império, fatos que por si só, na concepção do
Barão, demonstravam a distinção do Brasil do restante do "continente" latino-
americano. Na compreensão de Rio Branco a Monarquia fizera do Brasil um
país "unido, grande, próspero e livre, alvo da inveja dos súditos de Gusmão
Blanco e Porfírios Dias."
17
.
Rio Branco não escondia o orgulho de observar o Brasil como uma
exceção na América do Sul, considerando que a ação imperial brasileira
representou uma verdadeira "missão civilizadora"
18
. Tal perspectiva nos ajuda a
compreender o temor de Rio Branco de que, com a República, o Brasil deixasse
de ser a exceção igualando-se aos demais países da América do Sul.
19
Outro
15
Demétro MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit. p 261.
16
Clodoaldo BUENO e Amado CERVO. História da Política Exterior no Brasil Op cit
17
Carta de Rio Branco ao Barão Homem de Mello. (13/9/1889) Apud Clodoaldo BUENO.
Política Externa da Primeira República. São Paulo, Paz e Terra, 2003 p. 230
18
Sobre essa perspectiva de uma "missão civilizadora" ver. Álvaro LINS. Rio Branco. São
Paulo/Brasília, Alfa-ômega/FUNAG, 1996. Carlos Delgado de CARVALHO. História
diplomática do Brasil. São Paulo, Cia Editora Nacional, 1959. Affonso de CARVALHO. Rio
Branco: sua vida e obra. Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército Editora, 1995.
19
"[...] No momento em que o desenvolvimento da rede ferroviária brasileira e a imigração
européia estavam para completar a unificação da pátria brasileira, esta seria despedaçada em
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23
aspecto que merece atenção relaciona-se com a construção das relações
intracontinentais, marcadamente a questão do pan-americanismo. Sobre a
questão das fronteiras e, posteriormente, o pan-americanismo nos deteremos a
partir de agora.
2.2
Fronteiras e limites: a importância da questão territorial na construção de
um Estado Nacional
Antes de nos determos na análise da questão do territorial durante o
período da Chancelaria de Rio Branco cabe realizarmos um histórico da
importância da formação do território, tanto do ponto de vista concreto quanto
no imaginário do culo XIX e início do XX , questões que nos auxiliam na
compreensão da Diplomacia do Barão, bem como nos permite marcar a sua
relevância.
Em artigo recente Demetrio Magnoli
20
afirmou que a nação
contemporânea, sobretudo a partir do século XIX, depende, fundamentalmente,
de um corpo territorial definido. Nesse particular a construção das fronteiras
ganhou especial relevo nos projetos nacionais, cabendo, sobretudo, ao corpo
diplomático a legitimação de tal questão.
Inicialmente, caracterizando-se como conteúdo privilegiado da Geografia,
o estudo das fronteiras foi, ao longo dos oitocentos, marcado pela “teoria das
fronteiras naturais” na qual o Estado Nacional, em busca de maior segurança,
virtude do renascimento da questão federal." Carta ao Barão Homem de Mello. Apud Clodoaldo
BUENO. Op cit
20
Demétrio MAGNOLI. “Uma Ilha chamada Brasil” In: Nossa História, Rio de Janeiro, ano 3
n.º 25 p 4 , novembro 2005
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24
deveria levar seus limites
21
até acidentes geográficos bastante evidentes, com o
objetivo de tornar a fronteira certa e incontroversa. Mar, rios, montanhas,
cordilheiras etc. poderiam servir de limite entre os estados. Essa teoria nos
permite observar que havia uma clara preocupação com questões relacionadas à
defesa e consagração do território nacional. Surgida na França das Luzes, essa
teoria serviu de base para as justificativas, em especial durante o século XIX e
primeiras décadas do século XX, acerca dos limites entre estados nacionais e
como princípio regulador das relações entre nações vizinhas.
22
Inegavelmente
foi o suporte teórico para a formulação da noção de Ilha Brasil, fundamental
para as justificativas do Estado brasileiro na defesa da configuração de seu
território.
Segundo Magnoli, o Direito Internacional Público divide e classifica as
fronteiras em naturais e artificiais. As naturais, grosso modo, acompanham
certos traços físicos do solo ou dos chamados acidentes geográficos. As
artificiais não correspondem a nenhuma linha física ou acidente natural
23
. Essa
noção de fronteira natural tende a ser arbitrária na medida em que todas as
fronteiras são construções, escolhas” do homem. Cabe salientar, no entanto,
que tal fato não diminui sua eficácia, tanto no que tange a facilidade de
identificação, quanto pelos significados imaginários que elas comportam
24
.
Entretanto, convém destacar, que o apelo à natureza pode gerar a
“sublimação da história, a abstração da condição de construções geopolíticas
datadas ou seja, de tempos inscritos nos espaços.”
25
Magnoli ainda ressalta
que as fronteiras naturais não representam maior segurança que os traçados
artificiais. Para o autor, a experiência histórica demonstra que uma fronteira
21
Cabe salientar que, apesar do senso comum não fazer distinção entre os termos limites e
fronteiras, elas não são sinônimos. Limite é uma linha, ao passo que fronteira seria uma área,
uma zona. Mais a frente retomaremos essa discussão.
22
Demétrio MAGNOLI. O corpo da pátria. Op cit. p21
23
Hildebrando ACCIOLY. Manual do Direito Internacional Público. São Paulo, Saraiva, 1956.
24
Demétrio MAGNOLI. Op cit. p 21
25
Id ibid
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25
para ser segura precisa do reconhecimento de sua legitimidade por parte dos
estados vizinhos.
26
Claude Raffestin reforça e amplia essa visão ao afirmar que a linha
fronteiriça só é estabelecida quando a demarcação se processa, isto é, ela de fato
se estabelece quando já não estiver sujeita a quaisquer possíveis formas de
contestação por parte dos “estados conflitantes” e não quando tiver a simples
anuência dos mesmos.
27
No contexto da formação dos Estados Nacionais a noção de território,
como elemento constitutivo e, até mesmo, imprescindível a estes, ganhou
importância e legitimidade, na medida em que o Estado ergueu-se inserido nos
limites precisos, ou quase, dos territórios, caracterizando-se pela imposição de
uma ordem jurídica e política homogênea
28
. Tal noção de “configuração” do
território significou, por conseguinte, a criação de fronteiras políticas que o
delimitaram. Embora a noção de fronteira política, no sentido de separação
espacial em relação ao outro seja, de certa forma, muito antiga, o
estabelecimento de fronteiras precisas e, portanto, mais rígidas, consistiu em um
processo histórico relativamente recente, paralelo à formação dos estados
contemporâneos.
29
Nesse sentido, o significado do termo fronteira é, sobretudo,
conseqüência do processo histórico posterior a chamada Expansão Marítima,
quando o termo assumiu um dimensão planetária ligando-se à projeção colonial
dos estados nacionais europeus sobre vários continentes nos últimos quatro
séculos, exigindo, portanto, a superação do que se define como “fronteira
zonal”, característica do período medieval. Tal tipo de fronteira pode ser
compreendido por meio de vários significados: posto avançado; declive
defensivo, etc., contudo, ela é, principalmente, a expressão de uma informação
insuficiente, tendo em vista que as coletividades medievais, que muitas vezes de
26
Ibid p 42 O autor afirma que os critérios de reconhecimento de zonas de fronteiras variaram
de época para época.
27
Claude RAFFESTIN. Por uma Geografia do Poder. São Paulo, Ática, 1993. p 167
28
Demétrio MAGNOLI. O corpo da pátria. Op cit. p 15
29
Ibid p 31
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26
desenvolviam ao abrigo de “espessas florestas”, buscavam, no estabelecimento
de fronteiras, mais uma zona de defesa do que um traçado linear preciso.
30
Cabe ressaltar, dessa forma, que foi durante o longo período
compreendido entre os séculos XV e XIX que o espaço ganhou, - pela fixação
de fronteiras lineares e pela construção de um imaginário associado ao
território, baseada em uma precisa definição geográfica através de um
significativo desenvolvimento da cartografia, - relevante valor geopolítico,
chegando ao culo XX com as gidas linhas fronteiriças que caracterizam os
Estados contemporâneos.
Em relação à geopolítica, seu estudo é de fundamental importância para
compreendermos a ação diplomática a partir dos oitocentos e, principalmente do
século XX, uma vez que ela é o campo que, por definição, articula espaço
geográfico e ações políticas.
Data do último quartel do século XIX a consolidação da Geopolítica
enquanto disciplina sistematizada. Ao publicar, em 1882, o livro
Antropogeografia: fundamentos da aplicação da Geografia e da História
31
Friedrich Ratzel estabelece critérios de análises para a relação entre poder
político e espaço geográfico. Tais critérios passaram pela elaboração de uma
Teoria de Estado na qual a gênese deste exigiria a existência de um patrimônio
cultural associado a uma delimitação territorial. Para o autor o Estado seria a
“emanação natural da Sociedade destinada à defesa do território”.
“Espaço é poder”. Inegavelmente tal premissa transforma-se na viga
mestra da Geopolítica, colocando a questão das fronteiras como objeto central
de estudo. Para Ratzel, sem fronteiras não há Estado, na medida em que elas são
o “órgão periférico, o suporte e a fortificação de seu crescimento”, e delas
partiram, e partem, todas as transformações do organismo do Estado.
Outrossim, a reflexão acerca das fronteiras de uma nação nos remete ao campo
das relações internacionais, tendo em vista que elas explicitam as relações com
os Estados vizinhos e, sobretudo, a segurança de seu próprio território.
30
Claude RAFFESTIN. Por uma Geografia do Poder. Op cit p 166
31
Parte dessa obra encontra-se traduzida para o português em Antonio Carlos Robert MORAES
(org) Ratzel. São Paulo, Ática, 1990 (Coleção Grandes Cientistas Sociais- n º 59)
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27
As fronteiras e, por conseguinte, os países não são entidades fixas e
perenes, nem sempre estiveram onde estão, caracterizam-se como construções
da história humana, ou seja, como conclusões de processos sociais. Em ntese,
as fronteiras, partindo da linha limítrofe, podem ser consideradas como a
delimitação espacial do Estado, isto é, sua evidência territorial. Segundo Martin,
baseando-se em Ratzel, “a fronteira aparentemente rígida não é mais do que a
detenção temporária de um movimento.”
32
que se ter em mente que os conceitos de fronteira e limites não devem
ser confundidos. Ratzel chamava atenção para o erro, muitas vezes comum, de
definir fronteiras como “simples linhas ou divisórias, e não como instrumentos
vivos no desenvolvimento dos fenômenos máximos cujo teatro é a Terra.
33
Os
limites estabelecem a soberania do Estado sendo, portanto, fixas, enquanto as
fronteiras são linhas móveis, apresentando uma perspectiva mais ampla,
constituindo-se em faixas territoriais variáveis de acordo com os interesses de
cada Estado simbolizando não apenas as relações entre os diferentes Estados
Nacionais, mas também as relações entre o Estado e o seu território.
No texto “Geopolítica de Fronteras”
34
, Jacques Ancel afirma que as
fronteiras, ditas modernas, surgiram associadas ao aparecimento dos Estados
Nações. A partir de então, a noção de fronteira assumiu um papel moral e
espiritual”, noção esta que nos remete ao conceito de “espírito de fronteira”, que
para Ancel leva uma nação a se definir a partir da comparação com seus
vizinhos. Por esse prisma o autor afirma não existir fronteiras naturais”, não
passando esse conceito de uma doutrina pautada em justificativas cartográficas.
35
32
André Roberto MARTIN. Fronteiras e Nações. São Paulo, Contexto, 1992. p 42
33
Antonio Carlos ROBERT (org) Ratzel. Op cit . p95
34
Jacques ANCEL. Geopolítica de Fronteras. In: Daniel CASTAGNIN (comp). Poder Global y
Geopolítica. Buenos Aires. Pleamar, 1984.
35
Outro autor que estabelece uma contundente crítica à noção de Fronteira natural é Raymond
Aron ao afirmar que “a ideologia das fronteiras naturais serve para justificar uma fronteira,
quando não se dispõe de argumento melhor”. Raymond ARON. Paz e Guerra entre as Nações.
Brasília, UnB, 1992, p277.
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28
Richard Hartshorne
36
critica a noção de “fronteira natural” na medida em
que a construção de fronteiras deve se pautar em aspectos relacionados aos
processos de construção social uma vez que por mais arbitrárias e gidas que
sejam os limites, os grupos fronteiriços, independente de suas nacionalidades,
apresentam a tendência de manter os laços pré existentes com os lugares e
culturas de origem, desenvolvendo interações entre os lados separados
artificialmente.
Nesse sentido, Hartshorne, pensando, principalmente, nas regiões
formadas a partir de experiências coloniais, afirma ser cada fronteira uma
singularidade e que as instabilidades, muitas vezes comuns, em regiões
fronteiriças quase sempre se relacionam com as contradições entre traçados
artificiais dos limites territoriais impostos de “fora para dentro” pelas antigas
metrópoles, cujos contornos não levam em consideração aspectos étnicos,
lingüísticos, históricos etc.
37
De acordo com Adelar Heinsfeld
38
a diplomacia brasileira, em especial
durante e após a Chancelaria do Barão do Rio Branco assumiu um claro papel
geopolítico na construção do Estado brasileiro, tendo em vista que o Barão “foi
o responsável pelo traçado e fixação das modernas linhas limítrofes nacionais,
adentrando o território brasileiro no hiterland latino-americano”
39
Para Heinsfeld, em sua função Geopolítica a implantação de qualquer
fronteira deve observar o equilíbrio entre as “forças vitais de dois povos”, bem
como é a definição e o reconhecimento das fronteiras que garante a estabilidade
política entre as Nações envolvidas, sendo que tal reconhecimento passa pela
construção de uma justificativa histórica realizada por cada Estado.
36
Richard HARTSHOME. Propósitos e Natureza da Geografia. São Paulo,
HUCITEC/EDUSP, 1978.
37
Ibid p 135
38
Adelar HEINSFELD. As ações Geopolíticas do Barão do Rio Branco e seus reflexos na
Argentina. Porto Alegre, PUC – RS, 2000. Tese de Doutorado.
39
Ibid p 81. Ao analisar as estratégias do Barão no estabelecimento dos limites do Brasil.
Heinsfeld afirma, e esta é a sua tese central, ter sido Rio Branco um verdadeiro geopolítico,
claramente influenciado pelos postulados geográficos de sua época em especial de Ratzel com
sua teoria de que o “limite definido contribui para a maturação de um povo.”
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29
Com os tempos modernos a formação do território tornou-se, no Novo
Mundo, elemento constitutivo fundamental na elaboração de projetos nacionais,
uma vez que estes pressupõem a produção de fronteiras políticas entendidas, de
acordo com Raffestin, como limites entre Estados-Nações:
"Quando a fronteira se tornou um sinal? Tornou-se um sinal quando o Estado
moderno atingiu um controle territorial 'absoluto' e tornou unívoca a mensagem da
fronteira = limite sagrado. Para aí chegar, foi preciso que se realizassem toda uma série
de condições específicas, dentre as quais a linearização da fronteira é talvez a mais
importante."
40
Para Gomes
41
a construção de fronteiras consiste, em última análise, numa
"prática de identidade" por se tratar de elemento fundamental na representação
do território. Para Foucault
42
o discurso de construção e, principalmente, de
justificativa das fronteiras é o próprio discurso do nacionalismo.
De acordo com Magnoli a construção da nacionalidade aproxima a
Geografia da História, tendo em vista que a construção das fronteiras liga-se `a
elaboração do imaginário territorial no interior da(s) História(s) Nacional(is).
"As fronteiras são as estruturas espaciais elementares, de forma linear, com
função de descontinuidade geopolítica e de delimitação, de marco, nos três registros do
real, do simbólico e do imaginário. A descontinuidade se aplica entre as soberanias, as
histórias, as sociedades, as economias, os Estados as línguas e as nações. Na função de
realidade, corresponde ao limite espacial do exercício de uma soberania nas suas
modalidades específicas: linha aberta, entreaberta ou fechada. Na simbólica, remete à
pertinência a uma comunidade política inscrita num território que é o seu; têm um
sentido identitário. O imaginário conota relação com o Outro, vizinho, amigo ou
inimigo, e, portanto a relação consigo mesma, com a própria história e com seus mitos
fundadores ou destruidores."
43
A Nação constitui-se numa construção na qual a elaboração de um
imaginário territorial foi fundamental para aproximação entre soberania e
coletividade nacional, logo o território, além do aspecto concreto que assume
40
Apud Demétrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit. p. 31
41
R.C. GOMES. "A construção das fronteiras". In : A memória da nação. Lisboa, Livraria
da Costa, 1991.
42
M. FOUCAULT. "Sobre a Geografia". In : Microfísica do Poder. Rio de Janeiro, Graal, 1979.
43
Demétrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit. p 36.
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30
para a formação de um Estado-Nação, adquire um valor simbólico fundamental
para o (auto)reconhecimento da Nação.
44
Nesse sentido, Magnoli defende, conforme visto, a tese de que a narrativa
territorial foi um dos pilares centrais da construção do mito fundador brasileiro
que perdurou desde o processo de emancipação política até os primeiros anos
republicanos.
No caso brasileiro a importância do território na construção da Nação
ganha ainda maior relevo quando observamos, no discurso, que os "limites
territoriais" precedem a própria construção do Estado, visão esta que fez parte
do imaginário das últimas décadas do século XVIII e ao longo do século XIX.
Esse mito do "território pronto" serviu de base para uma intelectualidade que
partia do principio da existência de um território nacional prévio, que
perpassava entre os aspectos da natureza e a delimitação política estabelecidas
pela Coroa portuguesa. Tal mito, segundo Magnoli, construído ao longo do
século XIX, desempenhou a função de barreira conceitual para a reconstituição
da formação dos territórios coloniais portugueses na América bem como, em
última análise, para a compreensão do empreendimento territorial do Estado
imperial.
45
No cerne da construção deste "mito" identificamos a elaboração do
Tratado de Madri de 1750 que, não sem uma razão estratégica bastante
explícita, foi valorizado como o grande definidor da territorialidade nacional,
tanto em um sentido prático, a demarcação das fronteiras, quanto simbólico - a
dissolução de Tordesilhas, com a conseqüente superação da geopolítica do
Antigo Sistema Colonial Ibérico.
46
Em artigo de 2003, Ilmar Mattos, ao trabalhar com a construção do Estado
Imperial brasileiro, ressaltou a "monumentalização" do Tratado de Madri que se
tornou "documento principal na definição dos limites do Império" tanto
geograficamente, ao se relacionar com a natureza do território, quanto
44
Este é um dos argumentos principais do trabalho de Demétrio Magnoli.
45
Demétrio MAGNOLI. "O Estado em busca do seu território". In : István Jancso. Brasil:
formação do Estado e da Nação. São Paulo, Hucitec, 2003.
46
Essa abordagem aparece nos trabalhos citados de Demétrio MAGNOLI e em Ilmar
MATTOS. Do Império do Brasil ao Império do Brasil. 2003 (Mimeografado).
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31
historicamente ao se remeter ao desbravamento e à colonização, empreendidos
pelos descobridores da terra.
47
Ao trabalhar com a construção do Império brasileiro, Mattos explicita a
importância, para a compreensão deste Império, de que ele era composto por
várias regiões, vários "brasis", fato que traz à tona a questão do território, uma
vez que ele lança luz sobre a relação "parte - todo" defendendo a integridade
territorial - pedra de toque na construção de um Império - inserindo as
províncias nessa nova totalidade. Outrossim, tal integridade passava a ser
encarada como condição sine qua non para a manutenção de um projeto político
autônomo e independente.
A instabilidade interna brasileira nos remete para o argumento central de
Mattos, a saber: o Império do Brasil não pode ser compreendido a partir da
visão clássica de Império na qual este pode ser pensado a partir de uma
lógica expansionista. Tal possibilidade, no caso brasileiro, mostrou-se inviável
desde os primeiros anos do Primeiro Reinado, fato que leva o autor a pensar o
Império do Brasil como um Império voltado para dentro - diferenciando-se do
Império lusitano - o que levou o autor a valorizar as ressignificações do termo
brasileiro, entendido como peça fundamental para a compreensão do Império do
Brasil, na medida em que no contexto pré-emancipação a noção de brasileiro
passou a receber uma "conotação eminentemente política"
48
servindo para
definir "... um grupo político ou uma corrente de opinião que se contrapunha ao
'partido europeu'".
49
No cenário posterior ao sete de setembro, brasileiro passou a ser
denominação dos que aceitaram a independência "quem aderiu à nossa sagrada
causa, quem jurou a independência deste Império, é brasileiro."
50
Nesse
sentido estabelece-se uma estreita relação entre cidadania, nacionalidade e
território, conforme podemos observar no sexto artigo da Carta outorgada de
1824. "[...] São cidadãos brasileiros. I. Os que no Brasil tiverem nascido, quer
47
Ilmar MATTOS . Do Império do Brasil ao Império do Brasil. Op cit. p 3.
48
Ibid p 6.
49
Cartas sobre a Revolução do Brasil. Apud Ilmar MATTOS. Op cit.
50
José Honório RODRIGUES. Independência: revolução e contra -revolução. Apud Ilmar
Mattos. Op cit. p 7
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32
sejam ingênuos ou libertos, ainda que o pai seja estrangeiro, uma vez que este
não resida por serviço de sua nação."
51
Convém salientar que o ser brasileiro não foi compreendido e aceito de
uma forma única. Polarizações tais como: patriotas vs. portugueses; brasileiros
vs. pernambucanos etc., tanto ameaçavam a independência quanto a unidade
territorial do Império. "Essas clivagens no interior da boa sociedade revelavam
como somente a partir da colocação em evidência da questão do Estado uma
identidade política pode iniciar a trajetória de sua constituição."
52
De acordo com Magnoli o poder imperial no Brasil surge como resposta à
ameaça de desintegração republicana, observável na América Hispânica, bem
como instrumento da unidade política e territorial. A organização do Império
passou pela localização das bases sobre as quais seria fundamentado o poder do
Estado. Nas palavras do autor
“[...] nasce uma ‘nação’ na qual a soberania, a plenitude dos direitos políticos,
residia na Nação Brasileira, uma realidade composta do Povo e do Estado (o
Imperador) e fixada num território definido... A soberania não residia nem no Estado
nem no Povo, e sim na união dos dois."
53
Essa associação entre Império do Brasil e Nação brasileira nos remete à
questão do território na construção da nação, tendo em vista que eram "cidadãos
brasileiros os que no Brasil tiverem nascido, quer sejam ingênuos ou libertos".
Logo o território tanto definia quais indivíduos estavam aptos para construir a
nação brasileira, quanto servia para afirmar os elementos que singularizavam o
Império do Brasil “uma vez que este se encontrava impossibilitado de expandir
suas fronteiras espaciais”
54
.
Podemos observar nessa abordagem acerca da importância do território na
formação brasileira, que essa questão assumiu papel de destaque na construção
do projeto nacional brasileiro, sendo um dos eixos centrais para os "fundadores"
do Brasil, que ao assumirem uma perspectiva mítica, na qual a nossa unidade
51
Ibid. p 7.
52
Id ibid
53
Demétro MAGNOLI. "O Estado em busca do seu território". In : István Jancso. Brasil:
formação do Estado e da Nação. Op cit. p67
54
Ilmar MATTOS. Do Império do Brasil ao Império do Brasil Op cit. p 9.
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33
territorial seria uma herança colonial e que tal herança, marcava o lugar especial
que o Estado brasileiro deveria ocupar por ser a "maior unidade independente
da América - ao contrário das nações republicanas de origem espanhola."
55
Inegavelmente a unidade territorial brasileira foi fruto de um projeto
muito bem articulado do Estado Imperial. Nesse sentido a diplomacia brasileira
ocupou um lugar importante nessa construção, sobretudo a partir da organização
oficial do corpo diplomático em 1851
56
. Convém salientar, no entanto, que o
pretendemos abordar a política externa do Império, apesar de considerarmos que
tal período da diplomacia brasileira nos fornece chaves interessantes para
pensarmos a ação diplomática das primeiras décadas republicanas.
Com a Proclamação da República o cenário político brasileiro viveu um
período de ajuste, denominado pela historiografia como “República da
Espada”
57
. A instabilidade dos primeiros governos republicanos começou a ser
resolvida no mandato do primeiro presidente civil, Prudente de Morais, período
no qual se alcançou um certo equilíbrio político, suficiente para que seu
sucessor, Campos Salles, saneasse as finanças através do Funding Loan e
implantasse a chamada Política dos Governadores, uma das características
básicas do período da História do Brasil que ficou conhecido como República
Oligárquica.
58
Cabe salientar que, com o advento da República, a questão territorial
continuou a ser preocupação relevante do projeto de construção do Estado
brasileiro
59
. A primeira Constituição republicana, promulgada em fevereiro de
1891, deixava clara tal preocupação, tanto no que tange as atribuições do Poder
Executivo, quanto nos desígnios do Congresso Nacional.
55
Demétrio MAGNOLI . O Corpo da Pátria. Op cit. p 126.
56
Sobre isto ver. Demétrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit ; Clodoaldo Bueno &
Amado Luiz Cervo. História da Política Externa no Brasil. Op cit.
57
Período que compreende os dois primeiros governos republicanos nos quais os militares
estavam no Poder.
58
Sobre esse período, ver entre outros Boris FAUSTO. História do Brasil. São Paulo, EDUSP,
1995.
59
Não podemos perder de mente as várias questões de limites que, quando do início do período
republicano, ainda estavam pendentes.
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34
A Constituição apresentava evidente preocupação em relação à soberania
nacional quando estabelecia para o governo Federal a responsabilidade “para
repelir invasão estrangeira..”
60
. De forma análoga atribui ao Congresso uma
série de obrigações que passavam pela legislação “sobre a navegação dos rios
que banhem mais de um Estado, ou se estendam a territórios estrangeiros”,
assim como “resolver definitivamente sobre os limites dos Estados entre si, os
do Distrito Federal e os do território nacional com as nações limítrofes”
podendo “autorizar o governo a declarar guerra, se não tiver lugar ou
malograr-se o recurso do arbitramento, e a fazer a paz”, “resolver
definitivamente sobre os tratados e convenções com as nações estrangeiras”,
“adotar o regime conveniente à segurança das fronteiras”, “fixar anualmente
as forças de terra e mar”, “legislar sobre a organização do Exército e da
Armada” e, por fim, “conceder ou negar passagens a forças estrangeiras pelo
território do País, para operações militares”
61
.
Das atribuições do Poder Executivo merecem destaque as medidas
referentes à segurança nacional que passavam diretamente pela manutenção do
território, tais como: “exercer ou designar quem deva exercer o comando
supremo das forças de terra e mar dos Estados Unidos do Brasil, quando forem
chamadas às armas em defesa interna ou externa da União”; declarar a
guerra e fazer a paz...”; “declarar imediatamente a guerra nos casos de
invasão ou agressão estrangeira.”
62
Paralelo a isso, é bastante interessante
notar que caberia ao Poder Executivo a montagem do Corpo Diplomático
brasileiro, bem como ser, em última análise, o principal responsável pelas
relações com outras nações.
63
Outro aspecto bastante interessante se destacar era a percepção, de
certa forma próxima da visão imperial, do que deveria ser considerado
60
Constituição de 1891 º Das atribuições do Governo Federal Art 6º.
61
Ibid. Das atribuições do Congresso. Art 6º itens 10, 11 ,12, 16, 17, 18, 21, 24, 31
62
Ibid. Das atribuições do Poder Executivo. Art 48 itens 3, 4, 7, 8.
63
Ibid. Seriam atribuições também do Poder Executivo: “nomear os membros do Supremo
Tribunal Federal e os Ministros diplomáticos, sujeitando a nomeação à aprovação do Senado.
Na ausência do Congresso, designa-los-á em comissão até que o Senado se pronuncie; nomear
os demais membros do Corpo Diplomático e os agentes consulares; manter as relações com os
Estados estrangeiros.”
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35
brasileiro. Seriam cidadãos brasileiros: 1º) os nascidos no Brasil, ainda que de
pai estrangeiro, não, residindo este a serviço de sua nação; 2º) os filhos de pai
brasileiro e os ilegítimos de mãe brasileira, nascidos em país estrangeiro, se
estabelecerem domicílio na República; 3º) os filhos de pai brasileiro, que
estiver em outro país ao serviço da República, embora nela não venham
domiciliar-se; 4º) os estrangeiros, que achando-se no Brasil aos 15 de
novembro de 1889, não declararem, dentro em seis meses depois de entrar em
vigor a Constituição, o ânimo de conservar a nacionalidade de origem; 5º) os
estrangeiros que possuírem bens imóveis no Brasil e forem casados com
brasileiros ou tiverem filhos brasileiros contanto que residam no Brasil, salvo
se manifestarem a intenção de não mudar de nacionalidade; 6º) os estrangeiros
por outro modo naturalizados.”
64
A partir de agora pretendemos analisar como a questão territorial,
associada à manutenção da soberania nacional, foi importante na consolidação
de um projeto de nação, desenvolvido pelo Ministério das Relações Exteriores
(Itamaraty), no período de consolidação da República. Estratégia esta que teve
no Barão seu principal artífice.
2.3
O Itamaraty no Período Rio Branco
No período do Barão (1902 – 1912), o Itamaraty apresentou relativa
autonomia diante do restante do aparelho do Estado, fato que, no entanto, não
pode ser encarado como uma independência política, defendido por alguns
65
64
Id ibid
65
Ver em especial Sérgio DANESE. Diplomacia Presidencial. Op cit. Basta pensarmos de
acordo com os princípios constitucionais acima expressos a prevalência e relevância do Poder
Executivo na montagem do corpo diplomático nacional. Podemos observar também o fato da
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36
devido à longa duração da Chancelaria de Rio Branco
66
. Devemos salientar que
tal autonomia se explica na medida em que sua política aproximou-se dos
interesses das elites ligadas a agroexportação. Paralelo a isso, o Barão pôs em
prática uma estratégia que satisfazia o nacionalismo brasileiro, nutrido na
vastidão do território nacional, no potencial de suas riquezas naturais, na
prosperidade da agroexportação e, sobretudo, na estabilidade das instituições
políticas, alcançada a partir do Governo Campos Salles.
Inegavelmente a consolidação territorial brasileira foi pedra de toque do
pensamento político do Barão que, aproximando-se de uma clara perspectiva
unitarista e conservadora
67
, afirmava alguns meses antes de tornar-se Chanceler
que:
"[...] as grandes reformas políticas não podem ser feitas da noite para o dia, [...]
[com] tantas reformas precipitadas e inconsideradas, o de que precisamos é fortalecer e
desenvolver os elementos conservadores, pôr termo às agitações e à anarquia e
assegurar acima de tudo a unidade nacional"
68
.
Outro aspecto do pensamento de Rio Branco ligado à questão das
fronteiras, relaciona-se com o receio de eventuais agressões européias à
América do Sul, provocadas pela, citada, ação imperialista, fato que
provocava na opinião blica uma "repulsa que o levava a agir com a firmeza
que fosse necessária para impedir que a soberania nacional fosse
arranhada."
69
. Essa lógica passava pela necessidade, não apenas do Brasil, mas
de todo “continente” latino-americano buscar um equilíbrio político, melhor
retórica e da ação prática do Barão, a frente do Itamaraty, estar de acordo com as prerrogativas
constitucionais brasileiras.
66
Rio Branco esteve a frente do Itamaraty durante quatro mandatos presidenciais. Rodrigues
Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da Fonseca.
67
Tal visão sobre o Barão pode ser vista em Demétrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit. ;
Clodoaldo BUENO & Amado Luiz CERVO. História da Política Externa no Brasil. Op cit . e
em Clodoaldo BUENO. Política Externa da Primeira República.(1902 A 1918). Op cit.
68
Carta de Rio Branco a Joaquim Nabuco em 30 /8/ 1902. Apud Luiz Viana FILHO A vida do
Barão do Rio Branco. Rio de Janeiro, José OLYMPIO, 1959. p 317
69
Clodoaldo BUENO. Op cit. p 133. É interessante observar que o respeito à soberania nacional
também se colocava, na Constituição pelo viés do respeito à nação estrangeira conforme
podemos perceber nesse artigo: “Art.88 - Os Estados Unidos do Brasil, em caso algum, se
empenharão em guerra de conquista, direta ou indiretamente, por si ou em aliança com outra
nação.”
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37
maneira de evitar atentados às soberanias nacionais. Nesse sentido Rio Branco
compreendia que deveriam ser buscadas soluções para as constantes crises
políticas que assolavam a região. Nas suas palavras :
"[...] É do interesse de todos nós concorrer para que se encerre a era das
revoluções nesta parte do continente. Tão freqüentes agitações e desordens
desacreditam na Europa e nos Estados Unidos todos os latinos ou latinizados da
América, retardam ou paralisam o progresso de pses que, pelas obras da paz,
poderiam em pouco tempo ser ricos e fortes, e constituem um verdadeiro perigo para
grande parte do nosso continente em futuro não muito remoto. Quando as grandes
potências da Europa não tiverem mais terras a ocupar e colonizar na África e
Australásia hão de voltar os olhos para os países da América Latina, devastadas pelas
guerras civis, se ainda assim o estiverem, e não é provável que os ampare a Doutrina
de Monroe, porque na América do Norte também haverá excesso de população,
política imperialista e ali se sustenta o direito de desapropriação, pelos mais fortes,
dos povos incompetentes."
70
que se ter em mente a dupla perspectiva - diferenciação / aproximação
- assumida pelo Barão em relação aos países latino-americanos. De um lado ele
procurava diferenciar o Brasil dos demais países da região, porém tal
diferenciação não significava isolamento. Ao contrário. O período do Barão foi
marcado pelo aumento considerável da presença diplomática brasileira na
América Latina, em especial na América do Sul. Soma-se a isso a ampliação do
número de diplomatas estrangeiros no Rio de Janeiro, com o objetivo de
transformar a Capital Federal no local com "mais numeroso corpo diplomático
da América Latina".
71
Essa política adotada por Rio Branco buscava elevar o prestígio do Brasil
a partir de uma lógica na qual o país ocuparia uma posição diferenciada no
contexto latino-americano, fato que o levaria a exercer, obrigatoriamente, um
papel de liderança no continente, uma vez que seria "a única potência da
70
Despacho para Buenos Aires em 22 / 11/ 1904. Apud Clodoaldo BUENO. Política Externa
da Primeira República.(1902 A 1918) Op cit p.134. Grifos nossos
71
Clodoaldo BUENO e Amado Luiz CERVO. História da Política Externa no Brasil. Op cit
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38
América Latina".
72
Posição esta que só poderia ser confirmada a partir da
demarcação e delimitação das "grandiosas fronteiras nacionais"
73
Com o êxito da ação política / diplomática na questão dos limites e a
busca de uma nova posição brasileira no cenário internacional, Rio Branco
tornou-se ícone de um país, ao menos em tese, unido, estável e com visibilidade
externa
74
. Essa união passava fundamentalmente, conforme salientado, pela
defesa da soberania nacional e esta, em sintonia com a própria construção
mitológica criada desde a época colonial, passava pela defesa do território
brasileiro. Tal defesa perpassava por uma dupla perspectiva: a discussão sobre
os limites territoriais brasileiros propriamente dito associando-a à questão da
militarização, outro tema, destacado, igualmente caro ao Barão, que
preocupava-se com a defesa do Estado brasileiro antes mesmo de tornar-se
Chanceler, como podemos constatar na questão das Missões com a Argentina.
"Fico muito inquieto com nosso negócio de Missões, porque se os argentinos
aproveitarem a ocasião temo de passar por grandes vergonhas. Não temos torpedos, não
temos exército, e os argentinos têm tudo isso. Pela primeira vez, desde que o Império
existe, achamo-nos assim, à mercê dos nossos vizinhos, e em um tempo em que os
elementos de guerra não podem ser improvisados em meses ou semanas."
75
Vale ressaltar ainda que durante o litígio com a França na questão da
Guiana, Rio Branco, na qualidade de Delegado brasileiro, afirmava que para
uma boa negociação restava ao Brasil utilizar meios persuasivos na medida em
que " uma nação como o Brasil [...] ainda não dispõe de força suficiente para
impor a sua vontade à uma grande potência militar"
76
72
Luiz Viana FILHO. A vida do Barão do Rio Branco Op cit. "...o Brasil entrou resolutamente
na esfera das grandes amizades internacionais, a que tem direito pela aspiração de sua cultura,
pelo prestígio de sua grandeza territorial e pela força de sua população." p 393
73
Id, ibid.
74
Lidia BESOUCHET Rio Branco e as relações entre Brasil e a República Argentina. Rio de
Janeiro, Ministério das Relações Exteriores, 1949. p. 34
75
Carta de Rio Branco ao Barão Homem de Mello. 05 /9 / 1882. Apud Clodoaldo BUENO.
Política Externa da Primeira República.(1902 A 1918) Op cit
76
Rio Branco Apud Luiz Viana FILHO Op cit.
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39
Enquanto Chanceler, o Barão estimulou projetos de rearmamento naval e
construção militar
77
. Para Rio Branco o caráter pacífico da nacionalidade não
deveria ser sinônimo de fraqueza militar, em suas palavras:
"Temos de prover pela nossa segurança, de velar pela nossa dignidade e pela
garantia dos nossos direitos que às vezes a força pode dar. Carecemos de Exército e
de reservas numerosas, precisamos reconquistar para nossa Marinha a posição que
antigamente ocupava."
78
Segundo Clodoaldo Bueno o reaparelhamento das Forças Armadas era
fundamental devido a posição que o Brasil pretendia ocupar no continente.
Nesse sentido além da (re)militarização, fazia-se necessário o desenvolvimento
de uma educação cívica e militar do povo, como garantia da soberania e da paz
nacionais evitando "afrontas ao amor próprio nacional".
79
De acordo com o
autor a soberania brasileira, entendida, basicamente, como a manutenção do
território nacional, dependia, "principalmente da vontade dos vizinhos que nos
cercam"
80
, fato que forçava o Brasil a estar sempre preparado para "imediata e
eficaz repulsa"
81
gerando a necessidade de estar "aparelhado com todos os
elementos necessários à defesa nacional"
82
. Nesse sentido Bueno afirma que, na
concepção de Rio Branco, diplomatas e soldados seriam duas faces de um
mesmo projeto de delimitação e manutenção do território nacional.
Tais idéias do Barão ficam explicitas nesse discurso proferido no Clube
Militar em outubro de 1911.
"[...]Durante muito tempo fomos, incontestavelmente, a primeira potência militar
da América Latina, sem que essa superioridade de força, tanto em terra como no mar,
se houvesse mostrado nunca um perigo para os nossos vizinhos. nos lançamos a
lutas exteriores quando provocados ou quando invadido nosso território. Mas, cumpre
notar, jamais nos empenhamos em guerras de conquista. E muito menos poderíamos ter
planos agressivos agora que nossa constituição política proíbe expressamente a
conquista e impõe o recurso ao juízo arbitral antes de qualquer apelo às armas [...].
77
Sobre isso ver E. BACKEUSER.”Rio Branco, geográfo e geopolítico”. Revista da Sociedade
de Geografia, nº 52, 1945.
78
Barão do Rio Branco Obras Completas Volume 9 (Discursos) . Rio de Janeiro Ministério das
Relações Exteriores. 1948. pp. 103 e 104
79
Clodoaldo BUENO. Op cit. p 221.
80
Id, ibid
81
Ibid, p 223
82
Id, ibid
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40
Querer a educação cívica de um povo, como na libérrima Suíça, como nas
democracias mais cultas da Europa e da América, não é querer a guerra: pelo contrário,
é querer assegurar a paz, evitando a possibilidade de afrontas e de campanhas
desastrosas.
Os povos que, a exemplo da Celeste Império, desdenham as virtudes militares e
se não preparam para a eficaz defesa do seu território, dos seus direitos e da sua honra,
expõem às investidas mais fortes e aos danos e humilhações conseqüentes da derrota
[...]."
83
O receio de ataque à soberania nacional estava também, conforme já
destacado, relacionado ao avanço das potências imperialistas européias. Diante
desse contexto ganhou relevo um dos assuntos mais tratados pelos
pesquisadores do período Rio Branco, a saber: a aproximação com os Estados
Unidos.
84
que destacar, porém, que esta “americanização” assumiu um certo
pragmatismo, uma vez que Rio Branco observou a impossibilidade de, ao
menos naquele momento, se formar no "continente" sul-americano um bloco
capaz de opor-se aos Estados Unidos, devido á falta de coesão entre os países de
origem hispânica e destes com o Brasil.
Nesse particular aparece para nós o segundo pilar da política do Barão: o
Pan-americanismo um dos temas mais caros no debate intelectual e diplomático
do período e que teve na Revista Americana, tal qual a questão das fronteiras,
significativo destaque.
2.4
O Brasil e as Américas: buscando uma aproximação
A idéia de uma cooperação continental na América pode ser pensada
desde os primeiros anos após as independências se considerarmos a iniciativa de
Simon Bolívar de, em 1824, convocar os países do continente para um
83
Barão do Rio Branco. Obras Completas. Op cit pp 278 e 279.
84
De acordo com Álvaro da Costa FRANCO, Diretor do Centro de História e Documentação
do Itamaraty, a política externa da época, foi defensora, “inconteste”, do princípio do Pan-
americanismo, reforçada, bastante, pela “diplomacia do Barão”,como, segundo o autor pode ser
constatado, por exemplo, na realização da III Conferência Internacional Americana, na qual
ficou patente a política de unwritten aliance com os Estados Unidos
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41
Congresso no Panamá, - reunido em 1826- no qual se debateriam mecanismos
de cooperação entre as recém formadas nações americanas e que sirviese de
consejo en los grandes conflictos, de punto de contacto en los peligros
comunes, de fiel intérprete en los tratados públicos cuando ocurrieran
dificultades y de conciliador en las diferencias entre los pueblos”
85
. O
Congresso contou com a participação da Colômbia, Venezuela, Equador, Chile,
Argentina, Peru, México e América Central.
Anos depois, o pan-americanismo derivou da idéia de uma Pan-América
cunhado pela imprensa norte americana em 1889. Devemos observar que
durante o século XIX a Europa foi marcada por uma tendência a movimentos
ideológicos internacionais os “panismos” que tinham como proposta básica
reunir, em torno de um centro dominante, países, povos, ou comunidades de
parentesco vinculadas às questões étnicas, lingüísticas e culturais. Como
exemplos mais emblemáticos desse período temos: o pan-germanismo, o pan-
eslavismo, o pan-islamismo etc. Todavia, a singularidade do pan-americanismo
era seu caráter geográfico continental, muito embora não deixasse de ter um
objetivo político, apesar de não apresentar um plano doutrinário
86
. Para os EUA,
o movimento pan-americano deveria incorporar uma série de fatores, como
localização geográfica, interesses econômicos e aspirações nacionais que
possibilitassem maior aproximação continental.
Em uma perspectiva sul-americana, de um modo geral, o pan-
americanismo foi apropriado como um dos principais pilares da política externa
continental, configurando-se em um instrumento de defesa da soberania e da
igualdade jurídica dos Estados, que deveriam se constituir nos princípios
legitimadores das relações internacionais do continente. Entretanto, convém
observar a presença de certa dicotomia entre a prática e a teoria política
internacional, uma vez que, por um lado, havia a retórica da solidariedade
hemisférica e da conseqüente igualdade entre soberanias, enquanto, em termos
85
Manoel Lelo BELLOTO & Anna Maria Martinez CORRÊA (org.) Bolívar, Simón: Política.
Rio de Janeiro; Ed. Ática,1983.
86
Arturo ARDAO. “Panamericanismo y Latinoamericanismo”. In: Leopoldo ZEA
(coord.)América Latina en sus Ideas. México; Siglo XXI, 1986. Pp. 157-171.
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42
práticos, ocorriam sucessivas intervenções dos Estados Unidos em diferentes
assuntos internos de diferentes nações, sobretudo, na América Central e no
Caribe. Do ponto de vista prático a cooperação continental ficou praticamente
restrita às formulações teóricas. Tal fato se explica, para além de certa
desconfiança em relação aos reais interesses da política externa norte-
americana, pelo ambiente de rivalidade regional que marcava as relações entre
as repúblicas sul-americanas.
Podemos observar que na América do Sul existia um contexto de
rivalidades geopolíticas, com disputas territoriais, corrida armamentista,
tendência à formação de alianças e contra-alianças.
87
A formação de blocos
regionais era uma preocupação constante das Chancelarias do continente, na
medida em que havia um sentimento, até certo ponto comum, de se bloquear,
em especial no mundo hispano-americano, as intervenções norte-americanas,
configurando, tais uniões, em elementos aglutinadores para uma resistência
continental. Porém, os vários problemas fronteiriços prejudicavam a
possibilidade de uma unidade política da região, pois, na prática, a aproximação
de dois Estados estimulava a formação de um bloco contrário, como profilaxia à
uma possível ruptura do equilíbrio político.
88
Dentre as rivalidades continentais merece destaque a protagonizada
pelas principais economias da América do Sul: Argentina, Brasil e Chile. Dos
três, a Argentina era a única a fazer fronteira com os outros dois. Ao longo do
século XIX protagonizou disputa geopolítica com o Brasil pela região do Prata.
Com o advento da República no Brasil houve um ensaio de aproximação que,
no entanto, não logrou êxito, sobretudo pela política de rearmamento por parte
do governo brasileiro observado pela diplomacia portenha como indicativo de
uma política expansionista brasileira. Apenas em 1905, com a negociação do
tratado de arbitramento foi possível pensar na construção de uma boa relação
diplomática que, no entanto, retrocedeu após o episódio do Telegrama 9 ,
87
Clodoaldo BUENO. Do Idealismo ao Realismo: Brasil e Cone Sul no início da República
(1889 – 1902). In: Contexto Internacional nº 12, Rio de Janeiro, IRI/PUC, pp71-82, 1990.
88
Sobre isto ver Mario BARROS. Historia Diplomática de Chile (1541-1938). Barcelona,
Ediciones Ariel, 1970, pp 613 e seguintes.
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43
protagonizado pelo Ministro das Relações Estrangeiras da Argentina Ernesto
Zeballos.
89
Podemos afirmar que no alvorecer do século XX a diplomacia argentina
desistiu do objetivo central do século anterior de reconstituir o Vice-Reinado do
Prata. Cabe salientar, no entanto, que ela continuava com sua meta geopolítica
de consolidar-se como líder no continente, buscando modificar a distribuição de
poder na região com o claro objetivo de estabelecer a hegemonia da região.
90
Em relação ao Chile
91
, o primeiro aspecto a ser observado consiste na sua
posição geográfica, bastante particular entre a Cordilheira dos Andes e o mar.
Associando essa premissa com as questões de limites que a nação possuía com
seus vizinhos, Bolívia, Peru e Argentina, a preocupação central da diplomacia
chilena era com um possível isolamento no continente. Nesse sentido o Brasil
era visto como potencial aliado nessa geopolítica sul-americana. Para a
diplomacia brasileira, o Chile seria uma espécie de contrapeso geopolítico, no
sentido que obrigava a Argentina a manter suas atenções voltadas para as duas
fronteiras.
É interessante notar que as rivalidades sul-americanas eram
acompanhadas com enorme interesse pelo Itamaraty, que em alguns momentos
chegou a oferecer auxilio para mediar questões regionais, como no caso da
ameaça de Guerra entre Peru e Equador, em 1909 e do incidente entre Chile e
Peru, em 1910. O equilíbrio bastante instável nas relações internacionais sul-
americanas explica, de certa forma, a preocupação de Rio Branco em buscar
89
Tal fato consiste em uma versão falsa divulgada por ZEBALLOS acerca de um telegrama
sigiloso enviado pelo Brasil ao Chile. Após ser desmascarado, o Chanceler argentino foi
afastado do Ministério. Inegavelmente, apesar de em um primeiro momento as relações
Brasil/Argentina terem ficado tensas, esse episódio é considerado por muitos um divisor de
águas nas relações bilaterais entre as duas nações, pois, entre outros motivos, afastou o principal
rival de Rio Branco, no campo da política internacional, da cena continental. Sobre isto ver,
entre outros: Álvaro LINS. Rio Branco. Op cit p 383-391
90
Demetrio MAGNOLI. O corpo da pátria. Op cit, p230 e seguintes.
91
Nos baseamos na análise de Mario Barros. Historia Diplomática de Chile. Op cit e Leslie
BETHEL Historia da América Latina. São Paulo, EDUSP, 2001. (volumes 4 e 5)
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definir as fronteiras com os vizinhos do Brasil, bem como a política
americanista implementada, à época, pela Chancelaria brasileira.
A política americanista de Rio Branco inseriu-se em um novo momento
da política externa brasileira, inaugurado nos primeiros anos da era republicana.
O início da República no Brasil coincidiu com a reunião, em Washington, da
Primeira Conferência Internacional Americana, cujas sessões ocorreram de 02
de outubro de 1889 a 19 de abril de 1890, marcando oficialmente o início do
Pan-americanismo. Este termo apareceu, conforme salientado, primeiramente
na imprensa norte-americana, que começou a utilizar, por sua conta, alguns
meses antes do evento, a expressão Pan-América. A partir de então, antes
mesmo da abertura da reunião, esta passou a ser designada oficiosamente de
Conferência Pan-Americana, como também as reuniões posteriores. O termo
Pan-americanismo difundiu-se e passou a denominar o conjunto de políticas de
incentivo à integração dos países americanos, sob a hegemonia dos Estados
Unidos.
92
De acordo com Kátia Baggio
93
a já citada Primeira Conferência Pan-
Americana foi convocada pelo governo dos Estados Unidos, depois de quase
uma década de negociações diplomáticas e debates internos, como resultado de
um projeto do secretário de Estado norte-americano James G. Blaine,
considerado o principal mentor do Pan-americanismo. O incremento da
integração dos Estados Unidos com os demais países americanos visava, em
última instância, o crescimento das exportações de produtos norte-americanos
para o restante do continente, (em especial México, Cuba, Haiti, República
Dominicana, Chile
94
) a fim de superar a entrada dos produtos europeus,
principalmente da Inglaterra, sua principal concorrente.
92
Sobre as Conferências Pan-Americanas e o pan-americanismo, ver: Arturo Ardao.
“Panamericanismo y latinoamericanismo”. In: Leopoldo ZEA (coord.). América Latina en sus
ideas. Op cit e Hélio Lobo. O Pan-Americanismo e o Brasil. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1939.
93
Kátia BAGGIO A Revista Americana e as relações entre as Américas. Belo Horizonte,
FAFICH-UFMG. (Mimeografado)
94
Sobre isso ver Leslie BETHEL. História da América Latina. Op cit
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45
Uma prova clara desta intenção é que o único resultado concreto da
Primeira Conferência foi a criação do Departamento Comercial das Repúblicas
Americanas, com a função de realizar a “pronta compilação e distribuição de
dados sobre o comércio”
95
, posteriormente designado União Pan-Americana.
Encontros periódicos foram realizados durante toda a primeira metade do século
XX, em diversas capitais do continente, até que, em 1948, na Conferência de
Bogotá, foi criada a Organização dos Estados Americanos - OEA, com novo
aparato jurídico, substituindo a União Pan-Americana.
O Brasil republicano reforçou uma tendência de aproximação com os
Estados Unidos que, de certa forma, conforme veremos adiante, já vinha se
delineando desde o Segundo Reinado. Entretanto, não dúvidas quanto à
maior aproximação do Brasil com os Estados Unidos após a Proclamação da
República. O novo regime abria as portas para um melhor entendimento
diplomático do país com as repúblicas americanas. Tal fato significava que o
Brasil abandonava, mesmo que gradativamente, o monarquismo europeísta -
simbolizado pelos Bragança - e aderia à “vocação republicana e liberal das
Américas”. Não foi sem motivo que o novo regime brasileiro foi reconhecido
inicialmente pelos países americanos e, num segundo momento, obteve o
reconhecimento dos governos europeus.
96
As transformações pelas quais o Brasil e o mundo vinham passando no
início do século XX - modernização capitalista, ascensão dos Estados Unidos no
cenário internacional, conflitos na Europa decorrentes, principalmente, do
Imperialismo - levaram a essa mudança de rumo na política externa brasileira,
capitaneada por Rio Branco. Houve uma tentativa de abrir o leque das relações
internacionais, quebrando a quase exclusividade européia. Neste sentido,
podemos pensar que Rio Branco buscou solucionar os conflitos fronteiriços com
95
Ver Arturo ARDAO. Op. cit., p. 158.
96
Uruguai, Argentina e Chile foram os primeiros a reconhecer o novo governo brasileiro, em
1889. Em janeiro de 1890, foi a vez da Bolívia, Venezuela, México e Estados Unidos. Na
Europa, a França republicana foi a primeira, em julho de 1890, seguida pela Grã-Bretanha, Itália
e Espanha, em 1891.
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46
os países vizinhos sul-americanos
97
- numa clara tentativa de aumentar a
influência geopolítica do Brasil na América do Sul - e, ao mesmo tempo,
aproximar-se dos Estados Unidos. Entretanto, o Ministro não aceitou uma
adesão absoluta à política norte-americana, tentando uma posição
estrategicamente equilibrada entre as influências britânica e norte-americana no
Brasil. No discurso de abertura da III Conferência Pan-Americana - realizada no
Rio de Janeiro entre julho e agosto de 1906 -, Rio Branco reafirmou sua opção
de aproximação progressiva com os países americanos, mantendo, no entanto,
relações favoráveis com a Europa.
Rio Branco teve clareza da importância que os Estados Unidos vinham
adquirindo no século que se anunciava. Dentro desta perspectiva, uma de suas
medidas como Ministro consistiu na elevação, em 1905, da legação em
Washington à categoria de Embaixada (no mesmo ano, os Estados Unidos
também elevaram sua legação no Rio de Janeiro ao nível de Embaixada, a
primeira na América do Sul) escolhendo para ocupar o cargo Joaquim Nabuco,
que aderiu intensamente à defesa do pan-americanismo
98
.
De acordo com Demétrio Magnoli
99
a historiografia insere a aproximação
entre a política externa brasileira e a política pan-americanista como um
fenômeno associado ao advento da República. Para o autor essa perspectiva é
falha e superficial, na medida em que não consegue diferenciar dois processos
distintos da história diplomática brasileira: de um lado a ascensão da influência
norte-americana ocorrida antes mesmo da Proclamação da República e de outro
97
Durante a gestão do Barão do Rio Branco à frente das negociações relativas a disputas
territoriais (a partir de 1893) e depois como Chanceler da República (entre 1902 e 1912), foram
definidos vários litígios fronteiriços: com a Argentina, Guianas Francesa e Inglesa, Bolívia (em
relação ao Acre), Peru, Venezuela, Colômbia, Uruguai, Equador (que na época limitava com o
Brasil) e Holanda (em relação ao Suriname). Entre 1893 e 1912, 440 mil km
2
foram definidos
favoravelmente ao Brasil. Sobre isto ver: Francisco Doratioto. Espaços Nacionais na América
Latina: da utopia bolivariana à fragmentação. São Paulo: Brasiliense, 1994; e André Roberto
MARTIN. Fronteiras e Nações. Op cit.
98
Sobre isto ver Kátia G. BAGGIO A Revista Americana e as relações entre as Américas. Op
cit
99
Demetrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit.
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47
a apropriação do pan-americanismo como discurso e ação diplomática, uma das
principais características da política do Barão.
100
Podemos afirmar que o Barão objetivou adaptar a política externa
brasileira ao novo contexto internacional no qual os Estados Unidos estavam
sendo alçados à condição de potência, fato que explicitava a construção de uma
nova ordem internacional que estava redistribuindo o poder com a ascensão
norte-americana. Para Rio Branco as grandes potências européias
reconheciam que havia no Novo Mundo uma grande e poderosa nação com que
deveriam contar e que necessariamente “há de ter a sua parte de influência na
política internacional do mundo inteiro”
101
.
Todavia essa aproximação deve ser observada a partir da clara proposta de
conservação da autonomia nacional. Segundo Lafer e Peña, Rio Branco, ao
compreender, conforme acima destacado, a relevância dos Estados Unidos,
buscou aproximar os "irmãos do norte" a "serviço do Brasil" a partir de uma
"aliança Brasil-Estados Unidos, dentro de um subsistema regional alargado
para abranger às três Américas” servindo tanto para consolidar as fronteiras
nacionais quanto para diminuir a influência européia.
102
A partir dessa perspectiva podemos começar a pensar numa "visão global
do Barão"
103
construída sobre os dois pilares aqui apresentados: o primeiro, sob
a lógica central do pan-americanismo, estava ligado a consolidação da posição
brasileira como elo entre os Estados Unidos e a América Latina, sobretudo a
América do Sul
104
; o segundo pilar estaria associado ao aprofundamento do
"papel nacional de pólo geopolítico sul-americano"
105
possível, apenas, com a
consolidação das fronteiras da nação, articulada à uma política de equilíbrio
com os países fronteiriços. "O 'corpo da pátria', completamente delimitado na
100
Ibid. "O 'pai fundador' da diplomacia brasileira promoveu a ruptura dentro da continuidade,
combinando a tradição realista herdada do Império com a renovação das concepções de mundo
e dos paradigmas da política externa nacional" p 208
101
Clodoaldo BUENO & Amado CERVO. História da política exterior do Brasil. Op cit .
102
C. LAFER & F. PEÑA . Argentina e Brasil no sistema das relações internacionais. São
Paulo, Duas Cidades, 1973.
103
Termo cunhado por Demétrio MAGNOLI. O corpo da Pátria. Op cit
104
Para MAGNOLI a justificativa para tal premissa baseia-se no processo e na situação
histórica do Brasil
105
Demetrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria. Op cit p 215
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48
primeira década do século [XX], demandava, sob um ponto de vista
geopolítico, a consolidação de sua coluna vértebra."
106
Estabelecido os parâmetros e a ação geopolítica da diplomacia brasileira
nos primeiros anos republicanos, ganharam relevo novas possibilidades para os
quadros do Itamaraty, em especial em relação a aspectos referentes à construção
de possíveis estratégias ligadas a projetos culturais.
2.5
Elaborando uma estratégia: a diplomacia cultural e a criação da Revista
Americana
De acordo com rgio Danese, tão logo foram resolvidas as questões das
fronteiras, coube à diplomacia brasileira se constituir, também, em instrumento
do desenvolvimento dos demais projetos do Estado passando, a diplomacia, em
suas palavras :
“a trabalhar intensamente para colocar o Brasil no caminho da integração
regional com uma contribuição expressiva na dimensão cultural da construção da
nacionalidade que tem relação direta com o avanço do projeto de desenvolvimento em
suas ramificações externas”.
107
Corrobora com essa perspectiva o início de certo processo de
profissionalização
108
do corpo diplomático brasileiro posto em prática por Rio
Branco. Na época do Barão, o Itamaraty passou a se preocupar com a formação
cultural e política de seus diplomatas que, até então, ingressavam na carreira
apenas por meio de relações pessoais. Outrossim, o gabinete do Barão
106
Ibid. p 272
107
Sérgio França DANESE. Diplomacia Presidencial. Op cit
108
Processo este que se consolidou efetivamente a partir da década de 30.
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49
incentivou a intermediação nos processos de definição da nacionalidade, que se
fez em função de relações capitais no plano externo, capitais porque ofereciam
elementos de contraste, de competição, de cooperação, de resistência, de
influência que ajudaram a forjar uma nacionalidade.
Nesse ponto aparece para nós o conceito de Diplomacia Cultural. Como
base para a compreensão deste conceito, podemos pensá-lo associado aos
processos de construção da paz entre as nações. De acordo com Edgard Telles
Ribeiro
109
, baseando-se em T.S. Eliot, que ao definir cultura como sendo tudo
que faz a vida ter valor, estabelece que elementos culturais são a essência das
relações humanas, bem como das relações entre países. Com base nessa
argumentação, Telles Ribeiro afirma que o vínculo entre cultura e política
externa reside no propósito básico de se construir, por meio da compreensão e
do conhecimento, uma sociedade pacífica.
110
A Diplomacia Cultural de maneira bastante objetiva pode ser pensada
como um instrumento, uma estratégia de difusão de aspectos culturais de uma
nação no exterior associada à divulgação interna de culturas estrangeiras. Diante
dessa perspectiva seu universo temático pode ser resumido pelo: intercâmbio de
pessoas; pela promoção da arte e dos artistas nacionais; pela divulgação geral de
elementos culturais, pelo apoio a projetos de cooperação intelectual etc.
111
Para Telles Ribeiro as relações culturais internacionais caracterizam-se
pela busca, ao longo do tempo, de uma maior compreensão e aproximação entre
os povos e instituições com a meta de se estabelecer um proveito mútuo. A
Diplomacia Cultural, segundo o autor, por sua vez, seria a utilização específica
da relação cultural para a “consecução de objetivos nacionais de natureza não
somente cultural, mas também política, comercial ou econômica.”
112
Outrossim, o autor salienta que se por definição o jogo diplomático tem
como objetivo último contribuir para a preservação da paz mundial, nada mais
109
Edgard Telles RIBEIRO. A diplomacia cultural e o seu papel na Política Externa brasileira.
Brasília, FUNAG, 1989.
110
Ibid p 20
111
Ibid p 21
112
Ibid p 23
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50
eficiente para isso do que fortalecer os mecanismos de compreensão mútua,
sendo que para se alcançar tal compreensão a maneira mais eficiente e
duradoura é o intercâmbio cultural que possibilitaria a transferência de uma
nação à outra de experiências, idéias e patrimônios valiosos, favorecendo uma
atmosfera de entendimento. Tal contexto também contribuiria para minimizar
julgamentos por estereótipos, assim como reforçaria sentimentos pacíficos, pela
própria noção da universalidade do patrimônio cultural e artístico. Nesse
particular, de acordo com Telles Ribeiro, por menor que seja uma manifestação
cultural de um país sobre outro, atrelada a um modesto mecanismo de
cooperação intelectual, esses momentos reforçam a aproximação, contribuindo
para a comunhão de povos e culturas.
A referida comunhão tende a reduzir as tensões entre Estados, uma vez
que reduz a desconfiança, reforçando o principio da reciprocidade,
contribuindo, dessa forma para legitimar a credibilidade dos intercâmbios
culturais, reforçando um indispensável clima de confiança mútua”, tanto em
um plano regional, quanto em um intercontinental. Em última análise, para
Telles Ribeiro, a “cooperação cultural constitui poderoso esteio na luta pela
compreensão mútua dentro do respeito à diversidade – única maneira válida de
melhorar as relações entre povos e Governos.”
113
Essa aproximação baseada na construção de relações culturais entre
nações, foi reconhecida, ao longo do século XX, como elemento constitutivo
das relações internacionais. Um “terceiro pilar da política externa”
114
, que se
estabeleceu como uma das dimensões essenciais do relacionamento entre
Estados na era contemporânea.
Corrobora com essa perspectiva a análise do sociólogo francês Marcel
Merle
115
que afirma ser necessário, para uma perfeita compreensão dos atores
do campo das relações internacionais, o conhecimento das questões culturais, na
113
Ibid p 43
114
Termo cunhado por Willy BRANDT, Ministro dos Negócios Estrangeiros da antiga
República Federal da Alemanha em 1966. APUD. Edgard Telles RIBEIRO. Op cit
115
Marcel MERLE. Forces et engeux dans les Relations Internationales. Paris, Ed Economica,
1985.
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51
medida em que estes elementos se sobreporiam a aspectos meramente políticos
e econômicos. A argumentação central de Merle baseia-se no fato de boa parte
dos conflitos internacionais, na sua leitura, ser conseqüência de tensões de
origem cultural. Logo, esse elemento cultural teria que ser sempre levado em
consideração no quadro de formulações diplomáticas.
Em síntese podemos afirmar, nos baseando em Telles Ribeiro, que a
Diplomacia Cultural pode ser pensada como um instrumento que efetivamente
possibilite a inserção externa de uma nação, contribuindo para consolidar sua
identidade e reforçar a aproximação de nações em torno de um patrimônio, de
um referencial comum, desempenhando papel de extrema utilidade no esforço
de desempenhar uma função aglutinadora , que, segundo o autor, nenhum outro
componente do instrumental diplomático consegue preencher
satisfatoriamente.
116
Pensamos a Revista Americana inserindo-a nessa lógica de aproximação
das nações sul-americanas em busca da construção de uma estratégia
diplomática voltada para o equilíbrio do continente, garantidora da paz, em um
contexto de enorme instabilidade com um mundo sofrendo com as
conseqüências da Corrida Imperialista que levaria as nações centrais para uma
guerra generalizada e uma América, especialmente do Sul, buscando se inserir
nesse cenário, tentando consolidar suas instituições.
É a partir da inserção nesse contexto que destacamos a importância da
Revista Americana, periódico dirigido, inicialmente, pelos diplomatas Araújo
Jorge, principal responsável pela Revista, e Delgado de Carvalho, bem como
pelo jornalista Joaquim Viana, editada, no Rio de Janeiro, entre os anos de 1909
e 1919
117
, uma vez que a julgamos de extrema relevância para a compreensão
do cenário político e cultural da época, bem como pensamos ser ela uma das
116
Edgard Telles RIBEIRO. Diplomacia Cultural. Op cit p 100
117
A partir de 1916 a direção da Revista Americana ficou a cargo de Araújo JORGE e Silvio
Romero FILHO. Cabe ressaltar que Araújo Jorge era Secretário de Rio Branco e considerado
por muitos seu principal assistente apesar da pouca idade. Delgado de Carvalho teve grande
importância na consolidação da diplomacia brasileira assumindo a cadeira sobre História
Diplomática no curso de formação de diplomatas. Sérgio DANESE. Diplomacia Presidencial.
Op cit.
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52
primeiras, senão a primeira, manifestação organizada por um órgão ligado ao
Estado que objetivava pensar a cultura e identidades nacionais, sendo que estas
deveriam ser inseridas num projeto intercontinental, fato que demonstra certo
vanguardismo em relação à boa parte da intelectualidade daquele período.
Reforça esta perspectiva a participação de uma série de intelectuais e
diplomatas de destaque no cenário brasileiro e estrangeiro tais como: Rio
Branco, Joaquim Nabuco, Oliveira Lima, Araripe Júnior, Silvio Romero, José
Veríssimo, José Oiticica, Clovis Beviláqua, , Rocha Pombo, Hildebrando
Accioly, , Heitor Lyra., Alberto de Faria, Helio Lobo. Em relação aos
estrangeiros, entre outros, podemos citar: Ramon Cárcano, José Ingenieros,
Rubem Dario, Benjamin Vicuña Subercaseaux, Francisco Felix Bayon,
Francisco Garcia Calderón, Norberto Piñero, Jose Irigoyen.
A Revista Americana era um periódico mensal, impresso pela Imprensa
Nacional, tendo circulado de maneira contínua de outubro de 1909 a setembro
de 1910. Após intervalo de três meses, reapareceu em janeiro de 1911,
inaugurando o segundo ano do periódico. Editado em brochura se estruturava
em um formato de pequenas dimensões (aproximadamente 16cm por 29cm),
porém quase sempre volumoso (as menores edições superando 150 páginas e as
maiores 300 páginas). A capa impressa em papel pardo apresentava um
cabeçalho com a identificação do ano e número do volume e do mês de
circulação, um sumário com a indicação dos autores e respectivos artigos e de
outras seções: notas, redação, cartas.
Fogem à essa regra os quatros números editados em 1915, em que a
Revista como “Publicação Quinzenal de Sciencias e Artes”, apresentou artigos
como uma perspectiva mais artística, assim como lançou o “Suplemento
Ilustrado”
118
de conteúdo bastante variado.
No período no qual ela circulou, a Revista Americana foi uma das mais
importantes publicações que apareceram na cena cultural brasileira. Além de
divulgar idéias, seu principal objetivo era aproximar intelectuais, congregar
espíritos, revelar identidades e promover formas de integração cultural entre os
118
O suplemento restringiu-se a esses quatro números
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53
diversos povos da América.” Ao longo dos seus dez anos de vida
119
, foram
tratados os mais variados assuntos, com temas que versavam desde a
diplomacia, propriamente dita, à crítica literária, passando pela publicação de
poesias e contos que, na maioria das vezes, tratavam de problemáticas sul-
americanas. É possível afirmar que ela foi pioneira e única, no Brasil, em seu
gênero no período.
Seu vanguardismo pode ser observado a partir do fato da diplomacia ao
longo dos novecentos ter se tornado um dos segmentos mais atuantes no cenário
político e cultural do continente, assim como vários intelectuais, de diferentes
gerações e nacionalidades, ao longo do século XX, terem buscado responder
perguntas que eram preocupações básicas da Revista Americana tais como: o
que são as Américas no contexto da cultura ocidental? Quais são as
aproximações possíveis entre elas? Quais são os seus distanciamentos? Qual é a
identidade americana? Qual deve ser o futuro do continente?etc. Manoel
Bonfim, Darcy Ribeiro, Leopoldo Zea, Octavio Paz, Richard Morse, Nestor
Canclini, entre outros, realizaram grande esforço no sentido de responder essas
questões, sendo o legado de suas obras a maior prova disso.
Nesse sentido vemos a publicação da Revista Americana como uma
tentativa de se encontrar, senão uma resposta satisfatória à tais dúvidas, ao
menos um caminho de debate que levasse , doravante, à um possível
denominador comum que representaria, em síntese, uma cooperação e
solidariedade continental, molas mestras para se estabelecer a paz no
continente..
Em sua trajetória, várias dificuldades sobrepuseram-se à constância e
regularidade de seus números. No que consideramos uma primeira fase da
Revista, entre 1909 e 1912
120
, notamos que a publicação possuía grande
incentivo e apoio fazendo desse período o mais intenso de todos. Acreditamos
que esse fato está ligado à atuação pessoal do Barão do Rio Branco.
119
Com algumas interrupções como veremos adiante.
120
Convém destacar que no ano de 1913 a publicação ainda apresentou algum “fôlego”, em
especial até abril, mês da publicação de um número em homenagem ao Barão do Rio Branco.
Único volume temático da Revista Americana. Nesse sentido consideramos a primeira fase do
periódico o período que vai de 1909 a 1913.
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Mesmo com tal respaldo, devemos salientar que no início do segundo
semestre de 1911, um incêndio na Imprensa Nacional, local onde eram
compostos e impressos seus originais, acabou por suspender dois números. Em
1912, após o falecimento do Barão, as dificuldades nitidamente aumentaram
chegando ao ponto crítico em que a Revista deixou de ser editada no primeiro
semestre de 1914, antes mesmo do início da Primeira Guerra Mundial.
Dentre os motivos que podem ser apontados, além do falecimento do
Barão, como responsáveis pela paralisação da publicação destacam-se: as
dificuldades comuns ao mercado editorial brasileiro daquela época somado às
questões inerentes à conjuntura da Guerra, como, por exemplo, a carência de
papel apropriado para a publicação. Paralelo a isso, não podemos deixar de
mencionar a ausência no Rio de Janeiro de Araújo Jorge, que partiu para a
Europa em missão oficial, em 9 de fevereiro de 1913.
Em junho de 1915, conforme acima destacado, publicam-se quatro
números e a Revista Americana retorna ao cenário cultural com novo formato e,
em vários sentidos, bastante diferente do modelo anterior, buscando assumir um
perfil mais comercial e “popular”, conferindo amplo destaque à chamada “vida
mundana”, em detrimento do debate intelectual amplo e criterioso, tal qual ao
da primeira fase, que objetivava aproximar os espíritos das Américas. Data
dessa segunda fase a inserção do recurso gráfico da cor, sobretudo nos
“Suplementos Ilustrados”. Outra característica nova era a presença de inúmeras
fotografias de personalidades da vida pública da época, assim como de soldados
que lutaram na Guerra do Contestado, de Veteranos da Guerra do Paraguai, das
Missões Diplomáticas de Lauro Muller no Uruguai e Argentina, da Primeira
Guerra Mundial, além de fotos da vida cotidiana de grandes cidades como a da
Avenida Central, no Rio de Janeiro, da Avenida de Mayo, em Buenos Aires, e
da Quinta Avenida em Nova Iorque.
Apesar do claro esforço em se retomar a Revista, fica evidente a grande
dificuldade de fazê-lo, deixando, novamente de circular, entre fins de 1915 até
outubro de 1916, quando foi publicado um novo número, com o velho formato
original, numa clara perspectiva de retomar o velho rigor crítico, confirmado
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pelos números seguintes de novembro e dezembro, inaugurando o que seria a
última fase da Revista Americana.
121
Nos anos seguintes, 1917-1919, a Revista Americana, mesmo não
apresentando qualidade similar à da primeira fase, procurou manter como eixo
central de seus artigos a problemática da aproximação intelectual, política,
econômica e cultural dos povos da América, enfatizando a importância da
diplomacia na articulação de possíveis projetos para o continente.
De acordo com Álvaro da Costa Franco
122
, Diretor do Centro de História e
Documentação do Itamaraty, a Revista Americana surgiu como um projeto
inovador de cooperação intelectual internacional desempenhando, durante dez
anos, “papel de grande relevância, e único, em nosso cenário cultural”, sendo
núcleo de cooperação entre intelectuais americanos. Esta cooperação teria
funcionado, segundo Costa Franco, como alicerce da política de aproximação
com os “vizinhos” do Brasil.
No editorial do primeiro número afirmava-se que Revista tinha como
objetivo:
“Divulgar as diversas manifestações espirituais da América e seguir ao
mesmo passo, paralelamente, o traçado superior da sua evolução política e econômica,
tornando-se um traço de união entre as figuras representativas da intelectualidade desta
parte do mundo.
Ela facilitará ao historiador e ao geógrafo, ao político e ao jornalista, ao artista
e ao filósofo, elementos seguros determinantes de uma noção exata e precisa dos
múltiplos e paradoxos, aspectos da nossa vida espiritual.
123
A Revista Americana é considerada por muitos como um dos instrumentos
da política americanista de Rio Branco. Esta política, conforme observado,
insere-se em um novo momento da política externa brasileira, inaugurado com a
Proclamação da República.
No já citado editorial do primeiro número da Revista, era constatado o
hiato cultural existente entre as Américas, “continente conhecido aos
121
Para fins metodológicos estamos dividindo a Revista em duas fases. A primeira até 1913 e a
segunda a partir de 1915.
122
Senado Federal. Revista Americana : uma iniciativa pioneira de cooperação intelectual.
Seleção de artigos fac – similar. Brasilia, FUNAG, 2001. Apresentação.
123
Revista Americana volume 1 setembro de 1909. (editorial)
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fragmentos” que levava a “ignorância intelectual” entre os países do
continente. Tal fato reforçava-se pelas distâncias que separam os países
americanos assim como pela ausência, quase absoluta, de meios de
comunicação rápidos e eficientes.
Havia a necessidade de se criar uma identidade própria para o Brasil e a
América, na medida em que:
“... as idéias, para serem aceitáveis, necessitam trazer a marca européia e
transpor os mares nos bojos dos transatlânticos, o descaso injustificável pelas coisas do
nosso continente; a indiferença pela sua história; o desamor às suas tradições; o
desprezo pelos incontáveis aspectos de sua natureza e ter - se um quadro quase
completo de várias causas por que as gentes americanas se desconhecem
voluntariamente. [...]
Quando os povos americanos tiverem uma noção mais exata do valor das
suas fortes qualidades originarias e nativas, ainda não de todo esmaecidos ao influxo
das culturas exóticas; quando reconhecerem que o nosso continente, tão mal conhecido
e ultrajado, constitui, por si só, uma matriz perene de estudos, exames,
indagações...”
124
Portanto, torna-se de extrema relevância, analisar a Revista Americana
reconhecendo a contemporaneidade das preocupações que a inspiraram e a sua
importância no processo de criação de uma tradição republicana, aproximando-a
da crença em um futuro no qual o Brasil poderia assumir um lugar de destaque
no Continente e este no contexto mundial.
Inegavelmente pensar tais questões nos remete ao papel e às preocupações
da intelectualidade de fins do século XIX e primeiras décadas do XX. Pesquisar
um periódico que trás a posição de diplomatas/intelectuais com atuação nesse
período nos aproxima, obrigatoriamente, aos projetos de construção da Nação,
tema presente nos mais variados grupos intelectuais de então. Pensando de
forma mais precisa, a análise desse período nos permite observar uma
intelectualidade preocupada profundamente com o desenvolvimento, tanto
teórico quanto prático, do que se convencionou chamar de Nações e
Nacionalidades, compreendidas como combinações específicas de identidades
culturais, mais ou menos forjadas, mais ou menos herdadas, territorialidades e
124
Revista Americana , volume 1, ( Editorial)
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aparatos estatais modernos, ou seja, entidades "soberanas" capazes de entreter
relações com seus "súditos"
125
.
Essa perspectiva se fez bastante presente no chamado "Novo Mundo" que,
ao longo de todo o século XIX e inicio do XX, apresentou como um de seus
objetivos básicos a construção de seus Estados-Nações. Tal construção passa
pela própria definição do que seria uma nação, compreendida, em 1882, por
Enerst Renan como,
"...uma alma, um princípio espiritual. Duas coisas, que na verdade são uma só,
constituem essa alma ou princípio espiritual. Uma se encontra no passado, outra no
presente. Uma é a possessão em comum de um rico legado de memórias ; a outra é o
consentimento diário, o desejo de viver junto, a vontade de perpetuar o valor de uma
herança recebida de forma indivisa [...] pressupõe um passado; mas ela é sintetizada no
presente como um fato concreto, o consentimento, o desejo expresso e claro de
continuar uma vida em comum. A experiência de uma nação [...] é um plebiscito diário,
tanto quanto uma existência individual é uma perpétua afirmação da vida."
126
Fatores como política, interesses materiais comuns, necessidades militares
entre outros, sempre se mostraram elementos decisivos na formação das nações
ao longo de séculos, em especial a partir de fins do século XVIII, época que
marcou o inicio da chamada “Era das Revoluções”, que põe fim ao Antigo
Regime.
127
Encontramos nas páginas da Revista Americana um claro esforço em
analisar tais assuntos, relacionando-os com as preocupações presentes, tanto no
contexto mundial, quanto no contexto específico do chamado Novo Mundo,
buscando criar um espaço para o debate entre a intelectualidade sul-americana,
numa tentativa de gerar sínteses que poderiam ser transformadas em projetos
para o continente.
Paralelo a isso, não podemos perder de mente que a Revista, em se
tratando de uma publicação brasileira oriunda das fileiras do Itamaraty, trouxe
125
É bastante ampla a bibliografia acerca dessa temática. Como obras de referência destacamos:
Eric HOBSBAWN. Nações e nacionalismos desde 1780. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2002;
Ernest GELLNER Nações e nacionalismo. Lisboa, Gradiva, 1993 ; Benedict ANDERSON.
Nação e consciência nacional. São Paulo, Ática, 1989.
126
Ernest RENAN O que é uma Nação .1882
127
Essa época foi marcada pela eclosão de movimentos liberais que trazem consigo uma nova
concepção de Estado e, por conseguinte, de Nação. Sobre esse assunto ver, entre outros, Eric
HOBSBAWN. A Era das Revoluções. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1989.
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consigo um objetivo de consagração do Ministério das Relações Exteriores na
recém inaugurada ordem republicana brasileira, consagração esta que, no
entanto, não foi alcançada, definitivamente, naquela época, mas que teve a
Revista Americana como uma tentativa, um marco inaugural de uma
Diplomacia Cultural que visava aproximar as nações americanas, notadamente
as da América do Sul.
Neste sentido a Revista Americana apresentou como uma de suas
principais preocupações a necessidade de reflexão acerca da formação territorial
brasileira e, por extensão, sul-americana. Questões referentes à essa temática, tal
qual o pan-americanismo, tiveram destaque ao longo de todo o período em que
a Revista circulou e, em última análise, foram legitimadoras desse projeto maior
de consagração da diplomacia na elaboração de um ideário pautado na
aproximação das nações da América do Sul e, conseqüente, na construção de
uma paz continental.
No nosso próximo capítulo nos deteremos em como o pan-americanismo
foi trabalhado nas páginas do periódico.
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3
O pan-americanismo nas páginas da Revista
Americana
3.1 – Um início de conversa
Um dos principais objetivos da Revista Americana, explicitado nos
editoriais do periódico, relacionava-se com as estratégias de se estabelecer
uma “aproximação entre as Américas”. que se ter em mente que essa
questão, naquele momento histórico, remetia, entre outras temáticas, ao debate
intelectual acerca do monroismo e, por extensão, ao pan-americanismo. Nesse
sentido, as páginas da Revista trouxeram uma série de artigos que
expressavam tal preocupação.
Nessa perspectiva, alguns autores
1
tendem a colocar a Revista
Americana como um instrumento de divulgação da política pan-americanista
do Itamaraty junto à intelectualidade, sendo farta em artigos de intelectuais do
porte de Joaquim Nabuco, Araripe Jr., Hélio Lobo e do próprio Rio Branco
2
,
entre outros, que, segundo Kátia Baggio, publicavam artigos de entusiasmada
adesão ao pan-americanismo e de defesa da liderança brasileira na América do
Sul.
1
Sobre isso ver os trabalhos de Kátia BAGGIO A Revista Americana e as relações entre as
Américas. Op cit e Demetrio MAGNOLI. O corpo da Pátria. Op cit.
2
De Joaquim NABUCO temos a publicação, nos dois primeiros números, de conferências
realizadas nos Estados Unidos, a saber: A parte da América na Civilização e A aproximação
das duas Américas. De Araripe JR temos artigos intitulados A Doutrina Monroe nos anos de
1909 e 1910. Hélio LOBO escreveu entre outros George Canning ou James Monroe? Em
1909 e As relações entre os Estados Unidos e o Brasil em 1910. . Foi publicado do Barão do
Rio Branco , em 1912, logo após a sua morte, o artigo O Brasil, os Estados Unidos e o
Monroismo.
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60
Convém salientar, que a Revista, igualmente, apresentou espaço para
divergências com texto que criticavam o monroismo, compreendendo-o, por
exemplo, como parte central na estratégia imperialista norte-americana. O
debate se deu em vários números e mesmo reconhecendo a maior incidência
de artigos favoráveis à uma aproximação entre a América do Sul e os Estados
Unidos é importante ressaltar o espaço para opiniões contrárias, que por si
demonstra uma tentativa de que a Revista fosse um fórum neutro e aberto para
o pleno exercício intelectual.
Talvez por possamos entender o porquê do Barão não ter assumido
diretamente a direção do periódico, bem como os editores não estabelecerem
relação com ele
3
. Muito embora não houvesse, de forma explicita, a
participação de Rio Branco, seria muito difícil crer na sua ausência no projeto
e desenvolvimento da Revista. Corrobora com essa perspectiva o fato da
Revista Americana ter gozado desde o seu primeiro número de grande
prestígio junto à intelectualidade de então e relativa divulgação na imprensa
fato que dificilmente se daria sem o prestígio pessoal do Chanceler.
Antonio Candido no artigo “Os brasileiros e a nossa América”
publicado no livro Recortes
4
afirma, baseando-se na análise dos editoriais da
publicação, que a Revista Americana expressou uma manifestação da
“política de aproximação entre os países do subcontinente” apontando como
“linhas de colaboração” principais a integração continental e os ensaios
comparativos sobre o pan-americanismo. Tais linhas seriam a síntese do
“esforço notável de aproximação continental a começar pelo bilingüismo e
sem esquecer a equanimidade com que eram publicados artigos severos em
relação ao Brasil.”
5
Neste capítulo nos deteremos em como a Revista Americana tratou esse
assunto e como este nos ajuda a entender, mesmo que não completamente, o
3
Apenas nos últimos anos da Revista Americana os Editores assumiram a “influência e
inspiração” do Barão.
4
Antonio CANDIDO. Recortes. São Paulo, Companhia das Letras, 1993.
5
Ibid . p 134
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61
processo de construção de uma comunidade argumentativa na qual torna-se
possível observar possíveis estratégias para se compreender a ação
diplomática do período à luz de uma determinada visão de mundo, articulada
à um projeto cultural que buscava destacar e diferenciar o posicionamento da
América do Sul no cenário mundial, valorizando a existência de uma dada
moral sul-americana que possibilitaria o estabelecimento de um continente
pacífico e ordeiro, fato que o colocaria como um exemplo a ser seguido, assim
como ressaltaria as qualidades da diplomacia continental.
Any Marise Ortega em tese defendida no Programa de Ciências Sociais
da PUC de São Paulo
6
levantou algumas chaves de leitura bastante
interessantes para pensarmos o pan-americanismo na Revista. Segundo a
autora existem algumas questões básicas que carecem de reflexão tais como:
qual o significado do pan-americanismo para a Revista Americana? O ideário
da Revista seria expressão de uma política governamental que serviria como
instrumento ideológico na busca de uma hegemonia brasileira no
subcontinente sul-americano? O periódico propunha a aceitação simples da
hegemonia norte-americana dentro da lógica da Doutrina Monroe buscando
superar as diferenças existentes entre a América Latina e a América Anglo-
Saxônica ou seria apenas um instrumento de aproximação dos países latino-
americanos?
Tais questionamentos geraram a hipótese central de Ortega de que o
“ideário da Revista Americana pode ser considerado como um conjunto teórico
no qual é possível apreender os pontos fundamentais de uma ideologia de integração
continental com características próprias que procura fornecer fundamento para a
política externa e era colocada sob o ponto de vista dominante de uma corrente de
pensamento riobranquista, ou seja, expressa por intelectuais afinados com a política
do chanceler”.
7
6
Any Marise ORTEGA. A construção de uma ideologia continental no início do século XX: a
Revista Americana (1909-1919). o Paulo, Pontifícia Universidade Católica, Programa de
Pós –Graduação em Ciências Sociais (Política), 2003.
7
Ibid p6.
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62
O principal objetivo da autora foi realizar uma análise do pensamento
político visando compreender o ideário da Revista enquanto expressão
ideológica que defendia uma política de construção de uma “americanidade”
expressa em um tipo de esforço panfletário presente nos textos. Em síntese,
para Ortega, a Revista Americana apresentava teoria referente à política
internacional, isto é, um conjunto de idéias que refletiam um pensamento de
época numa perspectiva de fazer sobressair os elementos decisivos aos
processos e grande temas da política internacional”
8
, tendo como ponto
central o estabelecimento de uma visão kantiana de política, segundo a autora,
baseada na noção, desenvolvida pelo filósofo alemão, de “paz perpétua”.
Apesar de concordarmos com algumas das premissas apontadas pela
autora observamos um certo reducionismo nelas, uma vez que consideramos a
Revista Americana um objeto de análise muito mais rico e amplo, de acordo
com o acima apontado e que desenvolveremos adiante, do que um mero
instrumento para se compreender a política externa e as relações
internacionais do Brasil. Retomando a proposta central deste capítulo nos
deteremos a partir de agora no debate, existente na Revista Americana, acerca
do monroismo e do pan-americanismo.
No nosso primeiro capítulo apontamos a confirmação da mudança de
eixo da diplomacia brasileira com o advento do período republicano. Segundo
Clodoaldo Bueno
9
tal tendência já aparecia no Manifesto Republicano de
1870 que defende para o Brasil a condição de país americano e republicano,
fato que, para Bueno, inseria –o no “sistema continental” no qual os Estados
Unidos era o maior expoente.
10
Nas palavras do autor:
“Na primeira fase da República (1889-1902), os novos donos do poder
reorientaram a política externa brasileira no sentido de engajá-la no contexto
8
Ibid p 8
9
Clodoaldo BUENO. A República e sua política exterior (1889 a 1902). São Paulo, UNESP /
IPRI, 1995
10
Sobre essa temática ver, entre outros, Celso LAFER. A identidade internacional do Brasil
e a política externa brasileira: passado, presente e futuro. São Paulo, Perspectiva, 2001.
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63
hemisférico e aproximá-la dos Estados Unidos, tanto por razões políticas quanto
comerciais”
11
.
Pensar essa nova situação foi uma das preocupações da política e, mais
precisamente, da diplomacia brasileira, e de certa forma sul-americana, sendo
que tais preocupações estiveram presentes na Revista Americana. Nesse
sentido houve, nas páginas da Revista, uma preocupação em se esclarecer o
significado histórico do monroísmo e do pan-americanismo, desde as suas
origens até a aplicação prática em fins do século XIX e primeiros anos do
século XX.
Conforme já salientado, tais temáticas foram das mais debatidas no
periódico caracterizando-se como o principal, nos dizeres de Ortega, “eixo
norteador”
12
nas discussões travadas pelos colaboradores, brasileiros e
estrangeiros, da Revista. Para fins de organização e clareza dividiremos nosso
capítulo em dois momentos: o primeiro em que, após um rápido histórico do
conceito, colocaremos as duas principais correntes existentes à época acerca
do monroismo/pan-americanismo; em um segundo momento nos deteremos
nas diferentes interpretações acerca do pan-americanismo nas páginas da
Revista Americana.
13
3.2
Pressupostos para a análise - o Pan-americanismo: dos primórdios à
hegemonia norte-americana
11
Ibid p 47.
12
Termo utilizado por Any ORTEGA. A construção de uma ideologia continental no início
do século XX: a Revista Americana (1909-1919). Op cit.
13
Cabe ressaltar que nessa segunda parte dividiremos a análise dos artigos de acordo com as
fases da Revista
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64
Ampliando a discussão iniciada no nosso primeiro capítulo e seguindo a
abordagem desenvolvida por Anatoli Glinkin
14
, é possível observar duas
perspectivas nas quais o termo pan-americanismo é utilizado. O primeiro,
definida como latino-americana, se insere nos processos de independências
indo até fins dos oitocentos e a outra, denominada norte-americana,
inaugurada com a Declaração de Monroe e dominante a partir dos últimos
anos do século XIX.
Para Glinkin a idéia de uma solidariedade latino-americana surgiu
dentro de uma lógica anti-européia na medida em que nasceu associada às
lutas pelas independências, tendo como principal referência Simon Bolívar
que , em 1815, afirmava desejar mais do que ninguém, ver formar-se na
América a maior nação do mundo (...) o que pode nos tornar capazes de
expulsar os espanhóis e de fundar um governo livre é a união”.
15
Com as independências consolidadas, Bolívar, conforme salientado no
nosso primeiro capítulo, convoca o Congresso do Panamá de 1826,
considerado, por Glinkin, símbolo do pan-americanismo latino. Dentre as
dificuldades encontradas nesse projeto de união americana estava o fato das
novas nações terem sido áreas coloniais administradas com uma clara
tendência de autonomia, mantendo, quase sempre, relações mais próximas
com a Metrópole do que com as regiões vizinhas. Soma-se a isso a
instabilidade institucional, com a conseqüente falta de uma unidade nacional
sólida e a fraqueza econômica e financeira decorrente da estrutura agro-
exportadora.
16
Apesar do relativo fracasso do Congresso, uma vez que, em termos
práticos, o único tratado assinado “Tratado de União, Liga e Confederação
14
Anatolo GLINKIN. El latinoamericanismo contra el Panamericanismo desde Simón
Bolívar hasta nuestros dias. Moscou, Progresso, 1984.
15
Simon BOLÍVAR. Escritos Políticos. São Paulo, Editora UNICAMP, 1992 p 67 e 74
16
Sobre isto ver, entre outros, VILABOY & GALLARDO. “Raíces históricas de la
integración latinoamericana”. In: História y Perspectiva de la integración Latinoamericana.
Morelia, Universidad Michoacana San Nicolás de Hidalgo, México, 2000.
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65
Perpétua” jamais foi ratificado, é inegável o seu valor simbólico, sobretudo
no que tange a idéia de solidariedade e união latino-americana. Tal questão
apresentou, nas primeiras décadas do século XIX, duas linhas interpretativas.
A primeira trabalhava com a idéia de uma ex-América Espanhola unida por
meio de uma única república . Tese esta defendida por Francisco de
Miranda
17
,
Em resumo podemos afirmar que Miranda objetivava resgatar a base
cultural hispano-americana. Nesse sentido defendia a presença de uma
liderança Inca para governar os estados indo-americanos federativos. Esse
projeto mostrou-se absolutamente utópico perdendo espaço para uma segunda
proposta, defendida por Bolívar, que visava a construção de uma confederação
de nações unidas para garantir a manutenção das independências e a
integridade territorial contra ameaças estrangeiras defendendo relações
pacíficas entre os membros da confederação.
Apesar de menos centralizadora que a proposta de Miranda há que se ter
em mente que as idéias de Bolívar eram, igualmente, de difícil implantação
principalmente por passarem pela questão da soberania, a qual nenhuma das
recém formadas nações hispano-americanas estava disposta a abrir mão.
Outrossim, convém salientar as dificuldades econômicas e sociais, a falta de
unidade política e a ausência de uma identidade cultural capaz de estabelecer
paradigmas comuns na região.
Nesse sentido observou-se o desenvolvimento de conflitos que
explicitavam a supremacia dos interesses locais sobre uma possível unidade
latino-americana. Apesar do esforço em se resgatar esse ideal de construção
de uma união pan-americana ao longo do século XIX, conforme pode ser
17
Natural de Caracas, filho da aristocracia local que, após viver na Europa onde liderou o
exército francês na Bélgica no contexto da Revolução Francesa, retornou à América com o
intuito de liderar uma revolução libertadora . Acabou preso sendo sucedido no comando do
movimento por Bolívar .
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66
observado na convocação de conferências ao longo do período
18
, podemos
afirmar que a partir do fracasso da construção do “sonho bolivariano” houve
um arrefecimento do que foi denominado por Glinkin de pan-americanismo
latino, abrindo espaço para o pan-americanismo norte-americano.
Este outro pan-americanismo esteve associado, conforme visto, ao
que se convencionou chamar de monroismo. Inicialmente, sobre a Declaração
do Presidente James Monroe convém salientar que esta foi parte integrante de
uma mensagem enviada, pelo próprio, ao Congresso norte-americano, em
dezembro de 1823, na qual explicitava-se uma preocupação em relação às
reivindicações russas na costa noroeste da América do Norte e com a situação
das nações ao sul dos Estados Unidos conforme podemos observar nesse
trecho da mensagem.
“[...] princípio em que os direitos e interesses dos Estados Unidos estão
envolvidos, que os continentes americanos pela condição livre e independente que
arrogaram e mantiveram, não devem doravante ser considerados objetos de futura
colonização por quaisquer potências européias.”
19
A Doutrina Monroe se insere em um contexto no qual o Império
Colonial Ibérico no continente americano estava em clara decadência, ficando
a América à mercê de possíveis tentativas de recolonização lideradas pela
Santa Aliança que, em última análise, se caracterizava como uma reação aos
princípios liberais buscando restabelecer o Antigo Regime na Europa
estendendo-o para a América. Essa possibilidade histórica fez nascer nos
Estados Unidos uma clara postura, herdeira da construção ideológica do seu
processo de independência, que pode ser resumida pela noção dos “dois
hemisférios”. Esta se referia à clara sensação de que os caminhos da América
do Norte, marcados por princípios como: liberdade, democracia e
18
Essas conferências realizaram-se em Lima(1848), Santiago(1856), novamente em Lima
(1864 e 1877-79), Caracas(1883), Montevidéu (1888). Ver entre outros: VILLABOY &
GALLARDO. Raíces históricas de la integración latinoamericana. In: História y Perspectiva
de la integración Latinoamericana. Op Cit. e Luís Claudio Villafañe SANTOS. O Brasil
entre a América e a Europa: o Império e o interamericanismo ( do Congresso do Panamá à
Conferência de Washington). São Paulo, UNESP, 2004.
19
Citado por Charles E. HUGHES. “A doutrina Monroe”. In. C. FADIMAN (ed). O tesouro
da Enciclopédia Britânica. Rio de Janeiro, 1994, pp 121-122.
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67
republicanismo, bem como seu processo histórico ímpar, diferenciavam-se da
trajetória européia, pautada no absolutismo e pelas guerras de conquista.
20
Em síntese podemos afirmar que vários paradigmas do que, doravante,
viria a ser a política externa norte-americana já estavam presentes em 1823,
tais como: a separação/diferenciação dos mundos, europeu e americano; a não
intervenção européia em assuntos americanos; preponderância norte-
americana no restante do continente.
De acordo com Pecequilo e Atkins
21
, tanto a Doutrina Monroe, quanto
as ações posteriores no campo das relações internacionais dos Estados Unidos,
basearam-se em dois pilares básicos, ambos com a premissa fundamental de
garantir a segurança nacional, a saber: minimizar possíveis invasões
estrangeiras e promover a estabilidade latino-americana. Esta última não fazia
parte do ideário de James Monroe e, efetivamente, foi posta em prática
quando da política imperialista iniciada no final do século XIX e primeiros
anos do século XX.
Convém destacar que eram bastante evidentes as diferenças entre o
chamado monroismo pan-americano e o pan-americanismo latino. Este
assumia uma clara postura universalista ao acreditar na possibilidade de
aproximação, com outras partes do globo, a partir da Confederação dos países
latinos. O monroismo tendia a isolar o continente reforçando o princípio dos
dois hemisférios, baseando-se em uma lógica unilateral. Tal característica será
bastante cara para a compreensão da ação política norte-americana, para a
América Latina, em fins do século XIX. Data dessa época a ação efetiva dos
Estados Unidos no sentido de estabelecer um domínio concreto sobre o
continente americano fundamental para o desenvolvimento do seu comércio
20
Ver Dexter PERKINS. A History of the Monroe doctrine. London, Longmans, 1960.
Cristina PECEQUILO. A política externa dos Estados Unidos. Porto Alegre, Editora da
UFRGS, 2003. Tal perspectiva em muito explica a postura isolacionista norte-americana
desde a sua independência.
21
Pope G. ATKINS. A América Latina em el sistema político internacional. Buenos Aires,
Grupo Editor Latinoamericano, 1991. Cristina PECEQUILO. A política externa dos Estados
Unidos. Op Cit
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em um contexto claramente marcado pela redivisão de mercados.
22
Nesta
nova ordem econômica mundial os norte-americanos reorientaram sua política
externa. Dentre as mudanças temos um pan-americanismo orientado para criar
um sistema fechado de relacionamento interestatal a partir dos Estados
Unidos.
23
A idéia defendida por Blaine era de que esse sistema
interamericano poderia ser funcional, uma vez que haveria interesses comuns
entre os países do continente, entretanto caberia aos norte-americanos a
liderança do processo.
24
De acordo com Carlos Campos
25
, esta fase seria do “ajuste
hegemônico”, época posterior ao período “pré-hegemônico”, que
compreenderia o recorte cronológico da declaração de Monroe até fins dos
oitocentos. A fase hegemônica teria como marco inaugural a guerra contra a
Espanha em 1898. Após controlar áreas estratégicas na América Central e
Caribe, os Estados Unidos partiram para o restante do Continente baseando
seu discurso no conceito de pan-americanismo.
Retomando a idéia de construção de uma “união americana” , os
Estados Unidos, antes mesmo da sua participação na guerra de independência
de Cuba, estimularam as suas relações comerciais com os demais países do
continente, fato que é observável, conforme apontado no nosso primeiro
capítulo, nas preocupações centrais e medidas concretas da Conferência
Pan-americana de Washington , tais como: união aduaneira, sistema de pesos
e medidas, moeda comum etc
26
.
22
Sobre esse assunto ver entre outros: Eric HOBABAWN. A Era dos Impérios. Op Cit.
Leslie BETHEL. História da América Latina Op cit.
23
Anatolo GLINKIN. El latinoamericanismo contra el Panamericanismo desde Simón
Bolívar hasta nuestros dias. Op Cit.
24
Leslie BETHEL. História da América Latina . Op Cit
25
Carlos Oliva CAMPOS. “Estados Unidos América Latina y el caribe: entre el
panamericanismo hegemónico e la integración independente.” In: História y Perspectiva de
la integración Latinoamericana. Op Cit
26
Luís Claudio Villafañe SANTOS. O Brasil entre a América e a Europa: o Império e o
interamericanismo ( do Congresso do Panamá à Conferência de Washington). Op cit
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69
É interessante notar que, na Conferência supracitada, todos os países se
fizeram representar, marcando , por conseguinte, uma nova era nos
relacionamentos entre os países americanos. A retórica pan-americana de
então assumiu uma postura solidária defendendo aspectos práticos para o
comércio, assim como resgatando um ideal latino-americano de união, que
era necessário que existisse uma representação ideológica que possibilitasse a
aproximação.
27
que se destacar que essa aproximação não se baseava em
uma unidade hemisférica a partir de uma correspondência cultural e/ou
histórica, e sim seria compreendida por meio de uma visão de futuro comum
possível graças à presença da Doutrina Monroe que possibilitaria, segundo a
argumentação norte-americana, contrapor o continente americano ao europeu.
Essa evidente posição de liderança na qual os Estados Unidos se colocavam e,
efetivamente, atuavam, gerou receios em alguns países latino-americanos no
sentido do pan-americanismo assumir uma perspectiva meramente
imperialista.
Indubitavelmente o pan-americanismo, dos primeiros anos dos
novecentos, caracterizou-se como instrumento da ação dos Estados Unidos em
relação à inserção internacional da América Latina na qualidade de área
periférica norte-americana, sendo portanto absolutamente normal que tal
questão fosse um dos temas centrais da Revista Americana na medida em que
o periódico tinha a diplomacia e o estudo sobre as Américas como objetivo
básico.
Convém salientar que uma das preocupações mais presentes na Revista
Americana eram as análises das estratégias da política externa norte-
americana, compreendidas como uma extensão dos princípios da Doutrina
Monroe baseados nos chamados corolários, ou seja, em formulações políticas
posteriores que se fundamentavam nas idéias centrais de Monroe. Sobre essa
temática Ortega nos oferece uma interessante discussão conceitual.
27
Demétrio MAGNOLI. O Corpo da Pátria . Op Cit
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70
Baseando-se em Schilling
28
, a autora afirma que para se compreender a
política externa dos Estados Unidos é necessário ter em mente que existem
algumas “idéias-base” orientadoras e que devem ser “observadas de forma
hierárquica”. As doutrinas seriam as “leis maiores que orientam a política
norte-americana por longos períodos históricos” servindo, no caso, para
orientar a diplomacia e os negócios americanos nos assuntos internacionais.
Os ideários entendidos como um “conjunto ideológico que dá sustentação á
política externa dos Estados Unidos e que serve de estímulo e justificativa
para a ação”, seriam formulados por intelectuais, jornalistas ou, até mesmo,
por militares, exercendo “considerável influência sobre as decisões do
Executivo”. Os corolários “medidas cuja função é interpretar a doutrina
segundo a conjuntura histórica, adequando-se às realidades de interesses
táticos da política externa norte-americana”
29
.
De acordo com Navia
30
a Doutrina Monroe, ao interditar o direito de
conquista para os países da Europa “tem sido o pilar e a linha mestra de toda
política exterior desse país (Estados Unidos)”. Ainda tendo como referência
Navia, é possível afirmar que a primeira figura que se destaca na perspectiva
das interpretações norte-americanas é o Presidente Polk (1845-1849) com suas
“anexações preventivas” de territórios de repúblicas latino-americanas como
meio eficaz de se fazer respeitar o principio de não intervenção e não
colonização, sendo considerado o principal artífice da transformação da
mensagem de Monroe, em “doutrina propriamente dita”, ao colocar como
dever dos Estados Unidos assumir protetorados para impedir a ação de
28
Voltaire SCHLLING. Estados Unidos X América Latina: as etapas da dominação. Porto
Alegre, Mercado Aberto, 1984. APUD Any Marise ORTEGA. A construção de uma
ideologia continental no início do século XX: a Revista Americana (1909-1919). Op cit. P.74
29
Voltaire SCHILLING. Estados Unidos X América Latina: as etapas da dominação. Op cit
p. 11 APUD Any Marise ORTEGA. A construção de uma ideologia continental no início do
século XX: a Revista Americana (1909-1919). Op cit.
30
Rafael NAVIA. La doctrina de Monroe: presencia historica. Tesis de Grado, Bogotá, 1962
(Faculdat de Ciências Econômicas y Jurídicas. Pontifícia Universidade Católica Javeriana).
APUD Any Marise ORTEGA. A construção de uma ideologia continental no início do século
XX: a Revista Americana (1909-1919). Op cit.
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71
potências européias no Continente Americano Nas palavras da mensagem
presidencial de abril de 1848 reproduzidas por Navia:
“O Corolário de Polk está exposto nas seguintes palavras: ‘O Presidente
Monroe, em 1823, assentou a doutrina de que o continente americano não estaria
aberto a colonizações nem intervenções européias. Mas, que garante o cumprimento
desta? A garantia está a cargo dos Estados Unidos, que este é o único país que
conta com um exército medianamente poderoso e uma marinha suficiente para
organizar essa defesa. Em virtude desse monopólio, os Estados Unidos têm direito de
atuar com o caráter de corpo de polícia de todo o continente. Assim, os Estados
Unidos, para facilitarem a empresa de Monroe, têm um direito natural de intervenção
para conservar a tranqüilidade de todos os americanos.”
31
Marco Aurélio Nogueira em bela síntese define as últimas décadas do
século XIX e as primeiras do século XX com uma marcha imperialista em
escala mundial, com a conseqüente redefinição de equilíbrio de forças entre as
grandes potências econômicas. Esse contexto de certa forma explica a
necessidade histórica de aproximação entre as nações americanas, em um
cenário fortemente determinado pela emergência dos Estados Unidos como
fator de peso nos negócios internacionais. Nogueira também afirma que o
movimento em direção às Américas refletia a necessidade de redimensionar o
relacionamento brasileiro com os países latinos, sobretudo os fronteiriços,
fonte de tensões ao longo de todo século XIX, capaz tanto de estabelecer
limites territoriais e estabilizar politicamente a América do Sul como enfrentar
as exigências comerciais e financeiras impostas pela nova ordem econômica
mundial
32
.
Tal transição foi acompanhada de um debate que marcou boa parte da
intelectualidade do período, a saber: o alinhamento da América do Sul com os
Estados Unidos do Pan-americanismo embasado pela Corolário de Roosevelt.
Nesse debate devemos destacar a posição oficial brasileira que lhe era
favorável, capitaneada, à época, pelo Barão do Rio Branco e pelo primeiro
31
Rafael NAVIA. La doctrina de Monroe: presencia historica. Op cit, p.68. APUD Any
Marise Ortega. A construção de uma ideologia continental no início do século XX: a Revista
Americana (1909-1919). Op cit. P.80
32
Marco Aurélio NOGUEIRA. Joaquim Nabuco: um aristocrata entre os escravos. o
Paulo, Brasiliense, 1987.
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72
Embaixador brasileiro em Washington, Joaquim Nabuco. Uma avaliação
alternativa, entretanto, aparecia nas posições do também diplomata e,
considerado por muitos, principal critico do pan-americanismo, Manuel de
Oliveira Lima.
De acordo com Demétrio Magnoli
33
Nabuco foi “o primeiro a usar a
expressão ‘pan-americanismo’ no Brasil”. Bacharel pela Faculdade do
Recife, em 1870 entra para o serviço diplomático como adido em Londres e
depois em Washington (de 1876 a 1879). Atraído pela política interna entra
posteriormente para o Parlamento em Pernambuco ocupando o cargo de
deputado. Defendia o Abolicionismo e a Monarquia. Mesmo depois da
proclamação da República, em 1889, continua alinhado às idéias
monarquistas. Em 1900 torna-se enviado extraordinário e Ministro
Plenipotenciário em missão especial a Londres para resolver as questões
pendentes sobre a fronteira e o território da Guiana. Em 1902 começa a
trabalhar em Roma com objetivo de defender o acordo tratado com a
Inglaterra, que o árbitro da negociação havia sido o rei da Itália, Victor
Emmanuel III. Em 1905 é nomeado embaixador nos EUA, nomeação esta
feita pelo Barão do Rio Branco. Nessa sua função reforça sua posição
favorável ao monroismo.
34
Tal fato, para Magnoli é elucidativo para se compreender o porque de
Nabuco, bem como de Rio Branco, não terem questionado o Corolário
Roosevelt de 1904, que, em síntese, formalizava a existência no mapa
mundo” de uma “vasta zona” sob a “influência moral” norte americana.
Afirma o autor que o Barão do Rio Branco:
“conservou um silêncio oficial ensurdecedor, em meio aos protestos sul-
americanos, e chegou a escrever para o embaixador (Nabuco) que não encontrava
motivos para o ‘receio que certos governos sul-americanos têm de próximas
33
Demetrio MAGNOLI. O corpo da Pátria. Op cit, p 212
34
Sobre essa temática ver. Paulo José dos Reis PEREIRA. A Política externa da Primeira
República e os Estados Unidos: a atuação de Joaquim Nabuco em Washington. Campinas
Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais
UNESP/UNICAMP, 2005
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73
intervenções dos Estados Unidos em seus negócios’ [...]. O jornal londrino Morning
Post, coberto de motivos, interpretou a posição brasileira como representando uma
associação ao corolário”
35
.
A visão desse jornal foi igualmente trabalhada por Cervo e Bueno
36
.
Para esses autores tal interpretação serviu de base para a visão geral da época,
em especial na Europa, de que o Brasil aceitou “tacitamente a Doutrina de
Monroe nos termos em que foi reinterpretada por Roosevelt”
37
.
De acordo com o que apontamos no nosso primeiro capítulo e com base
em Cervo e Bueno, há que se ter em mente que a aproximação com os Estados
Unidos não ocorreu de forma acrítica. Ela seguia um pragmatismo que se
ligava ao fato de, naquele momento, mesmo reconhecendo a formação de um
“sistema continental”, ou seja, um sistema político que se pretendia integrador
das Repúblicas Americanas, com um discurso pacifista em oposição ao
“Hemisfério Beligerante” e liderado pelos Estados Unidos.
Dentro dessa perspectiva pragmática é que devemos entender a
articulação de defesa do monroismo e do pan-americanismo que teve na
Revista Americana um lugar privilegiado de discussão. De acordo com
Magnoli, Rio Branco tinha Joaquim Nabuco, seu primeiro embaixador em
Washington, como peça crucial para a política americana do Brasil, porém o
conteúdo dessa política era o Ministro quem definia, sendo a sua referência
básica o aprofundamento da autonomia nacional e não a adesão idealista aos
princípios pan-americanistas
38
.
O Monroismo do Barão não envolvia o estabelecimento de alianças
formais rígidas. Em instrução a Nabuco, ele precisava: “o nosso desejo é
35
Ibid p 213.
36
Amado CERVO e Clodoaldo BUENO. História da política exterior do Brasil. Op cit.
37
Ibid p 166
38
Neste ponto ocorria uma clara diferença entre Nabuco e Rio Branco , na medida em que o
Embaixador assumia um posicionamento mais idealista em relação ao pan-americanismo
enquanto o Chanceler aproximava-se do que a Teoria das Relações Internacionais denomina
como Realismo. Ver: Paulo José dos Reis PEREIRA. A Política externa da Primeira
República e os Estados Unidos: a atuação de Joaquim Nabuco em Washington Op cit. e
Bradford BUMS. A Aliança não Escrita. Brasília, FUNAG, 2003.
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74
prender-nos o menos possível por compromissos”
39
. O Barão operava a partir
da observação e constatação que o sistema internacional passava por
profundas transformações que repercutiram nas Américas através da gradativa
substituição da Grã-Bretanha pelos Estados Unidos como potência. A nova
supremacia, menos limitada nas suas ações pelos equilíbrios europeus,
característicos das relações internacionais dos oitocentos, tendia a restringir a
autonomia de todos os atores do subsistema hemisférico. Nesse cenário, a fim
de manter a margem de autonomia possível, restava, segundo Magnoli, para o
Brasil, alçar-se à condição de interlocutor privilegiado da potência americana,
estabelecendo as bases de uma parceria estratégica.
40
No bojo dessas questões surgiu uma voz dissonante de dentro da
diplomacia brasileira. Manuel de Oliveira Lima (1867-1928), nascido em
Pernambuco, doutorou-se em Filosofia e Letras pela Universidade de Lisboa.
Ingressou na carreira diplomática em 1890, permanecendo nela até 1913
41
.
Notabilizou-se como um dos maiores polemistas de sua geração, sendo uma
verdadeira “ovelha negra” do corpo diplomático brasileiro, principalmente no
que tange sua posição anti pan-americanista, ou melhor, contrária à leitura e
posição norte-americana acerca do tema, a partir dos primeiros anos do século
XX.
Sua posição diante do Pan-americanismo encontrada em uma obra
síntese
42
nos permite afirmar que Lima construiu um discurso extremamente
articulado com o objetivo de legitimar uma determinada visão do tema,
baseada em uma série de pressupostos presentes no debate intelectual do
período. De acordo com Helio Viana no artigo “Oliveira Lima, Historiador”
de livro em homenagem ao centenário de nascimento do autor
43
, O Pan-
39
Demétrio MAGNOLI. O corpo da Pátria. Op cit p215
40
Id Ibid.
41
Sobre isto ver: Cássia Zangrandi da Rocha LEITÃO.
Oliveira Lima: uma imagem das Américas
. Rio de
Janeiro, Pontifícia Universidade Católica, 1999 (Dissertação de Mestrado) ;
Fernando da Cruz GOUVÊA.
Oliveira Lima: uma biografia. Recife, Instituto Arqueológico Histórico e Geográfico
Pernambucano, 1976.
42
Manuel de Oliveira LIMA. O Pan-americanismo (Bolivar, Monroe, Roosevelt).Brasília,
Congresso Nacional, 1980. Original de 1907.
43
Editado em 1967 pela Comissão de Estudos dos Textos da Historia do Brasil
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75
americanismo muito contribuiu para que fosse mais bem conhecida entre os
brasileiros a chamada Doutrina Drago, assim como a ação “precursora” de
Bolívar, o desenvolvimento histórico do monroismo, as relações hispano-
americanas com o governo dos EUA, etc.
O Pan-americanismo, publicado em 1907, consiste numa coletânea de
artigos publicados nos jornais O Estado de São Paulo e Diário de
Pernambuco entre os anos de 1903 e 1907. Em linhas gerais podemos afirmar
que Lima criticou explicitamente a política norte-americana, colocando-se em
oposição ao monroismo, principalmente o “rooseveltiano”, a partir da
valorização da Doutrina Drago
44
.
Na defesa de suas convicções, claramente contrárias à orientação da
política externa brasileira, Lima opôs-se a Joaquim Nabuco, conforme
salientado, Embaixador brasileiro em Washington, que preparava a III
Conferencia Pan-americana a ser realizada no Rio de Janeiro. Entre outras
teorias, defendia uma espécie de fusão entre as doutrinas de Monroe e de
Drago. Nas suas palavras:
“A doutrina de Drago, consorciada com a tradicional doutrina de Monroe,
além de simbolizarem a fusão dos dois mundos, anglo-saxônico e latino, fusão moral,
sem sacrifício das suas respectivas soberanias, bastam para impedir não só ocupações
como até violações de territórios independentes. [...] Sua adesão à tese Argentina
servira para conservar seu prestígio americano, mais do que isto, mundial neste
gênero de questões, que entram como um capítulo do monroismo, simultaneamente
amparando as nações fracas do continente de outro modo ameaçadas e amparando-as
por uma forma que já não traduz a aplicação de um humilhante principio tutelar”.
45
Mesmo a III Conferencia o tendo representado uma vitória
esmagadora do Imperialismo norte-americano, após a sua realização, Lima
continuou a defender o argumento de que deveria existir uma fusão entre as
doutrinas “Monroe” e “Drago” sendo que esta última deveria predominar
sobre a primeira. Ao reconhecer a manutenção do monroismo, o autor conclui:
44
A Doutrina Drago, enunciada em 1902, afirmava que as “dividas de uma nação para com
outra não deviam ser cobradas a força.” Sobre essa Doutrina ver entre outros Robert Freeman
SMITH. Estados Unidos e a América Latina 1830-1930)”. In: Leslie BRTHEL Historia
da América Latina. (volume IV). Op cit.
45
Oliveira LIMA. O Pan-americanismo. Op cit. p 71
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76
“A doutrina de Monroe vive ainda, mais forte que jamais, e pretende a
transformar-se numa regra mais combativa, à custa dos receios da conquista colonial
por parte da Europa, quanto ao sistema continental americano é que visa a estabelecer
uma esfera de influências que abrange um mundo e busca torná-lo exclusivo da nação
mais forte do sistema”.
46
Após a Conferência, Lima, numa série de artigos
47
, buscou justificar,
historicamente, seu anti-americanismo, fato que o afastou cada vez mais do
direcionamento da política externa brasileira, marginalizando-se dentro do
Itamaraty. Esse fato talvez explique o pouco crédito à participação
diplomática de Lima nas questões territoriais brasileiras, principalmente
quando da sua estada na Venezuela.
48
Podemos afirmar, baseando-se em reflexão realizada por Teresa
Malatian
49
, que a missão venezuelana é chave para a compreensão do seu anti
pan-americanismo na medida em que ocorreu num período de grande tensão
provocada pelos desdobramentos da ação imperialista de 1901, que levaram o
governo venezuelano a solicitar a interferência dos Estados Unidos nos termos
previstos pela Doutrina Monroe. A interferência norte-americana representou,
entre outras medidas, a concessão da administração das alfândegas
venezuelanas para pagamentos da divida externa.
Tal fato foi um marco no debate sobre o monroismo e,
conseqüentemente, no papel dos Estados Unidos na “defesa” da América
Latina, tendo em vista que, desde 1901, Roosevelt reivindicava o exercício de
um poder policial sobre as Repúblicas da antiga América Espanhola, como
podemos constatar na Emenda Platt de 1901, que legitimava a interferência
em Cuba, bem como na releitura da Doutrina Monroe, em 1904, que admitia o
direito dos Estados Unidos de agir como uma força policial internacional, nas
46
Ibid. p 78
47
Publicados genericamente com o titulo de Após a Conferência
48
A questão da Venezuela foi bastante tratada no livro O Pan-americanismo e também no
livro Impressões da América Espanhola de 1908. Cabe ressaltar que nos livros consultados
sobre a historia diplomática brasileira, Oliveira Lima é muito pouco citado e quando isso
ocorre, quase sempre ele aparece, apenas, como opositor tanto de Rio Branco, quanto de
Joaquim Nabuco.
49
Teresa MALATIAN. Oliveira LIMA. São Paulo, UNESP, 2001.
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77
Republicas latino-americanas, em caso de não cumprimento do Direito
Internacional no que tange ao pagamento de suas dívidas. Essa política foi
sintetizada pela clássica expressão “big stick”.
50
Essas medidas relacionam-se com as transformações econômicas nos
Estados Unidos em fins do século XIX. De acordo com Clodoaldo Bueno, na
última década dos oitocentos, houve a conclusão do processo de concentração
capitalista norte-americana. Segundo o autor em 1896, os Estados Unidos
possuíam “o status de potência internacional”, conscientes, portanto de seu
peso no cenário mundial, tendo, nesse sentido, ingressados na disputa
interimperialista com as nações européias.
51
Essas mudanças explicam,
segundo Bueno, a reorientação na política externa dos Estados Unidos, com a
ampliação da noção de fronteira, que de terrestre passou a ser marítima,
atingindo, principalmente, as nações caribenhas. Podemos afirmar que a
vitória na Guerra Hispano-Americana marcou o nascimento da era imperial
norte-americana.
Em 1904, devemos salientar, ainda, a intervenção em São Domingos
que reforçou a nova política externa norte-americana, gerando uma onda de
protestos que valorizavam a Doutrina Drago que, conforme destacado,
combatia o uso da força na cobrança de dívidas e defendia a tese de que tais
medidas coercitivas afastavam-se do verdadeiro ideal da Doutrina Monroe.
Em última análise os partidários da Doutrina Drago, a começar pelo próprio
Drago, e que teve em Oliveira Lima um ardoroso defensor, consideravam
estar recuperando alguns aspectos do pan-americanismo bolivariano, no que
tange a defesa de uma ação conjunta e independente da América Latina, que
não representasse apenas os interesses imperialistas norte-americanos. Não
coincidentemente, na Venezuela, ocorreram as principais manifestações
contrárias ao corolário rooseveltiano.
50
Ibid p.482 . Devemos reforçar que tal corolário apresenta como uma de suas premissas, o
principio do “Big Stick”. Outrossim, cabe salientar que esse intervencionismo norte-
americano também se deu no Oriente, tema também tratado por Lima, que exerceu funções
diplomáticas, durante alguns anos, no Japão.
51
Clodoaldo BUENO. Política externa da Primeira Republica. Op cit . p 481
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78
Nesse contexto o Brasil tendeu, conforme salientado, a se aproximar
da política externa norte-americana. Sem nos determos nas reais intenções de
Rio Branco para adotar tal posicionamento
52
, cabe ressaltar que o mesmo
custou-lhe a acusação de imperialista por parte do restante da América Ibérica,
em especial da América do Sul, acusação esta reforçada ainda mais pela sua
atuação na política de delimitação das fronteiras brasileiras.
É justamente a partir desse período que Oliveira Lima assume uma clara
perspectiva anti pan-americanista. Teresa Malatian observa que Lima ao
acompanhar a intervenção norte-americana na Venezuela pela primeira vez
percebera, do lado mais fraco e vulnerável, os efeitos da política dos Estados
Unidos e dos problemas práticos da aplicação do monroismo rooseveltiano.
Isto teria determinado uma grande desilusão, de sua parte, com essa política,
passando a considerá-la nada mais do que expressão e justificativa do
expansionismo político e, principalmente, econômico e territorial, norte-
americano.
53
A oposição de Oliveira Lima ao pan-americanismo apresentou como um
de seus pilares principais a comparação entre Europa e América, ora
apresentando semelhanças, ora apresentando diferenças. A possibilidade de
paralelismo teve inicio, segundo o autor, com a oposição entre a Doutrina
Monroe de 1823 e a política recolonizadora da Santa Aliança. Lima
ressaltava, inicialmente, o aspecto defensivo do monroismo, como ele fora
concebido no contexto das independências da América Latina (inclusive na do
Brasil) e posteriormente, após análise dos desdobramentos históricos dos
oitocentos, sublinhava seu viés negativo presente na perspectiva do corolário
de Roosevelt dos primeiros anos do século XX. Em suas palavras:
“A doutrina tem, todavia, servido bastante, estou convencido e não se lhe pode
negar esta justiça, para afastar idéias de recolonização e arredar desígnios de
conquista que, sem a mesma, se teriam muito provavelmente precisado melhor e
dados largas, concretizando-se. É ela, portanto, um instrumento de utilidade
continental, contanto que a sua feição não seja alterada; a saber, que a arma de salva-
52
Conforme salientado devemos ter em mente que Rio Branco não pregava uma
aproximação acrítica por parte do Brasil aos Estados Unidos.
53
Teresa MALATIAN. Oliveira LIMA. Op cit
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79
guarda se não transforme o instrumento em arma de subjugação, quiçá de domínio
por anexações. Deixar que alguém nos entre em casa, para dirigir discricionariamente
a sua economia e até as nossas relações, não é muito diferente de presenteá-lo com a
casa de seus pertences.
O monroismo não é, pois, panacéia sem perigos, e de outra banda não
constitui, por enquanto, principio reconhecido do direito internacional, mesmo
americano, a menos que saia com esse caráter da Conferência do Rio de Janeiro. E
justamente o consenso comum o que lhe falta para ter obrigatoriedade legal em sua
aplicação.[...] As disposições do direito das gentes tem que se derivar de um acordo
internacional.
54
que se destacar, portanto, que Lima não se opunha à possibilidade
da implantação de uma política pan-americanista e sim ao pan-americanismo
preconizado por Roosevelt. O autor era favorável a um pan-americanismo
defensivo que teria sido expresso no Congresso do Panamá de 1826, ou seja,
defendia uma integração de toda a América sem, no entanto, a
preponderância, compreendida como intervencionismo, dos Estados Unidos.
Lima distinguiu a Doutrina Monroe em sua concepção original e após as
modificações implementadas por Roosevelt. Adotou a denúncia à política
deste, elaborada por Drago, cuja base havia sido, conforme afirmado, a
intervenção na Venezuela onde o abuso de poder por parte dos Estados
Unidos deixava explicito os limites das medidas abusivas e unilaterais por
parte do governo norte-americano.
No contexto da releitura do monroismo realizado por Roosevelt, Drago,
seguido por Lima, denunciava a preponderância dos Estados Unidos e o fato
dele ser o único a poder aplicá-lo, uma vez que reservava, a si próprio, o poder
de intervenção, poder este, que não lhe teria sido delegado pelas demais
repúblicas americanas. O fundamento da critica era, portanto, jurídico e
incidia sobre a “abdicação da soberania pela consagração do principio de
intervenção”. O resultado era público e notório: o uso da Doutrina seguindo
os interesses expansionistas norte-americanos. Em síntese para Lima:
54
Oliveira LIMA. O Pan-americanismo p. 35. Ao longo de vários artigos, tanto antes quanto
depois da Conferência, Lima retomou essa idéia. Tal fato nos ajuda a compreender o porque
dele, apesar de ser considerado um dos principais colaboradores da Revista Americana, jamais
ter publicado artigo sobre a temática do Pan-americanismo.
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80
“o irmão mais velho anda neste momento armado de cacete (o big stick
preconizado pelo atual presidente e que aliás faz parte dos trastes da Casa Branca)
para chamar à ordem as irmãs malcriadas e, quando lhe parece, não trepida em
despojar qualquer delas de um adorno mais vistoso ou do melhor do seu mealheiro.
Foi o que aconteceu no Panamá com a mana Colômbia.
55
Segundo Lima o imperialismo norte-americano iniciou-se com a Guerra
Hispano-americana, a qual, apesar de acabar com o domínio espanhol em
Cuba, estimulou a política intervencionista, sendo os casos de Colômbia, São
Domingos e Venezuela exemplos dessa nova estratégia política. Iniciava-se o
confronto entre as duas Américas na medida em que se abria espaço para a
dominação imperialista norte-americana. Oliveira Lima reconhecia a
existência de um sistema de poder americano no qual os Estados Unidos
seriam hegemônicos, razão que nos ajuda a compreender a sua aproximação
ao proposto por Drago, e conseqüente afastamento de Joaquim Nabuco, no
sentido de uma “latinização” da Doutrina Monroe para que a América do Sul
pudesse assumir seus destinos sem a intervenção dos Estados Unidos. Uma
união pan-americana seria o instrumento ideal nas negociações de dívidas com
os paises imperialistas europeus sem a intermediação dos Estados Unidos. A
estes caberia apenas o papel de parceiros comerciais. Em resumo uma nova
política para a América comportaria uma aproximação entre o Brasil,
Argentina e demais repúblicas, com manutenção de compromissos para
garantir boas relações com a Europa e bastante cautela nas relações com os
Estados Unidos.
O discurso de Lima surpreende, ao pensarmos na sua condição de
diplomata, por discordar abertamente da política do Ministério das Relações
Exteriores. Não admira o impacto que causaram na época, principalmente os
textos anteriores a Conferência que “denunciavam” uma possível tutela norte-
americana “moral, e até mesmo material, sobre o resto do continente”.
56
Lima previa que a Conferência consagraria a hegemonia norte-americana
sobre a América
55
Ibid p 39.
56
Ibid p 29-30
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81
“[...] a pretensão insistentemente aventada pelo Presidente dos Estados
Unidos, e que lhe tratara de seguro de fazer prevalecer na conferência, de tornar
efetiva a tutela americana moral até ser material, sobre o resto do continente
independente.”
57
Nesse ponto, Lima rompia, mais uma vez, explicitamente com a
política proposta pelo Itamaraty, tendo em vista que ele propunha uma
alternativa, na qual afirmava a necessidade de uma política soberana e
independente para as demais repúblicas americanas, distante de qualquer tipo
de interferência, pelo menos nos moldes propostos por Roosevelt, dos Estados
Unidos.
Lima, a partir de uma proposta de um pan-americanismo defensivo, nos
moldes do bolivarismo, imaginava a construção de um determinado projeto
político e cultural para o restante da América, qual seja: que os países do
continente tivessem as suas soberanias nacionais garantidas a fim de ser
possível que eles cumprissem seu papel na história mundial, que seria, em
síntese, o de obter os mais altos graus de desenvolvimento, entendido como
progresso e civilização. Tal projeto representava, igualmente, uma resposta ao
corolário de Roosevelt.
É nesse contexto que se insere o debate do pan-americanismo na Revista
Americana. Sendo que tal polêmica esteve presente nas suas ginas
58
. Tal
fato nos auxilia a compreender a importância do estudo do processo histórico
tanto do conceito quanto, e principalmente, da aplicação prática e efetiva dos
princípios que o nortearam. Dentro dessa lógica nos deteremos a partir de
agora nas análises acerca do monroismo / pan-americanismo presentes na
Revista Americana.
57
Ibid. p. 33.
58
Mesmo observando que Oliveira Lima, conforme já destacado, não escreveu sobre o Pan-
americanismo é interessante notar que essa idéia de um “pan-americanismo defensivo” esteve
presente na Revista, sobretudo na sua primeira fase.
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82
3.3
O primeiro momento do Pan-americanismo na Revista Americana: os
defensores do Monroismo nas páginas do periódico
Inicialmente, convém salientar que dividiremos nossa análise, neste
capítulo, seguindo a referência cronológica explicitada no primeiro capítulo.
Nesse sentido apresentaremos o debate acerca da temática proposta em artigos
até 1913 e, posteriormente, nos textos da segunda fase a partir de 1915.
Araripe Jr no artigo “A Doutrina Monroe”, publicado em duas partes,
59
estabelece uma análise histórica do processo de construção do monroismo.
Neste particular, o autor defendeu a tese de que tão importante quanto a
Doutrina Monroe, foi a, acima citada, “declaração” de Polk de 1845 que
seria, para ele, o “reflexo do sentimento democrático americano” em
oposição ao “espírito pérfido e perigoso da Santa Aliança”, interessando na
atitude de Polk “a força da corrente que irrompe através de todas as
dificuldades políticas, quaisquer que elas fossem naquela hora”.
60
59
Araripe JR (Tristão de Alencar) A Doutrina de Monroe. Revista Americana , dezembro de
1909 e janeiro de 1910. De acordo com biografia apresentada pela própria Revista, ele era
filho do conselheiro Tristão de Alencar Araripe e D. Argentina de A. Araripe. Nasceu na
cidade de Fortaleza (Ceará), em 27 de junho de 1848. Formou-se em direito na Faculdade do
Recife (1869). Secretário da Província de Santa Catarina em 1871; juiz municipal de
Maranguape (Ceará) de 1872 a 1876; deputado provincial dos biênios de 1872 a 1875.
Advogado nos auditórios do Rio de Janeiro de 1877 a 1886. Oficial, na secretaria do Império
em 1886. Diretor de seção e sucessivamente diretor geral da instrução pública, do interior e da
justiça, na secretaria da Justiça e Negócios Interiores. Consultor Geral da Republica em
1903.Colaborou nos seguintes jornais e revistas: Constituição do Ceará; Correio
Pernambucano; Diário de Pernambuco; Jornal do Recife; Fraternidade; Província, do Pará;
Novidades; Gazeta de Noticias; Gazeta da Tarde; A semana; Diário de Noticias; Revista
Brasileira; Renascença; Jornal do Commercio; os últimos da Capital Federal.
Obras publicadas: Contos Brasileiros (1868); Cartas sobre a literatura brasileira: Jacinta e
Marabá; O ninho de beija flôr (1874); Quizinha (1873); O papado (ap. 1873); O reino
encantado (1877); Jo de Alencar (1880); Martin Garcia Mérou; Chico Melindroso;
Gregório de Mattos (1874); Movimento de 1893 (1894); A constituição estadual, trabalho
publicado no Diário Oficial, incompleto (1895); Ibsen, ensaios publicados no Jornal do
Commercio,
60
Araripe JR (Tristão de Alencar) A Doutrina de Monroe. Op cit .p 67.
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83
Nesses mesmos artigos Araripe Jr salienta que apesar da Declaração de
Monroe ter sido inicialmente datada, isto é, nasceu como o fim específico de
criticar, combater e paralisar a Santa Aliança, ela acabou se tornando
atemporal tendo em vista que o seu “espírito e alma” continuaram vivos,
configurando-se em um dos pilares centrais da política norte-americana,
como, de acordo com Araripe Jr, pode ser constatado no posicionamento dos
Estados Unidos diante da querela entre França e México em meados do século
XIX. Nas palavras do autor:
“Do perigo do Império de Maximiliano livraram-se os Estados Unidos muito
facilmente pela simples ação mecânica da Lei de Monroe. A 4 de abril de 1864, a
Câmara dos Representantes em Washington, votava por unanimidade uma moção
concebida nestes termos: ‘o congresso dos Estados Unidos não deseja, por seu
silêncio, que as nações do mundo mantenham a ilusão de que ele se conserva como
espectador indiferente dos deploráveis acontecimentos que se desenvolvam
atualmente no México. O Congresso julga, pois, oportuno declarar que ao povo dos
Estados Unidos não convém reconhecer um governo monárquico, levantado sobre as
ruínas de um governo republicano na América, sob os auspícios de uma qualquer
potência européia’. O golpe estava dado, Maximiliano não foi reconhecido”
61
Com base nessa passagem podemos perceber que, para Araripe Jr, o
caso de Maximiliano, por ele tratado como sendo uma “guerra franco-
americana”, marcou o posicionamento estratégico da “grande República”, no
cenário americano, na medida em que por meio de pressão restituíram um
“governo americano a um território americano” resgatando os princípios da
Doutrina Monroe mas “sem a mínima quebra de princípios adotados e aceitos
pelas outras nações do continente” em uma clara perspectiva da “justa
aplicação daqueles princípios.”
62
Em síntese, podemos afirmar que a Doutrina Monroe, para Araripe Jr,
seria fruto de um “sentimento americano”, a própria vida nacional, tendo seu
fortalecimento ocorrido devido às repetidas tentativas de desagregação “por
influência estrangeira do sistema político em que firmava a América”
63
.
61
Ibid p70. Sobre essa questão ver, entre outros, Eric HOBSBAWN. A Era dos Impérios. Op
cit
62
Ibid p 72
63
Ibid p 77
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84
Logo ela é vista como uma forma de defesa da paz e da estabilidade da
América, evitando-se, por exemplo, a “africanização”
64
do Continente.
Seguindo essa lógica de valorização do monroismo, Araripe Jr teceu
séria crítica a Eduardo Prado por sua obra “A ilusão Americana”
65
. Nesta
obra Prado analisa o papel dos Estados Unidos nos processos de
independências das colônias ibéricas na América, observando, entre outras
temáticas, a posição norte-americana diante das investidas de governos
europeus aos recém formados países, assim como a sua influência política,
moral e econômica sobre esses países. Segundo Prado, a política interna e
externa dos Estados Unidos, à época das independências latino-americanas,
subordinadas à escravidão, não se orientaria a “fazer suas as brigas da
América Latina com as potências européias”, e tal posição não teria mudado
desde então. Para o autor residia nos ingleses, e não nos norte-americanos, a
“força moral” que propiciou a independência da América Ibérica.
Clodoaldo Bueno, na citada obra A República e sua política exterior
(1889 a 1902)
66
, ao comentar as críticas à aproximação entre Brasil e Estados
Unidos, destacou a obra de Eduardo Prado afirmando que a política exterior
dos Estados Unidos, segundo Prado não seria benevolente para o Brasil ou
a América Latina” na medida em que o Secretário Blaine, em última análise,
“extorquia” tratados desvantajosos para o restante do continente, não havendo,
portanto, a chamada fraternidade americana e sendo equivocado acreditar que
os “Estados Unidos tivessem simpatias pela América do Sul ou pelo Brasil,
mesmo depois de implantadas as novas instituições.”
67
64
Africanização nesse contexto deve ser entendida como partilha, ação ocorrida na
Conferência de Berlim de 1885.
65
Eduardo PRADO. A ilusão americana. São Paulo, Brasiliense, 1961.(3ªedição) original de
1893.
66
Clodoaldo BUENO. A República e sua política exterior (1889 a 1902) Op cit
67
Ibid p 29
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85
Para Antonio Candido
68
Eduardo Prado acreditava que nas repúblicas da
América Espanhola haveria uma “anarquia disfarçada em liberdade”, sob a
“ação dissolvente do imperialismo norte-americano”, sendo, portanto, mais
interessante o “imperialismo inglês, que era monárquico e europeu”, cabendo
ao Brasil “orientar-se no rumo da Europa, pois com os países da América
Latina não tinha afinidades nem interesses comuns”
69
São inegáveis, ao analisarmos artigos publicados na Revista Americana,
as críticas, diretas ou indiretas, feitas á obra de Eduardo Prado. Dunshee de
Abranches no artigo “O Brasil perante a Doutrina de Monroe”, de fevereiro
de 1910
70
afirma que Prado era um “jovem e ardoroso monarquista”, com o
claro intuito de “impopularizar os primeiros governos republicanos”, valendo-
se, para isso, da argumentação de “publicistas europeus infensos ao povo
norte-americano,[e que] o têm acusado de desvirtuamento da Doutrina de
Monroe.”
71
Abranches, no artigo supracitado, ao apresentar a temática do
imperialismo, critica veementemente autores europeus, em especial J Ribet,
por suas posições anti-monroístas. Argumenta o autor que os políticos do
68
Antonio CANDIDO. Recortes. Op cit
69
Eduardo PRADO. A lusão Americana. APUD Antonio CANDISO. Recortes. Op cit. P132
70
Dunshee de ABRANCHES “O Brasil perante a Doutrina de Monroe”. Revista Americana
fevereiro de 1910. Advogado e publicista nascido no Maranhão (1863). Autor de temas
ligados aos problemas internacionais brasileiros. Dedicou vários opúsculos a obra do Barão
do Rio Branco, cuja política defendeu na Câmara dos deputados. Principais obras :Tratado de
Comercio e Navegação do Brasil. Rio de janeiro. Imprensa Nacional. 1909 ;A lagoa mirim e
o Barão de Rio Branco. Imprensa Nacional, Rio de janeiro. 1910 ; Parecer da Comissão
Diplomática e Tratados da Câmara dos deputados. 1910 Rio Branco; Defesa de seus atos.
Imprensa Nacional. Rio de janeiro. 1911. ; O Brasil e Arbitramento. Tratados e convenções.
Rio de janeiro, tipografia Leuzieguer. 1911 ;O Maior dos Brasileiros. Necrológio político e
defesa póstuma do Barão do Rio Branco ; A Conflagração Européia e suas Causas. Rio de
Janeiro. Typografia do “Jornal do Commercio”, 1914. ; Apelo em favor da celebração
européia dirigida ao presidente da câmara Publica noDiário do Congresso nacional”, 1916.
; O Tratado de Bogotá. Rio de Janeiro, 1908 ; Brazil and Monroe Doctrine. Rio de Janeiro,
1915 ; O ABC e a Política Americana. Rio de Janeiro, 1915 ; A Inglaterra e a soberania do
Brasil. Rio de Janeiro, 1915 ; A expansão econômica e o comercio exterior do Brasil ; A
Black list e o projeto de Dunshee. Rio de Janeiro, 1916 ; A black list. Rio de Janeiro, 1916. ;
Contra a guerra. Rio de Janeiro, 1917 ; A presidência de Rodrigues Alves. Rio de Janeiro,
1916 ; Rio branco intimo. (sem data) ; Diplomacia e tratados do Brasil.(em 4 volumes)
71
Dunshee de ABRANCHES “O Brasil perante a Doutrina de Monroe”. Op Cit. p 181
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86
“Velho Mundo” analisam a ameaça americana, no contexto da corrida
imperialista a partir da gica de que a Doutrina de Monroe seria a causa, a
justificativa, a explicação para o imperialismo norte-americano, sendo que
este, para os europeus, segundo Abranches, teria tanto um aspecto político e
moral, quanto, sobretudo, um objetivo econômico. Citando Ribet:
“A Doutrina de Monroe não é , em sua letra, um capricho, como não é uma
virtualidade fácil: toda uma orientação econômica existe nela.[...]. É a arma dos
norte- americanos contra a Europa, arma que a Europa não volta contra eles, de modo
que podem, com segurança, estender o seu poderio sobre a América inteira e o
Universo. Sem a doutrina de Monroe, o pan-americanismo e o imperialismo yankee
não existiriam; eles são seus filhos”
72
Segundo Abranches essa visão européia é explicável pela luta entre os
mercados dos dois continentes, fato, principalmente naqueles anos anteriores à
Primeira Guerra Mundial, que fazia a Europa tomar precauções contra
quaisquer tipos de ameaça. Nas palavras do autor:
“Diante dos outros países ainda pouco manufatureiros, da América, e oriundos
de diversa formação étnica, não deixa de ser um processo engenhoso manter sempre
os Estados Unidos como uma ameaça perene à sua integridade territorial ou à sua
autonomia política. Se o nervo das transações comerciais é o crédito e este repousa na
confiança recíproca dos que as operam, nada mais natural do que as praças da Europa
continuarem a enfeixar o monopólio da exportação para as nações em que o seu
grande concorrente da América setentrional se mostra sempre sob as aparências
alarmantes de um conquistador insaciável”
73
Analisando os escritos de Dunshee de Abranches na Revista Americana
pode-se perceber que, para o autor, o imperialismo estadunidense não seria
um desdobramento direto da doutrina Monroe, mas sim “o resultado das
idéias em voga entre as grandes potências do mundo contemporâneo”, sendo
posterior ao europeu tendo surgido, em última análise, por uma necessidade
conjuntural diante da ação expansionista associada à
“uma atitude agressiva, dilatando todos os seus domínios e apossando-se, aqui
e ali, nos oceanos, de territórios importantes, quer pela sua posição estratégica, quer
como empórios comerciais de primeira ordem”
74
.
72
Ibid p 184
73
Ibid p 182-183
74
Ibid p 186
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87
Outrossim, apesar de se admitir a ação imperialista norte-americana,
esta acabava sendo observada, e, portanto, justificada, como uma reação ao
imperialismo europeu. Em síntese, Abranches defende que o imperialismo dos
Estados Unidos constituiu-se em uma arma de defesa em relação à ação
imperialista européia, assim como argumentava que deveria haver um
“equilíbrio continental”, cabendo o domínio do Oceano Pacífico aos norte-
americanos. Com um otimismo bastante evidente defende a tese que os
Estados Unidos teriam a necessidade, “a quase obrigação”, de intervir em
determinadas questões internacionais como nos exemplos, citados pelo autor,
dos arquipélagos do Havaí e de Samoa, uma vez que estes eram, naquele
momento, assediados de todas as partes pelo “apetite colonizador de certas
nações européias”. Logo, os norte-americanos “não o fizeram impelidos pelo
espírito imperialista do povo” mas sim pelo próprio “instinto de
conservação” que os levou a esses extremos “depois de larga relutância.” Em
resumo, para Abranches “o imperialismo yankee, proclamado do dia para a
noite, deveria ter assim profundamente irritado os governos autocráticos de
além-mar. Era a arma de defesa contra o imperialismo europeu.”
75
75
Ibid pp 189 - 190
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88
no primeiro número da Revista Americana Hélio Lobo
76
, no artigo
“George Canning ou James Monroe? (páginas de História diplomática)”
77
,
defendeu, após análise acerca dos antecedentes históricos da Declaração de
76
De acordo com a Academia Brasileira de Letras “Hélio Lobo (H. Leite Pereira), diplomata,
ensaísta, biógrafo e historiador, nasceu em Juiz de Fora, MG, em 27 de outubro de 1883, e
faleceu no Rio de Janeiro, em 1o de janeiro de 1960. Eleito em 6 de junho de 1918 para a
Cadeira 13, na sucessão de Sousa Bandeira, foi recebido em 26 de novembro de 1919 pelo
acadêmico Lauro Müller. Bacharelou-se em Direito pela Faculdade do Rio de Janeiro, em
1903. Pouco depois publicou o livro Sabres e togas, em que abordou as mais controvertidas
questões de direito penal militar. Ingressou no Itamaraty, onde então dominava com todo o
prestígio o Barão do Rio Branco. Não tardou muito para que Hélio Lobo revelasse uma
vocação admirável para a diplomacia. Em 1907, foi destacado para o Tribunal Arbitral
Brasileiro-Peruano e, a seguir, para o Brasileiro-Boliviano, sempre ocupando o lugar de
secretário. De 1910 a 1915, passou de terceiro a primeiro oficial da Secretaria de Estado das
Relações Exteriores. Em 1912, foi secretário da Junta de Jurisconsultos Americanos,
encarregada de codificar no Rio de Janeiro o Direito Internacional americano. Foi por essa
época que Hélio Lobo começou a escrever os seus primeiros trabalhos sobre a diplomacia
brasileira. Isolando-se na biblioteca do Itamaraty, compulsando documentos, esforçando-se
por refletir sobre questões falseadas pelas lendas históricas, reuniu material para muitas obras,
que lhe dariam um lugar primacial na história da diplomacia. Ao mesmo tempo, pela sua ação
diplomática, requintada e eficaz, desenvolveu uma das mais prestigiosas carreiras nas relações
exteriores, como cônsul-geral em Londres e Nova York (1920-1926); secretário geral da
Delegação do Brasil na Conferência de Versalhes (1919); delegado à IV e à V Conferência
Internacional Americana (1910 a 1923); delegado à Conferência para a Manutenção da Paz
(1936); ministro do Brasil em Montevidéu e em Haia (1926-1932); representante do Brasil na
Conferência sobre Proscritos da Alemanha e Áustria, em Evian (1938). Foi delegado do
governo do Brasil às Conferências Internacionais do Trabalho (de 1938 a 1939 e de 1947 a
1951); representante do Brasil no Conselho de Administração da Organização Internacional
do Trabalho, em Genebra e Montreal (1938 a 1941 e 1947 a 1951). Hélio Lobo foi
colaborador de jornais brasileiros e estrangeiros, entre os quais La Nación, de Buenos Aires;
O Jornal e Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro; o Diário, de São Paulo; A Tarde, da
Bahia; o Correio do Povo e a Federação, de Porto Alegre. Pseudônimos: Clara Benevente,
Palmella. Seus temas eram o Brasil, sua história diplomática, questões internacionais,
Sociedade das Nações, Organização Internacional do Trabalho. Ainda sobre esses assuntos
discorreu perante as principais universidades norte-americanas; na Universidade de Buenos
Aires; na Universidade de Montevidéu; em universidades brasileiras; no Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro; na Escola Naval de Guerra; na sala de conferências do Itamarati e na
Academia Brasileira de Letras. Era membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; do
Instituto Americano de Direito Internacional (Washington); da Sociedade Argentina de
Derecho Internacional; da Pan American Society e da Hispanic Society of America; do
Instituto Histórico e Geográfico do Uruguai; Doutor honoris causa pela Universidade de
Buenos Aires; membro fundador da Sociedade Brasileira de Direito Internacional. Principais
obras: Sabres e togas, direito (1906); O Tribunal Arbitral Brasileiro-Boliviano, diplomacia
(1910); De Monroe a Rio Branco, diplomacia (1912); Brasil, Terra Chara... (1913); O Brasil
e seus princípios de neutralidade, direito internacional (1915); Aos estudantes do Rio da
Prata, conferência (1918); Cousas diplomáticas (1918); A passo de gigante, problemas
norte-americanos (1923); Cousas americanas e brasileiras (1925); Brasilianos e yankees
(1926); No limiar da Ásia, ensaio (1935); Um varão da República: Fernando Lobo, biografia
(1937); Manuel de Araújo Porto-Alegre, biografia (1938); O pan-americanismo e o Brasil
(1939); O domínio do Canadá, ensaio (1942)”.
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89
Monroe, que o monroismo deve ser compreendido como uma “ideologia
americana”, por “iniciativa americana e em “função dos interesses
americanos”, bem como que os princípios expressos na Declaração, ao serem
consolidados serviram de base para o desenvolvimento, ao longo do século
XIX e inicio do XX, dos princípios do pan-americanismo.
Lobo abre uma discussão sobre a atuação e importância de dois dos
principais estadistas do primeiro quartel do século XIX, época em que foi
formulada a “Doutrina Monroe”. O próprio título do artigo é bastante
elucidativo na medida em que aponta para uma oposição entre Estados
Unidos e Inglaterra, e pela necessidade de se inserir tal questão na História
diplomática do continente uma vez que este tema era um dos centrais para a
diplomacia sul-americana de então.
George Canning foi Ministro do Exterior da Grã-Bretanha e, segundo
Lobo, um dos principais responsáveis pela ruptura entre a Inglaterra e a Santa
Aliança, fato motivado, principalmente, pela tentativa de recolonização das
Américas, pano de fundo da Declaração de Monroe. Segundo Lobo, Canning
em 1823, advertiu o embaixador francês em Londres que apesar da Inglaterra
não ter pressa no reconhecimento das recém independentes repúblicas
americanas ela agiria, imediatamente, caso a França utilizasse tropas em
auxílio à Espanha e/ou se esta buscasse limitar o comércio inglês nas
Américas. Outrossim, ainda seguindo a argumentação de Lobo, Canning teria
proposto ao plenipotenciário norte-americano em Londres, a idéia de uma
negociação, um pacto, entre Inglaterra e Estados Unidos, visando, em última
análise, uma ação conjunta contra a Santa Aliança. Tal proposta foi vista com
desconfiança, sobretudo com a negativa inglesa, em um primeiro momento, de
reconhecer as repúblicas americanas.
77
Helio LOBO “George Canning ou James Monroe? (páginas de História diplomática)”
Revista Americana, outubro de 1909.
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90
Logo é possível observarmos que, para Lobo, essa posição política dos
Estados Unidos explicava e justificava a Declaração de Monroe, que seria, na
verdade, fruto de um processo anterior a 1823 e que, segundo o autor, teve em
Quincy Adams (Secretário de Estado de Monroe e futuro presidente dos
Estados Unidos) figura de extrema relevância tendo em vista a sua destacada
atuação na questão, acima citada, do interesse russo na costa noroeste da
América, declarando que o governo dos Estados Unidos se oporia a qualquer
tentativa de povoamento e estabelecimento comercial nos “continentes
americanos”, proclamando que estes não seriam mais objeto de colonização
européia. Nas palavras de Adams citadas por Lobo:
“Com exceção dos ingleses ao Norte do Estados Unidos, ambas as Américas
devem ser deixadas doravante a mãos americanas. Não é admissível o projeto russo
de formar grandes estabelecimentos coloniais na América. As novas repúblicas deste
hemisfério ficarão, tanto quanto os Estados Unidos, inquietas da vizinhança russa.”
78
Nesse sentido, Lobo afirma que Adams foi o percussor da Doutrina
Monroe sendo esta a pedra fundamental da construção do “sistema
americano” em oposição ao “sistema europeu” e que se tornaria em breve um
“credo da política yankee” transformando-se na “pedra angular do pan-
americanismo” lançado por Henry Clay e desenvolvido por James Blaine.
Para Lobo seria Adams e, por conseguinte, os Estados Unidos a “viga mestra”
que diferenciava a América da Europa.
Hélio Lobo, no ano seguinte (maio de 1910) no texto intitulado “A
Assembléia do Istmo” (uma página de história diplomática americana)
79
retoma essa temática valorizando a participação dos Estados Unidos no
processo de integração das Américas salientando que a iniciativa do Secretário
78
APUD Helio LOBO. “George Canning ou James Monroe? (páginas de História
diplomática)Op cit p 100
79
Helio LOBO A Assembléia do Istmo” (uma página de história diplomática americana).
Revista Americana, maio de 1910.
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91
de Estado Blaine, ao longo dos anos de 1880, de convocar uma Conferência
80
,
realizada de acordo com o trabalhado no nosso primeiro capítulo, em
1889/1890, entre os Estados americanos “corresponderia ao sonho de Bolívar
de 1826”. Na década de 1820, mais precisamente na série de tratados que
antecederam o Congresso do Panamá, encontrava-se, segundo Lobo, a gênese
do pan-americanismo, conforme podemos observar nessa passagem:
“Em um dos artigos adicionais brota o germe do pan-americanismo. As duas
partes contratantes obrigam-se a reqüestrar a adesão dos demais estados da América,
primitivas colônias da Espanha e obtido esse escopo. Reza o artigo terceiro, todos
eles se reunirão, sem quebra de soberania, em congresso solene, uma Assembléia
Geral dos Estados Americanos composta de seus plenipotenciários com o encargo de
cimentar de um mais sólido e estável as relações íntimas que devam existir entre dois
e cada um deles e que lhes servia de conselho nos grandes conflitos, de ponto de
contato nos perigos comuns, de fiel interpretação de seus tratados públicos e de juiz,
árbitro e conciliador em suas disputas e diferenças”
81
Nesse cenário de início de uma gica pan-americana, Lobo destaca a
circular convocatória de dezembro de 1824, emitida por Bolívar na qual
objetivava-se a construção de uma base sólida para unir as repúblicas
americanas originadas do antigo Império Colonial Espanhol, com o intuito de
garantir a estabilidade de seus governos por meio de uma corporação política
que abarcaria as democracias ibero-americanas. Nas palavras de Bolívar
citadas por Lobo:
“Para estabelecer um tal sistema e consolidar a potência dessa Grande
Corporação Política, far-semister a existência efetiva de uma sublime autoridade,
que dirija a política de nossos governos, mantenha por sua influência a uniformidade
de nossos princípios e cujo nome seja por si só suficiente para enfrear nossas
agitações. Tão respeitável autoridade pode deparar-se numa Assembléia de
Plenipotenciários das Repúblicas, reunidos, sob os auspícios dos triunfos arrancados
ao poder central da Espanha.”
82
80
Convém salientar que as Conferências realizadas tiveram destaque nas páginas da Revista
Americana sempre pensadas inseridas na lógica da aproximação, da integração entre os países
americanos.
81
Helio LOBO “A Assembléia do Istmo” (um página de história diplomática americana) Op
cit. p 230.
82
Ibid p 232. Convém salientar que apesar de observar positivamente a proposta de Bolívar ,
Lobo a enxergou como ineficiente.
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92
Cabe salientar que a idéia de uma reunião entre países americanos que
buscasse estabelecer uma autonomia para as Américas, segundo Lobo, era de
interesse de Quincy Adams, àquela altura Presidente dos Estados Unidos. O
autor defendia essa tese baseando-se em discurso de Adams, por ele citado e
que reproduzimos aqui:
“Deliberará este Governo quando o plano se apresentar sob feição mais
específica e definida. Ao presente, ele supõe de preferência a quaisquer intuitos
práticos que possam interessar-nos a preocupação da Colômbia em assumir papel
preponderante neste hemisfério. Com relação à Europa, um ponto em que
possam coincidir os nossos e os interesses e desejos dos países sul-americanos, e esse
é o de que sejam eles governados por instituições republicanas, independentes
política e comercialmente dela. A qualquer confederação de províncias latinas deste
hemisfério, visando tal escopo, daremos nossa aprovação e nossos cordiais votos de
felicidade. Se mais nos pedirem, a respectiva proposta será favoravelmente acolhida e
meditada consoante o merecimento que tiver.”
83
Fica evidente nessa passagem de Adams, selecionada por Hélio Lobo, a
aproximação com os fundamentos da Declaração de Monroe, fato que reforça
a argumentação do autor de que Quincy Adams, na qualidade de Secretário de
Estado do Presidente James Monroe, fora um dos principais artífices dos
princípios da Declaração bem como explicita uma visão positiva acerca do
Monroismo para as Américas.
Dentro dessa perspectiva de defesa do monroismo nas páginas da
Revista Americana não podemos deixar de mencionar dois artigos de Joaquim
Nabuco- de acordo com o analisado no início do capítulo, um dos baluartes da
defesa do pan-americanismo- publicados nos anos de 1909 e 1910, a saber: “A
parte da América na Civilização” e “A aproximação das duas Américas”,
respectivamente, no primeiro e terceiro números da Revista.
Originalmente uma conferência realizada nos Estados Unidos, “A
parte da América na Civilização abre o número inaugural da Revista. Ao
falar da América, o próprio Nabuco admite estar se referindo apenas aos
Estados Unidos, pois, segundo ele, era “cedo ainda para discorrer sobre a
83
Quincy ADANS. APUD, Helio Lobo Ibid p 236
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93
parte reservada na História à América Latina”.
84
O autor chega a afirmar que
“a América, graças à doutrina Monroe, é o Continente da Paz” e que “paz e
pan-americanismo são termos equivalentes para vós e para nós”.
Evidentemente que o pan-americanismo é tomado como um mero
desdobramento do monroísmo e este visto como uma doutrina de defesa
continental contra agressões européias. O artigo trata, como expresso no
título, das “principais contribuições norte-americanas para a civilização,
que, segundo Nabuco, seriam, entre outras: a imigração, a democracia, e a
igualdade de condições sociais.
A imigração foi vista por Nabuco a partir da comparação com o tráfico
negreiro, observando que a partir daquela houve a criação de um sentimento
de pátria, fundamental na construção da “Nação Americana”. Para o autor a
imigração foi a grande responsável pela regeneração que o espírito americano
vinha tendo na “marcha da civilização” após os séculos de tráfico de escravos,
“(...) mas, afinal de contas, o que matou o tráfico de escravos e a escravidão
foi a imigração. A imigração, não escravidão, representa a verdadeira seiva
americana.” Mais adiante Nabuco afirma ser a imigração a “maior força da
civilização moderna, e sem dúvida alguma é uma força americana.”
85
Após desenvolver sua argumentação sobre a imigração o autor destaca
a Democracia, classificando-a como “distintamente americana”, mesmo sendo
um “produto” de origem inglesa, ganhou na América um espírito de liberdade,
caracteristicamente anglo-saxão “crescendo em uma terra sem tradição
monárquica, tomou a forma de Democracia, ou Republica.”
86
Nabuco, baseando-se em Aléxis de Tocqueville, aproximava esse viés
democrático da “igualdade geral de condições”, fato que destacaria os Estados
Unidos do restante do mundo e explicaria, segundo o autor, o porque dele ter
84
Joaquim NABUCO. “A parte da América na Civilização”. Revista Americana,
outubro/1909.
85
Ibid p. 19
86
Ibid p 20
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94
se tornado o lar adotivo, “o lar escolhido por homens de todas as raças,
nascidos e educados debaixo do principio da desigualdade”.
87
Tais prerrogativas levam-no a citar James Bryce, na frase que Nabuco
considera síntese de toda sua obra, “a América marca o mais alto nível não só
do bem estar material, mas da inteligência e da felicidade, que a raça jamais
atingiu”. Reforçando sua argumentação, seu texto termina com a seguinte
prova de fidelidade: “nunca pensaremos em esconder o nosso grande orgulho
em reconhecer nos filhos de Washington os modeladores da nossa civilização
americana”.
88
No segundo artigo do autor publicado na Revista Americana, A
aproximação das duas Américas”, observamos uma clara linha de
continuidade com o primeiro, fato absolutamente esperado, na medida em que
ambos foram artigos oriundos de conferências realizadas em Universidades
norte-americanas, na mesma época, e publicadas, conforme salientado no
primeiro e terceiro números da Revista Americana. Nesse sentido a Doutrina
de Monroe foi mais uma vez valorizada como podemos constatar nessa
passagem bastante elucidativa:
“Inspirou-se a Doutrina de Monroe somente no receio de ver a Europa estender
as suas esferas paralelas de influência sobre a América, como fez mais tarde na
África, e quase logrou fazer na Ásia, arriscando destarte a vossa posição solitária? Ou
vos moveu a intuição de que este é um novo mundo, nascido com destino comum?
Acredito firmemente que a doutrina Monroe inspirou-se muito mais nesse
instinto americano - tome-se a palavra americano no sentido continental - do que em
qualquer temor ou perigo para vós outros. Sem dúvida nessa doutrina se delineou
toda uma política estrangeira da qual este país nunca se afastou, de Monroe a
Cleveland, de Clay a Blaine e a Root. Tal constância, tal continuidade, é a melhor
prova de que vossa política americana obedece a um fundo instinto continental e não
é somente uma medida de precaução nacional a defesa própria. Essa política vos
reteve alheios ao labirinto da diplomacia européia, no qual, não fora a doutrina
Monroe, talvez viésseis a enredar-vos”
89
87
Id, ibid
88
Ibid p. 22.
89
Joaquim NABUCO “A aproximação das duas AméricasRevista Americana, dezembro de
1909. pp 177 - 178
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A grande novidade nesse artigo reside no fato de Nabuco explicitar o
seu desejo de que as diferentes partes do continente americano se
aproximassem, conforme fica claro no próprio titulo do texto. Mais do que um
desejo, Nabuco salienta a necessidade histórica dessa aproximação.
Resgatando o monroismo o autor deixa clara a necessidade dos paises
americanos se unirem como forma de não “recear da sua nacionalidade.” Mais
uma vez nos valendo das palavras do autor:
“(...) aqui (em Chicago) nos achamos em um dos portões do mundo, por onde
entram novas concepções sociais, novas formas de ser, em uma das fontes da
civilização moderna (...) se o progresso dos nossos tempos muito de pasmar as
gerações futuras, maior admiração lhes causará que as duas grandes partes do nosso
Continente hajam permanecido até tarde na história quase desconhecidas uma da
outra”
90
Ao retomar os elementos analisados no artigo anterior, Nabuco volta a
elogiar a formação histórica norte-americana e a necessidade, ou melhor, a
“obrigação”, que os paises americanos teriam de se aproximar, para aprender,
com seu “irmão do Norte”. Nesse sentido ele se baseia, mais uma vez, na
Doutrina Monroe, afirmando que esta se inspirou em um “instinto americano”,
com a palavra americana concebida no mais amplo sentido continental.
Encerrando seu artigo Nabuco, em tom de grande esperança afirma:
“(...) que a par das largas transformações que se realizarão no mundo, a seu
tempo, as quais nem podemos avaliar, eles vejam todos os Estados das duas
Américas conhecendo-se, amando-se e havendo uns aos outros como membros de
uma só família entre as Nações.”
91
Vários outros colaboradores da Revista Americana se aproximaram
dessa perspectiva de defesa do monroismo, como, por exemplo, Pedro
Irigoyen no artigo “Mediacion e intervencion” de maio de 1911
92
no qual
defende a tese de que a Doutrina Monroe é um exemplo de solidariedade
americana. Em suas palavras:
90
Ibid p 180
91
Ibid p 182
92
Pedro IRIGOYEN “Mediacion e intervencion” Revista Americana, maio de 1911.
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96
“Desde que os Estados Unidos proclamaram no ano 23 [1823] sua célebre
doutrina de política continental, na qual, negando o direito de intervenção européia
sobre os países sul-americanos, se arrojaram a faculdade de exercer um generoso e
nobre protetorado sobre esses povos, não têm deixado de mediar em todas as
questões transcendentais que a eles se refiram, procurando sempre garantir a vida
dessas nacionalidades e estabelecer entre elas vínculos de verdadeira
solidariedade.”
93
Merecem destaque também as posições de Araújo Jorge no artigo “O
reconhecimento da República do Brasil” de dezembro de 1909
94
no qual
defende que o próprio reconhecimento da proclamação da República passou
pela interferência da Doutrina Monroe. Segundo Jorge :
“[...] O Senador Morgam propôs que o Governo americano, inspirando-se nos
princípios aceitos em todas as administrações anteriores, a partir do Presidente
Monroe, no tocante a independência do continente americano[...] de abstar qualquer
intervenção por parte das monarquias européias [...] reconhecesse, por um ato solene
e inequívoco, a nova República.
95
Fica bastante evidente nessa análise a posição positiva em relação ao
monroismo por parte de intelectuais/diplomatas brasileiros, conforme visto
nas suas biografias ligados, diretos ou indiretamente ao Itamaraty e, por
conseguinte, ao Barão do Rio Branco. Cabe ressaltar, no entanto, que nas
páginas da Revista Americana houve espaço para críticas à Doutrina Monroe
e, por extensão, à política norte-americana para o restante do continente.
Observar tais críticas é condição sine qua non para a compreensão dos debates
presentes no periódico. A partir de agora nos deteremos nas críticas ao
monroismo presentes na primeira fase da Revista.
93
Id, ibid
94
Araújo JORGE que no artigo “O reconhecimento da República do Brasil” Revista
Americana, dezembro de 1909. Araújo Jorge , conforme visto, foi o principal editor da
Revista e “braço direito” do Barão do Rio Branco.
95
Ibid, p 27
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97
3.4
A visão dos críticos
Um dos principais colaboradores da Revista Americana a estabelecer
uma severa crítica ao monroismo foi o argentino Norberto Piñero. No artigo
“La política Internacional Argentina” de janeiro de 1913
96
, ao analisar a
questão do reconhecimento das independências dos países sul-americanos,
destaca a relevância do posicionamento inglês, sintetizado na atuação de
Canning, que teria tido papel decisivo nesse processo. Muito mais
significativo do que os de Monroe e Adams. Piñero chama a atenção para o
fato da diplomacia britânica ter como pilar central e “de uma maneira
brilhante a ação de Canning”. Para o autor, o diplomata britânico configurou-
se em poderoso homem de Estado, tanto pelos seus atos quanto pelas suas
palavras, sendo peça chave no processo que culminou com o reconhecimento
das independências.
97
Na seqüência desse artigo
98
, publicado no mês seguinte, Piñero defende
a tese de que a posição norte-americana diante das independências das
colônias espanholas seguia uma gica definida desde 1810, quando Monroe,
na qualidade de Secretário de Madison, explicitava uma “política liberal” com
o objetivo de marcar uma posição norte-americana favorável ao processo de
independência. Piñero, no entanto, afirma que tal apoio trazia consigo um
objetivo de estabelecer um “ostensivo” pacto mercantil, restringindo-se,
portanto, em uma política meramente comercial.
99
96
Norberto PIÑERO La política Internacional Argentina”. Revista Americana, janeiro de
1913.
97
Ibid pp 60-61
98
Norberto PIÑERO, “La política Internacional Argentina”. Revista Americana, fevereiro
de 1913.
99
Ibid p171
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98
Segundo o autor, apesar do Congresso dos Estados Unidos, em 1811,
apresentar uma posição favorável ao estabelecimento de países soberanos nas
“províncias espanholas da América”, o reconhecimento de tais processos era
dificultado em virtude da aspiração norte-americana em adquirir a Flórida.
Todavia, na medida em que esta se tornou parte do território americano, os
Estados Unidos teriam podido ceder às inclinações de sua política.
Para Piñero a política continental norte-americana pautava-se pela
garantia pragmática de seus interesses comerciais e pela prioridade de seus
interesses internos em relação à solidariedade com outras nações. Ao analisar
a Doutrina Monroe afirmou que esta havia sido interpretada de diferentes
maneiras, mas em sua opinião, a mais precisa dessas interpretações seria em
suas palavras:
“ela não somente excluía às potências européias toda aquisição possível de
territórios no Novo Mundo, mas que trazia implícita a extensão da soberania dos
Estados Unidos, no futuro, aos países do continente. [...] Pela suspeita e pelo temor
de que a riqueza e a excepcional expansão conduzisse aquele grande povo a
estabelecer seu poderio sobre os estados independentes do sul”
100
.
Continuando a análise das posições de Piñero cabe salientar que um de
seus argumentos centrais foi, tal qual Oliveira Lima, a valorização da
Doutrina Drago, defendendo a idéia de que ela também seria um corolário de
Doutrina Monroe. Desenvolvida a partir da questão do bloqueio naval imposto
pela Grã-Bretanha e Alemanha à Venezuela, em 1902, sob o pretexto de
cobranças de dívidas e indenizações, a Doutrina Drago explicitaria, para
Piñero, que também caberia à América do Sul se posicionar quanto a ações
estrangeiras no continente. Nas palavras de Luís M. Drago, citadas pelo autor:
“O principio que se quer ver reconhecido é o de que a dívida pública não pode
dar lugar à intervenção armada, nem menos à ocupação material do solo das nações
americanas por uma potência européia”
101
.
100
Ibid p 174
101
Ibid p 178
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99
Nesse sentido, podemos afirmar que, para o autor, as palavras de Drago
representariam uma “doutrina política baseada no rechaçamento à cobrança
compulsória de dívidas”, portanto, uma doutrina política americana, próxima
dos princípios enunciados por Monroe, e “não um postulado ou teoria abstrata
do direito” assim como seria uma manifestação de um sentimento das
Repúblicas da América do Sul e não uma medida imposta pelos norte-
americanos.
Piñero, ao citar discurso de Drago proferido em 1906
102
, reforçava sua
posição de considerar a “Doutrina Drago” um instrumento que tratava de
sobrepor o direito de soberania dos estados ao direito de intervenção
internacional em caso de acertos financeiros defendendo, em última análise, a
soberania dos países da América do Sul. Nos dizeres de Drago, citado por
Piñero:
“Em um momento solene, a República Argentina proclamou a ilegitimidade da
cobrança coercitiva das dívidas públicas pelas nações européias, não como um
princípio abstrato de valor acadêmico nem como uma regra jurídica de aplicação
universal [...], senão como um enunciado político de diplomacia americana que, se
bem se apóia em razões de direito, tende exclusivamente a evitar aos povos deste
continente as calamidades da conquista quando ela assume o disfarce das
intervenções financeiras, da mesma maneira que a política tradicional dos Estados
Unidos, sem acentuar superioridades nem buscar predomínios, condenou a opressão
das nações desta parte do mundo e o controle de seus destinos pelas potências da
Europa.”
103
.
Outro crítico à posição dominante na Revista Americana foi o chileno
Marcial Martinez. No artigo “Cuestión Chileno-Peruana” de abril de 1911
104
defendeu que
“[...] fora de dúvida que os Estados Unidos aspiram a hegemonia sobre todo o
novo continente. O Sr Blaine foi o fundador da idéia, e têm sido os seus
colaboradores posteriores os senhores Root e Knox. A pretendida Doutrina Monroe
não é outra coisa senão a proclamação implícita da hegemonia norte-americana ou
102
Segundo PIÑERO em um banquete oferecido ao então Secretário de Estado dos Estados
Unidos, Root.
103
Ibid pp178-179
104
Marcial MARTINEZ. “Cuestión Chileno-Peruana” Revista Americana, abril de 1911.
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100
simplesmente americana, como eles dizem, para manifestar que a América está
representada pelos Estados Unidos.
105
Martinez afirma que, para o povo chileno, o Secretário de Estado Blaine
era considerado o grande inimigo da nação, em decorrência dos atritos
relativos à prisão de Garcia Calderón (Presidente peruano reconhecido pelos
Estados Unidos mas não pelo Chile) após a Guerra chileno-peruana. Em
síntese, Blaine era visto como o “iniciador do imperialismo dos Estados
Unidos”.
Também seguindo essa linha de abordagem temos o artigo A
intervenção armada dos Estados Unidos na Republica Dominicana”
106
, de
Jacintho López , que afirma ser o controle dos norte-americanos sobre as
alfândegas, bem como sobre a dívida externa dominicana um primeiro passo
para o controle tanto da renda interior quanto das vias de comunicação do
país, com o ministro norte-americano intervindo na política, na legislação, no
governo, em suma, em todas as questões públicas. Ou seja, para López, as
intervenções trariam consigo uma clara perspectiva imperialista de usurpação
de todas as riquezas da República.
Com essa mesma linha de argumentação, Vicente Gay, ao analisar a
abertura do Canal do Panamá, no artigo “El canal Del Panamá y la crisis
econômica intercontinental”
107
, publicado em março de 1913, critica os
interesses “escusos” dos Estados Unidos no contexto dessa questão
internacional, observável pela ação norte-americana no processo de
desmembramento da Colônia com o claro intuito de “dispor da pequena
república do Panamá e descartar, assim, toda influência estranha”.
Para Gay a abertura do Canal traria como conseqüência imediata o
aumento da concorrência comercial norte-americana na Ásia e Oceania,
105
Ibid p110
106
Jacintho LOPEZ. “La intervención armada de los Estados Unidos en la Republica
Dominicana”. Revista Americana, abril de 1911.
107
Vicente GAY “El canal Del Panamá y la crisis económica intercontinental Revista
Americana, março de 1913.
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101
principalmente em relação à Inglaterra e Alemanha. Outrossim, mesmo com a
possibilidade de resistência comercial por parte dos países europeus,
sobretudo em relação à América do Sul, a tendência geral era que o Mar das
Antilhas e a América Central ficassem “sob a influência avassaladora e
direta das correntes comerciais americanas”. Diante dessa possibilidade Gay
criticava duramente a Doutrina Monroe, como podemos observar nessa
passagem de seu texto:
“houve um tempo em que a doutrina de Monroe significava a fórmula da
independência americana: a Europa não podia seguir nenhum intento colonizador no
continente americano; a era da colonização ativa havia terminado e começava a
colonização dos territórios americanos sob a soberania dos próprios Estados da
América. Mas, hoje que a avalanche de gentes da América do Norte e da Ásia
constitui um sério perigo para os americanos filhos do tronco latino, a exclusão que
proclama a Doutrina de Monroe significa o monopólio da América pelos norte-
americanos e a falta de defesa contra asiáticos, ao mesmo tempo que o afastamento
dos povos europeus que podem proporcionar os melhores elementos de resistência,
que são os núcleos de população”
108
.
Explicitam-se para nós dois aspectos, complementares, bastante
elucidativos, presentes nas páginas da Revista Americana. O primeiro
referente ao fato de Gay, de certa forma, aproximar-se dos dizeres de Joaquim
Nabuco no tocante a questão da imigração, sendo esta, porém, um fenômeno
que deveria se restringir ao fluxo Europa-América. E o segundo, em nossa
opinião mais representativo e, que reforça a primeira argumentação,
relaciona-se com o fato das contribuições que o Continente Europeu poderia
oferecer, ainda, às nações americanas, sobretudo em um contexto em que
cresciam os “perigos”, entendidos, pelo autor, relacionados com a “hegemonia
norte-americana” e a “expansão asiática”.
Dentro desse contexto duas tendências ideológicas, muito próximas, e
alternativas ao americanismo monroista, foram propostas nas ginas da
Revista Americana, a saber: o ibero- americanismo e o pan-iberismo. Este,
proposto por Gay, foi compreendido como sendo um estreitamento de
vínculos com a Europa e uma pretensa aliança latino-americana, como uma
108
Ibid p 323.
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102
alternativa tanto ao processo de “asiatização”, quanto ao que o autor
classificava como um “avanço ameaçador dos Estados Unidos”.
Seguindo um viés claramente influenciado pelas teorias raciais dos
oitocentos, Gay aponta o “perigo amarelo”, fruto da “expansão das massas
asiáticas” para as Américas. O perigo residiria, para o autor, numa possível
infusão de elementos tão distanciados em raça, costumes, arte, idéias morais,
que causariam, por conseguinte uma “perturbação funesta”.
Para Gay para as repúblicas latino-americanas tal fenômeno
representaria a perda da personalidade no sentido histórico e psicológico
sendo este o primeiro passo para a perda da sua independência. O autor
salientou também o fato que a ação absorvente da política pan-americanista
dos Estados Unidos se exacerbaria propondo como solução única, tanto para a
questão da “asiatização”, quanto para a ameaça norte-americana, o
estreitamento de vínculos com a Europa e a aliança dos países da América
Latina. Tais premissas se associariam ao processo de estímulo à imigração
européia, que seria uma espécie de antídoto, segundo o autor;
“contra a imigração asiática e o avanço ameaçador dos Estados Unidos”, na
medida em que deveriam “precaver-se os latinos da América. Acolhendo e
fomentando a imigração de elementos latino-europeus, estreitando cada vez mais
seus vínculos com a Europa”
109
Seguindo essa mesma linha de raciocínio temos Luís Arquisáin que, no
artigo “O porvir cultural da América”
110
de janeiro de 1913, reflete acerca da
possibilidade de crescimento de uma nova cultura espanhola que seria a base
de um “ibero-americanismo”, isto é, uma “união da Espanha com a América”
estabelecida não por tratados de quaisquer naturezas, mas sim pela existência
de uma “cultura comum”.
Essa análise acerca das diferentes formas de se pensar o binômio
monroismo /pan-americanismo continuou presente na segunda fase da
109
Id, ibid
110
Luís ARQUISÁIN “O porvir cultural da América” Revista Americana, janeiro de 1913.
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103
Revista Americana, porém nessa fase o debate, acerca dessa temática, abriu
espaço para um posicionamento mais voltado para a observação da
necessidade histórica do pan-americanismo, pensado como elemento
fundamental para a paz do continente americano.
3.5
O segundo momento: a consolidação de uma determinada posição
Na segunda fase da Revista Americana o debate acerca do pan-
americanismo, de certa forma, foi redimensionado, uma vez que a tendência à
defesa do pan-americanismo aparece sob um viés de manutenção da paz entre
os países da América. Não havia, portanto, mais espaço para posições
radicalmente contrárias à aproximação da América do Sul e dos Estados
Unidos, por mais que essa aproximação assumisse um caráter mais crítico do
que algumas das visões vistas na primeira fase do periódico. Cabe ainda
ressaltar que de forma mais evidente colocava-se a união entre as Américas
em uma perspectiva de maior autonomia para a América do Sul, isto é, o pan-
americanismo seria necessário, porém sem a obrigatoriedade da liderança e
tutela dos Estados Unidos
A prevalência de tais posições nos remete, entre outros fatores, à
Primeira Guerra Mundial, evento que gerou na intelectualidade americana
sentimento de grande frustração e preocupação com os rumos da humanidade
bem como uma desilusão com vários dos paradigmas seguidos que se
constituíam em referências teóricas de alguns projetos políticos e culturais sul-
americanos.
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104
Inegavelmente, essa época marcou um redimensionamento de boa parte
dos pensadores do continente que reforçavam em contraste com o cenário
Europeu (abalado com a Guerra), uma perspectiva claramente continental,
com um sentimento de americanidade.
No que tange a visão sobre o pan-americanismo ficou bastante evidente
a sua defesa, a partir de então, numa clara perspectiva de construção de um
marco identitário americano, diferenciando e afastando o continente da
“velha” Europa..
No contexto inicial do conflito europeu temos o posicionamento,
favorável ao monroismo de Victor Viana na série de artigos intitulados “A
política internacional”
111
, de 1915, nos quais aponta a posição de neutralidade
norte-americana no contexto inicial da Primeira Guerra, resgatando a linha
interpretativa, presente na análise de alguns colaboradores desde a primeira
111
Victor VIANA “A política internacional”. Publicados ao longo do segundo semestre de
1915 na Revista Americana. O autor segundo a Academia Brasileira de Letras foi o “Terceiro
ocupante da Cadeira 12, eleito em 11 de abril de 1935, na sucessão de Augusto de Lima e
recebido pelo Acadêmico Celso Vieira em 10 de agosto de 1935. Vítor Viana, jornalista,
professor, crítico literário e ensaísta, nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 23 de dezembro de
1881, e faleceu também no Rio de Janeiro, em 21 de agosto de 1937. Após os estudos de
humanidades e de Direito, entrou para o jornalismo. Dedicou-se aos problemas nacionais
constitucionais, tornando-se exímio articulista de assuntos econômicos e financeiros.
Colaborou nos jornais O século, Cidade do Rio, Imprensa (de Alcindo Guanabara), passando
para O Paiz e, finalmente, para o Jornal do Commercio, do qual chegou a ser o redator
principal e diretor. Durante a I Guerra Mundial, foi um dos comentadores mais informados
dos acontecimentos da guerra. Também colaborou na imprensa como crítico dos “Livros
Novos” e redator das “Notas pedagógicas”. Foi bibliotecário da Escola Nacional de Belas
Artes, professor da Escola de Altos Estudos e professor de Geografia Industrial e História das
Indústrias na Escola Nacional de Artes e Ofícios Venceslau Brás. Foi membro da comissão
incumbida de elaborar o Código Aduaneiro. Representou o governo da União no Congresso
da Instrução Primária, reunido no Rio de Janeiro em 1921. Fez parte do Conselho Superior de
Comércio e Indústria. Serviu em comissão junto ao gabinete do ministro da Fazenda, de 1919
e 1922, e junto ao gabinete do ministro da Agricultura, de 1922 a 1925. Ocupou, a seguir, o
cargo de superintendente dos estabelecimentos do Ensino Comercial. Seu nome aparece no
Almanaque do Ministério das Relações Exteriores como redator do respectivo Boletim de
1926 a 1929. Era membro do Conselho Federal de Comércio Exterior e da Sociedade de
Geografia do Rio de Janeiro e membro titular da Sociedade Brasileira de Direito
Internacional, por proposta de Amaro Cavalcanti, em virtude dos artigos publicados sobre a
guerra e a Liga das Nações.
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105
fase, que defendia a perspectiva do “imperialismo defensivo norte-
americano”, uma das características básicas daquela política externa, fato
que, segundo o autor, demonstraria o “desinteresse” dos Estados Unidos em
relação às questões européias.
Tomando como exemplo as intervenções realizadas no México e na
República Dominicana, Viana defende a tese que tais ações foram fruto de
uma necessidade histórica concreta e específica mais para o bem maior da
América do que para fins imperialistas, configurando-se em uma simples
aplicação da doutrina de Monroe.
Reforçando sua argumentação Victor Viana afirma, acerca da República
Dominicana, que “as paixões políticas da pequenina república insular”, eram
de tal ordem que seria praticamente impossível o pleito se travar sem uma
revolução. Logo defendeu a intervenção como sendo uma “missão de
fiscalização”, isto é, com o objetivo de conduzir a eleição impedindo que o
choque político se transformasse em conflito generalizado e, eventualmente,
desencadeasse um processo revolucionário. Em ntese, para o autor, os
Estados Unidos teriam a função, quase missionária, de garantir as liberdades
constitucionais do restante do continente americano, bem como a autonomia
econômica diante da Europa, - e, tais premissas seriam possíveis a partir da
aplicação prática dos princípios da Doutrina Monroe, conforme podemos
constatar no seguinte fragmento:
“Nas repúblicas do centro a ação norte-americana tende para exercer a mesma
influência. O Sr Wilson declarou mais de uma vez que tem o dever de chamar à
razão e à liberdade esses povos transviados, a fim que eles não se aniquilem na
anarquia. É um novo desenvolvimento da doutrina de Monroe [...]. No seu discurso
de Móbile, Alabama, o presidente dos Estados Unidos disse que ‘incumbe aos
Estados Unidos auxiliarem as nações deste continente a emanciparem-se dos
interesses materiais dos outros países a fim de que essas nações possam gozar
plenamente de sua liberdade constitucional’”.
112
112
Vitor VIANA. “A política internacionalRevista Americana, agosto de 1915. p 74
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106
Ao desenvolver a política intervencionista, compreendida enquanto
“ação tutelar” de controle das desordens políticas dos “povos transviados”,
Viana a aproxima dos propósitos da Doutrina Monroe, uma espécie de
desenvolvimento dela que deveria servir um modelo para os países sul-
americanos, um “exemplo a ser seguido”.
Em última análise o autor defende a estratégia da intervenção norte-
americana como um mecanismo para impedir uma outra intervenção, na sua
opinião, muito mais perigosa que seria a européia. Portanto, os Estados
Unidos não promoviam intervenções imperialistas e sim intervenções contra
imperialismos. “Essa é pelo menos a doutrina que eu descubro nos discursos
do grande estadista norte americano.”
113
.
Em 1917, Hélio Lobo, que já havia se notabilizado pela defesa do
monroismo na primeira fase da Revista, retoma essa temática no artigo
“Relações entre os Estados Unidos e o Brasil (1822-1916)”
114
, mais uma vez
de forma bastante positiva, observando a Declaração de Monroe, como um
“anteparo eficiente às ambições da Europa”, conforme podemos observar
nessa passagem:
“É sabido como se editou, e em que condições internacionais surgiu, a
declaração de anti-colonização e anti-conquista: a ele deve este continente a
soberania integral, em que vive. ‘Sem a atitude dessa grande e poderosa nação
perante a Europa’, um dia Rio Branco, em documento reservado (18 de novembro de
1905), ‘os países fracos da América Espanhola, dilacerados pelas guerra civis, e
empobrecidos por exploradores políticos e pretensos salvadores de pátrias, estariam
expostos aos ataques das potências européias e até à conquista.”
115
Resgatando aspectos históricos do fenômeno desde o que ele classificou
como “congressos defensivos”, que seriam as Conferências do século XIX,
nos quais, segundo o autor, Brasil e Estados Unidos eram fortemente
criticados pelas suas ausências. Lobo estabelece uma linha de raciocínio que
113
Ibid p 75
114
Helio LOBO Relações entre os Estados Unidos e o Brasil (1822-1916)”. Revista
Americana, novembro de 1917.
115
Ibid p. 221
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107
relaciona o não comparecimento dos dois países aos encontros continentais
pelo simples fato de naquele contexto não haver “receio de reconquista”, fato
que era a pedra de toque das reuniões nas quais discutia-se apenas a lógica da
não intervenção européia no continente americano. Segundo o autor caso
tivesse sobrevindo o processo de reconquista, ninguém mais que os Estados
Unidos, com sua famosa declaração, e o Brasil, com seu aplauso imediato,
estariam dispostos a enfrentá-lo.
116
Lobo afirma, nesse sentido, que Henry Clay fora o percussor do pan-
americanismo ao lançar as bases, os “alicerces” que doravante seriam
desenvolvidos. Tais alicerces foram, e eram, àquela altura, pilares da “alma
americana”, sendo esta indivisível e concreta desde o apoio dos norte-
americanos aos processos de independência das colônias ibéricas da
América
117
e que se reforçaram nas últimas décadas do período imperial e,
logicamente na era republicana.
Para embasar essa argumentação Lobo faz referência ao folheto, de
1866, Política Americana, de Pandiá Calógeras, no qual Brasil e Estados
Unidos deveriam se relacionar a partir de uma lógica na qual ambas as nações
fossem, nas palavras de Calógeras;
“chamadas a cimentar o bom acordo entre as potências do novo mundo e dele
resultará não a política geral, mas a civilização americana(...) que se encaminha para
a conquista de todos os benefícios da paz.
118
.
Segundo Lobo tal cimentação foi ampliada com a proclamação da
República brasileira que estreitou os laços com as demais nações do
continente que igualmente deveriam ser dirigidas por “homens realmente
superiores”, com o intuito de garantirem a harmonia e a civilização americana.
116
Ibid p. 222.
117
Não podemos perder de mente que essa premissa, conforma visto no início do capítulo,
não condiz precisamente com o processo histórico. Importa aqui ressaltar que tal visão nos
remete a uma determinada visão de mundo construída pelo autor e que corrobora com uma
posição diante da política americana e mundial de então.
118
Helio LOBO Relações entre os Estados Unidos e o Brasil (1822-1916)”. Revista
Americana Op cit p 223
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108
Por fim o autor, exaltando o processo histórico e a tradição norte-
americanas, destaca que o objetivo do restante do continente americano
deveria ser buscar:
“a par e vós, convosco, o estímulo para as ações belas e generosas, entre os
quais ambição vossa e nossa, paira, vitoriosa em meio ao cataclisma universal, a da
paz e da confraternidade internacional da América.”
119
Na série de artigos intitulados “El panamericanismo, su pasado y su
porvenir”
120
Francisco Garcia Calderón , ao dissertar acerca do fenômeno do
pan-americanismo aponta para um conjunto de transformações pelos quais a
denominação passou de uma perspectiva de criação de um sistema defensivo
contra prováveis conquistadores, para , segundo o autor, com a Primeira
Guerra Mundial constituir-se em um credo político de nações livres.
Nessa nova perspectiva caberia ao pan-americanismo representar alguns
princípios definidos, tais como: arbitragem, democracia, liberalismo sem
dominações, paz no progresso industrial, convivência pacífica entre repúblicas
menores e povos fortes, comunidade de interesses religiosos e morais.
Entretanto, cabe salientar que Calderón não estabelecia os Estados
Unidos como única referência a ser seguida. Em seus artigos enfatizava,
mesmo salientando e reconhecendo o grau de desenvolvimento alcançado
pelos norte-americanos, a importância histórica da América Latina
estabelecendo comparações entre as Américas. De acordo com o autor:
“Na América, a unidade é geográfica e moral. República , liberalismo,
democracia, tolerância, constituem de norte a sul aspectos idênticos. Saxões
germanizados e espanhóis latinizados chegam, em lenta cooperação, a definir
aspirações e ódios análogos. Se o norte-americano é protestante e o ibero-americano
é católico; se se expressam em idiomas distintos e obedecem a diversa lógica, da
terra semelhante, de sistema de governo uniforme , de um crescimento sem seculares
tradições, da ausência de rígidas castas, da comunidade de generosos princípios como
a arbitragem e o amor a paz(...) se deriva um pan-americanismo, teoria e realidade
militante, prática cruzada e apostolado romântico.(...) ideal livre de antigas ambições,
119
Ibid p 234.
120
Francisco Garcia CALDERÓN El panamericanismo, su pasado y su porvenir” Revista
Americana 1916 e 1917. Senado Federal. Revista Americana : uma iniciativa pioneira de
cooperação intelectual. Seleção de artigos fac – similar. Op cit.
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109
fraternais repúblicas constroem uma associação econômica e moral, formulam
aspirações de liberdade e de paz.”
121
Outrossim, Calderón confere grande destaque ao processo histórico
sul-americano do século XIX, em especial ao da América Hispânica,
dissertando sobre Simon Bolívar, para ele, ao lado de Henry Clay, os pilares
iniciais, os “precursores” de Monroe e, por conseguinte, do pan-
americanismo. Caberia, no entanto, a Bolívar o papel de grande mbolo de
uma América unida, na medida em que desde a defesa, do que Calderón
define como ilha profética, (Jamaica), haveria um sentimento de luta pelo
estabelecimento de um plano para se consolidar a unidade continental. O
Panamá, observado como sendo a nova Corinto, seria o centro geográfico das
duas Américas, onde se reuniram os ministros da futura paz.
122
Tal sentimento de solidariedade continental de certa forma perdurou,
segundo Calderòn, ao longo de boa parte dos oitocentos. Entretanto, o autor
reconhece que, na medida em que as décadas foram passando, o “sentimento
americanista”, o “sonho bolivariano”, foi se perdendo, esbarrando, entre
outros no sentimento de nacionalidade.
123
Com o arrefecimento do que poderíamos denominar, de acordo, com a
conceituação de Glinkin, de pan-americanismo latino, Calderón observava o
aumento da influência norte-americana. As Conferências Pan-americanas, nos
dizeres do autor, inauguraram o pan-americanismo de caráter econômico
atrelado ao sentimento de busca de um equilíbrio continental, a partir da
liderança dos Estados Unidos, com o estabelecimento dos princípios gerais da
arbitragem internacional, como dispositivos contrários às guerras, sobretudo
no que se refere às questões fronteiriças.
Esses dois princípios foram os mais destacados por Calderón que
chamava a atenção para o perigo de tal processo gerar um imperialismo norte-
americano, fato que seria nocivo para o restante do continente, salvo em casos
121
Francisco Gracia CALDERÓN. “Panamericanismo: seu passado e seu porvinir”. Revista
Americana Op cit. pp 237 e 238.
122
Ibid p 242.
123
Ibid p246
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110
de existências de “Repúblicas débeis”, quando deveria ser estabelecido um
“intervencionismo profilático” que significaria, em termos práticos, a
utilização do pan-americanismo em uma perspectiva de manutenção da ordem
continental, nem que para isso fosse necessária a utilização da força.
124
Após exemplificar seu argumento com uma análise da situação política
do México no contexto da Revolução Mexicana, Calderon parte para a sua
argumentação final ao expor acerca do Pan-americanismo na época da
Primeira Guerra Mundial ressaltando a sua importância histórica ao se
estabelecer como um sistema defensivo que, segundo o autor, seria de
fundamental importância para garantir a soberania continental. Nas suas
palavras
“sistema defensivo contra prováveis conquistadores, o ensaio de organização e
proteção dentro do continente, o pan-americanismo prospera e se transforma. Com a
Guerra de 1914, amplo conflito de doutrinas, de interesses e imperialismos,
transformam sua função histórica: é o credo político das nações livres (...) representa
princípios definidos : arbitragem , democracia, liberalismo sem dominações, paz
com progresso industrial, convivência pacífica entre repúblicas menores e povos
fortes , comunidade de interesses religiosos e morais (...) Somente a América o
assiste ao encontro sangrento das nações.”
125
Diante desse cenário caberia às Repúblicas do “sul da América”
buscarem construir projetos nacionais/ continentais que não permitissem uma
ação meramente imperialista por parte dos Estados Unidos. Em última análise
deveria haver um sentimento pan-americano que não fosse sinônimo de
controle e intervenção norte-americana.
Aproximando-se de algumas dessas premissas temos o artigo de Heitor
Lyra
126
: “O Pan-americanismo no Brasil antes da Declaração de Monroe”,
de 1919.
127
O título do texto é particularmente elucidativo, tendo em vista que
o argumento central do autor passa pela defesa de que o sentimento
124
Ibid p 266
125
Ibid p 281.
126
Diplomata e historiador (1893-1973). Notabilizou-se por sua preocupação em preservar a
memória da diplomacia brasileira, sendo um dos principais responsáveis pela organização e
preservação do Arquivo Histórico do Itamaraty. Sobre isto ver: Alberto da Costa e SILVA. O
Itamaraty na cultura brasileira. Rio de Janeiro, Francisco ALVES, 2002. p 32.
127
Heitor LYRA, “O Pan-americanismo no Brasil antes da Declaração de Monroe”. Revista
Americana , maio de 1919.
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111
americanista, definido como pan-americano, fora anterior à Declaração de
Monroe.
Partindo de uma análise histórica do processo de Independência do
Brasil, desde a época Joanina, o autor estabelece distinções claras entre o
Brasil e a América Hispânica, enfatizando a tendência anárquica e
politicamente instável,dos “nossos vizinhos”, destacando a tendência pacífica
brasileira. Segundo Lyra:
“graças ao regime monárquico não esteve a mercê de caudilhos que,
amparados em falsos princípios democráticos, investiam a todo momento contra o
poder constituído.
128
O autor argumenta que o nascimento do espírito americano ocorre com a
chegada da Corte Portuguesa, uma vez que esse fato, por conta da nova
estrutura administrativa montada, permite observar o estabelecimento de uma
burocracia estatal. Portanto, tal fato representaria a criação de “um estado
americano”, distante de qualquer proposta recolonizadora. Podemos
compreender a visão de Lyra sobre o tema nessa passagem:
“Porque o certo é que muito antes de Monroe declarar sua mensagem ao
Parlamento que ‘os continentes americanos não se podem doravante considerar como
objeto de futura colonização por parte de nenhuma potência européia’, havia, no
Brasil, uma tendência para, não somente dar por terminada, a era do domínio europeu
no Novo Mundo, mas ainda para a formação de uma Liga, de uma Aliança entre os
paises americanos - e mais especificamente os do sul como um meio de impedir
qualquer interferência da Europa.
Era, portanto, mais que o monroismo; era o pan-americanismo
“Se Monroe, em 1823, estabelecera, pública e oficialmente as bases do pan-
americanismo, a América do Sul alguns anos antes já pensava em adotar essa política
liberal”.
129
Interessante notar que em um mesmo texto, em parágrafos praticamente
seguidos, o autor faz referência, inicialmente a um tipo de vanguardismo
brasileiro e, posteriormente, ao da América do Sul. Tal questão aparece ao
longo do artigo o que nos leva a pensar que a intenção de Lyra é estabelecer
uma espécie de simbiose entre Brasil e América do Sul que justifique, tanto a
128
Ibid p 191.
129
Ibid p 201.
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112
aproximação das nações sul-americanas, quanto uma dada liderança brasileira
na construção política do continente.
Paralelo a isso, devemos salientar que o autor define monroismo a partir
de uma perspectiva norte- americana, isto é, ele serviria apenas aos interesses
dos Estados Unidos, diferenciando-o do que ele conceitua como Pan-
americanismo, que seria a união em nível continental, que teria, no Brasil de
D João, seu marco inicial e, como principal artífice, Bolívar, “que antes de
Monroe havia convidado nações do continente para o primeiro congresso
pan-americano.”
130
Se por um lado Bolívar é considerado, do ponto de vista prático, o
precursor do pan-americanismo, do ponto de vista teórico, Lyra aponta a
importância de alguns políticos brasileiros quais sejam: o pernambucano Cruz
Cabugá, no contexto da Revolução de 1817
131
, Araújo Carneiro, em 1818,
Rodrigo Pinto Guedes, em 1819 e, até mesmo José Bonifácio.
Tal estratégia serviu para o autor encaminhar sua conclusão defendendo
a tese de que o pan-americanismo seria uma herança histórica brasileira e, por
conseguinte, sul-americana, não sendo, portanto, um processo originalmente
norte-americano, não devendo, por conseguinte, ser necessariamente liderado
pelos Estados Unidos.. Numa clara perspectiva de valorizar a História
Nacional dos oitocentos, antes mesmo da era Imperial, Lyra salienta que a
aproximação americana não seria um fenômeno obrigatoriamente
republicano
132
, valorizando não apenas, em suas palavras:
130
Ibid p 202.
131
LYRA, nesse particular segue a interpretação de Oliveira Lima na obra “História da
Revolução Pernambucana de 1817.” Convém salientar que o autor deixa claro que o tinha a
intenção de pesquisar sobre o fundador do Pan-americanismo. Nas suas palavras: “Não é o
nosso objetivo, porém indagar quem foi o fundador do pan-americanismo na América do sul.
Procuramos apenas mostrar, apoiados nos documentos existentes, que no Brasil, mesmo antes
de 1823, isto é, antes de Monroe formular sua doutrina, havia uma tendência bastante
acentuada para a política americana, ou melhor, para a política pan-americana.” Id ibid
132
Citando o Diário Oficial (ano LVI, n, p 726) “Um ilustre e honrado membro do Parlamento
brasileiro declarou dias , citando vários fatos da política internacional do século passado,
que a política americana foi inaugurada pela República (...) tem-se espalhado a notícia que a
política esboçada por Monroe era uma conduta tradicional do Brasil. Não Sr Presidente, na
Monarquia essa diretriz não foi adotada. Começou a sê-lo, franca e desassombradamente,
depois de instituído o regime republicano.” Ibid p 207
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113
“a República, não ao Império, não ao Reino, mas ao Brasil. A ele é que cabe a
glória de ter inaugurado, antes mesmo de Monroe, a única política que deve existir
neste Continente: a política de completa união entre todos os estados americanos”
133
Podemos concluir que, para Lyra, o pan-americanismo assumia uma
tendência francamente sul-americana. Nesse sentido é interessante observar
que ele explicita um sentimento que não chega a ser contrário aos Estados
Unidos, porém ele sinaliza, tal qual os defensores do bolivarismo, no sentido
de uma união americana de caráter mais universalista, na qual deveria haver
espaço para outros continentes, inclusive o europeu. Entretanto, o autor
explicita que a Europa a qual ele se refere seria liberal, a culta, a inteligente”
e não a “atual, banhada em sangue”, carregada de crimes
134
, para a qual a
América deveria servir de exemplo por ser um continente que mantém-se,
mesmo em um contexto beligerante, em paz, conforme pode ser observado
nessa citação:
“política de completa união entre todos os Estados americanos, para que
entrelaçados , unidos uns aos outros, possam mostrar à Europa, à velha Europa, que
as invejas, as competições mesquinhas, as deslealdades e o maquiavelismo
diplomático, não transpuzeram ainda, para honra da América, o mar que nos
separa.”
135
Refletir sobre as diferentes apropriações sobre o pan-americanismo
torna-se interessante para entender a leitura realizada pelos colaboradores do
periódico de um dos temas mais caros ao Itamaraty e, por extensão, ao corpo
diplomático da época.
133
Ibid p 208.
134
Id ibid
135
Id ibid
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114
3.6
Em busca de uma síntese
Dentre as temáticas que, de certa maneira, nortearam o debate à época,
temos o monroismo e as releituras deste conceito, como peça fundamental
para a compreensão do pan-americanismo dos primeiros anos do século XX,
assunto abordado neste capítulo.
Como foi possível observar a Revista Americana tratou de forma
bastante intensa a chamada Doutrina Monroe, havendo espaço para os seus
defensores e os seus críticos, em especial na primeira fase do periódico, por
mais que os primeiros escrevessem com maior regularidade. Outrossim, é
interessante observar que aos brasileiros, mas não unicamente a eles, ficou
reservado o espaço da defesa do monroismo. As críticas eram quase sempre
feitas por autores estrangeiros, fato que, no entanto, não diminui a relevância
da Revista enquanto espaço privilegiado de análise dessa questão nos
permitindo afirmar que, mesmo com alguns limites
136
, havia espaço para o
debate intelectual pleno, fundamental na construção de um projeto político-
cultural eficiente.
Nesse ponto aparece para nós uma premissa bastante interessante que
foi a de observar certo redimensionamento do conceito de monroismo ao
longo do tempo de existência da Revista. Caminha-se, assim, de uma visão
quase doutrinária da Declaração de Monroe, para uma análise mais crítica, na
qual passou-se a valorizar um modelo de pan-americanismo mais diretamente
ligado aos interesses da América do Sul.
136
Any Marise ORTEGA. A construção de uma ideologia continental no início do século XX:
a Revista Americana (1909-1919). Op cit p 247
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115
Em relação às reflexões dos “defensores” de Monroe, o pilar central
pode ser sintetizado pelos textos de Helio Lobo que observava a Mensagem de
Monroe como um “anteparo eficiente às ambições da Europa”
estabelecendo-se como base para a política pan-americanista e sendo a grande
responsável pela “soberania integral do nosso continente” Lobo, ao
estabelecer uma análise histórica do monroismo afirma que ele foi útil tanto
no momento de sua formulação, em um contexto de clara ameaça
recolonizadora proposta pela Santa Aliança, quanto naquele momento
histórico, no inicio do culo XX, diante das ameaças imperialistas. Devido a
esse contexto tornou-se necessário afastar a doutrina da perspectiva
intervencionista construindo um discurso baseado na cooperação, na
integração entre América do Sul e Estados Unidos, a fim de assegurar que a
soberania sul-americana não fosse afetada.
Em síntese podemos afirmar que Lobo e outros colaboradores da
Revista Americana se preocuparam com o esclarecimento dos aspectos
históricos do monroismo, sendo que este seria a própria essência da posição
política norte-americana. O posicionamento de Quincy Adams e,
posteriormente, a Declaração de Monroe seriam, para o autor, a gênese de um
americanismo, e de um sistema americano, pensado a partir dos princípios da
democracia, do liberalismo e, seguindo uma lógica defensiva, comparando
elementos que se oporiam ao sistema europeu, opressivo e imperialista.
Uma linha de continuidade entre monroismo e o pan-americanismo foi
igualmente defendida por Joaquim Nabuco, que afirmou, nas Conferências
publicadas na Revista Americana, a tese de que a Doutrina Monroe marcou o
inicio de uma política estrangeira coerente e continua, baseada em um
“instinto continental”.
Por mais que saibamos que a Revista Americana fazia parte do projeto
político do Itamaraty, em especial da estratégia do Barão do Rio Branco,
achamos bastante impreciso considerá-la um instrumento apenas panfletário
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116
da diplomacia brasileira em um determinado contexto histórico. Um dos
argumentos para relativizarmos tal questão é a presença, mesmo que em
menor número e compostos quase sempre de estrangeiros, de críticos do
pensamento dominante do corpo diplomático brasileiro.
Um desses críticos, que tiveram espaço de relativo destaque na Revista,
foi Norberto Piñero que enfatizou a importância do papel inglês nos processos
de independência da América Hispânica, superando a importância norte-
americana tendo em vista que esta se estabeleceu apenas, nas suas palavras:
“por uma política de índole comercial” baseando-se na ‘garantia geográfica’
de seus interesses comerciais, na prioridade de seus interesses nacionais em relação à
solidariedade a outras nações e pela possibilidade implícita de extensão da soberania
norte-americana a outros países do continente”
137
É possível dividir as posições acerca do monroismo em dois grandes
grupos; um primeiro que enxergava tal política como sendo, segundo Piñero a
expressão da defesa de interesses próprios que se baseariam e de certa forma
se camuflariam através das idéias liberais por intermédio de uma imposição
hegemônica ou imperial e, de acordo com Lopez e Martinez de um caráter
imperialista efetivo, principalmente, sobre a América Central, conforme
defendem.
O segundo grupo defende a tese de que o monroismo seria uma
expressão de solidariedade autêntica, conquanto de motivação de uma
geopolítica estratégica, caso de Hélio Lobo, Joaquim Nabuco, Jose Irigoyen e
Dunshee de Abranches, tendendo a justificar a política intervencionista norte-
americana na América Central (Viana e Araripe Jr) ou ainda, mesmo
diferenciando o monroismo do pan-americanismo ou, mais precisamente,
colocando o monroismo como uma manifestação, uma possibilidade de
projeto para a união entre as Américas que, no entanto, não necessariamente
deveria ser dominante.
137
Norberto PIÑERO. “La política Internacional Argentina”. Revista Americana. fevereiro
de 1913.
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117
A guisa de conclusão do capítulo é inegável observar, sendo para nós o
ponto nevrálgico sobre a temática estudada, o binômio possibilidade /
necessidade de uma aproximação dos países americanos. Nesse particular se
inserem as possíveis relações entre os Estados Unidos e a América do Sul.
Relações estas que nos remetem aos conceitos de monroismo, pan-
americanismo e imperialismo.
Conforme visto, a posição predominante, mas não única, na Revista
Americana colocava a Doutrina Monroe como um instrumento de integração
entre as diferentes partes do Continente Americano, fato que gerava a
necessidade de se estabelecer um discurso no qual era necessário desassociar
o monroismo do imperialismo norte-americano sendo este, quando
reconhecido, considerado como uma resposta ao imperialismo europeu. Sobre
isso Dunshee de Abranches nos oferece uma bela síntese dessas posições:
“[...] era natural que, sob o ponto de vista de sua política econômica, os
Estados Unidos procurassem acautelar os seus grandes interesses nos mercados
exteriores e assegurar a sua própria estabilidade continental uma vez que as outras
potências assumiam uma atitude agressiva, dilatando todos os seus domínios a
apossando-se, aqui e ali, nos oceanos, de territórios importantes[...] Nem o pan-
americanismo[...] é uma conseqüência lógica da doutrina de Monroe; nem desta se
originou, de dedução em dedução, a fórmula imperialista, que possa ter adotado
recentemente a grande República e que nada difere da proclamada e seguida pelas
grandes potências do Velho Mundo[...] (A Doutrina Monroe) era a arma de defesa
contra o imperialismo europeu, já aparelhado então para golpes audazes no Extremo
Oriente e, mais tarde, sem dúvida, nos países mais fracos e ainda mal organizados da
América do Sul”
138
Helio Lobo aproximava-se dessa perspectiva ao defender que com a
Doutrina Monroe eram lançadas as bases para uma unidade continental “na
sua mais nobre e eficiente forma” devendo ao monroismo a soberania
integral em que vive”. Nesse sentido, é possível afirmar que a relação que se
buscava estabelecer com os Estados Unidos, construída nas páginas da Revista
pelos articulistas ligados ao Barão do Rio Branco, assumia um movimento
dialético entre um propósito universalizador, isto é, a união e solidariedade
138
Dunshee de ABRANCHES. “O Brasil perante a Doutrina de Monroe”. Op cit pp186-190
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118
pan-americanas e a necessidade pragmática de uma aproximação seletiva com
os Estados Unidos.
O contexto de extrema instabilidade internacional, no qual a Revista
Americana circulou, nos permite estabelecer aproximação com uma temática
que preocupou os intelectuais na virada do século XIX para o XX e que para
nós é fundamental para se compreender o projeto da Revista, a saber: a
elaboração de um discurso de defesa da manutenção da soberania externa do
Brasil e por extensão da América do Sul, em um contexto no qual as tensões
internacionais, fruto do Imperialismo (que levou o mundo à Primeira Guerra),
estavam latentes. Tal fato possibilita compreender a construção de um projeto
cultural sul-americano a partir da defesa de uma dada moral continental
baseada na manutenção de uma política regional de equilíbrio que, portanto,
deveria servir como exemplo para o mundo.
Tal argumentação pode ser observada a partir da elaboração de uma
lógica de reforço não apenas de uma aproximação entre as Américas, por
meio da análise do pan-americanismo, mas também pela construção de um
discurso que fundamentalmente valorizava o papel exercido pelo corpo
diplomático do Brasil e do continente. Nesse sentido torna-se fundamental
ampliarmos nossa análise por meio do que estamos classificando como sendo
o viés diplomático da Revista Americana
Essa perspectiva nos remete à formulação de propostas ligadas a um
Direito Internacional que traria consigo elementos construtores de um ideal
americano baseado em uma cultura, em uma moral sul-americana. Estas
deveriam servir de modelo tanto para as nações da América do Sul, quanto
para outros continentes sendo, em última análise, explicado pelo processo
histórico e legitimado pela diplomacia, tendo em vista que caberia aos
diplomatas a função de conduzir a América do Sul “ao seu destino”.
Portanto, observar a Revista como um objeto privilegiado para
compreender a elaboração de uma determinada linguagem política exige que
ampliemos o espectro de análise. Ao se restringir a pesquisa ao pan-
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119
americanismo, ou então considerá-lo o principal eixo norteador, reduziríamos
a Revista Americana a nada mais que, e esta é a tese de Ortega, um
instrumento ideológico do Estado para assuntos referentes ao campo das
relações internacionais do período em questão.
139
Essa perspectiva restringe as possibilidades de reflexão de outras
temáticas as quais a Revista nos permite observar. Em especial a importância
do debate sobre a construção do território nacional, que torna possível analisar
a atuação da diplomacia e a construção das relações continentais.
A elaboração de um projeto que valorizava a diplomacia na construção
de um equilíbrio geopolítico, garantidor da paz, é para nós a síntese intelectual
da Revista, o seu grande Lance, uma vez que é a partir dessa elaboração que é
construída a especificidade brasileira e o possível “intercâmbio cultural” entre
os países da América do Sul, que marcaria o lugar de destaque, para aquela
intelectualidade, de caráter diplomático, no novo concerto internacional,
cabendo ao Itamaraty e, por conseguinte, aos seus membros, o papel de
baluartes dessa nova ordem, possível pelo advento da Proclamação da
República no Brasil que trouxe consigo os elementos necessários para se
estabelecer uma nova legitimidade que aproximava o país dos seus “vizinhos”
devendo, tal aproximação, ser mantida e amadurecida pelo diplomatas que se
configurariam como verdadeiros “homens de Estado”, preparados para
exercer essa função.
Nesse sentido, no próximo capítulo nos deteremos nas análises e
reflexões sobre alguns aspectos da relação entre o Brasil e a América do Sul,
à luz dos debates sobre determinados conceitos, fundamentais para a
formulação de propostas da política internacional da época que valorizavam o
papel da América enquanto continente da paz, e da diplomacia como o grupo
que reunia as condições necessárias para nortear o continente.
139
A autora encerra a sua tese com a seguinte afirmação. “Sendo dessa forma, podemos
entender a Revista Americana como parte integrante, ou elemento ideológico, do paradigma
Rio Branco. Construía-se assim, uma ideologia da americanidade na República Velha”.
Any Marise Ortega. Op cit. p258. Cabe ressaltar que o tal campo, para a autora, seria
expresso de acordo com os artigos publicados pela lógica da busca da “Paz Perpétua”de
Kant.
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120
Os artigos a serem analisados nos remetem à atuação da diplomacia
continental na elaboração de um projeto de equilíbrio para a América do Sul,
fato que lança luz sobre qual papel deveria assumir o Itamaraty na nova ordem
republicana. Inseria-se nesse particular, assuntos referentes ao novo concerto
internacional que estava sendo construído no contexto da Primeira Guerra
Mundial. A estratégia utilizada pela Revista também foi o debate envolvendo
diferentes autores emitindo opiniões, construindo discursos sobre uma mesma
questão.
No que tange a apresentação desses artigos houve uma preocupação de
se estabelecer uma espécie de historicismo justificador, ou seja, a utilização de
elementos de uma determinada narrativa histórica para legitimar os
posicionamentos dos articulistas do periódico.
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4
O papel da diplomacia na construção de um projeto para a
América do Sul
4.1 – Nova ordem, novas questões
Conforme apontado no nosso segundo capítulo objetivamos, a partir de
agora, apresentar o que estamos definindo como sendo o viés diplomático da
Revista Americana e que, na nossa opinião, configurou-se em elemento chave
para a compreensão dos objetivos do periódico em apresentar, e debater, o que
seria uma moral sul-americana para as relações internacionais da época,
possibilitando a indicação de quais rumos deveriam ser seguidos pelo
Continente.
Tal premissa nos remete à importância dada à contribuição da
diplomacia nos projetos de consolidação das nações da América do Sul com
especial destaque para a brasileira que estava, naquele momento,
estabelecendo novos parâmetros diante da recém instalada ordem republicana.
Outrossim, devemos ter em mente que a Revista foi palco de intensos
debates que, no entanto, não expressavam algo acabado. Pelo contrário, ela se
caracterizou com um local onde idéias e visões de mundo estavam sendo
construídas. Em última análise, o periódico seria uma espécie de “laboratório”
em que intelectuais, em sua maioria ligados ao campo diplomático, se
posicionariam diante de questões contemporâneas, fundamentalmente
marcadas por uma nova ordem mundial que exigia, conseqüentemente, uma
leitura, ao menos, renovada do período com a elaboração de novas questões
que buscassem compreendê-lo para se estabelecer prognósticos que deveriam
servir de norte para o Brasil e o continente.
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122
Nesse sentido algumas temáticas tiveram destaque nas ginas da
Revista, tais como: a da formação do território; a do novo concerto
internacional no qual estavam sendo redefinidas as noções de Soberania e
Hegemonia ; o papel do Direito Internacional nas relações entre países como
elemento fundamental para a manutenção da paz e/ou como instrumento para
encerrar conflitos armados. Ainda que de forma breve debateremos a partir de
agora alguns dos pressupostos que fundamentavam o debate, à época, dos
temas supracitados.
Conforme visto no nosso primeiro capítulo, havia naquele momento
enorme interesse pela questão territorial. No Brasil podemos observar a
elaboração de vários mitos que consagraram no imaginário nacional uma
determinada visão da formação territorial nacional e que, em síntese, visavam
legitimar o processo de construção da paz continental. A Revista Americana
foi, inegavelmente, um lócus de divulgação desse projeto político e cultural da
diplomacia brasileira.
O projeto político republicano, nas suas primeiras décadas, caracterizou-
se por buscar solucionar os assuntos referentes às fronteiras nacionais, como
forma de legitimar o Estado por meio da definição, compreendida como
ratificação e, por extensão, consagração, do território nacional. Sendo que tal
definição deveria ser realizada com eficiência, rapidez e, principalmente, de
forma perene e pacífica, uma vez que a Guerra do Paraguai, último conflito
em que o Brasil se vira envolvido, fora muito desgastante para o Estado
brasileiro.
Dessa forma a preocupação em melhorar as relações diplomáticas com
os vizinhos foi explicitada desde os primeiros anos republicanos, inserindo,
definitivamente, o Itamaraty em posição de destaque na construção do projeto
nacional brasileiro, uma vez que definir as fronteiras nacionais se constituiu
em questão predominante nos debates e decisões políticas de então
1
.
1
Francisco Heitor Leão da ROCHA. O Instituto do Arbitramento nas questões dos limites do
Brasil. Brasília, UnB, Dissertação de Mestrado, 1990. p 225
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123
É possível afirmar que a parte sul da América, no início dos novecentos,
começou a obter, de forma efetiva e sistemática, uma identidade continental
com ênfase na elaboração de um conjunto de postulados que serviriam tanto
no processo de consolidação das soberanias nacionais, quanto no
aprofundamento dos laços de solidariedade intracontinentais.
2
Insere-se neste momento a valorização de determinados aspectos do
Direito Internacional como pilares para as relações entre nações. Data de fins
do século XIX e primeiros anos do século XX a sistematização de uma série
de regras e princípios para nortear tais relações, tendo a América do Sul
assumido posição de destaque nessa questão .
Dentre as soluções pacíficas das controvérsias internacionais, que
associavam a ação diplomática à ação jurídica, destacou-se, nesse período, a
arbitragem como a mais utilizada e recomendada pelos juristas, especialistas
em Direito Internacional Público, sendo definida como uma maneira de
solucionar litígios internacionais mediante o emprego de determinadas normas
jurídicas por meio de pessoas escolhidas, livremente, pelas partes em litígio.
3
Pode-se afirmar que a noção de arbitragem apareceu pela primeira vez
no discurso jurídico americano muito antes da época em questão, mais
precisamente em 1826, no, citado, Congresso do Panamá convocado por
Bolívar, uma vez que nele foi aprovada resolução que repudiava a guerra,
defendia a paz e recomendava a introdução das figuras do conciliador, ou
mediador, e do árbitro nas relações interamericanas.
4
Ao longo do século XIX, o arbitramento passou a ser objeto de análise
sistemática e, gradativamente, foi se firmando na jurisprudência americana
passando a ser recomendada, a partir da última década dos oitocentos, como
instrumento fundamental de solução das contendas internacionais, tanto pelas
duas Conferências Internacionais da Paz, em Haia, em 1899 e 1907, quanto
2
Sobre essa perspectiva Edmundo HEREDIA. O Cone Sul e a América Latina. In: Amado
Luiz CERVO e Mario RAPOPORT (orgs). História do Cone Sul. Brasília e Rio de Janeiro,
UnB e Revan, 1998.
3
Hildebrando Pompeu Pinto ACCIOLY. Manual de Direito Internacional Público. São Paulo,
Saraiva, 1956.
4
Essa linha de raciocínio pode ser vista em José Carlos Brandi ALEIXO. O Brasil e o
Congresso Anfictônico do Paraná. Brasília, FUNAG, 2000
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124
pelas primeiras Conferências Internacionais Americanas, de Washington,
México e Rio de Janeiro.
5
Na Conferência Internacional de Washington, em 1889, cogitou-se um
acordo sobre um plano de arbitragem, que se pensava definitivo, no qual,
divergências que existissem ou pudessem aparecer doravante entre os
diferentes estados americanos pudessem ser resolvidas pacificamente sem
guerra.
6
Nesse Congresso chegou a ser assinado tratado que defendia a
arbitragem como princípio de um Direito Internacional Americano para a
solução de controvérsias, tanto entre nações americanas, quanto destas em
relação às nações européias. Por mais que tal tratado não tenha sido ratificado
demonstra um belo indicio da mentalidade diplomática/jurídica dos
representantes do continente, que buscava marcar a identidade americana no
campo das relações internacionais pelo viés do diálogo, diferenciando-se de
outros continentes, notadamente a Europa, que vivia em plena era
imperialista, com a ameaça latente de um conflito armado generalizado.
Na Segunda Conferência, no México em 1901 e 1902, essa perspectiva
foi reforçada, na medida em que se buscou elaborar um tratado, igualmente
não ratificado, no qual as partes em litígio submeteriam, obrigatoriamente, à
arbitragem, todo e qualquer tipo de reclamações por danos pecuniários que
não pudessem ser resolvidos pela via diplomática stricto sensu. Nessa mesma
conferência debateu-se um tratado relativo à arbitragem obrigatória que, no
entanto, não alcançou consenso entre os participantes.
Na Terceira Conferência, no Rio de Janeiro em 1906, a arbitragem foi
debatida chegando a ser aprovada uma resolução que ratificava a adesão a
esse princípio, bem como se recomendava às nações representadas na
conferência que dessem instruções aos delegados que representariam os países
5
Francisco Heitor Pinto da ROCHA. O Instituto do Arbitramento nas questões dos limites do
Brasil. Op cit.
6
Hildebrando Pompeu Pinto ACCIOLY. Tratado de Direito Internacional Público. Rio de
Janeiro, Forense, 1953.
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125
americanos no ano seguinte em Haia que garantissem a aprovação de uma
convenção geral de arbitragem.
7
Se por um lado as Conferências Americanas não apresentaram consenso
imediato acerca da questão da arbitragem internacional, as Conferências de
Paz de Haia foram incisivas em indicá-la como mecanismo, por excelência,
ideal para solucionar contendas internacionais. Convém salientar que o Brasil,
na Segunda Conferência de Haia teve destacada atuação por meio da atuação
de Rui Barbosa que, de acordo com as instruções de Rio Branco, defendeu a
adoção do arbitramento, desde que este não fosse obrigatório, nos conflitos
internacionais
8
bem como, a participação de todas as nações se desse em
inteira igualdade de condições na Corte Internacional de Arbitramento.
De acordo com Clodoaldo Bueno
9
, os tratados de arbitramento estavam
em voga nesse período, muito provavelmente porque a perspectiva mundial
não era de paz duradoura. A época, como frisamos, era de uma corrida
armamentista que se configurava no que ficou conhecido como “paz armada”.
Nesse sentido é possível compreender os tratados de arbitramento e as várias
conferências de paz realizadas com a finalidade de se evitar os possíveis
conflitos armados que se desenhavam no cenário internacional de então.
Mesmo não impedindo a Primeira Guerra Mundial, convém salientar que as
conferências internacionais foram de fundamental importância para a
incorporação da arbitragem como instrumento jurídico fundamental do Direito
Internacional Público para a solução de conflitos territoriais, tendo sido
reconhecido como mecanismo legítimo pelo Brasil.
10
7
Na quarta Conferência realizada em Buenos Aires em 1910, a arbitragem o foi objeto de
discussão, a não ser no tocante às reclamações pecuniárias. Na quinta, realizada em Santiago
do Chile em 1923, o tema limitou-se a adotar um voto para o progresso da arbitragem e de
outros meios de solução pacífica de conflitos fosse sempre crescente e a sua aplicação se
tornasse a mais ampla possível. Apenas em Havana, em 1928, a arbitragem foi plenamente
adotada. Sobre isso ver Hildebrando ACCIOLY. Tratado do Direito Internacional Público.
Op cit
8
Francisco Heitor Leão da ROCHA. O Instituto do Arbitramento nas questões dos limites do
Brasil. Op cit
9
Clodoaldo BUENO. A República e sua Política Exterior. (1889 a 1902). Op cit, p 300
10
Francisco Heitor Leão da ROCHA. O Instituto do Arbitramento nas questões dos limites do
Brasil. Op cit, pp 39 e seguintes.
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126
É notório que a diplomacia brasileira, ao longo do período imperial e
mesmo no inicio da era republicana, tenha se notabilizado por preferir as
negociações diretas, bilaterais, quando da implementação da política exterior
de limites, que tinha como base a doutrina do Uti Possidetis de fato. Os
motivos que levaram o Brasil à arbitragem em três de suas questões
fronteiriças estiveram, de acordo com Leão da Rocha, relacionados com a
necessidade de definir as fronteiras nacionais, dotando-as de reconhecimento
internacional, objetivos estes alcançáveis, à época, não mais por intermédio de
negociações diretas, bilaterais, uma vez que estas demonstravam certa
estagnação desde os últimos anos da Monarquia e sim pelo instituto da
arbitragem, conforme visto, aceito e recomendado, tanto pela doutrina jurídica
da época, quanto pelos diversos congressos internacionais pela paz realizados.
11
que se ter em mente, no entanto, que apesar de não se notabilizar
como um defensor da arbitragem internacional ao longo do período
monárquico, e nem contar este princípio na legislação brasileira, o Brasil
participou de arbitramentos, tanto na condição de árbitro como na de parte
litigante durante o século XIX.
12
Podemos afirmar que o instituto do arbitramento já era aceito pelos
parlamentares do Império, como forma de encerrar controvérsias e legitimar
decisões, desde a década de 1860. Porém, inegavelmente, foi no período
republicano que o uso da arbitragem se estabeleceu definitivamente como o
principal recurso a ser utilizado pela diplomacia brasileira em questões
internacionais
13
.
Diante da nova ordem internacional que se desenhava no período ficava
evidente o interesse, por parte de cada Estado, na preservação da
11
Id, ibid
12
Dentre os quais podemos destacar; a controvérsia entre Brasil e Inglaterra acerca da prisão,
no Rio de Janeiro, de oficiais da fragata inglesa Forte, episódio que ficou conhecido como
Questão Christie; a questão entre Brasil e Estados Unidos relativa ao naufrágio da galera
estadunidense/canadense Canadá, nas Costas do Rio Grande do Sul; Questão de Palmas;
Questão do Amapá etc
13
Sobre isso ver, entre outros: Clodoaldo BUENO. A república e sua política exterior. Op cit
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127
independência e da autonomia externa. Logo, no debate diplomático de então
havia uma clara preocupação com os princípios da Soberania Nacional.
Era consenso no Direito Internacional Público dos primeiros anos do
século XX que a ocupação efetiva de um dado território só poderia considerar-
se realizada quando da tomada da posse efetiva, isto é, quando ela é
ininterrupta, permanente em nome do Estado, não bastando, por conseguinte,
a simples invocação do direito de soberania sobre determinada região. Nessa
época, ainda fortemente marcada pelo evolucionismo justificador da ação
imperialista, uma das idéias vigentes acerca dessa temática versava sob a
perspectiva da soberania não poder pertencer aos seus nativos se esses não
fossem capazes de se apresentar como um Estado forte do tipo ocidental.
Segundo Paul Fauchille, em texto de 1905,o direito de soberania sobre um
território só poderia pertencer àqueles que estivessem efetivamente
capacitados a exercer tal soberania. Os agrupamentos, apenas reunidos em
sociedades por uma espécie de simulacro de governo organizado, não
poderiam, pois, ser soberanos das terras que, por ventura detiam.
14
Ampliando um pouco a discussão acerca da soberania devemos ter em
mente que para alguns estudiosos, como por exemplo Gomes Canotilho
15
, a
visão moderna de soberania, construída a partir das últimas décadas do século
XIX, não é mais do que uma espécie de reafirmação do Direito Internacional
Público de então, caracterizando-se como uma ordem reguladora das relações
internacionais.
Canotilho salienta que nesse período estava ocorrendo uma profunda
transformação com o advento de uma nova ordem na qual a política externa
ganhava cada vez mais destaque, na medida em que estava havendo um rápido
e considerável desenvolvimento da interdependência entre as nações, fato que
colocava os Estados diante de problemas os quais eles não poderiam resolver
isoladamente. O autor chama a atenção para o significativo aumento do
14
Paul FAUCHILLE. conflict de limites entre Bresil et la Grande Bretagne, Brasil, A,
Pedone, 1905
15
JJ Gomes CANOTILHO. “Nova ordem mundial e ingerência humanitária”. In: Boletim da
Faculdade de Direito Internacional da Universidade de Coimbra, Vol LXXI, 1995.
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128
número de tratados assinados, sobretudo, a partir de 1870, com especial
destaque para os períodos imediatamente anterior e posterior à Primeira
Guerra Mundial.
Nesse contexto de evidente instabilidade no campo das relações
internacionais ganhou relevo no debate intelectual de então o conceito de
hegemonia que tornou-se extremamente caro para a compreensão da ação
diplomática do período, uma vez que data das últimas décadas do século XIX
e início do século XX a necessidade de se estabelecer um Estado forte
inserido em uma gica que visava garantir a liderança no sistema
internacional ou, ao menos, a liderança nos respectivos sub-sistemas
16
.
O conceito de hegemonia pode ser compreendido a partir da existência
de algum poder e/ou autoridade que apresentava a capacidade de determinar,
ao menos em tese, as relações que se estabeleceriam entre seus membros,
sendo compreendida como a supremacia de um Estado-nação ou, até mesmo,
uma comunidade político-territorial inserida em um sistema
17
. Essa
supremacia deve ser entendida para além de uma perspectiva militar, devendo
ser igualmente analisada pelo viés econômico do Estado hegemônico sobre os
demais membros do sistema. Tal premissa garantiria a manutenção do poder
por meio de mecanismos de coerção e intimidação.
18
De acordo com Silvano Beligni, a partir de segunda metade dos
oitocentos, um Estado poderia exercer sua hegemonia de duas maneiras: pela
ameaça e/ou uso efetivo da força militar ou por meio da construção de uma
16
Em nações periféricas essa perspectiva foi apropriada como a defesa da manutenção de
suas soberanias nacionais Tal fato se explica, especificamente para áreas periféricas inseridas
no contexto do Imperialismo
17
Dentre as questões mais relevantes do período temos a da formação do que a ciência
política definiu como Sistema de Estados que no século XIX foi analisado por Heeren, citado
por Watson, como a união de Estados limítrofes, que apresentariam características
semelhantes ‘no que diz respeito aos costumes, religião e grau de desenvolvimento social,
além de vinculados por interesses recíprocos. De acordo com Watson, baseando-se em Martin
Wight, um Sistema de Estados, para ser reconhecido como tal, alcançando, portanto, uma
legitimidade política, necessita ser reconhecido pelos membros do sistema a partir da
premissa que cada um dos membros tem direito à sua independência. Adam WATSON. The
Expansion of International Society. Oxford, Clarendon Press, 1984.
Sobre isso ver também Silvano BELIGNI. “Hegemonia” In: Norberto BOBBIO et alli (orgs)
Dicionário de Política. Brasília, Editora da UnB, 1993. p 579 e seguintes.
18
Id ibid
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129
legitimidade que garantisse o poder hegemônico sem a necessidade do uso das
forças armadas como mecanismo de intimidação.
19
Para Adam Watson, na era contemporânea, a hegemonia deve ser
compreendida pela capacidade que um Estado tem em impor sua autoridade
num sistema, mostrando-se capaz de estabelecer normas e de determinar as
relações externas entre os membros desse sistema. Todavia há que se ter em
mente que o exercício da hegemonia não consiste, obrigatoriamente, em
comandos ditatoriais, ou seja, pode envolver negociações contínuas entre a
autoridade hegemônica e os outros estados, além da avaliação, por ambos os
lados, da balança de vantagens e desvantagens
20
. É sob esse prisma que se
constrói a importância da diplomacia no jogo político internacional,
assumindo o papel de negociador e, principalmente, de legitimador de uma
determinada posição do Estado ao qual ela defende.
Na atuação do Itamaraty das primeiras décadas republicanas,
fundamentalmente a partir de Rio Branco, é possível notar a importância
concedida à formação de um corpo diplomático que seria pilar central de um
quadro institucional, suficientemente sólido, composto por verdadeiros
“homens de estado”, preparados, independente do posicionamento político,
para representar, defender e projetar o Brasil, tanto interna, quanto
externamente. A construção das fronteiras, a demarcação dos limites e a
consolidação do território, associadas à defesa nacional e a um determinado
tipo de americanismo, bem como a busca de prestigio internacional, foram a
marca do Ministério das Relações Exteriores na construção do projeto de
República e de certa forma definiram o papel da diplomacia na recém
inaugurada ordem republicana. Cabe salientar que essa época se insere em um
contexto de conflito armado fruto da corrida armamentista, que em pouco
tempo promoveria a Primeira Guerra Mundial, sendo portanto interessante
notar a valorização da ação diplomática na defesa de princípios como o da
arbitragem internacional.
19
Id ibid
20
Adam WATSON. The Expansion of International Society. Op cit p 260
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130
Nesse sentido outro aspecto a ser destacado refere-se à importância de
se refletir acerca do desenvolvimento do Direito Internacional como
mecanismo regulador das relações internacionais, capaz de impedir, em
muitos casos, até conflitos armados. É notória a visão positiva da ação
diplomática compreendida como um instrumento de solução para guerras
entre países, fato que lança luz, conforme trabalhado, sobre o papel assumido
pelas arbitragens no jogo das relações internacionais.
A questão da valorização do Direito Internacional Público no âmbito das
relações internacionais de então, tornou-se uma das questões mais
representativas para a diplomacia das últimas décadas do século XIX e
primeiras do século XX. Esta valorização relaciona-se com o contexto
imperialista que opunha, ao menos em tese, a prática diplomática das ões
militares.
Entretanto, no caso brasileiro, tal oposição deve ser relativizada uma vez
que aquela geração de diplomatas, incluindo Rio Branco, enxergava,
claramente a necessidade de se conjugar esses dois princípios, o da
negociação e o das armas, na busca da construção do equilíbrio entre as
nações. De acordo com o nosso primeiro capítulo podemos afirmar que o
Barão revelou-se um homem bastante preocupado com a geopolítica
americana, mesmo sem apresentar uma prática efetivamente belicosa,
defendendo uma paz para a América do Sul. O Chanceler não se furtava de
afirmar que para que o continente fosse pacífico seria condição sine qua non a
“vontade de numerosos vizinhos”. Portanto, seria necessário o aparelhamento
militar brasileiro.
Segundo Meira Mattos
21
reforça esse argumento o fato do Barão, na
chamada Questão Acreana, ter solicitado ao governo brasileiro o envio de uma
força militar para ocupar a área em litígio, saindo da imobilidade utilizando-se
do argumento da dissuasão militar. Nesse sentido é possível concluir que a
diplomacia do Barão no que tange as disputas de fronteiras, quando
21
Carlos de Meira MATTOS. “Rio Branco, as fronteiras e a defesa nacional”. Folha de São
Paulo, 17 de dezembro de 2002. Caderno A p 3
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131
necessário, baseava-se no equilíbrio entre a habilidade negociadora e a
utilização de aparato militar.
Meira Mattos, reforçando sua argumentação, destaca que Rio Branco ao
assumir a pasta do Ministério das Relações Exteriores, surpreendeu-se com a
fraqueza das forças armadas brasileiras que não apresentava condições de
deslocar efetivo para as fronteiras com o Peru e a Bolívia. Por necessitar de
um instrumento de força para compor seu jogo diplomático, tornou-se amigo
dos chefes militares da época
22
dando apoio ao programa de reorganização,
modernização e reequipamento das Forças Armadas
23
.
Logo, a defesa de princípios pacifistas não esteve ligada à uma política
de desarmamento e, sim, à uma prática baseada na organização de
mecanismos jurídicos e políticos internacionais, voltados para essa função
específica, como por exemplo, as Conferências Pan-americanas, instrumento
político diplomático defendido, à época, como uma eficiente maneira de
garantir o diálogo e, conseqüentemente, a paz nas relações entre as nações sul-
americanas.
Outro aspecto presente, à época, para se compreender as relações entre
as nações sul-americanas, é a temática da navegação fluvial. Sem nos
alongarmos na questão da navegabilidade dos rios interessa observar que ela
fez parte das preocupações diplomáticas sul-americanas do período, fato que
se torna compreensível tanto pelas teorias acerca da importância dos rios e
mares para a geopolítica de então, quanto pelo processo de justificativa do
estabelecimento dos limites territoriais americanos, em especial por parte do
governo brasileiro, baseado no principio da Ilha Brasil e no mito do território
pronto da virada do século XVIII para o XIX.
24
Convém salientar que compreender a questão do Rio da Prata e da Bacia
Amazônica exige a observação de aspectos geopolíticos de ambas as regiões,
principalmente em relação ao Amazonas. Há que se ter em mente que o
Direito Internacional, a partir de 1815, seguindo as determinações do
22
Argolo e Hermes, no Exército, e os Almirantes Julio Noronha e Alexandrino, na Marinha
23
Carlos de Meira MATTOS. “Rio Branco, as fronteiras e a defesa nacional”. Op Cit
24
Sobre isso ver a análise realizada no nosso primeiro capítulo
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132
Congresso de Viena, classificava os rios em internos e internacionais. Em
relação a estes últimos, poderiam ser definidos como fronteiriços, isto é,
quando sendo marcos de divisão entre Estados ou sucessivos, se o seu leito
fizesse parte de mais de um Estado.
25
O Rio Amazonas se enquadra nessa
última categoria, sendo que a divergência central passava pelo embate entre o
Peru, ribeirinho de montante (da cabeceira do rio), que objetivava ter acesso
por via fluvial ao oceano, e do Brasil, ribeirinho de jusante (rio abaixo), que
não aceitava a livre circulação de embarcações estrangeiras em seu
“território”.
Em linhas gerais podemos afirmar que o debate central acerca do Rio da
Prata relacionava-se com a definição, ou não, dele enquanto rio continental ou
parte integrante do domínio marítimo. Neste segundo caso ele estaria
submetido aos princípios jurídicos definidos pelas convenções do Direito
Internacional referentes às costas oceânicas.
26
Caso fosse considerado como
rio, a questão passaria pela negociação diplomática entre as nações
ribeirinhas.
A discussão que envolvia o Rio da Prata foi um dos temas mais caros à
diplomacia do Cone Sul desde meados do século XIX tendo influenciado a
elaboração, de acordo com Francisco Doratioto
27
, por exemplo, dos Tratados
da Tríplice Aliança, nos quais não apareceu a imposição da demolição das
fortificações paraguaias nos rios em que houvesse outra nação ribeirinha. Tal
ausência, explica-se, segundo o autor, pelo fato de para a Argentina,
localizada na foz dos rios brasileiros, não ser estratégico uma regulamentação
que impedisse fortificações.
25
O principio jurídico que defendia a existência de rios completamente internacionalizados, ou
seja, em que haveria liberdade de navegação para todos os Estados, fossem eles “ribeirinhos,
ou não”, apareceu apenas em 1919 no Tratado de Versalhes, que regulamentou a navegação
dos rios Reno e Danúbio. Sobre isso ver Guido SOARES. Direito Internacional no meio
ambiente: emergência, obrigações e responsabilidades. São Paulo, Atlas, 2001
26
O principio jurídico do mar territorial estabelecia algo em torno de três milhas contadas a
partir da Costa como área sob jurisprudência da Nação costeira. Para além desse marco seria
garantido o direito à livre navegação às outras nações.
27
Francisco DORATIOTO. Maldita Guerra: nova história da Guerra do Paraguai. São
Paulo, Companhia das Letras, 2002. p 166
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Ainda seguindo Doratioto, faz-se mister destacar que a situação da
Bacia Amazônica, para o Brasil, era diametralmente oposta. Desde o Império
era reivindicado, pelo Estado brasileiro, o direito à livre negociação na Bacia
do Rio da Prata. Entretanto, eram mantidos fechados o Rio Amazonas e seus
afluentes à navegação internacional. Nesse particular, o Brasil enfrentou uma
série de pressões de nações estrangeiras, principalmente por parte dos Estados
Unidos, que apresentavam claras ambições em relação à região amazônica,
estabelecendo, entre outras estratégias, a mobilização de Peru e Bolívia,
ambos interessados no acesso ao rio, em favor da abertura completa deste para
a navegação. No contexto da Guerra do Paraguai, o governo imperial, com o
intuito de evitar que quaisquer motivos de atrito surgissem envolvendo, tanto
os norte-americanos quanto a Grã-Bretanha, assim como para, de certa forma,
neutralizar as repúblicas americanas da costa pacífica, decidiu abrir a bacia
amazônica à navegação internacional em dezembro de 1866.
28
A questão da navegabilidade dos rios foi um dos pontos nevrálgicos das
relações entre as nações sul-americanas, uma vez que trazia consigo a
possibilidade do exercício de uma política hegemônica no continente, em
especial por parte do Brasil. Nesse particular, a reflexão acerca das fronteiras
nos remete à necessidade do debate acerca dos conceitos acima analisados
que, por conseguinte, estiveram presentes no discurso diplomático dos
primeiros anos do século XX obtendo destaque nas páginas da Revista
Americana.
A partir de agora aprofundaremos como tais temáticas foram
apresentadas na Revista, como instrumento de legitimação do papel da
diplomacia como segmento capaz de capitanear o processo de construção de
uma nova ordem continental no alvorecer do século XX, ordem esta baseada
na busca do equilíbrio e, conseqüentemente, da paz americana que apontaria o
caminho e o lugar da América do Sul, com especial destaque para o seu
Direito Internacional Público, no novo contexto internacional que se
28
Ibid p 257
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134
desenhava. Tal perspectiva, que trazia consigo a valorização do papel da
diplomacia na construção desse projeto, permeia todo o capítulo.
Para alcançarmos esse objetivo, dividimos nossa análise em três partes,
a saber: a da valorização da narrativa histórica na formação das fronteiras
brasileiras ; do debate sobre Hegemonia e Soberania e, finalmente, a do papel
da diplomacia na construção de uma moral sul-americana. Por último
buscamos estabelecer uma síntese do capítulo.
4.2
Em busca de virtudes: a importância da narrativa histórica na formação
das fronteiras nacionais
A política americanista dos primeiros anos republicanos, analisada no
nosso segundo capítulo apresentava como meta central consolidar uma
posição de destaque para o Brasil no “continente” sul- americano. Tal
consolidação passava pelo redimensionamento da posição política e
econômica com os Estados Unidos. Paralelo a isso, entre outras questões,
merece destaque o processo de reconhecimento e demarcação de fronteiras
com a, conseqüente, definição territorial.
A diplomacia do Barão que capitaneou esse projeto, conforme visto no
nosso primeiro capítulo, buscou destacar, como forma de legitimar seus
objetivos, as virtudes brasileiras no campo do Direito e da História. Tais
virtudes estariam inseridas em uma projeção continental, em uma valorização
da política internacional sul-americana. Por esse viés podemos notar a
importância da Revista Americana para a estratégia política e cultural do
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135
corpo diplomático brasileiro, inserido em uma lógica continental que deveria
se moldar pelos paradigmas estabelecidos por Rio Branco.
A Revista, valendo-se, fundamentalmente, de um certo culto à memória
do Barão, compreendendo suas interpretações e, sobretudo, suas ações, no que
tange as chamadas “questões de limites” , como um dos grandes legados
riobranquianos, valorizou, a partir do que podemos denominar de um
historicismo justificador, o processo de construção das fronteiras brasileiras
desde o período colonial, mais precisamente a partir do advento do Tratado de
Madri, e da participação ativa e fundamental de Alexandre de Gusmão. Nas
palavras do próprio Rio Branco:
“O estudo do Tratado de 1750 deixa mais viva e grata a impressão da boa fé,
lealdade e grandeza de vistas que inspiraram esse ajuste amigável de antigas e
mesquinhas querelas, consultando-se unicamente os princípios superiores da razão e
da justiça e as conveniências da paz e da civilização da América”
29
Essa interpretação do Barão serviu de norte para uma geração de
diplomatas/intelectuais brasileira que ocupou as fileiras do Itamaraty nas
primeiras décadas do período republicano e escreveu nas páginas da Revista
Americana. De um modo geral tais intelectuais assumiram uma posição de
defesa e integridade da América por meio da negociação, valorizando, por
conseguinte, as estratégias pacíficas de solução de conflitos, sendo que estas
teriam no Tratado de Madri seu marco inaugural.
Rodrigo Otávio, em artigo de 1915
30
, interpretou o Tratado como
manifestação de um sentimento e um exemplo americano para as relações
internacionais, defendendo a tese de que o posicionamento de Gusmão havia
sido inspirador para, décadas mais tarde, James Monroe formular suas idéias
para as Américas.
29
Esse fragmento fez parte da exposição de motivos apresentados pelo Barão quando do
litígio com a Argentina arbitrado pelos Estados Unidos em 1889. APUD, Álvaro LINS. Rio
Branco. Op Cit p277. Tal idéia permeou as análises da Revista Americana, tendo sido citado
em mais de uma oportunidade pela Redação. Por exemplo na edição de março de 1912..
30
Rodrigo OCTAVIO .”L’ Amerique et le Droit International”. Revista Americana, 01 a 15
de junho de 1915.
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Em 1919, Araújo Jorge também realizou reflexão acerca da importância
histórica de Alexandre Gusmão ao estabelecer uma comparação deste com
Rio Branco, afirmando que ambos compartilhavam o sonho de ver o Brasil e,
por conseguinte, a América, sob a bandeira da integridade territorial pautada
em uma fraternidade sul-americana. Em tom de enorme admiração Araújo
Jorge afirmou ser Gusmão o avô da diplomacia brasileira que teria como pai,
logicamente, o Barão do Rio Branco.
31
A base da argumentação acerca do pioneirismo de Alexandre de
Gusmão no que tange a elaboração de certo tipo de pan-americanismo e
equilíbrio geopolítico, residia no artigo XXI do Tratado de Madri, que para
aqueles intelectuais sugeria a noção, posteriormente consagrada de “América
para os americanos”
32
.
Obviamente que a leitura do Tratado aproximando-o da Doutrina de
Monroe representa um enorme anacronismo, porém, ao mesmo tempo, é
elucidativa para a compreensão do discurso dos diplomatas nos primeiros
tempos republicanos. Como na época não haveria mais possibilidade para
soluções diplomáticas pautadas em casamentos (considerado o elemento
chave para o êxito do tratado de 1750)
33
o caminho para a diplomacia
deveria ser pautado na sua capacidade de se impor, por meio do
convencimento às outras nações, através de argumentações baseadas em
princípios como: justiça; razão; civilização; lealdade; amizade; vizinhança;
aliança e cordialidade, sustentados, como forma de legitimá-los, pela história
do continente.
Rio Branco observava no Tratado de Madri um exemplo, um marco, ao
menos retórico, para justificar a política americanista. O supracitado artigo
31
A G Araújo JORGE. Crítica e história. Uma resenha desse livro foi publicada na Revista
Americana na edição de abril de 1919
32
O artigo em questão foi citado por Álvaro LINS. Rio Branco. Op cit. P 276 “Sendo a
guerra ocasião principal de abusos, e motivo de se alterarem as regras mais bem concertadas,
querem Suas Majestades Fidelíssima e Católica, que se (o que Deus não permita) chegasse a
romper entre as duas coroas, se mantenham em paz os vassalos de ambas, estabelecidas em
toda a América Meridional, vivendo uns e outros como se não houvera tal guerra entre os
Soberanos, sem fazer-se a menor hostilidade, nem por si sós, nem junto com os seus aliados.
33
Visconde de CARNAXIBE. Política Imperial de D João V (Conferência) APUD Álvaro
Lins. Rio Branco. Op cit p273
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servia de base para a defesa de uma estratégia de negociação amigável com a
paz como objetivo central para os países americanos. Nesse sentido a
construção de um equilíbrio continental passaria, obrigatoriamente, pela ação
diplomática. Tal premissa, à época, tornava-se ainda mais relevante na medida
em que o Brasil trazia consigo uma pesada herança imperial que apontava
para uma tendência à imposição de uma política hegemônica sobre a antiga
América Hispânica, fato que o colocaria não como vizinho mas sim como
“antípoda”.
34
A Revista Americana se insere nesse projeto político de Rio Branco e,
conseqüentemente, do Itamaraty, de aproximação com os vizinhos
americanos. Dentro dessa perspectiva temas ligados à formação territorial do
continente, uma das funções básicas da diplomacia, tiveram grande destaque
nas páginas do periódico.
A valorização dessa temática implicava o recurso à história como
auxílio para a construção de projetos de Nação apresentados nas páginas do
periódico. Em conferência realizada no Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, citada por Helio Lobo, o Barão afirmou que:
“O estudo da história nacional é ocupação das mais gratas e tão absorvente
para os que por ele se apaixonam que, às vezes, uma vida inteira se passa [...]. Mas
durante essa longa, prolixa e paciente preparação, em que as descobertas pessoais se
multiplicam, enchendo de encanto o investigador, durante o minucioso inquérito a
que procedemos’
35
Essa perspectiva de valorização da narrativa histórica como
legitimadora das posições políticas e culturais se fez presente na Revista
Americana em vários momentos. Dentre eles destaca-se o da morte de Rio
Branco, quando a Revista valorizou a memória do Barão buscando claramente
estabelecer e legitimar critérios que justificassem não apenas as ações do
Chanceler, mas também as estratégias do Itamaraty a partir de então. As
análises então apresentadas foram debatidas à luz do que era, e é, de certa
34
Expressão utilizada por J.B. Alberdi. APUD Hélio LOBO. “As relações entre os Estados
Unidos e o Brasil”. Revista Americana. Op cit.
35
Rio Branco. APUD Helio LOBO. “A Diplomacia Imperial no Rio da Prata”. Revista
Americana, janeiro de 1912.
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forma, definido como o paradigma riobranquiano da política externa
brasileira.
Poucos dias após a morte do Chanceler, na edição de fevereiro de 1912,
a Revista apresenta um Editorial no qual elabora um discurso que permite,
fazendo uso das próprias palavras do Barão, reafirmar suas teses e constituir
princípios para a diplomacia brasileira e sul-americana. Ao salientar o lema
básico da trajetória de Rio Branco Ubique patriae menor”
36
, a Revista
Americana observava e defendia a necessidade de como um diplomata
deveria se colocar e, principalmente, colocar seu país acima de todo e
qualquer tipo de interesse, devendo ser este o legado da diplomacia brasileira.
Caberia aos diplomatas o papel de construir um projeto de nação, projeto este
voltado para o futuro, mesmo que para isso as estratégias diplomáticas não
fossem perfeitamente compreendidas, uma vez que seria característica da
política internacional de qualquer Estado o reconhecimento apenas posterior
de seus feitos.
Fazendo uso das palavras do Barão, especificamente de seu
pronunciamento na Conferência Pan-Americana de 1906, a Revista
Americana ressaltava o que seria a essência e o legado deixado pelo
Chanceler, a saber: a unidade territorial brasileira associada a uma
cordialidade nas relações internacionais, sendo esta uma função básica das
nações civilizadas. Para Rio Branco havia, à época, uma tendência insana e
bárbara que estaria abalando os meios cultos. Nesse particular deveria ser
estabelecido, entre os estadistas, um verdadeiro senso político voltado,
fundamentalmente, para o combate a todo e qualquer tipo de rivalidade
internacional. Portanto, não deveria haver qualquer tipo de preocupação por
parte dos vizinhos brasileiros. Nas palavras do Chanceler reproduzidas no
editorial:
“Este vasto país todo unido, na tranqüila segurança de seus destinos, sem
preocupações ambiciosas [...] nunca teve, pretensão e predomínio de hegemonia. O
patriotismo brasileiro nada tem de agressivo[...] mais ainda por atos de que por
palavras fiéis às tradições da nossa política exterior, trabalhamos sempre por estreitar
as nossas relações com as nações do nosso continente e particularmente com as que
36
“Em qualquer lugar a pátria em minha lembrança”
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nos são mais vizinhas[...] Repúblicas limítrofes, a todas as nações americanas
desejamos paz, iniciativas inteligentes e trabalhos fecundos para que, prosperando e
engrandecendo-se, nos sirvam de exemplo e estímulo à nossa atividade pacífica,
como a grande e gloriosa irmã do norte, promotora dessas úteis conferências. Aos
países da Europa, a que sempre nos ligaram e hão de ligar tantos laços morais e
tantos interesses econômicos, desejamos continuar a oferecer as mesmas garantias
que lhes têm dado até hoje o nosso constante amor à ordem e ao progresso.”
37
Esta citação nos remete a algumas questões bastante elucidativas quanto
à escolha por parte dos editores da Revista desse discurso. Além do explícito
posicionamento em relação à América do Sul com os indicativos do concerto
político desejado pelo Itamaraty, evidencia-se a necessidade de aproximação
com os Estados Unidos, entretanto por um viés claramente realista, sobretudo
por manter uma posição favorável diante da Europa.
Por fim, Rio Branco encerra sua fala enaltecendo o lema republicano,
estratégia fundamental de sua política externa, tanto na aproximação com os
norte-americanos, quanto com os “vizinhos mais próximos”. Igualmente, fica
evidenciada a questão da formação territorial do continente, compreendida, na
lógica riobranquiana, a partir da construção das fronteiras brasileiras. Sendo
esta, conforme já afirmado, o grande legado da “diplomacia do Barão”.
Tal perspectiva pode ser observada em artigo de Rui Barbosa
38
,
publicado na Revista Americana, no qual afirma ter sido Rio Branco “o último
benfeitor das nossas fronteiras”, salientando, que ele não implementou uma
política expansionista, pois não alargou divisas brasileiras e, sim, “restaurou-
as”, tendo sido sua obra não uma ampliação, mas uma retificação. Nas
palavras de Barbosa:
“Não direi, como se tem dito, que nos dilatou o território. Não. Os grandes
méritos de outras coisas não precisam que da verdade. ela, no tribunal da
posteridade, resiste ao juízo final.
Para sermos bons irmãos, entre nossos vizinhos, cumpre assentar, em causa
julgada, que o Brasil nunca teve cobiças nem perpetrou expansões territoriais.
37
Revista Americana fevereiro de 1912 Editorial
38
RUI BARBOSA. Rio Branco. Revista Americana, abril de 1913. Esse número foi todo
dedicado ao Barão do Rio Branco, tendo sido publicado na íntegra com o título: O Barão do
Rio Branco visto por seus contemporâneos. Brasília, FUNAG, 2002. Esta edição foi por nós
utilizada.
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Invejável destino o desse conterrâneo em sua realidade, projetando o seu vulto
sobre os extremos do país, espécie de nome tutelar, como deus Termeiro da nossa
integridade nacional.”
39
Interessante notar a utilização do verbo restaurar por parte de Rui
Barbosa. Tal expressão por si só nos remete à perspectiva do mito do território
pronto
40
. A política de fronteiras do Barão, para Rui Barbosa, não expandiu,
não conquistou territórios, fez apenas cumprir o que seria o legado histórico
do Brasil. Logo é de fundamental importância, para o discurso e a ação
diplomática, a valorização de uma dada narrativa histórica, fato que nos
auxilia na compreensão da (re)leitura realizada como mecanismo de
legitimação das posições políticas tomadas pelo Itamaraty, no alvorecer do
período republicano brasileiro.
A valorização da estratégia do Chanceler como exemplo de homem
público e de estadista que, portanto deveria servir de referência a partir de
então foi tema central de três artigos publicados no número em homenagem ao
Barão, assinados por eminentes intelectuais do período, a saber : Pandiá
Calógeras, Clóvis Beviláqua e Carlos de Laet.
Pandiá Calógeras
41
, em longo artigo, desenvolveu aprofundada reflexão
acerca da política de Rio Branco, enfatizando aspectos referentes às relações
do Brasil com o restante da América e a importância do Direito Internacional,
assim como o papel político que fora desenvolvido pelo Barão e que deveria
servir de exemplo para os “homens de estado” brasileiros.
Para Calógeras era a aproximação com o restante do continente
americano, em especial a América do Sul, com o objetivo de manter a paz sul-
americana, um dos principais legados da recém proclamada República,-
principalmente após o equilíbrio financeiro alcançado durante o Governo de
39
Id, ibid
40
Conforme apontado por nós, a partir da análise de Demétrio Magnoli, no primeiro capítulo
de nossa Tese .
41
João Pandiá CALÓGERAS. “Rio Branco e a Política Exterior”. Revista Americana, abril de
1913. Engenheiro, historiador e político. Membro das delegações do Brasil nas III e IV
Conferências Pan-Americanas. Ministro da Agricultura, da Fazenda e da Guerra. Autor de
uma série de obras sobre a política externa brasileira.
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Campo Sales
42
,- tendo se tornado, por conseguinte, questão fundamental para
o Itamaraty
Para tal seria necessário que a diplomacia se transformasse em um
instrumento suprapartidário, isto é, que estivesse acima das “desordens da
política interna”. Segundo o autor, deveria ser sob esse prisma a observação
acerca do período do Barão à frente da Chancelaria brasileira. De acordo com
Calógeras, Rio Branco fora convicto na defesa de uma dada autonomia do
Ministério, fundamental na medida em que o regime instituído incentivava a
duração efêmera dos partidos, o predomínio de interesses individuais e uma
tendência a inexistir um debate intelectual saudável com espaço para
divergências.
43
A política internacional deveria corresponder aos anseios, às
necessidades permanentes do Estado e dos deveres deste. Logo, não poderia
ser dependente de quaisquer grupos que apresentassem vícios políticos
nocivos à Nação e sim deveria ficar a cargo de uma elite, de homens que,
independentemente de suas posições políticas, tivessem em mente a clara
concepção do dever para com o Brasil, reunindo predicados suficientes para
exercer tão importante função. Nesse sentido Calógeras afirmava ter sido
estratégia de Rio Branco:
“atrair para sua orientação diplomática colaboradores de todos os feitios
mentais, nas Câmaras e fora delas. Empenhado em fazer uma política exterior
nacional, lograria seu intento pela coadjuvação constante de todos os brasileiros,
irmanados no mesmo ideal que animava ao chefe eminente da Chancelaria.”
44
Por mais que tenhamos criticado essa visão, defendida por alguns até
os dias de hoje, de uma certa autonomia do Itamaraty, à época do Barão, que o
caracterizaria como uma espécie de braço independente do Poder Executivo, é
interessante notar que a defesa de tal autonomia, presente no discurso de
Calógeras, nos remete para qual papel, e conseqüentemente, que preparo,
42
Calógeras aponta para a importância histórica do Governo Campos Sales ao sanear as
finanças brasileiras e fazia referência, ainda que não explicitamente, ao Funding Loan. Sobre
isso ver nosso primeiro capítulo.
43
Ibid pp 187-188
44
Ibid p 188
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142
deveria ter o corpo diplomático brasileiro. Aponta, em última análise, para a
função do Itamaraty na recente ordem republicana, qual seja: uma instituição
que deveria, com base no mérito pessoal e no profundo conhecimento da
Nação, construir um projeto nacional, com repercussão internacional, a fim de
garantir a legitimidade e a respeitabilidade, no estrangeiro, da política e da
cultura brasileira e, por extensão, sul-americana sendo que tal reconhecimento
deveria ter como pilares centrais a cooperação entre os povos americanos que
faria da América o “Continente da Paz”
45
.
A busca da paz continental, para Calógeras, passava pelo
estabelecimento de relações cada vez mais estreitas entre as “nações
confrontantes” da América do Sul. Essa aproximação se inseria em uma
estratégia do Itamaraty voltada para acabar, inicialmente com as
desconfianças entre “os vizinhos” e posteriormente estabelecer uma ascensão
gradual e global do continente, uma vez que era fundamental compreender
que o progresso de cada nação seria vantajoso para todos, pois garantiria uma
política de “verdadeira confraternização”. Segundo o autor tais medidas
serviriam para:
“Em toda parte, em suma, levar a palavra da paz, em condições de se fazer
ouvida e acatada; mostrar que o perigo, caso viesse a existir, não podia ser senão
externo a todos, comum, portanto, e não de uma país americano a outro.
A sinceridade de nossa orientação sul-americana tinha por si oitenta anos de
história. Nunca interviéramos em negócios estranhos, senão por solicitação dos
interessados, confessada por seus próprios analistas, ou por provocação direta.”
46
Nesse ponto Calógeras, após comentar alguns fatos da História do Brasil
referentes à formação territorial nacional desde a época colonial, mas,
sobretudo, ao longo do século XIX, vai defender a tese da necessidade,
geográfica e histórica, de se estabelecer uma aproximação entre a negociação
diplomática e a ação militar. Esta de caracterizando como apoio primordial
para que o diplomata possa agir a fim de garantir a soberania nacional. Tal
premissa garantiria uma gestão pacífica nos negócios internacionais, fazendo
45
Ibid p 197
46
Ibid p 192
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143
inexistir uma ameaça latente à autonomia brasileira. Para isso, nas suas
palavras:
“era necessário, e ainda o é, que o Brasil estivesse aparelhado nesses dois
outros ramos administrativos que, com o das relações exteriores, enfeixam o
problema da defesa nacional no Ministério da Guerra e no da Marinha.
A essa orientação de paz, mas de paz assegurada pela consciência da força,
caso necessário, a fim de não temer perturbações; a esse dever da conservação
nacional quiseram críticos superficiais, quando não voluntariamente mal
intencionados, atribuir tendências imperialistas, agressivas, de conquista militar.”
47
Convém salientar, entretanto, que essa defesa do uso da força, quando
necessária para garantir a paz, não significava, para Calógeras, um
afastamento dos princípios jurídicos como norteadores das relações
internacionais. O autor estabelece longa explanação acerca da importância do
Direito Internacional na formulação do projeto nacional brasileiro destacando
que a ausência de uma prática jurídica forte e consistente violava princípios
elementares de civilização e cultura, aumentando a desconfiança para com as
nações que sofriam desse mal.
48
Igualmente, ressaltou a importância histórica dos grandes tratados
internacionais, que tiveram no Barão do Rio Branco seu principal artífice,
tendo em aproximadamente quinze anos “resolvido todos os problemas da
linha divisória”, sempre por meio de mecanismos de negociação pacífica,
baseada em uma política de arbitramentos visando o equilíbrio do continente e
o cumprimento dos ditames do Artigo 88 da Constituição republicana que
vedava por completo qualquer tipo de expansão conquistadora. Nas palavras
do autor:
“Basta citar os trinta e um países
49
com que celebramos pactos dessa natureza
para se verificar que ficaram firmadas regras dirimentes de controvérsias oriundas da
contigüidade territorial; do desenvolvimento da população pela corrente imigratória;
de reclamações causadas pelo entrelaçamento de relações econômicas do Brasil com
47
Ibid pp 194 - 195
48
Ibid p 181
49
A saber, de acordo com CALÓGERAS: Argentina; Áustria; Bolívia; Chile; Colômbia;
Costa Rica; China; Dinamarca; República Dominicana; Estados Unidos ; Equador ; França ;
Grécia ; Grã-Bretanha ; Haiti ; Espanha ; Honduras ; Itália ; México ; Nicarágua ; Noruega ;
Paraguai ; Portugal ; Panamá; Peru ; Rússia ; El Salvador ; Suécia; Uruguai e Venzuela.
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144
as principais potências. Da extensão do principio arbitral e do espírito de
solidariedade americana resultam, ainda, alguns desses atos.”
50
Seguindo a mesma perspectiva de Calógeras de estabelecer uma espécie
de culto à memória e aos ideais do Barão, como mecanismo de legitimação do
papel da diplomacia brasileira, temos o artigo “A educação histórica do
Barão do Rio Branco explica a extensão de sua influência na vida nacional
do Brasil”.
51
de Clovis Beviláqua no qual são ressaltas as qualidades de
estadista de Rio Branco, em especial na sua atuação como retificador
52
das
nossas fronteiras que, segundo o autor, foi possível pelo estudo
aprofundado da História e da Geografia nacionais que reforçou o amor do
Barão pelas coisas brasileiras, bem como estimulava a inteligência nacional e
o sentimento das suas virtudes, ao mesmo tempo que auxiliava no
desenvolvimento da erudição necessária para se transformar em um
especialista na defesa do direitos brasileiros nas chamadas questões de
limites. Um advogado que seria o representante do povo brasileiro e um
historiador diplomata que multiplicou os tratados de arbitramento e buscou
aproximar as nações sul-americanas em um momento de construção de
horizontes mais amplos que as levaria para o futuro.
De acordo com Beviláqua:
“O que deu a esses feitos uma alta significação histórica foi terem eles
correspondido a necessidades sentidas por nossa consciência nacional, foi traduzirem
afirmações de nossa nacionalidade, conforma ao direito, e necessárias à nossa
integração geográfica. O advogado da Nação, e o povo sentiam que o defensor de
suas pretenes exprimia, com vigor e lucidez, os anelos e pensamentos que se lhe
esboçavam na alma.”
53
50
Ibid p 201
51
Clovis BEVILAQUA. “A educação histórica do Barão do Rio Branco explica a extensão de
sua influência na vida nacional do Brasil.” Revista Americana, abril de 1913.
52
Mais uma vez é interessante notar o verbo utilizado. Retificar nos permite observar a
perspectiva de uma fronteira pronta e definida que precisaria apenas da confirmação por parte
do Brasil.
53
Clovis BEVILAQUA. “A educação histórica do Barão do Rio Branco explica a extensão de
sua influência na vida nacional do Brasil.” Op cit. p 32
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145
Nessa mesma linha argumentativa encontramos Carlos de Laet
54
que
definiu Rio Branco como o “máximo integrador do território nacional”, ao
salientar a predileção e profundo conhecimento sobre a História e a Geografia,
base para as vitórias diplomáticas do Barão e, conseqüentemente, do Brasil.
Paralelo a isso, Laet aponta para aspectos por ele considerados como
lapidares do pensamento do Chanceler, quais sejam: a questão das fronteiras e
da soberania brasileiras associadas à uma preocupação com o restante do
continente, tanto nas relações deste com o Brasil, quanto no que tange a
ameaças externas, como no caso, citado pelo autor, do Bolyvam Sindicate
55
.
Nesse sentido o estudo e o desenvolvimento de um Direito Internacional de
viés americano deveriam ganhar relevo nas preocupações diplomáticas do
período, fato que foi bastante valorizado nas páginas da Revista, que, com
isso, sinalizava qual caminho e que papel deveria assumir a diplomacia no
concerto político e cultural que estava sendo construído naquele momento.
A partir de agora nos deteremos em alguns temas presentes na Revista
Americana que nos permitem compreender determinadas preocupações
referentes ao projeto continental sul-americano, que se diferenciaria de outras
partes do Globo e teria como meta central a elaboração de uma moral própria
da América, que deveria servir de exemplo para outros continentes. Esse
cenário possível pelo, de acordo com a visão dos articulistas do periódico,
processo histórico único do continente, moldou princípios para uma política
internacional baseada em um “ideal americano” baseado na paz que teria na
diplomacia sua maior representante.
Buscar o equilíbrio continental como forma de garantir a paz na
América do Sul foi um dos principais objetivos do Itamaraty, à época, e
significou a elaboração de uma estratégia que teve como marco inicial a
consolidação das fronteiras e, posteriormente, uma aproximação intelectual
entre as nações sul-americanas.
54
Carlos de LAET. Rio Branco. Revista Americana abril de 1913. O autor nascido em 1847
no Rio de Janeiro, foi Catedrático de Português no Colégio Pedro II, escritor e jornalista tendo
trabalhado no Diário do Rio, Jornal do Commercio , O País e Jornal do Brasil.
55
Sobre esse tema ver nosso primeiro capítulo
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146
Nesse contexto, de construção de uma identidade americana a partir de
aspectos referentes à função social da diplomacia, se inserem, na Revista
Americana, os estudos dos conceitos de soberania e hegemonia, fundamentais
para a compreensão do periódico. Buscando entender tais questões nos
deteremos a partir de agora em como esses conceitos, que se aproximavam da
preocupação acerca da formação das fronteiras, foram apresentadas nas
páginas da Revista.
4.3
Soberania e hegemonia: uma (re)leitura para a América do Sul
Nesta parte do capítulo nos deteremos na análise que alguns
colaboradores da Revista Americana fizeram dos conceitos de soberania e
hegemonia. Foi possível notar que as posições seguiam um claro viés de
valorização da posição da América do Sul diante das questões surgidas
naquela época, fato que nos permite observar um evidente destaque para o que
seria o lugar destinado ao continente numa ordem internacional que naquele
momento apenas se desenhava, com a elaboração de uma leitura específica
que o diferenciaria das outras partes do globo.
Nas formulações dos articulistas notamos, igualmente, a busca em
estabelecer uma aproximação entre as principais nações sul-americanas, como
mecanismo de construção de possíveis marcos identitários, o que, na nossa
opinião, podem indicar quais caminhos, para aqueles intelectuais, poderiam
ser construídos nas décadas subseqüentes. Caminhos que pressupunham a
presença de uma diplomacia atuante que assumisse a proa dessas
transformações.
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147
Pensar o papel da América do Sul no novo concerto internacional exigia
da intelectualidade continental, em especial dos setores ligados às ações
diplomáticas, um posicionamento em relação aos temas acima citados que se
faziam presentes na nova dinâmica entre as nações, e que eram caros às
análises acerca das relações internacionais do período. Em face do exposto o
primeiro tema a ser trabalhado por nós será o da soberania.
Araripe Jr, em artigo de 1909
56
, defendeu o princípio, - que deveria ser
premissa básica das nações independentes, - da manutenção das soberanias
nacionais, por meio da noção da intransmissibilidade da soberania. Ao afirmar
que não poderia haver uma política internacional pautada em uma prática de
transferência do domínio político e territorial de uma nação para outra o autor
defendia a tese de que:
“A soberania é intransferível. Os governos não têm capacidade para aliená-la.
Sendo o território inseparável do povo que o ocupa e nele exerce a suprema função
jurídica do exercício do domínio, é óbvio que as guerras e as revoluções podem
romper, infelizmente, pela violência, essa aliança, ou alterar aquela jurisdição
primária.
57
Podemos afirmar que Araripe Jr defendia a idéia de uma soberania na
qual a delimitação das fronteiras seria um marco necessário e fundamental,
uma vez que seria o território, precisamente demarcado, a peça chave que
garantiria a autonomia de uma nação sendo, portanto, fundamental o
reconhecimento e, conseqüentemente, o respeito das nações estrangeiras para
com a soberania nacional de cada Estado.
Na seqüência desse artigo, no ano seguinte
58
, Araripe Jr reforçou essa
visão ao afirmar que as nações não seriam abstrações, uma vez que elas têm
vida própria, portanto, sendo capazes de desenvolver estratégias de força e
ação. Logo, mais do que depender de uma constituição escrita pelos seus
fundadores o mais importante seria o reconhecimento externo e interno do seu
56
Araripe JR. “A doutrina de Monroe”. Revista Americana dezembro de 1909.
57
Ibid p 298
58
Araripe JR. “A doutrina de Monroe”. Revista Americana , janeiro de 1910
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148
território, fruto, em última análise, do reconhecimento e da legitimação dos
tratados de fronteiras.
59
Aproximando-se dessa perspectiva temos Clóvis Beviláqua no artigo “A
modificação das fronteiras entre o Brasil e o Uruguai perante o Direito
Internacional e a Constituição brasileira”
60
de junho de 1910, ao analisar o
Tratado de outubro de 1909
61
, defende também o princípio da
inalienabilidade e indissolubilidade do território nacional, uma vez que para o
autor
“o direito internacional considera legitima a transferência de territórios, por
meio de tratados, exigindo apenas que estes obedeçam às prescrições do direito
constitucional de cada país.”
62
Afastando-se dessa visão, de caráter mais nacionalista, temos Arthur
Orlando
63
que defende o conceito de uma organização internacional de
estados, especificamente americanos, que, em última análise significaria a
criação de um grande bloco continental em que a noção de soberania nacional
seria substituída pela de integração continental. Orlando baseou sua
argumentação em alguns exemplos da história americana. O primeiro seria a
instituição do regime federativo nos Estados Unidos e a conseqüente cessão,
de acordo com o autor, de parte da soberania dos estados federados. O
segundo exemplo seria o caso do Panamá, que ilustra o argumento do autor da
soberania ser algo volátil, nesse particular por conta da posição geográfica
panamenha, estratégica para os interesses do continente, mais precisamente da
59
Ibid p 73
60
Clovis BEVILAQUA. A modificação das fronteiras entre o Brasil e o Uruguai perante o
direito internacional e a Constituição Brasileira.” Revista Americana, junho de 1910.
61
Trata-se do Tratado firmado com o Uruguai, considerado o último dos Tratados de Limites,
assinado em 30 /10/1909.
62
Araújo Jorge considera que o Tratado de 30 de outubro de 1909, concluído entre o Brasil e o
Uruguai, que modificou a linha e o regime de fronteira na Lagoa Mirim e no Rio Jaguarão
estabelecendo princípios gerais para o comércio e navegação naquelas águas , foi “o último
dos grandes atos internacionais de Rio Branco e constituiu o florão de remate de sua obra
benemérita de retificação do perímetro do território nacional.” A.G. Araújo JORGE.
Introdução às obras do Barão do Rio Branco. Rio de Janeiro, Ministério das Relações
Exteriores, 1945. p 183
63
Arthur ORLANDO. A Educação “Internacional Americana”. Revista Americana, março de
1910.
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149
necessidade política e econômica dos Estados Unidos em construir um canal
ligando o Oceano Pacífico ao Oceano Atlântico.
Para o autor a Secretaria Internacional das Repúblicas Americanas,
responsável, entre outras medidas, pela organização das Conferências
Internacionais Pan-Americanas, era um dos órgãos que estariam a serviço da
construção do que era por ele definido como sendo o “ideal americano”, que,
nas palavras de Orlando, consistiria, sobretudo após a III Conferência
realizada no Rio de Janeiro, em:
“Estados que se uniriam sem o menor sacrifício de sua independência e
autonomia, de seus usos, costumes e tradições e até mesmo daquelas pequeninas
peculiaridades, que lhes dão feição especial.”
64
Podemos afirmar que a noção de soberania defendia pelo autor saía da
esfera nacional e se inseria em uma esfera continental sem que isso
significasse paridade entre as nações. As relações intracontinentais se
estabeleceriam tendo como base as possibilidades de cada uma das nações
americanas.
Esta argumentação leva Orlando à análise de outro aspecto acerca da
temática das fronteiras entre Estados. O autor as considerava como “órgãos
sociais” na medida em que além de questões estritamente geográficas, as
fronteiras deveriam ser, igualmente, compreendidas através de fatores étnicos,
econômicos e políticos, pois toda nacionalidade pressupõe uma combinação
dos indivíduos com o meio em que vivem
65
. Nesse sentido a fronteira deveria
ser pensada por uma via de mão dupla: internamente, por meio do
reconhecimento dos limites territoriais por parte da sociedade, e externamente
pela organização e equilíbrio entre os Estados limítrofes. Em última análise as
fronteiras, para Orlando seriam :
“os mais consideráveis órgãos da vida internacional, devendo ser reputadas
não tanto linhas de separação e isolamento, de segurança e defesa dos estados entre
64
Ibid p 354
65
Ibid p 355.
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150
si, quanto linhas de comunicação e penetração, de entrelaçamento e solidariedade
entre diversas nações.”
66
Reforçando a sua argumentação, o autor aponta para a necessidade de se
pensar em uma integração econômica dos Estados Americanos
67
. Baseando-se
em discussão realizada no Congresso Pan-americano do México em 1901,
defende a tese de que a elaboração de um Código de Direito Internacional
Público, bem como de um Código de Direito Internacional Privado, seriam
fundamentais para a organização de uma “União das Repúblicas Americanas”
baseada em três princípios jurídicos básicos: a arbitragem como estratégia
para solução de conflitos existentes e que viessem a surgir entre as nações
americanas, premissa esta associada à criação de um tribunal permanente para
julgar tais conflitos e, por fim, uma lei internacional pela qual seriam julgados
os países envolvidos.
Convém salientar que a perspectiva jurídica de Orlando atrelava-se a
uma análise dos aspectos econômicos, isto é, a defesa da igualdade perante a
lei, influência iluminista consagrada nas constituições políticas dos oitocentos,
e sua extensão para o caso específico das leis internacionais, não garantiu uma
igualdade efetiva da sociedade e, por conseguinte, entre as nações. Para o
autor, o grande problema era fazer desaparecer a flagrante contradição entre a
igualdade jurídica e a desigualdade econômica, entre a igualdade de direito e
a “monstruosa” desigualdade de fato
68
.
Nesse sentido seria fundamental a organização, em nível jurídico, das
relações econômicas entre nações inserindo as referidas relações em um
quadro de justiça internacional. Segundo o autor:
“Com efeito, o Direito econômico ou a Economia Jurídica, isto é, a justiça nas
relações econômicas, poderia realizar-se por acordo dos Estados para formarem
uma União Internacional. E pela própria força das circunstâncias esta União só
66
Ibid p 367
67
Arthur ORLANDO. “A Educação Internacional Americana”. Revista Americana , março de
1910.
68
Ibid pp 358-359.
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151
poderá formar-se entre os Estados da América, porque são eles que têm um direito
público uniforme, destinado à garantia dos direitos individuais.”
69
Nesse cenário de valorização de questões econômicas, segundo Orlando,
ganha relevo a figura de um tipo de diplomacia que outrora restringia sua
atuação às questões políticas e naquele momento passava a se preocupar com
negócios comerciais e industriais, sendo o diplomata que por negligência ou
ignorância as desprezasse, não desempenharia bem o seu ofício e,
conseqüentemente, serviria mal a sua pátria
70
.
De certa maneira aproximando-se de Arthur Orlando no que tange a
relativização, ou melhor, a adaptação do conceito de soberania aos novos
tempos, observamos a posição defendida por JoIrigoyen, que apesar de ser
contrário aos possíveis processos de intervenção de uma nação sobre outra,
defendia a flexibilização das soberanias nacionais quando a defesa destas
trazia ameaça ao equilíbrio continental. Segundo o autor:
“Em principio geral não existe direito de intervenção, porque não pode existir
direito contra direito; e o de soberania, isto é, o de cada estado dirigir por si sua
relação externa, é o primeiro e superior de todos. Mas este princípio geral não é
absoluto; têm exceções, muito poucas por certo. Todos os tratadistas estão mais ou
menos de acordo em considerar que, quando se trata de conflitos que prejudiquem
diretamente os interesses da comunidade internacional ou de violações de
convenções (como a arbitragem por exemplo) que adquirem o valor das leis gerais e
obrigatórias para todas as nações que as subscrevem, a intervenção coletiva é
perfeitamente legitima. Suprimir o direito à intervenção, ainda que em casos
específicos, em nome da independência soberana da cada Estado, seria introduzir na
sociedade dos povos o direito à anarquia.”
71
A flexibilização ou não das soberanias nacionais nos remete ao papel
assumido pela diplomacia brasileira nos processos de construção das
fronteiras do Brasil e, por conseguinte da América do Sul. Essa temática
ganhou no Continente um adendo bastante significativo, conforme visto na
primeira parte deste capítulo, uma vez que para além das fronteiras terrestres,
havia a questão da navegabilidade dos rios que, devido à teoria das fronteiras
69
Ibid p 359
70
Ibid p 363
71
Jose IRYGOIEN. “Mediacion e Intervención”. Revista Americana maio de 1911.
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152
naturais, ainda em voga no inicio do século XX, foram marcos geográficos
privilegiados na definição dos limites nacionais.
O tema da navegabilidade dos rios era uma das preocupações dos
diplomatas brasileiros desde a época do Império. A ação da diplomacia ao
longo do período monárquico, em especial durante o Segundo Reinado,
baseada na defesa permanente da soberania nacional foi outro tema abordado
nas ginas da Revista. Tais artigos serviam para justificar, ou ao menos
explicar, as estratégias do Itamaraty no processo de construção dos limites
territoriais brasileiros das primeiras décadas republicanas.
Como exemplo disso podemos citar Helio Lobo, no artigo “Relações
entre os Estados Unidos e o Brasil”,
72
ao fazer referência à solicitação norte-
americana, de 1853, para a abertura do rio Amazonas à livre navegação,
baseada em principio jurídico que a equivaleria à navegação oceânica
internacional, foi bastante incisivo afirmando que tal proposta feria os
princípios básicos da soberania de qualquer Estado- nação, considerada pelo
autor como principio “fora de discussão”, ou seja, um axioma das relações
internacionais. De acordo com Lobo:
“Tal doutrina (da livre navegação) não podia aceitar, e nem aceitou, a
Chancelaria Imperial. No Brasil era de longa data a regra de que o Estado tem
soberania sobre o trecho de rio que atravessava seu território, podendo, por isso, o
ribeirinho inferior negar trânsito ao ribeirinho superior, desde que este não se
conformasse com as cláusulas que julgasse com razão, necessárias à sua segurança.
Não podia o Império, a meu ver, estar de acordo com a nova doutrina segundo a qual
se assemelhava o Amazonas ao Oceano.”
73
O peruano Juan Bautista Lavalle, em artigo de 1910
74
, também abordou
o tema, todavia em oposição à visão brasileira, defendendo que os acordos
internacionais liberassem a navegação dos rios, posicionamento este, que se
justificava pela posição geográfica do Peru sem acesso ao Atlântico. Nesse
72
Helio LOBO. “Relações entre os Estados Unidos e o Brasil.Revista Americana, abril de
1918.
73
Ibid pp 48 e 49 . A referência ao termo Oceano nos remete à noção de mar territorial que
mais adiante abordaremos.
74
Juan Bautista LAVALLE. “ El programa de la Cuarta Conferencia Internacional Americana
de 1910”. Revista Americana, maio de 1910.
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sentido é absolutamente compreensível que tal premissa tenha feito parte da
estratégia diplomática do país andino nas Conferências Pan-americanas, em
especial na de 1906, quando a navegabilidade dos rios foi proposta, sem
sucesso, como tema para discussão conforme destacou o autor nessa passagem
do seu artigo:
“O governo peruano propunha no ano de 1906, como tema para o programa
do Congresso que devia reunir-se no Rio, o estudo dos acordos internacionais que
facilitem as comunicações fluviais, marítimas e terrestres e, como principal recurso
para consegui-lo, a livre navegão dos rios que sulcam o continente americano. Seja
por intervenção do Brasil ao redigir o programa, seja por cortesia para a nação em
cuja capital devia reunir-se a assembléia e cujo critério a respeito deste problema é
bastante conhecido para que nos detenhamos em ponto tão delicado e frágil e que é
mais de política internacional que de direito e de princípios, a livre navegação dos
rios não foi incluída no programa da Conferência do Rio.”
75
No ano anterior Augustin de Vedia havia abordado o tema refletindo
acerca da navegação no Rio da Prata
76
considerando que nas negociações
entre os países do sul da América do Sul duas vertentes interpretativas eram
possíveis.
77
Ou se considerava o rio, juridicamente como um mar e,
conseqüentemente, impor-se-ia a legislação pertinente à essa condição ou,
efetivamente como um rio, adotando a legislação referente. O autor, ao longo
de seu artigo, apóia a segunda opção, porém em ambas ele defende o direito
de navegabilidade do Uruguai. Em bela síntese Vedia afirma:
“Uma de duas: ou o Rio da Prata é um mar aberto e livre, subtraído ao
domínio de qualquer Estado, onde os ribeirinhos teriam as três milhas, medida
convencional adotada geralmente pelas nações, como parece ser o critério britânico;
ou é um rio interior, pertencente em condomínio aos ribeirinhos, um dos quais, tem
que ser forçosamente a República Oriental do Uruguai.”
78
Inegavelmente a questão da navegabilidade dos rios, presente nas
páginas do periódico, nos remete tanto a aspectos relacionados à soberania das
75
Ibid p 193
76
Augustin VEDÍA. “El domínio eminente em el régimen federal y su aplicacion al Rio da
La Plata”. Revista Americana, outubro de 1909.
77
Convém salientar que a abordagem proposta pelo autor relaciona-se diretamente com as
questões em voga, acerca da navegabilidade dos rios, no inicio do século XX , conforme visto
na primeira parte deste capítulo
78
Ibid p 46
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154
nações sul-americanas, na medida em que os rios eram elementos chaves nos
processos de demarcação das fronteiras, quanto à reflexão sobre um possível
estabelecimento de uma política hegemônica no continente. Essa temática
fazia parte das preocupações dos articulistas da Revista Americana tendo
propiciado acalorado debate, principalmente, mas não exclusivamente, entre
argentinos e brasileiros.
Em relação aos estrangeiros que escreveram sobre hegemonia na Revista
é interessante notar certa preocupação quanto à aplicabilidade do conceito.
Em discurso realizado no IHGB, em agosto de 1910
79
, o argentino Ramon
Cárcano destaca a forte presença no discurso político, argentino e brasileiro,
de então, do termo hegemonia. Salienta o autor que este seria um conceito que
não trazia consigo qualquer aplicação científica, relacionando-se, apenas, com
a capacidade de um Estado ou povo de influenciar outro, ou seja, a hegemonia
se configuraria no estabelecimento de uma influência moral que garantiria
uma irradiação civilizadora voltada para a obtenção de um determinado nível
de progresso.
80
Em linha de raciocínio relativamente próxima a Cárcano temos o
chileno Marcial Martinez
81
, que ao diferenciar o conceito de hegemonia do
conceito de Imperialismo, este significando a ação por meio de força militar e
econômica a serviço de uma expansão territorial, chama a atenção para um
possível desenvolvimento de uma prática de dominação justificada,
caracterizada pela supremacia de um Estado sobre outro, ou outros, devido ao
seu valor físico, moral e intelectual, algo que, no entanto, não se enquadraria à
realidade sul-americana, que deveria buscar uma via de equilíbrio entre as
suas nações. Nas palavras do autor:
“Falar de hegemonia na América do Sul me parece um pouco ridículo; é uma
imitação, que tem tintas de paródia. Conhecendo que isto é assim, vêm muitos
falando de uma espécie de confederação convencional, entre o Brasil, a Argentina e
79
Ramon CÁRCANO . Discurso proferido na Seção do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro de 06 de agosto de 1910. Transcrito na seção notas da Revista Americana, agosto
de 1910.
80
Ibid pp 254-255
81
Marcial MARTINEZ. “Cuestión Chileno-Peruana”. Revista Americana, abril de 1911.
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155
Chile
82
, para controlar e dirigir os negócios políticos da América do Sul. Me assistem
cem razões para não subscrever a semelhante empresa. O que eu proponho é uma
política franca, leal, honrada, parelha para todos. Constituída a confraternidade
americana sobre essas bases sólidas, e não fictícias, as seções americanas se servirão
reciprocamente, em tempos normais como em épocas de agitação, porque a todas elas
armará o espírito de paz, de concórdia e de progresso paralelo.”
83
Retornando aos artigos de Ramón Cárcano, inegavelmente, dentre os
autores estrangeiros, um dos mais destacados articulistas da Revista
Americana, é interessante notar o que poderia ser uma certa incoerência em
suas posições. Em artigos publicados a partir de 1909
84
, o autor argentino
destacou as divergências diplomáticas entre o Brasil e a Argentina, ao longo
do século XIX, em especial no contexto da Guerra do Paraguai quando do
“embate” diplomático entre o Barão de Cotegipe e o Senador Manuel
Quintana.
85
Segundo rcano, Cotegipe não admitia em hipótese alguma que
qualquer nação questionasse a predominância do Brasil na cena continental,
notabilizando-se, nesse sentido, como um ferrenho opositor do espírito
republicano portenho, que representaria, para o autor, a verdadeira
originalidade e essência americana, o exemplo a ser seguido, com suas
instituições democráticas e um evidente potencial de crescimento. A partir da
comparação entre Cotegipe e Quintana, Cárcano buscou caracterizar a
oposição histórica entre Argentina e Brasil. Nas suas palavras:
]“Quintana frente a Cotegipe !
O primeiro político jovem, leal e ardente, o outro velho, experimentado e
astuto, tinham somente um ponto em comum, que era o ponto de repulsão, a aversão
recíproca aos respectivos países, nascida de lutas históricas e da diversidade de
instituições agravada pelas questões atuais em debate.
86
82
Martinez ao estabelecer esse raciocínio estabelece referência ao que alguns anos depois
ficaria conhecido como Pacto ABC, que, àquela altura já estava na pauta de discussões das
Chancelarias de Argentina, Brasil e Chile e, de certa forma, sendo taxado como uma tentativa
de se estabelecer uma ação imperialista na América do Sul.
83
Ibid p 111.
84
Ramón CÁRCANO. “La diplomacia de la Triple Alianza : el Baron de Cotegipe y Manuel
Quintana.”. Revista Americana , novembro de 1909.
85
Ministros de Estado no culo XIX, responsáveis pelas Pastas dos assuntos estrangeiros, na
Argentina e no Brasil respectivamente.
86
Ibid p 169
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156
No ano seguinte, no artigo “Golpe de Estado do Presidente Rivarola
87
,
Cárcano salienta, mais uma vez, as diferenças existentes entre os princípios
morais das diplomacias do Brasil e da Argentina, defendendo a tese de que
durante o período do Império o Brasil buscara consolidar sua hegemonia no
continente, por meio de mecanismos de intervenção nas questões internas dos
seus vizinhos. O exemplo utilizado pelo autor, como o próprio título do artigo
indica, foi o fechamento do Congresso Paraguaio, estabelecido por Rivarola,
“inimigo da nação Argentina” logo após a Guerra do Paraguai, com total
apoio do Brasil.
Dentro dessa linha de argumentação, Cárcano aponta que a política
externa da Argentina deveria caminhar em sentido contrário à do Brasil, na
medida em que esta visara, ao longo do seu processo histórico como nação
independente, expandir seu domínio territorial e sua influência ao sul do
Continente Americano. Para impedir tal estratégia a solução passava, segundo
o autor, pelo fortalecimento de uma política argentina necessariamente inversa
à brasileira, ou seja, que tivesse como estratégia norteadora o fortalecimento
do Estado Oriental (Uruguai), do Paraguai e talvez da Bolívia sobre o Rio
Paraguai, como forma de garantir um “cordão de segurança” geopolítico para
a Argentina.
88
Retornando aos seus primeiros artigos é interessante notar as severas
críticas à atuação Brasil no contexto da Guerra do Paraguai. Ao definir o
Império como “estacionário e arcaico”, o autor argumentou que foi a invasão
de Lopez à Argentina que definiu os rumos do conflito, uma vez que com a
entrada portenha o Império brasileiro foi salvo da ruína completa provocada
por uma guerra improvisada.
Ainda sobre a Guerra, Cárcano, na seqüência desse artigo
89
reforça sua
argumentação ao afirmar que o Império brasileiro se notabilizou como
opressor ao consolidar seu poderio sobre um povo vencido e na miséria,
87
Ramon CÁRCANO. “Golpe de Estado do Presidente Rivarola”. Revista Americana, janeiro
de 1910.
88
Ibid p 88
89
Ramón CÁRCANO. Relaciones Internacionales El critério Argentino Tradicional..
Revista Americana, março de 1910.
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157
valendo-se de estratégias definidas pelo autor como verdadeiras artimanhas,
tais como o casamento de soldados com mulheres paraguaias para ampliar seu
domínio.
90
Essa seqüência de artigos de Cárcano mobilizou a redação da Revista
Americana que, apesar de publicá-los, não se furtou de, no próprio texto
responder, em forma de notas explicativas, as críticas realizadas pelo autor
argentino. Dentre os comentários mais contundentes por parte da Redação do
periódico observamos a crítica à teoria de que o Brasil, sem auxílio argentino,
seria derrotado pelo Paraguai e a resposta ao aventado arcaísmo do
Império.
91
Interessante notar que nesse mesmo período a Revista publicou uma
série de artigos de José Oiticica intitulados “Como se deve escrever a
História do Brasil”, nos quais ele defende a tese de que a noção de hegemonia
deveria ser pensada por meio de uma perspectiva sul-americana sim, na qual
o Brasil teria um papel de destaque na medida em que, era a nação “mais
vasta”, “mais rica”, “mais poderosa” do continente americano devendo, por
conseguinte, assumir a frente no “honroso encargo de guia das nações co-
irmãs”
92
.
Oiticica defendia que para se pensar em estratégias para o Brasil
enfrentar o “futuro equilíbrio universal”, era condição “sine qua non”
destacar aspectos da históra brasileiro. Este serviria como legitimador do
papel de destaque a ser desempenhado pelo país no cenário continental /
internacional. A hegemonia sul-americana caberia ao Brasil como resultado
90
Ibid p 573
91
Por mais que não seja possível provar, pelas peculiaridades das observações, é bastante
provável que o autor das referidas notas fosse o próprio Rio Branco, uma vez que, para além
do seu interesse particular pelo tema, ele, segundo seus biógrafos, era um “obsessivo escritor
marginal”, como se comprova na edição que a Revista Americana fez dos Comentários à
História da Guerra do Paraguai de Schneider, que, em última análise era a obra de Schneider,
publicada na íntegra, com as notas de rodapé do Barão, que, na prática consistia em outra
obra. A suspeita se reforça tendo em vista que fazia parte dos hábitos intelectuais do chanceler
escrever, com pseudônimos ou até mesmo sem assinatura, texto respostas na grande imprensa,
em especial nos Jornais do Commercio, o Paiz e A Noticia. Sobre essa faceta da trajetória do
Barão ver Álvaro LINS. Rio Branco. Op cit
92
Jose OITICICA. “Como se deve escrever a Historia do Brasil.” Revista Americana, abril de
1910. Essa série de artigos foi publicada entre abril e julho desse ano.
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histórico de forças seculares, que seriam incontestáveis, espécie de
condensação de todo passado, associado a um “programa de todo futuro.”
A valorização do processo histórico brasileiro fica evidente nas idéias de
Oiticica que defendia a tese de que a busca pela hegemonia deveria ser um
objetivo nacional a ser alcançado tendo em vista que o Brasil se encontrava na
vanguarda das demais nações do continente, sob todos os pontos de vista e
que tal posição se explicava pela situação histórica do Brasil daquela época,
na qual a República se consolidava.
que se ter em mente que o autor estabeleceu alguns critérios pelos
quais deveria ser pensado o equilíbrio político da América do Sul.
Inicialmente seria necessário o estabelecimento de um instrumento
civilizatório, que não deveria ser compreendido como um mecanismo de
intervenção sobre vizinhos mais fracos e sim como uma espécie de exemplo,
uma referência, que para a América do Sul seria, obrigatoriamente, o Brasil.
Este seria um guia que os levaria do caos ao progresso compatível com a
civilização moderna.
93
Essa perspectiva nos remete aos princípios norteadores da República
brasileira, pautados na noção positivista de uma determinada ordem, oposta ao
caos, e de um progresso que se oporia ao atraso, à barbárie. Para o autor o
instrumento civilizatório representaria, em última análise, a extensão para o
restante do continente sul-americano dos elementos positivos brasileiros, fato
que não apenas beneficiaria as nações vizinhas, mas igualmente o Brasil, pois
garantiria um fundamental equilíbrio continental, tanto político quanto
econômico do qual o Estado brasileiro tiraria proveito, estabelecendo uma
dada hegemonia que seria responsável pela liberdade de toda a região.
Paralelo a isso Oiticica, destacava que o exercício da hegemonia
brasileira passaria por uma série de outros elementos que, de maneira didática,
ele esclarece aos leitores da Revista Americana. Em primeiro lugar ele destaca
a necessidade de se estabelecer uma hegemonia intelectual, baseada na
93
José OITICICA. “Como se deve escrever a História do Brasil. Revista Americana, maio
de 1910
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superioridade brasileira nas ciências e nas artes, (para tal o autor salienta a
importância da educação no processo de construção de uma Nação, em
especial de uma com projetos hegemônicos), associada à uma hegemonia
moral, entendida como construtora de um caráter nacional baseada em uma
moralidade social, política e administrativa. Com o “perfeito funcionamento
das instituições”.
Outro aspecto destacado pelo autor era a hegemonia física, com o
aprimoramento da raça pela ginástica e higiene, que serviria de base para a
supremacia militar, a partir de uma maior organização do Exército e da
Marinha. Por fim Oiticica destaca o que ele denomina como hegemonia
prática, a saber: o fortalecimento desde atividades industriais, agrícolas e
comerciais passando pela economia e finanças nacionais, chegando à
diplomacia e à administração pública, imprescindíveis para a construção de
uma estratégia de ascensão econômica e de estabilidade.
Ao observarmos a importância dada por Oiticica a esses diferentes
mecanismos explicita-se para nós o que poderia ser uma síntese das idéias do
autor acerca dessa temática, qual seja: o estabelecimento e exercício de um
projeto hegemônico passariam pela fusão entre a capacitação do “povo” por
meio da valorização da educação e a disponibilidade de recursos disponíveis.
Em relação a estes últimos o Brasil era, “inegavelmente” privilegiado, logo o
investimento em um processo educacional “civilizador” deveria ser objetivo
central no país, pois a partir do êxito de tal medida seria possível pensar uma
Nação hegemônica. Esse projeto educacional teria como elemento chave a
História, elemento diferenciador do Brasil em relação às outras nações sul-
americanas e deveria ser liderado pelo corpo diplomático nacional.
Apesar da diferença de posições entre Oiticica e Cárcano uma vez que o
autor argentino crítica justamente este anseio hegemônico brasileiro, aspecto
este que o brasileiro salienta como sendo o caminho da América do Sul, é
possível observar uma aproximação entre esses dois articulistas. Ambos
ressaltaram em suas argumentações a importância da Proclamação da
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160
República como meio, fundamental para inserir o Brasil na dinâmica do
continente.
Nesse ponto cabe uma importante observação acerca do pensamento de
Cárcano sobre a política externa brasileira de então. Para o autor, naquele
momento, primeira década do século XX, seria possível observar o Brasil
com um olhar diferente do da época do Império, foco de suas severas críticas,
na medida em que a República ao se tornar realidade, superou, por
conseguinte, as diferenças viscerais entre as “duas potências” da América do
Sul. O autor é explicito ao apontar a mudança de eixo da diplomacia brasileira
que, naquele momento, em oposição à época monárquica, mantinha princípios
de não incorporar territórios à força e sim por meio de tratados
internacionais.
94
De acordo com Cárcano:
“Vencida a tirania e constituído o país, a política externa se manteve dentro de
sua ação legítima e nobremente inspirada: neutra sem egoísmo, mediadora generosa,
protestante de abuso, conciliadora, apoiando com sua conduta seus princípios.
95
É inegável a valorização ao momento republicano brasileiro, bem como
a importância concedida à diplomacia nacional nessa nova fase do Brasil. Fica
evidente, mesmo com as duras críticas à História Imperial, a aproximação
entre as propostas do autor, e os paradigmas do Itamaraty, no alvorecer do
século XX. Talvez essa seja a chave para se compreender o porquê de
Cárcano, apesar de elaborar duras críticas aquele período histórico brasileiro,
ter continuado a gozar de imenso prestígio junto à Revista Americana, que
mesmo ao responder algumas das afirmações realizadas, manteve-se em
silêncio diante da maior parte das críticas.
Outrossim, Cárcano foi admitido como membro, em 1910, do IHGB,
sendo seu discurso, como era de praxe, publicado pela Revista e sua trajetória
bastante elogiada na edição de julho/agosto de 1910, na seção “Notas da
Redação” que o definiu, e esse é o elemento mais interessante, como sendo
94
Ramón CÁRCANO. “Relaciones Internacionales – El critério Argentino Tradicional.”
Revista Americana. Op cit. p 341
95
Ibid p 342
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161
um dos mais ativos e dedicados colaboradores da empresa de “fraternização
intelectual americana.”
96
Esta perspectiva se fez presente em vários colaboradores da Revista que,
mesmo apresentando diferenças entre si, em especial em relação a questão da
navegabilidade e na elaboração de possíveis projetos hegemônicos para o
continente caminharam na direção de propostas que valorizavam um
equilíbrio sul-americano.
Como síntese dessa parte do capítulo podemos afirmar que o conceito de
soberania foi observado, por Araripe Jr, por meio da ótica da
intransmissibilidade das fronteiras, fato que levava o autor a defender não
apenas o processo de demarcação das linhas fronteiriças, mas também que
estas fossem reconhecidas tanto interna, quanto externamente. Aproximando-
se dessa premissa encontramos Clóvis Beviláqua que também associa
soberania do principio da indissolubilidade do território. É possível observar,
em ambos os autores, uma perspectiva nacionalista acerca do estabelecimento
das soberanias.
Afastando-se um pouco dessa gica temos Arthur Orlando que pensava
soberania a partir de uma lógica continental com a organização de estados
americanos como pilar central para a consolidação de um “ideal americano”,
que seria baseado em uma integração econômica garantida pelo
estabelecimento de um Direito Internacional Americano que legitimaria essa
nova fase do continente. Mesmo baseando sua análise em uma visão
continental, Orlando defendia o reconhecimento das fronteiras nacionais.
José Irigoyen defendia uma adaptação do conceito de soberania com a
sua flexibilização quando a defesa de soberanias nacionais representasse uma
ameaça ao equilíbrio continental.
Outro aspecto observável nas páginas da Revista, quando abordado o
conceito de soberania, reside na aproximação desta noção com a temática da
navegabilidade dos rios. Assunto de extrema relevância à época, na medida
em que a possibilidade ou não de se estabelecer a livre navegação fluvial no
96
Nota da Redação quando da posse Cárcano no IHGB. Revista Americana, agosto de 1910.
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162
continente, opunha os autores brasileiros, como fora o caso de Hélio Lobo,
contrário à navegação, de estrangeiros, como o peruano Lavalle, favorável à
livre passagem dos rios. Dentro dessa discussão houve igualmente espaço para
posições que tendiam à uma certa neutralidade como Augustin Vedia que se
limitou a elaborar uma análise jurídica da questão.
Aproximando-se das preocupações acerca da questão da soberania
temos o debate sobre a possibilidade, ou não, do estabelecimento de projetos
hegemônicos na América do Sul, conforme visto nas posições apresentadas
por Ramon Cárcano, Marcial Martinez e José Oiticica.
Convém salientar, e essa é uma de nossas argumentações centrais, que a
chave para se compreender as análises dos articulistas sobre soberania e
hegemonia, reside no fato da análise de ambos os conceitos perpassarem pelo
estabelecimento de um equilíbrio continental que se tornara verossímil, entre
outros aspectos, a partir do advento da República no Brasil.
Outrossim, ficou evidente a função que o corpo diplomático brasileiro e,
por extensão, sul-americano deveria assumir naquele momento, como
construtor de uma moral americana distinta do restante do mundo e que
deveria servir de exemplo. O papel da diplomacia, em última análise,
permeou os debates, tornando-se pedra de toque das argumentações dos
articulistas da Revista Americana.
Em última análise, podemos afirmar que a valorização da diplomacia
sul-americana presente nas páginas da Revista Americana, servia de norte
para qual papel deveria exercer o Itamaraty, na recém inaugurada ordem
republicana e, por extensão na nova inserção do Brasil na cena continental, na
qual a meta seria estabelecer, conforme dito, um padrão moral próprio da
América que deveria servir de modelo para outros continentes.
A partir de agora analisaremos como esse padrão moral, que destacava o
papel a ser exercido pela diplomacia, foi enunciado nas páginas do periódico.
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163
4.4
Propondo uma moral diplomática sul-americana
Refletir acerca da ação diplomática sul-americana, em nossa opinião, é
uma chave para a compreensão do projeto de cooperação intelectual
preconizado pela Revista Americana, isto é, o intercâmbio que deveria ser
realizado partiria do corpo diplomático que, nesse sentido, seria “responsável”
pela construção de uma moral sul-americana, bem como pelo equilíbrio
continental que deveriam servir de exemplo para as outras regiões do planeta.
Sobre essa questão podemos observar o posicionamento do argentino
Francisco Félix Bayon
97
ao afirmar que caberia, a partir daquele momento
específico do contexto mundial, fundamentalmente à diplomacia, agir como
“meio civilizador”, com o intuito de garantir uma política internacional
coerente e, principalmente, sistemática, colocada a serviço da coletividade sul
–americana..
Bayon destacou a prática do arbitramento, como um dos legados da
diplomacia do novo mundo. Como exemplo para justificar seu
posicionamento ele analisa a questão envolvendo Estados Unidos e Inglaterra
em torno do Navio Alabama em 1871/1872. Para o autor tal fato não apenas
evitou uma guerra dos dois lados do oceano como levou a União americana a
firmar “um precedente inigualável, de moral internacional”
98
. A América seria
um exemplo a ser seguido, um continente que se constituiu, segundo o autor, a
partir da lógica da paz, valendo-se da arbitragem como mecanismo para se
evitar conflitos bélicos e garantir a soberania de seus povos. Tal premissa, na
visão de Bayón, naquele momento, encontrava-se em plena atividade nas
estratégias diplomáticas da América do Sul.
97
Francisco Felix BAYON. “ Virtud de uma alianza em la Politica latino-americana”. Revista
Americana, setembro de 1910.
98
Ibid p 321
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164
Houve nas páginas da Revista Americana uma valorização da ação
diplomática do continente em especial da brasileira e da argentina
99
. Em
relação a esta última podemos observar o artigo de Ramon Cárcano “Relações
Internacionais: o critério argentino tradicional”
100
, no qual são apresentados
aspectos da política externa Argentina, considerados pelo autor como sendo
elementos tradicionais da diplomacia portenha, responsáveis pelo
estabelecimento de um padrão muito mais equilibrado e coerente e que,
portanto, deveria servir como modelo a ser seguido pelos países americanos
àquela época. Segundo Cárcano um dos princípios básicos da diplomacia
argentina seria a:
“Arbitragem geral [que] não suprime as causas possíveis de guerra, mas
diminui suas causas prováveis, e basta esse efeito para sancionar com empenho sua
existência. Hoje constitui uma doutrina argentina, sustentada em todos os dias de sua
história, e aperfeiçoada pelo progresso das idéias. A República merece por ela a
confiança da América, o respeito e a simpatia do mundo.”
101
Podemos afirmar que a questão central para o autor era a defesa da
Argentina como uma nação que apresentaria critérios, classificados por
Cárcano, como sendo tradicionais, baseados na análise do processo histórico
portenho, que, ao longo do século XIX, havia construído um padrão de
diplomacia que somente no alvorecer do século XX o Brasil apresentava
condições de aplicar. Acerca desse momento brasileiro o autor afirma que:
“através de todas as situações que atravessa o país, se mantém firme, contínuo,
deliberado e consistente. Não é resultado transitório de homens e governos, da
imposição de vitórias ou derrotas; é a expressão de sentimentos e ambições coletivas
que perduram e se impõem no tempo por gravitações do conjunto.”
102
Mais uma vez evidencia-se para nós a valorização da ordem
republicana, recém inaugurada no Brasil, que possibilitava uma maior
aproximação entre os “mais importantes vizinhos da América do Sul”, uma
99
Considerados pela historiografia os dois principais corpos diplomáticos da América do Sul.
100
Ramon CÁRCANO. “Relaciones Internacionales – El critério Argentino Tradicional”.
Revista Americana. Op cit
101
Ibid p 348
102
Id , Ibid
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165
vez que a Proclamação da República havia representado a superação de
entraves políticos que, segundo Cárcano, haviam marcado as relações entre as
duas nações ao longo do século XIX.
A valorização da diplomacia da Argentina também se fez presente nos
trabalhos de Norberto Piñero que na série de artigos intitulados “A política
internacional Argentina”
103
destacou, ao realizar uma análise histórica desde
o período da proclamação da independência, a coerência da ação diplomática
de sua nação que poderia ser assim resumida: uma primeira fase em que se
estabeleceu uma estratégia para efetivar a emancipação política em relação à
Metrópole espanhola, um segundo momento no qual esteve associada à
organização e consolidação nacionais, com o objetivo de assegurar sua
soberania e, por fim, o período de definição de fronteiras com os países
vizinhos.
104
Piñero apresenta como um de seus argumentos centrais, além da
coerência da política externa portenha, a importância da diplomacia nos
processos de manutenção da paz. Segundo o autor, naquele momento,
primeiros anos do século XX, a comunidade internacional buscava, por meio
de tratados e alianças, estabelecer uma era de paz. Tal objetivo seria
“resultado de um acúmulo considerável de fatores; um efeito da civilização;
em parte obra da diplomacia essa estratégia de paz.”
105
.
Uma das formas de consolidação desses objetivos eram, para o autor, as
Conferências de Paz de Haia, instrumento que permitia o debate diplomático
em prol do equilíbrio entre as nações. De acordo com Piñero:
“A conferência de Haia, estabelecida para cumprir uma tarefa regular e
celebrar reuniões periódicas, é o acontecimento mais saliente e de maior
transcendência encaminhado para aquele propósito [de construção da paz]. A
conferência tem empreendido a meta de fundar o equilíbrio do mundo, a harmonia de
todos os estados cultos ou no caminho de civilizar-se na Terra.”
106
103
Norberto PIÑERO. “A política internacional Argentina”. Revista Americana, janeiro de
1913. A seqüência desse artigo foi publicado ao longo do primeiro semestre do referido ano.
104
Norberto PIÑERO. “A política internacional Argentina”. Revista Americana, fevereiro de
1913.
105
Norberto PIÑERO. “A política internacional Argentina.” Revista Americana, janeiro de
1913. p 294
106
Ibid p 295
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166
Por mais que seja observável uma leitura pouco precisa do contexto em
que o artigo foi produzido, uma vez que o mundo estava às vésperas da
Primeira Guerra Mundial, em um cenário crescentemente beligerante e que,
portanto, o equilíbrio entre as nações, base para a paz mundial, era mais um
sonho distante do que algo palpável, é interessante notar que as posições de
Piñero nos remetem para uma clara defesa do projeto nacional argentino que
teria apresentado como segmento fundamental para a consolidação da sua
diplomacia.
Em ntese é possível assinalar que tanto Cárcano quanto Piñero,
defendem como regras gerais para a diplomacia argentina a não incorporação,
por meio da força, de territórios à União Nacional, bem como a guerra ser um
instrumento válido apenas em caso de defesa da integridade e soberania
nacionais. Outros pontos que merecem destaque seriam: a defesa pela
manutenção de uma política de neutralidade, respeitados os limites e a as
circunstâncias entre os vizinhos, a defesa de tratados e de uma arbitragem
ampla. Esses aspectos seriam responsáveis pela consolidação da paz
continental e, portanto, elementos chaves de uma exemplar moral
americana”, devendo, portanto, servir de modelo para outras nações.
Tais princípios, segundo ambos os autores, que haviam sido a pouco
apropriados pela Chancelaria brasileira, devido ao recente processo de
Proclamação da Republica, seriam, naquele momento, norteadores da
política externa brasileira, pois caracterizariam e, por conseguinte,
valorizariam os aspectos positivos do espírito americano que garantiriam o
equilíbrio entre as nações, bem como serviriam de exemplo para os outros
países do continente e, em última análise, na visão dos autores, para os demais
continentes.
A defesa de uma política internacional americana, em oposição aos
paradigmas europeus, que traria um novo papel para a diplomacia do
continente foi igualmente abordada na Revista Americana que valorizava o
modelo americano que garantia a paz para a região. Reside aí, conforme
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destacado, a grande linha argumentativa da Revista, baseada na valorização do
corpo diplomático na nova ordem que garantia um estreitamento das relações
internas do continente, fato que exigiria além de uma aproximação política e
econômica, uma aproximação cultural e intelectual, obviamente capitaneada
pelas diplomacias nacionais. Nesse sentido estariam lançadas as bases para se
estabelecer o lugar do Itamaraty na nova ordem republicana.
Dentre os autores que enfatizaram esse novo momento do Brasil e do
continente, baseado nessa moral diplomática americana, temos Pinto da Rocha
que, à época, elaborou uma severa crítica ao fazer referência a uma
determinada visão, classificada por ele como imperialista, na qual o Direito
Internacional seria uma mera utopia e, conseqüentemente, as soluções para
quaisquer tipos de querelas internacionais deveriam ser resolvidas pelo
canhão. O autor considerava tal posicionamento, apesar de bastante comum
naquele contexto, altamente pessimista e impreciso
107
.
Suas críticas, após exposição de aspectos da história européia, em
particular do período bismarckiano, foram baseadas no fato de alguns
conflitos envolvendo a recém unificada Alemanha terem sido resolvidos nas
mesas de negociação e não nos campos de batalha. Essa tradição baseada em
uma “diplomacia sem canhões”, e que teria influenciado, segundo Pinto da
Rocha, explicitamente a diplomacia riobranquiana, seria contrária às ambições
imperialistas tornando-se fundamental para, doravante, consolidar os
princípios do Direito Internacional. Para o autor:
“O Direito Internacional pode ser violado ou desconhecido, sacrificado aos
interesses ou às paixões; mas nem por isso deixa de existir como princípio regulador
das relações entre os povos e encontra, finalmente, a sua sanção nas represálias que
experimentam, cedo ou tarde, aqueles que desprezam e sacrificam a severidade das
leis internacionais. A guerra será sem dúvida e por muito tempo ainda o recurso
extremo, mas se a arbitragem internacional puder alojar-se definitivamente entre os
costumes dos Estados, as soluções violentas, que estão bem longe de assegurar
sempre o triunfo do direito, serão evitadas, para o bem geral da humanidade. E as
nações confiando a uma terceira entidade, assim superiormente considerada pelos
107
Pinto da ROCHA. “O Barão do Rio Branco e o Direito Internacional”. Revista Americana,
abril de 1913. p 45
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contendores, a decisão da pendência, deixarão de ser juízes nas suas próprias
causas.”
108
Pinto da Rocha valeu-se dessa argumentação para enaltecer a trajetória
do Barão, afirmando ter sido ela baseada no respeito à moral existente nos
princípios norteadores do Direito Internacional. Tal respeito, base da ação
política de Rio Branco, foi possível na medida em que a República
brasileira foi proclamada, fato que possibilitou a superação do isolamento
imposto pelo Império.
Dando prosseguimento a sua análise, Pinto da Rocha defendeu a tese de
que com a República um novo horizonte se abriu para a diplomacia brasileira.
O Brasil, após se integrar no “amplo regime republicano que constitui a
atmosfera americana”, por meio das medidas de Rio Branco, rompeu com os
paradigmas isolacionistas da época anterior, construindo uma política de
aproximação no plano internacional. Convém salientar, entretanto que a
estratégia do Barão, para o autor, seguiu uma dupla perspectiva, a saber: antes
da aproximação com os vizinhos, havia sido necessário definir os limites
territoriais brasileiros. Nas palavras de Pinto da Rocha:
“O Chanceler eminente compreendeu que não podia ficar como o Prometeu da
lenda, amarrado ao cadeado constitucional, pelas correntes de uma pretensa
indissolubilidade territorial que, segundo alguns, o pacto fundamental da República
havia fixado com rematada imprudência, antes de saber positivamente até onde podia
chegar a soberania brasileira, nas linhas divisórias que ninguém havia
determinado.”
109
Convém salientar, no entanto, que não concordamos plenamente com as
posições de Pinto da Rocha, uma vez que este afirmou ter sido Rio Branco um
radical anti-belicista, um verdadeiro representante do não armamentismo,
condição que o colocaria, segundo o autor, na contra mão de sua época.
Discordamos na medida em que, conforme analisado, uma das preocupações
centrais do Barão, desde antes de se tornar Ministro das Relações Exteriores,
108
Ibid p 47. Segundo o autor, a diplomacia imperial, que teve no Barão de Cotegipe e no
Visconde do Rio Branco seus mais destacados estadistas, tinha a necessidade de se isolar do
restante das “Repúblicas vizinhas”.
109
Id Ibid
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169
era em relação à defesa nacional. Com base nos seus conhecimentos acerca da
história diplomática e militar brasileira, o Chanceler tinha convicção da
necessidade do reaparelhamento do Exército e, sobretudo, da Marinha
nacional, sem os quais, em sua opinião, o Brasil, devido à sua posição
geográfica no Continente, não poderia assegurar a sua paz, uma vez que o
“diplomata e o soldado são sócios”.
110
Neste sentido, tanto a logística das forças armadas, quanto a educação
cívica e militar do povo seriam fundamentais para o processo de construção da
soberania e da paz, uma vez que evitariam eventuais afrontas estrangeiras. O
rearmamento naval brasileiro atenderia questões referentes à segurança e
defesa do extenso litoral, bem como recolocaria a Marinha na sua antiga
função de preeminência que desfrutava no período imperial.
111
Apesar dessa ressalva fica evidente para nós a defesa, por parte de Pinto
da Rocha, tanto dos princípios do Direito Internacional Público, como
referência fundamental para as Relações Internacionais de então, quanto o
destaque ao momento histórico brasileiro com a consolidação da República.
Ambos os fatos convergiam para a aproximação entre as nações sul-
americanas, fato que deveria ser o pilar central para a diplomacia do
continente, constituindo-se no elemento chave da manutenção da paz .
Inserida nessa lógica de aproximação americana como estratégia para
garantir a paz continental, ganhou força a defesa de um equilíbrio entre as
nações sul-americanas, como forma de proteção contra ameaças externas. A
defesa desse equilíbrio na América do Sul explicitava, mais uma vez, a
importância da diplomacia nos processos de construção de uma nova ordem
continental Essa perspectiva assumira, desde fins do século XIX, um viés
110
Clodoaldo BUENO. O Brasil e sua política exterior. Op cit. p. 207 . Convém salientar que
nos projetos de construções nacionais República no Brasil, militares e diplomatas sempre
assumiram uma posição de “servidores” dos interesses da Nação. Sobre o papel assumido
pelos militares nos primeiros anos republicanos ver, entre outros, o trabalho de José Murilo de
Carvalho. Forças Armadas e política no Brasil. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2005.
111
Nesse ponto cabe ressaltar que a Proclamação da República representou uma acentuada
perda de prestígio por parte da Marinha do Brasil, tanto pelo fato dela não ter apoiado o
chamado Movimento Republicano, quanto por resistências políticas e até mesmo armadas,
como a Revolta da Armada, ocorridos nos anos seguintes à instalação do governo republicano
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170
diplomático, fundamentalmente pelo desenvolvimento de alianças
internacionais, vistas como um meio civilizador, principalmente por serem
compreendidas como instrumentos para evitar conflitos.
Um dos autores a defender tais premissas foi Francisco Félix Bayon,
que defendeu a idéia de que as alianças eram instrumentos fundamentais no
processo de consolidação da paz. Nas suas palavras, em artigo de 1910:
“As alianças consolidam a paz quando não se formalizam para conquistas
militares. É necessário selecionar o aliado e buscar na aliança o meio de evitar
conflitos. As alianças são um meio civilizador. O valor das alianças e a virtude de
sua gestão os estamos verificando todos os dias.
112
Para Bayon o estabelecimento de alianças seria premissa básica tanto
para que houvesse um equilíbrio interno no continente, impedindo possíveis
choques de interesses, entre as Nações sul-americanas, quanto para que a
América do Sul não sofresse com possíveis ameaças externas ao seu status
quo. O autor chama a atenção para a importância de se estabelecer um critério
doutrinário em questões internacionais, uma vez que faria parte do processo
histórico o anseio do mais forte dominar o mais fraco, sendo que cada povo,
cada Nação, sempre teria em mente tornar-se o mais forte com um claro
objetivo de dominação.
113
Algumas questões, segundo o autor, eram inerentes à formação da
América do Sul e deveriam estar na pauta de discussões do continente como
forma de impedir a instabilidade da região, garantindo, nesse sentido a paz
continental. Acerca dos pontos nevrálgicos do tema Bayon afirmava que:
“Os países que vivem no coração da América necessitarão aliviar suas dores;
os que possuem portos aspirarão a ampliar seus mercados; todos desejarão privilégios
aduaneiros; alguns necessitarão ajuda diplomática para debater suas questões: o
trânsito fluvial e terrestre reclamará correções, melhoras, tarifas diferenciais, etc., e o
continente inteiro terá necessidade de glória, de paz, de riqueza, de ilustração; e de
112
Felix BAYON. “Virtud de uma alianza em la Politica latino-americana.” Revista
Americana, setembro de 1910. Apesar de usar o termo América Latina, o autor faz referência
em seu artigo à América do Sul
113
Ibid p 318
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171
tudo isto não se poderá conseguir sem o culto das liberdades e da ordem, bases
iniludíveis da felicidade dos povos.”
114
Caberia à diplomacia estabelecer os parâmetros da política internacional
sul-americana, a serem reconhecidos e respeitados por todo o continente. As
alianças deveriam se consolidar enquanto prática diplomática a partir de
alguns elementos básicos neutralizadores de quaisquer receios existentes
entre vizinhos para evitar alarmes infundados e desconfianças, sendo
incentivadoras da paz e da defesa do Direito como instrumentos utilizados
para dificultar, ao máximo, guerras entre países americanos garantindo a
segurança continental contra as ameaças imperialistas européias.
115
Bayon, em outro ponto abordado em seu artigo, sinaliza para as
dificuldades das relações internacionais daquele período, fortemente marcado
pela corrida imperialista, que estava, entre outros aspectos, estabelecendo um
novo sentido para as estratégias diplomáticas. Tais estratégias baseavam-se
nas profundas rivalidades econômicas, assim como nos novos conflitos
geopolíticos, frutos de disputas territoriais. Logo, de acordo com o autor,
estava sendo construído um cenário internacional que, apesar da América do
Sul não fazer parte diretamente e, por conseguinte, a sua diplomacia não estar
envolvida, gerava uma nova era para a política internacional baseada, para o
imenso receio de Bayon, muito mais em intrigas e mesquinharias, do que em
aspectos relacionados à alta cultura e à moral política, que deveriam ser os
fundamentos básicos do jogo diplomático.
116
Esta aproximação diplomática marcava uma clara oposição em relação
à Europa, sinalizando para o perfil político, que representaria, para o autor, a
verdadeira tradição americana, de paz e equilíbrio entre suas nações com
valorização de tratados e alianças internacionais.
Próximo da argumentação de Bayon acerca da importância do
estabelecimento de alianças no processo de equilíbrio continental, encontram-
114
Ibid p 320
115
Id ibid
116
Id ibid
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172
se os artigos de Victor Vianna
117
que analisam o papel da “convenção de
arbitragem obrigatória” entre Argentina, Brasil e Chile que ficou conhecido
como Pacto ABC. O texto, escrito em plena Primeira Guerra, marca de
maneira explícita as diferenças entre a Europa, bélica e, portanto, propensa à
guerra e a América que apresentava uma clara tendência ao equilíbrio político,
sinalizado, naquele momento, pelo acordo entre as principais nações sul-
americanas. Segundo Vianna:
“Enquanto a Europa, apesar de sua cultura, é obrigada à Guerra, porque está
presa ainda a antigos preconceitos e a velhas aspirações, na América os povos que
não estão contentes de seu território são em número tão limitado que é possível
conseguir através de uma ação diplomática, serena e justa, que a paz do A.B.C se
desdobre pelo abecedário inteiro. Os internacionalistas e os antigos pacifistas
encontrarão nos artigos da convenção motivos para exclamações de
contentamento.”
118
Convém salientar que Vianna, ao longo de sua argumentação, não
associa a paz do continente americano ao tratado
119
e sim ao fato da América
possuir uma espécie de vocação pacífica, fruto de sua história. De acordo
com o autor não haveria conflito por não ser interesse do povo americano,
uma vez que qualquer tipo de tratado entre nações tem a possibilidade de
cumprimento quando a guerra não for possível. Essa premissa é destacada
pelo autor que afirma serem as terras americanas caracterizadas pela
cooperação e pela ausência de hostilidades.
120
Portanto, a guerra, para Vianna seria algo distante não necessariamente
pelos mecanismos de arbitragem, mas pela tradição americana. Mais uma vez
acentuavam-se as diferenças entre a Europa e a América. De acordo com
Vianna: as convenções, convênios e tratados não teriam valor pelo que eles
determinavam como obrigação, uma vez que efetivamente eles não obrigariam
117
Victor VIANNA. “A política internacional”. Revista Americana, junho de 1915.
118
Ibid p 68
119
Em uma primeira leitura poderíamos associar essa visão ao fato do Tratado, apesar de
assinado após alguns anos de negociação, não ter sido ratificado. No entanto o que se observa
é uma inversão de análise proposta pelo autor
120
Victor VIANNA. “A política internacional”. Revista Americana, junho de 1915. p 69
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173
a nada. Seu verdadeiro valor encontrar-se-ia inserido no estado de alma que
representavam. Nessas representações residiria seu grande valor.
A convenção, em síntese, para o autor, proclamaria, anunciaria,
exprimiria um estado de alma, de fraternidade, de compreensão, de boa
vontade, diferenciando-se da Europa que, naquele momento vivia a maior
guerra da história, enquanto a Argentina, o Brasil e o Chile (o ABC)
expressavam, de acordo com Vianna, a sua nas harmonias dos seus
interesses e de suas aspirações e asseguravam, de acordo com a sua prática
diplomática, que, em caso de conflito, optariam pela arbitragem à guerra. Nas
palavras do autor:
“Nós outros, críticos de fatos sociais, sabemos que não conflito, não pode
haver justamente porque não conflitos sérios que mereçam o sacrifício da guerra.
Mas por isso mesmo saudamos com alegria o pacto que confirma, assinala
oficialmente o estado de alma dos sul-americanos.
121
Na continuação do artigo, na segunda quinzena de junho de 1915,
Vianna continua a desenvolver sua linha de raciocínio argumentando acerca
da importância, para a política internacional da época, do exemplo dado pela
América do Sul. Também salienta a necessidade de existir uma ação
diplomática, coerente, justa e equilibrada, para garantir o êxito de quaisquer
tipos de tratados internacionais, sobretudo, os referentes a mecanismos de
arbitragens, tendo em vista que nas relações entre Estados haveria sempre,
obrigatoriamente, a necessidade de se respeitar as soberanias nacionais.
Diante dessa linha argumentativa, a defesa dos institutos de
arbitramento ganhava cada vez maior visibilidade no contexto das relações
internacionais, justamente como estratégia de manutenção da paz. Esta prática
era defendida, conforme afirmado, como inerente à uma pretensa tradição
sul-americana que, naquele momento com a eclosão da Primeira Guerra
Mundial deveria ganhar uma relevância ainda maior no cenário mundial
A importância da arbitragem para as relações internacionais naquele
momento foi igualmente destacada por Vianna, então Professor da
121
Ibid pp 70 - 71
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174
Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro, que em artigo
publicado em francês
122
, em fevereiro de 1917, defende o princípio da
arbitragem como modelo que deveria ser utilizado de forma perene,
obrigatório e universal, pois seria uma prática que ao evitar a guerra
garantiria, em definitivo, a paz. É importante frisar que Vianna, com evidente
entusiasmo, destaca a importância que, historicamente, a América do Sul
concedeu aos tratados de arbitragem, negociados e concluídos desde os
processos de independências nas primeiras décadas dos oitocentos e que
teriam sido a base da diplomacia do continente notabilizando-se, nas palavras
do autor:
“como uma característica permanente e obrigatória, não como um simples
compromisso, mas como principio orgânico de uma concepção política ampla e
complexa que os Estados Americanos haviam imaginado para garantir contra os
ataques da ex- metrópole espanhola”
123
Convém salientar que tal visão de Vianna carrega em si elementos
que evidenciam de forma bastante clara a época na qual o texto foi produzido.
Em primeiro lugar não podemos perder de mente que o artigo foi publicado
durante a Primeira Guerra Mundial, período, conforme já analisado, que
acirrou uma série de questões, sobretudo no que tange a valorização da
América em relação à Europa. No campo das relações internacionais tal
processo caminhou no sentido da defesa dos princípios ligados ao Direito
Internacional e, conseqüentemente da atuação da diplomacia como
instrumento de manutenção da paz.
A elaboração de uma moral própria da América que, para aquela
geração de diplomatas/intelectuais, explicaria a paz continental, fato que a
colocaria como exemplo a ser seguido pela Europa, mergulhada em grave
conflito bélico, passou a ser a bandeira de luta dessa intelectualidade
americana como forma tanto de construção de uma identidade americana, em
especial na parte sul do continente, e que passaria pelos princípios de
solidariedade e intercâmbio, tão presentes entre os articulistas da Revista,
quanto pelo reconhecimento externo do continente que deveria ser visto como
122
Sá VIANNA. “L’Arbitrage au Brésil”. Revista Americana, fevereiro de 1917.
123
Ibid p 19
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175
algo coeso e equilibrado, sem guerras, fato que o diferenciaria das outras
regiões do Globo.
Tais premissas nos permitem compreender uma leitura que permitia
valorizar o continente americano como defensor da arbitragem como
instrumento de negociação internacional, fato que o colocaria , desde os seus
primórdios, como um baluarte da paz, contrário à guerra. O instituto da
arbitragem seria um marco fundamental dessa diferenciação uma vez que ela,
mesmo tendo sido, para Vianna, pilar da política americana, somente aos
poucos foi se universalizando e se consolidando nas relações internacionais.
Nas palavras do autor:
“De um uso pouco freqüente ela passa a ter aplicação constante; de uma
simples tentativa onde os efeitos reais eram muito problemáticos, para evitar a
guerra, ela se torna o meio considerado quase único para a manutenção definitiva da
paz; de simples questões acidentais e secundárias, a arbitragem estendeu sua ação
civilizatória e humanitária a questões da maior gravidade e de uma importância vital;
de um tema de doutrina de caráter jurídico, objeto de estudo de professores e
publicistas, ele se transforma em uma matéria de natureza política, preocupação de
homens de Estado; de uma manifestação tímida e fugaz de sentimentos pacifistas de
certos gabinetes ministeriais, ele se transforma numa afirmação positiva do
pensamento dos governantes concretizada em numerosos diplomas internacionais;
exercida inicialmente por alguns Estados, ela passa a ser universalmente praticada; de
facultativa ela se torna obrigatória; de limitada ela se torna muito ampla; de possível
necessária.”
124
A América como exemplo a ser seguido também foi base de
argumentação para J.C Gomes Ribeiro. Em artigo intitulado “As fronteiras do
Brasil” afirma ser necessário o estabelecimento de uma “era de solidariedade,
entre as nações sul-americanas” que deveria se ligar com a criação de um
Direito Internacional exclusivo da América, tendo como princípio
fundamental, a fórmula decisória das questões de limites com base em
recursos da arbitragem internacional
125
.
Com o claro objetivo de legitimar seus argumentos, Gomes Ribeiro
realiza uma detalhada análise histórica acerca do processo de delimitação das
fronteiras ao longo do período imperial brasileiro, destacando o que ele
124
Ibid p 18
125
J. C. Gomes RIBEIRO. “As fronteiras do Brasil”. Revista Americana, março de 1917.
Houve continuação em abril e junho do mesmo ano.
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176
considerava serem os princípios gerais da diplomacia brasileira do Império: o
Uti Possidetis e o respeito aos tratados firmados entre Portugal e Espanha à
época colonial, quando não contrariassem os fatos da possessão e
esclarecessem dúvidas resultantes da falta de ocupação efetiva.
Gomes Ribeiro demonstrou, nesse artigo, uma preocupação em definir o
termo fronteira em um sentido jurídico mais tradicional associando-o tanto ao
que se refere às questões políticas entre vizinhos quanto ao reconhecimento
interno do território. Para o autor:
“o limite territorial das nações, a linha de contato das jurisdições de cada uma
delas, interessando portanto, profundamente, o seu conhecimento cabal, o aos
Estados limítrofes como também, individualmente aos cidadãos de qualquer deles,
em razão da multiplicidade de fatores sociais e políticos que de fronteira decorrem,
na ordem institucional, na penal, na administrativa, na comercial e sobretudo na
estratégica.”
126
Outro autor que realiza contundente defesa do instituto do arbitramento
foi Clóvis Beviláqua que no artigo “Pensamentos da Paz Aspirações de
Justiça, de 1918”
127
, defende a utilização, de maneira obrigatória, do
arbitramento como solução de litígios internacionais. Entretanto, o autor
sinaliza para qual direção as práticas de arbitragem deveriam caminhar para se
tornarem efetivamente eficazes, a saber: elas deveriam ser obrigatórias;
deveriam ser aplicadas a todas as questões existentes entre Estados, exceção
feita às questões relacionadas à ordem constitucional interna e deveria haver
mecanismos para garantir a execução da sentença arbitral.
128
Beviláqua estabeleceu uma analogia entre os Tribunais Arbitrais e o
Poder Judiciário dos Estados Nacionais. Sua linha de raciocínio consistia no
fato de que a ordem interna de cada Nação se relacionava diretamente com a
legitimidade que cada Poder, entre eles o Judiciário, possuía, ou seja, com a
capacidade que cada um dos poderes tinha em se fazer respeitar pela sua
sociedade. Logo, o primeiro passo para o bom funcionamento da arbitragem
126
Ibid p 106
127
Clovis BEVILAQUA. “Pensamentos da Paz – Aspirações de Justiça” . Revista Americana,
outubro de 1918.
128
Ibid p 51
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177
seria o estabelecimento de uma, incondicional, obrigatoriedade quando da
convocação de uma Nação, por um Tribunal Arbitral. Em caso de recusa, o
autor estabelecia uma série de mecanismos que deveriam ser cumpridos pela
comunidade internacional: o primeiro passaria pela ruptura das relações
diplomáticas; caso isto se mostrasse ineficiente, o segundo passo seria o
isolamento comercial e, por fim, caso não apenas ele recusasse o arbitramento,
mas também abusasse da sua força sobre Estados mais fracos, seria
imprescindível uma retaliação como forma de garantir a paz da referida
região.
129
Há que se ter em mente que para Bevilaqua essa possibilidade de
intervenção deveria sempre ser “muito bem analisada”, uma vez que, em
hipótese alguma poderia se sobrepor, bem como o próprio mecanismo do
arbitramento, à ordem constitucional interna
130
, pois esta deveria ser sempre
respeitada por todos os outros, sendo que essa respeitabilidade passaria,
obrigatoriamente, pela não submissão às autoridades estrangeiras.
131
Entre os artigos analisados nesta parte do capítulo podemos observar
que o elemento aglutinador de todos os autores reside na valorização de uma
moral americana pautada na defesa de princípios e valores associados à
implantação e/ou manutenção dos ditames de um Direito Internacional
Público que teria no corpo diplomático a instituição que seria responsável pela
sua aplicação e, portanto, peça chave para estabelecer quais os paradigmas
deveriam ser seguidos pela América do Sul no alvorecer do século XX.
129
Ibid p 54
130
Tal questão é de fácil compreensão ao observarmos a trajetória de Clóvis Bevilaqua
enquanto notório jurista defensor da Constituição e principal compilador e comentador do
Código Civil Brasileiro de 1916.
131
Clovis Bevilaqua “Pensamentos da Paz Aspirações de Justiça”. Revista Americana, Op
cit, p 54. Interessante notar que quando comparamos os artigos de Beviláqua sobre o tema
percebemos uma maior defesa das soberanias nacionais nesse artigo de 1918. Sem nos
aprofundarmos em tal questão, é possível pensar que a eclosão da Primeira Guerra exigiu a
flexibilização de certos posicionamentos evidenciados nos artigos do referido autor.
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178
4.5
Em busca de uma síntese
A análise dos conceitos apresentados neste capítulo nos permite afirmar
que os articulistas da Revista Americana defendiam, mesmo com divergências
de opiniões em alguns pontos, o respeito aos princípios gerais do Direito
Internacional, como forma de se estabelecer uma moral americana que deveria
servir de exemplo para os outros continentes, associada à discussão acerca de
temas como soberania e hegemonia que nos remetem á questão das fronteiras,
elemento primordial na construção de qualquer projeto nacional.
Paralelamente, nas argumentações realizadas, evidenciou-se a importância
fundamental concedida à diplomacia como responsável pela legitimação de
tais projetos.
Logo, o ponto central do que denominamos como viés diplomático da
Revista nos remete a valorização do continente americano como uma região
que reunia condições para se inserir em posição bastante favorável no novo
concerto internacional que naquele momento se desenhava.
Para tal, a síntese intelectual do periódico, isto é, o argumento que de
certa forma norteia a publicação transformando-a em uma comunidade
argumentativa, é a elaboração de um ideário americano, baseado no
intercâmbio e na cooperação entre as nações americanas, capitaneadas pela
diplomacia do continente. Fato relevante, pois a observação e legitimação do
que poderíamos definir como sendo a singularidade americana seria o
caminho que aquela geração diplomática/intelectual ofereceu como legado
para seus sucessores, tendo sido sistematizado no Brasil, pela primeira vez, na
Revista Americana, que tinha como objetivo explícito, estabelecer os
parâmetros de aproximação entre as nações americanas.
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179
Esse ideal americano pode ser observado em vários autores. Arthur
Orlando
132
,aponta para o que ele definiu como sendo “um caráter americano
próprio” marcado por um conjunto de Estados que respirariam uma mesma
atmosfera política, aspirando, por conseguinte, um mesmo ideal, que “age
iluminando e ilumina agindo”, um exemplo para todos, na medida em que
para Orlando esse ideal teria a função básica de:
“harmonizar o nacionalismo e o humanismo, as duas grandes forças, a que no
mundo físico, correspondem a atração e a repulsão, os Estados que forem envolvidos
em sua órbita nada sofrerão em sua autonomia, independência e integridade.”
133
Victor Vianna ressalta a tradição pacifista americana, como sendo o
pilar central do continente e o marco fundamental de diferenciação em relação
à Europa. Para o autor, na América, em especial a do Sul, não poderiam
sobreviver os ódios e as sedições comuns ao continente europeu, uma vez que
os povos se entrechocaram na disputa de territórios, fenômeno que gerou
enorme rancor e feridas abertas que poderiam ser resolvidos por meio de
conflito armado. Em última análise o processo histórico europeu definiu uma
tradição, pautada em ideais nacionalistas e teorias de domínio, que levara o
Velho Mundo à Guerra.
134
a América representaria o novo, a mudança, a busca de uma nova
tradição baseada em uma releitura dos princípios europeus em que os
preconceitos foram desaparecendo diante das necessidades americanas.
Vianna, mesmo reconhecendo que houve desafios e tensões que resultaram
em guerras no Novo Mundo, relativiza-os afirmando terem sido muito mais
guerras civis do que guerras internacionais. Paralelo a isso, afirmava que esses
embates não resultaram em tensões permanentes e rancores entre as nações e
caso houvesse algum tipo de instabilidade a diplomacia do continente
132
Arthur ORLANDO. “Educação Internacional Americana.”. Revista Americana, Op cit
133
Ibid p 351
134
Victor VIANNA. “A Política Internacional.” Revista Americana. , junho de 1915. p 66
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180
resolveria tais pendências, pois a vocação americana seria a da estabilidade
promovida e garantida pela ação diplomática.
135
Fica bastante evidente que esse projeto, defendido nas páginas da
Revista Americana merece todas as relativizações e críticas, na medida em
que era notória, conforme visto no nosso primeiro capítulo, a existência de
uma rivalidade sul-americana, principalmente, mas não unicamente entre os
“três grandes” do continente.
Entretanto, o que para nós se torna peça chave para a compreensão do
projeto da Revista e, em última análise, da própria retórica da diplomacia
brasileira e sul-americana nas duas primeiras décadas do século XX, era a
necessidade de se estabelecer, muito mais do que um diagnóstico preciso da
realidade, desenvolver um prognóstico, um projeto de futuro que deveria ser
construído, com uma América muito mais do que real, uma América possível,
uma América imaginada.
Essa perspectiva, mais uma vez nos remete à nossa crítica aos trabalhos
existentes sobre a Revista que tendem a enxergá-la unicamente como um mero
reflexo, uma reprodutora das opiniões do Barão e, por conseguinte, do
Itamaraty, ou seja, um simples instrumento propagandístico. Aceitar tal
assertiva é trabalhar com a perspectiva que o projeto da diplomacia brasileira,
na recém proclamada República, estava acabado, bem como a aproximação,
entre os vizinhos, plenamente estabelecida.
Ficou evidente para nós que os artigos da Revista Americana expressam
uma determinada leitura acerca de qual papel deveria assumir a diplomacia
brasileira na nova cena política que naquele momento estava sendo
construída, tanto em nível externo, com o novo concerto das nações no
contexto da Primeira Guerra Mundial, quanto internamente com a
consolidação da ordem republicana na qual o Itamaraty e, conseqüentemente,
a diplomacia brasileira buscava seu espaço. Em ambas as perspectivas havia a
valorização de uma aproximação entre as nações americanas como mote para
a construção de uma nova ordem continental que passaria pela construção de
135
Ibid pp 68 e 69
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181
mecanismos de soluções de conflitos fronteiriços por meio de uma moral
americana pautada em um conjunto de normas que garantiriam a paz e o
equilíbrio entre as nações.
A Revista Americana apresentou uma preocupação constante em
reforçar a importância de se pensar uma integração continental por meio da
geração de mecanismos para incrementar o conhecimento entre as nações sul-
americanas, para que fosse superado o isolamento entre elas através da
construção de projetos culturais para o continente a partir do reconhecimento
de especificidades da América do Sul. Dentre os autores que mais se
destacaram na defesa dessa premissa esteve Félix Bayón
136
que acreditava não
poder haver união sem conhecimento mútuo.
Nesse sentido, o autor propôs uma série de maneiras para aproximar,
intelectualmente, os povos americanos. A primeira estratégia seria o
estabelecimento de convênios intelectuais e sociais, que teriam como objetivo
verificar as opiniões, próximas e diferentes a fim de elaborar uma identidade
cultural americana acerca de temas contemporâneos.
Corroborando com essa perspectiva, a imprensa deveria ser um agente
divulgador das idéias intelectuais, bem como os governos e particulares
deveriam incentivar a publicação de livros como instrumentos de reflexão e,
sobretudo, de aproximação entre grupos intelectuais e nações.
Ligando-se a tais estratégias de estreitamento, legações diplomáticas
seriam os órgãos responsáveis pelo estabelecimento de relações intelectuais
internacionais, articulando as visitas que seriam, juntamente com o incentivo à
criação de revistas mensais que versariam acerca dos problemas e das
manifestações culturais do continente, a base do intercâmbio intelectual da
América do Sul.
Convém salientar que tal intercâmbio deveria ser conduzido pelo corpo
diplomático, grupo que reuniria as condições, morais e culturais necessárias,
para elaborar as novas diretrizes continentais. Nas palavras de Bayon:
136
Felix BAYON. “Solidaridad Intelectual”. Revista Americana, dezembro de 1909.
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182
“É necessário, então, que os intelectuais americanos cooperem para a
realização sublime do ideal de solidariedade, buscando na diplomacia o melhor dos
meios de união e de amor sem que se sacrifiquem nem a honra nem a soberania
nacional.”
137
É interessante notar, conforme visto na nossa introdução e no nosso
primeiro capítulo, que essa preocupação seria o pilar central da Revista
Americana, tendo sido expressa nos editoriais, na seção “notas” e na seção
“bibliografia”. Nesse sentido, é possível afirmar que o periódico foi, no caso
da diplomacia brasileira, uma primeira tentativa de se criar uma teia cultural
na qual se visava estabelecer parâmetros para se pensar o continente, relendo
o passado histórico, à luz dos interesses do presente, mas, principalmente,
indicando possíveis caminhos a serem construídos no futuro. Portanto, é
possível colocar a Revista como um exemplo efetivamente pioneiro da
diplomacia cultural brasileira, um marco inicial de uma estratégia que se
consagrou ao longo do século XX.
137
Francisco Felix BAYON. “Virtud de uma Alianza em la política latino-americana”.
Revista Americana, setembro de 1910.
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5
Conclusão
Vários trabalhos
1
salientaram o papel desempenhado pelo corpo
diplomático bem como, em última análise, o papel histórico da diplomacia,
nos processos de construções nacionais tendo em vista a destacada e
fundamental importância desses profissionais, ao longo da História dos
últimos séculos, sobretudo na definição dos limites territoriais dos Estados
Nacionais.
No tenso contexto do alvorecer do século XX, os posicionamentos dos
analistas sobre o período, variam desde a consideração da diplomacia como
um instrumento de civilização regulador das relações internacionais servindo
como instituição responsável pela defesa das nações menos poderosas,
passando por elemento estratégico de expansão comercial e negociadora em
situações extremas de conflito armado, promovidas, fundamentalmente, pelas
nações centrais da economia capitalista.
Nos debates da Revista Americana ficava latente a necessidade de se
pensar um determinado projeto para as Américas em um contexto de evidente
tensão entre uma ordem internacional, ainda vigente, baseada no princípio
“hobbesiano-vestfaliano” e a gênese de um novo sistema internacional que
viria a se consolidar após 1945, com a “era da política mundial.”
2
Uma
época, portanto, de transição, de crise de valores e de paradigmas, que trazia
consigo um enorme desafio para aquela geração intelectual: o de compreender
um mundo em constante mudança sem referências consolidadas.
O grande lance da Revista foi valorizar a diplomacia e indicar caminhos
para o Brasil e a América do Sul, que deveriam ser trilhados, construídos. Ao
1
Conforme visto no nosso primeiro capítulo
2
Sobre isso ver, entre outros G. BARRACLOUGH. Introdução à História Contemporânea.
Rio de Janeiro, Ed Zahar, 1976; Willians GONÇALVES. Relações Internacionais. Rio de
Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2002. Robert JACKSON e Georg SORENSEN. Introdução às
Relações Internacionais. Jorge Zahar Editor, 2007.
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se perceber as estratégias e os rumos do Itamaraty nas décadas posteriores à
publicação do periódico, fica claro qual o maior legado da Revista Americana.
Ela representou a primeira experiência brasileira do que se denominou,
posteriormente, “diplomacia cultural”, articulada a um projeto de aproximação
sul-americana. Capitaneada pelos corpos diplomáticos do continente, tal
política baseou-se na elaboração de uma moral e uma cultura próprias, da e
para a América do Sul, a partir de articulações entre conceitos que se
mostraram bastante caros para o debate diplomático e intelectual sul-
americano da época, tais como: o pan-americanismo e a arbitragem na questão
de limites territoriais.
Corroborando essa perspectiva, aspectos presentes na própria
estrutura da Revista que apontam para essa aproximação entre as nações sul-
americanas. Nesse particular devemos, inicialmente, destacar a lógica
divulgadora explicitada pelo próprio periódico, especificamente nas seções
denominadas “Bibliografia”, que consistia em uma espécie de boletim acerca
dos livros que chegavam ao conhecimento da redação, na seção “Revistas”
que consistia em resenhas de alguns periódicos publicados na América e na
Europa e, finalmente, na seção “Notas” direcionada aos leitores versando
sobre assuntos diversos, com especial destaque para resenhas críticas sobre
publicações a respeito da própria Revista Americana.
Outrossim, encontramos textos de caráter mais literário, versando desde
a história da literatura e da crítica literária propriamente dita, até a poesia e a
ficção. A maioria desses textos trazia consigo uma preocupação em divulgar
elementos culturais, históricos e sociológicos, das várias nações da América
do Sul, presentes no debate intelectual desde o último quartel dos oitocentos.
Um aspecto que merece destaque era o sentimento de americanidade
que ganhava relevo, em diversas publicações que simultaneamente à defesa
da pátria, da integridade territorial e da soberania nacional, projetavam a
defesa de um ideal americano, especialmente em artigos que versavam sobre
temas diplomáticos.
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Vários textos de história e critica literária apresentavam a clara função
de informar ao leitor do periódico as diversas manifestações culturais de parte
de América do Sul, em especial as do Brasil e Argentina, com algum destaque
para o Chile, Uruguai e Peru, permitindo um maior conhecimento da literatura
dos vizinhos, mas, igualmente, atualizando e incentivando a reflexão sobre as
culturas políticas presentes, com o objetivo de valorizar as semelhanças entre
as nações acima citadas.
Interessante perceber que a valorização dos aspectos em comum das
nações sul-americanas foi bastante marcante no periódico. Podemos afirmar
que a Revista tinha a preocupação em salientar tudo aquilo que poderia
promover a aproximação entre as nações, associada com a defesa da tese, -
conforme visto-, de que a América era um continente de paz
3
. Logo, não
haveria espaço para grandes divergências entre os países, bem como para
relatar tensões sociais e crises políticas do continente. Tal fato ajuda a
entender algumas ausências ‘deliberadas” como debates acerca da Revolução
Mexicana
4
e sobre movimentos insurrecionais ocorridos no Brasil como a
Revolta da Chibata por exemplo.
Dentre os textos que abordaram aspectos da literatura Hispano-
Americana, com especial destaque para aqueles relacionados à história e à
sociedade destacam-se: “Literatura Colonial del Peru”,de Carlos Wiesse
5
,
“Ojeada sumaria sobre la literatura chilena”, de Agustín Cannobio
6
, “Historia
de la literatura Argentina”, de Enrique Garcia Velloso
7
e “La literatura
uruguaya” (1757-1917), de Ventura Garcia Calderón e Hugo D. Barbagelata
8
.
Principalmente os dois últimos, longos e detalhistas, buscam estabelecer um
3
Uma dessas aproximações, considerada por nós pedra de toque para se compreender o
projeto da Revista relacionava-se com a valorização da Proclamação da República brasileira,
considerado por alguns como o responsável pela superação das diferenças existentes entre as
nações sul-americanas.
4
A Revolução Mexicana foi tema apenas mencionado por alguns articulistas.
5
Carlos WIESSE “Literatura Colonial del Peru”. Revista Americana, setembro de 1910.
6
Agustín CANNOBIO “Ojeada sumaria sobre la literatura chilena” Revista Americana,
setembro de 1909
7
Enrique Garcia VELLOSO. “Historia de la literatura Argentina”. Revista Americana, janeiro
de 1911, tendo sido publicado, de forma não contínua, até 1913.
8
Ventura Garcia CALDERÓN e Hugo D. BARBAGELATA. “La literatura uruguya” (1757-
1917). Revista Americana, novembro de 1918.
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panorama bastante completo das literaturas de Argentina e Uruguai, cobrindo
um recorte cronológico bastante significativo.
Encontramos ainda nessa perspectiva divulgadora de aspectos da
literatura os trabalhos de Silvio Romero: “Quadro da evolução da literatura
brasileira”; “História da Literatura brasileira”; “Da crítica e sua exata
definição” e o “Brasil social”
9
. De José Veríssimo foram publicados: “O
movimento literário de 1910” ; “Noticias de alguns livros do ano passado” e
“Evolução literária no Brasil”
10
.
O interesse em divulgar questões do meio intelectual sul-americano,
aparece em obras como: “Solidariedad Intelectual de América” e
“Intelectuales latinoamericanos”, de Félix Bayon
11
; “La intelectualidad en
Chile”, de Pedro Pablo Figueroa
12
; “Porvenir cultural de América”, de Luis
Arquisám
13
e “Poetas brasileños actuales”de Manoel Benavante.
14
Aspectos artísticos e de cultura popular sul-americanos foram, embora
com menor ênfase, igualmente apresentados na Revista. Trabalhos referentes
aos legados das culturas pré-colombianas, indígenas e, até mesmo ao folclore
nos diferentes países, tiveram algum espaço no periódico, fato que revela certa
preocupação com as respectivas identidades culturais sul-americanas e o papel
do popular nas mesmas. Dentre os artigos que foram publicados com essa
perspectiva temos: “Civilizacion preincaica”, de Carlos Wiesse
15
; “Las
lenguas indígenas de la cuenca del Amazonas y del Orinoco”, de Rodolfo
9
Silvio ROMERO. “Quadro da evolução da literatura brasileira” Revista Americana, janeiro
de 1910. ;História da Literatura brasileira” Revista Americana, julho de 1913 ; “Da crítica e
sua exata definição”, Revista Americana, novembro de 1909, e o Brasil social”, Revista
Americana , janeiro de 1912 e edições seguintes
10
José VERÍSSIMO. “O movimento literário de 1910”. Revista Americana, abril de 1911;
“Noticias de alguns livros do ano passado”, Revista Americana, maio de 1912 ; e “Evolução
literária no Brasil”, Revista Americana, maio de 1913.
11
Félix BAYON. “Solidariedad Intelectual de América”. Revista Americana, dezembro de
1909. ; “Intelectuales latinoamericanos”. Revista Americana, abril de 1910.
12
Pedro Pablo FIGUEROA. “La intelectualidad en Chile”. Revista Americana, fevereiro de
1910.
13
Luis ARQUISÁM. “Porvenir cultural de América”. Revista Americana, janeiro de 1913.
14
Manoel BENAVANTE. Poetas brasileños actuales”. Revista Americana, setembro de
1919.
15
Carlos Wiesse. “Civilizacion preincaica”. Revista Americana, abril de 1910.
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Schüller
16
; “Lendas del diabo”, de Fabio Luz
17
; “O engenho do tinhoso:
lendas da serra e da baixada”, de Salvador de Mendonça
18
; e “El folk lore
argentino: importância de su estúdio”, de Adán Queiroga.
19
A busca de um ideal americano era preocupação de vários autores e, em
nossa opinião, serviu de base para o projeto da publicação. Daí sua
importância para a análise dos intelectuais que formaram as fileiras da
diplomacia sul-americana, em especial a brasileira nos primeiros anos dos
novecentos e que serviram de base para o pensamento e a ação diplomática
nas décadas seguintes.
Em relação aos diplomatas brasileiros não podemos nos esquecer que na
sua esmagadora maioria eles foram oriundos, nesse inicio de período
republicano, das fileiras da Monarquia. Pensar essa transição da Monarquia
para a República é chave compreendermos as estratégias empreendidas pelo
corpo diplomático e, em última análise, pelos argumentadores da Revista
Americana. Não concordamos com os que tendem a colocar a diplomacia
brasileira como herdeira nostálgica da época do Império. Acreditamos que ela
assumiu um novo papel na ordem republicana se reconhecendo como parte de
um grupo de nações que apresentava os requisitos necessários para conduzir
um determinado projeto político e cultural responsável pela criação e,
posteriormente, a consolidação de uma pretendida tradição republicana nas
relações internacionais ao longo do século XX. Tradição esta que foi iniciada
e anunciada precocemente nas páginas da Revista Americana.
Não podemos esquecer que foi justamente ao longo do século passado
que o Itamaraty estabeleceu uma política institucional de formação
permanente de quadros com a consolidação da profissionalização da carreira
diplomática. Data do período imediatamente posterior ao fim da publicação da
16
Rodolfo SCHULLER “Las lenguas indígenas de la cuenca del Amazonas y del Orinoco”.
Revista Americana, março de 1911 e edições seguintes.
17
Fabio LUZ. “Lendas del diabo”. Revista Americana, março de 1911.
18
Salvador de MENDONÇA. O engenho do tinhoso: lendas da serra e da baixada”. Revista
Americana, junho de 1911.
19
Adán QUEIROGA. “El folk lore argentino: importância de su estúdio”. Revista
Americana, junho de 1918.
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Revista, anos 20 e 30, o início dessa preparação sistemática para a formação
efetiva de um corpo diplomático, uniforme e, principalmente, altamente
qualificado, sobretudo nos campos da História, da Geografia e do Direito,
além, obviamente, das questões internacionais, tanto para representar o Brasil
no exterior, quanto para legitimar, internamente, as ações do Ministério. Nesse
cenário, edificou-se a criação do Instituto Rio Branco que, a partir dos anos
40, tornou-se o órgão responsável, por excelência, pela formação do corpo
diplomático brasileiro.
Pensar o periódico como uma comunidade argumentativa nos permitiu
observar os debates apresentados, os conceitos trabalhados, enfim, os atos de
fala, que ganharam significação crescente no futuro, em função dos rumos
tomados pela diplomacia brasileira e sul-americana.
A defesa de princípios como o de cooperação e intercâmbio entre as
nações da América do Sul, de um lugar próprio no concerto das nações, de
uma identidade única, de uma moral específica, de princípios jurídicos
próprios e modelares para uma nova ordem continental e internacional são os
elementos que informaram a atuação dos intelectuais na Revista Americana.
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Lista de artigos publicados por edição da Revista Americana
Outubro de 1909. Volume 1 nº 1
Joaquim Nabuco _________ Parte da América na Civilização
Oliveira Lima __________ O movimento de Independência do Brasil
B. Vicuña Subercasseaux ____ La originalidad de los Estados Unidos
Helio Lobo _______________ George Canning ou James Monroe?
A.G.de Araújo Jorge ________ Euclydes da Cunha
Delgado de Carvalho _______ Política Exterior
Novembro de 1909. Volume 1 nº 2
Silvio Romero ______________ Da critica e sua exacta definição
Ramón J. Carcano ___________ La diplomacia de la triple alianza – El Baron
de Cotegipe y Manuel Quitana
Agustín Cannobio ___________ Ojeada sumaria sobre la literatura chilena
Dezembro de 1909. Volume 1 nº 3.
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207
Araripe Junior ______________ A doutrina de Monroe
Euclydes da Cunha __________ Da Independência à República (uma gina
de História do Brasil )
Francisco F. Bayón __________ Solidaridad intelectual de Hispano-América
A.G. Araújo Jorge ___________ O reconhecimento da República do Brasil
(1889-1891)
Delgado de Carvalho _________ O fracasso de uma aliança em 1869
Janeiro de 1910. Volume 2 nº 1
Araripe Júnior __________ A doutrina de Monroe (cont)
Ramón J. Carcano _______ Golpe de Estado Del Presidente Rivarola
Dissolución del Congreso Paraguayo
Euclydes da Cunha ________O reconhecimento da República do Brasil (
1889-1891) (cont)
Arthur Briggs ____________ Extradição do Nacional
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208
Fevereiro de 1910. Volume 2 nº 2
Dunshee de Abranches _____ O Brasil perante a Doutrina Monroe
A.G, Araújo Jorge _________ A Ilha de Trindade Incidente anglo-
brasileiro
Pedro Pablo Figueroa _______ La intelectualidad em Chile
Março de 1910. Volume 2 nº 3
Domicio da Gama __________ Joaquim Nabuco
Ramón J. Carcano __________ Relaciones internacionales el critério
argentino
tradicional.
Arthur Orlando ____________ Educação internacional americana.
Carlos Porter ______________ Estado actual de las ciências antropológicas
en Chile
A.de A. Mello Carvalho _____ A graphia de Brasil
Juan Bautista de Lavalle _____ Joaquim Nabuco – orador y publicista.
Abril de 1910. Volume 3 nº 1
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209
Oliveira Lima _____________ Do reconhecimento à abdicação uma
página de história diplomática.
A .G. Araújo Jorge _________ O ultimo livro de Euclydes da Cunha
Francisco Félix Bayon _______ Intelectuales latino-americanos.
Prado Sampaio _____________ A literatura como creação humana e
manifestação social
José Oiticica _______________ Como se deve escrever a História do Brasil.
Maio de 1910 . Volume 3 nº 2
Joaquim Nabuco ____________ A aproximação das duas Américas
Juan Bautista da Lavalle ______ El programa de la Cuarta Conferencia
Internacional Americana – Buenos Ayres – 1910
Alfredo de Carvalho __________ Um companheiro de Bolívar o General
Abreu e Lima
Alberto Nin Frias ____________ Comparaciones entre los Estadoa Unidos y
la América Latina
Helio Lobo _________________ A Assembléa do Isthmo ( Uma pagina de
historia diplomática americana)
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B. Vicuña Subercasseaux ______ Literatura americana
A.G. Araújo Jorge ___________ O litígio anglo-argentino sôbre as Ilha
Malvina – ( À margem do livro de Pual Groussac )
J José Oiticica ________________ Como se deve escrever a História do Brasil
(cont)
Junho de 1910. Volume III. nº 3
Clovis Bevilaqua ____________ A modificação das fronteiras entre o Brasil
e o Uruguay perante o Direito Internacional e a Constituição do Brasil.
Francisco F. Bayon __________ Revelación superior de los pueblos por el
arte ( Um capítulo de sociologia histórica americana)
Rodolpho Schüller ___________ Um livro americano único
José Oiticica ________________ Como se deve escrever a História do Brasil
(cont)
Walter Lehman ______________ Problemas americanistas.
Julho-agosto de 1910. Volume IV. nº 1
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211
Paulo Barreto ________________ Elogio de Guimarães Passos
José Oiticica _________________ Como se deve escrever a História do Brasil
(cont)
Setembro de 1910. Volume IV. nº 2
B. Vicuña Subercasseaux _______ Apuntes literários
Francisco F. Bayon ____________ Virtud de uma alianza em la política
latino-americana.
Janeiro de 1911 . Volume V. nº 1
Amaro Cavalcanti _________ Revisão das sentenças dos tribunaes, pêla
Suprema Corte dos Estados Unidos
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina
Fevereiro de 1911. Volume V. nº 2
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212
C. Magalhães de Azevedo ____ Comemoração de Joaquim Nabuco na
Universidade de Roma a 21 de maio de 1910.
Enrique Garcia Veloso _______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Março de 1911. Volume V. nº 3
Dantas Barreto ______________ Elogio de Joaquim Nabuco
Carlos de Laet ______________ Discurso de recepção
Ramón J. Carcano ___________ Diplomacia de la triple alianza.
Divergências de Cotegipe y Qintana-Retiro Del ministro argentino ( 1871)
Pedro Irigoyen ______________ Hostilidades em tiempo de paz
Abril de 1911. Volume VI nº 1
José Veríssimo ____________ O movimento literário brasileiro em 1910
Helio Lobo _______________ A Assembléa de Buenos Aires (uma página de
História diplomática americana )
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Jacintho Lopez. ____________ La intervención armada de los Estados
Unidos en la Republica Dominicana.
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Maio de 1911. Volume VI nº 2
José Irigoyen ______________ Mediación é intervención
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Junho de 1911. Volume VI nº 3
Ramon J. Cárcano __________ La diplomacia de la triple alianza- Los
tratados de
Cotegipe - Ruptura de la alianza – 1872.
Matheus de Albuquerque ______ Rio Branco
Enrique Garcia Veloso ________ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Janeiro de 1912. Volume VII nº 1
Sylvio Romero ____________ Brasil Social
Helio Lobo _______________ A Diplomacia imperial no Rio da Prata (1864-
1865) a Câmara em 1864 A agitação liberal
O impulso para a
intervenção no sul.
Luiz Avelino ______________ Ilusão desfeita
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Fevereiro de 1912. Volume VII nº 2
Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.
Cultura intelectual.
Gama Rosa ________________ A colonização nacional
Helio Lobo ________________A Diplomacia imperial no Rio da Prata (1864-
1865) O emissário brasileiro José Antonio Saraiva
As instruções
do Governo Imperial.
Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.-
Época colonial.
Enrique Garcia Veloso ________ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Abril de 1912. Volume VIII nº 1
Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
Norberto Piñero ____________ La política internacional Argentina.
Mariano de Vedia ___________ República Argentina. Résumen histórico
Descubrimento y conquista.
Clovis Beviláqua ____________ Psychologismo jurídico
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Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.-
Época colonial (cont)
Maio de 1912 . Volume VIII nº 2
Rio Branco _______________ O Brasil , os Estados Unidos e o Monroismo.
José Veríssimo ____________ Notícia de alguns livros do ano passado
José Ingenieros ____________ Premisas para uma sociologia Argentina
Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
Mariano de Vedia __________ República Argentina. Résumen histórico
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Helio Lobo _______________ A Diplomacia imperial no Rio da Prata –
(1864-1865). Aguirre A intransigencia ‘Blanca’-
Como são acolhidos
os primeiros ensaios de pacificação.
Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.-
Época colonial (cont)
Janeiro de 1913. Volume IX nº 1
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Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
Luis Arquisáin ____________ Porvenir cultural de América.
Norberto Piñero ___________ La Política Internacional Argentina (cont)
Fevereiro de 1913. Volume IX nº 2
Norberto Piñero ___________ La Política Internacional Argentina (cont)
Março de 1913. Volume IX nº 3
Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.
( Movimiento científico)
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Helio Lobo _______________ A Diplomacia imperial no Rio da Prata.
Vicente Gay ______________ El canal de Panamá.
Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
Norberto Piñero ___________ La Política Internacional Argentina (cont)
Abril - maio de 1913. Volume X nº 1
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Ruy Barbosa _____________ Rio Branco
Juansilvano Godoi ________ El Baron Del Rio Branco
Clovis Beviláqua _________ A educação histórica do Barão do Rio Branco
explica a extensão de sua influência na vida nacional do Brasil.
Carlo de Laet ____________ Rio Branco
M. Gorostiaga ___________ Rio Branco
Pinto da Rocha __________ o Barão do Rio Branco e o Direito Internacional.
Escragnolle Doria _________ Rio Branco a sua primeira função pública:
professor do Colégio Pedro II.
Manoel Bernárdez _________ Rio Branco y el Uruguay.
Liberato Bittencourt _______ Psychologia do Barão do Rio Branco.
Calogeras _______________ Rio Branco e a Política Exterior
José Enrique Rodo ________ Rio Branco
João do Rio ______________ A minha primeira entrevista e o meu primeiro
pedido.
A.A de Mello Carvalho _____ El más distinguido de los brasileños
Necrológico político.
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Junho de 1913. Volume X nº 2
Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
José Ingeneiros ____________ Formación econômica de la nacionalidad
Argentina
José Veríssimo ____________ A evolução literária do Brasil
Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.
Julho- agosto de 1913. Volume XI nº1
John Bassett Moore ________ Rio Branco
Sylvio Romero ____________ Historia da Literatura Brasileira
Angel César Rivas _________ El baron de Rio Branco
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Rufino Blanco Fombona ______ Ensayo sobre el modernismo literal em
América
Setembro de 1913. Volume XI nº 2
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Felix Pacheco e Souza Bandeira ______________ Discursos proferidos na
Academia Brasileira.
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Sylvio Romero ____________ Brasil Social (cont)
Carlos Wiesse _____________ Apuntes para la historia critica del Peru.
Affonso Costa _____________ A immigração no Brasil
Outubro – novembro – dezembro de 1913. Volume XII
Oliveira Lima ____________ América Latina e América inglesa ou a
evolução brasileira comparada com a Hispano-Americana e com a Anglo-
Americana.
Clovis Bevilaqua _________ O espírito da Constituição Brasileira.
Enrique Garcia Veloso ______ Historia de la Literatura Argentina (cont)
Leopoldo de Freitas ________ A União Centro-Americana.
Junho de 1915. Volume XIII nº 2
Vitor Vianna_________________Política Internacional
Agosto de 1915. Volume XIII nº 4
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Vitor Vianna_________________Política Internacional
Outubro de 1916. Volume XIV nº1
Rio Branco ______________ As primeiras lutas do Brasil
Rocha Pombo ____________ A civilização do Brasil nos fins do século XIX
Veiga Lima ______________ O movimento litterario
Helio Lobo ______________ Gesto mallogrado ( Historia Diplomática do
Brasil )
Novembro de 1916. Volume XIV nº 2
Rio Branco ______________ Apontamentos para a historia Militar do Brasil –
Guerras Cisplatinas
Afrânio Peixoto ___________ Aspectos do “Humour” na Literatura nacional
Lucillo Bueno ____________ Literatura Argentina
Hildebrando Accioly _______ A reforma eleitoral
Dezembro de 1916. Volume XIV nº 3
Francisco Garcia Calderón ___ El Pan-americanismo: su passado y su
porvenir
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Augustin Gómez Carrillo _____ Um capitulo de la historia de la América
Central.
Janeiro de 1917. Volume XV nº 1
Francisco Garcia Calderón ___ El Pan-americanismo: su passado y su
porvenir (cont)
Lindopho Collor ____________ Um estadista da República (Nilo Paçanha)
Fevereiro de 1917. Volume XV nº 2
Sá Vianna _______________ LÁrbitrage au Brésil
Hélio Lobo ______________ Relações entre os Estados unidos e o Brasil.
Uma nuvem que passa ( 1860 – 1870).
Rodrigues Doria __________ Impressões dos Estados Unidos
Março de 1917. Volume XV nº 3
Rio Branco ______________ Biographia de José Maria da Silva Paranhos.
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Sá Vianna _______________ LÁrbitrage au Brésil (conclusão)
Rocha Pombo ____________ A civilização do Brasil nos fins do século XIX.
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José Santos Chocano ________ Oda Continental.
J.C. Gomes Ribeiro _________ As fronteiras do Brasil.
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Afrânio Peixoto ___________ Comparações
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Heinrich Handelmann ______Historia do Brasil
José Vieira _______________ As Instituições Políticas e o meio social no
Brasil (sobre o discurso do Sr Gilberto Amado)
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Latine.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0310348/CA
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J.C. Gomes Ribeiro _________ As fronteiras do Brasil. Formação Histórica e
princípios constitutivos em geral.
Julho de 1917. Volume XVII nº 1
Raul Tavares _____________ Curso de altos estudos militares. Philosophia da
guerra.
Gabriel P. Troconis ________ Caracter Heróico de Bolívar
Paulo de Gardênia _________ O romance no Brasil.
Hildebrando Acciloy _______ A questão da Alsacia e Lorena e o próximo
Congresso da Paz.
Agosto de 1917. Volume XVII nº 2
Lauro Muller _____________ Elogio do Barão do Rio Branco
Juan Bautista de Lavalle ____ El novisimo Código Civil de los Estados
Unidos del Brasil.
Setembro de 1917. Volume XVII nº 3
Cristobal Rodriguez _______ La personalidad de Jose Enrique Rodó
Araújo Jorge _____________ O Brasil e a França no século XVI.( Um
capítulo de História diplomática do Brasil )
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Evaristo de Moraes ________ Jose do Patrocínio
Willian C. Lane ___________ As riquezas do Chile
Outubro de 1917. Volume XVIII nº 1
Francisco Garcia Calderón ___ El Pan-americanismo: su passado y su
porvenir (conclusão).
Jorge Jobim _______________ Esboços literários Arthur de Oliveira ;
Olavo Bilac e Alberto de Oliveira
Carlos Maul _______________ Do titanismo como base de uma esthetica
nacionalista.
Novembro de 1917. Volume XVIII nº 2
Helio Lobo ______________ As relações entre o Brasil e os Estados Unidos.
Janeiro de 1918. Volume XIX nº 1
Georgino Avelino _________ A nossa Guerra (Seus fins políticos e seus
effeitos sociais )
Luis Gasperi _____________ El código civil brasileño
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J.C. Gomes Ribeiro ________ O percursor da Independência hispano-
americano.
Heinrich Handelmann ______Historia do Brasil
Fevereiro – março de 1918. Volume XIX nº 2
Max Henrique Ureña _______ Problemas de Nuestra América
Luis Gasperi ______________ El código civil brasileiro
Jackson de Figueiredo _______ Bibliographia
Heinrich Handelmann ______Historia do Brasil (cont)
Abril de 1918. Volume XX nº1
Helio Lobo ______________ As relações entre o Brasil e os Estados Unidos.
(1822 – 1916). Conferências realizadas na Universidade de Harvard)
Gonzalo Zaldumbide ______ Jose Enrique Rodó
Heinrich Handelmann ______Historia do Brasil (cont)
Maio de 1918. Volume XX nº2
Heinrich Handelmann ______Historia do Brasil (cont)
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Junho de 1918. Volume XX nº 3
Helio Lobo ______________ A defesa da nacionalidade na historia colonial
brasileira ( Conferência realizada na Associação Cristã de Moços )
Adán Queiroga ___________ El folk lore argentino ( importância de su
estúdio )
Araújo Jorge _____________ Historia dipomatica do Brasil Holandez
Heinrich Handelmann ______Historia do Brasil (cont)
Julho de 1918. Volume XXI nº 1
Araújo Jorge _____________ Historia dipomatica do Brasil Holandez (cont)
Jackson de Figueiredo _______ Bibliographia
J.C. Gomes Ribeiro __________ A expedição Roosevelt- Rodon. A questão
do Rio da Duvida.
Barbosa Teixeira ____________ O Êxtase Convencional (a Política e o
Exército).
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Agosto e setembro de 1918. Volume XXI nº 2
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Rio Branco _______________ Índice do terceiro volume inédito da “História
da Guerra do Paraguay”. de Schneider, pelo Barão do Rio Branco.
Araújo Jorge _____________ Historia dipomatica do Brasil Holandez (cont).
José Leon Suarez _________ Algumas palavras sobre a “Diplomacia do
Brasil e da Guerra” , de Hector Diaz Leguizamon.
Hector Diaz Leguizamon. ___Diplomacia do Brasil e da Guerra.
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Outubro de 1918, Volume XXII nº 1
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.
Clovis Bevilaqua ____________ Pensamentos de Paz – Aspirações de justiça
Thiers Fleming ______________ As questões de limites inter-estaduaes e a
Constituição Federal Brasileira.
Helio Lobo _________________ Brasil e Uruguay
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Novembro de 1918. Volume XXII nº 2
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228
Rio Branco _________________ Commentarios à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Vedia y Mitre_______________ El Brasil em nuestra organización nacional
Mauricio W.de A. Pinho ______ A diplomacia brasileira e um casamento
escandaloso. Conferência realizada no Instituto Histórico e
Geographico Brasileiro.
Araújo Jorge _____________ Historia dipomatica do Brasil Holandez (cont).
Barbosa Lima Sobrinho _____ Um historiador moderno. Oliveira Lima
Cyro de Azevedo __________ Ensaio sobre la evolucion y la sancion del
derecho internacional. Conferencia realizada na Faculdade de
Direito de Buenos Aires.
Ventura Garcia Calderón _____ La literatura Uruguaya ( 1757-1917)
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Dezembro de 1918. Volume XXII nº 3
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider. (cont)
Ventura Garcia Calderón ______ La literatura Uruguaya ( 1757-1917)
Xavier de Barros _____________ Gilberto Amado O escritor , o político e
o poeta
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Dr Manoel Elicio Flor _________ El derecho internacional y el Aire
J.C. Gomes Ribeiro ___________ Um problema histórico e geographico. O
antigo Rio do Brasil
verdadeiro rio da Duvida. Quasi um novo
Jordão.
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Janeiro de 1919. Volume XXIII nº 1
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Ventura Garcia Calderón ______ La literatura Uruguaya ( 1757-1917)
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Fevereiro –março de 1919. Volume XXIII nº 2
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Ventura Garcia Calderón ______ La literatura Uruguaya ( 1757-1917)
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Abril de 1919. Volume XXIV nº 1
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Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Ventura Garcia Calderón ______ La literatura Uruguaya ( 1757-1917)
Moreira de Souza ____________Noção de Humanismo (A philosophia de
Augusto Comte)
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Maio de 1919. Volume XXIV nº 2
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Heitor Lyra _________________ O Panamericanismo no Brasil antes da
declaração de Monroe
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
Junho de 1919. Volume XXIV nº 3
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider. (cont)
Pedro Maria Bevolo __________ La religiosidad de Bolívar
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
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Julho de 1919. Volume XXV nº 1
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Agosto e setembro de 1919. Volume XXV nº 2
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Ventura Garcia Calderón ______ La literatura Uruguaya (1757-1917)
(conclusão)
Araújo Jorge _____________ Historia diplomática do Brasil Holandez (cont).
Outubro de 1919. Volume XXVI nº 1
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider. (cont)
José da Costa Sobrinho ________ Guerra do Paraguay (Pela verdade Histórica
)
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
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232
Novembro e dezembro de 1919. Volume XXVI nº 2
Rio Branco _________________ Comentários à História da Guerra do
Paraguay de Schneider.(cont)
Mario Carneiro ____________ Gênese das Guerras e impossibilidade de
pacifismo
Jackson de Figueiredo _______ Traços de uma apologia de Olavo Bilac
Heinrich Handelmann ________Historia do Brasil (cont)
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