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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE DESPORTOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA
MIGUEL SIDENEI BACHELADENSKI
(RE) SIGNIFICAÇÕES DO LAZER EM SUA RELAÇÃO COM A SAÚDE EM
COMUNIDADE DE IRATI/PR
FLORIANÓPOLIS
2006
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MIGUEL SIDENEI BACHELADENSKI
(RE) SIGNIFICAÇÕES DO LAZER EM SUA RELAÇÃO COM A SAÚDE EM
COMUNIDADE DE IRATI/PR
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação Física do Centro de
Desportos da Universidade Federal de Santa
Catarina, como requisito parcial para obtenção
do título de Mestre em Educação Física.
Orientador: Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior
FLORIANÓPOLIS
2006
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE DESPORTOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA
A dissertação
(RE) SIGNIFICAÇÕES DO LAZER EM SUA RELAÇÃO COM A SAÚDE EM
COMUNIDADE DE IRATI/PR
Elaborada por MIGUEL SIDENEI BACHELADENSKI
Orientada pelo Prof. Dr. EDGARD MATIELLO JÚNIOR
E aprovada por todos os membros da banca examinadora foi aceita pelo Programa de Pós-
Graduação em Educação Física da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito
parcial para a obtenção do título de
MESTRE EM EDUCAÇÃO FÍSICA
05 de dezembro de 2006.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior, CDS/UFSC (Orientador)
________________________________________________
Prof. Dr. Marco Aurélio Da Ros, CCS/UFSC
________________________________________________
Prof. Dr. Reinaldo Matias Fleuri, CED/UFSC
Dedico este trabalho às crianças do Bairro Lagoa, que, em muitos
momentos, possibilitaram o resgate da minha infância. Não porque
ela também foi pobre, ainda que incomparável com a deles, mas por
igualmente termos compartilhados sonhos, alegrias e até mesmo
tristezas.
O sonho de que o mundo pode ser melhor, sem violências,
preconceito, desigualdades; o sonho da cancha coberta no bairro com
materiais à disposição; o sonho de ser cidadão... A alegria por andar
de carro, de dar e receber um abraço, assim como ser chamado pelo
nome; a alegria por conhecer Curitiba e um estádio de futebol; a
alegria de receber o professor na sua residência para comer pipoca e
assistir um jogo do Brasil, com direito ao grito de gol; a alegria de
ser tratado como gente e de poder tirar fotografia dos gansos no
lago... A tristeza de a escolinha durar apenas três meses e pela
desunião no bairro; a tristeza de não ter um material apropriado para
participar de um evento ou por não poder participar da escolinha
porque é no horário da escola...
AGRADECIMENTOS
À minha família, mãe Neuza e as irmãs Marislei e Sirlei, pelo amor e apoio em todas
as horas.
À Universidade Estadual do Centro-Oeste por compreender a importância da formação
pós-graduada para minha capacitação profissional, concedendo-me o afastamento integral e
remunerado de minhas funções.
Aos amigos e companheiros de trabalho Machinski e Tomalchelski que não mediram
esforços para suprir minha ausência na Divisão de Esportes/UNICENTRO, inclusive tendo
que adiar seus planos.
Aos amigos do mestrado e de Florianópolis, em especial, Aninha, Bruno, Carlos,
Diego, Diogo, Eliane, Elisa, Fábio, Fernanda, Jorge, Karla, Liamara, Márcia, Mariana, Paula
(in memorian), Priscilla, Rafael, Rogério e Scheila.
À Clarete, simplesmente por ser a doçura de pessoa que é.
À Jéssica, irmã de orientação e inestimável amiga. Como esquecer das nossas
conversas, dos nossos sonhos, dos nossos risos e choros. Seu convívio foi muito importante
para que os desafios que diariamente surgiam pudessem ser superados.
Ao “irmão baiano” Marcius pelo convívio, dividindo despesas, alegrias e tristezas,
enfim, uma amizade maior que nossas diferenças.
Aos amigos de Irati: Anderson, Edilson, Felipe, Gerson, Maílson, Peterson e Rosel por
sempre estarem dispostos a me distrair desse processo “desumano” que é o mestrado.
Aos funcionários do PPGEF, Novânia e Paulo, e ao bolsista Gustavo pela presteza
com que me atenderam nas mais diferentes solicitações.
Aos professores Capela, Cristiane e Júlio pelas conversas acadêmicas e de amizade.
Aos professores Fernando, Marco e Reinaldo pelas contribuições com este trabalho e
com a minha formação.
Ao Dega, por ser mais que o “Orientador do Miguel”. Por ser amigo, pai e um
exemplo de caráter e de profissional comprometido com a vida humana. O meu
agradecimento por me proporcionar uma formação regida pelo sentimento de humanidade e,
por isso, voltada para me tornar mais sensível, crítico e indignado com vida repleta de
privações que milhões de pessoas vivem pelo mundo.
Enfim, obrigado a todos que participaram deste processo!
RESUMO
(RE) SIGNIFICAÇÕES DO LAZER EM SUA RELAÇÃO COM A SAÚDE EM
COMUNIDADE DE IRATI/PR
Autor: Miguel Sidenei Bacheladenski
Orientador: Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior
Esta investigação busca elementos teórico-metodológicos que permitam a superação
do enfoque funcionalista presente nas produções acadêmicas que veiculam a contribuição do
lazer para a Promoção da Saúde. Partindo da determinação social do processo saúde-doença,
tendo a Lazerania como referência e orientando-se por alguns pressupostos da Educação
Popular em Saúde e da Epidemiologia Crítica, consideramos ser possível (re) significar o
lazer através de uma Escolinha de Futebol para Crianças, desenvolvida no Bairro Lagoa, em
Irati/PR, adotando enfoques da pesquisa-ação. Compreendendo e respeitando o sonho de
ascensão social proporcionado pelo futebol, traçamos diferentes eixos para reflexão e
vivências das crianças nessa modalidade, destacando elementos fundamentais da atenção para
saúde individual na relação dialética com o coletivo. Simultaneamente, registramos em diário
de campo as informações obtidas nas reuniões da Associação de Moradores do Bairro Lagoa e
analisamos o conteúdo de entrevistas semi-estruturadas com informantes da comunidade, bem
como de documentos julgados importantes para a compreensão do lazer e saúde na vida social
do Bairro, tais como o Estatuto da Associação de Moradores e os Projetos Político-
Pedagógicos de duas escolas locais. Ao serem utilizadas técnicas da hermenêutica-dialética
para tratamento dos materiais obtidos no campo, evidenciamos tanto o conformismo dos
moradores com a sua realidade, como a resistência do Poder Público em atender algumas
reivindicações que dizem respeito ao direito coletivo. Mesmo assim, compreendemos que
uma outra relação lazer e saúde é possível quando os conceitos da participação e da mudança
são conjugados dialeticamente. A participação gira em torno dos compromissos assumidos
pelas crianças para o desenvolvimento das aulas e a mudança relaciona-se ao fortalecimento
da coletividade envolvida. Assim, em linhas gerais, acreditamos que esta relação é possível a
partir do momento em que há uma preocupação com a emancipação popular, sendo que aos
maiores interessados é garantida participação ativa neste processo.
Palavras-chave: Atividades de Lazer; Futebol; Promoção da Saúde; Condição Social;
Processo Saúde-Doença; Participação Comunitária; Mudança Social.
ABSTRACT
LEISURE NEW MEANINGS AND ITS RELATION WITH HEALTH IN
COMMUNITY OF IRATI/PR
Author: Miguel Sidenei Bacheladenski
Advisor: Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior
The present investigation searches theory-methodology elements to allow the
surpassing of the functional treatment present at academic productions that discuss about the
leisure contribution to Health Promotion. From the social determination of the health-disease
process, being the Lazerania its reference and being oriented by some Health Popular
Education thoughts and also of the Critical Epidemiology basis, one new meaning to
leisure by a Soccer School destined to children is considered possible being matured at the
District of Lagoa, in Irati/PR, applying the research-action basis. Understanding and
respecting the social rising dream provided by the soccer, different topics for reflection by
the children were traced and these children’s experiences were analyzed later, separating
fundamental elements for the individual health at the dialectical relation to the collectivity.
Simultaneously, the information obtained at the district of Lagoa Dwellers Association
meetings were registered in a field diary and the content of the semi-structured interviews
happened with the community informers and as well as the documents considered
important to comprehend leisure and health at the district social life, like the Dwellers
Association Rules and the Pedagogic-Politic Projects of two local schools were analyzed.
When the hermeneutic-dialectic techniques were applied to treat the material obtained at field,
a resignation by the dwellers for their real situation, like the reluctance of the Public
Administration in paying attention to some claiming related to the district. Otherwise, another
leisure-health relation is possible when the participation and change concepts are dialectically
conjugated. The participation is based on the commitments taken by the children, important to
the classes development and the changing is related to the involved collectivity strengthen.
Thus, this relation is possible from the moment there is a preoccupation with the popular
emancipation, where an active participation is guaranteed to the ones involved in this process.
Keywords: Leisure activities; Soccer; Health Promotion; Social Conditions; Health-Disease
Process; Consumer Participation; Social Change.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1. Localização do Município de Irati e do Bairro Lagoa......................................... 35
FIGURA 2. Área selecionada para a aproximação com as crianças....................................... 37
FIGURA 3. As condições da quadra esportiva do bairro........................................................ 38
FIGURA 4. A liberdade de ir e vir.......................................................................................... 45
FIGURA 5. O exercício da cidadania...................................................................................... 48
FIGURA 6. Simulando uma reanimação cárdio-pulmonar..................................................... 52
FIGURA 7. Pausa para beber água.......................................................................................... 85
FIGURA 8. Um brinde à organização coletiva....................................................................... 86
FIGURA 9. Mutirão para limpar a quadra ............................................................................. 87
FIGURA 10. O rap como marca coletiva................................................................................ 97
FIGURA 11. A surpresa com Curitiba.................................................................................... 98
SUMÁRIO
O PROBLEMA: JUSTIFICANDO SUA RELEVÂNCIA................................................. 10
1. POR UM LAZER RELACIONADO À SAÚDE: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS..... 16
1.1 PROMOÇÃO DA SAÚDE ............................................................................................... 16
1.2 EDUCAÇÃO POPULAR EM SAÚDE ............................................................................ 20
1.3 O CAMPO DO LAZER NO BRASIL .............................................................................. 22
1.4 O FUTEBOL COMO POSSIBILIDADE PEDAGÓGICA .............................................. 30
2. O FAZER INVESTIGATIVO POR UM LAZER RELACIONADO À SAÚDE........ 33
2.1 O CAMPO DE INVESTIGAÇÃO.................................................................................... 34
2.2 A APROXIMAÇÃO COM AS CRIANÇAS.................................................................... 36
2.3 O CAMINHO QUE SE FEZ CAMINHANDO ................................................................ 41
2.3.1 O sonho de ser jogador profissional como tema gerador............................................... 42
2.3.2 A rede temática gerada pelo sonho de ser jogador profissional..................................... 42
2.3.2.1 Alimentando o sonho de ser jogador profissional....................................................... 43
2.3.2.2 O jogador de futebol como um trabalhador do esporte............................................... 47
2.3.2.3 Os Problemas do Futebol............................................................................................. 49
2.3.2.4 As Contribuições do Futebol....................................................................................... 52
2.3.3 Para melhor compreender o campo................................................................................ 55
2.4 O TRATAMENTO DO MATERIAL OBTIDO NO CAMPO......................................... 57
3 CONDIÇÕES DE VIDA E SAÚDE.................................................................................. 58
3.1 ESTADO E POLÍTICAS PÚBLICAS.............................................................................. 58
3.2 CONDIÇÕES DE VIDA NO BAIRRO LAGOA............................................................. 62
3.2.1 Formas de trabalhar e consumir ..................................................................................... 64
3.2.2 Formas de conduta e consciência ................................................................................... 71
3.2.3 Instituições formadoras de consciência.......................................................................... 73
3.3 PROCESSO SAÚDE-DOENÇA....................................................................................... 77
4. PARTICIPAR PARA MUDAR E MUDANDO PARA PARTICIPAR ....................... 80
4.1 O SENTIDO DA PARTICIPAÇÃO ................................................................................. 80
4.1.1 Assumindo compromissos.............................................................................................. 84
4.1.2 Envolvimento consciente................................................................................................ 87
4.2 MUDANDO PARA PARTICIPAR .................................................................................. 90
4.2.1 Superando o individualismo........................................................................................... 91
4.2.2 Liberdade para descobrir o mundo................................................................................. 95
CONCLUSÕES...................................................................................................................... 99
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................104
APÊNDICE A – Formulário de consentimento para menores de 18 anos.............................114
APÊNDICE B – Formulário de consentimento para maiores de 18 anos..............................115
APÊNDICE C – Termo de autorização para análise do projeto político pedagógico das escolas
do bairro..................................................................................................................................116
APÊNDICE D – Termo de autorização para observações de reuniões e análise do estatuto da
Associação dos Moradores Progresso do Bairro Lagoa.........................................................117
APÊNDICE E – Estatuto da Escolinha de Futebol da Lagoa ................................................118
APÊNDICE F – Ofício de reivindicação de uma trave..........................................................119
APÊNDICE G – Primeira pagina do abaixo-assinado de reivindicação de melhorias no
alambrado da quadra...............................................................................................................120
ANEXO A – Bibliografia sobre Promoção da Saúde localizada na base de dados SciELO .122
ANEXO B – Bibliografia sobre Lazer localizada na base de dados SciELO ........................124
ANEXO C – Parecer do Comitê de Ética na Pesquisa com Seres Humanos.........................125
ANEXO D – Texto “As origens”...........................................................................................126
ANEXO E – Texto “As regras do jogo” ................................................................................127
ANEXO F – Letra da música “A vida é desafio”...................................................................128
ANEXO G – Notícia veiculada pela página da internet da Prefeitura Municipal de Irati, em 04
de agosto de 2006...................................................................................................................129
O PROBLEMA: JUSTIFICANDO SUA RELEVÂNCIA
O interesse nesta investigação parte das indagações vindas com o envolvimento em
projetos esportivos e de lazer desenvolvidos em parceria pela Universidade Estadual do
Centro-Oeste (Unicentro, Paraná) e o setor de esporte e lazer da Prefeitura Municipal de Irati
(PR), desde o ano 2000. Ali, diante das constantes afirmações de que o lazer seria um
caminho para a promoção da saúde dos iratienses, não compreendia o porquê da inexistência
de uma política que de fato democratizasse seu acesso, aliás, o que significaria o cumprimento
do que se preceitua na Constituição da República Federativa do Brasil, na Constituição do
Estado do Paraná e também na Lei Orgânica do Município de Irati.
Infelizmente, esta tem sido a tendência das diferentes gestões que ficam à frente do
município há mais de uma década. Como simples políticas de eventos, as ações não se
configuram em políticas públicas (sociais) e, muito menos, representam a garantia deste
direito. O importante não tem sido propiciar lazer em perspectiva emancipatória, duradoura,
mas atividades de baixo custo, que na base do improviso possam envolver uma grande
quantidade de pessoas, que logo depois são exaltadas em números
1
.
Nesta ótica
2
, a saúde é um forte apelo ao envolvimento popular, inclusive servindo de
estímulo para que os iratienses, nos demais dias do ano, busquem exercitar-se
espontaneamente. Contudo, sem opções, ou eles procuram a iniciativa privada (serviços de
personal training, academias, clubes, hotéis etc.), aderindo à moda do lazer de consumo, ou
devem contentar-se com atividades improvisadas, dentre as quais, os simulacros daquilo que
os meios de comunicação propagam como a mais popular manifestação esportiva e de lazer
dos brasileiros, o futebol. É o que de fato ocorre em Irati, a partir também dos jornais em
circulação local
3
, que destinam praticamente toda sua página de esporte e lazer às
informações do futebol amador e profissional do município, o mesmo ocorrendo com a
programação das rádios.
1
Nessa lógica, a administração local até se aproximou do Serviço Social do Comércio (SESC), aderindo ao
Challenge Day (Dia do Desafio). Este evento foi criado em 1983, no Canadá, e, sob coordenação do SESC-SP,
vem sendo realizado no Brasil há 10 anos. Anualmente, na última quarta-feira do mês de maio, as cidades
participantes têm como desafio mobilizar e reunir o maior percentual de pessoas, em relação ao total de
habitantes, a praticarem 15 minutos de atividade física durante o dia, como atitude simbólica contra o
sedentarismo.
2
Na mesma lógica pode-se citar: i) o Mexa-se, uma campanha lançada na década de 70, como parte do
movimento Esporte Para Todos (EPT), sob patrocínio da Rede Globo de Televisão; e ii) o Agita Brasil,
promovido pelo Ministério da Saúde, como extensão do Agita SP, que é promovido a partir de 1996, pelo Centro
de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul (Celafiscs) e, que, em 2002, sob apoio da
Organização Mundial da Saúde, transformou-se no Agita Mundo.
3
Conclusão de uma análise das edições de 2005 dos jornais Folha de Irati e Hoje Centro Sul, que com
periodicidade semanal, respectivamente apresentaram 49 e 50 edições.
11
Assim, a falta de opções de lazer no município tem uma solução bem definida:
transformar terrenos baldios em campos de futebol, por seus próprios praticantes, sendo
incomum a ajuda do Poder Público. No Bairro Lagoa, local onde foi realizada esta
investigação, em meio a tantas outras adversidades para se ter uma vida saudável, diversos
campos de futebol sobre terrenos acidentados são demarcados e servem de possibilidade dos
moradores vivenciarem o lazer e, desta forma, buscarem a saúde que acreditam ser possível
de ser conquistada pelos exercícios.
Contudo, a aproximação junto ao campo da Saúde Coletiva
4
permitiu-nos
compreender que a Promoção da Saúde exigiria muito mais do que apenas praticar exercícios
físicos (isso quando a própria saúde não estaria sendo prejudicada pela prática). Pela
participação no Grupo de Pesquisa Vivendo Educação Física e Saúde Coletiva (vinculado ao
Núcleo de Estudos Pedagógicos de Educação Física – NEPEF/CDS/UFSC), nossas
indagações agora não se resumiam apenas ao fato de ter ou não acesso a um lazer público e de
qualidade, mas, em meio às diferentes abordagens do processo saúde-doença, identificar
como o lazer pode contribuir com a Promoção da Saúde, que, em termos mundiais, vem se
apresentando como um dos grandes desafios do início do século.
Promover saúde significa desafiar interesses poderosos, que, na maioria das vezes, por
se preocuparem com a manutenção da dominação, impõem a precarização da vida aos mais
pobres, inclusive decretando suas mortes. Nessa direção, é coerente o desabafo de uma voz da
América Central, assim registrado na Carta de Saúde dos Povos
5
: “Doenças e mortes
acontecendo diariamente nos enchem de raiva. Não porque as pessoas ficam doentes ou
morrem. Temos raiva porque muitas dessas doenças e mortes têm sua origem nas políticas
econômicas e sociais que nos são impostas” (MOVIMIENTO DE LA SALUD DE LOS
PUEBLOS, 2000, p. 1).
Embora a Promoção da Saúde seja uma expressão tradicionalmente utilizada nas
produções da Educação Física brasileira, é fato que discussões como estas, ou seja, da
complexidade da Promoção da Saúde, são pouco freqüentes, predominando a despolitização
desse conceito (OURIQUES, 2005). Por outro lado, nos campos da Saúde Pública e da Saúde
Coletiva, ainda que o lazer seja reconhecido como um fenômeno de grande relevância para a
4
Campo de conhecimento constituído pelo conjunto de teorias e práticas para compreender, explicar e modificar
o processo saúde-doença, que se volta à dimensão coletiva para o enfrentamento das necessidades em saúde
(PAIM e ALMEIDA FILHO, 2000).
5
Documento elaborado durante a realização da Assembléia Mundial de Saúde dos Povos, em Bangladesh, no
ano de 2000. Com o tema Escutar os Excluídos, o evento reuniu mais de 1500 representantes de 75 países.
12
conquista da saúde, um levantamento
6
junto à base de dados do SciELO (Scientific Electronic
Library Online), no intuito de tentar compreender como o lazer é tratado no campo da saúde,
indica uma abordagem superficial acerca desse fenômeno. De modo geral, as menções ao
lazer ou simplesmente são citações em texto como representação de espaços físicos,
atividades e o direito a ser garantido aos brasileiros, sem nenhuma discussão aprofundada da
questão, ou, pior que isso, reforçam seu viés funcionalista
7
privilegiando os conteúdos
físicos
8
.
Diante do exposto e considerando que no campo crítico da Educação Física,
especificamente no campo de conhecimento do lazer, desde o início dos anos 80 diferentes
concepções discutem a superação do discurso do lazer funcionalista e, que, portanto,
poderiam articular-se às abordagens do campo da saúde que também se contrapõem ao
funcionalismo, esta investigação procura responder à seguinte questão-problema: Quais
conhecimentos e práticas permitem a superação do tradicional tratamento (e não-tratamento)
dado ao lazer em sua relação com a saúde?
Neste processo de construção teórico-metodológica, partindo do pressuposto de que a
Promoção da Saúde é bastante complexa e envolta de dinamismo e contradições, exigindo
bom-senso, compromisso com a vida e, sobretudo, articulação dos saberes científico e popular
para conscientizar as pessoas, potencializando suas capacidades para agir e transformar suas
próprias condições de vida, encontramos na lazerania (MASCARENHAS, 2005) uma
possibilidade concreta para superação da relação apresentada em ambos os campos.
Fundamentada na obra de Paulo Freire, a conquista da lazerania seria possível pela educação
dialógica que favorece a conscientização dos envolvidos sobre seu estar no e com o mundo, o
que indica uma aproximação às práticas da Educação Popular em Saúde, o “jeito brasileiro de
se promover saúde” (VASCONCELOS, 2004, p. 79).
Assim, diante do desejo de vivenciar esta possibilidade numa investigação no
Município de Irati, especificamente no Bairro Lagoa, onde há alguns anos temos
envolvimento com projetos comunitários, encontramos no método da pesquisa-ação a
6
Levantamento realizado pelo autor em 30 nov. 2005 e que foi dividido em duas etapas: i) pelo assunto
Promoção da/de Saúde, foram localizados 95 trabalhos, dos quais apenas 22 (23,16%) fazem menção ao lazer
(relação no Anexo A); e ii) pelo assunto Lazer, dez trabalhos foram localizados, sendo dois também encontrados
na consulta anterior (relação no Anexo B). Dos 30 trabalhos localizados e analisados, observou-se que apenas
um (PERES, BODSTEIN, RAMOS e MARCONDES, 2005) discute seus pressupostos.
7
Abordagem creditada ao francês Joffre Dumazedier, que padroniza as corretas formas das pessoas empregarem
seu tempo livre das obrigações profissionais, familiares e sociais, preferencialmente por ações despolitizadas.
8
Os conteúdos do lazer podem ser classificados em manuais, intelectuais, sociais, físicos, artísticos e turísticos
(MELO e ALVES JÚNIOR, 2003).
13
estratégia apropriada para assim proceder. Além de implicar em nossa participação junto aos
sujeitos durante o processo investigativo, este é
... um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em
estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no
qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema
estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1999, p. 14).
Complementando, Thiollent (1999) caracteriza-o como uma forma de engajamento
sócio-político, que relaciona dois tipos de objetivos: um prático (definição de soluções
alcançáveis) e outro de conhecimento (obtenção de informações que seriam difíceis de
conseguir por outras técnicas), sendo que quanto maior for o conhecimento, melhor será a
condução da ação. Para Oliveira e Oliveira (1984), a pesquisa-ação destaca-se não pela
explicação dos fatos depois que eles ocorrem, mas por favorecer o despertar da consciência
crítica e autônoma ao grupo participante do processo de transformação, possibilitando que
este assuma seu papel de protagonista e ator social. Pode até auxiliar na superação do
sentimento de impotência frente à ordem estabelecida, implicando na compreensão de que a
dominação não seria um fato normal nem natural.
Como estratégia de (re) aproximação aos moradores (agora na qualidade de
pesquisador), utilizamo-nos do grande interesse que eles têm pelo futebol, sendo comum a sua
prática para superar a precariedade (ou falta) de políticas de lazer no município. Além do
mais, este esporte embala o sonho de milhões de brasileiros em melhorar suas condições de
vida e, por ser ano da Copa do Mundo de Futebol da Alemanha, indiscutivelmente, os apelos
nesse sentido seriam maiores ainda. Assim, a investigação foi estruturada e desenvolvida sob
a forma de uma escolinha de futebol para as crianças residentes no bairro, na qual acima da
esportivização do lazer procuramos problematizar o futebol ali praticado, possibilitando uma
consciência para reclamar por melhores condições de vida e saúde, a iniciar pela garantia do
direito ao lazer em espaços públicos de qualidade.
Além disso, a metodologia proposta – pesquisa-ação – apresentou-se como uma
ferramenta potente para compreensão de aspectos das condições de vida e saúde dos
envolvidos. Para tanto, neste processo, foram estratégicos dois conceitos desenvolvidos pelo
Centro de Estudos e Assessoria em Saúde (CEAS), do Equador, fundamentados no
materialismo histórico-dialético. Um deles é o conceito processo saúde-doença, que significa
compreender a saúde como resultante de um processo dinâmico e contraditório na dimensão
coletiva. O outro é reprodução social, que significa considerar o conceito anterior como
determinado pelo social. Ou seja, reprodução social é
14
... o conjunto da vida social caracterizado pelas formas de trabalhar e consumir,
pelas relações que os seres humanos estabelecem entre si para produzir a vida social,
pela forma com que transformam a natureza, pela forma em que realizam a
distribuição e o intercâmbio dos bens socialmente produzidos, pelas instituições que
geram e pelo nível de consciência e organização que alcançam (CAMPAÑA, 1997,
p. 133).
Como objetivos, a investigação buscou: i) reconstruir elementos para entendimento de
relações entre Educação Física/Lazer e Saúde Pública/Saúde Coletiva nas políticas públicas
de lazer de Irati; ii) compreender aspectos de condições de vida e saúde dos envolvidos no
projeto; iii) analisar como o futebol pode favorecer a organização social para o lazer no
bairro; e iv) fornecer subsídios para elaboração de políticas públicas de lazer voltadas à
Promoção da Saúde em Irati.
Como questões a investigar formulamos as seguintes: Em tempo de políticas
neoliberais é possível um lazer emancipatório e que, conseqüentemente, possa de fato possa
contribuir com a Promoção da Saúde? Quais as condições de vida e saúde dos moradores do
Bairro Lagoa? Como é a participação dos moradores nas questões de interesse coletivo?
Quais aspectos dificultam a organização social no bairro? E quais favorecem? É possível
pela prática do futebol contribuir com esta organização?
Enquanto justificativa, acreditamos que esta investigação além de auxiliar a preencher
a lacuna detectada nos campos da Educação Física/Lazer e da Saúde Pública/Saúde Coletiva,
estreitando a relação das mesmas, também poderá servir de alento para as políticas públicas
de lazer, em Irati. Em especial, porque se na atualidade elas são deficitárias, a previsão para
os próximos anos não é nada animadora. Segundo consta na primeira edição do Plano Diretor
Municipal de Irati
9
, cumprindo o que determina o Estatuto da Cidade
10
, praticamente sela-se
a mesma orientação: manter a ênfase nos eventos e esportes de competição.
As experiências vividas no processo de investigação permitiram identificar as
categorias de análise e estruturar as reflexões. O presente texto é uma tentativa de expressar
os elementos fundamentais do processo vivido durante os três meses de convivência (estar
junto com os envolvidos), que foram repletos de aprendizado. Na sua redação, reconhece-se a
impossibilidade de explicar tudo, pois “o vivenciar é mais decisivo que explicar” (DEMO,
1991, p. 65).
9
Plano que estabelece o rumo das políticas municipais para o período de dezembro de 2004 a março de 2008.
10
Criado pela Lei Federal n.º 10.257/01 para regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988.
Ao estabelecer normas para a execução da Política Urbana, demonstra preocupação com o “desenvolvimento das
funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante o direito a cidades sustentáveis, este entendido
como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos
serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações” (SILVA e ARAÚJO, 2003, p. 60).
15
No primeiro capítulo são apresentados os pressupostos teóricos que sustentam a
reflexão de que é possível um lazer relacionado à saúde, sem ser aquele pautado pelo
funcionalismo. Nessa direção, a partir da contextualização da concepção de Promoção da
Saúde, que tem no empoderamento das pessoas e grupos sociais um dos seus principais eixos
de intervenção, e que, da mesma forma, é central na Lazerania, procuramos evidenciar que
esta outra relação “lazer e saúde” pode ser pensada através de um processo de ensino-
aprendizagem do futebol.
No próximo capítulo são discutidos aspectos que dizem respeito ao fazer da pesquisa,
apresentando-se o caminho percorrido que permitiu a consolidação desta investigação.
Também são anunciadas as categorias que emergiram no campo através das trocas entre o
pesquisador, as crianças e a comunidade.
No terceiro capítulo, partindo do pressuposto de que o contexto social é determinante
no processo saúde-doença, pela apresentação do que são políticas públicas (sociais),
procuramos demonstrar as possíveis conseqüências negativas na saúde dos brasileiros, ainda
que alguns indicadores revelem o contrário (redução da mortalidade infantil e aumento da
longevidade, do acesso à alimentação e a uma rede mais ampla de saneamento etc.). Por fim,
com a categoria reprodução social, apresentamos nossa compreensão sobre as condições de
vida dos moradores do Bairro Lagoa, que em alguns aspectos se revelam precárias.
O quarto capítulo proporciona uma reflexão sobre a superação do tratamento
funcionalista dado à relação lazer e saúde, através das principais categorias emergidas no
campo de investigação. Como conclusões, para aproveitamento dos potenciais da Lazerania
integrados aos pressupostos e objetivos da Educação Popular em Saúde, são pontuados os
aspectos centrais que favorecem a superação do tratamento (e não-tratamento) da relação
lazer e saúde, que está centrada na emancipação humana.
CAPÍTULO I
POR UM LAZER RELACIONADO À SAÚDE: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
O propósito de discutir o lazer relacionado à saúde é apresentar uma possibilidade de
superação do discurso funcionalista encontrado com predominância nas produções
acadêmicas tanto da Educação Física como da Saúde Pública/Saúde Coletiva e que têm forte
ressonância no senso comum. Antes de avançar, no entanto, convém esclarecer o significado
do funcionalismo. Como corrente do pensamento, é uma variante do positivismo que
considera que as perturbações da sociedade
... se explicam primordialmente pela intervenção de causas exteriores passíveis de
serem controladas. Esta visão se assenta na ilusão de que seria possível existir uma
sociedade equilibrada e fechada, onde não houvesse conflitos nem contradições. O
equilíbrio constituiria o indicador de uma sociedade saudável e a influência externa,
quase sempre, deveria ser considerada negativa. Por dedução, quem se guia por essa
mentalidade crê que é possível controlar os problemas, isolar as contradições e,
assim, voltar sempre no ponto de equilíbrio (MINAYO, 2005, p. 54-55).
Complementando, Minayo (2004) explica que nesta concepção: i) todo desequilíbrio
tende a ser corrigido por ajustes ou reajustes; ii) crenças e valores interagem e reforçam-se
mutuamente; e iii) as mudanças sociais não atingem as estruturas, não são revolucionárias.
Trata-se da vertente positivista mais observada no campo da saúde, e as doenças são vistas
como resultado de desvios de conduta, tal como o sedentarismo.
Partindo dessas premissas, acredita-se que uma reflexão acerca da Promoção de Saúde
possa direcionar a superação deste enfoque, principalmente, porque em sua concepção podem
ser encontradas duas diferentes perspectivas: uma conservadora e outra progressista.
1.1 Promoção da Saúde
Promoção da Saúde é uma expressão que em 1920 Winslow utiliza quando define
Saúde Pública. Caracteriza a Promoção da Saúde como um esforço da comunidade
politicamente organizada para obter melhorias em suas condições de vida, visando a
manutenção e o melhoramento da saúde de seus membros. Mais tarde, em 1946, o médico
Henry Sigerist utiliza esta expressão enquanto apresenta as quatro tarefas essenciais da
medicina: a promoção da saúde, a prevenção das doenças, a recuperação dos enfermos e a
reabilitação. Para ele, promover saúde seria uma responsabilidade de diferentes atores
17
(políticos, sindicatos, educadores, empresários etc.), pois seria essencial conceder às pessoas
condições decentes de vida, trabalho, educação, lazer etc. (BUSS, 2003).
Em 1965, Leavell e Clark, no desenvolvimento do Modelo Ecológico
11
, referem-se à
Promoção da Saúde como uma das medidas preventivas do nível primário das doenças. Neste,
incluem-se medidas para elevar a saúde e o bem-estar geral através de moradia adequada,
nutrição, recreação e condições agradáveis no lar e no trabalho, educação em saúde, dentre
outros. Defendiam que ações educativas e de motivação sanitária iniciadas a nível individual
acabariam sendo repassadas à família e à comunidade. Buss (2003) comenta que este modelo
apresentou-se inapropriado na contenção das doenças crônicas não-transmissíveis e, por isso,
a Promoção da Saúde acabou associada a medidas preventivas ligadas ao ambiente físico e
aos estilos de vida.
Pela valorização dos estilos de vida, a Promoção da Saúde centrou-se na concepção da
causa, ou seja, compreendida como uma simples sucessão de eventos, que através de
comparações estatísticas procura-se explicar os porquês das doenças (BARATA, 2005).
Assim, tudo aquilo que não estaria ao controle do indivíduo fugiria do âmbito da Promoção da
Saúde. Para Czeresnia (2003) estas medidas tinham o propósito de controlar o crescente custo
das assistências médicas, principalmente aqueles advindos pelas doenças crônicas que eram
cada vez mais freqüentes junto à população mais idosa.
Nessa direção, propunha-se como eixo básico do discurso da Promoção da Saúde o
fortalecimento da idéia da autonomia de indivíduos e grupos sociais. Uma idéia que estaria
“construindo representações científicas e culturais, conformando os sujeitos para exercerem
uma autonomia regulada, estimulando a livre escolha segundo uma lógica do mercado”
(CZERESNIA, 2003, p. 39-40), ou seja, defendia-se a redução dos gastos estatais,
transferindo progressivamente aos indivíduos a responsabilidade por sua saúde. É o que tantos
autores no campo da saúde denunciam como culpabilização da vítima.
Para Da Ros, Vieira e Cutolo (2005) esta visão seria responsável por imputar nas
pessoas a idéia de que é possível promover saúde para determinados tipos de patologia. Além
de fragmentar a complexidade da Promoção da Saúde, ela também favorece a confusão entre
11
O Modelo Ecológico, compreendido pela interação agente-hospedeiro-ambiente, parte da História Natural da
doença, apresenta duas fases: Pré-Patogênese (antes do homem adoecer) e Patogênese (o processo patológico
que se instala no homem). Considerando prevenção como uma ação antecipada à doença ou ao seu avanço e
agravamento, esta se divide em três níveis: i) primário: divididas em promoção da saúde (ações educativas) e
proteção específica (vacinas), as medidas visam à otimização da saúde para evitar que a doença se instale e
atinja estado clínico; ii) secundário inicia-se quando a doença já se manifestou e, por conseqüência, deve
estacionar a doença (diagnóstico precoce e tratamento adequado) e retardar suas conseqüências (limitações da
invalidez); e iii) terciário (reabilitação) busca limitar o dano acarretado pela doença, quando há cura total ou
com seqüelas ou a morte (LEAVELL e CLARK, 1976).
18
“Prevenção de Doenças” e “Promoção da Saúde”. Não se trata de negar a importância de
medidas preventivas para controle de certas patologias, mas o fato é que enquanto na primeira
o objeto de intervenção é a doença, na Promoção a saúde é o foco das atenções.
E é com a preocupação da saúde que, desde a década de 70, orientam-se as
proposições do moderno movimento de Promoção da Saúde. Resgatando o pensamento da
Medicina Social
12
que, no século XIX, defendia a melhoria da saúde condicionada a melhoria
das condições de vida da classe trabalhadora, este movimento surge como uma resposta aos
desafios sanitários da época. Frente às mudanças sociais, políticas e culturais, o paradigma
biomédico não conseguia mais sustentar a explicação da doença como uma simples relação de
causa e efeito, ganhando um novo enfoque (CARVALHO, 2004).
Impulsionado pelo Relatório Lalonde, elaborado pelo Ministério de Bem-Estar e
Saúde do Canadá, este movimento traz “a consigna básica de adicionar não só anos à vida,
mas vida aos anos” (PAIM e ALMEIDA FILHO, 2000, p. 44). Nessa lógica, em 1977, a
Assembléia Mundial de Saúde lança a meta Saúde para Todos no Ano 2000, tendo como base
a extensão de cobertura dos serviços de atenção simplificada. Esta meta é reiterada no ano
seguinte, em Alma-Ata (ex-URSS), durante a realização da Conferência Internacional sobre
Cuidados Primários de Saúde. Promovida pela Organização Mundial da Saúde (OMS),
reconhece-se a saúde como direito de todos e responsabilidade política dos governos, assim
como se amplia o entendimento do processo saúde-doença para além dos limites do campo
estritamente sanitário (PEDROSA, 2004).
A oficialização do modelo canadense, no entanto, só acontece em novembro de 1986,
com a realização da Primeira Conferência Internacional Sobre Promoção da Saúde, na capital
canadense. Nesta, é elaborada a Carta de Ottawa, que ainda hoje é referenciada como o
grande marco do movimento, reconhecendo a Promoção da Saúde a partir de uma perspectiva
que ao invés de limitar-se em ações de prevenção de doenças e riscos individuais, volta-se
para as influências dos aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais sobre as condições
de vida e saúde da população. Portanto,
... a promoção da saúde passou a ser vista como uma estratégia mediadora entre
pessoas e ambiente, visando aumentar a participação dos sujeitos e da coletividade
na modificação dos determinantes do processo saúde-doença, como emprego, renda,
educação, cultura, lazer e hábitos de vida. Desse modo, busca proporcionar aos
12
A Medicina Social surge na Europa (Inglaterra, França e Alemanha), como uma reivindicação dos
movimentos sociais da época, que compreendiam a crise sanitária como um processo político e social. Assim,
“postula-se que a medicina é a política aplicada no campo da saúde individual e que a política nada mais é que a
aplicação da medicina no âmbito social, curando-se os males da sociedade” (PAIM e ALMEIDA FILHO, 2000,
p. 37).
19
povos meios necessários para melhorar sua saúde, cabendo ao Estado a
responsabilidade de reduzir as diferenças, assegurar a igualdade de oportunidades e
promover os meios que permitam a todos desenvolver um melhor controle sobre ela
(AERTS et al, 2004, p. 1021).
Para Lefevre e Lefevre (2004), a Promoção da Saúde procura substituir a visão
limitada da ausência de doença pela visão da erradicação das causas das doenças. A
erradicação não estaria centrada no consumo de produtos, serviços e procedimentos adotados
em resposta à ameaça da doença, mas marcado por um entendimento cognitivo, reflexivo e
crítico, que visa a instalação progressiva da saúde no lugar da doença. Nessa direção, a
informação pode desempenhar um importante papel, pois é só ela que permite entender e
compartilhar as razões, as causas e conseqüências da doença. Entretanto, os autores advertem
que a Promoção da Saúde, em nenhum momento, significa educar as pessoas como se elas
fossem simples vasilhas a serem preenchidas pelo conhecimento científico. Trata-se de um
processo que informa as pessoas através do diálogo com as mesmas, valorizando os saberes
acumulados tanto pela ciência quanto pelas tradições culturais locais. Partindo da
preocupação com a formação da cidadania das pessoas, possibilita estratégias para o
enfrentamento das situações que vêm afetando a saúde da coletividade.
Nesse sentido, pode-se dizer que através de uma intervenção que informa e dialoga
com indivíduos e grupos sociais, favorecendo a formação da cidadania, a Promoção da Saúde
tem como um de seus pilares o conceito do empowerment. É um conceito complexo e
sustentado por diferentes campos de conhecimento, dentre os quais a ideologia da ação social
dos países desenvolvidos na segunda metade do século XX. Nos anos 70, esta concepção
sofre influências dos movimentos de auto-ajuda, e, nos 80, da psicologia comunitária.
Observa-se, na década de 90, a luta pelo direito à cidadania tanto na prática médica como na
educação em saúde e no ambiente físico (CARVALHO, 2004).
Amplamente utilizado por diferentes áreas, o empowerment é reportado como uma
ação social que traz benefícios tanto no plano individual como organizacional e comunitário.
Individualmente, as pessoas são estimuladas a desenvolver habilidades para agir em prol da
melhoria de sua situação de vida, como, por exemplo, na luta por seus direitos. Por sua vez,
quando organizados coletivamente, os indivíduos tomam posse de suas próprias vidas pela
interação com seus pares, despertando um pensamento crítico em relação à realidade, que
favorece a construção da capacidade social e pessoal, possibilitando a transformação de
relações de poder (ANDRADE e VAITSMAN, 2002).
20
No Brasil, pode-se dizer que este papel tem sido desenvolvido a contento pelo
movimento da Educação Popular em Saúde, com a criação de vínculos entre o conhecimento
do campo da saúde e o pensar e fazer cotidiano da população.
1.2 Educação Popular em Saúde
É um movimento que emerge no país a partir da década de 70, como uma resposta dos
profissionais de saúde descontentes com as práticas mercantis, rotineiras, biologicistas,
alienadoras e alheias às necessidades populares. Dirigindo-se para comunidades periféricas,
onde pela ligação com a Igreja católica predominavam práticas de Educação Popular
13
, estes
profissionais estabeleceram vínculos entre o conhecimento do campo da saúde e o pensar e
fazer cotidiano da população. Ali, convivendo com populares e na dinâmica de seu processo
saúde-doença, reorientaram suas práticas para uma atuação mais global frente aos problemas
de saúde encontrados (VASCONCELOS, 2001).
Foi através deste jeitinho brasileiro de promover saúde, que, pela primeira vez, se
reconheceu a importância e o potencial do povo para as ações de Educação em Saúde, já que
desde o início do século, além de ser acusado culpado por sua situação de
subdesenvolvimento, ele também era visto como incapaz de iniciativas criativas para
melhorar sua situação de saúde (VASCONCELOS, 1997). Assim, a proposta substituiu a
assistência médica pela convivência com as classes populares; a instituição saúde pública
assumiu compromissos populares; e a atuação médica apresentou-se como uma atuação
pedagógica para mobilizar as pessoas em direção de uma transformação do quadro social que
estaria degradando a saúde (BRANDÃO, 2001).
Nessa lógica, pode-se dizer que a Educação Popular em Saúde apresenta-se como uma
forma de trabalhar pedagogicamente as pessoas e grupos, promovendo sua capacidade de
análise crítica da realidade para aperfeiçoar estratégias de luta e enfrentamento de situações
adversas, inclusive no campo político. Para Souza (2001a, p. 136) é um “movimento social –
o movimento social pela vida – portanto, uma ação de construção de hegemonia, por isso
pedagógica na sua especificidade política”.
Outro aspecto importante desta prática, é que junto desta busca pela superação do
biologicismo, do mercantilismo, da ocultação das origens dos problemas sociais e de saúde e
13
De acordo com Vasconcelos (2004, p. 72) a “Educação Popular é o saber que orienta nos difíceis caminhos,
cheios de armadilhas, da ação pedagógica voltada para a apuração do sentir/pensar/agir dos setores subalternos
para a construção de uma sociedade fundada na solidariedade, justiça e participação de todos”.
21
do descarte do saber popular, Vasconcelos (2001) ressalta a ruptura com o poder centralizador
da categoria médica, o que coloca em pé de igualdade todos os profissionais da saúde
(médicos, enfermeiros, agente comunitários etc., abrindo espaço até para o professor de
educação física), pois, para o autor, a interdisciplinaridade permite entender que tudo é
problema de todos.
Para Pedrosa (2001) a adesão nesta prática possibilita a construção de vínculos
afetivos e político-ideológicos, promovendo uma vivência coletiva em torno “de projetos de
emancipação, libertação, autonomia, solidariedade, justiça e eqüidade” (p. 137). Por
conseqüência, seu compromisso não se resume em mudar atitudes e comportamentos, mas
visa à construção de um sujeito/cidadão, ou seja, inclui o envolvimento com a sua vida e com
a mudança das condições que deterioram sua saúde. Além do diálogo direto com a população,
outras estratégias podem ser utilizadas, dentre as quais, os rádios e jornais comunitários.
Contudo, conforme o modo de atuação do grupo de saúde – prestação de serviços de
saúde; ação reivindicatória; e mutirão –, Carvalho (apud VASCONCELOS, 1997) detecta
algumas armadilhas que contribuem para a permanência do quadro de dominação. Nos grupos
de saúde que prestam serviços de saúde, a preocupação em treinar e acompanhar a população
no exercício de atividades simplificadas de saúde (curativa ou preventiva), a partir de uma
visão mais ampla sobre os problemas de saúde local, a advertência recai sobre três pontos: i)
as pessoas treinadas identificam-se como minidoutores e, dessa forma, dificilmente as ações
extrapolam ao plano técnico e individual; ii) o seu objetivo é fortalecer o movimento coletivo,
porém, quando já existe um movimento anterior (associações, sindicatos etc.), este tende a ser
enfraquecido; e iii) corre-se o risco de substituir a responsabilidade do Estado e com isso a
população não mais vê os serviços de saúde como um direito.
Em relação aos grupos de saúde pautados nas ações reivindicatórias, o autor comenta
que as reivindicações (abaixo-assinados, envio de comissões às autoridades competentes etc.)
decorrem das diferenças observadas entre as necessidades de saúde da população e os serviços
oferecidos pelo poder público. Aqui, ao invés dela transcorrer como vontade coletiva, pode
ficar dependente do prestígio do profissional da saúde. A participação popular resume-se em
colaborar com este profissional, como se a transformação fosse uma vontade e luta
exclusivamente sua. A dependência acaba sendo maior ainda quando o profissional toma a
frente de tudo, sendo o centro dos acontecimentos.
Por fim, nos grupos de saúde de mutirão, observam-se ações nascidas a partir dos
debates que, sob a premissa da formação de redes de solidariedade e a união da população,
busca soluções aos problemas de saúde. Entretanto, raramente isso ocorre, seja como
22
decorrência do baixo nível de consciência da população ou por se tratar de uma sugestão do
profissional da saúde. Assim, a participação não é vista como uma ação coletiva para a
melhoria da comunidade, mas um simples agrado ao profissional.
Por conta destas armadilhas, Assis (2001) tem razão em dizer que nas práticas de
saúde é urgente pensar em como orientar as relações interpessoais para que ao invés de
reproduzir a dominação, consiga-se produzir formas mais solidárias e democráticas de viver e
lutar coletivamente por melhores condições de vida e saúde, inclusive, aquelas advindas pelo
lazer.
1.3 O campo do lazer no Brasil
As primeiras preocupações com o lazer no Brasil surgem no início do século XX,
quando o processo de industrialização vinha deteriorando acentuadamente as condições de
vida dos trabalhadores brasileiros. Sem a intenção de reduzir as injustiças sociais e, portanto,
combater esse processo de deterioração, observa-se nos grandes centros o emprego de
estratégias que apenas amenizam (encobrem) seus efeitos. Uma destas foi a construção de
equipamentos públicos de recreação, visando a manutenção da saúde da população e a
recuperação da força de trabalho (MELO e ALVES JÚNIOR, 2003).
Este seria um resultado da transição da economia brasileira de agrário-exportadora
para urbano-industrial. Como meras atividades para manter a saúde e recuperar a força de
trabalho, a utilidade do lazer assim permanece até o final dos anos 60, quando, sob influência
européia, ele é pensado como um fenômeno social capaz de resolver questões políticas, tais
como: i) adaptação do país às mudanças da produção capitalista de mercadorias; e ii)
estratégia para contenção dos movimentos sociais, que enfraquecidos após o golpe militar de
1964, voltavam fortalecidos.
Pode-se dizer que isso ocorre como uma exigência do mercado capitalista, pois da
mesma forma que se expandia a produção de bens duráveis, era necessária uma intervenção
estatal para elevar na mesma proporção o consumo destas. Para Frigotto (1995), vigorava a
tese de que se uma nação subdesenvolvida investisse fortemente no capital humano
14
, ela
entraria em desenvolvimento e, conseqüentemente, se desenvolveria. Foi nessa lógica que o
país detectou a maior taxa de crescimento do mundo. Como resposta à expansão da produção
14
Frigotto (1995, p. 92) caracteriza o capital humano como “saúde, conhecimento e atitudes, comportamentos,
hábitos, disciplina, ou seja, é expressão de um conjunto de elementos adquiridos, produzidos e que, uma vez
adquiridos, geram a ampliação da capacidade de trabalho e, portanto, de maior produtividade”.
23
de bens duráveis, o Estado tratou de oferecer saúde, educação e lazer aos brasileiros e, desta
forma, pretendia-se que a maior parte de seus salários fosse destinada ao consumo destes
bens, o que poderia impulsionar ainda mais a taxa de crescimento industrial.
Neste processo, reconhece-se a importância do Serviço Social do Comércio (SESC),
pois foi por meio deste que, no início da década de 70, o sociólogo francês Joffre Dumazedier
foi contratado para construção e desenvolvimento do campo de conhecimento do lazer no
país. Partindo de observações e enquetes sobre o lazer dos franceses, além de sustentar suas
reflexões sobre o lazer em oposição ao tempo de trabalho, o autor também aponta que outras
obrigações (familiares, as sociais e as religiosas) determinavam a vivência do lazer. Assim,
caracteriza o lazer como
... um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade,
seja para repousar, seja para desenvolver sua formação desinteressada, sua
participação social voluntária, ou sua livre capacidade criadora, após livrar-se ou
desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais (DUMAZEDIER,
1976, p. 34).
Sua tese seria empregada como instrumento para se estabelecer uma verdade sobre o
lazer, que não estaria preocupada exclusivamente nas práticas alegres e lúdicas, mas no
controle de hábitos contrários à obediência e em função de compensação para a produção e
reprodução da força de trabalho (MASCARENHAS, 2005). Colocado em dependência do
tempo liberado das obrigações, são assinaladas três funções inter-relacionadas para o lazer (os
chamados 3D): o descanso, que libera o indivíduo da fadiga advinda pelo trabalho; a diversão
(recreação e entretenimento), que oferece a possibilidade do indivíduo romper com o tédio da
sua rotina diária; e o desenvolvimento da personalidade, favorecendo uma maior participação
social. O lazer teria as seguintes características: i) liberatória: libera o indivíduo de suas
obrigações profissionais, familiares e sociais; ii) desinteressada: não tem finalidade lucrativa,
ideológica ou utilitária; iii) pessoal: representa uma escolha pessoal; e iv) hedonística:
direciona-se ao prazer, pois a satisfação é a condição primeira do lazer (DUMAZEDIER,
1999).
Para Dumazedier (1976), o lazer era a atividade que o indivíduo escolheria para
ocupar seu tempo livre de obrigações, determinando sua participação na vida social e cultural.
Como processo de escolha, seriam obedecidos cinco grupos de interesse: i) manuais:
atividades que podem ser desinteressadas e utilitárias ao mesmo tempo. Pela manipulação de
objetos e produtos podem constituir-se num trabalho não-profissional (por exemplo, a
jardinagem, pesca, bricolagem), que ao adentrar no campo das obrigações e do lazer
24
denomina-se semilazer
15
; ii) físicos: neste grupo os jogos predominam, pois a vida é jogada
em detrimento de compromissos e por isso o lazer representa uma compensação. O jogo é a
exigência da cultura popular nascida do lazer; iii) artísticas: atividades que afastam o
indivíduo da cultura vivida em direção da cultura mística, tal como cinema, teatro e museus;
iv) intelectuais: é a informação desinteressada que apresenta-se como a cultura permanente
para acompanhar as rápidas transformações da sociedade (jornais, rádios etc.); e v) sociais:
são atividades que favorecem a formação das coletividades e os relacionamentos
interpessoais. Segundo Cavichiolli, Cheluchiniak e Augusto (2005), anos mais tarde, Luís
Otávio de Lima Camargo, orientando de Dumazedier em seu Doutorado em Ciências da
Educação, na Universidade de Sorbonne-Paris V, acrescenta uma sexta divisão, a turística.
Nesta, exalta-se a quebra da rotina e a possibilidade de expansão de conhecimentos.
Embora discuta a satisfação de determinadas necessidades humanas (descanso,
diversão e desenvolvimento), Dumazedier (1976) não reflete sobre a dinâmica social que
geram estas necessidades. Elas seriam definidas da mesma forma para todas as pessoas,
desconsiderando-se o fato da sociedade ser dividida por classes. Assim, acabaria
aproximando-se dos pressupostos teóricos do funcionalismo, acreditando que as pessoas
teriam as mesmas necessidades e, por esta razão, estas deveriam ser satisfeitas da mesma
forma para todos (PADILHA, 2000).
Apesar de frisado o interesse e a liberdade dos indivíduos, facilmente eram
identificados outros propósitos. Se o desenvolvimento urbano-industrial era o foco, tudo
aquilo que pudesse atrapalhá-lo devia ser controlado. É óbvio então que o lazer seria um
poderoso projeto para controle ideológico da população, já que após o golpe de 64 houve um
nítido desmantelamento dos movimentos sociais (trabalhadores, estudantes e intelectuais),
através da repressão ao direito de liberdade de expressão e organização. Assim, o lazer
assume a função de vigiar a suposta liberdade da população, tais eram os perigos que o tempo
ocioso poderia acarretar ao sistema (PINTO, 2001), tal como ocorria com o ressurgimento dos
movimentos sociais em detrimento da assustadora pauperização da população.
Desta forma, delineiam-se as abordagens funcionalistas do lazer, que Marcellino
(1998) classifica em quatro grupos: (a) compensatória: o lazer é visto como fonte de prazer e
alegria a ser vivenciada no tempo de não-trabalho. Serve para encobrir as contradições do
mundo do trabalho e as insatisfações da vida humana; (b) utilitarista: objetiva a recuperação
15
Quando no lazer é constatada uma finalidade lucrativa, ideológica ou utilitária, mesmo sem representar uma
obrigação por completo, DUMAZEDIER (1976) classifica a atividade como lazer parcial. Numa mesma são
mescladas uma atividade lazer e uma obrigação, tal como: o jogador de recebe para jogar, o pescador de vara que
vende seu peixe, o jardineiro que cultiva hortaliças para alimentar-se etc.
25
da força produtiva, através de oficinas preparatórias, como os cursos profissionalizantes de
informática e marcenaria; (c) romântica: pela nostalgia do passado, resgata-se o prazer e a
alegria de épocas vividas, esquecendo-se de suas contradições da sociedade; e (d) moralista:
enfatiza a ambigüidade do lazer, uma vez que ao mesmo tempo em que pode ser benéfico
também pode prejudicar a sociedade, já que não permite atitudes que venham contestar a
ordem estabelecida.
Para Padilha (2000) estas abordagens surgem como críticas ao trabalho,
principalmente por representar uma compensação às restrições e descontentamentos advindos
com o mesmo. Exalta-se o lazer como a fórmula mágica para solucionar ou pôr fim às
desagradáveis condições de vida da classe trabalhadora. Contrapondo-se a este viés
funcionalista, desde o início dos anos 80, discussões no campo crítico da Educação Física
brasileira, capitaneadas pelas proposições de Marcellino, demonstram que o lazer não se
efetivava na sociedade por causa das fortes contradições do sistema produtivo e, por esta
razão, seria necessário ressignificar o lazer para, além do desenvolvimento humano, favorecer
a instalação de uma nova ordem social.
Marcellino (1998) entendia que o lazer funcionalista não poderia ser visto como lazer,
mas como a sua negação, isto é, um antilazer representado por simples atividades a serem
consumidas e que alimentam a alienação. No seu entender, ele penetra na vida das pessoas,
adaptando-as perfeitamente à sociedade industrial e urbana. Contrapondo-se a esta tendência,
como já anunciado, ele próprio impulsiona uma nova tendência de reflexão para o lazer no
país. Discutindo o lazer a partir da associação de dois conceitos – tempo e atitude –, de
imediato rompe com a restrição do lazer a um tempo livre, pois não acreditava na existência
de um tempo necessariamente livre de coações ou normas. Optando por tempo disponível,
anuncia o lazer como a experiência vivenciada neste tempo e, a atitude, relaciona ao modo
como o indivíduo lida com esta experiência (o sentido dado/obtido da mesma). Desta forma,
desmistifica a existência do semilazer, já que mesmo atividades como jardinagem e
bricolagem poderiam satisfazer o indivíduo. Entende,
... o lazer como a cultura – compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada
(praticada ou fruída) no ‘tempo disponível’. O importante, como traço definidor, é o
caráter ‘desinteressado’ dessa vivência. Não se busca, pelo menos
fundamentalmente, outra recompensa além da satisfação provocada pela situação. A
‘disponibilidade de tempo’ significa possibilidade de opção pela atividade prática ou
contemplativa (MARCELLINO, 1998, p. 31).
26
Sob esse prisma, Padilha (2000) assinala que lazer e ócio
16
puderam ocupar um
mesmo plano, diferenciando-se apenas na opção: na contemplação privilegia-se o ócio e
quando há o envolvimento em alguma atividade, o lazer. Aproveitando, comenta que a
ociosidade ficava em outro plano, pois, conforme ocorre com o desemprego, não há tempo
disponível, mas um tempo desocupado, que ao invés de ser opção é uma substituição ao
trabalho. Além disso, há indivíduos que, sem recursos para transporte, dirigem-se ao trabalho
caminhando ou pedalando (vários quilômetros) e que, em finais de semana e feriados, optam
por ficar em casa. Seria esta uma opção ou uma necessidade? Possivelmente, uma necessidade
para não afetar ainda mais a sua difícil realidade financeira.
Discutindo o lazer para além de um simples fator de amenização ou alegria para a
vida, como questão de sobrevivência do humano no homem, Marcellino (1998) critica a
organização da sociedade e o fetiche do ter mais (consumo de mercadorias), defendendo a
necessidade de privilegiar o ser mais humano. Exaltando o potencial educativo proporcionado
pelo lazer, ora como instrumento de educação (educação pelo lazer) ora como objeto de
educação (educação para o lazer), o autor preocupa-se com a superação das proposições
funcionalistas. Para isso, não bastaria simplesmente garantir o acesso das pessoas ao lazer,
mas deveria produzir e difundir uma cultura popular que, rompendo com as atitudes
conformistas, proporcionaria condições a uma participação crítica e criativa com vistas à
instalação da nova ordem.
Nessa lógica, associando as expressões educação e humanização, o lazer passaria a ser
interpretado como um meio de transformação da sociedade. De acordo com Pinto (2001), sua
preocupação traz o indivíduo como epicentro que, como ser histórico e social, devia ser
estimulado em sua imaginação, vontade e poder de escolhas. Como um direito, acreditava-se
que o lazer poderia levar as pessoas a administrar conflitos, não simplesmente maquiando-os,
mas que, ao fortalecer resistências, impulsionaria utopias.
Reconhecidamente, estas reflexões deram outros rumos aos estudos do lazer no país,
entretanto, na atualidade, seu pensamento é visto como insuficiente para superar os principais
preceitos funcionalistas, em especial por apontar uma outra funcionalidade ao lazer. Pois,
através de uma mudança de postura frente às necessidades do lazer, preocupa-se em
humanizar o homem e instalar uma nova ordem social. O problema é que esta proposição
fundamenta-se na crença de que transformações no plano cultural, por menor que fossem,
16
Do latim otium, remete “a idéia de tranqüilidade, de repouso, de não fazer nada” (PADILHA, 2000, p. 58).
27
auxiliaria em reflexões que pudessem acarretar mudanças no plano social (CAVIOCHIOLLI,
CHELUCHINHAK e AUGUSTO, 2005).
Fora isso, Mascarenhas (2005) demonstra que a valorização da atitude frente às
necessidades do lazer, por Marcellino, favoreceu a apropriação do lazer pela indústria
cultural. Assim, se antes o lazer era considerado como potencial para a educação e a
humanização, agora, diante das profundas transformações na sociedade (econômicas,
culturais, políticas, sociais e técnicas), e sua conseqüente incorporação pela indústria cultural
e a lógica do lucro, também seria necessário considerá-lo como mercadoria, o chamado
mercolazer. Contudo, mesmo assim, e contrariando a tendência com que muitos estudiosos do
lazer afirmam não ser mais possível revertê-lo, o autor demonstra que um outro lazer ainda é
possível, mesmo na sociedade capitalista.
Considerando a responsabilidade da tríade capitalista (altas tecnologias, globalização e
políticas neoliberais) no assustador crescimento da pobreza e da precarização da vida social
da população mundial, Mascarenhas (2005) demonstra que um outro lazer é possível, porém,
inviável caso uma alternativa de sociedade para além do capital não seja delineada. Na sua
concepção, os desejos de um outro lazer e uma outra sociedade devem integrar um único
projeto que, pela mobilização de pessoas, congregaria as aspirações comuns e a própria noção
de utopia. Defendendo uma sintonia com a história, ressalta a necessidade de se respeitar os
movimentos, as tensões, as contradições e as suas determinações históricas, em especial, para
evitar que seus reais propósitos sejam desviados ou não completados. Embora as metas sejam
planejadas para longo prazo, mudanças mais próximas também devem ser esperadas, como,
por exemplo, àquilo que se refere às questões econômicas que incidem sobre as condições de
vida da população.
Neste sentido, de forma utópica e revolucionária, sem vislumbrar o lazer para o futuro
como simples abstração teórica, e fundamentando-se em princípios éticos-políticos,
Mascarenhas (2005) apresenta uma proposta que, pautada nas relações do presente, visa à
conquista de uma cidadania mais ativa e participativa. A partir da pedagogia crítica de
Paulo Freire, fundamenta o que chama de Lazerania. Pelo diálogo e convívio com as
classes populares, num dialético teorizar a prática, esta é apresentada como um potente
instrumento para aproximação e transformação da realidade.
A lazerania tem como objeto central de preocupação, portanto, a educação, sempre
buscando proporcionar meios e condições aos sujeitos que de seu exercício tomam
parte para refletirem sobre suas condições de vida e sobre a sociedade mais ampla na
qual estão inseridos, possibilitando-lhes não só o acesso, mas o entendimento do
lazer como manifestação de uma cultura e como possível instrumento de ligação
28
com sua realidade. Deste modo, tem seus propósitos fincados sobre a noção de
sujeito social, afastando-se da passividade que cerca a atual condição de consumidor
comum à experiência do mercolazer. E mais, preconiza a noção de direitos e
deveres, incentivando a participação para a tomada de decisões que correspondem à
organização de uma dada coletividade, procurando garantir a reflexão acerca das
relações de poder e do significado das regras e valores necessários à convivência
comum, desmistificando o subjetivismo que cerca a idéia de lazer como fazer o que
se quer, entendendo a liberdade, que deve ser inerente à sua prática, como
consciência da necessidade (MASCARENHAS, 2005, p. 255).
Compreendida como uma ação política e pedagógica, a lazerania é sustentada por
princípios como planificação, participação, autonomia, organização, justiça e democracia,
ou seja, seu poder de transformação da realidade está no estímulo à organização popular para
se impor e autodeterminar. Sendo uma “força de reorganização da sociedade, agência
educativa capaz de fomentar e colaborar com a construção de novas normas, valores e
condutas para o convívio entre os homens” (MASCARENHAS, 2004, p. 13), com base em
Demo (1996), acreditamos que esta pode ser vista como uma política social organizada pela
sociedade civil e que se contrapõe, não simplesmente ao Estado, mas, especificamente, contra
a transferência de seu controle e regulação para o mercado.
Discutindo a lazerania como uma das políticas capazes de promover a transformação
social, Mascarenhas (2005) acredita que a partir delas possa
... resultar num dialético empurrão da superestrutura sobre a estrutura, contribuindo
para deslegitimação ideológica da segunda [...] cobrando, assim, uma política
econômica condizente com o projeto de desenvolvimento humano que se preconiza,
impondo limites à lógica mercantil que hoje comanda a despolitização dos Estados
Nacionais. Política Social requer compromisso econômico. É bom que se dê atenção
a isto, pois as atuais políticas sociais não têm nada de sociais. Ao contrário, são
políticas de exclusão (p. 253-4).
É dessa discussão que o autor demonstra como as políticas de lazer no país, mesmo
com a preocupação de democratizar seu acesso, permanecem excludentes. Em resposta,
defende uma reorientação política que incida nos planos social e econômico (mercado de
trabalho), propiciando o aumento da produção, a redistribuição de renda e, o mais importante,
o aumento de novos postos de trabalhos, o que seria possível pela redução da jornada de
trabalho. Contudo, essa redução da jornada não deve acarretar nem a diminuição dos salários
e, muito menos, aumentar flexibilização das leis trabalhistas, como assim defende a lógica
capitalista. Dispondo de maior tempo livre, acredita-se então que o lazer possa enfim ser
incluso na pauta das reivindicações trabalhistas. Antes, porém, é preciso combater os valores
que o associam à preguiça e vadiagem ou que, pela lógica da mercantilização da vida,
caracteriza-se em bem desnecessário.
29
A orientação geral colocada para o que estamos chamando de política de lazerania
consiste, nesse sentido, em converter a maior quantidade possível de espaços,
equipamentos, projetos e programas de lazer em verdadeiras casamatas da vontade
coletiva. Pressupõe a organização do lazer como mais um espaço de exercício para a
autodeterminação popular rumo a uma nova direção política, da reforma intelectual
e moral para uma nova direção cultural, com indivíduos e coletividades
protagonizando a luta popular pela emancipação frente às estruturas de dominação e
alienação, conquistando, dia-a-dia, uma participação cidadã que acumula
experiências, saberes, habilidades, métodos, enfim, instrumentos de poder que
reivindicam direitos, reconhecem determinações e reclamam transformações
(MASCARENHAS, 2005, p. 263).
A seu ver, esta intervenção crítica do lazer permite que outras dimensões da vida
humana sejam contempladas, como, por exemplo, a saúde. Nessa direção, transitando pelos
campos da Promoção da Saúde e do Lazer, conforme apresentado anteriormente, foram
identificadas aproximações desta proposta com as práticas da Educação Popular em Saúde, o
que permite dizer que a Lazerania apresenta-se como uma possibilidade concreta para a
reconstrução dos elementos de articulação entre a Saúde Pública/Saúde Coletiva e a Educação
Física/Lazer. Fundamentadas na pedagogia de Paulo Freire, ambas auxiliam na construção de
um sujeito/cidadão, permitindo a sua compreensão do porquê das suas condições de vida e,
em contrapartida, proporcionando elementos que possam contribuir na luta pela mudança das
condições que possam estar deteriorando sua saúde.
E isso bem pode ser pensado a partir do fenômeno esportivo, uma vez que este “possui
um enorme potencial para mobilizar interesses, ativar a participação, possibilitar acertos,
valorizar avanços, desafiar o pensamento, melhorar a auto-estima, instalar o entusiasmo e
despertar a confiança” (MASCARENHAS, 2005, p. 267) e, portanto, pode contribuir com o
processo de construção da consciência individual e coletiva. Para isso, no entanto, sua
preocupação não deve estar na formação de atletas ou no desenvolvimento da aptidão física,
mas, pelo questionamento (problematização) das suas atuais formas e manifestações
17
,
propiciar condições à conscientização dos envolvidos sobre a importância de participarem da
construção da sociedade, a iniciar pela garantia do seu direito ao lazer em espaços de
qualidade.
17
Para Proni (2002) as atuais formas e manifestações do esporte reproduzem as características da sociedade
capitalista: i) a especialização esportiva assemelha-se ao produto da divisão social do trabalho (técnica do
corpo); ii) a busca pelo máximo rendimento torna o recorde similar a uma medida da capacidade produtiva
almejada; iii) o esporte apresenta-se como uma corrida contra o relógio (o tempo capitalista); iv) o espetáculo
esportivo converte-se em mercadoria; v) os esportistas perdem sua individualidade (despersonalização e
massificação); e vi) a produtividade do sistema esportivo passou a ser medida pelo número de atletas
internacionais produzidos ou pelo número de medalhas obtidas.
30
1.4 O futebol como possibilidade pedagógica
Acreditamos que o futebol apresenta-se como um importantíssimo conteúdo
pedagógico para a reconstrução deste entendimento da relação lazer e saúde. Trata-se do
esporte mais popular do mundo, o que, segundo Grando (2004), deve-se ao fato dele ser uma
prática barata e de fácil adaptabilidade aos mais diferentes espaços físicos, número de atletas,
materiais, regras. Além disso, é um esporte constantemente utilizado com fins políticos e
ideológicos, tal como no período da Ditadura Militar no país, quando “serviu como forma de
integração e de produção da imagem de uma grande nação, sob os ideais de ordem e
progresso” (GRANDO, 2004, p. 273).
Este discurso ideológico, inclusive é reforçado por ocasião da 18ª Copa do Mundo de
Futebol, na Alemanha, quando o Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, reconhece seu
sentimento de inveja em relação à FIFA e à Copa do Mundo de Futebol.
Como o único jogo realmente global, praticado em todos os países, por todas as
raças e religiões, é um dos poucos fenômenos tão universais quanto as Nações
Unidas. Podemos até dizer que é ainda mais universal. A Fifa tem 207 membros.
Nós temos 191. Mas existem outros motivos de inveja. Primeiro, a Copa do Mundo
é um evento no qual todos conhecem seus times e o que eles fizeram pra chegar até
lá. Todo mundo sabe quem fez um gol e como e quando ele foi feito, conhece quem
perdeu a oportunidade de fazê-lo e lembra quem conseguiu evitar um gol de pênalti.
Gostaria que tivéssemos mais competições desse tipo na família das nações. Países
competindo pela melhor posição na escala de respeito aos direitos humanos [...].
Segundo, a Copa do Mundo é um evento sobre o qual todo o planeta adora
conversar. Discutir sobre o que seu time fez de certo e o que podia ter sido feito
diferente, sem mencionar o que o time adversário fez ou deixou de fazer. [...].
Normalmente, adolescentes calados tornam-se, de repente, eloqüentes, confiantes e
incríveis especialistas em análise. Eu gostaria que tivéssemos mais desse tipo de
conversa mundo afora. [...]. Terceiro, a Copa do Mundo é um evento que acontece
num campo igualitário, onde todos os países têm a chance de participar em termos
eqüitativos. Somente duas qualidades importam nesse jogo: talento e trabalho em
equipe. Eu gostaria que tivéssemos mais dessa homogeneidade na arena global.
Negociações livres e justas, sem a interferência de subsídios, barreiras ou tarifas.
[...]. Quarto, a Copa do Mundo é um evento que ilustra bem os benefícios da
interação entre pessoas e países. Cada vez mais seleções nacionais contratam
técnicos e jogadores de outros países, que trazem novas formas de se pensar e jogar
[...]. Eu gostaria que fosse igualmente simples para todos enxergarem que a
migração humana em geral pode criar ganhos triplos para migrantes, para seus
países de origem e para as sociedades que os recebem. [...]. Mas talvez o que nós
mais invejamos na ONU é que a Copa do Mundo é um evento no qual vemos
realmente os gols serem alcançados. E não estou falando somente dos gols que um
país marca. Também estou me referindo ao gol mais importante de todos: estar
representado lá, fazendo parte da família das nações e celebrando a humanidade
comum a todos (NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL, 2006, p.1).
No entanto, para que ele possa contribuir é necessário e urgente romper com suas
práticas atuais, ou seja, ele deve ser estudado, refletido, entendido e, quando necessário,
31
transformado. Capela e Matiello Júnior (2005) situando o esporte em prol da libertação e
como elemento fundamental da defesa da vida humana, embasados na obra de Paulo Freire,
assinalam que este não deva ser ensinado como uma mera cópia do esporte de rendimento,
mas pensado a partir de transformações didáticas que ao incorporar novas concepções
antropológica, filosófica e científica, supera o pensamento hegemônico, um tanto quanto
elitista e machista, e que privilegia a simples reprodução das técnicas e regras do esporte de
rendimento.
Complementando, Capela (1996) acredita que o ensino deve resgatar (considerar) a
história cultural tanto da prática do futebol como das próprias crianças, além, é claro, a cultura
local, regional, nacional e global gerada a partir do mesmo. A seu ver, esta é uma
possibilidade de garimpar em seu processo histórico-sócio-cultural o que há de original e
emancipatório em suas práticas. É preciso
... considerar que o futebol, como outro esporte, ao ser ‘pedagogizado’, deve
possibilitar ao aluno a compreensão de todas as suas dimensões, atendendo aos
diferentes níveis de aprendizado: como jogo, como técnica de corpo, como
profissão, como espetáculo, como mercadoria, etc. Como elemento da cultura
corporal, esse esporte pode tanto possibilitar a reprodução das relações excludentes e
preconceituosas enraizadas na cultura, como, ao ser problematizado, possibilitar a
superação dessas práticas numa reflexão crítica da realidade. Isto é, como um ícone
da cultura ocidental pode ser tratado nas aulas de Educação Física tanto como um
elemento de assimilação e alienação quanto um conteúdo que promove a educação
intercultural, reconhecendo e valorizando a diversidade cultural presente na
sociedade brasileira (GRANDO, 2004, p. 275).
Discursando sobre a formação de jogadores nas categorias de base, Souza (2001b)
propõe um ensino estruturado em quatro eixos: i) movimento corporal: sob o entendimento de
que o movimento corporal é muito mais complexo do que revelam as análises científicas
acerca de gestos estereotipados, ignorando a existência de um ser social se movimentando.
Assim, deve-se considerar o mundo vivido das crianças, que é rico em vivências corporais,
tais como as advindas pelas brincadeiras na rua, na ladeira, soltando pipa, pulando valas etc.;
ii) obtenção da maioridade sócio-política: a espetacularização do futebol tem transformado o
jogador de futebol num produto rentável, que sem senso crítico e reflexivo permite a
exploração de sua força-de-trabalho. Esta exploração, por conta da legislação (Lei Zico, Lei
Pelé etc.), tem ocorrido cada vez mais cedo e perdura até que haja retorno financeiro com a
mesma. Como superação, propõe-se que a formação de novos jogadores vise a sua resistência
no que tange a sua dominação (por exemplo, o conhecimento de seus direitos); iii) interação
social: o intenso processo de exclusão observado na sociedade capitalista, leva a milhares de
crianças sonharem em melhorar suas condições de vida pelo futebol. O problema é que por
32
poucos assim conseguirem, a competição entre uns e outros é crescente, privilegiando-se
exclusivamente a individualidade. Nesse sentido, deve-se pensar em práticas que possam
favorecer (resgatar) o sentido da coletividade presente no futebol; e iv) além da técnica, o
futebol deve respeitar o interesse das crianças, o mundo/cultura em que vivem, valorizando
sua iniciativa, imaginação e reflexão. Fora isso, pode-se pensar também na formação do
cidadão.
É com base nas produções mencionadas (CAPELA, 1996; CAPELA e MATIELLO
JÚNIOR, 2005; GRANDO, 2004 e SOUZA, 2001b) que foi estruturada uma intervenção no
Bairro Lagoa, em Irati (PR), onde o futebol é a grande ocupação do lazer (e da especialização
desportiva precoce) daqueles moradores.
CAPÍTULO II
O FAZER INVESTIGATIVO POR UM LAZER RELACIONADO À SAÚDE
O conhecimento tanto em sua produção como divulgação estaria articulado aos
interesses de classes e quando se foca a neutralidade científica corre-se o risco de beneficiar a
manutenção do status quo e os interesses burgueses (FRIGOTTO, 1993). Contudo, nem toda
produção científica e crítica do sistema tem a capacidade de impulsionar mudanças,
principalmente, quando estão limitadas ao plano teórico. Se o intelectual se acha esperto em
identificar uma falha e emitir crítica sobre a mesma, pode-se dizer que o sistema é ainda mais.
Ele descobriu “que a crítica sem prática lhe serve muito, pois incute a idéia de democracia nas
idéias. É muito bom que exista o crítico, desde que não seja prático, porque com isto o
sistema pode apregoar que não reprime quem tem idéias opostas” (DEMO, 1991, p. 98).
Na maioria das vezes, para que as mais singelas mudanças ocorram, é necessário que
uma proposição teórica configure-se numa teoria em prática, fazendo parte da chamada luta
contra-hegemônica. É quando são desvelados e desarticulados os interesses dominantes que
giram em torno de determinado objeto de estudo, rearticulando-os em prol dos interesses
populares, com a consistência, a coesão e a coerência de uma concepção de mundo
(SAVIANI, 2004). Tradicionalmente, no interior das pesquisas qualitativas, estas
investigações adotam enfoques de trabalho de campo.
Para Minayo (2004) o trabalho de campo apresenta-se como uma etapa essencial da
pesquisa qualitativa, que a rigor não poderia ser pensada sem ele.
A prática do trabalho de campo se dedica, fundamentalmente, à construção de dados
empíricos de um estudo, seja ele de pesquisa voltada para a produção de
conhecimento e/ou para a avaliação. Ao contrário da idéia positivista de coleta, que
supõe o observador externo indo aos locais para recolher coisas (inclusive fatos), a
proposta construcionista valoriza as premissas e as categorias do investigador, [...],
mas, simultaneamente, faz um movimento intencional de busca comunicativa com
as representações, valores, crenças, opiniões e categorias empíricas provenientes dos
investigados, em interação e intersubjetividade (DESLANDES, 2005, p. 158).
Sendo assim, no processo de reconstrução dos elementos de entendimento da relação
lazer e saúde, tomando como referência a Lazerania e orientando-se por alguns pressupostos
da Educação Popular em Saúde, foram fundamentais dois conceitos já anunciados
introdutoriamente: processo saúde-doença e reprodução social. Com estes conceitos,
procuramos desvelar a realidade social do bairro, para, progressivamente, estruturar a
intervenção da escolinha de futebol que foi além da simples instrumentalização técnica e
34
reprodução de gestos formatados pelo alto rendimento. O que propomos foi o futebol como
uma prática social e educativa de lazer.
Conceber o lazer como prática social e pedagógica é ver no conjunto de suas
atividades a possibilidade de produção e construção de um conhecimento que, em
seu caráter crítico e emancipador, guarda uma estreita ligação com o real, extraindo
dados e elementos, desvelando suas origens, identificando as contradições e
localizando o lugar que ocupa na totalidade de um determinado contexto. A ação
educativa do lazer passa então a ser vista como um constante teorizar a prática, cuja
exigência de processos organizados de abstração nos permite torná-los instrumento
concreto de aproximação e transformação da realidade (MASCARENHAS, 2004, p.
37).
Nessa direção, diante das contradições do futebol que reproduzem a sociedade
capitalista em seu atual estágio, suas atuais formas e manifestações foram questionadas,
refletidas, entendidas e, quando necessário, até transformadas (CAPELA e MATIELLO
JÚNIOR, 2005). Assumimos o desafio de preencher pedagogicamente o tempo de lazer das
crianças, com uma educação para e pelo lazer, que, dialeticamente conjugadas, foram
direcionadas à prática de liberdade, visando à conquista da cidadania
18
, e, dentro de seus
limites
19
, impulsionar melhorias nas suas condições de vida e saúde.
2.1 O campo de investigação
Embora tenhamos anunciado que o “campo” não se resume a um recorte espacial,
convém dizer que o município de Irati
20
distancia-se a 138 km à oeste da capital paranaense e
que o Bairro Lagoa localiza-se na região sudoeste do perímetro urbano, aproximadamente a 5
km da região central, conforme se observa na figura 1.
18
A cidadania pode ser definida como a “competência humana de fazer-se sujeito, para fazer história própria e
coletivamente organizada. Para o processo de formação dessa competência alguns componentes são cruciais,
como educação, organização política, identidade cultural, informação e comunicação, destacando, acima de tudo,
o processo emancipatório. Este funda-se, de partida, na capacidade crítica, para, com base nesta, intervir na
realidade de modo alternativo. O desafio maior da cidadania está na pobreza política, que está na raiz da
ignorância acerca da condição de massa de manobra. Não-cidadão é sobretudo quem, por estar coibido de tomar
consciência crítica da marginalização que lhe é imposta, não atinge a oportunidade de conceber uma história
alternativa e de organizar-se politicamente para tanto. Entende injustiça como destino. Faz a riqueza do outro,
sem dela participar” (DEMO, 1995, p. 1).
19
Seria utópico acreditar que uma intervenção, em apenas três meses, pudesse melhorar as condições de vida e
saúde desta população, entretanto, por menor que seja sua contribuição, como, por exemplo, a possibilidade de
melhoria nas instalações da quadra esportiva, certamente ela é muito válida, pois nutre a população de
experiência de atuação política concreta e bem sucedida.
20
Em 15 de julho de 2007, Irati comemorará seu primeiro centenário de emancipação política.
35
Figura 1. Localização do Município de Irati e do Bairro Lagoa
Se o campo não dizia respeito somente ao espaço geográfico denominado “Lagoa”,
não seria possível pensar que a entrada no mesmo ocorreria somente pelo “ir ao bairro”.
Deslandes (2005) anuncia que a forma como o pesquisador se comporta para entrar,
permanecer e sair do campo pode trazer tanto conseqüências positivas como negativas, isto é,
pode contribuir para o trabalho ou, por outro lado, inviabilizá-lo. Nesse sentido, a entrada em
campo requer uma aproximação estratégica, incluindo-se a forma de “como apresentar-se, a
quem se apresentar, através de quem, com quem estabelecer os primeiros contatos”
(MINAYO, 2004, p. 103).
Nossa opção foi uma aproximação junto à Associação dos Moradores Progresso do
Bairro Lagoa, mediante contato direto com seu presidente, sendo que, numa linguagem não-
acadêmica, apresentamos os objetivos da investigação. Pode-se dizer que este contato foi
favorecido pelo nosso anterior envolvimento nos mais diversos projetos extensionistas de
esporte e lazer desenvolvidos pela Universidade Estadual do Centro-Oeste, no município.
Assim, além de previamente conhecidos pela comunidade, também demonstramos grande
sensibilidade para com as lacunas das políticas municipais de lazer, em especial, no que tange
a questão dos bairros.
Esta aproximação, além de propiciar nossa aceitação junto à principal liderança local,
também se revelou crucial para o desenvolvimento da investigação. Proporcionou
informações sobre o bairro ao qual retornávamos, agora na qualidade de educador-
pesquisador, e estas foram decisivas na elaboração do “calendário de viabilidade e realização
36
da etapa empírica” (MINAYO, 2004, p. 103), que foi dividida em duas etapas: i) Escolinha de
Futebol para Crianças, com a formação da turma ocorrendo a partir de visita às residências
(em algumas ruas estrategicamente selecionadas); e ii) entrevistas semi-estruturadas com
informantes culturais privilegiados do bairro, observações de reuniões da Associação dos
Moradores, bem como análise de documentos julgados importantes para compreensão do
lazer e saúde na vida social do bairro, tais como o Estatuto da Associação dos Moradores e os
Projetos Político-Pedagógicos de duas escolas locais.
Para as duas etapas, consideramos que a investigação seria facilitada na medida em
que não procurássemos confirmar aquilo o que já supúnhamos, mas compreender o campo
como possibilidade de novas revelações. Deslandes (2005, p. 167) comenta que diversos
autores recomendam ao pesquisador adotar a postura de aprendiz, ou seja, “daquele que busca
aprender sobre a cultura local, sobre comportamentos e práticas que desconhece”. Além disso,
tomamos “cuidado teórico-metodológico com a temática explorada, considerando que a
mesma não se explica por si só” (CRUZ NETO, 2004, p. 56).
2.2 A aproximação com as crianças
Para aproximação com as crianças, a fim de formar a turma de trabalho, consideramos
a recomendação de Cruz Neto (2004) de que esta deveria visar um melhor conhecimento da
realidade para estabelecer sólidos laços de intercâmbio. Para tanto, o primeiro passo foi
selecionar uma área para iniciar as aproximações com a comunidade. Se a quadra esportiva do
bairro seria o local de desenvolvimento da escolinha (entenda-se como investigação),
tomando-a como referência, procuramos identificar as residências próximas e, a partir de
visita a estas, apresentar os objetivos da investigação, convidando as crianças ali residentes
para participar.
Nessa direção, conforme se observa na figura 2, foram selecionadas as residências
localizadas à Rua Vladislau Marinski (à leste da Rua Elias Onesko), Rua Rio Ipiranga (à leste
da Rua Elias Onesko), Rua Elias Onesko (da Rua Londrina até a Rua Rio Ipiranga) e Rua
Particular (entre a Rua Rio Ipiranga e Rua Vladislau Marinski).
37
Figura 2. Área selecionada para a aproximação com as crianças
Fonte: Google Earth
Depois de identificada a área selecionada para a aproximação, as visitas foram
realizadas num sábado, no período vespertino, já que assim haveria uma maior probabilidade
dos responsáveis pelas crianças serem encontrados em suas respectivas residências. Enquanto
apresentávamos com professor de Educação Física e mestrando em Educação Física, da
Universidade Federal de Santa Catarina, demonstrando as possíveis repercussões favoráveis
advindas pelo processo investigativo, ao contrário do que menciona Deslandes (2005), não
fomos interrogados sobre nossos propósitos. A nosso ver, já na apresentação, a comunidade
sentia-se minimamente confortável com nossa presença, o que, inclusive, seria reflexo da boa
receptividade existente no bairro.
Além de não questionar, a comunidade demonstrava que a investigação seria
importante, pois acreditavam que se as crianças estivessem ocupadas com projetos desta
natureza, dentre outras situações, não se envolveriam com drogas e/ou violências. Além disso,
a investigação serviria para dar outro sentido à quadra.
Ela serve apenas de local para que viciados de um bairro próximo se encontrem à
noite para fumar maconha. Eu até ando conversando com outros moradores para
fechar e transformá-la numa creche; no bairro não existe creche; daí nós temos que
se dirigir para outro bairro, para deixar as crianças na creche (palavras de um
morador).
38
Contribuindo para o posicionamento deste morador, está o fato da quadra encontrar-se
em péssimas condições, pois ela foi construída na década de 80 e, posteriormente recebeu
poucas melhorias (se é que houve melhorias). A Figura 3 revela algumas características desta
quadra.
Figura 3. As condições da quadra esportiva do bairro
Como se vê: (a) o mato toma conta das laterais da quadra; (b) há insegurança em
relação às tabelas de basquetebol, já que uma caiu e a outra também está ameaçada; (c) a trave
improvisada com pedaços de madeira dificilmente fica firme no lugar; (d) o alambrado está
muito deteriorado e, dessa forma, é comum que as bolas chutadas alcancem as residências
próximas, gerando um mal-estar entre os usuários da quadra e os vizinhos; (e) há buracos no
piso, que também é muito áspero. Assim, quando as crianças preferem jogar sem calçado para
não gastar seus tênis, elas acabam expondo-se aos perigos de se machucarem com os buracos.
As bolas utilizadas na quadra também não duram muito; (f) as linhas demarcatórias foram
improvisadas por uma professora da Escola Municipal da Lagoa, que comprou as tintas e em
mutirão com os alunos as pintaram. Por fim, é necessário emitir comentários sobre a água,
algo que não é disponível na quadra, pois nela não há sistema de água encanada. Assim, nem
sempre seria possível beber água quando se estivesse com sede.
Além disso, outras impressões sobre as possibilidades do lazer no bairro foram obtidas
a partir de três perguntas previamente definidas e feitas durante as visitas: Há criança(s) na
residência? Ela(s) gostaria(m) de participar da escolinha? Ela(s) poderia(m) participar?
Estas permitiram as seguintes compreensões: i) a concepção de criança dos moradores; ii) o
interesse das crianças em aprender jogar futebol próximo de suas residências; iii) as
39
possibilidades das crianças vivenciarem o lazer no bairro; e iv) se entendem o futebol como
uma prática exclusiva de meninos.
Quanto a concepção de criança, de modo geral, as respostas indicam compreender que
ela é vista como uma simples fase de preparação para a vida adulta, que inicia ou a partir dos
18 anos ou quando há o ingresso no mercado de trabalho. O trabalho, por transmitir um
sentido de responsabilidade, distinguiria quem seria ou não criança. Outra consideração que
se pôde observar foi a preocupação quanto a faixa etária que a escolinha atenderia. Assim,
nitidamente alinham-se ao pensamento hegemônico da Área da Atividade Física Relacionada
à Saúde, que condiciona suas intervenções a aspectos biológicos (faixa etária, nível de
maturação, força física etc.). Em geral, é isso que se concretiza no ensino do futebol, com
características vinculadas ao rendimento, quando as turmas são formadas a partir da faixa
etária, correspondendo a diferentes categorias (fraudinha, mirim, infantil, infanto-juvenil,
juvenil, adulto e veterano).
Procurando romper com esta lógica, e apoiando-se em Freire (1996, p. 144),
evidenciamos que estas divisões seriam desconsideradas, pois este trabalho seria com pessoas,
independente das suas características; seria “gente formando-se, mudando, crescendo,
reorientando-se, melhorando, mas, porque gente, capaz de negar os valores, de distorcer-se,
de recusar, de transgredir”. Enfim, trabalharíamos com sujeitos sociais e históricos que
poderiam conviver juntos num mesmo projeto e com vistas a participarem coletivamente da
construção de uma outra sociedade (a princípio apenas esportiva, mas com muito potencial
para expandir-se).
Em relação ao interesse pelo futebol e a oportunidade de aprender a jogá-lo próximo
de suas residências, constatamos que o interesse existia e era exaltado com louvor,
basicamente pela possibilidade de ser uma atividade para ocupar o tempo em que as crianças
estão fora da escola. Os moradores acreditam que se este tempo for ocupado com atividades
ditas “saudáveis”, as crianças estariam livres do mundo das drogas e das violências. Enfim,
também assumem o discurso funcionalista de que o esporte/lazer é a fórmula mágica para pôr
fim aos problemas sociais do mundo. Apesar desta visão, constatamos que muitas não
poderiam participar da escolinha, pois estudavam à tarde (escola regular ou catequese). Foi
interessante a fala de um pai sobre o porquê dele deixar seu filho jogar futebol como lazer,
mas não como profissão. Isso porque ele é evangélico e não deseja que seu filho rompa com
os valores que a sua família segue e, o futebol como profissão, não condiz com os mesmos.
Por fim, em meio aos discursos sobre a existência de crianças nas residências e que
desejassem e pudessem participar da escolinha, confirmou-se nossa suposição de que os
40
moradores consideram o futebol como uma prática exclusiva dos meninos. Tanto é que numa
residência, quando indagado se suas filhas gostariam de participar, um morador respondeu
que o futebol não é coisa para meninas, porque não pegava bem. Mesmo assim, deixamos
claro que a escolinha era voltada para “crianças”, ou seja, tanto para meninos quanto para
meninas.
A cada visita encerrada, agradecendo a atenção vinda dos responsáveis, informamos
que se as crianças tivessem interesse e a possibilidade de participar da escolinha, bastaria a
elas comparecer na quadra no dia e horário marcado para se inscrever. Neste, com base num
Projeto de Trabalho que daria ênfase ao diálogo, coletivamente (pesquisador e as nove
crianças presentes) determinamos os dias e horários de desenvolvimento da escolinha:
segundas e sextas-feiras, das 14 às 15 horas, e, quartas-feiras
21
, das 13 às 15 horas. Outra
decisão coletiva foi quanto ao número mínimo e máximo de crianças que participariam da
mesma, respeitando, é claro, a capacidade da quadra e dos materiais disponíveis. Assim,
compreendendo a necessidade de estendermos o convite a outras crianças, decidimos que,
para a próxima aula, cada criança convidaria uma outra criança para participar. E foi isso o
que aconteceu: no segundo encontro havia mais crianças e, na seqüência, outras surgiram.
Contudo, por se tratar de uma investigação que seguia recomendações éticas
22
, só
foram aceitos os alunos que se inscreveram até o fim da segunda semana da escolinha e, desde
que seus pais/responsáveis tivessem autorizado sua participação, assinando o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido para Menores de 18 anos
23
. A estratégia para obter a
assinatura deste foi da seguinte forma: ao final da segunda semana, retornamos às residências
dos inscritos e, relembrando
24
os objetivos da investigação, demonstramos a necessidade das
crianças terem consentimento para participarem da mesma. Compreendendo que para esta
formalidade os pais/responsáveis necessitariam de um tempo para analisar o documento,
recomendamos que as crianças deveriam levar este (assinado ou não) na próxima aula e, dessa
forma, no total, 18 crianças (meninos) foram autorizadas a participar da escolinha.
21
Neste dia da semana, as crianças têm aula de catequese às 16:30 horas. Assim, entendemos que a escolinha
desenvolvendo-se até as 15 horas favoreceria tanto a participação nesta, como não atrapalharia a freqüência na
catequese.
22
Conforme recomendação e aprovação pelo Comitê de Ética na Pesquisa com Seres Humanos, da UFSC
(Anexo C).
23
O modelo deste Termo de Consentimento, assim como do Termo de Consentimento para a realização das
entrevistas e dos Termos de Autorização para observação de Reunião da Associação dos Moradores Progresso
do Bairro Lagoa e para análise do Estatuto da referida Associação e dos Projetos Político-Pedagógicos das duas
escolas locais, seguem nos Apêndices deste trabalho.
24
Como algumas crianças ingressaram na investigação através do convite das próprias crianças, neste retorno,
em algumas residências, adotamos a mesma estratégia de aproximação anteriormente apresentada.
41
A fim de preservar a identidade destas crianças, seus nomes foram substituídos pelos
nomes dos jogadores que compuseram a seleção brasileira de futebol, na Copa do Mundo do
Japão e Coréia, em 2002, e que se sagrou pentacampeã. A opção por assim procedermos
deve-se ao fato de que desde o início dos trabalhos elas mencionavam “o sonho” de serem
jogadores profissionais. Foram relacionados os nomes de 18 jogadores da seleção, que depois
de classificados em ordem alfabética, foram postos ao lado de uma relação que continha o
nome das crianças e que, da mesma forma encontrava-se classificados por ordem alfabética, a
fim de observarmos a sua devida correspondência.
2.3 O caminho que se fez caminhando
Na proposta da intervenção pela Lazerania, Mascarenhas (2005) enquanto buscava
referências no campo do lazer, constatou que os métodos sugeridos (a animação cultural e a
animação dialética) eram incapazes de proporcionar as mudanças necessárias conforme se
encontra a realidade brasileira. Por conseqüência, adentrando em outros campos, o autor
encontrou na obra de Paulo Freire uma concepção pedagógica que, operando
... com a idéia de ‘lazer problematizador’, reclamando o ambiente, a disponibilidade
e as condições para que a reflexão elaborada e gerada a partir da vivência da cultura
lúdica, busca assegurar às classes populares a apropriação de um saber
correspondente às suas experiências e reais necessidades, possibilitando-lhe o
desenvolvimento de habilidades e valores necessários à sua autodeterminação como
sujeito coletivo (MASCARENHAS, 2005, p. 272).
Como uma pedagogia que produz conhecimento a partir das experiências da classe
popular no seu próprio cotidiano, construiu uma proposta de intervenção que, orientada por
ciclos temáticos, permite uma articulação do lazer com os problemas vividos pelo grupo
envolvido, materializando-se numa práxis político-pedagógica. Com base nas suas
recomendações, o desenvolvimento desta escolinha de futebol apresentou-se como um
processo em constante construção e redefinição
25
(através de diagnósticos, inclusive com a
participação das crianças
26
), sendo estruturada em: i) tema gerador ou eixo condutor; e ii)
rede temática, que engloba os sub-eixos orientadores.
25
Em conformidade ao pressuposto dialético, que se formula a partir da realidade e que, depois de referenciada
pela teoria, retorna-se novamente para a prática. Conforme Mascarenhas (2004) é um constante teorizar a
prática.
26
Contrariamente ao que poderia se pensar o ensino do futebol baseado em técnicas, ao longo dos três meses,
foram realizadas três avaliações coletivas (uma por mês) sobre o andamento dos trabalhos. Nestas, além das
crianças opinarem sobre os trabalhos, esta foi uma forma para se recuperar os elementos já trabalhados.
42
2.3.1 O sonho de ser jogador profissional como tema gerador
Partindo da hipótese de que o fascínio pelo futebol no bairro venha da possibilidade de
ascensão social¸ assumimos como tema gerador a priori: o sonho de ser jogador profissional.
Este, durante a ação diagnóstica, revelou-se bem apropriado, já que diversas crianças
demonstraram o desejo de um dia ser jogador profissional de futebol, o que poderia significar
fama, sucesso, dinheiro, enfim, melhorias em suas condições de vida. Assim, se o objetivo de
ser jogador de futebol estaria na possibilidade de mudar as condições de vida,
indiscutivelmente, as crianças desejavam mudanças em seus perfis de reprodução social, ou
seja, conforme já anunciado, uma das categorias centrais desta investigação.
Numa investigação temática, o tema gerador apresenta-se como um
... processo de busca, de conhecimento, por isto tudo, de criação, exige de seus
sujeitos que vão descobrindo, no encadeamento dos temas significativos, a
interpenetração dos problemas. [...]. Por isto é que a investigação temática se fará
tão mais pedagógica quanto mais crítica e tão mais crítica quanto, deixando de
perder-se nos esquemas estreitos das vies parciais da realidade, das visões
‘focalistas’ da realidade, se fixe na compreensão da totalidade. [...]. Assim é que, no
processo de busca da temática significativa, já deve estar presente a preocupação
pela problematização dos próprios temas. Por suas vinculações com outros. Por seu
envolvimento histórico-cultural (FREIRE, 1981, p. 117-118).
Nessa lógica, o tema gerador o sonho de ser jogador profissional acabou
fragmentando-se em diferentes temas, constituindo a rede temática de trabalho.
2.3.2 A rede temática gerada pelo sonho de ser jogador profissional
Considerando o sonho de ser jogador profissional, procuramos construir uma rede
temática que propiciasse, além do ensino do futebol, discussões, reflexões e a compreensão de
que uma outra sociedade poderia ser pensada a partir do fenômeno futebol, em especial, por
serem desveladas algumas de suas contradições, assim como exaltadas suas possíveis
contribuições. Pode-se dizer que esta é a intenção da rede temática, sugerindo,
... um conjunto de perguntas e respostas, insere o tema em um profícuo debate.
Trata-se de uma importante estratégia que autoriza a realização de um esclarecedor e
poderoso diálogo – mediado pelo tema gerador – entre o grupo e sua realidade.
Nessa perspectiva, a rede estabelece relações em simultaneidade com o particular da
atividade de lazer e com o que é estrutural do tema. E não pára por aí – aprofunda o
tema permitindo a descoberta dos diferentes interesses e determinantes que o
atravessam e serve de ponte, estabelecendo nexos para a síntese entre o concreto das
atividades e sua abstração conceitual. Tudo isto por meio da pergunta e da dúvida
(MASCARENHAS, 2004, p. 43).
43
Considerando a curta duração do mestrado e dentro dele o tempo exíguo para
intervenção, ela foi organizada em quatro sub-eixos: i) alimentando o sonho de ser jogador
profissional; ii) o jogador de futebol como um trabalhador do esporte; iii) os problemas do
futebol; e iv) as contribuições do futebol. Estes acabaram orientando a intervenção que se
desenvolveu ao longo dos meses de maio, junho e julho de 2006. Convém dizer que a opção
por estes meses não foi ao acaso. Foi uma estratégia para utilizarmos os apelos televisivos em
torno da Copa do Mundo da Alemanha e, por isso, sua organização acabou englobando tanto
o antes como o durante e o depois do evento, principalmente, porque ele poderia instigar
valiosas reflexões.
Reflexões que foram possíveis de serem feitas quando o tempo destinado às atividades
de aquecimento e alongamento (inclusive as que serviriam como atividades de volta à calma),
foi (re) significado. Normalmente, este tempo é empregado como um preparativo para o jogo
(aspectos fisiológicos), contudo, nesta investigação serviu de estratégia para aproximar as
crianças umas das outras e com o pesquisador, favorecendo o resgate das relações pessoais e,
em vez de preparar para o jogo, apresentam-se como importantes momentos educativos para o
lazer. Assim, os 10 ou 15 minutos iniciais das aulas apresentavam-se como oportunidade para
serem introduzidos assuntos variados (muitos relacionados ao cotidiano das crianças), que,
quando possível, também eram levados para as atividades futebolísticas.
Por sua vez, no final da aula (nos últimos 5 ou 10 minutos), a atividade de volta à
calma era empregada na recuperação dos principais pontos discutidos no dia. Na seqüência,
são apresentados os sub-eixos orientadores desta proposta.
2.3.2.1 Alimentando o sonho de ser jogador profissional
Embora existisse a pretensão de se superar o pensamento hegemônico sobre o ensino
de futebol, que de modo elitista e machista privilegia a simples reprodução das técnicas e
regras do esporte de rendimento, era óbvio que não poderíamos esquecer do objetivo com que
as crianças aceitaram o convite de participar do projeto: aprender a jogar futebol. Assim,
mesmo que a esportivização do lazer não fosse o objetivo, com base em Freire (1996), não
negamos o direito das crianças sonharem em no futuro tornarem-se jogadores profissionais.
Contudo, o ensino de movimentos e técnicas futebolísticas acabou servindo prioritariamente
de estratégia para reflexão dos participantes com a sua própria realidade.
Através do jogo global, nossa pedagogia de ensino procurou resgatar a história cultural
tanto do esporte futebol como das próprias crianças, além, é claro, a cultura local, regional,
44
nacional e global gerada pelo mesmo. Para isso, o processo de ensino-aprendizagem-reflexão
do futebol como esporte partiu da pergunta: O que é preciso para jogar futebol?
As respostas obtidas alinharam-se ao pensamento tradicional a respeito destas
necessidades: bola, campo, trave, habilidade, jogadores e regras. Refletindo sobre cada uma
destas, logo observamos que bola e campo existiam, mas a falta de uma trave era evidente
27
.
Com pedaços de madeira trazidos pelas crianças, uma trave foi improvisada. Em relação à
habilidade, houve consenso que o objetivo de estar numa escolinha de futebol era aprender;
por isso, esta habilidade poderia vir com a freqüência nas aulas. Quanto às regras, pode-se
dizer que por jogarem o futebol que reproduz o esporte de alto rendimento, conforme vêem
pela televisão, elas já estavam bem assimiladas. Contudo, sem exceção, as crianças nem
supunham como se deu o processo de elaboração das mesmas, aliás, nem faziam idéia de
como este esporte surgiu.
A fim de proporcionar-lhes esta compreensão, e que ela pudesse ser estendida para a
família das crianças, como um processo de socialização, foi adaptada a atividade do correio
futebolístico proposto por Silva (2003). Embora soubéssemos que a leitura de textos não seria
algo muito atrativo, propomos a leitura de textos como tarefas de casa (cada criança recebia
uma cópia do texto). Com a indicação da leitura do texto As Origens (Anexo D), de Eduardo
Galeano (2004), com linguagem simples e contextualizadas do esporte, foram estimuladas
reflexões que permitiriam os primeiros entendimentos de que o esporte já foi praticado de
diferentes formas por diferentes culturas, porém, hoje elas foram homogeneizadas em termos
de técnicas, táticas e regras. Para compreender o sentido das regras, também foi utilizado um
texto elaborado por Galeano (2004) – As regras do jogo (Anexo E). Neste, a menção ao
surgimento da FIFA (Federação Internacional de Futebol Associados), evidenciou sua
responsabilidade pela homogeneização das suas práticas.
Em meio ao entendimento de que eram as regras que definiam a forma de jogá-lo,
coletivamente foram definidas regras para o bom funcionamento da nossa escolinha. Foi
elaborado o Estatuto da Escolinha de Futebol da Lagoa
28
(Apêndice E) e, no intuito de
vivenciá-lo, durante os jogos, aos alunos era possibilitada uma atuação como árbitros. Esta
prática, em meio a discussão sobre o porquê de ter marcado ou deixado de marcar algo,
permitiria a compreensão do significado de termos como: “arbitrar”, “arbítrio” e
27
Os alunos informaram que o morador da casa em frente à quadra tirou esta trave, pois a bola que era chutada
na mesma acabava indo a sua casa e, dessa forma, como proteção à mesma, ele acabou a tirando, sem a
possibilidade de negociarem a sua devolução.
28
Na elaboração deste, quando foi dada voz às crianças, pudemos observar a idéia do castigo como, por
exemplo, para o cumprimento do horário das aulas. Assim, embora tenhamos acatado as decisões coletivas, ao
longo das aulas procuramos problematizar as mesmas.
45
“arbitrariedade”. Isso porque diante do interesse pela arbitragem do jogo, reflexões sobre o
sentido de ser árbitro repassaram a idéia de uma pessoa que manda no jogo, apita (Juninho
Paulista). As discussões sobre este poder que se instituía aos árbitros trouxe um
questionamento sobre o termo arbitrariedade. Como ninguém soube responder, uma criança
ficou responsável por na próxima aula levar um dicionário a fim de todos compreendermos
seu significado. E foi desta forma que todos compreenderam arbitrariedade como sendo a
qualidade de se fazer arbítrio, ou seja, tomar suas próprias decisões (fazer o que julga ser
apropriado).
Através de uma reflexão sobre estes termos, com base em Freire (1996), foi possível
iniciarmos um trabalho que procuraria estabelecer um equilíbrio entre a nossa autoridade e a
liberdade das crianças. Isso porque mesmo morando próximo à quadra, algumas crianças
optavam por ir de bicicleta para a aula e, ao deixarem-na encostadas no muro, outras crianças
as pegavam e saíam pedalando pelas delimitações da quadra, independente se havia alguma
atividade transcorrendo na mesma. A figura 4 demonstra um destes momentos.
Figura 4. A liberdade de ir e vir
Além deste fato, outra questão marcante nos primeiros dias eram as crianças que
chegavam atrasadas ou que saíam na hora que queriam, muitas vezes sem justificativa do
porquê da mesma. Quando justificavam, o motivo era chamado de “mimosa”, ou seja, uma
fruta cítrica também conhecida por mexerica. Num terreno baldio, não muito distante da
quadra, havia alguns pés de mimosa e, por isso, algumas crianças saíam correndo na sua
direção para pegar as ditas mimosas.
Por conta destes fatos, foi possível vivenciarmos a tensa relação entre autoridade e
liberdade, pois uma não é antagônica a outra. “É a partir deste aprendizado que ambas se
46
comprometem na prática educativa com o sonho democrático de uma autoridade ciosa de seus
limites em relação com uma liberdade zelosa igualmente de seus limites e de suas
possibilidades” (FREIRE, 2000, p. 35). Assim, estabeleceram-se e foram cumpridos alguns
acordos para o bom funcionamento das aulas: i) quem quisesse ir de bicicleta para as mesmas,
poderia, no entanto, assim que chegasse na quadra, encostaria sua bicicleta no muro e somente
a retiraria de lá no final da aula, ou em caso de necessidade; ii) as crianças que por ventura
não fossem de bicicleta, não pegariam as bicicletas encostadas, a menos que necessário; iii)
nenhuma criança sairia sozinha para buscar as mimosas; caso houvesse a possibilidade de ir
buscar, todas as crianças iriam juntas; e iv) alguns dias o pesquisador ficaria responsável por
levar mimosas para todos, assim como, em outros, algumas crianças seriam incumbidas dessa
tarefa.
Além disso, a partir das reflexões sobre arbitrariedade, pudemos demonstrar o quanto
o futebol tem sido um esporte em que nem sempre seus praticantes podem fazer aquilo o que
querem, pois sus práticas são homogeneizadas e reguladas por uma única instituição, a FIFA,
afinal, esta é quem manda no futebol (Luizão). Tamanho é seu poder, que, por ocasião da
abertura da Copa do Mundo, o Secretário-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas),
Kofi Annan, demonstrou seu sentimento de inveja em relação à Copa do Mundo (os motivos
foram apresentados no capítulo anterior). Neste ponto, o Jogo da Paz, disputado no Haiti,
entre o país local e a seleção brasileira reforça a tese. Desfilando em carro aberto, os craques
brasileiros foram ovacionados pela população haitiana e, diante do fascínio pelos mesmos, um
autógrafo ou uma camisa da seleção brasileira era mais disputado que os alimentos
distribuídos pelas Forças de Paz da ONU.
Em meio às reflexões acerca destas duas instituições (FIFA e ONU), cada uma em sua
especificidade própria, serviu para inserir a discussão de que ali no bairro também existe uma
instituição para cuidar dos interesses coletivos dos moradores, a Associação dos Moradores
Progresso do Bairro Lagoa, pelo que se tentou incluir no ensino do futebol a preocupação com
a organização social no bairro.
E quando se previa o ensino dos movimentos, técnicas e táticas futebolísticas, todo
componente constituiu-se num elemento educativo. Por exemplo, no ensino do drible, que
significa enganar um ou mais adversários com a posse de bola, procuramos evidenciar como a
população é driblada pelos governantes. Em períodos eleitorais fazem mil promessas, porém,
mesmo que eleitos, dificilmente são cumpridas. Por vezes, no entanto, as pessoas, umas às
outras, tentam driblar para tirar algum proveito, enganando-as (golpes), ou, até mesmo aos
governantes, quando se sonegam impostos (apesar de que as suas taxas são elevadíssimas no
47
país). Enfim, nesta sociedade capitalista e individualista, cada vez mais as artimanhas do
drible são utilizadas para se dar bem na vida.
2.3.2.2 O jogador de futebol como um trabalhador do esporte
Seguindo a lógica do sonho de ser um jogador profissional, o propósito deste sub-eixo
foi propiciar elementos para a compreensão de que este sonho das crianças deveria ser visto
para além do simples brincar de futebol, pois elas pensam é no exercício de uma profissão que
no futuro lhes traga fama, sucesso, dinheiro e, conseqüentemente, uma condição de vida
melhor da qual dispõem hoje. Assim constatamos na primeira aula após o Globo Repórter
veicular uma reportagem sobre um menino que, aos dez anos de idade, já possui um contrato
assinado com o Santos Futebol Clube, recebendo um salário mensal de dez mil reais.
Dessa forma, conforme sugere Souza (2001b), neste importante momento educativo
propiciado pelo lazer, a preocupação foi com a conquista da maioridade sócio-política das
crianças, em especial, favorecendo a compreensão de que o jogador de futebol é um
trabalhador do esporte e, por isso, detentor de uma série de direitos trabalhistas: adicional
noturno, horas extras, férias, descanso semanal, descanso mínimo entre jornadas e outros
tantos.
A estes direitos, não poderia ser esquecido o próprio direito ao trabalho, pois, a
exemplo das demais categorias trabalhistas, há um grande número de desempregados,
principalmente, aqueles que estão na faixa dos 30 anos de idade. Cada vez mais, no futebol
são reproduzidas as características capitalistas de exploração da mão-de-obra, o que significa
dizer que produtividade e lucro são as máximas. Como um produto descartável, cada vez mais
os jogadores pensam exclusivamente em suas carreiras, contribuindo assim para o
enfraquecimento desta classe de trabalhadores.
A desunião dos jogadores é sintomática. ‘A minoria que tem bons salários não liga
para a maioria que ganha pouco. O individualismo faz parte da profissão. No clube,
ele luta com outros para ser titular e joga para ganhar dos adversários. Vive uma
rotina de competitividade e não consegue se desvencilhar desse individualismo para
se perceber como classe que precisa estar unida (FUNDAJ, 2006, p. 2).
Através deste ponto, procuramos demonstrar a importância da instituição formada pela
união das classes trabalhadoras, que, neste caso, são os sindicatos de jogadores de futebol.
Situando as discussões conforme a realidade das crianças, novamente a Associação dos
Moradores Progresso do Bairro Lagoa ganhou atenção, já que ela seria a instituição
48
responsável por lutar por melhorias para o bairro. Nesse sentido, a partir do contato com o
Estatuto da Associação dos Moradores Progresso do Bairro Lagoa, a Lei Orgânica do
Município de Irati, a Constituição do Estado do Paraná e a Constituição da República
Federativa do Brasil, possibilitaram reflexões sobre: O que seria necessário para a garantia
dos direitos sociais?
Chegando-se a conclusão de que, em tempos de desmantelamento destes direitos, eles
somente são garantidos mediante suas reivindicações, partimos da precariedade da quadra
para capacitar as crianças ao exercício da cidadania. Nessa direção, coletivamente foi
elaborado um ofício (Apêndice F), pedindo a trave (aqui ainda não tinha sido trabalhado o
termo reivindicar). A figura 5 revela o momento de assinatura deste documento, que se
apresentou como o primeiro passo para o exercício da cidadania.
Figura 5. O exercício da cidadania
Depois a elaboração e assinatura do documento, uma comissão foi formada para
pessoalmente entregá-lo ao diretor do Departamento de Esporte e Lazer de Irati. Ao receber a
promessa de que em até 15 dias esta trave estaria na quadra, respeitando este prazo, decidimos
que se promessas não fossem cumpridas durante este, uma nova comissão seria formada para
visitar o referido setor, a fim de obter informações sobre o pedido. E foi isso o que aconteceu.
A trave não foi entregue e para esta visita, o termo trabalhado não era mais o pedir, e sim,
reivindicar. A reivindicação passou a ser vista como um dever dos cidadãos para que enfim
seus direitos pudessem ser garantidos. E, quando um direito é garantido, o cidadão também
tem o dever de, por exemplo, no caso da quadra, zelar pela sua conservação. Dessa forma,
diante da sujeira da mesma, um mutirão para limpá-la foi agendado.
49
Ainda em relação a trave, definimos que assim que a reivindicação fosse atendida, a
primeira atitude seria procurar o vizinho que retirou a trave para uma conversa, tendo como
propósito evitar que o fato se repetisse. Entretanto, esta conversa não teria o simples propósito
de pedir para ele não retirar a trave, mas unirmos forças para reivindicar melhorias no
alambrado da quadra.
Aqui vale registrar a alegria que as crianças demonstravam ao participarem das visitas
ao Departamento de Esporte e Lazer de Irati, contudo, não simplesmente porque estariam
exercendo sua cidadania, mas porque, para algumas, aquela era a primeira oportunidade que
tinham para andar de carro.
2.3.2.3 Os Problemas do Futebol
O futebol é repleto de contradições, as quais estão presentes na realidade das crianças
envolvidas na escolinha, dentre elas: o machismo, o preconceito, a exclusão, a fome, a
desnutrição, a violência entre outros. (muitas destas situações são observadas na letra de um
rap indicada pelas crianças – A vida é desafio, dos Racionais MC’s, que segue no Anexo F).
Em meio à problematização destas, procuramos estimular as crianças a refletirem sobre a
forma com que eles se apresentavam na sociedade.
Além disso, Matiello Júnior (2005) fala sobre falsas verdades de frases como “Esporte
é Saúde” ou “Esporte é Vida”, pois o esporte não é tão perfeito assim, aliás, sua prática pode
até ter efeito contrário à saúde. Mesmo que a prática regular traga melhoras na aptidão física,
é fato que as exaustivas repetições de gestos alienados e formatados podem deteriorar a saúde
dos praticantes, como, por exemplo, as lesões desportivas
29
, que são cada vez mais
freqüentes.
Assim pôde-se constatar já na terceira aula. Numa disputa de bola, uma criança
lesionou-se, apresentado a suspeita de deslocamento epifisário no tornozelo direito. Em meio
ao acontecido, conforme estava previsto no planejamento do pesquisador, com uma bolsa de
emergências, ainda em quadra os primeiros atendimentos foram prestados a esta criança. Este
atendimento foi facilitado pelo fato do pesquisador ter realizado Estágio de Docência na
disciplina DEF 5325 – Emergências em Educação Física, na UFSC. Na seqüência,
29
A Copa do Mundo proporcionou diversos exemplos para a discussão das lesões desportivas. Em todas edições
podemos observar o corte de jogadores brasileiros por causa das lesões, tal como ocorreu com Romário, em
1998, Emerson, em 2002, e, Edmilson, em 2006. Fora isso, é grande o número de lesões noticiadas durante o
Mundial. No último, por exemplo, a Equipe da Cidade do Futebol (2006) informa que durante os 58 primeiros
jogos foram observadas 129 lesões, ou seja, 2,2 lesões por jogo.
50
encaminhamos a criança ao serviço municipal de saúde
30
a fim de ela receber o tratamento
necessário (em todos momentos subseqüentes). Assumindo a valorização da vida como um
ponto crucial deste projeto, além de prestar os primeiros atendimentos à criança acidentada e
encaminhá-la ao tratamento necessário, também nos preocupamos em pessoalmente
acompanhar a sua recuperação, com freqüentes visitas à mesma, a fim de saber como ela
estava.
Diante dos limites do discurso hegemônico e do esclarecimento de que aquecimento e
alongamento não garantiriam a prevenção da ocorrência de lesões desportivas, estas
atividades continuaram sendo utilizadas com o propósito de oferecer momentos educativos
para e pelo lazer e, principalmente, voltando-os para a saúde. Neste ponto, a primeira reflexão
foi acerca de como reduzir a possibilidade de novas lesões ocorrerem, já que acidentes não
ocorrem ao acaso, mas porque algo é feito ou deixado de ser fazer. De forma unânime,
reconhecemos a necessidade de todos respeitarem-se mais um ao outro.
Para atingir este propósito, a preocupação central do ciclo temático foi a valorização
da vida humana e, indiscutivelmente, a Copa do Mundo da Alemanha assim forneceu
elementos importantíssimos. Por exemplo, dias antes da estréia do Brasil com a Croácia (a
opção por utilizar o conectivo “com” é para não caracterizar o jogo como uma batalha de
inimigos), numa das chamadas do Globo Esporte, ao vivo da concentração da seleção
brasileira e com um sorriso estampado no rosto, a repórter que cobria o treino naquele
momento anuncia: Boa notícia para o Brasil! O jogador Ivica Olic desfalcará a Croácia no
jogo com o Brasil, já que não se recuperou de uma lesão na coxa.
Assim, nossa intenção foi demonstrar o quanto o futebol carrega um sentimento de
egoísmo, fazendo com que as pessoas pensem somente em si mesmas, ou melhor, na equipe
para qual torcem. Comemorar para que um jogador de outra equipe não possa jogar, é uma
atitude um tanto quanto “desumana”, pois como se pode ficar alegre com a desgraça alheia?
Outro fato que mereceu comentários é o caso do descendente de japonês que, depois da
derrota da seleção japonesa de 4x1 para a seleção brasileira, se suicidou, deixando a
mensagem que sua atitude era fruto do sentimento de vergonha que lhe abateu após aquela
derrota. Portanto, além do egoísmo que o futebol planta nos seres humanos, ainda cultiva o
sentimento de que um jogo representa ou a vida ou a morte (nessa direção estão as torcidas
organizadas).
30
Apesar das constantes críticas que o Sistema Único de Saúde (SUS) recebe, o pesquisador aproveitou o
ocorrido para evidenciar a importância do SUS para a população brasileira.
51
Enfim, em meio a estas problematizações sobre a forma com que as pessoas se portam
frente ao sofrimento humano, diversos elementos procuraram despertar o sentimento de
humanidade entre os envolvidos, em especial, porque na seqüência estava prevista (e assim
ocorreu) a realização de uma aula de primeiros socorros ministrada por dois integrantes do
Corpo de Bombeiros de Irati
31
. Dessa forma, partimos do entendimento de que antes de
capacitar as crianças a agirem (com grandes limitações) em situações de emergência, elas
deveriam estar sensibilizadas de que todas as pessoas têm direito ao atendimento e, portanto, a
viver, independente de quem elas sejam.
Procuramos enfatizar que ao encontrarmos uma pessoa caída no chão, dentro do
possível e desde que haja segurança, devemos nos preocupar com esta pessoa, pois ela pode
necessitar de atendimentos especializados a fim de evitar sua morte e/ou seqüelas, ou seja, é
uma forma de portar-se com ética frente à vida humana
32
. A aula ministrada pelo Corpo de
Bombeiros teve o propósito de demonstrar que as pessoas estão suscetíveis a acidentes e, por
isso, é importante que os procedimentos de atendimentos de emergência sejam cada vez mais
aprendidos, questionados e socializados pela população. Essa socialização refere-se
especificamente em difundi-los junto à comunidade, seja no caso de uma emergência ou na
conversa que as crianças têm em casa, na escola, na catequese.
No caso do futebol, algo que pode facilmente ser abordado são as mortes de jogadores
por paradas cardio-respiratórias. É grande o número de jogadores que, nos últimos anos,
mesmo sendo sinônimos de pessoas saudáveis, perderam a vida no exercício da sua profissão,
como, por exemplo, o jogador Serginho, do São Caetano. Assim, o ensino dos procedimentos
para realização de uma reanimação cardio-pulmonar pode ser importante para aqueles que
desejam ser jogador profissional, pois um dia podem deparar-se com esta situação. Embora
esta não tenha sido a estratégia para o ensino deste procedimento, conforme se observa na
figura 6, duas crianças simulam uma reanimação cardio-pulmonar.
31
Esta aula foi solicitada formalmente com um ofício encaminhado pela Divisão de Esportes/UNICENTRO,
local de atuação profissional do pesquisador.
32
No último dia 29 de outubro, o programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, veiculou uma reportagem
sobre “Ética”, que teve como exemplo uma fotografia estampada numa edição do Jornal O Globo. Além de
retratar uma das paisagens mais belas da cidade do Rio de Janeiro e a alegria de inúmeras pessoas que ali
estavam, esta fotografia supostamente estaria retratando a indiferença daquelas pessoas para o fato de que
próximo a elas haver o corpo de um turista que morreu afogado. A tônica da reportagem foi que aquelas pessoas
portavam-se com indiferença àquele fato.
52
Figura 6. Simulando uma reanimação cárdio-pulmonar
Nas situações de emergência abordadas, procuramos relacioná-los a situações do
cotidiano em que vivem. Por exemplo, sabe-se que a maioria das pessoas que morrem
soterradas, atropeladas, eletrocutadas, afogadas são miseráveis, são negras e pobres, já que,
pela exclusão e desigualdades sociais, a estas pessoas somente resta (e quando resta) trabalhos
em condições precárias e moradias em locais sujeitos a deslizamentos de terra, enchentes
etc
33
. E, como observamos, estas seriam as ocupações da grande maioria dos
pais/responsáveis pelas crianças.
2.3.2.4 As Contribuições do Futebol
Há de se convir que o futebol não vive apenas de problemas, mas que também
proporciona bons exemplos, como durante a Copa do Mundo. É quando se presencia o
entusiasmo da população mobilizada em torno da seleção nacional, com grande participação
nas discussões sobre o porquê da vitória ou derrota do nosso selecionado. Assim, é partindo
destes momentos democráticos e críticos, que DaMatta (apud VAZ, 2002) recomenda o
exercício da cidadania, pois da mesma forma com que os torcedores pressionam jogadores e
treinadores por causa de seus erros, a população deveria portar-se da mesma forma frente aos
governantes e outros poderosos.
33
Pardos e negros são as pessoas para quais a descrição “morte por causa indefinida” é mais freqüente no país, o
que pode ser reflexo de que eles têm menos acesso aos serviços de saúde e são discriminados racialmente,
inclusive no preenchimento dos atestados de óbito. Além disso, por serem mais pobres, eles são quem mais
ficam expostos à violência e normalmente são enterrados sem ser verificada a causa das suas mortes (INFANTE,
2006).
53
Em meio a estas observações e aproveitando-se da má fase do Corinthians, que
constantemente vinha sendo pressionado por sua apaixonada torcida, utilizamos deste fato
para evidenciar esta ocorrência no futebol. A estratégia foi ir para a aula vestindo a camisa
deste time, o que logo na chegada à quadra causou surpresa entre as crianças, principalmente
pelo fato da equipe estar mal colocada no campeonato nacional.
Por conta disso, imediatamente procuramos fazer uma analogia em relação ao pedido
da trave, pois passados mais de quinze dias de uma segunda visita ao setor responsável pelo
esporte e lazer no município, a reivindicação não havia sido atendida. Contudo, não seria por
isso que deveríamos desistir. Nesse sentido, o exemplo da torcida que estava cobrando o seu
time foi providencial para ser formada uma nova comissão, a fim de uma terceira visita ao
referido setor ser feita para reclamar a trave. O interessante nestas visitas, é que na primeira o
intuito foi pedir, na segunda reivindicar o prometido e, agora, na terceira, a cobrança assumia
o sentido da conquista, já que seria preciso muita persistência para se conseguir a trave, ou
melhor, uma simples trave.
Depois desta visita, finalmente alguma coisa mudou. Nada teve a ver com a promessa
de um novo prazo, mas, pela primeira vez, o pessoal responsável por montar a trave
(funcionários do parque de máquinas da prefeitura), no dia seguinte esteve na quadra para
medir o espaço. O problema, no entanto, é que o vizinho que retirou a trave, segundo
informações repassadas pelos funcionários da prefeitura, ao ver o pessoal lá, foi até a quadra e
ameaçou novamente retirá-la. Assim, quando informado desta ameaça, anunciamos às
crianças que, antes mesmo da trave ser entregue, seria antecipada a conversa com este
vizinho. E foi desta forma que ocorreu. Tomando a frente na conversa, evidenciamos a
necessidade da união dos moradores do bairro para a conquista de melhorias no mesmo, pois,
caso contrário, dificilmente seria possível.
Como resultado da conversa, o vizinho se propôs a junto com os meninos fazer o
pedido por melhorias no alambrado da quadra, de maneira a proteger as residências próximas.
Embora fosse importante sua sugestão, optamos por um outro caminho, já que nem a trave
havia-se conseguido apenas com o pedido/reivindicação vindas das crianças. Seria necessária
uma ação maior, que assim se traduziu num abaixo-assinado, pelo qual as crianças obtiveram
o apoio de vários moradores, independente se eles usam ou usariam a quadra.
Após serem registradas 223 assinaturas (Apêndice G), a próxima decisão foi para
quem encaminhar. Atento às armadilhas apontadas por Carvalho (apud VASCONCELOS,
1997), de que um movimento à parte da Associação dos Moradores poderia enfraquecer esta,
não tivemos dúvida de que o caminho seria enviar o documento para a Associação dos
54
Moradores Progresso do Bairro Lagoa, pois esta também seria uma importante estratégia para
aproximar as crianças desta entidade, que vinha sendo referenciada desde o primeiro ciclo
temático. E a data desta entrega não poderia ter sido mais bem escolhida: durante a
inauguração do Centro Social do bairro (após 18 anos de luta, finalmente a Associação
ganhou uma sede), em especial, porque o evento naturalmente receberia a imprensa,
secretários do executivo, vereadores e também o prefeito municipal.
Mas esta não foi a única contribuição exaltada. Devido aos preparativos para os Jogos
Panamericanos que serão realizados na cidade do Rio de Janeiro, em 2007, a televisão veicula
diariamente anúncios de que o esporte é exemplar para as pessoas superarem seus limites. Em
meio a este discurso, a escolinha preocupou-se com a seguinte reflexão: Que limites as
crianças desejam superar?
Constatando que estes eram os limites geográficos do bairro, o que significava uma
limitação em diversos pontos, a estratégia para auxiliar na superação de alguns destes limites
foi proporcionar a participação num evento esportivo (torneio de futebol) promovido pelo
Departamento de Esporte e Lazer de Irati e duas viagens: uma dentro da cidade de Irati, a fim
de que as crianças conhecessem um pouco mais da história da cidade em que vivem; e a outra
foi para Curitiba, quando puderam conhecer as dependências do Estádio Joaquim Américo, a
popular Arena da Baixada.
A escolha de participar do evento esportivo deve-se ao desejo que as crianças
timidamente demonstravam de participar de um jogo/competição com outras crianças. Nesse
sentido, também como parte das comemorações do aniversário do município, estava agendada
a inauguração de algumas quadras esportivas nas dependências do Parque Aquático de Irati e
que, nesta ocasião, seria realizado um campeonato de futebol para as crianças.
Algo que propiciou importantes reflexões nesta participação veio através de uma
criança. Como de costume, o evento público estava desorganizado e quem tomava a frente
numa tentativa de organização eram os alunos de uma escolinha de futebol (privada) do
município. Ao ver a cena, o pesquisador é indagado: Professor, por que são eles que estão
fazendo o sorteio dos jogos? (Marcos). Para responder, procuramos demonstrar como as
coisas se desenrolam na sociedade: o poder sempre está na mão das mesmas pessoas. Para
mudar este quadro, então seria necessário que a população participasse mais das questões de
interesse público, se impondo como interessadas pelas mesmas, tal como ocorre, por exemplo,
na Associação de Moradores. E foi nesse sentido que as crianças foram estimuladas a
dirigirem-se ao local em que estava sendo efetuado o sorteio dos jogos, para atentamente
acompanhar o sorteio e, se necessário, questionar.
55
Em relação às viagens, na primeira, partimos do pressuposto de que uma equipe de
futebol profissional quando tem um jogo em outra cidade, ela geralmente desloca-se para esta
com pelo menos um dia de antecedência e, desta forma, os jogadores têm um momento de
folga para passear e conhecê-la. Portanto, a atividade pode ser vista como uma estratégia para
apresentar a cidade às crianças, principalmente, pelo fato de que dificilmente elas podem sair
do bairro, dadas algumas adversidades: não possuem condições de deslocamento, sofrem
preconceitos, nem sempre há um motivo para sair do bairro em direção ao centro, etc.
Por sua vez, a visita à Arena da Baixada, esta foi propiciada tal como ocorre com as
equipes de futebol, quando elas viajam a outras cidades. Esta viagem foi possibilitada com o
apoio recebido da Universidade Estadual do Centro-Oeste, por ter disponibilizado a Van e o
motorista, e também do Departamento de Esporte e Lazer de Irati, que forneceu o combustível
para o veículo.
Vale dizer que esta visita não teve o propósito de turismo ou de simular a viagem de
uma equipe de futebol, mas também propiciou ricos elementos para reflexão sobre a atual
configuração do futebol: i) o fato da Arena ter sido “arrendada” para uma empresa de
aparelhos eletrônicos, a sua publicidade e a sua boutique instigou a compreensão de como o
futebol é um negócio; ii) os diferentes setores do estádio visitados puderam ser vistos como
uma reprodução da divisão das classes sociais, pois, aos que podem pagar mais, podem
assistir aos jogos de lugares mais confortáveis, agradáveis e com melhor visibilidade dos
jogos; iii) durante a viagem, tanto na ida como na volta, a passagem por duas praças de
pedágio foi exemplar para uma discussão sobre a privatização dos bens públicos,
questionando o irrealismo do direito de ir e vir.
2.3.3 Para melhor compreender o campo
Diante do objetivo de, com esta investigação, contribuir com a organização social do
bairro, o campo foi complementado com algumas estratégias para se compreender os aspectos
que influenciam tal organização. Assim, simultaneamente às aulas de futebol, foram
identificados quatro informantes culturais privilegiados do bairro, que, concordando em
participar da investigação (mediante Termo de Consentimento Livre e Esclarecido), foram
entrevistados. Optamos pela entrevista semi-estruturada, na medida em que sua flexibilidade
permite um maior diálogo entre investigador e informante. Para Triviños (1995, p. 146) a
entrevista semi-estruturada, em geral, é:
56
... aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e
hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de
interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem
as respostas do informante. Desta maneira, o informante, dentro do foco principal
colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da
pesquisa.
As entrevistas foram elaboradas a partir de um roteiro que abrangeu, particularmente,
elementos que pudessem dificultar ou favorecer a organização social no bairro. Elas foram
gravadas (com a autorização dos entrevistados), sendo respeitado seu desejo de não responder
aquilo que não quisessem. A identidade dos entrevistados também foi preservada, com eles
sendo denominados em conformidade às funções dos membros da comissão técnica de uma
equipe de futebol (técnico, auxiliar técnico, preparador físico e massagista).
Com vistas a uma melhor compreensão destes aspectos que favorecem e/ou emperram
a organização social no bairro, com autorização do presidente da Associação dos Moradores
Progresso do Bairro Lagoa, foi acompanhada a visita dos moradores ao gabinete do prefeito
municipal, onde ocorreu uma reunião com o mesmo. Esta observação foi sistematizada para:
i) observar no processo participativo o número de pessoas, bem como a postura destas frente
aos assuntos em pauta; ii) identificar as relações da comunidade com o Poder Público local;
iii) compreender o nível de amadurecimento da cidadania, no que tange a reivindicação de
direitos e não pedido de favores; e iv) identificar até que ponto existe um projeto comum para
(e da) comunidade, destacadamente no que se refere ao esporte/lazer.
Complementando, a partir da categoria participação, foi feita uma análise de duas
importantes fontes documentais: (a) o Estatuto da Associação dos Moradores Progresso, para
identificar em quê essa participação é prevista; e (b) o Projeto Político Pedagógico
34
das duas
escolas do bairro (Escola Municipal da Lagoa, que atende cerca de 150 alunos de 1ª a 4ª
séries; e Escola Estadual Professora Luiza Rosa Zarpellon Pinto, com aproximadamente 240
estudantes de 5ª a 8ª séries), pois estes são registros oficiais da responsabilidade escolar e
comunitária de formação dos(as) alunos(as) para sua inserção e participação no mundo em
que vivem, pois e a escola tem o papel de preparar o aluno/aluna para sua inserção autônoma
e crítica na sociedade.
34
Para Gonçalves e Abdulmassih (2001, p. 2) “o projeto político pedagógico é uma busca de autoconhecimento
e de conhecimento da realidade e seu contexto. Planejá-lo requer encontrar no coletivo da escola respostas a uma
série de questionamentos: Para quê? O quê? Quando? Como? Com o que? Por quê? Com quem?”.
57
2.4 O tratamento do material obtido no campo
Para análise do material obtido no campo, adotamos a operacionalização proposta por
Minayo (2004). Suas bases fundamentam-se nos pressupostos da hermenêutica-dialética, que
segundo a autora é o método mais capaz de uma interpretação aproximada da realidade. Para
Gomes (2004, p. 77), “nesse método, a fala dos atores sociais é situada em seu contexto para
melhor ser compreendida. Essa compreensão tem, como ponto de partida, o interior da fala.
E, como de chegada, o campo da especificidade histórica e totalizante que produz a fala”.
Assim, o autor reconhece a existência de dois pressupostos: na produção de conhecimento não
há consenso e nem ponto de chegada; e “a ciência se constrói numa relação dinâmica entre a
razão daqueles que a praticam e a experiência que surge na realidade concreta” (p. 77).
A interpretação neste método é marcada pela presença de dois níveis. O primeiro é
representado por questões fundamentais, representadas pelo contexto sócio-histórico do grupo
em investigação e que constitui o marco teórico da análise. Neste, inclui-se tanto a sua
conjuntura sócio-econômica e política; da história do grupo e inserção na produção e de
reprodução. O segundo é o encontro com os fatos empíricos. Com dados colhidos e
acumulados e o retorno aos fundamentos da teoria e conseqüente reflexão sobre os conceitos
iniciais, colocam-se em dúvida as idéias evidentes. Assim pode-se construir “nova
aproximação do objeto: o pensamento antigo que é negado, mas não excluído, encontra outros
limites e se ilumina na elaboração presente. O novo contém o antigo incluindo-o numa nova
perspectiva” (Minayo, 2004, p. 234). Observando as recomendações de Minayo (2004) foram
obedecidos os seguintes passos para operacionalização:
¾ Ordenação dos dados: foram mapeados os dados obtidos através da: a) transcrição de
gravações; (b) elaboração de um texto a partir dos registros do diário de campo; c)
releitura do material produzido em busca de concatenação das idéias aparentemente
isoladas (convergências e divergências) nos diferentes campos de pesquisa; e d)
organização dos dados de observação de acordo com a proposta analítica.
¾ Classificação dos dados: a partir de leitura exaustiva e repetida do material coletado,
sendo tomado como conceitos-chave: condições de vida e processo saúde-doença
(CAMPAÑA, 1997), participação (DEMO, 1996) e mudança (MINAYO, 2005). A
partir delas foram retomadas as análises preliminares dos campos de pesquisa e
reelaboradas sob a perspectiva da saúde;
¾ Análise final: consiste no exercício dialético de transitar os dados obtidos com o marco
referencial teórico, em busca de uma síntese.
CAPÍTULO III
CONDIÇÕES DE VIDA E SAÚDE
Partindo do pressuposto de que as políticas econômicas e sociais modificam o perfil de
reprodução social de uma população, acreditamos que apesar do aumento na expectativa de
vida, da redução da taxa de mortalidade infantil e outras conquistas observadas na última
década, pela subordinação às normas do Consenso de Washington
35
, a vida social do
brasileiro vem sendo violentamente precarizada, o que traz graves problemas para a saúde
pública. Antes de avançar nesta discussão, no entanto, é necessário aclarar algumas questões
de fundo que orientam o funcionamento do Estado, afinal, como sugere Palma (2001), tratar
da saúde é compreender as tramas que orientam as políticas públicas e sociais.
3.1 Estado e políticas públicas
Quando se fala de Estado, primeiramente convém dizer que ele não é sinônimo de
Governo. Höfling (2001) explica que enquanto o primeiro equivale às instituições (órgãos
legislativos, executivos, tribunais, etc.), o governo é o pacote de programas e projetos
desenvolvidos em determinado período de tempo. Seu funcionamento está condicionado às
políticas públicas, caracterizadas nos programas propostos para os diferentes setores da
sociedade. Em sua direção, despontam as políticas sociais
36
, que estabelecem o grau de
proteção do Estado para a vida de seus cidadãos, visando a redução das desigualdades sociais,
através da garantia dos direitos básicos (trabalho, moradia, alimentação, segurança, educação,
saúde, lazer etc.).
Contudo, em escala global, é fato que esta proteção tem sido mínima e insuficiente.
Diante de pressões externas ou opção política, a maioria dos países adere ao receituário do
Estado Capitalista Mínimo
37
, modelo que ao evidenciar a incapacidade do Estado em
35
É o resultado de reuniões realizadas em Washington, em novembro de 1989, quando funcionários do governo
norte-americano e de organismos financeiros internacionais ali sediados (FMI, Banco Mundial e BID), reuniram-
se com economistas latino-americanos para registrar, avaliar e aprovar as políticas econômicas empreendidas na
América Latina, incluindo-se: disciplina fiscal; priorização dos gastos públicos; reforma tributária; liberalização
financeira; regime cambial; liberalização comercial; investimento direto estrangeiro; privatização; desregulação;
e propriedade intelectual (BATISTA, 1999, p. 33).
36
Nem toda política social é política pública, pois existem aquelas que, por iniciativa da sociedade civil,
contrapõem-se ao Estado (DEMO, 1996).
37
Demo (1995) apresenta outras três caracterizações de Estado: i) Estado Socialista Mínimo: defendido por
Marx, origina-se das discussões da Comuna de Paris, mas nunca saiu do papel. É fundamentado na idéia de que
o controle do Estado deveria vir de baixo (das classes populares); ii) Estado Socialista Máximo: versão socialista
59
organizar e regular a sociedade, defende que o controle e a alocação dos recursos públicos
sejam repassados para o mercado. Como resultado, os ditos direitos básicos são
desrespeitados, pisoteados e, até mesmo, anulados. Atesta-se que,
... o setor público (o Estado) é responsável pela crise, pela ineficiência, pelo
privilégio, e que o mercado e o privado são sinônimo de eficiência, qualidade e
equidade. Desta idéia-chave advém a tese do Estado mínimo e da necessidade de
zerar todas as conquistas sociais, como o direito à estabilidade de emprego, o direito
à saúde, educação, transportes públicos etc. Tudo isto passa a ser comprado e regido
pela férrea lógica das leis do mercado. Na realidade, a idéia de Estado mínimo
significa o Estado suficiente e necessário unicamente para os interesses da
reprodução do capital (FRIGOTTO, 1995, p. 83-4).
Este modelo surge na década de 40, como um movimento teórico e politicamente
contrário ao Estado intervencionista e preocupado com o bem-estar de todos. O texto “O
caminho da servidão”, escrito por Friedrich Hayek em 1944, é a bíblia do movimento. Em
1947, suas teses tornam-se os alicerces da Sociedade de Mont Pèlerin, uma francomaçonaria
que em reuniões internacionais difundia que o igualitarismo destruía a liberdade dos cidadãos
e a vitalidade da concorrência. Assinalava-se que a desigualdade seria essencial para o
desenvolvimento da sociedade capitalista (GROS, 2004).
A tese da igualdade fundamentava-se numa integração social dependente do trabalho,
sendo observado um forte contraste entre os países centrais e periféricos. Nos países centrais,
o Estado do Bem-Estar Social não só promovia a integração social pelo trabalho e pelo
consumo, mas também regulava a sociedade orientando-se pelos princípios abstratos de
cidadania e direitos. Já nos países periféricos, em pleno período desenvolvimentista, esta
integração resumia-se na oportunidade do emprego e a cidadania era o direito pago em
serviços. A integração social atrelava-se ao desenvolvimento econômico e é este quem
propiciaria o desenvolvimento social (COHN, 1997).
No início dos anos 70, a crise neste modelo de integração social pelo trabalho, ao
proporcionar um cenário negativo (baixas taxas de crescimento, altas taxas de inflação e
queda nos lucros), propicia que as teses de Hayek e seus companheiros deixem de ser mera
abstração teórica. Os sindicatos operários acabam responsabilizados pela crise, uma vez que
exerciam forte pressão para o Estado elevar seus gastos sociais. Como solução, defende-se um
de Lênin imposta na URSS, desde 1917. Com a ruptura do Estado Soviético, Cuba é o único país mundial que
resiste neste paradigma. Traz como consigna uma melhor divisão das riquezas para diminuir as desigualdades
sociais; e iii) Estado Capitalista Máximo: trata-se de um paradigma contraditório, pois no sistema capitalista
sendo o mercado o regulador, dificilmente seja possível alargar a intervenção do Estado. É representado pelo
Estado do Bem-Estar Social (Welfare State) que emergiu junto dos Direitos Humanos, logo após a 2ª Guerra
Mundial.
60
Estado forte na resistência às pressões sindicais e no controle do dinheiro e, ao mesmo tempo,
comedido nos gastos com políticas sociais (ANDERSON, 1995).
Historicamente, a Inglaterra, a partir da vitória eleitoral de Margaret Thatcher, em
1979, foi o primeiro país do capitalismo avançado a incorporar seus preceitos (como
laboratório, em 1973, o Chile, de Pinochet, já havia incorporado). Depois, em 1980, os
Estados Unidos, que se tornariam o centro do modelo, com o Presidente Ronald Reagan inicia
a tendência dos países centrais, e mais tarde, dos periféricos, em acompanhar o exemplo do
governo inglês. De acordo com Cohn (1997), centrado na liberalização financeira, abertura
econômica, estabilização monetária e privatização dos bens públicos, legitima-se o
imperialismo da razão econômica. O Estado, administrado como uma empresa e buscando o
crescimento econômico, reduz seus gastos e as políticas públicas perdem a identidade de
regulação social. O problema é que estes ajustes além de não impulsionar o crescimento
econômico, ainda precarizam o campo social com o aumento do desemprego e das
desigualdades.
Contudo, trata-se de um cenário desejado, pois o desemprego progressivamente
enfraquece os sindicatos, disponibilizando um exército de reserva de mão-de-obra. Um
exército que para Bordieu (1998) estaria cada vez mais docilizado e, na verdade, nem
chegaria a se apresentar como exército, “pois o desemprego isola, atomiza, individualiza,
desmobiliza e rompe com a solidariedade” (p. 140). Já a desigualdade além de ser resultado
direto do desemprego, serve para reanimar a vitalidade da concorrência. Diante deste cenário,
Cohn (1997) adverte que o Estado, por ser controlado pelo mercado, ao invés de investir na
geração de novos postos de trabalhos e reduzir as desigualdades, limita-se em combater suas
conseqüências, tal como ocorre com o combate à pobreza. Não se caracterizam, portanto,
como políticas sociais, mas programas compensatórios e voltados a grupos específicos, com o
simples propósito de aliviá-la, educando a população a conviver com este mal sem que ele
desapareça.
Assim, para Soares (2001), este modelo apresenta-se como um projeto global para a
sociedade. Suas políticas são articuladas e não se limitam em medidas econômicas de efeitos
conjunturais e/ou transitórios, mas trazem graves conseqüências sociais e que algumas podem
ser de difícil recuperação. Uma destas, diz respeito à saúde pública, que para Bordieu (2001) é
atingida de duas formas. Contribui “para o aumento do número de doentes e das doenças
(através da correlação entre a miséria – causas estruturais – e a doença: alcoolismo, droga,
delinqüência, acidentes de trabalho etc.) e reduzindo os recursos médicos, os meios de
tratamento” (p. 56-57).
61
Este modelo, aliás, seria o grande responsável por a meta Saúde Para Todos no Ano
2000, assumida em Alma-Ata, em 1977, e reafirmada em Ottawa, em 1986, ainda não ter sido
cumprida
38
. Depois da Conferência de Ottawa, os principais pontos relacionados a esta meta
foram levados para outras cinco conferências que, promovidas pela Organização Mundial da
Saúde (OMS), realizaram-se ao longo de duas décadas: i) Adelaide, na Austrália, em 1988; ii)
Sundsval, na Suécia, em 1991; iii) Jacarta, na Indonésia, em 1997; iv) Cidade do México, no
México, no ano 2000; e v) Bangkok, na Tailândia, em 2005. Em cada uma destas, um tema
específico era discutido, propiciando-se elementos para a elaboração de documentos
internacionais.
Uma análise destes documentos revela que ao longo de duas décadas as metas e
compromissos da Promoção da Saúde enfatizam praticamente os mesmos pontos
(estabelecimento de políticas públicas e criação de ambientes saudáveis, redução das
desigualdades sociais, participação comunitária etc.), o que permite a compreensão de que
além de não serem cumpridos, a própria agência que lhes recomenda, a OMS, mostra-se
insuficiente na sua missão. Por conseguinte, é possível dizer que a instituição venha sendo
conivente com a reprodução das condições de vida e de saúde de alguns povos em detrimento
de outros, perpetuando-se ainda mais a ampliação das desigualdades mundiais.
Estas contradições, no entanto, são apontadas por algumas organizações
internacionais, como é o caso do Global Health Watch
39
(GHW) que promoveu duas
Assembléias Mundiais de Saúde dos Povos (em Bangladesh, no ano 2000, e, em Cuenca,
Equador, em 2005), assim como organizou o Informe Alternativo sobre la Salud en América
Latina (BREILH, 2005). Este informe constitui-se num instrumento alternativo para
desvendar as contradições do Informe Mundial de Saúde da OMS, já que pelos modestos
avanços observados nos indicadores de saúde (expectativa de vida, mortalidade infantil etc.),
as reais causas do deterioro da saúde latino-americana são propositadamente desconsideradas.
No Brasil, pode-se citar o Movimento Sanitário, que é visto como um dos mais
importantes movimentos em prol da luta pela democratização da saúde no país. Surgido em
meados da década de 70, ele tem prestado inestimáveis contribuições: i) participou da
elaboração do conceito ampliado de saúde (BRASIL, 1986); ii) lutou para que a saúde fosse
38
Com exceção de Cuba (TORRE MONTEJO, 2005).
39
Movimento internacional que além de analisar as iniqüidades em saúde, também questiona a política
neoliberal que não permite intervenções simples e econômicas para prevenir, por exemplo, a morte de
aproximadamente 6 milhões de crianças no mundo, a cada ano.
62
inclusa na Constituição Federal de 1988 como um direito de todos; e iii) é responsável pela
implantação do Sistema Único de Saúde (SUS)
40
.
3.2 Condições de vida no Bairro Lagoa
O Centro de Estudios y Asesoría en Salud (CEAS)
41
, ao longo de sua história, inovou
em conceitos, instrumentos investigativos, instruções para o avanço dos programas de saúde
no Equador e em outros países latino-americanos. Com o propósito de formar recursos
humanos críticos e abertos ao avanço da ciência pelo mundo e na articulação dos saber
científico e popular, tem sido decisivo no desenvolvimento da Teoria da Epidemiologia
Crítica. Uma teoria que discute a produção social do processo saúde-doença a partir da
perspectiva teórica do realismo dialético
42
, explicitando os determinantes políticos,
econômicos e sociais da distribuição da saúde-doença, no interior e entre as sociedades.
Nessa lógica, o processo saúde-doença não é visto como uma simples lista de
processos patológicos ou taxas estatísticas de morbi-mortalidade específicas, mas que
identifica tanto os elementos protetores como os nocivos à saúde presentes na organização
social, enfatizando-se as suas contradições. Para Castellanos (1997), dificilmente uma pessoa
ou população está livre de qualquer processo patológico, já que constantemente depara-se
com momentos de necessidades, seja por sua localização geográfica e ecológica, cultura e
nível educacional ou ainda por sua situação econômica e social. Por isso, o autor revela que
“mais relevante do que conhecer do quê morrem as pessoas, seria conhecer como vivem, com
que idade morrem, como se articulam seus perfis de saúde e seus projetos de realização
pessoal e coletivos” (p. 60).
Nesse sentido, Paim (1997) recomenda que em estudos de condições de vida haja uma
aproximação com a categoria espaço. O objetivo desta aproximação não é simplesmente levar
em consideração o espaço geográfico, mas possibilitar a compreensão das relações sociais
definidoras do padrão espacial da cidade: o modo de produção, os processos de urbanização,
industrialização e das migrações externas. A partir deste conjunto, integra-se num único
40
Ver Cordeiro (2004), Da Ros (2006), Fleury (1997), Gerschman (2004).
41
Situado na capital equatoriana, o CEAS é uma organização multidisciplinar e sem fins lucrativos, criada em
1979 e que desempenha um importantíssimo papel na formação e desenvolvimento da Nova Saúde Pública
(Saúde Coletiva) na América Latina.
42
Breilh (2006, p. 77) opta pela “designação ‘realismo dialético’, em vez de materialismo dialético, porque ela
enfatiza o conceito de realidade e não o de matéria, e abre possibilidades para o estudo da relação sujeito-objeto
que a dialética marxista atual requer para uma nova epistemologia, liberta de um certo objetivismo, e para o
estudo da complexidade real nas dimensões empírica, atual e global”.
63
conceito tanto o aspecto biológico como os não-biológicos (inclusive os aspectos naturais,
como, o relevo, a vegetação etc.). Este conjunto denomina-se espaço social.
O espaço social de uma cidade, ao expressar as condições de vida dos segmentos
que o ocupam, representa uma instância da sociedade. Contém as demais instâncias
da estrutura social – econômicas, políticas e ideológicas – que nele se reproduzem e
encontra-se articulado/contido às mesmas em âmbito mais amplo. [...]. Nesse
particular, torna-se recomendável o estudo da própria constituição da cidade, mesmo
sem ser exaustivo, no sentido de recuperar a historicidade dos seus diferentes
espaços, em especial, no que se refere às formas socialmente definidas de sua
ocupação, seja pelo capital seja pelos diferentes segmentos da população (PAIM,
1997, p.13-14).
Nesta tônica, uma reflexão sobre o espaço social do Bairro Lagoa necessariamente
deve considerar aspectos sócio-históricos do município de Irati, principalmente aqueles que
estão em sintonia com o contexto nacional. Isso porque desde o início dos governos de
FHC
43
, quando as políticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial
(BM) passam a orientar o controle e a alocação dos recursos públicos do governo brasileiro, o
país passou a ser administrado como uma empresa e, conseqüentemente, na busca do
crescimento econômico, os gastos sociais foram drasticamente reduzidos e as políticas
públicas perderam a identidade de regulação social. Convertidas em programas sociais
compensatórios e focalizando grupos específicos, estas políticas assumiram o propósito de
combater as piores conseqüências da política econômica, como, por exemplo, a pobreza.
Contudo, como não são pensados para agir na causa dos problemas, eles são apenas aliviados
e adiados
44
. Como se não bastasse,
Esses pequenos e pulverizados programas quase sempre associados a uma estratégia
mais geral – chamada de Descentralização – que é a da total responsabilização dos
Municípios pela implementação de Políticas Sociais. No caso brasileiro (e eu diria
em boa parte dos países latinoamericanos) venho denominando esse processo de
Descentralização Destrutiva: de um lado se tem o desmonte das Políticas Sociais
existentes – sobretudo aquelas de âmbito nacional – sem deixar nada em
substituição; e de outro se delega aos Municípios as competências sem os recursos
correspondentes e/ou necessários. Em todos os âmbitos da Política Social – Saúde,
Educação, Saneamento Básico – onde essa estratégia de descentralização foi
acompanhada por um desmonte, o resultado foi um agravamento da iniqüidade na
distribuição e oferta de serviços. Os municípios que lograram manter uma boa
qualidade de serviços básicos sociais, estão tendo, como ‘prêmio’, a invasão de
populações vizinhas onde isso não acontece (SOARES, 2001, p. 177).
43
Fernando Henrique Cardoso foi Presidente da República Federativa do Brasil, no período de 1995-2002.
44
Embora o Governo do PT tenha dado continuidade à políticas econômicas iniciadas por seu antecessor, é fato
que os investimentos na área social elevaram-se consideravelmente.
64
O Município de Irati, considerado modesto e estagnado economicamente, não possui
uma boa qualidade nos serviços básicos, principalmente, nos bairros, conforme é retratado
pela primeira edição do Plano Diretor Municipal de Irati.
Os bairros, além de carecerem de uma definição legal (perímetro legal), não têm
suas identidades visuais trabalhadas, tanto numa perspectiva sócio-cultural
(sentimento de unidade) como em termos urbanísticos, na maior parte dos casos. [...]
As vias não apresentam uma hierarquização adequada e há vazios em termos de
infra-estrutura comercial e de serviços públicos, principalmente em termos de
transporte urbano, pavimentação, passeios e calçadas, iluminação pública e
arborização, isso quando possuem rede de esgotamento sanitário e um adequado
regime de coleta de resíduos sólidos (IRATI, 2004, p. 71-2)
Muitos destes bairros surgiram pela expansão do município, que ocorreu ao longo de
uma estrada ferroviária. Sem conseguir fixar-se na região central, milhares de pessoas,
acompanhando a ferrovia, afastaram-se da área central, e conforme compartilhavam
características relativamente similares, tanto de ordem cultural como socioeconômica,
instalaram suas residências, constituíram famílias e impulsionaram o surgimento de novos
bairros. Um destes é o Bairro Lagoa, que tem seu crescimento condicionado ao fato de que os
moradores se reconhecem como parte de um mesmo grupo populacional, o de baixo nível
socioeconômico.
Utilizar-se desta classificação socioeconômica para expressar as condições de vida dos
seus moradores, no entanto, seria insuficiente. Por isso, conforme anunciado
introdutoriamente e reforçado no capítulo anterior, tomamos como referência o conceito de
reprodução social. Nessa ótica, para compreensão das condições de vida no bairro,
consideramos os seguintes elementos constituintes: i) as formas de trabalhar e consumir; ii) as
formas de consciência e conduta; e iii) as instituições formadoras de consciência.
3.2.1 Formas de trabalhar e consumir
Campaña (1997) assinala a produção (trabalho) e o intercâmbio de produtos
(consumo) como a base de toda ordem social, pois “a partir do que produz a sociedade, de
como ela produz e de como se distribuem os produtos, dependerá sua estratificação social” (p.
134). Partindo desse pressuposto, dentre os elementos da reprodução social, optamos por
iniciar esta reflexão sobre as oportunidades de trabalho no bairro e também a forma pela qual
os moradores ingressam neste mercado.
De modo geral, pode-se dizer que no bairro não existem oportunidades de trabalho. O
comércio é limitado a um supermercado, três bares, uma serralheria e uma madeireira.
65
Trabalhar, então, só fora do bairro; porém, a exemplo do cenário nacional, também está tão
difícil ingressar como permanecer no mercado de trabalho, ainda mais porque os moradores
(em questão) não possuem formação específica
45
. Diante desse quadro de desalento, a maioria
dos moradores é empurrada para a mesma direção dos que sobrevivem às custas do trabalho
informal (quando existem vagas). As principais ocupações acabam sendo os trabalhos de
pedreiro, carpinteiro, encanador, eletricista, diarista, varredor de ruas, enfim, trabalhos que
exigem baixa escolaridade e qualificação.
Assim, ao invés de vender trabalho, eles vendem a força de seu trabalho, o que
representa a alienação ou desumanização do trabalho capitalista: i) constroem e limpam casas,
mas elas não lhes pertencem; e ii) o trabalho é repetitivo e inibe o desenvolvimento das
energias físicas e espirituais, danificando o corpo. Além disso, não se pode esquecer de
mencionar que eles acabam se deparando com a realidade de não contar com a seguridade
social (direitos trabalhistas).
E como um efeito cascata, caso os próximos governos não freiem o ritmo da
desregulamentação dos direitos sociais iniciados pelos governos FHC, provavelmente os
problemas podem se agravar ainda mais no futuro, como, por exemplo, quando desejarem e
estiverem na época de se aposentar. Isso porque, já na década de 90, a informalidade refletia
negativamente nas contribuições previdenciárias, dado o déficit gerado. Por conta disso, no
final da década foi proposta e aprovada a Reforma da Previdência, que extinguiu a
aposentadoria por tempo de serviço. A partir desta, a contribuição previdenciária é essencial
para se aposentar, desde é claro, que cumprido o período necessário de contribuição (35 anos
para os homens e 30 anos para as mulheres).
Há ainda o fato da queda dos rendimentos
46
. A exemplo de milhões de brasileiros,
vivem às custas do salário mínimo, que apesar dos aumentos anuais, é insuficiente para
satisfazer as necessidades individuais e familiares, intensificando-se cada vez mais as
situações sociais de exclusão, desigualdade e pobreza no país. Assim, o programa Bolsa
Família apresenta-se como uma das poucas possibilidades de aumento dos rendimentos dos
moradores. Neste ponto, convém dizer que embora se reconheçam os limites deste programa,
ele tem sido apontado como um dos responsáveis pela redução da pobreza e das
desigualdades no país, conforme o estudo Crescimento pró-pobre: o paradoxo brasileiro
45
Segundo o levantamento oficial da taxa de ocupação nas seis principais Regiões Metropolitanas do país
(Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre), feito em abril de 2006, 10,4% dos
brasileiros não tinha ocupação (IBGE, 2006). Levando-se em conta apenas a população jovem (15 e 24 anos),
pode-se dizer que a taxa é ainda maior. Em fevereiro, esta taxa foi de 27,1% (GOIS e LAGE, 2006).
46
Na década de 90, a queda nos rendimentos do brasileiro foi de 8% (SOARES, 2001).
66
(FGV e UNDP, 2006). Por este, constatou-se que entre 1995 e 2004, embora na renda média
brasileira tenha sido registrada uma perda de 0,63%, nos rendimentos dos mais pobres, houve
um acréscimo de 0,73%.
Contudo, mesmo com a possibilidade de aumento nos rendimentos, nem sempre os
moradores conseguem elevar seu poder aquisitivo, pois no bairro o comércio é limitado a um
supermercado. E, segundo Santos (1998), na periferia os preços são mais elevados que nas
regiões centrais, o que acaba contribuindo para manter ainda mais a situação precária da
população. Mas esta não seria a intenção dos proprietários e sim a forma deles garantirem seu
lucro, pois frente a baixa procura pelos produtos, deve-se elevar a margem de lucro dos
mesmos.
Com recursos escassos, o consumo de bens pelos moradores assim também é, e, a
nosso ver, muitas vezes ele pode ocorrer de duas formas. A primeira é o consumo pela
substituição: esse ocorre quando os moradores se desfazem de algum bem para conseguir
outro, como, por exemplo: Professor! O pai pediu para eu perguntar se ele pode vender a
bicicleta para comprar uniforme para eu jogar na escolinha (Ronaldinho Gaúcho). Já a
segunda forma é o consumo pensado para o futuro, mas não planejado. Neste, o consumo de
um bem é pensado para um futuro bem distante, o que significa dizer que aquele sonho
permanecerá vivo por um longo período, mesmo que não venha a acontecer. Nesta forma de
consumo, também estão aqueles gastos que não estavam previstos para um mês e, por isso,
acabam sendo deixados para o mês seguinte.
Eu gosto de ir para o centro de bicicleta, mas ela está com o pneu furado. Então, vou
a pé. Mas, no final do mês o meu pai me dará dois reais para consertar o pneu [...]. O
pai está pensando em comprar um computador para mim, daqui há uns dois anos
(Edmilson).
Embora não tenhamos indo a fundo para comprovar nosso entendimento, acreditamos
que estas dificuldades tanto na produção como no intercâmbio de produtos no bairro estariam
afetando negativamente as condições de saúde dos moradores. Isso porque tanto as
características individuais herdadas pelos genes (genótipo) e a sua realização (fenótipo)
dependem do espaço social em que vivem os indivíduos (CASTELLANOS, 1997). Exemplo
disso é a estatura das crianças que ali vivem, pois visivelmente elas possuem estaturas muito
baixas
47
, o que é reforçado nas palavras de um morador: Não sei, as crianças aqui não
crescem! Durante uma visita de um funcionário do setor de esporte e lazer do município na
47
Por não ser o objetivo desta investigação, a reflexão limitou-se a considerar a hipótese de que o espaço social
estaria limitando o crescimento normal daquelas crianças.
67
quadra, para observar como vinha sendo realizada esta intervenção, houve comentários nessa
direção: Quantos anos tem aquele menino? [...]. Parece que ele tem bem menos; ele é muito
pequeno.
Diante das dificuldades para produzir e consumir, resta aos moradores usufruir os
serviços públicos a eles oferecidos como a única forma de se amenizar estes efeitos. Nesse
sentido, na seqüência procuramos anunciar as condições destes serviços prestados aos
moradores do Bairro Lagoa.
Educação
O bairro conta com duas escolas, que por funcionarem num mesmo prédio desfrutam
dos mesmos recursos e necessidades. A Escola Municipal da Lagoa atende crianças de 1ª a 4ª
séries, no período vespertino; e a Escola Estadual Luiza Rosa Zarpellon Pinto atende crianças
de 5ª a 8ª séries, no período matutino. As principais dificuldades observadas são: i) a
biblioteca é pequena em espaço e quantidade dos livros; ii) não há sala de informática; iii) por
não contar com uma quadra esportiva, um terreno acidentado (com gramado) tem sido
utilizado como campo de futebol; iv) os materiais esportivos e a merenda escolar dividem um
mesmo espaço, o que pode contaminar os alimentos; e v) o terreno em que foi construído o
prédio, ficou por aproximadamente 15 anos de forma irregular, o que deixava toda a
comunidade escolar apreensiva quanto a possibilidade de o prédio ser desapropriado. Este
ano, a Câmara Municipal aprovou e o Prefeito Municipal sancionou a compra deste terreno.
Mesmo com estas limitações, o ensino fundamental é proporcionado às crianças do
bairro, porém, o ensino médio além de não ser oferecido, também não está previsto para os
próximos anos. Primeiro, porque não são todas as crianças que após concluir o ensino
fundamental ingressam no ensino médio. Segundo, porque para muitos dos que ingressam, o
desejo não tem sido a educação, mas a possibilidade de sair do bairro e ter contato com outra
realidade. Assim, este momento de sair do bairro acaba sendo um momento de alegria e muito
comemorado pelas crianças.
Não penso em solicitar o Ensino Médio para a escola, pois o que os alunos querem é
ir estudar no Xavier. Não porque o Xavier é bom, mas porque é fora do bairro. Eu
até posso solicitar num ano, mas no outro não sei se terá procura (Preparador
Físico).
Moradia
De modo geral, os moradores vivem em residências próprias, as quais podem
apresentar-se tanto em boas como péssimas condições: i) há residências com até três
68
cômodos, assim como outras com mais de cinco; ii) a maioria conta com energia elétrica
(muitos moradores enquadram-se no Programa Luz Fraterna, do Governo do Estado, e que
devido ao baixo consumo de energia elétrica não pagam taxa) e água encanada; e iii) apesar
da rede de esgoto passar por praticamente todo o bairro, muitas residências não estão ligadas à
rede, pois os moradores não têm condições deste investimento.
Pavimentação
Apenas uma rua do bairro é pavimentada com pedras regulares e não se estende por
mais de 100m. Por ser no trecho que passa pela frente da casa do proprietário do
supermercado e que, coincidentemente, é o presidente da Associação dos Moradores, isso
gera uma certa desconfiança entre os moradores.
A pavimentação é só num trecho de uma rua e na qual mora o próprio presidente do
bairro e as pessoas que estão envolvidas com a presidência do bairro. Dá pra
entender que eles lutam, mas primeiro têm que atender o lado deles (Técnico).
A explicação é que este trecho não foi construído pela administração municipal, mas
por uma empreiteira, que acabou empregando o material que restou de uma outra obra
realizada no município. E a escolha desta rua deve-se ao fato do tráfego de caminhões que
entregam mercadorias no mercado.
Quanto às demais, podem-se observar dois fatos antagônicos: i) quando chove forma-
se camadas de barro que dificultam o deslocamento pelas mesmas; e ii) em períodos de seca,
uma grande poeira é produzida e pelo movimento de veículos e ela se espalha, o que acaba
sujando as roupas estendidas nos varais e trazendo problemas respiratórios.
Segurança
A exemplo das periferias brasileiras, a violência é crescente e é um dos graves
problemas. Numa das primeiras visitas ao bairro, especificamente às escolas, quando se
pretendia obter cópias dos Projetos Político-Pedagógico, a diretora de uma das escolas
informou que na noite anterior o prédio havia sido invadido e dois botijões de gás foram
roubados. Este não seria um fato isolado que ocorreu no bairro, já que por ele estar situado na
rota de alguns dos bairros mais violentos do município (Morro da Formiga e a Vila Raquel),
era normal, durante as aulas, as crianças comentarem da violência que convivem: Ontem um
homem que morava ali naquela casa foi morto. Ele estava num churrasco com os amigos
69
dele, e veio um cara e deu uns tiros nele. Quando o bombeiro chegou, já estava branco, já
tinha perdido muito sangue (Dida).
O reflexo deste cenário é o medo observado tanto entre algumas crianças como entre
seus pais. Em relação às crianças, ouvíamos elas dizer que: À noite eu tenho medo de sair de
casa, o pessoal do Morro desce e dão tiro lá na curvinha, perto da ponte (Cafu). Já no que se
refere à preocupação dos pais, os preparativos para a viagem à Curitiba foi exemplar, pois
diante da previsão de retorno para 20h, observamos um sentimento de insegurança por parte
de uma mãe: Mas vocês entregarão eles em casa? É que eu fico preocupada se ele for ficar
na quadra. Daí eu tenho que ir lá esperar vocês chegar. É muito perigoso andar sozinho por
aí. Até de eu ficar lá na quadra, dá medo (mãe do Cafu).
Transporte coletivo
A questão do transporte coletivo não é problema exclusivo dos moradores do bairro,
mas de todo o município. Além do alto custo, são poucos os horários que atendem o bairro.
Nem sempre dispondo de recursos para pagar pelo transporte, é comum os moradores optarem
por se deslocarem para a cidade
48
caminhando ou pedalando. Como a distância entre o bairro
e o centro é de aproximadamente 5 km, para quem se desloca caminhando, no ir e vir são
necessárias praticamente duas horas. Se o tempo do deslocamento já não fosse o bastante,
logo na saída/entrada do bairro, há uma rodovia estadual (Rodovia Edgard Andrade Gomes,
que liga os municípios de Irati e Inácio Martins e que é freqüentemente trafegada por
caminhões carregados de madeira.), que sem acostamento
49
, tornava a caminhada/pedalada
uma aventura um tanto quanto perigosa: O pai um dia saiu fora da estrada; estava bêbado e
caiu da bicicleta; quebrou o braço (Edilson).
Assistência médica
O bairro conta com um posto de saúde, no entanto, além de ser mal localizado, não há
equipe diária de atendimento. Aqui nem tem médico. Temos que ir lá na secretaria, perto da
Fósforo (Júnior). O atendimento médico resume-se em uma visita semanal e os atendimentos
devem ser agendados com antecedência. Sem a possibilidade de atendimento diário, a
população somente procura os serviços na Secretaria de Saúde quando este é imprescindível.
Assim pôde-se constatar quando, durante as aulas, uma criança se lesionou e necessitava de
48
Para se referir a área central, as crianças expressam o termo cidade. É como se a periferia não fizesse parte da
mesma.
49
Convém registrar, no entanto, que durante a permanência do campo, foi construído o acostamento desta
rodovia, amenizando a situação.
70
atendimentos médicos. Depois de ser atendida, sua mãe demonstrava que o problema não se
resumia à lesão, mas no transtorno de depender do serviço público, que a seu ver era
demorado, atendia mal e distante da sua residência.
Lazer
Em meio a estas condições, engana-se quem pense que seus moradores apenas vivam
momentos tristes, pois ali também podem ser encontrados momentos alegres, tais como os
advindos com os momentos de lazer, o que coincide com o estudo de Magnani (1998), quando
estudou a periferia paulistana. Contudo, as atividades de lazer observadas no Bairro Lagoa,
além de não serem oferecidas pelo Poder Público, ainda acabam encobrindo esta lacuna, pois
dificilmente superam os passatempos: ouvir música, assistir televisão, chutar bola, jogar
bolinha de gude (bulica), brincar de carrinho, andar de bicicleta, visitar amigos, descansar,
freqüentar bares.
De certa forma, isso acaba contribuindo para que o único espaço público de lazer
existente no bairro seja a quadra esportiva (local de desenvolvimento desta investigação e que
pelos moradores é chamada de cancha). Diante da sua precariedade, as crianças preferem
construir “campinhos” alternativos para jogarem seu futebol, conforme anunciado
introdutoriamente. Contudo, como estes campos são demarcados em terrenos particulares,
nem sempre elas podem usufruir à vontade dos mesmos, pois algumas vezes os seus
proprietários impedem a sua longa e permanente utilização. Nós fizemos um campo lá perto
de casa e alguns dias depois já tinha uma placa para vender o terreno. Daí, nós tirávamos a
placa para chutar bola, mas antes de ir embora, nós colocávamos a placa no lugar de novo
(Kaká).
Além disso, se os meninos ainda contam com esta opção de fazer e freqüentar os
campinhos, o mesmo não se pode dizer das meninas. Elas
Se reúnem em 3 ou 4 e ficam ensaiando coreografias de dança. E isso vai causar o
quê? Não é aquela coreografia pra desenvolver o corpo, mas aquela coreografia que
é insinuante. E daí elas ficam se olhando o corpo, que uma está mais gorda. Daí elas
ficam ensaiando e vem aqui e falam: ‘Vera dá pra nós apresentar uma coreografia?’
Quando? ‘Ah, não sei que dia lá’. Pode! Mas vocês não vão ensaiar? ‘Ah, mas nós
vamos nos reunir na casa não sei de quem, daí nós vamos ensaiar’. Daí elas se
reúnem durante a semana inteira. Bom, o ensaio propriamente dito dá cinco minutos,
mas elas passam a tarde. Por quê? Pra ficar falando dos piás, a mãe não está em
casa, foi trabalhar, o pai não está em casa, foi trabalhar, quando moram pai e mãe,
né. Então, é isso que acontece (Preparador Físico).
71
De modo geral, o que se pode dizer do lazer no bairro é que além de ser um
passatempo, é algo exclusivo dos meninos. As meninas não têm direito ao mesmo, não só
porque falta estrutura, mas porque a cultura machista ali presenciada não permite que as
mesmas ocupem o tempo que teriam para o lazer. Normalmente, este tempo é ocupado com
atividades domésticas, já que seguindo a lógica da ocupação de trabalho de suas mães, esta
possivelmente será a sua ocupação futuramente. Por conta disso, as atividades da escola
acabam sendo o único momento em que elas podem desvencilhar-se dos trabalhos
domésticos, nem que para isso, elas mesmas proponham atividades, como as coreografias; ou
seja, é uma fuga da realidade.
3.2.2 Formas de conduta e consciência
As formas de conduta e consciência são compartilhadas pelas relações que os
indivíduos tomam com seus pares durante a formação de coletividades (desde a família até as
nações), influenciando a percepção de mundo, as relações com os outros seres humanos e a
atuação na vida social, que pode ser marcada pela passividade e conformismo ou então pelo
envolvimento ativo na construção da sociedade (CASTELLANOS, 1997).
No primeiro extremo, as condutas favorecem a manutenção da vida socioeconômica
no nível atual, com as contradições da sociedade sendo isoladas e estruturas permanecendo
estáticas. É a alienação da consciência, um dos grandes objetivos dos grupos hegemônicos.
No outro extremo, estão as condutas engajadas na transformação das relações sociais, e que
visam romper com as estruturas materiais, políticas e culturais, as grandes responsáveis pela
concentração do poder na sociedade capitalista (CAMPAÑA, 1997).
Demo (1996) classifica esta atuação como qualidade política, “a característica
processual que fenômenos participativos precisam apresentar, em termos de conteúdos, fins,
para além das instrumentações formais” (p. 116). O seu contrário é a pobreza política, o que
significa que as pessoas vivem na condição de massa de manobra, de objeto de dominação e
manipulação, de instrumento a serviço dos outros.
E esta pobreza foi nitidamente observada na investigação. Além de socioeconômica,
entre os moradores há também evidências de pobreza política. As crianças, talvez por estarem
na infância, que é determinada historicamente uma fase na qual as pessoas não têm voz
(ÁRIES, 1981), e assim pressionadas com isso, não demonstram preocupação com as
condições de vida precárias a que estão impostas: Não faz mal, professor! (Roberto Carlos).
Ou seja, há freqüentes expressões de aquela situação é natural.
72
Na questão do lazer, o que elas querem é só brincar. Em essência isto não é problema,
contudo, suas brincadeiras, como já anunciado, como simples atividades de passatempo e
divertimento adaptadas à realidade, sem questioná-la, acabam alinhando-se aos preceitos do
lazer funcionalista. Isto contribui para a permanência do quadro de dominação, demonstrando
a desistência da luta pela mudança e a fácil aceitação da realidade como ela está posta. A
temática Pedagogia do Improviso (MATIELLO JÚNIOR, 2005) auxiliou na observação deste
sentimento de conformação. Dispondo de apenas duas bolas de futsal para as atividades, as
crianças foram estimuladas a coletivamente solucionarem a falta de bolas para dinamizar o
desenvolvimento da aula e, de preferência, superarem a lógica do esporte oferecido aos
pobres, desenvolvido à base do improviso.
Embora alguns envolvidos tenham levantado a possibilidade de contribuírem na
aquisição de novas bolas (sinceramente, se assim fizessem, não se sabe de onde viriam estes
recursos), o que marcou foi o sentimento de aceitação daquela realidade. As bolas existentes
para as atividades já eram muito além do que um dia eles pensaram ter à disposição. É como
se tivessem nascido e recebido a informação de que viveriam sempre daquela forma, sem
direito a desejar nada além do que estivesse ao seu alcance. Quando tem bola, nós jogamos.
Se não tiver, não jogamos (Lúcio). Ter outras opções de lazer é bom, mas se não tiver não faz
mal, já estamos acostumados (Ronaldo).
Assim, atividades como a elaboração coletiva de um ofício reivindicando uma trave,
somente foi possível por termos tomado a frente, contudo, conforme adverte Carvalho (apud
VASCONCELOS, 1997), acreditamos que nem sempre foi possível não cairmos na armadilha
de ver a participação popular resumida na colaboração, como se a transformação não fosse
uma vontade e luta das crianças.
Outro agravante é que nas visitas para entrega do ofício ou para saber do andamento
das reivindicações, era grande o número de crianças que gostariam de ir, contudo, o desejo
não era o exercício da sua cidadania, mas aproveitar uma das poucas oportunidades que
tinham para andar de carro e passear pelo centro da cidade. Chegava-se a ponto de, na
formação das comissões, as crianças mencionarem nunca ter andado de carro e, sem exagero,
pudemos perfeitamente observar isso durante os trajetos. É difícil encontrar palavras para
explicar o que aquele “andar de carro” significava para aquelas crianças. Era uma
oportunidade que elas tinham de esquecer da vida repleta de privações em que viviam. Para
elas não importava que aquele momento seria tão rápido e passageiro quanto as paisagens e
pessoas que passariam pelos vidros do carro.
73
E quando chegava a hora da comissão entrar em cena, era nítido o reflexo do quadro
de dominação. As crianças apresentavam-se extremamente envergonhadas, tal como Freire
(1981) descreve na relação opressor-oprimido (a cultura do silêncio). Sequer entrar nas
dependências do ginásio de esportes (sede do Departamento de Esporte e Lazer de Irati) elas
se arriscavam. Diziam estar com vergonha e que nenhuma gostaria de se manifestar e entregar
o documento. Quando recebidos, na sala do diretor, sentiam-se intimidadas com a pressão de
ver do outro lado da mesa umas pessoas importantes da administração municipal. Assim,
tomando a iniciativa de falar, procuramos envolvê-las num diálogo, em que se ouviam vozes
tremidas e em baixo tom. Durante a entrega do documento por um menino, observamos um
suspiro profundo que dava a seguinte impressão: Ufa! Consegui! (Lúcio).
Quando o diretor lia o documento e se comprometia em atender aquela reivindicação,
inclusive indo além do que ali se reivindicava, os olhos das crianças se arregalavam e, diante
de sua “generosidade”, mudavam até a postura de sentar na cadeira e de se expressar,
surgindo alguns sorrisos. Outra observação importante a ser feita em situações como esta, é
que as crianças mais novas eram quem se apresentavam mais dispostas a se expressar. Um
fato confirmado também por um dos informantes culturais privilegiados: Isso mesmo, os
menores gostam mais de participar, de se expor. Quando tem alguma atividade aqui, é mais
fácil conseguir que os alunos da 5ª participem, porque os da 8ª não querem (Preparador
Físico).
Em meio a este contexto deflagrado, compreendemos que este poderia ser um reflexo
das instituições formadoras da consciência no bairro: a família, por ser responsável pela
formação primária; e as escolas e Associação de Moradores, por responderem pela formação
secundária (SAMAJA, 2000).
3.2.3 Instituições formadoras de consciência
Quando se fala em consciência, fala-se da maneira com que os homens se vêem no e
com o mundo, ou seja, a sua própria consciência do mundo.
A consciência do mundo, que viabiliza a consciência de mim, inviabiliza a
imutabilidade do mundo. A consciência do mundo e a consciência de mim me fazem
um ser não apenas no mundo, mas com o mundo e com os outros. Um ser capaz de
intervir no mundo e não só de a ele se adaptar. É neste sentido que mulheres e
homens interferem no mundo enquanto os outros animais apenas mexem nele. É por
isso que não apenas temos história, mas fazemos a história que igualmente nos faz e
que nos torna, portanto históricos (FREIRE, 2000, p. 40).
74
Para Duarte Júnior (1984) esta é a forma pela qual as pessoas apreendem a realidade,
também denominado de socialização. “Por ele tornamo-nos humanos, aprendemos a ver o
mundo como o vêem nossos semelhantes e a manipulá-lo prática e conceitualmente através
dos instrumentos e códigos empregados em nossa cultura” (p. 78). Conforme anunciado
anteriormente, esta socialização ocorre sob duas formas: primária e secundária.
A socialização primária é marcada pela questão da afetividade e dos laços familiares.
Neste ponto, convém dizer que família não é simplesmente um somatório de pessoas, mas,
... um todo sistêmico, uma estrutura na qual os elementos não somente se encontram
próximos entre si, mas ligados em relações que refletem as qualidades, interesses,
experiências particulares e que manifestam na totalidade uma configuração
qualitativa superior à adição das partes (CAMPAÑA, 1997, p. 142).
Para Arriagada (2001), a família é o local ao qual se recorre para enfrentamento das
crises de insegurança em que vivem as pessoas, tais como: trabalho (desemprego e baixos
salários), saúde (drogas, doenças, enfermidades e mortes), educação (exclusão) e violência
(delitos). No entanto, é também nestas crises que ela se revela mais vulnerável,
principalmente no que tange ao desemprego, violência e desestruturação familiar, que,
obrigatoriamente, acarretam profundas mudanças na sua configuração, tais como: a
necessidade de redução do tamanho das famílias (controle de natalidade) e de aumento entre
as idades de seus membros.
No Bairro Lagoa, no entanto, pode-se dizer que o significado de família não vai além
de representar um conjunto de pessoas vivendo num mesmo lar. Muitas vezes desestruturadas,
nestas famílias, ou melhor, lares, as crianças não encontram referência para compreenderem o
mundo em que vivem.
Aqui, a família é um amontoado de pessoas que vivem juntas. Tem filho só de pai,
filho só da mãe e filho dos dois; mais uma sobrinha que é da irmã que foi morar em
Curitiba, né, e avó. Então, a grande maioria das crianças aqui vive com a avó, a
madrasta e com o padrasto. É até, assim, uma coisa natural. [...]. “Minha mãe está
morando com outro homem” (Preparador Físico).
O reflexo disso pode ser o tamanho conformismo das crianças em relação à realidade
em que vivem. Ainda mais se considerar que aquelas que demonstram certo senso crítico com
a realidade convivem em lares onde se observa “o real sentido de família”. E esse
conformismo não é possível de ser rompido nem pelas instituições responsáveis pela
socialização secundária, mesmo que nos projetos político-pedagógicos das duas escolas, por
75
exemplo, identifique a preocupação com a formação do cidadão e transformação da
sociedade.
A educação não cura a pobreza econômica. É puro pedagogismo pretender isto. Mas
apresenta estratégias de superação da pobreza política, entendida como repressão da
cidadania popular e recriação das condições de massa de manobra nas mãos do
Estado e das oligarquias (DEMO, 1991, p. 93)
Pela análise destes projetos político-pedagógicos, quando se procurou compreender de
que forma as escolas possibilitam a participação da comunidade nas questões de interesse
coletivo, constatamos que, em ambas, as crianças seriam aprendizes de cidadãos, que em
interação poderiam construir uma sociedade mais justa e humana. Um discurso bonito, mas
que, no entanto, nesta investigação, por não terem sido feitas observações junto às escolas,
não se pode dizer que de fato ocorre, apenas levantar hipóteses. Uma delas é que as escolas
acreditam que o simples fato das crianças freqüentarem as aulas já seria possível de se chegar
às metas almejadas. É como se cidadania, interação social e a construção de uma outra
sociedade viessem naturalmente, sem resistência alguma, principalmente por parte dos grupos
dominantes, inclusive os que ditam as normas escolares no país e naquele município.
Fora isso, numa das escolas, por diversas vezes a categoria “avaliação” apareceu no
texto, entretanto, em nenhum momento se referia à avaliação de suas metas de formar
cidadãos, humanizar a sociedade e integrar as pessoas. O que veicula simplesmente é a
avaliação do desempenho curricular das crianças. Assim, reforça-se a hipótese da instituição
acreditar que o fato da criança estar na escola já seria suficiente para atingir os objetivos em
questão. Se considerada a “pobreza política” observada ali, sem nenhum exagero, a crença das
escolas está equivocada. Mas, este possível problema detectado, não é exclusividade local, e
sim a tendência que predomina no sistema educacional brasileiro, pautado naquilo que Paulo
Freire chama de Educação Bancária
50
, estimulando a individualidade e a competitividade
entre as pessoas.
Se nas famílias e nas escolas não são dadas condições propícias para se romper com o
conformismo que assola os moradores, pode-se dizer que a única instituição (restante, afora as
igrejas) que poderia auxiliar neste processo é a Associação dos Moradores do bairro. Seria,
mas não é isso o que acontece. Criada em 1988, esta associação levou praticamente 18 anos
50
A Educação Bancária é a prática na qual o educador é o único que educa, que sabe, que pensa, que diz, que
prescreve etc. e, por conseqüência, os educandos apenas são os educados, os que não sabem, os que são
pensados, os que escutam docilmente, os que seguem as prescrições etc. Ou seja, os educandos são simples
vasilhas nas quais precisam ser depositados conteúdos e, preferencialmente, por aqueles que dêem continuidade
a opressão (FREIRE, 1981).
76
para conquistar uma sede própria e os moradores pouco sabem da sua existência e
importância para o bairro. Das crianças participantes na investigação, nenhuma sabia da
existência da Associação e quando estimuladas a perguntar para seus pais/responsáveis,
informaram que os mesmos também não souberam responder. Assim, uma das informantes
culturais privilegiadas encontradas no bairro tem razão em dizer que:
Uma das coisas que eu acredito que o nosso povo não sabe é a importância que tem
uma Associação de Moradores no bairro. Eu tentei colocar isso em reuniões, mas
tinha muito pouca gente, porque nós como associação devidamente organizada,
legalizada, nós temos uma força muito grande até junto à esfera não só municipal,
mas estadual e até federal, para que venha recursos e para que nós desenvolvamos
projetos maiores pra comunidade, né. Então, eu, nesse sentido, acredito que as
pessoas não têm conhecimento e agora talvez, é uma realidade, uma coisa nova na
comunidade, vamos ver o que vai ser daqui pra frente (Massagista).
A esperança que esta informante tem é que a construção da sede social da associação
sirva de alento para a conscientização dos moradores e, conseqüentemente, favoreça a
organização popular em prol de melhorias para o bairro. Outro informante cultural
privilegiado, da mesma forma, acredita que a falta desta sede seria um dos motivos pelos
quais a população é ausente das discussões que envolvem questões de interesse coletivo.
Nessa lógica, a administração municipal foi apontada como a grande responsável pelo
desinteresse/conformismo dos moradores.
Não se pode negar que essa falta de atenção por parte da administração municipal
venha influenciando essa postura dos moradores em desistir da luta pela transformação da
realidade, contudo, este não seria o único motivo. O próprio estatuto da associação pode ser
visto como um dos responsáveis para isto. No documento, fica claro que a participação
popular fica condicionada a certas obrigações sociais, que não são muito claras, a não ser o
cumprimento daquilo o que é expresso no estatuto, tais como: “Contribuir financeiramente
para Associação assim quando for estipulado em assembléia”.
Assim, compreendemos outro forte motivo dos pais/responsáveis não participarem das
suas reuniões. Aliás, como estava previsto, foi observada uma destas reuniões. Ela teve a
participação do Prefeito Municipal e, por esta razão, foi realizada em seu gabinete. O
presidente da Associação convidou alguns moradores para participar, pelo que logo se
evidenciou que a participação não é aberta a todos os moradores. Devido aos compromissos
do Prefeito, a reunião teve algum atraso. Enquanto esperavam pelo seu início, pôde-se
observar a indignação daqueles moradores para a situação do bairro, dando a impressão de
que o convite para eles devia-se particularmente ao seu aguçado senso crítico.
77
Contudo, ao iniciar a reunião, logo tal senso foi silenciado. Passivamente ouviam os
planos e projetos da administração municipal para o bairro. O único questionamento foi
quanto a proposta do calçamento, já que existiam algumas ruas com maior necessidade de
serem pavimentadas (só que eram as ruas onde estes moravam, ou seja, cada um pensando em
si próprio). O mais curioso foi o final da reunião, quando, aglomerados próximos ao gabinete
do prefeito, os moradores falavam que se ganhassem a metade do que se falou, já estaria
muito bom, ou seja, nada seria conquista, mas uma dádiva.
Diante do exposto, fica claro que mudar o perfil do processo saúde-doença no bairro
passa, necessariamente, pela mudança de suas formas de conduta e consciência. De acordo
com Santos (1998), pouco valeria mudar o modelo econômico-político, caso não ocorra uma
mudança também no modelo cívico. Os moradores até desejam melhorias nas suas condições
de vida, mas ficam esperando que alguém faça isso por eles. De modo geral, são muito
acomodados.
3.3 Processo saúde-doença
Depois de desvelada esta realidade do bairro, comprovou-se a suposição de que o
grande desafio desta intervenção estaria em propiciar aos envolvidos a compreensão da saúde
como o resultado de um processo dinâmico e contraditório na dimensão coletiva, ou seja,
“alude aos padrões ou características em relação à constituição biológica e mental que
adquirem os seres humanos, segundo o perfil de reprodução social em que se desenvolvem
como seres sociais” (CAMPAÑA, 1997, p. 133).
Apesar da intenção, é fato que seu curto tempo de duração impossibilitaria avanços
significativos nessa compreensão. Assim, partimos da estratégia de desconstruir o
entendimento de saúde que as crianças apresentavam. Identificando seus limites, procuramos
estimular reflexões que demonstravam que doença não é uma fatalidade, pois, conforme já
anunciado, dificilmente as pessoas estão livres de qualquer processo patológico, dadas as suas
diversas necessidades (CASTELLANOS, 1997). Necessidades que não se resumem
simplesmente ao ato de comer verduras, conforme afirma Rivaldo, mas, por exemplo, em ter
o que comer diariamente com qualidade, já que anualmente milhões de crianças morrem por
causa da desnutrição (GLOBAL HEALTH WATCH, 2005). Aliás, a desnutrição é
reconhecida como um dos problemas que assola muitas crianças no bairro.
Nesse sentido, com vistas a romper com a visão fatalista da doença, enfatizamos que
as mesmas resultam de “algum tipo de sintoma dos grandes desarranjos ecológico-ambiental,
78
urbano, produtivo e propriamente humano” (LEFEVRE e LEFEVRE, 2004, p. 25). O objetivo
era evidenciar que ficar doente não é um privilégio, nem mesmo quando se ganha atenção e
presentes, conforme dizia Rivaldo. Para Berlinguer (1988), a doença não é nenhum privilégio,
pois com ela geralmente vem um quadro de sofrimento individual e coletivo. Assim, apesar
de respeitar suas crenças, fizemos um esforço permanente de problematizar essas questões.
Acreditamos que as lesões desportivas possam bem ilustrar este quadro, servindo para
desmistificar o entendimento de que saúde era fazer exercícios (Roberto Carlos) ou que os
exercícios serviriam para evitar que nós nos machuquemos (Cafu). Infelizmente, deve-se
dizer assim, as reflexões sobre o limite desta crença surgiram logo na primeira semana das
aulas, quando Ricardinho, numa disputa de bola, sofreu uma lesão grave. Tal fato serviria
para expor os limites das medidas preventivas no trato das questões da Promoção da Saúde,
em especial, para as crianças compreenderem que não bastaria dar “n” voltas pela quadra ou
alongar todos os músculos para evitar que elas se machucassem, pois mesmo realizando tais
atividades ele havia se lesionado.
A aula de primeiros socorros ministrada pelo Corpo de Bombeiros instigou a
compreensão de que a prevenção em saúde é bastante complexa e envolta de dinamismo e
contradições, já que se incluem medidas além do comer verduras e fazer exercícios. Exige-se
bom-senso, compromisso com a vida humana (todas as pessoas), conhecimentos e
competências técnicas. As crianças foram estimuladas a socializar o aprendizado com a
comunidade, principalmente, no modo do homem relacionar-se consigo mesmo e com seus
semelhantes e com a natureza. Na relação consigo mesmo e com o seu próximo, a aula de
primeiros socorros foi exemplar, pois o princípio básico para atuar numa situação de
emergência é: agir com humanidade. A inclusão deste, tem como consigna o direito que todos
têm a vida, independente de cor, credo, classe social ou valores pessoais.
Já na relação com a natureza, o fato das aulas se realizarem no período vespertino e
numa época de extrema estiagem no município, com as crianças expostas aos efeitos nocivos
dos raios solares, serviu de estratégia para evidenciar os problemas advindos por meio desta
relação. Assim, procuramos problematizar que aquela exposição poderia trazer-lhes
problemas, como o câncer de pele e o envelhecimento precoce, que faz com as pessoas
morram antes da hora delas (Cafu). A causa disso seria o buraco da camada de ozônio
(Rogério Ceni), que vem sendo causado pelo homem, pois somos nós que estragamos a
natureza (Dida). Para evitar isso, não é bom ficar no sol das 10 às 15h e tem que passar
protetor solar (Juninho Paulista). Algumas crianças mencionaram que tinham protetor solar
nas suas residências, mas nem sempre passavam.
79
Portanto, acompanhando o que Campaña (1997) fala sobre as relações que o homem
mantém com a natureza, seja protegendo ou explorando-a, propiciamos a compreensão de que
o fato das pessoas desenvolverem câncer de pele ou terem envelhecimento precoce não seria
causado só porque não usam protetor solar. Acreditamos que pelo lazer podemos “contribuir
para elevar a consciência sobre o natural como premissa do humano e, também, como
resultado do humano” (CAMPAÑA, 1997, p. 147).
CAPÍTULO IV
PARTICIPAR PARA MUDAR E MUDANDO PARA PARTICIPAR
Neste capítulo adentramos nas questões que envolvem as experiências vivenciadas
pelas crianças na escolinha de futebol, no âmbito da transformação da realidade em que
vivem. Uma escolinha que teve como foco o processo de formação humana instaurada na
consciência do inacabamento (FREIRE, 1996). Concordamos que a história é feita no
convívio entre seres humanos que, cada um contribuindo da sua forma, interagem no e com o
mundo. Por isso, ela é repleta de possibilidades e não de determinismos.
A consciência do mundo e a consciência de si como ser inacabado necessariamente
inscrevem o ser consciente de sua inconclusão num permanente movimento de
busca. Na verdade, seria uma contradição se, inacabado e consciente do
inacabamento, o ser humano não se inserisse em tal movimento. É neste sentido que,
para mulheres e homens, estar no mundo necessariamente significa estar com o
mundo e com os outros. Estar no mundo sem fazer história, sem por ela ser feito,
sem fazer cultura, sem ‘tratar’ sua própria presença no mundo, sem sonhar, sem
cantar, sem musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos,
sem esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência,
ou teologia, sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar, sem
idéias de formação, sem politizar não é possível (FREIRE, 1996, p. 58).
Enfim, é participando no e com o mundo que se pode transformá-lo (mudá-lo); porém,
como a participação não é simplesmente estar no mundo, compreende-se que muitas vezes
também é necessário mudar para participar. Assim, foram estas duas categorias – participação
e mudança – que emergiram no cotidiano da escolinha de futebol.
4.1 O sentido da participação
A questão da participação é objeto de divergências no campo do lazer no país. A partir
das idéias de Dumazedier (1976), na concepção funcionalista, enfatiza-se que a participação
popular no lazer (presença) seria a fórmula mágica para pôr fim aos mais variados problemas,
como, por exemplo, as violências, os preconceitos e a exclusão social; e, portanto, favoreceria
a integração popular e até mesmo a Promoção da Saúde. Contudo, este enfoque limita-se em
estimular as pessoas a participar de atividades previamente organizadas. Em se tratando das
ações oferecidas pelo poder público, na visão de Santos (1998), em vez de cidadão, as pessoas
são tratadas como consumidores, que facilmente aceitam ser chamadas de usuários.
81
Como apresentado por Marcellino (1998), defende-se que não basta simplesmente
garantir a presença da população no lazer, mas deve-se produzir e difundir uma cultura
popular que possa romper com atitudes conformistas, proporcionando condições a uma
participação crítica e criativa para a instalação de uma nova ordem social. A condição desta
participação, no entanto, de acordo com Mascarenhas (2005), é influenciada pelo modelo de
desenvolvimento comunitário, que seria incapaz de promover a melhoria das condições de
vida da população, já que suas ações seriam politicamente esvaziadas.
A ação política é a peça fundamental para se transformar a realidade. Por isso, a
população não deve apenas ser guiada ou empurrada por seu líder até aquilo o que sonham,
mas deve participar dos debates em torno do projeto de um mundo diferente (FREIRE, 2000).
É neste sentido que se compreende a participação pensada por Mascarenhas (2005) durante a
elaboração de uma intervenção pelos pressupostos da lazerania: o resultado de um processo de
formação política, que visa estimular a organização popular para se impor e autodeterminar.
Na mesma direção, Demo (1996) afirma que a participação é uma conquista. Significa
... que é um processo, no sentido legítimo do termo: infindável, em constante vir-a-
ser, sempre se fazendo. Assim, a participação é em essência autopromoção e existe
enquanto conquista processual. Não existe participação suficiente, nem acabada.
Participação que se imagina completa, nisto mesmo começa a regredir (p. 18).
A participação não pode ser entendida como dádiva, pois ela não é dada, e sim
conquistada. Também não seria uma concessão, já que não são os poderosos que cedem
voluntariamente, mas a população que se impõe. E, por fim, também não é algo preexistente
ou que caia do céu por descuido, mas uma resposta contra o processo histórico de dominação.
Em contrapartida, a falta de participação (o impedimento de participar) não deve ser um
problema em si, mas o ponto de partida para, de centímetro em centímetro (progressivamente
superando as dificuldades), conquistá-la (DEMO, 1996).
É comum que as pessoas se escondam atrás das dificuldades para justificar a
acomodação
51
, e, conseqüentemente, a não-participação. Durante a investigação, diante da
pobreza política do bairro, observamos que a não-participação é justificada de diferentes
formas pelos diferentes atores sociais. Para os moradores, a justificativa gira em torno das
instituições e dos seus líderes comunitários que não oportunizam a participação.
É sempre o mesmo grupo que participa das decisões. Entre eles decidem quem será
o presidente da Associação dos Moradores. A participação não acontece, grande
51
Para Freire (2000, p. 41) a “acomodação é a expressão da desistência da luta pela mudança. Falta a quem se
acomoda, ou em quem se acomoda fraqueja, a capacidade de resistir”.
82
parte da população é excluída. [...]. Eu nem sei quem é o presidente do bairro. Falta
conversar mais, deixar de excluir todo mundo do bairro, né. [...].Tem uma reunião,
mas a gente nem sabe. Tem alguma coisa lá na escola, os integrantes da APM só vão
pra assinar, porque tudo já está decidido, eles não decidem nada, não é democracia;
não tem uma votação. É um pequeno grupo que toma as decisões e depois chamam
os integrantes para assinar (Técnico).
Para os líderes, por sua vez, a não-participação é determinada pela cultura dos
moradores que além de acomodados, não querem compromisso. No máximo, a participação
comunitária seria através da colaboração nas atividades promovidas nas escolas e na igreja.
Olha, dia de festa da igreja, eu quero que você veja como que eles se organizam e
como eles participam em questão de ajudar. Festa quando tem aqui na escola não
precisa ficar saindo atrás e pedindo pelo amor de Deus venha ajudar. Não! Sabe,
uma vai comunicando a outra e elas vão se organizando em horário; olha eu venho
de tal hora, olha eu sou acostumada a fazer a massa do pastel, a outra já é
acostumada a fazer o tempero da carne, sabe. Eles têm uma organização muito
grande, com o pouquinho de oportunidade que eles têm. Sabe, mas não é assim que
eu tenho que ir lá em casa e pedir. Sabe, não há necessidade disso. Elas mesmas se
organizam. E isso eu observei no tempo que eu estou aqui. As mães passam para as
crianças já, para as filhas já (Preparador Físico).
A comunidade é muito participativa, não só na escola como também na igreja.
Então, nós temos festa uma vez por ano e sempre eles se dispõem mesmo,
colaboram, ajudam naquilo que a gente pede [...]. Estes estão prontos para colaborar
(Massagista).
Esta cultura, segundo Demo (1996), serve para retratar que a população até pode ser
organizada, porém não por descuido ou destino e sim como o resultado de um processo
histórico que lhes domestica e progressivamente desmobiliza. Este tem sido o objetivo do
sistema que divide para manter a dominação (FREIRE, 1981). Um quadro de difícil reversão,
mas, na visão ingênua de um dos líderes comunitários (identificado como informante cultural
privilegiado), com a inauguração da sede para a Associação dos Moradores (um dos canais da
participação) a expectativa é de que as coisas irão melhorar.
E agora se espera que as coisas comecem a melhorar, né. Esse é o primeiro passo.
Quem sabe as coisas vão acontecendo a partir daí. [...] até assim quando a gente
iniciou, eles até participavam bastante, inclusive tinha que ter guardado uma
listagem de 160/170 fotos. Então, daí eles começaram a contribuir com uma
mensalidade e tal, mas daí devido ao próprio poder executivo assim não demonstrar
nenhum interesse pela comunidade, as pessoas foram desistindo, sabe, inclusive a
própria associação, os líderes da associação e presidente, né, foram desanimando
e as coisas ficaram meio paradas, né. E agora, quando você vê que a coisa vai, que
tem gente interessada, gente que realmente pode fazer as coisas acontecer, então
anima o povo. O povo se anima, tanto que a mulherada voluntariamente vieram e
fizeram a limpeza ali do Centro Comunitário e tudo pra inauguração hoje, né. Então,
o povo se anima né. Quando tem gente que está se mostrando interessado pela
comunidade né. Daí participar, acredito que de novo reanima o povo (Massagista).
83
Não se duvida que uma sede de fato seja importante para uma Associação de
Moradores, até porque é uma oportunidade da comunidade compreender que no seu seio
existe uma instituição para cuidar dos interesses coletivos e, por isso, o canal de ligação com
o Poder Público. Contudo, como “participação supõe compromisso, envolvimento e presença
em ações por vezes arriscadas e até temerárias” (DEMO, 1996, p. 20), nada garante que estes
elementos tenham sido postos ao lado dos tijolos erguidos para a construção da referida sede.
Demo (1996) lembra que uma associação pode até aparecer bem arrumada em estrutura ou
legislação, entretanto, funcionando muito mal. É normal que líderes centralizem a atuação,
relegando aos demais membros a simples presença em reuniões, que além de ser em pouco
número, geralmente são sempre os mesmos.
Além do exemplo da Associação (organização da sociedade civil), o autor aponta
outros quatro canais que viabilizam a participação: i) planejamento participativo: um
autodiagnóstico que não camufla a realidade serve para hierarquizar o impacto das principais
necessidades e, a partir destas, organiza-se um plano de ação visando a mudança; ii) educação
como formação à cidadania: a educação com seu viés político é a primeira condição para a
participação e, por isso, uma incubadora da cidadania; iii) cultura como processo de
identificação comunitária: depende da cultura de participação de uma comunidade; e iv)
processo de conquista de direitos: pouco valem as legislações sobre os direitos assegurados,
pois na maioria das vezes, a sua garantia é dependente de processos reivindicatórios.
Em síntese, a participação tem como objetivo: a) autopromoção: sem o caráter
assistencialista das políticas sociais, a autopromoção permite aos próprios interessados
autogerir ou co-autogerir a satisfação das suas necessidades; b) realização da cidadania:
cidadão é aquele indivíduo que tem o conhecimento de seus direitos e reivindica os mesmos;
c) implementação de regras democráticas de jogo: a democracia permite que as comunidades
e pessoas tenham voz e vez, contudo, parte necessariamente da organização que as mesmas
geram; d) controle do poder: a relação crítica e criativa com o poder; e) controle da
burocracia: os serviços públicos são lentos e ineficazes, a sociedade organizada deve ser
capaz de reivindicar, de pressionar e de mudar as coisas; e) negociação: na resolução de
conflitos ou divergências, um lado deve ceder até um ponto onde as duas partes possam
conviver e realizarem seus interesses; e f) cultura democrática: a comunidade assumindo o
exercício democrático como característica (DEMO, 1996).
No que tange a escolinha de futebol para crianças, as categorias empíricas que
envolveram a discussão da participação foram agrupadas em torno de: i) assumindo
compromissos e ii) envolvimento consciente.
84
4.1.1 Assumindo compromissos
Para Freire (1988, p. 15) “o compromisso seria uma palavra oca, uma abstração, se
não envolvesse a decisão lúcida e profunda de quem o assume”. Por isso, comenta que a
primeira condição para se assumir um compromisso está na capacidade de se agir e refletir, ou
seja, na sua consciência de estar no e com o mundo, ou melhor, a práxis humana. Nesse
sentido, a participação das crianças esteve atrelada a um processo de conscientização
52
, que
iniciou em torno do próprio lazer, pois este nem sempre era visto como um compromisso. Um
compromisso, não no sentido de que eles foram obrigados a freqüentar todas as aulas, mas,
que a sua ausência não fosse justificada pelo esquecimento: Esqueci da escolinha, professor!
(Kleberson).
Fruto da falta de oportunidade de lazer, aquele esquecimento trazia outros problemas.
Na quadra não havia uma fonte (torneira) de água, por isso, desde os primeiros dias
procuramos estimular as crianças a se responsabilizarem por levar água para a próxima aula.
Embora sempre houvesse dois ou três que se manifestassem para assim procederem, na
prática isso não vinha ocorrendo. No início, os “responsáveis” chegavam atrasados, faltavam
ou, pior que isso, alegavam o esquecimento. Assim, como as aulas desenvolviam-se num
período de muito calor, constantemente as aulas tinham que ser interrompidas para as crianças
procurarem as residências próximas para pedir água.
A solução para isso foi a compra de uma garrafa térmica (pelo pesquisador). Com ela,
a proposição de que a cada final de aula, num sistema de rodízio, uma criança levaria a
garrafa para sua casa e na próxima aula teria o compromisso de trazer esta garrafa (com água),
servindo para saciar a sede dos companheiros. Caso a criança a esquecesse, não haveria aula,
ao menos que todos juntos fôssemos até a residência desta criança buscar a garrafa. Também
estabelecemos que se a criança no determinado dia que fosse responsável pela garrafa e, caso
não pudesse freqüentar a aula, ela teria que procurar uma outra criança (da escolinha) e pedir
sua colaboração para a tarefa. E foi nessa lógica que as crianças assumiram o primeiro e
importante compromisso com a escolinha, não deixar que a falta de água atrapalhasse o seu
desenvolvimento. A figura 7 demonstra um dos momentos em que as crianças fazem uma
pausa para beber a água levada na “vermelha” (denominação dada à garrafa por elas).
52
A conscientização é um processo de ação-reflexão da realidade, que não terminará jamais. Apresentando-se
“como um processo num determinado momento, deve continuar sendo processo no momento seguinte, durante o
qual a realidade transformada mostra um novo perfil” (FREIRE, 2005, p. 31).
85
Figura 7. Pausa para beber água
Esse compromisso com a água também teve finalidade educativa, pois a água que elas
trariam, deveria ser potável. Assim, eram estimuladas a observar como era o sistema de água
nas suas residências (descobrir se havia e qual o tipo de encanamento; se havia caixa d’água
etc.) e, a partir daí, é que poderiam se responsabilizar pela água. Isso porque a intenção da
escolinha era proporcionar uma prática de lazer para a saúde e, dessa forma, evitar que águas
impróprias fossem consumidas pelas crianças. Felizmente, todas as residências contam com
sistema de água encanada e, dessa forma, sem exceção, todas crianças puderam assumir este
compromisso. Este compromisso, talvez mascarado pelo desejo das crianças colaborar não
com as aulas, mas com o educador-investigador, era tão marcante que mesmo antes do final
das aulas, éramos procurados pelas crianças a fim de dizermos quem levaria a garrafa ou
então para autorizar para que a levassem. Curiosamente, esta garrafa também foi levada na
visita à Casa de Cultura de Irati, na viagem para Curitiba e no evento promovido pelo
Departamento de Esporte e Lazer de Irati em que participaram. Enfim, virou nossa
companheira de todas as horas.
Além disso, diante do período de estiagem, o município de Irati encontrava-se numa
campanha de racionamento de água e diariamente a população recebia recomendações para
evitar seu desperdício. Aderindo à campanha, enquanto uma criança assumia o compromisso
de levar água para a aula, as outras deviam evitar seu desperdício. Conforme se observou na
figura anterior, as crianças bebiam a água através do copinho que acompanhava a garrafa,
com todos esperando sua vez de beber. Para isso, utilizamo-nos do processo de
conscientização de que a água, um bem nacional de uso público (ZAPATTA, 2005), seria tão
mais necessário, e vital, que o petróleo. Por isso, todos teriam o compromisso de vigiar “as
86
ações produtivas que possam impactar de forma negativa” (CAMPAÑA, 1997, p. 147), pois,
sem água, não haverá lazer, saúde e, muito menos, condições do ser humano viver.
Outro fato relacionado ao assumir compromissos, diz respeito à Copa do Mundo da
Alemanha, quando por ocasião de um jogo da Copa do Mundo da Alemanha, entre Brasil e
Japão, coletivamente organizamos uma reunião para que todos juntos (crianças e pesquisador)
assistissem ao jogo. Uma criança ficou responsável por pedir autorização para seus pais se a
reunião poderia ser na sua residência, o que foi concedido; uma outra ficou responsável por
providenciar uma extensão elétrica, para que, se necessário, a televisão fosse levada para fora
da residência; outras duas se comprometeram a levar um banco (cada uma) para que todos
pudessem assistir ao jogo sentados; quanto às demais e o pesquisador, ficaram responsáveis
por levar um suco/refrigerante e a pipoca. Para comemorar que cada um cumpriu com sua
responsabilidade, um brinde foi proposto, conforme se observa na figura 8.
Figura 8. Um brinde à organização coletiva
Assim, ao longo das aulas procuramos evidenciar que pela união das pessoas aumenta-
se consideravelmente a chance de êxito naquilo que se propunha, principalmente, se
pensarmos nas reivindicações proporcionadas pela escolinha, ainda que até o momento
nenhuma tenha sido concretizada. A exemplo da forma com que Demo (1996) se refere à
participação, Mascarenhas (2005) se reporta à lazerania, isto é, como uma conquista. Anuncia
que isso não é “tarefa para uma única pessoa, nem para duas e nem para três. É um desafio
que precisa envolver os diferentes atores e forças socialmente comprometidas que interagem
direta ou indiretamente com o lazer” (p. 250-1). Quanto mais consciente e coletivo o
envolvimento, maior é a possibilidade de se obter melhorias de fato para o bairro.
87
4.1.2 Envolvimento consciente
Logo depois do primeiro encontro, quando explicitamos os objetivos do trabalho que
se iniciava, comentamos a necessidade de uma organização para, por exemplo, limpar a
quadra, já que ela estava tomada pelo mato, as crianças presentes neste encontro buscaram
espontaneamente enxadas e vassouras para iniciar a limpeza da quadra. Limpa, com certeza,
ela não ficou, pois algumas touceiras de mato ainda permaneciam, contudo, foi uma ação que
mereceu os sinceros cumprimentos do pesquisador, pois aquelas crianças demonstraram
iniciativa em retirar parte da sujeira da quadra.
Mesmo assim, dias mais tarde, quando já havia sido formada uma turma de trabalho,
todas as crianças foram convidadas para uma limpeza definitiva da quadra, pois este lazer
voltado para a saúde não seria propiciado num ambiente sujo e que em alguns pontos, por
estar cheio de galhos e pedaços de pau, apresentava-se como um perigo à segurança. Afinal,
se ainda não tinham a possibilidade de usufruir uma quadra em ótimas condições de
conservação e se o poder público não tinha agendado a limpeza do ambiente, não seria por
esse motivo que as atividades seriam desenvolvidas em local sujo, desarrumado, enfim,
desestimulante. A figura 9 demonstra momentos deste mutirão de limpeza.
Figura 9. Mutirão para limpar a quadra
Embora as crianças tenham respondido satisfatoriamente ao convite, trazendo
vassouras, enxadas, saco para lixo para contribuir com a limpeza, certamente esta participação
não foi fruto exclusivo da consciência das crianças e, por isso, uma ação coletiva para a
melhoria da comunidade, mas, apoiando-se em Carvalho (apud VASCONCELOS, 1997),
acreditamos que ela também apresentou-se como um agrado ao pesquisador.
Mas o envolvimento não dizia respeito simplesmente ao participar de mutirões de
limpeza, aqui também estavam inseridas aquelas ações que pretendiam obter melhorias
88
estruturais na quadra esportiva. Isso porque não poderíamos ficar esperando que pela vontade
de alguém fosse cumprido aquilo o que se expressa nas legislações nacionais, estaduais e
também municipais. Conforme Demo (1996, p. 61) “direito é algo incondicionalmente
devido; porém, só se efetiva, se conquistado. Por isso, não basta consignar direitos na letra,
fazer declarações verbais, aprimorar textos condicionais, se os interessados não urgirem na
teoria e na prática seus direitos”.
O autor complementa que aqui está em jogo a conquista da cidadania. Esta seria
representada de um lado pelos direitos a que os cidadãos têm e, no outro, pelo compromisso
comunitário de lutar pela efetividade destes direitos. Na elaboração de documentos
reivindicatórios, acreditamos que as crianças responderam satisfatoriamente, contudo, seria
um exagero dizer que isto seria somente o reflexo da consciência social das crianças, pois da
mesma forma que os mutirões, a participação poderia ser vista como uma colaboração para
com o pesquisador. Aliás, segundo os informantes culturais privilegiados identificados no
bairro, esta é a forma pela qual os moradores participam das questões de interesse coletivo e,
normalmente não gostam de ver seus nomes envolvidos. Essa última característica, a nosso
ver, como um fato isolado, foi descaracterizada, pois algumas crianças que estiveram na aula
em foi elaborado e assinado o documento, demonstraram o desejo de ter seu nome incluso no
documento: Eu não vim na aula passada, quando assinaram o ofício da trave, meu nome não
está lá (Ronaldo).
Tudo leva a crer que aquela indagação devia-se ao fato de que as crianças ao
retornarem da visita ao Departamento de Esporte e Lazer de Irati, quando receberam a
promessa de diversas melhorias para a quadra esportiva, estas se vangloriavam aquilo que
lhes foi prometido. Normalmente, ao ouvir que elas tinham ganhado tais melhorias, foi
comum observar os moradores perguntando: Quem ganhou? Como resposta, as crianças
anunciavam o nome das crianças que fizeram a visita e também as que assinaram o ofício.
Dessa forma, a criança que não participou da visita, nem assinou o ofício não teria contribuído
para ganhar e, talvez por isso, estava preocupada, demonstrando o interesse em incluir seu
nome neste documento. Assim, procuramos evidenciar que as conquistas obtidas não eram
individuais, mas coletivas, tal como ocorrem nos jogos do futebol. Não é o jogador que faz o
gol da vitória ou o goleiro que “fecha o gol” que vencem uma partida, mas o esforço de todos,
inclusive o dos que ficam no banco de reservas.
Ainda que estes documentos não refletissem unicamente a consciência social das
crianças, é fato que em um ponto elas compreenderam o significado das ações, pois como as
reivindicações dificilmente se concretizavam, surgiam indagações do tipo: Professor, quando
89
nós vamos lá de novo reivindicar a trave? (Rogério Ceni). Ou seja, compreenderam que elas
não estavam pedindo um favor, mas reivindicando a garantia de um direito. O problema, no
entanto, é que possivelmente ali o interesse maior não seria o exercício da cidadania, mas a
possibilidade de novamente andar de carro. Mesmo assim, demonstravam claramente o
aprendizado de que são portadores de direitos a uma vida melhor, mas é preciso que
reivindiquem por isso.
Partindo destas premissas, acreditamos que as atividades foram insuficientes para
possibilitar a ruptura da cultura do silêncio, pois as crianças seguem acostumadas a participar
das atividades apenas nos números, o que não deixa de ser reflexo da fase da vida em que se
encontram, ou seja, a infância. Conforme já anunciamos, uma fase que não tem direito à voz.
Para Freire (2005, p. 76), “somente quando o povo de uma sociedade dependente rompe com
a cultura do silêncio e conquista o direito da palavra transformam a sociedade dependente –, é
quando uma tal sociedade, em seu conjunto, pode deixar de ser silenciosa em relação à
sociedade dirigente”. No máximo, o que se conseguiu pela conscientização foi despertar o
espírito de liderança em algumas crianças, o que em Santos (1998) compreende-se que seja
algo natural.
O homem é multidimensional, e cada qual das suas dimensões pode obter, de um
modo relativamente autônomo, um movimento seu próprio. A consciência humana
se alarga a partir de situações concretas adversas, ainda que essa ampliação da
consciência seja desigual, segundo os indivíduos. São os que avançam os que podem
exercer liderança, ou pelo menos se colocar na dianteira das mudanças, ou das idéias
de mudanças e, portanto, mais perto do ideal de uma nova sociedade (p. 99).
Aliás, desde os primeiros encontros algumas crianças destacaram-se por sua
capacidade de liderança, seja por seus atos ou por reconhecimento das outras crianças. Por
exemplo, durante a primeira visita ao diretor do Departamento de Esporte e Lazer de Irati,
após ele ler o documento que pedia uma trave, além desta (ou melhor, uma par de traves),
entre outras melhorias na quadra, ele se comprometeu em providenciar uniforme e bola para
as crianças, para que assim elas pudessem vivenciar o lazer quando desejassem e não apenas
quando havia atividades da escolinha. Quando a comissão que foi entregar-lhe o documento
foi indagada sobre quem ficaria responsável pelo material, de forma unânime, indicaram o
Lúcio, pois ele seria o mais responsável.
O problema, no entanto, é que esta sua característica acabou lhe deixando um forte
peso, pois naturalmente os trabalhos para a mudança recaem exclusivamente sobre seus
ombros. E foi isso o que aconteceu depois de transcorrer os três meses da escolinha. Foi
formada uma comissão das crianças para num determinando dia e horário, comparecerem ao
90
Departamento de Esporte e Lazer de Irati para, em reunião com o seu respectivo diretor,
definirem uma forma de a administração pública dar continuidade ao trabalho iniciado.
Infelizmente, para esta reunião nem todas as crianças o acompanharam nesta tarefa. Para
piorar, o diretor esqueceu desta reunião e as crianças não foram recebidas. Como resultado, as
crianças desanimaram e não mais procuraram por ele, o que permite dizer que a realidade das
crianças permanece na mesma precariedade.
4.2 Mudando para participar
Minayo (2005) discute que em intervenções sociais, mudança é um conceito chave,
pois, em última análise, estas são pensadas e propostas para modificar algo da realidade. Tem
sido utilizada “tanto para falar de macroprocessos como de ambientes microssociais em que,
em escalas diferenciadas, atores, fatores e condições promoveram transformações em
diferentes níveis da realidade” (p. 54). Para Freire (1988) o contrário da mudança é a
estabilidade e, por isso, estudar uma significa estudar a outra, seja na sua totalidade, seja nas
suas partes. Tradicionalmente, a mudança de uma parte é capaz de promover mudanças em
outra, até se chegar na mudança da totalidade de uma estrutura social (idem na estabilidade).
Além da mudança da totalidade (mudança social), Minayo (2005) menciona que em
intervenções sociais podem ser feitas reflexões em torno da mudança educacional e da
mudança de valores e também do conjunto destas. Na sua concepção,
A dinâmica global das transformações sociais acontece, simultaneamente, por via de
forças externas e internas, umas atingindo e influenciando as outras. A dinâmica
interna de uma instituição, como a escola, a família ou qualquer outra organização,
acha-se permanentemente modificada pela reação do sistema ao qual se filia e pelos
processos e influxos do exterior. Seu dinamismo vem, ao mesmo tempo, das
tradições e das constantes adaptações ao meio (MINAYO, 2005, p. 56).
Complementando, diz que qualquer mudança social: i) “provoca diferença em relação
ao estado anterior da ação e dos atores”; ii) “ocorre por meio de uma dinâmica que incluiu
diálogo, cooperação e consensos estabelecidos entre atores e, concomitantemente,
antagonismos, contradições e conflitos entre eles”; e iii) tanto na linguagem como na ação
coletiva altera-se o distanciamento entre tensão e conflito aberto (MINAYO, 2005, p. 58).
Nesse processo em que as partes tendem a modificar a totalidade, é fato que a
mudança educacional apresenta-se como componente essencial, pois possui um enorme
potencial seja para modificar seja para favorecer a permanência do cenário que impõe a
adaptação das pessoas em suas relações no e com o mundo. Nesta investigação, conforme tem
91
sido anunciado, a preocupação foi propiciar uma educação voltada para a transformação,
entretanto, tendo como pressuposto que ela não viria curar a pobreza social e econômica, mas
apresentar estratégias para superar a pobreza política.
As mudanças propiciadas giram em torno da questão dos valores do gênero humano,
pois os seres humanos fazem sua própria história conforme as condições que lhes são dadas
(MINAYO, 2005). Segundo Heller (1989), valor é “tudo aquilo que faz parte do genérico do
homem e contribui, direta ou mediatamente, para a explicação desse ser genérico”, isto é, a
própria essência humana. Esta essência “não é o que ‘esteve sempre presente’ na humanidade
(para não falar mesmo de cada indivíduo), mas a realização gradual e contínua das
possibilidades imanentes à humanidade, ao gênero humano” (p. 4).
Fundamentada em Marx, a autora assinala que trabalho (enquanto objetivação),
socialidade, universalidade, consciência e liberdade são componentes essenciais na relação
entre os seres humanos. Assim, permite entender como valor tudo aquilo que contribui para
enriquecer estes componentes e, em contrapartida, aquilo que traz um sentido inverso seria
um desvalor. Partindo desse entendimento, esta investigação, ao focar a conscientização,
tendo como horizonte a universalização do direito ao lazer público e de qualidade em Irati,
além de propiciar mudanças quanto a consciência social dos envolvidos, possibilitou
mudanças nos componentes da socialidade e da liberdade.
4.2.1 Superando o individualismo
A escolha pelo tema gerador o sonho de ser um jogador de futebol teve como
justificativa que este é o maior, senão o único sonho de milhões de crianças que dia após dia
jogam bola até tarde nos campinhos demarcados em terrenos precários. Ali alimentam o
desejo de tornar-se uma celebridade do futebol, com chuteiras que levem seus nomes e que,
preferencialmente, sejam contratados por times europeus. Para além disso, vistam a camisa
verde e amarela da seleção brasileira. Por meio deste sonho, no entanto, a sociedade é
forçadamente homogeneizada no pensamento de que o futebol é o único caminho para sair da
pobreza.
Portanto, nem é uma escolha consciente. Na maioria das vezes é fruto das reportagens
da mídia que demonstram que este sonho pode facilmente ser concretizado, basta ter
qualidade. A realidade, no entanto, revela que são poucos os que conseguem concretizá-lo, já
que, de modo geral, se a sociedade por si só é excludente, o futebol vem sendo ainda mais.
Independente de suas habilidades, muitos sequer têm a oportunidade de mostrá-las. Engana-se
92
quem pense que os poucos que logram êxito tenham ingressado num mundo encantado e
repleto de felicidade. Como é pequeno o número dos que conseguem fama e salários dignos,
que permitam ascensão social. Portanto, o discurso de que o futebol é uma caixinha de
surpresa, não é aplicado somente ao resultado de jogos, mas também quanto à expectativa dos
candidatos a craque.
Nessa lógica, o que fica em voga no futebol é o individualismo do cada um por si.
Santos (1998) adverte que individualidade e individualismo são estados antagônicos, já que
enquanto o primeiro se realiza em comunhão com os outros, o segundo, por sua vez, é
realizado sozinho, afinal, “se não sou por mim, então quem será por mim?” (HILLEL apud
SANTOS, 1998, p. 77). Assim, o futebol possibilita a reprodução dos valores dominantes da
sociedade capitalista, estimulando a alta competitividade entre seus praticantes para ver quem
terá êxito em seu sonho de ser jogador de futebol.
Os primeiros dias de investigação visivelmente revelavam este quadro. Embora
jogassem em equipe, cada criança desejava resolver as partidas sozinhas e, de preferência, ao
final de cada dia de atividade contabilizavam seus feitos (gols e vitórias) para vangloriarem-se
uns aos outros. Ali percebia-se que o futebol além de possibilitar o sonho de um dia sair da
pobreza, também representava uma das poucas oportunidades que tinham para esquecer da
exclusão social que lhes é imposta. A importância de se marcar um gol ou obter uma vitória
não era simplesmente porque este é o objetivo do jogo, mas uma das formas para se sentirem
membros da sociedade que lhes exclui; era a forma de dizer que existem e são importantes,
inclusive para depois das atividades fazerem questão de relembrar dos gols e das vitórias. Os
dribles não eram utilizados apenas para desequilibrar as outras crianças, mas driblar a falta de
oportunidades. Enfim, o futebol era a possibilidade de dar um chute na vida repleta de
privações em que conviviam, tanto no futuro (caso conseguirem ser jogadores profissionais)
como no presente.
O problema é que por conta desta importância que davam ao êxito, queriam fazer de
tudo para se dar bem. No início do processo, as partidas desenrolavam-se com muita
violência. Ninguém queria e nem podia perder e, por isso, ocorriam muitos lances violentos.
Já na terceira aula, duas crianças medindo forças numa disputa de bola, permitiram que elas
vissem que isso nem sempre traz conseqüências benéficas, pois uma se lesionou e ficou um
certo período sem poder jogar com seus companheiros de bairro. Por conta disso, após um
debate coletivo sobre alternativas para reduzir a violência nas partidas, de forma unânime, as
crianças anunciaram que deveriam tomar mais cuidado umas com as outras. E de certa forma
foi isso o que aconteceu. Gradativamente, observamos partidas com poucas faltas, isso
93
quando aconteciam. Um certo dia em que o funcionário do Departamento de Esporte e Lazer
do município esteve na quadra para observar como se desenrolava aquele trabalho, com
grande espanto ele comenta: Nossa, não sai falta nesse jogo. É sempre assim?
A resposta para esta pergunta pode ser encontrada nas palavras de um pai das crianças
que ali participavam e que foi identificado como um informante cultural privilegiado: [...]
aqui eles aprenderam a ter respeito com os outros. Tem muita gente com idade diferente a
deles. Eles têm respeito com os colegas n. Isso é importante (Técnico). Vale dizer, no entanto,
que não há uma explicação pontual sobre como isso foi possível. No máximo, especula-se que
tenha sido o processo de respeito mútuo que proporcionou isto.
Mas o individualismo não trazia problemas apenas na questão da violência.
Dificilmente observavam-se crianças incentivando umas às outras após erros ou acertos. O
comum eram os xingamentos e reclamações ou, pior que isso, era excluir as crianças menos
habilidosas do jogo. Ainda que elas participassem das partidas, como parte de uma equipe,
não recebiam passes e por isso ficavam isoladas. As poucas vezes que a bola sobrava para
elas, como um revide, faziam a mesma coisa, não a passando para ninguém. E assim, como
uma bola de neve, pode-se dizer que o individualismo deixa o futebol um esporte sem graça.
É cada um querendo jogar por si, esquecendo que é um esporte coletivo.
Reproduzindo os valores da sociedade capitalista, observávamos que em vez de
contribuir com a organização social no bairro, através do futebol, estaríamos contribuindo
para emperrar ainda mais esta organização, pois ao contrário do que hegemonicamente se
prega, não é de um simples bate-bola entre “inimigos” que nascerá uma bela amizade. Muitas
vezes, uma amizade é desequilibrada por causa de uma discussão num bate-bola. Assim, as
mais diversas estratégias utilizadas procuraram demonstrar a importância de todos poderem
participar das atividades. Uma destas, foi a participação do pesquisador junto aos jogos,
valorizando todas as crianças das equipes em que compunha. O resultado das diferentes
estratégias, é que, ainda que permanecessem algumas situações individualistas, as
reclamações e xingamentos diminuíram sensivelmente e aquelas crianças que estavam ainda
aprendendo os primeiros fundamentos do esporte, foram gradativamente tendo uma maior
presença nas partidas.
Participavam inclusive em situações que antes geravam conflito, como, por exemplo,
no caso de uma cobrança de pênalti. Como normalmente todas desejavam realizar esta
cobrança, as discussões eram muitas e não levavam a lugar algum. Ao demonstrarmos que em
conflitos, caso não haja uma negociação, todas as partes envolvidas tendem a ser prejudicada.
Isso porque como ninguém queria ceder, a solução mais fácil seria não deixar ninguém
94
realizar a cobrança, pois esta era para a equipe e não para um jogador apenas. Assim, no
decorrer das atividades, foi sendo reduzido o desejo de brigar para cobrar os pênaltis. Quando
havia mais de duas equipes e uma partida terminava empatada, a decisão desta era através da
cobrança de pênaltis, sendo que todos os jogadores, inclusive o goleiro, tinham o direito de
realizar uma cobrança.
Se progressivamente o individualismo foi reduzido nas atividades da escolinha, o
mesmo não se pode dizer no que tange ao cotidiano do bairro, pois este seria um dos pontos
que dificultam a organização social no bairro. O que eu vejo aqui é que cada um está
preocupado com a sua vida (Técnico). Por conta desse individualismo, ao invés de uma
organização social ocorrer no bairro, o que se observa são conflitos entre os moradores, tal
como ocorreu quando o morador da residência que fica em frente da quadra retirou a trave. O
homem daquela casa tirou a trave porque a bola ia na casa dele, tirou e colocou ela num
cantinho onde ele prende o cachorro. Até soldou uns outros ferros e a mulher dele coloca flor
em cima (Lúcio). Ninguém quer ser incomodado, a cancha é um lugar de lazer e acham que o
pessoal vem pra fazer baderna (Técnico).
Aliás, aqui vale registrar que a precariedade das instalações da quadra esportiva não é
fruto exclusivo da omissão do Poder Público, mas algo que se acrescenta aos conflitos
observados logo depois da inauguração desta quadra.
Veio todo o apetrecho da quadra, as traves tinham, os ferros para pôr a rede de vôlei,
tinha a cesta de basquete, bola veio, bola de basquete, veio bola de vôlei, veio bola
de futebol de salão e quem ficou responsável foi o vizinho da frente. Mas só que daí
começou a aparecer muita criança e daí ele, acho que pensou que tava incomodando
ele e ele reteu tudo aquilo e não apareceu mais. Desapareceu bola, desapareceu rede,
tudo. E daí ficou assim, a piazada vinha e não tinha o que fazer, e então começaram
a destruir a quadra. Não podiam usar né (Técnico).
Diante destes conflitos, claramente pouco adiantaria que o Poder Público atendesse a
reivindicação de uma trave nova para a quadra, pois da mesma forma que ele retirou a trave
anterior, ele poderia retirar a nova também. E foi esta a promessa que ele fez ao pessoal
responsável pela montagem desta trave, quando estiveram na quadra para tirar suas medidas.
Ao ser informado do ocorrido, junto com as crianças procuramos antecipar algo que já estava
previsto para quando a trave fosse entregue: conversar com este morador. O curioso é que
nem o nome deste morador as crianças sabiam e diziam ter medo de falar com ele. Quando
procurado para conversar, logo as crianças observaram que ele não era uma pessoa brava
conforme imaginavam. Além disso, ele informou que:
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Não sou contra elas jogarem bola, mas eu fico preocupado com a minha casa por
causa das boladas. O pior é quando os maiores jogam, porque a bola vai lá em casa e
eles vão pedir a bola e, num certo dia, até ameaçaram a minha esposa quando ela
disse que quase quebraram a janela. Teve um que respondeu ela dizendo que ‘ainda
não quebrou’. Assim, o que é que eu posso imaginar, estava ameaçando ela. Foi por
isso que eu tirei a trave, que já estava quebrada (Morador).
Durante a conversa, confirmou ter dito às pessoas que tiraria novamente a trave, caso
ela fosse posta. A partir disso, pelo diálogo demonstrou interesse em participar de uma ação
coletiva para reivindicar melhorias no alambrado. Esta ação foi o abaixo-assinado
encaminhado para a Associação dos Moradores Progresso do Bairro Lagoa, durante a
inauguração do Centro Social do bairro. Assim, antes da cerimônia de inauguração, o abaixo-
assinado foi entregue ao presidente da Associação de Moradores e, durante a sua fala (na
inauguração), em mãos entregou este documento ao prefeito municipal. Ali, publicamente o
prefeito assumiu o compromisso de olhar com carinho para aquele pedido de melhorias para a
quadra. Vale dizer que, no mesmo dia, ele esteve na quadra para averiguar a sua situação e, no
dia seguinte, na página da Internet da prefeitura (Anexo G) foi veiculada a notícia de entrega
deste documento.
Também no dia seguinte, o mesmo teor desta notícia foi veiculado por uma rádio
local, o que ao ser ouvido por algumas crianças, as deixaram impressionadas quanto ao poder
que um documento como este tem, assim como a repercussão do mesmo, independente se as
reivindicações seriam conquistadas imediatamente ou se levaria um certo tempo. Aliás,
convém dizer que, pela aproximação da escolinha com a Associação, garantiu-se que na
seqüência seus líderes assumiriam a responsabilidade por cobrar as devidas melhorias na
quadra.
Foi nesse sentido que a investigação procurou auxiliar na superação do individualismo
observado junto às crianças durante o futebol e também no bairro, o que acaba dificultando a
organização comunitária.
4.2.2 Liberdade para descobrir o mundo
Lazer é a liberdade para brincar (Edílson). Esse era o entendimento que as crianças
demonstravam sobre o lazer no início dos trabalhos. Contudo, como poderia existir a
liberdade para brincar se elas não tinham bola para chutar a hora que bem entendessem?
Como poderiam ter a liberdade para pedalar se não eram todos os que possuíam bicicleta ou,
os que a possuíam, não estavam em condições de uso? Como teriam liberdade de usar a
96
quadra esportiva se o acesso era dificultado pelos próprios moradores do bairro, contrários a
sua utilização? Enfim, que liberdade era esta a que eles se referiam?
Na verdade, esta não se configurava em liberdade, mas num desejo assim traduzido. O
desejo de ser livre para ir e vir; se a exclusão os obrigava a viver dentro dos limites do bairro,
o que elas queriam era poder utilizar todos os seus espaços. Assim expressavam em suas
saídas rápidas da quadra no momento que bem entendessem para buscar as já mencionadas
mimosas ou pegar uma bicicleta e sair pedalando, independente se por onde passariam o
espaço já estaria ocupado, pois a quadra era pública e todos poderiam utilizá-la.
Embora de certa forma fosse possível ter este entendimento, para o bom
funcionamento das aulas o pesquisador teve que impor sua autoridade, o que significa que a
liberdade de fazer aquilo o que se queria, foi reduzida. Para Freire (1996, p. 105), é
importante que haja esse equilíbrio, pois uma “liberdade sem limite é tão negada quanto a
liberdade asfixiada ou castrada”.
Assim, a intenção de limitar esta liberdade a que desejavam ou que achavam ter,
objetivava proporcionar a prática de uma outra liberdade. Aquela que “que amadurece no
confronto com outras liberdades, na defesa de seus direitos em face da autoridade dos pais, do
professor, do Estado” (FREIRE, 1996, p. 105-106). Esta liberdade seria iniciada com a
ruptura dos tradicionais processos de ensino-aprendizagem do futebol, ou seja, pautados na
repetição de gestos formatados, alienados e repressores da criatividade humana. A
criatividade, aliás, é aquilo o que diferencia os homens dos animais, pois é através desta que
ele pode intervir no mundo, e não apenas adaptar-se ao mesmo.
Nesse sentido, mesmo nas aulas destinadas ao ensino de técnicas futebolísticas, as
crianças eram estimuladas a improvisar em diferentes situações. Quando as crianças têm a
liberdade de improvisar e criar no jogo, muitas vezes, elas nem sabem como isso ocorre. Por
exemplo, depois de realizar uma bela finta, Roberto Carlos foi indagado sobre como ele
pensou em fazer aquilo. Com uma fisionomia muito séria, ele respondeu: Não sei professor,
na hora eu fiz assim, mas não sei como é que eu conseguir fazer. Esse sentimento de não
saber explicar, no entanto, não deve ser visto como algo estranho; na verdade, é até bom, pois
era um processo educativo e não de treinamento ou adestramento. Educativo no sentido da
conscientização sobre o estar no e com o mundo e, por isso, que intervém no mesmo.
A conscientização proporciona as crianças conhecer o mundo em que fazem parte, não
apenas nas suas contradições, mas a partir de atividades que possibilitassem a eles superarem
os limites geográficos do bairro. Assim, duas atividades foram estratégicas: i) a visita à Casa
da Cultura de Irati; e ii) visita ao Estádio Joaquim Américo (Arena da Baixada), em Curitiba.
97
Na visita à Casa da Cultura, realizada às vésperas do 99º de aniversário do município,
elas revelaram conhecer parte desta história, no entanto, diante dos diversos documentos
antigos expostos, demonstraram grande curiosidade sobre os mesmos e, dessa forma, não
deixavam de expressar suas dúvidas junto à funcionária do setor. Diante da exposição das
fotografias selecionadas num concurso para comporem um calendário para as comemorações
do centenário do município, observaram que naquele calendário não haveria nenhuma menção
ao bairro em que vivem, pois eles não possuem máquina fotográfica e, por isso, não podiam
registrar momentos do seu cotidiano e nem participar de concursos de fotografia como este.
Além disso, muitas sequer sabiam como funcionava uma máquina fotográfica. Por
conta disso, ao longo das aulas, propiciamos o manejo de uma máquina às crianças, que, por
ser digital, possibilitava que elas logo que fotografassem algo pudessem ver o resultado. Algo
marcante nestas fotos é que quando uma fotografava as outras, a pose feita era um gesto
próprio do rap, com as crianças dando destaque para o movimento dos dedos, conforme se
observa nas imagens que compõem a figura 10.
Figura 10. O rap como marca coletiva
O curioso é que embora as crianças tanto façam estes gestos, elas não sabem o
significado dos mesmos. Assim, a partir do entendimento de que o rap é a única forma que o
pobre tem de falar e ser ouvido (Gilberto Silva), acreditamos que este gesto seja uma
manifestação contra os problemas sociais encontrados nas periferias. Problemas que são
responsáveis por impedir que eles conheçam o mundo à sua volta e, quando assim são
possibilitados, acabam espantando-se com o mesmo, como, por exemplo, durante a chegada
na cidade de Curitiba para visitar a Arena da Baixada. Tudo era uma novidade: os prédios, as
98
revendas de veículos que eram diversas, o trânsito intenso de veículos, as ruas asfaltadas e
arborizadas. A figura 11 revela este momento.
Figura 11. A surpresa com Curitiba
Assim, em síntese, pode-se dizer que a essência das aulas de futebol foi o desvelar do
mundo que existe para além do Bairro Lagoa e que, mesmo que as crianças não tenham
acesso ao mesmo, elas fazem parte deste mundo. Mudar esse cenário para que este mundo
seja acessível a todos, no entanto, não é tarefa fácil e muito menos o que desejam as classes
dominantes, que fazem de tudo para manter o quadro de dominação. Se a mudança não vem
voluntariamente pelos dominadores, é preciso pensá-la pelas classes populares mobilizando-
se num projeto de libertação coletiva, pois, segundo Freire (1981), ninguém liberta-se
sozinho, mas em comunhão. E, para libertarem-se, necessariamente é preciso compreender o
mundo, sabendo sobre aquilo que se quer libertar.
CONCLUSÕES
Quando partimos na busca de elementos que permitam a superação do discurso
funcionalista tão marcante nas produções acadêmicas dos campos da Educação Física e da
Saúde Pública/Saúde Coletiva, que associam o Lazer à Promoção da Saúde, bem sabíamos
que encontraríamos alternativas concretas para mediar um outro tratamento para esta
associação. Se a Promoção da Saúde significa desafiar interesses poderosos, principalmente
aqueles preocupados com a manutenção do quadro de dominação dos mais pobres, era óbvio
que nesta relação os nossos olhares deviam estar direcionados para a emancipação humana.
Uma emancipação que não seria dada por ninguém, mas possibilitada e conquistada
pelas pessoas, que são os componentes essenciais deste processo. Assim, tomando a
Lazerania como referência e orientando-se por alguns pressupostos da Educação Popular em
Saúde e da Epidemiologia Crítica, além de viabilizarmos a possibilidade de superação do
funcionalismo no plano teórico, compreendemos que no plano prático, mesmo que num curto
espaço de tempo e neste mundo “desumanizado” pelo capitalismo selvagem, também
poderíamos vivenciar um lazer que estivesse de fato voltado à Promoção da Saúde.
Aliás, foi a partir da desumanização capitalista que pudemos estruturar e desenvolver
um trabalho que não estivesse pautado simplesmente no envolvimento popular em atividades
sistemáticas e reprodutoras de gestos formatados e alienados, que supostamente serviriam de
estratégia para prevenir doenças cardíacas, respiratórias ou pensada no combate à obesidade.
O que propomos foi um processo educativo que partindo do convívio e do diálogo com as
crianças do Bairro Lagoa, preocupou-se em resgatar a solidariedade humana, favorecendo a
conscientização dos envolvidos, tornando-lhes os próprios agentes transformadores das suas
condições de vida.
Talvez o leitor possa até classificar este trabalho como ideológico, mas, conforme
Chauí (1980), se a ideologia representa o conjunto de idéias e valores que orientam as formas
de pensar na sociedade, será que o fato da Educação Física há décadas estar centrada na
prescrição de atividades físicas para resolver os problemas da saúde pública, já não seria uma
ideologia? Uma ideologia que serve aos interesses dominantes, pois nas suas entrelinhas cada
pessoa seria responsável pelo seu processo saúde-doença, e o que é pior, considerada culpada
pela elevação dos gastos estatais com saúde pública.
Assim, dizendo não a esta ideologia que entende a consciência como o simples
engajamento das pessoas em atividades físicas, e que só existe enquanto elas assim
permanecem, desenvolvemos um trabalho que, fundamentado em autores como Paulo Freire,
100
considera a consciência como uma ação-reflexão da realidade e como um processo que não
termina jamais. Neste, no entanto, nem tudo ocorreu como o desejado, dadas as dificuldades
encontradas. Logo nos primeiros dias, constatamos que o importante não era a nossa presença,
mas o fato de levarmos a bola para as crianças correrem atrás, contro-la e chutá-la, ou seja,
éramos o acessório que acompanhava a bola.
A ruptura deste cenário somente foi possível quando as crianças sentiram-se confiantes
com nossa presença. Uma confiança que nos obrigou a tomar cuidados para não cair na
armadilha de manipulá-las a fim de chegarmos rapidamente aos objetivos da investigação.
Isso porque a pobreza política ali encontrada era tamanha, que facilmente permitiria uma
manipulação, pela qual pode-se dizer que ao invés de libertar, estaríamos contribuindo para
manter ainda mais a dominação. Assim, nossa opção foi através do convívio com o
sofrimento e as alegrias humanas, propiciar condições para o progressivo florescer de atitude
reflexivas e críticas, possibilitadas por situações pedagógicas orientadas pela problematização
das atuais manifestações do futebol, sempre tendo como objetivo uma aproximação com os
problemas que afetavam a realidade daquelas crianças.
Dentro dos limites, contribuímos com o fortalecimento de uma ação coletiva e
solidária voltada a superar as raízes políticas, culturais e econômicas do sofrimento humano.
Destas, as poucas mudanças possíveis ocorreram no âmbito cultural, representando um alento
para a superação do individualismo que rege as lutas diárias da população na sociedade
capitalista. Com a preocupação de sempre TER mais, as pessoas vêm desconhecendo o
sentido de SER mais humanas. Por isso a maioria dos problemas tendem a ser individuais e
não coletivos. Nessa ótica, o primeiro e grande desafio para quem atua no campo do lazer e,
especificamente aquele voltado à Promoção da Saúde, é auxiliar a superar o individualismo.
A nosso ver, o êxito nesta investida permite que mudanças em outras esferas sejam
aguardadas, pois as mudanças culturais tendem a atingir a estrutura política que,
conseqüentemente, interfere na estrutura econômica. Isso porque a mudança política passa
necessariamente pela participação da população nas suas decisões, pressionando e
reivindicando a construção de uma sociedade onde todos tenham direito “aos bens e riquezas
materiais e simbólicas socialmente produzidas, assegurando democraticamente a condição de
cidadania, dispensando igual tratamento sob o ponto de vista da condição comum de cidadãos,
livres das relações de dominação, opressão, exploração ou exclusão (MASCARENHAS,
2005, p. 244).
Nesse sentido, o futebol apresentou-se como um valioso instrumento para trabalhar
pedagógica e politicamente os envolvidos, pois além do encanto com que os atrai, é fato que a
101
modalidade reproduz os valores da sociedade capitalista e, por isso, é repleto de contradições.
Mas não só isso, também traz bons exemplos, como a democracia que cerca seus apaixonados
torcedores, quando expressam suas alegrias, tristezas e sonhos. Apropriar-se destas
características, entretanto, só é possível quando se rompe com a lógica da reprodução do
futebol de rendimento, realizando transformações didáticas que apontam para novas
concepções antropológicas, filosóficas e científicas que têm como horizonte a construção de
uma nova sociedade (CAPELA e MATIELLO JÚNIOR, 2005).
Podemos dizer que esta atuação seria um tipo de política social que, organizada a
partir da sociedade civil e à rebelia do Estado, apresenta-se como um movimento social que
tem por consigna básica a luta por uma vida digna e saudável a todos. Sem sentimento de
nostalgia, resgata a história e o sonho dos trabalhadores que séculos atrás lutavam por
melhores condições de vida e saúde, sendo que nestas estava a luta pelo direito ao lazer. É um
resgate atualizado do pensamento de Lafargue
53
, já que hoje o importante para a organização
das classes populares seria o combate aos efeitos nefastos das políticas neoliberais, ou seja, a
desregulamentação dos direitos universais. Acreditamos que é pelo resgate da consciência
social que se chega a uma organização solidária capaz de romper as estruturas políticas e
econômicas, as grandes responsáveis pela concentração do poder na sociedade capitalista e,
portanto, pela privação de um viver coletivo e salutar.
Nessa lógica, uma atuação no lazer orientada por estes pressupostos não faz promessas
de que o simples envolvimento em atividades possa proporcionar uma vida mais digna e
saudável. Seria um equívoco acreditar nisso, pois se contrapõe àquilo o que se entende por
participação, que apresentamos como um dos conceitos-chave desta relação. Da mesma forma
que a participação não é uma dádiva, nem uma concessão dos poderosos, ou, muito menos,
algo que cai do céu de uma hora para outra, e sim um processo de conquista permanente, que
possibilita às classes populares se imporem para em comunhão libertarem-se da dominação,
entendemos que a relação lazer e saúde que pode superar ao funcionalismo, é aquela que
favorece o despertar da consciência social dos envolvidos, sendo aos maiores interessados
garantida uma participação ativa neste processo. Contudo, não só isso, pois para se criar estas
condições, necessariamente o profissional do lazer deve acreditar que o envolvimento e
comprometimento da população pode contribuir para a transformação social, sobretudo das
situações que afetam diretamente as suas condições de vida e, portanto, sua saúde.
53
Paul Lafargue, no final do século XIX, escreve o texto “O direito à preguiça”, que seria um convite para a
classe trabalhadora se mobilizar contra a exploração da sua mão-de-obra, já que o isto trazia graves
conseqüências às suas vidas.
102
Esta seria uma das maneiras de na Educação Física brasileira se propor intervenções
sintonizadas aos pressupostos da Promoção da Saúde. Contudo, isso dificilmente será possível
se tomarmos como referências as diretrizes curriculares que orientam os cursos de Educação
Física no país, pois na maior parte das disciplinas o objeto de estudo são as dimensões
biológicas dos seres humanos, em sentido muito restrito. Assim, ao invés de preocupações em
propiciar condições para as pessoas conquistarem sua “liberdade”, nossos “futuros
companheiros” de profissão tradicionalmente são obrigados (alienados) a aderirem à lógica de
se interessar pela especificidade humana, apenas no sentido de estimular as pessoas a serem
mais ágeis, fortes, velozes e belas.
Para reverter este quadro, certamente uma reformulação dos currículos mostra-se
importante, principalmente para eqüalizar a ênfase dada às disciplinas biológicas, abrindo
espaço para as humanas e sociais, aproximando-se da população para compreender suas reais
necessidades. Entretanto, acreditar que apenas com disciplinas curriculares seria propiciada
uma formação voltada às preocupações com a saúde da coletividade não condiz com a
realidade, pois dificilmente estas poderiam explicar o que é o sofrimento humano. Por isso,
fica claro que a Educação Física deveria se aproximar da população não apenas para levar o
conhecimento científico, mas para que este conhecimento seja produzido em articulação
direta com o saber popular.
Talvez um dos caminhos possíveis seja a Educação Física adequar-se às proposta da
Residência Multiprofissional, que, segundo Da Ros et al. (2006), ao ser aprovada em 2001,
defende que todas as áreas que compõem a grande área da saúde, além da sua especificidade
própria, deveriam acrescer uma outra área comum (formada pela administração e
epidemiologia da velha Saúde Pública e com a inclusão de novos valores da promoção da
saúde, integralidade, educação popular, dentre outros). Como resultado, esta formação poderia
ser reorientada, criando situações pedagógicas e problematizadoras voltadas para os interesses
de um sistema cidadão, justo, equânime.
Em termos de nossas conclusões, dando resposta aos nossos objetivos, objetivamente
consideramos que:
1- Na busca por elementos para um novo entendimento da relação lazer e saúde nas políticas
públicas de lazer em Irati, observamos que na Educação Física brasileira existem proposições
que assim podem contribuir. Uma destas é a Lazerania, que neste trabalho tomamos como
referência para a superação do discurso do lazer funcionalista, pois sua preocupação é
propiciar um lazer emancipatório, duradouro e, portanto, contrário ao lazer de improviso,
103
esporádico e que restringe a participação popular no envolvimento em atividades previamente
organizadas e despolitizadas.
2- Dentro dos limites desta investigação, compreendemos que as condições de vida dos
envolvidos apresentam-se de forma precária em aspectos como saneamento público,
pavimentação, segurança, transporte coletivo, atendimento médico e lazer, o que estaria
incidindo negativamente no processo saúde-doença destes moradores. Em relação ao lazer,
caso ele continue sendo vivenciado como meras atividades de passatempo, e, o que é pior,
algo exclusivo do universo masculino, é razvel dizer que dificilmente o propósito da
Promoção da Saúde desta coletividade será atingido.
3- O futebol como a modalidade esportiva mais praticada no Bairro Lagoa, apresentou-se
como um instrumento capaz de contribuir com a organização social daquela localidade, pois
além de possibilitar que as crianças tomassem contato com instituições de poder local (o
Departamento de Esporte e Lazer de Irati e a Associação dos Moradores Progresso do Bairro
Lagoa), instigou a união da comunidade em torno de causa comum: melhorias infra-
estruturais nas dependências da quadra esportiva do bairro.
4- Como decorrência deste trabalho, foram fornecidos subsídios para elaboração de políticas
públicas de lazer voltadas à Promoção da Saúde em Irati, pois além do acesso as supracitadas
instituições de poder, também causou impacto nos veículos de comunicação local (destaque
para a página de Internet da Prefeitura Municipal de Irati, que também foi reforçada em
programa informativo de uma rádio do município).
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Eduardo. Associação entre fatores sócio-demográficos e prática de atividade física de lazer no
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SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. 4. ed. São Paulo: Nobel, 1998.
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Cortez/Autores Associados, 2004.
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112
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Campinas: Autores Associados, 2002. p. 139-164.
VERAS, Renato Peixoto; CALDAS, Célia Pereira. Promovendo a saúde e a cidadania do
idoso: o movimento das universidades da terceira idade. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.2,
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ZANCAN, Lenira e ADESSE, Leila. Informe sobre a cooperação Brasil-Canadá em
promoção da saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.3, p. 739-744, 2004.
ZAPATTA, Alex. Las políticas del agua en América Latina: entre el ajuste hídrico y la
resistencia popular. In: BREILH, Jaime (org.). Informe alternativo sobre la salud en América
Latina. Quinto, Equador: Somos Punto y Línea, 2005. p. 128-137.
APÊNDICE
114
APÊNDICE A
FORMULÁRIO DE CONSENTIMENTO PARA MENORES DE 18 ANOS
Informações Gerais
O professor Miguel Sidenei Bacheladenski encontra-se regularmente matriculado no
Curso de Mestrado em Educação Física da UFSC. Para implementação da dissertação de
mestrado, sob a orientação do Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior, tornou-se necessária à
realização da investigação (Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
. O propósito desta investigação é desenvolver processo educativo
que proporcione obter informações sobre lazer, condições de vida e de saúde, visando também
a educação pelo e para o lazer, a partir do ensino de futebol para crianças.
Assim, pedimos
autorização para que a criança sob sua responsabilidade possa
participar desta investigação, na qual os desconfortos e riscos serão mínimos ou inexistentes.
Caso
alguma criança se machuque,
o pesquisador se responsabiliza por prestar os primeiros
atendimentos e, se necessário,
encaminhá-la para o tratamento necessário nos serviços de
saúde públicos do município. A participação não terá nenhuma remuneração e a identidade
do(a) menor e os dados obtidos serão mantidos em absoluto sigilo e utilizados somente para
fins de pesquisa. Tanto o seu consentimento como a participação da criança NÃO É
OBRIGATÓRIA, sendo que ela terá total liberdade de, a qualquer momento, desistir da
participação na pesquisa, sem penalidade alguma. Certos de contarmos com a sua
colaboração, antecipadamente agradecemos e colocamo-nos à disposição para quaisquer
esclarecimentos.
Miguel Sidenei Bacheladenski
Endereço: Rua Agostinho Zarpellon, 580 – Jardim Califórnia, Irati - Paraná
E-mail: m[email protected] Telefone: (42) 3422-1308 ou (48) 9997-2145
Edgard Matiello Júnior
Email: degam[email protected] Telefone: (48) 3331-8561
Assinaturas:
Edgard Matiello Júnior
Pesquisador Responsável
Miguel Sidenei Bacheladenski
Pesquisador Principal
CONSENTIMENTO (escreva o nome completo e legível)
Eu, _______________________________________________________________, declaro
que fui esclarecido sobre o estudo
(Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
, e concordo, de modo voluntário, que a criança
__________________________________________________________________, sob minha
responsabilidade, faça parte da investigação e que seus dados sejam utilizados no estudo.
Atesto também o recebimento de informações necessárias à minha compreensão do estudo.
__________________ de ____________ de 2006.
Assinatura: RG:
115
APÊNDICE B
FORMULÁRIO DE CONSENTIMENTO PARA MAIORES DE 18 ANOS
Informações Gerais
O professor Miguel Sidenei Bacheladenski encontra-se regularmente matriculado no
Curso de Mestrado em Educação Física da UFSC. Para implementação da dissertação de
mestrado, sob a orientação do Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior, tornou-se necessária à
realização da investigação (Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
. O propósito desta investigação é desenvolver processo educativo
que proporcione obter informações sobre lazer, condições de vida e de saúde, visando também
a educação pelo e para o lazer, a partir do ensino de futebol para crianças.
Assim, pedimos sua participação nesta investigação na qual
os desconfortos e riscos
serão mínimos ou inexistentes.
Sua participação não terá nenhuma remuneração e a sua
identidade e os dados obtidos serão mantidos em absoluto sigilo e utilizados somente para fins
de pesquisa. Sua participação NÃO É OBRIGATÓRIA. O Sr.(a) tem total liberdade de, a
qualquer momento, desistir da participação na pesquisa, sem penalidade alguma. Certos de
contarmos com a sua colaboração, antecipadamente agradecemos e colocamo-nos à
disposição para quaisquer esclarecimentos.
Miguel Sidenei Bacheladenski
Endereço: Rua Agostinho Zarpellon, 580 – Jardim Califórnia, Irati - Paraná
E-mail: m[email protected] Telefone: (42) 3422-1308 ou (48) 9997-2145
Edgard Matiello Júnior
Email: degam[email protected] Telefone: (48) 3331-8561
Assinaturas:
Edgard Matiello Júnior
Pesquisador Responsável
Miguel Sidenei Bacheladenski
Pesquisador Principal
CONSENTIMENTO (escreva o nome completo e legível)
Eu, _______________________________________________________________, declaro
que fui esclarecido sobre o estudo
(Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
, e concordo, de modo voluntário, em fazer parte da investigação e que
meus dados sejam utilizados no estudo.
Atesto também o recebimento de informações necessárias à minha compreensão do estudo.
__________________ de ____________ de 2006.
Assinatura: RG:
116
APÊNDICE C
TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA ANÁLISE DO PROJETO POLÍTICO
PEDAGÓGICO DAS ESCOLAS DO BAIRRO
Informações Gerais
O professor Miguel Sidenei Bacheladenski encontra-se regularmente matriculado no
Curso de Mestrado em Educação Física da UFSC. Para implementação da dissertação de
mestrado, sob a orientação do Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior, tornou-se necessária à
realização da investigação (Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
. O propósito desta investigação é desenvolver processo educativo
que proporcione obter informações sobre lazer, condições de vida e de saúde, visando também
a educação pelo e para o lazer, a partir do ensino de futebol para crianças.
Assim, faz-se necessário uma análise dos Projetos Político-Pedagógicos das escolas do
bairro, que além de serem mantidos em absoluto sigilo, somente serão utilizados para fins de
pesquisa. Sua autorização além de não trazer nenhuma remuneração, NÃO É
OBRIGATÓRIA e a qualquer momento poderá ser revogada. Certos de contarmos com a sua
colaboração, antecipadamente agradecemos e colocamo-nos à disposição para quaisquer
esclarecimentos.
Miguel Sidenei Bacheladenski
Endereço: Rua Agostinho Zarpellon, 580 – Jardim Califórnia, Irati - Paraná
E-mail: m[email protected] Telefone: (42) 3422-1308 ou (48) 9997-2145
Edgard Matiello Júnior
Email: degam[email protected] Telefone: (48) 3331-8561
Assinaturas:
Edgard Matiello Júnior
Pesquisador Responsável
Miguel Sidenei Bacheladenski
Pesquisador Principal
AUTORIZAÇÃO (escreva o nome completo e legível)
Eu, _______________________________________________________________, declaro
que fui esclarecido sobre o estudo
(Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
, e concordo com a análise do Projeto Político Pedagógico da Escola
______________________________________________________, a qual respondo como
diretor(a). Assim, de modo voluntário, autorizo que seus dados sejam utilizados no estudo.
Atesto também o recebimento de informações necessárias à minha compreensão do estudo.
__________________ de ____________ de 2006.
Assinatura: RG:
117
APÊNDICE D
TERMO DE AUTORIZAÇÃO PARA OBSERVAÇÕES DE REUNIÕES E ANÁLISE
DO ESTATUTO DA ASSOCIAÇÃO DOS MORADORES PROGRESSO DO BAIRRO
LAGOA
Informações Gerais
O professor Miguel Sidenei Bacheladenski encontra-se regularmente matriculado no
Curso de Mestrado em Educação Física da UFSC. Para implementação da dissertação de
mestrado, sob a orientação do Prof. Dr. Edgard Matiello Júnior, tornou-se necessária à
realização da investigação (Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
. O propósito desta investigação é desenvolver processo educativo
que proporcione obter informações sobre lazer, condições de vida e de saúde, visando também
a educação pelo e para o lazer, a partir do ensino de futebol para crianças.
Assim, faz-se necessário uma análise do Estatuto da Associação dos Moradores do
Bairro Lagoa, bem como observações das reuniões desta Associação. Informamos que estas
informações serão mantidas em absoluto sigilo e utilizadas somente para fins de pesquisa. Sua
autorização além de não trazer nenhuma remuneração, NÃO É OBRIGATÓRIA e a
qualquer momento poderá ser revogada. Certos de contarmos com a sua colaboração,
antecipadamente agradecemos e colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos.
Miguel Sidenei Bacheladenski
Endereço: Rua Agostinho Zarpellon, 580 – Jardim Califórnia, Irati - Paraná
E-mail: m[email protected] Telefone: (42) 3422-1308 ou (48) 9997-2145
Edgard Matiello Júnior
Email: degam[email protected] Telefone: (48) 3331-8561
Assinaturas:
Edgard Matiello Júnior
Pesquisador Responsável
Miguel Sidenei Bacheladenski
Pesquisador Principal
AUTORIZAÇÃO (escreva o nome completo e legível)
Eu, _______________________________________________________________, declaro
que fui esclarecido sobre o estudo
(Re) significações do
lazer em sua relação com a saúde em
comunidade de Irati/PR
, e concordo com a observação das reuniões e análise do Estatuto da
Associação dos Moradores Progresso do Bairro Lagoa, a qual respondo como presidente.
Assim, de modo voluntário, autorizo que seus dados sejam utilizados no estudo.
Atesto também o recebimento de informações necessárias à minha compreensão do estudo.
__________________ de ____________ de 2006.
Assinatura: RG:
118
APÊNDICE E
ESTATUTO DA ESCOLINHA DE FUTEBOL DA LAGOA
Nós, crianças do Bairro Lagoa, como cidadãos iratienses com direito ao lazer de
qualidade, tornamos público as normas que orientam o funcionamento da nossa escolinha de
futebol.
1. Todas as crianças do bairro têm o direito em participar, no entanto, a preferência sempre
será dos inscritos e respeitados os números máximo e mínimo para os jogos.
2. O número máximo de crianças nos jogos será de 20 e o mínimo de 8.
3. Quando não houver crianças suficientes para jogar, outras serão convidadas.
4. Somente serão convidadas crianças com idade inferior a 17 anos.
5. Caso em outros dias as convidadas retornem, elas somente poderão participar conforme a
concordância dos inscritos e deverão respeitosamente aguardar a sua vez de jogar.
6. Se uma criança inscrita tiver mais de três faltas consecutivas não justificadas, ela somente
poderá retornar às aulas caso os demais inscritos assim concordem.
7. A criança que chegar atrasada à aula deverá justificar o atraso e caso esta seja aceita, ela
deverá executar atividades como abdominais, polichinelos etc.
8. As regras do jogo serão as oficiais do futsal, com as seguintes alterações:
a) Não há tempo determinado para os jogos. Este sempre será decidido conforme o número de
crianças presentes e a partir de decisão coletiva.
b) Quando um jogo terminar empatado e houver a necessidade de desempatá-lo, haverá
disputa de pênaltis. Contudo, uma equipe não permanecerá em quadra por mais de dois jogos
consecutivos.
c) O tiro de meta sempre será cobrado com as mãos e não poderá ultrapassar a linha divisória
da quadra (meio-campo).
d) O lateral será cobrado com os pés e não serão válidos gols diretos.
e) As faltas e infrações serão cobradas através de um lateral próximo de onde ocorram.
9. Por fim, os princípios dos jogos durante as aulas pressupõem participação, integração e
valorização do respeito aos limites físicos e técnicos dos envolvidos, visando a prática envolta
de ambiente salutar, de ludicidade e da não-violência.
119
APÊNDICE F
OFÍCIO DE REIVINDICAÇÃO DE UMA TRAVE
120
APÊNDICE G
PRIMEIRA PAGINA DO ABAIXO-ASSINADO DE REIVINDICAÇÃO DE
MELHORIAS NO ALAMBRADO DA QUADRA (além desta, outras cinco páginas
trazem 223 assinaturas)
ANEXOS
122
ANEXO A
BIBLIOGRAFIA SOBRE PROMOÇÃO DA SAÚDE LOCALIZADA NA BASE DE
DADOS SCIELO
ADRIANO, Jaime Rabelo; WERNECK, Gustavo Azeredo Furquim; SANTOS, Max André;
SOUZA, Rita de Cássia. A construção de cidades saudáveis: uma estratégia viável para a
melhoria da qualidade de vida?. Ciência & Saúde Coletiva, v.5, n.1, p. 53-62, 2000.
AERTS, Denise; ALVES, Gehysa Guimarães; LA SALVIA, Maria Walderez; ABEGG,
Claídes. Promoção de saúde: a convergência entre as propostas da vigilância da saúde e da
escola cidadã. Cadernos de Saúde Pública, v.20, n.4, p. 1020-1028, 2004.
ALVES, Roberta Belizário. Vigilância em saúde do trabalhador e promoção da saúde:
aproximações possíveis e desafios. Cadernos de Saúde Pública, v.19, n.1, p. 319-322,
jan/fev., 2003.
ASSIS, Simone G.; AVANCI, Joviana Q., SILVA, Cosme M. F. P., MALAQUIAS, Juaci V.,
SANTOS, Nilton C.; OLIVEIRA, Raquel V. C. A representação social do ser adolescente: um
passo decisivo na promoção da saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v.8, n.3, p. 669-679, 2003.
BECKER, Daniel; EDMUNDO, Kátia; NUNES, Nilza Rogéria; BONATTO, Daniella;
SOUZA, Rosane de. Empowerment e avaliação participativa em um programa de
desenvolvimento local e promoção da saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.3, p. 655-667,
setembro, 2004.
CAMARGO, Rosângela Andrade Aukar de; BUENO, Sônia Maria Villela. Lazer, a vida além
do trabalho para uma equipe de futebol entre trabalhadores de hospital. Revista Latino-
Americana de Enfermagem, v.11, n.4, p. 490-498, agosto, 2003.
CARDOSO, Cristina Peres; COCCO, Maria Inês Monteiro. Projeto de vida de um grupo de
adolescentes à luz de Paulo Freire. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v.11, n.6, p.
778-785, nov./dez., 2003.
CARVALHO, Cecília Maria Resende Gonçalves, FONSECA, Carla Cristina Carvalho;
PEDROSA, José Ivo. Educação para a saúde em osteoporose com idosos de um programa
universitário: repercussões. Cadernos de Saúde Pública, v.20, n.3, p. 719-726, mai./jun.,
2004.
MELO, Elza Machado; FARIA, Horácio Pereira de; MELO, Maria Aparecida Machado;
CHAVES, Adriana Braga; MACHADO, Graziela Paronetto. Projeto Meninos do Rio: mundo
da vida, adolescência e riscos de saúde. Cadernos de Saúde Pública, v.21, n.1, p. 39-48,
jan./fev., 2005.
MINAYO, Maria Cecília de Souza; HARTZ, Zulmira Maria de Araújo; BUSS, Paulo
Marchiori. Qualidade de vida e saúde: um debate necessário. Ciência & Saúde Coletiva, v.5,
n.1, p. 7-18, 2000.
123
MOYSÉS, Samuel Jorge; MOYSÉS, Simone Tetu; KREMPEL, Márcia Cristina. Avaliando o
processo de construção de políticas públicas de promoção de saúde: a experiência de Curitiba.
Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.3, p. 627-641, jul./set., 2004.
MUZA, Gilson Maestrini; COSTA, Marisa Pacini. Elementos para a elaboração de um
projeto de promoção à saúde e desenvolvimento dos adolescentes: o olhar dos adolescentes.
Cadernos de Saúde Pública, v.18, n.1; p. 321-328, jan./fev., 2002.
PALHA, Pedro Fredemir; LIMA, Gislaine Messias de; MENDES, Iranilde José Messias.
Programa de integração comunitária: em busca de novas estratégias e novos sentidos à vida.
Revista Latino-Americana de Enfermagem, v.8, n.2, p. 5-10, abril, 2000.
PEDROSA, José Ivo dos Santos. Perspectivas na avaliação em promoção da saúde: uma
abordagem institucional. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.3, p. 617-626, jul./set., 2004.
PERES, Fabio de Faria; BODSTEIN, Regina; RAMOS, Célia Leitão; MARCONDES, Willer
Baumgarten. Lazer, esporte e cultura na agenda local: a experiência de promoção da saúde em
Manguinhos. Ciência & Saúde Coletiva, v.10, n.3, p. 757-769, setembro, 2005.
QUEIROZ, Creuza Maria Brito; SÁ, Evelin Naked de Castro; ASSIS, Marluce Maria Araújo.
Qualidade de vida e políticas públicas no município de Feira de Santana. Ciência & Saúde
Coletiva, v.9, n.2, p. 411-421, abr./jun., 2004.
SOUZA, Elza Maria; GRUNDY, Emily. Promoção da saúde, epidemiologia social e capital
social: inter-relações e perspectivas para a saúde pública. Cadernos de Saúde Pública, v.20,
n.5, p. 1354-1360, set./out., 2004.
SPERANDIO, Ana Maria Girotti; CORREA, Carlos R. S.; SERRANO, Miguel Malo;
RANGEL, Humberto de Araúo. Caminho para a construção coletiva de ambientes saudáveis:
São Paulo, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.3, p. 643-654, jul./set., 2004.
TEIXEIRA, Carmen Fontes. Promoção e vigilância da saúde no contexto da regionalização da
assistência à saúde no SUS. Cadernos de Saúde Pública, v.18, p. 153-162, 2002.
TEIXEIRA, Jesislei Bonolo do Amaral; NOGUEIRA, Maria Suely. Câncer gástrico: fatores
de risco em clientes atendidos nos serviços de atenção terciária em um município do interior
paulista. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v.11, n.1, p. 43-48, jan./fev., 2003.
VERAS, Renato Peixoto; CALDAS, Célia Pereira. Promovendo a saúde e a cidadania do
idoso: o movimento das universidades da terceira idade. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.2,
p. 423-432, abr./jun., 2004.
ZANCAN, Lenira e ADESSE, Leila. Informe sobre a cooperação Brasil-Canadá em
promoção da saúde. Ciência & Saúde Coletiva, v.9, n.3, p. 739-744, 2004.
124
ANEXO B
BIBLIOGRAFIA SOBRE LAZER LOCALIZADA NA BASE DE DADOS SCIELO
BARROS, Mauro V. G. de; NAHAS, Markus V. Comportamentos de risco, auto-avaliação do
nível de saúde e percepção de estresse entre trabalhadores da indústria. Revista de Saúde
Pública, v.35, n.6, p. 554-563, dezembro, 2001.
CAMARGO, Rosângela Andrade Aukar de; BUENO, Sônia Maria Villela. Lazer, a vida além
do trabalho para uma equipe de futebol entre trabalhadores de hospital. Revista Latino-
Americana de Enfermagem, v.11, n.4, p. 490-498, agosto, 2003.
GÁSPARI, Jossett Campagna de; SCHWARTZ, Gisele Maria. O idoso e a ressignificação
emocional do lazer. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v.21, n.1, p.069-076, abril, 2005.
GOMES, Valéria Barbosa; SIQUEIRA, Kamile Santos; SICHIERI, Rosely. Atividade física
em uma amostra probabilística da população do Município do Rio de Janeiro. Cadernos de
Saúde Pública, v.17, n.4, p. 969-976, agosto, 2001.
MATSUZAKI, Mayla; MUCCI, José Luiz Negrão; ROCHA, Aristides Almeida Comunidade
fitoplanctônica de um pesqueiro na cidade de São Paulo. Revista de Saúde Pública, v.38, n.5,
p. 679-686, outubro, 2004.
ORB, Angélica. Aspectos de salud en adultos mayores de 80 anos de edad que viven
independientemente en la comunidad: una perspectiva australiana. Revista Latino-Americana
de Enfermagem, v.12, n.4, p. 589-596, agosto, 2004.
PERES, Fabio de Faria; BODSTEIN, Regina; RAMOS, Célia Leitão; MARCONDES, Willer
Baumgarten. Lazer, esporte e cultura na agenda local: a experiência de promoção da saúde em
Manguinhos. Ciência & Saúde Coletiva, v.10, n.3, p. 757-769, setembro, 2005.
PITANGA, Francisco José Gondim; LESSA, Ines Prevalência e fatores associados ao
sedentarismo no lazer em adultos. Cadernos de Saúde Pública, v.21, n.3, p. 870-877, junho,
2005.
SALLES-COSTA, Rosana; HEILBORN, Maria Luiza; WERNECK, Guilherme Loureiro,
FAERSTEIN, Eduardo; LOPES, Cláudia S. Gênero e prática de atividade física de lazer.
Cadernos de Saúde Pública, v.19, suppl.2, p. 325-333, 2003.
SALLES-COSTA, Rosana; WERNECK, Guilherme L., LOPES, Claudia S. e AERSTEIN,
Eduardo. Associação entre fatores sócio-demográficos e prática de atividade física de lazer no
Estudo Pró-Saúde. Cadernos de Saúde Pública, v.19, n.4, p. 1095-1105, agosto, 2003.
125
ANEXO C
PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA NA PESQUISA COM SERES HUMANOS
126
ANEXO D
TEXTO “AS ORIGENS”
No futebol, como em quase tudo, os primeiros foram os chineses. Há cinco mil anos, os
malabaristas chineses faziam dançar a bola com os pés, e foi na China que tempos depois se organizaram os
primeiros jogos. A meta ficava no centro e os jogadores evitavam, sem usar as mãos, que a bola tocasse no
chão. De dinastia em dinastia continuou o costume, como se vê em alguns relevos de monumentos
anteriores a Cristo, e também em algumas gravuras posteriores, que mostram os chineses da dinastia Ming
jogando com uma bola que parece da Adidas.
Sabe-se que em tempos antigos os egípcios e os japoneses se divertiam chutando a bola. No
mármore de uma tumba grega de cinco séculos antes de Cristo, aparece um homem fazendo embaixadas
com a bola no joelho. Nas comédias de Antífanes, há expressões reveladoras: bola longa, passe curto, bola
adiantada... Dizem que o imperador Júlio César era bastante bom com as duas pernas, e que Nero não
acertava uma: em todo caso, não há dúvida de que os romanos jogavam algo bastante parecido com o
futebol enquanto Jesus e seus apóstolos morriam crucificados.
Pelos pés dos legionários romanos a novidade chegou às ilhas britânicas. Séculos depois, em 1314,
o rei Eduardo II estampou seu selo numa cédula que condenava este jogo plebeu e alvoroçador, “estas
escaramuças ao redor de bolas de grande tamanho, de que resultam muitos males que Deus não permitia”.
O futebol, que já se chamava assim, deixava uma fileira de vítimas. Jogava-se em grandes grupos, e não
havia limite de jogadores, nem de tempo, nem de nada. Um povoado inteiro chutava a bola contra outro
povoado, empurrando-a com pontapés e murros até a meta, que então era uma longínqua roda de moinho.
As partidas se estendiam ao longo de várias léguas, durante vários dias, à custa de várias vidas. Os reis
proibiam estes lances sangrentos: em 1349, Eduardo III inclui o futebol entre os jogos “estúpidos e de
nenhuma utilidade”, e há éditos contra o futebol assinados por Henrique IV em 1410 e Henrique VI em
1547. Quanto mais o proibiam, mais se jogava, o que não fazia mais que confirmar o poder estimulante das
proibições.
Em 1592, em sua Comédia dos Erros, Shakespeare recorreu ao futebol para formular a queixa de
um personagem:
- Rodo para vós de tal maneira... Tomais-me por uma bola de futebol? Vós me chutais para lá e
ele me chuta para cá. Se devo entrar neste serviço, deveis forrar-me de couro.
E uns anos depois, em Rei Lear, o conde de Kent insultava assim:
- Tu, desprezível jogador de futebol!
Em Florença, o futebol se chama cálcio, como se chama ainda em toda a Itália. Leonardo da Vinci
era torcedor fervoroso, e Maquiavel jogador praticante. Participavam equipes de 27 homens, distribuídos
em três linhas, que podiam usar mãos e pés para golpear a bola e para estripar adversários. Uma multidão
assistia às partidas, que se celebravam nas praças mais amplas e sobre as águas congeladas do rio Arno.
Longe de Florença, nos jardins do Vaticano, os papas Clemente VII, Leão IX e Urbano VIII costumavam
arregaçar as batinas para jogar o cálcio.
No México e América Central, a bola de borracha era o sol de uma cerimônia sagrada desde uns
mil e quinhentos anos antes de Cristo; mas não se sabe desde quando se joga o futebol em muitos lugares
da América. Segundo os índios da selva amazônica da Bolívia, tem origens remotas a tradição que os leva
a correr atrás de uma bola de borracha maciça, para metê-la entre dois paus sem fazer uso das mãos. No
século XVIII, um sacerdote espanhol das missões dos jesuítas do Alto Paraná, descreveu assim um costume
antigo dos guaranis: “Não lançam a bola com a mão, com nós, mas com a parte superior do pé descalço”.
Entre os índios do México e da América Central, a bola era golpeada geralmente com o quadril ou com o
antebraço, embora as pinturas de Teotihuacán e de Chichén-Itzá revelem que em certos jogos chutava a
bola com o pé e o joelho. Um mural de mais de mil anos mostra um avô de Hugo Sánchez jogando como
canhoto em Tepantitla. Quando o jogo terminava, a bola culminava sua viagem: o sol chegava ao
amanhecer depois de atravessar a região da morte. Então, para que o sol surgisse, os astecas tinham o
costume de sacrificar os vencedores. Antes de cortar-lhes a cabeça, pintavam seus corpos em faixas
vermelhas. Os eleitos dos deuses davam seu sangue em oferenda, para que a terra fosse fértil e o céu
generoso.
Fonte: GALEANO, Eduardo. Futebol ao sol e à somba. 3ª ed. Porto Alegre: L&PM, 2004. p. 28-32.
127
ANEXO E
TEXTO “AS REGRAS DO JOGO”
Ao fim de tantos séculos de rejeição oficial, as ilhas britânicas acabaram aceitando que havia uma
bola em seu destino. Nos tempos da rainha Vitória, o futebol já era unânime não só como vício plebeu, mas
também como virtude aristocrática.
Os futuros chefes da sociedade aprendiam a vencer jogando o futebol no pátio dos colégios e das
universidades. Ali, os rebentos da classe alta desafogavam seus ardores juvenis, aprimoravam sua
disciplina, temperavam sua coragem e afiavam sua astúcia. No outro extremo da escala social, os
proletários não precisavam extenuar o corpo, porque isso havia as fábricas e as oficinas, mas a pátria do
capitalismo industrial havia descoberto o futebol, paixão das massas, dava diversão e consolo aos pobres e
os distraía de greves e outros maus pensamentos.
Na sua forma moderna, o futebol provém de um acordo de cavalheiros que doze clubes ingleses
selaram no outono de 1863, numa taverna de Londres. Os clubes assumiram as regras estabelecidas em
1846 pela Universidade de Cambridge. Em Cambridge, o futebol se havia divorciado do rugby: era
proibido conduzir a bola com as mãos, embora fosse permitido tocá-la e era proibido chutar os adversários.
“Os pontapés só devem ser dirigidos para a bola”, advertia uma das regras: um século e meio depois, ainda
há jogadores que confundem a bola com o crânio do rival, por sua forma parecida.
O acordo de Londres não limitava o número de jogadores, nem a extensão do campo, nem a altura
do arco, nem a duração das partidas. As partidas duravam duas ou três horas, e seus protagonistas
conversavam e fumavam quando a bola voava para longe. Já existia, isso sim, o impedimento. Era desleal
fazer gols nas costas dos adversários.
Naqueles tempos, ninguém ocupava um lugar determinado no campo: todo mundo corria
alegremente atrás da bola, cada qual ia para onde bem entendesse, e mudava de posição à vontade. Foi na
Escócia que as equipes se organizaram com funções de defesa, meio de campo e ataque, lá pelo ano de
1870. Naquela época, as equipes já tinham onze jogadores. Ninguém podia tocar a bola com as mãos, desde
1869, nem mesmo para detê-la e colocá-la nos pés. Mas em 1871 nasceu o arqueiro, única exceção desse
tabu, que podia defender a meta com o corpo inteiro.
O arqueiro protegia um reduto quadrado: a meta, mais estreita que a atual e muito mais alta,
consistia de dois paus unidos por uma fita a cinco metros e meio de altura. A faixa foi substituída por um
travessão de madeira em 1875. Nas traves se marcavam os gols, com pequenos entalhes. A expressão
marcar um gol é usado até hoje, embora agora os gols já não sejam mais talhados nas traves, e sim
registrados nos placares eletrônicos dos estádios. A meta, feita em ângulos retos, não tem forma arqueada,
mas ainda a chamamos de arco em alguns países, e chamamos de arqueiro quem a defende, talvez porque
os estudantes dos colégios ingleses tenham usado como metas as arcadas dos pátios.
Em 1872, apareceu o árbitro. Até então, os jogadores eram seus próprios juízes, e eles mesmos
sancionavam as faltas que cometiam. Em 1880, cronômetro na mão, o árbitro decidia quando terminava a
partida e tinha o poder de expulsar quem se portasse mal, mas ainda dirigia de fora e aos gritos. Em 1891, o
árbitro entrou em campo pela primeira vez, usando um apito; marcou o primeiro pênalti da história e
caminhando doze passos assinalou o lugar da cobrança. Fazia muito tempo que a imprensa britânica vinha
fazendo campanha a favor do pênalti. Era preciso proteger os jogadores na boca do gol, que era cenário de
chacinas. A Gazeta de Westminster havia publicado uma impressionante lista de jogadores mortos e ossos
quebrados.
Em 1882, os dirigentes ingleses autorizaram a cobrança de lateral com as mãos. Em 1890, as áreas
do campo foram marcadas com cal, e traçou-se um círculo no centro. Naquele ano, o arco ganhou rede.
Segurando a bola, a rede evitava dúvidas nos gols.
Depois morreu o século, e com ele terminou o monopólio britânico. Em 1904 nasceu a FIFA,
Federação Internacional de Futebol Associado, que desde então governa as relações entre a bola e o pé, no
mundo inteiro. Ao longo dos campeonatos mundiais, a FIFA introduziu poucas mudanças naquelas regras
britânicas que organizaram o jogo.
Fonte: GALEANO, Eduardo. Futebol ao sol e à somba. 3ª ed. Porto Alegre: L&PM, 2004. p. 33-35.
128
ANEXO F
LETRA DA MÚSICA “A VIDA É DESAFIO”
É necessário sempre acreditar que o sonho é possível
Que o céu é o limite e você truta é imbatível
O tempo ruim vai passar é só uma fase
E o sofrimento alimenta mais a sua coragem
Que a sua família precisa de você
Lado a lado se ganhar pra te apoiar se perder
Falo do amor entre homem filho e mulher
A única verdade universal que mantém a fé
Olhe as crianças que é o futuro e a esperança
Que ainda ñ conhece, não sabe o que é ódio ganância
Eu vejo o rico que teme perder a fortuna
Enquanto o mano desempregado, viciado se afunda
Falo do enfermo, falo do são
Falo da rua que pra esse loko mundão
Que o caminho da cura pode ser a doença
Que o caminho do perdão as vezes é a sentença
Desavença, treta e falsa união
A ambição como um véu que cega os irmão
Que nem um carro guiado na estrada da vida
Sem farol no deserto da trevas perdida
Eu fui orgia mas hoje ando sóbrio
Guardo o revólver quando você me fala em ódio
Eu vejo o corpo a mente a alma espírito
Ouço o refém e o que diz la no canto lírico
Falo do cérebro e do coração
Vejo egoísmo preconceito de irmão pra irmão
A vida ñ é o problema é batalha desafio
Cada obstáculo é uma lição eu anuncio
É isso ai você não pode parar
Esperar o tempo ruim vir te abraçar
Acreditar que sonhar sempre é preciso
É o que mantém os irmãos vivos
Várias famílias vários barracos
Uma mina grávida
E o mano ta la trancafiado
Ele sonha na direta com a liberdade
Ele sonha em um dia voltar pra rua longe da maldade
Na cidade grande é assim
Você espera tempo bom e o que vem é só tempo ruim
No esporte no box ou no futebol alguém
Sonhando com uma medalha o seu lugar ao sol porém
Fazer o que se o maluco não estudou
500 anos de brasil e o brasil aqui nada mudou
"Desespero ai, senado louco,
Invadiu o mercado farinhado armado e mais um pouco"
Isso é reflexo da nossa atualidade
Esse é o espelho derradeiro da realidade
Não é areia, conversa, chaveco
Porque o sonho de vários na quebrada é abrir um boteco
Ser empresário não dá, estudar nem pensar
Tem que trampar ou ripar pros irmãos sustentar
Ser criminoso aqui é bem mais prático
Rápido, sádico, ou simplesmente esquema tático
Será extinto ou consciência
Viver entre o sonho e a merda da sobrevivência
"O aprendizado foi duro e mesmo diante desse
Revés não parei de sonhar fui persistente
Porque o fraco não alcança a meta
Através do rap corri atrás do preju
E pude realizar meu sonho
Por isso que eu afro x nunca deixo de sonhar"
Conheci o paraíso e eu conheço o inferno
Vi jesus da calça bege e o diabo vestido de terno
Mundo moderno, as pessoas não se falam
Ao contrário, se calam se pisam se traem se matam
Embaralho as cartas da inveja e da traição
Copa, ouro e uma espada na mão
O que é bom é pra si e o que sobra é do outro
Que nem o sol que aquece, mas também apodrece o esgoto
É muito louco olhar as pessoas
A atitude do mal influencia a minoria boa
Morrer atoa demais, matar atoa demais
Ser presa atoa , sonhando com uma fita boa
A vida voa e o futuro pega
Quem se firmo falo
Quem não ganho o jogo entrega
Mais um queda em 15 milhões
Na mais rica metrópole suas varias contradições
É incontável, inaceitável, implacável, inevitável
Ver o lado miserável se sujeitando com migalhas, favores
Se esquivando entre noite de medo e horrores
Qual é a fita treta cena
A gente reza foge continua sempre os mesmo problemas
Mulher e dinheiro ta sempre envolvido
Vaidade ambição munição pra criar inimigo
Vejo o povo antigo foi sempre assim
Quem não se lembra que abel foi morto por caim
Enfim, quero vencer sem pilantrar com ninguém
Quero dinheiro sem pisar na cabeça de alguém
O certo é certo na guerra ou na paz
Se for um sonho não me acorde nunca mais
Roleta russa quanto custa engatilhar
Eu pago o dobro pra você em mim acreditar
"É isso ai você não pode parar
Esperar o tempo ruim vir te abraçar
Acreditar que sonhar sempre é preciso
É o que mantém os irmãos vivos "
Geralmente quando os problemas aparecem
A gente está desprevenido né não
Errado
É você que perdeu o controle da situação
Perdeu a capacidade de controlar os desafios
Principalmente quando a gente foge da lições
Que a vida coloca na nossa frente
Você se acha sempre incapaz de resolver
Se acovarda moro
O pensamento é a força criadora
O amanha é ilusório
Porque ainda não existe
O hoje é real
É a realidade que você pode interferir
As oportunidades de mudança
Ta no presente
Ñ espere o futuro mudar sua vida
Porque o futuro será a conseqüência do presente
Parasita hoje
Um coitado amanha
Corrida hoje
Vitória amanha
Nunca esqueça disso
129
ANEXO G
NOTÍCIA VEICULADA PELA PÁGINA DA INTERNET DA PREFEITURA
MUNICIPAL DE IRATI, EM 04 DE AGOSTO DE 2006
http://www.irati.pr.gov.br/noticias/noticia.asp?id=624 5/08/2006
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