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Para se “comportar bem” o terapeuta deve buscar oferecer os cuidados
de que o paciente necessita, respeitando, inclusive sua hesitação inicial no
encontro. Este princípio, básico na clínica winnicottiana, encontra-se delineado no
texto “A Observação de Bebês numa Situação Padronizada” (1941/2000), no qual
Winnicott descreve o Jogo da Espátula. Khan (2000) relata que, neste artigo,
Winnicott apresenta sua experiência no Paddington Green Children’s Hospital e
no Queen’s Hospital for Children, onde atendeu bebês, crianças, mães, pais e
avós ao longo de quatro décadas e observou um certo padrão de comportamento
infantil em relação à espátula no contexto da consulta solicitada pela mãe .
Winnicott descreveu como as crianças se comportavam nesta situação
e suas observações sobre este fenômeno são extremamente importantes para
pensarmos sobre o ritmo que a criança estabelece, ela própria, a esta nova
experiência com o, também novo, objeto-espátula. Com o bebê em seus joelhos,
a mãe sentava-se à frente de Winnicott e, sobre a mesa, estava uma espátula
“reluzente”. Vale a pena, pela sua importância na clínica winnicottiana,
descrevermos a seqüência normal que se passava:
Primeiro estágio: O bebê avança sua mão para a espátula, mas nesse
momento descobre, inesperadamente, que a situação exige uma
consideração maior. Ele está num dilema. Ou ele pousa sua mão sobre a
espátula e, com olhos bem abertos, olha para mim e para sua mãe,
observa e espera, ou então, em certos casos, retira completamente o
seu interesse e enterra a cara na blusa da mãe. Normalmente é possível
administrar a situação de modo a evitar que qualquer reasseguramento
ativo seja dado, e é muito interessante observar como ressurge, gradual
e espontaneamente, o interesse do bebê pela espátula.
Segundo estágio: Ao longo de todo este tempo, que eu chamo de
‘período de hesitação’, o bebê não move o seu corpo, ainda que não
haja rigidez. Gradualmente ele se torna corajoso a ponto de permitir que
seus sentimentos aflorem, e então a situação muda rapidamente. O
momento em que essa primeira fase é substituída pela segunda é
evidente, pois a aceitação, pela criança, da realidade de seu desejo pela
espátula é anunciada por uma mudança que ocorre no interior de sua
boca, que se torna flácida, enquanto a língua parece grossa e macia, e a
saliva flui copiosamente. Não se passa muito tempo até ele pôr a
espátula na boca e começar a mastigá-la com suas gengivas, ou dar a
impressão de estar imitando o pai, fumando um cachimbo. A mudança
no comportamento do bebê é marcante. Em vez de expectativa e
quietude, agora há autoconfiança e movimentos livres com o corpo,
relacionados com a manipulação da espátula.
Fiz várias vezes a tentativa de levar a espátula à boca do bebê durante o
estágio de hesitação. Se a hesitação corresponde ao que eu considero
normal, ou difere disto em qualidade e grau, o fato é que cheguei à
conclusão de que é impossível, durante este estágio, fazer com que a
espátula entre na boca do bebê sem a utilização de força bruta. Em
certos casos em que a hesitação é aguda, qualquer esforço de minha