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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE ENFERMAGEM
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM ENFERMAGEM
A (RE)VOLTA DA VACINA:
EFICÁCIA E CREDIBILIDADE SOCIAL DA VACINAÇÃO CONTRA
INFLUENZA ENTRE IDOSOS DE PORTO ALEGRE
MARIA APARECIDA MULLER VILARINO
Porto Alegre, março de 2002.
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MARIA APARECIDA MULLER VILARINO
A (RE)VOLTA DA VACINA:
EFICÁCIA E CREDIBILIDADE SOCIAL DA VACINAÇÃO CONTRA
INFLUENZA ENTRE IDOSOS DE PORTO ALEGRE
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Enfermagem da
Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, como requisito parcial à obtenção do
título de MESTRE em ENFERMAGEM.
Orientadora:
Profª. Drª. Marta Júlia Marques Lopes
Porto Alegre, março de 2002.
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BANCA EXAMINADORA
Profa. Dra. Marta Júlia Marques Lopes (orientadora)
Profa. Dra. Ana Lúcia de Lourenzi Bonilha
Profa. Dra. Jussara Gue Martini
Profa. Dra. Maria Alice Dias da Silva Lima
Profa. Dra. Olga Rosária Eidt (suplente)
4
AGRADECIMENTOS
À Marta Júlia Marques Lopes, que orientou este trabalho com competência e
sensibilidade, mostrando-se uma amiga.
Às professoras Ana Bonilha, Jussara Martini e Maria Alice Lima pelas sugestões que
ajudaram na construção deste estudo.
Ao Manoel, servidor da Gerência de Regulação dos Serviços de Saúde da Secretaria
Municipal da Saúde de Porto Alegre, que auxiliou na coleta dos dados estatísticos de
internações hospitalares.
À Sirlei, enfermeira da Equipe de Informação da Coordenadoria Geral de Vigilância em
Saúde da Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre, que auxiliou na coleta dos
dados estatísticos sobre a mortalidade.
À professora Jandira Fachel, coordenadora do Núcleo de Apoio Estatístico da UFRGS,
que procedeu as análises estatísticas deste estudo.
À equipe do Núcleo de Imunizações da Coordenadoria Geral de Vigilância em Saúde,
da Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre, pelo apoio durante a realização do
mestrado.
À professora Clarice M. Dall’Agnol pelas sugestões na redação científica.
Às bibliotecárias Lúcia e Celina, da Escola de Enfermagem, UFRGS pelas orientações
nas referências bibliográficas.
Por fim, ao Vila, meu marido, pelo apoio e carinho durante o mestrado.
5
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS
LISTA DE TABELAS
RESUMO
1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................10
2 CONSTRUÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ..........................................18
2.1 A historicidade do pensar em saúde: corpo e significado...............................18
2.2 A promoção da saúde como base para políticas públicas...............................22
2.3 Saúde e sociedade: a transição demográfica e epidemiológica no Brasil ......26
2.4 O desafio de educar para prevenir em saúde do idoso:
limites e possibilidades no campo das imunizações.........................................29
2.5 Objetivos da investigação...................................................................................33
3 O MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO....................................................................34
3.1 Tipo de estudo.....................................................................................................34
3.2 População ............................................................................................................36
3.3 Coleta de dados...................................................................................................36
3.4 Análise dos dados................................................................................................37
3.5 Considerações éticas...........................................................................................39
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS .............................................................41
4 VACINAR É PRECISO? ADESÃO E CREDIBILIDADE SOCIAL
DA VACINAÇÃOCONTRA INFLUENZA ENTRE IDOSOS.........................41
4.1 A vacina, aspectos técnicos e epidemiológicos .................................................41
4.2 Vacinar-se ou não: as motivações entre os idosos............................................44
4.3 A introdução da vacina contra influenza e seu impacto na
morbimortalidade por pneumonias entre idosos,
1995 – 2001, Porto Alegre ..................................................................................51
4.3.1 O perfil de morbimortalidade por pneumonias após a introdução
da vacina contra influenza de 1995 a 2001 .......................................................51
4.3.2 O perfil de morbidade por pneumonias após a introdução
da vacina contra influenza de 1995 a 2001 .......................................................53
6
4.3.3 O perfil de mortalidade por pneumonias após a introdução
da vacina contra influenza de 1996 a 2001 ......................................................59
5 PRÁTICAS E REPRESENTAÇÕES DA SAÚDE-DOENÇA
ENTRE IDOSOS – ESTUDO QUALITATIVO....................................................63
5.1 Faixa etária, sexo e procedência dos idosos deste estudo................................63
5.2 O processo saúde–doença entre os idosos estudados:
cotidiano e representações .................................................................................66
5.3 Cotidiano e corpo................................................................................................71
6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS ................................................................84
ABSTRACT ..............................................................................................................89
RESUMEN ................................................................................................................90
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................91
ANEXOS ...................................................................................................................95
ANEXO A ..................................................................................................................95
ANEXO B...................................................................................................................96
7
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – MÉDIA MENSAL DAS INTERNAÇÕES
POR PNEUMONIAS, PORTO ALEGRE, 1995-2001...................53
FIGURA 2 – TAXA DE INTERNAÇÕES HOSPITALARES
POR PNEUMONIAS, PORTO ALEGRE, 1995 – 2001. ...............55
FIGURA 3 – POR PERCENTUAL DE INTERNAÇÕES
PNEUMONIA EM RELAÇÃO ÀS DEMAIS DOENÇAS
RESPIRATÓRIAS, PORTO ALEGRE,1995-2001........................56
FIGURA 4 – COEFICIENTE DE MORBIDADE POR PNEUMONIAS,
PORTO ALEGRE, 1995-2001..........................................................57
FIGURA 5 – MÉDIA MENSAL DA MORTALIDADE POR
PNEUMONIAS, PORTO ALEGRE, 1996 – 2001...........................59
FIGURA 6 – TAXA MENSAL DE MORTALIDADE POR
PNEUMONIAS EM RELAÇÃO À TAXA
MENSAL DE MORTALIDADE GERAL,
PORTO ALEGRE, 1996-2001..........................................................60
FIGURA 7 – COEFICIENTE DE MORTALIDADE POR
PNEUMONIAS, PORTO ALEGRE, 1996 – 2001..........................61
8
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ENTREVISTADA
SEGUNDO A FAIXA ETÁRIA, PORTO ALEGRE, 2001. ...........64
TABELA 2 – DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ENTREVISTADA
SEGUNDO O SEXO, PORTO ALEGRE, 2001 .............................65
TABELA 3 – DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ENTREVISTADA
SEGUNDO O LOCAL DE PROCEDÊNCIA,
PORTO ALEGRE, 2001...................................................................65
9
RESUMO
Trata-se de um estudo sobre o impacto da introdução da vacina contra influenza no
perfil de morbimortalidade por pneumonias na população acima de 65 anos, em Porto
Alegre, no período de 1995 a 2001. Associado ao estudo da série histórica, investigamos
os motivos de adesão ou recusa à prática de vacinação contra influenza entre 138
idosos. Aprofundamos a análise das concepções do processo saúde-doença e das
práticas preventivas em saúde com um grupo de 30 idosos usuários do sistema público
de saúde. A metodologia utilizada é de caráter epidemiológico do tipo série temporal,
combinando entrevistas com idosos e categorização temática das informações obtidas.
Os dados de morbidade foram obtidos pela pesquisa documental estatística, a partir dos
dados de internação hospitalar do Sistema Único de Saúde (Tabwin) e os dados de
mortalidade foram obtidos a partir do Sistema de Informação em Mortalidade (SIM). Os
resultados apontam um comportamento de tendência à queda na morbidade, através das
internações hospitalares e na mortalidade por pneumonias, após a introdução regular da
vacina contra influenza em nosso meio no ano de 1999. Particularizando a adesão ou
recusa à prática de vacinação, os idosos demonstram que fatores culturais e sociais
influenciaram suas decisões. Os idosos que participaram deste estudo também
revelaram que é fundamental a manutenção de uma atividade física, intelectual ou
laboral para um envelhecimento saudável. Os resultados deste estudo, acredita-se,
contribuem para o aperfeiçoamento das práticas de promoção em saúde através da
educação em saúde e da adoção de medidas de proteção específica como a vacinação
com eficácia e credibilidade junto à população.
10
1 INTRODUÇÃO
Esta dissertação é requisito parcial para a obtenção do título de Mestre pelo
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul .
A temática do estudo é a prevenção em saúde do idoso. Pretendemos investigar
as práticas preventivas em saúde e as medidas de proteção específica adotadas pelos
nossos sujeitos da pesquisa, os idosos. O desafio de discutir prevenção parte de uma
perspectiva social da concepção dessa fase da vida em que as perspectivas para o futuro
vão se diluindo nas lembranças do passado.
Inicialmente pretendíamos nos limitar a investigar a implantação da vacina
contra influenza em Porto Alegre e o impacto no perfil de morbimortalidade por
doenças respiratórias. Em função do desafio que representa a implantação dessa prática
preventiva nessa faixa etária, resolvemos agregar a esse estudo epidemiológico um
estudo qualitativo que permitisse discutir os motivos de recusa ou adesão à prática da
vacinação aliada a outras medidas de promoção à saúde que fazem parte do cotidiano
dos idosos.
A escolha desse tema está vinculada à trajetória de trabalho em saúde coletiva,
durante 16 anos, da pesquisadora. Nesse período constatamos que a prevenção em
saúde, tanto na ótica das práticas promocionais à saúde quanto na ótica das práticas de
11
proteção específica, especialmente relacionadas com a prática de vacinação, são
atividades de interesse constante dos trabalhadores que se dedicam à saúde coletiva.
Atualmente realizamos atividades de prevenção em saúde no Núcleo de
Imunizações (NI) da Equipe de Controle Epidemiológico (ECE) da Coordenadoria
Geral de Vigilância em Saúde (CGVS) da Secretaria Municipal da Saúde de Porto
Alegre (SMS), o que nos permite transitar com certo conhecimento na área das
imunizações, possibilitando apontar questões instigantes que se colocam frente a essa
realidade. O NI tem como função gerenciar as atividades de imunização, promovendo
cursos para capacitar os vacinadores em sala de vacinas, realizando supervisão nas salas
de vacinas do município, em âmbito público e privado, distribuindo e controlando a
qualidade dos imunobiológicos, analisando as coberturas vacinais e também
coordenando as campanhas de vacinação.
Com a nossa vivência em saúde coletiva, podemos afirmar que a atividade de
imunização se caracteriza como um instrumento eficaz para a vigilância epidemiológica
no que tange ao controle das doenças imunopreviníveis, para garantir uma qualidade de
vida melhor e assim se constituir em uma prática preventiva de alta magnitude entre a
população.
No cenário específico das imunizações aconteceram muitos avanços como a
produção de novas vacinas para o controle das doenças infectocontagiosas,
principalmente entre os menores de 5 anos. O incremento de pesquisas para a
descoberta de vias de administração e adjuvantes que permitem ampliar a resposta
imunológica, a produção de vacinas pelo método da engenharia genética, as quais se
caracterizam por serem mais eficazes e menos reatogênicas, e a possibilidade de
12
produzir vacinas a partir do DNA de microorganismos marcaram o final do século XX
no campo da imunologia.
Nas últimas décadas muitas mudanças ocorreram no cenário das políticas de
saúde em nosso país, que serão analisadas na construção do nosso problema de estudo.
Destacamos a mudança ocorrida no perfil demográfico do Brasil, que, devido à
diminuição da fecundidade e da mortalidade, apresenta um aumento da população de
idosos. Essa nova parcela da população demanda para o setor público a implantação de
políticas que atendam a suas necessidades específicas. As conquistas no plano das
políticas públicas são fruto de um trabalho realizado junto a segmentos da sociedade
organizada representada pelos idosos principalmente.
Para os indivíduos de sessenta anos de idade ou mais, que correspondem ao
grupo etário mais representativo para doenças crônicas e de crescimento mais rápido na
população do país, a influenza e suas complicações permanecem como uma causa de
significativa morbimortalidade (Toniolo Neto, 2001).
O melhor método preventivo contra o vírus influenza, que é capaz de reduzir sua
severidade, é a vacinação contra a gripe. A vacinação é um procedimento recomendado
pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e beneficia tanto indivíduos sadios como os
suscetíveis a episódios de gripe, nos quais se incluem portadores de doenças crônicas
pulmonares, cardiovasculares e metabólicas.
A gripe pode agravar a patologia básica das pessoas com distúrbios cardíacos ou
pulmonares. Essas complicações são a causa de visitas freqüentes a médicos,
hospitalizações prolongadas e aumento do número de mortes por pneumonia e/ou
patologias subjacentes, vinculadas aos surtos gripais que ocorrem todos os anos.
13
A vacinação de indivíduos com alto risco está associada a uma diminuição
significativa da gravidade da doença em relação à incidência de hospitalização e
mortalidade associadas à gripe.
Nos países em que as quatro estações do ano são mais marcadas, as epidemias de
gripe ocorrem virtualmente a cada inverno. Durante um surto típico nos Estados Unidos,
aproximadamente 30% da população (70 milhões) tornam-se enfermos. Desses, 400.000
são hospitalizados e entre 10.000 e 20.000 morrem em conseqüência de complicações.
Embora seja considerada uma enfermidade benigna e autolimitada, nos idosos
apresenta uma maior importância epidemiológica, face às suas conseqüências, aumento
de gastos hospitalares e mortalidade. Além disso, o idoso com uma infecção por
influenza sofre de uma maior predisposição para desenvolver pneumonia (Silvestre,
1997).
Estudos do
Centers for Disease Control and Prevention (CDC) mostram que a
vacina reduz a hospitalização em cerca de 70% e os óbitos em cerca de 85%. Em casas
geriátricas, a vacina pode reduzir o risco de hospitalização em cerca de 50%, de
pneumonias em cerca de 60% e de morrer de 75% a 80%. Quando ocorre a circulação
de vírus diferente da composição da vacina, a eficácia da vacina pode ser menor,
especialmente na redução da doença, mas a vacina poderá diminuir a severidade da
mesma e prevenir complicações e morte (CDC,1998).
Um estudo realizado em Manitoba (Canadá), no período de estação da influenza
em 1982-83 e 1985-86, com o objetivo de verificar os efeitos da vacinação contra
influenza na prevenção das hospitalizações e óbitos associados à influenza, mostrou
uma prevenção de 32% a 39% de hospitalização por pneumonias e influenza e de 15%
a 34% de admissões com problemas respiratórios durante dois períodos de influenza. A
14
vacinação também teve uma eficácia na prevenção de 43% a 65% dos óbitos
associados a qualquer dessas condições. Além disso, a vacinação protege de 27% a 30%
contra os óbitos de todas as causas.
Esses resultados podem ser associados a estudos observacionais da efetividade
da vacinação contra influenza na prevenção da influenza associada à hospitalização por
pneumonias e óbitos em casas geriátricas e pessoas não institucionalizadas, bem como a
estudos de caso-controle. Em adição ao estudo de Manitoba, descobriram-se novas
informações que recomendam ser a vacinação mais protetora contra as admissões
hospitalares por problemas respiratórios e óbitos por todas as causas (Fedsons et al,
1993).
Outro estudo realizado nos Estados Unidos durante três estações de influenza,
1990-90, 1991-92, 1992-93, no qual, a cada ano, se incluíram mais de 25.000 idosos
com 65 anos e mais, mostrou que, em geral, a vacinação diminuiu em 48% a 57% as
admissões hospitalares por pneumonias e influenza. Mais importante ainda, a vacinação
foi asssociada com uma diminuição de 39% a 54% da mortalidade considerando todas
as causas durante os três períodos do estudo (Nichol et al, 1994).
A inclusão da vacina contra influenza no calendário nacional de imunização no
Brasil inspirou-se nas iniciativas do município e Estado de São Paulo, que tornaram lei
a vacinação de idosos contra a gripe. Editadas em 1997 e 1998, respectivamente, ambas
as leis originaram-se na experiência do Centro de Estudos do Envelhecimento da
Universidade Federal de São Paulo (Aranda, 2000).
Dentro dessa perspectiva, a partir de 1999, o MS deu início a uma nova
estratégia na prática da vacinação, que foi a edição da campanha de vacinação contra
influenza em todo o território nacional com o objetivo de vacinar a população acima de
15
65 anos. Essa prática visa a diminuir as complicações e internações advindas da doença
influenza popularmente denominada gripe, mais especificamente, as pneumonias, que
ocorrem com maior freqüência nessa faixa etária mais vulnerável.
Com isso estava proposto um novo desafio para os trabalhadores da saúde
coletiva. Algumas reflexões foram se desenhando no cotidiano de nossa prática, no
Núcleo de Imunização, no que se refere a essa vacinação destinada aos idosos, as quais
deram origem à elaboração do nosso problema de pesquisa, conduzindo ao
encaminhamento das questões deste estudo. Cito a seguir algumas delas.
Ocorreu mudança no perfil de morbimortalidade por pneumonias após a
implantação da vacina contra influenza, no município de Porto Alegre? O que leva o
idoso a adotar ou não práticas preventivas, em especial, a proteção específica que
corresponde à vacinação contra influenza? É possível incrementarmos práticas
preventivas em saúde para os idosos? Os idosos sabem da eficácia da vacina na
prevenção da morbimortalidade por pneumonias (complicação da gripe), ou a
relacionam simplesmente ao resfriado comum e aos sintomas da gripe ?
Em nosso meio, dentre os estudos que discutem o impacto causado no perfil de
morbimortalidade das doenças respiratórias após a utilização da vacina contra influenza,
encontramos apenas dados parciais. Um levantamento realizado pelo grupo de estudos
do envelhecimento da Universidade Federal de São Paulo mostra uma diminuição das
internações por pneumonia no ano de 1999 em relação ao ano de 1998 e uma
diminuição da mortalidade por doenças respiratórias no mesmo período (Aranda, 2000).
Espina, Tietboehl e Vila Nova (2001) realizaram um breve estudo de uma
série histórica de mortalidade e internações por pneumonias no Estado do Rio Grande
16
do Sul, demonstrando uma diminuição da mortalidade por doenças respiratórias após o
ano de 1999, que corresponde à implantação da vacina contra influenza.
Para a cidade de Porto Alegre não encontramos referências de pesquisas que
tratem desses aspectos.
Segundo dados do Sistema Único de Saúde, de 1998 a 2000, houve uma queda
de 18% (179.000) em números de internações da população brasileira por pneumonia.
Nesse mesmo período, o maior impacto deu-se na Região Sul e Sudeste, onde houve
redução de 27,1% em registros de internação pela doença (Brasil, 2001).
Concomitante a essas indagações, a ocorrência, no início do século XX, no Rio
de Janeiro, do episódio chamado de A revolta da vacina populares se rebelaram
violentamente contra o governo, manifestando o repúdio à obrigatoriedade da
vacinação contra a varíola , nos permitiu uma associação com o momento atual, quando
a implantação da vacinação contra influenza gerou a idéia de que essa medida pretendia
matar os idosos, originando o medo e a sua recusa entre os mesmos.
Possivelmente esses fatos inspiraram a criação do titulo desta dissertação, ao
parafrasearmos esse episódio popular acontecido há cem anos, mas que toma um novo
caráter, adaptado ao momento político atual e a uma nova vacina.
Nessa perspectiva construímos este estudo, que se estrutura, a seguir, com a
construção do problema de pesquisa e do referencial teórico. Partimos da história do
conceito de saúde e doença, discutimos o referencial teórico influenciando, em cada
momento histórico do país, as mudanças nas políticas de promoção à saúde.
Paralelamente, analisamos as interfaces com as políticas de educação em saúde, o que
17
possibilitou analisarmos as práticas de prevenção em saúde dos idosos – preconizadas
pelo setor público - e suas repercussões entre eles.
Assim apresentamos uma análise da transição demográfica e epidemiológica
ocorrida nos últimos anos, para caracterizar a população de idosos que abordamos na
fase empírica deste estudo. Analisamos também as práticas de prevenção na área da
saúde do idoso, salientando questões culturais e históricas em relação à saúde e ao corpo
do idoso. Dirigimos a análise para os aspectos da vacina contra influenza e seu possível
impacto na saúde dos idosos, bem como a adesão desses a essa nova prática.
Na seqüência, detalhamos a trajetória metodológica da investigação, os
resultados obtidos neste estudo, que dividimos em duas partes. A primeira aborda os
motivos que levam os idosos a aderirem ou a recusarem a prática de vacinação contra
influenza e analisamos o comportamento da morbimortalidade por pneumonias em
Porto Alegre através de uma série histórica. A segunda consta das reflexões
desenvolvidas junto à população alvo, discutindo-se a relação dos idosos com as
práticas preventivas em saúde. Por fim elaboramos algumas considerações conclusivas.
Esperamos que os conhecimentos adquiridos neste estudo contribuam para as
atividades desenvolvidas pelos trabalhadores que atuam na saúde coletiva. Em especial,
os enfermeiros que exercem suas atividades nas unidades de saúde da rede pública e que
procuram praticar propostas novas e instigantes na busca do fortalecimento da
prevenção em saúde.
18
2 CONSTRUÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA
Para estruturarmos este estudo, partimos da convicção quanto à importância de
se situar historicamente as práticas preventivas em saúde e apontar suas interfaces com
a educação em saúde e as políticas públicas nesse campo. Assim, nos detivemos nas
abordagens construídas em torno do tema da saúde e que influenciaram as práticas
preventivas na saúde coletiva.
2.1 A historicidade do pensar a saúde: corpo e significado
Historicamente este tema é tratado pelo viés da doença, talvez porque a estrutura
do conhecimento e dos serviços de saúde, que sofreram por longo período a influência
do modelo médico-curativo, se encontre preparada para atender quem está doente ou
com suspeita de algum problema diagnosticável pela clínica.
Por outro lado, os serviços de saúde promovem ações que visam a prevenir os
males e as doenças que afetam sujeitos e coletividades. Nessa perspectiva, entendemos
que nos aproximamos do que poderia ser saúde.
O conceito de saúde clássico e difundido entre os órgãos formadores, os
trabalhadores de saúde e a população em geral é o proposto pela Organização Mundial
de Saúde (OMS), que diz: “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e
social e não apenas a ausência de afecção ou doença”(OMS citado por Rezende, 1986).
19
Esse conceito, nós o consideramos subjetivo, amplo e estático para definir o
fenômeno complexo e dinâmico que é o processo saúde-doença, constituído por uma
rede de condições sociais, políticas, econômicas e culturais de indivíduos e coletividade.
Mais próximo dessa nossa definição, encontramos em Laurell (1983) que a
determinação social do processo saúde-doença é um binômio intrinsecamente
relacionado e como tal determinado pelas condições de vida, pelo acesso à educação, ao
trabalho, ao exercício da cidadania.
Laurell (citado por Breihl 1991,p.13) assim define a dimensão histórica do
processo saúde-doença:
“Evidência incontestável de que o panorama patológico se
transforma ao longo da história, de que as doenças predominantes
são distintas de uma sociedade para outra em um dado momento,
de que a problemática da saúde difere de uma a outra classe social,
dentro de uma mesma sociedade comprova o caráter social e
histórico da doença.”
Observamos no decorrer dos séculos mudanças no enfoque central na análise
do que é considerado doença e saúde. Singer (1981,p.81) vem corroborar essa análise
feita a partir da dimensão social do processo saúde-doença. Diz ele:
“... o estado de saúde de uma população evolui em função do
desenvolvimento das forças produtivas e das mudanças nas
relações de produção, que condicionam genericamente tanto as
contradições que originam estados mórbidos como a capacidade de
prevenir, suprimir ou controlar a eclosão dessas contradições. Mais
do que isso, o estado de saúde reflete um recorte certamente não
arbitrário, mas historicamente determinado do quadro geral de
contradições que afetam o organismo social ...”
Essa dimensão social dos determinantes do processo saúde-doença embasaram
as diretrizes da 8° Conferência Nacional de Saúde, realizada em nosso país em 1986,
a qual foi um marco decisivo para desencadear o projeto de Reforma Sanitária no
20
país, culminando com a promulgação da Lei nº 8080/90 que cria o Sistema Único de
Saúde (SUS). No artigo segundo, parágrafo terceiro, dessa lei, encontramos o
seguinte:
“A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre
outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio
ambiente, o trabalho, o lazer e o acesso aos bens e serviços
essenciais; os níveis de saúde da população expressam a
organização social e econômica do país”(Lei n.8080/90, p.6).
Outra possibilidade de abordagem deste tema é a busca de como se constróem as
visões sobre os indicadores do processo saúde-doença. Nesse caso, contribuições
importantes de Boltanski (1984), Helman (1994) e Minayo (1997) trazem a dimensão
cultural e o enfoque das formas como o sujeito em questão representa sua doença, seu
corpo e que formas de experiências daí se originam.
Segundo Helman (1994,p.33), “... cada ser humano possui, em certo sentido,
dois corpos: um corpo individual (físico e psicológico), adquirido no nascimento, e
também um corpo social necessário ao primeiro para viver em determinada
sociedade”.
Esse autor ainda afirma:
“ O corpo social é uma parte importante da imagem do corpo, pois
fornece a cada pessoa uma base para perceber e interpretar suas
próprias experiências físicas e psicológicas .... exerce um controle
poderoso sobre todos os aspectos do corpo individual: sua forma,
tamanho, vestimenta, dieta alimentar e postura; seu comportamento
com relação à doença e à saúde além de suas atividades
reprodutoras, profissionais e de lazer”(Helman,1994, p.33).
Essas idéias nos remetem a pensar que o meio ambiente natural e social
influencia o sujeito na construção do modo como são percebidas as sensações físicas e
como tais sensações são expressas pelo corpo.
21
Boltanski faz uma análise do uso do corpo em relação às diferentes classes
sociais e afirma que, na medida em que o indivíduo sobe na hierarquia social, cresce o
nível de instrução e decresce, correlativa e progressivamente, o volume de trabalho
manual em favor do intelectual, o sistema de regras que rege a relação dos indivíduos
com o corpo também se modifica. O autor exemplifica com a valorização da magreza:
“Cresce quando se passa das classes populares às classes superiores ao mesmo tempo
que cresce a atenção dada à aparência física e que decresce correlativamente a
valorização da força física...”( Boltanski 1984, p.168).
Para Minayo a concepção de saúde-doença das camadas populares liga-se
intimamente à possibilidade de trabalhar, de realizar os afazeres rotineiros e cotidianos.
Diz ela:
“Essa equivalência da doença ao não-trabalho ou à não-
produtividade não é natural, mas socialmente construída de acordo
com a ideologia de que nosso corpo é feito para produzir.....Saúde,
doença e trabalho constituem, portanto, uma interdependente e
cotidiana relação, que pode ser traduzida pela própria concepção de
vida” (Minayo 1997, p.37).
Dessa forma, a análise das dimensões biológica, social e cultural do processo
saúde-doença é de fundamental importância para aqueles que de uma forma ou outra se
engajam nessa problemática. Ambas remetem às questões do cotidiano de cada sujeito
e/ ou coletividade, às condições materiais de vida e às formas de vivenciar sua inserção
na sociedade.
Com base nessas idéias de saúde, faremos uma breve reflexão sobre a trajetória
das políticas públicas implantadas ao longo da história de nosso país, que de uma
maneira ou outra influenciaram e/ou determinaram as práticas preventivas em saúde.
22
2.2 A promoção da saúde como base para políticas públicas
Leavell e Clark (1976) utilizaram o conceito de promoção da saúde ao
desenvolverem o modelo da história natural da doença, que comporta, segundo os
autores, três níveis de prevenção. No período de pré-patogênese da doença,
identificamos o nível denominado de prevenção primária, que se subdivide em
promoção da saúde e proteção específica. Nesse item definem-se as ações para prevenir
os possíveis agravos na saúde do indivíduo; preconizam os autores que as práticas de
educação em saúde são fundamentais para promovê-la. No período de patogênese da
doença, identificamos o nível denominado de prevenção secundária, no qual tem lugar
o diagnóstico precoce e o tratamento das doenças. No nível da prevenção terciária,
identificamos as ações reabilitadoras para se promover a recuperação da saúde.
Afirmam esses autores que os procedimentos para a promoção da saúde
incluem um bom padrão de nutrição, ajustado às várias fases do desenvolvimento
humano, o atendimento das necessidades para o desenvolvimento ótimo da
personalidade, educação sexual e aconselhamento nupcial, moradia adequada, recreação
e condições agradáveis no lar e no trabalho. O aconselhamento para a saúde realizar-se-
á em qualquer oportunidade de contato entre o médico e o paciente, com extensão entre
os componentes da promoção.
De acordo com Buss (2000, p.166), “trata-se, portanto, de um enfoque da
promoção da saúde centrado no indivíduo, com uma projeção para a família ou grupos,
dentro de certos limites”.
Esse modelo de atenção à saúde embasou os princípios da Conferência
Internacional de Cuidados Primários de Saúde, realizada na cidade de Alma-Ata, em
1978, que tinha como meta “A Saúde para todos até o ano 2000”. A proposta derivada
23
dessa conferência e introduzida no Brasil previa a promoção da saúde, a proteção
específica, o diagnóstico precoce, o tratamento das afecções e a reabilitação nas
situações específicas. (Rosa, 1989) Esse modelo, denominado cuidados primários de
saúde, norteou as práticas de saúde durante a década de 70 até meados de 80.
Buss (2000) defende que as diversas conceituações sobre promoção da saúde
podem ser reunidas em dois grandes grupos. No primeiro, as atividades nesse terreno
consistem na transformação do comportamento dos indivíduos, tendendo a concentrar-
se em elementos educativos relacionados com comportamentos de risco passíveis de
mudança. Por exemplo, o hábito de fumar, a dieta, a atividade física.
No segundo, que caracteriza a promoção da saúde moderna, tem-se a
constatação dos determinantes gerais sobre as condições de saúde, sustentada no
entendimento que a saúde é produto de um amplo espectro de fatores relacionados com
a qualidade de vida. Suas atividades estariam voltadas ao coletivo através de políticas
públicas e de condições favoráveis ao desenvolvimento da saúde e do reforço da
capacidade dos indivíduos e das comunidades. Esse grupo é o que vem norteando as
atividades de cunho preventivo desde a década de 90.
Abordaremos a seguir a prática de promoção da saúde que se estabeleceu
enquanto a prática preventiva mais preconizada no meio da saúde coletiva.
Educar, uma perspectiva para a promoção da saúde
As práticas educativas em saúde freqüentemente têm consistido num momento
específico das práticas de promoção da saúde. Atribuem aos indivíduos a
responsabilidade pelo seu processo saúde-doença, cuja gravidade variará em função do
24
maior ou menor nível de educação, isto é, segundo sua capacidade de prevenir males
físicos por meio de comportamentos e hábitos de higiene.
Essa premissa, durante muito tempo, norteou as práticas de educação em saúde
entre os trabalhadores dessa área. Gastaldo (1997) denominou-a de “educação em saúde
tradicional”; sendo desenvolvida sob a influência da teoria da prevenção da doença, a
saúde é percebida como uma responsabilidade pessoal. Tradicionalmente, a educação
em saúde tem sido considerada como uma prática positiva a ser integrada aos cuidados
de saúde, pois veicula informações e sugere alternativas para indivíduos, famílias ou
grupos em termos de prevenção à doença e de promoção da saúde.
Encontramos em Rosen (1994) um breve histórico de como nasceu a educação
em saúde que vem corroborar a tese acima. No final do século XIX, as agências de
saúde oficiais e voluntárias dos Estados Unidos viram-se envolvidas em um programa
de educação: para promover a saúde e prevenir a doença era necessário acabar com a
ignorância. Esse movimento para divulgar informação e orientações em saúde
continuou durante o século XX. A chama inicial da educação em saúde nasceu do
movimento antituberculose em 1904, através de exposições sobre a doença a fim de
despertar o interesse do público. A Primeira Guerra Mundial acelerou a evolução da
educação em saúde e definiu o cenário de seu crescimento principalmente em relação às
doenças venéreas. Em meados do século criou-se a Organização Comunitária para
Educação em Saúde, influente até hoje no programa de Educação em Saúde nos Estados
Unidos. Essa ideologia da transmissão de conhecimento através da informação para
garantir uma vida saudável norteou os programas de educação em saúde no início do
século em nosso país.
25
Em Melo (1976) observa-se uma crítica à prática da educação em saúde que se
reduzia à propaganda e informação, distribuindo noções de higiene e regrando a vida da
população.
Rosa (1989) argumenta que a educação em saúde no Brasil tem suas origens no
século XIX, inspirada nos princípios de higiene e ensinada com a finalidade de criar
hábitos sadios.
Durante as primeiras décadas do século XX, identificamos que a realização das
atividades de educação em saúde nos serviços básicos está impregnada de uma
metodologia de transmissão do conhecimento. A partir dos anos 80, a metodologia
utilizada pelos profissionais da saúde assume pressupostos diferentes, adotando
características problematizadoras como método de trabalho. Essa mudança ocorreu
devido ao movimento de Reforma Sanitária em nosso país, que apontou a necessidade
de se repensar o processo saúde-doença como resultante de determinantes sociais e de
entender a educação como instrumento de apreensão e compreensão dessa realidade.
Gastaldo (1997) denomina essa outra forma de realizar a prática educativa em
saúde de “educação em saúde radical” e argumenta que o enfoque dessa proposta está
comprometido com o combate às desigualdades sociais de forma ampla e promove a
participação comunitária em questões relativas à saúde. De acordo com esse referencial,
diz a autora: “...a educação em saúde tem se constituído numa prática que capacita
indivíduos e grupos a se auto-organizarem para desenvolver ações a partir de suas
próprias prioridades...”(Gastaldo,1997,p.149).
Compartilhando da idéia de que os programas de educação em saúde estão
comprometidos, em sua estratégia de ação, com o exercício da cidadania, encontramos
26
as considerações de Dilly e Jesus (1995, p.107) em relação a esse novo olhar que as
práticas educativas em saúde assumiram. Dizem elas:
“... chegamos à conclusão de que, para conquistar as condições
necessárias à manutenção, promoção, prevenção e recuperação da
saúde, se deve exercitar a cidadania, se fazer presente nos
momentos das decisões que nos afetam direta ou indiretamente,
opinar, questionar, reivindicar. Enfim, é preciso o conhecimento e
o exercício dos direitos e deveres do cidadão...”.
Entendemos que as práticas preventivas se confundem em alguns momentos
com as educativas, mas não se esgotam nelas; isso demonstra a importância das mesmas
nas estratégias preventivas.
Com base nessas considerações traçadas acerca da evolução teórica do
referencial sobre saúde e sua influência nas práticas estratégicas de saúde, nos
encaminhamos para situar as práticas preventivas em saúde dos idosos, articulando
assim o referencial e o problema de pesquisa.
2.3 Saúde e sociedade: a transição demográfica e epidemiológica no Brasil
A partir das décadas de 40 a 60, o Brasil vem num processo de transição
demográfica e epidemiológica. Devido à diminuição das taxas de fecundidade e
mortalidade, configurou-se um aumento da presença de adultos e idosos na população.
Conforme Monteiro (1995), a população de zero a vinte, nesta e nas próximas décadas,
terá taxas de crescimento reduzidas ou até negativas, ao passo que a população de 65
anos crescerá a taxas elevadas.
Monteiro e Alves (1997) contribuem com dados significativos em relação às
diferentes taxas de crescimento que mostram o recente e rápido envelhecimento da
população brasileira por conta do ritmo mais acelerado do crescimento da população de
27
idosos; afirmam que, entre 1940 e 1991, o crescimento da população de idosos se
manteve bem acima dos outros grupos de idade, chegando a ser de 4,4 % entre 1970 e
1980, enquanto grupos populacionais com idades de 20-39 e de 40-59 anos mantiveram
um ritmo estável de crescimento, entre 2,5 e 3,3 % ao ano.
Para Veras (1994), os atuais idosos brasileiros são os que conseguiram
sobreviver a condições adversas, os menos pobres do conjunto da sociedade, os que se
concentram nas grandes cidades e nos bairros com maiores facilidades de acesso aos
serviços de saúde.
Soares (2000) analisa que a transição está longe de apresentar uma evolução
em direção a um futuro melhor, devido a uma combinação perversa de avanço para
poucos e retrocesso para muitos. Os anos 90 apresentaram uma distribuição de renda
mais concentrada que ao final dos anos 70, aumentando o percentual da população em
extrema pobreza. O desmonte imposto às políticas sociais é um outro determinante da
degradação das condições de vida de grupos populacionais cada vez maiores. O descaso
com o saneamento básico e a adoção de políticas de saúde propiciou a volta de doenças
consideradas eliminadas denominadas reemergentes, como a cólera e o aumento do
número de casos de tuberculose.
Assim a transição demográfica tem nítida relação com a transição
epidemiológica; com o aumento da população acima de 65 anos, passamos de um
quadro caracterizado pela alta prevalência de mortalidade por doenças infecciosas,
típico da população infantil, para um quadro em que passam a predominar as doenças
crônico-degenerativas, também chamadas, modernamente, de doenças de longa duração.
28
Diante desse quadro, o setor público vê-se na necessidade de investir em
políticas públicas, principalmente de saúde, para atender essa parcela de excluídos que
aumentou após a globalização imposta pelo países ditos de primeiro mundo.
Assim, segundo comentário de Monteiro (1995, p.76):
“... uma proporção crescente de idosos representa, sem dúvida,
alterações nos arranjos domésticos, na inserção no mercado de
trabalho, nas necessidades de acesso ao atendimento em saúde,
educação, transporte, lazer e vários outros benefícios sociais. Há
que se rever prioridades na alocação de recursos públicos e re-
equacionar o sistema previdenciário.”
A estrutura etária vigente apresenta políticas públicas voltadas a serviços de
creche, atenção à saúde da criança e adolescente, nas quais se identifica a necessidade
de qualificação desses projetos e não de aumento da cobertura de tais serviços. Por parte
da população adulta, a pressão dá-se em torno da área do emprego. O desafio está no
aumento da longevidade, que apresenta a necessidade de se pensar em políticas de
atenção à saúde e cobertura previdenciária adequada para os próximos anos.
Compartilhando a idéia de desafio, Veras (1994) analisa que o país apresenta
uma configuração heterogênea em sua estrutura social, econômica e demográfica e para
tanto, no planejamento de ações, há que ser considerada essa heterogeneidade, pois,
onde quase não existem serviços e programas sociais para o idoso, aqueles de baixo
poder aquisitivo tendem a uma pior qualidade de vida e a morrer mais cedo.
Frente a esse quadro podemos nos questionar sobre quais práticas e políticas
em saúde mais se coadunam com esse perfil populacional. Acreditamos que se faz
necessário (re)discutir a relação envelhecimento e saúde, valores sociais relativos ao
“corpo útil” e à sustentação de novas ideologias que (re)humanizem o sentido da vida.
29
2.4 O desafio de educar para prevenir em saúde do idoso: limites e
possibilidades no campo das imunizações
As práticas de imunização no público infantil têm uma boa adesão da população
em geral, devido à diminuição de doenças (imunopreviníveis) que ocorreu a partir da
metade do século passado. Podemos citar como exemplo a erradicação da varíola, que
assolou o mundo durante muitos anos, a eliminação da poliomielite das Américas e o
controle da diminuição do número de casos das doenças infectocontagiosas (difteria,
coqueluche, sarampo, tétano). Essa situação epidemiológica vem contribuindo para a
diminuição da mortalidade infantil no país, principalmente, no Estado do Rio Grande do
Sul (RS), que apresenta o menor índice de mortalidade infantil.
A imunização em adultos, principalmente em idosos, é uma estratégia nova, um
desafio a ser enfrentado pelos trabalhadores que atuam em saúde coletiva. Um aspecto a
ser observado é que muitos idosos nunca foram vacinados em sua vida, o que
possivelmente dificulta a utilização dos recursos de imunização. Assim, acreditamos, é
preciso investigar concepções e mitos populares existentes em relação à adoção da
prática de vacinação entre adultos e idosos.
Costa (1985, p.63) faz em seu livro um relato das políticas sanitárias e da
resistência popular no início do século XX, destacando que “ ... o combate à varíola
implicou também em uma intervenção direta sobre o corpo através da vacina. Além
disso, existia o medo generalizado dos possíveis efeitos iatrogênicos da vacina”.
Quando o governo da época promulgou o uso obrigatório da vacina da varíola, ocorreu
uma mobilização popular importante, conhecida como A Revolta da Vacina, que
desencadeou conflitos diretos entre polícia e populares. Quando os militares aderiram à
30
revolta, decretou-se estado de sítio, sufocando-se o movimento, porém a lei da
vacinação obrigatória não entrou em vigor.
Situação semelhante encontramos atualmente em relação ao medo dos
possíveis eventos adversos pós-vacinação, que, acreditamos, circula como pensamento
comum entre os idosos.
O incremento da imunização em adultos movido pelas circunstâncias de
prevenir o tétano, pneumonias, influenza e suas complicações, responsáveis pelo
aumento das internações hospitalares, resultou na implantação de novas vacinas que não
faziam parte do Programa Nacional de Imunizações, ampliando a abrangência de
recursos imunobiológicos para essa população específica.
Em 1997, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) implantou a vacina contra
influenza através de uma Campanha de Vacinação destinada à população a partir de 65
anos, tendo como critérios de escolha os portadores de doenças respiratórias e/ou
cardiovasculares.
Devido à importância dessa vacinação entre os idosos na prevenção das
complicações advindas da gripe, diminuindo os óbitos e as internações hospitalares,
propôs-se em 1998 outra campanha de vacinação, dessa vez para a população acima de
65 anos de forma indiscriminada. Por motivos técnicos essa campanha foi suspensa.
O Ministério da Saúde (MS) no ano de 1999 editou em todo o território
nacional uma ampla campanha de vacinação para idosos a partir de 65 anos. As vacinas
preconizadas foram a dupla adulta (tétano e difteria) e a vacina contra influenza para
prevenção das complicações da gripe. Para idosos residentes em casas geriátricas ou
hospitalizados, destinou-se também a vacina contra o pneumococo para prevenção da
pneumonia.
31
A campanha de 1999 foi considerada pelo MS um sucesso, segundo dados
emitidos no boletim editado pelo grupo de vigilância epidemiológica da gripe; a
cobertura vacinal ficou em torno de 87% (7,5 milhões de idosos vacinados) em todo o
país (Aranda 2000). No Rio Grande do Sul a cobertura vacinal ficou em torno de 80% e
no município de Porto Alegre foi de 86,9% (Porto Alegre,1999), coberturas essas
consideradas excelentes, visto que, nos países do hemisfério norte, nunca ultrapassaram
os 60%.
No ano 2000, o MS reeditou-a, ampliando a faixa etária para 60 anos e mais,
mas a cobertura vacinal foi baixa em Porto Alegre - 65,49% - se considerarmos a meta
de 100% da população acima de 60 anos. O MS preconizou como meta 70% da
população acima de 60 anos e atingiu-se 95,38% de cobertura vacinal. (Porto Alegre,
2000)
Em função desses resultados, a coordenação estadual da campanha realizou um
processo de avaliação da cobertura vacinal. Técnicos das secretarias municipais de
saúde, representando vários municípios do interior do estado, focalizaram como
principal ponto de discussão a baixa cobertura vacinal e suas possíveis causas.
Entre os argumentos enumerados para a baixa adesão à prática de vacinação
contra influenza pelos idosos, foi destacada a pouca informação sobre a eficácia da
vacina, seus possíveis eventos adversos e a diferença entre os sintomas da gripe e do
resfriado (um dos motivos que alegam os idosos para não receberem a vacina é que ela
causa a gripe), acarretando na baixa adesão à vacinação.
Os técnicos relataram que, entre os idosos, são trocadas informações sobre a
sua história vacinal e opiniões acerca da vacinação. Dizem eles:
32
“... que esta vacina o governo implantou para matar os aposentados,
diminuindo os custos do Instituto Nacional de Seguridade Social
(INSS)...”,
“...no ano anterior receberam a vacina e mesmo assim apresentaram
gripe...”,
“...que ficaram sabendo de pessoas que receberam a vacina e tiveram
uma reação forte...”.
Contribuindo com essas informações, encontramos em um jornal da cidade a
seguinte manchete: “Vacinação enfrenta preconceitos”. Essa matéria foi produzida no
município de Pelotas, onde a coordenadora da campanha comenta que as grandes
barreiras enfrentadas pelas equipes da secretaria têm sido o medo das pessoas de se
vacinarem e a confusão entre gripe e doenças parecidas, raízes dos comentários de que a
vacina não funciona. E Thumé (2000, p.21) acrescenta que “os boatos de que a vacina
enfraquece em vez de proteger espalharam-se entre a comunidade e estão fazendo com
que as pessoas não queiram se vacinar”.
As discussões e questões aqui levantadas orientam nosso problema de pesquisa
para destacarmos os propósitos deste estudo, calcados na inexistência de estudos locais
que avaliem o impacto da vacinação contra influenza e que discutam razões de adoção e
rejeição dessa prática na população de idosos.
Tratando-se de uma estratégia de prevenção, acreditamos que, analisando as
práticas implementadas e as atitudes da população, possamos avaliar criticamente as
formas com que temos investido em saúde coletiva.
33
2.5 Objetivos da investigação
Apresentar um estudo de tendência temporal sobre o impacto da implantação
da vacinação contra influenza na casuística da morbidade através das internações
hospitalares e nos óbitos por pneumonias na população acima de 65 anos no município
de Porto Alegre, no período de 1995 a 2001, tendo como marco de análise o ano de
1999 em que foi implantada regularmente a vacinação contra influenza.
Identificar e interpretar as práticas de prevenção em saúde que estão sendo
adotadas pelos idosos em estudo, a partir da análise das concepções e atitudes concretas
dos mesmos frente ao processo saúde-adoecimento, particularizando, o uso dos
imunobiológicos, no caso, a vacina contra influenza.
Os objetivos são complementares e visam a contribuir para o fortalecimento e
credibilidade social das práticas preventivas em saúde do idoso particularmente.
34
3 MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO
3.1 Tipo de estudo
Em um primeiro momento foi realizado um estudo de tendência temporal para o
levantamento da série histórica da morbimortalidade por pneumonias na população
acima de 65 anos, no período de três anos anteriores à implantação da vacina contra
influenza, que data do ano de 1999, e dois anos após a sua implantação na cidade de
Porto Alegre.
O estudo de séries temporais em que uma mesma área ou população é
investigada em momentos distintos de tempo costuma ser classificado como um subtipo
de estudo epidemiológico do tipo ecológico. Esse tipo de estudo de tendência histórica é
empreendido para avaliação das medidas de controle das doenças ou para detecção de
mudanças na estrutura epidemiológica da doença considerada (Almeida Filho, 1999).
A base de dados para a morbidade foi a Autorização de Internação Hospitalar
do SUS (AIH) de Porto Alegre, que tem como fonte de registro a identificação do
hospital, a causa da internação, as faixas etárias e o custo para o sistema de saúde, esses
dados encontrando-se condensados no sistema denominado Tabwin.
Para o estudo da mortalidade, a base de dados foi o Sistema de Informação em
Mortalidade (SIM), que tem como fonte de registro a Declaração de Óbito (DO)
ocorrido no município de Porto Alegre.
35
Em um segundo momento, associado ao estudo epidemiológico, foi realizado
um estudo de abordagem qualitativa, utilizando a entrevista estruturada para a coleta de
dados visando a conhecer e compreender o grau de informação, as concepções e atitudes
dos idosos acerca do processo saúde-doença e as práticas preventivas adotadas,
privilegiando a proteção específica configurada na prática de vacinação. A entrevista
realizou-se com o auxílio de um instrumento-guia (ANEXO A).
Foram selecionados aleatoriamente 30 idosos que freqüentam o serviço de
geriatria da US Santa Marta. O número de idosos foi definido considerando-se os
estudos franceses e, particularmente, de Vergès, que sugere esse número de sujeitos
como adequado à obtenção da saturação dos dados coletados (Vergès, 1991/1992). Esse
referencial é bastante utilizado para coleta de dados em estudos de representações
sociais.
No que se refere às motivações em vacinar-se ou não, desenvolvemos,
paralelamente à campanha de vacinação dos idosos em 2001, uma enquete com 108
idosos no Mercado Público de Porto Alegre, onde havia uma sala de vacinação, com o
objetivo de aproveitarmos o momento da campanha, o que posteriormente
complementaríamos com os resultados obtidos através das entrevistas. Isso agregou um
universo maior de idosos especificamente nesse aspecto.
Portanto, obtivemos respostas sobre esse tema de 138 idosos, se computarmos os
108 da campanha e os 30 selecionados nas entrevistas.
A opção por um estudo híbrido baseia-se no que sugere Minayo (1997, p.22)
ao referir que “O conjunto de dados quantitativos e qualitativos não se opõem, ao
contrário se complementam, pois a realidade abrangida por eles interage
dinamicamente, excluindo qualquer dicotomia”. Essa argumentação e o tema a ser
36
estudado, acreditamos, nos impuseram uma abordagem plural no sentido de captarmos a
complexidade da questão a ser analisada.
3.2 População
A população em estudo é usuária dos serviços públicos de saúde, ou seja, do
Sistema Único de Saúde (SUS), e se encontra na faixa etária acima de 65 anos. Essa
faixa etária escolhida encontra-se relacionada no grupo de risco mais suscetível para as
complicações respiratórias que estão associadas ao vírus da influenza, conforme o
Centers for Disease Control and Prevention
(CDC,1998), por isso a indicação do uso da
vacina contra influenza.
No estudo qualitativo ampliamos a faixa etária e investigamos a partir de 60
anos, para abrangermos amplamente as diferentes possibilidades de práticas preventivas
adotadas pelos idosos.
3.3 Coleta de dados
Os dados de morbidade e mortalidade do estudo da série temporal foram
coletados do sistema Tabwin e do Sistema de Informação em Mortalidade(SIM),
respectivamente.
No Tabwin os dados estão disponíveis a partir do ano de 1995 até setembro de
2001, momento em que coletamos os últimos dados (dezembro de 2001). Esses dados
estão disponíveis no site do DATASUS, e, para acessá-lo, é necessário um softwear
específico. A coleta desses dados foi realizada nas dependências da Gerência de
Regulação de Serviços do SUS, da Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre
(SMS), com o auxílio de um servidor habilitado no manejo de acesso aos dados.
37
No SIM os dados estão disponíveis a partir de 1996; até dezembro de 2001, os
dados eram preliminares. A coleta de dados fez-se nas dependências da Equipe de
Informação (CEDIS) da Coordenadoria Geral de Vigilância em Saúde (CGVS) da SMS,
através do auxílio de uma servidora habilitada no acesso aos dados de mortalidade.
Quanto aos dados qualitativos, estruturaram-se as perguntas abertas com o
objetivo de conhecer e compreender o grau de informação, as idéias e comportamentos
dos idosos acerca do processo saúde-doença e suas práticas de prevenção. As perguntas
fechadas foram relacionadas a dados sócio-demográficos, ao bairro de procedência,
sexo e idade. Esses dados coletaram-se no período de outubro a novembro de 2001,
após a autorização do Comitê de Ética da Secretaria Municipal da Saúde.
As entrevistas ocorreram no ambiente de espera das consultas de geriatria. De
um modo geral os idosos foram receptivos a essa intervenção, facilitando o processo de
coleta de dados. Procedia-se primeiro a uma conversa informal e, no decorrer do
diálogo, propunha-se a realização de uma entrevista, que seria gravada e mantida sob
sigilo. Aos que aceitavam participar do estudo, fazia-se a leitura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido, assinado pelo entrevistador e pelo entrevistado.
Após era escolhido um nome fictício e a entrevista se concretizava. Apenas uma idosa,
durante a entrevista, mostrou-se melancólica, os demais demonstravam bastante
otimismo em relação a seu cotidiano.
As entrevistas foram levadas a termo tão somente pela autora deste estudo.
3.4 Análise dos dados
Os dados quantitativos foram analisados estatisticamente pelo programa
Statistical Package for Social Science (SPSS 8.0 for windows). Utilizamos a assessoria
do Núcleo de Apoio Estatístico da UFRGS (NAE), que constou de três momentos:
38
orientação sobre os dados necessários, confecção da tabela de dados e análise dos
dados.
As entrevistas foram gravadas e transcritas para que se processasse o trabalho
de análise de conteúdo temático proposta por Minayo (1996). Esse tipo de análise é
descrito em três etapas: organização, classificação das informações e análise final. Na
fase de organização (ordenação do material), procede-se à transcrição da fita e leitura do
material para a familiarização com o seu conteúdo. Na classificação, passa-se à leitura
exaustiva e repetida do material, para compreender melhor as informações coletadas e a
identificação das idéias centrais e dos aspectos relevantes. Finalmente, procede-se à
identificação do conteúdo subjacente ao que é manifestado. Além das informações
estatísticas, fica-se atento a questões ideológicas, tendências e outras questões referentes
ao objeto de estudo.
Assim, as questões do instrumento-guia da entrevista forneceram a base da
categorização temática que, associada à literatura e ao referencial teórico adotado,
compuseram as análises.
Primeiramente fez-se o processo de pré-análise do conteúdo, o qual se
construiu a partir das respostas dos idosos em relação às questões formuladas sobre a
concepção de saúde, cuidados com o corpo, atividades realizadas e a prática de
vacinação.
A análise final originou a formulação de três categorias que emergiram das
questões formuladas no instrumento-guia; as subcategorias emergiram das respostas dos
idosos, após leitura exaustiva e compreensão das falas.
A primeira categoria denominou-se “o processo saúde-doença”, as sub-
categorias “dimensão biológica, social e bio-sócio-cultural”. A segunda denominou-se
39
“cotidiano e corpo” e as subcategorias “imagem do corpo”, “mídia e dieta”,
“medicalização do corpo” e “lazer e trabalho”. A terceira categoria analisada chamou-se
“vacinar-se ou não” – as motivações entre os idosos dando origem às subcategorias
“noção normatizadora”, “noção preventiva” e “influências dos meios de comunicação
formal e informal”.
3.5 Considerações éticas
Obedeceu-se aos princípios éticos em relação ao acesso e análise dos dados,
respeitando as normas de pesquisa em saúde referidas pela Resolução n° 196, de 10 de
outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde. (Brasil, 1996)
Conforme a Resolução supracitada, o presente estudo constitui-se em uma
pesquisa que envolve seres humanos e que, portanto, deve atender às exigências éticas e
científicas fundamentais. A eticidade da pesquisa implica no consentimento livre e
esclarecido dos indivíduos-alvos e na proteção a grupos vulneráveis e aos legalmente
incapazes; no compromisso em oferecer o máximo de benefícios e o mínimo de danos e
riscos; na relevância social da pesquisa com vantagens significativas aos sujeitos do
estudo.
Para respeitar esses princípios, os idosos foram esclarecidos sobre os objetivos
da pesquisa e como seria realizada, após lhes foi apresentado um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (ANEXO B), no qual constou a assinatura do
entrevistado mediante a ciência do conteúdo desse documento e sua autorização.
O projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética da Secretaria Municipal da
Saúde de Porto Alegre para apreciação e aprovação, através de documento elaborado
40
pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul.
Após apreciação e aprovação do Comitê de Ética da Secretaria Municipal da
Saúde de Porto Alegre, em outubro de 2001, iniciaram-se as entrevistas no serviço de
geriatria da US Santa Marta e coletaram-se os dados secundários após autorização dos
servidores responsáveis pelo fornecimento das informações.
41
APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS - PARTE I
4 VACINAR-SE É PRECISO? ADESÃO E CREDIBILIDADE SOCIAL
DA VACINAÇÃO CONTRA INFLUENZA ENTRE OS IDOSOS
4.1 A vacina, aspectos técnicos e epidemiológicos
A influenza, também denominada gripe pelos leigos, constitui importante causa
de morbidade e mortalidade, principalmente em pessoas idosas e em pacientes com
cardiopatias e/ou pneumopatias crônicas.
As principais manifestações clínicas são as seguintes: “...febre, calafrios,
cefaléia, mal-estar geral, anorexia, mialgias, tosse seca, coriza hialina, hiperemia
conjuntival e da orofaringe...”( Amato Neto,1991).
A transmissão do vírus da influenza dá-se por contato direto, através de
gotículas nasofaríngeas, ocorrendo nas 24 horas que precedem o aparecimento dos
sintomas e durante todo o período de estado da doença. O período de incubação da
influenza dura de um a três dias.
A doença é mais freqüente em crianças, mas as complicações pulmonares são
mais comuns em adultos, sendo constituídas por pneumonia primária pelo próprio vírus,
pneumonia bacteriana secundária ou pneumonia mista (viral e bacteriana).
Segundo o Rio Grande do Sul (1997), em dados obtidos da norma técnica de
vacinação contra influenza, encontramos o seguinte:
42
“As infecções respiratórias agudas representam um grave
problema de saúde pública devido à elevada morbidade e
mortalidade, principalmente no grupo de idosos. A influenza é a
virose respiratória que mais contribui para o agravamento de
doenças respiratórias neste grupo populacional, aumentando assim
a mortalidade”.
Em relação ao aspecto da imunização, encontramos os seguintes tipos de
vacinas contra influenza: vacinas de vírus inativados contendo o vírus completo, vacinas
contendo frações virais, vacinas contendo antígenos de superfície do vírus e vacinas de
vírus atenuado.
Em nosso meio, utilizamos a vacina composta de três cepas do vírus,
fracionados e inativados. Todo o ano a composição é atualizada segundo as
recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em nosso país, no Estado de
São Paulo, existe uma organização não governamental (ONG) chamada Projeto
VigiGripe, que realiza a vigilância epidemiológica do vírus da gripe. Através de
parcerias com as secretarias municipais de saúde, determinados profissionais, após um
treinamento específico, realizam a coleta de swab da região nasal das pessoas que
apresentam a sintomatologia da gripe. O swab é acondicionado num tubo de ensaio sob
congelamento e enviado para essa ONG que, em parceria com a Fundação Osvaldo
Cruz, Instituto Adolfo Lutz e Instituto Evandro Chagas, realizam a identificação e
caracterização do vírus da influenza. O VigiGripe contribui para que os dados
provenientes do Brasil tenham maior representatividade na rede mundial de vigilância
coordenada pela OMS. Semanalmente podemos acompanhar a atualização da vigilância
epidemiológica do vírus da gripe através do site do VigiGripe.
A eficácia das vacinas varia com a idade, o tempo após a vacinação, a
imunocompetência do receptor e o grau de similaridade entre as cepas contidas na
43
vacina e aquelas que estão circulando na comunidade. Idosos geralmente desenvolvem
menores títulos de anticorpos do que crianças e adultos, entretanto, a vacina proporciona
uma proteção razoável contra as complicações, hospitalizações e óbitos, 50 a 95%
(Bricks, Resegue e Rodrigues, 1997).
Os eventos adversos mais comuns descritos são “...reações locais como
hiperemia, edema e dor, com duração de um a dois dias, poucas vezes se observam
reações sistêmicas (febre, mal-estar geral, mialgias)” (Amato Neto,1991). Dados da
Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre revelam que, no ano de 1999, foram
notificados 12 casos de eventos adversos num universo em torno de 80 mil doses
aplicadas. No ano de 2000, notificaram-se 15 casos após aplicação de quase cem mil
doses. O que demonstra a segurança desta vacina devido a sua baixa reatogenicidade.
Bricks, Resegue e Rodrigues (1997) em uma revisão científica sobre a vacina
contra influenza afirmam que as vacinas contendo o vírus total inativado e as vacinas
contendo apenas subunidades não são infecciosas e não causam influenza, portanto, o
surgimento de doença respiratória aguda após a vacinação é casual e não tem relação
com a vacina.
44
4.2 Vacinar-se ou não: as motivações entre os idosos
Encontramos uma freqüência significativa de idosos que recebem a vacina
contra influenza, desde que iniciaram as campanhas de vacinação. No universo dos
trinta entrevistados, vinte e cinco recebem a vacina e apenas cinco não admitem ser
vacinados contra influenza. Encontramos diferentes motivações que levam à adesão ou
não a essa prática.
Os resultados encontrados nas entrevistas foram relacionados aos dados da
enquete que realizamos para investigar as motivações existentes entre os idosos em
aderir ou não a essa prática preventiva, durante a Campanha de Vacinação dos Idosos
do ano 2001, na sala de vacinas montada para esse fim na sede do Mercado Público, em
Porto Alegre.
Dessa enquete com 108 idosos, 57 responderam que recebem a vacina
anualmente e 51 se recusam a receber a vacina contra influenza.. Os motivos de adesão
e recusa veremos na análise das subcategorias.
Portanto, reunindo os dados das entrevistas realizadas entre os 30 idosos do
estudo qualitativo e os da enquete, obtivemos um universo de 138 idosos, no qual 82
aderiram à prática da vacinação e 56 se recusam a aderir a essa prática. Esses números
representam, em percentuais, 59% de adesão e 41% de recusa. Essa constatação mostra
que existe um espaço de intervenção dos serviços trabalhando no sentido de mudar
esses índices.
A partir da categorização temática, encontramos três subcategorias que
nortearam as motivações relatadas pelos entrevistados; a seguir analisamos cada uma
delas.
45
A noção normatizadora: “é obrigatório”
A noção normatizadora que permeia historicamente as práticas em saúde, sejam
elas de cunho educativo ou assistenciais, está presente na fala dos idosos, ao referirem
as razões de realizarem ou não essa prática preventiva.
Entre os motivos de recusa da vacinação, encontramos o poder exercido pelos
médicos sobre os corpos dos indívíduos, criando uma relação de dependência, através
de orientações norteadoras de um comportamento. Dizem eles que não aderem à pratica
de vacinação quando o médico contra-indica:
“O meu médico cardiologista diz que não devo fazer a vacina. Até
eu perguntei para ele, por que, doutor? ‘Não, não faz, não vai
fazer. A gripe todos os anos muda, não é a mesma’”(Aurora).
“... fiz uma vez e fiquei gripada, então meu médico homeopata
disse que eu nunca mais fizesse” (Elisa).
Entre os motivos de se receber a vacina, encontramos claramente a tendência
normatizadora das práticas preventivas, quando demonstram uma preocupação com o
julgamento do médico ou do porquê vão fazer a vacina apenas por “a pedido” do
médico. Como diz Maria:
“Eu quase não me gripo, mas eu pensei, tem a vacina prá gente se
vacinar, né! Se eu não me vacinar e me dá uma gripe forte, daí eu
vou ao médico, o que é que o médico vai dizer? A senhora fez a
vacina? Não fiz, e agora...”
A questão normatizadora da obrigatoriedade para incorporar práticas preventivas
fica evidenciada no século XIX, quando da descoberta da vacina contra a varíola,
quando, na Grã-Bretanha de 1853, era compulsório a vacinação, depois na Bavária,
Dinamarca, Suécia, Würtemburg e Prússia. Na Grã-Bretanha, logo foi criada uma
46
sociedade para impedir o caráter compulsório da vacinação contra a varíola. Em 1899,
os pais podiam questionar a vacinação, mas somente em 1948 foi suspensa a vacinação
compulsória das crianças, continuando a voluntária (Gordon, 1997).
No Brasil, temos o famoso episódio denominado A Revolta da Vacina, quando,
no início de 1900, o governo tentou criar uma lei de obrigatariedade para realização da
vacina contra a varíola, desencadeando um movimento popular contrário a essa medida,
que culminou no enfrentamento do povo com a polícia, resultando até mesmo em
mortes e em que o governo suspendesse a citada lei (Costa, 1985).
Esses episódios estão fundamentados em uma prática de promoção da saúde
baseada na educação que tenta regrar a vida das pessoas através da metodologia da
transmissão do conhecimento, prevalente desde o início do século XX, conforme vimos
em Rosa (1989).
A noção preventiva: “é eficaz”
A noção preventiva está presente significativamente na maioria das respostas,
tanto nos motivos que levam os idosos a receberem a vacina, como nos motivos de não
aderir à mesma.
Essa noção de prevenção, podemos apontar-lhe a origem na descoberta da
bacteriologia e imunologia datada dos finais do século XIX e que foi sendo incorporada
ao longo dos anos pela população em geral.
Autores como Gastaldo (1997) nos auxiliam na compreensão de que,
provavelmente, esse conhecimento ocorreu pela ênfase que sempre foi dispensada aos
programas de educação em saúde, desenvolvidos sob a influência da teoria da
prevenção da doença, e nos quais a saúde é percebida como uma responsabilidade
pessoal. Tradicionalmente a educação em saúde tem sido considerada como uma prática
47
positiva a ser integrada aos cuidados de saúde, pois veicula informações e sugere
alternativas para indivíduos, famílias ou grupos em termos de prevenção à doença e de
promoção da saúde.
Encontramos com uma maior freqüência dez respostas entre os vinte e cinco
idosos que responderam positivamente pelo fato de não terem tido mais gripe. Vejamos
alguns relatos sobre essa afirmativa. Segundo Verônica: “Fiz a vacina para não ficar
gripada, seguido eu ficava gripada. Foi muito bom prá mim, adorei”. Lucrécia diz: “Fiz
a vacina para prevenir; antes da vacina, quando tinha gripe, ia para a cama, agora não.
Temos que manter a saúde”. Carlinda argumenta: “Fiz a vacina para evitar a gripe, para
não ficar abatida, antes tinha muita gripe”. Já Neida foi categórica em seu depoimento;
diz ela: “Fiz a vacina para não gripar e não me gripei, né! Depois que eu tô fazendo a
vacina não me gripei mais. Não tive nem ameaça da gripe”.
Para confirmar o principal motivo de receber a vacina contra influenza, nesse
grupo, o estudo realizado durante a campanha de 2001 revelou que, entre os 108
participantes, dos 57 idosos que responderam positivamente à enquete, 14 afirmaram
que o motivo mais freqüente para se vacinarem é “porque não tiveram mais gripe”, 13
respostas indicaram que é para “prevenirem a gripe”, 7 responderam que “acreditam no
efeito” e 6 responderam que é para “não se resfriarem”.
Outro motivo que encontramos, significativo, (quatro respostas), em relação à
adesão à prática da vacinação, foi o seguinte: para não ter gripe forte, apenas uma
gripe fraca. Aqui ainda se faz presente a noção da prevenção, pois mesmo ficando
“gripados”, não se evidenciaram mais as complicações advindas de uma gripe.
Verificamos tais afirmações nos relatos seguintes. Rosa diz: “ Faço a vacina para não ter
aquelas gripes fortes, não é! Eu tenho tido assim, começa a gripe e, em dois dias, não
48
tenho mais...”; Lúcia comenta: “Vivia sempre gripada, ultimamente tô boa, tem uma
gripezinha só, vem, mas não fica. São três anos que é uma beleza, isto foi bom mesmo”.
Evidenciou-se entre os idosos que fizeram a vacina e mesmo entre os que não
quiseram fazê-la o objetivo de prevenir gripes, sem no entanto acreditarem nessa vacina.
Diz Margarida: “Já fiz quatro vezes, mas sempre que faço a vacina, me dá a gripe pior,
pior, dura meses. Não vou fazer mais, passo muito mal...” e Joça reforça dizendo: “Fiz a
primeira vez e tive uma gripe pavorosa .... Não tomei mais e não tomo, prá mim não foi
bom”.
Para reforçar essas afirmações, também encontramos no estudo realizado durante
a campanha de 2001, que, dentre os 108 que participaram, 51 dos que responderam
negativamente à enquete apresentaram uma freqüência significativa (10 respostas) de
recusa à vacina contra influenza, porque, após tomarem a vacina, tiveram gripe, seguida
de 4 idosos que não acreditam no efeito da vacina.
Ficou claro que tanto a noção normatizadora quanto a noção da prevenção estão
diretamente relacionadas às práticas de educação em saúde que se confundem com as
práticas de prevenção em saúde. Revelando uma forte tendência ainda existente nas
práticas dos profissionais de saúde de interferirem no corpo dos sujeitos através da
transmissão do conhecimento calcada em aspectos informativos apenas.
A influência dos meios de comunicação: formais e informais
Na fala de nossos entrevistados identificamos uma rede de informação sobre
saúde que chega até eles, tanto formal, a mídia e os serviços; quanto informal, os
vizinhos, os familiares e outros idosos.
Alguns idosos afirmam que foram receber a vacina porque ouviram no rádio ou
televisão que havia disponível a vacina contra a gripe. Carlos afirma: “Fiz a vacina
49
porque eu escuto no rádio, na televisão, que é muito bom e deu certo prá mim, eu não
tenho me gripado...”
No artigo de Rondelli (1995), a autora faz uma exposição dos diferentes meios
de comunicação para se tratar do tema saúde-doença, das publicações científicas até os
programas de entrevistas que utilizam um leigo para “traduzir” o discurso produzido
pelo profissional da saúde. Aponta que a televisão, particularmente, aparece como um
lugar da amplificação do intercâmbio dos discursos construídos em vários campos do
saber, conseguindo socializar algumas informações sobre saúde. Por outro lado, ressalta
a dificuldade de encontrar na mídia um comportamento homogêneo em relação à saúde,
havendo uma compartimentação e sobreposição dos discursos expressos nos vários tipos
de publicações.
Identificamos que existem muitos interesses, de ordem política e social,
subjacentes à informação veiculada pela mídia, acarretando muitas vezes informações
truncadas, descompromissadas com a realidade. No campo da saúde existe uma
prevalência de programas pautados e apresentados de forma dramática, curiosa ou
apelativa, em detrimento de programas com cunho informativo e educativo de maneira
a elucidar a população, o que dificulta o trabalho realizado pela saúde coletiva.
Outros idosos fazem a vacina porque amigos, parentes e profissionais da saúde a
indicaram. Pedro fala: “ Fiz a vacina por recomendação de pessoas que acham que a
vacina faz bom efeito. Eu nunca me gripo, mas fiz e não fiquei gripado, estou
satisfeito”; Tereza revela: “Fiz a vacina por convite, o posto convidou, eu sempre ficava
muito gripada, mas isto é muito bom ... consegui eliminar a gripe”.
Mas há os que não fizeram a vacina contra influenza, entre os idosos, porque
ouviram que não adiantava, como afirma Érica em seu depoimento: “Não quis fazer,
50
uns dizem que é bom, outros dizem que não é. Eu tenho gente da família que fez a
vacina e se gripou...”.
Encontramos uma contribuição em Rondelli, quando analisa a estreita relação
entre o discurso elaborado sobre o corpo e a cultura:
“O nível de complexidade das elaborações discursivas sobre o
corpo depende do repertório que se tem para descrevê-lo, algo
estreitamente ligado à cultura ... tais elaborações sustentam-se em
padrões de linguagem que são recrutados para descrever esta
coisa, a mais próxima do indivíduo, o seu corpo e o corpo do
outro” (Rondelli 1995, p.39).
Essas elaborações discursivas passam a funcionar como guia das práticas
exercidas sobre o corpo, o que identificamos na construção do nosso problema de
estudo, quando lemos em Thumé (2000, p.21) que “os boatos de que a vacina
enfraquece em vez de proteger espalharam-se entre a comunidade e estão fazendo com
que as pessoas não queiram se vacinar”.
A partir desses resultados discursivos, podemos afirmar que, em nenhum
momento, houve referência nos idosos à prevenção das complicações da gripe e sua
principal decorrência, a pneumonia.
Isso atesta, ao nosso ver, que as informações veiculadas não contemplam essas
complicações e a magnitude que isso representa ao tratarmos de morbimortalidade por
pneumonia. A partir disso, podemos afirmar que a desinformação ou a incompletude da
informação aliada a outros aspectos são evidentes em se tratando dos processos de
imunização em adultos e, em especial, no caso da influenza.
Essa constatação assume maior relevância ao considerarmos o impacto positivo
dessa prática de proteção específica em nosso meio, o que nos propusemos a evidenciar
ao apresentarmos o estudo da série temporal no próximo item deste capítulo.
51
4.3 A introdução da vacina contra influenza e seu impacto na
morbimortalidade por pneumonia entre idosos, 1995 - 2001, Porto Alegre
4.3.1 O perfil da morbimortalidade por pneumonias de 1995 a 2001: algumas
considerações
Dentre os nossos objetivos consta a verificação das mudanças ocorridas no perfil
de morbimortalidade por pneumonias, que ocorreram após a implantação da vacina
contra influenza em nosso meio, no sentido de discutir não só a eficácia dessa prática,
mas também seu impacto na saúde da população idosa, como também subsidiar a
discussão sobre as motivações para a adesão advindas da credibilidade social da mesma.
Para possibilitar a verificação dessas mudanças, analisamos os dados de
internações hospitalares por pneumonias a partir do ano de 1995, quando da
implantação do sistema Tabwin e os dados de mortalidade a partir do ano de 1996,
quando da implantação do Sistema de Informação em Mortalidade.
Encontramos, na análise dos dados tanto de morbidade quanto de mortalidade,
os seguintes tipos de pneumonias: pneumonias por Staphylococcus, outras pneumonias
bacterianas, pneumonia bacteriana não especificada, pneumonia não especificada e a
broncopneumonia não especificada.
Nos detivemos na análise dos dados referentes às pneumonias, por se tratar de
uma doença aguda, que, geralmente, resulta da complicação de uma gripe
principalmente entre os idosos. Segundo o Centers for Disease Control and Prevention
(CDC,1998), a vacina contra influenza diminui as internações hospitalares por
pneumonia, reduzindo os custos das internações por essa patologia, por isso a indicação
da vacina para os idosos acima de 65 anos. Além dos custos, podemos acrescentar as
implicações ocasionadas pela hospitalização, o ambiente estranho, a separação da
52
família e outros laços afetivos, que representam sempre fonte de estresse para o
indivíduo.
O Ministério da Saúde, a partir de 1999, introduziu a vacinação contra influenza
aos maiores de 65 anos através da Campanha Nacional dos Idosos, ampliando no ano
2000 a faixa etária para a vacinação a partir dos 60 anos. No entanto, optamos por
analisar os dados na faixa etária acima de 65 anos, por ser considerada a mais
vulnerável às complicações da gripe (CDC,1998).
Em nosso município temos a peculiaridade da realização, em 1997, de uma
campanha de vacinação contra influenza destinada somente à população na faixa etária
de mais de 65 anos e que, comprovadamente, era portadora de doenças cardio-
respiratórias.
Para discutirmos o impacto dessa prática em nosso meio, analisamos o banco de
dados Tabwin, que condensa os dados referentes às internações hospitalares, obtidos
através da AIH (Autorização de Internação Hospitalares) e o Sistema de Informação
sobre Mortalidade (SIM), que apresenta os dados referentes à mortalidade através do
atestado de óbito.
Os dados referentes ao ano 2001 são parciais, estendem-se somente até o mês de
setembro; os dados totais estarão disponíveis a partir do mês de abril de 2002, o que
ocasionaria um atraso na apresentação desta dissertação. Consideramos, porém, que os
dados obtidos até o mês de setembro são significativos, visto os casos de pneumonias se
concentrarem nos meses de inverno.
53
4.3.2 O perfil de morbidade por pneumonias após a introdução da vacina contra
a influenza de 1995 a 2001
Na figura 1, podemos notar que, no ano de 1997, ocorreu uma queda
significativa na média mensal de internações por pneumonias, aumentando em 1998
novamente. A partir de 1999 até 2001, verificamos uma tendência à queda na média das
internações por pneumonias.
ANO
2001200019991998199719961995
Média Pneumo por mês
110
100
90
80
70
60
Fonte: Tabwin, Porto Alegre, pesquisa direta 1995 – 2001(dados parciais).
FIGURA 1 – MÉDIA MENSAL DAS INTERNAÇÕES POR PNEUMONIAS,
PORTO ALEGRE, 1995-2001
54
Analisando a figura um, identifica-se que, antes de 1995, os índices situavam-se
em patamares baixos, o que pode ser explicado não pelo baixo índice de pneumonias,
mas em razão de que, em 1995, se iniciou o sistema Tabwin; provavelmente, pois esses
índices são devidos ao sub-registro, mostrando uma média mensal reduzida, apenas 76
internações mensais.
Em 1997, como já mencionamos, ocorreu em Porto Alegre uma campanha de
vacinação contra influenza numa população restrita, ou seja, para maiores de 65 anos e
portadores de doença cárdio-respiratória. Isoladamente, podemos verificar que houve
uma queda na média de internações por pneumonias.
No ano de 1998, em que não ocorreu a campanha de vacinação contra influenza,
verificamos um aumento dessa média de internações.
A partir de 1999, ano em que efetivamente se estabeleceu a campanha de
vacinação contra influenza, constatamos que ocorre uma tendência à queda na média de
internações por pneumonia.
Os dados encontrados confirmam o que encontramos na literatura, mostrando
que um dos principais objetivos da vacinação contra influenza é diminuir a gravidade da
gripe e, conseqüentemente, complicações tais como as internações hospitalares por
pneumonias.
A vacina contra a influenza tem uma eficácia limitada, em torno de 50 a 80%,
por ser produzida por apenas 3 tipos de vírus. Esses vírus, mesmo sendo atualizados
anualmente, não são os únicos, pode ocorrer no meio ambiente a circulação de um tipo
de vírus não existente na composição da vacina, resultando na moléstia. Mesmo assim,
seu impacto é significativo na presença desses eventos.
55
A figura 2 demonstra a taxa de internações por pneumonias em cada dez mil
habitantes e revela semelhante comportamento em relação aos dados da figura 1.
No ano de 1997 ocorreu uma diminuição na taxa de internações hospitalares por
pneumonias em cada dez mil habitantes, verificando-se novamente o seu aumento em
1998.
A partir de 1999, ano em que foi implantada regularmente a vacinação contra
influenza, a mesma figura demonstra uma tendência à queda nessa taxa:
ANO
2001200019991998199719961995
taxa pneumo/10000 hab
11
10
9
8
7
6
Fonte: Tabwin, Porto Alegre, pesquisa direta 1995 – 2001.
FIGURA 2 – TAXA DE INTERNAÇÕES HOSPITALARES POR
PNEUMONIAS, PORTO ALEGRE, 1995 – 2001
A figura 3 mostra o percentual das pneumonias em relação às outras doenças
respiratórias (asma, enfisema, pneumotórax).
56
ANO
2001200019991998199719961995
% pneumo sobre doença resp
30
28
26
24
22
20
18
Fonte: Tabwin, Porto Alegre, pesquisa direta, 1995-2001.
FIGURA 3 – PERCENTUAL DE INTERNAÇÕES POR PNEUMONIA EM
RELAÇÃO ÀS DEMAIS DOENÇAS RESPIRATÓRIAS, PORTO ALEGRE,
1995-2001
57
Verificamos a mesma queda no ano de 1997, aumentando em 1998 e vindo a
cair novamente o percentual das pneumonias em relação às doenças respiratórias a partir
de 1999. Esses índices confirmam o verificado nas figuras anteriores: uma tendência à
queda nas internações hospitalares por pneumonias após a implantação da vacina contra
influenza.
Esses resultados têm um significado importante para o sistema de saúde, já que
diminuem as internações hospitalares, conseqüentemente, diminuem os custos
destinados ao setor hospitalar, havendo a possibilidade de os recursos financeiros serem
destinados a outras ações prioritárias.
A figura 4 apresenta o coeficiente de morbidade que representa o número de
casos de uma doença (pneumonia) sobre a população acima de 65 anos. Esse coeficiente
nos permite avaliar o comportamento da doença ao longo dessa série histórica numa
população com crescimento positivo.
Fonte: Dados de morbidade – Tabwin, dados da população – DATASUS
Porto Alegre, 199 –2001. Gráfico produzido por MAMV.
FIGURA 4 – COEFICIENTE DE MORBIDADE POR PNEU-
MONIAS, PORTO ALEGRE, 1995 – 2001
COEF. MORBIDADE.
0
50
100
150
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
COEF.
MORBIDADE.
58
Comprovamos através do traçado da figura a tendência à queda no
comportamento das internações por pneumonias, após a implantação da vacina contra
influenza em Porto Alegre, tendência que se configura também no Brasil,
principalmente nos estados da região sul.
Nos dados divulgados pelo Sistema Único de Saúde, de 1998 a 2000, houve uma
queda de 18% (179.000) em número de internações por pneumonia na população
brasileira. Nesse mesmo período, o maior impacto deu-se na região sul e sudeste, onde
houve redução de 27,1% em registros de internação pela doença (Brasil, 2001).
Também encontramos em nossa análise de dados do Tabwin que, no período de 1996 a
2000, verificou-se uma redução de 25,2% (301) nas internações hospitalares por
pneumonia no município de Porto Alegre .
59
4.3.3 O perfil de mortalidade por pneumonias após a introdução da vacina contra
influenza, de 1996 a 2001:
ANO
2001200019991998199719961995
MPNE_MES
28
26
24
22
20
18
16
14
Fonte: SIM, Porto Alegre, pesquisa direta 1996 –2001.
FIGURA 5 – MÉDIA MENSAL DA MORTALIDADE POR PNEUMONIAS,
PORTO ALEGRE, 1996 – 2001
A figura 5 demonstra semelhante tendência à queda no que se refere à
mortalidade por pneumonias ocorridas após a implantação da vacinação contra
influenza.
Verifica-se uma diminuição da média da mortalidade por pneumonias no ano de
1997, voltando a aumentar em 1998 e apresentando tendência à queda, novamente, a
partir de 1999.
60
Observamos novamente a tendência à queda na figura 6, que apresenta a taxa
mensal por pneumonias em relação à taxa mensal de mortalidade geral. Verificamos
que, tanto na mortalidade quanto na morbidade, também houve queda em 1997,
aumentando em 1998 e voltando à mesma tendência decrescente a partir de 1999 na
mortalidade por pneumonias em relação à mortalidade geral:
ANO
2001200019991998199719961995
mort pneumo/mes sobre mort geral/mes
3,2
3,0
2,8
2,6
2,4
2,2
2,0
1,8
1,6
1,4
Fonte: SIM, Porto Alegre, pesquisa direta 1996- 2001.
FIGURA 6 – TAXA MENSAL DE MORTALIDADE POR PNEUMONIAS EM
RELAÇÃO À TAXA MENSAL DE MORTALIDADE GERAL, PORTO
ALEGRE, 1996-2001
61
A figura 7 demonstra os coeficientes de mortalidade por causa, pelos quais
calculamos o número de óbitos ocorridos por determinada causa sobre a população
exposta ao risco de morrer por essa causa.
Fonte: Dados de mortalidade – Tabwin, dados da população – DATASUS
Porto Alegre, 1996 –2001. Gráfico produzido por MAMV
FIGURA 7 – COEFICIENTE DE MORTALIDADE POR PNEU-
MONIAS, PORTO ALEGRE, 1996 – 2001
Concluindo, verificamos que também está ocorrendo uma tendência à queda
nos óbitos por pneumonias sobre a população em estudo.
Dessa forma, novamente podemos inferir que o uso da vacina contra influenza
tem influenciado no comportamento dos óbitos por doenças respiratórias, em particular
as pneumonias, decorrentes das complicações da doença influenza. Sabe-se que, em
relação à eficácia da vacina, os idosos geralmente desenvolvem menores títulos de
anticorpos do que crianças e adultos, entretanto a vacina proporciona uma proteção
razoável contra as complicações, hospitalizações e óbitos, 50 a 95% (Bricks, Resegue e
Rodrigues 1997).
COEF.MORTALIDADE
0
100
200
300
400
1996
1997
1998
1999
2000
2001
COEF.MORTA
LIDADE
62
Outra análise importante realizada através dos dados de mortalidade no SIM
foi que, no período de 1996 a 2000, houve uma diminuição de 34,3% (105) na
mortalidade por pneumonias verificadas em Porto Alegre.
A análise da série temporal permite-nos avaliar os dados em relação ao tempo.
Podemos inferir, portanto, após a análise das figuras, que, com a implantação da vacina
contra influenza em nosso meio, vem ocorrendo tendencialmente uma queda em relação
à morbidade e mortalidade por pneumonias. O ano de 1997 é decisivo nessa análise,
porque, mesmo com uma campanha limitada, observou-se uma queda nesse ano
visualizada em todas as figuras analisadas no estudo. Esse dado de 1997 é inédito, visto
que os demais municípios do país não realizaram essa investigação, mesmo o município
de São Paulo, que realizou a vacinação contra influenza em 1996 e 1997 (Aranda,
2000).
Esses dados nos levam, na segunda parte deste estudo, a discutir concepções e
práticas de saúde entre os idosos, as quais, acreditamos, influenciaram na motivação e
adesão a práticas preventivas em saúde e, particularmente, na adoção de práticas
relativas à proteção específica como a vacinação. Essas práticas configuram-se em
“novidade” nessa faixa etária.
Essa discussão, pensa-se, é necessária na compreensão da eficácia das propostas
de promoção de saúde e, em especial, nas estratégias educativas em saúde que temos
veiculado à população. A valorização dos aspectos preventivos em uma nova ótica de
pensar a saúde passa por questionarmos a adequação dessas propostas e a credibilidade
das nossas ações junto aos indivíduos como um todo e aos idosos em particular.
63
PARTE II
5 Práticas e representações da saúde e da doença entre os idosos – estudo
qualitativo
5.1 Faixa etária, sexo e procedência dos idosos deste estudo
O instrumento-guia da pesquisa foi aplicado nas dependências da US Santa
Marta, junto ao serviço de geriatria, localizado no centro da cidade de Porto Alegre.
A US Santa Marta é uma unidade de referência do sistema de saúde, que se
caracteriza pelo atendimento das especialidades médicas, recebendo pacientes
referenciados de todo o Estado do Rio Grande do Sul e não somente de Porto Alegre.
Foram entrevistados trinta usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Nos
restringimos à clientela do SUS, já que é a mesma pesquisada na primeira parte deste
estudo, quando recorremos a dados das internações hospitalares.
Os dados quantitativos analisados nesta etapa foram relacionados à faixa etária,
sexo e local de procedência. Nos limitamos a esses, por considerá-los suficientes para
caracterizar o grupo em estudo, visto que nosso objetivo central é analisar as
concepções e atitudes concretas que os idosos adotam frente ao processo saúde-doença.
Os idosos participantes deste estudo são oriundos das classes populares, a
maioria possuidores de imóvel próprio, com recursos financeiros da aposentadoria e do
64
trabalho que alguns ainda realizam. Muitos ajudam os familares, cedendo seu terreno
para construção de outro imóvel, como podemos captar em seus depoimentos.
Optamos, nesta parte do estudo, por entrevistar os maiores de 60 anos,
diferentemente do estudo de série temporal, restrito aos acima de 65 anos para
conseguirmos uma maior abrangência e diversidade no estudo qualitativo. No entanto,
no campo empírico, encontramos uma população que se concentra acima de 70 anos.
Na tabela 1, que apresenta a distribuição da população entrevistada segundo a
faixa etária, identificamos que 60% se encontram na faixa etária de mais de 70 anos,
30% entre 65 e 69 anos, 10% entre 60 e 64 anos.
TABELA 1 - DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ENTREVIS –
TADA, SEGUNDO FAIXA ETÁRIA, PORTO ALEGRE, 2001.
Faixa Etária
Freqüência Percentual %
60 a 64 anos 3 10
65 a 69 anos 9 30
70 e mais 18 60
Total
30 100
A tabela 2 apresenta a distribuição da população entrevistada segundo sexo;
observamos que 83,3 % são do sexo feminino e apenas 16,7% do masculino.
Identificamos neste item um comportamento de gênero clássico, ou seja, ao
longo da vida, as mulheres procuram com maior freqüência os serviços de saúde, se
comparadas aos homens. Para isso contribuem o período gestacional e a realização
anual do exame de câncer uterino, práticas preventivas que não fazem parte do universo
masculino.
65
TABELA 2 – DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ENTREVIS-
TADA, SEGUNDO SEXO, PORTO ALEGRE, 2001.
Sexo
Frequência Percentual %
Masculino 5 16,7
Feminino 25 83,3
Total
30 100
A tabela 3 mostra a distribuição da população, segundo o local de procedência;
verificamos quatro usuários de outros municípios do Estado, Arroio dos Ratos,
Cachoeirinha, Canoas e Capela de Santana, o que representa 13,2 % da população
entrevistada; os demais são de Porto Alegre.
TABELA 3 – DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ENTREVISTA-
DA, SEGUNDO LOCAL DE PROCEDÊNCIA, PORTO ALEGRE,
2001.
Local
Freqüência Percentual %
Azenha 1 3,3
Arroio dos Ratos 1 3,3
Belém Novo 1 3,3
Bom Jesus 1 3,3
Cachoeirinha 1 3,3
Canoas 1 3,3
Capela de Santana 1 3,3
Cavalhada 3 10
Centro 6 20
Cristal 2 6,7
Ipanema 2 6,7
Lomba do Pinheiro 1 3,3
Menino Deus 2 6,7
Partenon 1 3,3
Porto Seco 1 3,3
Rubem Berta 1 3,3
Santo Antônio 1 3,3
Sarandi 2 6,7
Serraria 1 3,3
Total
30 100,0
Entre os moradores de Porto Alegre, constatamos um percentual de 20% de
moradores do Centro, seguido de 10% do bairro Cavalhada, ficando os demais bairros
66
assim distribuídos: Cristal, Ipanema e Sarandi com 6,7% respectivamente e Azenha,
Belém Novo, Bom Jesus, Lomba do Pinheiro, Partenon, Porto Seco, Rubem Berta,
Santo Antônio e Serraria com percentual de 3,3% cada.
Verificamos que esses bairros se localizam em diferentes regiões do município
e, conseqüentemente, pertencem a diferentes distritos de saúde. Observamos um
percentual significativo de moradores do Centro, o que pode dever-se ao acesso
facilitado pela proximidade do serviço de saúde que elegemos para realizar este estudo.
Esses dados apresentados caracterizam de forma simplificada os idosos do nosso
estudo qualitativo como sendo majoritariamente mulheres, na faixa etária acima de 70
anos, procedentes de Porto Alegre, de zona urbana e do centro da cidade
principalmente.
As categorias que passamos a comentar surgiram inicialmente das questões
formuladas no instrumento-guia; as subcategorias emergiram das respostas dos idosos
após leitura exaustiva e compreensão das falas.
5.2 O processo saúde-doença entre os idosos estudados: cotidiano e
representações
Neste item analisamos os depoimentos do grupo em relação à pergunta “o que é
saúde”. O objetivo da pergunta é conhecer as representações dos idosos em relação ao
processo saúde-doença que experienciam.
A partir das respostas obtidas, categorizamos essas representações em três
dimensões distintas: a biológica, a social e a bio-sócio-cultural. Tentamos com isso
compreender a complexidade dos processos envolvidos nas próprias vivências.
67
Selecionamos como dimensão biológica aquelas respostas que se limitavam a
questões puramente relacionadas ao estado de morbidade, nas quais não havia
referências a questões comportamentais ou de outro caráter.
Em relação à dimensão social selecionamos os depoimentos que faziam
referência às questões sociais envolvidas no processo saúde-doença vivenciado por
esses idosos.
A dimensão que denominamos bio-sócio-cultural, nós a organizamos a partir dos
depoimentos reveladores de uma articulação entre os determinantes biológicos, sociais e
culturais que, de uma maneira ou outra, os idosos reconhecem como influenciando suas
vidas e/ou determinando situações de normalidade ou doença.
As dimensões biológica, social e bio-sócio-cultural
A categoria que denominamos de dimensão biológica, porque se restringe a uma
visão de cunho biológico dos determinantes da saúde, foi referida por 43,3% dos idosos
paticipantes deste estudo.
Identificamos nesta dimensão a preocupação com os cuidados em relação aos
diferentes tipos de alimento, que acreditam influenciar no estado de saúde e de doença;
exercícios físicos, por exemplo, caminhadas, são algo bastante comum entre os
depoimentos e o ato de dormir, bem como um sinal de saúde. Encontramos também a
clássica referência ao fato de que não ter doença significa, sobretudo, a “ausência de
dor”, sintoma que preocupa os idosos desse grupo que se deteve a definir o processo nos
limites do corpo.
Essa visão biologicista do processo saúde-doença é nitidamente influenciada
pela predominância das práticas e políticas de saúde em nosso meio, privilegiando o
modelo médico-curativo.
68
Tal predominância nesse tipo de concepção pode ser observada em alguns
depoimentos dos idosos. Diz João: “Saúde é cuidar do meu corpo, zelar por ele e tratar
tudo que for necessário para ficar com ele em forma”. Lucinda associa quatro aspectos:
“Saúde é não sentir dor, é poder se alimentar, poder andar e dormir bem”. Rosa é
bastante pragmática: “Saúde prá mim é não ter enfermidade grave, né!”. Já Maria e
Esmerilda relacionam saúde a cuidados com o corpo:“ Saúde para mim é cuidar da
alimentação, caminhar, que é o que eu faço e se cuidar, na nossa idade tem que se
cuidar...”, “Saúde é se cuidar, fazer exercício, dar caminhadas, cuidar dos alimentos”.
Para Helman (1994) as teorias leigas fazem parte de um todo complexo de
heranças populares, influenciadas por conceitos emprestados dos meios de comunicação
e do modelo médico.
O mesmo autor contribui referindo que os profissionais de saúde situam a
origem do problema de saúde no indivíduo, tratam dos problemas do mau
funcionamento do organismo, algumas vezes relacionando-os à mudança de
comportamento ou alimentação. A responsabilidade, assim, recai principalmente sobre o
paciente, crença essa comum no mundo ocidental.
Minayo (1997) também contribui para a crítica da unicidade da dimensão
biológica, quando argumenta que a concepção biomédica reduz a doença e a saúde ao
contorno biológico individual, separando o sujeito de seu contexto integral de vida.
A categoria que denominamos de dimensão social inspirou-se nas palavras de
Ferreira (1998, p.103): “A noção de saúde e doença é também uma construção social,
pois o indivíduo é doente segundo a classificação de sua sociedade e de acordo com
critérios e modalidades que ela fixa ...”. Essa dimensão aparece em 30% dos
depoimentos dos idosos.
69
A idéia de que as representações que os indivíduos elaboram a respeito de
doença estão diretamente relacionadas com os usos sociais do corpo em seu estado
normal é evidente. Quando o indivíduo não consegue trabalhar, comer, dormir ou
realizar qualquer atividade habitual, isso implica em estar doente.
O que dizem os idosos que conseguem expressar suas concepções de saúde com
um enfoque social?
A relação da saúde com o trabalho é nítida nos depoimentos de Laura, quando
diz que “Saúde é a coisa mais importante da vida da gente, né! e a gente tem que se
cuidar para ter força de trabalhar...” e de Lúcia: “Acho que é viver em paz e trabalhar.
Acho que é isto”.
Em relação às camadas populares, Minayo (1997) contribui para entendermos
esses discursos quando, em seu estudo junto a seis favelas do Rio de Janeiro, mostra que
os moradores entrevistados expressavam a concepção dominante, ou seja, relacionada à
questão da produção, a doença associada à impossibilidade de trabalhar, de realizar os
afazeres rotineiros e cotidianos e conclui que “...a representação social de saúde e
doença, portanto, está muito ligada à atividade física e à capacidade para trabalhar”.
Nos depoimentos seguintes verificamos que os nossos idosos também
conseguem expressar a concepção de saúde-doença de uma forma mais ampla,
associando-a a um estreito laço com a própria vida. Isso se expressa na fala de
Verônica: “Ah! É bom, saúde é tudo na vida, em primeiro lugar é a saúde”; de Augusta:
“Saúde é a principal coisa que existe no mundo, porque saúde é vida, é tudo na vida.
Saúde em primeiro lugar”; de Roberto: “Saúde é o principal, a gente tendo saúde, tem
tudo”. Já Augusto a define em sucintas palavras definitivas: “É a felicidade”.
70
Percebemos, a partir destes depoimentos, que a saúde é algo muito importante
para os idosos. Encontramos no Relatório de Pesquisa sobre os Idosos no Rio Grande do
Sul (1997) que é uma das questões que mais os preocupa e que os principais motivos
relacionados a essa preocupação são a diminuição da capacidade física, restrições à
autonomia e à independência, perda de familiares e amigos e a carência de recursos
econômicos para o seu sustento.
Esse relatório propõe que se faz necessário conhecer o perfil do idoso para traçar
políticas de saúde voltadas para as reais necessidades desse segmento, para planejar,
efetivar e gerenciar a oferta de serviços de saúde para o idoso. Outro aspecto é do
conhecimento, pelos profissionais da saúde, do processo normal do envelhecimento e
dos processos patológicos, o que permitirá uma intervenção com práticas preventivas e
terapêuticas em saúde. Dentre os fatores atribuídos ao agravo da saúde do idoso está o
seu desconhecimento do próprio corpo e de como envelhece.
Na seqüência das análises, denominamos de dimensão bio-sócio-cultural aquela
em que o conteúdo dos depoimentos abrangia os determinantes biológicos, sociais e
culturais do processo saúde-doença, complexidade que encontramos em 26,7% dos
depoimentos. As próximas definições apontam nessa direção. Tereza diz que “Saúde é a
gente estar em paz com a vida, é muito importante, antes de tudo é gostar da gente, é
gostar de viver. Depois a medicina, tem que procurar, correr atrás”, enquanto Leni
associa físico e trabalho:“ Saúde é não sentir nada, sentir o corpo bem, ter disposição
para trabalhar”.
Pudemos analisar através desses depoimentos que as representações dos idosos
do processo saúde-doença são elaboradas a partir da construção e interação de
71
elementos originários de fontes diversas, de níveis de elaboração heterogêneos,
baseados na vivência de cada individuo.
Em apoio a essa idéia citamos Rondelli:
“Saúde e doença são coisas intrinsecamente ligadas à natureza
deste corpo humano que, embora universal quanto à sua estrutura
anatômica e fisiológica geral, é tomado como objeto de múltiplas
e quase infinitas construções significativas pelas culturas e
imaginários” ( Rondelli 1995, p.39).
Constatamos assim entre os nossos idosos a construção, ao longo de suas vidas,
de concepções dinâmicas e ampliadas do processo saúde-doença.
Minayo (1997) contribui para esta análise ao afirmar que saúde e doença não são
apenas efeitos biológicos, mas também acontecimentos culturais historicamente
construídos de diferentes formas em diferentes sociedades.
5.3 Cotidiano e corpo
A partir das questões formuladas sobre quais os cuidados que têm com o corpo e
que atividades realizam para se manter saudáveis, pudemos identificar nas respostas dos
idosos influências tanto dos discursos dos profissionais da saúde, através de referência a
práticas de educação em saúde, quanto de uma rede de comunicação, seja ela formal ou
informal.
No campo da influência dos profissionais, foi possível perceber uma grande
tendência a normas e regras do que é certo e errado para a manutenção da saúde de uma
população. Como vimos em Rosa (1989), isso responde às concepções de que a
educação em saúde é inspirada nos princípios de higiene e ensinada com a finalidade de
criar hábitos sadios.
72
No campo da comunicação, Melo (1976) critica as práticas de educação em
saúde que estavam reduzidas à propaganda e informação, com o objetivo de regrar a
vida da população.
Assim os idosos foram (des)construindo imagens e adquirindo hábitos e
costumes diversos, diferentes de décadas atrás de onde nos vem a imagem de uma
senhora sentada numa cadeira de balanço esquecida em seus pensamentos. Este estudo
oportunizou a descoberta de um novo mundo, de uma nova cultura entre os idosos.
Identificamos que é fundamental a realização de uma atividade em seus
cotidianos. Atentamos para a importância do trabalho na vida desses idosos, seja ele
formal ou informal. Essa importância, nós a discutiremos ao analisarmos a temática
lazer e trabalho.
Esta constatação fica evidente na importância de se praticar uma atividade, seja
ela física ou intelectual, para a obtenção de uma melhor qualidade de vida.
Nos estudos de Waldow (1994) sobre a opinião de idosos de diferentes classes
sociais, acerca da velhice em Porto Alegre, percebemos que independente da inserção
social do idoso, a manifestação de manterem-se ativos, seja através de atividades de
lazer, de educação e exercícios físicos, é o que lhes proporciona uma melhor qualidade
de vida.
A partir dessa categoria temática intitulada cotidiano e corpo construímos as
sub-categorias imagem do corpo, dieta e mídia, medicalização da saúde e lazer e
trabalho as quais emergiram da análise dos depoimentos sobre os cuidados que os
idosos estão dispensando, em relação ao seu corpo e quais atividades desenvolvem, por
julgarem importantes para sua saúde.
73
Imagem do corpo
Encontramos na maioria dos depoimentos em relação aos cuidados com o corpo
uma preocupação com a higiene como um fator determinante na sua saúde, porque a
higiene está relacionada à auto-estima e ao autocuidado.
Para Helman (1994,p.30), a expressão imagem do corpo “...é usada para
descrever todas as formas com que um indivíduo conceitua e experiencia o próprio
corpo, consciente ou inconscientemente”.
Para o autor, os conceitos de imagem do corpo podem ser divididos em três
grupos principais: crenças sobre o tamanho e forma ideais do corpo, incluindo o
vestuário e o embelezamento do seu exterior, crenças sobre a estrutura interna do corpo
e crenças sobre suas funções. Esses grupos são influenciados pelo background social e
cultural e podem repercurtir em efeitos importantes sobre a saúde do indivíduo.
(Helman, 1994)
Vejamos as declarações de Leni sobre os cuidados com o corpo para manter-se
com saúde:“...tomo banho, mesmo que esteja nevando, não fico sem tomar banho, não
posso ficar sem tomar banho, renova a gente”; quanto a Tereza, ela cita os cuidados
enfatizando a higiene: “...claro, a higiene pessoal, o banho, claro, não precisa se falar, é
uma coisa muito lógica. E quando sinto qualquer coisa, eu corro no postinho”.
A imagem do corpo entre os idosos está também relacionada com a imagem que
o outro elabora sobre seu corpo, quando demonstram uma preocupação com a limpeza e
o cheiro. Em relação a essa situação, Victora (1995) aponta: “Ao mesmo tempo em que
o corpo adquire significado na experiência social, ele próprio é um discurso a respeito
da sociedade, passível de leituras diferenciadas por diferentes agentes sociais”.
74
O corpo tem uma realidade social e uma física, a forma (gordo ou magro) e os
adornos (roupas, perfumes ) informam sobre a posição social na sociedade. É consenso
que o corpo magro emerge da classe com melhor inserção social e o corpo gordo da
classe com inserção social inferior, comenta o autor acima.
Vemos isso no depoimento de Alícia: ‘Tomo banho todos os dias, escovo os
dentes, lavo o cabelo todos os dias, só mesmo se não der, troco a roupa todos os dias,
ando sempre limpinha, graças a Deus. Gosto de usar um perfumizinho”.
Assim, o corpo social é uma parte importante da imagem física, exercendo um
controle sobre o corpo individual e, conseqüentemente, determinando seu
comportamento com relação à doença e à saúde, bem como suas atividades profissionais
e de lazer (Helman, 1994).
Dieta e mídia
Observamos, atualmente, uma grande preocupação em relação ao tipo de
alimentação adequada entre os idosos, por acreditarem que essa influencia em sua
saúde.
Encontramos 36,7% de idosos que relatam que comem verduras, frutas e carne
branca, abolindo a carne vermelha e a gordura de sua dieta.
Denominamos esse tipo de alimentação de “dieta da mídia”, porque na última
década fomos bombardeados com preceitos normativos que condicionam a manutenção
da saúde e a longevidade a mudanças no hábito alimentar. Partiu-se, então, para a
apologia ao consumo da carne branca, verduras e frutas em detrimento do consumo da
carne vermelha e gorduras de origem animal, que seriam fatores de riscos às doenças
cardiovasculares.
75
Em relação ao potencial da mídia em influenciar possíveis mudanças de hábitos
alimentares, encontramos em Camargo (1995, p.19) a seguinte afirmação: “No caso
específico do Brasil, a formulação de concepções populares acerca da saúde e da doença
está muito mais sujeita ao impacto dos meios de comunicação de massa - em especial da
televisão- do que a qualquer outra fonte...”.
Na sociedade contemporânea o campo das mídias emerge como uma das
principais fontes de influências no comportamento, mitificando a tecnologia que
promove formas de como cuidar do corpo e combater as doenças de interesse público.
Propagam quais tipos de alimentos devem ser consumidos graças a uma bem-sucedida
atividade de marketing comercial, modelando igualmente os corpos mediante a nutrição,
corrigindo um excesso ou problema corporal. É uma outra forma de controle social
sobre o corpo de cada cidadão Oliveira (1995).
Assim, muitos idosos estão imbuídos dessa nova cultura alimentar, e é pertinente
indagarmos até que ponto estão submetidos a um tipo de stress, do que é permitido ou
não comer e fazer ! O depoimento abaixo exemplifica o nível de detalhe com que hoje
alguns idosos se comportam ao se alimentarem:
“...cuidados com a comida, a gente usa muita verdura, carne
magra, o frango, eu tiro a pele, porque tenho problema de
colesterol. Pressão, se eu não cuidar, ela sobe muito, eu sou
hipertensa. Eu cuido da pressão com alimentação e tomo remédio
também”(Alícia).
No entanto esses condicionantes têm limites, se considerarmos, segundo Helman
(1995), que o alimento é mais que uma fonte de nutrição, está intimamente relacionado
com aspectos sociais, religiosos e econômicos da vida cotidiana, sendo muito difícil
modificar crenças e práticas alimentares.
76
Para o mesmo autor, o alimento pode ser um indicador de status, como um
emblema de uma identidade de grupo. Por isso cada país, região ou cidade possui suas
comidas típicas, uma forma de agregar diversos grupos sociais. Por exemplo, como
fazer para um gaúcho típico aceitar que carne vermelha e gorda faz mal para sua saúde,
visto que o churrasco é mais que um tipo de alimento, é um acontecimento social?
Identificamos esse fenômeno, quando alguns idosos relatam que “saem” fora da
dieta propagada como a “ideal”: frutas, verduras e carne branca e magra. Dizem eles:
“Procuro comer mais frutas, verduras, não quer dizer que eu não
como feijão, lentilha, frituras lá de vez em quando. Não gosto de
carne, não fumo e não bebo”(Elisa).
“Tenho três médicos e mais a nutricionista da PUC que faz a
dieta, verduras, frutas, coisa mais calma, menos gordura, menos
sal. As vezes, eu como um churrasquinho gordo, que uma vez um
médico me disse que lá de vez em quando não faz mal”(Carlos).
Podemos perceber, no entanto, que normativamente essas condutas são
consideradas transgressoras de uma nova norma, de um “tipo ideal” de comportamento
alimentar. Os depoimentos atestam esse caráter de subversão, quando admitem que
saem fora da dieta “ lá de vez em quando”. Existem relatos dos idosos que citam essa
dieta que denominamos “da mídia” como algo que foi “ensinado”, mas que não é
realizado:
“Acho que é comer bem, estar sempre limpa, dormir cedo, que é o
que eu não faço, levantar cedo, que é o que eu não faço, porque eu
acostumei a deitar tarde e levantar tarde, por isso que eu não faço.
Preguiça de cozinhar, como mal, qualquer coisa, porque tenho
muita preguiça de fazer, que brabo dizer isto, né! prá ti”(Aurora).
77
O caráter normativo está também expresso na construção do depoimento de
Aurora que percebe que “é brabo” contar as transgressões para os profissionais de
saúde, os guardiões da normalidade.
Encontramos também nos depoimentos da maioria dos idosos, principalmente
acima de 80 anos, que sua dieta é livre. Como diz Augusta: “Quanto à alimentação, o
que vem morre, não tenho nada, sou uma pessoa completamente sã. Prá mim nada faz
mal, tudo é cabeça, tudo é uma questão de cabeça”. E Tereza quando afirma: “Na
alimentação eu sou relaxada, gosto de comer aquilo que eu gosto”. Já Roberto é mais
comedido: “Como pouca comida, como de tudo, mas pouca. Não fumo e não bebo”.
A transgressão à norma parece adquirir um significado diferenciado no grupo
“mais velho”. A alimentação é (re)significada, e o conceito de “comida” parece ser
impor. A “comida” reflete os vínculos com a cultura alimentar de cada sujeito, e o
prazer de comer aflora. Talvez seja o momento da vida de se “libertar das amarras
sociais”?!
Medicalização do corpo
Esta subcategoria nos confronta com o mundo da tecnologia pesada, do aparato
de exames laboratoriais, da rádio-imagem e dos remédios.
Para Helman (1995), a medicina moderna atua cada vez mais como um agente
de controle social, o que torna as pessoas dependentes da profissão médica e do vínculo
com a indústria farmacêutica.
Illich (1975) nos fala sobre a iatrogenia clínica e a iatrogenia social que a
medicina incutiu na população, criando um mito da produção dos serviços médicos
como condicionante do processo saúde-doença de uma população.
78
Para o autor a iatrogenia clínica expõe a ineficácia global e os perigos da
medicina dispendiosa, na qual os sujeitos ficam submetidos a exames sofisticados ou
medicamentos modernos, nem sempre bem comprovadas sua eficácia, em nome de sua
saúde. A iatrogenia social é a perda da capacidade individual de adaptação ao meio
social e implícita recusa a esses meios. Isso resulta na perda de autonomia na ação e no
controle do meio.
Camargo (1995) contribui com a definição de iatrogenia clínica, quando
comenta que os médicos também estão sujeitos à medicalização, enquanto a tecnologia
mais avançada acriticamente é incorporada na sua prática cotidiana, sem maiores
considerações quanto a sua necessidade, ficando por conta da eficácia da propaganda da
indústria farmacêutica.
Essas idéias nos auxiliam a refletir sobre o que encontramos em uma parcela
significativa de nossa população entrevistada, 46,7%, que associa cuidados com o corpo
com o uso de medicação, realização de exames e do check-up, nome de origem inglesa,
que preconiza a idéia da realização de vários exames bioquímicos e biofísicos para
diagnóstico e tratamento precoces como meio de prevenção de doenças.
Vejamos o que afirma Laura sobre os cuidados com o corpo: “Sempre vou ao
médico, de seis em seis meses eu faço um check-up para melhorar a qualidade de vida.
Não como gorduras, não fumo, não tomo bebidas de álcool e faço caminhada também”.
Illich (1975) chama esse comportamento de “medicalização da prevenção” e
“medicalização do diagnóstico precoce”, o que considera um entrave e desencoraja a
verdadeira prevenção, levando o paciente potencial a comportar-se como um objeto,
entregando-se ao médico estando ou não com saúde, transformando-se num paciente
para o resto da vida.
79
Identificamos essas características nos relatos de Érica: “Cuido do colesterol,
triglicerídeos, a comida para baixar o colesterol. Tomo calmante à noite para dormir, faz
anos que eu tomo um pedacinho”; ou de Eni: “Para me manter com saúde cuido da
alimentação, levanto cedo, não durmo muito, deito tarde e levanto cedo. Eu procurei um
geriatra para me orientar e sigo suas orientações”.
Identificamos o relato de Maria como o que mais traduz a dependência em
relação ao aparato da medicina como forma de cuidar do corpo e de prevenção:
“ Cuidar do corpo é ter higiene, caminhar, boa alimentação. Eu
tenho problema de colesterol, sempre tenho que fazer exame de
sangue para ver com está e cuidar, cuidar de mim e do meu corpo,
quem gosta de mim sou eu mesma, tenho que me cuidar, né?!
Com a minha boca, inclusive eu faço tratamento aqui mesmo. Eu
acho que estou bem, porque todos os médicos que consulto e mais
a enfermeira padrão disse que pela minha idade eu estou bem
dentro do normal ...”(Maria).
O lazer e o trabalho
Nesta subcategoria identificamos que o sedentarismo não faz mais parte do
cotidiano dos idosos e começa a mudar a imagem do vovô e da vovó na “cadeira
preguiçosa” de pantufa e pijama. Entre as atividades realizadas para manterem-se
saudáveis, observamos que o trabalho, mesmo nessa fase de suas vidas, continua sendo
algo muito importante para uma melhor qualidade de vida e o associam com seu
processo saúde-doença, pois continuar trabalhando significa, para a grande maioria dos
entrevistados, ter saúde. O depoimento que segue diz muito dessa nova realidade e
mudança de imagem social.
“Trabalho muito, até hoje, com 82 anos, eu trabalho, forro botões,
faço crochê...é trabalhar, se movimentar, porque tá deitada na
cama não dá, que esperança! Me levanto cedo às 7h. Durmo bem
80
toda a noite, eu e a minha gatinha Rosinha....Ainda tenho miras de
durar muitos anos, eu não tenho filhos, mas tenho sobrinhos, vou
no aniversário das crianças, tudo isso a gente tem que fazer para
entreter, melhorar a cabeça, o cérebro. Acho que o principal é
trabalhar, se movimentar e ter amigos para conversar quando se
pode”(Florinda).
Outra maneira de analisarmos a importância que o trabalho representa para uma
vida com mais qualidade, encontramos em uma pesquisa realizada por Carlos et al
(1999), na qual os autores apontam como fundamental a identidade de trabalhador e sua
representatividade enquanto identidade do eu, a consciência de pertencer a um grupo
social, inclusive laboral. O espaço de trabalho e as categorias profissionais,
proporcionam atributos de qualificação ou desqualificação do eu. Portanto, existe um
vínculo simbólico com o trabalho e a identidade de trabalhador, que se reflete na
continuidade de uma vida, fazendo com que, mesmo após a aposentadoria, muitos
continuem trabalhando, ou mesmo nem a desejem.
Encontramos no depoimento de Augusta essa tendência:
“Trabalho, não fico em casa deitada, mastigando, saio prá rua.
Trabalho oito horas por dia, pego 4 ônibus. Temos uma
confeitaria, passo o dia lá. Chego em casa de tarde, tomo um
banho e vou dormir. Acho que isto é saúde, é vida”.
Provavelmente, esta identidade de trabalhador esteja diretamente associada à
identidade pessoal, de como nos encontramos em várias esferas de nosso cotidiano,
visto que passamos a maior parte de nosso tempo trabalhando. Passar do mundo do
trabalho para o “mundo do ócio” é algo que depende de como será feita essa transição.
Um estudo realizado na Espanha por Mendizabal (1990) aborda a importância da
preparação do idoso para a aposentadoria e propõe que a educação permanente seria
uma possibilidade de diminuir a brusca ruptura que ocorre quando se deixa a vida
81
economicamente ativa, o que gera em muitos depressão. Sugere que os governos
deveriam se preocupar com a educação permanente, pois diminuiriam os custos com a
seguridade social e saúde, além de propiciar uma melhor qualidade de vida a essa
parcela da população.
No Brasil, proliferaram na última década os programas voltados para idosos,
como as escolas abertas, as universidades para a terceira idade e os grupos de
convivência de idosos como cita Debert (2000).
Consideramos que essas práticas estão associadas diretamente aos determinantes
do processo saúde-doença. À medida que os idosos vão se inserindo e se adequando a
uma nova maneira de viver a vida, vão apreendendo novas formas de compreensão do
envelhecimento e, conseqüentemente, da imagem que fazem de seu corpo e das
potencialidades para usufruírem de uma melhor qualidade de vida. A manutenção da
atividade física e social pelos idosos, nós a percebemos como a chave para a prevenção
de processos reconhecidos como patológicos nesse segmento da população.
Assim, o trabalho aparece de diferentes formas na fala dos idosos entrevistados,
seja através do trabalho formal como fonte de renda, seja através do trabalho informal,
realizado no âmbito doméstico. Nesse aspecto, identificamos que o trabalho realizado
pelas mulheres é diferente do realizado pelos homens, marcando as diferenças de
gênero. Encontramos nos depoimentos seguintes esse aspecto das culturas de gênero:
“Faço tricot, sou síndica do prédio, faço obra, contrato, faço
reunião, faço bastante atividade. Esta atividade me faz bem,
sempre tem alguma coisa para pensar. Tenho um irmão numa
clínica, praticamente ninguém cuida dele, só eu, eu vou lá duas
vezes por semana. Eu só não trabalho fora, o resto tudo que eu
fazia antes, eu faço. Envelhecer depende da cabeça, né! Exercitar”
(Lucrécia).
82
“Faço costura, crochê e tricot, Tem horas, tô meio aborrecida,
pego um crochê, vou fazer, me esqueço que estava pensando
coisa ruim. Dar atenção para crianças, pessoas idosas que eu
adoro, não é porque sou idosa, sempre gostei”(Dileta).
Identificamos na maioria dos depoimentos a importância que é dispensada ao
mundo do trabalho para um envelhecimento saudável, além do que o trabalho
intelectual e o trabalho comunitário são também formas de se esquecerem dos
problemas.
Em relação à atividade comunitária e intelectual, concordamos com Lehr (1997)
quando afirma ser a atividade cognitiva essencial para um envelhecimento saudável,
bem como a atividade mental. A autora sugere que as pessoas idosas deveriam receber
tarefas mentais através de novas informações, como um desafio das atividades
intelectuais. Também associa que as pessoas mentalmente mais ativas, com um grande
número de contatos sociais, com mais interesses, alcançam uma velhice com maior
sentimento de bem-estar.
Além do trabalho, a atividade intelectual e social é, portanto, referida como algo
muito importante para a manutenção da saúde. Dizem eles:
“Eu trabalho com comunidade, só fico na minha casa para dormir.
Eu trabalho no orçamento participativo, eu trabalho com grupos,
sou voluntária, não ganho nada, só para ter uma atividade para
não ficar depressiva dentro de casa, então há dez anos eu faço
esse trabalho”(Laura).
“Escrevo, sou aposentado, e quando estou meio nervoso, meio
agitado, então eu pego a caneta e descarrego na caneta, vou
escrever. Escrevo poesias, sonetos, apesar de ser humilde, tenho
esse dom que Deus me deu. É a única coisa que tira minhas
preocupações ...”(João).
83
Outra atividade, bastante freqüente entre os idosos, é a caminhada. Referem que
caminhar e dançar é algo muito importante para se manterem saudáveis.
“Eu gosto de ir a baile, vou a baile, eu danço. Eu caminho uma
hora por dia, sempre. Eu vou no parque, passeio, viajo. E a minha
vida de casa, eu gosto de fazer a minha lida de casa, moro
sozinha. Vou na casa dos filhos, as vezes cuido dos netos, é um
prazer que eu tenho tido”(Neida).
Segundo Lehr (1997) ao apresentar dados da Alemanha e de Singapura, afirma
que a atividade física é um pré-requisito para um envelhecimento com sucesso. As
mudanças físicas determinadas pela idade, tais como incapacidade funcional dos órgãos,
modificação no sistema motor e muscular, bem como modificações nos órgãos
respiratórios, estão diretamente relacionados aos efeitos da falta de exercício. A
atividade física também afeta o bem-estar psicológico no que diz respeito às
habilidades, bem-estar pessoal, habilidades sociais e auto-estima.
Verificamos através do relato da população em estudo quase que uma
unanimidade em relacionar atividades para se manterem saudáveis com o exercício
físico, seja ele uma caminhada ou uma atividade de lazer (passeios e bailes).
Frente a essas constatações, fruto dos depoimentos que analisamos, podemos
afirmar que o caráter normativo do que é ter saúde, mesmo que estabeleça certos
parâmetros e condutas, se relativiza nas práticas e na relação com o cotidiano de vida de
cada idoso e identifica-se em uma busca pessoal em direção à construção de formas
individualizadas de manter-se saudável e com boa qualidade de vida.
84
6 CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS
Particularizando a adoção da prática de vacinação, em especial a vacina contra
influenza, identificamos que a idéia preventiva da doença é um fator decisivo na adoção
ou recusa dessa prática.. Notamos essa tendência de realizar a vacina na busca de não
adoecer, nesse caso, de não adquirir a gripe. Como vimos ao revisarmos a literatura, a
vacina contra influenza possui uma eficácia que depende da idade, da
imunocompetência do receptor, do grau de similaridade entre as cepas contidas na
vacina e aquelas que estão circulando na comunidade. Os idosos geralmente
desenvolvem menores títulos de anticorpos do que crianças e adultos, entretanto,
repetimos, a vacina proporciona uma proteção contra as complicações, hospitalizações e
óbitos por doenças respiratórias, em especial as pneumonias.
Concluímos que a falta de esclarecimentos sobre os efeitos da vacina e seu
impacto na diminuição da morbidade nas internações hospitalares e nos óbitos por
doenças respiratórias, advindas da complicação da influenza, é um fator decisivo de
adesão a essa prática.
Ao analisarmos a série temporal de 1995 a 2001, das internações hospitalares
por pneumonias, verificamos uma tendência à queda no ano de 1997, quando ocorreu
em Porto Alegre uma vacinação dos portadores de doenças crônicas com mais de 65
anos. No ano de 1998, quando não houve vacinação contra influenza, verificamos uma
85
tendência a aumentar a morbidade de internações hospitalares por pneumonias. A partir
de 1999, quando efetivamente foi estabelecida pelo Ministério da Saúde a Campanha de
Vacinação do Idoso, apontamos que vem ocorrendo uma tendência à queda na
morbidade de internações hospitalares por pneumonias.
Quando analisamos os gráficos referentes à média mensal de mortalidade por
pneumonias, a taxa mensal de mortalidade por pneumonias em relação à taxa mensal de
mortalidade geral e os coeficientes de mortalidade por causa, verificamos a mesma
tendência à queda na mortalidade por pneumonias.
Acreditamos que, se houvesse uma demanda maior de idosos que desejassem
receber a vacina contra influenza, teríamos uma queda mais acentuada na morbi-
mortalidade por pneumonias, visto que as coberturas vacinais em Porto Alegre
verificadas no período de estudo foram, em 1999, de 86,9%, em 2000, de 65,4% e em
2001, de 75,7%.
Para podermos avaliar com maior convicção o impacto que a vacina contra
influenza proporcionou em nossa cidade, é necessário continuarmos este estudo por um
período mais longo, um mínimo de 10 anos, para verificarmos a mudança efetiva no
perfil de morbimortalidade por pneumonias na população acima de 65 anos em Porto
Alegre e apontar a vacinação contra influenza como um elemento decisivo no
envelhecimento saudável.
A população do estudo qualitativo, podemos caracterizá-la como
essencialmente urbana, feminina, maior de setenta anos e usuária do SUS, visto que as
entrevistas foram realizadas em um serviço público de saúde.
Os depoimentos foram muito enriquecedores, porque deles emergiram
categorias de análise carregadas de concepção sobre os determinantes do processo
86
saúde-doença. Determinantes esses biológicos, sociais, culturais e econômicos que de
uma maneira ou outra estão intimamente relacionados às perspectivas com que os
idosos definem saúde e doença.
Neste estudo nos deparamos com um tipo de comportamento dos idosos que está
substituindo aquela imagem passiva, acomodada e sedentária por um tipo de
comportamento em que a manutenção de uma atividade física, intelectual ou laboral faz
parte do cotidiano dos mesmos como garantia de um envelhecimento saudável.
Em relação aos cuidados com o corpo, identificamos uma preocupação com a
sua imagem, via interesse pela higiene e peso corporal, demonstrando capacidade para
o autocuidado e um sentimento de auto-estima singular nesse grupo.
Verificamos também uma preocupação bastante freqüente com o tipo de
alimentos a serem consumidos, com predomínio da adesão a um tipo de dieta que
denominamos de dieta da mídia, a qual está modificando hábitos culturais e sociais que
a identificam. E nos indagamos até que ponto também não está gerando um tipo de
estress, anteriormente ausente, em relação aos alimentos selecionados, como se fossem
determinantes exclusivos de um estado de normalidade em saúde.
Identificamos, através das respostas dos entrevistados, a influência das práticas
de educação em saúde de tendência normatizadora e normalizadora, na tentativa de
regrar e disciplinar a vida e os corpos das pessoas nos aspectos relacionados às práticas
de prevenção à saúde. Isso, felizmente, enfrenta a “resistência” dos sujeitos, que, nem
sempre, adotam o que é tido como “certo” em seu cotidiano.
Outro aspecto que ficou muito evidente nas práticas de prevenção à saúde
adotadas pelo grupo é a dependência ao aparato da medicina através do check-up, da
dependência aos fármacos ou do seguimento das orientações médicas como rotina de
87
vida. Ficou evidente a prevalência do modelo médico-curativo, que ainda permeia os
serviços de saúde, fazendo com que haja entre a população um senso comum no sentido
da medicalização da prevenção, como vimos em Ilich (1975).
Constata-se a necessidade de serem melhor esclarecidas pelos profissionais da
saúde, através da mídia ou na prática diária, as medidas de prevenção ou tratamento de
determinados agravos à saúde com caráter técnico e valorização do humano em
substituição aos interesses financeiros das indústrias alimentícias e farmacêuticas.
Por outro lado, emergiu das análises a importância do trabalho, e analisamos o
quanto esse está intimamente ligado à identidade de cada um, seja o trabalho formal ou
informal, que ainda faz parte do mundo desses idosos e funciona, segundo eles próprios,
como uma fonte de vida. Deixar de trabalhar significa perda de identidade e,
conseqüentemente, em certa medida, desistência de lutar pela vida.
A manutenção constante de uma atividade física e intelectual também foi
apontada por esse grupo de idosos como algo muito importante e mesmo decisivo para o
envelhecimento saudável.
Frente a essas constatações verifica-se a necessidade da implementação de
políticas públicas que promovam atividades de lazer, de esportes, educacionais e
laborais dirigidas aos idosos, as quais estariam proporcionando práticas de promoção à
saúde e garantindo um envelhecimento com uma melhor qualidade de vida.
Ressaltamos a importância de se reproduzir este estudo em populações com
características diferentes, de inserção social diferenciadas e de diversas culturas, para
compararmos nossos achados e assim podermos ampliar nossa compreensão das
peculiaridades e comportamentos relativos ao processo saúde-doença. Essa
compreensão poderá auxiliar, a nós profissionais de saúde, a adequarmos nossas
88
práticas às necessidades específicas de cada grupo populacional. Essa adequação passa
certamente por compreendermos o nosso sujeito cuidado em sua complexidade bio-
sócio-cultural e espiritual.
No campo das práticas preventivas, da promoção de saúde e da proteção
específica, representada neste estudo pela vacinação contra influenza, identificamos
como fundamental a adoção de condutas que considerem a “novidade” dessa prática
entre a população adulta e idosa. A adoção de comportamentos e a adesão a “novas”
práticas estão associadas à credibilidade social que se impõem na população, nesse caso,
na adesão à prática de vacinação entre os idosos.
89
ABSTRACT
The present work talks about the impact that the introduction of the vaccine against
influenza caused on the pneumonia morbid-mortality profile, and covers the over 65-
year-old population in Porto Alegre from 1995 to 2001. Together with the historical
series study, we examined the reasons for enrollment in, or refusal of, anti-influenza
vaccine practice among 138 elderly people. We went further in the analysis of the
conceptions of the health-illness process and the Preventive Practices in Health, with a
group of 30 elderly people using the PUBLIC HEALTH SYSTEM. The methodology
used is of epidemiological feature--of temporal series kind--combining interviews with
elderly people and thematic categorization of the detained information.The morbidity
data were obtained by documental statistic research, from the hospital admission date in
the PUBLIC HEALTH SYSTEM (TABWIN); and the mortality data were obtained
from the MORTALITY INFORMATION SYSTEM (SIM). Results point to a decrease
in morbidity by hospital admissions, and a decrease in mortality by pneumonia after the
formal introduction of the anti-influenza vaccine in the area in 1999. The enrollment in,
or refusal of, the vaccination program, exposed in the elderly the social and cultural
factors that had influenced their decisions. The elderly people who participated in this
study also noted that the maintenance of a physical, intellectual or laborial activity is
indispensable to healthy aging. The results of this study, so it is believed, contribute to
improved health practices by using education in health, adopting specific protection
strategies--such as effective vaccination--and working together with people.
90
RESUMEN
Se trata de un estudio sobre el impacto de la vacuna contra la gripe en el perfil de
morbi-mortalidad por pneumonias en la población con más de 65 años, en Porto Alegre,
durante el período de 1995 a 2001. A la par de estudiar la serie histórica hemos
investigado los motivos de la adhesión o rechazo a la práctica de la vacuna entre 138
ancianos. Hemos profundizado el análisis de los conceptos del proceso salud y
enfermedad y el de las prácticas preventiva en salud con un grupo de 30 ancianos que
son usuarios del sistema público de salud. La metodología utilizada ha sido de carácter
epidemiológico del tipo serie temporal, que combina entrevistas con ancianos y la
categorización temática de las informaciones obtenidas. Los datos de morbidez se han
obtenido a través de una investigación documental estadística, a partir de los datos de
ingreso en hospitales del Sistema Único de la Salud (Tabwin); y los datos de
mortalidad se han obtenido a partir del Sistema de Información en Mortalidad (SIM).
Los resultados apuntan hacia un comportamiento que tiende a caer la morbidad, debido
a los ingresos y atención hospitalarios y en la mortandad por pneumonias, tras la
introducción regular de la vacuna de la gripe, en 1999. Al particularizar el adherir o
rehusar la costumbre de la vacuna, los ancianos demuestran los factores culturales y
sociales que han influido al tomar sus decisiones. Los ancianos que han participado de
este estudio también han revelado que es fundamental mantener una actividad física,
intelectual o laboral para que pueda haber un envejecimiento saludable. Creemos que
los resultados del presente estudio pueden contribuir al perfeccionamiento de las
prácticas de promoción en salud, a través de la educación para la salud y la adopción de
medidas de protección específica, como dar la vacuna con eficiencia, responsabilidad y
competencia para que la población confíe en dichas medidas.
91
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v.5, n.8, p.25-38, jun.1994.
95
ANEXOS
ANEXO A
Roteiro de Entrevista com o idoso
Data: Pesquisador:
Nome: (fictício)
Idade: Sexo:
Local de procedência:
1-
O que é saúde?
2-
Quais os cuidados que o senhor(a) tem com o seu corpo?
3- Que atividades realiza para manter-se saudável?
4- O senhor(a) já recebeu a vacina contra a gripe? ( ) SIM ( ) NÂO
Se SIM:
Desde quando faz a vacina?
Por que faz a vacina?
Se NÃO:
Por que não faz a vacina da gripe?
96
ANEXO B
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Declaro que, ao assinar este documento, estarei ciente que estou dando o meu
consentimento para ser entrevistado(a) pela Mestranda Maria Aparecida Müller
Vilarino, C.I. 1016258327, aluna da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul.
Fui informado(a) que se trata de uma pesquisa sobre as Práticas Preventivas na
Saúde do Idoso. A entrevista será gravada e realizada a partir de um instrumento-guia
proposto pela autora, sendo que o uso da gravação terá minha autorização após ter
ciência do que foi gravado.
Também fui informado(a) que a entrevista é livre e, mesmo após o seu início,
posso recusar-me a responder a qualquer pergunta específica e encerrá-la em qualquer
parte da mesma, sem que isso venha em meu prejuízo.
Declaro que fui informado(a) quanto à garantia do sigilo em relação às
informações por mim fornecidas e que estas serão utilizadas somente para fins de
pesquisa. Também será respeitada a garantia do meu anonimato e que não será
publicado qualquer material que possa me identificar.
_____________________
data - assinatura do entrevistado
_______________________
assinatura do entrevistador
End.R.Capitão Montanha, 27/sala 410- Fone: 32168837.
97
DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO
NA PUBLICAÇÃO (CIP)
V697r Vilarino, Maria Aparecida Muller.
A (re)volta da vacina: eficácia e credibilidade social da
vacinação contra influenza entre idosos de Porto Alegre.
Porto Alegre, 2002.
97 f.
Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem.
Programa de Pós-graduação em Enfermagem.
1. Idosos. – 2. Vacinação. – 3. Influenza:Prevenção. – 4.
Pneumonia. – 5. Morbimortalidade. I Título
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