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Universidade Federal do Rio Grande do Sul
GABRIEL DIOGO PAULO HAMILTON
EXAME FÍSICO:
uma face reveladora do cuidado humano.
Porto Alegre
2003
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GABRIEL DIOGO PAULO HAMILTON
EXAME FÍSICO:
uma face reveladora do cuidado humano.
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Enfermagem da
Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em
Enfermagem.
Orientadora: Profª Drª Dulce Maria Nunes
Porto Alegre
2003
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H218e Hamilton, Gabriel Diogo Paulo
Exame físico: uma face reveladora do cuidado humano / Gabriel
Diogo Paulo Hamilton ; orient. Dulce Maria Nunes. – Porto Alegre, 2003.
136 f. : il. color.
Dissertação (Mestrado em Enfermagem) Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem. Curso de Mestrado em
Enfermagem, 2003.
1. Exame físico. 2. Enfermagem. 3. Exercício. 4. Criança. I. Nunes,
Dulce Maria. II. Título.
CDD – 610.73
CDU – 616-07:616-083
HLSN – 410.6
NLM
WB 200
Catalogação por Celina Leite Miranda (CRB-10/837)
GABRIEL DIOGO PAULO HAMILTON
EXAME FÍSICO:
uma face reveladora do cuidado humano.
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Enfermagem da Escola de
Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para
obtenção do Título de Mestre em Enfermagem.
Aprovada em Porto Alegre, 22 de maio de 2003.
BANCA EXAMINADORA:
__________________________________________
Profª Drª Dulce Maria Nunes – Presidente
Escola de Enfermagem – UFRGS
__________________________________________
Profª Drª Conceição Vieira da Silva – Membro
Departamento de Enfermagem - UNIFESP
__________________________________________
Prof. Dr. Paulo Roberto Carvalho – Membro Convidado
Faculdade de Medicina - UFRGS
__________________________________________
Profª Drª Eva Nery Rubin Pedro – Membro Convidado
Escola de Enfermagem - UFRGS
__________________________________________
Profª Drª Liana Lautert – Membro Suplente
Escola de Enfermagem - UFRGS
AGRADECIMENTOS
À minha mãe, Alayde Paulo Hamilton, que conviveu comigo todos os
dias do mestrado e, com suas orações, acompanhou-me neste e em
todos os momentos de minha vida, sobrevivendo a todas as
dificuldades de sua frágil saúde.
À Dra. Dulce Maria Nunes, amiga, orientadora, que me introduziu nos
caminhos da fenomenologia.
À minha esposa Clarice Ana, que compartilha a vida comigo, prazer,
alegria e a compreensão sempre na hora certa.
Ao Pedro Dalla Vecchia Hamilton, meu filho – enquanto eu estudava
no mestrado, alfabetizou-se sozinho e mandou-me um bilhetinho.
À Gabriela Dalla Vecchia Hamilton, minha filha – este ser feminino
tão sensível, que foi minha maior preocupação quando das viagens
para o mestrado.
Irmãos, irmãs, primos, primas, vizinhos, vizinhas, amigos de infância,
atores naturais e criativos das encenações infantis no depósito do
armazém São Diogo: com vocês, eu entrei no teatro da vida...
Ao padrinho, professor Agapito Prates Paulo, pioneiro do teatro de rua
sacro em Sant’ana do Livramento, onde pude atuar, pelo gosto pelos
livros, a poesia, por seu amor e generosidade.
Aos sacerdotes Pe. Hermes da Silva Inácio – meu padrinho, Pe.
Firmino Dalcim – meu orientador de seminário, Pe. Afonso Warker
Endler e Pe. Alex Klopenburg – na pessoa de vocês homenageio
todos os ex-colegas do Seminário São Pio X – Bagé/RS.
Ao Frei Roberto Gomes Simões, mais que amigo, verdadeiro irmão,
que seguindo São Francisco fez uma opção cristã radical e, por isso,
não tem a compreensão que merece, ainda.
Aos profissionais da Clínica Mens Sana – especialmente à psicóloga
Berenice Volkmer – por sua competência profissional e sensibilidade
humana: “eu pude reconstruir minha vida, saber o lugar do afeto e
tudo que a ele se subordina”.
Ao DR. Oswaldo de Paula Barbosa – psiquiatra, pai, irmão e amigo –
“...tu és a estrela mais reluzente do velho cruzeiro do sul...”.
Ao amigo Camilo De Lélis, que me convidou e cursamos a disciplina
de improvisação teatral na UFRGS: eu prossegui na enfermagem e ele
foi tornar-se diretor teatral – o melhor do Rio Grande do Sul.
As enfermeiras sujeito desta pesquisa e aos meus alunos da graduação
– cujo convívio é imprescindível para o meu crescimento.
Ao grupo de atuadores “Oi Nóis Aqui Traveis”, gaúchos que fazem
teatro com a própria vida ou a vida como o próprio teatro na busca da
liberdade humana, contra toda a forma de exploração capitalista.
Ao Índio Sepé Tiaraju – uma das figuras principais do meu imaginário
de gaúcho, e ao “Cerro do Palomas” acidente geográfico de minha
terra natal Sant’Ana do Livramento, pelo simbolismo dessa paisagem
em minha vida interior.
“A significação do percebido não é nada mais do que uma
constelação de imagens que começam a aparecer sem razão
(MERLEAU-PONTY, 1971, p. 33).”
A todas as crianças com as quais convivi e conviverei até o último dia de minha vida
– eu escolhi vocês!
IN MEMORIAM
Ery Diogo Menezes Hamilton – Meu Pai.
Úrsula Prates Paulo – Irmã Ursula da Divina Hóstia – Missionária de
Jesus Cruxificado – Minha Dinda!
Carlos Ivahy Presser – Meu Amigo e Orientador nas Minhas Primeiras
Relações de Trabalho.
Ao Frei Albino Aresi – criador da Clínica Mens Sana e da
noosofrologia – que me ensinou a relaxar e meditar para transformar
minha vida.
Iasuhiro Tone – Professor de Acupuntura de cuja terapia tanto me
beneficiei e de cuja amizade jamais esquecerei.
Para morar na doçura do corpo, temos que enterrar a cabeça no seu ventre,
entrar de mansinho, sentir nas necessidades, escutar anseios. Não fugir par
a
além das nuvens, mas gotejar, como chuva, para o íntimo da terra (BUZZI,
1998).
RESUMO
Este é um estudo qualitativo, fenomenológico, com sustentação filosófica à luz de
Maurice Merleau-Ponty. Tem por objeto o conhecimento, a compreensão e o significado do
procedimento do exame físico como uma face reveladora do cuidado humano. Foi
desenvolvido entre enfermeiras que cuidam de crianças hospitalizadas, na Clínica Pediátrica
do Hospital Universitário da Fundação Universidade Federal do Rio Grande, RS. O estudo foi
norteado por quatro questões: sobre a seqüência das partes do corpo da criança examinadas
pela enfermeira; as bases de sustentação teórica e a defesa da prática da execução do exame
físico no cotidiano; sobre como é compreendido o procedimento e o significado do exame
físico. As enfermeiras possibilitaram compreender o fenômeno como um procedimento que é
ensinado e aprendido no curso de graduação em enfermagem; que é aperfeiçoado durante a
prática profissional; que exige estudo específico e rigor científico na técnica de execução,
interpretação e registro. As bases de sustentação do procedimento estão na literatura e na
continuidade do exercício; são defendidas na prática pelas suas finalidades e por se constituir
fundamento para o processo de cuidado humano. É compreendido como linguagem e prática
humanizada e a sua não execução é interpretada como falha da enfermeira no processo de
cuidado. O fenômeno alerta às instituições formadoras no que tange à importância do rigor no
ensino do exame físico, às instituições cuidadoras por se referir como fundamento ao processo
de cuidado e para as enfermeiras como uma revisão dos conceitos e valores sobre o
conhecimento e o exercício contínuo do exame físico.
Descritores: exame físico; enfermagem; exercício; criança.
RESUMEN
Este es un estudio qualitativo, fenomenólogico con sustentación filosófica, a luz
de Mauricio Merleau Ponty. Tiene por objeto el conocimiento, la comprensión y el
significado do procedimiento del examen fisico como una cara, reveladora del cuidado
humano. Fue desarrollado entre enfermeras que cuidan a niños hospitalizados en la Clínica
Pediátrica del Hospital Universitário de la Fundação Universidade Federal do Rio Grande
(RS). El estudio fue conducido por cuatro cuestiones: sobre la secuencia de las partes del
cuerpo del niño examinada por la enfermera; las bases de la sustentación teórica y la
defensa de la práctica de ejecución del examen físico en el cotidiano; sobre como es
comprendido el procedimiento y el significado del examen físico. Las enfermeras
posibilitaron comprender el fenómeno como un procedimiento que es ensenãdo y aprendido
en el curso de graduación en enfermería; que es perfeccionado durante la práctica
profesional que exige estudio específico y rigor científico en la técnica de ejecución,
interpretación y registro. Las bases de sustentación del procedimento están en la literatura y
la continuidad del ejercicio, son defendidas en la práctica por sus finalidades y por
constituirse fundamento para el proceso de cuidado humano. Es comprendido como lenguage
y práctica humanizada y su no ejecución es interpretada como omisión de la enfermera en el
proceso de cuidado. El fenómeno alerta a las instituciones formadoras para la importancia
del rigor en la enseñanza del examen físico, las instituciones cuidadoras por referirse como
fundamento al proceso de cuidado y para las enfermeras como una revisión de los conceptos
y valores sobre el conocimiento y el ejercicio continuo del examen físico.
Descriptores: examen físico; enfermería; ejercicio; niño.
Titulo: Examen físico: una faceta reveladora del cuidado humano.
ABSTRACT
This is a qualitative and phenomenological study with a philosofical support
based on Maurice Merleau-Ponty`s view. It`s content is divided in knowledge, comprehension
and the meaning of the phisical examining procedure, revealing though “human care”. It`s
been development among nurses responsible for impatient-children at the Hospital
Universitário da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (RS). The study was led by 4
tasks: -the sequency of a children`s body parts examined by the nurse; -the base of a
theoretical support and acceptance of performing a quotidian physical exam; -the way the
procedure is understood; -the meaning of having a physical exam. Furthermore, the nurses
enabled the understanding of the phenomenon as a procedure taugh and learned at a nursery
graduation course which improves through professional practice; requires specific study and
scientific duty on the execution of its technic, interpretation and register. The basis of a
sustaining the procedure lay on literature and continuous exercise. They are detected on
practice by their finalities and as once, for constituting the foundation of human-care process.
It is understood as a humanized practice and language and its non-execution is interpreted
as a nurse malpractice. This phenomenon is an alert to the institutions responsable for
teaching considering the extreme importance of righteousness of the physical exam, to the
ones due to the caring process and also to the nurses as a review of concepts and values
about the knowledge and continuous exercise of the physical exam.
Descriptors: physical examination; nursing; exercise; child.
Title: Physical examination: a revealing face of human care.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Q1 - O QUE O LEVOU A ESTABELECER A SEQÜÊNCIA DAS PARTES DO CORPO DA CRIANÇA NO EXAME
FÍSICO
? .........................................................................................................................................................68
F
IGURA 2 – Q2 - EM QUE BASES SUSTENTAS/DEFENDES A PRÁTICA DO EXAME FÍSICO?.......................................80
F
IGURA 3 – Q3 - COMO VOCÊ COMPREENDE A PRÁTICA DO EXAME FÍSICO? .......................................................... 95
F
IGURA 4 – Q4 - QUAL É O SIGNIFICADO DO EXAME FÍSICO ? .............................................................................. 106
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – Q1 - O QUE O LEVOU A ESTABELECER A SEQÜÊNCIA DAS PARTES DO CORPO DA CRIANÇA NO
EXAME FÍSICO
? – RIO GRANDE – RS. AGOSTO, 2002............................................................................... 56
Q
UADRO 2 - Q2 - EM QUE BASES SUSTENTAS/DEFENDES A PRÁTICA DO EXAME FÍSICO ? – RIO GRANDE – RS.
A
GOSTO, 2002. ............................................................................................................................................60
Q
UADRO 3 – Q3 - COMO VOCÊ COMPREENDE A PRÁTICA DO EXAME FÍSICO? – RS. AGOSTO, 2002. .............. 62
Q
UADRO 4 – Q4 - QUAL É O SIGNIFICADO DO EXAME FÍSICO? – RS. AGOSTO, 2002........................................66
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................ 17
2 EM BUSCA DE HORIZONTES..................................................................................................................... 21
3 REVENDO PAPÉIS E HABILIDADES ........................................................................................................ 28
4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA SOBRE EXAME FÍSICO..................................................................... 36
5 MERLEAU-PONTY, O FILÓSOFO E A FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO ................................ 42
6 A TRAJETÓRIA METODOLÓGICA........................................................................................................... 50
6.1 OBJETO DA PESQUISA........................................................................................................................... 50
6.2 CAMPO DA PESQUISA ........................................................................................................................... 50
6.3 SUJEITOS DA PESQUISA........................................................................................................................50
6.3.1 Descrição do local da pesquisa .......................................................................................................... 51
6.4 QUESTÃO ÉTICA..................................................................................................................................... 51
6.5 COLETA DOS MATERIAIS.....................................................................................................................52
6.5.1 Preparo do campo e dos sujeitos do estudo........................................................................................ 52
6.5.2 Instrumento de coleta dos materiais ................................................................................................... 52
6.6 PROCEDIMENTO DE COLETA DOS MATERIAIS...............................................................................53
6.6.1 Primeiro Momento..............................................................................................................................53
6.6.2 Segundo Momento............................................................................................................................... 53
6.7 ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS MATERIAIS.................................................................................. 53
6.8 TRAJETÓRIA FENOMENOLÓGICA...................................................................................................... 53
6.8.1 Primeiro Momento..............................................................................................................................53
6.8.2 Segundo Momento............................................................................................................................... 54
6.8.3 Terceiro Momento............................................................................................................................... 55
7 O FENÔMENO ................................................................................................................................................ 67
7.1 I
DIOSSINCRASIAS....................................................................................................................................... 115
8 REFLEXÃO E RECOMENDAÇÕES.......................................................................................................... 118
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................................ 128
APÊNDICES...................................................................................................................................................... 132
APÊNDICE A .................................................................................................................................................... 133
APÊNDICE B .................................................................................................................................................... 135
APÊNDICE C .................................................................................................................................................... 136
1 INTRODUÇÃO
Este estudo propõe o desvelamento de um dos fenômenos do campo do cuidado
humano, realizado por enfermeiras
*
pediátricas, cuja relevância inicia na formação acadêmica
e culmina no exercício profissional em todas as áreas do cuidado humano.
O objeto do estudo são o conhecimento, a compreensão e o significado do exame
físico, tendo como proposta olhar com perspicácia para o fenômeno do exame físico, ou seja,
de que modo ele é realizado nas crianças hospitalizadas para tratamento clínico, em um
hospital universitário do interior do Estado do Rio Grande do Sul, pelas enfermeiras no seu
cotidiano.
Essa intenção do pesquisador conduziu-o à escolha de um estudo de caráter
qualitativo fenomenológico, tomando como amparo filosófico a Fenomenologia da Percepção
de Merleau-Ponty.
Conforme Merleau-Ponty (citado por CARMO, 2000, p. 35), “o corpo é a figura
visível de nossas intenções”. Portanto, o pesquisador encontrou, na filosofia merleau-
pontyana, fundamentos para todas as questões que perpassam o tema deste estudo – a
intencionalidade da consciência, a questão do corpo, o campo perceptual, o mundo vivido, a
correlação do homem com o mundo, o processo da conscientização, o papel da cultura e modo
como se olha para o mundo, onde se interage (situando-se) e tantos outros aspectos do
desvelamento deste fenômeno.
Ao constituir esta investigação, o pesquisador acenou com o seu mundo vivido na
docência como o despertar para o procedimento do exame físico, tendo-o como uma das bases
da prática de cuidado humano.
*
Optou-se pela utilização do termo enfermeira, pois todos os sujeitos da pesquisao do gênero feminino.
18
Revela-se como examinador preocupado com a realidade da criança doente
hospitalizada e, acreditando nas possibilidades dela, reflete sobre o cuidador consciente,
conhecedor dos conteúdos teóricos e das habilidades necessárias para poder evidenciar as
indicações de cuidado através do procedimento do exame físico.
Por se preocupar com as crianças/familiares, compreende o significado do estar
hospitalizado e conviver com a situação da doença, estranhos ao cotidiano, reconhece, na
simplicidade e no acolhimento, o modo de estar-com as pessoas.
Chama a atenção à qualidade dos instrumentos de ensino-aprendizagem durante o
curso de graduação de enfermagem, como começo e fundamento responsável pela formação
de profissionais orientados para as especificidades da profissão.
O pesquisador apoiou o estudo na filosofia da percepção de Merleau-Ponty pela
possibilidade de trabalhar com o sensível, o estético, perpassando o inteligível e refletindo
sobre o sentir os espaços do corpo, as percepções.
Dessa forma, constrói uma visão do corpo humano adoecido, não como um corpo
entre os corpos, mas como um existencial, um modo de ser-no-mundo, orientado pelo rigor da
metodologia fenomenológica.
Assim, este estudo propõe-se a rever os horizontes dessa temática, contribuindo
para a valorização do corpo e do espírito como os maiores textos a serem considerados pelos
profissionais, os quais têm incorporado a tarefa de decodificar os diferentes discursos neles
inscritos.
Os resultados do estudo acenaram:
Em relação ao que levou o estabelecimento da seqüência das partes do corpo da
criança durante o exame físico foi: o aprendizado; a cabeça como referência; a seqüência
estabelecida; a técnica, a realização da seqüência como hábito e o registro.
Em relação às bases de sustentação/defesas da prática do exame físico foram:
19
Sustentação
: o curso de graduação em enfermagem e a prática profissional; o aprendizado
está na continuidade do exercício do exame físico e leituras específicas sobre o tema; na
avaliação do estado geral da criança, com roteiro elaborado pelos enfermeiros; e na literatura
no rigor científico.
Defesa:
pelas finalidades do exame físico; por se constituir base para o cuidado humano; por
ser orientador das atividades essenciais da enfermagem; por se constituir em intercâmbio
entre profissionais; por retratar o estado da criança; por indicar o tempo e a forma consciente
de intervenção; por propiciar o desenvolvimento de habilidades dos enfermeiros; por ser
função assistencial que precede à administrativa; e por serem procedimentos que aproximam
a enfermeira da criança.
Em relação à compreensão do exame físico: como fundamento, conhecimento e
finalidade do cuidado humano; aproximação, respeito, toque, afeto com a criança; discurso
da criança e apreensão pelos sentidos da enfermeira; linguagem, respostas, evolução e
registro entre criança/enfermeira; prática cotidiana, auto-regulante do aprendizado da
enfermeira; prática humanizada que exige tempo da enfermeira; não execução do exame
físico igual a falha profissional.
Em relação ao significado do exame físico: contato humano; linguagem única;
envolvimento profissional; bases para intervenção da enfermagem; interação
criança/família/enfermagem; desenvolvimento da percepção; encontro teoria-prática e
interesse do aprendizado.
As recomendações do estudo dizem respeito ao alerta que o fenômeno constitui,
às instituições formadoras no que tange a importância do rigor no ensino do exame físico; as
instituições cuidadoras por se referir como fundamento para o processo de cuidado e para as
enfermeiras como uma revisão de conceitos e valores sobre o conhecimento e ao exercício
contínuo do exame físico.
20
2 EM BUSCA DE HORIZONTES
A partir da docência do pesquisador na disciplina de Prática da Assistência de
Enfermagem à Criança e ao Adolescente II na Fundação Universidade Federal do Rio
Grande – FURG – em Rio Grande, inúmeras vivências estão relacionadas ao tema do exame
físico e o seu ensino no curso de graduação, que ocorre durante as práticas supervisionadas.
Os acadêmicos realizam as práticas supervisionados pelo professor, em local previamente
selecionado por ele – a Unidade de Clínica Pediátrica do Hospital Universitário da FURG.
As práticas supervisionadas nesse local compreendem a realização de cuidados de
enfermagem a crianças hospitalizadas e acompanhantes, geralmente as mães, cuja execução
fica sob a responsabilidade do professor por delegação das enfermeiras assistenciais daquela
clínica pediátrica.
Os cuidados e crianças escolhidos previamente pelo professor são aqueles que
permitam aos alunos a vivência e execução das ações de enfermagem que promovem as
habilidades a serem alcançadas na disciplina de Prática da Assistência de Enfermagem à
Criança e ao Adolescente II.
As práticas são executadas num período de quatro horas/aula, nos turnos da
manhã ou tarde, em grupo de cinco acadêmicos, com duração de quinze semanas. Na fase
inicial, o professor assume os cuidados das crianças, que escolhe tendo em vista os objetivos
da disciplina e realiza técnicas, procedimentos etc. sob a forma de demonstração aos alunos,
que o acompanham, no seu turno, conforme disposição da matrícula no semestre letivo.
O exame físico é demonstrado minuciosamente pelo professor, obedecendo a um
roteiro para o qual os alunos foram previamente preparados. Nessa fase de estágio, o
professor está numa relação mais estreita, próximo de cada um dos alunos supervisionados,
fase em que ocorre o ensino do exame físico.
22
Na segunda fase, já concluídas todas as demonstrações, quando os acadêmicos
repetem as práticas que o cuidado requer, o professor afasta-se progressivamente deles com o
propósito de lhes permitir o desenvolvimento de sua autonomia na prestação dos cuidados e
estejam seguros, hábeis, satisfeitos na realização da assistência à criança e sua família, no
final do período dessas práticas supervisionadas.
As habilidades do professor são exaustivamente testadas. Esse mantém
permanente atenção em cada um dos cinco alunos, aciona sua capacidade de observação, de
percepção nos diferentes estágios de desenvolvimento de cada um desses para lhes indicar
problemas a solucionar, a separar o significativo do menos relevante, do que é prioritário e do
que não é, enfim, realizar as advertências pedagógicas necessárias ao crescimento dos
acadêmicos.
A realização desse procedimento requer competência e motivação constante para
corrigir e estimular o retomar de uma gama de experiências que ocorrem na situação de
cuidado à criança, visando a alcançar autonomia e competência por parte do aluno.
Essa relação é enriquecida pelo convívio estreito do professor com os alunos, por
estar junto com eles, acompanhá-los em suas descobertas, corrigi-los e encorajá-los nos seus
insucessos, provocar-lhes o interesse em descobrir o novo, em refletir sobre o que se está
desenvolvendo, analisar, criticar, sintetizar, comparar... Porém, não se deve esquecer que essa
convivência tão próxima do professor com seus alunos insere-se em uma situação de cuidado
em que estão presentes, também, e por causa disso, a criança hospitalizada, sua
família/acompanhantes, os demais membros das equipes médica e de enfermagem dessa
clínica pediátrica onde as práticas são desenvolvidas.
O ensino do exame físico faz o professor aproximar-se da criança e sua família e,
ao mesmo tempo, de cada um dos estudantes. Essa aproximação requer tempo, perspicácia,
respeito à condição da criança e de sua família, segurança e paciência com as incertezas e
23
medos dos alunos.
O trabalho de ajudar o aluno a desenvolver sua percepção em relação aos sinais
emitidos pela criança, através de seu comportamento e de sua condição física, exige que esse
ensino freqüentemente seja conduzido com sofisticadas observações, com minúcias
valorizadas, procuradas, reconhecidas e tratadas.
Rememorando a atividade de docente da disciplina Prática de Assistência de
Enfermagem à Criança e ao Adolescente II na Fundação Universidade Federal do Rio Grande
(1979), surge a cena de um exame físico em criança hospitalizada, realizado pelo pesquisador,
na função de professor, numa demonstração minuciosa do processo de observar a criança. Ao
segurar um dos pés do lactente e afastar cada um dos artelhos percebeu-se um minúsculo
ponto escuro no centro de uma área hiperemiada da pele da região plantar.
Ao se referir sobre esse fato aos acadêmicos que o acompanhavam, a maioria
alegou não ver absolutamente nada. A minoria concordava com a descrição feita pelo
professor, portanto, decidiu-se providenciar uma lupa para esclarecer a dúvida. Ao usar esse
instrumento, o ponto escuro percebido surpreendeu: era um corte minúsculo na pele, contendo
um fio de cabelo! Um fio de cabelo, provavelmente da mãe, que havia circundado o dedo e,
ao ser puxado, cortara a pele e deixara nela inserido uma parte.
Dedicando atenção especial a cada acadêmico, ofereceu-se a uma das alunas a
oportunidade de escolher entre todas as crianças hospitalizadas aquela que ela gostaria de
cuidar. A aluna achou excelente a proposta e solicitou para ficar só, porque ela iria se sentir
mais à vontade e desenvolver melhor as atividades de cuidado.
As atividades da acadêmica compreendiam a elaboração de um histórico de
enfermagem, no qual a realização do exame físico era parte importante, pois a criança
escolhida estava hospitalizada sem a presença da mãe ou outro acompanhante. Transcorrido o
tempo previsto para a realização dos cuidados, ela revelou que tinha coletado vários dados
24
sobre a criança no prontuário, mas que não tinha conseguido realizar o exame físico.
Essa segunda experiência ilustra o que comumente ocorre nesse processo de
desenvolvimento das práticas supervisionadas dos alunos do curso de graduação. A coleta de
dados sobre a criança e sua família, com quem os acadêmicos passam a interagir na clínica
pediátrica, tem início com a entrevista que é parte da anamnese que precede a realização do
exame físico na criança hospitalizada; esta anamnese é designada como Histórico de
Enfermagem (modelo de Wanda de Aguiar Horta, 1979).
A técnica da entrevista com a criança, na experiência docente, não tem sido
suficientemente valorizada, a despeito de sua importância, e revela o despreparo dos alunos ao
fazê-la com adultos, mesmo após conclusão de disciplinas anteriores às práticas
supervisionadas na clínica pediátrica. Mas, esse é um tema de pesquisa que poderá ser
desenvolvido no futuro por estar relacionado intimamente com o tema aqui em estudo – o
exame físico, que reflete algumas dificuldades: medo de conversar com a criança e medo de
conversar com os familiares/acompanhantes das crianças hospitalizadas.
Freqüentemente, os alunos revelam enorme dificuldade em tomar a iniciativa do diálogo e não
conseguem sequer estabelecer estratégias mínimas que favoreçam essa aproximação,
desprezando até o uso do brinquedo que, comprovadamente, produz resultados eficientes no
estabelecimento desse diálogo tão necessário ao Histórico de Enfermagem e ao Exame Físico,
particularmente.
O aluno consegue utilizar as informações sobre a criança, seu meio social e
ambiental registrados no Prontuário do Paciente, identificado como prontuário médico. A
atitude de tomar a criança ao colo para estabelecer diálogo e mesmo para realizar o exame
físico é uma estratégia que nomalmente esquecem de incorporar ao seu fazer de estudantes.
Acrescenta-se, ainda, a dificuldade de suportar, compreender e aceitar o choro da criança
doente hospitalizada.
25
Retornando ao caso da segunda experiência relatada anteriormente, constata-se
que a aluna não realizou o exame físico por se considerar incapaz de fazê-lo. Ela revelou que
tinha coletado vários dados da criança no prontuário médico, mas que não tinha conseguido
realizar o exame físico da criança. Havia a informação de que a criança estava com uma
obstrução intestinal, pelo diagnóstico médico da internação, sendo a proeminência de seu
abdome um evento notável e, depois de tantos outros comentários, referiu que a criança
(lactente de 3 a 4 meses de vida) “era difícil de examinar, choramingava o tempo todo e
estava toda dura”.
Essa segunda experiência é descrita para relatar a conduta adotada como
professor, a fim de facilitar o aprendizado da aluna.
No decorrer de práticas da disciplina de Prática de Assistência de Enfermagem à
Criança e ao Adolescente II, após ouvir o relato de uma aluna sobre a criança o professor
resolveu levá-la no colo. Ao primeiro toque, deparei-me com uma surpreendente hipertonia
muscular, envolvendo cabeça, pescoço, tronco e membros, como jamais vira em qualquer das
crianças que já tivera contato.
Os sinais vitais não acusavam alterações significativas e a temperatura do
ambiente propiciava a manutenção da criança completamente despida. Procurou-se uma
cadeira e confortavelmente sentado, com o ambiente totalmente calmo, coloquei sobre minhas
coxas um travesseiro de adulto, macio e, sobre ele, a criança deitada em decúbito ventral
(apesar do abdome proeminente), em posição transversal, a criança que sustentava a cabeça
em hiperextensão e hipertonia muito acentuada, quase uma postura de opistótono. Iniciou a
passar as mãos afetivamente da região da cabeça em direção aos pés, suavemente,
ritmicamente, vagarosamente, emitindo um som nasalado de ...humm,....humm.....humm...
cantarolado, suave, como se fosse uma cantiga de ninar, porém sem as palavras.
Ao final de algum tempo, o choro cessou e, progressivamente, a cabeça relaxou e
26
deitou sobre o travesseiro [isto me incentivou a continuar], o pescoço, os músculos do tórax
relaxaram, os membros superiores “caíram lateralmente ao corpo”, os glúteos relaxaram e os
membros inferiores afrouxaram, ficando suas extremidades pendentes para fora do
travesseiro!
A acadêmica observava e, através de gestos, apontou as mudanças que estavam
ocorrendo. Pouquíssimo tempo após o relaxamento, a criança emitiu em jato fortíssimo, flatos
e fezes, projetados com muita força, alcançando grande distância e em grande volume.
Em síntese, não havia nenhuma obstrução intestinal. Em investigação posterior,
soube-se através de sua mãe, pessoa portadora de deficiência auditiva, mendiga, que pelas
dificuldades de sua situação sociocultural-econômica o agredia fisicamente e o rejeitava,
desejando que o mesmo fosse adotado, repetindo experiências passadas.
Particularmente, essa segunda experiência confrontou-se com a importância de
tocar o corpo da criança examinada e de comunicar-se com ele através do tato.
A conduta de tomar a criança ao colo produziu um contato mais aproximado do
que a aluna havia tentado, o contato da pele do professor com a pele da criança, a escolha de
um lugar adequado dentro da enfermaria, a posição escolhida para segurar a criança, as falas e
sons cantarolados estavam comunicando aconchego, um estado de aceitação da criança e do
seu choro, e a criança passando a sentir-se acolhida.
O fato de apontar para a aluna as transformações que iam ocorrendo no
comportamento e na condição física da criança – culminando com a eliminação – tinham o
sentido de levar a acadêmica a observar que determinadas falas, sons, comunicam aconchego,
e o progressivo desmonte de postura, contrações e posições de defesa que a dor e o
desconforto haviam deixado inscritas no corpo da criança, sob a forma de acentuada
hipertonia muscular.
Ambas experiências, aqui relatadas, suscitam a reflexão de que é preciso
27
esclarecer o significado de muitas das condutas dos enfermeiros pediatras, do seu proceder
diante da criança hospitalizada, da execução da técnica do exame físico em particular, cujo
significado desvelado pode contribuir para que acadêmicos e profissionais enfermeiros
possam refletir sobre a abordagem do corpo do outro.
Muitas outras vivências no ensino e na prática do exame físico na criança
hospitalizada indicaram o caminho do estudo do exame físico, do significado do proceder do
enfermeiro encarregado de prover os cuidados que a criança hospitalizada requer, das
questões que a presença dela suscita no dia-a-dia do profissional.
3 REVENDO PAPÉIS E HABILIDADES
A enfermagem brasileira viveu importantes transformações no período do início
da década de trinta até o final da década de setenta, ocasião em que o pesquisador concluía o
curso de graduação em enfermagem, na Escola de Enfermagem da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul – UFRGS.
O pesquisador vivenciou a prática do exame físico como acadêmico numa fase de
desenvolvimento da enfermagem marcada pelo aprendizado de uma nova abordagem no
planejamento, execução e avaliação da assistência ao paciente, consolidando mudanças
iniciadas nos idos de 1930, quando o país esboçava a ampliação de sua parte industrial.
Naquela época, a política trabalhista de Getúlio Vargas – proteção à mão-de-obra
empregada – favorecia aos sindicatos em sua ação junto aos institutos previdenciários, cada
um deles estabelecendo suas próprias normas de organização para assistência à saúde. Desse
modo, havia uma grande variedade de formas de atendimentos médicos.
A cobertura de enfermagem era ainda realizada por pessoal que pertencia aos
quadros dos Institutos da Previdência Social, nesse contexto, considerando a falta de
informações relativas às condições de trabalho de todo o pessoal de enfermagem, a
Associação Brasileira de Enfermagem – ABEN – motivou-se e realizou um levantamento
sobre recursos e necessidades de enfermagem em todo o país.
Oliveira (1979, p.16) informava que, após o término desse levantamento, no seu
relatório, constava:
Um déficit de enfermeiras, agravado pelo desvio de função (manutenção, lavanderia,
...) e pela falta de pessoal auxiliar devidamente preparado para o cuidado ao paciente
hospitalizado; estranhando a ausência das enfermeiras nas unidades de pediatria
onde a maioria dos pacientes não são ainda capazes de expressar suas necessidades e
devem ser cuidados por pessoas com conhecimento e compreensão de psicologia
infantil.
29
A década de sessenta assinalava grandes transformações na vida política, social e
econômica do país, refletindo no desenvolvimento da enfermagem; a tendência do Estado em
conferir prioridade ao tratamento curativo, em detrimento das medidas preventivas, carreando
para aquele grandes somas de recursos, fatalmente, repercutiu no mercado de trabalho das
enfermeiras e na orientação dos currículos das escolas de enfermagem, cujo ensino faz-se
predominantemente nos ambientes hospitalares; ensino esse já orientado segundo as
diretrizes do currículo mínimo do Curso Superior de Enfermagem.
Na área da saúde, criou-se o Sistema Nacional de Saúde com a integração de
vários Ministérios; combateu-se a dicotomia entre saúde coletiva e individual; criticou-se o
privilégio que vinha sendo concedido ao setor privado da medicina; houve aumento da força
de trabalho e intensa urbanização no país. Nesse quadro, a enfermagem desenvolveu-se, de
um lado, sobre a influência da Reforma Universitária; de outro, em face da Reforma do
Ensino Secundário, propiciou-se a revisão dos currículos dos cursos, tanto de enfermagem
quanto de auxiliares, pela criação dos cursos técnicos de enfermagem.
É, no final da década de sessenta, que os professores enfermeiros começaram a
preparar suas teses de doutoramento, docência-livre e de mestrado, com aprofundamento,
cada vez maior em áreas de conhecimento, com reflexos na prática. Intensificou-se, por sua
vez, o interesse dos enfermeiros pela clínica de enfermagem e, em conseqüência, pelo
aprendizado de uma nova abordagem no planejamento, execução e avaliação da assistência ao
paciente de modo que os enfermeiros voltaram-se para o cuidado direto ao paciente, o que fez
crescer o nível de competência; exigiu um respaldo legal para suas novas ações fazendo
surgir a Nova Lei do Exercício da Enfermagem.
A Organização Mundial da Saúde – OMS – patrocinou a Conferência
Internacional de Saúde, realizada em Alma-Ata, para tratar da ampliação da cobertura de
serviços de saúde dos países membros; isso repercutiu no Brasil que criou dois programas
30
para essa ampliação – PIASS e PLUS – nas áreas rural e urbana, respectivamente; e, através
da Organização Panamericana de Saúde – OPS –, a O.M.S. fez recomendações específicas
para um progressivo envolvimento dos enfermeiros em seus programas, inclusive com
extensão do seu papel, até mesmo para tarefas que vinham sendo monopolisticamente
exercidas pelos médicos.
Assim, concorda-se com Oliveira (1979, p 16), para quem
o desenvolvimento da prática da enfermagem moderna no Brasil, na qual surge a
práxis do exame físico realizado pelo enfermeiro, ocorreu, acompanhando as várias
fases da evolução sócio-político-econômico do pais; que a prática da enfermagem
moderna ocorreu concomitantemente à institucionalização do cuidado ao paciente;
que a institucionalização do cuidado ao paciente ocorreu de modo
predominantemente, nas instituições hospitalares, justamente porque a ênfase do
sistema de saúde recaía na medicina curativa, graças aos recursos carreados pela
previdência social na assistência à força de trabalho do setor formal da economia.
No início da década de setenta, a enfermagem brasileira já buscava alcançar um
modelo de prática adequado à sociedade brasileira, este mais voltado para saúde do que à
doença, para as necessidades coletivas mais do que à assistência individual, e antes para o
autocuidado do que para os cuidados custodiais.
Na Escola de Enfermagem da UFRGS, foi a turma de acadêmicos de 1973, da
qual fazia parte o pesquisador, a pioneira ao realizar o aprendizado do Processo de
Enfermagem como o definia Dra. Wanda de Aguiar Horta, no qual o tema da prática do
exame físico está inserido (HORTA, 1979). Isso ocorreu em meio à vivência das “mudanças
curriculares” e da “reforma universitária” que afetavam o currículo da graduação da
enfermagem.
Silva (1979, p. 29) diz:
Até 1961, os cursos de enfermagem eram de nível médio, passando a nível
universitário a partir de 1962. Este fator é um marco na história da enfermagem
brasileira, podendo explicar, em parte, as mudanças em processo nessa área da
saúde; perde assim a imagem da enfermeira, paulatinamente, as cores negativas que
a revestiam no passado, enquanto a moderna enfermagem busca auto-afirmar-se no
campo da ciência; são sinais evidentes disso, por exemplo, a ênfase dada, no
Ensino, ao chamado ‘processo de enfermagem’ ou ‘processo decisório’ (Mendes)...
na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-SP.
31
Ferreira-Santos, citado por Silva (1979, p.30) destaca que se percebe claramente
uma ambigüidade no conteúdo do status-papel da enfermeira: “Ambigüidade está
fundamentalmente calcada no dilema: cuidado direto ao paciente x atividades de supervisão e
administração”.
Segundo Silva (1979, p. 30):
Este, parece-nos, é o problema central da profissão nos dias atuais em Ribeirão
Preto, talvez no Estado e, quem sabe, no país. Apesar das alterações ocorridas no
desempenho da enfermagem, entre nós, (burocratização, intelectualização), nas
décadas de 60 e 70, o aparato ideológico da enfermagem parece que se manteve
inalterável: “nightingaliano”. Ao final da década de 70, o objetivo da OMS,
difundindo o que denomina papel ampliado da enfermeira, parece representar uma
tentativa de redefinição de seu status-papel atual.
No final da década de setenta, precisamente 1977, o pesquisador concluía o curso
de graduação motivado a compreender as próprias concepções sobre ser enfermeiro, em
conjunto com todo o grupo profissional, e incorporar novos papéis com disposição para a
prática do exame físico no exercício cotidiano de sua profissão.
Durante o curso de especialização em enfermagem materno-infanto-juvenil da
Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1978), o pesquisador
conheceu o livro de Sana e Judge – Métodos Para El Examen Físico Em La Pratica de
Enfermeria – para ele o primeiro livro de referência com o tema, enfocando os aspectos do
exame físico dentro do Processo de Avaliação Clínica, realizado por enfermeiras (SANA;
JUDGE, c 1977).
O pesquisador que passou a se utilizar dessa obra, ao concluir o curso em 1978,
tornou-se o primeiro “enfermeiro” especialista nesta área no Rio Grande do Sul, e até hoje é o
único; e assumiu a responsabilidade do ensino do exame físico ao iniciar a carreira docente
no curso de graduação em enfermagem da Universidade Federal de Pelotas, Município de
Pelotas-RS. Em 1979, transferiu-se para a Fundação Universidade Federal do Rio Grande,
32
Município de Rio Grande/RS, criando a disciplina de Enfermagem Pediátrica, em que se
envolveu com o ensino do exame físico até o presente momento da realização deste estudo.
Desde o início da prática docente, o pesquisador percebeu que para alcançar
competência na assistência à criança não poderia desviar-se do estudo, do aprendizado
contínuo do exame físico, tão fundamentalmente relacionado à tomada de decisões
profissionais.
A vivência do exame físico diário constituiu parte da busca de autonomia
profissional, uma forma de assumir o desenvolvimento do novo papel de enfermeiro dentro do
planejamento da assistência de enfermagem; interesse genuíno de alcançar o bem-estar das
crianças assistidas, no seu aqui e agora, durante o tempo de convívio na unidade de pediatria,
por desenvolver uma forma aguçada de lhe compreender as necessidades físicas e emocionais,
as carências resultantes da ausência ou da má assistência.
A prática do exame físico tornara-se o fundamento da assistência de enfermagem,
constituindo-se em passo primordial, essencial para o seu planejamento e avaliação, de modo
que a busca de autonomia se referia à capacidade de tomar decisões com base em dados,
informações e conhecimentos elaborados pelo próprio enfermeiro no exercício de suas
funções, abandonando a prática anterior de tomar como referência os dados de fontes escritas
obtidas por outros profissionais, principalmente o médico, registradas no prontuário do
paciente hospitalizado.
Recordando o pesquisador do aprendizado do exame físico durante o curso de
graduação, logo após ter iniciado os estágios (momentos de convivência real com as crianças
hospitalizadas), sob supervisão de professores, observou nestes uma habilidade muito
desenvolvida em interpretar corretamente os sinais, carências, desejos, necessidades que as
crianças lhes transmitiam, sentido-se estimulado a buscar um maior aprofundamento nessas
mesmas habilidades do exame físico. É nítida a lembrança de que as exigências do meu
33
aprendizado não podiam ser satisfeitas antes da satisfação das necessidades percebidas nas
crianças hospitalizadas.
Até os procedimentos técnicos tinham que se subordinar a essa ordem imperiosa,
no pensar e no fazer, numa relação cuidador-cuidado: mesmo tendo de realizar a seqüência de
um histórico de enfermagem, do qual o exame físico era uma parte significativa, interrompê-
lo para segurar a criança no colo, quando havia o apelo, era uma imposição!
A necessidade da prática do exame físico acompanhou o pesquisador desde o
primeiro dia de estágio na unidade de pediatria de um hospital em Porto Alegre, que, ao
ingressar e fazer o primeiro contato com a criança hospitalizada, presenciou a morte de um
lactente, nos últimos minutos de sua vida, com o corpo totalmente despido no berço aquecido
e com alterações da normalidade física visíveis até para o mais inexperiente observador.
No segundo dia de estágio, o pesquisador foi confrontado não com um, mas com
uma enfermaria de crianças com hidrocefalia, espinha bífida e outras graves malformações do
tubo neural, com as meninges expostas em copioso transudato. Foi olhar para as crianças e
perceber quão descaracterizada estava a figura de ser humano naquelas crianças, e mesmo
sem ter concluído a graduação em enfermagem, tropeçando nas próprias inexperiências, o
pesquisador sentiu-se credenciado a assistir aquelas crianças e pode constatar que o cuidado
que lhes prestava diminuía-lhes o desconforto e o quanto essas crianças apreciavam que
estivesse presente.
Desde estas observações iniciais e ao longo desse período de vivência do exame
físico, o pesquisador chegou à compreensão de que no âmbito das ações de enfermagem, o
exame físico é uma técnica, é um proceder da enfermeira que visa ao cuidado (examinar e
ponderar com minúcias). É um momento de aproximação, no qual a enfermeira e o paciente
estão ligados por laços de possíveis características, entre os quais a confiança, segurança,
tolerância. Esse contexto levou o pesquisador à reflexão de que o entrelaçamento dos afetos
34
do homem com os outros, tece a teia que ele habita, onde livremente move-se e nutre, ou
amarra-se, paralisa, definha e morre.
Ao apreciar a contribuição significativa que a habilidade de realizar o exame
físico dá ao profissional, identifica-se o acolhimento e a distinção das características dos
materiais e recursos que dela se obtém.
Reconhece-se a observação como uma utilização significativa dos sentidos,
desenvolvendo o campo perceptivo do profissional. A fundamentação científica para as ações
de enfermagem passam pela habilidade de observar, e ela refina os dados aprendidos e
empresta-os ao processo de análise, que conduz à avaliação, à formulação de um significado.
O enfermeiro é o profissional que acompanha o dinamismo característico do
viver, hoje o seu objeto de cuidado (ser humano) caracteriza-se por tal atributo que, no
amanhã, poderá já ter outra característica. Esta apreensão (aquilo que foi apreendido) sugere
que esteja à disposição do profissional (e em favor do paciente) que aprecia, avalia e integre-
as em seu fazer profissional.
Ao ver o ser humano que se entrega a esse proceder, é possível que haja a
oportunidade do paciente deixar ver as coisas contidas no seu âmago (intimidade). O
profissional que aperfeiçoa no cotidiano sua sensibilidade torna-se hábil a desvendar as coisas
da sutileza.
Refletindo sobre sua vivência nessa prática, o pesquisador pode testemunhar que
ao final percebeu que o exame físico suavizou o seu tato, aperfeiçoou a sua audição e aguçou
sua visão, que hoje faz com que perceba as diferenças entre ouvir e escutar, entre olhar e ver,
segurar e tocar o corpo com alma e também não ficar indiferente ao sem alma, que distingue o
que precisa a imagem humana.
O comportamento da criança, sua condição física e até a situação que vive é um
discurso! Cabe ao enfermeiro decifrá-lo, ou se verá frustrado em sua interação e intervenção.
35
Vê-se o exame físico, entre outras razões, como um instrumento privilegiado para
compreender não só cada parágrafo desse discurso, mas o significado de cada oração e o
sentido expresso em cada palavra. Ler o corpo da criança (linguagem não verbal) e decifrá-la;
a criança não fala (linguagem oral), mas não quer dizer que não se comunique ou se expresse;
fala através dos gestos, na cor, no cheiro, no som, etc.
4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA SOBRE EXAME FÍSICO
Intui-se e pratica-se, no exercício da enfermagem pediátrica, que o exame físico
na criança revela, primordialmente, o aspecto do cuidado humano que, antes de um
procedimento, é uma técnica de responsabilidade profissional. Os profissionais da
enfermagem, hoje, executam a técnica do exame físico como uma prática de sua
responsabilidade. Foram precedidos pelos profissionais da medicina nessa prática.
Revendo a bibliografia acerca do exame físico, encontra-se a origem do
aprendizado médico na obra Semiologia Médica, do Professor Vieira Romeiro
(TARANTINO, 1983). Segundo Aloysio de Paula (1983), no prefácio dessa obra, pode-se,
sem exagero, afirmar que no terreno do diagnóstico, desde Laennec, a medicina viveu sob o
signo da auscultação. Durante mais de século, os médicos eram educados a ouvir. Corações e
pulmões desafiaram gerações médicas a entender e interpretar seus ruídos normais e
patológicos. E Vieira Romeiro era um típico representante daquela mentalidade, a ponto de
escrever um livro dedicado ao problema, o “Manual de Auscultação”, que teve a mesma
acolhida dos demais do autor”.
Falando da auscultação, diante da fabulosa riqueza dos métodos auxiliares do
diagnóstico existentes e do reconhecimento pela contribuição dos mestres do
passado, sobre os sopros do coração e os métodos gráficos que muito enriqueceram
o diagnóstico, conferindo-lhe a impessoalidade e a exatidão do documento e dele
retirando o componente subjetivo de cada um. Comparando os tempos, é fácil
entender que a Semiologia de outrora era muito mais dos estados terminais: era
vizinha da necropsia. A rica sintomatologia e a abundância de sinais clínicos
traduziam a doença plenamente constituída, em toda a exuberância de sua
exteriorização; aqueles sinais e sintomas existiam como ainda existem (PAULA,
1983, p. 2).
De acordo com Burke (1983, p. 10-11), a técnica básica de exame físico
fundamenta-se no uso dos sentidos: visão, audição, tato e olfato. O exame físico informativo
depende de pelo menos três aspectos fundamentais: (1) deve ser completo; (2) deve ser
tecnicamente correto; (3) deve ser compreendido no decurso de sua execução.
37
Burke (1983, p. 2) reforça: “um médico jamais será procurado por um fígado ou
um coração doente, mas sim por pessoas que sofrem e para quem deverá dar muito mais do
que simplesmente o diagnóstico preciso e/ou remédio tido como ideal”.
A citação anterior põe relevância na questão da percepção humana, sem, contudo,
diminuir a importância da relação interpessoal, pois há uma diferença fundamental entre a
utilização do conhecimento técnico para o diagnóstico e terapêutica de um quadro de doença
hepática e a conduta global adotada durante o período de investigação e a fase terapêutica.
Em consonância com Romeiro (TARANTINO, 1983
*
), a habilidade da inspeção
tem-se: Wintrobe: “os olhos vêem o que está gravado no cérebro”; Waring: “o exame físico
não espera pela retirada da camisa; Goeth: “só se vê o que se conhece”; Tumulty: “não basta
olhar, há que se ver, não basta ver, há que se analisar, não basta analisar, há que se
compreender, não só uma parte, mas o todo”.
Swartz (c, 1992), no início de sua obra sobre Semiologia, cita Sir William Osler
(1849-1919): “não toque o paciente – observe primeiro o que você vê; cultive seu poder de
observação”, e ainda, “deve-se ensinar o olho a ver, o dedo a sentir, e o ouvido a ouvir”.
Bates (1990, p.107) chama a atenção para o fato de que não só ao examinado deve-se
proteger, com privacidade, mas que essa preocupação deve ser também aplicada ao médico
porque – “como examinador, você também deve sentir-se confortável, pois as posições
incômodas afetam suas percepções”.
Ramos Jr. (1982, p. 207) destaca que “como orientação geral e obrigatória na
propedêutica física e funcional da observação clínica, o estudante e o médico devem se
educar, disciplinar-se na percepção de todos os seus sentidos, no reconhecimento de tudo que
possa ser normal, e particularmente, é óbvio, na percepção de todos os desvios para a
*
passim
38
anormalidade”.
Após olhar para os primórdios da literatura sobre o ensino médico na prática do
exame físico, o pesquisador empenhou-se em buscar e encontrar os primórdios da literatura de
enfermagem sobre esse tema, constatando que sua importância é destacada já desde o início
da era moderna da enfermagem, na obra de Florence Nightingale.
Sob tal perspectiva, o pesquisador compreende que o exame físico é uma prática
relativamente recente no ensino e na função dos enfermeiros. Embora o exame físico possa
ser abordado como uma técnica, esse novo proceder do enfermeiro extrapola o campo das
técnicas de enfermagem e enraíza-se no campo do cuidado humano, onde está o cerne, o
fundamento de sua profissão.
É notória a evolução da prática na enfermagem, orientada pela busca
sistematizada dos fenômenos e fatos – sinônimo da prática de enfermagem fundamentada no
método e nos princípios científicos – por obra das evoluções tecnológicas introduzidas na
medicina, forças histórico-sociais próprias de cada época e através de modelos de assistência
de enfermagem.
O pesquisador, neste momento, enfatiza a importância da obra “ NOTES ON
NURSING. WHAT IT IS, AND WHAT IT IS NOT”, de Florence Nightingale em 1859
(NIGHTINGALE, 1989), e sua contribuição para o desenvolvimento da prática do exame
físico na enfermagem.
Resumidamente, nessa obra, não há uma alusão direta à técnica do exame físico,
mas há uma habilidade fundamental que a acompanha – a observação. Assim, conforme
Nightingale (1989, p. 119), “a lição prática mais importante que pode ser dada a enfermeiras é
ensinar-lhes o que observar, como observar, os sintomas que indicam melhora no estado do
doente, os que indicam o contrário, quais são os de importância, os de nenhuma importância,
quais as evidências de negligência e que tipo de negligência”.
39
Ao finalizar o parágrafo, a autora remete o leitor às questões da ética profissional.
Também aborda a questão do conhecimento na formação do enfermeiro, quando diz: “Tudo
isto é o que deve fazer parte, e parte essencial, do preparo de cada enfermeira. São poucas,
nos dias de hoje (1859), as profissionais ou leigas que de fato sabem se a pessoa doente a
quem dão assistência está melhor ou pior” (NIGHTINGALE, 1989, p.119).
E prossegue, referindo a observação como habilidade essencial da enfermeira:
“Pois pode-se afirmar com segurança que não é apenas o hábito de observar rápida e
seguramente que faz de nós enfermeiras úteis, mas que sem esse hábito seremos inúteis, ainda
que plenas de todo o devotamento” (NIGHTINGALE, 1989, p.125-6).
Em meados do século XIX, Florence Nightingale já destacava a habilidade
fundamental para o desenvolvimento da enfermagem, ressaltando o valor da observação,
tornando implícito o quê e como formar o profissional; uma habilidade fundamental que
acompanha o procedimento do exame físico e que mobiliza a utilização dos sentidos (olfato,
tato, visão, audição e gustação), que significa também o desenvolvimento da acuidade
perceptiva.
Ao falar diretamente sobre o quê e o como observar sintomas que indicam a
melhora ou a piora do paciente; quais são os sintomas de importância ou não; quais as
evidências de negligência, o tipo delas, Florence está abordando questões relacionadas ao
controle e à execução do cuidado, do estabelecimento de prioridades essenciais a atenção às
mudanças que orientam possíveis novas condições do paciente.
Destaca-se que, em 1859, Nightingale dizia serem poucas as “profissionais e
leigas” que “de fato” sabiam se a pessoa doente estaria melhor ou pior; falando em
enfermeiras úteis e inúteis. Ela estava referindo-se a evolução ou involução do quadro da
doença, mas, principalmente, às enfermeiras úteis, as quais possuíam a qualidade do que é
superior no conhecimento; e às enfermeiras inúteis, isto é, sem qualidade, dizendo não existir
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nenhuma vantagem se estivessem envolvidas no cuidado humano. Ressaltava, ainda, que a
falta dessa primazia no conhecimento suplantava e esvaziava o ato de devotamento, de
dedicação ao doente. Relaciona a observação com a capacidade de memória da enfermeira ou
de uso de registros:
Se você acredita que fazer anotações desses detalhes [gerados pela observação] em
um pedaço de papel auxilia seu trabalho, faça-o. Penso que essa prática muitas vezes
enfraquece a memória e a observação ao invés de fortalecê-las. Se você, porém, não
conseguir o hábito de observação de uma maneira ou de outra, é melhor então deixar
de ser enfermeira, pois não é sua vocação, em que pese sua bondade e seus anseios
(NIGHTINGALE, 1989, p.126).
Florence menciona outra habilidade vinculada à da observação – a de análise e
julgamento, intrinsecamente relacionadas ao exame físico, e recomenda:
Certamente [a enfermeira] pode pelo menos aprender a julgar, pelo olhar [inspeção],
quanto são 28 g de alimento sólido ou a mesma quantidade de alimento líquido.
Descobrirá que isto ajuda muito sua observação e memória, e dirá para si mesma ‘o
paciente A comeu 28 g da carne que lhe foi servida hoje; o paciente B tomou cerca
de 140 cc de caldo de carne, três vezes nas 24 horas’; ao invés de dizer: ‘o paciente
B não comeu nada durante o dia’ ou ‘servi o jantar ao paciente A como de costume’
(NIGHTINGALE, 1989, p. 126).
Quando Florence aborda a memória da enfermeira e o recurso das anotações,
enfatiza a necessidade da precisão ao evoluir das observações sobre o paciente, no intuito de
historiar o que se passou, as mudanças e os resultados, principalmente quanto à sua utilidade
ou não, o que alude diretamente à questão qualitativa da enfermagem.
Hoje, vivencia-se aquilo que foi sua preocupação em relação à análise e ao
julgamento do exercício, porque se pretende alcançar os juízos clínicos avançados com os
quais e a partir deles se desenvolvem cuidados pertinentes e efetivos.
Mais adiante, em sua obra, Florence aborda o tema da aparência do doente, seu
rosto, sua fisionomia, suas mãos, as pupilas, a pele, quando menciona que: “a aparência do
doente mostra apenas parte da fisionomia da doença. Há uma fisionomia da doença,
indubitavelmente. Que as enfermeiras aprendam isso” (NIGHTINGALE, 1989, p.130).
41
Ao se referir à “fisionomia da doença”, Florence aborda outro aspecto
fundamental que envolve os responsáveis pelos cuidados dos outros (pacientes, clientes)
quando o enfermeiro os assume verdadeiramente, ao formar uma imagem do ser cuidado em
sua mente de cuidador. Florence ainda prescreve que a enfermeira deve observar e detectar a
perda gradual de forças do paciente, pois ele não se queixa disso. Observar que o paciente não
pode mais fazer as coisas que fazia há um mês ou há um ano.
Ensina que o enfermeiro deve ficar atento à perda da autonomia provocada tanto
pela presença da doença quanto pela fase do processo de envelhecimento humano,
constatando que “é assombroso como as pessoas continuam fazendo observações superficiais
ou, muitas vezes, nenhuma observação” (NIGHTINGALE, 1989, p.130). Expressa
preocupação com o declínio da capacidade de observação, em vista da ampliação do
conhecimento em patologia – ciência que ensina a mudança final produzida pela doença no
corpo humano – e insuficiente apenas na arte de observar os sinais de mudança enquanto ela
se processa. Afirma, categoricamente, a necessidade, a vital importância da observação
minuciosa, que não deve ser feita para “coletar uma pilha de informações variadas ou de fatos
curiosos, mas para salvar vidas e melhorar a saúde e o conforto” (NIGHTINGALE, 1989, p.
137), e surpreende-se porque muitos profissionais valorizam a observação como se a
finalidade dela fosse apenas científica, como se o corpo doente fosse apenas um reservatório
para estocagem de remédios.
A experiência com a observação em relação à criança permite dizer que o
enfermeiro que realiza o exame físico constrói uma “imagem mental” do examinado, do seu
corpo, de forma privilegiada, mas também do seu comportamento, com tanta propriedade que
se habilita ou se capacita a acompanhar as mudanças que se processam nessa imagem, no
transcurso das inter-relações que mantém com o ser cuidado (o examinado), estando seguro
ao afirmar que é capaz de dizer se seu paciente está melhor (e no quê) ou pior (e por que).
5 MERLEAU-PONTY, O FILÓSOFO E A FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO
Este estudo propõe-se a olhar com perspicácia para o fenômeno do exame físico,
de que modo ele é realizado pelas enfermeiras nas crianças hospitalizadas para tratamento
clínico em um hospital universitário do interior do Estado do Rio Grande do Sul, e
principalmente o significado que a ele as enfermeiras atribuem em sua prática cotidiana.
Buscou-se o amparo filosófico na fenomenologia da percepção desenvolvida por
Merleau-Ponty, que, em sua obra “Fenomenologia da Percepção”, aborda as questões que
perpassam integralmente o tema aqui focalizado – a questão do corpo do examinado – o
campo perceptual – a relação do homem com o mundo – o papel da cultura e o modo como se
olha para o mundo em que se vive, e tantos outros aspectos que emergiram durante a
realização do estudo.
Merleau-Ponty considera a percepção a porta de entrada – e de saída – para o
mundo exterior, em consonância com o dito secular que afirma serem os olhos “as janelas da
alma e o espelho do mundo” (MERLEAU-PONTY, 1971).
No chamado pensamento clássico que o antecedeu, encontra-se a valorização
excessiva do inteligível, sendo que ao sensível deixou a noção de que cria obstáculos e
ambigüidades. A fenomenologia de Merleau-Ponty surgiu para contestar isso, pois, para ele, a
reflexão pura e simples não é capaz de esclarecer uma parte decisiva da realidade,
principalmente o fenômeno artístico, que depende também do sensível.
Ele ensina que não se deve banir, em nome da razão, aquilo que a precede, pois essas forças
irreflexivas, que outros chamam de inconsciente, desempenham importante papel na produção
artística, científica e filosófica.
A história do pensamento ocidental julgou ter conceituado com clareza o
conhecimento quando estabeleceu a separação, considerada inevitável, entre idéia e fato,
43
sujeito e objeto, espírito e corpo, olho e intelecto e, por fim, ciência e filosofia.
Merleau-Ponty buscou evitar essas oposições, em que ou tudo é consciência ou
tudo é matéria. O pensamento merleau-pontyano procurou superar o dualismo entre o sentir e
o entender, defendendo a interação entre ambos.
Numa relação de conhecimento, é necessário um mergulho no sensível, unindo o
sujeito que conhece ao objeto que é conhecido.
Sua preocupação central é definir que todo conhecimento presente na consciência
passou primeiro pelas portas da percepção: “Nós nunca deixamos de viver no mundo
da percepção, mas a ultrapassamos pelo pensamento crítico, a ponto de esquecer a
contribuição que a percepção dá para concepção de verdade (CARMO, 2000, p.32).
Quando Husserl, o criador da fenomenologia, defendia a volta da filosofia às suas
origens, às coisas tais como aparecem, sua pretensão era de que o pensamento crítico
tradicional deveria descer de suas alturas de idéias abstratas para tratar do mundo; e seu
discípulo Merleau-Ponty, em sua Fenomenologia da Percepção, foi além, especificando a
volta da filosofia às suas origens “em carne e osso”, em que a filosofia deveria voltar ao
mundo em que se vive; pôs-se, assim, Merleau-Ponty como um “filósofo da existência” –
sua filosofia preocupa-se com o homem muito mais na sua existência do que na sua essência
pois o homem é pensado em seu meio natural, cultural e histórico, ou seja, como ser-no-
mundo, mais do que como ser ideal, privilégio anteriormente dado pela filosofia da
consciência.
E Merleau-Ponty observa que nós vivemos tão “colados” ao mundo exterior que,
para descrevê-lo, somos obrigados a efetuar um recuo artificial, isto é, precisamos tomar
distância para melhor observar as coisas que nos cercam. Pela auto-reflexão, o pensamento
passa a ser objeto do próprio pensamento. O mundo exterior é colocado “entre parênteses”,
isto é, ele é posto de lado, deixando, portanto, de ser problema. A reflexão, pois, não se retira
definitivamente do mundo para criar um mundo idealizado; faz apenas um recuo ou, como
44
diz Merleau-Ponty (1971, p.23), “distende os fios intencionais que a ligam ao mundo”, sem
rompê-los, apenas para melhor compreendê-lo.
Na reflexão deve haver, portanto, o retorno para o lugar de onde ela partiu, isto é,
o mundo percebido em seu solo de experiência vivida. As idéias só existem porque são idéias
sobre coisas. Idéias e coisas não podem ser separadas, pois constituem um único fenômeno,
visto que a consciência não tem poder de constituir o mundo.
Para o filósofo não se trata de considerar a consciência como algo puro,
distanciado do mundo. O mundo é o meio de realização da consciência. Se o homem é um
ser-no-mundo, a consciência tem de coexistir com esse mundo que desde sempre o envolve.
Ela não pode ser tratada como um espectador distanciado do mundo ou como um legislador
supremo, pois é preciso reconhecê-la como uma luz em direção ao mundo. Merleau-Ponty
quis desenvolver uma filosofia que mostrasse o “enraizamento” do espírito no corpo, isto é, a
consciência atada a um corpo que a liga ao mundo.
A palavra fenômeno, em sua origem grega, quer dizer luz, brilho. “Fenômeno-
logia” é, assim, o estudo do fenômeno, a busca de sua coerência lógica. Implica permitir que
as coisas manifestem-se como são, sem que se projete nelas as construções intelectuais; quer
dizer, inverte-se filosoficamente a orientação que se está acostumado a receber de outras
correntes filosóficas. Pela fenomenologia, deseja-se deixar bem claro, não é o ser que interferi
nas coisas: são elas que se mostram, ou melhor, que se deixam revelar.
Esse ensinamento é relevante para a natureza deste estudo sobre o fenômeno do
exame físico da criança hospitalizada e de que modo ele é realizado pelas enfermeiras no seu
cuidado cotidiano.
Busca-se apoio na fenomenologia porque sua grande tarefa é descrever os
fenômenos, e não explicá-los; porque explicar implica interferir no fenômeno, introduzindo
nele categorias lógicas, de modo que explicar é um ato artificial, enquanto descrever supõe
45
abordar o fenômeno a partir da perspectiva do homem que o vivencia, tal como ele apresenta-
se à consciência; como visto, não há ruptura entre o vivido e o pensado, como se fossem dois
mundo diferentes, porém, trata-se de um mesmo universo a desvelar.
Nas correntes filosóficas que o antecederam, principalmente no empirismo e no
intelectualismo, há muito de construção artificial acerca do fenômeno e nem em uma nem em
outra “surpreendem a consciência aprendendo”. Para Merleau-Ponty, o aprendizado da
consciência ocorre no dia-a-dia, no fluxo da vida – chamado existência! Portanto, um corpo
sem consciência é apenas um autômato. A consciência sem corpo é impensável em termos
filosóficos, de modo que a consciência e o corpo devem funcionar em conjunto, um
dependendo do outro.
Foi Merlau-Ponty que, ao introduzir a consciência no mundo da percepção,
estabeleceu uma ponte entre ela o mundo; e pensando na relação sujeito-objeto ele se pôs
diante do enigma da realidade, cuja ambigüidade assim exemplificou: quando minha mão
direita toca a minha mão esquerda ocorre um fenômeno difícil de determinar – quem toca e
quem é tocado? Qual das mãos é sujeito e qual é objeto? Essa ambigüidade operada pelo
corpo acompanha toda a sua obra.
A parte interrogada do corpo – quando tocada – sai do anonimato e mostra-se,
anuncia-se. O que era fundo transforma-se em figura. Dessa forma, o corpo não se constitui
barreira que nos isola do mundo, mas, pelo contrário, atua como uma ponte que nos coloca em
permanente contato com o mundo. A ambigüidade da natureza corpórea resultante da reflexão
corpórea faz com que o corpo seja simultaneamente sujeito e objeto.
Dessa constatação, resulta a possibilidade de o corpo vivido voltar-se sobre si
mesmo e refletir-se, instaurando um outro tipo de reflexividade: “um visível que se vê, um
tocado que se toca, um sentido que se sente” (CHAUÍ, 1980 citado por CARMO, 2000, p.
90).
46
É possível concluir, sem erro, que a fenomenologia é uma corrente da filosofia
que não faz distinção entre o papel atuante do sujeito que conhece – como ocorre no
racionalismo – e a influência do objeto conhecido – como ocorre no empirismo. A
consciência é sempre consciência de alguma coisa e o objeto é sempre objeto para uma
consciência. Desse modo, não existe o objeto em si destacado de uma consciência que o
conhece. O objeto é um fenômeno. Citando Martin Heidegger, discípulo de Husserl,
fenômeno significa aquilo que se mostra, que está manifesto, o revelado. O manifesto não
significa aparência ilusória, mas algo “tal como é” (CARMO, 2000, p. 21-22).
Assim, recorrendo-se a uma das várias definições para a filosofia de Merleau-
Ponty, que foi adotado para embasamento deste estudo, poder-se-ia chamá-la, também, de
“Filosofia do Corpo”. É através [do corpo] e a partir dele que se estabelece a existência no
mundo.
Para Merleau-Ponty, o corpo é a figura visível das intenções humanas. Ele insiste
com radicalidade na reabilitação do sensível, de que a tradição filosófica sempre desconfiou.
Merleau-Ponty realiza um esforço para recolocar o pensamento numa existência pré-reflexiva,
introduzindo, como base, o mundo sensível, tal como ele existe para o nosso corpo. Quando
estudado o exame físico, sabe-se que se está pensando e tratando desse corpo.
Na história da filosofia, seus pensadores quase sempre duvidaram dos sentidos,
afastando-se deles por identificá-los com erro e ilusão, porém, na filosofia de Merleau-Ponty,
a meta preconizada é o contrário do sobrevôo, é o mergulho no sensível. A sensação não pode
ser estudada por meio de um juízo intelectual, por uma consciência distanciada que a toma
como objeto de estudo. Se a reflexão conjuga-se com o corpo, então, não é possível que ela se
situe fora dele e, ao mesmo tempo, o explicite.
Para ele, tudo o que teoricamente se afirma a respeito da sensação tem sido uma
construção acerca dessa mesma sensação, e não a descrição dos fenômenos tal como eles
47
ocorrem. Normalmente, atribui-se à consciência a capacidade de explicação do fenômeno da
sensação de maneira clara e distinta; entretanto, tudo aquilo que a consciência possui sobre a
percepção, ela o retira do percebido!
O que Merleau-Ponty afirma? Que, na ação cotidiana, os atos inconscientes
predominam sobre os conscientes, e toda atividade, reflexiva ou não, tem como fundamento a
percepção do mundo. Carmo (2000, p.37) diz:
Pensemos em nós mesmos, em nosso cotidiano: apreendemos o mundo sem
necessidade de problematizá-lo ou refletir sobre ele. Nem sempre estamos refletindo
sobre os nossos atos e sobre o mundo em que vivemos: a realidade mundana é aceita
ingênua e simplesmente, como ocorre com a criança, que ‘percebe antes de pensar’.
A experiência infantil oferece-nos uma visão de certo modo exemplar. Ela denuncia
a presença de um mundo anterior ao pensamento reflexivo e, justamente por ser
anterior à tomada de consciência do mundo, permite que entendamos o processo de
conscientização.
Carmo (2000) deixa bem claro que se poderia dizer que Merleau-Ponty faz
distinção entre dois níveis de existência: os níveis pessoal e pré-pessoal. Para Merleau-Ponty,
o nível pré-pessoal é o corpo, que, agindo como doador de sentido e significado, propicia-nos
o relacionamento que precede toda escolha consciente. Isso inverte a proposição de Descartes,
podendo-se dizer que o homem pensa porque existe! Constantemente, realizam-se ações que
não são determinadas pela livre escolha. Primeiramente, tem-se uma visão ingênua do mundo
e esta visão passa, posteriormente, pelo crivo da reflexão.
A próxima indagação que se impõe é: o que é, então, a percepção para Merleau-
Ponty? Encontra-se sua resposta conforme Carmo (2000, p.41):
A percepção não é um objeto tardio para a consciência. Ela é a forma originária e
primeira do conhecimento. O percebido se transforma para uma consciência que,
quando em estado de alerta, dá conta de sua manifestação. Toda percepção ocorre
numa atmosfera difusa e escapa ao controle do sujeito, pois não é um ato de vontade,
de decisão de uma consciência atenta, mas sim expressão de uma situação dada. As
cores, por exemplo, vêm a nós independentemente de um ato de nossa vontade; se
vemos o azul é porque somos sensíveis às cores.
Para Merleau-Ponty, o mundo vivido nunca é inteiramente compreensível.
48
Assim, os objetos não nos são dados por inteiro; nós os vemos por perfis: uma parte
se manifesta enquanto outra se esconde, numa relação figura-fundo. Apesar disso,
nossas sensações se dão numa configuração global: ver é tocar, ouvir é ver, tocar é
ver. Há uma unidade dos sentidos; eles se comunicam...Como não existem
sensações puras, somos assediados no mundo vivido por um turbilhão de sensações
que interagem entre si. Isso não quer dizer que se possa chegar ao extremo de
afirmar que os nossos órgãos sensitivos não tenham a sua especificidade. “Cada um
dos órgãos dos sentidos interroga o objeto à sua maneira (citado por CARMO,
2000, p. 42).
Não sendo o corpo apenas uma união de órgãos justapostos, como quer certa
fisiologia (a “mecânica do esqueleto”), pode-se falar nos sentidos traduzindo-se um no outro,
para além da necessidade de serem especificados pela consciência. Carmo (2000, p. 43) diz:
“O corpo permite que haja conexões entre os campos de sensitividade. Dessa maneira, é
possível explicar por que, a despeito da surdez, Beethoven continuava com a capacidade de
compor músicas” e, ainda, cita Merleau-Ponty na obra Fenomenologia da Percepção:
Assim, por intermédio dos olhos vê-se a rigidez e a fragilidade do ‘vidro’ e também
‘se vê o peso de um bloco de ferro fundido’, sente-se a ‘fluidez da água’ e a
‘viscosidade do xarope’. Pela audição ‘escuto a dureza e a diferença dos
paralelepípedos no barulho de um carro, e fala-se, com razão, de um barulho
‘delicado’, ‘terno’ ou ‘seco’ (citado por CARMO, 2000, p.265).
Não se está, portanto, diante das coisas do mundo como meros espectadores. Está-
se entre as coisas, interagindo com elas. Há um saber da coisa também pelo que ela tem de
oculto, pelo que ela não expressa ou manifesta diretamente ao olhar. A ciência e a filosofia
em geral têm como missão eliminar o mistério das coisas de que a arte, ao contrário, alimenta-
se.
Para a filosofia tradicional, o mistério é o que impede o pensamento; para
Merleau-Ponty, é o que faz pensar e o faz interrogar sobre o mistério do corpo reflexionante!
Para esse autor, o corpo não age como causa separada (como no dualismo corpo-alma) para
introduzir distorções no pensamento, mas sim produzir percepções da qual o pensamento se
serve. Assim, o corpo deixa de ser considerado um receptáculo passivo das ações de um
mundo de coisas ou uma barreira que isola o espírito do seu exterior. Tampouco, o corpo está
49
na dependência do poder soberano da consciência; em vez disso, ele exerce um papel de
mediador por excelência, uma vez que põe em permanente contato com o mundo e marca a
presença do mundo no ser.
Carmo (2000, p.82-85) afirma que “não é possível explicar a complexidade do
corpo somente através da relação mecânica de estímulos e respostas; ele é também animado
por relações imaginárias com o mundo. Deve-se evitar a idéia do corpo como uma máquina
ou um relógio, tão cara a Descartes”. Na seqüência, apresentam-se alguns fatos da biografia
de Merleau-Ponty que são suficientes em resposta à pergunta: Quem é Merleau-Ponty?
Bicudo e Espósito (1997, p.18) respondem:
Jean Jacques Maurice Merleau-Ponty nasceu em 12 de maio de 1908 e morreu em 3
de maio de 1961. Filósofo e Psicólogo francês, estudou na École Normale
Supérieure, onde mais tarde foi admitido como professor agregado (1962-1930).
Ensinou nos liceus de Beauvais (1931-1933) e Chartres (1934-1935). Em 1945, foi
nomeado “mestre de conferências” da Universidade de Lyon, onde viria a ser
também professor de Filosofia até 1949. Obteve a cátedra de Psicologia da Criança e
Pedagogia na Sorbonne (1949-1952), e depois de 1952 retomou a cátedra de
Filosofia no Collège de France.
6 A TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
Para desenvolver este estudo, o pesquisador entendeu adequada a utilização da
pesquisa qualitativa fenomenológica.
6.1 OBJETO DA PESQUISA
O conhecimento, a compreensão e o significado do exame físico.
6.2 CAMPO DA PESQUISA
A escolha do campo da pesquisa recaiu sobre a Clínica Pediátrica do Hospital
Universitário da Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG – onde desenvolve-
se concomitantemente as atividades de assistência à criança, o ensino, a pesquisa e a extensão
universitária.
6.3 SUJEITOS DA PESQUISA
Os sujeitos desta pesquisa foram as oito enfermeiras que desenvolvem sua função
no cuidado à criança internada para tratamento clínico no Hospital Universitário da FURG,
município do Rio Grande/RS. Todas as enfermeiras são egressas do Curso de Graduação em
Enfermagem e Obstetrícia da FURG; ingressaram por concurso público no Hospital
Universitário; o tempo de graduação varia de cinco a vinte anos; uma delas é mestre em
enfermagem pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC – e as demais graduadas.
51
6.3.1 Descrição do local da pesquisa
O Hospital Universitário (H.U.) da FURG é o campo onde se realiza o ensino de
graduação em enfermagem, no qual o pesquisador desenvolve sua prática na função de
enfermeiro e docente do curso de graduação.
O número de leitos da Clínica Pediátrica do H.U. é de vinte e quatro leitos para
tratamento clínico, sendo que há mais cinco leitos destinados ao cuidado intermediário, que
também ficam sob a responsabilidade de cinco enfermeiras, distribuídas da seguinte forma:
uma no turno da manhã, duas no turno da tarde e uma para a noite-01 e uma para a noite-02.
As três outras, desenvolvem atividades na UTI do Hospital Universitário.
O H.U. da FURG é referência para obstetrícia na área da terceira coordenadoria
regional de saúde do Estado do Rio Grande do Sul, abrangendo os municípios de Rio Grande,
Pelotas, São José do Norte, Santa Vitória do Palmar, Chuí, Bagé e Dom Pedrito. É também
hospital de referência para o tratamento da AID’S nos municípios da Zona Sul do Estado/RS e
obteve o título de “Hospital Amigo da Criança”.
O H.U. da FURG define-se como espaço onde a prática do exame físico no
cuidado à criança é considerada o passo principal para a organização e implementação do
plano de cuidados.
6.4 QUESTÃO ÉTICA
O estudo foi realizado após autorização da Direção do Hospital Universitário da
FURG, tendo em vista que não foi concluído o processo de criação e constituição da
COMISSÃO DE ÉTICA dessa instituição (Apêndice A).
Os sujeitos da pesquisa foram comunicados, esclarecidos e consultados sobre a
possibilidade de sua livre participação no estudo conforme a legislação que trata do
consentimento informado (Apêndice B).
52
Em face da participação dos pacientes no desenvolvimento da primeira etapa da
coleta dos materiais, oportunidade onde as enfermeiras necessitaram cada uma de uma criança
para realizar o procedimento, os pais acompanhantes também foram informados, esclarecidos
e consultados sobre a possibilidade da participação de seus filhos no estudo (Apêndice C ).
6.5 COLETA DOS MATERIAIS
6.5.1 Preparo do campo e dos sujeitos do estudo
O preparo do campo e dos sujeitos do estudo foi realizado prévio ao procedimento
da coleta dos materiais. Foi o momento quando o pesquisador visitou o campo de estudo;
contatou com cada sujeito solicitando sua participação e explicando como seria o processo de
inclusão na pesquisa.
Concluída esta etapa, o pesquisador agendou as entrevistas individuais,
combinando o dia, hora e local. Foi solicitado também anuência do sujeito para utilizar o
gravador (Apêndice B).
6.5.2 Instrumento de coleta dos materiais
Para coletar os materiais o pesquisador utilizou-se da técnica da entrevista semi-
estruturada constituída de quatro questões norteadoras do estudo. Estas questões foram
elaboradas com o propósito de possibilitar ao pesquisador desvelar aspectos do fenômeno
exame físico.
O que lhe levou a estabelecer esta seqüência das partes do corpo da criança que
você acabou de examinar?
Em que bases sustentas/defendes a prática do exame físico?
Como você compreende a prática do exame físico?
Qual o significado da prática do exame físico?
53
6.6 PROCEDIMENTO DE COLETA DOS MATERIAIS
6.6.1 Primeiro Momento
O pesquisador convidou cada sujeito para executar o exame físico em uma das
crianças hospitalizadas e sob seus cuidados durante o seu turno de trabalho. Nesse momento,
o sujeito realizou e relatou cada passo percorrido no exame físico, possibilitando ao
pesquisador presenciar o desenvolvimento da técnica sem realizar nenhuma interferência.
6.6.2 Segundo Momento
Tão logo concluída a execução do exame físico, a enfermeira foi convidada à sala
de entrevista previamente combinada e foi entrevistada pelo pesquisador. Este formulou-lhe
cada uma das quatro questões norteadoras do estudo, gravando as respostas em fita magnética.
6.7 ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS MATERIAIS
Organização
Após a coleta dos materiais e da transcrição dos dados da fita magnética, o
pesquisador leu atentamente cada entrevista para poder entrar no mundo descrito pelo sujeito.
6.8 TRAJETÓRIA FENOMENOLÓGICA
6.8.1 Primeiro Momento
De acordo com Martins (1992, p.59), “a descrição é o primeiro momento da
trajetória fenomenológica”. A leitura atenta da descrição fenomenológica possibilita ao
pesquisador ir destacando cada conjunto da fala ingênua do sujeito que encerra um
54
significado. Estes são cuidadosamente separados e reescritos na linguagem do pesquisador.
Merleau-Ponty explica que “para responder a indagação do pesquisador o sujeito direciona a
sua consciência para o seu mundo-vida, isto é, consciência do corps prope ou seja corpo-
vivido, consciência esta que é a descoberta da subjetividade e da intersubjetividade”
(MARTINS, 1992, p. 59).
6.8.2 Segundo Momento
O segundo momento da trajetória é a “redução fenomenológica” ou “époche”.
Este é o momento quando o pesquisador, imbuído das colocações do sujeito, procede o
distanciamento de suas próprias percepções, crenças e valores, privilegiando as experiências
vivenciadas pelo sujeito.
Para Martins (1992, p. 60), “o propósito deste momento é isolar o objeto da
consciência – as coisas, as pessoas, as emoções ou outros aspectos que constituem a
experiência que estamos tendo”.
De acordo com Bicudo e Espósito (1994, p. 27):
é o momento de determinar, selecionar quais partes da descrição são consideradas
essenciais e aquelas que não são. Deseja-se encontrar exatamente que partes da
experiência são verdadeiramente partes da nossa consciência. É o momento da
retirada de toda e qualquer crença, teoria ou explicações existentes sobre o
fenômeno. É o momento do encontro do pesquisador com o fenômeno.
O pesquisador, ao assim proceder, recolhe destas vivências relatadas pelos
sujeitos o que se passa no pré-reflexivo do sujeito. Aí se inicia a estruturação das unidades do
significado e a clarificação das temáticas que compõem as essências constituintes do
fenômeno.
As essências estão organizadas em temáticas convergentes e idiossincrásicas. As
convergências referem-se ao conjunto de temáticas que são verbalizadas pelos diversos
sujeitos do estudo em resposta a cada uma das questões norteadoras.
55
Cada sujeito pode manifestar-se uma ou mais vezes sobre a mesma temática,
dentro do mesmo discurso; falando sobre as suas experiências; eles permitem retratar ao que
se denomina de subjetividade. Quando vários sujeitos referem-se sobre a mesma temática nos
diversos discursos, retratam o que é denominado intersubjetividade.
Neste estudo, os aspectos relativos à subjetividade e à intersubjetividade podem
ser observados nos quadros 1, 2 , 3 e 4, respectivamente.
0s quadros podem ser lidos na posição vertical e horizontal. Na posição vertical
cada um dos sujeitos está apresentado e pode ser observado em suas referências a cada
temática. Na posição horizontal estão apresentadas as manifestações dos diversos sujeitos
sobre a mesma temática.
Quando os sujeitos se expressam individualmente sobre uma mesma temática,
ainda que sejam relativamente ao mesmo estudo, configuram-se como estranhas ao conjunto
das demais temáticas e são denominadas idiossincrasias; estas estão apresentadas circuladas
em coloração diferente nos quadros 1, 2 , 3 e 4, respectivamente.
6.8.3 Terceiro Momento
O terceiro momento da trajetória é a compreensão fenomenológica que sempre
envolve à interpretações. Aqui, o pesquisador tenta especificar o “significado” que é essencial
na descrição e redução, como forma de investigação da experiência.
A seguir, o pesquisador organizou as essências constituintes do fenômeno e
procedeu a compreensão e interpretação as quais passam a ser apresentadas.
Sujeitos S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8
ESSÊNCIA
1.Aprendizado no curso de graduação. US1 US1; 2;
3
2.A forma de realizar o exame físico. US2 US6 US1 US2 US5;
10
US1; 9 US1; 7
3.Proteção do físico da criança. US5 *
4.As relações com a criança. US8; 9;
10
5.Hábito de realizar o exame físico no
cotidiano.
US4 US2; 9
6.Técnica do exame físico. US20; 6; 8; 4 US5; 6; 8; 17;
19; 9
7.O registro do exame físico. US21; 22; 23;
25; 26
8.A seqüência do exame físico. US27 US1; 2; 3; 4; 8; 4; 5;
6; 9; 10; 7
9.Exame físico como um evento particular. US1; 5
10.Exame físico revelação compreensiva. US2; 3; 4; 7;
8; 20
11.O que a seqüência evita. US3;
7
12.Realização mecânica. US6 *
13.A cabeça como parte principal. US2; 5;
8; 6
US2; 3;
4
14.Ocorrências que emergem do exame
físico.
US7 US6
15.Transitoriedade das circunstâncias. US6; 7
* Idiossincrasias
Quadro 1 – Q1 - O que o levou a estabelecer a seqüência das partes do corpo da criança no exame físico? – Rio Grande – RS. Agosto, 2002.
57
Sujeitos S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8
ESSÊNCIA
1. Exame físico na
graduação...
US2; US36; US4;
US14; US38
US1; US2;
US3
2.Habilidade do observador... US13; US9;
US10; US23;
US24; US11US22
3. Finalidades do exame
físico.
US2; US10;
US11; US13;
US14
US19;
US20;
US22
US2; US3;
US4; US8;
US9
4.Prática básica à enfermeira. US1; US24 US1 US10; US11 US1; US2;
US3; US7;
US16
US2; US3;
US5; US7;
US9
5. Exame físico orientador da
prescrição.
US17; US18;
US19US20;
US21; US22
US23;
US8; US9
6. Exame físico minucioso do
corpo.
US10; US5;
US1
US7; US4;
US5
7.Requer aprendizado
contínuo em termos
científicos.
US24; US25;
US17US33;
US26;
US27US28;
US29;
US16US18;
US22;
8. As habilidades do exame
físico requer ser de prática
profissional.
US5; US6; US11;
US20; US19;
US39
58
9. Exame físico intercâmbio
entre profissionais.
US30; US32
10. Exame físico exige
interpretação.
US34; US35
11. Exame físico aperfeiçoar
requer conhecimento.
US41; US40;
US42
12. Exame físico exige
adaptação.
US3; US4; US5;
US6; US7; US8;
US25
13. Exame físico requer
mudanças do modelo
convencional.
US6; US29;
US28; US29;
US30; US31
14. Exame físico adaptado
para freqüência, forma e local.
US35; US32;
US33; US34;
US35
US4; US5
15. Exame físico minucioso
possibilita execução.
US9; US8;
US4; US6;
US7; US2;
US3
16. Prática do exame físico
cria possibilidades à profissão,
habilidade do observador...
US12;
US37
17. Função assistencial
antecede administração.
US33;
US32;
US34
18. Função administrativa
impede a execução do exame
físico.
US42
19. Evolução trabalho coletivo
que requer exame físico.
US16;
US17;
US20US21
US8
US6; US8;
US9; US10;
US12; US13
59
20.Adoção de atitudes
modificadas, respeitando a
criança.
US18;
US19
21. Exame físico beneficia
estar junto da criança.
US43;
US44;
US45US46
22. Excesso de atividades
múltiplas impede o exame
físico.
US7; US6;
US12; US9;
US10;
US13;
US11
23. Exame físico propicia a
enfermeira fazer companhia à
criança.
US14;
US15;
US17US16
24. Exame físico para
aprimorar a percepção das
enfermeiras.
US25;
US26;
US28US29;
US30
25. Sustentação do exame
físico esta no conhecimento e
rigor científico.
US1
26. Exame físico indica a
atuação do profissional no
tempo conveniente.
US14; US17
27. Exame físico organizador
do cuidado de enfermagem.
US8; US9;
US10; US11;
US13
28. Exame físico prática que
auxilia na conduta de outros
profissionais.
US12; US13
60
29. Sustentação do exame
físico esta na avaliação do
estudo geral da criança.
US1; US2;
US4
Quadro 2 - Q2 - Em que bases sustentas/defendes a prática do Exame Físico ? – Rio Grande – RS. Agosto, 2002.
Sujeitos S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8
ESSÊNCIA
1.Exame físico como fundamento... US1; 15; 41 US1; 6; 10;
36; 41
2.Finalidade do exame físico/subessencia US43; 44; 45;
46; 47; 54;
55
US20; 21;
22; 30; 36;
32; 33; 37;
38
US5; 6; 7;
8; 9; 10; 11
US8; 9 US7; 8; 9;
10; 11; 12;
13; 14
US3; 4; 5;
6; 7; 8
US2; 4; 5;
6; 7; 8
3.Exame físico como busca de
conhecimento.
US16; 17; 18;
19
US1; 2; 3;
4; 7
US12; 11;
16
US1
4.Exame físico atividade que deve respeitar
a criança.
US2
5.A idade da criança influencia no exame
físico.
US1; 2; 3; 9;
10; 11
6.Exame físico uma atividade que utiliza
os sentidos.
US3; 30
7.A enfermeira deve saber interpretar o
discurso não verbal.
US4; 5; 6; 29;
14
8.Exame físico aprendizado e experiência
do cotidiano.
US7; 5; 9
9.As aparências podem enganar o
examinador.
US24; 25; 26;
27; 28; 33;
34; 35
10.Exame físico aspectos de humanidade
que levam a modificar a execução.
62
11.Prática que consome tempo e
reclamações da enfermeira.
US41
12.Registro de evolução dos pacientes
influencia sobre o exame físico.
US35; 37;
38; 39; 43;
44; 51
13.Exame físico como linguagem e
possibilidade de resposta.
US20; 21;
22
14.Uma questão de toque e de afeto. US12; 17;
14; 13; 16;
26; 27; 23;
24; 25; 28;
30; 31; 32
15.O modo de aproximação no momento de
adm.
US19; 18;
20; 22
16.Exame físico prática autovigiada. US2; 43
17.Não execução do exame físico é falha
profissional.
US5; 15;
19; 17; 18;
20; 28; 22;
23; 24
Quadro 3 – Q3 - Como você compreende a prática do exame físico? – RS. Agosto, 2002.
Sujeitos S1 S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8
ESSÊNCIA
1. Exame físico
possibilidade de realizar
intervenções.
US3; US18; US19
US20; US21;
US22 US23;
US24; US25
US26; US27;
US28 US29
US30; US31
US44; US45; US4
US5; US6; US7;
US8 US9
;
US20; US16
US21; US5
US6; US14
US15; US17
US18; US13
US7; US8;
US9 US10;
US11
US2; US3
US4; US5
US6; US7
US11;
US12
US1; US2;
US3; US4
US4; US10
US13; US8
US5; US7
2.Atividade que torna enf.
co-responsável.
US9; US10; US11
US12
US10; US11
US12
3. O que acontece quando
exame físico não é
realizado.
US26; US27
US28; US29
US30; US31
US32
4. Exame físico contato,
integração, interação com a
criança.
US1; US8;
US9US11
US32; US35 US1; US3; US8
US9; US12
US12
5. Exame físico
instrumento essencial de
passagem de plantão.
US16;
US17;
US18;
US19;
US20;
US21;
US22;
US23;
US24;
US25
65
6. Exame físico significa segurança e
preparo para cuidar.
US1; US2;
US3US4; US5;
US6US17
7. Exame físico significa não envolver-se
com atividades administrativas.
US38;
US39;
US40;
US41;
US42
8. Exame físico significa frustração que a
enfermeira experimenta quando não há
interação.
US2; US3;
US4US5;
US6;
US7US8
9. Não interação, uma falha profissional. US11; US12
US13; US14
US15; US16
10. Atividade agradável apesar das
resistências.
US18; US19
US20; US21
US22; US23
US24; US26
US27
11. Encontro de teoria com a prática. US1; US2;
US3US4; US5;
US6US7; US8
12. O encontro teoria-prática produz efeitos
distintos.
US9; US10
US11; US12
US13
13. Exame físico desenvolvendo a previsão. US14; US15
US16; US17
US18; US19
US20; US21
US22; US23
66
US24
Quadro 4 – Q4 - Qual é o significado do exame físico? – RS. Agosto, 2002.
7 O FENÔMENO
Apresenta-se, neste capítulo, as perspectivas do fenômeno exame físico, oriundas
das convergências e idiossincrasias
*
.
*
A denominação das essências, bem como a numeração das unidades de significado foram retiradas do texto a
fim de evitar qualquer possibilidade de identificação dos sujeitos participantes.
68
O que o levou a
estabelecer esta
seqüência das partes
do corpo da criança
que você acabou de
examinar?
O aprendizado
A cabeça como referência
A seqüência estabelecida
A técnica
Realização da seqüência
como hábito
Registro
FIGURA 1 – Q1 - O QUE O LEVOU A ESTABELECER A SEQÜÊNCIA DAS PARTES DO CORPO DA CRIANÇA NO EXAME
FÍSICO?
O texto, a seguir, envolve a perspectiva do fenômeno exame físico clarificado
relativo à seqüência das partes do corpo da criança ao ser examinada pela enfermeira. Estas
69
revelam ter tomado conhecimento desta seqüência a partir de observações, estudos e
experiências vividas no curso de graduação em enfermagem.
Whaley e Wong (1999, p. 118) observam que “comumente, a seqüência do exame
dos pacientes segue a direção da cabeça para os pés. A principal função desta conduta
sistemática é fornecer uma orientação geral para a avaliação de cada área do corpo a fim de
minimizar a omissão de partes do exame”.
Esse modo de proceder é visto através da literatura. Segue-se o sentido céfalo-
caudal, compreendido como a lógica, da cabeça em direção aos pés, manifesta o sujeito:
“foi assim que aprendi na escola; - bom ... foi... aha... leitura de livros que; - e que
recomendam sempre o sentido céfalo-caudal, sentido céfalo-caudal” (S
2
).
As vivências das enfermeiras levam a compreender a necessidade de que as
situações de ensino-aprendizagem, no curso de graduação, devem proporcionar a busca de
literatura sobre o exame físico nas ciências básicas, como anatomia, fisiologia e comunicação
e outras, conferindo ao estudante possibilidades variadas de apreensão dos conteúdos e o
modo de se comunicar com o paciente. Afetas à organização do ensino deste procedimento,
torna-se evidente a necessidade de observar no aprendizado o que possa estar ausente, tanto
nos conteúdos teóricos como nos exercício práticos.
Para Capelli (1995, p. 7):
O exame físico é uma habilidade que faz parte do campo de ação do profissional que
atua junto à criança. Transformado em instrumento, é ele que enriquece a
informação e fundamenta, muitas vezes, a tomada de decisão dirigida ao cuidado da
criança. O conhecimento mesmo sumário, de alguns dados fisiológicos básicos é
indispensável para a compreensão dos problemas identificados.
Tais exercícios poderão proporcionar ao aluno uma escala crescente de
complexidade de acordo com a tábua curricular, evitando que o vivido (práxis) do aluno
70
aconteça somente em uma disciplina.
Outro aspecto a considerar é a questão das raízes do exame físico na semiologia
médica e enfatizar ao aluno a importância do processo da busca relativa às situações de
cuidado de enfermagem, ou seja, a ênfase no ser humano, não na doença, pois o diagnóstico
patológico diz respeito a outra ciência.
A enfermeira, sujeito do estudo, considerou a pergunta do pesquisador um
acontecimento interessante e revelou que as colegas de profissão tomam conhecimento dessas
partes, mediante o estudo, a observação ou a experiência vivida dentro da Universidade e,
portanto, tem o rigor de ciência, dizendo que seu aprendizado: –“bom...uma, que na
universidade a gente aprende tem que ser essa seqüência; - esta seqüência cientificamente”
(S
5
).
Em relação à aprendizagem do exame físico, o curso de graduação ocupa um
lugar privilegiado, nele as enfermeiras aprendem e podem experimentar a sua prática sob
orientação do professor, que tem a responsabilidade de advertir pedagogicamente no
momento certo, com as orientações que se adaptam às necessidades de cada acadêmico.
Durante o curso de graduação, o acadêmico faz e refaz o procedimento sob
orientação; experimenta e descobre o alcance de cada técnica utilizada, apreendendo o que
melhor pode obter com a inspeção, ausculta, palpação, etc.
Vazquez (citado por BACKES, 2000, p. 66), falando sobre prática, práxis,
esclarece que “toda práxis é atividade, mas nem toda atividade é práxis. Depreende-se que é
uma atividade humana e que está implicada na intervenção da consciência como resultado
ideal e como produto real”.
Orientado sobre a bibliografia específica, o acadêmico pôde comparar sua
experiência às situações que viveu ao desenvolver essa prática com os conhecimentos
71
científicos disponíveis sobre ela, podendo discernir o que tem o rigor da ciência do que é mera
experimentação.
As enfermeiras expressaram que a extremidade superior do corpo humano, a
cabeça, contém as vias aéreas, as coisas essenciais do exame físico; a cabeça é a parte
fundamental e mais notável do corpo. Esta é considerada em primeiro lugar, pois as
enfermeiras investigam as possibilidades das vias aéreas e se a fontanela está normotensa ou
hipotensa, etc. A cabeça contém órgãos como os que formam o encéfalo, a visão, a audição, o
olfato e demais órgãos sensoriais.
As enfermeiras devem perceber se a criança não apresenta uma cianose e se há
permeabilidade das vias aéreas afirma e explica o sujeito: “- eu acho que a cabeça, as vias
aéreas, tudo ali é a principal parte da criança; - é isso que eu acho que é a principal parte;
- mas ali a gente já verifica a permeabilidade das vias aéreas” (S
2,
S
3
).
A adoção do sentido céfalo-caudal na prática do exame físico atribui valor
especial à extremidade superior do corpo, destacando-a como principal, cujo exame precede
às demais partes.
Lowen (citado por DYCHTWALD, 1984, p.211) referendou que:
[o rosto] é a parte do corpo que está frontalmente colocada perante o mundo. É
também a primeira parte examinada quando se olha para outra pessoa... A palavra
‘face’ é usada igualmente para fazer referência à imagem de uma pessoa, o que
relaciona o conceito de face a ego, uma vez que o ego em uma de suas funções está
envolvido na imagem que uma pessoa projeta.
Destacam-se os órgãos envolvidos na percepção do mundo, ligados à consciência,
isto é, relacionados com a importante avaliação das condições de integridade física
neurológica dos seres humanos enquanto seres conscientes postos no mundo.
Já no primeiro olhar, ao se aproximar do paciente, a enfermeira examina a postura, o nível de
72
consciência, o olhar, a fala, o respirar, a fontanela e o grau de atividade como partes
importantes do exame que se inicia.
Lissauer e Clayden (c,1998, p. 3) no item sobre aparência geral e comportamento
dizem: “que a observação cuidadosa é a chave do sucesso do exame físico de crianças. Olhe
antes de toca-las. A aparência geral e o comportamento durante a consulta são instrutivos”.
A técnica de inspeção precede às demais na obtenção desses dados valorizados na
adoção do sentido céfalo-caudal. As primeiras avaliações da integridade do sistema nervoso,
os órgãos da percepção do mundo, a permeabilidade das vias aéreas, a coloração da pele como
indicação das condições de circulação e outras avaliações importantes que são realizadas no
exame da cabeça, precedendo as avaliações de outras partes do corpo, implementados pelas
enfermeiras que valorizam o sentido céfalo-caudal.
O sentido céfalo-caudal é adotado como estratégia de ensino para minimizar os
riscos do esquecimento, pelo aluno, das partes constituintes do procedimento. Caso haja
necessidade de interromper o exame físico, o enfermeiro poderá retomá-lo com precisão do
ponto onde interrompeu, desde que utilize uma referência. Para o sujeito que se segue, esta é a
seqüência básica: “- então basicamente é uma seqüência didática; - eu devia ter feito antes
(gesticulou o sentido céfalo-caudal); - no tempo que eu estava na universidade” (S
3
).
Ao iniciar o exame físico com a referencia céfalo-caudal, a enfermeira examina,
conversa com a criança, olha no olho, tentando conquistar a sua amizade. As enfermeiras
alertam que se a primeira abordagem do examinador não acontece na seqüência da cabeça
para os pés, pode modificar-se o estado de espírito da criança, dificultando a relação entre
eles. Chamam a atenção para o primeiro momento deste relacionamento que se inicia, a
empatia que proporciona ao examinador desenvolver esta tendência de sempre experimentar
mentalmente as circunstâncias em que vai colocar a criança. A fala deste sujeito expressa este
73
acontecimento: “- acho que se tu começa com o céfalo-caudal tu começa a conquistar a
criança, conversa com a criança, olho no olho; - e quando tu começa a mexer de baixo para
cima essa criança...já o humor dessa criança já muda né?”(S
1
).
A execução do exame físico constitui-se num momento especial para a enfermeira
e à criança, pois concretiza-se a relação de conquista, da confiança, no sentido desta aceitar o
procedimento, colaborando com a profissional.
Falando-se da relação enfermeira-criança, pode-se falar de linguagens e de apego.
Gomes (1999, p. 23) explica “que o apego é revestido pela empatia que possibilita o encontro
existencial Eu-Tu. Este encontro fundamenta a situação dialógica ser-a-ser e podemos
transforma-lo mediante os recursos que temos gestual, corpóreo, visual, o toque e a
linguagem, inclusive, a pronunciada”.
Ao iniciar o exame físico, desenvolve uma conversa que interesse à criança, que
prenda a sua atenção e, neste clima, começar a abordagem do corpo, observando suas reações.
Outro aspecto a considerar é que a enfermeira deve fazer todo este processo com gestualidade
simples, demonstrando à criança que sua atitude de cuidado é sincera, pois a atitude leva à
intenção e a criança percebe.
Nunes observa que (1995, p. 151) “estar com o outro é a linguagem do cuidado
que aponta para as questões das relações interpessoais e humanas dentro do ato de cuidar.
Desta linguagem emerge a complexidade do relacional, dentro da diversidade das idéias, de
outras profissões e das camadas sociais”.
Concentrada na criança e nas circunstâncias de examinar, a enfermeira vivencia
momentos que devem ser preservados à intimidade da relação entre ambos e igualmente do
procedimento. Ao se estabelecer essa interação, a enfermeira visa a conhecer a pessoa que ela
vai cuidar. Observando a seqüência céfalo-caudal, estará favorecendo o diálogo e amenizando
74
o medo tanto da criança quanto de seus familiares. Durante esses momentos de fragilidade
emocional da criança/família, a enfermeira deve prestar-lhes suporte agindo com positividade,
diminuindo as inseguranças, preocupações e possibilitando-lhes vislumbrar resoluções de suas
necessidades.
Relativo a como realizar o exame físico, os enfermeiros comentam ter que olhar
com atenção a tudo que antecede o procedimento; observar a evolução do estado de saúde da
criança, após examinar minuciosamente cada situação. Ao fazer isso, o examinador segue
uma seqüência coerente de idéias e obedecendo sua forma particular que cada profissional
tem ao agir.
Explicam que o sentido céfalo-caudal é o sentido que versa sobre a disposição
conveniente para a melhor realização e compreensão do exame físico, sua própria
organização. Um dos sujeitos demonstra em uma fala a questão da seqüência aprendida na
graduação e da seqüência ele entende como lógica: “- Bom, em primeiro lugar eu segui...é
uma seqüência aha...acadêmica; - pegar uma criança e ...pela seqüência lógica assim tu
proceder dessa maneira; - E torna-se uma série ou sucessão de partes que as enfermeiras
olham com atenção, examinando minuciosamente, estudando; - acho que realmente segue
uma seqüência lógica” (S
5
).
Conforme a manifestação deste outro sujeito, o sentido céfalo-caudal constitui-se
de uma disposição pedagógica de meios para obter os fins e exemplificam: no caso da
enfermeira perceber a necessidade de administrar oxigênio ou outra conduta para corrigir a
cianose, nesse caso, o exame físico é sempre feito da cabeça aos pés...“- constituindo uma
disposição conveniente dos meios para se obterem os fins; - olha...eu sempre examino
céfalo-caudal; - di...de cima para baixo sempre! di...céfalo-caudal” (S
7
).
Ao pontuar sobre a forma de realizar o exame físico, as enfermeiras permitem
75
compreender que o sentido céfalo-caudal confere uma estrutura mental sobre o procedimento,
a qual facilita a memorização, torna o aprendizado mais rápido; possibilita o olhar minucioso;
favorece o ensino e o aprendizado.
Ao requerer o uso de vários sentidos do examinador, este vai ampliando a forma
de perceber; conduzindo o examinador a uma abordagem didática conforme as circunstâncias
que se apresentam e, por isso, tem sido a forma mais utilizada no cotidiano das enfermeiras.
Confere-se que além dos sujeitos já manifestados, outro relata que utiliza, por
hábito, a seqüência céfalo-caudal em seu trabalho diário. Explicam que é uma disposição
habitual do modo de olhar a criança com atenção, estudar, examinar as minúcias da cabeça até
os pés; bibliografias também recomendam iniciar o exame físico pela extremidade superior
do corpo da criança e concluir em cada uma das extremidades inferiores: “- ... segui essa
seqüência i... também pela prática; - né...na literatura também se começa na cabeça e
termina nos pés; - eu falei realmente aquelas coisas que a gente olha primeiro”(S
8
).
O sentido céfalo-caudal é o modo de organização mental que predispõe uma
composição da imagem que vai se formando, e o examinador vai adquirindo mais nitidez,
consistência dos achados, possibilitando lembrar da criança, ainda, que não esteja próximo a
ela.
Outro aspecto a comentar é que o sentido céfalo-caudal privilegia o aprendizado
do acadêmico, facilitando internalizar o processo das partes do corpo e do emprego produtivo
para utilizar a inspeção, a palpação e a ausculta torácica e abdominal, distinguindo a presença
dos ruídos normais de outros.
Se a enfermeira pensar que a realidade do exame físico segue uma lógica, a
referência céfalo-caudal tomará em consideração o critério de ir das áreas limpas para as
menos limpas. Por exemplo, o períneo da criança encontra-se úmido ou seco. Análogo ao
76
períneo com limpeza e asseio. O sujeito aqui aponta para uma situação freqüente no cuidado
das crianças: “- segundo, é realmente se tu pensa assim tu segue das áreas limpas né...prá
áreas menos limpas; - por exemplo ahá...o períneo da criança está úmido ou está seco; -
ahá...a higiene e tal” (S
4
).
O exame que inicia pela parte superior do corpo e progride em direção às
extremidades dos membros inferiores permite que, antes de remover a parte das roupas que
cobre os genitais, relacionados com o desenvolvimento do pudor e dos esfíncteres de
eliminação fecal e urinária, cujo controle voluntário exige tempo de aprendizagem, sejam
alcançados muitos conhecimentos sobre a criança, enquanto percorre áreas mais limpas do
corpo, e não sendo surpreendido, como freqüentemente é, com eliminações presentes nessas
áreas e ou resistência em descobrir os genitais para exame.
As enfermeiras revelam que quando vão registrar o conjunto de modificações que
fazem surgir algo que de início era apenas potencial, se é em um único membro do corpo que
se encontra o problema. Habitualmente, elas principiam o registro por aquela parte ou ponto
onde se localiza o problema, tal como uma ferida operatória na região lombar e, a seguir,
deslocam-se para outro segmento do corpo.
A enfermeira afirma que teria possibilidade de começar o registro por outra parte
do corpo da criança, mas revela que principiou por aquela parte do corpo onde se localiza o
problema principal, é uma ocorrência que se observa pela força do hábito. A área corporal
atingida pode se constituir uma sugestão para seqüência do exame físico, refere o sujeito: “-
mas que...quando eu vou evoluir se eu...se é um membro só que está com o problema; -
normalmente, eu começo por aquela...pela zona aonde está o problema, como uma ferida
operatória...na região lombar né...; - aí, depois, então vou prá outro...meio(do corpo) outras
partes do corpo” (S
6
).
77
O registro dos dados provenientes do exame físico é uma prática simultânea ao
seu desenvolvimento. A anotação é especialmente importante não só como modo de evitar o
esquecimento da enfermeira, mas para possibilitar o estudo, a análise e a comparação de um
dado em relação a(aos) outro(s); para organizar o raciocínio lógico sobre o qual se elege o
diagnóstico de enfermagem, e todas as decisões sobre o cuidado da criança. [No local da
pesquisa, as enfermeiras dispõem de uma folha de evolução de enfermagem, onde os dados
obtidos pela prática do exame físico ficam anotados em planilha junto ao berço da criança,
com dados previamente impressos, e ao mesmo tempo, devem anotar esses e outros dados, no
prontuário do paciente, em folha de evolução comum aos demais profissionais da unidade].
Os registros precisam ser corretos, claros, sucintos, completos, o quanto
necessário, para servirem ao raciocínio da enfermeira, e ajudá-la a desenvolver a perspicácia,
não só das diferentes formas de examinar, mas principalmente sobre a compreensão das
necessidades da criança, problemas de enfermagem prioritários, bem como os cuidados de
enfermagem.
O não registrar, ou registrar de forma insuficiente, traz evidente prejuízo à
comunicação entre os diferentes profissionais, dos diferentes turnos de trabalho no mesmo
local, reduz a possibilidade ao leitor de formar com a mesma clareza a imagem mental
construída pelo colega que realizou o registro, manifestando as lacunas e borrões que sugerem
desde a realização incompleta e imprecisa do exame físico até a ausência da prestação de
cuidados pelo enfermeiro. A ausência de registros sugere a ausência do procedimento e a não
realização da assistência.
O sujeito revela que a seqüência das partes do corpo ao iniciar a observação, o
estudo e o exame minucioso de uma determinada parte evita deixar por inadvertência de fazer
o mesmo noutra(s) parte(s). Lembrar-se de não desprezar nenhum dado: “- e seria isso: prá
78
facilitar o trabalho desse paciente; - começa uma outra ordem... de repente; - o sujeito
revela que a seqüência das partes do corpo ao iniciar a observação, o estudo e o exame
minucioso de uma determinada parte evita deixar por inadvertência de fazer o mesmo
noutra(s) parte(s )”(S4).
A adoção do sentido céfalo-caudal na prática do exame físico que predomina no
ensino de graduação e na literatura especifica tem o propósito de permitir o exame detalhado,
estudado com atenção de determinada área do corpo escolhido até que dela se esgote o que
observar e pesquisar. Permite que, ao se esgotar o exame daquela área, o examinador com
segurança, sem distração, progrida para a área seguinte a ser examinada, concentrando-se
exclusivamente nela, nesse momento.
Perceber e reconhecer a necessidade de administrar oxigênio ou outro
procedimento para corrigir a cianose não é uma prática incomum na atividade de enfermeira.
Enquanto realiza o exame físico, permanece atenta também em relação ao que já foi
observado, sabendo que no ser humano as mudanças estão presentes, sendo que algumas delas
requerem a imediata interrupção que pode significar tanto a interrupção do exame como
realizar um retorno à parte que já fora examinada.
Por exemplo, a enfermeira, ao requerer examinar a região do períneo, tendo
encontrado a criança evacuada, e estando realizando a higiene percebe, nesse meio tempo, um
agravamento da função respiratória, com a criança apresentando uma cianose que não tinha
inicialmente, interrompe o exame para tomar a providência correta.
De acordo com esta enfermeira, o sentido céfalo-caudal, maneira preestabelecida
do exame físico, possibilita proteger a criança e a mantém o máximo de tempo com a roupa e
aquecida, concorda-se com a fala deste sujeito quando refere: “- acho que essa fórmula
céfalo-caudal preserva o máximo de tempo a criança vestida né” (S
5
).
79
Bauer e Pinheiro (1998, p 366) destacam que
o cuidar parece brotar das mãos e dos olhos do cuidador quando este o pensa e o
vive naturalmente. Também sabe-se que este cuidar natural precisa ser nutrido,
compartilhado, renovado. Um ser que não revitaliza seu ato de cuidar pode camuflar
sua arte com a falta de estímulo, frustrações e cansaço.
O exame físico é um procedimento que requer cuidado da criança em vista da
exposição do corpo para um olhar minucioso; proteger é uma ação de cuidado, permeando
um procedimento; uma atitude humana de estar com o ser humano sob responsabilidade e
discrição com a intimidade do paciente.
Conservando e preservando esse caminho, muitas vezes percorrido e conhecido,
corre-se o risco do exame físico ser realizado de forma mecânica. A colocação do sujeito,
alerta os cuidadores: “- conservando e preservando esse caminho já percorrido e conhecido,
em geral trilhado maquinalmente” (S
6
).
O sentido céfalo-caudal adotado como técnica de ensino e vivenciado com
freqüência pelos acadêmicos, nas diferentes disciplinas do currículo, com pacientes de
diferentes faixas etárias, condições físicas e comportamentos, permite uma abordagem que
respeita os aspectos humanos dessa relação, preservando a individualidade do paciente, a
tranqüilidade do examinador que pode seguir um caminho percorrido tantas vezes, portanto
que lhe é familiar, sem incorrer numa repetição mecânica de ações como sucede na operação
de uma máquina.
Em que bases
sustentas/defendas a
prática do
físico ?
Curso de graduação em
Enfermagem e a Prática Profissional
O aprendizado está na continuidade
do exercício do exame físico e leituras
específicas sobre o
t
Na avaliação do estado geral da criança
com roteiro elaborado pelas enfermeiras
Na literatura e no rigor científico
Pelas finalidades do E.F.
Por se constituir base para o
cuidado humano
Por ser orientador das atividades
essenciais da enfermagem
Por se constituir um intercâmbio
entre os profissionais
Por retratar o estado da criança
Por indicar o tempo e a forma
conveniente de intervenção
Por propiciar o desenvolvimento
de habilidades dos enfermeiros
Por ser funçãoassistencialque
precede a administrativa
Por ser um procedimento que
aproxima a enfermeira da criança
As bases de sustentação Defesa da prática
80
FIGURA 2 – Q2 - EM QUE BASES SUSTENTAS/DEFENDES A PRÁTICA DO EXAME FÍSICO?
O texto, a seguir, envolve a perspectiva do fenômeno exame físico desvelado
relativo às bases e sustentação/defesa da prática deste procedimento.
81
A formação acadêmica das enfermeiras proporciona o conhecimento e a vivência
do exame físico nas mais variadas disciplinas do curso de graduação. Segundo a experiência
docente deste pesquisador, deve haver um efetivo intercâmbio entre os docentes dessas
disciplinas que permita ser o ensino do exame físico realizado por níveis de complexidade.
Compreende-se que os conhecimentos básicos que dão suporte ao aprendizado do
exame físico a enfermeira trouxe da academia; Obedecendo a seqüência das disciplinas do
curso de graduação, existe a oportunidade de cuidar de pacientes das mais diversas faixas
etárias em condições também diversas; Pessoas sadias, hospitalizadas, em postos de saúde;
compreendendo crianças, idosos e adultos.
Acompanhando o processo de ensino do exame físico na disciplina de pediatria,
os acadêmicos manifestaram que, antes do ingresso na mesma, reuniam a experiência de
partes do exame físico, porque o objetivo era realizar o exame físico como um meio para
alcançar o mais importante daquela atividade na disciplina, ou seja, o “estudo de caso” de
pacientes portadores de patologias específicas.
Em seu estudo, Sousa e Barros (1998, p. 20) comentam sobre os docentes que não
concordam com a criação de uma disciplina específica para o ensino do exame físico,
destacando duas espécies de situações: “a primeira que o exame físico deve ser ensinado em
uma disciplina e complementado nas demais: o aluno deve ser ensinado em fundamentos ou
enfermagem médica e cobrado a cada disciplina que freqüenta; o exame físico deve ser
incluso desde o primeiro ano na disciplina de introdução em enfermagem, porém faz-se
necessária a cobrança nos anos subseqüentes, cada qual com suas particularidades (pediatria,
obstetrícia, ...). A segunda diz que o exame físico deve ser ensinado por todas as disciplinas:
acredita-se que a propedêutica aplicada a enfermagem pode permear o conteúdo das
disciplinas profissionalizantes”.
82
As enfermeiras falam sobre a experiência em disciplinas do curso de graduação
que trabalham com crianças, sendo que a mencionada foi a vivência do exame físico do
recém-nascido voltada para a assistência na sala de parto e no berçário, acompanhando as
mudanças físicas, anatômicas e fisiológicas, próprias desse período da vida da criança.
Revelam ter concluído o curso de graduação há longo tempo e diz ainda não ter aprendido
tudo o que envolve o procedimento do exame físico; E a partir disso reconhecem que
conseguiram avançar no conhecimento, descortinando a realidade desse procedimento.
Voltar a atenção para o ser humano, sua figura, seu espírito como merecedor do
cuidado ao ser concebido, ao nascer, ao crescer e ser acompanhado em seu projeto
assistencial. Entender a família como elo entre o enfermeiro e o doente; são
exercícios de sensibilização para lidar com o ser humano (NUNES; DEVES, 2001,
p. 185).
Em atenção a esse aspecto particular da atividade docente, considera-se necessário
realizar a demonstração do exame físico aos acadêmicos, encarando o fato de que eles estão
lidando pela primeira vez com um conhecimento novo. O papel representado pelo professor é
o de um mediador no processo de comunicação dos alunos com a criança, na vivência do
exame físico.
Isso acontece porque o discurso da criança é realizado, muitas vezes, de forma não
verbal, constituindo o seu próprio corpo o texto, e o professor deve ser aquele mais
experimentado em decodificar e compreender os significados ali descritos.
A prática do exame físico promove a distinção dos aspectos corporais da criança
que constituem a sua natureza – situação biológica enquanto ser no mundo, no qual a
hereditariedade tem seu papel característico – daqueles outros aspectos culturais cuja
influência não é menor – como membros de um grupo humano, interligados por uma rede de
relacionamentos – é que dão conformação a esse corpo individual e social constituindo-o
83
culturalmente.
Proporcionando aos alunos a vivência do exame físico e estando ao seu lado
durante o procedimento, pode-se notar como fundamentais: a vivência, por permitir ao aluno
cometer erros, e acompanhá-lo para poder realizar as advertências pedagógicas que auxiliam o
aluno a distinguir aquilo que é mais importante do que é menos.
Acerca do cuidado com o aluno no processo educativo, Geib (2001, p.93) escreve:
“fomentando valores: através do desenvolvimento no/na aluno/a de atitudes de respeito ao ser
humano, com aceitação de crenças, valores e sentimentos, evitando julgamentos e
discriminação” .
O processo de ensino do exame físico desperta admiração dos alunos pela riqueza
dos detalhes. Sucedem-se intermináveis questionamentos para os detalhes que vão sendo
demonstrados, o que transforma esta atividade em uma exigência; desperta a curiosidade; os
alunos perdem o medo de errar; o receio de não saber interpretar, tomam a iniciativa de
pesquisar, rever, reavaliar, buscando comparar com algum referencial bibliográfico. O sujeito
manifesta como pode fazer para que o aprendizado seja mais concreto: “Relativo ao
aprendizado do exame físico, a ocorrência de fatos que anteriormente não eram notados e
que o aluno percebe pela primeira vez; na segunda, o aluno inicia a examinar com atenção,
a pesquisar, de modo mais completo, aprofundando o olhar e examinando de modo mais
apurado” (S
1
).
O processo é significativo, e o proveito que se consegue com o aprendizado do
aluno motiva a consultar os livros sobre aquilo que se encontra na bibliografia, que está
estrategicamente preparado antes do início da demonstração do procedimento exame físico.
Os temas que estão na literatura pesquisada são encontrados no corpo da criança
examinada; é gratificante para o professor observar a mudança dos alunos que, assumindo o
84
aprendizado de olhar com atenção, buscam minúcias, aprofundam a pesquisa, sem pressa,
objetivando compreender melhor a atividade proposta pelo professor.
Influi poderosamente para o alcance desses momentos as condições de aceitação
do procedimento pela criança, ocasião em que acontece a comunicação, permitindo fluir ao
natural, ainda, que, eventualmente, certos procedimentos do exame físico possam produzir
algum desconforto físico.
É uma oportunidade única para auxiliar os alunos a compreenderem a significativa
diferença entre o ser adulto e o ser criança, pois as comparações e percepção das diferenças
vão ficando mais cristalinas na mente dos alunos, relacionando-se experiência passada com a
vivida no presente momento, ocorrendo a transposição da teoria para a prática, revela o
sujeito: “é inadmissível adotar uma providência, um comportamento ou ainda ter a
possibilidade de indicar com precisão uma prescrição de enfermagem, ...um calor local,
...sem antes analisar com atenção e minúcia o corpo da criança” (S
3
).
Nessas ocasiões, é comum o despertar para necessidade de intervenções imediatas
por parte da enfermeira, isto é, a necessidade de prestar o cuidado a criança diante daquela
percepção que acaba de ocorrer acerca do seu estado físico, de seu comportamento, das
mudanças que a doença provoca, intervenções que são inadiáveis, que antecedem, inclusive, a
progressão do exame físico para as partes do procedimento ainda não realizadas.
A experiência docente indica importante reflexão sobre a finalidade do exame
físico. Há vários métodos de investigação sobre a condição da criança que podem ser
utilizados pela enfermeira, porém considera-se que o principal deles é o exame físico do
paciente.
Utiliza-se o exame físico como passo inicial do cuidado de enfermagem que
juntamente com a entrevista constitui a busca dos primeiros e elementares conhecimentos
85
sobre a vida da criança, das condições físicas e comportamentais atuais, situação social e as
características do meio ambiente onde ela vive, antes de estabelecer o primeiro contato com o
examinador.
Valorizar a cultura e o meio onde ela vive é um fundamento do cuidado de
enfermagem. Através dele, inicia-se a coleta de dados para o conhecimento dos problemas de
enfermagem que afetam e das necessidades básicas e prioritárias, carentes de cuidados,
sugere: “de tal maneira para as enfermeira terem cuidados, tratarem as crianças; que as
enfermeiras possam dispor de conhecimentos elementares sobre a criança e o que ela
precisar (S
4
).
O planejamento da assistência de enfermagem tem o exame físico no início e
possibilita o diagnóstico de enfermagem, por meio do qual organizam-se os cuidados que
visam a atender as necessidades prioritárias, intervindo com fundamento no conhecimento
científico e o caráter humano, assim, unindo os dois pólos dessa relação: o encontro da
enfermeira com a criança doente/família.
Sabe-se que, se consideradas esgotadas as possibilidades de cura da doença, é da
tradição do saber e do fazer da enfermagem ocupar-se com apreço aos cuidados que
preservam os aspectos humanos em sua maior profundidade e intimidade até o final da vida.
Torna-se impossível pensar que a prescrição de enfermagem possa ser planejada e
muito menos implementada sem que a questão humana prevaleça, pois na experiência pode-se
testemunhar que ao esgotamento do saber científico, quando as respostas ao melhor
tratamento são insuficientes, ainda assim e por causa disso, está o pequeno paciente com todo
o valor de ser humano a servir como espelho, refletindo a mesma humanidade que se
compartilha com ele.
86
Nunes e Deves (2001, p. 185) escrevem: “cultivar o respeito pelo ser humano que
está inconsciente, revisando a possibilidade de escuta e a linguagem especial promovida pela
figura humana, fazendo-se presente através da intenção; esses fenômenos perduram no
encontro cotidiano e no modo como os doentes são tratados”.
O exame físico, como processo de investigação permite à enfermeira alcançar o
conhecimento daquilo que está na intimidade da criança/família, o qual, em algum momento
do cuidar, poderá revelar e compartilhar com ela; esses acontecimentos são privilégios para
quem cuida.
A prática do exame físico é inseparável da questão da qualidade do cuidado
prestado pela enfermeira. Ela ultrapassa sobremaneira os passos iniciais da coleta de dados, da
avaliação que formula o diagnóstico de enfermagem para estar além da assistência de
enfermagem através dos cuidados realizados pela enfermeira e, assim, atingir todo o processo
de reavaliação do que foi executado, proporcionando avaliar a qualidade da assistência de
enfermagem realmente recebida pela criança.
É o exame físico que proporciona à enfermeira conhecer a criança, avaliar
diagnosticar suas necessidades, planejar e executar os cuidados de enfermagem,
interrompendo-os quando não forem mais necessários. Em razão disso, constitui uma prática
essencial que a enfermeira não pode dispensar de realizá-la.
Ao possibilitar a prescrição de enfermagem, o exame físico também contribui para
os aspectos importantes da organização do trabalho das enfermeiras que passam a dispor de
um instrumento que orienta também o desenvolvimento dos trabalhos pelos auxiliares de
enfermagem. Por meio do exame físico, a enfermeira seleciona o cuidado de acordo com a
condição de cuidado que a criança necessita e decide se pode delegar, com a vantagem de
poder supervisionar e avaliar a qualidade de sua execução, diz a enfermeira: “o que as
87
auxiliares de enfermagem orientam-se para executar pela prescrição da enfermeira” (S
8
).
A delegação da execução dos cuidados de enfermagem não inclui a realização do
exame físico realizado pela enfermeira na admissão da criança ao hospital. Os exames físicos
a partir daí visam ao reconhecimento de alterações e modificações no estado físico e no
comportamento da criança, os quais determinarão a necessidade de alterar, manter ou
suspender determinados cuidados de enfermagem, este é um modelo apontado pelo sujeito: “o
exame físico como avaliação da criança para executar a assistência de enfermagem e olhar
com atenção de modo total, completo, absoluto o paciente” (S
2
).
O aprendizado do exame físico não se esgota durante o processo de aprendizagem
do curso de graduação em enfermagem, pois tem continuidade no exercício da vida
profissional.
A consulta freqüente e criteriosa à literatura específica sobre o exame físico é
essencial para percorrer com segurança o caminho desse aprendizado. Ela constitui luz para
esse conhecimento, afirma o sujeito: “de acordo com ela, o enfermeiro vai aprendendo a
realizar esse procedimento e mesmo assim entende que há a necessidade de dar continuidade
neste aprendizado” (S
1
).
É, no exercício da profissão, ao executar cotidianamente o exame físico, que a
enfermeira vai se aperfeiçoando nessa prática. Assim, educando os sentidos, tornando a
percepção cada vez mais acurada, atingindo um grau bem definido de perspicácia de modo
que ao examinador experimentado não escapem os sinais encobertos pela sutileza que
constituem as características próprias do ser criança, um ser em crescimento e
desenvolvimento constante, alerta o sujeito: “revela que em relação ao aprendizado do exame
físico, o essencial, e serve de fundamento é estar continuamente realizando leitura relativa a
esse procedimento” (S
1
).
88
Na literatura, encontra-se uma fonte de informações que se pode aliar com a
vivência e transformar em conhecimento. Os novos fatos científicos e as novas tecnologias
que surgem em auxílio da compreensão do examinador enriquecem a participação no diálogo
com as colegas que praticam o exame físico.
A importância da consciência do corpo que vai lidar com o outro corpo é um fator
primordial para que o exame físico seja completo. À medida que o profissional
conheça os mais profundos aspectos do seu corpo, seus limites, suas dores, suas
capacidades, à medida que ele vivencia e experimenta as diversas sensações de seu
corpo, que ele ouve seu corpo, e o respeita ele estará apto para cuidar do outro corpo
(ELUF, 1991, p.71).
A técnica de inspeção relacionada à visão do enfermeiro torna-o capaz de ir além
das aparências ou evidências. O toque refina-se, inclusive a maneira de palpar com firmeza,
delicadamente, segurar o corpo da criança de modo brando muito próximo da carícia,
tornando confortável a restrição de algum movimento. A ausculta permite compreender os
sons produzidos pelo corpo no sentido do vivido e não apenas do esperado ou da
possibilidade. O olfato passa a discriminar o que é comum do que é especial. Ao paladar da
enfermeira, que às vezes se envolve diretamente quando deseja saber o gosto da medicação,
da alimentação que é servida, simbolicamente desenvolve o gosto de estar com a criança
numa interação cotidiana, numa relação de cuidado humano. A enfermeira diz que: “o
profissional experimenta com conhecimentos técnicos e especiais como tocar com delicadeza
e brandamente o corpo, como entender os sons produzidos pelo corpo através do sentido da
audição, e do bater ou tocar fortemente nele...” (S
4
).
A prática do exame físico cotidiano acrescenta ao trabalho de equipe da
enfermagem, com os diferentes turnos de trabalho, em constante intercomunicação, da qual
tem importância ímpar a passagem de plantão, a vantagem da transferência mútua e
simultânea de conhecimentos e habilidades próprias do desenvolvimento desse procedimento.
89
Aquilo que o exame físico produz em termos da assistência de enfermagem e dos cuidados de
enfermagem executados são transmitidos de uma para outra equipe de enfermagem, cada uma
a seu turno de trabalho.
Quando uma enfermeira não realiza observações suficientemente esclarecedoras,
que deixem lugar para a dúvida, pode compartilhar com as colegas no sentido de encontrar o
esclarecimento necessário, a segurança procurada num retorno à observação minuciosa, à
pesquisa e ao reestudo daquilo que não ficou explícito. O trabalho de equipe auxilia aos
profissionais a se assegurarem das condições dos pacientes.
A profissional que se depara com um enigma, ela própria tem o recurso do
trabalho em equipe para compartilhar as dúvidas, compreender o significado daquilo que
aparentemente parecia insolúvel, enigmático na execução do exame físico.
A enfermeira revela que habilidades e conhecimentos são adquiridos com o
exercício constante do exame físico entre as pessoas que exercem a enfermagem e formam
um grupo de pessoas que se aplicam a mesma tarefa de cuidar de crianças. O
desenvolvimento de maior habilidade de execução do exame físico passa pelo estímulo e
desenvolvimento dos órgãos sensoriais, quando a enfermeira melhora a percepção com
tecnologias que auxilia os profissionais. O exame físico exige observações repetidas e
interpretação de enigmas. E que alguém – o examinador – ao analisar com atenção e minúcias
o corpo da criança, recomeça, retorna ao ponto de onde partiu, quando a observação não for
adequada se for necessário.
O exame físico é parte constitutiva do processo de enfermagem, sendo a etapa
inicial identificada como histórico de enfermagem, destina-se à coleta de dados que permitem
o planejamento, execução e avaliação da assistência de enfermagem.
Esta sistematização da assistência de enfermagem mostra-se exeqüível e produtiva
90
quando aplicada a qualquer espaço de atuação das enfermeiras, respeitadas as características
próprias de cada campo de ação da enfermeira, no consultório, no hospital, na saúde coletiva,
na administração de serviços etc.
A estrutura do exame físico aprendido na graduação, reconhecido como
“convencional”, requer sim planejamento e tempo disponível para sua execução em meio a
rotina de trabalho das enfermeiras. Considera-se a observação feita pelo sujeito como um
alerta para os enfermeiros: “revela que busca aprender em obras científicas que acabaram de
ser editadas, revela ter adquirido por compra livros, obras, que irá mostrar para o
pesquisador, que explicam detalhadamente o exame físico, esmiuçando-o, reproduzindo-o em
detalhes” (S
1
).
A realização das atividades cotidianas cria uma disposição no pensamento que
contempla a flexibilidade, em cada situação vivenciada pela enfermeira, que ela própria
necessita, desenvolvendo sua habilidade, sua perspicácia para melhor cuidar.
Quando o exame físico precisa ser repetitivo para o mesmo paciente, o modo de
execução sofre modificações porque a enfermeira já não está lidando com o mesmo nível de
conhecimento sobre o paciente, como ocorria no primeiro contato estabelecido.
O fato de já dispor de significativo conjunto de informações, a condição e situação
vividas pela criança examinada não autorizam o abandono da prática de olhar com atenção,
pesquisando.
A postura ou disposição mental do examinador permanece; ele passa a lidar com
a percepção e conhecimento daquilo que constitui a mudança, que se mostra neste momento
de repetição do exame físico e serve para avaliar a condição e situação apresentada pela
criança neste dia.
A realização do exame físico e do registro dos dados obtidos é uma necessidade
91
da enfermeira para a qual ela deve estar preparada, pois acompanha o desenrolar dos
acontecimentos daquelas pessoas para as quais está desenvolvendo a assistência profissional.
A prática do exame físico pressupõe o seu registro, pois relaciona-se com os aspectos éticos
de sua prática profissional, além de permitir a avaliação da eficácia da qualidade dos cuidados
de enfermagem de que é capaz, possibilitando conhecer o seu crescimento e amadurecimento
no exercício da profissão.
Presenciou-se, inúmeras vezes, na vivência docente do pesquisador, a resistência e
dificuldade de acadêmicos em compreender a importância de registrar os dados colhidos
através do exame físico. O mesmo verifica-se com outras fases do processo de enfermagem,
destacando-se principalmente, tal resistência, com relação à fase da evolução de enfermagem.
Sem o registro dos dados coletados no exame físico e os obtidos pela entrevista
com o paciente, torna-se inviável para a enfermeira memorizar a variabilidade de dados.
Impossibilita que ela tenha segurança no processo de analisar a importância, da relação ou
não, de uns dados em relação a outros, atribuindo o valor de cada um em termos do
estabelecimento do diagnóstico de enfermagem e do planejamento do cuidado.
Os dados do exame físico que não foram registrados consideram-se não apenas
como não pesquisados, mas não observados, não examinados, como se não existissem, porque
esse é um traço da cultura das instituições hospitalares, onde aquilo que não está de alguma
forma registrado é como se não existisse.
A distribuição de pessoal auxiliar de enfermagem e técnico de enfermagem deve
aproveitar o conhecimento, a capacidade técnica de cada um, adaptando-os preferentemente
às características próprias dos pacientes e de suas necessidades. A obtenção e planejamento de
materiais que permitirão a implementação dos cuidados de enfermagem, as quais atendem às
prioridades individuais de cada paciente, não pode servir de pretexto para afastar a enfermeira
92
das ações de cuidado, sua função assistencial.
As expectativas sociais, de modo especial de administradores não enfermeiros,
gestores de serviços de saúde, inclusive os próprios enfermeiros, são responsáveis pelo
afastamento das enfermeiras de sua função assistencial, com o grave risco da delegação
indevida dos cuidados de enfermagem, que essa profissional, inclusive por disposição legal,
não pode se omitir ou negligenciar de prestar aos pacientes.
A prática do exame físico contribui para a vinculação estabelecida entre a
enfermeira no exercício da sua função assistencial com a criança/família, caracterizando-se
por um “estar junto” que progride para uma gratificação pessoal, com base nas inter-relações
humanas, com aprendizados mútuos, com o compartilhar de esperanças, com os propósitos
comuns de recuperação da saúde e da independência dos cuidados de enfermagem.
Na função docente e convivendo com as enfermeiras assistenciais do Hospital
Universitário, presencia-se o quanto de frustração elas revelam quando as obrigações
pertinentes à função administrativa afastam-nas do convívio direto mais prolongado com as
crianças às quais necessitam planejar e manter a assistência.
Surgem daí as alegações constantes de falta de tempo por multiplicidade de
atividades administrativas como justificativa para a não realização do exame físico minucioso,
completo.
As enfermeiras têm consciência de que o exame físico deve estar revestido dessas
características, constituindo conflito para essas profissionais freqüentemente quando se vêm
afastadas do contato direto com as crianças devido às exigências administrativas criadas pelos
administradores a que estão subordinadas.
Toda assistência de enfermagem à criança/família nas unidades de internação
hospitalares é realizada pela enfermeira e sua equipe de auxiliares, em vista da complexidade
93
e extensão de tantas tarefas e atividades requeridas.
Esse trabalho não obstante ser realizado por equipe de profissionais define ações
específicas que devem ser praticadas pela enfermeira, algumas em caráter de exclusividade,
como corresponde a realização do processo de enfermagem, onde, em sua fase inicial, realiza-
se o exame físico na criança. Essa é uma disposição do texto legal que regulamenta o
exercício da enfermagem. Tudo o que o exame físico levanta como conhecimento da condição
e situação do paciente deve ser registrado, o que permite o seu compartilhar com os demais
membros da equipe de enfermagem e das demais equipes profissionais.
O que acontece ao paciente, e para ele, fica documentado em registro próprio, que
obedece ao princípio da preservação da intimidade do paciente, como sigilo ético; e para
essas informações que constituem a evolução do paciente concorrem as anotações e
observações de todos os integrantes das equipes profissionais que atuam na unidade de
pediatria, confere o sujeito: “fato interessante, que a enfermeira tem necessidade... que uma
das suas ocupações é a de registrar o desenrolar dos acontecimentos da pessoa que está sob
seus cuidados” (S
3
).
A evolução, portanto, é um trabalho coletivo, e a realização do exame físico uma
prática que muito contribui para a atualização sempre necessária desse conhecimento tão
fundamental à realização dos cuidados de enfermagem.
A prática do exame físico é a garantia de atualização dos conhecimentos sobre a
condição e situação dos pacientes, tornando as enfermeiras capazes de adotarem, sempre que
perceberem as modificações surgidas na criança, as correspondes medidas profissionais que
atualizam o cuidado de enfermagem de que essas crianças necessitam, compreende o sujeito:
“isso é um empreendimento que pode ser praticado; sendo necessário que a enfermeira
possua, os enfermeiros,... as colegas possuam a consciência da importância do exame físico
94
para que tenham a oportunidade de investir nesse procedimento” (S
2
).
Estabelecido um vínculo entre a enfermeira e as crianças e seus familiares, é
freqüente perceber o quanto a criança e família valorizam a presença da enfermeira, a sua
companhia é muito desejada. A prática do exame físico significa o momento desse encontro, o
qual permite a proximidade que o toque realiza, o estar muito próximo uma da outra, o
compartilhar de uma intimidade que se dá em profundidade em clima de respeito e dignidade.
Quem vive a profissão de enfermeira pediatra sabe que não é incomum que essa
relação de intimidade compreenda muito além do sigilo, do respeito, da ética, as relações
humanas superiores da profunda amizade e do amor incondicional; que não é compensado
nem comprado por dinheiro, ou compensação financeira salarial.
Quando lida-se com o ensino do exame físico, pensa-se e desenvolve-se as
experiências oportunizadas aos acadêmicos como exercício de transferência para a prática
profissional dos conhecimentos científicos aprendidos nas situações de ensino teórico,
realizados no processo da aula acadêmica ou da literatura selecionada com esse fim.
Compartilha-se com as enfermeiras essa experiência de transferência de
aprendizado, acreditando que o que dá sustentação à prática do exame físico não pode ser
fruto do acaso, da mera tentativa do acerto e do erro sem sistematização das observações do
que foi realizado, e sim aquilo que resulta do conhecimento científico pertinente,
corretamente aplicado, no momento certo.
É, no exame físico, que a profissional estuda a criança completamente, que
pesquisa com atenção o corpo da criança, o instrumento privilegiado e de garantia para a
enfermeira tomar as decisões rápidas, apropriadas a situação problema a ser resolvida, no
momento oportuno, isto é que responde sem demora a profunda necessidade da criança e de
sua família.
95
O exame físico é
compreendido
como:
Fundamento, conhecimento e
finalidade do cuidado humano
Aproximação, respeito, toque e
afeto com a criança
Discurso da criança e apreensão
pelos sentidos da enfermeira
Linguagem, resposta, evolução e
registro entre criança/enfermeira
Prática cotidiana, auto-vigilante
do aprendizado e experiência da
enfermeira
Prática humanizada que exige
tempo da enfermeira
Não execução do exame físico =
falha profissional
FIGURA 3 – Q3 - COMO VOCÊ COMPREENDE A PRÁTICA DO EXAME FÍSICO?
O texto, a seguir, envolve a perspectiva do fenômeno exame físico iluminado
96
relativo à compreensão da prática.
Os sujeitos compreendem o exame físico como uma realidade básica, essencial do
cuidado de enfermagem. Dessa forma, este procedimento emerge como fundamento de todos
os cuidados que serão prestados ao paciente.
Consideram como uma prática que exige presteza e rigor, indicando à auto-
exigência da enfermeira que provê a compreensão, a perspicácia e a intimidade da prática do
próprio exame físico e, ao mesmo tempo, permite compreender também a intimidade acerca
de minúcias sobre o paciente.
O exame físico é parte integrante na implementação da metodologia da assistência
de enfermagem; e os enfermeiros vêm desenvolvendo habilidades necessárias para realizá-lo
de forma a contribuir para o diagnóstico e avaliação de enfermagem (HORIUCHI;
SAPAROLLI, 1991).
É decisivo no relacionamento enfermeira-criança este momento, único, primeira
impressão que a pessoa da criança desperta na enfermeira, compete a ela valorizar e buscar
alcançar o melhor proveito dessa primeira impressão.
É significativa a boa organização para proceder o exame físico; o domínio, a
segurança dos passos do procedimento, o modo como a enfermeira fala, seu tom de voz, seu
conhecimento, bem como o humor e postura ética.
O modo como a enfermeira olha para a criança e seu acompanhante demonstra a
consideração com aquilo que eles estão dizendo para ela; a permissão para se deixar olhar e
examinar a criança e seu acompanhante; a paciência de aguardar resposta a perguntas
formuladas e o esforço em compreender essas mesmas respostas; o respeito às incapacidades
ou a pobreza das respostas.
Explicam que realizar o exame físico diário é um compromisso entre as próprias
97
enfermeiras, que devem auto-observar-se na execução para manter a qualidade do exercício
desta prática.
A qualidade do cuidado depende muito da base de conhecimento de cada
enfermeiro, mas a eficiência desse conhecimento depende muito de como ele é
usado...
É necessário que a sua utilização seja feita com senso de observação, mente
inquiridora, com crítica e avaliação constantes” (SOUSA citado por BARROS,
1998, p. 38).
Consideram a capacidade, saber executar, como uma das funções da enfermeira
com relação a este procedimento de investigação. Esta possibilidade acontece quando ainda
não têm conhecimento sobre a criança, como no momento da admissão desta ao hospital.
Enquanto desenvolve o exame físico, estabelece uma convivência próxima com o
paciente, ainda que de forma rápida e sucinta, mas todos os dias. Portanto, é um momento
valioso por estar junto com ela; a enfermeira deve recolher o maior proveito para planejar o
cuidado do paciente. As enfermeiras compreendem que devem perceber o paciente como um
todo, buscando conhecê-lo e saber o que está ocorrendo, a razão por estar hospitalizado.
O exame físico diário, sendo um instrumento de busca, orienta o plano de
execução do cuidado, norteando os procedimentos diários para os demais membros da equipe
de enfermagem. A enfermeira compreende a prática do exame físico como um dever
profissional, portanto, um compromisso ético. Não há como a enfermeira exercer sua
profissão sem estabelecer e manter a interação, o cuidado direto a cada uma das crianças
hospitalizadas. Ao não realizar o exame físico no início e durante a hospitalização, constitui-
se num risco para a consistência dos cuidados e uma falha no compromisso da enfermeira,
explica: “olha... eu compreendo a prática do exame físico como uma coisa fundamental, pelo
menos aqui na minha unidade que é a pediatria” (S
7
).
98
O exame físico representa o primeiro contato e um ponto de partida para a relação
da enfermeira com a criança. Isso eqüivale a possuir uma visão da criança e referir tudo o que
as enfermeiras necessitam para promover e melhorar a condição dos cuidados, inclusive
orientar as mães e a família acerca dos cuidados que elas (mãe e família) ainda não estão
realizando, bem como outras intervenções. O exame físico possibilita ainda reconhecer o
estado geral da criança e seu comportamento, a convivência com a mãe e com a equipe.
Proporciona à enfermeira o conhecimento sobre o grau de maturação da criança, analisa e
estabelece nexo de complexidade entre os cuidados, orientando a enfermeira para a evolução
e aprimoramento do conhecimento da criança.
A realização do exame físico é básica para a enfermeira compreender qual
cuidado pode ou não delegar; estabelecer o nexo de complexidade entre os cuidados de
enfermagem, podendo então acompanhar qual deles é o prioritário em função das dinâmicas
mudanças que se sucedem na criança.
A minúcia do exame físico, tal como a determinação das prioridades, identificação
das necessidades humanas básicas afetadas, a elaboração do diagnóstico de enfermagem e a
conseqüente prescrição dos cuidados constituem a possibilidade de cuidá-la efetivamente.
A prática desse procedimento tem a finalidade precisa de poder tomar atitudes;
agir de forma apropriada, completa, de tal modo que, se não o fizer, não terá condições de
avaliar o que possa suceder com a criança; fazer encaminhamentos, prever e propor soluções
para os problemas. Segundo o sujeito: “aquele primeiro contato nosso com a criança; mas
sempre já se aproveitando para se dar ensinamentos; aha...como é que eu compreendo...
como é que eu compreendo a prática...” (S
5
).
O exame físico é essencial no momento da admissão ao hospital porque nesse
momento as enfermeiras não têm conhecimento sobre a criança; é momento mais propício
99
em que se estabelece a primeira comunicação enfermeira-criança e ambas desenvolvem uma
visão geral uma da outra.
Nessa perspectiva, examinar minuciosa e completamente a criança é
compreendido como cuidar dela; conhecê-la em sua intimidade, portanto, uma função de
investigação da enfermeira que não pode prescindir dela. Buógo (2000, p.60) infere que:
A hospitalização é uma situação na qual o ser cuidado muitas vezes vê-se sozinho,
num ambiente estranho ao seu lar, exposto a procedimentos a pessoas que
desconhece. Nesta situação o toque do cuidador pode transmitir-lhe segurança, ou
seja fazer com que sinta-se protegido e que está com alguém em quem pode confiar.
Para Arruda e Nunes (citado por BUÓGO, 2000, p. 60):
A segurança/proteção é ao mesmo tempo um sentimento e uma necessidade que as
pessoas têm em relação a sua vida, estando aí, no mundo. A pessoa que experencia
segurança e proteção sente que tem condições de sobreviver apesar das hostilidades
potenciais do ambiente que o cerca.
A enfermeira, ao realizar o exame físico, respeita as características da criança, que
se diferencia do adulto por estar num período de sua vida em que nem sempre pode expressar-
se por palavras. Chama atenção o sujeito: “que a criança... ela não é como adulto que fala o
que ela está sentindo” (S
2
).
A necessidade e o objetivo das enfermeiras é alcançar o conhecimento sobre o que
a criança está experimentando; conduz à execução do exame físico, prática que estimula a
utilização da faculdade de ouvir, de ver e tocar, a capacidade de experimentar sentimentos de
humanidade, ternura, simpatia, compaixão.
Não apenas olhando para, observando com a vista, mas igualmente pondo a mão
sobre... apalpando, percutindo e aplicando o ouvido para conhecer os ruídos que se produzem
dentro do corpo da criança; esses são cuidados ao examinar, aponta o sujeito: “não só
observa, mas também tocar... palpar, percutir e auscultar né” (S
3
).
100
A enfermeira deve aproximar-se da criança e tratar de obter o conhecimento sobre
o que a criança está vivenciando; tentar localizar no corpo da criança onde a dor se manifesta
e onde ela não está presente, por exemplo, perceber um sapatinho que lhe comprime
excessivamente os pés.
No início da vida profissional, a enfermeira precisa de dois a três dias para
perceber e descobrir o que a criança expressa através de outra linguagem que não a verbal.
Essas crianças expressam-se de forma eloqüente para uma enfermeira experimentada quando
da execução do exame físico, constituindo seu corpo um texto rico de nuanças a serem
explicitadas e interpretadas por ela.
Essa habilidade de saber interpretar a linguagem verbal desenvolve-se sobretudo
na prática diária do exame físico, tornando a enfermeira capaz de localizar no corpo da
criança onde dói e onde não dói, com a mesma precisão se ela fosse capaz de indicar
verbalmente, como referem os sujeitos: “e tentar saber o que ela está sentindo” (S
6
); “para
talvez descobrir daí dois ou três dias o que a criança estava querendo me dizer” (S
2
).
A realização do exame físico diário permite à enfermeira perceber e distinguir a
cor da pele, a vivacidade, a respiração do bebê; e isso ela somente alcança executando o
procedimento nessa freqüência.
O convívio com a criança e a prática do exame físico completo, minucioso, ou de
outro modo, no dia-a-dia da enfermeira, em cada turno de trabalho, desenvolvem nela
perspicácia, mantendo e aperfeiçoando a qualidade do exercício dessa prática.
A experiência construída por longos anos permite à enfermeira o conhecimento de
combinar os métodos da inspeção e da palpação para evitar percepções enganosas, avaliações
errôneas, como, por exemplo, supor que o abdome visto como distendido possa ter sido
causado por simples acúmulo de gases, ao realizar a palpação, o toque, ela percebe a presença
101
de massas intra-abdominais.
Ela afirma que no exercício profissional muitos dados inicialmente colhidos
parecem ter semelhança com algo, com um diagnóstico certo e preciso, porém o exame mais
minucioso com as várias técnicas (inspeção, palpação,...) constata que isso não é real –
constitui algo muito diferente, uma outra realidade enfatizando que um mesmo dado real pode
ter significado distinto em crianças diferentes, alerta o sujeito: “muitas vezes tu vê um abdome
distendido; se tu não palpar esse abdome” (S
2
).
As múltiplas circunstâncias vivenciadas pelas crianças hospitalizadas influem, isto
é, produzem variações relativas no modo de execução do exame físico, entre essas, as
diferentes faixas de idade das crianças com quem convivem, as diversidades individuais, as
variadas situações que motivaram a hospitalização.
A enfermeira considera evidente que é mais fácil executar o exame físico na
criança recém-nascida. Não há receitas nem prescrições que se aplicam a todas as crianças e
situações; a novidade que cada uma traz para a relação com a enfermeira no momento da
realização do exame físico desafia a criatividade da enfermeira, e com certa freqüência
estimula o exercício da paciência e da tolerância para com as expressões negativas que tem
origem na imaturidade da criança de compreender a necessidade de certos procedimentos na
busca do atendimento eficiente de suas necessidades.
Com as crianças de mais idade, com as quais as enfermeiras passam a lidar com
conflitos de diferentes tipos, levando em consideração na interação com essas crianças, a
expressão de suas vontades e de seu consentimento e aceitação do mesmo.
O modo de agir humanizado da enfermeira admite a possibilidade da criança
recusar seu atendimento, portanto, respeitar a vontade da criança, traz para o momento do
exame físico aspectos humanitários responsáveis por outras maneiras de realizá-lo.
102
A pouca receptividade da criança e sua discordância em permitir o exame de
certas partes de seu corpo fazem com que as enfermeiras deixem de observar e conhecer
coisas eventualmente presentes nesses segmentos do corpo. As enfermeiras devem responder
com paciência e energia diante de intempestiva recusa de certas crianças em retirar a roupa
íntima e do exame dos genitais, sem desanimar com facilidade, investir demoradamente e com
novas formas na conquista da criança até a realização do procedimento. Isso requer tempo de
convívio com ela, de estar junto, para que se sinta apoiada pela enfermeira e confiante nela.
Remete para o quanto é embaraçoso olhar com atenção e examinar
minuciosamente os órgãos genitais de crianças maiores do que nos recém-nascidos. Diante da
recusa em tirar a roupa para exame dos genitais e possuindo essa criança a capacidade de se
comunicar pela fala, a enfermeira pode substituir o exame por um pedido de informações
diretamente à criança.
Levar em consideração o tipo de paciente que está examinando, remete a
enfermeira para a questão não de ora realizar o exame físico minucioso e ora do modo que
omite certas partes do exame, e sim para a questão de ter a enfermeira de trabalhar e obter a
conquista dessa criança para o modelo que lhe permite efetivamente conhecer a criança.
Da mesma forma, respeitar a vontade da mãe, fazer algumas concessões que
também deve ser conquistada na colaboração com a realização do exame físico; de modo
muito especial, considerar a vontade daquelas mães mais preocupadas e participantes nos
cuidados ao seu filho. Há muitas formas de realizar os procedimentos, conforme revela o
sujeito “alguns itens, precisam ser deixados de lado em virtude da... da... aceitação do
paciente” (S
4
).
As enfermeiras constantemente reclamam da falta de tempo para a execução do
exame físico em meio à multiplicidade de atividades profissionais diárias que realizam. O
103
exame físico minucioso e completo requer tempo para a sua execução e desafia a criatividade
das enfermeiras em decidir, diariamente, qual o momento mais adequado, pois, nem sempre
sem razão, elas reclamam da falta de tempo para realizá-lo em vista da multiplicidade de
atividades profissionais diárias que realizam. A fala a seguir tem sido considerada uma
constante: “as queixas constantes da enfermagem por falta de tempo” (S
2
).
Os registros dos controles de sinais vitais e demais itens da evolução dos
pacientes servem como auxílio para a prática do exame físico. Por meio deles, a enfermeira
pode perceber as alterações, ou não, e avaliar a estabilidade do estado da criança. Os dados
disponíveis na evolução não serão novamente verificados pela enfermeira, economizando
tempo e facilitando a tarefa da distribuição dos auxiliares e técnicos de enfermagem.
A enfermeira compreende que necessita ter conhecimento sobre o paciente para
falar a linguagem da unidade de pediatria; ela precisa responder as questões que lhe são
formuladas não apenas pela família, mas também pelas auxiliares de enfermagem e pelas
demais equipes de profissionais, compreende este sujeito: “e eu preciso conhecer ele (o
paciente) prá falar a linguagem da unidade, não é” (S
3
).
A enfermeira em sua compreensão considera a prática do exame físico como uma
possibilidade de estabelecer vínculo afetivo com a criança, essencial à recuperação dela. O
toque intencional da enfermeira facilita a recuperação da criança e o restabelecimento da
imunidade física. A enfermeira usa o toque como forma de expressar seu carinho pela criança,
criando com ela um grau de afinidade capaz de fazê-la experimentar um envolvimento afetivo
maior. Progressivamente, o toque é realizado pela enfermeira e as auxiliares de enfermagem
de sua equipe estabelecendo-se um vínculo entre a criança e os que cuidam dela, o que lhes
promove a integração efetiva da criança com toda a equipe de cuidadores.
Esse tocar, que não é uma mera palpação, é realizado pela enfermeira e os
104
membros de sua equipe; e contribui para integrar a criança com toda a equipe de cuidadores.
Esse vínculo é fruto de contato com a criança, sobressaindo a essencialidade do momento do
toque. Assim, a enfermeira pode sentir a criança e não apenas realizar o toque como mera
palpação, que define o local onde há dor e outros eventos. Para ela o exame físico é contato
verbal e pele-a-pele com a criança, caracterizando-se pela essencialidade do momento do
toque.
A enfermeira compreende que o momento da admissão da criança ao hospital, na
companhia da mãe, a contar da primeira internação da vida dessa criança e nas subseqüentes,
é momento valioso para ela por estabelecer a aproximação enfermeira-criança e a mãe,
criando-se o primeiro contato entre elas, influenciado pelo modo como a enfermeira
aproxima-se e pelas primeiras percepções da criança que identifica uma das características da
unidade de pediatria pela utilização da cor branca na roupa da maioria dos membros das
equipes hospitalares.
A criança reage à aproximação da enfermeira nesse primeiro contato, quando ela
traz uma medicação injetável que requer a imobilização para a punção, o toque ou palpação
do local da injeção e a experiência da dor que provoca a substância injetada na percepção da
criança. Considera-se importante este cuidado manifestado pelo sujeito: “a criança chega aqui
no hospital vê todo mundo de branco né...” (S
4
).
A enfermeira compreende que a execução da prática do exame físico deveria ser
exigida pelas próprias enfermeiras diariamente, tornando esta prática mais perspicaz, e que
venha do íntimo delas o desejo de aprender sobre seus pacientes.
Autovigiando-se na execução desta prática, as enfermeiras dispensam qualquer
controle externo de sua execução. A garantia de execução do exame físico tem origem no
íntimo de cada enfermeira que assume esse compromisso estabelecido pela consciência ética;
105
com a execução dos procedimentos que lhe garantem proporcionar à criança o cuidado de
qualidade. A afirmativa do sujeito, demonstra como este procedimento está impresso no
cuidado da enfermagem: “teria de sê cobrado de nós mesmo, no dia-a-dia bem mais, uma
coisa mais profunda né...; e que temos que nos policiar...e ... e... aí colegas mesmo policiar
umas as outras... prá saber se realmente foi feito” (S
5
).
A não realização do exame físico minucioso com a criança totalmente despida,
como denuncia a enfermeira, na unidade de pediatria, inclusive no momento da admissão,
constitui uma falha porque é substituída por uma avaliação superficial junto ao leito da
criança sem nenhuma base científica, que deixa a enfermeira sem noção do que realmente
acontece com a criança e sem condições para realizar os cuidados diários.
A enfermeira, mesmo admitindo que suas colegas possam eventualmente esquecer
partes do exame físico, reafirma que a sua não execução em cada criança com quem ela tem
contato é uma falha profissional.
A não realização do exame físico corresponde à assistência de enfermagem sem
fundamento científico, porque constitui num risco para a consistência dos cuidados, uma falha
no compromisso ético e suscita a questão que modo de assistência está essa enfermeira
praticando?
Qual o significado
do exame físico ?
Contato humano
Linguagem única
Envolvimento profissional
Bases para intervenção
da enfermagem
Interação crianças / família
/ enfermagem
Desenvolvimento da percepção
dos profissionais
Encontro teoria prática
Interesse do aprendizado da
família, profissionais e acadêmicos
106
FIGURA 4 – Q4 - QUAL É O SIGNIFICADO DO EXAME FÍSICO ?
O texto, a seguir, envolve a perspectiva do fenômeno exame físico, desvelado
107
relativo ao significado.
Os sujeitos do estudo permitiram ao pesquisador considerar o exame físico como
um dos contextos em que se pode evidenciar o cuidado, pois a enfermeira atua como
profissional e torna visível o procedimento do Exame Físico, como contato humano,
linguagem única, envolvimento profissional, bases para intervenção da enfermagem, interação
criança/família/enfermagem, desenvolvimento da percepção do cuidador, encontro da teoria e
prática, interesse do aprendizado do aluno.
Gutierrez e Souza (1991, p. 23), refletindo sobre o significado do exame físico,
contemplam:
que a prática do exame físico não pode consistir numa série de etapas que se
desenvolvem, mecanicamente, sem objetivos definidos; é prática que representa
uma oportunidade de comunicação e interação com o paciente; os dados obtidos
através dele devem ser relacionados e interpretados em uma configuração
significativa para a enfermagem; o referencial significativo para os dados coletados
é fornecido pelos esquemas conceituais, modelos e teorias.
O exame físico significa cuidar da criança no dia-a-dia, com a possibilidade de
surpreender novos eventos que surgem no estado de saúde da criança e acompanhá-la em sua
evolução a partir do que a enfermeira compreende; e reconhece em seu paciente uma mera
possibilidade.
O exame físico constitui o fundamento e a essência da assistência de enfermagem
à criança, permite inclusive avaliar o grau de maturidade da criança, se ela está dentro dos
padrões normais ou se apresenta alguma alteração, e outras tantas minúcias que a sua não
realização significa que a enfermeira não terá condições de elaborar e executar o plano de
assistência; a sua prescrição de cuidados não poderá considerar a determinação das
prioridades individuais de cada criança.
A execução diária do procedimento do exame físico, possibilita a enfermeira
108
conhecer com minúcias a criança/família; significa ter a possibilidade de intervir na condição
de profissional e auxiliá-las nas situações vividas por elas.
A enfermeira constrói o significado da prática do exame físico na interação e
vinculação que ela estabelece com a criança. Acredita ser a parte essencial do exame físico
essa integração porque, a partir daí, alcança realização disso; ajudar a criança, diz o sujeito:
Para mim,...isso pessoalmente..., o exame físico ele é uma oportunidade única de a
gente...aha...chega na situação do paciente; realmente vê como ele tá!; ter noção de seu
estado” (S
2
).
A principal intervenção da enfermeira refere-se à execução dos cuidados que
foram planejados, avaliando seus resultados e propondo as modificações, que em sua
percepção são inadiáveis e imprescindíveis, para manter e melhorar a qualidade da atenção à
saúde dessas pessoas.
No procedimento exame físico, é essencial o lidar com a criança. Quando a
enfermeira o realiza, percebe a criança como um todo, tem a possibilidade de realizar
cuidados proporcionando atenção às necessidades recuperando e promovendo bem-estar,
refere o sujeito: “então o exame físico é basicamente estar com aquela criança; quando eu
faço o exame físico e vejo a criança como um todo; eu consigo interferir nos cuidados dela
prá melhor sua recuperação” (S
3
).
Há intervenções que não são diretamente sobre o corpo da criança, sequer
dirigidas diretamente à criança, tais como as orientações e ensino de como proceder para
realizar determinados cuidados. O exame físico é o procedimento que orienta a enfermeira em
sua função de educadora. Ela precisa conhecer os aspectos relativos a cuidados preventivos à
criança/família.
A enfermeira recorda que em seu local de trabalho exerce sua função profissional
109
específica; alertando que esta não se limita a ser um instrumento de colaboração com o
médico, tal como executar a prescrição médica. Explica que, ao introduzir uma sonda
prescrita, estará aplicando a prescrição, mas lhe cabe sim, em sua função específica, estar ao
lado da criança, reconhecer, observar o que registrar e comunicar ao médico e a equipe de
enfermagem os resultados que se evidenciaram a partir da introdução da sonda; numa
sondagem gástrica avaliar o tipo de resíduo aspirado, sua coloração, transparência, textura e
quantidade e a eventual presença de sangue. Portanto, cabe-lhe reconhecer as diferenças e se
as providências são imediatas ou mediatas, alerta o sujeito: “porque eu também tenho uma
função aqui né; minha função...não é só di...di...di estar...aha...ser um instrumento do
médico); ser um instrumento aonde eu vou apenas vou fazer procedimento né...passar uma
sonda e pronto; e...e vou passar uma sonda mas com essa sonda eu vou conseguir ter
resultados, né... (S
6
).
Analisando a função assistencial da enfermeira que leva em consideração os
cuidados da terapêutica médica, o que significa a realização de cuidados para os quais o
conhecimento de ciências biológicas básicas lhe proporcionam avaliar a condição e situação
da criança, bem como as ciências humanas e sociais que contemplam olhar a criança inserindo
em sua família, na sociedade. A enfermeira é o profissional que permanece ao lado da criança
acompanhando sua vivência como pessoa adoecida, comunica ao médico e demais
profissionais da equipe as alterações do quadro clínico e/ou do comportamento da criança ao
sofrer alteração.
O exame físico significa também a possibilidade de observar, conhecer e
interpretar as necessidades da criança e sua família desde o cuidado corporal, o conforto, as
necessidades psicológicas e até financeiras sobre as quais as enfermeiras também fazem
encaminhamentos. Sobressai nos cuidados à criança hospitalizada não só pela importância,
110
mas também pela freqüência, as intervenções que atendem as necessidades psicológicas. As
carências financeiras, na família da criança, exercem pressões e interferência na qualidade do
conjunto de todos os cuidados de enfermagem à criança.
O exame físico oferece subsídios para a enfermeira conhecer a situação que
sustentará a realização de seu trabalho eliminando as inseguranças, como quando alguém
pergunta – o que tem aquela criança? E a resposta pode ser: - não sei! Não tendo realizado o
procedimento, o sujeito entende que não se pode desenvolver a elaboração do plano de
cuidado. Assim ele prevê que sem o exame físico nada poderá realizar como profissional ao
paciente, pois não terá condições de elaborar o plano de assistência, a prescrição de cuidados
e determinar a prioridade de execução.
Exame físico significa para a enfermeira acompanhar a criança e redirecionar os
cuidados em razão de que as condutas médicas prescritas já não são pertinentes, por exemplo:
a criança passa a reagir de maneira diferente daquela esperada, tal como o cessar de vômitos
em abundância. O sujeito na fala a seguir explica tais situações: “porque às vezes tem
condutas assim que não cabem; às vezes odico né, cabe a enfermeira né...em direcionar
determinados cuidados e tudo né...; eu acho que a partir do exame físico tu...tu consegue
fazer isso né” (S
3
).
Se para a enfermeira a realização do exame físico cotidianamente permite
relacionar coisas importantes entre si, para a criança a sua não realização significa atraso na
solução de seus problemas, que, por isso mesmo, não são devidamente interpretados,
conhecidos e tratados.
Para executar o exame físico a enfermeira necessita de contato com a criança,
porque aquilo que não é observado e percebido, não é visto; por conseguinte, se ela não vê a
criança ela nada tem a dizer a respeito dela; nada sabe; nada conhece.
111
Uma conseqüência imediata da não realização do exame físico é um dos fatores
que pode levar à necessidade de reinternação hospitalar por ter ocorrido alta hospitalar sem
que a necessidade prioritária da criança tenha sido percebida e tratada; não sendo incomum
várias reinternações sucessivas até que esse problema seja ntoado e a percepção desse
problema ocorre devido à realização do exame físico ainda mais minucioso e detalhado, ao
estudo acurado que ele provoca, a atenção concentrada que ele exige do examinador.
A vivência do ensino do exame físico está em acordo com as enfermeiras, para
quem o exame físico significa a interação que se estabelece com a criança/família. Percebe-se
que o acadêmico não realiza o exame físico, perde em conhecimento da criança, ficando
inabilitado a lidar com a situação; desconhecendo a idade e tantas outras características
importantes, pois demonstra sequer poder identificar características óbvias da criança lhe foi
confiado o cuidado.
O mesmo ocorre às enfermeiras que não estabelecem essa interação com a
criança/família, expondo-se a simples execução da terapêutica médica e a sensação
desagradável de frustração profissional por estar cometendo um falha em seu compromisso
ético, diz a enfermeira: “Esse nenê? ... tem impressão que não sabe nem a cor da criança!
Né...o tamanho né... ou a idade...e essa criança na enfermaria nesse momento né... (S
5
).
Quando a enfermeira não tem contato com a criança, ela diz ter a impressão de
que não trabalhou e considera isso uma falha.
Para a enfermeira é essencial a ocasião da passagem de plantão para conhecer
tudo sobre o paciente; as condições de como recebeu, e como está no momento da entrega;
nesse caso, a realização do exame físico, a observação durante todo o turno é importante. A
enfermeira possui a responsabilidade de receber e a serenidade da consciência em conhecer as
condições que entregará a criança ao próximo colega.
112
Em vista desta responsabilidade ética, a enfermeira não passará um plantão sem
ter visto completamente seu paciente e ter o conhecimento de como o está entregando à
colega, relata o sujeito: “prá mim é muito importante quando eu fizer a passagem do meu
plantão eu conhecer o meu paciente totalmente, né...; eu sabe como eu recebi e como estou
entregando ele né; então a observação do exame físico; a observação total do paciente
durante todo o plantão né...; é de suma importância (S
1
).
Desde o momento que a enfermeira vê a criança no primeiro contato, inicia a
executar o exame físico, sentindo-se mais preparada, mais enriquecida de elementos
essenciais ao cuidado o que na prática lhe dá sustentação, refere: “Bom..! eu acho que me dá
mais recursos prá trabalhar com mais segurança, trabalhar com...com...com esse cliente; Eu
me sinto mais segura né...no momento que estou inteirado das condições de cada cliente”
(S
5
).
A enfermeira afirma que pode permanecer seis horas no local de trabalho
envolvida com parte administrativa, dirigindo pessoal, solicitando e organizando material,
sem avistar o paciente e isto pode acontecer; acontece com certeza!
“Eu posso passar 6 horas aqui dentro (a unidade) só com administrativo...né; e dirigindo
pessoal; buscando material; sem enxergar o paciente...e...); e...pode acontecer!...acontece,
com certeza!” (S
2
).
Reconhecido como um compromisso da enfermeira, a realização do exame físico
diário não significa que, em várias situações, ele não seja executado ao longo de um turno
completo de trabalho, por estar envolvida com sua função administrativa que determina a sua
ausência no cuidado direto à criança/família que, inclusive, nessas ocasiões, costuma ser
considerada um estorvo em face das solicitações de atenção que provoca.
Esses eventos significam impressão de não ter trabalhado, considera uma falha,
113
uma interação que pode não ter havido em razão de que não se aproximou do paciente pela
falta de tempo ou consciência dos deveres de estar perto do paciente e identificar suas
necessidades conclui, que esse tipo de ocorrência lhe traz muita preocupação! — isso pode ter
sido falha...não pode; O sujeito considera: “uma interação pode não ter acontecido! (S
2
).
Contempla o exame físico como uma atividade muito agradável, ainda, que
realizada com crianças que se opõem ao procedimento na presença de mães, que também
facilmente discutem, brigam e opõem resistência a estes e outros procedimentos da
enfermeira. Mas ela afirma que apesar dessa oposição e resistência consegue transmitir algo a
essas mães e aprender algo delas também. Reconhece que nessa interação com as mães elas
ensinam as enfermeiras tanto quanto as enfermeiras às ensinam; em vista disso, o exame
físico é uma oportunidade única para se aproximar do paciente e ter um conhecimento real
sobre ele: conhecer a pessoa que se encontra por trás dessa situação de doença no momento
presente, qualifica o sujeito: “prá mim, é uma...uma tarefa muito agradável...; mesmo
naquelas crianças mais problemáticas); naquelas mães...aha...mais briguentas, digamos
assim; que são resistentes a certos procedimentos; e...pegar alguma coisa deles, também...
(S
2
) us18; us19; us20; us21; us23.
A interação que ocorre com a prática do exame físico possibilita troca de
ensinamentos, mesmo considerando que ocasionalmente ocorrem conflitos, resistência à
execução do procedimento por parte de mães que facilmente brigam com a enfermeira e
desejam barganhar de alguma forma regalias em relação às demais crianças e mães
hospitalizadas que participam dos cuidados.
A enfermeira sabe como dar atenção às mães desde um diálogo até aquelas que
necessitam de um abraço carinhoso, uma palavra de ânimo, um gesto de solidariedade, um
momento exclusivo para ouvir o que ela deseja falar naquele exato momento, demonstrando
114
possuir o conhecimento real das pessoas e situações com as quais está interagindo.
A enfermeira demonstra que o exame físico significa o encontro da prática
profissional com o conhecimento teórico. Reitera que as enfermeiras devem estar sempre
renovando seu conhecimento teórico e transferindo para a prática e da prática retornando...
um conhecimento alimentando o outro, conforme relata: “Olha!...o exame físico para
mim,...ele significa assim o encontro,...da...em nosso caso aqui da enfermagem...; ...o exame
físico do enfermeiro...é o encontro da nossa prática com o nosso conhecimento teórico!” (S
1
).
Em todas as situações de ensino do exame físico, procura-se realizar a
aproximação entre o conhecimento teórico e aquilo que nesse instante está sendo vivenciado,
isto é, contribui-se para que não haja distanciamento entre os fenômenos que a vivência nos
oferece pela prática do exame físico e as informações e conhecimentos obtidos da literatura e
nas atividades de ensino teórico.
Na aproximação desses dois momentos, o aprendizado na teoria e a transferência
dele para a prática constituem uma das atividades mais gratificantes para quem tem a
responsabilidade de ensinar o exame físico na criança; é possível perceber e acompanhar
como a evolução de cada aluno obedece as características individuais de cada um, e que há
um momento próprio nessa conquista de transferir o que é pura teoria para a prática e da
prática criar novos ensinamentos. A enfermeira encontrará dúvidas quando proceder as
leituras, ou ao examinar o paciente, e terá indicações mais precisas sobre o que precisa
conhecer mais aprofundadamente, refere: “porque através do exame físico é...tu vais ter
dúvida; que tu vais lê; tu vais buscar; tu vais direcionar que livro tu vais comprar; com
que tu vais conversar...né???” (S
1
).
A enfermeira que deposita um olhar atento sobre uma realidade palpável como é o
corpo da criança examinada; o exame físico tem a propriedade de permitir ao profissional não
115
só a emissão de juízos de valor sobre o quê for percebido, mas também capacitar a enfermeira
à previsão de determinados acontecimentos que no momento não estão presentes, mas que
terão ou provavelmente se manifestarão em futuro, a ser acompanhado por ela. Nesse sentido,
a vivência diária do exame físico sustenta a afirmativa de que aquelas enfermeiras, com mais
vivência desta prática, possuem um “olhar clínico” admirável.
7.1 IDIOSSINCRASIAS
As idiossincrasias estão constituídas por temáticas distintas do conjunto das
demais. Elas tratam de aspectos onde os sujeitos apontam para o que é sutil, levando ao
pesquisador compreender a importância de lhes conceder um espaço de especificidade.
Foram distinguidas as temáticas: um procedimento que deve respeitar a criança; protege a
criança ao examinar; utiliza os sentidos; pode facilitar a realização mecânica; a função
assistencial é essencial e antecede a função administrativa; consome tempo e pressupõe
reclamações constantes pelo enfermeiros; função administrativa impede a execução do exame
físico; e a sustentação do exame físico está no conhecimento e rigor científico.
O texto, que segue, envolve a perspectiva idiossincrática do fenômeno revelado. A
enfermeira, ao realizar o exame físico, respeita as características da criança que se diferencia
do adulto por estar num período de sua vida, que nem sempre pode expressar-se por palavras.
De acordo com as enfermeiras, o sentido céfalo-caudal, maneira preestabelecida do exame
físico, possibilita proteger a criança e a mantém o máximo de tempo com a roupa e aquecida.
O exame físico é um procedimento que requer cuidado da criança em vista da
exposição do corpo para um olhar minucioso; proteger é uma ação de cuidado permeando um
procedimento, uma atitude humana de estar com o ser humano sob a sua responsabilidade.
116
A necessidade e o objetivo do enfermeiro são alcançar o conhecimento sobre o
que a criança está experimentando; conduz à execução do exame físico, prática que estimula
a utilização da faculdade do ouvir, de ver e tocar, capacidade de experimentar sentimentos de
humanidade, ternura, simpatia e compaixão.
Não apenas olhando para, observando com a vista, mas igualmente pondo a mão
sobre ... apalpando, percutindo e aplicando o ouvido para conhecer os ruídos que se produzem
dentro do corpo da criança: “não só se observa, mas também se toca...,palpar, percutir e
auscultar, não é? (S4).
Conservando e preservando esse caminho céfalo-caudal, muitas vezes percorrido,
corre-se o risco de o exame físico ser realizado de forma mecânica... esse caminho em geral
feito maquinalmente.
O sentido céfalo-caudal é adotado como técnica e vivenciado com freqüência
pelos acadêmicos nas diferentes disciplinas do currículo. Esse aprendizado foi desenvolvido
com pacientes de diferentes faixas etárias, condições físicas e comportamentos permitindo
uma abordagem que respeita os aspectos humanos dessa relação, preservando a
individualidade do paciente, a tranqüilidade do examinador que pode seguir um caminho
tantas vezes, portanto que lhe é familiar, sem incorrer numa repetição mecânica de ações
como procede na operação de uma máquina.
Na conjuntura como enfermeiras envolvidas na assistência à criança ... realiza-se
também a função administrativa; no entanto, além disso, está-se envolvido na assistência; e
se ao acaso tiver de ser mandada para o interior de uma UTI, a enfermeira poderá ser
unicamente administrativa? ou deverá exercer a função assistencial, essencial e principal. A
sustentação do exame físico está no conhecimento científico com rigor em seu método.
As enfermeiras constantemente reclamam da falta de tempo para execução do
117
exame físico em meio à multiplicidade de atividades profissionais diárias que realizam. O
exame físico minucioso e completo requer tempo para sua execução e desafia a criatividade
das enfermeiras em decidir diariamente, qual o momento mais adequado, pois, nem sempre
sem razão, elas reclamam da falta de tempo para realizá-lo em vista da multiplicidade de
atividades diárias que realizam.
8 REFLEXÃO E RECOMENDAÇÕES
Perceber não é se lembrar. Perceber não é sentir uma multidão de impressões que
conduziriam com elas lembranças capazes de completá-las, é ver surgir de uma
constelação de dados um sentido imanente sem o qual nenhuma chamada às
lembranças seria possível.
(MERLEAU-PONTY, 1971, p. 40).
A presente reflexão surge no momento em que o pesquisador, fundamentado nas
experiências do seu mundo vivido, na qualidade de profissional envolvido no cuidado à
criança e responsável pelo ensino do exame físico, de propósito estabelece um diálogo com o
significado desse exame físico – o fenômeno – como foi desvelado pelas enfermeiras que o
vivenciam cotidianamente na Clinica Pediátrica do Hospital Universitário da Fundação
Universidade Federal do Rio Grande – FURG.
Compreende-se, assim, que a execução do exame físico na criança hospitalizada
realizado por este pesquisador, na presença dos acadêmicos, com a finalidade de beneficiar a
criança, promoveu o aprendizado dos alunos e apontou para outros aspectos desse modo de
proceder do enfermeiro, que até então não eram percebidos com muita clareza, provocando o
desvelar de “outros” significados também ainda não percebidos desse fenômeno.
No mundo-vida do pesquisador, e convivendo com ele, estavam e estão: a criança
doente centro dos cuidados; os acadêmicos de enfermagem interessados no aprendizado
do exame físico; as enfermeiras assistenciais responsáveis pelo cuidado; as mães
acompanhantes da criança durante a hospitalização; os membros das equipes de enfermagem
e médica, os quais constituíram um grupo significativo, interessados (múltiplos interesses),
num único fenômeno.
A vivência cotidiana do exame físico desse grupo, somada às preocupações com a
qualidade do ensino, despertaram, no pesquisador, forte motivação para desvelar o significado
119
desse fenômeno, que também pode sentir a mobilização produzida nas inúmeras vivências que
acumulou em sua prática profissional e o quanto estas o ajudaram no movimento de ir ao
encontro do tema. Além disso, o fato de entrar no processo reflexivo com as enfermeiras
provocou-lhe mudanças pessoais e profissionais que o arrastaram e o motivaram a continuar
os estudos, valorizando o corpo, o comportamento, os aspectos simbólicos e de linguagem
que o fenômeno envolve.
Ao estudar a obra Fenomenologia da Percepção percebe-se que o seu autor se
mostra preocupado com o homem, e muito mais com a sua existência do que com a sua
essência, pensado-o em seu meio natural, cultural e histórico como ser-no-mundo mais do
que ser ideal, como era considerado em escolas filosóficas que precederam ao
existencialismo, privilegiando a consciência (filosofias da consciência).
A fenomenologia, portanto, caracteriza-se como uma corrente da filosofia que
não faz distinção entre o papel atuante do sujeito que conhece e a influência do objeto
conhecido. Na fenomenologia de Merleau-Ponty, a consciência é sempre consciência de
alguma coisa e o objeto é sempre objeto para uma consciência e isso significa que não existe o
objeto em si destacado de uma consciência que o conhece. O objeto é um fenômeno, diz
Merleau-Ponty.
Para o autor não se trata de considerar a consciência como algo puro, distanciado
do mundo, mas o mundo é o meio de realização da consciência. Percebe-se, então, que se o
homem é um ser-no-mundo, a consciência tem de coexistir com esse mundo que desde
sempre o envolve. O filósofo ensina que a consciência não pode ser tratada como um
expectador distanciado do mundo ou como um legislador supremo, pois é preciso reconhecê-
la como uma luz em direção ao mundo ao qual ela se dirige; portanto, sua preocupação foi
120
desenvolver uma filosofia que mostrasse o enraizamento do espírito no corpo a
consciência atada a um corpo que a liga ao mundo.
Uma das grandes novidades do autor, em relação a outras escolas filosóficas, foi
sua declaração de que a consciência está sempre aprendendo; o aprendizado da consciência
ocorre no dia-a-dia, no fluxo da vida chamado existência. Reconhece-se, nesse ensinamento,
que a consciência e o corpo devem funcionar em conjunto, um dependendo do outro, pois um
corpo sem consciência é apenas um autômato, e a consciência sem corpo é impensável em
termos filosóficos.
Para evitar o dualismo consciência-mundo, entende-se que o filósofo teve como
objetivo principal, em sua obra, a primazia da percepção. Na Fenomenologia da Percepção,
ele argumenta que todas as funções mais altas da consciência estão enraizadas em, e
dependem de, a pré-reflexividade do sujeito, a existência corpórea, em suma, a percepção.
Assim, ele pretendia ir além dos construtos intelectuais da filosofia tradicional, tais como os
dados sensíveis, e efetuar um “retorno aos fenômenos”, ao mundo como, de fato, se o
experimenta na função de sujeito incorporado antes de toda a teorização.
O filósofo vai buscar, na percepção, a resposta que evita o dualismo consciência-
mundo, de modo que, na relação sujeito-objeto, ele se coloca diante do enigma da realidade,
cuja ambigüidade exemplifica: quando a minha mão direita toca a minha mão esquerda ocorre
um fenômeno difícil de determinar: Quem toca e Quem é tocado? Qual das mãos é sujeito e
qual é objeto? Essa ambigüidade operada pelo corpo acompanha toda sua obra. Para ele, tudo
o que a consciência conhece se originou da percepção e, assim, vale-se dos dados da
percepção.
Para Merleau-Ponty, todo o conhecimento presente na consciência passou
primeiro pelas portas da percepção, e considera a percepção a porta de entrada - e de saída -
121
para o mundo exterior, em consonância com o dito secular que afirma serem os olhos “as
janelas da alma e o espelho do mundo”. Portanto, o corpo vivido não é um objeto no mundo,
distinto do sujeito conhecedor (como em Descartes), mas o ponto de vista sobre o mundo do
próprio sujeito; o que em outras palavras quer dizer que o corpo é ele mesmo o sujeito
conhecedor original, do qual todas as outras formas de conhecimento se derivam, mesmo a
geometria.
Assim, anterior a todo conhecimento, científico ou filosófico, está o conhecimento
direto da realidade vivida; e esse conhecimento, original e espontâneo, é ponto de partida para
todos os outros; e essa realidade (“vemos as próprias coisas, o mundo é aquilo que vemos”)
deve ser explicitada, para, assim, tomarmos conhecimento do rico espetáculo do mundo. Ele
nos ensina, portanto, que o mundo ´´é o que vemos e, contudo, precisamos aprender a vê-lo”;
e fazermos isso sem dele nos desligarmos.
Aprende-se, assim, com o filósofo Merleau-Ponty, que esse mundo em que se
está imerso é inesgotável para a consciência, portanto, sempre haverá um saber latente,
secreto, além da percepção (o grifo é do pesquisador). Desse modo, os objetos não nos são
dados por inteiro; nós os vemos por perfis: uma parte se manifesta enquanto a outra se
esconde, numa relação figura-fundo. Apesar disso, as sensações ocorrem numa configuração
global: ver é tocar, ouvir é ver, tocar é ver, revelando que há uma unidade dos sentidos; eles
se comunicam e como não existem sensações puras, somos assediados no mundo vivido por
um turbilhão de sensações que interagem entre si. Nem por isso chegar-se-ia ao extremo de
afirmar que os nossos órgãos sensitivos não tenham a sua especificidade. O autor diz que cada
um dos órgãos dos sentidos interroga o objeto à sua maneira, e, embora se capte, em cada
momento, apenas determinadas facetas da coisa. Mesmo assim, ela se apresenta em sua
originalidade.
122
Esses ensinamentos da filosofia de Merleau-Ponty são destacados, aqui, nesse
momento de reflexão, como indicadores de uma feliz escolha para o estudo do fenômeno do
exame físico como cotidianamente as enfermeiras o realizam na criança hospitalizada. Para a
correta compreensão do que seja uma figura-fundo, acreditou-se ser melhor citar as palavras
do próprio filósofo (1971, p21):
Imaginemos uma mancha branca sobre um fundo homogêneo. Todos os pontos da
mancha têm em comum uma certa ‘função’ que faz deles uma ‘figura’. A cor da
figura é mais densa e como que mais resistente que a do fundo; os bordos da mancha
branca lhe ‘pertencem’ e não são solidários com o fundo apesar de contíguo; a
mancha parece colocada sobre o fundo e não o interrompe. Cada parte anuncia mais
do que contém e esta percepção elementar já está pois carregada de um sentido. Mas
se a figura e o fundo, como conjunto, não são sentidos, convém, dir-se-á, que o
sejam em cada um dos pontos. Seria esquecer que cada ponto por sua vez não pode
ser percebido senão como uma figura sobre um fundo. Quando a teoria gestaltista
nos diz que uma figura sobre um fundo é o dado sensível mais simples que podemos
obter, ...é a própria definição do fenômeno perceptivo, o fato sem o qual um
fenômeno não pode ser considerado percepção. A ‘alguma coisa’ está sempre no
meio de outras coisas, faz sempre parte de um ‘campo’. Uma praia verdadeiramente
homogênea que não ofereça nada a perceber não pode ser dada a nenhuma
percepção.
E Merleau-Ponty (1971, p. 31) continua:
Uma ‘figura’ sobre um ‘fundo’ contém muito mais que as qualidades atualmente
dadas.Ela tem ‘contornos’ que não ‘pertencem’ ao fundo e se ‘destacam dele, ela (a
figura) é ‘estável’ e de cor ‘compacta’, o fundo é ilimitado e de cor incerta, ele se
‘continua’ sob a figura. As diferentes partes do conjunto, por exemplo, as partes da
figura mais próximas do fundo possuem, pois, além da cor e das qualidades, um
sentido particular.
Aprende-se, portanto, com o filósofo, que a percepção descrita por ele é um ato
que cria o sentido, de um só golpe, a partir da constelação de dados; (o grifo é meu)que ela
ocorre a partir da sensação, pela atenção e o julgamento. Por isso, a sensação é uma
comunhão vital com o mundo, ocorrendo de maneira anônima, parcial e periférica. Assim,
pergunta-se: o que é ver uma figura?
O próprio Merleau-Ponty (1971, p.32) responde:
Ver uma figura, isto não pode ser senão possuir, simultaneamente, as sensações
123
pontuais que fazem parte dela. Cada uma delas continua sempre o que é, um contato
cego, uma impressão, o conjunto se faz ‘visão’ e forma um quadro diante de nós,
porque aprendemos a passar mais rápido de uma impressão a outra. Um contorno
não é nada mais do que a soma de visões locais e a consciência de um contorno é um
ser coletivo.... Mas um contorno não é somente o conjunto de dados presentes; estes
evocam outros que vêm completá-los.
As sensações e as imagens que deveriam começar e terminar todo o conhecimento
só aparecem num horizonte de sentido, e a significação do percebido, em vez de
resultar de uma associação, é, pelo contrário, pressuposta em todas as associações,
em se tratando da sinopse de uma figura presente ou da evocação de experiências
antigas.. Nosso campo perceptivo é feito de ‘coisas’ e de ‘vazio entre as coisas’
(MERLEAU-PONTY, 1971, p. 33).
Ao apreciar os achados do estudo, compreende-se que o significado do exame
físico para as enfermeiras surge de forma sutil no estudo, revelando com maior clareza
múltiplos e profundos aspectos que constituem o fenômeno, evidenciando o característico
movimento de andar em torno dele. Portanto, o fenômeno não se esgota e clarifica
importantes aspectos a serem considerados na teoria e na prática de enfermagem.
A indagação sobre a seqüência de partes do corpo, durante a execução do exame
físico, clarificou o fenômeno tomado pelas enfermeiras como um procedimento técnico que
depois de aprendido na Universidade, deve ter continuidade na prática profissional,
destacando-se a busca da literatura como fundamental nessa continuidade de aprendizado.
Esse aprendizado, sob a orientação do professor, a seqüência estabelecida na realização da
técnica e o registro dos dados obtidos revelam a sua importância.
O pesquisador, que é docente, pode ver ampliada a sua responsabilidade e
compromisso com essa prática, sentindo-se responsável em recomendá-la ao sistema
formador de enfermeiras – as instituições de ensino superior de enfermagem, de graduação e
pós-graduação a fim de que o papel exercido pelo professor na orientação aos alunos, na
responsabilidade de seu aperfeiçoamento contínuo, na criação de estratégias de ensino que
contemplem a complexidade desse procedimento, valorizem dois aspectos fundamentais: o da
124
proteção à criança e o da salvaguarda dos aspectos humanos envolvidos no procedimento do
exame físico contra a sua mera realização mecânica e despersonalizadora.
A seqüência céfalo-caudal ou a forma de execução do exame físico mostra-se tão
significativa quanto à estrutura mental que confere ao procedimento, tornando seu
aprendizado mais rápido, por possibilitar o olhar minucioso e favorecer o estudo aprofundado.
O pesquisador sente-se comprometido a retornar às vivências do ensino,
modificando aspectos fundamentais da técnica, propõe a criação de um “laboratório de
observação” para incentivar práticas de observação e análise a serem vivenciadas pelos
acadêmicos, antecedendo a prática do exame em uma criança real.
Essa iniciativa contemplaria o importante papel desempenhado nas habilidades de
registro dos dados do exame físico e na atitude de buscar a literatura específica sobre o
procedimento e na manutenção permanente de sua atualização.
A questão da base de sustentação e da defesa dessa prática conduz o pesquisador
para os aspectos clarificados do fenômeno que são provocativos de mudanças na prática
docente, e o leva a refletir sobre a importância da questão do ensino e da aprendizagem que
exigem mais do que solicitam a realização de intercâmbio entre os docentes das várias
disciplinas do curso de graduação.
Tornou-se clara a exigência da continuidade do aprendizado do exame físico na
prática profissional, pois, não se aprende, de uma vez, sob a orientação do professor, mas é o
começo de uma caminhada de aprendizagem a ser cotidianamente praticada, freqüentemente
buscada na literatura, obedecendo ao rigor científico que confere segurança a essa prática.
O pesquisador reflete, aqui, sobre a tarefa de conquistar a criança, a sua
colaboração na execução do procedimento, o seu caráter único de existência, próprio de cada
criança, consistindo numa interminável busca de recomeçar a aprender; a compreensão do
125
corpo da criança não apenas como reflexo de uma natureza dada(biologia), mas, também, dos
aspectos culturais que constróem o seu corpo.
A clarificação do fenômeno quanto à defesa da prática ocorrida pela indicação das
finalidades do exame físico, por se constituir base para o cuidado humano, por retratar o
estado da criança, por indicar o tempo e a forma conveniente de intervenção e por ser função
assistencial que precede a administrativa compromete o pesquisador na comunicação efetiva
com os responsáveis administradores de sua instituição, e das demais instituições cuidadoras
de crianças doentes, e instiga a todos para uma reflexão crítica sobre as expectativas quanto
ao trabalho e funções administrativas das enfermeiras e o reflexo de sua atuação sobre a
importante função do cuidado humano.
Os resultados do presente estudo, iluminando a fundamental importância dessa
prática, não apenas como uma técnica, mas ação decisiva no cuidado à criança, com quem as
enfermeiras estabelecem interação, mediante a qual podem realmente conhecer as
necessidades e planejar e avaliar os cuidados dessa criança com qualidade, recomenda a
inteligente valorização da função assistencial das enfermeiras, reduzindo a expectativa, por
parte das instituições cuidadoras da criança, dos aspectos tão-somente administrativos.
O exame físico, que se desvela como uma metodologia para conhecer a criança,
orientador da enfermeira para agir na prescrição, execução dos cuidados e providências
inadiáveis e precisas, constituem argumentos suficientes para sensibilizar a compreensão da
qualidade do trabalho desenvolvido por essas profissionais, para o refinamento das técnicas de
apreensão, induzindo ao esclarecimento de dúvidas, à sistematização de sua assistência e a tão
necessária atenção ao significado das necessidades das crianças.
Ao refletir sobre a compreensão da prática do exame físico, o pesquisador sente-
se, agora, ainda mais comprometido com os sujeitos de sua pesquisa. Percebe que alcançou a
126
realização de um estudo, mediante o qual possa reverter em benefícios àquelas que lhe
possibilitaram desvelar o fenômeno.
Este estudo recomenda, fundamentalmente, às enfermeiras, com ênfase àquelas
que estão ligadas diretamente ao cuidado de crianças doentes, a reflexão e competente revisão
de conceitos sobre a pratica da assistência de enfermagem e os valores próprios da profissão,
porque o fenômeno desvelado considera o exame físico uma prática humanizada, que exige
tempo da enfermeira. Esse exame é fundamento, conhecimento e finalidade do cuidado
humano, ele proporciona a aproximação, o respeito, o toque e o afeto com a criança.
Mediante esse procedimento, a enfermeira faz a apreensão do discurso, freqüentemente não-
verbal, da criança; desenvolve seus sentidos de percepção, habilita-se a se comunicar,
responder, acompanhar a evolução das mudanças que ocorrem cotidianamente em seu local de
trabalho.
O fenômeno revela, também, o compromisso ético do cuidador com o ser
cuidado, e considera a sua não-execução uma falha profissional porque trata da assistência de
enfermagem sem fundamento científico, portanto, representando um risco para a consistência
dos cuidados, e uma desqualificação da profissão como um todo.
Após refletir sobre o significado do exame físico para as enfermeiras, o
pesquisador não conseguiu encontrar, pelo menos com a clareza esperada, o brilho e
desvelamento maior desse significado. Aprendeu que o processo de desvelamento e de
clarificação do fenômeno segue o modo como as enfermeiras do estudo procederam.
Provocadas pelas questões norteadoras puderam mover-se livremente em torno do tema do
exame físico, movimento necessário reconhecido pela fenomenologia.
Para essas enfermeiras, o significado do exame físico é básico para a sua
intervenção, como interação do profissional com a criança/família, característico
127
envolvimento profissional, momento precioso de contato humano, de encontro da teoria de
enfermagem com sua prática profissional, que lhes desperta o interesse pelo aprendizado, que
produz o desenvolvimento da sua percepção.
Assim, o pesquisador compreendeu e recomenda que se dê continuidade ao
estudo desse fenômeno, porque a sua clarificação neste estudo, mostra que, quando um
profissional não consegue dizer algo, é muito possível que não possa também fazê-lo, pois o
exame físico é linguagem única. A enfermeira necessita de contato com a criança e quando
ele não ocorre a enfermeira não vê a criança, nada tem a dizer sobre ela, nada sabe, nada
conhece. O estudo possibilitou uma nova visão ao pesquisador que ao olhar para o exame
físico percebe-o, agora, como expressão genuína de cuidado humano.
Considera-se, por fim, que a oportunidade de mergulhar e refletir, à luz da
fenomenologia, permitiu sentir a necessidade de formar um “núcleo de conhecimentos” sobre
o exame físico, do qual possam participar docentes, acadêmicos, enfermeiras diretamente
envolvidas com o cuidado, e membros das equipes de enfermagem e médica interessados.
Esse núcleo seguramente fomentará o estudo, estimulando mais docentes a se dedicarem, de
forma inteligente, ao tema, influenciando possíveis mudanças curriculares que atendam as
necessidades legais sobre ele, pois compreende-se que são poucos os docentes que o ensinam,
mas, quantos estarão realmente preparados para esse ensino?
Há novos desafios a serem enfrentados em relação ao exame físico, realizado
pelas enfermeiras, ligados ao estabelecimento de um referencial próprio da enfermagem e a
pungente busca de especificidade e de conhecimento.
O conhecimento aparece como um sistema de substituições onde uma impressão
anuncia outras sem dar-lhe jamais razão, onde palavras fazem esperar sensações
como a tarde anuncia a noite. (MERLEAU-PONTY, 1971, p. 33).
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essenciais à intervenção efetiva. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1999. 1118 p., il.
APÊNDICES
APÊNDICE A
AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DA PESQUISA NO H.U. DA FURG
134
APÊNDICE B
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO DA ENFERMEIRA-SUJEITO
O Estudo “EXAME FÍSICO: UMA FACE REVELADORA DO CUIDADO
HUMANO” tem por objetivo conhecer, compreender e desvelar o significado do exame físico
atribuído pelas enfermeiras que trabalham em Unidade de Internação Pediátrica dos Hospitais
Universitários da Fundação Universitária Federal do Rio Grande – FURG – e da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
A enfermeira será observada durante a realização do exame físico, sendo os dados
observados e registrados. Após a observação, a mesma será entrevistada. A entrevista será
gravada em fita magnética e, após transcrição de seu conteúdo, será analisada.
Eu, .................................................................... estou ciente dos propósitos desse
estudo, bem como da forma da coleta dos dados. Autorizo o pesquisador a usar as
informações.
Ao assinar esse termo, declaro que fui informada que a entrevista é livre, posso recusar-me a
responder quaisquer das perguntas norteadoras do estudo, e encerrar a entrevista em qualquer
parte da mesma, sem que isso venha a meu prejuízo.
Tenho conhecimento também de que ficará garantido o sigilo absoluto quanto à minha
identificação.
Assinatura da entrevistada
Assinatura do pesquisador
Porto Alegre, ....de ............... 2002
APÊNDICE C
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO DO RESPONSÁVEL PELA
CRIANÇA
O Estudo “EXAME FÍSICO: UMA FACE REVELADORA DO CUIDADO
HUMANO” tem por objetivo conhecer, compreender e desvelar o significado do exame físico
atribuído pelas enfermeiras que trabalham em Unidade de Internação Pediátrica dos Hospitais
Universitários da Fundação Universitária Federal do Rio Grande – FURG – e da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
A enfermeira será observada durante a realização do exame físico numa criança
hospitalizada e o pesquisador realizará anotações no roteiro de observação previamente
elaborado por ele, sem interferir no desenvolvimento deste procedimento, sem interferir na
relação dela com a criança examinada.
Eu, ....................................................................(pai, mãe ou responsável pela
criança hospitalizada) declaro que fui informado(a) que o pesquisador observará e registrará o
procedimento realizado pela enfermeira, sem interferir nos cuidados à criança. Tenho
conhecimento também de que ficará garantido o anonimato absoluto quanto à identificação da
criança e da enfermeira examinadora.
Assinatura do(a) responsável
Assinatura do pesquisador
Porto Alegre, ....de ............... 2002
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