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estrangeira. Para Coracini (2003) pedagogos e lingüistas aplicados raramente
questionam a noção de sujeito para entenderem melhor o processo de ensinar e aprender
línguas. Segundo ela, o professor não pode se limitar a transmitir conhecimentos sobre a
língua, isto é, descrevê-la como sistema de signos e de estruturas, pois a língua é muito
mais que um mero instrumento de comunicação. Ela é matéria prima da constituição
identitária do sujeito. Prova disso é, por exemplo, o fato de uma pessoa alfabetizada não
ser meramente alguém que domina novas técnicas de leitura e escrita. Ela é, por essa
nova relação com a linguagem, de alguma forma outra pessoa. Sua posição sócio-
subjetiva mudou. Ao falar uma língua estrangeira, o aluno-sujeito está se posicionando
dentro de uma história, de uma cultura estrangeira diferente da sua. É preciso, portanto,
que o aluno e o professor compreendam que a língua estrangeira não é um sistema vazio
de sentido: ela traz consigo, à revelia do aprendiz, uma carga ideológica que o coloca
em conflito permanente com a ideologia da língua materna, o que é explicitado pela
maneira diferente de configurar as cores, os objetos, os fatos, o sistema dos tempos
verbais. De acordo com Coracini (2003), quando o sujeito-aluno desenvolve a
aprendizagem bem sucedida de uma segunda língua, isto é, quando se inscreve na
língua do outro, e consegue “se dizer” na e pela língua do outro, ocorre uma espécie de
desarranjo subjetivo (e por que não também corporal), de deslocamento que possibilita
um re-arranjo significante. Dessa maneira, dá-se a inscrição do sujeito na discursividade
nova da segunda língua. Inscrever-se na discursividade de uma segunda língua é re-
significar-se e re-signficar-se nas condições de produção de uma outra língua, o que
significa, em última instância, “saber” essa língua, isto é, ser falado por ela, como já
dissemos: “on n´habite pas un pays, on habite une langue”. A questão é compreender
que a inscrição do aluno-sujeito (e do corpo também) numa língua estrangeira será
portadora de novas vozes, novos confrontos, novos questionamentos, alterando,
inevitavelmente, a constituição da subjetividade, modificando o sujeito como um todo,
trazendo-lhes novas identificações, sem que, evidentemente, ocorra o apagamento da
discursividade da língua materna que o constitui. É, pois, dessa relação contraditória e
da capacidade de cada um em articular as diferenças, que decorre do grau de sucesso e o
modo de acontecimento do processo de aprendizagem de uma língua estrangeira.
Ainda discorrendo sobre a noção de sujeito e a perda de identidade no
aprendizado de uma LE, psicanalistas procuram explicar os chamados fracassos na
aquisição de uma LE afirmando que se devem ao medo de permitir ao estrangeiro (o