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Universidade Federal do Rio Grande do Sul
CELINA DEVES MARQUES
CONCEPÇÕES DE MULHERES SOBRE A TERMINOLOGIA
RELATIVA AO APARELHO REPRODUTOR FEMININO
Porto Alegre
2005
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1
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
CELINA DEVES MARQUES
CONCEPÇÕES DE MULHERES SOBRE A TERMINOLOGIA
RELATIVA AO APARELHO REPRODUTOR FEMININO
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Enfermagem da Escola de
Enfermagem da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, como requisito parcial à
obtenção do título de mestre em
enfermagem.
Orientadora: Dra. Dulce Maria Nunes
Porto Alegre
2005
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2
Catalogação por Celina Leite Miranda (CRB-10/837).
M357c Marques, Celina Deves
Concepções de mulheres sobre a terminologia relativa ao aparelho
reprodutor feminino / Celina Deves Marques ; orient. Dulce Maria
Nunes. – Porto Alegre, 2005.
111 f. :
Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Universidade
Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Enfermagem. Curso
de Mestrado em Enfermagem, 2004.
1. Saúde da mulher. 2. Genitália feminina. 3. Imagem
corporal. 4. Mulheres. 5. Terminologia. 6. Humano. 7. Feminino.
8. Adulto. I. Nunes, Dulce Maria. II. Título.
x Deves, Celina Escopelli
LHSN – 726
NLM – WP 100
3
4
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora Dulce Maria Nunes pelo estímulo, apoio, compreensão,
idéias que me fizeram refletir sobre a trajetória deste estudo.
À Prof. Dra. Eva por auxiliar no meu trabalho no final da caminhada quando
minha orientadora precisou se ausentar.
À equipe multiprofissional do PSF Jenor Jarros, em especial a enfermeira
Guiomar, pela boa receptividade e auxílio na coleta dos materiais.
Às usuárias do PSF Jenor Jarros por estarem dispostas a refletir sobre o
tema do estudo, possibilitando realizá-lo.
A minha irmã Lílian pela amizade, carinho e contribuição para realizar o
estudo.
Ao meu marido pelo estímulo, apoio, compreensão e carinho que não me
deixou desistir no meio desta jornada.
A minha família, em especial a minha mãe, pelo estímulo em trilhar o
caminho da docência desde o tempo da graduação.
A minha amiga Dorli que ouvia minhas queixas, dificuldades e anseios
sempre me estimulando com palavras apaziguadoras para que eu persistisse no
caminho da docência.
As minhas colegas do Hospital Cristo Redentor pela compreensão e ajuda
nas trocas de plantões, folgas, pois, sem isso, seria impossível conciliar os plantões
com o mestrado.
5
RESUMO
Esta é uma pesquisa qualitativa fenomenológica com embasamento
filosófico na fenomenologia da percepção de Merleau-Ponty. Tem como propósito
conhecer as concepções das mulheres sobre a terminologia relativa ao aparelho
reprodutor feminino. Os sujeitos do estudo foram 10 mulheres não-gestantes, não-
puérperas e não-nulíparas usuárias do Programa de Saúde da Família (PSF) Jenor
Jarros. O instrumento de pesquisa utilizado foi entrevista semi-estruturada no qual
perguntava-se sobre o significado das palavras relativas ao aparelho reprodutor
feminino, e foi construído a partir da terminologia expressa pelas usuárias do PSF
Jenor Jarros recolhida das observações das consultas de enfermagem ginecológica.
Surgiram 22 essências que possibilitaram à pesquisadora conhecer de que modo as
mulheres concebem seu aparelho reprodutor. As mulheres, sujeitos do estudo,
revelaram a íntima relação entre o sentir/perceber seus órgãos reprodutores a partir
da experiência vivida com a significação dos órgãos reprodutores. O enfermeiro
deve compreender e aceitar que cada mulher tem um modo de perceber seu corpo e
que interagem com o mundo de forma peculiar.
Descritores: Saúde da mulher. Genitália feminina. Imagem corporal. Mulheres.
Terminologia. Humano. Feminino. Adulto.
6
RESUMEN
*
Tratase de uma investigación cualitativa fenomenológica com fundamento
filosófico em la fenomenología de la percepción de Merleau-Ponty. El estúdio tiene
como objetivo conocer las concepciones de las mujeres sobre la terminología
relativa al aparato reproductor femenino. Los sujetos del estudio fueron 10 mujeres
no-gestantes, no-puérparas y no-nulíparas, usuarias del Programa de Salud de
Familia (PSF) Jenor Jarros. El instrumento de investigación utilizado fue la entrevista
semi-estructurada en la cual se preguntó sobre la significación de las palabras
relativas al aparato reproductor femenino y fue construido a partir de la terminología
expresa por las usuarias del PSF Jenor Jarros, recogida a través de observaciones
durante las consultas de enfermería ginecológica. Surgieron 22 esencias que
posibilitaron a la investigadora conocer de qué modo las mujeres conciben su
aparato reprodutor. Las mujeres sujetos del estudio revelaron la íntima relación entre
el sentir y percibir sus órganos reproductores. El enfermero debe comprender y
aceptar que cada mujer tiene una manera de percibir su cuerpo y que ella obra con
el mundo de forma peculiar.
Descriptores: Salud de las mujeres. Genitales femeninos. Imagen corporal.
Mujeres. Terminología. Humano. Femenino. Adulto.
Título: Concepción de las mujeres sobre la terminología relativa al aparato
reproductor femenino.
*
Tradutora: Lou Zanetti
7
ABSTRACT
*
It is about a phenomenological qualitative research with philosophical
foundation in Merleau-Ponty’s phenomenology of perception. It aims at knowing
women’s concepts about the terminology related to the women’s reproductive
anatomy. The subjects of the study comprised 10 non-gestacional, non-pueperal and
non-null parous women who visited Jenor Jarros Family Health Program (FHP). The
utilized research instrument was semi-structured interview whereby questions were
made about the meaning of the words regarding the women’s reproductive anatomy
and was constructed from the terminology expressed by the users of Jenor Jarros
FHP collected from observations during the gynecological nursing consultations. 22
essences were suggested by the women what allowed the researcher to know how
women conceive their reproductive organs. The subjects of this study disclosed the
intimate relationship between feeling and perceiving their reproductive anatomy from
their life experience with the meanig of the reproductive organs. The nurse must
understand and accept that each woman has a manner of perceiving her body and
that she interacts with the world in a peculiar way.
Descriptors: Women’s health. Genitalia, female. Body image. Women. Terminology.
Human. Female. Adult.
Title: Women’s concepts about the terminology regarding the women’s reproductive
organs.
*
Tradutora: Lou Zanetti
8
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................12
2 UMA VISÃO DO CORPO DA MULHER............................................................ 15
3 MERLEAU-PONTY E A FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO ......................20
4 PROPOSTA INICIAL DO ESTUDO ................................................................... 25
5 CAMINHO METODOLÓGICO ........................................................................... 27
5.1
F
ENOMENOLOGIA
............................................................................................... 27
5.2
C
AMPO DE
E
STUDO
............................................................................................ 29
5.3
S
UJEITOS DO
E
STUDO
........................................................................................ 30
5.4
C
OLETA DOS
M
ATERIAIS
.................................................................................... 31
5.4.1 Preparo do Campo de Pesquisa ..................................................................31
5.4.2 Instrumento de Pesquisa ........................................................................ 32
5.4.3 Construção do Instrumento de Coleta de Materiais ...............................33
5.4.4 Local das Entrevistas.............................................................................. 34
5.4.5 Realização da Entrevista ........................................................................ 35
5.5
C
ONSIDERAÇÕES
B
IOÉTICAS
.............................................................................. 35
5.6
O
RGANIZAÇÃO E
A
NÁLISE DOS
M
ATERIAIS
.......................................................... 37
6 O FENÔMENO............................................................................................... 39
6.1
E
SSÊNCIAS DA
P
RIMEIRA
Q
UESTÃO
.................................................................... 40
6.1
E
SSÊNCIAS DA
P
RIMEIRA
Q
UESTÃO
.................................................................... 41
6.1.1 Conhecimento Acerca do Aparelho Reprodutor Feminino ........................... 41
6.1.2 Desconhecimento Acerca do Aparelho Reprodutor Feminino...................... 41
9
6.1.3 Parte Principal do Corpo da Mulher .............................................................42
6.2
M
AMA
............................................................................................................... 42
6.2.1 Convergências ............................................................................................. 43
6.2.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 46
6.3
L
ACTAÇÃO
........................................................................................................ 50
6.3.1 Convergências ............................................................................................. 51
6.3.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 52
6.4
Ó
RGÃOS
R
EPRODUTORES
F
EMININOS
I
NTERNOS
.................................................. 55
6.4.1 Convergências ............................................................................................. 56
6.4.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 57
6.5
Ó
RGÃOS
R
EPRODUTORES
F
EMININOS
E
XTERNOS
................................................ 60
6.5.1 Convergências ............................................................................................. 60
6.5.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 60
6.6
C
ICLO
M
ENSTRUAL
............................................................................................ 61
6.6.1 Convergências ............................................................................................. 61
6.6.2 Divergências................................................................................................. 62
6.6.3 Idiossincrasias.............................................................................................. 63
6.7
F
LUIDOS
V
AGINAIS
............................................................................................. 66
6.7.1 Convergências ............................................................................................. 66
6.7.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 67
6.8
A
LTERAÇÕES
C
ELULARES
M
AMÁRIAS
................................................................. 69
6.8.1 Convergências ............................................................................................. 69
6.8.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 70
6.9
A
LTERAÇÕES
C
ELULARES
U
TERINAS
.................................................................. 72
6.9.1 Convergências ............................................................................................. 72
10
6.9.2 Idiossincrasias.............................................................................................. 72
6.10
P
ROLAPSO
U
TERINO
........................................................................................ 74
6.10.1 Convergências ........................................................................................... 74
6.10.2 Idiossincrasias............................................................................................ 75
6.11
A
LTERAÇÕES NO
A
TO
S
EXUAL
......................................................................... 76
6.11.1 Convergências ........................................................................................... 76
6.11.2 Divergências............................................................................................... 77
6.11.3 Idiossincrasias............................................................................................ 77
6.12
D
OENÇA
S
EXUALMENTE
T
RANSMISSÍVEL
........................................................... 80
6.12.1 Convergências ........................................................................................... 80
6.12.2 Divergências............................................................................................... 81
6.12.3 Idiossincrasias............................................................................................ 81
6.13
P
ROCESSO
I
NFECCIOSO
................................................................................... 83
6.13.1 Convergências ........................................................................................... 83
6.13.2 Idiossincrasias............................................................................................ 84
6.14
I
NCISÃO
C
IRÚRGICA NO
P
ARTO
N
ORMAL
........................................................... 85
6.14.1 Convergências ........................................................................................... 85
6.14.2 Divergências............................................................................................... 86
6.14.3 Idiossincrasias............................................................................................ 86
6.15
O
UTROS
E
VENTOS
........................................................................................... 87
6.15.1 Convergências ........................................................................................... 87
6.15.2 Idiossincrasias............................................................................................ 88
6.16
N
OMENCLATURA
D
ESCONHECIDA
..................................................................... 90
6.16.1 Convergências ........................................................................................... 91
6.16.2 Idiossincrasias............................................................................................ 91
11
6.17
E
SSÊNCIAS DA
Q
UESTÃO
F
INAL
........................................................................ 91
6.17.1 Não-Recebimento de Informações sobre o Aparelho Reprodutor Feminino92
6.17.2 Recebimento de Informações sobre o Aparelho Reprodutor Feminino...... 92
6.17.3 Como poderiam ser oferecidas Informações sobre o Aparelho Reprodutor
Feminino ............................................................................................................... 93
6.17.4 Local em que receberam Informações sobre o Aparelho Reprodutor
Feminino ............................................................................................................... 93
ANALISANDO O FENÔMENO............................................................................. 95
REFERÊNCIAS................................................................................................... 102
APÊNDICE A- ENTREVISTA ............................................................................. 108
APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO........................ 110
ANEXO – APROVAÇÃO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA.......................... 111
12
1 INTRODUÇÃO
Este estudo tem como objeto as concepções de mulheres sobre a
terminologia relativa ao aparelho reprodutor feminino, e é um estudo qualitativo
fenomenológico com a orientação filosófica em Merleau-Ponty. A escolha do tema,
com ênfase na mulher, ocorreu durante a trajetória acadêmica da pesquisadora, ao
perceber, nesse espaço, uma possibilidade de contribuição para o cuidado de
enfermagem.
Com o intuito de vivenciar e desenvolver o cuidado de enfermagem a
mulheres nos eventos específicos de sua vida, realizou-se estágio, na qualidade de
aluna e profissional, em Unidades de Internação e Centro Obstétrico em hospitais
públicos de Porto Alegre, onde são oferecidos cuidados específicos, porque cada
mulher vivencia essa experiência reagindo de maneira diferente, e cada uma tem
uma forma de vivenciar e atribuir significados a esses acontecimentos. Ao tratar
dessas mulheres, respeitando-se suas especificidades, procurou-se, durante os
estágios, observar seus comportamentos, ouvir suas considerações e formas de
expressão, durante o processo de pré-parto, parto e puerpério, por entender, de
acordo com George et al. (2000), que as mulheres reagem como um todo exclusivo,
em que corpo e mente funcionam juntos.
Ao realizar práticas de enfermagem - exame físico, cateterismo vesical,
curativos - e orientações específicas relativas ao puerpério, notou-se que algumas
mulheres manifestavam dúvidas, ansiedades e questionamentos que as deixavam
mais preocupadas e surpresas com as transformações e manifestações que
estavam ocorrendo no seu corpo. E, ao serem orientadas, não conseguiam
13
compreender o que os profissionais de saúde estavam dizendo. Constatou-se,
então, que essas mulheres percebiam e tinham seus próprios conceitos acerca das
modificações oriundas do processo de gestação/parto; por outro lado, sofriam a
intervenção dos cuidadores que, de maneira diversa do pensamento das mulheres,
impunham seus cuidados. Esse distanciamento se traduzia na interação dificultada
entre os atores do cuidado. De outra forma, os profissionais, também deixavam de
perceber outras possibilidades de concepção do aparelho reprodutor feminino por
manterem uma atitude hermética quanto ao seu conhecimento considerado
científico.
Foi a partir dessa experiência que a pesquisadora ficou instigada a descobrir
o que as mulheres concebem como aparelho reprodutor feminino, visto que o que
ela conhecia diferia do conhecimento dessas mulheres. Existia um distanciamento
entre o conhecimento da pesquisadora e o das mulheres, dificultando a interação
entre os sujeitos do cuidado. Conhecer as concepções das mulheres acerca da
terminologia relativa ao aparelho reprodutor é uma das formas de aproximar o
profissional das mulheres, pois, ele utilizará não o conhecimento biomédico para
assisti-las, mas o conhecimento das mulheres aliado ao dele, e poderão promover
um cuidado mais compreensivo e eficiente.
É necessário que o enfermeiro perceba e esteja atento às autoconcepções
das mulheres, para formar um conjunto de conhecimentos que lhe possibilite
proporcionar um cuidado humano congruente e de qualidade.
Este estudo, portanto, pretende conhecer e compreender as concepções das
mulheres sobre a terminologia relativa ao aparelho reprodutor a partir do significado
expresso por essas, usuárias do PSF Jenor Jarros, durante a consulta ginecológica de
enfermagem, para que os profissionais enfermeiros possam conhecer e incorporar a seu
14
saber outras possibilidades de conceber o aparelho reprodutor feminino visualizando
novos modelos de cuidado ao invés do modelo biomédico padronizado existente.
A contribuição social virá com a possibilidade de transformar um modelo de
cuidado de enfermagem que valorize o ser humano em sua individualidade e
possibilidades. É uma maneira, também, de direcionar o cuidado de enfermagem,
incorporando-lhe a concepção de que o cuidado é um processo que visa a tornar o ser
humano saudável e orientado, demandando respeito em suas práticas de autocuidado.
15
2 UMA VISÃO DO CORPO DA MULHER
Considerando-se o cuidado, objeto da profissão enfermagem, compreendido
como ciência e arte, cuidar é "...uma atitude de ocupação, preocupação, de
responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro"(BOFF, 1999, p. 33). Ao
apreender e experienciar os processos que corporificam e concretizam o cuidado de
enfermagem oferecido à mulher, nas especificidades do feminino - gestação, parto e
puerpério - descobriu-se, aí, uma área de interesse, não só pelo fato de ser mulher,
mas, também, pelo fascínio do nascimento. Portanto, cuidar da mulher seria uma
meta para um futuro profissional.
Cada mulher experiencia o seu aparelho reprodutor de forma única; é essa
vivência que a faz perceber o pleno funcionamento de seus órgãos reprodutores. É
importante estar consciente de que cada mulher tem uma forma de sentir os órgãos
que especificam o seu gênero.
As mulheres, por muitos anos, foram esquecidas como seres sensíveis e
autônomos. Perrot (2003) afirma que o que pesava sobre o corpo da mulher era
função anônima e impessoal da reprodução. Elas eram educadas para a
constituição da família. No século XIX, as mulheres não eram compreendidas pelo
direito somente como pessoas, mas, também, e, sobretudo, como reprodutoras. Elas
tinham o papel de guardiã da ordem da família (DHOQUOIS, 2003).
Os pudores vitorianos do século XIX dificultaram o falar sobre o aparelho
reprodutor feminino e sexualidade; “a ausência da educação sexual faz com que a
primeira menstruação seja uma surpresa vivida quase sempre no medo e vergonha”
(PERROT, 2003, p. 16).
16
A influência da igreja fez com que se condenasse a mulher a não conhecer
seus corpos. A maternidade, sua primordial função, assim como manter a ordem
familiar mantinha-a circunscrita ao lar, reproduzindo corpos biológicos, executando
as tarefas de manutenção do bem-estar e sobrevivência da família. Para tanto, era
preciso controlá-la, permitindo-lhe o exercício da sua sexualidade dentro dos limites
que não atentassem contra a moral (FONSECA et al., 1994).
Devido a essa trajetória, mesmo com o advento das grandes guerras, a
saída das mulheres de dentro de casa para o trabalho, os movimentos feministas, a
liberação sexual ampliou o papel e poder feminino para além da maternidade, a
mulher demonstra um comportamento envergonhado, com pudores em excesso
referentes à sexualidade e ao aparelho genital. Para Diamantino et al. (1993), a
mulher brasileira, ainda, desde pequena é criada para servir, ser obediente, casar,
ter filhos e ser dona de casa. Pode ser que, devido a isso, haja, ainda, como refere
Lopes e Souza (1997), uma relação pouco consciente com o próprio corpo no
cotidiano feminino. “A mulher não está habilitada a explorar e conhecer as
particularidades de seu próprio corpo. Nem a referir-se a elas sem pudores” diz
Moraes (2004, p. 49). Porém, acredita-se que a mulher esteja, sim, habilitada a falar
sobre seu corpo, do seu aparelho reprodutor. O que lhe faltam são oportunidades
para se expressar sobre ele.
Crê-se que, mesmo havendo pudores, há a necessidade de propiciar à
mulher espaços para que ela verbalize os sentimentos, sensações e vivencias sobre
seu aparelho reprodutor, para que os profissionais conheçam as suas concepções e
norteiem suas condutas de forma individualizada.
A mulher, geralmente, começa a notar a presença do aparelho reprodutor
feminino na adolescência, com a menarca, crescimento dos seios e com as
17
modificações de seu corpo em geral. Algumas mulheres passam pelo fenômeno da
gestação, o que as faz se sentir em um corpo diferente do não-gestacional. É uma
percepção nova que dá sentido a essa nova etapa de sua vida, conforme diz
Merleau-Ponty (apud PENNA, 1989, p. 42): "a perspectiva adotada na observação
de um fenômeno já determina, facilmente, este fenômeno. Este é um modo de existir
no mundo".
Para cuidar das mulheres é importante conhecê-las e compreendê-las no
contexto de suas possibilidades de concepção do seu corpo próprio, vivido. Essa é
uma maneira de revelar o conhecimento popular adquirido por elas, pois, como
mencionam Lakatos e Marconi (1991), ele é valorativo e reflexível. "A visão do corpo
biológico, sem história pessoal, familiar, social e cultural, deve ser abandonado",
pois, isso faz com que não se possa realizar um cuidado competente ao indivíduo
(WEISSHEIMER, 2002, p. 107) e que respeite a individualidade do ser humano
como um ser que percebe e vive no mundo.
Todo ser humano tem uma imagem de seu corpo, entendido como
"figuração de nosso corpo formada em nossa mente, ou seja, o modo pelo qual o
corpo se apresenta para nós" (SCHILDER, 1980, p. 11).
Para Merleau-Ponty (1971), o corpo põe o indivíduo em permanente contato
com o mundo e marca a presença do mundo nele. O corpo não tem um papel de
passividade e inércia, mas, sim, o de colocar o indivíduo em contato com o outro e o
mundo. É reconhecido que o corpo fundamenta todo o conhecimento, uma vez que
ele percebe o mundo vivido.
O corpo é a escritura de argila do que se é, é o templo que abriga outro
corpo. O corpo não mente, ele percebe e sente, sendo a memória mais arcaica, pois
18
ele se recorda de todos os momentos que viveu. Cada ser, de modo particular e
pessoal tem um espaço de abertura e fechamento (LELOUP, 1998).
Segundo Gaiarsa (1994), tem-se o corpo que se vê e o que se sente, sendo
que cada parte desse corpo, como diz Miranda (2000, p. 11) "leva em si mesma uma
consciência do verdadeiro Eu e de sua unidade”.
O que se vive e se sente no corpo fica na consciência e constrói o modo de ser e
sentir o mundo. É o que subjetiva o ser humano. O corpo é representado para o ser
humano de acordo com suas vivências, experiências e fatores culturais; assume uma
representação diferente a cada fase evolutiva e fisiológica do ser humano, iniciando na
infância, passando pela adolescência, chegando à velhice. Um estudo realizado por
Fachel et al. (1995, p. 42) revela que as meninas "têm uma percepção interna de seus
corpos mais aguda, demonstrada pela especificidade de vários órgãos internos" e que há
uma "freqüência mais significativa destes órgãos nos desenhos femininos do que nos
desenhos masculinos".
As individualidades corporais estão sendo pouco respeitadas pelos
profissionais da saúde. Cuida-se de um corpo como se fosse uma máquina com
suas partes, estabelecendo um modelo biomédico com cuidados únicos e gerais.
Vê-se um corpo passivo, alienado e alvo de prescrições institucionais e interdições
em que o não dito das emoções é a força matriz (POLAK et al., 1998).
Entretanto, a sociedade requer que haja uma modificação desse modelo de
assistência, pois, se o ser humano possui um corpo que sente, cria, que transforma
e é transformado, considerá-lo como objeto e instrumento seria desrespeitar as
especificidades e os seus encantamentos.
O profissional da saúde poderá desenvolver o cuidado adequado,
acreditando que, como refere Merleau-Ponty (1971, p. 83), “considero meu corpo,
19
que é meu ponto de vista sobre o mundo, como um dos objetos desse mundo”, ou
seja, o indivíduo percebe-se de acordo com sua experiência vivida no mundo. Um
exemplo disto é o que descreve Maués (1994, p. 114), em estudo sobre como os
itapuanenses concebem o corpo feminino:
Uma das principais diferenças internas é que o homem é 'inteiro' e a
mulher não. Isso significa que ela possui na sua 'barriga' um lugar vago,
ou seja, não-ocupado por nenhum órgão. Esse local 'oco' no ventre da
mulher destina-se a abrigar os filhos que ela vier a ter, durante a gestação
[...].
Victora (1995, p. 80), em seu trabalho sobre representações do aparelho
reprodutor feminino e reapropriações dos modelos médicos, descreve que "as mulheres
possuem uma representação do funcionamento dos seus corpos e dos seus aparelhos
reprodutores como um sistema singular". A autora demonstra que "o conhecimento que
as mulheres têm acerca de seu corpo conforma-se a partir da vivência e
experimentações objetivas".
20
3 MERLEAU-PONTY E A FENOMENOLOGIA DA PERCEPÇÃO
Triviños (1987) refere que quando se escreve sobre algo não é possível
interpretar e compreender a realidade sem um referencial teórico. Assim sendo,
opta-se por trabalhar à luz dos pressupostos do filósofo Merleau-Ponty, com o intuito
de melhor orientar o presente estudo, de acordo com a premissa da fenomenologia
da percepção, o que fornecerá subsídios para o desvelamento e reflexão sobre o
fenômeno a ser estudado. Adotou-se o amparo filosófico em Merleau-Ponty
1
por ele
ser o filósofo que trabalha com a fenomenologia da percepção que se volta para o
sensível, à experiência perceptiva, originária, vivida primordialmente no corpo (DIAS,
1994). Deseja-se trabalhar com as concepções de um corpo que existe e que é
concebido e construído na encruzilhada de discursos entre natureza e cultura
(VILLAÇA ; GOÉS, 1998).
Houve uma reação dos filósofos, na virada do século XIX, ao perceberem a
exaltação do cientificismo que pretendia explicar tudo. Merleau-Ponty foi um desses
filósofos, pois, acreditava que não deve haver rivalidade entre o conhecimento
científico e o saber filosófico, porque "uma ciência sem filosofia não saberia,
literalmente, do que fala. Uma filosofia sem exploração metódica dos fenômenos
chegaria apenas a verdades formais, isto é, a erros" (MERLEAU-PONTY apud
CARMO, 2000, p. 72).
Segundo Carmo (2000), Merleau-Ponty integra-se a uma corrente de
pensamento, a fenomenologia, na qual o maior expoente foi o filósofo Edmundo
1
Maurice Merleau-Ponty nasceu em 14 de março de 1908, na cidade francesa de
Rochefort-Sur-Mer, falecendo aos 53 anos, no dia 3 de maio de 1961. Filósofo e
psicólogo, estudou na École Normale Supérieure, onde posteriormente foi admitido
como professor agregado (CARMO, 2000).
21
Husserl. A fenomenologia de Merleau-Ponty, diferente da de Husserl, apresenta
elementos existenciais, em que o objeto de "análise é a consciência e a experiência
da pessoa como parte de um encontro interpessoal" (BICUDO ; ESPÓSITO, 1997, p.
19), pois, existe um interesse num homem histórico à medida que este existe no
mundo. Para Merleau-Ponty (1971), a fenomenologia é o ensaio de uma descrição
direta da experiência tal qual ela é, por isso ela trata de descrever e não de explicar
e de analisar. Para o autor o que sabe do mundo deve-se à vida pessoal ou a uma
experiência do mundo. A ciência não tem o mesmo sentido que o mundo percebido
pelo simples motivo que ele é a sua determinação ou explicação. O homem é a fonte
absoluta, sendo que sua existência dirige e sustenta o meio físico e social porque
”sou o que faço ser para mim” (MERLEAU-PONTY, 1971, p. 7).
Esse homem existe no mundo através de um corpo, mas não se pode
pensar que se é corpo entre corpos, porque se tem um existencial, um modo de ser-
no-mundo. O que diferencia o homem dos demais mamíferos é o desequilíbrio
existencial com a sua natureza biológica, pois há uma relação problemática com a
própria imagem (VILLAÇA ; GÓES, 1998). Esse dilema, facticidade, lança o homem
para projetos e sonhos de vida, o que dá a clareza de que o ser humano não é um
dado feito, pronto, ele é um ser em situação que se lança no mundo, vivendo e
existindo (BUZZI, 1993). A fenomenologia “tem a tarefa de revelar o mistério do
mundo e da razão” (MERLEAU-PONTY, 1971, p. 18).
O homem existe devido a um corpo que se lança no cotidiano dos
acontecimentos do dia-a-dia, é nele e por ele que se conecta e se enreda com o
mundo. É a partir dele que sente, deseja, ama, age e cria. É preciso pensar nos
limites e performances do corpo, lugar de fascínio, criação de alianças, de
celebração do prazer, da criatividade e do humor (VILLAÇA ; GÓES, 1998).
22
Merleau-Ponty se preocupa com o homem na sua existência, pensando em
seu meio natural e histórico - um ser que está no mundo, que tem uma consciência.
Consciência que deve coexistir com o mundo, visto que ele é o meio de sua
realização. O corpo e a consciência dependem um do outro para constituírem este
ser no mundo. Um corpo sem consciência é apenas um autômato. Portanto, o
homem existe como consciência, que conhece, que percebe a experiência. Para
Merleau-Ponty, o aprendizado da consciência ocorre no dia-a-dia, no pulso da vida,
na existência. Segundo Merleau-Ponty (1971), inicialmente um mundo se dispõe em
torno do sujeito e começa a existir para ele - é a perspectiva da consciência. Não se
pode aprender nenhuma coisa como existente se o homem não se sinta existindo no
ato de aprendê-la, com isso demonstra que a consciência nada mais é do que “a
absoluta certeza do eu para mim” (MERLEAU-PONTY, 1971, p. 7).
O mundo no qual o homem existe não pode ser reduzido a variáveis
objetivas, ele é o meio natural e o campo de todos os pensamentos e percepções
dos sujeitos. É nesse mundo, sistema de verdades, que o homem se conhece
(MERLEAU-PONTY, 1971). Merleau-Ponty está interessado no mundo-vida; explorar
este mundo-vida como ele é vivido. Esse filósofo faz do comportamento uma
categoria central, na qual o comportamento humano não são reações cegas a
estímulos, existe um inter-relacionamento dialético entre o homem e o mundo, e é
nesse inter-relacionamento que surge a atribuição de significados. O corpo, do modo
do que se o vive difere do corpo objetivo, que é observado fora. Deve-se produzir
uma nova forma de compreender o corpo vivido, sem separar o corpo da alma
(BICUDO ; ESPÓSITO, 1997).
O corpo é a forma que celebra a vida, é o organismo vivendo vida própria,
dotada de uma legalidade interna e autônoma (BUZZI, 1993). Por sua vez Carmo,
23
(2000) diz que corpo é mais que uma união de órgãos justapostos, é através dele
que se estabelece a existência no mundo é, também, "...metamorfose da vida, lugar
de percepções (...). O mundo que percebo é este que fornece o meu esquema
corporal, a minha mobilidadde, a minha experiência, a corporeidade ..." (MERLEAU-
PONTY apud POLAK et al., 1998, p. 119).
A fenomenologia da percepção trata do sensível. Merleau-Ponty a considera
a porta de entrada - e de saída para o mundo exterior. A percepção não é uma
ciência do mundo ou uma tomada de posição deliberada; é o fundo sobre o qual
todos os atos se destacam e está pressuposta por eles. A percepção não é
presumida como verdadeira, mas é definida como um acesso à verdade para aquele
sujeito (MERLEAU-PONTY, 1971). Deve-se superar o dualismo entre o sentir e o
entender, e produzir uma interação entre ambos. Todo o conhecimento presente da
existência humana passou, primeiro, pelas portas da percepção (CARMO, 2000). A
fenomenologia da percepção descreve o significado do sentir, o vivido pelo corpo
com o mundo. Segundo Dias (1994, p. 69), sentir é
esta comunicação vital com o mundo que o torna presente para nós
como lugar familiar da nossa vida. É a ele que o objeto percebido e o
sujeito perceptivo devem a sua espessura. O sentir é o tecido
intencional que o esforço de conhecimento procurará decompor.
Há uma relação direta entre o mundo sensível e o sujeito perceptivo, já que
ocorre um mútuo envolvimento. O sensível é recebido e vivido pelo corpo fenomenal
cujas funções são articuladas e retomadas no movimento geral do nosso ser no
mundo. Somente poder-se-á sentir se o corpo estiver aberto e despojado a sentir
(DIAS, 1994). Merleau-Ponty (1971) tem como sensação/sentir a maneira pela qual
o sujeito é afetado, é aquilo que se aprende do mundo pelos sentidos, o que salienta
a vitalidade da experiência sensível, já que é uma comunicação com o mundo.
24
É através do corpo que se estabelece a existência no mundo, ele é a "figura
visível de nossas intenções" (MERLEAU-PONTY apud CARMO, 2000, p. 10).O
mesmo autor menciona que o ser humano não tem condutas preestabelecidas e
rígidas. Pelo contrário, ele está aberto a respostas improvisadas e criativas. Seu
corpo é tido como a expressão e realização de intenção, desejos e projetos. Para
Merleau-Ponty, o corpo não está aberto somente a situações reais, ele está
preparado para o virtual. A fenomenologia da percepção embasa o presente estudo
por deixar claro que cada ser humano é dotado de uma consciência que percebe
intencionalmente o mundo sensível, nele existindo.
Segundo Merleau-Ponty (2000), o corpo é natureza, à medida que é do
mesmo tecido das coisas do mundo, é submetido a elas, vive em relação a essas
coisas e é dependente, também, do domínio biológico - O corpo é também cultura,
pois, o homem ultrapassa a fronteira do animal e institui níveis da ordem simbólica,
transforma o mundo, cria e recria culturas. O corpo deixa de ser um "mecanismo
cego" ou a soma de seqüências causais independentes.
25
4 PROPOSTA INICIAL DO ESTUDO
O projeto original deste estudo visava desvelar as concepções das mulheres
puérperas internadas na Unidade de Internação Obstétrica (UIO) de um hospital
universitário de Porto Alegre/RS, acerca de seus órgãos reprodutores.
A partir do Exame de Qualificação do projeto de pesquisa, os membros da
banca examinadora fizeram duas sugestões a serem incluídas no estudo definitivo: a
primeira, relativa ao campo da pesquisa e a segunda quanto à revisão do
instrumento para coleta dos materiais.
Revendo outras possibilidades para o campo de estudo, optou-se pelo posto
do Programa de Saúde da Família (PSF) Jenor Jarros, considerando que as
condições relativas aos usuários dessa instituição preenchiam os requisitos de
inclusão dos sujeitos da pesquisa. Para obtenção dos materiais, o instrumento seria
constituído a partir de observações quanto à terminologia expressa pelas puérperas,
usuárias do PSF acerca do aparelho reprodutor feminino, durante a consulta de
enfermagem.
Atendidas as sugestões, o projeto do estudo foi enviado ao Comitê de Ética
e Pesquisa da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, tendo o mesmo sido aprovado.
Ao realizar as observações com as puérperas, constatou-se que, durante a
consulta de enfermagem elas estavam com a atenção dirigida ao cuidado com o recém-
nascido.
A partir desse fato, a possibilidade da escolha dos sujeitos foi revisada,
acolhendo, então mulheres não-gestantes, não-nulíparas e não-puérperas, usuárias
do PSF, durante a consulta de enfermagem ginecológica. Essa consulta dirigia-se às
26
questões ginecológicas dessas mulheres, o que proporcionou à pesquisadora
observar a terminologia utilizada por elas ao conversar e questionar a enfermeira
sobre suas dúvidas referentes ao seu aparelho reprodutor. As questões abordadas
eram amplas e adequavam-se à captação da terminologia para construção do
instrumento de pesquisa, conforme a inquietação original da pesquisadora.
27
5 CAMINHO METODOLÓGICO
Será descrito neste capítulo os passos metodológicos utilizados nesta
pesquisa.
5.1 Fenomenologia
A escolha da metodologia qualitativa fenomenológica para este estudo deveu-se
pela adequação com a temática e pela possibilidade de iluminar e compreender os
fenômenos existentes no contexto das concepções das mulheres sobre a terminologia
relativa ao aparelho reprodutor feminino, a partir do significado da terminologia expressa
no decorrer da consulta de enfermagem ginecológica.
É uma pesquisa que se
"baseia na premissa de que os conhecimentos sobre os indivíduos
só são possíveis com a descrição da experiência humana, tal qual
ela é vivida e tal como ela é definida por seus próprios atores"
(POLIT ; HUNGLER, 1995, p. 270).
A fenomenologia desenvolveu-se a partir do pensamento do filósofo alemão
Edmund Husserl. É uma palavra composta, de origem grega, que pode ser entendida
como "o estudo que reúne os diferentes modos de aparecer o fenômeno ou o discurso
que expõe a inteligibilidade em que o sentido do fenômeno é articulado" (BICUDO, 1999,
p.14), trabalha com o qualitativo, com o que faz sentido para o sujeito (BICUDO, 1999).
A fenomenologia tem como idéia central a intencionalidade, na qual a
consciência está dirigida a um objeto, ou seja, não existe objeto sem sujeito (TRIVIÑOS,
28
1987). É a superação, como menciona Bruns (2000, p. 217), da "dicotomia sujeito-objeto,
afirmando que toda consciência é intencional, e, portanto, [...] não há consciência
desvinculada de um mundo para ser percebido e nem há mundo sem uma consciência
para percebê-lo". Entende-se que a consciência não está desvinculada de um mundo a
ser percebido, toda consciência é intencional, ou seja, o homem experiencia
intencionalmente sua existência, atribuindo-lhe significados (BRUNS, 2000).
A fenomenologia tem como característica apreciar o mundo vivido, a partir da
descrição de uma realidade, e compreender fenômenos tal qual eles são para os seres
que os vivenciam, sem a tentativa de explicações teóricas e lógicas. De acordo com
Merleau-Ponty (1971, p. 5), a fenomenologia “é o ensaio de uma descrição direta de
nossa experiência tal como ela é”. Entende-se, como descrição, um procedimento para
obter dados que serão interpretados fenomenologicamente, na busca da essência do
fenômeno em questão, forma de "ir às coisas mesmas" (MARTINS, 1992; BICUDO,
2001). Triviños (1987, p. 97) refere que a "natureza fenomenológica põe em relevo as
percepções dos sujeitos e, sobretudo, salienta o significado que os fenômenos têm para
as pessoas".
É preciso que a descrição relate o percebido que se expõe por uma
linguagem que não deve ser julgada, mas interpretada e compreendida (BICUDO,
2001). Entretanto, não se deve cair no erro de dizer que a metodologia
fenomenológica seja somente a descrição, até porque outros métodos qualitativos
utilizam a descrição na coleta de dados.
De acordo com Lopes et al. (1995, p. 50), não é "possível encontrar
respostas para os problemas do homem, sem que se saiba de que modo este
homem tem consciência como ser situado histórico e culturalmente em um
29
determinado grupo social”. As autoras afirmam que a fenomenologia propõe-se ao
estudo das experiências vividas. Bruns. (2000, p. 219) afirma que
a trajetória fenomenológica possibilita ao pesquisador um modo
específico de orientar sua indagação com base em pressupostos
epistemológicos que permeiam a sua visão de mundo num dado
momento histórico, visão de mundo essa que envolve crenças, valores e
ideologias.
Por desejar conhecer e compreender de que modo as mulheres concebem
seu aparelho reprodutor, a partir da sua terminologia expressa sobre a seus órgãos
reprodutores durante a consulta de enfermagem ginecológica, sem a preocupação
de explicar e classificar essas concepções como certas ou erradas, entendeu-se
adequada esta modalidade de pesquisa, que vai ao encontro dos propósitos deste
estudo.
5.2 Campo de Estudo
O local escolhido para realização do estudo foi no Posto do Programa de
Saúde da Família (PSF) Jenor Jarros em Porto Alegre, RS, devido a especialidade
do atendimento à saúde da mulher lá realizado.
O PSF Jenor Jarros se preocupa com o cuidado da saúde de todos os
membros da família - crianças, adultos e idosos - que residem na área abrangida
pelo PSF. Desenvolve um atendimento de atenção primária à saúde, sendo que sua
principal meta é trabalhar com a prevenção de doenças. A família somente deixa de
receber a assistência do PSF quando deixar de residir na área que o PSF abrange.
30
A equipe de profissionais é composta por médica, enfermeira, auxiliares de
enfermagem, agentes comunitários e auxiliar de higienização. A assistência aos
usuários realizada no PSF oferece orientações e tratamento para doenças como
Diabete Mellitus, Hipertensão Arterial Sistêmica; desenvolve consulta para mulheres
no pré-natal, gestação com trabalho em grupo e consultas individuais; consultas
ginecológicas de enfermagem e médica durante as quais são realizadas a coleta do
material para exame citopatológico de colo de útero, solicitação de mamografia,
orientação para auto-exame de mama e o uso de anticonceptivos orais; consultas
para as mulheres em puerpério; consultas para o recém-nascido; realização do teste
do pezinho, avaliação nutricional e avaliação do crescimento e desenvolvimento da
criança; aplicação de vacinas para crianças de acordo com calendário e campanhas
de vacinação oferecidas pelo governo.
O PSF distribui medicações à população mediante a prescrição médica. São
realizados curativos, administração de medicações, realização de nebulizações,
verificação de tensão arterial. Os pacientes/clientes são orientados a procurar
atendimento hospitalar, sempre que tiverem necessidade.
5.3 Sujeitos do Estudo
Os sujeitos do estudo são mulheres, usuárias do PSF. Os critérios para participar
do estudo foram os seguintes: não fossem gestantes, nem nulíparas e não estivessem
em puerpério e estivessem em consulta de enfermagem ginecológica. Incluiram-se
mulheres não-nulíparas por acreditar que o fenômeno da gestação/parto/puerpério
31
possibilita experienciar o funcionamento pleno dos órgãos reprodutores; a opção por
mulheres não-gestantes e não-puérperas deveu ao fato de que nesse período elas
estariam com a atenção mais voltada para com o feto/recém-nascido.
A escolha das mulheres foi aleatória, obedecendo os critérios mencionados.
As mulheres entrevistadas estavam entre a faixa etária de 24 a 50 anos,
possuindo entre um e quatro filhos, com o grau de instrução variando entre a 3
ª
série do
Ensino Fundamental e o Segundo Grau completo.
Foram entrevistadas 10 mulheres, tendo este número possibilitado a
pesquisadora perceber a suficiente consistência dos materiais para responder ao
propósito do estudo.
5.4 Coleta dos Materiais
A seguir será descrito como ocorreu a coleta dos materiais, desde o preparo
do campo de pesquisa até a realização da entrevista.
5.4.1 Preparo do Campo de Pesquisa
Após receber a aprovação da Comissão de Pesquisa e Ética do PSF da
Prefeitura Municipal de Porto Alegre (ANEXO), iniciou-se a preparação do campo.
Contatou-se, por telefone, com a enfermeira responsável pelo PSF, marcando dia e
horário para apresentar o projeto de pesquisa. Conforme o estabelecido, a
32
pesquisadora visitou o PSF quando informou sobre a proposta do estudo. A
enfermeira apresentou a área física do PSF à pesquisadora e como não existia um
dia específico para a consulta de enfermagem, essas foram agendadas para um
único dia da semana para facilitar a observação. Os contatos entre pesquisadora e
enfermeira, durante as observações, foram realizadas por telefone.
Após o término das observações, nas consultas de enfermagem
ginecológica, de posse da terminologia sobre os órgãos reprodutores, foi construído
o instrumento de pesquisa. Face às dificuldades de localizar as mulheres com as
características de inclusão da pesquisa, solicitou-se aos profissionais do PSF para
auxiliar nessa etapa.
A sugestão das agentes comunitárias e da enfermeira foi de que a
pesquisadora fosse acompanhada por um profissional ao realizar as entrevistas, e
que as mesmas acontecessem na residência das mulheres, devido à pesquisadora
desconhecer os endereços das mulheres e ser uma pessoa estranha ao ambiente
da comunidade. As agentes comunitárias acompanharam a pesquisadora até a
residência das mulheres usuárias do PSF. A pesquisadora ao chegar à casa de
cada sujeito foi apresentada como mestranda da Escola de Enfermagem da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
5.4.2 Instrumento de Pesquisa
A entrevista semi-estruturada foi a técnica escolhida para a coleta dos materiais
por ser um instrumento que, segundo Lakatos e Marconi (1991, p. 195), “proporciona
33
informações a partir de um encontro entre duas pessoas, mediante uma conversa
informal”. Solicitou-se aos sujeitos, o relato de experiências pessoais e reuniu-se uma boa
quantidade de informações acerca do assunto, indo ao encontro da natureza da pesquisa
(POLIT ; HUNGLER, 1995). Lakatos e Marconi (1991, p. 196) afirmam que o principal
objetivo da entrevista é a "obtenção de informações do entrevistado, sobre determinado
assunto ou problema". Pretendia-se conhecer o modo que as mulheres concebem a
terminologia sobre seu aparelho reprodutor, sendo a entrevista uma técnica que se
adapta para a obtenção dessas respostas.
5.4.3 Construção do Instrumento de Coleta de Materiais
Realizou-se a observação em 10 consultas de enfermagem ginecológica,
coletando-se 25 termos oriundos das expressões das mulheres usuárias do PSF, os
quais se referiam ao órgão reprodutor feminino.
O instrumento de coleta de materiais foi construído a partir dessa
terminologia expressa pelas usuárias do PSF Jenor Jarros, Porto Alegre – campo da
pesquisa nas consultas de enfermagem ginecológica.
De posse dessa terminologia realizou-se consulta léxica, com o intuito de
acrescer, junto aos termos oriundos das observações, as sinonímias e a terminologia
científica, constituindo, assim, o conjunto dos termos relativos a cada parte do aparelho
reprodutor feminino.
A análise abrangeu cada termo em que estava inserido o tema aparelho
reprodutor feminino. Exemplificando: ao termo “mama”, foram acrescidas as sinonímias
34
mais comuns no contexto social dos sujeitos (teta, seio e peito). Bauer e Gakell (2002)
propõem a utilização do corpus nas pesquisas qualitativas, pois ele maximiza a variedade
interna de dinâmica verbal. Corpus significa corpo e, na lingüística, é um material escrito e
falado sobre o qual se fundamenta uma análise lingüística.
O instrumento de coleta de materiais ficou assim constituído: duas questões
semi-estruturadas; uma que introduziu a entrevista e outra que a finalizou; entre
cada uma dessas questões dispôs-se de 42 termos, organizados em grupo,
referentes a cada parte do aparelho reprodutor feminino, oriundos das observações
em consultas de enfermagem ginecológica (APÊNDICE A).
5.4.4 Local das Entrevistas
A primeira intenção era de realizar as entrevistas no próprio PSF, em um
momento anterior a consulta de enfermagem. Entretanto, pela experiência dos
profissionais de saúde, as mulheres não raramente faltavam às consultas de
enfermagem, optando-se, então, por entrevistá-las no PSF ou em sua residência.
Foram realizadas cinco entrevistas na residência das mulheres e cinco no PSF, no
consultório da enfermeira. Não se observou diferenças em coletar os materiais no
PSF ou na residência das mulheres. Em ambos locais a coleta ocorreu com
tranqüilidade.
35
5.4.5 Realização da Entrevista
Após a anuência dos sujeitos em participar do estudo, realizou-se um
rapport com perguntas referentes à idade, número de filhos, número prontuário no
PSF e escolaridade. A seguir, realizou-se a entrevista, em que as mulheres
responderam sobre o que lhes foi perguntado, constituído, assim, o discurso do
sujeito. As entrevistas foram gravadas em fitas K7 para posterior transcrição,
organização e análise das informações.
Uma das mulheres não aceitou gravar a entrevista, porém, o fato não
inviabilizou a tarefa, pois, registrou-se o conteúdo das falas utilizando-se papel e
caneta.
5.5 Considerações Bioéticas
O projeto foi encaminhado à Comissão de Pesquisa e Ética do campo de
estudo, com a finalidade de apresentar a proposta de pesquisa, e
conseqüentemente, obter a aprovação para a realização do estudo.
Foram respeitadas as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa
em Seres Humanos (Resolução CNS 196/96), conforme descrito por Goldim (1997).
Cada sujeito foi informado sobre a justificativa e o objetivo do estudo e foi-lhe
assegurado o respeito ao anonimato. Todos foram informados que poderiam desistir
de participar da pesquisa a qualquer momento, que as informações seriam utilizadas
somente na pesquisa, e que os materiais seriam destruídos depois de cinco anos da
36
realização da pesquisa. Também lhes foi informado que os custos ficariam sob a
responsabilidade da pesquisadora. Caso observasse alguma intercorrência com o
sujeito da pesquisa, durante a entrevista, o encaminharia para auxílio e tratamento
do problema ao PSF. No entanto, não se observaram problemas com as mulheres
entrevistadas.
O sujeito da pesquisa, assim como o pesquisador, antes de iniciar a
observação da consulta ginecológica e a entrevista, assinaram o Termo de
Consentimento Informado (APÊNDICE B), ficando uma via com a pesquisadora e a
outra com o entrevistado.
Polit e Hungler (1995, p. 298) descrevem que
o consentimento autorizado significa que os sujeitos possuem
informação adequada quanto à pesquisa; são capazes de
compreender as informações e possuem o poder da livre escolha, o
que os capacita a consentir, voluntariamente, a participar da
pesquisa, ou a recusá-la.
A relação entre o risco e o benefício é mínimo para os sujeitos da
pesquisa, mas pode ocorrer perda da privacidade e constrangimentos por se
falar sobre o aparelho reprodutor feminino. Entretanto, os benefícios para os
sujeitos superam o risco. Assim com esta pesquisa pretende-se conhecer e
compreender as concepções das mulheres sobre o seu aparelho reprodutor, a partir
das significações das terminologias expressas por elas, possibilitando recriar um
modelo de cuidado de enfermagem que valorize o ser humano em sua
individualidade e possibilidades.
37
5.6 Organização e Análise dos Materiais
Os materiais foram organizados de forma a serem submetidos à análise
fenomenológica, de acordo com Merleau-Ponty, na concepção de Martins (1992).
Merleau-Ponty destaca o empirismo, considerando a consciência do sujeito que
percebe, a partir do encontro interpessoal. Na tentativa de analisar esse encontro, o
autor propõe uma trajetória composta de três momentos: a descrição, a redução e a
compreensão fenomenológica que envolve uma interpretação.
Realizada a transcrição dos discursos, gravada em fitas K7, iniciou-se a
descrição, primeiro momento da trajetória fenomenológica, no qual se descreveu a
experiência tal qual ela é para o ser que a vive. É o questionamento do
conhecimento, que exige uma suspensão, é o que se chama “epoché” que permite
ao fenomenólogo a descrição do dado como ele é na sua pureza (TRIVIÑOS, 1987).
Foi realizada a leitura atenta dos dados, de cada depoimento, quantas vezes foram
necessárias, para captar o sentido do todo, pois é nesse momento que a percepção
assume a primazia do processo, havendo a descoberta da subjetividade e da
intersubjetividade a partir do corpo vivido.
A seguir, partiu-se para a redução fenomenológica que é a possibilidade do
conhecimento, no qual se determina as partes da descrição que são essenciais da
consciência, e refletiu-se a concepção que possui significado para o fenômeno em
estudo. O sujeito apontou para sua experiência como ser no mundo, mas foi o
pesquisador quem formou um conjunto de asserções que levam um significado
próprio, denominado unidades de significado (US), que descreveu o fenômeno. As
expressões cotidianas do sujeito (discurso ingênuo) foram transformadas em
expressões próprias (discurso científico) que sustentaram o discurso. O objetivo final
38
da redução foi chegar à essência que se inicia com a intuição das vivências. Buscar
a essência é descobrir a presença que se tem de si mesmo, é o significado da
consciência. Significa, pois apresentar o mundo como ele é e se apresenta.
Mediante a redução questionou-se a existência de uma consciência que
sustenta a pureza intencional. A intenção é a característica que apresenta a
consciência de estar orientada para um objeto. Ela é imprescindível para o pensar
fenomenológico, visto que as idéias básicas são as vivências e a consciência.
A compreensão e interpretação ocorreu ao realizar-se a análise das
essências, emergidas a partir da redução fenomenológica. Ao proceder essa etapa,
reuniram-se as unidades de significado nas quais as temáticas se aproximam entre
si; esse processo ocorreu no interior do discurso de cada sujeito (subjetividade) e no
discurso dos diversos sujeitos (intersubjetividade), sendo denominado convergência.
No decorrer da análise, surgiram temáticas com sentido oposto e foram
denominadas de divergências; e as unidades de significado que se apresentaram
como únicas, são denominadas de idiossincrasias. Neste estudo, as idiossincrasias
que emergiram destacaram a subjetividade, o que propiciou a cada sujeito falar de
sua intimidade, das coisas de seu corpo. As mulheres apontaram para o requinte,
demonstrando que cada ser é único em determinados aspectos de seu vivido.
A análise das essências foram compreendidas e interpretadas à luz da
fenomenologia da percepção de Merleau-Ponty, na tentativa de alcançar o propósito
do estudo - conhecer e compreender o modo que as mulheres concebem seu
aparelho reprodutor.
39
6 O FENÔMENO
Neste capítulo apresenta-se o fenômeno desvelado pelas mulheres sujeitos
do estudo.
A terminologia constitutiva dos discursos, submetida à análise
fenomenológica, originou outro conjunto de significações. Pode-se apreciar o
desvelamento depreendido da fala dos sujeitos, o que permitiu recolher os
significados por eles emitidos. Os sujeitos receberam números de 1 a 10 para
identifica-los, por exemplo, S1 é a primeira mulher entrevistada. As unidades de
significado (US) também foram numeradas. A seguir, serão apresentadas as
essências que emergiram do estudo.
40
ESSÊNCIAS ORIUNDAS DA PRIMEIRA
QUESTÃO DA ENTREVISTA
Conhecimento acerca do aparelho
reprodutor feminino
Desconhecimento acerca do aparelho
reprodutor feminino
Parte principal do corpo da mulher
Mama
Lactação
Órgãos reprodutores feminino externos
Órgãos reprodutores feminino internos
Ciclo menstrual
Fluidos vaginais
ESSÊNCIAS ORIUNDAS DAS
SIGNIFICAÇÕES DOS
TERMOS
A
ltera
ç
ões celulares uterinas
A
ltera
ç
ões celulares mamárias
Prola
p
so uterino
Alterações no ato sexual
Doença sexualmente transmissível
Processo infeccioso
Incisão cirúr
g
ica no
p
arto normal
Outros eventos
Nomenclatura desconhecida
ESSÊNCIAS ORIUNDAS DA QUESTÃO
FINALIZADORA DA ENTREVISTA
Não recebimento de informações sobre o
aparelho reprodutor feminino
Recebimento de informações sobre o
aparelho reprodutor feminino
Como poderiam ser oferecidas
informações sobre o aparelho
reprodutor feminino
Local em que receberam informações
sobre o aparelho reprodutor feminino
Figura: Essências
41
6.1 Essências da Primeira Questão
O que você conhece sobre os seus órgãos reprodutores? Esta questão originou
três essências, as quais ressignificam: conhecimento acerca do aparelho reprodutor
feminino; desconhecimento acerca do aparelho reprodutor feminino; e parte principal do
corpo da mulher.
6.1.1 Conhecimento Acerca do Aparelho Reprodutor Feminino
Em relação ao conhecimento sobre o aparelho reprodutor feminino, dois sujeitos
da pesquisa mencionaram: ”os ovários e o útero” (S2US1 e S8US1), outros relataram
conhecer “ovários, útero e trompas” (S3US1 e S9US1).
A fala dessas mulheres permitiu compreender que o conhecimento acerca
do aparelho reprodutor feminino está restrito ao útero, aos ovários e às trompas, e
acreditam que estes são os órgãos femininos envolvidos na reprodução humana.
6.1.2 Desconhecimento Acerca do Aparelho Reprodutor Feminino
Houve mulheres que relataram não conhecer “nada” sobre o aparelho
reprodutor feminino (S1US1 e S6US1); outra conhece “muito pouco” sobre os seus
órgão reprodutores (S5US1), e outras, ainda, nada sabem dizer sobre os órgãos
42
reprodutores femininos (S4US1 e S7US3). Depreende-se, assim, que as que dizem
não conhecer ou não sabem se expressar sobre seu aparelho reprodutor não
estejam suficientemente informados sobre os eventos que envolvem seus órgãos
reprodutores.
6.1.3 Parte Principal do Corpo da Mulher
Uma das mulheres revelou ser difícil responder sobre o seu conhecimento
acerca do aparelho reprodutor feminino, mas pensa que seja a parte principal da mulher;
disse ainda, que sem esses órgãos a mulher não reproduz (S10US1 e S10US2). A
reprodução induz a mulher a considerar os órgãos reprodutores femininos como a parte
principal do seu corpo.
6.2 Mama
Ao apresentar-se o fenômeno, surge a essência mama que compreende as
convergências e divergências referentes aos termos seio, peito, teta, mama, toda a
volta escura da mama, aréola, bico do peito e mamilo.
43
6.2.1 Convergências
A análise fenomenológica possibilitou clarificar os significados referentes ao seio,
peito, teta, mama, toda a volta escura da mama, aréola, bico do peito e mamilo que
convergiram nos discursos das mulheres, apontados a seguir:
O seio feminino é uma parte do corpo da mulher muito apreciado pelas próprias
mulheres, pois é uma área essencial do corpo feminino, sendo assim referido: “o seio é
uma parte importante do corpo” (S4US1). Ao apreciar esta parte do corpo, a mulher
percebe o seio em harmonia com as demais partes de seu corpo. É uma das partes do
corpo da mulher que tem uma representação do feminino.
É o órgão capaz de secretar leite para nutrir o recém-nascido. É a parte do corpo
da mulher destinado a alimentar o recém-nascido, “o seio é onde eu amamento a criança”
(S5US1).
O seio feminino é uma das primeiras partes do corpo da mulher que se
modifica quando ela gesta uma criança; é o corpo feminino se preparando para
poder nutrir o recém-nascido. O seio é considerado pelas mulheres como um
contexto destacado em seu corpo, pois, o percebem no dia-a-dia ao sentirem as
mamas ingurgitadas e ao verem o leite sair.
O peito é compreendido pelas mulheres como sendo a “glândula mamária”
(S3US2; S6US2).
O peito é concebido como a parte anterior do corpo feminino, é a aparência
e é o que impressiona o outro. As mulheres acreditam que o peito seja a parte de
seu corpo que as apresentam como mulheres. Em geral, as mulheres valorizam-no
com adornos e no estilo de vestir. Elas percebem essa parte do corpo como algo a
44
ser admirado. É como se essa fosse uma área que as mantêm presentes no mundo
como mulheres.
A teta é uma palavra utilizada para se referir à glândula mamária, órgão do
aparelho reprodutor feminino responsável pela produção do leite materno. Ela se destina
à amamentação.
As mulheres compreendem que a mama signifique “uma glândula mamária”
(S3US5; S6US4), órgão responsável pela produção do alimento infantil. É incutido à
mulher, desde pequena, que é preciso ter cuidado com a mama por ser um órgão capaz
de alimentar o futuro filho. A natureza concedeu-lhe o dom de nutrir outro ser.
Tanto o seio quanto o peito, a teta e a mama são, para as mulheres, a
glândula mamária. A mama diz Moore (1994) é um órgão acessório do aparelho
reprodutor feminino, que contém tecido glandular, dutal, fibroso e gorduroso. A parte
glandular é a responsável pela secreção do leite, no período de lactação. Isso torna
evidente que os sujeitos do estudo já adquiriram um conhecimento acerca dessa
parte do corpo, a partir do processo de viver; e, como refere Merleau-Ponty (2000),
há uma relação vivida entre o corpo e o mundo.
Algumas mulheres utilizam a expressão toda a volta escura da mama para se
reportar à aréola.
As mulheres, ao visualizarem a aréola, a vêem como toda a volta escura, pois é
natural ter um modo de se referir a uma determinada parte do corpo para que as demais
pessoas as entendam. E a aréola é, realmente, como as mulheres descreveram, uma
região circular situada na porção mais saliente da mama que apresenta uma coloração
mais escura (CIAMPO et al., 2004).
A aréola é referida pelas mulheres como “a parte escura da mama” (S2US2;
S4US2), e há a compreensão, por parte delas, que aréola e toda a volta escura da mama
45
têm o mesmo significado. A aréola é um anel tissular escuro ao redor do mamilo, e,
abaixo dele, localizam-se seios lactíferos em que o leite se acumula durante a lactação
(SMELTZER et al., 1998).
A aréola é concebida, pelas mulheres, como a região da mama adequada para o
recém-nascido acomodar os lábios e sugar o leite materno. Quando a criança utiliza toda
a aréola para sugar o leite evita que ocorram fissuras e outros problemas no mamilo, o
que prejudicaria o período de amamentação. Ciampo et al. (2004, p. 21) confirmam esse
conhecimento das mulheres ao dizer:
...os seios galactóforos, onde fica armazenado o leite. Como os seios
galactóforos ficam na área de projeção da aréola, percebe-se a
importância de, durante as mamadas, introduzir-se o máximo possível da
aréola, e não somente o mamilo, na boca do lactente, para que este, ao
mamar, comprima aqueles reservatórios de leite, melhorando o
rendimento da mamada, que não deve restringir-se unicamente à sucção
do mamilo.
Há mulheres que não conhecem o significado de aréola. Elas mencionam que
esse desconhecimento se deve a “quando tive os meus, não tinha essas coisas de
reunião como tem agora, essas explicações não tinha” (S7US3). A informação possibilita
às próprias mulheres despertarem para o conhecimento a respeito de si próprias.
As mulheres compreendem que o bico do peito é próprio para que o recém-
nascido sugue o leite. Essa percepção deve-se ao fato de as mulheres observarem
que é do bico do peito que o leite é excretado e sugado pelo recém-nascido.
As mulheres fazem uma analogia entre o bico do peito com a mamadeira “o
bico do peito, como é que eu vou dizer é a mamadeira da criança” (S3US2; S4US1).
É possível comparar determinada parte do corpo humano com objetos do dia-a-dia,
cuja função se assemelha.
O mamilo é uma área do corpo em que ocorre a saída do leite materno, daí, a
sua importância na amamentação. O mamilo é uma proeminência que se localiza no
46
centro da aréola, ele é fissurado e contém uma abertura do qual sai o leite (MOORE,
1994). De acordo com as mulheres, é o local onde o recém-nascido suga o leite materno.
Sabe-se que o ponto ideal para a sucção é toda a aréola, evitando, com isso, as
rachaduras e fissuras no mamilo.
As mulheres comparam o mamilo à mamadeira, porque eles têm a mesma
forma e, não raramente, o bico de borracha é mais utilizado do que o mamilo.
6.2.2 Idiossincrasias
Apresenta-se as idiossincrasias que surgiram na essência mama.
O seio é uma das partes do corpo da mulher que a identifica como um ser
feminino, que distingue e denota a sua presença em relação ao homem - “o seio é
uma parte importante do corpo” (S4US1). É considerado área privilegiada do corpo
da mulher, que lhe confere característica corporal própria. O volume dos seios a
torna admirada e destacada. O seio delineia, no corpo feminino, uma estética
essencial que atrai o masculino.
Os sentidos visual e táctil revelam a diferença corporal entre o homem e a
mulher, no qual é a mulher que possui volume nos seios que a apresentam como um
ser feminino. Essa notável diferença surge na puberdade, momento de modificações
corporais intensas e marcantes. Hirsch menciona que “os seios são a marca
absoluta da feminilidade, sinal inconfundível de que o corpo já está se preparando
para conceber, gerar e nutrir” (2000, p. 63).
47
As mulheres utilizaram suas vivências para ressignificar os diferentes modos
de se referir à mama e suas partes. Todo o ser humano dá significado a um fato a
partir da experiência vivida; apreende-se algo a partir do momento que se sente.
A função de amamentação também dá ao seio uma essência específica –“o
seio é mais em relação à amamentação” (S8US1).
A palavra peito, para as mulheres, igualmente, remete à amamentação. É
uma glândula que exerce a função essencial de produzir alimentação natural ao
recém-nascido -”o peito é bom para amamentar” (S7US4). É o peito que secreta o
leite ideal para a nutrição da criança; possibilita o sentimento de segurança,
satisfação e proteção que a mulher pode oferecer ao filho por amamentar; eleva a
auto-estima, por sentir-se indispensável à sobrevivência de um ser humano gerado
por ela.
A teta, também, está associada à amamentação. É a parte do corpo da
mulher que tem a função de nutrir e prover alimento ao recém-nascido.
Teta se refere à glândula mamária humana; é concebida como termo bruto e
grosseiro, já que ele é utilizado igualmente para se reportar a teta dos animais -“a
teta é do animal” (S1US7). Ao significarem a teta, apareceu a similaridade, não
apreciada, entre o racional e o animal.
O volume e o tamanho da teta dizem das qualidades da fêmea. A mídia, em
geral, valoriza a idéia de que a mulher necessita ter tetas volumosas para ser aceita
como uma mulher atraente.
Independente do volume da teta, ela é a parte do corpo que é muito
apreciada pelas próprias mulheres, pois, quando o tamanho é pequeno, as mulheres
se sentem pouco admiradas e desejadas, conferindo à teta de tamanho grande
como o despertar da atenção do sexo oposto. Entretanto, quando há a necessidade
48
da retirada da teta devido a alguma patologia a mulher se pode sentir mutilada,
menos mulher, pois, independente de seu volume e características, a teta tem um
simbolismo -“a teta é como se fosse um símbolo da mulher” (S8US5).
É um sentimento natural a interferência do volume da mama na estética
corporal da mulher. Acredita-se que seios volumosos sejam mais apreciados e
valorizados. Penna (1989, p. 31) ao falar sobre o estereótipo da mulher, afirma que
“as imposições do estereótipo social parecem dizer que é bom ser pequena em
todas as dimensões, exceto no busto”. Há a cultura de uma sociedade interferindo
nos padrões comportamentais que são aceitas por alguns como verdadeiras.
Entretanto, o sujeito o vive, e é nisso que ele acredita e forma o seu autoconceito.
Todas as mulheres participantes deste estudo experimentaram a
maternidade. Este fato emergiu nos discursos devido à intima relação delas com o
seio (peito, teta e mama) com a amamentação. Vivenciar os seios ingurgitados, o
vazamento do leite, a sensação prazerosa e a sucção do recém-nascido significaram
o papel da mama na lactação. Como afirma Merleau-Ponty (1971), o que o sujeito
aprende do mundo se dá pelos sentidos e como ele foi afetado.
Ao contrário do termo teta, a mama é tida como a terminologia apropriada
para se referir ao ser humano -“a mama é dela” (S1US9).
A mulher vivencia a sua mama desde a puberdade com a timidez de ter algo
modificado em seu corpo; com a vaidade de mostrá-lo e exibi-lo para os outros; e
com a responsabilidade de nutrir o ser que gerar.
Toda a volta escura da mama pode ser definida como mamilo -“toda a volta
escura da mama é o bico do peito” (S9US1). É difícil para a mulher que desconhece
detalhes do corpo, definir o nome dessa área. Para essas mulheres, essas duas
partes da mama podem ter a mesma função, e o mesmo significado. Destacar a toda
49
a volta escura da mama do mamilo não é visto, na prática das mulheres, pois elas
experienciam as partes da mama como um todo.
Para algumas, a aréola pode significar a glândula mamária -“a aréola seria
como um seio” (S1US2), e, para outras, o mamilo -“a aréola é o bico do peito”
(S9US2); são significações confusas que podem ocorrer face à dificuldade de
diferenciar áreas do corpo humano relativas ao aparelho reprodutor. Conhecer o
significado do mamilo ou da aréola não implica questões práticas e visíveis para
algumas mulheres, ou seja, elas conseguem conviver com o seu conhecimento sem
maiores transtornos.
O bico do peito é por onde sai o leite materno, tornando-se, por isso, para as
mulheres, uma área essencial no processo da amamentação -“o bico do peito é
onde sai o leite” (S2US2). Existem partes do corpo que são explícitas na sua função,
sendo melhor compreendidas pela maioria das mulheres, é o conhecimento
adquirido através da experiência vivida.
Durante toda a fase de lactação surge a preocupação em manter o bico do
peito íntegro para que a mulher não sinta desconforto e não interrompa a
amamentação. O mamilo está intimamente ligado à prática de alimentar ao seio
materno, fazendo com que o bico do peito se torne presente no dia-a-dia das
mulheres lactantes. O sentido tátil e visual mostram à mulher a função do mamilo.
Além da sua importante função na amamentação, o bico do peito pode ser
considerado, para as mulheres, fonte de prazer durante o ato sexual. Quando
estimulado pode gerar sensações agradáveis que torna o ato sexual mais prazeroso
-“o bico do peito é um ponto G” (S1US1).
A presença do mamilo no ato sexual tornou-se evidente quando o
consideram um ponto G. Hirsch (2000, p. 63) diz que de
50
dentro do bico do seio, por trás dos poros onde terminam os canais
do leite, há um músculo. Minúsculo. Involuntário. Que fala mais sobre
a mulher do que mil palavras:basta acontecer o estímulo certo – um
toque, uma brisa, o roçar o pano, uma palavra dita ou pensada – que
ele empina o bico e responde logo: Alô? Pronto. Foi acionado o
comando do central, e você pode ter certeza de que todas as partes
especialmente sensíveis do corpo também acordaram.
Porém, quando uma mulher diz que esta parte do seu corpo, o bico do seio,
tão presente é insignificante para ela -“o bico do peito não quer dizer nada” (S6US1),
é difícil entender as razões de tal afirmação. Entretanto, as mulheres manifestam-se
sobre o seu corpo de acordo com suas vivências. Essa significância que se
evidenciou referente ao bico do peito demonstra que, para essa mulher, ele não
deve ter sido percebido como algo significante.
Existem mulheres que confundem o mamilo com a aréola, ou consideram que
o mamilo é todo o conjunto – mamilo e aréola -“o mamilo são as duas partes juntas
tanto o bico como a aréola” (S8US2).
Quando se fala em mamilo demonstram a consciência do visível. Por isso,
houve-se referências ao mamilo como uma pequena protuberância do seio ou uma
região natural do corpo; é a percepção visual e tátil auxiliando na definição dos conceitos.
6.3 Lactação
Na essência denominada lactação surgiram temas dos discursos das mulheres
referentes aos termos líquido branco que sai do bico do peito, colostro e quando seca o
leite.
51
6.3.1 Convergências
O termo líquido branco que sai do bico do peito foi expresso por algumas
mulheres nas consultas de enfermagem ginecológica ao se referirem ao colostro.
Algumas mulheres disseram que o líquido branco que sai do bico do peito é o leite e
outras, entretanto, consideraram que signifique colostro.
Esse líquido branco que sai do bico do peito, para as mulheres, tem a função
de fornecer ao recém-nascido todos os nutrientes necessários para o seu
desenvolvimento. As mulheres preocupam-se com a produção desse líquido que sai
da mama devido ao papel que ele desempenha, determinando o seu potencial
materno, não tem relevância para o mundo da mulher diferenciar o colostro do leite.
As mulheres aludem à palavra colostro como sendo “o primeiro leite do seu filho”
(S1US2). Elas compreendem que o colostro seja o mesmo que o leite. O leite é
concebido como algo nutritivo, protetor e responsável pelo desenvolvimento da criança,
tendo propriedades semelhantes ao colostro. Pode ser difícil para as mulheres diferenciar
esses dois tipos de fluidos - leite e colostro - secretados pela glândula mamária.
As mulheres compreendem que o líquido branco que sai do bico do peito,
como o colostro, seja um líquido nutritivo e ideal para o recém-nascido. A cada dia
surgem evidências de que o aleitamento materno não se restringe ao período
preconizado, mas até a idade adulta (CIAMPO et al., 2004).
As mulheres demonstraram, em seus discursos, acreditar na importância do
leite materno e percebem os benefícios da amamentação no crescimento e
desenvolvimento de seus filhos. A amamentação é um tema explorado e defendido
por profissionais de saúde da área materno-infantil e pelos profissionais que
52
participam dos programas governamentais e de organizações não-governamentais,
que chamam a atenção da população para a importância do resgate da
amamentação.
Há mulheres que desconhecem o significado da palavra colostro. O termo
colostro é utilizado nas campanhas de amamentação, entretanto, a informação de
seu significado é pouco falado no trabalho com as mulheres. Elas, como os demais
seres humanos, só apreenderão algo quando este se torna perceptível, sensível e
significativo no seu modo de ser no mundo (MERLEAU-PONTY, 1971).
Quando seca o leite materno, as mulheres ficam preocupadas, pela
importância da amamentação. É uma preocupação com a nutrição natural e o
desenvolvimento do recém-nascido, que é de responsabilidade da mãe. As mulheres
atribuem o secar o leite como o término do leite na glândula mamária “quando seca
o leite é quando não tem mais leite” (S5US1; S6US1; S7US2).
6.3.2 Idiossincrasias
O líquido branco que sai do bico do peito pode ser compreendido como um
processo patológico e deve ser investigado minuciosamente caso a mulher não seja
lactante -“o líquido branco que sai do bico do peito a princípio é uma inflamação”
(S1US1). A mulher pode ter associado a saída do líquido branco do bico do peito
com um processo inflamatório na mama por ter experienciado esse problema.
Smeltzer et al. (1998, p. 1119) afirmam que “carcinoma, papiloma, adenomas,
53
mamas císticas e muitos medicamentos podem resultar em uma secreção pelo
mamilo”.
Há fluidos excretados pelo corpo humano que geram preocupações e
angústias, devido ao desconhecimento da fisiologia humana. Excretam-se fluidos
que não indicam disfunção orgânica, que são normais, entretanto, o medo do
desconhecido estabelece a preocupação entre o que é saudável e o que é doente.
Esse líquido que sai do bico do peito mobiliza sentimentos de afeto na
mulher, pois, indica que se iniciará uma vivência que se perpetuará -“o líquido
branco que sai do bico do peito é a primeira sensação da mulher que vai ser mãe”
(S10US1). É o sinal de que ela está apta a prover o alimento para seu filho e, como
afirmam Szejer e Stewart (1997, p. 292), “é a primeira forma de diálogo, como uma
primeira troca entre dois seres diferentes”.
Ao idealizar sobre a amamentação, as mulheres dizem que o colostro
significa algo que flui como água da mama da puérpera, correspondendo ao que lhe
é considerado como nutritivo, de proteção ao recém-nascido.
Mesmo havendo a perceptível comparação do colostro com o soro do leite
coalhado, as mulheres estão percebendo a importância do colostro, valorizando o
leite natural. Esta é a forma como elas expressam os fenômenos. Utilizam
comparações a partir do que elas conhecem.
A expressão quando seca o leite é entendida pelas mulheres como “sem
vitamina” (S1US1); é a idéia de que o leite seco é aquele que não tem as moléculas
essenciais para a nutrição do recém-nascido e não simplesmente a falta do leite.
Existem mulheres que acreditam na concepção do leite fraco e que o leite não-
materno seja o que realmente alimentará a criança, e muitas delas abandonam a
54
amamentação, privando a criança de receber tudo o que o leite materno e o ato de
amamentar podem proporcionar.
Foi descrito por Fine (2003) que, entre 1920 e 1950, um grande número de
mulheres deixavam precipitadamente de dar o seio ao filho, com recomendação
médica formal, embora tivessem leite, por acreditarem que há o leite envenenado, o
perturbado e o contrariado, ou seja, que há o leite que prejudica o recém-nascido.
O secar o leite pode gerar frustração na mulher, assim como o sentimento de
culpa. Algumas mulheres definem que o leite seca devido “a mãe não colocar o
recém-nascido para sugar o leite de seu seio” (S3US2) ou “a mulher não tem mais
estado de saúde para permanecer amamentando”(S7US1). Essas alusões não se
sustentam, pois, um dos motivos de o leite da mulher secar ocorre devido à
impossibilidade ou ausência da sucção do mamilo que estimula a liberação do
hormônio da prolactina.
Deve-se abandonar a idéia de que uma boa mãe seja aquela que amamenta
seu filho nos seus primeiros meses de vida, pois, como afirmam Szejer e Stewart
(1997, p. 285), “não existe um modelo de boa mãe, em si, no qual seja necessário se
enquadrar, sob pena de falha, (...) mas existe, para cada mulher, uma forma própria
de ser para seu bebê”.
A amamentação está sendo amplamente defendida pela ciência e qualquer
fato que ocorra para impedí-la é visto como preocupante pelos profissionais de
saúde e a comunidade.
Há mulheres que desconhecem as causas que as levam a secar o leite,
entretanto, essa culpa que é imposta à mulher não é salutar para o relacionamento
entre mãe e filho.
55
Há situações em que as mulheres não estão preparadas psicologicamente
para o ato de amamentar ou não têm a persistência necessária para permanecer
amamentando o tempo desejado pela criança. Amamentar não é simplesmente
colocar o recém-nascido para sugar o mamilo, é um ato de aproximação e
aconchego entre a mãe e a criança.
As mulheres justificam o secar do leite por idéias como: “o leite seca quando
ele se solidifica como pedra” (S9US1). Essa compreensão advém do fato de a
mulher ter experienciado o “empedrar” do leite, o que realmente interfere na saída do
leite, e ter associado o “empedramento” com o secar do leite.
As mulheres disseram que são “pessoas sem cultura” (S2US2) quando
foram questionadas sobre o significado de o leite secar. A pessoa que vivencia algo
pode estar apta para falar sobre o assunto, na ótica em que ela o vivenciou, o
apreço pelo conhecimento do vivido deve ser estimulado, pois, ele é único, e é o que
possibilita o seu crescimento.
6.4 Órgãos Reprodutores Femininos Internos
A essência denominada de órgãos reprodutores femininos internos reúne os
discursos das mulheres referentes às terminologias: vagina, útero, ovário e Trompas de
Falópio.
56
6.4.1 Convergências
A vagina é um dos órgãos do aparelho reprodutor feminino, “a vagina é um órgão
genital” (S1US1; S5US1 e S6US2). As mulheres sabem que possuem vagina, “vagina é
do meu corpo” (S2US2), mas a significam como “vagina é vagina” (S3US1; S9US1), não
sabendo como expor o significado que essa parte de seus corpos tem. Para elas, “vagina
é, não tem como explicar” (S3US2; S7US2; S8US2 e S10US2).
Compreende-se que, para as mulheres, é difícil falar sobre essa parte do corpo.
Elas sabem que possuem vagina, entretanto, não sabem como expressar o seu
significado.
As mulheres, de acordo com uma pesquisa realizada nos EUA sobre a
percepção que as mulheres têm de sua vagina, apresentada no XVII Congresso da
Federação Internacional de Gionecologia e Obstetrícia – Figo (2003), revelou que 35%
das mulheres entrevistadas sentem desconforto ao discutirem sobre a palavra vagina
(MORAES, 2004). Questiona-se se as mulheres, usuárias do PSF, sentem também
inibição ao falar sobre o assunto ou se realmente não sabem explicar o que seja vagina.
O útero é o local onde o feto se desenvolve, “é onde a gente reproduz” (S4US1).
É nele que acontecerá o crescimento do óvulo fecundado, transformando-se em um feto.
Ele faz com que a mulher se sinta a perpetuadora da espécie humana, “o útero é onde a
gente reproduz” (S2US1 e S4US1). Ele simboliza o poder de gerar uma criança. Mesmo
não sendo o único órgão envolvido na reprodução humana, muitas vezes é classificado
como tal devido a sua importância nesse processo.
O útero é onde o embrião é matriciado e se desenvolve, a matriz uterina recebe,
mantém e dá a vida (MIRANDA, 2000).
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Os ovários, para as mulheres, são os locais de onde os óvulos saem em direção
ao útero, ”o ovário é onde sai o óvulo e vai para o útero” (S3US2 e S8US4). É como se
ele fosse somente o alojador dos óvulos. A sua função hormonal, de grande importância
para a reprodução humana, não foi mencionada pelas mulheres.
As mulheres concebem que as Trompas de Falópio são “por onde passa o
óvulo para o útero” (S3US1; S8US1).
6.4.2 Idiossincrasias
A vagina é um órgão que está intimamente ligado à prática sexual,
diretamente envolvido nesse ato.
Algumas mulheres referem que é “parte do corpo” (S6US1); é o órgão
interno que caracteriza o ser mulher, conferindo a identidade de feminino, “vagina é
o órgão da gente” (S10US1). A vagina também está envolvida, para as mulheres, no
ato de procriação, pela sua função no ato sexual e por ser o canal por onde o recém-
nascido passa para nascer.
Pelo desconhecimento da anatomia e fisiologia do corpo, existem mulheres
que confundem a vagina como sendo o orifício por onde sai a urina, “vagina é por
onde tu urina” (S4US2). Isso ocorre devido à proximidade dos orifícios da genitália
da mulher.
O útero é um órgão feminino que caracteriza a mulher como geradora da
existência humana, “útero é o que dá início à vida” (S1US1). O útero envolve e
58
acolhe a vida, fruto da união do feminino e masculino (MIRANDA, 2000). Isso torna
claro a potencialidade geradora da mulher.
As conseqüências diretas e os desdobramentos de suas virtualidades
biológicas fornecem à mulher a possibilidade de acolhimento e de cuidado em
relação ao outro, de que o homem seria naturalmente destituído (BIRMAN, 2001).
O útero é o local que aloja e que desempenha a função de desenvolver o
recém-nascido, “útero é onde fica o nenê dentro” (S2US1), enquanto esse não está
apto a viver fora dele. Há mulheres que acreditam que ele se localiza no interior da
vagina, “útero fica dentro da vagina” (S9US1). O desconhecimento da anatomia do
aparelho reprodutor feminino e o conhecimento vivido da mulher podem levar as
mulheres a acreditarem que o útero esteja, de fato, dentro da vagina.
O útero também está envolvido com o período menstrual, pois é do seu
interior que sai o fluxo menstrual. É um órgão interno, não-visível, mas de grande
simbolismo e de definição das possibilidades da maternidade biológica para a
mulher.
As mulheres têm o conhecimento do significado de útero, entretanto, não
conseguem manifestar esse conhecimento. Os estranhos mitos sobre a mulher
estão relacionados ao papel de mãe enquanto geradora (JOHNSON, 1990) e são
esses mitos que fazem que a imaginação estabeleça crenças acerca do útero.
O ovário é um órgão essencial do corpo feminino que contribui para a
geração de um ser, “ovário é a parte importante da gente para engravidar”
(S10US2). Esse órgão identifica o ser mulher devido à sua natureza, a de possibilitar
a produção dos óvulos, “ovário é onde é fabricado o óvulo” (S8US3). As mulheres
associam a proximidade da localização dos ovários com o útero, “o ovário fica perto
do útero” (S9US2).
59
Existe a concepção de que o ovário seja o local no qual se dá o encontro do
espermatozóide com o óvulo, “o ovário é onde o espermatozóide se encontra e gera
o filho” (S2US5). Também compreendem que são os ovários que determinam o sexo
da criança. São fatos que evidenciam o saber leigo sobre a fisiologia da reprodução.
As mulheres desconhecem a fisiologia baseada no modelo biomédico do aparelho
reprodutor feminino, mas utilizam suas vivências e experiências sobre o assunto
para construir um saber próprio sobre o assunto.
A dificuldade de as mulheres relatarem seu conhecimento relativo aos
ovários contribui para que o tema se torne complexo.
As mulheres acreditam que as Trompas de Falópio são indispensáveis para
o aparelho reprodutor exercer a sua função, “as Trompas de Falópio são importantes
para engravidar” (S10US1). A função das trompas é importante no processo de
geração da criança, pois elas conduzem os espermatozóides ao encontro do óvulo,
fecundando-o.
Existem mulheres que compreendem que as Trompas de Falópio, quando
seccionadas, não têm função reprodutiva “trompas de falópio é quando a gente
ganha e a pessoa não quer mais engravidar e faz ligamento” (S7US1).
O ligamento das tubas uterinas como método anticonceptivo é de
conhecimento das mulheres, isso pode ser o que favorece o conhecimento sobre o
órgão.
60
6.5 Órgãos Reprodutores Femininos Externos
A essência órgãos reprodutores femininos externos versa sobre as
convergências e idiossincrasias referentes ao termo vulva.
6.5.1 Convergências
As mulheres compreendem que a vulva é o local do organismo da mulher que se
relaciona à sexualidade, “vulva é um órgão sexual” (S3US4; S4US3 e S6US3). É uma
área que durante o ato sexual pode ocasionar à mulher intenso prazer.
6.5.2 Idiossincrasias
Pode acontecer que seja dada significação a somente uma das partes da
vulva como se fosse o todo – “vulva é o monte pubiano” (S1US2), ou “a vulva é os
pequenos lábios” (S8US3); ela se constitui de mais partes, mas pode ser que seja
associada a somente uma parte pelo desconhecimento da anatomia ou pela mulher
não explorar e conhecer as particularidades de seu corpo (MORAES, 2004).
Existe, também, a associação da vulva com o aparelho urinário, devido à
proximidade dos aparelhos – “parece que é um canal, a uretra” (S3US5).
61
6.6 Ciclo Menstrual
A essência denominada de Ciclo Menstrual reúne os termos dor na mama
antes de menstruar, cólica menstrual, regras, borrinha e menstruação, todos
verbalizados pelas mulheres durante as consultas de enfermagem ginecológica.
Nessa essência há convergências, divergências e idiossincrasias relativas
aos termos que ela reúne.
6.6.1 Convergências
Há mulheres que dias antes do início do período menstrual sentem dor na
mama. Essa dor se tornou um indício de que ficarão menstruadas, “a dor na mama
antes de menstruar é um sinal que vai vir a menstruação” (S3US3). Acontece um
aumento do volume das mamas antes do período menstrual devido à descarga
hormonal que ocorre nesse período, “acho que a dor na mama antes de menstruar é
os hormônios que mexem com o corpo” (S5US1).
Assim como a dor na mama, a cólica menstrual significa, para as mulheres,
uma manifestação de seu corpo que se prepara para o período de eliminação do
fluxo menstrual (S1US1; S4US1; S8US1; S9US2 e S10US2). Essa dor espasmódica
ocorre devido à contração uterina para a liberação da camada do endométrio
durante a menstruação, porque o óvulo não foi fecundado. De acordo com Ziegel e
Cranley (1985), um período menstrual pode ser precedido e ou acompanhado de
certa quantidade de distúrbios físicos e emocionais alguns dias antes do início do
62
sangramento, alguns sinais premonitórios podem ser notados, como distensão
abdominal, dor lombar e ingurgitamento mamário.
A regra é um termo utilizado por algumas mulheres para se referirem à
menstruação – “regras é a menstruação” (S2US1; S3US1; S4US1; S5US1; S7US1;
S8US1 e S9US1). A menstruação tem vários outros nomes por se tratar de algo sobre a
intimidade feminina. Essa palavra pode ter sido empregada desta forma por referir-se à
menstruação, pela característica de períodos: acontece todos os meses, com
regularidade. A mulher passa a produzir o sangue menstrual ciclicamente quando se
torna mulher, quando está apta à reprodução (LEAL, 1995).
A menstruação ocorre todos os meses do ano, em mulheres em idade fértil
que não estejam grávidas, durante cinco a sete dias - “menstruação é o que eu
tenho todos os meses” (S1US3). Existem mulheres que concebem que a
menstruação é um indício de que não há gravidez – “menstruação quer dizer que
não tem gravidez” (S3US5); é como se fosse um controle para elas. Existem vários
distúrbios orgânicos que causam alterações do fluxo menstrual, como excesso ou
cessamento da menstruação, mas as mulheres o associam à primeira manifestação
da gravidez.
6.6.2 Divergências
A dor na mama antes do período menstrual é uma manifestação que pode
não ocorrer com todas as mulheres, “nunca tive dor na mama antes de menstruar”
63
(S3US1). Há mulheres que têm dor na mama antes de menstruar (S2US1; S6US1 e
S7US1) e outras, não.
Existem mulheres que não sentem cólicas menstruais (S4US2; S6US1 e
S7US1). Entretanto, há mulheres que sentem cólicas de grande intensidade, “tenho
cólicas menstruais fortíssimas” (S6US1). Ter ou não ter cólicas menstruais depende
da fisiologia de cada mulher, não indica que uma ou outra tenha algum distúrbio
orgânico. Um corpo é diferente do outro. Muitas mulheres podem experimentar
pouca ou nenhuma alteração durante a menstruação, outras sentem apreciável
desconforto (ZIEGEL; CRANLEY, 1985).
A borrinha é um termo popular utilizado para denominar os fragmentos finais
da menstruação. Houve mulheres que ressignificaram a borrinha como o final da
menstruação (S5US2; S8US3 e S9US3) e outras a consideraram o início da
menstruação (S8US2). O termo borrinha é diminutivo da palavra borra que possui
um dos significados de sujeira, imundice. Esse significado, comparado ao ciclo
menstrual, pode ser considerado tanto o início quanto o fim da menstruação, pois,
em ambos os momentos, há a liberação de fragmentos que mancham a calcinha.
6.6.3 Idiossincrasias
A dor na mama antes de menstruar é compreendida pelas mulheres como
“fertilidade” (S1US1), é um indicativo de que a mulher é capaz de gerar uma criança.
Existem situações em que a dor na mama antes da menstruação é recebida com
alegria, satisfação e alívio, pois é uma manifestação de que não há gravidez. A dor é
64
relatada pelo aumento do volume dos seios – “dor na mama antes de menstruar é
porque incha o seio” (S9US1), à restrição hídrica, e à descarga hormonal.
Uma das mulheres, relatando a dor na mama antes da menstruação, fez
uma comparação entre esse momento com o momento antes de colocar a criança a
mamar no seio, “lembra bem quando tu tá amamentando pouquinho antes que
enrijece, para mim lembra isso” (S8US2), é vivência da mesma sensação em
momentos diferentes.
As alterações mamárias quando presentes são as mesmas que ocorrem na
gravidez, as mamas podem se tornar mais firmes e aumentadas de tamanho
(ZIEGEL ; CRANLEY, 1985).
A dor faz com que a mulher sinta desconforto, “dor na mama antes de
menstruar abate o ânimo” (S3US2). É uma dor que “impossibilita que a mulher toque
em seu seio” (S7US3), essa é uma desvantagem da menstruação, mas que pode
ser evitada com um tratamento específico, entretanto, algumas mulheres não têm
esse conhecimento, achando que essa é uma manifestação normal, que ocorre
normalmente. O fenômeno de base fisiológica mais importante e que diz das
alterações que ocorrem no corpo da mulher no período que antecede dois a três
dias a descida do fluxo menstrual é uma queda rápida nos níveis de estrogênio e de
progesterona (PENNA, 1989).
A cólica para as mulheres é uma manifestação do corpo de que há uma
alteração – “cólica é alguma coisa que não tá certo lá dentro do útero” (S3US2). As
mulheres significam a cólica menstrual como “os hormônios que estão em
movimento quando ela menstruará” (S2US2) ou que “ocorre devido os ovários
estarem com seu tamanho aumentado” (S9US1), todas essas causas parecem
tornar a cólica menstrual um fato comum.
65
A dor altera o ânimo das pessoas, influenciando as atividades, perturbando o
cotidiano, muitas vezes impossibilitando a mulher de realizar determinadas
atividades – “cólica menstrual é um desconforto tremendo” (S3US3).
“As regras” é um termo popular, antigo, utilizado para denominar a
menstruação. Pode ser uma forma de amenizar o constrangimento que ainda existe
de se falar sobre esse assunto.
“As regras impõem limites” (S1US1), só o termo regra tem esse significado.
A menstruação é vista como regras por vir todos os meses, por impor à mulher
cuidados específicos com a higiene e por ser um desconforto na relação sexual.
O corpo da mulher prepara-se todos os meses para menstruar, pois a
menstruação é o evento comum a todas as mulheres em idade fértil – “menstruação
é do organismo” (S4US5) e indica, para as mulheres, a presença adequada da
função hormonal e uterina, “menstruação quer dizer que está tudo certo, que a
mulher tá vindo no mês certo, no dia certo, que tá tudo em dia” (S3US4).
O ciclo menstrual para o povo Dagara, da Costa do Marfim – África, é o
marco para a iniciação das mulheres, no qual os anciões orientam jovens sobre
intimidade, sexualidade e rituais (SOME, 2003), o que demonstra a importância
desse ciclo na vida de uma mulher.
O fato de a mulher não ter uma menstruação regular, atemoriza, não só pelo
fato da alteração biológica, como pela suposição provável de uma gestação não-
planejada – “se não menstruar não tá normal com ela” (S5US5). De acordo com Del
Priore (1995), um corpo regulado significa um corpo ativo. O cessamento das regras
indica a morte dessas forças.
A naturalidade da menstruação, e o indicativo de fertilidade que ela denota
faz com que a mulher aprecie esse momento de sua intimidade – “é quando o corpo
66
da gente tá se preparando para ser mulher’ (S10US3), é sinal de sua feminilidade,
aptidão para gerar um novo ser – “acho que toda mulher tem que menstruar”
(S5US4). Como diz Leal (1995), o sangue menstrual é específico e indicador da
condição da fertilidade feminina.
Há mulheres que se sentem gratificadas por menstruar – “menstruar eu
gosto” (S1US3). O mesmo é sentido pelas mulheres do povo Dagar, “o fluxo de
sangue menstrual carrega poder. É uma época poderosa para a mulher” (SOME,
2003, p. 75).
O modo que se processa a menstruação, a descida do sangue, o cuidado
específico para esse momento e todos os limites que ele impõe faz com que
algumas mulheres não se sintam confortáveis durante esse período, “é o mal que a
mulher tem que passar” (S4US4).
6.7 Fluidos Vaginais
Os termos corrimento, corrimento fedido e leucorréia foram reunidos em uma
essência denominada fluidos corporais.
6.7.1 Convergências
Os fluidos estranhos, não comumente liberados pelo corpo, levam a crer que
haja uma infecção. É o que ocorre com o corrimento vaginal; as mulheres compreendem
67
que ele seja uma infecção no aparelho reprodutor -“corrimento é infecção” (S2US1;
S3US2; S6US1; S9US1).
Sentir odor desagradável sugere processo infeccioso. As mulheres
compreendem: “corrimento fedido é infecção” (S4US2; S5US2; S6US2; S9US2). Existe o
conhecimento de que quando há infecção acontece a eliminação de um fluido amarelado,
com odor desagradável, denominada pus. A associação entre o odor fétido do corrimento
vaginal e o odor da drenagem de secreção purulenta levam as mulheres a pressupor
infecção.
As mulheres concebem que a leucorréia seja o nome de uma doença -
“leucorréia parece uma doença” (S3US5; S10US4). A leucorréia pode, assim, ser
significada pelas mulheres, pois não é uma terminologia comumente utilizada.
Segundo Halbe et al.. (2000, p. 612) “secreção vaginal normal em geral é
branca, à semelhança da farinha de trigo molhada, em virtude das células
descamadas, daí advém o nome leucorréia, que significa corrimento branco”.
6.7.2 Idiossincrasias
O corrimento vaginal é percebido como um fluido impuro e é compreendido
como “...sinal que algo não vai bem” (S3US3), ele indica que pode haver um
processo patológico. Existem mulheres que acreditam que – “se o corrimento não
tiver cheiro ela não se importa” (S8US1). Há o corrimento que é considerado normal,
que denota o período da ovulação.
Quando há corrimento vaginal é salutar que se investigue minuciosamente,
pois, pode acarretar danos à saúde da mulher. Quando as mulheres percebem o
68
corrimento ficam preocupadas; a excreção de fluidos, principalmente pela área
genital, lhes causa constrangimentos.
O fato de o corrimento vaginal ter odor desagradável aumenta a suspeita de
gravidade de possível problema, “corrimento fedido é uma doença grave” (S1US2).
O corrimento é concebido como uma alteração biológica. Ele gera desconforto para
as mulheres não só pelo corrimento, mas pelo odor que pode ser sentido por outras
pessoas.
As mulheres percebem que “quando há corrimento fedido deve-se procurar
conhecer o que está acontecendo” (S8US2), pois sugere a existência de uma
possível patologia com conseqüências preocupantes.
Uma das características das secreções normais da vagina é ser inodora, a
partir do momento que esta característica se modifica é provável que esteja havendo
uma infecção genital (HALBE et al., 2000).
A terminologia leucorréia, mesmo não sendo utilizada pela maioria das
mulheres, é compreendida como “a secreção de cor branca que não tem nada”
(S8US3) ou “um líquido que sai com mau cheiro” (S9US3).
“O corrimento pode decorrer do excesso, real ou aparente, das secreções
normais – nesse caso chamado de leucorréia” (HALBE et al., 2000, p. 612).
Há mulheres que crêem que a leucorréia seja uma doença gravíssima. Esse
temor pode ocorrer em razão do desconhecimento do verdadeiro significado da
leucorréia.
69
6.8 Alterações Celulares Mamárias
A essência denominada Alterações Celulares Mamárias aborda os
significados das nomenclaturas caroço na mama, bolinha na mama e nódulo na
mama.
Emergiram, nessa essência, convergências e idiossincrasias que
conceituam as terminologias nela contidas.
6.8.1 Convergências
Ao perceber um caroço na mama, as mulheres acreditam ser um nódulo –
acho que caroço na mama é um nódulo” (S4US1 e S5US1); um câncer na glândula
mamária (S2US1; S6US1/ S7US1 e S10US1). As mulheres tendem ao pavor quando
palpam, no seio, um caroço, é a possibilidade de tratar-se de uma doença com
prognóstico reservado.
A bolinha na mama é um termo utilizado pelas mulheres para se referirem a algo
de formato circular que foi palpado no seio, mas que não sabem o que possa ser. A
bolinha também sugere um tumor ou câncer – “bolinha na mama é câncer
(S2US2;S6US2; S7US2 e S10US2) .
A palavra nódulo na mama faz com que as mulheres pensem em algo
nefasto e preocupante como o câncer, “nódulo na mama é câncer” (S1US3; S2US3;
S6US3; S10US3). Está havendo uma ampla divulgação sobre o câncer de mama
pela mídia, secretarias da saúde, órgãos governamentais e não-governamentais por
70
ser uma doença que vem aumentando os índices de mortalidade entre as mulheres.
No estado de São Paulo, o câncer de mama já é o segundo tumor mais freqüente
entre as mulheres, perdendo somente para os tumores de pele (BRENTANI, 2000).
Isso talvez seja o motivo de as mulheres acreditarem em câncer até que se prove o
contrário.
6.8.2 Idiossincrasias
Quando uma mulher se apalpa durante o auto-exame das mamas e percebe
um caroço podem surgir sentimentos de medo, angústia e preocupação- “caroço na
mama é algo que amedronta” (S9US1). A presença de algo incomum no corpo leva
a suposição de doença – “a pessoa fica achando que é uma coisa ruim” (S9US2); é
o medo iminente da morte ou do sofrimento, “um caroço na mama deve ser
submetido a uma rigorosa análise e dispensado atenção especial” (S8US1), este é
um cuidado que cabe à mulher, pois, ela deve buscar auxílio para descobrir o que
está ocorrendo. Hirsch (2000) menciona que para se ter certeza de que um cisto
seja um câncer é preciso a investigação.
Um caroço na mama nem sempre indica uma doença de prognóstico fatal. As
mulheres definem que caroço na mama pode significar “um gânglio ou glândula
endurecida na mamária”(S1US1) ou “um tecido que geralmente encerra uma
substância mole por parede própria (cisto)” (S3US1), tal como refere Kemp e Lima
(2000 ), os cistos mamários benignos.
71
A bolinha na mama é um termo utilizado por algumas mulheres ao se
referirem ao caroço ou ao nódulo. A terminologia bolinha pode fazer com que o
problema de palpar algo na mama amenize. Algumas mulheres compreendem que
bolinha na mama pode ser um aumento das glândulas, “um número exagerado de
hormônios” (S5US2). Percebe-se que as mulheres estão ampliando seus
conhecimentos quando buscam conhecer as manifestações estranhas ao corpo.
Entretanto, existe o medo ao sentir uma bolinha na mama, pois é sabido que
existe a possibilidade de ser algo nocivo para a saúde – “bolinha na mama é algo
perigoso” (S1US2). Esse medo pode ser determinante e essencial, pois estimula as
mulheres a buscar em auxílio para o problema, concorrendo para a precocidade do
diagnóstico.
As mulheres informantes do estudo ressignificam o nódulo da mama de
diversas maneiras: “pode ser um cisto” (S3US3), “um tumor, uma glândula
endurecida” (S9US4), “um aumento dos hormônios” (S4US3), “uma doença”
(S4US4).
De acordo com Kemp e Lima (2000), há diversos tipos de nódulo mamários:
nódulos benignos, nódulos suspeitos, nódulos malignos e nódulo não-palpável.
O principal cuidado que as mulheres devem ter é realizar, mensalmente, o
auto-exame das mamas e quando sentirem um nódulo procurarem imediatamente
um profissional de saúde especializado para descartar uma doença fatal ou definir
um diagnóstico precoce. Isso é salientado no discurso “o nódulo na mama deve ser
submetido a rigorosa análise e dispensado atenção especial” (S8US3). Na maioria
das vezes, é o diagnóstico precoce que salva a vida de uma mulher.
72
6.9 Alterações Celulares Uterinas
Os termos mioma e tumor foram referidos pelas mulheres durante a consulta
de enfermagem ginecológica ao falarem sobre doenças do aparelho reprodutor
feminino. Esses termos foram reunidos em uma essência denominada Alterações
Celulares Uterinas.
Nessa essência surgiram convergências e idiossincrasias.
6.9.1 Convergências
Tumor é a formação nova e anormal de tecido. Há tumores benignos e
malignos, os malignos podem ser chamados de cancerosos (RUESCAS, 1998). As
mulheres quando escutam essa palavra crêem se tratar de um câncer -”tumor é
câncer” (S2US5; S3US3; S7US2), gerando angústias relativas à fatalidade que a
doença representa.
6.9.2 Idiossincrasias
Há mulheres que têm ou já tiveram mioma, ou conhecem alguém que teve
esse problema -“minha vizinha tem mioma, mas não sei porque se tem isso”
73
(S2US2). Segundo Higg e Lopes (2000), os miomas uterinos são os tumores
benignos mais comuns do trato reprodutivo.
Essa patologia se desenvolve no interior do útero – “o mioma dá dentro do
útero” (S9US1), entretanto, há mulheres que confundem a verdadeira localização do
mioma, não sabendo se este se desenvolve no útero ou no ovário – “não sei se o
mioma é no útero ou no ovário” (S2US4).
O desconhecimento da anatomia e fisiologia do aparelho reprodutor feminino
pode favorecer dúvidas e angústias. Os órgãos mais falados do aparelho reprodutor
feminino são vagina, útero e ovários, no entanto, os seus significados não são
conhecidos.
O mioma contribui para o aumento das cólicas uterinas durante a
menstruação, do fluxo de sangue e do volume abdominal - “o mioma incha a barriga”
(S10US2). O significado da patologia nem sempre é conhecido pelas mulheres,
entretanto, os sintomas se fazem presentes. A principal manifestação causada pelo
fibroma uterino é a hemorragia e aumento do fluxo sangüíneo menstrual, o que pode
originar contrações uterinas dependendo do tamanho do mioma (RUESCAS, 1998).
Essa doença pode ser compreendida pelas mulheres como um tipo de
câncer – “mioma é um tipo de câncer” (S3US2), uma doença fatal. A palavra mioma,
nesse contexto, tem conotação apavoradora, sendo que qualquer alteração celular
as fazem acreditar no pior diagnóstico.
Há mulheres que ressignificam mioma como um gânglio inflamado. Esse
processo, dependendo do estágio em que se encontra, impossibilita a mulher de
realizar suas tarefas do cotidiano, por causa do sangramento e da dor. Esses
sintomas podem aumentar as preocupações das mulheres, fazendo-as acreditar em
um diagnóstico mais severo.
74
A palavra tumor é percebida pelas mulheres como um processo patológico
amedrontador – “tumor assusta a gente” (S10US2). Ao ouvir um diagnóstico de
tumor pensam na morte. A palavra lembra a morte e o sofrimento.
As mulheres significam o tumor como o crescimento de células musculares,
um pequeno nódulo, um gânglio inflamado ou endurecido e “uma bola de sangue”
(S6US2). O tumor é realmente um crescimento anormal de células, mas nem
sempre indica uma doença fatal, “ele pode ser maligno ou benigno” (S8US3). É uma
patologia que deve ser investigada, mas não deve ser concebida como sinônimo de
morte. O alto índice de óbitos por câncer ginecológico pode ser um fator que
aumente o temor das mulheres, já que o tumor e o câncer podem ser confundidos
como uma mesma doença.
6.10 Prolapso Uterino
O útero caído é o termo utilizado pelas mulheres, sujeitos do estudo, ao se
referirem ao prolapso uterino.
6.10.1 Convergências
Os pontos convergentes que emergiram neste estudo foi o fato de existirem
mulheres que não têm ou não tiveram o útero caído. Isso talvez explique o
desconhecimento dessa doença por parte de algumas delas. Não ter vivenciado uma
75
situação pode ser a causa do desconhecimento, é como se não existisse no contexto em
que vivem.
6.10.2 Idiossincrasias
As mulheres manifestaram-se sobre essa essência discorrendo sobre as
causas e as conseqüências dessa alteração.
O útero caído é uma alteração anatômica que pode ser provocada por esforço
excessivo durante o trabalho de parto. De acordo com Smeltzer et al. (1998, p.
1096), o prolapso uterino é quando as “estruturas que apóiam o útero se
enfraquecem (tipicamente pelo parto), o útero pode descer para o canal vaginal”. As
mulheres acreditam que a queda do útero acontece face ao número elevado de
gestações e partos. Haddad e Rossi (2000, p. 716) afirmam que “os prolapsos são
mais freqüentes em mulheres multíparas devido ao estiramento das fibras nervosas,
isquemia muscular e alongamento ou ruptura da fáscia endopélvica, que podem
ocorrer durante o parto e nas pacientes climatéricas”.
A fenomenologia da percepção de Merleau-Ponty enfatiza (1971, p. 68) ”o
sentir é a comunicação vital com o mundo que faz o presente como lugar familiar da
vida”. A mulher, ao vivenciar a causa do útero caído pelo modo como o percebeu,
lhe dá um novo significado.
O útero caído pode gerar sensações dolorosas de desconforto durante a
micção, bem como uma sensação de peso ou corpo estranho que exterioriza pela
vagina (HADDAD ; ROSSI, 2000), e algumas mulheres consideram que “útero caído
dá problema para engravidar” (S10US1). Elas sabem que qualquer alteração uterina
76
impossibilita a mulher de engravidar, devido o útero ser o principal órgão
responsável pelo desenvolvimento de uma criança. Algumas mulheres disseram que
nunca ouviram falar sobre útero caído.
6.11 Alterações no Ato Sexual
Os termos dor na relação e sangramento na relação expressados pelas
mulheres nas consultas de enfermagem ginecológica, e o termo dispaneuria,
acrescentado pela pesquisadora, foram reunidos na essência alterações no ato
sexual.
Surgiram, nessa essência, convergências, divergências e idiossincrasias.
6.11.1 Convergências
As mulheres concebem que a dor na relação ocorre devido a uma infecção,
“dor na relação pode ser uma infecção lá dentro, que quando toca dói” (S2US1).
Algumas vezes, a dor na relação pode ocorrer por outros motivos, entretanto, leva a
mulher a supor que haja uma infecção.
A dor na relação, de acordo com Quevauvilliers e Perlemuter (2001), tem
origem orgânica e psicológica; há a possibilidade de originar-se de uma seqüela
infecciosa pélvica e vaginites.
77
A relação sexual normal deve ocorrer sem alterações aparentes. O sangramento
durante a relação não é usual, por isso ele gera preocupações, “sangramento na relação
deve ser alguma coisa errada” (S4US1; S4US3).
A disfunção orgânica do útero pode causar sangramento na relação sexual,
“sangramento na relação deve ser alguma coisa no útero” (S9US1).
Halbe e Dolce (2000), afirmam que pode haver sangramento do coito devido a
violência sexual, em casos de desproporção entre o pênis e a vagina e em pacientes com
malformações na vagina.
Há mulheres que relataram não terem tido sangramento nas relações sexuais
(S5US1; S6US1 e S7US1).
6.11.2 Divergências
Existem mulheres que nunca tiveram dor na relação sexual (S3US2 e S5US2) e
outras que a experimentaram (S4US2 e S10US2).
6.11.3 Idiossincrasias
A relação sexual é um ato de prazer, mas em alguns momentos ela pode
ocasionar dor por inúmeros motivos: ressecamento da mucosa vaginal, movimentos
bruscos durante o ato sexual, mau uso de métodos anticonceptivos e outros. Por ser
78
um ato prazeroso quando há a dor as mulheres acreditam que seja uma doença - “a
dor na relação é um sintoma que tem algum problema com os teus órgãos”
(S10US1).
As mulheres têm a necessidade de justificar a causa de um sintoma que
ocasione sofrimento, “a dor na relação pode ser um mioma” (S1US1).
Em casos de mioma uterino ”a dispaneuria, geralmente está associada à
penetração profunda, ocorrendo quando estiver envolvido o fundo-de-saco”
(MOORE, 1994, p. 256).
O ato sexual é o encontro íntimo entre um homem e uma mulher, sendo
assim, o casal deve estar preparado e com desejo para que não cause dor,
principalmente na mulher, face a possibilidade de contratura muscular. A mulher
deve estar relaxada, segura e desejosa de manter relações sexuais, “tem-se dor na
relação quando tu não está disposta para ter relação” (S8US3).
A posição que o casal escolhe durante a relação sexual pode influir no
desencadear do processo doloroso.
A mulher “teve dor na relação quando usou DIU” (S8US1). Métodos
anticonceptivos que são colocados no corpo da mulher podem causar dor durante o
ato sexual quando não forem devidamente colocados ou quando se deslocam.
Existem várias causas para a dor na relação sexual, cada mulher que sente
dor tem o seu motivo, dentre esses estão as condições anatômicas do corpo, “sinto
dor na relação, pois meu útero é muito baixo” (S4US3).
Hacker e Moore (1994) afirmam que a vagina da mulher pós-menopáusica
reduz seu diâmetro, rompendo-se e rasgando com facilidade o que provoca intensa
dor durante a relação sexual.
79
As mulheres manifestam “ser pessoas sem cultura” (S2US4), justificando seu
desconhecimento quanto ao significado de dispaneuria. Este é um termo incomum,
pouco utilizado e conhecido pelas mulheres, não fazendo parte de seu mundo-vida.
O sangramento vaginal que não provém da menstruação ou do rompimento
do hímen é percebido como uma alteração orgânica que traz preocupações e a
desconfiança em relação à qualidade do saudável – “sangramento na relação
informa perigo” (S1US1).
Quando o sangramento na relação vem acompanhado de outros sintomas,
indica um processo patológico que pode amedrontar a mulher, “sangramento na
relação pode ser uma ferida no útero” (S10US1).
A falta de lubrificação do canal vaginal pode ocasionar sangramento durante
o ato sexual pelo atrito entre o pênis e a vagina – “sangramento na relação é porque
tu tá muito seca, sem lubrificação” (S8US1). A falta de lubrificação pode acometer
todas as mulheres, mas se torna mais presente nas mulheres que estão no
climatério.
Segundo Halbe e Dolce (2000), pode haver sangramento do coito nas
mulheres pós-menopausais que não fazem reposição hormonal.
O ato sexual, por si só, pode ser ainda concebido como algo vergonhoso, o
que aumenta mais esse constrangimento devido o sangramento, podendo interferir
no relacionamento do casal.
80
6.12 Doença Sexualmente Transmissível
A terminologia relativa à doença sexualmente transmissível manifestada
pelas mulheres durante as consultas de enfermagem ginecológica foi verrugas no
útero. A pesquisadora acrescentou a terminologia científica condiloma acuminado e
HPV. Essa essência foi denominada doença sexualmente transmissível por
apresentar o significado dos termos verrugas no útero, Papiloma Vírus Humano
(HPV) e condiloma acuminado.
6.12.1 Convergências
O HPV é uma doença infectocontagiosa transmitida por contato sexual –
“papiloma vírus é uma doença venérea” (S8US6; S10US3). É um vírus da família
papovaviridase. A infecção tem maior incidência em mulheres na idade de 20 a 40 anos,
e, normalmente, caracteriza-se por lesões denominadas de condiloma acuminado e por
verrugas genitais (PEREYRA et al., 2000).
Há mulheres que nunca ouviram falar sobre esse vírus o que indica que,
provavelmente, não foram acometidas por essa doença.
81
6.12.2 Divergências
Há mulheres que já ouviram falar sobre verruga no útero (S3US1) e outras não
(S7US1). Há mulheres que já ouviram falar sobre Condiloma Acuminado (S4US3 e
S8US3) e outras não (S3US3).
Cada corpo percebe o mundo a seu modo. São essas diversidades que
proporcionam a subjetividade do sujeito. Cada ser humano tem a sua experiência no
mundo que o constitui como ser único.
6.12.3 Idiossincrasias
Verruga no útero é um processo patológico no aparelho reprodutor
transmitido por contato sexual. As mulheres, ao discursarem sobre essa doença,
mostraram saber o seu modo de transmissão, entretanto, o fato de a verruga no
útero ser concebido como uma simples verruga, revela que as mulheres
desconhecem que a verruga possa ser a manifestação de uma infecção, de um
vírus.
A partir do momento em que as mulheres compreenderem que a verruga no
útero é uma doença viral, elas não a justificam como um evento banal.
Existe a dúvida se essa doença é adquirida somente por contato sexual. A
doença sexualmente transmissível ainda é concebida como algo que atinge pessoas
82
sem orientação sexual e promíscuas, ocasionando preconceito, vergonha e não
aceitação da doença em seu meio social.
As verrugas no útero são a manifestação de uma doença viral que ocorre
por contato íntimo (HIRSCH, 2000), devendo ser concebida como algo que informa
perigo e não simplesmente como uma verruga. Conforme diz Pereyra et al. (2000, p.
999), “desde o reconhecimento da transmissão sexual das verrugas genitais, muitos
avanços ocorreram, permitindo melhor compreensão dos mecanismos celulares
pelos quais o papilomavírus humano (HPV) está envolvido na alteração neoplásica”.
Algumas mulheres acreditam que o condiloma acuminado seja um tipo de
câncer. Ele não é um tipo de câncer, entretanto, pode predispor o seu aparecimento.
A associação que as mulheres fazem entre o condiloma acuminado e o
papilomavírus com o câncer pode ocorrer em razão do modo como ambos são
diagnosticados, através do exame preventivo citopatológico do colo do útero. Estar
infectada por HPV não indica estar com um tipo de câncer como é concebido pelas
mulheres. Pereyra et al. (2000) dizem que o HPV não é suficiente por si mesmo de
induzir a neoplasia. As mulheres associam o HPV a um tipo de câncer por estarem
vinculados ao mesmo exame.
O papiloma vírus é um vírus que favorece o aparecimento do câncer,
principalmente em mulheres. Ele não é uma categoria de câncer, como é concebido
por algumas mulheres, mas é compreendido por elas como uma infecção causada
por vírus.
Há um desconhecimento da nomenclatura papiloma vírus, entretanto, as
mulheres associam o termo com o agente transmissor, pois dizem que deve ser algo
relativo a um vírus.
83
6.13 Processo Infeccioso
A palavra infecção foi verbalizada pelas mulheres nas consultas de
enfermagem ginecológica. A infecção não é uma patologia específica do aparelho
reprodutor feminino, mas como foi abordada pelas mulheres, optou-se por
questiona-las sobre o significado desse termo.
A essência denominada Processo Infeccioso apresenta as convergências e
divergências que surgiram dos discursos das mulheres sobre infecção.
6.13.1 Convergências
As mulheres compreendem que infecção seja o mesmo que “uma
inflamação” (S7US3 e S9US1). Infecção e inflamação não são processos idênticos,
embora sejam confundidos pelas mulheres. De acordo com Smeltzer et al.(1998),
infecção é causada pelo crescimento de organismos patogênicos no corpo, mas
inflamação é a principal defesa do organismo utilizado para lutar contra seus
inúmeros invasores. Seus sinais são vermelhidão, calor, edema e dor (RUESCAS,
1998).
Há mulheres que têm o conhecimento de que infecção seja doença –
infecção é uma doença”(S4US1 e S10US1).
84
6.13.2 Idiossincrasias
A infecção é percebida pelas mulheres como uma doença ocasionada por
uma bactéria -“infecção é bactéria”(S1US1), e pela baixa imunidade da pessoa -
“infecção é quando teus anticorpos estão baixos e qualquer coisa aparece e dá
infecção” (S8US1).
A presença da secreção esverdeada – pus - a dor local e o odor fétido são
sinais que sugerem infecção, sendo uma defesa do hospedeiro (SMELTZER et al.,
1998) – “com pus é infecção” (S3US3).
A infecção é uma doença que se não tratada pode ser fatal. Uma infecção
pode levar a sepse e, conseqüentemente, à morte. As mulheres compreendem que
o local infectado se tornou impuro devido à introdução de elementos nocivos à
saúde – “infecção é alguma coisa por dentro de que de repente tá infeccionando
S6US1). É uma doença grave - “alguma coisa que está errada” (S4US2), que deve
ser investigada e tratada.
As mulheres sujeitos do estudo, relataram já ter tido infecção (S2US1). É
difícil encontrar uma pessoa que não tenha tido um processo infeccioso; é um
processo que atinge a maioria das pessoas, podendo ocorrer em qualquer parte do
corpo humano.
85
6.14 Incisão Cirúrgica no Parto Normal
O termo corte no parto foi verbalizado por algumas mulheres. A
pesquisadora acrescentou o termo episiotomia por ser o termo técnico do corte no
parto.
Os dois termos foram agrupados em uma única essência, nomeada de
incisão cirúrgica no parto normal.
Surgiram convergências, divergências e idiossincrasias referentes a essa
essência.
6.14.1 Convergências
O corte no parto é um termo utilizado pelas mulheres para se referirem à
episiotomia. Há mulheres que concebem o corte no parto como o corte abdominal
realizado no parto cesariano, “o corte no parto é a cesárea” (S6US1; S9US1).
Acredita-se que esta percepção esteja de acordo com a vivência dessas mulheres,
pois, elas sofreram um corte quando aconteceram seus partos. Sendo cesariana ou
parto normal com episiotomia houve o corte no parto, e é isso que caracteriza a
percepção dessas mulheres.
A episiotomia é um procedimento realizado na maioria dos partos normais,
entretanto, existem mulheres que nunca ouviram falar nessa palavra (S3US4;
S6US2 e S7US4).
86
6.14.2 Divergências
Existem mulheres que acreditam que o corte no parto seja realmente necessário
(S3US3; S4US1; S5US1 e S10US1), entretanto, há outras que crêem ser desnecessário
(S1US1 e S8US1).
Szejer e Stewart (1997) referem que, assim como as mulheres deste estudo, as
sages-femme” preferem evitar a episiotomia e que numerosas episiotomias são inúteis,
entretanto, algumas vezes, são necessárias.
6.14.3 Idiossincrasias
O corte no parto é uma intervenção cirúrgica que visa a facilitar a passagem
do recém-nascido pelo canal vaginal no momento da expulsão. Ele acarreta à
mulher um desconforto pela dor no local e pela incisão – “o corte no parto é a pior
coisa” (S2US1).
Existem mulheres que sentem dor no local da incisão mesmo depois da
cicatrização, principalmente durante o ato sexual – “o corte no parto dói até na
relação” (S2US6).
Segundo Szejer e Stewart (1997), a episiotomia, para muitas mulheres, é
indolor e para outras, muito doloroso, mas, de qualquer modo, é desconfortável
durante alguns dias e, até, por muito tempo.
87
Uma mulher revelou conhecer o significado de episiotomia como o corte no
parto “episiotomia é o corte” (S8US2).
A episiotomia é realizada em caso de risco de laceração do períneo quando
é preciso abreviar a expulsão. Alguns a fazem de forma sistemática nas primíparas
(QUEVAUVILLIERS ; PERLEMUTER, 2001).
Há mulheres que concebem episiotomia como “deve ser para não engravidar
mais” (S9US2); alguns termos podem confundir, já que o desconhecer induz a
imaginar o significado.
6.15 Outros Eventos
A essência chamada outros eventos revela os discursos das mulheres sobre
as expressões cheiro ruim lá embaixo, coceira lá embaixo e prurido vaginal.
Nessa essência emergiram convergências e idiossincrasias.
6.15.1 Convergências
Sentir odor desagradável na região perineal pode indicar uma disfunção
orgânica, “cheiro ruim lá embaixo é porque alguma coisa não está certo” (S3US2).
As mulheres acreditam ser um sintoma de que há infecção em um de seus órgãos
reprodutores -“cheiro ruim lá embaixo pode ser uma infecção” (S2US2; S4US2;
S6US1; S7US1; S8US1; S9US1; S10US2).
88
A coceira lá embaixo já foi vivenciada por algumas mulheres – “já tive várias
vezes coceira lá embaixo” (S2US1 e S7US1).
O prurido vulvar se constitui na queixa mais comum nas clínicas de patologia
vulvar e uma das mais comuns nos ambulatórios de ginecologia (AGUIAR ; RAMOS,
2000).
As mulheres compreendem que ter coceira na região perineal pode ser sintoma
de infecção – “coceira lá embaixo pode ser infecção” (S4US2; S6US1; S7US3 e S9US2),
ou a presença de um fungo – “coceira lá embaixo quer dizer fungo” (S1US1 e S5US2).
Ter a coceira lá embaixo, para as mulheres, pode indicar um distúrbio orgânico (S7US2 e
S10US1), mas pode ocorrer por outros motivos que não seja uma doença, tal como
irritação pelo material da roupa íntima ou falta de higiene.
6.15.2 Idiossincrasias
O cheiro ruim lá embaixo é concebido pelas mulheres como infecção, talvez
porque a “infecção geralmente tem mau cheiro” (S2US2).
O odor desagradável faz com que as mulheres acreditem estar doentes –
“cheiro ruim lá embaixo é algo que não tá bem” (S21US1).
A presença de fungos - “cheiro ruim lá embaixo quer dizer fungo azedo”
(S1US1), na mucosa vaginal pode desencadear processos patológicos que se
manifestam pelo odor desagradável – corrimento esbranquiçado e prurido intenso.
O odor desagradável no períneo, de acordo com as mulheres, pode ser
relatado, também, pelas más condições de higiene – “cheiro ruim lá embaixo pode
89
não ser bem lavada” (S4US3). Há mulheres que não têm o hábito da limpeza
perineal diária, desenvolvendo o mau cheiro. A higiene precária do períneo não é
uma doença, mas um fator que contribui para o surgimento delas.
Almeida (2000, p. 107) relata que na higiene feminina “reside a conservação
da saúde e a profilaxia de muitas doenças. É a base da medicina preventiva”.
A investigação cuidadosa, para descobrir a causa do sintoma de odor fétido,
deve ser feita a partir do momento em que a mulher julgar necessário - “cheiro ruim
lá embaixo é caso de procurar médico” (S3US1).
A sensação de coceira lá embaixo pode significar a presença de vírus,
bactéria, fungo (S4US1), ou seja, um distúrbio da saúde (S7US4). “Coceira lá
embaixo é vírus, bactéria, é mais ou menos são a mesma coisa” (S2US4); é difícil
para as mulheres estabelecerem diferenças entre vírus e bactéria; o importante, para
elas, é que ambas causam processos patológicos.
A coceira pode vir acompanhada de secreção de coloração branca; o local e
a razão de onde provêm é desconhecido pelas mulheres – “já tive várias vezes
coceira lá embaixo, daí me olho, me toco, coço e sai um floco branco que não sei de
onde vem” (S2US2).
“A cândida é causada por fungo que faz parte da flora vaginal, mas prolifera
em determinadas circunstâncias e é transmitida ao parceiro. O sintoma principal é a
coceira
2
” (HIRSCH, 2000, p. 34)
O sintoma de coceira lá embaixo sugere alteração da saúde ginecológica e,
por essa razão, deve ser tratada. O tratamento, geralmente, consiste no uso tópico
de pomadas via vaginal e no seu transcorrer as relações sexuais devem ser evitadas
2
O negrito foi colocado pela pesquisadora para salientar o sintoma sobre o qual se está discutindo.
90
- “a médica me deu pomada e não pude ter relação quando tive coceira lá embaixo”
(S2US3).
Segundo Aguiar e Ramos (2000), há a necessidade de atenção especial
para diagnosticar a causa do prurido vulvar.
Prurido vaginal significa a irritação da mucosa da genitália feminina que leva
a mulher a coçar para tentar aliviar essa irritação -“prurido vaginal é coceira
(S9US3).
Há mulheres que nunca ouviram falar sobre prurido vaginal (S3US2). O
termo prurido pode não ser utilizado por leigos “com essa palavra eu não conheço o
que seja prurido vaginal” (S5US3).
Aguiar e Ramos (2000) dizem que o prurido é um sintoma desagradável, em
que ocorre irritação do nervo sensorial periférico.
O prurido vaginal pode ocorrer devido à contaminação por fungos do gênero
Cândida (S8US2). Essa é uma moléstia que causa intenso prurido vaginal que
desconforta a mulher, pois, vem acompanhado de ardência pós-micção.
6.16 Nomenclatura Desconhecida
Essa essência, denominada nomenclatura desconhecida, reúne todos os
termos desconhecidos pelas mulheres. Os termos que elas relataram conhecer são:
bico do peito, caroço na mama, corrimento, corrimento fedido, coceira lá embaixo,
cheiro ruim lá embaixo e útero.
91
6.16.1 Convergências
Existem termos que as mulheres desconhecem o seu significado: colostro,
toda a volta escura da mama, aréola, mamilo, quando seca o leite, dor na mama
antes de menstruar, leucorréia, dispaneuria, prurido vaginal, as regras, borrinha,
menstruação, útero caído, mioma, verruga no útero, condiloma acuminado,
papilomavírus, vulva, ovários, episiotomia e Trompas de Falópio.
6.16.2 Idiossincrasias
Existem mulheres que dizem desconhecer os termos: seio, peito, teta,
mama, líquido branco que sai do bico do peito, bolinha na mama, nódulo na mama,
cólica menstrual, dor na relação, sangramento na relação, tumor, infecção, vagina e
corte no parto.
6.17 Essências da Questão Final
Da questão finalizadora do instrumento de pesquisa – a Senhora recebeu
alguma informação sobre o aparelho reprodutor feminino?- surgiram quatro essências,
assim denominadas: não-recebimento de informações sobre o aparelho reprodutor
feminino; recebimento de informações sobre o aparelho reprodutor feminino; como
92
poderiam ser oferecidas informações sobre o aparelho reprodutor feminino; local em que
receberam informações sobre o aparelho reprodutor feminino.
6.17.1 Não-Recebimento de Informações sobre o Aparelho Reprodutor Feminino
A maioria das mulheres manifestou que não recebeu nenhuma informação e
não leu sobre o aparelho reprodutor feminino (S2US1; S4US1;S4US2; S5US1; S6US1;
S7US1; S9US1 e S10US1). Uma das mulheres refere não ter cultura, por isso não sabe
sobre esse tema; ela não tem conhecimento sobre o próprio corpo (S2US4 e S2US5).
6.17.2 Recebimento de Informações sobre o Aparelho Reprodutor Feminino
As mulheres sujeitos do estudo comentaram ter recebido informações diversas
vezes e tiveram acesso a mais informações porque tiveram curiosidade. Elas gostam de
estudar sobre esse tema (S1US1; S3US1; S3US3 e S8US1).
93
6.17.3 Como poderiam ser oferecidas Informações sobre o Aparelho Reprodutor
Feminino
As mulheres compreendem que seria proveitoso se elas tivessem à disposição
no PSF alguns textos que pudessem pegar e levar para casa para ler sobre o assunto.
Outra forma de informação seria através de palestras sobre essa temática. Relataram
que alguns médicos não se preocupam em orientar com detalhes por falta de tempo
(S2US6; S5US2 e S8US4).
6.17.4 Local em que receberam Informações sobre o Aparelho Reprodutor Feminino
As mulheres relataram que assistem programas de televisão a respeito de
saúde, lêem jornais para terem informações sobre o assunto (S1US5; S1US6 e S1US7).
Algumas mulheres disseram ter recebido informações na escola, no primeiro e
no segundo grau, entretanto, essas informações foram pouco entendidas por elas
(S1US2; S1US3; S1US4; S1US13; S8US2 e S8US3).
Uma das mulheres disse não ser feminista e que apesar de estar em seu
mundo, na sua casa, procura sempre receber informações sobre o que as mulheres
pensam e passam. Ela lê vários livros, incluindo o dicionário, pois são termos médicos, os
quais estão fora de sua área (S1US8; S1US9; S1US10; S1US11 e S1US12).
Uma mulher mencionou que seu conhecimento se deve pela leitura de livros;
outra, que todas as pessoas falam sobre alguma coisa sobre o aparelho reprodutor
feminino, mas nunca com detalhes, em profundidade. Dizem que seus conhecimentos
94
sobre o assunto se deve às experiências por terem sofrido abortos involuntários, quando
aprenderam algo sobre o seu aparelho reprodutor (S2US2; S2US3; S3US2; S9US2;
S9US3; S9US4 e S9US5).
95
ANALISANDO O FENÔMENO
O ser humano vive em constante interação com o mundo, e é através do corpo
que percebe e interage com ele (MERLEAU-PONTY, 1971).
As mulheres sujeitos do estudo permitiram adentrar nas suas relações com o
seu corpo a partir das experiências vividas com a ressignificação dos órgãos,
inscritas neste estudo.
Cada mulher revelou o seu modo de sentir o seu aparelho reprodutor.
Compreendeu-se que muitas delas utilizaram os recursos de suas crenças e valores
para dar significado a essas distintas partes de seu corpo.
Todas as mulheres passaram pelo evento da gestação, o que proporcionou
a vivência plena do funcionamento de seus órgãos reprodutores, permitindo-lhes
retornar a esses espaços de sua consciência, retratando-os em suas falas. Para
Merleau-Ponty (1991), a fala do sujeito é o seu pensamento, envolvendo uma teoria
de significação que a palavra expressa.
A maternidade é compreendida pelos sujeitos do estudo como um evento
que gratifica e caracteriza o ser mulher. Desde os primórdios dos tempos a mulher é
vista como o ser que gera, armazena e desenvolve outro ser. Birman (2001) discute
a questão da mulher, devido as suas disposições naturais intrínsecas, deixar
evidente que a sua finalidade biológica era a gestação e a maternidade. Esse
pensamento perpetua-se para algumas mulheres até os dias de hoje, pois,
percebeu-se, neste estudo, que a mulher, na maior parte do tempo, se vê e pensa
como mãe.
96
A possibilidade da vivência do prazer, as sensações emitidas pelos órgãos
reprodutores apareceram nos discursos das mulheres.
O ato sexual e a função específica dos órgãos reprodutores femininos na
relação sexual não foram contemplados na entrevista por não ser objeto de estudo,
entretanto, foram mencionados com reserva pelas mulheres. Para essas mulheres, o
significado dos órgãos reprodutores está associado à reprodução e à maternidade.
Esse comportamento é reforçado pelos serviços de saúde que também se
preocupam com os aspectos biológicos da problemática de saúde da mulher, e
como diz Fonseca et al. (1994), centram-se no funcionamento do aparelho
reprodutor feminino.
A cultura familiar, os tabus - exposição do corpo, início da sexualidade,
relação com o sexo oposto, comportamento feminino, maternidade, amamentação e
estética interferem na maneira de ver e viver o aparelho reprodutor dessas mulheres.
Outro aspecto emergido dos discursos das mulheres foi o apreço pelas
mamas, conferindo-lhes um poder caracterizador do ser mulher. As mamas não são
sentidas simplesmente como glândulas capazes de produzir o leite (ALMEIDA et al.,
2004). Para as mulheres, essas duas saliências indicam a feminilidade e a
maternidade; é o que as diferenciam dos homens lhes conferindo uma estética que
lhes proporciona harmonia e funcionalidade.
Um dos cuidados com a saúde dos órgãos reprodutores abordados foi a
importância do auto-exame de mama, meio para investigar a presença de
crescimento celular anormal na glândula mamária. O auto-exame da mama vem
sendo amplamente defendido pelos profissionais da área da saúde por ser uma
técnica que permite à mulher conhecer e tocar seu corpo e, principalmente,
descobrir alterações que a faça procurar auxílio médico para exame e diagnóstico.
97
Existe a semelhança entre a mama da mulher e a mama de outras fêmeas
do reino animal. O termo”teta” não é apreciado pelas mulheres, mas observado e
sentido. Esta comparação, devido à natureza do animal e do humano, muitas vezes
não é compreendida e aceita.
Os líquidos excretados pelos órgãos reprodutores feminino são percebidos
como vilões e como heróis, dependendo do momento em que são excretados. O
leite, o colostro e a menstruação são compreendidos como fluidos normais,
indicadores de saúde e responsáveis pela caracterização da mulher. O sangue
menstrual é o indicador da fertilidade (LEAL, 1995), o leite representa o poder
materno. Entretanto, a excreção de líquidos fora do período menstrual e da
amamentação são considerados indicadores de alterações, de doenças. A liberação
de um fluido anormal amedronta a mulher, é um alerta que chama a atenção para
seu corpo.
As mulheres também falaram sobre o estímulo doloroso oriundo do aparelho
reprodutor. No período menstrual, ele é sentido como normal e não provoca
preocupações (SHINOHARA et al., 1994). Já, sentir dor em outros momentos faz a
mulher investigar a causa, procurar auxílio médico pelo medo e preocupação de
estar doente.
As mulheres mostraram compreender que há uma íntima relação de seus
comportamentos, suas manifestações corporais com a descarga hormonal. Os níveis
de progesterona e estrógeno fazem com apresentem determinados comportamentos
e sensações. No período menstrual, por exemplo, a descarga hormonal ocasiona
irritabilidade, mudanças no humor, manifestações corporais como o aumento da
sensibilidade. Já, no período ovulatório, a mulher se torna mais dócil, e encantadora.
98
O climatério é definido como o período de vida da mulher que vai até o fim
da fase reprodutiva (LIMA ; ANGELO, 2001). Nahoum e Simões (1989) afirmam que
podem surgir sintomas como fogachos, náuseas, angústias, depressão, irritação,
palpitações, cansaço, desejo sexual diminuído ou exacerbado. Esses sintomas não
foram mencionados por todas as mulheres, mas variam consideravelmente com a
formação, concepção e conhecimento prévio da mulher sobre o climatério e
possíveis alterações fisiológicas no aparelho reprodutor feminino.
A higiene feminina emergiu quando as mulheres mencionaram odor
desagradável. É um assunto que merece destaque pela sua importância, pois, nele
reside a profilaxia de muitas doenças do aparelho reprodutor (ALMEIDA, 2000).
Existe um cheiro natural da pele e dos pêlos que não deve ser confundido com a
falta de limpeza. Não se defende que a mulher tenha que apresentar odor agradável,
até porque se concorda com a psicóloga Liekens que a mulher deve sentir-se bem
como o seu odor natural (MORAES, 2004). Ressalta-se, porém, a importância da
higiene diária para a saúde do aparelho reprodutor da mulher.
As doenças sexualmente transmissíveis geram desconforto e preconceitos.
Normalmente, há um senso comum latente na sociedade de que essas doenças
advém da promiscuidade, significando relacionamento sexual não-monogâmico, com
muitos parceiros diferentes (DOENÇA..., 2001, p. 1070). Por isso, é um assunto
vergonhoso e muitas vezes não verbalizado pelas mulheres.
Surgiram associações e analogias entre as partes do aparelho reprodutor
feminino com objetos utilizados no cotidiano dessas mulheres, o que torna evidente
que o vivido dá significado ao fenômeno.
Esses foram alguns dos aspectos referentes ao aparelho reprodutor feminino
que fez com que se compreendesse que as concepções que essas mulheres têm
99
acerca de seu aparelho reprodutor revelam um modo de ver os órgãos reprodutores
que difere do modelo biomédico. Por exemplo, acreditam que a episiotomia seja um
método anticonceptivo, ainda que algumas o desconheçam. Demonstram outro
modo de ver o procedimento, cujo significado que essas mulheres lhe conferem é
desconhecido pelos profissionais de saúde.
Essas concepções devem ser conhecidas e compreendidas pelas
enfermeiras que prestarão cuidados a essas mulheres. É possível compreender e
tentar superar o conjunto de problemas da esfera psicossocial que, sem dúvida, são
desapercebidos quando se privilegia unicamente o biológico (FONSECA et al.,1994).
O desconhecimento dos termos biomédicos do aparelho reprodutor feminino
marcou o estudo, pois, as mulheres mostraram não conhecer ou não saber explicar
o significado, a função e a existência de alguns órgãos do aparelho reprodutor
feminino, conforme expressos no conhecimento científico. Ouvir e aceitar o
conhecimento e o desconhecimento dessas mulheres é primordial para se
estabelecer um cuidado congruente. Deve-se levar em conta que cada mulher tem
um modo de perceber e interagir com o mundo. A mulher é um ser humano com
uma história de vida que deve ser considerada no consultório, pois, se isso ocorrer,
o profissional estará cuidando e valorizando seu conhecimento. O enfermeiro e a
mulher devem trocar conhecimentos durante a consulta de enfermagem para que os
significados sejam compreendidos e utilizados na prática. Nada que é imposto sem a
compreensão do que é dito é aceito e realizado; e é isso que o profissional deve ter
em mente quando orienta um paciente. Por isso, é importante ouvir as concepções
dos pacientes.
Cada mulher, ao falar sobre os termos referentes ao seu aparelho reprodutor
reviveu, relembrou sua experiência de vida e lhe propiciou ressignificar alguns dos
100
termos. Evidenciou-se que alguns termos não eram conhecidos pelas mulheres,
entretanto, elas tinham um modo peculiar para se reportar a tal órgão ou situação
referente ao seu aparelho reprodutor. Isso deixa claro que não existe o
desconhecimento do corpo. Cada ser o conhece a seu modo, de acordo como o
sentiu e percebeu durante sua trajetória de vida.
As mulheres revelaram que receberam pouca informação sobre o assunto, e
que o que sabem acerca de seu aparelho reprodutor se deve à sua experiência de
vida, afirmando a filosofia de Merleau-Ponty (1971) ao declarar que é no cotidiano
dos acontecimentos do dia-a-dia que o corpo se conecta com o mundo,
caracterizando a existência do homem.
Foi gratificante e enriquecedor conhecer os diversos modos utilizados pelas
mulheres para se reportar aos órgãos de seu aparelho reprodutor. Isso reafirmou a idéia
de Merleau-Ponty (2000) de que cada palavra tem um sentido, de que as palavras não
são fichas de jogo, com valor impresso e inalterável. Ela própria, a palavra, tem um viver
que é carregada de significações e sentimentos. Merleau-Ponty (1991) revela que, do
ponto de vista fenomenológico, o sujeito falante utiliza seu idioma como meio de
comunicação com uma comunidade viva, o idioma reencontra a sua unidade.
As modificações corporais ocorridas pela gestação, pelas correções
patológicas e pelo passar do tempo fazem com que a mulher modifique a percepção
de seu ser. Ela adquire um novo olhar a partir da vivência de seu corpo, cada
experiência lhe possibilita sentir algo novo que a faz ter percepções diferentes que
compõem o seu ser. O corpo é, diz Merleau-Ponty (1971), uma obra de arte, pois,
cada um o sente e o vê de um modo e estilo diferentes, de acordo com sua
experiência vivida.
101
Merleau-Ponty (1971, p. 161) menciona que o ser humano vê por um olho
interior, percebendo o seu corpo de uma maneira própria, visto que “somos nós
mesmos aquele que mantém juntos estes braços e estas pernas, aquele que ao
mesmo tempo os vê e os toca”.
102
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108
APÊNDICE A- ENTREVISTA
O SIGNIFICADO DA TERMINOLOGIA EXPRESSA POR MULHERES SOBRE
SEUS ÓRGÃOS REPRODUTORES DURANTE A CONSULTA DE ENFERMAGEM
GINECOLÓGICA
Meu nome é Celina, sou aluna do curso de mestrado da Escola de
Enfermagem da UFRGS e estou realizando um estudo com mulheres que
freqüentam o PSF Jenor Jarros para conhecer e compreender o significado das
palavras que você usa durante a consulta de enfermagem ginecológica.
O que a você conhece sobre os seus órgãos reprodutores?
Você sabe me dizer o que é:
¾ O seio /o peito/a teta/a mama
¾ O líquido branco do bico do seio/ o colostro
¾ A toda a volta escura da mama/a aréola
¾ O bico do peito/o mamilo
¾ Quando seca o leite
¾ O caroço na mama /bolinha na mama/o nódulo na mama
Nome:
Idade: Grau de instrução: Nº Registro:
Número de Filhos vivos:
109
¾ A dor na mama antes de menstruar
¾ A cólica menstrual
¾ O corrimento/corrimento fedido/a leucorréia
¾ A dor na relação/dispaneuria
¾ O sangramento na relação
¾ A coceira lá embaixo/o prurido vaginal
¾ O cheiro ruim lá embaixo
¾ As regras/a borrinha/ a menstruação
¾ O útero caído
¾ O mioma/tumor
¾ a verruga no útero/o condiloma acuminado/papilomavírus
¾ A infecção
¾ A vagina/vulva
¾ O útero/ovários
¾ O corte no parto/a episiotomia
¾ Trompas de Falópio
Você recebeu alguma informação sobre o aparelho reprodutor feminino?
110
APÊNDICE B – TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM
TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO
Eu ___________________________________ estou ciente de que esta
entrevista servirá para a coleta de dados da pesquisa sobre as concepções das mulheres
sobre seu aparelho reprodutor. Autoria de Celina Escopelli Deves, sob a orientação da
prof. Dra. Dulce Maria Nunes, que tem como propósito conhecer e compreender as
concepções das mulheres sobre os órgãos reprodutores femininos a partir da significação
da terminologia usada pelas mulheres durante a consulta de enfermagem ginecológica.
Fui informada de que a minha declaração estará em sigilo, sendo somente usada como
informação para pesquisas, que a preservação da identidade será respeitada, e que
poderei desistir de participar da pesquisa no momento que desejar, sem que esta decisão
influencie na assistência que venho recebendo.
Porto Alegre, _______ de ____________________200 __.
_____________________________________
Assinatura da pesquisadora
_________________________________
Assinatura do entrevistado
OBS: Consentimento elaborado seguindo as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa em
Seres Humanos (Resolução CNS 196/96).
Telefone para contato e maiores informações Celina Deves: 33452266 ou Dulce Nunes:30263010
111
ANEXO – APROVAÇÃO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA
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