algodão doce, com a minha sombra. Hoje estou aqui. E, amanhã?
Alguém sabe do amanhã? De que adianta rezar? Posso estar aqui ou
não estar. Veneza, Nice, Sorrento, Gênova, já me viram passar.
Quantas mais virão? E, por tanto amar o jeito viandante de ser, a
reunião de pés e olhos, querer repeti-lo eternamente... Compor-me
com o fluxo do subir e descer das girafas, dos elefantes, dos cavalos,
das cores das roupas, dos chapéus, dos cabelos, dos sapatos, dos
bancos, das árvores, das nuvens, do som da orquestra da Sala de
Música, misturado à luz dos candelabros... Dos eixos sair, perder o
rumo. Embaralhar-me. E, fora do prumo, azular. Imperceptível, sou
como todo o mundo, sou com o mundo, sou com a praça. Imiscuído na
paisagem. Visito outras terras, subo montanhas, sem me deslocar. Vou
muito longe, sem sair do lugar. No intervalo de mais uma volta, tudo
passa e, aparentemente, nada muda. As girafas, os elefantes, os
cavalos seguem as suas trajetórias. Assim como o pipoqueiro e as
crianças que aguardam, impacientes, a sua vez de andar. Perambulo
entre a terra e o céu, novamente. Mais uma vez. Derradeira volta na
qual tudo o que é ruim não retorna. A vista fraca, a dor de cabeça, a
náusea. Um gosto pela zona vertiginosa. Região incerta, veloz.
Desestabilizadora. Nem aqui, nem lá. Nem antes, ou depois.
Passagem eterna. Uma simpatia pelo meio. Onde não há mais nada a
reconhecer, só a encontrar. Nem professor, nem filólogo, nem
filósofo, nem poeta. Possibilidades de vida, novos modos de ser, de
pensar. Um outro e desconhecido eu, fora de mim, mescla de humano
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