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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“Júlio de Mesquita Filho”
Instituto de Geociências e Ciências Exatas
Campus de Rio Claro
A
S NOVAS CONFIGURAÇÕES DO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO
O CASO DA REDE VAREJISTA NORTE-AMERICANA
WAL-MART
Pedro Henrique Ferreira Costa
Orientadora: Prof. Dr.Paulo Roberto Teixeira de Godoy
Dissertação de Mestrado elaborada junto ao
Programa de Pós-graduação em Geografia
Área de Concentração em Organização do
Espaço, para a obtenção do Título de Mestre
em Geografia
.
RIO CLARO (SP)
2007
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COMISSÃO EXAMINADORA
_________________________________
_________________________________
_________________________________
_________________________________
Pedro Henrique Ferreira Costa
Rio Claro, ___ de _____________de 2007
Resultado: ________________________________________________
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que diretamente e indiretamente contribuíram para a realização deste
trabalho; em especial: ao meu orientador Prof. Dr. Paulo Roberto Teixeira de Godoy
pelo estímulo e dedicação na orientação deste trabalho; aos meus familiares, pelo o apoio,
companhia e compreensão; aos colegas da pós, pelo incentivo na pesquisa; aos amigos
mais próximos que de alguma maneira nunca me deixaram na realização deste trabalho;
Sinceros agradecimentos aos funcionários da Secretaria da Pós-Graduação, da Biblioteca e
da Manutenção;
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo apoio
financeiro e pelo crédito conferido ao projeto de pesquisa.
Dedicatória
:
A minha vó, Dona Maria José;
Aos meus pais, Denise Maria e Antônio César;
e a Tamie Hammermeister Nezu
SUMÁRIO
ÍNDICE...........................................................................................................................
i
INDICE
DE
TABELA.................................................................................................... iii
ÍNDICE
DE
GRÁFICOS................................................................................................ iii
ÍNDICE
DE
MAPAS...................................................................................................... iii
ÍNDICE DE FIGURAS.................................................................................................. iii
ÍNDICE
DE
QUADROS................................................................................................ iv
RESUMO....................................................................................................................... v
ABSTRACT.................................................................................................................... vi
INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 01
I A PEQUENA HISTÓRIA DE UM PERSONAGEM EGOCÊNTRICO: O
CAPITALISMO..............................................................................................................
05
II - O CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO.............................................................. 34
III - EXAMINANDO O WAL-MART : NA BUSCA DA CULTURA
CAPITALISTA. .............................................................................................................
61
IV O INCRIMENTO DO COMÉRCIO VAREJISTA: O SETOR NO
BRASIL...........................................................................................................................
86
V – CONSIDERAÇÕES FINAIS. ................................................................................ 105
VI – REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS....................................................................
108
i
Í
NDICE
I
NTRODUÇÃO
......................................................................................................................
1.1
E
NSAIOS
M
ETODOLÓGICOS
....................................................................................
01
02
I – A
PEQUENA HISTÓRIA DE UM PERSONAGEM EGOCÊNTRICO
:
O CAPITALISMO
........... 05
1.1
I
NTRODUÇÃO
......................................................................................................................
05
1.2
A
S FASES DO CAPITALISMO PARA A GÊNESE DO CONTEMPORÂNEO
..................................
06
1.3
O
REGIME BRITÂNICO NA ECONOMIA MUNDIAL
................................................................
1.4
O
CURSO HISTÓRICO DOS
EUA:
O DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO
NORTE
-
AMERICANO
.
...................................................................................................................
1.5
P
ERÍODO ENTRE
-
GUERRAS
.................................................................................................
1.6
O CENÁRIO GEOPOLÍTICO DO
P
ÓS
-G
UERRA
........................................................................
17
19
23
26
II
O
CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO
............................................................................ 34
2.1
I
NTRODUÇÃO
.....................................................................................................................
34
2.2
C
APITALISMO CONTEMPORÂNEO E AS MUDANÇAS NO MUNDO DO CONSUMO
..................
35
2.3
A
HISTORICIDADE DAS FORMAS COMERCIAIS
....................................................................
2.4
O
ESPAÇO URBANO E SEUS EQUIPAMENTOS
:
O LUGAR DO POSSÍVEL
.................................
2.5
A
CONFIGURAÇAO DOS TERRITÓRIOS E A TERRITORIALIDADE
..........................................
2.6
A
S
OCIEDADE DO
C
ONSUMO
:
SOB A LÓGICA SOCIAL CAPITALISTA
...................................
40
49
52
56
III
-
E
XAMINANDO O
W
AL
-M
ART
:
NA BUSCA DA CULTURA CAPITALISTA
............
............
61
3.1
I
NTRODUÇÃO
......................................................................................................................
61
3.2
U
MA BREVE DISCUSSÃO SOBRE
M
ULTINACIONAL
W
AL
-M
ART
......................................
62
3.3
A
H
ISTÓRIA DO
W
AL
-M
ART NOS
EUA..............................................................................
3.4
O
PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO DO
W
AL
-M
ART
..............................................................
3.5
A
S LOJAS DO GRUPO
W
AL
-M
ART
......................................................................................
67
74
81
IV
O
INCRIMENTO DO COMÉRCIO VAREJISTA
:
O SETOR NO
B
RASIL
.............................
86
4.1
I
NTRODUÇÃO
.....................................................................................................................
86
4.2
P
ERSPECTIVA HISTÓRICA DOS SUPERMERCADOS NO
B
RASIL
............................................
87
ii
4.3
O
COMPORTAMENTO DO SETOR SUPERMERCADISTA NO
B
RASIL
.......................................
4.4
A
S ESTRATÉGIAS EM SUPERMERCADOS
.............................................................................
4.4.1
M
ACROESTRATÉGIA
...................................................................................................
4.4.2
–M
ICROESTRATÉGIA
.....................................................................................................
89
93
96
101
C
ONSIDERAÇÕES
F
INAIS.............................................................................................................
105
R
EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................................
108
.
iii
INDICE
DE
TABELA
Tabela 1 – A mudança de perfil nos setores econômicos..................................................
62
Tabela 2 – Faturamento das empresas líderes do mundo...................................................
64
Tabela 3 – Distribuição da rede varejista Wal-Mart nos EUA por década....................... 72
Tabela 4 – A expansão do Wal-Mart nos EUA................................................................. 73
Tabela 5 – A globalização do Wal-Mart............................................................................ 75
Tabela 6 – Expansão do Wal-Mart no México no período de 10 anos............................. 76
Tabela 7 – Lojas Wal-Mart por Região e Estados brasileiros...........................................
Tabela 8 Participação percentual das empresas de supermercados brasileiros entre as
300 maiores (1998 – 2006)................................................................................................
83
91
ÍNDICE
DE
GRÁFICOS
Gráfico 1Faturamento da rede varejista Wal-Mart por ano fiscal..................................
79
Gráfico 2
Comportamento do faturamento das 5 principais empresas do setor
supermercadista..................................................................................................................
92
Gráfico 3 – Evolução do número de lojas das 5 principais empresas em 2007................. 92
ÍNDICE
DE
MAPAS
Mapa 1 – Distribuição Espacial das lojas Wal-Mart divididas por formato......................
Mapa 2 – Localização das lojas Wal-Mart na cidade de São Paulo...................................
84
97
ÍNDICE
DE
FIGURAS
Figura 1 – Fases do Capitalismo........................................................................................
Figura 2 – Tipos de lojas segundo a área de venda e variedade de produtos.....................
Figura 3 – Localização das lojas Wal-Mart nos EUA (1962 – 2006)................................
Figura 4 – A distribuição das lojas da rede Wal-Mart no mundo......................................
Figura 5 – Formatos e bandeiras das lojas Wal-Mart........................................................
Figura 6 – Faturamento do setor supermercadista no Brasil ............................................
09
47
72
80
82
90
iv
ÍNDICE
DE
QUADROS
Quadro 1 Histórias distintas: EUA e EUROPA no início da colonização do Novo
Mundo................................................................................................................................
Quadro 2 Características e classificação de superfícies comerciais do varejo
supermercadista..................................................................................................................
Quadro 3 – Número de filiais de empresas multinacionais................................................
Quadro 4 – Características que marcaram a renovação no setor supermercadista............
Quadro 5 Concentração das principais empresas do setor supermercadista em
algumas capitais.................................................................................................................
Quadro 6 – Processo de fusão e aquisição (1998-2006)....................................................
20
46
64
89
98
99
v
RESUMO
Esta dissertação tem como finalidade compreender as metamorfoses que marcaram o
capitalismo contemporâneo. Para isso, toma como referência um diagnóstico histórico do
capitalismo com o propósito de perceber a complexidade do modo de produção vigente no
mundo. Enfatiza-se, então, sob uma concepção histórica e geográfica, os elementos que
colaboram para aumentar a diferenciação do indivíduo no mundo. Toma-se, portanto, a
rede varejista norte-americana Wal-Mart como exemplo de empresa capitalista do século
XXI.
Palavras-chave: capitalismo, Wal-Mart, produção de subjetividade, estratégias.
vi
ABSTRACT
This dissertation has as finality the understanding of the metamorphosis of which had
marked the contemporary capitalism. For this propose, it takes as reference the historical
diagnosis of the capitalism to perceive its effectiveness production mode and complexity in
the world. The elements, which colaborate to improve the subject
differentiation
, are
emphasized by such conceptions. Therefore, as a 21st century example, the north-american
retailer capitalistic company Wal-Mart has been taken.
Key-word: capitalism, Wal-Mart, Subjectivity's production, strategy.
S
OU
,
POR CERTO
,
UM SER HUMANO
,
E PARTILHO PLENA RESPONSABILIDADE
COM TODOS OS DEMAIS EM MINHA POSIÇÃO
,
QUANTO AO QUE O
CAPITALISMO REPRODUZ NO MUNDO
.
P
ORTANTO
,
GOSTARIA ANTES DE
APRESENTAR AS PARTES DESTA DISSERTAÇÃO
,
DIVIDIR COM O LEITOR
,
QUE
PREPAREI O TEXTO
,
RECONHECENDO OS EFEITOS DANOSOS DO CONSUMO
.
E
STOU BEM CIENTE DE QUE OS PROCESSOS PRODUTIVOS DO CAPITAL
AGENCIAM O MEU CORPO
,
NO MEU MAIS ÍNTIMO MOMENTO
,
E ME FAZ
DESPRENDER DE DESEJO
.
A
ESCOLHA DA COMPANHIA
W
AL
-M
ART FOI UMA
CURIOSIDADE
,
APÓS LEITURA DO ARTIGO
“L
EARNING TO
L
OVE
W
AL
-
M
ART
DA REVISTA NORTE
-
AMERICANA
“T
HE
E
CONOMIST
”.
D
ESSE MODO
,
SOB OS OLHARES ATENTOS E INVESTIGATIVOS PERCEBI QUE ESTA EMPRESA
REALMENTE UTILIZAVA DE UM ARSENAL PODEROSO
,
PORÉM SUSPEITO
,
DE
LÓGICAS CAPITALISTA PARA CONQUISTAREM SUA QUOTA DE MERCADO E
PROVOCAREM UM AMOR SEMÂNTICO AOS CONSUMIDORES
.
Inspirado em Immanuel Wallerstein, sociólogo americano, ao afirmar a sua preocupação com a posição dos
Estados Unidos da América frente ao mundo.
1
1
I
NTRODUÇÃO
No intuito de compreender as questões pelas quais se estruturam a natureza do
contemporâneo é necessário considerar que este, enquanto expressão de tempo, aplica-se a
toda uma época, a qual acusa mudanças socioculturais, econômicas e políticas. Este
pressuposto, em que o momento presente se organiza, no tempo e no espaço, sob constantes
mutações, acompanharam as preocupações descritas nesta dissertação. No entanto, ao destacar
certas minúcias arquitetada no período em que se fala, levou-se em consideração os processos
históricos.
A despeito de qualquer crítica que se venha a sustentar deve-se estar ciente de que as
reflexões que versam sobre as questões que serão apresentadas não se esgotam com a
publicação deste documento.
A intenção central do trabalho é o de investigar as transformações do capitalismo
contemporâneo. Para isso, delineou-se algumas considerações gerais, sob uma concepção
histórica e geográfica, a respeito da rede varejista norte-americana Wal-Mart, como
ferramenta para a análise do tema em curso.
Como objetivos do trabalho, podem ser expostos quatro pontos orientadores: (i)
entender o momento histórico que experienciamos, e destacar as diferentes fases da
reestruturação capitalista e sua complexidade temporal e espacial; (ii) examinar as
transformações sócio-espaciais que decorreram para a construção do capitalismo
contemporâneo, de modo a perceber os elementos que colaboraram para aumentar a
diferenciação (estranhamento e alienação), vividos pelos indivíduos nos seus empenhos para
se afirmarem no mundo; (iii) tecer uma avaliação da rede varejista norte americana Wal-Mart,
sob uma perspectiva global, bem como entender a prática que a garante como índice do
capitalismo contemporâneo; (iv) destacar as estratégias que a rede varejista Wal-Mart impõe
no território brasileiro para estreitar laços com os consumidores e diminuir os espaços das
demais concorrentes.
Estes objetivos apresentados acima foram desmembrados do propósito central do
trabalho; ainda, que se pense num ponto comum entre os capítulos desta dissertação, percebe-
se que o trabalho pode ser dividido em duas partes: a primeira de natureza histórico-
geográfica e a segunda de natureza empírica o caso da rede varejista norte-americana Wal-
Mart. Dessa maneira, entende-se que o trabalho apresenta, como justificativa: (1
o
) recuperar a
2
importância do debate, na Geografia, de autores que trabalham a História do capitalismo e que
de alguma forma contribuem para sustentar as concepções científicas e ideológicas do
presente; (2
o
) dar visibilidade da influência política, econômica e social assistida pelas
estratégias da rede varejista Wal-Mart no mundo, que se manifesta segundo lógicas de
reprodução capitalista. Acredita-se que refletir essas questões, destacável da natureza do
contemporâneo, a qual, com algum cuidado explicativo prévio, pode contribuir para suscitar
interpretações sobre o momento presente.
Quanto as Hipóteses que devem ser refletidas ao longo do trabalho, considere-se as
seguintes: (A) a sucessão das fases da história do capitalismo sugerem as novas configurações
no mundo, (B) a rede varejista Wal-Mart apresenta um discurso coerente com os alicerces do
capitalismo contemporâneo.
A dissertação estrutura-se em quatro capítulos, que confluem para as considerações
finais.
O primeiro capítulo discute os estágios e as contradições do modo de produção
capitalista tendo assim a perspectiva histórica e geográfica como norteadora. A periodização
proposta, neste capítulo, acompanhou critérios facultativos tomados da dimensão histórica do
capitalismo e que caracterizam processos fundamentais para pensar a rede varejista norte-
americana Wal-Mart. O segundo capítulo apresenta um debate sobre o atual estágio do
capitalismo e os elementos que contribuem para esvaziar de sentido as relações humanas e
anestesiar os indivíduos frente a violência real da ordem social. O terceiro capítulo é dedicado
a gênese da rede varejista Wal-Mart e as atuações no mercado global. O quarto capítulo expõe
as perversidades da rede varejista norte americana que ao se apropriar de alguns componentes
do capitalismo contemporâneo levam ao domínio do setor supermercadista no território
brasileiro.
1.1
E
NSAIOS
M
ETODOLÓGICOS
A pesquisa, sendo de natureza teórica, foi baseada no resultado da confluência entre a
Filosofia e a Geografia Crítica, “uma geografia militante, que luta por uma sociedade mais
justa”. (MORAES, 2005, p. 119).
Para conduzir esse encontro tratou-se de pensar a Filosofia não como uma ciência e
sim como uma reflexão crítica sobre os procedimentos e conceitos científicos; sobre as
origens e formas de crenças; sobre o conteúdo e as significações das obras; sobre o princípio,
3
a natureza e as formas de poder; sobre os acontecimentos ocorridos na Historia; sobre a
compreensão da realidade (CHAUÍ, 1997).
Em segundo lugar dedicou-se a priorizar a Geografia como uma ciência do presente,
sob o reflexo do passado, logo, uma construção inacabada de caráter histórico, que leva em
consideração as mutações do mundo e luta por uma sociedade mais justa. Por isso, a
Geografia deve pensar, (re)pensar e (des)pensar as categorias que a instrumentaliza na
produção do conhecimento e incorpora novos conceitos para compreender o espaço
geográfico. Este, visto como produto e, ao mesmo tempo, condição das manifestações de
conflito e contradição da reprodução social (LEFEBVRE, 1974; GODOY, 2004).
Nesta ocasião, a Filosofia participa do papel de tradutor, e viabiliza, junto ao aporte de
outras áreas do conhecimento, uma discussão mais apurada do fenômeno analisado. Este
interprete da realidade contribui para o aprofundamento do que se quer discutir, e por isso
ilumina os caminhos do campo da investigação científica. O filósofo opera na unificação e
intermediação de todo o conhecimento. Desta maneira, a Filosofia se inclui como pano de
fundo de todos os estudos.
Se a filosofia é mais do que a simples expressão conceitual das diferentes
visões do mundo, se, além de seu caráter ideológico, traz também certas
verdades fundamentais concernentes às relações do homem com outros
homens e dos homens com seu universo, então essas verdades devem
encontrar-se na própria base das ciências humanas e notadamente de seus
métodos. (GOLDMAN, 1978, p.15, grifo do autor)
Para dar conta disso, a Geografia, no encontro com a Filosofia, refina o “olhar sobre a
sociedade” e ganha formas mais profundas de direcionar as críticas e as construções do
pensamento geográfico sobre o seu objeto. Desta maneira produz e renova categorias
analíticas para explicar o presente ou a realidade do fenômeno pretendido.
O encontro com a Filosofia passou a permitir que o debate entre as
correntes filosóficas ganhasse lugar na produção acadêmica da
Geografia e, com ela, nascessem a crítica e a necessária e contínua
construção da história do pensamento geográfico. Como conseqüência
dessa verdadeira rebelião da base que os produziam a ciência
geográfica, estruturou-se a corrente de pensamento que tem na
4
dialética sua raiz filosófica. Esse movimento, identificado como
ideário marxista, trouxe o diálogo com a Filosofia para a produção do
conhecimento em Geografia. (OLIVEIRA, 2004, p. 10)
A geografia Crítica ou Radical, oriunda entre as décadas de 70 e 80, é considerada
uma fase de ruptura com o pensamento anterior (seja a Geografia Tradicional ou a
Pragmática). Esta é considerada como uma escola articulada ao pensamento dialético
materialista (HAESBART, 2002), que permitiu no processo de elaboração do conhecimento
geográfico a entrada de pressupostos filosóficos calcados no discurso crítico e no pensamento
marxista.
A geografia crítica contribui como um instrumento de uso político na libertação do
homem frente à realidade, frente ao mundo capitalista. Neste ponto de vista, a ciência
geográfica rompe com o isolamento do geógrafo, na academia, e adere a importantes
colaborações de cientistas de outras áreas do conhecimento, admitindo a diversidade que
“estimula o debate, gera polêmicas e faz avançar as colocações”. (MORAES, 2005, p.131).
Neste sentido, procurou-se nesta dissertação
1
aproximar as reflexões do texto ao
modo de pensar dos geógrafos críticos.
1
Vale dizer que as dificuldades encontradas foram: (i) a política interna de comunicação da empresa, a qual
restringe a divulgação de qualquer informação considerada estratégica; (ii) o número restrito de bibliografias a
respeito da rede varejista norte-americana Wal-Mart; (iii) a ausência de dados referentes ao ano 2000. Desse
modo, para o presente trabalho foram utilizados formações discursivas das textualizações de periódicos [Os
jornais consultados foram Gazeta Mercantil, no período de 1998-2004, totalizando 109 reportagens; Valor
Econômico, no segundo semestre de 2005, totalizando 131 reportagens; Estado de São Paulo e Folha de São
Paulo, ao longo do ano de 2005, totalizando 26 reportagens; The Wall Street Journal, dezembro de 2005,
totalizando 8 reportagens; e a edição do Le Monde Diplomatique de janeiro de 2006, que apresentou um dossiê
sobre a rede varejista norte-americana Wal-Mart.], de relatórios da empresa [O relatórios da empresa varejista
Wal-Mart que estão disponíveis no site:
www.walmartstores.com , vários acessos nos anos de 2005 e 2006, que
compreendem os Annual Reports de 1972-2006.], de bibliografias relacionadas ao assunto, e livros de diversas
áreas do conhecimento que podem ser facilmente percebidos na leitura da dissertação.
5
C
C
A
A
P
P
I
I
T
T
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L
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O
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1
1
-
-
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P
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I
I
T
T
A
A
L
L
I
I
S
S
M
M
O
O
-
-
1.1
-
I
NTRODUÇÃO
Este capítulo apresenta um histórico do capitalismo, as fases e as contradições deste
modo de produção. O objetivo do capítulo é entender o momento histórico que vivenciamos, a
partir das diferentes etapas de reestruturação capitalista, desde o século XV, e da
complexidade dos acontecimentos pretéritos. É preciso reconhecer não a historicidade das
formas assumidas por tal processo, como a articulação de diversos fatores necessários a sua
reprodução ou ainda as configurações políticas e econômicas que ora representaram
obstáculos ao seu crescimento, que ora constituíram um campo para seu penhor.
Um sistema como o capitalismo poderá ser mencionado de forma abstrata e banal.
Poderá apresentar ao leitor como descrevendo um momento ou um fato ou um único
aspecto que caracterizou diversos períodos. Porém, esta forma simples de analisar a História,
não produz e nem arranca do leitor uma reflexão crítica do tamanho e da força que essa
palavra ou expressão agrega.
É fato que, e assumimos este risco, tal levantamento das origens e de toda trajetória
deste sistema poderá enveredar para uma busca que caminha por um universo sem fim, que
correrá o perigo de cair em superficialidade. No entanto, apresentaremos algumas passagens
históricas da evolução deste sistema, a fim de chegar o mais próximo possível da concepção
do que é hoje o capitalismo contemporâneo. Assim, apresentar um conjunto de idéias capaz
de forjar um sistema geral de valores para a sociedade, no caso o capitalismo. Para isto optou-
se por debater essas questões ao longo de uma periodização.
O problema da periodização esbarra na dificuldade de definir um padrão único ou
consensual. Entretanto, a escolha dos períodos deriva de critérios facultativos. Segundo
Santos (1985, p. 23) Braudel nos informa que as periodizações históricas são um passo
tomado da realidade exterior e obedecem aos objetivos do investigador”. No caso em pauta, o
objetivo é apresentar as contribuições de cada “recorte” histórico do processo de acumulação
6
mundial de capital e detalhar momentos que atribuem um peso analítico bem marcante à
situação econômica, política e social que os EUA desfrutam.
A ferramenta fundamental para este trabalho são as contribuições de outras ciências
para construir as relações epistemológicas que suscitaram a construção das considerações
finais. A partir desse referencial, algumas questões vêm à tona: na trajetória do capitalismo,
quais são os elementos de “longa duração” ?, como diria Braudel. Como o progresso técnico e
científico pode ocasionar tamanho aprofundamento no campo das relações de dependência
entre as nações? Que fatores determinantes ajudaram o modo de produção capitalista nas
superações das crises? No decorrer da história do capitalismo, quais eram os valores
cultivados na sociedade que se transformaram ao entrar em contato com o novo instrumental
apresentado pelo sistema capitalista?
Em suma, o que se lerá a seguir é o resultado de nossa tentativa de compreender a
longa marcha que o capitalismo percorreu. Evidentemente, não é o nosso objetivo, e nem
temos a intenção de responder e esgotar todos os pontos a respeito do modo de produção
capitalista. Far-se-á apenas o levantamento de alguns pontos que contribuíram para uma
mudança na geografia das conjunturas econômica, política e social, a fim de uma leitura mais
abrangente do presente momento, o qual, com mais detalhes, no capítulo 2, abordaremos
como contemporâneo.
Nesse sentido, a expressão "contemporâneo", aplicar-se-á em relação a toda uma
época, a qual acusa mudanças socioculturais, econômica e política. E, no entanto, deram
forma às maneiras com as quais a sociedade convive no espaço de uma geração (NUNES,
1991). Desta forma, o capitalismo contemporâneo, para os fins deste estudo remete-nos à
segunda metade do século XX, no qual transformou tanto os processos produtivos quanto as
relações sociais e de governo.
1.2
-
A
S FASES DO CAPITALISMO PARA GÊNESE DO CONTEMPORÂNEO
A formação e a expansão do modo de produção capitalista no mundo, no decorrer dos
séculos, implicaram em um aumento dos meios de acumulação primitiva, de maneira a
permitir uma caracterização do sistema capitalista em diferentes períodos sob diferentes
modelos. Admite-se que o capitalismo se confunde entre suas fases, e o que modifica é o
centro do processo de alocação do recurso, onde se situa o fulcro do decurso de acumulação
7
do capital. Porém este não abandona suas características e se mantém tão alienante quanto
antes.
O estudo da base do capitalismo moderno é um protótipo das experiências
subseqüentes das eras capitalistas anteriores, as quais tiveram como conseqüência, menos uma
superação do que uma continuação das relações de produção. Neste movimento, as sociedades
capitalistas, pré-existentes, arcaram com as mutações apresentadas pelo sistema e propagaram
os novos conjuntos de valores universais adquiridos (DOBB, 1971; ARRIGHI, 1996).
A construção do capitalismo teve origem antes mesmo do nascimento das sociedades
mercantis e monetárias da Europa Ocidental. Este sistema está ligado a um padrão de vida, de
toda uma época, adotado pela sociedade, cuja atitude era de quem buscava o lucro, de forma
racional e sistemática (WEBER, 1967), além de estar condicionado a certos estágios de
produtividade (MARX, 1977), acreditando que o comportamento humano era conducente à
racionalidade burguesa de acumulação primitiva de capital (DOBB, 1971).
Em algum momento do passado remoto o espírito capitalista deve ter
existido em estado embrionário, se assim quiserem antes de qualquer
empreendimento capitalista poder tornar-se uma realidade. (DOBB apud
SOMBART, p. 6, 1971).
A economia capitalista moderna é um imenso cosmos no qual o indivíduo nasce, e que
se lhe afigura, ao menos como indivíduo, como uma ordem inalterável, na qual ele tem de
viver. Ela força o indivíduo, à medida que esse esteja envolvido no sistema de relações de
mercado, a se conformar às regras de comportamento capitalistas. Assim, o capitalismo atual,
que veio para dominar a vida econômica, educa e seleciona os indivíduos de quem precisa,
mediante o processo de sobrevivência econômica dos mais aptos. O espírito do capitalismo,
no sentido em que usamos o termo, teve de lutar por sua supremacia contra um mundo inteiro
de forças hostis (WEBER, 1967).
O capitalismo em potencial delineou-se desde o desabrochar da história, e se
desenvolveu, amadureceu e perpetuou-se ao longo dos séculos (BRAUDEL, 1996). Uma
maneira, pela qual possibilitou um olhar, uma atitude, um ponto, de pensar a ação do homem
como um produto econômico de sua própria natureza.
A fase embrionária de acumulação do capitalismo germina nas malhas da sociedade
feudal e padece dos limites estreitos deste período (HOBSBAWM, 1979). Desse modo, o
decurso de ruptura das bases da sociedade feudal foi dilacerando-se lentamente, cujo processo
8
teve iniciou no século XI e prolongou-se até o culo XVI. Para alguns autores, nesse período
permitiu-se generalizar no contexto mundial como a era do capitalismo
2
.
A organização e o aumento da produção, da extorsão do trabalho, da prestação de
serviços remunerados, seja por gênero ou em dinheiro, do contrato salarial, da propriedade
privada, da retomada do comércio frente à circulação de moeda, do abastecimento de produtos
para o mercado, do renascimento da vida urbana e da formação da classe burguesa,
contribuíram para anunciar o desenvolvimento do sistema capitalista. Mesmo que a essência
do capitalismo se encontre no estado de espírito e no comportamento humano condizente à
existência das formas econômicas e a emergência de novas mentalidades que influenciaram e
inspiraram o modo de vida de toda uma época, esses fatores foram importantes para legitimar
o modo de produção vigente (DOBB, 1971; MARX, 1977; BRAUDEL, 1989).
Este sistema atravessou longos períodos de crise, reestruturação e reorganização. De
modo que, a atual configuração capitalista pode ser considerada um compêndio das realidades
e experiências pretéritas. Portanto, sucessivos encontros e desencontros, sucessos e fracassos,
das diversas etapas conquistadas e atravessadas.
Na carreira do capitalismo, a partir da introdução do “gene” do capital, torna-se claro
que este passou por uma longa marcha para chegar ao período maduro do capitalismo
contemporâneo. De maneira que pode ser caracterizado, em síntese, por seis momentos que se
superaram e marcaram toda a cadeia evolutiva do sistema e a forma assumida pela reprodução
do modo de produção capitalista. Apontam-se então as seguintes fases: (i) cidades-estado; (ii)
capitalismo mercantil; (iii) capitalismo industrial; (iv) capitalismo monopolista; (v)
capitalismo financeiro; (vi) capitalismo contemporâneo.
2
Ainda que o esboço da produção capitalista fosse prematuro em algumas cidades do Mediterrâneo, a era
capitalista data do século XVI com o comercio e o mercado mundial, onde o poder capitalista disperso passa
para um poder concentrado, no caso a fusão do Estado com o capital e começa a penetrar na produção em escala
considerável. (PERROUX, 1967; MARX, 1977; DOBB, 1983; BRAUDEL, 1989; ARRIGHI, 1996).
9
Figura 1: Fases do Capitalismo [Org: nossa]
(i) Cidades-estado: As cidades-Estado Italianas exerceram o poder de liderar e
governar dentro de um sistema medieval, entre os séculos XI e XIII. Estas formavam, sob um
fragmento do universo, uma unidade econômica autônoma. Com efeito, esta zona
mediterrânica, apresentava-se como um subsistema regional capitalista, onde as leis eram
ditadas por grandes comerciantes, que conviviam em concordância com as autoridades
centrais (o papa e o imperador) (BRAUDEL, 1996).
Nesta fase, prevalecia a técnica, sob uma forma embrionária, da manufatura que
praticava em um mesmo lugar a divisão manual do trabalho e transformava matéria prima
bruta em mercadoria. Esta fabricada, conduzia à extensão e à generalização das relações
mercantis capitalistas (SURET-CANALE, 2000).
As atividades transcendiam os limites dos Impérios, os quais fragmentavam e
diferenciavam o universo mediterrâneo. Este pedaço do planeta economicamente autônomo
(BRAUDEL, 1996) põe em causa ao mesmo tempo várias realidades e formas de capitalismo,
que servirão de exemplo e superação das fases futuras deste sistema.
As cidades-Estado localizavam-se na parte setentrional da Itália, mais especificamente
nas cidades de Veneza, Florença, Gênova e Milão e formavam verdadeiras aglomerações
urbanas, por conta da convergência mercantil e cosmopolita assistida no local. Estas se
organizavam em comarcas de jurisdições políticas, separadas e independentes, que não
possuíam o aparato do Estado Nacional. Eram consideradas verdadeiras cidades
10
empreendedoras que viviam de linhas de crédito e comércio de produtos do oriente (China e
Índia), tidos como fonte da acumulação de capital e concentração de riqueza.
(...) o sucesso das cidades-Estado italianas em geral, e de Veneza em
particular, baseava-se, acima de tudo, no controle monopolista de um elo
crucial na cadeia de trocas comerciais que ligava a Europa Ocidental à Índia
e à China, através do mundo islâmico (ARRIGHI, 1996, p. 40).
O poder se configurava sobre a responsabilidade da oligarquia mercantil capitalista,
que a qualquer ação territorial analisava, antes, o custo-benefício e a capacidade em aumentar
a lucratividade do comércio. Decerto a cartografia, neste período, não representava somente
essa ordem econômica, pois existiam outras unidades, que também evidenciavam formas e
sujeições de se inscreverem no espaço de disputa do poder, porém menos expressivas.
No entanto, as relações capitalistas configuradas nesta época ocupavam determinado
espaço geográfico de entreposto comercial (BRAUDEL, 1989; WALLERSTEIN, 1990) de
maneira que se criou uma intensidade e uma multiplicidade de trocas, as quais envolviam a
totalidade do continente europeu. As feiras eram o principal exemplo de forma e estrutura
comercial, e lentamente se constituíram num mercado contínuo e monetário, fragmentado em
múltiplos pequenos negócios, que dividiu todo o espaço europeu em zonas comerciais. Os
mercados eram estruturas institucionais controladas e reguladas pela autoridade social. Estes
se conduziram para se transformarem em acessórios da vida econômica (POLANYI, 2000). O
desenvolvimento deste sistema introduziu necessidades que se tornaram orgânicas e inerentes
ao homem das sociedades capitalistas, como a cunhagem de moeda, a letra de câmbio, a
prática de crédito e a criação de instituições bancárias que promoviam a circulação de
capitais.
Entre as influências poderosas que promoviam a acumulação burguesa
estavam o crescimento das instituições bancárias e o aumento dos
empréstimos feitos pela Coroa e da dívida estatal. (DOBB, 1971, p.135)
Essas relações de capitais desenvolveram nos países uma economia monetária
suficiente para animar o novo circuito do comércio marítimo. Na mesma medida em que o
Mediterrâneo vai se desligando como fonte e veículo principal entre as atividades comerciais,
surge o esboço de uma economia atlântica que decide as novas configurações do mercado de
época. Assim, as Cidades-estado Italianas passaram por um processo de despossessão
11
comercial, de modo que permitiu o deslocamento das rotas mundiais de comércio e a
mudança do eixo econômico do período. Esse novo marco é caracterizado por uma
diversificação da produção e o contato com novos produtos. Portanto, num período de euforia
comercial os países se lançavam ao Atlântico para confirmar a economia expansionista
vigente.
(ii) Capitalismo Mercantil: As mudanças de orientação econômica neste período
enfrentaram um desenvolvimento particular na linha da libertação do comércio. A
preocupação centralizava-se na criação de uma balança comercial favorável, no sentido de
estimular as exportações e restringir as importações. Assim, os novos horizontes foram
descobertos, somados a um maior desenvolvimento da economia européia, de maneira que
conectou esse continente ao resto do mundo e ampliou a acumulação de capital para uma
escala mundial. Portanto, o resultado direto foi o desvio do fluxo financeiro do Mediterrâneo
para o Atlântico, além de transformar o sistema europeu medieval em um sistema moderno
inter-estatal (ARRIGHI, 1996). Porém, a acumulação neste período deu-se principalmente na
circulação das mercadorias e não na sua produção, preponderando a apropriação do excedente
a apropriação mercantil específica da exploração colonial.
A expansão marítima, conseqüência do progresso das cnicas de produção e
transporte permitiu ao continente europeu um contato maior com outras áreas de transações
mercantis e favoreceu de forma substancial a produtividade. O desenvolvimento do sistema
comercial europeu, liderados por Portugal e Espanha e orientados por antigos comerciantes
genoveses, levaram ao acúmulo de metais (ouro e prata) e a novos domínios territoriais
(colônias do novo mundo). Esses fatores foram pre-condição para o crescimento da produção
e fortaleceram a formação de uma economia mundial de mercado capitalista, além de
encorajar outros Estados a investirem em políticas-econômicas territorialistas (DOBB, 1971;
BEAUD, 1987; ARRIGHI, 1996).
O sistema expansionista também trouxe, para o território das Potências ascendentes,
insurgências sociais causadas por uma insatisfação popular criada pela base governante, o
Estado Nacional, este que ainda estava sob a progressiva centralização nas mãos dos reis. As
revoltas (urbanas e rurais) forçaram as monarquias nacionais ao uso do poder militar.
O Estado sustentou maciçamente o esforço de desenvolvimento da produção
manufatureira e do comércio mundial, de modo que sob sua proteção formou-se a burguesia
mercantil (BEAUD, 1987). A ascensão desta classe, tendo por base o compromisso
mercantilista, promoveu a política: de defesa em relação aos concorrentes estatais, de
12
expansão comercial e colonial, de desenvolvimento da produção, de autofinanciamento dos
gastos do Estado.
o sistema mercantil foi um sistema de exploração regulamentado pelo Estado
e executado por meio do comércio, que desempenhou papel importantíssimo
na adolescência da indústria capitalista: foi essencialmente a política
econômica de uma era de acumulação primitiva (DOBB, 1971, p.149).
Enfim, o enriquecimento da burguesia favoreceu a acumulação primitiva de capital
nos Estados Nacionais que beneficiaram e sustentaram os alicerces da Revolução Industrial.
(iii) Capitalismo Industrial: o século XIX registrou variações nas estruturas das
indústrias, nas relações sociais, no volume de produção e na extensão e variedade do
comércio, e caracterizou-se por uma nova conjuntura econômica. Uma era de transformação
técnica que proporcionou um aumento de produtividade do trabalho e da produção junto com
a mecanização das fábricas, além de uma crescente dependência em relação ao capital.
O progresso técnico permitiu um impulso próprio na especialização maior das
unidades de produção, na divisão do trabalho das equipes humanas, na produtividade
crescente da mão-de-obra, na circulação da mercadoria e na concentração da propriedade do
capital (DOBB, 1971). A inovação criava uma nova mentalidade para a sociedade, a qual
apontava para um surto crescente de urbanização e um aumento da população. De maneira
que sujeitava o estado ao conjunto de suas próprias leis (POLANYI, 2000). Entretanto, todo
processo civilizatório deste período está ligado ao florescimento de uma sociedade capitalista,
que decolou sob os impactos das guerras revolucionárias e napoleônicas.
O desenvolvimento do capitalismo industrial, do século XIX, operou com base numa
exploração das massas operárias sob a ascensão de uma nova classe dirigente. Longa jornada
de trabalho, insalubridade, subalimentação, trabalho infantil, doenças, acidentes
caracterizavam as condições miseráveis da força de trabalho vendida ao capitalista. A
extorsão da mais-valia era o ponto preponderante para a manutenção do modo-de-produção.
Nesse sentido, a industrialização apoiou-se sobre a produção de bens de consumo e
forneceu acessório e utensílio para a sociedade. Além de bens de capital para a construção de
novas indústrias, empreendimentos de transporte e equipamentos urbanos.
13
Porém, o consumo não acompanhou a prosperidade da produção, logo as fábricas
entraram em um processo de acirramento da concorrência por perda de mercados e baixa de
lucros.
O que nos choca retrospectivamente na primeira metade do século XIX é o
contraste entre o enorme e crescente potencial produtivo da industrialização
capitalista e sua incapacidade, bem patente, de quebrar as correntes que a
prendiam. Poderia crescer drasticamente, mas parecia incapaz de expandir o
mercado para seus produtos, proporcionar saídas lucrativas ao seu capital
acumulado, isso sem mencionar a capacidade de gerar emprego a uma taxa
comparável ou com salários adequados (HOBSBAWM, 2000, p. 59).
Por essas razões, o fim do século XIX havia sido um período de crise da lógica de
acumulação capitalista.
(iv) Capitalismo monopolista: O surgimento da fase monopolista do capitalismo, que
se configura a partir do ultimo quartel do século XIX, começa com a grande depressão’ que
afeta a economia capitalista entre 1873 e 1895. Esta teve um papel importante como
desencadeador de uma reorganização estrutural do sistema, junto à queda dos preços de bens
industriais e de matérias primas, do desemprego e do consumo, verifica-se uma redução da
margem de lucros das empresas.
O principal efeito desta situação foi o aumento da concorrência entre os países e
grupos econômicos. Desta maneira, desenvolve-se um amplo processo de centralização de
capital, no setor das indústrias, a partir do capital bancário, à custa da integração de capitais
originariamente distintos em um único tipo de capital. Esta parceria permitiu a expansão dos
negócios e a prosperidade dos mesmos frente à crise. Além da fusão das pequenas e médias
unidades de produção e da transformação em grandes corporações. Com efeito, proporcionou:
(i) o aumento da capacidade de investimentos das empresas para concorrer no mercado; (ii) o
progresso técnico e científico; (iii) o aumento da produtividade da indústria; e (iv) a busca de
novos mercados e áreas de investimentos.
A principal mudança estrutural que aconteceu na economia e na política, nesta época,
foi o surgimento do imperialismo, inerente ao próprio sistema capitalista e provocador da sua
manutenção. Para Ayber (1992), este período é caracterizado (a) pela a expansão constante do
capitalismo na esfera mundial; (b) pela política agressiva de países emergente perante a busca
de novos mercados; (c) o acentuado crescimento econômico das novas pseudo potências
14
centrais; (d) a reestruturação da estabilização econômica mundial; (e) uma forte organização
política da classe operária e a melhoria do seu padrão de vida; e finalmente (f) a partilha do
mundo entre as grandes potências capitalistas.
A especificidade do capitalismo monopolista refere-se à exportação de capitais para as
colônias e neo-colônias em busca de uma maior rentabilidade. Os investimentos visavam o
favorecimento indireto na Metrópole e efetivavam-se sob a forma de empréstimos de Estado a
Estado, ou Empresas Multinacionais e Estado. Assim privilegiaram a construção de portos e
vias de comunicação, que permitiam uma melhor e mais rápida exploração da produção
exportada e importada e pequenas indústrias de extração e transformação de matéria-prima. A
fase monopolista que se segue tem uma grande importância sobre os efeitos no
desenvolvimento econômico dos países, mas não sobre o equilíbrio econômico.
(v) Capitalismo Financeiro: O regime de acumulação atual, com dominância do
mercado especulativo, designa certa relação com a mundialização
3
do capital, em que os
mercados e operadores financeiros adquiriram certa importância (CHESNAIS, 2003). Esta
etapa particular do imperialismo associa-se, sobretudo, também, a um processo de
endividamento e adoção de políticas neoliberais nos países emergentes (HAESBAERT,
2001).
A nova fase do capitalismo universalizou determinados instrumentos de gestão
territorial, que fortaleceram os interesses do capital e impuseram novas formas de
concentração monetária, como os fundos de pensão, os fundos de aplicação financeira e os
mercados futuros. Esses mecanismos passaram a ser considerados como instituições
importantes para fins de regulação do regime de acumulação e conduziram às mudanças nas
formas de relação entre as empresas e remuneração dos empregados (CHESNAIS, 2003).
O capitalismo financeiro engendrou uma configuração mundial com dominância ao
capital fictício
4
, desde os anos 60, de maneira mais explícita do que aquela que prevalecera
durante a internacionalização da era monopolista. Sendo que, no final do século XIX,
presenciávamos uma participação do capital bancário na expansão industrial, porém este
ainda não era o foco e o determinante da inserção das gicas capitalistas. O capitalismo
financeiro de fato surgiu quando a riqueza privada passou a materializar-se, crescentemente,
3
Embora esta expressão seja objeto de discussão por diversos autores, que dão diferentes sentidos à palavra.
Neste trabalho não aprofundamos o termo e decidimos utilizar como sinônimo de globalização, mesmo
reconhecendo as diferenças.
4
Forma de capital, expressa em títulos ou ativos financeiros, que obtém rendas financeiras, reais ou fictícias,
mediante negócios especulativos.
15
em capital fictício (ações ou títulos em geral) ao invés de ativos produtivos (máquinas,
equipamentos, etc.) (PINTO, 1997).
As principais características dessa fase são: (i) um grande contingente de empresas
engajadas em praticar governança corporativa; (ii) o fortalecimento dos mercados acionários;
(iii) condições aos países de assegurar e de apoiar a formação de um montante elevado de
capital fictício; e (iv) grandes investimentos em ciência e tecnologia.
A mobilidade do capital, nesta fase de globalização financeira, é facilitada pelo padrão
tecnológico pautado na informática e acessórios, o que contribuiu para acelerar bruscamente
os fluxos de capital.
(vi) Capitalismo Contemporâneo: Essa forma de capitalismo não abandona os traços
da etapa anterior, porém anuncia, também, com mais força o desenvolvimento através dos
fatores cognitivos
5
. A produção depende mais de uma atividade intelectual, comunicativa e/ou
afetiva, criadora de signos e de subjetividades do que da própria estrutura produtiva
materialista. De acordo com Pelbart (2000, p. 36) “a produção de subjetividade, os processos
vitais ricos em relações intelectuais e valores afetivos, passam a ocupar um lugar cada vez
mais central do processo produtivo”.
Pode-se considerar que esta ordem capitalística incide na produção de desejo,
subordinadas às formas de inconsciente expressivo, sob os fluxos decodificados que se
precipitam e confundem o indivíduo. De modo que a produção materialista, agenciada pelos
universos lingüísticos, pressupõe e condiciona a apropriação e a utilização do consumo pelo
viés do capital. O desejo produz um imaginário que duplica a realidade como se houvesse um
objeto sonhado por detrás de cada objeto real ou uma produção mental por detrás das
produções reais (DELEUZE; GUATTARI, 1996).
(...) o capitalismo liberta os fluxos desejantes, mas nas condições sociais que
definem o seu limite e a possibilidade da sua própria dissolução, de modo
que contraria constantemente com todas as suas desesperadas forças o
movimento que o impele para este limite. (DELEUZE; GUATTARI, 1996,
p. 143)
5
Por exemplo: As ações da companhia farmacêutica irlandesa Elan despencaram 68% em um único dia, em
fevereiro de 2005, depois que as emissoras de televisão e jornais publicaram a morte de três pessoas nos EUA ao
ingerir o Tysabri um medicamento usado no tratamento de esclerose múltipla (EWING, 2005). Este assunto
implicou a quase falência da indústria farmacêutica. Ademais, a propaganda negativa que circulou sobre a
companhia permitiu a consolidação deste quadro de liquidez de mercado.
16
O Capitalismo iguala-se a ponto de uma máquina moderna que tem o objetivo de
intervir no desejo e transformá-lo numa categoria fundamental da economia. O capitalismo
tende para um limiar que liberta os fluxos de desejo num campo desterritorializado do
indivíduo e o incentiva a consumir.
Este sistema, parte do pressuposto de que estamos sob o Império do Efêmero, e
contribui para a espetacularização do real, imprimindo-lhe um sentido puramente ficcional.
Esta artificialidade da vida, que se alimenta do processo posto em movimento pelo capital,
empurra o indivíduo sob a apoteose da sedução e para o declínio da referência. A imagem,
instrumento das lógicas capitalistas legitima a sociedade do consumo. Esta tem, desta forma,
o desempenho de tornar a racionalidade humana num imaginário puro. E isso influi sobre a
razão do indivíduo na construção e reprodução de uma imagem distorcida e particular do
mundo. Assim, o individuo torna-se prisioneiro daquilo que descreve e ao mesmo tempo
compactua com o capitalismo (LIPOVETSKY, 1989; SFEZ, 1994; BAUDRILLARD, 1972).
O capitalismo contemporâneo inscreve-se no tecido social de forma a domesticar o
homem através da linguagem e das relações cognitivas. Este sistema encontra na produção
materialista aquilo que é considerado comum e natural para confundir o indivíduo e levá-lo a
consumir sob o signo do novo. Nesse sentido será na produção de subjetividade que os
mecanismos econômicos tendem a persuadir o indivíduo. Com efeito, nesta linha de
raciocínio, as empresas tornar-se-ão um campo de representação da própria subjetividade dos
indivíduos. Não obstante no mundo atual, as empresas seriam mais fornecedoras de produtos
desejados pela sociedade e passariam a atuar como força política de poderosa expressão de
nossa época.
No entanto, as megas empresas, como por exemplo: Shell, Wal-Mart, General Motors,
entre outras
6
apresentam o orçamento significativamente maior do que o produto interno bruto
declarado por muitos Estados Nações
7
. Nesta fase do capitalismo uma coisa é universal, o
mercado, que passou a administrar não só o paradoxo da fabricação de pobreza como também
o da riqueza.
Essas considerações de maneira sucinta e contundente relatam as transformações
ocorridas na história do modo de produção capitalista em seu constante movimento de
recriação. A apresentação dos períodos do capitalismo deve-se ao fato do texto caracterizar os
6
Tabela 2 (Faturamento das empresas líderes do mundo), capitulo 3, p. 65
7
O artigo do grupo de ação sobre erosão, tecnologia e concentração (ETCGROUP) “Oligopoly Inc 2005:
concentration in corporate power” comuniqué, n. 91, nov./dez. 2005. Disponível em:
<http://www.etcgroup.org>. Acesso em: 30 jun. 2007. ilustra a concentração de poder das corporações frente à
economia global.
17
processos que serão fundamentais ao nosso raciocínio posterior: WAL-MART como ícone do
capitalismo contemporâneo. Para tanto, continuaremos nossas elucidações contextualizando a
trajetória econômica-política do capitalismo, que de um modo geral contribuem de maneira
específica ao fortalecimento da companhia frente à dinâmica de acumulação capitalista. Desse
modo tomaremos como base a periodização proposta acima, retomando pontos importantes,
com o objetivo de relacionar acontecimentos e o seu sentido na constituição do capitalismo
contemporâneo.
1.3
-
O
R
EGIME
B
RITÂNICO NA
E
CONOMIA
M
UNDIAL
O poderio militar e a busca por novas terras contribuíram para que a Inglaterra se
colocasse frente à Espanha no fim do século XVI, opondo-se à Holanda no século XVII, e
passasse a enfrentar a França no século XVIII. O desenvolvimento das relações mercantis
entre a Inglaterra e suas colônias da América e da África, a partir da extorsão de valor e de
riquezas nas regiões dominadas, suscitou no fortalecimento do capitalismo inglês. Para Beaud
(1987, p.70),
Abre-se, assim, para a Inglaterra um período de supremacia mundial; e é
sobre uma base territorial expandida que o capitalismo inglês vai
desenvolver seus mercados, estender sua dominação, organizar a
acumulação.
A industrialização capitalista inglesa, cuja produção era incomparavelmente maior que
as demais, produzia cerca de metade da produção mundial de força a vapor e os produtos a ela
associados, carvão e ferro. Segundo, Hobsbawm (1979, p. 124):
O país produzia talvez 2/3 do carvão mundial, cerca da metade do ferro, 5/7
do pequeno suprimento de aço, mais ou menos a metade do tecido de
algodão que era produzido para o mercado e 40% dos produtos metalúrgicos.
As exportações britânicas aumentaram consideravelmente para outros continentes. O
montante acionado por essas divisas permitiu à Inglaterra enfrentar uma expansão territorial.
A política territorialista inglesa tentava incorporar em seus domínios as redes de
comércio e novas regiões geográficas. Esta concentrou esforços na luta pelo controle do
18
Atlântico e na conquista de fontes abundantes de riqueza, seja no continente africano, seja em
terras indianas. A acumulação mundial com base no livre comércio, forma típica do
imperialismo do regime britânico era apresentada como a força propulsora de expansão de
riqueza.
O imperialismo de livre comércio, ao contrário, estabeleceu o princípio de
que as leis que vigoravam dentre e entre as nações estavam sujeitas à
autoridade superior de uma nova entidade metafísica – um mercado mundial,
regido por suas próprias “leis” -, supostamente dotadas de poderes
sobrenaturais maiores do que tudo o que o papa e o imperador jamais
houvessem controlado no sistema de governo medieval (ARRIGHI, 1996, p.
55).
Ao abrirem seu mercado interno, a Inglaterra criou uma rede de territórios amplamente
dispersos. Fato que contribuiu para que o poder inglês, no fim do século XIX, começasse a
atingir seus limites, e logo perdesse o controle do equilíbrio econômico e político mundial.
Este fato pode ser somado em conjunto com o advento da chamada Grande Depressão de
1873 1896, que aumentou a concorrência inter-estatal do comércio para reaver os gastos e
os prejuízos locais que aumentavam exponencialmente.
A partir de então [início do século XX], a Grã-Bretanha passou a integrar um
grupo de grandes potencias industriais, mas deixou de ter a liderança da
industrialização. Na verdade, entre as nações industrializadas era a mais
lenta e aquela que revelava sinais mais óbvios de declínio relativo
(HOBSBAWM, 1979, p. 125).
Nesses termos, a dificuldade de acompanhar o aperfeiçoamento técnico e tecnológico
dos demais pólos industriais mundiais (EUA, Alemanha, França e Bélgica) contribuiu para a
derrocada da Inglaterra. O colapso deveu-se tanto à crise da economia mundial, após I Guerra,
que fez diminuir as transações internacionais, quanto à indústria e às máquinas inglesas que se
tornaram obsoletas e ineficientes, deixando de ser competitivas (HOBSBAWM, 1979).
É importante frisar, que a prosperidade da Inglaterra, no século XIX, firmara-se em
grande parte nas transações internacionais, cujos contratos eram estipulados em libras
esterlinas. Assim, a dificuldade do retorno ao padrão monetário anterior à guerra passara a ser
um dos aspectos dos abalos que a Grã-Bretanha apresentava, ao mesmo tempo em que no pós
19
1
a
Guerra, o volume de exportações foi menor que o das importações. O déficit na balança
comercial inglesa recuou o domínio econômico do país frente aos novos mercados e
anunciou, assim, como conseqüência, a renúncia da influência política. Não obstante, as
dificuldades que a Inglaterra mantinha foram somadas as revoltas sociais (greves e
reivindicações populares), ao crescente desemprego em massa, ao atraso industrial, e
finalmente, à depreciação da moeda (SIEGFRIED, 1937).
A partir desta crise a decadência da hegemonia do capital britânico, o sufocamento de
um capitalismo em plena maturidade foi minado por uma nova economia nacional, com
capacidade e dimensões territoriais bem mais significativas que da Inglaterra. A
responsabilidade dos Estados Unidos, como discutirá na próxima seção, fortaleceram sob a
natureza expansionista da sua industrialização e economia doméstica e que mantiveram as
portas do mercado interno fechadas aos produtos estrangeiros, entretanto abertas ao capital
financeiro (BEAUD, 1987; ARRIGHI, 1996).
1.4
-
O
CURSO HISTÓRICO DOS
EUA:
O DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO
NORTE
-
AMERICANO
Sem especular sobre projeções futuras da sociedade norte-americana não se pode
negar que o passado histórico transmitiu importantes lições em relação às possibilidades de
seu avanço econômico, político e social.
A odisséia realizada, através dos mares distantes, sob percalços e dificuldades,
apontava o perfil do chamado colono “americano”. De fato, o modelo de progresso, iniciou-se
com a vinda de seus primeiros colonizadores. Possuidores de um espírito corsário e de um
papel de vítima inocente da ordem mundial assentavam no individualismo a rejeição da
submissão à consciência da dependência européia.
Os imigrantes procuravam intensificar o desejo pela terra, melhorar a situação
econômica e de liberdade, e desenvolver um sentimento patriótico estruturado na persistência
e promessa do Novo Mundo. Desta forma tentaram desvencilhar-se dos valores “artificiais”
construídos pelo sistema europeu e combater as filosofias importadas e a legislação radical. A
fuga do Velho Mundo e a renuncia aos laços de consangüinidade permitiram que a
experiência americana, drenada pelas energias revolucionárias, materializasse um sonho. Este
assentado em raízes da ética protestante e em energias humanísticas seculares abeberadas pela
Pós-Renascença.
20
Quadro - 1 Histórias distintas: EUA e EUROPA no início da colonização do Novo
Mundo
Estados Unidos da América Europa
Livre iniciativa Mercantilismo
Privatismo Laissez faire
Individualismo Hierarquia de valores /Humanismo
Direitos naturais / Homens livres Monarquia / Anacronismos Feudais
Nacionalismo popular Regimes dinásticos
Mobilidade social Sistemas de castas
Espírito de pioneirismo Status quo
Fonte: LERNER, M. Civilização norte-americana: a vida e o pensamento nos Estados Unidos de hoje, 1960.
Org.: FERREIRA-COSTA, 2007
Segundo Negri (2003, p.184) “a revolução humanista da Renascença e as
subseqüentes experiências do protestantismo sectário desenvolveram essa idéia de
produtividade”. Portanto, a construção histórica e política dos Estados Unidos, nasceram
apoiadas num contínuo expansionismo. Para Aglietta (1989, p. 10) “A expansão é o fenômeno
dominante da vida norte-americana”. Antes mesmo, de ocupar definitivamente a estreita faixa
das colônias do Atlântico e adquirir uma compreensão de unidade territorial, a colonização do
País, já começava a fazer uma investida a terras inóspitas e não desbravadas pelo homem
“civilizado” (europeu, ocidental, branco).
Cada nova conquista, alcançada por parte dos novos territórios, era celebrado com
manifesto e grandeza. Os americanos sempre incitaram a imaginação nacional pela abertura
de novos horizontes, na medida em que ampliavam as redes de comunicação e a domesticação
do espaço geográfico. Alistaram novas áreas somadas ao sentimento de realização como o
lucro e o poder. A vida americana estruturava-se num movimento vertical mediante os centros
urbanos de verticalização, e no plano horizontal por meio do prolongamento do território.
Além disso, aos olhos dos colonizadores, foram encontradas provisões generosas de
recursos naturais no território norte americano que possibilitaram uma especulação territorial.
É uma felicidade que desde o princípio os Estados Unidos tenham sido bem
aquinhoados pela natureza. Os primeiros colonos encontraram florestas
abundantes e solo adequado com o necessário índice pluvial. À proporção
que os colonizadores migraram para o interior, alcançaram as pradarias
férteis do Meio-Oeste e as ricas baixadas do baixo Vale do Mississipi
(CLOUGH; MARBURG, 1969, p. 10).
A colonização interiorana se processou ao mesmo tempo em que estendia as idéias: da
revolução industrial, do modo de produção capitalista e da noção de democracia. Essas forças
21
constitutivas do novo sistema de estrutura social foram trazidas pelos colonizadores que
introduziram a arte das manufaturas aprendidas na fase inicial do industrialismo inglês. Estes
dispositivos contribuíram para que aumentassem a representatividade, o poderio e a vitalidade
do Estado Nacional Americano frente às outras nações. Também, proporcionaram a
sofisticação da técnica para exercer o domínio mecânico da natureza e a expansão do
território.
Desta maneira, além de atividades que não demandaram muito esforço físico ou
intelectual, o colono também executava atividades dotadas de experiências especiais, as quais
foram adquiridas no movimento de insurreição política que acontecia na Europa. As idéias de
Locke e Montesquieu, teóricos políticos, atravessaram o Atlântico vindo a constituir o
substrato teórico-filosófico do processo de institucionalização dos EUA.
Durante a Revolução Americana, movimento de ampla base popular, levou ao estado
autônomo as treze colônias. Estas posteriormente, em 1776, declararam independência à
metrópole inglesa, que reconheceu o fato por meio do tratado de Paris em 1783. Desse modo,
um novo cenário geopolítico é desenhado pelo Estado Americano mediante a formação de
uma confederação de Estados que oficializaram e estimularam a expansão em direção ao
Pacífico para consolidar uma nação de costa a costa. Neste movimento conhecido como
conquista do oeste, colocou em prática a insaciável sede de saber e de sentir novas
experiências. Para isso, dizimaram indígenas (apresentaram as armas da civilização);
anexaram importantes regiões (apropriaram e confiscaram as riquezas e os recursos);
compraram territórios de outros países (legitimaram e justificaram a posse); e declararam
guerra aos que se opunham (despeitaram e desafiaram a todos) aos interesses expansionistas.
No decorrer do século XIX, os EUA estavam divididos, em razão da organização
espacial, pelas províncias do Sul (latifundiários e aristocratas) e do Norte (industrializados e
abolicionistas). Os primeiros passos do fortalecimento econômico e político americano e a
origem da era moderna da revolução capitalista, percebiam que a região Norte passou por um
período de expansão apoiada na industrialização, proteção do mercado interno, mão de obra
livre e assalariada e a porção Sul dependia da exportação de produtos agropecuários. A
diferença existente entre esses fragmentos do território americano consistiu na guerra civil
americana (1860-65) que conduziu a um processo de modernização. Com o término do
conflito, a recuperação econômica foi muito rápida, facilitada pela estrutura construída,
naquele período como as ferrovias e a rede de transporte fluvial, além da abundância de
recursos naturais e da forte concentração industrial nos setores de bens de consumo duráveis.
As empresas passaram por uma série de transformação na sua estrutura e na organização
22
produtiva o que proporcionou novas corporações de ofícios verticalmente integradas e
burocraticamente administradas, com o intento de deter a luta competitiva, assim como a
formação de monopólios.
(...) após a guerra civil [Benjamin Franklin] promoveu a centralização da
atividade bancária, a proteção das indústrias domésticas (através do aumento
acentuado das tarifas), a ocupação e exploração da terra, a formação de
sistemas transcontinentais de ferrovias e telégrafo, e a entrada de imigrantes
vindos da Europa (ARRIGHI, 1996, p. 300).
Os americanos projetaram a construção da sociedade ideal, como um sistema aberto,
democrático, e que se ajustava à realidade do mundo. Absorviam as transformações sócio-
espaciais, de tendência mundial, e as adaptavam para o território americano, com o mínimo de
ônus para a sua população. Assim, o perfil nos setores econômicos mudou, ao longo dos anos.
Ao final do século XIX os Estados Unidos ultrapassavam em termo de desenvolvimento
industrial, os principais países europeus, e apresentavam um cenário de fusões entre grandes
empresas com o objetivo de competir e exercer certo grau de domínio no mercado
internacional (AYBER, 1992). No mesmo momento em que se produzia uma expansão
econômica pela agricultura e uma política de incentivo de povoamento em todo o território,
por meio de doações de terra para a exploração por atividades agrícolas e pastoris. No entanto,
a falta de um mercado consumidor consolidado e uma queda dos preços dos produtos
produziram um cenário de endividamento e miséria entre os fazendeiros (NERE, 1975).
Sob o efeito, da ganância de buscar novos horizontes, tanto para facilitar o escoamento
da produção interna, quanto para garantir a expansão política, os Estados Unidos, desta
maneira, assumem a função, a partir do século XX, de árbitro principal da história. Esses
protagonizaram um curioso papel e reivindicaram a Paz Mundial, sob título de “Esperança do
Mundo”, o que permitiu se apresentarem como a maior potência em exercício.
O primeiro passo, sob o argumento de evitar intervenções de outros países ao
continente americano, em dezembro de 1904, o presidente Theodore Roosevelt, apresenta a
Doutrina Monroe
8
. Em síntese, no início do século XX os Estados Unidos já apontavam como
uma grande potência econômica e geopolítica.
8
Para Ayerbe, (1992, p. 12) “entre os acontecimentos que marcaram a política norte-americana para a América
Latina neste período, destacam-se a assinatura da Emenda Platt, em 1902, que estabelece a tutela sobre Cuba e
autorização, em 1903, para a instalação de uma base militar em Guantámano; o apoio à insurreição separatista do
Panamá em relação à Colômbia, que culmina com a formação do novo Estado e a cessão, em novembro de 1903,
da zona do canal para uso perpétuo dos Estados Unidos; o desembarque na Republica Dominicana em 1905, em
23
1.5
-
P
ERÍODO ENTRE
-
GUERRAS
A primeira Guerra Mundial no começo do século XX contribuiu decisivamente para
destruir uma ordem mundial política, econômica e cultural que prevalecia desde 1789 com o
regime Britânico (HOBESBAWM, 1995). Este período está relacionado, também, com o
desenvolvimento de uma economia fortemente monopolizada, a crise do liberalismo e o fim
de uma época, para a Europa e a América do Norte, de prosperidade e riqueza (VIZENTINI,
2006).
O fim da primeira guerra provocou na Europa profundas alterações territoriais em
virtude do desmembramento dos Impérios Austro-Húngaro, Turco-Otomano, Russo e
Alemão. Ademais, foram assinados os tratados de Paz
9
que corroboravam com o caráter
imperialista e protagonizavam a tentativa de controlar a situação e assegurar interesses
comuns aos vencidos.
A assinatura dos acordos que suspenderam temporariamente as hostilidades entre os
lados envolvidos na guerra não significou o fim dos enfrentamentos armados na Europa. O
que se seguiu foi uma série de guerras civis de caráter étnico-nacional levados às novas
delimitações das fronteiras. De maneira que, as minorias nacionais e os Estados afetados com
a reestruturação territorial reivindicavam a revisão dos tratados. Entretanto, a agitação social
representava a instabilidade do sistema mundial frente às futuras crises e divergências
políticas e econômicas. As tensões tornavam-se cada vez mais permanentes e envolviam
políticas exteriores e a ingerência das grandes potências.
O pós-guerra apresentou um quadro de crise generalizada na Europa. O
desemprego, a inflação e a recessão somaram-se a uma intensa mobilização
aplicação do Corolário Roosevelt, assumindo a administração das aduanas do país com o objetivo de garantir o
pagamento da dívida externa. O seu sucessor, William H. Taft (1909-1913), também do Partido Republicano,
deu continuidade à política intervencionista, que com ênfase na expansão dos interesses capitalistas privados,
de onde vem a denominação de ‘diplomacia do dólar’. Em 1912, uma resolução do Congresso determinou que os
Estados Unidos se opusessem à transferência de zonas estratégicas das Américas a companhias privadas não
americanas, estendendo a jurisdição da Doutrina Monroe também aos interesses econômicos privados. Muitas
destas situações ou reflexos destes fatos podem ser observados nos dias de hoje, como o embargo econômico a
Cuba”.
9
Saint-Germain, de 1919, que celebrou o desmembramento da Áustria e a independência dos novos Estados
Danubianos; Neuilly, de 1919, o qual dividiu a Bulgária com os países vizinhos, Iugoslávia e Grécia; Trianon,
de 1919, que promoveu a divisão da Hungria, em proveito da Tchecoslováquia e da Iugoslávia; Sèvres, de 1920,
o qual diluiu o Império Turco perdendo as províncias Árabes para a Grécia e os estreitos de sforo e de
Dardanelos que passaram ao controle da Inglaterra. Entretanto a Conferência de Washington, em 1921-1922,
legitimou todos os acordos estabelecidos para a manutenção de um precário equilíbrio mundial (HOBSBAWM,
1995; SARAIVA, 2002; VIZENTINI, 2006).
24
política e a conflitos sociais acentuados. Os sintomas de uma revolução
social eram fortes desde fins de 1916 nos países beligerantes.(...).O
esmagamento sangrento destes levantes não restaurou, entretanto, a
estabilidade políticosocial. Os anos de 1919 a 1923 foram marcados pelas
graves dificuldades da reconversão econômica e pelo esforço de contenção
das tendências revolucionárias. O período que se estende de 1924 a 1929
ficou conhecido como os anos da grande ilusão ou da falsa prosperidade,
marcados que foram na Europa pela recuperação econômica e pelo relativo
afrouxamento das tensões sociais. (VIZENTINI, 2006, p. 171)
De acordo com Hobsbawm (1995) neste período assiste-se, ao menos parcialmente,
uma instabilidade no modo de produção capitalista. As necessidades da reconstrução
estimularam as atividades econômicas, mas ao mesmo tempo agravava o endividamento dos
países que precisavam se recompor.
A crise tornar-se-ia um fato transitório para a Europa que se lançava numa campanha
de restauração das dívidas do conflito. A ajuda dos EUA levava um sentimento de
prosperidade e otimismo na reorganização político-econômica e social européia. Este país
exercia a influencia decisiva na elaboração dos tratados, em proveito da decadência da
Europa. Os EUA haviam se tornado a maior economia do mundo, produzindo mais de um
terço da produção industrial e o principal credor dos danos causados na Grande Guerra
(HOBSBAWM, 1995).
Consequentemente, por conta dos frutos deixados da corrida armamentistas, ocorreu
uma expansão no sistema industrial que exerceu uma forte influência sobre as forças
produtivas de diversas nações. O incremento crescente da produtividade, por conta das
inovações técnicas, e uma, conseqüente, desorganização no mercado frearam a ascensão dos
EUA. De modo que, esbarrou nos acontecimentos de 1929 a 1931, uma crise “tanto do
superinvestimento capitalista como o do subconsumo proletário nos países capitalistas
dominantes” (HARDT; NEGRI, 2000, p. 262).
A crise econômica mundial foi gerada sobre uma superprodução latente. A falta de
mercado para escoar a produção agravava a instabilidade econômica. Neste momento,
somente os EUA importavam 40% de todas as matérias-primas e alimentos dos quinze
principais países produtores, cuja natureza dos acordos desencadeou um desastroso impacto
mundial. Segundo Hobsbawm (1995, p. 102) “o comércio mundial teve uma queda de quase
um terço entre 1929 e 1939, mas as exportações americanas despencaram para quase a
metade”. Além de uma desenfreada especulação das bolsas de valores, nos EUA, por conta da
25
fuga de capitais em busca de segurança e da aplicação em dívidas públicas fato este
decorrente da quebra da bolsa de valores. Desse modo, o crash da bolsa de Nova York,
resultou na falência de diversas companhias, na redução das produções industriais e agrícolas,
em milhões de desempregados, além da suspensão dos empréstimos externos e dos
investimentos estrangeiros que atingiram proporções internacionais (DOBB, 1971; NERÉ,
1975; POLANYI, 1980; HOBSBAWM, 1995; HARDT; NEGRI, 2000; MORAES, 2001).
Para superar os efeitos da crise, o governo americano, lançou um pacote de medidas
políticas, econômicas e sociais, regulacionistas para tentar restabelecer a ordem, o New Deal.
Dentre as medidas estabelecidas destaca-se a forte presença do setor público nas negociações
sindicais, na elaboração de políticas de distribuição de renda e de seguridade social. O Estado
assumiu as obrigações de equilibrar as flutuações de mercado, cujas medidas intervencionistas
foram: (i) a criação da política de pleno emprego; a moderação de desequilíbrios sociais
excessivos; (ii) o socorro a países e áreas economicamente deprimidas; (iii) a manutenção de
uma estrutura de serviços e bem-estar; (iv) implementação de medidas que atenuassem a
desigualdade material no corpo da sociedade; (v) a concessão de créditos para o pagamento de
dívidas; (vi) a limitação da produção; (vii) a diminuição da jornada de trabalho; (viii) política
agrícola comum; (ix) a instalação de modernos sistemas previdenciários (HOBSBAWM,
1995; MORAES, 2001).
Em todo o caso, todas as ações das empresas em reagir à crise acabavam, direta ou
indiretamente, influenciando as relações de trabalho. Entre elas assinalam-se as medidas
referentes aos salários mais baixos e ao desemprego. Nesse sentido, a primeira conseqüência
foi um processo de deflação conseqüente das compressões de despesas e da tentativa de
manter o equilíbrio orçamentário. Estes mecanismos visavam aliviar os encargos e as receitas
fiscais das empresas, permitindo-lhes recomeçar em bases mais sólidas. Porém, estas políticas
agravavam a crise, pois reduziam o poder de compra da população, por conseguinte, a
demanda (NERÉ, 1975).
Contudo, o colapso econômico entre-guerras presenciava um crescente desequilíbrio
entre os países. Para amenizar a crise interna os EUA promoveram um isolacionismo, sem se
preocupar em agir como estabilizador global. Para controlar a crise interna, os EUA
ampliaram a linha de crédito aos consumidores e incentivaram setores da sociedade em
retornar às atividades produtivas. O Estado passa a conceder empréstimos ilimitados aos
bancos; indenizaram os prejuízos dos fazendeiros com a queima do excesso de produção;
aumentaram os salários e fixaram um salário mínimo; controlaram a jornada de trabalho dos
empregados, criaram um seguro-desemprego; legalizaram os sindicatos, proibindo as horas-
26
extras; promoveram um amplo programa de obras públicas; e a estatização do sistema de
previdência social, entre outros.
Assim, segundo as circunstâncias, essas medidas espelhadas na teoria de Keynes,
encontraram ampla acolhida entre os países capitalistas, principalmente nos EUA. Essas
idéias Keynesianas visavam fortalecer o mercado consumidor para a aquisição de
mercadorias. No entanto, estas práticas contribuíram para diminuir o tempo de ócio do
operário e mesclar o tempo livre com o tempo do consumo. Segundo Hobsbawm (1995,
p.105) “os consumidores compravam os bens supérfluos da moderna sociedade de consumo
que os EUA, mesmo então, já iniciavam”.
Contudo, estas foram as funções do Estado como elemento fundamental para superar a
estagnação econômica. Assim, o período entre guerras introduz uma etapa de fechamento e
retorno ao protecionismo comercial, e esboça, no contexto da Segunda Guerra Mundial,
uma política liberal de comercio. Os EUA assumem a responsabilidade hegemônica de
modelar a nova ordem econômico-financeira e político-estratégica mundial (RICUPERO,
2002).
1.6
-
O CENÁRIO GEOPOLÍTICO DO
P
ÓS
-G
UERRA
O cenário geopolítico do pós-guerra aponta para o desenvolvimento de uma ordem
jurídica internacional, de mecanismos de controle financeiro, de um sistema hegemônico, os
quais, sob influência da concepção hobbesiana concentra-se em conceber a constituição de um
acordo contratual fundamentado na convergência de indivíduos estatais preexistentes, através
de recursos militares; sob a versão lockiana, o mesmo projeto é pensado em termos da
formação de um constitucionalismo global que irá minar as bases dos imperativos estatais e
consolidar uma sociedade civil global. Porem, ambas as visões sintetizadas na interpretação
do contemporâneo trabalha em afirmar que no cenário mundial, após a segunda guerra,
ascende a força de um poder nacional soberano (HARDT; NEGRI, 2000).
A economia mundial, neste período, para diversos autores, apresentava como
linguagem a tendência de classificar o capitalismo por uma diferenciação geográfica entre
centro e periferia, desenvolvido e não desenvolvido, avançado e atrasado. De modo que foi
permitido delimitar áreas supra-nacionais de menor ou maior desenvolvimento e polarizar as
27
rivalidades entre dois modos de produção (capitalista e socialista) sob lógicas político-
ideológicas e econômicas divergentes.
Essa manifestação territorial, historicamente possível, determinava o grau e a força de
penetração e da expansão do capitalismo e do socialismo em uma região; a dinâmica dos
mecanismos de intercâmbio desigual; as novas formas de dependência; e a desarticulação
interna da economia desses países (SEABRA, 1982), além de redefinir os rumos para uma
disputa de interesses hegemônicos. Tudo leva a crer que, naquele momento, as potências
(Estados Unidos e URSS) não desejavam a reconstrução só por via econômica de controle de
câmbio e capitais, o que parece ter ocorrido foi um processo de desobstrução das economias
nacionais, cada uma a seu modo, para intensificar as trocas tecnológicas e financeiras.
Na ex-URSS colocou-se em prática as bases de uma economia socialista, que tratou de
organizar um comercio comum entre os países “aliados”, países simpatizantes do bloco, cujo
custo de produção (dificuldade de transporte, valor da matéria-prima, níveis tecnológicos,
salário entre as classes obreiras) era tomado como base nas negociações de troca entre os
países da cortina de ferro
10
, sem ao menos pensar no lucro e no preço de concorrência. No
entanto, a dificuldade de uma base monetária comum, fundada nos distintos custos nacionais,
entre os participantes, somadas às tentativas de amoldar cada país a um esquema sociopolítico
semelhante, contribuiu para minar as estruturas do modo de produção socialista. Outras
características também podem ser observadas como: a adoção de um sistema misto (público-
privado) entre empresas internacionais, sob o controle total do Estado, e padrões nas
instalações das indústrias de base e nas atividades a serem desenvolvidas, entre outros
(MULLER, 1987; HOBSBAWM, 1995).
Ao mesmo tempo em que os EUA promoviam a hegemonia americana do dólar
através dos programas assistencialistas, lançados pelo então presidente Truman, (o “Plano
Marshall” e a reconstrução econômica do Japão “Plano Colombo”) e lançaram novidades
tecnológicas. Para os Estados Unidos era imprescindível a recuperação do poder de compra
dos países europeus. Neste período, de rápida expansão, o setor industrial não apenas se
transforma internamente, mas ao mesmo tempo, conduz e modifica todas as cadeias das
atividades produtivas. Conforme Ayeber (1992, p. 50) “a gica industrial e o progresso
10
Expressão usada no Ocidente para designar à fronteira que dividiu a Europa em duas áreas de distintas
influências política, econômica e militar, do final da Segunda Guerra Mundial até ao final da chamada Guerra
Fria, quando o bloco se desfez definitivamente, em 1991, com a dissolução da URSS. Inicialmente, a Cortina de
Ferro era integrada pelas repúblicas da Rússia: Armênia, Azerbaijão, Belarus, Estônia, Geórgia, Cazaquistão,
Quirguistão, Lituânia, Letônia, Moldávia, Tadjiquistão, Turcomenistão, Ucrânia, Uzbequistão e os estados-
satélites: da Alemanha Oriental, Polônia, Tchecoslováquia, Hungria, Bulgária e Romênia.
28
técnico atingem setores como a agricultura, saúde, educação, na busca de um aumento
crescente da produtividade”.
Em suma, a economia do pós-guerra cinge-se nesses dois blocos com distintas
estruturas sociais, políticas e econômicas e distintos ordenamentos produtivos, comerciais e
financeiros.
Após a Guerra Mundial, o crescimento dos países capitalistas “desenvolvidos” foi
apoiado por uma nova forma de organização econômica e uma transformação na vida e nos
hábitos cotidianos. A reconversão industrial em direção à produção de bens de consumo
duráveis e o fortalecimento do mercado local a partir da dinamização da capacidade produtiva
da indústria, permitiu ao capitalismo americano abastecer o mercado interno e, ainda, gerar
excedentes para exportação.
Este período de inflexão na história do capitalismo mundial deu início: (i) à
propagação do progresso dos meios técnicos, científicos e informacionais, (iii) aos novos
conceitos de globalização e (iii) ao gerenciamento associado à internacionalização da
economia; a fim de buscar um norte para o reordenamento internacional e formas de controle
para situações de crise. Para esses novos lineamentos, os países aliados se reuniram, em 1944,
na conferência de Bretton Woods. O encontro estabeleceu algumas normas de
comercialização entre os países industrializados e permitiu a construção dos novos alicerces
do capitalismo de época. Segundo Ayerbe (1992, p. 44), “a intenção foi de estabelecer as
bases para uma gestão multilateral do capitalismo”. Para Harvey (1992, p. 131), esta reunião,
possibilitou aos Estados Unidos agirem “como banqueiro do mundo em troca de uma abertura
dos mercados de capital e de mercadorias ao poder das grandes corporações”.
Portanto, as propostas, encaminhadas na Conferência de Bretton Woods, definiram um
conjunto de regras, instituições e procedimentos para regularem a política econômica
internacional, e ditaram o percurso econômico dos anos 50 e 60. Uma das deliberações foi a
criação de duas Instituições Financeiras, o Banco Mundial e o Fundo Monetário
Internacional, ambas as organizações com o objetivo de controlar a política externa através de
financiamentos e empréstimos a países membros, ou monitorar o funcionamento do sistema
financeiro mundial (POLANYI, 1980; HOBSBAWN, 1995; NEGRI; HARDT, 2000,
MORAES, 2001).
29
No início dos anos 50, a economia norte-americana apresentava não somente índices
elevados de produção e consumo interno, proveniente do modelo fordista
11
e de inovações
tecnológicas, como uma ampliação na capacidade de conquista de mercados externos,
influência indireta dos danos causados pela guerra e a necessidade da modernização industrial
por conta dos países europeus. Apoiado em uma geopolítica protecionista, o processo de
expansão das empresas norte-americanas ganhou uma natureza eminentemente imperialista,
sob um processo de “internalização” do mercado mundial. Este movimento contribuiu para
uma nova configuração espacial e temporal e uma tendência no aumento da mobilidade
geográfica do capital (ARRIGHI, 1996).
(...) o deslocamento espacial compreende a absorção pela expansão
geográfica do capital e do trabalho excedentes. Esse “reparo espacial” (como
o denominei alhures) do problema da super acumulação promove a produção
de novos espaços dentro dos quais a produção capitalista possa prosseguir
(por exemplo, por meio de investimentos em infra-estrutura) no crescimento
e dos investimentos diretos e no teste de novas possibilidades de exploração
de força de trabalho. (Harvey, 1992,p. 172).
No entanto, os países capitalistas passavam por transformações salutares. Nesta fase,
parte dos meios de produção pertencia ao Estado e outra aos empresários privados, conhecida
como economia mista, e “que ao mesmo tempo tornou mais fácil aos Estados planejar e
administrar a modernização econômica e aumentou enormemente a demanda”
(HOBSBAWM, 1995, p. 264). Nessas condições, os setores públicos e privados se
interpenetravam, sendo o Estado o grande articulador dos setores considerados estratégicos.
Neste período, o Estado adotou medidas intervencionistas nas esferas: financeira
(aprovação do orçamento), monetária (ação sobre o crédito e a taxa de cambio) e social
(regulamentação do salário, instalação dos regimes de seguro e a política do pleno emprego),
o que se convencionou chamar de “Welfare State”. De acordo com, Offe (1984, p. 372),
(...) foi adotado [welfare state] como concepção básica do Estado e da
prática estatal em quase todos os países ocidentais, não importa qual o
partido no poder, e com apenas alterações menores e diferenças de tempo.
11
Baseada em sistemas de máquinas especializadas, operando no interior das empresas gigantescas, com
integração vertical e administração burocrática. Sobre esse assunto ver: Scott e Storper (1986); Harvey (1992);
Boyer (1994); Benko (1999). Este assunto será tratado com mais detalhes no capítulo 2
30
Afeito foi (a) um boom econômico amplo e sem precedentes, que favoreceu
todas as economias capitalistas avançadas e (b) a transformação do padrão
de conflito industrial e de classe numa forma que se afasta cada vez mais do
radicalismo político, e até mesmo revolucionário, e que conduz a um conflito
de classe economicista, centrado na distribuição e crescentemente
institucionalizado.
A articulação entre políticas de crescimento econômico, a ação do Estado e os
setores produtivos permitiu a expansão do capital. Se por um lado os compromissos do Estado
para com a sociedade implicavam num aumento significativo de gastos públicos, por outro, o
setor empresarial se beneficiava com os subsídios cedidos. Em termos de investimentos
privados os EUA aumentaram a presença na América Latina e provocaram um estreitamento
de laços dessas economias com o padrão de desenvolvimento capitalista americano. A
internacionalização dos fatores de produção capitalista sob a liderança das empresas
multinacionais é considerada como característica marcante do padrão de desenvolvimento que
se configura após a Segunda Guerra (AYERBE, 1992).
No entanto, na segunda metade da década de 60, os Estados Unidos, apresentaram um
quadro de queda dos lucros das empresas americanas, que levaram a uma estagnação dos
salários reais
12
e refletiram nas crises das décadas posteriores. De maneira que, a
desarticulação do modelo fordismo-keynesianismo ao enfrentar as novas exigências do
capitalismo de época, no caso, a sofisticação do sistema financeiro, presumiram numa
desorganização dos processos rígidos
13
de acumulação do capital. Paralelamente, o consumo
de massa centrado no processo de urbanização atingia certa saturação (BOYER, 1994).
Teria havido problemas com a rigidez dos investimentos de longo prazo e
em larga escala nos sistemas de produção em massa, com a rigidez dos
compromissos estatais com programas de seguridade social e de defesa
(ARRIGHI, 1996, p. 3).
Neste contexto, as empresas e os governos perceberam as dificuldades e o custo de
adaptação, em face da incerteza e da desorganização das relações internacionais. A tensão
surgida foi agravada com o primeiro choque do Petróleo, após o conflito árabe-israelense (a
12
Segundo Brunhoff (1991, p.8) “o salário real, quer dizer, o salário nominal, pago em dinheiro, lares ou
franco, deflacionados pela alta dos preços”.
13
Idéia apresentada por David Harvey (1996) inspirou a discussão do modelo de especialização flexível
considerado como o grande sucessor do fordismo.
31
guerra de Yom Kippur) em 1973, que provocou a elevação dos preços do petróleo; o excesso
permanente de despesas sociais do Estado, herança keynesiana; o fim da conversibilidade do
ouro em dólar e do sistema monetário vigente; todas essas características compõem o quadro
crítico da economia mundial capitalista. O resultado deste cenário, nos EUA, foi (i) a perda de
controle da inflação; (ii) taxa de juros elevadas; (iii) baixa do escoamento da produção; (iv)
cortes representativos nos investimentos externos e internos; (v) alta dos preços; e (vi) o
aumento do desemprego.
Em 1974, registrou-se pela primeira vez a estagflação - um misto de inflação
alta e estagnação que afetava o conjunto de países capitalistas desenvolvidos.
Crescia o mercado financeiro paralelo que desafiava as regulamentações
nacionais: comercio de ações, de títulos públicos, de divisas, as formas de
riqueza intangível e quida do capitalismo de papel (MORAES, 2001, p.
32).
A crise produziu efeitos diversos na organização das empresas transnacionais e na
lógica competitiva estabelecida entre elas. Nas relações comerciais este período ficou
marcado pela mudança no foco da política antitruste. A grande empresa e os setores
concentrados deixam de ser os suspeitos usuais, cedendo lugar às distorções do processo de
competição, freqüentemente gerado por barreiras à entrada, assimetrias de informação e poder
de mercado. Da mesma forma, a proteção à pequena empresa perde relevância e os direitos do
consumidor passam a ser defendido primordialmente através da busca de eficiência produtiva
e de transparência nas condições de concorrência (ARRIGHI, 1996).
Um dos aspectos que difere a crise dos anos 70 e 80, da Grande Depressão, foram as
ausências dos grandes movimentos sociais que forçaram uma política intervencionista naquele
período. “Nos EUA, em 1982, não houve nenhuma marcha da fome de milhões de
desempregados; nenhuma grande greve operária enfrentando a repressão, nenhuma batalha
para a implantação de novos sindicatos” (BRUNHOFF, 1991, p. 9). Portanto, a resignação
admitida pela sociedade contribuiu para a retomada econômica, o fortalecimento do Estado
frente às políticas externas, à limitação de produtos importados em território nacional e à
concessão de empréstimos a juros baixos para as indústrias.
Neste mesmo período, a participação de ativos circulantes das empresas norte-
americanas no mercado externo declinou acentuadamente, por conta das economias japonesa
e européia. O mercado não estava favorável para investimentos diretos dos EUA, de maneira
32
que as empresas européias e japonesas passavam por um processo de superação na
competição mundial por recursos e mercados consumidores.
A diminuição crescente da rentabilidade e a saturação do consumo interno
estimulam a competição entre as economias capitalistas avançadas pela
conquista de novos mercados. Cresce o esforço exportador e aumentam os
investimentos diretos no exterior das firmas multinacionais (AYERBE,
1992, p. 58).
O efeito foi a intensa transnacionalização do capital norte-americano e investimentos
maciços do governo para reverter sua perda de participação no mercado mundial. As
empresas americanas passaram por um processo de multinacionalização, a partir da década de
80, para se protegerem dos desafios da competitividade, o que acarretou no fortalecimento do
poder mundial do governo dos EUA. Neste contexto conhecido como a Era Regan, a nova
política econômica dos Estados Unidos, buscou inspiração nas vertentes do pensamento
neoliberal
14
, de modo que se apoiaram: (i) na redução de gastos públicos, através do corte
seletivo de programas sociais; (ii) na redução dos impostos e aumentos dos incentivos fiscais
para as empresas; (iii) na ampliação dos gastos militares como decorrência da retomada da
política exterior de guerra fria; (iv) fortalecimento da poupança interna; e (v) aumento dos
investimentos externos e empréstimos financeiros, porém sob uma taxa de juros elevados.
Os países capitalistas, nos anos 90, sofreram com o reflexo da crise estrutural aberta
no final dos anos 60, que revelaram: (i) o esgotamento do sistema técnico; (ii) o agravamento
das contradições sociais; (iii) o fim da produção de massa de produtos padronizados, e (iv) a
ruína do regime internacional. Para superar esse momento foi necessário o equilíbrio entre a
inovação do produto e do processo, a demanda da parte social, e a produção cada vez menos
rígida.
Neste momento de estagnação econômica, de dívida externa elevada, de inflação
crescente, de recessão e de desemprego, os países Latino-Americanos se encontravam numa
grave crise financeira. No entanto para os países capitalistas credores dos financiamentos, a
política de endividamento global facilitou a reestruturação econômica.
14
Segundo Moraes (2001, p. 42, grifo do autor) “o pensamento neoliberal desdobrou-se, no pós-guerra, em
algumas linhas ou variantes. (...) as três principais são, pela ordem das ‘datas de nascimento’: 1) escola austríaca,
liderada por Friedrich August Von Hayek [“O caminho da servidão”], o patrono de todo o pensamento neoliberal
contemporâneo; 2) escola de Chicago, personificada em T.W. Schultz e Gari Becker (ligado à teoria do capital
humano) e principalmente Milton Friedman (1912- ) [“Liberdade de Escolher: o novo liberalismo econômico”],
o grande homem da mídia dessa escola; 3) escola de Virgínia ou public choice, capitaneada por James M.
Buchanan”.
33
Para diminuir a gravidade da situação dos países devedores foi lançado um conjunto
de procedimentos técnicos em favor da economia de mercado. Essas medidas, conhecidas
como Consenso de Washington, tinham como objetivo: (a) a diminuição das barreiras
alfandegárias; (b) a redução das dificuldades para entrada de investimentos estrangeiros; (c) a
reforma tributária e disciplina fiscal; (d) a liberalização das taxas de juros; e (e) a revisão dos
gastos públicos.
De maneira que, aumentaram os encargos com o serviço da dívida e prepararam os
potenciais mercados para receberem capitais externos. Este pacote de medidas contribuiu para
o ajustamento macroeconômico dos paises em desenvolvimento.
Apos apresentar o histórico do capitalismo pretende-se a seguir tratar do capitalismo e
sua fase contemporânea coma a finalidade de identificar as características principais do
contexto atual da economia global.
34
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-
-
2.1
I
NTRODUÇÃO
O atual estágio do capitalismo, que a partir da década de 60, adquire uma forma
globalizada e se serve da evolução das novas tecnologias da informação e da comunicação
15
,
tanto nos processos produtivos quanto nas relações sociais, aponta para o que, de uma
maneira geral, chamamos de capitalismo contemporâneo.
Nesse estudo percebe-se que “o capitalismo é essencialmente conjuntural. Ainda hoje,
um das suas grandes forças é a facilidade de adaptação e de reconversão” (BRAUDEL, 1989,
p. 66). O capitalismo contemporâneo consagra-se por apresentar um novo modelo de
reprodução do mundo e um novo modelo de acumulação. Ambos, centrados, sobretudo, nos
movimentos do capital financeiro, na circulação de bens e serviços, na informação, na
satisfação e na eficiência, do que situado somente na unidade de produção.
Na concepção de Hardt e Negri (2000), as grandes potências industriais e financeiras
produzem não apenas, o que citamos no parágrafo anterior, mas também subjetividade
16
.
Considera-se oportuno nesse momento do nosso trabalho fazer menção a este aspecto da
realidade contemporânea para melhor fundamentar a análise das relações entre empresa e
consumidor que setratada neste capítulo e no seguinte. A produção de subjetividades, de
necessidades, de relações sociais, de corpos e mentes, consiste na criação não de um
modelo de consumo, mas principalmente na produção do mundo do consumidor. Segundo
Moles (1975, p. 12, grifo do autor).
As relações do indivíduo com o meio social passam, a partir de agora e
fundamentalmente, pelos objetos e produtos transformados nas expressões
15
Entre as novas tecnologias destacam-se: a microeletrônica, a computação, as telecomunicações, a óptica
eletrônica, a radiodifusão, a engenharia genética, entre outras; que vieram operacionalizar a atividade humana e
o comportamento social.
16
A subjetividade não está sendo entendida aqui como coisa em si, essência imutável e centralizada no indivíduo,
mas como produção social. Ela é essencialmente fabricada e modelada no registro social e assumida por
indivíduos em suas existências particulares. (GUATTARI & ROLNIK, 1986)
35
mais tangíveis da presença e da sociedade em seu ambiente, desde o
momento em que tomam o lugar das coisas naturais.
Neste capítulo, abordar-se-á, as transformações sócio-espaciais que se sucederam para
a constituição do capitalismo contemporâneo, além dos mecanismos políticos, econômicos e
sociais que colaboram para aumentar o estranhamento e alienação
17
frente às maneiras
emergentes de sentimento, de pensamento, de imaginação e de criação, entre outros pontos.
2.2
-
C
APITALISMO CONTEMPORÂNEO E AS MUDANÇAS NO MUNDO DO
CONSUMO
Primeiramente, deve-se reconhecer que a sucessão dos regimes de acumulação
18
capitalista contribuiu para a modernização da dinâmica dos processos laborais, das formas de
regulação, da composição política do proletariado, do tipo de organização da produção. No
entanto, a ênfase será dada às transformações ocorridas no mundo do consumo.
Estas novas configurações territoriais do capitalismo contemporâneo derivam, em
grande parte, da sucessão de rupturas desencadeadas a partir do colapso sistêmico do regime
de acumulação fordista, na segunda metade do século XX. (GODOY, 2002). Segundo Boyer
(1994); Benko (1999); Harvey (1992); neste período, o fordismo passa por uma aguda crise:
baixa lucratividade, elevação inflacionária nos países capitalistas, taxas de juros altas
empregadas pelos Estados Unidos, desvalorização do dólar, crise do petróleo, avanço do
modelo de reivindicação das classes sociais, compilação da teoria crítica ao trabalho,
conforme apresentado no capítulo 1.
Para Scott e Storper (1986), além do conjunto combinado de tais eventos, a
desintegração vertical das indústrias de produção de massa levantou evidências, nos anos 70 e
17
As expressões em alemão, Entäusserung e Entfremdung, são freqüentemente traduzidos como alienação,
indicando uma marca negativa das relações humanas. Entretanto existe uma distinção entre alienação
(Entäusserung) e estranhamento (Entfremdung): enquanto a primeira tem o significado de algo ineliminável da
constituição do homem, ou seja, uma exteriorização que o autoproduz e forma no interior de sua sociabilidade; o
estranhamento é a designação dada para as insuficiências de realização do gênero humano decorrentes da
incoerência do homem ao pensar sobre os processos de humanização. Estes processos são, cada vez mais,
dependentes das lógicas capitalistas, as quais incidem sobre o resultado do ofício humano e produzem
subjetividades ao ponto do homem si considerar estranho em meio da sua existência individual. Dado que, o
estranhamento projeta certa dificuldade de ultrapassar os obstáculos que o impedem de que certas atividades se
realizem em conformidade com as potencialidades humanas e o promove à fuga da racionalidade para a
alienação (MARX, 1975; LACAN, 1998; RANIERI, 2001).
18
Um regime de acumulação explicita o conjunto das regularidades que permitem uma acumulação mais ou
menos coerente do capital, isto é, que amortecem e esbatem no tempo os desequilíbrios gerados constantemente
pelo próprio processo de formação do capital. (BOYER, 1994, p. 122).
36
80, em pleno período de reestruturação econômica e reajustamento político e social (Harvey,
1992), de que as estruturas sócio-espaciais produzidas durante as fases de industrialização
fordista encontravam-se em processo de dissolução e aniquilamento. Sendo assim, estas
estruturas foram substituídas por novas formas e por novas funções na organização industrial
e na vida social, econômica e política dos países capitalistas, exigidas pelo emergente modelo
de acumulação flexível
19
.
Desse modo a crise do fordismo corrobora com o detrimento da eficácia das normas
de regulação social dos países capitalistas, de modo que, admite-se a necessidade de
renovação dos dispositivos de reificação do proletariado somados aos ensejos criados pela
competição intercapitalista. Na concepção de Harvey (1992), a transição do regime de
acumulação fordista para o modelo de acumulação flexível permitiu minar certa rigidez
normativa pré-existente entre as relações sociais, e promover a restauração do progresso do
sistema capitalista.
A transformação das bases do regime de acumulação engendraria um novo
modelo, capaz de apontar uma saída duradoura e viável do processo de crise.
Este modelo faria, supostamente, progredir a acumulação capitalista, na
medida em que transformaria a totalidade das condições de existência do
trabalho assalariado, conseguindo responder de maneira orgânica à questão
da reprodução da relação salarial (BRAGA, 2003, p. 105).
As práticas relacionadas, nesta nova etapa de acumulação de capital em resposta à
crise do capitalismo, para qual Harvey (1992, p. 140-141) aponta as seguintes características:
(i) flexibilidade dos processos de trabalho, dos produtos e padrões de consumo; (ii)
surgimento de setores de produção inteiramente novos; (iii) novas maneiras de fornecimento
de serviços financeiros; (iv) novos mercados; (v) manutenção de taxas altamente
intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional; (vi) rápidas mudanças dos
padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas; (vii)
valorização do trabalho no setor de serviços; (viii) inserção de conjunto e práticas industriais
em áreas, ate então, pouco industrializadas que utilizaram de estratégias arrojadas de atração
19
Em relação à polêmica teórica em torno da concepção de uma economia com relações de produção
denominadas flexíveis, preferiu-se o não aprofundamento deste problema nem, tampouco, a aceitação sem
fundamentos prévios, da idéia de que a expansão do capitalismo “pós-fordista” ocorre de igual modo em
diferentes escalas espaciais. De passagem, vale dizer que as formas organizacionais da acumulação flexível não
se tornaram hegemônicas em escala planetária mas o fordismo que as precedeu também não (HARVEY, 1992;
GODOY, 2002; BRAGA, 2003).
37
de capital: mão de obra barata, isenção de impostos e baixo custo de instalação das empresas
(Flandres, na Bélgica; Califórnia, nos EUA; Cingapura, em Cingapura; Seul, na Coréia do
Sul, entre outros); (ix) profusão de técnicas e tecnologias que permitiram a ‘compressão do
espaço-tempo’; (x) radical reestruturação no mercado de trabalho, diante da volatilidade do
mercado, do aumento de competição e da diminuição das margens de lucro, além, (xi) das
transformações acerca do comportamento do operário frente à exploração da força de trabalho
e do retrocesso do poder sindical;
Esta fase iniciada na década de 60 e parcialmente completada no início dos anos 90,
provocou mudanças estruturais não somente na organização do trabalho e operação produtiva,
mas em todos os segmentos do consumo. Assim, esse novo princípio contém em único
processo todo o tratamento da produção, desde a mercantilização das formas culturais até a
racionalização do trabalho operário (HARVEY, 1992). Por tal razão, assisti-se uma maior
mobilidade e flexibilidade do capital, tendendo para uma existência nômade crescente, e
representando uma relação global, com efeito, em todos os setores econômico, político e
social.
Inicialmente, o novo modo de desenvolvimento capitalista, estruturou sua base
mediante o tratamento da informação e a introdução de novas tecnologias a partir da
automação das máquinas e estendida para os sistemas de controle na vida social. Para Mônica
Arroyo, (1999, p. 19), “a informação aparece, então, como o principal motor da vida
contemporânea, como a forma de energia predominante no comando de todas as fases do
processo de produção” e completamos que a informação aparece, também, como um meio de
abordar as fragilidades da subjetividade dos indivíduos. Estes novos aliados ao modelo
capitalista utilizaram os mais novos recursos, como a introdução de softwares, de interfaces
microeletrônicas e a produção de conhecimento, para alcançar tal desenvolvimento, e gerir de
modo revolucionário sua produção, melhorar qualitativamente a organização das atividades
produtivas e acelerar o consumo na sociedade.
O exemplo deste modelo de acumulação, que combinava estratégias comerciais,
escoamento da produção, gestão de excedentes, nasce no Japão, nos anos 70, e ficou
conhecido como Toyotismo. É importante lembrar que este novo conceito de produção e
consumo, apesar de ter origem em terras nipônicas, teve sua dimensão alargada o que
possibilitou sua execução em diversos países, podendo dispor de outras nomenclaturas
regionais.
O conjunto de inovações organizacionais, que transformou profundamente as
estruturas de produção, quanto à relação dos processos de trabalho (contratos, organização no
38
interior da empresa, salários, gestão de recursos humanos) e do convívio social (dinâmica do
consumo, lazer, acesso), tinha como objetivo atender a prosperidade do capital. Estas
modificações buscavam uma maior eficiência produtiva, associada à produção sem estoque e
de pronta reação à demanda do mercado. Para Coriat (1994), essas inovações consistem na
combinação de dois princípios: auto-ativação e Just in time. Primeiro, a auto-ativação que
procede para um único processo de transformar o trabalhador em agentes multifuncionais a
partir da linearização da produção e da organização do trabalho em torno de postos
polivalentes. Segundo, o just in time que se refere ao maior rendimento do trabalho vivo,
centrado na manipulação e observação simultânea da necessidade de suprir no tempo certo a
quantidade exata de mercadoria.
Portanto, a grande estratégia deste período foi a diminuição do tempo de giro da
mercadoria e a racionalização do trabalho. Isto foi possível a partir da introdução de novas
tecnologias de produção, como a automação e robotização dos sistemas, em relação à redução
do tempo de circulação do consumo do produto, tempo de vida substancial. Esses dois
campos são de grande importância para entender a constituição do capitalismo
contemporâneo, sendo uma relação de interdependência e não de hierarquia, ou seja, seria
inútil pensá-los separadamente.
A meia vida de um produto fordista típico, por exemplo, era de cinco a sete
anos, mas a acumulação flexível diminuiu isso em mais da metade em certos
setores (como o têxtil e o de vestuários) (HARVEY, 1992, p.148).
Os altos investimentos foram repassados por ambas as áreas, porém ocorreu uma
intensificação, na questão, da preparação do novo consumidor. Entretanto se dedicou uma
maior atenção nos artifícios de indução de necessidades e de transformação cultural ordenada
no cenário material da vida (HARVEY, 1992; GROSSMAN, 2006).
O modo de funcionamento da reprodução capitalista, no capitalismo contemporâneo,
tem na imaterialidade (trabalho intelectual/lingüístico e trabalho afetivo) a simbiose entre a
produção e o consumo. De modo que, no presente período, conhecimento/informação
20
transforma-se na base do processo de valorização e circulação da mercadoria. A circulação
deve ser concluída em uma determinada extensão de tempo de rotação, socialmente necessária
para o consumo e ditada pelas gicas do mercado, antes de se tornarem obsoletas para a
20
A inovação incessante das interatividades nos processos produtivos e a conseqüênte pluralidade de formas de
objetos a venda, faz com que as empresas invistam cada vez mais em Pesquisa & Desenvolvimento (HARVEY,
1992).
39
sociedade. A valorização implica na forma de acesso ao universo da mercadoria e no
exercício de tornar ativo a pulsão espontânea de consumo do indivíduo.
O poder do consumo é epidêmico, envolve o indivíduo e estimula a dinâmica da
sociedade capitalista, ainda como argumenta Rolnik (2003) o consumo, foi (e é) cafetinado a
serviço da acumulação capitalista. Segundo Santos (2000, p.34), “o poder de consumo é
contagiante, e sua capacidade de alienação é tão forte que sua exclusão atribui às pessoas a
condição de alienados”.
O que está em jogo é a racionalidade consumista, em moldes não mais apropriáveis
pelos antigos conceitos do paradigma produtivista, tais como produção-produção... e sim pela
forma categórica de transformar simples objetos em ícones do consumo. Para que isto ocorra,
o capitalismo contribui para oprimir o ócio, reduzir o tempo, padronizar o gosto e controlar a
natureza das coisas.
Segundo Pelbart (2000, p. 34) esta nova fase do capitalismo, que a denomina de
neocapitalismo, propende a subsumir a integralidade do tempo em função da produção de
sentidos. Tudo visa aceleração do consumo e acumulação capitalista. De modo que “o tempo
livre virou tempo escravizado”. Assim, o consumidor, onde quer que esteja, tende a ver a
visita às lojas e o ato do consumo mais como uma saída lúdica do que como uma tarefa
enfadonha.
No entanto, este movimento do consumo é acompanhado por um desvio de valores na
sociedade, entre valor de uso e o espírito de aquisição
21
das mercadorias (SMITH, 1988;
HAUG, 1997; COSTA, 2004). A lei do valor seria o mecanismo através do qual a forma
histórica particular do caráter social se expressa. Quando contextualizada na mercadoria
aglutina os processos e atos produtivos diversos e contraditórios, representando um uso, em
prol do funcionamento do sistema econômico vigente (MARX, 1977).
a forma na qual um valor de uso ocorre (...) compreende suas propriedades
espaciais. Mas não é apenas a substância intrínseca de uma mercadoria que
determina seu valor de uso. Antes, é a utilidade do objeto em relação aos
outros objetos, eventos e atividades. O valor de uso é, em primeira instância,
uma relação, e como parte do conjunto de relações que determinam um valor
de uso particular está um conjunto de relações espaciais (SMITH, 1988,
p.130).
21
40
A força da fetichização da mercadoria contribui para substituir estes princípios sociais
de valores. Esta submete a sociedade a uma dominação por coisas suprasensíveis que se
realiza nas imagens manipuladas pelas lógicas capitalistas e no movimento de produção
pseudo-real que repudia a realidade. A mercadoria se admira a si mesma num mundo
artificializado e construído por ela mesma (DEBORD, 1992). Assim, o exercício de forte
controle do fascismo à mercadoria encontrou as condições de reprodução nas formas de
comércio para a acumulação de capitais.
O desenvolvimento deste sistema supervalorizou as propostas burguesas e capitalistas,
além de manter uma grande oferta de utensílios para a sociedade. As empresas perceberam
que a utilidade da compra era um fator secundário e que os consumidores estavam mais
interessados ao prazer de comprar. Contudo, as vendas agregaram valores ideológicos e
moviam, cada vez mais, os consumidores a penetrar no universo simbólico do status social.
Segundo Padilha (2006, p. 55), “os objetos passaram a ser adquiridos não pelo seu valor-de-
uso, mas pelo significado social de sua posse”. De modo que as formas comerciais tornaram-
se centros de consumo, configurando-se em espaço de coisificação à qual sujeitam as pessoas
a experenciar o gosto do capitalismo. Segundo Debord, (1996, p. 9) O consumidor real
torna-se um consumidor de ilusões”.
Isto posto, conclui-se com base nas referências bibliográficas citadas que o capitalismo
contemporâneo tem gerado, através da produção de subjetividades, de processos de
agenciamento e de convencimento do consumidor, mecanismos cada vez mais eficazes para a
acumulação do capital. Nesse sentido apresenta-se a seguir considerações a respeito das
formas de comércio.
2.3
-
A
H
ISTORICIDADE DAS FORMAS DE COMÉRCIO
Entre os séculos XI e XVI, a evolução do Ocidente assistiu uma reformulação nas
bases econômicas, sociais e políticas. A partir da consolidação da ruptura do modo de
produção feudal, novos elementos foram incorporados nos lugares de convívio social. As
cidades se modificaram a fim de atender a uma nova lógica espacial de produção, tornando-se
centro de transação de capitais e das mais diversas mercadorias. O sistema capitalista
começou a apresentar um esboço prematuro e introduziu alguns dispositivos para compor a
morfologia urbana de época. Assim, os novos elementos incorporados no meio urbano como a
pequena indústria doméstica, a loja de artesões, as feiras livres, entre outros, dar-se-ia sentido
41
à nova dinâmica do capital. De maneira que, novos conceitos e valores perpetuaram-se para
gerar riqueza social naquele momento.
Conforme visto no capítulo anterior, os novos Estados formados na Europa
impulsionados por um novo arranjo territorial, lançaram-se à busca econômica entre os mares
e terras do novo mundo na tentativa de centralizar divisas ao seu território e
consequentemente propagar novas formas de organização espacial e conduzir para uma nova
promoção comercial no Ocidente (BRAUDEL, 1989; PINTAUDI, 2005; VARGAS, 2001).
Estes elementos contribuíram para afirmar e anunciar o desenvolvimento do sistema
capitalista.
Este novo modelo econômico foi marcado, entre importantes fatos, com a apropriação
da terra e a delegação da mesma por um titular. A propriedade privada, enquanto elemento
constituinte das relações socioeconômicas proporcionou a alienação do trabalhador e a
revolução da propriedade comercial. Estas características trouxeram uma refuncionalização
para a estrutura social existente. A produção de bens que antes era confeccionada na casa do
próprio artesão ou artista passava agora compor a paisagem da produção industrial.
A partir da industrialização e do crescimento demográfico, a propriedade comercial,
apresentou para as cidades um novo desenvolvimento do comércio. A produção em massa e a
demanda exigiram profundas modificações no setor. Entretanto o comércio apresentou
crescente valorização no conjunto das atividades econômicas.
“Entre meados do século XIX e os primeiros anos do século XX, o comércio
ganhou maior importância aliado à produção em massa e, assim, passou a
criar novas formas para a troca de mercadorias. É neste momento que
surgem as primeiras grandes Galerias Comerciais, Passagens Comerciais e
Lojas de Departamento nos centros das cidades européias. Estes
estabelecimentos comerciais inserem-se no movimento de modernização dos
centros urbanos iniciados no fim do século XVIII” (SILVA, 2005, p. 611).
Portanto, os primeiros caprichos de construir estabelecimentos que centralizavam
mercadorias, foram para atender a racionalidade burguesa de consumo. Assim, estes
abrigavam um comércio seletivo de objetos de luxo e que representavam as diferentes
estações do ano. O pequeno comércio de mercadorias populares era controlado por lojas
especializadas (SILVA, 2005).
42
Com o advento das Lojas de Departamento
22
, durante o final do século XIX, o
comércio apresentou ao público uma nova forma comercial
23
e um novo conceito de
consumo. Estas modificações contribuíram para reestruturar a paisagem urbana e passaram a
atender, também, outras classes, com produtos mais baratos e em grande quantidade
(VARGAS, 2001; SILVA, 2005). Estas transformações na propriedade ocorreram nos Estados
Unidos, Inglaterra e França, estimuladas pelas idéias de Aristide Boucicaut
24
, criador do Bom
Marché (MOLES 1975).
O mercado varejista de Paris
25
foi o berço na construção de grandes Lojas de
Departamento e o lugar onde começou a disseminar esta forma comercial. Estes
estabelecimentos, segundo Emile Zola
26
, eram como “uma catedral de comércio para uma
multidão de clientes”, estas por sua vez tratavam de satisfazer os desejos descontrolados da
sociedade. Para Benjamin (1971, p. 26), “Paris inaugura um modelo capitalista a que o
homem se integra para se distrair onde frutifica a ostentação e o desejo de consumir”.
As Galerias Comerciais e as Passagens Comerciais atendiam a uma clientela mais
seletiva, vendiam principalmente artigos de luxo e peças de vestuário; as Lojas de
Departamento ofereciam mercadorias mais baratas e em grande quantidade, para um público
mais popular, porém capitalizados.
Logo, a apresentação dessas grandes superfícies comerciais, nas cidades européias,
voltadas para um público burguês, enquadrava-se num movimento de modernização dos
centros urbanos iniciados no fim do século XVIII. Este introduziu ao espaço urbano uma série
de modificações, cuja finalidade era atender à demanda e a circulação do capital.
As duas primeiras décadas do século XX marcaram o início do desenvolvimento de
novas formas de comercio. Esta nova fase concebia no mesmo espaço físico a concentração e
centralização da produção. Esses estabelecimentos internalizavam, num único campo
22
Datas das grandes lojas parisienses, muitas já existiam como pequenos comércios, mas foram nesta datas a
mudança de estrutura: Bom Marche (1852), Louvre (1855), Bazar de l’Hotel de Ville (1856), Belle Jardiniere
(1856), Printemps (1859), Samaritaine (1869), Galerias Lafayette (1895).
23
Segundo Pintaudi (2005, p. 145) “As formas comerciais são, antes de mais nada, formas sociais; são as
relações sociais que produzem as formas que, ao mesmo tempo, ensejam relações sociais”. Estas construções,
produto do trabalho do homem, contribuem para a formação da consciência social, de maneira que, a criação
transforma a natureza das coisas, mediada por lógicas capitalistas, e cria um ambiente para o “alienar” humano.
24
Idealizador das lojas de departamento e pioneiro em estratégias comerciais para melhor atender o cliente
(entregas em domicílio, preços marcados no produto com etiquetas, vendas por catálogo por correspondência,
liquidação de verão e inverno, entrada livre para o consumidor e produtos em exposição em vitrines).
25
Segundo, Valquíria Padilha (2006), as primeiras galerias de Paris foram impulsionadas pelo o desenvolvimento
das indústrias têxteis, pelo o uso do ferro nas construções e pela a utilização da fotografia como meio de
comunicação.
26
Entre tantos livros, o autor escreve um romance francês titulado como “Paraíso das damas” que descreve o
cotidiano da cidade de Paris e a inserção da loja de departamento. ZOLA, E. Au bonheur des dames. Paris:
Pasquelle, [19..]. 504p.
43
organizacional, atividades e transações que em tempo anterior eram executadas por unidades
empresariais distintas. Antes, o comércio de bens de consumo diário era constituído por
formatos e modelos tradicionais de loja: padaria, mercearia, açougue, leiteria, quitanda, etc.
Neste segmento varejista, faziam parte, pequenos comércios, lojas especializadas e
comerciantes independentes. A junção de categorias de produtos, como é vista nos
supermercados de hoje, ainda não era expressiva, o máximo que acontecia era a combinação
entre mercearia e açougue. De modo que, o consumidor era obrigado a percorrer diferentes
estabelecimentos para adquirir tudo aquilo que necessitava (LEPSCH, 2001). Entretanto, com
o advento destas novas formas de comércio, permitiu-se uma racionalização nos gastos de
circulação da mercadoria, e “reduziram significativamente os custos no sistema de vendas ao
consumidor” (PINTAUDI, 1981, p. 28). Além de permitir que o consumidor realizasse um
volume maior de compra de uma vez. De início, estes tipos de estabelecimento comercial
surgiram principalmente nas grandes cidades.
Nesta época, para acelerar o giro de capital, os comerciantes adotaram certas técnicas
de venda para atrair consumidores de todas as classes sociais e, consequentemente, vender
seus produtos mais rapidamente. O capital assim obtido proporcionou uma economia de
velocidade. Para o desenvolvimento deste setor foi fundamental a criação de novos
equipamentos, de planejamento organizacional e de métodos de controlar os fluxos de saída e
entrada de mercadoria.
Também, tiveram apoio do poder público indiretamente, que investiu na construção de
linhas de trens e metrôs urbanos para auxiliar o transporte, o emprego de facilitadores
urbanos
27
, como praça, rotatória e grandes avenidas, para atender à circulação de pessoas que
27
Todo e qualquer equipamento urbano que ao se modificar materializa a produção no espaço geográfico. Este
contribui para a eficiência da circulação, acelera o consumo e, assim, atende a uma necessidade, física e
estrutural, na reprodução do capital dos estabelecimentos privados. Os facilitadores urbanos são um dos vasos
importantes para a difusão das territorialidades, assunto que será debatido na próxima seção (seção 5, capítulo 2).
Este mecanismo é constituído por acordos políticos tendo como contrapartida a instituição pública, na figura do
prefeito ou por um contrato entre a empresa privada e a prefeitura para melhorar a viabilidade ao acesso à
mercadoria. Como exemplo: No caso de Franca, interior do Estado de São Paulo, a prefeitura teve que investir,
em 2006, na adequação do canal do Córrego dos Bagres, a fim de evitar enchentes que atingiam a Avenida José
Barbosa Sobrinho; o redimensionamento de uma rotatória que dá acesso simultâneo às avenidas Antônio
Barbosa, Doutor Alonso, Ademar Pólo Filho e José Barbosa Sobrinho; além da construção de uma alça para a
Rodovia Candido Portinari, para atender às exigências da rede varejista Wal-Mart; ou em Vitória, capital do
Espírito Santo, onde a empresa da Wal-Mart cedeu parte do terreno que havia comprado para a reforma e a
construção do prolongamento da Avenida Jair Etienne Dessaune, além de custear melhorias no entorno do
supermercado para a comunidade local e removeu o ponto de ônibus da frente da prefeitura e passou para a
frente do estabelecimento aumentando a área do ponto. “Quanto ao impacto no trânsito na região, na cidade de
Vitória, o Wal-Mart vai investir R$ 710 mil na melhoria das vias no entorno do empreendimento” (MINGO,
2004, p. A10). Ambos os casos não estavam nos planos das prefeituras inicialmente. Estes vieram à tona após a
divulgação do interesse da companhia em se instalar nas respectivas cidades.
44
essas novas organizações exigiam. A difusão do uso de alguns “utensílios” domésticos, como
o automóvel e a geladeira, favoreceram o faturamento desses grupos capitalistas.
As transformações foram encaradas como uma nova etapa. Previamente nos
estabelecimentos menores, a vigília era controlada com mais facilidade e o consumidor não
detinha instrumentos para escolher o que comprar. O produto era atravessado pelo
comerciante de maneira que este se sentia “coagido” para realizar tal função.
No entanto, em oposição a esta configuração espacial, os novos modelos de venda
trouxeram uma relativa popularização do comércio. Ou seja, democratizaram o espaço interno
do estabelecimento, aumentaram a quantidade de produto, fixaram o preço e reduziram os
custos para os clientes.
Lojas com entradas livres (...), onde a entrada não implica a obrigação
moral de compra, liberação tão evidente em um espaço aberto, anônimo ao
visitante não-personalizado, afável aos tímidos, medrosos e comedidos, (...)
com suas vitrinas imensas (...) um Universo onde se vende de tudo com o
preço afixado, em plena luz (...) em meio de uma democracia burguesa do
comercio em face do qual, todos são iguais diante da compra e da vendedora
charmosa (...) (MOLES, 1975, p. 100).
Para melhor operacionalização da mercadoria algumas lojas adotaram o sistema de
auto-serviço, uma das formas que o capital comercial encontrou para viabilizar o livre acesso
do consumidor às mercadorias, valorizarem o comportamento impulsivo nas compras, e
reduzirem o número de trabalhadores, cada vez menos qualificados em vendas (PINTAUDI,
1981). Segundo Lepsch (2001, p. 35) “a oportunidade de examinar e tocar livremente os
produtos resultou no aumento das vendas médias”.
Desse modo, permitiu ao consumidor maior autonomia na escolha do que consumir
(entre várias linhas de produto e entre diversas marcas dentro de cada linha); também, optou
pela livre circulação entre as prateleiras (gôndolas) e a “responsabilidade” de se dirigir aos
locais de pagamento. Este modelo foi seguido pelos supermercados, que prenunciaram a
concentração financeira e territorial, e que surgiram nas periferias das grandes cidades
americanas, no início do século XX, em contraposição as Department Stores, difundidas na
Europa, no século XIX.
A criação desses novos estabelecimentos contribuiu, em primeiro lugar, para
responder um fenômeno tipicamente parisiense; segundo, para atender às necessidades da
indústria, que, passava por um processo de modernização e produção em massa; terceiro
45
com a Grande Depressão americana, em 1929, período de recessão econômica, alta taxa de
desemprego, aumento dos impostos, fuga de capital em grande escala e conseqüentemente a
redução do poder aquisitivo da população, revertendo o processo de expansão de pequenos
estabelecimentos e forçando a substituição por lojas únicas (supermercados), na tentativa de
diminuir os impostos e, reunindo-se em um único local, os produtos que anteriormente eram
dispersos no espaço e organizados por comércios especializados de pequenos capitais.
O supermercado significou concentração financeira e territorial, porque
passou a concentrar, sob a propriedade de um único empresário ou grupo e
em um único local, a comercialização de produtos anteriormente dispersos
no espaço, que se constituíam em comércios especializados de pequenos
capitais, tais como a padaria, o açougue, a peixaria, o bazar, a quitanda
(frutas, verduras e legumes) e a mercearia (produtos de limpeza e gêneros
alimentícios não perecíveis) (PINTAUDI, 2005, p.151).
Por sua vez, o surgimento dos supermercados atendeu a um movimento estratégico em
relação: às mudanças culturais (comportamento do consumidor, padrões de concorrência entre
países, estrutura de mercado, qualidade de vida), alterações nos ambientes tecnológicos e
organizacionais (economia de escala e escopo, aperfeiçoamento técnico, racionalização do
sistema operacional industrial, políticas setoriais privadas) e transformações institucionais
(distúrbio nas estruturas macroeconômicas e nos sistemas políticos).
“As principais características do novo formato eram: grandes lojas de baixo
custo; localização em fábricas e armazéns abandonados na periferia das
cidades; instalações internas extremamente toscas; elevado volume de
vendas, utilização de
check out
28
e produtos dispostos de maneira acessível,
permitindo ao consumidor se auto-servir; mix de produtos amplos, com
várias categorias compondo departamento ou seções (mercearia seca,
mercearia líquida, carnes, padaria e etc.); e mix de preços mais baixos do que
os dos formatos estabelecidos”. (LEPSCH, 2001, p. 34)
28
Esta palavra tem o mesmo significado no português que: checagem de saída ou caixa. Porém, trata-se de um
sistema de comando informatizado, em rede, com equipamentos sensoriais numéricos e mecânicos integrados,
capazes de manejar (indicar a sujeição do cliente e do trabalhador submetidos a essa técnica gerencial) o
comportamento de clientes, na fila do posto de caixa de saída e, com a participação involuntária deles e,
controlar o ritmo de trabalho dos operadores de caixas.
46
Com o passar do tempo, logo depois dos anos da Segunda Guerra Mundial, esses
supermercados foram absorvendo novos detalhes e novas estratégias foram sendo adotadas
para suportar a competitividade. Ampliaram as áreas de vendas, ofereceram estacionamentos
para automóveis, ganharam novas marcas e um mix de produtos diferenciados, delimitando
no espaço interno os pontos de venda e os setorizando em departamento específicos. Além
disso, passaram por uma reestruturação no design (progresso estético, razão e ótimo social) e
na arquitetura da loja, preocupando-se com layout e com a localização.
Outras transformações relevantes foram no serviço periférico, como: ar condicionado
central, carrinhos de compra, modernas gôndolas, balcões frigoríficos abertos, caixas
registradoras, entre outros. (LEPSCH, 1996). Contudo esses estabelecimentos renovaram os
processos e a forma de consumir e vender a mercadoria. Assim, o supermercado inseriu novos
conteúdos e maneiras de “socialização” da população no espaço urbano.
Quadro 2 - Características e classificação de superfícies comerciais do varejo
supermercadista
Formatos de
Loja
Áreas de
venda / m
2
N
o
médio de
itens
% de vendas
não alimentos
N
o
de
check-
outs
Seções
Loja de
Desconto
29
30 – 50 > 1000 --
1-2
Loja de
conveniência
50 – 250 1.000 3
1-2 Mercearia, frios e
laticínios, bazar,
snacks.
Loja de
sortimento
limitado
200 – 400 1000 3
2-4 Mercearia, hortifruti,
frios e laticínios, bazar.
Supermercado
compacto
30
300-700 4.000 3
2-6 Mercearia, hortifruti,
carnes e aves, frios e
laticínios, bazar.
Supermercado
convencional
700-2.500 9.000 6
7-20 Mercearia, hortifruti,
bazar, carnes e aves,
peixaria, padaria, frios
e laticínios.
Hipermercado 7.000-16.000 45.000 30
55-90 Mercearia, hortifruti,
bazar, carnes e aves,
peixaria, padaria, frios
e laticínios, têxtil e
eletrônico.
Org: FERREIRA-COSTA, 2007 Fonte: ABRAS.
O aumento das opções de formato de loja permitiu as mudanças nos hábitos de
consumo. O tempo disponível para a realização das compras tornou-se mais escasso, por
29
Este conceito encontra-se no território brasileiro como OUTLET, porém este, no Brasil, não existe uma loja
específica na categoria supermercadista para o desenvolvimento desta atividade.
30
Neste trabalho iremos considerar a categoria supermercado compacto semelhante ao Mini-Mercado.
47
conta da maior participação da sociedade no mercado de trabalho. Com isso, o consumidor
optou em realizar as compras e freqüentar os tipos de lojas, conforme a disponibilidade. O
tempo utilizado para a compra foi somado ao tempo de descanso e de lazer do trabalhador.
Seguindo esse pensamento, as modernizações dos supermercados atenderam esse fator e
proveram de tecnologias que garantissem o conforto dos freqüentadores. Com isso, para
otimizar as necessidades dos clientes, ampliaram as dependências dos estabelecimentos,
aumentaram o mix de produtos e agregaram outros pequenos estabelecimentos em sua área de
venda, como é o caso de farmácias, locadoras de filmes, fotocopiadoras, lanchonetes, entre
outros.
Figura 2 - : Tipos de lojas segundo a área de venda e variedade de produtos
31
Org: FERREIRA-COSTA, 2006.
Deste modo, o modelo criado, chamado de Hipermercado, introduziu novas
modificações na relação espaço-tempo de consumo, na relação entre cidade-comércio e nas
relações intersubjetivas. Assim, o hipermercado, destinado à liberdade de consumo, influi
31
Neste trabalho apresentamos outros formatos de lojas que não compõem a Figura 2, como: Sam’s Club,
TodoDia. Estes são estabelecimentos, exclusivos da bandeira Wal-Mart, que apresentam um conceito de venda
diferenciado. Estes levam em consideração o público consumidor, sendo que no Sam’s Club: a venda é por
atacado e em sistema de auto-serviço. Este formato funciona como clube de venda e oferece aos sócios,
geralmente pequenos comerciantes, as melhores oportunidades do mercado (preços mais baixos que as demais
lojas Wal-Mart); TodoDia: são estabelecimentos menores que atendem as necessidades locais, ou os bairros, de
maneira que não possuem estoques. Assim, todo produto é exposto nas prateleiras. O que o diferencia dos
demais, são os servidores, que geralmente são moradores próximos ao estabelecimento; Além do mais, o Wal-
Mart considera como Hipermercado as bandeiras: SuperCenter, HiperBompreço e BIG; como Supermercado:
BomPreço, Mercadorama e Nacional; como Mini-Mercado: Balaio e Mini-Bompreço. No entanto, veremos esse
assunto no capítulo 3.
Hipermercado
Loja de
Departamento
Supermercado
Loja
especializada
Mini-
Mercado
Loja de Sortimento
Limitado
Loja de Desconto
Loja de Conveniência
48
sobre o comportamento do indivíduo e produz uma ambiência perfeita, ou seja, um espaço
arquitetonicamente organizado e animado, que constitui um meio físico e, ao mesmo tempo,
meio estético, ou psicológico, especialmente preparado para o exercício de atividades
humanas. Os hipermercados, fruto da arquitetura moderna, se inscrevem na eterna curva de
desejos humanos e do progresso da realização desses desejos (JACQUES, 2003).
A forma hipermercado representa a desconstrução da modernidade nas cidades e a
passagem para uma fase contemporânea, a de “industrialização dos serviços”. Estas têm
como característica a introdução de novas tecnologias (prédios inteligentes, estruturas móveis)
e novos modos de vida (rítmos acelerados) nos espaços urbanos. Agrega no mesmo espaço
físico as funções das “antigas” formas comerciais: da loja de departamento, da loja de
conveniência, da loja especializada, da loja de desconto e do supermercado. Pode-se dizer que
os hipermercados contribuíram para a racionalização das diversas funções cotidianas.
O hipermercado é já, para além da fábrica e das instituições tradicionais do
capital, o modelo de toda forma futura de socialização controlada:
retotalização num espaço-tempo homogêneo de todas as funções dispersas
do corpo e da vida social (trabalho, tempos livres, alimentação, higiene,
transportes, mídia, cultura); retranscrição de todos os fluxos contraditórios
em termos de circuitos integrados; espaço-tempo de toda uma simulação
operacional da vida social, de toda uma estrutura de habitat e de tráfego
(BAUDRILLARD, 1991, p. 99).
Alem disso, os shoppings centers, restaurantes populares, os fast food, os
“camelódromos” surgiram como formas comerciais alternativas que “determinaram novas
centralidades, novos espaços do cotidiano, enfim, uma nova paisagem urbana e novas relações
sociais” (PINTAUDI, 2005, p. 158). As formas comerciais de distribuição de mercadoria
nunca foram tão diversificadas como hoje. Mas o dinamismo comercial dos nossos dias
firmou-se nos princípios das guerras comerciais. A disputa entre formas comerciais e,
consequentemente, entre empresas concorrentes, surge de maneira mais sistemática no espaço
urbano e obriga esses estabelecimentos à incrementação de estratégias mercadológicas.
49
2.4
-
O
ESPAÇO URBANO E SEUS EQUIPAMENTOS
:
O LUGAR DO POSSÍVEL
A cidade não constitui um acontecimento novo, ela sempre existiu e acompanhou o
processo civilizatório do homem. Esta revela, simultaneamente, a materialização dos
processos históricos e das relações sociais de produção do espaço geográfico (CARLOS,
2001). A cidade é a própria forma da exterioridade a qual obedece a um processo maquínico
do poder capitalista. Esta funciona como um recipiente que atrai para si partículas das mais
diversas naturezas. (PELBART, 2000). Enquanto espaço de reprodução capitalista a cidade
equivale em participar no processo da produção (abriga as unidades de produção), do
consumo (impõem um rítmo ao cotidiano) e da acumulação (centraliza capital). Segundo
Carlos (1994, p. 37),
(...) a cidade é a condição geral da produção, este fato impõe uma
determinada configuração ao urbano, aparecendo enquanto fenômeno
concentrado, fundamentado numa complexa divisão espacial do trabalho,
formando uma aglomeração que no capital, tem em vista o processo de
acumulação. Um aglomerado que busca diminuir a distância (medida do
tempo) entre o processo de produção da mercadoria e seu processo de
consumo.
Ao longo dos séculos a cidade mudou constantemente de função e de aparência. Esta
passou a afetar toda a existência do indivíduo. Nesta provável forma vazia da cidade, um
indivíduo que se esvazia, no mundo contemporâneo, de modo que, o preenchimento desses
espaços está associado com a racionalidade capitalista (GAETA, 1995). Ao questionar sobre a
cidade, Lefebvre (2004, p.111) pergunta: “O que ela cria? Nada. Ela centraliza as criações. E,
no entanto, ela cria tudo”. Nesse sentido, a cidade permite os acontecimentos, aceita as
transformações, manifesta as diferenças procedentes dos conflitos, sejam eles econômicos
sociais e/ou políticos. No entanto, no curso de suas realizações, a cidade concerne às gicas
capitalistas o direcionamento dos processos metamórficos do conteúdo urbano. Segundo
Lefebvre, (2004, p. 113),
a cidade, o urbano, também é o mistério, o oculto. Atrás da aparência, e sob
a transparência, empreendimentos são tramados, potências ocultas atuam,
sem contar os poderes ostensivos, como a riqueza e a policia.
50
As funções e o modo de vida da cidade se diversificaram. Os processos de
modernização do espaço urbano potencializaram a cidade para receber, tanto as atividades
empresarias privadas voltadas ao mercado, quanto a implementação de serviço e
equipamentos públicos organizados para atender a sociedade.
As mudanças materiais da vida e a criação de novos valores proporcionaram uma
intensificação mercadológica nesse cenário essencialmente urbano. A cidade se
metamorfoseia e o movimento de transformação ganha um sentido, no processo e na
realização, que as transcendem, de maneira que se criou um uso, uma função, para cidade
contemporânea nos moldes capitalistas.
Assim, novas estruturas foram construídas e incorporadas à paisagem das cidades que
revelaram as possibilidades do processo civilizatório e a aproximação de pensar a cidade
como meio de consumo. Os novos elementos arquitetônicos somados aos canais de
propaganda (out-doors, placas luminosas, cartazes) e aos novos traçados urbanos
(alargamento de ruas, troca do sentido do transito, passarelas, fachadas), criaram lugares com
estilo e com uma atmosfera própria para atender e consagrar os valores capitalistas.
O espaço urbano, submetido ao fetichismo do valor de uso, passa a ser
objeto de consumo e expressão de modismos, estes vendidos como estratégia
de requalificação urbana pelas administrações locais e seus parceiros
empresários. (SERPA, 2005, p. 414)
As ciências como a arquitetura e o urbanismo anunciaram o desdobramento das novas
formas e funções do capital para atingir uma sociedade potencialmente consumista, das quais
utilizaram a cidades como canal para a circulação (GROSSMAN, 2006). Segundo Jacques,
(2003, p. 68) “A arquitetura é o meio mais simples de articular tempo e espaço, de moldurar a
realidade, de fazer sonhar”.
As construções civis ganharam novas cores e novos recursos um tom de
embelezamento racional. As vias assumiram o papel de canal direto de livre circulação da
mercadoria. O tecido urbano expande e segrega setores da população. O transporte torna-se
um complemento do consumo. A cidade toma para si a forma de uma organização retratada
pelo capitalismo contemporâneo e absorve a criatividade coletiva através das lógicas
capitalistas.
Para Guattari (1992, p. 172), “as cidades são imensas máquinas produtoras de
subjetividade individual e coletiva”. De maneira que, as cidades contribuem para a
51
transformação das mentalidades e dos hábitos coletivos da sociedade relativos ao meio
material. Assim, “a cidade produz o destino da humanidade: suas promoções, assim como
suas segregações, a formação de suas elites, o futuro da inovação social, da criação em todos
os domínios” (GUATTARI, 1992, p. 173).
As cidades, no contemporâneo, retornaram à situação da perspectiva estética, indo ao
encontro da praticidade e da funcionalidade de alguns equipamentos urbanos. Os
equipamentos urbanos públicos ou privados organizam no espaço geográfico os objetos para
viabilizar a administração do meio urbano. Estes podem ser de uso comum ou de uso especial,
e compreendem o abastecimento de água, serviço de esgotos, energia elétrica, coleta de águas
pluviais, rede telefônica, gás canalizado, os estabelecimentos destinados à educação, saúde,
cultura, lazer, segurança e similares, além das vias de tráfego de veículos e pedestres e
espaços livres de uso público. Estes dois últimos itens, de forma direta, os mais propícios a
transformações para atender aos anseios das lógicas capitalistas. Os outros de uma forma
indireta podem ser patrimoniados por bens privados, ou seja, privatizados, e a partir deste
momento vinculados a uma necessidade pontual do capital.
As vias de circulação de veículos e pedestres e os espaços livres de uso público, no
contexto do capitalismo contemporâneo, são as ferramentas que operam a passagem da
apropriação e dominação do capital e podem ser consideradas como facilitadores urbanos,
como discutimos na seção anterior. E são considerados como os lugares sob os quais atuam as
empresas na intenção de transformar as cidades para atender essa dinâmica.
A cidade aparece como o lugar da reprodução da vida, da construção de sentidos, da
realização do novo, do esvaziamento das relações sociais (CARLOS, 2001). Esta, no
capitalismo contemporâneo, torna-se palco da produção capitalista e fantoche das grandes
empresas por meio das mudanças tecnológicas tanto nas estratégias de subsumir o indivíduo
ao consumo quanto na otimização do tempo na produção e circulação da mercadoria. Esta
variabilidade e densificação técnica na cidade ajudam a produzir modelos estéticos, valores e
moda; orienta a vida cotidiana; e contribui para fortalecer o sentido de comprar, ou seja, busca
no processo civilizador desencadear o verdadeiro sentido, a cultura de consumo. De modo
que, “passa a significar não apenas a compra de bens materiais para a satisfação das
necessidades, mas também o consumo de imagens e de valores para uma grande parte da
sociedade” (PADILHA, 2006, p. 43).
Na sociedade capitalista, a cidade é apropriada de forma diferenciada. O papel do
desenvolvimento avassalador do capitalismo reflete na transformação dos hábitos cotidianos,
das relações entre as pessoas, das percepções dos espaços e dos significados. Esta a redefine
52
seu território e cria novas territorialidades, orientada pelo mercado, mediador das relações
construídas nessa sociedade.
2.5
-
A
CONFIGURAÇAO DOS TERRITÓRIOS E A TERRIRORIALIDADE
O conceito de território foi cunhado na geografia clássica, meados do século XIX,
pelas mãos de Ratzel e Reclus, numa época nutrida pelo romantismo alemão e o
imperialismo. Estes encaravam o conceito de território como algo concreto, no sentido da
conjunção do solo, bem delimitado, lócus do controle do Estado Moderno e das manifestações
das classes sociais, na qual se organizaria a sociedade. “Um povo deve viver sobre o solo que
recebeu do destino, deve morrer aí, deve suportar sua lei” (RATZEL apud GOMES, 1996,
p.186). Portanto, o conceito de território era associado a uma escala nacional, limitado por
fronteiras absolutas. De maneira que o uso do conceito território consiste de grande
importância para o campo das questões políticas.
na óptica ratzeliana, o território é um espaço qualificado pelo domínio de um
grupo humano, sendo definido pelo controle político de um dado âmbito
espacial. Segundo ele, no mundo moderno constituem áreas de dominação
‘estatal’ e, mais recentemente, ‘estatal nacional’. (MOARAES, 2000, p. 19)
O conceito de território, frente ao capitalismo contemporâneo, toma outra dimensão,
por conta da nova configuração existente entre as esferas políticas, econômicas e sociais.
Assim, o território é reconhecido como uma relação simbólica direta com o espaço
geográfico, um produto histórico, a partir de uma relação de poder sob a ótica produtivista. De
maneira que, o conceito de território não se confunde com o conceito de espaço geográfico e
nem sob uma leitura simplista de espaço rígido como enraizamento, estabilidade, delimitação
e/ou fronteira. O território é fruto da produção do espaço geográfico. Espaço onde se projetou
um trabalho, a partir da intenção de apropriação, e transformado pelas redes, circuitos e fluxos
que aí se instala.
Assim, pensa-se o território dentro de um conjunto de movimentos, fluidez e
interconexões, cuja complexidade é apresentada na relação entre processos sociais,
materialidade das lógicas capitalista e sua historicidade (HAESBAERT, 2004).
53
Para Raffestin (1993, p. 143),
é essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O
território se forma a partir do espaço, e é resultado de uma ação conduzida
por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível.
No entanto, o território exprime uma ação imediata de limites, sob a superfície. Porém
este é reconfigurado de acordo com os objetivos possíveis do agente e o contexto histórico
que está inserido. Assim, pode-se admitir que a escala global, sob o comando das corporações
capitalistas, procuram impor uma racionalidade a todos os lugares, os quais dinamizam as
ações no território. Sendo assim, o território pode ser considerado como um produto que
acumula diferentes processos, fruto de um tempo de sucessões de coexistências.
A configuração do território pesa diferentemente dentro das parcelas políticas,
econômicas e sociais existentes no contemporâneo e é realizada pelos interesses capitalistas.
Como se viu, o território, além de ter uma base física, é também, uma estrutura construída por
uma sociedade. O território se apresenta como fator que absorve todas as manifestações
sociais, e delas partem as novas direções e composições territoriais.
Enquanto objeto ou coisa construída de uma relação complexa, o território é baseado
numa leitura da relação de poder, cujo espaço socialmente apropriado, produzido, é dotado de
significado. (RAFFESTIN, 1993; HAESBAERT, 2002). De maneira que, uma das
características do território, do mundo atual, é a facilidade de ser edificado pela sociedade, e
depois de constituir identidades para reger a própria sociedade que a configurou. Tais fatores
perpassam pelos processos produtivos do capital. Assim, atender as exigências reveladas pelo
modo de produção capitalista, “o território se metamorfoseia em algo mais que um simples
recurso, (...) constitui um abrigo.” (SANTOS, 2000, p. 111-112). De maneira que, o homem
constrói, porém comprometido pelos interesses capitalistas.
Neste caso, o território é uma inconstância que absorve e protege o resultado da
competitividade entre os agenciadores do capital. Estes propõem o modo imperativo da
remodelação da (re)organização espacial e das formas (re)constituídas no espaço geográfico,
sob um processo contínuo de perda e ganho. O que nos faz pensar que o produto formado por
esta compensação de movimentos de retração e dilatação, na totalidade, é o território
construído, e podem ser sobrepostos. Porém os novos braços que direcionam para esta
dinâmica são as territorialidades apresentadas, dando ênfase ao caráter simbólico.
Um fenômeno de comportamento associado à organização do espaço em
esferas de influência ou em territórios nitidamente diferenciados,
54
considerados distintos e exclusivos, ao menos parcialmente, por seus
ocupantes ou pelos que os definem. (SOJA apud RAFFESTIN, 1993, p.
159).
As territorialidades, não devem ser pensadas, como um “enraizamento de indivíduos a
um lugar” (VIDEIRA, 2005, p. 427), mas como uma “multiplicidade de formas de
apropriação do território que tensamente coexistem num determinado tempo e num
determinado lugar” (RIBEIRO, 2005, p. 94-95). Esta tensão é que configura o lugar e
sobrepõem distintos territórios. Ao mesmo tempo em que permite o regresso das forças ou
representações do capital a uma unidade de lutas de apropriação, de conflitos entre diferentes
atores, de confrontos entre representações sociais, de embate entre universos simbólicos e
valores universais. (RIBEIRO, 2005). As novas territorialidades surgem das ações estratégicas
espaciais que influenciam diretamente e obtém o controle dos territórios. A territorialidade é a
qualidade necessária para a construção do novo território.
(...) melhor entendida [a territorialidade] como uma estratégia espacial para
atingir, influenciar ou controlar recursos e pessoas, pelo controle de uma
área e, como estratégia, a territorialidade pode ser ativada e desativada. O
uso da territorialidade ‘depende de quem esta influenciando e controlando
quem e dos contextos geográficos de lugar, espaço e tempo. (...) (SACK
apud HAESBAERT, 2002 p. 86).
A territorialidade, no sentido dinâmico, não deve ser analisada como um justaposição
de territórios locais, mas como uma realidade territorial nova que surge de um sistema de
inter-relações e interesses comuns. Ao cabo desse novo território formado, um meio
propagador de informação, sobre o elemento que se move, e emerge. Portanto, não substitui o
território físico, compõem-no de elementos novos, porém efêmeros. O território constituído,
ao integrar todas as peças, fica a favor de novas ações para se deslocar.
De acordo com Raffestin (1993, p. 265), a territorialidade é “o conjunto de relações
estabelecidas pelo homem enquanto pertencente a uma sociedade, com a exterioridade e a
alteridade através do auxílio de mediadores ou instrumentos”. Assim a territorialidade afirma
sua relativa flexibilidade pelo qual o espaço e a sociedade se dialogam.
Para Haesbaert, (2002, p. 87) “Na modernidade, por exemplo, a territorialidade tende a
ser mais ubíqua e bastante mutável”. De modo que, de acordo com o agente (grupo ou classe
social), o território e a territorialidade podem desempenhar qualquer função ou configuração,
55
ou exercer controle sobre fluxos, redes, conexões, ou permitir a apropriação ou dominação do
espaço geográfico, a partir de um conjunto de transformações cnicas. Assim, a
territorialidade pensada na escala de uma empresa é controlada pela concorrência capitalista
ou interesses capitalísticos. Essa racionalização procede das práticas do capital que promovem
externalidades apropriadas para tal propagação, que caracteriza a dominação ou apropriação
do território.
A empresa controla não somente todo o aparelho da sua produção, que
compreende seres e coisas, mas também controla, de uma forma mais
indireta, os seres e as coisas por intermédio de seu ou de seus mercados.
Quando entra em concorrência com outras empresas, coloca na balança tudo
ou parte de seus trunfos. (RAFFESTIN, 1993, p. 59).
Dentro do capitalismo contemporâneo, seguindo as lógicas do capital, as empresas
souberam utilizar dessas novas ferramentas para persuadir o consumidor desguarnecido.
Assim, as territorialidades construídas, também, são de responsabilidade daqueles que
usufruem dos produtos oferecidos pela empresa, que de posse de lógicas mercadológicas
aproximaram o consumidor de sua seara. Isto é, as empresas utilizam, cada vez mais, das
ferramentas da comunicação social para assegurar os objetivos intencionais, quanto à
mercadoria, e às realizações proporcionadas. Para Raffestin, (1993, p. 145) “(...) fizemos da
imagem um ‘objeto’ em si e adquirimos, com o tempo, o bito de agir mais sobre as
imagens, simulacros dos objetos, do que sobre os próprios objetos”. Portanto, pode-se refletir
que as empresas não existem fora dos consumidores (objeto de sua manutenção no mercado).
Conforme Marx (1977, p 210),
Portanto, a produção não produz somente um objeto para o sujeito para o
objeto. A produção produz, portanto, o consumo, primeiro fornecendo-lhe
materiais, segundo deturpando o modo de consumo e, terceiro, excitando no
consumidor a necessidade dos produtos colocados por ela como objetos.
Logo, ela produz o objeto de consumo, o modo de consumo, e a tendência
para o consumo.
Marx, apontava que a produção cria os objetos de consumo, e o consumo cria o
indivíduo para esse objeto, mas além de criar o indivíduo para esse objeto, na
56
contemporaneidade, o consumo inventa todo o espaço de que esse indivíduo faz parte
32
. A
empresa não cria o objeto (a mercadoria), mas o mundo onde o objeto existe. Ela não cria
tampouco o indivíduo (trabalhador e consumidor), mas o mundo onde o sujeito existe
(LAZARATTO, 2004).
Assim, as empresas permitem que o indivíduo os expressem como sua própria
extensão territorial. De forma que, o território torna-se resultado também, de ações
conduzidas por indivíduos. Neste caso, o valor do território é existencial: ele circunscreve,
para cada um, o campo do familiar e do vinculante, marca as distâncias em relão a
outrem e protege do caos (DELEUZE, 1997), contudo esse território também é volátil e
seu produto está relacionado com as vantagens oferecidas pelas empresas ao consumidor e
de como o consumidor se identifica com a empresa. Para tanto, as empresas trabalham de
forma a anular o efeito das possibilidades do consumidor em reaver seus conceitos sobre
aqueles produtos oferecidos e não perder de maneira nenhuma o território conquistado
para as demais concorrentes.
Assim, esse território passa a ser visto como algo móvel, organizado, (des)organizado
e (re)organizado por distintos sistemas de conflitos, cujo controle parte de micro e macro
dispositivos de poder através de relações de força, sendo o alvo, o consumidor. A partir daí,
podemos pensar que o território produzido, também existe, em função dos mecanismos de
manipulação, dos formadores de consumidor. Porém, o uso desses objetivos intencionais
perpassam nas relações mantidas com o território, e se inscrevem no campo do produto e do
meio de produção.
2.6
-
A
S
OCIEDADE DO
C
ONSUMO
:
SOB A LÓGICA SOCIAL CAPITALISTA
De forma geral, diversos autores discutiram este tema por diferentes caminhos,
reflexões e posições. Pode-se destacar “sociedade burocrática do consumo dirigido
33
32
Os grandes estabelecimentos comerciais podem ser um bom exemplo para a materialização desta discussão
dado que praticam táticas de marketing de nicho para efetuar vendas. Assim, os supermercados importam
conceitos de redes especializadas para cada departamento da loja a fim de aproximar o consumidor do universo
simbólico do produto a venda. O Carrefour, em sua nova loja no bairro do Morumbi, na capital paulista,
produziu um ambiente para agradar o público endinheirado que vive na região. Segundo Rodrigo Lacerda,
diretor de marketing da empresa, a rede importou conceito de redes especializadas, como a Fnac, para a seção de
eletrônicos e deu ares de boteco à seção de cervejas (CARREFOUR ... , 2005).
33
Em 1968, Henri Lefebvre, coloca ao debate acadêmico esta qualificação a sociedade que o representava.
Naquele período, esta sociedade tinha como característica uma cotidianidade programada, destinada a ser nódulo
estratégico da reprodução social frente à artificialidade do mundo sob a afirmação da artificialidade do
indivíduo. O autor também relaciona a este momento com a estruturação das camadas médias urbanas, apesar de
57
(LEFEBVRE), “sociedade do consumo
34
(BAUDRILLARD), “sociedade dos consumidores
35
(ARENDT), e “sociedade do espetáculo
36
(DEBORD). O fator comum, entre todos, foram os
efeitos que o consumo incide ao indivíduo consumidor, investigado pela economia capitalista.
Assim, o consumo revela-se como palavra da sociedade contemporânea. Para tantos este
resultado pode ser passivo ou ativo. No entanto, centralizamos nossas intuições entre dois
pilares: o consumo como um querer de coisa e inerente à natureza do indivíduo e o consumo
como fim do processo produtivo.
O consumo o pode, então, ser considerado um momento autônomo: ele
encontra-se determinado seja pelo complexo processo constitutivo dos
desejos humanos, seja pela lógica de produção, o que, nas sociedades
capitalistas, significa dizer que se encontra determinado pela lógica do lucro.
(PADILHA, 2006, p. 85)
O que está diante, nesse encontro, será a legitimidade das lógicas capitalistas de
manipulação de massa, que ativam os estados de consumo, pelas sociedades modernas. Estas
representam em expressão certa subsunção ao modo de produção vigente. Nestas sociedades
capitalistas as necessidades de valorização do capital são maiores que as necessidades
humanas. Convertem-se, assim, em satisfazer as exigências das unidades de produção e
resguardar a expansão do capital.
A sociedade de consumo é um produto do qual o capitalismo contemporâneo assume
certa responsabilidade sob a lógica de operação do capital. Para o desenvolvimento da
sociedade burguesa, no presente período, foi necessário submeter-se aos imperativos da
economia capitalista. Para esta nova fase, a imagem (representação imaterial do objeto), a
que a inclusão ao consumo perpassa por uma indefinição de quem consumir, ou seja, perde a categorização de
classe a esta atividade.
34
Para J.Baudrillard (1995, p114), em seu livro a “Sociedade de Consumo”, a sociedade atual adota este
predicado como um modo novo e específico de socialização, em conseqüência à emergência de novas forças
produtivas e a reestruturação monopolística de um sistema econômico de produtividade alta.
35
A sociedade de consumidores é a fusão de dois estágios sociais: o labor e o consumo, visto como uma
alternativa do modo de viver em sociedade. A crítica que a autora presta é como o consumo é encarado na
sociedade, uma vez que este não se restringe às necessidades da vida, mas ao contrário visa principalmente às
superficialidades da vida. De modo que chegará o momento em que nenhum objeto do mundo estará a salvo do
consumo e da aniquilação através do consumo. (ARENDT, 2004, p. 146).
36
A “sociedade - espetáculo” é o mundo das pseudo-necessidades, o mundo da economia do consumo, o mundo
do espaço-tempo da “monotonia imóvel”, o mundo em que o viver tornou-se uma representação caricata da
própria forma-mercadoria, enfim, o mundo em que o valor de troca das mercadorias acabou por dirigir o seu uso
(DEBORD, 1992 p. 33).
58
partir da publicidade e o marketing
37
, invadem a esfera da mercadoria e agrega outros valores
ao produto
38
.
O Marketing, em si, é uma prática baseada em diferenças, e quanto mais
diferenças houver mais as estratégias de marketing encontram campo para se
desenvolver. O marketing pós-moderno reconhece a diferença de cada
mercadoria e de cada segmento da população, elaborando suas estratégias
apropriadamente. Toda diferença é uma oportunidade (HARDT, NEGRI,
2000, p.170).
Estas atividades representam uma das etapas da esfera produtiva da atual fase do
capitalismo. Para isto, as práticas de marketing e publicidade incidem sob a esfera do
consumo e transformam imagens em mercadorias. Assim, os conceitos trabalhados visam à
celebração do fetichismo e de simulacros na busca contínua pela novidade, pela satisfação,
pela realização, além da eficiência, lucratividade e acumulação de capitais.
Na segunda metade do século XX na Europa e na França, nada (um objeto,
um indivíduo, um grupo social) vale a não ser através de sua duplicata: a
imagem publicitária que o aureola. Esta imagem duplica não apenas a
materialidade sensível do objeto e o prazer situam-nos no imaginário. É ela
que traz felicidade, isto é satisfação ao estado de consumidor. A publicidade
destinada a suscitar o consumo de bens, torna-se assim o primeiro dos bens
de consumo (LEFEBVRE, 1991, p. 115).
A imagem passa a atuar diretamente sobre os indivíduos, a serviço dos capitalistas,
como consumidores, no sentido de criar o novo, os novos arquétipos ou os símbolos que estes
devem adotar (PADILHA, 2006). Daí, sobre este conjunto de informação, as pessoas passam
a constituir as pseudo necessidades que as levam a uma artificialização da vida. Assim, as
37
A publicidade, o marketing e a mídia, de uma forma geral, transformaram-se nas grandes vilãs da sociedade,
diversos autores apontam estes meios como os grandes colaboradores do distanciamento da realidade. Porém,
faço uma pausa para uma reflexão. É possível servir-se destes mecanismos de forma a libertar o indivíduo do
enclausuramento em vez de nos rendermos às forças centralizadoras de sentido? Então, acreditamos que estas
ferramentas, da sociedade contemporânea, não produzem esse efeito sozinhas e o que as condena é o sistema em
que estão sendo utilizados.
38
A declaração do principal executivo da Samsung Yung Jong-Yong ilustra esta discussão: "Qualquer um [IBM,
Motorola, Sony e Canon] pode fazer produtos eletrônicos de consumo" (...) "A diferença está no controle das
principais tecnologias, marketing e melhoria da imagem da marca" (EWING, 2005).
59
empresas, carapuça do modo de produção capitalista, tornam-se as curadoras dos estilos dos
indivíduos e a razão destas de procurarem a felicidade nas promoções e preços baixos
39
.
É, neste contexto, que a sociedade contemporânea constrói seus alicerces e se baseia
em falsas idéias. A interpenetração das lógicas capitalistas, por meio das imagens fabricadas,
na sociedade, faz-se no cotidiano do indivíduo e dão lugar ao consumo como norteador da
vida. Este elemento esconde o mundo real da sociedade e a coloca sob um universo de
certezas positivas que contaminam toda a coletividade sem distinção de classes.
Os indivíduos, desta sociedade, são anestesiados sobre um processo de personalização
imposto pelas lógicas capitalistas. Definem-se por não adotar um único sistema de referência.
Conflituam os mais íntimos desejos. E misturam as vontades de modo a praticarem um ritual
antropofágico de subjetivação sobre os sentidos (ROLNIK, 2002). O reconhecimento, do
indivíduo como indivíduo, vem através do universo lingüístico, o qual é criado pelo sistema
capitalista.
De acordo com Padilha, (2006, p.110),
na “sociedade de consumo”, as relações pessoais são mediatizadas pelo
sistema de signos, e fazem os indivíduos desejarem desprezar suas
qualidades pessoais e sua idiossincrasia para se igualar aos outros e
demonstrar adesão ao código socialmente construído.
Os consumidores, nesta sociedade, acabam por aceitar a proposta oferecida deste
universo subjetivo de forma passiva, que o tornam compradores em potencial, e ajudam as
empresas a definirem suas territorialidades, ou melhor, criam para as empresas suas
territorialidades. Para manter esse objetivo as empresas lançam estratégias das mais diversas
para garantir a persuasão ao espírito do indivíduo. Conforme Lazzarato, (2004, p.1), “a
empresa tenta assim construir a correspondência, os entrelaçamentos, o quiasma entre os
consumidores e os trabalhadores e seu mundo”.
39
Segundo Capell (2005), ao comentar o poder de persuasão da empresa Ikea, varejista sueca de mobiliário, em
atrair consumidores para as lojas, relatou um caso que aconteceu em Atlanta, capital do estado da Geórgia, nos
Estados Unidos, na inauguração da nova loja da cidade: Roger Penguino [cidadão comum], quando soube que a
Ikea oferecia US$ 4 mil em vales-compra para a primeira pessoa na fila no dia da inauguração, ele esperou, com
sua barraca, durante sete dias sob sol escaldante, juntamente com mais de 2 mil fãs da marca do estabelecimento.
Esta empreitada, é muito mais do que conseguir um desconto, é uma ocasião favorável dele ser o primeiro em
realizar uma compra na nova loja. Este é um exemplo. No mundo contemporâneo as campanhas publicitárias
e as empresas juntam-se para desenvolver expressões que completem o consumidor e o ajude a adquirir novas
mercadorias, a fim de integrá-los ao mundo da empresa como cidadãos comuns. Este fato ilustra o modo pelo
qual as máquinas tecnológicas de informação e de comunicação operam, não na oportunidade da oferta, mas
também na realização pessoal, na sensibilidade, nas fantasias inconscientes, em ter a mercadoria sonhada.
60
Assim, a esfera privada, constitui um território a partir de formas que se produzem e
conferem um sentido específico de desejo. Mas, formações provisórias que misturam finitos
materiais de dominação e a faz confundir o indivíduo da ação ou o consumidor por que
caminho seguir ou a que objeto irei me render. Este habitante do mundo capitalista
contemporâneo é atravessado por toda uma rede de informação de aparência desejante,
econômica, política, cultural, afetiva... que o convida a experimentar a composição de todas
elas, de algumas delas, de somente uma dela, de nenhuma dela, sob um movimento ágil e
veloz de mudanças.
As sociedades contemporâneas são marcadas por um processo contínuo de
aceleração onde as matérias de expressão tornam-se rapidamente obsoletas.
Parece que o mundo transforma-se numa seqüência aleatória e infinita. Neste
sentido, a pluralidade configura-se em intensidade e não em densidade.
(MACHADO, 1999, p. 215)
O indivíduo desta sociedade vive sob um estado profundo de letargia. Desestabilizado,
este absorve à determinação das lógicas capitalistas. Atravessados por princípios burgueses o
indivíduo vive um processo de desterritorialização
40
. Para Machado (1999, p. 220) a
incoerência nos aflige”. O capitalismo contemporâneo permite que as empresas incidem, ao
indivíduo da sociedade de consumo, informações suscetíveis para atrapalhar, embaralhar e
perturbar a opinião, e assim vendem suas mercadorias. Tornando-se suas próprias figuras
obsoletas muito rapidamente, forçando a desempenharem uma nova configuração. Para
Baudrillard (1972, p. 14), “os objetos nunca se esgotam para que servem”, assim eles
constituem um ciclo de renovação, antes de serem descartados pela totalidade da sociedade.
Assim, a sociedade materializada no presente passa por um constante processo de
abundância. Porem este recurso se pauta somente no que concerne o mundo da mercadoria.
Este processo contribui para que a pulsão, que controla nossos desejos, se limite ao campo do
consumo. Esta sociedade se esquece, que o mecanismo manipulado pelo capital, esvazia de
sentido as relações humanas e anestesia o indivíduo frente à violência real da ordem social.
40
Segundo Machado (1999, p. 217) “O processo de desterritorialização é um movimento de destruição dos
territórios constituídos, podendo desdobra-se em processo de territorialização, onde novos territórios provisórios
seriam inventados, ou em processo de reterritorialização, onde o processo de desterritorialização é capturado, e
em lugar da invenção de outros territórios teríamos a recomposição de territórios vinculados à ordem de
produção capitalistica. Os territórios se compõem de matériais existenciais, como comportamento, valores,
relações sociais etc. O território e as desterritorializações fazem parte e produzem formas de subjetividade. O
que não quer dizer que o território seja uma identidade e que cada um tenha o seu. Muitos e variados territórios
compõem nossa existência e eles podem ter sido produzidos ou não a partir da perspectiva de personalidade. Os
territórios são organizações de materiais de expressões históricos”.
61
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3.1
-
I
NTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, os EUA sofreram um intenso processo de desindustrialização em
virtude do custo da mão-de-obra empregada em países da periferia do capitalismo, sobretudo
na China, Índia e Malásia
41
. Países que apresentam em seu território nacional zonas especiais
de processamento de exportação (ZPE) onde as empresas neles localizadas operam com
isenção de impostos e livre de taxas cambiais, dado que destinam a maior parte da produção
para a exportação. Por não aplicarem as regulamentações e os impostos aduaneiros normais
da economia conseguem um custo da produção muito baixo em relação a outras regiões do
mundo. No entanto, segundo Klein (2003, p. 387) as condições de trabalho são desumanas e a
exploração do trabalho infantil é presente; “nas ZPE, as violações ao trabalho acontecem às
pencas – basta abrir uma frestinha da porta que elas [‘segredinhos sujos’] venham abaixo”.
A manobra permitiu que as empresas competissem no mercado mundial, por meio dos
baixos preços, com seus pares asiáticos. Porém, os centros de pesquisa, desenvolvimento,
marketing, finanças, logística e design, vinculados às novas tecnologias da informação e
comunicação, permaneceram em solo americano. Estas peças são fundamentais no manejo do
capitalismo contemporâneo como se observou no capítulo anterior
42
. No entanto as unidades
de produção transferiram-se para áreas mais vantajosas tributariamente. De modo que, a
participação da indústria no PIB americano caiu neste período. Em compensação houve um
crescimento no setor de serviço. Para Sader (2005, p.40) “os EUA são cada vez menos uma
economia industrial e cada vez mais uma economia de serviços”.
41
Na China, por exemplo: a fábrica da Wal-Mart paga à hora salário trabalhada US$ 0,13 a US$ 0, 35, com turno
de 10horas a 12 horas, entre 6-7 dias por semana, com condições irregulares: horas extras forçadas, multas
severas pela recusa ao trabalho, sem contrato legal e sem benefícios; os prédios, sem saída de incêndio,
dormitórios sujos e apinhados (KLEIN, 2003). Além de outros exemplos que podem ser consultados na obra de
Naomi Klein, 2003, página 522, figura 9.3 que se remetem ao lucro das fábricas exploradoras.
42
O mundo “artificial”, o qual se vive, é constituído por agenciamentos produtivos, por sistema de signos que,
juntos, abalam a subjetividade e constroem o momento e o consumidor. A responsabilidade dessa criação, o de
esvaziar de sentido o indivíduo e preenchê-lo com mercadoria, são da publicidade, do marketing, das finanças,
da logística e do design, ou melhor, dos profissionais que pensam na forma do uso do produto destes trabalhos e
nas estratégias de persuadir o consumidor para o consumo (GUATTARI, ROLNIK, 1986).
62
Tabela 1 -.A mudança de perfil nos setores econômicos
Participação no PIB dos EUA
Anos Indústria Serviços Agricultura
1820
15,0 % 15,0 % 70,0 %
1870
24,4 % 25,6 % 50,0 %
1913
29,7 % 42,8 % 27,5 %
1950
33,6 % 53,5 % 12,9 %
1960
33,6 % 58,1 % 8,3 %
1973
33,2 % 62,6 % 4,2 %
1981
30,1 % 66,4 % 3,5 %
1992
23,3 % 74,0 % 2,8 %
2005
19,0 % 80,0 % 1,0 %
Fonte: Labour Fource OCDE, Bureau of Economic Analysis
e CIA World Factbook, Études du centre de développement
Org: FERREIRA-COSTA, 2007.
Neste capítulo o conceito de multinacional será apresentado para em seguida tecer
uma avaliação sob o modelo Wal-Mart. Esta empresa, símbolo do capitalismo
contemporâneo, tornou-se em praticamente quatro décadas uma das maiores multinacionais
do planeta.
3.2
-
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MA BREVE DISCUSSÃO SOBRE
M
ULTINACIONAL
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AL
-M
ART
Sob a pressão do atual momento histórico, onde os fatores de competitividade e
lucratividade nunca estiveram tão presentes, as estratégias empresariais mudaram
profundamente a maneira de como conquistar alguns segmentos do mercado. Essas estratégias
modernizaram as inter relações entre os elementos constituintes das empresas: produção,
administração, marketing, transporte, entre outros; e permitiram um bom posicionamento no
mercado. Para evitarem a derrocada ou falência e garantir a prosperidade, algumas empresas
preferiram optar pela busca de novos mercados. Este assunto foi discutido no primeiro
capitulo, no período do capitalismo monopolista.
Essas empresas foram assumindo, cada vez mais, o papel de representantes nas
economias capitalistas por meio da internacionalização da produção o que permitiu a
emergência de um mundo globalizado. Desse modo, apresentar-se-á no cenário mundial as
multinacionais, as quais contribuíram para que os espaços econômicos nacionais não mais
coincidissem com os espaços geopolíticos dos capitais.
Para isto, as companhias mudaram para uma mentalidade internacional e começaram a
dedicar-se a uma intensa estratégia de produção global junto a uma política agressiva de
penetração em outros mercados nacionais. No entanto, se permitiu a essas empresas atuarem
entre diferentes países transações comerciais diversificadas, crescentes e lucrativas.
63
Além de dominar o setor de exportação as empresas multinacionais passaram a
investir em unidades de produção e comercialização destes produtos em outros países,
distintos da localização da matriz. Consequentemente essas ampliaram a presença em outros
lugares.
Apesar da consideração acerca do termo de “empresa multinacional” vale dizer que
existem várias definições e conceitos que tratam desta problemática. Neste estudo defendeu-
se a concepção de que estes estabelecimentos tornam-se multinacionais a partir do profundo
envolvimento mundial, o qual resulta da concentração do capital sob território nacional e da
internacionalização da produção capitalista.
uma empresa (ou um grupo), em geral de grande porte, que, a partir de uma
base nacional, implantou no exterior várias filiais em vários países, seguindo
uma estratégia e uma organização concebida em escala mundial
(MICHALET apud CHESNAIS, 1996, p.73).
O grupo multinacional tem como objetivo o lucro, precisa ser rentável e atuar de
forma competitiva. A base de sua competitividade está centrada nas novas formas e funções
organizacionais da indústria, no tratamento da informação e na introdução de novas
tecnologias. Estas medidas foram adotadas para que as empresas conquistassem com maior
afinco os mercados capitalistas e suportassem a concorrência. No entanto, para que isso
ocorresse, essas obtiveram vantagens em diversos setores, tanto nos países de origem quanto
nos países de destino, a fim de agir de forma organizada em diferentes mercados nacionais.
Os Estados Unidos, sempre estiveram no centro do capitalismo moderno, e é o país
com maior representação de corporações multinacionais em atividades. Este fato, a partir da
década de 50, foi possível pelos incentivos do governo americano às empresas, em adquirir
novos mercados em outros países (CHESNAIS, 1996).
64
Quadro 3 - Número de filiais de empresa multinacionais
Fonte: MÜLLER, G.. Introdução à economia mundial contemporânea, 1987, p. 93.
Para Arrighi (1996, p.19) estas empresas “que operam sob a hegemonia norte-
americana são incomparavelmente em número maior devido à sua transterritorialidade e à
especialização funcional em uma economia mundial grandemente expandida.”. Dentre as dez
empresas líderes do mundo em faturamento, cinco se encontram em território americano, cuja
primeira posição é ocupada pela companhia Wal-Mart Stores. Para Hymer (1983, p. 47), “as
grandes empresas dos Estados Unidos começam a deslocar-se para países estrangeiros logo
após se completar sua integração em escala continental” e que “as grandes empresas de todos
os países terminaram, cada vez mais, por ‘ter como habitat o mundo’” (p. 114). A exemplo,
desta citação a rede Wal-Mart utilizou deste sistema para alcançar o topo da tabela abaixo. De
maneira que seu processo de internacionalização do capital foi somente iniciado na década de
90, porém esta foi criada na década de 60.
Tabela 2 - Faturamento das empresas líderes do mundo.
Empresa País Fatur. (US$bilhões)
1
Wal-Mart Stores EUA 285,22
2
BP Reino Unido (RU) 285,06
3
Royal Dutch/Shell Group Holanda/ RU 265,19
4
ExxonMobil EUA 263,99
5
General Motors EUA 193,45
6
DaimlerChrysler Alemanha 192,75
7
Ford Motor EUA 170,84
8
Toyota Motor Japão 165,68
9
General Eletric EUA 152,36
10
Chevron Texaco EUA 142,90
Fonte: Forbes Brasil (2005, p. 22)
Org.: FERREIRA-COSTA, 2006.
65
No entanto, a rede varejista Wal-Mart soube compreender e aproveitar
economicamente estas novas configurações contemporâneas (econômica, política e social), as
novas funções do Estado (assistencialista e/ou mediador dos interesses capitalistas), os novos
mecanismos reguladores da produção (acumulação flexível, terceirização, modernização das
máquinas, rotatividade dos gostos e dos estilos) e a nova forma global da economia
(internacionalização do capital, mercado financeiro, especulação na bolsa de valores), entre
outros, que se verá ao longo da nossa discussão.
A partir de estratégias pontuais a companhia Wal-Mart construiu o seu Império
Varejista. Neste setor, a “Wal-Mart detém sozinha 47% das vendas gerais das doze maiores
empresas varejistas mundiais”. (DUPAS, 2005, p. 95).
A preocupação com o crescimento da empresa nos Estados Unidos da América e a
velocidade da expansão internacional, assim como suas práticas administrativas, coloca o
grupo Wal-Mart em destaque e o tornam objeto de estudo de cientistas de diferentes áreas e
foco central de diversas reuniões acadêmicas. Prova disso, foi o ocorrido, no mês de abril de
2004, onde intelectuais (sociólogos, antropólogos, historiadores e outros pesquisadores)
reuniram-se na Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, para examinar a Wal-Mart em
busca de idéias sobre a natureza básica da cultura capitalista americana. Entre os presentes, o
professor de história Nelson Lichtenstein
43
, da Universidade sede e organizador do evento, o
qual advertiu que em cada período do capitalismo norte-americano encontra-se um tipo de
empresa como padrão, provocando um conjunto inédito e inovador de estruturas sociais (uma
nova forma de organização do trabalho e produção), econômicas (um modelo mais eficiente e
lucrativo) e políticas (novos acordos entre as diversas classes da sociedade) com o objetivo de
controlar o mercado.
Entretanto, no século XIX, tivemos a presença da Pennsyvania Railroad, maior
empresa de ferrovias norte-americana; no início do século XX foi a vez da Ford; em meados
do século a General Motors seguido pela Microsoft e McDonald´s (SADER, 2005). Agora, no
início do século XXI, alguns intelectuais apostam nesta cadeia de lojas de varejo que impõem
lógicas de dominação no território. A companhia Wal-Mart transforma o mundo da
concorrência impondo um sistema de produção, de distribuição e de emprego multinacional e
fortemente integrado.
43
Considerado o maior estudioso da rede mundial do supermercado Wal-Mart. O professor acaba de lançar um
livro, em 2006, que detalha como funciona a maior empresa do mundo: Wal-Mart: The face of Twenty-First
Century Capitalism, este ainda não foi traduzido para o Português e nem se quer é comercializado no Brasil. O
objetivo desta nota é informar a existência desta bibliografia, sendo que a mesma não faz parte das referências
desta dissertação.
66
Este hipermercado foi capaz de “alterar o zoneamento de cidades americanas,
estabelecerem padrões de salário e até mesmo conduzir negociações diplomáticas com outros
países” (GREENHOUSE, 2004, p. A28). Além de, no Brasil, exigir mudanças nas vias de
acesso à loja e instalação de semáforos nas ruas próximas à unidade
44
, de modo a valorizar os
terrenos
45
no entorno do empreendimento com a produção do próprio espaço urbano. Ademais
se recusar a vender qualquer material que possa ferir a integridade da imagem da loja, uma
vez que esta acredita que ser uma loja de família é a essência de seu sucesso financeiro
46
.
Assim, os produtos de entretenimento, que representam somente uma fração de seus negócios,
lançam versões higienizadas de seu trabalho e apresentam, para a avaliação da empresa,
exemplares que serão comercializados antes de iniciar o seu processo produtivo
47
.
De acordo com Sader (2005, p. 40), esse empreendimento é o exemplo de empresa
capitalista do período atual.
Esse é o modelo de empresa capitalista do século 21, que combina
superexploração dos trabalhadores na periferia do sistema com
superexploração dos trabalhadores imigrantes dentro dos Estados Unidos,
proibição de sindicalização e expropriação dos direitos sindicais, incluída a
proibição de sindicalização (SADER, 2005, p. 40).
Este fenômeno que caracteriza uma das novas fases do capitalismo contemporâneo
pode ser descrito da seguinte forma: determina o valor da mercadoria na região instalada;
obriga a concorrente a baixar o preço do produto em até, aproximadamente, 10%; não oferece
encargos sociais aos funcionários; que remunera pessimamente o salário; emprega mão de
obra desqualificada, imigrante ou pessoas aposentadas, que recebem menos que o referido por
lei; não admite trabalhadores sindicalizados; preocupa-se com a “fidelização” do consumidor;
investe massivamente em formas mercadológicas.
44
No Brasil, em Sorocaba, interior de São Paulo, a implementação da rede varejista Wal-Mart implicou em
melhorias viárias da região, incluindo mudanças nas vias de acesso à loja, a Avenida Antonio Carlos Comitrê, e
instalação de semáforos nas ruas próximas à unidade, que possuíam intenso tráfego. Esta é a política de intenção
da empresa para a instalação de uma loja na cidade (SOROCABA, 2005, p. 23).
45
A construção de uma loja do Wal-Mart em Bauru (SP), em 1997, provocou uma valorização de até 150% nos
terrenos próximos. (EXPLOSÃO..., 1997)
46
Segundo Klein (2003, p. 191), “o caso mais conhecido envolveu a recusa da cadeia em vender o segundo disco
do Nirvana, In Utero, embora o álbum anterior da banda tenha recebido quatro disco de platina, por fazer
objeção á arte da contracapa, que retratava fetos”. (...). Diante de uma perda estimada de 10% (a participação da
Wal-Mart na venda de disco nos EUA na época), a Warner e o Nirvana voltaram atrás e mudaram a contracapa.
Eles também mudaram o título da canção ‘Rape Me (‘Estupre-me’) para ‘Waif Me’(‘Abandone-me’).
47
Esta iniciativa não está associada somente à rede varejista Wal-Mart, porém é a maior representação de
comerciantes de massa, outras no mercado, também, usam seu peso para modificar o tipo de “arte” que seus
fornecedores provêm.
67
3.3
-
A
H
ISTORIA DO
W
AL
-M
ART NOS
EUA
A rede varejista norte-americana Wal-Mart surge a partir de uma pequena loja em
Arkansas, situada na região chamada de Ozarks (Oklahoma oriental, norte do Arkansas e sul
de Missouri), localizada em um dos pontos mais pobres do país, considerada uma região
agrícola em plena decadência, com uma grande quantidade de mão-de-obra excedente. A
busca de emprego contribuiu para que a população local estreitasse as relações com o novo
empreendimento. Sendo uma das poucas ofertas de trabalho, a Wal-Mart conseguiu, sem
muitos problemas, violar as leis trabalhistas americanas e também criar uma relação de
dependência com a população local, iniciando um processo de fidelização.
Assim, a simplicidade e os hábitos interioranos contribuíram para consolidar a
Companhia em âmbito regional. Hoje, esta é considerada a maior empresa dos Estados
Unidos e a maior corporação do mundo, cuja soma de negócios chegam a quase 300 bilhões
de dólares
48
.
Para entender esta trajetória, é importante compreender o papel do fundador Saw
Walton
49
para o sucesso da empresa varejista. Este iniciou como franqueado de grandes
empresas americanas de comércio de variedades, culminando na fundação da sua própria
rede. Destacava-se por sua capacidade de conter em si os fatores inerentes ao espaço
geográfico, tanto físico como humano, trazendo ao interior das lojas produtos de necessidades
locais e técnicas inovadoras de comércio. A simplicidade foi sempre um fator preponderante
nas tomadas de decisões, optava sempre em reduzir os custos de funcionamento das lojas para
reverter aos consumidores. Desta maneira, não se preocupava com luxos e proibia qualquer
gasto que julgasse excessivo, sendo a ostentação uma desobediência. Morava próximo à sede
da Empresa, na pequena cidade de Bentoville, do interior do Estado do Arkansas, da qual se
deslocava à curta distância, com uma caminhonete velha e a longa distância, pilotava o
próprio avião, para visitar as lojas. Com escritórios que parecem uma alcova, de decoração
modesta, acreditava ser um homem parco, de ações moderadas.
Os executivos da empresa, também tinham que se despender com economia. Desta
maneira, durante as viagens, dividirem quartos de hotéis, trabalharem sem ar condicionado,
viajar em classe econômica e pagar o próprio cafezinho no interior da empresa, são formas
48
Fonte: Revista Forbees Brasil 13 de maio de 2005
49
Sam Walton, nasceu em Kingfischer, Oklahoma, em 1918, e morreu em 1992. Formou-se em Comércio, na
Universidade de Missouri, em 1940 e, logo em seguida, trabalhou na J.C.Penney, cadeia de lojas de miudezas,
em Iowa, onde começou sua carreira de comerciante, durante 18 meses, até os EUA entrarem na guerra. Para
maiores detalhes sobre a vida de Sam Walton e suas atividades comerciais, verem WALTON, Sam; HUEY,
John. Saw Walton: Made in América. Rio de Janeiro: Campus, 1995. 246p.
68
mercadológicas para poupar em prol do cliente e consequentemente aumentar sua margem de
lucro.
Em de setembro de 1945, Saw Walton, inaugurou a sua primeira loja como gerente
e “proprietário”. Esta era uma franquia
50
da cadeia Bem Franklin, especializada em miudezas,
em Newport, Arkansas uma cidade ferroviária e produtora de algodão de cerca de 7.000
habitantes. Foi ali, conhecendo seus concorrentes, procurando comprar diretamente dos
produtores não muito conhecidos e lançando programas promocionais próprios que Sam
aprendeu a ser comerciante. Após cinco anos, com o sucesso da loja de departamento, o ex-
proprietário optou em não renovar o contrato e resolveu despejá-lo para continuar com o
empreendimento.
Em 1951, em Bentoville, Sam abriu uma loja com o nome de Walton`s Five &
Dime
51
, também, uma franquia da Bem Franklin, que logo se tornou um destaque em vendas
na região. No ano seguinte, começou a procurar oportunidades de comprar seu próprio
negócio. Adquiriu, em Fayetteville, Arkansas, uma mercearia velha, que depois de reformada
recebeu o mesmo nome da matriz e um diferencial na forma de organização da loja. Esta
adotou o auto-atendimento total, uma inovação para a época.
O mentor da rede varejista Wal-Mart, tinha como estratégia abrir lojas de ofertas em
pequenas cidades como meio de difundir os seus negócios e promover mudanças de
comportamento em seus potenciais clientes. A carência de investimentos obrigou-o a realizar
contratos com familiares próximos e empréstimos em bancos. Desta maneira, associou-se com
o pai e o irmão Bud, seus dois cunhados (Nick e Frank), e abriu outras lojas em Little Rock,
Springdale, Tenesse e Siloam Springs, no Arkansas, além de outras em Neodesha e
Coffeyville, Kansas. “Num prazo de 15 anos passamos a ser a maior empresa independente de
lojas de miudezas nos Estados Unidos. Em 1960 estávamos fazendo US$ 1,4 milhão em 15
lojas” (WALTON, 1993, p. 38).
As primeiras lojas, de fraca densidade e pouco volume de vendas, foram
desconhecidas pelos grandes distribuidores. A empresa passou a adotar uma política caseira,
consolidando-se localmente, antes de estender os seus empreendimentos para outras regiões.
O centro administrativo ficava em Bentoville, no Arkansas, de onde partia o comando para
50
ou franchising empresarial é um sistema que se caracteriza por uma relação direta entre franqueador e
franqueado, sendo que o primeiro cede ao segundo o direito de uso da marca ou patente, associado ao direito de
distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços. De maneira que o franqueado não se torna
dono ou proprietário da marca mas um revendedor.
51
“Five and Dime” – lojas populares, conhecidas como lojas de miudezas, onde todas as mercadorias são
vendidas pelos mesmos preços 5 (five) e 10 (dime) centavos de dolar, como as “Lojas de dois mil reis” que
existiam no Brasil até a década de 40 e as “Lojas de R$ 1,99” que atualmente exercem bastante influencia no
mercado nacional.
69
ocupar os espaços vizinho e baseava-se por uma economia de escala
52
. A localização das lojas
e a distância entre elas era calculada, a partir do Centro de Distribuição da empresa, em um
raio de aproximadamente 150 km.
A estratégia estabelecida concentrava na centralidade produzida pelo centro de
distribuição (armazém) e no fator de abastecimento das lojas. A rede varejista Wal-Mart
somente abre suas lojas próximo aos próprios centros de distribuição, para economizar nos
custos em transporte e em carregamento da produção. Portanto os centros de distribuição são
construídos antes de abrir as redes de lojas. “Íamos [Wal-Mart Stores] o mais longe possível
de um armazém e abríamos uma loja. A partir daí enchíamos o mapa daquele território, estado
a estado, condado a condado, até que tivéssemos saturado aquela área de mercado”
(WALTON, 1993, p.). Assim, a empresa concentrava-se em uma região, de tal maneira que a
divulgação das novas lojas tornava-se secundária. A preocupação do fundador estava no
tempo de entrega da mercadoria, este era um fator limitante, e considerava que o cliente
deveria ser atendido com agilidade e destreza.
Ela [a Wal-Mart] não se muda para uma nova região até que tenha coberto a
última área com lojas muitas lojas quarenta em um raio de 150 km. Desse
modo, a empresa economiza dinheiro nos custos de transporte e embarque, e
desenvolve uma presença tão concentrada em uma área que quase não
necessidade de divulgar sua marca. (KLEIN, 2003, p. 157)
Contudo, à medida que as grandes lojas se expandiam, estas contribuíam para esgotar
as opções da comunidade local em freqüentar outras lojas de mesma categoria. Na verdade, os
pequenos estabelecimentos eram os mais prejudicados, uma vez que as concorrentes diretas
do Wal-Mart (Sears e Kmart), nos EUA, também, possuíam estratégias semelhantes com alto
poder de investimentos. Outro fator preocupante, que atingia diretamente o meio social era a
freqüência com que pessoas utilizavam o estabelecimento para realizar seus encontros casuais
ou de trabalho. De modo que, a Wal-Mart, nos Eua, apresentou um conceito que combinasse
seus modelos de preço baixo com lojas voltadas para o setor de serviço, salões de beleza,
bancos, entre outros, a fim de interagir, cada vez mais, com seus consumidores (KLEIN,
2003)
53
.
52
Produção de bens em larga escala, graças à racionalização intensiva da atividade produtiva, com vistas a uma
considerável diminuição dos gastos.
53
O assunto discutido neste parágrafo, também, pode ser acompanhado no Brasil como iremos apresentar no
próximo capítulo.
70
Em 1962, a família Walton, abriu a primeira loja Wal-Mart
54
, em Rogers, Arkansas,
apresentando um novo modelo de lojas de departamento: as lojas de promoção. Em vista
disso, aumentou-se o espaço físico adaptou seu tamanho de acordo com os potenciais
consumidores locais, selecionou uma grande variedade de produtos para serem
comercializados, investiram na estrutura interna (jogos de luzes, chão de lajotas, grandes
prateleiras, divisão de departamentos por artigos) e externa da loja (placas de propagandas), e
ofereceram preços baixos com garantia de satisfação e, caso o preço do concorrente fosse
mais baixo a política da empresa é a troca dos produtos direto no caixa. Estas também se
localizavam em cidades pequenas e nos subúrbios dos grandes centros, com as quais as outras
empresas e, também os grandes fornecedores o se importavam. Esse exemplo foi seguido
em todas as fases de expansão.
Pelo fato de atuarem em pequenas cidades do interior, longe dos grandes
centros e serem uma pequena cadeia de lojas, eram totalmente ignorados
pelos distribuidores e atacadistas. Para contornar este fato, tiveram que
organizar seu próprio sistema de distribuição (COSTA, 2004, p.12).
Na década de 70, a Wal-Mart tornou-se uma sociedade anônima
55
negociada no
mercado paralelo. Com a abertura do capital, a empresa cresceu de forma acelerada,
expandindo para outros Estados Norte-Americanos. Neste período, os EUA passavam por
uma fase de redução do salário mínimo real e da sindicalização, facilitando o acesso à mão de
obra barata, fator este extremamente importante para consolidar as políticas desenvolvidas
pela empresa e permitir seu crescimento. Para Medeiros (2005, p10),
A queda do salário mínimo real ao lado da redução da parcela dos salários na
renda e da sindicalização foi um fator central na explicação da forte
concentração da renda ocorrida nos EUA nos anos recentes.
54
O nome Wal-Mart surgiu numa conversa entre Sam Walton e Bob Bogle, primeiro gerente da Walton’s Five
& Dime, numa viagem de avião, sobre as montanhas de Boston. Bob sugeriu W-A-L-M-A-R-T, Wal, de Walton
e Mart, que significa lugar de fazer compras, em escocês (WALTON, 1993, p. 40).
55
Sociedade comercial formada por, no mínimo, sete sócios, sendo o capital de cada um representado pelo
número proporcional de ações e sua responsabilidade limitada ao capital investido (SANDRONI, 1994, p. 332).
As sociedades anônimas poderão ser de dois tipos: Companhia Aberta ou Companhia Fechada. No caso do Wal-
Mart é uma Companhia Aberta que disponibiliza seus valores mobiliários para a negociação do mercado através
da Bolsa de Valores.
71
Além disso, o mercado consumidor americano se fortaleceu com a cristalização de
uma classe mais favorecida e com um poder de compra mais elevado. Esses fatores, também,
contribuíram para que a rede Wal-Mart começasse seu processo de expansão.
O crescimento apressado da empresa, no final da década de 80, exigiu práticas e
técnicas organizativas internas (como centros de distribuição informatizados e automatizados
localizados estrategicamente, na proporção de um centro para 150 a 200 lojas, que despacham
cerca de 90% da produção no prazo de um dia) para responder os processos de globalização.
(...) a Wal-Mart passou verdadeiramente a ter consciência de seu papel
influente no varejo no final dos anos 80. Embora a primeira loja Wal-Mart
tenha sido inaugurada em 1962, a superloja modelo decolou em 1988 e
foi apenas em 1991 que a Wal-Mart que na época inaugurava 150 lojas de
desconto por ano ultrapassou a Kmart e a Sears e se tornou a força mais
poderosa no varejo americano (KLEIN, 2003, p. 156).
Desta maneira, foi necessário empenhar em desenvolver a logística e acompanhar as
novidades tecnológicas para otimizar o tempo de trabalho e aumentar a produtividade
(monitorar as vendas, as mercadorias, os estoques e os lucros). Os altos executivos viam a
necessidade de expandir para outros mercados consumidores frente à nova ordem
internacional. Apesar de controlar grande parte do território norte-americano, a nova fase
empreendedora, acreditava que estava pronta para disputar o mercado mundial. Esta opção foi
discutida internamente nas reuniões, sendo que alguns setores mais conservadores rejeitavam
uma expansão, e defendiam o controle “total” nos EUA. Porém a preocupação da cúpula
majoritária era se o Wal-Mart “agüentaria” a pressão de continuar sendo o número 1 (um) em
vendas no país sem ter uma visibilidade internacional, palavras do fundador, “Não sei se o
Wal-Mart pode manter realmente a nossa posição de liderança ficando apenas nos EUA. Acho
que teremos de nos transformar numa companhia mais internacional num futuro não muito
distante” (WALTON, 1993, p. 184).
Além disso, os EUA representam somente 4% da população mundial. Caso optassem
por garantir a totalidade dos consumidores no território americano estariam perdendo uma alta
porcentagem de potenciais consumidores que residem em outros países.
72
Tabela 3 - Distribuição da rede varejista Wal-Mart nos EUA por década
Período Lojas abertas no período Total
1962 - 1970 25 25
1971 - 1980 277 302
1981 - 1990 1223 1525
1991 - 2000 1080 2605
2001 - 2006 1251 3856
Fonte: HOLMES, T. J. The diffusion of Wal-Mart and economies of density, 2006.
No entanto, a difusão da rede varejista, nos EUA, apresenta uma acelerada expansão
no território. De maneira que a saturação no mercado interno pode reverter para um processo
de estagnação nas vendas sem ao menos manter o nível de crescimento à altura do potencial
da empresa.
Figura 3 – Localização das lojas Wal-Mart nos EUA (1962 – 2006)
Fonte: BASKER, E. The causes and consequences of Wal-Mart’s growth, 2007
73
Tabela 4 - A expansão do Wal-Mart nos EUA
Anos Números de lojas
Wal-Mart
I
NAUGURAÇÃO DAS LOJAS EM NOVOS
E
STADOS
1962 1 Arkansas
1972 50 Louisiana, Missouri, Kansas, Oklahoma.
1973 66 Tennessee
1974 78
1975 104 Kentucky, Mississippi
1976 125 Texas,
1977 153
1978 195 Illinois,
1979 229
1980 277 Alabama
1981 330
1982 491 Geórgia, Carolina do Sul,
1983 551 Nebraska, Flórida,
1984 642 Novo México, Iowa, Indiana, Carolina do Norte.
1985 745 Virgínia,
1986 859 Corolado, Wisconsin
1987 980 Minnesota
1988 1114
1989 1364 Arizona, Ohio, Virgínia Ocidental
1990 1525 Michigan, Nova Jersey, Wyoming
1991 1721 Utah, Dakota do Sul, Pensilvânia, Dakota do Norte, Nevada, Califórnia
1992 1928 Connecticut, Delaware, Maine, Maryland, Massachusetts, New Hampshire,
Nova York,
1993 2136 Idaho, Montana, Oregon, Porto Rico,
1994 2511 Alaska, Hawaii, Rhode Island, Washington, México
1995 2833 Hong Kong (China), Canadá
1996 2943 Vermont, Argentina, Brasil,
1997 3054
1998 3406 Alemanha
1999 3599 Coréia do Sul
2000 3989 Inglaterra
2001 4189
2002 4414
2003 4688
2004 4906
2005 5289
2006 6141
Fonte: Annual Reports Wal-Mart Stores (1972-2006) acesso: <www.walmartstores.com> , maio de 2006.
Org.: FERREIRA-COSTA, 2007
Antes de seguir com um processo expansão e de globalização das lojas, o fundador
Saw Walton percorreu alguns países europeus, asiáticos, africanos e latino-americanos. Este
voltou impressionado com as possibilidades de expansão, os mercados consumidores e o
modelo de loja instalada pelas concorrentes em países emergentes, no caso “as gigantescas
lojas Carrefour no Brasil”. (WALTON, 1993, p. 180). Ao voltar aos EUA, apresentou a
sociedade americana o modelo Hypermart, que agregavam diversos departamentos sob o
mesmo teto. Entretanto, este não se mostrou lucrativo e nem eficiente para atender às
necessidades da sociedade. A partir dessa fracassada empreitada, a Wal-Mart Stores
desenvolveu o conceito de Supercenters, que centralizavam na mesma superfície produtos de
74
mercearia e artigos em geral, com tamanhos menores que o protótipo anterior. Este modelo de
loja foi a base de expansão da empresa no início dos anos 90. Além das aquisições que
permitiram um acesso rápido a regiões que não participavam do mercado, pôr novas marcas
deveria passar pelo processo de administração do grupo Wal-Mart (COSTA, 2004).
3.4
-
O
PROCESSO DE GLOBALIZAÇÃO DA REDE VAREJISTA
W
AL
-M
ART
Neste período, década de 90, a empresa inicia o processo de globalização. Esta fase é
marcada pela morte do fundador Saw Walton e uma modificação na estrutura administrativa
que passa a ser controlada por conselhos mistos entre familiares e profissionais.
Os dirigentes que sucederam o fundador tiveram papel decisivo na
implementação de novos formatos de lojas, adequados ao perfil dos
consumidores e ao local de sua implantação, assim como fortaleceram
o setor de gêneros alimentícios. Também foi fundamental preparar o
grande arsenal de informações e o sistema logístico, assim como a
estruturação da burocracia administrativa,
que puderam garantir o forte
crescimento da empresa (Costa, 2004, p. 3).
Desta maneira, com a modernização no setor varejista, a empresa expandiu os acessos
a outros países. A estratégia de globalização do Wal-Mart começou na busca de mercado que
sustentasse uma classe média emergente e um contingente de possíveis consumidores.
Segundo Slater (2003, p.49), “os critérios de escolha dos países deveriam ser a grande base
demográfica e uma classe média forte e crescente”.
Entretanto outros fatores contribuíram para o crescimento vertiginoso. Primeiro, os
altos investimentos no setor de informática (VSATs
56
, GPS, comunicadores). A integração
das tecnologias da informação na estrutura da empresa possibilitou conhecer a demanda de
cada loja e as suas necessidades, além de conectar diretamente com os principais
fornecedores, os quais podiam usar dessas informações para preparar os planos de produção e
embarque de maneira mais eficiente (COSTA, 2004). Desta maneira, os gestores previam
antecipadamente as exigências do mercado local e encaminhavam os produtos solicitados.
Segundo, o transporte, também, foi um fator importante, a conteinerização permitiu uma
56
O sistema VSAT (Very Small Aperture Terminal) tem como objetivo inicial integrar unidades separadas por
longas distâncias e transmitir dados por satélites. A empresa Wal-Mart Stores foi a primeira a utilizar.
75
redução nos custos e melhorias nos portos. Além do mais, não havia equipamentos em terra
com capacidade e versatilidade suficiente para suportar grandes quantidades de mercadorias.
Em terceiro, conseguiu firmar grandes acordos, a baixo custo, com os principais fornecedores
internacionais (Procter & Gamble, Hall-mark, Kellogg, Nestlé, Coca-Cola, Pfizer, Revlon e
3M) cujo objetivo era de abastecer os novos mercados.
Nesta expansão, optou pelos países das Américas, Ásia e Europa. Desse modo,
desembarcou no México (1992), Canadá (1994), Brasil (1995), Argentina (1995), Porto Rico
(1995), China (1996), Alemanha (1997), Coréia do Sul (1998), Reino Unido (1999), Japão
(2005)
57
.
Tabela 5 - A globalização da rede varejista norte-americana Wal-Mart
País Ano da 1ª
Loja Ψ
ΨΨ
Ψ
Lojas de
desconto
Supercenters Sam´s
Club
Mercados de
Vizinhança
Total
%
Alemanha 1997 0 88 0 0 88 1,4
Argentina 1995 0 11 0 0 11 0,2
Brasil
1995 255 23 15 2 295
4,8
Canadá 1994 272 0 6 0 278 4,5
China 1994 0 51 3 2 56 0,9
Coréia do Sul 1998 0 16 0 0 16 0,3
Inglaterra φ
φφ
φ
1999 294 21 0 0 315
5,1
Japão λ
λλ
λ
2005 398 0 0 0 398
6,5
México
1994 599 105 70 0 774
12,6
Porto Rico #
##
#
1993 9 5 9 31 54
0,9
Total
Internacional
1431 416 103 335 2285 37,2
EUA 1962 1209 1980 567 100 3856 62,8
Total Geral
2640 2396 670 435 6141
No Brasil, em 2006, sobre o total de 255 lojas de desconto incluem as bandeiras: Bompreço (116 lojas) e Sonae
(139 lojas), o modelo de mercados de vizinhança, no país, é representado pelas lojas Todo Dia. Porém, as lojas
de descontos não existem no território brasileiro na categoria supermercadista. No entanto para compor o quadro
e respeitar as informações publicadas nos Relatório Anuais consideramos os totais das unidades de
supermercados e alguns hipermercados que não levam a marca Wal-Mart Supercenters. Para 2007, o quadro
ficaria na seguinte distribuição: 95 Hipermercados (Supercenters, HiperBompreço e BIG); 166 supermercados
(Bompreço, Mercadorama e Nacional); 15 Mini-Mercados (Balaio); além de 17 Sam’S Club e 2 TodoDia. A
rede MaxxiAtacado, especializada em vendas por atacado da bandeira Wal-Mart, não foi abordado nesta
dissertação. Esta possum conceito diferenciado, com modelo de auto-serviço e televendas. E está presente na
região Sul (8 no RS, 1 em SC e 2 no PR).
φ
φφ
φ Na Inglaterra, sobre o total de 294 lojas de desconto, incluem os modelos da companhia ASDA, de maneira que
as distribuem pelos seguintes estabelecimentos: 236 lojas ASDA Stores, 10 Georges Stores, 5 ASDA Living e 43
ASDA Small Stores.
λ
λλ
λ No Japão, sobre o total de 398 estabelecimentos, incluem: 2 lojas GM, 96 lojas de mercadoria em geral e 300
supermercados.
No México, sobre o total de 599 lojas de desconto, incluem: 187 Bodegas, 16 Mi Bodegas, 1 Mi Bodegas
Express, 1 Mercamas, 53 Suburbias, 55 Superamas, 286 Vips.
#
##
# Em Porto Rico, os 31 mercados de vizinhança são representados pelas lojas Amigos.
Ψ
ΨΨ
Ψ Ano da primeira loja Wal-Mart
A coluna da porcentagem indica o total de lojas por país e a representatividade deste sobre o total geral
Fonte: Dados disponíveis em www.walmartstores.com, acesso 7 de junho de 2006
Org: FERREIRA-COSTA, 2006
57
Disponível em: <www.walmartstores.com>.Acesso em: maio de 2006.
76
Cerca de 10 anos o grupo Wal-Mart tornou-se uma potencial concorrente nesses novos
mercados de forma que conquistou o posto de maior varejista no México e no Canadá. E nas
demais frentes de investimento, ou seja, nos outros países, ostenta um crescimento acelerado.
Tabela 6 - Expansão da rede varejista Wal-Mart no México no período de 10 anos
Bandeiras Número de lojas (1994) Número de lojas (2004)
Sam`s Club 7 55
Bodega 10 144
Wal-Mart Supercenter 2 83
Superama 2 46
Suburbia 50
Aurretas 1
Vips 271
Total 22 649
Fonte: Annual Reports Wal-Mart Stores (1972-2006) acesso: www.walmartstores.com , maio de 2006.
Org.: FERREIRA-COSTA, 2007
A primeira loja mexicana foi inaugurada em 1991, com expectativas favoráveis de
aceitação da população. Em 1998 adquiriu o controle do maior varejista, a Cifra, com lojas
em todo o país, assumindo, em 7 anos, o cargo de maior empresa do setor. Neste momento, o
Wal-Mart lança as políticas de estratégias e amplia os contratos entre fornecedores, mas
rebate nos salários dos funcionários. Com o menor preço do mercado a empresa proporciona
os primeiros sintomas do “efeito dominó”, ou seja, consiste na repetição sistemática de
acontecimentos no território que tem como objetivo controlar o mercado e excluir outras
bandeiras. Portanto, coage as pequenas empresas a filiarem-se ao Wal-Mart e aos
fornecedores a realizarem acordos não muito lucrativos
58
de modo que os concorrentes
venham a diminuir o espaço de venda na cidade.
No Canadá, com o perfil de consumidores semelhante ao americano, a Wal-Mart
iniciou o processo de globalização adquirindo a loja de desconto Woolco, em 1994. Porém, os
primeiros anos não foram tão significativos, resultando grandes prejuízos para a empresa.
No mercado asiático, a estratégia de expansão foi de ocupar por vias de associações
com empresas locais. Desse modo, as cautelas utilizadas, diferentes do ocidente, estavam
ligadas às características próprias da cultura oriental, pois temiam a rejeição da cadeia de
forma imediata. No caso do Japão, entre 1992-1993, a empresa varejista concordou em
fornecer produtos a baixo custo para dois importantes varejistas locais, Ito-Yokado e Yaohan,
58
A Vlasic, a maior produtora de picles dos EUA, em certa ocasião, começou a vender através do Wal-Mart um
vidro gigantesco de picles de um galão, para ser exato por apenas $2.97. Picles para mais de ano por menos
de 3 dólares! Como americano adora picles, o vidrão foi um sucesso. A empresa passou a vender mais de 240
mil vidros por semana. O preço, porém, era baixo demais para dar muito lucro, e a Vlasic, em janeiro de 2001,
pediu concordata. Desta maneira, depois de muita negociação com o Wal-Mart, conseguiu reduzir o tamanho do
vidro para meio galão, pelo mesmo preço. (Paulo Leite - 17/04/2006 – Diego Casagrande)
77
os quais, também, abasteciam os mercados de Cingapura, Hong Kong, Malásia, Tailândia,
Indonésia e Filipinas. Recentemente, em 2002, a empresa comprou 6,1% dos direitos de
participação na Seiy Ltda, quarta maior varejista do Japão.
Em 1994, a Wal-Mart, teve participação no mercado chinês por meio da joint venture
59
Pokphand Company (C.P.), conglomerado
60
com sede na Tailândia, que abriu três lojas de
desconto em Hong Kong. As vendas a varejo, na China, tiveram um crescimento significativo
por conta da liberalização da economia e da demanda de bens de consumo, uma vez que o
regime de governo reprimia a comercialização de certos produtos.
Após dois anos no anonimato, na China, a Wal-Mart iniciou um processo de lojas
próprias. A rede varejista experimentou diversos modelos para descobrir qual deles tinha
maior aceitação dos consumidores. Uma dessas experiências foi o supercenter da cidade de
Shenzhen, uma loja híbrida que combinava o supercenter tradicional e o clube de compras.
De maneira que, existia o sistema de cartões para sócios, com desconto de até 5%, e as vendas
ao público em geral. Outro formato testado foi o de pequenas lojas-satélites, similar às
mercearias brasileiras, que, aparentemente, eram mais adequadas tanto aos hábitos de compra
da população, pequenas quantidades, como ao tipo de transporte usado na China, bicicletas e
trens intra-urbanos.
Por outro lado, a empresa teve dificuldade de se instalar nos países europeus que já
apresentavam um setor varejista maduro e um modelo empresarial bastante semelhante. Isso
implicaria concorrer por uma parcela no market share
61
das empresas locais, sem ao menos
trazer importantes inovações e uma boa impressão aos clientes europeus que não estão muito
abertos a mudanças. Em 1998, a Wal-Mart adquiriu 21 hipermercados na Alemanha, e em
2000, com a compra da rede inglesa ASDA, inseriu no mercado do Reino Unido com 232
supermercados. “Na Europa, enfrentando custos de mão-de-obra mais altos, sindicatos mais
duros e um ambiente regulamentário mais paternalista que nos EUA, a Wal-Mart limitou sua
atuação à Inglaterra e Alemanha”. (SLATER, 2003, p. 149).
A companhia, exemplo do capitalismo contemporâneo preocupa empresas de todos os
setores. Antes os fornecedores de bens de consumo, diante de uma crise, repassavam o preço
para os consumidores a fim de diminuir os prejuízos. Mas os avanços ofensivos dos grupos
varejistas como o caso da rede Wal-Mart, inverteu esse papel, uma vez que tentavam arrancar
59
Associação entre empresas para o desenvolvimento e execução de um projeto específico. No Brasil, a rede
varejista norte-americana utilizou-se desta estratégia para iniciar suas ações no território nacional. Entretanto, a
associada foi Lojas Americanas e durou 3 anos a parceria.
60
Tipo de organização no qual várias empresas que atuam nos mais variados setores e ramos da economia
pertecem à mesma holding, ou seja, sistema pelo qual centraliza o controle sobre um complexo de empresas.
61
Expressão inglesa que significa participação no mercado.
78
dos fornecedores custos baixos para serem transferidos aos consumidores. Desse modo, as
indústrias, para suportar as intempéries do mercado apostaram na fusão de “supermarcas”,
como o caso da Procter&Gamble
62
com a Gillette
63
, em busca de economizar na publicidade e
no custo da produção.
O gigantismo da rede Wal-Mart, que abastece as residências de quase 80% das
famílias americanas, força os fornecedores a expor seus produtos nas estantes do varejista. As
vendas da companhia Wal-Mart somam, todo mês: 320 milhões de latas de Coca-Cola, 250
milhões de litros de água mineral Nestlé e 101 milhões de litros de leite de sua marca própria,
Great Value. Além de representar, como venda dentro dos EUA, 1 CD ou DVD em cada 5
compradores, 1 tubo de pasta de dente em cada 4, 1 berço de bebe em cada 3, 1 boneca Barbie
a cada 2 segundos (GUROVITZ, 2005). O preço baixo, a qualidade do produto, o
atendimento diferenciado e a garantia de venda aos fornecedores são valores compartilhados
em todas as unidades da rede.
Uma corporação poderosa como uma nação, que compra produtos a preço de
banana em países asiáticos, compactuando com trabalho semi-escravo, para
revendê-los garfando suculentas margens de lucro. Uma empresa de
tentáculos gigantescos, capazes de destruir o pequeno comércio e de
espremer cada centavo nas negociações com fornecedores, até levá-los a
bancarrota. Um empregador cruel, que paga os piores salários do mercado,
descrimina mulheres e minorias, desdenha planos de saúde e combate
ferozmente os sindicatos - não um único sindicalizado entre 1,3 milhões
de americanos que trabalham para o Wal-Mart. Um grupo de fanáticos
moralistas, capazes de censurar CDs, filmes e livros, de proibir remédios
legais como uma versão da pílula do dia seguinte e de tentar impor ao
resto do planeta a cultura caipira do Meio-Oeste americano (GUROVITZ,
2005, p. 24-25).
O faturamento da rede, no ano de 2005, ultrapassa o PIB nominal
64
da maior parte dos
países, destacando-se em 25º lugar. Entre os países africanos a companhia possui um poder de
venda e compra maior que qualquer um deles. Por outro lado, o fator de comparação com o
62
Produtos da Procter&Gamble: batata Pringles, creme dental Crash, absorvente Always, sabão em Tide,
entre outros.
63
Produtos da Gillette: mina de barbear Gillete, pilhas Duracel, produtos de higiene pessoal Oral B, entre
outros.
64
O Produto Interno Bruto (PIB) representa a soma, em valores financeiros, de todas as riquezas finais
produzidas dentro do território econômico do país, independente da nacionalidade das unidades produtoras,
durante um período determinado. (SANDRONI, 1994).
79
PIB dos países é uma maneira de atribuir o poder econômico relativo a essa corporação. A
companhia Wal-Mart Chores, representa 2,5% do PIB norte-americano
65
, “alguns
economistas dizem que a rede, sozinha, reduziu em 1% a inflação nos últimos anos,
economizando bilhões de dólares para os consumidores” (GREENHOUSE, 2004, p. A28). A
renda líquida da empresa deixa-a numa posição de investimentos bem favorável.
0,0
50.000,0
100.000,0
150.000,0
200.000,0
250.000,0
300.000,0
350.000,0
19681970197219741976197819801982198419861988199019921994199619982000200220042006
Faturamento da rede Wal-Mart (U$1.000.000,00) por ano fiscal
Gráfico 1 - Faturamento da rede varejista Wal-Mart por ano fiscal
Fonte: Annual Reports Wal-Mart Stores (1972-2006) acesso: www.walmartstores.com, maio de 2006.
Org.: FERREIRA-COSTA, 2007
Apesar do crescente faturamento da empresa, da sua alta capacidade de investimentos e de
sua internacionalização ter início na década de 90, a presença da rede varejista se limita em 10
países fora das fronteiras norte-americanas. Estudos da McKinsey
66
mostram que, embora gigante,
o Wal-Mart precisa crescer muito fora dos EUA, pois entre as grandes empresas de varejo ela é a
menos internacionalizada. Apenas 13,3% de suas receitas vêm de fora do seu país de origem, ante
31,1% no caso do Carrefour, uma das mais internacionalizadas (DINIZ, 2004).
65
Wall-Street Journal, 3 de dezembro de 2005.
66
A McKinsey & Company é uma empresa de consultoria de negócios
80
Figura 4 - A distribuição das lojas da rede Wal-Mart no mundo
Fonte: Annual Reports Wal-Mart Stores (1972-2006) acesso: www.walmartstores.com, abr de 2007
O efeito Wal-Mart exerce influência também sobre as pequenas lojas comercias. Esses
pequenos estabelecimentos especializados perderam o poder de venda frente à empresa. A
concorrência fez com que muitos fossem à falência
67
com a chegada das grandes superfícies
comerciais. O “populismo de mercado” e as “políticas de preço baixo” ameaçaram a atuação
das pequenas empresas. Desse modo forçaram-nas a procurarem mercados consumidores
menos consolidados e deslocarem-se para cidades menores. Segundo Rovani (2006) os
empreendedores de pequeno e médio porte da cidade de São Paulo, “fugindo de um ambiente
que reúne concorrência predatória, custos fixos nas alturas e escassez de bons pontos
comerciais, (...) começam a fincar bandeiras em cidades do interior”.
67
Quando a Wal-Mart se instalou em Iowa, em meados dos anos 1980, o estado perdeu metade de suas
mercearias, 45% de suas lojas de ferragem e 70% de suas confecções masculinas.
(SERGE HALIMI, 2006)
81
3.5
-
A
S LOJAS DO GRUPO
W
AL
-M
ART
O gigante americano do varejo mantém quatro tipos de lojas operacionais para atender
às duas condições básicas: a dos ritmos de consumo e a das sociabilidades do espaço urbano.
Essas formas de comércio atendem para uma flexibilidade e versatilidade das estratégias de
mercado que procuram satisfazer, desde os diferentes perfis socioeconômicos dos
consumidores às unidades de pequenos comerciantes e profissionais liberais. Assim, essas
categorias de estabelecimento trabalham tanto com varejo, quanto com o atacado.
No caso da rede varejista Wal-Mart, os formatos de lojas são: (i) Lojas de descontos
68
,
caracterizada por oferecer produtos com baixos preços, ponta de estoque; (ii) Sam Club`s,
venda por atacado e em sistema de auto-serviço, funcionam como clube de vendas e oferecem
aos sócios, geralmente pequenos comerciantes, as melhores oportunidades do mercado
(preços mais baixos que as demais lojas Wal-Mart); (iii) Supercenters, grandes lojas que
combinam produtos de supermercados e lojas de departamento, no Brasil este modelo é
semelhante aos hipermercados; (iv) Lojas de Vizinhança; estabelecimentos menores que
atendem às necessidades locais, ou os bairros, de maneira que não possuem estoques, no
Brasil este formato leva a bandeira TodoDia.
68
Este conceito encontra-se no território brasileiro como OUTLET, porém este, no Brasil, não possui uma loja
específica na categoria supermercadista para o desenvolvimento desta atividade.
82
Figura 5 – Formatos e bandeiras das lojas Wal-Mart
83
No território brasileiro o Wal-Mart apresenta, também, na direção das bandeiras
Bompreço (HiperBomPreço, BomPreço, MiniBomPreço e Balaio) e Sonae (Big,
Mercadorama, Nacional, MaxxiAtacado
69
). Ao mesmo tempo, a empresa aumentou sua
presença na Região Nordeste desde que passou a administrar os ativos da marca BomPreço,
do grupo holandês Ahold. E ampliou sua influência na Região Sul dado que começou a operar
a cadeia portuguesa Sonae.
Tabela 7 - Lojas Wal-Mart por Região e Estados brasileiro
Fonte: Annual Reports Wal-Mart Stores. Disponível em: <www.walmartstores.com> . Acesso: maio de 2007
Desta maneira a rede varejista norte-americana alargou os domínios no território
brasileiro transformando-se na cadeia supermercadista de maior extensão territorial do país
70
.
69
A rede MaxxiAtacado, especializada em vendas por atacado da bandeira Wal-Mart, não foi abordado nesta
dissertação. Esta possui um conceito diferenciado, com modelo de auto-serviço e televendas e está presente na
região Sul (8 lojas no Rio Grande do Sul, 1 em Santa Catarina e 2 no Paraná).
70
Em 2006, o grupo Carrefour estava presente em 14 unidades da federação, com 401 lojas e o grupo Pão de
Açúcar em 17 unidades da federação, com 549 lojas.
E
STADOS
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12 24 2
SC
6
RS
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S
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33 93 2
SP
26 9 2
RJ
2 2
MG
1 1
ES
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30
13
2
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8 33 6 1
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RN
1 1
CE
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PI
1 1
MA
1 7
N
ORDESTE
30 73 15 2
T
OTAL
95 166 15 17 2
84
Esta que antes era concentrada na região Sudeste passa a ter presença em 18 unidades da
federação. Assim, passou a concorrer diretamente com as maiores empresas do setor, o grupo
Pão de Açúcar e o Carrefour. Ademais, o faturamento bruto, sem deflacionar
71
, que era
aproximadamente, de R$ 2 bilhões, em 2003, passou para, quase, R$ 13 bilhões, em 2006.
Mapa 1 – Distribuição Espacial das lojas Wal-Mart, no Brasil, divididas por formato
Fonte: [Tabela 7]
71
Estes dados não foram reajustados de acordo com a inflação podendo apresentar alteração quando comparados
com outros trabalhos. A inflação, para os economistas, é a queda do valor de mercado ou do poder de compra do
dinheiro. Isso é, o equivalente ao aumento do nível geral de preços. Segundo o IBGE, o índice de inflação
durante o período do gráfico foi: entre 1990 a 1995 a média anual de 764%; entre 1995 a 2000 a média anual de
8,6%; em 2001 de 7,67%; em 2002 de 12,53%; em 2003 de 9,3%; em 2004 de 7,6%; em 2005 de 5,69%; e em
2006 de 4,5%.
85
Contudo, a estratégia de globalização da rede varejista é marginal aos interesses do grupo.
O fortalecimento interno no mercado americano ainda é o objetivo principal tendo em vista que a
pequena parcela do valor total arrecadado veio de outros países, apesar da rede Wal-Mart ter
quase 40% das lojas operando fora dos EUA. Também é fato considerar que existe uma
disparidade de renda entre os consumidores dos diferentes países onde a empresa possui sede,
além do território americano ser considerado genuinamente um país consumista.
Porém os desempenhos das vendas no Brasil, na Argentina e na China exercem um saldo
positivo para a companhia. Esta credita o bom resultado no poder de compra do consumidor
destes países (RESENDE, 2007). Desse modo a empresa anuncia investimentos consideráveis e
um conjunto de facilidades para o mercado brasileiro o qual tem crescido nos últimos anos.
As estratégias da empresa norte-americana, que serão o assunto do próximo capítulo, e
os demais apontamentos sobre o crescimento do setor varejista no Brasil, velam pela
consolidação do conceito da rede no setor. Além dessas estratégias manipularem um
prodigioso instrumental modulador que induz o consumidor às compras, também garantem
padrões de comportamento e subjetividades por meio de sua onipresença. Dado que a rede
varejista Wal-Mart parte de vendedor de bens de consumo diário a agente de significados,
que imprime no slogan every day low price
72
a oportunidade dos consumidores em
experimentar o tamanho da força de sua marca.
72
Na tradução para o português: “preço baixo todos os dias”.
86
C
C
A
A
P
P
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L
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4
4
-
-
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B
B
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R
A
A
S
S
I
I
L
L
4.1
-
I
NTRODUÇÃO
As empresas do setor varejista de supermercado vêm despontando como grandes
válvulas de desenvolvimento do país. Estas apresentaram um crescimento real de 0,6%, com
participação de 5,3% do PIB nacional, em 2006. No Brasil, o número de estabelecimentos
cresceu quase 48,0% no período de 1998/2006, entre as 300 empresas do setor
supermercadista (ABRAS, 2007).
No entanto existe uma tendência de controle da categoria pelas 3 principais empresas
no Brasil (Grupo Pão de Açúcar, a rede varejista Wal-Mart e a companhia Carrefour) que
promovem um ambiente de concorrência violento e indébito. De modo a influenciar a decisão
de compra dos consumidores, os quais determinam sua preferência por fatores de localização,
preço, qualidade do produto e variedade da oferta, atendimento, conforto, serviços agregados,
condições de venda e prazo de pagamento.
Para isto as empresas investem massivamente na gestão eficaz dos aspectos
operacionais e mercadológicos para manterem ou aumentarem a sua participação favorável no
mercado do segmento supermercadista. Os consumidores brasileiros quase destituídos de
possibilidades de escolha, entre as grandes superfícies comerciais, movem-se por impulsos
habilmente manipulados pela força de mercado. A expansão destas empresas parte tanto do
plano macro quanto do micro a níveis inimagináveis que construindo parcerias estratégicas
atraem diariamente milhões de consumidores.
Neste sentido, a seguir tratar-se-á das estratégias que a rede varejista Wal-Mart e de
outras empresas impõem ao território para estreitar os laços com os consumidores e diminuir
os espaços das demais concorrentes. E versam por reproduzir a ordem estabelecida.
87
4.2
-
P
ERSPECTIVA HISTÓRICA DOS SUPERMERCADOS NO
B
RASIL
O desenvolvimento da atividade agro-exportadora cafeeira, no final do século XIX e
início do século XX, impulsionaram certos ramos industriais a se instalarem no Brasil. Este
nascente processo de industrialização visava, entre outros pontos, abastecer o mercado
consumidor brasileiro, decorrente da crescente urbanização da população e da consolidação
de uma classe burguesa. Entretanto as péssimas condições de infra-estrutura e o arcaico modo
de produção agropecuário foram entraves para o progresso do exercício de abastecimento
urbano. Este ainda dependente de produtos importados. Os problemas encontrados no
percurso da industrialização brasileira contribuíram por elevar o preço dos produtos que eram
comercializados por mascates
73
ou lojas gerais
74
.
Com as mudanças no processo de industrialização provocadas pela crise de 1929, o
crescimento do mercado interno e as transformações no meio urbano, despertaram profundas
transformações na economia brasileira. A exemplo, a indústria e os estabelecimentos
comerciais começaram a se modernizar e a buscar atender da melhor forma os consumidores.
Desse modo as alterações no cenário econômico brasileiro corroboraram para os
representantes de grandes grupos internacionais, que operavam no comércio mundial de
importação e exportação, como exemplo, o Mappin Stores e a Sears, chegassem ao Brasil.
Estes tinham por objetivo difundir o modo de vida americano, anunciado nas revistas, jornais
e filmes de época e oferecer novos produtos, o que possibilitou a incorporação de novos
hábitos de consumo.
No entanto, somente em meados da década de 50, é que o modelo americano difusor
de vendas de alimentos por varejo, os supermercados, aterrissavam no território brasileiro.
Esses empreendimentos apresentavam para a sociedade brasileira uma nova forma comercial,
a qual possuía 3 mil itens a serem comercializados e, ainda, no interior desses
estabelecimentos dividiam por seção e por grupo de produtos as áreas de venda. Desse modo,
nos primeiros anos, estes concorriam diretamente, em matéria de preços e custos, com as
redes de mercearias, de padarias e de lojas especializadas, dado que os preços baixos do
varejo tradicional eram resultado de sonegação fiscal (STILMANN, 1962; LEPSCH, 2001,
WILDER, 2003). De acordo com Simões (2006, p. 38):
73
Mercador ambulante ou vendedor que oferece mercadorias a domicílio
74
Estabelecimentos comerciais onde se encontravam uma imensa variedade de produtos, cujas vendas eram
efetuadas através de um balcão, sendo que os clientes não tinham acesso direto às mercadorias.
88
(...) o maior entrave para o desenvolvimento do setor foi o regime tributário,
representado, sobretudo, pelo Imposto sobre Vendas e Consignações (IVC).
As altas alíquotas deste imposto sobre a receita das vendas estimulavam a
sonegação, principalmente pelo varejo tradicional. Como a estrutura
administrativa dos supermercados era caracterizada pelas vendas registradas
mecanicamente, com o aparato das caixas registradoras, era mais difícil
praticar a sonegação, o que gerava perda de competitividade frente ao varejo
tradicional. Somente com a substituição deste imposto pelo ICM (sobre
Circulação de Mercadorias), em 1968, é que este problema foi solucionado.
As primeiras lojas eram direcionadas ao consumidor de classe média-alta. Esta classe
atribuía o luxo e o conforto das lojas como pontos que valorizavam a mercadoria. Os
supermercados vendiam estilos e propagavam conceitos burgueses. No entanto se limitava a
uma pequena parcela da sociedade. Desse modo, para atingir outros setores sociais, desde o
popular até a elite monetária, estes estabelecimentos enfrentaram as resistências ao consumo
por uma política de preços baixos e promoções, associado a um sortimento de produtos mais
diversificados. Essas estratégias, gradativamente, começaram a atrair o consumidor, o qual
aprendeu a conviver com: (i) uma diversidade de serviços e produtos; (ii) uma centralização
de opção de mercadorias e marcas; (iii) um aumento da área de estacionamento; (iv) a
instalação de controles de temperatura e som no interior dos estabelecimentos, além (v) do
desenvolvimento dos novos formatos de lojas. Para todos esses fatores os produtos oferecidos
agregaram valor e o consumidor acostumou a pagar por um aumento dos custos operacionais
em função da otimização do tempo de compra. (LEPSCH, 1996).
Ao superar parte das dificuldades apresentadas, o expressivo crescimento dos
supermercados como distribuidor de gêneros alimentícios, constatava uma importante
participação do setor na economia brasileira. No entanto, as pequenas e médias empresas
sofreram um aumento nos casos de falência. Assim, durante a década de 70 o escoamento dos
produtos representava 26%, nos anos 80 a participação do setor aumentou para 74% e nos
anos 90 para 85% (ROJO, 1998). O sucesso dos supermercados foi atribuído às
transformações: (i) no sistema de abastecimento; (ii) na indústria agro-alimentar; (iii) na
forma de embalagem; (iv) no uso dos meios de comunicação; (v) no uso de equipamentos
específicos.
No varejo brasileiro, alguns detalhes marcaram a renovação no setor supermercadista,
89
Quadro 4 - Características que marcaram a renovação no setor supermercadista
Décadas (Déc.) Apontamentos:
Déc. de 50 Sirva-se, a empresa pioneira em auto-serviço; e Peg-Pag, a primeira em operar em
grande escala; desenvolveram um mostruário de produtos para a sociedade da época,
além de novas técnicas de vendas; Inauguração das primeiras lojas; dificuldades de
implementação do modelo no Brasil;
Déc. de 60 Políticas voltadas ao combate da inflação, reestruturação do sistema financeiro e
correção dos preços públicos; mudanças no regime de governo brasileiro; reajustes
salariais e conseqüente concentração de renda no país;
Déc. de 70 Pão de Açúcar introduziu importantes inovações, como a rede de supermercado 24 horas,
além da inauguração de uma loja dentro do Shopping Center Iguatemi/SP; a rede Peg-
Pag apresenta ao público o conceito de hipermercado, seguido pelas demais; Moralização
fiscal; Programa de Modernização e Reorganização da Comercialização; ajuda
governamental, criação da linha de crédito voltada para os supermercados cedida pelo
BNDE; Novas comodidades oferecidas aos consumidores (variedade de produtos,
estacionamento, lanchonete, entre outros).
Déc. de 80 Carrefour apresenta uma nova forma de gestão empresarial, a comercialização de
produtos com marcas próprias; Recessão econômica, aquisição entre empresas;
Fiscalização do governo, lista com os menores preços oferecidos por mercado;
tabelamento e congelamento dos preços do produto da cesta básica; adoção do código de
barras; queda do poder aquisitivo do trabalhador.
Déc. de 90 O Pão de Açúcar apresenta: o supermercado educacional para crianças; o delivery pela
internet, e o SAC (Sistema de Atendimento ao Consumidor). Entradas de novas
empresas estrangeiras como a rede varejista norte-americana Wal-Mart, o grupo
português SONAE, a rede francesa Casino e a holandesa Royal Ahold; A participação
dos supermercados na venda de bens de consumo diário para a população chegava a 82,6
%;
Fonte: (STILMANN, 1962; ROJO, 1998; LEPSCH, 2001; WILDER, 2003; SIMÕES, 2006)
A partir da década de 90, com a estabilidade da economia brasileira e a abertura de
mercado de capitais provocaram mudanças na estrutura do segmento supermercadista. Esse
cenário político, social e econômico atraiu a vinda de companhias multinacionais para o
território, acirrando a competição pela quota de mercado (market share).
4.3
-
O
COMPORTAMENTO DO SETOR SUPERMERCADISTA NO
B
RASIL
Dentre os ramos de varejo, a categoria supermercadista ocupa posição de destaque na
economia brasileira. O faturamento do setor, em 2006, foi de, aproximadamente, R$ 75,0
bilhões, o que representou um aumento de 6,7%, em relação ao ano anterior. Entre 1995-
2006, as vendas totais cresceram aproximadamente 51%. Porém, este crescimento esteve mais
concentrado a partir de 2001 quando se verificou um aumento de 35% no faturamento bruto
75
.
75
Os dados da tabela não foram reajustados de acordo com a inflação podendo estes apresentar uma alteração
quando comparados com outros trabalhos. A inflação, para os economistas, é a queda do valor de mercado ou do
poder de compra do dinheiro. Isso é o equivalente ao aumento do nível geral de preços. Segundo o IBGE, o
índice de inflação durante o período do gráfco foram: entre 1990 a 1995 a média anual de 764%; entre 1995 a
90
Figura 6 - Faturamento do setor supermercadista no Brasil /
Fonte: ABRAS (2007)
Em 2006, as 300 maiores empresas, proprietárias de 4,8 mil lojas neste segmento,
faturaram aproximadamente R$ 73 bilhões, com área total de vendas de 6 milhões de metros
quadrados e empregaram 360.000 funcionários diretamente, sem contar os que estão
envolvidos indiretamente na cadeia produtiva (ABRAS, 2007). os vinte maiores
responderam por 79% do faturamento total; das 300 empresas, os três primeiros por 58% do
faturamento total. Particularmente o Wal-Mart, o segundo do setor no Brasil, mas o primeiro
no mundo, representa 18 % do faturamento total no mercado brasileiro.
2000 a média anual de 8,6%; em 2001 de 7,67%; em 2002 de 12,53%; em 2003 de 9,3%; em 2004 de 7,6%; em
2005 de 5,69%; e em 2006 de 4,5%.
91
Tabela 8 Participação percentual das empresas de supermercados brasileiros entre as 300 maiores
(1998 – 2006)
P
ARTICIPAÇÃO PERCENTUAL DAS
20
PRIMEIRAS NAS
300
MAIORES EMPRESAS DE SUPERMERCADOS
BRASILEIROS
(1998
2006)
Descriminação/ano 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Faturamento
67 76 78 78 77 78 79 79
Número de lojas
31 48 41 47 48 44 45 36
Área de Venda
60 68 71 73 74 73,5 75 75
Número de Checkouts
56 67 69 70 70 69 71 75
Funcionários
57 68 70 70 70 69 71 71
P
ARTICIPAÇÃO PERCENTUAL DAS
03
PRIMEIRAS NAS
300
MAIORES EMPRESAS DE SUPERMERCADOS
BRASILEIROS
(1998
2006)
Descriminação/ano 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Faturamento
39 47 47 48 47 52 59 58
Número de lojas
14 21 25 23 24 24 27 26
Área de Venda
32 40 45 43 45 49 59 58
Número de Checkouts
29 37 42 40 42 43 52 51
Funcionários
27 35 39 40 39 42 47 48
P
ARTICIPAÇÃO PERCENTUAL DO
W
AL
-M
ART ENTRE AS
300
MAIORES EMPRESAS DE SUPERMERCADOS
BRASILEIROS
(1998
2006)
Descriminação/ano 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Faturamento
2 2,4 3,12 3,26 3,33 9,5 17 18
Número de lojas
0,28 0,28 0,66 0,57 0,63 3,26 6,36 6,3
Área de Venda
2,3 2,26 3,69 3,66 4,29 10,4 20,3 21,1
Número de Checkouts
1,12 1,16 1,84 1,8 1,61 7,17 14,4 15
Funcionários
1,48 2,34 2,28 2,06 2,27 8,87 14,7 15,5
A participação das 20 maiores empresas supermercadista brasileiras nas 300 maiores,
em relação aos indicadores importantes, como: faturamento, mero de loja, área de venda,
número de checkouts e funcionários, nos últimos cinco anos, vêm acompanhando uma suave
tendência a manter uma presença relativa no market share, ou seja, apresenta uma
concorrência mais branda entre os supermercadistas sem muitas variações entre a
classificação das empresas, segundo a ABRAS (2007). Entretanto, ao acompanharmos o
comportamento das 3 maiores empresas do setor (Grupo Pão de Açúcar, Wal-Mart e
Carefour), em 2006, vale destacar que juntas obtiveram um aumento significativo de 24% no
faturamento bruto, entre os períodos de 2004-2006, passando de quase R$ 34,00 bilhões para
mais que R$42,00 bilhões. Isso mostra que o setor vem sofrendo uma concentração de
92
mercado por parte destas empresas. Os gráficos (2 e 3) ajudam a observar a reação do
segmento.
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Carrefour Com. Ind.
Ltda SP
CIA Brasileira de
Distribuição SP
CIA Zaffari Com e
Ind RS
G. Barbosa & CIA
Ltda SE
Wal-Mart Brasil SP
Gráfico 2 – Comportamento do faturamento das 5 principais empresas do setor supermercadista
0
100
200
300
400
500
600
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
Carrefour Com. Ind.
Ltda SP
CIA Brasileira de
Distribuição SP
CIA Zaffari Com e
Ind RS
G. Barbosa & CIA
Ltda SE
Wal-Mart Brasil SP
Gráfico 3 Evolução do número de lojas das 5 principais empresas em 2007
A alta penetração da rede varejista norte-americana Wal-Mart estabeleceu uma
política forte de concorrência e elevou a disputa entre as empresas líderes. Esta tensão
aumentou a participação do mercado entre as 3 maiores frente aos consumidores, as quais
redefiniram algumas estratégias para se manterem representativas. Dado que o resultado
objetivado pela concorrência e configurado no cenário brasileiro é a acumulação de capital
nas mãos de poucos e, por conseqüência, conduzir a um quadro de monopólio. Como diria
93
MARX (1975, p.158, [xxii]) “os únicos motivos que põem em movimento a economia
política são a avareza e a guerra entre os ávaros, a competição”.
Diante disso, a intensificação da disputa pelo cliente, exige das empresas estender os
seus tentáculos no solo fecundo do consumo, por meio de suas estratégias modulares de
intervenção, sedução e captura que, a um tempo direcionam e padronizam os interesses da
sociedade (DELEUZE, 1992). A interceptação desses consumidores parte de um controle,
cada vez menos visível e material e cada vez mais sutil e imaterial (FOUCAULT, 1996).
Estas estratégias operam a produção de subjetividades. Conforme Araújo (2007, p.5) “assim a
empresa busca construir uma correspondência entre os consumidores/trabalhadores e seu
mundo”.
Contudo as estratégias de produção de subjetividade desempenham um papel
importante no capitalismo contemporâneo.
4.4
A
S ESTRATÉGIAS EM SUPERMERCADOS
A partir da década de 80 visualiza-se um deslocamento no poder de barganha na
indústria para o varejo, principalmente no setor de alimentos, o qual tem como principal
representante os supermercados/hipermercados. Essas empresas de varejo, entre os finais de
século XX e início do século XXI, apresentaram uma revolução em métodos de gestão,
logística, propaganda e recursos humanos.
O impacto nesta área pode ser sentido, com: (i) o aumento da concorrência; (ii) a
abertura de mercados e a expansão das multinacionais; (iii) a revolução em métodos e
conceitos operacionais; (iv) as novas tecnologias;
(...) após recentes alterações no ambiente econômico, como a saturação dos
mercados de países desenvolvidos, como o acirramento da concorrência e a
queda nas margens, o varejo em geral e mais particularmente o segmento
supermercadista passaram a dar ênfase às estratégias em suas empresas.
(LEPESCH, 2001, p. 50)
A reestruturação destas empresas em busca de maiores níveis de qualidade e
produtividade fez jus à globalização dos mercados e ao surgimento de novas demandas nas
áreas de tecnologia e serviços, para fins de acentuar a acumulação capitalista. Portanto, ao
mesmo tempo em que, essas inovações auxiliaram o trabalho dos consumidores nas escolhas
das variedades, a partir de estratégias lançadas ao mercado, também, apresentaram pontos
94
importantes para minar a concorrência, desde a distribuição publicitária no interior do
estabelecimento até as transformações no espaço urbano. Para as empresas, esses métodos
facilitaram ao consumidor escolher seus próprios produtos. Porém essas estratégias objetivam
aproximar o consumidor da mercadoria.
A estratégia das empresas varejistas, para conquistar o “market share
76
” e apropinquar
o consumidor da fidelização, partiram da preservação de uma cultura ágil, eficiente, criativa e
dinâmica. As decisões estratégicas traçadas envolveram, em grande parte, as estruturas de
mercado e de competitividade em que o estabelecimento iria concorrer. Os principais pontos
de concorrência são os preços, crédito ao consumidor e a qualidade do serviço prestado, o que
reforça altos investimentos em expansão e fortalecimento da bandeira, além de uma busca
constante na eficiência do trabalho executado. No entanto, estas estratégias levam em
consideração: (i) o mercado-alvo do varejista ou o perfil socioeconômico do público, (ii) o
formato de loja ou o tamanho da superfície comercial; para assim definirem: o sortimento de
produtos, os fornecedores de determinada loja e dependendo do espaço físico disponível outro
tipo de serviços (chaveiro, cabeleireiro, lanchonetes, petshops, farmácias entre outros). De
modo que, a vantagem de formatos mais amplos, com sortimento de mercadorias
diversificadas e lojas menores especializados aumenta a probabilidade do consumidor
encontrar aquilo de que necessita e (iii) as parcerias entre fornecedores, atacadistas, varejistas
e distribuidores.
O gerenciamento destes pontos é definido como o processo de atração do consumidor
ao lugar da compra e está relacionado com a logística que o empreendimento apresenta para
obter vantagens comparativas sustentáveis, capaz de otimizar a operação total. A
implementação dessas estratégias é fundamental para edificar a “imagem” da loja frente ao
consumidor e, consequentemente, construir as territorialidades distintas. Para Cunha (2001,
p.4) “a empresa deve buscar uma imagem positiva junto a seu público, pois quanto mais
favorável for sua imagem para o cliente, maior a probabilidade do consumidor buscar
satisfazer suas necessidades”. Assim, os clientes que freqüentam estes estabelecimentos e,
consequentemente, compram as mercadorias estão à procura de satisfazer sensações
construídas pelo capital. Para isto a empresa lança um conjunto de conhecimentos e códigos
de inter-relações lingüísticas, estratégias macros e micros, ao universo subjetivo da sociedade
para ocupar o âmago dos vários construtos relacionados de atitudes que afetam e são afetados
pela imagem.
76
Quota de mercado
95
A finalidade das estratégias é estabelecer quais serão os caminhos, os percursos, os
pontos que deverão ser seguidos para serem alcançados os objetivos, as metas e os desafios
estabelecidos. Em uma economia capitalista, o conceito de estratégia está relacionado à
ligação da empresa aos recursos disponíveis para maximização, eficiência e otimização dos
lucros, além de definir o desempenho da empresa frente aos potenciais concorrentes. Esta
ferramenta contribui para especular os erros e os acertos que tal empresa acompanha na
tentativa de conquistar setores de mercado. Apesar deste mecanismo valorizar o sucesso do
empreendimento, as decisões podem acabar determinando o fracasso do mesmo. Por isso, as
estratégias são pensadas para serem uma opção viável à rentabilidade da companhia.
No entanto, as estratégias na visão dos economistas podem ser definidas como: “(...)
determinação das metas e dos objetivos básicos de uma empresa (...)” (Chandler, A., 1962, p.
13); “(...) padrão de objetivos, propósitos ou metas e as principais políticas e planos para
alcançar essas metas (...) (Andrews, K., 1971, p. 28); “(...) modo pelo qual a empresa procura
distinguir-se de maneira positiva da concorrência, usando seus pontos fortes para atender
melhor às necessidades dos clientes (Ohmae, 1985, p. 42);”... forma que a empresa possa lidar
com o ambiente mutante e exercer influência sobre ele (...)” (Itami, H., 1987, p.23);
Estas, também, podem ser combinadas de forma a mover as empresas pelo território e
construírem suas territorialidades. Neste trabalho, as estratégias são definidas quanto aos
mecanismos que as empresas formulam para alcançar um melhor posicionamento frente à
concorrência e aos consumidores e imprimir sua marca nas pessoas que freqüentam o
estabelecimento. Assim, para nosso estudo, as estratégias podem ser classificadas
77
, quanto à
amplitude, em macroestratégias ou microestratégias, que conceituamos e dividimos da
seguinte forma:
(a) macroestratégia: corresponde à ação que a empresa toma perante o espaço
geográfico, tendo em vista os movimentos ou a série de movimentos específicos lançados a
conquista do território e ao fortalecimento do estabelecimento como uma centralidade.
(b) microestratégias: corresponde à forma de atuação operacional, de cunho
institucional, voltada para a produção de subjetividade, que visa à subsunção do cliente frente
as técnicas utilizadas para criar o mundo de consumo e aproximá-lo de uma passageira
77
Assim, as estratégias apresentadas, no contexto geral da dissertação, foram discutidas a partir dos seguintes
veículos de comunicação: Revista SuperHiper, publicada pela Associação Brasileira de Supermercados; Revista
SuperVarejo, publicada pela Associação Paulista de Supermercados; Revista Supermercado Moderno, publicada
pelo Grupo Lund, além das notícias publicadas pelo Jornais Gazeta Mercantil e Valor Econômico, todas
anualizadas e incorporadas ao texto do trabalho, entre os periodos de Janeiro de 1995 a Janeiro de 2005. O foco
das matérias selecionadas, para o nosso trabalho, estavam ligadas a qualquer notícia que evedenciava a
companhia Wal-Mart Stores.
96
fidelização. O interior destes estabelecimentos proporciona uma outra dimensão para o
consumidor, o qual perde as noções de tempo, temperatura, desconforto e orientação.
4.4.1 - MACROESTRATÉGIA
As macroestratégia: correspondem à ação que a empresa toma perante o espaço
geográfico, tendo em vista os movimentos ou a série de movimentos específicos lançados a
conquista do território e ao fortalecimento do estabelecimento como uma centralidade.
(i) Localização: Este ponto é extremamente importante para pensar o processo de
consolidação da competitividade da empresa. Envolve decisões arriscadas, primeiro pelo alto
capital disponibilizado para a aquisição e/ou reforma e/ou construção do novo
estabelecimento; segundo, por se tratar de um custo que não pode ser facilmente alterado;
terceiro, refere-se à importância que este atributo exerce na soma dos fatores decisivos que o
consumidor adota para adquirir os produtos. Acrescenta-se ainda os acordos tácitos, políticos
e fiscais, a construção de facilitadores urbanos, que conjuntamente, irão contribuir para
viabilizar o acesso à mercadoria e a acumulação de capital. Além destas facilidades à também,
sobre a escolha da localização: a vizinhança, o tráfego de pedestre, de transportes alternativos
e o estacionamento. Algumas empresas adotam estratégias de localização em conjunto com
Shoppings ou Ilhas Comerciais a fim de fortalecer as centralidades e oferecerem um número
maior de serviços. O processo ideal de escolha do local para a reprodução do capital tem por
base áreas de grande potencial de consumo. Os hipermercados procuram se instalar em
grandes avenidas que ligam bairros de grande densidade demográfica e alto poder de compra.
A rede varejista Wal-Mart, na cidade de São Paulo, localizou-se em ruas ou avenidas de
grande tráfego de automóveis e pedestres e áreas com alta densidade de: empresários,
dirigentes do setor público e privado, profissionais liberais (salvo exceção para as lojas
espacializadas, no mapa, acompanhadas pelos meros 9 e 1 com presença de trabalhadores
com ocupação de auxiliares, técnicos do setor de serviços ou operários da indústria moderna)
78
.
78
Estas informações a respeito da população ocupada fazem parte da investigação desenvolvida no Observatório
das Metrópoles, grupo de pesquisa cordenado pelo Professor Dr. Luiz César de Queiroz Ribeiro, financiado pelo
CNPq, Programa Institutos do Milênio, cujo núcleo São Paulo, conta com a participação dos pesquisadores do
NEPUR - Núcleo de Estudos de Pesquisas Urbanas da PUC/SP e do LABPLAN - Laboratório de Planejamento
do Departamento de História e Estética do Projeto, da FAU/USP. Dentre os pesquisadores daquele Núcleo
destaca-se a Professora Pesquisadora Lucia M. M. Bógus, à qual devemos a disponibilização de um material
continente dessas informações. (BOGUS, 2007)
97
Mapa 2 – Localização das lojas Wal-Mart na cidade de São Paulo
98
(ii) Concentração de Mercado: este fator está diretamente ligado ao aumento de
número de lojas das redes na cidade. Fator que possibilita o estabelecimento de expandir sua
área de influência e manter vigente a competitividade da companhia. Porém, a concentração
de mercado não quer dizer um faturamento proporcional ao número de lojas. Este está para
o consumidor como um atributo estrangulador, ou seja, quanto mais bandeiras da rede forem
visíveis para a sociedade maior a possibilidade de um indivíduo efetuar uma compra no local.
Além disso, o grande varejista, nos contratos diretamente com os fornecedores, consegue
preços mais vantajosos por quantidades vultosas que adquire. Essa estratégia valida um sinal
de intenções que as empresas possuem para monopolizar o território. No Brasil, as três
principais bandeiras no segmento supermercadista tendem a ter uma participação consistente
nas grandes capitais brasileiras. Em 2006, as principais grandes superfícies comerciais
representavam em algumas capitais do seguinte modo:
Quadro 5 – Concentração das principais empresas do setor supermercadista em
algumas capitais
Bandeiras/Capitais Belo Horizonte Curitiba Rio de Janeiro São Paulo
Wal-Mart Brasil --- 27 4 10
Carrefour 24 1 24 54
CIA Brasileira ... 2 6 106 69
Outros 358 339 342 317
Total
384 373 476 450
Fonte: ABRAS (2007)
(iii) Fusão / Aquisição: em busca de maior participação em diversas regiões as
principais empresas executaram um processo de fusões e aquisições ao longo dos anos. Essas
redes visaram um melhor posicionamento no mercado. A princípio o projeto não era tão
ambicioso, o processo de compra se limitava a redes com dificuldades de operações ou que
estavam se desfazendo de ativos (como, por exemplo, a venda da rede Paes Mendonça, em
1999, para o grupo Pão de Açúcar, o qual assumiu as dívidas trabalhistas e fiscais do grupo)
ou a compra de pequenas redes com o objetivo de penetrar em mercados pouco consolidados,
onde essas pequenas empresas detinham importantes participações (como, por exemplo, as
aquisições realizadas pelo grupo Carrefour, em 1999, que no mesmo ano adquiriu as redes
Planaltão (DF), Mineirão (MG) e Rainha, Dallas, Continental e Roncetti (RJ), com o objetivo
de ocupar uma melhor posição no setor e ao mesmo tempo melhorar a presença nos
respectivos Estados). No entanto, a rede varejista Wal-Mart, em 2004, após dez anos de
99
tentativas frustrantes para conseguir fortalecer a sua marca no setor, o grupo norte-americano
adquiriu a bandeira Bompreço, líder na região Nordeste e, em 2005, comprou a rede Sonae,
líder na região Sul. Com isso, a empresa inaugura uma estratégia de obter bandeiras já
consolidadas e representativas no cenário nacional, em vez de adquirir pequenas empresas ou
empresas em concordata. Desse modo obrigaram um reajuste estratégico do setor. Contudo,
pela primeira vez, o Grupo Pão de Açúcar e o Carrefour tiveram um terceiro competidor em
altura, com mais de 10% no mercado (FACHINI, 2005) (Tabela, 7) Essa prática, em 2005,
permitiu que as três primeiras maiores empresas de supermercado brasileiro tivessem quase
60% da participação percentual das 300 maiores empresas.
Quadro 6 – Processo de fusão.aquisição (1998-2006)
Ano Fusão / Aquisição
1998
Carrefour: adquire a rede Eldorado e a divisão de supermercados das Lojas Americanas
CIA Brasileira de Distribuição: passar a ser o representante das redes Barateiro, Ipical,
Mambo, Freeway
Casas Sendas: compra duas lojas da rede supermercado Parlé
Sonae: adquire a Companhia Real de Distribuição, a rede Cândia e Demeterco
1999
Carrefour: compra as bandeiras Planaltão, Mineirão, Roncetti, Dallas, Continental, Rainha
e Hiper Manaus
CIA Brasileira de Distribuição: adquire as redes Peralta, Mappin Lojas de Depto, Mogiano,
Guassu e Pães Mendonça
Sonae: passa a controlar as bandeiras nacional, coletão, muffatão e econômico
BomPreço: adquire os supermercados Petipreço e Palmares
Casas Sendas: compra a bandeira Três Poderes
Jeronimo Martins: fica sócio do grupo Sto Antônio
G.Barbosa: compra o supermercado C. Andrade
2000
2001
Carrefour: compra os supermercados Roncelli São Mateus e o São José do Rio Preto Mix
CIA Brasileira de Distribuição: compra a rede ABC Supermercados
COOP Cooperativa de Consumo: adquire o supermercado Ita Serv Tatuí
2002
CIA Brasileira de Distribuição: passa a controlar o grupo Jeronimo Martins
Casas Sendas: compra tres lojas da rede Roncetti
BomPreço: adquire a rede de Supermercado Lusitana
2003
Não ocorreu nenhuma aquisição entre as principais empresas
2004
Wal-Mart: compra a rede BomPreço
2005
Wal-Mart: adquire a rede Sonae que controla as bandeiras Big, Candia, Nacional e
Mercadorama.
2006
Não ocorreu nenhuma aquisição entre as principais empresas
(iv) Formatos de Lojas: A diversidade de formatos de lojas está associada à
disponibilidade de tempo de compra do consumidor e do seu perfil socioeconômico. A grande
diversidade de formatos é característica do setor varejista. Esta pode ser monoformato ou se
apresentar, como no segmento supermercadista com múltiplos formatos. Para Lepsch (2001,
p.66), “(...) a grande diversidade de formatos é característica do setor varejista. A empresa
varejista pode ser uma empresa monoformato ou se apresentar com ltiplos formatos
100
buscando ampliar seus segmentos-alvo.” A rede varejista americana associa os formatos de
lojas com o perfil do cliente.
(iv) Centros de Distribuição e Abastecimento: O uso de novas tecnologias, como
Web
79
, e-commerce
80
, ECR
81
, supply chain
82
, as quais substancialmente mudaram as formas
de fazer negócio e fizeram parte das condições vitais para permanecer no mercado,
contribuíram para manter a competitividade da empresa e sustentar a acumulação de capital.
Essas questões permitiram melhorias no desempenho da cadeia de distribuição e
abastecimento das mercadorias, dado que as empresas acompanham, diariamente, a
performance de vendas das lojas, de modo a planejar, desde as rotas de entrega dos
suprimentos, para melhor operacionalizar os custos da frota de transporte, até controlar o
estoque de cada estabelecimento. Para a rede varejista norte-americana Wal-Mart, nos EUA,
esses centros são fatores importantes para o desenvolvimento da empresa e sua localização
deve atingir o máximo de lojas, sem que interfira na relação consumidor/mercadoria
83
.
(v) os fornecedores: com a mudança na estrutura física de poder do setor de
abastecimento urbano, os supermercados implementaram novos procedimentos de parceria
com a indústria de bens de consumo. Estes exigiram pontualidade na entrega, prazos no
pagamento, estoques de mercadoria de pronta entrega, equipes para oferecer produtos novos e
arrumá-los no interior dos estabelecimentos, e modernização na unidade de produção. O
grupo varejista americano Wal-Mart priorizou as pequenas empresas. Para isso estas passaram
por um rigoroso processo de seleção. Além de estar quitados com a Receita Federal e ter
estabilidade financeira, os novos colaboradores tiveram que estar abertos para inspeção dos
técnicos e consultores eleitos pelo grupo, seguir padrão de produção e terem a infra-estrutura
para aumentá-la conforme a demanda. Ademais participar do desenvolvimento do design do
produto imposto pela rede, e manter a qualidade. De modo que, a reestruturação dessas
pequenas empresas apresentasse parâmetros de mercado estabelecidos pela rede Wal-Mart.
Assim, o grupo varejista instala, entre esse setor, dispositivos de qualidade considerados
79
World Wide Web, cuja tradução para o portugues significa "rede de alcance mundial", sendo um sistema de
documentos interligados que é executado na internet.
80
E-commerce é uma plataforma de comércio eletrônico integrada à internet.
81
A ECR (efficient consumer response - resposta eficiente ao consumidor) tem como objetivo organizar as
trocas de informações entre industria e varejo, agilizando o fluxo de produtos e estoques nas vendas dos
estabelecimentos comerciais.
82
Sistema de gestão empresarial
83
Não foi possível obter as informações da localização dos Centros de Distribuição e Abastecimento da rede
varejista Wal-Mart para fins de consideração no trabalho.
101
importantes por seus executivos. Com isso, a empresa impõe uma lógica e uma cultura Wal-
Mart para os fornecedores e esses passam a integrar a rede de comércio da companhia. E os
fornecedores garantem a presença das mercadorias nos locais de venda.
(vi) Serviços agregados: Esta estratégia visa otimizar o tempo do cliente na realização
de outros serviços. Além de permitir que o consumidor no mesmo espaço físico encontre de
tudo em um mesmo local. A rede varejista Wal-Mart trabalha o conceito de “one stop shop
84
”.
Desse modo, todas as lojas possuem uma mini-galeria de serviços de conveniência, onde o
cliente encontra: lanchonetes, café, restaurantes, lavanderia, salão de beleza, ótica, banca de
jornal e revistas, entre outros exemplos de serviços oferecidos ao consumidor (WAL-
MART..., 2007). A companhia, nos EUA, implementou um programa de atendimento médico
por meio de clínicas abertas no interior das lojas. As RediClinic tem como objetivo oferecer
serviços básicos e preventivos de saúde incluindo diagnósticos de emergências (400Health ....,
2007).
4.4.2 MICROESTRATÉGIA
As microestratégias correspondem à forma de atuação operacional, de cunho
institucional, voltada para a produção de subjetividade, que visa à subsunção do cliente frente
as técnicas utilizadas para criar o mundo de consumo e aproximá-lo de uma passageira
fidelização.
(i) Preço: O preço é como uma ancora para o estabelecimento, tem como objetivo
ampliar o acesso a certas mercadorias e aumentar a rotatividade e a circulação de certos
produtos para a acumulação de capital. Esta estratégia envolve uma política combinada com o
fornecedor. O monitoramento da concorrência é um instrumento mercadológico e ajuda a
definir o valor do produto. Segundo Lepsch (1996, p. 58) no Brasil, várias pesquisas
mostram que, independentemente da classe social, o preço ainda é o principal atributo”. Desse
modo, o grupo varejista Wal-Mart usa do slogan Every day low price(preços baixos todos
os dias) para garantir a clientela no setor. Para isso cruzam dois grandes fatores: o imenso
poder de negociação com os fornecedores e o baixo custo operacional. No entanto, para
garantir o preço baixo, a rede varejista faz uso de práticas administrativas abusivas, como: (a)
84
Lugar onde o cliente encontre de tudo em um mesmo local
102
combate contra sindicatos; (b) utilização da mão-de-obra superexplorada; (c) rebaixamento de
salários; (d) pressão aos fornecedores, todas as iniciativas visam diminuir os custos ao cliente.
(ii) Atendimento Personalizado: A qualidade da recepção dos funcionários das lojas é
um atributo significativo na formação da imagem e na escolha da empresa. Contudo, o
atendimento atencioso, as boas maneiras e a boa aparência dos empregados constituem um
serviço diferenciado. Para que isso ocorra de forma cortês, algumas empresas escalam
representantes para abordarem o cliente, com saudações calorosas e orienta-los sobre a
disposição dos produtos no estabelecimento. Desse modo, a empresa ativa o campo do
sensível do consumidor produzindo subjetividades que denunciam a preocupação com o
cliente. Este por sua vez se sente mais seguro ao entrar no estabelecimento e iniciar as
compras. O atendimento personalizado, também, pode ser uma estratégia externa ao
estabelecimento. A rede varejista Wal-Mart encaminha, diariamente, promotores de venda os
quais cadastram potenciais sócios para o Sam’s Club. Os bares, as padarias, os restaurantes e
os pequenos estabelecimentos recebem a visita de funcionários da empresa. A política visa
estabelecer um canal de comercialização de produtos próprios estreitando a relação com os
pequenos empresários, ampliando a rede de dominação territorial e acirrando a
competitividade.
(iii) Cartão Pessoal: Por meio desta estratégia, os supermercados ampliaram a
possibilidade de consumo à mercadoria desejada. Indiretamente, também, induziram o
consumidor a gastar mais do que seu planejamento. Como benefício aos consumidores, a rede
Wal-Mart dispõe de um cartão de crédito, administrado pelo UNIBANCO, uma parceria que
começou em 2005, e que possibilita pagar a compra em até 45 dias sem juros ou em até 24
vezes com juros mensais de 4,8%. Em datas comemorativas os prazos podem chegar a 70 dias
(FACCHINI, 2005). Esta é uma ferramenta de crédito concebida para prover maiores prazos
de pagamento e maior acesso a formas de pagamento com menor custo (BUENO, S.;
FACCHINI, C. 2005). Os bancos passaram a ver as lojas como um eficaz canal de
distribuição de produtos e serviços financeiros. Esta estratégia permitiu que o HiperCard,
cartão da bandeira Wal-Mart, em 2005, conseguisse desbancar, no Nordeste, as líderes do
setor como a Visa e a MasterCard. Dado que este pode efetuar compras em outros
estabelecimentos comerciais.
103
(v) Marcas Próprias: Esta estratégia é apresentada ao consumidor como marcas de
produtos desenvolvidos e vendidos com exclusividade por uma determinada organização
varejista. A expansão deste investimento partiu da necessidade do setor supermercadista criar
instrumentos para se diferenciarem em um mercado cada vez mais competitivo. A tendência
está sendo aplicar na elaboração dos próprios produtos conceitos próximos utilizado pelas
marcas deres de mercado. De modo a protagonizar uma concorrência direta com as grandes
empresas especializadas, as quais possuem embalagens peculiares e colocação segura no
mercado. Segundo pesquisa feita pela ACNielsen em parceria com a Associação Brasileira de
Supermercados (Abras), metade dos 300 supermercadistas ouvidos indicou a fidelidade dos
clientes como o principal benefício do lançamento de marcas próprias. (LEPSCH, 1996) Com
isso, as grandes superfícies comerciais adotam uma política de rápida disseminação e
inovação, com produtos de qualidade, da melhoria da imagem da loja aos consumidores. Este
artifício executa o papel de fidelização duplamente. Primeiro, ao apresentar uma mercadoria
nova ou concorrente, com a marca do estabelecimento. Segundo, por atuar no campo da
certeza do consumidor que este produto não ira faltar nas gôndolas do estabelecimento. Além
de aumentar o poder de barganha do supermercadista ao fornecedor na redução dos preços, e
explorar as indústrias de médio e pequeno porte. Assim, esse setor, em busca de posição
vantajosa perante a concorrência, tem explorado as bases da cadeia distributiva para
reproduzir as lógicas capitalistas ao consumo. O número de itens com marcas próprias cresceu
103%, em 1999, no total de 5,7 mil itens. O Carrefour é o maior exemplo desse 'boom': o
número de produtos com o carimbo da rede passou de 150 para 600, em 2000. No Reino
Unido, que é o campeão de venda de marcas próprias, as vendas representam 39% do total do
varejo; na Alemanha, 24%; na França, 21%; e nos Estados Unidos, 15%.
(iv) Sortimento: O número de itens diferentes em uma categoria de supermercados ou
o MIX do estabelecimento influência no movimento e no desempenho da loja. Esta estratégia
permite ao consumidor associar eficiência e qualidade de produtos a imagem da rede. Desse
modo o sortimento adequado representa a realização das vontades do indivíduo em consumir
as mercadorias e faz com que este sempre volte ao lugar de onde satisfez seus anseios.
(iv) Embalagens: As embalagens tornaram-se objeto imprescindível na
comercialização. Assim, grandes empresas aplicam grandes valores na criação e modificação
deste produto. O objetivo central é despertar a atenção dos consumidores para a efetivação da
compra. As embalagens influenciam diretamente no comportamento do consumidor frente à
104
forma de consumo. O setor supermercadista é o grande mostruário deste produto, e por onde
é escoada a maior parte da produção. São nos supermercados/hipermercados que esses
produtos são colocados em prova, e onde se verifica a eficiência e a aceitação de mercado. As
informações contidas nas embalagens são: as instruções de uso, a marca do produto, a
informação nutricional, o telefone do Serviço de Atendimento ao Consumidor, dados sobre o
fabricante, as datas de validade e fabricação, entre outros pontos. O conjunto destes fatores,
somados ainda à segurança e praticidade, ajudam a construir e fortalecer a marca do produto,
além de universalizar o desejo de consumir e sentir a mercadoria promovida pela embalagem.
Universalizar, no sentido de envolver e homogeneizar as vontades do consumidor, uma vez
que, o rosto deste produto (a embalagem propriamente dita) não modifica frente àquele que
está consumindo, apesar deste ser um indivíduo singular e ter sensações diferentes. Porém o
universo subjetivo do indivíduo contemporâneo é tocado por essas micro-estratégias que
oferece a impulsividade de consumo, a partir do externo e não da matéria interna vendida. As
evoluções nas embalagens promovem impactos no momento que são difundidas, pois logo
elas se incorporam ao cotidiano do consumidor. Sobre esta argumentação é que novos
produtos são lançados continuamente ao mercado. E por onde grandes cifras de capitais são
geradas para as grandes empresas. Hoje a empresa não possui mais um produto, linha de
frente, eles variam em relação ao preço, ao uso, ao estilo, ao conceito, buscam cada detalhe
para um perfil de consumidor. Porem estes circuitos também são renovados a partir de uma
nova tecnologia apresentada, e forçam a padronização dos gostos, a partir da diversidade da
produção e da overdose de marcas nas gôndolas.
Portanto, o conjunto destas estratégias visa a reprodução do capital. De maneira que
esse dispositivo contribui para que o consumidor continue imerso em suas emoções enquanto
estiver efetivando a compra, fazendo com que a escolha seja uma relação artificial. Além de
despertar no indivíduo o interesse de ocupar o tempo do ócio com tempo da compra e
estimular uma vida feitichizada voltada ao consumo. Portanto o resultado do fluxo subjetivo
destas estratégias são a rentabilidade e o lucro, a partir de um giro maior de mercadorias e
indivíduos dentro dos estabelecimentos. Para os consumidores estas políticas contribuem para
o fortalecimento do nome da empresa.
105
Considerações Finais
Inicialmente, vale retomar que a intenção central deste trabalho foi examinar as
metamorfoses que marcaram o capitalismo contemporâneo. Para isso foi necessário um
diagnóstico histórico do capitalismo com o propósito de compreender a complexidade do
modo de produção vigente no mundo. Nesse sentido a periodização proposta fez por atinar
que a sequência evolutiva das fases (Fig.1) contribuiu para a efetivação da configuração do
capitalismo contemporâneo.
Em relação ao primeiro capítulo, o objetivo foi mostrar que o capitalismo ao longo de
seu transcurso histórico cria e recria formas de organização do trabalho e de acumulação sem
necessariamente, alterar a sua estrutura produtiva. Além disso, o resgate da trajetória do
sistema capitalista permitiu-nos também a compreensão histórica e dialética do objeto de
estudo. Isto é a visibilidade sobre os processos geradores de distintas economias políticas das
quais derivaram as condições para o surgimento de empreendimentos de natureza comercial
como Wal-Mart.
Percebe-se que ao investigar as transformações sócio-espaciais pode-se construir uma
leitura diferenciada do processo de expansão do sistema capitalista bem como compreender os
mecanismos que engendram os procedimentos de realização de novas configurações
territoriais as quais revelam a racionalidade na qual a base do sistema vigente se assenta. Com
efeito, o capitalismo contemporâneo está diretamente relacionado, não só, com os
movimentos do capital financeiro, da circulação de bens e serviços, da informação, da
satisfação e da eficiência, mas também com a produção de subjetividade. Esta, como se viu, é
essencialmente fabricada e modelada no campo social e tem a função de definir o
comportamento do indivíduo e seu processo de existência particular e outras facetas afetivas,
perceptivas e volitivas, frente à captura das máquinas capitalistas. De modo que, toda a ação
realizada por meio dos propósitos do capital visam a aceleração do consumo e a acumulação
capitalista.
Neste novo cenário econômico refletiu-se que a rede varejista norte-americana Wal-
Mart pode ser considerada um modelo de empresa capitalista do século XXI, por fazer uso,
como se viu, dos mecanismos de controle e de produção de subjetividades, seguidos por
novas tecnologias da informação e comunicação. Além de, nos EUA, determinar o valor da
mercadoria na região instalada; obrigar a concorrente a baixar o preço do produto em até,
aproximadamente, 10%; não oferecer encargos sociais aos funcionários; remunerar
106
pessimamente o salário; empregar mão de obra desqualificada, imigrante ou de aposentados,
entre outras manobras.
A companhia afeta seus consumidores por meio de suas lógicas e linguagens. Deve-se
considerar que o espaço interno e externo não se restringe à porção ocupada no território, mas
engloba uma rede de fluxos visíveis (mercadorias) e invisíveis (capital e informação) centrada
na construção de territorialidades. A rede Wal-Mart utiliza do seu governo a tentativa de
regular como um todo a vida social de seus clientes e funcionários.. Desse modo, a companhia
partiu de vendedor de bens de consumo diários a agente de significados, ou seja, o objeto do
seu poder é a vida social.
Evidencia-se, neste trabalho, que no território brasileiro, a rede varejista norte-
americana Wal-Mart vem se destacando no setor supermercadista. Esta se encarregou de
modernizar todos os setores, conforme observado nas páginas anteriores, para manter ou
aumentar a sua participação favorável no mercado do segmento supermercadista.
Observou-se que a expansão da empresa principiá tanto do plano macroestratégico
quanto do microestratégicos que engloba níveis inimagináveis. Desta maneira a empresa
arquitetou parcerias e lançou importantes campanhas no território brasileiro para atrair e
estreitar a relação que a rede constrói diariamente com milhões de consumidores. Além de
diminuir os espaços das demais concorrentes. Apesar da rede não se apresentar em primeiro
lugar de vendas do segmento, no Brasil, esta possui uma clara possibilidade de reproduzir a
ordem estabelecida para fins de se equiparar a sua situação nos EUA. Dado que prescrevem
lógicas correspodentes às principais concorrentes, no país, para a acumulação de capitais.
Estas que contribuem para que o consumidor continue imerso em suas emoções enquanto
estiver efetivando as compra e que a escolha da mercadoria seja uma relação artificial. Assim,
o simples gesto de optar pelo o produto elegido, perpassa o campo da necessidade objetiva, ou
seja, visa o indivíduo adquirir mais que produtos básicos da sua alimentação.
Notou-se, também, que os consumidores brasileiros estão quase destituídos de
possibilidades de escolher, entre as grandes superfícies comerciais, o local de realização de
suas compras.
Por fim, longe de esgotar o assunto, o que se deduz, e que é inerente ao capitalismo a
necessidade de acumulação, a precarização do trabalho do proletariado, a expansão de seu
domínio e que cada vez mais, seus representantes, acirram a concorrência e atuam em outros
setores para alcançar o controle sob uma escala maior. Assim o capital elimina a possibilidade
de destruição da produção da própria existência individual e afirma apenas as formas
homogêneas de vida.
107
Porém, os que se opõem às lógicas capitalistas e se juntam a movimentos que
reivindicam o livre trânsito de capitais. Esses protaganizam, no cenário mundial, campanhas
na tentativa de diminuir a frequência de consumo de mercadorias de certas corporações. A
rede varejista norte-americana Wal-Mart tem sido alvo destes ativistas que forçam a empresa
a rever suas políticas de contratação de trabalhadores e de fornecedores.
Em suma: as frentes de pesquisa, as contribuições para a Geografia traduzem-se
mediante novas temáticas de estudo e emergem necessidades de reavaliação teórica e
conceitual. Neste sentido, sem a pretensão de esgotamento do assunto aqui proposto,
procurou-se avançar na compreensão das novas territorialidades produzidas dialeticamente
nas relações entre as distintas escalas de atuação do capital global.
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