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CONSELHO POPULAR DE VITÓRIA – FORMAÇÃO E
TRAJETÓRIA DE UM MOVIMENTO – 1986-2004
ROSELAINE CARLOS PINTO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM POLÍTICA SOCIAL
MESTRADO EM POLÍTICA SOCIAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
VITÓRIA, Abril de 2007
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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
Pinto, Roselaine Carlos, 1977-
P659c Conselho Popular de Vitória : formação e trajetória de um movimento,
1986-2004 / Roselaine Carlos Pinto. – 2007.
116 f. : il.
Orientadora: Ana Targina Rodrigues Ferraz.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas.
1. Conselho Popular de Vitória (ES) - História. 2. Movimentos sociais
urbanos. 3. Movimentos sociais - Relações com o governo. I. Ferraz, Ana
Targina Rodrigues. II. Universidade Federal do Espírito Santo. Centro de
Ciências Jurídicas e Econômicas. III. Título.
CDU: 32
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ROSELAINE CARLOS PINTO
CONSELHO POPULAR DE VITÓRIA – Formação e Trajetória
de um Movimento – 1986-2004
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Política Social do Centro
de Ciências Jurídicas e Econômicas da Universidade Federal do Espírito Santo, como
requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Política Social, na área de
concentração Movimentos Sociais.
Orientadora: Profª Drª Ana Targina Rodrigues Ferraz.
Aprovada em 27 de abril de 2007.
COMISSÃO EXAMINADORA
-------------------------------------------------------------------------------
Profª. Drª Ana Targina Rodrigues Ferraz
Universidade Federal do Espírito Santo
Orientadora
------------------------------------------------------------------------------
Profª. Drª Maria Beatriz Lima Herkenhoff
Universidade Federal do Espírito Santo
------------------------------------------------------------------------------
Profª. Drª Beatriz Stella Krohling
Faculdade de Vila Velha – UNIVILA
A Marcelo, meu amor, fonte constante de estímulo e apoio.
RESUMO
O trabalho é um estudo de caso sobre o Conselho Popular de Vitória (CPV) –
organização representativa das associações de moradores do município de Vitória – de
sua fundação, em 1986, até 2004. Ancorado em autores que estudaram a participação
política da sociedade civil nas décadas de 80 e 90 o objetivo é empreender uma análise
que especifique o perfil de atuação deste movimento em termos de interesses e
demandas, do seu papel junto aos movimentos de bairro que representa e da sua
relação com o poder municipal. A estratégia de apreensão do objeto de estudo deu-se
pela metodologia qualitativa que possibilita a compreensão de fenômenos, fatos e
procedimentos particulares de pequenos grupos. O resultado da pesquisa revelou que o
CPV, ao longo da sua trajetória, sofreu modificações no seu perfil de atuação. Se nos
anos 80 apresentou uma postura mais independente na relação com o poder público,
nos anos 90 assume uma posição mais próxima ao governo, fortalecida pelo processo
de abertura e institucionalização dos canais de participação. Contudo, essa postura
levaria ao longo dos anos a um padrão de relação extremamente frágil com o poder
público e entidades dos movimentos de bairro, visto que, assumindo uma postura de
parceiro e legitimador das ações do poder público, tem deixado de ser um operador das
demandas da sociedade civil e se transformado em agente cooperador do poder
público.
Palavras Chave: Movimentos populares urbanos – Conselho Popular de Vitória – ES.
Trajetória de atuação - relação poder público e movimentos de bairro.
ABSTRACT
This paper is a case study about the CPV (Vitória Popular Council) – organization that
represents the resident associations in the city of Vitória – from its foundation and in
1986 to 2004. Based on authors who studied the political participation of civil societies in
the 1980s and 90s, the aim is to perform an analysis to specify the acting profile of this
movement in terms of interest and demand; its role in the movements of the
neighborhoods it represents and its relation with the city government. The study strategy
adopted qualitative methodology, which allows understanding particular phenomena,
facts and procedures of small groups. Results showed that CPV, throughout its history,
has changed its acting focus. If in the 80s the movement had a more independent
position towards the city government, in the 90s it took a position closer to the
government, strengthened by the opening process and institutionalization of channels of
participation. Nevertheless, this posture would lead to an extremely fragile relation with
the government and neighborhood entities, throughout the years. Since the CPV has
had a position of government’s partner and legitimator of actions, it has quit being an
operator of the civil society’s demands and become a government collaborator.
Key-words: Urban popular movements; Popular Council of Vitória - ES; Acting History;
Relation between Government and neighborhood movement
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO…………………………………………………………………………………8
2 MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL………………………………..…………………. 17
2.1 O CENÁRIO POLÍTICO, ECONÔMICO E SOCIAL BRASILEIRO A PARTIR DA
DÉCADA DE 70………………………..............................................................................17
2.2 PERFIL ASSOCIATIVO NO BRASIL DOS ANOS 80………………………………….19
2.3 CONTEXTO DE ATUAÇÃO DOS MOVIMENTOS POPULARES URBANOS NO
BRASIL - ANOS 90 E INÍCIO DO SÉCULO XXI……………………………………………25
3 A TRAJETÓRIA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS DE VITÓRIA: O CONTEXTO EM
QUE EMERGE O CPV………………………………………………………………………...34
4 A TRAJETÓRIA DO CPV – 1986-2004: PERFIL DE ATUAÇÃO DO
MOVIMENTO..................................................................................................................49
4.1 ESTRUTURA ORGANIZACIONAL………………………………………………………52
4.2 RELAÇÃO COM O PODER PÚBLICO………………………………………………….59
4.3 OBJETIVOS E LUTAS DO MOVIMENTO………………………………………………64
4.3.1 PRINCIPAIS BANDEIRAS DE LUTA…………………………………………………..….68
4.3.1.1 A PARTICIPAÇÃO DO CPV NO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO
…………………….68
4.3.1.2 A PARTICIPAÇÃO DO CPV NOS CONSELHOS GESTORES DE POLÍTICAS
PÚBLICAS
……………………………………………………………………………………….70
4.4 RELAÇÃO COM OS MOVIMENTOS E ASSOCIAÇÕES DE BAIRRO…………… 73
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS………………………………………………………………...76
6 REFERÊNCIAS………………………………………………………………………………78
APÊNDICE……………………………………………………………………………………88
ANEXO………………………………………………………………………………………...94
1 Introdução
O cenário político e social da década de 1980 no Brasil foi marcado, principalmente,
pelo debate em torno da abertura democrática e por lutas pelos direitos sociais. Após
décadas de regime autoritário, a sociedade civil brasileira experimenta, a partir da
década de 70, um significativo ressurgimento. Inúmeros movimentos populares
urbanos, surgidos durante a ditadura e nos anos posteriores, fazem da década de 80 o
cenário de lutas pela liberdade política e por melhoria das suas condições de vida.
Este novo contexto de mobilização da sociedade civil, impondo novas questões e novas
práticas políticas, deixou suas marcas na Constituição de 1988 com a conquista de
vários direitos sociais. Dentre as conquistas, a nova Constituição, conhecida como
“Constituição Cidadã”, instituiu diversos mecanismos de participação direta ou semi-
direta, como complemento à democracia representativa, permitindo novos espaços de
legitimação da atuação dos sujeitos, de seus interesses e conflitos (REVISTA IDÉIAS,
1998).
O perfil do associativismo brasileiro a partir de meados dos anos 80 representou
mudanças nas formas de ação coletiva e de ocupação do espaço público. O que
repercute em um novo arranjo de forças políticas com um novo padrão de
relacionamento entre Estado e movimentos sociais. Estes passam a atuar de forma
efetiva na política institucional, nas quais suas demandas passam a serem
apresentadas de forma sistematizada, como proposições políticas.
Como resultado, a postura de confrontos e combatividade ao Estado, que
caracterizaram os anos do regime militar e a primeira metade da década de 1980,
sofreria grandes modificações. A partir de finais dos anos 80, configura-se um novo
cenário associativista no país com o envolvimento de atores da sociedade civil na
construção de espaços públicos
1
, tais como, os Conselhos Populares
2
, Conselhos
Gestores
3
, ONGs
4
, Orçamentos Participativos
5
, etc. (ALVAREZ & DAGNINO, 1995).
Contudo, Avritzer (1997) nos chama a atenção para os “problemas de longo prazo da
formação cultural latino-americana que continuam a determinar as práticas políticas no
eixo Estado-sociedade política” (AVRITZER, 1997, p. 152). Afirma que a participação da
sociedade civil na esfera pública não conseguiu “influenciar suficientemente os
processos de democratização de forma a contribuir na superação de problemas
históricos, como o privatismo, a falta de visibilidade e a falta de equilíbrio entre os
diferentes grupos societários” (AVRITZER, 1997, p. 167).
Esse cenário pode ser confirmado pelos trabalhos que foram realizados para analisar
os desafios e possibilidades dessas novas práticas participativas. Avrtizer (2002)
estudou a experiência do OP nas capitais de Porto Alegre e Belo Horizonte e concluiu
que esses espaços têm o potencial de aumentar a eficiência e a eqüidade na
distribuição dos recursos públicos. Mas, também destaca a pouca democratização na
relação dos atores comunitários entre si, marcada pelo predomínio de uma relação
hierárquica e a incapacidade de estender o OP para decisões que envolvam
alternativas de políticas públicas e não somente distribuição de recursos materiais.
1
Resultado da expansão e aprofundamento da democracia no Brasil, o conceito de espaço público
assume valor fundamental visto significar a ampliação da política e a legitimidade do conflito. “O espaço
público afirma um procedimento que se alicerça na suposição da igualdade, construída sob os fios das
diferenças e institui um cenário para o estabelecimento das fronteiras entre público e privado, indicando
também uma nova forma de relacionamento com o Estado” (REVISTA IDÉIAS, 1998/1999, p. 09).
2
Estes conselhos foram construídos, principalmente ao longo da década de 80, pelos movimentos
populares ou setores organizados da sociedade civil em suas relações de negociações com o poder
público (GONH, 2003b).
3
Os conselhos gestores de políticas públicas surgiram nos anos 1980 durante o processo de
redemocratização e foram incorporados pela Constituinte de 1988. Gohn define os Conselhos Gestores
como “[...] um novo padrão de relações entre Estado e sociedade, porque eles viabilizam a participação
de segmentos sociais na formulação de políticas sociais e possibilitam à população o acesso aos
espaços nos quais se tomam as decisões políticas” (GONH, 2003b, p. 85).
4
“Nos anos 70-80, as ONGs eram instituições de apoio aos movimentos sociais e populares, estavam
por detrás deles na luta contra o regime militar e pela democratização do país [...]. Nos anos 90 o cenário
se amplia e diversifica-se. Surgem entidades autodenominadas como terceiro setor (mais articuladas à
empresas e fundações), ao lado das ONGs cidadãs, militantes propriamente ditas, com perfil ideológico e
projeto político definidos” (GONH, 2005, p. 89).
5
Participação popular na definição de prioridades e critérios para o orçamento municipal (BAIERLE,
2000).
Baierle (2000) que também estudou o OP de Porto Alegre avalia a importância deste
instrumento enquanto espaço de justiça social. E ressalta as dificuldades dos
movimentos populares urbanos, atuantes no OP, de moverem-se e articularem-se para
além das pautas do âmbito governamental, expressando uma falta de autonomia
organizativa dos movimentos.
A participação da sociedade civil no espaço dos conselhos gestores de políticas
públicas foi tema do trabalho de Tatagiba (2002) que fez um levantamento de vários
estudos realizados sobre o tema até 1999 e concluiu que os conselhos gestores
representam um importante avanço na construção de formas mais democráticas de
gestão dos negócios públicos. Aponta também os limites no exercício da participação
nos conselhos ao destacar a recusa dos atores governamentais em partilhar o poder de
decisão: “os governos têm resistido – de forma mais ou menos acentuada dependendo
da natureza do governo e do seu projeto político – às novas formas de fiscalização,
controle e participação da sociedade civil no processo de produção das políticas
públicas” (TATAGIBA, 2002, p. 79).
Em um outro estudo, Tatagiba (2003) chama a atenção para a ascensão de um modelo
de participação, orientado pelo pressuposto neoliberal que, ao contrário de incentivar a
participação popular nos processos decisórios e democratizar as informações, ancora-
se numa participação em que o Estado e a sociedade civil complementam-se. Nessa
perspectiva o objetivo é mobilizar recursos (humanos, econômicos) para a
implementação eficaz de projetos, bem como para evitar conflitos, sendo um meio de
legitimar o plano e as ações do governo perante o conjunto da sociedade. Isso resulta
numa democracia gerencial em que “a participação pode não ser pública, nem
tampouco democrática” (TATAGIBA, 2003, p.17).
Dagnino (2002b, p. 288) acrescenta que nesse modelo de participação se forma uma
complementaridade instrumental entre os propósitos do Estado e da sociedade civil,
caracterizada “[...] por uma confluência perversa
6
entre um projeto participatório,
construído, a partir dos anos 80, ao redor da extensão da cidadania e do
aprofundamento da democracia, e o projeto de um Estado mínimo que se isenta
progressivamente do seu papel de garantidor de direitos”.
Esses trabalhos revelam inovações e limites nos espaços de participação e intenções
diferentes de mobilização dos diferentes atores e agentes sociais, demonstrando o
cenário em que o novo associativismo se desenvolve. É neste novo contexto que se
inserem os movimentos populares urbanos
7
, principais atores na luta por esses novos
espaços. A partir da década de 90 tornam-se participantes, formuladores com direito a
voz e voto em determinadas políticas públicas. Esta nova forma de atuação suscita,
algumas importantes inquietações sobre o perfil atual dos movimentos populares
urbanos: quem são, quais as suas lutas, como se configuram, em quais espaços
realmente participam.
A temática dos movimentos populares urbanos registrou misterioso sumiço no debate
acadêmico dos anos 90. Gohn (1997) faz um balanço da produção teórica sobre os
movimentos populares urbanos no Brasil e aponta que a maioria dos estudos foi
realizada nos anos 80 e que nos anos 90 houve um declínio do interesse pelo estudo
desses movimentos. Os estudos realizados nos anos 80 tendiam em sua maioria a
caracterizar os movimentos como espontâneos, autônomos e contrários ao Estado. A
abertura política e a institucionalização de canais de participação no espaço público, a
partir da década de 90, com uma maior proximidade dos movimentos sociais dos
espaços institucionais do Estado levariam a um certo desencanto dos conceitos
produzidos por parte dos estudiosos. Os movimentos populares urbanos passam a ser
6
Por perversa, Dagnino se refere “a um fenômeno cujas conseqüências contrariam sua aparência, cujos
efeitos não são imediatamente evidentes e se revelam distintos do que se poderia esperar” (Dagnino,
2004, p. 96).
7
Os movimentos populares urbanos são entendidos como “o conjunto das formas de ação coletiva
desenvolvido pelas classes subalternas em sua luta pelo acesso à cidade e à cidadania. Engloba
experiências de autogestão, reivindicações de coletivos de moradores dirigidas ao sistema político
(movimentos comunitários) e também o esforço para alterar o fluxo das políticas públicas, participar de
sua gestão, quebrar com o padrão de exclusão e clientelismo presente no Estado e transformar o seu
arcabouço legal-institucional (movimentos de luta pela moradia, pelo transporte, fóruns de entidades
populares, Fórum de luta pela Reforma Urbana)” (BAIERLE, p. 02, 1992).
percebidos como frágeis, corporativistas e excessivamente permeáveis ao
enquadramento pelo poder público (BANK, 1998).
O estudo de autores como Cardoso (1988, 1994) e Doimo (1995) nos mostram que a
emergência de novas formas organizativas e de participação também contribuiria para
diminuir o foco nos movimentos de bairro. Lavalle, Castello e Bichir (2004, p. 50-51)
apontam que a ocultação desses atores pode ser explicada pela mudança das
categorias analíticas empregadas, afirma que: “os ‘holofotes’ passaram a iluminar a
nova sociedade civil a partir de uma concepção particularmente restritiva dos atores
merecedores de tal denominação, fazendo com que os movimentos permanecessem
despercebidos a despeito de continuarem em cena”. Bank (1998, p. 208) afirma que a
razão para a redução de estudos na área dos movimentos de bairro “se encontra
menos na perda de dinâmica desses tipos de organização do que na constatação, por
parte dos cientistas sociais, de que eles precisavam deixar de projetar sua concepção
de comunidade na realidade social em estudo”, de olhar a partir da perspectiva dos
militantes.
Lavalle, Castello e Bichir (2004) afirmam que ao longo da sua trajetória as identidades
coletivas dos movimentos populares deixaram alguns elementos de lado, tais como, as
freqüentes contestações às políticas públicas, mas incorporaram outros elementos. O
que lhes possibilitou sair do nível apenas reivindicatório, para um nível mais
operacional, propositivo. Destaca que seus discursos, as matrizes que os estruturaram
e as práticas se alteraram em função da mudança de conjuntura. Não se tratava mais
de ficar de costas para o Estado, mas de participar das políticas, de construir novos
canais de participação e contribuir para a institucionalização de espaços públicos
importantes tais como os diferentes conselhos criados nas esferas municipais,
estaduais e nacional.
Aprofundar o entendimento desses movimentos que possuem espaço nos canais
participativos e possuem uma dinâmica própria com ideologias e formas de conceber e
de atuar nos espaços coletivos torna-se de fundamental importância frente às
transformações e continuidades que o movimento experimenta a partir da década de
80. Em suma, a relevância do estudo proposto parece estar precisamente na
possibilidade que ele abre para o avanço da reflexão acerca do papel do movimento
popular urbano no cenário associativista brasileiro.
Por sua relevância como movimento representativo dos movimentos comunitários e
associações de bairro da cidade de Vitória - ES a presente dissertação elegeu como
objeto de análise uma organização representante das associações de bairro e
movimentos populares do município de Vitória-ES – o Conselho Popular de Vitória –
CPV, no período de sua fundação em 1986 a 2004, final de uma gestão do CPV. Os
conselhos populares foram formados no final dos anos 80 em várias cidades brasileiras
e foram construídos principalmente pelos movimentos populares para estabelecer
relações de negociações com o poder público. No caso da cidade de Vitória/ES o
Conselho Popular foi criado em 1986 com o intuito de unificar o movimento popular e
reforçar a luta por melhoria da qualidade de vida nos bairros.
O movimento foi criado com o objetivo de aglutinar e incentivar a criação das
associações de bairro e fortalecer a luta por melhoria das condições de vida nos
bairros. O contexto de sua criação nos anos 80, no auge do associativismo, contribuiu
para uma mudança substancial no relacionamento do movimento popular com o poder
público por assumirem uma postura combativa e de oposição à política clientelística e
patrimonialista do governo local. Neste período buscou direcionar as lutas políticas e
fortalecer os movimentos articulando ações para melhoria da qualidade de vida.
(CARLOS, 2003).
O Estatuto do Conselho Popular de Vitória – CPV no seu artigo 1º define o movimento:
[...] é uma entidade, sem fins lucrativos, terá como objetivo geral, a
congregação das entidades representativas de moradores de Vitória,
assegurando a plena efetivação dos direitos de seus associados;
contribuindo para a solução de seus problemas, promovendo o
desenvolvimento comunitário, proporcionando aos associados meios para
lutarem por melhores condições de vida social, econômica, política,
cultural e ambiental (Estatuto Social do Conselho Popular de Vitória,
2003).
Estruturado principalmente a partir das associações de bairro ele também representava
entidades culturais e associações esportivas. A partir de 2003, com as modificações no
Estatuto, passou a representar somente as entidades de bairro. No ano de 2004 havia
130 entidades de bairro filiadas ao CPV, representando a quase totalidade dos
movimentos. Apesar de seu formato e ideais sofrerem modificações ao longo do tempo,
reflexo das ações do poder público e pela própria desarticulação da sociedade civil, a
partir da década de 90, sua principal atuação prende-se à implementação e
acompanhamento do orçamento participativo e à participação nos conselhos gestores.
A pergunta principal que se procura responder é a seguinte: que interesses, demandas,
bandeiras o CPV representa? Dando suporte a esta questão principal, existem mais
dois outros conjuntos de perguntas que nela se imbricam: 1- Como ente federativo, qual
é o seu papel junto às demais associações de moradores? (o objetivo na sua fundação
era agregar os movimentos, possui esse papel?) 2- Como se relaciona com o poder
municipal? (ao longo da sua trajetória participou da criação do OP, foi chamado a
participar dos conselhos, qual a sua postura, como se articula com o poder público?
Possui a capacidade de dialogar criativamente e incidir nos diversos níveis da prática
social na construção e defesa de seus interesses e na definição de um projeto para a
sociedade?).
O presente trabalho é uma pesquisa do tipo estudo de caso que se caracteriza pelo
estudo profundo e exaustivo de um objeto, de maneira a permitir conhecimento amplo e
detalhado do mesmo, sem pretender generalizações dos resultados obtidos (GIL,
1994). A estratégia de apreensão do objeto de estudo se dará pela metodologia
qualitativa. Minayo e Sanches (1993) afirmam que a abordagem qualitativa, ao trabalhar
com o nível mais profundo da vida social, que não se mede, mas se interpreta (como
hábitos, atitudes, opiniões) possibilita a compreensão de fenômenos, fatos e
procedimentos particulares de pequenos grupos. Afirmam que:
A abordagem qualitativa realiza uma aproximação fundamental e de
intimidade entre sujeito e objeto, uma vez que ambos são da mesma
natureza: ela se volve com empatia aos motivos, às intenções, aos
projetos dos atores, a partir dos quais as ações, as estruturas e as
relações tornam-se significativas (MINAYO & SANCHES, 1993, p. 244).
Dessa forma, a investigação qualitativa permite que os dados da realidade empírica
sejam aprofundados em sua complexidade, pois se orienta “[...] para a análise de casos
concretos em sua particularidade temporal e local, partindo das expressões e atividades
das pessoas em seus contextos locais” (FLICK, 2004, p. 28).
O plano da pesquisa compreendeu os seguintes procedimentos: Levantamento
bibliográfico e estudo da literatura em torno do tema da pesquisa para o devido
embasamento teórico e analítico; Pesquisa documental que envolveu o levantamento
de fontes como jornais e atas das reuniões disponibilizadas pelo CPV. A entidade
possui poucos registros de suas atividades do período entre a sua fundação e a
segunda metade dos anos 90, muitos desses documentos se encontram dispersos
entre suas ex-lideranças. Os principais materiais de pesquisa foram às atas com
registro a partir de 1995, o jornal da entidade que teve início em 1997 e entrevistas
semi-estruturadas com as lideranças e ex-lideranças do CPV. Foram entrevistadas ao
todo sete lideranças e ex-lideranças do CPV e consultadas três entrevistas com ex-
lideranças realizadas por Durvalina (1997) e Sampaio (2005). A escolha dos
entrevistados privilegiou lideranças que participaram da fundação do CPV e a partir dos
registros em atas no ano 1995 optou-se por lideranças que estavam envolvidas no
cotidiano do movimento. As entrevistas foram gravadas com a autorização dos
entrevistados, não foi assinado termo de compromisso. Para análise do material as
gravações foram transcritas e trabalhadas a partir das questões que buscávamos
pesquisar. Foram construídos dois roteiros de entrevistas (APÊNDICE A), com ex-
lideranças e lideranças que atuam no CPV.
Segundo Ferrarotti (apud Albuquerque, 1994, p. 44), a entrevista semi-estruturada, à
qual denomina de “não diretiva centrada num tema”,
“[...] procura obter simultaneamente as vantagens próprias da entrevista
com um questionário rígido e da entrevista não-diretiva, evitando as suas
características negativas, que são, no primeiro caso, a impossibilidade de
o entrevistado se exprimir livremente, e, no segundo, a tendência à
prolixidade.
A fim de atender ao objetivo proposto, o trabalho está dividido em três capítulos:
No capítulo 1 é feita uma revisão da bibliografia sobre os movimentos sociais, para
analisar o percurso destes movimentos a partir dos anos 90, quando os movimentos
populares urbanos perdem centralidade diante do processo de abertura de canais
institucionais de participação. Busca-se uma reconstrução estratégica desses
movimentos, a partir da inflexão sofrida pela prática do enfrentamento e da progressiva
ênfase dada à prática da participação nos espaços institucionais. No capítulo 2 fazemos
um relato, em linhas gerais, da realidade sócio-econômica do Espírito Santo e da
trajetória dos movimentos sociais de Vitória, as características da formação e o contexto
em que o CPV foi criado. E no Capítulo 3, por meio da análise dos dados coletados nas
entrevistas e em outros documentos (atas, jornais e materiais diversos), reconstruímos
e analisamos a trajetória de atuação do Conselho Popular de Vitória ao longo do
período delimitado da pesquisa.
2 Movimentos sociais no Brasil
2.1 O cenário político, econômico e social Brasileiro a partir da década de 70
Na história recente dos países da América Latina, mais especificamente a partir da
década de 70, ocorreram grandes mudanças nas relações entre poder político,
estrutura social e economia. A transição para as “novas democracias”
8
às quais
emergem em meio a rupturas com regimes autoritários, ocorreram simultaneamente
com a reconfiguração da ordem econômica pelo capitalismo mundial, gerando crises e
sucessivas reformas econômicas nos países latino-americanos (WEFFORT, 1992).
A longa e profunda recessão, experimentada pelos países centrais, a reestruturação do
modelo de Estado do Bem Estar Social – Welfare State
9
viria acompanhada da
ascensão da ortodoxia neoliberal, proponente de um outro tipo de capitalismo, baseado
nos pressupostos da superioridade da “ordem espontânea” do mercado, e
fundamentado, em linhas gerais, na estabilidade monetária e fiscal, na contenção dos
gastos com bem-estar e na restauração da taxa “natural” de desemprego (ANDERSON,
1995).
A adesão dos países latino-americanos se inicia a partir dos anos 80, quando seus
governos, com o objetivo de estabilizar suas economias e adquirir mais créditos passam
a negociar com as agências multilaterais de crédito – Banco Mundial (BM) e Fundo
Monetário Internacional (FMI)
10
(Boron, 1995). No caso brasileiro, a opção de preservar
8
Weffort (1992) entende como “novas” as democracias que surgiram a partir dos anos 70, iniciando com
a “revolução dos cravos” em 1974, em Portugal, passando pelo sul da Europa nos anos 70 e na América
Latina nos anos 80, tendo suas últimas manifestações no leste Europeu (1989) e na União Soviética
(1991).
9
“O Welfare State é um sistema de organização social que procura restringir as livres forças do mercado
em três principais direções: a) garantindo direitos e segurança social a grupos específicos da sociedade
como crianças, idosos e trabalhadores; b) distribuindo, de forma universal, serviços sociais como saúde e
educação; e c) transferindo recursos monetários para garantir a renda dos mais pobres em certas
contingências, com a maternidade, ou situações de interrupção de ganhos devidos a fatores como
doença e desemprego”(PEREIRA, 1994, p. 4).
10
Boron (1995) afirma que a principal estratégia dessas instituições, como propagadoras do paradigma
neoliberal seria condicionar os empréstimos aos ajustes estruturais, ou seja, a adoção da cartilha
neoliberal como forma de recebimento dos créditos.
as relações com o sistema financeiro internacional inviabiliza, a partir dos anos 80, os
pressupostos do Estado Desenvolvimentista
11
. O que resulta em grandes mudanças na
condução da política econômica brasileira, a partir da década de 80, “mudando a
perspectiva de ação e inserção do Estado como agente promotor do desenvolvimento”
(ZORZAL, 2004, p.40).
Sallum (1996) afirma que o principal impacto foi sentido na redução drástica do
financiamento para as empresas estatais e privadas, o que ocasionaria as primeiras
rachaduras no pacto de dominação estruturado em torno do Estado
Desenvolvimentista. Nogueira (2004) afirma que o ciclo expansivo dos anos 1968-1973
não teve como se sustentar e jogou o país numa grave crise de caráter recessivo. Esse
cenário, por sua vez, fracionou o bloco de sustentação do regime fazendo com que o
consenso em torno da ditadura e do “milagre econômico” entrasse progressivamente
em colapso.
Desse modo, Sallum (1996) destaca que a crise em torno do modelo de Estado
Desenvolvimentista, em fins dos anos 70, foi uma fonte crucial de impulsão para o fim
do regime militar. Afirma que se abrem brechas para que a luta da sociedade civil
contra o regime autoritário tivesse nova expressão e traz à tona as novas energias e os
novos sujeitos produzidos pela modernização do país. Os principais protagonistas
dessa luta, os movimentos de ação direta, sindicatos, partidos, organizações
representativas de classe e outros, passam a atuar de forma ativa na condução da
agenda política ao longo dos anos 80. A promulgação da Constituição de 1988
representaria a síntese dessas lutas ao consolidar direitos políticos e sociais.
Entretanto, se do ponto de vista social a sociedade civil obteve vitórias, no plano
econômico a opção, ao longo da década de 80, pela renegociação da dívida externa,
11
O Estado Desenvolvimentista teve sua gênese no Brasil, pós-Revolução de 1930 e sua meta principal
era impulsionar a industrialização. Ancorado na idéia do Estado como agente direto do desenvolvimento
econômico e social do país, esse paradigma deu direção e suporte para promover um grande
crescimento na economia brasileira, principalmente nos idos anos 70. Com uma estrutura burocrática
especializada o Estado controla e administra funções macroeconômicas e centraliza e normatiza as
emissão de títulos públicos e elevação dos juros, contribuiria ainda mais para o
aprofundamento da crise econômica iniciada na década de 70
12
. A implementação
acelerada da estratégia neoliberal, a partir dos anos 90, no país, por meio das
chamadas reformas estruturais, denominada por Behring (2003) de “contra-reforma”,
representou um profundo retrocesso social. Os impactos podem ser notados na “crise
dos serviços sociais públicos; desemprego; informalização da economia; ajustes fiscais,
privatizações e favorecimento da produção para exportação em detrimentos das
necessidades internas” (BEHRING, 2003, p. 134).
Desse modo, ao mesmo tempo em que o capitalismo internacional precipita e acelera a
crise do Estado Desenvolvimentista ele influi grandemente na sua superação pela
ortodoxia neoliberal, fazendo com que o novo pacto político formado em torno desses
pressupostos ortodoxos significasse para a maioria da população a anulação das
conquistas no terreno dos direitos sociais e a ampliação do déficit de cidadania. Os
inegáveis avanços políticos tiveram, dessa forma, uma contrapartida paradoxal: “foram
acompanhados por uma marcada pauperização das condições de vida das grandes
maiorias nacionais” (BORON, 1995, p. 67-68).
2.2 Perfil associativo no Brasil dos anos 80
A descrição sucinta do cenário econômico, político e social revela o contexto das forças
em ação na construção democrática a partir da década de 70 no Brasil e nos instiga a
refletir sobre o perfil associativo da sociedade civil nesse período. Nosso objetivo, nesse
segundo momento, é traçar, em linhas gerais, a natureza dos conflitos articulados pelos
movimentos populares urbanos. Para tanto, apresentamos a análise de alguns autores
sobre o potencial e a ação desses movimentos para entender como se deu a
principais áreas da atividade produtiva nacional. Para um maior aprofundamento, ver Draibe ( 1985) e
Zorzal (2004).
12
Berhing (2003) afirma que os efeitos destrutivos dessa política podem ser notados pela inflação nesse
período que salta de 91,2%, em 1981, para 217,9%, em 1985 (BEHRING, 2003, p. 134).
participação política da sociedade civil na década de 80 e os rumos que vem tomando
no decorrer da década de 90 e início do século XXI.
Ao caracterizar os movimentos sociais da década de 80, parte-se da noção de que essa
categoria não possui uma definição ou conceituação geral que dê conta das diversas
ações movimentalistas em diferentes momentos históricos. Apesar de sempre se referir
“[...] às lutas sociais dos homens, para a defesa de interesses coletivos amplos ou de
grupos minoritários; conservação de privilégios; obtenção ou extensão de benefícios e
bens coletivos, etc.” (GOHN, 1997, p. 247), essa definição não dá conta das diversas
especificidades dos movimentos sociais.
Dessa forma, parte-se da premissa de que “os movimentos sociais assumem formas
específicas, possuindo várias definições de acordo com o contexto sócio-econômico e a
matriz organizativa e ideológica dos movimentos” (DOIMO & BANK, 1989, p. 11).
Assim, dentro do universo dos movimentos sociais da década de 80, vamos mapear os
movimentos populares urbanos, uma vez que nosso interesse é buscar entender o perfil
associativo neste período para contribuir para as reflexões acerca do nosso objeto de
estudo.
Os movimentos populares urbanos florescem a partir de meados da década de 70 e
apresentam um novo tipo de associativismo. Doimo (1995) afirma que a novidade “[...]
está precisamente no fato de se originarem fora da esfera produtiva e dos canais
convencionais de mediação política, em espaços fortemente marcados por carências
referidas ao vertiginoso crescimento e crise do Estado capitalista” (DOIMO, 1995, p.
50). A base social desses movimentos era formada por segmentos de baixa renda e os
temas desses conflitos voltavam-se, sobretudo, para a sobrevivência imediata, como
“[...] saúde pública, moradia, transporte coletivo urbano, saneamento básico, segurança
pública, entre outros” (DOIMO, 1995, p. 61).
Suas lutas e reivindicações serão marcadas por uma participação de tipo
movimentalista, por meio da ação direta que, ao contrário da participação institucional,
feita pela via dos partidos, dos sistemas eleitorais e pautada em “[...] critérios
mensuráveis de representação e regras universalistas de procedimento” (DOIMO, 1995,
p. 59), irão se caracterizar por conflitos que se manifestam mediante a mobilização e a
pressão ancorada na lógica “consensual solidarística”. Ou seja, o processo de decisão
no interior desses movimentos seria construído a partir de “[...] valores éticos, morais,
comunitaristas” em substituição à lógica racional competitiva do sistema de
representação política (DOIMO, 1995, p. 59).
O perfil desses movimentos será moldado pela formação dos “campos ético-políticos”
ou redes sociais. Eles são constituídos pela complexa interação que se estabeleceu
entre setores da Igreja Católica, das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), de
segmentos da academia científica, grupamentos de esquerda e ONGs (DOIMO, 1995;
SADER, 1988). Esses atores exerceriam um papel fundamental tanto na emergência
desses movimentos quanto na formação de seu perfil associativo por criar “[...] um
corpo de novas representações acerca do popular, capaz de dar sentido ao presente,
reelaborar o passado e projetar promessas de futuro [...]” (DOIMO, 1995, p.149).
A constituição desse campo ético-político em torno dos movimentos populares, seria,
segundo Doimo (1995) a especificidade central dos movimentos e o que os diferenciaria
de simples conflitos de ação direta. Em seu estudo a autora considerou que apesar de
surgirem e pautarem suas ações por condutas de ação direta, a atuação das diversas
redes com a formação de campos ético-políticos deu aos movimentos novos valores,
alcançando um outro patamar, capaz “[...] de influir nos padrões culturais e nas formas
de convivência política” (DOIMO, 1995, p. 66). Não podendo, assim, serem
caracterizados como simples conflitos espontâneos voltados para reivindicações locais
e pontuais.
Frente a essa constatação, Doimo irá traçar o perfil do movimento popular, através das
influências dessas diversas redes que lhes deram sustentação e continuidade, tanto na
formatação de seu perfil, como na sua desarticulação em finais da década de 80. A
Igreja Católica, através de suas instituições, exerceria o principal peso na formação
desse campo
13
ético político. Construindo um “ethos movimentalista”, expresso numa
linguagem em comum, nortearia a “práxis organizativa” dos movimentos e recuperaria a
capacidade ativa do povo, em que a “disposição de luta”, a participação com autonomia
e independência, a “democracia de base”, a cidadania, etc, passam a ser sua
linguagem predominante (DOIMO, 1995; SADER, 1988).
A partir dessa caracterização dos movimentos populares, pode-se definir essas
experiências participativas no Brasil, como “[...] uma vasta gama de movimentos
reivindicativos referidos ao Estado do mal-estar social”. Pautado por condutas de ação
direta e por um campo ético-político que “[...] para além das reivindicações locais e
pontuais, influíram nos padrões de convivência política” (DOIMO, 1995, p. 68).
Cabe salientar que a abordagem de Doimo (1995) sobre os movimentos populares
urbanos diverge de muitos autores que estudaram o tema. Doimo adota uma
perspectiva na linha “institucional”, desenvolvida por autores como Boschi (1983) e
Cardoso (1985, 1988) e discorda das análises que consideram que as ações desses
movimentos eram anti-Estado. Para a autora a meta principal desses movimentos seria
a ampliação dos direitos de cidadania e para sua conquista, os movimentos poderiam
expressar “[...] um dinâmico quadro de demandas, recusas, alianças, pactos e conflitos
internos, [...]” na sua relação com o Estado (DOIMO, 1995, p. 49). Dessa forma, a
perspectiva institucional parte do entendimento de que “[...] o discurso do movimento
popular apontava o Estado como inimigo, mas também como o interlocutor, com que se
pretendia negociar as reivindicações imediatas” (CARDOSO, 1988, p. 368).
Outra autora que também estudou o tema, na perspectiva de autonomia desses
movimentos frente ao Estado, Scherer-Warren (1987; 1993), traz contribuições para
caracterizar o movimento popular urbano a partir das transformações da década de 80.
A autora entende que:
13
Ao usar a denominação “campo” a autora está “[...] pressupondo a existência de uma sociabilidade
comum, aflorada pelo senso de pertença a um mesmo espaço compartilhado de relações interpessoais e
Estes novos movimentos se caracterizam por suas lutas para romper com
os esquemas populistas do passado, para a criação de formas
comunitárias de participação direta das bases ao nível da reflexão, da
decisão e da execução, diminuindo ao mínimo a distância entre direção e
base do movimento. Defendem a autonomia frente ao Estado e Partidos,
considerando a cidadania um direito do povo, numa situação de um
capitalismo particularmente excludente. (SCHERER-WARREN, 1987, p.
42)
14
.
Sherer-Warren (1987) afirma que os movimentos sociais urbanos buscavam contrapor-
se aos ditos já velhos, expressos até 1964, no Brasil, pelas Associações de Amigos de
Bairro e Sociedades de Amigos de Bairro (SABs). Estes eram caracterizados “[...] pelo
seu recrutamento clientelístico, pela cooptação de suas lideranças pelo Estado
Populista, pelo encaminhamento de reivindicações segundo esquemas populistas e
paternalistas” (SHERER-WARREN, 1987, p, 41). Afirma que a principal diferenciação
dos “novos movimentos sociais”, do novo tipo de associativismo, estava nas práticas
sociais e no estilo de organizar a comunidade local. Visto que estes compartilhavam da
ideologia do anti-autoritarismo e da defesa do direito de participar das decisões tanto no
cotidiano desses movimentos quanto na esfera pública (SHERER-WARREN, 1993).
Para Sherer-Warren (1993) esses novos movimentos traziam em seu bojo uma nova
linguagem por reconhecerem-se como sujeitos da história e detentores de direitos
legítimos. Afirma que a construção dessa nova cultura política de base estaria se
desenvolvendo em torno dos seguintes aspectos: “reação às formas autoritárias, reação
às formas centralizadas de poder, defesa de autonomias locais e sistemas de auto
gestão e reação ao caráter excludente do modelo econômico adotado no país
(SHERER-WARREN, 1987, p. 50). Assim, a maioria destes novos movimentos sociais
estaria negando o modelo político existente e estaria apontando para novas formas de
relações entre Estado e sociedade civil
15
.
atributos culturais, como signos de linguagem, códigos de identificação, crenças religiosas e assim por
diante”. (Doimo, 1995, p. 68).
14
Sherer-Warren utiliza essa noção a partir dos estudos de Singer e Brant (1980), Gohn (1982) e Jacobi
(1982) e outros.
15
A concepção de Estado e sociedade civil que orienta a nossa análise está baseada na concepção de
Gramsci, nos trabalhos de Carlos Nelson Coutinho e Hugues Portelli. Portelli (1977) afirma que Gramsci
compreende a sociedade civil como campo constituído por instituições, organizações ditas privadas
(escolas, sindicatos, igrejas, partidos, meios de comunicação, organizações profissionais e artísticas)
As análises de Sherer-Warren (1987; 1993) e Doimo (1995) sobre os movimentos
populares urbanos da década de 80 trouxeram grandes contribuições para caracterizar
o perfil de participação desses movimentos. Os estudos de Sherer-Warren permitiram
refletir sobre o potencial político desses movimentos na construção de uma nova cultura
política, contrária ao perfil autoritário e clientelístico do Estado. Doimo (1995) inovou ao
enfatizar que o movimento popular constituiu-se e fundamentou-se a partir da
construção dos campos ético-políticos, formando um “ethos movimentalista” que
estruturaria suas demandas e formas de participação.
Dessa forma, a partir da caracterização da participação dos movimentos populares
urbanos, pode-se entender a forma como foi articulada a relação entre Estado e
movimentos sociais. Denominada por Doimo (1995) de sociabilidade cambiante, essa
forma de interação promoveu “[...] desde interesses voltados à grande transformação
da sociedade, até interesses dirigidos à maior integração e harmonização social, pela
via da implementação de políticas públicas e da ampliação da participação no sistema
decisório” (DOIMO, 1995, p. 197). Assim, o fato inegável é “[...] que os movimentos
sociais dos anos 70 e 80 contribuíram decisivamente, via demandas e pressões
organizadas, para a conquista de vários direitos sociais novos, que foram inscritos em
leis na nova Constituição Brasileira de 1988” (GOHN, 2003, p. 20).
Dentre as conquistas, a nova Constituição, conhecida como “Constituição Cidadã”,
instituiu diversos mecanismos de participação, como complemento à democracia
representativa que resultaria numa tendência à institucionalização de canais de
participação da sociedade civil. Assim, segundo Telles (1994) a partir dessa ampla
participação dos movimentos sociais se pode registrar uma sociedade civil em
formação, entendendo por isso uma sociedade:
correspondente a esfera da super-estrutura político-ideológica, ao espaço privilegiado da disputa pela
hegemonia entre as classes sociais. Neste sentido, a sociedade civil, em Gramsci, constitui o momento
de formulação do consenso ativo, de construção dos valores e da cultura de uma sociedade. Concepção
de Estado - amplia este conceito ao dotar o Estado tanto das tarefas da coerção, quanto da promoção do
consenso (Estado ampliado). O Estado ampliado é, então, a combinação de sociedade civil (hegemonia,
consenso) mais sociedade política (coerção, força). (PORTELLI, 1997).
[...] na qual as relações sociais são mediadas pelo reconhecimento
de direitos e representação de interesses, de tal forma que se torne
factível a construção de espaços públicos que confiram legitimidade
aos conflitos e nos quais a medida de eqüidade e a regra de justiça
venham a ser alvo do debate e de uma permanente interlocução
(TELLES, 1994, p. 101).
Neste sentido, a luta dos grupos, associações e instituições pela construção da
democracia permitem que o termo sociedade civil passe a fazer parte do debate político
nacional “com a instituição de múltiplos espaços públicos, a construção de novas
sociabilidades e de novos mecanismos de gestão de políticas públicas”. Configura-se
um quadro novo em que a sociedade civil assume a posição de protagonista
privilegiada da transformação social. (REVISTA IDÉIAS, p. 16, 1998).
Desse modo, a partir de final dos anos 80, temos um novo arranjo de forças políticas,
que aponta para uma forma de relacionamento entre Estado e Sociedade Civil na qual
os movimentos passam a se relacionar mais diretamente com as agências públicas
através de experiências participativas no âmbito dos conselhos setoriais em áreas como
saúde, educação, criança e adolescente, assistência social, entre outros e as práticas
do orçamento participativo desenvolvidas em vários municípios do país (Cardoso,
1994).
O novo contexto político de mudanças no modelo de gestão de políticas públicas com a
abertura de novos espaços de diálogo e interlocução com os atores da sociedade civil,
permitiu que os movimentos sociais assumissem novos contornos neste processo,
mudando no diálogo com o Estado. Descrever os limites e possibilidades dessa nova
prática será o objetivo do próximo item.
2.3 Contexto de atuação dos movimentos populares urbanos no Brasil - anos 90 e
início do século XXI
O processo de construção democrática enfrentaria na década de 90 inúmeros desafios.
Se nos anos anteriores os movimentos sociais conquistaram vários direitos firmados na
Constituição de 88, ao longo dos anos seguintes precisariam lutar pela sua efetivação,
para que as demandas fossem realmente satisfeitas nas áreas das políticas sociais e
no direito de participar das decisões políticas. Contudo, esses desafios do projeto
participativo democratizante, sustentado por setores da sociedade civil que assumiram
uma postura mais propositiva e aberta à atuação conjunta com o Estado precisariam
ser enfrentadas a partir do impacto do projeto neoliberal no Brasil.
No início deste capítulo fizemos uma breve exposição sobre o modelo neoliberal
principalmente do ponto de vista econômico. Em termos políticos e sociais, faz-se
necessário discutir sucintamente a visão da perspectiva neoliberal sobre a relação
Estado e sociedade civil do ponto de vista da construção das políticas sociais.
Entendemos que a nova dinâmica dos movimentos sociais precisa ser discutida a partir
das implicações desse cenário, uma vez que concorrem lado a lado um projeto político
democratizante e o projeto neoliberal que trará grandes impactos ao perfil de
participação da sociedade civil nos espaços públicos.
Os anos 90 foram marcados por um novo projeto de desenvolvimento que buscava
estabilizar a economia e substituir o projeto de desenvolvimento nacional-
desenvolvimentista. Ancorado nos pressupostos de Luiz Carlos Bresser Pereira,
principal protagonista da implementação da nova administração pública no Brasil, tem-
se na gestão Fernando Henrique Cardoso, de 1995 a 2002, a consolidação dessas
reformas. O principal impacto foi à adoção de políticas de ajuste econômico e social
com a adoção de uma visão minimalista do Estado e da democracia que ficaria
conhecida como “reforma gerencial”.
Paula (2005) afirma que a reforma gerencial brasileira foi um desdobramento do ajuste
estrutural da economia, que teve início na gestão Collor com a adesão às
recomendações do Consenso de Wasghington. Contudo, destaca, que se no primeiro
momento foram realizados algumas experiências concretas de ajuste estrutural com as
privatizações e redução das políticas sociais, posteriormente, frente às crescentes
críticas, esse discurso seria alterado para tentar se diferenciar do projeto neoliberal. O
discurso passa a ter uma postura de reforma com o objetivo de tornar o Estado mais
“administrável”, com a “reforma dos institutos legais e estatais” (PAULA, 2005, p. 126).
O principal articulador, Bresser Pereira, concentraria sua proposta de reforma em 3
dimensões: a institucional, cultural e gestão e seriam aprovadas pela emenda de
reforma administrativa em 1998. Paula (2005) afirma que a dimensão estrutural se
refere à reestruturação do aparelho de Estado e define atividades exclusivas e não
exclusivas do Estado. A principal mudança foi à institucionalização de “parceria entre o
Estado e a sociedade”, o que permite os setores privados lucrativos e não lucrativos
terem participação na produção e distribuição de serviços públicos.
Do ponto de vista da dimensão cultural, Paula (2005) esclarece que esta propõe a
necessidade de transformar a “cultura burocrática” do Estado em “cultura gerencial”.
Essa transformação se daria pelo uso de instrumentos de gestão do setor privado no
setor público, com a adoção dos programas de qualidade, reengenharia organizacional,
terceirização, planejamento estratégico, etc. A dimensão de gestão seria conseqüência
da cultura gerencial, ou seja, colocar em prática as premissas gerenciais “para oferecer
um serviço público de melhor qualidade e de menor custo ao “cidadão-cliente” (PAULA,
2005, p. 126-130).
Contudo, do ponto de vista democrático, Paula (2005) afirma que a eficiência
governamental permaneceu como sinônimo da centralização do poder e do fechamento
do processo decisório. Destaca que não houve grandes mudanças na gestão das
políticas públicas, pois o processo decisório continuou como um monopólio do núcleo
estratégico do Estado e das instâncias executivas. Desse modo, a implementação do
modelo gerencialista de gestão pública, a despeito do discurso participativo, não
garantiu uma inserção da sociedade civil nas decisões estratégicas e na formulação de
políticas públicas. “[...] há um discurso participativo, mas na prática se enfatiza o
engajamento da própria burocracia pública ou dos quadros das organizações sociais
16
para realizarem atividades públicas, no processo de gestão” (PAULA, 2005, p.147).
Desse modo, a participação remete a contribuir no fazer público. Propõe-se uma forma
de participação em que o Estado passa à sociedade civil a tarefa de contribuir, não na
qualidade de co-gestora, mas de executora das políticas públicas. A defesa do modelo
gerencialista que propõe a isenção do Estado do seu papel de garantidor de direitos,
através do encolhimento de suas responsabilidades sociais e sua transferência para a
sociedade civil, faz com que ocorra um deslocamento de sentidos dos termos
participação, sociedade civil e, conseqüentemente, do entendimento sobre a noção de
cidadania. A participação dos movimentos sociais nos espaços públicos a partir dos
anos 90, será permeada por essa disputa simbólica entre esses diferentes sentidos
(DAGNINO, 2004b).
Dagnino em alguns de seus trabalhos (2004a, 2004b) denomina essa disputa simbólica
de uma crise discursiva. Destaca que:
Essa crise discursiva resulta de uma confluência perversa entre, de um
lado, o projeto neoliberal que se instala em nossos países ao longo das
últimas décadas e, de outro, um projeto democratizante, participativo, que
emerge a partir das crises dos regimes autoritários e dos diferentes
esforços nacionais de aprofundamento democrático (DAGNINO, 2004a, p.
138)
Enquanto o projeto democrático-popular aposta na partilha do poder entre Estado e
sociedade para definir a noção de interesse público, propiciando as condições para o
exercício da cidadania, o projeto neoliberal expresso no modelo gerencial de
administração pública defende a participação efetiva do cidadão a partir da sua atuação
na execução das políticas públicas e na participação nos conselhos de administração
constituídos pela sociedade, no controle do custo e qualidade dos serviços prestados, e
16
Paula (2005) afirma que “as organizações sociais são entidades públicas não-estatais destinadas a
absorver atividades publicizáveis. A partir da Lei 9.367, de 15 de maio de 1998, as associações civis
sem fins lucrativos voltadas para os serviços sociais e científicos podem ser transformadas em
organizações sociais (PAULA, 2005 p. 128-129).
não na redefinição dos espaços públicos e na formulação de políticas (TATAGIBA,
2003).
Dagnino (2002) afirma que o principal elemento que diferencia esses projetos políticos
em termos da participação social seria a partilha efetiva do poder de decisão com a
sociedade. Enquanto no projeto neoliberal a expressão sociedade civil se restringe
cada vez mais a designar organizações do terceiro setor, em que as funções de
decisão e execução de políticas estão claramente separadas, o projeto societal se
inspira nas experiências alternativas de gestão pública realizadas no âmbito do poder
local. E busca “[…] a implementação de um projeto político que procura ampliar a
participação dos atores sociais na definição da agenda política, criando instrumentos
para exercer um maior controle social sobre as ações estatais e desmonopolizando a
definição e implementação das ações públicas” (PAULA, 2005, p. 155).
Esse projeto busca tornar a administração pública mais permeável à participação
popular e surge com as mobilizações sociais a partir dos anos 70, atingindo seu ápice
no momento da elaboração da constituição quando se institucionaliza um novo padrão
de relação entre o Estado e a sociedade. Um dos principais articuladores dessa
vertente, Tarso Genro, líder do PT, defende uma “esfera pública não-estatal” com a
criação de “espaços públicos de negociação” e “espaços deliberativos”. A esfera pública
não-estatal seria um “espaço para articular a representação política tradicional com a
presença direta e voluntária da cidadania”. E repercute na elaboração de novos
formatos institucionais que possibilitem a co-gestão e a participação dos cidadãos nas
decisões públicas. Destacam-se nessas experiências inovadoras, construídas
principalmente pelos governos das frentes populares, formadas por partidos de
esquerda e pelo PT, os conselhos gestores de políticas, os fóruns temáticos - “voltados
à discussão de questões variadas relacionadas com o interesse público” - e o
orçamento participativo (PAULA, 2005, p. 156- 157).
Contudo, apesar da multiplicação dessas experiências ao longo dos anos 1990, Paula
chama atenção para o fato de que ainda se manifestam de forma fragmentada e
demandam uma amarração a um projeto político mais abrangente para o Estado e a
sociedade. Considera ser necessário formatar um projeto com “um novo modelo de
desenvolvimento para o Brasil, com uma proposta de reorganização para o aparelho do
Estado, e uma visão de gestão pública oposta ao gerencialismo (PAULA, 2005, p. 157).
A descrição dessas duas vertentes revela problemas e limites na concepção da
participação social e nos faz refletir sobre a atuação dos movimentos sociais frente a
esse cenário. A partir da década de 90 quando os movimentos sociais na sua relação
com o Estado assumem ações propositivas, rompendo com o espírito resistente à
institucionalidade, passam também a estar sempre no limiar entre constituírem-se como
aprofundadores da democracia e da cidadania através da expansão dos espaços
públicos e/ou tornarem-se substitutos do papel estatal de fornecer serviços públicos aos
cidadãos. Essa disputa política por projetos políticos diversos e por vezes antagônicos
contribuiu significativamente para transformar as condições sob as quais a sociedade
civil
17
atua nos espaços públicos (REVISTA IDÉIAS, 1998-1999).
Os limites e possibilidades das práticas participativas foram temas de vários estudos de
caso no Brasil. Na pesquisa coordenada por Dagnino (2002) “Sociedade Civil e
Espaços Públicos no Brasil” a autora afirma que o retrato da participação da sociedade
civil nos espaços públicos revela que o processo de construção democrática não é
linear, mas contraditório e fragmentado. Varia muito de um local para outro, resultado
de uma multiplicidade de fatores como a estrutura estatal, os partidos políticos e as
matrizes culturais
18
. Esse exame deixa claro que os espaços de participação se
formatam a partir das clivagens de diferentes projetos políticos e seus atores no interior
do Estado e da sociedade civil (DAGNINO, 2002, p. 142-145).
17
Torna-se importante destacar que partimos da premissa de que a sociedade civil é plural e representa
diversos projetos e práticas. Engloba desde associações empresarias ao Movimento Sem Terra – MST e
há uma grande diversidade no interior dos próprios movimentos populares urbanos. As diferentes
orientações, objetivos e estratégias irão se expressar nas diversas concepções de participação política,
cidadania e democracia (REVISTA IDÉIAS, 1998-1999, p. 32-33).
18
Dagnino afirma que “o autoritarismo social e as visões hierárquicas e excludentes da sociedade e da
política constituem obstáculos cruciais na constituição e no funcionamento dos espaços públicos”
(DAGNINO, 2002, p. 143).
Frente a esse cenário, devemos agora examinar mais detidamente o perfil do
associativismo a partir dos anos 90. Gohn (1997) afirma que as novidades da gestão
pública, principalmente em nível local, construídas pelas demandas dos movimentos
sociais, resultam em uma nova concepção de sociedade civil. Destaca que:
Essa nova concepção construiu uma visão ampliada da relação Estado-
sociedade, que reconhece como legítima a existência de um espaço
ocupado por uma série de instituições situadas entre o mercado e o
Estado, exercendo o papel de mediação entre coletivos de indivíduos
organizados e as instituições do sistema governamental (GOHN, 1997, p.
301).
Avrtizer (1997) afirma que essa nova face da sociedade civil traz à cena um
associativismo de novo tipo com novos atores e novos temas. Destacam-se os
movimentos sociais centrados em questões éticas ou de revalorização da vida humana,
como o Movimento pela Ética na Política, Movimento Nacional de Meninos e Meninas
de Rua, movimentos pela revalorização da cidade como o Movimento Viva Rio,
Campanha da Ação da cidadania contra a Fome e a Miséria e pela Vida. Gonh (1997,
p. 306). afirma que essas ações:
Estão centradas em valores baseados mais na solidariedade humana e
pouco alicerçadas em projetos político-partidários, como nos anos 80,
ainda que a questão da solidariedade seja também, por si só, um projeto
político. [ E ] […] se apresentam mais como ‘campanhas’ do que como
movimentos sociais.
Outra característica dos movimentos sociais, ressaltada pela autora, refere-se à
formulação das políticas nos espaços públicos de modo a privilegiar “[…] áreas
temáticas-problema, como a fome, o desemprego, a moradia, os sem terra, etc. e não
mais os atores sociais organizados em movimentos” (GOHN, 1997, p. 311).
Gohn acrescenta duas outras novidades que devem ser assinaladas no cenário das
ações coletivas dos anos 90:
Primeira: o fortalecimento de redes e estruturas nacionais de movimentos
sociais, coordenadas por ONGs - como a ABONG, Associação Brasileira
de ONGs – ou a criação de estruturas macrocentralizadoras de vários
movimentos sociais – como a CMP – Central dos movimentos Populares
[,,,]. Segunda: o surgimento e/ou desenvolvimento de movimentos
internacionais. Produtos típicos da era da globalização, grandes ONGs
internacionais, como o Greenpace, a Rainforest, etc. (GOHN, 1997, p.
308-309)
19
.
A autora destaca que a emergência de novas formas organizativas também pode ser
notada pela eclosão de movimentos sociais de base pluriclassista, liderados pelas
camadas médias e articulados em torno de problemáticas de gênero, etnia, idade, etc.
(GOHN, 1997). Outra tendência é o crescimento das ONGs
20
e as políticas de parceria
implementadas pelo poder público, particularmente no âmbito do poder local. Gohn
(1997) e Gurza Lavalle (2004) afirmam que esse cenário definiria a tônica do campo da
ação coletiva na última década do século XX com a transferência de responsabilidades
do Estado para as “comunidades” organizadas através da intermediação das ONGs, em
trabalhos de parceria. Ocorrendo “a multiplicação de um tipo de organização
claramente coincidente com o perfil das ONGs” (GURZA LAVALLE, 2004, p. 38).
Dagnino afirma que:
O resultado tem sido uma crescente identificação entre “sociedade civil” e
ONGs, em que o significado da expressão “sociedade civil” se restringe
cada vez mais a designar apenas essas organizações, quando não em
mero sinônimo de “terceiro Setor (DAGNINO, 2002, p.157).
Neste cenário os novos movimentos sociais passam a atuar como co-partícipes das
ações estatais. Gohn (1997) afirma que as demandas passam a ser enfrentadas
coletivamente, ou seja, quem demanda pode ser também o executor da implantação e
gestão do serviço reivindicado. Chama a atenção para o fato de que “[…] tais ações
deixam de se estruturar como movimentos sociais e passam a ser articuladas em
grupos organizados” que devem apresentar “[…] projetos, propostas de soluções,
19
Gurza Lavalle (2004) denomina essas associações de articuladoras por agregarem um conjunto de
entidades constituídas por outras associações ou entidades civis. Tendo como principal função “a
articulação e a coordenação dos interesses e esforços de outros atores” (GURZA LAVALLE, 2004, p. 44).
20
Entidades sem fins lucrativos que se orientam para a promoção e para o desenvolvimento de
comunidades carentes a partir de relações baseadas em direitos e deveres da cidadania (GOHN, 1994).
sugestões e estratégias de execução das ações demandadas” (GOHN, 1997, p. 314-
15). O poder público se transforma em agente repassador de recursos, intermediado
pelas ONGs que passam a ter o papel principal de estruturar os projetos e cuidar da
organização e da divisão das tarefas
Gohn acrescenta que nos locais onde havia movimentos organizados surgem redes de
poder social local, “formadas pelas lideranças dos antigos movimentos, por uma base
militante pequena, que agora assume o papel de responsável por etapas ou processos
dos projetos em andamento” em conjunto com técnicos das ONGs. Nesses espaços as
questões ideológicas ou político-partidárias não são debatidas, estando mais
preocupados com a “eficiência das ações e o êxito dos projetos” (GOHN, 1997, p. 316).
Nesta perspectiva, Nogueira (2004) afirma que os movimentos sociais abandonam:
[...] a fronteira do Estado como campo de lutas de emancipação para se
concentrar numa idéia de Estado como espaço de regulação, elaboração e
implementação de políticas. Haverá menos antagonismo e mais consenso
racional, menos democracia política e mais deliberação democrática
(NOGUEIRA, 2004, p. 59).
Certamente que esse cenário não corresponde à totalidade da atuação dos movimentos
sociais nos espaços públicos, nosso intuito foi descrever os desafios e limites da
participação social a partir do cenário político e econômico dos anos 90. Desse modo,
se por um lado, os movimentos sociais enfrentam dificuldades de manterem-se na
posição de portadores de direitos legítimos frente à voracidade da política neoliberal,
por outro lado, a ampliação da inserção dos movimentos sociais nos espaços públicos
traz grandes contribuições para a consolidação democrática. O desafio dos movimentos
sociais (movimento de bairro, movimento ecológico, movimento feminista, movimento
dos sem-terra e outros) é conciliar a mobilização crítica e a atuação institucional.
3 A Trajetória dos movimentos sociais de Vitória: o contexto em que
emerge o CPV
A proposta de estudar o Conselho Popular de Vitória (CPV) implica na necessidade de
explicitar as características da sua formação e o contexto em que foi criado. Busca-se
no presente capítulo fazer um relato, em linhas gerais, da realidade sócio-econômica do
Espírito Santo, a trajetória dos movimentos sociais de Vitória e a formação do CPV.
A economia do Espírito Santo fora marcada até a década de 70 pelo predomínio da
produção agrícola que representava 54% do PIB, o principal produto cultivado era o
café que utilizava reduzida tecnologia. As atividades industriais representavam pouco
em termos de arrecadação e absorção de mão-de-obra, as mudanças mais profundas
na economia começariam a ocorrer em finais da década de 60 como resultado das
políticas de incentivo à industrialização. Rocha & Morandi (1991) destacam várias
condições que propiciaram esse primeiro processo de crescimento da produção
industrial no Estado do Espírito Santo que traria grandes impactos sociais à cidade de
Vitória. Entre elas vale frisar a aceleração dos investimentos privados em nível nacional;
a criação de importantes incentivos fiscais; a implantação do CIVIT (Centro Industrial de
Vitória) no município da Serra, cidade próxima à capital, que agregaria um grande
número de indústrias de pequeno e médio porte e o movimento imposto pela segunda
fase (1966/67) do processo de erradicação de parte dos cafezais capixabas que
resultou na transferência de recursos monetários para a indenização de alguns
proprietários e forçou ainda mais o processo de formação de um mercado de trabalho
urbano.
Destaca-se também que a partir da década de 70 ocorre a implantação dos grandes
projetos Industriais, tem-se a instalação de uma grande unidade siderúrgica na Grande
Vitória – Companhia Siderúrgica de Tubarão - CST, os projetos de produção de
celulose da Aracruz Celulose e a ampliação da Companhia Vale do Rio Doce – CVRD.
A participação dessas empresas na economia capixaba contribuiria decisivamente para
colocar o Espírito Santo entre os estados industrializados. Como resultado, a economia
do Espírito Santo nos anos 80 seria caracterizada pelos investimentos das grandes
empresas e pelas PMEs (pequenas e médias empresas) que obtiveram um grande
crescimento ao longo do processo de industrialização (PEREIRA, 1998).
A partir da segunda metade da década de 80, a crescente priorização pelo governo
federal das políticas de estabilização, faria com que os recursos para investimentos em
políticas industriais se tornassem cada vez mais escassos. Os apelos industrializantes
sofreriam uma certa desarticulação e teríamos a emergência de um novo “discurso”
voltado para a defesa de uma suposta vocação natural da região capixaba para o
comércio exterior articulado em torno do SINDIEX (Sindicato das Empresas
Importadoras e Exportadoras do Estado do Espírito Santo) e para o desenvolvimento do
setor de serviços como um todo. Essa mudança de perspectiva seria ancorada pelo
plano nacional de abertura comercial e das políticas federais de incentivo às
exportações que motivaram maiores investimentos em infra-estrutura portuária e de
transportes em geral. E, no plano regional, pode ser justificada pelas frágeis respostas
das unidades de capital local ao modelo de crescimento industrial. Desse modo, a partir
dos anos 90 a economia capixaba se voltaria para o setor de serviços, com destaque
para o comércio exterior, com localização em sua maioria na cidade de Vitória
(PEREIRA, 1998).
Do ponto de vista social o processo de erradicação dos cafezais provocou o
desemprego no campo e estimulou o deslocamento de grandes contingentes
populacionais para áreas urbanas, atraídas por novas perspectivas de emprego. O
intenso processo de urbanização pode ser notado pelo fato de que até a década de 60
a população rural do Estado representava cerca de 64,21% da população, em fins de
70 esse número se inverte com a preponderância da população urbana, concentrada
principalmente nos municípios da Grande Vitória (AFONSO & FERRAZ, 1993, p. 19).
Gomes (1998) afirma que apesar dos grandes projetos terem contribuído para a
elevação das taxas de crescimento industrial e da população urbana, essa estratégia de
desenvolvimento não correspondeu às expectativas esperadas, uma vez que a
implementação desses projetos trouxe pouco impacto para a economia local como um
todo por se limitar principalmente à sub-região da Grande Vitória e não absorver toda a
mão de obra disponível.
A capital Vitória se consolida como centro administrativo, comercial e urbano, mas a
pouca infra-estrutura para atender o enorme contingente populacional levaria à
ocupação desordenada das áreas de morros e mangues com a formação de grandes
bolsões de pobreza. Esse contexto contribuiria para um fecundo processo de
organização e participação política de diferentes segmentos sociais. Ao longo dos anos
60 e 70 tivemos o surgimento dos movimentos populares, novas lideranças e a
retomada do movimento sindical no estado (HERKENHOFF, 1995).
O governo estadual através da recém criada Secretaria de Serviços Sociais em 1969
teve um grande papel na criação dessas associações através de atividades
assistenciais e aplicação de subvenções públicas nas comunidades. A estratégia da
secretaria era atender às necessidades mais imediatas da população e, através de um
discurso de participação comunitária, legitimar os grandes projetos de industrialização
(AFONSO e FERRAZ, 1993, p.20).
Afonso e Ferraz (1993) afirmam que a atuação da secretaria na destinação de verbas
públicas para as comunidades estimulou o surgimento de organizações comunitárias, a
existência destas organizações era fundamental para que o bairro recebesse verbas.
Essa atuação da secretaria contribuiu para que o perfil de grande maioria dos
movimentos de bairro entre as décadas de 60 e 70 fosse de caráter assistencialista e
sem grandes vínculos com a população do bairro. As autoras acrescentam que os
estatutos destas entidades seguiam um modelo preparado pela secretaria que as
assessorava no planejamento e aplicação de verbas. Como resultado, muitas entidades
comunitárias eram ligadas à políticos locais e apoiadas pelo governo que desenvolvia
uma política clientelística nos bairros, tendo as entidades apenas como seu suporte
local. Como resultado, Herkenhoff afirma que: “Apesar da proliferação dos movimentos
sociais na década de 70, tais movimentos não se expressaram significativamente a
ponto de influenciar as decisões sócio-políticas e econômicas do Estado”
(HERKENHOFF, 1995, p. 41).
A prefeitura de Vitória através da “Divisão de Comunidade”, órgão ligado à secretaria de
Serviços Sociais, também detinha fortes vínculos com as entidades organizadas de
bairro. Afonso e Ferraz (1993, p. 20) afirmam que:
Os movimentos organizados de bairro em Vitória, entre as décadas de 60
e 70 surgiram sob forte influência do poder público estadual e municipal,
contando com um trabalho menor da igreja que estava mais fortemente
organizada nos municípios de Vila Velha e Serra.
Os movimentos de esquerda também não tiveram grande atuação na cidade de Vitória,
devido ao perfil social da cidade, composta pela população de classe média e
segmentos mais pobres, aglomerados em favelas nos morros e manguezais. Essa
realidade contribuiu para que “as associações de moradores se tornassem presas
fáceis das políticas clientelistas empreendidas pelo poder público” (AFONSO &
FERRAZ,1993,p. 20).
Somente a partir de meados dos anos 70 constituem-se na cidade de Vitória
associações comunitárias independentes e autônomas. Os movimentos sociais passam
a ser ancorados por agentes externos, a igreja Católica através das Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs) torna-se a principal articuladora. Estas passam a contribuir na
formação dos movimentos e conscientizá-los de suas carências. Ao longo dos anos 80
realizam várias lutas pela legalização das áreas urbanas ocupadas, pela melhoria nas
condições de infra-estrutura da periferia e na qualidade de serviços de saúde e de
educação (GENTILLI, 1987)
21
. Como resultado, o governo do Estado altera a sua
estratégia e passa a reduzir a sua interferência nos movimentos sociais cortando
subsídios financeiros e assessoria técnica. Doimo (1984) destaca que o clima de
abertura política favoreceu e intensificou a organização de movimentos sociais em todo
21
Nesse período houve um grande crescimento do associativismo comunitário, o número de associações
comunitárias existentes na cidade passou de 15 associações durante as décadas de 60 e 70 para 86 em
fins da década de 80 (AFONSO et al, 1990).
o Brasil, permitindo criar alternativas ao padrão de relacionamento marcado pela
cooptação e submissão.
A partir da primeira metade dos anos 80, as lideranças de movimentos de bairro de
Vitória iniciam uma discussão baseada nos exemplos de municípios vizinhos,
principalmente a Serra, com a Federação das Associações de Moradores e Vila Velha
com o Conselho Comunitário, para a formação de uma entidade que aglutinasse os
movimentos de bairro do município. A iniciativa foi da Secretaria Especial Municipal de
Ação Social que em 1983 promovia reuniões com o prefeito, secretários e as entidades
de bairro para discussão dos problemas nos bairros e sugeriu a criação de um
Conselho da prefeitura, envolvendo as entidades de bairro. Essa formatação não foi
adiante e membros do Centro Comunitário da Ilha de Santa Maria, com a liderança do
Sr. Ítalo Batan, lideranças do bairro de Maria Ortiz, Inhanguetá, São Benedito, Santo
Antônio e Eucalipto optaram por formar uma entidade independente (AFONSO et al,
1990).
Desse modo, em 1986, foi criado o Conselho Popular de Vitória, cujos objetivos eram:
representar as entidades de bairro nas diversas frentes de trabalho do município e do
Estado, fortalecer o movimento popular de caráter reivindicatório e político e unificar o
movimento em nível do município, respeitando a autonomia de cada entidade
(AFONSO et al, 1990). De acordo com Herkenhoff (1995, p. 154) o CPV se propunha:
“[…] democratizar as relações sociais e políticas, lutar pela autonomia do movimento e
pelo exercício da cidadania, denunciar a estratégia política do Estado e renovar
constantemente as lideranças”.
Gohn (1995) afirma que a temática dos conselhos populares surgiu no Brasil nos anos
80 e tinha como núcleo central a questão da participação popular. Destaca que os
conselhos foram reivindicações feitas pela sociedade civil ao longo das décadas de
lutas contra o regime militar e expressou a marca da idéia de democratização nas
diversas prefeituras. Esclarece que são vários os entendimentos sobre o seu
significado:
Os conselhos populares foram propostas dos setores da esquerda ou de
oposição ao regime militar, e surgiram com papéis diversos tais como:
organismos do movimento popular atuando com parcelas de poder junto
ao executivo (tendo a possibilidade de decidir sobre determinadas
questões de governo); organismos superiores de luta e de organização
popular, gerando situações de duplo poder; organismos de administração
municipal criados pelo governo para incorporar o movimento popular ao
governo, no sentido de assumirem tarefas de aconselhamento,
deliberação e/ou execução (GOHN, 1995, p. 75).
Na cidade de Vitória o CPV foi pensado como organismo superior de luta e organização
popular estruturado a partir de movimentos sociais da sociedade civil e composto
principalmente por entidades de bairro. A constituição do CPV significou a tentativa de
organizar e direcionar as lutas políticas, antes dispersas e fragmentadas. Afonso e
Ferraz (1993, p. 21) afirmam que:
A criação do Conselho Popular foi um marco importante para o
movimento em Vitória, que buscando uma verdadeira autonomia passou a
romper com práticas clientelistas anteriores, mudando aos poucos o perfil
do relacionamento entre os movimentos de bairro e o poder público.
Contudo, esta mudança no perfil de participação levou a uma maior presença da
administração municipal nos movimentos de bairro. Herkenhoff (1995) afirma que a
gestão Hermes Laranja (1986-1988) estabeleceu uma postura de desestabilização e
desmobilização das organizações populares. O objetivo era desarticular os movimentos
de bairro mais combativos e estimular a criação de associações paralelas, cooptando
lideranças com a oferta de cargos e empregos públicos e a realização de pequenas
obras nos seus bairros. Para combater o CPV, a administração municipal criou o
Conselho Comunitário de Vitória (CCV), coordenado pelo secretário da pasta de Ação
Social da PMV. Este conselho tinha o objetivo de apoiar as ações do prefeito através da
distribuição de alimentos à famílias carentes e de conseguir empregos para lideranças
comunitárias que não estivessem associadas ao CPV. O CPV perdeu um número
grande de filiações e entre os movimentos de bairro agravou a concorrência pela
distribuição de recursos públicos.
Como resultado tivemos à divisão e fragmentação dos movimentos de bairro e a
redução da capacidade de pressão junto ao Poder Público. Na pesquisa realizada por
Afonso et al (1990) temos o resultado desta estratégia política em números: em 1989
havia um total de 86 associações de bairro para 69 bairros registrados na cidade de
Vitória. A pesquisa também indicou que 44,1% dos presidentes de associações de
moradores eram funcionários públicos e 55,8% das associações possuíam convênio
com um ou mais órgãos públicos (AFONSO et al, 1990).
As autoras afirmam que a legitimidade dos movimentos de bairro foi dada mais por sua
capacidade de manter um bom relacionamento com o poder público, obtendo bens e
melhorias para o bairro do que pelo potencial de mobilização dos representados.
Acrescentam que:
Antes que as associações conseguissem angariar bases suficientes que
lhes permitissem mostrar seu potencial de luta, elas já estavam presas
numa rede que as levava ao oportunismo, trocando seus objetivos de
longo prazo por pequenas melhorias, que às vezes beneficiavam apenas
um ou outro líder do movimento (AFONSO & FERRAZ, 1993, p. 21).
Na mesma direção, avalia Oliosa (1999, p. 70):
[...] se é inegável o avanço alcançado pelo movimento através de
experiências que buscaram romper com as formas tradicionais de
organização, é visível também que estas não foram superadas, passando
a coexistirem, às vezes num mesmo movimento. Nem os movimentos
combativos estiveram imunes ao clientelismo e à cooptação.
Esse exame deixa claro que o perfil de associação dos movimentos de bairro da cidade
de Vitória, ao longo da década de 1980, fora marcado:
[...] por um movimento popular desarticulado, desmobilizado de suas
bases, dependente em grande medida do apoio e de ações do poder
público e das lideranças comunitárias na realização de suas propostas e
reivindicações, apesar do ciclo de mobilização vivido em meados desta
mesma década e, sobretudo, da existência de algumas lideranças e
entidades com propósitos e atitudes mais democráticas (CARLOS, 2006,
p. 4).
A partir da eleição do prefeito Vitor Buaiz, do Partido dos Trabalhadores (1989-92), o
CPV e as associações de bairro são convidados a pensar e compartilhar a gestão da
cidade. A proposta da Frente Vitória fundamentava-se em três princípios gerais:
moralização, participação/democratização e descentralização. A intenção, ancorada
pelo processo de democratização brasileiro, era introduzir novas formas de
gerenciamento da coisa pública (AFONSO & FERRAZ, 1993). Buscava-se reforçar a
participação e a autonomia dos movimentos de bairro através da maior acessibilidade
da população à administração municipal. A ênfase dada ao princípio da participação foi
ancorada na discussão do orçamento com as comunidades e na formação dos
Conselhos Setoriais (canais institucionais previstos na Lei Orgânica do Município).
Bank (1998) afirma que a gestão Vitor Buaiz assinalou o auge de um associativismo
comunitário marcadamente popular, sob o amparo de uma coalizão de atores situados
estritamente no campo da sociedade organizada (PT, Movimentos Comunitários,
Sindicatos, Igreja Católica etc.). E a partir de 1989, centrado na organização vertical
das entidades de bairro em torno do Conselho Popular de Vitória (CPV) a gestão Buaiz
instituiu o processo de formulação do Orçamento Participativo.
A criação dos Conselhos Gestores (saúde, meio ambiente, transporte, ciência e
tecnologia, criança e do adolescente, PDU - Plano Diretor Urbano) também foi uma
importante estratégia da administração petista. Estes eram compostos por
representantes do poder público e da sociedade civil (usuários e trabalhadores, a
maioria membros do CPV e prestadores de serviço de cada setor).
Afonso e Ferraz (1993) estudaram a participação popular no Conselho Municipal de
Saúde de Vitória e através de entrevistas buscou mapear a opinião dos atores sobre a
participação popular no espaço do Conselho. O secretário de saúde da gestão Vitor
Buaiz afirmou que:
“[...] como os conselhos [gestores] não foram criados por uma
necessidade de demanda eles não foram exigidos e sim foram criados por
determinação política da própria administração, ampliando enormemente
os canais de participação popular, eu acho que o movimento popular de
Vitória não estava organizado para ocupar esses espaços [...] (AFONSO
& FERRAZ, 1993, p. 26).
Torna-se importante destacar que a criação do Conselho Municipal de Saúde de Vitória
deu-se por iniciativa exclusiva do Poder Executivo Municipal, principalmente na figura
do dirigente político da Secretaria Municipal de Saúde, como desdobramento das
discussões nacionais em torno da reforma sanitária.
Do lado dos movimentos populares, representados pelo CPV, a presidente, Fátima
Santos (1991-92), destacou que:
[...] a nossa participação na criação dos conselhos - que foram criados
vários conselhos- se deu de forma diferente. Em nenhum momento a
administração, um conselho que existia dos secretários e prefeitos, nos
chamou para conversar sobre isso. [...] a Secretaria mandava
correspondência para nós dizendo que iria criar o Conselho, que era
importante a nossa participação, que se nós tivéssemos interesse era
para aproveitar, marcava a data e nós tínhamos que levar “X” delegados.
[...] Agora, na questão da própria composição dos conselhos nós nunca
fomos chamados [...](AFONSO & FERRAZ, 1993, p. 26).
Em um outro estudo realizado pelo Cecopes – Centro de Educação e Comunicação
Popular do Espírito Santo (1992) o CPV avaliou sua atuação nos diversos espaços
criados na gestão Buaiz e apontou alguns avanços:
O movimento popular adquiriu maior reconhecimento e força política; o
CPV conseguiu abrir e ocupar espaços e manter sua autonomia diante do
poder público, fortaleceu-se e acumulou experiência, participa hoje de
alguns Conselhos Municipais [...]; articula-se em âmbito estadual com a
Federação dos Movimentos Populares do Espírito Santo (Famopes) e em
âmbito nacional participou da criação da Central de Movimentos
Populares (CMP) em outubro de 1993 (CECOPES, 1992, apud
HERKENHOFF, 1995, p. 134).
Mas também destacou alguns limites na sua trajetória de participação:
O movimento popular não acompanhou o ritmo da Administração da
Frente Vitória – não possuía propostas concretas para as políticas de seu
interesse, acabava discutindo as propostas da PMV, e não sabia como
cobrar e fiscalizar os acordos estabelecidos. Como a PMV oferecia
respostas imediatas às suas necessidades, as entidades atendiam mais
aos convites da PMV do que do próprio CPV (CECOPES, 1992, apud
HERKENHOFF, 1995, p. 134).
O trabalho de Afonso e Ferraz (1993) analisou as propostas e projetos de participação
popular desenvolvidos pela gestão petista no município de Vitória e concluiu que, no
período, houve um aumento dos canais de participação da população nas discussões e
decisões relativas à vida do Município, uma maior democratização do poder local e
modificações nas relações entre poder público/sociedade civil. Contudo, assinala que
foi uma experiência permeada por problemas e limitações de diversas ordens, devido “a
fragilidade do movimento organizado no município e as experiências anteriores
calcadas em relações clientelistas com o poder público” (AFONSO & FERRAZ, 1993, p.
50-53).
A fragilidade do movimento repercutiria nas três gestões seguintes (1993-2004) que
seriam administradas pelo PSDB. Nota-se que o movimento seguiria as diretrizes dos
projetos políticos dessas administrações, sem grandes questionamentos, mesmo que
implicasse em dar outros sentidos à participação.
A gestão Paulo Hartung (1993-96) foi marcada pela discussão do planejamento
estratégico da cidade, através do Projeto Vitória do Futuro, Plano Estratégico da
Cidade, 1996-2010. Através de financiamento do setor privado, o projeto buscava
construir uma agenda de longo prazo para o desenvolvimento da cidade e envolveu o
público comunitário, associações filantrópicas, vereadores, deputados, funcionários
públicos, acadêmicos, igrejas, etc., numa tentativa de conciliar a participação com um
planejamento técnico eficiente. (NACIF,1996; TATAGIBA, 2003).
Sua gestão daria grande destaque aos canais de participação da sociedade civil, tendo
como ênfase o Orçamento Participativo que passaria a se chamar Orçamento Popular.
Segundo Sampaio (2005) esta mudança de nome visava desvincular esta política da
gestão anterior e apresentar o OP como algo mais amplo, mais ligado aos problemas
da cidade e não apenas ao caráter participativo em si. Afirma que “A nova gestão do
PSDB queria desvincular o OP de uma política pública que dependesse somente da
participação da população e colocá-la como uma política central, com um aspecto mais
estratégico” (SAMPAIO, p. 132, 2005) e fortalecer as instâncias representativas de
governo, de modo que a participação popular fosse entendida como reforço à
democracia representativa e não como sua negação (NACIF, 1996). Neste sentido,
Wampler (2003) afirma que os compromissos políticos da administração com a
instituição criada pelo governo anterior foram reformulados para se ajustar a um outro
projeto político e a uma outra ordem de prioridades.
A PMV privilegiou as instâncias representativas como o CPV e FAMOPES – Federação
das Associações de Moradores do Espírito Santo, para integrarem de forma decisiva e
dar maior visibilidade às ações implementadas pela prefeitura e acompanhar a
execução das obras do OP. Para a nova gestão um debate democrático significava
preparar a Prefeitura para receber o OP e abusar da propaganda para que a população
tivesse conhecimento do processo de discussão do Orçamento (SAMPAIO, 2005).
As duas gestões seguintes (97/2000 e 2001/2004) teriam à frente do poder o prefeito
Luiz Paulo Vellozo Lucas também do PSDB, que asseguraria a continuidade da
proposta do OP, mas faria mudanças decisivas em seu formato institucional. Nesta
gestão, os movimentos populares, principalmente o CPV, seriam indiretamente
excluídos do processo.
Tatagiba (2003) afirma que em seu Programa de Governo,
intitulado Avança Vitória, (1996), Luis Paulo Veloso Lucas afirma a intenção de dar
curso à reforma gerencial da Prefeitura de Vitória, alterando o padrão de relação da
administração municipal com os segmentos organizados, visando dotar de eficiência e
agilidade a máquina pública. “Seria por um lado, a adoção de estratégias de gestão do
setor privado, e, por outro, o incremento da participação popular” (TATAGIBA, 2003, p.
86).
No primeiro ano de governo (1997) como fruto de uma discussão interna da PMV, foram
instituídas as Administrações Regionais, com status de "Mini - Prefeituras", ao todo
seriam sete regiões administrativas que obedeceriam às divisões das antigas regionais
de obras, mas não se constituíram como administrações descentralizadas oficialmente.
O "prefeitinho" seria um representante do prefeito em cada uma das sete regiões da
cidade e teria como função principal acompanhar a execução e o trabalho das obras, o
funcionamento dos serviços privados e também discutir o OP em sua região. O
administrador regional seria uma espécie de gerente desse orçamento, o responsável
pela execução e acompanhamento das prioridades tiradas no processo de orçamento
popular (SAMPAIO, 2005).
O formato do OP também sofreria modificações, Sampaio (2005) afirma que depois da
realização de todas as assembléias de bairro, seria consolidado não um único
orçamento de Vitória, mas sete orçamentos, cada qual de uma regional. O objetivo era
tentar convergir às prioridades por bairro com as prioridades por região. Destaca
também que além dessa mudança, numa tentativa de que o delegado ampliasse seu
leque de funções, foi acordado entre PMV e CPV que a partir desse momento o antigo
"delegado do OP" passaria a "coordenador do OP". Esse coordenador iria acompanhar
o gerenciamento das obras e projetos e iria fazer um relatório periódico à PMV sobre o
andamento daquelas prioridades, seria uma espécie de gestor, um fiscalizador das
prioridades do bairro.
Neste mesmo ano de 1997 o Projeto Terra seria implantado com o objetivo de atuar na
área da habitação e na reurbanização dos morros através de uma parceria com a
União, a Caixa Econômica Federal e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES). Esta experiência do Projeto Terra ganhou reconhecimento nacional
em 2001, com o Prêmio “Melhores Práticas em Gestão Local”.
Ao longo das duas gestões da administração Velozo Lucas, verifica-se que o OP fazia
parte da estratégia política deste governo, mas apesar de ter fomentado as
assembléias do OP e a escolha das obras prioritárias (1997-1999) estas não foram
realizadas, transformando o processo num momento de grande insatisfação para os
participantes. Para amenizar a insatisfação e sustentar a imagem do OP, que de certa
forma, era positiva para a PMV, no ano de 2000 (ano de eleição em que o prefeito
disputaria a reeleição) foi aprovado o projeto de Lei Ítalo Batan nº 5165, que garantia a
institucionalização da discussão do Orçamento Municipal, aprovado em 11 de julho de
2000.
Contudo, nota-se que a prioridade da administração nas duas gestões do prefeito Luiz
Paulo Velozo Lucas foi o Projeto Terra. Sampaio (2005) afirma que
a PMV repassa para
o Projeto Terra alguns princípios do OP, criando uma estrutura semelhante, com um
enfoque participativo e democrático, substituindo aos poucos o OP. Em um documento
de apresentação do Projeto Terra a PMV
esclarece:
Os moradores participam do planejamento à execução, passando pela
fiscalização das obras e serviços. Nas visitas dos técnicos às
comunidades, moradores e entidades que os representam indicam, in
loco, os problemas mais graves e as alternativas de solução. No
cruzamento dos saberes técnico e popular, estabelecem-se as
intervenções e os custos. A população assume o papel de co-autora do
Projeto Terra, o que torna sólida a relação dela com a nova vida
construída (Disponível em www.vitoria.es.gov.br/projetoterra. Acesso em:
05/09/2004).
Ao final da gestão os líderes comunitários acusavam a PMV de usar o OP para se
promover através da mídia, pois a maioria das obras não foram executadas. Segue
abaixo, a fala de uma liderança do CPV em entrevista concedida a Sampaio (2005).
[...] o Projeto Terra tinha áreas definidas da cidade, diferente do OP que
você tem a participação da cidade toda. Então, na minha maneira de ver,
o Projeto Terra, enquanto a "menina dos olhos", o "carro chefe" da gestão
Luís Paulo, cessou a participação popular enquanto instrumento como
ferramenta da gestão democrática da cidade. O Projeto Terra veio
encerrar a participação em algumas comunidades.
Veja bem (...) Em Primeiro lugar, por parte da PMV, ela não tinha
interesse em está divulgando o OP pra cidade, em está mobilizando a
cidade pra participar do OP. Em segundo, a câmara que foi cooptada pela
PMV. Em terceiro, grande parte das lideranças comunitárias foram
cooptadas. Essas três coisas foram obstáculos para o OP. Foi o que eu te
falei, sobre investimentos e falta de planejamento e visibilidade das obras.
Era mais interessante pra eles fazer o calçadão da praia, que dá muito
mais visibilidade (Entrevista realizada em 19 de janeiro de 2005 a
SAMPAIO, 2005, p. 63).
Tatagiba (2003, p. 87) considera que os padrões de interação entre governo e
sociedade, em Vitória, através da análise panorâmica do funcionamento do Orçamento
Popular, dos conselhos municipais de Ação Social, Saúde, e Criança e Adolescente,
além de um primeiro reconhecimento dos padrões de funcionamento das
Administrações regionais, sugere:
[...] a persistência dos padrões clientelistas e autoritários de relação entre
governo e sociedade, mesmo na vigência desses arranjos inovadores de
gestão. Em Vitória uma cultura ainda fortemente patrimonial e clientelista
sobreviveu – atualizando-se - às reformas gerenciais e modernizantes a
que foi submetida a máquina pública municipal, e aos novos arranjos
participativos voltados a democratização da relação entre governo e
comunidades.
Carlos (2006a) afirma que a não sustentação e efetividade democrática do orçamento
participativo em Vitória pode ser analisada em sua interface com os projetos políticos
desses governos. Afirma que:
Confinado a um sentido instrumental e legitimador da participação e, por
outro lado, com excessivo protagonismo governamental, o orçamento
participativo em Vitória sob os auspícios de um projeto político autoritário
e centralizador não favoreceu a vivencia de práticas educativas e
politizadoras de democracia participativa por parte dos atores societais,
capaz de qualificar a cidadania para o exercício autônomo da tomada de
decisões e para a responsabilização e controle social dos agentes
públicos (CARLOS, 2006a, p. 08).
Face a esse cenário pode-se afirmar que o modo como o movimento popular se
posiciona seria um elemento importante para alterar esse quadro, contudo notou-se que
os movimentos populares urbanos, em específico o CPV, não atuaram de forma incisiva
para reverter o cenário de atraso e não realização das obras do OP. Podendo afirmar
que ocorreu a institucionalização e a cristalização desses atores sob lógicas
corporativas, ou seja, a desmobilização ocasionada não pelo desgaste, mas pela
cooptação do movimento. Examinar o CPV, abordando seus interesses e estratégias de
participação frente ao cenário descrito acima será um dos objetivos do próximo capítulo.
4 A trajetória do CPV – 1986-2004: perfil de atuação do movimento
A proposta deste capítulo é fazer uma análise do Conselho Popular de Vitória – CPV e
de sua trajetória, da sua fundação em 1986 até o ano de 2004 quando encerra uma
gestão completa do CPV. Através da leitura de documentos (atas, a partir de 1995,
jornais e materiais diversos) e entrevistas busca-se descrever as principais inflexões e
práticas sociais do CPV ao longo deste período. Mais especificamente busca-se
responder: Como se relaciona com o poder municipal? Quais interesses, demandas,
bandeiras o CPV representa? Como ente federativo, qual é o seu papel junto às
associações de moradores e movimentos populares?
Ao longo da pesquisa encontramos dificuldades para ter acesso aos registros da
trajetória do movimento. O CPV não possui muitos documentos produzidos e muitos
deles se encontram dispersos entre suas lideranças e ex-lideranças. Os principais
materiais de pesquisa foram as atas com registro a partir de 1995 e o Jornal da
entidade que teve início em 1997. O registro de suas atividades até 1995 se deu
principalmente pelas entrevistas realizadas.
A entidade fez neste ano de 2007 vinte e um anos de existência. Surgido em meio à
efervescência dos movimentos sociais da década de 80 e tendo por objetivo fortificar e
unir as diferentes lutas, em torno, principalmente, dos movimentos de bairro do
município, sofreria ao longo de sua trajetória transformações organizativas e políticas.
A proposta inicial do CPV era representar as associações de moradores e movimentos
comunitários, entidades culturais e associações esportivas da cidade de Vitória.
Contudo, ao longo da sua trajetória as lideranças do movimento passaram a defender
que a diversificação dos objetivos do CPV não fortalecia a entidade e deveriam
restringir o foco de atuação, desse modo, a partir de 2003 sua composição passa a ser
os movimentos e associações de bairro da cidade de Vitória, em 2004 eram 130
entidades de bairro filiadas.
Idealizado pelas lideranças dos movimentos de bairro da cidade de Vitória e inspirado
nos municípios da Grande Vitória que possuíam Conselhos ou Federações de
Movimentos Populares
22
, os encontros para a sua formação tiveram início em 1983 com
a participação de várias lideranças de bairro e membros das Comunidades Eclesiais de
Base. Através das suas relações com o movimento sindical e partidos, principalmente
de esquerda (PT, PCB), foram realizadas várias reuniões com debates intensos para
definir os objetivos de luta e a direção do movimento. Uma edição especial do jornal do
CPV (março, 2001) (ANEXO B) na qual resgata a criação e a trajetória do movimento,
destaca que:
Não havia diálogo entre comunidade e poder público. Era o período dos
governos biônicos, indicados pelo Governador. As obras e projetos eram
voltados para os bairros nobres e as regiões carentes eram desprezadas.
As comunidades não eram ouvidas. Preocupados com esse descaso
iniciou-se a mobilização para a criação do CPV, no sentido de cobrar
ações do poder público e fortalecer o movimento popular (O POPULAR,
2001, p. 2)
O CPV na sua fundação fora pensado como um conselho independente e apartidário
tendo como requisito para a participação de seus membros a não ocupação de cargos
políticos. Sua bandeira de luta centrava-se na construção de uma entidade que
agregasse e fortalecesse o movimento popular na cidade de Vitória para unificar e
ampliar suas reivindicações e dar suporte e orientação às associações:
O objetivo era unificar as lutas para fortalecer as demandas de água, saúde,
iluminação pública, segurança, transporte coletivo, temas de interesse universal,
etc., isso seria importante que fosse discutido com um grupo mais forte
(entrevista nº 03).
[...] dá sustentação e orientação às comunidades (entrevista nº 04).
Neste espaço as comunidades teriam voz e voto para decidirem em conjunto
(entrevista nº 01).
22
Torna-se importante destacar que o apoio das entidades do movimento popular dos municípios
vizinhos foi fundamental para a estruturação do projeto de formação do CPV. Contaram principalmente
com o apoio do Conselho Comunitário de Vila Velha e a Federação de Movimentos populares e
Associações de Moradores da Serra (Jornal O POPULAR, março, 2001, p. 2).
Nas entrevistas realizadas as lideranças que participaram da fundação do CPV,
destacam o importante momento histórico que vivenciaram ao unirem as associações
em torno de lutas, muitas delas vitoriosas, e por terem contribuído para uma inflexão na
trajetória dos movimentos populares da cidade de Vitória, ao ser criado como “um
conselho independente que não tinha relação direta de atrelamento com a prefeitura”
(Entrevista nº 1). No primeiro momento assumiram uma postura autônoma em relação
ao poder público e posteriormente, com o processo de abertura política, participaram da
criação e institucionalização de novos canais de participação, conforme enfatizou um
entrevistado:
Eu acho que o CPV teve o papel de mobilização dos movimentos sociais
em um momento histórico, início da década de 80, que era um momento
independente (entrevista nº 6).
[...] a história política de Vitória mudou com a construção do CPV. [...]
participamos do processo de democratização da cidade através da
criação desses instrumentos de participação, conselhos, OP, vivemos um
momento de transformação da cidade, primeiras eleições aconteceram,
as eleições diretas, o momento da fundação do CPV, foi um momento de
ebulição, muita coisa acontecendo (Entrevista nº 1).
A mudança na forma de articulação com o poder público ao longo da sua trajetória
impactaria no perfil de atuação e articulação do movimento, conforme expressa uma
liderança:
Muita mudança, ocorreu uma metamoforse, o CPV muda muito em cima
do caráter de sua liderança, em relação a linha partidária, projetos, CPV é
um órgão flutuante (Entrevista nº 7)
.
Descrever e analisar sua trajetória com o olhar na sua relação com o poder público e
movimentos que representa será o intuito deste capítulo.
4.1 Estrutura organizacional
Nos primeiros anos de fundação o Conselho Popular de Vitória foi dirigido por uma
comissão coordenadora provisória a quem coube conduzir o processo de discussão
para a elaboração do estatuto, realizar o congresso e a eleição que ocorreria em 1986.
A composição do CPV, a partir da sua primeira eleição em 1986
23
, constitui-se pela
diretoria executiva
24
, conselho fiscal
25
e diretoria de departamentos
26
. O mandato
compreende dois anos e, segundo o seu Estatuto (2003), (ANEXO A) a eleição para a
nova chapa é realizada através de um congresso que ocorre a cada dois anos, sempre
nos primeiros meses do ano. O congresso tem o objetivo de: (a) Eleger e empossar a
diretoria executiva e o conselho fiscal; b) Determinar o programa e a linha de atuação
do CPV para a próxima gestão; c) Atualizar os princípios e estatuto do CPV.
No congresso são eleitos a diretoria executiva e o conselho fiscal. Os representantes
regionais, até o ano de 2003, eram eleitos nos congressos, a partir das modificações do
Estatuto neste ano passam também a serem eleitos, com os diretores de departamento,
em data posterior ao congresso. Os representantes regionais são eleitos nas
regionais
27
no prazo máximo de trinta dias e somente as entidades filiadas tem direito à
23
No período anterior a 1986 não encontramos documentos que relatam a composição do CPV em termos de
diretoria, conselho fiscal e departamentos.
24
Formada por presidente e vice-presidente; primeiro e segundo secretários; primeiro e segundo
tesoureiros e representantes regionais em número de sete, segue a divisão realizada pela prefeitura
através das administrações regionais.
25
O Conselho Fiscal é composto de três membros titulares e três suplentes e possui as seguintes
competências: “a) Emitir pareceres pertinentes as contas e balanços inclusive de conclusão de mandatos
da diretoria”; b) Examinar mensalmente os livros, a contabilidade, as doações e outros emitindo parecer
para a diretoria; c) Apreciar o balancente mensal das atividades financeiras da entidade; d) Fiscalizar a
aplicação e destinação financeira da entidade (Estatuto).
26
As diretorias de departamento são assim formadas: diretor de relações públicas; diretor de saúde e
saneamento; diretor de habitação e urbanismo; diretor de transportes; diretor de meio ambiente; diretor
de cultura e esportes; diretor de assuntos da mulher; diretor jurídico; diretor de educação; diretor da
terceira idade; diretor de formação política e social; diretor da infância e juventude; diretor de geração de
empregos e renda; diretor financeiro e patrimônio; diretor para assuntos cooperativistas; diretor de
turismo e hospitalidade; diretor de eventos. A partir do ano de 2003 foi acrescentada a diretoria de
segurança pública e ocorreu a separação das diretorias de Esporte e Cultura. Segundo o Estatuto
compete a cada diretor de departamento a implantação e a coordenação das políticas inerentes a sua
pasta e ser um dos representantes do CPV nos respectivos conselhos setoriais municipais ou estaduais
(Estatuto CPV, 2003).
27
Na cidade de Vitória os bairros estão divididos entre sete regionais.
voto. Os diretores de departamentos são indicados no prazo máximo de sessenta dias
após o congresso, pela diretoria executiva. Ao todo são 25 departamentos que tem a
função, segundo uma de suas lideranças, de “descentralizar, trazer a movimentação
das comunidades e propor atividades ” (Entrevista n.º 4).
O congresso orienta-se por um regimento interno deliberado e aprovado em uma
assembléia geral trinta dias antes da data do congresso. Neste regimento constam os
critérios de participação das entidades filiadas e a pauta do congresso. Conforme
definição do Estatuto, tem direito a voto e ser votado os delegados eleitos em
assembléia específica de sua entidade, são três por entidade. A entidade precisa estar
filiada ao CPV por um tempo mínimo de doze meses para encaminhar delegados.
(Estatuto CPV, p.03, 2003).
No decorrer de sua trajetória, contudo, o congresso deixou de ser um espaço para
discutir a linha de atuação e a direção do movimento para focar quase que
exclusivamente na escolha das novas lideranças. Um entrevistado assim se expressou:
O congresso só serve para eleger presidente e nada mais, as pessoas
nem sequer se atém às palestras, [...] não querem debater, queriam que
passasse rápido para as eleições (Entrevista nº. 07).
Torna-se importante destacar que nesses congressos há uma grande participação das
lideranças de bairro, no geral, todas as entidades de bairro filiadas elegem de dois a
três delegados para participarem, resultando num público de 100 a 200 pessoas.
Contudo, a falta de debates mais amplos nos congressos se reflete no perfil de atuação
do CPV que, comparado as lutas iniciais do período de sua fundação perde ao longo da
sua trajetória a capacidade de ser um espaço agregador das discussões das
comunidades e associações de bairro.
O trabalho de articulação com as entidades filiadas ocorreu de forma mais intensa nos
primeiros anos de sua fundação, realizavam reuniões nos bairros e havia um número
maior de assembléias. A partir da década de 90 as assembléias limitam-se às eleições
para escolha da nova diretoria e o contato com as entidades acontecem
esporadicamente, geralmente nas eleições em que a associação solicita a presença de
um representante do CPV e nas visitas ou eventos realizados nos bairros pela
prefeitura que contam com a presença do CPV. O que repercute na agenda do
congresso que não fomenta debates e reflexões para traçar o projeto do movimento e
direcionar suas ações.
Constata-se também a presença nos congressos de vereadores, lideranças partidárias
e, na maioria das vezes, do prefeito, que possui influência na eleição da diretoria. Uma
ex-liderança afirma que essa interferência faz parte da trajetória do movimento:
Acho que hoje, sem sombra de dúvida, acho que o conselho é composto,
hoje, ontem, a composição dele é feita de acordo com os interesses do
chefe do executivo. Isso nós não conseguimos acabar [...] a composição
da diretoria reflete o que o chefe do executivo municipal quer, ele interfere
na composição. Como provo isso, na administração Hermes Laranja que
foi sucedida por Vítor, saímos do Hermes com uma composição para uma
composição que o Vítor tinha interesse, composição de mais esquerda,
tinha PC do B, PT. Saímos da administração do Vítor e fomos para o de
Paulo Hartung a composição deu uma guinada, estava todo o PSDB e os
partidos da direita na administração do CPV. Eu fiquei mas era minoria.
Quando entra João Coser, hoje já muda por completo, você vai lá
estamos lá dentro [partidários do PT], não é a maioria, mas uma boa parte
da diretoria, presidente já foi uma influência do prefeito. Não se discute o
presidente sem discutir com o prefeito (Entrevista n.º 3).
Através da análise das atas verifica-se que ao longo dos anos essa influência se torna
maior passando também a direcionar a própria agenda do movimento em termos de
suas bandeiras de luta. Essa realidade nos faz refletir sobre a capacidade de autonomia
do movimento. Por autonomia entendemos a capacidade de sustentar opiniões,
estabelecer acordos e defender posições sem coações, permite a deliberação
democrática e a participação efetiva (ZORZAL, 2002). A falta de uma maior direção ao
movimento devido ao enfraquecimento de sua base de apoio, as associações de bairro,
e a proximidade com o poder público que gerou ao longo dos anos uma relação de
dependência, faria com que o CPV se tornasse uma entidade de apoio às ações da
prefeitura, provocando grandes impactos sobre o perfil de atuação do movimento.
A periodicidade das reuniões do CPV e a participação dos filiados é um importante
elemento que pode contribuir para a autonomia do movimento. Verifica-se que em
períodos de organização de congresso as reuniões são mais freqüentes. No período da
sua fundação e durante as primeiras gestões, as reuniões ocorriam semanalmente com
a diretoria e lideranças de bairro. Havia reuniões durante a semana com a diretoria e
nos finais de semana reuniam-se nos bairros com as lideranças que, segundo
depoimentos, eram numerosas. A partir da década de 90 sua periodicidade foi
diminuindo e as reuniões passam a concentrar-se entre os membros da diretoria, com
uma média de uma a duas reuniões por mês.
Seus membros passam a dedicar-se mais às reuniões do OP e dos conselhos gestores
de políticas públicas, reuniões convocadas pelas secretarias, comissões e outros. Nota-
se que a demanda para a participação da sociedade civil nos espaços públicos foi
proporcional à diminuição das reuniões da entidade. Como resultado, ao longo dos
anos ocorre uma perda de espaços próprios do movimento para discutir suas ações,
construir suas propostas, traçar a trajetória do movimento em termos de lutas e
demandas e diminui a postura autônoma do movimento frente ao poder público e sua
capacidade de ser um instrumento agregador das demandas de seus filiados.
Um elemento que irá contribuir para uma maior dependência do movimento são as
fontes de financiamento para a sua manutenção. Nos primeiros anos de sua fundação,
na década de 80, com a efervescência dos movimentos sociais e uma rede maior de
apoio e de recursos, não precisou ser mantido por instituições de governo ou privadas,
como ocorreu na maioria dos movimentos. No geral, conseguia recursos através das
associações de bairro, Comunidades Eclesiais de base - CEBs, sindicatos, movimentos
estudantis e outras entidades. A partir dos anos 90 com o enfraquecimento de algumas
dessas entidades e o foco em outras ações, a principal fonte de recursos do movimento
passou a ser as instituições privadas e o governo municipal.
O local para a sede do CPV sempre foi uma preocupação do movimento desde a sua
fundação. No início, as reuniões eram realizadas no Centro Comunitário da Ilha de
Santa Maria e posteriormente passaram a acontecer em outros espaços ou
associações. Contudo, seus diretores temiam que isso provocasse um direcionamento
do movimento para questões localizadas da região e para resolver este problema foi
discutida a possibilidade de alugar um imóvel com recursos e contribuições de seus
filiados. A proposta não foi implementada e na gestão Ítalo Batan,
28
em 1995,
conseguiram com que a prefeitura pagasse o aluguel de uma sala no Centro da capital
para a realização das suas reuniões. Ao longo da trajetória do movimento ocorreram
tentativas de conseguir um outro local através da solicitação de apoio a deputados,
câmara de vereadores de Vitória e tentativas de parceria com bancos e clubes lojistas,
mas não obtiveram sucesso e permanecem na sala alugada pela prefeitura.
O presidente do CPV em sua avaliação sobre o período em que esteve na gestão
(1995-1998) afirmou:
A sede do CPV, no Edifício Jusmar, foi uma das nossas conquistas que
permitiu dar identidade ao Conselho, facilitar a comunicação com as
comunidades e garantir infra-estrutura (computadores, telefone, etc) às
lideranças comunitárias (Ítalo Batan, Jornal O Popular, p. 05, marcos
2001),
Contudo, verifica-se que o apoio financeiro da prefeitura para o pagamento do aluguel
da sala impacta na postura do movimento e inibe uma posição mais autônoma em
relação ao governo:
[...] por ser uma sala paga pela prefeitura a gente evitava bater muito na
prefeitura naquela época. Evitava por que primeiro a gente achava que
não ia conseguir nada se batesse. Num foi um cala boca aquela sala não,
mais a gente tinha essa dificuldade, alguns queriam se expor mais que
era contra a prefeitura [...] mas quase tudo que a gente pedia passava
(Entrevista nº. 5).
Em relação ao apoio das instituições privadas recebem o apoio de grandes empresas
como Companhia Vale do Rio Doce – CVRD, Companhia Siderúrgica de Tubarão –
CST, Corpus – Saneamento e obras, Telemar Telecomunicações e outras. Os recursos
28
Líder comunitário do bairro Ilha de Santa Maria e um dos fundadores do CPV, esteve na presidência do
CPV no período de 1995 a 1998.
disponibilizados são para compra de vale transporte, pagamento de salário para a
secretária do CPV, para realização de assembléias, congressos e eventos e também
receberam doações de computadores. Através da análise das atas verifica-se a visita
de representantes da CVRD e CST às reuniões do CPV para exporem e discutirem
sobre a questão ambiental e convites para visitarem a empresa e a reserva florestal da
CVRD.
Em uma reunião do CPV em outubro de 2001 decidiram encaminhar proposta para que
essas empresas se tornassem patrocinadoras do CPV. O jornal do CPV “O Popular”
29
lançado em 1997 e de distribuição bimestral, seria mantido através da publicação das
matérias dessas empresas, principalmente CST, CVRD e CORPUS e anúncios de
divulgação das ações da prefeitura. Uma liderança afirmou que:
A CST está se preocupando mais com o meio ambiente e, nesse sentido,
tem realizado ações para reduzir a poluição na cidade de Vitória (Atas,
1999)
Contudo, também nota-se a preocupação de suas lideranças com o apoio dado por
essas empresas, uma liderança afirmou que:
Se pegamos dinheiro com a Vale como depois vamos ter autoridade para
falar com a Vale que os índices de poeira estão altos e que causa
enfisema pulmonar? (Entrevista nº 7).
Uma das primeiras lutas do movimento na década de 80 dirigiu-se para a questão
ambiental. O CPV foi contrário à instalação de uma empresa no município, por entender
que traria danos sociais e ambientais. Verifica-se que o apoio dado pelas grandes
empresas ao movimento tem inviabilizado ao longo dos anos uma posição mais crítica e
independente para discutir a questão ambiental.
Esse cenário nos faz refletir sobre a autonomia do movimento. Gohn (2005, p.33) afirma
que “a autonomia se obtém quando se adquire a capacidade de ser um sujeito histórico,
29
O jornal sofreria várias interrupções ao longo dos anos, mudou de formato e em algumas edições
tornou-se um veículo de divulgação das ações da prefeitura.
que sabe ler e re-interpretar o mundo; quando se adquire uma linguagem que possibilita
ao sujeito participar de fato, compreender e se expressar por conta própria”. Ferraz
(2005, p. 141) afirma que:
O anseio de autonomia e a proclamação de uma existência autônoma,
foram as principais marcas dos movimentos sociais nos anos 70 e 80 em
contraposição a posturas particularistas, de relações clientelares e troca
de favores, tutela e controle dos movimentos por Estado e partidos
políticos, que tradicionalmente caracterizaram as relações políticas no
Brasil.
A institucionalização dos canais de participação, ao longo dos anos 90, com a maior
proximidade e negociação com o poder público não é um fator por si só que leva a
perda da autonomia dos movimentos sociais. No caso do CPV verifica-se que ao longo
da sua trajetória a necessidade de recursos materiais e financeiros também contribuiria
para a perda da sua autonomia, no sentido da sua capacidade de negociar de forma
independente com o poder público e sociedade em geral.
Quando perguntado para uma liderança se o movimento constitui um poder popular
autônomo:
Acredito que estamos trabalhando para isso, mas no momento ainda não
temos essa autonomia. Não temos uma assessoria, uma infra-estrutura
boa, ainda necessitamos de algumas coisas da prefeitura, das entidades
sindicais ou empresariais, mas estamos progredindo e sentindo de que
daqui mais uns anos teremos autonomia. Não temos uma infra-estrutura e
dependemos da prefeitura para arrumar um lugar para ficar, para nos
reunirmos, ter assembléia, etc. [...]. Nós dependemos do vereador que
muitas vezes não está afinado com a proposta do CPV. Ao passo que se
tivéssemos essa independência, autonomia nós poderíamos até fortalecer
esse movimento não só através da conscientização das comunidades
como também até eleger vereadores nas comunidades através do CPV
(Entrevista Ítalo Batan, 1997, por Durvalina Maria Sesari Oliosa).
Uma ex-liderança que participou da fundação do CPV afirmou que:
Estou muito afastado, acho que o CPV hoje é muito dependente, do
poder, para se manter, a sede mantida pela CST ou Vale, a prefeitura
influencia muito diretamente nas eleições, naquela época também
influenciava, mas existia uma independência, acho que hoje o poder
público influencia muito, os movimentos populares estão muito
dependentes do mandato político do parlamentar, vejo isso com tristeza
não vejo positivamente. Para voltar aquele momento anterior acho que
tem muita coisa que precisa ser feita (entrevista nº 01).
Como resultado não temos segundo Nogueira (2004, p. 59) “uma organização
autônoma voltada para a emancipação, a construção de consensos e hegemonias ou a
interferência coletiva nos espaços em que se definem as escolhas e as decisões
fundamentais, mas de uma organização subalternizada, domesticada”.
4.2 Relação com o Poder Público
A proposta inicial do movimento nos seus primeiros anos de fundação era marcada pela
articulação autônoma e pelo enfrentamento direto com o poder público. A gestão do
prefeito Hermes Laranja (1985-1988) não tinha interesse em manter um diálogo e
negociação com o movimento, que assumia no período uma postura contrária à tutela e
a cooptação na definição de suas bandeiras de luta e interesses.
Esta forma de atuação do CPV também provocou insatisfação entre os vereadores que
temiam perder influência nos bairros. A estratégia então utilizada pelo poder público foi
a de desarticular o movimento com a criação do Conselho Comunitário de Vitória –
CCV. O objetivo era agregar as lideranças comunitárias em torno do governo através da
oferta de cargos públicos, entrega de pequenas obras nos bairros e a criação de novas
associações nos bairros para substituir as que apoiavam o CPV e mantinham uma
postura mais autônoma (AFONSO et al, 1990). O CPV buscou conscientizar as
lideranças para serem contrárias a essa estratégia de subordinação e dependência e
procurou encaminhar suas lutas através de abaixo-assinados, ofícios e passeatas.
Contudo, o reflexo da política de tutela adotada pelo executivo pode ser observado no
trabalho de Afonso et al (1990) que estudaram os movimentos de bairro da cidade de
Vitória no final dos anos 80 e início de 90 e afirmam que tal política desmobilizou e
fragmentou os movimentos de bairro e o próprio CPV. Destacam que:
Contando com menos da metade das entidades existentes no município
filiadas, o Conselho vivencia inúmeras dificuldades de caráter financeiro e
político. O número baixo de filiações parece refletir a pouca mobilização
do movimento e sua fragmentação, fragilizando a entidade e tornando-a
vulnerável às investidas do poder público que se contraponham aos
interesses populares (AFONSO et. al, 1990, p.61).
Em entrevista o Sr. Ivo Santana, em 1989, presidente do CPV no período (1986-1989)
enfatiza que:
Por ter sido alvo de inúmeras perseguições políticas por parte do poder
público e enfrentado muitas disputas internas de caráter político-
partidário, o Conselho Popular tem hoje uma postura a-partidária, sem no
entanto se colocar contrário a qualquer contribuição que possa ser dada
por partidos e políticos, desde que esta contribuição não implique em
perda da sua própria autonomia e das entidades filiadas (AFONSO et. al,
1990, p.61).
Do ponto de vista das associações de bairro, Carlos (2006a, p. 6) afirma que:
Pode-se dizer que, ao final da década de 80, as entidades de bairro de
Vitória, em sua maioria, apresentavam um quadro caracterizado por um
movimento popular desarticulado, desmobilizado, dependente em grande
medida do apoio e de ações do poder público e das lideranças
comunitárias, apesar do ciclo de mobilização vivido em meados dessa
mesma década e, sobretudo, da existência de algumas lideranças e
entidades com propósitos e atitudes mais democráticas.
Esse quadro sofreria modificações a partir da gestão petista (1989-1993) quando o CPV
estabeleceria uma relação mais próxima com o poder público, a maioria dos integrantes
do CPV era do partido do governo e suas demandas passaram a ser negociadas.
Verificou-se que a plataforma política do governo do PT em Vitória buscava manter uma
relação democrática e transparente com a sociedade civil, o que contribuiria para
manter uma relação de relativa autonomia entre governo e movimento (CARLOS,
2006a). Desse modo, a articulação e proximidade entre CPV e governo não traria
grandes impactos ao movimento do ponto de vista da sua autonomia.
A proximidade com o poder público repercutiria em mudanças no perfil do movimento a
partir da administração Paulo Hartung (1993-1996) do PSDB e da eleição da diretoria
do CPV, tendo como presidente o Sr. Ítalo Batan (1995-1998). Os membros do CPV
passaram a ser em sua maioria filiados ao partido do governo e as ações centralizam-
se em reuniões e eventos promovidos pela prefeitura (divulgação de projetos, visitas
aos bairros, inaugurações de obras, etc.). A análise dos documentos registra em
algumas ocasiões a insatisfação do CPV por não ser convidado pela prefeitura para os
eventos festivos promovidos pela administração.
Na gestão Hartung e administrações seguintes, também do PSDB - Luis Paulo Velozo
Lucas (1997-2004), a prefeitura passa a empregar a maioria dos componentes do CPV
em cargos comissionados. As ações da prefeitura possuíam o apoio do CPV e o
governo passa a ter grande influência no movimento, seus membros eram, em sua
maioria, filiados ao partido do prefeito.
CPV passa a ser um braço político da administração (entrevista n.º 01).
Na gestão Paulo Hartung e Luís Paulo foi quase institucional,
empregavam toda a estrutura do CPV em cargos comissionados, [...] dava
emprego e pagavam o aluguel e ditavam para o CPV todas as coisas que
a prefeitura fazia, era com a conivência do CPV, era uma coisa ditada do
executivo para o movimento popular (entrevista n.º 7).
Teve um momento na administração do Luís Paulo que todos os
membros, todos, tinham cargos comissionados na prefeitura você quer
mais o quê? (entrevista nº 3).
No geral as novas diretorias eram apresentadas ao prefeito, que via o movimento como
um elo de ligação com as associações. Torna-se importante destacar a fala da diretoria
do CPV na gestão 1999-2000 que em uma reunião com o prefeito para apresentarem
seus objetivos e ações, destaca que seu papel era a organização das comunidades e o
trabalho em conjunto com a prefeitura. Na ocasião o prefeito Luiz Paulo Velozo Lucas
afirmou que:
Vitória é uma cidade bicameral, de um lado está a Câmara municipal. E
do outro o CPV, ambos ajudam no desenvolvimento da cidade numa
parceria com a PMV (Ata do CPV, março de 1999).
Essa realidade reflete uma grande dificuldade do movimento para colocar-se com
independência em relação ao poder público repercutindo na qualidade do processo de
participação. Ao longo da trajetória do CPV a sua capacidade de negociação e de
elaboração de propostas concretas para políticas de seu interesse tornam-se escassas
e direcionam-se mais para referendar e legitimar as propostas do governo. Assumem o
papel de parceiro, de agente cooperador dos projetos da administração, não há lutas ou
oposições, predominando uma relação de colaboração (Carlos, 2006a). Essa forma de
atuação não era um cenário satisfatório para uma ex-liderança do movimento:
Na verdade os movimentos tornam-se co-autores do processo de gestão,
isso é uma coisa confusa, mas ser co-autor não precisa necessariamente
ser cooptado pelo sistema, eu posso participar, mas eu quero ser crítico
também a ele. Acho que o CPV precisa se balizar nisso. (Entrevista nº 1).
Durante as três gestões do PSDB não ocorreriam mudanças no perfil de participação
do CPV. Como resultado:
[...] se a prefeitura falar que não pode construir escola nesta gestão vai
ficar por isso mesmo (entrevista n.º 7).
Acho que o CPV hoje é muito dependente do poder para se manter, a
sede mantida pela prefeitura, eventos apoiados pela CST ou Vale, [...]
acho que hoje o poder público influencia muito, os movimentos populares
estão muito dependentes do mandato político (entrevista n.º 1).
Se durante a gestão do PT valorizou-se a autonomia do movimento, nas gestões
seguintes, do PSDB, a participação assume um caráter consultivo, restrito a referendar
e legitimar as propostas de intervenção do poder público. O que para o movimento
implicará em maior dependência e um caráter limitado e restrito de poder de decisão.
Em longo prazo esta postura resultou no seu enfraquecimento frente às entidades que
representa, passa a estar deslocada da sua base, tornando-se representante de si
mesma. O depoimento de uma ex-liderança torna-se significativa:
Acho que é uma entidade, se continuar hoje como estava que era ir para
as ordens de serviço da prefeitura que era ir para as reuniões da
prefeitura em todas as assembléias, em todas as reuniões que o prefeito
faz, faz parte da campanha mesmo, pode apostar que não vai servir para
nada. Toda vez que você vai lá, ta lá o CPV lá. E aí fica escondido a
articulação com o movimento popular eu não vejo, eu não estou
percebendo. Eu não vejo o CPV se pronunciar em nada no jornal. Na
nossa época, a Tribuna e a Gazeta não deixavam de falar conosco. Sobre
tudo, taxista, saúde, posto de saúde, acidente de trânsito. Hoje, eu leio e
não vejo o CPV no jornal. Isso é uma demonstração que está no
ostracismo. Se mudar, acho que as pessoas que estão lá são sérias, mas
precisa mudar, precisa questionar a prefeitura. A tarefa do conselho é
questionar o órgão público, iluminação pública, tarifa de celular, de
telefone. Se não tiver isso não precisa existir (Entrevista nº 3).
Carlos (2006b, p. 9) afirma que:
[...] embora o discurso participacionista se fizesse presente no projeto
político do PSDB,[...] um olhar mais atento sobre os significados
atribuídos a participação permite identificá-la a um sentido estratégico e
gerencial de gestão democrática que busca conciliar participação e
planejamento técnico eficiente. [...] noção de participação enquanto
estratégia de gestão voltada a garantir a viabilidade e sustentabilidade
dos resultados das intervenções e a maior responsabilização dos agentes.
Segundo Nogueira (2004, p. 144):
A participação passa a ser convertida em recurso (gerencial) para
solucionar determinados problemas, administrar bens públicos ou
viabilizar e legitimar a reprodução política e eleitoral de governos ou
partidos.
Para concluir pode-se afirmar que a relação do CPV com o poder público pode ser
caracterizada a partir do seguinte entendimento:
No bojo dessa modalidade “cidadã” de participação, está se constituindo
outro tipo de participação que se orienta por uma idéia de política como
“troca” entre governantes e governados: quanto mais interações
cooperativas existirem, melhor para o sucesso eleitoral e a legitimação
dos governantes e melhor para os grupos sociais envolvidos, que podem
assim ver atendida parte de suas postulações. Creio ser possível chamar
esse conjunto de práticas e de ações de participação gerencial (Nogueira,
2004, p. 142).
Esse exame deixa claro as mudanças no projeto político do movimento entre sua
fundação e os anos posteriores. No próximo item busca-se discutir os impactos desse
cenário em relação aos objetivos e lutas do movimento.
4.3 Objetivos e lutas do movimento
Inicialmente, nos anos 80, os objetivos do CPV centraram-se no envolvimento em
diversas lutas, algumas se destacaram pela capacidade de aglutinar o movimento e
pelos resultados obtidos. Em 1984 empreenderam um movimento contrário à instalação
da indústria Flexibrás em Vitória, por acreditar que ela traria danos sociais e ambientais
ao município. O Conselho obteve uma vitória parcial, uma vez que adiou a instalação
da indústria para o ano seguinte (FERRAZ, et al, 1993).
Outra luta se refere à pressão junto aos governos do município e do estado pela
adoção de uma política para o transporte coletivo na região contando neste processo
com as entidades municipais dos movimentos populares da Serra, Cariacica e Vila
Velha. Os resultados foram à ativação do CODIVIT (Conselho de Desenvolvimento
Integrado da Grande Vitória) composto por dois membros do CPV - a entidade assume
o papel de representante dos movimentos sociais da cidade de Vitória - representantes
do movimento Popular de cada município, governos dos municípios e Estado através
das Secretarias de Planejamento, Bem Estar Social e Transportes e Instituto Jones dos
Santos Neves que se reunia para discutir as tarifas do transporte coletivo da Grande
Vitória. Em 1985, como fruto dessas discussões, foi criada a CETURB – GV –
Companhia de Transportes Urbanos – Grande Vitória para gerenciamento do setor e
estabelecimento de uma política para o transporte coletivo (FERRAZ, et al, 1993).
Somado a essas lutas o CPV fortaleceu as demandas dos bairros por melhores
condições de vida com debates e reivindicações principalmente nas áreas da saúde,
segurança pública, saneamento, o problema das encostas com risco de desabamento e
a ocupação dos manquezais. Outro destaque entre as lutas do CPV foi o movimento do
transporte coletivo em 1990, iniciado em várias capitais para impedir o reajuste no valor
da passagem. Em Vitória o CPV e outros movimentos sociais realizaram um grande
movimento com panfletagem, cartazes e passeatas e contaram com o apoio do
movimento estudantil. As reivindicações eram apresentadas tanto em nível municipal
quanto em nível estadual e, em algumas ocasiões, conseguiram com que o valor da
passagem não fosse reajustado.
Ao longo dos anos 90 o perfil de suas lutas sofreria modificações, o CPV assume a
postura de parceiro da administração municipal e verifica-se uma diminuição das ações
e proposições articuladas pelo movimento. A partir da gestão Luiz Paulo Veloso Lucas
(1997-2004) houve um aumento dos convites para participar de reuniões e eventos
promovidos pelas secretarias. Através das atas verifica-se que os membros do CPV
participavam desses encontros que tinham como ponto de pauta os projetos das
secretarias, a inauguração de obras e apoio na divulgação e implementação de ações.
Os convites partiam principalmente das secretarias de Cidadania, Ação Social, Meio
ambiente, Cultura, Saúde, Educação, Transportes e Obras.
Desse modo, conforme discutido no item acima, esse cenário demonstra profundas
mudanças no projeto político do movimento entre sua fundação e os anos posteriores.
Ao assumir a posição de parceiro, no papel de articular, apoiar e divulgar as ações das
secretarias, o CPV abandona a postura de lutas e o projeto emancipatório construído
pelos movimentos sociais nos anos 80, para se concentrar num modelo de Estado
como espaço de elaboração e implementação de políticas. Nogueira (2004, p. 59)
afirma que a sociedade civil:
Abandonará a fronteira do Estado como campo de lutas de emancipação
para se concentrar numa idéia de Estado como espaço de regulação,
elaboração e implementação de políticas. Haverá menos antagonismo e
mais consenso racional, menos democracia política e mais deliberação
democrática.
Como exemplo, podemos destacar suas ações na área da segurança pública. O CPV, à
convite da Secretaria de Cidadania, apoiou a realização do 2º Fórum municipal de
segurança pública, direitos humanos e cidadania. Também à convite desta secretaria
coordenou as eleições dos Conselhos regionais de segurança Pública nas sete
regionais do município e apoiou campanhas realizadas pela secretaria na área da
violência contra as crianças.
Essa demanda por apoio também será solicitada pelos movimentos culturais,
instituições e órgãos estaduais e vereadores. Eram convidados a participar na
divulgação de seminários, congressos, conferências e também para escolha de
delegados, representação em comissões formadas e apoio na implementação de
alguns projetos. Entre os pedidos de apoio podemos citar as seguintes ações: projeto
de vereador pela obrigatoriedade de porta eletrônica (1995); repúdio ao auxílio paletó
pela associação dos comerciários (1996); projeto de transporte mais humanizado pela
CETURB (1996); projeto de cidadania nos bairros através da emissão de CPF, Carteira
de identidade e justiça volante do juizado de pequenas causas e confecção de tabela
comparativa de preços, projeto da secretaria de cidadania de Vitória em conjunto com o
Procon e Sunab (1996); liberação do comércio aos domingos e feriados, projeto da
câmara de vereadores de Vitória (1997); solicitação de apoio contra a privatização da
Cesan (1997), funcionários da Cesan participaram de algumas reuniões do CPV para
apresentarem o andamento das atividades contra a privatização e pedirem para
envolverem-se na realização de protestos e outras ações contra a privatização,
realização de debates nos bairros para ampliar a articulação contra a privatização. O
CPV participaria através do apoio na realização de uma ação popular e de uma
audiência pública na câmara contra a venda; apoio no programa Integrar – oficina
pedagógicas e desenvolvimento sustentável do governo do Estado (1998); criação de
núcleo do Procon em cada comunidade, projeto do Procon (1999) e diversos outros
projetos.
Verifica-se nas atas que algumas demandas encaminhadas ao movimento não foram
atendidas, ou porque pertenciam a outro partido ou porque não queriam ter uma
postura contrária ao poder público. Como exemplo, destaca-se o pedido via ofício de
uma vereadora do PT solicitando ajuda para os moradores de alguns morros de Vitória
(Romão, Cruzamento e Forte São João) atingidos pela chuva. Os membros do CPV
consideraram que o assunto é de responsabilidade da defesa civil e secretaria de ação
social (Ata do CPV, dezembro, 1995).
Ações de apoio que poderiam entrar em conflito com a prefeitura também não eram
assumidas pelo movimento. Como exemplo a solicitação do sindicato dos professores –
Sindiupes (2003) para que o CPV apoiasse a categoria em sua luta pelo reajuste
salarial, pela recuperação dos investimentos no setor educacional junto aos conselhos
de escolas, congressos da categoria e na comissão de educação. O presidente do CPV
afirmou que:
O objetivo da reunião não é dá apoio ao sindicato e sim ouvir o que está
acontecendo. Gostaria de saber quem estar certo visto que a prefeitura
investe em educação mais que o determinado em lei segundo divulgação.
Eu participei da Assembléia do Sindiupes em defesa de um ensino de
qualidade e não de bons salários. O papel do CPV é está como mediador
nas negociações (documento escrito em Ata do CPV, abril de 2003).
Essa postura de recusa de apoio demonstra o perfil do movimento que se configurou a
partir dos anos 90. Tornam-se co-particípes das políticas públicas locais e se sentem
partes constitutivas desta construção, impedindo um olhar mais crítico:
A administração mostra seu trabalho nas escolas e na saúde pública. A
prefeitura de Vitória tem um plano estratégico. [...] Vitória tem boas
unidades de saúde e escolas. A cidade está bonita, com várias obras, e o
salário dos servidores está em dia. Nossa cidade é a quarta capital do
Brasil em qualidade de vida. [...] Na área da segurança, por exemplo, só
Vitória está trabalhando (entrevista presidente CPV, Homero Alves
Martins - Jornal do CPV, 1999, p. 2).
Nas reuniões do CPV a pauta era ocupada principalmente pela leitura de
correspondências e ofícios enviados pelas secretarias, empresas ou outras entidades
da sociedade civil. As reuniões eram marcadas pela escolha de representantes para
comparecerem a esses eventos e para apresentação das decisões políticas ou projetos
interessantes realizados pela prefeitura, empresas ou entidades da sociedade civil.
Ocasionalmente expressavam sugestões e críticas. Desse modo, o CPV não
estabelece projetos que poderiam impactar ou agregar as entidades que representa,
não há discussões sobre temas que expressem insatisfações ou problemas que afetem
a vida na cidade ou mesmo qualquer questão de caráter mais amplo.
4.3.1 Principais bandeiras de luta
Uma edição do jornal “O popular” de março de 2001 reconstrói um pouco da história do
movimento até este ano e relata as principais lutas empreendidas durante as gestões
do CPV nesse período. Destaca-se a participação do CPV nos conselhos gestores de
políticas públicas e a participação no orçamento participativo. A trajetória do movimento
a partir dos anos 90 seria marcada principalmente pela inserção nesses espaços que
contribuiriam para a formação da sua identidade. Uma liderança assim se expressou:
A cidade melhorou, o nível de reivindicação também foi diminuindo. Briga
mais pela questão local, de melhoria da escola do que está discutindo a
questão de vagas na escola, de certa forma há uma acomodação, é um
processo que o movimento está passando. Eu acho positivo por esse lado
que mostra que a cidade está melhorando, por outro lado o movimento foi
se acomodando também. Como o poder público foi se democratizando
mais e o próprio conselho [CPV] foi participando das decisões da cidade,
as grandes lutas sociais vão desaparecendo, se eu posso participar via
OP das decisões da cidade então não há muito o que requerer, reivindicar
(entrevista nº 01).
4.3.1.1 A participação do CPV no Orçamento Participativo
São poucas as informações nas atas sobre o processo de discussão do CPV no OP,
reflexo da dificuldade do movimento em construir um espaço próprio de discussão e
formulação de propostas e projetos. A maioria das informações foi conseguida através
de entrevistas, documentos e pesquisas produzidos. Segundo suas ex-lideranças já
havia um debate desde a fundação do movimento, baseado na experiência de Vila
Velha, para implementarem a discussão do OP na cidade de Vitória. Na gestão de
Hermes Laranja foi feita a proposta, mas não conseguiram apoio. Na gestão de Vítor
Buaiz foram convidados a participarem das discussões do OP. Ao longo dos anos 90, o
CPV assumiria o papel de principal articulador nas reuniões com as comunidades.
Verifica-se que o CPV não teve participação na formulação do OP, no geral, todo o
processo da elaboração da metodologia de trabalho até às assembléias nos bairros era
conduzido pela prefeitura, apresentado ao movimento para sugestões. A proposta era
apresentada ao CPV para que este indicasse modificações. Ocorria à exposição da
secretaria, a apresentação das datas das assembléias e a solicitação da opinião e
apoio do CPV para divulgar as assembléias nos bairros. O CPV desde a criação do OP
sempre participou de todas as etapas para definir as prioridades de obras e serviços,
contudo, foram realizados poucos treinamentos para a atuação do movimento no OP.
As mudanças de gestão trouxeram variações substantivas no desenho institucional do
OP que refletem, muitas vezes, retrocessos e perdas. Carlos (2006) analisa que essas
modificações geraram uma simplificação no formato do OP com a redução de
elementos importantes para os processos participativos, como as assembléias e os
fóruns populares. Autores como Dagnino (2002); Tatagiba (2003) e Carlos (2006a)
afirmam que as regras institucionais de participação devem ser compreendidas à luz da
relação com os projetos políticos governamentais aos quais subordinam as
experiências participativas. Carlos (2006a, p. 10) afirma que:
[...] o pressuposto democrático da administração do PT (gestão 1989-92)
era a democracia participativa, em conseqüência, defendia-se a
participação direta da população na formulação das políticas; nas três
gestões seguintes do PSDB (1993 a 2004), com poucas variações, ao
assumir a democracia representativa como forma de governo possível,
exige-se uma participação apenas complementar, de conteúdo mais
consultivo e legitimador, ao invés de deliberativo (apud CARLOS, 2003;
PMV, 2002)
A partir da gestão Velozo Lucas (1997-2004) a principal ação do CPV passa a ser a
participação em reuniões com a prefeitura para discutir sobre o atraso das obras do OP.
Contudo, apesar do comprometimento da prefeitura, as obras não eram realizadas. A
proposta da prefeitura era que não fossem eleitas novas obras enquanto não fossem
realizadas as obras já escolhidas. Foi traçado um cronograma de ação com um
levantamento, bairro a bairro, de todas as melhorias ainda não executadas. As obras
seriam feitas de acordo com a disponibilidade de caixa. Mas a administração alegou
queda no repasse do ICMS por parte do governo estadual, e não cumpriu o acordo
firmado. Em reuniões posteriores o CPV demonstrou a sua insatisfação pela não
prioridade das obras do OP que estavam paralisadas desde o ano de 1999. Uma
liderança afirmou que:
Não estamos contra as obras do Projeto Terra, mas queremos resgatar o
Orçamento Popular. É preciso que as decisões sobre o que e quando
fazer voltem a ser discutidas entre o Executivo e os moradores, o
orçamento foi esquecido no segundo mandato (Entrevista nº 6).
Como o CPV era o principal movimento articulador do OP, sempre esteve ao lado da
prefeitura no projeto, a não realização das obras resultou em descrédito para o
movimento. Mas, o atraso das obras não trouxe mudanças no perfil de atuação do CPV
frente ao poder público que permanece como ator secundário, perdendo o foco de
representante de demandas da sociedade civil, configurando uma participação apenas
de caráter consultivo marcada pela postura de parceiro e agente cooperador do poder
público.
4.3.1.2 A participação do CPV nos Conselhos Gestores de Políticas Públicas
O CPV também teria uma participação importante nos conselhos gestores municipais,
desde a sua formação. Torna-se importante destacar a fala de uma liderança sobre a
participação do CPV nos conselhos:
Participamos do processo de democratização da cidade através da
criação desses instrumentos de participação, conselhos, vivemos um
momento de transformação da cidade (entrevista nº 1).
O CPV não participou da formulação dos conselhos de iniciativa do governo municipal e
nos criados por lei federal, a atuação do CPV nos conselhos gestores do município
pautou–se principalmente pela indicação de representantes da sociedade civil, no qual
detinha assento em todos os conselhos. Segundo relato de suas lideranças, o CPV
buscou ampliar a visão de seus representantes nos Conselhos Gestores para além das
demandas locais e trabalhar na formação das entidades para entenderem que
representavam nos Conselhos demandas mais amplas e não específicas de seu bairro.
Verifica-se que as reuniões dos conselhos gestores tornam-se espaços para o
movimento articular suas demandas, deixa de ter um espaço próprio e passa a utilizar
esses canais para as suas reivindicações. Na gestão 1993-1994 um membro da
diretoria de saúde do CPV e membro do Conselho Municipal de Saúde relata a
participação do CPV no Conselho municipal de saúde de Vitória:
Realizávamos reuniões quinzenais com um trabalho de qualificação e de
ampla discussão com os conselheiros representantes dos usuários que
contribuiu, de forma significativa, para a formulação da política municipal
de saúde (Jornal O Popular, p. 05, março, 2001).
Contudo, também havia nesses espaços uma tendência a seguir a agenda posta pelo
poder público. Estudo de Zorzal (2002) sobre os Conselhos Gestores da cidade de
Vitória demonstra que as ações dos Conselhos ainda enfrentam dificuldades em
interferir nas diretrizes estratégicas, assim como na dinâmica de funcionamento da
Secretaria. Afirma que:
A agenda, geralmente é definida pelos interesses temáticos do Estado, o
que impede uma inovação das políticas públicas a partir da participação
da sociedade civil nos Conselhos. A existência dos Conselhos está
propiciando a criação de uma nova institucionalidade. Porém, ela ainda
contém traços predominantes de uma racionalidade fundada na lógica do
insulamento burocrático, que se traduz no fato de que o governo
municipal ainda é o principal protagonista, até mesmo pela fragilidade das
organizações da sociedade civil (ZORZAL, 2002, p. 11 e 12).
Um elemento que contribui para essa fragilidade pode ser verificado pela forma de
inserção nos espaços dos Conselhos pela sociedade civil. O CPV que detinha, no
período, assento na maioria dos conselhos escolhia seus representantes
30
entre os
diretores de departamento da entidade. Somente quando não havia membros
suficientes para compor os conselhos procuravam as lideranças comunitárias,
aumentando o distanciamento entre base e liderança comunitária. Seus membros
assumiam a representação em vários conselhos:
Tinha vez que tínhamos dificuldade de conseguir conselheiro, tinha uns
que participam de dois, três, eu participava de dois (Entrevista nº 5).
Conforme registro nas atas do CPV ocorreu uma sobrecarga de trabalho e eram
constantes as ausências nas reuniões nos Conselhos Gestores. No Conselho Municipal
de Saúde, conselho em que o CPV possuía mais representantes, total de doze titulares
e doze suplentes, a secretaria recorreu ao CPV para substituir os membros faltosos, a
ausência de seus conselheiros estava contribuindo para a falta de quórum nas
reuniões. Tal ação demonstra um esvaziamento do movimento e do próprio Conselho
gestor como instância participativa. Em entrevista a uma liderança, esta não conseguiu
relacionar em quantos conselhos participava, afirmou que:
Eu atuo em mais de 5 conselhos, dois ou três pelo CPV e tenho uns três
pela Famopes – COMDEV [Conselho Municipal de Desenvolvimento
Econômico de Vitória], CONSEA, Conselho de usuários da Telemar,
Conselho de multas fiscais, deixei o conselho de saúde, [faltou relacionar
o quinto conselho mas não lembrou] (Entrevista nº 7).
Também verificou-se que não havia um processo contínuo para acompanhar o debate e
encaminhar propostas aos conselhos, apenas assuntos mais polêmicos eram
colocados em pauta, como, por exemplo, parecer sobre a lei do PDU – Plano Diretor
Urbano, tarifa de transporte urbano, municipalização da educação ou falta de
medicamentos.
A participação do CPV nos Conselhos Gestores também foi marcada pela falta de
controle das informações sobre os membros que participavam dos Conselhos gestores.
30
O processo de eleição ocorre por indicação ou por meio de assembléias, dependendo do regulamento
do conselho, contudo na maioria dos conselhos era através de indicação.
No geral, não tinham controle sobre a data de vencimento dos mandatos, se seus
representantes estavam participando ou não. Tomavam conhecimento da necessidade
de renovação através de ofícios encaminhados pelas secretarias para a solicitação de
representantes e informações sobre as ausências dos conselheiros. Em 1998, último
ano da gestão Ítalo Batan, ocorreram tentativas pela diretoria de exercer um controle
maior, solicitando relatórios aos conselheiros, contudo, a sua representação nos
Conselhos permaneceu sem controle.
4.4 Relação com os movimentos e associações de bairro
O contato com as comunidades de bairro se dá principalmente pelo apoio nas eleições
com envio de representantes do CPV e intervenções quando de eleições tumultuadas
ou com fraudes. A representação do CPV para a eleição nos bairros não é obrigatória,
algumas associações preferem somente convidar ou descrever como foi a eleição. O
CPV pelo Estatuto não pode intervir em uma associação para promover as eleições, ele
pode acompanhar o processo eleitoral para garantir a legalidade.
Uma dificuldade encontrada pelo movimento ao longo de sua trajetória refere-se ao
surgimento de novas associações no mesmo bairro. O CPV não pôde impedir sua
criação e muitas delas foram fundadas somente para se contrapor à associação
existente no bairro. Sua estratégia foi estabelecer critérios para a filiação dessas
entidades do CPV e no final de 2004 foi realizado um movimento para regularizar as
associações, muitas com dívidas e gestões com mandatos vencidos.
Nota-se que poucas são as demandas dos bairros ao CPV, podem ser citadas
reivindicações para melhoria de ônibus nos bairros, demandas por assessoria para
fazer um requerimento ou ofício, apoio financeiro para conseguir passagens. Na gestão
(1999-2000) conseguiram uma parceira com o Sindicato das empresas de transporte de
passageiros - SETURB para fornecer vales-transporte para as lideranças, atendendo a
cerca de 750 lideranças comunitárias (O POPULAR, p. 6, março de 2001). Outras
associações optam pela independência do CPV, elegem vereadores que os
representam em seus interesses, e possuem seus próprios canais de discussão e uma
organização forte no bairro.
A análise das atas demonstra que foram feitas algumas tentativas de realizar
planejamento estratégico para uma atuação mais efetiva nos bairros, contudo não
houve continuidade. Verifica-se também que ocorreram poucas ações dos
coordenadores regionais, a divulgação da realidade das regionais não era, no geral,
ponto de pauta nas reuniões do CPV.
Do ponto de vista das associações de bairro, em relação ao encaminhamento das suas
demandas, verifica-se que em geral estas optam pelo contato direto com o vereador da
sua região o que torna ainda mais frágil a representatividade e articulação do CPV em
relação aos seus associados. Uma liderança destacou que:
Vejo o CPV um pouco enfraquecido porque quase todas as associações
vão direto ao vereador para solicitar, é comum encaminhar suas
demandas. No corredor da câmara de vereadores é possível vê a maioria
das lideranças comunitárias. [...] Isso enfraquece o CPV, o líder e a
associação deveriam se unir para fortalecer o CPV, porque quando ela
fortalece o CPV ela não vai mais sozinha, ela vai com o CPV (Entrevista
nº 7).
Uma ex-liderança do CPV e líder de associação de bairro justifica que os pedidos da
comunidade precisam ser solicitados a um vereador porque “[...] se não tá com o cara
você não recebe recursos, atrelou” (Entrevista nº 05). Segundo uma liderança do CPV o
vereador não tem interesse em uma relação próxima com o CPV:
O vereador também quer o seu quinhão porque à medida que acha que o
presidente do CPV coordena, afina, dirige e está na vanguarda na frente
de todos esses movimentos ele é um potencial concorrente dele na
câmara (Entrevista nº 07).
O contato com todas as associações somente ocorre no final do ano através das festas
de confraternização, reuniões convocadas para eleição de representantes nos
conselhos - que regulamentam a escolha de conselheiros por eleição, ou na realização
dos congresso que ocorrem a cada dois anos. Na gestão Luiz Paulo, no ano de 1998, a
partir do convite da administração, começaram a realizar visitas às comunidades em
conjunto com o prefeito. Através de sorteio definiam o bairro que seria visitado. Nota-se
que esta atividade torna-se uma das prioridades do CPV e o seu principal modo de
articulação nos bairros.
Para concluir verifica-se que através dos dados apresentados o CPV, ao longo da sua
trajetória, sofreu modificações no seu perfil de atuação. Se nos anos 80 apresentou
uma postura mais independente na relação com o poder público, principalmente na
gestão Hermes Laranja (1985-1989), nas gestões seguintes assume uma posição mais
próxima ao governo como resultado também do processo de abertura e
institucionalização dos canais de participação. Contudo, essa aproximação levaria ao
longo dos anos a um padrão de relação extremamente frágil, enfraquecendo uma
participação efetiva com ausência ou pouca presença de sujeitos sociais autônomos.
Esse perfil de participação refletiria em sua atuação, na definição de lutas e demandas,
sua agenda passa a estar condicionada aos projetos do poder público, levando ao
enfraquecimento do seu objetivo maior como órgão federativo representante das
entidades dos movimentos de bairro da cidade de Vitória, uma vez que, assumindo uma
postura de parceiro e legitimador das ações do poder público deixa de ser um operador
das demandas da sociedade civil para ser um cooperador do poder público.
5 Considerações Finais
O perfil da grande maioria dos movimentos de bairro da cidade de Vitória entre as
décadas de 60 e 70 foi marcado pelo caráter assistencialista e a ausência de grandes
vínculos com a população do bairro. Muitas entidades comunitárias eram ligadas à
políticos locais e apoiadas pelo governo que desenvolvia uma política clientelística nos
bairros tendo as entidades apenas como seu suporte local. Somente a partir de meados
dos anos 70 começam a se constituir na cidade de Vitória associações comunitárias
independentes e autônomas, ancoradas principalmente pela igreja Católica através das
Comunidades Eclesiais de Base (CEBs).
A criação do CPV na década de 80 seria articulada a partir desses princípios e teve o
objetivo de unir, principalmente as associações de bairro, fortalecer as lutas e
demandas dos seus moradores e expressar inovação a partir desta postura mais
autônoma. Contudo, verifica-se, ao longo do trabalho, que essas práticas associativas
não foram capazes de gerar transformações no movimento popular como um todo.
Visto que, antes que as associações conseguissem angariar bases suficientes que lhes
permitissem mostrar seu potencial de luta, elas já estavam presas numa rede que as
levava ao oportunismo, trocando seus objetivos de longo prazo por pequenas
melhorias. O próprio CPV com a mudança de perfil de seus membros ao longo da
década de 90 adotaria essa postura mais próxima e dependente do poder público.
O reflexo desta postura pode ser notado no seu formato organizacional e no seu
funcionamento, pouca articulação com as entidades que representa, poucos debates
em torno do projeto do movimento, sua forma de atuação privilegia o apoio às ações da
prefeitura e assume uma relação de dependência com o poder público. Não se verifica
no CPV ao longo da década de 90 uma postura autônoma em relação ao poder público
a ponto de influenciar as decisões sócio-políticas e econômicas, mas um padrão de
relação extremamente frágil, em que pesa a inexistência da participação efetiva.
A fragilidade do CPV em relação a uma autonomia maior para sustentar opiniões e
propor ações gerou ao longo da sua trajetória uma relação de dependência com o
poder público municipal. As atividades do CPV restringem-se, no geral, às reuniões do
OP e dos conselhos gestores de políticas públicas e às reuniões convocadas pelas
secretarias municipais. Como resultado, ao longo dos anos ocorre uma perda de
espaços próprios do movimento para discutir suas ações, construir suas propostas,
traçar a trajetória do movimento em termos de lutas e demandas. Esta postura também
resulta no seu enfraquecimento frente às entidades que representa, torna-se deslocado
de sua base, perdendo a capacidade de aglutinar seus interesses.
Verifica-se que a necessidade de recursos materiais e financeiros da prefeitura e
instituições privadas, o emprego da maioria dos componentes do CPV em cargos
comissionados restringe a sua capacidade de negociar de forma autônoma com o
poder público e sociedade em geral. Tornam-se escassas a elaboração de propostas
concretas para políticas de seu interesse e direcionam-se mais para referendar e
legitimar as propostas do governo. Assumem o papel de parceiro, de agente
cooperador dos projetos da administração, não há lutas ou oposições, predomina uma
relação de colaboração.
Desse modo, o perfil da participação do CPV ao longo dos anos 90 é marcado pela
idéia de “troca” entre governo e movimento, por interações cooperativas e legitimação
dos projetos da administração municipal, fortalecendo um modelo gerencialista de
participação. Comparando os objetivos do movimento em sua fundação e nos anos
posteriores verifica-se profundas mudanças no seu projeto político. Ao assumir a
posição de parceiro, no papel de articular, apoiar e divulgar as ações das secretarias, o
CPV abandona a postura de lutas e de emancipação para se concentrar num modelo
de Estado como espaço de elaboração e implementação de políticas.
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APÊNDICE A
Entrevista com membros que pertencem à gestão do CPV
Bloco I – Perfil dos entrevistados
Data: __________
Nome: __________________________________________________________
Idade: __________
Escolaridade: ______________________________________________________
Cargo que ocupa atualmente:_____________________________________________
Perfil profissional:____________________________________________
Filiação partidária:________________
Trajetória de participação (movimentos, entidades, partidos que participou, quando e
por quanto tempo, o que o motivou a participar):___________________________
Quando começou seus trabalhos no CPV? __________________________________
Bloco II – Caracterização do CPV
1- Como surgiu o movimento do qual você participa?
2- Como é o CPV em termos de sua forma de atuação. Quais são os objetivos, o que
busca o CPV? Quais as bandeiras de luta? Em que o CPV concentra suas
atividades hoje?
3- Quais as principais lutas desenvolvidas pelo movimento nos três últimos anos?
4- Que mecanismos utilizou para desenvolver estas lutas?
5- Estas lutas contaram com a participação de outros movimentos?
6- Como é definido às prioridades de atuação/lutas/reivindicações do CPV?
7- Quais são as formas utilizadas pelo movimento para reunir e articular seus membros
e a comunidade em geral? Quantas pessoas costumam comparecer a estes
encontros?
8- Quais elementos são considerados pontos fortes do movimento (comunicação,
capacidade de mobilização e de empreender ações diretas, articulação com outros
movimentos e entidades, definição precisa dos objetivos, outros)?
9- Quais são as principais conquistas do CPV ao longo desta e das outras gestões?
Quais foram os fatores que influenciaram essas conquistas?
10- Quais as principais dificuldades, limites do CPV?
11- Quantas pessoas estão envolvidas no trabalho cotidiano da entidade entre diretoria
e comissões e departamentos?
Mudanças verificadas no perfil de participação do CPV:
12- Você acha que houve mudanças ao longo do tempo no perfil de atuação do CPV?
13- Que diferenças você percebe entre o início do movimento e sua forma atual? O que
mudou? Por que você acha que mudou?
14- (Se mudou) Quais as mudanças que você considera positivas? Por que? E
negativas? Por que?
Instâncias de articulação:
15- Como é a relação do CPV com as associações de moradores? As associações de
moradores têm mostrado interesse em participar de forma efetiva no CPV?
16- Como se dá à articulação com a FAMOPES, e com os outros movimentos sociais
(culturais)?
17- O CPV tem apoio de alguma entidade para exercer suas atividades?
18- Atualmente que tipo de relação o movimento mantêm com pessoas da igreja, com
assessores, com grupos ou partidos políticos?
19- Como é a relação do CPV com órgãos da secretaria municipal? E com o prefeito?
Com as administrações regionais? E vereadores? Há conflitos? As relações são de
diferentes tipos? Como?
Participação no OP:
20- Qual foi ou tem sido o papel do CPV nesse espaço? Quais são as principais
disputas? Que saldos restaram dessas disputas?
21- O que esta experiência diz sobre a força do CPV hoje?
Participação nos Conselhos Gestores:
22- Quais as reivindicações encaminhadas pelo CPV?
23- Participa de algum conselho? Quantos representantes são? Comparecem com
regularidade às reuniões? Ficam nas reuniões até o final? Fazem intervenções,
encaminham propostas?
24- Avaliação desta participação- quais são as principais conquistas e dificuldades
enfrentadas pelo CPV ao longo de sua atuação no conselho? (em termos de
vitórias, derrotas do ponto de vista popular).
25- Avaliação desta participação- Quais os aspectos positivos e negativos dessa
participação?
26- Em quais conselhos o CPV tem assento?
Visão sobre as Ongs
27- Na sua opinião qual a diferença entre o CPV e uma ONG? Seus papéis são
diferentes? (há objetivos ou projetos comuns e/ou diferentes) Qual a importância de
cada um hoje?
Entrevista com membros das gestões anteriores do CPV
Bloco I – Perfil dos entrevistados
Data: __________
Nome: __________________________________________________________
Idade: __________
Escolaridade: ______________________________________________________
Cargo que ocupa atualmente:_____________________________________________
Perfil profissional:____________________________________________
Filiação partidária:________________
Trajetória de participação (movimentos, entidades, partidos que participou, quando e
por quanto tempo, o que o motivou a participar):______________________________
Quando começou seus trabalhos no CPV?____________________________________
Bloco II – Questões sobre o CPV
1- Qual foi o ano em foi criado e registrado?
2- Como era o CPV no seu início, quais eram os seus objetivos, as bandeiras de
luta? Quais as principais reivindicações por ocasião de sua formação?
3- Se tivéssemos que enumerar quais eram os três principais objetivos, por ordem
de importância?
4- Como eram definidas as prioridades de ação do CPV?
5- Quantas pessoas estavam envolvidas com o trabalho cotidiano da entidade e
nas comissões ou departamentos?
6- Quais eram as formas utilizadas pelo movimento para reunir e articular seus
membros? Quantas pessoas costumavam comparecer a estes encontros?
7- Qual a sua avaliação sobre os resultados conquistados pelo CPV? O que este
movimento pretendia? O que conseguiu? O que não conseguiu? Quais eram as
dificuldades, limites, fragilidades?
8- Na sua opinião, qual foi à importância do CPV v naquele momento?
Mudanças verificadas no perfil de participação do CPV:
9- Que tipo de mudança você observou na trajetória do movimento?
10- (Se mudou) Quais as mudanças que você considera positivas? Por que? E
negativas? Por que?
11- Qual a sua opinião sobre a atuação do CPV hoje?
Instâncias de articulação:
12- Como era a relação do CPV com as associações de moradores?
13- Onde o CPV buscava apoio? Tinha apoio de alguma entidade? Como a
entidade obtinha recursos para desenvolver suas atividades?
14- Como era a relação com pessoas da igreja, com assessores, com grupos ou
partidos políticos, com órgão públicos, com as administrações regionais, com
vereadores, deputados? Havia relações de diferentes tipos? Como?
Participação no OP:
15- Como foi a atuação do CPV no OP?
16- Qual foi o papel do CPV nesse espaço? Quais foram as principais disputas? Que
saldos restaram dessas disputas?
17- O que esta experiência pode demonstrar sobre a força do CPV?
Participação no Conselho:
18- Qual foi a participação do CPV na formação e efetivação desses espaços de
participação?
19- Qual a avaliação que você faz sobre estes espaços? (em termos de vitórias e
derrotas).
20- Quais foram as principais conquistas e dificuldades enfrentadas pelo CPV ao
longo de sua atuação no conselho?
21- Naquele período em quais conselhos o CPV tinha assento?
ANEXO
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