43
Concluído em 1985, o Projeto Brasil: Nunca Mais resultou em 12 tomos. Este
material é a maior fonte histórica de pesquisa que, até hoje, temos sobre aquele período.
Com base nesses dados, foram realizadas cassações de, registro profissional de apenas
alguns dos muitos médicos envolvidos, diretamente, no aparelho repressivo, como, por
exemplo, o médico aspirante à psicanalista Amílcar Lobo
18
. Denúncias de que torturadores
ocupavam cargos públicos, realizadas por entidades de direitos humanos
19
, também foram
formalizadas, a partir de informações contidas nesta pesquisa e nas pesquisas efetuadas
pelo GTNM/RJ, nos arquivos do Instituto Médico Legal do Rio de Janeiro, em 1992. Até
mesmo alguns processos, na Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos, em Brasília, e
nas Comissões de Reparação
20
, criadas em alguns estados, foram legitimados por esses
dados.
No texto de apresentação do livro Brasil: Nunca Mais (1985), versão resumida da
pesquisa BNM, são colocadas algumas dificuldades e riscos que envolveram o estudo.
Dentre elas, chama atenção a vivacidade da experiência, recentemente ocorrida, ter sido
incluída no campo das dificuldades e/ou riscos. Está dito que:
[...] os traumas do período anterior, marcado pela tortura rotineira, pelas mortes e
pelos desaparecimentos, ainda estavam bastante vivos nas consciências,
inspirando temores e exigindo cautelas. Não se tinha, sequer, a certeza de que a
pesquisa conseguiria atingir o seu final, nem se sabia se um dia seria possível
publicá-la (Arquidiocese de São Paulo (org.), 1985, p.23).
18
Citado por Ana Bursztyn em “Fala Corpo”, como “médico da PE de triste memória”, integrou a
equipe de médicos torturadores durante a ditadura militar. A função destes profissionais era avaliar
a resistência dos prisioneiros, para saber o quanto agüentavam, evitando, assim, que morressem
antes de fornecer as informações almejadas pela repressão. Além disso, cuidavam dos presos,
após as sessões de tortura, a fim de recuperá-los para serem novamente torturados.
Amílcar Lobo teve seu registro médico cassado, em 1988, como resultado do processo aberto pelo
próprio Conselho de Medicina do Rio de Janeiro. O GTNM/RJ contribuiu no processo, fornecendo
depoimentos e enviando testemunhas (COIMBRA, Médicos e Tortura, www.dhnet.org.br).
Ver mais
em COIMBRA, Cecília Maria Bouças. Guardiães da Ordem: uma viagem pelas práticas psi no
Brasil do milagre. Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1995.
19
O Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro surge em 1985 e um de seus objetivos, na
época, era impedir que torturadores ocupassem cargos públicos.
20
Resultado da luta de diversas entidades de direitos humanos, familiares de mortos e
desaparecidos, militantes e alguns parlamentares, foi a assinatura do governo brasileiro, em
dezembro de 1995 da Lei n° 9.140/95. Esta prevê condições, para reparação financeira de
pessoas mortas e desaparecidas por motivos políticos, bem como reparação financeira a seus
familiares. Reconhecendo de imediato como mortos 136 desaparecidos políticos, criou uma
Comissão Especial, para analisar outras mortes de causas não naturais, por motivação política,
ocorridas em “dependências policiais ou assemelhados” entre 02 de setembro de 1961 e 15 de
agosto de 1979 (COIMBRA, Resquícios da Ditadura no Brasil, www.dhnet.org.br
).