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para dar sentido ou funcionamento às suas vidas.
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Este senso comum ideológico pode ser
pensado na forma de instrumento cultural que se manifesta na disputa por significação das
classes no espaço onde o discurso se apresenta. Para entender as questões de luta ideológica
e chegar a uma resposta para nossa pergunta anterior, precisamos primeiro pensar sobre a
teoria do signo ideológico de Bakhtin, assim como fez Hall. Para Mikhail Bakhtin, além
das questões da herança da fala, como a polifonia
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que mantém harmonicamente, em um
elo de cadeia, vozes dos discursos dialogando com outros discursos e sendo reconstruídos
sempre como heranças da fala, foi mais valioso para Hall pensar que todo signo é
ideológico e que o dialogismo (elos em cadeia) é o que faz as vozes interagirem no interior
do texto, gerando significados e novos valores.
A partir dessa visão, Hall propõe reflexões acerca da importância da arena de
conflito, onde aparecem lutas de resistência, batalhas por significar. Se todo signo é
ideológico, como afirma Bakhtin, a ideologia é uma luta pela significação. Portanto, nas
narrativas, onde tais significações emergem como embates, há um lugar de visibilidade por
esses jogos de força e poder. O discurso narrativo, portanto, é uma arena ideológica, no
qual se apresenta também a produção de hegemonia (levando-se em conta que toda
hegemonia pressupõe a contra hegemonia), deslocada no fluxo dos acontecimentos.
Neste sentido, como aponta Stuart Hall, o conceito de dialogismo recuperou e
ampliou os limites da contradição dialética e da razão dualista ao oferecer uma
interpretação ampliada e múltipla dos sentidos.
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A rigor, a ampliação da questão da
dominação já tinha sido operada pelo pensamento de Antonio Gramsci, ao conceber a idéia
de hegemonia sempre a partir de um duplo, ou seja, visualizando as ações contra-
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STUART, Hall (2003, p.267). O autor está trabalhando com o conceito de ideologia no sentido proposto
por Bakhtin: uma prática discursiva, “arena onde se desenvolve a luta de classes”. Para ele, ideologias são
sistemas de representação, mas também práticas concretas.
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A polifonia é esta variedade de vozes dentro de um texto, em contradição transformando-o em diálogo.
Todo discurso sempre está relacionado a outro discurso. Nem sempre é conhecida dos autores a existência em
seu texto de outras vozes, estas podem estar muitas vezes explícitas em citações ou referências, mas também
se manter ocultas. Qualquer discurso sempre estará, desta forma, impregnado pelas vozes de outros discursos
com os quais ele dialoga. Com relação a estes enunciados que antecedem, Bakhtin diz que "o locutor não é
um Adão bíblico, perante objeto virgem". (BAKHTIN, Mikhail, Estética da criação verbal, São Paulo,
Martins Fontes, 1992, p.314)
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HALL, op. cit., p. 235.