Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“Júlio de Mesquita Filho”
FAAC FACULDADE DE ARQUITETURA ARTES E COMUNICAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO MIDIÁTICA
RAQUEL CABRAL
ESTRATÉGIAS DA COMUNICAÇÃO
NO CINEMA PÓS-11 DE SETEMBRO –
A legitimação da guerra
BAURU/SP
Novembro/2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“Júlio de Mesquita Filho”
FAAC FACULDADE DE ARQUITETURA ARTES E COMUNICAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO MIDIÁTICA
RAQUEL CABRAL
ESTRATÉGIAS DA COMUNICAÇÃO
NO CINEMA PÓS-11 DE SETEMBRO –
A legitimação da guerra
Dissertação de Mestrado apresentada por
Raquel Cabral ao Programa de Pós-Graduação
em Comunicação – Área de Concentração:
Comunicação Midiática, Linha de Pesquisa
em Gêneros, Formatos na Cultura Midiática,
da Faculdade de Arquitetura, Artes e
Comunicação da Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” – Campus Bauru-SP,
como requisito para a obtenção do Título de
Mestre em Comunicação Midiática,
desenvolvida sob a orientação do Prof. Dr.
Maximiliano Martin Vicente.
BAURU/SP
Novembro/2006
ads:
DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO
UNESP – BAURU
Cabral, Raquel.
Estratégias da comunicação no cinema pós-11 de
setembro : a legitimação da guerra / Raquel Cabral,
2006.
115 f.
Orientador : Maximiliano Martin Vicente.
Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual
Paulista. Faculdade de Arquitetura, Artes e
Comunicação, Bauru, 2006.
1. Comunicação. 2. Estratégia. 3. Cinema. 4.
Política. I – Universidade Estadual Paulista.
Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação. II -
Título.
Ficha catalográfica elaborada por Maristela Brichi Cintra – CRB 5046
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“Júlio de Mesquita Filho”
FAAC FACULDADE DE ARQUITETURA ARTES E COMUNICAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO EM COMUNICAÇÃO MIDIÁTICA
A Dissertação ESTRATÉGIAS DA COMUNICAÇÃO NO CINEMA PÓS-11 DE
SETEMBRO – A legitimação da guerra, desenvolvida por RAQUEL CABRAL, foi
submetida à Banca Examinadora como exigência para obtenção do Título de Mestre em
Comunicação Midiática, junto ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação, na
Área de Concentração em Comunicação Midiática, Linha de Pesquisa Gêneros,
Formatos na Cultura Midiática, da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação –
Universidade Estadual Paulista, Campus de Bauru-SP.
Orientador:
Prof. Dr. Maximiliano Martin Vicente
Doutor em História Social pela USP – Universidade de São Paulo
Instituição: Universidade Estadual Paulista – FAAC/Bauru-SP
Área de Pesquisa: Comunicação, História, Nova ordem internacional.
Banca examinadora:
Prof. Dr. Murilo César Soares
Doutor em Ciências da Comunicação pela USP – Universidade de São Paulo
Instituição: Universidade Estadual Paulista – FAAC/Bauru-SP
Área de Pesquisa: Comunicação, Propaganda, Retórica.
Prof. Dr. Sidney Ferreira Leite
Doutor em História Social pela USP – Universidade de São Paulo
Instituição: Universidade Metodista de São Paulo, UMESP, Brasil.
Área de Pesquisa: História, Cinema e Política.
BAURU/SP
Novembro/2006
Dedico este trabalho a todas as vítimas de guerras.
Agradecimentos
Agradeço aos familiares e amigos, que partilharam comigo da
fabulosa experiência de viver o cinema intensamente, diante dos
filmes que assistimos
.
Agradeço meu orientador, Prof. Max, por ter me acolhido como
orientanda e por ter sido para mim, referência de todas as
qualidades do que é ser um verdadeiro professor.
Agradeço à banca examinadora deste trabalho, pela especial
contribuição do Prof. Murilo que desde a Qualificação pôde me
apontar caminhos valiosos na construção dessa pesquisa. E na rica
presença do Prof. Sidney, por ter aceitado o convite e cuja
contribuição vem reafirmar a consistência da Análise Política,
principalmente ao ver que nossas pesquisas dialogam.
Por fim, agradeço a UNESP-Bauru, através de seus professores,
funcionários e amigos, por me receberem nos seus bancos escolares
desde o Colégio, depois na Graduação e agora no Mestrado. Espero
que como professora, eu possa devolver à sociedade, todo
conhecimento e humanismo que a experiência na Universidade
Pública me proporcionou.
A todos, meus sinceros agradecimentos.
“Guerra!
Esta palavra implica geralmente na
subordinação de qualquer trabalho no
campo da arte, especialmente de sua
teoria e de qualquer trabalho de
investigação, às necessidades bélicas.
Os problemas da Cultura, da Estética
e das Ciências Humanas são
automaticamente deixados para
último plano. Somente a guerra, com
suas indústrias e atividades,
permanece no centro das atenções.
Mas a guerra de nossos dias atuais
não é uma guerra comum. É a guerra
da humanidade emancipada e
progressista contra os bárbaros.
Não é uma guerra por mercados, ou
colônias, por novos territórios ou pela
mera conservação de fronteiras. Essa
guerra mundial supera estreitos
objetivos.
Esta guerra visa todos os ideais da
raça humana contra o tenebroso
mundo da barbárie. [...]
Uma guerra cujo propósito final não é
destruir e sim construir. Uma guerra
para devolver o aspecto e a dignidade
de seres humanos a esses povos
oprimidos agora pelo plano fascista da
dominação do mundo.
Tudo o que há criado o espírito do
homem e o gênio das nações em
milhares de anos, está ameaçado pela
aniquilação total.
A magnífica resistência de homens e
mulheres contra o fascismo prossegue
debaixo da bandeira da cultura
humana redimida, resguardando-a
para o momento em que a Terra será
libertada. Porque ao consagrar todas
as nossas forças à luta contra os
inimigos da humanidade, não
devemos desistir do trabalho criador e
da análise teórica. Eles também são
fatores desta luta.”
Eisenstein, 1942.
RESUMO – ABSTRACT – RESUMEN
Resumo: Pensando nas sofisticadas estratégias da comunicação, que ora seduzem, ora
inibem valores e legitimam ideologias, é que analisamos o cinema sob um ponto de vista
político. Neste sentido, nos perguntamos: como estudar uma arte, que ao mesmo tempo em
que é arte, é também um meio de comunicação? Acreditamos que, conhecer sua
manifestação no interior das sociedades é também compreender como arte e política se
relacionam, pautando e influenciando muitas vezes, o cotidiano das populações, no nosso
caso, através de filmes e trailers de “guerra”. Assim, é que nossa pesquisa essencialmente
qualitativa, interpreta o cinema: como espaço de mediação entre Cultura, Política, Mercado
e Sociedade, um campo de batalha da Comunicação Social, que recria a guerra
cinematográfica para discutir ou reafirmar valores que promovem e incentivam conflitos;
para criticar posicionamentos políticos, para resistir à hegemonia nas suas mais diversas
faces e quem sabe assim, vir a apontar os caminhos rumo a uma Cultura da Paz.
Palavras-chave: Comunicação. Estratégia. Cinema. Política.
Abstract: We analyze the cinema under a political a point of view when we think about
high strategy of communications, which sometimes enchant or sometimes hinder values
and became truth some ideology. This way, we ask ourselves: How study an art, which the
same time is an art and also media? We believe on knowing this manifestation in the inner
of societies is also understand how art and politic are related, they often show and flow into
the daily life of the people, in our condition, this influence is through war films and war
trailers. So, in our quality survey we explain the cinema like a space of meditation among
culture, politic, market and society, a battle field of social communication, where rebuild a
war of the cinema to discuss or to reaffirm values which promote and estimulate conflicts,
criticize politics attitude , to resist to the hegemony in their different ways and who knows,
point a way to a Culture of Peace.
Keywords: Comunication. Strategy. Cine. Politics.
Resumen: Pensando en las sofisticadas estrategias de la comunicación, que por veces
seducen y otras, inhibe valores y legitiman ideologías, es que analizamos el cine a partir de
un punto de vista político. En ese sentido, nos preguntamos: ¿Cómo estudiar una arte, que
al mismo tiempo en que es arte, es también un medio de la comunicación? Creamos que
conocer su manifestación en el interior de las sociedades, es también comprender como arte
y política se relacionan, pautando y influenciando el cotidiano de las populaciones, en
nuestro caso, a través de películas y trailers de “guerra”. Así es que nuestra pesquisa
esencialmente cualitativa interpreta el Cine: como un espacio de mediación entre Cultura,
Política, Mercado y Sociedad, un campo de batalla de la Comunicación Social, que recría la
guerra cinematográfica para discutir o reafirmar valores que hacen la promoción y
incentivan los conflictos, para criticar los posicionamientos políticos, para resistir a la
hegemonía en sus más diversas facetas, y quien sabe así, llegar a apuntar los caminos rumo
a una Cultura de la Paz.
Palabras claves: Comunicación. Estrategia. Cine. Política.
Sumário
INTRODUÇÃO
PARTE I – CINEMA: ESPAÇO DE MEDIAÇÃO ENTRE CULTURA,
POLÍTICA, MERCADO E SOCIEDADE
1 Capítulo I – O sentido do cinema – seus significados para a
comunicação e as implicações em sociedade ....................... 03
1.1 A sedução como processo emocional: a arte do convencimento. 08
1.2 Cinema e Comunicação: algumas estratégias emocionais........... 16
2 Capítulo II – O uso político do cinema ..................................... 25
2.1 A história que inspira o cinema, o cinema que pauta a
sociedade ..................................................................................... 28
2.2 Alguns usos políticos do cinema em “Triunfo da Vontade” na
Alemanha Nazista e no “Star-System” de Hollywood.................... 38
PARTE II – UMA ANÁLISE POLÍTICA DE TRAILERS E FILMES DE
GUERRA PÓS-11 DE SETEMBRO
3 Capítulo III – O contexto de análise: um início de século
marcado pela guerra cinematográfica e pelo “messianismo
de mídia”...................................................................................... 43
3.1 “Era da Emergência”..................................................................... 44
3.2 11 de setembro de 2001: o evento que inaugura o novo século.. 54
4 Capítulo IV – Trailers e filmes legitimando os valores do
novo século – Uma análise......................................................... 63
4.1 Fase 1 – Mapa temático – filmes produzidos pela indústria
cinematográfica norte-americana entre 2001 a 2005.................... 65
4.2 Fase 2 – Análise Política aplicada aos trailers de cinco filmes de
guerra (Entre 2001 a 2005) .......................................................... 71
4.3 Cruzada no cinema x “Cruzada contra o terrorismo” – uma
análise de “Kingdom of Heaven” .................................................. 98
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................... 107
REFERÊNCIAS ........................................................................
111
LISTA DE ANEXOS .................................................................
115
INTRODUÇÃO
Pensando na predominância que o audiovisual tem em termos de informação e
sedução no mundo contemporâneo, é que focamos o cinema como objeto de estudo neste
trabalho.
A partir de uma abordagem que vai desde uma análise de conjuntura do mundo
contemporâneo, perpassando as estruturas produtivas da indústria do cinema diante dos
conglomerados de mídia e entretenimento, queremos ressaltar a importância de estudar o
cinema como campo de mediação entre Cultura, Política, Mercado e Sociedade, portanto
como um fenômeno que interessa à comunicação.
A pertinência de uma análise crítica sobre o cinema, nos aponta a necessidade de
compreender uma arte que, ao mesmo tempo em que é arte, também é um meio de
comunicação. Com isso, subentendemos, que ele não apenas contempla sofisticadas
técnicas artísticas, mas também, eficientes estratégias da comunicação, que buscam seduzir
e persuadir o espectador, e é especialmente produzido com esta finalidade.
Por isso, na intenção de conhecer melhor essa configuração contemporânea da
comunicação, é que privilegiamos a Análise Política de Douglas Kellner que utiliza
concepções advindas da Economia Política, da História e da Teoria Social, para identificar
as possíveis relações de um produto midiático com o seu contexto histórico. Esse método
de análise nos auxiliará nas leituras dos produtos cinematográficos selecionados,
procurando conferir um caráter essencialmente qualitativo e interpretativo para os dados de
nossa pesquisa.
Traremos também a contribuição de alguns outros teóricos e pensadores que, em
determinados posicionamentos se complementam. Para nós, a principal contribuição de
Walter Benjamin e seu olhar para o cinema e para a comunicação, se referem ao seu
entendimento sobre um cinema antes e depois da chamada “era da reprodutibilidade
técnica”. Para ele, o cinema antes da “Indústria cultural” e da introdução das técnicas
capazes de reproduzir uma obra de arte, podia ser compreendido como “ritual”, e depois,
passa a ser uma “prática política”.
Outro pensador sobre o cinema é Gerard Betton, cuja principal contribuição para
nossa pesquisa é em relação à sua compreensão sobre a estética. Para ele, a idéia de estética
e de beleza está intimamente ligada às épocas. As técnicas de uso da luz, da cor, de
dilatação e contração do tempo no cinema, variam de acordo com a concepção estética de
cada época. Portanto, estudar a estética em “determinado” momento histórico, é também
conhecer e entender o pensamento individual e coletivo da sociedade “daquele” período.
Martín-Barbero, também traz uma importante contribuição para nosso trabalho a
respeito de seus estudos sobre Cultura, Comunicação e suas relações com os processos de
formação e de deslocamento de Poder. Para ele, os processos culturais que ganham
dinamismo através dos processos criados pela comunicação, produzem um efeito inegável
no campo político e social. Daí a importâncias dos estudos acerca da Comunicação, Cultura
e Política.
Já, Marc Ferro, pesquisador das relações entre Cinema e História, complementa
nossa pesquisa no que se refere à valorizar o elemento contextual no exercício de análise de
determinado obra. Para ele, uma obra de arte ou um produto cultural, mantém uma íntima
relação com o contexto histórico em que é pensado e produzido, e por isso, podem revelar
componentes importantes a respeito de determinadas épocas e suas ideologias.
Por fim, ao reunir todos esses pensadores, entendemos que o ponto de convergência
de seus posicionamentos e contribuições se dá no campo da Política. Para nós, todos eles
apontam para uma questão de extrema importância na contemporaneidade, que é a nítida
relação da Política ocupando um espaço de Mediação junto às esferas da Cultura, do
Mercado e da Sociedade. Isso é particularmente importante quando queremos entender a
forma como ela cria e sedimenta “laços” e também legitima valores.
Neste sentido, procurando conferir organização a estes pensamentos e discussões,
dividimos o presente trabalho em duas partes. A primeira tem como objetivo introduzir as
análises políticas, discutindo, inicialmente, no capítulo 1, questões que envolvem cinema e
comunicação, e suas implicações na sociedade: como se manifesta, como atua, qual seu
significado para as massas, suas estratégias que acionam mais a emoção que a razão das
multidões.
No capítulo 2, abordaremos como isso tudo se relaciona com a Política. Para
evidenciar essa relação, apresentaremos alguns exemplos do uso político do cinema na
história, como ocorreu na Alemanha Nazista e ainda ocorre em Hollywood.
Já, na segunda parte, nos dedicamos às análises políticas de cinco trailers de filmes
de “guerra” produzidos no mesmo período (de 2001 a 2005) pela indústria norte-americana
de cinema. E finalmente, traremos a análise do filme “Cruzada” ou Kingdom of Heaven
(2005) no qual pretendemos traçar algumas possíveis relações com o contexto histórico
contemporâneo, num contraponto entre o filme e seu trailer.
Aliás, para justificar o recorte sobre o formato trailer, recaímos sobre a intenção de
estudar um formato característico da publicidade cinematográfica, embora muito copiado
também, por outras mídias e que resume em si mesmo, técnicas advindas da estética do
cinema com as persuasivas estratégias retóricas da comunicação.
Diante disto, nos perguntamos: será que esse formato e técnica discursiva
contribuem para a formação e aceitação de alguns valores, que nem sempre são tão
agressivos e evidentes no próprio filme? Será que ele torna esses valores mais atraentes e
por isso, os legitima?
Queremos com essas perguntas, visualizar quais as possíveis técnicas da
comunicação utilizadas pelo trailer e qual delas predominam na maioria destes produtos.
Com isso, acreditamos ser possível verificar os elementos técnicos ou estratégicos, pelos
quais, o cinema torna mais atrativa uma mensagem, tornando-a mais aceita por parte do
público em detrimento de outra.
No entanto, para esta tarefa, sentimos a necessidade de olhar ao redor de nosso
objeto de estudo, procurando contextualizá-lo no tempo, a exemplo do que defende Kellner,
(que privilegia o contexto), para que se possa chegar a uma Análise Política mais fiel
possível de tais produtos culturais.
Com esta intenção, precedendo a apresentação dos trailers e do filme, no capítulo 3
faremos uma análise de conjuntura dos primeiros cinco anos do século XXI,
surpreendentemente inaugurado com os atentados de 11 de setembro de 2001, em Nova
York, período este denominado por alguns analistas de a “Era da Emergência”.
Dentre as questões que envolvem o próprio contexto deste período e das principais
transformações sociais deste início de século, queremos refletir sobre as articulações da
indústria cinematográfica de Hollywood, que envolvem grandes conglomerados de mídia, e
que dominam a maior parte do entretenimento audiovisual no mundo.
No capítulo 4, depois de ilustrar essas observações e fazer as análises dos produtos
selecionados, apresentaremos alguns dados a respeito da tendência de temas retratados nos
filmes produzidos por essa indústria no mesmo período, através de um Mapa temático e de
alguns gráficos que nos ajudarão a compreender a organização e a articulação comercial e
política de uma das maiores indústrias do entretenimento mundial.
Na seqüência, traremos por fim, a análise política dos trailers dos cinco filmes de
“guerra” que tiveram repercussão nacional e internacional, e iremos submetê-los a uma
tabela de categorias previamente criada com a intenção de identificar alguns elementos
comuns a todos eles, e que apontem as técnicas artísticas e as estratégias comunicacionais
que adotaram. Através delas, é que queremos verificar o elemento político presente nestas
obras, que ora apelam para a inspiração artística, ora para a persuasão publicitária e
comunicacional para tornar suas ideologias mais atrativas.
Por fim, nos perguntamos a essa altura: com que intenção eles atuam de tal
maneira? Meramente para vender um filme? Tamanha sofisticação contida em um formato,
aparentemente simples e breve, mas de relevante eficácia, não poderia ser utilizado mais
amplamente para outras finalidades, além da comercial?
Esta é a pergunta com que iniciamos essa jornada dissertativa e que justifica a
escolha dos trailers especificamente de “guerra” para a análise: Por que não
empreendermos as mesmas técnicas encontradas no trailer (estratégias de sensibilização e
persuasão que ora inibem, ora divulgam valores), em produtos midiáticos, que privilegiem
conteúdos mais éticos, democráticos e humanos?
Reconhecemos que a resposta para este questionamento, talvez não se encontre aqui
nestas páginas; mas certamente através delas, essa pergunta comece a ser abordada pelos
leitores deste trabalho.
“ Na primeira noite, eles se aproximam
e roubam uma flor do nosso jardim,
e não dizemos nada. ...
PARTE I
CINEMA: ESPAÇO DE MEDIAÇÃO ENTRE
CULTURA, POLÍTICA, MERCADO E SOCIEDADE
Como estudar uma arte que, ao mesmo tempo, que é arte, é também um meio de
comunicação? Como entendê-la em meio à complexidade em que se manifesta entre os
anseios sociais de um mundo pós “Luzes”?
Será a emoção ou a razão que nos leva às salas de cinema em busca de diversão,
informação, entretenimento ou conhecimento? Encontramos na obra cinematográfica um
sentido para nossa realidade? Em alguns momento, fazemos uso do cinema para explicar,
imitar ou confortar nossas vidas?
São vários os questionamentos que nos motivam a olhar para um ponto de vista em
que o cinema, dentre as várias análises e estudos já feitos, surge para nós como uma arena,
palco de mediação de importantes questões que a comunicação há muito investiga. Cultura,
Política, Mercado e Sociedade nos apontam apenas uma ponta do iceberg da discussão, que
não se esgota aqui. O papel que o cinema adquiriu nas últimas décadas, não pode ser
atribuído apenas à sua capacidade de entreter e divertir. Algo além disto tem despertado o
interesse de outras áreas, além da Arte e da Cultura, e tem prestado um importante serviço
às sociedades.
Em face de um mundo pós I e II Guerra vemos quão significativa foi a presença do
cinema em meio ao angustiante cotidiano da guerra, da resistência e da desesperança. Na
falta de pão, muitos homens, mulheres e crianças se alimentaram da magia que a imagem
em movimento podia lhes dar, que a fantasia lhes fazia esquecer.
Por outro lado, muitos governos percebendo esse fascínio sobre as multidões, se
apropriaram do cinema para seduzir e convencer a favor de suas ideologias, especialmente
na segunda metade do século XX.
Na atualidade, em face do grande deslocamento do poder no mundo, poderíamos
dizer que mais intensamente, no mundo pós-virada de século, ao invés de Governos ou
Estados, são os grandes grupos de interesses que criam e sedimentam mercados, e para isso,
fazem uso de toda e qualquer estratégia de convencimento ideológico ou persuasão
econômica.
Diante disso, nossa preocupação nessa primeira parte do trabalho, é discutir sobre
estas relações que ora se opõem, mas por vezes, se complementam, agindo potencialmente,
em nossas práticas sociais através do cinema, o que implica necessariamente, em
compreender essa discussão, como uma das investigações possíveis da Comunicação
Social.
Capítulo 1
O SENTIDO DO CINEMA –
SEUS SIGNIFICADOS PARA A COMUNICAÇÃO E AS
IMPLICAÇÕES NA SOCIEDADE
Eisenstein dizia que uma obra de arte verdadeiramente viva, distinta de uma
produção sem vida, é aquela concebida dinamicamente, ou seja, pensada a partir de uma
imagem, que faça com que os sentimentos surjam, cresçam, originem outros, enfim,
vivam antes de tudo, no espectador.
O grande gênio da montagem cinematográfica defendia que a obra de arte, entre as
mais dinâmicas, como um filme, às mais estáticas como uma pintura, só é viva, se
conseguir imitar a vida real, se conseguir iniciar o processo de criação de imagens novas na
consciência e nos sentimentos humanos, e por conseqüência, ordená-los, o mais próximo
possível, daquelas imagens concebidas pelo autor.
Porém, para gerar uma imagem, a obra de arte deve contar com um método, que
Eisenstein chamou de “cadeia de representações”.
Examinemos por exemplo, a figura geométrica de um relógio. Logo, ela fará surgir
em nossa consciência, uma imagem que representa o tempo. Mas, há casos na cena de um
filme, por exemplo, que o importante não é perceber a hora cronométrica do relógio, mas
sim, experimentar todas as associações e sensações que determinada hora dele, pode evocar
no espectador. Pode ser a representação da “meia-noite” como de a “hora fatal”, a “hora da
morte”, a ansiosa espera de um encontro, enfim, uma hora plena de sentido.
O belo exemplo que Eisenstein cita em seu livro “El sentido del cine” (1974)
1
, de
Bol Ami, de Maupassant, mostra a técnica de um escritor que consegue “gravar na
consciência e nas sensações do leitor, a qualidade emocional da meia-noite” (1974, p.25). A
cena é aquela que George Duroy está no carro esperando Suzanne, que havia prometido sair
com ele à meia-noite.
“Salió alrededor de las once, anduvo un rato, tomo un coche
y se hizo conducir hasta la Plaza de la Concordia, cerca del
Ministerio de Marina. De vez en cuando encendrá un fósforo
1
EISENSTEIN, Serguei. El sentido del cine. Buenos Aires: Siglo XXI Argentina Editores S.ª, 2ª ed., 1974.
para ver la hora en su reloj. Cuando advirtió que se
aproximaba la medianoche, su impaciencia se hizo febril. A
cada rato se asomaba por la ventanilla. Un reloj lejano dio las
doce, luego otro más cercano, después dos a la vez, por
último, uno muy distante. Cuando este dejó de sonar, pensó:
‘Se acabó. Es un fracaso. Ella no vendrá’. Sin embargo,
había resuelto esperar hasta el alba. En estas cosas hay que
ser paciente. Oyó dar el cuarto de hora, luego la media, y la
menos cuarto, y todos los relojes repitieron ‘la una’ como lo
habían hecho con la medianoche”. (EISENSTEIN, 1974, p.
25)
Neste trecho, o autor não se limitou a descrever a cena, mas nos obrigou a
experimentar a sensação da meia-noite
, fazendo com que em diferentes lugares, distintos
relógios, batessem a “meia-noite”. Com isso, Eisenstein vai afirmar que as combinações
das badaladas de todos esses grupos de relógios, estrutura-se em uma única sensação geral:
a imagem da “meia-noite
”. Isso só é possível, graças à técnica da montagem, que enfatiza o
elemento emocional, mesmo que ele fuja à lógica real.
Por isso, o efeito principal desse angustioso soar de relógios em Maupassant é a
notável acentuação da imagem emocional
da hora funesta da “meia-noite” e não a simples
informação de que são “doze horas”. Isso nos aponta, dentre outras questões, a ver o
inegável efeito desta arte, que buscando essencialmente, o sentido da imagem, nos permite
ter a experiência do sentido da representação.
“Si el objeto de Maupassant hubiese sido simplemente
informar que eran las doce, difícilmente habría recurrido a
tan pulido trozo literario. Recíprocamente, sin esta solución
de montaje, cuidadosamente elegida, no habría logrado con
tanta facilidad un efecto emocional innegable”.
(EISENSTEIN, 1974, p. 26, grifo nosso)
O autor também cita a pintura de Leonardo D´Vinci emEl Dilúvio”, na qual o
artista consegue sintetizar em detalhes a imensa “ópera poética” deste acontecimento
bíblico. Para ele, nessa obra, Leonardo cumpre perfeitamente, não só a tarefa de pintar os
detalhes, como também de delinear a trajetória do futuro movimento da atenção sobre a
superfície da tela. A distribuição de detalhes em um quadro, sobre um plano único, supõe
também o movimento dos olhos dirigido de um fenômeno a outro, com um sentido de
“composição”, como faz a montagem.
Por suposição, compor uma cena no cinema, implica também, em criar um
movimento, onde o olhar humano possa discernir os detalhes numa única ordem,
determinada pela montagem. Essa, por sua vez, tem a tarefa de justapor as imagens
separadas gerando a síntese do tema, do sentido da obra. Na realidade, Eisenstein vai
afirmar que “Es la imagen que incorpora el tema
” (1974, p. 31).
Pasando de esta definición al procceso creador, veremos que
éste se cumple de la seguiente manera: Ante la visión
interior, ante la percepción del creador, está en suspenso
cierta imagen, encarnación emocional del tema. La tarea que
se presenta es transformar esa imagen en unas pocas y
básicas representaciones parciales, las cuales, combinadas y
yuxtapuestas, evocarán en la conciencia y sentimientos del
espectador, lector u oyente, la misma imagen general que
estuviera en suspenso ante el artista creador. (EISENSTEIN,
1974, p. 31)
Diante destas concepções sobre a montagem no cinema, podemos concluir que a
técnica cinematográfica ademais de bela, não é ingênua. Trata-se de uma arte complexa,
pensada e planejada, a fim de suscitar no espectador, uma imagem que surja, que nasça a
partir de elementos representativos separados, mas que são reconstruídos finalmente na
percepção humana de quem assiste. Esse é o objeto final do esforço criador de todo artista.
Conclui-se então, que se há uma intenção na prática desta técnica, há necessariamente, uma
escolha. E se há uma escolha, há por suposição, uma ideologia.
Sobre esta concepção, Walter Benjamin
2
, influenciado pelas idéias marxistas, via a
técnica cinematográfica sobre uma perspectiva positiva, mesmo frente às críticas fervorosas
da indústria cultural, que ganhavam destaque em sua época. Para ele, a reprodução e a
popularização da arte, por meio da técnica, que se intensificava já em meados do século
XX, representava a transformação que a função social da arte iria tomar mais à frente, rumo
a uma função política.
[...] com a reprodutibilidade técnica, a obra de arte se emancipa, pela
primeira vez na história de sua existência parasitária, destacando-se do
ritual. A obra de arte reproduzida é cada vez mais a reprodução de uma
obra de arte criada para ser reproduzida (...) Mas, no momento em que o
2
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. São Paulo: Brasiliense,
1985.
critério de autenticidade deixa de aplicar-se à produção artística, toda a
função social da arte se transforma. Em vez de fundar-se no ritual, ela
passa a fundar-se em outra prática, a política. (BENJAMIN, 1985,
171, grifo nosso)
Como aponta Benjamin, outros teóricos também partiram para a mesma linha de
reflexão. A preocupação com uma leitura política desta arte, aparentemente, inocente e
muito bela, reúne componentes polêmicos, como ressalta o pesquisador norte-americano
Douglas Kellner, da terceira geração dos Estudos Culturais. Ele propõe uma análise política
dos “media” em camadas cada vez mais profundas; método que ele vai chamar de “Estudo
cultural multiperspectívico” e o seu resultado é denominado “Crítica diagnóstica”.
[...] um estudo cultural multiperspectívico utiliza uma ampla gama de
estratégias textuais e críticas para interpretar, criticar e desconstruir as
produções culturais em exame. O conceito inspira-se no perspectivismo
de Nietzsche, segundo o qual toda interpretação é necessariamente
mediada pela perspectiva de quem a faz, trazendo, portanto, em seu bojo,
inevitavelmente, pressupostos, valores, preconceitos e limitações. Para
evitar a unilateralidade e a parcialidade, devemos aprender como
empregar várias perspectivas e interpretações a serviço do conhecimento.
(KELLNER, 2002, p. 129, grifo nosso)
3
O método proposto por Kellner, consiste em traçar o máximo de dimensões políticas
e ideológicas em perspectivas como, por exemplo, perspectiva estrutural, formal, de gênero,
psicanalítica, e outras mais que forem necessárias, sobre os produtos culturais. Desta forma,
na intersecção das várias perspectivas, estará evidenciada a maior probabilidade de uma
leitura mais consistente sobre o texto midiático, no nosso caso, o cinematográfico.
O método é necessariamente histórico e dialético, e nos permite percorrer a
dinâmica da produção destes textos culturais, desde a sua concepção, planejamento,
produção e distribuição.
Como o próprio Kellner (2001, p.163) ressalta, o método da “Análise política” se
utiliza da história e da teoria social para analisar textos culturais, e faz uso destes mesmos
textos, para elucidar tendências, conflitos, possibilidades e anseios históricos. Trata-se de
um estudo cultural contextual, cuja leitura através de textos e do próprio uso da história
3
KELLNER, Douglas. A cultura da mídia – estudos culturais: identidade e política entre o moderno e o
pós moderno. Bauru-SP: EDUSC, 2001.
para ler estes mesmos produtos culturais, já havia sido empregado por Theodor Adorno e
Walter Benjamin na década de 60, via análise da indústria cultural. Já o desenvolvimento
da “crítica diagnóstica” é empregado pela primeira vez pelo próprio Kellner e Ryan em
1988.
4
Cada método crítico tem seus pontos fracos e fortes, seus clarões e pontos
cegos. As críticas feitas com base na ideologia marxista sempre foram
fortes na contextualização histórica das classes e fraca na análise formal,
sexual, racial; o feminismo é excelente na análise dos aspectos sexuais,
mas às vezes, ignora questões de classe, [...]; o estruturalismo é útil na
análise da narrativa, mas tende a ser excessivamente formal; a psicanálise
convida à hermenêutica da profundidade e à articulação do conteúdo e dos
significados do inconsciente, mas às vezes, ignora a determinação
sociológica dos textos e dos indivíduos. Portanto, quanto mais métodos
críticos como esses tivermos, maiores serão as probabilidades de produzir
leituras críticas, reflexivas e multilaterais. (KELLNER, 2001, p. 131)
Por essa razão, é que propomos utilizar neste trabalho, essencialmente, a
contribuição de Kellner através de seu método da Análise Política com algumas
contribuições de outros autores, que por hora, possam complementar seu pensamento.
Contudo, Kellner chamou esta análise de “Análise política da mídia”, porque
fatalmente, se chegam aos elementos políticos estruturantes do sistema produtivo cultural
de uma obra, e esta revelação interessa à comunicação, por ser ideológica, revelando
interesses e intenções veladas, através da sedução no discurso midiático, da retórica.
4
KELLNER, Douglas & RYAN, Michael. Câmera Política: The Politics and Ideology of Contemporary
Hollywood Film. Bloomington: Ind. Indiana University Press, 1988.
1.1 A SEDUÇÃO COMO PROCESSO EMOCIONAL
A retórica no cinema se dá em vários sentidos e âmbitos, como por exemplo, através
do domínio do tempo, que é um exemplo das mais notáveis performances do cinema.
“Descontinuidade, câmera lenta, aceleração, inversão da escala do tempo, todas essas
trucagens – que só o cinema permite – têm um inestimável valor educativo, científico,
filosófico, humorístico e artístico” (BETTON, 1987, p.17)
5
. Este fenômeno belo e simples,
que consiste em variar a orientação temporal, interrompendo-a, alongando-a, encurtando-a
e até mesmo, invertendo-a, é o extraordinário do espetáculo narrativo.
Estudar o cinema sob o ponto de vista político, como sugere Kellner (2003) e
geopolítico como já apontou Barreto (1999)
6
, nos motiva a olhar para a história na busca
por algumas respostas às prerrogativas que nos mostram, como o cinema foi se estruturando
durante os anos e chegou ao que é e representa para nós hoje.
Parece-nos relativamente fácil, aceitar que preconceitos e crenças individuais
alterem nossa forma de ver o mundo. No entanto, pode ser mais difícil entender que os
meios tecnológicos com os quais interagimos e estamos inseridos, façam o mesmo, ao
filtrar nossa percepção de espectadores, e por conseqüência, influam também em nossa
compreensão do mundo através das representações, as quais, toda a mídia se utiliza.
Segundo Macluhan (1985)
7
, ambos os processos são semelhantes, pois funcionam como
“janelas” por onde atravessa o nosso olhar e, inevitavelmente, nossa percepção e
interpretação de mundo, são de alguma maneira, influenciados.
Castells (1999)
8
, afirma que, uma das maiores mudanças em razão da experiência
do homem moderno com a tecnologia reside nas relações sociais, que em decorrência dessa
influência perceptiva, passam de verticais para uma maior tendência à horizontalidade,
principalmente, com o uso da Rede.
5
BETTON, Gerard. Estética do cinema. São Paulo: Martins Fontes Editora, 1987.
6
BARRETO, Luiz C. A geopolítica da Cultura. Revista Cadernos do Terceiro Mundo, nº 210. Rio de
Janeiro. Ed. Terceiro Milênio, 1999.
7
MACLUHAN, Marshall. Visão, Som e Fúria. São Paulo: Brasiliense, 1985.
8
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede – A Era da Informação: Economia, Sociedade e Cultura.
São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1999.
Nisso, o cinema também se encaixa, com a própria digitalização, que como enfatiza
Maciel e Parente (2003)
9
, tende a criar uma experiência nova entre homem, obra de arte e
percepção. Nesse sentido, eles definem o termo “Ciberpercepção”, para conceituar essa
nova forma de mediação do homem contemporâneo com o cinema, através da tecnologia.
Ciberpercepção é a antítese do túnel da visão ou do pensamento linear. É
tudo ao mesmo tempo, percepção da multiplicidade de pontos de vista,
extensão de todas as dimensões do pensamento associativo, o
reconhecimento da transitoriedade de toda experiência, a relatividade de
todo conhecimento, a impermanência de toda percepção. (MACIEL &
PARENTE, 2003, p. 34)
Contudo, voltando ao pensamento de Eisenstein tal como foi apresentado, a respeito
dessa imagem, na qual, todo artista concentra esforços para fazê-la nascer no espectador,
deduzimos que há de fato, no cinema, uma intenção de seduzir.
Por conseqüência, se a sedução é uma prerrogativa do cinema, logo, estudar os
mecanismos e a estrutura da retórica do próprio cinema, é pois, importante área de
investigação da comunicação social, já que antes de ser uma arte, ele é um meio de
comunicação e se constitui como uma importante forma de expressão da sociedade.
Martín-Barbero dedica parte de sua investigação às relações entre a cultura social e
a política. Para ele, é preciso olhar para as questões que envolvem as expressões culturais
de uma sociedade e sua relação com a política. Mais que objetos de políticas, a
comunicação e a cultura constituem hoje, um campo primordial de batalha política: o
estratégico cenário que exige que esta mesma política recupere sua dimensão simbólica –
sua capacidade de representar o vínculo entre os cidadãos, o sentimento de pertencer a uma
comunidade.
Para ele, somente a política é capaz de sedimentar tradições, embora, o mercado
também o tente. A lógica de valores do mercado, implica em trocas puramente formais,
sem contudo, engendrar o sentido que tanto a coletividade busca.
É, porém neste espaço de mediação entre Política, Mercado e Sociedade que a
Cultura tem seu protagonismo, de forma a fazer-nos entender que todos os valores de uma
9
MACIEL, Kátia. & PARENTE, André. Redes sensoriais – arte, ciência e tecnologia. Rio de Janeiro:
Contra Capa Livraria, 2003.
sociedade são transmitidos, ensinados e veiculados nesta esfera, e de alguma maneira, pode
gerar um processo de reflexão, de resistência e/ou de transferência de poder.
Se falar de cultura política significa levar em conta as formas de
intersecção das linguagens e culturas na constituição de atores e do
sistema político, pensar a política a partir da comunicação, significa pôr
em primeiro plano os ingredientes simbólicos e imaginários presentes nos
processos de formação de poder. O que leva a democratização da
sociedade em direção a um trabalho na própria trama cultural e
comunicativa da política. (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 15)
Para Martín-Barbero, cuja essência de sua pesquisa teórica, baseia-se numa
solidariedade histórica sobre o estudo da cultura em diferentes sociedades, com especial
ênfase, na América Latina, é preciso pensar a dominação como um processo de
comunicação. É preciso mudar o lugar das perguntas, inverter os olhares, desfazer-se do
pensamento de que a tecnologia é hoje, o “grande mediador” entre as pessoas e o mundo,
quando na verdade, ela tem sim, um papel importante, mas na “...transformação da
sociedade em mercado, e deste em principal agenciador da mundialização (em seus muitos
contrapontos e sentidos)” (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 20).
Contudo, ainda é preciso ir além e ver como a cultura contemporânea está fazendo
uso da tecnologia no social, recriando “novas maneiras de estar juntos”, seja através de
comunidades na Internet, seja por meio de emissoras de rádio e TV, seja pela música de
rua, como o rap e o funk, ou ainda, pelo cinema trazendo-o de forma física e intelectual
para mais perto das massas. Isso pressupõe que de fato, estamos vivendo um momento na
história, em que cultura, política e comunicação, nunca estiveram tão próximos, nem se
diluíram tanto um no outro.
Neste sentido, voltando ao assunto da sedução que toda arte busca e que pressupõe a
existência de um discurso verbal ou não-verbal persuasivo ou livremente estético, olhamos
para duas peças da comunicação, ambas, produtos do cinema: de um lado, o FILME - obra
completa que integra elementos discursivos mais coesos e cuja narrativa busca transmitir
uma mensagem mais plena e cheia de sentido; do outro lado, o TRAILER, um instrumento
da publicidade contemporânea, utilizado não só pelo cinema, mas por outras medias, que
utilizam essa forma de “edição de fragmentos” para resumir uma obra maior e tentar atrair
a atenção do espectador. O trailer concentra em si mesmo, os componentes de uma
estratégia retórica de forma explícita, cuja narrativa (que ao contrário do filme, não busca a
coerência discursiva, tampouco, lógica), tem o objetivo de transmitir uma mensagem de
forma rápida, efetiva e imperativa, portanto, exige o uso concentrado de estratégias de
sedução, bem mais que o próprio filme.
Queremos analisar ambos sobre dois pontos de vista: o estético e o ideológico,
entendendo estas esferas de análise numa dinâmica de inter-relação, em que quase sempre
caminham juntas. E, por não serem dimensões involuntárias, ou seja, por serem dotadas de
técnicas aprimoradas para atingir um fim, as chamaremos de estratégia estética (ou
retórica) e estratégia ideológica (ou política).
Buscamos discutir a leitura política deste formato (trailer) que dialoga
simultaneamente com a arte (através da estética) e com a comunicação (através da retórica),
e de como esses componentes se relacionam com os estudos em torno da Economia
Política, algo que nos remeterá a analisar os mecanismos de atuação da política e do
mercado nas sociedades contemporâneas, através de produtos culturais, fazendo uso de
técnicas artísticas e publicitárias para seduzir e conquistar mercados. Isso nos aponta,
dentre outras questões, sobre a tendência da aproximação entre cultura e mercado,
intensificada nas últimas décadas.
Nosso foco irá se concentrar no método de análise destes formatos, o que pressupõe
nossa concentração nos estudos a respeito da PRODUÇÃO cinematográfica, e não
propriamente na RECEPÇÃO destes mesmos produtos por parte do público, como o faz
Martín-Barbero, embora ele seja para nós, uma referência teórica no que se refere às suas
concepções sobre cultura, política e hegemonia.
A intenção é fazer uma análise de conteúdo reflexiva da técnica de “edição de
fragmentos” adotada pelo formato (trailer), que é largamente utilizada, não só pela
publicidade cinematográfica, mas inclusive, por outros meios de comunicação: como a TV,
que faz uso desta técnica de síntese, para anunciar sua programação; ou os telejornais para
anunciar as notícias que serão apresentadas, a Internet através dos POP-UP´s para anunciar
produtos, divulgar outros sites; ou ainda como faz a primeira página do jornal impresso,
que com suas manchetes, tentam atrair o leitor para o conteúdo das próximas páginas; a
capa das revistas, que condensam informações quase sempre chocantes, atraentes e
sintéticas, na intenção de despertar o interesse do leitor para comprá-las. Enfim, a nosso
ver, são muitos os exemplos da adoção desta técnica que mistura de certa forma,
informação e publicidade, a fim de seduzir o público.
Embora não tenhamos encontrado o registro de outras pesquisas sobre este objeto de
estudo, (o TRAILER de cinema ouMOVIE PREVIEW” propriamente dito), nosso interesse
se deu no momento em que vimos sua transformação e evolução no tempo, para um modelo
e estruturação na contemporaneidade, muito mais sofisticada, concisa, com uma linguagem
menos direta do que era, por exemplo, nas décadas de 60 e 70, e bem mais profissional.
É sabido que hoje, as empresas que comercializam e distribuem filmes, investem
muito na produção de trailers para sua publicidade, e até compram espaços e tempos das
salas de exibição, que são destinados, justamente, para a publicidade cinematográfica.
Trata-se de um grande mercado, inclusive porque o cinema é hoje, um dos meios que mais
exigem investimentos, um dos mais caros e por necessitar de maior estrutura e tempo para
produção.
Em geral, os trailers não são produzidos pelos mesmos diretores do filme. Muitos
declaram nem reconhecerem seus filmes nos trailers publicitários, já que são releituras, re-
interpretações, novos olhares sobre a obra. É fato também, que eles muitas vezes, criam
tamanhas expectativas, o que gera em alguns casos, frustrações na hora que se assiste o
próprio filme, pois o trailer tem mesmo a função de seduzir, o que nem sempre é suprida
com a obra inteira. Neste sentido, ao analisar um filme, procuraremos avançar no sentido de
verificar como a mensagem contida nos trailers nem sempre se encontra nos seus próprios
filmes.
Contudo, não podemos e não queremos aqui, afirmar que a grande maioria do
público se veja seduzida por um trailer. Pode ser que muitos nem se sintam atraídos ou não
gostem. Por isso, só poderemos ter uma noção a respeito da receptividade destes formatos,
quando realizarmos uma pesquisa de recepção propriamente. Tarefa essa que não será
realizada neste trabalho, que apenas se deterá em iniciar o debate sobre o tema.
Neste sentido, entretanto, será necessário fazermos algumas observações e
considerações a respeito do cinema como um todo, para chegarmos na especificidade do
trailer num momento posterior. Inclusive, a respeito das estratégias estéticas e ideológicas
do cinema, visto a partir da análise de um trailer, (que é a síntese da narrativa do filme),
mesmo se tratando de um discurso retórico fragmentado, já que não contempla estruturas
textuais conexas, tampouco coerentes (início, meio e fim), sua objetividade subjetiva e sua
eficácia sobre a emoção humana – princípios da publicidade – parecem compensar toda sua
irracionalidade. Pode até ser, que um indivíduo não se sinta plenamente envolvido por um
trailer, contudo, como já dissemos há pouco, o que nos interessa nesse trabalho, é que o
trailer de fato, é especialmente feito para este fim – para seduzir o espectador, característica
esta que veremos ser demonstrada neste trabalho com a análise política dos filmes
selecionados..
Aliás, sobre isso, Chalita (1998, p. 16)
10
, assumindo o pensamento de Aristóteles a
respeito da retórica, no seu trabalho a respeito da investigação da sedução no discurso
utilizado por advogados e juristas nos tribunais do júri, ao analisar alguns filmes que
retratavam tais situações, chegou à conclusão, de que:
A sedução é um processo emocional – não ocorre por vias do raciocínio
puro, da demonstração. O discurso do sedutor não se fundamenta
puramente em argumentos lógicos, recorre a artifícios retóricos e visuais a
fim de envolver e comover. (ARISTÓTELES apud CHALITA, 1998, p.
16)
Já a persuasão, de significado similar, mas com uma tênue diferenciação para os
comunicadores, sugere um maior envolvimento do raciocínio e da argumentação:
“Persuadir, significa levar convicção ao ânimo de alguém. Portanto, persuadir constitui um
processo racional.” (CHALITA, 1998, p. 16)
Para o autor, seduzir o espectador de um filme, assim como o jurado de um tribunal,
vai além do que foi dito. Seduzir significa em certo sentido, “desvirtuar”, “tirar alguém de
um caminho pré-estabelecido”. O discurso sedutor não respeita padrões da lógica formal.
Diante daquele que se pretende seduzir, ele se atêm fundamentalmente aos sentidos e aos
sentimentos, “tira-o do caminho que ele havia estabelecido para si e o conduz pelo caminho
desejado, aquele que provocará certos sentimentos, que o levará ao seu universo”
(CHALITA, 1998, p. 16).
Isso para nós, explica um pouco sobre a intencionalidade de um trailer, já que ele é
a publicidade de um filme, e tem a finalidade de conquistar o público, apostando na
expectativa que pode ser gerada para levá-lo à ação de assistir o filme, ou seja, de alguma
10
CHALITA, Gabriel. A sedução no discurso – O poder da linguagem nos tribunais de júri. São Paulo:
Max Limonad, 1998.
maneira, faz exatamente o que Chalita afirmou há pouco, “tira-o de seu caminho e o
convida a outro”. Cabe ao espectador sentir-se suficientemente atraído a tal ação ou não.
Sem dúvida nenhuma, uma pesquisa de recepção nos apontaria as respostas
referentes a estas observações, em especial, se um trailer chega a nos influenciar de forma
significativa ou não. Contudo, pesquisas sobre filmes publicitários, já realizadas, provam
que há um nível de efeito inegável no público que assiste, evidente que com diferenças de
indivíduo para indivíduo, especialmente quando observadas inúmeras variáveis, como:
gênero, faixa etária, grau de escolaridade, nível econômico, etc.
Entretanto, como também já dissemos, nossa atenção se concentrará em iniciar a
discussão com enfoque apenas na PRODUÇÃO do trailer e do filme, principalmente, ao
verificar que todas essas observações anteriores, relacionam-se diretamente com a proposta
de Kellner, no que se refere à coerência da Análise Política nas leituras de produtos
culturais midiáticos, pois sua aplicação na análise de filmes, já foi provada e utilizada por
Kellner em vários momentos em várias obras cinematográficas, contudo, a análise sobre
trailers será uma novidade. Todavia, sendo ele (o trailer), uma edição de fragmentos do
discurso cinematográfico e publicitário, tal procedimento, para nós, além de aplicável,
torna-se importante, já que as evidências ideológicas de um discurso retórico, estão em
grande número, submersas no texto seja ele artístico ou publicitário, cuja essência continua
sendo ideológica, como afirma Chalita (1998, p. 76): “Se no passado, a arte do
convencimento decidia o destino das civilizações, no presente, a sua importância é
incontestável, porque o homem continua a fazer história e a envolver-se com as tramas do
poder”.
Com base nisso, Betton (1987, p. 07), pesquisador francês de cinema, refletiu sobre
a função política que o cinema adquire diante da sua arte de representar a realidade:
“Deduz-se que a realidade é não apenas complexa em sua infinita diversidade, mas que ela
é, além disso, movente. Seria então possível captá-la?”.
Pensando nisso, e vivendo numa época de inúmeras concepções ideológicas e
mudanças desconexas, a sociedade contemporânea, embora resistente a alguns
tradicionalismos, passou a adotar um certo relativismo em suas concepções a cerca de si
própria e do mundo. “As imagens passam a ser cada vez mais conceituais e os textos cada
vez mais imaginativos (FLUSSER, 2002)
11
, E assim, nossas leituras tornaram-se mais
complexas e menos dicotômicas.
Olhamos para os produtos culturais e para a humanidade de forma filtrada, e nada
nos garante que o que vemos afinal, é o real. Julgamos e interpretamos segundo nossas
experiências pessoais e coletivas.
Independentemente das experiências técnico-científicas que ampliam
nossas faculdades sensoriais ou compensam diferenças, resta compreender
o que está além do realismo, a imaginação, a intuição que permite sentir,
pressentir, adivinhar, [...]. Parece que não podemos conhecer as coisas de
modo absoluto, só conhecemos as aparências, os fenômenos. (BETTON,
1987, p.08)
No decorrer dos grandes períodos históricos da humanidade, Benjamin, nos diz que
há uma constante modificação na percepção da coletividade humana, em relação ao seu
modo de sentir e perceber os fatos e a arte, a partir de sua existência particular e histórica.
“A forma orgânica que a sensibilidade assume – o meio no qual ela se realiza – não
depende apenas da natureza, mas também da própria história” (BENJAMIN, 1985, p.214).
Há em todas as artes uma parte física, que não mais pode ser vista e
tratada como o era antes, que não mais pode ser subtraída à intervenção
do conhecimento e do poderio modernos. Nem a matéria, nem o espaço,
nem o tempo, são, há cerca de vinte anos, o que sempre haviam sido. È de
se esperar que tão grandes novidades transformem toda a técnica das
artes, agindo assim sobre a própria invenção e chegando mesmo, talvez, a
maravilhosamente alterar a própria noção da arte. (BENJAMIN, 1985:
214)
Os homens, situados em um momento histórico específico, percebem as
transformações sociais do seu tempo de forma única, e as expressam segundo sua
compreensão do mundo daquele momento.
Diante disto, Benjamin faz uma observação a respeito da Indústria Cultural, dizendo
que dentre os mass media da época, o que desempenha de forma mais qualitativa, a tarefa
de “contar”, compreender e representar o mundo como se fosse real, é o cinema, e seu
melhor agente é o filme. “A adequação da realidade às massas, bem como a conexa
11
FLUSSER, Villèn. Filosofia da caixa preta. Rio de Janeiro: Relumé-Dumará, 2002.
adequação das massas à realidade, constituem um processo de eficácia ilimitada, tanto para
o pensamento quanto para a intuição” (BENJAMIN, 1985, p.216).
1.2 CINEMA E COMUNICAÇÃO: ALGUMAS ESTRATÉGIAS
EMOCIONAIS
Como analisa Baitello Jr. (2006)
12
, o mundo das imagens criou um ambiente onde a
sua “reprodutibilidade técnica”, acompanha o ritmo da mobilidade alucinante dos “media”,
assim como a lógica publicitária do trailer, que gera uma sobrecarga de imagens,
produzindo uma espécie de “repetição da informação” – princípio bastante enfatizado por
Goebbels na Alemanha Nazista com o objetivo de persuadir os indivíduos a favor de um
tema.
As faculdades receptivas das massas são muito restritas e seu raciocínio é
débil. Por outro lado, esquecem rapidamente o que se lhe diz. Sendo
assim, toda propaganda eficaz deve confinar-se a algumas coisas
essenciais e simples, que, na medida do possível, devem ser expressas em
fórmulas estereotipadas. Estes slogans devem ser repetidos
persistentemente até que o último dos indivíduos tenha conseguido captar
a idéia que lhe foi apresentada. (...) A propaganda não diz respeito à
verdade em geral, mas a verdade tal como ela é interpretada pelo
propagandista. A propaganda não deve investigar objetivamente a verdade
e, na medida em que isso é favorável à parte contrária, não se deve seguir
as regras teóricas da justiça; deve-se apresentar somente o aspecto da
verdade favorável à sua posição.(JOSEPH GOEBBELS – Ministro da
Propaganda nazista)
13
Por outro lado, Baitello Jr. parece compreender essa técnica da repetição incessante
da qual a publicidade e a propaganda fazem uso, de forma a atribuir-lhe um caráter
hipnótico, diferente de Goebbels que o entende como alienante.
Essa repetição é sedativa e hipnotizante e por isso, gera dependência.
Gerar dependência significa criar déficits. Criar déficits equivale a criar
vazios. Quanto mais imagens, mais vazio. E quanto mais vazio, mais
imagens. Esta, a lógica dos “media” : criar vazios. Harry Pross e Dieter
Wyss já haviam descrito o fenômeno como “criação de déficit
emocional”. Pross fala mesmo em “media como droga”, Malena Contrera
qualifica o fenômeno como “obesos anêmicos”, Boris Cyrulnik escreve
sobre a “captura sensorial visual” que hipnotiza e imobiliza, ao contrário
da captura sensorial olfativa, tátil, gustativa. (BAITELLO JR, 2006, p.11)
12
BAITELLO JR, Norval. As núpcias entre o nada e a máquina: algumas notas sobre a era da imagem.
Disponível em http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum
. Acesso em 16/03/2006.
13
SIMON WISENTHAL CENTER. Nazismo alemão: Disponível em <http://www.wiesenthal.com/>.
Acesso em: 31/052003. Citações de J. Goebbels.
Com isso, podemos deduzir que há algo no formato trailer que está a serviço da
sedução, e que antes de nos envolver pela “repetição hipnótica” ou pelo “excesso sedativo”,
ou seja, pela forma como enfatiza determinadas cenas, conceitos e valores, de que fala
Baitello Jr, nos seduz pelo seu discurso retórico.
Isso nos prova que Goebbels em algum aspecto, tinha uma conduta refinada no que
se referia à mensagem, público e sedução. De fato, em relação à sua teoria da “repetição
alienante”, poderia estar equivocado, pois a ação aí entendida não é a de gerar alienação no
público, julgando-o como “massa de manobra” facilmente induzida; mas sim de
proporcionar a experiência da “hipnose comunicativa”, fenômeno este que Baitello Jr.
remeteu, lembrando os vários termos denominados pelos teóricos que já o estudaram. Esse
fenômeno, segundo ele, levaria o público apenas a uma predisposição em colocar, um
maior tempo de sua atenção, para aquela determinada mensagem que está sendo
transmitida, podendo ser aceita ou não ao final. O que pressupõe ainda, uma avaliação desta
mesma mensagem por parte do indivíduo. Na verdade, trata-se de dois procedimentos
distintos e eles não se excluem.
Todavia, sabemos que Goebbels excluindo suas considerações a respeito da
“manipulação”, tinha um pensamento e um comportamento diante dos meios de
comunicação, bastante avançado para a época, e ele conseguiu, de alguma maneira,
conquistar uma boa parte do público alemão, principalmente, através do rádio e do cinema.
E ainda é considerado o pai de toda propaganda política pós-guerra até os dias de hoje.
Porém, voltando ao nosso estudo, devemos considerar que a estrutura discursiva de
um trailer é totalmente diferente da estrutura de uma obra completa, como o filme, por
exemplo. Portanto, teremos que buscar enfoques e olhares diferenciados para a análise de
um em relação ao outro e trazer a tona, as possíveis contribuições que as inúmeras
pesquisas sobre o próprio cinema, já levantaram.
Entendemos porém, que a adoção de um método para a leitura deste formato, no
nosso caso, a Análise Política de Kellner, não exclui a influência que a nossa época, que o
nosso tempo, que o pensamento contemporâneo, podem dar ao nosso olhar. Sabemos que
vivendo num momento histórico, onde o contato diário com produções culturais que
privilegiam a mensagem direta, objetiva, embora transmitida de forma subjetiva, nos
permite aceitar com mais naturalidade tal complexidade. Contudo, sabemos da sua
dificuldade e é por isso, que consideramos importante o seu estudo.
A idéia de beleza parece variar de acordo com as latitudes, com as épocas
e mesmo com os indivíduos. As estéticas provêm do hábito, da educação.
Divergem a ponto de as dizermos contraditórias. Cada cultura propõe
insidiosamente ao homem inclinações inconfessas, que ele considera
naturais mas que vêm da história ou da escola. O mundo sensível sempre
é captado através de uma tela que influi sobre nosso modo de ver as
coisas, sugerindo preferências secretas que, em princípio, excluem-se.
(BETTON, 1987, p. 91)
No trailer, que em geral, aposta na câmera rápida para a maioria das cenas, sua
característica mais marcante é a de provocar efeitos cômicos ou vibrantes, mesmo em cenas
mais dramáticas, como nos filmes de Chaplin, nas comédias mudas. Esse efeito pode
produzir no espectador um rebaixamento da tensão psíquica, uma diminuição da gravidade
sensorial. Além disso, a câmera rápida também pode ser usada para provocar outra
sensação psicológica precisa, a da experiência metafísica, como vai explicar Betton (1987,
p.19): “A aceleração do tempo vivifica e espiritualiza. A câmera lenta mortifica e
materializa. Passa-se, portanto das aparências materiais às aparências espirituais ou vice-
versa (...) por simples contrações ou extensões do tempo”.
A câmera lenta é largamente utilizada para ressaltar a queda da força gravitacional.
Ela também provoca, muitas vezes, “a adesão completa do espectador, um recuo de sua
consciência acompanhada de reações afetivas diversas: mal-estar, angústia, tristeza,
nostalgia, exuberância imaginativa, etc, e às vezes, psicomotoras - atividade onírica”
(BETTON, 1987, p.18).
O trailer, por ser uma narrativa resumida, quase sempre utiliza elipses e contrações
temporais. Supre partes e tempos fracos da ação e enfatiza cenas marcantes. Assim como ...
[...]provoca freqüentemente um maior impacto sobre o espectador. È
possível traduzir então, com o máximo de intensidade, emoções e
sentimentos violentos inesperados. O plano de corte, que permite
interromper a ação sem qualquer problema para retorná-la posteriormente,
é largamente utilizado para contrair o tempo.(BETTON, 1987, p.25)
Essa estratégia também reforça a intensidade temática e dá a entender algo sem que
seja necessário apresentá-lo diretamente.
O mesmo acontece com o espaço espaço, como explica Betton:
Nunca antes do cinema, foi nossa imaginação forçada a um exercício tão
acrobático de representação do espaço quanto aquele a que nos obrigam
os filmes em que se sucedem ininterruptamente primeiros planos e long
shots, tomadas ascendentes e descendentes, normais e oblíquas, segundo
todos os ângulos possíveis. (BETTON, 1987, p.28)
Assim como na dimensão temporal, o espaço fílmico é vivo, relaciona-se com a
narrativa, tem valor dramático ou psicológico, uma significação simbólica. Ainda para
Betton, tem também um valor figurativo e plástico e um considerável caráter estético.
A iluminação é um cenário vivo e quase um ´ator´. Cria lugares, climas
temporais e psicológicos, cria estética. Assim como as linhas, as formas e
as cores, a luz pode produzir efeitos sobre a sensibilidade de nossos olhos,
mas também sobre nossa sensibilidade como um todo. (BETTON, 1987,
p.55)
Através do jogo de luzes, que diante de um cineasta, ganham valores expressivos, o
espectador pode perceber sensações e sentimentos agradáveis ou não, belos ou repulsivos,
conforme o cineasta deseja.
Para Betton (1987, p.55), “a iluminação serve para definir e moldar contornos e
planos dos objetos, para criar a impressão de profundidade espacial, para produzir uma
atmosfera emocional e mesmo certos efeitos dramáticos”.
A luz ambiente (geral e difusa) cria um ambiente psicológico geral, enquanto a luz
dirigida e contrastada permite efeitos dramáticos precisos.
A representação em preto-e-branco em alguns filmes, é justificável quando se
pretende ressaltar efeitos psicológicos. Na verdade, como defende Betton (1987, p.59), é
difícil imaginar um mundo colorido, quando o que se pretende mostrar é um mundo pesado,
sensorial, uma abordagem realista das coisas. Como acontece na bela seqüência do filme
“A lista de Schindler”, do diretor Steven Spielberg, no momento em que é lido a lista.
Betton observa que, “precisamente por ser o mundo colorido em demasia, a cor
paradoxalmente apaga o que é, atenua a luz, os contrastes: ela suaviza, ou melhor, absorve
os fragmentos de sensualidade de que os objetos são feitos”.
Alguns cineastas, compreendendo que momentos de grande intensidade psicológica,
mesclam-se com outros de distensão e felicidade, tentaram com sucesso, introduzir a cor,
ou combiná-la com o preto-e-branco de forma permanente ou não, como nos filmes
contemporâneos: “Sin City – a cidade do pecado” (2005) do diretor Robert Rodriguez e
Frank Miller, com participação de Tarantino, e o francês O fabuloso destino de Amelie
Poulain” (2001) do diretor Jean-Pierre Jeunet. É fato que, a cor pontualmente destacada
em meio ao preto-e-branco, insinua sensações precisas como: violência, paixão, solidão,
repúdio, tristeza, etc. Por isso, se constitui como técnica precisamente estratégica.
É fato também que, o cineasta pode explorar as nuances de cores e suas tonalidades
mais quentes ou mais frias, com finalidades estéticas, como acontece no filme “Kingdom of
Heaven (Cruzada)” (2005) do diretor, Ridley Scott.
Entretanto, para Betton, o que importa bem mais que as cores, é seu dinamismo,
suas relações na continuidade e sua transformação gradual em outras cores.
Deste ponto de vista, elas podem ser trabalhadas e interpretadas em função do que o
autor deseja expressar. Sabemos hoje, que é indiscutível a existência de ligações entre as
sensações visuais e entre a cor e seus estímulos, que se relacionam com o tato, paladar,
olfato e até a audição.
Os perfumes, as cores e os sons se correspondem. [...] Essas associações
de sentidos (sinestesias) e correspondências sensoriais, essa idéia da
correspondência universal, já cara aos românticos [...] Sinestesias e
correspondências sensoriais são fenômenos intuitivos ou de ordem
afetiva: daí a dificuldade de extrair suas regras gerais, ou ao menos, certas
relações rigorosas, equações matemáticas que poderiam interferir na
elaboração de um filme. (BETTON, 1987, p.63)
O fenômeno da sinestesia, já conhecido no cinema, nos remete a pensar também
dentre outros elementos, na estética do material sonoro que ele conquistou com o passar do
tempo, e que evoluiu muito com a inserção dos diálogos e da música. O som tem a
responsabilidade de criar uma atmosfera, dar mais expressão ao filme, e a facilitar a
compreensão da narrativa. É um complemento da imagem.
Não há regras para o acompanhamento musical na narrativa fílmica, sendo uma
questão de sensibilidade e gosto. No entanto, deve harmonizar-se com as imagens e
diálogos. A palavra, que deve ser o menos abundante possível, tem o seu lugar,
imediatamente após a ação.
O filme mudo, como comenta Betton (1987, p.38), constituía-se um universo
privado de som, o que explica os muitos simbolismos que compensavam esta deficiência. A
imagem destituída de um dos seus componentes principais (o som), podia se limitar a um
papel expressivo, psicológico ou dramático na narrativa, mas devia necessariamente,
exercer a função descritiva e explicativa da cena fazendo uso de vários elementos, como
o
emprego de sobre-impressão, primeiros planos e montagens; justamente porque é possível
ouvir não só com os ouvidos. Na realidade, todos os sentidos participam do ato, assim
como todo corpo e todo espírito.
Com o advento do som no cinema, permitiu-se dar mais autenticidade, além de
credibilidade material e estética das imagens. Ele assegura, como aponta Betton, a unidade
orgânica do filme. Até mesmo, o silêncio ganha realismo e significação com o som.
Edgar Morin como lembrou Betton (1987, p.39) observa que: “O cinema mudo já
representava o silêncio, mas o sonoro pode traduzi-lo por ruído, enquanto o mudo traduzia
o silêncio por silêncio. O mundo colocava em cena, o silêncio. O sonoro concede-lhe a
palavra”. O domínio da palavra e o som na narrativa fílmico, podem provocar determinadas
e previsíveis reações no espectador, como por exemplo:
uma sobreposição de sons e imagens (som e imagem indicando a mesma
informação simultaneamente) – reforçam e condicionam. É a chamada combinação
redundante em que a atenção do receptor é condicionada e concentrada. O risco é a
saturação ou rejeição por parte do espectador;
uma combinação complementar - é usada freqüentemente nos documentários, por
seu caráter didático, tem o objetivo de informar e descrever – neste caso, som e
imagem comentam-se reciprocamente, cada uma delas, sendo uma parte da
informação. O receptor é mais ou menos, passivo. O risco é se a mensagem for
longa ou prolixa demais;
uma combinação contraditória – o som principal e a imagem têm conteúdos
opostos, a informação está num segundo nível de leitura – o receptor é estimulado a
dirigir sua atenção e imaginação (efeito choque), o risco é o contra-senso na
interpretação já que são solicitados do receptor, dois sentidos perceptivos diferentes,
simultaneamente.
Os grandes mestres da “não-coincidência”, da dissociação entre som e imagem, que
foi chamado de “Contraponto Orquestral” foram entre outros, Eisenstein, Pudovkin e
Alexandroff, no Manifesto dos Três em 1928.
Conforme observa Betton, os melhores efeitos do cinema são os que alternam a
imagem de um ser e o som produzido por ele, por oferecer ao receptor, uma leitura dialética
e contra-pontual.
No cinema, o que deve prevalecer não é nem o significado nem a
significação, mas a passagem gradual e contínua do ‘não-significado ao
significado’, do emocional ao intelectual, através de uma significação
sempre contingente. [...] Ao se passar da linguagem dirigida aos olhos à
linguagem dirigida aos ouvidos, passa-se do não significado ao
significado, acionando-se primeiro, a afetividade do receptor, e só depois
a sua inteligência. (BETTON, 1987, p.42)
Um belo exemplo do uso da voz na narrativa fílmica é a famosa seqüência de Aldo
Vergano em “Il sole sorge ancora”, quando um padre em pleno campo de concentração
nazista, está para ser executado. O padre então começa a recitar uma ladainha e algumas
pessoas começam a responder “Ora pro nobis” em latim. Em seguida, pouco a pouco, mais
pessoas entoam a mesma resposta até que, se percebe toda a multidão, num extraordinário
e comovente “crescente”, pedir em coro que “Deus olhe por eles”. É possível, com esse
movimento sonoro, sentir a revolta do povo, embora, estejam num espaço mítico, velado no
enquadramento da imagem. O poder ameaçador da multidão torna-se um símbolo sonoro,
porque não podemos vê-la, mas sentimos sua presença.
Não vamos ao cinema para escutar música. Só pedimos que ela nos
‘explique’ as imagens, mas que lhes acrescente uma ressonância de
natureza especificamente diferente. Não lhe pedimos que seja ‘expressiva’
e que acrescente um sentimento ao das personagens ou do diretor, mas
que seja ‘decorativa’ e que acrescente seu próprio arabesco àquele que a
tela nos propõe. Finalmente, que ela se liberte de todos os seus elementos
subjetivos, que nos torne fisicamente sensível o ritmo intenso da imagem,
sem que para isso, queira traduzir seu conteúdo sentimental dramático ou
poético. (BETTON, 1987, p.49)
Desta maneira, para Betton, a música deve reunir qualidades como objetividade,
despojamento, neutralidade no plano sentimental, para que ela sustente o conteúdo plástico
da imagem com um material sonoro ‘impessoal’. Quanto mais ela se apagar atrás da
imagem, mais chances terá de abrir novos horizontes para si.
Por essa mesma razão, a música e o som no trailer, traduzem o ritmo, a cadência
narrativa e dão o tom emotivo necessário à expressão.
O cinema é essencialmente movimento, observa Betton. Assim como os
movimentos de câmera, o próprio cenário é mais um protagonista, sem deixar que ele roube
a cena, mas revelando tudo ao espectador.
[...] devo ver tudo, mas minha atenção deve se voltar a todo instante para
aquilo que é o mais importante. Isto, porém, só pode ser revelado pela
própria ação, pois é ela que dirige meu olhar. Se, portanto, ela me guia,
não posso mais escolher livremente. Na verdade, o espectador é sempre
atraído, numa imagem, por aquilo que atinge, plástica ou dramaticamente,
o máximo em significação. (BETTON, 1987, p.52)
Assim, no trailer, o jogo de objetos e seus significados, está situado em meio a um
ambiente complexo, evidenciando o movimento e a natureza técnica e elaborada desta
linguagem artística e específica no mundo do cinema.
Todavia, realizar uma análise crítica e política do cinema como queremos, além de
requerer um estudo focando o próprio objeto de análise, exige ainda como observa Kellner
(2003), um olhar sobre o contexto em que este objeto está inserido. Conduta bastante
adotada pelos teóricos dos Estudos Culturais.
Como se vê, hoje temos um arranjo social mais complexo do aquele apontado por
Benjamin na década de 60. Contudo, parece que algumas questões continuam valendo para
o mundo do século XXI.
Dentre outras coisas, isso também nos revela que em meio à multiplicidade de vozes
de uma narrativa fílmico, há bem lá no fundo, um uníssono discurso de uma ideologia
dominante, que pelo menos, naquela obra, naquele momento, como nos afirmou há pouco
Eisenstein, tenta suscitar uma única imagem cheia de sentido, plena e emocional, na
consciência do espectador, esperando que ela seja, a mais próxima possível daquela
idealizada pelo diretor do filme.
Partindo de um referencial marxista, Benjamin conseguiu identificar, por exemplo,
o exato momento em que o nazismo e o fascismo se apropriaram dos meios de
comunicação em favor de suas ideologias. Essa aproximação dos media, especialmente o
cinema, com as forças políticas, é para nós, o ponto de debate no próximo capítulo.
... Na segunda noite já não se
escondem; pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada. ...
Capítulo II
O USO POLÍTICO DO CINEMA
Durante a Segunda Guerra, o cinema já se caracterizava como um sistema
diferenciado de conhecimento e entretenimento. Era o espetáculo de som e imagem num
único canal, diferente da cultura letrada vivenciada pela humanidade. Todavia, tratava-se de
uma nova experiência social, uma nova maneira de ver e filtrar a realidade. Um modo
diferente de viver e buscar uma identidade, e por meio dela, sua inserção na coletividade
social. Com isso, ele ganhou popularidade.
O historiador Marc Ferro (1992)
14
, a exemplo de Kellner, analisando o cinema
durante a Segunda Guerra, viu também que o filme é uma fonte documental. Entendia-o
como um revelador ideológico, político e social de determinada sociedade e de seus
interesses explícitos ou implícitos, segundo as sutilezas das imagens e da narrativa fílmico.
Já que as pessoas buscavam essa experiência, de forma a viver uma espécie de imaginário
coletivo contra o triste cotidiano da guerra.
Essa concepção é aproveitada por Kellner em sua análise política, já que privilegia o
contexto:
[...] ler politicamente a cultura da mídia significa situá-la em sua
conjuntura histórica e analisar o modo como seus códigos genéricos, a
posição dos observadores, suas imagens dominantes, seus discursos e seus
elementos estético-formais incorporam certas posições políticas e
ideológicas, e produzem efeitos políticos. (KELLNER, 2003, p.76)
Ferro também acreditava que o filme precisa ser abordado não apenas como obra de
arte, mas como um objeto de estudo, um produto que vale por aquilo que testemunhou, no
que também coincide com Kellner (2003, p.76):
Ler politicamente a cultura também significa ver como as produções
culturais da mídia reproduzem as lutas sociais existentes em suas imagens,
seus espetáculos e sua narrativa (...) o modo como as lutas da vida diária e
o mundo mais amplo das lutas sociais e políticas se expressam no cinema
14
FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
popular, que, por sua vez, sofre uma apropriação e exerce efeitos sobre
esses contextos.
No entanto, para Santos (2005)
15
, pesquisadora brasileira sobre o audiovisual, um
filme, pelo seu alto custo produtivo, é uma criação que deve pertencer à coletividade; pois é
especialmente feito para ela. Por esse motivo, acreditamos também que é particularmente
difícil excluir o caráter de obra de arte que o filme se utiliza para revelar a história do
mundo.
Quanto a isso, Kellner parece fazer uma classificação distinta para filmes,
considerados populares e os de qualidade artística. Contudo, isso não fica muito claro na
sua obra. Todavia, ele dialoga com as idéias de Benjamin (1985), a respeito do novo espaço
em que a função artística do cinema ocupou com a reprodutibilidade técnica, ou seja, o
espaço da prática política.
Ferro (1992) ainda percebeu ser indispensável analisar outros elementos como a
narrativa, o cenário, o texto, as relações do filme com o autor, a produção, o público, a
crítica e o regime político, quando queremos investigar o contexto histórico em que um
filme é produzido. Ele compreendeu que além da obra, também há uma essência – a
realidade histórica que ela representa e suas implicações sociais, culturais e políticas.
Para este autor, desde que o cinema se tornou uma arte, seus pioneiros
passaram a intervir na história com filmes, documentários ou de ficção
que desde sua origem, sob a aparência de representação, doutrinam ou
glorificam. (SANTOS, 2005)
Esta colocação é importante se queremos compreender o contexto histórico do filme
no momento de seu nascimento, e nas futuras releituras feitas a partir dele, sempre
contextualizado pela realidade social e visão de mundo da época em que é lido ou
revisitado.
Partindo disto, e entendendo que o cinema possui modos de expressão que tem sua
especificidade própria e domínios técnicos singulares, seria ilusão imaginarmos que a
15
SANTOS, Andréa Paula. O audiovisual como documento histórico: questões acerca de seu estudo e
produção. Disponível em http://www.mnemocine.com.br/pesquisa/pesquisatextos/andrea1.htm
, acesso em
17/01/2005.
prática dessa linguagem é, inconscientemente, inocente. Precisamos compreender os limites
e as fronteiras nas quais, o espectador se vê fascinado e quase sempre, emocionado.
No cinema, as relações entre visível e invisível, a interação entre o dado
imediato e sua significação tornam-se mais intrincadas. A sucessão de
imagens criadas pela montagem produz relações novas a todo instante e
somos sempre levados a estabelecer ligações propriamente não existentes
na tela. A montagem sugere, nós deduzimos. As significações se
engendram menos por força de isolamentos (...) mas por força de
contextualizações para as quais, o cinema possui uma liberdade invejável.
É sabido que a combinação de imagens cria significados, não presentes
em cada uma isoladamente. (SANTOS, 2005)
Para Ferro, uma questão fundamental é situar o audiovisual no contexto, em que ele
foi produzido e nos diferentes contextos históricos em que é recebido. E isso influencia
Kellner fortemente na construção da Análise Política. Por isso, esta é uma pista de partida
para a investigação da nossa proposta de pesquisa, já que o autor afirma que as imagens
podem ser lidas de diferentes maneiras e mesmo inversamente, em dois momentos distintos
da história. Neste sentido, fica claro a importância de delimitarmos um recorte histórico
neste trabalho, passo este, que daremos mais adiante.
2.1 ARTE E POLÍTICA – A HISTÓRIA QUE INSPIRA O CINEMA, O
CINEMA QUE PAUTA A SOCIEDADE
Outra questão polêmica a respeito do caráter político que o cinema adquire, está
explicitamente registrado na produção do filme-documentário. Ferro (1992), ressalta que
ele é o mais bem-elaborado “discurso da sobriedade”, porque revela geralmente, a
espectadores que não testemunharam os fatos abordados em sua narrativa, a versão cuja
escolha ideológica vai contar.
[..].o documentário aparece como um pálido reflexo do discurso
instrumental dominante na nossa sociedade. Os filmes de ficção ‘refletem’
nossa cultura e essa imagem ‘espelhada’ é fundamental, determinando a
própria definição do que é o cinema. O documentário também pode vir a
fazer isso, mas freqüentemente ‘distorce’ o reflexo.(SANTOS, 2005)
O documentário possui a responsabilidade de descrever e interpretar o mundo da
experiência coletiva, assim como outros discursos sobre a construção do real, como os
temas da família, política, educação, leis e nação.
Ferro (1992) também evoca Benjamin para afirmar que a imagem está a serviço da
ideologia dominante como espetáculo e distração. Santos (2005)
lembra Vertov, que
entendeu “[...] ser o filme um processo ativo de construção social, incluindo a construção
de pontos-de-vistas de uma consciência materialista-histórica”.
Aí talvez resida o sentido que Benjamin quis dar ao cinema quando disse “[...] o
filme é pois, a mais perfectível das obras de arte” (BENJAMIN, 1985, p.174). E segundo
Santos (2005), é através da distração oferecida pela arte, que a percepção dos indivíduos
mobiliza-se ou não, apropria-se ou não das representações culturais imersas nas questões
históricas do documentário. Com isso, o mesmo documentário pode ser veículo de
“fascínio”, que simultaneamente ao ato de informar e ilustrar a história, também atua de
forma estratégica sobre o pensamento crítico. Talvez exista um espaço interessante para a
atuação de artistas e comunicadores, na produção de filmes-documentários comprometidos
com a história e com o bem-estar coletivos.
Mas por que será que a maioria do público se vê fascinado diante desta técnica da
imagem em movimento? Consideremos para isso, algumas observações de Mannoni
(2003)
16
. Dois séculos separam o registro oficial do aparecimento do cinematógrafo dos
irmãos Lumière, que junto ao quinetoscópio de Thomas Edison, são considerados o marco
zero do que entendemos por cinematografia hoje.
Mannoni, pesquisador francês de cinema, dedica sua obra à tarefa de conhecer a
história do pré-cinema, séculos que antecederam os primeiros registros mais próximos do
cinema que conhecemos. Para ele, esse movimento dos homens, já nos séculos XVIII e
XIX, de buscarem “[...] o sonho de apreender a realidade, engendrar o fluxo do tempo, fixar
a vida em imagens duradouras” (MANNONI, 2003, p.10), representa a manifestação da
natureza humana, que ao contrário do que muito se pensa, não expressa apenas “instintos”
violentos mas, também, o sublime, a emoção e o encantamento com o mundo.
Conhecer a história do pré-cinema, nos revela umas tantas coisas que antes,
sabíamos apenas superficialmente, se é que sabíamos. Imaginar que Thomas Edison e os
irmãos Lumière foram apenas, os últimos elos de uma longa cadeia de pesquisadores sobre
o cinema, não é mais curioso do que constatar que “[...] muito antes das salas de cinema de
hoje, já se cobrava e se pagava ingresso para a caixa óptica, a fantasmagoria e a lanterna
mágica” (MANNONI, 2003, p.11).
Conta-se também, que os efeitos produzidos hoje pelo cinema, como: fades,
panorâmicas, carrinhos, superimposições, foram inventados e empregados pelos
habilidosos lanternistas, já nos séculos XVIII e XIX!
Os espetáculos de lanterna mágica eram de grande beleza plástica e inventividade
técnica. Tão belos que muitos românticos até hoje, mantêm viva essa atividade no interior
da Grã-Bretanha e EUA. Tudo nos moldes das apresentações do século XIX, com aparelhos
e placas originais, projetadas para grandes platéias, com música, efeitos sonoros, narração e
interpretação.
Muitos escritores, filósofos e cientistas como: Goethe, Baudelaire, Balzac, Proust,
Da Vinci, Huygens, Descartes, Newton, Leibniz, Aristóteles, Bacon, Rosseau, Voltaire e
até Spinoza, são citados na pesquisa histórica de Mannoni, pois participaram e também
foram seduzidos pela lanterna mágica.
16
MANNONI, Laurent. A Grande Arte da Luz e da Sombra – arqueologia do cinema. São Paulo: Editora
SENAC, 2003.
Mas, nem tudo é um “mar de rosas”. Os séculos que antecederam o cinema, também
foram repletos de desavenças, negócios escusos, apropriações indébitas de idéias, vaidades
e ganância. A lanterna, logo se tornaria instrumento para várias finalidades, desde contar
histórias infantis, divertir a elite, popularizar a ciência ou satirizar os costumes, a religião e
a nobreza.
Ao chegarmos neste ponto, constatamos que essa visão sobre a história do cinema,
retrata também a apropriação que o homem, desde o passado, fez da arte para fins diversos.
Na descoberta obtida com o auxílio de uma lente e com o domínio da óptica e da
química, Mannoni (2003) nos lembra da obra de um jovem francês, que aos 27 anos,
concluía em sua pesquisa, que o homem teria começado sua narrativa de apreender a
realidade e registrá-la, desde os desenhos feitos nas cavernas do período Paleolítico. Para
ele, desde o amanhecer da humanidade, representado na Alegoria da Caverna de Platão, (e
que relação sugestiva tem essa metáfora com o princípio da cinematografia!), o homem tem
buscado capturar sua trajetória e registrá-la de alguma forma. “Afinal, a arte nada mais é
que a materialização do anseio humano pela imortalidade, pois a grande angústia
existencial do homem é a morte, que a fotografia e depois o cinema, lograriam
vencer”(MANNONI, 2003, p.12).
As fantasmagorias e o planetário de Robertson, instalados à Rua 123 do Rio de
Janeiro, entre 1822 a 1898, do Brasil imperial ao independente, divertiam a população até
altas horas da noite, com eclipses, o sistema solar, os planetas, as fases da lua, além de
estranhas criaturas que cresciam e diminuíam provocando estranhas sensações.
Essas técnicas primitivas, porém, engenhosas eram, de tempo em tempo,
aperfeiçoadas. Trata-se de compreender, através dos tempos, a revolução na percepção e na
comunicação humana.
É compreensível nos certificarmos de que, imagens pintadas com luz, seriam
mágicas para pessoas que jamais tinham visto algo semelhante. Por este motivo, os
exibicionistas das lanternas mágicas foram recebidos como “portadores de algo divino” nas
cidades da Europa, já nos séculos XVII e XVIII.
Desde épocas remotas, “[...] quanto mais a magia luminosa se aperfeiçoava, mais o
público se mostrava ávido de imagens” (MANNONI, 2003, p. 23).
Por esta razão, Mannoni afirma nunca ter havido, em toda a história, um inventor do
cinema. O cinema nasceu de um espírito comum que pairava a humanidade, e que resolveu,
em determinado momento, se manifestar em várias partes do mundo.
“O que se passa na rua quando o sol brilha?” assim, indagava Gerolamo Cardano, o
italiano que mais tarde despertava os cientistas para a idéia de ver o mundo através da
câmera escura, onde fosse possível isolar a realidade num pequeno quadro ou foco, e sobre
ele, incidir a luz.
Pois quando caminhamos ao sol e adentramos a escuridão, tal efeito ainda
continua e não conseguimos ver nada, ou muito pouco, porque o efeito
causado pela luz ainda permanece em nossos olhos; e quando ele
gradualmente se desvanece, vemos claramente em locais escuros.
(MANNONI, 2003, p.36)
Este é um elemento de importância no cinema. A câmera escura é parte do ambiente
necessário para se projetar a imagem na tela clara, a exemplo dos nossos sonhos, onde
vemo-nos quietos num ambiente escuro, e onde o imaginário pode dar cor, luz, movimento
a todas as coisas possíveis e impossíveis para a condição humana. Por isso, tamanho é seu
encantamento nos homens, pois imita o sonho dentro da vida real.
O filósofo Nietzsche anunciava: “As palavras mais quietas são as que trazem
tempestades; pensamentos que vêm com os pés de pomba, dirigem o mundo”. (HAYMAN,
2000, p. 44)
17
. Essa força sutil na qual o cinema é hoje uma referência, nos leva a pensar,
por exemplo, no quanto há de real, de “verdade” em um filme e o quanto há de ficção na
realidade. Uma controvérsia que nos lança uma certa inquietação diante do cinema e da
vida. É neste intuito de desmistificar essa linguagem sensível aos olhos e ao coração, que
este trabalho propõe a Análise Política como um instrumento de Análise Crítica.
Sabemos que a história inspira o cinema, mas, pouco notamos, o quanto o cinema e
a ficção também pautam a sociedade manifestando-se em nossas próprias práticas sociais.
Este paradigma, aparentemente, próprio deste tempo, nos leva a tomar uma postura
crítica diante das intenções da mídia para analisá-las. Será um fenômeno desta cultura
ocidentalizada e mediada constantemente pelas produções culturais, cada vez mais
elaboradas e que chamamos “cultura da mídia”?
17
HAYMAN, Ronald. Nietzsche. São Paulo: Ed. Unesp, 2000.
Buscando conhecer estas intenções e respostas, olhamos para o cinema como
produto cultural altamente elaborado, já que ele evidencia o planejamento criativo e
produtivo, a longo prazo, portanto, estratégico.
Ele também provoca, como defende Maffesoli (2005) (comunicação verbal)
18
, a
contaminação do imaginário para o bem ou para o mal. Essa espécie de rebelião do
imaginário vivido na história do homem contemporâneo, sugere ainda uma volta às
imagens, um retorno a uma espécie de cultura do visual.
Através da tecnologia moderna, a cinematografia tem conseguido manipular
imagem e som de forma que a experiência do visual vem ocupando espaços cada vez mais
privilegiados e tempos cada vez mais longos das experiências sensoriais desta sociedade, e
que pouco a pouco, também vem transformando a própria técnica em um personagem da
narrativa fílmico, ou seja, a técnica ganha vida e espaço cênico no cinema contemporâneo,
ou seja, a técnica passa a ser um personagem da narrativa.
Podemos citar como exemplo, o filme Matrix, que na época de sua exibição
representou uma novidade dentre os demais filmes de ficção até então conhecidos, e já
trazia alguns recursos e técnicas cinematográficas, como aceleração e diminuição do tempo,
como elementos-personagem da narrativa. A cena da bala saindo da arma numa espécie de
câmera lenta, traçando um desenho no ar, lentamente, até que atingisse seu alvo, alcançou
sucesso em qualidade cênica e foi bastante explorada em outros filmes.
Com isso, a afirmação de Parente (2000, p. 08)
19
parece se aplicar neste contexto, ao
dizer que o cinema moderno está além da representação de “um estado de coisas, fatos ou
pessoas”, mas, é ele, o próprio acontecimento.
Por essa razão, deduz-se que a preocupação cinematográfica na contemporaneidade
esteja a caminho de uma concepção do próprio cinema se manifestando e influenciando de
alguma maneira, a vida dos indivíduos e transformando seu meio ambiente, através da
tecnologia, cada vez mais capaz de gerar reflexão e com isso, conduzir seus espectadores,
em alguns momentos, a uma experiência de reflexão sobre suas temáticas.
18
MAFFESOLI, Michel. O material e o simbólico na cultura contemporânea: o audiovisual, as artes
digitais e os meios tecnológicos de produção. Conferência apresentada no Simpósio Interfaces das
Representações Urbanas em tempos de globalização, SESC-Bauru-SP e FAAC-UNESP, 26 ago. 2005.
19
PARENTE, André. Narrativa e modernidade – Os cinemas não-narrativos do pós-guerra. Campinas-
SP: Papirus, 2000.
A volta às imagens, como sugere Maffesoli, nos faz perceber dentre outras questões,
que a técnica audiovisual caminha definitivamente para o ambiente multimídia.
Propriedades que antes eram reservadas estritamente ao olfato ou ao paladar, por exemplo,
conseguem ser reproduzidas e/ou introduzidas na imagem com extrema perfeição, e quase
superam algumas experiências sensoriais naturais, por meio das habilidades
cinematográficas de dilatação ou diminuão do tempo, dos recuos e desdobramentos do
espaço, do uso e da ausência de cor e luz, dentre outros. Isso também aponta para a
afirmação de que o homem contemporâneo, vivendo cada vez mais em um ambiente
“midiático”, com o passar do tempo, poderá desenvolver habilidades perceptivas cada vez
mais complexas.
De alguma maneira, todas essas afirmações recordam o que Descartes disse sobre a
imaginação. Para ele, a imaginação é capaz de inverter nossas concepções de racionalidade.
Edgar Morin, como lembra Maffesoli (2005), sugere a metáfora de que a imaginação se
tornou a “fada da casa” no contexto da sociedade da informação, pois o homem
contemporâneo não suportaria conceber sua realidade sem um misto de fantasia.
Dessa forma, cabe-nos ressaltar a importância de estudar o cinema como fenômeno
que interessa à comunicação, justamente, pela necessidade de compreender outros tantos
elementos acerca da imagem e do imaginário, que a própria comunicação também
investiga.
De um lado, os filmes refletem à ideologia a qual servem, a partir da
“reprodutibilidade técnica” de que falava Walter Benjamin, e passam a ser produzidos em
escala industrial já no início do século XX. Daí o termo “indústria cinematográfica” que no
contexto dos últimos anos, vem se intensificando.
Por outro lado, o audiovisual vem se constituindo como um formato dotado de
elementos muito específicos, com uma linguagem bastante elaborada. Com isso,
entendemos que ele não pode ser visto apenas pelo aspecto negativo da retórica ou do
consumo, mas também como uma ferramenta eficaz e uma linguagem geradora de
argumentos capazes de iniciar uma mudança no processo de produção e distribuição de
bens culturais, tanto para o próprio cinema (através de seus documentários e ficções), como
para as agências de publicidade (através de filmes publicitários). E assim, quem sabe ela
consiga motivar uma reflexão que gere mudanças significativas no comportamento ético
daqueles que “pensam” e “participam” do processo produtivo audiovisual ou da
comunicação em geral.
Kellner (2003, p.77) nos lembra ainda, algumas questões acerca do estudo da
cultura e suas implicações em relação à ideologia. Ele nos recorda que Marx e Engels
defendiam “a ideologia como as idéias da classe dominante”, idéias que foram publicadas
na obra “Ideologia Alemã” e que influenciaram críticos e obteve predominância em
determinada era histórica, com o intuito denunciativo de atacar as idéias que legitimavam a
hegemonia da classe burguesa.
Depois, o marxismo clássico de Marx e Engels, dava ênfase demasiada à economia
e à política e deixavam um pouco de lado, as questões envolvendo a cultura e a ideologia.
Todavia, foi nos anos 20 do século XX, que Lukács, Korsch, Bloch e principalmente
Gramsci, ressaltaram a importância da cultura e da ideologia, assim como a Escola de
Frankfurt, viram a aplicabilidade e a importância da crítica da ideologia como componente
da crítica da dominação.
Contudo, como afirma Kellner, foram os estudos culturais britânicos no seu período
de formação, que puseram o conceito de ideologia no centro do estudo da cultura e da
sociedade, como fica evidenciado em uma das primeiras coletâneas publicadas na época, a
On Ideology”.
Para Hall (2003)
20
, um dos fundadores dos centros para os estudos culturais, a
concepção de ideologia mais condizente com a diversidade cultural, tão presente nas
sociedades contemporâneas, é a empregada por Althusser, que compreende a “totalidade
social” de Marx como uma “estrutura em dominância”. Nela são encontradas certas
tendências, todavia distintas das que Marx empregou. Para Hall, além desta nova
concepção de ideologia, a maior contribuição de Althusser para os estudos culturais foi a de
indicar como é possível viver na diferença e com ela, o que sugere também uma nova visão
sobre a ideologia pelo viés da cultura e da identidade, e neste último, com especial ênfase.
Sua ruptura com a concepção monística do marxismo,
demandou a teorização da diferença – o reconhecimento de
que há distintas contradições sociais cujas origens são
também diversas, que as contradições que impulsionam os
20
HALL, Stuart. Da Diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Ed. UFMG; Brasília-
DF: Representante da UNESCO no Brasil, 2003.
processos históricos nem sempre surgem no mesmo lugar,
nem causam os mesmos efeitos históricos. (HALL, 2003, p.
161)
Esse pensamento influencia Kellner fortemente, para o desenvolvimento do método
da “Crítica diagnóstica”. Para ele, devido à proximidade que os textos culturais mantêm
com as condições sociais em que surgem, constituem um acesso privilegiado às realidades
sociais de sua era, assim, sua interpretação permite compreender através de uma análise
contextual, o que estará acontecendo de fato, em determinada sociedade, em dado
momento.
É desta preocupação também que Kellner se inspira para denominar o termo
“Cultura da Mídia”, por entender que existe de fato, algo muito específico emanando das
produções midiáticas, que de alguma maneira, são estrategicamente pensadas, produzidas e
transmitidas.
Com isso, podemos entender porque Kellner também observa que a Análise Política
deve ainda buscar os momentos utópicos, as projeções de “mundo melhor” que se
encontram em grande número nos textos produzidos pela própria mídia. Neste sentido, ele
cita a obra de Ernst Bloch “The Principle of Hope
21
, traduzido para o inglês em 1986:
Bloch faz um exame sistemático do modo como os devaneios, a cultura
popular, a grande literatura, as utopias políticas e sociais, a filosofia e a
religião – muitas vezes descartadas como ideologia por alguns críticos
ideólogos marxistas – contêm momentos emancipatórios que projetam
visões de uma vida melhor, capaz de pôr em xeque a organização e a
estrutura da vida no capitalismo (ou no socialismo estatal). (KELLNER,
2003, p.143)
Para ambos, a ideologia tem duas faces: contêm erros, mistificações e técnicas de
manipulação e dominação, mas, também, contêm resíduos excedentes de utopia, que pode
ser usado pela crítica social ou pela emancipação política dos indivíduos.
[...] os textos da cultura de massa freqüentemente, têm momentos
utópicos, propondo que a crítica cultural radical analise tanto as
esperanças e fantasias sociais do filme quanto as vias ideológicas pelas
quais as fantasias são apresentadas, os conflitos são resolvidos e as
21
Tradução para o português: “O Princípio da Esperança”.
esperanças e ansiedades, potencialmente, destruidoras são administradas.
(KELLNER, 2003, p. 144)
Segundo Martín-Barbero (2003)
22
, o deslocamento do camponês, nos finais do
século XIX e início dos XX para os grandes centros, exigiu dele, a incorporação de alguns
padrões normativos, traumáticos de certa forma, como pegar um ônibus e tirar um
documento de identidade, que para o homem rural consistia numa mudança substancial de
comportamento.
A massa em formação que tomava conta das cidades, chegava em busca de novas
promessas de emprego, educação, saúde e diversão, e era forçada, a se comportar diante de
alguns padrões de organização, diante de um outro modo de vida.
Esse movimento, simultaneamente, nos leva a outro movimento, o de olhar para os
fenômenos urbanos de forma investigativa. Buscar respostas para nossa complexa
organização social, é buscar também, dentre outros enfoques, o de estudar a cultura destas
cidades. Esta cultura em formação, que passava da cultura popular para a cultura de massa,
implicou em mudanças profundas no pensamento humano, na organização política e na
estrutura social destas cidades, que precisavam de um elo comum, de algo que fizesse essa
coletividade se reconhecer parte de um todo coeso, que era a Nação.
Neste momento, a política vê nos meios de comunicação, importantes aliados na
tarefa da unificação nacional, estratégia bem utilizada durante os governos populistas,
especialmente na América Latina em meados do século XX, que, conforme vai observar
Martín-Barbero (2003, p. 230), diferentemente do que havia ocorrido na Europa, a América
Latina não havia reconhecido sua identidade própria, ela importou o modelo europeu de
“nação civilizada”. Portanto, a idéia era a dinâmica inversa do que naturalmente deveria
ocorrer, ou seja, os países latino-americanos em geral, quiseram primeiramente “ser uma
nação para ter uma identidade”, e não ter uma identidade, para só depois, se consolidar
como nação. E isto, para Martín-Barbero, implicou em problemas sérios na formação dos
Estados na América Latina.
22
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Tradução
Ronald Polito e Sérgio Alcides. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2003.
Com isso, os meios de comunicação que seriam utilizados como “elos” de ligação
do Estado com o povo, alcançaram sucesso através do rádio e do cinema por toda a
América Latina, a exemplo do que acontecia na Europa, principalmente durante os períodos
nazi-fascistas, inclusive com a influência de alguns programas produzidos na Alemanha e
Inglaterra.
Por esse motivo, a esta altura, o “olhar” para o rádio, para o cinema, para o jornal,
para a música e a TV é simultaneamente, um olhar para as cidades e suas manifestações
como espaços em formação e de reconhecimento de identidades nacionais, com maior
intensidade no século XX.
2.2 ALGUNS USOS POLÍTICOS DO CINEMA: O “TRIUNFO DA
VONTADE” NA ALEMANHA NAZISTA E O “STAR-SYSTEM” DE
HOLLYWOOD
Um exemplo desta apropriação dos “media” pelo Estado aconteceu na Alemanha
nazista, durante a Segunda Guerra, onde Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista,
percebeu a aliança perfeita entre cinema, política e publicidade, contudo, esta última
deveria ficar diluída na obra, de forma que não fosse percebida pelo público.
Por outro lado, nos Estados Unidos, a indústria cinematográfica crescia a todo
vapor, com o apoio do Estado, a fim de suscitar valores propriamente norte-americanos, a
respeito do modelo de vida baseado no consumo, e no “star-system” divulgado por
Hollywood.
Estudando o período nazista no que se refere à estratégia política de apropriação dos
meios de comunicação massivos por parte do Estado, descobrimos que o rádio e o cinema
foram decisivos na divulgação da ideologia nazista, e amplamente utilizados por Adolf
Hitler e Goebbels.
Diante disso, somos forçados a reconhecer que, a comunicação foi e é ainda
utilizada para fins ideológicos, a partir do filtro da estética. Como ressalva Benjamin
(1985), ao considerar que a “guerra” embora seja considerada “esteticamente” apropriada
para o cinema, deve nos motivar não à sua uma exaltação, mas, à sua condenação como
prática humana.
[...] a guerra é bela, pois, em virtude das máscaras contra
gases, do terrificante megafone, dos lança-chamas e dos
carros de assalto, funda a soberania do homem sobre a
máquina subjugada. A guerra é bela porque realiza, pela
primeira vez, o sonho de um homem com o corpo metálico.
A guerra é bela porque enriquece o prado florido com as
orquídeas flamejantes que são as metralhadoras. A guerra é
bela porque reúne, para compor uma sinfonia , a fuzilaria, o
fogo dos canhões, a pausa entre os tiros, os perfumes, os
odores da decomposição. A guerra é bela porque cria novas
arquiteturas, como a dos tanques, das esquadrilhas aéreas em
formas geométricas, das espirais de fumo subindo das
cidades incendiadas e muitas outras ainda (...) lembrai-vos
destes princípios fundamentais de uma estética de guerra,
para que assim, se esclareça vosso combate por uma nova
poesia e uma nova plástica. (FILIPPO MARINETTI apud
BENJAMIN, 1985, p. 239, citando Manifesto Futurista.)
Diante disso, nos perguntamos se não são estas as razões que motivaram Goebbels a
investir nos chamados de “Documentários de Propaganda” - um gênero cinematográfico
que simula uma realidade truncada, e foi largamente utilizado pelo Partido Nazista, na
época. Sutilmente, apresentavam-se fatos reais, mas manipulados de acordo com os
interesses de quem os produzia. Temas como a condenação à deficiência física, mental, e a
eutanásia, foram bastante explorados por estes filmes, especialmente quando na aprovação
de leis para o extermínio de doentes terminais e deficientes.
Já em “Triunfo da Vontade” – documentário de Leni Riefenstahl, cineasta e amiga
pessoal de Hitler, é considerado por ela, um filme de arte, embora seja acusado por muitos
críticos de fazer apologia à ideologia nazista, privilegiando valores como o nacionalismo
exacerbado, a simetria, a limpeza étnica e estética, o alistamento da juventude, o estereótipo
alemão da raça ariana, etc, através de um texto artístico muito refinado. Nuremberg é
tomada como palco e seus habitantes como figurantes. De fato, artisticamente, o filme
alcança um nível de qualidade estética e narrativa invejáveis para a época, e é bastante
premiado na Europa, além de se tornar uma referência do período.
Na reportagem “Arquiteturas da destruição” publicada na Folha de S. Paulo, pelo
jornalista Tiago Machado em 14/09/2003
23
, fica evidenciado que a manipulação da
realidade foi estrategicamente pensada pelo nazismo. Segundo o jornalista, “[...]Leni,
amiga íntima de Hitler, o ajudou a desenvolver a mais eficiente arma nazista: o
documentário de propaganda”.
Embora estes filmes de propaganda não sejam de autoria dela, acredita-se ainda
assim, que ela e Goebbels tenham influenciado a concepção fundamental destes
documentários, ao sugerir a eficaz aliança entre propaganda do Estado e cinema, gerando
documentários, que em essência, deveriam narrar acontecimentos históricos ademais de
serem fiéis à realidade, à verdade histórica.
Contudo, a estratégia foi a de que não era preciso usar trucagens cinematográficas
para convencer os indivíduos: “trucar” a própria realidade e filmá-la como um
23
FOLHA DE S. PAULO. MACHADO, Tiago. Arquiteturas da destruição. Artigo publicado no jornal
Folha de S. Paulo. Caderno Ilustrada, em 14/09/2003 – Ver lista de anexos.
documentário era muito mais eficiente, já que neste gênero, a propaganda é sutil, e fica
encoberta sob a cortina de uma falsa realidade.
Evidentemente, devemos ressaltar a existência de questões que não podem ser vistas
isoladamente, para que não se corra o risco de perdermos as suas relações com o contexto.
Porém, alguns questionamentos se fazem pertinentes neste cenário, como por exemplo:
quais as razões que levam uma sociedade a legitimar uma barbárie? Sabemos que a
violência esteve presente nos cenários históricos em vários momentos e desde épocas
remotas. Entretanto, o que teria fundamentado o pensamento coletivo do povo alemão para
“aceitar” com algumas restrições, a guerra e o extermínio de milhares de vidas?
Estes questionamentos também foram feitos por Adorno & Horkheimer
24
, já em
1967, ao analisarem o holocausto na Alemanha nazista. Para eles, a barbárie foi o triste
resultado do Projeto da Razão, movimento que ressaltava a racionalidade como a única via
possível para salvar a humanidade da “escuridão” e do misticismo da Idade Média.
Infelizmente, o projeto culmina com a Segunda Guerra Mundial: “o que nos propuséramos,
era de fato, nada menos do que descobrir por que a humanidade, em vez de entrar em um
estado verdadeiramente humano, está se afundando em uma nova espécie de barbárie”.
Para esta resposta, Lenharo (2003), acredita que um conjunto de técnicas eficazes,
dentre elas, uma especial ênfase à comunicação, selou o último pacto entre Estado e Povo, e
assim, produziu-se um efeito arrasador sobre mentes e corações.
“A propaganda tem que quebrar a principal linha de defesa do inimigo antes que o
exército avance“ (LENHARO, 2003, p. 45)
25
, foi com este pensamento, que Goebbels
dirigiu as plataformas de comunicação do Estado nazista, com maior atenção no rádio e
cinema, trazendo-os como aliados políticos a serviço do totalitarismo e contra seus
inimigos.
Quando Adorno e Horkheimer (1985, p.46), anunciavam que os instrumentos
estratégicos utilizados pelo nazismo foram “a linguagem, as armas e por fim, as máquinas”,
temos uma idéia, dentre outras questões, do quanto a comunicação foi de fato, planejada a
24
ADORNO, Theodor W. & HORKHEIMER, Max. A dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 1985.
25
LENHARO, Alcir. Nazismo – Triunfo da Vontade. São Paulo. Editora Ática, 2003.
serviço do totalitarismo na Alemanha Nazista. Os autores afirmam que a linguagem serviu
a uma minoria para justificar os “próprios crimes como conseqüências necessárias de
sistemas de leis”.
[...] enquanto nos abstraímos de quem emprega a razão, ela terá tanta
afinidade com a força quanto com a mediação; conforme a situação do
indivíduo e dos grupos, ela faz com que a paz ou a guerra, a tolerância ou
a repressão, apareçam como o melhor convier. (ADORNO &
HORKHEIMER, 1985, p. 86)
Nesse momento, a racionalidade de que falamos, segundo os autores (1985, p.114),
passa a ser chamada de TÉCNICA. Para eles, ela é a própria dominação que encontra seu
mecanismo propulsor na sociedade alienada de si mesma, e que mantêm em todos os seus
mecanismos, desde os “automóveis, bombas e o cinema”, todos justapostos, coesos,
complexos e interdependentes: “[ ...] e chega o momento em que seu elemento nivelador
mostra sua força na própria injustiça a qual servia”.E ainda vão acrescentar: “O que não se
diz é que o terreno no qual a cnica conquista seu poder sobre a sociedade é o poder que os
economicamente mais fortes exercem sobre a sociedade.” (ADORNO & HORKHEIMER,
1985, p.114)
Essa “injustiça” social a qual se referem, manifesta sua face protagonizada, quando
dentro deste mesmo sistema (técnico), as distinções entre filmes de várias categorias ou
entre os conteúdos de diferentes revistas, têm mais a ver com a sua utilidade para a
classificação, mapeamento e computação estatística de seus consumidores, do que com os
seus conteúdos. Adorno anunciava: “Para todos algo está previsto; para que ninguém
escape, as distinções são acentuadas e difundidas”.
Do outro lado do Ocidente, Hollywood também aplicou largamente suas estratégias
cinematográficas e as mantém até hoje, com muita tradição e altos investimentos na
indústria do entretenimento.
No artigo publicado em 28/01/2006 por Ana Maria Bahiana
26
, intitulado “Guerra
na Mídia”, a jornalista relata ter tido acesso a informações que revelaram o encontro de
26
BAHIANA, Ana Maria. Guerra na Mídia. Observatório da Imprensa. Disponível em
http://observatorio.ultimosegundo.og.com.br/artigos/asp2111200194.htm
. Acesso em 28/01/2006 - Ver lista
de anexos.
executivos de Hollywood com o alto escalão da Casa Branca, às portas fechadas, logo após
os atentados do 11 de setembro de 2001.
Neste encontro, comenta, o Governo de Bush propunha um acordo com os cineastas
norte-americanos, para que produzissem filmes que pudessem suscitar três objetivos
políticos fundamentais: 1) divulgar o conceito de “guerra ao terrorismo” proposto por Bush,
2) mobilizar tropas americanas para a guerra e 3) levantar a moral e incentivar o consumo
do povo americano, em troco, teriam altos investimentos no setor por parte do governo.
Isso, segundo ela, era necessário para confortar a opinião pública norte-americana,
fragilizada com os atentados de 11 de setembro de 2001. A idéia era de que, fatalmente,
conquistariam sucesso, especialmente em se tratando do cinema como um instrumento
poderoso na formação de opinião.
“Nada pior para os negócios do que filmes de propaganda” dizia um executivo
de Hollywood. Eis aqui, a razão por buscarem um conceito diferente daquele empregado na
Alemanha Nazista. A intenção continuaria a mesma, a de promover ideologias de grupos de
interesses, todavia, a forma como essa propaganda seria transmitida teria que ser muito
mais sutil. Daí, Hollywood descobriu as famosas releituras históricas ou ficções históricas,
que sempre tiveram larga aceitação por parte do público em geral, como: “Gladiador”,
“Tróia”, “Alexandre”, “Rei Arthur” e “Cruzada”. Filmes que, reconstituem fatos
históricos, onde o personagem principal é geralmente um herói e, onde os conflitos
ficcionais da narrativa, na maioria das vezes, são levemente adaptados para a
contemporaneidade. Assim, fica evidente a escolha ideológica no filme, seja ela qual for, o
que confirma mais uma vez, a força política do cinema junto às sociedades.
É neste sentido, que caminhamos agora para a Segunda Parte do trabalho,
procurando focar as análises políticas de trailers e filmes de guerra produzidos durante o
período de 2001 a 2005.
... Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
nos rouba a luz, e, ...
PARTE II
UMA ANÁLISE POLÍTICA DE
TRAILERS E FILMES DE GUERRA PÓS-11 DE SETEMBRO
Diante da reflexão levantada até o momento, cabe-nos agora verificar como todas
essas questões que envolvem o cinema como espaço de mediação entre Cultura, Política,
Mercado e Sociedade, se revelam em um filme e em um trailer.
Entretanto, para tal tarefa, foi necessário, a princípio, delimitarmos o recorte
histórico para a análise de tais obras, que elegeu o período de 2001 a 2005, como contexto
amplamente marcado pela presença da mídia, cobrindo conflitos e guerras por todo o
mundo. Algo que se intensificou nos últimos tempos, por conta da maior liberdade de
imprensa e maior presença dos grupos de mídia, em várias partes do mundo.
Dentre outras questões, também iremos discutir algumas relações que este período
travou com o cinema, em especial, o filme “Cruzada”, título original “Kingdom of Heaven
(2005), produzido e distribuído ao mundo, bem no momento em que de fato, estava
ocorrendo um conflito entre EUA e Iraque. Haverá algumas coincidências? Cristãos de um
lado e muçulmanos de outro. O que significa para nós, tal produção de cinema em meio a
este polêmico cenário?
Para tentar responder a essas questões, iremos apresentar alguns dados a respeito da
produção cinematográfica norte-americana atual, e o que ela representa para o mundo do
entretenimento audiovisual hoje.
Por fim, aplicaremos a análise política em cinco trailers de guerra, do período de
2001 a 2005, que tiveram boa repercussão nacional e internacional. Queremos privilegiar
elementos estéticos e estratégicos deste formato, em meio ao contexto político hoje vivido,
para verificar se há de fato, relações da obra com o contexto, mesmo se tratando de um
discurso fragmentado, cuja aparente incoerência narrativa, também tem uma
intencionalidade. E é esta intenção que queremos conhecer.
Capítulo III
O CONTEXTO DE ANÁLISE: UM INÍCIO DE SÉCULO MARCADO
PELA GUERRA CINEMATOGRÁFICA
E PELO “MESSIANISMO DE MÍDIA
27
Em meio à nossa análise, sentimos a necessidade de olhar à margem de nosso objeto
de estudo para saber o que estava ocorrendo no mundo, bem no início do século XXI,
enquanto o trailer ia adotando novas técnicas, sofisticando-se, ajustando-se às novas e
complexas exigências do homem midiático.
O recorte contextual de nossa pesquisa recai sobre os cinco primeiros anos do
século XXI, de 2001 a 2005, que além de ser um contexto rico em análises políticas, é
ainda um balanço sobre o século que passou e sobre tudo o que a humanidade ainda não
superou.
O novo milênio é marcado não só pelo episódio do 11 de setembro em 2001
28
, em
Nova York, mas também pela quantidade de conflitos internacionais que eclodiram em
vários países, e em especial, a primeira guerra declarada do novo século: Estados Unidos e
Iraque, em 2003. Podemos ainda lembrar das inúmeras catástrofes naturais ocorridas:
maremotos, terremotos, furacões, enchentes, a acentuação da fome e da miséria no mundo.
Além da maior manifestação da sociedade em resposta às desigualdades provocadas pela
ideologia neoliberal, bem como na defesa da paz e da verdadeira democracia defendida nos
fóruns sociais mundiais.
O cinema também participou desta dinâmica, reforçando, denunciando, expressando
de uma forma poética através das ficções ou de forma explícita através dos documentários,
tais eventos. Por essa razão, e conhecendo a importância do CONTEXTO na análise de um
produto cultural, no nosso caso, de um filme e de um trailer, como afirmava Ferro e como
defende Kellner, é que propomos neste capítulo, uma radiografia contextual, uma análise
de conjuntura de alguns fatos importantes, deste período selecionado.
27
Messianismo de mídia – termo utilizado por Ignácio Ramonet para se referir à tirania da comunicação
quanto à cobertura em tempo real dos episódios de guerra.
28
11 de setembro de 2001 – episódio referente aos atentados às Torres Gêmeas de Nova York, ao Pentágono e
à tentativa de ataque à Casa Branca nos EUA. Todos atribuídos à organização Al Kaeda.
3.1 “ERA DA EMERGÊNCIA”
Neste novo século, já denominado de Era da Emergência (comunicação verbal)
29
,
inaugurado pelos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, em Nova York, a
capital mundial”, sede do complexo econômico e político do Ocidente capitalista,
observamos o redesenho de uma nova organização geopolítica no mundo, onde
diferentemente do passado, o fenômeno agora não é mais a conquista de territórios, como
no tempo das grandes invasões e dos hiper-nacionalismos, mas é a tomada de riquezas, ou
melhor, a conquista de mercados.
Este redesenho já vinha se configurando desde a virada do século, em 2000, com
importantes transformações no modo de vida das pessoas, que ainda superavam o trauma
do “fim do mundo”, e com as mudanças nas relações comerciais e políticas entre os países,
que vinham se reajustando às exigências do mercado liberal, desde os anos 90 do século
anterior.
Segundo Arantes (2002), o termo que melhor denomina esse novo tempo é a “Era
da Emergência“ – expressão entendida como o aflorar de inúmeras manifestações sociais,
que denotam a insatisfação atual da humanidade com o sistema vigente, quando a iminência
do caos total, estabelece-se no limite extremo, entre a possibilidade e a dúvida e, desta
forma, instaura-se um clima de terror.
Para, Ramonet (2003)
30
, a prova disto está nos crescentes movimentos separatistas
em todo o mundo, nas redes do terrorismo que se intensificaram, nos fundamentalismos
fanáticos, nos grupos anti-semitas; enfim, em todos que representam o estado-limite de
tensão, no qual a globalização chegou, e conseqüentemente, está demonstrando ser incapaz
de gerenciar de modo satisfatório, para a grande maioria da população mundial.
Ainda para Arantes (2002), a Era da Emergência supõe um estado permanente de
vigilância dos indivíduos, uns para com os outros, fazendo com que o medo seja a força
motriz do esquema de terror e tensão instalados na sociedade contemporânea.
29
“Era da Emergência” - Conferência proferida pelo Prof. Dr. Paulo E. Arantes-USP na Jornada
Multidisciplinar realizada pelo Departamento de Ciências Humanas – FAAC/UNESP campus Bauru-SP, em
Ago de 2002.
30
RAMONET, Ignácio. Guerras do século XXI – Novos temores e novas ameaças. Rio de Janeiro: Ed.
Vozes, 2003.
Para Ramonet (2003), a eminência do “perigo“ mascarado, sem rosto, e da violência
sem precedentes, torna possível, a co-existência do caos e da organização simultaneamente.
De um lado, a extrema desordem e a crise, e do outro, um crescente sistema organizado do
terror.
Diante deste cenário, nos chocamos quando a mídia divulga especulações a respeito
da criação de um possível futuro mercado do terror noticiado recentemente como intenção
vinda do Pentágono (Estados Unidos) até para tornar a “caça ao terror” mais profissional.
Numa visão global, a propaganda e a indústria bélica, se beneficiam dia após dia,
com as eclosões de conflitos em várias partes do mundo, assim como, os conflitos de
abrangência ou repercussões menores, também contribuem para instaurar o clima de medo
e instabilidade em instituições e governos em geral.
Fica então, evidente, a legítima preocupação de Arantes, no que diz respeito à
fragilidade e a tênue linha, que separa uma civilização inteira de sua própria auto-destruição
na contemporaneidade.
Esse é o século XXI, cheio de perguntas ainda sem respostas, cheio de desafios,
possibilidades e dialeticamente, novos temores. Por isso, vemos que é cada vez mais
necessária, a análise destes novos arranjos sócio-políticos, assim como os efeitos da
propaganda ideológica articulada, pois só assim, poderemos propor, alternativas viáveis
para uma coexistência pacífica entre povos, e da própria humanidade com a natureza.
Não se trata, entretanto, de propor a harmonização do mundo, tarefa essa que só
cabe aos próprios sujeitos históricos. Tampouco, de estimular uma ruptura utópica com a
“globalização irreversível”. Trata-se na verdade, de abrir caminhos viáveis, para um
desenvolvimento sustentável onde possamos começar a viver uma cultura de cooperação e
tolerância. E ainda, convivermos conectados a um pensamento global, mas, agindo
localmente, integrados e conscientes de nossa identidade e responsabilidade histórica.
Diante disto, nos perguntaríamos: por que então estudar a Guerra como femeno
histórico e como principal gênero de cinema neste trabalho, se a criticamos como prática
humana condenável? A intenção é justamente para indicarmos as estratégias e os
mecanismos de crítica que essas mesmas produções cinematográficas, ora revelam, ora
inibem, ora condenam e ora, estimulam.
Os anos que vivemos, são portadores de grandes esperanças para os
povos. E não se trata de esperanças vãs: grandes modificações históricas
se operam no mundo. As forças de paz são mais poderosas que nunca.
Mas para que elas obtenham a vitória final é preciso conhecer os
métodos, os planos e os procedimentos dos inimigos da paz.
(BESIMENSKI, L. 1967, p.12, grifo nosso)
31
Com este objetivo, é que os Estados Unidos se tornam foco de observação neste
capítulo, pois, a sua atuação sócio-política, econômica e ideológica, nas últimas décadas, e
em especial, nestes primeiros cinco anos do século XXI, merecem atenção para
compreendermos a conjuntura geopolítica atual. Especialmente por serem hoje, uma das
grandes sedes da indústria cinematográfica de todos os tempos, onde anualmente são
produzidos mais de 3 mil (três mil) filmes de todos os gêneros e distribuídos por todo o
mundo
32
.
Sabemos que a maior indústria em quantidade de filmes é a Indiana, chamada de
“Bollywood”.
33
Todavia, pouco de sua produção chega para o Ocidente, em razão do forte
esquema comercial da indústria norte-americana de distribuição. Por essa razão, é que a
questão geopolítica nos interessa, como já tratamos anteriormente no que se refere a
analisar os âmbitos de abrangência e intervenção cultural desta indústria norte-americana e
de sua forte presença no mundo.
Para Ramonet, os Estados Unidos exercem uma esmagadora supremacia nos cinco
campos tradicionais do poder: político, econômico, militar, tecnológico e cultural neste
século XXI:
De certa forma, os Estados Unidos são o primeiro Estado proto-mundial,
pensa um analista americano. Têm a capacidade de liderar uma versão
moderna do Império Universal, um império espontâneo, cujos membros se
submetem voluntariamente à sua autoridade. (RAMONET, 2003, p.07)
31
BESIMENSKI, L. O militarismo alemão com/sem Hitler. Rio de Janeiro: Ed. Saga, 1967
32
Dados obtidos junto à Rede de Locadoras Vídeo Imagem Gerência Bauru-SP em 10/02/06.
33
BOLLYWOOD – termo usado para denominar a indústria indiana de cinema, cuja inspiração surgiu do
nome da capital da Índia: “Bombaim” e “Hollywood”- surgindo assim, uma nova denominação para essa
indústria do cinema oriental.
Nesse sentido, a ex-secretária de Estado do Presidente Clinton, Madeleine Albright
até afirmou, por exemplo, que “o canal CNN é o décimo sexto membro do Conselho de
Segurança da ONU”, referindo-se dentre outros, à forte influência dos grupos de
comunicação e entretenimento norte-americano, até em instituições internacionais como a
ONU – Organização das Nações Unidas. .
Este cenário é perigoso, como também denuncia Kellner, especialmente, em tempos
de tensão política e conflitos generalizados, onde a indústria cultural toma a postura de uma
voz onipresente e a tudo passa a julgar, dialogando com a sociedade e mediando suas
interpretações e análises.
Enquanto no passado, a era das conquistas territoriais era protagonizada por
Estados, neste século, a conquista se dá na busca por mercados, e os agentes desta
“segunda revolução capitalista” (RAMONET, 2003, p.09), são empresas, conglomerados,
grupos industriais e financeiros, trustes da comunicação, que pretendem dominar o mundo.
“Nunca os senhores da Terra foram tão poucos e tão poderosos” (RAMONET,
2003, p.09). E como aponta Vicente (2006, p.03)
34
, constata-se que há na
contemporaneidade, um deslocamento do poder:
Tal deslocamento passou do Estado para as grandes corporações
internacionais. Como esses mega-grupos agem no mundo inteiro, o poder
estaria diluído pelo mundo, palco da ação desses novos agentes,
propulsores das relações sociais e econômicas perdendo-se, com isso, as
tradicionais limitações da concepção mais clássica de poder, definido pela
materialização do Estado, território e fronteiras. Dessa maneira, o
imperialismo não é mais entendido como a ingerência de alguns países em
outros.
Diante da colocação, entendemos que a concentração midiática, não pode ser vista
tomando apenas “países” como referência de sedes dos mega-grupos, que se ramificam
pelo Planeta, seguindo uma lógica neoliberal; pois a idéia de “fronteira” e “Estado”, há
muito desapareceu para estas mega-corporações. Como aponta Vicente, hoje, o poder está
34
VICENTE, Maximiliano M. Comunicação e manipulação na época da concentração midiática, Revista
TEXTOS de la CiberSociedad, 8. Temática variada. Disponível em: http://www.cibersociedad.net
Acesso em
11/03/2006.
diluído no mundo, redesenhando fronteiras, criando novos conglomerados de domínios e
intervenções.
Esta concentração é tanta que estes conglomerados adotam uma atuação de estarem
e marcarem presença em diversas partes do mundo, mesmo nas mais distantes, visando
incorporar mercados e a maximização do lucro.
Ainda como observa Vicente (2006, p.06), “a globalização econômica e cultural
seria impossível sem um sistema de mídia comercial global, para promover os mercados
globais e para encorajar os valores de consumo”. Com isso, constata-se que as corporações
de mídia, constituem-se hoje, “instrumentos operacionais da globalização”.
Já em relação à América Latina, embora diante da força desta concentração mundial
da indústria da comunicação e entretenimento, Vicente nos lembra sobre a certa margem de
autonomia que os meios de comunicação latino-americanos preservam na produção de
conteúdos específicos para nossa diversidade cultural. O que lembra de certa maneira, o
pensamento de Martín-Barbero, ao discutir a hegemonia cultural na América Latina,
afirmando existir uma riqueza sobre a identidade cultural tão diversa, que fica difícil
assegurar a eficácia da comunicação massiva, como querem os grandes conglomerados de
mídia, o que recai sobre a necessidade da adoção de outras estratégias de comunicação mais
“dirigidas” para a diversidade cultural.
Outra questão apontada por Vicente (2006) e Ramonet (2003), é a visualização do
crescente descontentamento mundial com a lógica neoliberal, onde fica complicado ignorar
a margem esmagadora de miséria nos países pobres. Isso poderia gerar um movimento
global de condenação a tais condutas concentracionistas.
Vicente nos recorda que a “concentração midiática” ocorreu na década de 90,
momento em que a tecnologia passou ser fundamental no processo produtivo da indústria
cultural e nos meios de comunicação. Com isso, em 2001, o mundo já assistia à
intensificação desta concentração consolidada, com certos arranjos entre os grupos, mas,
mantendo ainda a mesma lógica: o máximo de lucro e o início de fusões que visavam
interesses de mercado.
Ramonet aponta a abolição das regras sobre a concentração do audiovisual em 2002
nos Estados Unidos, como um marco para a indústria cinematográfica. Em decorrência
disto, sucederam várias fissões e fusões entre as corporações de mídia, que resultaram no
atual quadro de concentração midiática internacional.
Outra observação pertinente, que reforça nossas prerrogativas levantadas a respeito
da aliança entre comunicação e indústria bélica, Vicente (2006, p.09, grifo nosso) aponta:
[...]a crise da publicidade e de vendas por assinatura, ocasionou a
passagem do controle dos meios de comunicação para grupos ligados
à indústria bélica notadamente, o Dassault e Lagardère, que têm em
comum, a particularidade de serem constituídos em torno de uma empresa
central cuja atividade é militar (aviões de caça, helicópteros, mísseis,
foguetes, satélites...).
Isso é apontado por (RAMONET apud VICENTE, 2006, p.09), como “medo
realizado”, ou seja, se as corporações de mídia estiverem nas mãos de “mercadores de
canhões”, na hora da tensão e dos conflitos entre países, eles não hesitarão em influenciar a
opinião pública, através de seus veículos.
Para Ramonet (2003), essa concentração do capital e do poder, acelerou-se durante
os últimos vinte anos, sob o efeito das revoluções das tecnologias da Informação. Ela tem
sido o carro-chefe desta nova era.
Sua previsão para as próximas décadas é a da privatização de tudo aquilo que se
refere à vida em sociedade e à natureza, como os “setores da eletricidade, informática,
armamento, construção, telefonia e água” (VICENTE, 2006, p.09). Para Ramonet, é o novo
passo do capitalismo que favorecerá o aparecimento de um poder provavelmente mais
absoluto do que todos os que já conhecemos na história. E esse “medo realizado” sempre
foi inspiração para o cinema, mesmo no passado, através de filmes como: “O dia depois de
amanhã.
“No mundo todo (...) entidades e organismos caóticos ingovernáveis se
desenvolvem, escapam a toda legalidade, mergulham num estado de barbárie”
(RAMONET, 2003, p.11). Simultaneamente, novos perigos ressurgem como eventos ainda
não superados pela humanidade, mesmo em face de tantos avanços tecnológicos: hiper-
terrorismo, guerras civis, fanatismos religiosos, discriminação racial, movimentos de
grupos hostis ao regime vigente, a organização do crime e da violência, a proliferação
nuclear, desertificação, escassez da água potável no planeta, efeito estufa, etc. Muitos são
os exemplos que podemos citar, sinalizando que o século XXI traz consigo, uma bagagem
pesada para o homem contemporâneo, como conseqüência da exploração a que ele
submeteu toda a natureza, especialmente nas últimas décadas.
A grande contradição hoje é: como co-existir pacificamente em meio ao caos
instalado? Quem lucra com isso? Como gerenciar os conflitos de ordem social, ainda mais
agravados pela crise ética e ecológica do Planeta? O cenário, como vemos, é de uma crise
generalizada o que torna cada vez mais evidente, a necessidade de profissionais preparados
para esta era e conscientes do momento atual.
Para começar a responder estas questões, Ramonet (2003) aponta que, os
comunicadores e agentes da informação são os elementos fundamentais neste momento
histórico. Enquanto aparentemente, a democracia e o discurso da liberdade triunfam, num
planeta livre dos piores regimes autoritários, paradoxalmente, a censura e as manipulações,
retornam sob formas sedutoras “ópios das massas e com a promessa de o “melhor dos
mundos alienando-nos no tempo da velocidade da informação, principalmente da Internet,
da CyberCultura ou “World Culture” como qualifica Ramonet, proporcionando assim, às
tecnologias da informação, uma posição de agente ideológico diante do pensamento
amordaçado.
Desta forma, importantes transformações alteram os conceitos geopolíticos, até
então conhecidos, como: Estado, Poder, Soberania, Fronteiras, que passaram a ter novos
significados. Ainda para Ramonet, sabe-se que hoje, o árbitro mundial não é mais a ONU –
Organização das Nações Unidas, mas a OMC – Organização Mundial do Comércio, o FMI
– Fundo Monetário Internacional e o BM – Banco Mundial. As posições se invertem e os
valores modificam-se. A ética deteriora-se.
A nova ordem também implica em redefinir o conceito de riqueza das nações, que
não mais residirá em matéria-prima, mas, na detenção da Informação, em “matéria
cinzenta, no saber, na pesquisa, na capacidade de inovar[...]” ( RAMONET, 2003, p.15)
Para ele, os pilares em que as democracias modernas se apóiam são a comunicação
e o mercado enfatizando assim, a expansão do neoliberalismo – que sonha impor a sua
concepção do mundo, a sua própria utopia, como pensamento único de toda Terra.
Esse é o cenário da globalização, cujos efeitos especulativos do capital, resultam na
explosão das mazelas sociais, e só representam a negação do Estado moderno, da cidadania
e da ética.
Como conseqüência, vemos a questão ética tomar conta dos espaços de discussão, e
a crise que se instala é derivada, dentre outros elementos, da volumosa descrença da
população na ordem vigente. Em várias partes do mundo, movimentos e partidos políticos
neofascistas, principalmente europeus, propõem o culto do “sangue e do solo” – conceitos
defendidos por Adolf Hitler, além da xenofobia e do anti-semitismo. A técnica por eles
utilizada é a de estarem sempre “próximos às massas” atuando como mediadores entre os
anseios populares e o governo.
Por outro lado, sabemos também que muitos cidadãos desejariam introduzir uma
semente de humanidade no neoliberalismo e, é justamente aí, que este trabalho ganha força,
pois a utopia é vista como necessidade do novo século. Ramonet (2003, p.41) afirmou:
“Sentimos a necessidade de sonhadores que pensem e de pensadores que sonhem”.
Essa nova era, pede um contra-projeto global, uma contra-ideologia, como também
defende Ramonet. Por essa razão, pensamos a arte como uma proposta de resistência contra
a barbárie ainda presente. O cinema, com seu caráter sensível e ideológico, pode ser capaz
de trazer novas temáticas mais humanas e mais éticas.
Para isso, a discussão em pauta, também é a do comportamento ético dentro do
processo de comunicação, no nosso caso, na produção cinematográfica. Para nós,
comunicadores, essa consciência comportamental é ainda mais importante, principalmente
quando sabemos que nossa ação foi e é responsável por vários eventos ocorridos na
História, seja por intermédio dos meios de comunicação de massa, da propaganda
ideológica ou especialmente das relações inter-pessoais que se dão, a todo momento, em
diferentes esferas sociais e que portanto, influem amplamente em escalas locais e globais,
na conjuntura do presente e do futuro da Humanidade.
Conforme vai nos lembrar Ramonet (2003, p.43): “Nos caminhos que ninguém
trilhou, arrisca teus passos, nos pensamentos que ninguém pensou, arrisca tua cabeça. (...)
Se quisermos fundar uma ética do futuro, a situação atual nos convida para semelhantes
audácias”.
Contudo, é particularmente necessário esclarecer que refletir sobre o presente é
sempre uma tarefa desafiadora, já que os acontecimentos que vamos relatar, de certa forma,
são recentes e suas conseqüências ainda se processam nos dias de hoje.
Por essa razão, preocupados com os futuros desdobramentos que o episódio
histórico do 11 de setembro de 2001 possa vir a ter, registramos a intenção de nos determos
na análise de conjuntura do presente, apoiados, sobretudo, nas fontes encontradas em livros,
jornais, revistas e artigos sobre o assunto, e aqui referenciados.
Não descartamos a possibilidade de uma possível mudança na versão sobre este
episódio, que no futuro, possa se revelar diferente do que está sendo relatado hoje. Já que,
no momento, nos cabe, acima de tudo, um olhar crítico do cenário apoiados no material
disponível e no qual tivemos acesso.
3.2 11 DE SETEMBRO DE 2001 – O EVENTO QUE INAUGURA O
NOVO SÉCULO
Era o dia 11 de setembro de 2001. As redes de televisão e jornais de todo o mundo
noticiavam em tempo real o episódio que abalava o mundo.
Alguém havia desafiado a principal potência mundial do Planeta: os Estados
Unidos, e resolveu destruir certeiramente o coração da ideologia norte-americana – os
símbolos mais conhecidos de seu sistema político. As Torres Gêmeas (WTC – World Trade
Center) de Nova York eram o alvo, além de uma ala do Pentágono (sede militar) e se não
fosse a derrubada de um outro avião sobre a Pensilvânia, seria a Casa Branca (a sede do
Governo).
Ninguém podia acreditar que os aviões estavam colidindo com as torres e tampouco
que eles causariam tamanha destruição. Imediatamente, imensas explosões, incêndios,
destroços do edifício desabavam e várias pessoas pulavam das janelas desesperadas com o
fogo que incendiavam as torres. Simultaneamente, tudo era visto, ao vivo, e noticiado para
o mundo inteiro pelas redes de comunicação. Como num espetáculo, o mundo assistia
várias vezes, à mesma cena, perplexo e intrigado.
De quem seria a autoria destes atentados? – o mundo se perguntava.
Rapidamente, a mídia norte-americana interpretou o fato do ponto de vista da luta
“do bem contra o mal”, algo parecido com a narrativa retratada no filme “Cruzada”, de
2005. Os Estados Unidos haviam sido feridos em sua mais profunda auto-estima e os
atentados produziram três tipos de efeitos, como discute (Ramonet, 2003): “destruição
material, impacto simbólico e grande choque na mídia”.
Os resultados, bem conhecidos de todos: a morte de mais de três mil pessoas e o
abalo sobre os símbolos da hegemonia imperial norte-americana em matéria econômica
(World Trade Center), militar (o Pentágono) e política (a Casa Branca).
Agora, o menos notado dos dois precedentes, ou seja, o terceiro objetivo terrorista
se referia à mídia. Seria uma espécie de Golpe televiso onde de um lado, Ossama Bin Laden
– o autor confessado dos crimes, provava ao mundo, a vulnerabilidade da superpotência,
através de um atentado a princípio, primitivo; ou seja, em que não foi preciso utilizar armas
nucleares. Apenas o rapto de um avião cheio de combustível. Uma verdadeira guerra
cinematográfica ocorreu nas telas das TV´s de todo o mundo.
Do outro lado, a nação norte-americana, através de seu representante George W.
Bush, diagnosticando o golpe, numa estratégica atitude política, aproveitou o momento para
reforçar ainda mais sua doutrina de “combate ao terrorismo” e hegemonia norte-americana.
Diante disso, celebrando a alta audiência mundial, a mídia saboreava o seu novo
papel pós-11 de setembro, o que Ramonet chama de “messianismo de mídia”, ou seja, uma
espécie de “profeta eletrônico”, onde os meios de comunicação tomam a forma
personificada de agentes capazes de contar e julgar todos os episódios da história, em
especial, dos eventos de guerra.
Atacados pela primeira vez em casa, no santuário de sua metrópole, os Estados
Unidos decidiram reagir. Finalmente, após dez anos do desabamento da União Soviética em
1991, um adversário havia aparecido afinal.
Sob o nome de terrorismo, esse adversário - o islamismo radical - autorizava os
EUA a tomarem todas as medidas arbitrárias e a cometerem excessos, que teriam como
alvo, não somente as organizações terroristas, mas, também todos aqueles que se opunham
à hegemonia norte-americana e sutilmente, até os adversários da globalização liberal.
Com esta justificativa, era a primeira vez na história que um império fazia guerra
não a um Estado, mas, a um homem: Osama Bin Laden. Era um momento inédito.
Inúmeras as guerras e confrontos travados pelos Estados Unidos contra o mundo.
Como o próprio cinema retratou, na extensa lista de filmes produzidos nesta temática. Entre
os anos 2001 a 2005, por exemplo, mais de 40 (quarenta) filmes só do gênero de guerra
35
produzidos em Hollywood (dentre os que chegaram às distribuidoras brasileiras). Prova de
que, são de fato, uma das maiores indústrias cinematográficas do mundo, nos mais diversos
gêneros fílmicos, perdendo apenas em quantidade, para a indústria indiana.
Entretanto, Ramonet (2003, p.54) vai afirmar que“[ ...] os trágicos acontecimentos
do 11 de setembro de 2001 abriram um novo período da história contemporânea”.
Para Ramonet (2003), a época que está terminando começara a 09 de novembro de
1989 com a queda do Muro de Berlim e o desaparecimento da extinta URSS a 25 de
35
Dados obtidos junto à Rede de Locadoras Vídeo Imagem Gerência Bauru-SP em 10/02/06.
dezembro de 1991. Naquele momento, celebrava-se, incessantemente, a democracia, o
estado de direito e os direitos humanos. Estes três referenciais contavam com a adesão das
populações do mundo todo que viam neles, um progresso do direito contra a barbárie.
“Entretanto, neste aspecto, o dia 11 de setembro de 2001, marcou uma nítida
ruptura. Em nome da ‘guerra justa‘ contra o terrorismo, todas essas idéias generosas
parecem subitamente esquecidas” (RAMONET, 2003, p.55). Com o 11 de setembro de
2001, todos compreenderam que o momento não era para sutilezas. “Quem não está
conosco, está com os terroristas!” – advertia Bush em pronunciamento ao mundo, o que
provocou uma constatada omissão das nações, inclusive da Organização das Nações
Unidas, da OTAN – Tratado do Atlântico Norte e da UE - União Européia, salvo a França e
a Alemanha.
Washington celebrava duas sensações dialeticamente contrárias: viram-se atacados
em sua auto-estima e, simultaneamente, afirmavam sua autoridade no mundo.
“Nenhuma nação jamais teve um poder semelhante, nem uma invulnerabilidade
comparável” (RAMONET, 2003, p.55). Todas as nações e embaixadas do mundo inteiro,
menos a do Iraque, prestavam suas condolências a Bush. Todos compreendiam até mesmo
a Rússia, que o momento era inédito e opor-se a Washington seria fatal. A advertência foi
para todos os países. O domínio militar dos EUA neste início de século, é absoluto,
segundo Ramonet.
Outra lição do 11 de setembro de 2001, “[...] é que a globalização continua e se
afirma como a principal característica do mundo contemporâneo. Mas a crise atual revelou
a sua vulnerabilidade” (RAMONET, 2003, p.67).
Prova disto, é a insistência dos EUA em agilizar a instalação do que eles chamam de
“aparelho de segurança da globalização“ – um dispositivo global certamente confiado à
nova OTAN com o objetivo de insistir na adesão da Rússia e da China para entrarem na
Organização Mundial do Comércio (OMC), e reiterar o pretexto da luta mundial contra o
terrorismo e para isso, reduzindo se preciso, as liberdades e o perímetro da democracia.
Em detrimento desse tipo de discurso, várias nações como França, Itália e
Alemanha já instituíram novas legislações que reduzem os direitos individuais
principalmente, a estrangeiros ou qualquer cidadão suspeito de ligações criminosas com as
redes de terrorismo.
Com isso, quem perde são os indivíduos que vêem restringida sua liberdade a favor
de um sistema, que se torna cada vez mais autoritário.
Para Jordão & Durso (2003)
36
, após o trágico acontecimento destes atentados, o
mundo passou a experimentar uma nova plataforma política do governo norte-americano,
cujo precursor foi George W. Bush (pai) e agora, o filho. Ambos, republicanos e
conservadores, viram no 11 de setembro, a necessidade de deter o inimigo mascarado,
mesmo que para isso, fosse necessário interromper a agenda política e econômica do país,
sob o risco de se fracassarem, virem sua popularidade decair e a hegemonia norte-
americana ficar abalada.
Nesta pretensão e apoiados por alguns Estados sob o discurso da “luta contra o
terrorismo global”, foi realizado um ataque ao Afeganistão (país que dava suporte ao
Regime autoritarista Taleban). Os Estados Unidos bombardearam o país, a procura dos
autores dos atentados.
A guerra ocorreu, com pouca resistência por parte do Afeganistão, já que não
possuíam armas, tecnologicamente à altura dos norte-americanos. Como se sabe, milhares
de vidas pagaram o preço da revanche norte-americana. Novamente, a barbárie revelou-se
em sua faceta mais violenta: o conflito armado.
Para Oliveira (2003)
37
, o episódio do 11 de setembro, marca uma verdadeira
ruptura, com também pensa Ramonet, no modelo político de relações internacionais.
Hoje, a mudança no perfil da condução das Relações Internacionais, tende a ser
mais unilateral do que antes, ocorrendo um claro desrespeito com as instituições como a
ONU, por exemplo.
Entretanto, o que o 11 de setembro indica é um marco histórico de rompimento de
toda a política internacional dos EUA, pautada em uma manobra estratégica de legitimação
de sua supremacia nos chamados “ataques preventivos”, que apelam para toda a
ilegalidade em nome do discurso da “liberdade” a qualquer custo.
Daí, mais uma justificativa para a escolha desse recorte sobre o período
citado, prova de que realmente, o 11 de setembro representou uma ruptura no
36
JORDAO, Daniel. & DURSO, Rafael. “O mundo pós 11 de setembro de 2001”. Disponível em
http://www.revistaautor.com.br/textos/11_de_setembro.shtml
Acesso em 08/10/2003.
37
OLIVEIRA, Marcelo. 11 de Setembro de 2001: ruptura ou continuidade?”. Disponível em
http://www.revistaautor.com.br/artigos/2002/w15/MFO_15.shtml
Acesso em 08/10/2003.
discurso norte-americano, manifestando-se inevitavelmente, na própria cultura, e
que é revelado dentre outros, em filmes, por exemplo.
As opiniões expostas, na reportagem da Revista Veja
38
, edição especial de 11 de
setembro de 2002 – “11 de setembro – o mundo nunca mais foi o mesmo”, divergem dos
autores citados anteriormente, no que se refere à afirmação de que após o 11 de setembro, a
supremacia norte-americana tenha ganhado espaço a ponto de fortalecer sua estrutura
política e econômica. Ao contrário, a reportagem fala da situação anterior ao atentado nos
Estados Unidos, que já se encontrava abalada pela revelação de fraudes escandalosas nas
contas de empresas gigantescas, como a Enron e de uma economia que já andava mal. Tudo
isso aliado aos atentados, é que produziu um baixo índice de investimentos; pois vários
setores da economia americana já se encontravam em declínio e precisavam de
aquecimento, principalmente a bélica e a petrolífera.
Quando a principal economia adoece, o contágio é inevitável (...) Na
América Latina por exemplo, o que se vê, é um clima generalizado de
desesperança em relação ao desenvolvimento. Uma das novidades é a
maior revitalização da receita americana de abertura econômica,
privatizações e redução do Estado, o conjunto batizado de Consenso de
Washington. (Revista Veja, Edição Especial, 2002)
A doutrina Bush – idealizada pelos neo-conservadores norte-americanos, iniciada
por George W. Bush (pai) e agora, o filho, não oferece realmente nenhuma explicação
plausível para a guerra no Iraque em 2003.
Para Habermas (2003)
39
, a cena do dia 09 de abril de 2003 quando soldados
americanos enlaçam o pescoço da estátua do ditador Saddam Hussein e o derrubam do
pedestal, parece inverter a percepção pública de uma guerra de choque e pavor, sobre uma
população bombardeada e indefesa. Esta cena, transformou-se na saudação da vitória da
doutrina Bush sob o entusiasmado discurso do “Iraque livre”.
À primeira vista, a cena pode soar como um “pathos” de liberdade ou de uma
“perspectiva revolucionária” sobre o regime de direito do indivíduo; mas, para o filósofo,
38
REVISTA VEJA. Edição Especial. 11 de setembro – o Mundo nunca mais foi o mesmo. Publicada em
11/09/2002.
39
FOLHA DE S. PAULO. HABERMAS, Jurguen.“A guerra e seus juízos contraditórios”. Artigo publicado
no Caderno Ilustrada em 25/04/2003.
certamente, a superpotência dos Estados Unidos, se reserva o direito de agir de modo
unilateral, impondo um pensamento único às nações do mundo, cuja aparente promessa, é a
da liberdade a qualquer custo, mesmo que para isso, seja necessário empregar de maneira
preventiva, todos os meios militares para afirmar sua posição hegemônica.
Ainda para o autor, não podemos, contudo, entender a nova doutrina como
expressão de um cinismo normativo. Hobsbawn denominou o século XX de “século
americano”. Para ele, os neo-conservadores de Washington teriam a vantagem de dispensar
o discurso da normatividade sobre suas ações; ou seja, para os Estados Unidos - nada é
melhor para o mundo do que o que eles consideram como “melhor“, ou como “estilo de
vida perfeito“, a ideologia do “American Way” e doStar-System”, que na verdade, seria o
alastramento mundial do consumo e da globalização de mercados livres.
Para a doutrina Bush, “guerras que melhoram o mundo não precisariam de nenhuma
outra justificação”(HABERMAS, 2003).
Entretanto, especificamente nesta guerra do Iraque, a doutrina Bush alcançou
legitimação posterior, segundo Habermas, apoiada em três circunstâncias: 1) limpeza étnica
muçulmana – que já se encontrava em andamento; 2) o preceito de ajuda emergencial,
quando o direito internacional se visse abalado, e 3) o caráter democrático do discurso da
liberdade com o qual, os EUA se cobriam.
Com isso, não há como relacionar este fato ao 11 de setembro. Evidentemente, essa
doutrina foi desenvolvida muito antes do ataque terrorista...
[...]todavia, só a administração inteligente da psicologia das massas,
resultante do choque compreensível do 11 de setembro criou o clima em
que a doutrina pôde encontrar ampla aceitação, mas em uma versão
diferente afiada para a ‘guerra contra o terrorismo’. (HABERMAS,
2003, grifo nosso)
Essa associação é evidentemente polêmica, principalmente quando vai para a esfera
pública:
O governo americano procurou convencer a opinião pública mundial dos
contatos entre Saddam Hussein e a Al Qaeda. Essa campanha de
desinformação foi tão bem-sucedida no próprio país que 60% dos
americanos saúdam a mudança de regime no Iraque como ‘reparação‘
pelo 11 de setembro.
(HABERMAS, 2003)
Para Habermas, o emprego do termo “guerra preventiva”, usada pela doutrina Bush,
não oferece nenhuma justificativa legítima. Pois contra os terroristas, estes que operam em
redes globais; bombas não ajudam em nada. Mas sim, uma forte e segura rede internacional
de serviços de informação. Para ele, a informação é que se configura uma arma poderosa e
eficaz tanto para a paz quanto para a guerra. E neste ponto, ele coincide com Ramonet.
Outros perigos que resultam do fracasso auto-imputável de
uma política de não-propagação de armas de destruição em
massa, podem ser superados muitos mais por meio de
negociações do que mediante guerras para o desarmamento.
(HABERMAS, 2003)
Dessa forma, a atitude norte-americana simbolizada na doutrina Bush, só denota
uma coisa: um país hegemônico que autoriza a si mesmo. Para Habermas, este é o perigo
latente deste novo século – o risco eminente da dominação totalitária por meio de políticas
econômicas e culturais ou ações militares de intervenção mundial.
Na verdade, este é um risco muito maior do que todas as ditaduras já vividas na
história, porque ela atinge os indivíduos num momento de uma grande crise de valores, e na
ausência de uma consciência plena de ética.
“A sociedade mundial se tornou complexa demais para ser controlada a partir de um
centro e com os meios de uma política apoiada na força militar”(HABERMAS, 2003
). Para
ele, quanto mais o poder político se fizer valer pelas vias do Exército, do serviço secreto e
da polícia, mais ele impede a si mesmo, de exercer um papel de configuração civilizadora
mundial, pondo em risco, as próprias liberdades e fazendo esvaecer o Estado de Direito,
levando à humanidade inteira, inevitavelmente, à barbárie e ao colapso.
Por esta razão, a doutrina Bush resume o que o Ocidente vincula a “valores políticos
fundamentais”; ou seja, o vocabulário dos direitos humanos ou a auto-determinação do
conceito de democracia, não podem ser confundidos, com uma pretensão imperial de que a
forma de vida política e cultural de uma sociedade, seja exemplar para todas as outras.
Com isso, podemos concluir que os autores trabalhados neste capítulo, convergem
para um ponto: o de que os Estados Unidos concentram hoje, a hegemonia sobre as
dimensões básicas de uma sociedade: a política, a econômica, a militar e a cultural.
Em relação a esta última esfera, a cultural, muito tem se falado, por exemplo, na
possível crise das salas de cinema, diante da onda tecnológica do DVD. Desde 1997, ano da
entrada desta tecnologia no país, já se anunciava que o conforto de assistir um filme em sua
casa, aos poucos, ia substituir a experiência da sala de cinema. Entretanto, segundo Dan
Fellman, executivo da Warner Bros nos EUA, em entrevista à Folha de S. Paulo em
25/06/05
40
, acha que ainda é cedo para culpar o DVD pela real queda do índice de
freqüência da população norte-americana ao cinema. “Certamente, devemos prestar atenção
nisso. Mas, creio que você não pode fazer isso [concluir que o espectador prefere o DVD ao
cinema], apenas observando seis meses de resultado. Precisaremos de alguns anos”, disse.
Conforme o quadro abaixo, referindo-se aos anos de 1995 a 2005, selecionando os
meses de maio de cada ano, constata-se um significativo aumento nas bilheterias de cinema
de 2001 para 2002, atingindo o auge em 2003 e caindo até 2005. Vejamos a seguir:
Fonte: Quadro extraído do jornal Folha de S. Paulo, em 25/06/2005, p. E-7.
Esse quadro pode representar outras tantas coisas aquém do DVD. Como explica o
distribuidor José Carlos Oliveira, diretor da Warner no Brasil, na mesma reportagem.
Campeão de bilheteria no ano de 2005 com o filme “Constantineque chegou a 2,5
40
FOLHA DE S. PAULO. Entrevista de Dan Fellman – executivo de Hollywood - concedida à jornalista
Silvana Arantes, sob o título “Executivo nega crise e ‘ morte’ das salas de cinema”. Caderno Ilustrada, p.
E-7, em 25/06/2005 – Ver lista de anexos.
milhões de espectadores e líder (até a data publicada junho/05) com o filme “Batman
Begins”, ele diz que não há crise do cinema.
“Crise, só se for de oferta”, diz. Segundo a jornalista Silvana Arantes, os filmes da
temporada de 2005, estão menos atrativos do que os de anos anteriores, incluindo os filmes
da Warner. Em 2004, havia “O Senhos dos Anéis”, “O último Samurai”, “Alguém tem que
ceder” e a maior de todas as surpresas, “A Paixão de Cristo”, que fez 6,5 milhões de
espectadores só no Brasil.
Quanto aos filmes nacionais, Oliveira acredita que se há uma crise, é em relação à
qualidade e quanto às estratégias de venda e investimento. No Brasil, há uma esquizofrenia
em relação ao cinema experimental e ao cinema comercial, uma mistura que impede a
indústria e o comércio, de se entenderem na distribuição e divulgação dos filmes nacionais.
O que no caso norte-americano, é estrategicamente articulado.
Para ele, a cinematografia brasileira deve separar em duas esferas distantes, aqueles
cineastas que fazem cinema industrial de um lado, e os que fazem cinema autoral de outro.
Só assim, ele acredita que poderá haver um entendimento e maior investimento por parte do
setor privado e também, um aquecimento de políticas públicas de incentivo à Cultura.
Ainda ressalta que, pesquisas feitas pela Warner, revelam que o mesmo consumidor
de cinema é também consumidor de DVD, sendo que os maiores itens de venda nos últimos
anos, foram “Matrix”, “O Senhor dos Anéis”, “Harry Potter” e “Tróia”. Oliveira diz que
as pessoas gostam de ter em casa, os filmes que gostaram de ver no cinema. Portanto, não
acredita que a indústria do cinema venha a sofrer declínios de audiência por conta de
tecnologias do entretenimento audiovisual.
Com base nesse referencial histórico sobre o contexto geopolítico no mundo dos
primeiros cinco anos do século XXI, com ênfase na indústria cinematográfica norte-
americana, não poderíamos deixar de destacar sua inegável supremacia na indústria do
entretenimento mundial. Neste sentido, é que procuraremos a seguir, apresentar um
panorama das produções de cinema que Hollywood vem adotando nesse período, com a
intenção de utilizar a Análise política para nos auxiliar na compreensão e interpretação de
como estratégias de comunicação são adotadas para diversos fins, desde encantar, educar,
entreter, ocultar ou persuadir grande parte das pessoas, a aceitarem ou no mínimo,
diminuírem sua resistência a certos valores ou comportamentos, cuja finalidade é serem
cada dia mais reforçados e legitimados. É na intenção de conhecer melhor essa estratégia
de legitimação de valores que passamos agora para as Análises políticas no capítulo 4.
... e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da
garganta. ...
Capítulo 4
TRAILERS E FILMES LEGITIMANDO VALORES – UMA ANÁLISE
Amparados pela análise contextual de nossa investigação e com o intuito de refletir
sobre o trailer como uma expressão que vai além da publicidade cinematográfica, pois
acreditamos que ela contempla recursos sensibilizadores que podem atuar em outros
espaços ademais do comercial, elaboramos nossa pesquisa em DUAS FASES:
1ª FASE - Primeiramente, elaboramos um MAPA TEMÁTICO com os principais filmes
produzidos pela indústria cinematográfica norte-americana
41
, entre os anos de 2001 a 2005
– para a verificação da tendência temática
que estes filmes têm adotado, através de consulta
a uma Rede de Locadoras da cidade de Bauru (São Paulo-Brasil)
42
. Para tanto e por se
tratar de uma grande produção, recortamos este universo, optando pelo gênero fílmico
“Guerra”.
Esta escolha se deu por entendermos que, se nossa motivação é chegar a
pressupostos teóricos que direcionem a técnica cinematográfica à sensibilização de uma
Cultura de Paz, conhecer as estratégias dos inimigos da paz”, é um processo necessário
para a compreensão das reais motivações que levam um filme, a no mínimo inibir ou
promover a divulgação de uma cultura de paz.
Todavia, para que possamos fazer uma Análise política mais consistente, queremos
nos aprofundar em camadas mais densas da obra cinematográfica com o auxílio do Método
de Kellner. Queremos visualizar, se há indicações de alguns temas específicos, que se
relacionem ou não com os fatos históricos do referido período temporal, ou que façam
menção à outro tempo histórico, mas, ainda assim, de forte conotação ideológica.
41
Entendendo que a indústria cinematográfica norte-americana atual é composta por vários grupos de
empresas que estão ramificadas em todo o mundo, denominamos por “indústria norte-americana” devido à
sua concepção diferenciada dentro do cinema mundial, em que circulam altos investimentos em produção e
eficazes estratégias de distribuição. Em outros momentos, também denominaremos de a “Indústria de
Hollywood”, em face da concepção adotada do “star-system”.
42
Rede de Locadoras “Vídeo Imagem” – localizada na cidade de Bauru-SP/Brasil, possui um banco de dados
com informações a respeito da produção e distribuição mundial de filmes. Trata-se de uma amostra local,
contudo, não perde em fidelidade aos dados que se processam em grandes capitais, portanto, em nível
nacional.
A intenção é também descobrir se há uma espécie de “agendamento” por parte do
cinema, intervindo na história ou da história inspirando o cinema – “o quanto há de ficção
na realidade e quanto há de realidade na ficção”.
2ª FASE - Em seguida, partindo deste MAPA GERAL, fizemos uma Seleção de cinco
filmes do gênero “guerra” de repercussão nacional e internacional, segundo
informações da Rede de Locadoras consultada – para analisamos seus trailers oficiais
utilizando o Método de Kellner. - Queremos com isso, verificar, se há pressupostos
estéticos (retóricos) e ideológicos (políticos) que revelem a aplicabilidade do método aos
trailers. Se mesmo em face da sua fragmentação discursiva, é possível ainda assim,
identificar uma certa coerência narrativa que denota um certo tom ideológico, político de
determinado tema.
Para tanto, na Análise dos trailers, será elaborada uma TABELA COM
CATEGORIAS PRÉ-DEFINIDAS, onde serão analisados os elementos cinematográficos
do trailer, a partir de uma abordagem de Kellner e alguns teóricos propriamente do cinema,
como Eisenstein e Betton. Pretendemos com isso, chegar a uma possível reunião de
elementos, que configurem uma análise em perspectiva sobre as estratégias do formato
trailer.
Acreditamos que esta metodologia de pesquisa poderá nos responder a duas
importantes indagações: 1) revelar alguns elementos velados da indústria cinematográfica
hollywoodiana, sob o recorte da realidade contemporânea, para averiguarmos as tendências
temáticas que estes filmes têm adotado, procurando conferir uma interpretação crítica,
sobre o ponto de vista dos possíveis “agendamentos” que o cinema cria na ficção e que se
relacionam com alguns fatos na vida real; e 2) comprovar se o método de Kellner pode ser
utilizado para análise de trailers, cuja estrutura ainda que fragmentada, tem uma
intencionalidade que lhe confere um sentido dentro de determinado contexto.
Assim, supomos reunir informações iniciais a respeito da produção do trailer para
uma futura pesquisa sobre a recepção dele junto ao público.
4.1 FASE 1 – MAPA TEMÁTICO – FILMES PRODUZIDOS PELA
INDÚSTRIA CINEMATOGRÁFICA NORTE-
AMERICANA ENTRE 2001 A 2005
Em consulta ao banco de dados da Rede de Locadoras “Vídeo Imagem” da cidade
de Bauru-SP/Brasil, colhemos os seguintes dados abaixo descritos e elaboramos alguns
gráficos, até chegarmos ao objetivo principal desta primeira fase que é, além de conhecer
mais profundamente a indústria cinematográfica norte-americana, investigar também, as
tendências temáticas do gênero fílmico “guerra” produzidos por esta indústria.
GRÁFICO 1: Indústria cinematográfica (País) x Quantidade de Produções
Explicação sobre a construção do gráfico: No período de 2001 a 2005, o número total de filmes produzidos
pelos EUA, foi de aproximadamente 9.275 produções cinematográficas (que chegaram ao Brasil pelas
distribuidoras representantes no país). Isso representa quase 2 mil produções por ano. Salvo, em relação à
indústria cinematográfica indiana, que em quantidade, segundo a Locadora consultada, é a maior do mundo,
os EUA concentram a maior indústria (conglomerados de vários empresas, nem sempre com sede no próprio
país), em termos econômicos e de distribuição, ou seja, está presente em vários países, mesmo em regiões do
Oriente Médio e da Ásia.
Indústria cinematográfica (país) x Número de Produções no período de 2000 a 2005
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
7000
8000
9000
10000
Estados Unidos EUA GRA + FRA GER + ITA
Países (indústria cinematográfica)
Número de filmes produzidos
Seqüência1
Seqüência2
Interpretação: Nota-se que a indústria norte-americana é quatro ou cinco vezes maior, que as segundas
colocadas: Inglaterra (GRA) e França (FRA), Alemanha (GER) e Itália (ITA), que possuem produções
consideráveis em termos quantitativos, sem falar em termos de qualidade.
Todavia, a maior em quantidade como dissemos, é a Indiana, denominada inclusive de “Bollywood”,
que sugere a união do nome da capital indiana “Bombaim” e “Hollywood”, a indústria do “star-system”.
“Bollywood” portanto seria uma nova Hollywood, só que oriental. O fato é que, o cinema indiano, dotado de
uma estética e cultura diferenciada da cultura ocidental e rica em estilo autoral, pouco chega até o Ocidente,
devido a uma forte influência da indústria norte-americana de cinema. O que torna para nós, seu
conhecimento um pouco dificultoso.
Sabemos ainda, que em termos de investimentos, Hollywood é sem dúvida, a maior indústria em
entretenimento audiovisual do mundo.
GRÁFICO 2: Gênero cinematográfico x Quantidade:
Explicação sobre a construção do gráfico: No mesmo período de 2001 a 2005, dividimos estes (9.275)
filmes distribuídos às redes de locadoras no Brasil, e alguns ao circuito de cinema, em uma diluição por
gêneros fílmicos: Comédias, Aventura, Suspense, Ação, Drama, Terror, Romance, Ficção científica e Guerra.
0
500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
Número de produções
Comédia Aventura Suspense Ação Drama Terror Romance Fic Científica Guerra
Gênero cinematográfico
Gênero cinematográfico x Número de produções
Seqüência2
Seqüência1
Interpretação: Como se nota, a maior incidência de gêneros fílmicos deste período é a de Comédias que
ocupa o 1º lugar no gráfico, Aventuras e Suspenses em 2º lugar e Ação em 3º lugar.
Observemos também, que os filmes classificados como “guerra”, são a menor incidência de gêneros
no gráfico apresentado. No entanto, este gênero também pode estar diluído em outros gêneros, não
necessariamente em guerra ou ação, mas, até mesmo em um Romance ou em um Épico.
Outro fato interessante, é que as Comédias lembram de alguma maneira, o que Goebbels dizia a
respeito da “repetição” de uma informação aliada ao divertimento, com fins estrategicamente
propagandísticos. Como disse Lenharo (2003), a diversão de que Goebbels falava, referia-se não somente a
fazer “rir” mas, a “distrair as massas”, mesmo que para isso, fosse preciso fazê-las “chorar”, assim como o
Drama, também revelado no gráfico, está na 5ª posição em número de produções. Prova de que é um gênero
de grande aceitação junto ao público.
Segundo informações da Rede de Locadoras, a classificação por gênero, é dada pelas distribuidoras,
o que mostra muitas vezes, os equívocos de classificação, pois tendem a atender uma estratégia mais
comercial do que propriamente, artística. No entanto, uma Comédia, nem sempre, é essencialmente Comédia.
Ela pode trazer um Drama em seu núcleo, o que não elimina seu caráter original.
Ainda, segundo a Rede de Locadoras, as Ficções Históricas, ou Épicos em geral, estão diluídos
nestas mesmas classificações. Como por exemplo, o filme “Cruzada” está classificado como “Guerra” por
trazer uma narrativa onde alguns personagens fictícios, constroem sua saga aventureira nos inter-textos da
própria história real, ou seja, de uma guerra entre cristãos e islâmicos. Contudo, também pode ser encontrado
como filme de “ação”.
Entretanto, para nossa análise neste trabalho, consideraremos um filme como sendo de “guerra”,
aqueles que trazem uma guerra ou um conflito em sua narrativa, independente de sua classificação por
gênero.
GRÁFICO 3 – Tendências temáticas x Níveis de incidência:
Explicação sobre a construção do gráfico: Embora o gênero “guerra” no referido período analisado, seja o
de menor incidência dentre as produções norte-americanas, nos deteremos nele, pela própria escolha e
construção epistemológica desta Pesquisa, como já foi argumentado anteriormente.
Nada mais coerente do que tentar compreender as possíveis relações e diálogos do cinema com a
história, na produção de reflexão sob temas da guerra.
Neste gráfico, queremos verificar quais os temas da guerra mais visitados pelo cinema nos
primeiros cinco anos do século XXI
43
:
Tendências temáticas x Incidência
0
2
4
6
8
10
12
Nazismo
(específico)
Conflitos
ideológicos
2ª Guerra
Mundial
Épicos (Guerras
históricas)
Guerra do
Vietnã
Oriente Médio
(Iraque e outros)
Ataque em Pearl
Harbor
Conflitos no
Japão
Conflitos
Nucleares
Conflitos
"Internos"
Temas abordados
Número de produções
Seqüência1
Seqüência2
Seqüência3
Interpretação: Conforme revela o gráfico, de fato, algo está acontecendo entre o cinema (no caso, o norte-
americano) e a História. Em especial, se tratando de heróicos personagens históricos, que tiveram uma
trajetória de sucesso, como: Alexandre, Júlio César, Rei Arthur, assim como, em momentos históricos
gloriosos ou trágicos, como a era das Cruzadas, a guerra de Tróia e o estabelecimento do Império Romano.
Tanto é verdade, que os demais temas, salvo algumas exceções, se referem a fatos mais
contemporâneos, como: o período Nazista, a Segunda Guerra Mundial, o ataque em Pearl Harbor e a Guerra
do Vietnã. Temas que já viraram tradição no cinema norte-americano.
O que chama a atenção, é que a figura de Hitler ainda desperta muita curiosidade e indignação por
parte do público, e talvez por isso, seja um personagem sempre visitado pelo cinema, mesmo o norte-
americano.
43
Conforme dados obtidos junto à Rede “Vídeo Imagem”, reunimos todos os filmes de guerra produzidos no
período e os dividimos por áreas temáticas. Obs: nosso critério deteve-se na temática do filme, e não somente
em sua classificação por gênero adotada pelas distribuidoras, que segue uma regra mais para fins comerciais,
do que propriamente, artísticos - Ver lista de anexos.
Vale ressaltar também, que separamos o “Nazismo” da “Segunda Guerra Mundial”, em duas
modalidades temáticas diferentes, justamente pela grande incidência de filmes especificamente sobre um e
outro. Todavia, até poderíamos juntá-los em um único tópico, que se configuraria o mais alto índice temático
de todo gênero fílmico de “guerra” durante o período de 2001 a 2005, produzido pelo cinema norte-
americano. Revelando que este é o tema mais abordado pelos cineastas deste período: a Segunda Guerra
Mundial. Contudo, achamos que seria melhor separá-los em face das análises políticas.
Entretanto, não podemos nos esquecer que poderemos encontrar temas da guerra em outros gêneros.
Vale a pena chamar a atenção, para as produções que antecederam o 11 de setembro de 2001, como
Gladiador”, que segundo a crítica, fez apologia velada aos EUA, como legítima nação sucessora do Império
Romano nos dias atuais. E em um momento posterior ao 11 de setembro, produções como “Cruzada” e
Tróia”, ganham destaque por serem temas históricos retratando guerras e conflitos entre povos e culturas
diferentes.
A partir de 2005, no entanto, também se vê, um aumento de filmes do gênero “Suspense” e Ação”,
que retratam relações mais sutis, que nos levam a estabelecer conexões sobre a atual preocupação norte-
americana do inimigo que está “dentro de casa”, ou seja em relação aos “conflitos internos”. Filmes como “A
ilha”, “Ameaça invisível”, “Assalto ao 13º DP”, “Tiros em Columbine” e o documentário “Farenheit 11/9”,
revelam os problemas internos de uma nação em conflito consigo mesma, com seus próprios habitantes.
Todavia, nem sempre são encontrados como filmes de “Guerra, como já explicamos anteriormente.
Outro ponto que vale observar é a grande incidência de filmes que trazem temas que abordam
essencialmente os valores da democracia, liberdade, racismo e conflitos religiosos - uma tendência tradicional
do cinema norte-americano.
4.2 FASE 2 – ANÁLISE POLÍTICA APLICADA AOS TRAILERS DE
CINCO FILMES DE GUERRA (Entre 2001 a 2005)
Atualmente, o Brasil possui várias distribuidoras de filmes e são elas que controlam
o circuito de cinema “Entertainement home” – “Entretenimento em casa” (locadoras),
como também a distribuição de cópias dos filmes para as salas de cinema (exibição) no
país. As mais relevantes da atualidade são: FOX filmes, Warner, Universal, Califórnia,
Imagem Films, Flashstar, Paramount, Europa, Focus, Casablanca, Alpha Films, Buena
Vista e Paris Filmes.
Diante disso, selecionamos os seguintes trailers abaixo, todos do período de 2001 a
2005, produzidos pelo conglomerado de empresas ligadas à Hollywood, para aplicarmos o
método da Análise Política de Kellner. São eles:
* O Pianista (2002) – sobre o período de ocupação nazista na Polônia
* Tróia (2004) – sobre a guerra mítica de Tróia
* Pearl Harbor (2001) – sobre o ataque japonês à base da marinha norte-americana
* Hotel Hwanda (2004) – sobre a guerra civil em Huanda, África, em 1994
* Cruzada (2005)sobre a guerra santa entre cristãos e islâmicos em 1.187
Obs: Segue anexo a este trabalho, o CD com os cinco trailers analisados, em formato para ser visualizado
em DVD – Ver lista de anexos.
Passamos agora, para a análise dos trailers destes cinco filmes. Como já dissemos
anteriormente, queremos aplicar o método da Análise política que Kellner chama de um
Estudo cultural multiperspectivo” cujo resultado chamaremos de “Crítica diagnóstica”.
[...] um estudo cultural multiperspectívico utiliza uma ampla gama de
estratégias textuais e críticas para interpretar, criticar e desconstruir as
produções culturais em exame. O conceito inspira-se no perspectivismo
de Nietzsche, segundo o qual toda interpretação é necessariamente
mediada pela perspectiva de quem a faz, trazendo, portanto, em seu bojo,
inevitavelmente, pressupostos, valores, preconceitos e limitações. Para
evitar a unilateralidade e a parcialidade, devemos aprender como
empregar várias
perspectivas e interpretações a serviço do conhecimento.
(NIETZSCHE apud KELLNER, 2002, p. 129)
Como tratamos anteriormente, a proposta desta fase de pesquisa, é analisar estética
e ideologicamente os trailers, compreendendo que esta classificação em duas dimensões se
dá apenas para fins didáticos, pois devemos entender que ambos estão diluídos na narrativa.
Por isso, considerando a estética como “estratégia” também dotada de teor político,
ideológico e cultural, podemos afirmar que, falar em “análise estética” é falar em “reflexão
estética”.
Kellner chamou esta análise de “Análise política da mídia”, porque fatalmente, se
chega aos elementos políticos estruturantes do sistema produtivo cultural de uma obra, e
esta revelação interessa à comunicação, elucidando interesses e intenções veladas.
Ilustração 1
Visualizemos a figura desta ilustração 1. Entendamos o retângulo amarelo como o
objeto de nossa análise submetido ao método da crítica diagnóstica de Kellner. As elipses
em azul seriam os âmbitos de análises das mais diversas áreas do conhecimento, como por
exemplo: uma análise semiótica, análise crítica, análise textual, análise de conteúdo ou
análise psicanalítica, que é o que Kellner chama de estudo multiperspectívico, ou seja,
várias perspectivas do conhecimento na busca pela compreensão mais profunda e maior
abrangência sobre o objeto de análise.
Na intersecção de todas elas, no exato ponto onde elas coincidem, é que reside a
convergência e a coerência da Análise Política, ou seja, quanto maior o número de
perspectivas traçadas, maiores as chances da Análise conquistar a abrangência do objeto e
por isso, possui mais condições de resultar numa crítica mais racional, concisa e profunda.
Por outro lado, essa problemática “racional” nos leva a entender, que o exercício da
reflexão e da análise, não se deve achar nem totalmente no campo do entendimento teórico
nem no da razão prática, mas, em muitos momentos, a uma simples faculdade de julgar e
refletir. Em especial, quando o objeto desta análise, não pode ser visto apenas em uma de
suas aparências, ou seja, quando não é possível “percebê-lo” apenas com a razão, como já
havia afirmado Jean-François Lyotard
44
, cuja contribuição para nossa pesquisa, se dá
apenas neste seu pensamento:
Tal é a ‘ subjetividade’ deste princípio: a faculdade que o exerce é a
mesma que o inventa. Esse princípio, que resulta de uma arte, mais que da
razão, e que só pode se aplicar com arte, não pode pois ter a mesma
validade objetiva que as categorias para o entendimento ou a lei para a
razão prática, que se deduzem por argumentações. (LYOTARD, 1993, p.
11)
44
LYOTARD, Jean-François. Lições sobre a analítica do sublime. Campinas-SP: Papirus, 1993.
ANÁLISE 1 – Trailer de “O PIANISTA
Ficha técnica:
Título original: LE PIANISTE
Tempo de duração do filme: 148 minutos
Tempo de duração do trailer: 1´20
Ano de lançamento: 2002 (FRANÇA-EUA)
Site oficial: www.thepianist-themovie.com
Direção: Roman Polanski
Sinopse: O pianista polonês Wladyslaw Szpilman (Adrien Brody)
interpretava peças clássicas em uma rádio de Varsóvia quando as
primeiras bombas caíram sobre a cidade, em 1939. Com a invasão
alemã e o início da 2ª Guerra Mundial, começaram também restrições
aos judeus poloneses pelos nazistas. Inspirado nas memórias do
pianista, o filme mostra o surgimento do Gueto de Varsóvia, quando os
alemães construíram muros para encerrar os judeus em algumas
áreas, e acompanha a perseguição que levou à captura e envio da
família de Szpilman para os campos de concentração. Wladyslaw é o
único que consegue fugir e é obrigado a se refugiar em prédios
abandonados espalhados pela cidade, até que o pesadelo da guerra
acabe.
Premiações
- Ganhou 3 Oscars, nas seguintes categorias: Melhor Diretor, Melhor
Ator (Adrien Brody) e Melhor Roteiro Adaptado. Foi ainda indicado nas
seguintes categorias: Melhor Filme, Melhor Fotografia, Melhor Figurino
e Melhor Edição.
- Recebeu 2 indicações ao Globo de Ouro, nas seguintes categorias:
Melhor Filme - Drama e Melhor Ator - Drama (Adrien Brody).
- Ganhou 2 prêmios no BAFTA, nas categorias de Melhor Filme e
Melhor Diretor. Foi ainda indicado em outras 5 categorias: Melhor Ator
(Adrien Brody), Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Trilha Sonora, Melhor
Fotografia e Melhor Som.
- Ganhou 7 prêmios no Cesar, nas seguintes categorias: Melhor Filme,
Melhor Diretor, Melhor Ator (Adrien Brody), Melhor Fotografia, Melhor
Som, Melhor Trilha Sonora e Melhor Desenho de Produção. Foi ainda
indicado em outras 3 categorias: Melhor Roteiro Adaptado, Melhor
Edição e Melhor Figurino.
- Ganhou a Palma de Ouro, no Festival de Cannes.
- Recebeu uma indicação ao Goya, na categoria de Melhor Filme
Europeu.
- Recebeu uma indicação ao Grande Prêmio Cinema Brasil de Melhor
Filme Estrangeiro.
No trailer de “O pianista”, a primeira cena já anuncia e apresenta Wladyslaw (o
protagonista) que é um pianista polonês. Nela, podemos ouvir primeiro o piano e depois
sua imagem, intercalada com a fala de uma outra cena do filme, em que um amigo de
Wladyslaw o apresenta como sendo “um dos grandes pianistas do mundo”.
Na seqüência, a melódica canção tocada por ele é brutalmente interrompida com a
explosão de uma bomba em sua janela, que o apavora. Rapidamente, são apresentadas
algumas cenas de militares nazistas marchando nas ruas polonesas e várias explosões se
seguem.
Nesse momento, surge a inscrição na telaMelhor Filme – Palma de Ouro Festival
de Cannes 2002”. Isso visa a valorizar a obra na tentativa de impressionar o espectador a
assistir um filme que já é premiado.
A seqüência elege algumas cenas de forte significado: a saída em massa dos
poloneses judeus, obrigados a deixarem suas casas com suas famílias e poucas malas;
caminham a pé pela rua, expulsos de seus lares, levando no braço a estrela judaica que os
identifica e os segrega. Em contraponto, a cena da família de Wladislaw olhando a marcha
pela janela, todos com expressão terrivelmente abatida e triste. A escolha destas cenas
parece sugerir que se trata de uma dolorosa história como todas as guerras são, porém, que
se trata de uma história real, que é formalmente dito na inscrição seguinte “Baseado em
uma história real”.
Na sequência de cenas, a montagem procurou harmonizar-se com a música de
fundo. O uso de falas dos próprios diálogos do filme com a inserção de imagens “não-
coincidentes” como falava Eisenstein, dá o tom envolvente e original do discurso narrativo,
tornando-o interessante e cativante.
Em meio a um diálogo que Wladyslaw trava com uma personagem, são inseridas
cenas das perseguições aos judeus, das marchas militares e dos poloneses que caminham
para as áreas de confinamento, que seria mais tarde conhecida como “gueto de Varsóvia”.
A cena é chocante, pois são milhares de pessoas que terão suas vidas interrompidas em
razão da guerra.
Em seguida, é apresentada a inscrição “A música era sua paixão”, revelando que a
história tratará da vida deste homem, apaixonado pela música em meio à guerra. Nesse
momento, a música fica mais alta e caminha para seu ápice, sugerindo dramaticidade nesse
ponto. Acreditamos que isso seja um recurso emocional do trailer, que em sintonia com a
montagem das imagens, procurou organizá-las em sincronismo com a música de fundo.
Contudo, não há “coincidências” entre imagem e som, ambas parecem se complementar,
como Betton denominou de sobreposição de imagem e som”, onde imagem e som, embora
em tempos diferentes, indicam a mesma informação, levando o espectador a uma espécie
de condicionamento e atenção.
Em seguida, é apresentado o diálogo de Wladyslaw com outro personagem, onde
lhe é dito que os alemães matam homens, mulheres, crianças, judeus, poloneses,
indiscriminadamente. Então, surge a inscrição “sobreviver era sua obra-prima”.
Nesse momento, em que a música no seu ápice em sintonia com o ritmo melódico,
as cenas começam a ser apresentadas de forma mais rápida, acompanhando a cadência
musical. Isso confere dramaticidade ao discurso, dando-lhe vigor e gerando uma espécie de
envolvimento do espectador.
As cenas que passam nesse momento do ápice musical são as mais dramáticas, que
por contar com a ótima representação do ator protagonista, deixa-as ainda mais realistas e
emotivas. A cena de Wladyslaw fazendo os gestos como se estivesse tocando piano,
todavia, sem tocá-lo, já indica que alguma coisa ocorrerá no filme, que o impedirá de tocar,
talvez porque será proibido de tal desejo, ou talvez por medo de que seja ouvido por
alguém. Enfim, essa expectativa gerada, de não saber por quê ele não toca o piano, se é
evidente a sua vontade em tocá-lo, parece ser uma técnica intencionalmente criada no
trailer para produzir tal efeito no espectador, ou seja, será preciso ver o filme para entender
porque ele não toca o piano naquelas cenas.
É na sequência que a música orquestral chega ao seu ápice maior, e é intercalada
com cenas em que a câmera lenta provoca maior adesão do espectador e maior densidade
gravitacional como dizia Betton. Parece que tudo fica ainda mais pesado, mais doloroso e
angustiante. As explosões que seguem, os assassinatos ao ar livre, as perseguições, o
desespero das pessoas nas ruas, o choro, as perdas, os destroços, e os militares que ateiam
fogo nas casas, exigem que Wladyslaw fuja, se esconda. Em contraponto com essas cenas,
o recurso da inserção de um monólogo do próprio Waldyslaw, mostra a arte da “não-
coincidência” entre imagem e som novamente, de forma harmônica. Essa harmonia é
estratégica pois as cenas começam e terminam no mesmo tempo dos compassos musicais.
Mostra que o recurso musical é bastante explorado nos trailers.
Como numa “eclosão” de sentimentos, no momento mais “alto” da montagem
rítmica, apresenta-se a cena do pianista fisicamente cansado, abatido, sujo, com roupas
rasgadas e de cabelos compridos e barba, sugerindo que já se passou um bom tempo, desde
que ele podia tomar um banho, vestir uma roupa limpa, dormir ou se alimentar. Sua
aparência denota esse estado lastimável daqueles que têm suas vidas restringidas por
ocasião da guerra, cuja única alternativa, é tentar sobreviver. Entretanto, nesta cena, ele
toca piano com toda a força que lhe resta, de forma apaixonada. Esse momento coincide
com o ápice da música de fundo.
Depois deste ponto, a música começa a desacelerar, e a apresentação das cenas fica
mais esparsa. A tensão parece que vai sendo diminuída e as cenas acompanham essa
tendência, mostrando agora, imagens de um brinde numa mesa de jantar, e do abraço mútuo
e fraterno de uma família.
Em pouco tempo, o trailer consegue passar a mensagem de que no filme, ademais
da guerra, também serão privilegiados os temas do amor, da solidariedade e da dignidade
humana, mesmo em face das maiores barbáries que se teve notícia na história: o nazismo.
Com isso, é possível vislumbrar, que neste trailer, o recurso que parece se
sobressair aos demais é a montagem rítmica acompanhando a sequência das cenas. Ela
confere dramaticidade, envolvimento e mantêm a coerência discursiva dos fragmentos do
texto fílmico.
Vejamos algumas fotos do trailer:
ANÁLISE 2 – Trailer de “TRÓIA”
Certamente, as cenas mais impressionantes ressaltadas no trailer de Tróia são as dos
exércitos em batalha. Essas são bem exploradas no trailer, sugerindo a grandiosidade da
mega produção, que também pode ser um recurso utilizado para atrair o espectador.
Contudo, a cena do mar povoado de embarcações preparadas para saltar na Ilha de
Tróia, simula a técnica da câmera rápida sobre trilhos. As visões panorâmicas (com a
câmera aparentemente, vindo de cima) sobre os quilômetros de guerreiros enfileirados à
beira-praia, prontos para o combate, é um recurso que dá ritmo à cena e sugere um enredo
que não necessita de narração. Nota-se que o recurso é propositadamente elaborado para o
trailer, e quem assiste o filme, sabe que estas cenas são mais lentas. No entanto, no trailer,
que precisa ser altamente sintético, a cena é largamente explorada com a câmera rápida.
Há uma narradora no início do trailer e sua alternância de voz com a música
instrumental de fundo, sugere a saga de uma história mítica do personagem Aquiles, vivido
pelo ator Brad Pitt, que é o guerreiro herói. O narrador (homem) é inserido na segunda
parte do trailer, quando surge a figura de Helena. Isso dá dramaticidade á narração e sugere
Ficha técnica:
Título original: Troy
Tempo de duração do filme: 162 minutos
Tempo de duração do trailer: 2’
Ano de lançamento: 2004 (EUA)
Site oficial: http://traoymovie.warnerbros.com
Direção: Wolfgang Petersen
Sinopse: Em 1193 a.c., Paris (Orlando Bloom) é um príncipe que
provoca uma guerra da Messência contra Tróia, ao afastar Helena
(Diane Kruger) de seu marido Menelaus (Brendan Gleeson). Tem
início então uma sangrenta batalha, que dura por mais de uma
década. A esperança do Priam (Peter O´Toole), rei de Tróia, em
vencer a guerra está nas mãos de Aquiles (Brad Pitt), o maior herói
da Grécia, e seu filho Hector (Eric Bana).
Premiações
- Recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Figurino.
- Recebeu 2 indicações ao MTV Movie Awards, nas seguintes
categorias: Melhor Ator (Brad Pitt) e Melhor Luta (Brad Pitt e Eric
Bana).
um jogo de imagem em contraste com a voz. O que Betton chamou de “combinação
complementar” quando som e imagem se complementam.
Ao final do trailer é apresentado em formato “vídeo-clip”, os atores principais do
filme: Brad Pitt, Eric Bana e Orlando Bloom. Os três são precedidos por suas imagens em
luta, o que denota serem todos, guerreiros. Este também parece ser um recurso interessante
para a publicidade do filme, pois descreve quais serão as “estrelas” do espetáculo fílmico.
Contudo, novamente, nota-se a inserção da cultura norte-americana na trama
histórica. O culto à beleza feminina que em Helena, resume: mulher magra, de cor branca,
loira, de olhos claros; os temas da traição, da honra, da força e do poder, são
constantemente revelados no trailer. Inclusive, o poder que um único homem, através de
sua força e honra, tem sobre um exército, que pode até mesmo submeter um outro reinado.
Não é em vão que o figurino do filme concorreu ao Oscar. Nota-se a beleza visual
inclusive em sintonia com a plástica e a fotografia das cenas. Chama a atenção, a beleza das
paisagens naturais que exercem um certo fascínio, ainda mais ao saber, que o filme foi
gravado em praias mexicanas e não na Grécia. A reprodução da paisagem grega foi um
recurso de cenário muito sofisticado.
Neste trailer, o recurso que parece se sobressair aos demais é a montagem rítmica
que também está em sintonia com a sequência de cenas. Contudo ela é mais explorada ao
final do filme, inserindo cenas que revelam a grandiosidade do cenário, das esquadras e dos
exércitos com o uso da câmera lenta para dar maior dramaticidade e densidade à narrativa.
Vejamos algumas das fotografias do trailer:
ANÁLISE 3 – Trailer de “PEARL HARBOR”
Baseado no episódio do ataque à base norte-americana em Harbor, em 1941, o
trailer do filme inicia apresentando dois meninos brincando com um avião na garagem de
uma casa de fazenda tipicamente americana. A música calma e melodicamente suave,
denota que se trata de um drama. A apresentação da seqüência é feita em câmera lenta,
enfatizando algumas cenas que misturam ação, ataques, vôos e um romance.
Há um narrador que é o próprio presidente americano, Roosevelt, após o ataque
japonês, declarando oficialmente guerra ao Japão. Em meio a isso, os flashes fotográficos
Ficha técnica:
Título original: Pearl Harbor
Tempo de duração do filme: 183 minutos
Tempo de duração do trailer: 3:00‘
Ano de lançamento: 2001 (EUA)
Site oficial: http://studio.go.com/movies/pearlharbor
Direção: Michael Bay
Sinopse: Pouco antes do bombardeio japonês em Pearl Harbor, dois
amigos que são como irmãos um para o outro, se envolvem de
maneira distinta nos eventos que fazem com que os Estados Unidos
entrem na 2ª Guerra Mundial. Enquanto que Rafe (Bem Affleck) se
apaixona pela enfermeira Evelyn (Kate Beckinsale) e decide se alistar
na força americana que lutará na 2ªGuerra Mundial, em Londres,
Danny (Josh Hartnett) torna-se piloto da Força Aérea dos EUA e
permanece no país. Após a notícia de que Rafe morrera em um dos
combates que travava contra os alemães, Danny e Evelyn se
aproximam e terminam se apaixonando.
Premiações
- Ganhou o Oscar de Melhores Efeitos Sonoros, além de ter sido
indicado em outras 3 categorias: Melhores Efeitos Especiais, Melhor
Som e Melhor Canção Original ("There You'll Be").
- Recebeu 2 indicações ao Globo de Ouro, nas categorias de Melhor
Trilha Sonora e Melhor Canção Original ("There you'll be").
- Recebeu 6 indicações ao Framboesa de Ouro, nas seguintes
categorias: Pior Filme, Pior Diretor, Pior Ator (Ben Affleck), Pior Dupla
(Ben Affleck com Kate Beckinsale ou Josh Hartnett), Pior Roteiro e Pior
Remake ou Sequência.
- Recebeu 3 indicações ao MTV Movie Awards, nas seguintes
categorias: Melhor Ator (Josh Hartnett), Melhor Atriz (Kate Beckinsale)
e Melhor Sequência de Ação.
revelam que autoridades civis e militares foram protagonistas das negociações que
decidiam o futuro de milhares de vidas que pouco sabiam ou participaram da guerra.
Em contra-partida, as cenas que denotam algum tipo de emoção, como o romance
central ou as cenas de ataque, o desespero das pessoas, a revolta dos soldados, são
acentuadas com a câmera lenta nesta sequência.
A belíssima cena de crianças brincando nos campos verdes e nas colinas, quando
avistam os aviões japoneses (kamikases) revela o tom enfático que o produtor do trailer
quis dar ao contexto: as crianças sequer entendiam o que ocorria. Isso causa um certo
choque porque demonstra a sensibilidade na escolha de cenas mais significativas que falam
por si sós. Elas também nos levam a antecipar um certo julgamento sobre o ataque e a
tomar uma certa postura diante da guerra.
A apresentação dos militares japoneses com ar feroz parece demonstrar uma certa
tomada de posição por parte do cineasta: ambos os lados lutavam por suas soberanias, por
seus povos. No entanto, ao final do trailer, vai ficando clara a defesa pela soberania norte-
americana.
A cena dos aviões, em pleno céu entre nuvens, cria uma bela plástica visual, onde se
pode deduzir como a guerra é em si mesma, a premissa de destruição de toda beleza natural
e toda forma de vida.
Outra cena acentuada pelo trailer é da bomba que é lançada por um caça japonês
que cumpre sua rota de acertar um dos navios americanos ancorados no cais. É uma bela
cena e o trailer a enfatiza com o recurso da câmera lenta. O narrador acentua seu discurso e
anuncia que naquele dia, os Estados Unidos foram atacados em sua casa. A música
acompanha tal acentuação e provoca uma certa desestabilização emocional. Uma espécie de
rebaixamento da gravidade emocional como falava Betton.
A partir desta cena do míssil, inicia o clímax do trailer que vai se acentuando com
as cenas das explosões, dos ataques aos navios e hospitais, no desespero dos médicos e
enfermeiros que devem atender uma grande quantidade de feridos, os incêndios, os mortos,
os contra-ataques, os gritos, os pedidos de socorro, o choro.
Uma das cenas finais, em que um garoto segura uma bandeira norte-americana em
pé, em meio aos destroços do ataque, embora com fisionomia triste, parece apontar para
uma certa resistência por parte do povo, que embora atacado, jamais será vencido.
Na seqüência, a cena da bandeira na água e depois dela hasteada ao vento, em meio
ao caos, reforça esta constatação.
Neste trailer, o recurso que sobressai aos demais, parece ser a montagem rítmica
que indica a perfeita harmonia entre música e imagem. Ela foi feita exclusivamente para
este trailer e, por meio de sua melodia, dá acentuação a cenas específicas como a do míssil
caindo em câmera lenta e a das crianças brincando nos campos enquanto sobrevoam os
aviões japoneses.
Vejamos algumas fotografias das cenas.
ANÁLISE 4 – Trailer de “HOTEL RWANDA”
Em Hotel Rwanda”, temos o exemplo de um trailer com a presença do narrador
que é o próprio protagonista do filme, e que tem a função de contar a história e situar-nos
na narrativa.
O trailer inicia com a inscrição do ano e do país em que ocorreu a história que se
vai contar: “Rwanda 1994” e com o registro de que o filme foi premiado no Festival de
Inverno em Toronto, Canadá.
O protagonista inicia se apresentando como “Eu sou Paul Rusesabagina, gerente de
um luxuoso hotel quatro estrelas na capital de Rwanda, um lugar que eu e minha família
chamamos de lar, até o dia em que tudo mudou”.
Ficha técnica:
Título original: HOTEL RWANDA
Tempo de duração do filme: 121 minutos
Tempo de duração do trailer: 2´10
Ano de lançamento: 2004 (EUA / ITÁLIA / ÁFRICA DO SUL)
Site Oficial: www.mgm.com/ua/hotelrwanda
Direção: Terry George
Sinopse: Em 1994 um conflito político em Ruanda levou à morte de
quase um milhão de pessoas em apenas cem dias. Sem apoio dos
demais países, os ruandenses tiveram que buscar saídas em seu
próprio cotidiano para sobreviver. Uma delas foi oferecida por Paul
Rusesabagina (Don Cheadle), que era gerente do hotel Milles Collines,
localizado na capital do país. Contando apenas com sua coragem,
Paul abrigou no hotel mais de 1200 pessoas durante o conflito.
-Premiações
- Recebeu 3 indicações ao Oscar, nas categorias de Melhor Ator (Don
Cheadle), Melhor Atriz Coadjuvante (Sophie Okonedo) e Melhor
Roteiro Original.
- Recebeu 3 indicações ao Globo de Ouro, nas categorias de Melhor
Filme - Drama, Melhor Ator - Drama (Don Cheadle) e Melhor Canção
Original ("Million Voices").
- Recebeu uma indicação ao BAFTA de Melhor Roteiro Original.
- Ganhou o Prêmio do Público, no Festival de Toronto.
Nesse momento, a música inicial que é melodicamente suave, torna-se mais forte e
ritmada, sugerindo a interrupção da paz até então vivida pelo protagonista. É quando surge
a inscrição “Baseado em uma história real” descrevendo que se trata de um filme cuja
narrativa é verídica. Esse recurso parece atrair nossa atenção, pois o que veremos, será um
fato histórico verdadeiramente ocorrido em Ruanda.
Em seguida, sucedem as cenas das guerrilhas, quando um repórter ao telefone, diz
É um massacre!”. É quando se tem noção, de que há um conflito político muito grave
acontecendo. Imediatamente, surge a imagem do protagonista indignado com o fato: Paul.
Nesta cena, temos a idéia clara do que a montagem cinematográfica pode fazer. As
cenas apresentadas são de fato, desconexas em termos de “continuidade narrativa”, mas, o
editor do trailer certamente produziu a montagem de tal forma, que lhe proporcionou
coesão, lhe deu SENTIDO. A cena que o antecede (do repórter comunicando o conflito por
telefone) é coerentemente seguida por outra (a do protagonista indignado com essa mesma
notícia), como se elas fossem seqüenciais, mas não são. Esse recurso confere coesão e
fluidez discursiva para o trailer. Isso demonstra que a montagem trailer é essencialmente
criada a partir de uma visão pessoal de seu produtor, sugerindo que é portanto, ideológica e
subjetiva.
A “não-coincidência” musical em contraponto com a imagem, também é outro
recurso utilizado no trailer. A música tem a função nítida de dar dramaticidade às cenas e
uma certeza cadência para o movimento seqüencial das imagens, sugerindo os pontos
“altos” e “baixos” do pequeno discurso narrativo.
A presença do narrador parece dar credibilidade à obra. Como toda história real, a
existência de um narrador confere um clima de fidelidade aos fatos e reforça o espectador a
se sentir no mínimo, curioso em conhecer a verdadeira história do conflito político interno
entre hutus e tutsis de 1994 em Ruanda.
A escolha das cenas apresentadas no trailer como também dissemos, é intencional.
A bela cena em que brancos e negros são separados em frente ao Hotel, impressiona pela
evidente discriminação. A ONU consegue autorização para a retirada dos turistas “brancos”
no Hotel, mas para os negros não. Os brancos tomam o ônibus e indignados olham para a
multidão negra em frente ao Hotel que fica à própria sorte, pois nem a polícia, nem a ONU
podem fazer mais nada.
Nesta cena, o protagonista “Paul”, embaixo de chuva, olha o ônibus que se afasta e
então se dá conta, de que eles (os negros) estão sozinhos.
Em uma cena anterior, apresenta-se o momento em que ele conversa com algumas
pessoas dizendo: “os brancos foram embora, fomos abandonados”. Em seguida, intercala
outra cena em que Paul pede ajuda ao comandante da missão da ONU na região e ele então
responde:“A ONU tem a missão de manter a paz, não de estabelecê-la“, referindo-se ao
fato de que a ONU não poderia fazer nada, pois não podia usar armas em nenhuma
situação.
Em outro momento, o próprio comandante da missão da ONU diz a Paul: “Milhares
de crianças estão morrendo. As superpotências não vão deter o ataque”, referindo-se ao
fato de que os países mais ricos do mundo viraram as costas para Ruanda, deixando-os à
própria sorte, principalmente os EUA, por conta do conflito ocorrido na Somália em 1991.
A partir daquele incidente, a crítica que existe é que os EUA passaram a olhar a África
como um continente de “selvagens mal-agradecidos” e que não representavam qualquer
espécie de riqueza para os mercados lucrativos da globalização.
A seqüência que intercala a voz do narrador e os diálogos do filme sugere uma
montagem que vai alcançando seu ápice no momento em que o Hotel é atacado. A música
acompanha melodicamente tal projeção e a seqüência apresenta a cena em que Paul é
obrigado a enviar sua família para um lugar seguro e eles se separam de forma dramática.
Em seguida, há a inserção do diálogo entre Paul e um dos comandantes da polícia
ruandense, onde sem ter mais o que oferecer como “suborno” aos policiais, Paul diz que se
o policial não ajudá-lo na defesa daquelas pessoas, ele não testemunhará a favor dele no
tribunal que se estabelecerá após a cessação do conflito. A conversa é tensa, revelando o
limite em que Paul chegou, mesmo em face de toda diplomacia que fica evidente com sua
postura durante o breve relato do filme no trailer.
A seleção da cena em que as crianças órfãs são salvas por uma agente da ONU é
intencionalmente escolhida. No diálogo com Paul, a agente diz “eles estão matando as
crianças para exterminar as novas gerações”. Essa cena compõe a carga emotiva do
trailer, que dificilmente passa desapercebida pelo espectador.
Na seqüência, a presença da mídia no conflito parece reforçar essa carga emotiva de
que falamos. O repórter tenta filmar tudo que vê e é impedido pelos guerrilheiros. Parece
ser uma crítica do filme ao trabalho da mídia no mundo, que tenta mostrar os fatos que
verdadeiramente ocorrem nas guerras. O detalhe é que os repórteres são brancos e
americanos. Em conversa com um dos deles, Paul pede que ele mostre aquelas imagens ao
mundo, para que as pessoas possam fazer alguma coisa e intervir naquele conflito. Mas, o
repórter diz: “As pessoas vão assistir, vão se incomodar por uns instantes, mas depois
voltarão a jantar”. A escolha dessa cena parece também se juntar às cenas que dão o tom
dramático, emotivo e denunciativo do trailer.
A cena seguinte apresenta o momento em que Paul se depara com uma estrada
repleta de mortos. Uma cena aterrorizante. Quase 40 mil corpos. Esta cena choca e parece
provocar certa adesão do espectador.
Por fim, a seqüência apresenta Paul conversando com as pessoas que ficaram no
Hotel e diz “Temos que nos ajudar uns aos outros. É só o que pode nos manter vivos”.
Indicando que o filme tratará além do conflito político, questões que pretendem discutir os
valores da solidariedade, da dignidade, do preconceito e da liberdade.
Neste trailer, o elemento que parece se sobressair é a montagem rítmica como já
apontamos, que cria conexões entre os fragmentos discursivos, dando coesão à narrativa. A
música acompanha a progressão das cenas e enfatiza os momentos dramáticos.
Vejamos algumas das fotografias do trailer:
ANÁLISE 5 – Trailer de “CRUZADA”
Conforme nos revela Vestergaard & Schroder
45
(2000), “os processos ideológicos,
verdadeiramente insidiosos, são aqueles que apresentam um fenômeno como algo tão
evidente e natural que dispensa qualquer exame crítico e o torna inevitável”.
Desta forma, no trailer de Cruzada, pouco mais de dois minutos são suficientes para
demonstrar alguns indícios sobre os valores que serão privilegiados na obra. Temas como:
família, moral, amor e heroísmo, roubam breves flashes que se assemelham a piscadelas do
olhar humano. Trata-se de um trailer que apresenta alguns valores e faz algumas
afirmações como fenômenos naturais.
Este trailer é exemplo da técnica que se fundamenta muito mais na sedução pelas
imagens e pela música, do que propriamente na narração da história. Ele é essencialmente
musical, e reúne estrategicamente, elementos visuais ritmados pela música, uma montagem
que resulta num arranjo dinâmico.
Os flashes não passam de dois segundos e surgem como slides, nos quais, a cena se
apresenta e se extingue, como se fossem de fato “slides” em transições suaves. Esta técnica
dá ritmo à narrativa que começa lenta e depois, se torna mais veloz desencadeando uma
45
VESTERGAARD, Torben. & SCHRODER, Kim. A linguagem da propaganda. São Paulo: Martins
Fontes, 2000.
Ficha técnica:
Título original: Kingdom of Heaven
Tempo de duração do filme: 145 minutos
Tempo de duração do trailer: 2:25’
Ano de lançamento: 2005 (EUA, Inglaterra, Espanha)
Site oficial: www.kingdomofheavenmovie.com
Direção: Ridley Scott
Sinopse: Balian (Orlando Bloom) é um jovem ferreiro francês, que guarda
luto pela morte de sua esposa e filho. Ele recebe a visita de Godfrey de
Ibelin (Liam Neeson), seu pai, que é também um conceituado barão do rei
de Jerusalém e dedica sua vida a manter a paz na Terra Santa. Balian
decide se dedicar também à esta meta, mas após a morte de Godfrey, ele
herda terras e um título de nobreza em Jerusalém. Determinado a manter
seu juramento, Balian decide permanecer no local e servir a um rei
amaldiçoado como cavaleiro. Paralelamente, ele se apaixona pela princesa
Sibylla (Eva Green), a irmã do rei.
sobreposição de imagens sobre imagens, sugerindo emoção e drama às cenas, alternando
câmeras lentas e rápidas.
A montagem rítmica é cortada em poucos momentos, quando são inseridas algumas
cenas de significado sugestivo e intencional, como por exemplo: quando o pai de Balian lhe
dá a espada, quando o sacerdote lhe diz que Deus está na mente e no coração dos homens e
não em uma religião e quando Balian espera o ataque do exército islâmico em Jerusalém.
Durante o trailer, a seleção de algumas imagens na edição como já dissemos, é
bastante sugestiva. O uso de símbolos universais permite que os espectadores façam
associações, inclusive, sem o auxílio de narrador: o beijo, o choro, o coração, a cruz, a
fúria, a ira, a morte, a casa, a mulher, os campos de trigo verde, o sol, a espada, o inferno e
o céu.
As cores e o uso da luz também integram uma sugestão narrativa. O emprego de
muitos tons de azul, cinza, e marrom nas cenas mais tranqüilas e nas florestas, nos passam
sensações de umidade, frio, serenidade ou distanciamento; enquanto, o vermelho e o laranja
aparecem para realçar as cenas de fúria, de paixão e das batalhas.
No próprio trailer também é possível identificar a tendência de criar valores sobre a
história. Distinguimos desde o início, quem está do lado do bem e do mal, quem são os
cristãos e não-cristãos, e quem deve viver e quem deve morrer (bem e mal). E as cores
auxiliam nesta criação de valores.
A música “eclesial” do início, entrecortada por outra mais ritmada, parece ser um
recurso que contribui para a identificação e localização do contexto no tempo, embora com
uma versão “mais moderna” quando essa segunda música é utilizada. Esse recurso parece
abrir nossa sensibilidade para associações contidas em nosso imaginário acerca de temas
sobre a vida, a morte e sobre religião, todas sugeridas pela música, que parece misturar sons
medievais. Todos estes elementos nos levam a concluir que se trata de uma “guerra santa”.
Uma das cenas mostradas no trailer é muito paradoxal, pois mostra o céu de uma
noite escura, onde bolas de fogo são disparadas, sugerindo um ataque aterrorizante. A
associação desta cena com os bombardeios de mísseis na ofensiva dos EUA contra o
Afeganistão, logo depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, e ao Iraque em 2003, é
inevitável. Talvez porque associemos o episódio das Cruzadas cristãs ao que George Bush
chamou de “cruzada contra o terrorismo”, atacando países islâmicos em decorrência do 11
de setembro.
O filme, feito pelo mesmo diretor de Gladiador (2000), apresenta várias correlações
com este, especialmente, ao ressaltar valores semelhantes. Ambos parecem fazer apologia
velada ao governo norte-americano. O primeiro (Gladiador) como verdadeiro sucessor do
Império Romano nos dias atuais, e em (Cruzada), como única nação (cristã) capaz de livrar
o mundo de “selvagens” fanáticos e autoritários.
Neste trailer, o recurso que parece se sobressair aos demais é a montagem rítmica,
que sem dúvida, parece atrair a atenção do espectador. Com esse recurso, é possível fazer
algumas ligações entre uma cena e outra, embora desconexas, mas que ao final, sinalizam o
tom geral da obra: uma versão moderna sobre as cruzadas cristãs, que irão privilegiar
principalmente, o valor da liberdade, que inevitavelmente, remete à idéia de democracia.
Isso parece ser uma crítica velada às ditaduras e imperialismos do mundo muçulmano,
ainda nos dias de hoje, que se mostram intolerantes.
Vejamos abaixo, algumas fotografias do trailer:
PROPOSTA DE TABELA PARA ANÁLISE POLÍTICA DE TRAILERS
A justificativa da criação desta Tabela com categorias selecionadas para análise dos
trailers, se fundamenta essencialmente em Kellner e Betton.
1. Tempo de duração
– Segundo (BETTON, 1987), o domínio do tempo é um dos
procedimentos mais notáveis do cinema. Essa capacidade de fazer com que a
dimensão e orientação temporal variem, tem um enorme valor educativo, científico,
filosófico, artístico e ideológico. Por isso, a eleição desta categoria para análise, tem
a sua importância na intenção de compreender a capacidade de extrema síntese de
um filme. Esse elemento revela o quanto de tempo é necessário para se transmitir
uma quantidade razoável de mensagem, para que o espectador se sinta
suficientemente atraído. È evidente que isso varia de tema para tema, de filme para
filme, e outras variáveis mais, no entanto, esse item na tabela, em conjunto com os
demais, poderá nos apontar a duração de tempo mais apropriada para um trailer
deixar a sua mensagem gerando boas expectativas.
Toda contração é obrigatoriamente levada a cortar algumas cenas e eleger outras. E
ao fazer uma opção, qualquer que seja, é sempre ideológica, como afirmou Istvan
Meszários.
2. Tema
- Aparentemente, esta categoria poderia nos revelar de início, todas as
intenções do filme, temáticas e até plásticas. No entanto, sabemos que determinados
temas podem ainda nos mostrar outras tantas coisas que nem imaginávamos. Betton
(1987) dizia que “a vida é um criptograma. Os cineastas decifram-na à sua maneira,
e suas obras são outros criptogramas, cujos signos falam a alguns espectadores e
emudecem diante de outros”. Por isso, todo título retrata uma certa interpretação
particular de quem o cria, um certo olhar, uma certa intenção. Já o tema, que deveria
se relacionar diretamente com ele, nem sempre é retratado no título, o que às vezes,
gera uma certa confusão, principalmente, nas traduções de títulos de um idioma para
outro.
3. O gênero – O gênero em que tal filme (trailer) é classificado também pode nos
dizer muito, embora, algumas classificações sejam meramente para fins comerciais.
No caso de nossa pesquisa, o gênero escolhido foi o de “guerra”, por um critério
antecipadamente ideológico, em um contexto previamente selecionado. Todavia, os
gêneros costumam revelar as intenções iniciais em que o filme foi produzido.
4. O enquadramento (formato cache
46
ou tela cheia) – Aqui, o critério é conhecer
qual a opção adotada pelos editores do trailer para a apresentação em tela: formato
cache ou tela cheia (padrão). Não é uma regra, mas Betton sinaliza alguns usos
apropriados destes elementos, como por exemplo: o recurso da tela cheia é
apropriado quando se quer dar destaque a cenas mais “intimistas” de coloração
“psicológica”, dramas ou conflitos “internos”. Já a tela em cache é mais usada para
a apresentação de vastas paisagens, cenas de massa ou movimentos de multidão, em
especial, quando se quer, em contraponto com o próprio recurso, chamar a atenção
do espectador para tentar descobrir a visão periférica ao objeto principal da cena, a
busca pela profundidade. Por isso, este recurso é importante na análise, para se
conhecer o que de fato, se quer mostrar ou inibir nas imagens selecionadas no
trailer.
5. Som/Música/Voz
– Reunimos estes três elementos para tratar do grau de incidência
de palavra e som na narrativa do trailer. Betton observa que a música tem uma
função estética e psicológica de altíssimo grau, criando um estado onírico, uma
atmosfera, choques afetivos que exaltam a emotividade. Elemento bastante
subjetivo, a música é para nós, critério de análise por sua carga emocional, que
geralmente, apela muito mais para a correspondência afetiva das pessoas, o gosto,
(a emoção), do que propriamente, para suas preferências intelectuais (racionais).
6. O uso da cor e luz
- Observações a serem feitas: intensidade, sombras,
predominância de algumas cores ou do preto-e-branco. Com uso da luz, o cineasta
46
Cache – no sentido literal, “esconde”; na linguagem cinematográfica, papel negro usado para cobrir uma
parte da película a ser impressa
pode dar realce ou omitir determinados aspectos da cena e, é um elemento que pode
produzir sensibilidade aos nossos olhos. Sabe-se que sentimos bem menos as cores,
do que os valores, por isso, o uso do preto-e-branco é indicado em filmes
“psicológicos”. Mas, é evidente a influência de certas cores e em certos temas e
gêneros do cinema.
7. A fotografia
– A partir de uma concepção estética de Betton e política de Kellner,
nos aproximamos de um elemento, embora mensurável, ainda assim subjetivo.
Todavia, esta categoria nos permite observar além do investimento e da inovação e
originalidade artística, elementos que evidenciam uma intenção ideológica.
8. A síntese do roteiro
– Refere-se ao sintético percurso narrativo que o trailer adota
para contar o filme em poucos minutos, pois a escolha de determinadas frases ou
cenas, também é intencional. Essa capacidade de sintetizar, em geral, omite grande
parte de fatos e informações. No trailer é necessário dizer o suficiente no tempo
apropriado. Nem mais, nem menos. No entanto, será possível encontrar uma
fórmula para saber sempre o que dizer? A síntese é uma técnica muito subjetiva e
pessoal. Cabe ao criador do trailer, encontrar o roteiro mais adequado para que os
poucos minutos da atenção do espectador, seja na sala de cinema ou no intervalo da
TV, possa lhe gerar uma expectativa, que o levará a querer assistir o filme.
9. Edição e Montagem rítmica
– Este é um elemento de interesse em nossa pesquisa,
pois, como defendia Eisenstein, a montagem é obra de fato do criador (diretor) de
cinema. Nela estão reunidos, todos os demais elementos, que compõem a cena. É o
elemento que envolve e torna atraente, um texto discursivo. É a união da imagem e
do som (música). Nisso, Eisenstein nos prestou grandes contribuições a respeito do
“contraponto” e da “não-coincidência”, entendendo que a montagem deve evoluir
com os sentimentos do espectador. Em relação ao movimento (direção) da
montagem no trailer, a princípio, há dois tipos: 1) os planos cada vez mais curtos –
traduzem um aumento da intensidade dramática em direção ao nó ou ao ápice
narrativo e 2) os planos cada vez mais longos – provocam normalmente, a
impressão inversa, uma volta à calmaria, relaxamento progressivo, abrandamento da
angústia.
10. O clímax
– A localização do clímax na trama narrativa nos indica qual o (foco) que
o editor ou produtor quis dar ao trailer. Ele (o clímax) é o responsável pela
expectativa criada ou não para levar o espectador a assistir o filme completo.
11. Sensações sinestésicas –
A sinestesia é um fenômeno bastante visto no cinema. Já
observava Betton “os perfumes, as cores e os sons se correspondem”. É válido que
possivelmente, estas percepções variem de espectador e, por isso, sejam subjetivas.
Mas, algumas impressões parecem ser um pouco mais evidentes que outras e estas,
pretendemos captar, pois também apontam algumas intenções.
12. A linguagem
O idioma utilizado na maioria das vezes, é o inglês com legenda em
português para o Brasil. Mas, a linguagem que nos referimos é a poética, a coloquial
ou a formal. Poética, geralmente quando há pouco texto verbal propriamente dito, e
há uma exaltação de outros elementos da linguagem, como as próprias expressões
dos personagens que dizem muito. Coloquial quando é descontraída e não se prende
a normas discursivas. E formal geralmente quando há presença de um narrador, que
tem a preocupação de situar o espectador em alguns detalhes de “tempo, lugar,
tema” a respeito do filme.
Em alguns trailers, a inserção de uma linguagem nova, sem se fundamentar em
elementos do próprio filme, como a voz narrativa de um protagonista, torna a
criação discursiva totalmente nova até divergindo do filme. Esta intenção merece ser
observada, embora a predominância seja a da “voz off”.
13. Qual a predominância?
-> Este é o ponto de intersecção, de que a análise de
Kellner, evidencia. Para nós, o item 13 do gráfico representa a convergência de
análises de que falávamos na figura ilustrativa 1 demonstrando o percurso
investigativo do método.
Na Tabela a seguir, resumimos todas as análises anteriores, procurando classificar
suas estratégias comunicacionais em categorias. Deixamos claro que, nosso suporte
teórico no Método utilizado está essencialmente pautado na concepção da Análise
Política de Kellner, que defende a compreensão da totalidade de uma obra midiática,
através da análise de vários pontos de vista. Sendo assim, auxiliados por ele, criamos a
tabela a seguir, no intuito de tentar relacionar uma quantidade razoável de elementos
objetivos e subjetivos, capazes de nos indicar algumas evidências, dentre elas, as de
caráter essencialmente ideológicas. Essas evidências, muitas vezes, aparecem no trailer
envoltas em técnicas e estratégias estéticas (retóricas) e ideológicas (políticas), como já
tratamos durante o trabalho.
TABELA: A ANÁLISE POLÍTICA DE KELLNER
APLICADA A
TRAILERS
DE CINEMA
TABELA: A ANÁLISE POLÍTICA DE KELLNER APLICADA A
TRAILERS
DE CINEMA
TRAILERS
O PIANISTA TRÓIA PEARL
HARBOR
HOTEL
RUANDA
CRUZADA
1. Tempo
1:20´
2:00´ 3:00´ 2:10´ 2:25´
2. Tema
Invasão nazista
na Polônia – 2ª
Guerra
Guerra mítica
de Tróia
Ataque japonês
a Pearl Harbor
– EUA
Guerra civil de
1994 em
Ruanda – África
Cruzadas
cristãs contra
islâmicos
3. Gênero
Guerra / Drama Guerra / Épico Guerra / Ação Guerra / Drama Guerra / Épico
4.
Enquadramento
Tela cheia Tela em cache Tela em cache Tela cheia Tela cheia
5. Som / Música
Música
instrumental
clássica
Música
instrumental
(eclesial) –
sugere o
contexto mítico
na 1ª parte. Na
2ª parte, ela
muda para um
ritmo mais forte
e compassado
sugerindo a
guerra
Música
instrumental
(suave e
melodiosa) –
confere
dramaticidade
às cenas,
contudo
quando vai
chegando no
ápice narrativo,
ela fica mais
forte e intensa.
Música
instrumental –
inicia com o
som de uma
flauta e depois,
vai ganhando a
inclusão de
outros
instrumentos,
chegando a
uma orquestra
até o final do
trailer.
Música
instrumental
(mistura de
harpa – que
sugere o
contexto das
cruzadas)
com (o som
de outros
instrumentos,
como a
guitarra e um
coral ao
fundo –
sugere uma
versão mais
moderna
sobre o fato).
6. Cor / Luz
Nas cenas de
dor, desilusão,
desesperança,
há pouca
presença de
luz. Durante o
trailer, há a
presença
intensa dos
tons cinza e
azul – parece
relacionar o
tom cinza com
as “cinzas”
produzidas
pela guerra.
Muita luz, sol,
uso das cores
azul, branco e
palha. Parecem
corresponder
ao contexto
litorâneo da
Grécia.
Cores vivas
que enfatizam
o verde das
matas, o azul
do céu e do
mar, o branco
das nuvens,
indicando as
belezas
naturais que
seriam
destruídas com
a guerra.
Depois do
ataque, há a
presença
Cores quentes
que
correspondem
às cores vivas
de um país
tropical como
Ruanda. Há a
forte presença
do sol, dos tons
azuis e marrom.
Há uma
mistura de
cores quentes
e frias. Pouca
luz, uso de
tons de azul e
cinza
representando
a umidade das
florestas e os
tons de palha
nas cenas de
deserto.
Trata-se de um
elemento
plástico,
contudo,
indicando uma
questão
político do
trailer.
intensa do
vermelho.
7. Fotografia
Aqui, a
fotografia
privilegia ora
imagens mais
intimistas dos
personagens,
ora, as
imagens do
contexto, da
paisagem; em
especial, o céu
é sempre
apresentado e
ganha
destaque nas
cenas ao ar
livre. Parece
que o céu é um
símbolo
adotado pelo
cineasta para
indicar a
“liberdade” que
tantos eles
buscavam.
Trata-se
também de um
elemento
plástico,
contudo, indica
uma intenção
ideológica do
trailer.
O ângulo dos
personagens
fotografados é
dirigido de
acordo com a
posição de
poder que eles
ocupam. Reis,
Príncipes e os
principais
guerreiros são
fotografados de
baixo para
cima. Dá a
sensação de
poder.
Também é um
elemento
plástico,
contudo, indica
um
posicionamento
ideológico do
trailer.
Os ângulos
fotografados
embora
privilegiem os
personagens
centrais,
sempre
procuram
revelar o
cenário, a
paisagem, o
contexto. Não
há muitas
fotografias
“intimistas”,
elas são mais
gerais.
A fotografia aqui
procura sempre
deixar uma
margem “oculta”
no ângulo de
visão de quem
assiste. Parece
sempre haver
algo escondido,
principalmente
nas cenas de
violência e dos
mortos.
Aqui, a
fotografia
também
utiliza o
recurso da
posição de
poder que o
personagem
ocupa.
Contudo, há a
inserção de
um misto de
névoa nas
fotografias, o
que dá um
efeito de
mistério e de
que tais fatos
ocorreram
num tempo
muito
distante.
8. Roteiro da
síntese
A história real
de um jovem
pianista
polonês que
durante a
invasão
nazista na
Polônia, em
meio à 2ª
Guerra, é
obrigado a
A traição que
iniciou uma
guerra sem
precedentes na
Grécia. Só há
um guerreiro
capaz de
resgatar
Helena.
Contudo, a
guerra se
mostrou
Dois amigos
que são como
irmãos desde
criança,
crescem e
juntos prestam
serviço às
Forças
Armadas norte-
americanas. Lá
eles se
apaixonam e
Baseado em
uma história
real, o trailer
narra a vida de
Paul
Rusesabagina,
gerente de um
Hotel luxuoso
na capital de
Ruanda, em
meio à guerra
A saga do
cavaleiro
cristão Balian,
que diante do
pedido de seu
pai, se torna
um defensor do
Reino de
Jerusalém
governado por
Balduíno IV.
Durante a
deixar sua
casa, amor e
família. A sua
única chance
de
sobrevivência
é a sua
paixão pela
música. E
isso se torna
sua “maior
obra prima”.
impiedosa para
ambos os
lados.
vivem um
drama, em
meio ao ataque
japonês à Pearl
Harbor em
1941.
civil de 1994
que produziu
mais de 1
milhão de
mortos em
menos de 100
dias. No breve
roteiro do
trailer, está
evidenciado o
descaso das
autoridades
civis e
militares locais
e
internacionais
com o conflito,
salvo a ONU
que
infelizmente,
não pode
intervir
militarmente.
narrativa,
percebe-se que
serão
privilegiados
valores como:
moral, honra,
diplomacia dos
governantes,
religião e
liberdade.
9. Montagem
rítmica
A composição
da montagem é
dramática e
lenta, com
suaves
transições
entre as cenas
que se
complementam
com a música
instrumental
(orquestra) que
toca ao fundo,
porém ela é em
alguns
momentos,
entrecortada
pelos diálogos,
chegando ao
ápice
juntamente
com a última
cena.
Dramática –
exalta as cenas
de dor, da
guerra e
sofrimento.
Compasso
harmonioso
com a música e
as imagens
num movimento
“não-
coincidente” –
As imagens
dizem algo, e a
música outro,
embora, elas se
complementem.
Transposições
suaves de cena
em sintonia
com a música
de fundo.
Ganham
velocidade e
densidade
quando se
aproxima do
ápice
coincidindo
com o ataque.
Aí, é intenso o
uso da câmera
lenta.
A transição
entre as cenas
é suave, e a
composição
caminha em
sintonia com a
música de fundo
e os diálogos.
Em alguns
momentos, essa
harmonia é
quebrada
propositalmente
para dar maior
impacto à cena,
como aquele
em que negros
e brancos são
separados em
frente ao hotel e
naquela em que
Paul vê uma
estrada repleta
de mortos.
Bastante
criativo. Quase
sem diálogos,
a música
instrumental dá
conta de
conduzir a
narrativa em
sintonia com a
sequência de
cenas, que ora
aceleram nas
câmeras
rápidas, ora
ficam mais
suaves nas
câmeras
lentas. Parece
ser um recurso
que provoca
certa adesão
da atenção do
espectador.
10. Clímax
È a sequência
que se inicia
depois da frase
”sobreviver era
sua obra-
A cena final: o
grito de morte
do guerreiro
que anuncia o
incêndio no
A cena das
crianças
brincando nos
campos,
enquanto
É a cena em
que o ônibus da
ONU está em
frente ao Hotel
levando brancos
Inicia com a
própria música,
que vai ficando
mais aguda e
culmina com a
prima”, em que
se sucedem
cenas do
protagonista
revelando sua
força em
resistir à guerra
e à
perseguição.
Em meio a
isso, o
momento em
que ele toca
piano
fervorosamente
é o ponto
máximo da
narrativa
.
castelo de
Tróia. A análise
político aqui,
indica que
parece haver
uma relação
entre a
fragilidade dos
homens,
mesmo os mais
invencíveis, e a
guerra, que
resume-se a
um caos total,
onde não há
vencedores.
assistem a
chegada dos
caças
japoneses e o
ataque se
iniciando. Aqui,
a análise
política indica
uma
contraposição
plástica
(crianças –
inocentes) x
(caças
japoneses –
cruéis), isso
aponta uma
intenção
ideológica,
bastante
evidenciada
pelo trailer.
para um lugar
seguro,
enquanto os
negros
permanecem
em pé, debaixo
da chuva,
indignados com
a evidente
situação de
descaso das
autoridades
para com eles.
Aqui também, a
análise política
aponta a
questão racial
em pauta. Essa
cena evidencia
a discriminação
vivida pelas
vítimas dessa
guerra.
cena em que o
pai de Balian é
atingido
mortalmente
em uma
batalha,
revelando que
uma guerra
sempre produz
resultados
dramáticos.
11. Sinestesia
Uma junção
dos sentidos
da audição,
em sintonia
com as
sensações
físicas de dor
e frio, porém
em contraste
com as cores
cinzas, que
denotam os
destroços da
guerra.
Sensações da
grandiosidade
das paisagens,
da grandeza e
do frio mar
azul, da secura
e do calor na
praia onde
pesadas
armaduras de
guerreiros
enfileirados
preparam-se
para o ataque.
A dor e a
sensação de
brutalidade
devido às
bombas e tiros
impiedosos.
A sensação
mais percebida
nesse trailer é a
do medo
extremo e a
vigilância de
uns para os
outros. Embora
não possamos
classificá-la
como um
“sentido”, essa
sensação
consegue ser
transmitida
pelos
personagens
durante todo o
trailer.
A sensação
produzida com
o auxílio
musical na
montagem nos
leva a perceber
que se trata de
uma história de
amor central,
vivida pelo
protagonista
em meio ao
contexto das
cruzadas. A
sensação
transmitida é a
da “luta por
uma causa” ,
no caso, a
religiosa em
contraponto
com a vida
pessoal de
cada um de
nós.
É a sensação
mais forte,
embora
também
ressalte o
medo e a dor e
a compressão
do tempo nas
cenas das lutas
que duraram
dias e noites.
12. Linguagem
(Fala narrativa)
Formal e
Poética – traz
trechos dos
diálogos do
protagonista
com outros
personagens, e
há uma
intervenção de
voz do próprio
pianista que
faz uma
citação
emocionada no
momento das
cenas de sua
fuga.
Formal e
Poética – é
clara, objetiva –
tem o auxílio de
narradores que
utilizam um
recurso de voz
mais grave
para dar a
sensação de
mistério
(elemento
artístico),
contudo, são
formais porque
tentam narrar a
história de
forma objetiva.
Formal - é clara
e objetiva
(possui
narrador, que é
o próprio
Presidente
Roosevelt,
após o ataque,
declarando
guerra ao
Japão). Trata-
se de um
recurso
interessante
para o contexto
do filme, além
do que,
demonstra de
forma clara, o
posicionamento
político do
trailer, que se
deterá aos
fatos narrados
a partir dos
EUA.
Formal – possui
um narrador
oculto e outro
que é o próprio
protagonista,
Paul. Suas falas
são intercaladas
por diálogos do
filme. Também
revela um
recurso que
aponta o
posicionamento
ideológico do
trailer, ou seja,
é contado pelas
vítimas da
guerra, no caso,
um ruandense.
É totalmente
poética. Não
há muitos
diálogos, e
toda a
comunicação é
feita
essencialmente
pela montagem
rítmica. Parece
ser um recurso
bastante
envolvente, e
que não exige
um esforço tão
grande da
atenção do
espectador,
pois não possui
muitos textos
verbais.
13.
Predominância
Montagem
rítmica
(sintonia entre
imagem e
som/música) –
lhe confere
movimento e
por isso,
parece atrair o
envolvimento e
a atenção.
Montagem
rítmica (sintonia
entre imagem e
som/música) –
lhe confere
movimento e
por isso, parece
atrair o
envolvimento e
a atenção.
Montagem
rítmica
(sintonia entre
imagem e
som/música) –
lhe confere
movimento e
por isso,
parece atrair o
envolvimento e
a atenção.
Montagem
rítmica (sintonia
entre imagem e
som/música) –
lhe confere
movimento e
por isso, parece
atrair o
envolvimento e
a atenção.
Montagem
rítmica
(sintonia entre
imagem e
som/música) –
lhe confere
movimento e
por isso,
parece atrair o
envolvimento e
a atenção.
Obs1: Todos os trailers dos filmes analisados tratam de fatos realmente ocorridos – “baseados em
histórias reais”.
Obs2: Para efeito de Análise Política, entendemos os filmes “O Pianista” e “Hotel Rwanda”
como aqueles que se referem ao tema da guerra a partir de um olhar das vítimas, enquanto os
demais “Tróia”, “Pearl Harbor” e “Cruzada” parecem focar a guerra a partir de um ponto de
vista grandioso e hegemônico.
Diante do que analisamos, podemos pensar que o trailer é especialmente criado para
antecipar a expectativa de um produto midiático criado primeiramente para divulgar e em
seguida, preparar o público para aceitar os valores que serão privilegiados no seu filme,
sejam eles simbólicos ou culturais.
Nesse sentido, é que agora faremos uma Análise do filmeKingdom of Heaven”,
procurando apontar as técnicas e as estratégias da comunicação utilizadas no trailer em
confronto com o seu filme.
4.3 CRUZADA NO CINEMA x “CRUZADA CONTRA O
TERRORISMO”
47
– Uma análise de “Kingdom of Heaven”
Cruzada” ou “Kingdom of Heaven” é o longa-metragem de Ridley Scott, o mesmo
diretor de “Alien” (1979) e “Blade Runner” (1980) e que segundo críticos, com “Cruzada”
completa sua “Trilogia do Império” que começou comGladiador” (2000) e “Falcão
negro em perigo” (2001).
Como vai afirmar o jornalista e crítico de cinema da Folha de S. Paulo, Sérgio
Dávila
48
, “são três filmes em que o britânico Scott louva de maneira incondicional o
império norte-americano, primeiro como sucessor e sucedâneo do romano, depois como
libertador de selvagens mal-agradecidos, agora como condutor da nova ‘guerra santa’ que
se impõe”.
Ainda segundo o jornalista, Ridley Scott desde a virada do século, tornou-se uma
espécie de braço audiovisual da coalizão anglo-americana formada principalmente a partir
do 11 de setembro, mas, consolidada com a invasão do Iraque, uma versão fílmico da
aliança Bush-Blair.
47
Cruzada contra o terrorismo” – termo utilizado pelo presidente dos EUA, George W Bush em 2001, logo
após os atentados do 11 de setembro, referindo-se à nova política ofensiva norte-americana contra os autores
dos ataques terroristas, supostamente atribuídos a um grupo de origem islâmica, Al Kaeda.
48
FOLHA DE S. PAULO. Sérgio Dávila. Caderno Ilustrada. Cruzada’ faz apologia velada da era Bush.
04/05/2005, p. E6.
A principal crítica que existe a respeito deste filme é o fato de ter sido produzido
bem em meio a um contexto histórico de conflito real no Oriente médio. Após o ataque
terrorista de 11 de setembro de 2001, o presidente norte-americano, George Bush chamou
inicialmente de “Cruzada” o que depois rebatizaria de “guerra ao terror”.
Vejamos um trecho dessa entrevista do diretor Ridley Scott à Folha de S. Paulo:
O filme que tem pouco mais de duas horas de duração, recebeu como título original
Kingdom of Heaven”, em tradução para o português: “Reino dos Céus”. Durante a
narrativa, vai ficando cada vez mais clara, a intenção do título. Em várias cenas, o Rei de
Jerusalém em 1.184, Balduíno IV, se refere à Jerusalém como um “Reino de Consciência”,
como um verdadeiro “Reino dos Céus”, metáfora onde se compreende um lugar criado por
Deus, onde seriam reproduzidas todas as promessas de Cristo.
Balian (Orlando Bloom), é um jovem ferreiro francês, que guarda luto pela morte de
sua esposa e filho. Ele recebe a visita de Godfrey de Ibelin (Liam Neeson), seu pai, que é
também um conceituado barão do Rei de Jerusalém e dedica sua vida a manter a paz na
Terra Santa. Nesta visita, Godfrey pede perdão a Balian por nunca tê-lo reconhecido como
Folha – Por que fazer um filme como “cruzada” justo agora?
Ridley Scott – Sempre quis fazer um filme de cavaleiro ou de caubói. São dois
personagens iconográficos que sempre me impressionaram como cineasta. Para não
desperdiçar meu tempo com um filme sobre um cavaleiro qualquer, Bill (o roteirista
estreante William Monahan), me sugeriu que nós situássemos a ação nas Cruzadas,
especialmente entre a segunda e a terceira, um momento historicamente rico.
Folha – Mas o sr. concorda que há uma controvérsia em relação
a esse tema, especialmente depois do 11 de setembro?
Scott – Claro, mas há controvérsias em relação a qualquer tema histórico. Você
quer me dizer que a Guerra do Iraque é religiosa, por exemplo? Pode ser que
envolva facções religiosas, mas não é religiosa. Pensar que eu fiz este filme
deliberadamente como um paralelo do nosso tempo ...
Folha – Mas como ignorar que o próprio Bush chamou primeiro
“a guerra ao terror” de “cruzada” e que os principais
antagonistas são de novo cristãos e islâmicos?
Scott – Sim e depois ele se desculpou pelo termo, assim como o papa João Paulo 2º
se desculparia pelas Cruzadas.
filho até aquele momento, e o convida a ser um defensor do rei de Jerusalém, um templário
(defensor da Terra Santa).
Balian decide então se dedicar também a esta missão, mas Godfrey sofre um ataque
de cavaleiros, e em seu leito de morte, faz um pedido a Balian, seu filho: Encare com
coragem e sem medo a face dos seus inimigos; seja bravo e honrado para que Deus possa
amá-lo; defenda o Rei de Jerusalém; proteja sempre os indefesos e não cometa erros”.
Determinado a manter seu juramento ao pai, Balian decide permanecer na região e
servir ao Rei Balduíno, um rei justo e honrado, que defende a paz entre cristãos e islâmicos,
porém com pouco tempo de vida, pois é amaldiçoado pela lepra. Aliás, essa visão sobre o
Rei cristão é nítida. Tanto ele, quanto o Rei Saladino (do islã) são vistos como
“governantes justos”, todavia, tem-se a impressão de que Balduíno (cristão) é o mais
humano. No entanto, com a iminência de uma guerra após sua morte certa devido à lepra,
alguns templários que divergem do pensamento do Rei, preparam-se para tomar o poder e
anunciar a tão esperada guerra ao islã, que até o momento, tinha sido negociada e evitada
por Balduíno.
Em meio a isso, a missão de Balian, é continuar o trabalho de seu pai em defender a
paz em Jerusalém, mesmo em face da morte do Rei.
Em alguns momentos, aparecem cenas de islâmicos rezando na Terra Santa, o que
faz Balian reconhecer: “... muçulmanos rezando, parecem com as ’nossas’ orações”. Isso
parece ser uma crítica velada à separação histórica entre esses povos, que lutaram entre si
mas, rezam as mesmas orações, evocam o mesmo Deus. Parece haver um uníssono discurso
na narrativa de “Kingdom of Heaven” para uma certa universalização do diálogo entre as
religiões, trazendo para o contexto do mundo atual.
Após a morte de Godfrey, Balian é orientado pelo sacerdote, fiel amigo de seu pai, a
continuar a missão e proteger o Rei de Jerusalém dos inimigos da paz. Em certa altura, o
sacerdote diz: Se Deus o deseja lá, o manterá a salvo em suas mãos, senão,... Deus o
abençoe”. Esse fragmento de discurso do sacerdote, parece sugerir a necessidade da guerra
em nome da paz, e conforta Balian no sentido de que a morte daquele que luta em nome de
Deus, é sempre gloriosa.
Na sua peregrinação até a Terra Santa, Balian, encontra um cavaleiro islâmico e seu
escravo, e travam uma luta pela posse de um cavalo, a pedido do cavaleiro, segundo as leis
islâmicas. Nessa luta, Balian, mata o escravo, mas resolve poupar a vida do cavaleiro, que
em retribuição a tal honrada atitude, se oferece como escravo a ele. Então, Balian diz: “Eu
já fui um escravo. Jamais teria um”. Com essa frase, ele ganha maior admiração do
cavaleiro que diz: Sua nobreza será conhecida até entre os seus inimigos”. Essa cena
pode nos indicar dentre outras questões, a exaltação da liberdade como ideologia bastante
defendida pelos povos ocidentais, onde a idéia de escravidão é totalmente condenável. E de
como tal atitude, deve ser “bem vista” pelos povos que ainda não comungam deste
pensamento.
No caminho, Balian vai até o local onde Cristo fora crucificado. Nesta interessante
cena, Balian começa a fazer um exame de consciência sobre sua vida e sobre a vida
daqueles milhares de peregrinos que iam a Terra Santa, em busca de um milagre, de um
conforto espiritual, de uma promessa de liberdade, de vida em abundância. Nesse momento,
ele pergunta a Deus: Deus, que queres de mim?” – Questionando se seria ele mesmo o
escolhido para proteger o Rei e o povo de Jerusalém.
Em seguida, o sacerdote amigo de seu pai, lhe convence de que ele é realmente um
cavaleiro de Jerusalém, e deve proteger o Reino. No entanto, Balian, desacreditado em
Deus devido à morte de sua esposa e filho, questiona a religião. Ele se vê perdido em meio
a tantas crenças, tantos povos com ideologias tão diferentes, e se pergunta se esta será uma
“guerra justa” de religiões. O sacerdote então lhe responde: “Não aposte em religião.
Através da religião, eu vi os mais diversos fanatismos serem chamados de ‘A vontade de
Deus’. A santidade e a verdade está na ação justa, mas não em religiões”. Esse diálogo
para sugerir que a “guerra santa” não é uma “guerra de religiões”, mas, uma guerra de
“verdades e justiça”, onde o que está em jogo, não é o lado cristão ou o islâmico, mas, em
qual deles reside a ação mais justa, o “Reino mais consciente”, mais digno de ser o “Reino
dos Céus”.
Isso é reforçado quanto o sacerdote acrescenta que, se fosse pelos Reis Balduíno
(cristão) e Saladino (islâmico), tudo seria um mundo melhor”. Mas, que em detrimento
da vontade de seus governantes, a corrupção está dentro dos corações de alguns homens,
que acabam alterando os rumos da história, e tornando a guerra inevitável.
A bela cena dos dois exércitos frente a frente, em razão da quebra do pacto de paz
pelos templários (cristãos), os tais “corruptos” segundo o sacerdote, revela o peso da
responsabilidade de dois governantes, dos dois Reis. Balduíno e Saladino se aproximam e
então, Balduíno diz: Se continuarmos lutando, todos morreremos. Perdoem-nos pela
quebra do pacto de paz. O cavaleiro que ousou fazer isso, será castigado por minhas
próprias mãos”. Diante disso, e vendo a sinceridade do Rei Balduíno, que padecia da lepra,
Saladino se comove com sua atitude e decide se retirar, evitando a guerra.
Em face do momento de trégua vivido em Jerusalém, Balian vai até as terras que
outrora, havia herdado de seu pai, e vê que são improdutivas, e há um povo ali, que sofre
com a seca e com a fome. Ele então, começa a cavar e descobre “água”. Esse fato é notável
porque revela que sua presença ali trouxe “vida” àquela terra e povo. Isso é reforçado
quando a princesa Sibylla (irmã do Rei Balduíno), vai visitá-lo e encontra uma terra
renovada, com plantações em pleno vigor, e um povo feliz. Ela então diz: Você construiu
aqui uma nova Canaã. Não transformou água em vinho, mas encontrou água onde
jamais existiu”.
Sibylla, conhecida por sua não-submissão ao marido, um cavaleiro corrupto de
Jerusalém, não esconde sua paixão por Balian, que a questiona sobre a guerra entre cristãos
e islâmicos. Ela então, responde que acredita no Cristianismo porque “Jesus disse
‘decidam’, enquanto o profeta deles [do islã] disse ‘submetam-se’”. Essa é uma
interessante comparação entre as duas religiões, aqui, bastante ideológica, indicando que o
Islamismo pregaria uma certa submissão de homens e mulheres, enquanto o Cristianismo
promoveria a liberdade de escolha, mesmo que ela não seja a mais correta.
Aliás, sobre isso, em uma cena mais à frente, com a premissa da morte de Balduíno,
devido à sua doença, Balian é convidado pelo Rei a casar-se com sua irmã, para assim, após
sua morte, herdar o trono de Jerusalém e continuar seu trabalho em favor da paz na Terra
Santa. Todavia, Balian não acredita que tal atitude seja a mais correta, pois seria necessária
a morte do marido da princesa Sibylla, para que viúva, pudesse se casar novamente. Diante
do fato que pressupunha o assassinato de uma pessoa, Balian recusa o pedido do Rei e se
defende dizendo: Será um Reino de Consciência ou nada”. O que reafirma uma
proposta de conduta justa e consciente, segundo o protagonista acredita, e que reúne em si,
todos os ideais ocidentais de liberdade de escolha, justiça, consciência e ética. Isso talvez
revele o pensamento do produtor do filme? Pode ser, mesmo frente à complexidade das
circunstâncias que se intensificavam, e que tornaria um conflito entre cristãos e islâmicos,
inevitável, para o cineasta, talvez, essa conduta fosse a mais correta.
Esse embate é bastante atacado também pela própria princesa Sibylla, que condena
tal atitude de Balian ao dizer: Haverá um tempo em que desejará ter feito um pouco de
mal, para alcançar um bem maior”. Entendendo que tal atitude era necessária, quando se
tem clara uma causa, que se acredita ser a mais correta, mais justa e verdadeiramente
consciente. Uma questão polêmica no filme! Todavia, Balian não volta atrás.
Enfim, morre o Rei Balduíno, e toma posse o marido de Sibylla, irmã do Rei, um
cavaleiro corrupto de Jerusalém, que tem sede de guerra contra o islã, contrariando a
conduta até então adotada por Balduíno. Em face do poder, ele lidera um ataque contra o
exército islâmico, o que quebra o pacto de paz entre os dois povos. Então, Saladino (Rei
Islâmico), captura-o e declara guerra ao povo cristão para a tomada de Jerusalém, causa da
guerra entre eles, local que se tinha como a casa do verdadeiro povo de Deus.
Em razão do eminente ataque, Balian é chamado para defender Jerusalém como
cavaleiro, lembrando de seu juramento ao pai.
Em Jerusalém, Balian diz ao povo, que sem Rei, sente-se indefeso: “Nós vamos
proteger Jerusalém, não pelos seus muros e pedras, mas pelo povo que vive entre eles”.
Indicando que ao contrário do que muitos pensavam, a luta não era material (pelos muros
que cercavam a Terra Santa), mas, que ela tinha um valor imaterial, que só era possível
compreender com o coração. Valores que só estão entre aqueles que têm consciência do
verdadeiro Reino dos Céus. Naquele momento, o mais importante não era defender os
muros, mas sim, proteger os indefesos que não tinham culpa da irracionalidade de seus
governantes. Algo muito parecido com o que Bush disse a respeito de Saddan, em face da
guerra ao Iraque em 2003 – “É preciso libertar o povo da tirania de seus governantes”.
Nesse momento, o bispo de Jerusalém diz a Balian: “Quem você pensa que é?
Pensa que vai mudar o mundo? Pensa que vai torná-lo melhor?” E Balian responde:
Sim, pelo menos no que depender de mim”.
O exército islâmico se prepara para o ataque, Jerusalém espera. Saladino, o Rei
islâmico, é cobrado pelo seu povo para que retome a posse da Terra Santa, perdida para os
cristãos séculos antes. Contudo, sua conduta pautada na justiça, sempre procurou evitar o
conflito armado, mas diante das quebras de paz dos cristãos, ele não viu outra situação. Na
linha de frente de batalha, um cavaleiro de seu exército diz: “Saladino, misericórdia!
Todos eles vão morrer”, em razão da incomparável frota de um em detrimento do outro
exército. Saladino então responde bastante arrasado: “Não, não posso”. Revelando que ele
já havia sido muito complacente com os cristãos.
Jerusalém é então atacada sem cessar. Dias e noites, ambos os exércitos se
aniquilam. Milhares de mortos. Em certa noite, bolas de fogo são atiradas contra Jerusalém;
uma cena que lembra muito o ataque norte-americano a Bagdá, na guerra contra o Iraque
em 2003, onde em lugar das primitivas armas de fogo, foram utilizados sofisticados mísseis
de guerra. Uma metáfora difícil de não ser feita por aqueles que assistiram à “guerra
cinematográfica” dos Eua x Iraque, amplamente coberta pela mídia em 2003.
Balian tenta motivar o povo a resistir à guerra: “Se largarem suas armas, suas
famílias morrerão. Não temos como vencer esse exército. Que eles venham!”
Seguem dias e noites de luta e massacre. Milhares morrem de ambos os lados.
Balian não tem saída, pensa nos feridos, nos mortos, nas crianças e mulheres indefesas. Ele
então chega a uma conclusão: render-se, entregar Jerusalém, em troca da liberdade e da
condução segura de seu povo até terras mais distantes, para lá recomeçarem nova vida.
Saladino aceita a proposta em troca do bem mais valioso para seu povo islâmico:
Jerusalém.
Balian então pergunta a Saladino: “O que Jerusalém significa para vocês?”.
Saladino então responde: Nada e Tudo”.
O povo cristão é então conduzido em segurança para terras distantes, e Balian diz a
princesa Sibylla que se junta anonimamente à multidão: “Se esse é o Reino do Céu, deixem
Deus fazer dele o que desejar. O Reino de seu irmão, Balduíno, estava na cabeça e no
coração dele, e esse Reino nunca se renderá”.
Com essa frase, Balian resume o pensamento que permeia toda a obra fílmico de
“Kingdom of Heaven”, de que o verdadeiro “Reino dos Céus”, de consciência e justiça,
como foi denominado e almejado pelos protagonistas do filme, é aquele que acontece e se
manifesta em cada homem, em cada indivíduo, consciente de si mesmo e do outro. E que
reconhece no “outro”, a existência da “diferença”, que justamente, faz dele um outro
homem.
É bem claro também, que alguns outros valores são bastante atacados pela narrativa,
como: a escravidão e a submissão que o Ocidente interpreta como sendo valores defendidos
pelo Islamismo. Em detrimento do pensamento cristão ocidental, de que a verdadeira
conduta divina é aquela em que os próprios indivíduos fazem suas escolhas e constroem sua
história e liberdade.
Por fim, no caminho, Balian resolve visitar sua casa, onde viveu com sua esposa e
filho. Lá, a inscrição no alto de sua ferraria diz: Que homem é verdadeiramente um
homem, que não torna um mundo melhor?”.
Com essa frase, poderíamos fazer uma relação entre a doutrina Bush-Blair de
intervenção militar no mundo, que em face do discurso “por um bem maior”, fazem uso de
todos os meios para garantir a “paz” e melhorar o mundo, conforme o próprio modelo
anglo-americano? Como aponta a Análise Política de Kellner, difícil não identificar aí,
pressupostos de uma ideologia que tem a intenção de ser difundida, e de estabelecer-se
como a mais justa, a mais democrática e a mais “consciente” de todas no mundo atual.
Esse é o papel da Análise Política, identificar os labirintos do texto midiático e suas
possíveis intencionalidades. Mesmo que não previstas pelo cineasta ou roteirista, o texto
reproduz o pensamento e o posicionamento de quem o faz.
Com esse exemplo de uma Análise de “Cruzada”, podemos entender como essas
observações também puderam se revelar no seu trailer, tão vivas quanto no filme; mesmo
em face das diferenças no tom e no apelo publicitário em confronto com o discurso artístico
e político de outro.
No trailer foi possível identificar o contexto das Cruzadas através dos personagens,
do figurino, das paisagens e da música utilizada, que misturava sons medievais com corais
religiosos.
Também foi possível ver no trailer e depois constatar no filme, o uso dos recursos
de cores, que davam a sensação de frio e umidade nas cenas de florestas, e depois, nas
cenas do deserto, sensações de calor e secura.
Outro elemento identificado no trailer e constatado no filme foi o uso da fotografia,
que tomou como ângulo, a posição de poder que os personagens tinham. Já durante o
trailer foi possível ver, que Balian era um célebre cavaleiro. E acompanhar de certa forma,
os posicionamentos de alguns personagens, como a da Princesa Sibylla, que ora era
mostrada em ângulos altivos (de baixo para cima) dando idéia de sua realeza e soberania, e
depois em ângulos mais fechados e baixos (de cima para baixo) quando Jerusalém é atacada
por Saladino. Esse jogo é bastante explorado no Trailer para situar o espectador na
narrativa e no filme, é fatalmente constatado.
Contudo, só o que deixa a desejar no filme é a ausência da montagem rítmica
dinâmica e envolvente que existe no trailer. Nota-se e é evidente que assim seja, que no
filme, a sequência de cenas é lenta e a própria narrativa da obra em geral, não adota a
velocidade como fio condutor do discurso. Tudo é muito lento e o filme é longo. Isso talvez
gere uma certa frustração de quem assiste o trailer e depois assiste o filme. Entretanto,
todas as cenas de batalhas e lutas no trailer são fiéis ao filme. Adotam a mesma velocidade.
Com isso, podemos constatar que a Análise Política mostra que conhecer e
reconhecer o uníssono discurso que há por trás da mensagem midiática, cuja aparente
intenção, nem sempre é a real, pode indicar muitas outras questões além daquelas
visivelmente apresentadas pelos produtores, como em “Kingdom of Heaven” para ser a de
legitimar uma guerra, cuja causa é santa.
Baseados em Kellner, entendemos que legitimar uma guerra, não é apenas torná-la
atraente aos olhos do público, mas, contraditoriamente também, atacá-la em suas reais ou
fictícias motivações, a fim de introduzi-las na pauta social. Kellner apontou Top Gun como
um dos filmes que na época de sua exibição, atraiu milhares de jovens em todo mundo, a
alistarem-se nas Forças Armadas.
Evidente que há filmes que concentram sua força artística em tornar uma guerra
sedutora, como acontece em Pearl Harbor, Tróia e Cruzada, uma visão a partir de quem
“faz” a guerra. Já em O Pianista e Hotel Rwanda, vemos a guerra sendo atacada em sua
pesada e triste realidade, a partir de um ponto de vista das vítimas.
Neste sentido, podemos ver como o Filme e o Trailer trabalharam juntos. Enquanto
um tornava a narrativa sedutora, envolvente, funcionando com um verdadeiro instrumento
de divulgação do tema; o outro, tratou de pormenorizar a saga que criou um personagem
central e fictício para contar a era das cruzadas cristãs dos séculos XI a XIII.
Por fim, acreditamos que através da Análise política, tenha sido possível visualizar a
legitimação de alguns valores presentes na obra fílmico, tanto nos trailers selecionados,
como no próprio filme de “Kingdom of Heaven”, através de uma sutil relação entre
elementos estéticos e estratégias retóricas, que apontaram intenções políticas bem definidas.
... E já não
podemos dizer nada.”
(Eduardo Alves da
Costa, Poema No caminho,
com Maiakóvski)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, chegando ao término desta dissertação, nos parece que algumas
considerações podem ser apresentadas.
Primeiramente, pudemos notar que esse início de novo século é fortemente marcado
pela presença das leis do Mercado global intervindo diretamente na esfera da Cultura. Por
essa razão, é que compreendemos o cinema na contemporaneidade como espaço de
mediação entre Cultura, Política, Mercado e Sociedade. Uma configuração que veio se
constituindo durante as últimas décadas, e que hoje, alcançou seu lugar e triunfo no mundo
globalizado.
Diante destas estratégias de mercado da indústria cinematográfica mundial, em
especial, a norte-americana, vimos que existe uma aparente relação entre a supremacia do
capital e a forma como ele aplica suas regras nos conteúdos e técnicas adotadas pelo
cinema, e que em muitos momentos, refletem resquícios de uma ideologia do pensamento
hegemônico. Como foi visto nas análises, parece haver uma tendência em mostrar a
alteridade (o outro, o diferente), como um grande problema para a humanidade que desde
séculos atrás, ainda não foi superado, como as questões raciais, religiosas, étnicas, etc. E
que a solução, talvez seja a “universalização do pensamento”, ou seja, parece haver a
intenção de por meio do cinema e com o passar do tempo, o “pensamento único” tornar-se-
á uma realidade presente nos mais diferentes povos e lugares da Terra.
Todavia, nota-se também que, se por um lado, esses produtos culturais legitimam
ideologias, de outro, numa surpreendente contradição, eles também levantam críticas, que
também puderam ser identificadas pela Análise Política adotada nesta pesquisa.
Com isso, ficam evidentes as implicações que o cinema adquire perante a sociedade
contemporânea e a capacidade com que hoje, cria “sentido” e sedimenta “laços” que
legitimam idéias, pensamentos e instituições. Característica esta que no passado, era
estritamente reservada à Política. Daí é que vemos no cenário atual, o triunfo das leis de
Mercado que fizeram uso dos produtos advindos da Cultura em detrimento da Política.
Um exemplo que apresentamos foi Hollywood (EUA) e Bollywood (Índia), as duas
maiores indústrias do cinema no mundo. Ambas com grandes produções, embora esta
última seja a maior em quantidade no mundo, não consegue se sobrepor à outra por
questões mercadológicas.
Aliás, sobre a questão política, também foram apresentados os exemplos da
apropriação do cinema por parte do Estado para finalidades propagandísticas. Na Alemanha
de Hitler, pudemos ver como a qualidade estética e retórica de um filme, como é
encontrado em “Triunfo da Vontadede Riefenstahl, pôde contribuir para a legitimação de
alguns pensamentos defendidos pela ideologia nazi-fascista. Mesmo considerado um filme
de arte pela própria cineasta, é inegável sua predileção por alguns temas sagrados a Adolf
Hitler, como a simetria, beleza, ordem, o nacionalismo, o culto ao “sangue e solo”, dentre
outros. .
Já em Hollywood é possível identificar também, a mesma intenção de divulgar e
sedimentar idéias, só que em relação ao modo de vida americano. O modelo do “American
Way” foi amplamente divulgado em filmes como Super-Homem, Rambo, Homem-Aranha,
Gladiador e tantos outros que, mesmo considerados filmes de puro entretenimento, não
deixaram de apresentar elementos que se relacionam diretamente com a ideologia norte-
americana como única Nação hoje, capaz de livrar o mundo das piores ameaças à paz.
Em face destas considerações, pudemos partir finalmente, para a análise dos
produtos selecionados de nossa pesquisa, que com a prévia contextualização do período
estudado, pôde demonstrar algumas correlações entre contexto e produção de bens
culturais. Verificamos que existe de fato, uma relação muito forte entre história e cinema,
especialmente, no gênero de guerra. Vimos que todos os trailers e o próprio filme
analisado, trataram de eventos reais, guerras e conflitos realmente ocorridos. Isso nos
aponta, dentre outras questões, a tentativa do cinema norte-americano de ser um dos
“narradores oficiais” da história contada através de filmes.
Com isso, foi possível estabelecer ainda, uma relação de como esses produtos
midiáticos (filmes e trailers), contribuem para formar um pensamento predominante acerca
de um tema ou de um posicionamento.
No caso do trailer, pudemos compreender sua especificidade como formato distinto
do filme, embora repetindo elementos também encontrados neste, como vimos na Análise
Política de “Kingdom of Heaven” em contraponto com seu trailer. Todavia, reconhecemos
que ele possui uma especificidade marcante, que reúne técnicas e estratégias da
comunicação com a finalidade de seduzir o público.
Daí a pertinência do recorte desta pesquisa, ao compreender a importância de um
estudo mais detalhado sobre esse formato, não só como veículo da Publicidade ou das
Relações Públicas, mas como um produto midiático complexo, eficiente e contemporâneo,
que através da síntese (seleção e contração de algumas informações), adquire um caráter
notadamente ideológico, e por isso, revela intenções mais agressivas, que no filme nem
sempre são notadas, pois ficam diluídas na narrativa, e no trailer são acentuadas.
Sendo assim, constatamos que o trailer com todas as suas peculiaridades como
mostramos, antecipa a expectativa de um produto midiático que serve, primeiramente,
como divulgação de seus filmes, e depois, como técnica de preparo do público para aceitar
valores que serão apresentados, sejam eles simbólicos, culturais, etc.
Pudemos também averiguar com a pesquisa, que o elemento predominante nos
trailers, ou seja, o mais evidente e que se sobressai aos demais, conforme a tabela de
análise apresentada, é a montagem rítmica (que reúne elementos que se relacionam com a
sintonia entre som e imagem). Vimos que ela exerce forte influência sobre o restante da
obra. Isto nos aponta que, mesmo no cinema mudo, o uso da música em sintonia com a
imagem, já se constituía um recurso poderoso de sedução, e por conseqüência, de
sensibilização.
Para nós, ficou claro que o uso da montagem rítmica (com ênfase na trilha sonora)
em produções de trailers é um instrumento eficaz na produção de sensibilização sobre
determinado tema. Ela parece conduzir o espectador durante a narrativa. Ela acompanha o
“leitor audiovisual” durante o percurso cinematográfico, dando ritmo às sensações que vão
sendo despertadas com as cenas.
Contudo, não queremos com isso, diminuir a importância dos demais elementos
fundamentais para a estética fílmico, entretanto, devemos chamar atenção para este recurso
por seu caráter sensibilizador e político, porque como se viu, seduzir significa em grande
parte, conduzir a um caminho diferente daquele em que o indivíduo estabeleceu
previamente para si. Portanto, também significa “desvirtuar”.
É nítido também, vermos este tipo de recurso quando assistimos a notícias do dia a
dia, em especial, em retrospectivas na TV, que nos passam uma seqüência de fatos com
uma trilha sonora sugerindo uma espécie de “filme da vida real”. Podemos afirmar que se
trata de um recurso realmente, sensibilizador.
Com isso, reforçamos a premissa deste trabalho ao demonstrar que de fato, o cinema
tem sim uma relação direta com a comunicação, e que exige e demanda de mais estudos
destinados a esclarecer, de que forma os valores são incluídos nas sociedades e legitimam
idéias e instituições através de filmes e trailers. Isso denota a tentativa de elaborar produtos
com claros interesses econômicos e hegemônicos de um país ou de um conglomerado de
empresas, que não conhecem restrições de fronteira, como foi o caso por nós abordado da
indústria de cinema e do entretenimento norte-americano.
Dessa maneira, acreditamos que em razão do nosso recorte sobre o gênero fílmico
“guerra”, foi possível evidenciar que mesmo em face da resistência e do pensamento crítico
das multidões, é preciso estar alerta em relação aos conteúdos, que ora promovem, ora
inibem uma Cultura de Cooperação e de Solidariedade. Isso denuncia que a Paz nesta “Era
da Emergência”, pode estar em perigo.
Por fim, sabemos que o exercício de análise empregado neste trabalho é também um
fragmento da resistência criativa de tantos indivíduos contra os imperialismos, que se
materializam nas mais diversas faces da hegemonia cultural. Esperamos, no entanto, que a
experiência da reflexão e da crítica, não nos prive de apreciarmos uma obra
cinematográfica com todo seu encanto e poesia, e mesmo nos filmes mais comerciais, que
nos aponte, o gosto cinematográfico como uma forma de lazer e entretenimento saudável.
Contudo, que ela também possa, cada vez mais, nos levar à consciência e à necessidade de
promover estudos e produções de formas e conteúdos midiáticos mais democráticos, de
maior acesso, e capazes de promover e sedimentar uma Cultura de Paz.
Só assim, poderemos viver o triunfo do bem comum, através da percepção e do uso
da tecnologia (seja ela de forma física ou de conhecimento), em prol das populações, que
finalmente poderão assistir a Política e a Cultura sobressaírem-se e tomarem seus lugares
protagonistas no mundo globalizado.
REFERÊNCIAS
Bibliográficas:
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS –NBR 6023 –
Informação e documentação – Resumo - Apresentação, 29/12/2003.
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS –NBR 6027 – Informação
e documentação – Sumário – Apresentação, 30/06/2003.
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS –NBR 6028 –
Informação e documentação – Trabalhos acadêmicos – Apresentação, 30/01/2006.
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS –NBR 10520 –
Informação e documentação – Citações em Documentos - Apresentação, 29/09/2002.
ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS –NBR 14724 –
Informação e documentação – Trabalhos acadêmicos – Apresentação, 30/01/2006.
ADORNO, Theodor W. & HORKHEIMER, Max. A dialética do esclarecimento. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985.
BARRETO, Luiz C. A geopolítica da Cultura. Revista Cadernos do Terceiro Mundo, nº
210. Rio de Janeiro. Ed. Terceiro Milênio, 1999.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. São
Paulo: Brasiliense, 1985.
BESIMENSKI, L. O militarismo alemão com/sem Hitler. Rio de Janeiro: Ed. Saga, 1967
BETTON, Gerard. Estética do cinema. São Paulo: Martins Fontes Editora, 1987.
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede – A Era da Informação: Economia,
Sociedade e Cultura. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1999.
CHALITA, Gabriel. A sedução no discurso – O poder da linguagem nos tribunais de
júri. São Paulo: Max Limonad, 1998
EISENSTEIN, Serguei. El sentido del cine. Buenos Aires: Siglo XXI Argentina Editores
S.ª, 2ª ed., 1974.
FERRO, Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FLUSSER, Villèn. Filosofia da caixa preta. Rio de Janeiro: Relumé-Dumará, 2002.
FOLHA DE S. PAULO. MACHADO, Tiago. Arquiteturas da destruição. Artigo
publicado no Caderno Ilustrada, em 14/09/2003.
FOLHA DE S. PAULO. HABERMAS, Jurguen. A guerra e seus juízos contraditórios.
Artigo publicado no Caderno Ilustrada, em 25/04/2003.
FOLHA DE S. PAULO. Entrevista de Dan Fellman – executivo de Hollywood - concedida
à jornalista Silvana Arantes, sob o título Executivo nega crise e ‘morte’ das salas de
cinema. Caderno Ilustrada, p. E-7, em 25/06/2005.
FOLHA DE S. PAULO. Sérgio Dávila. Caderno Ilustrada. Cruzada’ faz apologia velada
da era Bush. 04/05/2005, p. E6.
HALL, Stuart. Da Diáspora: Identidades e mediações culturais. Belo Horizonte: Ed.
UFMG; Brasília-DF: Representante da UNESCO no Brasil, 2003
HAYMAN, Ronald. Nietzsche. São Paulo: Ed. Unesp, 2000.
KELLNER, Douglas. A cultura da mídia – estudos culturais: identidade e política
entre o moderno e o pós moderno. Bauru-SP: EDUSC, 2001.
KELLNER, Douglas & RYAN, Michael. Câmera Política: The Politics and Ideology of
Contemporary Hollywood Film. Bloomington: Ind. Indiana University Press, 1988.
LENHARO, Alcir. Nazismo – Triunfo da Vontade. São Paulo. Editora Ática, 2003.
LYOTARD, Jean-François. Lições sobre a analítica do sublime. Campinas-SP: Papirus,
1993.
MACIEL, Kátia. & PARENTE, André. Redes sensoriais – arte, ciência e tecnologia. Rio
de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2003.
MACLUHAN, Marshall. Visão, Som e Fúria. São Paulo: Brasiliense, 1985.
MANNONI, Laurent. A Grande Arte da Luz e da Sombra – arqueologia do cinema. São
Paulo: Editora SENAC, 2003.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e
hegemonia. Tradução Ronald Polito e Sérgio Alcides. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ,
2003.
PARENTE, André. Narrativa e modernidade – Os cinemas não-narrativos do pós-
guerra. Campinas-SP: Papirus, 2000.
RAMONET, Ignácio. Guerras do século XXI – Novos temores e novas ameaças. Rio de
Janeiro: Ed. Vozes, 2003.
REVISTA VEJA. Edição Especial. 11 de setembro – o Mundo nunca mais foi o mesmo.
Publicada em 11/09/2002.
VESTERGAARD, Torben. & SCHRODER, Kim. A linguagem da propaganda. São
Paulo: Martins Fontes, 2000.
Sitiográficas:
BAHIANA, Ana Maria. Guerra na Mídia. Observatório da Imprensa. Disponível em
http://observatorio.ultimosegundo.og.com.br/artigos/asp2111200194.htm
. Acesso em
28/01/2006 - Ver lista de anexos.
BAITELLO JR, Norval. As núpcias entre o nada e a máquina: algumas notas sobre a
era da imagem. Disponível em http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum
. Acesso em
16/03/2006.
JORDAO, Daniel. & DURSO, Rafael. “O mundo pós 11 de setembro de 2001”.
Disponível em http://www.revistaautor.com.br/textos/11_de_setembro.shtml
Acesso em
08/10/2003.
OLIVEIRA, Marcelo. 11 de Setembro de 2001: ruptura ou continuidade?”. Disponível
em http://www.revistaautor.com.br/artigos/2002/w15/MFO_15.shtml
Acesso em
08/10/2003.
SANTOS, Andréa Paula. O audiovisual como documento histórico: questões acerca de
seu estudo e produção.
Disponível em http://www.mnemocine.com.br/pesquisa/pesquisatextos/andrea1.htm
, acesso
em 17/01/2005.
SIMON WISENTHAL CENTER. Nazismo alemão: Disponível em
<http://www.wiesenthal.com/
>. Acesso em: 31/052003. Citações de J. Goebbels.
VICENTE, Maximiliano M. Comunicação e manipulação na época da concentração
midiática, Revista TEXTOS de la CiberSociedad, 8. Temática variada. Disponível em:
http://www.cibersociedad.net
Acesso em 11/03/2006.
Comunicação Verbal (Conferências, Congressos e Palestras):
“Era da Emergência” - Conferência proferida pelo Prof. Dr. Paulo E. Arantes-USP na
Jornada Multidisciplinar realizada pelo Departamento de Ciências Humanas –
FAAC/UNESP campus Bauru-SP, em Ago de 2002.
MAFFESOLI, Michel. O material e o simbólico na cultura contemporânea: o
audiovisual, as artes digitais e os meios tecnológicos de produção. Conferência
apresentada no Simpósio Interfaces das Representações Urbanas em tempos de
globalização, SESC-Bauru-SP e FAAC-UNESP, 26 ago. 2005.
LISTA DE ANEXOS
Anexo 01 – FOLHA DE S. PAULO. MACHADO, Tiago. Arquiteturas da destruição.
Artigo publicado no Caderno Ilustrada, em 14/09/2003.
Anexo 02 – BAHIANA, Ana Maria. Guerra na Mídia. Observatório da Imprensa.
Disponível em http://observatorio.ultimosegundo.og.com.br/artigos/asp2111200194.htm
.
Acesso em 28/01/2006.
Anexo 03 – FOLHA DE S. PAULO. Entrevista de Dan Fellman – executivo de Hollywood
- concedida à jornalista Silvana Arantes, sob o título “Executivo nega crise e ‘ morte’ das
salas de cinema”. Caderno Ilustrada, p. E-7, em 25/06/2005.
Anexo 04 – Lista fornecida pela Rede “Vídeo Imagem” com os filmes de “guerra”
lançados no período de 2001 a 2005.
Anexo 05 – FOLHA DE S. PAULO. Sérgio Dávila. Caderno Ilustrada. Cruzada’ faz
apologia velada da era Bush. 04/05/2005, p. E6.
Anexo 06 – CD com os 5 trailers analisados na dissertação – Formato para ser visualizado
em aparelho de DVD ou computador com leitor de DVD.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo