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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DIRCEU BLANSKI
A ARTICULAÇÃO DOS SABERES DOCENTES NO PROCESSO DE
FORMAÇÃO DOS ACADÊMICOS DO CURSO DE PEDAGOGIA DA
UFMT/IE/NEAD: OS SEMINÁRIOS TEMÁTICOS COMO LOCUS DE
POSSIBILIDADES
CUIABÁ – MT
2006
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DIRCEU BLANSKI
A ARTICULAÇÃO DOS SABERES DOCENTES NO PROCESSO DE
FORMAÇÃO DOS ACADÊMICOS DO CURSO DE PEDAGOGIA DA
UFMT/IE/NEAD: OS SEMINÁRIOS TEMÁTICOS COMO LOCUS DE
POSSIBILIDADES
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Educação, do Instituto de Educação da Universidade
Federal de Mato Grosso, na Linha de Pesquisa Formação
de Professores e Organização Escolar, Área de
Concentração Teorias e Práticas Pedagógicas da
Educação Escolar, como parte dos requisitos para
obtenção do Título de Mestre em Educação, sob a
orientação da Professora Doutora Jorcelina Elisabeth
Fernandes.
CUIABÁ – MT
2006
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FICHA CATALOGRÁFICA
B643a
Blanski, Dirceu
A articulação dos saberes docentes no processo de formação
dos acadêmicos do curso de pedagogia da UFMT/IE/NEAD:
os seminários temáticos como locus de possibilidades / Dirceu
Blanski. - 2006.
146 p.: il.
Dissertação (mestrado) Universidade Federal de Mato
Grosso, Instituto de Educação, Pós-Graduação em Educação,
2006.
“Orientação: Profª Drª Jorcelina Elisabeth Fernandes”.
CDU -371.13(817.2)
Índice para Catálogo Sistemático
1. Professores – Formação – Ensino fundamental
2. Professores – Formação – Construção de saberes
3. Professores – Saberes científicos e pedagógicos
4.
Saberes docentes
Dissertação Apresentada à Coordenação do PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
EDUCAÇÃO DA UFMT
__________________________________________
Profª Drª Ângela Imaculada Loureiro de Freitas Dalben
Examinadora Externa (UFMG)
__________________________________________________
Profª Drª Marta Maria Pontim Darsie
Examinadora Interna (UFMT)
__________________________________________________
Profª Drª Jorcelina Elisabeth Fernandes
Orientadora (UFMT)
Cuiabá, 20 de Novembro de 2006
5
PENSAMENTO
“O aprendizado se dá quando compartilhamos experiências
e isso só é possível num ambiente democrático,
onde não haja barreiras ao intercâmbio de idéias.”
(John Dewey)
6
AGRADECIMENTO
Primeiramente a Deus por ter me guiado em todos os passos desta caminhada e ter sido fonte
de inspiração em todos os momentos;
À professora Drª Jorcelina Elizabeth Fernandes, por ter dispensado toda a atenção e carinho
necessário desde as mais tenras até as mais árduas fazes desta pesquisa;
À Camilli e a Rosa pela compreensão das ausências muitas vezes árduas para ambas as partes;
Aos meus pais Alberto e Mariana, que muitas vezes ficaram com o coração apertado em
função dos perigos que corria nas constantes viagens;
Especialmente aos meus queridos irmãos Lucas, Valter (chofer) e principalmente à Carmem,
(in memorian), pelas muitas ajudas prestadas nos momentos de aflição;
À Rose, Débora, Kauana, Mateus, Everton e Kaio, pelos gestos de companheirismo;
À professora Drª Marta Darsie pelo primeiro apoio construtivo ainda nas fases iniciais do
projeto de pesquisa, como professora nas disciplinas e como banca de exame do trabalho;
Ao professor Domingo Pimienta Barquim, que com sua humildade e dedicação despertou o
sonho possível para o mestrado e contribuiu no primeiro esboço do projeto;
À professora Izumi, Nanci, Ana Arlinda, Ademar e Filomena, que muito contribuíram para a
minha formação durante o período de realização das disciplinas presenciais no mestrado;
Ao grande amigo Marcelo, companheiro de caminhada e de cooperação em todos os sentidos
desse processo;
Aos colegas de trabalho que jamais sairão da lista das minhas melhores intenções, e que
fomos de mãos dadas nessa caminhada, Márcia, Jocelita, Solange, Jeane, Ivone, Waldinei,
muito obrigado;
Aos amigos do grupo de pesquisa, aos primeiros da fila, Cidinha, Érika, Marilce, e os que
vêm depois, Eleonor, Jair, Irene e Ana, que compartilhamos muitas angústias e conquistas. O
sucesso de cada um também é nosso!
A todos os colegas da turma 2003 que compartilhamos momentos nas disciplinas, e que hoje
apenas temos alguns contatos e os recordamos por meio de fotos;
Aos companheiros Prina, Cleufa, Sid, Devanez, Rute, Simone, pelo gesto de amizade e
divisão;
A todos os colegas de profissão no NEAD, que muito torceram por mim, em especial amigos
como Gesieli, Beth, Renata, Paulo, Selma, Cristiane, Clarinda, Eliete, Ruth, Glades, Délia,
Mário,...
A todos que contribuíram direta ou indiretamente para a construção dessa minha
profissionalidade, sucesso, meu muito obrigado!
RESUMO
Esta investigação trata da formação inicial de professores na modalidade a distância, e o
aporte teórico utilizado nos remete a discussões sobre a construção de saberes específicos da
profissão docente e modelos de formação profissional praticados nos cursos de formação de
professores. Tecemos nosso aporte teórico com base em estudiosos como Contreras (2002);
Tardif (2002); Elliot (1994); Gauthier (1998); Giroux (1997); Gómez (1992); Kincheloe
(1997); Nóvoa (1992); Pimenta (1997) e Stenhouse (2003). Enfocamos o Curso de
Licenciatura Plena em Pedagogia para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental da
Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Educação, no Núcleo de Educação Aberta
a Distância, e como locus o Seminário Temático da Área de Matemática. Nosso objeto de
estudo circunscreve-se aos saberes da docência, construídos estes no processo de formação
dos novos professores, objetivando verificar se, no Seminário Temático deste Curso, dá-se a
articulação entre os saberes científico-pedagógicos e os saberes experienciais. Os sujeitos de
nossa pesquisa, em número de doze, eram alunos do Curso, objeto de nosso estudo, no
município de Alta Floresta MT. Optamos pela análise de conteúdo, enfatizando aspectos
qualitativos do material levantado, com a utilização de instrumentos como o questionário,
gravação em VHF, análise e leitura de documentos. Procurou-se demonstrar como e com
quais características se a articulação de saberes em um momento específico do Curso, ou
seja, no Seminário Temático de Matemática. Este nosso estudo revelou que, enquanto
proposta metodológica do Curso, a prática docente configura-se como determinante, durante a
formação desses professores; contudo, de acordo com os dados levantados, as atividades
desse Seminário Temático foram previamente planejadas, e os alunos (sujeitos da nossa
pesquisa) executaram essa proposta em um contexto exterior à sua prática. Nesse aspecto do
currículo Seminário Temático de Matemática evidencia-se um movimento formativo, em
direção ao modelo da racionalidade técnica. Assim, essa formação profissional passou a ser
arquitetada e executada, de acordo com uma perspectiva institucional, a nosso ver, pouco
emancipadora, tirando do aluno a possibilidade do desenvolvimento de uma postura crítica e
da articulação de saberes. É possível um Curso de Formação de Professores trabalhar os
saberes profissionais articulados com a prática, mas, para isso, torna-se imperativa uma
organização curricular e pedagógica que valorize os saberes experienciais dos professores e
direcione seu olhar para as questões do cotidiano docente, na perspectiva de problematizá-las.
Quanto aos professores, é imprescindível capacitá-los com saberes científico-pedagógicos que
lhes possibilitem analisar e refletir criticamente sua própria prática docente, buscando
ressignificá-la.
Palavras-chave: Formação de Professores, construção de saberes, articulação, emancipação.
ABSTRACT
This inquiry in the deals with the initial formation of teachers in the distance modality, and
the theoretical approach used which leads us to quarrels about the construction of specific
knowledge of the teaching profession and the practised models of professional formation in
the courses of formation of teachers. We state our theoretical approach on the basis of
studious like Contreras (2002); Tardif (2002); Elliot (1994); Gauthier (1998); Giroux (1997);
Gómez (1992); Kincheloe (1997); Nóvoa (1992); Pepper (1997) and Stenhouse (2003). We
focus the Course of Full Bachelor in Pedagogy for the Initial Series of Basic Teaching of the
Federal University of Mato Grosso, Institute of Education, in the Nucleus of Open Education
in the distance, and as locus the Thematic Seminary of the Area of Mathematics. Our object
of study confines the knowledge of the teaching, constructed these in the process of formation
of the new teachers, objectifying to verify if, in the Thematic Seminary of this Course, joint
between the klnowledge scientific-pedagogical and knowing experience done. The citizens of
our research, in twelve number, were pupils of the Course, object of our study, in the city of
Alta Floresta - MT. We opt to the content analysis, emphasizing qualitative aspects of the
raised material, with the use of instruments like the questionnaire, recording in VHF, analysis
and reading of documents. It was looked to demonstrate how and with which characteristics if
it gives the joint of the knowledge are reached at a specific moment of the Course, that is, in
the Thematic Seminary of Mathematics. Our study disclosed that, while methodological
proposal of the Course, the teaching practice configures itself as determinative, during the
formation of these teachers; however, in accordance with the raised data, the activities of this
Thematic Seminary previously had been planned, and the pupils (citizens of our research) had
executed this proposal in an exterior context to its practice. In this aspect of the resume -
Thematic Seminary of Mathematics - a formative movement is proven, in direction to the
model of the rationality technique. Thus, this professional formation passed to be architeted
and to be executed, in accordance with an institucional perspective, as we see it, little
emancipating, taking off from the pupil the possibility of the development of a critical
position and of the joint of the knowledge. It is possible to a Course of Formation of Teacher
to work to knowledge professionals articulated with the practice, but, for this, a curricular and
pedagogical organization that values the knowledge experience of the teacher and directs its
look to the questions of the daily teaching, in the perspective of problem them becomes
imperative. In relation to the teachers, it is essential to enable them with scientific-
pedagogical knowing that make them possible to criticaly, analyze and to reflect their proper
teaching practice, searching to remeaning it.
Keywords: Teaching Formation, Knowledge Construction, Articulation, Emancipation.
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................... 12
CAPÍTULO I ............................................................................................................................... 17
O CURSO DE PEDAGOGIA E O CONTEXTO DO SEMINÁRIO TEMÁTICO DE
MATEMÁTICA .......................................................................................................................... 17
1.1 A Proposta de Formação do Pedagogo pelo IE/NEAD/UFMT ...................................... 18
1.2 A estrutura curricular do curso ........................................................................................ 22
1.3 Estrutura avaliativa do Curso de Pedagogia ................................................................... 28
1.4 A tessitura do Seminário Temático de Matemática e a inserção de atividades
práticas ...................................................................................................................................... 33
1.5 A área de matemática e a construção do relatório reflexivo .......................................... 38
CAPÍTULO II .............................................................................................................................. 40
SABERES DOCENTES E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES ......................................... 40
2.1 Concepções do saber docente ............................................................................................ 40
2.1.1 Os saberes científico-pedagógicos na formação inicial do professor ............................ 45
Os saberes da experiência na profissão docente ..................................................................... 48
2.1.2 O status dos saberes dos professores ............................................................................. 52
2.1.3 Os saberes cientifico-pedagógicos como referência para resignificação dos saberes
da prática docente ................................................................................................................... 53
2.2 Modelos de professores no contexto da formação docente ............................................. 60
2.2.1 O professor como profissional técnico .......................................................................... 60
2.2.2 O professor como profissional reflexivo ....................................................................... 66
2.2.3 O professor como pesquisador ....................................................................................... 68
2.2.4 O professor: do reflexivo ao intelectual crítico ............................................................. 70
2.2.4.1 A formação docente na perspectiva do intelectual crítico .......................................... 75
2.2.4.2 A possibilidade de emancipação do professor intelectual pela reflexão crítica.......... 76
CAPÍTULO III ............................................................................................................................ 80
DESCREVENDO O CAMINHO DE CONSTRUÇÃO DO ESTUDO ................................... 80
3.1 A definição do método e o caminho percorrido ............................................................... 80
3.1.1 A escolha do locus de pesquisa ...................................................................................... 81
3.1.2-A definição da organização do estudo ........................................................................... 82
3.1.3 O critério de seleção e a caracterização dos sujeitos ..................................................... 82
3.1.4 Definição, elaboração e aplicação dos instrumentos ..................................................... 83
11
CAPÍTULO IV ............................................................................................................................. 89
ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS .......................................................................... 89
4.1 A organização dos dados .................................................................................................. 89
4.2 O levantamento das categorias de análise ........................................................................ 90
4.3 Os saberes da docência, mobilizados pelos alunos do Curso de Pedagogia .................. 91
4.3.1 Os saberes científicos-pedagógicos do Curso, a partir das compreensões dos
professores-acadêmicos .......................................................................................................... 93
4.3.2 Os saberes da experiência docente, mobilizados no processo de formação
profissional dos professores-acadêmicos ................................................................................ 99
4.4 Meio I: a relação do acadêmico com as atividades práticas no Seminário Temático
de Matemática ........................................................................................................................ 104
4.4.1 A proposição das atividades do Seminário Temático .................................................. 105
4.4.2 A definição das atividades práticas apresentadas no Seminário Temático de
Matemática ............................................................................................................................ 107
4.4.3 Participação do acadêmico, quanto à elaboração das atividades práticas para o
Seminário Temático .............................................................................................................. 109
4.5 Meio II: o momento de reflexão dos resultados da atividade prática desenvolvida
em sala de aula ........................................................................................................................ 110
4.6 Meio III, a realização do Seminário Temático de Matemática: do planejamento à
avaliação .................................................................................................................................. 113
4.6.1 O acadêmico frente à proposta de realização das oficinas no Seminário Temático .... 114
4.6.2 A articulação teoria/prática dos saberes científico-pedagógicos com os saberes
experienciais ......................................................................................................................... 122
4.7 O conhecimento ressignificado na formação acadêmica dos alunos no Curso de
Pedagogia ................................................................................................................................ 125
4.7.1 Postura do acadêmico frente à Área de Matemática: suas percepções, limites e
superações ............................................................................................................................. 126
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................... 137
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 143
ANEXOS .................................................................................................................................... 146
Anexo 01 – Carta de Apresentação ....................................................................................... 147
Anexo 02- Questionário respondido pelos informantes ....................................................... 148
INTRODUÇÃO
Ser professor, muito mais que uma profissão, se comparada esta com algumas
atividades profissionais, é um desafio que requer um vasto leque de conhecimentos e saberes
específicos necessários ao exercício da prática docente. Adquirir esses saberes exige, além da
experiência pessoal, a formação universitária e o convívio com os seus pares no contexto
profissional cotidiano.
O agir profissional do professor torna-se complexo, na medida em que não se trata de
uma função que se esgota em si mesma, porque sua prática abarca os amplos contextos do
setor social, com uma pluralidade de atores que objetivam valores diferenciados. O professor,
em uma sociedade como a que vivemos, heterogênea, torna-se um mediador de forças e
diferenças, visando à transformação social para a construção de uma sociedade democrática e
justa, de forma a minimizar os pólos opostos que corroem o equilíbrio da estrutura social.
Para tanto, a ação do professor ultrapassa o caráter técnico, aquele transmissor do
saber acumulado, para o político, construtor de saberes e habilidades necessárias para o
desenvolvimento cognitivo, moral e ético de seus alunos. Assim, faz-se necessário que o
educador tenha uma formação que busque o diálogo entre os saberes acumulados pela ciência
e os saberes da experiência.
Este estudo tem como objeto a articulação dos saberes da docência no processo de
formação acadêmica no Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos
Iniciais do Ensino Fundamental a Distância da Universidade Federal de Mato Grosso,
Instituto de Educação, Núcleo de Educação Aberta a Distância.
O nosso interesse por este tema surgiu no processo de atuação como formador de
professores, no Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do
Ensino Fundamental da UFMT/IE/NEAD
1
, o que nos levou a pensar e questionar sobre a
qualidade da formação inicial que estava sendo proporcionada aos alunos do Curso. Assim,
levamos em consideração que a formação recebida pelo acadêmico em um curso de formação
1
Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Educação, Núcleo de Educação Aberta a Distância.
13
inicial de professores tem a ver com a organização curricular e pedagógica desse mesmo
curso, bem como com os saberes que ele é capaz de mobilizar, a partir dos conhecimentos
científico-pedagógicos e os experienciais. No caso do presente estudo, os sujeitos já são
professores, atuantes nas séries iniciais do ensino fundamental da rede pública.
A formação dos professores no Brasil, atualmente, está no ápice dos debates, em
decorrência de uma crescente demanda de professores no mercado, bem como do baixo índice
de qualidade educacional, fazendo com que surja a necessidade de redefinição da prática
educacional que, assim como o conhecimento das ciências, também deve evoluir,
historicamente, rumo a uma educação transformadora que considere a formação de
conhecimentos na complexidade e não na fragmentação.
A política de formação de professores da UFMT/IE/NEAD, através do Curso de
Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, define-
se, no sentido da busca de melhorias na qualidade da educação do Estado de Mato Grosso,
propondo-se a contribuir, qualitativamente, com a formação de professores da rede pública de
ensino. Trata-se de um Curso com características próprias, justamente porque não diz respeito
à formação de professores em início de carreira, mas à formação de profissionais da educação
que, em muito dos casos, têm anos de experiência docente, porém não possuem a
graduação que os habilite para a docência.
Essa formação tem, como uma das estratégias de desenvolvimento do aprender a
ensinar, os Seminários Temáticos, realizados no fechamento de cada área de estudo, e sua
meta é possibilitar que o acadêmico, por intermédio dos referenciais da prática docente e do
Curso, articule os saberes experienciais com os saberes da formação e construa
conhecimentos, ou saberes significativos, que ressignifiquem a própria prática docente.
Portanto, segundo o projeto do Curso, é na realização dos Seminários Temáticos que se
proporciona ao professor-acadêmico a sistematização da relação teoria-prática, entre os
conhecimentos trabalhados nas disciplinas e a prática docente vivenciada no contexto escolar.
A experiência docente há que ser considerada pelo formador como uma possibilidade
na contribuição da formação do novo professor, enquanto constitutiva de saberes
profissionais. Nesse sentido, as questões fundamentais deste estudo são: a estrutura curricular
do Curso de Pedagogia para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental tem permitido, na
14
formação acadêmica, que os alunos articulem os saberes da formação com os saberes da
experiência? Como isso se dá e com quais características?
A estrutura curricular do Curso é composta por Áreas de Estudo que são estudadas
pelos alunos, uma por vez e, no interior de cada uma delas, realiza-se o Seminário Temático.
Para responder ao questionamento proposto, recorremos a um dos Seminários
Temáticos do Curso de Pedagogia para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental da
UFMT/IE/NEAD, porque é este, segundo o projeto do Curso, o momento em que o
acadêmico deverá demonstrar nas suas atividades, qual a compreensão que está construindo
da relação entre os saberes científico-pedagógicos, trabalhados na respectiva área componente
do currículo do curso, com os saberes experienciais da sua prática docente.
Surgem disso outros questionamentos que podem nortear a investigação e
compreender a problemática levantada:
- Tem-se dado a articulação dos conhecimentos científico-pedagógicos com os
conhecimentos experienciais, no Seminário Temático de Matemática do Curso de
Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental?
- A articulação dos saberes científico-pedagógicos com os saberes da experiência
docente está sendo concretizada no Seminário Temático de Matemática?
- Qual a compreensão que o acadêmico tem da articulação entre os conhecimentos
científico-pedagógicos com os conhecimentos da experiência, durante a realização do
Seminário Temático de Matemática?
A demonstração da articulação de saberes na formação do professor-acadêmico do
Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino
Fundamental a Distância do NEAD/IE/UFMT deve acontecer, estrategicamente, no momento
em que se realizam os Seminários Temáticos, pois, nessa ocasião, o acadêmico deve fazer
uma reflexão das problemáticas de sua prática docente, utilizando-se dos referenciais
estudados no curso. Nesse sentido, no Projeto do Curso, Neder e Preti (2003: 45), destacam
que
os Seminários Temáticos, além de fazerem parte da estrutura curricular do curso
como um dos elementos centrais do processo de acompanhamento e avaliação do
15
aluno, servem de elemento motivador para que desenvolvam a atitude de pesquisar o
cotidiano de suas práticas pedagógicas .
A prática dos Seminários Temáticos, porém, vai além do ato de escrever-pensar-
expor o trabalho conclusivo na área de conhecimento. Ela possibilita aos acadêmicos
o ato de reflexão sobre sua prática e de ‘ressignificação das teorias a partir dos
conhecimentos da prática’ (PIMENTA, In: NEDER e PRETI), como de caminhar
em direção a uma práxis, quando esses se propõem e assumem para si mudanças em
sua prática pedagógica.
No presente trabalho, o principal objetivo é verificar se, no Seminário Temático da
Área de Matemática, do Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos
Iniciais do Ensino Fundamental a Distância do NEAD/IE/UFMT dá-se a articulação dos
saberes científico-pedagógicos com os saberes experienciais. Decorrentes deste, outros
objetivos mais específicos, serão considerados:
- identificar que tratamento é dado aos saberes científico-pedagógicos e aos
saberes experienciais no Seminário Temático da Área de Matemática;
- caracterizar os aspectos em que o Seminário Temático da Área de Matemática,
do Curso de Pedagogia para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, possibilitou aos
acadêmicos a efetivação da relação teoria-prática na sua formação docente;
- compreender como o acadêmico percebe a articulação entre os saberes
científico-pedagógicos com os saberes da experiência docente no Seminário Temático
de Matemática;
A relevância deste estudo para a educação de Mato Grosso consiste em contribuir
com o debate sobre a formação de professores, tanto na modalidade a distância como na
presencial, no sentido de colocar em evidência e em análise as práticas, até então executadas
pelos órgãos de educação superior, e destacar que a formação do professor não se deve dar
desvinculada das práticas cotidianas docentes dos ensinos, fundamental e médio, das escolas
públicas e particulares.
Nossa experiência de pesquisador neste estudo contribuiu para que alcancemos a
complexa teia em que consiste o Curso de Pedagogia do NEAD/IE/UFMT, junto ao qual
temos atuado como orientador acadêmico, buscando compreender na prática algumas das
questões levantadas aqui, no intuito de superar alguns limites até então identificados.
16
O aporte teórico que nos serviu de base para as reflexões, teve como centro de
referencia autores como Alarcão (1996) na questão de que a produção do saber está ligada à
ação, Contreras (2002) nos apresenta modelos de professores na formação docente, Carvalho
e Gil Peres (2001) nos faz a classificação dos saberes docentes, Gauthier (1998) discute que o
saber resulta de uma atividade intelectual, Giroux (1997) faz uma análise da formação de
professores na perspectiva instrumental e, Kincheloe (1997) que trata da formação de
professores na perspectiva crítica.
Por fim, este trabalho constitui-se de uma parte introdutória, seguida de quatro
capítulos, nos quais desenvolvemos sua discussão, a partir da descrição de nosso objeto de
pesquisa, passando pela fundamentação teórico-metodológica, pela análise dos dados
coletados e pelas considerações finais.
Começamos, pois, o capítulo I, pela discussão em torno do Curso, objeto de nosso
estudo, e em torno do contexto dos Seminários Temáticos.
No capítulo II tratamos de nossa fundamentação teórica, no III os caminhos
percorridos para a realização dessa pesquisa e o IV compõe-se da análise e reflexão dos dados
coletados no processo de realização do Seminário Temático de Matemática.
CAPÍTULO I
O CURSO DE PEDAGOGIA E O CONTEXTO DO SEMINÁRIO TEMÁTICO DE
MATEMÁTICA
Pensar sobre o Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais
do Ensino Fundamental da Universidade Federal do Estado de Mato Grosso é buscar, na
nossa subjetividade, uma vivência direta com o Curso por um período que abrange o ano 2000
e estende-se até o início de 2004. Este período, durante o qual atuamos como orientador
acadêmico permitiu-nos conhecer as particularidades dentre as diversidades de situações
técnicas, políticas e pedagógicas que perpassam essa Licenciatura. Trata-se de situações
conduzidas sob várias formas que têm dimensão educativa e formativa para aqueles que
fazem parte desse processo.
O presente capítulo tem como principal meta apresentar a dinâmica técnica, política e
pedagógica do Curso de Pedagogia em questão, situando o processo de organização do
Seminário Temático da Área de Matemática, desde as suas primeiras elaborações até sua
concretização, e buscando abordar a ão dos diversos atores envolvidos nesse processo,
autores dos fascículos, especialista da disciplina, coordenador do curso, orientador acadêmico
e o próprio acadêmico.
As informações estão baseadas na Proposta Curricular do Curso, na Proposta do
Seminário da Área de Matemática, em entrevista informal com o orientador acadêmico de
Alta Floresta, responsável pelos acadêmicos na integralização do Curso e, também, em nossa
própria vivência histórica no contexto do estudo. Aliás, foi essa vivência que nos encorajou a
buscar respostas para nosso questionamento do objeto de estudo para, quem sabe, poder
contribuir com novas experiências na formação de professores pela modalidade da educação a
distância.
18
1.1 A Proposta de Formação do Pedagogo pelo IE/NEAD/UFMT
A proposta do Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais
do Ensino Fundamental a Distância vem na perspectiva de responder aos atuais paradigmas
educacionais que, para Neder e Preti (2003: 50),
falam da necessidade da participação, da construção do conhecimento, da autonomia
de aprendizagem, de currículo aberto, de redes de conhecimentos, da
interconectividade dos problemas, das relações.
Trata-se de uma proposta de formação de professores que procura superar as
concepções tradicionais de ensino, no sentido de romper com o modelo curricular que não
valoriza a emancipação dos sujeitos para o desenvolvimento de uma postura crítica.
A escolha pela modalidade a distância, segundo os autores acima, busca oferecer
possibilidades de nova prática social e educativa que,
“deve compreender o contexto em que se dá
e comprometer-se com os processos de libertação do homem em direção a uma sociedade mais justa,
solidária e igualitária”
(2003: 51). Sendo uma prática educativa mediatizada, faz uso dos
recursos tecnológicos, com um processo lógico de planejamento e formatação do Curso, em
que a instituição educativa se caracteriza como “aprendente” e não como “ensinante”. Nesse
sentido,
organizada, a ‘instituição ensinante’ poderá oferecer saber atualizado (filtrando o
mais válido das recentes produções científicas), dando prioridade aos conhecimentos
instrumentais (aprender a aprender), visando à educação permanente do cidadão,
estando comprometida com o meio circundante (2003: 54).
A Educação a Distância - embora não seja sua condição única a relação face a face,
em todos os momentos do processo ensino-aprendizagem - para Neder e Preti, (2003: 59),
exige uma relação dialógica efetiva entre os alunos, professores e orientadores acadêmicos.
Para tanto, no Curso é organizado um sistema que possibilita o processo de interlocução
permanente entre os sujeitos da ação pedagógica.
O Curso foi concebido para formar professores em exercício, tanto na rede pública
estadual, quanto nas redes municipais de educação deste Estado. Seus alunos são professores
atuantes, que não possuem formação profissional, ou seja, não são graduados na licenciatura,
de forma que, por essa via, habilitem-se, profissionalmente, para o exercício da docência.
19
O projeto do Curso foi elaborado, a partir de 1992, pelo Instituto de Educação da
Universidade Federal de Mato Grosso, por uma equipe de professores que se propôs a discutir
o ensino superior na modalidade de Educação a Distância. Para tanto, esse grupo visitou
várias instituições educacionais que possuíam esta modalidade, tempo em que, também,
delineava sua proposta pedagógica.
A implementação do projeto da Licenciatura da UFMT/IE/NEAD ocorreu em
fevereiro de 1995, no pólo de Colíder, com um grupo de 350 (trezentos e cinqüenta)
professores-cursistas dos municípios de Nova Canaã, Peixoto de Azevedo, Marcelândia,
Colíder, Matupá, Nova Guarita do Norte, Terra Nova e Guarantã do Norte.
No ano 2000, em função da experiência vivenciada no Pólo Experimental
2
abrem-
se novas turmas nos pólos de Colíder, Terra Nova, Juara, Juína e Diamantino, totalizando
3500 (três mil e quinhentos) novos acadêmicos. O Pólo de Colíder conta com 550 (quinhentos
e cinqüenta) acadêmicos, distribuídos entre os municípios de Santa Carmem, Sorriso, Itaúba,
Nova Santa Helena, Colíder, Nova Canaã do Norte, Carlinda, Alta Floresta, Paranaíta, Nova
Monte Verde, Apiacás e Nova Bandeirantes.
O Curso é executado em uma parceria entre a Universidade Federal de Mato Grosso,
doravante denominada UFMT, Secretaria de Educação do Estado e Secretarias Municipais de
Educação. A UFMT é responsável pelo apoio pedagógico e administrativo. O Estado, além de
oferecer o apoio técnico, tem de ceder ao projeto 50% do quadro de orientadores acadêmicos;
o município, além de ceder outros 50% de orientadores acadêmicos, é também responsável
pela infra-estrutura nos Núcleos Municipais de Educação a Distância, com o espaço físico,
livros para as áreas do Curso, computador com “internet”, linha telefônica, transporte e
hospedagem de orientadores e de acadêmicos, para desenvolvimento das atividades do Curso
realizadas fora do município-sede, e material diário de expediente.
O passo seguinte foi o preparo do material instrucional
3
por parte de professores
4
da
UFMT e de outros que estavam envolvidos no processo. Produziram-se fascículos nas áreas
de Antropologia, Sociologia, Psicologia, Filosofia, Linguagem, Ciências Naturais, Estudos
Sociais (Historia, Geografia) e Matemática que são utilizados no curso até o presente
momento. As disciplinas de Antropologia, Sociologia, Psicologia e Filosofia foram
2
Na cidade de Colíder-MT, abarcando os municípios supramencionados.
3
Denominado fascículos, organizados nas áreas de estudo e seqüenciados por volumes.
4
No contexto do Curso são denominados de Especialistas.
20
denominadas Área de Fundamentos da Educação, e as demais, Áreas das Ciências Básicas e
Metodologias.
A primeira Área do Curso é a de Fundamentos da Educação
“com vistas a oferecer
suporte para a realização de análises contextualizadas da educação brasileira e regional”
e
,
também,
para
“a compreensão da complexidade do processo de formação do cidadão e do professor”
(NEDER, 1999: 18). a Área das Ciências Básicas volta sua a atenção, principalmente,
“para
as questões epistemológicas e metodológicas das áreas de linguagem, ciências naturais, estudos sociais
e matemática”,
com vistas a subsidiar o professor-acadêmico com conhecimentos básicos sobre
o ensino dessas áreas e dos quais necessita para sua ação docente nas séries iniciais do ensino
fundamental.
ainda um cleo de estudos que é trabalhado no decorrer do curso, contendo
orientações referentes à modalidade a distância, com o seguinte conteúdo:
“objetivos,
organização, e estrutura curricular, processo de avaliação de aprendizagem
(NEDER, 1999:17) e,
também,
“o processo de interlocução que se estabelecerá entre alunos/professor responsável por
disciplinas/orientador acadêmico”
. Há, ainda, fascículos intitulados
“A ‘Aventura de Ser Estudante’
que têm como objetivo auxiliar o aluno em seu percurso enquanto acadêmico da educação a
distância”
, bem como,
“informações relativas à metodologia do trabalho científico e métodos de
pesquisa e de estudo”
que são utilizadas pelo acadêmico, durante o Curso, para auxiliá-lo na
realização dos trabalhos exigidos.
Na Proposta Pedagógica do Curso, define-se currículo como
[...] produção que se estabelece por meio da relação entre pessoas, contrapondo-se às
concepções que o percebem como coisa ou como idéia, como algo pronto, um
‘pacote’, uma fetichização ou reificação (NEDER e PRETI: 2003: 19).
Na mesma perspectiva acima, para esses autores, as narrativas e as representações
contidas no currículo do Curso privilegiam os significados, a cultura e o ponto de vista dos
grupos étnicos dominantes, visando à “descolonização” do currículo. Nesse sentido, sua
produção move-se na direção da formação política, em que todos os sujeitos e componentes
envolvidos participam de sua configuração. Assim, a construção,
se daria principalmente pelas experiências presentes dos alunos que podem servir de
base para a discussão e produção de novo conhecimento. Os materiais existentes
devem constituir matéria-prima, com base na qual os significados, as visões e as
21
representações dominantes podem ser contestados, desafiados e resistidos (NEDER
e PRETI, 2003: 21).
Os princípios que alicerçam o currículo do Curso são:
a) Princípios epistemológicos. A opção é pelo interacionismo, para o qual, a
realidade é dialética, de um processo de ir-e-vir, de reflexão-ação, de
interação da experiência sensorial e da razão, da inter-relação sujeito e
objeto, em que
“o conhecimento não é transmitido, ou adquirido, como um objeto
ou uma mercadoria. Ele é construído. [...] tem que ser significativo para o sujeito”
(NEDER e PRETI, 2003:23). A aprendizagem ocorre quando mudança
de comportamento, mediado pela relação humana, com a premissa de que
aprendizagem e educação são processos presenciais, que exigem o encontro,
a troca, a cooperação, mesmo que esse processo se a distância, por meios
tecnológicos.
b) Princípios metodológicos. Nesses, a compreensão de que o próprio
currículo e o conhecimento devem ser vistos como construções e produtos
de relações sociais particulares e históricas que, apoiados numa perspectiva
crítica, pressupõem ultrapassar o conhecimento do senso comum. Quatro
conceitos são escolhidos para a base metodológica do Curso: diversidade,
pela qual o aluno precisa ter clareza da diferença entre a natureza do
conhecimento e a diversidade na abordagem que a ele se dá; historicidade,
pelo qual o aluno deve perceber que o conhecimento se desenvolve e é
construído em determinado contexto histórico-social-cultural; construção,
conceito que perpassa por todas as áreas de conhecimento do Curso, pelo
qual o professor-acadêmico
“deve imbuir-se do firme propósito de transformar-
se num profissional que não reproduz conhecimento, mas que também, em sua
prática discente e docente, principalmente por meio das relações com seus alunos,
estará mediando e produzindo conhecimentos”
(NEDER e PRETI, 2003:27);
interação, conceito que, na construção do conhecimento, permite elucidar
que, na interação entre sujeito-objeto, está a oportunidade do
desenvolvimento. O sujeito é um ser ativo na construção do conhecimento,
pois, na interação, transforma e é transformado, no processo da reflexão-
ação, de intervenção e transformação.
22
c) Princípios dinamizadores. Esses decorrem do fato de que os alunos são
professores em exercício nas séries iniciais, assumindo que a formação
profissional do professor deve estar intrinsecamente relacionada com o
projeto-político-pedagógico da escola e sua prática profissional tomada
como dimensão curricular. São, também, eixos metodológicos do Curso o
princípio da indissociabilidade entre teoria e prática e o da construção
histórica e interdisciplinar do conhecimento.
1.2 A estrutura curricular do curso
O Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino
Fundamental da UFMT/IE/NEAD, em sua estrutura curricular, é organizado à luz de razões
pedagógicas, em dois núcleos de estudo que, segundo Neder e Preti (2003), são
complementares e interdependentes, perfazendo um total de 3300 horas, o que corresponde a
220 (duzentos e vinte) créditos.
O Primeiro Núcleo de Estudos é composto pelos Fundamentos da Educação, com um
total de 900 horas. É organizado em três fases que não se apresentam em ordem hierárquica,
com objetivo de oferecer ao professor-acadêmico informações referentes aos objetivos do
Curso, a sua organização curricular, e às orientações metodológicas sobre o processo ensino-
aprendizagem a distância.
A fase I, cuja duração corresponde a 60 (sessenta) horas, é constituída pela
organização geral do Curso que é exposta ao aluno, juntamente com as características da
modalidade educação a distância, no que tange ao processo de interlocução entre alunos-
orientadores acadêmicos e professores especialistas das Áreas. Essa fase encerra-se com a
realização do Seminário Integrador, que tem por finalidade reforçar nos alunos os laços de
pertença à Universidade Federal de Mato Grosso, ao Projeto Político-pedagógico do Curso, e
a uma profissão que busca fortalecer sua identidade profissional.
Na fase II, em 720 (setecentos e vinte) horas, desenvolvem-se estudos sobre as
Ciências da Educação. Seus conteúdos referem-se às Áreas de Antropologia, Sociologia,
Filosofia e Psicologia, com 180 (cento e oitenta) horas cada uma, objetivando “oferecer
23
suporte teórico e metodológico para a realização de análises contextualizadas da Educação
brasileira e regional” (NEDER e PRETI, 2003: 31).
Na fase III, em 120 (cento e vinte) horas, são realizados pelos professores-
acadêmicos
estudos e pesquisas tendentes à compreensão da complexidade do processo de
formação do cidadão e do professor, da realidade educacional do Brasil, na região/e
ou nas escolas em que atuam, apoiado na área de Fundamentos da Educação.
Os resultados dessas pesquisas são apresentados em dois Seminários Temáticos que
visam debater os temas abordados, fundamentando-se nas teorias das diferentes Áreas
estudadas.
O Segundo Núcleo de Estudo. Nesse são focalizados os Fundamentos Teórico-
metodológicos das Ciências, em 2400 (dois mil e quatrocentos) horas. Seu objetivo, segundo
Neder e Preti (2003: 32), é favorecer ao aluno um aprofundamento dos princípios teóricos
básicos e metodológicos das ciências que compõem o currículo das séries iniciais e das
relações entre cognição, produção de conhecimento e ensino. É desenvolvido em duas fases.
Na fase I, em 1680 horas, prosseguem os estudos sobre o fazer pedagógico escolar,
tomando como base os estudos realizados no primeiro núcleo e centrando a atenção para as
questões epistemológicas e metodológicas das Áreas de Linguagem, Estudos Sociais (História
e Geografia), Ciências Naturais e Matemática, alicerçado no processo biopsicossocial da
criança.
Na fase II, em 720 (setecentos e vinte) horas, têm lugar os Seminários Temáticos de
cada Área. Nesses,
são realizados estudos, atividades práticas e pesquisas, com base nos subsídios
teórico-metodológicos desenvolvidos nos diferentes núcleos e áreas de
conhecimento do Curso, para levar os acadêmicos a uma (re)flexão sobre sua
prática, a um olhar sobre a escola e seu entorno que, ultrapassando o senso comum,
e leve à (re)construção de sua prática pedagógica.
É nos Seminários Temáticos que se o momento privilegiado para os professores-
acadêmicos realizarem a reflexão da prática docente, articulando os saberes, desenvolvendo a
atitude de questionamento e da crítica sobre a realidade social e educacional. Os resultados
desses estudos e reflexão são socializados, em sessões blicas, com os colegas de Curso,
24
orientadores acadêmicos e especialistas, podendo haver participação da comunidade externa.
Sua realização é sempre precedida de planejamento específico e, para Neder e Preti (2003:
46), torna-se
um espaço para o debate teórico, para o questionamento reconstrutivo de
conhecimentos e práticas anteriores, para aprender a trabalhar colaborativamente,
socializando conhecimentos. É o espaço propicio para produzir vida: provocando
mudanças nas pessoas, dinamizando o Curso, influenciando os espaços escolares e
domésticos dos alunos-professores.
No Curso, é trabalhada uma área de conhecimento por vez, para permitir um maior
envolvimento do aluno no processo de estudo das diferentes ciências. Para Neder e Preti
(2003),
a organização dos conteúdos com base em áreas de conhecimento, possibilita um
trabalho integrador entre os diferentes conteúdos trabalhados, evitando-se uma
excessiva compartimentalização do saber.
É na perspectiva da não compartimentalização do saber que as áreas que compõem o
currículo do Curso são organizadas na seguinte ordem: Antropologia que faz um estudo para a
compreensão das múltiplas relações sociais; Filosofia que busca a compreensão da atividade
filosófica, destacando o papel do conhecimento e da reflexão da prática; Sociologia que trata
dos conceitos de sociedade e suas relações, ideologia, educação como práxis, etc; Psicologia
que trata do processo de desenvolvimento da criança e das teorias da aprendizagem escolar;
Linguagem que busca a compreensão das múltiplas formas de linguagem enquanto
possibilidade de interação; Ciências Naturais que procuram elucidar os princípios
epistemológicos, metodológicos do ensino de ciências e conceituais para a compreensão do
universo e seus fatores químicos, físicos e biológicos; Estudos Sociais que trabalham a
conceituação da história, dos sujeitos, do conhecimento e do tempo, bem como, a dualidade
sociedade/natureza; Matemática que prioriza a construção de conceitos matemáticos através
da participação ativa da criança. Assim,
o estudo da matemática tem por objetivo a construção do pensamento gico-
matemático, o espírito da investigação, além de fornecer elementos básicos para a
participação dos alunos na vida em sociedade, dotando-os de conhecimentos úteis
para a resolução de problemas da realidade (NEDER, 1999: 35).
As Áreas referenciadas acima, no decorrer de todo Curso, são trabalhadas, uma por
vez, na mesma seqüência que ora as apresentamos. Assim, esse percurso requer do aluno
25
licenciando um envolvimento mais efetivo no processo de estudo, pois sempre apenas uma
disciplina com a qual deve envolver-se.
A grade curricular do Curso é assim organizada:
1º Núcleo de Estudos: Fundamentos da Educação Horas: 900
Introdução à Educação a Distância e à Metodologia Científica 60h
Fundamentos: Antrpologia, Filosofia, Sociologia, Psicologia 720h
Seminário Temático 120h
2º Núcleo de Estudos: Fundamentos Teórico-metodológicos das Ciências Horas: 2.400
Linguagem 420h
Língua Portuguesa
Literatura
Artes
Educação Física
Metodologia do Ensino de Linguagem
Estudos Sociais 420h
História
Geografia
Metodologia do Ensino de História e Geografia
Ciências Naturais 420h
Física
Química
Biologia
Ecologia
Metodologia do Ensino de Ciências
Matemática 420h
Fundamentos da Matemática
Geometria
Elementos da Estatística
Metodologia do Ensino da Matemática
Seminários Temáticos Semestrais / Prática de Ensino 720h
Fonte: Neder e Preti, 2003: 101.
Para cada área de estudo, o material didático do aluno é organizado em um a oito
fascículos, variando de área para área, em partes seqüenciais. Cada parte é composta por um
26
fascículo que contém em média 100 laudas impressas. Cada fascículo deve ser superado pelo
acadêmico no prazo de, aproximadamente, 20 dias. Na maioria das vezes, realiza-se o
processo avaliativo do curso a cada dois fascículos superados pelo aluno ou, se o especialista
da disciplina julgar que o conteúdo do fascículo é mais complexo, faz-se o processo avaliativo
de cada fascículo.
O orientador acadêmico é o primeiro a fazer a leitura dos fascículos, na mesma
seqüência estabelecida para os acadêmicos. Depois de terem feito a leitura do material, a cada
trinta dias aproximadamente, reúnem-se orientadores e especialista da área, ocasião em que
este último tem por função fazer a capacitação dos orientadores para que possam trabalhar os
fascículos com os acadêmicos. A capacitação dos orientadores, realizada pelo professor-
especialista da UFMT/IE/NEAD que expõe todo o conteúdo contido no fascículo, de uma
forma mais ampla possível, dá-se em forma de aulas expositivas, no período de um a três dias,
para cada fascículo. Na ocasião da capacitação, o professor-especialista também apresenta a
proposta de avaliação formal da disciplina, bem como já traça encaminhamentos para o
Seminário Temático realizado ao final de cada área. O debate entre orientadores, coordenador
e especialista, referente aos seminários, acontece, concomitantemente com os estudos da área,
desde os seus primeiros fascículos.
Os objetivos (NEDER e PRETI, 2003: 29-30) que orientam o Curso estão definidos
no Projeto de Formação Acadêmica do Instituto de Educação
5
que se propõe a desenvolver,
nos alunos-professores, formação teórica e metodológica, buscando as relações teoria e
prática, na direção de suas preocupações fundamentais.
Objetivos Gerais:
Contribuir para a compreensão do processo educativo escolar em suas múltiplas
inter-relações pedagógicas, históricas, sociais, econômicas, políticas, culturais;
Contribuir para o conhecimento dos fundamentos teóricos das ciências que
integram o currículo das series iniciais e, concomitantemente, para o tratamento
didático-metodológico por essas séries exigido;
Desenvolver autonomia pessoal e intelectual que lhe permita relacionar-se com o
mundo do conhecimento e com os demais atores que integram o contexto
educacional, e conduzindo, assim, sua própria caminhada.
5
Documento que espelha os objetivos e pressupostos do Projeto de Formação de Professores, pela Universidade
Federal de Mato Grosso, produzido entre 1996-98, sob coordenação da Profª Célia S. de Almeida.
27
Objetivos Específicos:
Compreender a natureza das relações e inter-relações sociais, econômicas,
políticas e culturais na constituição da realidade da educação escolar brasileira e
regional, bem como a importância do processo da escolarização na formação do
cidadão brasileiro;
Conhecer criticamente os conteúdos específicos que integram diferentes ciências
que compõem o currículo das series iniciais;
Desenvolver postura investigativa que o leve a problematizar a realidade
educacional, o seu entorno, e a compreender a prática educativa em toda sua
complexidade;
Desenvolver ações político-pedagógicas para buscar a transformação da escola e a
construção de uma sociedade includente, justa e solidária;
Desenvolver, no âmbito do projeto pedagógico de sua escola, a capacidade de
organização curricular para subsidiar, de forma integral, a criança em seu processo
de construção dos conceitos básicos no campo da Linguagem, da Matemática, das
Ciências Sociais e Naturais;
Criar espaços de aprendizagem coletiva, incentivando o diálogo, a troca de idéias
e o trabalho colaborativo.
O orientador acadêmico é um professor, graduado nas mais diversas licenciaturas da
educação, atuante na rede pública de ensino, seja estadual ou municipal, sendo escolhido
através de exame de seleção realizado pela Coordenação Pedagógica do NEAD. Esse exame é
feito através de uma inscrição prévia do candidato que envia à Coordenação seu currículo,
acompanhado de cópias de documentos pessoais; então, em data previamente marcada, os
candidatos realizam uma prova escrita, e os que tiverem bom aproveitamento são chamados
para entrevista. O orientador acadêmico, a partir da sua aprovação e designação, torna-se
responsável por um grupo de acadêmicos, geralmente nunca mais de 25, com a função de
orientá-los quanto à aprendizagem dos conteúdos propostos nos fascículos, bem como em
avaliá-los.
O professor especialista de cada área é o responsável por repassar os conteúdos e
procedimentos contidos nos fascículos aos orientadores que trabalharão com os acadêmicos.
O professor especialista é um professor do quadro do IE/UFMT, ou contratado
especificamente para atender ao NEAD. Cada um assume a Coordenação Pedagógica de uma
Área de estudo, de acordo com sua habilitação.
28
1.3 Estrutura avaliativa do Curso de Pedagogia
Para Neder e Preti (2003: 73), a avaliação no contexto do Curso de Pedagogia, na
Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, é entendida como
uma atividade política que tem como função básica subsidiar tomadas de decisão. O destaque
dado no Projeto Político-pedagógico do Curso ao processo da avaliação de aprendizagem na
educação a distância que requer tratamento e considerações especiais, considerando que
um dos objetivos fundamentais da Educação a Distância deve ser o de obter dos
alunos não a capacidade de reproduzir idéias ou informações, mas sim a capacidade
de produzir e re-construir conhecimentos, analisar e posicionar-se criticamente
diante das situações concretas que se lhes apresentem (NEDER e PRETI, 2003: 73).
Na Educação a Distância, o aluno não conta com a presença física de um professor
em uma sala de aula como no ensino presencial. Para isso, o aluno precisa desenvolver
métodos de estudo individuais e em grupo, para que possa garantir a aprendizagem pela
interação entre os colegas, os especialistas e orientadores acadêmicos, ter confiança e auto-
estima e elaborar juízos próprios.
Para Neder e Preti (2003: 74), o material didático básico, elaborado pelo professor
especialista, deve contribuir com o aluno para que todos questionem aquilo que julgam saber,
e principalmente, para que interroguem os princípios subjacentes a esse saber. Assim, a
relação teoria-prática se introduz como um imperativo no tratamento dos conteúdos
selecionados para o Curso, do mesmo modo que é fundamental a relação dialógica,
intersubjetiva, professor-aluno, mediada por textos.
No processo de avaliação da aprendizagem no Curso, o que interessa
é analisar a capacidade de reflexão crítica dos alunos diante de suas próprias
experiências, a fim de que possam atuar, dentro de seus limites, sobre o que os
impede de agir para transformar aquilo que julgam limitado no que respeita ao
projeto político-pedagógico da escola (NEDER e PRETI, 2003: 74).
O processo avaliativo é composto de momentos distintos, denominados de Meio I,
Meio II e Meio III que, no entanto, devem complementar-se entre si, dando unicidade ao
processo.
29
Meio I. Inicia-se no momento em que o acadêmico adquire seu fascículo e faz sua
leitura individual e, por vezes, reúne-se com outros acadêmicos, formando grupos de cinco
componentes, em média, para a discussão dos conteúdos e atividades. Então o acadêmico
marca, junto ao orientador, um encontro individual para a discussão do fascículo e
apresentação das atividades. Nesse momento, o orientador retoma, junto ao acadêmico, todos
os conceitos fundamentais que devem ficar explicitados com o estudo daquele fascículo,
buscando identificar o nível de compreensão do acadêmico, pois o orientador precisa ter
certeza de que o acadêmico domina os conteúdos em questão. Nesse momento, são também
observados todos os apontamentos, sínteses e produções escritas do acadêmico, sobre os quais
o orientador tem o poder de interferência construtiva. Se, no encontro, o orientador julgar que
o acadêmico não adquiriu todas as habilidades exigidas ou não abstraiu todos os conceitos
apresentados no fascículo, indica-lhe tarefas, com o objetivo de subsidiá-lo até que tenha a
aprendizagem adequada, e marca-se um novo encontro para a apresentação dessas e, a
partir do momento que o acadêmico tiver clareza do que é exigido nesse momento, então ele é
orientado a fazer o Meio II. Durante esse processo de estudo, o acadêmico pode ter vários
contatos com o orientador, seja pessoalmente, por cartas, por recados ou por telefone.
Esse processo acima descrito é realizado em um tempo de aproximadamente 40 dias
(para dois fascículos), se o acadêmico estiver em momentos ordinários, ou de 15 dias, se
estiver em momento extraordinário. Entende-se que o acadêmico está em momento ordinário,
quando estiver no curso, cumprindo suas atividades dentro das datas previstas no calendário
para realização da disciplina e, por momento extraordinário, aquele em que o acadêmico não
conseguir cumprir as disciplinas, como previstas em calendário do andamento regular do
curso. Mas, o acadêmico é livre para fazer sua escolha quanto ao calendário que pretende
cumprir, o ordinário ou extraordinário. Geralmente fica para o momento extraordinário aquele
acadêmico que não conseguiu dedicar-se efetivamente aos estudos e à realização das tarefas,
não dando conta de estudar os fascículos, em tempo hábil, ou aquele que não consegue ter
conceito suficiente na avaliação escrita formal.
Na ficha individual do acadêmico, o Meio I é registrado pelo orientador, abordando
todo o percurso do acadêmico, com os avanços, dificuldades e habilidades adquiridas.
A realização do Meio I (estudo dos fascículos e encontro com o orientador) é
imprescindível ao prosseguimento para outros Meios. Como na Licenciatura em questão não
30
a possibilidade de o aluno ser reprovado, é nesse Meio I que deve ficar confiados ao
acadêmico sua habilidade e seu preparo para passar para o Meio II.
O Meio II. Esse é o momento em que, ao final do Meio I, o acadêmico, em uma
data previamente marcada em calendário pelo pólo do NEAD, faz uma avaliação individual
escrita, com o objetivo de verificar se o professor-acadêmico
está acompanhando e compreendendo o conteúdo proposto em cada uma das áreas
de conhecimento e se é capaz de posicionamentos crítico-reflexivos em face das
abordagens trabalhadas e em face da sua prática docente (NEDER e PRETI, 2003:
75).
Essa avaliação é elaborada pelos especialistas da disciplina que, por vezes, discutem-
na com os orientadores acadêmicos na ocasião das capacitações. Com cada questão elaborada,
os especialistas também sugerem os critérios de correção que são utilizados pelos orientadores
acadêmicos, no momento da correção das avaliações. O acadêmico não pode ter acesso a
esses critérios de correção antes da avaliação.
O tempo que o acadêmico tem para fazer a avaliação escrita é de 04 horas, em que se
exige dele capacidade de síntese dos principais conceitos apresentados pelos fascículos no
decorrer do Meio I. O orientador faz a correção dessa avaliação, atribuindo conceitos como I
(insuficiente), B (bom) e O (ótimo). Caso o conceito seja insuficiente, o acadêmico refaz o
percurso com novos Meio I e Meio II. A ficha individual do acadêmico recebe a descrição
deste procedimento acima apresentado abordando quais conteúdos conceituais o acadêmico
conseguiu abordar na avaliação escrita e quais, por acaso, não conseguiu. Caso o acadêmico
obtenha conceito “suficiente”, ele estará apto a dar prosseguimento ao curso, passando a
estudar novo fascículo.
Meio III. Esse é um momento chamado de Seminário Temático e acontece ao final
de cada área, com o objetivo de que o acadêmico faça uma reflexão sobre as temáticas
educacionais e sobre sua prática na respectiva área (NEDER e PRETI, 2003: 44-45), como se
segue:
propiciar ao aluno-professor momentos de reflexão e análise sobre a realidade
educacional e sua prática pedagógica, com base nos subsídios teóricos-
metodológicos desenvolvidos nos diferentes núcleos e áreas de conhecimento do
curso;
31
possibilitar-lhe elementos para a produção de um trabalho de análise crítico reflexiva
diante de determinada temática ou situação de seu cotidiano escolar;
apontar possíveis caminhos e/ou estratégias para superação da situação estudada;
ensejar, ainda, uma abordagem integradora entre os conteúdos de diferentes áreas de
conhecimento.
Para cumprir os objetivos, o acadêmico, individualmente, ou em grupo de até três
componentes, faz um trabalho monográfico que acontece da seguinte forma: é possível
iniciar esse trabalho, dentro da Área de estudo que o(s) acadêmico esteja(m) cursando, pois é
ela que lhe(s) dará subsídios teóricos para a problematização. O professor especialista da Área
define um grande tema geral para ser desenvolvido durante o Seminário Temático e sugere
também subtemas para que o acadêmico, caso queira, possa desenvolvê-lo. A partir daí, o
acadêmico elabora um projeto de pesquisa, cuja problemática pode ter surgido do próprio
acadêmico, ou aquela sugerida pelo professor especialista.
De posse desses projetos de pesquisa, nas ocasiões de suas aulas de capacitação, o
orientador acadêmico os discutirá com o professor especialista das disciplinas, pois é ele que
indicará as diretrizes que os trabalhos de pesquisa dos acadêmicos devem seguir. Então, cada
projeto volta ao acadêmico e, a partir disso, dá-se continuidade às leituras bibliográficas para
a fundamentação teórica do trabalho, bem como para a análise dos dados coletados e a
construção final do trabalho escrito.
O processo do Meio III, para o aluno, inicia-se com o fascículo I da área, a partir do
qual começa a busca de problemáticas para reflexão, principalmente, da prática docente, uma
vez que todos os alunos são professores das séries iniciais do ensino fundamental e,
esta condição é que permite trazer a dimensão da relação teoria-prática para todos os
momentos do desenvolvimento dos conhecimentos curriculares. A expressão dessa
relação acontece em diferentes atividades desenvolvidas pelos alunos,
acompanhadas pelos professores orientadores e pelos professores responsáveis pelas
áreas de conhecimento do curso, sobretudo nos seminários temáticos que tem carga
horária de 300 horas para contemplar o que determina o artigo 65 da Lei 9.394/96
(NEDER, 1999: 22).
Definido seu problema de pesquisa, o acadêmico já inicia a elaboração de seu projeto
de pesquisa.
32
O debate referente ao Seminário Temático, logo no início da área, tem como fim
pedagógico o esclarecimento da temática para o acadêmico, bem como o tempo hábil para a
coleta de dados e, conseqüentemente, a construção do trabalho de pesquisa.
O tempo para a realização do Seminário Temático é, em média, seis meses, podendo
ter uma pequena variação, pois é realizado quando da integralização da área de estudo. Só
estará apto a apresentar os trabalhos no Seminário Temático, aquele acadêmico que estiver na
integralização da área, e a principal justificativa para essa afirmação é que os conteúdos
apresentados nos fascículos deverão ser de fundamental importância para a reflexão da
problemática. Assim, julga-se que o acadêmico primeiro precisa ter a fundamentação teórica
básica apresentada no fascículo para, então, iniciar o trabalho de pesquisa.
O acadêmico que não tiver meios de apresentar o trabalho no Seminário Temático na
data ordinária da apresentação tem uma outra possibilidade, em que se realiza um Seminário
Temático extraordinário e apresentam-se os trabalhos de todos os acadêmicos, cujos trabalhos
de Seminários Temáticos estiverem em atraso nas diferentes áreas.
Nos Seminários Temáticos são apresentados trabalhos-sínteses de reflexões dos
acadêmicos e cada um dispõe de planejamento específico. Neder (1999), ao sistematizar a
proposta curricular da licenciatura do NEAD, busca resgatar a prática docente como base
formativa dos acadêmicos.
Nesse, a prática profissional do professor/aluno é uma das bases para o estudo
teórico das disciplinas, trazida na perspectiva de problematização do trabalho
educativo escolar em toda sua complexidade, de aprofundamento epistemológico e
pedagógico disciplinar e de concepção de ensino como projeto político pedagógico,
com intencionalidade e projeção de atividades na tentativa de superar a condição de
cotidianidade e suas características de espontaneísmo, pragmatismo e imediatismo
(1999: 20).
Nessa perspectiva, os trabalhos nos seminários temáticos
[...] são apresentados pelos alunos como resultados de estudos, propostas teórico-
metodológicas e pesquisas desenvolvidas ao longo de cada semestre, impulsionando
os alunos a um processo de reflexão sabre questões ligadas as políticas educacionais
do País e do Estado, ao projeto político-pedagógico de sua escola e as ações político-
pedagógicas desenvolvidas no cotidiano de suas práticas docentes (1999: 20).
O acadêmico elabora uma prévia do trabalho escrito que é submetido a uma
comissão de avaliação composta por dois ou três orientadores acadêmicos do mesmo pólo.
33
Essa comissão terá assessoria do especialista e acompanhará o trabalho do acadêmico até a
sua apresentação. O trabalho é avaliado por esta comissão em um primeiro momento e fará
indicações para sua melhor qualidade, quando necessárias. Nessas condições, o acadêmico
retoma o trabalho, faz os ajustes e devolve-o à comissão; após esta etapa é preparada, pelo
acadêmico, sua apresentação (em torno de vinte minutos de duração) para a comunidade
acadêmica nos Seminários Temáticos do NEAD.
A equipe de avaliadores assiste à apresentação e faz a avaliação, registrando-a em
uma ficha que, posteriormente, fica de posse do orientador acadêmico do trabalho. As etapas e
processos percorridos pelo acadêmico, durante a organização, apresentação e texto final do
trabalho de pesquisa, também são registrados em fichas específicas pelo orientador
acadêmico. As informações dessas fichas são resumidas na ficha individual do acadêmico em
questão.
1.4 A tessitura do Seminário Temático de Matemática e a inserção de atividades práticas
Para abordar a dinâmica do desenvolvimento das atividades práticas que foram
apresentadas no Seminário Temático de Matemática, utilizamo-nos de alguns referenciais
obtidos, a partir da nossa convivência no Curso. Outros dados foram obtidos em conversas
informais com um orientador acadêmico do mesmo contexto de estudo, uma vez que este
orientou e coordenou todas as atividades da Área de Matemática e, conseqüentemente, do
Seminário Temático de Matemática, com os acadêmicos do município de Alta Floresta MT.
Essa busca de informações complementares com terceiros se porque, na nossa condição
atual de ex-orientador acadêmico, não tivemos uma vivência direta de orientação de
acadêmicos do NEAD na Área de Matemática, em função da dedicação ao presente estudo.
A Área de Matemática, como um todo, foi organizada em oito fascículos, dispostos,
seqüencialmente, de I a VIII. Alguns desses fascículos foram estudados juntos, como se
verificou com os de números II e III, ou os de números IV e V, cujos conteúdos foram
considerados menos complexos do que os dos fascículos I, VI, VII e VIII, estes abordados
separadamente.
No fascículo I, de Matemática, o processo avaliativo se deu pela construção
orientada de um texto reflexivo, referente ao conteúdo abordado, utilizando-se as seguintes
34
temáticas propostas pela coordenação do Curso: a) as inteligências múltiplas nas situações
que envolvem aluno e professor; b) posicionamentos antigos, mas atuais no ensino de
matemática; c) avaliação de Matemática que se prática na escola; d) ações e conseqüências
educativas para o ensino de Matemática. Nesse fascículo, não houve nenhuma atividade
prática a ser aplicada em sala de aula. Os demais fascículos foram acompanhados por
atividades práticas, desenvolvidas pelos acadêmicos em salas de aula das séries iniciais do
ensino fundamental. Para os fascículos II, III IV, V e VI, aplicou-se uma atividade; em
relação aos fascículos VII e VIII foram aplicadas duas atividades: uma contemplando
conteúdo matemático e outra, o de dobraduras. No total, na sala de aula, cada grupo de
acadêmicos desenvolveu cinco atividades práticas e, conseqüentemente, elaborou-se a mesma
quantidade de relatórios de aula. Maiores detalhes das atividades práticas serão descritos nos
próximos parágrafos.
Na capacitação pedagógica do orientador acadêmico para a Área de Matemática, o
professor-especialista apresentou e discutiu ligeiramente os conteúdos dos fascículos,
folheando-os, página por página, e apresentando os resultados dos exercícios destes, dando
maior atenção aos conteúdos que considerou mais complexos e à aqueles sobre os quais
orientadores acadêmicos apresentaram dúvidas. Nesta formação do orientador acadêmico, a
maior ênfase foi dada à execução das atividades práticas que os acadêmicos apresentariam em
sala de aula do ensino fundamental; todas foram executadas rapidamente e em grupos, na
presença do professor especialista. Não se discutiram as questões didáticas e metodológicas
do ensino da Matemática, tampouco das atividades práticas.
O acadêmico teve o primeiro contato com as atividades práticas, a partir do estudo do
fascículo II. As atividades práticas propostas pelos autores dos fascículos, em apostilas
complementares e desenvolvidas pelos alunos, em seguida ao estudo de cada fascículo, não
foram elaboradas especificamente para este Curso de Pedagogia e não possuem uma relação
direta com os conteúdos abordados nos fascículos.
Para o desenvolvimento das atividades práticas, os alunos se organizaram em grupos
de dois a três componentes. Enquanto os alunos estudavam os fascículos, cada grupo se
dirigia ao orientador acadêmico, em busca da atividade prática. Este lhe apresentava as
atividades práticas referentes aquele momento de estudo, divididas por fascículos, e definia a
atividade que o grupo iria desenvolver na sala de aula dos componentes do grupo.
35
O orientador acadêmico, por seu turno, utilizou alguns critérios para essa distribuição
das atividades, tais como: cuidado para que a mesma atividade não fosse desenvolvida
repetidamente por vários grupos; atividades práticas organizadas por séries escolares, de
forma a contemplar todas as séries; indicação de atividades que exigissem conteúdos, em
relação aos quais os acadêmicos sentissem mais dificuldades. Essas dificuldades seriam
detectadas nos processos de orientação do fascículo ao acadêmico. Assim, para a
Coordenação do Curso, o acadêmico teria uma atividade que, além de desafiá-lo,
impulsionava-o a uma aprendizagem.
Uma vez definidas as atividades práticas de cada um dos grupos, pelo orientador
acadêmico, fazia-se o planejamento coletivamente para aplicação na sala de aula. O
orientador acadêmico apreciava o planejamento, no intuito de que aquela atividade garantisse
a construção do conceito matemático com o qual se trabalhava. Esse controle do planejamento
das atividades se deu em consonância com o processo avaliativo Meio I, dos fascículos de II a
VIII.
Concluído o planejamento da atividade, era o momento de desenvolvê-lo na sala de
aula e, para isso, foram-lhe dados dois direcionamentos, entre os quais os acadêmicos
poderiam optar: a um deles, o grupo de acadêmicos, de posse do planejamento coletivo,
assumia uma sala de aula, na respectiva série, para fazer o desenvolvimento da atividade e, ao
outro, propunha-se que adotasse uma única sala de aula, enquanto um dos componentes do
grupo daria as coordenadas gerais aos alunos para o desenvolvimento da atividade. Após as
coordenadas gerais para a aula, a turma seria dividida em grupos. Cada um dos acadêmicos
coordenava um grupo de alunos para acompanhar o desenvolvimento das atividades.
Qualquer um dos direcionamentos acima apresentados que o acadêmico tomasse, ele
teria que estar atento aos encaminhamentos direcionados por ele aos alunos, bem como, a
partir desses encaminhamentos, quais os resultados alcançados. De posse desses dois dados
(encaminhamentos, resultados), o acadêmico deveria produzir um texto reflexivo da aula,
abordando-o a partir de elementos teóricos apresentados no fascículo I e de outras referências
utilizadas, a seu critério. Esse texto reflexivo deveria ser enviado ao orientador, com o
planejamento da atividade em anexo, para fins de registro acadêmico, com peso para o
processo avaliativo Meio II.
36
Nos fascículos II e III, as atividades foram realizadas principalmente nas salas das
quais o acadêmico era docente. Esse fato gerou um problema, visto que as aulas ocorriam de
forma que o acadêmico não conseguia registrar nenhuma interferência, durante a realização
das atividades, por não conseguir distinguir entre o que era rotina e o que não o era e quais,
então, as particularidades do desenvolvimento das atividades em estudo, revelando, assim,
dificuldade em distanciar-se do objeto de análise. Desse modo, os acadêmicos acabaram por
ficar com poucos elementos para fazerem um julgamento crítico de seus respectivos relatórios
reflexivos de aula. Então, os orientadores acadêmicos indicaram-lhes a realização das
atividades em salas de aula, cujos contextos desconheciam. Assim, teriam melhor visibilidade
das intervenções que faziam.
Após o término do estudo de todos os fascículos de Matemática, bem como da
aplicação das atividades nas salas de aula e entrega dos relatórios de aula, tem-se momento
em que o acadêmico deve preocupar-se com a apresentação do Seminário Temático para
concluir a Área de Estudo.
Os orientadores acadêmicos e o Coordenador do Curso, desde o início das aulas da
Área de Matemática, vinham articulando os encaminhamentos do Seminário Temático. Ao
fim dos estudos dos fascículos e aplicação das atividades práticas pelos alunos, os
orientadores acadêmicos enviam para a coordenação do curso uma planilha com o nome de
todos os acadêmicos e as respectivas atividades que desenvolveram nas salas de aula. A
Coordenadora do pólo do NEAD na região de Colíder MT, juntamente com a professora
especialista da área de Matemática, ficou incumbida de receber a planilha acima referida e
definir quais os grupos de acadêmicos e a suas respectivas atividades que seriam
desenvolvidas e apresentadas nas oficinas do Seminário Temático. O critério utilizado foi
“município X diversidade de atividades”, ou seja, como no Seminário Temático estariam
presentes acadêmicos de onze municípios, procurou-se garantir que cada município
apresentasse um rol de atividades nas diversas séries, de forma que se evitasse a repetição de
atividades ou que algum município não fosse contemplado na apresentação de trabalhos nas
oficinas.
Nem todos os grupos de acadêmicos tiveram a oportunidade de apresentar uma
oficina, pois a quantidade de atividades foi insuficiente para abrigar todos os acadêmicos
aptos a apresentarem seus respectivos trabalhos. Uma das soluções encontradas para esse
impasse foi de definir para cada oficina um grupo de acadêmicos como “auxiliar”, com a
37
função de ajudar o grupo “aplicador
6
de oficina. Assim, todos os acadêmicos tiveram uma
participação direta na execução das oficinas, ou, ainda na função de aplicadores ou de
auxiliares, distribuídos em quatorze salas de oficina por dois períodos de quatro horas.
A professora especialista escolheu uma atividade para cada grupo. Foram as mesmas
que os acadêmicos (aplicadores e auxiliares) desenvolveram na sala de aula, com alunos do
ensino fundamental. Essas atividades foram desenvolvidas no Seminário Temático, em forma
de oficina, reproduzindo os mesmos procedimentos tomados nas salas de aula com as
crianças, tomando-se, todavia, como alvos os participantes do Seminário Temático.
Para apresentar a atividade na oficina do Seminário Temático, os acadêmicos
receberam a orientação para apresentação padronizada de seus respectivos trabalhos,
contemplando o título da atividade, os objetivos, os procedimentos e os resultados a que
chegaram na sala de aula do ensino fundamental. Nas atividades mais complexas, os
procedimentos utilizados na sala de aula foram apresentados passo a passo. As oficinas
reproduziram a prática efetivada, assim como previsto no documento das instruções do
Seminário Temático, por Miranda & Moreno (2004).
O Seminário Temático de Matemática tem por objetivo, resgatar as atividades
didático-pedagógicas vivenciadas pel@ academic@ no decorrer da área de
matemática. [...]
Socializar, na forma de Oficinas, as atividades matemáticas aplicadas pel@s
academic@s em salas de aula de à séries, no dia marcado para o seminário.
Participarão deste momento os acadêmicos que tiverem terminado todas as
atividades[...].
A apresentação do Seminário Temático deu-se no pólo do NEAD, na cidade de
Colíder-MT. Cada oficina constava de aproximadamente vinte participantes, entre acadêmicos
e professores convidados, bem como um orientador acadêmico, responsável pela coordenação
da atividade, que fazia sua abertura, bem como seu fechamento tecendo, a respeito da referida
oficina alguns comentários.. Era de responsabilidade do orientador acadêmico garantir, ao
final da apresentação do trabalho na oficina, se caso os acadêmicos não fizessem isso, a
discussão dos resultados das apresentações das atividades práticas nas salas de aula, bem
6
Tanto o grupo aplicador quanto o auxiliar estudaram as mesmas atividades práticas. As atribuições dos
aplicadores eram de coordenar as atividades nas oficinas, as dos auxiliares eram de ajudar o grupo aplicador a
manusear os materiais e, se caso os aplicadores não dessem conta de esclarecer certos conceitos durante a
apresentação, eles assumiriam a responsabilidade.
38
como uma articulação dos conceitos trabalhados naquela atividade com o cotidiano educativo
escolar do ensino da Matemática nas séries iniciais.
Todos os componentes dos grupos, tanto os aplicadores quanto os auxiliares,
deveriam estar devidamente preparados para a apresentação da oficina. No entanto, do grupo
dos aplicadores, apenas um componente deveria coordenar a atividade, e o que aconteceu na
prática, foi que esse componente, conseqüentemente o mais expressivo do grupo, fez também
a aplicação da atividade, dominando praticamente toda a fala durante a oficina, enquanto os
demais (aplicadores e auxiliares) prestavam ajuda às questões práticas da oficina.
1.5 A área de matemática e a construção do relatório reflexivo
Concluída a apresentação da oficina, é momento do acadêmico se voltar com seu olhar
para o todo da área de matemática, e numa perspectiva avaliativa, construir um relatório
reflexivo destacando a aprendizagem a partir do olhar para a prática docente. A orientação
que receberam para construção desse relatório reflexivo de fechamento de área é assim
sistematizado por Miranda e Moreno, (2004)
Sistematizar o trabalho desenvolvido na área, com a elaboração de um relatório
individual, a ser entregue após o termino dos fascículos. O relatório deverá conter
também o momento das oficinas.
Os seguintes procedimentos poderão ajudar os acadêmicos na elaboração do
relatório:
-pensar na organização das informações a partir de registros já efetuados e de
memória, ao longo do estudo dos fascículos, reafirmando dessa forma a utilidade da
escrita;
-discutir o relatório com seus pares e com o orientador acadêmico, como
enriquecimento e ajuda ao trabalho individual de produção escrita, na versão
preliminar;
-exercitar a reescrita do relatório, tomando-a como parte do processo de elaboração
de um texto;
-considerar que sempre haverá um estilo próprio na produção escrita e na
organização do relatório;
-estar atento às informações do Aventura de ser Estudante
7
, principalmente às
normas técnicas de apresentação de trabalhos;
-utilizar-se de tabelas, gráficos, fotos, etc, que possam melhorar a interpretação das
informações.
7
PRETI, Oreste. A Aventura de Ser Estudante: um guia metodológico. Cuiabá: EdUFMT, 2002.
39
O que é importante que seja registrado no relatório:
-quanto à aprendizagem dos conteúdos dos fascículos:durante a leitura, realização
dos exercícios e orientação, conteúdos novos, ‘reaprendidos’ e conhecidos: leitura
de textos complementares.
-quanto à prática vivenciada: preparação, aplicação, relatório das atividades
aplicadas em sala de aula e aspectos significativos da socialização.
-quanto ao alcance das expectativas, reflexões e sentimentos sobre os vários
momentos vividos na área de matemática e a respeito da vossa própria atuação.
De fato, o relatório reflexivo objetiva uma retrospectiva dos fenômenos que foram
relevantes para o acadêmico, exigindo dele capacidade de sistematização escrita. Esse
relatório, cuja versão final foi entregue para arquivamento no NEAD, teve orientação e
acompanhamento do orientador acadêmico. Uma vez cumprida essa exigência, considera-se
que a área de estudo e, conseqüentemente, o Curso foram finalizados. Logo em seguida,
houve a formatura, para a concessão do título de Pedagogia, na modalidade Licenciatura para
as Séries Iniciais do Ensino Fundamental, e seus portadores continuam nos seus locais de
trabalho, todavia, com uma responsabilidade social maior do que aquela que possuíam no
início do Curso.
CAPÍTULO II
SABERES DOCENTES E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES
2.1 Concepções do saber docente
Os saberes docentes que estão presentes na vida profissional do professor têm
estreita relação com a tradição filosófica que se constituiu pelas ciências (GAUTHIER, 1998:
333), com os conhecimentos que a humanidade detém sobre a complexidade do ambiente
natural e social, e o modo como se entende esse saber, influi na sobre a forma como se aborda
a realidade pelo uso racional. O saber é uma constante construção histórico-social da
humanidade que busca, através dos tempos, o domínio dos fatos sociais e naturais para melhor
compreender o meio e nele poder interferir.
No âmbito da modernidade, afirmam Tardif (2002) e Gauthier (1998), o saber foi
definido sob três perspectivas: a subjetividade, o julgamento (o juízo), e a argumentação,
assim como apresentamos abaixo.
Na primeira concepção, subjetividade, considera-se o saber como uma certeza
subjetiva produzida pelo pensamento racional, opondo-se à dúvida, ao erro e à imaginação,
pelos quais se forma de uma intuição intelectual, em que a verdade é imediatamente
identificada e captada ou uma representação intelectual resultante de uma cadeia de
raciocínios ou de uma indução (TARDIF, 2002: 194). Portanto, a subjetividade é o lugar do
saber, sendo fruto de um diálogo interior marcado pela racionalidade.
Já na segunda concepção, julgamento, o saber é o juízo verdadeiro, resultante de uma
atividade intelectual muito maior que uma representação subjetiva, é um julgamento.
“O saber
se limita ao juízo de realidade e exclui os juízos de valor, a vivência, etc”
(TARDIF, 2002: 195).
Para essa concepção, afirma Gauthier (1998: 334), que o saber é conseqüência de uma
atividade intelectual a respeito de fatos.
41
A terceira concepção, a argumentação, é a que adotamos e coaduna-se com o
pensamento de Tardif (2002: 194) sobre o saber docente que, para ele, é um saber que se
desenvolve no espaço do outro e para o outro. Para essa concepção, pode-se chamar de saber
“a atividade discursiva que consiste em tentar validar, por meio de argumentos e operações discursivas
(lógicas, retóricas, dialéticas, empíricas, etc.) e lingüísticas, uma proposição ou uma ação. A
argumentação é, portanto, o lugar do saber”
(TARDIF, 2002: 196). Essa argumentação é o que
remete à dimensão intersubjetiva do saber, que é construído como afirma Gauthier (1998:
335) coletivamente e de natureza lingüística, oriunda de trocas entre os agentes que
argumentam sua validade.
Como podemos perceber, a exigência da racionalidade para definir a natureza do
saber é defendida pelas três concepções. Tardif, (2002: 199) chama de saber
“unicamente os
pensamentos, as idéias, os juízos, os discursos, os argumentos que obedeçam a certas exigências de
racionalidade”.
Porém essa exigência de racionalidade não vai além da linguagem e da práxis,
pois dependem das razões dos atores e dos locutores, bem como do contexto em que agem e
falam. Esse saber não pertence somente a um ator hiper-racional, mas é partilhado por uma
comunidade de atores sociais onde estão presentes vários tipos de juízos.
Para Tardif, (2002: 205), é a terceira tendência que contempla os ideais da educação
atual por representar nos saberes a existência das ciências da educação. Em se tratando das
práticas educativas, manifestam-se pela aplicação de modelos de atividades racionais; no que
diz respeito às instituições, manifestam-se pela existência de sistemas escolares que executam
o planejamento, embora esse repertório de conhecimentos possa existir, se se reconhecer
que os professores possuem capacidade de racionalizar sua própria prática, de definir suas
razões de agir.
Além do mais, o saber não reside no sujeito, mas nas suas razões públicas, ao tentar
validá-lo. Corroborando este pensamento, Gauthier (1998: 339) afirma que o saber é o
resultado de uma produção social, não se reduzindo apenas aos sujeitos pensantes, mas é fruto
de uma interação entre sujeitos que o revisam e reavaliam-no, no interior de um processo
dinâmico situado no tempo e no espaço.
O professor, em sua atividade docente, mobiliza uma gama de saberes para
concretizar as suas diversas tarefas no interior das escolas. Portanto, questiona-se que
características têm esses saberes? São provindos de quais fontes? O estudo desses saberes
42
profissionais tem sido feito no mais amplo contexto da história do professor, da escola e da
sociedade, assim como define Tardif, (2002: 11)
o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber deles
e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a experiência de vida e
com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula
e com os outros atores escolares.
Além dos saberes estarem diretamente relacionados à identidade do docente, Tardif
(2002:11) também defende que o saber dos professores é um “saber social”, por estarem eles
ligados diretamente às condições que estruturam seu trabalho. Esse contexto, segundo
Gauthier (1998: 343), exerce uma ação sobre os saberes, atribuindo-lhes um status particular
que outras profissões não possuem. Trata-se de um saber social, segundo Tardif, porque, em
primeiro lugar, o saber dos professores é partilhado pelos colegas de profissão e ganha sentido
na situação coletiva de trabalho; em segundo lugar, porque esse saber resulta de uma
negociação entre diversos grupos, como a universidade, os sindicatos, a administração
escolar, os grupos científicos, etc, que orientam sua definição e o legitimam; em terceiro
lugar, porque são “objetos sociais”, isto é, são práticas sociais porque trabalham com sujeitos
e em função de um projeto; em quarto lugar, o que os professores ensinam e a maneira de
ensinar são históricos, evoluem com o tempo e com as mudanças sociais; e, por fim, em
quinto lugar, o saber é adquirido numa socialização profissional, em que “é incorporado,
modificado, adaptado em função dos momentos e das fazes de uma carreira, ao longo de uma
história profissional onde o professor aprende a ensinar fazendo o seu trabalho”, no entanto,
“o saber dos professores é profundamente social e é, ao mesmo tempo, o saber dos atores
individuais que o possuem e o incorporam à sua prática profissional para a ela adaptá-lo e
para transformá-lo” (TARDIF, 2002: 14-15). Sua construção não depende unicamente do
sujeito que tem a intenção de mobilizá-lo.
Ao contrário da natureza social dos saberes dos professores, Tardif (2002) apresenta
uma outra concepção de saber, com a qual se deve ter o cuidado para não cair no
sociologismo que “tende a eliminar totalmente a contribuição dos atores na construção
concreta do saber, tratando-o como uma produção social em si mesma e por si mesma, (...),
subordinada a mecanismos sociais” (TARDIF, 2002: 14). Para esta, o saber profissional é
exterior ao sujeito, cabendo a ele captá-lo. Para nós, essa concepção revela uma postura
tradicional de constituição da profissão, desarticulada da prática docente.
43
Nos últimos anos, estudos têm indicado com intensidade que os saberes dos
professores dependem das condições concretas em que o trabalho se realiza, bem como da
personalidade e da experiência profissional dos professores. Ele se materializa em uma
formação, através de “programas, de práticas coletivas, de disciplinas escolares, de uma
pedagogia institucionalizada, etc” (TARDIF, 2002: 16), superando as concepções mais
tradicionais de que a formação do professor se daria basicamente pelos conhecimentos
catedráticos, dos quais fariam uso quando do contato com a prática profissional.
Para o mesmo autor, e nós corroboramos com seu entendimento, trata-se agora de
repensar os cursos de formação de professores, buscando articulação e equilíbrio entre os
conhecimentos produzidos pelas universidades e os saberes desenvolvidos pelos professores
em suas práticas cotidianas. Nesse sentido, os Cursos de formação de professores, ao
executarem seus programas curriculares, têm, como dever, levar em consideração o contexto
da prática docente em que os sujeitos já são, ou serão, inseridos.
Os professores definem a sua prática em relação aos saberes que possuem e
transmitem. Isso quer dizer também que, ao longo de sua carreira, os professores constroem
saberes e são estes que o orientam para fazê-lo educativo. Além do mais, os professores
ocupam uma posição estratégica nas relações que se dão entre as sociedades contemporâneas
e os saberes.
Tardif, (2002: 33) identifica diferentes saberes que estão presentes na prática dos
professores, bem como as relações que os docentes mantêm com eles, demonstrando que:
O saber docente se compõe, na verdade, de vários saberes provenientes de
diferentes fontes. Esses saberes são os saberes disciplinares, curriculares,
profissionais (incluindo os das ciências da educação e da pedagogia) e
experiênciais;
Embora os seus saberes ocupem uma posição estratégica entre os saberes
sociais, o corpo docente é desvalorizado em relação aos saberes que possui e
transmite;
O professor confere um status particular aos saberes experienciais por ser este
que fundamenta basicamente sua prática.
A produção de saberes na sociedade contemporânea tem-se dado pela pesquisa
científica e vem “inter-relacionada com o sistema de formação e de educação em vigor”
(TARDIF, 2002: 34), tarefa assumida por instituições como a universidade na produção de
44
pesquisas, de ensino, de produção de conhecimentos e de formação com base nesses
conhecimentos.
Para Tardif, (2002: 34) “os processos de produção dos saberes sociais e os processos
sociais de formação podem, então, ser considerados como dois fenômenos complementares no
âmbito da cultura moderna e contemporânea”. Portanto, hoje, a produção de novos saberes
tem-se imposto como um fim em si mesmo e, conseqüentemente, as funções de educação e de
formação têm passado para o segundo plano. Dessa forma, a aquisição de saberes tem ficado
subordinada, basicamente, à produção de novos conhecimentos. Nessa perspectiva, para
Tardif, (2002: 34)
os saberes são, de um certo modo, comparáveis a ‘estoques’ de informações
tecnicamente disponíveis, renovados e produzidos pela comunidade científica em
exercício e passíveis de serem mobilizados em diferentes práticas sociais,
econômicas, técnicas, culturais, etc.,
e os pesquisadores ficam com a tarefa da produção dos saberes, enquanto o corpo docente
limita-se apenas pela transmissão sem nenhuma relação entre si, não assumindo nenhuma
postura de formação. Portanto, segundo esse mesmo autor, essa visão fabril, que atende
somente à dimensão de produção, tende a ser superada por um saber historicamente situado,
em que o novo conhecimento pode surgir do antigo, visto ser este sempre re-atualizado, por
meio dos processos de aprendizagem, e
todo saber implica um processo de aprendizagem e de formação; e, quanto mais
desenvolvido, formalizado e sistematizado é um saber, como acontece com as
ciências e os saberes contemporâneos, mais longo e complexo se torna o processo de
aprendizagem, o qual, por sua vez, exige uma formalização e uma sistematização
adequada (TARDIF, 2002: 35).
Nas sociedades atuais, quando um saber adquire certa formalização e sistematização,
integra-se a processos institucionais de formação e, conseqüentemente, de socialização. Para
nós, o saber dos professores é constituído por meio de um processo gradual e sistemático, no
contato com as ciências e com a cultura profissional docente.
No mesmo sentido, como mencionamos no último parágrafo, a profissão docente é
constituída por saberes que se constroem ao longo da vida do professor. Esses saberes
possuem características próprias e, no exercício da profissão, completam-se. Assim, Tardif
(2002), classifica-os, como mencionamos pouco, em saberes da formação profissional,
45
saberes disciplinares, saberes curriculares e saberes experienciais, afirmando que o saber dos
professores é plural, assim como veremos nas páginas seguintes, subsidiados por Gauthier
(1998), Carvalho e Perez (2001), Kincheloe (1997) e Chakur (2001).
2.1.1 Os saberes científico-pedagógicos na formação inicial do professor
8
Durante a formação profissional inicial, oferecida pela instituição de formação de
professores, o professor em formação entra em contato com uma diversidade de
conhecimentos e normas que já são validados pela sociedade por intermédio da ciência,
cabendo-lhe apropriar-se desses conhecimentos
9
e, especificamente, dos saberes pertinentes à
sua profissão. Da mesma forma, assim como tem contato com novos saberes que ainda lhes
são desconhecidos, possui, em sua experiência, conhecimentos elaborados pela própria
experiência e que dialogarão com os que serão propostos, resultando em novos saberes
profissionais. Assim procuramos descrevê-los:
Saberes da formação profissional
Entende-se por saberes profissionais dos educadores o conjunto de saberes
veiculados pelas instituições de formação de professores, para as quais o professor e o ensino
se tornam objetos de saber das ciências humanas e das ciências da educação, produzindo
conhecimentos e procurando incorporá-los à prática do professor. De acordo com Tardif,
(2002: 37)
“esses conhecimentos se transformam em saberes destinados à formação científica ou
erudita dos professores, e, caso sejam incorporados à prática docente, esta pode transformar-se em
prática científica, em tecnologia da aprendizagem”.
As ciências da educação são, basicamente, colocadas em contato com os professores,
quando da formação profissional. O ideal seria que esses conhecimentos estivessem,
constantemente, em contato com o meio escolar profissional, para subsidiarem, teoricamente,
a prática dos professores, pois esse contexto, segundo Tardif (2002), mobiliza diversos
saberes chamados saberes pedagógicos que se apresentam no professor como uma doutrina,
ou concepção, proveniente de reflexões sobre a prática educativa
“que conduzem a sistemas
8
Os saberes científico-pedagógicos são aqui entendidos como sendo todos os saberes da formação profissional
dos professores e que têm origem nas ciências.
9
Conhecimento é uma forma de capital cultural. (KINCHELOE, 1997: 187)
46
mais ou menos coerentes de representação e de orientação da atividade educativa”
(2002: 37), e
articulam-se com as ciências da educação.
Os saberes pedagógicos, para Carvalho e Perez Gil (2001: 115), são provenientes de
pesquisas nos campos da Didática Geral e da Psicologia da Aprendizagem, relacionadas com
os acontecimentos da sala de aula e têm influência direta no ensino e na aprendizagem de
todos os conteúdos. Para esses autores, o professor precisa
“construir o saber-fazer em relação
aos saberes”
da educação científica, e o lócus de obtenção de dados para a relação teoria e
prática é a escola. Para eles, a atividade de formação profissional dos professores deve
acontecer articulada com a prática.
Os saberes disciplinares
A prática docente também incorpora saberes sociais definidos pelas instituições
universitárias e que se integram à prática dos professores a partir da formação inicial e
continuada dos docentes por meio das disciplinas universitárias. Esses são chamados por
Tardif, de saberes disciplinares e, conseqüentemente, respondem pelos diversos campos do
conhecimento, como a Matemática, História, Literatura, etc. Esses saberes emergem da
tradição cultural e de grupos sociais produtores de saberes. Chakur (2001: 32), comentando
Tardif, enfatiza que:
“os saberes das disciplinas são aqueles correspondentes aos vários campos de
conhecimento, tradicionalmente transmitidos em forma de disciplinas nas universidades”.
Para Gauthier (1998: 29), os saberes disciplinares são os produzidos pelos
pesquisadores e cientistas nas diversas áreas, referentes ao conhecimento de mundo. Não são
produzidos pelos professores, mas extraídos por eles para serem ensinados, com possibilidade
de impor aos conteúdos uma série de transformações. Ensinar, portanto, exige conhecimento e
domínio do conteúdo a ser ensinado.
Carvalho e Perez Gil (2001: 108), classificam os saberes da educação científica em
saberes conceituais e metodológicos da área especifica (2001: 109). Para esses autores, os
professores, nos cursos de formação inicial, precisam dominar
“os saberes conceituais e
metodológicos de sua área
, para, assim, estarem aptos às inovações curriculares. Justificam
essa forma de saber, pelo fato de as pesquisas indicarem carência de conhecimento da matéria
pelo professor que, assim, torna-se um transmissor mecânico de conteúdos. Propõem que as
47
disciplinas nos cursos de formação de professores
“façam uma estreita ligação entre o conteúdo
específico e as reflexões históricas e filosóficas de sua produção”
(2001: 110). Assim,
“a relação
teoria e prática não é feita em relação ao ensino desse conteúdo, mas sim ao próprio desenvolvimento
metodológico do conteúdo”
. Nesse sentido, o professor, tendo o domínio dos conhecimentos
específicos de sua área, bem como das metodologias, passa a compreender o conhecimento
em constante desenvolvimento e aprimoramento, tratando-o na perspectiva da pesquisa. Desse
modo, deixa de ser um mero transmissor, passando a ser um produtor de conteúdos que
subsidiarão suas aulas.
Os saberes curriculares
Pela definição de Tardif (2002), os saberes curriculares provém de fatores
burocráticos do ambiente escolar e concretizam-se sob a forma de programas escolares, tais
como objetivos, conteúdos e métodos que os professores precisam aprender e aplicar. São os
que categorizam e apresentam os saberes sociais com um fim de apresentação e formação da
cultura erudita. Chakur (2001: 33), assim, afirma que os
“saberes curriculares correspondem aos
discursos, objetivos, conteúdos e métodos que os professores devem aprender e aplicar na forma de
programas escolares”.
Para Gauthier (1998: 30), os saberes curriculares dos professores são produzidos por
agentes exteriores ao contexto escolar, geralmente funcionários do Estado. Para esse autor,
uma disciplina nunca é ensinada da mesma forma pela qual é proposta nos programas
curriculares, sofrendo inúmeras transformações, promovidas por agentes escolares, pois a
escola seleciona e organiza certos saberes produzidos pelas ciências e transforma-os em um
corpus que será ensinado nos seus programas, tomando, assim, uma identidade definida.
Uma caracterização do como ensinar eficazmente os conteúdos escolares
organizados nos currículos é traçada por Carvallho e Perez Gil (2001: 110) sob os saberes
integradores. Assim,
os saberes integradores são os relacionados ao ensino dos conteúdos escolares
e são provenientes das pesquisas realizadas na área de ensino do conteúdo especifico”
. Ensinar
eficazmente um conteúdo, para estes autores supõe superar o senso comum dos alunos,
desestabilizando-o a partir de seus esquemas conceituais prévios (2001: 113). Nesse sentido,
faz-se necessário, como apontam os mesmos autores,
“colocar problemas, questões, ou seja,
atividades desequilibradoras, para que os professores tomem consciência da importância que estes
48
aspectos têm no desenvolvimento do ensino e da aprendizagem do conteúdo
(2001: 111), ou, como
destaca Elliott (1994: 197), que os resultados da aprendizagem constituam-se na própria
atividade autônoma de estudo e não de ensino.
A relação teoria e prática se nos momentos em que os professores vão testar seus
conhecimentos na prática docente, quando mais importante de que o simples fazer, é o saber-
fazer (CARVALLHO e PEREZ GIL, 2001: 114). E, para isso, eles têm de ter conhecimento
do contexto em que atuarão, para extrair, desse momento formativo, os saberes profissionais,
fazendo uso da pesquisa educativa que, para Stenhouse (apud ELLIOTT, 2005: 147),
“supõe
tanto o fazer como o utilizar a pesquisa, considerando-a como um elemento próprio da função do
professor, ou seja, o uso que este faz da pesquisa em sua área para fundamentar seu ensino supõe fazer
pesquisa sobre ela através de seu ensino”.
Assim, os conhecimentos profissionais tornam-se
objeto de pesquisa, ao mesmo tempo em que os alunos também a aprendem (ELLIOTT, 2005:
148).
Concordamos com a caracterização dos saberes profissionais dos professores,
adquiridos durante a formação científico-pedagógica na formação inicial, assim como
apresentado acima, uma vez que são estes os saberes de base para a formação acadêmica do
professor que farão com que ele mobilize outros tipos de saber, inclusive os saberes da
experiência.
Os saberes da experiência na profissão docente
Os professores, no exercício da profissão, também desenvolvem saberes baseados no
trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio. Esses conhecimentos surgem a partir da
experiência, seja individual seja coletiva, e por ela são validados. A esses saberes Tardif
(2002) chama de saberes experienciais ou práticos, sendo eles elementos constitutivos da
prática docente.
Para Tardif (2002: 48), os professores, na incapacidade de controlar os saberes
disciplinares, curriculares e de formação profissional, produzem saberes através dos quais
compreendem e dominam sua prática. Esses então, chamados de saberes experienciais,
tornam-se os fundamentos de sua competência e a partir dos quais é que esses professores
julgam a pertinência ou o realismo das reformas introduzidas nos programas ou nos métodos.
49
Tardif (2002: 48) chama de saberes experienciais
O conjunto de saberes atualizados, adquiridos e necessário no âmbito da prática da
profissão docente e que não provém das instituições de formação nem dos
currículos. Esses saberes não se encontram sistematizados em doutrinas ou teorias.
São saberes práticos e formam um conjunto de representações a partir das quais os
professores interpretam, compreendem e orientam sua profissão e sua prática
cotidiana em todas as suas dimensões. Eles constituem, por assim dizer, a cultura
docente em ação.
Trata-se de saberes que, para Chakur (2001: 33), são desenvolvidos pelos próprios
professores em sua atuação prática e profissional. Por assim serem, são considerados como o
fator educativo com condicionantes no sistema de interação real e não abstrato, como o que os
cientistas ou tecnólogos levam em conta. Para Tardif, (2002: 49) “no exercício cotidiano de
sua função, os condicionantes aparecem relacionados a situações concretas que não são
passíveis de definições acabadas e que exigem improvisação e habilidade pessoal”. Para o
professor, lidar com as diversas situações que exijam dele respostas e decisões tem em si o
caráter formador. Isso permite ao professor desenvolver por si mesmo o habitus, ou seja,
disposições adquiridas na e pela prática real, validadas pelo trabalho cotidiano, no saber-fazer
e de saber-ser.
Gauthier (1998: 33) denomina os saberes experienciais dos professores de saber da
ação pedagógica. Este torna-se saber experiencial dos professores “a partir do momento em
que se torna público e que é testado através das pesquisas realizadas em sala de aula”. Trata-
se de um saber específico da profissão docente, não passa por validação em outras profissões
e marca a identidade profissional. Para o autor, esse tipo de saber é que deveria ser levado a
cabo na formação dos professores, por ser real, concreto (1998:35). Segundo, ainda, esse
mesmo autor, para a profissionalização do ensino, esse tipo de saber precisa ser mais
explicitado, “visto que os saberes da ação pedagógica constituem um dos fundamentos da
identidade profissional do professor” (1998: 34), em suma.
Para o professor, os saberes experienciais fornecem determinadas certezas, relativas
ao contexto de trabalho, de modo que facilitem a sua integração com a realidade. Para Tardif,
(2002: 50) os saberes experienciais possuem três objetos e que expressam as condições da
profissão:
a) as relações e interações que os professores estabelecem e desenvolvem com os
demais atores no campo de sua prática; b) as diversas obrigações e normas às quais
50
seu trabalho deve submeter-se; c) a instituição enquanto meio organizado é
composto de funções diversificadas.
Disso decorrem algumas observações. Em relação a esses objetos, muitas vezes,
uma distância crítica entre os saberes da formação, fazendo com que o professor, ao entrar em
contato com a realidade, sinta um choque, descobrindo os limites de seus saberes. Essa
distância pode trazer conseqüências para o professor: em alguns pode provocar a rejeição da
formação inicial e a certeza de que ele mesmo é o único responsável pelo seu sucesso; em
outros, provoca uma reavaliação de que foi útil, ou não, na formação; e, finalmente, em
outros, gera julgamentos mais relativos, pelos quais pode afirmar que a formação serviu
basicamente para uma melhor apresentação do material pedagógico e organização do curso.
Os objetos, por fazerem parte de seu cotidiano profissional, são aprendidos de
forma rápida pelo professor, em seu contato com a prática, pela qual têm de aprender fazendo.
Assim, nos primeiros cinco anos de carreira, o profissional tem de demonstrar aos seus pares e
a si mesmo que é capaz de exercer a profissão. A experiência logo se torna habitus, ou seja,
“macete” da profissão, interiorizado pelo professor.
Os objetos, ou condições, não têm o mesmo valor para a prática da profissão. Por
exemplo, reger a sala de aula é mais importante que conhecer os mecanismos da direção
escolar ou da secretaria. Para Tardif (2002: 51) “os saberes docentes obedecem, portanto, a
uma hierarquia: seu valor depende das dificuldades que apresentam em relação à prática. Ora,
no discurso docente, as relações com os alunos constituem o espaço onde são validados, em
última instância, sua competência e seus saberes”.
Os saberes experienciais têm origem na prática cotidiana e são de propriedade
individual, mas, nem por isso, residem totalmente nas certezas subjetivas. Para Tardif (2002:
52)
Essas certezas também são partilhadas e partilháveis nas relações com os pares [...],
portanto, através do confronto entre os saberes produzidos pela experiência coletiva
dos professores, que os saberes experienciais adquirem uma certa objetividade.
Sendo assim, o docente não é apenas um prático, mas um formador, na medida que
transmite saberes experienciais a seus colegas e, ao mesmo tempo, é levado a tomar
consciência de seus próprios saberes experienciais. As trocas profissionais também podem
acontecer em reuniões pedagógicas ou congressos realizados pelos profissionais.
51
Para Tardif (2002: 53), “Os saberes experienciais adquirem também uma certa
objetividade em sua relação crítica com os saberes disciplinares, curriculares e de formação
profissional”. Assim, a prática profissional não favorece apenas o desenvolvimento de saberes
experienciais, mas também proporciona uma avaliação dos outros saberes através de sua
retradução, em função das condições limitadoras da experiência. Isso o quer dizer que os
professores rejeitem os outros saberes. Na sua prática, reelaboram-nos, de acordo com seu
próprio discurso; na verdade, a prática promove a oportunidade em que os professores
reorganizam a formação e adaptam-na à sua profissão. Desse modo, afirma Tardif, (2002: 53),
o professor objetiva “um saber formado de todos os saberes retraduzidos e submetidos ao
processo de validação constituído pela prática cotidiana”.
Para esse mesmo autor, (2002: 54), os saberes experienciais são o núcleo vital do
saber docente e não são como os demais, pois formam-se a partir de todos, mas retraduzidos,
“polidos” e submetidos às certezas construídas na prática e na experiência. Portanto, os
saberes experienciais passarão a ser reconhecidos, a partir do momento em que os
professores manifestarem suas próprias idéias a respeito dos saberes curriculares e
disciplinares e, principalmente, a respeito de sua própria formação profissional, constituindo,
assim, a sua identidade.
Em suma, para Tardif (2002: 39),
o professor ideal é alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu
programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e
à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência cotidiana
com os alunos.
Vale ressaltar que, sendo assim, o professor não se faz somente quando da sua
formação inicial; esta é um dos elementos que contribui para a sua profissionalização, porque,
após essa formação, o professor, em contato com a prática escolar, ressignificará sua
subjetividade e construirá novos saberes, constituindo-se como um profissional capaz de
renovar suas relações, tanto com seus alunos como com os colegas de profissão. Para Nóvoa
(1992: 23), a profissionalização docente “é um processo através do qual os trabalhadores
melhoram o seu estatuto, elevam os seus rendimentos e aumentam o seu poder/autonomia",
melhorando, assim, as condições do exercício da profissão.
Para Nóvoa (1992: 25), a formação do professor não se dá pela acumulação de
cursos, conhecimentos e técnicas, mas por meio da reflexão crítica da prática profissional, no
52
sentido da (re)construção permanente de sua identidade pessoal. Por isso, o autor propõe que
a formação deve privilegiar e “investir na pessoa” e dar estatuto ao “saber da experiência”.
Desse modo, afirma que os conhecimentos teóricos fornecem os indicadores e grelhas de
leitura, mas o saber de referência que é retido pelo sujeito adulto está ligado à sua experiência,
bem como à sua identidade. Nesse sentido, os saberes dos professores não provêm de fontes
externas: se fosse o contrário, os professores seriam receptadores de saberes e não produtores
de saberes específicos de sua profissão, a partir da ressignificação desses saberes e da sua
construção ativa, ao longo do seu percurso de vida.
2.1.2 O status dos saberes dos professores
O professor ocupa posição estratégica na sociedade e é, também, peça fundamental
para a sua evolução através do tempo histórico. Dada a relevância do papel do professor,
como um dos transmissores da cultura erudita às futuras gerações, é lamentável sua pouca
valorização profissional, em função da falta de políticas emancipadoras para esses
profissionais da educação. Isto, segundo Tardif (2002: 40), faz com que a relação do professor
com os saberes da formação profissional, saberes disciplinares e saberes curriculares seja de
segunda mão, uma vez que esses saberes são incorporados à prática docente sem, porém, ser
produzidos ou legitimados por ela. Para Tardif (2002: 40),
a relação que os professores mantêm com os saberes é o de ‘transmissores’, de
‘portadores’ ou de ‘objetos’ de saber, mas não de produtores de um saber ou de
saberes que poderiam impor como instância de legitimação social de sua função e
como espaço de verdade de sua prática [...] a função docente se define em relação
aos saberes, mas parece incapaz de definir um saber produzido, ou controlado pelos
que a exercem.
Os saberes das disciplinas e os saberes curriculares, por fim, acabam não sendo o
saber dos professores, tampouco o saber docente, pelo fato de que esses saberes que os
professores transmitem situam–se numa posição de exterioridade, em relação à prática por
aparecerem como produto determinado, em forma e conteúdo, oriundo da tradição cultural
e de grupos produtores de saberes sociais. Nesse sentido, os professores seriam transmissores
de saberes escolares com um papel meramente técnico, e o saber seria o da pedagogia ou
pedagógico, adquirido nas universidades, no contexto da formação pela qual
“os formadores
universitários assumem as tarefas de produção e de legitimação dos saberes científicos e pedagógicos,
ao passo que aos professares compete apropriar-se desses saberes”
(TARDIF, 2002: 41). Assim,
53
uma certa desvalorização da própria formação do professor e supervalorização dos
conhecimentos e saberes, criados fora do contexto prático em que os professores se
encontram.
O saber, a partir da modernidade já não é mais concebido, como no passado, quando
o conhecimento era propriedade da elite intelectual, e a formação dava-se de forma
distanciada das instâncias de produção do saber. Hoje, saber alguma coisa não é mais o
suficiente; é preciso ter o domínio metodológico e saber ensinar.
Um outro grande avanço histórico deu-se, também, na formação de professores, na
medida em que esta perde sua característica de formação geral para se transformar em uma
formação profissional especializada, e o saber a eles conferido passa a ser aquele destinado e
considerado útil ao mercado de trabalho no qual, segundo Tardif, (2002: 47)
“a função dos
professores não consistiria mais em formar indivíduos, mas em equipá-los, tendo em vista a
concorrência implacável que rege o mercado de trabalho”.
Os saberes, portanto, não mais surgem de uma elite intelectual, mas são provenientes
de um exercício intelectual dos atores que se encontram nas instâncias de aplicação desses
saberes e que, no caso, é a prática docente, em função da qual os saberes são construídos,
levando em conta o contexto de aplicação. Assim, os professores têm uma formação, cuja
preocupação central é a necessidade da realidade profissional vivida, tendo os conhecimentos
eruditos como base para reflexões das problemáticas que se apresentam no cotidiano.
2.1.3 Os saberes cientifico-pedagógicos como referência para resignificação dos saberes
da prática docente
A ação do professor é uma prática social, uma atividade, trabalho que desencadeia
uma transformação real nos trabalhadores que, ao construir a sua identidade, assumem-se
como “produtores da sua profissão” (NÓVOA, 1992: 28), ou carregam as marcas de sua
própria atividade “com sua cultura, seu ethos, suas idéias, suas funções, seus interesses, etc”
(TARDIF, 2002: 57). Além do mais, os saberes ligados ao trabalho são temporais, por serem
construídos progressivamente em um longo processo de aprendizagem conforme cada
ocupação profissional.
54
A experiência adquirida com o tempo na profissão é considerada pelos professores
como fonte primeira de competência do “saber-ensinar
10
”, portanto, os professores de
profissão aprendem pela experiência. E se o saber-ensinar é aprendido no cotidiano, afirma
Tardif (2002: 61),
Os saberes profissionais dos professores parecem ser, portanto, plurais, compósitos,
heterogêneos, pois trazem à tona, no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e
manifestações do saber-fazer e do saber-ser bastante diversificados e provenientes
de fontes variadas, as quais podemos supor também que sejam de natureza diferente.
Podemos observar abaixo, segundo Tardif, (2002: 63), o quanto o saber profissional
é plural e provém de diversas fontes:
Os Saberes dos Professores
Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição Modos de integração no
trabalho docente
Saberes pessoais dos
professores.
A família, o ambiente de vida, a
educação no sentido lato, etc.
Pela história de vida e pela
socialização primária.
Saberes provenientes da
formação escolar anterior.
A escola primária e secundária,
os estudos pós-secundários não
especializados, etc.
Pela formação e pela
socialização pré-profissionais.
Saberes provenientes da
formação profissional para o
magistério.
Os estabelecimentos de
formação de professores, os
estágios, os cursos de
reciclagem, etc.
Pela formação e pela
socialização, profissionais, nas
instituições de formação de
professores.
Saberes provenientes dos
programas e livros didáticos
usados no trabalho.
A utilização das ferramentas dos
professores: programas, livros
didáticos, cadernos de
exercícios, fichas, etc.
Pela utilização das ferramentas
de trabalho, sua adaptação às
tarefas.
Saberes provenientes de sua
própria experiência na profissão,
na sala de aula e na escola.
A prática do oficio na escola e na
sala de aula, a experiência dos
pares, etc.
Pela prática do trabalho e pela
socialização profissional.
Fonte: Tardif (2002: 63)
Como podemos perceber, grande parte dos saberes é exterior ao indivíduo, pois
provêm de fontes sociais exteriores ao trabalho cotidiano. Para Tardif, (2002: 64),
o saber profissional está, de um certo modo, na confluência entre várias fontes de
saberes provenientes da historia de vida individual, da sociedade, da instituição
escolar, dos outros atores educativos, dos lugares de formação, etc.
10
Grifos originais Tardif, (2002: 61).
55
Vale ressaltar que os saberes não antecedem a prática, logo não provêm da pesquisa,
assim como no modelo de formação de professores pela racionalidade técnica. Os saberes são
construídos no interior do contexto da prática, na qual o professor não tem uma concepção
dela, mas várias, em função da dificuldade de ter uma unidade teórica, frente à diversidade de
ocorrência, pois, segundo Tardif, (2002: 66),
“para atingir fins pedagógicos, o professor também
se baseia em juízos provenientes de tradições escolares, pedagógicas e profissionais que ele mesmo
assimilou e interiorizou”,
sobre os quais ele se baseia em sua experiência vivida, fazendo uso
de vários raciocínios, de conhecimentos, de regras, de normas e de diversos procedimentos.
Esses conhecimentos encontram-se inscritos na memória do professor, sendo fruto de sua
trajetória de vivência social, principalmente, a do seu processo de escolarização inicial que lhe
será muito marcante para a construção do Eu profissional (TARDIF, 2002: 67).
A dimensão temporal também que se levar em conta na construção dos saberes
pelo professor, pois a diversidade de conhecimentos, que está atrelada à vivência social,
tem significação ímpar e histórica no momento de sua aquisição. A esse propósito, afirma
Tardif, (2002: 68),
“o desenvolvimento do saber profissional é associado tanto a suas fontes e
lugares de aquisição quanto aos seus momentos e fases de construção”.
Assim, a competência
profissional dos professores tem raízes em sua história de vida e
“o que foi retido das
experiências familiares ou escolares dimensiona, ou pelo menos orienta, os investimentos e as ações
durante a formação inicial universitária”
(TARDIF, 2002: 69), e ainda que a formação teórica
adquirida na universidade tenha sua utilidade, não pode substituir a experiência. Enfim, para
ingressar na carreira, o novo professor antes leva em conta saberes adquiridos no meio
familiar, ou de experiência, enquanto aluno, e isso faz com que ele justifique a sua escolha
pela profissão.
O tempo é um fator de relevada importância na construção dos saberes que servem
de base ao trabalho docente, porque os fundamentos de ensino são existenciais, sociais e
pragmáticos.
São existenciais porque o pensamento do professor age, a partir de sua história de
vida, com aquilo que acumulou em termos de experiência de vida. Ele é um ser existencial no
mundo. Para Tardif, (2002: 104),
“fazer perguntas aos professores sobre seus saberes equivale, de
uma certa maneira, a levá-los a contar a história de seu saber-ensinar, através de suas experiências
pessoais e profissionais que foram significativas para eles do ponto de vista da identidade pessoal”.
56
Os fundamentos do ensino são sociais, porque os saberes profissionais são plurais,
isto é, provêm de diversas fontes
11
, e são
adquiridos em tempos sociais diferentes: tempo da
infância, da escola, da formação profissional, do ingresso na profissão, da carreira...”
(TARDIF,
2002: 104).
Finalmente, são pragmáticos, por estarem ligados tanto ao trabalho quanto à pessoa
do trabalhador. Trata-se, portanto, de saberes práticos ou operativos, por sua utilização
depender da adequação às funções, aos problemas e às situações de trabalho. Por outro lado,
esses saberes têm essência interativa, por serem modelados no âmbito das relações entre o
professor e os outros atores educacionais.
Assim, fica ratificada a dimensão temporal dos saberes dos professores, pois
compreender os saberes dos professores é compreender, portanto, sua evolução e
suas transformações e sedimentações sucessivas ao longo da história de vida e da
carreira, historia e carreira essas que remetem a várias camadas de socialização e de
recomeços (TARDIF, 2002 p.106).
que os saberes dos professores passam pela historicidade do sujeito, ao entrar na
trajetória profissional com “formação profissional, inserção na profissão, choque com a
realidade, aprendizagem na prática, descoberta de seus limites, negociação com os outros”
(TARDIF, 2002: 107), o professor é levado a demonstrar que é capaz de exercer a profissão e,
nessa demonstração, constrói saberes experienciais que, aos poucos, vão-se tornando
“certezas profissionais, em truques do ofício, em rotinas, em modelos de gestão da classe e de
transmissão da matéria” (TARDIF, 2002: 108).
Por fim, Tardif (2002: 108–111), caracteriza, em síntese, o saber experiencial dos
professores, conforme apresentamos abaixo:
o saber experiencial é um saber ligado às funções dos professores que atribuem
especial importância à experiência;
é um saber prático, pelo fato de a cognição do professor estar condicionada à
prática;
é um saber interativo, pelo fato de o professor interagir com outros atores
educativos;
11
Família, escola, universidade, etc.
57
é um saber sincrético e plural, por repousar sob um repertório de conhecimentos
unificado e coerente, mas sobre vários conhecimentos e sobre um saber-fazer;
é um saber heterogêneo, por ser adquirido a partir de fontes diversas e em lugares
e momentos variados;
é um saber complexo, não analítico, por impregnar comportamentos do ator
(regras e hábitos), quanto a sua consciência discursiva;
é um saber aberto, por integrar experiências novas;
o saber experiencial é personalizado por trazer a marca do trabalhador;
é um saber existencial, por não estar ligado somente à experiência de trabalho,
mas também à história de vida do professor;
é um saber experienciado, por ser experimentado no trabalho, portanto é
consciência no trabalho e modela a identidade de quem trabalha;
é um saber temporal, por se construir no âmbito de uma carreira e de uma história
de vida profissional;
é um saber social, por ser construído pelo ator em interação com diversas fontes
sociais;
Essas características, segundo Tardif, (2002: 111), esboçam uma epistemologia da
prática docente que supera os modelos propostos pelos conhecimentos inspirados na técnica e
na ciência positiva, por ter como objeto o ser humano, cujo processo de realização é
fundamentalmente interativo, e o trabalhador da educação é apresentado com tudo o que ele é,
com sua história, sua personalidade, seus recursos e seus limites. Kincheloe (1997: 222), ao
esboçar as características dos professores s-formais críticos, ainda retrata que os
professores práticos nesta concepção não se submetem a definições autoritárias do papel do
professor.
Como iconoclastas pedagógicos, os professores pós-formais transcendem as
restrições dos papeis tradicionais, estilhaçando estereótipos, encorajando o
desenvolvimento da consciência crítica, gerando novas interpretações, ajudando a
criar novos conhecimentos e sacudindo a confortável hierarquia das escolas.
Recusando a aceitar a ilusão modernista do “self” livre dos laços com uma
58
construção social, os educadores s-formais analisam a produção de suas
subjetividades ao procurarem por uma consciência crítica comprometida (id).
Temos ainda Nóvoa (1992: 26-29) que faz uma crítica aos modelos da racionalidade
técnica para a formação de professores. Para ele, a formação organizada, em torno dos
professores como técnicos, deve ser superada por um modelo emancipador, pelo qual os
professores se assumem como produtores da sua profissão e concebem a escola como um
ambiente educativo, onde trabalhar e formar-se não se tornam atividades distintas.
Para o exercício da profissão docente, o professor precisa valer-se de certas técnicas
e saberes que lhe dão sustentação para garantir a eficácia de seu ato educativo. Determinadas
estratégias docentes não provêm apenas das ciências da educação, mas emergem do contexto
da prática do professor. Tardif, (2002: 137–140), assim as caracteriza: a coerção consiste nos
comportamentos punitivos reais e simbólicos desenvolvidos pelos professores, em interação
com os alunos na sala de aula, bem como pela instituição escolar que impõe certos limites; a
autoridade reside no respeito imposto pelo professor, frente a seus alunos; a persuasão é a
arte de convencer os alunos daquilo que o professor quer transmitir, utilizando-se
principalmente da fala, relacionada a um conjunto de procedimentos lingüísticos, pelos quais
o professor leva os alunos a “partilhar os significados legítimos relativos à ordem física e
simbólica da sala de aula e da escola” (TARDIF, 2002: 140).
O saber-ensinar, no contexto da prática docente, é um dos principais elementos para
o exercício da profissão e, para fazê-lo, o professor remete-o a uma pluralidade de saberes
que, para Tardif (2002: 210) “forma, de um certo modo, um reservatório onde o professor vai
buscar suas certezas, modelos simplificados de realidade, razões, argumentos, motivos, para
validar seus próprios julgamentos em função de sua ação”. Esses saberes são resultados de
processos de raciocínios realizados pela atividade intelectual do docente que, para Tardif,
(2002: 210), acabam-se tornando rotineiros de tanto se repetirem.
As rotinas também são fenômenos de suma importância, a serem consideradas, ao se
tratar da prática do professor, porque elas permitem que a complexidade das situações seja
compreendida, utilizando-se de um menor investimento cognitivo para o controle dos
acontecimentos. Elas se tornam, segundo Tardif, (2002: 216)
parte integrante da atividade profissional, constituindo, desse modo, ‘maneiras de
ser’ do professor, seu ‘estilo’, sua ‘personalidade profissional’[...], o fato de uma
59
atividade ser rotineira é um recurso fundamental da ação que torna possível a sua
reprodução pelo mesmo ator.
Assim, ao agir profissionalmente, o professor é forçado a tomar decisões e fazer
escolhas, utilizando-se de saberes que não se limitam a saberes empíricos, mas a resultados de
vários tipos de juízos “ligados a tradições escolares, pedagógicas e profissionais que ele
mesmo assimilou e interiorizou [...], bem como [...] em sua ‘experiência vivida’ como fonte
viva de sentido a partir da qual o passado lhe permite esclarecer o presente e antecipar o
futuro” (TARDIF, 2002: 211).
Buscando uma síntese do entendimento dos saberes que os professores possuem e
(re)constroem, entendemos que o trabalho docente, assim como todo trabalho humano, requer
certos saberes específicos para concretizar-se no contexto da prática. Esses saberes são
considerados específicos, por serem partilhados somente pelo grupo de professores em ofício.
Tardif, (2002: 217) assim os define: “esse repertório de saberes não se refere a saberes
intemporais e universais”, e assegura ainda que os saberes dos professores dependem
intimamente das condições sociais e históricas, nas quais eles exercem seu ofício e,
principalmente, das condições que estruturam seu próprio trabalho em um lugar social
determinado. Assim, pode-se afirmar que os saberes dos professores estão ligados ao trabalho
docente no ambiente escolar e resultam de duas fontes: uma delas é a cultura profissional que
está disponível para o grupo de professores, e a outra provém do valor pessoal que o próprio
sujeito constrói e atribui a si mesmo. Portanto, o caráter específico da profissão que depende
de fenômenos concretos é assim apresentado por Tardif, (2002: 219):
1º) eles são adquiridos principalmente no âmbito de uma formação específica e
relativamente longa na universidade; 2º) sua aquisição é acompanhada de uma certa
socialização profissional e de uma experiência do ramo; 3º) são usados numa
instituição a escola que possui um certo número de traços originais; 4º) são
mobilizados no âmbito de um trabalho – o ensino – que também possui certas
características específicas.
A origem do saber profissional dos professores, como acabamos de mencionar, tem
seu fundamento inicial numa longa formação universitária e deve ter sua validação no
contexto de sua prática docente. Portanto, a formação dos professores não segue um modelo
unívoco. várias orientações teóricas que a influenciam, destacando nelas posturas
singulares que acabam marcando a prática profissional do docente. São essas características
60
diferenciadas de formação docente que são objeto de nosso próximo item e que passaremos a
explicitar.
2.2 Modelos de professores no contexto da formação docente
Este texto destina-se a discutir os modelos de professores que se fazem presentes em
cursos de formação de professores, tendo Contreras (2002) como referência, subsidiado pelas
contribuições de Giroux (1997), Kincheloe (1997), Perez Gómez (1992). Assim, de acordo
com o modelo em que o professor é representado pela formação, revela-se também a
dimensão da sua autonomia profissional.
2.2.1 O professor como profissional técnico
As concepções que se fazem presentes no ensino é que delineiam as diferentes
formas de se entender a autonomia profissional do professor que se configura em sua prática
docente.
O modelo mais tradicionalmente utilizado, no exercício da docência e na relação
entre pesquisa e conhecimento, é o da racionalidade técnica. Trata-se de uma concepção
epistemológica da prática, herdada do positivismo, sendo muito defendida ao longo do século
XX e tida como referência dos docentes (GÓMEZ, 1992: 96). Para Contreras, (2002: 90) a
idéia básica desse modelo é que
a prática profissional consiste na solução instrumental de problemas mediante a
aplicação de um conhecimento teórico e técnico, previamente disponível, que
procede da pesquisa cientifica. É instrumental porque supõe a aplicação de técnicas
e procedimentos que se justificam por sua capacidade para conseguir os efeitos ou
resultados desejados.
A prática profissional, nesses termos, é entendida como a oportunidade de aplicação
de conhecimentos validados pela ciência que, para Contreras (2002: 91), é uma
“aplicação de
meios disponíveis a fins definidos”.
E, nessa mesma perspectiva, Shein (apud CONTRERAS,
2002: 91), também identifica alguns elementos que compõem o conhecimento profissional
nessa racionalidade:
61
a) a prática se apóia e desenvolve-se em uma ciência ou disciplina básica, isto é, nos
conhecimentos elaborados pela ciência.
b) O cotidiano do professor é caracterizado por uma ciência aplicada ou de engenharia,
é desta que provêm os procedimentos cotidianos tomados pelo professor.
c) Um elemento que diz respeito à capacidade em estar a serviço de seu cliente, chamado
de habilidade e atitude, e consiste em saber articular os conhecimentos científicos com
a necessidade cotidiana.
Neste sentido, Giroux (1997: 158), ao explicitar esta concepção, tratando da
separação entre os conhecimentos e os professores que assumem o status de
“técnicos
especializados dentro da burocracia escolar”
, chama-a de
“proletarização do trabalho docente”.
Para
ele, a função do professor nessa perspectiva, torna-se administrar e implementar os programas
curriculares exteriores ao seu contexto, ao invés de
“apropriar-se criticamente de currículos que
satisfaçam objetivos pedagógicos específicos”.
Portanto, ciência aplicada que supõe o
desenvolvimento de estratégias e procedimentos para diagnóstico e solução de problemas que
tem afetado o desempenho profissional pelos seguintes motivos, assim como nos aponta
Contreras, (2002: 91-94). Desse modo, em primeiro lugar,
a relação que se estabelece entre a prática e o conhecimento é hierárquica: as
habilidades práticas são necessárias para a realização de técnicas, as quais derivam
do material disponível da ciência aplicada, que por sua vez, se fundamenta nas
contribuições que a ciência básica realiza (2002: 91-92).
Essa ordem de dependência necessita prioritariamente da elaboração prévia de
recursos técnicos e de conhecimentos básicos que são produzidos em um outro contexto
institucional. A divisão do trabalho aqui é explicitada pelo reconhecimento e pelo status
social entre os que produzem os diferentes tipos de conhecimento e os que os aplicam.
Assim, como menciona Gómez (1992: 97), a racionalidade técnica impõe, pela sua
“natureza da produção do conhecimento, uma relação de subordinação dos níveis mais
aplicados e próximos da prática aos níveis mais abstratos de produção do conhecimento”.
Nesses termos, “o currículo profissional é um reflexo da hierarquia de subordinação do
aprendizado prático ao teórico” (CONTRERAS, 2002: 92), em que o aprendiz recebe os
saberes da formação e aplica-os sem uma prévia reorganização. Neste sentido, Giroux (1997:
62
159) chama essa ideologia instrumental, de abordagem tecnocrática”, posto que, para ele, as
suposições pedagógicas incluem:
O apelo pela separação de concepção de execução; a padronização do conhecimento
escolar com o interesse de administrá-lo e controlá-lo; e a desvalorização do
trabalho crítico e intelectual dos professores e estudantes pela primazia de
considerações práticas.
Em segundo lugar,
a consideração da prática profissional como aplicação de procedimentos e meios
técnicos para conseguir determinados fins entende a ciência aplicada como a
formulação de regras tecnológicas, segundo as quais se estabelecem aqueles
procedimentos de atuação que o lugar a determinados resultados desejados
(CONTRERAS, 2002: 93).
Sendo assim, uma ão sobre os objetos, esperando deles resultados desejados,
uma ação instrumental sobre os objetos. A ação profissional e o conhecimento prático
estabelecem-se por ações técnicas, ficando à margem dos contextos humanos e sociais nas
quais essas práticas ocorrem. O modelo positivista é que sustenta tal prática.
Em terceiro lugar, a elaboração desse conhecimento técnico é possível na medida em
que se considera que os fins são fixos e bem definidos (CONTRERAS, 2002: 94). Só se
aplicam meios para fins bem definidos, objetivados, sem possibilidades para interpretações
subjetivadas. Para Giroux (1997: 159), a formação de professores com essa orientação é de
ênfase behaviorista e perde de vista o interesse pela análise dos problemas escolares,
pregando metodologias que negam a necessidade do pensamento crítico. Além do mais,
em vez de aprenderem a levantar questões acerca dos princípios que subjazem os
diferentes ‘métodos didáticos, técnicas de pesquisa e teorias da educação, os
estudantes com freqüência preocupam-se em aprender o ‘como fazer’, ‘o que
funciona’ ou o domínio da melhor maneira de ensinar um ‘dado’ corpo de
conhecimento (GIROUX, 1997: 159).
Comungando com Kincheloe (1997: 190), destacamos o fato de que professor, com
orientação da postura como apresentamos acima, torna-se um profissional não crítico e
apenas um aplicador instrumental de programas curriculares criados fora de seu contexto de
trabalho.
63
Para esse autor, a pesquisa-ação
12
não crítica dirige
a aplicação das informações acumuladas de uma investigação para serem
aplicadas em situações especificas de sala de aula; um estilo tipo livro de
receitas do pensamento formal é, então, encorajado, caracterizado por
professores seguidores de receitas.
Para esses professores, a prática docente torna-se nula de racionalidade e autonomia,
porque o material didático utilizado é elaborado nas instâncias superiores do contexto escolar,
material este que se torna instrucional, por conter os conteúdos didaticamente definidos e
organizados de forma que, seqüencialmente, sejam introjetados nos alunos através de
metodologias previamente conferidas.
A dependência profissional do professor na postura técnica
O reconhecimento que os professores possuem como profissionais, sob a concepção
do professor como um técnico, está baseado em seu domínio técnico para a solução de
problemas “no conhecimento dos procedimentos adequados de ensino e em sua aplicação
inteligente(CONTRERAS, 2002: 95). Todos esses conhecimentos têm seu fundamento na
bagagem do conhecimento pedagógico disponível, elaborado pelos especialistas, por meio das
ciências, e o conhecimento pedagógico mais relevante é aquele que estabelecem quais são os
meios mais eficientes para alcançar alguma finalidade predeterminada.
O docente, nesse modelo, “não dispõe em principio das habilidades para a elaboração
das técnicas, mas apenas para sua aplicação” (CONTRERAS, 2002: 96). Assim, o professor
não fica dependente de um conhecimento que não elabora, mas também da sua finalidade,
assumindo as técnicas pré-estabelecidas e suas mesmas finalidades. Trata-se de uma atividade
dirigida para alcançar resultados ou produtos predeterminados.
O professor é, assim, um profissional técnico, cuja ação consiste em aplicar decisões
técnicas. O professor, no exercício da prática, ao definir qual sua prioridade, seleciona no
repertório de conhecimentos o que mais se adapta à situação formulada e aplica-o. Desse
modo, para Contreras, (2002: 97), “o pressuposto que aqui se manipula é que o conhecimento
12
Pesquisa-ação é aqui entendida como definido por Kincheloe (1997: 180), pela qual o sujeito é induzido a
pensar sobre o seu próprio pensamento, em relação à sua aplicabilidade para a seleção de diferentes espectros,
para ajudar a determinar as condições de seu próprio trabalho.
64
pedagógico disponível dirige a prática, proporcionando os meios para reconhecer os
problemas e soluciona-los”. O limite da ação profissional do professor reside no fato de
conviver com dilemas, na prática com seus alunos, e ter de solucioná-los, de acordo com o
conhecimento pedagógico disponível e que melhor se aplique à situação.
Não é um conhecimento específico, produzido para resolver tal problema na
particularidade, pelo fato de que o conhecimento disponível é generalizante em vários
contextos. Dessa maneira, a relação do conhecimento com o professor é neutra, pois os
professores, como afirma Kincheloe (1997: 182), são considerados “funcionários não
qualificados” para produzir saberes específicos de sua prática e “o papel do professor como
um transmissor neutro de fatos pré-arranjados não é entendido como um papel político”
(1997: 184), em que a prática torna-se uma oportunidade de aplicação de teorias ou
conhecimentos produzidos paralelamente a ela, e não como uma possibilidade de interferência
política do professor.
Superar os limites impostos pela racionalidade técnica supõe agir de modo que
compreenda além dos problemas e dilemas educacionais, de forma previamente estruturada,
assim como, nessa concepção, é compreender que os problemas não se resolvem por meio de
repertório técnico de possíveis soluções e formas de tratamento.
Os professores devem entender as situações no contexto específico em que se
apresentam e na sua singularidade, e também devem tomar decisões que nem sempre
refletem uma atuação que se dirige a um fim, senão manter aberta a interpretação a
diferentes possibilidades e finalidades, encontrar respostas singulares e às vezes
provisórias, para casos que não havia previsto nem imaginado (CONTRERAS,
2002: 98).
O ato de educar exige arte, improvisação, recursos criativos, intuição, tentativas, etc,
e não apenas a execução de regras e procedimentos técnicos. Exige a imparcialidade do
professor, frente aos problemas e aos conhecimentos acumulados, superando a pedagogia que
Giroux (1997) identifica como
“o comportamento dos professores precisa ser controlado”
(1997:
160) e supor que os professores têm a função de
“repensar e reestruturar a natureza da atividade
docente, (...) como intelectuais transformadores”
(1997: 161).
65
A negação da autonomia profissional
O professor, como um profissional técnico, tem a sua autonomia negada pela própria
organização do sistema. Ele se torna o que Elliott (apud CONTRERAS, 2002: 100) chama de
expert infalível”, aquele tipo de professor que tem uma preocupação maior pelo rigor que
pela relevância; sua prática vem estabelecida pelo seu ponto de vista, sem flexibilidade ou
sensibilidade para adaptar-se às situações. Sua decisão é inquestionável, unilateral. Assim,
afirma Contreras, (1997: 101)
“as capacidades que se associam à ação autônoma, como a
deliberação e o juízo, ficam aqui reduzidas a um conjunto de habilidades e regras que devem ser
seguidas”.
A autonomia do professor sobre sua prática fica minimizada, tendo ele de ficar a
mercê de objetivos sobrepostos nas instâncias superiores.
Por vezes, esses modelos de regras, objetivos e habilidades não chegam a se
concretizar na prática profissional, por esses conhecimentos serem aplicados pelo “expert
infalível”, muitas vezes de forma intuitiva, baseando-se no senso comum que é partilhado na
cultura profissional e acaba executando a prática de forma que julga conveniente. Isso ocorre
porque o professor, como mero aplicador, não necessita de sólida formação teórica,
metodológica e didática, apenas como afirma Gómez (1997: 98), bastam-lhe dois
componentes: um científico-cultural que lhe assegura o conhecimento do conteúdo a ensinar,
e outro psicopedagógico que lhe permite aprender como atuar eficazmente na sala de aula.
Para Contreras, (2002: 101)
desse modo, predominam os estereótipos, as visões pré-fixadas e dominantes,
como padrões para os juízos e decisões profissionais, constituindo a socialização
profissional um modo dominante por meio do qual se aprende na prática a relação
entre a definição das situações e os modos de atuação.
Os objetivos do ensino, assim, não se tornam uma construção processual de quem os
irá perseguir; ficam aquém de um processo racional e a mercê de políticas educativas e
pensamentos dominantes para os quais a ciência trabalha, visando alcançar os fins esperados.
O conhecimento pedagógico, que debateria a forma de consecução de fins
estabelecidos, não entra em questão. Este processo racional é utilizado apenas para
desenvolver os meios em função dos fins estabelecidos. Desse modo,
“as políticas públicas
ficam fora de todo o debate, ao serem fixadas como razões cientificas ou técnicas”
(2002: 102).
66
Portanto, os especialistas e acadêmicos dedicam-se à difusão de novas iniciativas curriculares
e produção de materiais curriculares, enquanto aos professores cabe a aplicação dos novos
processos e materiais para alcançar objetivos oficiais.
Na prática, a fixação de objetivos externos causa conseqüências contraditórias
porque, no contexto da prática, cada situação exige uma interpretação singular, em que o
educador elabora seu próprio juízo sobre o que deve, ou não, fazer e exceder a delimitação
oficial de objetivos, superando o que a racionalidade técnica limita, a incapacidade de tratar e
resolver tudo o que é imprevisível.
2.2.2 O professor como profissional reflexivo
A racionalidade técnica revela-se como uma incapacidade em resolver as questões
problemáticas e voláteis que perpassam o processo educacional. O processo pedagógico, ao se
limitar a cumprir procedimentos estabelecidos por órgãos exteriores ao contexto, acaba
negando aos professores a possibilidade de reflexão.
Assim, torna-se importante resgatar a base reflexiva da atuação profissional dos
agentes educacionais, objetivando compreender a forma pela qual se abordam as situações
problemáticas da prática docente.
A idéia do profissional reflexivo é desenvolvida por Shön, (apud
CONTRERAS, 2002: 106). Essa idéia
trata justamente de dar conta da forma pela qual os profissionais enfrentam aquelas
situações que não se resolvem por meio de repertórios técnicos; aquelas atividades
que, como o ensino, se caracterizam por atuar sobre situações que são incertas,
instáveis, singulares e nas quais há conflitos de valor.
para Duarte (1998: 57), a noção de professor, como prático reflexivo de Shon, é
baseada na premissa de que, na prática profissional dos professores, há um saber de referência
que se constitui de um amplo leque de eventos experienciados e armazenados em sua
memória, podendo ser mobilizados e reorientados em situações que se assemelham
futuramente, traduzindo-se, assim, na aquisição de novos saberes. Gómez (1997: 102) chama
esses saberes de conhecimento tácito que está presente na vida cotidiana de qualquer
profissional prático que o mobiliza e elabora-o, durante sua própria ação.
67
A prática cotidiana do professor é perplexa, por conter conhecimentos sobre os quais,
muitas vezes, não possui um real controle. Por vezes, são executados sem reflexão, antes de
sua execução. Na maioria das vezes, esses conhecimentos são descobertos durante o contexto
da ação, assim
“o conhecimento não precede a ação, mas, sim, está na ação (...), o conhecimento não
se aplica à ação, mas está tacitamente personificado nela. Por isso é um conhecimento na ação”
(CONTRERAS, 2002: 107).
Para Alarcão (1996: 16), o conhecimento na ação
é o conhecimento que os profissionais demonstram na execução da ação; é
tácito e manifesta-se na espontaneidade com que uma ação é bem
desempenhada. (...) É difícil ao profissional falar deste conhecimento.
Todavia, se necessário ele consegue descrevê-lo. (...) Estas descrições são
sempre construções pessoais, de caráter estático, porque diferidas no tempo.
Quando somos surpreendidos por algo que nos afasta das situações habituais, quando
pensamos sobre o que fazemos, ou pensamos enquanto fazemos algo, Shön denomina esse
processo de reflexão na ação. “Supõe uma reflexão sobre a forma com que habitualmente
entendemos a ação que realizamos, que emerge para podermos analisá-la em relação à
situação na qual nos encontramos, e reconduzi-la adequadamente” (CONTRERAS, 2002:
107). Para essa concepção, o profissional passa por uma gama de experiências diferenciadas
que exigem dele tomada de decisões. A cada nova decisão a ser tomada, reporta-se às
anteriores para identificar semelhanças e, assim, desenvolve-se um repertório de expectativas,
imagens e técnicas que serve de base para suas decisões. Seu conhecimento torna-se cada vez
mais espontâneo, na medida em que sua prática se torna mais repetitiva. É o conhecimento
que está na ação e que, nas palavras de Pimenta (2002: 20), “é mobilizado pelos profissionais
no seu dia-a-dia, configurando num hábito”.
A reflexão torna-se necessária, perante a necessidade de resposta ao não cotidiano, à
situação incomoda para “confrontar seu conhecimento prático com a situação para a qual o
repertório disponível de casos não lhe proporciona uma resposta satisfatória” (CONTRERAS,
2002: 108). Refletir, constantemente, sobre a prática requer do profissional a criação de novas
perspectivas, requer o entendimento dos problemas, de novas maneiras, requer entender cada
situação de uma forma diferente, independentemente de que a solução possa ser a mesma.
A prática não se torna um processo de resolução de problemas, de acordo com
determinados fins, mas abre-se à reflexão a respeito dos fins aos quais se destina. Assim, o
68
profissional torna-se um “pesquisador no contexto da prática” (CONTRERAS, 2002: 108),
não necessitando mais de teorias e técnicas preestabelecidas; a partir do repertório dos
conhecimentos que possui e que não dão conta de novas situações, faz novas buscas,
contextualizações, problematizações, análises e estabelece um diálogo com outras
perspectivas, praticando aquilo que Shön chama de reflexão sobre a reflexão na ação e,
posteriormente, de professor pesquisador (PIMENTA, 2002: 20).
A prática da reflexão não se encaixa em contextos institucionais de burocratização e
de controle, pois, nesse caso, o profissional questiona a definição de sua própria tarefa,
levando-a na direção que lhe pareça melhor. Os fenômenos de sua reflexão são, portanto,
resultantes de sua própria ação.
A prática não é mais entendida como um momento de aplicação de procedimentos
não subjetivos por parte de quem a executa, e tampouco o conhecimento profissional é
instigado somente em situações inesperadas, mas a prática supõe
um sistema valorativo que também começa a se tornar explícito, a desenvolver sua
significação e a redefinir seus limites quando se está obrigado a tomar decisões que
superam os limites do que se considera aceitável, quando se analisa o alcance social
de suas próprias ações, ou quando se está em situações de dilemas ou conflitos
valorativos para as quais os critérios existentes se mostram insuficientes
(CONTRERAS, 2002: 112).
Para Shön, afirma Contreras (2002), a prática profissional se compara com a atuação
artística, em que o professor tem que colocar em jogo simultaneamente todas as suas
qualidades, sem remeter-se ao inexplicável ou ao irracional.
2.2.3 O professor como pesquisador
Em oposição ao modelo da racionalidade técnica, temos Stenhouse que propõe a
idéia do “professor como pesquisador” (CONTRERAS, 2002: 114). Para ele, o ensino é uma
arte “que significa a expressão de certos valores e de determinada busca que se realiza na
própria prática do ensino (...), os docentes são como artistas, que melhoram sua arte
experimentando-a e examinando-a criticamente (2002: 114). Os professores buscam e
experimentam novas situações de ensino, na procura de processos que revelam um maior
69
potencial educativo, e cada situação educativa possui sua singularidade, na qual é impossível
a uniformização dos processos educativos.
Para Stenhouse, reforça-se a idéia do professor-pesquisador, de sua prática,
afirmando que é sobre os critérios implícitos em sua prática que os professores devem refletir.
Para ele, a docência é “um hábito”, pois as habilidades e disposições estão assimiladas de tal
forma pelo docente, que a prática não necessita de ser guiada de forma consciente para ser
executada com domínio. Essa prática, para ser aperfeiçoada, deve tornar-se consciente
(CONTRERAS, 2002: 117-118).
Quanto aos modelos pedagógicos, estes são possibilidades que devem ser
experimentadas de tal forma que se possa rever a prática, bem como as idéias pedagógicas,
com base naquilo que a prática revela. Assim, o currículo é sempre reinterpretado e adaptado,
estando, assim, sempre em processo de construção. Para Contreras (2002: 119), “o professor
como pesquisador de sua prática, transforma-a em objeto de indagação dirigida à melhoria de
suas qualidades educativas”. Desse modo, o professor tem a possibilidade de desenvolver seu
próprio pensamento e transformar as propostas de ensino, de acordo com suas necessidades,
recusando, como afirma Kincheloe (1997: 185),
os ditames do currículo oficial” e “como produtores de conhecimento, estes
professores começam a construir currículos em torno da experiência do aluno,
promovendo o entendimento destes sobre as forças sociais, econômicas e culturais
que tem moldado suas vidas. Os alunos são ensinados nas formas de investigações
etnográficas, semióticas, fenomenológicas e historiográficas, no processo de
aprender a desconstruir as forças ideológicas que moldam suas vidas.
Elliott (apud CONTRERAS, 2002: 122) aborda a teoria e a prática no processo
reflexivo, expressando que “constitui um processo dialético de geração da prática a partir da
teoria e da teoria a partir da prática”. No entanto, o processo reflexivo não se pode dar fora do
contexto da prática, assim como nos aponta (CONTRERAS, 2002: 128), “é que a deliberação
ou a reflexão sobre a relação entre as exigências de uma situação particular e o que é
adequado para ela é algo que não pode vir decidido por nenhuma instancia alheia aos que a
praticam”.
A definição dos valores educativos, elaborados na racionalidade técnica dos
currículos estado, aqui toma outra conotação, uma vez que é na prática docente cotidiana
que se podem realizar os valores, cujos significados são questionados. Assim, os docentes
70
reflexivos, ao deliberarem sobre sua prática, adotam decisões que estão em consonância com
seus valores, com suas próprias perspectivas; em suma, trilham o percurso de profissionais
portadores de autonomia para decidirem, por si mesmos, os rumos de sua ação e compreensão
de sua prática (ELLIOTT, 1994: 197).
E, ao se tratar da autonomia profissional, para essa concepção, reside nisso sua
limitação, pois atribui a total responsabilidade pelas decisões apenas aos docentes, excluindo
a comunidade da participação nas decisões educativas. Assim, conforme essa concepção, esse
profissional delibera, de forma unilateral, sobre os problemas que são plurais e não podem ser
abstraídos do contexto social em que ocorrem, tendo em vista o princípio da neutralidade de
procedimento (ELLIOTT, 1994:198). Partindo desse ponto de análise,
a deliberação prática e o julgamento profissional autônomo se realizam no contexto
dos elementos que intervêm na reflexão, e nela participa o conflito ideológico ou a
contradição de interesses que se desenvolve publicamente (ELLIOTT, 1994: 131).
Para ele, a conquista, pelo docente, de sua autodireção de aprendizagem e de ação
prática implica a própria atividade autônoma de estudo e reflexão, e não de ensino.
O modelo de professor reflexivo, de Schön, e o modelo de professor pesquisador, de
Stenhouse, convergem, entre si, ao atribuírem ao professor a responsabilidade de concentrar
esforços e atenção na prática docente, na perspectiva de compreendê-la, buscando sua
ressignificação.
2.2.4 O professor: do reflexivo ao intelectual crítico
A grande contribuição da perspectiva que trata dos professores, como profissionais
reflexivos, deu-se, no sentido de rejeitar a aplicação do conhecimento científico, de forma
inquestionável, à solução de problemas da prática, assinalando que há sempre uma valoração
pela qual se identificam algumas situações como problemáticas, movendo-se sempre em
incertezas e dilemas que necessitam de racionalização.
Para Contreras (2002: 134), a concepção do professor, como um profissional
reflexivo, tem avançado na literatura, de forma até ambiciosa, em considerar o professor
71
como um intelectual crítico, sem renunciar à pretensão reflexiva e que se propõe, como afirma
Kincheloe (1997: 188), não só a descrever a prática, mas a mudá-la.
A reflexão sobre a prática não se identifica apenas com um pensamento não
rotineiro, de acordo com o que propuseram Shön e Stenhouse (apud CONTRERAS, 2002:
137):
1) os professores reflexivos elaboram compreensões específicas dos casos problemáticos;
2) é um processo que inclui a deliberação sobre o valor educativo das situações, a
meditação sobre as finalidades, a realização de ações práticas consistentes com as
finalidades e valores educativos, e a valorização argumentada de processos e
conseqüências;
3) isso conduz ao desenvolvimento de qualidades profissionais com: a) a construção de
um conhecimento profissional específico; b) a capacidade para desenvolver-se nessas
situações de conflito e incertezas da profissão.
4) A perspectiva reflexiva aplicada aos docentes refere-se à capacidade de deliberação
moral sobre o ensino.
O uso da concepção dos docentes, como profissionais reflexivos na literatura atual,
não é um fenômeno casual nesse contexto de reformas educacionais, mas cumpre um papel de
legitimação dessas reformas - como apontado por Giroux (1997: 161) - de tratarem os
professores como intelectuais, o que favorece uma crítica teórica das ideologias
instrumentais e tecnocráticas, bem como a implementação e execução dos currículos,
passando para a ênfase de que
“os professores devem assumir responsabilidade ativa pelo
levantamento de questões sérias do que ensinam, como devem ensinar, e quais são as metas mais
amplas pelas quais estão lutando”
.
Alguns limites do professor reflexivo
Segundo Contreras (2002: 143), Stenhouse também é criticado, em face de sua
concepção de professor como pesquisador. “Uma das acusações que lhe foram feitas é que em
seu trabalho sempre esteve ausente uma compreensão crítica do contexto social no qual se
desenvolve a ação educativa”. Para esse autor, as idéias educativas deveriam se traduzir de
72
forma prática e experimentada em sala de aula. Aquela que fosse considerada melhor é que
seria a mais utilizada pelo docente. A sala de aula seria o lugar de experimentação e pesquisa
onde o docente teria, individualmente, o desafio de encontrar as aspirações educativas. Um
grande avanço está também na autonomia do professor que aspira à possibilidade de
libertação da dependência de pesquisadores, funcionários, ou inovadores, não estando mais
submetido a essas instâncias. Mas, nessa alternativa, incorre-se em um outro problema, como
aponta Pimenta (2002: 27), mediante o que os professores se tornam autores isolados.
Para desenvolver qualidades educativas que superem o exposto acima, não basta
olhar o sistema somente por dentro da sala de aula, pois a prática a excede. Grundy, (apud
CONTRERAS, 2002: 146) nos ensina que:
não se pode limitar a concepção do professor pesquisador à reflexão sobre sua
prática, a partir da qual o conhecimento que implicitamente a guiava se torna
consciente. É necessário dispor de uma teoria com que se possa entender quais são
as restrições que a prática institucional impõe às nossas próprias concepções sobre o
ensino, de maneira que desperte o potencial transformador que esta deve ter.É
necessário desenvolver uma consciência crítica a partir da qual se podem detectar
aqueles limites que, em nossa consciência, não se dirigem a possibilidade de
emancipação, e reconhecer as práticas escolares que estão guiadas por interesses de
dominação.
Essa consciência crítica, segundo Elliott, (apud CONTRERAS, 2002: 147) não
necessita de fontes teóricas externas para ser gerada, pois sua possibilidade já está implícita na
capacidade que o professor-pesquisador tem de gerar o pensamento crítico, a partir de suas
reflexões sobre as ambigüidades, conflitos e tensões que existem na compreensão que eles
possuem do ensino e de seu contexto de realização. Os próprios docentes possuem pré-
condições para iniciar um processo reflexivo, partindo das contradições de sua prática e de
seus conhecimentos, decorrentes de sua formação e de sua própria prática; o que lhes falta é
deixar de serem personagens isolados, como expressa Stenhouse (apud CONTRERAS, 2002:
148), e passarem a desempenhar o papel de um artista na sociedade, buscando entender o
contexto que lhe proporcionam as situações.
73
As limitações da reflexão nas práticas institucionais dos professores e as perspectivas de
superação pela crítica teórica
Os professores constroem seu papel no contexto de suas escolas. Essa construção
torna-se parte de sua identidade e é influenciada pela instituição da qual fazem parte. A
definição do ensino também responde às expectativas dessa instituição que possui as
pretensões, uma história, rotinas e estilos estabelecidos. Os docentes se introduzem numa
cultura com a qual aprendem a conviver.
Essa socialização do docente com a instituição da qual faz parte foi estudada por
Lortie (apud CONTRERAS, 2002: 149) que detectou determinadas orientações que os
professores desenvolvem em seu trabalho, tais como: presentismo (concentração de esforços
nos planos de suas próprias aulas, a curto prazo); conservadorismo (evitam qualquer
discussão, reflexão ou compromisso com mudanças que possam afetar o contexto do que
fazem, ou debater sobre o que ensinam e como fazem); e individualismo (rejeição a colaborar
com os colegas e medo de julgamentos e críticas que possam advir em conseqüência). Desse
ponto de vista, podemos entender que os professores se encontram com poucas facilidades
para, por si mesmos, desenvolverem postura crítica com relação à instituição e a seu trabalho,
por não considerarem os colegas com os quais convivem no cotidiano, executando as ações,
individualmente, e respondendo apenas às proposições legitimadas pela instituição.
Assim, os docentes não assumem responsabilidades, mas fazem de seu cotidiano uma
prática de procedimentos de solução para problemas imediatos, uma ação cnica de
cumprimento de normas. Para Contreras (2002, 150-155), os docentes precisam assumir
responsabilidades, refletir sobre seus problemas e tomar posição a curto e a longo prazo. Sua
prática deve ser uma ação intencional, planejada, na busca de um fim que não se completa em
si mesmo, na qual os professores preparam seus alunos para serem adultos com capacidades
de juízos maduros.
A instituição escolar com seus procedimentos educativos deve sustentar que
questionar, debater, assumir riscos e erros desenvolve a capacidade de pensamento nas
pessoas, desenvolve as crianças com total responsabilidade, não se restringindo aos tipos de
condutas pré-estabelecidas. A escola proporciona oportunidades iguais para a população
escolar de uma sociedade pluralista e multinivelada e compreende a educação como pública
74
que sustenta a democracia, desenvolvendo a capacidade do pensamento crítico e o equilíbrio
de alternativas inteligentes.
Ao professor é dado crédito para que, por si mesmo, possa gerir a complexidade de
seu cotidiano educativo, não necessitando de racionalização externa e controle. Ele, também,
não fica excluído das decisões fundamentais sobre o ensino. Suas decisões vão além da sala
de aula, resultando, assim, numa prática coerente entre as finalidades educacionais e a forma
pela qual encontra seu trabalho definido.
O professor não pode ficar voltado somente para o contexto de sua sala de aula, ou
fechar sua reflexão somente sobre seu trabalho em classe. Ele necessita ir além disso, para ter
compreensão teórica dos vários elementos que compõem sua prática e dos quais pode não ter
consciência.
Alguns professores, em função dos limites impostos pela instituição educacional,
acabam analisando e interpretando as situações que vivenciam no ensino, a partir dos
elementos de compreensão que seu contexto mais próximo lhes proporciona. Isso os conduz à
fragilização de sua prática e submissão a autoridades burocráticas. Assim,
“a reflexão dos
docentes, deixada a seu próprio curso, pode-se encontrar impedida de ir além de seus próprios limites,
isto é, de ir além da experiência e dos círculos viciosos nos quais se encontra atada”
(CONTRERAS,
2002: 156). Para superar essa situação, os professores necessitam de uma análise crítica e,
para isso, precisam dispor de um modelo teórico de análise para compreender a situação em
que se encontram e transcender os limites em que o trabalho está inscrito, bem como superar a
visão meramente técnica de separação entre a concepção e a execução, para uma perspectiva
crítica de que, para Kincheloe (1997: 186), a auto-análise reflexiva dos humanos e o
conhecimento de mundo levam à ação, o que equivale a um ver a si mesmo e o mundo, a
partir de novos ângulos.
Uma prática na perspectiva crítica supõe, tal como propõe Smyth (apud
CONTRERAS, 2002: 157):
começar a perguntar-se sobre o que deveria ser um ensino valioso e por que, e não se
limitar apenas às perguntas sobre o como, (...) é preciso que os professores
intelectualizem seu trabalho, isto é, questionem críticamente sua concepção da
sociedade, da escola e do ensino, o que significa não assumirem a
responsabilidade pela construção e utilização do conhecimento teórico, mas também
terem o compromisso de transformação do pensamento e da prática dominantes.
75
O trabalho do professor torna-se uma função intelectual, na qual as práticas se
relacionam com o conhecimento socialmente construído, e este tem a finalidade de contribuir
para a compreensão dessas práticas de forma emancipatória.
2.2.4.1 A formação docente na perspectiva do intelectual crítico
Foi Giroux (1997: 162) que melhor desenvolveu a idéia dos professores como
intelectuais e, entendendo o trabalho deles como uma tarefa intelectual, propõe a função dos
professores como ocupados em uma prática intelectual crítica, relacionada com a vida diária e
que devem desenvolver juntamente, com seus alunos, as bases para a crítica e a transformação
das práticas sociais que se constituem ao redor da escola. Para esse autor,
“as escolas são
lugares que representam formas de conhecimento, práticas de linguagem, relações e valores sociais
que são seleções e exclusões particulares da cultura mais ampla”.
A concepção que Giroux aponta, segundo Contreras (2002: 158), está ligada a idéia
de “autoridade emancipadora”. Assim,
entende que os docentes têm por obrigação tornar problemáticos os pressupostos por
meio das quais se sustentam os discursos e valores que legitimam as práticas sociais
e acadêmicas, valendo-se do conhecimento crítico do qual são portadores, com o
objetivo de construir um ensino dirigido à formação de cidadãos críticos e ativos.
Para Giroux, segundo Contreras, a autoridade emancipadora está associada às idéias
de liberdade, igualdade e democracia. Os docentes são encarados como intelectuais
transformadores” (GIROUX, 1997: 161) que significa para ele,
ajudar os estudantes a adquirir um conhecimento crítico sobre as estruturas sociais
básicas, tais como a economia, o Estado, o mundo do trabalho e a cultura de massa
(...) uma transformação dirigida à progressiva humanização da ordem social
(CONTRERAS, 2002: 159).
[...] encarando os professores como intelectuais, nós podemos começar a repensar e
reformar as tradições e condições que tem impedido que os professores assumam
todo seu potencial como estudiosos e profissionais ativos e reflexivos. Acredito que
é importante não apenas encarar os professores como intelectuais, mas também
contextualizar em termos políticos e normativos as funções sociais concretas
desempenhadas pelos mesmos (GIROUX, 1997: p.162).
O professor que busca essa prática precisa, muito mais que o ensino institucional
escolar, abrir-se para outros grupos e práticas sociais que estejam compromissadas com a
76
contestação popular ativa. Os professores também devem exercer um papel extremamente
ativo, procurando excluir do poder as instituições, grupos políticos e econômicos que possam
ter excessiva influência prejudicial aos currículos e políticas educacionais na busca dessa
ordem social de humanização e reconstrução (CONTRERAS, 2002: 159-160).
2.2.4.2 A possibilidade de emancipação do professor intelectual pela reflexão crítica
A crítica por si mesma não tem seu alcance, enquanto prática de emancipação, se não
for favorecida pela reflexão, pois esta última amplia seu alcance. A crítica não pode ser vista
como um processo de pensamento sem orientação, pois
ela tem um propósito muito claro de definir-se diante dos problemas e atuar
conseqüentemente, considerando-os como situações que estão além de nossas
próprias intenções e atuações pessoais, para incluir sua análise como problemas que
têm origem social e histórica (CONTRERAS, 2002: 163).
A prática reflexiva não se na neutralidade histórica da humanidade, tampouco é
um trabalho individualista da mente. Ela está carregada de valores das teias sociais e tem
como principal meta reconstituir a teia social, tendo como referência os preceitos da
humanização libertadora. O professor sua prática e a escola com um olhar mais aguçado,
buscando compreender os condicionantes que estão além do evidente, daquilo que o prende
ao inquestionável, assim como afirma Kincheloe (1997: 188)
“debaixo da superfície das
aparências”
.
Os professores críticos, como pesquisadores da ação,
“estão habilitados para ver as
contradições sociopolíticas das escolas de uma maneira concreta e obvia”
, com possibilidade de
interpretação real dos fatos e evidências, favorecendo a tomada de consciência e decisão
humanizada.
Quanto à prática pedagógica do professor, a reflexão crítica permite avançar para um
processo de transformação da prática pedagógica, mediante sua própria transformação, como
intelectuais críticos que questionem aquilo que tinham como certo, transformando-o em
assuntos problemáticos passíveis de reflexão. Assim, como ponto de partida, quanto à função
social dos professores, como intelectuais, propõe Giroux (1997: 162) que vejam as escolas
como locais permeados por questões econômicas, culturais e sociais, portanto,
intrinsecamente atrelados às questões de poder e de controle social.
77
As idéias discutidas no parágrafo anterior, em que se expõe a postura do professor
como um intelectual reflexivo que busca transformar sua prática pedagógica, de forma a
proporcionar melhores possibilidades a seus alunos, podem ser ilustradas por Smyth (apud
CONTRERAS, 2002: 166), que afirmam:
é necessário trabalhar criticamente com os docentes, de maneira que essa capacidade
de questionamento que se pretende deles possa seguir uma lógica de conscientização
progressiva (...) favorecer um diálogo mediante o qual os professores sejam capazes
de reconhecer e analisar os fatores que limitam sua atuação, e em seguida, dar-lhes a
oportunidade de verem a si mesmos como agentes potencialmente ativos e
comprometidos a alterar as situações opressivas que os reduzem a meros técnicos
realizando idéias alheias.
Para esse mesmo autor, segundo Contreras, o processo reflexivo do professor deve
perpassar determinado procedimento: em primeiro lugar, o professor precisa compreender e
descrever quais são as suas práticas, identificando nelas os fatores relevantes e os não
relevantes; em segundo lugar, precisa da informação, pela qual deve ter claras quais teorias
fundamentam sua prática; em terceiro lugar, fazer o confronto entre esses elementos teóricos,
o que os causa e de onde provém sua prática e seus valores; em quarto lugar, promover a
reconstrução de sua prática, sobre como deveria fazer de forma diferente, o que é importante
pedagogicamente. E, por último, precisa retomar o primeiro ciclo de compreensão de sua
prática, reconstruindo o processo reflexivo e permitindo-se desenvolver seu papel como
intelectual transformador.
Para Contreras, (2002:168), a proposta do professor reflexivo fundamenta-se na idéia
de que é necessário enfrentar situações incertas e buscar respostas, de acordo com o que se
considera correto para o caso. Mais do que isso, a reflexão crítica, na busca da emancipação
individual, opõe-se aos modos de “deformação ideológica”, à crítica da introjeção de valores
sociais dominantes. Corroborando o exposto acima, Kincheloe (1997: 192) nos informa que
os pesquisadores pós-formais desejam ‘ver’ a sala de aula como oposição ao apenas
‘olhar’, que tem o propósito de adapta-las a categorias. Quando nos aprendemos
porque vemos o que vemos, nos estamos pensando sobre o pensar, analisando as
forças que moldam nossa consciência, colocando o que nos percebemos num
contexto significativo.
O olhar está dirigido para o modelo que trata dos professores como intelectuais
críticos e com intenção transformadora, em função de que as concepções sobre os professores
como profissionais reflexivos consideram que lhes falta, como conteúdo, uma prática de
78
deliberação, um compromisso social emancipador. Assim, na tentativa de superação, adotam-
se as bases da teoria crítica que tem seu compromisso com a emancipação, mostrando as
formas libertadoras e integrando-se ao processo de transformação, visto que esta, como
assegura Contreras (2002: 179),
“nos faz crer que é possível identificar, de forma clara, as
contradições e contrariedades nas quais vivem professores e estudantes, e construir um processo de
reflexão crítica pela qual estas podem ser teorizadas e superadas”.
O fenômeno das diferenças sociais também é levado a cabo pela postura crítica, pois
é Ellsworth (apud CONTRERAS, 2002: 182), que trata dessa questão, ressaltando que os
sujeitos ocupam diferentes posições sociais, têm diferentes experiências de vida, emoções e
interpretações. Assim, o desenvolvimento de uma reflexão crítica não supera as diferenças,
mas faz o seu reconhecimento.
O modelo dos professores, como intelectuais críticos, remete à compreensão de que
os fatores institucionais que condicionam a prática, a emancipação das formas de dominação,
não são processos espontâneos. O esforço do profissional visa descobrir o oculto e
transparecer a origem histórica e social do que se apresenta como natural.
A postura posta acima supõe, então, resistência aos discursos escolares tradicionais,
em aceitar a missão profissional inscrita institucionalmente. Assim, a autonomia
profissional não se limita a posições estanques, mas a
um processo continuo de descobertas e de transformação das diferenças entre nossa
prática cotidiana e as aspirações sociais e educativas de um ensino guiado pelos
valores da igualdade, justiça e democracia. Um processo contínuo de compreensão
dos fatores que dificultam não a transformação das condições sociais e
institucionais do ensino, como também de nossa própria consciência
(CONTRERAS, 2002: 185).
Contudo, esse modelo supera o reflexivo, uma vez que este último privilegia o
processo da reflexão, com fins individuais; já a idéia de emancipação crítica considera uma
“construção das conexões entre a realização da prática profissional e o contexto social mais
amplo” (CONTRERAS, 2002: 186).
A autonomia profissional, na perspectiva emancipatória, sugere a sensibilidade moral
de reconhecimento de nossos limites, das diferenças, das contradições, da opressão ou da
exclusão, bem como a forma de superar tudo isso. Nessa forma de reflexão, afirma Kincheloe
(1997: 193), o poder dos indivíduos, profissionais e membros dos grupos sociais será
79
dramaticamente afetado pela habilidade cognitiva para ver além da superfície, tornando-se
“um esforço pós-formal para reconhecer sentido profundo no trivial”.
Neste trabalho, assumimos o modelo de professor como intelectual crítico, por julgá-
lo mais significativo para o atual contexto educacional, além do que, na formação do
professor, se adotada essa postura, ele será um profissional mais sensível às questões da teia
social e comprometido com a luta por justiça social e por uma educação que possibilite o
crescimento intelectual dos alunos, bem como sua emancipação social e capacidade de luta
pela democracia para a melhora das condições de vida na sociedade. Esboça aqui uma
concepção de formação em que “a técnica e os conhecimentos profissionais podem ser objeto
de dúvidas, isto é, de saber, e, conseqüentemente de pesquisa, considerando-a como um
elemento próprio da função do professor”. (STENHOUSE, 2003: 147).
CAPÍTULO III
DESCREVENDO O CAMINHO DE CONSTRUÇÃO DO ESTUDO
3.1 A definição do método e o caminho percorrido
Para a realização deste trabalho, a opção metodológica utilizada para a análise dos
dados, é a qualitativa interpretativa, assim como definido por Triviños (1987). Buscamos a
compreensão contextual do fenômeno estudado, privilegiando a prática acadêmica dos
sujeitos, como alunos da Pedagogia, na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do
Ensino Fundamental e a prática docente, bem como o propósito transformador de seus
conhecimentos.
Para nós, a prática acadêmica é entendida, neste estudo, como o processo em que o
acadêmico é considerado aluno e desenvolve as atividades curriculares do Curso de
Pedagogia, durante a leitura dos fascículos e de outros materiais, nas reflexões sugeridas pelo
Curso, nos debates e, propriamente, na preparação e na apresentação da oficina no Seminário
Temático.
O entendimento de prática docente decorre de que se leve em conta que o acadêmico
aplica, com seus alunos, as atividades práticas e programadas do Seminário Temático e, ainda,
por exercer a profissão de professor, possuidor de saberes, deve utilizar estes últimos para
reflexões, articulando os saberes científicos-pedagógicos veiculados pelo Curso de Pedagogia
na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, na área de
Matemática, com os saberes experienciais, no propósito de transformar seus conhecimentos
(NEDER e PRETI, 2003: 28). Assim, a prática acadêmica e a prática docente devem-se
materializar, conjuntamente, no contexto da formação docente.
A opção pela abordagem qualitativa teve como ponto de referência o que nos
recomenda Triviños (1987), ao assinalar dois traços fundamentais desta abordagem que, para
ele, tem, “por um lado, sua tendência definida, de desreificadora dos fenômenos, do
81
conhecimento e do ser humano; e, por outro, relacionada com aquela, a rejeição da
neutralidade do saber cientifico” (1987: 125).
Justifica-se a escolha por essa opção metodológica, pela necessidade de contato
direto com a fonte de dados para o levantamento das informações e compreensão do
fenômeno estudado, pois, segundo Bogdan e Biklen (2000: 47-48),
na investigação qualitativa a fonte direta de dados é o ambiente natural, constituindo
o investigador o instrumento principal, [...] os dados são recolhidos em situação e
complementados pela informação que se obtém através do contato direto. [...] os
materiais registrados mecanicamente são revistos na sua totalidade pelo
investigador, sendo o entendimento que este tem deles o instrumento-chave de
análise.
Julgamos, também, essa abordagem a mais adequada para o estudo sistemático dos
dados, pois todos os detalhes do fenômeno podem ser significativos para a análise e, para isso,
amparamo-nos no aporte teórico recomendado por Bogdan e Biklen (2000: 49), ao afirmarem
que “a abordagem da investigação qualitativa exige que o mundo seja examinado com a idéia
de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista que nos permita
estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do nosso objeto de estudo”. Assim,
entenderemos a essência do fenômeno, a partir da subjetividade dos sujeitos, bem como, a
partir de sua prática acadêmica, como alunos da graduação, buscando aquilo a que se referem
Bogdan e Biklen (2000: 51), ou seja, estratégias e procedimentos que nos permitam
compreender as experiências do ponto de vista do informador.
Esta pesquisa foi organizada de forma que os procedimentos dessem um sentido
articulado ao fenômeno em estudo. Começamos por uma exploratória teórica de
conhecimentos acumulados para a compreensão da problemática do estudo, a escolha do
locus, os sujeitos do estudo e a definição e elaboração dos instrumentos; na seqüência, fez-se
a aplicação dos instrumentos para coleta de dados; e, finalmente, sistematização e
interpretação dos dados, bem como a construção do relatório final.
3.1.1 A escolha do locus de pesquisa
Nosso locus de pesquisa é o Seminário Temático da Área de Matemática do Curso de
Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental a
82
Distância, no pólo de Colíder-MT, município de Alta Floresta. Optamos por fazer do
Seminário Temático deste Curso nosso universo de estudo da problemática, por ser este,
segundo o projeto do Curso, o momento privilegiado para que ocorra, na formação do
professor-pedagogo, a articulação de saberes. Escolhemos a área de Matemática, pelo fato de
que, no momento em que coletamos os dados, esse seria o último Seminário e, também, um
amálgama de dados de uma área importantíssima no processo de escolarização. Os
Seminários Temáticos de outras áreas do Curso haviam todos acontecido e, obviamente,
não poderíamos acompanhar o seu desenvolvimento. Assim, foi o Seminário Temático da
Área de Matemática que nos possibilitou captar informações contextualizadas, de extrema
relevância para este estudo.
3.1.2 A definição da organização do estudo
Inicialmente, tínhamos uma primeira idéia do projeto de pesquisa, do que comporia o
trabalho, mas havia necessidade de uma delimitação do nosso objeto de investigação para o
seu melhor entendimento. Isso aconteceu após um levantamento e leitura da bibliografia
adequada para o esclarecimento da problemática, a partir de conhecimentos produzidos,
seguindo a orientação de Triviños, no sentido de que
“não é possível interpretar, explicar e
compreender a realidade sem um referencial teórico”
(1987: 104).
Assim, com esforço intelectual, desencadeamos um processo de construção de
conhecimentos teóricos sistematizados, referentes à temática, o que então, pôde-nos
subsidiar, no foco de estudo e na elaboração dos instrumentos da coleta de dados e, também, a
partir disso, dispormos da fundamentação teórica adequada para a análise dos dados que
começariam a surgir (LÜDKE e ANDRÉ, 1986: 39), bem como para apoiar as idéias que
nasceriam no decorrer do desenvolvimento da investigação (TRIVIÑOS, 1987: 133).
3.1.3 O critério de seleção e a caracterização dos sujeitos
No município de Alta Floresta-MT, o Curso de Pedagogia na Modalidade
Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental a Distância conta com 60
(sessenta) acadêmicos. Destes nem todos ainda estavam, no momento, desenvolvendo
83
atividades curriculares na Área de Matemática, ou seja, não estavam aptos para a realização
do Seminário Temático da referida área. Como nosso foco de estudo é a articulação de
saberes no Seminário Temático da Área de Matemática, a primeira decisão que tomamos foi a
de trabalhar com acadêmicos que estavam na integralização do curso, ou seja, concluindo a
Área de Matemática, pois este foi o último Seminário do Curso.
Dentre os acadêmicos que se encontravam na integralização curricular da Área de
Matemática, a amostragem se constituiu de 12 alunos do Curso que são os sujeitos de
investigação. A escolha se fez por sorteio, estabelecendo-se, de forma aleatória, cinco grupos
constituídos de dois ou três elementos, cujos componentes já estavam trabalhando juntos, no
desenvolvimento das atividades programadas do Seminário Temático da Área de Matemática.
3.1.4 Definição, elaboração e aplicação dos instrumentos
Como havíamos definido que a nossa coleta de dados iria privilegiar o momento do
Curso denominado Seminário Temático, na Área de Matemática, e que para obter essas
informações, utilizaríamos sujeitos, definimos, então, os instrumentos para a coleta de dados,
levando em consideração o contexto do Curso e as possibilidades que esses sujeitos nos
ofereciam para esta etapa. Optamos pela aplicação de três instrumentos, considerando a
necessidade de triangulação das informações e consistência da análise.
O primeiro instrumento definido foi o questionário, respondido pelos informantes,
para colher as informações mais objetivas sobre como o acadêmico se percebeu no processo
de realização das atividades do Seminário Temático. Esse é um instrumento valioso para a
coleta de dados, principalmente quando se desejam informações mais objetivas. Assim,
consideramos importante elaborar um questionário estruturado, com questões abertas, para ser
respondido individualmente, no intuito de que os acadêmicos sujeitos da pesquisa pudessem
escrever espontaneamente suas idéias referentes a aspectos do problema investigado, assim
como propõe Triviños (1987: 171).
O questionário teve como principal objetivo esclarecer o desenvolvimento das
atividades práticas da Área de Matemática que foram realizadas nas salas de aula com alunos
das séries iniciais do ensino fundamental e apresentadas no Seminário Temático, buscando
compreender “a perspectiva pessoal nos sujeitos” (BOGDAN e BIKLEN 2000: 139), pela
84
dinâmica da prática acadêmica e pelos saberes que utilizaram no desenvolvimento dessas
atividades.
O questionário foi distribuído a todos os sujeitos, três dias antes de participarem do
Seminário Temático de Matemática, com a proposta de que nos fosse devolvido, logo após a
realização do referido seminário. Fizemos a distribuição dos questionários, pessoalmente, em
seus locais de trabalho; apresentamos nossa problemática de estudo, bem como o objetivo do
referido instrumento. Todos foram receptivos à nossa presença, receberam o questionário e,
naquela ocasião, deixamos agendado o dia em que faríamos a recolha do questionário. Em
menos de uma semana após a distribuição, todos devolveram o questionário respondido.
O segundo procedimento utilizado na coleta de dados foi a gravação, em fita VHS,
das apresentações das atividades práticas dos sujeitos nas oficinas do Seminário Temático de
Matemática que fizemos, a partir de todo o contexto do Curso, utilizando a técnica da
observação livre que, para Triviños (1987: 153), é largamente utilizada nas pesquisas de
cunho qualitativo, porque observar não é simplesmente olhar, é ir além e destacar, de um
conjunto complexo, algo específico, prestando atenção em suas características. Para o mesmo
autor ainda,
observar um ‘fenômeno social’ significa, em primeiro lugar, que determinado evento
social, simples ou complexo, tenha sido abstratamente separado de seu contexto para
que, em sua dimensão singular, seja estudado em seus atos, atividades, significados,
relações, etc (1987: 153).
A definição por esse instrumento se deu pelo fato de que a apresentação do
Seminário Temático, segundo o projeto curricular do Curso, é um momento privilegiado para
que os acadêmicos demonstrem a sua capacidade de refletir o cotidiano da sua prática, a partir
de saberes da formação profissional. Ou seja, nesse momento do Curso, espera-se do aluno a
articulação dos saberes da prática docente com os saberes adquiridos na formação
profissional, transformando seus conhecimentos e perspectivando mudança da prática
educativa (NEDER e PRETI, 2003: 44-46). O objetivo principal foi o de captar o tratamento
dado aos saberes profissionais dos professores, durante as apresentações das atividades
matemáticas nas oficinas do Seminário Temático de Matemática, buscando compreender se
houve a relação teoria-prática na prática docente.
85
As apresentações das atividades práticas da Matemática foram feitas em forma de
oficina no Seminário Temático, no período vespertino e no período matutino. No primeiro
período, o grupo composto pelos sujeitos A1
13
, A2 e A3, apresentou a atividade “O Jogo do
Tangran”, como aplicadores
14
, e o grupo composto pelos acadêmicos A12 e A11 cedeu os
auxiliares da mesma oficina, mas esses componentes não compareceram à oficina. Indagados
depois sobre suas ausências, respectivamente, afirmaram que não estavam informados de que
seriam os auxiliares, durante a realização da referida atividade. No segundo período,
apresentaram-se os demais grupos: A9 e A10 foram aplicadores da oficina com a atividade
“Construção com Barbantes - Polígonos”; A6, A7 e A8 foram aplicadores da oficina com a
atividade “Círculos”; A4 e A5 foram auxiliares da oficina com a atividade “Poliedros”.
Durante as apresentações, apenas um componente de cada grupo aplicador
coordenou a apresentação da oficina, com a seguinte distribuição: coordenador A1,
pertencente ao grupo de A2 e A3; coordenador A6, pertencente ao grupo de A7 e A8;
coordenador A10 que compôs grupo com A11. Quanto aos demais grupos, o composto por
A4 e A5 não teve componente coordenando atividade, uma vez que ambos foram auxiliares
de apresentação de um outro grupo que não é também constituído pelos sujeitos de nossa
pesquisa, mas, mesmo assim, gravamos sua apresentação; e o grupo composto por A11 e A12,
como citamos, não compareceu à apresentação, durante a qual seriam auxiliares do grupo, em
que A1 coordenou a atividade.
Os grupos que realizaram as atividades nas oficinas aparentaram estar bastante
tensos, quando da apresentação, pois vivenciavam uma situação não corriqueira e sentiam-se
expostos perante o público que participava da oficina.
Tivemos o cuidado de chegar com antecedência aos locais de apresentação das
atividades, na tentativa de amenizar o “efeito do observador” (BOGDAN e BIKLEN, 2000:
68-69), que, segundo esses autores afirmam, é impossível o investigador eliminar todos os
efeitos que produz nos sujeitos e ter um ambiente natural. Em todas as salas, as pessoas foram
receptivas a nós que adotamos como rotina, antes do início das atividades, dialogar com os
13
Para identificar nossos sujeitos, utilizamos sempre uma letra e um numeral: a primeira A indicando a palavra
acadêmico, e o segundo 1, 2, 3,..., indicando nossa seqüência de organização. Assim, temos A1 acadêmico 01,
A2 para acadêmico 02, A3 acadêmico 03 e, assim, sucessivamente, até as letras A12, nomeando o cimo
segundo sujeito da pesquisa.
14
O Seminário Temático de Matemática foi o único, dentre os demais do Curso, que utilizou as nomenclaturas
“aplicadores”, para caracterizar o grupo de acadêmicos que aplicou a atividade prática, e “auxiliares”, para
caracterizar os acadêmicos que também planejaram a atividade, a ser aplicada durante o Seminário Temático,
mas seriam apenas ajudantes do grupo que realizava a oficina.
86
acadêmicos, tanto com os sujeitos da pesquisa, como com os demais participantes, procurando
criar um ambiente favorável ao levantamento dos dados.
De certa forma, o próprio contexto já favorecia a que os acadêmicos se sentissem não
muito à vontade, dando interferência nos seus comportamentos, pois se tratava de um
momento avaliativo dos alunos. Além disso, o fato de ter que apresentar um trabalho, o
público não muito familiar, a presença da câmera filmadora, são fatores que podem interferir
ao ambiente natural.
As gravações, em fita VHF, das apresentações de oficina no Seminário Temático, de
que nossos sujeitos participavam como aplicadores ou auxiliares, começaram a ser feitas por
duas câmeras, pelo fato de que havia horários, em que, ao mesmo tempo, realizavam-se duas
oficinas dos nossos sujeitos.
Por falha técnica, uma das câmeras não funcionou, a partir do segundo dia de
apresentações das oficinas. Isso gerou um problema, porque não tivemos como gravar a
apresentação de um dos nossos grupos, o composto por A6, A7, A8 e, nem sequer, marcar
nossa presença em sua apresentação para acompanhar o desenvolvimento de sua oficina.
Contudo, à oficina do grupo composto por A9 e A10, estivemos presente e, por observação
direta, procuramos registrar os passos daquela atividade, além de fragmentos de falas mais
relevantes. Assim, dos nossos cinco grupos, um não realizou as atividades de auxiliar; de
outro grupo não conseguimos efetuar a gravação; de um grupo fizemos a observação direta, e
dos outros dois, fizemos a gravação, em fita VHF, com filmadora.
Nas filmagens, procuramos registrar todo o percurso da apresentação, focalizando os
sujeitos do estudo e, quando a atenção voltava-se para os participantes da oficina, cuja
participação também registramos, procuramos captar a mediação que, no momento, ocorria.
Tendo as apresentações gravadas em VHF, o passo seguinte foi fazer a transcrição sistemática
das informações captadas, destacando os procedimentos da oficina e as falas dos sujeitos no
episódio.
O terceiro instrumento utilizado para análise de dados foi constituído pelos
relatórios reflexivos individuais, de conclusão da Área de Matemática dos sujeitos do estudo,
porque é nesse relatório que os acadêmicos, tendo como parâmetro o aprendizado teórico do
Curso, faziam a síntese de sua aprendizagem, na Área de Matemática e, conseqüentemente, do
Seminário Temático, tendo sua prática docente como ponto de apoio para suas reflexões.
87
No tratamento desse terceiro instrumento de coleta de dados, utilizamos a técnica da
análise documental, pois se trata de relatórios reflexivos individuais que os acadêmicos do
Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para as Séries Iniciais do Ensino
Fundamental a Distância fazem como requisito de fechamento de Área da Matemática, após a
realização do Seminário Temático, dando conta de toda a aprendizagem adquirida no decorrer
das atividades da área.
Esse relatório é um texto produzido pelo acadêmico, em que ele procura fazer uma
síntese de toda a Área de Matemática, inclusive o Seminário Temático, descrevendo o
processo de estudo e aprendizagens/dificuldades. Seu peso avaliativo é utilizado para a
atribuição de conceito ao Seminário Temático. Nesse caso, foi à última produção escrita
exigida no Curso e, obviamente, na Área de Matemática.
Nos relatórios reflexivos buscamos, pelo “método de análise de conteúdo”
(TRIVIÑOS, 1987: 158), indícios de articulação dos saberes da prática docente com os
saberes da formação profissional, que essa produção escrita tem como função, junto ao
acadêmico, possibilitar-lhe fazer a análise e a reflexão, fundamentadas, de sua prática docente
no ensino da Matemática.
O acesso aos relatórios individuais foi possibilitado pela equipe de orientadores
acadêmicos, após sua entrega pelos alunos ao centro de apoio local
15
, na sua versão final de
produção, de que nos forneceram os originais, dos 12 sujeitos da pesquisa, para que
pudéssemos copiá-los. Para proceder à análise, a partir de uma leitura sistemática, buscamos
indícios de questões que fossem relevantes para nosso trabalho, a partir das categorias
levantadas e buscando outras que se fizessem ali presentes. Todos os sujeitos estão cientes de
que seus relatórios reflexivos de fechamento da Área de Matemática foram utilizados para
este estudo. Não tivemos nenhuma restrição por parte dos autores dos relatórios, quanto à
utilização de seus conteúdos para nossa pesquisa.
Todo cuidado foi adotado para preservar a fonte natural dos dados, enquanto se fazia
uso dos instrumentos, levando em consideração que,
os investigadores qualitativos tentam interagir com os seus sujeitos de forma natural,
não intrusiva e não ameaçadora, (...). Como os investigadores qualitativos estão
15
O centro de apoio local do NEAD é um espaço fornecido pela Prefeitura Municipal para que os orientadores
acadêmicos tenham condições de fazer os encontros presenciais com os acadêmicos. É uma unidade de
referência física do NEAD/IE/UFMT no município.
88
interessados no modo como as pessoas normalmente se comportam e pensam nos
seus ambientes naturais, tentam agir de modo a que as atividades que ocorrem na sua
presença não difiram significativamente daquilo que se passa na sua ausência
(BOGDAN e BIKLEN, 2000: 68).
CAPÍTULO IV
ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
4.1 A organização dos dados
Para os dados serem analisados e interpretados, careciam de organização para a
categorização adequada e a construção do relatório final.
Na organização dos dados, a primeira atitude tomada foi fazer uma leitura
sistemática das respostas dos questionários, a transcrição dos vídeos e a leitura dos relatórios
reflexivos de fechamento da Área de Matemática. Após ter terminado esse processo, no passo
seguinte, trabalhamos com cada instrumento separadamente.
Com o questionário, primeiramente organizamos um quadro, contendo todas as
respostas de cada acadêmico sujeito do estudo. A partir desse quadro, para cada pergunta feita
aos sujeitos, reunimos as respostas de todos sujeitos, tivemos as recorrências que mais se
evidenciaram e os dados identificados como relevantes.
Com o relatório reflexivo, por meio da leitura sistemática, destacamos as
recorrências das informações relevantes de cada relatório reflexivo e construímos um quadro
de recorrência para cada sujeito. Finalmente, tivemos um quadro com as recorrências que se
destacavam entre todos sujeitos.
Com a descrição da gravação dos episódios das apresentações da oficina no
Seminário Temático, por meio da leitura sistemática, destacamos os fragmentos que se
mostraram relevantes e recorrentes.
Tendo em mãos as recorrências de cada instrumento, o passo seguinte foi
sistematizá-las de forma que nos dariam as categorias e subcategorias que abrangiam todos os
90
instrumentos e contemplariam a riqueza das informações. Assim, as respostas e citações dos
sujeitos foram organizadas nas suas respectivas categorias.
Finalmente, com os materiais devidamente selecionados e os dados categorizados,
realizamos sua análise e sua interpretação, tomando por base o objeto e as questões da
pesquisa, na direção de uma compreensão do fenômeno estudado.
4.2 O levantamento das categorias de análise
O levantamento das categorias de análise começou a surgir, a partir da
problematização da pesquisa, e concretizou-se quando da leitura sistemática de todos os dados
coletados para se ter a noção da totalidade, assim como sugerido por Bogdan e Biklen. Desse
exercício, ficaram evidentes três grandes categorias que se decompõem em subcategorias,
caracterizando os dados contidos nos instrumentos de coleta e que darão subsídio e coerência
às reflexões desenvolvidas.
A primeira categoria levantada caracterizou-se pelos saberes da docência. Nesta,
procuramos discutir como subcategorias os saberes da formação docente, incluindo os
saberes científico-pedagógicos e os saberes da experiência docente, mobilizados no processo
de formação profissional dos professores.
Na segunda categoria enfocamos a relação teoria-prática no processo do Seminário
Temático de Matemática. Aqui fazemos a discussão da vivência do acadêmico com as
atividades práticas desenvolvidas com seus alunos na sala de aula e, posteriormente,
apresentadas nas oficinas do Seminário Temático, procurando abordar a relação estabelecida
pelo acadêmico, entre os conhecimentos científico-pedagógicos e os da experiência, bem
assim a forma de compreendê-los no desenvolvimento das atividades. A organização dessa
categoria deu-se, de acordo com os momentos avaliativos da respectiva área - Meio I, Meio II
e Meio III - desencadeados no processo que culminou no Seminário Temático de Matemática.
Na primeira subcategoria, fazemos a discussão dos contatos iniciais do acadêmico com as
atividades práticas da Matemática, abordando a proposição das atividades práticas, a
definição da atividade para ser apresentada, e a participação do acadêmico quanto à
elaboração das atividades práticas que apresentou. A segunda subcategoria é caracterizada
pelo Meio II, ou seja, o momento de reflexão dos professores-acadêmicos sobre os resultados
91
da atividade prática desenvolvida em sala de aula. Na terceira subcategoria, é enfatizada a
realização do Seminário Temático de Matemática, desde o momento em que o acadêmico
planejou a atividade para ser apresentada na oficina do Seminário Temático, a forma de
apresentação da oficina, e as posteriores reflexões avaliativas do acadêmico, referentes à Área
de Matemática. Aqui abordamos também a postura do acadêmico, frente à proposta das
atividades práticas do Seminário Temático, e à articulação estabelecida pelo acadêmico entre
a teoria-prática dos saberes científico-pedagógicos e os saberes experienciais.
Na terceira categoria foi evidenciado o conhecimento ressignificado dos
acadêmicos, pela Área de Matemática, mostrando como eles dizem ter adquirido novas
posturas profissionais, em relação ao ensino da respectiva Área para a prática docente. Como
subcategoria apresenta-se a postura do acadêmico frente à Área de Matemática: suas
percepções, limites e superações. Aqui se retrata a percepção do acadêmico, quanto ao ensino
da Matemática e a sua nova postura, assumida frente ao ensino desta disciplina.
Neste momento, vamos fazer a análise da problemática de estudo que se dará, a partir
dos dados sistematizados nos instrumentos, triangulando-os para que se tenha a noção da
totalidade do objeto. Descrevemos o texto na seqüência, como apresentamos as categorias de
análise.
4.3 Os saberes da docência, mobilizados pelos alunos do Curso de Pedagogia
Aqui, os saberes da docência são abordados na perspectiva da formação inicial de
professores, buscando identificar, com os professores-acadêmicos em formação profissional,
o tratamento dado aos saberes docentes que se evidenciaram, no processo de realização do
Seminário Temático da Área de Matemática do Curso de Pedagogia a Distância. Os dados
serão analisados, evidenciando os relatos dos sujeitos.
O professor, em seu percurso profissional, desde a formação inicial até o seu
desenvolvimento profissional no exercício da prática docente, mobiliza para si uma gama de
saberes específicos da profissão. Estes são construídos historicamente e mobilizados em
momentos, com os quais o professor se depara, numa situação de seu exercício profissional do
qual lhe exige uma tomada de decisão.
92
Levamos em consideração, neste estudo, que a construção dos saberes dos
professores é individualizada, por isso, é impossível afirmar, com convicção, que, no Curso,
os professores-acadêmicos tenham construído, ou ressignificado, os mesmos saberes, porque,
como se sabe, o pensamento opera, a partir da história de vida de cada um, além do que todos
os sujeitos trazem um rol de experiências profissionais acumuladas e, muitas vezes,
socializadas na sua prática docente.
As atividades práticas aplicadas nas oficinas do Seminário Temático foram,
inicialmente, desenvolvidas pelos professores-acadêmicos nas salas de aula do ensino
fundamental. Ao questionarmos os sujeitos sobre se tais atividades práticas exigiram
conhecimentos trabalhados no Curso e se mobilizaram os conhecimentos experienciais,
durante a execução das atividades, obtivemos respostas como:
A aquisição de bases teóricas. Metodologias adequadas que levam o aluno a
construir os conceitos matemáticos. Como deve acontecer as intervenções do
professor, entre outros. (A10, Q1A, R5).
Todas, pois sem a experiência que eu já tinha se tornaria difícil desenvolver as
atividades, apesar que os fascículos ajudaram muito. (A9, Q1A, R6).
Fica explícito que esse momento do Curso, para o desenvolvimento das atividades
práticas em sala de aula, exigiu dos acadêmicos não os saberes enfatizados nos fascículos
da Área de Matemática, como também os saberes já sistematizados pela prática profissional,
afirmando o que aponta Tardif (2002), no sentido de que os saberes dos professores estão
ligados ao trabalho docente no ambiente escolar, que os sujeitos da pesquisa são
professores do ensino fundamental, destacando-se, nesse ponto, a articulação de saberes,
quando do desenvolvimento das atividades práticas na sala de aula.
No processo de formação profissional desses docentes, a prática docente deve-se
abrir à reflexão, como afirma Contreras, tomando a direção que a eles próprios interessa, que
lhes pareça melhor, aquela em que os professores têm a possibilidade de desenvolver seu
próprio pensamento e transformar as propostas de ensino, de acordo com suas necessidades.
Contudo, a forma pela qual as atividades práticas foram realizadas no contexto de formação
dos acadêmicos trouxe à tona o inverso do que se expõe acima, pois as atividades práticas da
Matemática não surgiram do contexto da prática docente dos professores-acadêmicos. Logo,
não lhes foram proporcionados tempo e espaço, no planejamento do Seminário Temático,
93
para que pensassem sobre sua prática docente e definissem suas atividades a partir dela.
Assim, vivenciaram uma realidade descontextualizada de seu cotidiano, tornando-se aquela
uma proposta a ser executada pelos sujeitos, sem a possibilidade de nela intervirem e
procurarem respostas para os problemas reais da sala de aula, perdendo-se, assim, uma grande
possibilidade de formação.
4.3.1 Os saberes científicos-pedagógicos do Curso, a partir das compreensões dos
professores-acadêmicos
Os saberes científico-pedagógicos, como afirma Tardif (2002) e outros,
caracterizam-se por serem conhecimentos já validados pela ciência e pela sociedade, cabendo
ao professor em formação apropriar-se desses saberes principalmente na universidade. Nesse
sentido, o Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do Ensino
Fundamental a Distância, UFMT/IE/NEAD, por meio da Área Curricular de Matemática
propôs uma estrutura curricular composta de rios conhecimentos a serem trabalhados pelos
acadêmicos. A esse respeito, não é intenção nossa verificar os conteúdos do currículo da
referida Área, mas buscar os saberes profissionais mobilizados com a realização do Seminário
Temático da Área de Matemática.
Na Área da Matemática, os acadêmicos, enquanto faziam o estudo dos fascículos,
também desenvolviam, com seus alunos, atividades práticas sugeridas pela equipe de
Coordenação do Curso, em material impresso, apostilado, que acompanhava os fascículos,
com o objetivo de aplicar, na prática docente, os conteúdos curriculares da área que
estudavam. A proposta das atividades sugeridas pela equipe de Coordenação do Curso
explicitava, detalhadamente, todos os procedimentos, quanto à forma de aplicá-las, com os
alunos do ensino fundamental e no Seminário Temático de Matemática. A função do
acadêmico foi a de apropriação dos procedimentos, quanto à forma de desenvolver as
atividades com seus alunos, ou seja, apenas executa-las como propostas ou, nas palavras de
Contreras (2002: 91), faz-se a
“aplicação de meios disponíveis a fins definidos”,
pois cada
atividade trazia consigo os objetivos a serem alcançados. Dessa forma, a mobilização dos
saberes científico-pedagógicos ficou prejudicada pelo fato de as atividades práticas não
exigirem reflexão dos professores-acadêmicos para seu planejamento e aplicação.
94
Os saberes científico-pedagógicos, assim como definidos por Tardif (2002) e outros
que se coadunam com seu pensamento, são os que embasaram as nossas reflexões sobre o
desenvolvimento das atividades práticas programadas no Seminário Temático. Esses saberes,
para os acadêmicos, foram compreendidos como conhecimentos transmitidos,
institucionalmente, na formação docente, através dos fascículos e das atividades práticas
programadas para aplicação, junto aos alunos e reapresentadas no Seminário Temático da
Área de Matemática.
Para o desenvolvimento das atividades práticas em sala de aula, os acadêmicos
necessitaram utilizar os conhecimentos trabalhados nos fascículos de Matemática. Isso ficou
evidente, quando perguntamos aos sujeitos se as atividades que desenvolveram na sala de aula
exigiram conhecimentos trabalhados no curso, obtivemos respostas como:
Apenas abrangendo o fascículo I de matemática, pois ele trouxe um campo
amplo de aprendizagens, como: inteligências múltiplas, os sentidos na
aprendizagem, como acontece a aprendizagem, e teóricos que fez com que
refletisse minha prática, revendo meus conceitos de aprendizagem (A1,
Q1A, R 05).
A aquisição e aplicação de bases teóricas. Metodologias adequadas que
levam o aluno a construir conceitos matemáticos. Como deve acontecer as
intervenções do professor; entre outros (A10, Q1A, R 05).
Concepções sobre o processo educativo, no que toca a questão metodológica
e avaliação; caminho Arquimediano da Proposta AME
16
; inteligências
múltiplas (A6, Q1A, R 05).
Na primeira fala, pode-se observar que o informante afirma que os conteúdos que
subsidiaram as atividades práticas fazem parte do fascículo I da Área de Matemática e, pelo
que expõem os demais, nota-se que as respostas possuem conteúdos semelhantes. É um
indício de que os demais fascículos não abordaram conteúdos referentes ao ensino-
aprendizagem da Matemática, bem como questões metodológicas, centrando-se mais em
conteúdos matemáticos que poderiam trazer pouca contribuição à prática docente dos alunos.
De acordo com os relatos acima, nota-se que foram os saberes profissionais e
disciplinares que contribuíram para a realização das atividades práticas na sala de aula, mas
também fica evidente que nem todos os fascículos abordaram os saberes disciplinares dos
16
Ações matemáticas que educam.
95
quais os professores-acadêmicos iriam se prover para trabalharem com seus alunos. Essa
evidência também pode ser identificada abaixo, quando relatam o estudo nos fascículos:
[...] o que não aconteceu com os fascículos seguintes que abordavam mais a
decoreba, fórmulas e não a descoberta em potencial. Achei que os fascículos
tratavam a matemática de forma muito técnica, com muita repetição e em
alguns pontos quase não existia uma explicação que facilitasse o
entendimento (A4, RR p.2).
Mas os fascículos posteriores trouxeram muitas atividades mecânicas que
pouco contribuíram nos momentos de reflexão e, ainda, teceram poucas
relações com a prática (A6, RR p.4).
Esses relatos sugerem que os conteúdos trabalhados nos fascículos, exceto os do
volume I, tiveram uma abordagem tecnicista. Dessa forma, acreditamos que os conhecimentos
veiculados nos outros fascículos não foram totalmente úteis para esses acadêmicos
trabalharem com as séries iniciais do ensino fundamental, logo, a prática docente pode ter
ficado com pouca contribuição da formação que buscaram neste Curso pela área curricular de
Matemática. Esses reiteram sempre que, através do fascículo I, tiveram acesso a conceitos que
sugeriam uma nova forma de compreender o ensino de Matemática, por uma proposta
metodológica que pode levar o aluno à construção do conhecimento. Nesse sentido, como
apresentado no relato abaixo, nota-se, ainda, que os saberes científico-pedagógicos, segundo a
definição de Tardif (2002), foram bastante enfatizados no decorrer da área de estudo da
Matemática, tendo ficado evidentes, quando os acadêmicos realizavam o relatório reflexivo de
fechamento da Área de Matemática, e afirmaram:
Posso dizer que no decorrer desse tempo em que estudamos na área de
matemática, tive oportunidade de analisar reflexivamente os conteúdos, bem
como as metodologias mais adequadas no ensino dessa disciplina. É
importante que o trabalho com a matemática seja desenvolvida através de
situações problemas que levem o aluno a pensar, analisar e refletir sobre as
possíveis soluções (A10, RR p.4).
O que me despertou interesse maior foi que durante as leituras, situações
escolares usualmente encontradas na sala de aula, por exemplo, quando o
aluno é tratado com ameaça, autoritarismo, pressão etc, fazendo eu entender
melhor o motivo de termos em nossas salas de aula alunos revoltados,
agressivos ou com mau comportamento diante dos professores e colegas
(A12, RR p.6).
Assim, como podemos observar acima, quando os sujeitos afirmam terem feito uma
análise reflexiva dos conteúdos e metodologias mais adequados para o ensino da Matemática,
96
chegaram à conclusão de que o ensino de Matemática deve-se dar, a partir de situações-
problema e por meio de uma relação mediada e estável com aluno. Porém, essa proposta
vigorou com eles, como alunos, uma vez que as atividades práticas não foram pensadas por
eles, a partir de situações-problema de sua sala de aula, além do que tiveram o papel passivo,
quanto a sua organização.
Quando os acadêmicos retrataram que “puderam analisar reflexivamente os
conteúdos”, eles se referiram aos apresentados nos fascículos, volume II ao VIII que, segundo
eles, de forma mecânica, permitiram pouca relação com a prática, ou seja, os conteúdos
abordados no decorrer do estudo não são aplicáveis em suas salas de aula. E, mais ainda,
quando relataram que puderam analisar as metodologias mais adequadas aos seus alunos para
a aula de Matemática, vale lembrar que os sujeitos receberam propostas metodológicas para
serem executadas em suas salas de aula, em forma de atividades práticas. No entanto, é
positivo o fato dos alunos perceberem que os fascículos além do volume I, foram pouco
significativo para a prática. Assim avançam quanto ao aprendizado matemático, pois
demonstram ter postura critica quanto aos conteúdos curriculares de sua formação.
Para a aplicação das atividades práticas na sala de aula, a escolha, por eles, da
metodologia mais adequada girou, então, em torno das proposições feitas pelo professor
especialista, já que, no momento em que o acadêmico, ao escolher a atividade para ser
aplicada por ele, fazia-o junto com seu orientador, sendo considerados, assim, os preconceitos
de que conhecia o tema, uma vez que teria de escolher uma proposta de atividade que mais
se adaptaria a sua experiência e ao nível de seus alunos. A proposta deixou de ser desafiadora
para os professores-acadêmicos e limitou a mobilização e articulação de saberes.
Pode-se notar também a evidência dos saberes pedagógicos, com falas unânimes
entre os sujeitos, quando da apresentação das oficinas no Seminário Temático de Matemática:
O professor tem de perceber que assim ele vai ter mais trabalho. Para que o
professor possa chegar na sala de aula, o professor tem que preparar,
planejar. Professor precisa saber como conduzir a sala de aula, porque vai
haver competição, o aluno vai sentir mais liberdade, mas o aluno vai ter mais
aprendizagem porque vai ter interação, ele vai olhar o outro. O papel do
professor será o de um mediador (Transcrições do Seminário, Grupo A4 A5,
p.03).
97
Apesar das limitações da proposta desse Seminário Temático, podemos perceber, na
fala acima, que os alunos do Curso ainda conseguem sistematizar conhecimentos, o que
consideramos inovador.
O saber profissional, para Tardif (2002), é um conhecimento erudito que, no caso da
formação de professores, provém da universidade e concretiza-se enquanto tecnologia da
aprendizagem. No caso descrito acima, é um saber que os acadêmicos adquiriram com as
leituras da Área de Matemática que se concretizou, também, quando da aplicação da atividade
com os alunos, e esses indícios podem ser percebidos, quando relatam que o professor precisa
preparar bem a aula, antes de desenvolver qualquer atividade; que haveria competição e
interação entre os alunos na aula; e que, dessa forma, o professor teria um papel de mediador.
Para eles, o ato de preparar a aula de aplicação da atividade prática foi de elaborar os
materiais a serem utilizados em cada atividade, assumir e apropriar-se dos objetivos,
metodologia e procedimentos já definidos pelo especialista para cada atividade.
Sínteses como as apresentadas acima, em que, apesar das limitações do Curso,
evidência de que os alunos adquiriram saberes científico-pedagógicos e mobilizaram os
saberes experienciais, indicam-nos que este Curso, na Área curricular de Matemática, pode ter
feito com que os acadêmicos tenham obtido subsídios para a reflexão da prática docente, bem
como para a constituição de saberes científico-pedagógicos e articulação de saberes com os
experienciais. São também indicativas de que a prática docente desses professores-
acadêmicos é diferente da forma como é sugerida pela Área de Matemática do Curso, pois
esta lhes apresentou metodologias que valorizam o lúdico para o ensino da Matemática, sendo
muito valorizada pelos sujeitos. Esses sujeitos desenvolveram, com expressivo valor
subjetivo, tais atividades nas salas de aula, de forma que indícios de não terem percebido
que elas não estavam incluídas em seu planejamento escolar anual, revelando-se, desse modo,
a racionalidade técnica para o processo de formação profissional que receberam.
Os conteúdos que foram abordados nos fascículos da Área de Matemática e,
principalmente, o método adotado para a realização das atividades práticas, utilizando-se de
materiais manipuláveis, fizeram com que os acadêmicos pensassem sobre as suas práticas de
ensino de Matemática. Pedimos para que enumerassem alguns conhecimentos pedagógicos
adquiridos na Área de Matemática:
98
Aprendi que na disciplina de matemática principalmente o importante é
fazer com que o aluno aprenda fazendo, só assim o aprendizado será
significativo para ele (A11, Q1A, R7).
No relatório reflexivo de fechamento de área, também foi possível identificar tais
posturas:
Posso dizer que no decorrer desse tempo em que estudamos na área de
matemática, tive oportunidade de analisar reflexivamente os conteúdos, bem
como as metodologias mais adequadas no ensino dessa disciplina. É
importante que o trabalho com a matemática seja desenvolvida através de
situações problemas que levem o aluno a pensar, analisar e refletir sobre as
possíveis soluções (A10, RR p.4).
A maneira como aprendemos a matemática no passado deve ficar no
esquecimento, pois através desse curso que estamos concluindo, nossa
prática pedagógica tende a se modificar, mais uma vez veio nos confirmar a
idéia de que o aluno aprende quando encontra o significado naquilo que lhe é
ensinado, e busca novos conhecimentos quando a escola lhe subsídios
para construir a própria autonomia (A12, RR p.6).
Neste curso, adquiri uma outra formação em relação ao ensino de
matemática, e vou procurar relacionar com o cotidiano (A12, RR p.9).
Todas as afirmativas indicam que os acadêmicos, após terem realizado as atividades
da Área de Matemática, passaram a compreender seu ensino de forma diferenciada da
concepção que possuíam dessa disciplina, propondo, agora, um ensino que supere as
concepções tradicionais, enfatize conteúdos da realidade do aluno, e que ele aprenda fazendo,
etc. A ênfase do Curso foi dada na aprendizagem de novas metodologias, mas, para os
professores-acadêmicos, não ficou esclarecida a mudança de concepção teórica da
Matemática, em função dessa nova concepção metodológica. Há disso evidências, quando os
sujeitos não perceberam a forma como as programações das atividades práticas destinadas ao
Seminário Temático acenaram para uma visão instrumentalista da Matemática.
Os conhecimentos pedagógicos, como os apresentados nas falas acima, tratando da
prática educativa, fizeram com que os acadêmicos refletissem sobre a prática docente que, até
então, vinham tendo. Essa característica de reflexão, da prática educativa, é chamada, por
Tardif, de saberes pedagógicos, mobilizados no Curso pelas ciências da educação que têm por
finalidade subsidiar a prática dos professores.
No caso dos sujeitos do estudo, como o conhecimento foi trabalhado em contexto
externo ao da prática docente, eles poderão ainda relacionar o conhecimento estudado com o
99
cotidiano, depois do Curso. Essa possibilidade pode ser observada numa das falas acima, na
qual o sujeito afirma que ainda vai procurar relacionar com sua prática tudo o que aprendeu.
Assim, a formação que receberam pouco valorizou que os alunos são professores,
possuidores de saberes e estão inseridos em um contexto social e profissional. Ainda que
esses sujeitos tenham afirmado que pensaram sobre suas práticas, para Contreras (2002: 118),
o processo reflexivo não se pode dar fora do contexto da prática.
Analisando, ainda, as falas acima, podemos notar que há, nos relatos, afirmações de
que fizeram análise reflexiva dos conteúdos e que estes devem ser desenvolvidos, por meio de
situações-problema, mas não conseguiram perceber, também, que as atividades que
propuseram não foram pensadas, a partir de uma situação-problema da própria prática.
Relataram, ainda, que a Matemática, da forma que aprenderam inicialmente em sua vida
estudantil, deve ficar no esquecimento; que com o que aprenderam, sua prática tende a
modificar-se e que o aluno tem de encontrar significado naquilo que aprende para construir a
autonomia.
O modelo curricular das atividades práticas do Seminário Temático de Matemática,
não obstante, foi marcantemente tradicional, ao impor as atividades que os acadêmicos
deveriam aplicar. Assim, os professores-acadêmicos aprenderam um método, da forma que
consideramos não ser a correta, com um conteúdo sem significado real e prático, não
desenvolvendo a autonomia, porque não lhes foi dada a oportunidade de prepararem suas
próprias atividades matemáticas para as desenvolverem com seus alunos, de acordo com o
contexto de cada escola.
4.3.2 Os saberes da experiência docente, mobilizados no processo de formação
profissional dos professores-acadêmicos
A condição profissional dos professores-acadêmicos dá-lhes o status de possuidores
de saberes experienciais da profissão docente, no dizer de Tardif (2002). Esse mesmo autor
afirma que esses são saberes pelos quais o professor compreende e domina sua prática. Esses
saberes não provêm das instituições de formação, nem dos currículos dos Cursos de formação
de professores, porém são adquiridos no âmbito da prática da profissão, ao mesmo tempo em
que orientam esta mesma prática em todas as dimensões.
100
As atividades práticas desenvolvidas na Área de Matemática, desde o momento de
seu desenvolvimento nas salas de aula até a realização das oficinas no Seminário Temático,
fizeram com que os alunos mobilizassem alguns saberes experienciais, o que ficou
evidenciado, quando questionamos se as atividades desenvolvidas na sala de aula exigiram
conhecimentos oriundos da experiência profissional:
Sim. Por exemplo tenho hábito de trabalhar com recursos manipuláveis
principalmente na área de matemática e as sugestões das apostilas (onde
estavam impressas as atividades práticas) vieram contribuir mais (A11,
Q1A, R6).
De quando trabalhava com outras séries como a e da escola tradicional.
Adeqüei os conhecimentos que possuía a metodologia apresentada pela
Universidade. O resultado foi surpreendente (A1, Q1A, R6).
Se as atividades práticas que foram sugeridas aos alunos do Curso exigiram saberes
experienciais para se trabalhar com materiais manipuláveis nas aulas de Matemática e,
também, conteúdos e metodologias das séries iniciais, podemos afirmar que a proposta das
atividades práticas apresentadas na programação do Seminário Temático de Matemática
contemplou um conhecimento metodológico, resgatando o que os acadêmicos já possuíam.
Por outro lado, tendo em vista que a proposta de atividades práticas sugeria recursos
manipuláveis com conteúdos das séries iniciais, os sujeitos afirmam acima que tinham
conhecimento desse conteúdo e da respectiva metodologia. Assim, podemos afirmar que a
construção de novos saberes pode ter sido limitada, e as atividades práticas podem ter
contribuído mais para legitimar um saber que já possuíam.
O professor, ao iniciar uma atividade com seus alunos, possui uma certa expectativa,
quanto aos resultados que poderá alcançar, tendo por base seus conhecimentos experienciais.
De acordo com o método que utiliza, os resultados podem atender às suas expectativas iniciais
ou superá-las. Os sujeitos, após terem realizado as atividades com os alunos, relatam terem
chegado a conclusões como:
os resultados com o desenvolvimento dessas atividades em sala de aula
deram-me uma contribuição muito valiosa, me fazendo ver que para que isso
ocorra, é preciso que o professor crie oportunidades e condições para a
criança poder pensar, criar, descobrir e poder pensar, criar, descobrir e poder
expressar suas descobertas (A11, RR, p.10).
101
Reflexões como esta, pelas quais os sujeitos demonstram ter adquirido nova
concepção sobre o ensino-aprendizagem da Matemática, são possíveis se os acadêmicos
houverem tido, como parâmetros para reflexão, seus conhecimentos experienciais, no
momento em que desenvolveram as atividades com seus alunos, propondo-se, assim, a pensar
sobre sua prática, sob nova postura pedagógica. Convém, porém, destacar que o Seminário
Temático de Matemática, em função da concepção adotada, pode ter oferecido aos
acadêmicos pouca possibilidade de observarem sua própria prática docente.
O momento da apresentação das atividades práticas nas oficinas do Seminário
Temático proporcionou uma oportunidade privilegiada para a mobilização dos saberes
experienciais, pois toda a organização e procedimentos da oficina deveriam ter características
de uma sala de aula do ensino fundamental. Nessa atividade, os participantes da oficina
tiveram tratamento pedagógico parecido com o destinado às crianças, alunas das séries
iniciais do ensino fundamental. Revelou-se aqui a infantilização desse momento, deixando de
valorizar o adulto possuidor de conhecimentos e saberes profissionais. Questionados sobre
que conhecimentos da experiência profissional utilizaram para preparar essa oficina,
responderam:
“Usei as experiências de sala de aula, pois sabia que iria dar uma aula
apenas, e que após teria um debate referente os acontecimentos em sala
(A1, Q1B, R6).
Construir materiais simples, adequar a fala ao nível do aluno (2ªfase do
ciclo) (A7, Q1B, R6).
Os conhecimentos construtivistas e interacionistas ou seja, os utilizados
diariamente, as vivências e experiências” (A8, Q1B, R6).
Para a apresentação das atividades no Seminário Temático de Matemática, ficou
evidente ter sido desnecessária a busca por novos saberes, além daqueles que os professores já
possuíam na experiência, tais como saber dar aulas, adequar à fala ao nível do aluno, e
conhecimentos construtivistas e interacionistas, assim como afirmam os sujeitos. Faltaram
desafios para os acadêmicos buscarem novos saberes que ampliassem seus conhecimentos
científico-pedagógicos e experienciais.
Vale ressaltar que as mesmas atividades haviam sido aplicadas nas salas de aula e,
na oficina do Seminário Temático, deveriam ser repetidos todos os passos utilizados
anteriormente; para isso, utilizaram conhecimentos que possuem na experiência docente.
102
Como nas oficinas foi aplicado o mesmo procedimento da sala de aula, convém destacar que
não se exigiu a sistematização de novos saberes. Na fala abaixo, é possível identificar como,
na apresentação da oficina, utilizou-se a metodologia que provavelmente haviam
desenvolvido na sala de aula, evidenciando-se a aplicação de saberes experienciais:
Vamos começar com uma perguntinha, vocês observaram alguma vez as
belas formas que a natureza nos apresenta? Já observaram? (Transcrições do
Seminário, Grupo A1, A2, A3).
Essa fala foi realizada, quando o grupo dava os encaminhamentos iniciais da oficina.
E o fato de os professores-acadêmicos (aplicadores da oficina) fazerem esta pergunta, logo ao
início da atividade, para introduzir um assunto, indica que eles lançaram mão de um saber
experiencial específico da profissão docente, para tentar captar as primeiras impressões dos
alunos, no que se refere adeterminado fato. A mesma característica desse saber também fica
evidente em posicionamentos, como os apresentados abaixo, quando o grupo aplicador da
atividade procurou nomear uma figura geométrica de cinco lados.
Essas figuras também precisam receber um nome, o precisa? Então fez na
lousa o desenho de uma casa. Quinhado, quintolado, o que a gente vai dizer
agora, casinha? Que nome a gente vai dar pra nossa casinha mesmo? Vai ser
casinha, (um participante arrisca: quintagono) quintagono? E aí, quem mais
tem alguma sugestão? (participante: quintolado), e aí, vocês concordam?
(participante: é novo). Mas esse nome ficou muito feio, acho muito feio esse
nome. Hih! Então a gente vai ter de arrumar um nome bem legal pra ele. Eu
ouvi o nominho dele por aqui, alguém já disse..., como é o nome dele
mesmo colega? Apontando para uma participante que responde: pentágono
(Transcrições do Seminário, Grupo A1, A2, A3).
outros momentos das apresentações da oficina, durante os quais se fez referência
a saberes experienciais, como, por exemplo, quando comentaram que não é recomendado
apresentar aos alunos um conteúdo desconhecido, de forma precipitada, sem antes fazer uma
breve introdução, buscando, dessa forma, situar o aluno, em relação ao conteúdo, de acordo
com a seguinte fala:
“A gente muito sobre geometria nos livros de matemática, e até então, é
tão pouco trabalhado. De repente chega pra meia dúzia de alunos e fala
‘Poliedro’, eles nem nunca viram falar isso! (Transcrições do Seminário,
Grupo A4, A5).
103
Os saberes experienciais constituem uma das formas pelas quais os professores
compreendem e dominam sua prática docente; esses saberes fazem parte da sua prática
educativa e, na hipótese acima referida, o sujeito utiliza-os para criticar uma situação
pedagógica, em face da qual ficou indignado por perceber que o modelo tradicional de escola
ainda não foi superado.
Lamenta-se, também, o fato de o Seminário Temático da Área de Matemática perder
de vista a dimensão educativa da formação do professor, a partir do momento que na oficina
se repetiram atividades que já haviam sido desenvolvidas nas salas de aula, e isso caracterizou
treinamento, o que não trouxe para análise, discussão e reelaboração as problemáticas da
prática docente desses professores-acadêmicos. As atividades poderiam ser até testadas entre
os alunos, mas os resultados deveriam ter sido trazidos para discussão coletiva no Seminário
Temático.
O fundamental é que o Seminário Temático de Matemática seja um espaço de debate
da prática docente, das problemáticas sugeridas no contexto dessas práticas e de socialização
de propostas criadas, em função do próprio currículo escolar de cada escola, em que os
professores assumam uma postura de intelectual crítico, assim como apontado por Contreras
(2002: 134).
Tardif (2002) afirma que, para o professor, os saberes experienciais, resultantes da
formação científico-pedagógica, tornam-se os fundamentos de sua competência profissional e,
a partir deles, o professor julga a pertinência, ou o realismo das reformas sugeridas nos
programas escolares e nos métodos.
Assim, a prática profissional não favorece apenas o desenvolvimento de saberes
experienciais, mas, também, proporciona uma avaliação dos outros saberes, pela sua
retradução, em função das condições limitadoras da experiência. Isso o quer dizer que os
professores rejeitem os outros saberes; na sua prática, eles retraduzem-nos, de acordo com seu
próprio discurso; na verdade, a prática oportuniza aos professores que retraduzam sua
formação e adaptem-na à sua profissão. Assim, afirma Tardif (2002: 53), o professor objetiva
“um saber formado de todos os saberes retraduzidos e submetidos ao processo de validação
constituído pela prática cotidiana”.
Desse modo, para Tardif (2002: 54), os saberes experienciais são o núcleo vital do
saber docente e não são como os demais, pois não são apenas formados a partir de todos os
104
outros saberes, mas retraduzidos, “polidos” e submetidos às certezas construídas na prática e
na experiência.
4.4 Meio I: a relação do acadêmico com as atividades práticas no Seminário Temático de
Matemática
A relação teoria-prática é a categoria desenvolvida nesse momento, procurando
explicitar a forma como o Seminário Temático de Matemática abordou os conhecimentos
científico-pedagógicos e experienciais, na busca de articulá-los com a prática docente do
professor-acadêmico do Curso.
No contexto do Curso de Pedagogia para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental,
na modalidade licenciatura a distância que estudamos, entende-se por Meio I a primeira parte
do processo avaliativo da Área de Estudo. No caso da Área de Matemática, este consistiu do
momento em que os acadêmicos tiveram o primeiro contato com os fascículos, por meio da
leitura, e procuraram o orientador acadêmico para discutir os conceitos ali presentes, bem
como a forma de melhor estudá-los. Nesse processo, o orientador acadêmico apresentou-lhes
as atividades práticas a serem planejadas e desenvolvidas com seus alunos
17
, traçando para
eles os rumos da orientação. Outro desencadeamento das atividades práticas se refere ao Meio
II e ao Meio III, dos quais trataremos adiante.
O primeiro contato do acadêmico com a Área de Matemática e, conseqüentemente,
com as atividades práticas, gerou expectativas, pois no Curso seria a primeira área de estudo
em que se promoveria um Seminário Temático diferenciado, sem elaboração de TCA
(Trabalho Conclusivo de Área). O novo formato previa realização das oficinas, apresentação
de atividades práticas, já desenvolvidas com alunos do ensino fundamental nas salas de aula, e
elaboração de relatório reflexivo. O principal temor dos alunos do Curso dizia respeito aos
conteúdos matemáticos que poderiam ser apresentados nesta área. Neste sentido relatam:
Tinha medo de me deparar novamente com aqueles conteúdos complexos,
desprovidos de significados pra mim (A10, RR, p.5).
17
As atividades práticas foram apresentadas aos alunos em um material apostilado, anexo aos fascículos de
matemática.
105
Depoimentos como o apresentado acima, são traumas da escola tradicional, em que
os sujeitos estudaram, e as aulas de matemática consistiam de longos cálculos matemáticos e
poucos conhecimentos disciplinares. Nisso, reside uma certeza reside: o fato de estarem
conscientes de que a forma como podem ter apreendido os conceitos matemáticos no passado
não faz mais sentido. No contexto atual, os modelos tradicionais não atendem às exigências
do processo ensino-aprendizagem e, de certa forma, o Curso veio legitimar este
posicionamento. Assim, o medo que tinham com relação a esta área de estudo foi sendo
superado, e criaram-se entre os acadêmicos, atitudes como descrevem:
Foi muito importante desenvolver as atividades propostas em sala, porque
através das mesmas aprendi muito como professora, já que se trata de
atividades que lançam à criança desafios, ou seja, situações problemáticas
contextualizadas que para serem solucionadas carecem de análise, discussão,
trocas de pontos de vista, etc. Sugerem uma participação ativa do aluno...
(A6, RR p.4).
Desse modo, o contato deles com as atividades práticas permitiu que construíssem
saberes pedagógicos, mas não se pode afirmar que reconstruíram saberes experienciais, em
função da proposta pedagógica do Seminário Temático, que, como afirma Tardif (2002), os
saberes experienciais são mobilizados, a partir dos saberes científico-pedagógicos da
formação acadêmica.
No relato acima, questiona-se o fato de afirmarem que aprenderam muito com o
Curso, porém poderia ser mais rica essa aprendizagem, caso eles próprios definissem as
atividades que foram desenvolvidas no Seminário Temático, a partir das dificuldades do
ensino e da aprendizagem de seus alunos. Além do mais, os professores-acadêmicos não
tiveram clareza de que o aprender a ensinar deles se baseou na repetição de atividades pré-
programadas, e não na construção do conhecimento.
4.4.1 A proposição das atividades do Seminário Temático
As atividades desenvolvidas nas oficinas, quando da realização do Seminário
Temático, foram às mesmas que os acadêmicos desenvolveram com seus alunos no Meio I.
Essas foram propostas pelo professor especialista da Área de Matemática, em material
complementar, e distribuídas pelos orientadores acadêmicos aos grupos de professores-
106
acadêmicos para que as executassem. Ao questionarmos os sujeitos, sobre como foram
definidas as atividades práticas para serem desenvolvidas na sala de aula, responderam:
A proposta veio da universidade, mas os acadêmicos tiveram a liberdade na
escolha a que melhor adaptaria à fase e ciclo. Com o estudo sistemático dos
fascículos elas se tornaram fáceis por ser bastante objetiva e dentro da
realidade dos alunos, foram orientadas conforme a necessidade dos
acadêmicos (A7, Q1A, R1).
De acordo com a proposta pedagógica da Área de Matemática, não era obrigatório
que cada acadêmico realizasse com seus alunos todas as atividades práticas. Assim, como
observamos na fala acima, eles poderiam desenvolver somente as atividades que julgassem
ser as melhores para seus alunos. Afirmaram que as atividades se deram no contexto da
realidade social do aluno, porém revela-se nos professores-acadêmicos um nível de percepção
crítica bastante baixo, por não perceberem que as atividades não eram de suas realidades da
prática docente, pois foram elaboradas em contexto exteriores e com objetivos previamente
definidos. negação da possibilidade de pensar a própria prática docente, revelando uma
formação profissional na direção da racionalidade técnica.
No momento em que o grupo de acadêmicos, juntamente com o orientador, escolhia
a atividade que seria desenvolvida com os alunos, também, recebia as devidas orientações
para o seu desenvolvimento. Neste sentido, os sujeitos afirmaram, ao serem questionados
sobre quem propôs as atividades práticas a eles, e como foram orientados:
[...] A orientação foi que fizéssemos a atividade tal qual a proposta, já que
foram elaboradas por especialistas no assunto. A orientação quanto ao
desenvolvimento das atividades não foi feita, por que não sentirmos
necessidade (A6, Q1A, R1).
[...] Orientadores ofereciam as várias propostas e os acadêmicos escolhiam
uma e desenvolviam sob orientação do orientador. O grupo deveria estudar a
atividade e montar o planejamento coletivo e aplicá-lo. A aula seria normal
como o de costume, porém preparada de forma um pouco diferente... (A1,
Q1A, R1).
As propostas de atividades vieram acompanhadas de todos os procedimentos e
materiais a serem utilizados, exigindo dos alunos para seguissem tais regras, com a finalidade
de alcançar os objetivos determinados na própria proposta. O planejamento da atividade a
que se referem os sujeitos diz respeito ao fato de apropriarem-se dos procedimentos pré-
definidos para aplicação em atividades práticas, ou seja, a oportunidade de aprendizagem
107
circunscreveu-se à executar as tarefas docentes previamente determinadas pelo professor
especialista. Como as propostas foram sugeridas pela universidade, dentro do programa
curricular da Área de Matemática do Curso, estas não levaram em consideração o currículo da
escola na qual o professor-acadêmico exercia a docência. Desse modo foi necessário abrir um
espaço, à parte do programa escolar, para o desenvolvimento das atividades, fora do contexto
da escola.
que os acadêmicos são professores em formação, o ideal seria que as atividades
práticas fossem elaboradas e organizadas pelos próprios acadêmicos, dentro de um contexto
real da prática docente, tendo como referência um currículo contextualizado e crítico. Isso
levaria ao modelo de professor que Contreras (2002) chama de intelectuais críticos. Nessa
mesma direção, Smyth posiciona-se, conforme ressalta Contreras, ao indicar que, na formação
dos professores, deve-se favorecer um diálogo, mediante o qual esses sejam capazes de
reconhecer e analisar os fatores que limitam sua atuação. Em seguida, devem ter a
oportunidade de verem a si mesmos como agentes potencialmente ativos e comprometidos
com ações que alterem as situações opressivas que os reduzem a meros técnicos realizadores
de idéias alheias. Conseqüentemente, suas práticas ficam sujeitas as mudanças, como propõe
Kincheloe (1997).
4.4.2 A definição das atividades práticas apresentadas no Seminário Temático de
Matemática
Os grupos de alunos afirmaram que desenvolveram na prática docente com os
alunos, entre quatro a seis atividades práticas da matemática.
Dentre as atividades práticas que os professores-acadêmicos realizaram na sala de
aula, a Coordenação Pedagógica do Curso definiu uma delas para ser apresentada na oficina
do Seminário Temático de Matemática, utilizando-se dos procedimentos metodológicos
desenvolvidos com os alunos. Nessa definição da atividade prática, ficou indicado
previamente os grupos que teriam a função de aplicadores e de auxiliares, conforme
observamos, nas afirmações dos sujeitos, quando relataram como foi feita a indicação da
atividade:
Foi feita pelo especialista de matemática no Pólo de Colíder. Mandou uma
planilha indicando qual atividade o grupo iria apresentar. Os acadêmicos
108
apenas tinham que se preparar para apresentação da atividade (A1, Q1B,
R02).
Recebi a informação da seguinte forma: que um grupo iria apresentar a
atividade, outro iria auxiliar e os demais iriam ser expectadores das
atividades (A4, Q1B, R02).
Não se permitiu aos alunos do Curso que apresentassem, no Seminário Temático,
resultados de reflexões sobre temáticas que dizem respeito ao ensino-aprendizagem da
Matemática. Nesse sentido, tiveram de preparar e desenvolver exemplos de atividades práticas
sugeridas pelo Curso que possibilitassem às crianças brincarem e jogarem, sem nenhuma
discussão pedagógica que fundamentasse essa metodologia. Essas atividades lúdicas foram
levadas às oficinas do Seminário Temático, para serem realizadas pelos demais professores-
acadêmicos, que nem todos os grupos de professores-acadêmicos aplicaram, com seus
alunos, todas as atividades que foram sugeridas.
A construção do saber profissional, nesse caso, não se fundamentou na
racionalização da prática docente, como expõe Tardif (2002: 205), tampouco como expõe
Gauthier (1998: 339), no fazer dos sujeitos pensantes, não resultando, portanto, em uma
produção social. Para esses autores, e concordamos com eles, os saberes não mais devem
surgir de uma elite intelectual, mas devem ser provenientes de um exercício intelectual dos
atores que se encontram nas instâncias de aplicação destes saberes que, no caso, consiste na
prática docente.
Essa conjunção de fatores levou-nos à inferência de que, como todo o processo de
organização das atividades práticas dos acadêmicos se deu em um outro contexto
institucional, estabeleceu-se uma relação hierárquica entre a prática e o conhecimento, ou
entre organização e execução que Giroux (1997: 159) identifica como “abordagem
tecnocrática”, e que inclui:
O apelo pela separação de concepção de execução; a padronização do
conhecimento escolar com o interesse de administrá-lo e controlá-lo; e a
desvalorização do trabalho crítico e intelectual dos professores e estudantes
pela primazia de considerações práticas.
E o professor, em um modelo como esse, torna-se um técnico aplicador de idéias
alheias, marcando a desprofissionalização da profissão, e transforma-se em um proletário,
incapaz de dar rumo a sua própria história. Esse modelo de professor impede o sujeito de
109
transpor os limites de sua prática por não lhe proporcionar as ferramentas para compreensão
das problemáticas com as quais convive.
4.4.3 Participação do acadêmico, quanto à elaboração das atividades práticas para o
Seminário Temático
Como discutimos acima, as atividades práticas às quais os alunos da Pedagogia
tiveram acesso, na Área de Matemática, não levaram em consideração o contexto do Curso
para serem elaboradas. Pedagogicamente, foram organizadas de forma que não havia
necessidade de os alunos elaborarem estratégias para sua aplicação, tanto na sala de aula,
como no Seminário Temático, pois estavam com todos os procedimentos definidos,
bastando-lhes apenas incorporá-los e providenciar alguns materiais concretos. Trata-se de
atividades de aplicação prática, mas, para a definição de seus conteúdos, não foi levado em
consideração o cotidiano vivido da prática profissional dos professores-acadêmicos. Eles não
participaram do processo de elaboração das atividades, assim como nos explicitam nas falas
abaixo:
As atividades já vieram elaboradas nas apostilas (A5, Q1A, R04).
Já recebíamos as sugestões de atividades já elaboradas. Era só planejar, fazer
algumas adequações, quando necessário e aplicar (A10, Q1A, R04).
Concordamos com os autores estudados que essas atividades práticas, já que o
Seminário Temático tem por finalidade do aluno do Curso fazer uma reflexão de problemática
da sala de aula, fossem definidas a partir de estratégias para soluções de problemas da sala de
aula, das necessidades educativas de seus alunos. Assim, estariam fazendo reflexão da prática
perspectivando a sua ressignificação, como propõe Kincheloe (1997: 188), mas isso não
aconteceu porque o Curso trabalha com um currículo pré-ativo, e nesta concepção, é natural
este procedimento de planejamento.
Aos professores-acadêmicos, foi dada menor importância nesse momento do
processo de formação profissional, ao desenvolvimento da autonomia profissional, como
propõe Contreras (2002: 185), visto que desenvolveram atividades preestabelecidas, nas quais
ignoraram-se a experiência dos professores e os dilemas da sala de aula, o que fez do
professor-acadêmico um “técnico de alto nível” (GIROUX, 1997: 158), em prejuízo de
110
desenvolverem seu potencial crítico de análise de uma proposta de reforma, que o Curso de
Pedagogia para as Séries Iniciais da UFMT/IE/NEAD, na Área de Matemática, ofereceu
atividades que os acadêmicos consideraram uma inovadoras por trazerem atividades lúdicas,
ainda que não tenham favorecido a reflexão sobre os fundamentos da proposta.
4.5 Meio II: o momento de reflexão dos resultados da atividade prática desenvolvida em
sala de aula
O processo avaliativo Meio II da Área de Matemática consistiu de um relatório de
aula que os professores-acadêmicos realizaram, em face das atividades práticas desenvolvidas
com seus alunos, relatando os procedimentos da aula e as interferências pedagógicas que
fizeram. Esse momento avaliativo no contexto do Curso é um dos momentos formais da
avaliação do aluno. Nesse relatório, os acadêmicos relatam a vivência que tiveram durante o
desenvolvimento da atividade prática na sala de aula.
Quando os professores-acadêmicos fazem o relatório reflexivo do fechamento da
Área de Matemática, mencionam, dentre outros assuntos, o processo avaliativo Meio II. Neste
sentido, são divergentes as opiniões dos sujeitos, quanto à contribuição que o relatório de aula
possibilitou para a construção de saberes da docência:
O Meio II, ou seja, os relatórios das atividades desenvolvidas, pra mim
pouco contribuíram, porque o importante mesmo foi o desenvolvimento (das
atividades práticas) e a criatividade dos alunos (A1, RR, p.7).
Dentre todo o percurso da matemática, este foi o que mais deixou
aprendizagem, pois pude contemplar momentos maravilhosos nas resoluções
das atividades desenvolvidas pelos alunos em sala de aula, (...) isso me fez
refletir minha prática em matemática a qual nunca tinha trabalhado assim
antes (A7, RR, p.5).
Nos relatos pode-se perceber a valorização da aplicação da atividade prática na sala
de aula, uma ação instrumental de desenvolvimento dos procedimentos externos da sua
realidade, na perspectiva da ciência aplicada, como apontado por Contreras (2002: 93), em se
que aplicam meios para fins definidos. Assim, a prática docente e acadêmica dos sujeitos do
estudo torna-se uma oportunidade de aplicação de procedimentos técnicos que negam a
racionalidade e o pensamento crítico do professor:
111
Em vez de aprenderem a levantar questões acerca dos princípios que subjazem os
diferentes “métodos didáticos, técnicas de pesquisa e teorias da educação, os
estudantes com freqüência preocupam-se em aprender o ‘como fazer’, ‘o que
funciona” ou o domínio da melhor maneira de ensinar um ‘dado’ corpo de
conhecimento (GIROUX, 1997:159).
Nesta perspectiva, os sujeitos não buscam os elementos do conhecimento científico
para fazerem análise e reflexão da prática que realizaram, mesmo porque as próprias
atividades não traziam uma relação direta com os conteúdos dos fascículos da Área de
Matemática. E se os sujeitos não buscam é porque essa condição de se capacitar teoricamente
para compreender a prática à luz das teorias pode ter sido pouco oferecida pelo Curso. Nas
falas acima ainda se destaca, e com maior freqüência, que foi no Meio II que adquiriram
maiores aprendizagens. Não se investigaram quais aprendizagens foram essas, porém, levando
em conta que as atividades práticas que aplicaram não surgiram das necessidades educativas
dos alunos, e os objetivos tinham sido previamente definidos pelo especialista da Área, é
lícito supor-se que os novos conhecimentos podem não ser aplicáveis ao contexto de sua sala
de aula e, em conseqüência, a articulação de saberes ficaria bastante artificial.
Os sujeitos afirmam também que analisaram suas práticas docentes de Matemática e
fizeram isso, comparando o que sabiam sobre seu ensino com o proposto no Curso. Ficaram
deslumbrados com a inovação proposta, pois lhes proporcionou que aplicassem com seus
alunos uma metodologia que ainda não dominavam: a do ensino da Matemática, fazendo uso
de atividades lúdicas. Contudo, o fato de os acadêmicos concluírem que os conteúdos
matemáticos veiculados por meio de metodologias que valorizem a ludicidade possibilitam ao
aluno uma aprendizagem mais significativa dá indícios de uma nova compreensão na forma
de abordar as situações problemáticas da prática docente do ensino desses conteúdos.
Conseguiram perceber que, na prática docente, quando se lança mão de estratégias que
exigem um maior envolvimento de seus alunos, esta se torna mais significativa. Perceberam
que a forma pela qual vinham realizando sua prática docente não estava adequada às
necessidades, em face daquelas atividades que o Curso propunha, em uma outra direção
metodológica que julgaram ser inovadora. Nesse sentido, a estratégia fez surgir a necessidade
de respostas ao não cotidiano e à situação incômoda, como apontado por Contreras (2002:
108), se tornando no entanto, aprendizes da matemática. Assim, remete-se à idéia de que os
sujeitos tenham desenvolvido indícios do profissional reflexivo, segundo o entendimento de
Shön (CONTRERAS, 2002: 106). Essa idéia,
112
trata justamente de dar conta da forma pela qual os profissionais enfrentam aquelas
situações que não se resolvem por meio de repertórios técnicos; aquelas atividades
que, como o ensino, se caracterizam por atuar sobre situações que são incertas,
instáveis, singulares e nas quais há conflitos de valor (id).
Os valores conceituais da prática dos sujeitos foram conflitados com os saberes
mobilizados pelo Curso. Se esses conflitos internos fossem trazidos à discussão no processo
do Seminário Temático, ter-se-ia então a reflexão da prática.
Justifica-se o posicionamento acima, porque os sujeitos perceberam que, nas suas
práticas docentes de Matemática, fazia-se necessário adotar novas metodologias das quais
ainda não possuem total domínio. A situação que se impôs aos acadêmicos, com atividades
práticas e lúdicas, levou-os a perceber os limites de suas práticas. Ao utilizar os
procedimentos metodológicos que definira anteriormente, a equipe pedagógica do Curso
garantiu o desenvolvimento das atividades práticas e que os resultados esperados pelos
professores-acadêmicos fossem alcançados, o que os levou a pensar sobre a prática
metodológica que vinham desenvolvendo nas suas respectivas aulas de Matemática, mas
não encontramos indícios destas práticas docentes terem mudado de acordo com a concepção
apresentada pelo Curso, que para tanto, seria imprescindível que antes acontecesse a
reflexão sobre ela, o que o Curso não proporcionou.
A nosso ver, a fragilidade da proposta do Seminário Temático de Matemática residiu
na forma como as atividades práticas foram definidas e sugeridas para serem aplicadas pelos
professores-acadêmicos, sem considerar as características dos alunos das escolas em que os
acadêmicos são professores. Mesmo assim, os sujeitos acreditaram na concepção de ensino de
Matemática apresentado pelo Curso porque a proposta de trabalho com conteúdos
matemáticos utilizando-se da ludicidade foi bem aceita tanto pelo acadêmico quanto pelos
seus alunos:
[...] podíamos perceber as diferentes estratégias utilizadas pelos alunos para
realizarem as tarefas propostas. Tornou-se evidente que ao utilizar uma
metodologia adequada, o professor tem condições de levar os alunos a
alcançarem um bom rendimento nas aulas de matemática e que, mesmo que
o aprendizado aconteça de forma diferente para cada aluno, todos tem
capacidade de aprender (A10, RR p.7).
O fato de as atividades práticas terem sido desenvolvidas com fluência, tanto na sala
de aula como nas oficinas do Seminário Temático, fez com que os acadêmicos a percebessem
113
como um conhecimento inovador para ser desenvolvido na prática. Como apenas aplicaram as
atividades práticas propostas durante a realização da Área de Matemática, e não foram eles
que as elaboraram, podem não ter aprendido a desenvolver atividades práticas de Matemática
para suprir as necessidades de seus alunos. Logo, não se tornou um hábito, porque este se
torna mais espontâneo, na medida em que a prática se torna mais recorrente, pois as atividades
práticas sugeriram uma metodologia para uma realidade abstrata, e isso pode acarretar em
descontinuidade desse conhecimento, levando o professor-acadêmico voltar a acreditar e
executar suas crenças anteriores, porque o conhecimento novo pode se apresentar na ação
(PIMENTA, 2002: 20), (CONTRERAS, 2002: 107), (ALARCÃO, 1996, 16). Como a
proposta metodológica de ensino de Matemática oferecida pelo Curso foi um momento que
não proporcionou a continuidade do desenvolvimento desse novo saber aos professores-
acadêmicos, diminui-se a possibilidade de ter no Curso um movimento para o modelo de
professor reflexivo.
4.6 Meio III, a realização do Seminário Temático de Matemática: do planejamento à
avaliação
Os professores-acadêmicos para apresentação da oficina no Seminário Temático,
trouxeram uma das atividades que desenvolveram na sala de aula. O grupo aplicador
coordenou o encaminhamento da oficina com a ajuda do grupo auxiliar.
As funções do grupo aplicador foram preparar e aplicar a atividade na oficina do
Seminário Temático, enquanto o grupo auxiliar acompanhava os procedimentos da oficina,
ajudando a distribuir entre os participantes o material didático, esclarecer dúvidas dos
participantes da oficina e, se caso o grupo aplicador deixasse de esclarecer alguns dos
conceitos importantes abordados nas atividades práticas, teriam a função de resgatá-los.
Desde o início das atividades da Área de Matemática, os acadêmicos vinham,
gradativamente, preparando e desenvolvendo as atividades práticas com seus alunos do ensino
fundamental. Não realizaram todas as atividades propostas no programa, pelo fato de que elas
eram destinadas às diversas fases de aprendizagem das crianças. Os professores-acadêmicos,
com a anuência do orientador acadêmico, escolhiam somente as atividades que se adaptavam
às fases de seus alunos para aplicar em suas salas de aula.
114
O Seminário Temático de Matemática consistiu no desenvolvimento (com os alunos
do ensino fundamental) e aplicação (nas oficinas), das atividades práticas da Matemática,
objetivando vivenciar na prática docente os conteúdos e metodologias propostas através das
atividades práticas.
4.6.1 O acadêmico frente à proposta de realização das oficinas no Seminário Temático
As relações estabelecidas entre os acadêmicos, à equipe organizadora e as atividades
práticas programadas para o Seminário Temático de Matemática retrataram uma característica
peculiar a esta Área.
A escolha dos grupos de alunos integrantes do Curso que iriam ser aplicadores ou
auxiliares das apresentações nas oficinas, conforme já nos referimos, deu-se em reunião
coletiva entre o Coordenador Pedagógico do Curso e os orientadores acadêmicos. Os
orientadores acadêmicos forneceram à coordenação a relação nominal dos acadêmicos e as
respectivas atividades que eles, em conjunto, desenvolveram com seus alunos nas escolas. De
posse desses dados, em reunião coletiva entre coordenador e orientadores, definiu-se que
quem iria coordenar e aplicar cada oficina seriam os grupos de professores-acadêmicos que
tivessem melhor domínio da respectiva atividade prática, segundo o julgamento do orientador
acadêmico que era responsável pela orientação dos grupos.
nas oficinas do Seminário Temático, em cada sala de apresentação, fazia-se
presente um orientador acadêmico, constituindo a banca de exame das apresentações. A
escolha da atividade para cada grupo foi realizada pelo Coordenador Pedagógica do Curso,
considerando as informações oferecidas pelos orientadores acadêmicos. Trata-se de atividades
que haviam sido desenvolvidas com os alunos do ensino fundamental e, sendo assim, não
replanejaram a atividade para ser desenvolvida na oficina, pois tinham a sugestão de
desenvolvê-la metodologicamente, de forma idêntica à sala de aula, assim como afirmam, ao
serem questionados se aplicaram a atividade prática como proposto pelo Curso, ou a
reorganizaram:
Não foi feita nenhuma reorganização, eu apliquei exatamente como foi
proposta, se fosse feita alguma alteração, deveria dizer o ‘porque’ e como o
tempo é sempre pouco, não reorganizei nada (A8, Q1B, R03).
115
O seminário acabou se transformando numa mera repetição de tudo o que
havia sido discutido. Digo isto porque não houve nenhum aprofundamento
com relação aos conceitos trabalhados nos fascículos. Ficou o dito pelo já
dito, contradizendo a proposta de avaliação do curso, (...) que é a de
oportunizar ao aluno, elementos para a produção de um trabalho de análise
crítico-reflexiva frente a uma determinada temática ou situação do cotidiano
escolar (A6, RR p.07).
Como podemos observar nos relatos acima, para o acadêmico realizar as atividades
práticas de Matemática na oficina, não lhes foi possibilitada a alternativa de racionalizar a sua
prática docente (TARDIF, 2002: 205) com vistas à ressignificação de seus saberes
profissionais da docência. Já se sabe que o saber docente não se constrói de forma
descontextualizada, com atividades em que o aluno da Pedagogia apenas faz aplicação de
conhecimentos produzidos por outros, pois como nos diz Tardif (2002: 11):
o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber deles
e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a experiência de vida e
com a sua história profissional, com as suas relações com os alunos em sala de aula
e com os outros atores escolares.
Por isso, as atividades que foram destinadas à apresentação nas oficinas deveriam ser
resultantes de propostas metodológicas desenvolvidas pelo próprio professor-acadêmico, para
o caso específico de seus alunos na sala de aula. Assim, o Seminário Temático, com as
oficinas, tornar-se-ia um espaço de debates sobre os contextos de articulação dos saberes
profissionais, e não uma mera repetição de atividades que se passaram em sala de aula.
Como frisamos neste trabalho, nas oficinas, houve apenas a apresentação de um método
utilizado para cumprir os procedimentos metodológicos das atividades práticas determinadas
pela Coordenação do Curso, e os interessados em participar nas oficinas eram os professores-
acadêmicos que não haviam estudado e desenvolvido tais atividades em sala de aula, pelo fato
de terem desenvolvido outras que julgaram ser as mais adequadas à fase de seus alunos, assim
como podemos observar na afirmação seguinte, em que se descreve o Seminário Temático:
foi um momento propício para partilhar experiências (A9, RR p.7).
Nele puderam:
presenciar trabalhos que não tinha tido oportunidade de pôr em prática com
os meus alunos, me dando mais subsídios para a execução do mesmo
posteriormente (A9, RR p.8).
116
Evidencia-se nesses relatos que nas oficinas do Seminário Temático favoreceram-se
a troca de experiências e a aquisição de conhecimentos na prática docente. Questionamos
essas afirmações, porque, durante a realização das oficinas, não houve apresentação de
trabalhos elaborados a partir da experiência docente dos sujeitos, que todos os professores-
acadêmicos tiveram acesso ao rol de atividades que foram propostas durante a realização da
Área de Matemática: bastava desenvolvê-las com seus alunos, de acordo com as orientações
metodológicas de cada uma. Durante a execução da oficina, o subsídio oferecido aos
professores-acadêmicos que dela participaram foi o de como fazer para desenvolver cada uma
das atividades práticas. Se relataram que vão “executar” a mesma atividade na sua sala de
aula, evidencia-se o treinamento do professor para a execução de programas definidos fora de
seu contexto prático e da realidade de sua sala de aula, caracterizando um professor técnico,
que não articula saberes experienciais com os saberes científico-pedagógicos.
A apresentação das atividades nas oficinas ocorreu simultaneamente em várias salas
no decorrer de dois dias. Assim, os participantes puderam escolher quais oficinas iriam
assistir. Para apresentar as atividades nas oficinas do Seminário, os acadêmicos foram
orientados, no sentido de que adotassem encaminhamentos metodológicos parecidos com o
desenvolvido em suas salas de aula:
Segundo as orientações que nos passaram, é para trabalhar assim de forma
bem natural, real como a gente trabalhou com os alunos. Com os alunos
demorou muito mais tempo, até eles construírem seu conhecimento,
chegarem as suas próprias conclusões. Aqui vai ser muito mais rápido
porque estamos trabalhando com os colegas acadêmicos (Grupo A1, A2, A3
na apresentação da oficina, p.01).
Isso fez com que as oficinas fossem organizadas para demonstrar todos os passos que
também foram trilhados pelos alunos do ensino fundamental, quando desenvolveram as
atividades práticas, tendo ocupado a maior parte do tempo da oficina explicando esses passos
e abordando muito pouco as discussões sobre a própria prática docente, quanto ao ensino de
Matemática. No relato abaixo, fica explicitado tal posicionamento, quando o orientador
acadêmico que coordenava a oficina comenta sobre ela:
O autor também coloca que estas atividades são o ponto de partida, que
depois vem o que significa: o uso do livro didático né, não fica nisso,
porque agora talvez vocês desenvolveram a atividade de forma pontual que
tem que cumprir a proposta de avaliação do curso né? Então, aplica-se a
atividade, mas de uma forma assim meio corrida né? Mas a proposta do
117
autor é que seja dada a continuidade do conteúdo, avançando pra aspectos
mais formal, mais abstrato. Não ficar também só preso nessas atividades.
Alguns conteúdos vocês não vão anotar tanto, como é o caso da geometria,
mas lá nos cálculos das quatro operações, vocês desenvolveram algumas
atividades de aproximação e posteriormente vão avançando para o algoritmo
e tal. Mas então, como eu falei, nosso debate ficou um pouco comprometido
pela falta de tempo, se alguém tem mais consideração a fazer, fique a
vontade. (comentário do orientador que coordenava a oficina aos membros
do grupo de A1, A2, A3).
Fica claro aqui que a proposta das oficinas do Seminário Temático de Matemática no
Curso previa de que os acadêmicos apenas desenvolvessem a atividade para o fim específico
de avaliação. No relato aparece também que a proposição é que os alunos do Curso dêem
continuidade aos conteúdos com seus alunos. Mas, como fazer isso, se esses conteúdos não
fizeram parte do planejamento curricular do professor na escola? Como seria isso? O
professor teria que desconsiderar seu plano e adotar um outro conferido pelo Curso?
Certamente não seria esse o procedimento a ser tomado. O ideal teria sido um replanejamento
das aulas, a partir de suas reflexões teóricas e práticas, suscitadas pelas atividades
vivenciadas, buscando-se a ressignificação da prática docente, o que ia ao encontro daquilo
que Nóvoa (1992: 28) afirma: os professores se assumem como “produtores da sua
profissão”. Sendo influenciado e transformado pela sua ação, o professor constrói, assim, sua
identidade.
Na fala acima, evidencia-se que o tempo não foi suficiente para se fazer o debate das
questões que verdadeiramente interessavam ao Seminário Temático. Essa falta de tempo
atribui-se ao fato de estarem privilegiadas nas oficinas somente as reapresentações das
atividades práticas. O tempo não foi gerenciado para o debate pedagógico da prática docente.
E, tendo em vista que era um orientador acadêmico que estava responsável pela coordenação
lógica da oficina, deveria ele fazer o gerenciamento do tempo. Mas pelo contrário, fê-lo,
excluindo, todavia, a possibilidade do momento para o debate.
Se a proposta dos Seminários Temáticos do Curso é uma oportunidade para o debate
de questões problemáticas que afligem o professor-acadêmico, então questionamos os
motivos que levaram à não-organização do tempo, durante as oficinas, para se criar um
espaço de debates das questões relacionadas ao ensino de Matemática e à ressignificação de
saberes. Arriscamo-nos a afirmar, então, que as oficinas foram somente um espaço de
socialização de atividades práticas sugeridas, durante a realização da Área de Matemática, e
de apresentação de saberes pedagógicos aos professores-acadêmicos.
118
O desenvolvimento das oficinas no Seminário se deu em todas, mais ou menos com
as mesmas características. Os sujeitos aplicadores faziam à abertura da oficina, apresentando
o nome da atividade que iriam desenvolver e, na seqüência, em um cartaz, expunham os
objetivos como segue:
O JOGO DO TANGRAN
Objetivos:
Identificar Polígonos;
Propor aos alunos construções de polígonos, usando o Tangran de 07 peças;
Construir e classificar polígonos de 3, 4, 5 e 6 lados (Oficina do grupo A1,
A2, A3, p.01).
Os cartazes fixados na parede da sala eram lidos em voz alta e, na seqüência,
iniciavam as atividades da oficina, quando o grupo aplicador fazia a distribuição de material
pedagógico aos participantes, e iniciam-se, propriamente, as atividades, assim como no relato
que fazemos a seguir, do grupo composto por A4 e A5 (p.01-02): distribuem caixinhas de
papelão aos participantes, para que as desmontem e montem novamente, e ao terminarem esta
tarefa, comentam com os participantes, que as caixinhas retornaram à sua forma inicial e se
tornaram novamente uns sólidos geométricos. Distribuem aos participantes folhas de papel
com desenhos geométricos e orientam para que recortem nos traçados fortes e dobrem o papel
nos pontilhados, e dizem que assim irão montar poliedros. Todos os poliedros montados são
colocados em uma caixa grande posicionada ao centro da sala. Os auxiliares, conversam
baixinho com os participantes que montam os sólidos geométricos, manuseando-os e
contando os lados. “Quem não sabe o qual é o tetraedro?(p.02) pergunta uma aplicadora.
Ninguém se manifesta. Pede aos participantes para colorirem a parte do tetraedro que está
virada para mesa e, assim, os participantes fazem-no. Passam para outra atividade,
distribuindo uma folha de papel com desenhos aos participantes e instruem: “Colorir três de
seus vértices, colorir de azul as arestas e de amarelo as partes visíveis” (p.02), e continuam
lendo as instruções, enquanto os participantes executam a tarefa. O próximo passo foi chamar
um participante à lousa para escrever uma fórmula matemática, para a qual se tem o valor dos
vértices e número de faces (já escrito na lousa) para se calcularem as arestas.
Dessa forma, as atividades foram desenvolvidas, passo a passo, metodologicamente,
pouco organizadas, podendo ter dificultado a compreensão da seqüência da oficina aos
119
participantes. Os conteúdos matemáticos ali presentes não foram discutidos, de forma que
ficassem melhor evidenciados aos participantes e possibilitassem reflexão das respectivas
abordagens. Faltou domínio de saberes profissionais e disciplinares para articular com os
saberes experienciais que estavam sendo mobilizados na prática docente que se realizava.
Essa problemática também foi sentida, de forma significativa pelos sujeitos que compunham o
grupo que apresentava a oficina, e relata ao avaliá-la:
a respeito da oficina apresentada por meu grupo, pude observar que muitos
dos participantes necessitavam de um melhor trabalho com o material
utilizado, já que sentiam dificuldades de manipulação, tanto no recorte,
como nas dobraduras e colagens, visto que estas pessoas deveriam ter visto
ou aplicado esta experiência anterior por serem acadêmicos e professores
regentes de sala (A4, RR p.6).
Nesse sentido, fica esclarecido que os acadêmicos participantes da oficina não
desenvolveram todas as atividades propostas no plano curricular da Área e tiveram
dificuldades no processo de realização da oficina em que participaram. Se tiveram
dificuldades como ouvintes nas oficinas, isso significa que não adquiriram domínio dos
conteúdos e metodologias que estavam sendo apresentadas nas oficinas, e sendo assim, não
possuem condições favoráveis para desenvolver tais propostas nas salas de aula do ensino
fundamental. Isso faz com que a relação teoria-prática no Curso seja prejudicada em função
da falta de domínio dos conhecimentos teóricos abordados nas atividades práticas. não
sentiram dificuldades os aplicadores e auxiliares ao desenvolverem as oficinas, por terem
aplicado a mesma atividade em sala de aula, e relatam, ao responderem, se tiveram
dificuldades na preparação da oficina no Seminário Temático:
Não foi difícil a apresentação, pois a preparação foi a mesma feita para os
alunos, só o nervosismo é maior em um seminário (A9, Q1B, R04).
Não tive dificuldades de preparação da oficina, haja visto que fui auxiliar,
apenas os ajudamos em algumas dificuldades que surgiram nas pessoas que
participavam como expectadores, enfocando sempre e relação teoria-prática
(A4, Q1B, R04).
Os sujeitos não demonstraram criticidade quanto à forma do Seminário Temático,
que não lhes proporcionava saberes, ao apresentarem as atividades práticas, e relatam com a
maior naturalidade que, nas oficinas repetiram os procedimentos testados com seus alunos.
Não houve desafios, e as oficinas tornaram-se uma atividade instrumental que não tiveram um
120
fim prático emancipador, contrariando, como afirma Contreras (2002: 185), a possibilidade de
desenvolver mais habilidades formativas nos alunos do Curso, rumo ao modelo de professores
como intelectuais críticos e possuidores de autonomia profissional. Neste sentido, o esforço
do sujeito é para descobrir o oculto, transparecer a origem histórica e social do que se
apresenta como natural, e a autonomia profissional não se limita a posições estanques, mas é
um processo continuo de descobertas e de transformação das diferenças entre nossa
prática cotidiana e as aspirações sociais e educativas de um ensino guiado pelos
valores da igualdade, justiça e democracia (CONTRERAS, 2002: 185).
Os alunos do Curso fizeram pouca reflexão para buscar melhor entendimento da
postura pedagógica que assumiram na oficina que desenvolveram ou sobre a forma como lhes
foi apresentada à proposta de atividades. Não foi buscada a compreensão do oculto que
permeou as atividades práticas, tampouco houve um processo de descobertas e
transformações, deixando indícios de que o conhecimento dos professores, seus saberes
profissionais pouco foram reconstruídos, a partir do exercício de sua própria reflexão, nos
termos utilizados por Kincheloe (1997: 193), para o qual o poder dos indivíduos, profissionais
e membros dos grupos sociais, será dramaticamente afetado pela habilidade cognitiva para ver
além da superfície, em tornar-se
“um esforço pós-formal para reconhecer sentido profundo no
trivial”.
Essa possibilidade não foi favorecida no processo de realização do Seminário
Temático da Área de Matemática e, conseqüentemente, nesse meio formativo.
Os sujeitos, de certa forma, acreditam que as oficinas foram bastante valiosas para
eles, pois lhes trouxeram informações que não possuíam:
Sem dúvida as oficinas passaram para o público presente o seu principal
objetivo, ensinar o aluno a partir do contexto em que vive trazendo seu
conhecimento para a atualidade (A7, RR p.06).
[...] percebemos que as apresentações das oficinas eram uma forma muito
boa de contribuir com o processo de aprendizagem dos acadêmicos, tanto
quem apresentava quanto o grupo que assistia entendeu que aquele era um
momento muito favorável para a troca de experiências (A10, RR p.8).
Relatos como estes se evidenciam com bastante intensidade entre os sujeitos. No
primeiro, procura-se explicitar que as atividades práticas, da forma como estavam organizadas
pela equipe pedagógica do Curso, sugeriam que os acadêmicos utilizassem procedimentos que
exigissem materiais manipuláveis, tais como a construção de sólidos geométricos, a partir de
121
folha de papel (sujeitos A4, A5 com a atividade Poliedros de Platão), recortes do Tangran em
papel e posterior montagem das 07 (sete) peças do jogo (sujeitos A1, A2, A3, com a atividade
O Jogo do Tangran), e pintura em gravuras de flores, desenhadas em papel (sujeitos A9, A10
com a atividade Polígonos). Por isso, é que se referem ao ensino da Matemática, a partir do
contexto vivido. Mas, as atividades práticas não abordaram, metodologicamente, os conteúdos
a partir do cotidiano dos alunos, pelo fato de que todos os procedimentos e materiais
estavam estabelecidos a priori e, de forma inquestionável, foram aplicados. Os alunos na sala
de aula e, posteriormente, os acadêmicos na oficina gostaram mais da atividade, pelo fato de
fazerem Matemática de forma diferente, com o uso da ludicidade e manipulação de materiais,
no que diferem das propostas pedagógicas tradicionais de Matemática de que possuíam um
certo domínio.
No segundo relato apresentado acima, identifica-se que a oficina do Seminário
Temático de Matemática foi um bom momento para a troca de experiências, já que os
participantes procuravam assistir às oficinas nas quais não haviam desenvolvido as atividades
com seus alunos. Esse foi mais um momento de socialização das experiências práticas
vivenciadas com os alunos do ensino fundamental, do que de inserção na construção de
saberes.
É importante destacar também que, nas oficinas, não foi destinado espaço suficiente
para o debate pedagógico da própria experiência que vivenciaram na sala de aula do ensino
fundamental, tornando-se um momento em que a construção coletiva e partilha dos saberes
específicos da profissão (TARDIF, 2002: 217) pouco foram enfatizadas.
E, nesse sentido, já que os conteúdos abordados nas oficinas e suas metodologias não
entraram para o debate pedagógico, a articulação teoria-prática acaba sendo prejudicada, pois
seria muito mais rico se essa construção fosse instigada coletivamente, logo após o
desenvolvimento da atividade prática na oficina. Assim, os alunos do Curso teriam mais
elementos para desenvolver o seu processo reflexivo, ressignificando seus saberes para uma
tomada de decisão e superando o modelo de professor, como um profissional técnico, que
para Contreras (2002: 97), nesse modelo, o conhecimento pedagógico disponível dirige sua
prática, no sentido de fornecer-lhe meios para reconhecer os problemas e solucioná-los.
122
4.6.2 A articulação teoria/prática dos saberes científico-pedagógicos com os saberes
experienciais
O Seminário Temático é o momento privilegiado do Curso para que o professor-
acadêmico realize a articulação dos conhecimentos teóricos com os de sua prática docente,
tendo em vista que, pela sua proposta curricular, é nesse momento que se proporcionaram ao
aluno instrumentos teóricos e metodológicos que o levem a uma reflexão de sua prática
docente, na perspectiva de ressignificá-la, tendo como referência a teoria estudada na Área
De acordo com o relato dos sujeitos, podemos perceber o seguinte, ao questioná-los
se as atividades aplicadas na sala de aula e na oficina do Seminário, possibilitaram a
articulação da teoria com a prática:
Sim. Em todos os momentos, especialmente no planejamento e no relatório
sobre a intervenção do professor, que exigia uma reflexão da prática
embasados em referenciais teóricos (A6, Q1A, R08).
Sim. Ao levarmos as atividades para a sala tivemos a oportunidade de
confrontar as teorias estudadas com a prática em sala de aula. Isso nos
incentivava a fazer constantemente uma reflexão sobre a ação (A10, Q1A,
R08).
É unânime a afirmação de que, durante o processo de desenvolvimento da atividade
prática na sala de aula com seus alunos, os acadêmicos fizeram a articulação da teoria com a
prática. No primeiro relato, destaca-se essa relação, quando o acadêmico construía o relatório
de aplicação das atividades práticas na sala de aula. Logo, subtende-se que a teoria-prática
verificou-se mais especificamente, quando da aplicação da atividade aos alunos, não se
considerando a reflexão com a mesma relevância em outros momentos do Seminário
Temático de Matemática. Como no segundo caso, afirmam que as teorias estudadas foram
confrontadas com a prática docente que desencadeavam, ao aplicar-se a atividade prática que
lhes foi proposta pelo Curso.
Podemos destacar que, no caso acima, a reflexão da prática docente, articulando os
conhecimentos científico-pedagógicos com os experienciais, pode não ter ocorrido, pois como
se pode perceber nas falas dos sujeitos, a relação teoria-prática restringiu-se à atividade
prática que desenvolviam com seus alunos, não ampliando o processo reflexivo a todo o
contexto da prática docente. Além do mais, como pode a atividade ter desencadeado a
123
articulação teoria-prática, se nela todos os conteúdos e procedimentos metodológicos para a
aplicação estavam previamente definidos, desconectados da realidade da prática docente
dos acadêmicos? Nestes termos, o objetivo do aluno foi de desenvolver a atividade de acordo
com os procedimentos exigidos, para alcançar também os objetivos definidos, reduzindo
assim, a possibilidade de pensar a prática. Fica evidente nas falas, que os sujeitos ainda não
compreenderam a profundidade e o contexto em que essa relação teoria prática é efetivada.
Nesse sentido, Kincheloe (1997: 159) afirma que o professor, ao assumir uma
postura, como a apresentada acima, em que se aplicam informações acumuladas pela ciência a
situações específicas de sala de aula, acaba por tornar-se um profissional não-crítico, cuja
prática se torna nula de racionalidade.
Durante a realização da oficina, uma possível mobilização de saberes científico-
pedagógicos com os saberes experienciais é abordada pelo grupo, quando discute, após ter
apresentado a oficina, a forma pela qual os alunos se organizaram, quando da realização das
atividades práticas em suas salas de aula:
Que para nós, enquanto professores é difícil trabalhar com essa sala dessa
maneira, por quê? Por que nem nós sabemos realmente como conduzir para
que certo que todo mundo consiga no mesmo instante, porque nós somos
educados de uma outra maneira, que na realidade essa bagunça toda é o
momento em que a criança aprende realmente; que ela está manipulando, ela
está organizando, está pondo seu pensamento para florir mesmo, e aos
poucos eles mesmos vão se organizando do mesmo jeito que a gente vai
conseguindo se organizar (Oficina do grupo A1, A2, A3, p.04).
Para os sujeitos, a sala de aula se tornou agitada com a atividade que desencadeavam,
mas têm consciência de que é impossível que todos os alunos possuam o mesmo processo
gradual de aprendizagem e que, para alcançar os objetivos, os alunos necessitam, antes,
organizar o pensamento. Neste sentido, revela-se na oficina uma mobilização dos saberes
disciplinares, ao mencionarem-se os conteúdos que se referem à aprendizagem das crianças
18
,
articulando-se com os saberes experienciais, quando se resgatam os conhecimentos referentes
à metodologia de condução da aula de Matemática. No entanto, retoma-se o caráter limitador
da proposta da atividade prática, pois os sujeitos não possuíam prática docente organizada
metodologicamente, da forma como foi apresentada nas oficinas e, ao buscarem a relação
teoria-prática, fazem-no, mas somente considerando a experiência prática, particularizada,
18
Os conteúdos que tratam do processo de aprendizagem matemática pelas crianças foram abordados no
fascículo I de Matemática.
124
desse momento do Seminário Temático, sem ampliar para outros fatores da prática docente do
ensino da Matemática, como já afirmamos acima.
Os sujeitos também fazem relatos da experiência que tiveram no Seminário Temático
de Matemática, do que se pode destacar:
[...] podíamos perceber as diferentes estratégias utilizadas pelos alunos para
realizarem as tarefas propostas. Tornou-se evidente que ao utilizar uma
metodologia adequada, o professor tem condições de levar os alunos a
alcançarem um bom rendimento nas aulas de matemática e que, mesmo que
o aprendizado aconteça de forma diferente para cada aluno, todos m
capacidade de aprender (A10, RR p.7).
Outra contribuição muito valiosa foi a melhoria da qualidade de ensino nas
salas de aula, pois uma vez que o professor tem bases sólidas de
entendimento, em determinados assuntos, ele terá subsídios para desenvolver
os conteúdos com maior êxito em suas aulas, também terá recursos para
despertar o interesse em seus alunos (A11, RR p.12).
Foi de suma importância o desenvolvimento das atividades práticas pelo professor
acadêmico com os alunos da escola, utilizando-se dos procedimentos metodológicos definidos
pelo Curso. Isso possibilitou que os sujeitos percebessem que, nas aulas de Matemática, é
possível propor metodologias que levem em conta um aprendizado mais significativo, em que
o professor ficará mais atento aos interesses dos alunos, buscando maior compreensão
conceitual e metodológica para a prática, pelo que poderá superar a postura tradicional de
ensino da disciplina. No entanto, a preocupação fundamental, que os sujeitos demonstraram,
está com o foco na questão metodológica do ensino da Matemática, e pouco na teórica,
levando-os a terem dificuldades para concretizar a melhoria de suas práticas docente por
ficarem sem a fundamentação teórica que subsidie. Nesses termos, podemos afirmar que o
Seminário Temático teve pouco ambiente propício para que os sujeitos fizessem uma reflexão
sistemática destes conceitos trabalhados na respectiva Área para possibilitar articulação dos
saberes, tendo como eixo a prática docente.
Na fala dos sujeitos, é muito presente o relato como o expresso a seguir, ao tratar do
Seminário Temático:
através dele pude analisar diretamente a prática pedagógica relativa ao
ensino da matemática em todos os aspectos: ensino, aprendizagem,
metodologia e avaliação. [...] tornando-se conseqüentemente, o momento de
maior aprendizagem (A6, RR p.4,5).
125
no que se refere ao seminário de matemática, houve novas situações para o
aprendizado de conceitos matemáticos, bem como a troca de experiências,
quanto às oficinas apresentadas serviram para contribuir e socializar os
conhecimentos aplicados nos trabalhos desenvolvidos com os alunos e
conseqüentemente interagidos com os colegas (A4, RR p.6).
Nesses discursos, percebe-se um esvaziamento de conteúdos que subsidiem o aluno
para que ele possa refletir sobre sua prática docente, uma vez que afirmam que tiveram novas
aprendizagens, mas não às evidenciam. O dia da apresentação do Seminário Temático seria a
oportunidade privilegiada para que, por meio de uma metodologia que valorizasse o debate
sobre os saberes profissionais, trouxessem-se à tona os saberes científico-pedagógicos e os
saberes experienciais dos professores-acadêmicos, que a prática docente realizada com as
atividades práticas na oficina se mostrou ineficiente para resgatar, teoricamente, os conceitos
estudados na Área e articulá-los com a prática profissional docente, de forma a ressignificar
os saberes desses professores em formação.
Os sujeitos demonstram ter aprendido elementos teóricos, mas como não os
articulam com a prática profissional, esses elementos logo se tornam insignificante para eles.
É, como afirma Contreras (2002: 156) “a reflexão dos docentes, deixada a seu próprio curso,
pode-se encontrar impedida de ir além de seus próprios limites, isto é, de ir além da
experiência e dos círculos viciosos nos quais se encontra atada”, fragilizando sua prática, a
mercê das autoridades burocráticas, tanto é que os sujeitos não perceberam quão momentâneo
foi esse aprendizado que obtiveram.
Assim, os sujeitos, professores em formação, precisam de uma formação teórica
orientada para a compreensão e análise crítica da prática docente e de seu contexto.
Necessitam eles de transcender os limites, em que o trabalho está inscrito, e superar a visão
meramente técnica de separação entre a concepção e execução das propostas educativas
(KINCHELOE, 1997, 186).
4.7 O conhecimento ressignificado na formação acadêmica dos alunos no Curso de
Pedagogia
A formação docente dos professores-acadêmicos, de acordo com o objetivo do
projeto curricular do Curso (NEDER e PRETI, 2003: 29-30), visa a que o aluno compreenda
126
as múltiplas inter-relações teóricas, metodológicas e práticas que subjazem à docência, no
ensino fundamental, bem como compreendam os eventos do cotidiano docente,
perspectivando a sua colaboração, na construção de um projeto educativo que venha
corroborar o que pretendem os sujeitos na sociedade. Para tanto, faz-se necessário, na maioria
dos casos, que os alunos tomem para si novos saberes, mobilizados através do Curso,
ressignificando, assim, os conhecimentos da formação profissional e experienciais que, até
então, possuíam, bem como a própria prática profissional, buscando, desse modo, novas
concepções teóricas e de práticas.
4.7.1 Postura do acadêmico frente à Área de Matemática: suas percepções, limites e
superações
Os sujeitos da pesquisa, ao realizarem as atividades do Seminário Temático na Área
de Matemática, desenvolveram algumas concepções, quanto a essa disciplina e revelaram as
que possuíam. Trata-se de posicionamentos que dizem respeito às suas percepções, quanto ao
processo que o Seminário Temático de Matemática percorreu, os limites impostos a eles,
quanto à ressignificação de saberes, e às suas superações, em face de posturas que consideram
tradicionais para a prática docente que possuem.
As percepções evidenciadas pelo Seminário Temático quanto ao ensino da Matemática:
O Seminário Temático de Matemática suscitou nos acadêmicos indícios de algumas
reflexões sobre as concepções que possuíam do ensino de Matemática, e que foram
provocadas, em função das atividades práticas que realizaram. Essas reflexões foram
privilegiadas no momento em que os alunos realizavam o relatório reflexivo
19
, pois em outros
momentos da pesquisa foram pouco percebidas nos sujeitos, evidenciando-se mais a
reprodução de saberes.
O modelo de reflexão que aqui adotamos é aquele referido por Kincheloe (1997:
188), em que o professor não se propõe a descrever a prática, mas a mudá-la. E, nessa
perspectiva, os professores-acadêmicos do Curso deveriam refletir sobre suas práticas para
19
Utilizei esses relatórios reflexivos como fontes de dados para a pesquisa. Esses relatórios foram desenvolvidos
como etapa avaliativa do Seminário Temático e fechamento da Área de Matemática.
127
melhor compreendê-las, tendo como parâmetros os saberes desencadeados na formação
acadêmica. Isso implica articularem essa formação acadêmica com os saberes da prática,
ressignificando-a. No entanto, não fizeram a reflexão da prática com a profundidade esperada.
Com a realização das atividades da Área de Matemática no Curso, ficou perceptível
como os sujeitos tratam essa disciplina, pela forma como a aprenderam e como a ensinavam,
comparando-se essas práticas com a proposta pedagógica oferecida no Curso:
Na forma como aprendi, sempre foi com base na decoreba, o que dificultou a
minha aprendizagem e no futuro a prática em sala de aula, a qual exige uma
formação dinâmica, ativa voltada para a necessidade do sujeito na
atualidade, e não como simples repasse de informação (A7, RR p.02).
Pois aprendi matemática de forma fragmentada, onde o que valia era a forma
como a professora ensinava, não havia diálogo, nem respeito, o que
precisava era somente fazer os exercícios seguindo os benditos modelos ali
existentes e que por muitas vezes por não entender tais modelos e ter medo
da professora acabei me frustrando e perdendo a graça com a matemática,
(...) tive muita dificuldade em resolver os exercícios matemáticos de alguns
fascículos, inclusive alguns foi possível com a explicação do orientador
(A8, RR p.4).
Destaca-se nos relatos acima, a crítica que os sujeitos fazem ao modelo de ensino de
Matemática que, até então, prevalecia em seus saberes, que, agora, desaprovam, como é o
caso do simples repasse de informações, a Matemática fragmentada e as propostas de seguir
o modelo. Seus discursos revelam a percepção de que o ensino com essas características não
forma o sujeito preparado para resolver suas necessidades sociais. Porém, não percebem que a
própria estrutura curricular do Curso, está sendo executada por meio de repasse de
informação, seguindo modelos pré-definidos, e que sua ação, enquanto alunos, restringiu-se a
resolver exercícios matemáticos descontextualizados. O encantamento dos professores-
acadêmicos com a metodologia da Matemática, baseada no lúdico, encobriu a concepção de
ensino que estava presente na forma de ensinamento que estavam recebendo e que, embora os
modelos das atividades práticas fossem baseados no jogo, a resolução dos problemas de deu
de forma mecânica.
Na proposta pedagógica da Área de Matemática, realizaram-se atividades que
apresentaram características metodológicas que não aprovam em seus discursos, no sentido de
que apenas executaram atividades de cuja programação e planejamento não participaram.
Seguiram o modelo proposto e definido exteriormente à sua realidade. Além do mais, essas
128
atividades práticas que desenvolveram com os alunos e posteriormente refizeram-na em
oficinas do Seminário Temático, fragmentaram o planejamento curricular da Matemática da
escola em que atuam, uma vez que essas atividades não foram previstas no planejamento
anual, mas os professores-acadêmicos tiveram que deixar de desenvolver em um certo
momento o seu planejamento escolar, para aplicar, com seus alunos, as atividades práticas
sugeridas pelo Curso.
Neste sentido, essas atividades ficaram descontextualizadas da realidade escolar, não
indo ao encontro daquilo a que se refere Tardif (2002: 11), na direção de que o saber dos
professores é um saber social” por estar diretamente ligado às condições que estruturam o
seu trabalho. Para o mesmo autor (2002: 14), uma proposta que elimina a contribuição dos
atores na construção do saber está na concepção do sociologismo, porque elimina a
contribuição dos atores na construção concreta do saber, que é deixada a cabo dos
mecanismos sociais.
Os sujeitos da pesquisa relatam as suas percepções, quanto às concepções que
possuíam desta Área de Matemática, enquanto disciplina do currículo escolar:
minha maior preocupação era a assimilação de regras, para resolver as
operações com cálculos extensos (equações, raízes, lculos de área, ...).
Mesmo sabendo que a matemática é uma interpretação constante, minha
concepção era de fazer cálculos, pouco valorizando a interpretação
matemática do cotidiano (A1, RR p.3).
[...] as expectativas foram ainda maiores, justamente por se tratar da área que
mais encontro dificuldade para trabalhar. Certamente reflexo de meu tempo
de ‘escola’, ou seja, da forma como me ensinaram matemática. Um ensino
mais voltado para a teoria que para a prática (A6, RR p.2).
Evidenciaram-se nos relatos, as expectativas que possuíam em relação à Matemática,
pois pensavam que, no Curso seriam trabalhadas as regras matemáticas. A expectativa que
possuíam era a de que a sua formação nessa área se daria através de treino de modelos e
exercícios da Matemática. Pode-se interpretar com isso, que era essa a concepção (tradicional)
de ensino de Matemática que possuíam. Verificou-se, porém, a concepção trabalhada no
Curso não avançou muito para outras concepções, porque acabou por executar o treino de
modelos matemáticos, e as atividades práticas, ao contrário do que afirmam, não valorizaram
a interpretação do cotidiano docente, tendo reproduzido os mesmos procedimentos já
considerados antigos pelos sujeitos, sobre o que afirmam que se percebiam-se como alunos
129
assimiladores de regras e procedimentos de conteúdos e não como professores em formação
que devem refletir a prática docente para ressignificá-la. O relato abaixo pode representar essa
visão:
Pois aprendi matemática de forma fragmentada, onde o que valia era a forma
como a professora ensinava, não havia diálogo, nem respeito, o que
precisava era somente fazer os exercícios seguindo os benditos modelos ali
existentes e que por muitas vezes por não entender tais modelos e ter medo
da professora acabei me frustrando e perdendo a graça com a matemática,
(...) tive muita dificuldade em resolver os exercícios matemáticos de alguns
fascículos, inclusive alguns foi possível com a explicação do orientador
(A8, RR p.4).
Percebe-se, nesse, e na maioria dos relatos, a real preocupação dos sujeitos em
aprender os conteúdos da Matemática apresentados nos fascículos dessa área. Ficam
centrados nessa preocupação, pouco se abrindo para buscar articulá-los com os saberes
experienciais ou com a prática docente. Assim, apontam os limites que os têm impossibilitado
de fazer um ensino de Matemática que respeite a construção gradual e significativa de
conhecimentos, pois a experiência que possuem dessa disciplina tem como parâmetro a
Matemática que aprenderam no passado; agora, possuem consciência de que o modelo que
aprenderam deve ser reformulado, mas, na resolução dos exercícios e atividades dessa área,
continuaram tendo as mesmas dificuldades, de acordo com o que relatam, pois aqueles
modelos se repetiram no Curso.
Os professores-acadêmicos, após terem realizado as atividades da Área de
Matemática, do Curso, passaram a percebê-la como um momento legitimador de uma nova
concepção do ensino de Matemática, em substituição à concepção tradicional da qual
possuíam conhecimento e que, de forma unânime, condenam.
Ao se tratar da aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos no Curso, Área de
Matemática, há afirmações como:
os conceitos, conteúdos e novas metodologias estudadas na área da
matemática me proporcionaram uma nova maneira de pensar e agir diante de
cada atividade aplicada em sala de aula, e em cada fascículo estudado. Por
tudo isso, tenho certeza que vou melhorar a minha pratica pedagógica
20
em
relação ao ensino da matemática (A5, RR p.9).
20
Grifo nosso.
130
Como as atividades curriculares da Área de Matemática e, principalmente, do
Seminário Temático não surgiram do cotidiano docente dos professores-acadêmicos, pode-se
inferir que a nova postura apresentada pelo Curso aos sujeitos não seja ainda executada na
prática, pois desenvolveram com seus alunos cerca de quatro atividades práticas na área, com
os conteúdos definidos e repetiram uma delas no Seminário Temático, e os professores-
acadêmicos não conseguiram reagir às atividades que vieram prontas para eles executarem,
não sendo verdadeiro aquilo que afirmam acima, de que cada atividade lhes fez pensar e agir
de forma diferente para o ensino de Matemática.
As afirmações acima não querem dizer que os professores-acadêmicos não estejam
preparados para trabalhar com todos os conteúdos matemáticos para as séries iniciais, pois
essas atividades práticas mostraram que é possível trabalhar esses conteúdos, a partir de
alguns fenômenos presentes na natureza, valorizando a ludicidade e o manuseio de materiais
concretos. Cabe aos professores-acadêmicos, se conseguirem, generalizar essas premissas e
aplicá-las aos conteúdos da Matemática para as séries iniciais. Nesse sentido, podemos
dialogar com Nóvoa, (1992: 28), ao afirmar que a prática do professor desencadeia uma
transformação real no trabalhador, ao construir sua identidade, assumindo-se como “produtor
de sua profissão”, tendo em vista a definição de Tardif (2002: 66), de que os saberes dos
professores não antecedem a prática e não provêm somente da pesquisa, mas que se
constroem no interior do contexto da prática, e “são adquiridos principalmente no âmbito de
uma formação específica e relativamente longa na universidade” (TARDIF, 2002: 219).
Pode-se afirmar que, com o Seminário Temático da Área de Matemática,
articularam-se pouco os saberes científicos-pedagógicos com os experienciais, por não ter
privilegiado o olhar para a prática docente dos professores acadêmicos, ter trabalhado poucos
conteúdos nas atividades práticas, e pouco foi discutida a metodologia para o ensino da
Matemática nos momentos das apresentações das oficinas no Seminário Temático. No
entanto, mobilizou mais os saberes profissionais e disciplinares, por ter levantado alguns
conteúdos e enfocado o como fazer das atividades práticas e não “o para que fazer”, ou “o que
aprender”.
A nova postura docente assumida no discurso é significativa nos relatos dos sujeitos,
ao tratar dos saberes adquiridos com o Seminário Temático da Área de Matemática:
uma metodologia através das quais todos os alunos podem ter oportunidades
de participar e expor suas idéias acerca de cada conteúdo em discussão, onde
131
possam interagir com seus pares, questionando possíveis respostas para uma
determinada situação e se sentem naturalmente atraídos para participar e
aprender, que as atividades envolvem jogos, brincadeiras, estórias e
situações do seu universo cultural e social e, ao mesmo tempo, lançam-lhes
desafios a serem solucionados. Assim, o aluno constrói conceitos
matemáticos (A6, RR p.3).
É importante que a matemática seja trabalhada através de situações,
problemas próprios da criança e que faça realmente a criança pensar,
analisar, julgar e decidir pela melhor solução, que seja um trabalho
significativo, que o aluno tenha interesse e encontre sentido no que está
fazendo, conseqüentemente acontecerá o aprendizado para sua vida em
sociedade (A9, RR p.4).
Defende-se, a partir do Curso, que o ensino da Matemática deva ser significativo
para a vida do aluno, enfatizando procedimentos metodológicos que valorizem situações-
problema. Os professores-acadêmicos tiveram essa sensibilidade porque as atividades práticas
que desenvolveram, com seus alunos e no Seminário Temático, idealizaram situações-
problema e, no volume do Fascículo I de Matemática que estudaram, abordaram-se alguns dos
conceitos de aprendizagem processual e contextualizada. Pelo que percebemos, o Curso
mobilizou saberes nos sujeitos, porém, durante as apresentações das oficinas no Seminário
Temático, não foi possível perceber articulação de saberes científico-pedagógicos com os
saberes da experiência dos professores-acadêmicos.
Os alunos do Curso refletiram sobre a situação conceitual do ensino da Matemática e
ficou indicado algum caminho para superar as concepções tradicionais cristalizadas, mas a
formação docente que receberam ficou fragilizada por não trabalhar melhor as situações reais
no planejamento de atividades escolares para o ensino da Matemática nas séries iniciais do
ensino fundamental. O caráter pedagógico do ensino da Matemática foi menos abordado no
processo de realização do Seminário Temático desse matéria. No entanto, os saberes
pedagógicos para Carvalho e Perez (2001: 115) e Tardif (2002: 37), são provenientes da
educação científica, Didática Geral e da Psicologia da Aprendizagem, articulados com os
acontecimentos da sala de aula ou reflexões sobre a prática educativa. E, nesse aspecto do
Curso, os acontecimentos de sala de aula e, conseqüentemente, a prática educativa dos
professores-acadêmicos pouco foi considerada, em função do formato curricular proposto no
Seminário Temático que não considerou os saberes da experiência como um elemento
importante na formação profissional do professor.
132
O Curso de Pedagogia como uma possibilidade de ressignificar a prática docente para o
ensino da Matemática
Aos acadêmicos do Curso de Pedagogia a Distância, em função do Seminário
Temático da Área da Matemática e dos saberes veiculados através da formação profissional
na respectiva área, bem como do formato curricular que foi dado ao Seminário Temático,
possibilitou-se muito pouco, um olhar mais profundo sobre suas práticas de ensino, bem como
os novos conhecimentos propostos pela Área, evidenciando uma prática nula de
racionalidade. Mesmo assim, no discurso, buscam os professores-acadêmicos um modelo de
ensino mais emancipador do que o que possuíam.
Quando os acadêmicos estavam no período de conclusão do Seminário Temático da
Área de Matemática e, conseqüentemente da área de estudo, elaboraram um relatório
reflexivo individual de todo o processo pelo qual percorreram no respectivo Curso. Nesses
relatórios é que mais ficou evidente o relato de que a Área lhes proporcionou conhecimentos
que, segundo eles, irão influenciar suas práticas docentes, sugerindo mudança de postura
profissional, assim como apresentam nos relatos abaixo:
Através dessa leitura pude refletir e reparar erros bárbaros que cometi em
sala, compreendo que nada adianta o professor usar-se de ameaça,
autoritarismo e pressão para trabalhar com conteúdos que não despertam o
interesse do aluno, cabe a nós professores valorizarmos o conhecimento dos
alunos e juntos construirmos o conhecimento
(A11, RR p.9).
com estes aprendizados fui adquirindo mais experiência e autonomia, dando
mais oportunidade para que o aluno possa ter um espaço melhor em seu
aprendizado, com mais liberdade e responsabilidade
(A3, RR p.6).
Novas reflexões, novos métodos, novos entendimentos na área da
matemática inovam minha forma de trabalhar pedagogicamente dentro do
processo ensino/aprendizagem, contribuindo assim, para a qualidade do
aprendizado dos alunos que freqüentam a escola
(A3, RR p.10).
Posicionamentos como os apresentados acima, afirmando que estão se propondo a
tomar novas posturas, indicam-nos que os professores-acadêmicos possuíam posicionamentos
pedagógicos em relação ao ensino da Matemática e que, para eles, nesse momento tornaram-
se inoportunos. Seus saberes profissionais acenaram para novas dimensões, a ponto de levá-
los a pensar o ensino da Matemática, sob um novo olhar, e propõem-se a mudar suas práticas
pedagógicas, de acordo com o que conseguiram sistematizar das atividades da Área de
133
Matemática. Apesar das atividades práticas que realizaram serem exteriores ao contexto de
sua sala de aula, ao escreverem sobre o Curso e a prática docente, no relatório reflexivo,
destacaram o que esse momento lhes possibilitou perceberem que, da forma como
executavam a prática docente, não estão satisfeitos e, por isso, dizem que pretendem assumir
outra proposta pedagógica, mesmo que seja uma única alternativa que possuem, haja vista
que, na Área da Matemática, apresentou-se um único modelo pedagógico/metodológico,
restringindo-se o caráter formativo que a proposta do Seminário Temático poderia oferecer.
Fica, assim, evidente também nos relatos a preocupação que possuem com relação ao
conhecimento a ser trabalhado com seus alunos. Para eles, o conhecimento deve ser
contextualizado e significativo, porém a proposta pedagógica trabalhada no Seminário
Temático não valorizou esses fatores. É unânime nos relatos a consideração feita sobre a
forma como aprenderam a Matemática:
A maneira como aprendemos a matemática no passado deve ficar no
esquecimento, pois através desse curso que estamos concluindo, nossa
prática pedagógica tende a se modificar, mais uma vez veio nos confirmar a
idéia de que o aluno aprende quando encontra o significado naquilo que lhe é
ensinado, e busca novos conhecimentos quando a escola lhe subsídios
para construir a própria autonomia (A12, RR p.6).
assim ficou claro que a matemática está no nosso cotidiano, em todos os
momentos e que podemos aproveitá-los para introduzir em nossas aulas, de
forma prazerosa, trazendo assim o aluno para o mundo real, mesmo
possuindo um caráter abstrato. O importante agora é transformar esta
matemática de simples cálculos, em uma matemática vivenciada (A1, RR
p.5).
Para os sujeitos, a Matemática assim como aprenderam no passado, quando eram
alunos, não deve ser ensinada, pois, os conteúdos matemáticos devem fazer parte de um
currículo contextualizado. Dessa forma, os saberes experienciais dos professores-acadêmicos
são influenciados por novos conhecimentos científico-pedagógicos que poderão contribuir
para a ressignificação de suas práticas, por meio da retradução dos saberes, assim como é
definido por Tardif (2002: 53).
Fica implícito também nos relatos da maioria dos sujeitos que eles possuíam grandes
limitações, quanto ao ensino da Matemática, e que buscavam nesse Curso ressignificar essa
prática de ensino. Esse posicionamento ficou evidente, quando os sujeitos escreveram
134
sobre a Área, na perspectiva da sistematização final. Nesse, é que deixam indícios de reflexão
da prática docente.
Agora, convém pensar se os questionamentos que fazem da prática docente,
individualmente, e sem o acompanhamento pedagógico do Curso, trarão influências para
superar os limites conceituais e práticos que sentiram com a realização das atividades do
Seminário Temático. Isso porque a reflexão da prática docente deu-se sobre elementos das
atividades práticas propostas pelo Curso, uma vez que essas atividades práticas se
constituíram em uma realidade artificializada que, de certa forma, nega a ação do professor na
direção de um modelo emancipador e produtor de sua profissão, conforme Nóvoa (1992: 26-
29).
A forma pela qual foram sugeridas as atividades práticas da Matemática impede,
como afirma Giroux (1997: 158), que os professores se tornem cidadãos críticos e ativos,
porque ignoram a experiência dos professores-acadêmicos, transformando-os em “técnicos de
alto nível”, que se restringem a aplicar regras. Além disso, ficam impedidos de analisar
criticamente a reforma, ou no caso dos sujeitos de estudo, de analisar a inovação
metodológica no ensino da Matemática para a ressignificação da prática por meio da
articulação de saberes específicos da profissão.
As atividades práticas possibilitaram-lhes, no momento da construção do relatório
reflexivo, pensar sobre o ensino da Matemática, como se pode observar em relatos como:
No trabalho com as apostilas e as atividades sugeridas para a sala de aula fui
ampliando meu conhecimento ao utilizar o caminho Arquimediano, onde
percebi que é possível trabalhar qualquer conteúdo matemático independente
da fase em que a criança se encontra, necessitando apenas de se adaptar as
atividades ao nível do aluno. Também vi que é possível trabalhar os
conteúdos matemáticos partindo das observações da natureza e da realidade
em que se está inserido, que qualquer resolução de problemas é um caminho
matemático (A4, RR p.2).
Assim como o sujeito ressalta, os demais momentos da Área de Estudo, além do
desenvolvimento das atividades práticas, pouco lhes foram significativos para ampliação de
seus conhecimentos. Vale ressaltar que a reflexão que fizeram, assim como podemos observar
no relato acima, centrou-se basicamente nas atividades práticas que desenvolveram, não a
ampliando para as demais dimensões das funções docentes e da formação profissional do
professor. Assim debilitam a formação que receberam.
135
Nas falas abaixo, sobre as atividades práticas que desenvolveram nas salas de aula,
anunciam uma concepção de prática docente para o ensino da Matemática mais atualizada:
buscar meios que me auxiliassem no sentido de desenvolver um ensino de
matemática contextualizado, de forma lúdica e interdisciplinar, considerando
também seu caráter histórico-social e as experiências e conhecimentos
prévios dos alunos, partindo sempre de uma situação problema, (...). Essas
expectativas foram contempladas (A6, RR p.2,3).
É importante que a matemática seja trabalhada através de situações,
problemas próprios da criança e que faça realmente a criança pensar,
analisar, julgar e decidir pela melhor solução, que seja um trabalho
significativo, que o aluno tenha interesse e encontre sentido no que está
fazendo, conseqüentemente acontecerá o aprendizado para sua vida em
sociedade (A9, RR p.4).
Na prática docente do ensino da Matemática, como afirmado nos relatos acima, a
concepção que desenvolveram, pelo menos teoricamente, dá-nos indícios de uma direção
crítica e emancipatória. Mas para isso se comprovar, haver-se-ia que observar a prática
docente desses sujeitos para se conferir se a postura que aqui defenderam evidencia-se no
cotidiano da sala de aula.
Para Contreras, (2002; 185) o professor, para ser considerado dentro de um modelo
intelectual crítico, precisa estar livre de fatores institucionais que condicionam a prática, das
formas de dominação, e descobrir o oculto. Nesse sentido, consideramos que os professores-
acadêmicos na Área de Matemática não tiveram a formação dentro desse modelo proposto por
esse autor, pelo fato de que as atividades práticas definidas para o Seminário Temático e
realizadas pelos acadêmicos foram instituídas pela Universidade, sem considerar o contexto
da prática docente dos sujeitos.
Além do mais, o Curso, nesse aspecto do currículo, não possibilitou que os
professores acadêmicos compreendessem os fatores que dificultam suas práticas, por não
levar a estudo e debate os condicionantes da prática docente para o ensino da Matemática.
Essa formação nesta Área está na direção do modelo de professor como profissional reflexivo,
assim como definido por Contreras (2002), Duarte (1998), Alarcão (1996) e Gómez (1997), e
dificulta as possibilidades de se evidenciar no modelo de professor-pesquisador, como
refererido por Stenhouse Apud Contreras (2002) e Kincheloe (1997), porque não
experimentaram a prática docente e nem a examinaram criticamente. Está, também, distante
das posturas assumidas no Projeto Curricular do Curso.
136
Considerando que a Área de Matemática, mais especificamente no Seminário
Temático, não valorizou as experiências docentes dos professores acadêmicos, os saberes
experienciais dos sujeitos foram pouco mobilizados. E, se assim foi, poucas são as
possibilidades de articularem-se esses saberes com os saberes científicos-pedagógicos, do que
pode resultar a dificuldade de ressignificação da prática docente desses sujeitos, mesmo que
eles afirmem que “ressignificaram” suas posturas pedagógicas, estas podem ficar no nível de
seus discursos, distanciados do real possível.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O que nos conduziu à pesquisa foi à preocupação com a formação de professores de
um Curso de Pedagogia da UFMT, em que atuávamos como orientador acadêmico, a partir do
momento em que começamos a perguntar se nossa prática, como formador de professores,
estava trazendo resultados práticos satisfatórios, se nós estávamos contribuindo,
positivamente, com a formação profissional dos alunos do Curso. Assim, este trabalho teve
como objeto de estudo a articulação dos saberes da docência no processo de formação
acadêmica no Curso de Pedagogia na Modalidade Licenciatura para os Anos Iniciais do
Ensino Fundamental a Distância, do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato
Grosso.
O questionamento fundamental é se a estrutura curricular do Curso tem permitido, na
formação acadêmica, que os alunos articulem os saberes da formação com os saberes da
experiência, como isso se dá e com quais características. Assim, ele possibilitou-nos organizar
conhecimentos sistematizados, referentes aos saberes profissionais dos professores e dos
modelos de professores, e que fosse possível emitir algumas considerações, procurando
responder às questões iniciais da pesquisa guiadas pelos objetivos deste trabalho.
A compreensão dos saberes profissionais dos professores neste trabalho dá-se, na
perspectiva moderna, como tratado por Tardif, em que não separação entre a concepção e
execução desses saberes. O que salientamos aqui é que o professor precisa produzir o
conhecimento e ter seu domínio metodológico em sua prática docente.
O Curso de Pedagogia em questão teve sua fase experimental em 1995, na região
norte do Estado de Mato Grosso, ampliando-se e distribuindo-se geograficamente para todo
Estado em 1999. No seu projeto curricular é defendida a postura interacionista nas inter-
relações e ações dos sujeitos que fazem parte do contexto. No entanto, pelo menos no aspecto
curricular analisado, no Seminário Temático da Área de Matemática, percebemos que essa
linha teórica fundamental não foi levada a cabo assim como é proposta no projeto.
138
O estudo, feito com sujeitos alunos do Curso no município de Alta Floresta-MT,
mostrou um pouco do processo da Área de Matemática, centrando-se no Seminário Temático,
desde a sua preparação, apresentação e avaliação.
A Área de Matemática, para efeitos didáticos, foi organizada em 08 (oito) fascículos.
Com essa organização, as unidades temáticas foram sendo trabalhadas seqüencialmente, no
tempo em que se realizava continuamente a respectiva Área. Isso possibilitou que o aluno
tivesse o contato gradual com os conhecimentos apresentados na Área, de forma a garantir o
seu aprendizado.
No Seminário Temático, foram trabalhadas atividades práticas de conteúdos
matemáticos que, inicialmente, os professores-acadêmicos desenvolveram com seus alunos,
durante o processo avaliativo Meio I e Meio II da Área. Cada grupo de alunos do Curso
apresentou uma atividade prática nas oficinas do respectivo Seminário.
Convém destacar que as atividades práticas sugeridas para os professores-
acadêmicos desenvolverem foram consolidadas em material complementar aos fascículos de
Matemática, proposto e organizado pelo professor especialista da Área de Matemática, com
os objetivos, metodologia e procedimentos a serem utilizados. Assim, cabia-lhes apenas
desenvolvê-las nas salas de aula e, posteriormente, no Seminário Temático, como definido
pela Universidade. A abordagem tecnocrática, referida por Giroux, ficou evidente nesta
atividade, pois, na proposição pedagógica, houve separação entre concepção e execução.
É interessante notar que, de acordo com o Projeto do Curso, o Seminário Temático
deve ser um dos momentos cruciais para que o acadêmico possa refletir sobre sua prática
docente. Sendo assim, as atividades práticas deveriam representar situações reais para
solucionar problemas de sua docência, e não de uma realidade artificializada.
Pela forma como foram guiadas as atividades práticas, a prática docente dos
professores-acadêmicos não se abriu para a reflexão neste aspecto da formação profissional,
em função do planejamento do Seminário, que não destinou tempo e espaço para se pensar
sobre a docência, mesmo eles tendo contato com alguns saberes científico-pedagógicos.
No que concerne aos saberes científico-pedagógicos como caracterizado por Tardif,
durante a realização do Seminário Temático de Matemática, mobilizam-se mais os saberes
profissionais, revelando-se no “como” aplicar as atividades práticas, e os disciplinares que se
139
identificaram nos conteúdos curriculares do ensino da Matemática, bem como de
conhecimentos da Psicologia Educacional, ao tratar do ensino aprendizagem da matemática.
Os saberes pedagógicos também aparecem quando os alunos do Curso dizem ter aprendido o
novo conhecimento, enquanto uma nova tecnologia da aprendizagem; no entanto, esse saber é
descontextualizado da sua prática docente, e os professores-acadêmicos estão certos de que
vão tentar desenvolvê-los na prática, ou seja, treinaram durante a realização da aulas de
Matemática, na função de professores-acadêmicos, e esperam poder retransmiti-las a seus
alunos em algum outro momento.
No entanto, ao executarem as atividades práticas e destinadas às oficinas do
Seminário Temático, percebe-se que os sujeitos pensam ter feito análise reflexiva dos
conteúdos e metodologias da respectiva Área, buscando construir conhecimentos mais
adequados para o ensino da Matemática; contudo, essa afirmativa não procede, pelo fato de
que os professores-acadêmicos ficaram deslumbrados com toda a proposta, por ela apresentar
atividades matemáticas que davam ênfases à utilização de materiais concretos. No entanto
aceitaram tudo, da forma como foi lhes proposto, com o discurso de que vão transpor para sua
prática docente todos esses novos conhecimentos que dizem ter aprendido. Assim, não
analisaram a prática que possuíam, na perspectiva de, a partir dela, construírem novos
conhecimentos.
Convém destacar que os saberes mobilizados pelo Curso na Área de Matemática
dariam subsídios para a reflexão da prática, porém, seria necessária uma organização
pedagógica que garantisse isso, de forma que houvesse, nos professores-acadêmicos, mudança
de concepção teórica da disciplina, na perspectiva de valorização dos problemas reais do
ensino e aprendizagem, e não de aplicação de conhecimentos definidos a priori.
A autonomia profissional nessa perspectiva deveria ser mais instigada, pois, a partir
do momento em que nesse Seminário Temático não se buscaram meios de os professores-
acadêmicos construírem, por si próprios, as atividades direcionadas a seus alunos com os
conhecimentos adquiridos no Curso; não se abriu espaço para a ressignificação de suas
práticas pedagógicas.
Em decorrência da realização das atividades práticas, tanto em sala de aula, como nas
oficinas do Seminário Temático, houve possibilidade de que os acadêmicos mobilizassem
alguns saberes experienciais, pois resgatariam conhecimentos que possuíam, para então,
140
desenvolverem as propostas de atividades práticas, embora não tenham feito o exercício da
busca de articulação com os saberes científico-pedagógicos.
Durante a apresentação das oficinas no Seminário Temático evidenciaram-se mais
alguns saberes experienciais, pois, para a sua condução, fizeram uso de metodologias das
quais já tinham domínio, uma vez que agiram como se ministrassem aulas de Matemática para
crianças, com a preocupação de apresentar aos participantes o “como” deveriam proceder para
que a respectiva atividade prática fosse desenvolvida com êxito. A prática docente para o
ensino da Matemática não foi abordada para o debate nesse espaço único em que todos os
acadêmicos do Curso estavam reunidos.
que se destacar que o aprender a ensinar dos alunos do Curso, na área curricular
de Matemática baseou-se na repetição de atividades pré-programadas, por isso, pode-se
assegurar que a reconstrução de saberes experienciais pode não ter ocorrido, a partir do
exercício de sua própria reflexão nos termos utilizado por Kincheloe. Tanto é assim, que os
sujeitos não perceberam que as atividades práticas não haviam precedido da realidade da sala
de aula em que atuavam, muito menos lembraram-se de que o Seminário Temático é o
momento privilegiado para refletirem sobre suas práticas, na perspectiva de ressignificá-las e,
para quem desenvolveu o Curso, não se considerou que, na formação de professores, a
constituição da docência não se dá de forma descontextualizada do espaço escolar.
Se procederem as afirmações acima, em que os saberes científico-pedagógicos foram
pouco mobilizados e os saberes experienciais poderiam ser mais ressignificados, que se
destacar ainda que, dessa forma, a articulação de saberes não fica favorecida, haja vista que
no Seminário Temático o maior foco dado é no metodológico, não se resgataram,
adequadamente, os conhecimentos experienciais e os teóricos da Área, em que se daria a
articulação de saberes. A possibilidade de reflexão da prática dos sujeitos foi deixada a seu
próprio curso, e isso poderá impedi-los de irem além dos seus limites, de fazerem a relação
teoria-prática.
Convém assinalar que os sujeitos demonstraram indícios de reflexões sobre as
concepções do ensino da Matemática que possuíam, criticando a forma tradicional pela qual
aprenderam, mas não se colocaram no lugar de seus alunos que tiveram que executar uma
proposta que não está ligada à sua realidade. Os professores-acadêmicos apenas ficaram
141
intensamente encantados com a proposta que apresentava o lúdico como uma das estratégias
para o ensino da matemática, a ponto de aceitá-la sem questionar sua viabilidade.
Os próprios professores-acadêmicos ficaram muito preocupados em aprender e
desenvolver os conteúdos e metodologias da Matemática que estava sendo proposta e não se
preocuparam em refletir e criticar a prática docente, não percebendo a necessidade de
articulação de saberes. Neste sentido, configura-se uma formação profissional artificializada
desses professores.
A presença das atividades matemáticas na prática acadêmica, a partir do momento
que tiveram de abrir espaço para aplicá-las nas salas de aula do ensino fundamental, fez ainda
com que fragmentassem o planejamento curricular da escola, em que fizeram à aplicação,
comprovando mais ainda o caráter determinante da proposta.
Cremos ser importante destacar que a Matemática nesse Curso de formação de
professores apresentou um modelo pedagógico-metodológico reprodutivista e, sendo assim,
não podemos afirmar que com esse modelo capacita o aluno a assumir uma nova postura.
No máximo, isto pode suscitar-lhe algumas reflexões, incentivando-o a buscar compreender
outros modelos para elaborar um juízo sobre a temática e propor soluções para seus
problemas cotidianos da docência na Matemática.
Devemos acrescentar que nesse Seminário Temático de Matemática, sugerimos que o
ideal é que ao aluno fossem ministrados conhecimentos científico-pedagógicos para que eles
pudessem compreender sua prática, a complexidade dos problemas da sala de aula à luz de
conhecimentos já sistematizados e, por meio de atividades lúdicas e concretas da Matemática,
procurasse solucioná-las. Essas propostas, elaboradas e desenvolvidas pelos professores-
acadêmicos com seus alunos, é que seriam apresentadas nas oficinas do Seminário Temático,
socializando com os colegas de Curso as possibilidades de intervenção nos problemas reais de
aprendizagem de Matemática, fazendo uso dos conceitos trabalhados no decorrer da
realização da Área. Assim, o Seminário estaria cumprindo seu papel, como apresentado no
projeto do Curso. Para isso, também os fascículos da área de matemática deveria trazer outros
conteúdos, para que, assim como retratam os sujeitos, fossem mais significativos para a
prática docente.
Cremos ser importante destacar que questionamos neste trabalho a forma pela qual o
Seminário Temático foi organizado, em função da proposição das atividades práticas da
142
Matemática, sem considerar as vivências dos professores-acadêmicos. Isso, no nosso
entender, alijou do processo de aprimoramento a prática profissional desses professores que
ficaram sem indícios de intervenção pedagógica na mesma, o que poderia ter ocorrido o
contrário, caso o Seminário Temático tivesse outra organização pedagógica-metodológica,
que valorizasse as construções pessoais dos sujeitos.
Pela forma como o Seminário Temático foi organizado, entendemos que não foi
totalmente nulo para a formação profissional dos alunos, que mesmo tendo prevalecido a
racionalidade técnica, o saber extraído de todo esse processo formativo, irá compor o rol de
conhecimentos de cada sujeito, passíveis de uso em outros contextos da sua formação
profissional.
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146
ANEXOS
Anexo 01 – Carta de Apresentação
Caro professor-acadêmico do NEAD, Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia para as
Séries Iniciais, muito respeitosamente, dirijo-me a Vossa Senhoria a fim de solicitar-lhe
contribuição para realização de pesquisa pelo aluno Dirceu Blanski, matricula 02.03.12
com o trabalho entitulado provisóriamente “A ARTICULAÇÃO DOS SABERES
DOCENTES NA FORMAÇÃO DO ACADEMICO DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO
ABERTA A DISTÂNCIA/UFMT: os seminários temáticos como ‘lócus’ de
possibilidades”, na Linha de Pesquisa Formação de Professores e Organização Escolar, Área
de Concentração Teorias e Praticas Pedagógicas da Educação Escolar do Programa de Pós-
Graduação em Educação/ Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso,
como parte elementar do programa, no período letivo de 2004, podendo se estender ao ano de
2005.
Para o desenvolvimento metodológico da investigação, o pesquisador realizará:
1. Observação direta, de Seminário Temático da área de matemática com uso de
filmadora;
2. Análise documental de materiais oficiais da instituição NEAD, bem como
produções acadêmicas;
3. Entrevista com uso de questionário estruturado;
4. Entrevistas semi-estruturadas com uso de gravador;
Os dados coletados serão utilizados exclusivamente com fins científicos, podendo você acadêmico, ao término
da pesquisa solicitar um retorno do trabalho.
Para o questionário em anexo, solicitamos que por gentileza dedique seriedade nas respostas,
pois assim o trabalho que estamos realizando terá sua relevância social e pode contribuir
com o tema Formação de Professores e conseqüentemente com a Pedagogia do NEAD.
Portanto, você é um sujeito fundamental neste processo. Caso o espaço para as respostas seja
insuficiente, use a folha em branco que encontra-se ao final.
Sem mais a tratar, agradecemos
.
Atenciosamente,
Orientadora:
Jorcelina Elizabeth Fernandes
Prof. Dra do PPGE/UFMT
Diretora do Instituto de Educação/UFMT
Aluno: Dirceu Blanski
Aluno do Programa de Pós Graduação em
Educação da Universidade Federal de Mato
Grosso
Anexo 02- Questionário respondido pelos informantes
QUESTIONÁRIO 1A
Desenvolvimento das Atividades da Área de Matemática em Sala de Aula
1) Quem propôs as atividades para serem desenvolvidas na sala de aula, e como foram
orientadas?
2) Quantas atividades você desenvolveu na sala de aula?
3) Você teve dificuldades em fazer a aplicação das atividades em sala de aula? Por que?
4) Você participou na elaboração das atividades? Se sim, em que você contribuiu?
5) As atividades desenvolvidas na sala de aula exigiram conhecimentos trabalhados no curso?
( ) Sim. Quais?
( ) Não. Porque?
6) As atividades desenvolvidas na sala de aula exigiram conhecimentos que você possui na
experiência profissional?
( ) Sim. Quais?
( ) Não. Porque?
7) Enumere alguns conhecimentos pedagógicos que você adquiriu no estudo dos fascículos na
área de matemática.
8) As atividades aplicadas na sala de aula lhe possibilitou a articulação da teoria com a prática?
( ) Sim. Como?
( ) Não. Por que?
9) Que orientações você não recebeu e que as considera importantes para desenvolver as
atividades propostas?
QUESTIONÁRIO 1B
Desenvolvimento da Atividade da Área de Matemática Apresentada no Seminário Temático
1) Qual atividade você desenvolveu no Seminário Temático?
2) Como foi definido que seria exatamente esta a atividade que iria desenvolver no Seminário
Temático?
3) Na atividade a ser apresentada no Seminário Temático, você aplicou-a assim como foi
proposta pelos especialistas da área, ou fez alguma reorganização. Caso reorganizou a atividade,
em que você contribuiu?
4) Você teve dificuldades na preparação da oficina e desenvolvimento da atividade que
apresentou no Seminário Temático? Se sim, quais?
5) Que conhecimentos trabalhados no curso você utilizou para a preparação da oficina?
6) Que conhecimentos da experiência profissional você utilizou para preparar a oficina?
7) No momento de apresentação da atividade no Seminário Temático, qual a atenção dada aos
conhecimentos da prática articulando-os com os conhecimentos teóricos da matemática?
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