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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA
CATARINA DE MIRANDA SCHERER
CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE INSTITUCIONAL E SUA MUDANÇA NO
BRASIL ENTRE 1889 E 1945
Porto Alegre
2007
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CATARINA DE MIRANDA SCHERER
CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE INSTITUCIONAL E SUA MUDANÇA NO
BRASIL ENTRE 1889 E 1945
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Economia da Faculdade de
Ciências Econômicas da UFRGS, como
quesito parcial para obtenção do título de
Mestre em Economia.
Orientador: Prof. Dr. Sérgio Monteiro
Porto Alegre
2007
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DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
Responsável: Biblioteca Gládis W. do Amaral, Faculdade de Ciências Econômicas da
UFRGS
S326c Scherer, Catarina de Miranda
Caracterização do ambiente institucional e sua mudança no Brasil entre 1889 e
1945 / Catarina de Miranda Scherer. – Porto Alegre, 2007.
207 f.
Orientador: Sérgio Monteiro.
Ênfase em Economia do Desenvolvimento.
Dissertação (Mestrado em Economia) - Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-
Graduação em Economia, Porto Alegre, 2007.
1. Economia institucional : Brasil. 2. Desenvolvimento econômico :
Brasil. 3. Economia : Brasil. 4. Governo Getúlio Vargas : 1930-1945. I.
Monteiro, Sérgio. II. Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Faculdade de Ciências Econômicas. Programa de Pós-Graduação em
Economia. III. Título.
CDU 338.22 (81)
4
CATARINA DE MIRANDA SCHERER
CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE INSTITUCIONAL E SUA MUDANÇA NO
BRASIL ENTRE 1889 E 1945
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Economia da Faculdade de
Ciências Econômicas da UFRGS, como
quesito parcial para obtenção do título de
Mestre em Economia.
Aprovada em: Porto Alegre, 31 de outubro de 2007.
Prof. Dr. Octavio Augusto Camargo Conceição
UFRGS
Prof. Dr. Pedro Cezar Dutra Fonseca
UFRGS
Prof. Dr. Nali de Jesus de Souza
PUC-RS
5
RESUMO
Pelo menos até o primeiro governo Vargas, a dinâmica da economia brasileira era ditada
pela produção primária para exportação, numa sucessão de produtos que culminou com a
produção cafeeira. Esse quadro foi, porém, completamente alterado durante a década de
1930, quando se caracterizou um momento de inflexão econômica e institucional de
grandes dimensões, que transformou a dinâmica de toda a economia. A solidificação da
nova forma da economia foi possível por ter sido acompanhada de uma alteração na
estrutura institucional do país, tornando os sistemas financeiro, tributário e educacional,
além das relações de trabalho, mais adequados a este novo panorama. Instituições são as
regras do jogo em uma sociedade que moldam a interação entre os homens e, assim,
fornecem estruturas estáveis para que as transações ocorram. Conhecer as características
institucionais históricas de cada país pode trazer uma melhor compreensão de suas
deficiências atuais e das alternativas viáveis de mudança para superá-las. O presente
trabalho pretende caracterizar o ambiente institucional brasileiro do período entre 1889 e
1945, com base na Nova Economia Institucional, identificando, também, os efeitos destas
instituições sobre o desempenho econômico e os processos de mudança institucional do
período, especialmente a mudança ocorrida após a Revolução de 1930. Mostra-se que a
nova estrutura institucional, então criada, permitiu a continuidade do processo de
industrialização, com maior intervenção do Estado na economia, o qual dispôs de
melhores instrumentos para alcançar seu objetivo industrializante e com regras mais
claras, seja para o sistema financeiro e a concessão de crédito, seja para a contratação de
mão-de-obra. Permitiu, ademais, que a economia brasileira se tornasse mais robusta,
deixando de ser tão vulnerável às flutuações externas. As mudanças desta época foram
importantes para o crescimento do período posterior por criar uma base mais sólida
tributária, financeira, de relações de trabalho e de educação.
Palavras-chave: Nova Economia Institucional, Primeira República, Primeiro Governo
Vargas, Revolução de 1930, Ambiente Institucional, Mudança Insitucional.
6
ABSTRACT
At least until the first Vargas government, the dynamics of the Brazilian economy
was dictated by the primary production for exportation, in a succession of products that
culminated with coffee. This situation was, however, completely modified during the
decade of 1930, when a moment of economic and institutional inflection of great
dimensions was characterized, that transformed the dynamics of the whole economy. The
solidification of the new form of the economy was only possible because it came along
with an alteration in the institutional structure of the country, rendering the financial,
educational, tributary systems and work relations more adjusted to this new panorama.
Institutions are the rules of the game in a society that shape human interactions,
establishing stable structures for the occurrence of transactions. To know the historical
institutional characteristics of the country can provide a better understanding of its
current deficiencies and suggest the viable alternatives to surpass them. The present work
intends to characterize the Brazilian institutional environment of the period between 1889
and 1945, on the basis of the New Institutional Economics, identifying, also, the effect of
these institutions on the economic performance and the processes of institutional change
of the period, especially those that occurred after the Revolution of 1930. It is shown that
the then created institutional structure allowed the continuity of the industrialization
process, with stronger intervention of the State in the economy and with clearer rules,
both for the financial system and the concession of credit, and for hiring labor. The
government had available better instruments to reach its industrializing objective.
Moreover, it allowed the Brazilian economy to become more robust, becoming less
vulnerable to the external fluctuations. The changes of this period were important for the
growth of the following decades for it created a more solid tax, financial, educational and
work relations structure.
Keywords: New Institutional Economics, First Republic, First Vargas Government, 1930
Revolution, institutional environment, institutional change.
7
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico 4.1: Evolução do produto agrícola e industrial no Brasil: 1900 a 1946 ............ 112
Gráfico 4.2: Crescimento da matrícula dos diversos graus de ensino: Brasil, 1907-45 . 175
Quadro 2.1: Esquema de quatro níveis de Análise Social ................................................ 27
Quadro 2.2: Esquema de determinação institucional endógena ....................................... 33
Quadro 2.3: Atributos dos três modos de governança...................................................... 40
Quadro 3.1: Tributos e Competências: 1891 .................................................................... 59
Quadro 4.1: Tributos e Competências: 1934 .................................................................. 131
Quadro 4.2: Sistema de Partilha e Transferências: 1934 ................................................ 132
Quadro 4.3: Tributos e Competências: 1937 .................................................................. 134
Quadro 4.4: Sistema de partilha e transferências: 1937.................................................. 134
Quadro 4.5: Diferenças entre os ambientes institucionais dos dois períodos................. 181
Tabela 3.1: Capitalização de Mercado no Brasil (preços correntes) ................................ 77
Tabela 4.1: Dados Populacionais e Analfabetismo - Brasil............................................ 164
Tabela 4.2: Participação dos graus de ensino no total de matrículas: Brasil, 1907-45.. 175
8
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................... 9
2 A NOVA ECONOMIA INSTITUCIONAL.......................................................... 13
2.1 Hipóteses Principais da Nova Economia Institucional ............................................ 16
2.2 Instituições............................................................................................................... 23
2.3 Mudança Institucional.............................................................................................. 41
3 ESTRUTURA E MUDANÇA INSTITUCIONAL NA PRIMEIRA
REPÚBLICA................................................................................................................... 45
3.1 Instituições Políticas ................................................................................................ 50
3.2 Instituições Econômicas e Sociais ........................................................................... 57
3.3 O Ambiente Institucional do Primeiro Período Republicano ................................ 101
4 O PRIMEIRO GOVERNO VARGAS E A FORMAÇÃO DE UMA NOVA
ESTRUTURA INSTITUCIONAL DESENVOLVIMENTISTA.............................. 105
4.1 Antecedentes.......................................................................................................... 105
4.2 Instituições Políticas .............................................................................................. 117
4.3 Instituições Econômicas e Sociais ......................................................................... 128
4.4 O Ambiente Institucional do Primeiro Governo Vargas ....................................... 177
5 CONCLUSÃO....................................................................................................... 183
REFERÊNCIAS............................................................................................................ 188
9
1 INTRODUÇÃO
Pelo menos até o período do primeiro governo Vargas, a dinâmica da economia
brasileira era ditada pela produção de produtos de natureza primária para exportação,
numa sucessão de produtos que culminou com a produção cafeeira no final do séc XIX e
início do XX. A produção do café iniciou-se, principalmente, na região do Vale do
Paraíba, seguindo, então, para o oeste paulista. Nesta mudança de área geográfica,
também a mentalidade e os objetivos dos grupos que produziam o café sofreram
alterações, levando a uma mudança na forma de organização da produção, o que permitiu
uma diversificação da atividade econômica. A República possibilitou a solidificação do
poder, tanto econômico, quanto político dos cafeicultores, com o estabelecimento do
federalismo, que dava ampla autonomia aos estados e do “Pacto Oligárquico”, que
definiu as bases do sistema de controle político e centralização de poder.
Na década de 1930, a mudança no panorama internacional foi abrupta. Em muitos
países, o Estado Liberal foi substituído por ditaduras totalitárias e a instituição central do
século anterior – produção baseada em mercados livres – foi substituída por novas formas
de economia. Ademais, estavam em formação novas bases institucionais para sustentar
estas novas formas de economia. Estas mudanças refletiam-se também no Brasil. Após a
Primeira Guerra Mundial, a estrutura política havia começado a ruir, culminando em um
golpe de Estado que impôs rupturas drásticas, centralizando o poder nas mãos de Vargas
a fim de promover mudanças na vida política e econômica. Ao mesmo tempo,
aumentava-se a participação da indústria, possibilitando uma verdadeira transformação da
dinâmica econômica brasileira.
Essa mudança econômica e institucional foi de grandes dimensões. Nos estudos
sobre o período são destacados, principalmente, a virada “para dentro” da produção e o
crescimento da participação da indústria e dos serviços no produto nacional. Destacam-
se, ademais, mudanças nas relações de poder no governo, com a redução do poder dos
estados, centralizado na esfera federal, além da própria concepção do papel do Estado na
economia, marcado por uma mudança de ideologia.
10
A grande inflexão ocorrida durante a década de 1930 foi causada pela
transformação na dinâmica de toda a economia: o Brasil deixaria de ser um país
exclusivamente agro-exportador, passando a dinâmica a ser dada pela produção
industrial, voltada, principalmente, para o mercado interno, gerando uma economia
menos dependente de flutuações externas. Estas mudanças só foram possíveis, pois foram
acompanhadas de uma mudança na estrutura institucional do país, que precisou ser
readequada às novas condições. Entre as principais áreas transformadas no período, as
mudanças no sistema financeiro, especialmente para a concessão de crédito e a
manipulação do câmbio com objetivos protecionistas, e no sistema tributário e
educacional, além das relações de trabalho, mais adequados a este novo panorama, são
destacadas na literatura
1
.
A importância da mudança institucional, que foi incentivada por mudanças
econômicas, e como a nova estrutura institucional, formulada durante o primeiro período
Vargas possibilitou o grande salto qualitativo da economia brasileira são questões a
serem tratadas neste trabalho. Cabe, também, analisar quais foram as instituições-chave
deste período para o desempenho econômico brasileiro e como ocorreu esta mudança.
Para isso, utilizamos a Nova Economia Institucional como arcabouço teórico.
O papel das instituições como fator determinante para a compreensão da
diversidade social e econômica dos países foi tratada por diversos economistas, desde
representantes da Economia Política Clássica como Adam Smith, John Stuart Mill e Karl
Marx, da Escola Histórica Alemã, como Schmoller, da Escola Austríaca, como Menger,
Mises e Hayek e até mesmo da economia neoclássica, como Marshall. Para estes autores,
entretanto, embora as instituições tivessem um papel relevante na análise, este papel
nunca foi central.
Principalmente nas últimas duas décadas, a relevância do estudo do ambiente
institucional das nações para a compreensão das diferentes performances econômicas tem
voltado a ter destaque, não apenas entre economistas heterodoxos, mas também entre
economistas do chamado mainstream. Sua importância, inclusive, cresceu tanto, que a
1
Fonseca (2003a), chama atenção para mudanças institucionais nessas áreas como forma de dar
sustentação à sua hipótese de que houve intencionalidade na política industrializante do primeiro governo
Vargas.
11
busca por ambientes institucionais adequados ultrapassou os estudos acadêmicos e passou
a fazer parte das determinações de política econômica, adotadas principalmente por
organismos internacionais.
Se algumas exincias desses organismos internacionais com relação a mudanças
institucionais parecem até mesmo bastante razoáveis, argumenta-se que, talvez, estas
medidas tenham sido tomadas de forma um tanto quanto apressada, uma vez que os
estudos na área ainda são bastante incipientes
2
. De fato, diversos estudos têm
demonstrado a importância das instituições para o crescimento e o desenvolvimento
econômico, tanto de forma teórica como em trabalhos aplicados. Entretanto, se estes
estudos apontam proxys institucionais como as principais variáveis explicativas para o
crescimento, não há um consenso com relação a quais sejam as instituições determinantes
para alcançá-lo, uma vez que os resultados são ambíguos. Isso se deve, principalmente,
ao fato de que estas variáveis são muito difíceis de especificar.
Por outro lado, a simples imposição de estruturas institucionais de outras
sociedades, em geral trará resultados bastante diversos, uma vez que instituições,
principalmente as informais, são muito difíceis de mudar, que elas o determinadas,
entre outros, pelas características históricas e culturais de cada país. Desta forma, não
seria possível impor ou mesmo definir qual ambiente institucional deve ser adotado para
que os países se desenvolvam.
Nesse sentido, parece claro que estudar as características institucionais históricas
de cada país (estudos de caso) pode trazer uma melhor compreensão de suas deficiências
atuais e das alternativas viáveis de mudança institucional para superá-las. Além do mais,
argumenta-se que não apenas as estruturas institucionais “ideais” mudam entre países,
como também podem depender do estágio de desenvolvimento e contexto internacional
em que se inserem as economias em questão. Dado que a maioria dos estudos em
economia institucional trata de situações recentes (a partir da década de 1990),
consideramos relevante analisar um período para o qual as conseqüências da mudança
institucional já são mais evidentes. Para isso, o período entre a Proclamação da República
e o fim do primeiro governo Vargas apresenta-se como relevante, principalmente por
2
A este respeito ver, por exemplo, Chang e Evans (2000).
12
conter uma época de forte ruptura institucional, que foi a Revolução de 1930. As
mudanças institucionais ocorridas nesta época foram resultado de mudanças econômicas
e de cenário internacional que ocorreram na fase anterior (1889-1930) e permitiram uma
melhora do desempenho econômico posterior, extrapolando, inclusive, o período de
análise.
O objetivo geral deste trabalho é, portanto, caracterizar o ambiente institucional
brasileiro entre 1889 e 1945. Para alcançar tal objetivo, pretende-se sistematizar o
pensamento da Nova Economia Institucional no que se refere ao papel das instituições de
cada país como determinantes de seu desempenho econômico e ao processo de mudança
institucional. Esta sistematização servirá de apoio para a caracterização do período de
estudo com um enfoque institucionalista, identificando, também, os efeitos destas
instituições sobre o desempenho econômico e os processos de mudança institucional
daquele momento histórico, principalmente a mudança ocorrida após a Revolução de
1930.
A base teórica utilizada na interpretação do período em questão é definida no
capítulo 2. Neste sentido, procura-se expor as principais hipóteses da Nova Economia
Institucional no que se refere à importância das instituições para o desempenho das
economias, a forma como as instituições mudam e evoluem ao longo do tempo e as
causas destas mudanças.
No terceiro capítulo, caracterizam-se as instituições da primeira etapa do período
de análise, qual seja, entre 1889 e 1930, destacando-se as principais instituições
responsáveis pelo desempenho econômico desta etapa e antecipando suas falhas, além da
mudança no ambiente político-econômico que precipitaria na Revolução de 1930.
Os antecedentes da Revolução de 1930, a mudança ideológica e de preços
relativos originada no contexto internacional e suas conseqüências para o contexto
interno são discutidos no capítulo 4. Ademais, neste capítulo, são caracterizadas as
instituições da etapa entre 1930 e 1945 e sua influência no desempenho econômico e na
mudança do eixo dinâmico da economia brasileira. Por fim, o quinto capítulo sintetiza as
idéias concluídas ao longo deste trabalho, além de suas limitações e implicações para
futuros trabalhos.
13
2 A NOVA ECONOMIA INSTITUCIONAL
Após a Segunda Guerra Mundial, principalmente nas três primeiras décadas que
se seguiram a ela, grandes avanços foram feitos nas diversas áreas de estudo da ciência
econômica. Foram desenvolvidos e expandidos os fundamentos teóricos da economia
neoclássica
1
e as técnicas econométricas para medir empiricamente os parâmetros destes
modelos teóricos e testá-los. Estes avanços foram bem aceitos, tendo sido utilizados
fortemente nas decisões de política econômica, assim como naquelas de caráter privado
do período e até os dias atuais.
No início dos anos 1970, os resultados daqueles estudos começaram, porém, a
mostrar suas fraquezas e sua incapacidade de explicar novas questões que se impunham.
Isto se deveu, em boa parte, ao fato de que a tradição neoclássica sempre utilizou
abordagens que tomavam a estrutura institucional como dada. As instituições legais
básicas eram assumidas como existentes e operando perfeitamente e sem custos (ou não
operando, no caso das externalidades) ou eram, efetivamente, ignoradas completamente.
De fato, dentro do que pode ser considerado como mainstream em teoria econômica (por
exemplo, o modelo de equilíbrio geral de Arrow-Debreu), as instituições não possuem
papel algum. A ênfase é na eficiência alocativa e arranjos institucionais diferentes são
vistos como meros “meios alternativos” para se alcançar as condições necessárias para o
ótimo de Pareto (LANCASTER, 1969 apud FURUBOTN; RICHTER, 2000).
Essa neutralidade institucional, ou, ao menos, sua predisposição para negligenciar
várias considerações com relação a restrições institucionais e custos de transação
enfraquece muito a teoria neoclássica, de forma que pode ser aplicada a questões de
alocação de recursos em um sentido altamente abstrato. Estas deficiências eram
1
Segundo Colander (2000), as principais características da economia neoclássica, encontradas em livros de
história do pensamento econômico, são: 1. Ela foca na alocação de recursos em um dado momento no
tempo (alocação de recursos escassos entre fins alternativos); 2. Aceita alguma variação do utilitarismo
como fator central para a compreensão da economia; 3. Foca em tradeoffs marginais; 4. Assume
racionalidade capaz de fazer previsões corretas; 5. Aceita o individualismo metodológico; 6. É estruturada
em torno de uma concepção de equilíbrio geral da economia.
14
conhecidas por parte da heterodoxia econômica que, entretanto, também sempre foi
avessa aos demais recursos analíticos da abordagem neoclássica. As instituições só foram
consideradas como questão central de estudo na compreensão da economia, em torno da
década de 1920, pelo chamado velho institucionalismo, de Veblen, Commons e Mitchell.
Entretanto, sendo criticada por não conseguir estabelecer uma teoria, esta escola acabou
abandonada por, pelo menos, 30 anos.
Influenciado em certa medida pelos estudos de Commons (1931), em 1937,
Ronald Coase escreveu um de seus mais importantes trabalhos, “A natureza da firma”.
Este trazia uma nova visão de firma, bastante diversa daquela adotada pela economia
neoclássica. Coase considerava a existência de custos de transação para a compreensão
da existência de firmas hierarquizadas. Seus estudos formaram as bases da Nova
Economia Institucional (NEI), que trouxe as instituições de volta ao centro das
discussões, a partir da década de 1960
2
.
Segundo Douglass North, um dos mais importantes autores dessa escola
3
, as
instituições são “[…] the rules of the game in a society or, more formally, are the
humanly devised constraints that shape human interaction.” (1990, p. 3) Sua importância
deve-se ao fato de que elas diminuem as incertezas implícitas nas decisões humanas do
dia-a-dia, criando estruturas estáveis que regulam a interação entre os indivíduos e, como
conseqüência, acabam por determinar a estrutura de incentivos da sociedade, de modo
que as instituições direcionam a forma como a sociedade irá evoluir ao longo do tempo.
A NEI diferencia-se das antigas abordagens institucionalistas, pois, além de
destacar a importância das instituições, procura desenvolver uma estrutura que possibilite
integrar a análise institucional à economia utilizando o aparato analítico da teoria
neoclássica para explicar o funcionamento e evolução dos arranjos institucionais e, assim,
ampliar o alcance e o poder de previsão dos modelos econômicos (FURUBOTN;
RICHTER, 2000). Este fato possibilitou sua ampla aceitação pelo mainstream, tal que
2
Segundo Williamson (1985), as primeiras contribuições incluem a re-conceitualização dos custos de
transação do próprio Ronaldo Coase (1960), o tratamento pioneiro de direitos de propriedade de Armen
Alchian (1961), os trabalhos de Kenneth Arrow sobre propriedades econômicas de informação (1962,
1963) e a contribuição de Alfred Chandler Jr para a business history” (1962). Na década de 1970,
começaram a aparecer conteúdos mais operacionais, sendo que as pesquisas na área atingiram uma massa
crítica em 1975 e, na década seguinte, testemunharam um crescimento exponencial.
3
Juntamente com Ronald Coase e Oliver Williamson.
15
[…] it is now widely recognized that understanding how institutions affect economic
performance and why different institutional arrangements emerge in different social,
cultural and economic settings is now widely accepted by economists.” (JOSKOW, 2004,
p. 25), apesar de algumas hipóteses básicas terem sido amplamente modificadas.
Embora se possam considerar diversas abordagens como fazendo parte do que é
chamado de Nova Economia Institucional
4
, consideraremos aqui, principalmente, as
abordagens Histórica, cujo principal autor é Douglass North, e a de Custos de Transação,
de Coase e Williamson. Na primeira, a preocupação central é analisar as mudanças no
meio ambiente institucional geral das economias, isto é no conjunto de regras políticas,
sociais e legais fundamentais, buscando entender de que forma as macro-instituições de
um país afetam seu desempenho econômico no longo prazo. Já a segunda corrente ocupa-
se basicamente do estudo da interação entre as unidades econômicas nos processo de
produção, troca e distribuição, enfatizando a forma como surgem e se desenvolvem
instituições que asseguram a cooperação entre as unidades econômicas nestes processos.
Seu objetivo principal é entender como se formam e como se modificam as estruturas de
governança para determinadas transações, isto é, o conjunto de instituições que permite
que um determinado tipo de transação realize-se de forma contínua (BUENO, 2004).
O presente capítulo propõe-se a fazer uma sistematização das idéias principais da
Nova Economia Institucional no que se refere aos diferentes tipos de instituições e a
forma como mudam. Para tanto, na primeira parte são apresentadas as hipóteses básicas
que dão sustentação à idéia de que as instituições importam para a economia. A seguir, os
diferentes tipos de instituições são definidos e organizados segundo uma matriz
institucional; na terceira parte discorre-se sobre a mudança institucional e, por fim, são
feitos alguns comentários finais.
4
Richter (2005) destaca nove campos que podem ser consideradas como partes integrantes da NEI:
Abordagem de Direitos de Propriedade; Abordagem de Custos de Transação; Economia Evolucionária;
Escolha Constitucional; Teoria da Ação Coletiva; Teoria da Escolha Pública; Teoria de Contratos
Econômicos; Abordagem Novo-Institucional para História Econômica e Economia Austríaca Moderna.
16
2.1 Hipóteses Principais da Nova Economia Institucional
O estudo das instituições na economia tem por trás algumas hipóteses básicas
essenciais, quais sejam, o entendimento de que os indivíduos não possuem racionalidade
perfeita e que há custos envolvidos no processo de troca.
2.1.1 A Hipótese Comportamental (Racionalidade)
Uma das hipóteses de sustentação da teoria neoclássica é a de que os agentes
econômicos comportam-se (fazem suas escolhas) conforme a Teoria da Escolha Racional
(TER) (ou, segundo Simon (1987), possuem racionalidade substantiva vista em termos
das escolhas que produz). Dentro desta perspectiva, uma escolha é vista como racional se
maximiza o interesse do indivíduo, sejam quais forem seus objetivos. Assim, o indivíduo
racional sempre fará a escolha que é objetiva ou subjetivamente melhor em termos de sua
própria função utilidade, ou seja, ele maximizará esta função sujeita a algum conjunto de
restrições (em geral, orçamentárias).
Para que isto seja possível, no entanto, é preciso assumir que os indivíduos
possuem capacidade ilimitada de cálculo, informação perfeita acerca das possibilidades
de escolha (ou seja, que eles conhecem todos os conjuntos possíveis de escolhas que
podem ser feitas, de forma não ambígua), e que o ambiente é previsível e estável, até
como resultado das hipóteses anteriores. Assume-se, também, que o indivíduo é capaz, de
forma inequívoca, de estabelecer um ranking de preferências a partir de algum critério
pessoal qualquer (necessidades vitais, emocionais, psicológicas, etc.) e que as
preferências são transitivas (ou seja, se um individuo prefere um ativo A a outro ativo B e
este ativo B a outro ativo C, então ele prefere o ativo A ao C).
A TER é aceita pela teoria neoclássica, pois, apesar de pouco realista, mostra-se
útil, segundo os representantes desta abordagem, para criar modelos de comportamento
17
do mercado
5
. Porém, ela inviabiliza a compreensão de grande parte dos fenômenos com
os quais os economistas confrontam-se diariamente, pois distancia muito a teoria do
mundo real
6
, o que coloca em cheque, até mesmo sua capacidade de previsão
7
.
Elster (1990) destaca que a TER seria muito mais uma teoria normativa do que
descritiva, pois ela incorreria tanto no problema de indeterminação, ou seja, falhar na
tarefa de produzir previsões únicas, quanto no de inadequação, que significa que suas
previsões falham. De fato, segundo Aumann (1997, p.2), há diversas objeções com
relação ao seu uso:
First, casual empiricism or even just simple introspection leads to the
conclusion that even in quite simple decision problems, most economic
agents are not in fact maximizers, in the sense that they do not scan the
choice set and consciously pick a maximal element from it. Second,
such maximizations are often quite difficult, and even if they wanted
to, most people including economists and even computer scientists
would be unable to carry them out in practice. Third, polls and
laboratory experiments indicate that people often fail to conform to
some of the basic assumptions of rational decision theory. Fourth,
laboratory experiments indicate that the conclusions of rational
analysis (as distinguished from the assumptions) sometimes fail to
conform to ‘reality’. And finally, the conclusions of rational analysis
sometimes seem unreasonable even on the basis of simple
introspection.
North (1990, p.17) considera que, não apenas a TER está errada
8
, como […]
have prevented economists from coming to grip with some very fundamental issues and
that a modification of these assumptions is essential to further progress in the social
sciences.” Pois, em um mundo onde há racionalidade perfeita, as instituições são
supérfluas, a cultura não tem papel algum e a sociedade é caracterizada por mercados
econômicos e políticos eficientes.
5
Esta visão reflete a preponderância do instrumentalismo, de Friedman, como metodologia da economia,
onde o valor da teoria está na sua capacidade de previsão, e não no realismo de suas hipóteses.
(FRIEDMAN, 1953)
6
Diversos estudos empíricos, como, por exemplo Sippel (1997), demonstram que as hipóteses da Teoria da
Escolha Racional não se verificam na prática.
7
Simon (1987), por exemplo, mostra uma descrença total com relação a isso: “I would recommend that we
stop debating whether a theory of substantive rationality and the assumption of utility maximization
provide a sufficient base for explaining and predicting economic behavior. The evidence is overwhelming
that they do not.” (SIMON, 1987, p.39)
8
Porém, este autor considera que a TER ainda poderia ser utilizada em situações específicas, quando
houvesse problemas simples, informação completa, situações repetitivas, e motivação alta.
18
Os autores da NEI, procurando entender o mundo como o vêem (e não como um
mundo perfeito da teoria neoclássica) romperam com a hipótese da racionalidade
substantiva
9
e passaram a buscar as pessoas reais
10
que
[…] are not omniscient nor perfectly far-sighted. They cannot solve
arbitrarily complex problems exactly, costlessly, and instantaneously,
and they cannot communicate with one another freely and perfectly.
Instead, they are bounded rational, and they know it. They recognize that
they cannot possibly foresee all the things that might matter for them,
they understand that communication is costly and imperfect and that
understanding are often flawed, and they know that they are not likely to
find the mathematically best solution to difficult problems. They then act
in an intentionally rational manner, trying to do the best they can given
the limitations under witch they work. And they learn. (MILGROM;
ROBERTS, 1992, p. 130, grifos dos autores)
Dessa forma, as preferências dos tomadores de decisão são consideradas
incompletas e sujeitas a mudanças ao longo do tempo e estes agem com base em
informações incompletas, de forma que fazem escolhas utilizando modelos subjetivos
que divergem entre indivíduos e que não mostram nenhuma tendência a convergir. Esta
capacidade computacional limitada, juntamente com a imperfeição da informação com
relação ao comportamento dos demais agentes no processo de interação humana, gera
uma grande incerteza. Devido a esta incerteza e também àquelas envolvidas em
reconhecer o ambiente, regras e procedimentos são desenvolvidos para simplificar o
processo. O ambiente institucional resultante, ao estruturar a interação humana e, assim,
limitar o conjunto de escolhas dos agentes, reduz as incertezas, embora nada garanta que
estas instituições sejam eficientes. Em um mundo assim, as idéias e ideologias possuem
papel central nas escolhas e os custos da transação geram mercados imperfeitos
(NORTH, 1990). Desta forma, a existência de instituições faz sentido em um mundo
onde a racionalidade é limitada.
Quando os indivíduos são limitadamente racionais, eles constroem modelos
mentais para interpretar o mundo ao seu redor. Estes modelos são fortemente
9
Algumas abordagens que podem ser vinculadas a NEI, como Teoria da Agência, Direito e Economia,
Teoria da Escolha Pública, entretanto, mantém a hipótese da racionalidade perfeita ou completa
(substantiva).
10
“modern institutional economics should start with real institutions. Let us also start with man as he is”
(Coase,1984 apud WILLIAMSON, 1989, 138).
19
influenciados pela cultura produzida pela transferência de conhecimentos, valores e
normas entre gerações, que variam radicalmente entre diferentes sociedades mas
também pela experiência própria, que varia de acordo com os diferentes ambientes. Em
conseqüência, uma grande variedade de modelos mentais e, portanto, diferentes
percepções do mundo e da forma como ele funciona.
Apesar da NEI acreditar que a racionalidade só possa funcionar de maneira
limitada, não consenso dentro desta escola quanto a melhor teoria que molde esta
racionalidade limitada para substituir a TER. Uma das substitutas mais aceita é a da
racionalidade restrita (bounded rationality) de Herbert Simon (1987)
11
. Porém, devido à
ausência de formalização, esta teoria nunca alcançou um maior progresso e, ao invés de
esforços neste sentido terem possibilitado o desenvolvimento de uma teoria ampla, o que
se deu foi uma diversificação e várias abordagens de racionalidade limitada
desenvolveram-se (AUMANN, 1997).
Mesmo não havendo consenso, se aceitamos que a racionalidade é limitada e,
desta forma, a informação é assimétrica e, ainda, se procurarmos ver os homens como
agentes econômicos que buscam o próprio interesse (são egoístas), abre-se a
possibilidade para a existência de oportunismo. Segundo Williamson (1998),
oportunismo refere-se à possibilidade de as pessoas agirem buscando o próprio interesse
de forma fraudulenta, incluindo esforços calculados no sentido de corromper, enganar,
ofuscar e confundir de diversas formas
12
. Ou seja, as pessoas podem não ser totalmente
honestas e sinceras sobre suas intenções, ou elas podem tentar tirar vantagem de
circunstancias não previstas que dão a elas a chance de explorar a outra parte. Ressalte-se
11
Segundo Williamson (1989, p. 139), “[…] Simon actually enlarges rather than reduces the scope for
rationality analysis. Thus, economic actors with whom Simon is concerned are intendedly rational, but
only limitedly so’ [...] “it is only because individual human beings are limited in knowledge, foresight, skill,
and time that organizations are useful investments for the achievement of human purpose” (SIMON, 1957
apud WILLIAMSON, 1989, p. 139). North (1990), da mesma forma, aceita a racionalidade procedimental,
de Herbert Simon, pois esta capturaria a essência do porquê, para ele, o processamento subjetivo e
incompleto das informações teria papel decisivo na tomada de decisão. “It accounts for ideology based
upon subjective perceptions of reality, playing a major part in human beings choices. It brings into play the
complexity and incompleteness of our information and the fumbling efforts we make to decipher it. It
focuses on the need to develop regularized patterns of human interaction in the face of such complexities,
and it suggests that these regularized interactions we call institutions may be very inadequate or very far
from optimal in any sense of the term. In short, such a way of looking at how human beings proceeds is
consistent with the arguments about the formation of institutions […]” (NORTH, 1990, p. 23)
12
O oportunismo deve ser diferenciado da simples busca do auto interesse, de acordo com o qual os
indivíduos jogam um jogo com regras fixas que eles obedecem de forma confiável.
20
que o pressuposto não é de que todos os indivíduos agem sempre oportunisticamente,
mas apenas que algumas pessoas agirão de forma oportunista em algum momento e que
não é possível definir, a priori, quem é, ou não, oportunista.
Esse fator faz com que as partes de uma transação deixem de ser confiáveis,
passando a ser necessário utilizar recursos no sentido de reduzir brechas para estes
comportamentos, e monitorar para que os termos dos contratos sejam cumpridos, ou seja,
incorre-se em custos durante uma transação que não estão ligados à produção do que será
trocado.
2.1.2 A Existência de Custos de Transação
Uma segunda hipótese subjacente à teoria neoclássica é a de que não custos
envolvidos no processo de troca. Esta idéia decorre da hipótese da racionalidade
substantiva, já que se supõe que os agentes podem adquirir e processar toda a informação
de que necessitarem sem custos e instantaneamente, assim como que estes mesmos
agentes podem fazer previsões perfeitas e, portanto, são capazes de escrever contratos
completos, que podem ser monitorados e impostos com precisão absoluta. Neste modelo,
o mercado, através de uma “mão invisível” é que aloca os recursos, igualando oferta e
demanda através de um mecanismo de preços, que se tornam a variável fundamental de
análise. Os custos considerados são apenas aqueles relativos à produção das mercadorias.
Commons (1931) já propunha que a unidade básica de análise deveria ser a
transação em si, não os preços.
Transactions intervene between the labor of the classic economists and
the pleasures of the hedonic economists, simply because it is society
that controls access to the forces of nature, and transactions are, not the
‘exchange of commodities’, but the alienation and acquisition, between
individuals, of the rights of property and liberty created by society,
which must therefore be negotiated between the parties concerned
before labor can produce, or consumers can consume, or commodities
be physically exchanged. (p. 5)
[…]
Transactions are the means, under operation of law and custom, of
acquiring and alienating legal control of commodities, or legal control
21
of the labor and management that will produce and deliver or exchange
the commodities and services, forward to the ultimate consumers.
(p.10)
Alguns anos depois, Coase (1937) mostrou que a organização da produção
internamente a uma firma faz sentido se aceitarmos que custos ligados à utilização
do mecanismo de preços, ou seja, à necessidade de coordenar as transações entre os
atores do mercado, os chamados custos de transação. Entre eles, destacam-se os custos de
obter e processar informações, de monitorar agentes e os de negociar e exigir o
cumprimento de contratos.
A idéia de custos de transação de Coase é ampliada, entendendo-se que os custos
de transação ocorrem tanto na utilização do mercado como internamente à firma,
havendo ainda aqueles relacionados à política. Estes últimos são destacados por
Eggertson (1990), para quem os custos de transação, ao ressaltarem a importância na
transmissão de direitos de propriedade, introduzem a questão da organização econômica e
fazem da estrutura das instituições políticas um fator-chave para a compreensão do
crescimento econômico.
De fato, segundo Furubotn e Richter (2000), se aceitarmos que os indivíduos
possuem racionalidade limitada, para toda a atividade exercida por estes, em qualquer
setor da economia, incorrer-se-á em custos de transação positivos. As limitações
humanas, as restrições de conhecimento e a tendência a cometer erros dos tomadores de
decisão do mundo real tornam-nos ineficientes, relativamente aos agentes racionais da
teoria neoclássica. Passamos a ser ineficientes quando passamos a depender dos outros
para obter os bens de que necessitamos. Isto ocorre, segundo Bueno (2004), quando surge
a divisão do trabalho e, com ela, portanto, os custos de transação.
Além da definição dada por Coase (1937), que relaciona custos de transação à
utilização do mecanismo de preços, outras mais amplas, como a de Arrow (1969 apud
FURUBOTN; RICHTER, 2000), que os define como os custos de colocar o sistema
econômico em operação, ampliada por Furubotn e Richter (2000) que destacam, além
destes custos de rotina, os de estabelecer, manter e mudar a estrutura institucional básica
deste sistema; ou de Williamson (1989), que divide estes custos em custos de transação
22
ex ante (relacionados ao desenvolvimento e negociação de acordos ou contratos) e ex
post (de monitoramento e imposição)
13
.
Para Williamson (1989), as principais “dimensões críticas” das transações (e,
portanto, de seu custo) são (1) sua freqüência, (2) o nível e tipo de incerteza a que estão
sujeitas e (3) a condição de especificidade do ativo, sendo a última considerada a mais
crítica, pois ativos muito específicos abrem a possibilidade de oportunismo, criando
novos custos, que não aqueles relativos à produção. O seu principal problema é que, se os
custos de transação forem demasiadamente altos, eles podem efetivamente impedir que
trocas ocorram, ou seja, podem fazer com que determinados mercados deixem de existir
ou mesmo, sequer, consigam estruturar-se.
É nesse sentido que uma estrutura institucional que ofereça regras e normas
regulares para as trocas e imponha o cumprimento de contratos torna-se muito
relevante
14
. Sem as restrições institucionais, o comportamento de interesse próprio
impedirá trocas complexas devido à incerteza que surgirá com relação ao cumprimento
do acordo pela outra parte. O custo de transação refletirá a incerteza, incluindo um
prêmio de risco com a magnitude da probabilidade de deserção da outra parte e o
conseqüente custo para a primeira parte. Porém, nada garante que todas as instituições
sejam eficientes, no sentido de oferecer baixos custos para as transações. Quanto maior a
especialização e o número e variabilidade dos atributos valiosos, mais importante torna-
se a existência de instituições confiáveis que permitam aos indivíduos engajarem-se em
contratos complexos com um mínimo de incerteza quanto à possibilidade de os termos do
contrato se realizarem (NORTH, 1990).
13
Allen (2000) destaca que há duas definições para o termo “custos de transação” na literatura, dependendo
de qual abordagem teórica a utiliza: Para a abordagem de direitos de propriedade, inspirada nos trabalhos
de Coase (1937, 1960), os custos de transação são aqueles relacionados ao estabelecimento e manutenção
de direitos de propriedade. Já na abordagem neoclássica, seriam aqueles custos incorridos na transferência
de direitos de propriedade (só ocorrem no momento em que se dá uma transação no mercado)
14
Segundo Coase (1960), o resultado neoclássico de mercados eficientes é alcançado quando não
custos para transacionar. Quando estes custos existem, as instituições importam. Wallis e North (1986 apud
NORTH, 1990) mostraram a importância dos custos de transação no PNB, ou seja, que realmente é custoso
transacionar.
23
2.2 Instituições
A palavra “instituição” possui um significado muito amplo na língua portuguesa
15
,
que mistura os conceitos de instituições e de organizações utilizados pelos autores da
Nova Economia Institucional, o que torna necessário defini-los adequadamente.
‘Instituições’ é o termo genérico que os economistas institucionais
utilizam para representar o comportamento regular e padronizado das
pessoas em uma sociedade, bem como as idéias e os valores associados a
essas regularidades; são exemplos de instituições: as leis e os costumes
que regulamentam o direito de propriedade, as práticas comerciais
formalmente codificadas ou não vigentes nas diferentes sociedades, as
formas de casamento e até as regras de etiqueta à mesa. A maior parte de
nossas atividades diárias, assim, obedecem a padrões porque, consciente
ou inconscientemente, calculamos que agir de acordo com as normas
estabelecidas é mais vantajoso do que adotar comportamentos
alternativos. (BUENO, 2004, p. 362)
Gustav Schmoller, considerado por Schumpeter (1926 apud RICHTER, 2001)
como o “pai” do institucionalismo americano, em 1900, definia instituições como um
conjunto de regras formais e informais, incluindo seu sistema de imposição
(enforcement). Esta definição também é utilizada por North (1990), que a complementa,
enfatizando que estas são impostas pelos homens a si mesmos, de forma a estruturar suas
interações
.
Juntamente com as restrições clássicas da economia, elas definem o conjunto
de escolhas e, portanto, os custos de produção e de transação assim como a possibilidade
e a lucratividade de se dar inicio a uma atividade econômica.
Se as instituições são as regras do jogo, as organizações, para North (1990), são
vistas como “os jogadores”. Estas se desenvolveriam devido aos incentivos gerados pela
estrutura institucional. Seriam grupos de indivíduos ligados por algum propósito comum
para alcançar objetivos. Entre organizações estariam corpos políticos (como partidos
políticos, o Senado, maras de vereadores, agências reguladoras), corpos econômicos
15
No dicionário Aurélio constam: Instituição: 1. Ato de instituir, criação, estabelecimento; 2. A coisa
instituída ou estabelecida, instituto: instituições legais; 3. Associação ou organização de caráter social,
educacional, religioso, filantrópico, etc. 4. Nomeação (de herdeiro); 5.Estrutura decorrente das
necessidades sociais básicas, com caráter de relativa permanência, e identificável pelo valor de seus
códigos de conduta, alguns deles expressos em leis; instituto; 6. Pessoa ou coisa que, por sua eficiência,
antiguidade, etc., como que representa uma instituição. E Instituições: 1. Leis fundamentais que regem uma
sociedade política; regime. 2. O conjunto de estruturas sociais estabelecidas pela tradição, especialmente as
relacionadas com a coisa pública.
24
(como firmas, sindicatos, fazendas, cooperativas), corpos sociais (como igrejas, clubes,
associações atléticas) e corpos educacionais (como escolas, universidades, centros de
instrução vocacional)
16
. Além destas, Furubotn e Richter (2000) mostram que, se
entendermos as organizações neste sentido destacado por North (como grupos
estruturados de indivíduos que buscam alcançar um objetivo comum), não firmas, mas
os mercados e mesmo os Estados podem ser vistos como organizações. Nos mercados, o
objetivo comum seria o aumento da utilidade de compradores e vendedores potenciais,
enquanto no Estado, seria oferecer um certo nível de bens públicos e estabelecer taxas
suficientes para alcançar tal propósito.
A importância das instituições, segundo North (1990), deve-se ao fato de que, à
medida que restringem certos tipos de condutas, ou selecionam entre condutas permitidas
e proibidas, elas facilitam a formação de uma estrutura de comportamentos previsíveis,
ou, em outras palavras, uma estrutura geral de estabilidade do ambiente, e, assim,
diminuem as incertezas implícitas nas atividades humanas do dia-a-dia. Esta
previsibilidade do ambiente possibilita a redução de custos de transação e, como
conseqüência, acaba por incentivar as trocas. Deve ficar claro, entretanto, que nada
garante que as instituições sejam eficientes.
Além disso, a coerência entre os objetivos das restrições institucionais e as
escolhas efetivamente feitas pelos indivíduos dentro da estrutura institucional depende da
efetividade dos mecanismos de imposição. Estes mecanismos podem ser códigos de
conduta auto-impositivos, retaliação por parte dos demais membros da sociedade e/ou
sanções sociais e coerção impositiva estatal.
16
Menárd (1995) também procura diferenciar e dar definições claras de instituições e organizações.
Segundo este autor,
[…] an institution is manifested in a long-standing historically determined set of
stable, abstract and impersonal rules, crystallized in traditions, customs, or laws,
so as to implement and enforce patterns of behavior governing the relationships
between separate social constituencies. (p.168)
e uma organização,
[…] is an institutional arrangement designed to make possible the conscious and
deliberate coordination of activities within identifiable boundaries, in which
members associate on a regular basis through a set of implicit and explicit
agreements, commit themselves to collective actions for the purpose of creating
or allocating resources and capabilities by a combination of command and
cooperation (p. 175).
25
A idéia de instituições como restrições que os homens desenvolvem para moldar
as interações humanas é bastante abrangente, incluindo desde instituições informais,
como tradições, costumes, normas de conduta, etc., até as formais, como as leis, podendo
surgir por criação dos homens ou mesmo por “evolução espontânea”. Jütting (2003)
destaca que, na literatura, podemos encontrar varias formas de classificar instituições, as
quais podem ser agrupadas segundo três diferentes abordagens: grau de formalidade, área
de análise ou níveis hierárquicos.
2.2.1 Grau de Formalidade
A forma de classificação institucional adotada por North (1990) segue a idéia de
que as instituições são formas de restrições criadas pelos homens para moldar a interação
humana. Elas consistem tanto de regras formais escritas, quanto de códigos de conduta
não escritos, que subordinam e complementam as regras formais. As regras e restrições
formais são as constituições, leis, direitos de propriedade, escrituras, estatutos, direito
comum e regulamentos e suas características impositivas (enforcement), como sanções.
as regras informais podem ser tanto extensões, elaborações e modificações das
formais, normas de comportamento sancionadas socialmente (como costumes, tabus e
tradições), assim como padrões de conduta impostos internamente.
2.2.2 Área de Análise
Uma segunda forma de classificação das instituições é a diferenciação entre as
várias áreas de análise. Neste caso, as quatro principais categorias encontradas na
literatura, segundo Jütting (2003), são:
- Instituições Econômicas: regras que definem processos de produção, alocação e
distribuição de bens e serviços, incluindo mercados.
- Instituições Políticas: Regras eleitorais, tipos de sistema político, composição
partidária da oposição e governo, sistemas de controle e estabilidade política.
26
- Instituições Legais: sistema legal, definição e imposição de direitos de propriedade e
princípio legal.
- Instituições Sociais: regras ligadas a acesso a saúde e educação, arranjos de
seguridade social, questões de gênero e de relações entre atores econômicos.
2.2.3 Nível Hierárquico
Williamson (2000) desenvolve um esquema hierárquico de quatro níveis de
análise social, que pode ser visto no Quadro 2.1. Sua abordagem tem a vantagem de
destacar a interconexão entre os diferentes níveis institucionais e ser dinâmica,
possibilitando uma melhor compreensão da mudança institucional e do impacto das
instituições no produto. As flechas sólidas que ligam um nível mais alto a outro mais
baixo significam que o nível superior impõe restrições no nível imediatamente inferior.
As flechas tracejadas no sentido inverso indicam feedback.
No primeiro nível, denominado embeddedness
17
social, encontram-se as
normas, costumes, maneiras, tradições, etc. Williamson supõe que muitas destas
instituições surgem de forma espontânea e, dada esta origem evolucionária, elas são
adotadas e, a partir daí, sofrem, em parte, grande inércia algumas por serem funcionais
(como convenções), outras pelos seus valores simbólicos, e muitas são profundamente
ligadas a instituições complementares (formais e informais). Desta forma, elas mudam
muito lentamente neste nível na ordem de séculos ou milênios. Para a NEI, não
dúvida de que estas instituições informais têm grande influência sobre características de
longo prazo das economias, entretanto, esta escola não sabe como explicá-las. O
conceito de “embeddedness”, tanto ao nível de sociedade quanto no contexto das redes de
relacionamento vigentes, foi desenvolvido para explicar melhor esta questão. A vasta
literatura sobre cultura também é pertinente.
17
Segundo Dequech (2003), a noção de embeddedness remonta aos trabalhos de Karl Polanyi e Clifford
Geertz, tendo sido revitalizada por Mark Granovetter (1985) e, desde então, tornou-se um conceito central
na nova sociologia econômica. O artigo de Granovetter focou no embeddednes da ação econômica em
“redes de relações interpessoais”. Smelser e Swedberg (1994 apud WILLIAMSON, 2000) observam que há
diferentes tipos de embeddednesse concluem que este conceito ainda necessita de melhor especificação
teórica.
27
Quadro 2.1: Esquema de quatro níveis de Análise Social
Fonte: Williamson (2000, p. 597).
O segundo nível é denominado Ambiente Institucional, onde figuram as
chamadas regras formais, como constituições, leis, direitos de propriedade, etc. Neste
nível, as instituições são criações voluntárias dos homens com o objetivo de obter
ambiente institucional mais adequado às relações humanas vigentes. Restringidos pela
sombra do passado, os instrumentos desenhados no nível 2 incluem tanto o Executivo, o
Legislativo, o Judiciário e as funções burocráticas dos governos, como a divisão de
poderes entre diferentes níveis governamentais (federalismo). A definição e o
Alocação de recursos:
Determinação de preços e
quantidades
Contínuo
Eficiência na alocação.
Abordagem marginal
NIVEL
FREQÜÊNCIA
(anos)
OBJETIVO
N 1
Embeddedness:
Instituições informais, costumes,
tradições, normas, religiões
100 a 1000
Surgem espontaneamente
Estrutura de Governança
Estabelecer contratos.
(Ajustar estruturas de
governança às transações)
1 a 10
Obter a estrutura de
governança mais
adequada.
Economia de 2ª ordem
Ambiente Institucional:
Regras formais, direito de
propriedade (política, judiciário,
burocracia)
10 a 100
Obter o ambiente
Institucional mais
adequado.
Economia de 1ª ordem
N 2
N 3
N 4
N1: Teoria Social
N2: Economia dos Direitos de Propriedade / Teoria Política Positiva
N3: Economia dos Custos de Transação
N4: Economia Neoclássica / Teoria da Agência
28
enforcement (imposição do cumprimento das regras) dos direitos de propriedade e dos
contratos são questões importantes neste nível.
No terceiro nível, figura o que seria “o jogo em si” (contratos), ou seja, as
estruturas de governança. Com base na proposta de Commons (1931) de que a principal
unidade de análise deve ser a transação, uma vez que ela engloba os princípios de
conflito, mutualismo e ordem, Williamson a governança exatamente como este
esforço em alcançar a ordem, mitigar o conflito e conseguir ganhos mútuos. Desta forma,
a estrutura de governança redesenha incentivos que levam a construção de organizações
específicas, como governos locais ou nacionais, agências de Estado, ONGs, etc.
Por fim, o último nível seria aquele onde a microeconomia neoclássica atua, qual
seja, o de alocação de recursos e emprego. Neste nível, os instrumentos de otimização e
análise marginal são empregados e a firma é tipicamente descrita como uma função de
produção. O ajuste a preços e produtos ocorre mais ou menos continuamente. Neste nível,
os incentivos são definidos pelos efeitos combinados dos três níveis superiores. A seguir,
procurar-se-á aprofundar melhor os três primeiros níveis acima mencionados.
2.2.3.1 Embeddedness
Neste primeiro nível, são enquadradas instituições consideradas “enraizadas” na
sociedade, como as derivadas de fatores culturais, costumes, tradições, normas éticas e
sociais, religião e alguns aspectos de linguagem, cognição e motivações humanas. Estas
constituem a base cultural e social das economias, indicando a conexão indissolúvel entre
os indivíduos e seu ambiente social. Constituídas basicamente por instituições informais,
são amplamente difundidas, de tal forma que chegam a passar despercebidas, por
parecerem obviedades do dia-a-dia.
Segundo North (1990), as instituições informais definem a forma como a
sociedade se auto-regula. Elas surgem para coordenar a interação humana repetitiva,
como (i) extensões, elaborações e modificações de regras formais; (ii) normas de
comportamento sancionadas socialmente e (iii) normas de conduta internamente
impostas. Possuem papel importante nas transações, principalmente em países onde os
29
direitos de propriedade não são bem especificados, pois estas transações são reguladas
por expectativas, as quais, por sua vez, são baseadas em crenças e identidade. Apesar das
instituições informais não possuírem mecanismos formais de imposição, o
comprometimento dos indivíduos em relação a elas é, em geral, bastante forte.
North (1990) diferencia três tipos de restrições informais segundo sua forma de
imposição: as auto-impostas, como convenções que resolvem problemas de coordenação
(por exemplo, regras de trânsito), uma vez que, dados os custos de troca, ambas as partes
têm interesse em minimizar o custo de medida; as não auto-impostas, como organizações
e instrumentos que tornam efetivas normas de comportamento cooperativo e, assim,
reduzem os custos de medida e imposição (por exemplo, padronização de pesos e
medidas, classificação de crédito, melhores casas de comércio); e os códigos de conduta
internamente impostos (internally enforced) que modificam o comportamento e fazem
com que nem todas as escolhas sejam no sentido de maximização de riqueza, mas de
outros valores, como religiosos.
As restrições informais são importantes na constituição do conjunto de escolhas,
tanto no curto quanto no longo prazo de evolução das sociedades. No curto prazo, a
cultura define a forma como os indivíduos processam e utilizam a informação, e ainda,
pode afetar a forma como as restrições formais são especificadas. No longo prazo, o
processamento das informações moldado pela cultura tem importância na forma de
evolução incremental das instituições e, portanto, é uma fonte de trajetória dependente
(path-dependence)
18
. Igualmente importante é o fato de que as restrições informais que
são derivadas da cultura não mudarão imediatamente como reação a mudanças nas regras
formais. Como resultado, a tensão entre as regras formais alteradas e as informais
persistentes produz resultados que têm importantes implicações no modo como as
economias mudam (NORTH, 1990).
A importância de tais restrições, por si mesmas (e não apenas como apêndice das
formais), fica evidente quando comparamos duas sociedades diferentes com as mesmas
regras formais ou constituições impostas que produzem resultados diferentes. De fato,
18
A dependência de trajetória não significa que seja impossível mudar, apenas que uma tendência de se
manter em determinado caminho.
30
segundo Azfar (2002), são as restrições informais as responsáveis pelo estabelecimento
da chamada ordem social
19
. Também, quando ocorre uma mudança institucional
descontínua, devida, por exemplo, a guerras e revoluções, há persistência de muitas
restrições informais. E é por isso que as revoluções sempre mudam muito menos do que
se propõem (NORTH, 1990).
O surgimento dessas instituições dá-se, em geral, de forma espontânea. Dadas
suas origens evolucionárias, elas são adotadas e, a partir de então, sofrem grande inércia
algumas por serem funcionais (por exemplo, convenções); outras por possuírem valor
simbólico e um conjunto de pessoas que acreditam nelas, muitas são amplamente ligadas
a instituições complementares (formais e informais). Sua perpetuação deve-se ao fato de
que são transmitidas socialmente e de que são parte da herança chamada cultura
20
. O
filtro cultural oferece continuidade, de forma que a solução informal para problemas de
troca no passado reproduz-se no presente, o que torna estas restrições informais fontes
importantes de continuidade na mudança social de longo prazo. Assim, as instituições
resultantes possuem poder duradouro sobre a forma como a sociedade se conduz.
Granovetter (1985) expandiu esse conceito de embeddedness, acrescentando as
relações pessoais às instituições informais ao criticar o atomismo das análises da ação
humana sub e sobre-socializadas
21
. Seu argumento enfatiza o papel das relações pessoais
19
Segundo North, Summerhill e Weingast (2000 apud AZFAR, 2002, p. 7), a ordem social consiste de: 1.
A shared belief system about the rights and privileges of private parties and public institutions; 2. The clear
statement of these rights and privileges; 3. Implicit or explicit incentive structures that prevent officials
from exceeding the bounds of their authority these include limited benefits from deviations, and fear of
reprisal; 4. A clear and shared understanding on the part of the population of what constitutes a deviation
from expected behavior, and a willingness to rebel or retaliate; 5. A shared understanding of the legitimacy
of rules and a widespread willingness to follow them, so that deviations are rare and can effectively be
punished.
20
Segundo Boys e Richerson (1985 apud NORTH, 1990), a cultura pode ser definida como a transmissão,
de geração para geração, através de ensino e imitação, de conhecimentos, valores e outros fatores que
influenciam o comportamento. Segundo North (1990, p. 37), “culture provides a language-based
conceptual framework for encoding and interpreting the information that the senses are presenting to the
brain”.
21
Segundo esse autor, a abordagem subsocializada seria a da Nova Economia Institucional, para quem
“social institutions and arrangements previously thought to be the adventitious result of legal, historical,
social, or political forces are better viewed as the efficient solution to certain economic problems”
(
GRANOVETTER,
1985, p.488). Já a sobre-socializada seria associada à escola “substantivista” em
antropologia, identificada, especialmente, com Karl Polanyi (POLANYI, 1944; POLANYI; ARENSBERG;
PEARSON, 1957 apud GRANOVETTER, 1985) e com a idéia de “economia moral” em história e ciência
política (THOMPSON, 1971; SCOTT, 1976 apud GRANOVETTER, 1985), além de ter uma relação clara
com o pensamento marxista.
31
concretas e estruturas (ou redes) de tais relações na geração de confiança e
desencorajamento de condutas mal intencionadas
22
. Segundo este autor
Actors do not behave or decide as atoms outside a social context, nor do
they adhere slavishly to a script written for them by the particular
intersection of social categories that they happen to occupy. Their
attempts at purposive action are instead embedded in concrete, ongoing
systems of social relations. (GRANOVETTER, 1985, p.487)
Zukin e DiMaggio's (1990 apud DEQUECH, 2003) procuram ampliar ainda mais
tal conceito, identificando quatro tipos de embeddedness da ação econômica.
Primeiramente, o Embeddedness Cognitivo, que se refere às formas pelas quais as
regularidades estruturadas dos processos mentais limitam o exercício do raciocínio
econômico. Esta noção chama atenção para a questão da racionalidade limitada. O
Embeddedness Cultural refere-se ao papel da compreensão coletiva comum na formação
das estratégias e objetivos econômicos, enquanto o Embeddedness Estrutural é definido
como “the contextualization of economic exchange in patterns of ongoing interpersonal
relations” (DEQUECH, 2003, p. 462). Por último, o Embeddedness Político, que seria a
forma como as instituições e decisões econômicas são moldadas na luta pelo poder,
envolvendo atores econômicos e instituições não relacionadas ao mercado, como a
estrutura legal do Estado.
2.2.3.2 Ambiente Institucional
As estruturas observadas neste nível são restringidas pelo embeddedness em que
estão inseridas. Constituem-se de restrições formais, que, em parte, são produto de um
processo evolucionário, embora haja também aquelas planejadas. As regras formais
podem complementar e aumentar a efetividade das restrições informais. Elas podem
reduzir os custos de informação, monitoramento e enforcement e, assim, tornar as
restrições informais possíveis soluções para trocas mais complexas.
22
Isso fica claro, pois “The widespread preference for transacting with individuals of known reputation
implies that few are actually content to rely on either generalized morality or institutional arrangements to
guard against trouble.” (GRANOVETTER, 1985, p. 490)
32
Segundo North (1990), dado o poder de barganha inicial das partes do processo de
decisão, a função das regras é facilitar a troca política ou econômica. A estrutura
existente de direitos (e a qualidade de seu enforcement) define as oportunidades de
maximização de riqueza dos jogadores, que podem ser alcançadas pela realização de
trocas políticas ou econômicas. Deve-se notar, entretanto, que a função das regras
formais é facilitar alguns tipos de trocas, mas o todas. Assim, há regras que facilitam
algumas trocas enquanto elevam os custos de outras, que são indesejadas. Nada garante,
entretanto, que estas regras sejam eficientes, que são desenvolvidas, principalmente,
em interesse do bem-estar privado e não do social.
No ambiente institucional enquadram-se: constituições, sistema político e direitos
humanos básicos; direitos de propriedade e sua alocação; leis, cortes e instituições
relacionadas à imposição (enforcement); moeda, instituições financeiras básicas e o poder
governamental de cobrar impostos, leis e instituições que regulam migração, comércio e
investimento externo; os mecanismos políticos, econômicos e legais que facilitam
mudanças no ambiente institucional. Podemos dividi-las em regras políticas e regras
econômicas.
As regras políticas em vigor moldam as regras econômicas, embora a causalidade
seja nos dois sentidos. Ou seja, direitos de propriedade, assim como contratos individuais,
são especificados e impostos (enforced) por decisões políticas, mas a estrutura de
interesses econômicos também influencia a estrutura política. Em equilíbrio, uma dada
estrutura de direitos de propriedade (e seu enforcement) será consistente com um
conjunto particular de regras políticas (e seu enforcement). Mudanças em um induzirão
mudanças no outro (NORTH, 1990).
Acemoglu, Johnson e Robinson (2004) procuram explicar como se esta dupla
determinação. Enquanto as instituições políticas estabelecem a distribuição do poder
político jurídico da sociedade, a distribuição de recursos afeta a distribuição do poder
político de fato
23
em um primeiro momento. Estas variáveis de poder político, por sua
vez, influenciam a escolha das instituições econômicas e as próprias instituições políticas
23
O poder político-jurídico seria o determinado pelas instituições políticas, enquanto o “de fatoviria da
capacidade de engajar-se em ação coletiva, usar força bruta ou outros meios como lobby ou suborno.
33
num segundo momento. As instituições econômicas, então definidas, determinarão a
performance econômica, ou seja, a taxa de crescimento e a distribuição de recursos.
Portanto, embora as instituições econômicas sejam o principal fator determinante da
performance, elas próprias são determinadas de forma endógena pelas instituições
políticas e pela distribuição de recursos na sociedade. Este modelo pode ser visto no
Quadro 2.2.
Quadro 2.2: Esquema de determinação institucional endógena
Fonte: Acemoglu, Johnson e Robinson (2004, p.6)
a) Regras Políticas
As instituições políticas definem as regras do jogo político, ou seja, a estrutura
hierárquica da política, sua estrutura básica de decisão e as características explícitas de
controle da agenda, e, assim, influenciam fortemente as propriedades de funcionamento
do processo político. Elas constituem-se de acordos ex ante sobre cooperação entre
políticos e, assim, reduzem a incerteza criando uma estrutura estável de troca. O
resultado, segundo North (1990) é um sistema complexo de estrutura de comissões, que
consiste tanto em regras formais quanto em métodos informais de organização.
As instituições políticas definem: métodos de seleção de governo (ditaduras e
democracias); separação de poderes dentro do governo (entre Executivo, Legislativo e
Judiciário, se são eleitos separadamente e se são independentes de fato entre si); o quanto
os cidadãos podem participar diretamente na criação de leis através de referendo; como o
Instituições
Políticas
t
Distribuição
de recursos
t
Poder
político
jurídico
&
Poder
político de
fato
Instituições
Econômicas
t+1
Instituições
Políticas
t+1
Performance
Econômica
t
&
Distribuição de
recursos
t+1
34
poder é atribuído a governos federal e locais e a existência de imprensa livre. Berggren e
Kurrild-Klitgaard (2002) consideram a constituição formal de um país a principal entre
estas instituições, pois ela contém itens básicos como o sistema eleitoral e suas regras, um
catálogo de direitos, as unidades políticas centrais (e a relação entre Executivo,
Legislativo e Judiciário). Há, porém, diversas outras instituições políticas que também
são bastante importantes.
Segundo North (1990) a hierarquia das regras de constituições, legislações
específicas, estatutos e regulamentos define restrições que formam uma hierarquia de
dificuldade de mudança, sendo que as regras mais gerais, de mais alto nível hierárquico
(como constituições) são mais difíceis de mudar do que as mais específicas (como
regulamentos internos).
Apesar da mudança de tais regras depender, basicamente, dos interesses dos
atores com maior poder de barganha, os atores centrais com relação a instituições
políticas são os próprios políticos. São seus objetivos e as restrições impostas sobre eles
no empenho de alcançar esses objetivos que determinam o arranjo institucional. Segundo
Aghion, Alesina e Trebbi (2002, p.2),
Political institutions contribute to determine the choice of economic
policies, which, in turn, determines economic success. However,
institutions themselves are chosen by individuals and they evolve in
response to changing politicoeconomic conditions.
Assim, em boa medida, são também os políticos que, em nome do Estado,
determinam as instituições econômicas. Portanto, a eficiência dos mercados políticos é a
chave para entendermos a estrutura dos direitos de propriedade. Se os custos de transação
no ambiente político forem baixos e os agentes políticos possuírem modelos mentais
acurados para guiá-los, então será possível alcançar direitos de propriedade eficientes (ou
seja, que estimulem a atividade produtiva). No entanto, quanto maiores os custos de
transação e o nível de subjetividade da percepção dos agentes, menos eficientes serão os
direitos de propriedade resultantes, prejudicando o crescimento econômico (NORTH,
1990).
35
b) Regras Econômicas
As instituições econômicas de uma sociedade constituem-se basicamente da
estrutura de direitos de propriedade e da conseqüente presença e perfeição dos
mercados
24
. Segundo Furubotn e Richter (2000), direitos de propriedade, em um sentido
econômico amplo do termo, englobam o direito de usar e receber benefícios de um objeto
físico ou trabalho intelectual e o direito de demandar certo comportamento de outro
indivíduo. segundo Eggertson (1990), um sistema de direitos de propriedade é um
método de atribuir a um indivíduo particular a autoridade de escolher, para bens
específicos, qualquer uso dentre uma classe de usos não proibidos. Mais especificamente,
segundo Alston e Mueller (2005, p.573),
Property rights range from open access to a fully specified set of private
rights. By open access we mean that anyone can use the asset regardless
of how their use affects the use of others. A full set of private rights
consists of the following: 1) the right to use the asset in any manner that
the user wishes, generally with the caveat that such use does not interfere
with some one else’s property right; 2) the right to exclude others from
the use of the same asset; 3) the right to derive income from the asset; 4)
the right to sell the asset; and 5) the right to bequeath the asset to
someone of your choice. In between open access and private property
rights are a host of commons arrangements. Commons arrangements
differ from open access in several respects. Under a common
arrangement only a select group is allowed access to the asset and the use
rights of individuals using the asset may be circumscribed. (p. 573)
Alchian e Demsetz (1973, p.17, 19, grifo do autor) procuram evitar confusões,
clarificando que
it is not the resource itself which is owned; it is a bundle, or a portion, of
rights to use a resource that is owned. In its original meaning, property
referred solely to a right, title, or interest, and resources could not be
identified as property any more than they could be identified as right,
title, or interest. (p.17) […] The bundle of property rights associated with
a resource is divisible. Some rights to some uses may be states owned
and others privately owned.
24
Segundo Ménard (1995, p.172), um mercado é “[…] a specific institutional arrangement consisting of
rules and conventions that make possible a large number of voluntary transfers of property rights on a
regular basis, these reversible transfers being implemented and enforced through a specific mechanism of
regulation, the competitive price system.”
36
A importância das instituições econômicas deve-se ao fato de que elas
influenciam a estrutura de incentivos em uma sociedade, assim como são determinantes
do conjunto de oportunidades disponíveis. Sem direitos de propriedade, os indivíduos não
terão incentivos para investir em capital físico ou humano ou adotar tecnologias mais
eficientes. Além disso, elas ajudam a alocar recursos em seus usos mais eficientes,
determinam quem recebe os lucros, rendas e direitos de controle residuais, assim como
quem deverá pagar a quem para modificar os efeitos da ação tomada por determinado
indivíduo. Quando bem definidas, diminuem os custos de transação, permitindo que os
custos e/ou benefícios (externalidades) de uma dada ação sejam alocados entre os
indivíduos (ou seja, sejam internalizados).
Segundo Acemoglu, Johnson e Robinson (2004), quando os mercados são
ausentes ou ignorados (como eram na União Soviética, por exemplo), os ganhos de
comércio não são explorados e os recursos são mal alocados, de forma que as sociedades
com instituições econômicas que facilitam e encorajam a acumulação de fatores,
inovação e alocação eficiente dos recursos terão mais chances de prosperar. Embora
fatores culturais e geográficos também sejam importantes para a performance econômica,
diferenças em instituições econômicas são a principal causa de diferenças de crescimento
e prosperidade entre países. Elas não determinam o crescimento agregado, mas
também a distribuição do produto entre grupos e indivíduos na sociedade.
Allen (2000, p. 897) complementa, argumentando que, dado que o comércio é a
transferência de direitos de propriedade, não é possível existir comércio (e, portanto,
ganhos de comércio) na ausência destes direitos. Além disso, quando eles são
perfeitamente definidos, o teorema de Coase afirma que os ganhos serão maximizados.
Se assumirmos que a relação entre direitos de propriedade e comércio é uma função
contínua, quanto mais bem definidos forem os primeiros, maiores os ganhos de comércio.
Mas para que direitos de propriedade possam gerar tal prosperidade, eles devem
não apenas ser bem definidos, mas também efetivamente impostos na sociedade. A
definição, interpretação e imposição dos direitos de propriedade são funções do Estado
em diferentes níveis, quais sejam, Legislativo, Judiciário e poder de polícia,
respectivamente (ALSTON; MUELLER, 2005).
37
Com relação ao surgimento dos direitos de propriedade, segundo Alston e Mueller
(2005), em geral, os estudos indicam que eles são desenvolvidos a partir da necessidade
que surge devido ao aumento da escassez de recursos, em geral, causada por alguma
mudança de tecnologia, população, preferências, preços relativos ou oportunidades de
mercado. Quando isto acontece o regime anterior de direitos de propriedade deixa de ser
capaz de arbitrar as demandas concorrentes de maneira eficiente. As perdas que seguem
geram incentivos para que os indivíduos e grupos envolvidos se dediquem a alterar os
direitos de propriedade para uma forma mais propícia à nova realidade. A forma como
estes novos arranjos se realizam depende do processo político e varia de acordo com as
especificidades de cada caso e pode ser determinante para a performance posterior das
economias.
2.2.3.3 Estrutura de Governança
Neste nível, enquadram-se as estruturas de governança, ou “como o jogo é
jogado”. Segundo Williamson (1996), uma estrutura de governança pode ser vista como
uma estrutura institucional na qual a transação, em sua integridade, ou um conjunto de
transações relacionadas, é decidido. No setor comercial, três alternativas discretas de
governança são comumente reconhecidas: mercados clássicos; contratos híbridos e
hierarquias.
Dado o ambiente institucional, as escolhas são feitas considerando o arranjo
institucional que governará as relações econômicas. Para cada transação específica, existe
uma estrutura de governança que minimiza os custos de transação. Se aceitarmos que a
transação é a unidade básica de análise, e que esta traz sempre implícitas as relações
sociais de conflito, dependência (mutualismo) e ordem, como desenvolvido por
Commons (1931)
25
, a governança será o meio pelo qual se introduz a ordem, de forma a
25
The parties are involved in a conflict of interests on account of the universal principle of scarcity. Yet
they depend on each other for reciprocal alienation and acquisition of what the other wants but does not
own. Then the working rule is not a foreordained harmony of interests, as assumed in the hypotheses of
natural rights or mechanical equilibrium of the classical and hedonic schools, but it actually creates, out of
conflict of interests, a workable mutuality and orderly expectation of property and liberty. (COMMONS,
1931, p. 656)
38
mitigar o conflito e alcançar ganhos mútuos nas trocas. Os parâmetros dos níveis 1 e 2
alteram os custos competitivos da governança.
Na teoria neoclássica, esses resultados poderiam ser facilmente alcançados se as
transações se dessem através do mercado. Entretanto, como visto anteriormente, tal
resultado simples é alcançado em um mundo onde não custos para transacionar. A
existência de custos de transação a base para a compreensão do porquê pode ser mais
eficiente a escolha pela realização das transações internamente a uma firma (ou estrutura
hierárquica qualquer). O argumento principal é que modos alternativos de governança, os
quais possuem diferentes forças e fraquezas alinham-se com as necessidades adaptativas
das diferentes transações, de forma a (principalmente) economizar em custos de
transação, havendo espaço para os mais diferentes tipos de governança.
Essas questões relacionadas a governança inserem-se nos estudos da Economia de
Custos de Transação da NEI, cujos principais autores são Ronald Coase e Oliver
Williamson. Esta adota uma abordagem contratual para o estudo da organização
econômica, assumindo que contratos complexos são incompletos (pois a racionalidade é
limitada) e estão sujeitos a quebras estratégicas (por razões de oportunismo). Além disso,
a adaptação a distúrbios é o problema central da organização econômica, podendo ser
tanto autônoma, dos agentes respondendo a mudanças de oportunidade no mercado,
indicadas por variações em preços relativos, como imposta através da administração
internamente a uma hierarquia.
Note que a abordagem contratual da Economia de Custos de Transação as
firmas (e outras formas de hierarquias, ou mercados) como instituições, diferentemente
da dada por North (1990), que vê as organizações como agentes. Segundo Nicolau e
Cario (2006), esta diferença deve-se ao tipo de análise empregada pelos autores. A
análise de North (1990) distingue entre instituição e organização a partir do esquema
meios-fins da ação humana, onde as organizações são agentes tais como famílias, firmas
e Estados, que têm preferências e objetivos, ou seja, devem ser associadas aos fins;
instituições são restrições sociais formais e informais sendo, portanto, ligada aos meios.
Desta maneira, as organizações são pessoas jurídicas com capacidade de ação, através das
pessoas físicas de seus dirigentes. Já na abordagem de Williamson (1996),
39
[...] as firmas são instituições, assim como mercados e contratos
relacionais, pois o autor refere-se à estrutura contratual subjacente. As
organizações são instituições na medida em que seu funcionamento
depende de regulamentos, rotinas e ‘cultura’ própria. Estes diferentes
mecanismos operam, na firma, no mercado e nos contratos relacionais,
como estruturas de governança’ concretas das transações econômicas,
condicionados por leis e normas sociais integrantes do ambiente
institucional de âmbito nacional. Assim, o termo estrutura de governança
refere-se a um segundo nível institucional, o do ordenamento privado,
podendo-se falar, neste nível, em escolha institucional a escolha da
forma contratual mais adequada a determinada transação. Neste mesmo
nível operacional e planejamento, pode-se também incluir os
instrumentos de política econômica e institucional, cuja finalidade é a
criação de estruturas setoriais, regionais ou locais com vistas a melhor
orientar os processos sócio-econômicos. (NICOLAU; CARIO, 2006, p.
2)
Williamson (2004) procura explicar como as estruturas de governança
relacionam-se com os diferentes tipos de transação. As principais dimensões críticas
determinantes da complexidade das transações são a especificidade dos ativos
26
, a
incerteza e a freqüência com que ocorrem. Já as estruturas de governança no setor
comercial são distinguidas, de uma forma simplificada, entre mercados clássicos, modos
híbridos de contratos e hierarquias.
Mercados referem-se ao espaço onde partes autônomas fazem trocas. Eles podem
ser densos (mercados clássicos), com um grande número de compradores e vendedores
de cada lado da transação; ou estreitos, caracterizados pela escassez, devida em grande
parte a especificidade de ativos. Contratos híbridos e hierarquias surgem à medida que
aumenta a especificidade de ativos e a identidade passa a ser importante. Nas hierarquias,
as transações ocorrem sob domínio unificado (compradores e vendedores estão dentro da
mesma empresa) e estão sujeitas a controles administrativos (uma relação de autoridade,
que inclui os credores). As leis contratuais de uma hierarquia são de indulgência, segundo
a qual a organização interna é sua própria corte de apelação final. Formas híbridas são
relações contratuais de longo prazo que preservam a autonomia, mas oferecem
26
Segundo Williamson (1996) um ativo específico é um investimento especializado que não pode ser
reempregado para usos alternativos sem perda de valor produtivo. Especificidade de ativos pode ter formas
variadas, entre as quais humana, sica e de localização são as mais comuns. Especificidade de ativos gera
dependência bilateral, que complica relações contratuais.
40
salvaguardas
27
adicionais a transações especificas em comparação com mercados. O
Quadro 2.3 descreve estas três formas segundo os atributos de intensidade de
incentivos
28
, controles administrativos e regime de leis contratuais. O tipo de governança
a ser usado dependerá das diferentes necessidades adaptativas impostas pelas transações.
Quadro 2.3: Atributos dos três modos de governança
---------Estruturas de Governança---------
Atributos
Mercados Híbridos Hierarquias
Intensidade de
incentivos
Forte
(++)
Médio
(+)
Fraco
(0)
Controles
Administrativos
Pouco
(0)
Algum
(+)
Muito
(++)
Regimes de Leis
Contratuais
Legalidade
(++)
Contrato como
estrutura
(+)
Omissão
(0)
Fonte: Williamson (2004, p. 31-32)
As escolhas entre diferentes estruturas de governança é uma forma de
comportamento maximizador das firmas dentro do conjunto de restrições, mas uma forma
alternativa de maximização é aplicar recursos para mudar as restrições institucionais. A
direção escolhida pela organização depende de suas percepções subjetivas de ganhos
(NORTH, 1990).
27
Segundo Williamson (1996, 379), salvaguardas são “[…] added security features, if any, that are
introduced into a contract in order to reduce hazards (due mainly to asset specificity) and to create
confidence.”. Elas podem tomar a forma de penalidades, redução de intensidade de incentivos e/ ou
aparatos de ordem privada para lidar com contingências mais bem desenvolvidas.
28
Segundo Williamson (1996, 378), a intensidade de incentivos é “a measure of the degree to which a party
reliable appropriates the net receipts (which could be negative) associated with its efforts and decisions.
High-powered incentives will obtain if a party has a clear entitlement to and can establish the magnitude of
its net receipts easily. Lower-powered incentives will obtains if the net receipts are pooled and/or if the
magnitude is difficult to ascertain.
41
2.3 Mudança Institucional
A importância fundamental das instituições para a economia centra-se no fato de
que elas oferecem uma estrutura estável para as trocas, mesmo as mais complexas no
tempo e no espaço. Esta estabilidade fica evidente se atentarmos para a matriz
institucional de Williamson, que mostra a persistência, principalmente das instituições
informais, as quais impõem restrições sobre a mudança dos níveis seguintes.
Tal estabilidade, todavia, não implica que as instituições sejam estáticas. Elas
estão continuamente evoluindo, e, assim, alterando as escolhas possíveis. Entretanto, as
mudanças, em geral, são tão lentas que as enxergamos se olhamos para a história. De
fato, segundo North (1990, p. 5)
[Institutions] evolve incrementally, connecting the past with the present
and the future; history in consequence is largely a story of institutional
evolution in which the historical performance of economies can only be
understood as a part of a sequential story. Institutions provide the
incentive structure of an economy; as that structure evolves, it shapes the
direction of economic change towards growth, stagnation, or decline.
A mudança institucional pode ocorrer de forma abrupta, gerada por choques
(como guerras, conquistas e desastres naturais), ou marginal. A característica de
sobreposição hierárquica da estrutura institucional da sociedade, entretanto, a enrijece de
tal forma que mudanças institucionais extremas e descontínuas são bastante raras, e
mesmo assim nunca são totalmente descontínuas, pois há persistência ao menos das
instituições informais mais enraizadas na sociedade. A mudança, em geral, ocorre de
forma marginal, ou incremental, ou seja, grandes transformações são o resultado da soma
de muitas pequenas mudanças ao longo do tempo.
Os principais agentes dessa mudança contínua são, segundo North (1990), as
organizações (ou mais especificamente os empresários
29
) que, na busca de maximização
da riqueza, renda ou outros objetivos definidos pelas oportunidades proporcionadas pela
estrutura institucional da sociedade, a alteram de forma incremental, respondendo a
29
Empresário no sentido de quem toma as decisões dentro de uma organização, entendendo-se organização
no sentido amplo dado por North (1990) já exposto anteriormente.
42
mudanças externas do ambiente (em preços relativos
30
ou preferências) ou mudanças nos
modelos mentais dos empresários para decifrar tal ambiente (devidas a novos
aprendizados adquiridos), os quais alteram o preço relativo percebido por estes com
relação às escolhas possíveis. Esta mudança pode ocorrer por três meios distintos:
a) Através da demanda derivada por investimentos em todos os tipos de conhecimento
Dada sua função-objetivo, a organização buscará adquirir as habilidades e
conhecimentos que aumentem suas possibilidades da sobrevivência em um contexto de
escassez e competição. Os tipos de conhecimento, habilidades e aprendizado adquiridos
pelos membros de uma organização refletem a estrutura de incentivos embedded na
estrutura institucional da sociedade, e, ao mesmo tempo, são determinantes para a forma
como o estoque de conhecimento desta sociedade evoluirá e será usado. Por exemplo,
uma estrutura institucional que estimule atividades produtivas agrícolas, gerará incentivos
para que se busquem conhecimentos nesta área e não para a produção de carros, por
exemplo. Este aspecto é especialmente importante no que se refere ao desenvolvimento
tecnológico. A escolha por um caminho de conhecimento gera retornos crescentes,
desestimulando a busca por caminhos alternativos. Isso gera uma dependência de
trajetória com relação às escolhas feitas em um momento anterior. Neste sentido, a
escolha do tipo de conhecimento adquirido e desenvolvido será fundamental para o
desenvolvimento de longo prazo da sociedade.
Os tipos de conhecimento a serem desenvolvidos também podem ser definidos
por aspectos ideológicos. O desenvolvimento do conhecimento é determinante sobre a
forma como se formam os modelos mentais dos indivíduos para compreender o mundo a
sua volta, mas, ao mesmo tempo, esta compreensão definirá quais os tipos de
conhecimento que devem ser perseguidos.
30
Mudança nos preços relativos englobam: mudanças na relação de preços dos fatores (ou seja, mudanças
na proporção entre terra e trabalho, trabalho e capital ou capital e terra), mudanças nos custos de
informação e mudanças na tecnologia (incluindo de forma significativa a tecnologia militar). Estas
mudanças podem ser tanto exógenas (ex. desastres naturais) como endógenas (refletindo o esforço
maximizador dos empresários, tanto na área econômica como política ou militar) (NORTH, 1990, p. 84).
43
O processo de aquisição de habilidades e conhecimentos por parte dos
empresários muda os preços relativos através da mudança dos custos observados de
medida e imposição, assim como os custos e benefícios de novos contratos e barganhas.
b) Através da interação contínua entre atividade econômica organizada, estoque de
conhecimento e estrutura institucional
As organizações surgem devido a incentivos criados pela estrutura institucional
vigente e procuram maximizar seus objetivos dentro das restrições desta estrutura.
Entretanto, mudanças em preços relativos ou preferências podem abrir possibilidades
maiores de ganho se a estrutura institucional for alterada. Se as percepções dos
empresários indicarem que os ganhos de alterar a estrutura são maiores do que os custos
para esta alteração, organizações com suficiente poder de barganha utilizarão a política
para alcançar seus objetivos. Além disso, elas estimularão que a sociedade invista nos
tipos de habilidades e conhecimentos que indiretamente também lhes trarão maiores
retornos. Estas escolhas podem levar ao crescimento econômico (podem ser eficiente de
forma adaptativa) se forem direcionadas para atividades produtivas, inovação e atividades
criativas de todos os tipos, assim como para a resolução de problemas e gargalos da
sociedade ao longo do tempo.
c) Através da alteração incremental das restrições informais como subproduto das
atividades maximizadoras das organizações
As organizações, estimuladas pela mudança de preços relativos ou preferências,
empenham recursos para alterar, direta ou indiretamente, as instituições vigentes. A
princípio, haverá estímulos apenas para mudanças em contratos, porém, como estes estão
aninhados dentro da hierarquia institucional, pode ser que seja possível alterá-los se
outras regras superiores também o forem. Neste caso, aquele que estiver buscando
44
aumentar seu poder de barganha poderá empregar recursos para reestruturar regras de
nível superior.
As mudanças nas regras formais podem ser conseqüência de mudanças: legislativas,
como a aprovação de um novo estatuto; judiciais que tem origem nas decisões da corte,
que alteram a lei comum; de regulamentos, decretados por agências reguladoras; e
constitucionais, que alteram as regras que definem como as outras regras são feitas
(NORTH, 1993).
No caso de normas de comportamento, tradições e costumes, uma mudança nos
preços relativos ou nos gostos levará a sua erosão gradual e sua substituição por uma
norma ou costume diferente. Ao longo do tempo a regra pode ser mudada ou
simplesmente ignorada. Também uma mudança nas regras formais poderá gerar um
desequilíbrio que desencadeie o mesmo tipo de mudança. Deve ficar claro, porém, que
vários fatores podem complicar esta mudança, incluindo a própria tenacidade de tais
instituições. Por outro lado, estas regras informais também podem evoluir sem o
incentivo de qualquer atitude especial com este propósito.
Um agente de mudança institucional especial deve ainda ser considerado. Como
referido anteriormente, se entendermos as organizações como grupos estruturados de
indivíduos que buscam alcançar um objetivo comum, o Estado pode ser visto como uma
organização. Seu poder de mudança institucional, no entanto, é maior do que o das
demais organizações, que ele possui o poder de imposição. Além disso, seu
envolvimento com instituições é inerente, pois é ele o garantidor máximo dos direitos de
propriedade e, portanto, quem decide que tipos de direitos e deveres reconhecerá e
imporá. Seus objetivos, entretanto, não são apenas de maximização. Estes, em geral,
estão ligados ao provimento de bens públicos e à distribuição da renda. Seria ingênuo
pensar, porém, que o processo de redistribuição de renda se sempre em favor dos mais
pobres; inúmeros exemplos que revelam o contrário, uma vez que o interesse dos
grupos mais influentes, em geral, determina tal direção, mediada pelo voto. Os efeitos das
mudanças institucionais promovidas pelo Estado podem, devido a isto, até se dar em
sentido contrario ao da eficiência e do crescimento econômico (MATTHEWS, 1986).
45
3 ESTRUTURA E MUDANÇA INSTITUCIONAL NA PRIMEIRA
REPÚBLICA
A economia brasileira, ao menos até o período do primeiro governo Vargas,
consistia na produção de produtos de natureza primária para exportação, com sua história
caracterizada por uma sucessão de ciclos destes produtos (pau-brasil, açúcar, ouro e
diamantes, café, borracha, algodão, fumo, cacau). Quando da proclamação da República,
era principalmente a produção cafeeira que mantinha e dinamizava a economia.
Segundo Carone (1970), o predomínio do café era incontestável e, de fato, se
estendia por outros compartimentos da sociedade brasileira: o café era a principal fonte
de divisas (moeda estrangeira) necessárias às importações do país; sua produção
empregava, direta ou indiretamente, a grande maioria dos assalariados do país:
trabalhadores na lavoura, no transporte e na comercialização, trabalhadores nas indústrias
fornecedoras de bens para a cafeicultura, funcionários dos municípios cafeicultores, dos
estados e da União etc; a arrecadação fiscal da União originava-se, sobretudo, de tributos
cobrados sobre as importações, que dependiam das exportações, principalmente de café.
A ascensão deste produto como o mais importante da pauta de exportações
brasileira ocorreu durante o século XIX. De fato, a grande expansão da cultura cafeeira
em termos mundiais ocorreu quase que completamente dentro das fronteiras brasileiras.
Segundo Furtado (1987, p. 178)
As condições excepcionais que oferecia o Brasil para essa cultura
valeram aos empresários brasileiros a oportunidade de controlar três
quartas partes da oferta mundial desse produto. Esta circunstancia é que
possibilitou a manipulação da oferta mundial de café, a qual iria
emprestar um comportamento todo especial à evolução dos preços desse
artigo.
A produção começou centrada na região do Vale do Paraíba, passando, a seguir,
para o oeste paulista. Segundo Fernandes (1975) a transição geográfica trouxe mais do
46
que a simples mudança de localização
1
. Também a mentalidade dos grupos (ou
organizações) que produziam o café mudou, assim como seus objetivos (que seriam mais
no sentido que maximização do lucro), o que possibilitou uma mudança na forma de
organização da produção, que passou a ir muito além da atividade agrícola.
Segundo Mello (1982), a produção cafeeira desenvolvia além do setor agrário,
também o industrial e o mercantil, convindo pensar em um complexo exportador
cafeeiro, integrado por um núcleo produtivo, que incluía as atividades de beneficiamento,
e por um segmento urbano, que acolhia os serviços de transportes (estradas de ferro,
portos, etc.), as atividades comerciais (casas importadoras e exportadoras) e financeiras
(bancos), alem de demandar toda uma atividade estatal ligada a ele. Este complexo
absorveu boa parte da força de trabalho imigrante que ingressava no Brasil naquele
período, difundindo o trabalho assalariado no campo e na cidade e possibilitando o
alargamento do mercado interno, de modo a estimular a produção manufatureira e
industrial. Todas essas atividades, entretanto, subordinavam-se ao comércio de
exportação, ou seja, era o café que movia a economia e as outras atividades eram
“apêndices” dele, não eram autônomas.
O fato de a economia brasileira, ser preponderantemente agrícola e voltada ao
mercado externo, tornava-a muito vulnerável aos efeitos de qualquer crise econômica
mundial. Entretanto, como destacado por Furtado (1987), a concentração da produção
cafeeira em território brasileiro possibilitava um grande poder de barganha aos
produtores de café, de forma que, ao comprovar-se a primeira crise de superprodução,
nos anos iniciais do século XX, eles puderam criar mecanismos de defesa contra a baixa
de preços do produto.
Tal mecanismo consistia, basicamente, na retenção de parte da produção fora do
mercado, que permitia uma contração artificial da oferta. Os estoques assim formados
seriam mobilizados quando o mercado apresentasse mais resistência, vale dizer, quando a
1
“[...] o estado de espírito de alguns fazendeiros preocupados com a modernização e a racionalização da
produção agrária, segundo um estilo bem diferente do que prevaleceu no Vale do Paraíba, empenhando-se
desde os meados do século XIX em sucessivas experiências com a introdução e a utilização do trabalho
livre ou com os custos marginais da produtividade das técnicas agrícolas”. Assim sendo, “[...] sem saber (e
também sem o desejar de forma consciente), o fazendeiro acabou compartilhando o destino burguês.”
(FERNANDES, 1975, p. 120; 104.)
47
renda estivesse a altos níveis nos países importadores, ou serviriam para cobrir
deficiências em anos de colheitas más. Além disso, a depreciação cambial, embora
afetasse todos aqueles que dependiam de importados
2
, garantia a lucratividade do setor
cafeeiro em moeda nacional.
Após 1893, sucessivas crises pressionaram para um forte declínio no preço do
café e da rentabilidade do setor cafeeiro, que, devido a pressões sociais, não de ser
amenizado por depreciações cambiais. Somou-se a isso, ainda, o problema da
superprodução, que, gerando um aumento crescente dos estoques, pressionava ainda mais
o preço para baixo.
A necessidade de retirar esses excedentes do mercado, somada ao poder político
dos estados cafeeiros permitiu que fosse instituída, em 1906, uma política de valorização
do produto, o chamado convênio de Taubaté. Em essência, essa política consistia no
seguinte:
a) com o fim de restabelecer o equilíbrio entre oferta e procura de café e manter um
preço mínimo (55 a 65 francos por saca de café do tipo 7), o governo interviria no
mercado para comprar os excedentes;
b) o financiamento dessas compras se faria a custa de emissões lastreadas com
empréstimos estrangeiros;
c) o serviço desses empréstimos seria coberto com um novo imposto cobrado em
ouro sobre cada saca de café exportada;
d) para estabilizar o câmbio e impedir valorizações, foi criada uma “Caixa de
Conversão”;
e) a fim de solucionar o problema a mais longo prazo, os governos dos estados
signatários do convênio (SP, MG e RJ) se comprometeriam a dificultar a
expansão da área plantada.
f) Foi dificultada a exportação de cafés de qualidade inferior, melhorada a
propaganda no exterior e estimulado o consumo no país.
2
Fenômeno denominado por Furtado (1987) como “socialização das perdas”.
48
O primeiro esquema de valorização, sem o apoio do governo federal, foi posto em
prática pelos estados cafeicultores, que apelaram diretamente para o crédito internacional.
O êxito financeiro da experiência veio consolidar a vitória dos
cafeicultores que reforçaram o seu poder e por mais de um quarto de
século isto é, até 1930 – lograram submeter o governo central aos
objetivos de sua política econômica. (FURTADO, 1987, p. 180)
Após a primeira valorização (1906-1918), o mesmo mecanismo foi ainda adotado
duas vezes (1917-1920 e 1921-1924). Segundo Delfim Netto (1981), o êxito das
operações intermitentes de valorização foi devido às circunstancias excepcionais que se
ligaram a cada caso (quebras de safra, geadas, fim da guerra, impossibilidade material de
crescimento da produção). Apesar disso, no início da década de 1920 foi colocada a idéia
de organizar um sistema de defesa permanente, o qual se concretizou com a criação de
armazéns reguladores
3
e do Instituto Paulista de Defesa Permanente do Café (1924), que
tinha em seu conselho o próprio secretário da Fazenda e do Tesouro, o secretário da
agricultura, dois representantes das lavouras cafeeiras e um da Associação Comercial de
Santos. A defesa apoiava-se nos seguintes pontos:
a) Limitação dos transportes para possibilitar a entrada de café nos portos;
b) Empréstimo sob o café depositado nos armazéns;
c) Compra do café, quando necessário, para regularizar a oferta;
d) O financiamento seria obtido com uma taxa sobre cada saca de café em
trânsito no estado e nos demais estados cafeeiros e empréstimos externos,
tendo esta taxa como garantia.
O último item era necessário, pois, nem a União, nem os estados possuíam
recursos suficientes para arcar com o ônus da política de valorização. Isso fez com que
3
Junto a entroncamentos das estradas de ferro nas regiões cafeeiras para conservar o café no interior e
regular a entrada nos portos. A criação destes armazéns foi, segundo Delfim Netto (1981), praticamente o
único fruto do Instituto de Defesa Permanente da Produção Nacional, sancionado em junho de 1922, mas
nunca posto em efetivo funcionamento. Os reguladores, entretanto, aumentaram os custos de transação que
criaram dificuldades financeiras para os agricultores. Devido a isso, estes pressionaram e conseguiram que
os armazéns fossem transferidos para o Estado de São Paulo.
49
fosse buscado auxilio externo
4
, que levaria a uma relação de dependência entre os
fazendeiros e os grupos financeiros internacionais. Não o seu nível de renda
continuava dependente dos preços alcançados no mercado mundial, mas também a
manutenção destes preços passou a só ser possível através da obtenção de recursos vindos
do exterior, que desapareceriam diante de uma grande crise. Ou seja, a economia
encontrava-se muito vulnerável aos acontecimentos internacionais. (FAUSTO, 1995)
Por outro lado, a predominância, na economia, do setor agrário, cujas atividades
estavam voltadas para o mercado externo, somadas a razões de ordem geográfica (como a
dimensão do país e as, conseqüentes dificuldades de comunicação e transportes entre as
regiões) eram entraves à constituição de um mercado nacional integrado. Essa
desintegração fazia com que as crises (ou prosperidades) regionais não repercutissem no
conjunto da economia diretamente, mas somente através da mediação do comércio
internacional e do balanço de pagamentos.
De uma forma geral, podemos dividir o período da Primeira República
relativamente à Guerra Mundial, que, como se esperaria, teve forte impacto sobre uma
economia amplamente dependente do comércio exterior.
O período anterior à Guerra (1889 1913) foi marcadamente influenciado pelos
eventos do fim do Império e inicio da República, entre os quais, destacam-se a crise da
agricultura, relacionada à abolição da escravatura e à forte seca de 1889 e ao conjunto de
reformas bancárias, monetárias e das sociedades anônimas, que levaram ao
Encilhamento. Já durante a Guerra (1914 - 1918), o país viveu o aprofundamento de uma
crise de comercio exterior que se iniciara ainda em 1913. O impacto do conflito sobre o
país não foi mais profundo, pois não foi possível ao governo manter uma política de
contenção monetária e fiscal. Investimentos públicos mantidos em nível elevado, déficits
orçamentários vultosos, financiados por emissão de papel moeda e saldos na balança
comercial conseguidos pela diversificação da atividade exportadora devem ter
4
Como destacado por Fausto (1995), grupos financeiros alemães, através da firma exportadora Theodor
Wille & Cia, os opositores dos Rotshild, J. Henry Schroeder & Cia. Banco da França Société Générale de
Paris, o National City Bank de Nova Iorque e a própria casa Rothchild forneceram recursos financeiros
quando a política de valorização se impôs e, após a Primeira Guerra Mundial, o grupo Lazard Brothers de
Londres tornou-se o maior financiador.
50
compensado em boa parte o impacto negativo sobre a economia como um todo. Por fim,
o período posterior à Guerra, até a Grande Depressão (1919 – 1928) pode ser considerado
como o auge da economia de exportação, apesar da crise do comercio exterior dos anos
1920 1923. Os efeitos da terceira valorização do café, efetuada em 1922-23 se fizeram
sentir, e a recuperação e manutenção dos preços do produto em níveis elevados tornaram
as relações de troca bastante favoráveis até 1928, permitindo a expansão das importações.
Os altos preços estimularam o grande aumento da produção das culturas de exportação
durante o período, que traria graves conseqüências para o setor no final daquela década
(VILLELA; SUZIGAN, 1973).
3.1 Instituições Políticas
A proclamação da República em 1889 foi resultado de um movimento que vinha
crescendo desde o Manifesto Republicano de 1870 e o aparecimento do jornal A
República, e que foi fortalecido pela abolição da escravatura (1888) e, principalmente,
pela adesão do Exército. Correspondeu ao encontro de duas forças diversas Exército e
fazendeiros de café movidas por razões diferentes. Os motivos do Exército eram de
ordem corporativa (identificação como grupo, que não concordava com a posição
secundária a que estavam relegados) e ideológica (positivismo). Já os fazendeiros
paulistas, possuíam razões claramente econômicas. Buscavam o federalismo para
alcançarem a autonomia dos estados e a possibilidade de impor ao país um sistema que
favorecesse o cleo agrário-exportador em expansão. Após a tomada do governo, uma
Assembléia Constituinte foi convocada (em 21 de dezembro) para redigir uma nova carta
constitucional para o Brasil, a qual foi outorgada em 1891.
A nova Constituição Republicana extinguiu todas as formas e instituições
monárquicas: Poder Moderador, Conselho de Ministros, Senado Vitalício e a união da
Igreja-Estado. Baseada no modelo republicano norte-americano
5
com cunho liberal e
5
Prudente de Morais diz que “[...] a nossa pátria, de hoje em diante, tem uma constituição livre e
democrática com o regime da mais larga federação, única capaz de mantê-la unida, de fazer com que possa
51
democrático, tinha como pontos principais o federalismo, o presidencialismo, a divisão
de três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – e o regime representativo.
O federalismo foi um ponto fundamental da constituição (talvez o mais
importante na configuração do poder político nacional), estabelecendo ampla autonomia
dos estados “princípio cardeal e solene” do novo regime, conforme estabelecia em
1870, o Manifesto Republicano. Aproximando-se muito da constituição americana, a
brasileira de 1891 determinava que o país “[...] constitui-se, por união perpétua e
indissolúvel das suas antigas Províncias, em Estados Unidos do Brasil.” (BRASIL, 1891,
Art ), muito embora as mesmas nunca tenham, de fato, alcançado um alto grau de
autonomia, como no caso americano. Nos EUA, o Estado federal foi o resultado de um
esforço de concentração do poder, antes disperso entre as 13 ex-colônias quase
soberanas; no Brasil, foi fruto de um movimento visando à descentralização.
De fato, a introdução do regime federativo veio ao encontro dos interesses das
oligarquias políticas regionais, tendo sido, inclusive, uma das exigências do PRP para seu
apoio ao movimento. Tal arranjo possibilitava que estados (regidos por oligarquias
regionais, ou seja, organizações) com maior poder econômico, alcançassem, também, o
maior poder político, de forma a gerir o Estado conforme seus objetivos. (Ou seja, as
organizações com maior poder econômico empreenderam esforços no sentido de
modificar as instituições vigentes para alcançar também maior poder político).
O federalismo efetivamente concedia ampla autonomia aos estados, que possuíam
sua própria constituição (desde que não contrariasse a constituição federal), elegiam seus
governos, podiam criar suas próprias forças militares e organizar suas finanças, inclusive
realizar empréstimos diretamente no exterior, dispor de suas próprias receitas de
exportação e decretar impostos, podendo recorrer ao socorro da União em caso de
calamidade pública. O governo federal, todavia, não poderia intervir em negócios
peculiares aos estados
6
(BRASIL, 1891, Art 6
o
).
desenvolver-se, prosperar e corresponder, na América do Sul, ao seu modelo da América do Norte.” (apud
CARONE, 1970, p.286).
6
Salvo 1º ) para repelir invasão estrangeira, ou de um Estado em outro; 2º ) para manter a forma
republicana federativa; ) para restabelecer a ordem e a tranqüilidade nos Estados, à requisição dos
respectivos governos; ) para assegurar a execução das leis e sentenças federais. (BRASIL, Constituição,
1891).
52
Segundo Abrucio (2000), a república brasileira não nasceu colada ao ideal de
Federação como a ele foi subordinada. “Mas não era uma Federação qualquer: enquanto
na maioria dos países federativos a palavra federalismo, na verdade, quer dizer
associação de estados em prol de objetivos comuns, no Brasil seu significado ficou
atrelado à descentralização do poder”. (ABRUCIO, 2000, p.10)
Apesar de tal descentralização, foi instituída a divisão de poderes e o
presidencialismo, que colocava um presidente da república como o chefe do Executivo,
auxiliado por ministros nomeados diretamente por ele. Este, entretanto, tinha poderes
limitados, não possuindo mais o direito de dissolver a câmara dos deputados, por
exemplo. Além disso, o novo regime presidencialista, sob o signo do federalismo
republicano, era amplamente controlado pelos partidos regionais, representativos de
oligarquias estaduais dominantes e coordenados nacionalmente pelo Presidente da
República.
Além do Executivo, a carta também instituiu o Legislativo e o Judiciário. O Poder
Legislativo passou a ser composto por uma Câmara dos Deputados, com deputados
eleitos proporcionalmente à população dos estados, e um Senado Federal que deixava de
ser vitalício, com três senadores por estado. Os estados com maior população - como
Minas Gerais, São Paulo e Bahia - foram bastante beneficiados pela nova legislação, pois
formavam grandes bancadas na mara dos Deputados. Isso lhes garantia amplas
parcelas de poder. Já com o Judiciário, foi criado o Supremo Tribunal Federal, que, entre
outros, deveria julgar questões relacionadas aos diferentes níveis de governo.
Os presidentes da República e dos estados, assim como os membros do poder
Legislativo, em todos os níveis, seriam eleitos diretamente pelo povo. O sistema eleitoral
censitário, com base em renda mínima, foi extinto e o voto universal (não-obrigatório)
para maiores de 21 anos, instituído. As mulheres, os analfabetos, soldados e cabos e os
religiosos de claustros ainda ficavam excluídos. O voto não era secreto e tinha de ser
declarado em público e assinalado em listas. Este sistema, porém, abria a possibilidade de
um amplo controle do voto da população por parte das organizações regionais com poder
político, criando-se a prática do “voto de cabresto”, que, sistematicamente, produzia a
vitória dos candidatos governistas.
53
A democracia política tinha um conteúdo apenas formal: a soberania
popular significava a ratificação das decisões palacianas e a possibilidade
de representação de correntes democratizantes era anulada pelo voto a
descoberto, a falsificação eleitoral, o voto por distrito e o chamado
terceiro escrutínio, pelo qual os deputados e senadores cujos mandatos
fossem contestados submetiam-se ao reconhecimento de poderes por
parte da respectiva Casa do Congresso. (FAUSTO, 1995, p. 233)
A configuração das instituições formais da Primeira República permitia o
fortalecimento da estrutura de poder regional-oligárquico, onde os estados mais fortes
economicamente e mais expressivos demograficamente garantiam para si o controle
político e econômico do país. Tratava-se, de fato, de uma relação hierarquizada, na qual
São Paulo e Minas Gerais, por serem regiões de produção cafeeira pólo dinâmico da
economia nacional tinham assegurada uma posição hegemônica sobre os demais
estados. Complementarmente a isso, um amplo arranjo institucional informal foi
constituído visando à preservação de tal poder.
3.1.1 Instituições Informais
O início do período republicano, de governos militares, foi bastante conturbado,
apresentando disputas políticas de organizações que buscavam arranjos diferentes, e
marcado por diversas revoltas populares, revoluções, golpes e contragolpes. Com a
derrota dos militares jacobinos e seu afastamento do palco dos acontecimentos políticos,
além do estancamento da revolução de Canudos, os grupos militares e monarquistas
reduziram seu poder de barganha, permitindo o fortalecimento dos grupos políticos
ligados aos cafeicultores, que ficariam no poder durante todo o resto da República Velha.
D
urante o governo Campos Sales, foram estabelecidas as bases do sistema de
controle político e centralização de poder que vigorariam durante todo o período, o
chamado “Pacto Oligárquico”. Este pacto baseava-se na troca de favores políticos entre
grupos de poder (oligarquias locais e o governo federal) visando à manutenção deste
poder dentre eles. Os coronéis - chefes políticos nos municípios - garantiam apoio ao
candidato oficial nas eleições estaduais e federais e recebiam autonomia nas decisões do
54
próprio município. Os grupos dominantes dos estados apoiavam o presidente, que
defendia seus interesses e lhes garantia autonomia nos negócios estaduais.
O órgão-chave para o funcionamento de tal sistema era a comissão de Verificação
do Congresso Federal, que, por lei, tinha o poder de reconhecer, ou não, a eleição de
senadores, deputados, presidentes e vice-presidentes. Ela permitia que apenas os
mandatos dos políticos pertencentes às oligarquias que dominavam nos estados fossem
referendados. O não reconhecimento de candidatos eleitos pela oposição era conhecido
como “degola”.
O pacto ocorria em três níveis. Na área regional, era comandado pelo
coronelismo, na estadual, pela política dos governadores e, na federal, pela aliança do
café-com-leite. Todos eram interligados, de forma que uma ampla dominação sobre todo
o território federal baseada no pacto tornava-se possível.
A chamada política do café-com-leite estabelecia uma alternância do poder federal
entre políticos mineiros (leite) e paulistas (café), de forma que as oligarquias destes
estados tornaram-se hegemônicas no plano nacional, ou seja, havia uma hierarquização
federal (uns estados mais importantes que outros). Seu poder de barganha devia-se ao
fato de que a oligarquia paulista contava, especialmente, com o poder econômico,
baseado no “rei-café”, além da máquina eleitoral, e a mineira controlava o maior
eleitorado do país, o que lhe assegurava a bancada mais numerosa do Congresso. Alem
disso, ou devido a isso, elas controlavam os dois maiores e mais organizados partidos
políticos estaduais: O Partido Republicano Paulista e o Partido Republicano Mineiro.
A “política dos governadores” buscava fortalecer o presidente da República e os
governadores dos estados, determinando a formação do poder Legislativo de antemão.
Para tanto, no momento das eleições para o Legislativo federal, os governadores faziam a
lista dos candidatos dos seus respectivos estados que deveriam ser eleitos. Uma vez
eleitos, estes parlamentares tinham a obrigação de apoiar sempre o presidente da
República (determinado através da aliança do café-com-leite). Em troca, o governo
federal dava total liberdade ao governador do estado que o estava apoiando, que podia,
assim, controlar seus opositores e promover perseguições políticas e violências. Além
disso, também eram concedidas ao governador verbas para a realização de obras e o
55
direito de nomeação para cargos públicos. Este tipo de acordo também acontecia entre os
governadores e os chefes municipais os prefeitos e entre os prefeitos e coronéis. Desse
modo, os conflitos no interior dos estados eram resolvidos sem intervenção federal e,
quase sempre, no interior de um único partido republicano (os partidos republicanos
estaduais). Definiam-se, assim, as oligarquias estaduais a partir do controle político do
eleitorado rural. Estas oligarquias eram grupos com poder político e econômico,
constituídos pelas famílias e chefes políticos das principais regiões, como os Montenegro
no Pará, os Benedito Leite, no Maranhão, os Acióli no Ceará, os Pedro Velho no Rio
Grande do Norte, e assim por diante. Não havia estado que não fosse dominado por
alguma dessas famílias, quase todas de latifundiários.
No âmbito local, o poder era concentrado na figura do coronel
7
. Dentro do pacto
oligárquico, a função do coronel era a de garantir os resultados eleitorais, os quais eram
determinados pelas oligarquias estaduais.
Os coronéis podiam ser proprietários de terras, comerciantes e até industriais e
bacharéis, que ganhavam este título em função do poder que exerciam sobre seus
parentes, agregados e moradores dos distritos e municípios. Segundo Carone (1970,
p.251), o termo “coronel” origina-se de patente da Guarda Nacional concedida ou
comprada pelos grandes fazendeiros, comerciantes e industriais locais, e “[...] seu
significado hierárquico do termo define o mandonismo político, reflexo natural das
estruturas existentes”. Para chegar à condição de coronel em determinado local,
entretanto, era necessário mais do que o “simples ato de vontade arbitrária”, sendo
necessário que o mesmo possuísse algumas qualidades.
O posto era comumente herdado, nas cidades mais antigas, mediante a
influencia natural das famílias tradicionais, de geração em geração.
Sobretudo nas cidades mais novas, povoadas de aluvião, cabia, entre os
primeiros chegados, aos que revelaram mais atividade e eficiência.
Sempre, a conquista representava o consenso geral ou da maioria, em
competições que eram seleções do mais forte pela tradição, pela fortuna,
7
Segundo Carone (1970), a origem das oligarquias e do coronel é comum, sendo diferenciados apenas pela
escala política em que atuam: âmbito geral, estadual, ou particular. O domínio do coronel tornava-se
incontestável em sua fazenda. Estendia-se ao município, se ele era o chefe dos fazendeiros dos distritos
rurais. Os chefes municipais, por sua vez, se agrupavam em torno dos líderes das cidades mais importantes
de uma região, que elegiam os chefes políticos regionais. Finalmente, os mais fortes destes eram os
mandantes do partido no Estado. Formavam a oligarquia estadual e controlavam o governo.
56
pela ação e pela inteligência. (AMARAL, 1944 apud CARONE, 1970, p.
251)
Na ausência de uma estrutura institucional formal, o coronel cumpria diversas
funções no seu município, muitas delas relacionadas ao seu poder de enforcement
8
. Neste
sentido, como em uma sociedade tribal, era uma espécie de chefe que protege sua família,
seus agregados e todos aqueles que vivem em seus domínios, e faz com que eles acatem
todas as suas decisões, sem questionamentos. Em contrapartida a toda esta fidelidade, ele
dispensa favores a seus agregados (dá-lhe terras, tira-os da cadeia e ajuda-os quando
doentes) e regalias a familiares e amigos (distribui empregos públicos, empresta dinheiro,
obtém créditos; protege-os das autoridades policiais e jurídicas, ajuda-os a fugir dos
compromissos fiscais do Estado, etc).
É o juiz, pois obrigatoriamente é ouvido a respeito de questões de terras e
até de casos de fuga de moças solteiras. É comerciante e agricultor,
porque produz e serve de intermediário entre o produtor e o mercado,
jogando com os maiores recursos financeiros e representando a potência
econômica fundamental do município. É homem de fé, pois é quem
anima as festas religiosas e as oficializa. É hospitaleiro com os de fora e
os do lugar, sendo sua casa e mesa abrigo seguro para todos que o
procuram (MELO, 1944 apud CARONE, 1970).
Para manter seu poder, todavia, além da dominação local, precisavam do respaldo
do governo estadual. assim poderiam ter acesso aos recursos necessários para arcar
com os custos de transação relacionados à manutenção deste domínio (desde a realização
de obras públicas municipais, pagamento dos funcionários e a ajuda das forças policiais
do Estado até o controle dos empregos públicos nos municípios e os demais recursos
desviados diretamente para uso pessoal, tanto em obras particulares como em benefício
de seus simpatizantes
9
). Como o governo estadual controlava a maior parte dos recursos,
os coronéis e chefes municipais viam-se obrigados a pactuar com estes, principalmente
controlando as eleições (voto de cabresto) em sua região (curral eleitoral) através de
máquinas eleitorais que sistematicamente produziam a vitória dos candidatos governistas.
8
O grupo no poder é quem nomeia o chefe da polícia. Além disso, o judiciário, com juízes vitalícios, em
geral é aquiescente e identificado com poderes dominantes.
9
Atividades permitidas pelas constituições estaduais que davam completa liberdade administrativa e
financeira.
57
A ampla autonomia dos coronéis, devida à grande descentralização do poder, um
dos carros chefes do federalismo da época, possibilitou o aumento do seu domínio, aliado
a uma limitação dos poderes dos governos federal e estadual e a uma crescente autonomia
local. Tal autonomia permitia que certos atos extralegais subsistissem durante a primeira
república, como a existência de forças armadas próprias e a cunhagem e circulação de
moedas particulares municipal.
Portanto, podemos caracterizar as instituições políticas do Primeiro Período
Republicano pela ampla dominação oligárquica em todos os níveis de governo,
sustentada pelo coronelismo. Assim, o poder era descentralizado, tendo o seu foco nos
estados, e o federalismo como ponto fundamental. Era, entretanto, um federalismo
desigual, marcado pela hegemonia dos estados economicamente mais fortes sobre as
demais unidades da federação. O regime presidencialista dava poderes limitados ao
chefe da nação e era amplamente controlado pelos partidos regionais. Com regras formais
importadas, possuía forma liberal, de acordo com as tendências internacionais, que,
todavia, podiam ser ignoradas, quando medidas intervencionistas se fizessem necessárias
para atender os interesses das oligarquias (como a política de valorização do café).
3.2 Instituições Econômicas e Sociais
As características da economia (e, portanto, da distribuição de recursos na
sociedade) e a configuração das instituições políticas, ao determinarem o poder político,
tanto jurídico, como de fato, influenciam a escolha das instituições econômicas e as
próprias instituições políticas num segundo momento. Além disso, como destacado no
capítulo anterior, as instituições econômicas, então definidas, determinarão a
performance econômica, ou seja, a taxa de crescimento e a distribuição de recursos. Entre
tais instituições, podemos destacar o sistema tributário e o sistema financeira. As regras
formais e informais relacionadas ao mercado de trabalho e ao sistema educacional, que
forma o capital humano para o mercado de trabalho, podem ser enquadradas tanto como
instituições econômicas, como sociais.
58
3.2.1 Sistema Tributário
A proclamação da República, como discutido, foi motivada principalmente por
razões econômicas para os fazendeiros paulistas, que exigiam, mais do que o fim do
Império, a forma federativa de organização do país. O aumento da autonomia dos estados
implicava o estabelecimento de mecanismos tributários e financeiros que permitissem a
expansão de seu poder político. A Constituição de 1891 representou, efetivamente, uma
vitória para os grandes estados.
Com uma economia eminentemente agrícola e extremamente aberta, tendo o café
como produto principal, a estrutura tributária dependia, também, fundamentalmente, do
comércio exterior. Como conseqüência, a Constituição de 1891 adotou praticamente a
mesma composição do sistema tributário existente ao final do período Imperial, onde a
base tributária era fundamentalmente a de impostos sobre o comércio exterior (de
importação e de exportação), sobre a propriedade e sobre a produção e transações
internas, sendo que o comércio exterior respondia por cerca de 80% da arrecadação, o
que indica uma alta vulnerabilidade da carga tributária a fatores externos durante o
período da República Velha.
Devido à criação do sistema federativo, entretanto, foi adotado o regime de
separação de fontes tributárias, a partir da discriminação dos impostos de competência da
União e dos estados, de forma a permitir a autonomia financeira desses entes federados.
Quanto aos Municípios, coube aos estados a fixação dos impostos municipais necessários
a suas autonomias. A maneira como foi feita esta separação, como pode ser visto no
Quadro 2.1, respondeu aos objetivos dos paulistas e criou um formato tributário peculiar,
no qual, de um lado, colocavam-se os estados cafeeiros que desfrutavam de sólida base
financeira devido à grande renda gerada pelos impostos sobre a exportação do café, com
autonomia de ação para atender às demandas nos momentos de crise e nas fases de
crescimento. De outro, estavam os estados das regiões menos desenvolvidas, sem fontes
promissoras de renda e que reproduziam suas formas de dominação pela articulação
específica com a União, tendo representação mais do que proporcional no Poder
Legislativo. (LOPREATO, 2000)
59
Quadro 3.1: Tributos e Competências: 1891
União Estados
1. Impostos sobre importação
10
2. Direitos de entrada, saída e
estadia de navios.
3. Taxas de selo
4. Taxas dos correios e telégrafos
federais
5. Competência residual:
1. Imposto de exportação
11
2. Imposto sobre imóveis rurais e
urbanos
3. Imposto sobre transmissão
4. Impostos sobre indústria e
profissões
5. Taxas de selos
6. Contribuições dos correios e
telégrafos estaduais
7. Competência Residual
Fonte: Lagemann (2003), elaborado com base na Constituição da República Federativa dos Estados
Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891.
O Imposto de Importação manteve-se, durante toda a República Velha, como a
principal fonte de receita da União. Entretanto, durante a Primeira Guerra Mundial, a
redução dos fluxos de comércio exterior devido ao conflito obrigou o governo a buscar
receitas através da tributação das bases domésticas. Isso fez com que crescesse a
importância relativa do Imposto de Consumo e dos diversos impostos sobre rendimentos,
tanto devido ao crescimento da receita destes impostos como pela redução da arrecadação
do Imposto de Importação.
Na órbita dos estados, o imposto mais importante de Exportação era cobrado
tanto nas exportações para o exterior como nas operações interestaduais. Outros tributos
relativamente importantes eram o Imposto de Transmissão de Propriedade e o Imposto
sobre Indústrias e Profissões. O último era também a principal fonte de receita tributária
municipal, secundado pelo Imposto Predial.
Rendas de diversas outras fontes foram incorporadas à base tributária durante as
primeiras décadas da República. Em relação a fluxos internos, por exemplo, desde 1892
foi estabelecida a cobrança de um Imposto de Fumo que, ainda antes do final do século,
foi estendida a outros produtos, estabelecendo-se o Imposto de Consumo.
10
Também cobrável pelos Estados sobre mercadorias estrangeiras, quando destinadas ao consumo em seu
território. O produto do imposto revertia, no entanto, para o governo federal.
11
Alcançava apenas os produtos de sua própria produção. Como exportações são consideradas tanto as
vendas para o exterior quanto as para outros Estados.
60
No ano de 1922 foi criado o primeiro imposto sobre vendas de competência
estadual no Brasil, o chamado Imposto sobre Vendas Mercantis (IVM), que passou a ser
arrecadado e fiscalizado pelos estados-membros da Federação.
12
Ainda na década de
1920, foi instituído um impostos de renda geral cobrado pela União.
13
A reforma
constitucional de 1926 praticamente não alterou as principais disposições referentes à
tributação.
A desigualdade de condições entre os estados deu ao governo federal o papel de
assegurar as formas de articulação da Federação e de manter a reprodução global do
sistema. A presença deste Estado Central garantia a interface com o sistema internacional
e com as condições de existência do pacto oligárquico. Segundo Lopreato (2000), o
governo federal cumpria este papel, no plano econômico, garantindo aos estados sem
capacidade tributária própria, recursos de transferências fiscais, verbas dos órgãos
federais ou simples inserções no orçamento, bem como atuando na sustentação da
rentabilidade dos complexos regionais. E, no plano político, apoiando os interesses
daquelas frações dominantes que, mesmo não sendo importantes economicamente,
cumpriam papel relevante no sistema de alianças políticas. Este arranjo institucional,
apesar da precária situação financeira de muitas das unidades da Federação, manteve as
condições de funcionalidade do sistema tributário que, assim, pôde se manter inalterado
em suas linhas mestras, até que revolução de 1930 superasse a Federação oligárquica no
Brasil, embora não as oligarquias.
Portanto, o sistema tributário da Primeira República era caracterizado por
descentralização da distribuição de impostos entre níveis de governo, forte
desequilíbrio financeiro entre estados, concentração em impostos indiretos e uma carga
tributária relativamente baixa (em torno de 10% do PIB)
14
, embora altamente
vulnerável a fatores externos.
12
Segundo Carvalho (2002), o IVM foi criado devido à pressão das Associações Comerciais que
reivindicaram a sua criação para facilitar os descontos bancários das faturas das vendas dos comerciantes e
industriais, sobretudo quando requeridos e assinados pelos compradores.
13
O Artigo 31 da Lei nº 4.625, de 31 de dezembro de 1922, cria o imposto sobre a renda, de competência
da União. (BRASIL, Lei 4.624, 1922, Art. 31)
14
Como indicado por Cossio (2002), a carga tributária (Receita tributária/PIB) era de 10,5% em 1900,
9,8%, em 1910, 7,0% em 1920 e 8,1% em 1930.
61
3.2.2 Sistema Financeiro
Para entendermos a política monetária do início da República, determinante para a
criação das instituições monetárias e financeiras no período, devemos conhecer as
questões ideológicas que as guiavam. As concepções sobre política monetária foram
divididas em duas linhas, desde o Império e durante toda a República Velha, a dos
papelistas e dos metalistas. As polêmicas apresentavam-se sob diversas formas: unidade
emissora versus pluralidade emissora; emissão estatal versus emissão de bancos privados;
lastro metálico integral ou parcial versus lastro por meio de títulos ou moeda fiduciária,
etc
15
.
Os metalistas defendiam a conversibilidade da moeda e o Padrão Ouro (ou a
manutenção do valor metálico da moeda), baseados na Teoria Quantitativa da Moeda e
nas teorias de comércio internacional dos clássicos (Smith, Ricardo, Say, Fisher). Dentro
desta visão, a política econômica deveria buscar a estabilização como meta principal,
utilizando a política cambial, a definição da taxa de câmbio, como fator estabilizador e a
emissão deveria ser monopólio de um único banco. A base de seu argumento centrava-se
na relação entre política monetária e balanço de pagamentos: metais preciosos
ingressariam naturalmente no país se a economia fosse saudável e qualquer oferta de
moeda sem lastro causaria inflação. A taxa de juros era entendida como fenômeno real, à
la Ricardo, dependente da taxa de lucro. Sendo a política monetária ineficaz, restava
aumentar as condições de competitividade real do setor exportador, garantir as regras de
finanças sadias e manter uma taxa de câmbio realista para que a economia prosperasse
(
FONSECA, 2004).
Franco (2005) procura explicar o raciocínio metalista:
[...] se a razão entre o ouro em circulação na forma de moedas nacionais
e estrangeiras e a quantidade total de papel moeda é menor que um, tudo
se passa como se o papel tivesse menos ouro embutido do que deveria
ter. O ouro se torna escasso relativamente ao papel, e assim se tornará
caro relativamente à paridade, ou seja, terá ágio. A paridade aqui é mera
15
Muller (2004), percebe que, em linhas gerais, os metalistas e os papelistas reproduziram no Brasil o
debate teórico travado no século XIX, na Inglaterra, entre os defensores da currency school, da banking
schoool e da free banking school..
62
convenção, consiste na exata quantidade de ouro que deve estar contida
no interior de uma unidade monetária nacional na forma de moedas de
ouro e/ou prata e também nas cédulas feitas de papel. Quando ‘estamos’
no padrão ouro, o papel moeda é conversível, ou livremente trocável por
ouro à taxa de paridade, como se moeda metálica fosse. Se emissões
adicionais de ‘papel’, desequilibrando a relação entre ouro e papel, tudo
se passa como se o Estado mandasse fazer mais moedas de ouro do que
existe para fundir, o que necessariamente levaria à redução do conteúdo
de ouro nas moedas. (FRANCO, 2005, p.9, grifos do autor)
Os papelistas, por sua vez, defendiam a emissão para suprir as necessidades dos
negócios, destacando as dificuldades enfrentadas pelo país nas tentativas de manter o
padrão ouro e a plena conversibilidade. Para esta escola, a variável mais importante era o
nível de atividade econômica, e a oferta de moeda deveria ser condizente com ele, e não
oposta ao seu crescimento. Ou seja, antes de existir um claro entendimento sobre o
funcionamento dos bancos e do sistema financeiro no contexto de moeda fiduciária, os
papelistas argumentavam pela endogeneidade da moeda, respondendo às necessidades
da economia. Segundo Fonseca (2004), as idéias dos papelistas aproximavam-se do
futuro keynesianismo. Neste sentido, a taxa de juros refletiria o estado de ânimo da
economia, sendo um fenômeno monetário.
Contrários, na sua maioria, ao Padrão Ouro, os papelistas entendiam que a política
cambial deveria subordinar-se à política monetária, e esta às necessidades impostas pela
produção. A conversibilidade era vista como uma medida artificial, prejudicial ao ânimo
dos negócios. Consideravam que o metal, apesar de sua ótima aceitação, não poderia ser
um instrumento de permuta exclusivo de uma sociedade desenvolvida, com uma estrutura
financeira avançada, pois apresentava alguns inconvenientes escassez, dificuldade de
transporte e de contagem que impediam um desenvolvimento maior do sistema
bancário e, conseqüentemente, levavam à escassez da moeda. Daí a proposta da
pluralidade emissora para assegurar a liquidez monetária, mesmo quando houvesse um
banco público (MÜLLER, 2004).
Em geral, entre os papelistas figuravam comerciantes, grupos ligados a interesses
urbanos, particularmente aqueles envolvidos com o setor bancário e manufatureiro, que
operavam no negócio de importação e no comércio doméstico e que tendiam a apoiar
uma política econômica mais liberal, assim como liberdade de organização para
63
sociedades anônimas, como Barão de Mauá, Rui Barbosa e Vieira Souto. entre os
metalistas estavam, em geral, os políticos mais tradicionais, alguns intelectuais com
formação liberal e idéias conservadoras e bacharéis, isto é, aqueles formados em direito,
que eram educados com a idéia de austeridade e cautela.
Triner (1999) sugere que, durante a Primeira República, as lutas por controle
político (que alternavam papelistas e metalistas na pasta da Fazenda) fizeram a política
monetária oscilar com freqüência e de forma violenta. Na época, os instrumentos mais
diretos de política fiscal e controles de rendas e gastos eram bastante precários, de forma
que a política monetária tornou-se um instrumento adicional de mediação de demandas
rivais de formação de poder político.
3.2.2.1 Ambiente Institucional Financeiro do início da República
As bases da ampla mudança institucional verificada no sistema financeiro
brasileiro durante os primeiros anos da Republica remontam ainda aos últimos anos do
Império. A mais importante delas, segundo concepções amplamente aceitas (FRANCO,
1989; FURTADO, 1987) foi a abolição da escravatura de 1888, que, juntamente com a
onda de imigrações de trabalhadores europeus e a ampliação do trabalho assalariado,
especialmente no setor agrícola, fez com que a demanda por moeda crescesse
rapidamente, devido às necessidades criadas pelo novo tipo de relação de trabalho
estabelecida (demanda de moeda para pagamento de salários, para compras de bens e
serviços pelos assalariados, para pagamento de transações que antes eram feitas por troca
de créditos).
Até então, a demanda por moeda era variável, com caráter sazonal, sendo baixa
em boa parte do ano, mas muito alta na época das colheitas, quando o contrato de
trabalhadores temporários que recebiam salários aumentava muito, gerando sérias
dificuldades de liquidez, dado que os bancos eram ainda pouco disseminados no Brasil.
As funções dos bancos eram supridas pelo trabalho dos comissários. Estes negociantes
enviavam escravos, alimentos, implementos agrícolas e roupas aos fazendeiros, para
64
serem pagos com a venda do café. Os pagamentos efetuavam-se por ordens e saques que,
debitados em conta corrente, se compensavam oportunamente com o haver apurado na
alienação das safras. Este ‘mecanismo’ reduzia a necessidade de meio circulante no
interior do Brasil, tornando as operações registros de débito e crédito nas contas dos
agentes e dos fazendeiros (FRANCO, 1989).
A baixa disseminação dos bancos mantinha o sistema financeiro bastante
atrasado, pois não fora desenvolvido o hábito da utilização de depósitos à vista, o que
criava barreiras ao desenvolvimento do crédito, devido ao reduzido valor do
multiplicador bancário. Um relato contemporâneo apresentado por Franco (1989) deixa
claro que não fazia parte dos hábitos e costumes da maior parte da população da época a
utilização de bancos para guardar o dinheiro:
[...] era raro o uso de cheques, com hábito comum ali de reterem os
indivíduos em seu poder largas quantias em vez de depositá-las em
bancos. Os pequenos negociantes, os taverneiros, por exemplo, no Rio de
Janeiro, apenas excepcionalmente depositam nos estabelecimentos. De
ordinários preferem ter consigo seu dinheiro até a época de
pagamentos..., satisfazendo então os seus débitos com as somas
acumuladas em casa no decurso de seis a nove meses. O mesmo sucede
com as classes que vivem de salário... os agricultores e outros habitantes
do interior amuam grandes somas, para satisfazer as suas necessidades; e
esse dinheiro leva meses, ou anos, para ir ter aos bancos. A receita das
alfândegas, em vez de se depositar em bancos, e por eles transmitir-se ao
Rio de Janeiro, acumula-se em somas importantes, expedidas
periodicamente pelos paquetes para a capital. (THE ECONOMIST,
23/12/1890 apud FRANCO, 1989, p. 17)
Quando o trabalho escravo foi abolido e o assalariado virou regra, a pressão de
demanda por moeda ficou ainda mais forte, de forma que a estrutura institucional vigente
não apenas não mais supria as necessidades, como impediria o crescimento econômico.
As primeiras medidas no sentido de transformar tal estrutura institucional foram tomadas
ainda durante o Império, com o favorecimento de políticas bancárias e monetárias
expansionistas em busca do aumento nos meios de pagamento para suprir as demandas
criadas e os auxílios à lavoura
16
, que, na prática, beneficiaram mais os bancos que as
16
Os auxílios à lavoura, como foram chamados, eram um vasto programa de concessão de crédito
destinados a servir como compensação aos ex-proprietários de escravos. O Tesouro emprestaria uma
determinada quantia aos bancos sem cobrar juros e estes últimos teriam a obrigação de emprestar o dobro
65
lavouras propriamente ditas. Além disso, em novembro de 1888, após discussão entre
papelistas e metalistas, uma nova lei bancária
17
foi aprovada. Ela simplificava o processo
para se tornar um banco emissor.
Na lei de 1888, estavam previstas tanto a emissão sobre apólices (títulos da
dívida, até 80% das notas emitidas) quanto a emissão sobre lastro metálico. Vários
bancos foram criados, mas, provavelmente devido a alguns entraves impostos pela
mesma lei, ela não produziu o resultado esperado, pois nenhuma instituição se propôs a
operar de imediato naqueles termos
18
.
Quando o liberal (e papelista) Visconde de Ouro Preto assumiu a pasta da
Fazenda, em junho de 1889, a conjuntura apresentava-se extremamente favorável, pois
um grande fluxo de entrada de capitais e saldos positivos no Balanço de Pagamento
haviam permitido a valorização da taxa de mbio. Com isso, se retirava a objeção de
metalistas à expansão monetária, sendo apenas necessário preservar a conversibilidade,
que um “freio natural” ao excesso de emissão ficaria estabelecido. Isso possibilitou que a
circulação metálica conversível fosse estabelecida
19
à paridade de 1846. (FRANCO,
2005).
Logo após esse decreto, o Banco Nacional do Brasil, fruto da fusão do Banco
Nacional com o Banco Intercontinental, foi autorizado a funcionar, com permissão de
emitir mais do que o dobro do total de papel moeda em circulação na época
20
. O BNB
desta quantia a uma taxa de juros de 6% ao ano. A política era bastante favorável aos bancos escolhidos.
Isto fez com que novos bancos fossem criados com a finalidade de obter tais "favores".
17
Lei 3.403 de 24 de novembro 1888. (BRASIL, Lei 3.403, 1888)
18
A lei estabelecia que os bancos deveriam comprar do Tesouro, os títulos de 4,5% pelo seu valor ao par
(um conto de réis 1:000$000) e teriam o direito de emitir na proporção de 1:1 em relação ao valor de
mercado das apólices. que residia o problema. Caso as apólices estivessem cotadas abaixo do par, como
efetivamente estavam, ocorreria uma perda de capital nas emissões sobre apólices, desestimulando os
banqueiros a adquirir as mesmas. Por exemplo, se o preço de mercado de uma apólice fosse 950 mil réis, os
bancos estariam comprando por 1:000$000 o direito de emitir apenas 950$000. A operação só se tornaria
interessante para o banqueiro, quando o preço das apólices estivesse acima do par, gerando um ganho de
capital igual ao ágio sobre as apólices. Outro fator que desestimulava as instituições era a limitação
presente no Art.1º §1º onde bancos emissores com lastro metálico, não obstante a permissão para emitir
sobre o triplo de seu capital, não podiam exercer o montante de 20.000 contos fixados para instituições
fundadas na capital do Império. Isto porque esta limitação não era condizente com o período histórico em
questão, pois o aumento de liquidez desejado pelos agentes econômicos não poderia ser satisfeito com
bancos de baixo teto emissor (MENEGHETTI, 2006).
19
Decreto nº 10.262 de 6 de julho de 1889. (BRASIL, Decreto nº 10.262, 1889).
20
O capital do banco era de 90 mil contos, assim lhe permitindo uma emissão total de 270 mil contos. O
total de moeda em circulação era cerca de 200 mil contos.
66
funcionava como um banco semi-oficial, sendo o braço financeiro do governo e tinha o
direito de comprar ações de todos os tipos e café e outros produtos a termo. A seguir,
outros bancos emissores menores também foram autorizados a funcionar. Esta criação de
bancos emissores iniciou um processo especulativo no mercado acionário, o qual
culminaria, na República, com o episódio do Encilhamento.
Quando a República foi proclamada, e o Visconde de Ouro Preto, juntamente com
todo o ministério, foi preso, havia a expectativa de que o fim do Império implicaria
melhoria da situação econômica e social brasileira. Os republicanos acreditavam que
[...] o fim das arcaicas políticas metalistas, da insuficiente oferta
monetária, da falta de crédito para as atividades comerciais seria o início
de um longo período de progresso econômico. [...] A atrasada monarquia
seria substituída por um dinâmico governo, moderno e democrático, em
que os interesses dos agricultores seriam respeitados, mas também
haveria espaço para os crescentes negócios urbanos, no comércio, nas
finanças, nos serviços e até em determinados ramos industriais.
(PRADO, 2003, p. 2).
Foi dentro dessa perspectiva, que Rui Barbosa assumiu a pasta da Fazenda,
famoso por suas idéias industrialistas e papelistas, que, como tal, via as finanças como
resultado da situação econômica do país:
[...] esperar a regeneração do meio circulante pela circulação metálica,
num país de câmbio mutável como o tempo nos climas tropicais, é cair
num círculo vicioso. Essa mutabilidade do câmbio, essa sua depressão
habitual denunciam a insuficiência dos recursos ordinários do país na
liquidação de suas contas com os mercados do exterior. Não é, portanto,
a circulação metálica que nos de firmar o câmbio alto; é, pelo
contrário, a estabilidade do câmbio ao par, efeito da prosperidade
econômica da nação, que nos de permitir a circulação conversível.
(BARBOSA, 1891 apud CARONE, 1970, p. 94)
Segundo Levy (1980), a orientação capitalista de Rui Barbosa introduziu a idéia
de que o curso forçado era uma decorrência da insuficiência dos recursos ordinários do
país para liquidar suas contas no mercado exterior. Abandonou-se o mito da circulação
conversível como instrumento de estabilização bancária, e passou-se a encarar o câmbio
alto como efeito da prosperidade econômica da nação.
67
Logo que assumiu a pasta, Rui Barbosa defrontou-se com a desconfiança externa
quanto ao novo regime, pois havia a crença de que o federalismo dividiria o Brasil em
várias repúblicas, de forma que não haveria mais garantias quanto ao cumprimento de
contratos
21
. A desconfiança para com a nova organização política criou uma atmosfera de
expectativa, estimulando o êxodo de capitais e a recessão do crédito, o que acabou
levando o ministro a manter a estrutura anterior. Assim, a primeira legislação financeira
da República (Lei Monetária de 17/01/1890) foi apenas complementar ao que existia
no Império. Quatro decretos regulamentavam as Sociedades Anônimas, os Bancos de
Emissão, o crédito agrícola e as instituições de crédito real. O país foi dividido em três
regiões
22
de emissão e a política de expansão dos meios de pagamento foi intensificada,
com o sistema emissor de papéis inconversíveis, lastreados em igual quantidade de
Apólices da Dívida Pública, as quais deveriam ser adquiridas em mercados pelos
bancos
23
. Além disso, os bancos passaram a ter uma grande variedade de funções e
direitos.
As operações bancárias eram as mais amplas possíveis, abrangendo não
descontos, empréstimos, câmbio, hipotecas e penhor agrícola, mas
também adiantamentos sobre meios de produção, e empréstimos
industriais, tanto para construção civil quanto para estradas de ferro,
docas e portos. Através dessas operações também eram efetuadas a
compra e venda de terras para colonização, drenagens e irrigação de solo
e, finalmente, para exploração de Minas. Os bancos emissores tinham
ainda direito a terras devolutas para a colonização e fundação de
indústrias, além de gozarem de preferências para a construção de
21
Um empréstimo externo de 5 milhões de libras realizado anteriormente foi cancelado unilateralmente,
numa prova de “má vontade” por parte dos banqueiros ingleses com relação ao novo Regime que se
impunha e os títulos brasileiros desvalorizam-se no exterior. Para reduzir este pânico, Rui Barbosa reuniu-
se com banqueiros da capital, e apesar de crítico do Império e da política de Ouro Preto, viu-se obrigado
não só a continuar a política de empréstimos aos bancos particulares, como, também, a manter a lei de 1888
(LEVY, 1980).
22
A região Norte/Nordeste, com sede na Bahia; a do Centro, compreendendo São Paulo, Minas Gerais,
Espírito Santo e Santa Catarina, com sede na capital federal; e a região sul, composta por Rio Grande do
Sul, Mato Grosso e Goiás, com sede em Porto Alegre. A cada uma das regiões cabiam os seguintes
montantes de emissão: 150 mil contos ao Norte/Nordeste, 200 mil ao centro e 100 mil ao Sul. Em 31 de
Janeiro de 1890, por influência de Campos Sales, uma nova região bancária e um novo banco emissor
foram criados em São Paulo. Em março, o ministro concedeu ao Banco Nacional do Brasil e ao Banco do
Brasil o direito de emitir notas inconversíveis até o dobro de 25.000 contos depositados em espécies
metálicas no Tesouro. Este privilégio seria estendido em agosto a vários bancos emissores regionais e ao
Banco dos Estados Unidos do Brasil.
23
A emissão bancária transformava o crédito do Estado em crédito privado. Em contrapartida, a circulação
garantida por letras do Tesouro permitia alargar o crédito e diminuir a quantidade desses títulos em
circulação. Segundo essa modalidade, o Estado eximia-se do pagamento dos juros e das amortizações das
apólices, que oneravam o orçamento nacional.
68
ferrovias, exploração de canais e comunicações fluviais. Além disso,
tinham o direito também de desapropriação nos termos legais e isenção
de impostos de direitos alfandegários para suas empresas quanto aos
materiais importados necessários à construção de estradas de ferro, minas
e outras atividades produtivas. (LEVY, 1980, p. 204)
O aumento do papel moeda resultante da Lei Monetária foi maior do que o
necessário. Em um ano, a oferta de moeda cresceu quase 100% e entre 1889 e 1894, 3,5
vezes. O aumento da liquidez provocado pela expansão de moeda gerou inflação e
desvalorização cambial, mas também um grande aquecimento econômico, pois o crédito
ficou mais barato, e muitas novas empresas foram implantadas. Tais empresas, seguindo
as novas regras estabelecidas para sociedades anônimas buscavam crédito junto às bolsas
de valores.
A lei 164 de 1890 facilitou as trocas e introduziu uma lei de corporações
completa. A facilidade com que as corporações poderiam fazer ofertas públicas iniciais
de títulos (initial public offering of equity) criou incentivos para a criação de companhias
e a negociação de ações destas em níveis de preços inflados. Isso gerou um grande
crescimento no estabelecimento de novas corporações e ofertas de títulos. O número de
companhias negociadas na bolsa de valores do Rio passou por um boom repentino, com
centenas de companhias registrando-se em questão de meses
24
. Muitas pessoas
aproveitaram a oportunidade e criaram companhias que não produziam nada. O
fenômeno de 1889-1891 atraiu muitos investidores desinformados em busca de lucro
rápido (MUSACCHIO, 2005).
Na ausência de um organismo de controle central e fiscalização, a especulação
tomou conta do mercado, abarrotado de títulos de empresas fantasmas, originando a crise
conhecida por “Encilhamento”
25
em fins de 1891. A onda especulativa teve início com
24
Segundo Musacchio (2005), antes de 1888, o valor de todas as Companhias de Sociedades por Ações
(joint stock companies) estabelecidas no Brasil era algo em torno de 43 milhões de libras esterlinas. Entre
1888 e novembro de 1889, o capital de novas companhias representou quase o mesmo montante: 44
milhões de libras. Além disso, entre novembro 1889 e outubro 1890, quando Rui Barbosa apresentou o
relatório do Ministério da Fazenda, o capital de todas as companhias novas adicionou 104 milhões de
libras.
25
No seu sentido original, encilhamento provém do verbo encilhar, isto é, apertar o cavalo com o cinto ou
barrigueira. Nas corridas de turfe, o encilhamento era também o momento em que os jóqueis se preparavam
para montar na sela e os apostadores tentavam comprar suas desistências. Durante essas negociações, a
montaria pronta para a corrida era refreada antes da largada final. A semelhança com o barulho que ocorria
nas negociações da bolsa denominou tal momento histórico (LEVY, 1980).
69
ações dos bancos, valorizadas pelo crescimento dos empréstimos bancários, mas acabou
por envolver ações de outras companhias, sobretudo, dos ramos de seguros e de
transportes. A crise especulativa se estendeu até 1893, quando a Bolsa mostrou sinais de
queda do volume de negócios.
Em 1891, algumas pequenas mudanças na lei de corporações foram introduzidas
para evitar fraudes no futuro. Assim, um aumento de 20% para 40% dos depósitos
mínimos para a constituição de novas sociedades como condição necessária para a
negociação de ações no mercado acionário foi introduzido, fazendo com que os ofertantes
de ações precisassem arriscar mais de seu próprio dinheiro antes de envolver outros
investidores. Todavia, o envolvimento dos grandes bancos de capital com a torrente de
novas companhias sendo lançadas tornava o problema de se estancar a especulação
bastante complexo. Para lidar com o problema, buscou-se então a consolidação de um
novo banco que funcionaria como uma espécie de banco central O Banco da República
dos Estados Unidos do Brasil (BREUB), resultado da fusão do BEUB e do BNB. Mas
com a saída de Rui Barbosa do Ministério, no começo de 1891, tal plano não obteve
êxito. (FRANCO, 1989).
Depois de Rui Barbosa, outros ministros papelistas o sucederam. O ministro
Serzedelo Correia, industrialista, buscou aprofundar a política de Rui Barbosa, e criou o
Banco da República do Brasil, a partir da fusão do BREUB com o BB. Este banco, apesar
de ter como objetivo apoiar “empresas viáveis” do Encilhamento acabou por apenas
aumentar ainda mais a emissão de papel moeda. A conjuntura política e externa também
não ajudaram e o governo instalado em 1894 deu fim à experiência papelista, nomeando
como ministro da Fazenda o metalista Rodrigues Alves, que buscaria saldar os problemas
de transferências internas e externas com financiamento externo e com a cassação do
privilégio de emissão dos bancos. A emissão foi unificada e passou ao monopólio do
governo.
Em 1898 o Brasil faz um acordo com a Casa Rothschild de refinanciamento de
pagamentos (funding loan), que exigiu severas medidas de saneamento fiscal e
monetário. Tais medidas levaram a uma forte redução do papel moeda em circulação e a
uma conseqüente avalanche de falências bancárias em 1900. Todavia, a partir de tal
70
ajuste, entre 1900 e 1913, a economia passou por um período de grande expansão, devido
principalmente à repentina melhoria da posição externa em virtude do rápido crescimento
das exportações de borracha e do início do grande boom de investimentos europeus na
periferia.
A conseqüente apreciação do câmbio levou à criação, em 1906, da Caixa de
Conversão, com poder de emissão de notas plenamente conversíveis em ouro a uma taxa
fixa de câmbio, que funcionava como um mecanismo para prover ativos domésticos
líquidos em quantidade suficiente para prover a crescente oferta de divisas, de modo a
aliviar as pressões para a apreciação da taxa de câmbio. A caixa de conversão, portanto,
permitiu que houvesse na economia o ajustamento “normal” de um sistema monetário de
Padrão Ouro, i.e, movimentos de ouro causariam mudanças na oferta de moeda,
induzindo variações estabilizadoras no balanço de pagamentos em conta corrente.
Todavia, a estabilidade monetária doméstica passou a ser dependente do comportamento
do balanço de pagamentos, acentuando o caráter pró-cíclico dos déficits e superávits
externos da economia primário-exportadora e, assim, da atividade interna (FRITSCH,
1989).
A experiência ruim vivida durante o Encilhamento, acompanhada das convicções
metalistas de boa parte das figuras mais influentes do governo, fez com que a política
econômica, a partir de então, passasse a ser uma eterna busca pela manutenção do padrão
ouro. Todavia, as características de dependência externa da economia brasileira,
tornavam o balanço de pagamentos muito sujeito a choques externos de caráter pró-
cíclico. Desta forma, embora o governo tenha alcançado estabilidade suficiente nos
períodos de crescimento econômico mundial para permitir a institucionalização do padrão
ouro no país, quando os resultados externos eram revertidos, a economia ficava
submetida a fortes crises de liquidez, que acabavam por obrigar o governo a fazer uso de
emissões inconversíveis e abrir mão da austeridade da política monetária, e, portanto, do
Padrão Ouro. Quando o governo decidiu não ceder às pressões e manter o Padrão-Ouro,
mesmo sob forte crise de liquidez, em 1929, deu subsídios para que um novo golpe de
Estado desse fim à Primeira República.
71
Fritsch (1989) defende a idéia de que as intervenções do governo federal no
mercado de café devem ser relacionadas principalmente à necessidade de o governo
equilibrar o balanço de pagamentos para evitar maiores depreciações da moeda, que
levariam a maiores déficits governamentais (já que a maior parte da dívida federal era
cotada em moeda estrangeira) e não tanto a questões políticas. Todavia, o dilema da
política econômica era de que tal sustentação dos preços do café, se por um lado
mantinha a principal fonte de moeda estrangeira no país, por outro, poderia tornar
necessário o abandono da política monetária restritiva, na medida em que eram utilizadas
emissões para financiá-la.
Assim, em 1913, a eminência da Guerra Mundial gerou forte deterioração da
posição externa, e, portanto, um período de permanente crise de liquidez devido a auto-
regulação do Padrão-Ouro. A manutenção deste sistema monetário fez com que a rápida
queda da caixa de conversão ocasionasse severo arrocho monetário que implantou uma
nova recessão profunda na economia brasileira, bem antes do início das hostilidades na
Europa.
Com a guerra, o governo fechou a Caixa de Conversão e autorizou uma grande
emissão de notas inconversíveis, que serviu para aliviar temporariamente a crise de
liquidez e atender a despesas do governo. A normalização do comércio gerou uma forte
pressão de depreciação da taxa de câmbio, que levou o governo a recorrer a um novo
funding loan, o qual possibilitou o alivio do balanço de pagamentos e contribuiu para a
estabilização da taxa de câmbio. Todavia, com o desenrolar da guerra e a sensação de que
o conflito seria longo, o país afundava em uma grave depressão, exigindo medidas
emergenciais do governo para contê-la. Entre tais medidas, destaca-se uma nova emissão
de notas do Tesouro e de títulos federais de longo prazo, utilizadas para cobrir os déficits
acumulados do governo e para expandir as atividades do Banco do Brasil, considerado
importante na estabilização das condições de crédito. no final da guerra, foi efetuada
uma nova emissão de notas inconversíveis para reforçar a caixa do Banco do Brasil e
financiar a compra da safra estocada de café, devido à impossibilidade de exportação
imposta pelas ameaças (cumpridas) alemãs de afundar navios mercantes engajados em
comércio com o inimigo.
72
Após o armistício de 1918, questões conjunturais permitiram um grande superávit
comercial em 1919, revertido subitamente pelas políticas monetárias restritivas adotadas
na Europa em 1920, que geraram grande depreciação cambial do mil-réis. Na mesma
época, uma crise iminente do complexo cafeeiro ocupava a atenção das autoridades
federais, que se negavam a prestar auxílio para evitar a desvalorização da moeda. Tal
crise era aprofundada pela restrição de crédito agravada pela incapacidade conjuntural do
sistema bancário em prestar assistência normal ao financiamento da comercialização da
safra.
No final do mesmo ano, o governo acabou cedendo às pressões e autorizou uma
pequena emissão de notas do Tesouro para alívio emergencial de liquidez. Além disso,
criou a Carteira de Redesconto do Banco do Brasil, a qual teria poderes de emitir notas
do Tesouro até um limite passível de ampliação pelo Presidente da República, contra
títulos comerciais e proibia explicitamente o redesconto de títulos públicos. Segundo
Fritsch,
Ao atender aos reclamos imediatos do setor privado e à antiga
reivindicação de criação de um emprestador automático de última
instancia, o governo federal conseguiu esvaziar a demanda corporativa
da institucionalização da defesa do café e implementar, ainda que de
forma reconhecidamente provisória e incompleta, um instrumento
considerado fundamental para a maior estabilidade do sistema bancário.
(FRITSCH, 1989, p. 47-48)
A Carteira de Redesconto do BB foi utilizada tanto como mecanismo indireto de
financiamento dos déficits do governo federal, assim como mecanismo direto, com a
autorização de redesconto de títulos federais até meio milhão de contos. Essas medidas
geraram um crescimento explosivo da base monetária no final de 1922 e,
conseqüentemente, grande pressão inflacionária e desvalorização cambial, que levariam a
uma nova adoção de políticas austeras.
Em 1922 é cancelado o direito de emissão do Tesouro e o BB é dotado do
monopólio de emissão monetária em condições idênticas às da extinta Carteira de
Redesconto. Em 1923, novamente, o BB tem de lançar mão de sua faculdade de emissão,
para suprir a forte crise de liquidez gerada pela necessidade de financiamento da
valorização do café, dado as dificuldades de concessão de crédito por parte do sistema
73
bancário privado. Isso, como sempre, acelerou a depreciação do mil-réis, e o governo
recorreu novamente a empréstimos de estabilização. Todavia, nesta época, a situação
internacional era desfavorável e a necessidade de fortalecer a libra para o retorno ao
padrão ouro, em 1924, inviabilizou tal empréstimo.
O crescimento da inflação passou a pressionar camadas urbanas e gerar
insatisfação em diversos setores da sociedade. Em 1924 a necessidade de conter revoltas
militares aumentou as despesas do governo, e novas notas foram emitidas para saldá-las,
gerando nova perda de controle sobre a política monetária. Como resposta, um choque
monetário é implementado, com uma política ortodoxa de ajuste interno e externo,
acoplando uma política monetária contracionista à política de austeridade fiscal. Além
disso, a manutenção das políticas de valorização do café era um entrave aos objetivos
maiores da política macroeconômica de estabilização, de forma que, no mesmo ano o
governo federal, aproveitando uma conjuntura favorável
26
, declarou o fim de seu
envolvimento com tal política, transferindo a responsabilidade para o estado de São
Paulo.
Em 1925 um novo processo de contração monetária é posto em ação, com a
elevação das taxas no Banco do Brasil e a restrição do montante de suas operações de
redesconto com a intenção de reduzir a base monetária através da retirada de notas do
Tesouro em circulação. A esta política recessiva somou-se a manutenção do esforço para
equilibrar o orçamento, pois a disciplina fiscal era considerada pressuposto da viabilidade
da manutenção da política monetária restritiva. Apesar do alto custo em termos de perdas
de produto e emprego, o interlúdio deflacionário de 1925-26 atingiu seus principais
objetivos. Por um lado, a taxa de câmbio apreciou-se abruptamente em mais de 40% entre
agosto e outubro de 1925, por outro, a inflação desacelerou rapidamente. A melhora da
posição externa, essencial para tal recuperação, deveu-se a recuperação dos fluxos de
comércio e investimento internacionais.
Durante o último governo da República Velha (Washington Luís) houve nova
reversão na política monetária e cambial. Desde fins de 1925 cresciam os protestos de
26
Em 1924, os preços do café estavam elevados, aumentando as perspectivas de ganhos com a valorização.
Isso tornava mais fácil politicamente a saída do governo federal do esquema.
74
industriais – especialmente os da indústria têxtil – e exportadores contra os efeitos
deflacionários da contração de moeda e da apreciação cambial, enquanto desapareciam as
razões objetivas que informaram a opção pelo ajuste recessivo em fins de 1924. Em fins
de 1926, com o controle da inflação e a melhora da posição externa a manutenção da
política contracionista colocaria o governo em choque com importantes camadas da
sociedade.
Assim, Washington Luís envia ao Congresso um projeto de reforma monetária
propondo o retorno ao Padrão Ouro. O projeto era, formalmente, um plano para atingir-
se, em etapas sucessivas, a conversibilidade do total do estoque de moeda em circulação à
nova paridade. A primeira fase seria de estabilização. Para isso, propunha a criação da
Caixa de Estabilização, um órgão do Tesouro que teria a atribuição precípua de emitir
notas conversíveis à vista contra depósitos em ouro nela feitos ao novo par, exatamente
nos moldes da antiga caixa de conversão. Quando o estoque de ouro acumulado pela
caixa fosse considerado suficiente para permitir a decretação da conversibilidade plena
das notas em circulação, inclusive das não emitidas pela Caixa, viria a segunda fase, com
a mudança da unidade monetária (o cruzeiro) e a transferência do poder de emissão de
volta para o BB. Nesse período a economia cresceu com condições de quase perfeita
estabilidade de preços, garantida pela estabilidade cambial e pela existência de margens,
provavelmente amplas, de capacidade ociosa na indústria.
A exuberante recuperação de 1927-28 sustentava-se, entretanto, em bases frágeis,
que dependia crucialmente da manutenção das condições econômicas internacionais
extremamente favoráveis verificadas desde 1926. Como a experiência de antes da Guerra
havia demonstrado, dada a instabilidade dos fluxos financeiros à periferia, normalmente
variando em sincronia com os preços internacionais de produtos primários, a adoção do
padrão ouro em ciclos de endividamento externo aumentava a vulnerabilidade do
equilíbrio macroeconômico doméstico. Isto porque as condições favoráveis de balanço de
pagamentos que induziram a adoção do padrão ouro podiam reverter-se abruptamente, a
perda de reservas automaticamente submeteria a economia a violentas pressões
deflacionárias. O potencial desestabilizador desse regime monetário era ampliado por
seus efeitos sobre a viabilidade do esquema de defesa do café e, portanto, sobre as
receitas de exportação.
75
Em 1928 o balanço de pagamentos passou por novas dificuldades, devidas, de um
lado, à estagnação das exportações num contexto de crescimento acelerado das
importações, induzido pela recuperação dos níveis de atividade e investimento
domésticos, e, de outro, pelo estancamento temporário do fluxo de empréstimos externos
para a periferia na segunda metade de 1928. A erosão no saldo do BP faz cair o ritmo de
crescimento das emissões da Caixa de Estabilização.
Após um curto auxílio do BB aos bancos, o governo optou pela adoção de
medidas contracionistas opostas à postura acomodadora então adotada pelo banco,
visando à manutenção do padrão ouro. Assim, os depósitos dos demais bancos foram
rapidamente contraídos e os estoques de moeda estagnados, causando deflação que
atingiu, logo, os veis de atividade econômica. Com o colapso de capacidade de
sustentação do café e das condições de crédito externo, a convicção (teimosia) do
governo com relação à necessidade de sustentação do padrão ouro, via manutenção da
estabilidade cambial, e conclusão do programa de reforma monetária levaram o país a
uma crise de proporções sem precedentes, que, segundo Fritsch (1989) acabaria por
sepultar o regime.
Com relação ao Mercado de Crédito, apesar do grande crescimento dos bancos e
do crédito bancário no período do Encilhamento, as políticas restritivas adotadas para
contê-lo ocasionaram uma avalanche de falências bancárias, de forma que, em 1910, o
Brasil Republicano permanecia com o mesmo problema do Império: o reduzido número
de estabelecimentos bancários. Além disso, o país mantinha um sistema bancário
“inelástico”, ou seja, uma limitada capacidade de criação de crédito resultante dos
altíssimos encaixes com que operavam especialmente os bancos nacionais e a
variabilidade sazonal de sua capacidade de empréstimo vis-à-vis as necessidades do setor
real.
As dificuldades de crédito eram aprofundadas sempre durante o terceiro trimestre
do ano nos centros financeiros urbanos, pois era nesta época que os fazendeiros faziam
seus pagamentos de fim de colheitas, em dinheiro, gerando grande redirecionamento de
liquidez para o interior. Como no Império a preferência pela moeda manual aos depósitos
bancários por parte de fazendeiros e colonos se mantinha, já que se mantinha a escassez
76
de bancos no interior. A contração da oferta de moeda resultante afetava diretamente as
atividades urbanas, fazendo com que se desenvolvessem as primeiras idéias de
transformação do Banco do Brasil em uma espécie de Banco Central, que, através de uma
carteira de Redesconto, poderia reduzir tais problemas. Todavia, tal carteira, como
visto, só foi introduzida nos últimos anos da República Velha.
Com tal restrição de crédito, como foram possíveis os episódios de
desenvolvimento industrial vistos durante a República? Musacchio (2005) argumenta que
a quase inexistência de crédito bancário não se fez sentir de forma tão profunda pelas
empresas que foram criadas no período, pois a demanda de crédito era suprida pelo
grande desenvolvimento institucional do mercado acionário e de títulos, que, àquela
época mostrava-se tão desenvolvido quanto os mercados de capitais dos principais
centros urbanos do mundo (Tabela 3.1). Suas conclusões foram baseadas em fatores
como nível de proteção a portadores de títulos, imposição de contratos financeiros, leis
empresariais e de falências.
Como pode ser visto na Tabela 3.1, o período de melhor desenvolvimento do
mercado de títulos no Brasil foi de 1890 a 1913. Após a I Guerra Mundial, tanto o
mercado de títulos como de ações passaram a declinar
27
.
Musacchio (2005) indica que o desenvolvimento inicial dos mercados de tulos e
ações estava altamente relacionados às mudanças legais que facilitaram a abertura de
empresas (chartering), introduziram os títulos corporativos (corporate bond) com
prioridade para proprietários de títulos durante as falências, depois de 1890 e
estabeleceram o grande conjunto de incentivos para companhias serem abertas como
corporações, emitindo ações e títulos. A utilização de emissão de debêntures para
levantamento de fundos era utilizada por empresas de todos os setores de atividades.
Mais da metade das companhias de portos, estradas de ferro, produção têxtil e serviços de
utilidade pública registrados na bolsa de valores utilizaram debêntures durante o período
(1895 1931). Outros setores como imprensa jornais e empresas de papel para
impressão e construção tinham mais de um terço das firmas usando debêntures. A
27
Até a década de 1960, quando ocorreram as reformas institucionais do PAEG.
77
maior parte das companhias que emitiam títulos financiavam quase um terço de seu
capital desta forma (com quase dois terços levantados via emissão de ações).
Tabela 3.1: Capitalização de Mercado no Brasil (preços correntes)
Mercado
Acionário
de São
Paulo
Mercado
Acionário
do Rio de
Janeiro
Debêntures
do Rio de
Janeiro PIB
Capitalização
Privada Total
Capitalização
de debêntures
do Rio de
Janeiro
1886
71 213 0 1,778 16%
1895
217 634 264 4,175 20% 6%
1905
228 482 261 4,088 17% 6%
1913
392 897 781 6,315 20% 12%
1920
1,234 645 14,19 9% 5%
1925
1,565 472 27,261
6% 2%
1931
997 1,771 660 23,052
12% 3%
1935
1,577 440.0 32,553
5% 1%
1940
4,202 3,501 682.2 50,78 15% 1%
Fonte: Musacchio (2005, p. 35)
Portanto, por um lado, o episódio do Encilhamento no inicio da República
propiciou o desenvolvimento de uma estrutura institucional bastante avançada para
corporações e mercado de capitais; por outro, fortaleceu as medidas metalistas, como o
monopólio estatal da emissão de moeda e a meta do Padrão Ouro como meio de
estabilizar a economia. Todavia, as freqüentes flutuações do balanço de pagamentos
tornavam a liquidez da economia vulnerável às oscilações externas, freqüentemente
comprometendo o lastro metálico da moeda. O sistema bancário, embora tenha se
expandido durante o inicio da república, se reduziu logo a seguir, de forma que se
manteve um sistema bancário “inelástico”, mas com forte presença de bancos
estrangeiros durante o período, e, também, embora o Banco do Brasil tenha recebido
algumas funções de banco central, ainda não se configurava como uma autoridade
monetária.
78
3.2.3 Trabalho
As questões acerca do mercado de trabalho e sua regulamentação no Brasil podem
ser fortemente relacionadas às características da produção no país. Neste sentido, devem
ser considerados: a utilização de mão-de-obra escrava, que, a partir de 1850, com a lei
Eusébio de Queiros, passou a declinar e, em 1888, foi proibida; assim como as grandes
diferenças regionais, aprofundadas pelo federalismo extremado introduzido com a
República.
Com relação à formação de um mercado de trabalho propriamente dito, Barbosa
(2003) acredita que ele não tenha surgido “de um dia para o outro”, com a abolição, mas
seja resultado de um longo processo, que se iniciou com a proibição do tráfico em 1850.
Tal processo pode ser dividido em três fases: Entre 1850 e 1888 deu-se o início do
processo de construção deste mercado; entre 1889 e 1930, a conformação de mercados de
trabalho fragmentados regionalmente e incompletos e, a partir de 1930, seu processo de
nacionalização e consolidação.
Nesse sentido, ainda durante o Império, a lei de 1850 determinou a tendência de
escasseamento da oferta de mão-de-obra escrava e o conseqüente aumento de seu preço.
Devido a isso, após um período de realocação de escravos disponíveis através de
comercio interno entre Províncias
28
, buscou-se uma paulatina experimentação de formas
de trabalho livre. Os fazendeiros, segundo Kirdeikas (2003), tinham três possíveis fontes
a que recorrer: os imigrantes, os brasileiros livres e, principalmente a partir de 1889, os
ex-escravos. Os dois últimos grupos, entretanto, deveriam ser disciplinados ao trabalho
livre, enquanto os primeiros vinham de regiões onde um mercado de trabalho havia se
estabelecido há muito. Na mesma época, como medida paliativa, o Estado passou a
auxiliar na disponibilização de braços livres e dispostos ao trabalho, tanto pelo
acionamento de um conjunto de políticas voltadas a desescravização paulatina e ao
disciplinamento do trabalho livre, além de uma política de terras que restringia o acesso
aos pequenos proprietários (uma decorrência prática da edição da Lei de Terras, também
28
Freado pela imposição de impostos interprovinciais sobre a entrada de escravos nas províncias do Rio de
Janeiro, Minas Gerais e São Paulo e proibido definitivamente pela lei Saraiva-Cotegipe, de 1885.
79
de 1850); como pela retomada do estímulo e subvenção à imigração de trabalhadores
livres (principalmente europeus).
A partir de 1881, o governo de São Paulo passou a subsidiar o transporte de
imigrantes: o Estado pagaria a metade dos custos de transporte e a outra metade deveria
ser paga pelo imigrante ao fazendeiro que o importou. Esta dívida, todavia, acabava
tornando os imigrantes uma espécie de escravos, o que criava obstáculos para que novos
imigrantes viessem para o Brasil. Isso fez com que, em 1884, o governo começasse a
reembolsar integralmente os gastos que os fazendeiros realizavam com o pagamento das
passagens, e, em 1885, a subsidiar diretamente o custo do transporte dos imigrantes
(KOWARICK, 1987). Estes subsídios mostraram efeitos muito rápido, de maneira que,
entre 1885 e 1889, cerca de 160 mil imigrantes ingressaram na província de São Paulo
um montante equivalente a 52,5% do total entrando no país representando um aumento
de mais de dez vezes em relação ao qüinqüênio anterior.
A maior parte dos imigrantes era direcionada para as fazendas de capaulistas,
sob uma espécie de regime de parcerias, onde ficavam “presos” ao fazendeiro devido às
dividas de transporte, até meados de 1860. A partir daí, passou-se a utilizar outras
modalidades de contratação, generalizando-se o pagamento do “contrato de ajuste”, no
qual os trabalhadores recebiam uma quantia fixa por alqueire de grãos entregue ao
fazendeiro. Este método levou ao surgimento do regime de colonato, onde, além deste
pagamento fixo, os imigrantes ainda recebiam um “salário mínimo fixo”, pago a cada mil
pés tratados. Segundo Silva (1995 apud BARBOSA, 2003), este colonato ainda não pode
ser considerado um assalariamento puro, uma vez que a renda não-monetária cumpre
papel de destaque. Entretanto, este tipo de contrato permitiu tornar o trabalhador
formalmente livre, diferentemente do que ocorreu nas parcerias, uma vez que a mão-de-
obra passou a ser vinculada a contratos, com duração de um ano, os quais poderiam ser
rescindidos por ambas as partes com aviso prévio de um mês.
Com a Lei Áurea, de 1888, houve uma realocação de direitos de propriedade
sobre o trabalho, que impuseram grandes perdas para os fazendeiros que possuíam boa
parte de seu imobilizado em forma de escravos. Todavia, como ressaltado por Furtado
(1987), embora prevalecesse a idéia de que um escravo era uma “riqueza” e de que a
80
abolição da escravatura acarretaria o empobrecimento do setor da população que era
responsável pela criação de riqueza no país,
A abolição da escravatura, à semelhança de uma reforma agrária não
constitui per se nem destruição, nem criação de riqueza. Constitui
simplesmente uma redistribuição da propriedade dentro de uma
coletividade. A aparente complexidade desse problema deriva de que a
propriedade da força de trabalho, ao passar do senhor de escravos para o
indivíduo, deixa de ser um ativo que figura numa contabilidade para
constituir-se em simples virtualidade. Do ponto de vista econômico, o
aspecto fundamental desse problema radica no tipo de repercussões que a
redistribuição da propriedade terá na organização da produção, no
aproveitamento dos fatores disponíveis, na distribuição da renda e na
utilização final dessa renda. (FURTADO, 1987, p. 137, grifos do autor)
A processo de transição do cativeiro para o trabalho livre foi controlado
fortemente pelo Estado, que procurou promover a disciplina, o controle e o treinamento,
temendo que após a abolição surgisse uma massa de indivíduos que não mais se
subordinassem ao trabalho regular e que se tornariam uma classe de indivíduos que
ameaçariam a propriedade e a ordem vigente.
A libertação dessa mão-de-obra, todavia, não abriu espaço para sua contratação
dentro das novas regras de assalariamento. Tal possibilidade, provavelmente mais por
preconceito do que por motivos mais nobres, foi rejeitada em favor da imigração de
trabalhadores europeus considerados “mais dispostos ao trabalho”, especialmente em São
Paulo. Esta escolha, segundo Mello (1982), tornou-se viável devido às condições
particulares vigentes no mercado internacional de trabalho à época, com fortes
transformações de várias economias européias, nas duas últimas décadas do século XIX
que provocaram a formação de imensos contingentes de homens livres e sem trabalho
dispostos a emigrar. Destaca-se a crise econômica enfrentada pela Itália a partir de 1870,
que permitiu a emigração de grandes contingentes de mão-de-obra abundante e barata.
As grandes diferenças econômicas regionais do país, aprofundadas com o
federalismo republicano, determinavam uma ampla possibilidade de configurações de
diferentes tipos de relações de trabalho em cada região. Com relação às fazendas de café,
segundo Delfin Netto (1981), em São Paulo, a forma de exploração mais comum era o
colonato, enquanto que nos demais estados, era a parceria.
81
No regime de colonato, o trabalhador rural recebe, em geral, uma
remuneração de três tipos: a) uma remuneração fixa por mil pés para
manter limpo e preparar o terreno para a colheita; b) uma remuneração
por dia de trabalho para os serviços de poda, adubação, pequenos reparos
no equipamento de produção, etc.; e c) uma remuneração diretamente
proporcional ao número de sacas de café por ele colhida. O salário real
do colono é, de fato, muito maior do que a remuneração monetária
referida acima, pois o colonato implica na permissão para se plantar
arroz, feijão, milho etc., dentro da própria fazenda (em terreno separado
ou dentro das ruas do cafezal novo) e cujos resultados pertencentes e da
concessão de outras vantagens (lenha, café para o seu consumo, etc.).
No regime de parceria, o chamado “parceiro” executa todos os serviços
do cafezal (desde a limpeza até os trabalhos de terreiro), entregando ao
proprietário a porcentagem de café seco relativa ao contrato. Também
neste regime a remuneração real do trabalho é mais elevada, porque o
trato geralmente inclui outras vantagens, como no sistema de colonato.
(DELFIM NETTO, 1981, p. 44)
Segundo Barbosa (2003), a marca dos distintos mercados de trabalho era a
incompletude e a fragmentação, embora sua construção apresentasse especificidades
regionais marcantes, relacionados à situação econômica de cada região: Sudeste dinâmico
(oeste paulista e capital da província), Sudeste estagnado (vale do Paraíba incluindo
porções das províncias de São Paulo e Rio de Janeiro, e a zona da mata de Minas Gerais),
Nordeste e Extremo Sul.
No Sudeste Dinâmico, podemos dividir as relações de trabalho entre rurais e
urbanas. O trabalho rural era executado, na República, predominantemente por
imigrantes europeus. Esta configuração foi influenciada pela atuação Estatal no sentido
de subsidiar tal imigração. Aos trabalhadores nacionais restavam as tarefas mais penosas
e pior pagas, rejeitadas pelos imigrantes.
Nos cafezais paulistas era comum a prática de multas ou espancamentos aplicados
a trabalhadores que fugiam às duras regras impostas pelos proprietários. Ademais, os
colonos eram obrigados a comprar nas vendas das fazendas, pagando mais caro pelos
gêneros adquiridos; imperavam também as práticas de diminuir os preços dos produtos
por eles cultivados, seu confisco, a alteração das medidas, a protelação ou o não
pagamento do salário. Desprovido de organizações e no contexto de um sistema
Judiciário que sistematicamente favorecia as regras de domínio dos potentados rurais, o
trabalhador não poderia fazer valer os seus direitos. Estes fatores faziam com que boa
82
parte dos imigrantes fosse para as cidades e para as atividades urbanas. Desta forma,
também nas atividades urbanas a maioria dos trabalhadores eram imigrantes ou filhos
destes, que migravam para as cidades, tanto para preencher vagas em aberto como para
criar novas funções.
O imigrante deixava poucas oportunidades aos nacionais, enchendo o
mercado por todos os seus poros, ocupando os vários níveis da hierarquia
econômica e social, “desde o mais importante comerciante até o mais
desamparado menino vendedor de jornais”. Estava melhor
“psicoeconomicamente equipado” para aproveitar as brechas ainda não
exploradas da economia urbana. O mercado se segmentaria aos poucos,
posto que as várias nacionalidades de estrangeiros monopolizariam
atividades econômicas específicas. Estabelecia-se assim uma
solidariedade de grupos primários, identificados pela origem ou pelo
ofício comum. (BARBOSA, 2003, 142-143)
Aos escravos recém libertos, em desvantagem competitiva devido ao preconceito,
não restavam oportunidades, de forma que estes acabavam relegados a uma situação de
marginalidade e anomalia. “O ócio dissimulado e a inatividade forçada foram as suas
opções de liberdade nesta sociedade competitiva, quase-contratual e recém-
transformada.”
(BARBOSA, 2003, p.144)
na região do Vale do Paraíba e Zona da Mata Mineira (Sudeste estagnado), os
poucos recursos dos cafeicultores, ainda mais reduzidos com a abolição (pois os escravos
respondiam muitas vezes por quase a totalidade do seu patrimônio) inviabilizavam a
contratação de trabalhadores assalariados nos mesmos termos que as regiões mais
desenvolvidas. Devido a isso, houve uma reutilização dos ex-escravos na cafeicultura por
falta de opções tanto do lado do senhor, como dos escravos, destacando-se as turmas de
camaradas, onde o empreiteiro fornecia comida e alojamento nos ranchos construídos no
cafezal. Mas eram comuns também os colonos-parceiros, colonos-empreiteiros e os
arrendatários de pequenos pedaços de terra no Vale do Paraíba fluminense e a meação,
que trazia como estímulo a cultura de cereais e as casas de moradia, na Zona da Mata.
Nas épocas de colheita, uma mão-de-obra temporária de migrantes do norte do estado e
do Nordeste do país suplementava a força de trabalho. Portanto, nessas regiões, os
homens livres brasileiros e libertos foram incorporados ao mercado de trabalho sem a
introdução do assalariamento.
83
Na região Nordeste, a estagnação econômica tornava a demanda por trabalho
inexpressiva. Além disso, com fortes traços patrimonialistas na sociedade, os vínculos
empregatícios mantiveram um caráter patriarcal, e não de assalariamento, ainda por
muito tempo após o fim da escravidão (na verdade, existente em algumas regiões até
hoje).
Por fim, na região Sul, a presença de núcleos coloniais, baseados na pequena
propriedade agrícola, permitiram um desenvolvimento bem diferente do mercado de
trabalho. A possibilidade de acesso à terra e, assim, de subsistência dada aos colonos,
assim como a baixa densidade demográfica da região, fizeram com que a mão-de-obra se
mantivesse escassa durante o período, fazendo com que medidas assistencialistas fossem
introduzidas pelos empregadores para estimular a oferta de trabalho
29
.
Embora a maior parte da economia brasileira fosse agrícola, havia um setor
manufatureiro crescente. Segundo Patto (1999), embora no Censo de 1920 69,7% da
população economicamente ativa se dedicasse à agricultura, havia também 16,5%
empregada no setor de serviços e 13,8% na indústria. Esta indústria era constituída,
basicamente, de fábricas de médio e de grande porte de fiação e tecelagem, bebidas,
roupas, sapatos e alimentos, instaladas no Rio de Janeiro e em São Paulo desde o começo
do século, as quais empregavam um número crescente de operários. Neste sentido,
também devemos dar atenção às relações de trabalho urbanas e industriais.
Em São Paulo havia, grande relação entre o trabalho urbano e a economia cafeeira.
Quando o café estava em expansão, crescia a imigração que ia para as lavouras, mas em
época de crises, os imigrantes eram dispensados e partiam para as cidades, de forma que
havia uma tendência de crescimento da oferta de mão-de-obra nos centros urbanos.
O trabalho nas fábricas era caracterizado por ampla exploração, inclusive de
mulheres e crianças, com jornadas de trabalho que podiam chegar a 17 horas ininterruptas,
salários miseráveis, inexistência de quaisquer direitos trabalhistas ou estabilidade.
29
Segundo Herrlein Jr.(2003), no Rio Grande do Sul as “empresas” urbanas passaram a introduzir a
utilização de práticas assistencialistas aos seus trabalhadores (fundos de pensão, assistência médica, escolas
para os trabalhadores e para seus filhos, provimento de moradias) e salários dios superiores aos
patamares das demais regiões, para conseguirem suprir sua necessidade de trabalhadores.
84
Como boa parte das pequenas e médias empresas, predominantes até os anos 1920,
produziam sob encomenda, instaurava-se um regime de extrema flexibilidade
ocupacional em termos de número de trabalhadores e de horas trabalhadas. Face às crises
conjunturais, quando se contava com estoques expressivos, prevalecia uma completa
indiferença com respeito à retenção de força de trabalho. Cortava-se o número de dias de
trabalho e de tarefas, barateando o salário até que o fechamento da empresa levasse à
demissão como última alternativa.
Na maioria dos setores, como havia excesso de mão-de-obra disponível e baixa
necessidade de qualificação (como no têxtil), as greves não surtiam efeitos positivos; pelo
contrário: a maioria culminava com demissões em massa. No entanto, havia também
uma espécie de elite entre os trabalhadores urbanos, composta pelos trabalhadores da
construção civil: pedreiros, marmoreiros e pintores. Em virtude do alto grau de
especialização e da característica dos empreendimentos, além de uma demanda de
trabalho geralmente crescente, possuíam salários elevados e maior poder organizativo.
Tais trabalhadores, já em 1907, obtiveram a jornada de 8 horas e foram vitoriosos em
praticamente todas as greves entre 1907 e 1913. A maioria dos trabalhadores, por outro
lado, não possuía qualquer especialização ou classificação profissional, que também não
seria um diferencial que servisse para selecionar a oferta de trabalho mais adequada, pois
a própria indústria se incumbia do preparo de boa parte da mão-de-obra. Ainda que os
estrangeiros possuíssem um maior nível de alfabetização, as habilidades do trabalho não
giravam em torno da instrução. A vantagem dos imigrantes, entretanto, advinha do fato
de não serem tão discriminados como os ex-escravos e os trabalhadores nacionais, que
eram descartados por preconceitos sociais e raciais. Já os ex-escravos e seus
descendentes, sem alternativas no mercado de trabalho, viviam em situação de
desemprego crônico ou agregados a famílias ricas, onde exerciam extensas jornadas de
trabalho doméstico não-remunerado, mostrando a existência de fortes traços patriarcais,
mesmo no “emprego” urbano.
85
3.2.3.1 Instituições Formais
As primeiras legislações de regulamentação das relações de trabalho, embora
muito específicas, podem ser encontradas ainda durante o Império. Estas legislações
separavam o trabalho escravo do trabalho livre (nacionais e imigrantes) e dentro deste, o
rural do urbano.
Com relação ao trabalho urbano, em 1850, o Código Comercial
30
já incluía
algumas regras direcionadas ao trabalho no comércio. Entre outros temas, dispunha
sobre trabalho dos feitores, guarda-livros, caixeiros, administradores de armazéns de
depósito, mestres, administradores e diretores de fábricas; acidente do trabalho; aviso-
prévio; indenização pela denúncia antecipada dos contratos a termo resolutivo; justas
causas; trabalho marítimo.
para o trabalho rural, são pioneiras as leis de locação e serviços de 1830,
1837
31
. A primeira regulamentava os contratos entre nacionais e estrangeiros, e a segunda
dispunha apenas sobre trabalho de estrangeiros. Todavia, segundo Machado (2003), estas
leis não tiveram grande repercussão dado que tinham um conteúdo bastante vago.
A primeira lei geral sobre trabalho rural foi promulgada em 1879, após quase dez
anos de discussões. A Lei de Locação de Serviços
32
(ou Lei Sinimbu), destinada ao
trabalhador nacional e ao estrangeiro, dispunha sobre a locação para os serviços na
agricultura, abrangendo tanto a locação de serviços propriamente dita como a parceria
agrícola e pecuária. Contemplava além das obrigações contratuais entre trabalhadores e
fazendeiros, disposições anti-greves e contra quaisquer resistências coletivas ao
trabalho
33
. Continha, ainda, um capítulo dedicado à matéria penal e outro a competências
e procedimentos processuais. Segundo Biavaschi (2005), essa lei atendeu, basicamente,
aos apelos dos fazendeiros de café para que lhes fossem oferecidas garantias quanto ao
cumprimento dos contratos. Neste sentido, foram mais bem definidas suas relações com
30
Lei 556, de 25 de junho de 1850. (BRASIL, Lei 556, 1850)
31
Decreto 0-028, de 13 de setembro de 1830 (BRASIL, Decreto 0-028, 1830) e Lei 108, de 11 de outubro
de 1837 (BRASIL, Lei 108, 1837).
32
Decreto 2.827, de 15 de março de 1879. (BRASIL, Decreto 2.827, 1879)
33
Em caso de recusa coletiva ao trabalho, os infratores seriam detidos até o julgamento e enquadrados no
mesmo processo.
86
os trabalhadores nacionais e estrangeiros, com introdução de obrigações contratuais
bastante gidas. Tal lei também previa a obrigação de contratar, como mecanismo de
combate à vadiagem, somente deixando de ser aplicada caso o trabalhador livre estivesse
servindo o exército. Segundo Machado (2003), ela facilitou a transição do trabalho
escravo ao trabalho livre, ao constranger os nacionais ao trabalho e incentivar os
imigrantes, além de possibilitar a adaptação dos fazendeiros às novas relações de trabalho.
Paralelamente ao desenvolvimento da lei que regulava o trabalho livre, foi
formulada a legislação de desescravização, que resultou na Lei do Ventre Livre de 1871
34
,
na criação do Fundo de Emancipação
35
para a libertação de escravos, segundo critérios
preferenciais
36
, e na Lei do Sexagenário em 1885. Estas leis também funcionaram como
um meio de adaptação para a criação de um mercado de trabalho, introduzindo o
gradualismo e impondo o trabalho aos libertos - “os escravos libertados ficam cinco anos
sob inspeção do governo”, sendo “obrigados a contratar seus serviços”, sob pena de
“serem constrangidos, se viverem vadios, a trabalhar nos estabelecimentos públicos”.
Segundo Barbosa (2003, p.134-135), quando da abolição, podemos considerar
que todas as relações de trabalho encontravam-se regulamentadas: “[...] escravos e
ingênuos pelas Lei do Ventre Livre e dos Sexagenários; libertos, trabalhadores livre
agrícolas nacionais e imigrantes pela Lei de Locação de Serviços; e trabalhadores
urbanos pelo Código Comercial”. Nos municípios havia também os Códigos de
Posturas que regulavam as relações, tanto com escravos, como com homens livres
37
. Com
34
Lei nº 2040 de 28 de setembro de 1871. Atribuía a condição de “livres” aos filhos das escravas nascidos a
partir de sua vigência, ressalvando, porém, que ficariam sob a guarda e poder do senhor de suas mães até 8
anos completos, quando tais senhores poderiam optar por entregá-los ao Estado mediante indenização de
600$000 ou, então, por usar seus trabalhos até completarem 21 anos. No entanto, cercava-os de certa
proteção na medida em que atribuía a estes senhores algumas obrigações, como a de criá-los e tratá-los até
os 8 anos completos. Previa, ainda, que antes dos 21 anos completos a prestação dos serviços poderia
cessar por sentença de juízo criminal reconhecendo maus tratos e castigos excessivos. (BRASIL, Lei 2040,
1871)
35
Com recursos angariados por meio de impostos sobre escravos, tributos sobre a propriedade na
transferência de escravos, rendimentos de loterias, multas e recursos definidos no orçamento geral e das
províncias e municípios.
36
O fundo privilegiaria as famílias, depois os cônjuges escravos de diferentes senhores e, na seqüência, os
que tivessem filhos nascidos livres.
37
No Rio Grande do Sul, por exemplo, no período entre 1887 e 1889, cerca de dezoito Câmaras Municipais
inscreveram nos Códigos de Posturas regras dirigidas aos escravos “libertos estabelecendo, sobretudo,
mecanismos de vigilância sobre suas condutas. O primeiro que se tem notícia é o de Pelotas, região das
charqueadas. Em Porto Alegre, lei municipal de janeiro de 1888 fez incluir 11 artigos a uma lei municipal
anterior, de janeiro de 1884, reportando-se àquela lei de Pelotas. Segundo este regramento, os criados são
87
o fim da escravidão, as primeiras perdem a razão de ser, e logo a seguir, durante a
República, em 1890, a lei de 1879 é revogada
38
, instaurando, em tese a “liberdade do
trabalho” e a greve pacífica passa a ser permitida. Apenas o Código de Comércio
continuou vigendo (BARBOSA, 2003).
Nos primeiros anos da República, todavia, algumas medidas de caráter social
foram tomadas, como regras destinadas à assistência à infância na Capital Federal
39
e à
criação de Bancos Operários para a construção de moradias
40
e normas direta ou
indiretamente destinadas aos trabalhadores.
Durante a gestão de Demétrio Ribeiro na pasta da Agricultura, nos primeiros anos
da República ainda durante o governo provisório, foram criados alguns direitos para
categorias específicas, que visavam a dar melhores condições de vida e trabalho a
trabalhadores, especialmente de fábricas. Entre tais medidas destacam-se 15 dias de férias
aos funcionários e diaristas que trabalhavam no Ministério; aposentadoria aos
empregados da Central do Brasil
41
; extensão da aposentadoria aos empregados em outras
ferrovias
42
; e, em janeiro de 1891, regulamentação do trabalho dos menores nas fabricas
da Capital Federal
43
.
No âmbito estadual, os governos poderiam legislar residualmente sobre a questão
social por meio dos Códigos Sanitários. Foi assim, por exemplo, que o Código Sanitário
do governo estadual de São Paulo proibiu, em 1894, o trabalho de menores de 10 anos
e vetou o trabalho noturno a jovens com idade inferior a 18 anos.
Com relação à imigração, na Constituição de 1891 o governo federal passou a ter
de incentivá-la, mas os estados poderiam atraí-la conforme seus interesses. Neste sentido,
o estado de São Paulo aprimorou seu serviço de imigração para suprir o déficit de mão-
de-obra nas fazendas de café devido ao fim da escravidão, aumentando o financiamento
os indivíduos livres, de ambos os sexos, que, mediante salário mensal, se empreguem de cocheiro, copeiro,
cozinheiro, pajem de ama-de-leite e ama-seca (BIAVASCHI, 2005).
38
Decreto 1162, de 12 de dezembro de 1890. (BRASIL, Decreto 1162, 1890).
39
Decreto 439, de 31 de maio de 1890. (BRASIL, Decreto 439, 1890).
40
Decreto 843, de 11 de outubro de 1890. (BRASIL, Decreto 843, 1890).
41
Decreto 221, de 26 de fevereiro de 1890. (BRASIL, Decreto 221, 1890).
42
Decretos 405 e 565, de 1890. (BRASIL, Decretos 405 e 565, 1890).
43
Decreto 1.313, de 17 de janeiro de 1891. (BRASIL, Decreto 1.313, 1891).
88
estatal: entre 1889 e 1893, 94% dos imigrantes que ingressaram no estado de São Paulo
eram subsidiados.
Todavia, as péssimas condições impostas aos colonos, com os baixos salários
reduzidos por multas; a impontualidade e as fraudes nos pagamentos, confiscos, pesos e
medidas ilegais, os endividamentos nos armazéns das fazendas assim como a disciplina
coercitiva e a violência física levaram à promulgação do Decreto Prinetti, em 1902, pelo
qual o governo italiano proibiu a emigração subsidiada para São Paulo. Mesmo sendo
freqüentemente burlada, a medida reduziu consideravelmente a entrada de italianos, e, a
partir de então, a procura direcionou-se para as fontes ibéricas. Em 1910, porém, o
governo espanhol seguiu o exemplo italiano, do que resultou uma ampliação da entrada
de portugueses e, posteriormente, de japoneses.
Após tais medidas, o governo federal e alguns governos estaduais tomaram
medidas no sentido de dar mais garantias aos colonos. Dois decretos federais, de 1904 e
de 1906, procuraram assegurar a precedência dos salários dos colonos em relação a outras
dívidas no caso de falência dos fazendeiros e um, de 1903
44
(regulamentado em 1907),
facultou a organização de trabalhadores da agricultura e das indústrias rurais para a
defesa de seus interesses. E, nos estados, foram criadas, a partir de dezembro de 1906, da
Agencias Oficiais de Colonização e Trabalho, cujo papel era vistoriar o cumprimento dos
contratos de trabalho entre os fazendeiros e colonos; e posteriormente, em 1911, do
Patronato Agrícola, agência de mediação encarregada de resolver os conflitos trabalhistas
no campo, que permitia uma imposição mais decisiva do governo estadual.
Além disso, em 1907
45
, os contratos de trabalho tornaram-se escritos, devendo ser
expressos na caderneta agrícola que discriminava as condições de concessão de
moradia, de plantio de terra e contabilizava os pagamentos e oficialmente registrados
pela Agência de Colonização, o que introduziu uma maior proteção de salários, definidos
como crédito privilegiado. As ações judiciais por cobrança dos salários seriam
patrocinadas pelo setor público, dois anos após a chegada dos colonos no Estado. Além
44
Decreto 979, de 6 de janeiro de 1903. (BRASIL, Decreto 979, 1903).
45
Decreto 1.150, de 5 de janeiro de 1904 (BRASIL, Decreto 1.150, 1904), modificada pela Lei 1.607, de
29 de dezembro de 1906 (BRASIL, Lei 1.607, 1906).
89
disso, os fazendeiros que não mantivessem as cadernetas atualizadas seriam punidos,
tornando-se as ações judiciais extensivas a todos os trabalhadores.
No mesmo ano, a legislação que previa a sindicalização dos operários urbanos
46
também seria aprovada. Os sindicatos não necessitavam de aprovação do governo, sendo
a direção sindical limitada a brasileiros natos ou naturalizados com residência no país por
mais de cinco anos.
Em 1916 foi criado o digo Civil Brasileiro
47
, que passaria a vigorar em 1917.
Nele constavam regulamentações sobre a locação de serviços, que legislava tanto sobre
serviços em geral como, especificamente, agrícolas e instituiu o aviso prévio; e parceria
rural, tanto agrícola quanto pecuária.
No ano de 1917, houve um fenômeno de greves operárias generalizadas por todo
o país. A partir de então, segundo Barbosa (2003), instaurar-se-ia, progressivamente, uma
mudança no campo de contato político entre trabalhadores, industriais e o Estado.
A discussão dos direitos sociais coletivos passa a figurar na agenda
estatal, nos jornais da grande imprensa, nos artigos de ensaístas, nas
revoltas tenentistas e no cálculo dos empresários, deixando para sempre
o espaço restrito das assembléias operárias. (BARBOSA, 2003, p. 267)
Neste sentido, destaca-se a criação Comissão de Legislação Social na Câmara dos
Deputados
48
, no ano seguinte, incumbida de examinar todas as iniciativas legislativas no
campo do trabalho; e a aprovação da legislação concernente aos acidentes de trabalho
49
,
que estabelecia a responsabilidade potencial do empregador em 1919
50
. Biavaschi (2005)
destaca o fato de que a ampliação das discussões acerca das normas de proteção ao
trabalho no período foi impulsionada tanto pela Conferência de Paz, em Versalhes; como
pela organizada por Rui Barbosa no Rio de Janeiro para tratar da Questão Social, de
46
Decreto Legislativo 1.637, de 5 de janeiro de 1907. (BRASIL, Decreto Legislativo 1.637, 1907)
47
Lei 3.071, de 1º de janeiro de 1916. (BRASIL, Lei 3.071, 1916).
48
18 de novembro de 1918.
49
Lei 3.724, de 15 de janeiro de 1919. (BRASIL, Lei 3.724, 1919).
50
Porém, até 1924, o trabalhador acidentado deveria entrar com inquérito policial para obter sua
indenização. Ao invés de se assumir o acidente como inerente ao processo de trabalho, e como custo
integrante da acumulação industrial, esse surge no âmbito dessa lei mais como privilégio social
(BARBOSA, 2003).
90
forma que, em outubro, foi criado o Departamento Nacional do Trabalho
51
para fiscalizar
a aplicação das leis do trabalho (embora ineficaz).
Em 1923, foi criada a Caixa de Aposentadoria e Pensão para empregados das
empresas de estradas de ferro, pioneira no financiamento de aposentadoria no país, e
concedida estabilidade ao trabalhador com mais de dez anos “de casa” para os mesmos.
A partir de então, outras companhias passaram a tomar as mesmas medidas, expandindo
o sistema rapidamente entre trabalhadores urbanos. Em 1925, uma lei
52
assegurou aos
empregados em estabelecimentos comerciais, industriais, bancários e jornalísticos um
período de férias de 15 dias. Em 1926, uma emenda à Constituição de 1891
53
deu ao
Congresso Nacional o direito de legislar sobre o trabalho, antes atribuído aos estados
Federados, abrindo espaço para a criação de uma legislação trabalhista em âmbito federal.
Até o golpe de 1930, ainda outras legislações específicas e esparsas foram introduzidas.
Deve-se notar, todavia, que todos estes pequenos avanços no que concerne a legislação
trabalhista durante a Primeira República, assim como o crescimento da organização dos
grupos de trabalhadores e de suas demandas foram essenciais para o desenvolvimento das
regras formais amplas e de caráter nacional consolidadas durante o governo Vargas.
Portanto, durante o período, a maior parte dos trabalhadores ainda estava
concentrada na área rural, embora ocorresse um rápido crescimento do emprego
urbano. As relações de trabalho mostravam configurações bastante diversas entre as
regiões, de forma que não é possível ainda falar de um mercado de trabalho nacional,
apenas de mercados de trabalho fragmentados regionalmente e incompletos. Os
trabalhadores imigrantes eram preferidos aos nacionais, formando a maior parte da
mão-de-obra nas regiões mais ricas, de forma que os nacionais e ex-escravos eram
marginalizados. Mais organizados, os imigrantes alcançaram mais cedo a formulação de
algumas regras de regulamentação do trabalho no campo. A legislação social avançava
de forma desequilibrada, e esparsa, por categorias e principalmente nos setores
secundário e terciário, respondendo à crescente organização livre dos trabalhadores.
51
Decreto 3.550, 16 de outubro de 1918. (BRASIL, Decreto 3.550, 1918)
52
Lei 4.982, de dezembro de 1925, a chamada Lei de Férias.(BRASIL, Lei 4.982, 1925)
53
Artigo 32, n. 28, da Reforma Constitucional de 1926. (BRASIL, EMC 1, 1926)
91
Todavia, ainda não havia uma estrutura institucional de imposição de regras
trabalhistas.
3.2.4 Sistema Educacional
A estrutura educacional no Brasil desde a Colônia possuía forte base religiosa,
uma vez que as primeiras escolas, assim como as bases, estrutural e funcional das
mesmas foram implantadas pelos padres jesuítas, com um primeiro intuito de catequizar a
população indígena. Assim, a escola se apresentava como um meio de reprodução de
valores católicos portugueses. Segundo Oliveira (2004)
Sem a concorrência do protestantismo e com as injunções políticas e
econômicas da condição colonial, a educação jesuítica reproduziu no
Brasil o espírito da Idade Média, com o aprisionamento do homem ao
dogma da tradição escolástica, a sua submissão à autoridade e à rígida
ordenação social, avesso ao livre exame e à experimentação. Em
contraste, portanto, ao homem de livre-pensamento, de visão igualitária e
espírito associativo, confiante no conhecimento como instrumento de
transformação do mundo natural. (OLIVEIRA, 2004, p. 947)
Em 1759, as reformas pombalinas, visando a recuperar o atraso da metrópole
lusitana em relação a outros países europeus, buscavam a abertura do ensino às ciências
experimentais, tornando-o mais prático e utilitário. Tais reformas tentaram extinguir o
sistema educacional jesuíta, expulsando a Companhia de Jesus do Brasil. Em
substituição, o Estado assumiria a educação, porém “[...] os mestres leigos das aulas e
escolas régias, recém-criadas, se revelaram incapazes de assimilar toda modernidade que
norteava a iniciativa pombalina.” (OLIVEIRA, 2004 p.948). A formação de professores
acabou continuando tarefa da igreja católica, de forma que as características da educação
colonial foram mantidas. Apenas com a chegada da família real ao Brasil, em 1808 é que
pode ser verificada alguma transformação do ensino no Brasil, com o surgimento dos
primeiros cursos superiores
54
.
54
Dentre eles, distinguiam-se a Academia Real da Marinha e a Academia Real Militar (depois
transformada em Escola Militar de Aplicação), que formavam engenheiros civis e preparavam a carreira
das armas. Já os cursos médico-cirúrgicos do Rio de Janeiro e da Bahia foram o embrião das primeiras
92
Durante o Império, em 1834, o ensino foi descentralizado, e as províncias
passaram a ter direito de legislar sobre instrução pública primária e secundária e instituir
estabelecimentos próprios. O poder central continuava responsável pela educação de
nível superior
55
. A falta de recursos das províncias, entretanto, relegou o ensino primário
ao quase total abandono, e o secundário, à iniciativa privada (principalmente religiosa).
Assim, no final do Império, havia poucas escolas primárias, liceus provinciais nas
capitais, colégios particulares nas principais cidades, alguns cursos normais e cursos
superiores. Entre os cursos superiores, predominava o ensino jurídico
56.
Considerando o
abandono do ensino básico, comparado a abundância de cursos de direito, percebe-se a
incoerência de tal estrutura. Este quadro, que se manteria ainda durante a República,
mostra como as desigualdades sociais se refletiam na educação, e, ao mesmo tempo,
através dela, se fortaleciam:
O fato mais digno de significação do ponto de vista cultural nesse
período é o que se chamou de bacharelismo, no pior sentido,
significando a mania generalizada entre os respectivos pais, de formar o
filho, dar-lhe de qualquer modo um título de doutor. [...], pois ser
doutor era, senão um meio de enriquecer, certamente uma forma de
ascender socialmente. Ao doutor abriam-se todas as portas, e,
principalmente, os melhores cargos no funcionalismo. [...] éramos um
país de doutores e analfabetos.
(BASBAUM, 1962 apud RIBEIRO,
1998, p. 89, grifos do autor)
A reforma eleitoral de 1882 (Lei Saraiva), que derrubou a barreira da renda, mas
proibiu o voto do analfabeto (critério mantido pela Constituição Republicana), trouxe à
tona o problema do grave analfabetismo no país, em um momento em que esta questão
ganhava importância nos países centrais, com a divulgação de índices para vários países
do mundo. O Brasil ocupava a pior posição em 1890, com 85,21% de analfabetos
(CLARK, 2006).
A República foi proclamada embasada por ideais liberais e positivistas. Segundo
Ribeiro (1998), ambas ideologias possuíam como ponto comum em seus programas de
Faculdades de Medicina. Assinala-se ainda a presença da Missão Cultural Francesa, que possibilitou a
criação da Real Academia de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil, em 1820.
55
E também pelo Colégio Pedro II, que deveria servir de modelo às escolas provinciais.
56
Para se ter uma idéia da predominância do ensino jurídico sobre os demais ramos, assinala-se que em
1864, nas duas faculdades de Direito, estavam matriculados 826 alunos, contra 294 em medicina, 154 em
Engenharia (Escola Central) e 109 na Escola Militar e de Aplicação.
93
ação a crença na educação como chave dos problemas fundamentais do país
57
. Desta
forma, como explicitado por Magalhães (2006), durante o período republicano, em nível
nacional, parece terem sido os positivistas, como Benjamin Constant, que “pensaram” a
Educação e efetivaram as reformas educacionais. as leis educacionais dos estados
foram preparadas e organizadas principalmente por ideários liberais, como o de Francisco
Campos, entre 1890 e 1896, em São Paulo.
A Constituição de 1891 manteve a descentralização e o ensino público leigo. Ao
Congresso Nacional competia privativamente, legislar sobre o ensino superior na capital,
e não privativamente, criar instituições de ensino superior e secundário nos estados e
prover a instrução secundária no Distrito Federal. Aos estados e Municípios, portanto,
caberiam o ensino primário e o profissional (que compreendia, na época, as escolas
normais de nível médio para moças e as escolas técnicas para rapazes), embora não
ficasse explícito na carta constitucional.
A vitória dos princípios federalistas, que consagrou a autonomia dos poderes
estaduais fez com que o governo federal, reservando-se uma parte da tarefa de
proporcionar educação à nação, não interferisse de modo algum nos direitos de
autonomia reservados aos estados na construção de seu sistema de ensino. As grandes
disparidades econômicas e de poder entre os estados, evidenciadas nas instituições
políticas republicanas, faziam com que tal autonomia agravasse ainda mais as
desigualdades regionais, também no plano educacional, aprofundando a distância que
existia entre os sistemas escolares estaduais. Os estados com poder econômico e político
possuíam recursos para equipar o aparelho educacional, enquanto os mais pobres
econômica e politicamente, não, de forma que nos primeiros, como São Paulo, percebe-se
certo desenvolvimento da educação neste período, todavia, nos demais, a educação
mantêm-se a mesma da Colônia e do Império.
57
E também: abolição dos privilégios aristocráticos, separação da Igreja e do Estado, instituição do
casamento e do registro civil, secularização dos cemitérios, abolição da escravidão, libertação da mulher
para, através da instrução, desempenhar seu papel de esposa e mãe (RIBEIRO, 1998, p. 65).
94
3.2.4.1 Reformas Institucionais da Educação
Durante o período de 1889 a 1925 várias reformas educacionais foram
promovidas com o objetivo de melhor estruturar o ensino
58
, principalmente no que se
refere ao nível superior (que era responsabilidade federal). No que tange aos níveis
primário e secundário, devemos considerar a descentralização constitucional do ensino,
ou seja, que tais reformas foram implantadas apenas regionalmente. Até a década de
1920, porém, as reformas não trouxeram mudanças significativas, de forma que, como
considerado por Azevedo (1964 apud MAGALHÃES, 2006),
[...] do ponto de vista cultural e pedagógico, (a República) não vingou:
foi uma revolução que abortou e que, contentando-se com a mudança
do regime não teve o pensamento ou a decisão de realizar uma
renovação intelectual das elites culturais e políticas, necessárias às
novas instituições democráticas (AZEVEDO, 1964 apud
MAGALHÃES, 2006, p. 5).
a década de 1920 destaca-se por diversas reformas educacionais, que visavam
implantar novos sistemas e métodos de ensino, em vários estados
59
, como Ceará, São
Paulo, Bahia, Minas Gerais, Distrito Federal e Pernambuco, e pela reforma Rocha Vaz,
que colocou mais responsabilidade para o governo federal com relação à educação
primária. Por esta razão, é comum que a história da educação no Brasil, para a Primeira
República, seja dividida em dois períodos: até 1920 e após 1920.
Com relação ao primeiro período, segundo Ribeiro (1998), as reformas
revelavam uma grande oscilação entre a influência humanística clássica e a realista ou
científica, que acabava por não alcançar progresso, na prática.
Enquanto uma reforma, com base em determinado modelo, era vista
como solução para os problemas apresentados pelo outro modelo, os
problemas reais agravavam-se e, no dia-a-dia escolar, profissionais e
alunos ‘solucionavam como podiam’, isto é, improvisadamente e,
58
Reforma Benjamin Constant (1890), Código Epitácio Pessoa (1901), Reforma Rivadávia Corrêa (1911),
Reforma Carlos Maximiliano (1915) e Reforma Rocha Vaz (1925).
59
Segundo Niskier (1989) tais reformas ocorreram graças ao trabalho de alguns educadores familiarizados
com as normas colocadas em prática nos países mais cultos da Europa e da América: Lourenço Filho, no
Ceará, e, mais tarde, em São Paulo; Anísio Teixeira, na Bahia; Francisco Campos, em Minas Gerais;
Carneiro Leão, no Distrito Federal e em Pernambuco; Fernando de Azevedo e Sampaio Dória, em São
Paulo (NISKIER, 1989, p. 242).
95
portanto, também de forma deficiente. [...] É assim que o problema do
analfabetismo não pode ser solucionado, ficando muito longe disto, já
que aumentou em números absolutos e, em 1920, 65% da população de
quinze anos e mais era analfabeta. (RIBEIRO, 1998, p. 81)
A primeira dessa série de reformas, a Reforma Benjamin Constant
60
, entre 1890 e
1891, ainda antes da promulgação da carta constitucional, organizou a escola primária em
duas categorias (1º grau, para crianças de 7 a 13 anos e grau para crianças de 13 a 15
anos), a secundária, que passou a ter duração de sete anos e afetou, no nível superior, o
ensino politécnico, o de direito, o de medicina e o militar. Além disso, seguindo
premissas positivistas, especificava que “a instrução primária (seria) livre, gratuita e leiga
[...]” (NISKIER, 1989, p. 186) e visava a substituir a predominância literária pela
científica nos currículos, introduzindo as ciências (matemática, astronomia, física,
química, biologia, sociologia e moral). Esta primeira reforma foi bastante criticada, tanto
pelo fato de ter simplesmente acrescido matérias cientificas ao currículo tradicional,
tornando o ensino enciclopédico, como (pelos próprios positivistas) por não respeitar o
modelo pedagógico de Comte no que diz respeito à idade de introdução dos estudos
científicos.
Segundo Romanelli (1987, p. 42),
Se a Reforma Benjamin Constant teve o mérito de romper “com a antiga
tradição do ensino humanístico”, não teve, porém, o cuidado de pensar a
educação a partir de uma realidade dada, pecando, portanto, pela base e
sofrendo dos males de que vão padecer quase todas as reformas
educacionais que se tentou implantar no Brasil.
Em São Paulo, um decreto do então governador, Prudente de Morais, propôs a
reforma da Escola Normal, mostrando a preocupação com a formação de professores, que
constituía medida básica, visando a estruturar racionalmente o ensino, a começar pela
escola primária, seu primeiro degrau, para daí atingir, mais tarde, os níveis secundário e
superior. Em 1894, foram criados os primeiro Grupos Escolares no mesmo estado, que
reuniram unidades de ensino dispersas
61
. Os alunos eram organizados conforme a idade e
60
Implantada no Distrito Federal, e, portanto, atingia apenas a instrução pública primária e secundária deste
e a instrução superior artista e técnica em todo o território nacional.
61
Decreto Estadual 248, de 26 de setembro de 1894. Até hoje, a expressão “grupo escolar” é usada no
Brasil com referência a escolas elementares que fornecem os quatro primeiros anos de ensino básico.
96
proficiência e organizou-se, pela primeira vez, um programa seqüencial de estudos,
dividido em séries anuais (SOUZA, 1998 apud SCHWARZMAN, 2005) e foi proposta
uma nova estrutura arquitetônica, construída especificamente para comportá-los. Nos
estados que receberam imigrantes, alemães, italianos e japoneses criaram suas próprias
escolas, às vezes com o apoio dos governos de seus países, ou de padres estrangeiros
62
.
Nos demais estados, que não empreenderam reformas, as regras aplicadas ainda eram
praticamente as mesmas do Império.
No Distrito Federal, em 1901, Epitácio Pessoa, retomando princípios humanistas,
acentua a parte literária ao incluir a lógica e retirar a biologia, a sociologia e a moral e
elabora o Código das Instituições Oficiais do Ensino Superior e Secundário. Dez anos
depois, em 1911, a reforma Rivadávia Correia retoma a orientação positivista, tentando
infundir o critério prático ao estudo das disciplinas e a total desoficialização e liberdade
de ensino e de freqüência, abolindo o diploma em favor de um certificado de assistência e
aproveitamento, e transferindo os exames de admissão ao ensino superior para as
faculdades (criou o vestibular), com o objetivo de que o secundário se tornasse formador
do cidadão e não do candidato ao nível seguinte
63
. Tal reforma sofreu tanta oposição, que
quatro anos depois (1915) teve de ser revogada, com uma nova, conhecida como Carlos
Maximiliano, que reoficializou o ensino, reformou o Colégio Pedro II e regulamentou o
ingresso nas escolas superiores.
Alguns autores, como Garcia (2000), sugerem que a Primeira Guerra Mundial e o
decorrente surgimento de algumas indústrias, possibilitado pela falta de suprimento de
Dentre outras iniciativas do Estado de São Paulo no período, destaca-se a criação de várias escolas de
ensino superior e institutos de pesquisa.
62
Antes da guerra, havia cerca de cinco mil professores alemães trabalhando num sistema escolar bem
integrado que se espalhava pelos estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. Em São Paulo, em
1917, havia 37 escolas alemãs e 51 italianas. Os japoneses começaram a chegar em maior quantidade em
meados da década de 1920, e em 1936 havia 310 escolas estrangeiras no estado de São Paulo, das quais
215 eram japonesas (BITTENCOURT,1990 apud SCHWARTZMAN, 2005).
63
Art. 2º - Os institutos, até agora subordinados ao Ministério do Interior, serão, de ora em diante,
considerados corporações autônomas, tanto do ponto de vista didático, como do administrativo.
Art. - O Conselho Superior do Ensino, criado pela presente lei, substituia função fiscal do Estado;
estabelecerá as ligações necessárias e imprescindíveis no regime de transição que vai da oficialização,
completa do ensino, a sua total independência futura, entre a União e os estabelecimentos de ensino.
Art. - Pela completa autonomia didática que lhes é conferida, cabe aos institutos a organização dos
programas de seus cursos, devendo os do Colégio Pedro II revestir-se de caráter prático e libertar-se da
condição subalterna de mero preparatório para as academias. (REFORMA RIVADÁVIA CORREIA, apud
NISKIER, 1989, p. 120)
97
importados, fez com que aumentasse a demanda por operários com alguma qualificação,
o que significava uma maior necessidade de ensino profissional, assim como houve uma
maior percepção da necessidade de um nível mínimo de alfabetização de tais
trabalhadores, o que exigia a ampliação da oferta de ensino básico. Niskier (1989)
acredita que a Guerra alterou profundamente as influências estrangeiras sobre o Brasil,
que trocou a preponderância européia (francesa, suíça e alemã) sobre o ensino pela anglo-
americana. Além disso, a contribuição de pedagogos de diferentes países permitiu
delinear novos métodos e princípios no campo da educação que, em conjunto, tomariam a
denominação de Escola Nova.
Em 1918, o governo federal toma algumas medidas de aperfeiçoamento do ensino
profissional, aprovando novo regulamento das Escolas de Aprendizes e Artífices. Na
verdade, o ensino profissional vinha se desenvolvendo no Brasil desde o governo Nilo
Peçanha, quando foi determinada a criação de escolas profissionalizantes (escolas de
aprendizes artífices) gratuitas em todas as capitais do país. Todavia, o regulamento de
1918 veio a melhorar a qualidade destes estabelecimentos.
Em 1920, o governo federal cria a Universidade do Rio de Janeiro e passa a
conceder créditos especiais destinados à manutenção de escolas públicas primárias nos
núcleos coloniais do Paraná, de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul
64
. Diversas outras
medidas relacionadas à cultura e à educação são tomadas no período e, em 1924,
percebendo a desatualização de muitos dispositivos da legislação então vigente, elabora
um novo regulamento, estabelecido com a Reforma Rocha Vaz, que deu
responsabilidades também à União para a difusão do ensino primário, eliminou os
exames preparatórios e parcelados, ainda vigentes e herança do Império, organizou o
Departamento Nacional de Ensino e reformou o ensino secundário e superior.
64
Era necessário reduzir a influência dos estabelecimentos particulares nos quais o ensino em alemão ou
italiano – deixava em segundo plano a língua portuguesa.
98
3.2.4.2 A Estrutura do Ensino
Com relação ao ensino primário, a mudança institucional que parece mais
relevante para o período está relacionada à criação dos grupos escolares. Quando da
proclamação da República, o tipo comum de escola primária era a de um professor e uma
só classe, congregando alunos de vários níveis. Pouco tempo depois, esta realidade
começa a ser transformada no estado de São Paulo, onde são criados os primeiros Grupos
Escolares. A partir daí, outros estados também começam a adotá-los paulatinamente.
Todavia, deve-se observar que esta mudança apenas iniciou nesta época (de fato, até hoje
podemos encontrar escolas com as características do início da República em cidades
pequenas do Brasil), e a oferta de vagas no ensino primário manteve-se muito inferior ao
necessário, de forma que o número de analfabetos manteve-se muito elevado.
A precariedade do nível de ensino devia-se tanto ao fato deste ser
responsabilidade dos estados e municípios, que, em sua maioria, por não possuírem uma
produção significativa voltada para exportação, praticamente não possuíam renda, como
pela própria questão da formação de professores, que poderia ser equacionada pelo
secundário, mas não foi resolvida durante todo o período da Primeira República. Vale
notar que a Reforma Benjamin Constant (1890) reforçava a exigência do diploma do
Curso Normal para o magistério do ensino primário, mas até a década de 30 nada de
concreto foi realizado para a ampliação dos cursos de formação de professores primários.
Com relação ao ensino secundário, este ficou bastante abandonado durante o
período, que a União, embora pudesse criar escolas de nível secundário nos estados,
compartilhava tal obrigação com os mesmos, sendo responsável, apenas, por manter o
Colégio Pedro II, no Distrito Federal. Os estados, por sua vez, tinham como obrigação,
apenas a manutenção de um ginásio-modelo nas suas capitais, os quais se submetiam às
diretrizes curriculares do colégio do Distrito Federal. Devido a isto, a oferta acabou
ficando, em boa medida, função das organizações privadas, principalmente religiosas.
Ribeiro (1998) destaca que, se ocorreu alguma ampliação de vagas no vel secundário
durante a Primeira República, ela se deu no ensino particular. A falta de escolas
primárias, o problema da evasão, o fato das escolas secundárias serem
99
predominantemente pagas, assim como o valor das taxas, selos e contribuições exigidas
para a freqüência dos alunos, que acabavam por fazer dos próprios estabelecimentos
públicos instituições privadas, geravam uma seleção intensa e davam caráter elitista a
este nível e, portanto, também ao ensino superior.
A opção que existia para os indivíduos que não faziam parte da elite eram as
escolas de ofícios (o ensino profissionalizante). Diferentemente da escola secundária,
preparatória para os cursos superiores profissionais, essas escolas eram voltadas
diretamente para os proletários e para as classes menos favorecidas
65
. Embora ainda em
quantidade insuficiente, considerando o tamanho da população, tais escolas foram
expandidas ao longo da Primeira República, principalmente durante o governo Nilo
Peçanha, com a criação de uma escola de aprendizes e artífices por capital do país
66
.
Além disso, após a I Guerra, em 1919, foi incorporada a Escola Normal de Artes e
Ofícios Wenceslau Brás, destinada a formar professores para as escolas de aprendizes
artífices, o que proporcionou uma melhora de qualidade a este nível de ensino. Além
disso, entre outras reformas deste nível, destaca-se a criação de cursos noturnos de
aperfeiçoamento, isto é, para trabalhadores que durante o dia desenvolviam sua atividade
profissional, à noite lhes eram ofertados os cursos de desenho e do ensino primário, com
o objetivo de melhorar o resultado do trabalho.
Um maior desenvolvimento destas escolas, todavia, como sugerido por Romanelli
(1987), esbarrava tanto na falta de recursos e na escassez de demanda de mão-de-obra
qualificada, devido ao ainda incipiente desenvolvimento industrial do país, como no fato
65
Christófaro (1999, p. 192) mostra como os “considerandos” que justificam o Decreto 7566/1909
retratam a “função” do ensino técnico e o seu “lugar” na sociedade:
considerando que aumento constante da população das cidades exige que se facilite às classes proletárias
e os meios de vencer as dificuldades sempre crescentes da luta pela existência;
considerando que para isto se torna necessário não só habilitar os filhos dos desfavorecidos da fortuna
com o indispensável como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastarão da ociosidade,
escola do vício e do crime;
• considerando que um dos primeiros deveres do governo da República é formar cidadãos úteis à Nação.
66
Decreto 7.566, de 23 de setembro de 1909. Segundo Cunha (2000, p. 94), essas escolas formavam, desde
sua criação, todo um sistema escolar, pois estavam submetidas a uma legislação específica que as distinguia
das demais instituições de ensino profissional mantidas por particulares (fossem congregações religiosas ou
sociedades laicas), por governos estaduais e se diferenciavam até mesmo de instituições mantidas pelo
próprio governo federal. Em suma, as escolas de aprendizes artífices tinham prédios, currículos e
metodologia didática próprios; alunos, condições de ingresso e destinação esperada dos egressos que as
distinguiam das demais instituições de ensino elementar.
100
da população em geral mostrar-se avessa ao ensino técnico, considerado símbolo de
classes dominadas.
A velha mentalidade escravocrata não era privilégio das camadas
dirigentes: era também uma característica marcante do comportamento
das massas que se acostumaram, após três séculos, a ligar trabalho com
escravidão. O povo, principalmente as camadas médias que almejavam
ascender na escala social, afastou logo de si a idéia de educar-se para o
trabalho. Decorreu daí que, malgrado os esforços privatistas das camadas
dominantes, a educação que acabou por expandir-se foi justamente
aquela que representava o próprio símbolo de classe. (ROMANELLI,
1987, p. 44)
Sendo o Brasil uma sociedade estamental e com ampla mentalidade escravista, o
ensino superior afigurava-se, como já destacado, como a melhor forma de ascensão
social, caracterizando o fenômeno do “bacharelismo”, mencionado. Tanto as camadas
médias, que almejavam “virar elite” como a elite oligárquica, que queria manter-se no
poder, pressionavam a ampliação de vagas. Assim, embora o acesso a este nível de
ensino ainda fosse muito reduzido, com apenas 0,05% da população total matriculada,
havia uma ampla concentração de faculdades isoladas no Distrito Federal (que
começaram a ser fundadas com a vinda da família real para aquela cidade e que, em
1920, foram reunidas na Universidade de Rio de Janeiro). Estes cursos, todavia,
formavam muito mais bacharéis em direito do que em qualquer outro curso
67
.
[...] o nosso ensino superior, com as suas escolas e faculdades, não é
mais destinado a formar técnicos de certas e determinadas profissões de
que a sociedade tem ‘precisão’. Os seus estabelecimentos são verdadeiras
oficinas de enobrecimento, para dar títulos, pergaminhos, como o povo
chama os seus diplomas, o que lhes vai a calhar aos bem nascidos ou
pela fortuna ou pela posição dos pais. Armados com as tais cartas, os
jovens doutores podem se encher de várias prosápias e afastar
concorrentes mais capazes. (LIMA BARRETO, 1921 apud LOPES,
2006)
67
Como fica claro na “exposição dos motivos” da reforma de 1915, de Carlos Maximiliano: “para que
cinco academias de direito na capital de um país de analfabetos, na qual se não contam quatro ginásios
excelentes? Em cidade nenhuma do mundo se nos depara semelhante abundancia de cursos superiores. Nos
centros pouco populosos, se acaso uma faculdade existe, não é possível a seleção de pessoal docente: todos
os médicos ou todos os advogados do lugar se tornam professores” (MOACYR, 1942 apud RIBEIRO,
1998, p.85).
101
Em resumo, no período, a situação escolar era a seguinte: cursos secundários
para poucos; nenhum incentivo à formação de professores; poucos recursos para as
escolas públicas; aumento do número de escolas particulares e cursos superiores para
formar bacharéis. Todavia, tal composição não estava em desacordo com as
características predominantes, sociais e econômicas da República Velha.
As lavouras de café, de açúcar e de outros produtos e as atividades extrativas não
exigiam qualquer grau de instrução de sua mão-de-obra (se quer a alfabetização),
tampouco um maior grau de desenvolvimento científico e tecnológico. Todavia, o grande
arranjo político-institucional montado tanto pelo esquema da política dos governadores,
como por toda a burocracia para atender as funções criadas pelo Estado, gerava a
necessidade de formação dos quadros burocráticos, ampliados e diversificados, tanto no
setor público quanto no privado que mantinham um amplo estamento burocrático
(FAORO,1995), o que estimulava, como visto, a criação de universidades para a
formação de bacharéis.
Foi somente quando as bases econômicas e a distribuição do poder começaram a
alterar-se que se começou a pensar uma nova educação para o Brasil. Os movimentos
culturais e pedagógicos da Escola Nova foram o primeiro passo nesse sentido.
3.3 O Ambiente Institucional do Primeiro Período Republicano
O predomínio do café como o principal produto gerador de renda da economia
deu às organizações produtoras um forte poder político de fato, e, com o Pacto
Oligárquico, o poder político jurídico também pôde ser consolidado. Isso permitiu que as
instituições políticas e econômicas do Primeiro Período Republicano se configurassem de
acordo com os interesses destas organizações.
Assim, as Instituições Políticas foram caracterizadas pela ampla dominação
oligárquica em todos os níveis de governo, sustentada, desde suas bases, pelo
coronelismo. O poder era descentralizado, tendo o seu foco nos estados, que possuíam
ampla autonomia. O federalismo era o ponto fundamental destas instituições, mas era um
federalismo desigual, marcado pela hegemonia dos estados economicamente mais fortes
sobre as demais unidades da federação. O regime presidencialista dava poderes limitados
102
ao chefe da nação, que era amplamente controlado pelos partidos regionais dos estados
hegemônicos. Com regras formais importadas, a estrutura política possuía forma liberal,
em acordo com as tendências internacionais. Este liberalismo, no entanto, podia ser
ignorado, quando medidas intervencionistas se fizessem necessárias para atender os
interesses das oligarquias, como a política de valorização do café, por exemplo.
O arranjo institucional econômico também se estruturava de forma a manter o
poder daquelas organizações hegemônicas. Desta forma, o sistema tributário,
caracterizado pela descentralização da distribuição de impostos entre os níveis de
governo, e prevalência dos impostos indiretos, especialmente os sobre comércio exterior,
matinha um forte desequilíbrio financeiro entre estados, de forma que apenas os estados
exportadores eram privilegiados por tal sistema. Todavia, embora a carga tributária fosse
relativamente baixa (em torno de 10% do PIB), o sistema tornava as receitas públicas
altamente vulneráveis a fatores externos. Deve-se notar, todavia, que era muito difícil,
naquele momento, basear-se em tributos sobre a economia doméstica, já que ainda não se
havia configurado um mercado nacional integrado.
Com relação ao sistema monetário, como o Brasil era uma economia amplamente
dependente do comércio internacional, ficava implícita a exigência pela adaptação deste
sistema aos mecanismos básicos de transações internacionais, o que torna clara a
recorrente busca pelo Padrão-Ouro. Porém, esta busca não poderia ser prejudicial às
organizações com maior poder de barganha, de forma que, quando se fazia necessário, o
Padrão-Ouro era abandonado em nome da manutenção das receitas dos cafeicultores.
Quanto ao resto do sistema financeiro, seu desenvolvimento não apresentava
contradições com o poder político vigente, sendo, até mesmo facilitador dos empréstimos
para as políticas de valorização do café. Mesmo assim, se, por um lado, o episódio do
Encilhamento no inicio da República propiciou o desenvolvimento de uma estrutura
institucional bastante avançada para corporações e mercado de capitais; por outro, o
sistema bancário, embora tenha se expandido durante o início da República, reduziu-se
logo a seguir, de forma que se manteve um sistema bancário "inelástico", mas com forte
presença de bancos estrangeiros durante o período. Ademais, embora o Banco do Brasil
tenha recebido algumas funções de banco central, ainda não se configurava como uma
autoridade monetária.
103
O amplo predomínio da produção agrícola na economia, mantinha a maior parte
dos trabalhadores concentrada na área rural, embora, durante o período tenha ocorrido um
forte crescimento do emprego urbano. As relações de trabalho mostravam configurações
bastante diversas entre as regiões, de forma que não é possível ainda falar de um mercado
de trabalho nacional, apenas de mercados de trabalho fragmentados regionalmente e
incompletos. Os trabalhadores imigrantes eram preferidos aos nacionais, formando a
maior parte da mão-de-obra nas regiões mais ricas, de forma que os nacionais e ex-
escravos eram marginalizados. Devido à sua maior organização, os imigrantes
alcançaram mais cedo a formulação de algumas regras de regulamentação do trabalho no
campo. Deste modo, a legislação social avançava de forma desequilibrada, e esparsa,
por categorias e principalmente nos setores secundário e terciário, respondendo à
crescente organização livre dos trabalhadores. Além de não existir um conjunto de regras
trabalhistas para o conjunto dos trabalhadores, ainda não havia uma estrutura institucional
de imposição das poucas e esparsas regras trabalhistas do período.
Ademais de não haver uma estrutura de organização racional para os sistemas
tributário e financeiro e para as regras trabalhistas, não havia uma organização do sistema
educacional, que gerasse trabalhadores qualificados para a atividade econômica. Muito
pelo contrário, o sistema educacional ainda era bastante elitista e o descaso com a
educação bastante evidente. Mas de certo modo, esta organização era conseqüência, por
um lado, da falta de demanda por mão-de-obra instruída pela atividade agrícola, assim
como de qualquer desenvolvimento científico e tecnológico, e de outro, da grande
desigualdade social e do arranjo político-institucional montado tanto pelo esquema da
política dos governadores, como por toda a burocracia para atender as funções criadas
pelo estado, que gerava a necessidade de formação dos quadros burocráticos, ampliados e
diversificados, tanto no setor público quanto no privado que mantinham um amplo
estamento burocrático. Assim, se por um lado havia poucos recursos para o ensino
público básico, nenhum incentivo para a formação de professores e poucos cursos
secundários, por outro, aumentavam as escolas particulares e os cursos superiores para
formar bacharéis, o que reflete o proposto pela NEI, de que dada sua função-objetivo,
uma organização buscará adquirir as habilidades e conhecimentos que aumentem suas
possibilidades da sobrevivência em um contexto de escassez e competição e que,
104
portanto, uma estrutura institucional que estimule atividades produtivas agrícolas, gerará
incentivos para que se busquem conhecimentos nesta área e não para a produção de bens
de consumo duráveis, por exemplo.
Portanto, que as organizações com maior poder de barganha eram os
cafeicultores, eles moldavam as instituições ao seu modo, dificultando a que outros
setores fossem incentivados. Foi necessário que este grupo perdesse força (tanto pela
mudança de preços relativos quando de ideologia no contexto internacional e nacional)
para que outras organizações conseguissem promover uma mudança institucional que
beneficiasse novos setores da economia. Isto está de acordo com a NEI, já que a estrutura
existente de direitos define as oportunidades de maximização de riqueza dos jogadores.
Deste modo, como a função das regras formais é facilitar alguns tipos de trocas, mas não
todas, regras que facilitam algumas trocas enquanto elevam os custos de outras, que
são indesejadas, ou seja, a estrutura institucional deste período facilitava o aumento da
riqueza dos cafeicultores, mas não incentivava outras atividades econômicas, pois as
regras são desenvolvidas, principalmente, em interesse do bem-estar privado (riqueza dos
cafeicultores) e não do social (desenvolvimento econômico nacional).
Com as mudanças de cenário internacional e nacional, o regime anterior de
direitos de propriedade deixou de ser capaz de arbitrar as demandas concorrentes de
maneira eficiente, levando a que organizações se dedicassem a alterar os direitos de
propriedade para uma forma mais propícia à nova realidade. não era mais a mesma a
distribuição de poder de barganha entre as organizações nacionais e com, isso, outros
objetivos puderam ser perseguidos. Para acompanhar tais mudanças, a nova estrutura
institucional passaria por reformas de diversas estruturas como: do sistema tributário,
permitindo maior equilíbrio entre os estados e maior receita para que o Estado pudesse
interferir na economia e promover o desenvolvimento econômico; do sistema financeiro,
gerando um conjunto de regras mais claras e mais disponibilidade de crédito; do sistema
educacional, formando mão-de-obra qualificada para outros setores da economia; das
relações de trabalho, formando um mercado de trabalho nacional, que proporcionaria
mão-de-obra para a indústria e para o comércio e conformaria um mercado consumidor
nacional.
105
4 O PRIMEIRO GOVERNO VARGAS E A FORMAÇÃO DE UMA
NOVA ESTRUTURA INSTITUCIONAL
DESENVOLVIMENTISTA
Nos anos 1930 é inegável que o Brasil passou por uma mudança econômica, assim
como institucional, de grandes dimensões. A riqueza de estudos sobre o período, por mais
diferentes que sejam, deixa clara a importância do mesmo. Os economistas destacam,
especialmente, a virada “para dentro” da produção e o crescimento da participação da
indústria e dos serviços no produto. Todavia, destacam-se também mudanças nas relações
de poder no governo, com a redução do poder dos estados, centralizado na esfera federal,
assim como na própria ideologia e, conseguinte concepção do papel do Estado na
economia.
4.1 Antecedentes
A fim de melhor compreender as mudanças ocorridas durante a década de 1930,
que significaram uma profunda reconfiguração da economia brasileira, precisamos,
primeiramente, conhecer o contexto em que ocorreram estas mudanças. Para tanto, é
interessante fazer uma reconstrução do ambiente político e econômico, tanto externo
como interno, em que o país se inseria, buscando investigar as possíveis mudanças de
preços relativos e de preferências que podem ter determinado a mudança institucional.
Desta forma, antes de caracterizarmos as instituições do Primeiro Governo Vargas,
faremos uma breve contextualização, tanto internacional, marcado por uma mudança de
ideologia quanto ao papel dos Estados e à forma que assumiam as economia nacionais,
como da situação política nacional, que serviu de incentivo e de possibilitador para a
mudança institucional e econômica, e do contexto econômico interno, ou seja, as
mudanças na organização da atividade econômica que tomavam lugar no Brasil.
106
4.1.1 Contexto Internacional
Para que possamos compreender a magnitude da mudança institucional que
ocorreu no Brasil na virada da década de 1920 para 1930 é preciso contextualizá-la
internacionalmente, como parte de uma transformação de dimensões muito mais amplas.
De fato, segundo Polanyi (2000), a estrutura institucional sobre a qual a civilização
ocidental firmava-se durante todo o século XIX acabou de ruir nesta época. A base desta
civilização era formada por quatro instituições, que determinavam os contornos
característicos daquela sociedade: o Sistema de Equilíbrio de Poder, o Padrão-Ouro, o
mercado auto-regulável e o Estado Liberal e não-intervencionista.
Conforme a tese desse autor, no século XIX, viveu-se um fenômeno sem
precedentes nos anais da civilização ocidental, a saber, uma paz que durou cem anos de
1815 (fim das guerras napoleônicas) a 1914 (Primeira Guerra Mundial)
1
. Essa paz foi
devida à emergência de um forte interesse pela mesma, quando os negócios pacíficos
tornaram-se interesse universal, e foi possível graças ao Equilíbrio de Poder
2
então
estabelecido. Quando este equilíbrio de poder foi rompido e substituído por dois
agrupamentos de poder hostis a Tríplice Aliança (Alemanha, Áustria-Hungria e Itália)
de um lado e a Contra Aliança (Inglaterra, França e Rússia) de outro iniciou-se a ruína
daquela civilização.
Após a Primeira Guerra, o único pilar remanescente das bases institucionais da
economia do século XIX era o Padrão-Ouro. Na década seguinte, houve um esforço,
profundamente conservador, de restabelecimento do sistema anterior, associado aos
ideais das revoluções inglesa, francesa e americana. Esta busca centrou-se na restauração
do Padrão-Ouro.
A crença no padrão-ouro tornou-se a religião daquele tempo. [...] a
essencialidade do padrão-ouro para o funcionamento do sistema
econômico internacional da época era o dogma primeiro e único comum
1
Durante os cem anos, na verdade, foram apenas 18 meses de guerras entre as grandes potências.
2
Postula que três ou mais unidades capazes de exercer poder atuarão sempre de forma a combinar o poder
das unidades mais fracas contra qualquer incremento de poder do mais forte.
107
aos homens de todas as nações, de todas as classes, de todas as religiões
e filosofias sociais. Era a única realidade invisível à qual podia se apegar
a vontade de viver, quando a humanidade se encontrava, a braços, ela
mesma, com a tarefa de restaurar sua existência em frangalhos.
(POLANYI, 2000, p. 41-42)
Durante a década de 1920, essa busca de restauração do Padrão-Ouro foi símbolo
de solidariedade mundial. As medidas tomadas acabaram, entretanto, sendo restritivas
quanto ao comercio exterior e a pagamentos externos, estrangulando a liberdade de
comércio, de forma que as nações foram fechando-se em autarquias. O esforço de
salvação do Padrão-Ouro acabou por sacrificar os demais pilares sobre os quais o sistema
que se buscava restaurar mantinha-se.
A derrocada final deveu-se ao trágico colapso do sistema econômico
internacional, que, em 1929, determinou uma seqüência quase ininterrupta de crises
monetárias por todo o mundo, ligado através da conexão elástica de um sistema
internacional de crédito que transmitiu a tensão de moedas imperfeitamente restauradas,
primeiro da Europa Oriental para a Ocidental, depois desta para os EUA. “A América,
num gesto instintivo de libertação, abandonou o padrão-ouro em 1933, desaparecendo,
assim, o último vestígio da economia mundial tradicional.” (POLANYI, 2000, p. 43).
Na década de 1930, a mudança foi abrupta. “Uma destruição completa das
instituições da sociedade do século XIX acompanhou a crise em grande parte do mundo,
e em todos os lugares estas instituições foram modificadas e reformuladas além de todo o
reconhecimento.” (POLANYI, 2000, p. 44). Em muitos países, o Estado Liberal foi
substituído por ditaduras totalitárias e a instituição central do século anterior produção
baseada em mercados livres foi substituída por novas formas de economia. O abandono
do Padrão-Ouro pela Grã-Bretanha, os Planos Qüinqüenais na Rússia, o lançamento do
New Deal, nos Estados Unidos, a Revolução Nacional Socialista na Alemanha, com o
colapso da Liga das Nações em favor de impérios autárquicos, mostravam que estavam
em formação novas bases institucionais para sustentar estas novas formas de economia.
Essas mudanças se refletiram também no Brasil. A crise de 1929 e o fim do
Padrão-Ouro seriam sucedidos pela substituição do Estado Liberal por outro, mais
autoritário e intervencionista e a volatilidade externa, devida à ampla inserção
108
internacional da economia, seria reduzida, com uma “virada para dentro” e melhor
conformação do mercado interno. O novo tipo de Estado e a nova forma da economia
exigiram a reformulação da estrutura institucional interna para poderem se consolidar.
4.1.2 Contexto Político Interno
Após a Primeira Guerra, também no Brasil, a estrutura política começou a ruir. A
década de 1920 foi um período de grande efervescência e profundas transformações. A
crise manifestou-se em diversas áreas e seu resultado final foi um golpe de Estado que
viria impor rupturas drásticas no modelo então vigente. Podemos considerar o ano de
1922 como um marco inicial deste processo.
O ano de 1922, em especial, aglutinou uma sucessão de eventos que
mudaram de forma significativa o panorama político e cultural brasileiro.
A semana de Arte Moderna, a criação do Partido Comunista, o
movimento tenentista, a criação do Centro Dom Vital, a comemoração
do centenário da Independência e a própria sucessão presidencial de
1922 foram indicadores importantes dos novos ventos que sopravam,
colocando em questão os padrões culturais e políticos da Primeira
República. (FERREIRA; PINTO, 2006, p. 1)
A sucessão presidencial indicava um certo esgotamento do modelo político.
Diferentemente das disputas anteriores, em que o consenso em torno de um nome fazia-se
com relativa facilidade, em 1922 a candidatura de Arthur Bernardes foi contestada pelas
oligarquias dos estados “de segunda grandeza” aquelas que não tinham o direito de
indicar um candidato a presidente, como Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia e Rio
Grande do Sul, que articularam um movimento que ficaria conhecido como Reação
Republicana, lançando uma candidatura de oposição à presidência (Nilo Peçanha). Como
estratégia, tal grupo buscou a aproximação com os setores urbanos em crescimento e,
principalmente, com os grupos militares, através da crítica à posição secundária que lhes
vinha sendo atribuída pelo governo federal.
Como o resultado era controlado pela máquina oficial, ele foi o esperado: a vitória
foi dada a Bernardes. Diferentemente do que ocorreu em momentos anteriores, porém, a
109
oposição não reconheceu a derrota e iniciou uma campanha visando, de um lado, manter
a mobilização popular, e, de outro, aprofundar o processo de acirramento dos ânimos
militares
3
. Poucos meses depois, a Reação Republicana estava totalmente
desarticulada, mas os militares passaram a dar cada vez mais demonstrações de que
estavam efetivamente dispostos a tomar atitudes para mudar o regime, e as possibilidades
de subversão da ordem e de intervenção militar tornaram-se cada vez mais concretas.
O primeiro ato desse movimento, dando inicio ao chamado movimento
tenentista
4
, foi o levante militar, de julho de 1922, que ficou conhecido como Dezoito do
Forte de Copacabana. O movimento, que tomou proporções nacionais, empolgou amplos
setores da sociedade da época, desde segmentos oligárquicos dissidentes aos setores
urbanos (camadas médias e a classe operária das cidades).
Dois anos mais tarde um novo movimento eclodiria em São Paulo, o chamado 5
de Julho. Mais bem articulado, este movimento tinha como objetivo a derrubada do
governo de Arthur Bernardes. Em principio instalados na capital paulista, os tenentes
acabaram por deslocar-se para o interior do estado, fixando-se, a seguir, no Oeste do
Paraná onde encontrariam os tenentes provenientes do Rio Grande do Sul. Em abril de
1925 as duas forças juntaram-se, dando origem à Coluna Prestes
5
, momento culminante
das revoltas tenentistas e episódio mais importante da saga dos tenentes.
Os tenentes combatiam as oligarquias que haviam dividido o país em “vinte
feudos”, e, embora ainda com idéias muito vagas, as propostas políticas dos tenentes, de
uma maneira geral, vinculavam-se ao clima do pós-Primeira Guerra Mundial, marcado
pelo avanço do nacionalismo e da centralização política. Defendiam propostas como a
reforma da Constituição, a limitação da autonomia local e um estado mais forte, a
3
Ao longo de todo o primeiro semestre de 1922, e, em especial, após as eleições, a imprensa pró-Nilo
assumiu uma postura panfletária, denunciando diariamente as punições e transferências sofridas pelos
tenentes antibernardistas. Além de denunciar as perseguições feitas pelos bernardistas aos militares, as
lideranças da Reação Republicana radicalizavam suas posições, abrindo espaço para a possibilidade de
intervenção armada na decisão do conflito político.
4
O tenentismo recebeu esta denominação uma vez que teve como principais figuras não a cúpula das forças
armadas, mas oficiais de nível intermediário do Exército – os tenentes e os capitães. O alto comando militar
do Exército manteve-se alheio a uma ruptura pelas armas, assim como a Marinha.
5
Organizada sem que um plano tivesse sido previamente traçado, com seus 1500 homens, percorreu cerca
de 25 mil quilômetros, atravessando 13 estados brasileiros, propagando a revolução e o levante da
população contra as oligarquias, até que seus remanescentes dirigiram-se para a Bolívia e para o Paraguai.
110
moralização dos costumes políticos, com o voto secreto e a independência e unificação da
justiça, assim como a unificação do ensino, do regime eleitoral e do fisco (PRESTES,
1997 apud FERREIRA; PINTO, 2006).
Os movimentos tenentistas foram combatidos, tanto pelo governo, como por
outras correntes no interior do Exército, que defendiam a legalidade e a
profissionalização. Porém, muitos oficiais passaram a ser favoráveis a uma intervenção
na vida política do país pela própria instituição militar, representado pelo seu Estado
Maior (e não por um grupo ou facção), se fosse constatada grave ameaça à organização
nacional. Devido à perseguição, muitos tenentes exilaram-se, voltando no final da década
de 1920 para o Brasil, quando consideravam que a hora da Revolução havia chegado.
A situação política, após um curto período de tranqüilidade, durante o governo
Washington Luís, voltou a ficar tensa quando o presidente indicou para a sua sucessão o
paulista Júlio Prestes, e não, como se esperava, o mineiro Antônio Carlos. O rompimento
do pacto entre Minas e São Paulo fez com que fosse formada uma chapa oposicionista
com apoio da oligarquia Mineira. A Aliança Liberal lançou as candidaturas do gaúcho
Getúlio Vargas para a presidência e do paraibano João Pessoa para a vice-presidência.
Embora a candidatura oposicionista tenha crescido bastante durante o período,
novamente apelando para os setores urbanos, o resultado, novamente, como esperado, foi
a vitória da candidatura oficial. Como em 1922, as denúncias de fraude ganharam a
imprensa, e grupos oposicionistas civis e militares começaram a conspirar. Todavia e
diferentemente daquele ano, a tensão manteve-se, e o desfecho foi a derrubada de
Washington Luís na Revolução de 1930.
Como destacado por Fonseca (1989), as forças políticas que constituíram a
Aliança Liberal políticos civis tradicionais, descontentes com o situacionismo e com a
imposição, por parte de Washington Luís, do paulista Júlio Prestes para sucedê-lo não
eram exatamente as mesmas que empreenderam o levante armado de outubro de 1930,
que, sem o apoio das forças armadas, dificilmente se consolidaria.
À medida que parte dos políticos tradicionais negava apoio ou preferia
omitir-se, os que propugnavam pelo levante aproximavam-se dos
quartéis e dos ‘tenentes’, mesmo com os que estavam ainda no exílio.
Assim a composição de forças articuladoras da Aliança Liberal
111
começava a alterar-se, e a presença dos militares seguiu crescente, de
importância fundamental por ocasião do movimento armado, na posse do
governo e em seus primeiros anos. (FONSECA, 1989, p. 130)
Após a Revolução, os tenentes ganharam papel de destaque no governo
provisório, recebendo cargos federais e sendo nomeados interventores, especialmente nos
estados considerados estratégicos (como São Paulo). Este grupo buscava com o golpe não
apenas uma mera troca de cadeiras entre os grupos oligárquicos, mas uma verdadeira
transformação do Estado. Com idéias mais sólidas do em 1922, eram favoráveis a um
governo centralizador, intervencionista e reformista, defendendo medidas como a
centralização do sistema tributário, o fortalecimento das Forças Armadas, a federalização
das milícias estaduais, a criação de uma legislação trabalhista e a modernização da infra-
estrutura do país. Do ponto de vista político, aprovavam a centralização do poder nas
mãos de Vargas, como forma de promover mudanças na vida política e econômica.
4.1.3 Contexto Econômico Interno
A década de 1930 destaca-se pela grande inflexão que ocorreu nas taxas de
crescimento da indústria durante o período (Gráfico 4.1), a qual possibilitou uma
verdadeira transformação na dinâmica de toda a economia: o Brasil deixaria de ser um
país exclusivamente agroexportador, passando a dinâmica a ser dada pela produção
industrial, voltada, principalmente, para o mercado interno.
A Grande Depressão de 1929 teve grande impacto sobre a economia e, em especial,
sobre o seu setor dinâmico, da agricultura de exportação, o que fez com que houvesse
queda do PNB e da renda nacional em níveis absolutos nos anos 1930-32. O preço do
café, não obstante a política de valorização, em 1931 foi de apenas um terço dos níveis
alcançados nos anos 1925-29, de forma que as relações de troca foram reduzidas à
metade. O valor das exportações caiu de US$ 445,9 milhões, em 1929, para US$ 180,6
milhões, em 1932. O uso de controles de câmbio e de outros controles diretos, combinado
com a depreciação da moeda, encareceu o preço interno dos bens importados,
provocando a queda das importações do nível de US$ 416,6 milhões, em 1929, para US$
112
108,1 milhões em 1932 e permitindo a redução do impacto negativo no balanço de
pagamentos (BAER, 1966).
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
1
9
0
0
1903
1906
1909
1912
1
9
1
5
1918
1
9
2
1
1924
1
9
2
7
1930
1933
1
9
3
6
1939
1
9
4
2
194
5
Indústria Agricultura
Gráfico 4.1: Evolução do produto agrícola e industrial no Brasil: 1900 a 1946
Fonte: Elaborado pela autora, com base nos dados do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas - IPEA
(2007).
Nota: Metodologia conforme HADDAD, Cláudio Luiz da Silva. Crescimento do produto real no Brasil,
1900-1947. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1978.
(1) PIB - indústria - índice (média 1900 = 100)
(2) PIB - agricultura - índice (média 1900 = 100)
Após os três difíceis primeiros anos da década de 1930, em 1933, mesmo com o
estrangulamento externo, a economia começava a recuperar-se, sob a liderança do setor
industrial, que cresceu 11,2% anuais entre 1933-1939, enquanto a agricultura alcançava
pouco mais de 2% entre 1934-1937. A expansão industrial compensou a estagnação da
agricultura, causada, basicamente, pela crise do café. No período, a taxa média de
crescimento da economia ficou em torno de 6%, todavia, em termos de renda real per
capita, a economia como um todo permaneceu praticamente estagnada entre 1928 e 1939.
Como destacado por Fonseca (2003b), tal crescimento da indústria centrava-se em
ramos tradicionais, como alimentos, têxteis e bebidas (bens de consumo não duráveis),
que representavam de 70% a 80% do valor agregado industrial, mas não era restringido a
tais ramos, havendo também expressivo crescimento de segmentos como os de papel e
papelão, de metalurgia e minerais não metálicos, de ferro gusa, de aço em lingotes e de
laminados. Durante os anos 1930, a produção industrial continuou a crescer, alcançando,
no fim da década, níveis mais de 60% acima dos de 1929.
113
É, portanto, a partir da recuperação da economia, em 1933, que se pode falar no
desencadeamento de um processo de industrialização no Brasil, quando o ritmo de
crescimento da indústria superou por larga margem o crescimento da agricultura (veja
Gráfico 4.1). Até então, as indústrias existentes eram complementares à produção
agrícola para exportação. Já a partir do primeiro governo Vargas, a indústria passa a ser o
centro dinâmico da economia, deslocando o setor agrário para uma posição auxiliar e,
paulatinamente, o país vai migrando de um modelo agro-exportador para um urbano-
industrial.
A importância do período fica evidente pela riqueza de interpretações que sobre ele
surgiram. A tese mais conhecida é, certamente, a de Furtado (1987), segundo a qual teria
se iniciado, no período, o chamado Processo de Substituição de Importações (PSI).
Segundo Fonseca (2003b, p. 250), denomina-se PSI, um processo no qual “[...] a
liderança do crescimento econômico repouse no setor industrial, que este seja responsável
pela dinâmica da economia, ou seja, que crescentemente seja responsável pela
determinação dos níveis de renda e de emprego.” Segundo a tese defendida por Furtado, a
onda de industrialização vivenciada na década de 1930 foi resultado das políticas
adotadas pelo governo para amenizar o choque adverso da crise de 1929 sobre o setor
exportador, que acabaram estimulando a produção industrial para o mercado interno.
Para reduzir o choque da crise sobre o setor exportador (especialmente cafeeiro,
que respondia por 71% das exportações), não suficientemente compensado pela
desvalorização cambial, o governo comprou os excedentes de café, que se avolumavam
6
e destruiu grande parte dos mesmos
7
, tomando medidas no sentido de desestimular o
aumento da produção
8
, o que tornava essas políticas diferentes das implementadas
durante a República Velha, pois sinalizava aos cafeicultores que sua atividade era
problemática a longo prazo. Desta forma, conseguia simultaneamente segurar em parte os
preços sem estimular a oferta, ao mesmo tempo em que colaborava para que o café
6
Somente no Estado de São Paulo, calculava-se, havia 18 milhões de sacas e a nova safra prevista para
1931 era de 17,5 milhões; diante de uma demanda externa de 9,5 milhões, o excedente de oferta sobre a
demanda externa era de 26 milhões de sacas (FONSECA, 2003b).
7
A destruição dos estoques, iniciou em cerca de 10% da safra de 1931-1932 até alcançar 40% da de 1937-
1938, estimando-se que, no total, foram destruídas 70 milhões de sacas (FONSECA, 2003b).
8
Criou impostos em dinheiros e em espécie sobre o café exportado e, em dinheiro, sobre cada novo
cafeeiro plantado (FONSECA, 2003b).
114
perdesse peso na pauta de exportações e que esta se diversificasse
9
(FONSECA, 2003b).
Tais medidas, segundo Furtado (1987), com objetivo explicito de proteger o setor
cafeeiro, teriam sido, na realidade, uma espécie de “política keynesiana antes de Keynes”.
Estas políticas geraram um efeito multiplicador no conjunto do sistema econômico e, em
especial, na indústria, dirigindo-o “para dentro”.
Ao garantir preços mínimos de compra, remuneradores para a grande
maioria dos produtores, estava-se na realidade mantendo o nível de
emprego na economia exportadora e, indiretamente, nos setores
produtores ligados ao mercado interno. Ao evitar-se uma contração de
grandes proporções na renda monetária do setor exportador, reduziam-se,
proporcionalmente os efeitos do multiplicador de desemprego sobre os
demais setores da economia. (FURTADO, 1987, p. 190)
Essa manutenção da demanda interna, somada ao encarecimento das importações,
devido, principalmente, à progressiva desvalorização da moeda nacional, que gerava um
efeito protecionista a favor da indústria nacional, e a existência de capacidade ociosa nas
indústrias instaladas no país, voltadas ao mercado interno, explicaria, segundo Furtado
(1987) a rápida ascensão da produção industrial, que passa a ser o fator dinâmico
principal no processo de criação da renda.
Para Furtado (1987), o apenas o governo tinha interesse na defesa do setor
cafeicultor, mas o mesmo, devido à crise, estaria passando por um período de grande
queda da arrecadação. Para poder realizar os gastos correntes, além dos relacionados à
sustentação do preço do café, via-se forçado a partir para uma política monetária
expansiva. Assim, as políticas monetárias e fiscais teriam acabado beneficiando o
mercado interno não ao impedirem a substancial queda na demanda agregada, mas
também ao baixarem taxas de juros. Fica assim, para Furtado (1987, p.193)
[...] perfeitamente claro que a recuperação da economia brasileira, que se
manifesta a partir de 1933, não se deve a nenhum fator externo e sim à
política de fomento seguida inconscientemente no país e que era um
subproduto da defesa dos interesses cafeeiros.
Fonseca (2003a), aceitando a tese de Furtado de que houve o deslocamento do
centro dinâmico da economia em favor do mercado interno e da indústria na década de
9
No período 1934-1939 o café alcançou 47,8% do valor das exportações, em contraste com 72,5% do
período 1924-29, enquanto o algodão crescia de 1,9% para 17,6% de um para outro (FONSECA, 2003b).
115
1930, contesta que este tenha sido um subproduto não intencional da defesa do café.
Segundo Fonseca (2003a), a consciência pela opção industrializante do governo de 1930
pode ser demonstrada através de uma análise das instituições do período. Dentre estas,
destacam-se entre as regras formais, leis voltadas aos interesses industriais, como o
Decreto de 1931
10
, que proibia a importação de máquinas e equipamentos para certos
segmentos da indústria
11
, o tratado de comércio com os Estados Unidos de 1935
12
, as a
políticas protecionistas adotadas com a reforma tributária de 1934, a política creditícia
voltada diretamente à indústria, a regulamentação de direitos de propriedade via criação
de diversos institutos e departamentos e a regulamentação do trabalho com a criação da
legislação trabalhista. Complementarmente, não as medidas adotadas, mas também os
discursos de Getúlio na época, corroboram a tese da consciência industrializante do
governo. Segundo Fonseca (2003a), já em 1931, Vargas afirmava a necessidade de
protecionismo deliberadamente para proteger a indústria nascente e, em 1936,
relacionava a indústria ao desenvolvimento econômico.
Desenvolvimento, então, paulatinamente transformara-se em sinônimo
de industrialização. Passava a ser, por excelência, a condição necessária
para o país se desenvolver, ou seja, melhorar seus indicadores
econômicos e sociais; precisava-se romper com o passado agrário, do
marasmo rural e das oligarquias retrógradas. O desenvolvimentismo,
assim, foi-se formando e se consolidando como ideologia, ao nortear e
justificar o reordenamento de leis e práticas de política econômica, bem
como mudanças e criação de instituições. Foram se formando novas
crenças, valores, símbolos e padrões de comportamento – ou seja, o
amplo significado abarcado pela palavra instituição e que enfatiza sua
importância e complexidade, que de forma alguma pode ser reduzido
apenas a órgãos, mas abarca todo um conjunto de regras, normas,
comportamentos e símbolos. (FONSECA, 2003a, p.142, grifos do autor)
O consenso quanto aos objetivos industrializantes do governo Vargas é alcançado
quanto tratamos da segunda parte deste governo: o período autoritário do Estado Novo. O
repúdio ao liberalismo político tinha reflexos também contra o liberalismo econômico.
10
Decreto nº 19.739, de 07 de março de 1931. (BRASIL, Decreto nº 19.739, 1931).
11
Embora pareça estranho, esta medida decorria de pressão dos próprios líderes empresariais, que
possuíam capacidade instalada e, com esta medida, impediam que novas unidades fabris fossem instaladas.
12
Este concedeu vantagens a alguns produtos de exportação brasileiros (café, borracha, cacau) em troca de
redução de 20% a 60% na importação de certos artigos norte-americanos, como máquinas, equipamentos,
aparelhos e aços. [...] sua assinatura não deixa de demonstrar a intenção governamental de romper com o
antigo papel de importador destes bens, ao incluir com ênfase — e esta era a novidade, em termos
históricos —, os bens de capital e intermediários necessários à indústria.” (FONSECA, 2003a, p. 141)
116
Desta forma, a partir de 1937, a intervenção do Estado na economia é aprofundada. O
governo federal se utilizava tanto de manipulação de incentivos, tais como impostos,
controles de câmbio, cotas de importação, controles de crédito e exigências salariais,
como de intervenção direta, através de investimentos públicos, em setores como
ferrovias, navegação, serviços públicos e indústrias básicas, como o petróleo e o aço
(SKIDMORE, 1969).
Segundo Fonseca (2003b), o governo deixava claro seu projeto industrializante e
em prol da diversificação do setor primário e das exportações. Foram criados diversos
órgãos para intervenção direta nas industrias e riquezas estratégicas
13
, fomento de
culturas específicas
14
, racionalização administrativa e de tomada de decisões
15
e, em
especial, o Plano Especial de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa Nacional
16
, com
objetivos de criação de industrias básicas, execução de obras públicas e defesa nacional
de elementos necessários ao desenvolvimento do país e a construção da siderúrgica de
Volta Redonda, a qual se tornará um marco simbólico desta época, pois inaugurou a forte
presença estatal na produção de insumos básicos.
Apesar de todo o esforço industrializante do governo, em 1939, teve início a II
Guerra Mundial, impondo uma desaceleração no ritmo de crescimento da economia que,
entre 1939 e 1942, cresceu apenas 0,4% e a indústria, 1,6%. A queda da produção
industrial foi determinada pela dificuldade de importar insumos, devido às dificuldades
de transporte marítimo e à própria carência de produtos disponíveis nas fontes dos países
exportadores. Todavia, a partir de 1942, as taxas de crescimento são recuperadas, com
a indústria voltando a crescer em média 9,5% e o PIB, 6,4% entre 1942 e 1945.
A queda das importações não teve uma contrapartida proporcional na queda das
exportações. De fato, houve até mesmo aumento das receitas de exportação, tanto porque
as exportações se diversificaram, havendo uma maior participação dos produtos
13
Conselho Nacional do Petróleo, Aparelho de Defesa, Conselho de Águas e Energia, Comissão de Defesa
da Economia Nacional, brica Nacional de Motores, Comissão Executiva do Plano Siderúrgico Nacional,
Companhia Siderúrgica Nacional, Comissão de Combustíveis e Lubrificantes, Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial – SENAI, Comissão do Vale do Rio Doce, Companhia Nacional de Álcalis,
Serviço Social da Indústria – SESI, Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial.
14
Instituto do Mate e do Pinho, Serviço Nacional do Trigo.
15
DASP – Departamento Administrativo do Serviço Público, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística,
Plano de Obras Públicas, Conselho Nacional de Ferrovias, Coordenação de Mobilização Econômica,
Comissão de Planejamento Econômico e Superintendência da Moeda e do Crédito - SUMOC
16
Decreto
1058 de 19 de Janeiro de 1939. (BRASIL, Decreto 1058, 1939).
117
manufaturados, principalmente têxteis, mas também de minerais estratégicos, devido à
alta do preço do café, que quase duplicou entre 1939 e 1945, melhorando as relações de
troca e permitindo um grande saldo positivo na balança comercial.
Durante a II Guerra, portanto, apesar da desaceleração do ritmo de crescimento, a
recuperação nas relações de trocas permitiu uma melhora da renda per capita que, em
1945, era cerca de 10% superior à de 1939 (VILLELA; SUZIGAN, 1973).
4.2 Instituições Políticas
Os acontecimentos políticos que levaram à Revolução de 1930 fizeram com que
ela fosse, em princípio, um movimento que buscava a regeneração dos costumes
políticos, abolindo todas os hábitos e vícios da corrupção institucional que haviam
degenerado a ordem representativa, reduzida a mera fraude durante a Primeira República.
Este objetivo acabou por agregar grupos bastante diversos, o que proporcionou uma
grande instabilidade política após a tomada do poder pelos revolucionários.
O governo precisou conciliar interesses diferentes, e, por vezes, contraditórios,
especialmente no primeiro período. O caminho encontrado para a estabilização foi a
centralização política, com o fortalecimento do governo federal, em detrimento dos
Executivos estaduais, e a criação de um quadro institucional de abrangência nacional, em
substituição ao profundo regionalismo que marcara o regime anterior. De fato, durante os
15 anos do Primeiro Governo Vargas, tanto a legislação como a relação do Estado com a
economia, as questões sociais e quaisquer que sejam as questões pertinentes ao país
foram profundamente transformados.
A mudança de liderança política, resultante da ascensão de Vargas à
presidência, tornou-se conhecida como Revolução de 30. Os
acontecimentos posteriores confirmaram a precisão da denominação,
pelo menos na esfera política. Na década e meia depois de Vargas ter
assumido o poder, praticamente todas as características do sistema
político e da estrutura administrativa foram objeto de zelo reformista.
Muitas dessas mudanças permaneceram ficções jurídicas, em bom
número suficientemente consolidadas em 1945, a ponto de ter
transformado irrevogavelmente o mundo do governo e da política, que
havia produzido os promotores da Revolução de 1930. (SKIDMORE,
1969, p. 25)
118
A mudança do papel do Estado seguiu as tendências internacionais do período. A
nova ideologia desenvolvimentista, paulatinamente, consolidava-se na política nacional e
legitimava o aprofundamento da intervenção do Estado na economia como meio de
alcançar-se o objetivo supremo do desenvolvimento econômico. O crescimento de novas
instituições políticas em nível federal permitiu o aprofundamento do processo de
unificação administrativa de um país que se ampliava e ajudou a capacitar o presidente a
articular uma rede nacional de alianças políticas, que legitimariam medidas autoritárias
de um governo emanado de um golpe de Estado, em busca de tal desenvolvimento.
4.2.1 Ideologia e Instituições Informais
O período em que Getúlio Vargas governou o país foi, certamente, de inflexão
para a economia brasileira. Mesmo os autores revisionistas mais clássicos (como Pelaez
(1972)) que discordam da tese de Furtado (1987) de que houve uma mudança do centro
dinâmico na década de 1930, não poderiam negar a ampla mudança estrutural que se
sucedeu entre a década de 1930 e 1950. Desde a Colônia, a economia brasileira era
primordialmente baseada em atividades primárias (extrativismo, mineração, agricultura),
sendo que o período da República Velha viveu o apogeu da cultura do café. Após o
período Vargas, no entanto, as indústrias multiplicavam-se pelo Brasil, cada dia mais
urbano.
Portanto, os anos de Getúlio constituem a transição entre o mais bem
sucedido projeto de controle do mercado mundial de uma commodity por
parte de uma economia primário-exportadora antes da OPEP e o mais
bem sucedido programa de industrialização implantado na América
Latina. (EARP; KORNIS, 2004, p. 30)
Como destacado na seção anterior e demonstrado por Fonseca (2003a), o governo
possuía claros objetivos industrializantes, diferentemente do que se via na Primeira
República. Esta mudança de posição do governo foi determinada pela mudança na visão
de mundo dos governantes, ou seja, da ideologia (preferências) que determina os
caminhos que o mesmo escolhe. Em outro artigo, Fonseca (2004) mostra que esta nova
119
ideologia que norteou os rumos do Governo Vargas foi o Desenvolvimentismo, que se
formou a partir da associação de quatro correntes de idéias que já existiam anteriormente:
o nacionalismo, a defesa da industrialização, o intervencionismo pró-crescimento
(representado pelos papelistas) e o positivismo. Esta ideologia, ademais, já havia
norteado o governo de Vargas no Rio Grande do Sul, em 1928, que desde esta época,
via o desenvolvimento como um fim em si mesmo, o qual sentido a toda ação do
governo.
[...] o desenvolvimento assume a configuração de uma utopia, um
estágio superior a ser conquistado, com patamar mais elevado de
felicidade. Sem ele a nação permanecerá no atraso, com péssima
distribuição de renda, periférica ou subordinada no contexto
internacional, com indicadores sociais degradantes. Mas a reversão deste
quadro não vem espontaneamente, deve ser construída, exige ação,
determinação, vontade e em suas versões mais maduras -
planejamento. através do Estado, como instituição que materializa
por excelência a racionalidade burocrática e política, isto pode ser
conseguido. Como toda boa ideologia, constrói-se um projeto de sonho
que se propõe factível e realizável e que, portanto, incita a um
programa de ação. (FONSECA, 2004, p. 227, grifos do autor)
Para alcançar o objetivo do desenvolvimento econômico, através do Estado, foi
necessário criar um Estado Forte e interventor, centralizando o poder na esfera federal,
mais especificamente, nas mãos do presidente da República. Para tanto, foi preciso
desacreditar ou reprimir adversários, e, ao mesmo tempo, alcançar o apoio dos grupos de
poder solidamente estabelecidos, como as classes agrárias e os militares superiores, além
dos próprios industriais e tenentes, que já eram favoráveis ao processo, e manter o
controle sobre a crescente massa de trabalhadores urbanos. Este apoio foi buscado através
de concessões tanto à classe agrária, como os auxílios ao café e a criação de institutos de
estimulo à diversas culturas, quanto aos trabalhadores, que passaram a contar com uma
nova estrutura de direitos e proteção social. Ao mesmo tempo, a organização de
sindicatos oficiais, submissos ao ministério do trabalho permitiu o fortalecimento do
Estado através da estruturação corporativista da sociedade.
A criação de todo um arranjo institucional voltado para a regulamentação das
relações de trabalho foi um marco do governo Vargas, que criaria uma imagem de
protetor da classe trabalhadora, ou "pai dos pobres". Este fato determinou o
120
desenvolvimento de uma nova ideologia política, ligada diretamente à figura do
presidente em sua obra social e em sua relação direta e pessoal com os trabalhadores: o
Trabalhismo, que marca a tentativa de incorporação das grandes massas no projeto de
desenvolvimento, com uma certa distribuição de renda, e que foi aprofundado com a
volta do presidente, por via democrática, à presidência da República em 1950.
O fortalecimento do governo federal, em detrimento dos estados e das oligarquias
regionais foi fundamentado sobre uma gica nacionalista, que, embora fosse
defendida por grupos isolados desde o período colonial, assumiu características mais
sólidas com a Revolução de 1930 e estabeleceu-se, definitivamente, com o Estado Novo,
quando se buscou a construção de uma identidade nacional e se combateu fortemente os
regionalismos. Neste aspecto, o Brasil também seguia a tendência internacional, que na
Europa era evidenciada pelo ultra-nacionalismo alemão e italiano.
Até 1937, o nacionalismo foi relativamente ameno, concentrado nos discursos. A
partir do Estado Novo, entretanto, medidas radicais foram tomadas no sentido de
extinguir os regionalismos e tornar o Brasil um país uno. Foram criados órgãos, como o
Departamento Nacional de Propaganda (DNP), que, em 1939, foi alterado para
Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), com objetivo de divulgar as ões do
governo Vargas e reprimir as divulgações contrárias à imagem do novo regime. Na área
de educação, a criação da disciplina de História do Brasil buscava mostrar um passado
comum e despertar o orgulho nacional. Além disso, entre março e maio de 1938, várias
normas buscaram regulamentar as atividades dos estrangeiros, denominadas “Leis
Nacionalizadoras”
17
. Entre as medidas de caráter nacionalista, foi simbólica a cerimônia
pública de queima das bandeiras estaduais, em favor da unidade nacional. A idéia era a
de se possuir “uma única bandeira a nacional, um escudo o da República, e um
hino – o brasileiro.” (VARGAS, 1941, p. 5) Além disso, “Só há uma ideologia no Estado
17
Entre tais normas destacam-se os decretos-lei 341, de 17 de março de 1938, que regulava a
apresentação de documentos por parte dos estrangeiros ao Registro de Comércio; 383, de 18 de abril de
1938, que proibia a prática de qualquer atividade de natureza política dos estrangeiros no País; 392, de
27 de abril de 1938, que regulava a expulsão dos estrangeiros, que poderia ocorrer desde que o motivo
comprometesse a segurança nacional; 406, de 04 de maio de 1938, que dispunha sobre a entrada de
estrangeiros no território nacional; 431, de 18 de maio de 1938, que definia quais eram os crimes contra
a personalidade internacional, a estrutura e a segurança do Estado contra a ordem social, passíveis de pena
de morte ou de trinta anos de prisão.
121
que integra todos os valores brasileiros; um chefe no governo nacional”
(MAGALHÃES, 1937, Capa)
4.2.2 Instituições Formais
O Primeiro Governo Vargas é dividido em três momentos políticos distintos e
bem definidos: O Governo Provisório (1930-34); O Governo Constitucional (1934-37) e
o Estado Novo (1937-45).
O Período do Governo Provisório é caracterizado por uma ordem ditatorial, em
princípio, provisória, e ausência de ordem constitucional, que a Constituição de 1891
não mais vigorava, e outra não havia sido promulgada. Seria o interregno entre a tomada
do poder e a promulgação de uma nova constituição, que, todavia, foi adiada por quatro
anos. Governava-se por decretos-lei (que foram criados na época, por Getúlio), e muitos
deles foram criados no período para estabilizar o ambiente econômico, assim com dar as
bases da nova estrutura institucional que se moldava. O primeiro estabeleceu a demissão
de todos os governadores da República Velha e quem governaria, a partir de então,
seriam os interventores nomeados por Getúlio, reduzindo, instantaneamente, o poder, ao
menos o de jure, das oligarquias estaduais. Além disso, outras medidas foram sendo
tomadas, paulatinamente, que conseguiriam esvaziar o poder das mesmas de forma mais
sólida, aumentando o poder central, como a federalização de órgãos e políticas estaduais
e o fortalecimento dos sistemas administrativos e da burocracia federais.
De fato, as forças ligadas ao poder político eram bastante diversas, e o período foi
marcado por profunda instabilidade. Com relação à constitucionalização, havia duas
correntes antagônicas: a constitucionalista, que pressionava pela restauração, o mais
breve possível, da ordem constitucional, suspensa desde o golpe, ligada, sobretudo, aos
paulistas e às oligarquias afastadas do poder com a Revolução; e outra, contrária a
constitucionalização, representada principalmente pelos tenentistas (Clube Três de
Outubro e Bloco do Norte), que defendiam que, antes de convocar uma constituinte, a
122
ditadura deveria completar sua missão, preparando o Brasil para voltar ao regime legal
em novos moldes, que não os mesmos que a Revolução buscou extinguir.
Há quem entenda que está terminada a missão da ditadura e que é preciso
volver o quanto antes à normalidade constitucional [...] Em desacordo
com tais ideais está, porém, a mentalidade nova que deseja para a obra
revolucionária maior amplitude. Os propugnadores desta renovação
profunda querem que a futura constituinte seja oriunda de outro ambiente
que não o atual. Desejam que ela se reúna sob o influxo de um espírito
imbuído de ideais renovadores, de maneira a tornar impossível a
ressurreição do passado [...] (REGINA, 1931, p. 3, Editoriais)
Extinguir-se a ditadura desde e entregar o governo a uma constituinte
será de fato perder a ocasião mais propícia para operar radicalmente
reformas que entendem com a existência do Brasil como nação que quer
ser evidentemente uma nação civilizada, sem os vícios e “chinoiseries”
que se acham radicados nos nossos hábitos e costumes político-sociais.
(CARMO, 1931, Editoriais)
[...] [queremos] uma constituinte quando isto for possível, quando o
Brasil estiver preparado para recebê-la. Porque se consentirmos numa
constituinte imediata, praticaremos o maior crime contra a Revolução e a
maior traição à Pátria. (ALMEIDA, 1932, Capa)
os constitucionalistas eram representados pelas Frentes Únicas Estaduais,
especialmente a paulista, mas também a gaúcha e mineira, o que deixa claro o aspecto
fortemente regionalista e federalista deste movimento e, portanto, marcado pelos
princípios básicos da República Velha.
Sabemos que nossa mesma mentalidade não se nos perdoa e anseia que
manifestemos pela convocação de uma constituinte, conquanto o retorno
à ordem constitucional no menor prazo possível não representa apenas o
sentir de um grupo ou de uma região, senão a aspiração pela qual todos
palpitam [...] Acha-se em jogo a sorte de São Paulo e com ela a do Brasil
inteiro, porque S.P. não é apenas a pérola, senão a medula, o sangue da
Federação. (PARTIDO DEMOCRÁTICO DE SÃO PAULO, 1931)
Para si a política riograndense não quer coisa alguma. O que ela pede,
interessa, em primeiro lugar, ao país: a volta ao regime constitucional em
tempo certo e determinado. [...] A unidade da pátria está dependendo
agora, mais do que nunca, do regime constitucional. Se escapássemos à
calamidade da desagregação, não escaparíamos ao infortúnio de uma
guerra civil, perfeitamente estúpida. (
COMENTÁRIOS DO
“ESTADO DE SÃO PAULO”
, 1932, Capa).
123
Em fevereiro de 1932, um decreto
18
dispôs sobre o Código Eleitoral e, em maio,
outro
19
, marcou a data das eleições para Assembléia Constituinte e criou uma comissão
para elaborar o anteprojeto de Constituição. Apesar disso, no começo de julho, foi
deflagrada a Revolução Constitucionalista em São Paulo, que foi totalmente derrotada em
três meses, mas que conseguiu garantir a convocação da Constituinte
20
e a nomeação de
um paulista como interventor
21
.
A Constituição foi promulgada em 16 de julho de 1934, e, no dia seguinte, Vargas
foi eleito presidente da República pela Assembléia Constituinte. A nova carta tinha claras
influências de outras constituições da época, como da mexicana de 1917, da Constituição
da primeira república alemã, de Weimar, de 1919 (que estabelecia uma república
federalista com Executivo forte) e da Constituição de 1931 da Espanha. Considerada
progressista para a época, instituiu o voto secreto, estabeleceu o voto obrigatório para
maiores de 18 anos e o voto feminino, previu a criação da Justiça do Trabalho e Eleitoral.
Muito mais extensa e detalhada que a de 1891, manteve a República Democrática, o
Presidencialismo e o Federalismo, que foi bastante amenizado, com a diminuição da
autonomia estadual, decorrente do aumento da competência da União Federal.
mostrava tendências corporativistas, com a criação das representações profissionais (que
estavam presentes na constituinte). Possuía novas rubricas, como “Da Ordem
Econômica e Social”, que legislava sobre questões como industrialização, exploração do
solo e sua nacionalização, sistema financeiro, organização do trabalho e questões
trabalhistas e sociais, imigração, direitos de propriedade, “Da Família, da Educação e da
Cultura”, “Da Segurança Nacional” e “Dos Funcionários Públicos”, que indicam um
18
Decreto 21.076, de 24 de fevereiro de 1932: dispõe sobre o Código Eleitoral. Entre outras
providências, institui a Justiça Eleitoral, concede direito de voto aos maiores de 18 anos, o direito das
mulheres votarem e serem votadas e estabelece o sufrágio direto, secreto e universal. (BRASIL, Decreto
21.076, 1932)
19
Decreto 21.402, de 14 de maio de 1932: fixa o dia três de maio de 1933 para a realização das eleições
à Assembléia Constituinte e cria uma comissão para elaborar o anteprojeto de Constituição. (BRASIL,
Decreto nº 21.402, 1932)
20
O Decreto 22.621 de 5 de abril de 1933: dispõe sobre a convocação da Assembléia Nacional
Constituinte, aprova o seu Regimento Interno, prefixa o número de deputados à mesma e dá outras
providências. Em 3 de maio de 1933, são realizadas as eleições para a Assembléia Nacional Constituinte e
o Decreto 23.102, de 19 de agosto de 1933: convoca a Assembléia Nacional Constituinte. (BRASIL,
Decretos 22.621 e 23.102, 1933)
21
Em julho de 1933, Armando Salles de Oliveira (SP) foi nomeado o novo interventor do Estado de São
Paulo.
124
aumento da intervenção do Estado nas diversas áreas da economia (apesar de garantir a
liberdade econômica)
22
, assim como regras mais específicas, buscando a racionalização
do Estado. Sua grande abrangência, buscando abranger as diversas ideologias que
constituíam a Assembléia Constituinte, impossibilitou que fosse plenamente seguida,
especialmente em um período de ampla instabilidade política, como aquele em que se
vivia.
Colcha de retalhos ideológica, reflexo de uma sociedade plural em pleno
entrechoque de idéias e doutrinas, tenta abrigar o liberalismo e o
intervencionismo, terminando por submergir na impossibilidade de
conciliar tendências antípodas. (AMARAL, 2004, p. 298)
O interregno republicano de efetiva normalidade constitucional foi bastante curto
Não apenas a constituição vigeu por apenas três anos, mas, durante dois deles, foi
parcialmente suspensa pela Lei de Segurança Nacional, acionada devido a repetidos
levantes comunistas a partir de 1935. Skidmore (1969) relaciona a curta duração da
Constituição de 1934 à forte tendência à radicalização política, que, no Brasil, refletia a
conjuntura internacional.
Se o acordo precário corporificado pela nova constituição tivesse sido o
produto de um balanço entre forças políticas opostas, poderia ter gozado
de maiores perspectivas de longevidade. Mas os grupos políticos mais
intimamente identificados com as posições do constitucionalismo liberal
e reformismo sócio-econômico estavam, em 1934, superados por um
novo gênero de ativismo político. A política no Brasil, como na Europa,
no começo da década de 1930, marchava para a radicalização.
(SKIDMORE, 1969, p. 40-41)
22
Art. 115: a ordem econômica deve ser organizada conforme os princípios da justiça e as necessidades da
vida nacional, de modo que possibilite a todos existência digna. Dentro desses limites, é garantida a
liberdade econômica.
Art. 116: por motivo de interesse público e autorizada em lei especial, a União poderá monopolizar
determinada indústria ou atividade econômica, asseguradas as indenizações, devidas, conforme o art. 112,
nº 17, e ressalvados os serviços municipalizados ou de competência dos Poderes locais.
Art.117: a lei promoverá o fomento da economia popular, o desenvolvimento do crédito e a nacionalização
progressiva dos bancos de depósito. Igualmente providenciará sobre a nacionalização das empresas de
seguros em todas as suas modalidades, devendo constituir-se em sociedades brasileiras as estrangeiras que
atualmente operam no País.
Art 119, § 4º: a lei regulará a nacionalização progressiva das minas, jazidas minerais e quedas d’água ou
outras fontes de energia hidráulica, julgadas básicas ou essenciais à defesa econômica ou militar do País.
(BRASIL, Constituição, 1934)
125
Em 10 de novembro de 1937, às vésperas da eleição presidencial direta, que
elegeria o seu sucessor, Vargas, diante de movimentos políticos que se fortaleciam, como
a Ação Integralista Brasileira e o Partido Comunista, e que “colocavam em risco a
segurança nacional”, dissolveu a Câmara e o Senado, revogou a Constituição de 1934 e
promulgou uma nova Carta Constitucional. Este evento inaugurou no país a ditadura do
Estado Novo, um regime muito centralizador e autoritário, com concentração de poder
nas mãos do presidente e com forte apelo nacionalista.
As justificativas oficiais para o golpe de Estado não diferem muito de suas
verdadeiras razões: associavam-se motivos internos, como a polarização política do país
entre integralistas e comunistas e a dificuldade do governo de, dentro dos marcos de
regras democrático-liberais, constituir forças suficientes para consolidar seu projeto, até o
contexto de ameaça e, posteriormente, de guerra mundial, com a bipolarização
internacional entre o Eixo e os Aliados. Em discurso ao povo brasileiro, Vargas afirmava
que
Por outro lado, as novas formações partidárias surgidas em todo o
mundo, por sua própria natureza refratária aos processos democráticos,
oferecem perigo imediato para as instituições, exigindo, de maneira
urgente e proporcional à virulência dos antagonismos, o reforço do poder
central. (VARGAS, 1937, apud FILARDI, 2007, p. 77)
Com o golpe, ficou clara a vitória sobre o constitucionalismo estreito que havia
negligenciado as questões econômicas e sociais, pela via autoritária, que pregava o bem-
estar social de fundo nacionalista inequivocamente antidemocrático. De 1938 até fins de
1944, o Estado Novo repousou no apoio das Forças Armadas, a polícia de Vargas e a
desorganização, a desmoralização e a debilitação da oposição (SKIDMORE, 1969).
A base ideológica do Estado Novo, normalmente comparada ao fascismo, era
respaldada pelas idéias dos chamados pensadores autoritários dos anos 1930, como
Francisco Campos e Oliveira Viana, que pregavam
[...] uma série de reformas modernizantes e pró-industrialização, contra o
marasmo rural das oligarquias, julgando impossível implementá-las sem
um Estado forte e impessoal, que se impusesse sobre poderes locais
arcaicos, e sobre outros opositores, como os políticos tradicionais
126
desgostosos com os rumos da revolução e os comunistas. (FONSECA,
2003b, p. 273)
As idéias autoritárias ficaram claras com a Constituição de 1937, elaborada por
Francisco Campos (que se tornaria ministro da Justiça) e outorgada por Vargas, que ficou
conhecida como “Polaca” devido a certas semelhanças com a Constituição da Ditadura
Polonesa de 1935. Esta promovia um “Executivo forte, legislador, centralizador, o único
poder político, exercendo seu império sobre a política, a economia e a vida social”
(AMARAL, 2004, p. 299). Autoritária, extinguiu o cargo de vice-presidente, suprimiu a
liberdade político-partidária, permitiu a cassação da imunidade parlamentar, a prisão e o
exílio de opositores, anulou a independência dos Poderes e instituiu a eleição indireta
para presidente da República, a pena de morte e a censura prévia nos meios de
comunicação. Centralizadora e Nacionalista, procurou extinguir os últimos resquícios do
federalismo da República Velha, determinando a nomeação de interventores pelo
governo federal, esvaziando as competências dos estados e proibindo símbolos estaduais,
com a bandeira, o hino, o escudo e as armas nacionais passando a ser de uso obrigatório
em todo o País, e centralizou o poder nas mãos do presidente da República
23
.
Interventora, garantiu ao governo, em nome dos interesses da nação, intervir nas
atividades econômicas, inclusive possíveis estatizações, e de trabalho e promoveu a
expansão de mecanismos estatais de controle da vida econômica e social, destacando-se o
Conselho de Economia Nacional.
De fato, a centralização do poder, o autoritarismo e o aumento da intervenção
estatal na economia não faziam parte de um evento isolado no Brasil, mas se
apresentavam como tendência mundial, desde o fim da primeira guerra. Nesta linha, a
Carta de 1937,
Reflete o mundo. O fascismo de Mussolini reinava na Itália desde 1922;
o nazismo fôra implantado na Alemanha (e festejado pela grande
imprensa brasileira) desde 1933. A onda direitista era a resposta
reacionária à ‘ameaça comunista’, diante do recuo social-democrata e da
democracia.
23
Art. 73: o Presidente da República, autoridade suprema do Estado, coordena a atividade dos órgãos
representativos, de grau superior, dirige a política interna e externa, promove ou orienta a política
legislativa de interesse nacional, e superintende a administração do país. (BRASIL, Constituição, 1937)
127
Reflete o Brasil, onde se chocam as doutrinas em guerra na Europa e no
mundo. Reflete o conflito ideológico ensejado pela emergência do eixo
fascista e da União Soviética comunista, o avanço das idéias autoritárias,
de direita e de esquerda. No Brasil, o avanço do integralismo e das forças
democráticas, progressistas e comunistas. Por fim, a provocação em que
terminou se constituindo o levante comunista de 1935 e a maquinação do
Plano Cohen, como pretextos para o golpe. (AMARAL, 2004, p. 299-
300)
Dentro dos objetivos desenvolvimentistas, no Estado Novo, iniciou-se uma busca
pela eficiência e racionalidade administrativa do governo. Os primeiros passos neste
sentido foram dados com a mudança na forma de recrutamento do funcionalismo, que
deveria ser guiado pela lógica da formação profissional, da capacidade técnica e do
mérito, em substituição à da filiação partidária ou da indicação política, e com a criação
de um órgão voltado especificamente para a reforma e a modernização da administração
pública, o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP). Na mesma época,
surgiu também o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com o objetivo de
oferecer informações estatísticas para o acompanhamento mais racional do
desenvolvimento do país. Na área econômica, inúmeros conselhos e órgãos técnicos
passaram a promover estudos e discussões, assessorar o governo na elaboração e na
execução de suas decisões, além de propiciar o acesso de setores empresariais ao
aparelho estatal.
O fim do Estado Novo, em 1945, não foi o fim das mudanças implantadas no
período; as instituições da vida política e da administração pública foram
irreversivelmente transformadas. A nova relação estabelecida entre o poder federal e
estadual aproximou muito mais o Brasil de um governo verdadeiramente nacional. O
Executivo federal manteve-se muito mais forte do que aquele tomado pelos
revolucionários em 1930. Muitas funções antes exercidas pelos governos estaduais foram
definitivamente incorporadas pelo poder central, e novas áreas de atividade foram
criadas, como a previdência social e as indústrias pesadas, definindo uma crescente
intervenção estatal na esfera econômica. Embora ainda houvesse grandes áreas do Brasil
rural onde a velha política de “cabresto” persistia, a política nacional, quando fossem
realizadas eleições livres, tornou-se um jogo mais aberto e menos previsível. Vargas
conseguiu substituir o poder descentralizado dos estados por um Executivo federal forte,
128
neutralizando os oligarcas políticos locais e atacando os regionalismos extremos. Depois
de 1945, estas lideranças estaduais mostraram reagir bem às ordens de outros detentores
do poder nacional, demonstrando que fora montado um sistema de governo nacional
capaz de sobreviver à ditadura (SKIDMORE, 1969).
Portanto, as instituições políticas do período têm como característica principal a
forte centralização do poder no Executivo federal, e a conformação de um Estado
Nacional mais uno, com embasamento nacionalista, em detrimento dos demais entes
federativos. O Presidente da República passou a ter uma posição de destaque como
chefe da nação e o autoritarismo foi intensificado. Seguindo objetivos
desenvolvimentistas o poder central passou a intervir diretamente na economia,
conduzindo a política econômica não mais apenas para responder aos interesses da
oligarquia, mas buscando o desenvolvimento econômico. A criação de regras mais claras
para o funcionalismo público e a criação de órgãos com funções específicas contribuiu
para uma maior racionalização do aparelho estatal. A legitimação viria através da
incorporação das massas, com a criação da ideologia trabalhista.
4.3 Instituições Econômicas e Sociais
Como no capítulo anterior, as instituições ligadas aos Sistemas Tributário,
Financeiro, do Mercado de Trabalho e Educacional também serão analisadas para o
período do Primeiro Governo Vargas.
4.3.1 Sistema Tributário
A crise de superprodução cafeeira, aprofundada pela Grande Depressão, que
desestabilizou o comércio internacional, com a forte redução do valor das exportações e
comprometeu diretamente as finanças da União e, principalmente dos estados, uma vez
que as mesmas eram amplamente dependentes dos impostos de importação e exportação,
respectivamente. Essa perda de receitas foi um fator importante para a redução do poder
dos estados cafeicultores e fortalecimento do poder da União.
129
A crise alcançou tal dimensão que não poderia mais ser resolvida no
âmbito dos estados. As burguesias regionais, comprometidas
financeiramente, perderam o poder de administrá-la e abriram espaço à
ação federal. O governo central passou, então, a gerir os complexos em
crise, atuando com certa autonomia em relação aos interesses imediatos.
Definiu-se uma nova fase na formação do Estado brasileiro, com a
centralização do poder e a constituição de um aparelho estatal com maior
poder de regulação e controle sobre diversos interesses específicos,
transformando-os em problemas nacionais e sujeitos à definição de uma
política de Estado. (LOPREATO, 2000, p. 3)
As medidas de centralização e nacionalização foram acompanhadas, durante o
governo provisório, de um regime de intervenção generalizada nos estados. A criação da
Comissão de Estudos Financeiros e Econômicos dos Estados e Municípios (CEFEEM)
permitiu a melhor obtenção de informações sobre as finanças das unidades federativas e o
desenvolvimento de propostas para aumentar sua eficiência. Os estudos mostraram a
grande utilização de impostos, taxas ou contribuições interestaduais, que eram proibidos
24
(e inviabilizavam a conformação do mercado nacional) e a “desorganização” financeira
nos estados, muitos dos quais, insolventes, o que legitimava a intervenção federal.
[...] por mais fervoroso partidário que se possa ser do regime federativo,
não é possível negar que o exercício da autonomia em matéria financeira
deu lugar aos abusos, cuja repetição no futuro deve ser evitada mediante
pré-tarefa que tem de executar aquela comissão [...] (OS TRABALHOS
DA COMISSÃO DE ESTUDOS FINANCEIROS, 1932, Contracapa)
A partir das informações do CEFEEM o governo federal tomou medidas no
sentido de inviabilizar um maior endividamento dos estados, com conseqüente redução
da autonomia destes. Os resultados da Comissão também foram utilizados na definição
das reformulações do sistema tributário, definidas na Constituição de 1934.
A nova Constituição, assim como outras leis do período, promoveu importantes
alterações na estrutura tributária do país, deixando-o em condições de ingressar na fase
seguinte da evolução dos sistemas tributários, aquela em que predominam os impostos
internos sobre produtos (VARSANO, 1996). A divisão de competências tributárias na
Carta de 1934 está resumida no Quadro 4.1.
24
Lei n. 1185 de 11 de junho de 1904 e Decreto n. 19.995 de 14 de maio de 1931. (BRASIL, Lei 1185,
1904 e Decreto n. 19.995, 1931).
130
Como se pode observar, o novo marco institucional delimitou melhor a
competência tributária das três esferas de governo, e pela primeira vez os municípios
foram inseridos na partilha tributária. Além disso, expandiu as fontes de financiamento
tributário do governo através da exploração mais intensa de bases de tributação
domésticas, que promoveram uma significativa mudança na composição da carga
tributária, a qual passou a depender menos do comércio exterior, indicando uma resposta
da estrutura tributária à nova dinâmica econômica.
Os estados foram dotados de competência privativa para definir o novo IVM, que
até então era federal e tivera sua base de incidência ampliada, com a inclusão das
consignações, passando a ser chamado de Imposto sobre Vendas e Consignações (IVC).
Este foi transformado num imposto tipo ‘cascata’, cobrado a cada operação de venda ou
consignação pelo valor total da mercadoria, de acordo com uma alíquota fixa ad valorem.
Porém, como destacado por Carvalho (2002), apesar do IVC ser de elevada produtividade
fiscal, tornando-se a principal fonte da receita tributária estadual, sua sistemática de
cobrança em cascata e o elevado grau de liberdade por parte dos estados, para alterarem
as suas alíquotas, acirraram as disputas por recursos, do que resultou uma guerra fiscal
entre os estados da Federação.
25
Para minimizar este problema, foi proibida a cobrança
do IVC nas operações interestaduais e limitada a alíquota desse imposto a um máximo de
10%. Com relação ao imposto de exportação, foi determinada a limitação de suas taxas a
um nível máximo de 10% e excluído o comércio interestadual da base de tributação do
mesmo. As transações deste tipo passaram a ser tributadas através do Imposto de Vendas
e Consignações.
Quanto aos Municípios, a Constituição de 1934 lhes auferiu, pela primeira vez,
competência tributária própria, permitindo que ficassem mais independentes de
25
A sistemática do IVC, imposto em cascata, cobrado em todas as etapas de comercialização do produto,
não estimulava a integração vertical das empresas, como a integração das fases de produção e
comercialização com vistas a evitar o pagamento do IVC, devido as profundas distorções que o mesmo
provocava sobre os preços relativos. Na verdade, à medida que a integração forçada resultava mais do
imperativo de burlar o fisco do que da evolução técnico-econômica da estrutura produtiva, seu efeito
prejudicava a eficiência econômica brasileira. Além disso, a plena autonomia fiscal concedida aos Estados
pela Constituição, para criação e reajuste das alíquotas de seus tributos, contribuía para que ora os governos
estaduais elevassem as alíquotas para satisfazer suas necessidades de caixa, ora reduzissem para tornar a
produção estadual mais competitiva além de suas fronteiras (CARVALHO, 2002).
131
Constituições e leis estaduais para determinar suas bases de tributação. Ou seja,
ganharam maior autonomia.
Como medida essencial para que fosse possível a configuração de um mercado
nacional, foi proibida a cobrança de qualquer tipo de tributo que barrasse o comércio
entre os estados. A proibição à cobrança de impostos interestaduais possibilitou o
incremento do comércio inter-regional, aumentando o grau de complementaridade e a
integração regional.
Quadro 4.1: Tributos e Competências: 1934
União Estados
26
Municípios
II. Impostos sobre
importação
III. Imposto de consumo
27
IV. Imposto de renda
V. Imposto de transferência
de fundos para o exterior
VI. Impostos sobre atos e
contratos
VII. Competência
residual
28
VIII. Taxas (correios e
telégrafos, entrada, saída e
estadia de navios e
aeronaves)
11 Imposto sobre propriedade
rural
12 Imposto sobre transmissão
de propriedade “causa
mortis
13 Imposto sobre transmissão
de propriedade imobiliária
“inter vivos”
14 Imposto sobre consumo de
combustíveis de motor de
explosão
15 Imposto sobre vendas e
consignações
16 Imposto sobre exportação
17 Imposto sobre indústrias e
profissões
18 Imposto sobre atos e
negócios
19 Competência residual
20
20 Taxas
1. Imposto de licenças
2. Imposto predial e
territorial urbano
3. Imposto sobre
diversões públicas
4. Imposto cedular
sobre a renda de
imóveis rurais
5. Taxas
Fonte: Lagemann (2003), elaborado com base na Constituição da República Federativa dos Estados
Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934.
Outra inovação da Constituição de 1934 foi repartir a receita de impostos entre
diferentes esferas de governo. Tanto a União como os estados mantiveram a competência
26
Nos Territórios os impostos atribuídos aos Estados são de competência da União.
27
Exceto de combustíveis de motor de explosão
28
Sem possibilidade de bitributação. A preferência é da União.
132
para criar outros impostos, além dos que lhes eram atribuídos privativamente, mas tais
impostos seriam arrecadados pelos estados que entregariam 30% da arrecadação à União
e 20% ao Município que originasse a arrecadação. Também o Imposto de Indústrias e
Profissões, cobrado pelos estados, teria sua arrecadação repartida entre estados e
Municípios, cabendo a cada um metade da mesma, como pode ser visto no Quadro 4.2.
Quadro 4.2: Sistema de Partilha e Transferências: 1934
Imposto Competência Participação
Competência residual União/ Estados
Se implantado pelo Estado: Estados – 50%;
União - 30% e Municípios – 20%
Em caso de intervenção do governo federal
pela falta de pagamento das quotas à União e
Municípios: União – 50%; Estados – 30% e
Municípios – 20%
Indústria e profissões Estados Estados – 50% e Municípios – 50%
Fonte: Lagemann (2003), elaborado com base na Constituição da República Federativa dos Estados
Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934.
Com o advento do Estado Novo, o governo federal interveio novamente nos
estados, nomeando interventores. A busca pela racionalização administrativa e
centralização do poder levou à padronização dos orçamentos estaduais, que passaram a
ser controlados diretamente pela União. O principal argumento para esta centralização era
dado com base na situação financeira da maioria dos estados, com “orçamentos com
impostos ilegais e despesas excessivas”. Assim,
[...] uma vez que [...] os orçamentos elaborados pelos governos Estaduais
sejam submetidos a exame e aprovação de um órgão central, os
inconvenientes acima mencionados desaparecem e haverá unidade de
critério na receita e na despesa. O equilíbrio destas será imposto por um
poder superior. E certas desinteligências que sacrificam habitualmente as
relações entre os estados vizinhos, quanto à constitucionalidade de
impostos e taxas de fronteiras, etc, terão que desaparecer em proveito do
intercâmbio comercial livre que é um elemento poderoso e decisivo, de
prosperidade nacional. (
OS ORÇAMENTOS ESTADUAIS SERÃO
CONTROLADOS PELA UNIÃO
, 1939, Contracapa)
Entretanto, se por um lado o Estado Novo trouxe, no plano político, a imposição
de um sistema extremamente autoritário e centralizador, no plano tributário, o formato
133
institucional da Constituição de 1934 foi preservado no fundamental. As alterações
referiram-se à expansão dos impostos com base no mercado interno, à racionalização da
estrutura tributária e à definição da competência das esferas governamentais. Em relação
a esta última, os estados perderam a competência privativa para tributar o consumo de
combustíveis de motor de explosão, e aos Municípios foi retirada a competência para
tributar a renda das propriedades rurais. Por outro lado, os estados ganharam autoridade
tributária exclusiva sobre o campo residual, sem obrigação de repartição com os demais
entes federativos, como pode ser visto nos Quadros 4.3 e 4.5. Apesar das poucas
modificações, Cossio (2002) indica que, depois de cair a níveis próximos a 60%, o grau
de centralização tributária aumentou a partir de 1937, atingindo mais de 70% em 1945.
Em 1940, a Lei Constitucional 3 vedou aos estados o lançamento de tributos
sobre o carvão mineral nacional e sobre combustíveis e lubrificantes quidos, e a 4
incluiu na competência privativa da União o Imposto Único sobre a Produção, o
Comércio, a Distribuição, o Consumo, a Importação e a Exportação de Carvão Mineral e
dos Combustíveis e Lubrificantes Líquidos de qualquer origem.
29
Nessa mesma época, a crise econômica desencadeada pela Segunda Guerra
Mundial inviabilizou a arrecadação baseada nos fluxos do comércio externo. Na esfera
federal, o imposto de importações vinha perdendo progressivamente importância
quantitativa, passando a ser mais um instrumento de política econômica do que uma fonte
de arrecadação fiscal. Por outro lado, a ampliação da base de incidência do imposto sobre
o consumo e de renda fez com que se tornassem, respectivamente, o primeiro e segundo
imposto federal mais importante. Nos estados, da mesma forma, com a proibição da
cobrança do imposto sobre transações interestaduais e com a limitação da alíquota
máxima de 10%, o imposto estadual sobre exportações foi substituído pelo IVC, que
tornou-se rapidamente a principal fonte de receita estadual, correspondendo, no início da
década de 1940, a cerca de 45% da receita tributária dos estados, enquanto a participação
do Imposto de Exportação caía para pouco mais que 10%, inferior às dos impostos de
transmissão inter vivos e de indústrias e profissões. Em 1946, o Imposto de Vendas e
Consignações era responsável por cerca de 60% da receita tributária estadual
29
Lei Constitucional 3, de 18 de setembro de 1940, e Lei Constitucional nº 4, de 20 de setembro de
1940. (BRASIL, Leis Constitucionais nº 3 e 4, 1940).
134
(VARSANO, 1996). Nos Municípios, os impostos sobre indústrias e profissões e predial
permaneceram como os mais importantes, correspondendo a pouco menos que 40 e 30%
da receita tributária, respectivamente.
Quadro 4.3: Tributos e Competências: 1937
União Estados
30
Municípios
1. Imposto sobre
importação
2. Imposto de consumo
3. Imposto de renda
4. Imposto de
transferência de
fundos para o exterior
5. Impostos sobre atos e
contratos
6. Competência
residual
31
7. Imposto (único) sobre
carvão mineral e
combustível e
lubrificantes líquidos
de qualquer origem
32
8. Taxas
1. Imposto sobre
propriedade rural
2. Imposto sobre
transmissão de
propriedade “causa
mortis”
3. Imposto sobre
transmissão de
propriedade imóvel
“inter vivos”
4. Imposto sobre vendas e
consignações
5. Imposto sobre
exportação
33
6. Imposto sobre indústrias
e profissões
7. Imposto sobre atos e
negócios
8. Competência residual
34
9. Taxas
1. Imposto de
licenças
2. Imposto predial
e territorial
urbanos
3. Imposto sobre
diversões
públicas
4. Taxas
Fonte: Lagemann (2003), elaborado com base na Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de
novembro de 1937.
Quadro 4.4: Sistema de partilha e transferências: 1937
Imposto Competência Participação
Indústria e profissões Estados Estados – 50% e Municípios – 50%
Combustíveis e
lubrificantes
União
Os Estados e Municípios recebem uma quota
correspondente ao seu consumo. Recurso a ser
aplicado na construção de estradas
35
.
30
Nos Territórios os impostos atribuídos aos Estados são de competência da União.
31
Sem possibilidade de bitributação. A preferência é da União.
32
Lei constitucional n
o
4 de 20 de setembro de 1940 (Emenda ao artigo 20 da Constituição). (BRASIL, Lei
Constitucional nº 4, 1940).
33
Alíquota máxima: 10%, vedados quaisquer adicionais.
34
Sem possibilidade de bitributação. A preferência é da União.
35
Lei Constitucional n
o
4 de 20 de setembro de 1940. (BRASIL, Lei Constitucional nº 4, 1940).
135
Fonte: Lagemann (2003), elaborado com base na Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de
novembro de 1937.
A racionalização do sistema tributário, a partir da reforma de 1934, teve como
efeito mais importante, o aumento da carga tributária. Com o grande crescimento
econômico e a industrialização do país, verificados especialmente a partir de 1933, foi
possível a grande expansão das bases de tributação domésticas. Além disso, como
destacado por Cossio (2002), o desenvolvimento e regulamentação do mercado de
trabalho urbano, com incorporação maciça da população e a ampliação do grau de
cobertura do sistema de previdência social também explicam o crescimento da carga
tributária no período 1930-46, que, depois de ter crescido continuamente até 1941,
manteve-se oscilando entre 13% do PIB e 15% do PIB. Essa transição para o predomínio
de bases domésticas (e não mais comércio exterior, como no período anterior) reduziu o
grau de vulnerabilidade externa da receita tributária do governo, que não foi muito
afetada pela Segunda Guerra Mundial.
Por outro lado, o estabelecimento da unidade do ponto de vista alfandegário,
econômico e comercial no território nacional, com a proibição da imposição de quaisquer
barreiras ou limitações à livre circulação de bens ou de pessoas, criou as condições
necessárias para a solidificação de um sistema econômico nacional.
No que tange à estrutura da arrecadação de impostos, apesar de a melhor
exploração de impostos indiretos ter sido a principal responsável pelo crescimento da
carga, a consolidação do imposto de renda e a expressiva ampliação das contribuições
para a previdência social resultaram no crescimento da participação dos impostos diretos
na estrutura de tributação do período.
Com relação à distribuição da receita tributária entre os entes da federação, pode-
se dizer que houve uma tendência de centralização tributária, especialmente a partir de
1937, quando a reforma, embora não tenha alterado significativamente o sistema de
impostos, permitiu dar maior poder tributário à União. Todavia, a criação de um sistema
de transferências intergovernamentais permitiu atenuar o grau de centralização
36
.
36
Segundo Cossio (2002), o grau de centralização da receita disponível aumentou de 55% em 1930 para
65% em 1945.
136
Portanto, pode-se dizer que no período do Governo Vargas, o sistema tributário
passou a ser caracterizado por maior importância das bases de tributação domésticas,
com conseqüente redução da vulnerabilidade externa; os impostos indiretos ainda
eram os mais importantes, mas com crescimento da importância dos impostos diretos;
aumento da centralização e instituição de um sistema de transferências
intergovernamentais e aumento da carga tributária.
4.3.2 Sistema Financeiro
A grande mudança estrutural que ocorreu na economia brasileira na década de
1930, em um contexto de depressão econômica mundial, que interrompeu o afluxo
regular de capitais estrangeiros para o país, acarretou uma grande necessidade de
aprimoramento do sistema financeiro, principalmente devido à necessidade de realocação
de recursos e fornecimento de crédito para o setor produtivo. A crise de 1929 inviabilizou
definitivamente a manutenção do Padrão-Ouro, abandonado em 1930, o que permitiu o
rompimento da vinculação entre choque externo e contração monetária. Durante todo o
Primeiro Governo Vargas, vigorou o padrão de papel-moeda inconversível.
Os primeiros anos do governo foram de enfrentamento da crise por vias
recessivas. A base monetária foi bastante contraída com o fechamento da Caixa de
Estabilização e o confisco da emissão de notas do Banco do Brasil em plena depressão,
período em que os preços caíram acentuadamente. Contudo, em 1931 o Banco foi
novamente autorizado a emitir e, em 1932, os preços se estabilizaram. Após a saída de
Whitaker da pasta da Fazenda, foram adotadas, paulatinamente, medidas de alargamento
das operações creditícias governamentais tanto para as operações de suporte ao café e a
outros setores agro-exportadores como para a indústria (VILLELA; SUZIGAN, 1973).
O governo Vargas inaugurou novas formas de supervisão da atividade financeira
do país. Em 1931, foi implantada a Comissão de Estudos Financeiros e Econômicos dos
estados e municípios, que permitiu, através de levantamentos estatísticos básicos sobre as
dívidas e empréstimos das três esferas da administração, uma ampliação da informação e
do controle por parte do governo federal. Estes foram ainda mais aprofundados com a
137
legislação que impôs o aval obrigatório da União para os empréstimos dos estados e
Municípios e com a passagem da comissão para a responsabilidade do Departamento de
Estatística Econômica e Financeira do Ministério da Fazenda em 1934. Finalmente, em
1937, foi criado o Conselho Técnico de Economia e Finanças (CTEF), subordinado ao
Ministério da Fazenda, com competência ampliada para estudos sobre o sistema
monetário, organização bancária, política cambial, transferência de valores para o
exterior e dívida pública.
Embora uma autoridade monetária (não um banco central) tenha sido definida
apenas em 1945 (SUMOC), o Banco do Brasil, devido ao seu peso considerável no
sistema bancário e sua conexão com o Tesouro, aproximou-se gradualmente do status de
banco central oficial durante o período. Em 1930, o BB recebeu a função de “banco dos
bancos”, com a reativação de sua Carteira de Redescontos
37
naquele ano e a criação, em
1932, da Caixa de Mobilização Bancária (CAMOB), que introduziu reservas obrigatórias
mínimas e a obrigatoriedade de depósitos no Banco do Brasil de reservas excessivas, de
tal modo que bancos com carteiras de baixa liquidez pudessem ser financiados. A Caixa
também possuía a função de emprestador de última instancia, com o objetivo de evitar a
insolvência. Ela concedia empréstimos aos bancos, tendo ativos como garantias. Os
recursos recebidos da Caixa só podiam ser usados em operações relacionadas com tais
ativos e não em novas operações bancárias, de forma que apenas os ativos de bancos
existentes na data de criação da Caixa poderiam ser nela redescontados. Esta medida
buscava reforçar a confiança no sistema bancário e permitiu que os bancos comerciais
brasileiros resistissem bem à crise.
Outra função de banco central assumida pelo BB foi a de “banco do governo”,
tendo passado a receber, em 1932, depósitos do tesouro e a transferir recursos para o
pagamento das despesas da União, passando a contar em seu balancete as contas “Receita
37
Decreto n. 19.525, de 24 de dezembro de 1930: restabelece, no Banco do Brasil, a Carteira de
Redescontos, criada pelo art. da lei n. 4. 182, de 15 de novembro de 1920, e modificada pelo art. 50 da
lei n. 4.230 de 31 de dezembro de 1920. (BRASIL, Decreto 19.525, 1930)
138
da União” e "Despesas da União”.
38
Com relação ao crédito, o BB vinha financiando as
necessidades do Tesouro Nacional
39
e do Departamento Nacional do Café
40
.
Em 1932, o país já começava a recuperar-se da crise de 1929 e, com isso, o
governo, através de uma nova regulamentação na Carteira de Redescontos do BB
41
,
ampliou a oferta de crédito, especialmente de curto prazo, com a expansão do acesso ao
redesconto para títulos industriais e agrícolas. A forte expansão da atividade industrial
que se seguiu, em 1934, aumentou a pressão sobre as instituições financeiras. O setor
industrial nascente requeria financiamento de capital de giro, de curto e médio prazo, e o
investimento industrial, de maior escala, demandava recursos de longo prazo e gerava
necessidade de financiamento, também, para serviços de infra-estrutura, que exigiam
mobilização de recursos em larga escala, com prazos ainda maiores. O tipo de crédito
oferecido pelo BB como banco comercial possuía, porém, as mesmas limitações de
outros bancos comerciais, pois dependia do volume de depósitos.
Formou-se, assim, a necessidade de instituições financeiras que suprissem crédito
industrial a médio e longo prazos. Passou-se, portanto, a perseguir o objetivo da criação
de um banco de investimentos, através de medidas e propostas de variados teores. Assim,
ainda em 1934, foi permitida, por decreto a implementação de bancos industriais no
país
42
para oferecer crédito de forma sistemática para a indústria, em pé de igualdade com
o crédito agrícola, de forma a intensificar, acelerar e aperfeiçoar a produção industrial e
tornar possível a nacionalização das indústrias que tivessem base estável no país
43
(DRAIBE, 1985).
38
Decreto 21.621, de 14 de julho de 1932: aprova o contrato firmado com o Banco do Brasil para a
execução do sistema de gestão financeira instituído pelo decreto n. 20.393, de 10 de setembro de 1931.
(BRASIL, Decreto 21.621, 1932)
39
Decreto 22.263, de 28 de dezembro de 1932: autoriza operações de crédito entre o Tesouro Nacional e o
Banco do Brasil. (BRASIL, Decreto 22.263, 1932)
40
Decreto n. 20.828, de 21 de dezembro de 1931: amplia o limite para as operações da Carteira de Emissão
e Redesconto do Banco do Brasil e dá outras providências. (BRASIL, Decreto 20.828, 1931)
41
Decreto 21.537, de 15 de junho de 1932: autoriza o redesconto de títulos destinados ao financiamento de
produção industrial, agrícola ou pecuária. A Lei 160, de 31 de dezembro de 1935: altera a Carteira de
Redescontos, estabelecida no Banco do Brasil. (BRASIL, Decreto 21.537, 1932 e Lei 160, 1935)
42
Decreto 24.575, de 4 de julho de 1934: regula a organização dos bancos de crédito industrial e dá outras
providências. (BRASIL, Decreto 24.575, 1934)
43
Segundo Draibe (1985), essas medidas esbarrariam nos problemas do volume e das fontes do capital
inicial, e em dúvidas quanto à natureza e à participação que caberia ao Estado.
139
Parte dessa necessidade de crédito foi suprida em 1937, com a criação da Carteira
de Crédito Agrícola e Industrial do Banco do Brasil (CREAI). Esta marca a
institucionalização de um órgão voltado especificamente à concessão de crédito para
criação de novas indústrias e expansão das existentes, concedendo empréstimos em
prazos de até dez anos. Os recursos para a Carteira podiam ser captados mediante a
colocação de bônus no mercado de capitais junto aos então nascentes Institutos de
Aposentadorias e Pensões. Estes títulos autônomos eram cotados na Bolsa do Rio de
Janeiro e financiavam a aquisição de maquinaria, o custeio de safras e entressafras,
sementes e adubos, a melhoria de rebanhos, além de matéria prima e reequipamento
industrial. As operações da CREAI eram feitas com garantias reais. Os limites superiores
aos empréstimos eram de 1/3 da estimativa da futura colheita, no caso da agricultura, e de
40% dos melhoramentos ou aquisições nas operações industriais. Segundo Abreu (1989),
a política creditícia revelou inflexão a partir de 1942, quando os saldos reais de
empréstimos do banco do Brasil e dos bancos comerciais ao setor privado cresceram 20%
ao ano, principalmente como resultado da CREAI. Neste mesmo ano, também foi criado
o Banco de Crédito da Borracha.
A criação das Comissões de Financiamento da Produção (1943) e de Investimento
(1944) alargou mais ainda o espaço ocupado pelo crédito estatal, avançando na
consolidação de uma política creditícia pública de alcance nacional que atingiria seu
patamar mais elevado com o decreto de nacionalização dos bancos de depósito em abril
de 1941
44
(DRAIBE, 1985).
A ampliação das funções do Banco do Brasil foi concomitante à rápida expansão
do sistema bancário brasileiro
45
, que trocou a hegemonia dos bancos estrangeiros do
início da República, por muitos bancos nacionais, inclusive estaduais
46
. Esta
44
O decreto é de 09 de abril de 1941 e previa a data de 1 de junho de 1946 para seu pleno cumprimento,
que, entretanto, não ocorreu.
45
Segundo Goldsmith (1986), o número de bancos comerciais aumentou rapidamente de algumas dezenas
em 1913 para mais de 200 em 1937 e 500 em 1945, enquanto que o número de suas agencias foi ampliado
para aproximadamente 600 em 1937 e cerca de 1.600 em 1945.
46
Em 1913, os bancos estrangeiros em atividade nas principais cidades brasileiras eram responsáveis por
cerca de 45% dos depósitos e empréstimos do sistema bancário. Em 1929, sua participação nos depósitos e
empréstimos havia caído para cerca de 25%, continuando a decair através do período. Em 1945, os bancos
estrangeiros detinham apenas 7% de todos os depósitos, caracteristicamente 9% dos depósitos à vista, mas
140
nacionalização do sistema bancário foi iniciada logo após a Guerra, ainda durante a
República Velha, com limitações impostas à remessa de valores para o exterior
47
, e pela
lei bancária de 1921
48
. Segundo Costa e Deos (2002), após tal reforma e até o final da
Primeira República, nenhum banco estrangeiro estabeleceu-se no país, e após a crise de
1929, houve fuga de capital estrangeiro. A nacionalização foi aprofundada com a
importância decrescente do comércio exterior na economia brasileira a partir da década
de 1930, que retraiu uma área de atuação onde estes bancos mantinham absoluta
predominância e com a legislação restritiva ao seu funcionamento
49
, quando se impôs
prazo para a nacionalização do sistema bancário brasileiro. Além disso, a introdução dos
controles cambiais pelo governo, representou um choque para os bancos estrangeiros,
que, normalmente, não tinham o mercado interno como atividade primordial.
Por outro lado, o grande crescimento do mero de bancos nacionais deveu-se à
quase inexistência de barreiras à entrada de brasileiros nos negócios bancários: a
legislação era permissiva; exigia-se nível reduzido de recursos de capital; eram poucos os
requisitos organizacionais e tecnológicos necessários à instalação de novos bancos.
Assim, durante o período, ocorreu o estabelecimento de um sistema bancário
efetivamente nacional. A rede bancária doméstica expandiu-se e os depósitos bancários
passaram a ser aceitos de forma mais ampla, com os recursos emprestados voltando,
então, ao sistema bancário. “Do ponto de vista da expansão e do aprofundamento das
atividades bancárias, estariam assegurado os pré-requisitos mínimos para financiar o
investimento via crédito, via criação endógena de moeda bancária, independentemente da
acumulação prévia de ‘poupança’.” (COSTA; DEOS, 2002, p. 8).
A expansão persistente do crédito pode ser verificada em todo o conjunto do
sistema bancário, e não apenas no Banco do Brasil, principalmente devido ao acesso ao
redesconto prestado pelo último. Como destacado por Oliveira (1996), o aumento do
somente 2% dos depósitos a prazo fixo, realizando somente 5% de todos os empréstimos. Suas 39 agências
representavam menos do que 2% do total (GOLDSMITH, 1986).
47
Decreto 13.110, de 19 de julho de 1918: proíbe a exportação de valores e a remessa de fundos para o
exterior e dá outras providencias. (BRASIL, Decreto 13.110, 1918)
48
Decreto 14.728, de 16 de março de 1921: aprova o regulamento para a fiscalização dos bancos e casas
bancárias. (BRASIL, Decreto 14.728, 1921)
49
Imposta pelas Constituições de 1934 e 1937 e pelo Decreto-Lei 3.182de 09 de abril de 1941. (BRASIL,
Constituições, 1934 e 1937 e Decreto-Lei 3.182, 1941)
141
encaixe e do próprio capital das sociedades bancárias não acompanhou a expansão dos
empréstimos. No que tange aos bancos nacionais, todavia, estes desenvolveram uma
arrojada política de crédito, aumentando suas operações ativas através do incremento dos
empréstimos, sem se preocuparem, basicamente, em reforçar, na mesma proporção, os
encaixes e o capital.
A discussão sobre a criação de um Banco Industrial especificamente para prover
crédito começou nesse período e aprofundou-se em 1942 com o relatório da Missão
Cooke, que formulou a idéia da alteração no mercado de capitais e da criação de um
banco de investimentos responsável pelos empréstimos e pela assistência técnica e
financeira às empresas. Todavia, tal Banco (o BNDE) viria a ser criado em 1952,
durante o Segundo Governo Vargas. A solução do problema de financiamento para
investimentos de grande porte, especialmente para o desenvolvimento industrial, foi a
intervenção direta do Estado, que assumiu o papel de produtor e, assim, conseguiu
canalizar recursos externos e realizar diretamente os investimentos como ocorreu no
caso da Companhia Siderúrgica Nacional.
4.3.2.1 Câmbio
A grande depressão de 1929 afetou diretamente o balanço de pagamentos
brasileiro, principalmente devido à forte queda nos preços dos produtos de exportação,
que não foi compensada por um aumento na quantidade exportada, e à interrupção dos
fluxos de capitais externos. Os termos de intercâmbio caíram em cerca de 30% e a
capacidade de importar, em 40%.
Após uma curta busca por uma solução liberal para o câmbio, com a abolição do
monopólio cambial que havia sido estabelecido no fim da República Velha, mas, na
prática, com moratórias sucessivas em relação às dívidas em moeda estrangeira, em 1931
a situação tornou-se insustentável. Entre 1930 e 1931, o mil-réis desvalorizou-se 55% (de
9$230 para 13$660 mil-réis/US$). Em setembro de 1931, os pagamentos relativos à
142
divida pública externa foram suspensos, e o monopólio cambial do Banco do Brasil foi
reintroduzido
50
.
Pelo sistema então introduzido, a venda de cambiais de exportação ao BB era
obrigatória. De posse destas, o Banco passaria a atender às necessidades do mercado à
taxa oficial segundo a seguinte ordem de prioridades:
1. Compras do governo e pagamento do serviço da dívida pública;
2. Importações essenciais;
3. Procura de cambiais para outros fins, inclusive a remessa de rendimentos de
capitais particulares para o exterior.
Em princípio, o objetivo de tais medidas era alcançar o equilíbrio, ou, ao menos,
reduzir o déficit no balanço de pagamentos. Uma taxa de câmbio artificialmente
sustentada tornava menos difícil a liquidação dos compromissos do governo em moeda
conversível. Indiretamente, porém, elas favoreceram a indústria interna, beneficiada
pela contínua desvalorização cambial, ao inibir ou dificultar as importações menos
essenciais. Além disso, os interesses ligados à indústria eram protegidos da competição
internacional pela existência do controle de importações, além da indústria ter acesso a
insumos relativamente baratos. Ao mesmo tempo, a fixação da taxa oficial acima da taxa
de mercado livre diminuía os efeitos sobre a renda do setor exportador da queda nos
preços do café (VILLELA; SUZIGAN, 1973; ABREU, 1989).
Apesar da adoção das medidas restritivas, a situação cambial não mostrou
melhoras até 1934. As relações de troca continuaram deteriorando-se, afetando as receitas
cambiais e o balanço de pagamentos. A dívida externa, sozinha, absorvia mais da metade
do saldo da balança comercial. Esta escassez de divisas fez com que surgisse um
“mercado negro” cambial, com taxas bem mais elevadas que as do mercado oficial. Para
contornar a situação, foi criado, em 1932-33, um mercado “cinzento”, semi-oficial,
alimentado por módico montante das cambiais de exportação, que variava entre 7 e 11%,
para aliviar a escassez de divisas, principalmente para remessas de lucros, vendidas fora
50
Decreto 20.451, de 28 de setembro de 1931 (BRASIL, Decreto 20.451, 1931).
143
do mercado oficial. A taxa cambial era mais alta que a oficial, porém mais baixa que a do
mercado negro. Este sistema vigorou até abril de 1933, quando o BB voltou a operar
apenas à taxa oficial e com o monopólio de todas as operações.
Em 1934, acentuou-se a tendência a uma maior liberalização do câmbio.
Inicialmente, foi permitido aos bancos comerciais operar no mercado livre com o câmbio
proveniente de outras fontes que não as das exportações, com o objetivo de canalizar para
este tipo de operações os recursos que, até então, convergiam para o mercado negro. O
Banco do Brasil, contudo, continuava com o monopólio de compra das divisas de
exportações e supria integralmente as cambiais para importações essenciais. Pouco
depois, também as exportações não tradicionais passaram ao mercado livre. Em setembro
do mesmo ano, toda a cobertura cambial gerada por exportações
51
foi liberada do controle
cambial, respondendo às recomendações feitas por uma missão norte americana que veio
ao Brasil para avaliar a situação cambial
52
.
A liberdade na concessão de licenças para remeter lucros voltou a agravar a crise
cambial, e, no inicio de 1935, foi proposta a suspensão do pagamento do serviço da
dívida externa. O acirramento dos ânimos, especialmente nos EUA, todavia, fez com que
tal idéia fosse abortada e com que um novo arranjo no mercado de câmbio fosse adotado,
criando-se um mercado livre com um volume de operações predominante sobre o
mercado oficial.
O novo arranjo estabelecia a venda compulsória de uma cota de 35% das cambiais
de exportações ao Banco do Brasil e à taxa oficial destinada exclusivamente aos serviços
da dívida externa e da liquidação dos atrasados comerciais. Todas as demais operações,
inclusive importações, passaram para o mercado livre, que seria suprido pelos 65%
restantes das cambiais de exportação. Este regime vigorou até fins de 1937, com a taxa de
importação permanecendo constante no período, mas a de exportação tendo variado
bastante, devido à concessão de isenções parciais ou totais da venda obrigatória de 35%
51
Segundo Abreu (1989), inclusive o café. Já segundo Villela e Suzigan (1973), exceto café, o qual
continuou sujeito a uma entrega ao Banco do Brasil e à taxa oficial de 155 francos por saca exportada, que
correspondiam a cerca de 83% de seu valor, o restante poderia ser negociado no mercado livre. Por outro
lado, ficava o Banco do Brasil obrigado a fornecer, ao câmbio oficial, o equivalente a 60% das importações
do país.
52
Chefiada por John Williams, do Federal Reserve Bank of New York.
144
das cambiais de exportação à taxa oficial ao BB para incentivar certos produtos de
exportação, beneficiados com as melhores taxas do mercado livre. Segundo Abreu
(1989), desta política, acoplada à política cafeeira, resultou uma expansão de 20% no
valor das exportações entre 1935 e 1936, enquanto o nível de importações mantinha-se
praticamente constante, o que permitiu a acumulação rápida de uma razoável reserva de
cambiais.
A relativa folga cambial alcançada nesse período possibilitou uma maior
liberalização quanto à remessa de lucros. Em 1937, o aquecimento da economia, que,
entre 1934 e 1937, crescia 6,5% ao ano, permitiu um aumento de cerca de 40% em valor
nas importações entre 1936 e 1937, de forma que o saldo da balança comercial foi
fortemente reduzido, obrigando o governo a decretar a volta do monopólio de todas as
operações cambiais através do Banco do Brasil, a partir de dezembro de 1937. Com base
em uma taxa de câmbio única desvalorizada, introduziu-se um sistema de controle
cambial similar ao vigente entre 1931 e 1934. Além disso, foram suspensos por dois anos
(1938-39) os pagamentos da dívida externa e instituído um imposto de 3% sobre todas as
transações cambiais.
Com a volta ao monopólio, os exportadores foram obrigados, novamente, a
vender ao Banco do Brasil toda a receita de exportação à taxa oficial, e as solicitações
cambiais passaram a ser atendidas dentro do seguinte critério de prioridades:
1. Necessidades da administração pública;
2. Importações de mercadorias e fretes de exportação;
3. Despesas no estrangeiro das empresas de serviço público;
4. Remessas de dividendos e lucros em geral;
5. Outras remessas.
Esse sistema vigorou até abril de 1939 quando, em face das melhores condições
do mercado cambial já a partir de 1938, praticamente liquidaram-se os créditos
comerciais em atraso desde 1933, e foi possível restabelecer, quase que integralmente, a
145
liberdade das operações cambiais
53
. O novo sistema estabeleceu três taxas cambiais
diferentes: a livre, determinada pelo mercado “livre”, suprida por 70% das cambiais
geradas pelas exportações, que deveria suprir integralmente as divisas para importação de
mercadorias; a oficial, administrada exclusivamente pelo Banco do Brasil, destinada a
prover as necessidades cambiais do governo e suprida pelos 30% restantes das cambiais
de exportação, que deveriam ser vendidos compulsoriamente ao BB à taxa oficial de
câmbio mais favorável ao governo do que a taxa livre –; a livre especial, destinada a
operações não comerciais, englobando transações financeiras privadas, especialmente
remessas de lucros e dividendos de capitais estrangeiros, mais depreciada do que a taxa
de mercado livre.
No período da Segunda Guerra, salvo uma curta fase em 1939-40, em que a queda
no preço do café, juntamente com a perda de alguns dos principais mercados europeus
envolvidos pela guerra, reduziu as receitas de exportações brasileiras, registraram-se
grandes saldos na balança comercial e folga no balanço de pagamentos. O acumulo de
divisas então verificado, em face da restrição da oferta externa, possibilitou a
estabilização cambial e permitiria, até mesmo, uma valorização do mil-réis (cruzeiro, a
partir de 1942), que, todavia, não foi efetivada, para evitar desgastes políticos e
econômicos quando a situação mundial voltasse à normalidade. De fato, embora se tenha
retornado à liberdade cambial durante o período, o ambiente de guerra fez com que se
vivesse como se houvesse restrições de importações ou controle de câmbio, já que os
fluxos comerciais foram praticamente interrompidos, permitindo que se mantivesse uma
procura reprimida de importações e remessas.
Do exposto, percebe-se que a política cambial foi direcionada de forma a
contribuir com os objetivos do governo, seja para equilibrar o balanço de pagamentos,
seja especificamente com objetivos industrializantes. Assim, até 1937, a garantia de uma
oferta “adequada” de divisas que possibilitasse a liquidação de compromissos financeiros
era, segundo Abreu (1989), um objetivo explícito da política econômica. Para alcançá-lo,
foram adotados regimes de controle cambial e de importações que tinham como
justificativa básica a garantia da obtenção, pelo governo, de divisas a uma taxa de câmbio
53
Decreto 1.201, de 08 de abril de 1939. (BRASIL, Decreto 1.201, 1939).
146
favorável. A desvalorização cambial e o conseqüente encarecimento das importações
permitiram a utilização da capacidade ociosa na indústria, enquanto a continuada adoção
de políticas fiscal, cafeeira, monetária e creditícia expansionistas permitiu a sustentação
da demanda.
Em 1937, entretanto, explicitou-se a contradição entre os programas de
investimentos públicos e a manutenção dos pagamentos do serviço da dívida, mesmo em
escala reduzida, o que conduziu a uma reversão da política adotada desde 1930. O
controle cambial e de importações depois de 1937 tornou-se o principal instrumento de
política comercial. Com a Guerra, as restrições às importações passaram ao lado da oferta
e a intervenção direta no mercado de câmbio não se fez necessária.
4.3.2.2 Mercado de Capitais
Como visto no capítulo anterior, após a I Guerra Mundial, tanto o mercado de
títulos como de ações passaram a declinar. O número de empresas registradas na Bolsa de
Valores do Rio de Janeiro diminuiu quase 20% até a cada de 1940, embora tenha
aumentado a participação de indústrias em detrimento de setores como bancos (que, de
mais de a metade das negociações antes da IGG, passaram a não mais de 10% na década
de 1940), empresas têxteis e de transportes (GOLDSMITH, 1986).
O declínio do mercado de capitais, segundo Musacchio (2005), foi
definitivamente consolidado com a reforma da lei de falências de 1945, que alterou
radicalmente a posição de credores, dando prioridade aos trabalhadores e às dívidas com
o governo.
De uma forma geral, portanto, o sistema financeiro do período pode ser
caracterizado por uma maior intervenção governamental. Uma Autoridade Monetária
foi sendo solidificada ao longo do período com o aumento das funções do Banco do
Brasil e, no final do período, com a criação da SUMOC. O fim do Padrão-Ouro permitiu
uma maior desvinculação entre política monetária e cambial. Além disso, as políticas
147
monetária e cambial passaram a ser utilizadas, além de suas funções típicas, como
instrumentos para a promoção do desenvolvimento e uma estrutura de órgãos de
acompanhamento foi criada, permitindo um feedback e, assim, uma maior
racionalização das políticas. O crescimento industrial foi facilitado pela expansão do
crédito, com a criação de uma estrutura especializada, consolidando uma política
creditícia pública de alcance nacional e com o crescimento do sistema bancário, que
passou a ser predominantemente nacional. Por outro lado, a mudança na legislação de
mercado de capitais e corporações tornou a oferta de financiamento por esse meio menos
atrativa.
4.3.3 Trabalho
Mudanças no ambiente econômico e na “visão de mundo” do governo, em
especial a concentração do poder no Executivo Federal além da necessidade de formação
de uma base de apoio ao novo governo induziram uma série de mudanças nas regras
formais, assim como nas relações de trabalho durante o primeiro governo Vargas. Como
destacado por Barbosa (2003) é a partir de 1930 que se inicia o processo de
nacionalização e consolidação de um mercado de trabalho no Brasil, que até então se
mostrava fragmentado regionalmente e incompleto.
Após 1930 o mercado de trabalho pôde se nacionalizar sob vários aspectos,
acompanhando a expansão industrial. Em primeiro lugar, a oferta de trabalho já respondia
mais que suficientemente ao aumento da demanda devida ao crescimento da produção
54
.
Em segundo lugar, as diferenças regionais, em termos de condições de trabalho urbano,
se atenuavam
55
. Por fim, a participação dos imigrantes foi reduzida, especialmente no
54
Segundo Barbosa (2003), isto fica claro quando se leva em conta a taxa anual de crescimento do emprego
assalariado industrial para o conjunto do país, de 5% ao ano (contra 6% para o Estado de São Paulo), entre
1920 e 1940 significando uma ampliação da ocupação de mais de duas vezes e meia para o Brasil ao
longo do período, e de três vezes para o estado mais dinâmico, que já acumulava 35% dos empregos
industriais em 1940.
55
Como o prova a queda da participação de o Paulo e do Distrito Federal no total de sindicatos do país,
entre 1934 e 1939, de 43,9% para 21,4%, devido ao incentivo à sindicalização de todos os trabalhadores em
todo o território nacional. Posteriormente, a partir de 1954 e a 1963, também o diferencial de salários
entre as regiões do país reduziram-se de forma expressiva (BARBOSA, 2003).
148
mercado de trabalho urbano paulista, sendo substituídos, por uma segunda geração de
trabalhadores, composta pelos migrantes rurais, especialmente do Nordeste.
Dentro desse novo quadro, tornou-se necessária uma maior regulamentação do
trabalho, tanto para se alcançar uma maior estabilidade política quanto para dar
continuidade ao desenvolvimento urbano-industrial do país. As leis trabalhistas ganharam
nova dimensão política e maior relevância econômica e social e a chamada “questão
social” deixou de ser vista como um “caso de polícia”. De fato, a partir da Revolução de
30 o tratamento dispensado pelo Estado à questão social sofreu uma alteração substantiva
e desdobrou-se em inúmeras iniciativas que resultaram, em meados dos anos 1940, em
um sistema nacional de relações de trabalho, embora esteja claro que o debate e as
iniciativas de regulamentação do trabalho já haviam começado durante a República
Velha.
A formação desse novo sistema não ocorreu de forma linear. Como destacado por
Oliveira (2002), para cada ambiente político do período configurou-se um tipo de relação
com os trabalhadores. Durante o Governo Provisório, proliferaram as iniciativas de
criação de legislação sindical, previdenciária e do trabalho, aproveitando a margem de
manobra que o Poder Executivo detinha. Já no Governo Constitucional, buscou-se o
restabelecimento do pluralismo sindical e uma redução na quantidade de novas leis
criadas, embora ainda tenham ocorrido novas iniciativas de regulamentação do trabalho e
de preservação do esforço Legislativo anterior. Finalmente, sob o Estado Novo, foi
consolidado um ambiente institucional muito mais autoritário e corporativista no âmbito
das relações de trabalho. Todavia, o período como um todo, mostrou muito mais do que
uma nova abordagem da questão social ou uma profusão de leis sindicais, trabalhistas e
previdenciárias. O que se viu foi uma redefinição do papel do Estado, que tomou as
rédeas do desenvolvimento do país, se prontificando a organizar o mercado de trabalho
de forma a suprir as necessidades criadas no novo estágio em que o país ingressava.
A nova distribuição de poder, mais centralizado no Executivo federal, em
detrimento das oligarquias regionais, permitiu que outros grupos se destacassem e
estimulou a retomada da organização sindical por parte dos trabalhadores, que passaram a
ter o Estado como intermediador de conflitos. Esta nova relação do Estado com
organizações representativas conformava-se com os preceitos de pensadores autoritários
149
da época, como Oliveira Viana, Azevedo Amaral, Alceu Amoroso Lima e Francisco
Campos, que defendiam um Estado forte e centralizado e a elevação da questão social à
condição de problema fundamental de Estado que exigia uma política social, em
consonância com o clima político internacional marcado pela crise do liberalismo e pela
ascensão de experiências autoritárias em vários países europeus.
A relação do Estado com a questão social está conjugada também com a nova
ideologia política de valorização do trabalho e de “reabilitação” do papel e do lugar do
trabalhador nacional que se estruturou no período. A partir de 1930, e em especial
durante o Estado Novo, podemos detectar uma estratégia político-ideológica de combate
à “pobreza”, que estaria centrada justamente na promoção do valor do trabalho. O meio
por excelência de superação dos graves problemas socioeconômicos do país, cujas causas
mais profundas radicavam-se no abandono da população, seria justamente o de assegurar
a esta população uma forma digna de vida. Promover o homem brasileiro, defender o
desenvolvimento econômico e a paz social do país eram objetivos que se unificavam em
uma mesma e grande meta: transformar o homem em cidadão/trabalhador, responsável
por sua riqueza individual e também pela riqueza do conjunto da nação. Como destacado
por Gomes (1999),
[...] o trabalho, desvinculado da situação de pobreza, seria o ideal do
homem na aquisição de riqueza e cidadania. A aprovação e a
implementação de direitos sociais estariam, desta forma, no cerne de uma
ampla política de revalorização do trabalho caracterizada como dimensão
essencial de revalorização do homem. O trabalho passaria a ser um
direito e um dever; uma tarefa moral e ao mesmo tempo um ato de
realização; uma obrigação para com a sociedade e o Estado, mas também
uma necessidade para o próprio indivíduo encarado como cidadão.
(GOMES, 1999, p. 55)
As transformações no setor urbano, todavia, não apresentaram paralelo nas
atividades rurais. Como destacado por Ramos (2003), na República mantiveram-se a
estrutura fundiária concentrada e os regimes de “colonato” em São Paulo e em parte do
Sudeste e de “moradia sob condição” na Zona da Mata do Nordeste. Os
“colonos/moradores” podiam ter acesso à terra e, portanto, produzir bens agropecuários,
sem serem proprietários, de forma que a estrutura fundiária concentrada não impedia a
produção de caráter familiar. Apenas no final do período foram definidas algumas regras
150
também para os trabalhadores rurais, que, todavia, devido às dificuldades de fiscalização,
dificilmente seriam efetivas.
Fonseca (1989) enfatiza que, embora segundo a ‘memória histórica oficial’, a
legislação trabalhista possa ser considerada a verdadeira marca do primeiro governo
Vargas, essa questão é polêmica. Se por um lado
[...] alguns procuram ver no tratamento da ‘questão social’ as vantagens
recebidas pelos trabalhadores, antes desprotegidos e largados à própria
sorte, evidenciando o papel do Estado que consagrou e adiantou
conquistas à classe operária, outros preferem denunciar o caráter
autoritário (e fascista) da legislação, a anulação da autonomia sindical e
das lideranças espontâneas dos trabalhadores anteriores a 1930, a
importância das leis antes para reprimi-los que para beneficiar,
salientando as vantagens das medidas para a própria acumulação
capitalista. (FONSECA, 1989, p. 222)
Como percebemos do capítulo anterior, é evidente que as leis trabalhistas não são
inovações do governo estabelecido após 1930, constituindo-se, a regulamentação da força
de trabalho nesse período como uma continuidade e aprofundamento do que vinha
ocorrendo. Todavia, como destacado por Fonseca (1989, 223, grifo do autor), “[...] a
extensão e o caráter globalizante da legislação trabalhista do pós-30, impondo o Estado
como mediador, executor, legislador e julgador dos conflitos de classe, iria de fato
estabelecer relações entre trabalho e capital, cuja forma difere significativamente da
anterior”, e que resultariam no favorecimento da expansão capitalista.
4.3.3.1 Instituições Formais
Vitoriosa a revolução de outubro, um dos primeiros atos do Governo Provisório
foi criar o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio
56
, demonstrando os objetivos do
governo de enquadrar juridicamente a questão social. O chamado “Ministério da
Revolução” buscava congregar os interesses dos trabalhadores, da indústria e do
comércio
57
. Neste sentido, os empresários passaram a ter acesso a um órgão público
encarregado de regulamentar as condições de contratação, uso e remuneração da força de
56
Decreto 19.433, de 26 de novembro de 1930. (BRASIL, Decreto 19.433, 1930)
57
O que em várias oportunidades justificou a entrega do comando ministerial a um representante do
empresariado.
151
trabalho e de atender seus interesses em áreas como política tarifária, importação de bens
de capital e incentivos públicos, que seriam tratados no âmbito do Departamento
Nacional da Industrial (DNI) e do Departamento Nacional do Comércio (DNC); enquanto
os trabalhadores foram contemplados com uma ampla legislação trabalhistas e os seus
interesses específicos passariam a ser tratados pelo departamento Nacional do Trabalho
(DNI), transformado em órgão central responsável pelo controle, aplicação e proposição
das novas leis sobre previdência social e condições gerais de trabalho
58
.
O primeiro ministro desse novo órgão foi Lindolfo Collor, que marcou sua
passagem pelo “Ministério da Revolução” com uma grande produção normativa. De
orientação positivista, este ministro era claramente contrário ao liberalismo econômico e
à visão do trabalho como mercadoria, que
[...] não está de acordo, não apenas com as tendências sociais
contemporâneas, senão também com o nível das conquistas políticas e as
próprias imposições econômicas, definitivamente reconhecidas e aceitas
em quase todos os países do Velho e em não poucos do Novo Mundo.
[...] o Tratado de Versalhes, de que nosso pais é signatário, dispõe que “o
trabalho não deve ser considerado simplesmente como mercadoria ou
artigo de comércio”, o que quer dizer, em outras palavras, que se o de
cercar de garantias normais e permanentes, capazes de permitirem aos
trabalhadores um vel de vida compatível com a dignidade humana.
Entre as conquista sociaes e políticas que se podem ter como
absolutamente pacificas em todos os paises civilizados, destaca-se em
primeira linha o direito de associação. [...] Foi o culo XIX a era do
individualismo econômico; o século XX será, como está sendo, o da
sindicalização das forças produtoras [...] (COLLOR, 1931
59
apud
BIAVASCHI, 2005, p.205)
Foi baseado nesse tipo de visão que o governo que aos poucos se estabilizava no
poder criaria um ambiente institucional que incentivava a sindicalização amplamente
controlada pelo Estado em troca de concessões de uma legislação que definia as regras e
assegurava um novo grau de proteção aos trabalhadores sob a tutela deste Estado a cada
período mais centralizador.
58
O DNI, o DNC e o DNT, bem como o Departamento Nacional de Estatística (DNE) e o Departamento
Nacional de Povoamento (DNP), foram criados ou reorganizados por meio do Decreto 19.667, de 04 de
fevereiro de 1931, que definiu a estrutura interna do Ministério do Trabalho. (BRASIL, Decreto 19.667,
1931)
59
Exposição de motivos ao decreto sobre organização a sindical. Decreto 19.770, de 19 de março de 1931.
(BRASIL, Decreto 19.770, 1931)
152
As inúmeras regras formais relativas a questões trabalhistas expedidas no período
podem ser divididas em cinco categorias: a) nacionalização do trabalho, b)
sindicalização, c) direitos trabalhistas e seguridade social e d) órgãos para fiscalizar e
concretizar a aplicação das normas (enforcement).
a) Nacionalização do trabalho
Uma das primeiras medidas tomadas pelo novo Ministério era voltada à
nacionalização dos trabalhadores
60
, ou seja, de incentivo à contratação de trabalhadores
nacionais. Esta medida limitou por um ano a imigração estrangeira de classe e
estabeleceu a obrigatoriedade de contratação de, no mínimo, dois terços de brasileiros
natos por todas as empresas ou estabelecimentos comerciais
61
. A chamada lei dos dois
terços pretendia fomentar a incorporação do trabalhador nacional ao mercado de trabalho
e restringir a contratação de estrangeiros. Tal medida enquadrava-se nos ideais
nacionalistas do novo governo, que buscava dessa forma aumentar a auto-estima do
brasileiro com um esforço ideológico de valorização desse trabalhador, que passou a ser
visto como elemento formador de uma verdadeira “raça brasileira”. Até então, durante
toda a República Velha, a grande entrada de imigrantes, somada ao preconceito de
industriais e oligarcas fazia com que estes fossem preferidos aos trabalhadores nacionais
que, desempregados, aumentavam o estigma de “vagabundos”. Ao mesmo tempo, esta
legislação buscava reduzir a entrada de ideologias estrangeiras nos sindicatos, uma vez
que, não os imigrantes eram a maioria dos empregados nas atividades industriais,
como também o eram nas associações operárias.
Em 1934, foi criado, junto ao Ministério do Trabalho, no Departamento Nacional
do Povoamento, o serviço de identificação de imigrantes
62
. E, durante o Estado Novo,
60
Decreto 19.482, de 12 de dezembro de 1930: limita a entrada, no território nacional, de passageiros
estrangeiros de terceira classe, dispõe sobre a localização e amparo de trabalhadores nacionais, e dá outras
providências. (Lei dos Dois Terços). (BRASIL, Decreto 19.482, 1930)
61
A lei dos dois terços foi regulamentada pelo decreto n
o
20.291, de 12 de agosto de 1931, segundo o qual
“[...] todos os indivíduos, empresas, associações, sindicatos, companhias e firmas comerciais ou industriais
que exploram qualquer ramo de comércio ou indústria ocupem, entre os seus empregados, de todas as
categorias, dois terços pelo menos, de brasileiros natos”. (BRASIL, Decreto 20.291, 1931).
62
Decreto n
o
24.695, de 12 de julho de 1934: cria, no Departamento Nacional do Povoamento, o serviço de
identificação de imigrantes e dá outras providencias. (BRASIL, Decreto 24.695, 1934)
153
reiterou-se a obrigatoriedade de contratação de pelo menos dois terços de empregados
brasileiros e se equiparou ao trabalhador nacional os estrangeiros residentes no país
mais de dez anos, desde que casados com cônjuge brasileiro ou com filho brasileiro
63
.
Esta medida foi promulgada em um momento em que era evidente o declínio da
imigração estrangeira e havia se intensificado o fluxo interno de mão-de-obra,
especialmente do Nordeste para o Sudeste.
b) Sindicalização
Uma das marcas do Primeiro Governo Vargas é o grande crescimento da
sindicalização dos trabalhadores, especialmente em sindicatos reconhecidos pelo governo
(oficiais). Este processo de sindicalização foi iniciado em 1931, com sua regulamentação,
tanto para empregados (classes operárias) como para empregadores (classes patronais)
64
,
que pretendia fomentar a intermediação de interesses por meio de sindicatos de
empregados e empregadores, sujeitos ao reconhecimento oficial, inaugurando-se aí a
adoção de mecanismos de controle ministerial sobre a vida interna dos sindicatos
65
.
Como contrapartida a tal controle, o Ministério oferecia muitas vantagens aos sindicatos
oficiais
66
. Os empregados associados aos sindicatos oficiais seriam, ainda, protegidos
pelo governo da repreensão dos patrões (Art. 13 e 14).
63
Decreto-Lei 1.843, de 7 de dezembro de 1939. (BRASIL, Decreto-Lei 1.843, 1939).
64
Decreto n
o
19.770, de 19 de março de 1931: regula a sindicalização das classes patronais e operárias e dá
outras providências. (BRASIL, Decreto 19.770, 1931)
65
Entre as condições para a organização do sindicato, constavam: a reunião de, pelo menos, 30 associados
de ambos os sexos, maiores de 18 anos; maioria, na totalidade dos associados, de dois terços, no mínimo,
de brasileiros natos ou naturalizados, assim como para o exercício de cargos de administração e de
representação, com mandato anual, sem direito a reeleição; gratuidade dos serviços de administração, sem
direito ao acumulo de cargos; e abstenção de qualquer propaganda de “ideologia sectária”, de caráter social,
político ou religioso, bem como de candidaturas a cargos eletivos, estranhos à natureza e finalidade das
associações (art 1º). Os empregados ou empregadores sindicalizados não poderiam fazer parte de sindicatos
internacionais, sob pena de exclusão. Além disso, os estatutos deveriam ser aprovados pelo Ministério, e
todos os dados dos associados remetidos ao mesmo e suas atividades relatadas anualmente aos órgãos
ministeriais. Ao Ministério do Trabalho cabia conceder ou não o reconhecimento oficial, fiscalizar as
assembléias gerais e a situação financeira dos sindicatos, lavrar multas pelo descumprimento da lei, fechar
o sindicato, federação ou confederação por até seis meses ou promover a sua dissolução definitiva, podendo
destinar o seu patrimônio a entidades de assistência social. (BRASIL, Decreto 19.770, 1931)
66
Estes poderiam fundar e administrar caixas beneficentes, agências de colocação, cooperativas, serviços
hospitalares, escolas e outras instituições de assistência, assim como seriam considerados órgãos
consultivos e técnicos no estudo e solução, pelo governo federal, dos problemas que, econômica e
socialmente, se relacionassem com os seus interesses de classe (Art ). Além disso, poderiam: pleitear
154
Portanto, na medida em que as conquistas trabalhistas só seriam concedidas
àqueles que se associassem a sindicatos oficiais, o governo conseguiu estimular um
rápido crescimento de tais organizações
67
. No caso dos empresários, o aumento da
sindicalização deveu-se ao progressivo estímulo que representaria a criação de conselhos
para o encaminhamento de suas demandas junto à burocracia estatal encarregada tanto da
regulação pública do trabalho como da promoção da indústria e do comércio
68
. Segundo
Oliveira (2002), a consagração da unicidade sindical e a definição do sindicato como
órgão de colaboração com o poder público representou a primeira iniciativa legal no
sentido de submeter explicitamente os sindicatos à tutela estatal e de conferir a eles o
caráter de instituições de direito público. Com isso, o governo buscava concorrer com as
lideranças tradicionais do movimento operário e interferir na organização sindical de
trabalhadores, conferindo ao sindicato um papel predominantemente assistencial.
Todavia, Oliveria (2002) destaca o fato de que a concessão de direitos não foi
simplesmente uma iniciativa unilateral do governo, que estimulou a organização dos
trabalhadores urbanos com a finalidade de ampliar sua própria força política, o
corporativismo em estágio embrionário, expresso na montagem do aparato ministerial e
na nova legislação sindical e trabalhista, mas também uma resposta aos sinais de
mobilização e reorganização dos trabalhadores.
perante o Ministério medidas de proteção, auxílios, subvenções, para os seus institutos de assistência e de
educação, assim como a criação de tais institutos pelo governo, no caso de falta de recursos do sindicato; a
regularização de horas de trabalho em geral, e, em particular para menores, para mulheres e nas indústrias
insalubres; melhoria de salários e sua uniformização em igualdade de condições, para ambos os sexos;
fixação de salários mínimos para trabalhadores urbanos e rurais; regulamentação e fiscalização das
condições higiênicas do trabalho e medidas preventivas ou repressivas contra infrações de leis, decretos e
regulamentos que prescreverem garantias ou direto às organizações sindicais (Art. 8º). (BRASIL, Decreto
19.770, 1931)
67
Entre 1931 e 1933 foi expressivo o crescimento do número de sindicatos oficiais, que nesse intervalo de
tempo saltou de 41 para 413 sindicatos de empregados. A maioria deles (258) foi reconhecida em 1933. No
ano seguinte, foram reconhecidos mais 166 sindicatos de empregados, perfazendo um total de 579
sindicatos oficiais até 1934. Esse movimento de sindicalização atingiu todos os estados, exceto Goiás,
concentrando-se nas regiões Sudeste (239) e Sul (127), seguidas pelo Nordeste (99), Distrito Federal (77),
Norte (33) e Centro-Oeste (4) (OLIVEIRA, 2002).
68
Também no caso do empresariado, registrou-se um aumento no número de sindicatos oficiais, mas
inicialmente em ritmo menos intenso do que o observado no caso dos trabalhadores. Entre 1931 e 1933,
passou-se de três para 87 sindicatos oficiais de empregadores, 79 deles reconhecidos em 1933. Esses
sindicatos estavam concentrados no Distrito Federal (26) e nos estados de São Paulo (21), Rio de Janeiro
(11) e Minas Gerais (11), seguidos pelo Rio Grande do Norte (7), Alagoas (2) e Sergipe (1). A partir de
1934, porém, houve uma expansão significativa do número de empregadores (OLIVEIRA, 2002).
155
Com a Constituinte, em 1933, um novo estimulo à sindicalização oficial foi dado
com a definição de regras de participação na Assembléia Nacional Constituinte, que além
da eleição de deputados por meio do voto popular, previu a escolha de delegados
classistas de empregados e empregadores
69
, permitindo uma participação mais direta
destes representantes na elaboração do novo texto constitucional. Além disso, a
regulamentação do direito de férias anuais de 15 dias para os trabalhadores da Indústria,
empresas jornalísticas, comunicações, transportes terrestres e aéreos e serviços públicos,
restrito apenas aos empregados filiados aos sindicatos reconhecidos por lei
70
, tornava
quase que inevitável a sindicalização a trabalhadores “racionais”. No caso do
empresariado, a adesão à sindicalização oficial intensificou-se apenas depois que algumas
mudanças introduzidas na legislação sindical possibilitaram a sobrevivência de suas
associações livres.
A constituição de 1934 consagrou a representação profissional adotada durante a
constituinte como critério regular de representação política, reiterando, por outros meios,
o papel do sindicato oficial como órgão de colaboração com o poder público e o um
decreto elaborado sob a coordenação de Oliveira Viana
71
reiterou os preceitos da lei de
sindicalização de 1931 e os aprimorou, oferecendo novos estímulos à sindicalização
oficial e coibindo o direito à pluralidade e à autonomia dos sindicatos, conferindo ao
sindicato o papel de órgão de defesa da respectiva profissão e dos direitos e interesses
profissionais de seus associados, de coordenação de direitos e deveres recíprocos,
comuns a empregados e empregadores, decorrentes de sua atividade econômica e social;
e de colaboração com o Estado, no estudo e solução dos problemas que direta ou
indiretamente se relacionassem com os interesses da profissão.
Em 1935, com a Lei de Segurança Nacional
72
o governo passou a retardar o
reconhecimento de sindicatos considerados indesejáveis, assim como a apoiar a criação
de entidades que, mesmo sem representatividade, fossem dirigidas por homens de
69
De acordo com o Decreto 22.696, de 11 de maio de 1933, os empregados e empregadores legalmente
sindicalizados teriam direito a eleger seus respectivos representantes na proporção de um para cada
sindicato, que posteriormente se reuniriam em um colégio eleitoral encarregado de escolher entre seus
membros, 40 delegados constituintes, sendo 17 de empregadores, 18 de empregados, três de profissionais
liberais e dois de funcionários públicos. (BRASIL, Decreto 22.696, 1933)
70
Decreto 23.768, de 18 de janeiro de 1934. (BRASIL, Decreto 23.768, 1934)
71
Decreto n
o
24.694 - de 12 de julho de 1934. (BRASIL, Decreto n
o
24.694, 1934).
72
Lei n
o
38, de 4 de abril de 1935. (BRASIL, Lei n
o
38, 1935)
156
confiança do Ministério do Trabalho. Além disso, as greves e manifestações políticas de
trabalhadores passaram a ser duramente reprimidas, o sindicalismo autônomo foi
liquidado e vários sindicatos oficiais, fechados.
A constituição de 1937 restabeleceu o sindicato único e apenas os sindicados
legalizados poderiam defender os direitos da categoria que representavam perante o
Estado. A greve e o lock-out foram proibidos, pois passaram a ser considerados recursos
“anti-sociais, nocivos ao trabalho e ao capital e incompatíveis com os superiores
interesses da produção nacional”. Durante o Estado Novo, houve um processo de
institucionalização das relações de trabalho e de transformação efetiva dos sindicatos em
instituições de direito público. Todavia, houve também um esvaziamentos dos sindicatos
de empregados, com uma queda expressiva nas taxas de sindicalização, embora tenha
ocorrido um movimento em sentido inverso nos sindicatos de empregadores. Segundo
Oliveira (2002), tal esvaziamento deveu-se, em grande medida, à repressão e ao controle
estatal a que estiveram sujeitos desde 1935, mas também ao esvaziamento de suas
funções de representação coletiva e à inexistência do direito de greve, proibida pela
Constituição de 1937.
Buscando redefinir suas atribuições e tornar os sindicatos mais atraentes aos
associados o governo decretou um novo regulamento de associação sindical em 1939
73
,
conferindo aos mesmos novas tarefas de caráter assistencial. Tal medida, porém, deu uma
feição ainda mais centralizada à estrutura sindical, uma vez que as centrais que reuniam
diferentes categorias profissionais por município ou região foram eliminadas em favor de
uma organização de caráter vertical, em que os sindicatos de cada categoria convergiam
para as federações estaduais e confederações nacionais. Também aumentou o controle
administrativo e político de suas atividades pelo Estado, restabeleceu juridicamente a
unicidade sindical, tornando explicita a norma de que não seria reconhecido mais do que
um sindicato por profissão; reiterou a proibição à sindicalização de servidores públicos e
de instituições paraestatais e previu uma lei específica sobre sindicalização na agricultura
e na pecuária
74
.
73
Decreto-Lei n
o
1.402 - de 5 de julho de 1939. (BRASIL, Decreto-Lei 1.402, 1939)
74
Apenas no final do Estado Novo, por meio do Decreto-Lei n
o
7.038, de 10 de novembro de 1944, foi
regulamentado o direito de sindicalização de empregados e empregadores rurais. Este decreto pretendia
157
Para dotar os sindicatos de recursos financeiros, foi criado o imposto sindical
75
-
uma contribuição compulsória correspondente a um dia de salário, pago ao sindicato por
trabalhadores sindicalizados ou não. Tal imposto, que deveria ser utilizado nas inúmeras
atividades assistenciais promovidas pelos sindicatos, propiciou uma estabilidade
financeira aos sindicatos, que até então não dispunham, possibilitando a constituição e a
manutenção de sindicatos de "fachada", que passavam a não depender mais da
contribuição voluntária dos associados. O governo utilizou-se de muitos destes sindicatos
e de seus dirigentes, os chamados pelegos
76
, para fortalecer sua base sindical, mas ao
contrário do que se esperava, esta medida não levou a um aumento do número de
sindicalizados.
Com a CLT, o poder de atuação dos sindicatos foi delimitado e a regulação dos
conflitos trabalhistas foi transferida para a esfera da Justiça do Trabalho. Os sindicatos
eram vistos como órgãos de colaboração com o Estado e para a promoção da paz social.
Em 1943, foi lançada uma nova campanha de sindicalização em massa, com a criação da
Comissão Técnica de Orientação Sindical
77
para dinamizar os sindicatos oficiais com
base em ações de cunha pedagógico, e o repressivo; exigência de prova de
sindicalização para o exercício de qualquer função representativa de classe ou categoria
econômica, bem como para o gozo de favores e de isenções tributárias
78
, entre outros.
c) Direitos Trabalhistas e Seguridade Social
A mudança na visão da questão social a partir da década de 1930 consagrou a
implementação de uma ampla legislação social, que, além de ampliar a abrangência de
direitos conquistados na década anterior para grupos específicos, também introduziu
adaptar os termos da lei de sindicalização de 1939 à realidade do campo brasileiro, mas teve poucas
conseqüências práticas. (BRASIL, Decreto-Lei n
o
7.038, 1944)
75
Concebido desde o início da década de 1930, foi instituído pelo Decreto-Lei n
o
2377 de 08 de julho de
1940 e regulamentado pelo Decreto-Lei 4.298, de 14 de maio de 1942, que criou a Comissão do Imposto
Sindical. (BRASIL, Decretos-Lei 2377, 1940 e 4.298, 1942)
76
Termo utilizado para designar o dirigente sindical que defende as orientações do Ministério do Trabalho
entre trabalhadores, cumprindo assim o papel de intermediário entre os sindicatos e o governo. Em muitos
casos, os pelegos mantinham sindicatos chamados "de fachada" ou "de carimbo", entidades sem existência
real, que viviam do imposto sindical.
77
Decreto-Lei 5.199, de 16 de janeiro de 1943. (BRASIL, Decreto-Lei 5.199, 1943)
78
Decreto-Lei 5.242, de 11 de fevereiro de 1943. (BRASIL, Decreto-Lei 5.242, 1943)
158
novos. A partir da criação do Ministério do Trabalho foram expedidos decretos sobre
diversas questões trabalhistas.
A maior parte dessa nova legislação foi criada ainda durante o Governo
Provisório
79
. Entre tais medidas destacam-se a regulamentação do trabalho do menor na
indústria e da mulher na indústria e no comércio e a criação da carteira de trabalho. A
regulamentação do trabalho da mulher contemplava o princípio da não-discriminação,
assegurando salário igual a trabalho de igual valor, sem distinção de sexo. Segundo
Biavaschi (2005), tratava-se de regra bastante avançada em relação à própria CLT, uma
vez que protegia tanto as mulheres quanto a maternidade
80
. Já a criação da Carteira
Profissional para os trabalhadores com mais de 16 anos na indústria ou no comércio, sem
distinção de sexo foi um marco do governo provisório
81
. Tal documento oficial e idôneo
permitia identificar o trabalhador quanto à sua profissão e pré-constituir, em favor do
mesmo, a prova da relação de emprego e de suas condições contratuais. Como
complemento, todos os empregadores passaram a ser obrigados a manter em seus
estabelecimentos livros especiais, visando a permitir que os fiscais, em suas visitas
periódicas, pudessem vigiar o cumprimento das leis sociais. A exigência de que o
trabalhador fosse portador deste documento para poder associar-se a um sindicato (que
era o único meio de garantir seus direitos) levou a grande demanda pelo mesmo e criou a
diferenciação vigente até hoje, entre trabalhadores “formais” (com carteira assinada) e
“informais”.
79
Entre as medidas tomadas neste período encontram-se a concessão de férias a operários e empregados , a
extensão do pagamento de aposentadorias e pensões a diversas categorias, pagamento de inativos pelas
Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs) e criação de uma carteira de empréstimos para os associados
das CAPs; estabilidade no emprego, pensão e aposentadoria aos servidores públicos dos serviços de
transportes urbanos, luz, força, telegrafo, telefone, portos, águas e esgotos , a regulamentação do trabalho
no comércio e na indústria, prevendo-se jornadas de oito horas diárias e 48 horas semanais, descanso
semanal obrigatório e condições para o trabalho noturno; regulamentação do trabalho do menor na indústria
e da mulher na indústria e no comércio .
80
Proibiu o trabalho de mulheres em serviços perigosos e insalubres e o trabalho da gestante quatro
semanas antes e quatro após o parto, obrigando os estabelecimentos com, pelo menos 30 mulheres com
mais de 16 anos, a contar com local apropriado para a guarda e vigilância dos filhos em período de
amamentação, e proibindo a despedida das grávidas pelo simples fato da gravidez, sem outro motivo que
justificasse. Em 1932 as mulheres ainda conquistaram o direito de voto e o status de sujeito de direitos, de
forma que as mulheres casadas poderiam trabalhar e pleitear sem assistência dos maridos, dirigindo suas
reclamações pessoalmente ou por seus representantes às respectivas Inspetorias Regionais, delegados ou
aos funcionários federais indicados pelo Ministro do Trabalho, escritas ou verbais, que as encaminhava às
Juntas de Conciliação.
81
Decreto 21.175 de 21 de março de 1932, regulamentado pelo Decreto 21.580, de 29 de junho de 1932,
alterado pelo 22.035, de 29 de outubro de 1932. (BRASIL, Decretos 21.175, 21.580 e 22.035, 1932)
159
Com a Constituição de 1934, apesar de não ter havido grande novidade no âmbito
da proteção social, foi elevada à condição de direito constitucional a maioria dos direitos
que tinham sido regulamentados por lei no período anterior (art. 121 da constituição de
1934) e, a eles, se agregaram alguns novos direitos, como a criação de Comissões sobre o
Salário Mínimo
82
, indenização por dispensa sem justa causa e estabilidade para
empregados com mais de 10 anos de serviço, dispôs sobre acidentes de trabalho e
doenças profissionais
83
, a ampliação do alcance da seguridade social com criação de
novas CAPs, a instituição da Justiça do Trabalho e a convenção coletiva de trabalho. A
consagração destes direitos sociais, segundo Oliveira (2002), envolveu intensa luta
política, cabendo aos delegados classistas dos empregados o mérito pela apresentação de
todas as emendas voltadas à proteção dos trabalhadores. Todavia, segundo o mesmo
autor, esta constitucionalização de direitos não representou garantia automática de
cumprimento da lei. Mesmo que a maioria destes direitos tenha sido objeto de medidas
legais, anteriores ao novo texto constitucional, a ausência de órgãos públicos suficientes
em condições de fiscalizar a aplicação das leis e acordos trabalhistas facilitou o seu
descumprimento por parte do empresariado.
Biavaschi (2005) considera a chamada Lei da Despedida
84
um marco do período.
Esta, entre outras medidas, garantiu ampla estabilidade aos empregados na indústria e no
comércio, limitando as despedidas dos trabalhadores com dez anos ou mais de serviço à
prática de falta grave provada em inquérito, e assegurou aos não estáveis, contratados a
prazo indeterminado e injustamente despedidos, uma indenização, garantindo a contagem
do tempo de serviço para fins de cálculo da indenização mesmo que houvesse mudança
na propriedade do estabelecimento ou na direção da empresa.
Por fim, quando do golpe do Estado Novo, a legislação trabalhista se
encontrava bastante ampla e abrangente. Neste último período ainda foram criadas
algumas normas específicas, como a ampliação da Seguridade Social para novas
categorias e a regulamentação dos serviços domésticos e do salário mínimo. A iniciativa
mais relevante do período, porém, não foi a criação de novas regras, mas a sistematização
82
A Lei 185, de 14 de janeiro de 1936, criou as Comissões do Salário Mínimo e o Decreto-Lei 399 de 30
de abril de 1938 regulamentou seu funcionamento e os critérios para definição dos níveis salariais em cada
região do país. (BRASIL, Lei 185, 1936 e Decreto-Lei 399, 1938)
83
Decreto 24.637, de 10 de julho de 1934. (BRASIL, Decreto 24.637, 1934).
84
Lei 62, de 05 de junho de 1935. (BRASIL, Lei 62, 1935).
160
das diversas regras esparsas existentes, criadas no período anterior, que envolveu um
importante esforço de generalização, regulamentação e sistematização das leis
trabalhistas e sindicais, que culminou na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
85
.
A CLT brasileira a cartilha dos direitos do trabalhador e seu certificado de
cidadania consolidava um conjunto de leis arbitrando o uso do trabalho na indústria
nascente e restringindo a liberdade de contratação das empresas: limitação da jornada de
trabalho em 48 horas; proibição do trabalho de menores de 14 anos; regulamentação do
trabalho feminino; remuneração obrigatória da hora extra; descanso e férias remuneradas;
condições de salubridade e proteção contra acidentes de trabalho; elevada indenização
por dispensa imotivada, o que regulava a estabilidade no emprego para indivíduos com
mais de dez anos de trabalho; entre outros. Após este ato, ainda outras regras foram
criadas e incorporadas à CLT, como a Reforma da Lei de Acidentes do Trabalho
86
.
d) Órgãos para fiscalizar e concretizar a aplicação das normas (enforcement).
A implantação da legislação trabalhista na década de 1930 foi acompanhada da
criação de diversos órgãos com objetivo de impor o cumprimento de tais normas e mediar
conflitos entre empregados e empregadores. O primeiro foi o próprio Ministério do
Trabalho, em 1930. Em 1931, foram enviados ao Executivo anteprojetos de lei que
regulamentavam as Convenções Coletivas e as Juntas de Conciliação e, em 1932, foram
instituídas as Comissões Mistas de Conciliação, as Juntas de Conciliação e Julgamento e
as Inspetorias Regionais do Trabalho
87
. Enquanto as Comissões Mistas destinavam-se aos
conflitos coletivos do trabalho, as Juntas tinham como objetivo dirimir litígios individuais
dos empregados sindicalizados.
Em 1933, para intermediar assuntos relativos à sindicalização oficial e de assuntos
relativos à fiscalização das leis de assistência e de proteção ao trabalho, foi criada a
seção do DNT e em 1934 foi regulamentado o Conselho Nacional do Trabalho
88
integrante do Ministério do Trabalho, uma organização técnica consultiva e julgadora de
85
Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. (BRASIL, Decreto-lei n. 5.452, 1943).
86
Decreto-lei 7.036, de 10 de novembro de 1944. (BRASIL, Decreto-lei n
o
7.036, 1944).
87
Decreto 21.396 de 12 de maio de 1932, 22.132, de 25 de novembro de 1932 e 21.690 de 01 de agosto de
1932. (BRASIL, Decretos 21.396, 22.132 e 21.690, 1932).
88
Decreto 24.784, de 14 de julho de 1934. (BRASIL, Decreto 24.784, 1934).
161
questões relativas à economia nacional, ao trabalho e à previdência social, com funções
administrativas, entre elas fiscalizar e punir. No mesmo ano, a Constituição Federal de
1934 previu a criação da Justiça do Trabalho para dirimir questões entre empregados e
empregadores, regidas pela legislação social (Art. 122).
Após o golpe do Estado Novo, no mesmo compasso em que se tornaram mais
rígidos os controles ministeriais sobre os sindicatos de empregados e se acomodaram as
pressões dos empregadores, também foram adotados novos procedimentos de fiscalização
do trabalho
89
e estabelecidas as bases para a organização da Justiça do trabalho. Em
1939
90
, foram definidos seus órgãos de administração: a) Juntas de Conciliação e
Julgamento e Juízes de Direito em localidades que não fossem compreendidas pelas
Juntas; b) Conselhos Regionais do Trabalho; c) Conselho Nacional do Trabalho, na
plenitude de sua composição ou por intermédio de sua Câmara de Justiça do Trabalho.
Dentre as atribuições das Juntas de Conciliação e julgamento destacavam-se:
conciliar e julgar dissídios sobre estabilidade no emprego, salários, férias e indenizações
por motivos de despedida injusta, bem como dissídios resultantes de contratos de
empreitada em que o empreiteiro fosse operário ou artífice, além de outros relativos ao
contrato individual de trabalho; requisitar e realizar diligencias para esclarecimentos; e
exercer outras atribuições em sua jurisdição. aos Conselhos Regionais do Trabalho
cabia, entre outras coisas: conciliar e julgar dissídios coletivos; homologar os acordos
celebrados nos dissídios; estender decisões sobre contratos coletivos e sobre outras
situações previstas em lei; rever as próprias decisões preferidas em dissídios coletivos;
julgar inquéritos administrativos; julgar em segunda instancia dissídios individuais;
requerer diligencia e impor multas e outras penalidades em sua jurisdição.
Finalmente, cabia ao Conselho Nacional do Trabalho, por meio das Câmaras de
Justiça do Trabalho, conciliar e julgar dissídios coletivos que excedessem a jurisdição dos
89
Atribuiu-se aos chefes de serviço do DNT a competência para lavrar multas (Decreto-Lei 1743, de
04/11/1939) e o Departamento Estadual do Trabalho de São Paulo assumiu as atribuições das inspetorias
regionais do trabalho (Decreto-Lei 1970, de 18/01/1940).
90
Decreto-Lei 1.237, de 02 de maio de 1939, com modificações introduzidas pelo Decreto-Lei 2.851, de 10
de dezembro de 1940, organizou a Justiça do Trabalho, definindo seus órgãos e o Decreto 6.596, de 12 de
dezembro de 1940, aprovou seu regulamento da Justiça do Trabalho. O art. 233 deixou expresso que em 01
de maio de 1941 a Justiça do Trabalho seria instalada no país, extintas as Juntas de Conciliação e
Julgamento e as Comissões Mistas de então, cabendo-lhes competência residual até aquela instalação.
BRASIL, Decreto-Lei 1.237, 1939 e Decreto-Lei 2.851, Decreto 6.596, 1940)
162
Conselhos Regionais; estender decisões proferidas em dissídios coletivos; estender
contratos coletivos para toda a categoria; rever suas próprias decisões; impor multas e
penalidades e julgar recursos em última instancia. Além disso, estava prevista a criação
de Câmaras de Previdência Social, cuja finalidade era orientar e fiscalizar a
administração dos institutos e das CAPs.
Portanto, no final do Primeiro Governo Vargas o país possuía toda uma nova
estrutura institucional relativa às questões trabalhistas. Tanto a visão do papel do
trabalhador na sociedade havia sido transformada, devido a um grande esforço de
valorização por parte do governo central, especialmente durante o período do Estado
Novo, como toda uma nova legislação, sistematizada na CLT, e um sistema para impor
tais regras estavam montados.
Foi possível configurar um sistema nacional de relações de trabalho de inspiração
autoritária e corporativista. Embora tenha respondido de certa forma a pressões de
trabalhadores e empresários, a montagem desse sistema foi feita principalmente de cima
para baixo, com o Estado tendo tomado para si a tarefa de legislar sobre as questões
sindicais, trabalhistas e previdenciárias.
Apesar de todo o mecanismo de imposição, as leis trabalhistas não eram
amplamente cumpridas. Valendo-se da ausência de mecanismos efetivos de fiscalização
do trabalho e até mesma da corrupção de funcionários daqueles órgãos encarregados
justamente de zelar pelo cumprimento das leis e das negociações coletivas, os
empresários continuaram a desrespeitar a nova legislação.
Percebemos, portanto, que no período ocorreu uma ampla transformação nas
regras relacionadas ao trabalho no Brasil. A mudança do ambiente econômico e da
configuração do poder político transformaram o tratamento dispensado à questão social
pelo Estado, que passou a intervir diretamente nas relações trabalhistas. As regras de
sindicalização, com a exigência de registro dos sindicatos, permitiram ao Estado um
maior controle sobre a massa de trabalhadores. Em contrapartida, foi criada uma ampla
estrutura institucional tanto de regras, com uma ampla legislação trabalhista, como de
organismos de imposição dessas regras. Como medida nacionalista, mas também como
meio de ter maior controle sobre as organizações de trabalhadores, foram criadas regras
163
de estimulo à contratação de trabalhadores nacionais. Todas essas medidas, tomadas
por um governo central, e de caráter nacional permitiram a consolidação de um
mercado de trabalho de dimensão nacional no Brasil.
4.3.4 Sistema Educacional
[...] se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas
condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas ou de
produção, sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das
aptidões à invenção e à iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo
de riqueza de uma sociedade. (AZEVEDO et al., 1932, p.1)
Quando a Revolução de 1930 foi deflagrada, vinha se formando, há algum
tempo, um movimento em favor de uma nova concepção de escola e educação no Brasil:
a Escola Nova. Tal movimento organizou-se, desde 1924, na Associação Brasileira de
Educação (ABE), que incentivou vários debates em torno da questão educacional no
período. Parte de seus atores engajou-se no movimento revolucionário de 1930. Desta
forma, quando o governo provisório foi instalado, buscou tomar providencias no sentido
de uma transformação também no ensino. Para tanto, uma das primeiras medidas do novo
governo foi a criação do Ministério da Educação e da Saúde, chefiado por Francisco
Campos, que, em Minas Gerais, havia implantado reformas educacionais baseadas nas
concepções escolanovistas. Todavia, as novas concepções de educação não foram
facilmente aceitas, de forma que um movimento conservador, liderado pela igreja,
ergueu-se, abrindo um amplo debate na época.
Por outro lado, as transformações da economia que se fizeram sentir a partir da
década de 1930, com o crescimento industrial e a urbanização, determinaram um novo
tipo de necessidades educacionais no país. Em um contexto de expansão da produção
industrial, a educação passou a ser considerada um instrumento fundamental de inserção
social, tanto por educadores, quanto por uma ampla parcela da população que almejava
um lugar neste processo. Ademais, com o crescimento das atividades urbanas,
especialmente das ligadas ao setor de serviços, a leitura e a escrita mostravam-se mais
úteis e benéficas, de forma que a demanda se elevou. Além disso, o crescimento da renda
per capita criou novas demandas culturais por parte da população brasileira, sobretudo
164
nas áreas atingidas pela industrialização. Estes fatores acabariam criando uma pressão,
cada vez mais forte, pela expansão do ensino.
Com relação à intensificação do processo de urbanização, o crescimento
demográfico e o aumento gradativo da renda per capita fizeram-se acompanhar,
naturalmente, de uma diminuição da taxa de analfabetismo. Como pode ser visto na
Tabela 4.1, desenvolvida por Romanelli (1987), a demanda social de educação cresceu na
medida em que aumentou a densidade demográfica, diminuindo o isolamento social e
acelerando-se o processo de urbanização.
Tabela 4.1: Dados Populacionais e Analfabetismo - Brasil
Especificação 1900 1920 1940 1950
População total (milhões) 17,4 30.6 41,2 51,9
Densidade demográfica 2,06 3,62 4,88 6,14
Renda per capita em dólares 55 90 180 -
% da população urbana 10 16 31 36
% de analfabetos (de 15 anos e
mais)
65,3 69,9 56,2 50,0
Fonte: Romanelli, 1987, p. 25
Portanto, as transformações na educação durante o período decorrem de dois tipos
de forças: de um lado, questões ideológicas, influenciadas pelas mudanças
implementadas em outros países (mudança nas preferências); de outro, questões
econômico-estruturais, determinadas pela grande transformação por que passava a
economia brasileira no período (mudança em preços relativos).
4.3.4.1 Mudança na Ideologia
A mudança na estrutura de poder no governo brasileiro após a Revolução de 1930
inaugurou um amplo debate ideológico no país, que buscava determinar os rumos a serem
seguidos pelo novo governo. Isso possibilitou o aprofundamento do movimento
escolanovista, assim como a organização de um grupo de oposição, contra as mudanças
que os primeiros pregavam, liderados por grupos ligados à Igreja Católica, que possuíam
certo monopólio sobre a educação (especialmente secundária) até então.
165
O movimento da Escola Nova era fortemente influenciado por novas idéias
pedagógicas que estavam em pauta nos EUA e na Europa. Estas pregavam um novo tipo
de educação, que pudesse integrar o indivíduo na sociedade e, ao mesmo tempo, ampliar
o acesso de todos à escola, opondo-se às praticas pedagógicas tidas como tradicionais.
Um dos precursores deste movimento internacional foi o filósofo John Dewey, que
defendia a educação como o único meio realmente efetivo para a construção de uma
sociedade democrática marcada pelo respeito às características individuais de cada
pessoa.
Diversos educadores brasileiros aderiram a esse movimento, vislumbrando a
possibilidade de interferir na organização da sociedade brasileira do ponto de vista da
educação e consolidando uma nova ideologia educacional para o Brasil. Em uma
sociedade em constante transformação, tanto social como econômica e política, a escola
era vista, dentro de uma concepção humanista moderna, como formadora de indivíduos,
que deveriam estar aptos a inserir-se e refletir sobre esta sociedade. Suas linhas gerais
podem ser encontradas no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932
91
, embora
as posições ideológicas de seus membros pudessem ser distintas.
Tal documento, que se tornou o marco inaugural do projeto de renovação
educacional do país, constatava a desorganização do aparelho escolar e propunha que o
Estado organizasse um plano geral de educação. O acesso à educação passou a ser visto
como direito dos cidadãos e dever do Estado. A escola deveria ser: essencialmente
pública, integrando família e escola; laica, não submissa a quaisquer crenças ou disputas
religiosas; gratuita, para todos, indiscriminadamente, que tivessem vontade e condições
de freqüentá-la; obrigatória, sob pena de punição, para todos até os 18 anos; unificada,
colocando no mesmo ambiente, meninos e meninas e única, em que todas as crianças
tivessem uma educação comum, igual para todos.
A educação integral era vista por essa corrente como uma “necessidade biológica”
dos indivíduos, de forma que a seleção dos alunos deveria ser feita segundo suas aptidões
naturais, e seria função do Estado tornar “[...] a escola acessível, em todos os seus graus,
aos cidadãos a quem a estrutura social do país mantém em condições de inferioridade
91
Redigido por Fernando de Azevedo e assinado por 26 intelectuais, entre os quais Anísio Teixeira,
Afrânio Peixoto, Lourenço Filho, Roquette Pinto, Delgado de Carvalho, Hermes Lima e Cecília Meireles.
166
econômica para obter o ximo de desenvolvimento de acordo com as suas aptidões
vitais”. (AZEVEDO et al., 1932, p. 15)
Desprendendo-se dos interesses de classes, a que ela tem servido, a
educação [...] deixa de constituir um privilégio determinado pela
condição econômica e social do indivíduo, para assumir um ‘caráter
biológico’, com que ela se organiza para a coletividade em geral,
reconhecendo a todo o indivíduo o direito a ser educado a onde o
permitam as suas aptidões naturais, independente de razões de ordem
econômica e social. A educação nova, alargando a sua finalidade para
além dos limites das classes, assume, com uma feição mais humana, a
sua verdadeira função social, preparando-se para formar ‘a hierarquia
democrática’ pela ‘hierarquia das capacidades’, recrutadas em todos os
grupos sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educação.
Ela tem, por objeto, organizar e desenvolver os meios de ação durável
com o fim de ‘dirigir o desenvolvimento natural e integral do ser humano
em cada uma das etapas de seu crescimento’, de acordo com uma certa
concepção do mundo. (AZEVEDO et al., 1932, p. 10)
Apesar disso, os escolanovistas eram contrários à centralização do ensino,
levantando a bandeira da doutrina federativa e descentralizadora. A unidade, segundo
eles, não deveria significar uniformidade e, sim, pressupor multiplicidade, favorável à
adaptação da escola aos interesses e exincias regionais.
À União, na capital, e aos estados, nos seus respectivos territórios, é que
deve competir a educação em todos os graus, dentro dos princípios gerais
fixados na nova constituição, que deve conter, com a definição de
atribuições e deveres, os fundamentos da educação nacional. Ao governo
central, pelo Ministério da Educação, caberá vigiar sobre a obediência a
esses princípios, fazendo executar as orientações e os rumos gerais da
função educacional, estabelecidos na carta constitucional e em leis
ordinárias, socorrendo onde haja deficiência de meios, facilitando o
intercâmbio pedagógico e cultural dos estados e intensificando por todas
as formas as suas relações espirituais. (AZEVEDO et al., 1932, p. 19)
O movimento reformador foi alvo da crítica forte e continuada da Igreja Católica,
que, naquela conjuntura, era forte concorrente do Estado na expectativa de educar a
população, e tinha sob seu controle a propriedade e a orientação de parcela expressiva das
escolas da rede privada. Os católicos defendiam o ensino da doutrina religiosa na escola,
a separação entre os sexos nos espaços escolares, o ensino particular e a responsabilidade
167
da família quanto à educação. A Revolução de 1930 era vista com receio, por representar
o fortalecimento dos ideais escola-novistas, que com a defesa do ensino laico e da escola
pública colocavam em risco o predomínio das escolas confessionais. Para acalmar os
ânimos, o governo fez concessões a ambas as partes e introduziu o ensino religioso
facultativo nas escolas públicas (OLIVEIRA, 2004).
Por fim, com relação à questão ideológica, devemos considerar ainda a visão do
novo governo que se instalava e que, portanto, possuía o poder político para,
efetivamente, implantar as mudanças. Neste sentido, ao longo do período e,
especialmente, após 1937, durante o Estado Novo, ficou clara sua posição nacionalista,
com objetivos de extinguir os regionalismos dominantes durante a República Velha e
criar uma identidade nacional. Dentro deste projeto, o papel estratégico da educação, na
construção de tal identidade era enfatizado, e o combate ao regionalismo foi buscado por
meio da padronização do ensino, da centralização das atividades escolares, da unicidade
dos programas e materiais escolares, etc, ações condizentes com a perspectiva de criação
de uma educação em bases nacionais. Além disso, buscou-se, também, minimizar a
presença estrangeira nas zonas de colonização, por meio de políticas de nacionalização
do elemento estrangeiro, que levassem ao seu abrasileiramento, e que se transformou em
questão de segurança nacional, principalmente com o acirramento dos conflitos na
Europa (BRITO, 2006).
4.3.4.2 Reformas do Ensino (Regras Formais)
O primeiro período Vargas foi rico em mudanças nas regras formais relativas à
educação, a começar, pouco após a tomada do governo pelos revolucionários, pela
criação do Ministério da Educação e da Saúde, chefiado por Francisco Campos. Este
ministro aprovou uma série de medidas de reformulação no ensino que abrangeu todos os
níveis, e que em conjunto foram chamadas de Reforma Francisco Campos. Esta reforma
buscou, pela primeira vez, organizar um sistema nacional de educação, ou seja, estruturar
o ensino em todo território nacional, contando com iniciativas mais centralizadoras, como
a inspeção federal e a criação do Conselho Nacional de Educação e Estaduais de
168
Educação
92
(que começaram a funcionar em 1934), destinados a assessorar o
Ministério na administração e na direção da educação em todo o país.
Para o ensino superior, estruturou os cursos superiores e propôs a instituição do
regime universitário, pela implantação do Estatuto das Universidades Brasileiras
93
. Mais
especificamente, determinava a organização dos cursos isolados em Universidades e
exigia para isso, que estas congregassem em unidade universitária pelo menos três dos
seguintes institutos do ensino superior: Faculdade de Direito, Faculdade de Medicina,
Escola de Engenharia e Faculdade de Educação, Ciências e Letras. As universidades
poderiam ser criadas e mantidas pela União, pelos estados ou, sob a forma de fundações
ou de associações, por particulares, constituindo universidades federais, estaduais e
livres.
com relação ao ensino secundário, foram estabelecidos dois ramos: o
secundário, propriamente dito e o médio profissional. O secundário passou a ser dividido
em dois ciclos, um fundamental, de cinco anos, e um complementar, de dois, que oferecia
habilitação para o ingresso no ensino superior em determinadas carreiras. O currículo
seriado, assim como a freqüência obrigatória, foram definitivamente estabelecidos. Além
disso, tal grau de ensino passou a ser priorizado, com normas para a admissão do corpo
docente e exigência de registro junto ao Ministério da Educação de todos os colégios
secundários, públicos ou particulares, que deveriam ser equiparados ao Colégio Pedro II,
mediante inspeção federal.
Com relação ao ensino médio profissional
94
, novos cursos foram criados e, da
mesma forma que o secundário, foi dividido em dois ciclos: um curso propedêutico, de
três anos, e um curso técnico, com duração variada, dependendo da ênfase (secretário,
guarda-livros e administrador-vendedor, de caráter terminar e atuário e perito-contador,
que davam ingresso ao curso superior de Administração e Finanças).
O ensino primário ou elementar e o ensino normal não foram contemplados nessa
legislação por serem de competência dos estados. Todavia, alguns estados, como o de
São Paulo, precursor de reformas educacionais desde a República Velha, aumentaram a
oferta de vagas e introduziram algumas mudanças na configuração das disciplinas e
92
Decreto 19.850, de 11 de abril de 1931. (BRASIL, Decreto 19.850, 1931).
93
Decretos 19.851 e 19.852, de 11 de abril de 1931. (BRASIL, Decretos 19.851 e 19.852, 1931).
94
Decreto 20.158, de 30 de julho de 1931. (BRASIL, Decreto 20.158, 1931).
169
inovações pedagógicas, por influência dos escolanovistas, embora os programas destas
escolas e a concepção geral do curso pouco tenham se alterado durante o período.
Seguindo a tendência de fortalecimento da educação instaurada desde as reformas
de 1931, a Constituição promulgada em 1934 continha um capítulo especificamente sobre
educação e cultura. Nele a educação passa a ser entendida como direito de todos, devendo
ser ministrada, tanto pela família, como pelos Poderes Públicos (Art.149). Tentava
atender às reivindicações de renovadores, assim como da Igreja. Neste sentido,
determinava que a União deveria fixar o plano nacional de educação, compreensivo do
ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a sua
execução, em todo o território do País. Este plano estabelecia que o ensino primário seria
integral, gratuito e de freqüência obrigatória, e que se deveria buscar estender a
gratuidade aos demais níveis de ensino, para torná-los mais acessíveis; estabelecia
também a limitação da matrícula à capacidade didática do estabelecimento e seleção por
meio de provas de inteligência e aproveitamento, ou por processos objetivos apropriados
à finalidade do curso; mas também tornava matéria dos horários nas escolas públicas
primárias, secundárias, profissionais e normais o ensino religioso, que deveria ser
ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos
pais ou responsáveis, embora tornasse facultativa a freqüência. A carta determinava
também a forma de financiamento da educação, que consistiria em no mínimo 10% da
renda resultante dos impostos da União e Municípios, e 20% da mesma renda nos estados
e o Distrito Federal (art. 156).
A constituição de 1934 teve, todavia, curta duração. Em 1937, o golpe que
instituiu o Estado Novo também outorgou uma nova Carta Constitucional. Tal carta fazia
pouca referência à educação, determinando que competia privativamente à União, fixar
as bases e determinar os quadros da educação nacional, traçando as diretrizes a que deve
obedecer a formação física, intelectual e moral da infância e da juventude (art 15, IX) e
legislar sobre as diretrizes da educação nacional (Art. 16, XXIV). Mantinha também
alguns princípios anteriores, como a liberdade da arte, ciência e ensino à iniciativa
individual e à de associação ou pessoas coletivas públicas ou particulares (art 128) e a
gratuidade e obrigatoriedade do ensino primário e dava ênfase ao trabalho manual, que
passou a ser obrigatório em todas as escolas primárias, normais e secundárias, e ao ensino
170
pré-vocacional e profissional que se destinaria “[...] às classes menos favorecidas e
(seria), em matéria de educação, o primeiro dever do Estado.” (art. 129).
Após este primeiro ato, na década de 1940, o então Ministro da Educação e
Saúde, Gustavo Capanema (desde 1934), implantou uma nova série de adaptações,
especificamente para o nível secundário, que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas de
Ensino ou Reforma Capanema e que flexibilizaram e ampliaram as de Francisco Campos.
Tal reforma concentrou-se em dois possíveis caminhos a serem seguidos pelos egressos
do ensino primário: o ensino secundário ou o industrial.
O ensino secundário
95
foi mantido dividido em dois ciclos, reforçando os
objetivos formativos consignados pela Reforma Francisco Campos: um curso ginasial,
com duração de quatro anos, e onde o estudo das Humanidades era introduzido por meio
de um conjunto de disciplinas que incluíam o Português, Latim, Francês, História Geral e
do Brasil, etc., ao lado das matérias científicas Ciências Naturais e Matemática; e
outro, com duração de três anos, que poderia ser clássico (maior ênfase em filosofia e
letras antigas) ou científico (maior ênfase em ciências), que permitiam o ingresso em
qualquer curso superior. Os novos currículos previstos na Lei Orgânica caracterizavam-se
pela predominância do enciclopedismo, com valorização da cultura geral e humanística.
No plano orçamentário, foi instituída a gratuidade progressiva, isto é, a disponibilização
de vagas gratuitas ou de contribuição reduzida, sem que fosse explicitada, no entanto, a
cobertura orçamentária para este fim. A lei recomendava também a separação entre
escolas masculinas e femininas, incluindo-se os trabalhos manuais e a orientação para a
vida doméstica entre as matérias do currículo das escolas femininas.
o ensino industrial ganhou bases mais sólidas e melhor regulamentação,
podendo ser considerado um marco neste período, dentro do projeto industrializante do
Estado Novo. Em janeiro de 1942 foi criado o Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial - SENAI
96
, dirigido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), para
organizar e administrar, em todo o país, escolas de aprendizagem para industriários; e
regulamentado o ensino industrial
97
(lei orgânica do ensino industrial).
95
Regulamentado pelo Decreto-lei 4.244, de 09 de abril de 1942. (BRASIL, Decreto-lei 4.244, 1942)
96
Decreto-lei 4.048, de 22 de janeiro de 1942. (BRASIL, Decreto-lei 4.048, 1942).
97
Decreto-lei 4.073, de 30 de janeiro de 1942. (BRASIL, Decreto-lei 4.073, 1942)
171
O ensino industrial deveria oferecer ensino, de grau secundário, destinado à
preparação profissional dos trabalhadores da indústria e das atividades artesanais, e ainda
dos trabalhadores dos transportes, das comunicações e da pesca (art ) e atender tanto
aos interesses do trabalhador (realizando a sua preparação profissional e a sua formação
humana, como das empresas (nutrindo-as, segundo as suas necessidades crescentes e
mutáveis, de suficiente e adequada mão-de-obra) e da nação (promovendo continuamente
a mobilização de eficientes construtores de sua economia e cultura) (art 3º). Este nível de
ensino também foi dividido em dois ciclos: o primeiro previa quatro modalidades de
ensino: ensino industrial básico, ensino de mestria, ensino artesanal ou aprendizagem;
o segundo ciclo previa o ensino técnico industrial ou o ensino pedagógico, que visava
formar os docentes responsáveis pelas escolas deste ramo de ensino. No currículo de
todas formações profissionais, constavam disciplinas de cultura geral e práticas
educativas, visando a acentuar e elevar o valor humano do trabalhador. Além dos cursos
ordinários deste sistema de ensino, em seus dois ciclos, a formação industrial era
complementada com cursos extraordinários e avulsos, que permitiriam a continuidade,
aperfeiçoamento e especialização do aluno. Para ingressar nestes cursos
profissionalizantes, além de outros testes, como de aptidão física, os alunos deveriam ser
aprovados em exame vestibular.
Fechando o conjunto de reformas, em 1943 foi regulamentado, também, o ensino
comercial
98
, que deveria oferecer ensino, de grau secundário, destinado a
formar
profissionais aptos ao exercício de atividades específicas no comércio, assim como de
funções auxiliares de caráter administrativo nos negócios públicos e privados; dar a
candidatos ao exercício das mais simples ou correntes atividades no comércio e na
administração uma sumária preparação profissional e aperfeiçoar os conhecimentos e
capacidades técnicas de profissionais diplomados (Art 1º). Também se manteve dividido
em dois ciclos: um curso comercial básico, com duração de quatro anos e um curso
comercial técnico, com a duração de três anos (Comércio e Propaganda, Administração,
Contabilidade, Estatística ou Secretariado).
Assim como no caso do ensino industrial,
eram previstos para o ensino comercial dois outros tipos de formação, abrangendo a
especialização e o aperfeiçoamento do aluno.
98
Decreto-lei 6.141, de 28 de dezembro de 1943. (BRASIL, Decreto-lei 6.141, 1943)
172
A lei determinava a inclusão da educação moral e cívica como parte integrante de
todas as disciplinas. Deveriam-se buscar, nos alunos, “[...] como base do caráter, a
compreensão do valor e do destino do homem, e, como base do patriotismo, a
compreensão da continuidade histórica do povo brasileiro, de seus problemas e desígnios,
e de sua missão em meio aos outros povos” (Art 22º do Decreto-lei 4.244/1942) e no
“[...] próprio processo da vida escolar, que, em todas as atividades e circunstâncias,
(deveria) transcorrer em termos de elevada dignidade e fervor patriótico” (Art 38º,
Decreto-lei 6.141/1943). O que mostra o caráter ideológico nacionalista da reforma.
Além disso, o culto cívico também era obrigatório nesta modalidade de ensino.
Durante o Estado Novo, principalmente com o acirramento do conflito
internacional e após a aliança com os americanos, o governo passou a considerar a
nacionalização do ensino como questão de segurança nacional, principalmente porque a
maior parte dos imigrantes era de origem italiana, alemã ou japonesa. Neste sentido, criou
a Comissão Nacional de Ensino Primário, com a atribuição de nacionalizar o ensino nos
núcleos estrangeiros
99
, e que buscou expandir o ensino público e controlar o ensino
particular nas colônias, além de fechar as escolas que ministrassem o ensino em língua
estrangeira, instituindo o português como língua oficial. Além disso, uma política de
abrasileiramento cultural destas populações foi implementada, com objetivos de alcançar
a unidade nacional, tanto pelo uso da língua portuguesa, como pelo expurgo de ideologias
alienígenas, incluídos o fascismo e o nazismo, pela nacionalização da atividade
econômica, ou pela implantação de um ensino em bases nacionais
100
.
Com relação ao ensino superior, o Estado Novo buscou seu fortalecimento e a
centralização da regulamentação e da fiscalização das instituições de ensino no governo
federal. Neste sentido, em 1938
101
o controle federal sobre o processo de abertura de
cursos superiores foi estabelecido, bem como a fiscalização das instituições existentes,
principalmente quando de sua equiparação às instituições federais.
99
Decretos 868, de 18 de novembro de 1938 e 948, de 13 de dezembro de 1938. (BRASIL, Decretos
868 e 948, 1938)
100
Para tanto, foram introduzidos novos currículos, com a presença da História e Geografia do Brasil, da
Educação Moral e Cívica e da Educação Física, esta última ministrada, preferentemente, por militares . Este
novo currículo deveria ser secundado pelo estímulo ao patriotismo, pelo uso dos mbolos nacionais e pela
comemoração das datas cívicas, assim como o que foi instituído para as escolas secundárias.
101
Decreto-Lei 421, de 11 de maio de 1938. (BRASIL, Decreto-Lei 421, 1938)
173
O ciclo de reformas seria fechado pouco depois do fim do Estado Novo, em 1946,
durante o governo provisório, com a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial - SENAC
102
e as Leis Orgânicas do Ensino Primário
103
, Normal
104
e
Agrícola
105
, que organizaram o ensino primário com diretrizes gerais, mantendo-o sob a
responsabilidade dos estados, embora coubesse à União a fixação de programas mínimos
e diretrizes essenciais para o seu funcionamento e o ensino primário supletivo, destinado
a adolescentes a partir dos 13 anos e a adultos, visando à escolarização da população
analfabeta, adulta e jovem, com duração de dois anos; criaram o Fundo Nacional do
Ensino Primário, com o intuito de adequar mais recursos a este grau de ensino, a partir de
contribuições dos estados, da União e dos municípios; fixaram diretrizes para o ensino
normal, mas mantiveram a responsabilidade dos estados na sua administração; e
organizaram o ensino agrícola.
4.3.4.3 Estrutura do Ensino
No primeiro período do governo Vargas houve uma ampliação relevante das
matriculas no ensino, que cresceram 70% (média de todos os graus) entre 1927 e 1937
ante um aumento de 15% na população no mesmo período. Todavia, não houve melhoras
significativas no que se refere ao rendimento escolar, ao aperfeiçoamento administrativo
e à continuidade dos estudos (RIBEIRO, 1998).
Se a efervescência de idéias e discussões com relação aos novos rumos que o país
deveria tomar, em diversos campos e especificamente com relação à educação, que se
seguiu ao golpe de 1930, fez do período uma espécie de experimentação, não havendo
um plano de governo bem definido, segundo Romanelli (1987), a idealização teórica
mostrava-se inconsistente com a realidade das escolas do país, de forma que o
crescimento verificado não ocorreu de forma satisfatória qualitativa ou quantitativamente
(em 1935, 54,4% da população em idade para cursar o ensino elementar estava fora da
escola).
102
Decreto-Lei 8.621 - de 10 de janeiro de 1946. (BRASIL, Decreto-Lei 8.621,1946).
103
Decreto-Lei 8.529, de 2 de janeiro de 1946. (BRASIL, Decreto-Lei 8.529,1946).
104
Decreto-Lei 8530, de 2 de janeiro de 1946. (BRASIL, Decreto-Lei 8.530,1946).
105
Decreto-Lei 9.613, de 20 de agosto de 1946. (BRASIL, Decreto-Lei 9.613,1946).
174
[...] o que se verificou, a partir daí, foi o fato de a expansão do sistema
escolar, inevitável, ter-se processado de forma atropelada, improvisada,
agindo o Estado mais com vistas ao atendimento das pressões do
momento do que propriamente com vistas a uma política nacional de
educação. [...]
O tipo de escola que passou a expandir-se foi o mesmo que até então
educara as elites e essa expansão, obedecendo, como já se disse, às
pressões da demanda e controlada pelas elites, jamais ocorreu de forma
que tornasse universal e gratuita a escola elementar e adequado e
suficiente o ensino médio e superior. A expansão da educação no Brasil,
mormente a contar de 1930, obedeceu às normas de instabilidade própria
de uma sociedade heterogênea profundamente marcada por uma herança
cultural academicista e aristocrática. (ROMANELLI, 1987, p. 61)
Apesar dos resultados não terem alcançado um nível satisfatório, as mudanças
com relação à importância dada à educação como questão central no desenvolvimento do
país, decorrentes dos debates da época, foram essenciais, pois permitiram mudanças de
preferências que viabilizariam mudanças institucionais maiores nesta esfera, na história
brasileira (apesar de ainda nos encontrarmos muito distantes de um resultado, no mínimo,
satisfatório). A necessidade de um Plano Nacional de Educação, como também a
gratuidade e obrigatoriedade do ensino elementar na Constituição de 1934 evidenciam
esta mudança de posicionamento. Além disso, a estruturação do ensino em nível
nacional, a criação e regulamentação de cursos técnicos comerciais, assim como as
iniciativas centralizadoras, como a inspeção federal, implementadas com a reforma
Francisco Campos, ainda antes da mesma Constituição, mostram a consciência do
governo quanto aos rumos que a economia brasileira estava tomando.
durante o Estado Novo, o governo mostrou ter objetivos mais claros, uma vez
que tomou medidas, principalmente com relação ao ensino industrial, no sentido de
buscar atender aos objetivos de provimento de mão-de-obra qualificada para a industria,
que passava a ser a centro dinâmico da economia. As transformações do ensino eram
parte de um projeto mais amplo de desenvolvimento econômico, com fortes apelos
nacionalistas e centralizadores do poder nas mãos do governo federal. A introdução da
educação moral e cívica como fundamento do ensino mostra o papel dado à educação no
sentido de moldar os alunos à nova concepção de país idealizada pela ditadura. A
preocupação com a moral, o civismo e as responsabilidades trazem para a esfera
175
educacional os objetivos de valorização da auto-imagem do brasileiro e a criação de uma
identidade nacional.
Tabela 4.2: Participação dos graus de ensino no total de matrículas:
Brasil, 1907-1945
Primário Secundário Profissional Superior
1907 92,2% 4,4% 2,6% 0,8%
1927 94,1% 2,8% 2,5% 0,6%
1937 92,3% 3,9% 3,0% 0,8%
1945 87,5% 6,2% 5,7% 0,7%
Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
(2003).
Como pode ser visto no Gráfico 4.2, durante o Estado Novo o crescimento do
ensino foi muito concentrado no nível secundário, todavia, este crescimento ainda não foi
suficiente para oferecer ensino a todos, de forma que a maior parcela dos egressos da
escola primária não tinha acesso à escola secundária.
179%
77%
72%
9%
160%
65%
101%
27%
63%
42%
136%
105%
101%
76%
118%
90%
20%
3%
99%
71%
140%
106%
11%
Absoluto Per Capita Absoluto Per Capita Absoluto Per Capita Absoluto Per Capita
PRIMÁRIO SECUNDÁRIO PROFISSIONAL SUPERIOR
1907 -1927 1927-1937 1937-1945
Gráfico 4.2: Crescimento da matrícula dos diversos graus de ensino no Brasil: 1907-1945
Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
(2003).
176
Por um lado, o crescimento do Estado permitiu a continuidade de uma
configuração educacional de uma sociedade estamental, em que os cursos
profissionalizantes eram voltados para os “desfavorecidos”, enquanto os cursos
secundários, que davam acesso ao ensino superior, eram muito mais acessíveis aos
indivíduos de mais alta renda. O acesso ao ensino profissional dependia, ainda, da
aprovação em exames de seleção e testes de aptidão física e mental, sendo, portanto,
também reservado apenas aos “mais aptos” entre os “desfavorecidos”. E os cursos
superiores eram necessários para o provimento de pessoal para o amplo aparelho estatal
que se formava. Como seu acesso dependia da conclusão do secundário, permitia que o
estamento mantivesse sua posição. Por outro lado, devemos considerar que o acesso por
mérito, e não por renda, aumentou as possibilidades de melhora da qualidade de vida, via
educação, às classes “desfavorecidas”.
O primeiro período Vargas deixou uma estrutura educacional bastante modificada
com relação àquela da Primeira República. Com relação ao ensino fundamental, a
gratuidade e obrigatoriedade asseguradas nas Constituições, determinaram, ao menos, a
meta de universalização do mesmo, apesar de suas diretrizes e responsabilidade direta
continuarem a cargo de estados e Municípios.
Com relação aos outros níveis, a nova visão de país determinou um sistema
educacional coordenado com uma nova divisão econômico-social do trabalho.
Assim, a educação deveria servir ao desenvolvimento de habilidades e mentalidades de
acordo com os diversos papéis e funções a serem exercidas. O nível secundário de ensino
foi o mais transformado. Tanto o secundário, como os profissionalizantes para
indústria, comercial, pedagógico, etc, foram regulamentados e expandidos e foi
desenvolvida a concepção de que este nível de ensino também deveria ser universalizado.
Por fim, o ensino superior foi melhor organizado, com a criação do regime
universitário e a implantação do Estatuto das Universidades Brasileiras. Todavia, seu
acesso manteve-se muito restrito e sua participação muito pequena no sistema
educacional como um todo.
177
4.4 O Ambiente Institucional do Primeiro Governo Vargas
Após a Primeira Guerra Mundial iniciou-se um processo de profundas
transformações nas principais instituições políticas e econômicas dos países ocidentais.
Essas mudanças tiveram reflexos visíveis no Brasil, tanto no que concerne à visão de
mundo das organizações que alcançariam o poder político em 1930, quanto com relação
às vantagens comparativas da especialização na produção agrícola para exportação,
especialmente após a Grande Depressão de 1929, que inaugurou uma tendência de
fechamento das economias. Essas mudanças de preferências e preços relativos,
certamente não ocorreram “do dia para a noite”, mas foram resultado de um processo de
degeneração das bases institucionais que sustentavam o liberalismo do séc XIX.
O sucesso da nova fase em que ingressou o Brasil a partir de então, quando a
estrutura produtiva foi amplamente modificada, não pode ser entendida como resultado
de algum evento isolado. Por um lado, as mudanças externas de preços relativos, assim
como de preferências teriam aberto novas possibilidades de ganho para a economia
brasileira e, por outro, o grupo que conquistou o poder político (liderado por Getúlio
Vargas) também apresentava preferências diferentes de seu antecessor (a ideologia
Desenvolvimentista). Estes fatores teriam criado incentivos para que o novo grupo com
poder político empreendesse esforços para alterar as instituições, com a criação de regras
que viabilizassem um maior desenvolvimento econômico e estimulo ao desenvolvimento
de habilidades e conhecimentos nas novas áreas em que se ingressava.
Assim, em contraposição com o período anterior, as instituições políticas do
primeiro governo Vargas tiveram como característica principal a forte centralização do
poder no Executivo federal e a conformação de um Estado Nacional mais uno, com
embasamento nacionalista, em detrimento dos demais entes federativos. A incorporação
das massas, com a criação da ideologia trabalhista, deu legitimidade ao Presidente da
República, que passou a ter uma posição de destaque como chefe da nação,
intensificando o autoritarismo. Seguindo objetivos desenvolvimentistas, o poder central
passou a intervir diretamente na economia, conduzindo a política econômica não mais
apenas para responder aos interesses da oligarquia, mas buscando o desenvolvimento
178
econômico. A criação de regras mais claras para o funcionalismo público e a criação de
órgãos com funções específicas contribuíram para uma maior racionalização do aparelho
estatal.
Apesar da mudança das regras políticas depender, basicamente, dos interesses dos
atores com maior poder de barganha, os atores centrais com relação a instituições
políticas são os próprios políticos. Seus objetivos e as restrições impostas sobre eles no
empenho de alcançar estes objetivos são os determinantes do arranjo institucional. Se os
custos de transação no ambiente político forem baixos e os agentes políticos possuírem
modelos mentais acurados para guiá-los, então será possível alcançar direitos de
propriedade eficientes. Deste modo, a centralização do poder e o autoritarismo do
primeiro governo Vargas permitiram que o presidente concentrasse uma maior habilidade
de mudar as regras conforme sua ideologia e a daqueles que lhe apoiavam. Neste sentido,
a configuração deste novo arranjo institucional político possibilitou a que Vargas tivesse
mais poder para configurar as instituições econômicas, voltando-as para o incentivo de
outras atividades econômicas, que não a agricultura cafeeira, especialmente a indústria.
A virada para dentro da economia permitiu que, no período do primeiro governo
Vargas, o sistema tributário passasse a ser caracterizado por uma maior importância das
bases de tributação domésticas, com uma conseqüente redução da vulnerabilidade
externa. Ademais, apesar dos impostos indiretos ainda serem os mais importantes, houve
um aumento da importância dos impostos diretos. Como conseqüência da centralização
do poder, o sistema tributário também foi mais centralizado e se instituiu um sistema de
transferências intergovernamentais, para cobrir as necessidades dos estados e municípios.
Houve também um aumento da carga tributária, para compensar a maior e mais direta
intervenção do Estado na economia.
O sistema financeiro do período também pode ser, de modo geral, caracterizado
por uma maior intervenção governamental. Deste modo, uma Autoridade Monetária foi
sendo solidificada ao longo do período, primeiramente, com o aumento das funções do
Banco do Brasil e, no final do período, com a criação da SUMOC. O fim do Padrão-Ouro
permitiu uma maior desvinculação entre política monetária e cambial, o que possibilitou
as políticas monetária e cambial passassem a assumir, ademais de suas funções típicas, a
179
função de instrumentos para a promoção do desenvolvimento. Paralelamente, uma
estrutura de órgãos de acompanhamento foi criada, permitindo um feedback e, assim,
uma maior racionalização dessas políticas.
Para facilitar o crescimento industrial, houve uma expansão do crédito, com a
criação de uma estrutura especializada, consolidando uma política creditícia blica de
alcance nacional, e com o crescimento do sistema bancário, que passou a ser
predominantemente nacional. Por outro lado, a mudança na legislação de mercado de
capitais e corporações tornou a oferta de financiamento por este meio menos atrativa, o
que aprofundou a transição do financiamento para o crédito bancário.
Uma maior diversificação da economia, também demandava uma melhor
organização das regras trabalhistas, que configurassem um mercado de trabalho nacional
unificado. Percebemos, portanto, que no período ocorreu uma ampla transformação nas
regras relacionadas ao trabalho no Brasil. A mudança do ambiente econômico e da
configuração do poder político transformaram o tratamento dispensado à questão social
pelo Estado, que passou a intervir diretamente nas relações trabalhistas. As regras de
sindicalização, com a exigência de registro dos sindicatos, permitiram ao Estado um
maior controle sobre a massa de trabalhadores. Em contrapartida, foi criada uma ampla
estrutura institucional tanto de regras, com uma ampla legislação trabalhista, como de
organismos de imposição destas regras. Como medida nacionalista, mas também como
meio de ter maior controle sobre as organizações de trabalhadores, foram criadas regras
de estimulo à contratação de trabalhadores nacionais. Todas essas medidas, tomadas por
um governo central, e de caráter nacional permitiram a consolidação de um mercado de
trabalho de dimensão nacional no Brasil.
Para acompanhar a nova dinâmica econômica, o sistema educacional também teve
que sofrer mudanças, permitindo a formação de mão-de-obra qualificada para a indústria
e para o comércio, duas atividades que ganhavam ímpeto neste período, além da
educação básica de uma população que se tornava cada vez mais urbana. O primeiro
governo Vargas, portanto, deixou uma estrutura educacional bastante modificada com
relação àquela da Primeira República. Com relação ao ensino fundamental, a gratuidade e
obrigatoriedade asseguradas nas Constituições, determinaram, ao menos, a meta de
180
universalização do mesmo, apesar de suas diretrizes e responsabilidade direta
continuarem a cargo de estados e Municípios.
Com relação aos outros níveis, a nova visão de país determinou um sistema
educacional coordenado com uma nova divisão econômico-social do trabalho. Assim, a
educação deveria servir ao desenvolvimento de habilidades e mentalidades de acordo
com os diversos papéis e funções a serem exercidas. O nível secundário de ensino foi o
mais transformado. Tanto o secundário, como os cursos profissionalizantes industrial,
comercial, pedagógico, etc, foram regulamentados e expandidos e foi desenvolvida a
concepção de que este nível de ensino também deveria ser universalizado. Por fim, o
ensino superior foi melhor organizado, com a criação do regime universitário e a
implantação do Estatuto das Universidades Brasileiras. Todavia, seu acesso manteve-se
muito restrito e sua participação muito pequena no sistema educacional como um todo.
Como forma de ilustração das diferenças observadas entre as estruturas
institucionais da Primeira República e do primeiro governo Vargas, apresenta-se o
Quadro 4.5. A partir deste quadro, nota-se que houve uma reconfiguração das instituições
políticas que deram maior poder ao presidente para a constituição de estruturas
institucionais condizentes com a ideologia desenvolvimentista. Houve, portanto, uma
mudança do sistema tributário, que passou a permitir um maior equilíbrio entre os estados
e uma maior receita para que o Estado pudesse interferir positivamente na economia e
promover o desenvolvimento econômico. Também, o sistema financeiro sofreu
alterações, gerando um conjunto de regras mais claras e mais disponibilidade de crédito.
Quanto ao sistema educacional, passou-se a formar mão-de-obra qualificada para outros
setores da economia, como a indústria e o comércio. A mudança das relações de trabalho
possibilitou a formação um mercado de trabalho nacional, que proporcionaria mão-de-
obra para a indústria e para o comércio e conformaria um mercado consumidor nacional.
Após todas estas mudanças institucionais da década de 1930, a economia
brasileira tornou-se mais robusta, deixando de ser tão vulnerável às flutuações externas.
As mudanças desta época, provavelmente, foram importantes para todo o crescimento
posterior por criar uma base mais sólida tributária, financeira, de relações de trabalho e de
educação. Isso porque as regras do jogo tornaram-se mais claras. Passou a haver mais
181
intervenção do governo na economia, mas uma intervenção que deixou de ser pontual,
atendendo interesses específicos de oligarquias, e passou a ser sistematizada, buscando o
desenvolvimento do país.
Quadro 4.5
: Diferenças entre os ambientes institucionais dos dois períodos
(continua)
Primeiro Período Republicano Período Governo Vargas
Instituições políticas
Dominação oligárquica e coronelismo
Poder descentralizado
Hegemonia dos estados
economicamente mais fortes
Federalismo
Poderes limitados
Forma liberal
Medidas intervencionistas - interesses
das oligarquias
Conformação de um Estado Nacional
Centralização do poder no Executivo
federal
Maior racionalização do aparelho
estatal
Embasamento nacionalista
Autoritarismo
Ideologia trabalhista.
Desenvolvimentismo - intervenção
direta na economia,
Sistema
tributário
Descentralização da distribuição
Forte desequilíbrio financeiro
Concentração em impostos indiretos
Carga tributária baixa e vulnerável a
fatores externos
Centralização e sistema de
transferências intergovernamentais
Aumento da carga tributária
Crescimento da importância dos
impostos diretos
Bases de tributação domésticas -
redução da vulnerabilidade externa
Instituições econômicas
Sistema financeiro
Falta de uma autoridade monetária
Sistema bancário “inelástico” e forte
presença de bancos estrangeiros
Monopólio estatal da emissão de
moeda
Meta do Padrão-Ouro
Estrutura institucional avançada para
corporações e mercado de capitais
Autoridade monetária
Crescimento do sistema bancário -
predominantemente nacional.
Maior intervenção governamental
Políticas monetária e cambial como
instrumentos para o desenvolvimento
Expansão do crédito e política
creditícia pública de alcance nacional
182
(conclusão)
Primeiro Período Republicano Período Governo Vargas
Trabalho
Mercados de trabalho fragmentados
regionalmente e incompletos
Imigrantes preferidos aos nacionais:
nacionais e ex-escravos marginalizados
Legislação social desequilibrada e por
categorias e sem modo de imposição
Crescente organização livre dos
trabalhadores
Concentrada na área rural, mas
crescimento do emprego urbano
Consolidação de um mercado de
trabalho de dimensão nacional
Estimulo à contratação de
trabalhadores nacionais
Ampla estrutura institucional -
legislação trabalhista e organismos de
imposição
Regras de sindicalização - maior
controle
Intervenção direta nas relações
trabalhistas
Instituições econômicas e sociais
Sistema
educacional
Poucos recursos para as escolas
públicas
Cursos secundários para poucos
Cursos superiores para formar
bacharéis
Ensino fundamental - meta de
universalização
Nova divisão econômico-social do
trabalho profissionalizantes
industrial, comercial, pedagógico, etc.
Ensino superior mais organizado, mas
com acesso ainda muito restrito
Fonte: Elaborado pela autora.
183
5 CONCLUSÃO
Neste trabalho, procurou-se caracterizar o ambiente institucional brasileiro e
identificar a importância das instituições para o desempenho econômico de dois períodos
bem definidos da história política brasileira: A Primeira República (1889 a 1930) e o
Primeiro Governo Vargas (1930 a 1945). Além disso, buscou-se conhecer os processos
de mudança institucional e seus determinantes, especialmente aqueles relacionados à
Revolução de 1930, entendida aqui não apenas como o golpe de outubro de 1930, mas
como um processo, que se iniciou com as mudanças ideológicas e de preços relativos da
década anterior.
Como sugerido por Acemoglu, Johnson e Robinson (2004), no Brasil republicano
do começo do séc XX fica clara a relação entre poder econômico e político, assim como
o papel determinante do poder político para influenciar a escolha das instituições
econômicas e das próprias instituições políticas num segundo momento.
Neste sentido, o predomínio do café permitiu que os grupos cafeicultores
lograssem alcançar tanto o poder político de fato, como o jurídico. Com isso, puderam
definir Instituições Políticas, formais e informais, que permitiam a manutenção deste
poder, como a forma federalista, com forte descentralização e o Pacto Oligárquico; assim
como um arranjo de direitos de propriedade com o mesmo objetivo, sendo característica a
forma do sistema tributário, que beneficiava amplamente os estados exportadores.
A forma de inserção internacional da economia também foi um fator determinante
do formato institucional do período. Como uma economia amplamente “voltada para
fora”, ficava implícita uma certa exigência de conformação com as instituições
internacionais, como o Padrão-Ouro e o Estado Liberal. Todavia, essas formas
“importadas” eram implementadas enquanto não afetassem econômica ou
politicamente os grupos cafeicultores. Neste sentido, o Padrão-Ouro seria abandonado
periodicamente para evitar desequilíbrios profundos no balanço de pagamentos e a
184
intervenção do Estado na economia se faria presente quando se fizesse necessária para
atender os interesses das oligarquias.
O predomínio do setor agrário, somado a questões de ordem geográfica e de infra-
estrutura também foi determinante para o baixo desenvolvimento de um mercado
nacional integrado. Além disso, a industria e a urbanização ainda eram bastante
incipientes no período (embora, é claro, tenham crescido muito, especialmente após com
a Primeira Guerra). Com isso, a exigência de mão-de-obra qualificada era muito pequena,
e o trabalho era predominantemente rural. Estes aspectos faziam com que não fosse
necessário nem um grande desenvolvimento do sistema financeiro, tampouco maiores
investimentos na formação dos trabalhadores. Apenas alguns grupos, mais organizados
alcançaram algum tipo de direitos trabalhistas até a década de 1930.
As mudanças no ambiente institucional que se sucederam a partir da década de
1930 podem ser entendidas como respostas a mudanças de ideologia e de preços
relativos. Assim, por um lado, a crise do modelo de mercado auto-regulável do século
XIX, que terminou de ruir com a crise de 1929, determinou uma forte mudança de preços
relativos, aprofundada pela superprodução de café. A crise do produto, que vinha
sendo atenuada desde 1906 com os programas de valorização, determinaria a redução do
poder político dos cafeicultores. Por outro lado, as mudanças ideológicas externas teriam
reflexos no Brasil, com a solidificação da ideologia desenvolvimentista. A redução do
poder dos cafeicultores e o crescimento de outros grupos (em especial, os tenentes) com
uma visão de mundo mais próxima das tendências mundiais (especialmente nacionalismo
e intervencionismo), possibilitaria a tomada do poder por um grupo que, estimulado por
tais mudanças de preços relativos e de preferências, empreenderia esforços para mudar as
instituições vigentes por outras que gerassem mais incentivos para a industrialização e o
desenvolvimento econômico.
Assim, a partir do momento em que Vargas tomou o poder, uma série de
mudanças institucionais foi empreendida. Seguindo as tendências internacionais, se
buscou uma maior unificação do país, para a conformação de um Estado Nacional (e não
mais uma “confederação”) e o poder foi fortemente centralizado no Executivo federal. O
Estado aumentou sua intervenção, assim como sua participação ativa (como ator) na
185
economia, procurando colocá-la no caminho do desenvolvimento e da industrialização.
Também criou novas instituições e institutos com tarefas especificas que tinham, como
fim último o desenvolvimento, de forma que o aparelho estatal foi aumentado e
racionalizado.
Da mesma forma que no período anterior, as instituições econômicas e sociais
foram alteradas pelo Estado para conformar-se aos seus novos objetivos e ao novo
ambiente econômico que o país alcançava. Assim, o sistema tributário ganhou bases
predominantemente domésticas, reduzindo a vulnerabilidade externa a que as receitas
governamentais eram submetidas e garantindo recursos para que o Estado pudesse
intervir diretamente na produção; o sistema financeiro tornou-se mais confiável, com o
surgimento de uma autoridade monetária, o que permitiu que este pudesse oferecer um
maior volume de crédito ao setor privado; a educação recebeu um papel mais importante
do que no período anterior, transformando-se em formadora de mão-de-obra qualificada
para os novos quadros industriais e burocráticos que a economia demandava; por fim, as
relações de trabalho ganharam regras mais claras, o que facilitaria a contratação (troca) e
evitaria tensões sociais, prejudiciais à conformação de um ambiente institucional seguro
para a produção.
Esse profundo processo de mudança institucional permitiu a continuação e
aprofundamento do processo de industrialização. As novas instituições forneceram um
conjunto de regras mais claras e uma ampla estrutura de imposição das regras, que
facilitavam as trocas e criavam um ambiente mais confiável para a produção. Assim, a
economia brasileira tornou-se mais robusta, deixando de ser tão vulnerável às flutuações
externas (embora, como acentuado por Tavares (1978), a continuidade do processo de
substituição de importações seja dependente das receitas de exportações para manter o
fluxo nimo de importações necessárias ao processo produtivo industrial). O ambiente
institucional então criado (embora parcialmente modificado pela nova constituição
promulgada em 1946) daria as condições para o acentuado desenvolvimento econômico
do período imediatamente posterior, mas se tornaria impeditivo a partir da década de
1960, quando novas mudanças de preços relativos exigiriam, novamente, uma
concentração de esforços no sentido de transformar a estrutura institucional para que a
mesma se conformasse com uma economia, então, muito mais urbana e industrializada.
186
O presente trabalho, ao procurar fazer uma caracterização e enfatizar a mudança,
não considera que havia um ambiente institucional estático que foi mudado,
abruptamente, fazendo surgir outro ambiente institucional estático. Este tipo de
interpretação deve ser evitado. O rucurso estático (o Quadro) permite ressaltar a
mudança, mas deve ficar claro que a história é um processo continuo e, embora regras
formais possam ser criadas e transformadas de um instante para o outro, instituições
informais mudam de forma contínua e incremental. Além disso, embora tenhamos
enfatizado as mudanças, houve também muitas continuidades. Em especial, instituições
enraizadas na sociedade (embedded) tendem a se manter, sendo parte fundamental na
determinação dos caminhos que a economia e a sociedade irá tomar (há dependencia de
trajetória). Assim, como enfatizado por North (1990), as revoluções sempre mudam
muito menos do que se propõem porque há a persistência de instituições informais, que
estão fortemente arraigadas na sociedade. Apesar de o objetivo não ter sido a análise do
que permanece, há questões culturais, como o patrimonialismo, os arranjos de elite e a
dominaçao do estamento burocrático (FAORO, 2005), e a desigualdade social (e
regional) que continuaram e que continuam até hoje. Apesar dos esforços para mudar
isso, as transformações teriam que ser mais radicais para lograr diminuir estas
desigualdades ou romper com a sociedade estamental. Ou seja, não estamos defendendo a
idéia de que todo o processo neste período foi de ruptura nem de que a sociedade mudou
totalmente de uma hora para a outra. A mudança foi gradual, ocorrendo antes e depois da
Revolução de 1930, além de existirem também outras instituições que não mudaram. A
estrutura social, por exemplo, não mudou, continuaram existindo “os amigos do rei”, isto
é, os ricos com influências políticas, e "o resto" da população. O preconceito e o racismo
também continuaram existindo, apesar dos esforços em se formar um mercado de
trabalho único e com incentivo à contratação dos nacionais.
O conhecimento das características institucionais históricas do Brasil, em um
período característico de amplo desenvolvimento econômico ajuda a corroborar as teses
de que não é possível se definir uma estrutura institucional ótima a ser imposta aos países
para que se desenvolvam. As melhores instituições serão “as melhores” para algum
187
objetivo especifico que se queira alcançar, mas, ao tornarem alguns mercados eficientes,
aumentarão custos de transação em outros. Alem disso, seus resultados serão dependentes
do contexto internacional e nacional em que se inserem, devendo ser consideradas aí, não
apenas regras formais e informais, mas também questões ideológicas e culturais.
Ademais, como instituições são muito difíceis de mudar, a simples imposição de regras
formais externas pode não ser suficiente para fazer com que elas sejam seguidas ou que
sejam seguidas como se gostaria, gerando resultados muito diversos do esperado.
O estudo concentrou-se em apenas um dos quatro níveis de análise institucional
sugeridos por Williamson (2000), qual seja, o nível dois, ambiente institucional. Para
estudos futuros seria interessante uma ampliação da análise para os demais níveis
(especialmente embeddedness e estruturas de governança), assim como do período.
188
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regulamentos, observados os dispositivos do seguinte estatuto das universidades
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