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minha infância. Minha avó era doente e foi ela que me criou, apanhei bastante,
então foi bastante difícil. Pai e mãe trabalhando a vida toda. Meus pais só tiveram
contato mesmo comigo a partir dos 15 anos, que eu só os via aos sábados e aos
domingos. E fora isso era sozinha. Entrei na escola com 6 anos e desde então eu
tenho a chave de casa, ia para a escola sozinha, voltava sozinha. Os deveres de
escola, sempre o pai e mãe nunca olharam, sempre mantinha tudo certinho, para
evitar ser um problema para eles. Isso eu carrego na vida até hoje, principalmente
nas questões da unidade, sou muito chata até comigo. Fiz a faculdade em 92 na
Federal e me formei em 96. Aí quando eu me formei eu já tinha aquela idéia HU,
HU, só queria HU. Quando eu entrei no HU primeiro eu entrei como voluntária, fiz
386 horas na clínica médica. [...]. Um dia me liga a [...] na 6ª feira dizendo que eu
ia ser contratada pela FAPEU. Eu faceira da vida achando que ia para a clínica
médica, achei que eu ia ficar lá. [...] a segunda notícia é que não é aqui, é na [...].
Aí eu entrei em pânico, fiquei apavorada, pensei Meu Deus eu não sei nada de
[...], o que eu vou fazer lá? Encontrei uma alma muito boa que disse para mim:
vai para casa, este final de semana é teu, não pegue em livro nenhum. Porque eu
já queria saber qual é o livro, qual a bibliografia que eu tenho que estudar porque
eu já sei que tem alguns, eu já tenho o livro tal, o que mais eu preciso? Ela assim,
“não você não vai ver nada disso, tu vai para casa, esta semana tu ainda não foi
contratada, passa o final de semana, aproveita estas férias e depois na 2ª feira a
gente vai resolver isso” E foi aí que a gente começou gradativamente o meu
treinamento, [...]. E eu fui aos pouquinhos ganhando mais espaço, a confiança do
pessoal porque eu tinha 21 anos quando me formei, recém saída da
universidade, nunca tinha trabalhado a não ser na mercearia do meu pai e da
minha mãe. Para mim, foi um desafio imenso, primeiro porque eles me
questionavam o tempo inteiro, usavam a medicação há 500 anos, chegavam
para mim ah que medicação é esta? Consegues coletar uma gasometria? E daí
para frente. Só que aos pouquinhos eu fui dividindo com eles esta
responsabilidade de ser enfermeira numa equipe que já está há muito
estabelecida e que eu precisava deles e eles precisavam também de um
conhecimento novo, de alguém que tivesse vontade, e foi aí que a gente
começou uma interação super boa na unidade. E no ano de 2002 fiz o concurso.
[...]. Meu pai e minha mãe são tudo na minha vida, são tudo de bom na minha
vida, tudo. Meus Deus hoje eu sou o que sou por causa deles, mas assim a gente
vivia muita dificuldade, [...]. É, pode ser que hoje a depressão, essa necessidade
que eu tenho de aceitação pode ser disso. Acredito que seja. Claro que demorou
muito para aparecer porque foi um estresse que gerou isso na verdade, a
depressão. [...] Quando eu passei no concurso, eu passei por muita coisa na vida,
as pessoas olhavam para mim na mercearia, trabalhar com homem que bebe
essas coisas toda, não é uma coisa fácil. E o fato de ser pobre também era um
fator de que, nunca vai conseguir passar para uma universidade federal, isso eles
falavam na nossa cara. Teve um senhor inclusive que quando eu passei para o
[...] o pai foi lá dizer para ele que passei, porque a tristeza era tanta, das pessoas
desacreditarem. Você sempre estudou num colégio público não vai conseguir
nada na vida. A gente ouve muito assim, só filho de rico que tem condições, filho
de rico passa na universidade pública porque tem escola boa. [..]. Eu vivi isso
muito na pele, por isso que tudo que eu faço é com muito esforço, sempre com a
preocupação de fazer o melhor que eu posso, porque é como se eu tivesse me
mostrando o tempo inteiro que não é porque eu fui pobre a vida toda que eu não
posso ser uma pessoa feliz na minha profissão (E4).
Eu passei no vestibular, na turma de 96/01 para enfermagem. Comecei a
faculdade e depois na segunda fase acabei engravidando. Eu era bem nova e o
pai do meu filho também. Eu tinha 18 para 19 anos, engravidei com 19 e a gente
resolveu não ficar junto. Minha mãe me deu apoio para continuar a faculdade,
então eu acabei fazendo, fazendo os estágios grávida. Depois eu continuei,
amamentava, parei um semestre porque era estágio e depois aos 10 dias de
cesárea eu já estava de volta fazendo provas. Foi assim, vida de faculdade,
ser mãe solteira com a ajuda dos pais, ainda um pouco adolescente, mas foi
super boa. Moro com meus pais, meu filho tem 8 anos, um menino.Trabalho