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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
PROGRAMA DE MESTRADO
MESTRADO INTERINSTITUCIONAL EM DIREITO (UFSC/UFAC)
DANILO LOVISARO DO NASCIMENTO
A BIOPIRATARIA NA AMAZÔNIA: UMA PROPOSTA JURÍDICA DE
PROTEÇÃO TRANSNACIONAL DA BIODIVERSIDADE E DOS
CONHECIMENTOS TRADICIONAIS ASSOCIADOS
FLORIANÓPOLIS-SC
2007
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DANILO LOVISARO DO NASCIMENTO
A BIOPIRATARIA NA AMAZÔNIA: UMA PROPOSTA JURÍDICA DE
PROTEÇÃO TRANSNACIONAL DA BIODIVERSIDADE E DOS
CONHECIMENTOS TRADICIONAIS ASSOCIADOS
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado
em Direito da Universidade Federal de Santa
Catarina, no semestre 2007.2, como requisito
para a obtenção do grau de Mestre em Direito,
área de concentração Relações Internacionais,
sob a orientação do Prof. Dr. Fernando
Kinoshita.
FLORIANÓPOLIS-SC
2007
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DANILO LOVISARO DO NASCIMENTO
A BIOPIRATARIA NA AMAZÔNIA: UMA PROPOSTA JURÍDICA DE
PROTEÇÃO TRANSNACIONAL DA BIODIVERSIDADE E DOS
CONHECIMENTOS TRADICIONAIS ASSOCIADOS
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em
Direito da Universidade Federal de Santa Catarina
UFSC, para obtenção do título de Mestre em Direito.
Banca Examinadora:
___________________________________________________________________________
Presidente: Professor Doutor Fernando Kinoshita
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Brasil
___________________________________________________________________________
Professor Doutor Anderson Pereira de Andrade
Universidad Carlos III, Espanha/Ministério Público do Distrito Federal, Brasil
___________________________________________________________________________
Professor Doutor Eduardo Antônio Temponi Lebre
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Brasil
___________________________________________________________________________
Professor Doutor Antonio Carlos Wolkmer
Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Direito – UFSC
A Ana Lúcia, fonte de tanto amor e
compreensão, que jamais serei capaz de
retribuir.
A Giovanna, motivo de felicidade e vida.
A meus pais, por terem me ensinado desde
cedo a valorizar o estudo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Conselho Superior do Ministério Público do Estado do Acre pela
autorização concedida para participar do Curso de Mestrado.
Agradeço, em especial, ao Procurador-Geral de Justiça, Dr. Edmar Azevedo Monteiro
Filho e ao Corregedor-Geral do Ministério Público, Dr. Ubirajara Braga de Albuquerque, que
vislumbraram na qualificação de seus membros uma oportunidade para o crescimento
institucional, criando as condições necessárias para que eu e mais três colegas, ainda que sem
o afastamento integral de suas funções, pudessem realizar essa difícil empreitada.
Agradeço à Universidade Federal de Santa Catarina e à Universidade Federal do Acre,
notadamente a todos aqueles que se empenharam diretamente para a realização deste
Mestrado Interinstitucional e, assim, concretizaram os nossos sonhos.
Agradeço ao corpo docente do Curso de Mestrado da Universidade Federal de Santa
Catarina pelo padrão de excelência e, em especial, ao meu orientador, Professor Doutor
Fernando Kinoshita, exemplo de dedicação à Academia, fonte de conhecimento e inspiração
para aqueles que dão os primeiros passos no árduo caminho da pesquisa.
Agradeço, finalmente, a todos os meus alunos, que são também a razão do meu
esforço e superação.
RESUMO
A presente dissertação foi elaborada por Danilo Lovisaro do Nascimento e apresentada
à Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC para obtenção do título de mestre. O tema
investigado recai sobre a biopirataria na região da bacia amazônica e os instrumentos que
podem reforçar a proteção jurídica da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais
associados. Faz-se a análise das conseqüências negativas da biopirataria para os países em
desenvolvimento e, especificamente, para os países da região amazônica, dando-se especial
ênfase à ameaça que esta prática representa para a execução de uma estratégia regional
voltada para o aproveitamento sustentável da biodiversidade, como alternativa para o
desenvolvimento. Sustenta-se a necessidade de criminalização da biopirataria no plano interno
como uma etapa essencial ao fortalecimento de um marco jurídico protetor da biodiversidade
nos âmbitos nacional e sub-regional. Com base nesta premissa e diante de uma abordagem da
questão a partir de uma perspectiva complexa, que visa tomar o fenômeno na sua totalidade,
elabora-se uma proposta complementar para combater a biopirataria e assegurar a sua
proteção, mediante a realização da cooperação internacional para o desenvolvimento. Para
este fim, propõe-se a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica – OTCA, como foro
privilegiado para a implementação de estratégias de cooperação que favoreçam uma tomada
de posição no plano internacional, que possa assegurar a consecução de um projeto regional
eficiente e voltado para a realização do desenvolvimento sustentável em escala sub-regional.
Palavras chaves: Biopirataria. Criminalização. Cooperação Internacional. Desenvolvimento
Sustentável.
ABSTRACT
The present dissertation was prepared by Danilo Lovisaro do Nascimento and
presented to Santa Catarina Federal University to get his Master of Law. The investigated
subject concerns to biopiracy at the region of Amazon’s bacin and to the legal instruments
that can enforce the juridical protection to biodiversity and associated traditional knowledge.
It analyses the negative consequences of biopiracy to developing countries and, specifically,
to the Amazon’s region countries, emphasying the threat that this practice represents for the
accomplishment of a regional strategy, related to the sustainable use of biodiversity, as an
alternative to development. It sustains biopiracy criminalization need at an internal level as an
essential stage to the empowerment of a juridical framework for protecting biodiversity at
nacional and subregional levels. Based on this premise and wishing approach the question by
a complex perspective, which focuses the phenomenon by its totallity, it is presented a
complementary proposal to struggle against biopiracy and to ensure its own protection,
through the realization of international cooperation to development. To this aim, it is proposed
that Amazon Cooperation Treaty Organization be a privilegious forum to the realization of
cooperation strategies on behalf of a making of decision at international plan that ensures the
accomplishment of an efficient regional project to carrying out a sustainable development at
subregional level.
Keys word: Biopiracy. Criminalization. International Cooperation. Sustainable Development.
RESUMEN
La presente disertación fue elaborada por Danilo Lovisaro do Nascimento y presentada
a la Univesidad Federal de Santa Catarina UFSC para obtención del título de maestría. El
tema investigado recae sobre la biopirataria en la región de la cuenca amazónica y los
instrumentos que pueden reforzar la protección juridica de la biodiversidad y de los
conocimientos tradicionales asociados. Se hace analisis de las consecuencias negativas de la
biopirataria para los países en desarrollo y, especialmente, para los países de la región
amazónica, dandose especial énfasis a la amenaza que esta práctica representa para la
ejecución de una estrategia regional vuelta para el aprovechamiento sostenible de la
biodiversidad, como alternativa para el desarrollo. Se sostiene la necesidad de criminalización
de la biopirataria como una etapa esencial al fortalecimento de un marco jurídico protector de
la biodiversidad en los ambitos nacional y subregional. Con base en esta premisa y delante de
un abordaje de la cuestión apartir de una pespectiva compleja, que objetiva tomar el fenómeno
en su totalidad, elaborandose una propuesta complementar para combatir la biopirataria y
asegurar la protección, frente a la realización de la cooperación internacional para el
desarrollo. Para este fin, propone a la Organización del Tratado de Cooperación Amazónica –
OTCA, como foro privilegiado para implementación de estratégias de cooperación que
favorezcan una tomada de posición en el plan internacional que asegure la consecución de un
proyecto regional eficaz para la realización del desarrollo sostenible en escala subregional.
Palabras claves: Biopirataria. Criminalización. Cooperación Internacional. Desarrollo
Sostenible.
LISTA DE SIGLAS
ABIN – Agência Brasileira de Inteligência
ACT Amazon Conservation Team
AOD – Ajuda Oficial para o Desenvolvimento
BIDBanco Interamericano de Desenvolvimento
CAD – Comitê de Ajuda para o Desenvolvimento
CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
CNUMAD – Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito
CPIBIOPI – Comissão Parlamentar de Inquérito da Biopirataria
CPITRAFI Comissão Parlamentar de Inquérito que Investigou o Tráfico Ilegal de Animais
e Plantas Silvestres da Fauna e da Flora Brasileiras
EMNs – Empresas Multinacionais
FUNAIFundação Nacional do Índio
GATT – General Agreement on Trade and Services
GTAMGrupo de Trabalho da Amazônia
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
OCDE
– Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OMSOrganização Mundial de Saúde
ONGOrganização Não-Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
OTCA – Organização do Tratado de Cooperação Amazônica
PEC – Proposta de Emenda Constitucional
PIB – Produto Interno Bruto
PNUDPrograma das Nações Unidas para o Desenvolvimento
SISBINSistema Brasileiro de Inteligência
TCATratado de Cooperação Amazônia
TRF – Tribunal Regional Federal
TRIPSAgreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 11
CAPÍTULO I – FUNDAMENTOS INTERDISCIPLINARES SOBRE A
BIODIVERSIDADE E BIOPIRATARIA
14
1.1 Aspectos conceituais da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais
associados
14
1.2 Aspectos quantitativos e qualitativos da biodiversidade 21
1.3 Um novo olhar sobre a biodiversidade
34
1.4 Aspectos conceituais da biopirataria
37
1.5 Aspectos destacados da globalização e o pensamento de Vandana Shiva
44
CAPÍTULO II – CRIMINALIZAÇÃO DA BIOPIRATARIA NA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL
52
2.1 Considerações necessárias sobre a criminalização da biopirataria
52
2.2 O processo de criminalização primária e o Direito Penal interno 59
2.3 O sistema penal garantista e a teoria do bem jurídico como referenciais
teóricos para a discussão sobre a criminalização da biopirataria
67
2.3.1 O bem jurídico tutelado em caso de criminalização da biopirataria
73
2.3.2 As bases para a (des)legitimação da intervenção penal e as limitações da política
criminal à intervenção penal na contemporaneidade
78
2.3.3. O arcabouço jurídico protetor da biodiversidade no Brasil
84
2.4 A viabilidade ou não de uma resposta criminalizante em relação a biopirataria 87
CAPÍTULO III COOPERAÇÃO INTERNACIONAL PARA O
DESENVOLVIMENTO
96
3.1 Considerações preliminares sobre o Direito e as Relações Internacionais, desde
a perspectiva Latino-americana e Amazônica
96
3.2 Aspectos paradigmáticos da cooperação internacional 103
3.3 Crítica ao modelo atual de cooperação internacional e sua necessária relação
com o desenvolvimento sustentável e os direitos humanos
109
3.4 A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica como foro privilegiado
para a promoção do desenvolvimento sustentável e para a proteção da
biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados
125
4 CONCLUSÃO
136
5 REFERÊNCIAS
139
6 GLOSSÁRIO 150
7 ANEXOS 154
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa tem como tema a biopirataria na região amazônica, apontando-se
como razão para essa delimitação a preocupação em se produzir um conhecimento científico
para a discussão de questões de elevada importância nos planos local, nacional, sub-regional e
internacional.
O problema proposto consiste na análise da necessidade de se criminalizar a
biopirataria. Indaga-se em que medida a tutela penal poderá representar um mecanismo
jurídico eficiente à proteção da biodiversidade brasileira e amazônica, visto que a República
Federativa do Brasil e os demais países da hiléia amazônica são possuidores de uma vasta
biodiversidade e o aproveitamento racional de tal riqueza pode ser uma alternativa
interessante para o desenvolvimento sustentável desses países no contexto da globalização e
da integração sub-regional.
Logo, o uso não autorizado de componentes da biodiversidade ou a apropriação dos
conhecimentos das populações tradicionais representam uma ameaça real para toda e qualquer
estratégia de desenvolvimento da região amazônica, o que, por via de conseqüência, afeta a
todo o planeta.
Diante desse quadro, tem-se que a biodiversidade é um dos elementos que compõe o
equilíbrio do meio ambiente e que, ao mesmo tempo, poderá servir como um fator diferencial
para os países da região amazônica na realização do próprio desenvolvimento.
A dissertação, portanto, tem como hipótese de investigação a legitimidade da
intervenção penal para criminalizar a biopirataria, uma vez que se considera esse processo
como um passo importante e decisivo à efetiva proteção jurídica da biodiversidade, de forma
a se assegurar a realização de uma proposta complementar por meio da cooperação
internacional para o desenvolvimento.
Assim, o Capítulo I trata dos aspectos conceituais da biodiversidade, seja na sua
dimensão material, seja na dimensão imaterial, esta última abrangendo os conhecimentos
tradicionais associados à biodiversidade. Nesse plano conceitual, sem se desprezar o valor
intrínseco da biodiversidade, se pretende demonstrar que o fator econômico representa uma
variável importante para a elaboração de um conceito que possa alcançar os objetivos a que se
propõe nesta pesquisa, ou seja, de se reconhecer a biodiversidade como uma alternativa para o
desenvolvimento sustentável dos países da região amazônica.
Ainda no Capítulo I é abordada a questão da biopirataria para, a partir do
estabelecimento de uma compreensão do termo, ser possível identificar os casos de
biopirataria e os aspectos negativos desta prática para os países em desenvolvimento.
Demonstra-se que combater a biopirataria é uma questão de extrema relevância para os países
amazônicos e que a construção de uma via para o desenvolvimento dependerá de como esses
países conseguirão proteger suas riquezas naturais e culturais com vistas a utilizá-las de forma
sustentável, melhorando as condições de vida de suas populações.
O marco teórico adotado é a autora indiana Vandana Shiva,
1
que na sua condição de
pesquisadora, desenvolve um pensamento autóctone e valorizador da cultura do seu povo e
das riquezas naturais do seu país. Desse modo, apesar da distância geográfica e das diferenças
culturais, são identificados elos de conexão que unem a Índia e o Brasil quando o assunto é
biopirataria e suas relações internacionais com os países desenvolvidos, sendo que a Índia e o
Brasil precisam lutar por uma identidade que lhes permita romper com o processo de
dominação que divide o mundo em globalizadores e globalizados, ou em desenvolvidos e
“subdesenvolvidos”.
Nesse sentido, ambos países detêm uma riqueza de biodiversidade e de manifestações
culturais que não podem ser objeto de apropriações injustas, violando-se a soberania e a
própria identidade cultural de suas populações. Ambos, inobstante sejam países com grandes
territórios e tenham uma economia mais estável do que muitos outros países em
desenvolvimento, sofrem com adistribuição de renda, a fome e a miséria no plano interno
e, no plano internacional, permanecem em uma situação desprivilegiada que lhes dificulta
transformar as suas verdadeiras condições de “explorados” ou “oprimidos”.
Por essas razões, a teoria de base fundamentada no de pensamento de Vandana Shiva
representa uma importante ferramenta teórica para se compreender a realidade do Brasil e dos
países da região amazônica dentro de um contexto sul-americano, no qual, ou continuarão
“dominados”, explorados e fornecedores de matérias-primas a preços vis, ou poderão
desempenhar o papel de protagonistas, partilhando a riqueza de forma justa, racional e
inovadora.
No Capítulo II, uma vez demonstrada a importância da biodiversidade para o mundo e,
especialmente, para os países da região amazônica, como uma alternativa para o
desenvolvimento sustentável, se passa a investigar a necessidade de uma resposta
criminalizadora para a biopirataria. Este capítulo apresenta as razões porque se entende
justificada a intervenção penal para coibir a biopirataria, desenvolvendo-se a argumentação
com fundamento na dignidade constitucional do bem jurídico a ser tutelado, no mandato
1
SHIVA, Vandana. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Tradução Laura Cardellini
Barbosa de Oliveira. Petrópolis: Vozes, 2001.
constitucional expresso de criminalização e na necessidade da tutela penal como mecanismo
de controle indispensável diante da ineficiência dos outros meios de reação estatal.
O Capítulo III traz uma proposta complementar à tutela penal da biopirataria,
consistente na cooperação internacional para o desenvolvimento. Neste capítulo são
examinados brevemente os paradigmas das relações internacionais, dando-se ênfase ao
modelo da interdependência sob o referencial teórico de Robert Keohane
2
para fixar a noção
de que a assimetria nas relações entre os atores internacionais não é um óbice à cooperação
internacional, mas um valioso instrumento para os fins perseguidos nesta pesquisa.
Neste último capítulo, ainda, é trabalhado um conceito de desenvolvimento
sustentável segundo uma proposta desenhada por Fernando Kinoshita,
3
que não se contém nos
estreitos limites do sentido de um desenvolvimento voltado apenas ao crescimento
econômico. Trata-se de um conceito multidimensional e complexo e que, portanto, exige uma
intercomunicação entre todos os seus elementos, de forma a se assegurar o desenvolvimento
sustentável.
Finalmente, o direito ao desenvolvimento é analisado como expressão síntese dos
direitos humanos, concluindo-se a dissertação com uma proposta complementar à
criminalização da biopirataria, que é o estímulo à cooperação internacional, como instrumento
para a proteção da biodiversidade e implementação de um processo sólido de
desenvolvimento sustentável para a região, em que a Organização do Tratado de Cooperação
Amazônica – OTCA é apresentada como foro alternativo interessante e necessário.
2
KEOHANE, Robert O. After hegemony: cooperation and discord in the world political economy. Estados
Unidos: Princeton University Press, 2005
.
3
KINOSHITA, Fernando. Ciência, tecnologia e sociedade: uma proposta renovada de desenvolvimento
sustentável de caráter universal. jul. 2007. Mimeografado.
CAPÍTULO I – FUNDAMENTOS INTERDISCIPLINARES SOBRE A
BIODIVERSIDADE E BIOPIRATARIA
1.1 Aspectos conceituais da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados
A presente pesquisa tem como pressuposto que a diversidade biológica dos países
amazônicos é um patrimônio que merece ser protegido, pois representa uma alternativa
valiosa ao desenvolvimento sustentável nos planos local, nacional e sub-regional.
Para se poder avançar nesta investigação, portanto, é imprescindível que, primeiro, se
estabeleçam alguns aspectos conceituais, de forma a se ter a correta compreensão, à luz da
tecnologia jurídica, dos seguintes termos: biodiversidade e conhecimentos tradicionais
associados à biodiversidade. Antes de se passar, entretanto, ao enfoque jurídico é preciso
conhecer o significado desses termos segundo as Ciências Biológicas e a Ecologia.
Em relação, ao termo biodiversidade, Lewinsohn
4
traz a informação de que o referido
vocábulo foi utilizado pela primeira vez na obra organizada por Wilson e Peter, que foi
editada, inicialmente, pela National Academy Press, em 1988, em Washington, Estados
Unidos.
5
A partir da divulgação da referida obra e, principalmente, com a Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento – CNUMAD, ocorrida em 1992,
no Rio de Janeiro
6
, a expressão diversidade biológica e sua abreviação biodiversidade
passaram a ser empregadas com bastante freqüência, embora advirta Lewinsohn
7
que não
unanimidade entre os estudiosos quanto ao alcance do aludido termo científico.
Como é sabido, o ser humano desde longa data vem se preocupando com o estudo, a
descrição e a classificação das espécies vegetais e animais, havendo informações de que na
Antigüidade naturalistas e filósofos gregos se dedicaram a listar e classificar as espécies dos
organismos que eram conhecidos em sua época. Aristóteles, segundo afirmação de Soares,
classificou os animais em dois grandes grupos: animais com sangue e animais sem sangue.
8
Lewinsohn também destaca que em Roma, entre 23-79 DC, Plínio elaborou sua
Historia Naturalis, que foi, provavelmente, a obra mais completa do conhecimento de
4
LEWINSOHN, Thomas Michael. A evolução do conceito de biodiversidade. Disponível em:
<http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio09.htm>. Acesso em: 1 set. 2007.
5
Existe a seguinte edição nacional da obra: WILSON, E. O; PETER, Francês M (Org.). Biodiversidade.
Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
6
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, também chamada de ECO-92,
Rio-92, Conferência da Terra ou pula da Terra, foi convocada pela Assembléia Geral das Nações Unidas,
Resolução nº 44/228, de 22 de dezembro de 1989 e ocorreu na cidade do Rio de Janeiro, durante duas
semanas, coincidindo a data do seu início com o dia 5 de junho de 1992, Dia Mundial do Meio Ambiente.
7
LEWINSOHN, op. cit.
8
SOARES, José Luís. Biologia. 9. ed. São Paulo: Scipione, 1997. p. 345.
História Natural até o início da ciência moderna.
9
Apenas com Karl Von Linné, porém, é que
o estudo e a classificação das espécies ganhou sistematicidade. Soares
10
registra que em 1758,
na 10ª edição do livro Systema Naturae, Linné definiu as regras para a nomenclatura
binominal de plantas e animais, que é adotada ainda hoje.
Nesse sentido, Lewinsohn acrescenta, ainda, que paralelamente aos avanços no campo
do conhecimento e classificações das espécies, proporcionado pela Taxionomia, surgiu a
Biogeografia, como ramo das Ciências Biológicas que se dedicou a estudar a distribuição
geográfica das espécies nos seus ambientes naturais e em cada região geográfica. O mesmo
autor salienta, também, que a idéia de diversidade de espécies adveio da reunião das duas
ciências, a Taxionomia e a Biogeografia.
11
Odum, por sua vez, ao explanar sobre a diversidade de espécies, afirma que o conceito
apresenta dois componentes: a) a riqueza e b) a uniformidade. O primeiro componente
corresponde à densidade de espécies, tomando-se como referência o número total de espécies
presentes em uma comunidade biótica. O segundo componente se baseia na abundância
relativa de espécies e no grau de dominância ou falta de dominância de espécies em uma
comunidade.
12
Além disso, a variação da diversidade de espécies, como enuncia o mesmo autor,
tende a aumentar em áreas maiores e na proporção crescente das altas latitudes para as mais
baixas, próximas do Equador, lembrando que a diversidade pode diminuir em comunidades
bióticas que sofram estresse ou ainda no caso de competição em comunidades antigas e
ambientes físicos estáveis.
13
Convém deixar assentado, no entanto, que Odum, mesmo reconhecendo a relevância
da diversidade de espécies, adverte que a diversidade de padrões e a diversidade genética
também são essenciais. É o que se depreende da passagem a seguir:
Dois outros tipos de diversidade também são importantes: (1) a diversidade
de padrões, que resulta na zonação e micro-habitats componentes; e (2)
diversidade genética, a manutenção de heterozigosidade genotípica,
polimorfismo e outras formas de variabilidade genética, que constituem uma
necessidade adaptativa de populações naturais. Muitos ecologistas estão
preocupados com o fato de que a redução na diversidade genética, que
resulta das atividades humanas, esteja prejudicando a adaptabilidade futura,
9
LEWINSOHN, Thomas Michael. A evolução do conceito de biodiversidade. Disponível
em:<http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio09.htm>. Acesso em: 1 set. 2007.
10
SOARES, José Luís. Biologia. 9. ed. São Paulo: Scipione, 1997. p. 343.
11
LEWINSOHN, op. cit.
12
ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988. p. 258.
13
Id. Ibid., p. 258.
tanto nos ecossistemas naturais como nos agroecossistemas.
14
É importante frisar, igualmente, que ainda que no senso comum a expressão
diversidade biológica muitas vezes assuma o sentido de diversidade de espécies, o termo
científico é mais abrangente. Este discrímen, aliás, é fundamental para a captação do pleno
significado jurídico do termo. Desse modo, para demonstrar o dissenso entre os autores,
Lewinsohn apresenta os seguintes conceitos de biodiversidade:
A soma de todos os diferentes tipos de organismos que habitam uma região
tal como o planeta inteiro, o continente africano, a Bacia Amazônica, ou
nossos quintais (Andy Dobson).
A totalidade de gens, espécies e ecossistemas de uma região e do mundo
(Estratégia Global de Biodiversidade).
A variedade total de vida na Terra. Inclui todos os genes, espécies, e
ecossistemas, e os processos ecológicos de que são parte (ICBP - Conselho
Internacional para a Proteção das Aves)
15
Apesar da simplicidade das definições trazidas pelo autor, um aspecto comum merece
ser destacado para a compreensão correta do termo. Assim sendo, Lewinsohn acentua que a
biodiversidade abrange diversos níveis de organização da vida, respeitando-se uma certa
hierarquia entre esses níveis, como na seqüência: “genes > que pertencem a organismos > que
compõem populações > que pertencem a espécies > cujos conjuntos formam comunidades >
que fazem parte dos ecossistemas”.
16
Além disso, como frisa o pesquisador, a biodiversidade não se restringe a coleção de
componentes em cada um desses níveis, mas a maneira como esses componentes estão
organizados e interagem.
17
Bráulio Dias, por sua vez, explica que o conceito de biodiversidade inclui diferentes
propriedades e fenômenos:
Diversidade biológica, ou biodiversidade, refere-se à variedade de vida no
planeta Terra, incluindo: a variedade genética dentro das populações e
espécies; a variedade de espécies da flora, da fauna e de microrganismos; a
variedade de funções ecológicas desempenhadas pelos organismos nos
ecossistemas; e a variedade de comunidades, bitats e ecossistemas
formados pelos organismos.
18
14
ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988. p. 258.
15
LEWINSOHN, Thomas Michael. A evolução do conceito de biodiversidade. Disponível
em:<http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio09.htm>. Acesso em: 1 set. 2007.
16
LEWINSOHN, op. cit.
17
LEWINSOHN, op. cit.
18
DIAS, Bráulio Ferreira de Souza. A biodiversidade na amazônia: uma introdução ao desconhecido. In:
VELLOSO, João Paulo dos Reis; ALBUQUERQUE, Roberto Cavalcanti de (Coord.). Amazônia, vazio de
soluções? desenvolvimento moderno baseado na biodiversidade. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. p 16.
O conceito jurídico de diversidade biológica seguiu a orientação de se conferir um
significado mais ampliado ao termo. Assim, ficou consignado no art. , da Convenção sobre
a Diversidade Biológica,
19
a seguinte definição:
“Diversidade biológica” significa a variabilidade de organismos vivos de
todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres,
marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que
fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre
espécies e de ecossistemas.
20
Como se pode notar, não divergências de relevo entre as acepções técnicas
apresentadas e a jurídica, pois não é novidade alguma que no campo do Direito Ambiental a
interdisciplinaridade é especialmente ressaltada, notadamente porque o objeto de estudo deste
ramo do direito possui fortes imbricações com as ciências extrajurídicas.
De uma forma geral, diversidade biológica é a variabilidade de vida na Terra, mas a
expressão, seja do ponto de vista científico, seja na sua significação jurídica, alcança a
diversidade de espécies, a diversidade genética dentro das espécies, a variabilidade de
ecossistemas, as relações complexas entre os seres vivos e entre estes e o meio ambiente.
21
Neste diapasão, Bráulio Dias acresce que a biodiversidade pode ser analisada nos diversos
níveis de organização biológica, podendo-se levar em consideração:
Riqueza de genes: (tamanho do genoma); Variabilidade genética
(intrapopulacional); Diferenciação entre populações; Riqueza de espécies
(tamanho dos reinos); Diferenciação entre comunidades; Riqueza de
paisagens e fisionomias; Diferenciação entre biomas.
22
Isto tudo significa, ainda na dicção de Bráulio Dias,
23
que não existe uma única forma
de se medir a biodiversidade. Logo, para o autor, é possível identificar locais em que a
variedade biológica apresente índices diversos para cada nível de organização biológica, pois:
19
A Convenção sobre a Diversidade Biológica foi assinada em 5 de junho de 1992, ratificada em 28 de fevereiro
de 1994 e promulgada pelo Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998.
20
BRASIL. Decreto 2.519, de 16 de março de 1998. Promulga a Convenção sobre Diversidade Biológica,
assinada no Rio de Janeiro, em 5 de junho de 1992. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Os textos integrais do
Decreto e da Convenção estão no Anexo A]
21
GROSS, Tony; JOHNSTON, Sam; BARBER, Charles Victor. Convenção sobre a diversidade biológica:
entendendo e influenciando o processo um guia para entender e participar efetivamente da Oitava Reunião
da Conferência das Partes sobre a Convenção sobre a Diversidade Biológica (COP-8). Instituto de Estudos
Avançados da Universidade das Nações Unidas. Nov. 2005, p. 7. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/estruturas/sbf_chm_rbbio/_arquivos/entendendo%20e%20influenciando%20a%20C
DB.pdf>. Acesso em: 2 set. 2007.
22
DIAS, Bráulio Ferreira de Souza. A biodiversidade na amazônia: uma introdução ao desconhecido. In:
VELLOSO, João Paulo dos Reis; ALBUQUERQUE, Roberto Cavalcanti de (Coord.). Amazônia, vazio de
soluções? desenvolvimento moderno baseado na biodiversidade. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. p 18.
23
Id. Ibid., p. 18.
Cabe chamar a atenção para o fato de que a diversidade dos diferentes níveis
de organização biológica não é congruente, isto é, eles podem variar de
forma independente. Por exemplo, podemos encontrar locais com baixa
diversidade de paisagens, alta diversidade de espécies por paisagem e baixa
variabilidade genética intra-específica e vice-versa.
24
Odum ressalta, também, este aspecto e pondera que nem sempre a espécie será a
melhor unidade ecológica para medir a biodiversidade.
25
Por essas razões, o conceito jurídico estabelecido pela Convenção deve ser
interpretado no sentido de incluir como biodiversidade qualquer dessas variantes. Assim, a
diversidade biológica é, segundo Bráulio Dias, “uma das propriedades fundamentais da
natureza, responsável pelo equilíbrio e estabilidade dos ecossistemas”
26
. Em outros termos, o
direito a um ambiente ecologicamente equilibrado depende, também, dessa compreensão.
Resolvida a questão conceitual acerca da expressão diversidade biológica, cabe voltar
os esforços para o trabalho de definição de um outro conceito operacional, que é a
compreensão da noção de conhecimento tradicional associado à biodiversidade.
A Medida Provisória 2.816-16, de 23 de agosto de 2001, define conhecimento
tradicional associado como: “a informação ou prática individual ou coletiva de comunidade
indígena ou de comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao patrimônio
genético.”
27
Bessa Antunes disseca esse conceito e lista os seus aspectos fundamentais. Em
primeiro lugar, alerta, o autor, que o sujeito tutelado, neste caso, não é uma pessoa física ou
jurídica, mas uma comunidade. Em segundo lugar, aponta como característica marcante do
conhecimento tradicional, ser este tipo de conhecimento de natureza coletiva, que não
pertence, portanto, individualmente a ninguém, que é fruto de uma atividade coletiva. Em
24
DIAS, Bráulio Ferreira de Souza. A biodiversidade na amazônia: uma introdução ao desconhecido. In:
VELLOSO, João Paulo dos Reis; ALBUQUERQUE, Roberto Cavalcanti de (Coord.). Amazônia, vazio de
soluções? desenvolvimento moderno baseado na biodiversidade. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. p. 18.
25
“A espécie pode não ser sempre a melhor unidade ecológica para medidas de diversidade, uma vez que
estádios bionômicos ou formas vitais dentro da espécie, muitas vezes, ocupem habitats e nichos diferentes,
contribuindo, assim, para a variedade no ecossistema. Uma lagarta e uma borboleta da mesma espécie, ou uma
e seu estado de girino, são mais diversos nos seus papéis na comunidade do que duas espécies de lagarta ou
adulta. Como Harper assinalou (1977), ‘os estádios do ciclo vital de uma planta acrescentam, no
ecossistema, uma diversidade tão grande quanto a de muitas espécies’(ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de
Janeiro: Guanabara, 1988. p. 265).
26
DIAS, op. cit., p. 19.
27
BRASIL. Medida Provisória 2.816-16, de 23 de agosto de 2001. Regulamenta o inciso II do § 1o e o § 4o
do art. 225 da Constituição, os arts., , alínea "j", 10, alínea "c", 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção sobre
Diversidade Biológica, dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento
tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua
conservação e utilização, e outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2186-16.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [O texto integral da
Medida Provisória está no Anexo B]
terceiro lugar, o doutrinador adverte que o termo comunidades tradicionais não deve ser
equiparado indevidamente a comunidades pobres ou marginalizadas, pois representa qualquer
população que pratique um modo de vida tradicional, a exemplo das comunidades locais ou
indígenas.
28
A estes efeitos, para ser mais fiel à definição de Bessa Antunes é importante
recordar o seu conceito de populações tradicionais quando assevera:
[...] aquelas que, em princípio, encontram seus habitats em florestas
nacionais, reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento sustentável,
ou seja, os grupos que são conhecidos como povos da floresta, caiçaras ou
outros que, reconhecidamente, tenham uma forma de vida peculiar e
característica, distinguindo-os na comunidade nacional.
29
Bessa Antunes ainda esclarece que a expressão conhecimento tradicional abrange os
conhecimentos indígenas, os conhecimentos de comunidades locais e o folclore.
30
Para Juliana Santilli os conhecimentos tradicionais são os componentes intangíveis da
biodiversidade e podem ser representados nas “práticas, inovações e conhecimentos
desenvolvidos pelos povos indígenas, quilombolas e populações tradicionais, relevantes à
conservação e utilização sustentável da diversidade biológica”.
31
Em um outro excerto de sua
autoria, Juliana Santilli ilustra o conceito de conhecimentos tradicionais, destacando o
seguinte:
[...] vão desde técnicas de manejo de recursos naturais até métodos de caça e
pesca, conhecimentos sobre os diversos ecossistemas e sobre propriedades
farmacêuticas, alimentícias e agrícolas de espécies e as próprias
categorizações e classificações de espécies de flora e fauna utilizadas pelas
populações tradicionais.
32
Ainda segundo Juliana Santilli, é importante enfatizar que os componentes tangíveis e
intangíveis da biodiversidade estão intimamente ligados e a criação de um sistema jurídico
que busque a proteção desses bens não pode dissociá-los.
33
O arcabouço jurídico que visa proteger a biodiversidade nacional será estudado no
Capítulo II, porém é imprescindível que se tenha presente, desde logo, que a Medida
28
ANTUNES, Paulo Bessa. Diversidade biológica e conhecimento tradicional associado. Rio de Janeiro:
Lumen Iuris, 2002. p. 118-119.
29
Id. Ibid., p. 126.
30
Id. Ibid., p. 133.
31
SANTILLI, Juliana. Patrimônio imaterial e direitos intelectuais coletivos. In: MATHIAS, Fernando;
NOVIUON, Henry de (Org.). As encruzilhadas da modernidade: debate sobre biodiversidade, tecnociência
e cultura. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2006. p. 85 (Série documentos do ISA, 9).
32
Id. Socioambientalismos e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e cultural. São Paulo:
Peirópolis, 2004. p. 192.
33
Id. Ibid., p. 185.
Provisória 2.186-16/2001,
34
se refere, em seu art. , a acesso a componente do patrimônio
genético e acesso ao conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético.
Infere-se daí que a principal norma a o momento para regular o acesso à
biodiversidade faz uma importante distinção, que deve ser logo apontada para se evitar
dificuldades de interpretação. Em outras palavras, o que se regulamenta é o acesso ao
patrimônio genético da biodiversidade e aos conhecimentos tradicionais associados a esse
patrimônio genético.
A própria Medida Provisória 2.186-16/2001, no art. , inciso I, define patrimônio
genético
35
e ao se interpretar este regramento jurídico sobre o acesso à biodiversidade é
possível concluir que a proteção jurídica à biodiversidade, na Medida Provisória, se por
meio da regulamentação quanto à concessão de licença de acesso ao patrimônio genético da
biodiversidade ou de acesso aos conhecimentos tradicionais associados ao patrimônio
genético. Logo, o que a norma regulamenta é a informação relativa à biodiversidade. Neste
sentido, Bessa Antunes, ao comentar o artigo citado, explica que o patrimônio genético não é
um conjunto de bens materiais, mas um conjunto de informações:
Ele não é, portanto, um conjunto de bens materiais, pois é uma informação,
um conjunto de bens imateriais. A norma estabelece que tal conjunto de
informações, mesmo que ainda não tenham sido reveladas, é propriedade do
estado brasileiro e que, em função de tal regime de titularidade, os benefícios
econômicos e outros que possam dele advir devem ser repartidos entre o
Estado e os outros intervenientes no processo de seu desvendamento.
36
Assim sendo, ainda que a biodiversidade, no seu sentido mais amplo, esteja protegida
por normas internacionais e nacionais, deve-se ter presente que a Medida Provisória 2.186-
16/2001 a principal norma que regulamenta o acesso à biodiversidade no Brasil instituiu,
em verdade, um regime jurídico para o acesso e utilização, dentro de certas condições, do
patrimônio genético da biodiversidade e do conhecimento tradicional associado ao patrimônio
34
Vide Anexo B.
35
Art 7º. [...]
I – patrimônio genético: informação de origem genética, contida em amostras do todo ou em parte de espécime
vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na forma de moléculas e substâncias provenientes do metabolismo
destes seres vivos e de extratos obtidos destes organismos vivos ou mortos, encontrados em condições in situ,
inclusive domesticados, ou mantidos em coleções ex situ, desde que coletados em condições in situ no
território nacional, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva. (BRASIL. Medida Provisória
2.816-16, de 23 de agosto de 2001. Regulamenta o inciso II do § 1o e o § 4o do art. 225 da Constituição, os
arts. , , alínea "j", 10, alínea "c", 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção sobre Diversidade Biológica, dispõe
sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a
repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e
utilização, e outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2186-
16.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007).
36
ANTUNES, Paulo Bessa. Diversidade biológica e conhecimento tradicional associado. Rio de Janeiro:
Lumen Iuris, 2002. p. 41.
genético.
1.2 Aspectos quantitativos e qualitativos da biodiversidade
Fixados os conceitos de biodiversidade e de conhecimentos tradicionais associados,
convém apresentar alguns números que servirão para dimensionar o potencial que a
diversidade biológica pode representar para os países amazônicos.
Sendo assim, os números a seguir revelados servem apenas para situar melhor o objeto
da pesquisa e estabelecer uma noção, que é do conhecimento comum, segundo a qual o
Brasil e os países da Amazônia possuem um vasto potencial de biodiversidade.
Mesmo com as ressalvas quanto à complexidade deste conceito e às dificuldades de se
mesurar a biodiversidade, forma-se um consenso em relação a determinados países que,
indiscutivelmente, apresentam uma diversidade biológica muito rica.
O Brasil, acompanhado da Bolívia, China, Colômbia, Costa Rica, Equador, Filipinas,
Índia, Indonésia, Quênia, Malásia, México, Peru, África do Sul e Venezuela, compõem um
grupo formado por quinze países que são considerados megadiversos e que juntos possuem
cerca de 70% da biodiversidade do planeta.
37
Cabe registrar, também, que o bioma amazônico é especialmente privilegiado em
termos de biodiversidade e ocupa quase a metade do território brasileiro. O Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), lançou o Mapa de Biomas do Brasil
acompanhado de uma tabela,
38
onde se pode constatar que o percentual ocupado pelo bioma
amazônico, em relação à totalidade do território nacional, é de 49,29%.
Para se ter uma idéia da dimensão da biodiversidade mundial, Wilson, citando a
Synopsis and Classification of Living Organisms, revela que existem entre 5 a 30 milhões de
espécies.
39
O Brasil, por sua vez, seria o país com a maior biodiversidade do mundo,
37
Informação extraída do site do Ministério do Meio Ambiente. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=15>. Acesso em: 2 set. 2007.
38
Vide Anexo O.
39
“Indicam que cerca de 1,4 milhões de espécies vivas de todos os tipos de organismos foram descritas.
(Parker, 1982; ver também a classificação numérica de acordo com a principal categoria taxonômica da fauna
mundial de insetos preparada por Arnett, 1985). Aproximadamente 750.000 são insetos, 41.000 são
vertebrados e 250.000 são plantas (isto é, plantas vasculares e briófitos). O resto consiste de um vasto
complexo de invertebrados, fungos, algas e microrganismos (ver Tabela 1 1). A maioria dos sistematas
concorda que este quadro ainda é muito incompleto, com exceção de alguns grupos bem estudados, como os
vertebrados e as plantas com flores. Se incluirmos os insetos, de todos os grupos principais o mais rico em
espécies, acredito que o número absoluto seja maior do 5 milhões. [...] Minha suposição, baseada na flora e
fauna descritas e em muitas discussões com entomologistas e outros especialistas, é a de que o número
absoluto fica entre 5 e 30 milhões”. (WILSON, E. O. A situação atual da diversidade biológica. In: ______
estimando-se que possui de 10 a 20% de toda a biodiversidade do planeta.
40
Recentemente,
inclusive, foi noticiado que pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
(INPA) descobriram novas espécies de animais e plantas em uma região ainda não tocada
pelo homem, no sudeste da Amazônia, em trechos dos Rios Purus e Madeira, nos Estados do
Amazonas e Rondônia. Na expedição, que durou 46 dias, os pesquisadores descobriram
quatro novas espécies de aves, duas novas espécies de macacos e uma nova espécie de
esquilo, além de dezenas de tipos de aranhas e várias espécies de plantas.
O valor desta
descoberta se deve principalmente ao fato de que área pesquisa era intacta e, portanto,
totalmente preservada, bem como que em razão da biodiversidade encontrada pode ser
considerada uma das áreas de maior diversidade biológica da região amazônica.
41
A biodiversidade, portanto, é ainda um patrimônio incalculável e o Brasil com o
avanço das pesquisas nessa área a cada dia realiza novas descobertas, o que demonstra que as
dimensões da biodiversidade são, em verdade, inestimáveis e que um grande potencial
nesse campo em termos de oportunidades e opções para os países amazônicos.
O Brasil, entretanto, ainda é deficitário em seu próprio inventário quanto à
biodiversidade e, apesar dos esforços realizados, há um longo caminho a ser percorrido,
principalmente após a ratificação da Convenção sobre a Diversidade Ecológica e a
implantação da Política Nacional da Biodiversidade (PNB), por meio do Decreto
4.339/2002.
Feitas essas ponderações, pode-se constatar que definir um valor para biodiversidade é
uma questão bastante tormentosa, pois envolve uma série de problemas de ordem prática e,
ainda, questionamentos que desbordam os limites das ciências naturais e adentram na
(Org.). Biodiversidade. Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p.
3).
40
“O Brasil é o país com a maior biodiversidade o maior dos ‘países de megadiversidade’), contando com um
número estimado entre 10 e 20 % do número total de espécies do planeta. O Brasil conta com a mais diversa
flora do mundo, com mais de 45 mil espécies descritas (perto de 20 % do total mundial). O país possui, por
exemplo, a maior riqueza de espécies de palmeiras (390 espécies) e de orquídeas (2.300 espécies). Diversas
espécies de plantas de importância econômica mundial são originárias do Brasil, destacando-se dentre elas o
abacaxi, o amendoim, a castanha-do-pará, a mandioca, o caju e a carnaúba. Os animais vertebrados o
amplamente representados na fauna brasileira. Foram registrados no país 394 espécies de mamíferos, 1.573
espécies de aves, 468 espécies de répteis, 502 espécies de anfíbios e mais de 3 mil espécies de peixes. Esta
riqueza de espécies corresponde a pelo menos 10 % dos anfíbios e mamíferos, e 17 % das aves de todo o
planeta. O Brasil conta ainda com a maior diversidade de primatas do mundo, com 55 espécies, sendo 19
endêmicas. Como evidência da riqueza da fauna brasileira e de seu desconhecimento, cinco novas espécies de
macacos foram descritas no país nos últimos cinco anos”. (DIAS, Bráulio Ferreira de Souza. A biodiversidade
na amazônia: uma introdução ao desconhecido. In: VELLOSO, João Paulo dos Reis; ALBUQUERQUE,
Roberto Cavalcanti de (Coord.). Amazônia, vazio de soluções? desenvolvimento moderno baseado na
biodiversidade. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. p. 40).
41
PESQUISADORES DESCOBREM NOVAS ESPÉCIES DE ANIMAIS E PLANTAS NA AMAZÔNIA.
Correio do Brasil. 20 ago. 2007. Disponível em: <http://www.correiodobrasil.com.br/noticia.asp?c=124540>.
Acesso em: 1 set. 2007.
própria Filosofia e Ética. Nesse sentido, Ehrenfeld, ao escrever sobre o tema, faz a seguinte
provocação:
Designar valor aquilo que não nos pertence e cujo propósito não podemos
entender, exceto em suas maiores superficialidades, é o cúmulo da
insensatez presunçosa.
42
Como se pode deduzir da reflexão de Ehrenfeld, qualquer valor que se à
diversidade biológica pode não contemplar a sua real importância para a humanidade, já que
são desconhecidas até o momento as conseqüências que a perda de biodiversidade pode
significar para a qualidade de vida do ser humano no planeta.
Surgem, então, algumas indagações. Será que algum dia o ser humano conseguirá
definir o nimo de biodiversidade que é preciso para manter a sua espécie? Será que a
geração atual teria o direito de reduzir a biodiversidade a esse mínimo, privando as gerações
futuras de um meio ambiente tão variado como o que vivemos hoje?
Parece que Dias responde em parte a essas questões existenciais, quando afirma que a
biodiversidade é um dos componentes básicos da qualidade ambiental e que, por conseguinte,
“qualquer perda de diversidade biológica, seja no nível de ecossistemas, espécies ou
populações, representa uma perda de qualidade ambiental”.
43
Não se pode olvidar que rios riscos na exploração predatória da biodiversidade,
pois como enfatiza Paul Erhlich, a destruição do patrimônio genético levará a conseqüências
gravíssimas para a humanidade, como o aumento de doenças epidêmicas e respiratórias,
desastres naturais, fome e o surgimento de uma situação equivalente ao inverno nuclear.
44
João Paulo Capobianco faz uma importante advertência no sentido de que o
42
EHRENFELD, David. Por que atribuir um valor à biodiversidade? In: WILSON, E. O. (Org.).
Biodiversidade. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 274.
43
DIAS, Bráulio Ferreira de Souza. A biodiversidade na amazônia: uma introdução ao desconhecido. In:
VELLOSO, João Paulo dos Reis; ALBUQUERQUE, Roberto Cavalcanti de (Coord.). Amazônia, vazio de
soluções? desenvolvimento moderno baseado na biodiversidade. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. p. 20.
44
“O que acontecerá então, se a atual dizimação orgânica continuar? As colheitas das plantações serão mais
difíceis de se manter em razão de fatores como mudanças climáticas, erosão do solo, perdas de reservatórios
de água seguros, declínio de polinizadores e ataques cada vez mais sérios de pestes. A conversão de terra
produtiva em terra devastadas se acelerará; os desertos continuarão em sua inexorável expansão. A poluição
do ar aumentará e os climas locais ficarão mais severos. A humanidade terá que passar sem muitos de seus
benefícios econômicos diretos, que talvez tenha retirado da coleção genética bem estocada que a Terra teve um
dia. Pode ser, por exemplo, que não consiga um tipo de cura para o ncer; mas isso fará pouca diferença. À
medida que os serviços dos ecossistemas começarem a faltar, a mortalidade de doenças epidêmicas e
respiratórias, os desastres naturais e especialmente a fome diminuirão as expectativas de vida a um ponto no
qual o câncer (basicamente uma doença de gente mais velha) não será mais importante. A humanidade tra
para si mesma conseqüências com as de um inverno nuclear (Ehrlich, 1984). Tirando-se a hipótese de um
conflito nuclear, parece que a civilização desaparecerá algum tempo antes do fim do próximo século não
com uma explosão, mas com uma lamúria”. (EHRLICH. Paul R. A perda da diversidade causas e
conseqüências. In: WILSON, E. O. (Org.) Biodiversidade. Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 32).
tratamento da questão sob o prisma econômico afasta do centro da discussão o valor
intrínseco da biodiversidade e a necessidade de preservá-la, como meta objetivo principal a
ser buscada para garantir a qualidade de vida e a sobrevivência humana.
45
Paulo Coutinho, a
seu turno, faz coro ao posicionamento de que não é possível se atribuir um valor econômico à
biodiversidade e ressalta o seu valor intrínseco, quando afirma que:
A biodiversidade tem um valor intrínseco: trata-se de mantermos as
condições de permanência da vida; é, portanto, incomensurável. Senão, que
medida usaríamos para medi-la? Número de espécies, fluxos de energia,
unidades monetárias ou qualquer outra medida pode nos dar algumas
referências parciais. Não conseguimos atribuir um valor financeiro à nossa
própria vida, ainda que as companhias de seguro façam suas contas. Essas
mesmas empresas, no entanto, não se arriscariam a fazer seus cálculos para a
vida no planeta - assim esperamos - pelo absurdo de que com o fim da
biodiversidade não teríamos ninguém para receber ou pagar o prêmio do
seguro.
46
Há, de fato, um valor intrínseco à biodiversidade que não pode ser medido. Ehrenfeld
assinala que é um erro definir uma estratégia para a conservação da biodiversidade a partir da
ótica economicista, que essa postura não permite o enfretamento do problema relacionado
às causas de perda de diversidade ecológica, que são as pressões e o determinismo dos fatores
tecnológicos e socioeconômicos.
47
Assim sendo, o citado autor faz notar que dois
problemas práticos ao se querer atribuir valor à biodiversidade:
O primeiro é um problema para os economistas: não é possível calcular o
verdadeiro valor econômico de qualquer parte da diversidade biológica,
muito menos o valor da diversidade quando agregada. Não conhecemos o
suficiente a respeito de qualquer gen, espécie ou ecossistema para sermos
capazes de calcular seu valor econômico e ecológico em um plano mais
amplo.
[...] O segundo problema prático ao se atribuir valor à diversidade biológica
é para os conservacionistas. [...] O triste fato que poucos conservacionistas
se importam em encarar é que muitas espécies, talvez a maioria, parecem
não ter valor convencional algum, mesmo que escondido. [...] Se o condor-
da-Califórnia (Gymnogyps californianus) desaparecer para sempre das
montanhas da Califórnia, será uma tragédia: mas não espere que o chaparral
morra, as sequóias feneçam, a falha de San Andrés se abra, ou mesmo que a
indústria de turismo da Califórnia sofra – isto não acontecerá.
48
Para reforçar seus argumentos Ehrenfeld cita um instigante estudo de Clark, que
45
BIODIVER$IDADE. ComCiência. 10 jun. 2001. Disponível em:
<http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio04.htm>. Acesso em: 1 set. 2007.
46
COUTINHO, Paulo. O valor da biodiversidade. Disponível em:
<http://www.comciencia.br/reportagens/biodiversidade/bio12.htm>. Acesso em: 1 set. 2007.
47
EHRENFELD, David. Por que atribuir um valor à biodiversidade? In: WILSON, E. O. (Org.) Biodiversidade.
Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 271.
48
Id. Ibid., p. 272-273.
consegue demonstrar que economicamente seria mais viável matar todas as baleias azuis que
restam nos oceanos e investir os lucros na indústria, ao invés de se aguardar o crescimento da
população de baleias para permitir novamente a pesca controlada.
49
Por essas razões,
Ehrenfeld sustenta que a biodiversidade deve ser conservada, não em razão do seu valor
econômico, mas pelo seu valor intrínseco, fazendo com que as pessoas compreendam que a
perda da diversidade biológica é um erro:
Se a conservação tiver que ser bem sucedida, o público deverá vir a entender
o erro inerente à destruição da diversidade biológica. Essa noção de erro é
um argumento poderoso com grande amplitude de apelo sobre todos os tipos
de filosofias pessoais.
50
Em verdade, a idéia de que a diversidade biológica deve ser conservada porque possui
um valor que lhe é inerente ganhou força com o movimento da ecologia profunda. Nations
informa que nos Estados Unidos um dos principais ideólogos desse movimento foi Tobias
com a obra Deep Ecology, publicada em 1985.
51
Nations sintetiza as bases da ecologia
profunda do seguinte modo:
Em poucas palavras, seu princípio básico é o de que todos os seres vivos têm
o direito de existir que os seres humanos não têm nenhum direito de levar
outras criaturas à extinção ou de brincar de Deus ao decidir quais as espécies
que nos servem e que portanto podemos permitir que vivam. A ecologia
profunda rejeita a visão antropocêntrica de que a humanidade fica no centro
de tudo que tem valor e que as outras criaturas têm valor quando nos
servem. Ao invés disso, diz a ecologia profunda, todas as coisas vivas têm
um valor intrínseco animais, plantas, bactérias, vírus –, e os animais não
são mais importantes do que as plantas, e os mamíferos não são mais
valiosos do que os insetos (Blea, 1986). A ecologia profunda é parecida com
muitas religiões orientais no que diz respeito a considerar todas as coisas
vivas como sagradas.
52
François Ost, entretanto, revela que desde 1972, A. Naess fazia a distinção entre
(ecologia superficial) shallow ecology e (ecologia profunda) deep ecology, ressaltando que
nesta fase inicial de idéias a principal crítica que os ecologistas radicais faziam à ecologia
superficial era o o rompimento com a perspectiva antropocêntrica.
53
Com a própria
evolução do movimento, A. Naess definiu os princípios básicos da ecologia profunda,
49
EHRENFELD, David. Por que atribuir um valor à biodiversidade? In: WILSON, E. O. (Org.) Biodiversidade.
Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. Cap. 24, p. 270-271.
50
Id. Ibid., p. 273.
51
NATIONS, James D. A ecologia profunda encontra o mundo em desenvolvimento. In: WILSON, E. O. (Org.)
Biodiversidade. Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 101.
52
Id. Ibid., p. 101.
53
OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Tradução Joana Chaves. Lisboa:
Instituto Piaget, 1995. p. 183.
organizados por François Ost, da seguinte forma:
Os dois primeiros princípios estabelecem que o desenvolvimento da vida
humana e não humana sobre a terra apresenta um “valor intrínseco”,
independentemente da sua utilidade para o homem. A diversidade da vida é
um aspecto essencial e representa, em si, um valor. Anteriormente, A. Naess
já havia insistido sobre o facto de que a diversidade das formas da vida era a
melhor garantia de que a diversidade das formas da vida era a melhor
garantia da sua sobrevivência, assegurando-lhe possibilidades de adaptação e
de complexificação. Os três princípios seguintes dizem respeito à atitude a
adoptar pelos humanos: estes não têm o direito de reduzir a diversidade da
vida, salvo para satisfazer as suas próprias “necessidades vitais”; mas a
pressão exercida pelos homens sobre o mundo não humano é, actualmente,
excessiva e exponencial, de modo que se impõe a redução da população
mundial.
[...] Os sexto e sétimo princípios apelam a uma mudança radical de política,
e isto nos planos econômico, tecnológico e ideológico: ao aumento constante
dos standards de vida, tratar-se-á de contrapor o objetivo da qualidade de
vida. O oitavo princípio estabelece a obrigação da “passagem à acção”, com
vista a obter a realização destes diferentes objectivos.
54
É interessante notar que não escapou a François Ost a observação anteriormente feita
por Nations de que a ecologia profunda apresenta alguma ligação com os aspectos religiosos.
François Ost afirma que a ecologia profunda apresenta-se como uma espiritualidade e que A.
Naess, no seu pensamento original, não afasta os componentes religiosos.
55
Apesar da importância que o movimento da ecologia profunda representa para depurar
a discussão em torno da conservação da biodiversidade sob contornos meramente
econômicos, como salienta Nations, afastar os argumentos utilitários ou econômicos é fugir
da realidade:
Num mundo em desenvolvimento, assim como em nosso mundo
superdesenvolvido, somos obrigados a apresentar argumentos econômicos e
utilitários para preservar a diversidade biológica que fundamentalmente nos
beneficiará. A ecologia profunda proporciona uma excelente conversa em
torno de uma mesa de seminário, mas não funciona na fronteira agrícola do
Terceiro Mundo ou nas salas de reunião do Banco Interamericano de
Desenvolvimento.
56
Seguindo essa linha de raciocínio, quem sustente que atribuir um valor à
biodiversidade é um passou fundamental para a sua conservação. O valor da diversidade
biológica e dos conhecimentos das populações tradicionais, tomando-se por base o lucro que
54
OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Tradução Joana Chaves. Lisboa:
Instituto Piaget, 1995. p. 185-186.
55
Id. Ibid., p. 183-184.
56
NATIONS, James D. A ecologia profunda encontra o mundo em desenvolvimento. In: WILSON, E. O. (Org.)
Biodiversidade. Tradução Marcos Santos e Ricardo Oliveira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997. p. 103.
advém da comercialização dos produtos da biotecnologia, é de notável potencial econômico e
não pode ser desprezado por nenhum país amazônico, posto que representa uma nova fonte de
riqueza, por meio da qual se poderia construir estratégias para um desenvolvimento
sustentável da região.
Focando as relações internacionais, é possível afirmar que os países megadiversos, na
sua grande maioria, estão situados na periferia. Logo, para reverter a condição de explorados e
dependentes precisam, em primeiro lugar, criar mecanismos que lhes garanta preservar o meio
ambiente e proteger essa nova fonte de riqueza, que é a biodiversidade. Em segundo lugar,
esses países devem usar de forma sustentável a biodiversidade, gerando desenvolvimento e
sustento para as populações, com ênfase nas menos favorecidas.
Por isso, é importante neste momento se discutir o valor da biodiversidade. Para que
se possa ter uma noção preliminar do potencial econômico que a exploração do patrimônio
genético dos países detentores de biodiversidade pode representar, cita-se o Primeiro
Relatório Nacional sobre Comércio Ilegal da Fauna Silvestre, elaborado pela organização
não-governamental Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres Renctas,
que expõe números impressionantes no que se refere ao comércio ilegal de espécies da flora e
fauna no País.
57
O Relatório mencionado o deixa dúvida que a movimentação econômica em torno
desta atividade ilícita é altamente lucrativa para os países desenvolvidos, principais
consumidores da biodiversidade. A pesquisa citada estima, a partir de um dado específico,
57
O tráfico de vida silvestre, no qual se inclui a flora, a fauna e seus produtos e subprodutos, é considerado a
terceira maior atividade ilegal do mundo, depois das armas e das drogas. Ninguém sabe a exata dimensão
desse comércio, mas estima-se que movimente anualmente de 10 a 20 bilhões de dólares por todo o mundo
(Webster apud Webb, 2001). Estima-se também que o Brasil participa com cerca de 5% a 15% deste total
(Rocha, 1995; Lopes, 2000). É estimado, com base no comércio registrado dos EUA, que a cada ano essa
atividade movimente em todo mundo os seguintes meros (Block, 1987; Hardie, 1987; Fitzgerald, 1989;
Hemley e Fuller, 1994; Le Duc, 1996): primatas: 25.000 - 40.000 animais vivos, a maioria para pesquisa
biomédica; aves: 2 - 5 milhões de animais vivos; répteis: 3 milhões de tartarugas criadas em cativeiro; 2 - 3
milhões de outros répteis vivos; 10 - 15 milhões de cascos; 10 milhões de peles; 30 - 50 milhões de produtos
manufaturados.
De acordo com Amado (1991), o tráfico ilegal seria responsável pela retirada de 12 milhões de espécimes da
natureza, no Brasil, por ano. Este número é o único valor encontrado nas bibliografias que foram consultadas e
na Moção do CONAMA . 16/91. No entanto, para se chegar a esse valor o foi utilizada metodologia
alguma [...]
[...] a RENCTAS realizou uma projeção, utilizando-se de métodos estatísticos, e chegou aos seguintes valores:
a) por ano o tráfico de animais silvestres é responsável pela retirada de cerca de 38 milhões de espécimes da
natureza no Brasil. O número de animais retirado é muito maior do que o encontrado comercializado, devido
às perdas que ocorrem durante todo o processo de captura e comercialização (Soini, 1972; Coimbra-Filho,
1977; Sick e Teixeira, 1979; Redford, 1992). É estimado que para cada produto animal comercializado são
mortos pelo menos 3 espécimes; e para o comércio de animais vivos esse índice é ainda maior (Redford,
1992), de 10 animais traficados apenas 1 sobrevive (PRIMEIRO RELATÓRIO NACIONAL SOBRE
COMÉRCIO ILEGAL DA FAUNA SILVESTRE, 2001, Brasília: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de
Animais Silvestres Renctas, p. 31-32. Disponível em:<http://www.renctas.org.br/pt/trafico/rel_renctas.asp>.
Acesso em: 14 dez. 2006).
que é o volume de apreensão de animais silvestres e sua respectiva cotação no “mercado
negro”, que, anualmente, somente no que toca ao tráfico de animais no Brasil, se movimente
em torno de R$ 2.500.000.000,00 (dois bilhões e quinhentos milhões de reais).
58
Além do tráfico ilegal não se pode esquecer que, hoje, existe uma grande produção
em cativeiro, nos Estados Unidos e países da Europa, de animais tropicais que foram
importados por esses países, em princípio legalmente, e que depois são reproduzidos em larga
escala, com o auxílio da tecnologia, e depois revendidos, em alguns casos, com preços até
mais interessantes do que aquele é oferecido no mercado negro.
A produção em cativeiro desses animais, na sua maior parte, da fauna brasileira, é tão
impressionante que, em reportagem recente, trouxe-se a informação de já existem mais
animais criados em cativeiro nos Estados Unidos e Europa do que no Brasil.
59
Embora no exemplo trazido à colação a aquisição de animais exóticos alcance
principalmente uma função hedônica, casos existem em que a biodiversidade apresenta uma
grande utilidade para cura de doenças e até para a preservação da espécie humana, razão pela
qual a conservação e uso sustentável da biodiversidade deveria ser um fim a ser perseguido.
Além da exportação ilegal de exemplares da fauna, não se pode deixar de registrar a
exploração madeireira e de plantas medicinais, que ameaçam de forma significativa a flora
nacional. O documento “O estado do meio ambiente no Brasil. GEO BRASIL 2002
Perspectivas do meio ambiente no Brasil”, revela com detalhes as ameaças que a exploração
indiscriminada representa para a biodiversidade brasileira, que o mercado de fitoterápicos
no Brasil movimentaria em torno de US$ 355 milhões e que o faturamento mundial neste
segmento seria de cerca de 20 bilhões de dólares anuais. Além disso, o documento menciona
que dois terços das espécies empregadas na produção de medicamentos tem por base plantas
nativas, na sua maior parte das florestas tropicais.
60
58
PRIMEIRO RELATÓRIO NACIONAL SOBRE COMÉRCIO ILEGAL DA FAUNA SILVESTRE, 2001,
Brasília: Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres Renctas, p. 33. Disponível
em:<http://www.renctas.org.br/pt/trafico/rel_renctas.asp>. Acesso em: 14 dez. 2006).
59
“Nas últimas décadas, os países do Hemisfério Norte transformaram-se em grandes criadores legais de animais
de espécies originárias de locais como a Amazônia e o Pantanal. A lista inclui também as araras, os iguanas e
os periquitos. O que impressiona é que a reprodução em cativeiro dessas espécies naqueles países é maior
do que no Brasil. A Inglaterra, com temperatura média de 5 graus nos meses de inverno, produz e exporta
legalmente quase dez vezes mais sagüis do que o Brasil. A Holanda tornou-se a terra dos papagaios, e de
saem legalmente vinte vezes mais desses bichos do que do Brasil. Os animais da fauna brasileira engordam o
mercado mundial de pets, que movimenta 56 bilhões de dólares por ano mas quem lucra com isso são os
criadores europeus e americanos”. (VEJA. São Paulo: Abril, edição n. 2024, ano 40, n. 35, 5 set. 2007, p. 100-
102).
60
“A extração madeireira, a utilização de plantas nativas no paisagismo, o uso medicinal, e a biopirataria são
algumas das pressões que incidem sobre espécies selecionadas. O Estado de Minas Gerais, considerado centro
de diversidade genética de diversas famílias de sempre-vivas, em nível mundial (Mendonça & Lins, 2000),
não possui uma política ou quaisquer cuidados de proteção e conservação do grupo. A exploração madeireira,
Aventa-se ainda, que as indústrias farmacêutica, de cosméticos e agroquímicos,
movimentem valores muito mais expressivos, valendo lembrar alguns dados trazidos por
Joselito Santos Abrantes:
O mercado mundial de produtos farmacêuticos apresenta um movimento
anual de US$ 250 bilhões e o de cosméticos US$ 120 bilhões, totalizando
US$ 370 bilhões. Estima-se que o consumo de matérias-primas representa
10% deste valor. O mercado de agroquímicos, de US$ 25 bilhões,
praticamente não se distingue dos produtos finais, o que elevaria o total de
matérias-primas para aproximadamente US$ 2 bilhões (Barata, 1995).
61
A respeito de plantas medicinais, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA)
produziu um documento em 2001, denominado “Plantas Medicinais Diagnóstico e Gestão”,
62
que traz a constatação estarrecedora de que apenas no período de março a dezembro de 1994
foram exportadas a partir do Aeroporto de Garulhos a quantidade de 107.529,90 kg de plantas
ou partes de plantas, oriundas da biodiversidade da Mata Atlântica, equivalendo ao montante
de US$ 389.416,95. A tabela abaixo está no documento citado e discrimina os valores
indicados:
DADOS DAS DEZ ESPÉCIES MAIS EXPORTADAS NO PERÍODO
DE MARÇO A DEZEMBRO DE 1994
Ipê
-
roxo
84.598,02 kg
US$ 237.406,78
Faffia paniculata 1.215,15 kg US$ 25.074,25
Chapéu
-
de
-
couro
1.109,00 kg
US$ 5.382,30
como vem ocorrendo com o mogno, além de representar uma ameaça direta à espécie, traz conseqüências
desastrosas para as áreas vizinhas. Os caminhos abertos, especificamente, para retirar as toras de madeira,
aumentam a susceptibilidade das florestas de serem convertidas em terras de cultivo pelos agricultores
migrantes, resultando em alteração do habitat e perda da diversidade biológica. Anualmente, mais de 120.000
m3 de mogno proveniente da América Latina ingressa no comércio internacional, dos quais os Estados Unidos
importam 76.000 m3, ou 60% do comércio global. Segundo dados da TRAFFIC (2000), os Estados Unidos
importaram mogno de oito países latino-americanos em 1998 e 95% destas importações foram provenientes do
Brasil. A exploração direta e não controlada de plantas medicinais também é um fator de ameaça à flora
brasileira. De maneira semelhante à tendência mundial, o mercado brasileiro de fitoterápicos também está em
expansão. Estima-se que, em 1994, o mercado de fitoterápicos tenha movimentado a cifra de US$ 355 milhões
no Brasil (Ferreira,1998). A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que cerca de 20.000 espécies de
plantas superiores são empregadas como medicamento em todo o mundo (Phillipson, 1994), com um
faturamento global estimado em cerca de 20 bilhões de dólares anuais. Mais de dois terços das espécies
empregadas o nativas, principalmente de florestas tropicais (Franz, 1993)”. (O ESTADO DO MEIO
AMBIENTE NO BRASIL. GEO BRASIL 2002 – Perspectivas do meio ambiente no Brasil. Cap. 2, p. 43-45.
Disponível em:
<http://ibama2.ibama.gov.br/cnia2/download/publicacoes/geobr/Livro/cap2/biodiversidade.pdf>. Acesso em:
2 set. 2007).
61
ABRANTES, Joselito Santos. Bio (sócio) diversidade e empreendedorismo ambiental na amazônia. Rio de
Janeiro: Garamond, 2002, p. 72.
62
NEVES, Mary Carla Marcon. Plantas medicinais diagnóstico e gestão. Ibama. 2001. Disponível em:
<http://ibama2.ibama.gov.br/cnia2/download/publicacoes/t0135.pdf>. Acesso em: 2 set. 2007.
Catuaba 41,25 kg US$ 1.039,40
Erva-príncipe 761,00 kg US$ 2.054,70
Erva
-
de
-
bicho
500,00 kg
US$ 1.300,00
Pedra-hume-kaá 58,00 kg US$ 254,80
Carqueja
45,00 kg
US$ 25,80
Espinheira-santa 45,10 kg US$ 3,40
Total de Exportação em
1994
107.529,90 kg US$ 389.416,95
O documento do Ibama informa, ainda, que essas exportações se deram de forma
ilegal. A tabela, contudo, demonstra que as plantas medicinais poderiam representar para o
país um caminho para o desenvolvimento sustentável, desde que houvesse uma política
adequada para o uso e gestão desses recursos.
A extração descontrolada de plantas e a falta de controle quanto às exportações são
fatores que certamente já exercem grande pressão sobre a perda de biodiversidade da flora
brasileira. Ademais, não se pode esquecer que a exportação pura e simples dessas plantas ou
partes de plantas, sem qualquer transferência de know-how, com o único objetivo de abastecer
as indústrias dos países desenvolvidos pouco ajudaao Brasil e aos países amazônicos, que
atualmente sequer conseguem obter a repartição dos benefícios, como manda a Convenção
sobre a Diversidade Biológica.
Como se pode notar, o mercado mundial da biodiversidade lida com valores altíssimos
que não podem ser desprezados pelos países da região amazônica, tendo em vista a janela de
oportunidade que este setor pode oferecer, desde que não se abandone a trilha da
sustentabilidade, fazendo-se opções ecologicamente corretas, mas que ao mesmo tempo
garantam a melhoria das condições de vida das populações locais e assegurem aos países em
desenvolvimento uma alternativa de crescimento viável.
O valor da biodiversidade, entretanto, não é uma tarefa que possa ser facilmente
alcançada. Por esta razão, acredita-se que quanto mais se aproxime de um valor real da
biodiversidade maiores serão as chances de se influir diretamente na escolha, tanto em nível
individual, quanto em nível governamental, a favor da conservação do meio ambiente. Nesse
sentido, Pearce e Moran apontam que:
O reconhecimento de uma avaliação econômica total mais ampla de riquezas
naturais pode contribuir em alterar decisões acerca do seu próprio uso,
particularmente em decisões de investimento e uso de terras, as quais
representam uma escolha clara entre destruição e conservação. Tais decisões
estão a ser tomadas quer em países desenvolvidos, quer em países em via de
desenvolvimento, onde um grande número de competitivas reivindicações
sociais e econômicas entram crescentemente em conflito com as exigências
os recursos de áreas protegidas.
63
Os autores citados ressaltam, com razão, que a conservação da biodiversidade o
pode estar dissociada do estudo do seu aspecto econômico. A perda da biodiversidade, ou em
outros termos, a escolha em não conservar o meio ambiente, decorre da “disparidade
subjacente entre custos privados e sociais e benefícios do uso e conservação da
biodiversidade.”
64
É preciso, por conseguinte, transformar essa relação em uma operação que não seja de
soma zero. Não é viável que se pretenda proteger a biodiversidade sem que sejam
apresentadas aos envolvidos alternativas que gerem ganhos mútuos. A estes efeitos, Pearce e
Moran demonstram que muitas vezes interesses sociais e privados não coincidem, pois o que
é bom sob a ótica particular pode não atender aos reclamos sociais. Exemplificam a questão
da seguinte forma:
Assim, do ponto de vista do indivíduo (o agricultor, o industrial, o pescador,
etc.) compensa destruir a biodiversidade. Mas do ponto de vista da sociedade
como um todo, compensa freqüentemente procurar formas de utilização
sustentável dessa biodiversidade e, em muitas ocasiões, compensa protegê-la
de uma forma absoluta. A sociedade’ neste contexto pode ser a sociedade
local, a nação ou o mundo com o um todo.
65
Em outra passagem, enfocando o assunto sob o prisma eminentemente pragmático,
propõe a seguinte equação:
Schneider (1992) informa acerca de valores de limiar máximo, sendo o preço
a $300 por hectare de terra na Rondônia. Os números sugerem valores de
crédito de carbono duas a quinze vezes o preço da terra em Rondônia. Estes
“créditos de carbonotambém se comparam favoravelmente com o valor da
área florestal para a madeira, digamos, na Indonésia, onde as estimativas são
na ordem de $2000-2500 por hectare. Tudo isso sugere o campo de acção
para uma bagatela global. A terra vale $300 por hectare para o colono
florestal mas várias vezes este preço para o mundo duma maneira geral. Se o
Norte conseguir transferir uma soma de dinheiro maior que $300 mas menor
que o custo do dano do aquecimento global, há ganhos mútuos a serem
contabilizados.
66
No estudo realizado por Pearce e Moran os principais fatores apontados para essa
63
PEARCE, David; MORAN, Dominic. O valor econômico da biodiversidade. Tradução Sofia da Costa
Raimundo. Lisboa: Instituto Piaget, 1994. p. 34.
64
Id. Ibid., p. 34.
65
Id. Ibid., p. 35.
66
Id. Ibid., p. 66-67.
divergência entre os interesses sociais e privados são os seguintes: 1) incapacidade dos
mercados de captarem o verdadeiro valor dos recursos naturais; 2) as políticas de intervenção
dos governos no mercado, que acabam estimulando interesses contrários à conservação do
meio ambiente; 3) a constatação de que muitas atividades de conservação geram benefícios
globais externos, devendo o país que realiza a atividade de conservação receber, também,
benefícios de alguma ordem, sob pena de não haver incentivo à conservação.
67
Daí a importância de se buscar um valor econômico para a biodiversidade de tal modo
abrangente que consiga revelar que o uso sustentável da biodiversidade é a opção mais
vantajosa, ao invés da exploração predatória dos recursos naturais.
Os autores citados, em verdade, apontam que nos cálculos do valor da biodiversidade,
de regra, não se computam fatores relevantes à demonstração de um valor global,
suficientemente abrangente, que indique a alternativa pela conservação como a opção mais
vantajosa.
68
Ainda que não se pretenda descer às minúcias que os autores desenvolvem para
alcançar um valor econômico total para a biodiversidade, convém registrar que compõem essa
expressão econômica valores que não são geralmente captados e que os autores
convencionaram chamar de “incapacidade de apropriação global”. Neste fator inclui-se a
aplicação de todos para medir as preferências individuais, como a aferição da
disponibilidade dos indivíduos em pagar para a conservação da biodiversidade, ou seja, o não-
uso
69
. São fatores ainda que devem ser levados em consideração: armazenamento de carbono,
custos pela renúncia aos benefícios do desenvolvimento e custos do desenvolvimento,
restrição às oportunidades de renda para as populações locais, gastos com fiscalização, custo
de se recuperar um bem danificado, benefícios diretos e indiretos pelo uso sustentável da
biodiversidade, valor econômico das plantas medicinais e dos conhecimentos tradicionais
quanto ao uso da biodiversidade, entre outros.
Quanto à crítica da atribuição de um valor à biodiversidade, Pearce e Moran afirmam
que a busca de um valor econômico para a diversidade biológica não afasta a discussão
quanto à questão moral.
70
Os autores esclarecerem que a avaliação econômica da
biodiversidade não exclui o debate sobre a questão moral, pois na medida em que as políticas
de conservação do meio ambiente desprezam o componente econômico da equação, acabam
67
PEARCE, David e MORAN, Dominic. O valor econômico da biodiversidade. Tradução Sofia da Costa
Raimundo. Lisboa: Instituto Piaget, 1994. p. 35-36
68
Id. Ibid, passim.
69
Id. Ibid., p. 62.
70
Id. Ibid., p. 51-52.
por direcionar as ões humanas no sentido de explorar indiscriminadamente os recursos
naturais, ao invés de conservá-lo.
Para os autores, esta é uma opção moralmente errada e, por isso, a perspectiva
econômica anda de mãos dadas com a visão utilitarista. As alternativas para a conservação
dissociadas do aspecto utilitarista o têm eficácia, daí porque a questão moral não pode
desprezar os aspectos práticos que estimulam a conservação.
71
Na dicção de Pearce e Moran:
[...] mesmo que alguns não gostem da aproximação econômico-utilitária, ela
tem uma função muito importante que não é preenchida por nenhuma outra
abordagem à conservação. Esta explica porque é que a biodiversidade está a
desaparecer. Diz-nos que, que as pessoas são frequentemente utilitárias
nas suas escolhas quanto ao uso e conservação da terra, é necessária uma
aproximação utilitária para compreender o processo de perda e, por
conseguinte, o processo da política de correcção.
72
No Brasil, importante trabalho na área foi elaborado por Ronaldo Serôa da Motta, que
aprofundou a discussão sobre o valor da biodiversidade, valendo ressaltar que o autor
argumenta como um dos principais motivos para se definir um valor monetário à
biodiversidade a própria necessidade de gestão desses recursos.
73
Diante dessas considerações, ainda que não se pretenda um enfoque minimalista da
questão relativa à conservação da biodiversidade, limitando-a à discussão do problema ao
campo meramente econômico, pois mais importante é considerar a necessidade de
conservação do meio ambiente sob a perspectiva do respeito aos direitos humanos, não se
pode excluir do debate a necessidade de se mostrar, a partir de uma relação de custo-
benefício, que investir no uso sustentável da biodiversidade deve sempre ser mais vantajoso
que a dilapidação dos recursos naturais.
Além disso, essa abordagem, na medida em que consegue demonstrar que na
composição do valor da biodiversidade ingressam diversos elementos, certamente mais
argumentos serão alcançados para conservar a diversidade biológica, já que as pessoas, como
regra geral, são imediatistas e fazem pouca ressonância os motivos fundados na necessidade
de conservação para o bem-estar da humanidade.
Nota-se, também, que com o surgimento da biotecnologia acaba-se inevitavelmente
tendo que se atribuir valor à biodiversidade, pois surge um novo mercado que certamente se
guia por balizas de ordem econômicas. Em suma, se reputa importante igualmente para a
71
PEARCE, David e MORAN, Dominic. O valor econômico da biodiversidade. Tradução Sofia da Costa
Raimundo. Lisboa: Instituto Piaget, 1994. p. 52-53.
72
Id. Ibid., p. 54.
73
MOTTA, Manoel Serôa da. Manual de valoração econômica da diversidade ecológica. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/biodiversidade/publica/mvalora/man0003.html>. Acesso em: 2 set. 2007.
hipótese apresentada nesta pesquisa, a possibilidade de se recorrer a multidisciplinariedade.
Não se pode esquecer que nesta polêmica o legislador brasileiro fez uma opção, pois
editar o Decreto nº 4.339, de 22 de agosto de 2002,
74
que define os princípios e diretrizes para
a implementação da Política Nacional da Biodiversidade, no item 2, II, do Anexo, ficou
consignado expressamente que:
2. A Política Nacional da Biodiversidade reger-se-á pelos seguintes
princípios:
I - a diversidade biológica tem valor intrínseco, merecendo respeito
independentemente de seu valor para o homem ou potencial para uso
humano;
[...]
XIV - o valor de uso da biodiversidade é determinado pelos valores culturais
e inclui valor de uso direto e indireto, de opção de uso futuro e, ainda, valor
intrínseco, incluindo os valores ecológico, genético, social, econômico,
científico, educacional, cultural, recreativo e estético;
Não se afasta, contudo, em nenhum momento, o valor intrínseco que a biodiversidade
possui, assegurando a sua importância para a defesa dos direitos humanos e, sobretudo, para a
preservação da própria humanidade.
Por outro lado, traz-se à discussão a questão da valoração econômica da
biodiversidade porque há evidentes implicações de ordem utilitárias, como até mesmo a
partição dos benefícios decorrentes do uso da biodiversidade ou da apropriação do
conhecimento tradicional associado à biodiversidade, que não podem deixar de ser
consideradas. Como recorda Bessa Antunes, o acesso a diversidade biológica é um importante
elemento da atividade econômica moderna.
75
1.3 Um novo olhar sobre a biodiversidade
Chegando-se ao ponto em que já se sabe os parâmetros conceituais de biodiversidade e
que se tem noção da quantificação da biodiversidade e dos valores que esses recursos podem
representar, cabe assinalar que a questão ambiental tem evoluído ao longo dos anos,
superando a visão dicotômica tradicional de que a conservação do meio ambiente é um
obstáculo ao desenvolvimento.
74
BRASIL. Decreto 4.339, de 22 de agosto de 2002. Institui princípios e diretrizes para a implementação da
Política Nacional da Biodiversidade. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4339.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Texto integral
no Anexo D]
75
ANTUNES, Paulo Bessa. Diversidade biológica e conhecimento tradicional associado. Rio de Janeiro:
Lumen Iuris, 2002. p. 132.
Assim sendo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento (CNUMAD), na qual mais de uma centena de países firmaram a Declaração
do Rio e a Agenda 21,
76
desempenhou e desempenha papel importante nessa mudança
paradigmática, ao propor como meta o desenvolvimento sustentável.
A capacidade de uma população utilizar os recursos naturais na área em que ocupa,
sem colocar em risco o meio ambiente, representa uma nova proposta, que tem a
sustentabilidade ecológica como fundamento para o desenvolvimento. Não se trata aqui de
qualquer desenvolvimento, mas um desenvolvimento sustentável, ancorado em uma política
ambiental e social capaz de gerir de forma racional os componentes da biodiversidade,
conservando o meio ambiente para as gerações presentes e futuras.
Quanto ao Brasil, o país possui uma política para o tratamento da biodiversidade
instituída com base nas diretrizes da Convenção sobre a Diversidade Biológica
77
, outro
documento fruto da CNUMAD.
Por outra parte, o Decreto 4.339, de 22 de agosto de 2002, instituiu princípios e
diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade, cabendo ressaltar que
a norma citada, no item 2, XV, prescreve que: “a conservação e a utilização sustentável da
biodiversidade devem contribuir para o desenvolvimento econômico e social e para a
erradicação da pobreza”.
Além disso, no item 4, V, o Decreto estabelece como uma de suas diretrizes que: “a
sustentabilidade da utilização de componentes da biodiversidade deve ser determinada do
ponto de vista econômico, social e ambiental, especialmente quanto à manutenção da
biodiversidade”.
Depreende-se, portanto, que nesse processo de busca por um caminho que contemple
o desenvolvimento sustentável para a Amazônia é fundamental compreender que a proteção
da biodiversidade é uma questão central e necessária para a transformação paradigmática.
A Amazônia, nesse contexto, além de contribuir de forma relevante para a preservação
da espécie humana neste planeta, é uma alternativa para o sustento das populações
tradicionais e de vários setores da sociedade, mediante o uso sustentável da biodiversidade,
bem como para o desenvolvimento local, nacional e sub-regional.
76
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, também chamada de ECO-
92, Rio-92, Conferência da Terra ou Cúpula da Terra, foi convocada pela Assembléia Geral das Nações
Unidas, Resolução nº 44/228, de 22 de dezembro de 1989 e ocorreu na cidade do Rio de Janeiro, durante duas
semanas.
77
BRASIL. Decreto 2.519, de 16 de março de 1998. Promulga a Convenção sobre Diversidade Biológica,
assinada no Rio de Janeiro, em 5 de junho de 1992. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Os textos integrais do
Decreto e da Convenção estão no Anexo A]
Entretanto, a maior dificuldade que se enfrenta é o estabelecimento de um equilíbrio
nesta equação, pois é preciso estar ciente das conseqüências que a perda da diversidade
biológica representa para o Brasil e para a humanidade, ao tempo em que não se pode tornar a
biodiversidade um bem intangível. Nesta equação, a gestão racional do patrimônio genético e
dos recursos naturais pode e deve trazer benefícios às populações dos países amazônicos,
melhorando suas condições de vida.
Entre outros importantes documentos internacionais, cabe anotar a Declaração de
Cocoyoc apontava para uma boa solução ao problema que tanto aflige o ser humano,
enquanto ser vivo e ao mesmo tempo responsável, por meio de suas ões, pelo destino do
meio ambiente e, em última análise, até mesmo do planeta. Na parte final desta Declaração
ficou registrado o seguinte consenso entre os países participantes da Conferência das Nações
Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, ocorrida em 1974, na cidade de Cocoyoc,
México, quando aponta que:
O caminho à frente não se encontra no desespero pelo fim dos tempos nem
em um otimismo fácil resultante de sucessivas soluções tecnológicas. Ele se
encontra na avaliação cuidadosa e imparcial dos “limites externos”, na busca
conjunta por meios de alcançar os “limites internosdos direitos humanos
fundamentais, na construção de estruturas sociais que expressem esses
direitos e no trabalho paciente de elaborar técnicas e estilos de
desenvolvimento que aprimorem e preservem o nosso patrimônio terrestre.
78
Este documento internacional, embora não tenha força obrigatória entre as partes que
o assinaram, tem sua importância porque, pela primeira vez, se reconheceu a existência de
limites humanos e sociais para o desenvolvimento. Assim, seguindo esta mesma linha de
fundamentação, esta pesquisa, por uma questão de opção metodológica voltada à proteção dos
direitos humanos, não se afasta da premissa segundo a qual a riqueza da biodiversidade não
pode ser considerada um objeto exclusivo de exploração econômica.
Em verdade, a biodiversidade dos países amazônicos deve ser entendida como um
importante instrumento de suporte ao desenvolvimento sustentável da região, merecendo, por
isso, especial proteção e cuidado na sua gestão.
A utilização desse patrimônio, que é até chamado de “ouro verde”
79
e que na sua
maior parte está situado na região amazônica, pode ser admitida de forma racional e
sustentável, de modo a assegurar a conservação do meio ambiente e o respeito ao direito dos
78
CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE COMÉRCIO E DESENVOLVIMENTO. 1974. Cocoyoc.
México. Disponível em: <http://amaliagodoy.blogspot.com/2007/10/declarao-de-cocoyoc.html>. Acesso em:
22 nov. 2007.
79
RIFKIN, Jeremy. O século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do mundo. Tradução
Arão Sapiro. São Paulo: Makron, 1999. p. 39.
países detentores de biodiversidade.
Por outra parte, não se pode esquecer que a biodiversidade, em uma sociedade da
informação, é o fim último da biopirataria e da biotecnologia. Sendo assim, em que pese a
Convenção sobre a Biodiversidade reconhecer, no art. 15, § , a soberania dos Estados
quanto ao acesso aos seus recursos genéticos, os países desenvolvidos têm se apropriado
indevidamente desses recursos naturais para fabricar medicamentos, cosméticos, produtos
químicos e outras utilidades, sem o pagamento equivalente de qualquer contrapartida. Daí
porque a importância da colocação do problema apresentado nesta pesquisa, pois se assume,
ex hypotesis, a posição segundo a qual a criminalização das condutas relacionadas a
biopirataria é uma conquista ou um passo necessário à conservação da biodiversidade, que
será discutido oportunamente no Capítulo II.
1.4 Aspectos conceituais da biopirataria
Diante da obviedade de que a biodiversidade representa uma expressão econômica
que, na atualidade, é um dos principais alvos da cobiça dos países desenvolvidos, cabe
estabelecer os contornos do que se entende por biopirataria.
Malgrado não existir uma definição jurídica para biopirataria, vários autores
trabalharam conceitos para essa prática exploratória. Juliana Santilli delimita o termo
biopirataria da seguinte forma:
[...] é a atividade que envolve o acesso aos recursos genéticos de um
determinado país ou aos conhecimentos tradicionais associados a tais
recursos genéticos (ou a ambos) em desacordo com os princípios
estabelecidos na Convenção sobre Diversidade Biológica, a saber: - a
soberania dos Estados sobre os seus recursos genéticos, e o consentimento
prévio e informado dos países de origem dos recursos genéticos para as
atividades de acesso, bem como a repartição justa e eqüitativa dos benefícios
derivados de sua utilização.
80
Para autora, a biopirataria seria a coleta da biodiversidade, com ou sem o uso do
conhecimento tradicional associado, e sem o consentimento prévio e informado dos países de
origem e das populações detentoras do conhecimento tradicional, para identificar os
princípios ativos úteis e depois patenteá-los e explorá-los economicamente, sem qualquer
repartição de benefícios com os países de origem detentores da biodiversidade ou com as
80
SANTILLI, Juliana. Patrimônio imaterial e direitos intelectuais coletivos. In: MATHIAS, Fernando;
NOVIUON, Henry de (Org.). As encruzilhadas da modernidade: debate sobre biodiversidade, tecnociência
e cultura.. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2006. p. 85 (Série documentos do ISA, 9).
populações possuidoras do conhecimento tradicional associado.
81
A autora acrescenta, ainda,
que na biopirataria:
[...] uma aproprião indevida e injusta coibida pela Convenção sobre a
Diversidade Biológica de um recurso que pertence a outro país e às suas
comunidades locais, por meio do uso de um instrumento legal o direito de
propriedade intelectual, especialmente a patente –, consagrado pelas
legislações nacionais e internacionais.
82
Neste sentido, Rifkin havia chamado atenção para esta questão, mostrando que as
“descobertas” dos países do Norte o consideradas pelos países do Sul como pirataria, pois
uma pequena alteração genética feita em laboratório numa planta ou erva se equipara a uma
invenção, desprezando-se todo o trabalho secular de cultivo e preservação desses
organismos.
83
Nesse contexto, cabe frisar que para Rifkin esse mecanismo de exploração representa
uma nova forma de dominação, pois: “A invasão e tomada da terra na forma de colônias foi
possibilitada pela tecnologia da canhoneira; a invasão e tomada da vida dos organismos como
novas colônias está sendo possibilitada pela tecnologia da engenharia genética.”
84
Vandana Shiva também tem essa percepção e indica a biopirataria como uma
continuação do processo colonizatório e de exploração levado a efeito pelos países do Norte
em relação aos países do hemisfério Sul, quando afirma:
No coração da “descoberta” de Colombo estava o tratamento da pirataria
como um direito natural do colonizador, necessário para a salvação do
colonizado. No coração do tratado do GATT e sua leis de patentes está o
tratamento da biopirataria como um direito natural das grandes empresas
ocidentais, necessário para o “desenvolvimento” das comunidades do
Terceiro Mundo.
A biopirataria é a “descoberta” de Colombo 500 anos depois de Colombo.
As patentes ainda são o meio de proteger essa pirataria da riqueza dos povos
não-ocidentais como um direito das potências ocidentais.
81
SANTILLI, Juliana. Socioambientalismos e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e
cultural. São Paulo: Peirópolis, 2004. p. 204.
82
Id. Ibid., p. 204-205.
83
“De acordo com os países do Sul, o que as empresas do Norte chamam “descobertas” são, na verdade, pirataria
de conhecimentos acumulados pelos povos e culturas nativos. As empresas, de fato, acrescentam algum valor
ao construir e modificar a composição genética das plantas ou ao isolar, purificar, destilar e produzir em
grande escala através da propagação por clonagem e outros meios genes que codificam determinadas
proteínas úteis em alimentos, medicamentos, fibras e pigmentos. Ainda assim, os países do Sul argumentam
que uma pequena alteração genética em uma planta ou erva realizada em laboratório é insignificante, quando
comparada aos séculos de trabalhosos cuidados necessários para cultivar e preservar organismos que contêm
aqueles traços exclusivos e valiosos, tão cobiçados pelos cientistas em suas pesquisas” (RIFKIN, Jeremy. O
século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do mundo. Tradução Arão Sapiro. o
Paulo: Makron, 1999. p. 52).
84
RIFKIN, Jeremy. O século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do mundo. Tradução
Arão Sapiro. São Paulo: Makron, 1999. p. 69.
Por meio das patentes e da engenharia genética, novas colônias estão sendo
estabelecidas. A terra, as florestas, os rios, os oceanos e a atmosfera têm sido
todos colonizados, depauperados e poluídos. O capital agora tem que
procurar novas colônias a serem invadidas e exploradas, para dar
continuidade a seu processo de acumulação.
85
Adalberto Val e Vera Maria Val informam que o termo biopirataria surgiu na década
de 90, assumindo o significado de “apropriação de conhecimento e de recursos genéticos com
vistas ao uso unilateral”.
86
Para Marilena Lavorato “a biopirataria é o desvio ilegal das riquezas naturais (flora,
águas e fauna) e do conhecimento das populações tradicionais sobre a utilização dos
mesmos”. A pesquisadora ainda acrescenta sobre a questão da biopirataria o seguinte:
Em várias regiões da Amazônia, pesquisadores estrangeiros desembarcam
com vistos de turista, entram na floresta, muitas vezes, infiltrando-se em
comunidades tradicionais ou em áreas indígenas. Estudam diferentes
espécies vegetais ou animais com interesse para as indústrias de remédios ou
de cosméticos, coletam exemplares e descobrem, com o auxílio dos povos
habitantes da floresta, seus usos a aplicações. Após obterem informações
valiosas, voltam para seus países e utilizam as espécies e os conhecimentos
das populações nativas para isolarem os princípios ativos.
Ao ser descoberto o princípio ativo, registram uma patente, que lhes o
direito de receber um valor a cada vez que aquele produto for
comercializado. Vendem o produto para o mundo todo e até mesmo para o
próprio país de origem, cujas comunidades tradicionais já tinham o
conhecimento da sua utilização.
87
Outra definição encontrada em obras especializadas sobre o assunto é o conceito
cunhado por Celso Fiorillo e Adriana Diaféria, segundo o qual a “biopirataria consiste na
coleta de materiais para fabricação de medicamentos no exterior sem o pagamento de
royalties ao Brasil”.
88
Merece destaque, também, a distinção apresentada por Alfredo Homma
acerca da biopirataria ativa e passiva, embora o autor em seu texto não tenha tido qualquer
preocupação em estabelecer conceitos para os termos empregados.
89
No primeiro caso, o
85
SHIVA, Vandana. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Tradução Laura Cardellini
Barbosa de Oliveira. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 27-28.
86
VAL, Adalberto Luís; VAL, Vera Maria Fonseca de Almeida e. Biopirataria na amazônia: a recorrência de
uma prática antiga. Disponível em: <http: www.comciencia.br/reportagens/genetico/gen10.shtml>. Acesso
em: 14 set. 2007.
87
LAVORATO, Marilena Lino de Almeida. Biodiversidade, um ativo de imenso valor:
biopirataria, plantas medicinais e etnoconhecimento. Disponível em:
<http://www.ecoterrabrasil.com.br/home/index.php?pg=temas&tipo=temas&cd=1359>. Acesso em: 14 set.
2007.
88
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; DIAFÉRRIA, Adriana. Biodiversidade e patrimônio genético: no
direito ambiental brasileiro. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 66.
89
HOMMA, Alfredo Kingo Oyama. Patrimônio genético da amazônia, como proteger da biopirataria? In:
SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE BIODIVERSIDADE E TRANSGÊNICOS, 1999, Brasília. Anais
do Seminário. Brasília: Senado Federal, p. 100.
cientista cita como exemplo a exportação clandestina da seringueira, ocorrida no século
passado.
Logo, acredita-se que o autor entenda por biopirataria ativa aquela apropriação
intencional do material genético oriundo da biodiversidade de um país com o fim de
exploração comercial por outro país. Já a biopirataria passiva parece ser aquela apropriação de
biodiversidade decorrente da própria transferência genética efetuada pelo país detentor da
biodiversidade por fins diversos, como, por exemplo, aquela que atende finalidades
científicas.
Pode-se definir a biopirataria, em termos amplos, portanto, como a apropriação dos
recursos genéticos da biodiversidade de um país ou dos conhecimentos tradicionais
associados à biodiversidade, sem que exista autorização do país detentor desses recursos ou
da população possuidora do conhecimento tradicional.
O principal mecanismo jurídico para garantir aos países desenvolvidos a exploração
desse patrimônio alheio e colhido sem autorização tem sido o monopólio decorrente de
patentes, que vem sendo conferidas a esses países por meio do acordo geral sobre propriedade
intelectual (TRIPs) no âmbito da Organização Mundial do Comércio.
Apesar da discussão acerca da biopirataria ganhar corpo apenas nos anos 90, não se
pode deixar de registrar que se trata de uma prática antiga e fatos históricos revelam a sua
ocorrência ao longo dos culos, desde o descobrimento, como na extração do pau-brasil, no
contrabando da semente da seringueira, da quinina e do curare.
90
O objeto desta investigação,
contudo, não é identificar os casos de biopirataria, e sim, discutir instrumentos jurídicos que
possam garantir uma proteção mais eficaz a um bem jurídico que se encontra atualmente, por
deficiência normativa, passível de lesão.
No Estado do Acre, apenas à guisa de exemplo, dentre os vários fatos conhecidos e
dentre aqueles que sequer chegaram ao conhecimento das autoridades e que assim compõem
uma cifra negra significativa, pode-se citar pelo menos dois casos emblemáticos e que foram
objeto de demandas na Justiça Federal local.
No primeiro desses casos, a Selvaviva Associação Ecológica Alto Juruá
91
,
organização não-governamental presidida pelo austríaco naturalizado brasileiro, Ruedger Von
Reininghaus, sob a fachada da realização de trabalhos sociais com os índios e conservação do
90
BIOPIRATRAIA NA AMAZÔNIA: fatos históricos. Amazonlink. Disponível em:
<http://www.amazonlink.org/biopirataria/biopirataria_historia.htm >. Acesso em: 4 mar. de 2007.
91
BRASIL. Vara da Justiça Federal da Seção Judiciária do Estado do Acre. ão Civil Pública
1997.30.00.001701-0. Requerentes: Ministério Público Federal e Outros. Requeridos: Cilas Araújo Lima,
Jacob Valstar, Edwin Robert Valstar e Oscar Rogier Valstar.
meio ambiente, em 1994 passou a distribuir de graça, junto às populações indígenas do alto do
rio Juruá e dos rios Tarauacá e Muru, medicamentos fornecidos pelas indústrias farmacêuticas
Bayer, Hoescht, Cyba Novartis e Cyba Especialidades Químicas.
A Selvavida confeccionou “folders” em três línguas divulgando o seu trabalho social
e ambiental”, declarando a existência de seis postos de saúde em aldeias indígenas e escolas
instaladas, o que, em realidade, nunca existiu.
O propósito encoberto, no entanto, era a apropriação da biodiversidade da flora local e
do saber tradicional dos povos indígenas. A Selvavida, por meio de Ruedger Von
Reininghaus, passou, então, a se dedicar ao preenchimento de fichas, nas quais eram
catalogados os nomes de plantas e o seu uso medicinal.
O caso Valstar, também, retrata a cobiça internacional sobre o patrimônio genético da
Amazônia.
92
Neste caso, em 7 de outubro de 1999, na cidade de Cruzeiro do Sul, Estado do
Acre, o IBAMA e a Polícia Federal apreenderam em poder de Cilas de Araújo Lima, Jacob
Valstar, Edwin Robert Valstar e Oscar Rogier Valstar (os três últimos de nacionalidade
holandesa), a quantidade de 137 (cento e trinta e sete) amostras de vegetação local, bem como
“folder” de informe publicitário em cinco línguas (Italiano, Francês, Inglês, Alemão e
Holandês), oferecendo à comercialização várias espécies vegetais existentes no Brasil,
informando, ainda, exclusividade de direitos com relação a algumas espécies.
Vários casos de repercussão podem ser citados à guisa de ilustração. Em setembro de
2003 a Polícia Federal prendeu, no Parque Nacional do Pico da Neblina, em São Gabriel da
Cachoeira, Joachim Thiem, de nacionalidade alemã, transportando 21 sementes das plantas
nativas paricá e paxiúba, usadas pelos índios ianomâmis para fins diversos.
93
Outro caso clamoroso foi a condenação, em junho de 2007, pela Justiça Federal da
Seção Judiciária de Manaus, do holandês naturalizado brasileiro, Marc Van Roosmalen, a
quase 16 anos de prisão. O cientista do Inpa é um primatologista de renome internacional e
premiado, sendo responsável pela descoberta de cinco espécies de macacos e de um novo
gênero de primata.
94
A condenação, segundo a notícia se deu em razão de várias acusações,
92
BRASIL. Vara da Justiça Federal da Seção Judiciária do Estado do Acre. Ação Civil Pública
1999.30.00.002718-9. Requerentes: Ministério Público Federal e Outros. Requeridos: Selvaviva Associação
Ecológica Alto Juruá.
93
SOUZA, Kátia. Ibama aperta cerco contra biopirataria. Jornal da Ciência, 5 set. 2003. Disponível em:
<http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=12549>. Acesso em: 14 ago. 2007.
94
ROHTER, Larry. Enquanto Brasil defende a sua biodiversidade, regras amarram cientistas. New York Times,
28 ago. 2007. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2007/08/28/ult574u7719.jhtm>.
Acesso em: 16 nov. 2007. [É importante destacar que a reportagem em questão uma conotação negativa à
condenação, como se fosse um caso de xenofobia a cientistas estrangeiros e que o governo brasileiro criaria
regras injustificadas que prejudicam as pesquisas, o que parece não representar a realidade dos fatos].
como manter animais em cativeiro, inclusive em extinção, sem autorização, transportar
ilegalmente macacos e orquídeas, peculato, apropriação indébita (vendia pela Internet o
direito de escolha do nome das espécies de macacos que descobria, por valores que variavam
de US$ 500 mil a US$ 1 milhão), dentre outras imputações. É importante que se esclareça que
o cientista o chegou a ficar preso um mês, pois foi liberado por ordem de habeas corpus
concedida pelo TRF da 1ª Região e que a condenação maior, de 14 anos de prisão, se deu por
peculato.
95
Logo, no que interessa a esta pesquisa, fica evidente que as normas incriminadoras
que tutelam a flora e a fauna o insuficientes para coibir a biopirataria, conforme se analisa
no Capítulo II.
A respeito do cientista Marc Van Roosmalen cabe ressaltar que a Comissão
Parlamentar de Inquérito da Biopirataria (CPIBIOPI), cujo Relator foi o Deputado José
Sarney Filho, já apontava para diversas atividades ilegais promovidas pelo pesquisador. Ficou
consignado no Relatório Final que, em audiência pública ocorrida em 24 de novembro de
2004, José Antônio Alves Gomes, Diretor do Inpa, relatou o seguinte:
[...] em 2002, houve indícios de que um pesquisador do INPA estava
praticando biopirataria, ficando conhecido como o caso Roosmalen, que
desencadeou um processo disciplinar e quebra de contrato com o
pesquisador, resultado, ironicamente, não da ação de biopirataria, mas de
descumprimento de questões administrativas.
96
Consta, ainda, do Relatório Final da CPIBIOPI, que a Auditora Interna da Funai, em
audiência publica realizada em 18 de maio de 2005, imputou ao cientista holandês a prática de
biopirataria através da ONG dirigida por ele e seus familiares:
[...] iniciou afirmando ter denunciado a relação da FUNAI com a Amazon
Conservation Team – ACT por considerar que a minuta de convênio que esta
instituição pretendia fazer com a comunidade indígena do Parque do
Tumucumaque, abrangendo um projeto de artesanato, na verdade trabalhava
com o conhecimento tradicional dos índios. Aliado à impropriedade da
minuta de convênio, havia um Manual de Plantas Medicinais feito pelo Sr.
Marcus Van Roosmalen, que apresenta 93 espécimes de plantas, com a
forma de uso delas. Somou-se a estes fatos uma certa morosidade por parte
da FUNAI, no sentido de apurar essas questões, o que, segundo a Sra.
Regina, levou-a a fazer a denúncia contra a ACT. Para ela, não havia como
95
GIRARDI, Giovana. Justiça solta primatólogo holandês no Amazonas. Folhaonline, Seção Ciência e Saúde, 8
ago. 2007. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u318490.shtml>. Acesso em 17
nov. 2007.
96
RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DA BIOPIRATARIA
(CPIBIOPI). Câmara dos Deputados. Presidente Dep. Antônio Carlos Mendes Thame e Relator Dep. José
Sarney Filho. Brasília: Centro de Documentação e Informação, 2007. p. 40. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/cpi/Rel_Fin_CPI_Biopirataria.pdf>. Acesso em: 17 nov.
2007.
negar que o produto coletado pelo Sr. Marcus Van Roosmalen era típico de
biopirataria.
97
As informações coletadas pela CPIBIOPI são bem variadas e apontam para inúmeros
casos identificados de tráfico da fauna e flora nacionais, bem como comercio ilegal de
madeira. Quanto ao contrabando de animais, a CPIBIOPI apurou que a comercialização ilegal
se dava pela imprensa, internet e até mesmo em criadouros e centros de triagem.
98
Não se pode esquecer que no Brasil já foram patenteados diversos produtos elaborados
a partir de componentes da flora nacional, o que implica na apropriação não da
biodiversidade nacional, mas também dos conhecimentos tradicionais que são indevidamente
utilizados para a produção desses produtos. Como exemplo, pode-se citar os casos de
patenteamento do cupuaçu, açaí, andiroba, copaíba e do ayahuasca.
99
No âmbito internacional, um dos casos que mais chamou a atenção e até se poderia
dizer foi o estopim para a discussão da biopirataria foi o patenteamento da árvore Neem.
Vandana Shiva esclarece que durante anos o Ocidente deu pouco importância às propriedades
da árvore, que é praticamente sagrada para população tradicional da Índia e que milenarmente
a utiliza para os mais variados fins. Serve como medicamento para o tratamento da úlcera,
diabetes, lepra, problemas de pele, constipação e outros. Para higiene pessoal, na composição
de sabão ou para a limpeza dos dentes. Para evitar a contracepção, como potente espermicida.
Como material resistente para construção ou, ainda, servindo de óleo combustível para
lamparinas, dentre outras funções. Relata vandana que em 1971 o madeireiro americano,
Robert Larson, começou a importar a árvore Neem para sua companhia no Wisconsin e após
vários anos de testes registrou um pesticida extraído das propriedades da árvore, que registrou
sob o nome comercial de Margosan-O, em 1985. Três anos depois vendeu a patente para a
multinacional W R Grace and Co.
100
Este caso foi especialmente emblemático porque
desencadeou uma grande campanha em nível internacional contra o direito a propriedade
intelectual sobre “a criatividade da natureza e suas culturas”.
101
Os protestos originados na
97
RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DA BIOPIRATARIA
(CPIBIOPI). mara dos Deputados. Presidente Dep. Antônio Carlos Mendes Thame e Relator Dep. José
Sarney Filho. Brasília: Centro de Documentação e Informação, 2007. p. 146. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/cpi/Rel_Fin_CPI_Biopirataria.pdf>. Acesso em: 17 nov.
2007.
98
Id. Ibid., p. 374 et seq.
99
BIOPIRATARIA NA AMAZÔNIA: apresentação. Amazonlink. Disponível em:
<http://www.amazonlink.org/biopirataria/index.htm>. Acesso em: 14 set. 2007.
100
SHIVA, Vandana. The neem tree: a case history of biopiracy. Disponível em:
<http://www.twnside.org.sg/title/pir-ch.htm>. Acesso em: 17 nov. 2007.
101
Id. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Tradução Laura Cardellini Barbosa de Oliveira.
Petrópolis: Vozes, 2001, p. 97.
Índia foram a base de uma conscientização de países em desenvolvimento sobre a questão da
biopirataria.
É bom que se esclareça que a biopirataria, seja pela falta de regulamentação que existe
sobre a matéria, seja pela facilidade com que se pode praticá-la, dificilmente é detectada e
raramente as autoridades tomam conhecimento da sua ocorrência.
Nesse sentido, Ozório Fonseca relata que a fiscalização ou vigilância quanto à
apropriação indevida de material biológico é de difícil execução, o que torna muito fácil a
prática da biopirataria. O pesquisador destaca que para a indústria da biotecnologia basta
algumas lulas que podem ser carregadas sem muita necessidade de disfarce, que são
partículas bem pequenas.
102
A biopirataria é, portanto, uma prática que remonta, no caso da região amazônica, ao
descobrimento das Américas, sendo que tanto naquela época, como na atualidade, o que se
verifica é o estabelecimento de uma relação de exploração econômica ou de dependência,
atentatória aos direitos humanos e que compromete o desenvolvimento sustentável do Brasil e
dos países amazônicos.
1.5 Aspectos destacados da globalização e o pensamento de Vandana Shiva
Pode-se afirmar que o processo de dominação econômica que é imposto séculos
pelos países centrais” aos países periféricos” continua. Mudou-se apenas a forma de
exploração. Esse processo que começou com o “descobrimento” das Américas foi responsável
pela dilapidação das riquezas naturais e pela criação de um antagonismo que persiste até os
102
Na realidade, a experiência mostra que para retirar material biológico da Amazônia não necessidade de
grandes aparatos ou de estruturas formais. Na era da biotecnologia e da engenharia genética tudo que se
precisa para reproduzir uma espécie são algumas células facilmente levadas e dificilmente detectadas por
mecanismos de vigilância e segurança. O bolso, a caneta, o frasco de perfume, os estojos de maquiagem, os
cigarros, os adornos artesanais, as dobras e costuras das roupas, enfim, milhares de maneiras de esconder
fragmentos de tecidos, culturas de microorganismos, minúsculas gêmulas ou diminutas sementes, sem que seja
necessário sequer o uso de muita criatividade. Além disso o se pode esquecer que o comércio legalizado de
plantas medicinais e a indústria de fitoterápicos disponibilizam livremente fragmentos e extratos vegetais que
podem ser adquiridos nos mercados e feiras e levados sem nenhuma restrição. Quanto às práticas delituosas ou
criminosas, elas podem ser praticadas em qualquer ponto dos cinco milhões de quilômetros quadrados da
Amazônia que estão disponíveis para receber a visita autorizada de vários tipos de pessoas, entre as quais se
incluem turistas, empresários, estudantes, missionários de várias seitas e religiões, jornalistas de periódicos do
mundo inteiro, equipes de cinema e televisão, dirigentes e membros de ONGs nacionais e internacionais,
agentes comerciais, curiosos, contrabandistas, narcotraficantes, etc. E existem ainda as visitas não autorizadas
que podem transpor os mais de 13 mil quilômetros de fronteira terrestre e oceânica onde a fiscalização é quase
nula, embora seja heróica onde é exercida. Adicione-se a esse contingente de peregrinos constantes e
eventuais, os cerca de 19 milhões de habitantes da região que são absolutamente livres para ir e vir e teremos
um universo de possibilidades onde o combate a essa prática lesiva aos interesses nacionais, se torna uma
tarefa inexeqüível”. (FONSECA, Ozório José de M. Biopirataria, uma questão (quase) insolúvel.
Disponível em: <http://www.inpa.gov.br/artigos/BIOPIRATARIA.doc>. Acesso em: 05 ago. 2007).
dias atuais, colocando de um lado dominadores e do outro lado dominados e,
conseqüentemente, dividindo o mundo em centro e periferia.
Todo ouro e prata que estava ao alcance dos “descobridores” foi levado para a Europa
e serviu, como denuncia Eduardo Galeano, como “formidável contribuição da América para o
progresso alheio”.
103
O autor citado ressalta que:
Entre 1503 e 1660, chegaram ao porto de San Lúcar de Barrameda 185 mil
quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata. A prata transportada para a
Espanha em pouco mais de um século e meio, excedia três vezes o total de
reservas européias. E é preciso levar em conta que essas cifras oficiais são
sempre minimizadas.
104
Rifkin, aliás, também fez considerações neste sentido, lembrando que a biopirataria,
ou o que ele chama de “biocolonialismo”, não é um fenômeno novo, pois:
A história das lutas coloniais tem sido sempre a história da usurpação das
riquezas biológicas nativas em benefício do colonizador. As grandes
expedições exploradoras ao Novo Mundo eram voltadas tanto à tarefa de
encontrar novas fontes biológicas de alimentos, fibras, pigmentos e
medicamentos quanto à de encontrar ouro prata e outros metais preciosos.
105
Seguindo essa linha de argumentação, em época bem mais recente, como mostram
Fernando Henrique e Enzo Faletto, com o término da Segunda Guerra Mundial, alguns países
da América Latina estavam em condições de se industrializar e dar início a um processo de
desenvolvimento auto-suficiente, porém, apesar das inúmeras condições favoráveis, esta etapa
não foi alcançada.
106
A resposta para esse insucesso está, segundo os autores, na teoria da
dependência, que reservou aos países da periferia uma posição bem definida na estrutura
econômica internacional e na relação de dominação:
Em todo caso, a situação de subdesenvolvimento produziu-se historicamente
quando a expansão do capitalismo comercial e depois do capitalismo
industrial vinculou a um mesmo mercado economias que, além de apresentar
graus variados de diferenciação do sistema produtivo, passaram a ocupar
posições distintas na estrutura global do sistema capitalista. Dessa forma,
entre as economias desenvolvidas e as subdesenvolvidas não existe uma
simples diferença de etapa ou de estágio do sistema produtivo, mas também
de função ou posição dentro de uma mesma estrutura econômica
internacional de produção e distribuição. Isso supõe, por outro lado, uma
103
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da américa latina. 45. ed. Tradução Galeno de Freitas. São Paulo:
Paz e Terra, 2005. p. 41.
104
Id. Ibid., p. 40.
105
RIFKIN, Jeremy. O século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do mundo. Tradução
Arão Sapiro. São Paulo: Makron, 1999. p 51.
106
CARDOSO, Fernando Henrique; FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na américa latina:
ensaio de interpretação sociológica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p. 17.
estrutura definida de relações de dominação.
107
Transferindo a análise para o contexto atual, em uma sociedade da informação, deter a
informação e dominar as novas tecnologias, significa ter controle sobre os países que estão
alijados desses conhecimentos e, portanto, manter o processo de dominação.
É cada vez mais evidente que a sociedade industrial esem declínio e que surge uma
nova estrutura social que alguns chamam de sociedade de informação, pós-industrial, pós-
moderna, sociedade dos serviços, tecnotrônica ou, ainda, programada.
108
Enfim, adjetivos
variados, porém que significam que a sociedade atual apresenta novas características que
apontam para uma nova forma de organização social na qual o processamento de
informações, a preponderância do setor de serviços, o domínio das novas tecnologias são os
seus principais fundamentos. De Masi indica pelo menos cinco aspectos que revelam essa
mudança na estrutura social:
Os cinco aspectos que a definem são: 1) a passagem da produção de bens
para a economia de serviços; 2) a preeminência da classe dos profissionais e
dos técnicos; 3) o caráter central do saber teórico, gerador da inovação e das
idéias diretivas nas quais a coletividade se inspira; 4) a gestão do
desenvolvimento técnico e o controle normativo da tecnologia; 5) a criação
de uma nova tecnologia intelectual.
109
Nessa nova realidade social a biotecnologia assume lugar de destaque, ao ponto de
Rifkin chamar esse momento histórico de o “Século Biotecnológico”.
110
Na esteira dessa nova sociedade seguem também os diversos processos de
globalização que têm gerado mais desigualdade e exclusão social.
Neste sentido, o poder econômico internacional das grandes potências se assenta sobre
diversos fatores, porém merece destaque, como frisa Petras, a concentração de empresas
transnacionais que cada país detém.
111
Assim, esclarece o citado autor que:
Os Estados Unidos da América (EUA) continuam sendo o poder dominante
em termos absolutos e relativos: contam com 227 (45%) das 500 EMNs mais
importantes, seguidos pela Europa Ocidental, com 141 (28%), e Ásia, 92
(18%). Esses três blocos regionais controlam 91% das principais EMNs do
107
CARDOSO, Fernando Henrique; FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na américa latina:
ensaio de interpretação sociológica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p. 38-39.
108
DE MASI, Domenico. A sociedade pós-industrial. Tradução Anna Maria Capovilla et. al. 4. ed. São Paulo:
Senac, 2003, p. 32.
109
Id. Ibid., p. 35.
110
RIFKIN, Jeremy. O século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do mundo. Tradução
Arão Sapiro. São Paulo: Makron, 1999.
111
PETRAS, James. Imperialismo e luta de classes no mundo contemporâneo. Florianópolis: UFSC, 2007. p.
11.
mundo. A “globalização” pode ser entendida em seu sentido mais geral
como o poder derivado das EMNs estabelecidas nos três blocos de poder
citados, que lhes permite movimentar capitais, controlar o comércio, o
crédito, o financiamento e o espetáculo. Quase três quartos (73%) das
grandes instituições corporativas encontram-se na esfera de poder
configurada pela Europa-EUA. Embora as EMNs asiáticas tenham um papel
cada vez maior e possam representar um certo perigo nas próximas
décadas,a curto e médio prazo, o eixo econômicos EUA-Europa continuará
sendo predominante.
112
Outro dado que se apresenta de suma importância para se compreender o momento
atual e se tentar definir alternativas sustentáveis para o Brasil e os demais países da região
amazônica diante de um contexto de economia globalizada, diz respeito às áreas de atuação
dessas empresas transnacionais.
Petras revela que os Estados Unidos detêm os oito lugares entre as dez primeiras
posições de empresas transnacionais que atuam no setor do comércio varejista.
113
Segundo Petras, as oito das dez principais empresas transnacionais do setor de
tecnologia e informação são norte-americanas
114
e no setor de meios de comunicação de
massa e entretenimento pertencem aos Estados Unidos onze das quatorze empresas
transnacionais de maior importância.
115
Não se pode deixar de destacar, apor razões de maior interesse para esta pesquisa,
que os Estados Unidos dominam o setor de produtos farmacêuticos, controlando as principais
empresas transnacionais dessa área. Isto significa, em outros termos, que a concentração de
empresas transnacionais principalmente nos setores de tecnologia, informação e
medicamentos, torna o Brasil e os países da região amazônica, detentores de biodiversidade e,
por sua vez, desprovidos nos setores explorados pelas grandes potências, em alvos prioritários
à expansão do “poder imperial”.
Hoje, de um lado estão os países centrais com suas indústrias poderosas de
biotecnologia e, do outro lado, os “países periféricos” detentores de biodiversidade. Em outros
termos, países ricos detentores do poder econômico e consumidores de biodiversidade,
explorando países pobres fornecedores de biodiversidade.
É, portanto, inarredável que se estabeleça o quanto antes instrumentos eficazes para o
controle do acesso à biodiversidade e aos conhecimentos tradicionais associados, garantindo-
se a conservação desse patrimônio e a repartição dos benefícios.
112
PETRAS, James. Imperialismo e luta de classes no mundo contemporâneo. Florianópolis: UFSC, 2007, p.
12.
113
Id. Ibid., p. 14.
114
Id. Ibid., p. 15.
115
Id. Ibid., p. 15.
Compreendida essa conjuntura, faz sentido o raciocínio de Petras quanto à expansão
do “projeto imperialista” norte-americano e europeu, assinalando que a América Latina e,
especialmente o Brasil por sua relevância estratégia, fazem parte do processo de partilha
comandado pelas grandes potências com o objetivo de garantir os interesses das suas
empresas transnacionais.
116
Uma vez apresentados os aspectos destacados da globalização, constata-se que em
linhas gerais, as relações internacionais se desenvolvem em uma dimensão de desigualdade,
onde países desenvolvidos e países em desenvolvimento. Sob o ângulo econômico, os
países da periferia, autorizando a dilapidação do patrimônio genético extraído da sua
biodiversidade ou se limitando à condição de simples fornecedores desse patrimônio, só
estarão perpetuando a relação de dependência com os países desenvolvidos.
Esse contraste, que revela claramente a perpetuação em um cenário atual da relação de
dominação e dependência entre Norte e Sul, conduz a um referencial teórico embasado nas
obras de Vandana Shiva para o enfoque da questão ambiental.
Vandana Shiva, ambientalista e ativista de renome internacional, por ser indiana e
trabalhar com os movimentos sociais junto a populações rurais pobres do seu país, constrói o
seu pensamento a partir de um olhar dos países em desenvolvimento, ou seja, da perspectiva
do oprimido e dominado. Em sua obra Biopirataria: A pilhagem da natureza e do
conhecimento, a autora sustenta que: Resistir à biopirataria é resistir à colonização final da
própria vida”.
117
É inegável que com o descobrimento das Américas deu-se início a um processo
contínuo de dominação, no qual os “países centrais” dilapidaram todo o ouro e prata dos
“países colonizados” e ainda exterminaram grande parte das populações locais.
Com o comércio global que teve lugar no início da Idade Moderna, marcado
principalmente pelas grandes navegações, a Europa conseguiu amealhar lucros fabulosos e
impôs o seu domínio sobre o resto do mundo. O comércio, baseado na exploração
inescrupulosa, era triangular e consistia no envio de matéria-prima oriunda das colônias do
Novo Mundo para as metrópoles, onde eram confeccionados produtos manufaturados, que,
então, alimentavam o tráfico de escravos negros para as plantações das colônias.
Após o capitalismo mercantil, veio o capitalismo industrial, sendo evidente que os
“países periféricos” sempre estiveram, no processo comercial global, em uma posição
116
PETRAS, James. Imperialismo e luta de classes no mundo contemporâneo. Florianópolis: UFSC, 2007,
passim.
117
SHIVA, Vandana. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Tradução Laura Cardellini
Barbosa de Oliveira. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 28.
secundária, que os coloca na condição de meros fornecedores de matérias-primas, sem
alternativa de assumir um papel de destaque na cadeia produtiva, que lhes permita
desenvolvimento e efetivo crescimento, pelo menos econômico.
A situação desses países na sociedade da informação não mudou, pois a “colonização”
continua sendo implementada sutilmente, agora pelo conhecimento privilegiado da
biotecnologia.
Vandana Shiva revela, portanto, forte preocupação com o surgimento deste novo
modelo de dominação e critica o reconhecimento dos direitos de propriedade intelectual aos
países desenvolvidos com fundamento no acordo geral sobre propriedade intelectual no
âmbito da Organização Mundial do Comércio, apontando o sistema de patentes como um
novo instrumento de conquista e exploração.
Segundo Vandana Shiva, os direitos à propriedade intelectual defendidos pelos países
desenvolvidos são ilegítimos por duas razões: a) em primeiro lugar, trata-se de apropriação
indevida da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais; e, b) em segundo lugar, a
patente leva à presunção falsa de que o produto foi criado pelo detentor do registro.
118
A pesquisadora constata, portanto, que a violência e a pilhagem praticadas pelos
países desenvolvidos o os instrumentos atuais usados por eles para a geração de riqueza e a
colonização da natureza por meio das novas tecnologias.
119
O pensamento de Vandana Shiva fortalece um sentimento autóctone e valoriza o que é
construído pelo povo, objetivando que as riquezas dos países em desenvolvimento não sejam
mais uma vez objeto da cobiça internacional. Para a autora:
A biodiversidade é um recurso do povo. Enquanto o mundo industrializado e
as sociedades afluentes deram as costas à biodiversidade, os pobres no
Terceiro Mundo dependem continuamente dos recursos biológicos para
obter comida, cuidar da saúde, extrair energia, fibras, e construir moradias.
120
A pesquisadora exerce um papel muito importante na denúncia do processo
exploratório a que os países em desenvolvimento estão submetidos, revelando a ideologia do
poder dominante, ou se poderia até dizer globalizante quando afirma que:
Os que o explorados tornam-se criminosos, os que exploram reivindicam
proteção. O Norte tem que ser protegido do Sul para poder continuar seu
roubo ininterrupto da diversidade genética do Terceiro Mundo.
121
118
SHIVA, Vandana. Tradução Laura Cardellini Barbosa de Oliveira. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do
conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 97-98.
119
Id. Ibid., passim.
120
Id. Ibid., p. 92.
121
Id. Ibid., p. 81.
Sob essa perspectiva crítica, que pressupõe como primeiro passo uma tomada de
consciência, a teoria de base colhida a partir do pensamento de Vandana Shiva representa uma
importante ferramenta para se compreender a realidade do Brasil e dos países da região
amazônica que detêm biodiversidade e conhecimentos tradicionais dentro de um contexto
mundial, no qual, ou continuarão dominados, explorados e fornecedores de matérias-primas a
preços vis, ou poderão desempenhar o papel de protagonistas, partilhando a riqueza de forma
justa, mediante a utilização sustentável da biodiversidade.
Lembra Alfredo Homma que uma lei contra a biopirataria provavelmente estaria
vindo tarde demais, pois: “É bem provável que uma grande parte de plantas amazônicas
estejam em diversos jardins botânicos do mundo, como parte do esforço que se caracterizou a
partir do século XVII”.
122
O cientista ressalta, também, que vários recursos genéticos oriundos
da Amazônia, conforme apurado na CPI da Biopirataria, bastante tempo já foram levados
para outros países.
123
Nessa mesma esteira, em 1987, Pat Mooney já relatava a existência de vários bancos
genéticos espalhados pelo mundo, onde está armazenado um grande número de espécies:
Na base da escada da conservação genética estão aproximadamente sessenta
bancos de genes, formados para coletar e preservar tesouros nacionais e para
colher, dos recursos mundiais, qualquer material que possa ser solicitado por
melhoristas locais.
[...] Desde que o sistema de coleções tornou-se oficial, em 1898, o governo
norte-americano subvencionou mais de 150 expedições ao exterior, que
trouxeram para o país mais de 350 mil novas plantas. O relatório de 1978 do
“Sistema Nacional de Germoplasma Vegetal” identificou onze principais
bancos de genes, com o total de 276.124 introduções de plantas.
124
Assim sendo, fica a impressão de que certamente os governos dos países
desenvolvidos sabem mais sobre a biodiversidade dos países detentores dos recursos
genéticos, do que esses próprios países. Tudo isso faz com que se concorde com a afirmação
de que, realmente, é possível que seja um pouco tarde para criminalizar a biopirataria, mas
não é por isso que se deva deixar de criar os mecanismos de proteção ao que se considera um
patrimônio nacional e que o pode ser entregue gratuitamente, repetindo-se a história de
exploração.
122
HOMMA, Alfredo. Biopirataria na amazônia: ainda é tempo para salvar? Disponível em:
<http://www.atech.br/agenda21.as/download/amazonia2.pdf>. Acesso em 17 out. 2007.
123
Para maiores detalhes, vide Anexo P.
124
MOONEY, Pat Roy. O escândalo das sementes: o domínio na produção de alimentos. Tradução Adilson D.
Paschoal. São Paulo: Nobel, 1987. p. 28-29.
Conforme se observa no Capítulo II, o que realmente se propõe quando se quer
criminalizar a biopirataria é a proteger o Brasil e os países detentores de biodiversidade do
processo exploratório a que estão submetidos por causa da sua condição de “países
periféricos” na ordem internacional. Assim sendo, a biopirataria representa a continuidade da
relação de dominação econômica, pois os “países periféricos” mantêm sua posição de
explorados e fornecedores de matérias-primas. A diferença agora é que os exploradores são as
empresas transnacionais da biotecnologia, que ficam com as vantagens e benefícios das
atividades econômicas desenvolvidas com a exploração da biodiversidade.
Assume-se, portanto, nesta investigação a premissa de que para se assegurar um
desenvolvimento sustentável dos “países periféricos” é preciso também reforçar os
instrumentos jurídicos para a proteção da biodiversidade, inclusive de natureza penal.
CAPÍTULO II – CRIMINALIZAÇÃO DA BIOPIRATARIA NA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL
2.1 Considerações necessárias sobre a criminalização da biopirataria
Dentre as principais preocupações que orientaram a realização desta pesquisa está,
evidentemente, o esforço em se consolidar instrumentos jurídicos que garantam de forma
eficiente a proteção da biodiversidade na República Federativa do Brasil e nos países da
região amazônica.
Conforme alerta Juliana Santilli, não há uma definição jurídica para biopirataria,
porém nos últimos anos tem ocorrido um grande debate em torno desta questão,
especialmente porque a partir da Convenção sobre a Diversidade Biológica
125
ficou
expressamente reconhecida no plano internacional a soberania dos Estados sobre os seus
recursos genéticos, bem ainda se garantiu a repartição justa e eqüitativa dos benefícios
advindos do uso desses recursos ou da apropriação dos conhecimentos tradicionais
associados.
126
O conceito de biopirataria foi aprofundado no Capítulo I, razão pela qual se torna
desnecessário voltar à discussão sobre a definição do termo, que pode ser encontrada nas
páginas antecedentes no glossário de conceitos operacionais. Assim sendo, este capítulo
analisa com mais profundidade o problema e a hipótese apresentados nesta pesquisa e seus
aspectos criminais.
Dessa maneira, o problema suscitado versa sobre a construção de uma fundamentação
teórica para a criminalização da biopirataria, a partir da qual, por meio da cooperação
internacional para o desenvolvimento, se discutirá a implementação de mecanismos jurídicos
que possam melhor assegurar a proteção à biodiversidade dos Estados membros da
Organização do Tratado de Cooperação Amazônica – OTCA.
A hipótese central neste capítulo é que a criminalização da biopirataria é um
125
Para melhor compreensão do leitor, o § , do art. 15, da Convenção, prevê: “Em reconhecimento dos direitos
soberanos dos Estados sobre os seus recursos naturais, a autoridade para determinar o acesso a recursos
genéticos pertence aos governos nacionais e está sujeita à legislação nacional”. No § , por sua vez, está
consignado: “Cada Parte Contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas, conforme
o caso e em conformidade com os Artigos 16 e 19 e, quando necessário, mediante o mecanismo financeiro
estabelecido pelos Artigos 20 e 21, para compartilhar de forma justa e eqüitativa os resultados da pesquisa e do
desenvolvimento de recursos genéticos e os benefícios derivados de sua utilização comercial e de outra
natureza com a Parte Contratante provedora desses recursos. Essa partilha deve se dar de comum acordo”. [A
Convenção na íntegra está no Anexo A].
126
SANTILLI, Juliana. Socioambientalismos e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e
cultural. São Paulo: Peirópolis, 2004. p. 198-199.
pressuposto importante para o tratamento da biodiversidade e para o enfrentamento da
biopirataria, cuja forma de abordagem interna do problema, nos países da região amazônica,
deve se dar de maneira uniforme, estimulando-se de modo complementar, os mecanismos de
cooperação internacional para combater esse tipo de conduta sobre a qual se pretende
justificar a tutela penal nos planos nacionais e sub-regional.
Diante dessa hipótese, é necessário que se passe a analisar, sob bases científicas, se a
afirmação teórica apresentada realmente se verifica, ou seja, se é viável a legitimação da
intervenção penal como mecanismo jurídico para coibir a biopirataria.
O discurso das agências políticas
127
e organizações o-governamentais que se
interessam pela proteção da biodiversidade, ao que se constata e em linhas gerais, é no sentido
de buscar a criminalização primária
128
da conduta de biopirataria, por entenderem que essa
prática levada a efeito, principalmente, por pesquisadores estrangeiros ou pessoas ligadas às
empresas transnacionais do setor da biotecnologia tem gerado graves prejuízos, não
econômicos ao país, mas também sociais, culturais, políticos e tecnológicos, constituindo-se
em uma nova forma de dominação e exploração no alvorecer do terceiro milênio.
Quanto a este aspecto, vários casos de grande repercussão na mídia comum e
especializada foram citados no Capítulo I, não se podendo esquecer que o legislativo também
dedicou grande atenção ao assunto, ressaltando-se os trabalhos da Comissão Parlamentar de
Inquérito que investigou o tráfico ilegal de animais e plantas silvestres da fauna e da flora
brasileiras CPITRAFI, no âmbito da Câmara dos Deputados, cujo relator foi o Deputado
Sarney Filho. A aludida Comissão, embora tenha funcionado por três meses, encerrando seus
trabalhos em 31 de janeiro de 2004, trouxe importantes informações sobre o assunto.
A Comissão Parlamentar de Inquérito da Biopirataria (CPIBIOPI), que deu
continuidade aos trabalhos e ampliou o foco da CPITRAFI, concluiu seus trabalhos em 28 de
março de 2006, com a apresentação de um substancioso Relatório Final de 502 páginas,
reunindo muitos dados sobre o tráfico da fauna, flora, comércio ilegal de madeira e
biopirataria. O Relator foi o também o Dep. Sarney Filho. Foram realizadas diversas
audiências públicas e a CPIBIOPI coletou elementos de grande valor para o diagnóstico da
biopirataria no País, apresentando, inclusive, projetos de lei para alteração da legislação em
127
Utiliza-se o termo “agências” na acepção a seguir apresentada: “A referência a entes gestores da
criminalização como agências tem como objetivo evitar outros substantivos mais valorados, equívocos ou
inclusive pejorativos (tais como corporações, burocracias, instituições etc.). Agência (do latim agens, particípio
do verbo agere, fazer) é empregada aqui no sentido amplo e dentro do possível neutro de entes ativos (que
atuam)”. (ZAFFARONI, E. Raúl et al. Direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 43, v. 1.)
128
Criminalização primária é: “o ato e o efeito de sancionar uma lei penal material que incrimina ou permite a
punição de certas pessoas” (ZAFFARONI, E. Raúl et al. Direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003,
vol. 1, p. 43). E criminalização secundária é: “a ação punitiva exercida sobre pessoa concretas”. (Id. Ibid., p. 43)
vigor e recomendando urgência na tramitação de outros projetos de lei sobre o assunto
encaminhados ao Congresso Nacional.
129
Há, ainda, uma grande mobilização da sociedade civil nacional e internacional quando
o assunto em pauta é a biopirataria, podendo-se destacar a atuação de várias organizações
não-governamentais, que desempenham trabalho relevante na proteção da biodiversidade
amazônica.
Por outro lado, não se pode esquecer que neste campo, por vezes, se desenvolvem
relações bastante conflitantes entre as agências de governo, as organizações não-
governamentais e setores que defendem o interesse do capital relacionado à indústria
madeireira, ao agronegócio e à agropecuária.
Para melhor conhecimento do assunto, segundo notícia da Agênciamara, veiculada
em 9 de maio de 2007, o General Maynard Marques Santa Rosa, Secretário de Política,
Estratégia e Assuntos Internacionais do Ministério da Defesa, ao ser ouvido na Comissão da
Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, da Câmara dos Deputados,
denunciou o envolvimento de organizações não-governamentais em atividades ilícitas ou
escusas na Amazônia.
130
Qualquer generalização quanto à atuação das organizações não-governamentais na
Amazônia, entretanto, é um exagero, pois muitas têm prestado um relevante serviço em prol
da conservação da biodiversidade, defesa do meio ambiente e dos interesses indígenas. O
problema levantado pelo general, porém, existe de fato e está relacionado, sobretudo, com a
ausência de fiscalização da parte dos órgãos estatais encarregados de exercer o controle
quanto à instituição e atuação das organizações não-governamentais em território brasileiro.
Nota-se, assim, e este aspecto é que interessa à pesquisa, que o discurso quanto à
criminalização da biopirataria é recorrente e atual. Neste sentido, merece destaque mais uma
129
RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DA BIOPIRATARIA
(CPIBIOPI). Câmara dos Deputados. Presidente Antônio Carlos Mendes Thame e Relator Dep. José Sarney
Filho. Brasília: Centro de Documentação e Informação, 2007, 502 p. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/cpi/Rel_Fin_CPI_Biopirataria.pdf>. Acesso em: 17 nov.
2007.
130
“Há 100 mil organizações não-governamentais operando na Amazônia brasileira, segundo informou o
general-do-Exército Maynard Marques Santa Rosa, secretário de Política, Estratégia e Assuntos Internacionais
do Ministério da Defesa. Esses números foram coletados por sistemas de inteligência das forças de segurança.
Oficialmente, diz o general, as ONGs visam principalmente a defesa do meio ambiente e dos direitos
indígenas, mas, segundo ele, muitas têm interesses ocultos como tráfico de drogas, lavagem de dinheiro,
tráfico de armas e de pessoas e até mesmo espionagem’. Santa Rosa que participou da audiência pública sobre
a atuação de ONGs estrangeiras no território brasileiro, promovida pela Comissão de Relações Exteriores e de
Defesa Nacional, ressaltou na ocasião, que suas informações têm caráter oficial e não o meras opiniões.
(ARAÚJO JÚNIOR, Newton. General ressalta interesses ocultos de ongs na Amazônia. Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br/internet/homeagencia/materias.html?pk=102844&searchterm=general>. Acesso
em: 12 set. 2007).
reportagem da Agência Câmara, veiculada em 20 de março de 2007, onde se registra que
durante a audiência pública da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de
Desenvolvimento Regional, anteriormente referida, o Diretor-Geral da Agência Brasileira de
Inteligência (ABIN), defendeu, publicamente, que a biopirataria deveria ser tipificada como
crime.
131
Dentro desse contexto, cabe mencionar que em 2005 foi criado um grupo informal
denominado Grupo de Trabalho da Amazônia (GTAM),
132
formado por integrantes do
Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN), contando com a colaboração de órgãos de
inteligência da ABIN, das Forças Armadas e do Departamento de Polícia Federal.
Este grupo, coordenado pelo Coronel Gélio Fregapani da Abin, elaborou relatórios
sobre a Amazônia que foram encaminhados à ABIN, não havendo divulgação desses
documentos além da esfera técnica, pois segundo o GTAM o seu objetivo era apenas subsidiar
os estudos e discussões sobre a Amazônia entre os integrantes do SISBIN. De qualquer forma,
o conteúdo destes relatórios, propositalmente ou não, foi vazado para a imprensa, um em 2005
e outro em 2006.
Dentre as reportagens que se referem aos citados relatórios, é importante destacar a
notícia veiculada no jornal “O Liberal”, de Belém do Pará, que revela a ideologia do citado
grupo quanto às questões amazônicas, ou seja, um raciocínio voltado à ocupação,
principalmente das áreas de fronteira da região, sob o velho mote do perigo de uma invasão
estrangeira.
133
131
O diretor-geral da Abin, Márcio Paulo Buzanelli, defendeu a tipificação do crime de biopirataria pelo
Congresso para que se combata a ação de ONGs que pratiquem esse tipo de irregularidade. Muitas ONGs
poderiam responder por falsidade ideológica, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e biopirataria, se este
último crime fosse tipificado’, afirmou Buzanelli. Por não haver tipificação da prática, segundo o diretor, os
julgamentos são baseados na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9605/98), considerada branda”. (BITTAR,
Rodrigo. Entidades querem controle de ongs que atuam na amazônia. Disponível em:
<http://www2.camara.gov.br/homeagencia/materias.html?pk=99791>. Acesso em: 12 set. 2007).
132
ABIN: NOTA À IMPRENSA. Amazônia. 12 mai. 2005. Disponível em:
<http://www.amazonia.org.br/noticias/noticia.cfm?id=161403>. Acesso em 12 set. 2007.
133
“O coronel Gélio Fregapani afirmou, publicamente, que o interesse de boa parte das ONGs que atuam na
Amazônia é barrar o desenvolvimento do Brasil. Gélio Fregapani é o mentor da Doutrina Brasileira de Guerra
na Selva e esteve em quase todos os locais habitados e desabitados da Amazônia. Segundo o coronel, a
Amazônia será ocupada por nós ou por outros e apesar de o Brasil ter legitimamente a posse, essa legitimidade
não nos garante o futuro, segundo ele. ‘Se nós o ocuparmos a Amazônia, alguém a ocupará. Se nós o a
utilizarmos, alguém vai utilizá-la. Portanto a questão é: devemos ocupá-la ou não? s somos brasileiros,
então devemos ocupá-la’, defende. Gélio Fregapani diz que haverá pressões e que outros tentarão ocupar a
Amazônia. Sabemos que se nós não a ocuparmos, certamente teremos uma guerra pela ocupação’, alerta o
coronel. Ele afirma que a necessidade de ocupação da Amazônia é um fato e a melhor forma é deixar
prosseguir a fronteira agrícola. ‘E quanto mais perto das serras que separam o Brasil dos países ao Norte,
melhor’, diz. Para o coronel, é nítido o desejo dos povos desenvolvidos tomarem conta das serras que separam
o Brasil da Venezuela e da Guiana, por dois motivos: para evitar que o Brasil concorra com seus mercados e
como reserva futura de matéria-prima”. (DENÚNCIA ATINGE ONGS. O Liberal, Belém, 15 mai. 2005.
Disponível em: <http://www.orm.com.br/oliberal/>. Acesso em: 15 de set. 2007).
Em outra reportagem, desta vez no “JB Online”, se tem a informação de que o GTAM
após o vazamento do relatório de 2005, elaborou novo documento expositivo em que reitera o
alerta anterior contra as atividades ilícitas e sem qualquer controle de organizações não-
governamentais na região amazônica e acrescenta uma nova preocupação dirigida, agora,
contra a demarcação de grandes áreas indígenas contíguas a faixa de fronteira.
134
Desta maneira, observa-se que as idéias do Coronel Gélio Fregapani sobre a Amazônia
já eram conhecidas, mesmo antes dos relatórios do GTAM, pois em sua obra intitulada
“Amazônia a grande cobiça internacional”, editada em 2000, o militar registrou de forma
articulada o seu discurso desenvolvimentista através da necessidade de ocupação da
Amazônia, fortalecimento das defesas militares e exploração das riquezas naturais. Na
passagem a seguir, Gélio Fregapani expõe a sua solução para o problema da cobiça
internacional sobre a Amazônia: “Se até lá nós tivermos adensado a ocupação da área e
reforçado a capacidade de reação pode até não haver pressão nenhuma. Hoje, como sempre
foi, os fracos e os pusilânimes são os que atraem as guerras [...]”.
135
Essa mesma linha de argumentação que visa transformar as organizações não-
governamentais de proteção ao meio ambiente em títeres dos interesses estrangeiros, que
buscariam a todo custo impedir o desenvolvimento econômico do país, porque a exploração
das riquezas da Amazônia colocaria em risco a economia das potências hegemônicas,
encontra ressonância, também, em setores civis, como se nota no discurso de Lorenzo
Carrasco, em sua polêmica obra, “Máfia Verde”. Para se ter uma breve noção das idéias deste
autor, cabe reproduzir a seguinte passagem do livro citado, que bem sintetiza o seu
pensamento sobre a questão ambiental: “Assim, o objetivo da ofensiva ambientalista é
inviabilizar a capacidade das nações de manter não apenas o crescimento e a prosperidade de
suas populações, mas até mesmo de sustentar as suas populações atuais”.
136
Constata-se de tudo que foi apresentado que bastante histeria dos atores envolvidos
com a questão ambiental, sendo difícil até revelar os verdadeiros interesses de cada grupo.
134
Apesar da polêmica provocada no início de 2005 pelo vazamento de seu primeiro relatório, o Grupo de
Trabalho da Amazônia (GTAM) o diminuiu suas críticas à atuação das organizações não-governamentais
(ONGs) no texto sobre a situação da Amazônia no primeiro semestre de 2006. Muito pelo contrário. Alerta
para o fato de que a parte norte da Amazônia brasileira ‘permanece como um território virtual para o Brasil’. E
que a luta das ONGs para aumentar as reservas indígenas ameaça a integridade do territorial do país: ‘Algumas
terras indígenas tendem a se transformar em bantustans, outras em curdistões, quando contíguas a áreas com
mesma etnia no outro lado da fronteira’”. (FARIAS, Tales. Militares apontam ameaças. JB Online, Rio de
Janeiro, 29 jan. 2007. Disponível em: <http://quest1.jb.com.br/editorias/pais/papel/2007/01/29/pais.html>.
Acesso em: 15 set. 2007).
135
FREGAPANI, Gélio. Amazônia: a grande cobiça internacional. Brasília, 2000, p. 47.
136
CARRASCO, Lorenzo (Coord.). Máfia verde: o ambientalismo a serviço do governo mundial. 10. ed. Rio de
Janeiro: Capax Dei, 2006. p. 25.
Assim, sem uma preocupação maior de examinar essas teorias conspiratórias, o que é certo é
que diante do cenário descrito e de um discurso ideológico bem estruturado, é muito cil
proliferar adeptos de teorias xenófobas ou que busquem a criminalização da biopirataria a
todo custo, por razões meramente simbólicas para satisfazer os interesses e clamores de
determinados setores da sociedade. Por outro lado, vislumbra-se que nesse emaranhado de
acusações uma preocupação legítima de proteção do patrimônio nacional e dos
conhecimentos das populações tradicionais locais. O problema está em saber como
reconhecer a ajuda estrangeira bem-intencionada, que possa cooperar com o desenvolvimento
regional e aquela que busca apenas o lucro e somente servirá para alimentar o processo de
dominação dos países desenvolvidos sobre os países em desenvolvimento.
Em razão da conjuntura descrita, borbotaram projetos de lei que visam a
criminalização da biopirataria, cabendo destacar que o próprio Relatório Final da CPIBIOPI,
recomendou o seguinte:
finalizar a tramitação do Projeto de Lei 7.211/02, que prevê o tipo penal
de biopirataria, assegurando que ele seja apenado com sanções severas, e que
se permita aos operadores da fiscalização dispor de todas as ferramentas
investigativas necessárias;
• tipificar como crime a apropriação dos conhecimentos tradicionais de
comunidades locais;
definir a titularidade do patrimônio genético, finalizando-se as discussões
em torno da PEC 618/1998, de modo a consagrar o patrimônio genético
como bem da União, assegurada a previsão de repartição de benefícios
envolvendo Estados, Municípios e comunidades tradicionais;
137
Pode-se mencionar, igualmente, o Projeto de Lei 80/2007,
138
de autoria do
Deputado Antônio Carlos Mendes Thame do PSDB/SP, atualmente em tramitação na
Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania. Este projeto visa não corrigir algumas
incongruências previstas nos tipos penais descritos na Lei 9.605/98, mas principalmente
tem por objetivo a exasperação de penas e a criação de algumas figuras penais de delitos
ambientais por equiparação.
137
RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DA BIOPIRATARIA
(CPIBIOPI). Câmara dos Deputados. Presidente Antônio Carlos Mendes Thame e Relator Dep. José Sarney
Filho. Brasília: Centro de Documentação e Informação, 2007. p. 464. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/internet/comissao/index/cpi/Rel_Fin_CPI_Biopirataria.pdf>. Acesso em: 17 nov.
2007.
138
BRASIL. Projeto de lei nº 80/2007. Altera a pena cominada a crimes ambientais, previstos na Lei n° 9.605, de
12 de fevereiro de 1998. Câmara dos Deputados. Disponível em: <http://www.wspabrasil.org/newsletter/julho-
2007/docs/PL-080.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Cópia integral do projeto de lei foi reproduzida no Anexo
N].
Tramita no Congresso Nacional, também, o Projeto de Lei 7211/2002
139
, oriundo
do Poder Executivo e que teve como relator o Deputado Sarney Filho. Este outro projeto
institui o crime de biopirataria, introduzindo figuras penais novas na Lei 9.605/93. O
projeto está relatado e aguarda pauta para votação em Plenário desde de 2 de outubro de 2002.
Outro projeto em tramitação que também tipifica condutas relacionadas a biopirataria
é o Projeto de Lei nº 2.360/2003
140
, de autoria do Deputado Mário Negromonte do PP/BA.
O Projeto de Lei 4.842/98, mais antigo, oriundo do Senado e de autoria da então
Senadora Marina Silva do PT/AC, que também visava regular o acesso ao patrimônio
genético e combater biopirataria, passou a tramitar em conjunto com o Projeto de Lei
2.360/2003, estando ambos parados na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados desde de 23
de agosto de 2005.
Apenas a título de registro quanto à evolução legislativa da matéria, traz-se à memória
que o texto da Lei 9.605/93 foi aprovado pelo Congresso Nacional, contemplando no art.
47 o crime de biopirataria. O Presidente Fernando Henrique, contudo, vetou o referido
dispositivo legal.
141
Por último, é conveniente lembrar que o Decreto nº 4.339, de 22 de agosto de 2002,
142
instituiu princípios e diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade.
Assim, no item 9, VII, do Decreto, está previsto que a Política Nacional da Biodiversidade
tem como um de seus componentes o fortalecimento do marco-legal e, no item 16.6, verifica-
139
BRASIL. Projeto de lei 7.211/2002. Acrescenta artigos à Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que
dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=71835>. Acesso em: 22 nov. 2007
[Cópia do projeto de lei foi reproduzida no Anexo L].
140
BRASIL. Projeto de lei 2.360/2003. Altera a Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, e a Lei 9.605, de
12 de fevereiro de 1998, para dispor sobre a pesquisa ou a coleta de amostras da flora brasileira. Câmara dos
Deputados. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/174819.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2007
[Cópia do projeto de lei foi reproduzida no Anexo M].
141
A redação do artigo vetado e as razões do veto seguem para conhecimento: “Art. 47. Exportar espécie
vegetal, germoplasma ou qualquer produto ou subproduto de origem vegetal, sem licença da autoridade
competente:
Pena - detenção, de um a cinco anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Razões do Veto: O artigo, na forma como está redigido, permite a interpretação de que entidades
administrativas indeterminadas terão que fornecer licença para a exportação de quaisquer produtos ou
subprodutos de origem vegetal, mesmo os de espécies não incluídas dentre aquelas protegidas por leis
ambientais.
A biodiversidade e as normas de proteção às espécies vegetais nativas, pela sua amplitude e importância,
devem ser objeto de normas específicas uniformes. Ademais, existem projetos de lei nesse sentido em
tramitação no Congresso Nacional”. (Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/Mensagem_Veto/1998/Vep181-98.pdf>. Acesso em: 17 set.
2007).
142
BRASIL. Decreto 4.339, de 22 de agosto de 2002. Institui princípios e diretrizes para a implementação da
Política Nacional da Biodiversidade. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4339.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Cópia integral
do Decreto está no Anexo E].
se que a diretriz que determina o fortalecimento deste marco-teórico tem como objetivos
específicos, previstos nos itens 16.6.1 e 16.6.2 “promover o levantamento e a avaliação de
todo o quadro normativo relativo à biodiversidade no Brasil, com vistas em propor a
adequação para a gestão da biodiversidade” e “consolidar a legislação brasileira sobre a
biodiversidade”.
143
2.2 O processo de criminalização primária e o Direito Penal interno
Ao longo do item anterior se revelou o discurso jurídico-político e econômico
dominante, podendo-se concluir que seria muito fácil se deixar seduzir pelo “canto da sereia”
e aceitar a ideologia criminalizante sem maiores questionamentos, aportando-se nesta
pesquisa os mesmos argumentos que vêm justificando a inflação das normas penais e a
utilização do Direito Penal de forma meramente simbólica, como instrumento de “sustentação
da estrutura do poder social através da via punitiva”.
144
Hassemer, jurista alemão avesso ao Direito Penal Ambiental, ao palestrar no 57º
Congresso de Juristas, ocorrido em Mainz, Alemanha, no ano de 1998, declarou o seguinte:
“Quem se distancia do Direito Penal Ambiental atual, com isso o se distancia da proteção
ambiental; ele apenas duvida da efetividade de um meio para a proteção de nosso meio
vital”.
145
Em seguida, acrescentou a constatação, que segue adiante transcrita:
Quem toma o Direito penal não como ultima ratio, mas como prima ratio ou,
até mesmo, como sola ratio da política interna, torna as coisas muito fáceis e
desiste, antecipadamente, da busca por medidas de ajuda de natureza mais
próxima dos problemas.
146
Acredita-se que a crítica do autor, ainda que se tenha em conta o seu posicionamento
contrário à intervenção do Direito Penal para a proteção do meio ambiente, é um importante
alerta ao pesquisador para que, ao invés de acolher cegamente o discurso jurídico-penal
dominante, emanado principalmente das agências políticas em favor da criminalização da
biopirataria, passe a analisar a validade desta proposta em face do Direito Penal de um Estado
143
BRASIL. Decreto 4.339, de 22 de agosto de 2002. Institui princípios e diretrizes para a implementação da
Política Nacional da Biodiversidade. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4339.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Cópia integral
do Decreto está no Anexo E].
144
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, Jo Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte
geral. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 78.
145
HASSEMER, Winfried. Direito penal libertário. Tradução Regina Greve. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p.
225.
146
Id. Ibid., p. 227.
democrático de direito. Em outros termos, cabe indagar até que ponto a criminalização da
biopirataria se justifica de modo eficaz e equilibrado com as atuais tendências nacionais, sub-
regionais e internacionais?
Parte-se, portanto, da premissa de que, para fazer valer seus interesses, as agências que
exercem a criminalização primária constroem o seu discurso teórico a partir de falsas
generalizações
147
e escolhem condutas para criminalizar de forma seletiva e de modo a
satisfazer a opinião pública e assegurar a manutenção do poder.
Eleger comportamentos para incriminar, sobretudo quando uma pressão social,
como é o caso da questão ambiental, traz uma certa sensação de tranqüilidade aos setores
sociais predominantes,
148
que ao responderem com uma atuação estatal em favor de uma
pseudo repressão ou “endurecimento”, deixam de ser incomodados.
Logo, porém, surge o segundo problema, voltado a criminalização secundária, já que o
poder estatal, incompetente na sua capacidade fiscalizatória e de aplicação da norma
incriminadora, passa a selecionar pessoas para criminalizar.
Aparecem, então, outros questionamentos. O que, de fato, há por trás das propostas de
intervenção penal no caso da biopirataria? Justifica-se a intervenção penal?
Estes são os pontos sensíveis que devem ser analisados nesta pesquisa e para se dar
respostas às inquietações levantadas, primeiro, se deve compreender qual o papel que a
política criminal desempenha diante da dogmática jurídico-penal, com ênfase na incipiente
discussão sobre a hipótese de criminalização em matéria de biodiversidade e conhecimentos
tradicionais associados.
Como se tem ciência, durante algum tempo, o Direito Penal foi tratado de forma
fragmentada, separando-se dogmática, criminologia e política criminal. Esta proposição
metodológica foi fruto, principalmente, do pensamento positivista. No tocante à dogmática,
como esclarece Luiz Fernando Coelho, o enfoque é o do “[...] saber construído a partir das
normas jurídicas e que não vai além dessas normas”.
149
O mesmo autor, prosseguindo em sua
tentativa de delimitar o objeto de investigação da dogmática, faz outra constatação de
fundamental importância, que merece a devida transcrição:
[...] os fatores de caráter sociológico, econômico, político, ideológico,
religioso ou filosófico são em geral excluídos do objeto da dogmática
jurídica, ou seja, entende-se que a pesquisa de tais aspectos, ainda que
147
ZAFFARONI, Eugenio Raúl et al. Direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 73, v. 1.
148
Id.; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 2. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1999. p. 78.
149
COELHO, Luiz Fernando. Teoria crítica do direito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 175.
configurem conteúdo das normas, pertence a outros ramos do saber jurídico,
as chamadas ciências jurídicas lato sensu, e deve ser excluída da
dogmática.
150
A dogmática, portanto, apresenta um campo de investigação bastante reduzido, pois
não toma em consideração fatores extra-jurídicos para a construção do saber, sendo suficiente
o estudo da norma, o que, à toda evidência, é uma abordagem limitada e frustrante para lidar
com a complexidade representada pela biodiversidade e pelos conhecimentos tradicionais
associados,bem como o tema relacionado que é a biopirataria.
Zaffaroni e Pierangeli, entretanto, lembram que o método mais aceito, na atualidade, é
o dogmático, que “consiste na análise da letra do texto, em sua decomposição analítica em
elementos (unidades e dogmas) e na reconstrução destes elementos em forma coerente, tudo o
que produz como resultado uma construção ou teoria.”
151
Os autores citados recordam, ainda, que o termo “dogmática” no Direito Penal seria
uma remissão ao método desenvolvido por Ihering para o direito privado, segundo o qual o
intérprete, uma vez decompostos os elementos da norma, deve respeitá-los como dogmas, ou
seja, “o intérprete não pode alterar o conteúdo da lei”.
152
A visão dogmática, contudo, e em princípio, inevitavelmente despreza ou acaba por
desprezar a multidimensionalidade do fenômeno em matéria de biodiversidade e
conhecimentos tradicionais associados, especialmente naqueles casos em que se pretende
discutir a legitimidade da intervenção penal.
Com isso se poderia pontuar que uma coisa é a visão dogmática voltada à aplicação da
norma penal incriminadora. Uma postura dogmática, neste caso, vai de encontro ao princípio
da legalidade e garante ao acusado maior precisão interpretativa e segurança na aplicação da
norma. Outra situação, no entanto, é o estudo da Teoria do Direito Penal, que não pode se
contentar com a dogmática
Com Von Liszt houve uma tentativa de quebra do paradigma tradicional assentado na
dogmática, propondo-se, então, uma abordagem da ciência penal de forma totalizadora,
153
ou
150
COELHO, Luiz Fernando. Teoria crítica do direito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 175.
151
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, Jo Henrique. Manual de direito penal brasileiro: parte
geral. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 164.
152
Id. Ibid., p. 165.
153
Em nota do tradutor do Tratado de Direito Penal de Von Liszt, consta a seguinte observação: Eis como o
autor se pronuncia[sic] a este respeito na edição do seu tratado em um trecho que não foi reproduzido na
edição. ‘Só pela união e mútua influência do Direito Penal e da Política Criminal se completa as idéias da
ciência do Direito Penal (das sciences pénales, como dizem os franceses). Criá-las, desenvol-las e transmiti-
las são a missão do criminalista, não são missão do médico, do sociólogo, do estatístico. Desde que não atue o
pensamento de que o Direito Penal e a Política Criminal são dos ramos do mesmo tronco, duas partes do
mesmo todo, que se tocam, se cruzam e se frutificam e que, sem esta relação de tua dependência, se
seja, da união e mútua influência do Direito Penal e da política criminal.
Von Liszt defendeu, do ponto de vista teórico, uma ciência global do Direito Penal
que compreenderia a dogmática, a criminologia e a política criminal. Figueiredo Dias,
entretanto, faz notar com precisão, que no pensamento de Von Liszt a autonomia das ciências
penais era apenas relativa, pois qualquer uma das três vertentes poderia ser o melhor caminho
para a aplicação do Direito Penal.
154
Quanto à política criminal, a sua finalidade era apontar os rumos adequados para a
produção legislativa, mas não chegava ao ponto de influir diretamente no direito posto ou na
sua aplicação.
A proposta de Von Liszt, ao longo do século XX, foi alvo de críticas, mas como
destaca Figueiredo Dias, o importante é que a idéia central de uma ciência conjunta
sobreviveu e é ainda uma das principais discussões teóricas, que o épacífico o estatuto
que dentro dela deveria caber a cada uma das três ciências que a compõem, nem tão-pouco a
hierarquia e o modo como elas devem relacionar-se entre si”.
155
[grifos do autor]
Figueiredo Dias mostra que o dito estatuto das ciências penais sofreu uma evolução
até os dias atuais, seguindo os modelos de Estados de Direito que predominaram de acordo
com os diversos momentos históricos.
156
No caso do Estado de direito formal ou liberal-individualista, a política criminal tinha
pouco espaço. Como pondera Figueiredo Dias:
Para a política criminal restava a função de, baseada nos conhecimentos e
na análise da realidade criminal, naturalísitica e empírica baseada, numa
palavra, na criminologia tal como ela era então concebida – dirigir ao
legislador recomendações e propor-lhe directivas em tema de reforma
penal.
157
[grifos do autor]
Com o Estado social, nova mudança ocorreu nas relações de força dentro do Estado e,
superando o reinado absoluto do princípio da legalidade, no qual a dogmática naturalmente
possuía um status elevado, surgiu a preocupação social, que de certa forma garantiu à política
desnaturam, é inevitável a decadência do Direito Penal. [...]’”. (LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal.
Tradução José Higino Duarte Pereira. Atual. Ricardo Rodrigues Gama. Campinas: Russell, 2003. p. 147, t. 1.).
154
“Mas ciências só ‘relativamente’ autônomas:: visando por esta via encarecer sobretudo a autonomia da
política criminal e da criminologia perante o estudo estritamente jurídico do crime e o seu tratamento
‘dogmático’ e ‘sistemático’, o modelo da ‘ciência conjunta’ tinha como ponto essencial dar a compreender que
qualquer uma das três vertente seria em último termo relevante para a tarefa da aplicação do direito penal e,
por si, para a tarefa sócio-política de controle do fenômeno do crime”. (DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito
penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime. Lisboa: Coimbra, 2004, Tomo 1, p. 19).
155
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra, 2004. p. 20, t. 1.
156
Id. Ibid., p. 20.
157
Id. Ibid., p. 22.
criminal e à criminologia uma nova posição.
158
Figueiredo Dias assevera que nesse novo
contexto: “Não se estranhará que, desta perspectiva, a política criminal e a criminologia não
somente tenham se autonomizado completamente do direito penal e da sua dogmática, mas
verdadeiramente lhe tenham virado as costas”.
159
Feitas estas considerações preliminares, percebe-se que o rompimento com o
paradigma anterior foi traumático e decisivo para se estabelecer um choque entre a política
criminal e a dogmática, posto que não se compreendia como a política criminal não era mais
uma ciência auxiliar da dogmática e o Direito Penal, por sua vez, o aceitava a sua nova
condição de não ser mais o único meio de controle social.
160
Esse conflito gerou uma certa
esquizofrenia no Direito Penal, que continuou a ofuscar o papel e a importância da política
criminal, segundo a perspectiva do jurista português.
Chega-se, então, ao momento contemporâneo, que Figueiredo Dias chama de Estado
de direito material. Nessa fase, uma verdadeira mudança de abordagem e propõe-se a
alteração radical dos papéis de cada uma das três ciências, bem como o relacionamento entre
elas, ou seja, o estatuto, na dicção do autor. Para se ter uma correta dimensão dessa nova
forma de abordagem, cabe transcrever a seguinte passagem:
No contexto deste Estado de Direito material a função e a tarefa da
dogmática jurídico-penal transformam-se profundamente. O jurista deixa
de ser considerado um simples fazedor de silogismos, que se limita a deduzir
do texto da lei as soluções dos concretos problemas jurídicos da vida, para se
tornar em alguém sobre quem recai a indeclinável responsabilidade de
procurar e encontrar se bem que do modo jurídico-formalmente válido a
solução mais justa para cada um daqueles problemas.
161
[grifos do autor]
Essa mudança no pensar interferiu sensivelmente na função que passou a ser exercida
pela política criminal, visto que para se alcançar a solução mais justa o caminho trilhado
deixou de ser apenas o estritamente normativo. É preciso, agora, buscar o verdadeiro
conteúdo desta norma que se encontra limitado previamente por uma estrutura ontológica.
162
Por isso, Figueiredo Dias considera que a norma e a dogmática não retiram “o seu conteúdo
de sentido da valoração do legislador ou do aplicador”.
163
Esse conteúdo de sentido da
158
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra, 2004. p. 22, t. 1.
159
Id. Ibid., p. 23.
160
Id. Ibid., p. 24.
161
Id. Ibid., p. 26.
162
Id. Ibid., p. 26.
163
Id. Ibid., p. 27.
valoração é previamente dado pelos “princípios e estruturas de desenvolvimento ônticos”.
164
Assim sendo, o ponto nevrálgico esta na constatação de que não havendo mais um
contentamento com a norma em si mesmo, passa-se a questionar as escolhas, ou seja, as
valorações, que o feitas pelo legislador. Figueiredo Dias esclarece, ainda, que a dogmática
passa a sofrer uma “penetração axiológica do problema jurídico-penal”,
165
que deve levar em
consideração as “valorações político-criminais imanentes ao sistema”.
166
Por outra parte, na ciência penal da atualidade, a política criminal legitimidade à
intervenção penal, que se justificará apenas para a proteção de bens jurídicos contemplados
expressa ou implicitamente na Constituição e segundo critérios claros e dentro de limites
previamente estabelecidos.
Figueiredo Dias chega a afirmar que os conceitos básicos da dogmática, mais do que
“penetrados” ou “influenciados” por considerações político-criminais, devem ser
determinados e cunhados a partir de proposições político-criminais e da função que por
estas lhes é assinalada no sistema”.
167
[grifos do autor]
A norma penal para ter validade, portanto, passa a supor a observância às proposições
político-criminais, que limitam o poder de punição do Estado. Assim, no Estado de direito
material, de acordo com Figueiredo Dias, existe uma unidade funcional entre a política
criminal e a dogmática jurídico-penal.”
168
[grifos do autor]
Dessa maneira, a nova ciência penal amplia a visão Lisztiana, conferindo à política
criminal transcendência em face da própria dogmática.
169
Neste diapasão, não é por outra
razão que Luiz Flávio Gomes, se referindo a criminologia, a política criminal e a dogmática,
nesta ordem, inclui nesta nova ciência penal total o processo penal e a execução:
As três ciências citadas constituem três momentos do fenômeno criminal:
seu estudo empírico, as medidas de combate e o estudo e sistematização das
normas vigentes. Esses três momentos se completam com dois outros: o
processual e o execucional. A ciência penal, quando enfocada de modo
totalizador (Gesamte Strafrechtswissenschaft), significa, assim, na
atualidade, estudar cinco segmentos, que se complementam: o empírico, o
político-criminal, o penal, o processual penal (ou jurisdicional) e o
execucional.
170
164
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra, 2004. p. 27, t. 1.
165
Id. Ibid., p. 27.
166
Id. Ibid., p. 27.
167
Id. Ibid., p. 32.
168
Id. Ibid., p. 33.
169
Id. Ibid., p. 32.
170
GOMES, Luiz Flávio. Direito penal: parte geral. 2ª ed. São Paulo; Revista dos Tribunais, 2004. p. 53, v. 1.
Figueiredo Dias, a seu turno, refletindo acerca da política criminal em um Estado de
direito democrático e social, afiança que a sua finalidade é definir “as fronteiras da
punibilidade”.
171
O autor argumenta que:
[...] a política criminal surge como uma ciência transpositiva,
transdisciplinar, transdogmática e trans-sistemática face a um qualquer
direito penal positivo. A sua função última consiste em servir de padrão
crítico tanto do direito constituído, como do direito constituendo, dos seus
limites e da sua legitimação. Neste sentido se deve compreender a
afirmação dos limites da punibilidade e constitui, deste modo, a pedra
angular de todo o discurso legal-social da
criminalização/descriminalização.
172
Zaffaroni também se refere a esse “potencial crítico”
173
da política criminal, valendo
frisar que uma reflexão mais profunda da ciência penal na s-modernidade, além de renovar
a proposta de uma visão conjunta e global da política criminal, criminologia e dogmática,
deve caminhar na direção de um pensamento complexo que busque a “unidade da ciência”.
174
Desse modo, para a compreensão da hipótese apresentada, que sustenta a criminalização da
biopirataria, se verá que as vertentes tradicionais da ciência penal devem ser unidas, sofrendo
interações e interferências entre si e com todos os saberes, otimizando-se, assim, a capacidade
de integração e articulação dos conhecimentos.
Nesse esteira de pensamento, Paulo Roney, ao tecer considerações sobre o pensamento
jurídico complexo, observa que: “A fragmentação leva à decomposição, à desestruturação,
perdendo-se a noção de unidade. O modelo analítico prioriza o atomismo, em detrimento do
holismo, que não reconhece as fronteiras estabelecidas pela ciência”.
175
Logo, em uma ciência
penal moldada a partir de um pensamento complexo não se pode admitir monopólio de
qualquer ramo do saber ou definição de fronteiras para o conhecimento.
176
A estes efeitos, Edgar Morin se refere ao momento atual como a “era planetária”,
177
na
171
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra, 2004. p. 33, t. 1.
172
Id. Ibid., p. 35.
173
ZAFFARONI, Eugenio Raúl et al. Direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 274, v. 1.
174
A expressão foi empregada no sentido cunhado por Edgard Morin: Colocamos ao mesmo tempo a
possibilidade e a necessidade de uma unidade da ciência. Tal unidade é, evidentemente, impossível no quadro
atual onde miríades de dados se acumulam nos alvéolos disciplinares cada vez mais estreitos e fechados. Ela é
impossível no quadro onde grandes disciplinas parecem corresponder a essências e a matérias heterogêneas: o
físico, o biológico, o antropológico. Mas ela é concebível no campo de uma physis generalizada”. (MORIN,
Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2006. p. 50)
175
FAGÚNDEZ, Paulo Roney Ávila. O direito e a hipercomplexidade. São Paulo: LTr., 2003. p. 24.
176
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2006,
p. 51.
177
Id. Educação na era planetária. Disponível em
<http://www.universodoconhecimento.com.br/edgardmorin.php>. Acesso em: 30 mai 2007.
qual cada vez mais as pessoas são chamadas a enfrentar os desafios da complexidade. Assim,
se a sociedade é complexa, e não é difícil se chegar a essa constatação, que se torna mais
evidente a cada momento, o paradigma cartesiano, que atua dentro de uma lógica racional,
impondo a fragmentação do conhecimento, não tem mais serventia para a compreensão da
realidade de uma “era planetária”, em que a interação entre diversos fatores, sejam eles
econômicos, sociais, culturais, políticos, ecológicos, espirituais, éticos, entre outros, é o
elemento característico dessa nova estrutura complexa, que demanda a interação dos saberes,
ou seja, que persegue conhecimentos inter e transdiciplinares.
Assim sendo, o que é complexo é o que é tecido junto. Logo, transportando-se este
pensar complexo para o campo da ciência penal, é inevitável que para se elaborar uma nova
noção de ciência penal total, que possa servir para resolver os problemas complexos, de uma
sociedade complexa, deve-se abandonar o reducionismo, que impede o conhecimento
complexo e toma o fenômeno apenas de forma fragmentada, sem se conhecer a realidade
plena.
Sem um pensamento complexo, não será possível relacionar os diversos aspectos do
problema, que, no caso em questão, se trata da biodiversidade e dos conhecimentos
tradicionais associados através da criminalização da biopirataria. Não se compreenderá,
portanto, o que Edgar Morin chama de o “princípio do holograma”,
178
pois a exemplo do que
ocorre em um holograma, uma pequena parte do objeto contém a totalidade do que está
representado. Em outras palavras, se o for por uma visão que aceite a complexidade, não
será possível alcançar a realidade plena do objeto/sujeito.
Desse modo, ainda que as alternativas clássicas não fiquem totalmente afastadas,
segundo Morin elas não são mais a única e nem a última palavra.
179
Como ficou registrado no
início deste capítulo, aceitar a proposta de criminalização, per si, como quem desce o rio em
uma correnteza, é abordar a questão por meio de um paradigma simplificador. Morin
argumenta que “não há nada mais fácil do que explicar uma coisa difícil a partir de premissas
simples admitidas ao mesmo tempo pelo locutor e pelo ouvinte.”
180
Diante dessas considerações, conclui-se que aquele enfoque metodológico fundado
eminentemente no dogmatismo e na visão fragmentada do conhecimento deve ser superado
para que se possa construir uma proposta voltada para o acolhimento de uma teoria da ciência
penal globalizante, que leve em consideração a existência de um mundo complexo.
178
MORIN, Edgard. Educação na era planetária. Disponível em:
<http://www.universodoconhecimento.com.br/edgardmorin.php>. Acesso em: 30 mai 2007
179
Id. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2006. p. 54.
180
Id. Ibid., p. 56.
Não se pretende, assim, tratar o problema da criminalização da biopirataria a partir de
uma única realidade. A ciência penal total deve ser inter e transdisciplinar. Não é mais a
criminologia, a política criminal e a dogmática, consideradas em um mesmo nível, mas a
dialética e a conjunção entre essas disciplinas e outras áreas do conhecimento que indicam
uma nova proposta de abordagem. Nesse sentido, Morin critica o pensamento simplificador e
compartimentalizado, nos seguintes termos:
[...] o pensamento simplificador se baseia no predomínio de dois tipos de
operações gicas: disjunção e redução, ambas brutais e mutiladoras, então
os princípios do pensamento complexo serão necessariamente princípios de
disjunção, de conjunção e de implicação.
181
Dessa forma, convém salientar que as primeiras propostas totalizadoras da ciência
penal, que foram abordadas a partir do pensamento Lisztiano, mais se aproximavam da
multidisciplinariedade, já que se tratava do enfoque de uma questão sob os diversos ângulos
de várias disciplinas. Essa idéia, entretanto, pressupunha a preponderância de um dos ramos
disciplinares sobre os outros. O estudo de um determinado ramo do saber apenas se auxiliava
das visões de outras disciplinas.
Por outra parte, na interdisciplinariedade há um diálogo entre as disciplinas, não
existindo mais, neste caso, a preeminência de qualquer disciplina sobre a outra. na
transdisciplinaridade, que tem como principal instrumento a própria interdisciplinariedade, o
que se propõe é uma visão totalmente aberta e holística para se compreender o problema. Há,
portanto, a transposição das fronteiras do conhecimento para se alcançar uma visão integral e
abrangente. Para Edgard Morin “transdisciplinar significa hoje indisciplinar”,
182
ou seja,
acabar com o olhar compartimentalizado.
Uma vez compreendida a necessidade de uma ciência penal norteada por uma visão
globalizadora, convém definir, para um modelo de Estado democrático de direito, quais as
interferências e limitações que a política criminal impõe à criminalização de condutas,
considerando-se a hipótese de criminalização da biopirataria.
2.3 O sistema penal garantista e a teoria do bem jurídico como referenciais teóricos para
a discussão sobre a criminalização da biopirataria
Já foi dito alhures que o Direito Penal serve para justificar a intervenção penal e que as
181
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2006.
p. 77.
182
Id. Ibid., p. 51.
proposições político-criminais indicam os caminhos para a criminalização ou
descriminalização de condutas. Isto tudo, porém, ocorre segundo os fundamentos jurídicos-
políticos da concepção de Estado”.
183
A pergunta que se coloca, portanto, é: Qual é a concepção do Estado brasileiro?
Primeiramente, como sustenta Canotilho, “o Estado se concebe hoje como Estado
constitucional”.
184
[grifo do autor] Logo, o Estado brasileiro também é um estado fundado e
guiado por uma Constituição. É essa Constituição, por mais pleonástica que essa afirmação
possa parecer, que constitui o Estado e também define o seu modelo. Em segundo lugar,
salienta Canotilho que esse Estado constitucional deve ser também um Estado democrático,
ou seja, legitimado pela vontade popular.
185
Nesse ponto, Canotilho faz uma observação que
se reputa de extrema importância. Para o autor, o Estado constitucional moderno não se limita
apenas a ser um Estado de direito: “Ele tem que estruturar-se como Estado de direito
democrático, isto é, como uma ordem de domínio legitimada pelo povo”.
186
[grifo do autor]
Conclui-se, portanto, de modo ainda preliminar, que o modelo de Estado é de um
Estado constitucional democrático.
187
Essa afirmação, por si só, e ainda que se apresente por
enquanto bastante genérica, afasta qualquer argumentação no sentido de se aceitar um
modelo de Estado autoritário.
Ferrajoli, embora se reportando ao ordenamento constitucional italiano, faz um
comento que é perfeitamente válido ao modelo de Estado brasileiro, valendo transcrevê-lo
para não se perder a exatidão da idéia do autor:
A estrutura do nosso ordenamento é de um Estado de direito” em sentido
estrito, onde o exercício de qualquer poder – não apenas do Poder Judiciário
e do Executivo e administrativo mas também do Poder Legislativo está
subordinado aos vínculos de legalidade não formais mais também
substanciais. O legislador penal não tem o poder de dispor ou predispor
proibições, penas e juízos “quando” e “como” quiser, mas apenas na
presença das condições estabelecidas como necessárias pelos princípios
garantistas enunciados na Constituição.
188
[grifos do autor]
Assim, não resta dúvida que para o modelo de Estado brasileiro, cuja Constituição
apresenta inclusive um extenso rol de direitos fundamentais, o sistema penal que melhor se
183
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 34, t. 1.
184
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra:
Almedina, 2003. p. 92.
185
Id. Ibid., p. 93.
186
Id. Ibid., p. 98.
187
Id. Ibid., p. 100.
188
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 560.
harmoniza é o garantista. Fica registrada, entretanto, a advertência de Ferrajoli, segundo a
qual uma coisa é o modelo constitucional e outra é o efetivo funcionamento do sistema penal
de acordo com esse modelo.
189
Daí porque Ferrajoli fala em graus de garantismo.
190
O grau de
garantismo do sistema penal desenhado pela Constituição brasileira é dos mais avançados,
porém a sua prática efetiva deixa muito a desejar em razão das profundas desigualdades
sócio-econômicas.
A sintonia entre o modelo constitucional e o funcionamento do sistema penal em boa
parte depende do conhecimento teórico das bases do garantismo. Nesse sentido, Ferrajoli
esclarece que: “Um sistema penal é justificado se, e somente se, minimiza a violência
arbitrária na sociedade. E atinge tal objetivo à medida que satisfaz as garantias penais e
processuais do direito penal mínimo”.
191
Conhecer, portanto, a teoria do garantismo penal é
um passo fundamental para a justificação da intervenção penal. A legitimação do Direito
Penal dependerá, portanto, do modelo normativo escolhido e do seu efetivo funcionamento,
daí porque Ferrajoli afirmar que: “O problema da justificação, portanto, se confunde, em larga
escala, com o problema do garantismo”.
192
[grifos do autor]
Por esta razão, considerando que o modelo normativo a ser escolhido dependerá do
estudo teórico ou de uma crítica ao garantismo penal, convém examinar esta corrente de
pensamento do Direito Penal, cujo principal sistematizador é Luigi Ferrajoli.
Assim sendo, Ferrajoli na obra “Direito e razão”, após assumir que o modelo penal
garantista é “um modelo-limite, apenas tendencialmente e jamais perfeitamente
satisfatível”,
193
desenha o sistema garantista, a partir da enunciação dos dez axiomas, a seguir
elencados:
A1 Nulla poena sine crimine
A2 Nullum crimen sine lege
A3 Nulla lex (poenalis) sine necessitate
A4 Nulla necessitas sine injuria
A5 Nulla injuria sine actione;
A6 Nulla actio sine culpa
A7 Nulla culpa sine judicio
A8 Nulla judicium sine accusatione
A9 Nulla accusatio sine probatione
A10 Nulla probatio sine difensione.
194
189
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 684.
190
Id. Ibid., p. 78-79 e 684.
191
Id. Ibid., p. 276.
192
Id. Ibid., p. 169.
193
Id. Ibid., p. 74.
194
Id. Ibid., p. 74-75.
Segundo Ferrajoli, esses “axiomas ou princípios axiológicos fundamentais
correspondem às garantias penais e processuais do moderno Estado de direito e estão
incorporados na maioria dos ordenamentos jurídicos.
195
Assim, equivalendo às máximas
latinas, Ferrajoli elenca as garantias penais e processuais. Aquelas nos axiomas A1-A6 e estas
nos axiomas A7-A10, conforme seqüência abaixo, que guarda perfeita correspondência com a
ordem de apresentação dos axiomas anteriormente exposta:
1) princípio da retributividade ou da conseqüencialidade da pena em relação
ao delito; 2) princípio da legalidade, no sentido lato ou no sentido estrito; 3)
princípio da necessidade ou da economia do direito penal; 4) princípio da
lesividade ou da ofensividade do evento; 5) princípio da materialidade ou da
exterioridade da ão; 6) princípio da culpabilidade ou da responsabilidade
pessoal; 7) princípio da jurisdicionalidade, também no sentido lato ou no
sentido estrito; 8) princípio acusatório ou da separação entre juiz e acusação;
9) princípio do ônus da prova ou da verificação; 10) princípio do
contraditório ou da defesa, ou da falseabilidade.
196
[grifos do autor]
Como assinala Ferrajoli, esses princípios atuam como limites contra “o arbítrio ou erro
penal”.
197
Desse modo, tomando-se por base o modelo do sistema penal garantista, que seria o
modelo ideal, é possível examinar, em concreto, qualquer sistema punitivo, apontando o grau
de garantismo do sistema analisado, conforme se faça a subtração de axiomas do sistema
garantista modelo.
198
Ferrajoli faz esse exercício, apresentando uma tipologia de nove sistemas, a partir da
retirada de axiomas do sistema garantista, a saber: 1) sistema S1 sem prova e defesa; 2)
sistema S2 sem acusação separada; 3) sistema S3 sem culpabilidade; 4) sistema S4 sem
ação; 5) sistema S5 sem ofensa; 6) sistema S6 sem necessidade; 7) sistema S7 sem
delito; 8) sistema S8 – sem juízo; 9) sistema S9 – sem lei.
199
Os sistemas S1 e S2 equivalem a um Processo Penal autoritário. Os sistemas S3, S4,
S5 e S6 correspondem a um Direito Penal autoritário e os sistemas S7, S8 e S9 são descritos
por Ferrajoli como sistemas punitivos irracionais.
200
Dos sistemas punitivos teorizados por Ferrajoli, interessa à presente pesquisa o
sistema batizado de “sem necessidade S6”. Como ficou estabelecido pelo autor, o sistema sem
necessidade é um sistema punitivo de Direito Penal autoritário e ocorre quando há a supressão
195
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 75.
196
Id. Ibid., p. 75.
197
Id. Ibid., p. 83.
198
Id. Ibid., p. 78.
199
Id. Ibid., p. 78.
200
Id. Ibid., p. 79-82.
do axioma A3, ou seja, o princípio da necessidade ou economia do Direito Penal.
201
O princípio da necessidade da pena, segundo Ferrajoli, é um critério de política
criminal e guarda estreita correlação como o Direito Penal mínimo. Por isso, a criminalização
de condutas deve levar em consideração a estrita necessidade da pena, cabendo ao Direito
Penal intervir o mínimo possível e naqueles casos em que a conduta lesiva produza efeitos
que sejam mais graves do que aqueles que possam ser gerados pela atuação do Direito
Penal.
202
Seguindo a linha de argumentação proposta pelo garantismo, cabe frisar que ao se
estabelecer o princípio da necessidade da pena como um pressuposto para a incriminação de
condutas, em certa medida se está tomando a teoria do bem jurídico como elemento limitativo
do Direito Penal, cuja função primordial é a proteção de bens jurídicos. Comentando o que
chama de critério da necessidade de tutela penal, Figueiredo Dias sustenta que “não pode
haver criminalização onde se não divise o propósito de tutela de um bem jurídico-penal”.
203
Hassemer também defende a posição de que: A lei penal protege bens jurídicos e,
sem esse seu conhecimento, não poderíamos mais, atualmente, viver em comunidade, em
conformidade com o nosso entendimento social [...]”.
204
Roxin, outro adepto da teoria de que o Direito Penal tem a função de proteger bens
jurídicos, sustenta que os bens jurídicos são:
[...] circunstâncias reais dadas ou finalidades necessárias para uma vida
segura e livre, que garanta todos os direitos humanos e civis de cada um na
sociedade ou para o funcionamento de um sistema estatal que se baseia
nestes objetivos.
205
Para o se delongar nessa reprodução do pensamento de autores adeptos da teoria
mencionada e sem a preocupação, por óbvio, de ser exaustivo, cita-se, ainda, pela relevância
dos trabalhos apresentados em nível nacional, Luiz Regis Prado
206
, Alice Bianchini
207
e Luiz
201
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 81.
202
Id. Ibid., p. 373.
203
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004, Tomo I, p. 120.
204
HASSEMER, Winfried. Direito penal libertário. Tradução Regina Greve. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p.
89.
205
ROXIN, Claus. A proteção de bens jurídicos como função de direito penal. Tradução André Luís
Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 18-19.
206
PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e constituição. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
207
BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002.
Flávio Gomes
208
, que igualmente perfilham a corrente segundo a qual o Direito Penal tem a
missão de proteger bens jurídicos.
209
Como se pode notar no desenvolvimento da argumentação, a pesquisa irá analisar se a
intervenção penal para se enfrentar a biopirataria é uma proposta legítima, ainda que se tome
o garantismo e a teoria do bem jurídicos como referenciais teóricos.
Em suma, aceita-se a premissa de que o Direito Penal deve intervir o mínimo
possível e que a tutela penal se justifica quando a necessidade de se proteger bens
jurídicos de elevado valor. A partir daí, cabe responder quais os bens que deverão ser
protegidos e quais os limites para a intervenção penal na busca da tutela desses bens.
Visando responder à primeira indagação, caberia uma reflexão inicial de que a teoria
do bem jurídico, embora largamente aceita e adotada inclusive, acolhida nesta pesquisa
como marco teórico para a discussão sobre a criminalização da biopirataria apresenta, pelo
menos, um ponto de debilidade, que é a delimitação dos bens jurídicos que merecem a tutela
penal.
Luiz Flávio Gomes ressalta que “apesar de todos os últimos estudos e tentativas, não
reúne (ainda?) capacidade suficiente para oferecer um catálogo fechado dos bens suscetíveis
de tutela penal”.
210
Por isso, o grande exercício que deve ser feito, ao que parece, é definir limites precisos
para a intervenção penal. Daí porque Luiz Flávio Gomes se reporta à teoria do bem jurídico
como um limite negativo da intervenção penal
211
e porque se chamou em auxílio também o
garantismo como teoria limitadora da violência ou arbítrio do Direito Penal.
208
GOMES, Luiz Flávio. Norma e bem jurídico no direito penal: normas penais primárias e secundárias,
normas valorativas e imperativas, introdução ao princípio da ofensividade, lineamentos da teoria
constitucional do fato punível, teoria do bem jurídico-penal, o bem jurídico protegido nas falsidades
documentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
209
o se pretende discutir neste trabalho se a teoria do bem jurídico é a melhor formulação teórica como base
epistemológica para se sustentar a afirmação de que o direito penal tem por finalidade essencial a preservação
de bens jurídicos. Assim sendo, passa-se ao largo da discussão por não se conter nos limites deste trabalho. No
entanto, para situar o leitor e fornecer um mínimo de conhecimento sobre as discussões em torno desta
questão, faz-se uma breve transcrição de Claus Roxin, que aborda o tema indicando alguns posicionamentos
contrários: Hirsch afirma que ‘não existe’ um conceito de bem jurídico predeterminado para o legislador. ‘O
conceito de bem jurídico não é um princípio idôneo para limitar o Direito Penal’. Stratenwerth remete às
múltiplas e variadas definições do bem jurídico na literatura para logo afirmar que uma definição material
universal de bem jurídico’ equivaleria a ‘deixar o círculo quadrado’, isto é, seria impossível. Ademais, ele
sustenta que o motivo para a elaboração de um tipo penal não é a proteção de bens jurídicos, mas a
inconveniência de um comportamento. [...] Finalmente, para Jakobs observa-se, desde um princípio, que a
função do Direito penal é a confirmação da vigência da norma, e não a proteção de bens jurídicos. O fato
punível é a negação da norma pelo autor, e a pena tem como significado que ‘a afirmação do autor não é
determinante e que a norma segue vigendo inalteradamente’. [grifos do autor] (ROXIN, Claus. A proteção de
bens jurídicos como função de direito penal. Tradução André Luís Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 14-15)
210
GOMES, op. cit., p. 54.
211
Id. Ibid., p. 54.
Aponta-se, assim, para duas funções fundamentais da teoria do bem jurídico. Um
primeiro aspecto funcional é a natureza indicativa, pois é possível identificar quais os bens
que o merecedores de tutela penal. O autor citado observa que somente os bens existenciais
e que são indispensáveis para os seres humanos e para o desenvolvimento da própria
personalidade devem ser objeto de proteção.
212
O outro aspecto funcional decorrente da teoria do bem jurídico é o caráter negativo
que pode ser propagado a partir dessa construção teórica, pois é possível indicar, com certa
precisão, quais os bens que não merecem a tutela penal e cita, entre outros, “a moral, a ética, a
religião, a ideologia, os valores culturais como tais etc”.
213
Sempre objetivando melhor delimitar os bens jurídicos que deverão ficar sujeitos à
tutela penal, tem-se, para a maioria dos autores, que estão contemplados neste rol os bens
protegidos constitucionalmente. Nesse sentido, Luiz Flávio Gomes registra que:
Não é reduzido o grupo de doutrinadores que afirmam que a Constituição é o
‘referencial’ mais idôneo para que a teoria do bem jurídico venha a cumprir
uma função crítica e limitadora do ius puniendi.
214
Antes de se passar, portanto, à discussão de qual o bem jurídico que se pretende tutelar
no caso da criminalização da biopirataria, apenas para se deixar registrado o posicionamento,
esta pesquisa não é orientada por uma teoria constitucionalista pura, pois se segue a tendência
majoritária, como assinala Luiz Flávio Gomes, no sentido de que o bem jurídico em Direito
Penal tem que ter necessariamente relevância ou plasmação constitucional expressa”.
215
[grifos do autor]
Não pode haver, portanto, é uma incompatibilidade com os valores protegidos
constitucionalmente.
216
Esta discussão, contudo, no caso da biopirataria que visa proteger, em
última análise, o meio ambiente, perde um pouco o sentido, tendo em vista a expressa
previsão constitucional quanto à necessidade de tutela do meio ambiente, como se
demonstrará a seguir.
2.3.1 O bem jurídico tutelado em caso de criminalização da biopirataria
De uma forma geral, e ainda sem a preocupação nesse primeiro momento de se fazer
212
GOMES, Luiz Flávio. Norma e bem jurídico no direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.
55.
213
Id. Ibid., p. 55.
214
Id. Ibid., p. 87.
215
Id. Ibid., p. 96.
216
Id. Ibid., p. 96.
uma delimitação mais precisa do bem jurídico que deve ser protegido, caso se pretenda
criminalizar a biopirataria, é viável admitir que a intervenção penal, na hipótese proposta,
visaria a tutela do meio ambiente.
Este asserto, embora contenha uma generalização, remete imediatamente à
Constituição, onde se busca encontrar a previsão de tutela do bem jurídico meio ambiente,
como um valor relevante que mereça a intervenção penal como meio adequado e necessário à
sua proteção.
Quanto a este aspecto não muita dificuldade de se chegar à conclusão de que o
legislador constituinte elegeu o bem jurídico meio ambiente como um direito fundamental que
faz jus a uma proteção especial, inclusive penal.
Luiz Regis Prado salienta que em matéria de meio ambiente existe um mandato
expresso de criminalização:
Esta última inovação vem gizada no parágrafo 3º do artigo 225 como
determinação particular, em que se prevê explicitamente a cominação de
sanções penais e administrativas, conforma o caso, aos sujeitos (pessoas
físicas ou jurídicas) que eventualmente causem lesão ao meio ambiente.
217
[grifos do autor]
O art. 225, § , da Constituição da República,
218
não deixa a menor margem de
dúvida quando à opção do poder constituinte originário em conferir ao legislador
infraconstitucional uma extensa gama de mecanismos jurídicos que possam assegurar a defesa
e a preservação do meio ambiente para as gerações presentes e futuras, ainda que para se
alcançar esta finalidade se faça necessário a intervenção da tutela penal.
Luiz Regis Prado complementa salientando que todos os casos que o perigo ou lesão
recair sobre o bem jurídico meio ambiente devem ser tidos como penalmente relevantes”.
219
[grifo do autor]
É importante deixar assentado que a Constituição e a ordem internacional protegem o
meio ambiente de forma especial, orientando o legislador a construir um sólido arcabouço
jurídico de proteção, pois se busca um ambiente ecologicamente equilibrado e o
217
PRADO, Luiz Regis. Direito penal do ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação do território
e biossegurança (com análise da Lei 11.105/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 80.
218
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. KINOSHITA, F. (Org.) Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Brasília: OAB Editora, 2003. p.168.
[...] § 3. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas
físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
causados.
219
PRADO, op. cit., p. 80.
desenvolvimento sustentável.
Atualmente, o direito ao meio ambiente assume uma posição central e precedente na
defesa dos direitos humanos. Conservar o meio ambiente é um antecedente lógico necessário
à defesa dos direitos humanos, tanto que Edson de Carvalho faz notar que:
Do ponto de vista biológico, pode-se afirmar que existe relação umbilical
entre fruição dos direitos humanos e proteção ao meio ambiente,
principalmente em relação aos direitos à vida e à saúde. Nenhum direito
humano, a começar pelo direito à vida, pode ser exercido fora da plataforma
ecológica.
220
Assim, existe uma intrincada e complexa relação entre meio ambiente e direitos
humanos. Por isso, Juliana Santilli, comentando o art. 225 da Constituição, salienta que o
princípio da eqüidade intergeracional está devidamente contemplado no texto: “Pela primeira
vez são assegurados direitos a gerações que ainda o existem, e tais direitos restringem e
condicionam a utilização e o consumo dos recursos naturais pelas presentes gerações”.
221
Além disso, Edson de Carvalho sustenta, com razão, que os desastres ecológicos de
grandes proporções, atualmente divulgados de forma ampla pela imprensa, levam à criação de
uma consciência ecológica, que é cada vez mais óbvio à humanidade que o modelo de
desenvolvimento que vem sendo praticado podecomprometer de forma irreversível a vida
do ser humano na Terra.
222
Recentemente, inclusive, Lovelock declarou fatidicamente que o destino da Amazônia
provavelmente já estaria traçado em razão das mudanças climáticas e que entre 50 e 100 anos
a região poderá se tornar em uma fina camada desértica.
223
Odum e Barrett se referem a um paradoxo no desenvolvimento tecnológico,
ponderando que: “Quase todo e qualquer avanço tecnológico que pretende melhorar o bem-
estar e a prosperidade tem seu lado ruim e seu lado bom”.
224
Os autores ilustram essa
220
CARVALHO, Edson Ferreira de. Meio ambiente e direitos humanos. Curitiba: Juruá, 2005. p. 163.
221
SANTILLI, Juliana. Socioambientalismos e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e
cultural. São Paulo: Peirópolis, 2004. p. 50.
222
Dentre os acidentes ambientais de maiores proporções ocorridos, Edson de Carvalho elenca os seguintes: “os
de Seveso, onde morreram 193 pessoas; o de Minamata no Japão que matou centenas de pessoas; o de Bophal
na Índia, onde uma fábrica de pesticidas da multinacional Union Carbide liberou gases altamente tóxicos
ocasionando 2.660 mortes e danos em 30 a 40 mil pessoas; o da Sandoz na Suíça, que poluiu o rio Reno e
destruiu sua fauna e flora; o acidente com o petroleiro Exxon-Valdez que derramou 11 milhões de galões de
petróleo próximo à Costa do Alasca; o de Chernobyl que causou a morte de dezenas de pessoas e deixou
640.000 sob controle dico e 140.000 evacuadas”. (CARVALHO, Edson Ferreira de. Meio ambiente e
direitos humanos. Curitiba: Juruá, 2005. p. 143-144).
223
OTTOBONI, Júlio. Cientista diz que Amazônia tem morte decretada. Disponível em
http:<//noticias.terra.com.br/ciencia/interna/0,,OI1926890-EI8278,00.html>. Acesso em: 17 out 2007.
224
ODUM. Eugene P. BARRETT, Gary W. Fundamentos de Ecologia. Tradução Pégasus Sistemas e Soluções.
São Paulo: Thomson, 2007. p. 470.
proposição com o exemplo da Revolução Verde que, no seu lado bom, permitiu o aumento da
produção de alimentos com menos mão-de-obra e, no seu lado ruim, gerou poluição,
desenvolvimento de pragas resistentes aos inseticidas e desemprego na área rural.
225
Neste sentido, uma convicção, hoje, de que a Revolução Verde trouxe mais
problemas do que benefícios. Malgrado o aumento na produção de alimentos, a grande
maioria da população mundial continua faminta e poucos o os beneficiados dos progressos
tecnológicos. O excesso de inseticidas e fertilizantes locupleta as transnacionais e insere os
países em desenvolvimento no processo de exploração mundial, tornando-os dependentes dos
países desenvolvidos detentores da tecnologia.
Pat Mooney fazia a advertência de que: “Controlando-se as sementes, caminha-se
para o controle de todo o sistema de alimentos: as culturas que serão plantadas, os insumos
que serão usados e onde os produtos serão vendidos”.
226
Na mesma linha, Vandana Shiva censura a formação de monoculturas e as
conseqüências que podem advir do mau uso da biotecnologia como mecanismo de dominação
na relação entre Norte e Sul. Vandana Shiva alerta que há um mito de que a biotecnologia iria
dar início a uma nova era na agricultura, livrando-a dos agrotóxicos. Em verdade, esclarece, a
autora que:
[...] O foco predominante da pesquisa em engenharia genética não é safras
sem fertilizantes e sem pesticidas, e sim variedades resistentes e herbicidas.
[...] A resistência a herbicidas e pesticidas também vai aumentar a integração
sementes/produtos químicos e o controle de grandes empresas transnacionais
na agricultura.
227
Como se pode notar, é mais fácil criar uma nova variedade de semente, do que criar
um novo herbicida. Vandana Shiva estima que o custo de criar uma nova variedade vegetal
raramente chega aos US$ 2 milhões, enquanto o custo de um novo herbicida excede os US$
40 milhões”.
228
Some-se a isso, o risco ainda imprevisível de que essa estratégia de
engenharia genética para criar resistência a herbicidas, que estão destruindo espécies vegetais
úteis, também podem acabar criando superervas-daninhas”.
229
Diante do quadro descrito, é inevitável concluir que a proteção do bem ambiental
225
ODUM. Eugene P. BARRETT, Gary W. Fundamentos de Ecologia. Tradução Pégasus Sistemas e Soluções.
São Paulo: Thomson, 2007. p. 470.
226
MOONEY, Pat Roy. O escândalo das sementes: o domínio na produção de alimentos. Tradução Adilson D.
Paschoal. São Paulo: Nobel, 1987. p. 51.
227
SHIVA, Vandana. Monoculturas da mente: perspectivas da biodiversidade e da biotecnologia. Tradução
Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo: Gaia, 2003. p. 133-134.
228
Id. Ibid., p. 134.
229
Id. Ibid., p. 137.
apresenta uma dimensão difusa e está diretamente relacionada à defesa do meio ambiente
contra toda sorte de agressões que possam comprometer o equilíbrio ecológico.
Por essa razão, autores, como Márcia Moraes, que ao analisar o art. 225 da
Constituição, se posicionam de forma mais precisa, fixando como bem jurídico legitimado o
meio ambiente ecologicamente equilibrado.
230
Apesar de todas as observações que foram feitas, a noção de tutela do bem jurídico
meio ambiente é ainda uma idéia vaga e fluida, quando se toma como referencial a
biopirataria. Dessa forma, é preciso definir melhor os limites do bem jurídico que se
pretenderá tutelar para se justificar uma eventual intervenção penal no caso da biopirataria.
Parece óbvio afirmar que a tutela, ainda no caso da biopirataria, sempre irá recair
sobre o meio ambiente, mas acredita-se que o bem estará mais bem delimitado, no caso da
biopirataria, com a especificação de que a tutela visa proteger, essencialmente, a
biodiversidade ou os conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade. Em outros
termos, protege-se o patrimônio genético da biodiversidade e os conhecimentos que as
populações tradicionais adquiriram ao longo de muitos anos sobre a manipulação desse
patrimônio.
Assim, no caso da biopirataria, ainda que em última análise sempre se vise proteger o
meio ambiente ecologicamente equilibrado, a tutela incidiria mais precisamente sobre o
patrimônio genético da biodiversidade e/ou sobre os conhecimentos tradicionais associados à
biodiversidade, elementos que, evidentemente, integram o conceito bem ambiental em seu
aspecto amplo e difuso.
Não é por outra razão que na presente dissertação, visando essa discussão quanto à
necessidade de se buscar uma especificação ou precisão do bem que se pretende tutelar para
justificar a intervenção penal, procedeu-se, logo de início, a análise dos aspectos conceituais
da biodiversidade.
231
Assim sendo, como ficou assentado no Capítulo I, a biodiversidade
apresenta uma dimensão material e outra dimensão imaterial. A primeira corresponde à
variabilidade de espécies e a segunda representa os conhecimentos tradicionais, ou seja, os
saberes dos povos tradicionais acerca do uso da biodiversidade.
Na oportunidade, deixou-se consignado, também, o entendimento de Juliana Santilli,
230
MORAES, Márcia Elayne Berbich de. A (in) eficiência do direito penal moderno para a tutela do meio
ambiente na sociedade de risco (Lei n. 9605/98). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 71. Frise-se que
autora em sua obra se posiciona no sentido de que a previsão constitucional quanto à criminalização de
condutas que atentem contra o meio ambiente se deveu mais a pressões externas do que à uma vontade do
legislador constituinte originário e, ainda, salienta que normas penais que visem garantir um ambiente
ecologicamente equilibrado assumem forte caráter político, simbólico e promocional, se mostrando cética
quanto ao abandono de um direito penal clássico. Vide, especialmente, p. 193-198 da obra citada.
231
Vide Capítulo I, Seção 1.1, p. 14 et seq.
segundo o qual os componentes tangíveis e intangíveis da biodiversidade estão intimamente
ligados e que a criação de um sistema jurídico que vise a proteção desses bens não pode
dissociá-los.
232
Esses conceitos, obviamente, foram aprofundados no Capítulo I e por isso o haverá
necessidade de serem novamente esquadrinhados neste momento. Uma conclusão, porém,
extraída naquela fase inicial, se apresenta como fundamental para que se possa avançar
nesta pesquisa. Naquela ocasião, analisando-se a Medida Provisória 2.186-16/2001, o que
se verificou foi que a regulamentação recai estatal sobre o acesso ao patrimônio genético da
biodiversidade e sobre o acesso aos conhecimentos tradicionais associados a esse patrimônio
genético.
Desenvolvendo um pouco mais esse raciocínio, pondera-se que a norma, em verdade,
regulamenta a informação relativa à biodiversidade, pois o patrimônio genético não é um
conjunto de bens materiais, mas sim, um conjunto de informações.
Por outro lado, também no Capítulo I foi visto que por biopirataria se entende a
apropriação dos recursos genéticos da biodiversidade de um país ou dos conhecimentos
tradicionais associados à biodiversidade, sem que exista autorização do país detentor desses
recursos ou da população detentora do conhecimento tradicional.
Dessa forma, fica patente que ao se pretender criminalizar a biopirataria o tipo
incriminador deverá tutelar o bem jurídico biodiversidade. Isto significa que a conduta que se
objetiva coibir é a apropriação indevida das riquezas naturais que integram o patrimônio do
País e também os conhecimentos dos povos tradicionais referentes à biodiversidade. Abarca-
se, logicamente, todo o conjunto de informações referentes à biodiversidade, ou seja, o
patrimônio genético e os conhecimentos tradicionais que recaem sobre este patrimônio
genético.
Nessa esteira, uma norma penal para criminalizar a biopirataria visaria punir o acesso
à biodiversidade ou ao conhecimento tradicional associado fora dos casos autorizados por
norma regulamentar. Logo, o que se objetiva é punir a apropriação da biodiversidade sem o
consentimento de quem de direito, que no caso é o próprio Estado. Neste sentido, só haveria
biopirataria quando o acesso às informações sobre o patrimônio genético da biodiversidade se
der de forma não autorizada, porque, neste caso, inviabilizada estaria a repartição dos
benefícios pela exploração econômica dessa riqueza.
232
SANTILLI, Juliana. Socioambientalismos e novos direitos: proteção jurídica à diversidade biológica e
cultural. São Paulo: Peirópolis, 2004. p. 185.
2.3.2 As bases para a (des)legitimação da intervenção penal e as limitações da política
criminal à intervenção penal na contemporaneidade
Uma vez definido o que se pretende tutelar através da intervenção penal no caso da
biopirataria, já é possível avançar no sentido de se tentar responder uma indagação muito
importante para esta pesquisa, qual seja: deve-se, realmente, criminalizar a biopirataria?
Uma das vertentes que pode servir para iniciar esta análise é justamente a discussão
acerca do surgimento de um Direito Penal secundário. Figueiredo Dias explica este fenômeno
lembrando que o processo de expansão do campo de abrangência do Direito Penal tradicional
se deu justamente com a modificação do modelo de Estado, que evoluiu de suas matrizes
meramente liberais para um novo modelo de Estado social.
233
Nas suas palavras:
[...] o legislador foi se deixando seduzir pela idéias, perniciosa mais difícil
de evitar, de pôr o aparato das sanções criminais ao serviço dos mais
diversos fins de política social. E é o aparecimento, ao lado do direito penal
tradicional, de um abundante direito penal extravagante, acessório ou
secundário que porventura melhor ainda se qualificaria de direito penal
espacial [sic]
234
, não fosse a circunstância de tal designativo se encontrar já,
na nossa língua, dogmaticamente ocupado” direito este que é, em sentido
próprio, direito penal administrativo: no preciso sentido que sanciona, com
penas, a violação de ordenações da administração e se apresenta assim como
direito administrativo, senão segundo a competência, por certo segundo a
matéria.
235
[grifos do autor]
Como se sabe, o Direito Penal primário, cujas bases foram delineadas no Iluminismo,
pretende tutelar, direta ou indiretamente, os direitos, liberdades e garantias das pessoas”,
236
enquanto que o Direito Penal secundário ou extravagante, a seu turno, “se relaciona
essencialmente com a ordenação jurídico-constitucional relativa aos direitos sociais e à
organização econômica”.
237
[grifos do autor]
Assim, como bem esclarece Figueiredo Dias, a diferença fundamental está na tutela de
direitos individuais, na modalidade clássica, e na proteção de um interesse social ou
econômico, no Direito Penal secundário. Para o autor português, neste último caso, protege-se
233
DIAS, Jorge de Figueiredo. Para uma dogmática do direito penal secundário. Um contributo para a reforma
do direito penal econômico e social português. In: D’ÁVILA, Fábio Roberto; SOUZA, Paulo Vinicius
Sporleder. (Org.). Direito penal secundário: estudos sobre crimes econômicos, ambientais, informáticos e
outras questões.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 14-16.
234
Depreende-se da leitura do texto e da nota remissiva de rodano texto original que, em verdade, houve um
erro de grafia, sendo correto afirmar que o autor se referia a direito penal especial.
235
DIAS, op. cit., p. 16.
236
Id. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime. Lisboa: Coimbra Editora,
2004. p. 115, t. 1.
237
Id. Ibid., p. 115.
o ser humano na sua esfera de atuação social, “como membro da comunidade”.
238
Cabe depreender dessa nova acepção para o Direito Penal que agora a tutela o está
mais vocacionada exclusivamente para a preservação de bens de interesses individuais do ser
humano, enquanto indivíduo que vive em uma sociedade organizada. Surge neste novo
cenário, em constante modificação pela própria evolução do modelo de Estado e da ciência
ocidental, um Direito Penal que amplia os seus limites tradicionais da intervenção penal,
legitimando a preservação também de bens coletivos, que não pertencem mais a alguém
considerado individualmente, mas à comunidade. Entra-se em um campo que, à primeira
vista, seria de interesse eminentemente administrativo.
Esse movimento de expansão do Direito Penal, explica Figueiredo Dias, veio no rastro
de um novo paradigma de sociedade, que pode ser chamada de sociedade de risco, na linha do
que defende Ulrich Beck e cujos principais problemas advêm da pós-modernidade e
globalização.
239
Dentro desse novo contexto, em que os riscos das atividades desenvolvidas pelo ser
humano em sociedade adquirem uma dimensão global e difusa, não mais atingindo apenas o
indivíduo, o Direito Penal também transmuta o seu paradigma para que se possa proteger a
coletividade dos riscos globais, garantindo, também, a proteção de gerações futuras.
Figueiredo Dias, com perfeita lucidez científica, concebe que o Direito Penal, ainda
que respeitadas as suas bases tradicionais de cunho liberal, para passar a tutelar os bens
jurídicos coletivos em uma sociedade de risco, necessita de uma nova política criminal e uma
nova dogmática penal.
240
A Escola Coimbrã, portanto, finda por admitir que o sistema
criminal na sua acepção tradicional, calcado na individualização do bem, não podeatender
às necessidades que advêm de uma sociedade pós-moderna, já que:
[...] a tutela dos grandes riscos e das gerações futuras passa pela assunção de
um direito penal do comportamento em que são penalizadas e punidas puras
relações da vida como tais. Não se trata com isto, porém, de uma alternativa
ao direito penal do bem jurídico: ainda aqui a punição imediata de certas
espécies de comportamentos é feita em nome da tutela de bens jurídicos
colectivos e só nesta medida se encontra legitimada.
241
Dessa forma, a tutela de bens coletivos que até então não estava no campo de
incidência da norma penal passa a se justificar, pois o Direito Penal, se libertando de sua
238
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 115, t. 1.
239
Id. Ibid., p. 127.
240
Id. Ibid., p. 128.
241
Id. Ibid., p. 142-143.
função tradicional voltada à proteção de bens jurídicos individuais e de limitação dos excessos
punitivos do Estado, amplia a sua área de atuação original e assume novas pretensões na
contemporaneidade, como a prevenção dos novos riscos decorrentes da sociedade pós-
moderna, a defesa dos interesses da humanidade e a garantia do bem-estar de gerações
futuras.
Feitas essas considerações, percebe-se uma tendência de política criminal direcionada
à ampliação das áreas tradicionais de atuação do Direito Penal, cabendo indagar se a
criminalização da biopirataria também não estaria inserida nesse novo contexto, como uma
exigência de proteção de um bem jurídico merecedor de tutela em um Estado de direito que
convive com novos riscos.
Apesar da manifesta vontade constitucional quanto à existência de um mandato
expresso de criminalização, como foi visto linhas atrás, tem-se um cuidado especial para o
se extrair da referida norma conclusões precipitadas no sentido de que tal comando
constitucional acabaria por impor uma obrigação cega ao legislador infraconstitucional de
criminalizar todas as condutas que de alguma forma violem o meio ambiente. A discussão que
se passa a desenvolver, portanto, visa justificar a intervenção penal, e não, impor a resposta
criminalizadora como um mero argumento de autoridade.
Regis Prado assinala que o bem jurídico ambiental ganha especial transcendência e
merece especial proteção, mas os princípios constitucionais penais não são afastados, pois:
Afinal, a partir dessa exigência constitucional, impende ao legislador
ordinário constituir um verdadeiro sistema normativo penal que defina, de
modo certo e taxativo, as condutas puníveis e respectivas penas, em
harmonia com os princípios constitucionais penais, como estrutura jurídica
mínima, para dar cumprimento ao estatuído na Constituição Federal.
242
O citado autor pondera que para se fazer incidir a intervenção penal não é suficiente a
violação de um bem jurídico-penal, pois é preciso que exista a necessidade da tutela penal
como sendo o meio “absolutamente indispensável à livre realização da personalidade de cada
um na comunidade”.
243
Na obra “Direito penal do ambiente” Regis Prado tece diversas considerações, que são
de grande relevância para que se possa definir limites claros quanto à intervenção penal. O
autor reconhece que o Direito Penal deve atuar na defesa dos bens jurídicos
242
PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e constituição. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.
83.
243
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 121, t. 1.
imprescindíveis à coexistência pacífica dos homens, e que não podem ser eficazmente
protegidos de outra forma”.
244
Fica evidente a sua opção pela utilização do Direito Penal
apenas como ultima ratio, chegando a afirmar o seguinte:
[...] a função maior de proteção de bens jurídicos atribuída à lei penal não é
absoluta. O bem jurídico é defendido penalmente diante de certas formas
de agressão ou ataque, consideradas socialmente intoleráveis. Isso explica
que apenas as ações mais graves dirigidas contra bens fundamentais podem
ser criminalizadas. É o que se denomina caráter fragmentário do Direito
Penal. Faz-se uma tutela seletiva do bem jurídico, limitada àquela tipologia
agressiva que revela dotada de indiscutível relevância quanto à gravidade e
intensidade da ofensa. Esse princípio impõe que o Direito Penal continue a
ser um arquipélogo de pequenas ilhas no grande mar do penalmente
indiferente.
245
Alice Bianchini, em sua tese de doutoramento, ao analisar a função do bem jurídico no
processo de criminalização, chega a uma constatação parecida, pois, segundo seu pensamento,
o dever de criminalizar deve incidir sobre condutas que “atentem ou exponham a perigo
concreto bens jurídicos imprescindíveis a uma qualificada existência do indivíduo em
sociedade”.
246
A natureza do Direito Penal é, portanto, subsidiária, sendo, dentre os meios de
controle social, o que causa maiores gravames aos direitos e liberdades das pessoas. Logo, o
Direito Penal pode intervir “nos casos em que todos os outros meios da política social, em
particular a política jurídica não-penal, se revelem insuficientes ou inadequados”.
247
[grifos do
autor]. Figueiredo Dias reforça este entendimento, afirmando textualmente que a função
precípua do direito penal “reside na tutela subsidiária (de ultima ratio) de bens jurídicos-
penais”.
248
[grifos do autor]
Alice Bianchini, por sua vez, sustenta que o princípio da intervenção nima pode ser
analisado por três perspectivas diferentes, mas complementares entre si: o princípio da
necessidade, o princípio da ofensividade e o princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos.
Pela ótica do princípio da necessidade a intervenção penal deve ocorrer quando os outros
meios de controle social não possam garantir a harmonia social. O princípio da exclusiva
proteção de bens jurídicos admite a tutela penal de bens de elevado valor e importância.
Para o princípio da ofensividade, somente lesões graves a bens jurídicos poderão ser objeto de
244
PRADO, Luiz Regis. Direito penal do ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação do território
e biossegurança (com análise da Lei 11.105/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 103.
245
Id. Ibid., p. 103-104.
246
BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 51.
247
Id. Ibid., p. 121.
248
Id. Ibid., p. 122.
criminalização.
249
Juarez Cirino, de igual sorte, destaca que a natureza fragmentária do Direito Penal
obsta qualquer tentativa de se querer proteger todos os bens jurídicos previstos na
Constituição, cabendo apenas tutelar
250
“parcialmente os bens jurídicos selecionados para a
proteção penal”.
Sendo assim, fazendo-se a atualização do discurso de política criminal, poder-se-ia
afirmar que a tutela do meio ambiente realmente ingressaria naquele campo que se passou a
denominar Direito Penal secundário e que, por sua vez, admite a proteção de bens coletivos,
como decorrência de uma sociedade que convive com riscos globais.
Mesmo dentro desse novo contexto, cabe frisar que Figueiredo Diaso afasta, apesar
da introdução do que chama o topos da sociedade de risco no Direito Penal, o postulado
clássico de que a intervenção penal se justifica para a tutela de bens jurídicos. Segundo o
penalista português, existem “autênticos bens jurídicos sociais, trans-individuais,
transpessoais, colectivos
251
[grifos do autor]. Esses bens, que poderiam ser chamados
também de supra-individuais, embora se refiram a interesses da coletividade não deixam de se
relacionar com interesses individuais, como bem expõe Figueiredo Dias:
O caráter supra-individual do bem jurídico não exclui a existência de
interesses individuais que com ele convergem: se todos os membros da
comunidade (ou de uma certa comunidade) se vêem prejudicados por
condutas pesadamente poluidoras, cada um deles não deixa,
individualmente, de sê-lo também e de ter um interesse legítimo na
preservação das condições vitais.
252
Assim, a criminalização de condutas que envolvam a tutela de bens coletivos só se
tornam legítimas se, segundo os dados das ciências empíricas, o comportamento individual,
somado a conduta de outros indivíduos, torne provável a lesão ao bem que se quer proteger. É
o que Figueiredo Dias chama de tipos aditivos ou acumulativos, podendo-se transcrever a
seguinte passagem para melhor compreensão do pensamento do autor:
Tratar-se-á então patentemente de um delito acumulativo que todavia, em
nome de um bem jurídico colectivo de indiscutível referência jurídica-
constitucional, é digno de pena; e se, ademais, os aludidos dados das ciências
empíricas revelarem a necessidade da sua protecção, nada mais será
249
BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 51.
250
SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: ICPC; Lumen Juris, 2006. p. 5.
251
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 136, t. 1.
252
Id. Ibid., p. 138.
necessário para a validade/legitimidade da incriminação.
253
Dessa feita, a aceitação do Direito Penal para tutelar o meio ambiente não se faz sem a
flexibilização dos princípios e institutos tradicionais, já que os desafios e necessidades são
diferentes. No caso da poluição, não é difícil concluir que o processo de degradação ambiental
não ocorre com a ação isolada de um poluidor, mas advém de um processo cumulativo. Daí
porque para incidir o Direito Penal neste campo o será possível levar em consideração a
ação individual, pois não se sabeem que medida cada poluidor contribuiu para um dano
ambiental. Alarga-se o Direito Penal para se admitir, sem muito apego ao princípio penal
fundamental da vedação da responsabilidade objetiva, a proibição de comportamentos sociais
que acarretem lesões “mais do que possíveis, indubitavelmente previsíveis e muito prováveis,
para não se dizer certas”.
254
Logo, não se pode deixar de registrar que o abandono dos moldes clássicos do
princípio da culpabilidade se torna uma exigência para que se alcance, também, a
responsabilização da pessoa jurídica, às vezes o único poluidor que se possa identificar.
Assim, mesmo que se aceite essas transposições para atualizar o Direito Penal a uma
sociedade de risco, a questão suplementar que se coloca é analisar de que forma a
criminalização da biopirataria poderá, a partir de uma política criminal inerente a um Estado
de direito democrático, assegurar a tutela de um bem jurídico ambiental. Em outros termos, a
tutela penal da biopirataria é necessária? Será que a inclusão da biopirataria no campo de
incidência do Direito Penal alcançará os fins a que se propõe, proteger o patrimônio genético
decorrente da biodiversidade e os conhecimentos tradicionais que recaem sobre a
biodiversidade?
2.3.3. O arcabouço jurídico protetor da biodiversidade no Brasil
Para que se possa discutir as hipóteses apresentadas, de conformidade com as
especificidades brasileiras, sobre a necessidade ou não da intervenção da tutela penal como
um mecanismo protetor da biodiversidade, é importante que se analise se já existe um
regramento sobre a matéria, pelo menos em nível administrativo, já que um dos fatores que
certamente contribui para a biopirataria é a ausência de instrumentos jurídicos que
disciplinem satisfatoriamente o acesso à biodiversidade.
253
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 142, t. 1.
254
Id. Ibid., p. 141.
No caso do Brasil, as regras de acesso à biodiversidade basicamente estão nos
seguintes diplomas: Decreto 2.519/98, a Medida Provisória 2.186-16/2001 e os Decretos
3.945/2001; 4.339/2002; 4.946/2003; 5.439/2005; 5.459/2005; 6.159/2007.
255
Como se observa, a partir do exame do marco legal existente na República Federativa
do Brasil, o acesso à biodiversidade e aos conhecimentos tradicionais associados à
biodiversidade o é livre. Pelo contrário, um conjunto de normas administrativas que
regulamenta a pesquisa, o uso da biodiversidade e a repartição dos benefícios.
Assim, a Convenção sobre a Diversidade Biológica, promulgada pelo Decreto nº
2.519/98
256
, no art. 15, prevê a soberania dos Estados quanto aos seus recursos naturais,
cabendo à legislação nacional regular o acesso à biodiversidade. Na seqüência, a Medida
Provisória nº 2186-16/2001,
257
que disciplinou a matéria, no art. 2º, estabeleceu que:
O acesso ao patrimônio genético existente no País somente será feito
mediante autorização da União e terá o seu uso, comercialização e
aproveitamento para quaisquer fins submetidos à fiscalização, restrições e
repartição de benefícios nos termos e nas condições estabelecidos nesta
Medida Provisória e no seu regulamento.
O art. 30, da Medida Provisória, prevê, ainda, que a violação das regras quanto ao
acesso ao patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional associado constitui infração
administrativa e sujeita o infrator a diversas sanções.
Assim, se quedando nos dispositivos citados, pois não está no âmbito desta pesquisa
discutir a legislação de acesso à biodiversidade, resta patente que há normas administrativas
bastante claras quanto à exigência de prévia autorização para o acesso à biodiversidade e ao
conhecimento tradicional associado, repartição dos benefícios decorrentes deste acesso e
imposição de sanções administrativas aos infratores.
O que se observa, em verdade, é que apesar da existência de normas administrativas
que regulam o acesso à biodiversidade, existem dificuldades de ordem prática que tornam o
ordenamento administrativo totalmente ineficaz para a proteção do bem jurídico consistente
255
A legislação citada está na íntegra nos Anexos A, B, C, D, E, F, G e H, respectivamente.
256
BRASIL. Decreto n. 2.519, de 16 de março de 1998. Promulga a Convenção sobre Diversidade Biológica,
assinada no Rio de Janeiro, em 5 de junho de 1992. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [Os textos integrais do
Decreto e da Convenção estão no Anexo A]
257
BRASIL. Medida Provisória 2.816-16, de 23 de agosto de 2001. Regulamenta o inciso II do § 1º e o §
do art. 225 da Constituição, os arts., , alínea "j", 10, alínea "c", 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção sobre
Diversidade Biológica, dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento
tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua
conservação e utilização, e outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2186-16.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [O texto integral da
Medida Provisória está no Anexo B]
no patrimônio genético do País.
O Direito Penal pode exercer sua função de prevenção geral quanto à extração ilegal
de plantas, captura de animais ou a apropriação, sob qualquer forma, de componentes da
biodiversidade ou do conhecimento tradicional.
Para se fazer uma comparação, caberia notar que a apropriação da biodiversidade pode
ocorrer de forma aimperceptível, diferentemente do que ocorre com o tráfico de drogas.
Tirante os casos de algumas drogas sintéticas que poderiam ser transportadas pelos traficantes
de forma oculta e bem disfarçada, como em uma folha de papel, o transporte de cocaína ou
maconha exige investimento e criatividade do agente criminoso para conseguir camuflar
embalagens de drogas, que são volumosas e, em princípio, visíveis.
O tráfico de drogas pressupõe a existência de organizações criminosas, pois não é
possível que uma única pessoa financie, produza, transporte e comercialize a droga. Faz-se
necessário um alto grau de investimento e organização para a realização do tráfico e todos
sabem que até hoje o problema das drogas não foi resolvido no mundo e muito menos no
Brasil. O país que possui o maior número de consumidores de substâncias entorpecentes é o
Estados Unidos e, ironicamente, o maior orçamento para o combate ao tráfico de drogas e um
dos melhores sistemas repressivos não impedem este tipo de comércio ilegal.
No caso da biodiversidade é importante lembrar que para se apropriar do patrimônio
genético de uma planta da flora nacional bastaria que algum “inofensivo” turista, de viagem
pela Floresta Amazônica, ao voltar para o seu país levasse no bolso do casaco uma pequenina
semente.
Os países detentores de biodiversidade mostram-se ineficientes em conservar a
biodiversidade e extrair benefícios do uso sustentável de suas próprias riquezas, o que só
reforça a idéia de que criminalizar a biopirataria trará um reforço indispensável aos
instrumentos jurídicos de proteção.
Não se pode dizer que não existem instrumentos penais, que sirvam à proteção da
biodiversidade. Há condutas incriminadas, como destruir ou danificar florestas,
258
matar,
perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre.
259
Esses exemplos versam
sobre condutas tipificadas como crimes e que objetivam proteger o meio ambiente, mas que,
em última análise, também servem à preservação da biodiversidade.
Com efeito, a incriminação das condutas relacionadas a biopirataria assume uma
258
Art. 38, da Lei n. 9.605/98. (BRASIL. Vade mecum universitário de direito Rideel. 3. ed. o Paulo: Rideel,
2007, p. 1.197)
259
Art. 29, da Lei n. 9.605/98. (Id. Ibid., p. 1.195)
exigência de complementariedade do ordenamento jurídico, de forma a reforçar arcabouço
existente, que atualmente é deficiente para algumas situações e inexistente para outras. No
próximo capítulo se demonstrará que a tutela penal no caso da biopirataria se justifica e deve
ser o mais breve possível implementada, como um outro passo importante para uma política
nacional de biodiversidade.
2.4 A viabilidade ou não de uma resposta criminalizante em relação a biopirataria
Fixada a premissa de que a tutela deve recair sobre bens jurídicos e que no caso da
biopirataria esse bem é um bem supra-individual, cumpre estabelecer até onde se pode
estender a tutela penal.
Figueiredo Dias ensina que o Direito Penal, como sistema de controle social, pode ser
compreendido a partir do seu objeto, que é o fato ou o comportamento delituoso e, em última
análise, portanto, o crime e as conseqüências jurídicas que estão ligadas a ele, ou seja, as
sanções penais.
260
Logo, o Direito Penal exerce uma função essencial na justificação da
intervenção penal estatal, seja buscando estabelecer os fins da pena, seja se debruçando sobre
um conceito de crime.
No caso desta pesquisa, em que pese o tema da legitimação da pena estar sempre
conjugado ao conceito de crime,
261
interessa mais de perto a esta investigação fixar limites à
incriminação, tarefa que deve se alicerçar na definição de um conteúdo material para o
conceito de crime.
Como se observou ao longo desta dissertação, há uma opção metodológica clara
quanto à utilização como marco teórico da teoria do bem jurídico para orientar a pesquisa, o
que significa assumir, também, como postulado fundamental, que o Direito Penal exerce a
função essencial de proteção de bens jurídicos. Esta concepção, esclarece Figueiredo Dias,
leva à conclusão de que a tutela de bens jurídicos é “o elemento constitutivo mais relevante do
conceito material de crime”, podendo-se extrair desta afirmação várias conseqüências.
262
Dentre as conseqüências apontadas por Figueiredo Dias es a constatação de que
puras violações morais não conformam como tais a lesão de um bem jurídico e não podem,
por isso, integrar o conceito material de crime”.
263
[grifos do autor] Outra conclusão do autor
260
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 42, t. 1.
261
Id. Ibid., p. 42.
262
Id. Ibid., p. 118.
263
Id. Ibid., p. 118.
é que proposições meramente ideológicas”
264
também o podem ser acolhidas como
autênticos bens jurídicos e que a “violação de valores de mera ordenação”
265
não devem ser
objeto de criminalização. se justificará, portanto, a intervenção penal como instrumento
último e indispensável à proteção de bens jurídicos relevantes, que encontrem fundamento
constitucional.
Chega-se, então, ao ponto, que se reputa de importância e que na expressão de
Figueiredo Dias é chamado de critério da necessidade da tutela penal
266
ou transportando-se o
discurso para o garantismo se poderia denominar, na esteira de Luigi Ferrajoli, de princípio da
necessidade, que corresponde ao axioma nulla poena sine necessitate.
267
Luigi Ferrajoli adverte que o princípio da necessidade impõe limitações às proibições
penais pelo menos de duas ordens. Primeiro, diante da secularização do direito, não seria
necessária a intervenção penal para regular aspectos morais. Segundo, a necessidade penal
recai sobre a “tutela de bens fundamentais não garantizáveis de outra forma”.
268
Nesse ponto, tomando-se como premissa a teoria do garantismo penal como uma
corrente de pensamento que se considera mais bem ajustada a um modelo de Estado de direito
democrático, decorrendo daí a aceitação de suas proposições teóricas como um programa de
Direito Penal mínimo, surge naturalmente o questionamento de que a sugestão de
criminalização da biopirataria, marcada pela necessidade de ampliação das bases tradicionais
do Direito Penal, como já apontado linhas atrás, poderia ser uma proposta antigarantista.
É óbvio que esta indagação não é de fácil deslinde, porém de antemão cabe assinalar
que uma proposta criminalizante da biopirataria não obrigatoriamente infirma as bases
teóricas do garantismo e seu corolário principal voltado à redução da intervenção penal ao
mínimo necessário.
Esta afirmação, de certa forma, é feita pelo próprio Ferrajoli que reconhece que a
proposta garantista de um Direito Penal mínimo, apesar de ter a necessidade de retirar do
campo da tutela penal vários bens atualmente protegidos pelo ordenamento penal, não exclui
a possibilidade de que ocorra uma maior penalização de bens fundamentais que estejam
insatisfatoriamente tutelados. De acordo com Ferrajoli:
264
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 119, t. 1.
265
Id. Ibid., p. 119.
266
Id.Ibid., p. 120.
267
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 372.
268
Id. Ibid., p. 373.
Um programa de direito penal mínimo deve apontar a uma massiva deflação
dos bens” penais e das proibições legais, como condição de legitimidade
política e jurídica. É possível, também, que nesta reelaboração fique
evidenciada a oportunidade, em função da tutela de bens fundamentais, de
uma maior penalização de condutas hoje não adequadamente proibidas nem
castigadas: por exemplo, a introdução de um delito específico de tortura
(exigência expressa do art. 13, par. , da Constituição) diante da tendência
jurisprudencial de ludibriar sua punição ou a criação de novos delitos
ambientais.
269
Em outra passagem, ainda teorizando sobre os bens jurídicos que merecem a tutela
penal, Ferrajoli esclarece que se enquadram na condição de bens que merecem a tutela penal
todos os direitos fundamentais:
O primeiro e mais elementar critério é o de justificar as proibições somente
quando se dirigem a impedir ataques concretos a bens fundamentais de tipo
individual ou social e, em todo o caso, externos ao mesmo direito,
entendendo por ataque não somente o dano causado, senão, também por
ser inerente à finalidade preventiva do direito penal , o perigo causado.
Entre os bens externos ao direito penal, cuja lesão é necessária, ainda que
não suficiente, para a justificação das proibições penais, estão, por razões
óbvias, todos os “direitos fundamentais”, quer dizer, não só os clássicos
direitos individuais e liberais, senão também os coletivos e/ou sociais como
ao meio ambiente ou à saúde. Mas também hão de se incluir aqui bens que
não são direitos, como o interesse coletivo, e certamente fundamental, a uma
administração não corrupta.
270
[grifos do autor]
A criminalização da biopirataria, portanto, se justificaria enquanto tutela de um direito
fundamental, que é o direito ao desenvolvimento. Assim, além de se proteger o meio
ambiente, a criminalização da biopirataria, ao ter como escopo principal a tutela do direito ao
desenvolvimento, idéia esta que será melhor desenvolvida no Capítulo III,
271
escolhe como
objeto um bem jurídico muito expressivo e merecedor, sem dúvida, de tutela penal. O direito
ao desenvolvimento, como ficará demonstrado, é o direito síntese de todos os direitos
humanos. Logo, sem a proteção eficaz do direito ao desenvolvimento não será possível a
realização dos direitos humanos, que são concebidos como os valores mais essenciais e
indispensáveis à vida digna das pessoas.
Por esses motivos, não se vislumbra uma incompatibilidade do garantismo com a
hipótese defendida na presente pesquisa, que se encontra direcionada a criminalização da
biopirataria, pois o bem jurídico eleito está entre aqueles que são, induvidosamente, dignos de
269
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 381-382.
270
Id. Ibid., p. 378.
271
Vide Capítulo III, Seção 3.3, p. 109 et. seq.
tutela penal, restando legitimada a intervenção penal.
Como ficou assentado, não são todas as propostas criminalizantes que são
incompatíveis com o garantismo e a justificação de uma proposta de intervenção penal o
significa rejeição aos postulados garantistas e a um programa de Direito Penal mínimo. O que
a teoria garantista propõe é a definição clara do que se deve criminalizar e do que deve ser
expurgado do Direito Penal ou, como propõe Ferrajoli “[...] uma política penal orientada à
tutela máxima de bens, com o mínimo necessário de proibições e castigos”.
272
Assim sendo, a averiguação da necessidade de criminalização de uma conduta,
portanto, é algo bem mais complexo do que a simples constatação de que o legislador
constituinte determinou expressamente a criminalização. Embora o mandato constitucional
reflita a importância que o legislador conferiu ao bem ambiental, podendo-se, prima facie, até
se aceitar que a criminalização deva ser um corolário, outras considerações devem ser levadas
em conta antes de se optar definitivamente pela intervenção penal. Foi o que se viu nos itens
anteriores e que se pretende desenvolver com mais profundidade no Capítulo III.
Alice Bianchini, após discorrer sobre as imposições constitucionais implícitas e
expressas de criminalização, resume seu pensamento no sentido de que em face de um
mandamento constitucional de criminalização não ficam afastadas considerações quanto à
existência de meios menos onerosos ou acerca da adequação ou eficácia do Direito Penal.
273
Luiz Flávio Gomes, em igual sentido, também perfilha o entendimento de que a
indicação constitucional para criminalizar condutas não justifica uma atuação automática do
legislador infraconstitucional:
A sinalização da Constituição no sentido da criminalização ou penalização
de determinadas condutas, de qualquer modo, não significa, sic et
simpliciter, que a imposição de sanções penais seja uma operação
legisferante automática. Recorde-se que o legislador goza, dentro dos limites
estabelecidos na Constituição, de uma ampla margem de liberdade que
deriva de sua posição constitucional e, em última instância, de sua específica
legitimidade democrática.
Não existe, portanto, uma obrigação de criminalização automática, senão
uma indicação do valor do bem jurídico referido.
274
272
FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução Ana Paula Zomer et. al. o
Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 378.
273
BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 99.
274
GOMES, Luiz Flávio. Norma e bem jurídico no direito penal: normas penais primárias e secundárias,
normas valorativas e imperativas, introdução ao princípio da ofensividade, lineamentos da teoria
constitucional do fato punível, teoria do bem jurídico-penal, o bem jurídico protegido nas falsidades
documentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 106.
Figueiredo Dias, ainda a respeito das imposições jurídico-constitucionais de
criminalização, salienta: “Sempre será questão da competência do legislador ordinário [...]
decidir se uma tal tutela [...] não será melhor lograda através da restrição do âmbito da
criminalização e da sua ‘compensação’ por meios não penais de política social”.
275
Outro aspecto que se considera importante quando se trata de definir uma política
criminal fruto de um Estado de direito democrático e que, por conseguinte, serve de limite ao
poder punitivo estatal, é a compreensão de que o Direito Penal não deve ser utilizado para
alcançar objetivos que o estejam abrangidos na sua função essencial de proteção de bens
jurídicos.
Não legitimação na intervenção penal quando a lei tiver efeitos meramente
simbólicos, perseguindo “fins que estão fora do Direito Penal”.
276
O processo de
criminalização não pode pretender resolver a ineficiência administrativa da máquina estatal ou
se considerar capaz, em substituição do Estado, de implementar através de normas
incriminadoras políticas sociais que não foram realizadas pela via administrativa. Nesse
sentido, Janaína Paschoal tece importantes considerações:
Não se pode perder de vista é que o Direito penal não tem e não pode ter
uma função promocional. Ele não deve e não pode ser utilizado sob a
desculpa de intentar-se um suposto desenvolvimento ou aprimoramento da
sociedade, em razão de essa utilização poder levar a um autoritarismo; em
segundo lugar, em virtude de o Direito Penal não constituir meio hábil para a
implementação de políticas sociais.
277
Desse modo, deve-se ter especial cuidado para que respostas criminalizantes não
sejam fabricadas nos casos em que é perfeitamente viável e até preferível a proteção do bem
jurídico por meios diversos da intervenção penal, sendo que Figueiredo Dias denomina de
princípio da proibição de excesso, de forma que não se deve admitir a intervenção penal para
a proteção de bens jurídicos “que podem ser suficientemente tutelados pela intervenção de
meios não-penais, como o direito civil ou administrativo.
278
Além disso, a intervenção penal não seria válida naqueles casos em que o Direito
Penal se mostre inadequado para proteger o bem jurídico a que se propõe, seja porque seria
totalmente ineficaz como instrumento de controle social, seja porque o comportamento
275
DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal: parte geral, questões fundamentais, a doutrina geral do crime.
Lisboa: Coimbra Editora, 2004. p. 123, t. 1.
276
ROXIN, Claus. A proteção de bens jurídicos como função de direito penal. Tradução André Luís
Callegari; Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 24.
277
PASCHOAL, Janaína Conceição. Constituição, criminalização e direito penal mínimo. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003. p. 123.
278
DIAS, op. cit., p. 121.
estaria suficientemente regulado por outras áreas do direito, se tornando desnecessária a
intervenção penal.
Quanto aos argumentos pela criminalização da biopirataria, considerando-se a
exposição anterior, percebe-se que a criminalização da biopirataria embora encontre respaldo
em norma constitucional expressa, pois em última análise proteger a biodiversidade é garantir
um meio ambiente ecologicamente equilibrado, não é uma conseqüência direta deste mandato.
A intervenção penal, no entanto, na fase em que se encontra a sociedade brasileira, é
um instrumento necessário e valioso para proteção dos bens jurídicos violados pela
biopirataria.
Acredita-se que o princípio da necessidade da tutela penal pode variar conforme a
evolução do próprio Estado, assim como a própria Constituição também evolui. No momento
presente, não criminalizar a biopirataria seria um erro, pois os demais mecanismos
estabelecidos para realizar o referido controle se mostram ineficientes e pouco importa se a
ineficiência é por inoperância do próprio aparelho estatal. O que é relevante, neste caso, é que
o Direito Penal, mais do que os outros meios de controle, exerce também uma função
intimidadora ou de prevenção geral que necessariamente contribui para a preservação de um
bem juridicamente protegido.
Assim, convém admitir que a biopirataria atenta contra os interesses nacionais e que,
também, se constitui em uma prática violadora de direitos humanos, nunca sendo demais
lembrar que tutelar o meio ambiente é proteger a própria vida.
Nesse contexto, se torna bastante óbvio que a estatura constitucional do bem protegido
somada aos benefícios que podem advir da sua preservação, impõem uma resposta
criminalizante.
A estes efeitos, Von Liszt afirma que a essência do Direito Penal não está na qualidade
dos interesses que se quer proteger, mas na qualidade da proteção, que é dada.
279
A proposta de criminalização da biopirataria poderia ser considerada a partir de uma
visão garantista radical como uma violação ao princípio da intervenção mínima, porém o que
decorre claramente do marco teórico adotado que demonstra que a biopirataria é uma nova
face da exploração do Brasil e dos países em desenvolvimento é que a insuficiência dos
demais meios de controle justifica a tutela penal é legítima.
Além disso, como ficou pontuado, a proposta garantista não é totalmente infensa à
criminalização de fatos que merecem a tutela penal em razão da dignidade dos bens jurídicos
279
LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal. Tradução Jo Higino Duarte Pereira. Atual. Ricardo
Rodrigues Gama. Campinas: Russell, 2003. p. 146, t. 1.
que se pretenda preservar.
Neste sentido, Cerezo Mir expõe que a pena como ultima ratio se justifica para a
defesa da ordem social quando se torne imprescindível porque as outras formas de reação
jurídica se mostraram insuficientes.
280
O mesmo autor adverte que a função do Direito Penal não pode se limitar a proteção
de bens jurídicos, pois deve fomentar o respeito aos bens jurídicos:
A função do Direito penal consiste essencialmente no fomento do respeito
aos bens jurídicos. Para fomentar o respeito aos bens jurídicos, o Direito
penal deve tratar de obrigar os cidadãos em sua consciência, por seu
conteúdo valioso, de habituar-lhes ao seu cumprimento (mediante sua
continuidade) e de apelar, inclusive, aos seus interesses egoístas por meio da
coação.
281
[tradução nossa]
A afirmação do autor, em verdade, não infirma a tese da teoria do bem jurídico,
apenas destaca que a função do Direito Penal de proteção aos bens jurídicos também serve
para fomentar o respeito aos bens jurídicos escolhidos pelo legislador.
Por outro lado, discorrendo acerca da necessidade da tutela penal do meio ambiente
Ana Paula Cruz sentencia que: [...] é inevitável a conclusão de que a proteção dos bens
ambientais vai poder efetivar-se a contento com a utilização de todas as formas de tutela
jurídica, inclusive aquela que, por definição, é a mais forte de todas – a tutela penal”.
282
Uma argumentação, portanto, no sentido de excluir a importância do bem jurídico que
se pretende tutelar no caso da biopirataria, parece fugir da realidade. Afirmar-se que a norma
constitucional que determina a criminalização de condutas que atentam contra o meio
ambiente, por exemplo, teria decorrido de pressões decorrentes de um contexto internacional,
é retirar a legitimidade da própria Constituição e, se é assim, o caminho é a “revolução” para
que o poder constituinte originário possa fundar novamente um modelo de Estado em que a
resposta penal para esses casos não seja a via eleita pelo povo.
Pode-se asseverar, igualmente, que uma norma para incriminar a biopirataria
fundamentalmente atingiria a cobiça estrangeira, ou seja, aquele pesquisador ou aquelas
pessoas que movidas pela ganância de lucros que podem auferir no tráfico de animais ou
280
MIR, José Cerezo. Derecho penal: parte general. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 34.
281
“La función del Derecho penal consiste esencialmente en el fomento del respeto a los bienes jurídicos. Para
fomentar el respeto a los bienes jurídicos, el Derecho penal ha de tratar de obligar los ciudadanos en su
conciencia, por su contenido valioso, de habituarles a su cumplimento (mediante su continuidad) y de apelar,
incluso, a sus interes egoístas por medio de la coacción”. (MIR, José Cerezo. Derecho penal: parte general.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 29).
282
CRUZ, Ana Paula Fernandes Nogueira da. A importância da tutela penal do meio ambiente. In: BENJAMIN,
Antônio Herman V.; MILARÉ, Edis. (Coord.). Revista de direito ambiental. São Paulo: Revista dos
Tribunais, n. 31, jul. – set. 2003, p. 76.
plantas para as transnacionais da biotecnologia, sem a autorização da Administração,
exportassem componentes da biodiversidade ou transmitissem os conhecimentos das
populações tradicionais.
Ainda, o se o inconveniente de se proteger um bem que pertence difusamente a
todo o povo brasileiro. Aliás, tudo recomenda que assim seja feito, antes que se repita a
trajetória desigual da História da Humanidade. Uma consciência ambiental começa a ser
forjada e junto com essa ética ecológica não justificativa para que não se adotem todas as
medidas que estão ao alcance do poder público e da sociedade para evitar a dilapidação da
biodiversidade e, conseqüentemente, a destruição do meio ambiente e o desaparecimento de
oportunidades para o desenvolvimento sustentável dos cidadãos brasileiros e amazônicos.
Dessa forma, a convicção que surge da pesquisa é que o Direito Penal é um importante
e indispensável instrumental para a defesa dos bens jurídicos atingidos pela biopirataria,
porém a norma penal, per se stante, o resolverá o problema que deve ser abordado desde
outras perspectivas.
O estabelecimento de regras administrativas mais aperfeiçoadas e de um aparato
fiscalizatório eficiente, bem como a implantação de um regime internacional que assegure de
forma justa a repartição dos benefícios decorrentes da exploração sustentável da
biodiversidade aos países detentores dos recursos naturais, o medidas imprescindíveis à
proteção da biodiversidade.
Some-se, ainda, a intensificação da cooperação internacional para o desenvolvimento
como um outro instrumento complementar indispensável aos fins que se perseguem nesta
pesquisa. A legitimação da proposta criminalizadora da biopirataria está amparada na
magnitude constitucional do bem ambiental, compreendido o patrimônio genético da
biodiversidade nacional.
Logo, mesmo se reconhecendo a necessidade da intervenção penal, não se pretende
aceitar a criminalização como a primeira ou única razão, mas como uma proposta que é
necessária e complementar à realização de outros instrumentos que o igualmente
importantes à eficácia da proteção jurídica, onde se destaca a cooperação internacional para o
desenvolvimento.
A opção nesta pesquisa de se criminalizar a conduta da biopirataria, portanto, não
objetiva ser a única resposta ao problema. Como ficou assentado, a tutela penal se justifica em
razão da relevância do bem jurídico protegido, mas com isso não se quer excluir ou encobrir
outras soluções.
A cooperação internacional para o desenvolvimento, como será analisada no Capítulo
III é um complemento importante ao fim perseguido de proteção à biodiversidade e aos
conhecimentos tradicionais associados. Para a sua efetivação, entretanto, é necessário ter um
marco legal que possa impedir a dilapidação desse patrimônio. Garantido esse aspecto, a
cooperação, ao promover o desenvolvimento regional, poderá reforçar ainda mais o problema
da proteção jurídica nos planos nacional e sub-regional.
CAPÍTULO III – COOPERAÇÃO INTERNACIONAL PARA O
DESENVOLVIMENTO
3.1 Considerações preliminares sobre o Direito e as Relações Internacionais, desde a
perspectiva Latino-americana e Amazônica
A cooperação internacional para o desenvolvimento é um valioso instrumento para a
proteção dos direitos humanos e integração entre os países. No caso desta pesquisa, sem
perder de vista essas possibilidades de abordagem, a cooperação será enfatizada, também,
como uma estratégia proposta para a conservação da biodiversidade e a sua utilização
sustentável.
Deve se ter presente, contudo, que para se adentrar na análise do tema cooperação será
necessário discutir brevemente as relações internacionais, como um pressuposto aos
fundamentos teóricos de uma proposta de cooperação para o desenvolvimento, da região
amazônica.
No Capítulo I, tomando-se por base o pensamento de Vandana Shiva, se fez registrar
uma perspectiva de relações internacionais fortemente marcada pelo paradigma da
dependência. Ainda que Vandana Shiva o faça essa correlação expressamente, não parece
existir qualquer dificuldade em se concluir que, a partir da sua visão acerca do processo
econômico que se esconde por trás do sistema de concessão de patentes amparado pelo
GATT, o modelo que melhor explicaria o quadro internacional descrito pela cientista seria o
modelo da dependência.
Recorde-se que a abordagem de Vandana Shiva coloca, de um lado, os países
desenvolvidos, que comandam a economia mundial por suas empresas transnacionais de
biotecnologia e, do outro lado, os países em desenvolvimento, que possuem a biodiversidade
e que continuam sendo espoliados de suas riquezas naturais e, por isso, são mantidos em um
segundo plano na ordem internacional.
Na visão de Vandana Shiva, a biopirataria representa uma continuidade do processo de
exploração e dominação imposto aos países que pertencem ao “Terceiro Mundo”.
283
Segundo
ela: Quinhentos anos depois de Colombo, uma versão secular do mesmo projeto de
colonização está em andamento por meio das patentes e dos direitos de propriedade
283
Embora teoricamente, por estar superada cientificamente e ser discriminatória em matéria de direitos
humanos, se evite esta expressão ao longo do texto, no caso preferiu-se usá-la porque é a expressão empregada
pela autora em sua obra.
intelectual (DPI)”.
284
Essa afirmação evidencia que para a autora, dentro de um processo econômico global,
existem países centrais que bastante tempo vêm explorando as riquezas naturais de “países
periféricos”, como se estes países ainda fossem suas colônias. Há, porém, na atualidade, uma
sofisticação dessa exploração, pois como ressalta Vandana Shiva, foi implementado pela
Organização Mundial do Comércio o acordo geral sobre propriedade intelectual que “tende a
favorecer as corporações transnacionais em detrimento dos camponeses e povos das florestas
do Terceiro Mundo em particular”.
285
Para Vandana Shiva o acordo geral sobre propriedade intelectual da Organização
Mundial do Comércio é uma convenção injusta, pois visa assegurar o direito de patentes às
empresas transnacionais dos países desenvolvidos, legalizando “o roubo da herança biológica
e intelectual das comunidades do Terceiro Mundo”.
286
Assim, mesmo que não seja o caso de reforçar mais uma vez os argumentos
expendidos no Capítulo I, vale lembrar, apenas para se manter a fidelidade ao pensamento da
autora, que a sua idéia, em verdade, prega uma mudança para um paradigma econômico
alternativo, em que: “não se reduza todo e qualquer valor a preços de mercado e toda e
qualquer atividade humana ao comércio”.
287
A proposta de Vandana Shiva passa obrigatoriamente por um discurso ecológico e
ético, que reconheça, diante dos países desenvolvidos, os direitos e valores dos outros povos e
culturas. De acordo com a autora, há, em termos de biodiversidade, dois paradigmas
conflitantes. O agir e pensar das comunidades locais, que se fundamenta na conservação da
biodiversidade para a sua própria sobrevivência, e os interesses das transnacionais da
biotecnologia, que vêem na biodiversidade apenas matéria-prima para exploração e obtenção
de lucros.
288
Assim sendo, em que pese o modelo dependentista explicar satisfatoriamente o
cenário internacional que se desenha a partir de uma questão bem pontual que se propõe nesta
pesquisa, qual seja, revelar o processo exploratório em que os “países periféricos” estão
inseridos, cabe reconhecer a insuficiência desse modelo como referencial teórico para
justificar as relações internacionais em todos os seus níveis.
Não se pode esquecer que no plano internacional uma superpotência absoluta em
284
SHIVA, Vandana. Biopirataria: a pilhagem da natureza e do conhecimento. Tradução Laura Cardellini
Barbosa de Oliveira. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 24.
285
Id. Ibid., p. 31-32.
286
Id. Ibid., p. 152.
287
Id. Ibid., p. 104.
288
Id. Ibid., p. 146.
termos bélicos e diversas potências, que ganham significação apenas do ponto de vista
econômico quando unem suas forças. Assim, o que tem prevalecido, quando se toma por base
principalmente a perspectiva dos Estados Unidos da América, são relações guiadas, ainda,
pelo realismo político, cujos pressupostos teóricos, baseados, principalmente, na segurança e
na militarização, explicam e justificam suas intervenções no âmbito internacional, que pode
até chegar ao uso da força contra os países não alinhados, se for necessário.
Além disso, não se pode esquecer que para assegurar o poder “imperialista”, em
termos de relações internacionais, não se pode esperar uma atuação principalmente dos
Estados Unidos da América, dentro de um contexto de unimultipolaridade, restringida por
limites éticos.
Não se pretende aqui afirmar que as relações internacionais decorrem exclusivamente
do realismo, mas não se pode admitir, também, o abandono total desse paradigma, sobretudo
quando se tem como foco a diplomacia norte-americana.
Desse modo, se por um lado a teoria da dependência explica porque os “países
periféricos” assumem uma posição secundária e subalterna na estrutura econômica
internacional, por outro lado o realismo político mostra que a busca pelo poder ainda orientará
por muito tempo os movimentos dos países desenvolvidos no cenário internacional.
Noam Chomsky, a partir de uma perspectiva racionalista, descreve os fenômenos
internacionais, apontando a ideologia subjacente nos discursos dos países desenvolvidos e
revela o lado oculto das estruturas das relações de poder no cenário internacional.
O esforço intelectual de Noam Chomsky, fortemente combatido pelos detentores do
poder nos países desenvolvidos, ataca visceralmente a política “imperialista” e ensina, por
meio de suas usuais comparações, a compreender que por trás de aparente motivação nobre e
humanitária, nas ações dos governos desses países, notadamente na atuação dos Estados
Unidos da América, se escondem intenções pouco altruístas e que representam única e
exclusivamente o interesse pela manutenção da própria supremacia.
Com a sua postura ativista, Noam Chomsky foi capaz de desenvolver inúmeros
exemplos que revelam que acontecimentos importantes das relações internacionais, na
atualidade, como o terrorismo, por exemplo, seriam conseqüências direitas das políticas de
opressão e dominação levadas a cabo pelos países desenvolvidos.
Apenas para citar alguns exemplos do próprio autor, que colocam os Estados Unidos
da América na condição de um Estado que elegeu como política exterior o terrorismo, pode-se
mencionar os efeitos do embargo econômico ao Iraque, que causou, segundo estimativas, a
morte de aproximadamente meio milhão de crianças. O bombardeio abrica de remédios em
Al-Shifa, no Sudão, em 1998, durante o governo Clinton, que gerou a morte de dezenas de
milhares de pessoas. O massacre da Turquia contra populações curdas, os casos da Nicarágua,
Afeganistão e tantos outros, que se constituem em verdadeiros atos terroristas praticados ou
estimulados pelos Estados Unidos da América e seus aliados.
289
O autor deixa no ar a
indagação: E se fosse contra os Estados Unidos da América, qual seria a reação?
Noam Chomsky, na sua abordagem comparativa, demonstra que o ataque as “Torres
Gêmeas”, provavelmente praticado por Bin Laden, é um ato terrorista infinitamente menos
grave que muitas dessas ações terroristas levadas a cabo pelos Estados Unidos.
Sempre em suas entrevistas, preleções ou obras, Noam Chomsky usa esse recurso
retórico por meio do qual compara as reações violentas dos países oprimidos diante dos atos
terroristas praticados pelos países desenvolvidos, deixando evidente sempre a
desproporcionalidade na ação e reação.
Embora o aprove a violência e acredite nos sistemas internacionais para a resolução
dos conflitos, muitas vezes Chomsky é acusado de defender as atrocidades e minimizar os
genocídios cujas evocações serviriam para justificar o “imperialismo”.
Em verdade, Chomsky apenas não se ilude pelo discurso ideológico e falacioso com
que os governos, auxiliados em boa parte pelos meios de comunicação, justificam suas ações
no campo da política internacional, quase sempre guiadas pelo realismo político, sobretudo
quando se trata de países “hegemônicos”.
Diante dessas colocações e da certeza que a doutrina do realismo não foi abandonada,
principalmente pelos países hegemônicos”, ganha relevância o discurso da cobiça
internacional pela Amazônia, como foi enfatizado no Capítulo II, ainda que se identifiquem
alguns exageros de retórica.
290
Nesse contexto, porém, não são infundadas as preocupações que decorrem, por
exemplo, do apoio conferido pelo Brasil e outros países da América Latina à intervenção no
Haiti, como bem destacou Petras:
Sob o governo Lula, o Brasil deu presença sica e legitimidade à meta
estratégica norte-americana intensamente requisitada de uma “força militar
interamericana” capaz de intervir para manter os interesses estratégicos
estadunidenses. Hoje é o Haiti, amanhã poderá ser a Venezuela ou qualquer
outro país que desafie os clientes imperiais americanos.
291
289
CHOMSKY, Noam. 11 de Setembro. 9. ed. Tradução Luiz Antônio Aguiar. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2005. p. 49-62.
290
Vide Cap. II, p. 54.
291
PETRAS, James. Imperialismo e luta de classes no mundo contemporâneo. Tradução Eleonora Frenkel
Barreto. Florianópolis: UFSC, 2007. p. 62-63.
Em uma visão ampliada do cenário internacional, é realmente preocupante que se
tenha criado um precedente para futuras intervenções, não sendo, então, uma utopia pensar
em questões mais graves sob o prisma regional, visto que tanto já se falou em cobiça
estrangeira pela Amazônia e tentativas de internacionalização de nossas florestas.
Diante dessas considerações, o estudo das relações internacionais e a correta
compreensão da posição ocupada pelos países amazônicos no plano internacional é
imprescindível para que se possa definir estratégias que garantam a edificação de alternativas
que facilitem a cooperação internacional para o desenvolvimento no plano sub-regional.
Para que se possa definir estratégias que visem reverter o processo de “dominação” a
que os países em desenvolvimento estão submetidos e assim garantir também aos povos
latino-americanos dignidade e respeito aos direitos humanos, é imprescindível, primeiro, que
se conheça onde está localizada a origem do problema.
A questão da exclusão social na América Latina, compreendidos obviamente os
países da região amazônica que interessam ao recorte feito nesta pesquisa, é, sem dúvida, um
dos principais flagelos que angustia as sociedades latino-americanas.
Rosa Fernández, em interessante estudo sobre a desigualdade na América Latina e
Caribe, esclarece que o fenômeno da desigualdade social na região, segundo informe da
Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL), é um dos principais
obstáculos ao crescimento e à legitimidade das democracias:
Dois relatórios publicados no ano de 2005 pela Comissão Econômica para
América Latina e Caribe (CEPAL), Panorama social da América Latina e
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: um olhar a partir da América
Latina e Caribe, demonstraram a intrínseca relação entre o fenômeno da
desigualdade e a persistência da pobreza na região, mas também sua
relevância como fator inibidor do crescimento e sua repercussão negativa
nos níveis de legitimidade da democracia e do estado como garantes do bem-
estar.
292
É importante lembrar que, consoante a pesquisadora citada, desde os anos 90 a região
recebeu o vergonhoso tulo de apresentar o mais alto grau de desigualdade de renda,
superando, inclusive, outras regiões do mundo que exibem níveis de pobreza mais
292
FERNÁNDEZ, Rosa de la Fuente. América Latina y el Caribe: el reto de uma sociedad desigual. In:
SOTILLO, José Angel; PINO, Bruno Ayllón. (Org.). América Latina en construcción: sociedad, política,
economia y relaciones internacionales. Madrid: Catarata, 2006. p. 18, tradução nossa. (Dos informes
publicados en el año 2005 por la Comisión Econômica para América Latina y el Caribe (CEPAL), Panorama
social de América Latina y Objetivos de Desarollo del Milenio: una mirada desde América Latina y el Caribe,
han resultado la intrínseca relación entre fenômeno de la desigualdad y la persistencia de la pobreza en la
región, pero también su relevância como factor inhibidor del crecimiento y su repercusión negativa en los
niveles de legitimidad de la democracia y del estado como garantes del bienestar.)
elevados.
293
No Relatório Rumo ao Objetivo do Milênio de Reduzir a Pobreza na América Latina e
Caribe
294
, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD),
CEPAL e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), é apresentada a tabela, a
seguir reproduzida, com dados referentes ao ano de 1999, em que o Brasil é o detentor do
coeficiente Gini mais elevado da região América Latina e Caribe, alcançando 0,64:
Tabela 1
INFORMAÇÃO BÁSICA SOBRE O CONTEXTO, 1999
País PIB per capita
a
(US$ por ano)
Renda média por
domicílio per
capita
b
(US$ por ano)
Coeficiente Gini
em 1999
b
Quociente de
dependência
inverso
b
(Porcentagem)
Média de anos
de escolaridade
b
Argentina
7,435
580.02
0.53
73.00
9.4
Bolívia 955
168.75
0.60
60.96
5.6
Brasil 4,225
594.35
0.64
70.00
6.0
Chile 5,129
474.98
0.55
72.00
9.8
Colômbia
2,266
496.4
0
0.55
68.94
5.6
Costa Rica 3,706
394.00
0.49
63.53
7.5
República
Dominicana
1,943
491.83
0.47
63.00
6.9
Equador 1,404
158.13
0.56
63.72
6.4
El Salvador 1,753
148.00
0.52
64.10
6.2
Guatemala 1,551
257.00
0.58
56.00
4.1
Honduras
694
146.00
0.57
56.90
5.3
México 4,577
662.50
0.57
60.87
5.9
Nicarágua 473
238.00
0.59
58.10
5.9
Panamá 3,274
506.00
0.56
68.10
5.3
Paraguai
1,603
305.88
0.54
69.00
7.6
Peru 2,310
178.12
0.50
65.94
7.6
Uruguai 6,016
570.43
0.44
75.00
9.3
Venezuela 3,037
365.20
0.49
70.00
7.1
Cabe registrar que o índice de Gini é uma medida da desigualdade de renda que varia
do valor 0”, correspondendo ao que seria uma igualdade perfeita e o valor “100”,
equivalendo à desigualdade absoluta.
295
O aludido Relatório analisa, ainda, as desigualdades na distribuição de renda na
293
FERNÁNDEZ, Rosa de la Fuente. América Latina y el Caribe: el reto de uma sociedad desigual. In:
SOTILLO, José Angel; PINO, Bruno Ayllón. (Org.). América Latina en construcción: sociedad, política,
economia y relaciones internacionales. Madrid: Catarata, 2006. p. 18.
294
PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD); COMISSÃO
ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE (CEPAL) E INSTITUTO DE PESQUISA
ECONÔMICA APLICADA (IPEA).
Relatório Rumo ao Objetivo do Milênio de Reduzir a Pobreza na
América Latina e Caribe. Santiago do Chile: Nações Unidas, 2003. p. 19. Disponível em:
<http://www.eclac.cl/publicaciones/xml/8/12728/lcg2188p.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2007.
295
O
Relatório de Desenvolvimento Humano 2003 do PNUD, explica o índice Gini, os seguintes termos: “Índice
de Gini mede a extensão aà qual a distribuição do rendimento (ou consumo) entre indivíduos e famílias,
num país, desvia de uma distribuição perfeitamente igual. Uma curva de Lorenz relaciona percentagens
acumuladas do rendimento total recebido com quantidades acumuladas de beneficiários, partindo dos
indivíduos ou famílias mais pobres. O índice de Gini mede a área entre a curva de Lorenz e uma linha
hipotética de igualdade absoluta, exprimindo uma percentagem da área máxima debaixo da linha. O valor 0
representa a igualdade perfeita e o valor 100 a desigualdade perfeita”. (RELATÓRIO DE
DESENVOLVIMENTO HUMANO 2003. PNUD, p. 354. Disponível em:
<http://www.pnud.org.br/hdr/hdr2003/hdr03-17%20backmatter2.pdf>. Acesso em: 14 ago. 2007)
região, ressaltando que com base em dados comparativos do coeficiente Gini, a América
Latina e Caribe, e notadamente o Brasil, apresentam índices sofríveis em relação aos padrões
internacionais, pois:
Apesar das disparidades entre os países da região serem claramente grandes,
existe uma desigualdade ainda maior dentro de cada país. A região da
América Latina e do Caribe registra consistentemente o nível mais elevado
de desigualdade em relação a qualquer região no mundo (ver, por exemplo,
Banco Mundial, 2001). E realmente, os coeficientes Gini de renda
registrados na terceira coluna da tabela acima variando de 0.44 no
Uruguai a 0.64 no Brasil são todos altos segundo os padrões
internacionais. Para fins de comparação, os coeficientes Gini dios nas
outras regiões na década de 1990 variaram de 0.29 no Leste Europeu até
0.47 na África Sub-Saara. Os países de alta renda apresentavam médias de
0.34 durante a década (Ahuja et al., 1997, p. 26). No entanto, apesar de todos
os coeficientes Gini dos países da América Latina estarem, sem exceção,
acima tanto da média internacional como da média da OECD, a variação
neste coeficiente dentro da região também não deveria ser ignorada.
Ademais, 20 pontos Gini separam o Uruguai do Brasil. Isto eqüivale a quase
a metade da desigualdade medida no primeiro país.
296
Malgrado essa desigualdade na distribuição de renda, o Brasil vem registrando nos
últimos anos crescimento econômico, ainda que acanhado, a base de 1% ao ano durante o
período compreendido entre os anos 1990-1999.
297
É importante ressaltar, contudo, que o crescimento do PIB o significa redução da
pobreza ou maior igualdade na distribuição de renda. O Relatório, inclusive, conclui que a
redução da desigualdade aportaria mais efeitos benéficos aos países da região do que anos
seguidos de crescimento econômico elevado:
Portanto as conclusões parecem indicar que mesmo as reduções muito
pequenas na desigualdade podem apresentar impactos positivos bastante
grandes em termos de redução da pobreza. Para a maioria dos países
considerados, uma redução de um ou dois pontos no coeficiente Gini
alcançaria uma redução na incidência da pobreza equivalente a muitos anos
de crescimento econômico positivo. Em grande parte o motivo pelo qual os
recentes esforços para redução da pobreza na América Latina e no Caribe
apresentaram resultados decepcionantes é que os altos veis de
desigualdade na região se mostraram extraordinariamente intratáveis. Nos
raros casos em que os países conseguiram reduzir a desigualdade, os ganhos
em termos de redução da pobreza têm sido grandes.
298
296
PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD); COMISSÃO
ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE (CEPAL) e INSTITUTO DE PESQUISA
ECONÔMICA APLICADA (IPEA).
Relatório Rumo ao Objetivo do Milênio de Reduzir a Pobreza na
América Latina e Caribe. Santiago do Chile: Nações Unidas, 2003. p. 19. Disponível em:
<http://www.eclac.cl/publicaciones/xml/8/12728/lcg2188p.pdf>. Acesso em: 15 ago. 2007.
297
Id. Ibid., p. 17.
298
Id. Ibid., p. 19.
Em boa parte o problema da distribuição de renda nos países em desenvolvimento
e em particular nos países latino-americanos é o principal responsável pela manutenção do
status quo, impedindo que esses países consigam alcançar patamares significativos de
desenvolvimento, de modo a modificar a realidade dos seus povos. A cooperação
internacional para o desenvolvimento, como se observa nos itens seguintes, apresenta-se
como alternativa que se propõe como um caminho possível de transformação deste quadro,
fortemente marcado pela interdependência.
3.2 Aspectos paradigmáticos da cooperação internacional
Keohane, analisando de forma profunda as relações internacionais, elaborou uma
teoria em torno da cooperação internacional, salientando aspectos de grande importância para
o estudo deste tema e que não devem ser desprezados, principalmente quando se busca tal
alternativa como resposta ao problema pesquisado.
A biopirataria, como ficou definido no capítulo anterior, precisa ser objeto de
criminalização, porém, ao mesmo tempo em que se chegou a esta conclusão, também ficou
assentado que tal proposta não irá resolver o problema da apropriação não autorizada da
biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados em razão da própria
complexidade da questão, que apresenta a necessidade de complementariedade da proposta de
intervenção penal em âmbito legislativo interno.
Pretende-se neste sentido, complementar a proposta de criminalização com a
cooperação internacional para o desenvolvimento, mas antes de se demonstrar de que forma
isto pode ser operacionalizado, é importante definir em que tipo de cenário internacional
ficaria mais oportunizada a cooperação.
Assim sendo, começa-se esta abordagem, registrando que para Keohane a teoria da
estabilidade hegemônica não é um pressuposto à existência da cooperação. No seu pensar, a
hegemonia pode até facilitar um tipo de cooperação, mas não é uma condição em si mesma:
[...] hegemonia pode facilitar um certo tipo de cooperação – mas existe
pouca razão para acreditar que a hegemonia é nem necessária, nem uma
condição bastante para o surgimento de relações cooperativas.
299
299
KEOHANE, Robert O. After Hegemony: cooperation and discord in the world political economy. Estados
Unidos: Princeton University Press, 2005. p. 31, tradução nossa. (... hegemony can facilitate a certain type of
cooperation – but there is little reason to believe that hegemony is either a necessary or sufficient condition for
the emergence of cooperative relationships)
O autor, portanto, admite a possibilidade de cooperação, mesmo em um cenário
internacional onde não exista uma potência hegemônica, o que, de certa forma, é um
afastamento dos princípios clássicos do realismo.
É possível afirmar que Keohane o pretende abandonar o paradigma realista, mas a
sua doutrina vai além dos limites teóricos do modelo clássico realista.
300
Para este teórico é
necessário agregar ao realismo também a ênfase nas instituições internacionais,
301
que
exercem um papel importante na ampliação do alcance da cooperação entre Estados, entre
Estados e Organizações Internacionais e entre Organizações Internacionais afins.
Dessa forma, concordando-se com a idéia de que a cooperação pode existir mesmo
sem a figura de uma potência hegemônica, cabe mesmo assim questionar, se como pretende
Keohane, o realismo com a suplementação proposta, seria ainda a melhor alternativa para
facilitar a cooperação entre os países.
A maior crítica que se pode fazer à escola realista reside justamente no ponto que
representa uma ruptura de qualquer vinculação da ação política à exigência de observância de
um conteúdo moral nas relações entre os Estados.
Se era correta a postura metodológica de Maquiavel ao promover a cisão da política
em face da religião, não se pode dizer a mesma coisa da exclusão da moral do sistema
político. Na medida em que se abstrai da política a moral, se acaba legitimando, também, as
injustiças. Assim sendo, Mancini foi capaz de detectar esse erro metodológico na doutrina de
Maquiavel, comentando o seguinte:
Mas somente porque considerou possível excluir da esfera que é própria e
essencial da disciplina política o problema moral e jurídico e dele fazer total
abstração, caiu, como pensamos, num erro fundamental que desgasta e
corrompe todo o sistema.
302
Logo, um sistema político que busque a paz e a harmonia entre os povos o pode
sobreviver sem o resgate do seu conteúdo ético.
Em estudo no qual se propõe uma releitura de Maquiavel adequada à pós-
modernidade, Emerson Gabardo,
303
teoriza que o novo príncipe deve atender a um espírito
ético-estatal pautado nos direitos humanos. O autor faz notar que o Estado contemporâneo
300
KEOHANE, Robert O. After Hegemony: cooperation and discord in the world political economy. Estados
Unidos: Princeton University Press, 2005. p. 16.
301
Id. Ibid., p. 14.
302
MANCINI, Pasquale Stanislao. Direito Internacional. Tradução Ciro Mioranza. Ijuí: Unijuí, 2003. p. 307.
(Coleção clássicos do direito internacional).
303
GABARDO, Emerson. O pós-moderno príncipe e a busca da tranqüilidade da alma. In: FONSECA, Ricardo
Marcelo (Org.). Repensando a teoria do estado. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 41.
está passando por um processo rápido e constante de substituição dos valores universais da
Ilustração pelos particularismos.
É fundamental que se promova a reavaliação do universalismo, porém é nocivo ao
desenvolvimento da sociedade mundial que o subjetivismo consiga continuar ganhando
espaço. Dentro de uma concepção universal, é preciso estabelecer um domínio dos direitos
humanos para todos os seres humanos, de forma a ampliar as garantias dos povos e assegurar
a busca do progresso cultural, social e tecnológico. A conclusão de Emerson Gabardo é que:
O espírito estatal propõe uma “ética política” de inspiração universalista
(hegeliana) e socialista (gramsciana). Para tanto, abandona-se o conceito
negativo de “virtude” contemplado por Maquiavel, rumo a uma proposta
ética positiva: a valorização da dignidade humana.
304
O caminho para a transformação do cenário internacional, portanto, é a compreensão
pelos atores internacionais de que a política de dominação e a busca desenfreada pelo poder
não podem prosseguir, sendo imprescindível que se combata as causas estruturais da violência
no mundo, diminuindo os conflitos decorrentes das disparidades sócio-econômicas,
implementando a efetiva promoção e proteção dos direitos humanos a todos os povos,
enfatizando o respeito à dignidade da pessoa humana e inserindo valores éticos nas relações
internacionais.
Dessa forma, a compreensão de que a biopirataria é uma prática que viola direitos
humanos deve ser o ponto de partida para uma construção teórica de cunho crítico que busca
fundamentos para a definição de um novo caminho a ser traçado nas relações internacionais
entre os países em desenvolvimento e os países desenvolvidos.
Além dessa abordagem, acredita-se que o paradigma da interdependência traz
também, alguns aportes relevantes para a discussão apresentada, revelando outros enfoques do
problema.
Quanto ao modelo da interdependência, sua análise de dará como um instrumento
teórico que pode contribuir para a compreensão das relações internacionais na atualidade, por
meio do favorecimento dos canais de diálogo para a cooperação internacional para o
desenvolvimento.
Como ficou demonstrado por Keohane, espaço para a cooperação mesmo em um
cenário internacional que dispense a figura da potência hegemônica, construída sobre as bases
do realismo. Logo, ainda que se assuma uma postura de admitir que nenhum dos paradigmas
304
GABARDO, Emerson. O pós-moderno príncipe e a busca da tranqüilidade da alma. In: FONSECA, Ricardo
Marcelo (Org.). Repensando a teoria do estado. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 43.
elaborados pela doutrina possa explicar de forma satisfatória a complexidade das relações
internacionais contemporâneas, no presente item, acolhe-se a teoria da interdependência como
um modelo teórico ideal, que pode contribuir de maneira mais adequada ao propósito
perseguido nesta pesquisa, que visa a implementação concreta da cooperação internacional
para o desenvolvimento em âmbito amazônico, como forma complementar à protão da
biodiversidade nacional e sub-regional, além da criminalização interna da biopirataria.
Raimundo dos Santos Júnior faz uma interessante colocação a esse respeito, que se
passa a reproduzir para a reflexão e desenvolvimento da presente linha de argumentação:
No geral, os fenômenos políticos transitam entre uma e outra teoria.
Existem, de fato, momentos em que os pressupostos realistas serão mais
precisos, mas, na maioria das vezes, a teoria da interdependência apresenta
melhores condições de retratar a realidade atual.
305
Assim, como já foi dito no item anterior deste mesmo capítulo, o realismo ainda é uma
teoria importante para a compreensão de certos fenômenos políticos, como a teoria da
dependência também teve sua relevância para explicar os motivos pelos quais muitos países
em desenvolvimento, e que chegaram a reunir em um determinado momento histórico as
condições necessárias para o crescimento, não conseguiram realizar o almejado salto de
qualidade que lhes permitiria ingressar, ainda no século XX, no chamado “Primeiro Mundo”.
A teoria da dependência, como se sustenta também nesta dissertação é um instrumento ainda
muito valioso para revelar o processo exploratório a que os países da América Latina estão
submetidos, quando se tem em foco, no momento presente, a biodiversidade versus empresas
transnacionais da biotecnologia.
Como ressaltam Kinoshita e nia Mota, a dependência é uma leitura a partir dos
“dominados” e que explica o “‘subdesenvolvimento’ como conseqüência direta e
proporcional da manutenção do desenvolvido”.
306
Os autores alertam, também, que a
interdependência, enquanto teoria elaborada pelos países centrais para negar a dependência,
deve ser examinada sob uma perspectiva crítica, não desprezando as desigualdades nas
relações internacionais e a prejudicialidade que possa advir nesse contexto aos Estados o
305
SANTOS JÚNIOR, Raimundo Batista. Diversificação das relações internacionais e teoria da
interdependência. In: BEDIN, Gilmar Antônio. et al. Paradigmas das relações internacionais: realismo,
idealismo, dependência, interdependência. 2. ed. Ijuí: Unijuí, 2004. p. 218. (Coleção relações internacionais e
globalização, v. 1).
306
KINOSHITA, Fernando; MOTA, Tânia. Uma análise contemporânea da crítica à teoria da dependência,
desde a perspectiva brasileira. Seqüência: estudos jurídicos e políticos, Florianópolis, ano 27, n. 54, p. 25, dez.
2007. No prelo.
“hegemônicos”.
307
Tomando como fundamentais essas considerações para a análise da teoria da
interdependência, passa-se ao exame do novo modelo teórico, salientando que o surgimento
da interdependência se deu em face das inúmeras mudanças ocorridas nas relações
internacionais, que apresentam como marco histórico o término da Segunda Guerra Mundial.
A fase do pós-guerra, embora em um primeiro momento tenha se norteado pela
estabilidade hegemônica das grandes potências militares vencedoras da conflagração mundial,
o que durou até o término da Guerra Fria, serviu também como meio propício para o
surgimento de várias organizações internacionais. Essa transição, estimulada por vários
fatores, mas principalmente pela globalização, aos poucos foi acrescentando outros atores no
cenário internacional, fazendo ruir a posição de supremacia dos Estados como os únicos
interlocutores nas relações internacionais.
Com os ventos da globalização a sociedade internacional se tornou cada vez mais
complexa. As relações internacionais antes eram marcadas pelos postulados teóricos do
realismo político, dentre os quais: a segurança, a militarização, a alternativa ao uso da força,
os Estados como únicos atores internacionais e a predominância da high politics. Esses
postulados passaram, então, por grandes transformações.
A globalização, notadamente econômica, exigiu maior integração entre os Estados,
amplificando-se as relações internacionais, que agora ocorrerem, não necessariamente pela
via interestatal, como esclarece Raimundo dos Santos Júnior, pois:
[...] uma relação transnacional compreende que os Estados não são os únicos
atores significantes em política mundial. Bancos, corporações empresariais,
ONGs, entre outras, são instâncias que atualmente, assim como a unidade
estatal ou seus componentes funcionais, a alteram significativamente.
308
Assim, a interdependência acarreta, também, uma considerável mutação nos temas de
política internacional, não havendo mais hierarquia nos assuntos de política externa, o que faz
perder o sentido a divisão entre high politics e low politics. O uso da força deixa de ser a
alternativa mais viável para assegurar a realização do poder. Neste ponto, aliás, convém
ressaltar que, segundo Raimundo Santos Júnior, o emprego da força se tornou extremamente
307
KINOSHITA, Fernando; MOTA, Tânia. Uma análise contemporânea da crítica à teoria da dependência,
desde a perspectiva brasileira. Seqüência: estudos jurídicos e políticos, Florianópolis, ano 27, n. 54, p. 26, dez.
2007. No prelo.
308
SANTOS JÚNIOR, Raimundo Batista. Diversificação das relações internacionais e teoria da
interdependência. In: BEDIN, Gilmar Antônio. et al. Paradigmas das relações internacionais: realismo,
idealismo, dependência, interdependência. 2. ed. Ijuí: Unijuí, 2004. p. 219. (Coleção relações internacionais e
globalização, v. 1).
complexo. O autor aponta dentre os fatores desestimuladores do uso da força o resultado
devastador que o emprego de armas nucleares poderia causar, a ineficiência do uso de armas
convencionais contra populações socialmente mobilizadas e a necessidade de uma ponderação
profunda em face das conseqüências negativas que o uso da força representa.
309
Assim sendo,
segundo o autor, o uso da força se justifica como alternativa possível nos casos em que o
problema assuma “proporções perigosas para a segurança ou a economia”.
310
Os teóricos da interdependência assinalam, ainda, que a dependência mútua entre os
Estados não se limita a situações de benefícios recíprocos,
311
pois a interdependência se
desenvolve de forma complexa e assimétrica, o que significa que não obrigatoriamente haverá
uma redução dos conflitos e que a assimetria nas relações também implica em diversos níveis
de dependência, abrindo-se a possibilidade, segundo André Meireles, de “atores menos
dependentes se aproveitarem das relações de interdependência como fontes de poder, ou seja,
como formas de imposição de suas necessidades ante as negociações com os demais
atores”.
312
Quanto a este aspecto, Keohane é taxativo ao afirmar que a cooperação não significa
uma ausência de conflito
313
e que, ao contrário, é uma reação ao conflito ou potencial conflito:
A cooperação ocorre somente em situações em que os atores percebem que
suas políticas estão de fato ou potencialmente em conflito, não onde existe
harmonia. A cooperação não deve ser vista com a ausência de conflito, mas
preferivelmente como uma reação ao conflito ou potencial conflito. Sem o
espectro do conflito, não há necessidade de cooperar.
314
Patrícia Alves observa, ainda, que se o grau de assimetria na relação de
interdependência for muito acentuado é provável que se tenha não mais uma relação de
309
SANTOS NIOR, Raimundo Batista. Diversificação das relações internacionais e teoria da
interdependência. In: BEDIN, Gilmar Antônio. et al. Paradigmas das relações internacionais: realismo,
idealismo, dependência, interdependência. 2. ed. Ijuí: Unijuí, 2004. p. 224. (Coleção relações internacionais e
globalização, v. 1)
310
Id. Ibid., loc. cit.
311
DI SENA JÚNIOR, Roberto. Poder e interdependência: perspectivas de análise das relações internacionais na
ótica de Robert O. Keohane; Joseph S. Nye. In: OLIVEIRA, Odete Maria de; DAL RI JÚNIOR, Arno. (Org.).
Relações internacionais: interdependência e sociedade global. Ijuí: Unijuí, 2003. p.188. (Coleção direito,
política e cidadania, v. 10).
312
MEIRELES, André Bezerra. Dependência e interdependência: variantes em uma mesma” realidade. In:
OLIVEIRA, Odete Maria de; DAL RI JÚNIOR, Arno. (Org.). Relações Internacionais: interdependência e
sociedade global. Ijuí: Unijuí, 2003. p.340. (Coleção direito, política e cidadania, v. 10).
313
KEOHANE, Robert O. After hegemony: cooperation and discord in the world political economy. Estados
Unidos: Princeton University Press, 2005. p. 53.
314
Id. Ibid., p. 54, tradução nossa. (Cooperation takes place only in situations in which actors perceive that their
policies are actually or potentially in conflict, not where there is harmony. Cooperation should not be viewed
as the absence of conflict, but rather as a reaction to conflict or potencial conflict. Without the specter of
conflict, there is no need to cooperate.)
interdependência, mas de dependência.
315
Por isso, é imprescindível que se tenha especial
atenção quanto às assimetrias que existem nas relações internacionais, pois se por um lado é
este desequilíbrio que gera um espaço para o conflito e também para atitudes concretas de
cooperação, por outro lado, a assimetria entre os atores não pode ser a tal ponto desigual que
um dos envolvidos não tire benefícios dessa relação. Nesse sentido, André Meireles faz as
seguintes constatações:
São as assimetrias de poder político e econômico que existem entre os
países, entretanto, que dão capacidade de negociar da melhor maneira
possível para a obtenção de seus interesses e é que se encontra o paralelo
dialético entre os paradigmas da dependência e da interdependência. A
interdependência pode ser retratada como uma disputa em que sempre
haverá assimetria entre seus atores, uma zona de conflitos e de cooperação
onde sempre perdas e ganhos, maiores e menores conquistas. Nenhum
dos envolvidos, contudo, pode deixar de ganhar, não podendo haver uma
perda total de seus objetivos, sob o risco de se transformar em uma relação
de dependência.
316
Assim, uma vez definidas as bases da interdependência, não é difícil ponderar que este
modelo é um importante instrumento teórico para explicar as relações internacionais na
contemporaneidade. Mesmo que não se admita quaisquer dos modelos como suficiente para a
compreensão das complexas relações que se desenvolvem entre os atores internacionais,
como já ficou asseverado neste trabalho, a interdependência traz aportes valiosos para a
discussão do tema das desigualdades entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, bem
como para criar um espaço de diálogo dentro desse campo conflituoso, que vise garantir mais
cooperação e, em última análise, realização dos direitos humanos em nível individual e
coletivo que culmina com o próprio desenvolvimento do Estado.
No item a seguir, se pretende mostrar o nível de desigualdade em que o Brasil e os
países da América Latina se encontram, de forma que, uma vez se conhecendo esta realidade,
seja possível identificar um cenário internacional de interdependência entre os Estados e os
demais atores internacionais, onde exista um dever de cooperação para que se possa atingir o
desenvolvimento mundial.
3.3 Crítica ao modelo atual de cooperação internacional e sua necessária relação com o
desenvolvimento sustentável e os direitos humanos
315
ALVES, Patrícia Vignolo. A interdependência complexa e os direitos humanos. In: OLIVEIRA, Odete Maria
de; DAL RI JÚNIOR, Arno. (Org.). Relações internacionais: interdependência e sociedade global. Ijuí:
Unijuí, 2003. p. 364. (Coleção direito, política e cidadania, v. 10).
316
MEIRELES, André Bezerra. Dependência e interdependência: variantes em uma “mesma” realidade. In: Id.
Ibid., p. 346.
Não se pretende nesse ponto entabular uma discussão profunda sobre um conceito de
cooperação internacional. Busca-se, contudo, definir em termos teóricos o que se entende por
cooperação internacional, que este termo é um conceito operacional importante para esse
trabalho, sendo fundamental que ao menos se delimite o seu significado na forma utilizada
para esta pesquisa.
Kinoshita, em sua tese de doutoramento, aborda alguns conceitos de cooperação
internacional, como a noção extraída do Dictionnaire de la terminologie du Droit
International, que define cooperação como sendo uma “ação coordenada de dois ou vários
Estados com vistas a alcançar resultados que eles consideram desejáveis”.
317
Colhe-se, ainda, no trabalho de Kinoshita, o conceito elaborado por Perez Gonzalez,
para quem a cooperação internacional é a via adequada para os Estados alcancem interesses
coletivos, por meio da conjunção de esforços comuns.
318
Dessas duas definições já se pode extrair um elemento para a formação do conceito de
cooperação que se revela, de certa forma, indiscutível. A cooperação pressupõe um processo
de negociação e, portanto, um acordo de vontades.
Keohane distingue claramente cooperação de harmonia. Para o autor, enquanto nesta
última cada ator automaticamente facilita que o outro alcance seus objetivos, naquela cada um
dos atores internacionais busca se adequar ao outro através de um processo de negociação.
319
Na dicção do próprio Keohane: “A cooperação ocorre quando os atores ajustam seus
comportamentos às preferências reais ou esperadas pelos outros atores, por meio de um
processo de coordenação política”.
320
A cooperação, segundo Keohane, é desnecessária onde existe a harmonia, pois como
ficou consignado linhas atrás, o campo propício para a cooperação é uma relação onde
esteja presente um certo grau de conflito.
321
A razão pela qual um determinado ator i
conseguir com que outros atores adiram a sua política é o resultado de um processo político
de coordenação.
322
317
Apud KINOSHITA, Fernando. El tratado de libre comercio entre la Unión Europea y el Mercosur:
consolidación de un marco jurídico-económico internacional. Tesis doctoral, Madrid: Universidad
Pontificia Comillas/ICADE, 1999. p. 57-58.
318
Apud KINOSHITA, op. cit., p. 58.
319
KEOHANE, Robert O. After hegemony: cooperation and discord in the world political economy. Estados
Unidos: Princeton University Press, 2005. p. 51
320
Id. Ibid., p. 51, tradução nossa. (Cooperation occurs when actors adjust their behavior to the actual or
anticipated preferences of others, through a process of policy coordination.)
321
Vide p. 108.
322
KEOHANE, op. cit., p. 51-52.
Colocadas essas balizas, é possível adentrar em outra definição que se reputa de
grande importância. É imprescindível que se refine ainda mais a idéia de cooperação para se
chegar na definição de uma cooperação para o desenvolvimento, que é o que, de fato,
interessa a esta pesquisa.
Bruno Pino esboça a seguinte definição de cooperação internacional para o
desenvolvimento:
Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, entendida como o
conjunto de ações que realizam os governos e seus organismos
administrativos, assim como entidades da sociedade civil de um determinado
país ou conjunto de países, orientadas a melhorar as condições de vida e
impulsionar o processo de desenvolvimento em países em situação de
vulnerabilidade social, econômica ou política e que, além disso, não tem
capacidade suficiente para melhorar sua situação por si sós.
323
O autor explicita, também, que no campo da cooperação internacional para o
desenvolvimento diversas formas de ajuda, dentre elas a Ajuda Oficial para o
Desenvolvimento (AOD), que é o repasse de recursos, em condições vantajosas, de países
desenvolvidos para os países em via de desenvolvimento.
Importa notar, entretanto, que uma crítica bastante consistente vem sendo feita em
relação à cooperação internacional para o desenvolvimento. Em verdade, observa-se que na
atualidade o fluxo de recursos a título de cooperação, pouco serve para fomentar o
desenvolvimento dos países que se encontram em uma situação desfavorecida. Esta afirmação
se fundamenta na opinião, dentre outros, de José Antonio Sanahuja, que salienta que a
pobreza e o direito ao desenvolvimento, principais e legítimos objetivos da cooperação
internacional, passaram a ser substituídos pela “securitización de la ayuda”, notadamente após
o atentado de 11 de Setembro.
324
O grande fantasma das nações ditas desenvolvidas, na atualidade, é o terrorismo e, por
esse motivo, não é de se espantar que os países que mais se beneficiam da cooperação
internacional são aqueles que onde se concentra a “guerra contra o terrorismo”. Bruno Pino
também chama atenção para a securitização da cooperação internacional, tecendo os seguintes
323
PINO, Bruno Ayllón. América Latina en el sistema internacional de cooperación para el desarollo. In:
SOTILLO, José Angel; PINO, Bruno Ayllón. (Org.). América Latina en construcción: sociedad, política,
economia y relaciones internacionales. Madrid: Catarata, 2006. p. 251, tradução nossa. (Cooperación
Internacional para el Desarollo, entendida como el conjunto de acciones que realizan gobiernos y sus
organismos administrativos, acomo entidades de la sociedad civil de um determinado país o conjunto de
países, orientadas a mejorar las condiciones de vida e impulsar los procesos de desarollo en países en situación
de vulnerabilidad social, económica o política y que, además, no tienen suficiente capacidad para mejorar su
situación por sí solos.)
324
SANAHUJA, José Antonio. La “securitización”de la ayuda tras el 11-S: ni seguridad, ni desarollo. [S.l.:
s.d.]. p. 16-17.
comentários:
Caberia apontar nestas páginas se não nos encontramos com todos os
elementos necessários para formular a hipótese de uma nova dinâmica que
está organizando, ou melhor “desorganizando”, a CID: o conflito entre o
mundo ocidental e o mundo islâmico. As tendências que se registram a partir
do 11 de setembro na direção da “securitizaçãoda ajuda, em benefício de
países como o Iraque, Paquistão e Afeganistão, parecem confirmar esta
hipótese que desejamos não se veja provada.
325
Reforçando a sua convicção quanto à securitização da ajuda oficial, o autor ainda
destaca que, ao se levar em consideração apenas os recursos recebidos pelo Iraque e pelo
Afeganistão em 2003, que beirou 3.500 milhões de dólares, a correspondência é de 64% em
relação a toda AOD aportada para a América Latina, que tem uma população infinitamente
superior.
326
Atualizando-se esses dados, mediante consulta ao Relatório de Cooperação para o
Desenvolvimento de 2006, vê-se que a situação não mudou. Em uma curva ascendente, foram
aportados a tulo de AOD para o Afeganistão, nos anos de 2004 e 2005, respectivamente,
US$ 2.188 milhões e US$ 2.775 milhões. No caso do Iraque, o quadro também não se alterou,
como se observa dos dados a seguir: US$ 4.650 milhões, em 2004 e US$ 21.654 milhões em
2005. Ainda visando estabelecer melhor as comparações, toda AOD concedida à América do
Sul vem seguindo uma curva descendente: US$ 3.112 milhões em 2003; US$ 2.934 milhões
em 2004 e US$ 2.543 milhões em 2005.
327
Não se pretende fazer uma análise mais ampla e aprofundada desses fluxos de recursos
provenientes da AOD, mas convém registrar que se foram acrescentados outros fatores como
número de habitantes, distribuição de renda e que a “cruzada” contra o terrorismo em boa
parte se deve uma política internacional de cunho realista, levada a efeito pelos Estados
Unidos da América enquanto potência militar “hegemônicae seus aliados, fica patente que
se não houver uma reavaliação desses posicionamentos, a cooperação internacional como
325
PINO, Bruno Ayllón. América Latina en el sistema internacional de cooperación para el desarollo. In:
SOTILLO, José Angel; PINO, Bruno Ayllón. (Org.). América Latina em construcción: sociedad, política,
economia y relaciones internacionales. Madrid: Catarata, 2006. cap. 6, p. 248, tradução nossa. (Cabria apuntar
en estas páginas si no nos encontramos con todos los elementos necesarios para formular la hipótesis de una
nueva dinámica que está organizando, o mejor desorganizando”, la CID: el conflicto entre el mundo
occidental y el mundo islámico. Las tendências que se registran a partir del 11 de septiembre hacia la
“securitización” de la ayuda, en beneficio de países como Iraq, Pakistán o Afeganistán, parecen confirmar esta
hipótesis que deseamos no se vea probada.)
326
Id. Ibid., p. 268.
327
Todos os dados estatísticos citados foram obtidos no: DEVELOPMENT CO-OPERATION REPORT – 2006.
OECD, 2007, vol. 8, 1, p. 187, tabela 25. Disponível em: <http://www.ocde.org>. Acesso em: 5 nov.
2007.
instrumento de promoção ao desenvolvimento não alcançará os fins almejados em prol da
construção de um mundo com menos desigualdade e mais sustentabilidade.
Quanto ao conceito de desenvolvimento, o mesmo não pode se restringir a uma noção
reducionista de desenvolvimento como algo limitado, exclusivamente, à idéia de crescimento
econômico. O conceito de desenvolvimento também seria insatisfatório se admitisse outros
enfoques, mas não pretendesse correlacioná-los. Por essas razões, considera-se de grande
relevância o esforço científico de Kinoshita, que constrói um conceito de desenvolvimento
que busca a universalidade e que não se limita à noção tradicional fragmentária, restrita a
visões e áreas de atuação limitadas no tempo, conforme a ênfase que se em um
determinado aspecto do “desenvolvimento”, segundo os momentos históricos e as políticas
internacionais
328
.
Deve-se ter presente, como argumenta o próprio autor, que o conceito de
desenvolvimento, ao longo do tempo, foi objeto de ênfases diversas. Em um primeiro,
momento, o termo desenvolvimento passou a ser utilizado, com o surgimento da Organização
das Nações Unidas, em 1945, quando o termo tinha uma significação acanhada, no sentido de
se satisfazer com os aspectos do desenvolvimento econômico e social, sendo que este
conceito estava em sintonia com os objetivos fundamentais da própria organização
internacional (arts.1º e 55 da Carta da Nações Unidas),
329
no momento da sua criação.
330
Com as transformações do cenário internacional, essa perspectiva logo se mostrou
insuficiente, ainda que alcançar o progresso econômico e com isso trazer também as
vantagens de um desenvolvimento social fossem os principais objetivos dos países que
acabavam de sair da 2ª Guerra Mundial. Verificou-se, porém, que atrelar o desenvolvimento a
metas eminentemente econômicas representava uma visão extremamente reducionista e
liberal que findava por desprezar outros aspectos importantes que deveriam ser incorporados
no conceito de desenvolvimento.
Nessa linha de evolução, Sachs lembra que vários padrões de crescimento
diferentes e um desses tipos é chamado pelo autor de crescimento selvagem”,
331
pelo qual se
pagou um “alto preço social e ecológico”.
332
Cristovam Buarque denominou esta situação
328
KINOSHITA, Fernando. Ciência, tecnologia e sociedade: uma proposta renovada de desenvolvimento
sustentável de caráter universal. jul. 2007, p. 15. Mimeografado.
329
ONU. Carta das nações unidas. Coletânea de direito internacional. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004. p. 33 e 41.
330
KINOSHITA, op. cit., p. 16.
331
SACHS, Ignacy. Desenvolvimento sustentável. Brasília: Ibama, 1996, p. 10 (Série meio ambiente em
debate, n. 7). Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/edicoes/site/pubLivros/serie_07.pdf>. Acesso em: 10
nov. 2007.
332
Id. Ibid, loc. cit.
como o susto do limite ecológico”,
333
para se referir ao momento em que a Ecologia trouxe
argumentos que tornaram necessária a imposição de limites à capacidade de crescimento da
economia. De repente, se passou a ter a consciência de que os recursos naturais o são
inesgotáveis.
Tanto Sachs,
334
quanto Cristovam Buarque,
335
lembram que o paradigma do
desenvolvimento econômico a todo custo, como motor para a melhoria das condições de vida
das pessoas, passou a ser abertamente criticado, até que em 1972, na Conferência de
Estocolmo, com a publicação do livro Limit to Growth, ficou patente a limitação e
inviabilidade do conceito nos parâmetros originariamente propostos.
O sistema vigente voltado para a acumulação de riquezas apenas gerou mais
desigualdade e degradação ambiental, sendo importante frisar que a esperada distribuição de
renda para as populações mais pobres, que deveria ocorrer como conseqüência do
desenvolvimento econômico, não foi alcançada, tornando-se uma utopia, pois, em verdade, os
que já eram ricos, se tornaram mais ricos.
A partir daí se torna necessário um conceito de desenvolvimento sustentável com
outros elementos que ultrapassam os aspectos exclusivamente econômico e social. O aspecto
político não pode ser mais desprezado, pois como lembra Kinoshita, fazendo remissão a Celso
Albuquerque de Mello, este orientará o sentido do desenvolvimento econômico.
336
Outros fatores são chamados a compor, também, um novo conceito de
desenvolvimento. Sachs ressalta a dimensão cultural do conceito, alertando para a
“impossibilidade de forçar padrões, paradigmas de desenvolvimento que não correspondem à
cultura de um dado grupo ou povo”.
337
Além disso, Sachs se refere, de igual modo, a um “critério de sustentabilidade
espacial-territorial”, pois na sua visão a má distribuição dos homens e das atividades humanas
no planeta é uma das principais causas da “crise sócio-ambiental”.
338
Nesse contexto, a reformulação do conceito de desenvolvimento se tornou
praticamente inevitável, pois o paradigma existente, de bases liberais, apresenta-se superado,
333
BUARQUE, Cristovam. Modernidade, desenvolvimento e meio ambiente. Brasília: Ibama, 1996. p. 12
(Série meio ambiente em debate, n. 2). Disponível em:
<http://www.ibama.gov.br/edicoes/site/pubLivros/serie_02.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2007.
334
SACHS, Ignacy. Desenvolvimento sustentável. Brasília: Ibama, 1996. p. 10 (Série meio ambiente em
debate, n. 7). Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/edicoes/site/pubLivros/serie_07.pdf>. Acesso em: 10
nov. 2007.
335
BUARQUE, op. cit., p. 12.
336
KINOSHITA, Fernando. Ciência, tecnologia e sociedade: uma proposta renovada de desenvolvimento
sustentável de caráter universal. jul. 2007, p. 16. Mimeografado.
337
SACHS, op. cit., p. 11.
338
Id. Ibid., loc. cit.
devendo ser substituído por um conceito mais abrangente, que além das dimensões apontadas,
tenha como um dos seus elementos centrais a questão ecológica, como uma preocupação
reconhecidamente universal.
Nesse sentido, em 1987 foi apresentado o Relatório Final da Comissão Mundial sobre
o Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, com o título “Nosso Futuro
Comum”,
339
que propôs o seguinte conceito de desenvolvimento sustentável, na Parte 1,
subtítulo “Desenvolvimento Sustentável”, item 27:
A humanidade tem a capacidade de fazer o desenvolvimento sustentável
para assegurar que se alcance as necessidades do presente sem comprometer
a capacidade para as gerações futuras alcançar as suas próprias necessidades.
O conceito de desenvolvimento sustentável implica limites não limites
absolutos, mas limitações impostas pelo estado presente da tecnologia e da
organização social sobre os recursos ambientais e da capacidade da biosfera
de absorver os efeitos das atividades humanas.
340
O termo desenvolvimento sustentável, mesmo na forma proposta pela Comissão
Brundtland, não é um conceito acabado
341
e acredita-se, na linha do que defende Kinoshita,
342
que este conceito sempre estará sujeito a algum tipo de aperfeiçoamento e evolução, devido
ao seu aspecto complexo e transdisciplinar.
Seguindo uma linha de desdobramento natural, a partir do esforço crítico exercido
pelo Relatório Brundtland, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, também chamada de ECO-92, elaborou-se o documento denominado
339
Esse relatório foi intitulado pela Comissão como “Our Common Future” e também ficou conhecido como
Relatório Brundtland, em homenagem a Coordenadora da Comissão, Gro Harlem Brundtland.
340
RELATÓRIO COMISSÃO MUNDIAL SOBRE O MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nações
Unidas, Assembléia Geral de 4 de agosto de 1987. Disponível em:
<http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N87/184/67/IMG/N8718467.pdf?OpenElement. Acesso em: 10
nov 2007, tradução nossa. (Humanity has the ability to make development sustainable to ensure that it meets
the needs of the present without compromising the ability of future generations to meet their own needs. The
concept of sustainable development does imply limits not absolute limits but limitations imposed by the
present state of technology and social organization on environmental resources and by the ability of the
biosphere to absorb the effects of human activities.)
341
Não se pretende no âmbito desta pesquisa discutir a origem do termo desenvolvimento sustentável, mas não
se pode deixar de registrar que muita discussão em torno de quando se utilizou pela primeira vez tal
expressão e quem a teria inventado. Como esse tipo de polêmica em pouco contribuiria para os argumentos
que se desenvolvem neste estudo, reproduz-se Carlos Alfredo Joly, que resume brevemente toda a discussão:
“Os que gostam de romancear a história do ambientalismo dizem que a formulação do conceito de
desenvolvimento sustentado, que aparece pela primeira vez no relatório da Comissão Brundtland em 1987 ,
baseou-se no dito popular africano ‘Nós não herdamos a Terra de nossos pais nós a emprestamos de nossos
filhos’. Outros postulam que o conceito é uma evolução do termo ecodesenvolvimento, utilizado por Maurice
Strong em 1973, na primeira reunião do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), e
posteriormente definido por Ignacy Sachs em 1974 no clássico ‘Environnement et styles de développement’
(Sachs, 1986)”. (JOLY, Carlos Alberto. Desenvolvimento sustentável: a utopia possível?. Disponível em:
<http://www.biotaneotropica.org.br/v3n2/pt/editorial>. Acesso em: 10 nov. 2007)
342
KINOSHITA, Fernando. Ciência, tecnologia e sociedade: uma proposta renovada de desenvolvimento
sustentável de caráter universal. jul. 2007, p. 16. Mimeografado.
Agenda 21, que embora não tenha o status de hard law, representa, igualmente, um marco
muito importante na evolução do conceito de desenvolvimento sustentável, pois se ampliou
mais uma vez esta noção para enfatizar que no desenvolvimento sustentável deve-se levar em
consideração uma conjunção de fatores, como pobreza, fome, doenças, analfabetismo,
degradação do meio ambiente e que nenhuma não nação pode construir um futuro próspero e
seguro sozinha.
343
Na Cúpula Mundial de Joanesburgo sobre o Desenvolvimento Sustentável ocorre
efetivamente uma consolidação do conceito, que passou a se apoiar, como se manifesta
Kinoshita, em três pilares interdependentes e complementares: o desenvolvimento econômico,
o desenvolvimento social e a proteção ao meio ambiente.
344
Na Declaração de Joanesburgo
sobre o Desenvolvimento Sustentável, consta o seguinte propósito:
Reconhecemos que a erradicação da pobreza, a mudança dos padrões de
consumo e produção e a proteção e manejo da base de recursos naturais para
o desenvolvimento econômico e social são objetivos fundamentais e
requisitos essenciais do desenvolvimento sustentável.
345
Não se pode, portanto, perder neste processo de evolução histórica do conceito as
diversas facetas do direito ao desenvolvimento, que podem ser: o desenvolvimento
econômico, o desenvolvimento social, o desenvolvimento político, o desenvolvimento
ambiental, o desenvolvimento cultural e o desenvolvimento científico tecnológico.
O conceito de desenvolvimento sustentável para Kinoshita dever ser aberto e
dinâmico, nunca fechando as portas a novos elementos que possam dar mais relevância e
alcance a este direito, como, por exemplo, o desenvolvimento espiritual, enquanto algo que
toca as pessoas e as transforma
346
.
A dimensão espiritual do conceito é muito valiosa e pode ser confirmada nas palavras
de Leonardo Boff, que revelam, com muita clareza, que as transformações na busca de um
futuro melhor para a humanidade, dependem diretamente dessa compreensão, mas do que de
forças políticas:
Precisamos sim de revoluções para realizar as transformações necessárias.
343
Vide AGENDA 21, Capítulo 1, item 1.1. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=18&idConteudo=579>. Acesso em: 10
nov. 2007.
344
KINOSHITA, Fernando. Ciência, tecnologia e sociedade: uma proposta renovada de desenvolvimento
sustentável de caráter universal. jul. 2007, p. 17. Mimeografado.
345
DECLARAÇÃO DE JOANESBURGO SOBRE O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, item n. 11.
Disponível:<http://www.ana.gov.br/AcoesAdministrativas/RelatorioGestao/Rio10/Riomaisdez/documentos/68
0-DeclaracaoPoliticaJoanesburgo.doc.149.wiz>. Acesso em: 1 set. 2007.
346
KINOSHITA, op. cit., p. 16.
Mas elas não se farão por forças políticas, que supõem um determinado
sujeito histórico, certo projeto e estratégias de realização. O tempo deste tipo
de revolução passou. Em fase de globalização, precisamos antes de uma
coalizão de forças éticas, morais e humanitárias que se mobilizam para as
transformações que têm como destino a inteira humanidade. Elas começam
pela transformação das subjetividades, pessoais e coletivas.
347
A proposta defendida no artigo, portanto, introduz uma nova forma de pensar e
trabalhar a questão do desenvolvimento, a partir de uma crítica à visão fragmentária
dominante. Contrastando o conceito tradicional de desenvolvimento, orientado por uma
abordagem fracionada e fortemente influenciada pelos momentos históricos e pela lógica
economicista reducionista; com a proposta do autor, surge logo a constatação de que o
conceito proposto define contornos mais abrangentes para o termo, afastando-se, de plano,
qualquer associação do vocábulo desenvolvimento ao seu aspecto meramente econômico.
É um esforço de se estabelecer um conceito de desenvolvimento sustentável ampliado,
desde uma perspectiva inter e transdisciplinar que abranja todos os conceitos anteriores de
desenvolvimento, tomando-os como indivisíveis, interdependentes, inter-relacionados e
complementares, fato este que representa um grande avanço.
Essa transformação paradigmática descortina uma rie de novas possibilidades, que,
certamente, favorecem mudanças de abordagem para o tema, que podem ser mais
interessantes aos países em desenvolvimento num primeiro momento, tendo por fim
beneficiar a própria Humanidade de forma mais equilibrada.
A proposta defendida no artigo tem uma orientação metodológica de grande utilidade,
pois se propõe a construir um conceito de desenvolvimento que atende ao pensamento
complexo e, portanto, se insere dentro desse novo contexto que tem por certo a superação de
um modelo de sociedade industrial, na qual as relações se desenvolviam de uma forma
bastante simplificada, repetitiva, economicista e reducionista.
Neste sentido, é fato a existência de uma nova estrutura social, que alguns chamam de
sociedade de informação, pós-moderna, pós-industrial, dentre outros adjetivos, e que demanda
um novo approach investigativo. A estes efeitos, conforme trabalhado no Capítulo I, Edgar
Morin se refere a este momento como a “era planetária”,
348
na qual, cada vez mais, a
sociedade é chamada a enfrentar os desafios da complexidade. Assim, em uma sociedade
complexa o paradigma cartesiano, centrado na lógica racional que impunha a fragmentação do
347
BOFF, Leonardo. Civilização planetária: desafios à sociedade e ao cristianismo. Rio de Janeiro: Sextante,
2003. p. 96.
348
MORIN, Edgar. Educação na era planetária. Disponível em:
<http://www.universodoconhecimento.com.br/edgardmorin.php>. Acesso em: 30 mai. 2007.
conhecimento, não tem mais serventia para a compreensão da realidade de uma “era
planetária”, em que a interação entre diversos fatores, sejam eles econômicos, sociais,
culturais, políticos, ecológicos, espirituais, éticos, entre outros, é o elemento característico
dessa nova estrutura civilizatória.
Recorde-se que o que é complexo é o que “encerra muitos elementos
349
. Logo,
transportando-se este pensar complexo para o campo do conceito de desenvolvimento, é
inevitável, que para se elaborar uma noção de desenvolvimento que se pretenda universal,
deva-se abandonar o reducionismo, que impede o conhecimento complexo e toma o fenômeno
apenas de forma fragmentária.
Não se concebendo a complexidade, ainda que se admita os diversos aspectos que
envolvem o fenômeno do desenvolvimento, essas categorias não serão relacionadas entre si.
Não se compreenderá, portanto, o que Morin chama de o “princípio do holograma”
350
, pois a
exemplo do que ocorre em um holograma, uma pequena parte do objeto contém a totalidade
do que está representado. Para Morin, a idéia do holograma “vai além do reducionismo que
as partes e do holismo que o todo”.
351
Em outras palavras, se não for por uma visão
que aceite a complexidade, não será possível alcançar a realidade plena.
Por isso, o conceito de desenvolvimento não pode desconsiderar a complexidade,
ampliando-se a noção para fundir no conceito de desenvolvimento sustentável todos os
conceitos, sem perder de vista a indivisibilidade, a interdependência, inter-relação e
complementariedade desses conceitos, pois a complexidade é a união entre a unidade e a
multiplicidade”.
352
Por outro lado, não se poderia deixar de questionar se a ampliação do conceito o
estaria a representar um esforço inútil, pois a multidimensionalidade poderia amplificar o
conceito de tal forma a desnaturá-lo ou, de algum modo, torná-lo inaplicável pelo grau de
abstração que poderá alcançar. Essa crítica, acredita-se pode ser facilmente afastada, já que,
consoante afirmado por Kinoshita, o conceito proposto é extremamente dinâmico.
353
Assim,
essa relatividade no conceito é que lhe a permeabilidade para acolher as diversas
dimensões do fenômeno e se remodelar, inclusive, ao longo do tempo.
Assim sendo, a proposta representa um importante passo para a busca de um conceito
349
CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimolóligo nova fronteira da língua portuguesa. 2. ed. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1989. p. 201.
350
MORIN, Edgar. Educação na era planetária. Disponível em:
<http://www.universodoconhecimento.com.br/edgardmorin.php>. Acesso em: 30 mai. 2007.
351
Id. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2006. p. 74.
352
Id. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 10. ed. São Paulo: Cortez, 2005. p. 38-39.
353
KINOSHITA, Fernando. Ciência, tecnologia e sociedade: uma proposta renovada de desenvolvimento
sustentável de caráter universal. jul. 2007, p. 16. Mimeografado.
universal e complexo, posto que, ao mesmo tempo em que apresenta um conceito ampliado,
não considera este conceito acabado e admite que ele pode sempre evoluir.
Nesse diapasão, o pensamento complexo ensina que nenhuma realidade pode ser
compreendida de modo unidimencional
354
, sendo que Morin lembra que “a consciência da
multidimencionalidade nos conduz à idéia de que toda visão unidimensional, toda visão
especializada, parcelada é pobre”.
355
Com isso, adverte o autor que este tipo de visão
unidimensional deve ser ligada a outras dimensões de forma a buscar a sua
multidimensionalidade. Para Morin a complexidade aspira à completude, mas a própria
“consciência da complexidade nos faz compreender que jamais poderemos escapar da
incerteza e que jamais poderemos ter um saber total: ‘a totalidade é a não-verdade’”.
356
Essas colocações de Morin revelam que o conceito de desenvolvimento sustentável, na
visão de Kinoshita, sendo um conceito multidimensional e, portanto, complexo, ainda que
traga em si mesmo uma aspiração à completude, jamais poderá ser um conceito total ou
absoluto.
Feitas estas considerações e diante da especificidade relativa à promoção e proteção da
biodiversidade brasileira e amazônica, o desenvolvimento que se propõe aos países
amazônicos é um desenvolvimento sustentável, entendido na sua acepção multidimensional e
complexa, na forma proposta por Kinoshita. A realização desse desenvolvimento sustentável
dependerá em grande medida da cooperação, pois o conceito pressupõe também uma tomada
de consciência em que o individual deixa de ser importante, ganhando-se destaque o aspecto
coletivo. Quanto a este processo de transformação, Leonardo Boff, inclusive, teoriza uma
idéia de consciência planetária que bem se aplica ao conceito de desenvolvimento sustentável.
Para o autor: “somos co-responsáveis pelo nosso destino comum, humano e terrenal, pois
constituímos uma unidade coesa e diversa”.
357
Em termos práticos, há pelo menos duas conseqüências diretas da aceitação deste
conceito ampliado proposto no artigo, no que tange ao campo da cooperação internacional
para o desenvolvimento.
Em primeiro lugar, o conceito serve para orientar uma nova forma de diálogo entre os
atores envolvidos, na proporção em que os projetos de cooperação internacional para o
desenvolvimento, incorporando este novo conceito, poderão ampliar de forma sensível as
354
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Tradução Eliane Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2006,
p. 69.
355
Id. Ibid., p. 69.
356
Id. Ibid., p. 69.
357
BOFF, Leonardo. Civilização planetária: desafios à sociedade e ao cristianismo. Rio de Janeiro: Sextante,
2003. p. 96.
formas de solidariedade internacional. Não se trabalhará mais com um conceito limitado ou
que, mesmo se preocupando com vários conceitos de desenvolvimento, não faça a devida
interconexão entre esses conceitos.
Em segundo lugar, ou em um segundo plano, o conceito ampliado, em nível local,
tende a significar que a cooperação será recebida não para alcaar um ou alguns aspectos do
desenvolvimento (econômico, social, político, ambiental, científico, tecnológico, cultural ou
espiritual), mas para atingir um desenvolvimento sustentável, em que todas essas dimensões
devem estar contempladas, sendo indivisíveis, interdependentes, inter-relacionadas e
complementares. Dessa forma, o desenvolvimento será sustentável porque tomará o
desenvolvimento a partir da sua complexidade, criando as bases junto à população para as
transformações necessárias que possam emancipar as comunidades menos favorecidas, que
em geral são as mais prejudicadas.
Quanto à relação entre desenvolvimento e direitos humanos, uma vez enfrentada a
árdua e interminável tarefa de conceituar desenvolvimento sustentável, é preciso ter presente,
ainda, que o conceito de desenvolvimento sustentável, sendo a fusão de todos os conceitos de
desenvolvimento, representa um direito fundamental que, por sua vez, é a síntese de todos os
direitos humanos do indivíduo. Daí decorre que buscar o desenvolvimento a partir dessa
concepção ampliada é promover e proteger os direitos humanos não somente daqueles que são
menos favorecidos, mas igualmente de toda a sociedade.
Patrícia Alves destaca o caráter de essencialidade que o direito ao desenvolvimento
representa em relação aos demais direitos, quando assevera que:
A importância do tema direito ao desenvolvimento reside no fato de que,
atualmente, este é considerado como essencial à própria existência dos
outros direitos de cunho humanitário. Se não existirem condições para uma
vida digna, impossível será exercer qualquer outro direito em nível político
ou cultural.
358
Há autores, ainda, como Irene Hadiprayitno, que enfatizam um outro aspecto de
extrema relevância, colocando o direito ao desenvolvimento como a solução para o problema
da eliminação da pobreza.
359
Desenvolvendo a sua linha de argumentação, a autora inicialmente destaca que
segundo o Banco Mundial a pobreza mata mais que a guerra, sendo, portanto, uma questão de
358
ALVES, Patrícia Vignolo. A interdependência complexa e os direitos humanos. In: OLIVEIRA, Odete Maria
de; DAL RI JÚNIOR, Arno. (Org.). Relações internacionais: interdependência e sociedade global. Ijuí:
Unijuí, 2003. p. 363. (Coleção direito, política e cidadania, v. 10).
359
HADIPRAYITNO, Irene I. Poverty and international human rights law. Disponível em:
<http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=602321>. Acesso em: 11 nov. 2007.
direitos humanos. Para Irene Hadiprayitno, o conceito de pobreza não é apenas a privação
econômica ou de recursos materiais, mas também a violação da dignidade humana. Assim,
define pobreza, em termos de direitos humanos, como:
[...] uma condição humana caracterizada pela privação contínua ou crônica
de recursos, capacidades, escolhas, segurança ou poder necessário para a
satisfação de um padrão adequado de vida e outros direitos civis, culturais,
econômicos, políticos e sociais.
360
Por outro lado, Sachs também é muito incisivo ao colocar a pobreza extrema como um
elemento de “negação manifesta dos direitos fundamentais”
361
e lembra que o
desenvolvimento, enquanto caminho para a apropriação dos direitos humanos, deve se aplicar
a totalidade das nações:
Em sua forma pluridimensional, o desenvolvimento, entendido ao mesmo
tempo como um projeto (uma norma) e o caminho histórico em direção a ele
aplica-se à totalidade das nações. De forma alguma limita-se apenas ao caso
dos países sucessivamente chamados de atrasados, subdesenvolvidos, menos
desenvolvidos, em via de desenvolvimento. Ele é reconhecido como um dos
dois eixos de ação do sistema da ONU, ao lado da manutenção da paz.
362
Assim, considerando que o direito ao desenvolvimento é um direito síntese de todos os
outros direitos humanos, com o mero objetivo de dimensionar a extensão das necessidades
mais essenciais da pessoa humana, passa-se a citar alguns desses direitos relacionados por
Irene Hadiprayitno: direito a um padrão de vida decente; direito à habitação; direito à
educação; direito ao trabalho; direito à saúde; direito à proteção da família; direito de ser
reconhecido como pessoa perante a lei e ser registrado; direito à vida e direito à integridade
física; direito de acesso à justiça; direito de tomar parte nos assuntos políticos.
363
A enumeração, evidentemente, não pretende ser exaustiva, mas serve para demonstrar
que a realização desses direitos humanos pode ser alcançada pelo desenvolvimento. Desse
modo, mesmo correndo o risco de ser redundante, o desenvolvimento a que se está referindo é
aquele que foi delineado no item anterior e que apresenta um caráter complexo, pois como
360
HADIPRAYITNO, Irene I. Poverty and international human rights law. Disponível em:
<http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=602321>. Acesso em: 11 nov. 2007, tradução nossa. (a
human condition characterized by the sustained or chronic deprivation of the resources, capabilities, choices,
security and power necessary for the enjoyment of an adequate standard of living and other civil, cultural,
economic, political and social rights.)
361
SACHS, Ignacy. O desenvolvimento enquanto apropriação dos direitos humanos. Tradução de Gilberto
Pinheiro Passos.
Estudos Avançados, 1998, vol. 12, n. 33, ISSN 0103-4014.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40141998000200011&script=sci_arttext>.
Acesso em: 11 nov. 2007.
362
Id. Ibid.
363
HADIPRAYITNO, op. cit.
ficou assentado, o desenvolvimento enquanto progresso econômico é uma noção superada e
jamais serviria como conceito que pudesse reunir todos as dimensões de direitos humanos,
como se tenciona ao reconhecer o direito ao desenvolvimento como um direito síntese dos
demais direitos do ser humano.
Nicolás Angulo ressalta quanto a este aspecto que a satisfação das necessidades
fundamentais do ser humano é pressuposto para que se possa exercer e desfrutar de todos os
direitos humanos.
364
Arjun Sengupta, por sua vez, lembra que é importante identificar o direito ao
desenvolvimento como fazendo parte do rol de direitos humanos, pois o reconhecimento de
qualquer direito fundamental decorre da construção de um consenso e aqueles que
participaram desse processo de aceitação do direito ao desenvolvimento como um direito
humano, certamente buscarão garantir o fortalecimento e a realização deste direito.
365
Nicolás Angulo ressalta, ainda, que o direito ao desenvolvimento possui uma
dimensão individual e outra coletiva, pois representa um direito reivindicado por parte dos
indivíduos, mas também pelos povos mais pobres em face dos povos mais ricos e
industrializados.
366
Não é por outra razão que vários diplomas internacionais se referem, de alguma forma,
ao direito ao desenvolvimento, como destaca Irene Hadiprayitno.
367
A citada pesquisadora
frisa que a própria Carta das Nações Unidas tem como um desses objetivos previstos no
preâmbulo “promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma
liberdade mais ampla”, sendo que no art. , item nº 3, a Carta prevê como um dos propósitos
das Nações Unidas conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas
internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, buscando-se, ainda, a
promoção dos direitos humanos e o respeito às liberdades fundamentais para todos, sem
distinção de raça, sexo, língua ou religião.
A autora cita, ainda, a Declaração Universal de Direitos Humanos, enfatizando que
esta convenção tem entre os seus propósitos a promoção do progresso social e a melhoria dos
padrões de vida, bem como o reconhecimento ao direito a não-discriminação, a participação
364
ANGULO, Nicolás. El derecho al desarollo. XX aniversario de la declaración sobre el derecho al desarollo.
Revista española de desarollo y cooperación, 2007, n. 19, p. 195.
365
SENGUPTA, Arjun. The right to development as a human right. Disponível em:
<http://www.hsph.harvard.edu/fxbcenter/FXBC_WP7--Sengupta.pdf>. Acesso em: 11 nov. 2007.
366
ANGULO, op. cit., p. 195.
367
HADIPRAYITNO, Irene I. Poverty and international human rights law. Disponível em:
<http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=602321>. Acesso em: 11 nov. 2007.
política e o direito a um adequado padrão de vida.
368
Com relação à Declaração Universal de
Direitos Humanos cabe reproduzir, em especial, o art. XXV,
369
cujo teor é o seguinte:
Art. XXV.
1. Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a
sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário,
habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, o
direito à segurança, em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez,
velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em
circunstâncias fora do controle.
Irene Hadiprayitno menciona igualmente a Conferência sobre Direitos Humanos
ocorrida em Teerã, em 1968, como um momento histórico antecedente à Declaração sobre o
Direito ao Desenvolvimento de grande significação. Na referida Conferência, formou-se um
consenso entre os Estados participantes que: “o gozo dos direitos sociais e econômicos está
inerentemente ligado a uma interconexão significativa e profunda entre a realização de
direitos humanos e o desenvolvimento econômico”.
370
A autora pontua, ainda, que na
Conferência ficou reconhecida:
[...] a responsabilidade coletiva da comunidade internacional para assegurar
o alcance do padrão mínimo de vida necessário para o gozo dos direitos
humanos e liberdades fundamentais para todas as pessoas em todas as partes
do mundo.
371
De todas as formas, o elenco de diplomas internacionais que versam de alguma
maneira sobre o tema do direito ao desenvolvimento é extenso e considerando-se que não é o
objetivo deste trabalho discutir os marcos legais que reconhecem esse direito também como
um direito humano, fica a importante observação elaborada a partir do raciocínio de Irene
Hadiprayitno, segundo a qual houve uma evolução na doutrina dos direitos humanos até se
chegar na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, que, finalmente, sagrou o direito
ao desenvolvimento também como um direito humano inalienável do qual defluem todos os
outros direitos e cuja responsabilidade é individual e coletiva. Nesse sentido, apenas para se
ter a correta noção do conceito alcançado após a trajetória evolutiva desenhada pela autora,
368
HADIPRAYITNO, Irene I. Poverty and international human rights law. Disponível em:
<http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=602321>. Acesso em: 11 nov. 2007.
369
ONU. Declaração universal de direitos humanos. Coletânea de direito internacional. 2. ed. o Paulo:
Revista dos Tribunais, 2004. p. 422. [O texto integral da Declaração está no Anexo I].
370
HADIPRAYITNO, op. cit., tradução nossa. (that the enjoyment of economic and social rights is inherently
linked with any meaningful and profound interconnection between the realization of human rights and
economic development.)
371
Id. Ibid., tradução nossa. (… the colective responsability of the international community to ensure the
attainment of the minimum standard of living necessary for the enjoyment of human rights and fundamental
freedoms by all persons throughout the world.)
transcreve-se o art. 1º da Declaração:
Art. 1.
1. O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável em virtude
do qual toda pessoa humana e todos os povos estão habilitados a participar
do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e
dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais
possam ser plenamente realizados
372
Uma vez apresentadas essas considerações, fica muito evidente que a realização deste
direito fundamental em boa parte dependerá de um esforço conjunto em que os Estados
assumam “a responsabilidade primária pela criação de condições nacionais e internacionais
favoráveis à realização do direito ao desenvolvimento” (art. 3, item 1, da Declaração),
373
bem como de “cooperar uns com os outros para assegurar o desenvolvimento e eliminar os
obstáculos ao desenvolvimento” (art. 3, item 3, da Declaração).
374
De forma complementar, a Declaração ressalta, também, que: “Os Estados têm o dever
de, individual ou coletivamente, tomar as medidas para formular as políticas internacionais de
desenvolvimento” (art. 4, item 1, da Declaração)
375
, sendo que está consignado na
Declaração, ainda, que: “É necessária uma ação permanente para promover um
desenvolvimento mais rápido dos países em desenvolvimento” (art. 4, item 2, da
Declaração).
376
Quanto a este ponto, inclusive, no mesmo dispositivo citado, fica patente a
preocupação dos Estados com o estabelecimento de uma cooperação internacional efetiva
como um instrumento essencial para prover os países em desenvolvimento de “meios e
facilidades apropriados para incrementar o seu amplo desenvolvimento” (art. 4, item 2, da
Declaração)
377
.
Finalmente, na Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, realizada em 1993, os
Estados Membros das Nações Unidas adotaram a Declaração e Programa de Ação de
Viana,
378
reafirmando o direito ao desenvolvimento, previsto na Declaração sobre Direito ao
Desenvolvimento, como um direito universal e inalienável e parte integral dos direitos
humanos fundamentais, sendo a pessoa humana o sujeito central do direito ao
372
ONU. Declaração sobre o direito ao desenvolvimento. Coletânea de direito internacional. 2. ed. o Paulo:
Revista dos Tribunais, 2004. p. 424.
373
Id. Ibid., p. 424.
374
Id. Ibid., p. 425.
375
Id. Ibid., p. 425.
376
Id. Ibid., p. 425.
377
Id. Ibid., p. 425.
378
Id. Ibid., p. 426-450.
desenvolvimento (item 10, da Declaração).
379
Logo, a promoção do direito ao
desenvolvimento, sob a ótica dos direitos humanos, passa portanto, obrigatoriamente pelos
instrumentos de cooperação internacional que devem ser ampliados e intensificados. A
questão que se coloca, porém, é saber qual o espaço que existe para os países amazônicos no
campo da cooperação internacional, no contexto atual das relações internacionais.
3.4 A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica como foro privilegiado para a
promoção do desenvolvimento sustentável e para a proteção da biodiversidade e dos
conhecimentos tradicionais associados
Irene Hadiprayitno evoca o discurso de Nelson Mandela na Conferência de
Copenhagen, lembrando as declarações do Presidente Sul-africano de que a pobreza é a nova
face do apartheid e a nova face da escravidão.
380
Nesse sentido, é preciso estar consciente de
que o crescimento econômico não leva, por si só, ao desenvolvimento. Se não houver políticas
públicas específicas por parte dos Estados e um consenso internacional em torno da
cooperação internacional para o desenvolvimento, a tendência é que o crescimento econômico
só aumente a concentração de renda e a desigualdade.
Um país que quer se desenvolver seguindo o caminho da cooperação internacional
para o desenvolvimento precisa, antes de tudo, respeitar os direitos humanos, garantindo,
inclusive, meios mais eficientes de participação popular no processo de tomada de decisão.
Além disso, não se deve esquecer que não basta distribuir subsídios e ajudas oficiais, é
essencial conferir a todos os indivíduos oportunidades de trabalho, mobilidade social,
igualdade na distribuição de benefícios e a necessária proteção jurídica
Conforme assinalado anteriormente, o desenvolvimento econômico é apenas um dos
meios, porém o indispensável é a realização de direitos humanos em sua plenitude para que se
possa alcançar o desenvolvimento humano e sustentável.
Diante desse quadro, é que se propõe a biodiversidade como uma alternativa para a
mudança da condição de pobreza em que vivem os povos da Amazônia, visto que saber
utilizar de forma sustentável a biodiversidade pode ser um caminho para o desenvolvimento e
a distribuição de riqueza àqueles que se encontram privados de suas necessidades mais
básicas, contribuindo para o desenvolvimento nacional.
379
ONU. Declaração sobre o direito ao desenvolvimento. Coletânea de direito internacional. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2004. p. 429.
380
HADIPRAYITNO, Irene I. Poverty and international human rights law. Disponível em:
<http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=602321>. Acesso em: 11 nov. 2007.
Bertha Becker realça que a Amazônia é “o coração ecológico do planeta,
heartland”.
381
Assim, ao mesmo tempo em que se tem o conhecimento de que os países da
Amazônia são detentores de um capital natural imenso e que esta situação privilegiada pode
ser uma vantagem, é fundamental que se faça uma transformação na cultura vigente, para que
o uso dessa riqueza natural não seja motivo de mais desequilíbrios sócio-ecológicos e
exploração sem sustentabilidade.
Essa discussão, que está muito relacionada ao tema discutido no Capítulo I, tem a
importância de trazer ao contexto atual alguns pontos de reflexão que se tornaram
impostergáveis. Hoje, é sabido que o desrespeito ao equilíbrio da natureza cobra um preço
altíssimo. Seja como no sonho do sábio de Lichtenberg,
382
seja como na Teoria de Gaia,
383
o
certo é que o ser humano não pode mais continuar agindo como se os recursos naturais
fossem inesgotáveis e que o equilíbrio do planeta não esteja ameaçado por essa exploração
desenfreada e sem limites. Hawken, Amory Lovins e Hunter Lovins denunciam que:
Nos últimos cinqüenta anos, o mundo perdeu um quarto da camada superior
do solo e um terço da cobertura florestal. Mantendo-se o ritmo atual de
devastação, no espaço de uma geração o planeta perderá setenta por cento
dos recifes de coral, os quais hospedam 25 por cento da vida marinha. Nas
últimas décadas, consumiu-se nada menos que um terço dos recursos da
Terra, ou seja, de sua “riqueza natural”. Estamos perdendo ecossistemas de
água doce à razão de seis por cento ao ano, ecossistemas marinhos à
proporção de quatro por cento ao ano.
384
Como advoga o movimento da ecologia profunda é necessário estabelecer uma
mudança de paradigma. A perspectiva antropocentrista deve ceder lugar a uma visão
381
BECKER, Bertha Koiffmann. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Rio de Janeiro: Garamond,
2006. p. 33.
382
“Um sábio alemão de nome Lichtenberg, relata este sonho estranho: quando se vangloriava de conseguir
identificar, graças à análise química, os componentes de qualquer objecto, apareceu-lhe um velho sobrenatural,
no qual poderíamos reconhecer facilmente a figura de Deus. O velho tira do seu saco um objecto esférico e
desafia o químico a analisá-lo. Lichtenberg põe de imediato mãos à obra: ele esmaga-o, amassa-o, precipita-o,
analisa-o, e acaba por elaborar uma lista de elementos: carbono, hidrogénio, oxigénio, azoto . . . O velho,
tendo vindo buscar a resposta , anuncia-lhe que a bola não era senão o globo terrestre e eis as catástrofes
provocadas pelas suas manipulações: a atmosfera dissipada no seu sopro, os oceanos ainda húmidos no seu
lenço, as montanhas poeiras na sua face . . . Abalado, Lichtenberg pede uma nova oportunidade; magnânimo, o
velho tira um novo objecto do seu saco. Desta vez, Lichtenberg cai de joelhos, vencido: tratava-se de um livro.
(LICHTENBERG, G. C. Apud OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito.
Tradução Joana Chaves. Lisboa: Instituto Piaget, 1995. p. 169).
383
A hipótese Gaia foi elaborada por James Lovelock e, resumidamente, tem seus fundamentos da constatação
cientifica feita pelo autor de que a Terra (ou Gaia) seria o maior organismo vivo. Assim, com todas as
características de um organismo vivo, a Terra está sujeita a estímulos, apresenta um metabolismo e busca um
equilíbrio homeostático. Para aprofundamento da teoria vide LOVELOCK, James. As eras de gaia: a
biografia de nossa terra viva. Tradução Beatriz Sidou. Rio de Janeiro: Campus, 1991.
384
HAWKEN, Paul; LOVINS, Amory; LOVINS, L. Hunter. Capitalismo natural: criando a próxima revolução
industrial. Tradução Luiz A. de Araújo e Maria Luiza Felizardo. São Paulo: Cultrix, 1999. p. 4.
ecocentrista.
385
François Ost frisa que a ecologia radical pretende que a natureza não seja mais
vista apenas como objeto de direito, mas como sujeito de direito, capaz de ter dignidade e
opor os seus direitos fundamentais ao próprio ser humano.
386
Com todo o reforço retórico que este posicionamento da deep ecology possa
representar, o certo é que na situação atual em que se encontra a Terra é indispensável que
haja uma reconciliação imediata do ser humano com a natureza, de forma a respeitar os
limites naturais e o equilíbrio ecológico desse delicado sistema.
Com efeito, o desenvolvimento sustentável é possível a partir dessa consciência
ecológica ou, em outros termos, da aceitação da interdependência existente entre os seres
humanos e entre estes e a natureza.
A grande questão a ser equacionada, portanto, é como usar a biodiversidade com
responsabilidade e de forma sustentável. Neste trabalho, a proposta de uma cooperação
internacional para o desenvolvimento, que passa pelo uso sustentável da biodiversidade, é um
complemento necessário à criminalização da biopirataria.
O objetivo portanto, é proteger a biodiversidade porque esta é essencial ao
desenvolvimento sustentável do Brasil e, para isso, além da criminalização da biopirataria em
âmbito nacional, é preciso descobrir de que forma a biodiversidade pode ser também um
capital natural, que será utilizado pelos Estados e povos amazônicos para gerir e estimular o
próprio desenvolvimento sustentável.
Quanto às especificidades amazônicas, Bertha Becker constata que valorização
ecológica da Amazônia apresenta duas faces: “a da sobrevivência humana e a do capital
natural, sobretudo a megadiversidade e a água”.
387
A autora salienta, ainda, que atualmente
existem três grandes eldorados: os fundos oceânicos ainda não regulamentados, a Antártida,
partilhada entre as potências, e a Amazônia, único a pertencer, em sua maior parte, a um só
Estado Nacional”.
388
O valor estratégico que a biodiversidade representa é muito significativo. Bertha
Becker sinaliza que nas décadas de 70 a 90 houve uma grande preocupação com a proteção da
natureza, ao passo que no momento, após a virada do milênio, o desenvolvimento sustentável
ganha o centro das atenções. Para a pesquisadora, que é inegavelmente uma expert da
Amazônia: “Torna-se gradualmente mais forte a sua vertente econômica, patente em vários
385
OST, François. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Tradução Joana Chaves. Lisboa:
Instituto Piaget, 1995. p. 177.
386
Id. Ibid., p. 177.
387
BECKER, Bertha Koiffmann. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Rio de Janeiro: Garamond,
2006. p. 33.
388
Id. Ibid., p. 35.
níveis, num processo que, evidentemente, envolve a Amazônia. Realiza-se o capital
natural”.
389
Bertha Becker aponta para a existência de vários “mercados”: o do ar, o da vida e o da
água.
390
Quanto ao “mercado do ar” a pesquisadora informa que o seu principal instrumento é
o Protocolo de Kyoto, mediante a comercialização de créditos de carbono.
391
O mercado da
água” que para a autora também é promissor, pode ser altamente valorizado, já que a escassez
de água doce no mundo em decorrência do aumento do consumo é algo já previsível, podendo
a Amazônia ser uma grande fonte desse recurso natural, desde que se proceda com
sustentabilidade. Como destaca a autora, a água é um bem social, mas deve ser visto também
como um bem econômico.
392
E, finalmente, o “mercado da vida”, que na visão da autora se
expressa na biodiversidade e seria o mais complexo.
393
A respeito desse “mercado”, vale
transcrever os quatro níveis de aproveitamento que a autora dimensiona para a biodiversidade:
[...] o extrativismo e a pesca, a agregação de valor mediante beneficiamento
local, a industrialização para a produção de extratos cosméticos a tecnologia
de ponta para a produção de fármacos.
394
Há um longo caminho a ser percorrido e não se pretende a mercantilização da
natureza como a solução para o problema ecológico, mas se tem a consciência de que
desprezar o fator econômico representa uma ameaça também.
Como uma proposta sustentável de exploração econômica do meio ambiente, colhe-se
na doutrina a noção do que se convencionou chamar capitalismo “natural”, identificando-se
quatro estratégias fundamentais, na linha defendida por Hawken, Amory Lovins e Hunter
Lovins: a produtividade radical dos recursos, o biomimetismo, uma economia de serviços e
fluxos e o investimento no capital natural.
395
Para o se carregar o texto como as definições dos autores, pode-se registrar,
resumidamente, que a produtividade radical dos recursos visa a eficiência, ou seja, “aumentar
a produtividade dos recursos significa obter de um produto ou processo a mesma quantidade
de utilidade ou trabalho empregando menos potencial e energia”.
396
O que se pretende é que
389
BECKER, Bertha Koiffmann. Amazônia: geopolítica na virada do III milênio. Rio de Janeiro: Garamond,
2006. p. 39.
390
Id. Ibid., p. 39-45.
391
Id. Ibid., p. 40.
392
Id. Ibid., p. 43-44.
393
Id. Ibid., p. 41.
394
Id. Ibid., p. 42.
395
HAWKEN, Paul; LOVINS, Amory; LOVINS, L. Hunter. Capitalismo natural: criando a próxima revolução
industrial. Tradução Luiz A. de Araújo e Maria Luiza Felizardo. São Paulo: Cultrix, 1999. p. 9-19.
396
Id. Ibid., p. 11.
haja produtividade dos recursos e eficiência. É preciso otimizar a utilização dos recursos e os
processos de produção. Práticas poluentes, que geram desperdício ou ecologicamente
incorretas devem ser substituídas. O biomimetismo, segundo os autores, é a redução do uso
dissipador de material”.
397
Com essa estratégia se pretende a modernização do sistema
industrial sob uma concepção que evite o desperdício e ao mesmo tempo possibilite a
reciclagem constante do material utilizado. Quanto à economia de serviços e fluxos, esta se
traduz na transformação da economia de aquisição de bens para uma economia de serviço em
que os fabricantes produzem bens duráveis e de maior facilidade de manutenção. Ao invés de
vender o produto, o fabricante prefere vender a satisfação e o desempenho promovidos pelo
seu produto, pois se vende o resultado. O produto dura mais tempo e deixa menos resíduos, o
que diminui a utilização dos recursos naturais e dos danos ambientais.
398
Por fim, uma outra estratégia seria o investimento no capital natural que significa a
necessidade de se ter uma preocupação e adotar ações que evitem o esgotamento dos recursos
naturais. Na medida em que a eficiência tecnológica do ser humano permite a exploração em
grandes proporções dos recursos naturais, torna-se imprescindível que se tenha uma especial
precaução para o se afetar o equilíbrio ambiental e permitir a sustentabilidade desse capital
natural.
399
Alfredo Homma destaca que um aspecto econômico na biodiversidade, que não
pode ser desprezado:
Da mesma forma que o policial estuda o perfil do criminoso para estabelecer
estratégias para a sua captura, o mesmo raciocínio pode ser efetuado para o
caso da biopirataria na Amazônia. Um conjunto de interesses deve
prevalecer para essa efetivação, destacando-se em primeiro lugar o caráter de
economia potencial. Nesse sentido, os recursos genéticos potenciais para
serem transferidos seriam àquelas que teriam importância medicinal,
aromática, inseticida natural, corante natural e plantas que poderiam criar
novas atividades econômicas.
400
[grifos do autor]
Considerando-se que no Capítulo I foi igualmente trabalhado o aspecto econômico da
biodiversidade,
401
lembra-se novamente que não se pretende reduzir a discussão da
necessidade de conservação da biodiversidade ao seu contexto puramente econômico, porém
não é difícil concluir, como ficou assentado naquela oportunidade, que a consideração
exclusiva do valor intrínseco da biodiversidade, desprezando-se o seu conteúdo econômico, é
397
HAWKEN, Paul; LOVINS, Amory; LOVINS, L. Hunter. Capitalismo natural: criando a próxima revolução
industrial. Tradução Luiz A. de Araújo e Maria Luiza Felizardo. São Paulo: Cultrix, 1999. p. 10.
398
Id. Ibid., p. 15-17.
399
Id. Ibid., p. 10.
400
HOMMA, Alfredo. Biopirataria na amazônia: ainda é tempo para salvar? Disponível em:
<http://www.atech.br/agenda21.as/download/amazonia2.pdf>. Acesso em: 17 out. 2007.
401
Vide Cap. I, Seção 1.2, p. 21 et seq.
uma armadilha, que provavelmente leva a inviabilização de estratégias mais eficientes de
conservação e uso sustentável do meio ambiente.
Dessa feita, observa-se o surgimento de uma grande e crescente preocupação
ecológica, posto que já existe uma parcela de investidores que procuram empresas que tenham
como meta a sustentabilidade e responsabilidade social. Assim sendo, é possível inferir que
em um futuro próximo somente as empresas que tenham essa preocupação com a
sustentabilidade terão espaço no mercado, o que transformará a opção por políticas
sustentáveis um negócio rentável do ponto de vista econômico. O raciocínio, aliás, é muito
simples. Para um investidor, em um mundo que tem uma consciência ecológica, é natural que
o seu investimento atrás de consumidores que tem este mesmo perfil. Seria, portanto, um
erro estratégico investir em algo que não se quer ser consumido. Além disso, empresas que
poluem, violam regras trabalhistas e sonegam tributos o têm muita chance de crescimento
em um mercado verde ou devem ser consideradas, pelo menos, um investimento de alto risco.
Assim sendo, uma vez apontados no Capítulo II os instrumentos jurídicos internos
voltados à proteção da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados dos povos
tradicionais da Amazônia, bem como a necessidade de se combater a biopirataria, passa-se à
fundamental complementariedade que se realizará através de instrumentos internacionais que
permitam a criação de estratégias nos planos nacional e sub-regional para se proteger esse
patrimônio.
Para atender a esse propósito, foram discutidos os conceitos interdisciplinares
relacionados aos termos biodiversidade e conhecimentos tradicionais associados,
demonstrando-se, ainda, a necessidade de criminalização da biopirataria no plano interno. A
proposta complementar a criminalização, portanto, se apresenta por meio da ampliação e
consolidação da cooperação internacional para o desenvolvimento.
Dessa forma, mesmo diante da convicção de que a criminalização da biopirataria no
plano interno é um passo importante para a defesa de um interesse nacional e sub-regional, o
que decorre da pesquisa é que a cooperação internacional se apresenta como um instrumento
formidável para alavancar, tanto a promoção e proteção da biodiversidade e dos
conhecimentos tradicionais associados, quanto para potencializar de modo sustentado e
dinâmico o desenvolvimento regional.
Nesse contexto, surge o Tratado de Cooperação Amazônia (TCA) celebrado em 3 de
julho de 1978, tendo como Partes Contratantes a Bolívia, o Brasil, a Colômbia, o Equador, a
Guiana, o Peru, o Suriname e a Venezuela, que foi aprovado pelo Congresso Nacional e
ratificado pelo Estado brasileiro, através da promulgação do Decreto 85.050, de 18 de
agosto de 1980.
402
No preâmbulo do Tratado se pode extrair que os principais objetivos dessa convenção
multilateral são promover o desenvolvimento regional, manter o equilíbrio ecológico,
preservar o meio ambiente e estimular a cooperação entre as Partes Contratantes.
O ponto em comum entre as Partes Contratantes do TCA reside no fato de terem os
seus territórios localizados na Bacia Amazônica ou, como explicita o art. 11 do Tratado, que o
Estado em razão de suas características geográficas, ecológicas ou econômicas, esteja
estreitamente vinculado à região da maior bacia hidrográfica do mundo.
403
Assim sendo, em 14 de dezembro de 1998, as Partes Contratantes que firmaram o
Pacto Amazônico resolveram constituir a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica
(OTCA) e assinaram o Protocolo de Emenda ao TCA, que foi aprovado e promulgado pelo
Decreto nº 4.387, de 25 de setembro de 2002.
404
O estabelecimento da OTCA foi um passo importante para conferir personalidade
jurídica internacional à associação existente entre as Partes Contratantes e para reforçar suas
ações. Nesse sentido, o art. , do Protocolo de Emenda, estabelece a criação da OTCA,
dotando-a de personalidade jurídica internacional e lhe dando competência para celebrar
acordos com as próprias Partes Contratantes, com Estados não-Membros e com outras
organizações internacionais.
Argemiro Procópio, ao chamar a atenção para os graves problemas sociais que existem
na Amazônia, aponta o instrumento do TCA como um caminho necessário ao
desenvolvimento sustentável regional e sub-regional, embora critique as Partes Contratantes
que até este momento ainda não alcançaram resultados práticos palpáveis.
405
Logo, o caminho a ser percorrido pela OTCA ainda é muito longo, pois a este
momento são poucas as iniciativas de cooperação sub-regional efetivas entre o organismo
internacional e as Partes Contratantes ou organismo e outros Estados não-Membros.
402
BRASIL. Decreto 85.050, de 18 agosto de 1980. Promulga o Tratado de Cooperação Amazônica,
Concluído entre os Governos da República da Bolívia, da República Federativa do Brasil, da República da
Colômbia, da República do Equador, da República Cooperativa da Guiana, da República do Peru, da
República do Suriname e da República da Venezuela (artigos 1 e 2). Disponível em:
<http://www.lei.adv.br/85050-80.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007. [O texto integral do Tratado está no Anexo
J].
403
Christian Caubet ressalta que a previsão do art. 11 é que permite a Guiana e o Suriname serem signatários do
Pacto, apesar de não terem rios tributários do Amazonas, que cortem os seus territórios. (CAUBET, Christian
Guy. A água doce nas relações internacionais. São Paulo: Manole, 2006. p. 162).
404
BRASIL. Decreto nº 4.387, de 25 setembro de 2002. Promulga o Protocolo de Emenda ao Tratado de
Cooperação Amazônica. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4387.htm>.
Acesso em: 22 nov. 2007. [O texto integral do Protocolo de Emenda ao Tratado está no Anexo K].
405
PROCÓPIO, Argemiro. Destino amazônico: devastação nos oito países da Hiléia. São Paulo: Huitec, 2005,
passim.
Dessa forma, a atual OTCA, que deveria estimular a realização dos objetivos
acordados no Pacto Amazônico, fundamentalmente o desenvolvimento regional e a
implementação de políticas ambientais internacionais, até este momento pouco contribuiu
para este fim. Argemiro Procópio tece críticas neste sentido, asseverando que:
Inexistem operações multilaterais conjuntas, verdadeiramente dinâmicas,
contra as doenças endêmicas, a fome, o analfabetismo e contra o crime
organizado. Nada se faz em favor da fiscalização integrada e da defesa
coletiva.
406
A necessidade, entretanto, de intensificação da cooperação internacional para o
desenvolvimento regional e sub-regional é patente e, no caso da biopirataria, a obviedade de
que o tema transcende às fronteiras dos territórios de cada Parte Contratante deixa evidente
que não possibilidade de enfrentamento a não ser pela via da cooperação internacional,
buscando-se reunir esforços, reduzir custos e potencializar os resultados esperados.
O citado autor alerta, ainda, quanto à urgência do multilateralismo, advertindo que:
“Se o exercício do multilateralismo permanece incipiente entre os Estados nesta parte do
mundo, o crime organizado a seu modo, com excelente proveito, soube construir suas práticas
multilaterais”.
407
Em diversas passagens Argemiro Procópio mostra que os países amazônicos sequer
conseguiram desenvolver políticas regionais contra o tráfico, contrabando e corrupção, sendo
que o caminho mais viável, segundo o autor, para se dar início a uma mentalidade voltada
para o multilateralismo amazônico seria a cooperação na área de segurança. O projeto mais
eficaz nesta área até este momento, porém, é o bilateralismo, onde se destaca, principalmente,
aquele praticado entre os Estados Unidos da América e a Colômbia.
408
Para Argemiro Procópio fica muito claro que o crime organizado preenche “o vácuo
deixado pela democracia e exclusão social”.
409
A esse pensamento, se poderia acrescentar que
a ausência de poder também permite que os interesses dos países desenvolvidos, muitas vezes
dissociados de qualquer preocupação com o desenvolvimento sustentável da região, findem
por prevalecer. Daí a importância da OTCA ocupar este espaço e intensificar a cooperação
internacional para o desenvolvimento em âmbito sub-regional.
A cooperação internacional para o desenvolvimento, portanto, precisa ser entendida
406
PROCÓPIO, Argemiro. O multilateralismo amazônico e as fronteiras da segurança. In: _____ (Org.).
Relações internacionais: os excluídos da arca de Noé. São Paulo: Hucitec, 2005. p. 127.
407
Id. Ibid., p. 118.
408
Id. Ibid., p.133.
409
Id. Destino amazônico: devastação nos oito países da Hiléia. São Paulo: Huitec, 2005. p. 117.
como uma estratégia regional complementar de combate a biopirataria e ao crime organizado,
que alcançará a preservação do meio ambiente e a promoção do desenvolvimento sustentável.
A biopirataria não deixa de ser uma nova forma de exploração e, seguramente, os
países em desenvolvimento, especialmente suas populações tradicionais, são os principais
prejudicados nessa fase de transição do sistema capitalista para um novo modelo de sociedade
pós-industrial.
Conforme foi afirmado nesta dissertação, uma das formas de se proteger a
biodiversidade é investir em biotecnologia, sendo muito evidente que da perspectiva de países
em desenvolvimento a união de esforços nesta área pode fazer a diferença de modo positivo e
dinâmico.
Quanto a projetos voltados para a pesquisa e tecnologia, em matéria de ações
concretas no quadro da OTCA, o acordo de cooperação técnica mais relevante foi celebrado
entre o organismo e o BID, com vistas à promoção de bens regionais, fortalecimento da
gestão regional conjunta para o aproveitamento sustentável da biodiversidade amazônica.
Vale destacar que se trata de acordo em que se prevê o repasse, não reembolsável, de US$
1.900.000,00 dos Estados Unidos da América para a entidade.
410
Convém notar, no entanto, que a cooperação entre a própria OTCA e as Partes
Contratantes, que deveria ser primeiramente estimulada, parece ser a mais difícil de
implementar, pois é ressaltada a obtenção de cooperação dos Estados Unidos da América para
uma gestão conjunta da biodiversidade, o que, certamente, mesmo com uma aparência de
gratuidade, pode conflitar com os interesses regionais, tendo em vista o objeto do acordo e a
forma de fiscalização ou gestão deste acordo.
Neste ponto, não se pretende fazer uma análise das conseqüências que um acordo de
cooperação nesses termos possa significar, pois isto implicaria um exame muito mais
complexo, porém não se pode deixar de fazer a crítica de que o caminho trilhado pelas Partes
Contratantes do TCA e pela própria OTCA, aparentemente, não mostras de que possa ser a
via mais apropriada ao resguardo dos interesses regionais e sub-regionais. Não se quer excluir
a cooperação Norte-Sul, mas a necessidade de que as Partes Contratantes e a própria
OTCA revigorem seus sentimentos autóctones e de interdependência crescente,
compreendendo que os seus interesses comuns, certamente, se antagonizam com
determinados interesses dos países desenvolvidos e, por isso, primeiro é necessário a
realização de ações dirigidas à integração sub-regional para a promoção e proteção da
410
Vide Anexo Q.
biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados através do combate a biopirataria.
Finalmente, a biodiversidade poderá ser protegida, tendo-se em conta esta
realidade. De fato, nesse processo de busca por um caminho que contemple o
desenvolvimento sustentável para a Amazônia é fundamental compreender que a proteção da
biodiversidade não pode se esquecer jamais da dimensão humana, como adverte Bertha
Becker.
411
Pensando nessa dimensão humana, nos povos indígenas, nos ribeirinhos, nos
seringueiros, nos caboclos da Amazônia, é que a biopirataria deve ser entendida como
violação ao direito humano ao desenvolvimento individual, coletivo, nacional e sub-regional.
Assim, o direito ao desenvolvimento, como um direito síntese de todos os direitos
humanos, representa um importante instrumental para a reflexão acerca de uma vida digna
para as populações tradicionais da Amazônia, bem como para se propor um novo olhar quanto
ao processo histórico de desenvolvimento nacional e sub-regional.
Por isso, proteger a biodiversidade dos países amazônicos significa impedir a
continuação de um processo de exploração de soma negativa em prejuízo do Brasil e dos
demais países amazônicos, de tal forma que esta proteção tende a favorecer uma tomada de
posição conjunta no plano internacional que garanta um caminho para o desenvolvimento
sustentável da região amazônica e, por conseqüência, de todos os países amazônicos.
Diante dessas ponderações, a alternativa que se apresenta mais viável para abordar
esse novo processo é a cooperação internacional para o desenvolvimento em bases
igualitárias, com o estabelecimento de um tratamento jurídico harmônico no âmbito da
OTCA, que favoreça a promoção e a proteção da biodiversidade e dos conhecimentos
tradicionais associados, através do combate a biopirataria e, ao mesmo tempo, buscando-se a
preservação do meio ambiente e o estímulo ao desenvolvimento sustentável dos países
amazônicos.
Somente com o surgimento de um verdadeiro e pragmático sentimento pan-
amazônico, que possa unir os povos da floresta, é que a OTCA poderá assumir um relevante
papel de transformação, contribuindo como um foro privilegiado para as discussões dos
interesses regionais e, também, como um organismo que seja capaz de aproximar nações com
uma mesma identidade e iguais propósitos.
Enfim, em face da complexidade das variáveis interdisciplinares analisadas, pode-se
411
BECKER, Bertha. Da preservação à utilização consciente da biodiversidade amazônica. O papel da ciência,
tecnologia e inovação. In: GARAY, Irene; BECKER, Bertha K. (Org.). Dimensões humanas da
biodiversidade: o desafio de novas relações sociedade-natureza no século XXI. Petrópolis: Vozes, 2006. p.
355.
deduzir que a promoção e proteção dos direitos humanos das comunidades locais amazônicas
depende, fundamentalmente, da promoção e proteção da biodiversidade e dos conhecimentos
tradicionais associados através da criminalização nacional da biopirataria, de um lado, e de
outro lado, da intensificação e consolidação da cooperação internacional para o
desenvolvimento no quadro da OTCA, visto que o destino da Amazônia passa
necessariamente pelo seu desenvolvimento, que pode e deve ser sustentável.
4 CONCLUSÃO
Após toda a argumentação expendida nos três capítulos que integram esta dissertação,
impõe-se identificar quais as contribuições que este trabalho trouxe para a análise científica
do tema proposto.
A primeira constatação a ser registrada é no sentido de que essa dissertação
representou uma reflexão sobre qual o papel que os países em desenvolvimento, notadamente
o Brasil e os seus vizinhos da região amazônica, pretendem desempenhar no plano das
relações internacionais.
A pesquisa apontou para a existência de um processo de dominação que continua
sendo exercido pelos países desenvolvidos e, no momento histórico recente, é representado
pela biopirataria, por meio da qual esses países desenvolvidos se apropriam da biodiversidade
e dos conhecimentos tradicionais das populações locais, sob a proteção jurídica dos direitos
de propriedade intelectual.
Ao mesmo tempo em que o ser humano, com as suas tecnologias, pode dominar o
meio em que vive e explorar de forma cada vez mais eficiente os recursos naturais do planeta,
percebe-se que esses recursos não são mais inesgotáveis e que o próprio ser humano, com a
sua atitude individualista, causou um desequilíbrio que pode ser irreversível. Além disso, o
progresso tecnológico, ao contrário de aumentar a distribuição de renda, acabou por
concentrar a riqueza nas mãos de um número reduzido de pessoas, fazendo-se crescer a
pobreza mundial.
Jean-Paul Sartre, ao construir o seu pensamento sobre o existencialismo, argumentou
que a palavra humanismo tem dois sentidos: um significado que o ser humano como um
valor superior e o centro do universo
412
e uma outra acepção que corresponderia ao que ele
denominou de humanismo existencialista, em que o ser humano ao invés de olhar para dentro,
procura fora si um objetivo, que é a sua própria realização como ser humano.
413
A pesquisa revelou que o ser humano necessita encontrar este objetivo fora de si, para
poder compreender que não é a natureza que depende dele, mas ele que está, agora, a
depender da própria natureza e, por isso, precisa voltar a viver em harmonia com o seu meio e
passar assumir comportamentos ecologicamente corretos e, sobretudo, influenciados pela
alteridade.
Por essas razões, a metodologia empregada visou, primeiro, compreender esta
412
SARTRE, Jean Paul. L’existencialisme est un humanisme. Paris: Nagel, 1970. p. 90.
413
Id. Ibid., p. 94.
realidade, para, em seguida, trabalhar a construção de um marco jurídico interno e
internacional coeso e realista, que pudesse assegurar a promoção e proteção da biodiversidade
e dos conhecimentos tradicionais associados.
Os objetivos perseguidos foram sendo vencidos ao longo da pesquisa para que se
pudesse apresentar ao final um resultado que confirmasse ou não a hipótese proposta, ou seja,
que a criminalização da biopirataria é um passo importante e decisivo para a proteção da
biodiversidade.
A pesquisa revelou, porém, que tal proposta de tutela penal interna deve ser
complementada com o fortalecimento de práticas de cooperação internacional para o
desenvolvimento, com vistas à realização de um desenvolvimento regional e sub-regional
sustentável, tendo como marco jurídico internacional o Tratado de Cooperação Amazônica e a
Organização respectiva.
Assim sendo, a primeira etapa a ser superada foi a compreensão dos conceitos
operacionais biodiversidade, conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade e
biopirataria, o que se fez no Capítulo I. A investigação, sem desprezar o valor intrínseco da
biodiversidade, revelou a importância real de se considerar o aspecto econômico para garantir
a consistência dos argumentos trazidos nos capítulos seguintes.
Considerando-se que a biopirataria tem como elemento propulsor o aspecto
econômico, representado na biodiversidade, inferiu-se que tal aspecto econômico serve, de
um lado, para fomentar a biopirataria e garantir o processo de exploração levado a efeito pelos
países desenvolvidos através de suas empresas transnacionais de biotecnologia e, de outro
lado, esse mesmo aspecto econômico pode ser o diferencial para uma política nacional e sub-
regional de desenvolvimento sustentável.
Em razão dessa constatação é que se procedeu à abordagem do Direito Penal de forma
complexa, opondo-se a uma visão fragmentada, que levaria a uma separação da dogmática em
relação à política criminal e até mesmo a outros ramos do conhecimento. Com isso, se propôs
um Direito Penal transdisciplinar, em que a política criminal, assim como as outras ciências e
saberes, exerceram um papel crítico, servindo, no caso desta pesquisa, para revelar quais os
limites da punibilidade e para demonstrar a necessidade da intervenção penal como meio de
se tutelar a biodiversidade.
Além disso, apresentou-se uma argumentação amparada na dignidade constitucional
do bem jurídico a ser tutelado, que se fundamenta no próprio mandato constitucional expresso
de criminalização e na necessidade da tutela como mecanismo de controle indispensável
diante da ineficiência dos outros meios de reação estatal, destacando-se, inclusive, a função
preventiva da norma penal.
A partir dessa proposta criminalizadora, verificou-se que a tutela penal em âmbito
interno não é a única resposta ao problema da biopirataria, razão pela qual a pesquisa
apresentou uma alternativa complementar para a promoção e proteção da biodiversidade e dos
conhecimentos tradicionais associados, que consiste no enfrentamento da biopirataria
mediante a cooperação internacional para o desenvolvimento, tendo como marco jurídico
internacional a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica.
Nesse ponto, a investigação canalizou esforços no sentido de trabalhar um conceito de
desenvolvimento ampliado, tomando-se por base uma perspectiva complexa, o que se reputa
tarefa da mais elevada importância para se atingir o fim de se identificar qual o tipo de
desenvolvimento que se pretende atingir com a cooperação proposta.
Dessa maneira, o conceito de desenvolvimento visado para a Amazônia deve ser
multidimensional e complexo, exigindo uma intercomunicação entre todos os seus elementos,
de forma a se assegurar um desenvolvimento sustentável cada vez mais ampliado.
A pesquisa demonstrou, igualmente, que o direito ao desenvolvimento é um direito
humano, que representa a síntese de todos os outros direitos do indivíduo, fortalecendo e
confirmando a proposta interdisciplinar e transnacional apresentada, pois a cooperação
internacional para o desenvolvimento é, inegavelmente, fortalecida se encarada como um
mecanismo de promoção e proteção dos direitos humanos em nível nacional e sub-regional.
Finalmente, embora a pesquisa tenha criticado a débil atuação da Organização do
Tratado de Cooperação Amazônica, reconheceu-se a sua importância como um foro
privilegiado para a implementação da cooperação internacional para o desenvolvimento dos
países da bacia amazônica e combate a biopirataria.
Como se pode depreender de tudo que ficou exposto, a investigação conduziu à
validação da hipótese de trabalho, constatando-se a relevância da criminalização da
biopirataria no plano nacional, porém revelou, igualmente, a necessidade desta proposta de
tutela penal ser complementada pela cooperação internacional para o desenvolvimento no
quadro da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, mediante o uso sustentável da
biodiversidade, que deve e pode trazer benefícios significativos em termos de
desenvolvimento e promoção de direitos humanos nos planos local, nacional e sub-regional.
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GLOSSÁRIO
Amazônia – área geográfica que corresponde à bacia hidrográfica do rio Amazonas, podendo
este conceito ser ampliado, segundo critérios geopolíticos internacionais, como ocorre no
Tratado de Cooperação Amazônica, que considera a Amazônia, não a Bacia Amazônica,
mas também outras áreas que em razão de suas características geográficas, ecológicas ou
econômicas estejam estreitamente vinculadas a esta bacia hidrográfica (art. 3º, do TCA).
bacia amazônica toda área de terra banhada pelo rio Amazonas e seus afluentes.
bem jurídico significa a expressão de um interesse pessoal ou da sociedade, que é
protegido pelo Direito.
bioma “conjunto de vida (vegetal e animal) constituído pelo agrupamento de tipos de
vegetação contíguos e identificáveis em escala regional, com condições geoclimáticas
similares e história compartilhada de mudanças, o que resulta em uma diversidade biológica
própria” (IBGE LANÇA O MAPA DE BIOMAS DO BRASIL E O MAPA DE
VEGETAÇÃO DO BRASIL, EM COMEMORAÇÃO AO DIA MUNDIAL DA
BIODIVERSIDADE. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=169&id
_pagina=1>. Acesso em: 2 set. 2007).
biodiversidade variabilidade de vida na Terra, compreendendo a diversidade de espécies, a
diversidade genética dentro das espécies, a variabilidade de ecossistemas, as relações
complexas entre os seres vivos e entre estes e o meio ambiente.
biopirataria a apropriação dos recursos genéticos da biodiversidade de um país ou dos
conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade, sem que exista autorização do país
detentor desses recursos ou da população possuidora do conhecimento tradicional.
biocolonialismo usurpação das riquezas biológicas nativas em benefício do colonizador”
(RIFKIN, Jeremy. O século da biotecnologia: a valorização dos genes e a reconstrução do
mundo. Tradução Arão Sapiro. São Paulo: Makron, 1999. p 51)
biotecnologia conceito de significação ainda imprecisa, mas que pode ser entendido com a
tecnologia desenvolvida por diversas áreas da biologia, como o uso das técnicas do DNA
recombiante, as técnicas de cultivo de células e tecidos ‘in vitro’, visando a micropropagação,
a limpeza clonal, a produção de fármacos, enzimas, hormônios, vacinas e de outros produtos
químicos bioconvertidos”, bem como “as técnicas de sequenciamento do DNA e as de
clonagem de seres vivos” (PRISCO, José Tarquínio. Biotecnologia
conceito, potencialidades e dificuldades. Disponível em:
<http://www.sfiec.org.br/palestras/tecnologia/biotecnologia_conceito_potencialidades_e_dific
uldades.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007).
ciência penal total abordagem teórica que permite a mútua influência da dogmática penal,
política criminal e criminologia, sem a exclusão ainda de outras áreas do saber.
conhecimento tradicional corresponde aos conhecimentos indígenas, conhecimentos de
comunidades locais e o folclore.
conhecimentos tradicionais associados à biodiversidadesão os conhecimentos dos povos
indígenas e das populações tradicionais passados de geração em geração e que são
importantes tanto para a conservação da diversidade biológica, quanto para o seu uso
sustentável.
cooperação internacional atuação conjunta de dois ou mais atores internacionais para a
consecução de objetivos comuns.
cooperação internacional para o desenvolvimentocooperação direcionada para estimular
o processo de desenvolvimento de países em situação de vulnerabilidade.
criminalização processo por meio do qual se busca justificar do ponto de vista da política
criminal o sancionamento de alguma conduta por uma norma penal.
criminalização primária o ato e o efeito de sancionar uma lei penal material que
incrimina ou permite a punição de certas pessoas” (ZAFFARONI, E. Raúl et al. Direito penal
brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 43, v. 1)
criminalização secundária “a ação punitiva exercida sobre pessoas concretas”.
(ZAFFARONI, E. Raúl et al. Direito penal brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 43, v.
1.)
deep ecology (ecologia profunda) ramo da ecologia cujos fundamentos filosóficos colocam
a espécie humana como parte integrante do meio ambiente, atribuindo valor intrínseco às
demais espécies e ao ambiente, independentemente da sua utilidade ou não para o homem.
desenvolvimento noção restrita, que se limita ao crescimento social, político e econômico.
desenvolvimento sustentável conceito aberto e dinâmico, que abrange todas as formas de
desenvolvimento, como o político, o social, o econômico, o ambiental, o cultural, o científico
tecnológico e o espiritual.
direito ao desenvolvimento – direito humano síntese de todos os direitos humanos.
direitos humanos determinados bens ou valores universais que são inerentes à própria
condição de existência digna do ser humano.
direito penal transdisciplinar proposta de ciência penal moldada a partir de um
pensamento complexo, que não admite o monopólio de qualquer ramo do saber ou definição
de fronteiras para o conhecimento.
hegemonia posição de supremacia que um Estado exerce sobre os demais no plano das
relações internacionais.
high politics termo de cunho marcantemente realista que define como política de alta
relevância para o Estado as questões relacionadas à segurança nacional.
low politics termo realista que demonstra menor apreço às questões internacionais
relacionadas às políticas econômicas e sociais.
países centrais países que para a teoria da dependência são representados pelas economias
avançadas, que ditam as regras no sistema de produção capitalista, obstando o
desenvolvimento dos países periféricos, relegados a condição de fornecedores de matéria-
prima e consumidores de produtos industrializados.
países periféricos países que na teoria da dependência são representados pelas economias
que no sistema produtivo mundial são dependentes das economias dos países centrais e
hegemônicos.
países desenvolvidos países que apresentam elevados níveis de desenvolvimento social,
político e econômico.
países em desenvolvimento países que ainda o alcançaram altos índices de
desenvolvimento humano.
países em via de desenvolvimento expressão de significação aproximada a países em
desenvolvimento, incluindo os países que atualmente são chamados de economias
emergentes.
países hegemônicos países que no plano das relações internacionais exercem a supremacia
militar e, geralmente, também a econômica e cultural, tendo assim forte poder de influência
sobre os demais países.
países subdesenvolvidos no sistema de produção capitalista países que estão em atraso
econômico.
Primeiro mundo termo criado no período pós-Segunda Guerra Mundial, durante a Guerra
Fria, para se referir aos países do sistema de produção capitalista, fortemente industrializados
e com altos índices desenvolvimento humano.
shallow ecology (ecologia superficial) termo que se contrapõe à ecologia profunda, como
forma de demonstrar uma visão estreita da ecologia, como ramo das ciências biológicas, em
que se privilegia o estudo do meio ambiente a partir da perspectiva antropocêntrica, voltada
para enfoques utilitários.
Segundo mundo nações do antigo bloco socialista.
sociedade da informação nova forma de organização social que tem como fundamentos o
processamento de informações, a preponderância do setor de serviços e o domínio das novas
tecnologias.
teoria da dependência modelo teórico que almeja explicar o processo de dominação a que
estão submetidos os países da América Latina, através da análise da estrutura econômica
internacional que, na esteira da expansão do capitalismo, relegou aos países latino-americanos
o papel de economias periféricas voltadas para o fornecimento de matérias-primas aos países
centrais.
teoria da interdependência modelo teórico de relações internacionais que defende a idéia
da existência de uma dependência recíproca entre os atores internacionais.
teoria da interdependência complexa vertente da teoria da interdependência que enfatiza
o aspecto de que a dependência mútua entre os atores internacionais não se limita a situações
de benefícios recíprocos, pois a interdependência se desenvolve de forma complexa e
assimétrica.
teoria do bem jurídico teoria que se fundamenta na noção de que o Direito Penal tem por
finalidade essencial a preservação de bens jurídicos.
teoria do realismo modelo teórico de relações internacionais que privilegia as questões
relacionadas à segurança, militarização e uso da força.
Terceiro mundo países que no sistema de produção capitalista representam as economias
subdesenvolvidas.
ANEXO A – Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998
414
DECRETO Nº 2.519, DE 16 DE MARÇO DE 1998.
Promulga a Convenção sobre Diversidade
Biológica, assinada no Rio de Janeiro, em 05 de
junho de 1992.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,
inciso VIII, da Constituição,
CONSIDERANDO que a Convenção sobre Diversidade Biológica foi assinada pelo
Governo brasileiro no Rio de Janeiro, em 05 de junho de 1992;
CONSIDERANDO que o ato multilateral em epígrafe foi oportunamente submetido ao
Congresso Nacional, que o aprovou por meio do Decreto Legislativo nº 02, de 03 de fevereiro
de 1994;
CONSIDERANDO que Convenção em tela entrou em vigor internacional em 29 de
dezembro de 1993;
CONSIDERANDO que o Governo brasileiro depositou o instrumento de ratificação da
Convenção em 28 de fevereiro de 1994, passando a mesma a vigorar, para o Brasil, em 29 de
maio de 1994, na forma de seu artigo 36,
DECRETA:
Art. A Convenção sobre Diversidade Biológica, assinada no Rio de Janeiro, em 05 de
junho de 1992, apensa por cópia ao presente Decreto, deveser executada tão inteiramente
como nela se contém.
Art. 2º O presente Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 16 de março de 1998; 177º da Independência e 110º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Luiz Felipe Lampreia
Este texto não substitui o publicado no D.O.U de 17.3.1998.
414
BRASIL. Decreto 2.519, de 16 de março de 1998. Promulga a Convenção sobre Diversidade Biológica,
assinada no Rio de Janeiro, em 5 de junho de 1992. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2519.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
Convenção sobre Diversidade Biológica
Preâmbulo
As Partes Contratantes,
Conscientes do valor intrínseco da diversidade biológica e dos valores ecológico, genético,
social, econômico, científico, educacional, cultural, recreativo e estético da diversidade
biológica e de seus componentes,
Conscientes, também, da importância da diversidade biológica para a evolução e para a
manutenção dos sistemas necessários à vida da biosfera,
Afirmando que a conservação da diversidade biológica é uma preocupação comum à
humanidade,
Reafirmando que os Estados têm direitos soberanos sobre os seus próprios recursos
biológicos,
Reafirmando, igualmente, que os Estados são responsáveis pela conservação de sua
diversidade biológica e pela utilização sustentável de seus recursos biológicos,
Preocupados com a sensível redução da diversidade biológica causada por determinadas
atividades humanas,
Conscientes da falta geral de informação e de conhecimento sobre a diversidade biológica e
da necessidade urgente de desenvolver capacitação científica, técnica e institucional que
proporcione o conhecimento fundamental necessário ao planejamento e implementação de
medidas adequadas,
Observando que é vital prever, prevenir e combater na origem as causas da sensível redução
ou perda da diversidade biológica,
Observando também que quando exista ameaça de sensível redução ou perda de diversidade
biológica, a falta de plena certeza científica não deve ser usada como razão para postergar
medidas para evitar ou minimizar essa ameaça,
Observando igualmente que a exigência fundamental para a conservação da diversidade
biológica é a conservação in-situ dos ecossistemas e dos habitat naturais e a manutenção e
recuperação de populações viáveis de espécies no seu meio natural,
Observando ainda que medidas ex-situ, preferivelmente no país de origem, desempenham
igualmente um importante papel,
Reconhecendo a estreita e tradicional dependência de recursos biológicos de muitas
comunidades locais e populações indígenas com estilos de vida tradicionais, e que é desejável
repartir eqüitativamente os benefícios derivados da utilização do conhecimento tradicional, de
inovações e de práticas relevantes à conservação da diversidade biológica e à utilização
sustentável de seus componentes,
Reconhecendo, igualmente, o papel fundamental da mulher na conservação e na utilização
sustentável da diversidade biológica e afirmando a necessidade da plena participação da
mulher em todos os níveis de formulação e execução de políticas para a conservação da
diversidade biológica,
Enfatizando a importância e a necessidade de promover a cooperação internacional, regional e
mundial entre os Estados e as organizações intergovernamentais e o setor não-governamental
para a conservação da diversidade biológica e a utilização sustentável de seus componentes,
Reconhecendo que cabe esperar que o aporte de recursos financeiros novos e adicionais e o
acesso adequado às tecnologias pertinentes possam modificar sensivelmente a capacidade
mundial de enfrentar a perda da diversidade biológica,
Reconhecendo, ademais, que medidas especiais são necessárias para atender as necessidades
dos países em desenvolvimento, inclusive o aporte de recursos financeiros novos e adicionais
e o acesso adequado às tecnologias pertinentes,
Observando, nesse sentido, as condições especiais dos países de menor desenvolvimento
relativo e dos pequenos Estados insulares,
Reconhecendo que investimentos substanciais são necessários para conservar a diversidade
biológica e que expectativa de um amplo escopo de benefícios ambientais, econômicos e
sociais resultantes desses investimentos,
Reconhecendo que o desenvolvimento econômico e social e a erradicação da pobreza o as
prioridades primordiais e absolutas dos países em desenvolvimento,
Conscientes de que a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica é de
importância absoluta para atender as necessidades de alimentação, de saúde e de outra
natureza da crescente população mundial, para o que são essenciais o acesso a e a repartão
de recursos genéticos e tecnologia,
Observando, enfim, que a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica
fortalecerão as relações de amizade entre os Estados e contribuirão para a paz da humanidade,
Desejosas de fortalecer e complementar instrumentos internacionais existentes para a
conservação da diversidade biológica e a utilização sustentável de seus componentes, e
Determinadas a conservar e utilizar de forma sustentável a diversidade biológica para
benefício das gerações presentes e futuras,
Convieram no seguinte:
Artigo 1
Objetivos
Os objetivos desta Convenção, a serem cumpridos de acordo com as disposições pertinentes,
são a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a
repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos,
mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de
tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, e
mediante financiamento adequado.
Artigo 2
Utilização de Termos
Para os propósitos desta Convenção:
"Área protegida" significa uma área definida geograficamente que é destinada, ou
regulamentada, e administrada para alcançar objetivos específicos de conservação.
"Biotecnologia" significa qualquer aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos,
organismos vivos, ou seus derivados, para fabricar ou modificar produtos ou processos para
utilização específica.
"condições in-situ " significa as condições em que recursos genéticos existem em
ecossistemas e habitats naturais e, no caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios
onde tenham desenvolvido suas propriedades características.
"Conservação ex-situ " significa a conservação de componentes da diversidade biológica fora
de seus habitats naturais.
"Conservação in-situ " significa a conservação de ecossistemas e habitats naturais e a
manutenção e recuperação de populações viáveis de espécies em seus meios naturais e, no
caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios onde tenham desenvolvido suas
propriedades características.
"Diversidade biológica" significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens,
compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas
aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade
dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas.
"Ecossistema" significa um complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais e de
microorganismos e o seu meio inorgânico que interagem como uma unidade funcional.
"Espécie domesticada ou cultivada" significa espécie em cujo processo de evolução influiu o
ser humano para atender suas necessidades.
"Habitat" significa o lugar ou tipo de local onde um organismo ou população ocorre
naturalmente.
"Material genético" significa todo material de origem vegetal, animal, microbiana ou outra
que contenha unidades funcionais de hereditariedade.
"Organização regional de integração econômica" significa uma organização constituída de
Estados soberanos de uma determinada região, a que os Estados membros transferiram
competência em relação a assuntos regidos por esta Convenção, e que foi devidamente
autorizada, conforme seus procedimentos internos, a assinar, ratificar, aceitar, aprovar a
mesma e a ela aderir.
"País de origem de recursos genéticos" significa o país que possui esses recursos genéticos em
condições in-situ.
"País provedor de recursos genéticos" significa o país que provê recursos genéticos coletados
de fontes in-situ , incluindo populações de espécies domesticadas e silvestres, ou obtidas de
fontes ex-situ , que possam ou não ter sido originados nesse país.
"Recursos biológicos" compreende recursos genéticos, organismos ou partes destes,
populações, ou qualquer outro componente biótico de ecossistemas, de real ou potencial
utilidade ou valor para a humanidade.
"Recursos genéticos" significa material genético de valor real ou potencial.
"Tecnologia" inclui biotecnologia.
"Utilização sustentável" significa a utilização de componentes da diversidade biológica de
modo e em ritmo tais que não levem, no longo prazo, à diminuição da diversidade biológica,
mantendo assim seu potencial para atender as necessidades e aspirações das gerações
presentes e futuras.
Artigo 3
Princípio
Os Estados, em conformidade com a Carta das nações Unidas e com os princípios de Direito
internacional, têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos segundo suas políticas
ambientais, e a responsabilidade de assegurar que atividades sob sua jurisdição ou controle
não causem dano ao meio ambiente de outros Estados ou de áreas além dos limites da
jurisdição nacional.
Artigo 4
Âmbito Jurisdicional
Sujeito aos direitos de outros Estados, e a não ser que de outro modo expressamente
determinado nesta Convenção, as disposições desta Convenção aplicam-se em relação a cada
Parte Contratante:
a) No caso de componentes da diversidade biológica, nas áreas dentro dos limites de sua
jurisdição nacional; e
b) No caso de processos e atividades realizadas sob sua jurisdição ou controle,
independentemente de onde ocorram seus efeitos, dentro da área de sua jurisdição nacional ou
além dos limites da jurisdição nacional.
Artigo 5
Cooperação
Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, cooperar com outras
Partes Contratantes, diretamente ou, quando apropriado, mediante organizações internacionais
competentes, no que respeita a áreas além da jurisdição nacional e em outros assuntos de
mútuo interesse, para a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica.
Artigo 6
Medidas Gerais para a Conservação e a Utilização Sustentável
Cada Parte Contratante deve, de acordo com suas próprias condições e capacidades:
a) desenvolver estratégias, planos ou programas para a conservação e a utilização sustentável
da diversidade biológica ou adaptar para esse fim estratégias, planos ou programas existentes
que devem refletir, entre outros aspectos, as medidas estabelecidas nesta Convenção
concernentes à Parte interessada; e
b) integrar, na medida do possível e conforme o caso, a conservação e a utilização sustentável
da diversidade biológica em planos, programas e políticas setoriais ou intersetoriais
pertinentes.
Artigo 7
Identificação e Monitoramento
Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, em especial para os
propósitos dos Artigos 8 a 10:
a) Identificar componentes da diversidade biológica importantes para sua conservação e sua
utilização sustentável, levando em conta a lista indicativa de categorias constante no anexo I;
b) Monitorar, por meio de levantamento de amostras e outras técnicas, os componentes da
diversidade biológica identificados em conformidade com a alínea (a) acima, prestando
especial atenção aos que requeiram urgentemente medidas de conservação e aos que ofereçam
o maior potencial de utilização sustentável;
c) Identificar processos e categorias de atividades que tenham ou possam ter sensíveis efeitos
negativos na conservação e na utilização sustentável da diversidade biológica, e monitorar
seus efeitos por meio de levantamento de amostras e outras técnicas; e
d) Manter e organizar, por qualquer sistema, dados derivados de atividades de identificação e
monitoramento em conformidade com as alíneas (a), (b) e (c) acima.
Artigo 8
Conservação In-Situ
Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme o caso:
a) Estabelecer um sistema de áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais precisem ser
tomadas para conservar a diversidade biológica;
b) Desenvolver, se necessário, diretrizes para a seleção, estabelecimento e administração de
áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais precisem ser tomadas para conservar a
diversidade biológica;
c) Regulamentar ou administrar recursos biológicos importantes para a conservação da
diversidade biológica, dentro ou fora de áreas protegidas, a fim de assegurar sua conservação
e utilização sustentável;
d) Promover a proteção de ecossistemas, habitats naturais e manutenção de populações
viáveis de espécies em seu meio natural;
e) Promover o desenvolvimento sustentável e ambientalmente sadio em áreas adjacentes às
áreas protegidas a fim de reforçar a proteção dessas áreas;
f) Recuperar e restaurar ecossistemas degradados e promover a recuperação de espécies
ameaçadas, mediante, entre outros meios, a elaboração e implementação de planos e outras
estratégias de gestão;
g) Estabelecer ou manter meios para regulamentar, administrar ou controlar os riscos
associados à utilização e liberação de organismos vivos modificados resultantes da
biotecnologia que provavelmente provoquem impacto ambiental negativo que possa afetar a
conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica, levando também em conta os
riscos para a saúde humana;
h) Impedir que se introduzam, controlar ou erradicar espécies exóticas que ameacem os
ecossistemas, habitats ou espécies;
i) Procurar proporcionar as condições necessárias para compatibilizar as utilizações atuais
com a conservação da diversidade biológica e a utilização sustentável de seus componentes;
j) Em conformidade com sua legislação nacional, respeitar, preservar e manter o
conhecimento, inovações e práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilo
de vida tradicionais relevantes à conservação e à utilização sustentável da diversidade
biológica e incentivar sua mais ampla aplicação com a aprovação e a participação dos
detentores desse conhecimento, inovações e práticas; e encorajar a repartição eqüitativa dos
benefícios oriundos da utilização desse conhecimento, inovações e práticas;
k) Elaborar ou manter em vigor a legislação necessária e/ou outras disposições
regulamentares para a proteção de espécies e populações ameaçadas;
l) Quando se verifique um sensível efeito negativo à diversidade biológica, em conformidade
com o Artigo 7, regulamentar ou administrar os processos e as categorias de atividades em
causa; e
m) Cooperar com o aporte de apoio financeiro e de outra natureza para a conservação in-situ a
que se referem as alíneas (a) a (l) acima, particularmente aos países em desenvolvimento.
Artigo 9
Conservação ex-situ
Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, e principalmente a
fim de complementar medidas de conservação in-situ :
a) Adotar medidas para a conservação ex-situ de componentes da diversidade biológica, de
preferência no país de origem desses componentes;
b) Estabelecer e manter instalações para a conservação ex-situ e pesquisa de vegetais, animais
e microorganismos, de preferência no país de origem dos recursos genéticos;
c) Adotar medidas para a recuperação e regeneração de espécies ameaçadas e para sua
reintrodução em seu habitat natural em condições adequadas;
d) Regulamentar e administrar a coleta de recursos biológicos de habitats naturais com a
finalidade de conservação ex-situ de maneira a não ameaçar ecossistemas e populações in-situ
de espécies, exceto quando forem necessárias medidas temporárias especiais ex-situ de acordo
com a alínea (c) acima; e
e) Cooperar com o aporte de apoio financeiro e de outra natureza para a conservação ex-situ a
que se referem as alíneas (a) a (d) acima; e com o estabelecimento e a manutenção de
instalações de conservação ex-situ em países em desenvolvimento.
Artigo 10
Utilização Sustentável de Componentes da Diversidade Biológica
Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme o caso:
a) Incorporar o exame da conservação e utilização sustentável de recursos biológicos no
processo decisório nacional;
b) Adotar medidas relacionadas à utilização de recursos biológicos para evitar ou minimizar
impactos negativos na diversidade biológica;
c) Proteger e encorajar a utilização costumeira de recursos biológicos de acordo com práticas
culturais tradicionais compatíveis com as exigências de conservação ou utilização sustentável;
d) Apoiar populações locais na elaboração e aplicação de medidas corretivas em áreas
degradadas onde a diversidade biológica tenha sido reduzida; e
e) Estimular a cooperação entre suas autoridades governamentais e seu setor privado na
elaboração de métodos de utilização sustentável de recursos biológicos.
Artigo 11
Incentivos
Cada Parte Contratante deve, na medida do possível e conforme o caso, adotar medidas
econômica e socialmente racionais que sirvam de incentivo à conservação e utilização
sustentável de componentes da diversidade biológica.
Artigo 12
Pesquisa e Treinamento
As Partes Contratantes, levando em conta as necessidades especiais dos países em
desenvolvimento, devem:
a) Estabelecer e manter programas de educação e treinamento científico e técnico sobre
medidas para a identificação, conservação e utilização sustentável da diversidade biológica e
seus componentes, e proporcionar apoio a esses programas de educação e treinamento
destinados às necessidades específicas dos países em desenvolvimento;
b) Promover e estimular pesquisas que contribuam para a conservação e a utilização
sustentável da diversidade biológica, especialmente nos países em desenvolvimento,
conforme, entre outras, as decisões da Conferência das Partes tomadas em conseqüência das
recomendações do órgão Subsidiário de Assessoramento Científico, Técnico e tecnológico; e
c) Em conformidade com as disposições dos Artigos 16, 18 e 20, promover e cooperar na
utilização de avanços científicos da pesquisa sobre diversidade biológica para elaborar
métodos de conservação e utilização sustentável de recursos biológicos.
Artigo 13
Educação e Conscientização Pública
As Partes Contratantes devem:
a) Promover e estimular a compreensão da importância da conservação da diversidade
biológica e das medidas necessárias a esse fim, sua divulgação pelos meios de comunicação, e
a inclusão desses temas nos programas educacionais; e
b) Cooperar, conforme o caso, com outros Estados e organizações internacionais na
elaboração de programas educacionais de conscientização pública no que concerne à
conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica.
Artigo 14
Avaliação de Impacto e Minimização de Impactos Negativos
1. Cada Parte Contratante, na medida do possível e conforme o caso, deve:
a) Estabelecer procedimentos adequados que exijam a avaliação de impacto ambiental de seus
projetos propostos que possam ter sensíveis efeitos negativos na diversidade biológica, a fim
de evitar ou minimizar tais efeitos e, conforme o caso, permitir a participação pública nesses
procedimentos;
b) Tomar providências adequadas para assegurar que sejam devidamente levadas em conta as
conseqüências ambientais de seus programas e políticas que possam ter sensíveis efeitos
negativos na diversidade biológica;
c) Promover, com base em reciprocidade, notificação, intercâmbio de informação e consulta
sobre atividades sob sua jurisdição ou controle que possam ter sensíveis efeitos negativos na
diversidade biológica de outros Estados ou áreas além dos limites da jurisdição nacional,
estimulando-se a adoção de acordos bilaterais, regionais ou multilaterais, conforme o caso;
d) Notificar imediatamente, no caso em que se originem sob sua jurisdição ou controle, perigo
ou dano iminente ou grave à diversidade biológica em área sob jurisdição de outros Estados
ou em áreas além dos limites da jurisdição nacional, os Estados que possam ser afetados por
esse perigo ou dano, assim como tomar medidas para prevenir ou minimizar esse perigo ou
dano; e
e) Estimular providências nacionais sobre medidas de emergência para o caso de atividades
ou acontecimentos de origem natural ou outra que representem perigo grave e iminente à
diversidade biológica e promover a cooperação internacional para complementar tais esforços
nacionais e, conforme o caso e em acordo com os Estados ou organizações regionais de
integração econômica interessados, estabelecer planos conjuntos de contingência.
2. A Conferência das Partes deve examinar, com base em estudos a serem efetuados, as
questões da responsabilidade e reparação, inclusive restauração e indenização, por danos
causados à diversidade biológica, exceto quando essa responsabilidade for de ordem
estritamente interna.
Artigo 15
Acesso a Recursos Genéticos
1. Em reconhecimento dos direitos soberanos dos Estados sobre seus recursos naturais, a
autoridade para determinar o acesso a recursos genéticos pertence aos governos nacionais e
está sujeita à legislação nacional.
2. Cada Parte Contratante deve procurar criar condições para permitir o acesso a recursos
genéticos para utilização ambientalmente saudável por outras Partes Contratantes e não impor
restrições contrárias aos objetivos desta Convenção.
3. Para os propósitos desta Convenção, os recursos genéticos providos por uma Parte
Contratante, a que se referem este Artigo e os Artigos 16 e 19, o apenas aqueles providos
por Partes Contratantes que sejam países de origem desses recursos ou por Partes que os
tenham adquirido em conformidade com esta Convenção.
4. O acesso, quando concedido, deverá sê-lo de comum acordo e sujeito ao disposto no
presente Artigo.
5. O acesso aos recursos genéticos deve estar sujeito ao consentimento prévio fundamentado
da Parte Contratante provedora desses recursos, a menos que de outra forma determinado por
essa Parte.
6. Cada Parte Contratante deve procurar conceber e realizar pesquisas científicas baseadas em
recursos genéticos providos por outras Partes Contratantes com sua plena participação e, na
medida do possível, no território dessas Partes Contratantes.
7. Cada Parte Contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas,
conforme o caso e em conformidade com os Artigos 16 e 19 e, quando necessário, mediante o
mecanismo financeiro estabelecido pelos Artigos 20 e 21, para compartilhar de forma justa e
eqüitativa os resultados da pesquisa e do desenvolvimento de recursos genéticos e os
benefícios derivados de sua utilização comercial e de outra natureza com a Parte Contratante
provedora desses recursos. Essa partilha deve dar-se de comum acordo.
Artigo 16
Acesso à Tecnologia e Transferência de Tecnologia
1. Cada Parte Contratante, reconhecendo que a tecnologia inclui biotecnologia, e que tanto o
acesso à tecnologia quanto sua transferência entre Partes Contratantes são elementos
essenciais para a realização dos objetivos desta Convenção, compromete-se, sujeito ao
disposto neste Artigo, a permitir e/ou facilitar a outras Partes Contratantes acesso a
tecnologias que sejam pertinentes à conservação e utilização sustentável da diversidade
biológica ou que utilizem recursos genéticos e o causem dano sensível ao meio ambiente,
assim como a transferência dessas tecnologias.
2. O acesso a tecnologia e sua transferência a países em desenvolvimento, a que se refere o
parágrafo 1 acima, devem ser permitidos e/ou facilitados em condições justas e as mais
favoráveis, inclusive em condições concessionais e preferenciais quando de comum acordo, e,
caso necessário, em conformidade com o mecanismo financeiro estabelecido nos Artigos 20 e
21. No caso de tecnologia sujeita a patentes e outros direitos de propriedade intelectual, o
acesso à tecnologia e sua transferência devem ser permitidos em condições que reconheçam e
sejam compatíveis com a adequada e efetiva proteção dos direitos de propriedade intelectual.
A aplicação deste parágrafo deve ser compatível com os parágrafos 3, 4 e 5 abaixo.
3. Cada Parte Contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas,
conforme o caso, para que as Partes Contratantes, em particular as que são países em
desenvolvimento, que provêem recursos genéticos, tenham garantido o acesso à tecnologia
que utilize esses recursos e sua transferência, de comum acordo, incluindo tecnologia
protegida por patentes e outros direitos de propriedade intelectual, quando necessário,
mediante as disposições dos Artigos 20 e 21, de acordo com o direito internacional e
conforme os parágrafos 4 e 5 abaixo.
4. Cada Parte Contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas,
conforme o caso, para que o setor privado permita o acesso à tecnologia a que se refere o
parágrafo 1 acima, seu desenvolvimento conjunto e sua transferência em benefício das
instituições governamentais e do setor privado de países em desenvolvimento, e a esse
respeito deve observar as obrigações constantes dos parágrafos 1, 2 e 3 acima.
5. As Partes Contratantes, reconhecendo que patentes e outros direitos de propriedade
intelectual podem influir na implementação desta Convenção, devem cooperar a esse respeito
em conformidade com a legislação nacional e o direito internacional para garantir que esses
direitos apóiem e não se oponham aos objetivos desta Convenção.
Artigo 17
Intercâmbio de Informações
1. As Partes Contratantes devem proporcionar o intercâmbio de Informações, de todas as
fontes disponíveis do público, pertinentes à conservação e à utilização sustentável da
diversidade biológica, levando em conta as necessidades especiais dos países em
desenvolvimento.
2. Esse intercâmbio de Informações deve incluir o intercâmbio dos resultados de pesquisas
técnicas, científicas, e sócio-econômicas, como também Informações sobre programas de
treinamento e de pesquisa, conhecimento especializado, conhecimento indígena e tradicional
como tais e associados às tecnologias a que se refere o parágrafo 1 do Artigo 16. Deve
também, quando possível, incluir a repatriação das informações.
Artigo 18
Cooperação Técnica e Científica
1. As Partes Contratantes devem promover a cooperação técnica e científica internacional no
campo da conservação e utilização sustentável da diversidade biológica, caso necessário, por
meio de instituições nacionais e internacionais competentes.
2. Cada Parte Contratante deve, ao implementar esta Convenção, promover a cooperação
técnica e científica com outras Partes Contratantes, em particular países em desenvolvimento,
por meio, entre outros, da elaboração e implementação de políticas nacionais. Ao promover
essa cooperação, deve ser dada especial atenção ao desenvolvimento e fortalecimento dos
meios nacionais mediante a capacitação de recursos humanos e fortalecimento institucional.
3. A Conferência das Partes, em sua primeira sessão, deve determinar a forma de estabelecer
um mecanismo de intermediação para promover e facilitar a cooperação técnica e científica.
4. As Partes Contratantes devem, em conformidade com sua legislação e suas políticas
nacionais, elaborar e estimular modalidades de cooperação para o desenvolvimento e
utilização de tecnologias, inclusive tecnologias indígenas e tradicionais, para alcançar os
objetivos desta Convenção. Com esse fim, as Partes Contratantes devem também promover a
cooperação para a capacitação de pessoal e o intercâmbio de técnicos.
5. As Partes Contratantes devem, no caso de comum acordo, promover o estabelecimento de
programas de pesquisa conjuntos e empresas conjuntas para o desenvolvimento de tecnologias
relevantes aos objetivos desta Convenção.
Artigo 19
Gestão da Biotecnologia e Distribuição de seus Benefícios
1. Cada Parte Contratante deve adotar medidas legislativas, administrativas ou políticas,
conforme o caso, para permitir a participação efetiva, em atividades de pesquisa
biotecnológica, das Partes Contratantes, especialmente países em desenvolvimento, que
provêem os recursos genéticos para essa pesquisa, e se possível nessas Partes Contratantes.
2. Cada Parte Contratante deve adotar todas as medidas possíveis para promover e antecipar
acesso prioritário, em base justa e eqüitativa das Partes Contratantes, especialmente países em
desenvolvimento, aos resultados e benefícios derivados de biotecnologias baseadas em
recursos genéticos providos por essas Partes Contratantes. Esse acesso deve ser de comum
acordo.
3. As Partes devem examinar a necessidade e as modalidades de um protocolo que estabeleça
procedimentos adequados, inclusive, em especial, a concordância prévia fundamentada, no
que respeita à transferência, manipulação e utilização seguras de todo organismo vivo
modificado pela biotecnologia, que possa ter efeito negativo para a conservação e utilização
sustentável da diversidade biológica.
4. Cada Parte Contratante deve proporcionar, diretamente ou por solicitação, a qualquer
pessoa física ou jurídica sob sua jurisdição provedora dos organismos a que se refere o
parágrafo 3 acima, à Parte Contratante em que esses organismos devam ser introduzidos,
todas as Informações disponíveis sobre a utilização e as normas de segurança exigidas por
essa Parte Contratante para a manipulação desses organismos, bem como todas as
Informações disponíveis sobre os potenciais efeitos negativos desses organismos específicos.
Artigo 20
Recursos Financeiros
1. Cada Parte Contratante compromete-se a proporcionar, de acordo com a sua capacidade,
apoio financeiro e incentivos respectivos às atividades nacionais destinadas a alcançar os
objetivos desta Convenção em conformidade com seus planos, prioridades e programas
nacionais.
2. As Partes países desenvolvidos devem prover recursos financeiros novos e adicionais para
que as Partes países em desenvolvimento possam cobrir integralmente os custos adicionais
por elas concordados decorrentes da implementação de medidas em cumprimento das
obrigações desta Convenção, bem como para que se beneficiem de seus dispositivos. Estes
custos devem ser determinados de comum acordo entre cada Parte país em desenvolvimento e
o mecanismo institucional previsto no Artigo 21, de acordo com políticas, estratégias,
prioridades programáticas e critérios de aceitabilidade, segundo uma lista indicativa de custos
adicionais estabelecida pela Conferência das Partes. Outras Partes, inclusive países em
transição para uma economia de mercado, podem assumir voluntariamente as obrigações das
Partes países desenvolvidos. Para os fins deste Artigo, a Conferência das Partes deve
estabelecer, em sua primeira sessão, uma lista de Partes países desenvolvidos e outras Partes
que voluntariamente assumam as obrigações das Partes países desenvolvidos. A Conferência
das Partes deve periodicamente revisar e, se necessário, alterar a lista. Contribuições
voluntárias de outros países e fontes podem ser também estimuladas. Para o cumprimento
desses compromissos deve ser levada em conta a necessidade de que o fluxo de recursos seja
adequado, previsível e oportuno, e a importância de distribuir os custos entre as Partes
contribuintes incluídas na citada lista.
3. As Partes países desenvolvidos podem também prover recursos financeiros relativos à
implementação desta Convenção por canais bilaterais, regionais e outros multilaterais.
4. O grau de efetivo cumprimento dos compromissos assumidos sob esta Convenção das
Partes países em desenvolvimento dependerá do cumprimento efetivo dos compromissos
assumidos sob esta Convenção pelas Partes países desenvolvidos, no que se refere a recursos
financeiros e transferência de tecnologia, e levará plenamente em conta o fato de que o
desenvolvimento econômico e social e a erradicação da pobreza são as prioridades
primordiais e absolutas das Partes países em desenvolvimento.
5. As Partes devem levar plenamente em conta as necessidades específicas e a situação
especial dos países de menor desenvolvimento relativo em suas medidas relativas a
financiamento e transferência de tecnologia.
6. As Partes Contratantes devem também levar em conta as condições especiais decorrentes
da dependência da diversidade biológica, sua distribuição e localização nas Partes países em
desenvolvimento, em particular os pequenos Estados insulares.
7. Deve-se também levar em consideração a situação especial dos países em desenvolvimento,
inclusive os que o ecologicamente mais vulneráveis, como os que possuem regiões áridas e
semi-áridas, zonas costeiras e montanhosas.
Artigo 21
Mecanismos Financeiros
1. Deve ser estabelecido um mecanismo para prover, por meio de doação ou em bases
concessionais, recursos financeiros para os fins desta Convenção, às Partes países em
desenvolvimento, cujos elementos essenciais são descritos neste Artigo. O mecanismo deve
operar, para os fins desta Convenção, sob a autoridade e a orientação da Conferência das
Partes, e a ela responder. As operações do mecanismo devem ser realizadas por estrutura
institucional a ser decidida pela Conferência das Partes em sua primeira sessão. A
Conferência das Partes deve determinar, para os fins desta Convenção, políticas, estratégias,
prioridades programáticas e critérios de aceitabilidade relativos ao acesso e à utilização desses
recursos. As Contribuições devem levar em conta a necessidade mencionada no Artigo 20 de
que o fluxo de recursos seja previsível, adequado e oportuno, de acordo com o montante de
recursos necessários, a ser decidido periodicamente pela Conferência das Partes, bem como a
importância da distribuição de custos entre as partes contribuintes incluídas na lista a que se
refere o parágrafo 2 do Artigo 20. Contribuições voluntárias podem também ser feitas pelas
Partes países desenvolvidos e por outros países e fontes. O mecanismo deve operar sob um
sistema de administração democrático e transparente.
2. Em conformidade com os objetivos desta Convenção, a Conferência das Partes deve
determinar, em sua primeira sessão, políticas, estratégias e prioridades programáticas, bem
como diretrizes e critérios detalhados de aceitabilidade para acesso e utilização dos recursos
financeiros, inclusive o acompanhamento e a avaliação periódica de sua utilização. A
Conferência das Partes deve decidir sobre as providências para a implementação do parágrafo
1 acima após consulta à estrutura institucional encarregada da operação do mecanismo
financeiro.
3. A Conferência das Partes deve examinar a eficácia do mecanismo estabelecido neste
Artigo, inclusive os critérios e as diretrizes referidas no Parágrafo 2 acima, em não menos que
dois anos da entrada em vigor desta Convenção, e a partir de então periodicamente. Com base
nesse exame, deve, se necessário, tomar medidas adequadas para melhorar a eficácia do
mecanismo.
4. As Partes Contratantes devem estudar a possibilidade de fortalecer as instituições
financeiras existentes para prover recursos financeiros para a conservação e a utilização
sustentável da diversidade biológica.
Artigo 22
Relação com Outras Convenções Internacionais
1. As disposições desta Convenção não devem afetar os direitos e obrigações de qualquer
Parte Contratante decorrentes de qualquer acordo internacional existente, salvo se o exercício
desses direitos e o cumprimento dessas obrigações cause grave dano ou ameaça à diversidade
biológica.
2. As Partes Contratantes devem implementar esta Convenção, no que se refere ao meio
ambiente marinho, em conformidade com os direitos e obrigações dos Estados decorrentes do
direito do mar.
Artigo 23
Conferência das Partes
1. Uma Conferência das Partes é estabelecida por esta Convenção. A primeira sessão da
Conferência das Partes deve ser convocada pelo Diretor Executivo do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente no mais tardar dentro de um ano da entrada em vigor desta
Convenção. Subseqüentemente, sessões ordinárias da Conferência das Partes devem ser
realizadas em intervalos a serem determinados pela Conferência em sua primeira sessão.
2. Sessões extraordinárias da Conferência das Partes devem ser realizadas quando for
considerado necessário pela Conferência, ou por solicitação escrita de qualquer Parte, desde
que, dentro de seis meses após a solicitação ter sido comunicada às Partes pelo Secretariado,
seja apoiada por pelo menos um terço das Partes.
3. A Conferência das Partes deve aprovar e adotar por consenso suas regras de procedimento
e as de qualquer organismo subsidiário que estabeleça, bem como as normas de administração
financeira do Secretariado. Em cada sessão ordinária, a Conferência das Partes deve adotar
um orçamento para o exercício até a seguinte sessão ordinária.
4. A Conferência das Partes deve manter sob exame a implementação desta Convenção, e,
com esse fim, deve:
a) Estabelecer a forma e a periodicidade da comunicação das Informações a serem
apresentadas em conformidade com o Artigo 26, e examinar essas Informações, bem como os
relatórios apresentados por qualquer órgão subsidiário;
b) Examinar os pareceres científicos, técnicos e tecnológicos apresentados de acordo com o
Artigo 25;
c) Examinar e adotar protocolos, caso necessário, em conformidade com o Artigo 28;
d) Examinar e adotar, caso necessário, emendas a esta Convenção e a seus anexos, em
conformidade com os Artigos 29 e 30;
e) Examinar emendas a qualquer protocolo, bem como a quaisquer de seus anexos e, se assim
decidir, recomendar sua adoção às partes desses protocolos;
f) Examinar e adotar, caso necessário, anexos adicionais a esta Convenção, em conformidade
com o Artigo 30;
g) Estabelecer os órgãos subsidiários, especialmente de consultoria científica e técnica,
considerados necessários à implementação desta Convenção;
h) Entrar em contato, por meio do Secretariado, com os órgãos executivos de Convenções que
tratem de assuntos objeto desta Convenção, para com eles estabelecer formas adequadas de
cooperação; e
i) Examinar e tomar todas as demais medidas que possam ser necessárias para alcançar os fins
desta Convenção, à luz da experiência adquirida na sua implementação.
5. As Nações Unidas, seus organismos especializados e a Agência Internacional de Energia
Atômica, bem como qualquer Estado que não seja Parte desta Convenção, podem se fazer
representar como observadores nas sessões da Conferência das Partes. Qualquer outro órgão
ou organismo, governamental ou o-governamental, competente no campo da conservação e
da utilização sustentável da diversidade biológica, que informe ao Secretariado do seu desejo
de se fazer representar como observador numa sessão da Conferência das Partes, pode ser
admitido, a menos que um terço das Partes apresente objeção. A admissão e participação de
observadores deve sujeitar-se às regras de procedimento adotadas pela Conferência das
Partes.
Artigo 24
Secretariado
1. Fica estabelecido um Secretariado com as seguintes funções:
a) Organizar as sessões da Conferência das Partes prevista no Artigo 23 e prestar-lhes serviço;
b) Desempenhar as funções que lhe atribuam os protocolos;
c) Preparar relatórios sobre o desempenho de suas funções sob esta Convenção e apresentá-los
à Conferência das Partes;
d) Assegurar a coordenação com outros organismos internacionais pertinentes e, em
particular, tomar as providências administrativas e contratuais necessárias para o desempenho
eficaz de suas funções; e
e) Desempenhar as demais funções que lhe forem atribuídas pela Conferência das Partes.
2. Em sua primeira sessão ordinária, a Conferência das Partes deve designar o Secretariado
dentre as organizações internacionais competentes que se tenham demonstrado dispostas a
desempenhar as funções de secretariado previstas nesta Convenção.
Artigo 25
Órgão Subsidiário de Assessoramento Científico, Técnico e Tecnológico
1. Fica estabelecido um órgão subsidiário de assessoramento científico, técnico e tecnológico
para prestar, em tempo oportuno, à Conferência das Partes e, conforme o caso, aos seus
demais órgãos subsidiários, assessoramento sobre a implementação desta Convenção. Este
órgão deve estar aberto à participação de todas as Partes e deve ser multidisciplinar. Deve ser
composto por representantes governamentais com competências nos campos de
especialização pertinentes. Deve apresentar relatórios regularmente à Conferência das Partes
sobre todos os aspectos de seu trabalho.
2. Sob a autoridade da Conferência das Partes e de acordo com as diretrizes por ela
estabelecidas, e a seu pedido, o órgão deve:
a) Apresentar avaliações científicas e técnicas da situação da diversidade biológica;
b) Preparar avaliações científicas e técnicas dos efeitos dos tipos de medidas adotadas, em
conformidade com o previsto nesta Convenção;
c) Identificar tecnologias e conhecimentos técnicos inovadores, eficientes e avançados
relacionados à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica e prestar
assessoramento sobre as formas e meios de promover o desenvolvimento e/ou a transferência
dessas tecnologias;
d) Prestar assessoramento sobre programas científicos e cooperação internacional em pesquisa
e desenvolvimento, relativos à conservação e à utilização sustentável da diversidade
biológica; e
e) Responder a questões científicas, técnicas, tecnológicas e metodológicas que lhe formulem
a Conferência das Partes e seus órgãos subsidiários.
3. As funções, mandato, organização e funcionamento deste órgão podem ser posteriormente
melhor definidos pela Conferência das Partes.
Artigo 26
Relatórios
Cada Parte Contratante deve, com a periodicidade a ser estabelecida pela Conferência das
Partes, apresentar-lhe relatórios sobre medidas que tenha adotado para a implementação dos
dispositivos desta Convenção e sobre sua eficácia para alcançar os seus objetivos.
Artigo 27
Solução de Controvérsias
1. No caso de controvérsia entre Partes Contratantes no que respeita à interpretação ou
aplicação desta Convenção, as Partes envolvidas devem procurar resolvê-la por meio de
negociação.
2. Se as Partes envolvidas não conseguirem chegar a um acordo por meio de negociação,
podem conjuntamente solicitar os bons ofícios ou a mediação de uma terceira Parte.
3. Ao ratificar, aceitar, ou aprovar esta Convenção ou a ela aderir, ou em qualquer momento
posterior, um Estado ou organização de integração econômica regional pode declarar por
escrito ao Depositário que, no caso de controvérsia não resolvida de acordo com o parágrafo 1
ou o parágrafo 2 acima, aceita como compulsórios um ou ambos dos seguintes meios de
solução de controvérsias:
a) Arbitragem de acordo com o procedimento estabelecido na Parte 1 do anexo II;
b) Submissão da controvérsia à Corte Internacional de Justiça.
4. Se as Partes na controvérsia não tiverem aceito, de acordo com o parágrafo 3 acima, aquele
ou qualquer outro procedimento, a controvérsia deve ser submetida à conciliação de acordo
com a Parte 2 do Anexo II, a menos que as Partes concordem de outra maneira.
5. O disposto neste Artigo aplica-se a qualquer protocolo salvo se de outra maneira disposto
nesse protocolo.
Artigo 28
Adoção dos Protocolos
1. As Partes Contratantes devem cooperar na formulação e adoção de protocolos desta
Convenção.
2. Os protocolos devem ser adotados em sessão da Conferência das Partes.
3. O texto de qualquer protocolo proposto deve ser comunicado pelo Secretariado às Partes
Contratantes pelo menos seis meses antes dessa sessão.
Artigo 29
Emendas à Convenção ou Protocolos
1. Qualquer Parte Contratante pode propor emendas a esta Convenção. Emendas a qualquer
protocolo podem ser propostas por quaisquer Partes dos mesmos.
2. Emendas a esta Convenção devem ser adotadas em sessão da Conferência das Partes.
Emendas a qualquer protocolo devem ser adotadas em sessão das Partes dos protocolos
pertinentes. O texto de qualquer emenda proposta a esta Convenção ou a qualquer protocolo,
salvo se de outro modo disposto no protocolo, deve ser comunicado às Partes do instrumento
pertinente pelo Secretariado pelo menos seis meses antes da sessão na qual será proposta sua
adoção. Propostas de emenda devem também ser comunicadas pelo Secretariado aos
signatários desta Convenção, para informação.
3. As Partes devem fazer todo o possível para chegar a acordo por consenso sobre as emendas
propostas a esta Convenção ou a qualquer protocolo. Uma vez exauridos todos os esforços
para chegar a um consenso sem que se tenha chegado a um acordo, a emenda deve ser
adotada, em última instância, por maioria de dois terços das Partes do instrumento pertinente
presentes e votantes nessa sessão, e deve ser submetida pelo Depositário a todas as Partes para
ratificação, aceitação ou aprovação.
4. A ratificação, aceitação ou aprovação de emendas deve ser notificada por escrito ao
Depositário. As emendas adotadas em conformidade com o parágrafo 3 acima devem entrar
em vigor entre as Partes que as tenham aceito no nonagésimo dia após o depósito dos
instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação de pelo menos dois terços das Partes
Contratantes desta Convenção ou das Partes do protocolo pertinente, salvo se de outro modo
disposto nesse protocolo. A partir de então, as emendas devem entrar em vigor para qualquer
outra Parte no nonagésimo dia após a Parte ter depositado seu instrumento de ratificação,
aceitação ou aprovação das emendas.
5. Para os fins deste Artigo, "Partes presentes e votantes" significa Partes presentes e que
emitam voto afirmativo ou negativo.
Artigo 30
Adoção de Anexos e Emendas a Anexos
1. Os anexos a esta Convenção ou a seus protocolos constituem parte integral da Convenção
ou do protocolo pertinente, conforme o caso, e, salvo se expressamente disposto de outro
modo, qualquer referência a esta Convenção e a seus protocolos constitui ao mesmo tempo
referência a quaisquer de seus anexos. Esses anexos devem restringir-se a assuntos
processuais, científicos, técnicos e administrativos.
2. Salvo se disposto de outro modo em qualquer protocolo no que se refere a seus anexos,
para a proposta, adoção e entrada em vigor de anexos suplementares a esta Convenção ou de
anexos a quaisquer de seus protocolos, deve-se obedecer o seguinte procedimento:
a) Os anexos a esta Convenção ou a qualquer protocolo devem ser propostos e adotados de
acordo com o procedimento estabelecido no Artigo 29;
b) Qualquer Parte que não possa aceitar um anexo suplementar a esta Convenção ou um
anexo a qualquer protocolo do qual é Parte o deve notificar, por escrito, ao Depositário,
dentro de um ano da data da comunicação de sua adoção pelo Depositário. O Depositário
deve comunicar sem demora a todas as Partes qualquer notificação desse tipo recebida. Uma
Parte pode a qualquer momento retirar uma declaração anterior de objeção, e, assim, os
anexos devem entrar em vigor para aquela Parte de acordo com o disposto na alínea (c)
abaixo;
c) Um ano após a data da comunicação pelo Depositário de sua adoção, o anexo deve entrar
em vigor para todas as Partes desta Convenção ou de qualquer protocolo pertinente que o
tenham apresentado uma notificação de acordo com o disposto na alínea (b) acima.
3. A proposta, adoção e entrada em vigor de emendas aos anexos a esta Convenção ou a
qualquer protocolo devem estar sujeitas ao procedimento obedecido no caso da proposta,
adoção e entrada em vigor de anexos à esta Convenção ou anexos a qualquer protocolo.
4. Se qualquer anexo suplementar ou uma emenda a um anexo for relacionada a uma emenda
a esta Convenção ou qualquer protocolo, este anexo suplementar ou esta emenda somente
deve entrar em vigor quando a referida emenda à Convenção ou protocolo estiver em vigor.
Artigo 31
Direito de Voto
1. Salvo o disposto no parágrafo 2 abaixo, cada Parte Contratante desta Convenção ou de
qualquer protocolo deve ter um voto.
2. Em assuntos de sua competência, organizações de integração econômica regional devem
exercer seu direito ao voto com um número de votos igual ao número de seus Estados
membros que sejam Partes Contratantes desta Convenção ou de protocolo pertinente. Essas
organizações não devem exercer seu direito de voto se seus Estados-membros exercerem os
seus, e vice-versa.
Artigo 32
Relação entre esta Convenção e seus Protocolos
1. Um Estado ou uma organização de integração econômica regional não pode ser Parte de
um protocolo salvo se for, ou se tornar simultaneamente, Parte Contratante desta Convenção.
2. Decisões decorrentes de qualquer protocolo devem ser tomadas somente pelas Partes do
protocolo pertinente. Qualquer Parte Contratante que não tenha ratificado, aceito ou aprovado
um protocolo pode participar como observadora em qualquer sessão das Partes daquele
protocolo.
Artigo 33
Assinatura
Esta Convenção está aberta a assinatura por todos os Estados e qualquer organização de
integração econômica regional na cidade do Rio de Janeiro de 5 de junho de 1992 a 14 de
junho de 1992, e na sede das Nações Unidas em Nova York, de 15 de junho de 1992 a 4 de
junho de 1993.
Artigo 34
Ratificação, Aceitação ou Aprovação
1. Esta Convenção e seus protocolos estão sujeitos a ratificação, aceitação ou aprovação,
pelos Estados e por organizações de integração econômica regional. Os Instrumentos de
ratificação, aceitação ou aprovação devem ser depositados junto ao Depositário.
2. Qualquer organização mencionada no parágrafo 1 acima que se torne Parte Contratante
desta Convenção ou de quaisquer de seus protocolos, sem que seja Parte contratante nenhum
de seus Estados membros, deve ficar sujeita a todas as obrigações da Convenção ou do
protocolo, conforme o caso. No caso dessas organizações, se um ou mais de seus Estados
membros for uma Parte Contratante desta Convenção ou de protocolo pertinente, a
organização e seus Estados membros devem decidir sobre suas respectivas responsabilidades
para o cumprimento de suas obrigações previstas nesta Convenção ou no protocolo, conforme
o caso. Nesses casos, a organização e os Estados membros não devem exercer
simultaneamente direitos estabelecidos por esta Convenção ou pelo protocolo pertinente.
3. Em seus instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação, as organizações mencionadas
no parágrafo 1 acima devem declarar o âmbito de sua competência no que respeita a assuntos
regidos por esta Convenção ou por protocolo pertinente. Essas organizações devem também
informar ao Depositário de qualquer modificação pertinente no âmbito de sua competência.
Artigo 35
Adesão
1. Esta Convenção e quaisquer de seus protocolos está aberta a adesão de Estados e
organizações de integração econômica regional a partir da data em que expire o prazo para a
assinatura da Convenção ou do protocolo pertinente. Os instrumentos de adesão devem ser
depositados junto ao Depositário.
2. Em seus instrumentos de adesão, as organizações mencionadas no parágrafo 1 acima
devem declarar o âmbito de suas competências no que respeita aos assuntos regidos por esta
Convenção ou pelos protocolos. Essas organizações devem também informar ao Depositário
qualquer modificação pertinente no âmbito de suas competências.
3. O disposto no Artigo 34, parágrafo 2, deve aplicar-se a organizações de integração
econômica regional que adiram a esta Convenção ou a quaisquer de seus protocolos.
Artigo 36
Entrada em Vigor
1. Esta Convenção entra em vigor no nonagésimo dia após a data de depósito do trigésimo
instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão.
2. Um protocolo deve entrar em vigor no nonagésimo dia após a data do depósito do número
de instrumentos de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão estipulada nesse protocolo.
3. Para cada Parte Contratante que ratifique, aceite ou aprove esta Convenção ou a ela adira
após o depósito do trigésimo instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, esta
Convenção entra em vigor no nonagésimo dia após a data de depósito pela Parte Contratante
do seu instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão.
4. Um protocolo, salvo se disposto de outro modo nesse protocolo, deve entrar em vigor para
uma Parte Contratante que o ratifique, aceite ou aprove ou a ele adira após sua entrada em
vigor de acordo com o parágrafo 2 acima, no nonagésimo dia após a data do depósito do
instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão por essa Parte Contratante, ou na
data em que esta Convenção entre em vigor para essa Parte Contratante, a que for posterior.
5. Para os fins dos parágrafos 1 e 2 acima, os instrumentos depositados por uma organização
de integração econômica regional não devem ser contados como adicionais àqueles
depositados por Estados- membros dessa organização.
Artigo 37
Reservas
Nenhuma reserva pode ser feita a esta Convenção.
Artigo 38
Denúncias
1. Após dois anos da entrada em vigor desta Convenção para uma Parte Contratante, essa
Parte Contratante pode a qualquer momento denunciá-la por meio de notificação escrita ao
Depositário.
2. Essa denúncia tem efeito um ano após a data de seu recebimento pelo Depositário, ou em
data posterior se assim for estipulado na notificação de denúncia.
3. Deve ser considerado que qualquer Parte Contratante que denuncie esta Convenção
denuncia também os protocolos de que é Parte.
Artigo 39
Disposição Financeiras Provisórias
Desde que completamente reestruturado, em conformidade com o disposto no Artigo 21, o
Fundo para o Meio Ambiente Mundial, do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, e do Banco
Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento, deve ser a estrutura institucional
provisória a que se refere o Artigo 21, no período entre a entrada em vigor desta Convenção e
a primeira sessão da Conferência das Partes ou até que a Conferência das Partes designe uma
estrutura institucional em conformidade com o Artigo 21.
Artigo 40
Disposições Transitórias para o Secretariado
O Secretariado a ser provido pelo Diretor Executivo do Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente deve ser o Secretariado a que se refere o Artigo 24, parágrafo 2,
provisoriamente pelo período entre a entrada em vigor desta Convenção e a primeira sessão
da Conferência das Partes.
Artigo 41
Depositário
O Secretário-Geral das Nações Unidas deve assumir as funções de Depositário desta
Convenção e de seus protocolos.
Artigo 42
Textos Autênticos
O original desta Convenção, cujos textos em árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo
são igualmente autênticos, deve ser depositado junto ao Secretário-Geral das Nações Unidas.
Em fé do que, os abaixo assinados, devidamente autorizados para esse fim, firmam esta
Convenção.
ANEXO B – Medida Provisória nº 2.186-16, de 23 de agosto de 2001
415
MEDIDA PROVISÓRIA N
o
2.186-16, DE 23 DE AGOSTO DE 2001.
Regulamenta o inciso II do §
1
o
e o §
4
o
do art.
225 da Constituição, os arts. 1
o
, 8
o
, alínea "j", 10,
alínea "c", 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção
sobre Diversidade Biológi
ca, dispõe sobre o
acesso ao patrimônio genético, a proteção e o
acesso ao conhecimento tradicional associado, a
repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e
transferência de tecnologia para sua conservação e
utilização, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da
Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1
o
Esta Medida Provisória dispõe sobre os bens, os direitos e as obrigações
relativos:
I - ao acesso a componente do patrimônio genético existente no território nacional, na
plataforma continental e na zona econômica exclusiva para fins de pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção;
II - ao acesso ao conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, relevante à
conservação da diversidade biológica, à integridade do patrimônio genético do País e à
utilização de seus componentes;
III - à repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da exploração de
componente do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado; e
IV - ao acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para a conservação e a
utilização da diversidade biológica.
§ 1
o
O acesso a componente do patrimônio genético para fins de pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção far-se-á na forma desta Medida Provisória,
sem prejuízo dos direitos de propriedade material ou imaterial que incidam sobre o
componente do patrimônio genético acessado ou sobre o local de sua ocorrência.
415
BRASIL. Medida Provisória 2.816-16, de 23 de agosto de 2001. Regulamenta o inciso II do § 1º e o §
do art. 225 da Constituição, os arts., , alínea "j", 10, alínea "c", 15 e 16, alíneas 3 e 4 da Convenção sobre
Diversidade Biológica, dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento
tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua
conservação e utilização, e outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/2186-16.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
§ 2
o
O acesso a componente do patrimônio genético existente na plataforma continental
observará o disposto na Lei n
o
8.617, de 4 de janeiro de 1993.
Art. 2
o
O acesso ao patrimônio genético existente no País somente será feito mediante
autorização da União e terá o seu uso, comercialização e aproveitamento para quaisquer fins
submetidos à fiscalização, restrições e repartição de benefícios nos termos e nas condições
estabelecidos nesta Medida Provisória e no seu regulamento.
Art. 3
o
Esta Medida Provisória não se aplica ao patrimônio genético humano.
Art. 4
o
É preservado o intercâmbio e a difusão de componente do patrimônio genético e
do conhecimento tradicional associado praticado entre si por comunidades indígenas e
comunidades locais para seu próprio benefício e baseados em prática costumeira.
Art. 5
o
É vedado o acesso ao patrimônio genético para práticas nocivas ao meio
ambiente e à saúde humana e para o desenvolvimento de armas biológicas e químicas.
Art. 6
o
A qualquer tempo, existindo evidência científica consistente de perigo de dano
grave e irreversível à diversidade biológica, decorrente de atividades praticadas na forma
desta Medida Provisória, o Poder Público, por intermédio do Conselho de Gestão do
Patrimônio Genético, previsto no art. 10, com base em critérios e parecer técnico, determinará
medidas destinadas a impedir o dano, podendo, inclusive, sustar a atividade, respeitada a
competência do órgão responsável pela biossegurança de organismos geneticamente
modificados.
CAPÍTULO II
DAS DEFINIÇÕES
Art. 7
o
Além dos conceitos e das definições constantes da Convenção sobre Diversidade
Biológica, considera-se para os fins desta Medida Provisória:
I - patrimônio genético: informação de origem genética, contida em amostras do todo ou
de parte de espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na forma de moléculas e
substâncias provenientes do metabolismo destes seres vivos e de extratos obtidos destes
organismos vivos ou mortos, encontrados em condições in situ, inclusive domesticados, ou
mantidos em coleções ex situ, desde que coletados em condições in situ no território nacional,
na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva;
II - conhecimento tradicional associado: informação ou prática individual ou coletiva de
comunidade indígena ou de comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao
patrimônio genético;
III - comunidade local: grupo humano, incluindo remanescentes de comunidades de
quilombos, distinto por suas condições culturais, que se organiza, tradicionalmente, por
gerações sucessivas e costumes próprios, e que conserva suas instituições sociais e
econômicas;
IV - acesso ao patrimônio genético: obtenção de amostra de componente do patrimônio
genético para fins de pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção,
visando a sua aplicação industrial ou de outra natureza;
V - acesso ao conhecimento tradicional associado: obtenção de informação sobre
conhecimento ou prática individual ou coletiva, associada ao patrimônio genético, de
comunidade indígena ou de comunidade local, para fins de pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, visando sua aplicação industrial ou de outra
natureza;
VI - acesso à tecnologia e transferência de tecnologia: ação que tenha por objetivo o
acesso, o desenvolvimento e a transferência de tecnologia para a conservação e a utilização da
diversidade biológica ou tecnologia desenvolvida a partir de amostra de componente do
patrimônio genético ou do conhecimento tradicional associado;
VII - bioprospecção: atividade exploratória que visa identificar componente do
patrimônio genético e informação sobre conhecimento tradicional associado, com potencial de
uso comercial;
VIII - espécie ameaçada de extinção: espécie com alto risco de desaparecimento na
natureza em futuro próximo, assim reconhecida pela autoridade competente;
IX - espécie domesticada: aquela em cujo processo de evolução influiu o ser humano
para atender às suas necessidades;
X - Autorização de Acesso e de Remessa: documento que permite, sob condições
específicas, o acesso a amostra de componente do patrimônio genético e sua remessa à
instituição destinatária e o acesso a conhecimento tradicional associado;
XI - Autorização Especial de Acesso e de Remessa: documento que permite, sob
condições específicas, o acesso a amostra de componente do patrimônio genético e sua
remessa à instituição destinatária e o acesso a conhecimento tradicional associado, com prazo
de duração de até dois anos, renovável por iguais períodos;
XII - Termo de Transferência de Material: instrumento de adesão a ser firmado pela
instituição destinatária antes da remessa de qualquer amostra de componente do patrimônio
genético, indicando, quando for o caso, se houve acesso a conhecimento tradicional
associado;
XIII - Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios:
instrumento jurídico multilateral, que qualifica as partes, o objeto e as condições de acesso e
de remessa de componente do patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado,
bem como as condições para repartição de benefícios;
XIV - condição ex situ: manutenção de amostra de componente do patrimônio genético
fora de seu habitat natural, em coleções vivas ou mortas.
CAPÍTULO III
DA PROTEÇÃO AO CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO
Art. 8
o
Fica protegido por esta Medida Provisória o conhecimento tradicional das
comunidades indígenas e das comunidades locais, associado ao patrimônio genético, contra a
utilização e exploração ilícita e outras ações lesivas ou não autorizadas pelo Conselho de
Gestão de que trata o art. 10, ou por instituição credenciada.
§ 1
o
O Estado reconhece o direito das comunidades indígenas e das comunidades locais
para decidir sobre o uso de seus conhecimentos tradicionais associados ao patrimônio
genético do País, nos termos desta Medida Provisória e do seu regulamento.
§ 2
o
O conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético de que trata esta
Medida Provisória integra o patrimônio cultural brasileiro e poderá ser objeto de cadastro,
conforme dispuser o Conselho de Gestão ou legislação específica.
§ 3
o
A proteção outorgada por esta Medida Provisória o poderá ser interpretada de
modo a obstar a preservação, a utilização e o desenvolvimento de conhecimento tradicional de
comunidade indígena ou comunidade local.
§ 4
o
A proteção ora instituída não afetará, prejudicará ou limitará direitos relativos à
propriedade intelectual.
Art. 9
o
À comunidade indígena e à comunidade local que criam, desenvolvem, detêm ou
conservam conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, é garantido o direito
de:
I - ter indicada a origem do acesso ao conhecimento tradicional em todas as publicações,
utilizações, explorações e divulgações;
II - impedir terceiros não autorizados de:
a) utilizar, realizar testes, pesquisas ou exploração, relacionados ao conhecimento
tradicional associado;
b) divulgar, transmitir ou retransmitir dados ou informações que integram ou constituem
conhecimento tradicional associado;
III - perceber benefícios pela exploração econômica por terceiros, direta ou
indiretamente, de conhecimento tradicional associado, cujos direitos são de sua titularidade,
nos termos desta Medida Provisória.
Parágrafo único. Para efeito desta Medida Provisória, qualquer conhecimento tradicional
associado ao patrimônio genético poderá ser de titularidade da comunidade, ainda que apenas
um indivíduo, membro dessa comunidade, detenha esse conhecimento.
CAPÍTULO IV
DAS COMPETÊNCIAS E ATRIBUIÇÕES INSTITUCIONAIS
Art. 10. Fica criado, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, o Conselho de Gestão
do Patrimônio Genético, de caráter deliberativo e normativo, composto de representantes de
órgãos e de entidades da Administração Pública Federal que detêm competência sobre as
diversas ações de que trata esta Medida Provisória.
§ 1
o
O Conselho de Gestão será presidido pelo representante do Ministério do Meio
Ambiente.
§ 2
o
O Conselho de Gestão terá sua composição e seu funcionamento dispostos no
regulamento.
Art. 11. Compete ao Conselho de Gestão:
I - coordenar a implementação de políticas para a gestão do patrimônio genético;
II - estabelecer:
a) normas técnicas;
b) critérios para as autorizações de acesso e de remessa;
c) diretrizes para elaboração do Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios;
d) critérios para a criação de base de dados para o registro de informação sobre
conhecimento tradicional associado;
III - acompanhar, em articulação com órgãos federais, ou mediante convênio com outras
instituições, as atividades de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio
genético e de acesso a conhecimento tradicional associado;
IV - deliberar sobre:
a) autorização de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético,
mediante anuência prévia de seu titular;
b) autorização de acesso a conhecimento tradicional associado, mediante anuência prévia
de seu titular;
c) autorização especial de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio
genético à instituição nacional, pública ou privada, que exerça atividade de pesquisa e
desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, e à universidade nacional, pública ou privada,
com prazo de duração de até dois anos, renovável por iguais períodos, nos termos do
regulamento;
d) autorização especial de acesso a conhecimento tradicional associado à instituição
nacional, pública ou privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas
biológicas e afins, e à universidade nacional, pública ou privada, com prazo de duração de até
dois anos, renovável por iguais períodos, nos termos do regulamento;
e) credenciamento de instituição pública nacional de pesquisa e desenvolvimento ou de
instituição pública federal de gestão para autorizar outra instituição nacional, pública ou
privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins:
1. a acessar amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento
tradicional associado;
2. a remeter amostra de componente do patrimônio genético para instituição nacional,
pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior;
f) credenciamento de instituição pública nacional para ser fiel depositária de amostra de
componente do patrimônio genético;
V - dar anuência aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios quanto ao atendimento dos requisitos previstos nesta Medida Provisória e no seu
regulamento;
VI - promover debates e consultas públicas sobre os temas de que trata esta Medida
Provisória;
VII - funcionar como instância superior de recurso em relação a decisão de instituição
credenciada e dos atos decorrentes da aplicação desta Medida Provisória;
VIII - aprovar seu regimento interno.
§ 1
o
Das decisões do Conselho de Gestão caberá recurso ao plenário, na forma do
regulamento.
§ 2
o
O Conselho de Gestão poderá organizar-se em câmaras temáticas, para subsidiar
decisões do plenário.
Art. 12. A atividade de coleta de componente do patrimônio genético e de acesso a
conhecimento tradicional associado, que contribua para o avanço do conhecimento e que o
esteja associada à bioprospecção, quando envolver a participação de pessoa jurídica
estrangeira, será autorizada pelo órgão responsável pela política nacional de pesquisa
científica e tecnológica, observadas as determinações desta Medida Provisória e a legislação
vigente.
Parágrafo único. A autorização prevista no caput deste artigo observará as normas
técnicas definidas pelo Conselho de Gestão, o qual exercerá supervisão dessas atividades.
Art. 13. Compete ao Presidente do Conselho de Gestão firmar, em nome da União,
Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios.
§ 1
o
Mantida a competência de que trata o caput deste artigo, o Presidente do Conselho
de Gestão subdelegará ao titular de instituição pública federal de pesquisa e desenvolvimento
ou instituição pública federal de gestão a competência prevista no caput deste artigo,
conforme sua respectiva área de atuação.
§ 2
o
Quando a instituição prevista no parágrafo anterior for parte interessada no
contrato, este será firmado pelo Presidente do Conselho de Gestão.
Art. 14. Caberá à instituição credenciada de que tratam os números 1 e 2 da alínea "e"
do inciso IV do art. 11 desta Medida Provisória uma ou mais das seguintes atribuições,
observadas as diretrizes do Conselho de Gestão:
I - analisar requerimento e emitir, a terceiros, autorização:
a) de acesso a amostra de componente do patrimônio genético existente em condições in
situ no território nacional, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva, mediante
anuência prévia de seus titulares;
b) de acesso a conhecimento tradicional associado, mediante anuência prévia dos
titulares da área;
c) de remessa de amostra de componente do patrimônio genético para instituição
nacional, pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior;
II - acompanhar, em articulação com órgãos federais, ou mediante convênio com outras
instituições, as atividades de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio
genético e de acesso a conhecimento tradicional associado;
III - criar e manter:
a) cadastro de coleções ex situ, conforme previsto no art. 18 desta Medida Provisória;
b) base de dados para registro de informações obtidas durante a coleta de amostra de
componente do patrimônio genético;
c) base de dados relativos às Autorizações de Acesso e de Remessa, aos Termos de
Transferência de Material e aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios, na forma do regulamento;
IV - divulgar, periodicamente, lista das Autorizações de Acesso e de Remessa, dos
Termos de Transferência de Material e dos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e
de Repartição de Benefícios;
V - acompanhar a implementação dos Termos de Transferência de Material e dos
Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios referente aos
processos por ela autorizados.
§ 1
o
A instituição credenciada deverá, anualmente, mediante relatório, dar conhecimento
pleno ao Conselho de Gestão sobre a atividade realizada e repassar cópia das bases de dados à
unidade executora prevista no art. 15.
§ 2
o
A instituição credenciada, na forma do art. 11, deverá observar o cumprimento das
disposições desta Medida Provisória, do seu regulamento e das decisões do Conselho de
Gestão, sob pena de seu descredenciamento, ficando, ainda, sujeita à aplicação, no que
couber, das penalidades previstas no art. 30 e na legislação vigente.
Art. 15. Fica autorizada a criação, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, de
unidade executora que exercerá a função de secretaria executiva do Conselho de Gestão, de
que trata o art. 10 desta Medida Provisória, com as seguintes atribuições, dentre outras:
I - implementar as deliberações do Conselho de Gestão;
II - dar suporte às instituições credenciadas;
III - emitir, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome:
a) Autorização de Acesso e de Remessa;
b) Autorização Especial de Acesso e de Remessa;
IV - acompanhar, em articulação com os demais órgãos federais, as atividades de acesso
e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético e de acesso a conhecimento
tradicional associado;
V - credenciar, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome,
instituição pública nacional de pesquisa e desenvolvimento ou instituição pública federal de
gestão para autorizar instituição nacional, pública ou privada:
a) a acessar amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento
tradicional associado;
b) a enviar amostra de componente do patrimônio genético para instituição nacional,
pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior, respeitadas as exigências do art. 19
desta Medida Provisória;
VI - credenciar, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome,
instituição pública nacional para ser fiel depositária de amostra de componente do patrimônio
genético;
VII - registrar os Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios, após anuência do Conselho de Gestão;
VIII - divulgar lista de espécies de intercâmbio facilitado constantes de acordos
internacionais, inclusive sobre segurança alimentar, dos quais o País seja signatário, de acordo
com o § 2
o
do art. 19 desta Medida Provisória;
IX - criar e manter:
a) cadastro de coleções ex situ, conforme previsto no art. 18;
b) base de dados para registro de informações obtidas durante a coleta de amostra de
componente do patrimônio genético;
c) base de dados relativos às Autorizações de Acesso e de Remessa, aos Termos de
Transferência de Material e aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios;
X - divulgar, periodicamente, lista das Autorizações de Acesso e de Remessa, dos
Termos de Transferência de Material e dos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e
de Repartição de Benefícios.
CAPÍTULO V
DO ACESSO E DA REMESSA
Art. 16. O acesso a componente do patrimônio genético existente em condições in situ
no território nacional, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva, e ao
conhecimento tradicional associado far-se-á mediante a coleta de amostra e de informação,
respectivamente, e somente será autorizado a instituição nacional, pública ou privada, que
exerça atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, mediante prévia
autorização, na forma desta Medida Provisória.
§ 1
o
O responsável pela expedição de coleta deverá, ao término de suas atividades em
cada área acessada, assinar com o seu titular ou representante declaração contendo listagem
do material acessado, na forma do regulamento.
§ 2
o
Excepcionalmente, nos casos em que o titular da área ou seu representante o for
identificado ou localizado por ocasião da expedição de coleta, a declaração contendo listagem
do material acessado deverá ser assinada pelo responsável pela expedição e encaminhada ao
Conselho de Gestão.
§ 3
o
Sub-amostra representativa de cada população componente do patrimônio genético
acessada deve ser depositada em condição ex situ em instituição credenciada como fiel
depositária, de que trata a alínea "f" do inciso IV do art. 11 desta Medida Provisória, na forma
do regulamento.
§ 4
o
Quando houver perspectiva de uso comercial, o acesso a amostra de componente do
patrimônio genético, em condições in situ, e ao conhecimento tradicional associado poderá
ocorrer após assinatura de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios.
§ 5
o
Caso seja identificado potencial de uso econômico, de produto ou processo,
passível ou não de proteção intelectual, originado de amostra de componente do patrimônio
genético e de informação oriunda de conhecimento tradicional associado, acessado com base
em autorização que não estabeleceu esta hipótese, a instituição beneficiária obriga-se a
comunicar ao Conselho de Gestão ou a instituição onde se originou o processo de acesso e de
remessa, para a formalização de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios.
§ 6
o
A participação de pessoa jurídica estrangeira em expedição para coleta de amostra
de componente do patrimônio genético in situ e para acesso de conhecimento tradicional
associado somente será autorizada quando em conjunto com instituição pública nacional,
ficando a coordenação das atividades obrigatoriamente a cargo desta última e desde que todas
as instituições envolvidas exerçam atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas
biológicas e afins.
§ 7
o
A pesquisa sobre componentes do patrimônio genético deve ser realizada
preferencialmente no território nacional.
§ 8
o
A Autorização de Acesso e de Remessa de amostra de componente do patrimônio
genético de espécie de endemismo estrito ou ameaçada de extinção dependerá da anuência
prévia do órgão competente.
§ 9
o
A Autorização de Acesso e de Remessa dar-se-á após a anuência prévia:
I - da comunidade indígena envolvida, ouvido o órgão indigenista oficial, quando o
acesso ocorrer em terra indígena;
II - do órgão competente, quando o acesso ocorrer em área protegida;
III - do titular de área privada, quando o acesso nela ocorrer;
IV - do Conselho de Defesa Nacional, quando o acesso se der em área indispensável à
segurança nacional;
V - da autoridade marítima, quando o acesso se der em águas jurisdicionais brasileiras,
na plataforma continental e na zona econômica exclusiva.
§ 10. O detentor de Autorização de Acesso e de Remessa de que tratam os incisos I a V
do § 9
o
deste artigo fica responsável a ressarcir o titular da área por eventuais danos ou
prejuízos, desde que devidamente comprovados.
§ 11. A instituição detentora de Autorização Especial de Acesso e de Remessa
encaminhará ao Conselho de Gestão as anuências de que tratam os §§ e deste artigo
antes ou por ocasião das expedições de coleta a serem efetuadas durante o período de vigência
da Autorização, cujo descumprimento acarretará o seu cancelamento.
Art. 17. Em caso de relevante interesse público, assim caracterizado pelo Conselho de
Gestão, o ingresso em área pública ou privada para acesso a amostra de componente do
patrimônio genético dispensará anuência prévia dos seus titulares, garantido a estes o disposto
nos arts. 24 e 25 desta Medida Provisória.
§ 1
o
No caso previsto no caput deste artigo, a comunidade indígena, a comunidade local
ou o proprietário deverá ser previamente informado.
§ 2
o
Em se tratando de terra indígena, observar-se-á o disposto no § 6
o
do art. 231 da
Constituição Federal.
Art. 18. A conservação ex situ de amostra de componente do patrimônio genético deve
ser realizada no território nacional, podendo, suplementarmente, a critério do Conselho de
Gestão, ser realizada no exterior.
§ 1
o
As coleções ex situ de amostra de componente do patrimônio genético deverão ser
cadastradas junto à unidade executora do Conselho de Gestão, conforme dispuser o
regulamento.
§ 2
o
O Conselho de Gestão poderá delegar o cadastramento de que trata o § 1
o
deste
artigo a uma ou mais instituições credenciadas na forma das alíneas "d" e "e" do inciso IV do
art. 11 desta Medida Provisória.
Art. 19. A remessa de amostra de componente do patrimônio genético de instituição
nacional, pública ou privada, para outra instituição nacional, pública ou privada, será efetuada
a partir de material em condições ex situ, mediante a informação do uso pretendido,
observado o cumprimento cumulativo das seguintes condições, além de outras que o Conselho
de Gestão venha a estabelecer:
I - depósito de sub-amostra representativa de componente do patrimônio genético em
coleção mantida por instituição credenciada, caso ainda não tenha sido cumprido o disposto
no § 3
o
do art. 16 desta Medida Provisória;
II - nos casos de amostra de componente do patrimônio genético acessado em condições
in situ, antes da edição desta Medida Provisória, o depósito de que trata o inciso anterior será
feito na forma acessada, se ainda disponível, nos termos do regulamento;
III - fornecimento de informação obtida durante a coleta de amostra de componente do
patrimônio genético para registro em base de dados mencionada na alínea "b" do inciso III do
art. 14 e alínea "b" do inciso IX do art. 15 desta Medida Provisória;
IV - prévia assinatura de Termo de Transferência de Material.
§ 1
o
Sempre que houver perspectiva de uso comercial de produto ou processo resultante
da utilização de componente do patrimônio genético será necessária a prévia assinatura de
Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios.
§ 2
o
A remessa de amostra de componente do patrimônio genético de espécies
consideradas de intercâmbio facilitado em acordos internacionais, inclusive sobre segurança
alimentar, dos quais o País seja signatário, deverá ser efetuada em conformidade com as
condições neles definidas, mantidas as exigências deles constantes.
§ 3
o
A remessa de qualquer amostra de componente do patrimônio genético de
instituição nacional, pública ou privada, para instituição sediada no exterior, será efetuada a
partir de material em condições ex situ, mediante a informação do uso pretendido e a prévia
autorização do Conselho de Gestão ou de instituição credenciada, observado o cumprimento
cumulativo das condições estabelecidas nos incisos I a IV e §§ 1
o
e 2
o
deste artigo.
Art. 20. O Termo de Transferência de Material terá seu modelo aprovado pelo Conselho
de Gestão.
CAPÍTULO VI
DO ACESSO À TECNOLOGIA E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA
Art. 21. A instituição que receber amostra de componente do patrimônio genético ou
conhecimento tradicional associado facilitará o acesso à tecnologia e transferência de
tecnologia para a conservação e utilização desse patrimônio ou desse conhecimento à
instituição nacional responsável pelo acesso e remessa da amostra e da informação sobre o
conhecimento, ou instituição por ela indicada.
Art. 22. O acesso à tecnologia e transferência de tecnologia entre instituição nacional de
pesquisa e desenvolvimento, blica ou privada, e instituição sediada no exterior, poderá
realizar-se, dentre outras atividades, mediante:
I - pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico;
II - formação e capacitação de recursos humanos;
III - intercâmbio de informações;
IV - intercâmbio entre instituição nacional de pesquisa e instituição de pesquisa sediada
no exterior;
V - consolidação de infra-estrutura de pesquisa científica e de desenvolvimento
tecnológico;
VI - exploração econômica, em parceria, de processo e produto derivado do uso de
componente do patrimônio genético; e
VII - estabelecimento de empreendimento conjunto de base tecnológica.
Art. 23. A empresa que, no processo de garantir o acesso à tecnologia e transferência de
tecnologia à instituição nacional, pública ou privada, responsável pelo acesso e remessa de
amostra de componente do patrimônio genético e pelo acesso à informação sobre
conhecimento tradicional associado, investir em atividade de pesquisa e desenvolvimento no
País, fará jus a incentivo fiscal para a capacitação tecnológica da indústria e da agropecuária,
e a outros instrumentos de estímulo, na forma da legislação pertinente.
CAPÍTULO VII
DA REPARTIÇÃO DE BENEFÍCIOS
Art. 24. Os benefícios resultantes da exploração econômica de produto ou processo
desenvolvido a partir de amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento
tradicional associado, obtidos por instituição nacional ou instituição sediada no exterior, serão
repartidos, de forma justa e eqüitativa, entre as partes contratantes, conforme dispuser o
regulamento e a legislação pertinente.
Parágrafo único. À União, quando não for parte no Contrato de Utilização do
Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios, será assegurada, no que couber, a
participação nos benefícios a que se refere o caput deste artigo, na forma do regulamento.
Art. 25. Os benefícios decorrentes da exploração econômica de produto ou processo,
desenvolvido a partir de amostra do patrimônio genético ou de conhecimento tradicional
associado, poderão constituir-se, dentre outros, de:
I - divisão de lucros;
II - pagamento de royalties;
III - acesso e transferência de tecnologias;
IV - licenciamento, livre de ônus, de produtos e processos; e
V - capacitação de recursos humanos.
Art. 26. A exploração econômica de produto ou processo desenvolvido a partir de
amostra de componente do patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado,
acessada em desacordo com as disposições desta Medida Provisória, sujeitará o infrator ao
pagamento de indenização correspondente a, no mínimo, vinte por cento do faturamento bruto
obtido na comercialização de produto ou de royalties obtidos de terceiros pelo infrator, em
decorrência de licenciamento de produto ou processo ou do uso da tecnologia, protegidos ou
não por propriedade intelectual, sem prejuízo das sanções administrativas e penais cabíveis.
Art. 27. O Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios
deverá indicar e qualificar com clareza as partes contratantes, sendo, de um lado, o
proprietário da área pública ou privada, ou o representante da comunidade indígena e do
órgão indigenista oficial, ou o representante da comunidade local e, de outro, a instituição
nacional autorizada a efetuar o acesso e a instituição destinatária.
Art. 28. São cláusulas essenciais do Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios, na forma do regulamento, sem prejuízo de outras, as que
disponham sobre:
I - objeto, seus elementos, quantificação da amostra e uso pretendido;
II - prazo de duração;
III - forma de repartição justa e eqüitativa de benefícios e, quando for o caso, acesso à
tecnologia e transferência de tecnologia;
IV - direitos e responsabilidades das partes;
V - direito de propriedade intelectual;
VI - rescisão;
VII - penalidades;
VIII - foro no Brasil.
Parágrafo único. Quando a União for parte, o contrato referido no caput deste artigo
reger-se-á pelo regime jurídico de direito público.
Art. 29. Os Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios serão submetidos para registro no Conselho de Gestão e terão eficácia após sua
anuência.
Parágrafo único. Serão nulos, não gerando qualquer efeito jurídico, os Contratos de
Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios firmados em desacordo com
os dispositivos desta Medida Provisória e de seu regulamento.
CAPÍTULO VIII
DAS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS
Art. 30. Considera-se infração administrativa contra o patrimônio genético ou ao
conhecimento tradicional associado toda ação ou omissão que viole as normas desta Medida
Provisória e demais disposições legais pertinentes. (Vide Decreto nº 5.459, de 2005)
§ 1
o
As infrações administrativas serão punidas na forma estabelecida no regulamento
desta Medida Provisória, com as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa;
III - apreensão das amostras de componentes do patrimônio genético e dos instrumentos
utilizados na coleta ou no processamento ou dos produtos obtidos a partir de informação sobre
conhecimento tradicional associado;
IV - apreensão dos produtos derivados de amostra de componente do patrimônio
genético ou do conhecimento tradicional associado;
V - suspensão da venda do produto derivado de amostra de componente do patrimônio
genético ou do conhecimento tradicional associado e sua apreensão;
VI - embargo da atividade;
VII - interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou empreendimento;
VIII - suspensão de registro, patente, licea ou autorização;
IX - cancelamento de registro, patente, licença ou autorização;
X - perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal concedidos pelo governo;
XI - perda ou suspensão da participação em linha de financiamento em estabelecimento
oficial de crédito;
XII - intervenção no estabelecimento;
XIII - proibição de contratar com a Administração Pública, por período de a cinco
anos.
§ 2
o
As amostras, os produtos e os instrumentos de que tratam os incisos III, IV e V do §
1
o
deste artigo, terão sua destinação definida pelo Conselho de Gestão.
§ 3
o
As sanções estabelecidas neste artigo serão aplicadas na forma processual
estabelecida no regulamento desta Medida Provisória, sem prejuízo das sanções civis ou
penais cabíveis.
§ 4
o
A multa de que trata o inciso II do § 1
o
deste artigo searbitrada pela autoridade
competente, de acordo com a gravidade da infração e na forma do regulamento, podendo
variar de R$ 200,00 (duzentos reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), quando se tratar de
pessoa física.
§ 5
o
Se a infração for cometida por pessoa jurídica, ou com seu concurso, a multa será
de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais), arbitrada
pela autoridade competente, de acordo com a gravidade da infração, na forma do
regulamento.
§ 6
o
Em caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.
CAPÍTULO IX
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 31. A concessão de direito de propriedade industrial pelos órgãos competentes,
sobre processo ou produto obtido a partir de amostra de componente do patrimônio genético,
fica condicionada à observância desta Medida Provisória, devendo o requerente informar a
origem do material genético e do conhecimento tradicional associado, quando for o caso.
Art. 32. Os órgãos federais competentes exercerão a fiscalização, a interceptação e a
apreensão de amostra de componente do patrimônio genético ou de produto obtido a partir de
informação sobre conhecimento tradicional associado, acessados em desacordo com as
disposições desta Medida Provisória, podendo, ainda, tais atividades serem descentralizadas,
mediante convênios, de acordo com o regulamento.
Art. 33. A parcela dos lucros e dos royalties devidos à União, resultantes da exploração
econômica de processo ou produto desenvolvido a partir de amostra de componente do
patrimônio genético, bem como o valor das multas e indenizações de que trata esta Medida
Provisória serão destinados ao Fundo Nacional do Meio Ambiente, criado pela Lei n
o
7.797,
de 10 de julho de 1989, ao Fundo Naval, criado pelo Decreto n
o
20.923, de 8 de janeiro de
1932, e ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, criado pelo
Decreto-Lei n
o
719, de 31 de julho de 1969, e restabelecido pela Lei n
o
8.172, de 18 de janeiro
de 1991, na forma do regulamento.
Parágrafo único. Os recursos de que trata este artigo serão utilizados exclusivamente na
conservação da diversidade biológica, incluindo a recuperação, criação e manutenção de
bancos depositários, no fomento à pesquisa científica, no desenvolvimento tecnológico
associado ao patrimônio genético e na capacitação de recursos humanos associados ao
desenvolvimento das atividades relacionadas ao uso e à conservação do patrimônio genético.
Art. 34. A pessoa que utiliza ou explora economicamente componentes do patrimônio
genético e conhecimento tradicional associado deverá adequar suas atividades às normas desta
Medida Provisória e do seu regulamento.
Art. 35. O Poder Executivo regulamentará esta Medida Provisória até 30 de dezembro
de 2001.
Art. 36. As disposições desta Medida Provisória não se aplicam à matéria regulada pela
Art. 37. Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória n
o
2.186-
15, de 26 de julho de 2001.
Art. 38. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 23 de agosto de 2001; 180
o
da Independência e 113
o
da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
José Gregori
José Serra
Ronaldo Mota Sardenberg
José Sarney Filho
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 24.8.2001.
ANEXO C – Decreto nº 3.945, de 28 de setembro de 2001
416
DECRETO Nº 3.945, DE 28 DE SETEMBRO DE 2001.
Define a composição do Conselho de Gestão
do Patrimônio Genético e estabelece as normas
para o seu funcionamento, mediante a
regulamentação dos arts. 10, 11, 12, 14, 15,
16, 18 e 19 da Medida Provisória n
o
2.186-
16,
de 23 de agosto de 2001, que dispõe sobre o
acesso ao patrimônio genético, a proteção e o
acesso ao conhecimento tradicional associado,
a repartição de benefícios e o acesso à
tecnologia e transferência de tecnologia para
sua conservação e uti
lização, e outras
providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,
incisos IV e VI, alínea "a", da Constituição,
DECRETA:
Art. 1
o
Este Decreto define a composição do Conselho de Gestão do Patrimônio
Genético e estabelece as normas para o seu funcionamento, mediante a regulamentação dos
arts. 10, 11, 12, 14, 15, 16, 18 e 19 da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 23 de agosto de
2001.
Art. 2
o
O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético é composto por um representante
e dois suplentes dos seguintes órgãos e entidades da Administração Pública Federal, que
detêm competência sobre as matérias objeto da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001:
(Redação dada pelo Decreto nº 5.439, de 2005)
I - Ministério do Meio Ambiente;
II - Ministério da Ciência e Tecnologia;
III - Ministério da Saúde;
IV - Ministério da Justiça;
V - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;
416
BRASIL. Decreto 3.945, de 28 de setembro de 2001. Define a composição do Conselho de Gestão do
Patrimônio Genético e estabelece as normas para o seu funcionamento, mediante a regulamentação dos arts.
10, 11, 12, 14, 15, 16, 18 e 19 da Medida Provisória 2.186-16, de 23 de agosto de 2001, que dispõe sobre o
acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de
benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e utilização, e outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/D3945compilado.htm>.
Acesso em: 22 nov. 2007.
VI - Ministério da Defesa;
VII - Ministério da Cultura;
VIII - Ministério das Relações Exteriores;
IX - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior;
X - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis -
IBAMA;
XI - Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro;
XII - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq;
XIII - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA;
XIV - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa;
XV - Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz;
XVI - Instituto Evandro Chagas;
XVII - Fundação Nacional do Índio - Funai;
XVIII - Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI;
XIX - Fundação Cultural Palmares.
§ 1
o
O Conselho de Gestão sepresidido pelo representante titular do Ministério do
Meio Ambiente e, nos seus impedimentos ou afastamentos, pelo respectivo suplente.
§ 2
o
Os membros do Conselho de Gestão, titulares e suplentes, serão indicados pelos
representantes legais dos Ministérios e das entidades da Administração Pública Federal que o
compõem, e serão designados em ato do Ministro de Estado do Meio Ambiente.
§ 3
o
As funções dos membros do Conselho de Gestão o serão remuneradas e o seu
exercício é considerado serviço público relevante.
§ 4
o
O Conselho de Gestão reunir-se-á em caráter ordinário uma vez por mês e,
extraordinariamente, a qualquer momento, mediante convocação de seu Presidente, ou da
maioria absoluta de seus membros, neste caso por intermédio de documento escrito,
acompanhado de pauta justificada.
§ 5
o
A periodicidade a que se refere o § 4
o
pode ser alterada por decisão do Conselho de
Gestão.
§ 6
o
O membro que faltar a duas reuniões seguidas ou a três intercaladas, sem as
correspondentes substituições pelo suplente, será afastado do Conselho de Gestão.
§ 7
o
A fim de subsidiar a tomada de decio, o Conselho de Gestão pode deliberar pelo
convite de especialistas ou de representantes de distintos setores da sociedade envolvidos com o
tema. (Redão dada pelo Decreto 6.159, de 2007)
Art. 3
o
Nos termos da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, compete ao Conselho de
Gestão do Patrimônio Genético, atendida a sua natureza deliberativa e normativa:
I - coordenar a implementação de políticas para a gestão do patrimônio genético;
II - estabelecer:
a) normas técnicas, pertinentes à gestão do patrimônio genético;
b) critérios para as autorizações de acesso e de remessa;
c) diretrizes para elaboração de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios;
d) critérios para a criação de base de dados para o registro de informação sobre
conhecimento tradicional associado;
III - acompanhar, em articulação com órgãos federais, ou mediante convênio com outras
instituições, as atividades de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio
genético e de acesso a conhecimento tradicional associado;
IV- deliberar sobre:
a) autorização de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético,
mediante anuência prévia de seu titular;
b) autorização de acesso a conhecimento tradicional associado, mediante anuência prévia
de seu titular;
c) autorização especial de acesso e de remessa de amostra de componente do patrimônio
genético, com prazo de duração de até dois anos, renovável por iguais períodos, a instituição
pública ou privada nacional que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas
biológicas e afins, e a universidade nacional, pública ou privada;
d) autorização especial de acesso a conhecimento tradicional associado, com prazo de
duração de até dois anos, renovável por iguais períodos, a instituição pública ou privada
nacional que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, e a
universidade nacional, pública ou privada;
e) credenciamento de instituição pública nacional de pesquisa e desenvolvimento, ou de
instituição pública federal de gestão, para autorizar outra instituição nacional, pública ou
privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins, a
acessar amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento tradicional
associado, e bem assim a remeter amostra de componente do patrimônio genético para
instituição nacional, pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior;
f) credenciamento de instituição pública nacional para ser fiel depositária de amostra de
componente do patrimônio genético;
g) descredenciamento de instituições pelo descumprimento das disposições da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001, e deste Decreto;
V - dar anuência aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios quanto ao atendimento dos requisitos previstos na Medida Provisória n
o
2.186-16,
de 2001;
VI - promover debates e consultas públicas sobre os temas de que trata a Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
VII - funcionar como instância superior de recurso em relação a decisão de instituição
credenciada e dos atos decorrentes da aplicação da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
VIII - aprovar seu regimento interno.
Parágrafo único. O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético exercerá sua
competência segundo os dispositivos da Convenção sobre Diversidade Biológica, da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001, e deste Decreto.
Art. 4
o
O Plenário do Conselho de Gestão reunir-se-á com a presença de, no mínimo, dez
Conselheiros, e suas deliberações serão tomadas pela maioria absoluta dos votos dos
Conselheiros presentes. (Redação dada pelo Decreto nº 5.439, de 2005)
Parágrafo único. Cabe ao Presidente do Conselho de Gestão o voto de desempate.
Art. 5
o
Das deliberações do Conselho de Gestão cabe recurso para o Plenário, cuja
decisão será tomada por dois terços de seus membros.
Parágrafo único. São irrecorríveis as deliberações do Plenário do Conselho de Gestão
que decidirem os recursos interpostos.
Art. 6
o
Nas deliberações em processos que envolvam a participação direta de Ministério
ou de entidade representada no Conselho de Gestão, o respectivo membro não tedireito de
voto.
Art. 7
o
Fica criada, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Departamento do
Patrimônio Genético, que exercerá a função de Secretaria-Executiva do Conselho de Gestão, e
terá as seguintes atribuições, dentre outras:
I - implementar as deliberações do Conselho de Gestão;
II - promover a instrução e a tramitação dos processos a serem submetidos à deliberação
do Conselho de Gestão;
III - dar suporte às instituições credenciadas;
IV - emitir, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome,
Autorização de Acesso e de Remessa de amostra de componente do patrimônio genético
existente no território nacional, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva,
bem como Autorização de Acesso a conhecimento tradicional associado;
V - emitir, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome,
Autorização Especial de Acesso e de Remessa de amostra de componente do patrimônio
genético, e Autorização de Acesso a conhecimento tradicional associado, com prazo de
duração de até dois anos, renovável por iguais períodos, a instituição pública ou privada
nacional que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins e a
universidade nacional, pública ou privada;
VI - acompanhar, em articulação com os demais órgãos federais, as atividades de acesso
e de remessa de amostra de componente do patrimônio genético e de acesso a conhecimento
tradicional associado;
VII - promover, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome, o
credenciamento de instituição pública nacional de pesquisa e desenvolvimento, ou instituição
pública federal de gestão, para autorizar instituição nacional, pública ou privada, a acessar
amostra de componente do patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado, e
bem assim a enviar amostra de componente do patrimônio genético a instituição nacional,
pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior, respeitadas as exigências do art. 19
da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
VIII - promover, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em seu nome, o
credenciamento de instituição pública nacional para ser fiel depositária de amostra de
componente do patrimônio genético;
IX - descredenciar instituições, de acordo com deliberação do Conselho de Gestão e em
seu nome, pelo descumprimento das disposições da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, e
deste Decreto;
X - registrar os Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios, após anuência do Conselho de Gestão;
XI - divulgar lista de espécies de intercâmbio facilitado constantes de acordos
internacionais, inclusive sobre segurança alimentar, dos quais o País seja signatário, de acordo
com o § 2
o
do art. 19 da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
XII - criar e manter:
a) cadastro de coleções ex situ, conforme previsto no art. 18 da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
b) base de dados para registro de informações obtidas durante a coleta de amostra de
componente do patrimônio genético;
c) base de dados relativos às Autorizações de Acesso e de Remessa de amostra de
componente do patrimônio genético e de acesso a conhecimento tradicional associado, aos
Termos de Transferência de Material e aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e
de Repartição de Benefícios;
XIII - divulgar, periodicamente, lista das Autorizações de Acesso e de Remessa, dos
Termos de Transferência de Material e dos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e
de Repartição de Benefícios.
Art. 8º Poderá obter as autorizações de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas "a" e "b", da
Medida Provisória 2.186-16, de 2001, a instituição que atenda aos seguintes requisitos,
entre outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de Gestão: (Redação dada pelo Decreto
4.946, de 31.12.2003)
I - comprovação de que a instituição: (Redação dada pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
a) constituiu-se sob as leis brasileiras; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
(Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - qualificação técnica para o desempenho de atividades de acesso e remessa de amostra
de componente do patrimônio genético ou de acesso ao conhecimento tradicional associado,
quando for o caso; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - estrutura disponível para o manuseio de amostra de componente do Patrimônio
Genético;
IV - projeto de pesquisa que descreva a atividade de coleta de amostra de componente do
Patrimônio Genético ou de acesso a conhecimento tradicional associado, incluindo
informação sobre o uso pretendido;
V - apresentação das anuências prévias de que trata o art. 16, §§ e , da Medida
Provisória nº 2.186-16, de 2001; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VI - apresentação de anuência prévia da comunidade indígena ou local envolvida,
quando se tratar de acesso a conhecimento tradicional associado, em observância aos arts. ,
§ , art. , inciso II, e art. 11, inciso IV, alínea "b", da Medida Provisória 2.186-16, de
2001; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VII - indicação do destino das amostras de componentes do patrimônio genético ou das
informações relativas ao conhecimento tradicional associado; (Incluído pelo Decreto nº 4.946,
de 31.12.2003)
VIII - indicação da instituição fiel depositária credenciada pelo Conselho de Gestão onde
serão depositadas as sub-amostras de componente do patrimônio genético; (Incluído pelo
Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
IX - quando se tratar de acesso com finalidade de pesquisa científica, apresentação de
termo de compromisso assinado pelo representante legal da instituição, comprometendo-se a
acessar patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado apenas para a finalidade
autorizada; e (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
X - apresentação de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios devidamente assinado pelas partes, quando se tratar de acesso ao patrimônio
genético ou ao conhecimento tradicional associado com potencial de uso econômico, como
ocorre nas atividades de bioprospecção e desenvolvimento tecnológico. (Incluído pelo
Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 1º Quando o acesso tiver a finalidade de pesquisa científica, a comprovação dos
requisitos constantes dos incisos II e III do caput deste artigo poderá ser dispensada pelo
Conselho de Gestão ou pela instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória
2.186-16, de 2001. (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 2º O projeto de pesquisa a que se refere o inciso IV do caput deste artigo deverá
conter: (Renumerado do páragrafo único pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
I - introdução, justificativa, objetivos, métodos e resultados esperados a partir da amostra
ou da informação a ser acessada; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - localização geográfica e cronograma das etapas do projeto, especificando o período
em que serão desenvolvidas as atividades de campo e, quando se tratar de acesso a
conhecimento tradicional associado, identificação das comunidades indígenas ou locais
envolvidas; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - discriminação do tipo de material ou informação a ser acessado e quantificação
aproximada de amostras a serem obtidas; (Redação dada pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
IV - indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das
responsabilidades e direitos de cada parte; (Redação dada pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
V - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso não
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq. (Redação dada pelo Decreto nº
4.946, de 31.12.2003)
§ 3º A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo deverá
encaminhar ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da
Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001, relatórios sobre o andamento do projeto, em prazos a
serem fixados na autorização de acesso. (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 4
o
Nos casos de autorização de acesso ao patrimônio genético para bioprospecção, a
apresentação de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e Repartição de Benefícios
pode ser postergada pelo Conselho de Gestão, desde que o interessado declare não existir
perspectiva de uso comercial e o anuente preveja, no Termo de Anuência Prévia, momento
diverso para a formalização do contrato. (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
§ 5
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, a formalização do Contrato de Utilização do
Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios sempre deverá anteceder o
desenvolvimento tecnológico e o depósito do pedido de patentes. (Incldo pelo Decreto nº
6.159, de 2007)
§ 6
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, em caso de remessa de componente do patrimônio
genético ao exterior, deverá ser firmado Termo de Transferência de Material contendo
compromisso expresso da instituição destinatária de o ceder a terceiros o componente do
patrimônio genético, iniciar atividade de desenvolvimento tecnológico ou depositar pedido de
patente, sem a prévia assinatura do contrato e correspondente autorizão do Conselho de Gestão,
quando for o caso. (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
Art. Poderá obter as autorizações especiais de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas
"c" e "d", da Medida Provisória 2.186-16, de 2001, para pesquisa científica sem potencial
de uso econômico, a instituição interessada em realizar acesso a componente do patrimônio
genético ou ao conhecimento tradicional associado que atenda aos seguintes requisitos, entre
outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de Gestão: (Redação dada pelo Decreto
4.946, de 31.12.2003)
I - comprovação de que a instituição: (Redação dada pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
a) constituiu-se sob as leis brasileiras; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
(Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - qualificação técnica para o desempenho das atividades de acesso e remessa de
amostra de componente do patrimônio genético ou de acesso ao conhecimento tradicional
associado, quando for o caso; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - estrutura disponível para o manuseio de amostras de componentes do patrimônio
genético; (Redação dada pelo Decreto 4.946, de 31.12.2003)
IV - portfólio dos projetos e das atividades de rotina que envolvam acesso e remessa a
componentes do patrimônio genético desenvolvidas pela instituição; (Redação dada pelo
Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
V - apresentação das anuências prévias de que trata o art. 16, §§ e , da Medida
Provisória 2.186-16, de 2001, quando se tratar de acesso a componente do patrimônio
genético; (Redação dada pelo Decreto 4.946, de 31.12.2003)
VI - apresentação de anuência prévia da comunidade indígena ou local envolvida, em
observância aos arts. , § , art. , inciso II, e art. 11, inciso IV, alínea "b", da Medida
Provisória 2.186-16, de 2001, quando se tratar de acesso a conhecimento tradicional
associado; (Redação dada pelo Decreto 4.946, de 31.12.2003)
VII - indicação do destino do material genético ou das informações relativas ao
conhecimento tradicional associado e da equipe cnica e da infra-estrutura disponível para
gerenciar os termos de transferência de material a serem assinados previamente à remessa de
amostra para outra instituição nacional, pública ou privada, ou sediada no exterior; (Incluído
pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VIII - termo de compromisso assinado pelo representante legal da instituição,
comprometendo-se a acessar patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado
apenas para fins de pesquisa científica sem potencial de uso econômico. (Incluído pelo
Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 1º O portfólio a que se refere o inciso IV do caput deste artigo deverá trazer a
descrição sumária das atividades a serem desenvolvidas, bem como os projetos resumidos,
com os seguintes requisitos mínimos: (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
I - objetivos, material, métodos, uso pretendido e destino da amostra ou da informação a
ser acessada; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - área de abrangência das atividades de campo e, quando se tratar de acesso a
conhecimento tradicional associado, identificação das comunidades indígenas ou locais
envolvidas; (Redação dada pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - indicação das fontes de financiamento; (Redação dada pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
IV - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso o
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq. (Redação dada pelo Decreto nº
4.946, de 31.12.2003)
§ 2º A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo deverá
encaminhar ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da
Medida Provisória 2.186-16, de 2001, relatórios cuja periodicidade será fixada na
autorização, não podendo exceder o prazo de doze meses. (Incluído pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
§ 3º O relatório a que se refere o § 2
o
deverá conter, no mínimo: (Incluído pelo Decreto
4.946, de 31.12.2003)
I - informações detalhadas sobre o andamento dos projetos e atividades integrantes do
portfólio; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - indicação das áreas onde foram realizadas as coletas, por meio de coordenadas
geográficas; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - listagem quantitativa e qualitativa das espécies ou morfotipos coletados em cada
área; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
IV - cópia dos registros das informações relativas ao conhecimento tradicional associado;
(Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
V - comprovação do depósito das sub-amostras em instituição fiel depositária
credenciada pelo Conselho de Gestão; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VI - apresentação dos Termos de Transferência de Material; (Incluído pelo Decreto
4.946, de 31.12.2003)
VII - indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das
responsabilidades e direitos de cada parte; e (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VIII - resultados preliminares. (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 4º A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo poderá, durante a
vigência da autorização, inserir novas atividades ou projetos no portfólio, desde que observe
as condições estabelecidas neste artigo e, no prazo de sessenta dias a partir do início da nova
atividade ou projeto, comunique a alteração realizada ao Conselho de Gestão ou à instituição
credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória 2.186-16, de 2001. (Incluído pelo
Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
Art. 9-A. Poderá obter a autorização especial de que trata o art. 11, inciso IV, alínea "c",
da Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001, para realizar o acesso ao patrimônio genético com
a finalidade de constituir e integrar coleções ex situ que visem a atividades com potencial de
uso econômico, como a bioprospecção ou o desenvolvimento tecnológico, a instituição que
atenda aos seguintes requisitos, entre outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de
Gestão: (Incluído pelo Decreto 4.946, de 31.12.2003)
I - comprovação de que a instituição: (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
a) constituiu-se sob as leis brasileiras; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
(Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - qualificação técnica para desempenho das atividades de formação e manutenção de
coleções ex situ ou remessa de amostras de componentes do patrimônio genético, quando for
o caso; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - estrutura disponível para o manuseio de amostras de componentes do patrimônio
genético; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
IV - projeto de constituição de coleção ex situ a partir de atividades de acesso ao
patrimônio genético; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
V - apresentação das anuências prévias de que trata o art. 16, §§ e , da Medida
Provisória nº 2.186-16, de 2001; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VI - indicação do destino do material genético, bem como da equipe técnica e da infra-
estrutura disponíveis para gerenciar os termos de transferência de material a serem assinados
previamente à remessa de amostra para outra instituição nacional, pública ou privada;
(Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VII - assinatura, pelo representante legal da instituição, de termo de compromisso pelo
qual comprometa-se a acessar patrimônio genético apenas para a finalidade de constituir
coleção ex situ; e (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VIII - apresentação de modelo de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e
Repartição de Benefícios, a ser firmado com o proprietário da área pública ou privada ou com
representante da comunidade indígena e do órgão indigenista oficial. (Incluído pelo Decreto
4.946, de 31.12.2003)
§ 1º O modelo de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético de que trata o inciso
VIII do caput deste artigo deverá ser submetido ao Conselho de Gestão para aprovação, a qual
ficará condicionada ao atendimento do disposto no art. 28 da Medida Provisória 2.186-16,
de 2001, sem prejuízo de outros requisitos que poderão ser exigidos pelo Conselho. (Incluído
pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 2º O projeto de que trata o inciso IV do caput deste artigo deverá trazer a descrição
sumária das atividades a serem desenvolvidas, com os seguintes requisitos mínimos: (Incluído
pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
I - objetivos, material, todos, uso pretendido e destino da amostra a ser acessada;
(Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
II - área de abrangência das atividades de campo; (Incluído pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
III - indicação das fontes de financiamento; e (Incluído pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
IV - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso o
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq. (Incluído pelo Decreto
4.946, de 31.12.2003)
§ 3º A instituição beneficiada pela autorização especial de que trata este artigo deverá
encaminhar ao Conselho de Gestão relatórios cuja periodicidade será fixada na autorização,
não podendo exceder o prazo de doze meses. (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 4º O relatório a que se refere o § 3
o
deverá indicar o andamento do projeto, contendo
no mínimo: (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
I - indicação das áreas onde foram realizadas as coletas por meio de coordenadas
geográficas, bem como dos respectivos proprietários; (Incluído pelo Decreto 4.946, de
31.12.2003)
II - listagem quantitativa e qualitativa das espécies ou morfotipos coletados em cada
área; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
III - comprovação do depósito das sub-amostras em instituição fiel depositária
credenciada pelo Conselho de Gestão; (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
IV - apresentação dos termos de transferência de material assinados; (Incluído pelo
Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
V - indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das
responsabilidades e direitos de cada parte; e (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
VI - resultados preliminares. (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 5º O interessado em obter a autorização especial para constituição de coleção ex situ
deverá dirigir requerimento ao Conselho de Gestão, comprovando o atendimento aos
requisitos mencionados neste artigo e na Medida Provisória 2.186-16, de 2001. (Incluído
pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
§ 6º A instituição que pretender realizar outros acessos a partir da coleção formada com
base na autorização especial de que trata este artigo deverá solicitar autorização específica
para tanto ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida
Provisória nº 2.186-16, de 2001. (Incluído pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
Art. 9
o
-B. A autorização especial de que trata o art. 11, inciso IV, alínea “d”, da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001, o se aplica a atividades com potencial de uso econômico,
como a bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico. (Redação dada pelo Decreto 6.159,
de 2007)
Art. 9
o
-C. As autorizações de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas “a” e “c”, da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001, poderão abranger o acesso e a remessa, isolada ou
conjuntamente, de acordo com o pedido formulado pela instituição interessada. (Redão dada
pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
Art. 9
o
-D. Poderá obter a autorização especial de que trata o art. 11, inciso IV, alínea
“c”, da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, para a finalidade de bioprospecção, a
instituição interessada em realizar acesso ou a remessa de componente do patrimônio genético
que atenda aos seguintes requisitos, entre outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de
Gestão: (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
I - comprovação de que a instituição: (Incluído pelo Decreto 6.159, de 2007)
a) constituiu-se sob as leis brasileiras; e (Incldo pelo Decreto 6.159, de 2007)
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins; (Incluído
pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
II - qualificação técnica para o desempenho das atividades de acesso e remessa de
amostra de componente do patrimônio genético; (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
III - estrutura disponível para o manuseio de amostras de componentes do patrimônio
genético; (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
IV - portfólio dos projetos que envolvam acesso e remessa de componentes do
patrimônio genético desenvolvidos pela instituição e a indicação do destino das amostras de
componentes do patrimônio genético, quando houver previsão; (Incluído pelo Decreto 6.159,
de 2007)
V - indicação da equipe técnica e da infra-estrutura disponível para gerenciar os Termos
de Transferência de Material, nos casos de remessa; e (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
VI - indicação da instituição credenciada como fiel depositária prevista para receber as
subamostras de componentes do patrimônio genético a serem acessadas. (Incldo pelo Decreto
6.159, de 2007)
§ 1
o
O portfólio a que se refere o inciso IV do caput deverá trazer os projetos resumidos,
com os seguintes requisitos mínimos: (Incldo pelo Decreto 6.159, de 2007)
I - objetivos, material, métodos, uso pretendido e destino da amostra a ser acessada,
quando já houver previsão de remessa; (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
II - área de abrangência ou localização das atividades de campo; (Incluído pelo Decreto nº
6.159, de 2007)
III - período previsto para as atividades de coleta; (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
IV - indicação das fontes de recursos, estimativa dos respectivos montantes, no caso de
recursos financeiros, e das responsabilidades e direitos de cada parte; e (Incluído pelo Decreto
6.159, de 2007)
V - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso não
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq. (Incldo pelo Decreto nº 6.159,
de 2007)
§ 2
o
As anuências prévias a que se refere o art. 16, § 11, da Medida Provisória n
o
2.186-16,
de 2001, e os Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios
correspondentes deverão ser encaminhadas ao Conselho de Gestão antes ou por ocasião das
expedições de coleta a serem efetuadas durante o peodo de vigência da autorização especial, sob
pena de seu cancelamento. (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
§ 3
o
O descumprimento do disposto no § 2
o
acarretará a exclusão do projeto
correspondente do portfólio abrangido pela autorização especial para a bioprospecção.
(Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
§ 4
o
A exigência da apresentação de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios pode ser postergada pelo Conselho de Gestão, desde que o
interessado declare não existir perspectiva de uso comercial e o Termo de Anuência Prévia
preveja momento diverso para a formalização do contrato. (Incluído pelo Decreto 6.159, de
2007)
§ 5
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, a formalização do Contrato de Utilização do
Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios sempre deverá anteceder o início do
desenvolvimento tecnológico ou o depósito do pedido de patentes. (Incldo pelo Decreto
6.159, de 2007)
§ 6
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, em caso de remessa de componente do patrimônio
genético ao exterior, deverá ser firmado Termo de Transferência de Material contendo
compromisso expresso da instituição destinatária de o ceder a terceiros o componente do
patrimônio genético, iniciar atividade de desenvolvimento tecnológico ou depositar pedido de
patente, sem a prévia assinatura do contrato e correspondente autorizão do Conselho de Gestão,
quando for o caso. (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
§ 7
o
A instituição detentora da autorização especial de que trata este artigo poderá
iniciar a atividade de bioprospecção de projetos cujas anuências prévias tenham sido
aprovadas pelo Conselho de Gestão. (Incluído pelo Decreto 6.159, de 2007)
§ 8
o
A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo deverá
encaminhar ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da
Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, relatórios cuja periodicidade será fixada na
autorização, não podendo exceder o prazo de doze meses. (Incluído pelo Decreto 6.159, de
2007)
§ 9
o
O relatório a que se refere o § 8
o
deverá conter, no mínimo: (Incluído pelo Decreto
6.159, de 2007)
I - informações sobre o andamento dos projetos integrantes do portfólio; (Incluído pelo
Decreto nº 6.159, de 2007)
II - indicação das áreas onde foram realizadas as coletas, por meio de coordenadas
geográficas; (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
III - listagem quantitativa e qualitativa das espécies ou morfotipos coletados em cada
área; (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
IV - comprovão do desito das subamostras em instituição credenciada como fiel
depositária; (Incluído pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
V - apresentação dos Termos de Transferência de Material, quando houver; e (Incluído
pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
VI - resultados preliminares. (Incldo pelo Decreto nº 6.159, de 2007)
§ 10. A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo poderá, durante a
vigência da autorização, inserir novos projetos no portfólio, desde que observe as condições
estabelecidas neste artigo e, previamente ao início da nova atividade ou projeto, comunique a
alteração realizada ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da
Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001. (Incluído pelo Decreto 6.159, de 2007)
Art. 10. Para o credenciamento de instituição pública nacional de pesquisa e
desenvolvimento ou de instituição pública federal de gestão para autorizar outra instituição
nacional, pública ou privada, que exerça atividade de pesquisa e desenvolvimento nas áreas
biológicas e afins, para acessar e remeter amostra de componente do patrimônio genético e
para acessar conhecimento tradicional associado de que tratam os itens 1 e 2 da alínea "e" do
inciso IV do art. 11, da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, o Conselho de Gestão deverá
receber solicitação que atenda, pelo menos, os seguintes requisitos:
I - comprovação da sua atuação em pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e
afins ou na área de gestão;
II - lista das atividades e dos projetos em desenvolvimento relacionados às ões de que
trata a Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
III - infra-estrutura disponível e equipe técnica para atuar:
a) na análise de requerimento e emissão, a terceiros, de autorização de:
1. acesso a amostra de componente do patrimônio genético existente em condições in
situ no território nacional, na plataforma continental e na zona econômica exclusiva, mediante
anuência prévia de seus titulares;
2. acesso a conhecimento tradicional associado, mediante anuência prévia de seus
titulares;
3. remessa de amostra de componente do patrimônio genético para instituição nacional,
pública ou privada, ou para instituição sediada no exterior;
b) no acompanhamento, em articulação com órgãos federais, ou mediante convênio com
outras instituições, das atividades de acesso e de remessa de amostra de componente do
patrimônio genético e de acesso a conhecimento tradicional associado;
c) na criação e manutenção de:
1. cadastro de coleções ex situ, conforme previsto no art. 18 da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001;
2. base de dados para registro de informações obtidas durante a coleta de amostra de
componente do patrimônio genético;
3. base de dados relativos às Autorizações de Acesso e de Remessa, aos Termos de
Transferência de Material e aos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios;
d) na divulgação de lista de Autorizações de Acesso e de Remessa, dos Termos de
Transferência de Material e dos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios;
e) no acompanhamento e na implementação dos Termos de Transferência de Material e
dos Contratos de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios referente
aos processos por ela autorizados;
f) na preparação e encaminhamento, ao Conselho de Gestão, de relatório anual das
atividades realizadas e de cópia das bases de dados à Secretaria-Executiva do Conselho de
Gestão.
Art. 11. Para o credenciamento de instituição pública nacional de pesquisa e
desenvolvimento como fiel depositária de amostra de componente do Patrimônio Genético de
que trata a alínea "f" do inciso IV do art. 11, da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, o
Conselho de Gestão deverá receber solicitação que atenda, pelo menos, os seguintes
requisitos:
I - comprovação da sua atuação em pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e
afins;
II - indicação da infra-estrutura disponível e capacidade para conservação, em condições
ex situ, de amostras de componentes do Patrimônio Genético;
III - comprovação da capacidade da equipe técnica responsável pelas atividades de
conservação;
IV - descrição da metodologia e material empregado para a conservação de espécies
sobre as quais a instituição assumirá responsabilidade na qualidade de fiel depositária;
V - indicação da disponibilidade orçamentária para manutenção das coleções.
Art. 12. (Revogado pelo Decreto nº 4.946, de 31.12.2003)
Art. 13. O Regimento Interno do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético disporá,
pelo menos, sobre a forma de sua atuação, os meios de registro das suas deliberações e o
arquivamento de seus atos.
Art. 14. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 28 de setembro de 2001; 180º da Independência e 113º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Johaness Eck
José Serra
Carlos Américo Pacheco
José Sarney Filho
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. 3.10.2001
ANEXO D – Decreto nº 4.339, DE 22 DE AGOSTO DE 2002
417
DECRETO Nº 4.339, DE 22 DE AGOSTO DE 2002
Institui princípios e diretrizes para a implementação
da Política Nacional da Biodiversidade.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,
inciso IV, da Constituição, e
Considerando os compromissos assumidos pelo Brasil ao assinar a Convenção sobre
Diversidade Biológica, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento - CNUMAD, em 1992, a qual foi aprovada pelo Decreto Legislativo n
o
2,
de 3 de fevereiro de 1994, e promulgada pelo Decreto n
o
2.519, de 16 de março de 1998;
Considerando o disposto no art. 225 da Constituição, na Lei n
o
6.938, de 31 de agosto de
1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, na Declaração do Rio e na
Agenda 21, ambas assinadas pelo Brasil em 1992, durante a CNUMAD, e nas demais normas
vigentes relativas à biodiversidade; e
Considerando que o desenvolvimento de estratégias, políticas, planos e programas
nacionais de biodiversidade é um dos principais compromissos assumidos pelos países
membros da Convenção sobre Diversidade Biológica;
DECRETA:
Art. 1
o
Ficam instituídos, conforme o disposto no Anexo a este Decreto, princípios e
diretrizes para a implementação, na forma da lei, da Política Nacional da Biodiversidade, com
a participação dos governos federal, distrital, estaduais e municipais, e da sociedade civil.
Art. 2
o
Este Decreto entra em vigor na data da sua publicação.
Brasília, 22 de agosto de 2002; 181
o
da Independência e 114
o
da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
José Carlos Carvalho
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 23.8.2002.
417
BRASIL. Decreto 4.339, de 22 de agosto de 2002. Institui princípios e diretrizes para a implementação da
Política Nacional da Biodiversidade. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4339.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
A N E X O
Da Política Nacional da Biodiversidade
Dos Princípios e Diretrizes Gerais da Política Nacional da Biodiversidade
1. Os princípios estabelecidos neste Anexo derivam, basicamente, daqueles estabelecidos
na Convenção sobre Diversidade Biológica e na Declaração do Rio, ambas de 1992, na
Constituição e na legislação nacional vigente sobre a matéria.
2. A Política Nacional da Biodiversidade reger-se-á pelos seguintes princípios:
I - a diversidade biológica tem valor intrínseco, merecendo respeito independentemente
de seu valor para o homem ou potencial para uso humano;
II - as nações têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos biológicos,
segundo suas políticas de meio ambiente e desenvolvimento;
III - as nações são responsáveis pela conservação de sua biodiversidade e por assegurar
que atividades sob sua jurisdição ou controle não causem dano ao meio ambiente e à
biodiversidade de outras nações ou de áreas além dos limites da jurisdição nacional;
IV - a conservação e a utilização sustentável da biodiversidade são uma preocupação
comum à humanidade, mas com responsabilidades diferenciadas, cabendo aos países
desenvolvidos o aporte de recursos financeiros novos e adicionais e a facilitação do acesso
adequado às tecnologias pertinentes para atender às necessidades dos países em
desenvolvimento;
V - todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum
do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se, ao Poder Público e à coletividade,
o dever de defendê-lo e de preservá-lo para as presentes e as futuras gerações;
VI - os objetivos de manejo de solos, águas e recursos biológicos o uma questão de
escolha da sociedade, devendo envolver todos os setores relevantes da sociedade e todas as
disciplinas científicas e considerar todas as formas de informação relevantes, incluindo os
conhecimentos científicos, tradicionais e locais, inovações e costumes;
VII - a manutenção da biodiversidade é essencial para a evolução e para a manutenção
dos sistemas necessários à vida da biosfera e, para tanto, é necessário garantir e promover a
capacidade de reprodução sexuada e cruzada dos organismos;
VIII - onde exista evidência científica consistente de risco sério e irreversível à
diversidade biológica, o Poder Público determinará medidas eficazes em termos de custo para
evitar a degradação ambiental;
IX - a internalização dos custos ambientais e a utilização de instrumentos econômicos
será promovida tendo em conta o princípio de que o poluidor deverá, em princípio, suportar o
custo da poluição, com o devido respeito pelo interesse público e sem distorcer o comércio e
os investimentos internacionais;
X - a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa
degradação do meio ambiente deverá ser precedida de estudo prévio de impacto ambiental, a
que se dará publicidade;
XI - o homem faz parte da natureza e está presente nos diferentes ecossistemas
brasileiros mais de dez mil anos, e todos estes ecossistemas foram e estão sendo alterados
por ele em maior ou menor escala;
XII - a manutenção da diversidade cultural nacional é importante para pluralidade de
valores na sociedade em relação à biodiversidade, sendo que os povos indígenas, os
quilombolas e as outras comunidades locais desempenham um papel importante na
conservação e na utilização sustentável da biodiversidade brasileira;
XIII - as ações relacionadas ao acesso ao conhecimento tradicional associado à
biodiversidade deverão transcorrer com consentimento prévio informado dos povos indígenas,
dos quilombolas e das outras comunidades locais;
XIV - o valor de uso da biodiversidade é determinado pelos valores culturais e inclui
valor de uso direto e indireto, de opção de uso futuro e, ainda, valor intrínseco, incluindo os
valores ecológico, genético, social, econômico, científico, educacional, cultural, recreativo e
estético;
XV - a conservação e a utilização sustentável da biodiversidade devem contribuir para o
desenvolvimento econômico e social e para a erradicação da pobreza;
XVI - a gestão dos ecossistemas deve buscar o equilíbrio apropriado entre a conservação
e a utilização sustentável da biodiversidade, e os ecossistemas devem ser administrados dentro
dos limites de seu funcionamento;
XVII - os ecossistemas devem ser entendidos e manejados em um contexto econômico,
objetivando:
a) reduzir distorções de mercado que afetam negativamente a biodiversidade;
b) promover incentivos para a conservação da biodiversidade e sua utilização
sustentável; e
c) internalizar custos e benefícios em um dado ecossistema o tanto quanto possível;
XVIII - a pesquisa, a conservação ex situ e a agregação de valor sobre componentes da
biodiversidade brasileira devem ser realizadas preferencialmente no país, sendo bem vindas as
iniciativas de cooperação internacional, respeitados os interesses e a coordenação nacional;
XIX - as ações nacionais de gestão da biodiversidade devem estabelecer sinergias e
ações integradas com convenções, tratados e acordos internacionais relacionados ao tema da
gestão da biodiversidade; e
XX - as ações de gestão da biodiversidade terão caráter integrado, descentralizado e
participativo, permitindo que todos os setores da sociedade brasileira tenham, efetivamente,
acesso aos benefícios gerados por sua utilização.
3. A Política Nacional da Biodiversidade aplica-se aos componentes da diversidade
biológica localizados nas áreas sob jurisdição nacional, incluindo o território nacional, a
plataforma continental e a zona econômica exclusiva; e aos processos e atividades realizados
sob sua jurisdição ou controle, independentemente de onde ocorram seus efeitos, dentro da
área sob jurisdição nacional ou além dos limites desta.
4. A Política Nacional da Biodiversidade reger-se-á pelas seguintes diretrizes:
I - estabelecer-se-á cooperação com outras nações, diretamente ou, quando necessário,
mediante acordos e organizações internacionais competentes, no que respeita a áreas além da
jurisdição nacional, em particular nas áreas de fronteira, na Antártida, no alto-mar e nos
grandes fundos marinhos e em relação a espécies migratórias, e em outros assuntos de mútuo
interesse, para a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica;
II - o esforço nacional de conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica
deve ser integrado em planos, programas e políticas setoriais ou intersetoriais pertinentes de
forma complementar e harmônica;
III - investimentos substanciais são necessários para conservar a diversidade biológica,
dos quais resultarão, conseqüentemente, benefícios ambientais, econômicos e sociais;
IV - é vital prever, prevenir e combater na origem as causas da sensível redução ou perda
da diversidade biológica;
V - a sustentabilidade da utilização de componentes da biodiversidade deve ser
determinada do ponto de vista econômico, social e ambiental, especialmente quanto à
manutenção da biodiversidade;
VI - a gestão dos ecossistemas deve ser descentralizada ao nível apropriado e os gestores
de ecossistemas devem considerar os efeitos atuais e potenciais de suas atividades sobre os
ecossistemas vizinhos e outros;
VII - a gestão dos ecossistemas deve ser implementada nas escalas espaciais e temporais
apropriadas e os objetivos para o gerenciamento de ecossistemas devem ser estabelecidos a
longo prazo, reconhecendo que mudanças são inevitáveis.
VIII - a gestão dos ecossistemas deve se concentrar nas estruturas, nos processos e nos
relacionamentos funcionais dentro dos ecossistemas, usar práticas gerenciais adaptativas e
assegurar a cooperação intersetorial;
IX - criar-se-ão condições para permitir o acesso aos recursos genéticos e para a
utilização ambientalmente saudável destes por outros países que sejam Partes Contratantes da
Convenção sobre Diversidade Biológica, evitando-se a imposição de restrições contrárias aos
objetivos da Convenção.
Do Objetivo Geral da Política Nacional da Biodiversidade
5. A Política Nacional da Biodiversidade tem como objetivo geral a promoção, de forma
integrada, da conservação da biodiversidade e da utilização sustentável de seus componentes,
com a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos
genéticos, de componentes do patrimônio genético e dos conhecimentos tradicionais
associados a esses recursos.
Dos Componentes da Política Nacional da Biodiversidade
6. Os Componentes da Política Nacional da Biodiversidade e respectivos objetivos
específicos, abaixo relacionados e estabelecidos com base na Convenção sobre Diversidade
Biológica, devem ser considerados como os eixos temáticos que orientarão as etapas de
implementação desta Política.
7. As diretrizes estabelecidas para os Componentes devem ser consideradas para todos os
biomas brasileiros, quando couber.
8. Diretrizes específicas por bioma poderão ser estabelecidas nos Planos de Ação,
quando da implementação da Política.
9. A Política Nacional da Biodiversidade abrange os seguintes Componentes:
I - Componente 1 - Conhecimento da Biodiversidade: congrega diretrizes voltadas à
geração, sistematização e disponibilização de informações que permitam conhecer os
componentes da biodiversidade do país e que apóiem a gestão da biodiversidade, bem como
diretrizes relacionadas à produção de inventários, à realização de pesquisas ecológicas e à
realização de pesquisas sobre conhecimentos tradicionais;
II - Componente 2 - Conservação da Biodiversidade: engloba diretrizes destinadas à
conservação in situ e ex situ de variabilidade genética, de ecossistemas, incluindo os serviços
ambientais, e de espécies, particularmente daquelas ameaçadas ou com potencial econômico,
bem como diretrizes para implementação de instrumentos econômicos e tecnológicos em prol
da conservação da biodiversidade;
III - Componente 3 - Utilização Sustentável dos Componentes da Biodiversidade: reúne
diretrizes para a utilização sustentável da biodiversidade e da biotecnologia, incluindo o
fortalecimento da gestão pública, o estabelecimento de mecanismos e instrumentos
econômicos, e o apoio a práticas e negócios sustentáveis que garantam a manutenção da
biodiversidade e da funcionalidade dos ecossistemas, considerando não apenas o valor
econômico, mas também os valores sociais e culturais da biodiversidade;
IV - Componente 4 - Monitoramento, Avaliação, Prevenção e Mitigação de Impactos
sobre a Biodiversidade: engloba diretrizes para fortalecer os sistemas de monitoramento, de
avaliação, de prevenção e de mitigação de impactos sobre a biodiversidade, bem como para
promover a recuperação de ecossistemas degradados e de componentes da biodiversidade
sobreexplotados;
V - Componente 5 - Acesso aos Recursos Genéticos e aos Conhecimentos Tradicionais
Associados e Repartição de Benefícios: alinha diretrizes que promovam o acesso controlado,
com vistas à agregação de valor mediante pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico,
e a distribuição dos benefícios gerados pela utilização dos recursos genéticos, dos
componentes do patrimônio genético e dos conhecimentos tradicionais associados, de modo
que sejam compartilhados, de forma justa e eqüitativa, com a sociedade brasileira e, inclusive,
com os povos indígenas, com os quilombolas e com outras comunidades locais;
VI - Componente 6 - Educação, Sensibilização Pública, Informação e Divulgação sobre
Biodiversidade: define diretrizes para a educação e sensibilização pública e para a gestão e
divulgação de informações sobre biodiversidade, com a promoção da participação da
sociedade, inclusive dos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, no
respeito à conservação da biodiversidade, à utilização sustentável de seus componentes e à
repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização de recursos genéticos, de
componentes do patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado à
biodiversidade;
VII - Componente 7 - Fortalecimento Jurídico e Institucional para a Gestão da
Biodiversidade: sintetiza os meios de implementação da Política; apresenta diretrizes para o
fortalecimento da infra-estrutura, para a formação e fixação de recursos humanos, para o
acesso à tecnologia e transferência de tecnologia, para o estímulo à criação de mecanismos de
financiamento, para o fortalecimento do marco-legal, para a integração de políticas públicas e
para a cooperação internacional.
Do Componente 1 da Política Nacional da Biodiversidade - Conhecimento da
Biodiversidade
10. Objetivos Gerais: gerar, sistematizar e disponibilizar informações para a gestão da
biodiversidade nos biomas e seu papel no funcionamento e na manutenção dos ecossistemas
terrestres e aquáticos, incluindo as águas jurisdicionais. Promover o conhecimento da
biodiversidade brasileira, sua distribuição, seus determinantes, seus valores, suas funções
ecológicas e seu potencial de uso econômico.
10.1. Primeira diretriz: Inventário e caracterização da biodiversidade. Levantamento,
identificação, catalogação e caracterização dos componentes da biodiversidade (ecossistemas,
espécies e diversidade genética intra-específica), para gerar informações que possibilitem a
proposição de medidas para a gestão desta.
Objetivos Específicos:
10.1.1. Instituir e implementar programa nacional de inventários biológicos integrados a
estudos do meio físico, com ênfase em grupos taxonômicos megadiversos abrangendo os
diferentes habitats e regiões geográficas do país, preferencialmente realizados em áreas
prioritárias para conservação, estabelecendo-se protocolos mínimos padronizados para coleta,
com obrigatoriedade do uso de coordenadas geográficas (georreferenciamento).
10.1.2. Promover e apoiar pesquisas voltadas a estudos taxonômicos de todas as espécies
que ocorrem no Brasil e para a caracterização e classificação da biodiversidade brasileira.
10.1.3. Instituir um sistema nacional, coordenado e compartilhado, de registro de
espécies descritas em território brasileiro e nas demais áreas sob jurisdição nacional, criando,
apoiando, consolidando e integrando coleções científicas e centros de referência nacionais e
regionais.
10.1.4. Elaborar e manter atualizadas listas de espécies endêmicas e ameaçadas no país,
de modo articulado com as listas estaduais e regionais.
10.1.5. Promover pesquisas para identificar as características ecológicas, a diversidade
genética e a viabilidade populacional das espécies de plantas, animais, fungos e
microrganismos endêmicas e ameaçadas no Brasil, a fim de subsidiar ações de recuperação,
regeneração, utilização sustentável e conservação destas.
10.1.6. Promover pesquisas para determinar propriedades e características ecológicas,
biológicas e genéticas das espécies de maior interesse para conservação e utilização
socioeconômica sustentável, principalmente espécies nativas utilizadas para fins econômicos
ou que possuam grande valor para povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais.
10.1.7. Mapear a diversidade e a distribuição das variedades locais de espécies
domesticadas e seus parentes silvestres.
10.1.8. Inventariar e mapear as espécies exóticas invasoras e as espécies-problema, bem
como os ecossistemas em que foram introduzidas para nortear estudos dos impactos gerados e
ações de controle.
10.1.9. Promover a avaliação sistemática das metodologias empregadas na realização de
inventários.
10.1.10. Estabelecer mecanismos para exigir, por parte do empreendedor, de realização
de inventário da biodiversidade daqueles ambientes especiais (por exemplo canga ferrífera,
platôs residuais) altamente ameaçados pela atividade de exploração econômica, inclusive a
mineral.
10.1.11. Apoiar a formação de recursos humanos nas áreas de taxonomia, incluindo
taxônomos e auxiliares (parataxônomos).
10.1.12. Promover a recuperação e a síntese das informações existentes no acervo
científico brasileiro, principalmente teses e dissertações.
10.1.13. Promover o mapeamento da biodiversidade em todo o território nacional, gerar
e distribuir amplamente mapas da biodiversidade brasileira, resguardando-se o devido sigilo
de informações de interesse nacional.
10.1.14. Promover a repatriação das informações sobre a biodiversidade brasileira
existentes no exterior.
10.2. Segunda diretriz: Promoção de pesquisas ecológicas e estudos sobre o papel
desempenhado pelos seres vivos na funcionalidade dos ecossistemas e sobre os impactos das
mudanças globais na biodiversidade.
Objetivos Específicos:
10.2.1. Promover pesquisas para determinar as propriedades ecológicas das espécies e as
formas de sinergia entre estas, visando a compreender sua importância nos ecossistemas.
10.2.2. Promover estudos, preferencialmente nas áreas prioritárias para conservação da
biodiversidade e nas unidades de conservação, sobre o funcionamento de comunidades e
ecossistemas, sobre dinâmica e situação das populações e sobre avaliação de estoques e
manejo dos componentes da biodiversidade.
10.2.3. Fortalecer e expandir pesquisas ecológicas de longa duração, preferencialmente
em unidades de conservação.
10.2.4. Promover pesquisas para determinar o efeito da dinâmica das mudanças globais
sobre a biodiversidade e a participação das espécies nos processos de fluxo de matéria e
energia e de homeostase nos ecossistemas.
10.2.5. Promover pesquisas sobre os efeitos das alterações ambientais causadas pela
fragmentação de habitats na perda da biodiversidade, com ênfase nas áreas com maiores
níveis de desconhecimento, de degradação e de perda de recursos genéticos.
10.2.6. Promover o desenvolvimento e o aperfeiçoamento de ferramentas de modelagem
de ecossistemas.
10.2.7. Promover e apoiar a pesquisa sobre impacto das alterações ambientais na
produção agropecuária e na saúde humana, com ênfase em dados para as análises de risco
promovidas pelos órgãos competentes das áreas ambiental, sanitária e fitossanitária.
10.3. Terceira diretriz: Promoção de pesquisas para a gestão da biodiversidade. Apoio à
produção de informação e de conhecimento sobre os componentes da biodiversidade nos
diferentes biomas para subsidiar a gestão da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
10.3.1. Promover e apoiar pesquisa sobre biologia da conservação para os diferentes
ecossistemas do país e particularmente para os componentes da biodiversidade ameaçados.
10.3.2. Promover e apoiar desenvolvimento de pesquisa e tecnologia sobre conservação e
utilização sustentável da biodiversidade, especialmente sobre a propagação e o
desenvolvimento de espécies nativas com potencial medicinal, agrícola e industrial.
10.3.3. Desenvolver estudos para o manejo da conservação e utilização sustentável da
biodiversidade nas reservas legais das propriedades rurais, conforme previsto no Código
Florestal.
10.3.4. Fomentar a pesquisa em técnicas de prevenção, recuperação e restauração de
áreas em processo de desertificação, fragmentação ou degradação ambiental, que utilizem a
biodiversidade.
10.3.5. Promover e apoiar pesquisas sobre sanidade da vida silvestre e estabelecer
mecanismos para que seus dados sejam incorporados na gestão da biodiversidade.
10.3.6. Promover e apoiar pesquisas para subsidiar a prevenção, erradicação e controle
de espécies exóticas invasoras e espécies-problema que ameacem a biodiversidade, atividades
da agricultura, pecuária, silvicultura e aqüicultura e a saúde humana.
10.3.7. Apoiar estudos sobre o valor dos componentes da biodiversidade e dos serviços
ambientais associados.
10.3.8. Apoiar estudos que promovam a utilização sustentável da biodiversidade em
benefício de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, assegurando sua
participação direta.
10.3.9. Atualizar as avaliações de áreas e ações prioritárias para conservação, utilização
sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade.
10.3.10. Definir estratégias de pesquisa multidisciplinar em biodiversidade.
10.4. Quarta diretriz: Promoção de pesquisas sobre o conhecimento tradicional de povos
indígenas, quilombolas e outras comunidades locais. Apoio a estudos para organização e
sistematização de informações e procedimentos relacionados ao conhecimento tradicional
associado à biodiversidade, com consentimento prévio informado das populações envolvidas
e em conformidade com a legislação vigente e com os objetivos específicos estabelecidos na
segunda diretriz do Componente 5, prevista no item 14.2.
Objetivos Específicos:
10.4.1. Desenvolver estudos e metodologias para a elaboração e implementação de
instrumentos econômicos e regime jurídico específico que possibilitem a repartição justa e
eqüitativa de benefícios, compensação econômica e outros tipos de compensação para os
detentores dos conhecimentos tradicionais associados, segundo as demandas por eles
definidas.
10.4.2. Desenvolver estudos acerca do conhecimento, inovações e práticas dos povos
indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, respeitando, resgatando, mantendo e
preservando os valores culturais agregados a estes conhecimentos, inovações e práticas, e
assegurando a confidencialidade das informações obtidas, sempre que solicitado pelas partes
detentoras destes ou quando a sua divulgação possa ocasionar dano à integridade social,
ambiental ou cultural destas comunidades ou povos detentores destes conhecimentos.
10.4.3. Apoiar estudos e iniciativas de povos indígenas, quilombos e outras comunidades
locais de sistematização de seus conhecimentos, inovações e práticas, com ênfase nos temas
de valoração, valorização, conservação e utilização sustentável dos recursos da
biodiversidade.
10.4.4. Promover estudos e iniciativas de diferentes setores da sociedade voltados para a
valoração, valorização, conhecimento, conservação e utilização sustentável dos saberes
tradicionais de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, assegurando a
participação direta dos detentores desse conhecimento tradicional.
10.4.5. Promover iniciativas que agreguem povos indígenas, quilombolas, outras
comunidades locais e comunidades científicas para informar e fazer intercâmbio dos aspectos
legais e científicos sobre a pesquisa da biodiversidade e sobre as atividades de bioprospecção.
10.4.6. Promover a divulgação junto a povos indígenas, quilombolas e outras
comunidades locais dos resultados das pesquisas que envolvam seus conhecimentos e dos
institutos jurídicos relativos aos seus direitos.
10.4.7. Apoiar e estimular a pesquisa sobre o saber tradicional (conhecimentos, práticas e
inovações) de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, assegurando a sua
integridade sociocultural, a posse e o usufruto de suas terras.
Do Componente 2 da Política Nacional da Biodiversidade - Conservação da
Biodiversidade
11. Objetivo Geral: Promover a conservação, in situ e ex situ, dos componentes da
biodiversidade, incluindo variabilidade genética, de espécies e de ecossistemas, bem como
dos serviços ambientais mantidos pela biodiversidade.
11.1. Primeira diretriz: Conservação de ecossistemas. Promoção de ações de conservação
in situ da biodiversidade e dos ecossistemas em áreas não estabelecidas como unidades de
conservação, mantendo os processos ecológicos e evolutivos e a oferta sustentável dos
serviços ambientais.
Objetivos Específicos:
11.1.1. Fortalecer a fiscalização para controle de atividades degradadoras e ilegais:
desmatamento, destruição de habitats, caça, aprisionamento e comercialização de animais
silvestres e coleta de plantas silvestres.
11.1.2. Desenvolver estudos e metodologias participativas que contribuam para a
definição da abrangência e do uso de zonas de amortecimento para as unidades de
conservação.
11.1.3. Planejar, promover, implantar e consolidar corredores ecológicos e outras formas
de conectividade de paisagens, como forma de planejamento e gerenciamento regional da
biodiversidade, incluindo compatibilização e integração das reservas legais, áreas de
preservação permanentes e outras áreas protegidas.
11.1.4. Apoiar ações para elaboração dos zoneamentos ecológico-econômicos, de
abrangência nacional, regional, estadual, municipal ou em bacias hidrográficas, com enfoque
para o estabelecimento de unidades de conservação, e adotando suas conclusões, com
diretrizes e roteiro metodológico mínimos comuns e com transparência, rigor científico e
controle social.
11.1.5. Promover e apoiar estudos de melhoria dos sistemas de uso e de ocupação da
terra, assegurando a conservação da biodiversidade e sua utilização sustentável, em áreas fora
de unidades de conservação de proteção integral e inclusive em terras indígenas, quilombolas
e de outras comunidades locais, com especial atenção às zonas de amortecimento de unidades
de conservação.
11.1.6. Propor uma agenda de implementação de áreas e ações prioritárias para
conservação da biodiversidade em cada estado e bioma brasileiro.
11.1.7. Promover e apoiar a conservação da biodiversidade no interior e no entorno de
terras indígenas, de quilombolas e de outras comunidades locais, respeitando o uso
etnoambiental do ecossistema pelos seus ocupantes.
11.1.8. Fortalecer mecanismos de incentivos para o setor privado e para comunidades
locais com adoção de iniciativas voltadas à conservação da biodiversidade.
11.1.9. Criar mecanismos de incentivos à recuperação e à proteção de áreas de
preservação permanente e de reservas legais previstas em Lei.
11.1.10. Criar estratégias para a conservação de ecossistemas pioneiros, garantindo sua
representatividade e função.
11.1.11. Estabelecer uma iniciativa nacional para conservação e recuperação da
biodiversidade de águas interiores, da zona costeira e da zona marinha.
11.1.12. Articular ações com o órgão responsável pelo controle sanitário e fitossanitário
com vistas à troca de informações para impedir a entrada no país de espécies exóticas
invasoras que possam afetar a biodiversidade.
11.1.13. Promover a prevenção, a erradicação e o controle de espécies exóticas invasoras
que possam afetar a biodiversidade.
11.1.14. Promover ações de conservação visando a manutenção da estrutura e dos
processos ecológicos e evolutivos e a oferta sustentável dos serviços ambientais.
11.1.15. Conservar a biodiversidade dos ecossistemas, inclusive naqueles sob sistemas
intensivos de produção econômica, como seguro contra mudanças climáticas e alterações
ambientais e econômicas imprevistas, preservando a capacidade dos componentes da
biodiversidade se adaptarem a mudanças, inclusive as climáticas.
11.2. Segunda diretriz: Conservação de ecossistemas em unidades de
conservação. Promoção de ações de conservação in situ da biodiversidade dos ecossistemas
nas unidades de conservação, mantendo os processos ecológicos e evolutivos, a oferta
sustentável dos serviços ambientais e a integridade dos ecossistemas.
Objetivos Específicos:
11.2.1. Apoiar e promover a consolidação e a expansão do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza - SNUC, com ateão particular para as unidades de
proteção integral, garantindo a representatividade dos ecossistemas e das ecorregiões e a
oferta sustentável dos servos ambientais e a integridade dos ecossistemas.
11.2.2. Promover e apoiar o desenvolvimento de mecanismos técnicos e econômicos
para a implementação efetiva de unidades de conservação.
11.2.3. Apoiar as ações do órgão oficial de controle fitossanitário com vistas a evitar a
introdução de pragas e espécies exóticas invasoras em áreas no entorno e no interior de
unidades de conservação.
11.2.4. Incentivar o estabelecimento de processos de gestão participativa, propiciando a
tomada de decisões com participação da esfera federal, da estadual e da municipal do Poder
Público e dos setores organizados da sociedade civil, em conformidade com a Lei do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC.
11.2.5. Incentivar a participação do setor privado na conservação in situ, com ênfase na
criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural - RPPN, e no patrocínio de unidade de
conservação pública.
11.2.6. Promover a criação de unidades de conservação de proteção integral e de uso
sustentável, levando-se em consideração a representatividade, conectividade e
complementaridade da unidade para o Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
11.2.7. Desenvolver mecanismos adicionais de apoio às unidades de conservação de
proteção integral e de uso sustentável, inclusive pela remuneração dos serviços ambientais
prestados.
11.2.8. Promover o desenvolvimento e a implementação de um plano de ação para
solucionar os conflitos devidos à sobreposição de unidades de conservação, terras indígenas e
de quilombolas.
11.2.9. Incentivar e apoiar a criação de unidades de conservação marinhas com diversos
graus de restrição e de exploração.
11.2.10. Conservar amostras representativas e suficientes da totalidade da
biodiversidade, do patrimônio genético nacional (inclusive de espécies domesticadas), da
diversidade de ecossistemas e da flora e fauna brasileira (inclusive de espécies ameaçadas),
como reserva estratégica para usufruto futuro.
11.3. Terceira diretriz: Conservação in situ de espécies. Consolidação de ações de
conservação in situ das espécies que compõem a biodiversidade, com o objetivo de reduzir a
erosão genética, de promover sua conservação e utilização sustentável, particularmente das
espécies ameaçadas, bem como dos processos ecológicos e evolutivos a elas associados e de
manter os serviços ambientais.
Objetivos Específicos:
11.3.1. Criar, identificar e estabelecer iniciativas, programas e projetos de conservação e
recuperação de espécies ameaçadas, endêmicas ou insuficientemente conhecidas.
11.3.2. Identificar áreas para criação de novas unidades de conservação, baseando-se nas
necessidades das espécies ameaçadas.
11.3.3. Fortalecer e disseminar mecanismos de incentivo para empresas privadas e
comunidades que desenvolvem projetos de conservação de espécies ameaçadas.
11.3.4. Implementar e aperfeiçoar o sistema de autorização, vigilância e
acompanhamento de coleta de material biológico e de componentes do patrimônio genético.
11.3.5. Promover a regulamentação e a implementação de reservas genéticas para
proteger variedades locais de espécies silvestres usadas no extrativismo, na agricultura e na
aqüicultura.
11.3.6. Implementar ações para maior proteção de espécies ameaçadas dentro e fora de
unidades de conservação.
11.3.7. Promover e aperfeiçoar as ações de manejo de espécies-problema em situação de
descontrole populacional.
11.3.8. Estabelecer mecanismos para tornar obrigatória a inclusão, em parte ou no todo,
de ambientes especiais que apresentam alto grau de endemismo ou contenham espécies
ameaçadas nas Zonas Intangíveis das Unidades de Conservação de Uso Sustentável.
11.3.9. Estabelecer medidas de proteção das espécies ameaçadas nas terras indígenas e
nas terras de quilombolas.
11.4. Quarta diretriz: Conservação ex situ de espécies. Consolidação de ões de
conservação ex situ de espécies e de sua variabilidade genética, com ênfase nas espécies
ameaçadas e nas espécies com potencial de uso econômico, em conformidade com os
objetivos específicos estabelecidos nas diretrizes do Componente 5.
Objetivos Específicos:
11.4.1. Desenvolver estudos para a conservação ex situ de espécies, com ênfase nas
espécies ameaçadas e nas espécies com potencial de uso econômico.
11.4.2. Desenvolver, promover e apoiar estudos e estabelecer metodologias para
conservação e manutenção dos bancos de germoplasma das espécies nativas e exóticas de
interesse científico e comercial.
11.4.3. Promover a manutenção, a caracterização e a documentação do germoplasma de
plantas, animais, fungos e microrganismos contido nas instituições científicas e nos centros
nacionais e regionais, de maneira a estabelecer coleções nucleares para fomentar programas
de melhoramento genético.
11.4.4. Integrar iniciativas, planos e programas de conservação ex situ de espécies, com
ênfase nas espécies ameaçadas e nas espécies com potencial de uso econômico.
11.4.5. Promover a conservação ex situ visando à obtenção de matrizes animais e
vegetais, inclusive microrganismos, de espécies ameaçadas ou com potencial de uso
econômico para formação de coleções vivas representativas.
11.4.6. Ampliar, fortalecer e integrar o sistema de herbários, museus zoológicos,
coleções etnobotânicas, criadouros de vida silvestre, jardins botânicos, arboretos, hortos
florestais, coleções zoológicas, coleções botânicas, viveiros de plantas nativas, coleções de
cultura de microrganismos, bancos de germoplasma vegetal, núcleos de criação animal,
zoológicos, aquários e oceanários.
11.4.7. Integrar jardins botânicos, zoológicos e criadouros de vida silvestre aos planos
nacionais de conservação de recursos genéticos animais e vegetais e de pesquisa ambiental,
especialmente em áreas de alto endemismo.
11.4.8. Criar e fortalecer centros de triagem de animais e plantas silvestres, integrando-os
ao sistema de zoológicos e jardins botânicos, para serem transformados em centros de
conservação de fauna e de flora.
11.4.9. Criar centros e promover iniciativas para a reprodução de espécies ameaçadas,
utilizando técnicas como inseminação artificial, fertilização in vitro, entre outras.
11.4.10. Incentivar a participação do setor privado na estratégia de conservação ex situ
da biodiversidade.
11.4.11. Promover medidas e iniciativas para o enriquecimento da variabilidade genética
disponível nos bancos de germoplasma, estabelecendo coleções representativas do patrimônio
genético (animal, vegetal e de microrganismos).
11.4.12. Estabelecer e apoiar iniciativas de coleta para aumentar a representatividade
geográfica dos bancos de germoplasma.
11.4.13. Criar e manter bancos de germoplasma regionais e coleções de base para a
conservação da variabilidade genética, promovendo principalmente a conservação de espécies
nativas sub-representadas em coleções, variedades locais, parentes silvestres, espécies raras,
endêmicas, ameaçadas ou com potencial econômico.
11.4.14. Estabelecer iniciativas de coleta, reintrodução e intercâmbio de espécies nativas
de importância socioeconômica, incluindo variedades locais de espécies domesticadas e de
espécies ameaçadas, para manutenção de sua variabilidade genética.
11.4.15. Apoiar e subsidiar a conservação e a ampliação de bancos de germoplasma de
espécies introduzidas, com fins econômicos ou ornamentais, mantidas por entidades de
pesquisa, jardins botânicos, zoológicos e pela iniciativa privada.
11.4.16. Ampliar os programas nacionais de coleta e conservação de microrganismos do
solo de interesse econômico.
11.4.17. Integrar as ões de conservação ex situ com as ações de gestão do acesso a
recursos genéticos e repartição de benefícios derivados da utilização do conhecimento
tradicional.
11.4.18. Apoiar as ações de órgão oficial de controle sanitário e fitossanitário no que diz
respeito ao controle de espécies invasoras ou pragas.
11.5. Quinta diretriz: Instrumentos econômicos e tecnológicos de conservação da
biodiversidade. Desenvolvimento de instrumentos econômicos e tecnológicos para a
conservação da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
11.5.1. Promover estudos para a avaliação da efetividade dos instrumentos econômicos
para a conservação da biodiversidade.
11.5.2. Criar e consolidar legislação específica relativa ao uso de instrumentos
econômicos que visem ao estímulo à conservação da biodiversidade, associado ao processo de
reforma tributária.
11.5.3. Desenvolver instrumentos econômicos e legais para reduzir as pressões
antrópicas sobre a biodiversidade, associado ao processo de reforma tributária.
11.5.4. Desenvolver instrumentos econômicos e instrumentos legais para cobrança
pública, quando couber, pelo uso de serviços ambientais, associado ao processo de reforma
tributária.
11.5.5. Promover a internalização de custos e benefícios da conservação da
biodiversidade (bens e serviços) na contabilidade pública e privada.
11.5.6. Estimular mecanismos para reversão dos benefícios da cobrança pública pelo uso
de serviços ambientais da biodiversidade para a sua conservação.
11.5.7. Criar e implantar mecanismos tributários, creditícios e de facilitação
administrativa específicos para proprietários rurais que mantêm reservas legais e áreas de
preservação permanente protegidas.
11.5.8. Aprimorar os instrumentos legais existentes de estímulo à conservação da
biodiversidade por meio do imposto sobre circulação de mercadoria (ICMS Ecológico) e
incentivar sua adoção em todos os estados da federação, incentivando a aplicação dos
recursos na gestão da biodiversidade.
Do Componente 3 da Política Nacional da Biodiversidade - Utilização Sustentável dos
Componentes da Biodiversidade
12. Objetivo Geral: Promover mecanismos e instrumentos que envolvam todos os setores
governamentais e não-governamentais, públicos e privados, que atuam na utilização de
componentes da biodiversidade, visando que toda utilização de componentes da
biodiversidade seja sustentável e considerando não apenas seu valor econômico, mas também
os valores ambientais, sociais e culturais da biodiversidade.
12.1. Primeira diretriz: Gestão da biotecnologia e da biossegurança. Elaboração e
implementação de instrumentos e mecanismos jurídicos e econômicos que incentivem o
desenvolvimento de um setor nacional de biotecnologia competitivo e de excelência, com
biossegurança e com atenção para as oportunidades de utilização sustentável de componentes
do patrimônio genético, em conformidade com a legislação vigente e com as diretrizes e
objetivos específicos estabelecidos no Componente 5.
Objetivos Específicos:
12.1.1. Elaborar e implementar códigos de ética para a biotecnologia e a bioprospecção,
de forma participativa, envolvendo os diferentes segmentos da sociedade brasileira, com base
na legislação vigente.
12.1.2. Consolidar a regulamentação dos usos de produtos geneticamente modificados,
com base na legislação vigente, em conformidade com o princípio da precaução e com análise
de risco dos potenciais impactos sobre a biodiversidade, a saúde e o meio ambiente,
envolvendo os diferentes segmentos da sociedade brasileira, garantindo a transparência e o
controle social destes e com a responsabilização civil, criminal e administrativa para
introdução ou difusão não autorizada de organismos geneticamente modificados que ofereçam
riscos ao meio ambiente e à saúde humana.
12.1.3. Consolidar a estruturação, tanto na composição quanto os procedimentos de
operação, dos órgãos colegiados que tratam da utilização da biodiversidade, especialmente a
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio e o Conselho de Gestão do
Patrimônio Genético - CGEN.
12.1.4. Fomentar a criação e o fortalecimento de instituições nacionais e de grupos de
pesquisa nacionais, blicos e privados, especializados em bioprospecção, biotecnologia e
biossegurança, inclusive apoiando estudos e projetos para a melhoria dos conhecimentos
sobre a biossegurança e avaliação de conformidade de organismos geneticamente modificados
e produtos derivados.
12.1.6. Apoiar e fomentar a formação de empresas nacionais dedicadas à pesquisa
científica e tecnológica, à agregação de valor, à conservação e à utilização sustentável dos
recursos biológicos e genéticos.
12.1.7. Apoiar e fomentar a formação de parcerias entre instituições científicas públicas e
privadas, inclusive empresas nacionais de tecnologia, com suas congêneres estrangeiras,
objetivando estabelecer e consolidar as cadeias de agregação de valor, comercialização e
retorno de benefícios relativos a negócios da biodiversidade.
12.1.8. Apoiar e fomentar a formação de pessoal pós-graduado especializado em
administração de negócios sustentáveis com biodiversidade, com o objetivo de seu
aproveitamento pelos sistemas públicos e privados ativos no setor, conferindo ao país
condições adequadas de interlocução com seus parceiros estrangeiros.
12.1.9. Exigir licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos que façam uso
de Organismos Geneticamente Modificados - OGM e derivados, efetiva ou potencialmente
poluidores, nos termos da legislação vigente.
12.1.10. Apoiar a implementação da infra-estrutura e capacitação de recursos humanos
dos órgãos públicos e instituições privadas para avaliação de conformidade de material
biológico, certificação e rotulagem de produtos, licenciamento ambiental e estudo de impacto
ambiental.
12.2. Segunda diretriz: Gestão da utilização sustentável dos recursos
biológicos. Estruturação de sistemas reguladores da utilização dos recursos da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
12.2.1. Criar e consolidar programas de manejo e regulamentação de atividades
relacionadas à utilização sustentável da biodiversidade.
12.2.2. Promover o ordenamento e a gestão territorial das áreas de exploração dos
recursos ambientais, de acordo com a capacidade de suporte destes e de forma integrada com
os esforços de conservação in situ da biodiversidade.
12.2.3. Implementar ações que atendam às demandas de povos indígenas, de quilombolas
e de outras comunidades locais, quanto às prioridades relacionadas à conservação e à
utilização sustentável dos recursos biológicos existentes em seus territórios, salvaguardando
os princípios e a legislação inerentes à matéria e assegurando a sua sustentabilidade nos seus
locais de origem.
12.2.4. Desenvolver e apoiar programas, ões e medidas que promovam a conservação
e a utilização sustentável da agrobiodiversidade.
12.2.5. Promover políticas e programas visando à agregação de valor e à utilização
sustentável dos recursos biológicos.
12.2.6. Promover programas de apoio a pequenas e médias empresas, que utilizem
recursos da biodiversidade de forma sustentável.
12.2.7. Promover instrumentos para assegurar que atividades turísticas sejam
compatíveis com a conservação e a utilização sustentável da biodiversidade.
12.2.8. Promover, de forma integrada, e quando legalmente permitido, a utilização
sustentável de recursos florestais, madeireiros e não-madeireiros, pesqueiros e faunísticos,
privilegiando o manejo certificado, a reposição, o uso múltiplo e a manutenção dos estoques.
12.2.9. Adaptar para as condições brasileiras e aplicar os princípios da Abordagem
Ecossistêmica no manejo da biodiversidade.
12.3. Terceira diretriz: Instrumentos econômicos, tecnológicos e incentivo às práticas e
aos negócios sustentáveis para a utilização da biodiversidade. Implantação de mecanismos,
inclusive fiscais e financeiros, para incentivar empreendimentos e iniciativas produtivas de
utilização sustentável da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
12.3.1. Criar e consolidar legislação específica, relativa ao uso de instrumentos
econômicos que visem ao estímulo à utilização sustentável da biodiversidade.
12.3.2. Criar e fortalecer mecanismos de incentivos fiscais e de crédito, para criação e
aplicação de tecnologias, empreendimentos e programas relacionados com a utilização
sustentável da biodiversidade.
12.3.3. Promover incentivos econômicos para o desenvolvimento e a consolidação de
práticas e negócios realizados em unidades de conservação de proteção integral e de uso
sustentável, em territórios quilombolas, terras indígenas e demais espaços territoriais sob
proteção formal do Poder Público.
12.3.4. Promover a internalização de custos e benefícios da utilização da biodiversidade
(bens e serviços) na contabilidade pública e privada.
12.3.5. Identificar, avaliar e promover experiências, práticas, tecnologias, negócios e
mercados para produtos oriundos da utilização sustentável da biodiversidade, incentivando a
certificação voluntária de processos e produtos, de forma participativa e integrada.
12.3.6. Estimular o uso de instrumentos voluntários de certificação de produtos,
processos, empresas, órgãos do governo e outras formas de organizações produtivas
relacionadas com a utilização sustentável da biodiversidade, inclusive nas compras do
governo.
12.3.7. Promover a inserção de espécies nativas com valor comercial no mercado interno
e externo, bem como a diversificação da utilização sustentável destas espécies.
12.3.8. Estimular a interação e a articulação dos agentes da Política Nacional da
Biodiversidade com o setor empresarial para identificar oportunidades de negócios com a
utilização sustentável dos componentes da biodiversidade.
12.3.9. Apoiar as comunidades locais na identificação e no desenvolvimento de práticas
e negócios sustentáveis.
12.3.10. Apoiar, de forma integrada, a domesticação e a utilização sustentável de
espécies nativas da flora, da fauna e dos microrganismos com potencial econômico.
12.3.11. Estimular a implantação de criadouros de animais silvestres e viveiros de
plantas nativas para consumo e comercialização.
12.3.12. Estimular a utilização sustentável de produtos não madeireiros e as atividades de
extrativismo sustentável, com agregação de valor local por intermédio de protocolos para
produção e comercialização destes produtos.
12.3.13. Estimular a implantação de projetos baseados no Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo do Protocolo de Quioto que estejam de acordo com a conservação e
utilização sustentável da biodiversidade.
12.3.14. Incentivar políticas de apoio a novas empresas, visando à agregação de valor, à
conservação, à utilização sustentável dos recursos biológicos e genéticos.
12.4. Quarta diretriz: Utilização da biodiversidade nas unidades de conservação de uso
sustentável. Desenvolvimento de todos para a utilização sustentável da biodiversidade e
indicadores para medir sua efetividade nas unidades de conservação de uso sustentável.
Objetivos Específicos:
12.4.1. Aprimorar métodos e criar novas tecnologias para a utilização de recursos
biológicos, eliminando ou minimizando os impactos causados à biodiversidade.
12.4.2. Desenvolver estudos de sustentabilidade ambiental, econômica, social e cultural
da utilização dos recursos biológicos.
12.4.3. Fomentar o desenvolvimento de projetos de utilização sustentável de recursos
biológicos oriundos de associações e comunidades em unidades de conservação de uso
sustentável, de forma a integrar com a conservação da biodiversidade.
12.4.4. Estabelecer critérios para que os planos de manejo de exploração de qualquer
recurso biológico incluam o monitoramento dos processos de recuperação destes recursos.
Do Componente 4 da Política Nacional da Biodiversidade - Monitoramento, Avaliação,
Prevenção e Mitigação de Impactos sobre a Biodiversidade.
13. Objetivo Geral: estabelecer formas para o desenvolvimento de sistemas e
procedimentos de monitoramento e de avaliação do estado da biodiversidade brasileira e das
pressões antrópicas sobre a biodiversidade, para a prevenção e a mitigação de impactos sobre
a biodiversidade.
13.1. Primeira diretriz: Monitoramento da biodiversidade. Monitoramento do estado das
pressões e das respostas dos componentes da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
13.1.1. Apoiar o desenvolvimento de metodologias e de indicadores para o
monitoramento dos componentes da biodiversidade dos ecossistemas e dos impactos
ambientais responsáveis pela sua degradação, inclusive aqueles causados pela introdução de
espécies exóticas invasoras e de espécies-problema.
13.1.2. Implantar e fortalecer sistema de indicadores para monitoramento permanente da
biodiversidade, especialmente de espécies ameaçadas e nas unidades de conservação, terras
indígenas, terras de quilombolas, áreas de manejo de recursos biológicos, reservas legais e nas
áreas indicadas como prioritárias para conservação.
13.1.3. Integrar o sistema de monitoramento da biodiversidade com os sistemas de
monitoramento de outros recursos naturais existentes.
13.1.4. Expandir, consolidar e atualizar um sistema de vigilância e proteção para todos os
biomas, incluindo o Sistema de Vigilância da Amazônia, com transparência e controle social e
com o acesso permitido às informações obtidas pelo sistema por parte das comunidades
envolvidas, incluindo as populações localmente inseridas e as instituições de pesquisa ou
ensino.
13.1.5. Instituir sistema de monitoramento do impacto das mudanças globais sobre
distribuição, abundância e extinção de espécies.
13.1.6. Implantar sistema de identificação, monitoramento e controle das áreas de reserva
legal e de preservação permanente.
13.1.7. Estimular o desenvolvimento de programa de capacitação da população local,
visando à sua participação no monitoramento da biodiversidade.
13.1.8. Apoiar as ões do órgão oficial responsável pela sanidade e pela fitossanidade
com vistas em monitorar espécies exóticas invasoras para prevenir e mitigar os impactos de
pragas e doenças na biodiversidade.
13.1.9. Realizar o mapeamento periódico de áreas naturais remanescentes em todos os
biomas.
13.1.10. Promover o automonitoramento e sua publicidade.
13.2. Segunda diretriz: Avaliação, prevenção e mitigação de impactos sobre os
componentes da biodiversidade. Estabelecimento de procedimentos de avaliação, prevenção e
mitigação de impactos sobre os componentes da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
13.2.1. Criar capacidade nos órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental no país
para avaliação de impacto sobre a biodiversidade.
13.2.2. Identificar e avaliar as políticas públicas e não-governamentais que afetam
negativamente a biodiversidade.
13.2.3. Fortalecer os sistemas de licenciamento, fiscalização e monitoramento de
atividades relacionadas com a biodiversidade.
13.2.4. Promover a integração entre o Zoneamento Ecológico-Econômico e as ações de
licenciamento ambiental, especialmente por intermédio da realização de Avaliações
Ambientais Estratégicas feitas com uma escala regional.
13.2.5. Apoiar políticas, programas e projetos de avaliação, prevenção e mitigação de
impactos sobre a biodiversidade, inclusive aqueles relacionados com programas e planos de
desenvolvimento nacional, regional e local.
13.2.6. Apoiar a realização de análises de risco e estudos dos impactos da introdução de
espécies exóticas potencialmente invasoras, espécies potencialmente problema e outras que
ameacem a biodiversidade, as atividades econômicas e a saúde da população, e a criação e
implementação de mecanismos de controle.
13.2.7. Promover e aperfeiçoar ações de prevenção, controle e erradicação de espécies
exóticas invasoras e de espécies-problema.
13.2.8. Apoiar estudos de impacto da fragmentação de habitats sobre a manutenção da
biodiversidade.
13.2.9. Desenvolver estudos de impacto ambiental e implementar medidas de controle
dos riscos associados ao desenvolvimento biotecnológico sobre a biodiversidade,
especialmente quanto à utilização de organismos geneticamente modificados, quando
potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente.
13.2.10. Aperfeiçoar procedimentos e normas de coleta de espécies nativas com fins
técnico-científicos com vistas na mitigação de seu potencial impacto sobre a biodiversidade.
13.2.11. Desenvolver iniciativas de sensibilização e capacitação de entidades da
sociedade civil em práticas de monitoramento e fiscalização da utilização dos recursos
biológicos.
13.2.12. Promover, juntamente com os diversos atores envolvidos, o planejamento da
gestão da biodiversidade nas zonas de fronteiras agrícolas, visando a minimizar os impactos
ambientais sobre a biodiversidade.
13.2.13. Intensificar e garantir a eficiência do combate à caça ilegal e ao comércio ilegal
de espécies e de variedades agrícolas.
13.2.14. Desenvolver instrumentos de cobrança e aplicação de recursos auferidos pelo
uso de serviços ambientais para reduzir as pressões antrópicas sobre a biodiversidade.
13.2.15. Apoiar a realização de inventário das fontes de poluição da biodiversidade e de
seus níveis de risco nos biomas.
13.2.16. Apoiar ações de zoneamento e identificação de áreas críticas, por bacias
hidrográficas, para conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos.
13.2.18. Apoiar estudos de impacto sobre a biodiversidade nas diferentes bacias
hidrográficas, sobretudo nas matas ribeirinhas, cabeceiras, olhos d´água e outras áreas de
preservação permanente e em áreas críticas para a conservação de recursos hídricos.
13.2.19. Estabelecer mecanismos para determinar a realização de estudos de impacto
ambiental, inclusive Avaliação Ambiental Estratégica, em projetos e empreendimentos de
larga escala, inclusive os que possam gerar impactos agregados, que envolvam recursos
biológicos, inclusive aqueles que utilizem espécies exóticas e organismos geneticamente
modificados, quando potencialmente causadores de significativa degradação do meio
ambiente.
13.3. Terceira diretriz: Recuperação de ecossistemas degradados e dos componentes da
biodiversidade sobreexplotados. Estabelecimento de instrumentos que promovam a
recuperação de ecossistemas degradados e de componentes da biodiversidade
sobreexplotados.
Objetivos Específicos:
13.3.1. Promover estudos e programas adaptados para conservação e recuperação de
espécies ameaçadas ou sobreexplotadas e de ecossistemas sob pressão antrópica, de acordo
com o Princípio do Poluidor-Pagador.
13.3.2. Promover a recuperação, a regeneração e o controle da cobertura vegetal e dos
serviços ambientais a ela relacionados em áreas alteradas, degradadas e em processo de
desertificação e arenização, inclusive para a captura de carbono, de acordo com o Princípio do
Poluidor-Pagador.
13.3.3. Promover a recuperação de estoques pesqueiros sobreexplotados, inclusive pela
identificação de espécies alternativas para o redirecionamento do esforço de pesca.
13.3.4. Estimular as pesquisas paleoecológicas como estratégicas para a recuperação de
ecossistemas naturais.
13.3.5. Apoiar povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais na elaboração
e na aplicação de medidas corretivas em áreas degradadas, onde a biodiversidade tenha sido
reduzida.
13.3.6. Identificar e apoiar iniciativas, programas, tecnologias e projetos de obtenção de
germoplasma, reintrodução e translocação de espécies nativas, especialmente as ameaçadas,
observando estudos e indicações referentes à sanidade dos ecossistemas.
13.3.7. Apoiar iniciativas nacionais e estaduais de promoção do estudo e de difusão de
tecnologias de restauração ambiental e recuperação de áreas degradadas com espécies nativas
autóctones.
13.3.8. Apoiar criação e consolidação de bancos de germoplasma como instrumento
adicional de recuperação de áreas degradadas.
13.3.9. Criar unidades florestais nos estados brasileiros, para produção e fornecimento de
sementes e mudas para a execução de projetos de restauração ambiental e recuperação de
áreas degradadas, apoiados por universidades e centros de pesquisa no país.
13.3.10. Promover mecanismos de coordenação das iniciativas governamentais e de
apoio às iniciativas não-governamentais de proteção das áreas em recuperação natural.
13.3.11. Promover recuperação, revitalização e conservação da biodiversidade nas
diferentes bacias hidrográficas, sobretudo nas matas ribeirinhas, nas cabeceiras, nos olhos
d’água, em outras áreas de preservação permanente e em áreas críticas para a conservação de
recursos hídricos.
13.3.12. Promover ações de recuperação e restauração dos ecossistemas degradados e
dos componentes da biodiversidade marinha sobreexplotados.
Do Componente 5 da Política Nacional da Biodiversidade - Acesso aos Recursos
Genéticos e aos Conhecimentos Tradicionais Associados e Repartição de Benefícios.
14. Objetivo Geral: Permitir o acesso controlado aos recursos genéticos, aos
componentes do patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais associados com vistas
à agregação de valor mediante pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico e de forma
que a sociedade brasileira, em particular os povos indígenas, quilombolas e outras
comunidades locais, possam compartilhar, justa e eqüitativamente, dos benefícios derivados
do acesso aos recursos genéticos, aos componentes do patrimônio genético e aos
conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade.
14.1. Primeira diretriz: Acesso aos recursos genéticos e repartição de benefícios
derivados da utilização dos recursos genéticos. Estabelecimento de um sistema controlado de
acesso e de repartição justa e eqüitativa de benefícios oriundos da utilização de recursos
genéticos e de componentes do patrimônio genético, que promova a agregação de valor
mediante pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico e que contribua para a
conservação e para a utilização sustentável da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
14.1.1. Regulamentar e aplicar lei específica, e demais legislações necessárias,
elaboradas com ampla participação da sociedade brasileira, em particular da comunidade
acadêmica, do setor empresarial, dos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades
locais, para normalizar a relação entre provedor e usuário de recursos genéticos, de
componentes do patrimônio genético e de conhecimentos tradicionais associados, e para
estabelecer as bases legais para repartição justa e eqüitativa de benefícios derivados da
utilização destes.
14.1.2. Estabelecer mecanismos legais e institucionais para maior publicidade e para
viabilizar a participação da sociedade civil (organizações não-governamentais, povos
indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, setor acadêmico e setor privado) nos
conselhos, comitês e órgãos colegiados que tratam do tema de gestão dos recursos genéticos e
dos componentes do patrimônio genético.
14.1.3. Identificar as necessidades e os interesses de povos indígenas, quilombolas,
outras comunidades locais, proprietários de terras, empresas tecnológicas nacionais e de
agentes econômicos, órgãos governamentais, instituições de pesquisa e de desenvolvimento
na regulamentação de sistema de acesso e de repartição justa e eqüitativa de benefícios
oriundos da utilização de recursos genéticos e dos componentes do patrimônio genético.
14.1.4. Definir as normas e os procedimentos para a coleta, o armazenamento e para a
remessa de recursos genéticos e de componentes do patrimônio genético para pesquisa e
bioprospecção.
14.1.5. Implantar e aperfeiçoar mecanismos de acompanhamento, de controle social e de
negociação governamental nos resultados da comercialização de produtos e processos
oriundos da bioprospecção, associados à reversão de parte dos benefícios para fundos
públicos destinados à pesquisa, à conservação e à utilização sustentável da biodiversidade.
14.1.6. Estabelecer contratos de exploração econômica da biodiversidade, cadastrados e
homologados pelo governo federal, com cláusulas claras e objetivas, e com cláusulas de
repartição de benefícios aos detentores dos recursos genéticos, dos componentes do
patrimônio genético e dos conhecimentos tradicionais associados acessados.
14.1.7. Apoiar ações para implementação de infra-estrutura, de recursos humanos e
recursos materiais em conselhos e órgãos colegiados que tratam da gestão de patrimônio
genético, inclusive o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético.
14.2. Segunda diretriz: Proteção de conhecimentos, inovações e práticas de povos
indígenas, de quilombolas e de outras comunidades locais e repartição dos benefícios
decorrentes do uso dos conhecimentos tradicionais associados à
biodiversidade. Desenvolvimento de mecanismos que assegurem a proteção e a repartição
justa e eqüitativa dos benefícios derivados do uso de conhecimentos, inovações e práticas de
povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, relevantes à conservação e à
utilização sustentável da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
14.2.1. Estabelecer e implementar um regime legal sui generis de proteção a direitos
intelectuais coletivos relativos à biodiversidade de povos indígenas, quilombolas e outras
comunidades locais, com a ampla participação destas comunidades e povos.
14.2.2. Estabelecer e implementar instrumentos econômicos e regime jurídico específico
que possibilitem a repartição justa e eqüitativa de benefícios derivados do acesso aos
conhecimentos tradicionais associados, com a compensação econômica e de outros tipos para
os detentores dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade, segundo as
demandas por estes definidas e resguardando seus valores culturais.
14.2.3. Estabelecer e implementar mecanismos para respeitar, preservar, resgatar,
proteger a confidencialidade e manter o conhecimento, as inovações e as práticas de povos
indígenas, quilombolas e outras comunidades locais.
14.2.4. Regulamentar e implementar mecanismos e instrumentos jurídicos que garantam
aos povos indígenas, aos quilombolas e às outras comunidades locais a participação nos
processos de negociação e definição de protocolos para acesso aos conhecimentos, inovações
e práticas associados à biodiversidade e repartição dos benefícios derivados do seu uso.
14.2.5. Desenvolver e implementar mecanismos sui generis de proteção do
conhecimento tradicional e de repartição justa e eqüitativa de benefícios para os povos
indígenas, quilombolas, outras comunidades locais detentores de conhecimentos associados à
biodiversidade, com a participação destes e resguardados seus interesses e valores.
14.2.6. Estabelecer iniciativas visando à gestão e ao controle participativos de povos
indígenas, quilombolas e outras comunidades locais na identificação e no cadastramento,
quando couber, de conhecimentos tradicionais, inovações e práticas associados à utilização
dos componentes da biodiversidade.
14.2.7. Estabelecer, quando couber e com a participação direta dos detentores do
conhecimento tradicional, mecanismo de cadastramento de conhecimentos tradicionais,
inovações e práticas, associados à biodiversidade, de povos indígenas, quilombolas e outras
comunidades locais, e de seu potencial para uso comercial, como uma das formas de prova
quanto à origem destes conhecimentos.
14.2.8. Promover o reconhecimento e valorizar os direitos de povos indígenas,
quilombolas e outras comunidades locais, quanto aos conhecimentos tradicionais associados à
biodiversidade e da relação de mútua dependência entre diversidade etnocultural e
biodiversidade.
14.2.9. Elaborar e implementar código de ética para trabalho com povos indígenas,
quilombolas e outras comunidades locais, com a participação destes.
14.2.10. Assegurar o reconhecimento dos direitos intelectuais coletivos de povos
indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, e a necessária repartição de benefícios
pelo uso de conhecimento tradicional associado à biodiversidade em seus territórios.
Do Componente 6 da Política Nacional da Biodiversidade - Educação, Sensibilização
Pública, Informação e Divulgação sobre Biodiversidade.
15. Objetivo Geral: Sistematizar, integrar e difundir informações sobre a biodiversidade,
seu potencial para desenvolvimento e a necessidade de sua conservação e de sua utilização
sustentável, bem como da repartição dos benefícios derivados da utilização de recursos
genéticos, de componentes do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado,
nos diversos níveis de educação, bem como junto à população e aos tomadores de decisão.
15.1. Primeira diretriz: Sistemas de informação e divulgação. Desenvolvimento de
sistema nacional de informação e divulgação de informações sobre biodiversidade.
Objetivos Específicos:
15.1.1. Difundir informações para todos os setores da sociedade sobre biodiversidade
brasileira.
15.1.2. Facilitar o acesso à informação e promover a divulgação da informação para a
tomada de decisões por parte dos diferentes produtores e usuários de bens e serviços advindos
da biodiversidade.
15.1.3. Instituir e manter permanentemente atualizada uma rede de informação sobre
gestão da biodiversidade, promovendo e facilitando o acesso a uma base de dados disponível
em meio eletrônico, integrando-a com iniciativas já existentes.
15.1.4. Identificar e catalogar as coleções biológicas (herbários, coleções zoológicas, de
microrganismos e de germoplasma) existentes no país, seguida de padronização e integração
das informações sobre as mesmas.
15.1.5. Mapear e manter bancos de dados sobre variedade locais, parentes silvestres das
plantas nacionais cultivadas e de cultivares de uso atual ou potencial.
15.1.6. Instituir e implementar mecanismos para facilitar o acesso às informações sobre
coleções de componentes da biodiversidade brasileira existentes no exterior e, quando couber,
a repatriação do material associado à informação.
15.1.7. Apoiar e divulgar experiências de conservação e utilização sustentável da
biodiversidade, inclusive por povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais,
quando houver consentimento destes e desde que sejam resguardados os direitos sobre a
propriedade intelectual e o interesse nacional.
15.1.8. Divulgar os instrumentos econômicos, financeiros e jurídicos voltados para a
gestão da biodiversidade.
15.1.9. Organizar, promover a produção, distribuir e facilitar o acesso a materiais
institucionais e educativos sobre biodiversidade e sobre aspectos étnicos e culturais
relacionados à biodiversidade.
15.1.10. Promover a elaboração e a sistematização de estudos de casos e lições
aprendidas quanto à gestão sustentável da biodiversidade.
15.1.11. Criar mecanismos de monitoramento da utilização de dados, do acesso às redes
de bancos de dados e dos usuários dessas redes, visando à repartição dos benefícios oriundos
do uso das informações disponíveis na rede.
15.1.12. Promover e apoiar programas nacionais de publicações científicas sobre temas
referentes à biodiversidade, e incentivar a valorização das publicações nacionais relativas à
diversidade biológica das instituições ligadas à pesquisa e ao ensino.
15.2. Segunda diretriz: Sensibilização pública. Realização de programas e campanhas de
sensibilização sobre a biodiversidade.
Objetivos Específicos:
15.2.1. Promover e apoiar campanhas nacionais, regionais e locais para valorização e
difusão de conhecimentos sobre a biodiversidade, ressaltando a importância e o valor da
heterogeneidade dos diferentes biomas para a conservação e para a utilização sustentável da
biodiversidade.
15.2.2. Promover campanhas nacionais de valorização da diversidade cultural e dos
conhecimentos tradicionais sobre a biodiversidade.
15.2.3. Promover campanhas junto aos setores produtivos, especialmente os setores
agropecuário, pesqueiro e de exploração mineral, e ao de pesquisas sobre a importância das
reservas legais e áreas de preservação permanentes no processo de conservação da
biodiversidade.
15.2.4. Criar novos estímulos, tais como prêmios e concursos, que promovam o
envolvimento das populações na defesa das espécies ameaçadas e dos biomas submetidos a
pressão antrópica, levando-se em consideração as especificidades regionais.
15.2.5. Promover e apoiar a sensibilização e a capacitação de tomadores de decisão,
formadores de opinião e do setor empresarial quanto à importância da biodiversidade.
15.2.6. Estimular a atuação da sociedade civil organizada para a condução de iniciativas
em educação ambiental relacionadas à biodiversidade.
15.2.7. Divulgar informações sobre conhecimentos tradicionais, inovações e práticas de
povos indígenas, quilombolas e outras de comunidades locais e sua importância na
conservação da biodiversidade, quando houver consentimento destes.
15.2.8. Sensibilizar povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais sobre a
importância do conhecimento que detêm sobre a biodiversidade, possibilitando ações de
conservação, de utilização sustentável da biodiversidade e de repartição dos benefícios
decorrentes do uso dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade.
15.2.9. Divulgar a importância da interação entre a gestão da biodiversidade e a saúde
pública.
15.2.10. Promover sensibilização para a gestão da biodiversidade em áreas de uso
público.
15.2.11. Desenvolver, implementar e divulgar indicadores que permitam avaliar e
acompanhar a evolução do grau de sensibilização da sociedade quanto à biodiversidade.
15.2.12. Promover a integração das ações de fiscalização do meio ambiente com
programas de educação ambiental, no que se refere à biodiversidade.
15.2.13. Promover cursos e treinamentos para jornalistas sobre conceitos de gestão da
biodiversidade.
15.3. Terceira diretriz: Incorporação de temas relativos à conservação e à utilização
sustentável da biodiversidade na educação. Integração de temas relativos à gestão da
biodiversidade nos processos de educação.
Objetivos Específicos:
15.3.1. Fortalecer o uso do tema biodiversidade como conteúdo do tema transversal meio
ambiente proposto por parâmetros e diretrizes curriculares nas políticas de formação
continuada de professores.
15.3.2. Promover articulação entre os órgãos ambientais e as instituições educacionais,
para atualização contínua das informações sobre a biodiversidade.
15.3.3. Introduzir o tema "biodiversidade" nas atividades de extensão comunitária.
15.3.4. Incorporar na educação formal os princípios da Convenção sobre Diversidade
Biológica e da etnobiodiversidade, atendendo ao princípio da educação diferenciada para
povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais.
15.3.5. Estimular parcerias, pesquisas e demais atividades entre universidades,
organizações não-governamentais, órgãos profissionais e iniciativa privada para o
aprimoramento contínuo dos profissionais de educação.
15.3.6. Promover a formação inicial e continuada dos profissionais de educação
ambiental, no que se refere à biodiversidade.
15.3.7. Promover a capacitação dos cnicos de extensão rural e dos agentes de saúde
sobre o tema "biodiversidade".
15.3.8. Promover iniciativas para articulação das instituições envolvidas com educação
ambiental (instituições de ensino, de pesquisa, de conservação e da sociedade civil) em uma
rede de centros de educação ambiental, para tratar do tema "biodiversidade".
15.3.9. Estabelecer a integração entre os ministérios e os demais órgãos de governo para
a articulação das políticas educacionais de gestão da biodiversidade.
15.3.10. Fortalecer a Política Nacional de Educação Ambiental.
Do Componente 7 da Política Nacional da Biodiversidade - Fortalecimento Jurídico e
Institucional para a Gestão da Biodiversidade.
16. Objetivo Geral: Promover meios e condições para o fortalecimento da infra-estrutura
de pesquisa e gestão, para o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia, para a formação
e fixação de recursos humanos, para mecanismos de financiamento, para a cooperação
internacional e para a adequação jurídica visando à gestão da biodiversidade e à integração e à
harmonização de políticas setoriais pertinentes à biodiversidade.
16.1. Primeira diretriz: Fortalecimento da infra-estrutura de pesquisa e gestão da
biodiversidade. Fortalecimento e ampliação da infra-estrutura das instituições brasileiras,
públicas e privadas, envolvidas com o conhecimento e com a gestão da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
16.1.1. Recuperar a capacidade dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente -
SISNAMA para executar sua missão em relação ao licenciamento e à fiscalização da
biodiversidade.
16.1.2. Aprimorar a definição das competências dos diversos órgãos de governo de
forma a prevenir eventuais conflitos de competência quando da aplicação da legislação
ambiental pertinente à biodiversidade.
16.1.3. Fortalecer o conjunto de unidades de conservação e sua integração no
SISNAMA.
16.1.4. Estimular iniciativas para a criação de bases de pesquisa de campo permanente
em unidades de conservação de proteção integral em cada um dos biomas brasileiros.
16.1.5. Promover o fortalecimento da infra-estrutura e a modernização das instituições
brasileiras envolvidas com o inventário e a caracterização da biodiversidade, tais como
coleções zoológicas, botânicas e de microrganismos, bancos de germoplasma e núcleos de
criação animal.
16.1.6. Fortalecer instituições científicas com programas de pesquisa, criando, quando
necessário, centros específicos em cada um dos biomas visando a fortalecer a pesquisa sobre
recursos biológicos e suas aplicações.
16.1.7. Adequar a infra-estrutura das instituições que trabalham com recursos genéticos,
componentes do patrimônio genético e conhecimentos tradicionais para conservar de forma
segura, a curto, a médio e em longo prazo, espécies de interesse socioeconômico e as culturas
de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais do país.
16.1.8. Apoiar programas de pesquisa e de infra-estrutura voltados para o conhecimento
tradicional de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, com a participação
destes.
16.1.9. Apoiar a participação efetiva de especialistas das diferentes regiões do país em
programas de seqüenciamento genético e outros programas para o desenvolvimento de
tecnologias a partir da utilização de recursos biológicos.
16.1.10. Formalizar e fortalecer centros de referência depositários de organismos
associados a produtos e processos patenteados no Brasil.
16.1.11. Promover a integração de programas e ações da esfera federal, das estaduais e
das municipais e da sociedade civil organizada, relacionados à pesquisa, à formação de
recursos humanos, a programas e projetos em áreas relacionadas à biodiversidade.
16.1.12. Incentivar a formação e consolidação de redes nacionais de pesquisa,
desenvolvimento tecnológico e gestão da biodiversidade, como forma de promover e facilitar
o intercâmbio sobre biodiversidade entre diferentes setores da sociedade.
16.1.13. Criar estímulos à gestão da biodiversidade, tais como prêmios a pesquisas e
projetos de conservação e utilização sustentável.
16.1.14. Criar estímulos para organizações não-governamentais que atuam na proteção
da biodiversidade.
16.1.15. Apoiar a criação de centros de documentação especializados para cada um dos
biomas brasileiros para facilitar a cooperação científica dentro e fora do país.
16.1.16. Estimular o desenvolvimento de programa de apoio a publicações científicas
sobre a biodiversidade brasileira, particularmente guias de campo, chaves taxonômicas,
catalogação eletrônica de floras e faunas, revisões sistemáticas, monografias e estudos
etnobiológicos.
16.2. Segunda diretriz: Formação e fixação de recursos humanos. Promoção de
programas de formação, atualização e fixação de recursos humanos, inclusive a capacitação
de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, para a ampliação e o domínio
dos conhecimentos e das tecnologias necessárias à gestão da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
16.2.1. Instituir programas de formação, atualização e fixação de recursos humanos em
instituições voltadas para o inventário, a caracterização, a classificação e a gestão da
biodiversidade dos diversos biomas do país.
16.2.2. Reduzir as disparidades regionais, estimulando a capacitação humana e
institucional em gestão da biodiversidade, inclusive em biotecnologia, promovendo a criação
de mecanismos diferenciados para a contratação imediata nas instituições de ensino e
pesquisa em regiões carentes e realizando a fixação de profissionais envolvidos com a
capacitação em pesquisa e gestão da biodiversidade.
16.2.3. Fortalecer a pós-graduação ou os programas de doutorado em instituições de
pesquisa nos temas relacionados aos objetivos da Convenção sobre Diversidade Biológica.
16.2.4. Apoiar a capacitação e a atualização de povos indígenas, quilombolas e outras
comunidades locais quanto à gestão da biodiversidade, especialmente para agregação de valor
e comercialização de produtos da biodiversidade derivados de técnicas tradicionais
sustentáveis.
16.2.5. Apoiar formação ou aperfeiçoamento em gestão da biodiversidade de técnicos
que atuem em projetos ou empreendimentos com potencial impacto ambiental.
16.2.6. Apoiar iniciativas de ensino a distância em áreas relacionadas à biodiversidade.
16.2.7. Promover a ampla divulgação dos termos da legislação de acesso aos recursos
genéticos, aos componentes do patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais
associados junto aos setores relacionados a esta temática.
16.2.8. Promover cursos e treinamentos para servidores públicos, inclusive juízes,
membros do Ministério Público, polícia federal, civil e militar nos campos de gestão e
proteção da biodiversidade.
16.2.9. Promover e apoiar a formação de recursos humanos voltados para o
desenvolvimento e a disseminação de redes de informação sobre biodiversidade.
16.2.10. Capacitar pessoal para a gestão da biodiversidade em unidades de conservação.
16.2.11. Promover eventos regionais para os povos indígenas, quilombolas e outras
comunidades locais com o objetivo de divulgar e esclarecer os termos da legislação de acesso
a recursos genéticos, e capacitar agentes locais.
16.2.12. Estimular a cooperação entre governo, universidades, centros de pesquisa, setor
privado e organizações da sociedade civil na elaboração de modelos de gestão da
biodiversidade.
16.2.13. Apoiar a cooperação entre o setor público e o privado para formação e fixação
de recursos humanos voltados para o desempenho de atividades de pesquisa em gestão da
biodiversidade, especialmente no que tange à utilização de recursos biológicos, manutenção e
utilização dos bancos de germoplasma.
16.3. Terceira diretriz: Acesso à tecnologia e transferência de tecnologia. Promoção do
acesso à tecnologia e da transferência de tecnologia científica nacional e internacional sobre a
gestão da biodiversidade brasileira.
Objetivos Específicos:
16.3.1. Criar e apoiar programas que promovam a transferência e a difusão de
tecnologias em gestão da biodiversidade.
16.3.2. Apoiar o intercâmbio de conhecimentos e tecnologias em temas selecionados e
em áreas definidas como prioritárias para a gestão da biodiversidade, inclusive com centros de
referência internacionais e estrangeiros.
16.3.3. Estabelecer mecanismos facilitadores do processo de intercâmbio e geração de
conhecimento biotecnológico com seus potenciais usuários, resguardados os direitos sobre a
propriedade intelectual.
16.3.4. Promover o aperfeiçoamento do arcabouço legal brasileiro no que diz respeito ao
acesso à tecnologia e à transferência de tecnologias.
16.3.5. Estabelecer iniciativa nacional para disseminar o uso de tecnologias de domínio
público úteis à gestão da biodiversidade.
16.3.6. Implantar unidades demonstrativas de utilização de tecnologias para conservação
e utilização sustentável da biodiversidade.
16.3.7. Promover a cooperação para a certificação de tecnologias transferidas dos países
desenvolvidos para o país.
16.3.8. Definir e implementar normas e procedimentos para o intercâmbio de tecnologias
de utilização de recursos genéticos e biológicos, com transparência e assegurando os
interesses nacionais, da comunidade acadêmica e dos povos indígenas, quilombolas e outras
das comunidades locais.
16.4. Quarta diretriz: Mecanismos de financiamento. Integração, desenvolvimento e
fortalecimento de mecanismos de financiamento da gestão da biodiversidade.
Objetivos Específicos:
16.4.1. Fortalecer os fundos existentes de financiamento para a gestão da biodiversidade.
16.4.2. Estimular a criação de fundos de investimentos para a gestão da biodiversidade,
incentivando inclusive a participação do setor empresarial.
16.4.3. Apoiar estudo para a criação de um fundo fiduciário ou outros mecanismos
equivalentes, capazes de garantir a estabilidade financeira para implementação e manutenção
de unidades de conservação, inclusive para regularização fundiária.
16.4.4. Estimular a criação de fundos ou outros mecanismos, geridos de forma
participativa por povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, que promovam a
repartição justa e eqüitativa de benefícios, monetários ou não, decorrentes do acesso aos
recursos genéticos, aos componentes do patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais
associados.
16.4.5. Fortalecer a atuação em prol da biodiversidade dos órgãos estaduais de fomento à
pesquisa em todos os estados.
16.4.6. Promover mecanismos que visem a assegurar a previsão e a aplicação de recursos
orçamentários bem como de outras fontes para a gestão da biodiversidade.
16.4.7. Estimular a criação de linhas de financiamento por parte dos órgãos de fomento à
pesquisa, direcionadas à implementação dos planos de pesquisa e à gestão da biodiversidade
em unidades de conservação e em seu entorno.
16.4.8. Estimular a criação de linhas de financiamento para empreendimentos
cooperativos e para pequenos e médios produtores rurais que usem os recursos da
biodiversidade de forma sustentável.
16.4.9. Estimular a participação do setor privado em investimentos na gestão da
biodiversidade do país.
16.4.10. Estimular a criação de mecanismos econômicos e fiscais que incentivem o setor
empresarial a investir no inventário e na pesquisa sobre conservação e utilização sustentável
da biodiversidade do país, em parceria com instituições de pesquisa e setor público.
16.4.11. Fomentar mediante incentivos econômicos, a conservação e a utilização
sustentável da biodiversidade nas áreas sob domínio privado.
16.5. Quinta diretriz: Cooperação internacional. Promoção da cooperação internacional
relativa à gestão da biodiversidade, com o fortalecimento de atos jurídicos internacionais.
Objetivos Específicos:
16.5.1. Fortalecer a preparação e a participação de delegações brasileiras em negociações
internacionais relacionadas aos temas da biodiversidade.
16.5.2. Promover a implementação de acordos e convenções internacionais relacionados
com a gestão da biodiversidade, com atenção especial para a Convenção sobre Diversidade
Biológica e seus programas e iniciativas.
16.5.3. Estabelecer sinergias visando à implementação das convenções ambientais
assinadas pelo país.
16.5.4. Apoiar a negociação de acordos e convênios, justos e com benefícios para o país,
para o intercâmbio de conhecimentos e transferências de tecnologia com centros de pesquisa
internacionais e estrangeiros.
16.5.5. Fortalecer a cooperação internacional em pesquisas, programas e projetos
relacionados com o conhecimento e com a gestão da biodiversidade, e agregação de valor aos
seus componentes, em conformidade com as diretrizes do Componente 5.
16.5.6. Apoiar a participação dos centros de pesquisa nacionais em redes internacionais
de pesquisa, desenvolvimento de tecnologias e programas relacionados ao conhecimento e à
gestão da biodiversidade.
16.5.7. Identificar e estimular a utilização de mecanismos constantes de acordos
internacionais que possam beneficiar a conservação e a utilização sustentável da
biodiversidade, incluindo a utilização do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.
16.6. Sexta diretriz: Fortalecimento do marco-legal e integração de políticas
setoriais. Promoção de ações visando ao fortalecimento da legislação brasileira sobre a
biodiversidade e da articulação, da integração e da harmonização de políticas setoriais.
Objetivos Específicos:
16.6.1. Promover o levantamento e a avaliação de todo o quadro normativo relativo à
biodiversidade no Brasil, com vistas em propor a adequação para a gestão da biodiversidade.
16.6.2. Consolidar a legislação brasileira sobre a biodiversidade.
16.6.3. Promover a articulação, a integração e a harmonização de políticas setoriais
relevantes para a conservação da biodiversidade, a utilização sustentável de seus componentes
e a repartição de benefícios derivados da utilização de recursos genéticos, de componentes do
patrimônio genético e de conhecimento tradicional associado.
17. ARCABOUÇO JURÍDICO INSTITUCIONAL
17.1. Muitas iniciativas institucionais em andamento no Brasil têm relação com os
propósitos da Convenção sobre Diversidade Biológica - CDB e com as diretrizes e objetivos
desta Política Nacional da Biodiversidade. Planos, políticas e programas setoriais necessitam
de ser integrados, de forma a evitar-se a duplicação ou o conflito entre ações. A Política
Nacional da Biodiversidade requer que mecanismos participativos sejam fortalecidos ou
criados para que se articule a ação da sociedade em prol dos objetivos da CDB. A
implementação desta política depende da atuação de diversos setores e ministérios do
Governo Federal, segundo suas competências legais, bem como dos Governos Estaduais, do
Distrito Federal, dos Governos Municipais e da sociedade civil.
17.2. Tendo em vista o conjunto de atores e políticas públicas que, direta ou
indiretamente, guardam interesse com a gestão da biodiversidade e, portanto, com os
compromissos assumidos pelo Brasil na implementação da CDB, é necessário que a
implementação da Política propicie a criação ou o fortalecimento de arranjos institucionais
que assegurem legitimidade e sustentabilidade no cumprimento dos objetivos da CDB, no que
se refere à conservação e à utilização sustentável da biodiversidade e à repartição justa e
eqüitativa dos benefícios decorrentes de sua utilização.
17.3. Na implementação da Política Nacional da Biodiversidade, caberá ao Ministério do
Meio Ambiente:
a) articular as ões da Política Nacional da Biodiversidade no âmbito do SISNAMA e
junto aos demais setores do governo e da sociedade;
b) acompanhar e avaliar a execão dos componentes da Política Nacional da
Biodiversidade e elaborar relatórios nacionais sobre biodiversidade;
c) monitorar, inclusive com indicadores, a execução das ações previstas na Política
Nacional da Biodiversidade;
d) formular e implementar programas e projetos em apoio à execução das ações previstas
na Política Nacional da Biodiversidade e propor e negociar recursos financeiros;
e) articular-se com os demais ministérios afetos aos temas tratados para a elaboração e
encaminhamento de propostas de criação ou modificação de instrumentos legais necessários à
boa execução da Política Nacional da Biodiversidade;
f) promover a integração de políticas setoriais para aumentar a sinergia na
implementação de ações direcionadas à gestão sustentável da biodiversidade (conservação,
utilização sustentável e repartição de benefícios), evitando que estas sejam conflituosas; e
g) estimular a cooperação interinstitucional e internacional para a melhoria da
implementação das ações de gestão da biodiversidade.
17.4. A implementação da Política Nacional da Biodiversidade requer instância
colegiada que busque o cumprimento dos interesses dessa Política Nacional da Biodiversidade
junto ao governo federal, zele pela descentralização da execução das ações e vise assegurar a
participação dos setores interessados.
17.5. Buscará, igualmente, essa instância colegiada cuidar para que os princípios e os
objetivos da Política Nacional da Biodiversidade sejam cumpridos, prestando assistência
técnica em apoio aos agentes públicos e privados responsáveis pela execução de seus
componentes no território nacional.
17.6. O Ministério do Meio Ambiente, por intermédio do Programa Nacional da
Diversidade Biológica - Pronabio, instituído pelo Decreto n
o
1.354, de 29 de dezembro de
1994, coordenará a implementação da Política Nacional da Biodiversidade, mediante a
promoção da parceria entre o Poder Público e a sociedade civil para o conhecimento, a
conservação da biodiversidade, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição
justa e eqüitativa dos benefícios derivados de sua utilização.
ANEXO E – Decreto nº 4.946, de 31 de dezembro de 2003
418
DECRETO Nº 4.946, DE 31 DE DEZEMBRO DE 2003.
Altera, revoga e acrescenta dispositivos ao
Decreto n
o
3.945, de 28 de setembro de 2001,
que regulamenta a Medida Provisória n
o
2.186-16, de 23 de agosto de 2001.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,
inciso IV, da Constituição,
DECRETA:
Art. 1º O Decreto nº 3.945, de 28 de setembro de 2001, passa a vigorar com as seguintes
alterações:
"Art. 8º Poderá obter as autorizações de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas "a" e "b", da
Medida Provisória 2.186-16, de 2001, a instituição que atenda aos seguintes requisitos,
entre outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de Gestão:
I - comprovação de que a instituição:
a) constituiu-se sob as leis brasileiras;
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
II - qualificação técnica para o desempenho de atividades de acesso e remessa de amostra de
componente do patrimônio genético ou de acesso ao conhecimento tradicional associado,
quando for o caso;
................................................
V - apresentação das anuências prévias de que trata o art. 16, §§ e , da Medida Provisória
2.186-16, de 2001;
VI - apresentação de anuência prévia da comunidade indígena ou local envolvida, quando se
tratar de acesso a conhecimento tradicional associado, em observância aos arts. , § , art.
, inciso II, e art. 11, inciso IV, alínea "b", da Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001;
VII - indicação do destino das amostras de componentes do patrimônio genético ou das
informações relativas ao conhecimento tradicional associado;
418
BRASIL. Decreto 4.946, de 31 de dezembro 2003.
Altera, revoga e acrescenta dispositivos ao Decreto
3.945, de 28 de setembro de 2001, que regulamenta a Medida Provisória 2.186-16, de 23 de agosto de 2001.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4946.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
VIII - indicação da instituição fiel depositária credenciada pelo Conselho de Gestão onde
serão depositadas as sub-amostras de componente do patrimônio genético;
IX - quando se tratar de acesso com finalidade de pesquisa científica, apresentação de termo
de compromisso assinado pelo representante legal da instituição, comprometendo-se a acessar
patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado apenas para a finalidade
autorizada; e
X - apresentação de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de
Benefícios devidamente assinado pelas partes, quando se tratar de acesso ao patrimônio
genético ou ao conhecimento tradicional associado com potencial de uso econômico, como
ocorre nas atividades de bioprospecção e desenvolvimento tecnológico.
§ 1º Quando o acesso tiver a finalidade de pesquisa científica, a comprovação dos requisitos
constantes dos incisos II e III do caput deste artigo poderá ser dispensada pelo Conselho de
Gestão ou pela instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória 2.186-16,
de 2001.
§ 2º O projeto de pesquisa a que se refere o inciso IV do caput deste artigo deverá conter:
I - introdução, justificativa, objetivos, todos e resultados esperados a partir da amostra ou
da informação a ser acessada;
II - localização geográfica e cronograma das etapas do projeto, especificando o período em
que serão desenvolvidas as atividades de campo e, quando se tratar de acesso a conhecimento
tradicional associado, identificação das comunidades indígenas ou locais envolvidas;
III - discriminação do tipo de material ou informação a ser acessado e quantificação
aproximada de amostras a serem obtidas;
IV - indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das responsabilidades
e direitos de cada parte;
V - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso não
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq.
§ 3º A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo deverá encaminhar ao
Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória
2.186-16, de 2001, relatórios sobre o andamento do projeto, em prazos a serem fixados na
autorização de acesso." (NR)
"Art. 9º Poderá obter as autorizações especiais de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas "c" e
"d", da Medida Provisória 2.186-16, de 2001, para pesquisa científica sem potencial de uso
econômico, a instituição interessada em realizar acesso a componente do patrimônio genético
ou ao conhecimento tradicional associado que atenda aos seguintes requisitos, entre outros
que poderão ser exigidos pelo Conselho de Gestão:
I - comprovação de que a instituição:
a) constituiu-se sob as leis brasileiras;
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
II - qualificação técnica para o desempenho das atividades de acesso e remessa de amostra de
componente do patrimônio genético ou de acesso ao conhecimento tradicional associado,
quando for o caso;
III - estrutura disponível para o manuseio de amostras de componentes do patrimônio
genético;
IV - portfólio dos projetos e das atividades de rotina que envolvam acesso e remessa a
componentes do patrimônio genético desenvolvidas pela instituição;
V - apresentação das anuências prévias de que trata o art. 16, §§ e , da Medida Provisória
2.186-16, de 2001, quando se tratar de acesso a componente do patrimônio genético;
VI - apresentação de anuência prévia da comunidade indígena ou local envolvida, em
observância aos arts. , § , art. , inciso II, e art. 11, inciso IV, alínea "b", da Medida
Provisória 2.186-16, de 2001, quando se tratar de acesso a conhecimento tradicional
associado;
VII - indicação do destino do material genético ou das informações relativas ao conhecimento
tradicional associado e da equipe técnica e da infra-estrutura disponível para gerenciar os
termos de transferência de material a serem assinados previamente à remessa de amostra para
outra instituição nacional, pública ou privada, ou sediada no exterior;
VIII - termo de compromisso assinado pelo representante legal da instituição,
comprometendo-se a acessar patrimônio genético ou conhecimento tradicional associado
apenas para fins de pesquisa científica sem potencial de uso econômico.
§ 1º O portfólio a que se refere o inciso IV do caput deste artigo deverá trazer a descrição
sumária das atividades a serem desenvolvidas, bem como os projetos resumidos, com os
seguintes requisitos mínimos:
I - objetivos, material, métodos, uso pretendido e destino da amostra ou da informação a ser
acessada;
II - área de abrangência das atividades de campo e, quando se tratar de acesso a conhecimento
tradicional associado, identificação das comunidades indígenas ou locais envolvidas;
III - indicação das fontes de financiamento;
IV - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso não
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq.
§ 2º A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo deverá encaminhar ao
Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória
2.186-16, de 2001, relatórios cuja periodicidade será fixada na autorização, não podendo
exceder o prazo de doze meses.
§ 3º O relatório a que se refere o § 2
o
deverá conter, no mínimo:
I - informações detalhadas sobre o andamento dos projetos e atividades integrantes do
portfólio;
II - indicação das áreas onde foram realizadas as coletas, por meio de coordenadas
geográficas;
III - listagem quantitativa e qualitativa das espécies ou morfotipos coletados em cada área;
IV - cópia dos registros das informações relativas ao conhecimento tradicional associado;
V - comprovação do depósito das sub-amostras em instituição fiel depositária credenciada
pelo Conselho de Gestão;
VI - apresentação dos Termos de Transferência de Material;
VII - indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das
responsabilidades e direitos de cada parte; e
VIII - resultados preliminares.
§ 4º A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo poderá, durante a
vigência da autorização, inserir novas atividades ou projetos no portfólio, desde que observe
as condições estabelecidas neste artigo e, no prazo de sessenta dias a partir do início da nova
atividade ou projeto, comunique a alteração realizada ao Conselho de Gestão ou à instituição
credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória 2.186-16, de 2001." (NR)
Art. 2º O Decreto nº 3.945, de 2001, passa a vigorar acrescido dos seguintes artigos:
"Art. 9-A. Poderá obter a autorização especial de que trata o art. 11, inciso IV, alínea "c", da
Medida Provisória 2.186-16, de 2001, para realizar o acesso ao patrimônio genético com a
finalidade de constituir e integrar coleções ex situ que visem a atividades com potencial de
uso econômico, como a bioprospecção ou o desenvolvimento tecnológico, a instituição que
atenda aos seguintes requisitos, entre outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de
Gestão:
I - comprovação de que a instituição:
a) constituiu-se sob as leis brasileiras;
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
II - qualificação técnica para desempenho das atividades de formação e manutenção de
coleções ex situ ou remessa de amostras de componentes do patrimônio genético, quando for
o caso;
III - estrutura disponível para o manuseio de amostras de componentes do patrimônio
genético;
IV - projeto de constituição de coleção ex situ a partir de atividades de acesso ao patrimônio
genético;
V - apresentação das anuências prévias de que trata o art. 16, §§ e , da Medida Provisória
2.186-16, de 2001;
VI - indicação do destino do material genético, bem como da equipe técnica e da infra-
estrutura disponíveis para gerenciar os termos de transferência de material a serem assinados
previamente à remessa de amostra para outra instituição nacional, pública ou privada;
VII - assinatura, pelo representante legal da instituição, de termo de compromisso pelo qual
comprometa-se a acessar patrimônio genético apenas para a finalidade de constituir coleção
ex situ; e
VIII - apresentação de modelo de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e Repartição
de Benefícios, a ser firmado com o proprietário da área pública ou privada ou com
representante da comunidade indígena e do órgão indigenista oficial.
§ 1º O modelo de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético de que trata o inciso VIII
do caput deste artigo deverá ser submetido ao Conselho de Gestão para aprovação, a qual
ficará condicionada ao atendimento do disposto no art. 28 da Medida Provisória 2.186-16,
de 2001, sem prejuízo de outros requisitos que poderão ser exigidos pelo Conselho.
§ 2º O projeto de que trata o inciso IV do caput deste artigo deverá trazer a descrição sumária
das atividades a serem desenvolvidas, com os seguintes requisitos mínimos:
I - objetivos, material, métodos, uso pretendido e destino da amostra a ser acessada;
II - área de abrangência das atividades de campo;
III - indicação das fontes de financiamento; e
IV - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso não
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq.
§ 3º A instituição beneficiada pela autorização especial de que trata este artigo deverá
encaminhar ao Conselho de Gestão relatórios cuja periodicidade será fixada na autorização,
não podendo exceder o prazo de doze meses.
§ 4º O relatório a que se refere o § 3
o
deverá indicar o andamento do projeto, contendo no
mínimo:
I - indicação das áreas onde foram realizadas as coletas por meio de coordenadas geográficas,
bem como dos respectivos proprietários;
II - listagem quantitativa e qualitativa das espécies ou morfotipos coletados em cada área;
III - comprovação do depósito das sub-amostras em instituição fiel depositária credenciada
pelo Conselho de Gestão;
IV - apresentação dos termos de transferência de material assinados;
V - indicação das fontes de financiamento, dos respectivos montantes e das responsabilidades
e direitos de cada parte; e
VI - resultados preliminares.
§ 5º O interessado em obter a autorização especial para constituição de coleção ex situ deverá
dirigir requerimento ao Conselho de Gestão, comprovando o atendimento aos requisitos
mencionados neste artigo e na Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001.
§ 6º A instituição que pretender realizar outros acessos a partir da coleção formada com base
na autorização especial de que trata este artigo deverá solicitar autorização específica para
tanto ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida
Provisória nº 2.186-16, de 2001." (NR)
"Art. 9-B. As autorizações especiais de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas "c" e "d", da
Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001, não se aplicam às atividades de acesso ao patrimônio
genético com potencial de uso econômico, como a bioprospecção ou o desenvolvimento
tecnológico, ressalvado o disposto no art. 9-A deste Decreto." (NR)
"Art. 9-C. As autorizações a que se referem os arts. , 9º e 9-A deste Decreto poderão
abranger o acesso e a remessa, isolada ou conjuntamente, de acordo com o pedido formulado
pela instituição interessada e com os termos da autorização concedida pelo Conselho de
Gestão ou pela instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória 2.186-16,
de 2001." (NR)
Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 4º Fica revogado o art. 12 do Decreto nº 3.945, de 28 de setembro de 2001.
Brasília, 31 de dezembro de 2003; 182º da Independência e 115º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Marina Silva
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 5.1.2004.
ANEXO F – Decreto nº 5.439, de 3 de maio de 2005
419
DECRETO Nº 5.439, DE 3 DE MAIO DE 2005.
nova redação aos arts. 2
o
e 4
o
do Decreto n
o
3.945, de 28 de setembro de 2001.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,
inciso IV, da Constituição,
DECRETA:
Art. 1
o
Os arts. 2
o
e 4
o
do Decreto n
o
3.945, de 28 de setembro de 2001, passam a
vigorar com a seguinte redação:
"Art. 2
o
O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético é composto por um representante e
dois suplentes dos seguintes órgãos e entidades da Administração Pública Federal, que detêm
competência sobre as matérias objeto da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001:
..................................................................................." (NR)
"Art. 4
o
O Plenário do Conselho de Gestão reunir-se-á com a presença de, no mínimo, dez
Conselheiros, e suas deliberações serão tomadas pela maioria absoluta dos votos dos
Conselheiros presentes.
.................................................................................." (NR)
Art. 2
o
Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 3 de maio de 2005; 184
o
da Independência e 117
o
da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Marina Silva
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 04.5.2005.
419
BRASIL. Decreto 5439, de 3 de maio 2005. nova redação aos arts. e do Decreto 3.945, de 28
de setembro de 2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-
2006/2005/Decreto/D5439.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
ANEXO G – Decreto nº 5.459, de 7 de junho de 2005
420
DECRETO Nº 5.459, DE 7 DE JUNHO DE 2005.
Regulamenta o art. 30 da Medida Provisória n
o
2.186-
16, de 23 de agosto de 2001,
disciplinando as sanções aplicáveis às
condutas e atividades lesivas ao patrimônio
genético ou ao conhec
imento tradicional
associado e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,
inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 30, § 1
o
, da Medida Provisória
n
o
2.186-16, de 23 de agosto de 2001,
DECRETA:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1
o
Considera-se infração administrativa contra o patrimônio genético ou ao
conhecimento tradicional associado toda ação ou omissão que viole as normas da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 23 de agosto de 2001, e demais disposições pertinentes.
Parágrafo único. Aplicam-se a este Decreto as definições constantes do art. 7
o
da
Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, e da Convenção sobre Diversidade Biológica,
promulgada pelo Decreto n
o
2.519, de 16 de março de 1998, bem como as orientações
técnicas editadas pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético.
Seção I
Do Processo Administrativo
Art. 2
o
As infrações contra o patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional
associado serão apuradas em processo administrativo próprio de cada autoridade competente,
mediante a lavratura de auto de infração e respectivos termos, assegurado o direito de ampla
defesa e ao contraditório.
Art. 3
o
Qualquer pessoa, constatando infração contra o patrimônio genético ou ao
conhecimento tradicional associado, poderá dirigir representação às autoridades relacionadas
no art. 4
o
, para efeito do exercício do seu poder de polícia.
420
BRASIL. Decreto 5.459, de 7 de junho de 2005. Regulamenta o art. 30 da Medida Provisória 2.186-16,
de 23 de agosto de 2001, disciplinando as sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas ao patrimônio
genético ou ao conhecimento tradicional associado e outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5459.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
Art. 4
o
São autoridades competentes para a fiscalização, na forma deste Decreto, os
agentes públicos do seguinte órgão e entidade, no âmbito de suas respectivas competências:
I - o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis -
IBAMA;
II - o Comando da Marinha, do Ministério da Defesa.
§ 1
o
Os titulares do órgão e entidade federal de que trata os incisos I e II do caput
poderão firmar convênios com os órgãos ambientais estaduais e municipais integrantes do
Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, para descentralizar as atividades descritas
no caput.
§ 2
o
O exercício da competência de fiscalização de que trata o caput pelo Comando da
Marinha ocorrerá no âmbito de águas jurisdicionais brasileiras e da plataforma continental
brasileira, em coordenação com os órgãos ambientais, quando se fizer necessário, por meio de
instrumentos de cooperação.
Art. 5
o
O agente público do órgão e entidade mencionados no art. 4
o
que tiver
conhecimento de infração prevista neste Decreto é obrigado a promover a sua apuração
imediata, sob pena de responsabilização.
Art. 6
o
O processo administrativo para apuração de infração contra o patrimônio
genético ou ao conhecimento tradicional associado deve observar os seguintes prazos
máximos:
I - vinte dias para o autuado oferecer defesa ou impugnação contra o auto de infração,
contados da data da ciência da autuação;
II - trinta dias para a autoridade competente julgar o auto de infração, contados da data
da ciência da autuação, apresentada ou não a defesa ou a impugnação;
III - vinte dias para o autuado recorrer da decisão condenatória à instância
hierarquicamente superior ao órgão autuante, contados da ciência da decisão de primeira
instância;
IV - vinte dias para o autuado recorrer da decisão condenatória de segunda instância ao
Conselho de Gestão do Patrimônio Genético; e
V - cinco dias para o pagamento de multa, contados da data do recebimento da
notificação.
Art. 7
o
O agente autuante, ao lavrar o auto de infração, indicará as sanções aplicáveis à
conduta, observando, para tanto:
I - a gravidade dos fatos, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências
para o patrimônio genético, o conhecimento tradicional associado, a saúde pública ou para o
meio ambiente;
II - os antecedentes do autuado, quanto ao cumprimento da legislação de proteção ao
patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado; e
III - a situação econômica do autuado.
Art. 8
o
A autoridade competente deve, de ofício ou mediante provocação,
independentemente do recolhimento da multa aplicada, minorar, manter ou majorar o seu
valor, respeitados os limites estabelecidos nos artigos infringidos, observado o disposto no art.
7
o
.
Art. 9
o
Em caso de reincidência, a multa será aplicada em dobro.
Parágrafo único. O reincidente não poderá gozar do benefício previsto no art. 25.
Seção II
Das Sanções Administrativas contra o Patrimônio Genético ou ao
Conhecimento Tradicional Associado
Art. 10. As infrações administrativas contra o patrimônio genético ou ao conhecimento
tradicional associado serão punidas com as seguintes sanções, aplicáveis, isolada ou
cumulativamente, às pessoas físicas ou jurídicas:
I - advertência;
II - multa;
III - apreensão das amostras de componentes do patrimônio genético e dos instrumentos
utilizados na sua coleta ou no processamento ou dos produtos obtidos a partir de informação
sobre conhecimento tradicional associado;
IV - apreensão dos produtos derivados de amostra de componente do patrimônio
genético ou do conhecimento tradicional associado;
V - suspensão da venda do produto derivado de amostra de componente do patrimônio
genético ou do conhecimento tradicional associado e sua apreensão;
VI - embargo da atividade;
VII - interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou empreendimento;
VIII - suspensão de registro, patente, licea ou autorização;
IX - cancelamento de registro, patente, licença ou autorização;
X - perda ou restrição de incentivo e benefício fiscal concedidos pelo governo;
XI - perda ou suspensão da participação em linha de financiamento em estabelecimento
oficial de crédito;
XII - intervenção no estabelecimento; e
XIII - proibição de contratar com a administração pública, por período de até cinco anos.
§ 1
o
Entende-se como produtos obtidos a partir de informação sobre conhecimento
tradicional associado, previstos no inciso III do caput, os registros, em quaisquer meios, de
informações relacionadas a este conhecimento.
§ 2
o
Se o autuado, com uma única conduta, cometer mais de uma infração, ser-lhe-ão
aplicadas, cumulativamente, as sanções a ela cominadas.
§ 3
o
As sanções previstas nos incisos I e III a XIII poderão ser aplicadas independente
da previsão única de pena de multa para as infrações administrativas descritas neste Decreto.
Art. 11. A sanção de advertência será aplicada às infrações de pequeno potencial
ofensivo, a critério da autoridade autuante, quando ela, considerando os antecedentes do
autuado, entender esta providência como mais educativa, sem prejuízo das demais sanções
previstas no art. 10.
Art. 12. A sanção de multa será aplicada nas hipóteses previstas neste Decreto e terá seu
valor arbitrado pela autoridade competente, podendo variar de:
I - R$ 200,00 (duzentos reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), quando se tratar de
pessoa física; ou
II - R$ 10.000,00 (dez mil reais) a R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais), se a
infração for cometida por pessoa jurídica, ou com seu concurso.
Art. 13. Os produtos, amostras, equipamentos, veículos, petrechos e demais instrumentos
utilizados diretamente na prática da infração terão sua destinação definida pelo Conselho de
Gestão do Patrimônio Genético, levando-se em conta os seguintes critérios:
I - sempre que possível, os produtos, amostras, equipamentos, veículos, petrechos e
instrumentos de que trata este artigo deverão ser doados a instituições científicas, culturais,
ambientalistas, educacionais, hospitalares, penais, militares, públicas ou outras entidades com
fins beneficentes;
II - quando a doação de que trata o inciso I o for recomendável, por motivo de saúde
pública, razoabilidade ou moralidade, os bens apreendidos serão destruídos ou leiloados,
garantida a sua descaracterização por meio da reciclagem, quando possível; ou
III - quando o material apreendido referir-se a conhecimento tradicional associado,
deverá ele ser devolvido à comunidade provedora, salvo se esta concordar com a doação às
entidades mencionadas no inciso I.
§ 1
o
As doações de que trata este artigo não eximem o donatário de solicitar a respectiva
autorização, caso deseje realizar acesso ao patrimônio genético ou ao conhecimento
tradicional associado a partir do material recebido em doação.
§ 2
o
Os valores arrecadados em leilão serão revertidos para os fundos previstos no art.
33 da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, na proporção prevista no art. 14 deste Decreto.
§ 3
o
Os veículos e as embarcações utilizados diretamente na prática da infração serão
confiados a fiel depositário na forma dos arts. 627 a 647, 651 e 652 da Lei n
o
10.406, de 10 de
janeiro de 2002, a critério da autoridade autuante, podendo ser liberados mediante
pagamento da multa.
Art. 14. Os valores arrecadados em pagamento das multas de que trata este Decreto
reverterão:
I - quando a infração for cometida em área sob jurisdição do Comando da Marinha:
a) cinqüenta por cento ao Fundo Naval; e
b) o restante, repartido igualmente entre o Fundo Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico, regulado pela Lei n
o
8.172, de 18 de janeiro de 1991, e o Fundo
Nacional de Meio Ambiente, criado pela Lei n
o
7.797, de 10 de julho de 1989;
II - nos demais casos os valores arrecadados serão repartidos, igualmente, entre o Fundo
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e o Fundo Nacional do Meio
Ambiente.
§ 1
o
Os recursos de que trata este artigo deverão ser utilizados exclusivamente na
conservação da diversidade biológica, incluindo a recuperação, criação e manutenção de
bancos depositários, o fomento à pesquisa científica, o desenvolvimento tecnológico
associado ao patrimônio genético e a capacitação de recursos humanos associados ao
desenvolvimento das atividades relacionadas ao uso e à conservação do patrimônio genético.
§ 2
o
Entende-se como utilizado na conservação da diversidade biológica, a aplicação dos
recursos repassados ao Fundo Naval na aquisição, operação, manutenção e conservação pelo
Comando da Marinha de meios utilizados na atividade de fiscalização de condutas e
atividades lesivas ao meio ambiente, dentre elas as lesivas ao patrimônio genético ou ao
conhecimento tradicional associado.
CAPÍTULO II
DAS INFRAÇÕES CONTRA O PATRIMÔNIO GENÉTICO
Art. 15. Acessar componente do patrimônio genético para fins de pesquisa científica
sem autorização do órgão competente ou em desacordo com a obtida:
Multa mínima de R$ 10.000 (dez mil reais) e máxima de R$ 100.000,00 (cem mil reais),
quando se tratar de pessoa jurídica, e multa mínima de R$ 200,00 (duzentos reais) e máxima
de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), quando se tratar de pessoa física.
§ 1
o
A pena prevista no caput será aplicada em dobro se o acesso ao patrimônio genético
for realizado para práticas nocivas ao meio ambiente ou práticas nocivas à saúde humana.
§ 2
o
Se o acesso ao patrimônio genético for realizado para o desenvolvimento de armas
biológicas e químicas, a pena prevista no caput será triplicada e deverá ser aplicada a sanção
de interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou empreendimento.
Art. 16. Acessar componente do patrimônio genético para fins de bioprospecção ou
desenvolvimento tecnológico, sem autorização do órgão competente ou em desacordo com a
obtida:
Multa mínima de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) e máxima de R$ 10.000.000,00 (dez
milhões de reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa nima de R$ 5.000,00 (cinco
mil reais) e máxima de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), quando se tratar de pessoa física.
§ 1
o
Incorre nas mesmas penas quem acessa componente do patrimônio genético a fim
de constituir ou integrar coleção ex situ para bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico,
sem autorização do órgão competente ou em desacordo com a autorização obtida.
§ 2
o
A pena prevista no caput será aumentada de um terço quando o acesso envolver
reivindicação de direito de propriedade industrial relacionado a produto ou processo obtido a
partir do acesso ilícito junto ao órgão competente.
§ 3
o
A pena prevista no caput será aumentada da metade se houver exploração
econômica de produto ou processo obtidos a partir de acesso ilícito ao patrimônio genético.
§ 4
o
A pena prevista no caput será aplicada em dobro se o acesso ao patrimônio genético
for realizado para práticas nocivas ao meio ambiente ou práticas nocivas à saúde humana.
§ 5
o
Se o acesso ao patrimônio genético for realizado para o desenvolvimento de armas
biológicas e químicas, a pena prevista no caput será triplicada e deverá ser aplicada a sanção
de interdição parcial ou total do estabelecimento, atividade ou empreendimento.
Art. 17. Remeter para o exterior amostra de componente do patrimônio genético sem
autorização do órgão competente ou em desacordo com a autorização obtida:
Multa mínima de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e xima de R$ 5.000.000,00 (cinco
milhões de reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa nima de R$ 5.000,00 (cinco
mil reais) e máxima de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), quando se tratar de pessoa física.
§ 1
o
Pune-se a tentativa do cometimento da infração de que trata o caput com a multa
correspondente à infração consumada, diminuída de um terço.
§ 2
o
Diz-se tentada uma infração, quando, iniciada a sua execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
§ 3
o
A pena prevista no caput será aumentada da metade se a amostra for obtida a partir
de espécie constante da lista oficial da fauna brasileira ameaçada de extinção e do Anexo I da
Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em
Perigo de Extinção - CITES.
§ 4
o
A pena prevista no caput será aplicada em dobro se a amostra for obtida a partir de
espécie constante da lista oficial de fauna brasileira ameaçada de extinção e do Anexo II da
CITES.
§ 5
o
A pena prevista no caput será aplicada em dobro se a amostra for obtida a partir de
espécie constante da lista oficial da flora brasileira ameaçada de extinção.
Art. 18. Deixar de repartir, quando existentes, os benefícios resultantes da exploração
econômica de produto ou processo desenvolvido a partir do acesso a amostra do patrimônio
genético ou do conhecimento tradicional associado com quem de direito, de acordo com o
disposto na Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, ou de acordo com o Contrato de
Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios anuído pelo Conselho de
Gestão do Patrimônio Genético:
Multa mínima de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) e máxima de R$ 50.000.000,00
(cinquenta milhões de reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa nima de R$
20.000,00 (vinte mil reais) e xima de R$ 100.000,00 (cem mil reais), quando se tratar de
pessoa física.
Art. 19. Prestar falsa informação ou omitir ao Poder Público informação essencial sobre
atividade de pesquisa, bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico relacionada ao
patrimônio genético, por ocasião de auditoria, fiscalização ou requerimento de autorização de
acesso ou remessa:
Multa mínima de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e máxima de R$ 100.000,00 (cem mil
reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa mínima de R$ 200,00 (duzentos reais) e
máxima de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), quando se tratar de pessoa física.
CAPÍTULO III
DAS INFRAÇÕES AO CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO
Art. 20. Acessar conhecimento tradicional associado para fins de pesquisa científica sem
a autorização do órgão competente ou em desacordo com a obtida:
Multa mínima de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e máxima de R$ 500.000,00 (quinhentos
mil reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa mínima de R$ 1.000,00 (mil reais) e
máxima de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), quando se tratar de pessoa física.
Art. 21. Acessar conhecimento tradicional associado para fins de bioprospecção ou
desenvolvimento tecnológico sem a autorização do órgão competente ou em desacordo com a
obtida:
Multa mínima de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) e máxima de R$ 15.000.000,00
(quinze milhões de reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa nima de R$
10.000,00 (dez mil reais) e máxima de R$ 100.000,00 (cem mil reais), quando se tratar de
pessoa física.
§ 1
o
A pena prevista no caput será aumentada de um terço caso haja reivindicação de
direito de propriedade industrial de qualquer natureza relacionado a produto ou processo
obtido a partir do acesso ilícito junto a órgão nacional ou estrangeiro competente.
§ 2
o
A pena prevista no caput será aumentada de metade se houver exploração
econômica de produto ou processo obtido a partir de acesso ilícito ao conhecimento
tradicional associado.
Art. 22. Divulgar, transmitir ou retransmitir dados ou informações que integram ou
constituem conhecimento tradicional associado, sem autorização do órgão competente ou em
desacordo com a autorização obtida, quando exigida:
Multa mínima de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e máxima de R$ 500.000,00 (quinhentos
mil reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa mínima de R$ 1.000,00 (mil reais) e
máxima de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), quando se tratar de pessoa física.
Art. 23. Omitir a origem de conhecimento tradicional associado em publicação, registro,
inventário, utilização, exploração, transmissão ou qualquer forma de divulgação em que este
conhecimento seja direta ou indiretamente mencionado:
Multa mínima de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e máxima de R$ 200.000,00 (duzentos
mil reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa mínima de R$ 5.000,00 (cinco mil
reais) e máxima de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), quando se tratar de pessoa física.
Art. 24. Omitir ao Poder Público informação essencial sobre atividade de acesso a
conhecimento tradicional associado, por ocasião de auditoria, fiscalização ou requerimento de
autorização de acesso ou remessa:
Multa mínima de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e máxima de R$ 100.000,00 (cem mil
reais), quando se tratar de pessoa jurídica, e multa mínima de R$ 200,00 (duzentos reais) e
máxima de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), quando se tratar de pessoa física.
CAPÍTULO IV
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 25. As multas previstas neste Decreto podem ter a sua exigibilidade suspensa,
quando o autuado, por termo de compromisso aprovado pela autoridade competente, obrigar-
se à adoção de medidas específicas para adequar-se ao disposto na Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, em sua regulamentação e demais normas oriundas do Conselho de Gestão
do Patrimônio Genético.
§ 1
o
Cumpridas integralmente as obrigações assumidas pelo autuado, desde que
comprovado em parecer técnico emitido pelo órgão competente, a multa será reduzida em até
noventa por cento do seu valor, atualizado monetariamente.
§ 2
o
Na hipótese de interrupção do cumprimento das obrigações dispostas no termo de
compromisso referido no caput, quer seja por decisão da autoridade competente ou por fato
do infrator, o valor da multa será atualizado monetariamente.
§ 3
o
Os valores apurados nos termos dos §§ 1
o
e 2
o
serão recolhidos no prazo de cinco
dias do recebimento da notificação.
Art. 26. As sanções estabelecidas neste Decreto serão aplicadas, independentemente da
existência de culpa, sem prejuízo das sanções penais previstas na legislação vigente e da
responsabilidade civil objetiva pelos danos causados.
Art. 27. Incumbe ao IBAMA e ao Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, no
âmbito das respectivas competências, expedir atos normativos visando disciplinar os
procedimentos necessários ao cumprimento deste Decreto.
Parágrafo único. O Comando da Marinha estabelecerá em atos normativos próprios os
procedimentos a serem por ele adotados.
Art. 28. Aplicam-se subsidiariamente a este Decreto o disposto no Código Penal, no
Código de Processo Penal, na Lei n
o
9.784, de 29 de janeiro de 1999, na Lei n
o
9.605, de 12
de fevereiro de 1998, e no Decreto n
o
3.179, de 21 de setembro de 1999.
Art. 29. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 7 de junho de 2005; 184
o
da Independência e 117
o
da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Marina Silva
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 8.6.2005 e retificado no D.O.U. de
21.6.2005.
ANEXO H – Decreto nº 6.159, de 17 de julho de 2007
421
DECRETO Nº 6.159, DE 17 DE JULHO DE 2007.
Altera o Decreto n
o
3.945, de 28 de setembro de
2001, que define a composição do Conselho de
Gestão do Patrimônio Genético e estabelece as
normas para o seu funcionamento, mediante a
regulamentação dos arts. 10, 11, 12, 14, 15, 16,
18 e 19 da Medida Provisória n
o
2.186-
16, de 23
de agosto de 2001, que dispõe sobre o acesso ao
patrimônio genético, a proteção e o acesso ao
conhecimento tradicional associado, a repartão
de benefícios e o acesso à tecnologia e
transferência de tecnologia para sua
conservação
e utilizão.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84,
incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Medida Provisória
n
o
2.186-16, de 23 de agosto de 2001,
DECRETA:
Art. 1
o
O Decreto n
o
3.945, de 28 de setembro de 2001, passa a vigorar com as seguintes
alterações:
“Art. 2
o
...................................................................
..............................................................................
§ 7
o
A fim de subsidiar a tomada de decisão, o Conselho de Gestão poderá deliberar pelo convite de
especialistas ou de representantes de distintos setores da sociedade envolvidos com o tema.”
(NR)
“Art. 8
o
..................................................................
.............................................................................
§ 4
o
Nos casos de autorização de acesso ao patrimônio genético para bioprospecção, a
apresentação de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e Repartição de Benefícios
pode ser postergada pelo Conselho de Gestão, desde que o interessado declare não existir
421
BRASIL. Decreto 6.159, de 17 de jullho de 2007. Altera o Decreto 3.945, de 28 de setembro de 2001,
que define a composição do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético e estabelece as normas para o seu
funcionamento, mediante a regulamentação dos arts. 10, 11, 12, 14, 15, 16, 18 e 19 da Medida Provisória
2.186-16, de 23 de agosto de 2001, que dispõe sobre o acesso ao patrimônio genético, a proteção e o acesso ao
conhecimento tradicional associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de
tecnologia para sua conservação e utilização. 17 jul. 2007. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6159.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
perspectiva de uso comercial e o anuente preveja, no Termo de Anuência Prévia, momento
diverso para a formalização do contrato.
§ 5
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, a formalização do Contrato de Utilização do Patrimônio
Genético e de Repartição de Benefícios sempre deverá anteceder o desenvolvimento
tecnológico e o depósito do pedido de patentes.
§ 6
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, em caso de remessa de componente do patrimônio genético ao
exterior, deverá ser firmado Termo de Transferência de Material contendo compromisso expresso
da instituição destinatária de o ceder a terceiros o componente do patrimônio genético, iniciar
atividade de desenvolvimento tecnológico ou depositar pedido de patente, sem a prévia assinatura
do contrato e correspondente autorização do Conselho de Gestão, quando for o caso.” (NR)
“Art. 9
o
-B. A autorização especial de que trata o art. 11, inciso IV, alínea “d”, da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001, o se aplica a atividades com potencial de uso econômico,
como a bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico.” (NR)
“Art. 9
o
-C. As autorizações de que trata o art. 11, inciso IV, alíneas “ae “c”, da Medida
Provisória n
o
2.186-16, de 2001, poderão abranger o acesso e a remessa, isolada ou
conjuntamente, de acordo com o pedido formulado pela instituição interessada.” (NR)
“Art. 9
o
-D. Poderá obter a autorização especial de que trata o art. 11, inciso IV, alínea “c”, da
Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, para a finalidade de bioprospecção, a instituição
interessada em realizar acesso ou a remessa de componente do patrimônio genético que
atenda aos seguintes requisitos, entre outros que poderão ser exigidos pelo Conselho de
Gestão:
I - comprovação de que a instituição:
a) constituiu-se sob as leis brasileiras; e
b) exerce atividades de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins;
II - qualificação técnica para o desempenho das atividades de acesso e remessa de amostra de
componente do patrimônio genético;
III - estrutura disponível para o manuseio de amostras de componentes do patrimônio
genético;
IV - portfólio dos projetos que envolvam acesso e remessa de componentes do patrimônio
genético desenvolvidos pela instituição e a indicação do destino das amostras de componentes
do patrimônio genético, quando houver previsão;
V - indicação da equipe técnica e da infra-estrutura disponível para gerenciar os Termos de
Transferência de Material, nos casos de remessa; e
VI - indicação da instituição credenciada como fiel depositária prevista para receber as
subamostras de componentes do patrimônio genético a serem acessadas.
§ 1
o
O portfólio a que se refere o inciso IV do caput deverá trazer os projetos resumidos, com
os seguintes requisitos mínimos:
I - objetivos, material, métodos, uso pretendido e destino da amostra a ser acessada, quando já
houver previsão de remessa;
II - área de abrangência ou localização das atividades de campo;
III - período previsto para as atividades de coleta;
IV - indicação das fontes de recursos, estimativa dos respectivos montantes, no caso de
recursos financeiros, e das responsabilidades e direitos de cada parte; e
V - identificação da equipe e curriculum vitae dos pesquisadores envolvidos, caso não
estejam disponíveis na Plataforma Lattes, mantida pelo CNPq.
§ 2
o
As anuências prévias a que se refere o art. 16, § 11, da Medida Provisória n
o
2.186-16, de
2001, e os Contratos de Utilização do Patrimônio Getico e de Repartição de Benefícios
correspondentes deverão ser encaminhadas ao Conselho de Gestão antes ou por ocasião das
expedições de coleta a serem efetuadas durante o peodo de vigência da autorização especial, sob
pena de seu cancelamento.
§ 3
o
O descumprimento do disposto no § 2
o
acarretará a exclusão do projeto correspondente
do portfólio abrangido pela autorização especial para a bioprospecção.
§ 4
o
A exigência da apresentação de Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de
Repartição de Benefícios pode ser postergada pelo Conselho de Gestão, desde que o
interessado declare não existir perspectiva de uso comercial e o Termo de Anuência Prévia
preveja momento diverso para a formalização do contrato.
§ 5
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, a formalização do Contrato de Utilização do Patrimônio
Genético e de Repartição de Benefícios sempre deverá anteceder o início do desenvolvimento
tecnológico ou o depósito do pedido de patentes.
§ 6
o
Na hipótese prevista no § 4
o
, em caso de remessa de componente do patrimônio genético ao
exterior, deverá ser firmado Termo de Transferência de Material contendo compromisso expresso
da instituição destinatária de o ceder a terceiros o componente do patrimônio genético, iniciar
atividade de desenvolvimento tecnológico ou depositar pedido de patente, sem a prévia assinatura
do contrato e correspondente autorização do Conselho de Gestão, quando for o caso.
§ 7
o
A instituição detentora da autorização especial de que trata este artigo só poderá iniciar a
atividade de bioprospecção de projetos cujas anuências prévias tenham sido aprovadas pelo
Conselho de Gestão.
§ 8
o
A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo deverá encaminhar ao
Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001, relatórios cuja periodicidade será fixada na autorização, não podendo
exceder o prazo de doze meses.
§ 9
o
O relatório a que se refere o § 8
o
deverá conter, no mínimo:
I - informações sobre o andamento dos projetos integrantes do portfólio;
II - indicão das áreas onde foram realizadas as coletas, por meio de coordenadas geográficas;
III - listagem quantitativa e qualitativa das espécies ou morfotipos coletados em cada área;
IV - comprovação do depósito das subamostras em instituição credenciada como fiel deposiria;
V - apresentação dos Termos de Transferência de Material, quando houver; e
VI - resultados preliminares.
§ 10. A instituição beneficiada pela autorização de que trata este artigo poderá, durante a
vigência da autorização, inserir novos projetos no portfólio, desde que observe as condições
estabelecidas neste artigo e, previamente ao início da nova atividade ou projeto, comunique a
alteração realizada ao Conselho de Gestão ou à instituição credenciada na forma do art. 14 da
Medida Provisória n
o
2.186-16, de 2001.” (NR)
Art. 2
o
Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 17 de julho de 2007; 186
o
da Independência e 119
o
da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
José Gomes Temporão
Sergio Machado Rezende
Marina Silva
Este texto não substitui o publicado no DOU de 18.7.2007.
ANEXO I DECLARAÇÃO SOBRE O DIREITO AO
DESENVOLVIMENTO
422
A Assembléia Geral,
Tendo em mente os propósitos e os princípios da Carta das Nações Unidas relativas à
realização da cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter
econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e encorajar o respeito aos
Direitos Humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo,
língua ou religião;
Reconhecendo que o desenvolvimento é um processo econômico, social, cultural e político
abrangente, que visa ao constante incremento do bem-estar de toda a população e de todos os
indivíduos com base em sua participação ativa, livre e significativa no desenvolvimento e na
distribuição justa dos benefícios daí resultantes;
Considerando que sob as disposições da Declaração Universal dos Direitos Humanos todos
têm direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e as liberdades consagrados
nesta Declaração possam ser plenamente realizados;
Recordando os dispositivos do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos;
Recordando ainda os importantes Acordos, Convenções, Resoluções, Recomendações e
outros instrumentos das Nações Unidas e de suas agências especializadas relativos ao
desenvolvimento integral do ser humano, ao progresso econômico e social e desenvolvimento
de todos os povos, inclusive os instrumentos relativos à descolonização, à prevenção de
discriminação, ao respeito e observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais,
à manutenção da paz e segurança internacionais e maior promoção das relações amistosas e
cooperação entre os Estados de acordo com a Carta;
Recordando o direito dos povos à autodeterminação, em virtude do qual eles têm o direito de
determinar livremente seus status político e de buscar seu desenvolvimento econômico, social
e cultural;
Recordando também o direito dos povos de exercer, sujeitos aos dispositivos relevantes de
ambos os Pactos Internacionais sobre Direitos Humanos, soberania plena e completa sobre
todas as suas riquezas e recursos naturais;
Atenta à obrigação dos Estados sob a Carta de promover o respeito e a observância universais
aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de qualquer
natureza, tal como de raça, cor, sexo, língua, religião, política ou outra opinião nacional ou
social, propriedade, nascimento ou outro status;
422
ONU. Declaração sobre o direito ao desenvolvimento. Adotada pela Revolução n.º 41/128 da Assembléia
Geral das Nações Unidas, de 4 de dezembro de 1986. Disponível em:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/counter/Onu/Desenvolvimento/texto/texto_3.html>. Acesso em: 22 nov.
2007.
Considerando que a eliminação das violações maciças e flagrantes dos direitos humanos dos
povos e indivíduos afetados por situações tais como as resultantes do colonialismo,
neocolonialismo, apartheid, de todas as formas de racismo e discriminação racial, dominação
estrangeira e ocupação, agressão e ameaças contra a soberania nacional, unidade nacional e
integridade territorial, e ameaças de guerra, contribuiria para o estabelecimento de
circunstâncias propícias para o desenvolvimento de grande parte da humanidade;
Preocupada com a existência de sérios obstáculos ao desenvolvimento, assim como à
completa realização dos seres humanos e dos povos, constituídos, inter alia, pela negação dos
direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, e considerando que todos os direitos
humanos e as liberdades fundamentais são indivisíveis e interdependentes, e que, para
promover o desenvolvimento, devem ser dadas atenção igual e consideração urgente à
implementação, promoção e proteção dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e
culturais, e que, por conseguinte, a promoção, o respeito e o gozo de certos direitos humanos
e liberdades fundamentais não podem justificar a negação de outros direitos humanos e
liberdades fundamentais;
Considerando que a paz e a segurança internacionais são elementos essenciais à realização do
direito ao desenvolvimento;
Reafirmando que existe uma relação íntima entre desarmamento e desenvolvimento, que o
progresso no campo do desarmamento promoveria consideravelmente o progresso no campo
do desenvolvimento, e que os recursos liberados pelas medidas de desarmamento deveriam
dedicar-se ao desenvolvimento econômico e social e ao bem-estar de todos os povos e, em
particular, daqueles dos países em desenvolvimento;
Reconhecendo que a pessoa humana é o sujeito central do processo de desenvolvimento e que
essa política de desenvolvimento deveria assim fazer do ser humano o principal participante e
beneficiário do desenvolvimento;
Reconhecendo que a criação de condições favoráveis ao desenvolvimento dos povos e
indivíduos é a responsabilidade primária de seus Estados;
Ciente de que os esforços em nível internacional para promover e proteger os direitos
humanos devem ser acompanhados de esforços para estabelecer uma nova ordem econômica
internacional;
Confirmando que o direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável e que a
igualdade de oportunidade para o desenvolvimento é uma prerrogativa tanto das nações
quanto dos indivíduos que compõem as nações;
Proclama a seguinte Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento:
Artigo 1º
§1. O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável, em virtude do qual toda
pessoa e todos os povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social,
cultural e político, para ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e
liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados.
§2. O direito humano ao desenvolvimento também implica a plena realização do direito dos
povos à autodeterminação que inclui, sujeito às disposições relevantes de ambos os Pactos
Internacionais sobre Direitos Humanos, o exercício de seu direito inalienável à soberania
plena sobre todas as sua riquezas e recursos naturais.
Artigo 2º
§1. A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e deveria ser participante ativo e
beneficiário do direito ao desenvolvimento.
§2. Todos os seres humanos têm responsabilidade pelo desenvolvimento, individual e
coletivamente, levando-se em conta a necessidade de pleno respeito aos seus direitos humanos
e liberdades fundamentais, bem como seus deveres para com a comunidade, que sozinhos
podem assegurar a realização livre e completa do ser humano e deveriam por isso promover e
proteger uma ordem política, social e econômica apropriada para o desenvolvimento.
§3. Os Estados têm o direito e o dever de formular políticas nacionais adequadas para o
desenvolvimento, que visem ao constante aprimoramento do bem-estar de toda a população e
de todos os indivíduos, com base em sua participação ativa, livre e significativa, e no
desenvolvimento e na distribuição eqüitativa dos benefícios daí resultantes.
Artigo 3º
§1. Os Estados têm a responsabilidade primária pela criação das condições nacionais e
internacionais favoráveis à realização do direito ao desenvolvimento.
§2. A realização do direito ao desenvolvimento requer pleno respeito aos princípios do direito
internacional, relativos às relações amistosas de cooperação entre os Estados, em
conformidade com a Carta das Nações Unidas.
§3. Os Estados têm o dever de cooperar uns com os outros para assegurar o desenvolvimento
e eliminar os obstáculos ao desenvolvimento. Os Estados deveriam realizar seus direitos e
cumprir suas obrigações, de modo tal a promover uma nova ordem econômica internacional,
baseada na igualdade soberana, interdependência, interesse mútuo e cooperação entre todos os
Estados, assim como a encorajar a observância e a realização dos direitos humanos.
Artigo 4º
Os Estados têm o dever de, individual e coletivamente, tomar medidas para formular as
políticas internacionais de desenvolvimento, com vistas a facilitar a plena realização do
direito ao desenvolvimento. É necessária ação permanente para promover um
desenvolvimento mais rápido dos países em desenvolvimento. Como complemento dos
esforços dos países em desenvolvimento, uma cooperação internacional efetiva é essencial
para prover esses países de meios e facilidades apropriados para incrementar seu amplo
desenvolvimento.
Artigo 5º
Os Estados tomarão medidas firmes para eliminar as violações maciças e flagrantes dos
direitos humanos dos povos e dos seres humanos afetados por situações tais como as
resultantes do apartheid, de todas as formas de racismo e discriminação racial, colonialismo,
dominação estrangeira e ocupação, agressão, interferência estrangeira e ameaças contra a
soberania nacional, unidade nacional e integridade territorial, ameaças de guerra e recusas de
reconhecimento do direito fundamental dos povos à autodeterminação.
Artigo 6º
§1. Todos os Estados devem cooperar, com vistas a promover, encorajar e fortalecer o
respeito universal à observância de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais para
todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião.
§2. Todos os direitos humanos e liberdades fundamentais o indivisíveis e interdependentes;
atenção igual e consideração urgente devem ser dadas à implementação, promoção e proteção
dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais.
§3. Os Estados devem tomar providências para eliminar os obstáculos ao desenvolvimento
resultantes da falha na observância dos direitos civis e políticos, assim como dos direitos
econômicos, sociais e culturais.
Artigo 7º
Todos os Estados devem promover o estabelecimento, a manutenção e o fortalecimento da
paz e segurança internacionais e, para este fim, deveriam fazer o máximo para alcançar o
desarmamento geral e completo do efetivo controle internacional, assim como assegurar que
os recursos liberados por medidas efetivas de desarmamento sejam usados para o
desenvolvimento amplo, em particular o dos países em via de desenvolvimento.
Artigo 8º
§1. Os Estados devem tomar, em nível nacional, todas as medidas necessárias para a
realização do direito ao desenvolvimento, e devem assegurar, inter alia, igualdade de
oportunidade para todos no acesso aos recursos básicos, educação, serviços de saúde,
alimentação, habitação, emprego e distribuição eqüitativa da renda. Medidas efetivas devem
ser tomadas para assegurar que as mulheres tenham um papel ativo no processo de
desenvolvimento. Reformas econômicas e sociais apropriadas devem ser efetuadas com vistas
à erradicação de todas as injustiças sociais.
§2. Os Estados devem encorajar a participação popular em todas as esferas, como um fator
importante no desenvolvimento e na plena realização de todos os direitos humanos.
Artigo 9º
§1. Todos os aspectos dos direito ao desenvolvimento estabelecidos na presente Declaração
são indivisíveis e interdependentes, e cada um deles deve ser considerado no contexto do
todo.
§2. Nada na presente Declaração deverá ser tido como sendo contrário aos propósitos e
princípios das Nações Unidas, ou como implicando que qualquer Estado, grupo ou pessoa
tenha o direito de se engajar em qualquer atividade ou de desempenhar qualquer ato voltado à
violação dos direitos consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos
Pactos Internacionais sobre Direitos Humanos,
Artigo 1
Os Estados deverão tomar medidas para assegurar o pleno exercício e o fortalecimento
progressivo do direito ao desenvolvimento, incluindo a formulação, adoção e implementação
de políticas, medidas legislativas e outras, em níveis nacional e internacional.
ANEXO J – Tratado de Cooperação Amazônica
423
DECRETO Nº 85.050, de 18 de agosto de 1980
Aprovado pelo Decreto Legislativo nº 69, de 18 de outubro de 1978
Promulga o Tratado de Cooperação Amazônica, Concluído entre os Governos da República
da Bolívia, da República Federativa do Brasil, da República da Colômbia, da República do
Equador, da República Cooperativa da Guiana, da República do Peru, da República do
Suriname e da República da Venezuela (artigos 1 e 2)
Art. - O Tratado de Cooperação Amazônica, apenso por cópia ao presente Decreto, será
executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém.
Art. - Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições
em contrário.
TRATADO DE COOPERAÇÃO AMAZÔNICA
Art. - As Partes Contratantes convêm em realizar esforços e ões conjuntas a fim de
promover o desenvolvimento harmônico de seus respectivos territórios amazônicos, de modo
a que essas ações conjuntas produzam resultados eqüitativos e mutuamente proveitosos, assim
como para a preservação do meio ambiente e a conservação e utilização racional dos recursos
naturais desses territórios.
Parágrafo único. Para tal fim, trocarão informações e concertarão acordos e entendimentos
operativos, assim como os instrumentos jurídicos pertinentes que permitam o cumprimento
das finalidades do presente Tratado.
Art. 2º - O presente Tratado se aplicará nos territórios das Partes Contratantes na Bacia
Amazônica, assim como, também, em qualquer território de uma Parte Contratante que, pelas
suas características geográficas, ecológicas ou econômicas, se considere estreitamente
vinculado a mesma.
Art. - De acordo com e sem detrimento dos direitos outorgados por atos unilaterais, do
estabelecido nos tratados bilaterais entre as Partes e dos princípios e normas do Direito
Internacional, as Partes Contratantes asseguram-se mutuamente, na base da reciprocidade, a
mais ampla liberdade de navegação comercial no curso do Amazonas e demais rios
amazônicos internacionais, observando os regulamentos fiscais e de polícia estabelecidos ou
que se estabelecerem no território de cada uma delas. Tais regulamentos deverão, na medida
do possível, favorecer essa navegação e o comércio e guardar entre si uniformidade.
Parágrafo único. O presente Artigo não se aplicará à navegação de cabotagem.
423
BRASIL. Decreto 85.050, de 18 de agosto de 1980. Promulga o Tratado de Cooperação Amazônica,
Concluído entre os Governos da República da Bolívia, da República Federativa do Brasil, da República da
Colômbia, da República do Equador, da República Cooperativa da Guiana, da República do Peru, da
República do Suriname e da República da Venezuela (artigos 1 e 2). Disponível em:
<http://www.lei.adv.br/85050-80.htm>. Acesso em: 22 nov. 2007.
Art. - As Partes Contratantes proclamam que o uso e aproveitamento exclusivo dos
recursos naturais em seus respectivos territórios é direito inerente à soberania do Estado e seu
exercício não terá outras restrições senão as que resultem do Direito Internacional.
Art. - Tendo em vista a importância e multiplicidade de funções que os rios amazônicos
desempenham no processo de desenvolvimento econômico e social da região, as Partes
Contratantes procurarão envidar esforços com vistas à utilização racional dos recurso
hídricos.
Art. - Com o objetivo de que os rios amazônicos constituam um vínculo eficaz de
comunicação entre as Partes Contratantes e com o oceano Atlântico, os Estados ribeirinhos
interessados num determinado problema que afete a navegação livre e desimpedida
empreenderão, conforme for o caso, ações nacionais, bilaterais ou multilaterais para o
melhoramento e habilitação dessas vias navegáveis.
Parágrafo único. Para tal efeito, estudar-se-ão as formas de eliminar os obstáculos físicos que
dificultam ou impedem a referida navegação, assim como os aspectos econômicos e
financeiros correspondentes, a fim de concretizar os meios operativos mais adequados.
Art. - Tendo em vista a necessidade de que o aproveitamento da flora e da fauna da
Amazônia seja racionalmente planejado, a fim de manter o equilíbrio ecológico da região e
preservar as espécies, as Partes Contratantes decidem:
a) promover a pesquisa científica e o intercâmbio de informações e de pessoal técnico entre as
entidades competentes dos respectivos países, a fim de ampliar os conhecimentos sobre os
recursos da flora e da fauna de seus territórios amazônicos e prevenir e controlar as
enfermidades nesses territórios;
b) estabelecer um sistema regular de troca adequada de informações sobre as medidas
conservacionistas que cada Estado tenha adotado ou adote em seus territórios amazônicos, as
quais serão matéria de um relatório anual apresentado por cada país.
Art. - As Partes Contratantes decidem promover a coordenação dos atuais serviços de
saúde de seus respectivos territórios amazônicos e tomar outras medidas que sejam
aconselháveis, com vistas à melhoria das condições sanitárias da região e ao aperfeiçoamento
dos métodos tendentes a prevenir e combater as epidemias.
Art. 9º - As Partes Contratantes concordam em estabelecer estreita colaboração nos campos da
pesquisa científica e tecnológica, com o objetivo de criar condições mais adequadas à
aceleração do desenvolvimento econômico e social da região.
§ Para os fins do presente Tratado, a cooperação técnica e científica a ser desenvolvida
entre as Partes Contratantes poderá assumir as seguinte formas:
a) realização conjunta ou coordenada de programas de pesquisa e desenvolvimento;
b) criação e operação de instituições de pesquisa ou de centros de aperfeiçoamento e produção
experimental;
c) organização de seminários e conferências, intercâmbio de informações e documentação e
organização de meios destinados à sua difusão.
§ As Partes Contratantes poderão, sempre que julgarem necessário e conveniente, solicitar
a participação de organismos internacionais na execução de estudos, programas e projetos
resultantes das formas de cooperação técnica e científica definidas no § 1º do presente Artigo.
Art. 10 - As Partes Contratantes coincidem na conveniência de criar uma infra-estrutura física
adequada entre seus respectivos países, especialmente nos aspectos de transportes e
comunicações.
Conseqüentemente, comprometem-se a estudar as formas mais harmônicas de estabelecer ou
aperfeiçoar as interconexões rodoviárias, de transportes fluviais, aéreos e de
telecomunicações, tendo em conta os planos e programas de cada país para lograr o objetivo
prioritário de integrar plenamente seus territórios amazônicos às suas respectivas economias
nacionais.
Art. 11 - Com o propósito de incrementar o emprego racional dos recursos humanos e naturais
de seus respectivos territórios amazônicos, as Partes Contratantes concordam em estimular a
realização de estudos e a adoção de medidas conjuntas tendentes a promover o
desenvolvimento econômico e social desses territórios e a gerar formas de complementação
que reforcem as ações previstas nos planos nacionais para os referidos territórios.
Art. 12 - As Partes Contratantes reconhecem a utilidade de desenvolver, em condições
eqüitativas e de mútuo proveito, o comércio a varejo de produtos de consumo local entre as
suas respectivas populações amazônicas limítrofes, mediante acordos bilaterais ou
multilaterais adequados.
Art. 13 - As Partes Contratantes cooperarão para incrementar as correntes turísticas, nacionais
e de terceiros países, em seus respectivos territórios amazônicos, sem prejuízo das disposições
nacionais de proteção às culturas indígenas e aos recursos naturais.
Art. 14 - As Partes Contratantes cooperarão no sentido de lograr a eficácia das medidas que se
adotem para a conservação das riquezas etnológicas e arqueológicas da área amazônica.
Art. 15 - As Partes Contratantes se esforçarão por manter um intercâmbio permanente de
informações e colaboração entre si e com os órgãos de cooperação latino-americanos, nos
campos de ação que se relacionam com as matérias queo objeto deste Tratado.
Art. 16 - As decisões e compromissos adotados pelas Partes Contratantes na aplicação do
presente Tratado não prejudicarão os projetos e empreendimentos que executem em seus
respectivos territórios, dentro do respeito ao Direito Internacional e segundo a boa prática
entre nações vizinhas e amigas.
Art. 17 - As Partes Contratantes poderão apresentar iniciativas para a realização de estudos
destinados à concretização de projetos de interesse comum, para o desenvolvimento de seus
territórios amazônicos e, em geral, que permitam o cumprimento das ações contempladas no
presente Tratado.
Parágrafo único. As Partes Contratantes acordam conceder especial atenção à consideração de
iniciativas apresentadas por países de menor desenvolvimento que impliquem esforços e
ações conjuntas das Partes.
Art. 18 - O estabelecido no presente Tratado não significará qualquer limitação a que as
Partes Contratantes celebrem acordos bilaterais ou multilaterais sobre temas específicos ou
genéricos, desde que não sejam contrários à consecução dos objetivos comuns de cooperação
na Amazônia, consagrados neste instrumento.
Art. 19 - Nem a celebração do presente Tratado, nem a sua execução terão algum efeito sobre
quaisquer outros tratados ou atos internacionais vigentes entre as Partes, nem sobre quaisquer
divergências sobre limites ou direitos territoriais existentes entre as Partes, nem pode
interpretar-se ou invocar-se a celebração deste Tratado ou sua execução para alegar aceitação
ou renúncia, afirmação ou modificação, direta ou indireta, expressa ou tácita, das posições e
interpretações que sobre estes assuntos sustente cada Parte Contratante.
Art. 20 - Sem prejuízo de que posteriormente se estabeleça a periodicidade mais adequada, os
Ministros das Relações Exteriores das Partes Contratantes realizarão reuniões cada vez que o
julguem conveniente ou oportuno, a fim de fixar as diretrizes básicas da política comum,
apreciar e avaliar o andamento geral do processo de cooperação amazônica e adotar as
decisões tendentes à realização dos fins propostos neste instrumento.
§ Celebrar-se-ão reuniões dos Ministros das Relações Exteriores por iniciativa de qualquer
das Partes Contratantes sempre que conte com o apoio de pelo menos outros 4 (quatro)
Estados-Membros.
§ 2º A primeira reunião de Ministros das Relações Exteriores celebrar-se-á dentro dos 2 (dois)
anos seguintes à data de entrada em vigor do presente Tratado. A sede e a data da primeira
reunião serão fixadas mediante entendimento entre as Chancelarias das Partes Contratantes.
§ A designação do país-sede das reuniões obedecerá ao critério de rodízio por ordem
alfabética.
Art. 21 - Representantes diplomáticos de alto nível das Partes Contratantes reunir-se-ão,
anualmente, integrando o Conselho de Cooperação Amazônica, com as seguintes atribuições:
1. Velar pelo cumprimento dos objetivos e finalidades do Tratado.
2. Velar pelo cumprimento das decisões tomadas nas reuniões de Ministros das Relações
Exteriores.
3. Recomendar às Partes a conveniência ou oportunidade de celebrar reuniões de Ministros
das Relações Exteriores e preparar o temário correspondente.
4. Considerar as iniciativas e os projetos que apresentem as Partes e adotar as decisões
pertinentes para a realização de estudos e projetos bilaterais ou multilaterais, cuja execução,
quando for o caso, estará a cargo das Comissões Nacionais Permanentes.
5. Avaliar o cumprimento dos projetos de interesse bilateral ou multilateral.
6. Adotar as normas para o seu funcionamento.
§ 1º O Conselho poderá celebrar reuniões extraordinárias por iniciativa de qualquer das Partes
Contratantes, com o apoio da maioria das demais.
§ A sede das reuniões ordinárias obedeceao critério de rodízio, por ordem alfabética,
entre as Partes Contratantes.
Art. 22 - As funções de Secretaria serão exercidas "pro tempore", pela Parte Contratante em
cujo território deva celebrar-se a seguinte reunião ordinária do Conselho de Cooperação
Amazônica.
Parágrafo único. A Secretaria "pro tempore" enviará, às Partes, a documentação pertinente.
Art. 23 - As Partes Contratantes criarão Comissões Nacionais Permanentes encarregadas da
aplicação, em seus respectivos territórios, das disposições deste Tratado, assim como da
execução das decisões adotadas pelas reuniões dos Ministros das Relações Exteriores e pelo
Conselho de Cooperação Amazônica, sem prejuízo de outras atividades que lhes sejam
atribuídas por cada Estado.
Art. 24 - Sempre que necessário, as Partes Contratantes poderão constituir comissões
especiais destinadas ao estudo de problemas ou temas específicos relacionados com os fins
deste Tratado.
Art. 25 - As decisões adotadas em reuniões efetuadas em conformidade com os Artigos 20 e
21, requererão sempre o voto unânime dos Países-Membros do presente Tratado. As decisões
adotadas em reuniões efetuadas em conformidade com o Artigo 24 requererão sempre o voto
unânime dos países participantes.
Art. 26 - As Partes Contratantes acordam que o presente Tratado não será susceptível de
reservas ou declarações interpretativas.
Art. 27 - O presente Tratado te duração ilimitada e não estará aberto a adesões.
Art. 28 - O presente Tratado será ratificado pelas Partes Contratantes e os instrumentos de
ratificação serão depositados junto ao Governo da República Federativa do Brasil.
§ O presente Tratado entrará em vigor 30 (trinta) dias depois de depositado o último
instrumento de ratificação das Partes Contratantes.
§ A intenção de denunciar o presente Tratado será comunicada por uma Parte Contratante
às demais Partes Contratantes, pelo menos 90 (noventa) dias antes da entrega formal do
instrumento de denúncia ao Governo da República Federativa do Brasil. Formalizada a
denúncia, os efeitos do Tratado cessarão para a Parte Contratante denunciante, no prazo de 1
(um) ano.
§ O presente Tratado será redigido nos idiomas português, espanhol, holandês e inglês,
fazendo todos igualmente fé.
ANEXO K Protocolo de Emenda ao Tratado de Cooperação
Amazônica
424
DECRETO Nº 4.387, DE 25 DE SETEMBRO DE 2002.
Promulga o Protocolo de Emenda ao Tratado
de Cooperação Amazônica.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84,
inciso VIII, da Constituição,
Considerando que o Congresso Nacional aprovou o texto do Protocolo de Emenda ao
Tratado de Cooperação Amazônica, celebrado em Caracas, em 14 de dezembro de 1998, por
meio do Decreto Legislativo n
o
102, de 28 de outubro de 1999;
Considerando que o Protocolo entrou em vigor, para o Brasil, em 2 de agosto de 2002,
nos termos de seu art. III;
DECRETA:
Art. 1
o
O Protocolo de Emenda ao Tratado de Cooperação Amanica, celebrado em
Caracas, em 14 de dezembro de 1998, apenso por cópia ao presente Decreto, será executado e
cumprido tão inteiramente como nele se contém.
Art. 2
o
São sujeitos à aprovação do Congresso Nacional quaisquer atos que possam
resultar em revisão do referido Protocolo, assim como quaisquer ajustes complementares que,
nos termos do art. 49, inciso I, da Constituição, acarretem encargos ou compromissos
gravosos ao patrimônio nacional.
Art. 3
o
Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 25 de setembro de 2002; 181
o
da Independência e 114
o
da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Luiz Augusto Soint-Brisson de Araujo Castro
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 26.9.2002
PROTOCOLO DE EMENDA AO TRATADO DE COOPERAÇÃO AMAZÔNICA
As República da Bolívia, do Brasil, da Colômbia, do Equador, da Guiana, do Peru, do
Suriname e da Venezuela,
424
BRASIL. Decreto 4.387, de 25 de setembro de 2002. Promulga o Protocolo de Emenda ao Tratado de
Cooperação Amazônica. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4387.htm>.
Acesso em: 22 nov. 2007.
Reafirmando os princípios e objetivos do Tratado de Cooperação Amazônica,
Considerando a conveniência de aperfeiçoar e fortalecer, institucionalmente, o processo
de cooperação desenvolvido sob a égide do mencionado instrumento,
Acordam:
I. Criar a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), dotada de
personalidade jurídica, sendo competente para celebrar acordos com as Partes Contratantes,
com Estados não-Membros e com outras organizações internacionais.
II. Modificar, da seguinte forma, o Artigo XXII do texto do Tratado:
A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica terá uma Secretaria Permanente
com sede em Brasília, encarregada de implementar os objetivos previstos no Tratado em
conformidade com as resoluções emanadas das Reuniões de Ministros das Relações
Exteriores e do Conselho de Cooperação Amazônica.
Parágrafo Primeiro - As competências e funções da Secretaria Permanente e de seu
titular serão estabelecidas no seu regulamento, que será aprovado pelos Ministros das
Relações Exteriores das Partes Contratantes.
Parágrafo Segundo - A Secretaria Permanente elaborará, em coordenação com as Partes
Contratantes, seus planos de trabalho e programa de atividades, bem como formulao seu
orçamento-programa, os quais deverão ser aprovados pelo Conselho de Cooperação
Amazônica.
Parágrafo Terceiro - A Secretaria Permanente será dirigida por um Secretário-Geral, que
poderá assinar acordos, em nome da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica,
quando as Partes Contratantes assim o autorizarem por unanimidade.
III. Esta emenda estará sujeita ao cumprimento dos requisitos constitucionais internos
por parte de todas as Partes Contratantes, e entrará em vigor na data do recebimento, pelo
governo da República Federativa do Brasil, da última nota em que seja comunicado haverem
sido cumpridos esses requisitos constitucionais.
Firmado em Caracas, aos 14 dias do mês de dezembro de mil novecentos e noventa e
oito, em oito (8) exemplares originais, nos idiomas espanhol, inglês, português e holandês,
todos igualmente autênticos.
ANEXO L – Projeto de Lei n. 7.211/2002
425
PROJETO DE LEI Nº 7.211/2002
Acrescenta artigos à Lei 9.605, de 12 de
fevereiro de 1998, que dispõe sobre as
sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio
ambiente.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º A Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, fica acrescida dos seguintes artigos:
“Art. 61-A. Acessar ou coletar, com fim econômico ou ilícito, componente da flora, da
fauna, de fungo ou de microorganismo existente no território nacional, na plataforma
continental ou na zona econômica exclusiva, para pesquisa científica, desenvolvimento
tecnológico ou bioprospecção, em desacordo com a legislação vigente:
Pena: reclusão, de um a três anos, e multa.
§ Para efeitos deste artigo, acessar significa obter informação de caráter genético
existente em espécime vegetal, animal, fúngico ou microbiano, no seu todo ou em parte, ou
em substância originada destes seres, na forma de moléculas e de extratos provenientes destes
organismos vivos ou mortos, encontrados na natureza, in situ, ou em coleções ex situ.
§ Nas mesmas penas incorre quem, com fim econômico ou ilícito, se apropria, em
desacordo com a legislação vigente, de conhecimento tradicional associado à biodiversidade,
assim entendido a informação ou a prática individual ou coletiva de comunidade indígena ou
comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao patrimônio genético.
Art. 61-B. Utilizar componente da flora, da fauna, de fungo ou de microorganismo:
I – para fim econômico, em desacordo com a legislação vigente, ou para fim ilícito:
Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa.
425
BRASIL. Projeto de lei 7.211/2002. Acrescenta artigos à Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que
dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
Câmara dos Deputados. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=71835>.
Acesso em: 22 nov. 2007.
II – para práticas nocivas ao meio ambiente:
Pena: reclusão, de dois a cinco anos, e multa.
III – para práticas nocivas à saúde humana:
Pena: reclusão, de três a seis anos, e multa.
IV – para o desenvolvimento de armas biológicas ou químicas:
Pena: reclusão, de quatro a oito anos, e multa.
Art. 61-C. Remeter para o exterior amostra de material genético ou recurso genético,
em desacordo com a legislação vigente:
Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa”
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília,
ANEXO M – Projeto de Lei n. 2.360/2003
426
PROJETO DE LEI Nº , DE 2003
(Do Sr. Mário Negromonte)
Altera a Lei 4.771, de 15 de
setembro de 1965, e a Lei nº 9.605, de 12 de
fevereiro de 1998, para dispor sobre a
pesquisa ou a coleta de amostras da flora
brasileira.
O Congresso Nacional decreta:
Art. O Código Florestal, instituído pela Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, passa a
vigorar acrescido do seguinte art. 13-A:
“Art. 13-A. A pesquisa ou a coleta de amostras da flora brasileira dependem de autorização do
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente – IBAMA.
Parágrafo único. Tratando-se de expedições estrangeiras, é obrigatória a presença de
funcionário do IBAMA. (AC)”
Art. A Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que “dispõe sobre as sanções penais e
administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras
providências”, passa a vigorar acrescida dos seguintes art. 47-A e 47-B:
“Art. 47-A. Realizar pesquisa ou coletar amostras da flora brasileira sem autorização da
autoridade competente ou em desacordo com a obtida:
“Pena: detenção, de seis meses a um ano, e multa. (AC)”
“Art. 47-B. Remeter ou levar para o exterior espécime, germoplasma, produto ou subproduto
da flora brasileira sem autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
“Pena: reclusão, de um a cinco anos, e multa. (AC)”
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data da sua publicação oficial.
JUSTIFICAÇÃO
426
BRASIL. Projeto de lei 2.360/2003. Altera a Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, e a Lei 9.605, de
12 de fevereiro de 1998, para dispor sobre a pesquisa ou a coleta de amostras da flora brasileira. Câmara dos
Deputados. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/174819.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2007.
A biotecnologia certamente será o ramo de maior crescimento neste século, o que
confere ao Brasil lugar de destaque no contexto mundial. Afinal, em território brasileiro
encontra-se a maior diversidade biológica do planeta. de plantas, são mais de 55 mil
espécies, muitas com propriedades medicinais ainda desconhecidas para a ciência.
Esse riquíssimo patrimônio tem despertado a cobiça internacional, em especial, por parte de
grandes laboratórios farmacêuticos, que tentam obter, a todo o custo, não apenas informações,
mas também amostras de plantas. A biopirataria, como é conhecida a prática, é freqüente e
resultou, inclusive, no patenteamento de alguns de nossos produtos no exterior.
Para fazer uma idéia da dimensão de nossas perdas, é importante ter em mente que um
quarto dos atuais medicamentos industrializados é derivado de plantas, o que representa um
mercado mundial de 14 bilhões de dólares ao ano, sendo 124 milhões de dólares no Brasil.
Entretanto, segundo o Ibama, o País amarga um prejuízo diário de 16 milhões de dólares com
a biopirataria, pois os laboratórios multinacionais têm patenteado diversas de nossas riquezas,
submetendo-nos ao pagamento de royalties, da mesma forma que qualquer outro país
consumidor dos medicamentos então produzidos.
Um dos casos mais famosos é do professor da faculdade de medicina de Ribeirão
Preto, Sérgio Ferreira, que descobriu, no veneno da jararaca, um princípio ativo capaz de
controlar a pressão arterial, área em que é previsto um mercado de 2,5 milhões de dólares ao
ano. O laboratório americano Bristol-Myers Squibb registrou a patente do Captopril, em troca
dos recursos para a continuidade das pesquisas, devendo o Brasil, futuramente, pagar todo o
valor agregado ao medicamento que será comercializado.
Essa é uma prova cabal de que nossos recursos genéticos são subutilizados, pois, além
dos parcos recursos financeiros destinados à investigação científica, nossas confusas regras
amarram a pesquisa nacional e abrem brechas para o triunfo de interesses menos legítimos.
O carro-chefe da exploração predatória, no entanto, é o mogno, cuja madeira é a mais
valorizada do mercado internacional. Explorado, em sua maioria, de forma ilegal, sua tora é
vendida a 1,4 mil dólares. De 1971 a 2001, calcula-se que 2,5 milhões de árvores tenham sido
extraídas, dois terços delas com destino aos EUA e Inglaterra. Se os trâmites legais de
licenciamento e de arrecadação de impostos tivessem sido observados, esse comércio poderia
ter gerado quase 4 bilhões de dólares em divisas.
São essas distorções que procuramos corrigir com a presente proposição, a qual
esperamos ver aprovada com a brevidade possível.
Sala das Sessões, em de de 2003.
Deputado Mario Negromonte
ANEXO N – Projeto de Lei n. 80/2007
427
PROJETO DE LEI Nº , DE 2007
(Do Sr. Antonio Carlos Mendes Thame)
Altera a pena cominada a crimes
ambientais, previstos na Lei n° 9605, de
12 de fevereiro de 1998.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1° Esta Lei altera a pena cominada a crimes ambientais, previstos na Lei 9605, de 12
de fevereiro de 1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e dá outras providências”.
Art. 2° O art. 33 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998,
passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de
espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, udes, lagoas, baías ou águas
jurisdicionais brasileiras:
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas:
I - quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aqüicultura de domínio
público;
II - quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão
ou autorização da autoridade competente;
III - quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de
moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica.(NR)”
Art. O art. 38 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que
em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena –reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à
metade. (NR)”
427
BRASIL. Projeto de lei 80/2007. Altera a pena cominada a crimes ambientais, previstos na Lei 9605,
de 12 de fevereiro de 1998 Câmara dos Deputados. Disponível em:
<http://www.wspabrasil.org/newsletter/julho-2007/docs/PL-080.pdf>. Acesso em: 22 nov. 2007.
Art. O art. 39 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art. 39. Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão
da autoridade competente:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.(NR)”
Art. O art. 44 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art. 44. Extrair de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente,
sem prévia autorização, pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais:
Pena -reclusão, de um a dois anos, e multa.(NR)”
Art. O art. 46 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art. 46. Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e
outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada
pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final
beneficiamento:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito,
transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem licença
válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento, outorgada pela autoridade
competente. (NR)”
Art. O art. 50 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art. 50. Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas,
protetora de mangues, objeto de especial preservação:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.(NR)”
Art. O art. 55 da Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte
redação:
“Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente
autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida:
Pena -reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem deixa de recuperar a área pesquisada ou
explorada, nos termos da autorização, permissão, licença, concessão ou determinação do
órgão competente.(NR)”
Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
Conforme as informações disponíveis no relatório da Comissão Parlamentar de
Inquérito destinada a “INVESTIGAR O TRÁFICO DE ANIMAIS E PLANTAS
SILVESTRES BRASILEIROS, A EXPLORAÇÃO E COMÉRCIO ILEGAL DE MADEIRA
E BIOPIRATARIA NO PAÍS” , o combate aos crimes ambientais é dificultado em razão da
excessiva brandura da legislação ambiental.
Hoje, por exemplo, quando se consegue prender o traficante ou o comerciante de
madeira ilegal, ele simplesmente paga uma fiança e depois sai livre. Tendo em vista o alto
lucro proporcionado pelos crimes ambientais, a atual legislação representa um estímulo à
prática de infrações. Nos dias atuais, a atividade voltada para a prática de crimes ambientais é
organizada, estratificada e departamentalizada, adquirindo características empresariais e
semelhantes às atividades de máfia. É imperioso, portanto, modificar a legislação ambiental,
de modo a conferir à polícia, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário meios para punir os
infratores ambientais.
Isto posto, o presente Projeto de Lei propõe aumentar a pena cominada a alguns
crimes ambientais e modificar, em outros, a pena de detenção para reclusão. Tais medidas,
embora simples, possibilitarão a realização de interceptações telefônicas pela polícia, a
imposição de regime inicialmente fechado para o cumprimento da pena e dificultarão a
concessão de liberdade provisória.
Por todo o exposto, clamamos os nossos Pares a aprovar o presente Projeto de Lei.
Sala das Sessões, em 08 de fevereiro de 2007.
Deputado Antonio Carlos Mendes Thame
ANEXO O Artigo: IBGE lança o Mapa de Biomas do Brasil e o Mapa de
Vegetação do Brasil, em comemoração ao Dia Mundial da Biodiversidade
428
O Mapa de Biomas do Brasil, resultado de uma parceria entre o IBGE e o
Ministério do Meio Ambiente (MMA), mostra que o Bioma Amazônia e o Bioma Pantanal
ocupam juntos mais de metade do território brasileiro. O Mapa de Vegetação do Brasil
reconstitui com mais detalhes a provável situação da vegetação na época do descobrimento.
Em tamanho mural e escala de um para cinco milhões, os dois mapas são lançados em
comemoração ao Dia Mundial da Biodiversidade (22 de maio).
O bioma continental brasileiro de maior extensão, a Amazônia, e o de menor
extensão, o Pantanal, ocupam juntos mais de metade do Brasil: o Bioma Amazônia, com
49,29%, e o Bioma Pantanal, com 1,76% do território brasileiro. Mapeados pela primeira vez,
os seis biomas continentais brasileiros - Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica,
Pantanal e Pampa - são apresentados no Mapa de Biomas do Brasil (1: 5.000.000), resultado
da parceria entre o IBGE e o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Assim como o Mapa de
Vegetação do Brasil (1: 5.000.000) 2004, que lhe serviu de referência, o Mapa de Biomas do
Brasil se junta à série "Mapas Murais" do IBGE, que inclui outros temas como relevo, solos,
geologia, unidades de conservação federais, fauna e flora.
428
IBGE LANÇA O MAPA DE BIOMAS DO BRASIL E O MAPA DE VEGETAÇÃO DO BRASIL, EM
COMEMORAÇÃO AO DIA MUNDIAL DA BIODIVERSIDADE.
Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=169&id_pagina=1>.
Acesso em: 2 set. 2007.
Além de representar cartograficamente a abrangência dos seis biomas continentais
brasileiros, o Mapa de Biomas do Brasil 1: 5.000.000 (primeira aproximação) traz a área
aproximada que ocupa cada um desses conjuntos, sua descrição e a proporção de sua presença
nas 27 unidades da federação. Também estão indicadas no mapa as áreas alteradas pela
presença humana (antropismo).
Complementares, o Mapa de Biomas do Brasil e o Mapa de Vegetação do Brasil têm
grande utilidade para a análise de cenários e tendências dos diferentes biomas. Servem como
referência para o estabelecimento de políticas públicas diferenciadas e para o
acompanhamento, pela sociedade, das ações implementadas. Bioma é conceituado no mapa
como um conjunto de vida (vegetal e animal) constituído pelo agrupamento de tipos de
vegetação contíguos e identificáveis em escala regional, com condições geoclimáticas
similares e história compartilhada de mudanças, o que resulta em uma diversidade
biológica própria.
Vegetação brasileira tem formações florestais e campestres
O Mapa de Vegetação do Brasil reconstitui a situação da vegetação no território
brasileiro na época do descobrimento pelos portugueses e mostra que no país ocorrem dois
grandes conjuntos vegetacionais: um florestal, que ocupa mais de 60% do território nacional,
e outro campestre. As formações florestais são constituídas pelas florestas ombrófilas (em
que não falta umidade durante o ano) e estacionais (em que falta umidade num período do
ano) situadas tanto na região amazônica quanto nas áreas extra-amazônicas, mais
precisamente na Mata Atlântica. Na Amazônia, predominam as florestas ombrófilas densas
e abertas, com árvores de médio e grande porte, com ocorrência de cipós, bromélias e
orquídeas. As florestas extra-amazônicas coincidem com as formações florestais que
compõem a Mata Atlântica, onde predominam as florestas estacionais semideciduais (em
que 20 a 50 % das árvores perdem as folhas no período seco do ano), e as florestas
ombrófilas densas e mistas (com araucária). Em ambos os conjuntos florestais ocorrem, em
menor proporção, as florestas estacionais deciduais (em que mais de 50% das árvores
perdem folhas no período seco).
As formações campestres são constituídas pelas tipologias de vegetação abertas,
mapeadas como: savana, correspondente ao Cerrado que predomina no Brasil central,
ocorrendo também em pequenas áreas em outras regiões do país, inclusive na Amazônia;
savana estépica que inclui a caatinga nordestina, os campos de Roraima, o Pantanal mato-
grossense e uma pequena ocorrência no extremo oeste do Rio Grande do Sul; estepe que
corresponde aos campos, do planalto e da campanha, do extremo sul do Brasil; e a
campinarana, um tipo de vegetação decorrente da falta de nutrientes minerais no solo e que
ocorre na Amazônia, na bacia do rio Negro.
O mapa traz ainda a indicação das áreas das formações pioneiras, que abrigam a
vegetação das restingas, dos manguezais e dos alagados, além das áreas de tensão ecológica,
onde ocorrem os contatos entre tipos de vegetação, e os chamados refúgios vegetacionais
onde a vegetação em geral é constituída por comunidades relíquias.
Estão assinaladas no mapa as formações remanescentes, que correspondem à
vegetação que permanece preservada ou pouco alterada, e os antropismos, ou seja, as áreas
afetadas pelas atividades humanas. Estas, mapeadas como vegetação secundária e atividades
agrárias, estão representadas no mapa por um pontilhado que recobre as cores que
representam os tipos de vegetação original.
Em sua terceira versão (as anteriores foram editadas em 1988 e 1993), o Mapa de
Vegetação do Brasil traz aprimoramentos permitidos pelo avanço da tecnologia de
mapeamento e geoprocessamento, bem como da pesquisa científica. As inovações contribuem
também para a qualidade do Mapa de Biomas do Brasil, que tem ao fundo as linhas e letras do
Mapa de Vegetação do Brasil, que lhe serviu como referência técnico-operacional.
Mapa de Biomas é resultado da parceria entre IBGE e MMA, iniciada em 2003
O Mapa de Biomas do Brasil é resultado do termo de cooperação assinado entre o
IBGE e o Ministério do Meio Ambiente em agosto de 2003. Com sua publicação, o governo
brasileiro e a sociedade passam a contar com um valioso instrumento na formulação de
políticas públicas específicas para os diferentes biomas brasileiros, denominados: Bioma
Amazônia, Bioma Mata Atlântica, Bioma Caatinga, Bioma Cerrado, Bioma Pantanal e
Bioma Pampa.
Os nomes adotados foram os mais usuais e populares, em geral associados ao tipo de
vegetação predominante, ou ao relevo, como no caso do Bioma Pantanal, que constitui a
maior superfície inundável interiorana do mundo. O Bioma Amazônia é definido pela unidade
de clima, fisionomia florestal e localização geográfica. O Bioma Mata Atlântica, que ocupa
toda a faixa continental atlântica leste brasileira e se estende para o interior no Sudeste e Sul
do País, é definido pela vegetação florestal predominante e relevo diversificado. O Pampa,
restrito ao Rio Grande do Sul, se define por um conjunto de vegetação de campo em relevo de
planície. A vegetação predominante dá nome ao Cerrado, segundo bioma do Brasil em
extensão, que se estende desde o litoral maranhense até o Centro-Oeste e ao Bioma Caatinga,
típico do clima semi-árido do sertão nordestino.
Desde o próprio entendimento de bioma até as possíveis correlações existentes entre
os biomas brasileiros e os conceitos que definem o Mapa de Vegetação do Brasil, base
técnico-operacional do primeiro, houve ampla discussão sobre o marco conceitual orientador
do mapeamento dos biomas. Além de técnicos e representantes regionais do IBGE,
participaram da discussão futuros usuários, tanto do Ministério do Meio Ambiente quanto da
comunidade científica e de organizações da sociedade civil atuantes no campo
socioambiental. No segundo semestre de 2003 o IBGE sediou dois seminários com a
finalidade de discutir o Mapa de Biomas do Brasil.
No Mapa de Biomas do Brasil, elaborado em meio digital, foram considerados
exclusivamente os seis biomas continentais do território brasileiro. O mapa mural apresenta os
biomas em cores dominantes, tendo ao fundo, além da representação dos rios e estradas
principais, os polígonos e letras-símbolo das regiões fitoecológicas (conforme o Mapa de
Vegetação do Brasil) que compõem o bioma, com suas formações remanescentes. O mapa
inclui uma nota técnica explicativa sobre os conceitos e a terminologia utilizada, além de dois
quadros: um com a legenda do mapa indicando a área aproximada de cada bioma, e outro com
o percentual de área ocupada pelos biomas nos estados e no Distrito Federal.
Amazônia e Mata Atlântica ocupam 100% de oito estados brasileiros
Maior reserva de diversidade biológica do mundo, a Amazônia é também o maior
bioma brasileiro em extensão e ocupa quase metade do território nacional (49,29%). A bacia
amazônica ocupa 2/5 da América do Sul e 5% da superfície terrestre. Sua área, de
aproximadamente 6,5 milhões de quilômetros quadrados, abriga a maior rede hidrográfica do
planeta, que escoa cerca de 1/5 do volume de água doce do mundo. Sessenta por cento da
bacia amazônica se encontra em território brasileiro, onde o Bioma Amazônia ocupa a
totalidade de cinco unidades da federação (Acre, Amapá, Amazonas, Pará e Roraima), grande
parte de Rondônia (98,8%), mais da metade de Mato Grosso (54%), além de parte de
Maranhão (34%) e Tocantins (9%). O Bioma Mata Atlântica ocupa inteiramente três estados
- Espírito Santo, Rio de Janeiro e Santa Catarina - e 98% do Paraná, além de porções de
outras 11 unidades da federação.
O Bioma Cerrado ocupa a totalidade do Distrito Federal, mais da metade dos estados
de Goiás (97%), Maranhão (65%), Mato Grosso do Sul (61%), Minas Gerais (57%) e
Tocantins (91%), além de porções de outros seis estados. O Bioma Caatinga se estende pela
totalidade do estado do Ceará (100%) e mais de metade da Bahia (54%), da Paraíba (92%), de
Pernambuco (83%), do Piauí (63%) e do Rio Grande do Norte (95%), quase metade de
Alagoas (48%) e Sergipe (49%), além de pequenas porções de Minas Gerais (2%) e do
Maranhão (1%). O Bioma Pantanal está presente em dois estados: ocupa 25% do Mato
Grosso do Sul e 7% do Mato Grosso. O Bioma Pampa se restringe ao Rio Grande do Sul e
ocupa 63% do território do estado.
ANEXO P – Trecho de artigo assinado por Alfredo Homma
429
“Quanto a saída de material genético, que constitui o tema desta CPI da Biopirataria da
Amazônia merecem destacar:
- O primeiro recurso genético importante transferido foi o cacau, efetivado em 1746, por
Frederico Warneaux, para a fazenda de Antonio Dias Ribeiro, em Canavieiras, Bahia e, deste
Estado, para o continente africano, tornando-se em importantes centros produtores nos seus
novos locais de origem;
- Da mesma forma que na atualidade a AIDS constitui o maior desafio da medicina, a malária
constituia um dos maiores flagelos da humanidade até a descoberta do quinino. Essa
importância fez com que Richard Spruce, botânico inglês com grande conhecimento sobre a
Amazônia fosse encarregado de proceder a coleta de mudas de cinchona, de cujas cascas se
extraí o quinino, em 1860, que foi levado para o Sudeste asiático. A Indonésia tornou um dos
maiores produtores de quinino, que por ocasião da II Guerra Mundial, com a invasão do
Sudeste asiático pelas tropas japoneses fizeram com que os americanos envidassem esforços
no desenvolvimento do quinimo sintético para atender as tropas americanas que combatiam
no Pacífico, reduzindo a importância dessa planta;
- A transferência das 70.000 sementes de seringueira da região de Santarém, por Henry
Wickham em 1876, com a colaboração do consul inglês Green, sediado em Belém e, das
próprias autoridades brasileiras, mudou o eixo da História na Amazônia. Isso fez com que o
boom extrativista durasse enquanto cresciam as sementes levadas pelos ingleses para o
Sudeste asiático. É interessante verificar que os brasileiros não conseguiram aprender o
sentido histórico dessa transferência, comportando-se até hoje como as carpideiras
nordestinas, lamentando essa perda. É provável que a escolha de Santarém para a seleção das
sementes de seringueira decorreu da presença de imigrantes americanos que tinham
estabelecido naquela região em 17 de setembro de 1867, insatisfeitos com o resultado da
Guerra da Secessão;
- A batata inglesa foi outro recurso genético importante da América do Sul que foi levado
para a Europa no final do século XVIII, tem sua origem na Cordilheira dos Andes. Tornou-se
em importante base alimentar de diversos países, fazendo com que em 1846-1854, com o
aparecimento de uma doença nos batatais da Irlanda provocasse a morte por inanição mais de
1 milhão de irlandeses e a migração de 1,5 milhão para os USA, entre os quais descendentes
da família Kennedy;
- O tomate, também tem a sua origem na Cordilheira dos Andes, bem como o milho eram
cultivados pelos incas, astecas e maias e tornou-se cultivo agrícola universal;
- Em época recente, as transferências de material genético podem ser testemunhadas por
inúmeros textos científicos, técnicos e populares. Mencionam-se a presença da ipecacuanha,
planta nativa em Rondônia, de cujas raízes se extraí o princípio ativo a ementina, sendo
cultivada experimentalmente em Darjeeling, na base dos montes Himalaia, Índia (Franz,
1993); a castanha-do-pará em Cingapura, Península Malásia, Sri Lanka e Trinidad e Tobago;
a venda de mudas de cupuaçu, sapota do Solimões e grumixama, em viveiros de Miami
(White e White, 1996), e assim por diante;
- Deve-se destacar quanto a saída de 35.000 sementes de seringueira em 1981 coletados nos
Estados do Acre, Mato Grosso e Rondônia através do Acordo entre a EMBRAPA e a
International Rubber Research Development Board, que foi repetida em 1994, com baixo
êxito pelo pequeno percentual de sementes que conseguiram germinar. Em termos práticos
429
HOMMA, Alfredo. Biopirataria na amazônia: ainda é tempo para salvar? Disponível em:
<http://www.atech.br/agenda21.as/download/amazonia2.pdf>. Acesso em 17 out. 2007.
pode-se afirmar que essas trocas foram proveitosas para o país, uma vez que a heveicultura
nacional depende de vários clones provenientes da Malásia. Em 1981 verificou-se também
uma coleta de germoplasmas de dendê nativo da Amazônia (Elaeis oleifera) para programas
de melhoramento genético na Malásia, cujas trocas foram também benéficas para o país;
- Chama-se a atenção, que do ponto de vista econômico, com exceção das culturas de cacau e
seringueira, somente o urucu, que tem origem na América do Sul, não se tornaram em
atividades econômicas importantes nas outras áreas do mundo. Atualmente, o Brasil é a
primeira produtora mundial de urucu e a terceira exportadora, sendo que o Quênia e o Peru
disputam a posição de primeira exportadora. A nível nacional, o Estado de São Paulo é o
primeiro produtor nacional, seguindo-se da Paraíba e, em terceiro lugar, o Estado do Pará”.
(HOMMA, Alfredo. Biopirataria na amazônia: ainda é tempo para salvar? Disponível em:
<http://www.atech.br/agenda21.as/download/amazonia2.pdf>. Acesso em 17 out. 2007.
ANEXO Q
ACORDO ENTRE A OTCA E O BID - FORTALECIMENTO DA
GESTÃO REGIONAL CONJUNTA PARA O APROVEITAMENTO SUSTENTÁVEL
DA BIODIVERSIDADE AMAZÔNICA
430
LEGIII/RG-563338-05
25 de julio de 2005
Señora
Rosalía Arteaga Serrano
Secretaria General
Organización del Tratado de Cooperación Amazónica (OTCA)
SHIS – QI 05, Conjunto 16 Casa 21
Lago Sul -Brasilia, DF, Brasil
C.E.P. 71.615.160
Ref.: Cooperación Técnica Regional No Reembolsable No. ATN/OC-9251-RG. Iniciativa
para la Promoción de Bienes Públicos Regionales. Fortalecimiento de la Gestión Regional
Conjunta para el Aprovechamiento Sostenible de la Biodiversidad Amazónica.
Estimada señora Secretaria General:
Esta carta convenio, en adelante denominada el "Convenio", entre la Organización del
Tratado de Cooperación Amazónica, en adelante denominada el "Organismo Ejecutor" u
"OTCA", y el Banco Interamericano de Desarrollo, en adelante denominado el "Banco", que
sometemos a su consideración, tiene el propósito de formalizar los términos del otorgamiento
de una cooperación técnica no reembolsable al Organismo Ejecutor, hasta por el monto de un
millón novecientos mil dólares de los Estados Unidos de América (US$1.900.000),
provenientes de la Facilidad para la Promoción de Bienes Públicos Regionales, en adelante
denominada la "Contribución", para financiar la contratación de servicios de consultoría y la
adquisición de bienes necesarios para la realización de un programa de cooperación técnica
para el fortalecimiento de la gestión regional conjunta para el aprovechamiento sostenible de
la biodiversidad amazónica, en adelante denominado el "Programa", que se describe en el
Anexo Único de este Convenio. Salvo que en este Convenio se exprese lo contrario, en
adelante el rmino "dólares" significa la moneda de curso legal en los Estados Unidos de
América.
El Banco y el Organismo Ejecutor convienen lo siguiente:
430
ACORDO ENTRE A OTCA E O BID - FORTALECIMENTO DA GESTÃO REGIONAL CONJUNTA
PARA O APROVEITAMENTO SUSTENTÁVEL DA BIODIVERSIDADE AMAZÔNICA. OTCA. 25 jul.
2005. Disponível em: <http://www.otca.org.br/ep/proyetos-programas/index.php?id=1204>. Acesso em: 23
nov. 2007.
Primero. Partes integrantes del Convenio. Este Convenio está integrado por esta
primera parte, denominada las "Estipulaciones Especiales", una segunda parte denominada las
"Normas Generales", y el Anexo Único que se agregan. En el Artículo 1 de las Normas
Generales, se establece la primacía entre las referidas partes y el Anexo.
Segundo. Organismo Ejecutor. El Organismo Ejecutor de este Programa será la
Organización del Tratado de Cooperación Amazónica (OTCA), que se denominará
indistintamente “Organismo Ejecutor” o “Beneficiario”.
Tercero. Condiciones previas al primer desembolso. El primer desembolso de los
recursos de la Contribución está condicionado a que se cumplan, a satisfacción del Banco, las
condiciones previas estipuladas en el Artículo 2 de las Normas Generales.
Cuarto. Reembolso de gastos con cargo a la Contribución. Con la aceptación del
Banco, se podrán utilizar recursos de la Contribución para reembolsar gastos efectuados o
financiar los que se efectúen en el Programa a partir del 22 de junio de 2005 y hasta la fecha
del presente Convenio, siempre que se hayan cumplido requisitos sustancialmente análogos a
los establecidos en este Convenio.
Quinto. Fondo rotatorio. El monto del fondo rotatorio para este Programa será por
la suma equivalente de ciento noventa mil dólares (US$190.000), correspondiente al 10% del
monto de la Contribución.
Sexto. Plazos. (a) El plazo para la ejecución del Programa será de cuarenta y dos (42)
meses, contados a partir de la fecha de vigencia de este Convenio.
(b) El plazo para el último desembolso de los recursos de la Contribución será de
cuarenta y ocho (48) meses, contados a partir de esa misma fecha. El desembolso de los
recursos necesarios para pagar el servicio de auditoría a que se refiere el Artículo 11 de las
Normas Generales debeefectuarse dentro de este plazo. Cualquier parte de la Contribución
no utilizada vencido el plazo antedicho quedará cancelada.
(c) Los plazos indicados anteriormente y otros que se establezcan en este
Convenio sólo podrán ser ampliados, por razones justificadas, con el consentimiento escrito
del Banco.
Séptimo. Costo total del Programa y recursos adicionales. (a) El Organismo
Ejecutor se compromete a realizar oportunamente los aportes que se requieran para la
completa e ininterrumpida ejecución del Programa, en adelante el "Aporte", en adición a la
Contribución y al aporte comprometido por los 8 países participantes, estimado en doscientos
mil dólares (US$200.000). El total del Aporte del Organismo Ejecutor se estima en el
equivalente de trescientos mil dólares (US$300.000) con el fin de completar, conjuntamente
con la Contribución y el aporte comprometido por parte de los países miembros de la OTCA,
la suma equivalente a dos millones cuatrocientos mil dólares (US$2.400.000), en que se
estima el costo total del Programa, sin que estas estimaciones reduzcan la obligación del
Organismo Ejecutor de aportar los recursos adicionales que se requieran para completar el
Programa.
(b) El Aporte del Organismo Ejecutor se destinará a financiar las categorías que,
con cargo al mismo, se establecen en el presupuesto del Programa que aparece en el Anexo
Único.
Octavo. Reconocimiento de gastos con cargo al Aporte. El Banco podrá reconocer
como parte de los recursos del Aporte del Organismo Ejecutor, los gastos efectuados o los que
se efectúen en el Programa a partir del 22 de junio de 2005 y hasta la fecha del presente
Convenio, siempre que se hayan cumplido requisitos sustancialmente análogos a los
establecidos en este Convenio.
Noveno. Monedas para los desembolsos. El Banco hará el desembolso de la
Contribución en dólares.
Décimo. Adquisición de bienes. La adquisición de bienes, que incluye la
contratación de servicios diferentes a los de consultoría, se llevará a cabo de conformidad con
las disposiciones establecidas en el Documento GN-2349-4 “Políticas para la adquisición de
obras y bienes financiados por el Banco Interamericano de Desarrollo”, de fecha 19 de enero
de 2005, en adelante denominado las “Políticas de Adquisiciones”, que el Organismo Ejecutor
declara conocer.
Undécimo. Selección y contratación de consultores. La selección y contratación de
consultores deberá ser llevada a cabo de conformidad con las disposiciones establecidas en el
Documento GN-2350-4 Políticas para la selección y contratación de consultores financiados
por el Banco Interamericano de Desarrollo”, de fecha 19 de enero de 2005, en adelante
denominado las “Políticas de Consultores”, que el Organismo Ejecutor declara conocer.
Duodécimo. Plan de Contrataciones. Antes de que pueda efectuarse cualquier
llamado a licitación (cuando corresponda) en el caso de bienes y servicios (diferentes de los
de consultoría) o antes de efectuarse cualquier solicitud de propuestas a los consultores, el
Organismo Ejecutor deberá presentar a la revisión y aprobación del Banco, el Plan de
Contrataciones propuesto para el Programa, que debe incluir el costo estimado de cada
contrato, la agrupación de los contratos y los métodos de adquisición y selección aplicables,
de conformidad con lo dispuesto en el párrafo 1 de los Apéndices 1 de las Políticas de
Adquisiciones y de Consultores. Este plan deberá ser actualizado cada seis (6) meses durante
la ejecución del Programa y cada versión actualizada será sometida a la revisión y aprobación
del Banco. La adquisición de los bienes y servicios y la selección y contratación de
consultores deberán ser llevadas a cabo de conformidad con el Plan de Contrataciones
aprobado por el Banco y sus respectivas modificaciones.
Decimotercero. Revisión de los contratos. Salvo que el Banco determine por escrito
lo contrario, cada contrato para la adquisición de los bienes y servicios diferentes de los de
consultoría y la contratación de consultores serán revisados en forma ex ante, de conformidad
con los procedimientos establecidos en los párrafos 2 y 3 de los Apéndices 1 de las Políticas
de Adquisiciones y de Consultores.
Decimocuarto. Condiciones especiales de ejecución. Con el fin de buscar la
sustentabilidad de las acciones, la OTCA acordará cumplir las siguientes condiciones
contractuales: (i) ofrecer al Programa y a los consultores, en especial, al Coordinador, las
facilidades logísticas, administrativas y contables indispensables para el funcionamiento del
Programa; (ii) contratar al inicio del tercer año de operaciones, los funcionarios profesionales
necesarios para dar continuidad y mantener los procesos, acciones y mecanismos de gestión y
coordinación apoyados por la operación; (iii) contratar y presentar la auditoria independiente
para el Programa, a satisfacción del Banco; y (iv) formalizar un mecanismo y plan de
coordinación con la Secretaría General de la Comunidad Andina de Naciones (SGCAN). El
Programa contempla, además, actividades para palanquear recursos financieros de largo plazo
en apoyo a iniciativas prioritarias que se desprendan de cada uno de los componentes.
Decimoquinto. Informes de Progreso y finales. Dentro de los treinta (30) días
siguientes de la finalización de cada semestre calendario, la OTCA presentará informes de
progreso, los que deberán incluir: (i) el avance físico-financiero de las actividades; (ii) el
cumplimiento de indicadores del marco lógico; (iii) propuestas para abordar las dificultades
surgidas, y (iv) plan de trabajo del siguiente semestre. El informe final será presentado a los
tres (3) meses de la fecha de finalización del Programa, e incluirá los resultados de la
evaluación contratada para el efecto.
Decimosexto. Disponibilidad de información. El Organismo Ejecutor se
compromete a comunicar al Banco, por escrito, dentro de un plazo ximo de diez (10) días
hábiles, contados a partir de la fecha de suscripción del presente Convenio, si considera
alguna parte de este Convenio como confidencial o delicada, o que pueda afectar
negativamente las relaciones entre el Organismo Ejecutor
y el Banco o entre los clientes del
sector privado y el Banco, en cuyo caso el Organismo Ejecutor se compromete a señalar las
disposiciones consideradas como tales. De conformidad con la política sobre disponibilidad
de información del Banco, éste procederá a poner a disposición del público el texto del
presente Convenio, una vez que el mismo haya sido suscrito y haya entrado en vigencia,
excluyendo solamente aquella información que el Organismo Ejecutor haya identificado
como confidencial, delicada o perjudicial a las relaciones con el Banco en la forma señalada
en este párrafo.
Decimoseptimo. Comunicaciones. Todos los avisos, solicitudes, comunicaciones o
notificaciones que las partes deban dirigirse en virtud de este Convenio, se efectuarán por
escrito y se considerarán realizados desde el momento en que el documento correspondiente
se entregue al destinatario en la dirección indicada a continuación, a menos que las partes
acordasen por escrito de otra manera:
Del Organismo Ejecutor: la dirección correspondiente será la indicada en la primera
página de este Convenio.
Facsímil: (55-61) 248-42-38
Del Banco:
Banco Interamericano de Desarrollo
1300 New York Avenue, N.W.
Washington, D.C. 20577
Estados Unidos de América
Facsímil: (202) 623-3096
EN FE DE LO CUAL, el Organismo Ejecutor y el Banco, actuando cada uno por
medio de su representante autorizado, firman el presente Convenio en dos (2) ejemplares de
igual tenor, en Washington, Distrito de Columbia, Estados Unidos de América, el día arriba
indicado.
Atentamente,
BANCO INTERAMERICANO
DE DESARROLLO
/f/ Enrique V. Iglesias
_______________________________
Enrique V. Iglesias
Presidente
Aceptado Por:
ORGANIZACIÓN DEL TRATADO DE
COOPERACIÓN AMAZÓNICA (OTCA)
/f/ Rosalía Arteaga Serrano
________________________________
Rosalía Arteaga Serrano
Secretaria General
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