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PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
ÁREA DE CIÊNCIAS NATURAIS E TECNOLÓGICAS
Curso de Mestrado Profissionalizante em Ensino de Física e de Matemática
LETÍCIA MENEZES PANCIERA
A ETNOMATEMÁTICA E OS SABERES COTIDIANOS DOS ALUNOS DA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Santa Maria, RS
2007
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LETÍCIA MENEZES PANCIERA
A ETNOMATEMÁTICA E OS SABERES COTIDIANOS DOS ALUNOS DA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado Profissionalizante em Ensino de
Física e de Matemática do Centro
Universitário Franciscano como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre
em Ensino de Matemática.
Orientadora: Profª. Drª. MARIA ARLETH PEREIRA
Santa Maria, RS
2007
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CENTRO UNIVERSITÁRIO FRANCISCANO
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
CURSO DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM ENSINO DE FÍSICA E DE
MATEMÁTICA
A COMISSÃO EXAMINADORA, ABAIXO-ASSINADA, APROVA A DISSERTAÇÃO:
A ETNOMATEMÁTICA E OS SABERES COTIDIANOS DOS ALUNOS DA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Elaborada por:
LETÍCIA MENEZES PANCIERA
COMISSÃO EXAMINADORA
______________________________________________
Profª. Drª. Maria Arleth Pereira
Presidente
_______________________________________________
Profª. Drª. Rosane Carneiro Sarturi
_______________________________________________
Profª. Dr. Marcio Violante Ferreira
Santa Maria, 23 de novembro de 2007
DEDICATÓRIA
Aos meus queridos pais, Lino e
Leda, como gratidão pelo amor, carinho,
incentivos constantes ao longo de minha
vida e ao meu noivo Alex, pela
compreensão e paciência durante esta
caminhada; vocês foram essenciais nesta
conquista.
AGRADECIMENTOS
Nesta caminhada, com inúmeros desafios, dificuldades e conquistas, é
grande o meu prazer em poder agradecer, externando a estas pessoas esse
sentimento que me faz sentir tão bem: a minha gratidão.
Agradeço a Deus, presença constante nos momentos de reflexão, sabedoria
e capacidade para a realização desta pesquisa, principalmente por abençoar-me
com saúde, fundamental para a vida.
Á minha amada mãe, Leda, incentivadora para a realização do curso de
mestrado e que nunca mediu esforços para colaborar com as suas idéias nesta
caminhada, seus pensamentos positivos foram essenciais e a confiança depositada
em mim foi muito significativa, vibrava a cada conquista.
Ao meu querido pai, Lino, que muitas vezes angustiava-se ao me ver
escrevendo esta dissertação e dizia carinhosamente: “filha, falta muito ainda...”
Ao Alex, anjo da minha vida, pelo amor, carinho, incentivo, colaboração,
sempre dando muita força e apoio para a realização desta pesquisa.
À minha orientadora, Profª. Drª. Maria Arleth Pereira, por sua valiosa
contribuição e orientação, pela confiança depositada e pelas palavras de incentivo
durante esta caminhada.
Ao Prof. Dr. Márcio Violante Ferreira, por suas importantes sugestões durante
a realização deste trabalho.
Aos meus professores do Curso de Mestrado - Unifra, pelo incentivo ao meu
crescimento profissional.
Aos meus colegas do curso: Liane, Caren, Marinez, Mateus, Eugênio, Paulo,
Dieini, Salete, Lurdes Eliane, Ana Cristina, Carlos e carinhosamente, as amigas
Eliana Druzian e Lucilene Dalmedico.
Aos meus colegas de trabalho das escolas em que atuo, em especial a minha
amiga Eliane de Fátima Diniz.
Aos queridos alunos da EJA, pela receptividade proporcionada em seus locais
de trabalho, possibilitando o desenvolvimento da pesquisa.
Por fim, agradeço a todas as pessoas que de uma forma ou de outra
contribuíram para esta conquista. Obrigada!
Pela educação, “queremos mudar o mundo, a começar pela sala de aula, pois
as grandes transformações não se dão apenas como resultantes dos grandes
gestos, mas de iniciativas cotidianas, simples, e persistentes”.
Gadotti (2001, p. 68)
RESUMO
Este trabalho é resultado de um estudo que envolveu um relato de
experiência com o emprego da abordagem Etnomatemática. A temática centrou-se
nos valores das práticas vivenciadas pelos alunos da etapa cinco da Educação de
Jovens e Adultos (EJA), de uma escola estadual, da região central do Rio Grande do
Sul. O objetivo neste foi desenvolver, analisar e interpretar a inter-relação dos
conceitos matemáticos, trabalhados em sala de aula e aprendidos pelos alunos, a
partir das diferentes situações vivenciadas por esses jovens adultos em seus
ambientes de trabalho e de seus interesses. Neste estudo, trazemos as questões
dos afazeres e da vivência cotidiana em geral para sala de aula, envolvendo os
diferentes saberes matemáticos e valores profissionais construídos por esses alunos,
enquanto trabalhadores, a fim de estabelecer a conexão com o conhecimento
matemático construído e elaborado pela base científica. O processo metodológico
caracterizou-se pela análise teórica, questionário, observação participante e pela
entrevista semi-estruturada com os alunos. Esses procedimentos foram significativos
para a análise do desenvolvimento da experiência pedagógica desenvolvida neste
contexto. As evidências registradas revelam que o conhecimento matemático do
ponto de vista cognitivo, quando conectado com o saber fazer de um grupo
profissional, valoriza o aluno como sujeito e acrescenta-lhe valores culturais. Os
resultados confirmaram que é possível relacionar o conhecimento matemático,
construído no contexto do saber da experiência de um grupo social, ao modo de
compreender e explicar as relações quanti-qualitativas. A Etnomatemática, por meio
de suas múltiplas possibilidades, pode contribuir para a construção de uma
aprendizagem significativa e uma prática pedagógica transformadora. Para a nossa
experiência, como professora e pesquisadora da EJA, foi possível fortalecer a nossa
prática, a partir de várias situações vivenciadas durante as experiências realizadas
nesse contexto.
Palavras-chave: Etnomatemática. Saber cotidiano. Ambientes de trabalho.
Aprendizagem significativa. EJA.
ABSTRACT
This work is the result of a study involving the Ethnomathematics approach,
which was used to analyse the values of experiences of students in the fifth grade of
Youth and Adult Education (EJA), a state school in the central part of Rio Grande do
Sul in the south of Brazil. The aim of this work was to a) develop, review and interpret
the interrelation of mathematical concepts with classroom learning and other
activities b) raise issues of student behaviour and daily experience through the
application of different mathematical skills and professional practices, to establish a
link with learning based on scientific knowledge. The methodological process
consisted of a theoretical review, questionnaire, participative observation and semi-
structured interviews with our students. These procedures were key to a review of the
development of the pedagogical experience developed in this context. The findings
show that mathematical knowledge from a cognitive point of view, as related to the
know-how of a professional group, promotes the student as an individual and
enhances cultural values. The results confirm that it is possible to relate
mathematical knowledge, within the context of a social group, to the understanding
and explanation of quantitative and qualitative relations. Ethnomathematics, owing to
its multiple applications, can contribute to relevant learning and evolving pedagogical
practice. Through our experience, as a teacher and researcher with EJA, we
managed to enhance our practice in various situations encountered during the study.
Key-words: Ethnomathematics, general knowledge, work environment, relevant
learning, EJA.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................13
1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.............................................................................16
1.1 Contextualizando a Educação de Jovens e Adultos......................................16
1.2 Etnomatemática: contribuições para o ensino da Matemática na EJA........22
1.3 Os diferentes saberes.......................................................................................27
1.4 As teorias da aprendizagem no contexto do ensino da Matemática............29
2 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA...........................................................................39
2.1 Espaço de desenvolvimento da pesquisa e os sujeitos envolvidos ............40
2.2 O contexto operacional da pesquisa...............................................................42
2.3 Os procedimentos e as técnicas utilizadas para a coleta de dados.............45
3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS..........................................49
3.1 Análise e interpretação dos dados do questionário que investigou as
vivências relacionadas ao fazer matemático no cotidiano do aluno..................49
3.1.1 Considerações sobre respostas dos alunos ao questionário ...........................50
3.2 Análise dos dados obtidos nas visitas in loco...............................................56
4 DESCRIÇÃO E RELATO DAS AULAS.................................................................56
4.1 Aula 1..................................................................................................................58
4.2 Aula 2..................................................................................................................67
4.3 Aula 3..................................................................................................................77
4.4 Aula 4..................................................................................................................81
4.4.1 Visita nº 1 - Padaria..........................................................................................81
4.4.2 Visita nº 2 – Mercado .......................................................................................82
4.4.3 Visita nº 3 – Ferraria.........................................................................................83
4.4.4 Visita nº 4 – Sítio Hotel.....................................................................................84
4.5 Aula 5..................................................................................................................93
4.6 Aula 6..................................................................................................................99
4.7 Aula 7................................................................................................................105
CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................115
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................................120
APÊNDICE A - Questionário.................................................................................126
APÊNDICE B - Consentimento Livre e Esclarecido. ..........................................128
ANEXO A – Livro Caixa.........................................................................................130
ANEXO B – Boleto Bancário.................................................................................132
ANEXO C – Boleto Bancário.................................................................................134
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: o aluno A mostra a aplicabilidade da serrafita............................................59
Figura 2: mostrando o funcionamento da desempenadeira ......................................59
Figura 3: mostrando a espessura da madeira...........................................................60
Figura 4: material utilizado para fazer detalhes nos móveis em madeira..................60
Figura 5: o aluno utiliza no seu trabalho a lixadeira ..................................................60
Figuras 6 e 7: objetos construídos pelo aluno A........................................................60
Figura 8: explicação do cálculo relacionado à pergunta 4.........................................61
Figura 9: saber cotidiano do aluno............................................................................61
Figura 10: atividades desenvolvidas com objetos circulares.....................................64
Figuras 11, 12 e 13: atividades práticas....................................................................65
Figuras 14, 15 e 16: trabalhos em grupo...................................................................65
Figura 17: a pesquisadora no local de trabalho do aluno da EJA .............................68
Figura 18: a professora e o aluno no laboratório da cooperativa ..............................68
Figuras 19 e 20: aparelho que controla a umidade dos produtos em graus..............68
Figura 21: silo............................................................................................................69
Figura 22: medida da altura do objeto cilíndrico........................................................71
Figura 23, 24: realização das atividades nos grupos ................................................73
Figura 25: utilizando a régua para medir o diâmetro da lata .....................................74
Figura 26: gráficos de colunas ..................................................................................80
Figuras 27, 28 e 29: a aluna J no seu local de trabalho............................................82
Figura 30: J na sala de aula.....................................................................................82
Figura 31 e 32: O aluno P no seu trabalho e na sala de aula da EJA.......................82
Figura 33: A aluna E na ferraria ................................................................................83
Figura 34: paquímetro...............................................................................................83
Figura 35: A aluna E na sala de aula ........................................................................83
Figura 36 e 37: a aluna I no seu local de trabalho....................................................84
Figura 38: a aluna realizando o seu cálculo no livro caixa ........................................93
Figura 39: a aluna mostrando como faz a ampliação dos desenhos no pano...........94
Figura 40 e 41: trabalhos realizados pela aluna........................................................94
Figura 42: amostra de uma revista que utiliza para fazer seus trabalhos manuais...95
Figura 43 e 44: a aluna como realiza ampliações e reduções das figuras retiradas
das revistas...............................................................................................................95
Figura 45: a aluna estava reduzindo a figura ............................................................97
Figuras 46 e 47: redução e ampliação de pentágonos..............................................97
Figuras 48 e 49: redução e ampliação de flores........................................................98
Figura 50: análise dos boletos bancários com a professora ...................................100
Figura 51: produtos cosméticos trazidos pelas alunas............................................100
Figura 52: troca de conhecimento entre os colegas................................................101
Figura 53: cálculos de uma aluna............................................................................102
figura 54: discussão no grupo 3 sobre os juros.......................................................102
Figura 55: discussão no grupo 4.............................................................................103
Figura 56: grupo 5...................................................................................................103
Figura 57: os alunos do grupo realizando os cálculos matemáticos .......................103
Figura 58: grupo 6...................................................................................................104
Figura 59: atividade prática na cozinha...................................................................106
Figura 60: a colega explicando os ingredientes da receita......................................106
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Cálculo Prático do Valor do
π
...................................................................63
Tabela 2: Índice de Massa Corporal (IMC)................................................................79
Tabela 3: IMC de Mulheres e Homens......................................................................79
Tabela 4: Exemplo do Livro Caixa Trabalhado por uma Aluna. ................................92
Tabela 5: Receita Original e o Seu Dobro...............................................................108
Tabela 6: Proporcionalidade e Proporção...............................................................109
Tabela 7: Proporcionalidade....................................................................................110
Tabela 8: Proporcionalidade....................................................................................111
Tabela 9: Proporcionalidade....................................................................................111
Tabela 10: Proporcionalidade..................................................................................112
13
INTRODUÇÃO
No ano de 2004, iniciamos nossas atividades de ensino numa turma de 38
alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Nessa ocasião, percebemos que
muitos jovens e adultos de 15 a 65 anos procuravam novamente a escola a fim de
retomarem os estudos, que haviam deixado de lado, porque trabalhavam, eram pais
ou mães de família. Por isso, nessa volta, encaravam a escola como uma
oportunidade de aquisição de conhecimento e formação que lhes propiciasse auxiliar
na educação dos filhos, conseguirem emprego no mercado de trabalho, ou até
mesmo garantirem o seu.
Com o emprego de uma dinâmica de conhecimento desses alunos, em
termos de informação sobre o seu mundo de trabalho, de seu cotidiano, de suas
aspirações, valores, entre outras, constatamos que a maioria deles apresentava
dificuldades em relacionar aos conteúdos matemáticos aprendidos em sala de aula
com os conhecimentos vivenciados no seu ambiente de trabalho e de vida em geral.
A partir dessa constatação, surgiu este estudo, voltado para o relato de
experiência que envolveu o desenvolvimento de uma proposta de ensino de
Matemática com o emprego da abordagem Etnomatemática, junto aos alunos da
etapa cinco da EJA, do Ensino Fundamental, de uma Escola Estadual, da Região
Central, do Rio Grande do Sul.
Assim, o propósito deste trabalho consistiu em valorizar as experiências que
esses alunos traziam para a sala de aula e, aos poucos, passamos a introduzir, com
o auxilio do exercício da criatividade, uma metodologia de trabalho pedagógico que
facilitasse a interligação das vivências e dos saberes aprendidos por eles na vida
cotidiana com os conceitos matemáticos aprendidos na escola, de forma que
pudessem perceber as relações existentes entre os afazeres próprios do seu mundo
social e o conhecimento científico próprio da Matemática.
Portanto, o objetivo proposto foi trazer as questões dos afazeres e das
14
vivências cotidianas para a sala de aula, envolvendo os diferentes saberes
matemáticos, os valores profissionais e sociais construídos por esses alunos,
enquanto trabalhadores e cidadãos, para que pudéssemos estabelecer a conexão,
com o auxílio das múltiplas possibilidades de contribuição da Etnomatemática, entre
os aspectos quantitativos e qualitativos das experiências vivenciadas, dentro e fora
da escola.
Na complexidade da problematização, preocupamo-nos em identificar quais
os conceitos matemáticos que se fazem presentes nas diferentes práticas sociais
desenvolvidas pelos alunos em seus ambientes de trabalho e, como esses saberes,
construídos nas suas atividades profissionais, poderão ser aplicados no contexto
escolar.
Nessa fase, utilizamos leituras pertinentes e afins ao campo da Educação
Matemática, de circulação de propostas e idéias compreendidas e fundadas na
relação de valores sociais e culturais, à luz da realidade concreta e presente na
sociedade. Nessas teorias que se encontram contempladas na nossa revisão de
literatura, destacamos as contribuições de D’Ambrósio, Freire, Santomé, Zabala,
Ausubel, Miranda, Smole e Diniz, Fonseca, Moreira, Sacristán, Monteiro, Fiorentini,
Knijnik e outros que, de forma direta ou indireta, contribuíram para referendar a
contextualização desse trabalho.
Com o propósito de responder ao nosso problema de investigação, lançamos
mão de um processo metodológico que se caracterizou pelo emprego de
instrumentos orais e escritos, como questionário, observação participante, entrevista
semi-estruturada e diário de campo, com objetivo de registrar as informações obtidas
nas visitas que fizemos ao local de trabalho dos alunos, na sala de aula, na
convivência informal, identificando os conhecimentos prévios de Matemática
presentes nas práticas desses alunos, nas diversas aprendizagens observáveis.
Com os dados coletados, procuramos articular o referencial teórico com as
estruturas que compõem o desenvolvimento do experimento.
Quanto às aulas ministradas, essas foram planejadas, partindo sempre da
problematização decorrente dos registros obtidos por meio das visitas realizadas,
dos resultados da aplicação do questionário sobre os conhecimentos prévios de
Matemática dos alunos. Durante o desenvolvimento das aulas, tivemos o cuidado de
focar nossa atenção nos interesses dos alunos e nas suas reações diante da
construção científica do saber.
15
Nesse sentido, com o cuidado necessário, partimos para a implantação de
estratégias de ensino diferenciado, na busca de atividades mais próximas dos
saberes cotidianos, conquistando assim o interesse e a motivação de cada um deles.
Dando seqüência às etapas deste experimento, apresentamos a descrição e
a análise das atividades desenvolvidas nas aulas de Matemática com a sinalização
de resultados desafiadores em termos de aprendizagem significativa para alunos
jovens e adultos.
Sabemos que, para haver aprendizagem significativa na disciplina de
Matemática, é importante que o aluno entenda que os conteúdos desenvolvidos
estão ligados as suas vivências do dia-a-dia e que, por isso, faz-se necessária a
contextualização como forma de vivenciar as situações-problema para que melhor
conheça sua capacidade e busque soluções para suas dificuldades de
aprendizagem e também, para avançar no seu processo do saber conhecer, para
aplicar no seu fazer, como condição indispensável e necessária ao fortalecimento da
sua forma de ser cidadão.
Nas considerações finais, tivemos a preocupação de elencar os principais
resultados alcançados em decorrência das análises e discussões realizadas,
confirmando, assim, a contribuição da Etnomatematica para o ensino de Matemática,
como uma abordagem interativa que contempla a mediação dos múltiplos aspectos
socioeconômicos, enquanto prática social, vividos por grupos na sociedade, os
aspectos pedagógicos do processo ensino e aprendizagem e o conhecimento
cientifico de base. Essa mediação faz da Matemática um campo ideal que permite a
formação de sujeitos criativos, autônomos e autoconfiantes.
O trabalho destaca-se como uma proposta qualitativa, principalmente, pela
disposição em se aproximar de fenômenos sociais que não são só quantificáveis,
tais como valores e crenças. Acreditamos que a objetivação da realidade não-
quantificável, no cotidiano dos alunos jovens e adultos, suscita conhecimento
matemático com capacidade de ampliar as oportunidades comprometidas
socialmente com a sua própria transformação e com a dos outros.
16
1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1 Contextualizando a Educação de Jovens e Adultos
Os dados sobre a realidade educacional brasileira indicam que os programas
de Educação de Jovens e Adultos são necessários em nossa sociedade,
principalmente, porque a educação é um direito de todo e qualquer cidadão.
O campo da EJA está se firmando de maneira intensa com sua especificidade,
suas dificuldades próprias e também com suas deficiências, as quais precisam ser
vencidas.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº. 9.394/96, na seção V,
do capítulo II, arts. 37 e 38, assegura a oferta de oportunidade escolar à população
de jovens e adultos, fora da idade regular, mas estabelece a necessidade de uma
abordagem pedagógica diferenciada.
A ressignificação da concepção de EJA, baseada na elaboração dessas
diretrizes e na formulação de políticas de alfabetização, passa a ser vista como
modalidade de ensino. Possui características próprias, envolve materiais e
procedimentos adequados à faixa etária, metodologias, conteúdos apropriados à
aprendizagem dos alunos, sustentados na adequação de práticas pedagógicas e
nas necessidades dos jovens e adultos.
A oferta educacional para jovens e adultos se distribui em três grupos bem
distintos: primeiro, aqueles reconhecidamente não-letrados, ou também não-
escolarizados; segundo, aqueles que foram à escola, passaram ali pouco tempo e,
portanto, não tiveram tempo de sedimentar o que haviam, superficialmente,
aprendido; e terceiro, aqueles que estiveram na escola em momentos não contínuos.
A condição de não-criança repercute de diversas formas do ponto de vista da
incorporação do aluno ao sistema e às práticas escolares. Em primeiro lugar, está a
luta pelo direito à Educação Básica. Assim, o artigo 208 da Constituição Federal
vigente (BRASIL, 1988) assegura que:
O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de:
I. Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele
não tiveram acesso na idade própria.
Em atendimento a esse artigo, devemos dar oportunidade de estudo às
17
pessoas de mais idade que não tiveram acesso, na época adequada, à
escolarização.
Na década de 60, um novo paradigma pedagógico surgiu. O pensamento
pedagógico de Freire (2002) passou a direcionar diversas experiências de
educação popular com adultos. Freire propunha uma ação educativa que se
pautasse em sua cultura e que fosse baseada no diálogo. Esse paradigma
pedagógico muito contribui para o desenvolvimento da política da Educação de
Jovens e Adultos.
A Educação de Jovens e Adultos
1
tem construído sustentabilidade na área
educacional a partir da normatização legal do Conselho Estadual de Educação -
CEED/RS, através da Resolução Nº. 250/99 e do Parecer Nº. 774/99, em
cumprimento ao disposto na LDB, art.9, IV, que orientam a oferta dessa modalidade
no Ensino Fundamental e Médio. Visando à qualidade da Educação de Jovens e
Adultos, o Conselho Nacional de Educação aprovou as Diretrizes Curriculares
Nacionais para EJA – Parecer CNE/CEB Nº. 11/2000 e Resolução CNE/CEB Nº.
01/2000, que devem ser observados pelas instituições integrantes dos diferentes
sistemas de ensino.
A EJA, segundo parecer CEB Nº 11/2000, p.5:
[...] é uma categoria organizacional constante da estrutura da educação
nacional, com finalidades e funções específicas, o que significa o direito a
uma escola de qualidade, pois, dentro dos seus limites, a educação escolar
possibilita um espaço democrático de conhecimento e de postura tendente
a assinalar um projeto de sociedade menos desigual (apud RIO GRANDE
DO SUL, 2006).
A idéia é que a escola trabalhe um processo psicopedagógico, respeite o
perfil cultural do aluno adulto, oportunize-lhe o aproveitamento da experiência
humana adquirida no trabalho, fonte insubstituível na construção da trajetória da
auto-aprendizagem.
Conforme o Parecer CEB Nº 11/2000, p.47:
“[...] a educação possibilita a jovens e adultos retomar seu potencial,
desenvolver suas habilidades, confirmar competências adquiridas na
educação extra escolar e na própria vida, possibilitar um nível técnico e
profissional mais qualificado” (apud RIO GRANDE DO SUL, 2006).
1
Atualmente a EJA conta com uma longa legislação. Os pareceres e resoluções estão disponíveis no site:
http://portal.mec.gov.br
18
A proposta desta pesquisa se confirma nesse parecer, pois buscamos
resgatar os conhecimentos prévios dos alunos no seu trabalho e na sua cultura,
oferecendo-lhes oportunidades de novas aprendizagens.
A educação básica, segundo o Parecer Nº. 774/99 do CEED, deve organizar-
se “através do desencadeamento de propostas e programas que atendam aos
interesses da parcela da população considerada excluída, resgatando o
conhecimento prévio dos educandos, fazendo-os partícipes nos processos de
investigação, na resolução de problemas, na construção de conhecimentos de forma
a responderem com eficácia, às necessidades de vida, trabalho e participação
social” (RIO GRANDE DO SUL, 2006, p.47).
Com essa perspectiva, consideramos que atuar junto à EJA é uma
oportunidade significativa de reconstrução de experiências de vida ativa, com
valorização dos conhecimentos de etapas anteriores da escolarização, articulando-
os com os saberes escolares.
Para Arroyo (2003), os educandos da EJA são sujeitos da construção desse
espaço, têm características próprias e uma identidade construída, coletivamente,
entre alunos e educadores.
A compreensão da EJA, como um direito do cidadão, uma necessidade da
sociedade e uma possibilidade de realização da pessoa, como sujeito de
conhecimento, tem uma significativa repercussão na prática pedagógica do
educador.
Quem trabalha com Educação de Jovens e Adultos, não atende a pessoas
“desencantadas” com a educação, mas sujeitos que chegam à escola, trazendo
saberes, vivências, culturas, valores, visões de mundo e de trabalho.
É necessário que os educadores de jovens e adultos estejam abertos à
especificidade e à identidade cultural dos seus alunos, ainda que eles sejam
indivíduos com histórias de vida bastante diferenciadas.
O currículo pode ser descrito como um projeto educacional planejado e
desenvolvido a partir de uma seleção da cultura e das experiências, nas quais se
deseja a participação das novas gerações, a fim de socializá-las e capacitá-las para
serem cidadãos solidários, responsáveis e democráticos (SANTOMÉ, 1998).
Trabalhar com esta modalidade de ensino exige flexibilidade na organização
curricular. O desenvolvimento dos conteúdos não pode se ausentar da vivência do
trabalho e da expectativa de melhoria de vida, deve oferecer oportunidades de
19
aprendizagem tanto em termos de assimilação de conceitos e dados quanto no
domínio de instrumentos de trabalho e capacidades de atuação autônoma,
permitindo a discussão e a ampliação de saberes já construídos.
A organização do currículo da EJA exige um pensar reflexivo e crítico acerca
de todo o contexto que necessita ser adequado aos alunos, pois esses possuem
uma vivência bem diferente da oferta tradicional de ensino. Por isso, devem-se criar
situações pedagógicas que satisfaçam as necessidades de aprendizagem da
Educação de Jovens e Adultos, que atende a cidadãos participantes, sujeitos de sua
própria aprendizagem.
Assim, torna-se inevitável uma atuação pedagógica que tenha um enfoque
globalizador cujos conteúdos de aprendizagem sejam os meios para conhecer ou
responder às questões que a realidade experiencial dos alunos proporciona:
realidade essa sempre global e complexa.
O enfoque globalizador, conforme Zabala, define-se na
[...] maneira de organizar os conteúdos a partir de uma concepção de
ensino na qual o objeto fundamental de estudo para os alunos seja o
conhecimento e a intervenção na realidade. Aceitar essa finalidade significa
entender que a função básica do ensino é potencializar as capacidades que
lhes permitam responder aos problemas reais em todos os âmbitos de
desenvolvimento pessoal, sejam sociais, emocionais ou profissionais (2002,
p. 35).
Desse modo, a capacidade de compreender e intervir na realidade significa
dispor de instrumentos cognoscitivos que permitam lidar com a complexidade, e
esse enfoque globalizador oportuniza aos alunos os meios para compreenderem e
atuarem na complexidade.
Freire é categórico quanto ao papel social e revolucionário da educação e
registra essa visão em: A Pedagogia do Oprimido, ao dizer:
A educação como prática de liberdade, ao contrário daquela que é
prática da dominação, implica na negação do homem abstrato, isolado,
desligado do mundo, assim como na negação do mundo como uma
realidade ausente dos homens. A reflexão que propõe, por ser autêntico,
não é sobre este homem abstração nem sobre este mundo sem homens
mas sobre os homens em suas relações com o mundo (1987, p. 70).
Esse argumento bem pode caracterizar o conceito freireano sobre a
capacidade transformadora da educação a partir do instante em que se fala do
20
homem concreto, daquele que pensa, sente, espera e aspira a condições dignas de
vida na sua relação com o mundo.
A inclinação de Freire pela educação popular e pela alfabetização de adultos
é produto da aguda percepção que esse autor tem sobre as condições insuportáveis
de alienação em que vive a população da base da pirâmide social.
Atualmente, as pessoas sentem-se pressionadas pela demanda do mercado
de trabalho e pelos critérios de uma sociedade, na qual o saber letrado é valorizado,
e isso lhes desperta a necessidade de retornarem aos estudos, almejando uma vida
mais digna.
A Educação de Jovens e Adultos nos remete a uma caracterização da
modalidade pela idade dos alunos participantes. Assim, o grande traço definidor da
EJA é a caracterização sociocultural de seu público.
Os alunos jovens e adultos caracterizam-se como um grupo heterogêneo, do
ponto de vista da faixa etária, da cultura, da visão de mundo, dos conhecimentos
prévios. Trazem consigo características de baixa auto-estima, atitudes de extrema
timidez, fracasso escolar, insegurança e de desvalorização pessoal diante de novos
desafios.
Verificamos durante os períodos de aulas que alguns alunos preferiam
silenciar a se exporem nas atividades propostas em sala de aula, porém, depois de
realizadas as visitas, víamos esses mesmos alunos libertarem-se, expondo suas
maiores riquezas, ou seja, “o conhecimento de trabalho e experiências cotidianas”.
É fato que eles trazem saberes ricos e diversos, nascidos da interação com o meio
físico, familiar, da experiência com o trabalho e dos papéis sociais que cada um
desempenha.
Por isso, concordamos com as afirmações de Miranda (2003, p. 79), ao
declarar que:
Oportunizar e valorizar dentro da EJA as diferentes culturas que
fazem parte do cotidiano, da realidade dos nossos educandos, com ênfase
a sua cultura pessoal e intelectual, num clima harmônico para que o
educando sinta-se estimulado a enfrentar obstáculos e vencer objetivos é
passo fundamental para a educação voltada à realidade.
A experiência que os alunos trazem consigo para o ambiente escolar contribui
para conhecê-los, o que possibilita auxiliá-los na aprendizagem da Matemática.
Sabemos que os alunos da EJA esperam aprender conteúdos que possam ter
21
aplicabilidade no seu dia a dia profissional e, para isso, devemos contextualizar as
atividades propostas dentro das suas realidades.
No Brasil, o trabalho de Carraher (1982), apud MENDES (2001, p. 78),
[...] analisaram o desempenho de meninos vendedores de cocos em Recife,
em problemas apresentados tanto na forma oral como na escrita formal,
semelhante ao que é apresentado na escola tradicional. Os autores
verificaram que os meninos apresentavam um bom desempenho na
resolução de problemas na forma oral, porém apresentavam grande
dificuldade em resolver os mesmos problemas quando expressos na forma
escrita. Para resolver os problemas orais, eles podiam usar o seu modo
próprio de trabalhar as quantidades e preços dos cocos – a sua prática de
numeramento. Mas esses mesmos problemas, apresentados do modo
proposto pela prática escolar, passavam a ser algo totalmente novo,
desvinculado do contexto.
Segundo esse autor, a escola valoriza um tipo de escrita (um tipo de prática
de letramento e numeramento). Não existe a possibilidade de outra forma escrita
que seja mais condizente com os procedimentos orais presentes nessas práticas. Os
alunos da EJA também demonstraram que, na prática, era mais fácil explicar como
utilizavam a Matemática no seu dia a dia, do que escrever em sala de aula, pois
apresentavam dificuldades na escrita.
Para Smole e Diniz, “[...] escrever depende de um planejamento que não é
necessariamente escrito, mas que auxilia na escrita” (2001, p. 23). O recurso da
escrita, segundo as autoras, não possui a mesma rapidez e maleabilidade da
oralidade em determinados fatos durante o desenvolvimento das aulas.
Pinto (2003), em seu livro, “Sete Lições sobre Educação de Adultos”, aborda
questões que traduzem conceitos sobre o tema “Educação de Adultos”. Tais
concepções evidenciam e enfatizam a realidade do trabalhador, bem como o
conjunto de conhecimentos básicos que possui. Assim, para lidar com a educação
de adultos, faz-se necessário considerar a sua condição de sujeitos pensantes,
dotados de experiências, portadores de idéias e, conseqüentemente, atuantes e
úteis a sua sociedade.
Dessa forma, é imprescindível que a competência do educador se concretize
na prática de um método crítico de educação de adultos que dê ao aluno a
oportunidade de alcançar a consciência crítica instruída de si e do mundo, por meio
de conteúdos e atividades de real significância, contemplando o que o educando
adulto precisa saber para a sua inserção no universo letrado.
O artigo sobre Letramento e etnologia: fundamentos conceituais da educação
22
de jovens e adultos (FRASSETO, 2006) salienta que as políticas para educação
desses contribuem para a superação da alfabetização instrumental, sendo
compostas a partir do prefixo etno, tal como a Etnomatemática. Assim, essa teoria
resgata o saber de outras culturas sobre os modos de quantificar, calcular e
mensurar.
Devemos considerar que o sentido de aprender, nas classes de EJA, está no
encontro dos alunos com a satisfação de suas necessidades e expectativas. Essas
foram se construindo ao longo da vida e no contexto de sua cultura. O lugar em que
vivem e as suas experiências são o ponto de partida, para que possam atribuir
sentido ao conhecimento.
1.2 Etnomatemática: contribuições para o ensino da Matemática na EJA
Diversos trabalhos citados por D’Ambrósio (1998) não apenas trazem uma
análise de relevância social do conhecimento matemático, como enfatizam a
responsabilidade das escolhas pedagógicas que devem evidenciar essa relevância
na proposta do Ensino de Matemática a ser desenvolvido, contemplando-se
problemas significativos para os alunos a situações hipotéticas, artificiais e
repetitivas.
Para Fonseca (2002),
O papel na construção da cidadania que se tem buscado conferir à
educação de jovens e adultos pede hoje um cuidado crescente com o
aspecto sociocultural da abordagem matemática. Torna-se cada vez mais
evidente a necessidade de contextualizar o conhecimento matemático a ser
transmitido ou construído, não apenas inserindo-o numa situação-problema,
ou uma abordagem dita concreta, mas buscando suas origens,
acompanhando sua evolução, transformação da realidade com a qual o
aluno se depara e/ou de suas formas de vê-la e participar dela (p. 54).
Assim, a aprendizagem da Matemática deve justificar-se como uma emoção
presente, que comove os sujeitos, enquanto resgata e atualiza vivências,
sentimentos, cultura e torna possível compreender o mundo em que vivemos.
Segundo Knijnik (1998), a “Abordagem Etnomatemática” pode ser vista como
uma proposta para o ensino da Matemática que procura resgatar a intencionalidade
do sujeito cultural em seu fazer matemático.
O cotidiano está impregnado dos saberes e fazeres próprios da cultura, em
23
que esses são contextualizados e responde a fatores naturais e sociais. A todo
instante os indivíduos fazem comparações, classificações, medições, generalizações
e, de algum modo, avaliações, usando os instrumentos materiais e intelectuais que
são próprios à sua cultura.
Na experiência de Fonseca (2002), “[...] como educadora de jovens e adultos
e pesquisadora no campo de educação da EJA, jamais escutou de um aluno ou uma
aluna algo como: “eu acho que a gente não devia aprender Matemática”, já escutei
que a Matemática é difícil, chata, teimosa, abstrata, irracional, mas jamais que ela
fosse dispensável.
Segundo a autora, esse é um fenômeno interessante porque sugere que o
questionamento dos educandos jovens e adultos pousa sobre os modos de
matematizar, mas não sobre a importância de fazê-lo.
Também concordamos com as palavras de D'Ambrósio (1998) de que o verbo
"matematizar" deve ser usado para indicar as diversas capacidades relativas à
quantificação, medição, classificação e ordenação do mundo.
Do mesmo modo que a escrita e a leitura, a compreensão de situações
numéricas envolve uma série de conhecimentos, capacidades e competências que
não abrangem apenas a mera decodificação dos números; muito além disso,
abarcam também a compreensão de diversos tipos de relações ligadas ao contexto
social.
Segundo Monteiro:
[...] na resolução de problemas, quando se privilegiam problemas do
cotidiano, busca tornar o ensino da matemática mais significativo para quem
aprende, na medida em que parte do real-vivido pelos educandos (1991,
p.110).
Para os jovens e adultos da EJA, reconhecemos a necessidade de
considerarmos as experiências que trazem de sua vida cotidiana. Conforme D’
Ambrósio, em 1986,
[...] respeitar o passado cultural do aluno não só lhe daria confiança em seu
próprio conhecimento e na sua habilidade de conhecer, como também lhe
conferir “uma certa dignidade cultural ao ver suas origens culturais sendo
aceitas por seu mestre e desse modo saber que esse respeito se estende
também a sua família e a sua cultura” (p. 5).
O reconhecimento de outras formas de pensar, inclusive a da Matemática,
24
encoraja reflexões mais amplas sobre a natureza do pensamento matemático, do
ponto de vista cognitivo, histórico, cultural, social e pedagógico.
Esse autor é considerado o “pai da Etnomatemática” e grande motivador da
abordagem no Brasil, sendo o primeiro a mencionar o termo em meados da década
de 70. Sobre a origem do termo, refere que “Etnomatemática é a arte ou técnica
(techné = tica) de explicar, de entender, de desempenhar na realidade (matema),
dentro de um contexto cultural próprio (etno)”, procura, dessa forma, entender o
saber/fazer matemático ao longo da história da humanidade, contextualizado-o em
diferentes grupos de interesse, comunidades, povos e nações (D’AMBRÓSIO, 2002).
A Etnomatemática como o corpo de artes, técnicas, modos de conhecer,
explicar, entender, lidar com os diferentes ambientes naturais e sociais,
estabelecidos por culturas distintas, inclui maneiras de comparar, classificar, ordenar,
medir, contar, inferir, e muitas outras. Por isso, no decorrer dos anos tem se
apresentado de maneira bastante relevante para os estudos e pesquisas em
Educação Matemática, com implicações pedagógicas.
Nessa direção, D’Ambrosio (2002) argumenta que é necessário reconhecer
as diferentes matemáticas encontradas em diferentes contextos culturais, para que
as instituições escolares ampliem suas referências discursivas a fim de incluírem e
legitimarem diferentes formas de pensar e fazer Matemática.
Conseqüentemente, percebemos a importância, para o educador, do
conhecimento da prática cotidiana do aluno no seu ambiente de trabalho, visando a
contextualizar os saberes matemáticos.
Para Wanderer:
Considerando a cultura dos alunos, seus modos de lidar com o
conhecimento, suas histórias e trajetórias, suas opiniões, penso que a
Matemática pode receber um outro enfoque. Ao invés de um conjunto de
técnicas e fórmulas descontextualizadas, o conhecimento matemático a se
conectar mais com a vida dos alunos, com suas formas de lidar com seu
mundo social, auxiliando-os na compreensão e problematização de
situações concreta de sua vida (2002, p. 35-6).
A denominação Etnomatemática resulta de uma preocupação dessa autora
com as tentativas de propostas de uma outra epistemologia e, em entender a
aventura da espécie humana, na busca de conhecimento.
Conforme D’Ambrósio (2002), a Etnomatemática é parte do cotidiano, que é o
25
universo, no qual se situam as expectativas e as angústias dos adultos. Para o autor,
as distintas maneiras de fazer [práticas], de saber [teorias], as quais caracterizam
uma cultura, são parte do conhecimento compartilhado e do comportamento
compatibilizado. Como o comportamento e o conhecimento, as maneiras de saber e
de fazer estão em permanente interação e atingem uma proposta de
interdisciplinariedade e transdisciplinaridade.
Desse modo, a proposta pedagógica da Etnomatemática é fazer na disciplina
algo vivo, lidando com situações reais no tempo [agora] e no espaço [aqui] e, pela
crítica, questionar o “aqui e o agora” (D’AMBRÓSIO, 2001).
Assim, a essência dessa proposta é se ter consciência de que existem
diferentes maneiras de se fazer Matemática. Para isso, devemos considerar a
apropriação do conhecimento matemático acadêmico por diferentes setores da
sociedade e os modos diferentes pelos quais diferentes culturas negociam as
práticas matemáticas.
Destacamos a constatação de uma grande variedade de procedimentos
matemáticos que são transmitidos de geração em geração, incluindo conceitos
geométricos em trabalhos artísticos, relações numéricas, medidas e cálculos.
Naturalmente, em todas as culturas e em todos os tempos, o conhecimento,
que é gerado pela necessidade de uma resposta a problemas e situações distintas,
está subordinado a um contexto natural, social e cultural (D’AMBRÓSIO, 2002).
A construção de calendários, isto é, a contagem e registro do tempo, é um
excelente exemplo de Etnomatemática, segundo D’Ambrósio (2001). Os calendários
são associados aos mitos e cultos dirigidos às entidades responsáveis e garantem a
sobrevivência da comunidade. Desse modo, os calendários são modelos de uma
Etnomatemática associada ao sistema de produção, supondo-se a necessidade de
alimentar um povo.
Outro exemplo de Etnomatemática é a Geometria que, na sua origem e no
seu próprio nome, está relacionada às medições de terreno. Descoberta e divulgada
pelos egípcios, para quem, a Geometria era mais que uma simples medição de
terreno, tendo tudo a ver com o sistema de taxação de áreas produtivas.
Desse modo, há vários estudos sobre a Etnomatemática do cotidiano. É um
conhecimento não aprendido nas escolas, mas no ambiente familiar, no ambiente
dos brinquedos e do trabalho, recebida de amigos e colegas. A utilização do
cotidiano das compras para ensinar Matemática revela práticas apreendidas fora do
26
ambiente escolar, uma verdadeira Etnomatemática do comércio. Com isso, essa
abordagem possibilita uma visão crítica da realidade, utilizando instrumentos de
natureza Matemática.
A Etnomatemática procura entender a realidade e chegar a ação pedagógica
de maneira natural, mediante um enfoque cognitivo com forte fundamentação
cultural (PCNs, 1998, p. 33). Tal abordagem privilegia o raciocínio qualitativo,
sempre está ligada a uma questão de natureza ambiental, ou de produção, estando
vinculada a manifestações culturais.
Conforme D’Ambrósio (2001), a Etnomatemática se enquadra perfeitamente
numa concepção multicultural e holística de educação. Dessa forma, o que ela irá
problematizar é justamente essa dicotomia existente entre os conhecimentos
instituídos como matemáticos e aqueles praticados pelos mais diversos grupos
sociais como a classe trabalhadora.
Para Zabala (2002), os novos conteúdos de aprendizagem ou as novas
experiências incrementam a potencialidade de compreensão e intervenção do ser
humano, devendo integrar-se ao conhecimento por meio de um processo de
reelaboração do conhecimento já existente.
Surge, assim, a necessidade de nos acercarmos da realidade em sua
complexidade, o que implica na aproximação de um enfoque globalizador em que as
disciplinas não são as finalidades, mas os meios para compreensão e intervenção
na realidade.
Segundo Sacristán (1998), para o processo de reconstrução do pensamento
do/a aluno/a existem duas condições: partir da cultura experiencial desse aluno/a e
criar, na aula, um espaço de conhecimento compartilhado. Acredita-se que, na EJA,
a aprendizagem tornar-se-á mais significativa se buscarmos os saberes da cultura
do aluno para serem desenvolvidos e ampliados em sala de aula.
Para a Etnomatemática, a melhoria do ensino de Matemática dar-se-ia pela
valorização das diferentes formas culturais de entender, interpretar e produzir a
Matemática, ou seja, deixar de supervalorizar apenas o saber escolar e dar ênfase
também ao saber cotidiano. Nesse contexto, D´Ambrósio (1990, p. 32) defende a
idéia, segundo a qual, o processo educativo escolar deveria tomar cuidado, para que
não houvesse a valorização de apenas “um tipo” de conhecimento.
É preciso conhecer “as outras” matemáticas fora do contexto escolar. Nesse
sentido, citamos a Educação de Jovens e Adultos cujos alunos que apresentam uma
27
experiência de vida e trazem para dentro da escola toda uma vivência rica em
conteúdos matemáticos.
De acordo com Borba (1993), as pesquisas existentes na área sugerem
várias críticas e propostas para o sistema formal e acadêmico. No entanto, pouca
investigação baseada na proposta Etnomatemática tem sido realizada em sala de
aula, sendo necessário que a ação pedagógica comece a ser amplamente discutida
e aplicada.
1.3 Os diferentes saberes
Os conhecimentos de um cidadão são inúmeros, valiosos, adquiridos ao
longo de sua história de vida. Segundo os cadernos, “Trabalhando com a Educação
de Jovens e Adultos”, do MEC (2006), a educação permite-nos analisar dois dos
diferentes tipos de saberes: o sensível e o cotidiano.
O saber sensível é aquele que todos nós possuímos, é um saber sustentado
pelos cinco sentidos, mas que valorizamos pouco na vida moderna. Qualquer
processo educativo tanto com crianças quanto com jovens e adultos deve ter bases
nesse saber sensível, porque é somente através dele que o aluno abre-se a um
conhecimento mais formal e reflexivo.
Os alunos jovens e adultos, pela sua experiência de vida, manifestam esse
saber sensível através do encantamento nas situações de aprendizagem, em sala
de aula. Essa manifestação do aluno com o conhecimento é extremamente positiva
e deve ser cultivada pelo educador, pois estimula o raciocínio lógico, a reflexão, a
análise e a abstração, para, a partir disso, construir o conhecimento científico.
O aluno da EJA traz consigo também o saber cotidiano que possui concretude,
é aprendido e consolidado em modos de pensar originados no dia a dia. É uma
espécie de saber das ruas, freqüentemente assentado no “senso comum” e diferente
do conhecimento formal, com o qual a escola lida. Esse saber deve ser valorizado
no mundo letrado, escolar e pelo próprio aluno.
Giardinetto (1999) afirma que:
“[...] com base no conhecimento maior possível da estrutura e
funcionamento do conhecimento cotidiano, o professor pode e deve utilizar
o conhecimento cotidiano como ponto de apoio para o processo de ensino-
aprendizagem” (p.68).
28
A função da escola seria a de melhorar, aprofundar e ampliar esses
conhecimentos a partir de um processo de construção cada vez mais elaborado em
que o conhecimento científico é mais ou menos relevante em função de sua
capacidade na melhora do conhecimento cotidiano (ZABALA,1998).
Se entendermos que a função da escola deve ser a de prover os meios para
intervir na realidade, e que o conhecimento a ser adquirido é aquele capaz de
facilitar tal intervenção, devendo assimilar também os conhecimentos prévios,
significativos.
A escola é um local de encontro de diferentes mundos e, como nos ensina
Freire, é necessário reconhecer os valores, práticas e saberes dos nossos alunos,
para que possamos não apenas identificá-los, mas problematizá-los, propiciando-
lhes, assim, um processo pedagógico com significado científico e social (apud
MONTEIRO, 2004).
Essa demanda está contemplada diante de estratégias que jovens e adultos
constroem ou adquirem em situações extra-escolares para a solução dos problemas
cotidianos. Assim, formam-se alunos cidadãos críticos e autônomos, capazes de
interpretar e intervir no mundo em que vivem.
No campo da educação Matemática, Monteiro (1998) tem defendido a
necessidade de articular o saber escolar e o saber cotidiano, considerando esse
caminho ora como motivador, ora como possibilitador de um ensino com significado,
ou ainda por entender ser necessário legitimar o conhecimento cotidiano.
Uma boa Matemática será conseguida se deixarmos de lado muito do que
ainda está nos programas sem outras justificativas. Costumamos dizer, “é
necessário aprender isso para adquirir base para poder aprender aquilo, o fato é que
“aquilo” deve cair fora e ainda, com maior razão, o “isso” ( D´AMBRÓSIO, 2001).
Para esse autor, o ensino “útil” é aquele que o indivíduo efetivamente utiliza no
trabalho ou em situações cotidianas.
O conhecimento escolar seria constituído pela seleção dos conteúdos de
aprendizagem que devem intervir no processo de melhora do conhecimento
cotidiano. Assim, o conhecimento escolar não pode ser uma simples cópia do
conhecimento científico, que, estruturado em disciplinas, se apresenta fragmentado.
Segundo Zabala (1998), é preciso buscar um ensino que supere a excessiva
divisão em disciplinas e conteúdos, com estratégias didáticas diferenciadas que
29
aproximem alunos e alunas de um conhecimento profundo da realidade. Desse
modo, o educador deve partir de situações da realidade e permitir a esses alunos
entenderem que o conhecimento é para indagar e intervir.
Estudos realizados nas últimas décadas permitem-nos confirmar que a
aprendizagem não é simplesmente um acúmulo de saberes. Ela depende da
capacidade de quem aprende e de suas experiências prévias. De alguma maneira,
relaciona-se as antigas idéias de que os alunos não são recipientes vazios, ou uma
tábula rasa que é preciso preencher. No entanto, Gadotti (2001) afirma que o
contexto cultural do aluno trabalhador deve ser “a ponte entre o seu saber e o que a
escola pode lhe proporcionar”.
Conforme Piaget (1973), é evidente a importância do conhecimento prévio,
visto que nesse enfoque, só há aprendizagem quando há uma reestruturação das
estruturas cognitivas preexistentes do indivíduo. Essas estruturas resultam em
novos esquemas de assimilação, por meio dos quais, eles atingem um novo
equilíbrio.
Os alunos da EJA trazem consigo um conhecimento sobre o qual se constrói
a nova aprendizagem. Todos nós dispomos de alguns conhecimentos adquiridos ao
longo da vida como resultado de nossas experiências, que nos permitem dar
respostas às diferentes situações. Assim, não só devemos saber resolver problemas
e questões, como também dar explicações sobre o porquê dessas situações.
1.4 As teorias da aprendizagem no contexto do ensino da Matemática
Existem inúmeras pesquisas educacionais que trazem considerações sobre
as mudanças necessárias para alcançar a melhoria da qualidade do ensino da
Matemática. No entanto, como afirma Demo (1990), enquanto alguns professores
somente pesquisam, a maioria dá aulas, e essa situação faz com que muitas
pesquisas não alcancem as realidades escolares. Com isso, agregar teoria e prática
na pesquisa pode constituir-se em um caminho para concretizar mudanças
significativas no ensino da Matemática na EJA.
A função da escola, de acordo com Ausubel (2003), é “[...] ensinar como
pensar e não o que pensar”. Sendo assim, a função da escola consiste em ensinar a
dominar a linguagem e ensinar a pensar criticamente.
As autoras Smole e Diniz (2001) argumentam que, quanto mais temos
30
oportunidade para refletir sobre um determinado assunto – com a fala, a escrita ou
com representação – mais o compreenderemos. Além disso, a comunicação, como
um elemento essencial do ensino e aprendizagem da Matemática, que inclui a fala, a
leitura, a escuta e a escrita, é para muitos pesquisadores e educadores matemáticos,
um benefício de duplo sentido: comunicar para aprender Matemática e aprender a
comunicar matematicamente.
Por isso, é preciso dar oportunidades aos alunos para dialogarem,
questionarem, exporem suas idéias sobre os conteúdos matemáticos. Isso porque é
assim, através da comunicação, que se consegue aprender.
Segundo a teoria de Ausubel (1980), podem-se distinguir três tipos de
aprendizagem: cognitiva, afetiva e psicomotora. A aprendizagem cognitiva é aquela
que resulta do armazenamento organizado de informações na mente do ser que
aprende. Esse complexo organizado é conhecido como estrutura cognitiva.
A aprendizagem cognitiva significa organização e integração do material na
estrutura cognitiva. Sacristán (1998, p.37) afirma que “[...] a pedra fundamental do
desenvolvimento cognitivo do homem e o objeto prioritário da prática didática
incluem conceitos, princípios e teorias”.
A aprendizagem afetiva resulta de sinais internos ao indivíduo e pode ser
identificada com experiências, como satisfação ou descontentamento, alegria ou
ansiedade. Algumas experiências afetivas sempre acompanham as experiências
cognitivas. O conhecimento só é afetivo quando o sistema cognitivo absorve as
perturbações, atingindo um novo estado de equilíbrio, diferente e superior ao
anterior.
Já a aprendizagem psicomotora envolve respostas musculares, adquiridas
através de treino e prática. Contudo, geralmente alguma aprendizagem cognitiva é
importante na aquisição de habilidades psicomotoras.
No conceito da teoria do psicólogo Ausubel (1980), o foco central do processo
de ensino é que a aprendizagem seja significativa, seja por recepção seja por
descoberta, isto é, o material a ser aprendido precisa fazer algum sentido para o
aluno. Isso acontece quando a nova informação "ancora-se” nos conceitos
relevantes já existentes, na estrutura cognitiva do aprendiz. Nesse processo, a nova
informação interage como uma estrutura de conhecimento específico, que Ausubel
chama de conceito "subsunçor", palavra que tenta traduzir a inglesa "subsumer".
A coexistência de diferentes conhecimentos isolados uns dos outros não tem
31
nenhum sentido. Por esse motivo, o aluno deve compreender a importância de se
aprender um conteúdo anterior para depois usá-lo, de forma aprofundada, num novo
conceito mais abrangente, além da consciência de que nada se aprende por
aprender. Tudo tem uma função e importância, por isso, a sua assimilação deve
servir para a continuidade de sua formação.
De acordo com Skovsmose (apud ROSA e OREY, 2005), a interpretação da
Etnomatemática como ação pedagógica para as práticas escolares deve ser
centrada no conhecimento previamente adquirido pelos alunos levando em
consideração o acesso ao conjunto de oportunidades e possibilidades futuras
oferecidas no contexto cultural deles.
Assim, devemos levar os alunos a disporem de uma estrutura cognoscitiva
que lhes sirva de resposta a um número, o mais elevado possível, de problemas e
questões que a vida em sociedade lhes coloca, resultado de sua experiência
cotidiana.
Para Ausubel (1980), a aprendizagem, na qual somos capazes de atribuir
significado ao conteúdo aprendido, remete à possibilidade de estabelecer vínculos
substanciais e não-arbitrários entre as novas aprendizagens e as que o estudante já
possui.
A atribuição de sentido está intimamente relacionada à aprendizagem
significativa e à abordagem da Etnomatemática nas aulas de EJA, pois trabalhar
com assuntos reais possibilita que os conteúdos matemáticos apareçam dotados de
sentido para a vida dos alunos.
Para Fiorentini (1994), através da busca de novos saberes e conceitos
matemáticos, atribui-se maior sentido às idéias matemáticas, ocorrendo assim uma
aprendizagem significativa capaz de discutir e de criar novas possibilidades para o
ensino nas aulas de Matemática.
A aprendizagem deve ser significativa na vida do indivíduo, para que se
sobressaia a qualidade de um envolvimento pessoal, indo ao encontro de suas
necessidades.
Para Moreira (1983, p.18), a idéia mais importante na teoria de aprendizagem
de Ausubel, está resumida no seguinte:
Se tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um só princípio, diria
o seguinte: o fator isolado mais importante influenciando a aprendizagem é
aquilo que o aprendiz já sabe. Determine isso e ensine-o de acordo
32
(Ausubel, 1978).
O conceito central, portanto, é o da aprendizagem significativa. Essa
aprendizagem tem em vista os conhecimentos prévios que o aluno já possui, ou seja,
é um processo de interação entre o conhecimento novo e o prévio.
A aprendizagem mecânica, segundo Ausubel, é uma aprendizagem de novas
informações com pouca ou nenhuma associação aos conceitos relevantes existentes
na estrutura cognitiva. Quando o material a ser aprendido não consegue ligar-se a
algo já conhecido, ocorre o que Ausubel (1980) chamou de aprendizagem mecânica
("rote learning"), ou seja, isso acontece quando as novas informações são
aprendidas sem interagirem com conceitos relevantes existentes na estrutura
cognitiva (MOREIRA, 1982).
Um exemplo da aprendizagem mecânica é a “decoreba” de fórmulas,
conceitos e teorias, é aquela aprendizagem Matemática que o aluno diz após uma
avaliação: “estudei e sabia todo o conteúdo, mas na hora me deu um branco”.
Em uma escola que pretende formar para a vida, não tem sentido a presença
de aprendizagens mecânicas. Já em uma escola que tem a finalidade prioritária de
selecionar os melhores alunos para chegar à universidade, é possível admitir,
apesar de esta não ser sua intenção, aprendizagens mecânicas. Nesse tipo de
aprendizagem, também chamada de repetitiva, o conhecimento limita-se a
capacidade de repeti-los tal como foram apresentados e memorizados.
Dessa forma, na escola tradicional, os alunos eram submetidos à resolução
de quantidades de exercícios, depois o professor corrigia e repassava novos
exercícios, semelhantes aos anteriores. Essa prática reforçava a memorização dos
alunos por meio de repetição.
A freqüência com que os alunos resolviam os exercícios propostos colaborava
com a “decoreba” dos conteúdos sem, muitas vezes, entenderem o processo do
cálculo utilizado.
No entanto, quando o aluno aprende os conteúdos que partem de situações
cotidianas e a problematização está inserida no contexto deles, isso faz com que a
proposta da abordagem Etnomatemática supere a aprendizagem mecânica.
Para Ausubel (apud NUÑEZ; RAMALHO, 2004), a aprendizagem significativa
pode ser por recepção, quando o aluno recebe as informações e consegue
relacioná-las as suas estruturas cognitivas, criando novos significados. Também
33
pode ocorrer aprendizagem significativa por descoberta, quando o aluno por si só
constrói conhecimento, relacionando as novas informações àquelas já existentes em
sua mente, como idéias prévias.
Com isso, o aluno estuda para saber utilizar o conteúdo em qualquer ocasião,
em que haja necessidade e não apenas para manifestar competência em testes,
provas e avaliações em geral.
Conforme Almeida (2005), a aprendizagem significativa precisa das seguintes
condições: uso do material potencialmente significativo nas atividades do ensino,
existência de conhecimentos prévios na estrutura cognitiva do aluno e predisposição
positiva do aluno para aprender.
Os professores têm que ser capazes de mostrar aos alunos o significado
daquele determinado conteúdo que está sendo aprendido. Se a atitude é favorável
para a aprendizagem significativa, fará referência a uma intencionalidade do aluno
para relacionar o novo material de aprendizagem ao que já conhece, aos
conhecimentos adquiridos previamente e aos significados já construídos
anteriormente.
Em contrapartida, a teoria de Ausubel (1989) não nega a aprendizagem
mecânica no contexto escolar, mas reconhece que esse tipo de aprendizagem
diferencia-se de sua proposta, visto que a aprendizagem mecânica considera muito
pouco ou nenhuma informação prévia da estrutura cognitiva, de modo a estabelecer
relações.
Sobre o papel do educador, para uma aprendizagem significativa, Melo (2004,
p. 37) nos lembra que:
O educador assume, assim, uma função relevante no processo de
construção do conhecimento matemático do aluno no sentido de que lhe
compete, primeiro, saber o quê, quando e como explorar seus
conhecimentos prévios; segundo, decidir sobre os conhecimentos prévios
que deverão ser explorados na abordagem de novos conteúdos; terceiro,
estabelecer relações entre esses conhecimentos (saber espontâneo ou
prévio) e o conhecimento matemático escolar (saber formal) como ponto de
partida para aprendizagem da matemática escolar.
Os alunos da EJA chegam à escola com um saber próprio, elaborado a partir
de suas relações sociais e dos seus mecanismos de sobrevivência. A escola pode
fazer com que os alunos possam reconstruir a experiência e o conhecimento
característicos de sua comunidade. O aluno da EJA tem oportunidade de sentir
34
satisfação em aprender conceitos matemáticos relacionados a experiências de
trabalho.
Assim, na perspectiva “dambrosiana”, a Etnomatemática é uma abordagem
favorável à descoberta e à análise dos processos de origem, transmissão e
institucionalização do conhecimento matemático provenientes de diversos grupos
culturais.
A aprendizagem em aula não é nunca meramente individual, é uma
aprendizagem dentro de um grupo social com vida própria, interesses, necessidades
e exigências que vão configurando uma cultura peculiar (SACRISTÁN, 1998).
Desse modo, os alunos da EJA participam das aulas, trazendo consigo seus
conhecimentos, seus saberes, suas culturas, seus valores. Compartilham com os
colegas e com a professora o que realmente interessa ao grupo em sala de aula. O
aluno, ao se introduzir na cultura escolar e da sala de aula, adquire os conceitos
necessários para o seu desempenho satisfatório dentre as demandas dessa
comunidade e dessa cultura.
Em termos piagetianos, poderíamos dizer que construímos significados ao
integrarmos ou assimilarmos o novo material de aprendizagem aos esquemas que já
possuímos de compreensão da realidade (COLL, 1994).
No momento em que aquilo que estamos aprendendo entra em relação e
integra-se a conhecimentos já possuídos, é possível incorporá-lo às estruturas de
conhecimentos atuais. Ao contrário, quando quem aprende encontra conteúdos
quase sem sentido, ligados arbitrariamente entre si e difíceis de relacionar aos
conteúdos de sua atual estrutura cognitiva, ocorre uma aprendizagem memorística.
Destaca (GUY CLAXTON, 1987, p. 215) que “[...] as pessoas aprendem antes
o que necessitam com mais urgência e o que querem saber”. Assim, tudo o que se
distanciar de suas preocupações e interesses, que não estiver relacionado, de
alguma maneira, à satisfação de uma necessidade, de um desejo ou à busca para
evitar algum perigo, dificilmente pode converter-se em relevante e significativo para
quem deve aprender (apud SANTOMÉ, 1998, p. 43).
Os alunos, muitas vezes, fazem a seguinte indagação para o professor:
“Por que tenho que aprender este conteúdo que não tem nada a ver com o
meu cotidiano, pois é um conteúdo estranho à minha realidade e, nele, não vejo
nada ligado aos meus afazeres?”.
O importante a se considerar é que os alunos da EJA são diferentes dos
35
alunos presentes nos anos adequados à faixa etária. São jovens e adultos, na
grande maioria, trabalhadores, maduros, com larga experiência profissional, ou com
expectativa de (re) inserção no mercado de trabalho e com um olhar diferenciado
sobre as coisas da existência da sua vida.
No entanto, tratar coisas da vida que interessem não é finalidade. A finalidade
está em, a partir das coisas que interessam, despertar a atitude de empreender o
caminho de aprendizagem de alguns conteúdos necessários para melhorar o
conhecimento sobre tal realidade. O interesse pela ação será mais proveitoso se os
alunos participarem na decisão sobre o que trabalhar ou realizar. Por isso, essa fase
deve servir para criar as condições, para que os alunos possam expressar suas
opiniões sobre o que querem fazer e aprender.
A Matemática presente nas profissões dos alunos da EJA pode nos remeter à
uma educação contextualizada, enriquecida de aspectos interessantes, motivada por
razões pelos quais o homem se insere nesse processo.
Segundo Santomé:
“[...] a contribuição de Ausubel baseia-se na pesquisa sobre a forma com
que as pessoas reconstroem continuamente seu conhecimento, sobre a
forma em que aprendem e sobre as estratégias didáticas que facilitam esse
processo” (1998, p. 41).
O papel do professor, na facilitação da aprendizagem, envolve pelo menos
quatro tarefas fundamentais: identificar a estrutura conceitual e proposicional da
matéria de ensino; diagnosticar aquilo que o aluno já sabe; ensinar, levando em
conta o que o aluno já aprendeu, utilizando recursos e princípios que facilitem a
aprendizagem significativa da estrutura conceitual e proposicional da matéria de
ensino; identificar os subsunçores relevantes à aprendizagem do conteúdo a ser
ensinado (MOREIRA, 1983).
Dessa maneira, a tarefa do professor é auxiliar o aluno a assimilar a estrutura
da matéria de ensino e organizar sua própria estrutura cognitiva nessa área do
conhecimento, através da aquisição de significados claros e estáveis.
Por outro lado, costumamos verificar a aprendizagem por meio de
comportamentos apresentados pelos alunos e dos resultados nas atividades
propostas. Contudo, o seu comportamento nos diz apenas quando o individuo
aprendeu algo e não sobre o processo de aprendizagem, pois esse ocorre na
36
estrutura cognitiva do individuo. Apenas as respostas emitidas pelos alunos são
passíveis de observação.
Segundo Coll (1998), é necessário que o aluno não somente procure o
significado, relacionando-o aos conhecimentos que possui, mas principalmente que
tente encontrar sentido no que está aprendendo, ou seja, que “descubra o que está
relacionado ao que vê e com o que o cerca, que tem sentido esforçar-se para
compreender”.
Isso se relaciona, por exemplo, à aula “Saberes matemáticos presentes na
marcenaria”, pois assim os alunos compreendem a situação quando abordamos as
palavras utilizadas por eles na sua prática diária.
Conforme questiona Barcelos (2006), a escola é esta que, a partir de agora,
tem, em suas salas de aula, as mesmas pessoas que, um dia, podem ter ajudado a
lançar seus alicerces, a erguer suas paredes, a colocar o seu telhado? Que escola é
esta que, a partir de agora, recebe o desafio de ensinar àqueles(as) que, sem o
saber, foram capazes de construí-la?
É preciso dedicar muita atenção aos saberes e fazeres de alguns alunos da
EJA, pois trazem consigo, para o interior da escola e da sala de aula, uma longa
experiência de vida acumulada que merece uma escuta muito especial.
Em sala de aula, há a necessidade de o professor conhecer as experiências
dos alunos para melhor orientar o processo de aprendizagem, pois somos cientes de
que a participação dos alunos torna as aulas mais dinâmicas e motivadoras. Os
conceitos matemáticos desenvolvidos a partir das problematizações em que os
alunos estão inseridos proporcionam uma aprendizagem com significado para o
alunado da EJA.
Logo, ao perceber que a escola não apenas aceita, mas valoriza os
conhecimentos que já possuem, os alunos sentem-se mais integrados ao fazer
escolar e reconhecem que têm valor por si mesmo e por suas decisões. Além disso,
quando o aluno percebe que o conteúdo é relevante para atingir um certo objetivo, a
aprendizagem é muito mais rápida.
Quando o aluno escolhe suas próprias direções, descobre seus próprios
recursos de aprendizagem, formula seus próprios problemas, decide sobre seu
próprio curso de ação, vive as conseqüências de cada uma dessas escolhas, então,
a aprendizagem significativa é maximizada (SANTOMÉ, 1998).
É imprescindível não esquecermos que uma educação, que respeita as
37
características pessoais de cada membro do grupo de estudantes participantes do
desenvolvimento de uma unidade didática integrada, já possui uma experiência e
conhecimentos prévios nos quais se baseia. Os estudantes da EJA já sabem muitas
coisas e vão às instituições escolares para aprofundar os seus conhecimentos
anteriores e adquirir novos, através do trabalho e da comparação com outros
recursos didáticos e, até mesmo, com os seus colegas. Eles vão à escola para
passar de um conhecimento subjetivo a outro mais intersubjetivo e compartilhado.
Segundo Fonseca (2002), uma proposta educativa precisa averiguar em seus
alunos suas próprias expectativas, demandas e desejos para indagar-se sobre a
sinceridade de sua disposição e a disponibilidade de suas condições para atendê-las
ou com elas negociar.
Uma coisa é a organização dos saberes a partir de uma perspectiva científica;
outra é como devem ser apresentados e ensinados os conteúdos desses saberes,
para serem aprendidos em um maior grau de profundidade. Assim, para que o aluno
tenha acesso aos conhecimentos matemáticos e seja um sujeito atuante na
sociedade em que vive, deve desenvolver valores e enfrentar as mais diversas
situações.
A educação na EJA deve ser voltada à atualização dos conhecimentos das
pessoas a fim de que possam aplicá-los à vida diária. Para o desenvolvimento
integral do trabalhador que estuda, devemos valorizar a cultura do indivíduo,
resgatando o homem/cidadão, a mulher/cidadã.
O objetivo da aprendizagem significativa é que a interação entre as
problematizações abordadas nas aulas e as idéias prévias ativadas, para dar sentido
ao ensino, possam modificar os conhecimentos prévios e façam surgir um novo
conhecimento. Isso ocorre quando os alunos conseguem observar determinado fato
e modificam suas idéias prévias acerca dele e, ainda, que esse conhecimento novo
passe a ser incorporado em suas atitudes e valores. Por exemplo, quando os alunos
se preocupam por estarem obesos e, a partir do trabalho em sala de aula sobre o
Índice de Massa Corporal, modificam os seus hábitos alimentares.
A Etnomatemática apresenta uma aprendizagem por excelência, na qual o
aluno pode ter capacidade de enfrentar situações e problemas novos, de modelar
adequadamente uma situação real para que estimule, constantemente, sua
“capacidade de explicar, de aprender e compreender, enfrentando criticamente
situações novas” (D`AMBRÓSIO, 2002).
38
Nesse sentido, poderíamos definir aprendizagem significativa como uma
mudança relativamente permanente no comportamento dos sujeitos envolvidos,
resultante da significação dada aos assuntos que foram abordados e a conexão com
a realidade. Diante disso, há sentido na aprendizagem, pois essa interfere na
realidade do aluno.
Precisamos considerar o aluno da EJA como sujeito ativo na construção do
conhecimento. Assim, estaremos contribuindo para que ele crie sua própria
estratégia de resolução de problemas, não desista tão facilmente quando esbarrar
em pequenos e grandes desafios e, ainda, conquiste sua autonomia e sua confiança
sobre o ensino da Matemática, o que lhe proporcionará uma formação digna de
cidadão que poderá competir e não será excluído da sociedade.
39
2 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
Esta pesquisa consistiu na realização de atividades contextualizadas, partindo
de saberes do cotidiano dos alunos e com o emprego da abordagem
Etnomatemática.
Para realizar uma pesquisa, sabemos que há necessidade de coerência na
escolha dos procedimentos metodológicos que lhe servirão de base, pois como
dizem Araújo e Borba (2004, p. 43):
Para nós, em uma pesquisa em Educação (Matemática), a metodologia que
embasa seu desenvolvimento deve ser coerente com as visões de
Educação e de conhecimento sustentada pelo pesquisador, o que inclui
suas concepções de Matemática e de Educação Matemática. Portanto, o
que o pesquisador acreditar ser a Matemática e a Educação Matemática e
seu entendimento de conhecimento e de como ele é produzido (ou
transmitido, ou descoberto) são fundamentos que influenciam diretamente
os resultados de pesquisa.
Devido ao objetivo desta investigação, foi preciso optarmos por uma pesquisa
do tipo qualitativa e, ao mesmo tempo, fazermos a definição de procedimentos
metodológicos para as atividades de ensino que foram desenvolvidas nas aulas de
Matemática.
Foi selecionado pela escola o tema gerador “Educação e Realidade
Brasileira”, para ser trabalhado de forma interdisciplinar, por todos os professores da
instituição. O tema surgiu neste momento, pois alunos e professores assistiram ao
filme: “Dois filhos de Francisco”, o qual relata a história de uma família pobre cujos
pais incentivam seus filhos a desenvolverem dons artísticos e saírem pelo mundo
em busca de trabalho.
Nesse momento, oportunizamos aos alunos um debate sobre o assunto, com
o objetivo de analisarmos a história de vida dos personagens do filme, relacionando-
a, muitas vezes, às vivências dos alunos. Durante esse debate, gravamos as falas
dos alunos, para serem analisadas posteriormente. Continuando o trabalho, os
alunos produziram suas próprias histórias de vida, o que resultará em uma
publicação com o título, “Vivências de Vida”.
Tudo isso contribuiu para o primeiro momento da nossa pesquisa,
oportunizando-nos conhecer um pouco mais da realidade e história de vida dos
nossos alunos, jovens e adultos, sujeitos da nossa investigação.
40
Na aula seguinte, a turma recebeu o texto “Educar para o trabalho e para a
vida”, retirado do Mundo Jovem: um jornal de idéias, de março/2006, para leitura e
discussão em grupos de três integrantes.
A partir da leitura, os alunos tiveram um tempo de 10 minutos para a
discussão do assunto no pequeno grupo. Cada grupo fez um relato oral, destacando
aspectos considerados positivos e negativos. Nesse momento, observamos e
registramos o processo de elaboração do conhecimento dos alunos, e
posteriormente, comentamos com os alunos sobre a pesquisa que iria ser
desenvolvida.
Com a intenção de sondar, por escrito, suas concepções, como alunos, sobre
a Educação Matemática e sua aprendizagem, usamos como referência a cultura,
experiências cotidianas, objetivos de vida, aplicabilidade da Matemática na sua
profissão e no seu cotidiano, suas necessidades e seus interesses na EJA.
Elaboramos e distribuímos aos alunos um questionário aberto (APÊNDICE A),
visando a analisar mais de perto a realidade dos envolvidos nesta pesquisa.
Depois de analisados todos os questionários, apresentamos ao grupo a
proposta de trabalho. Nessa ocasião, foi realizado o agendamento das visitas
selecionadas, em horários combinados com os alunos, buscando a coleta de
informações para o planejamento das aulas com o emprego da abordagem da
Etnomatemática, as quais estão descritas logo após as análises.
Na seqüência, especificaremos o espaço, no qual foi desenvolvida a
pesquisa, os sujeitos que dela fizeram parte, o contexto operacional da pesquisa,
bem como os instrumentos que foram utilizados para a coleta de dados.
2.1 Espaço de desenvolvimento da pesquisa e os sujeitos envolvidos
O experimento foi desenvolvido na Escola Estadual de Ensino Fundamental
Professora Hilda Köetz, situada no Bairro Riveira, na cidade de São Pedro do Sul,
Região Centro do Estado do Rio Grande do Sul, a qual iniciou suas atividades no
ano de 1938.
A escola tem como missão “Liberdade com responsabilidade” e, como
objetivos, promover a participação efetiva de toda comunidade escolar em uma
convivência prazerosa; estabelecer que o diálogo é fundamental na construção da
auto-estima do cidadão; respeitar as diferenças individuais de credo, raça, gênero,
41
dificuldades de aprendizagem e outras que venham se apresentar; buscar
alternativas para a formação permanente dos profissionais, como um indicativo para
superação das dificuldades pedagógicas; construir um espaço físico capaz de
atender às necessidades da comunidade escolar tanto sociais como pedagógicas.
A escola conta com um corpo docente de vinte e nove professores e cinco
funcionários, possui em torno de quinhentos alunos, distribuídos em turmas de
Educação Infantil, Ensino Fundamental regular e modalidade de EJA - Educação de
Jovens e Adultos, objeto da nossa investigação.
A EJA está assim constituída, conforme consta nos planos de estudo.
Etapas 1 e 2 – Alfabetização (1200 horas) e etapas 3, 4, 5 e 6 – Pós-
Alfabetização (3200 horas).
Etapa 1 – é a etapa de início do processo de alfabetização, na qual são
identificadas as concepções sobre o que é ler e escrever e planejada a intervenção
pedagógica adequada à sua evolução. Esta etapa atende aos alunos que têm,
desde os conhecimentos mais rudimentares até aqueles que possuem saberes mais
avançados dentro do processo de aquisição da língua escrita. Dá ênfase à
construção do número, das noções espaço-tempo-causalidade e à produção escrita
e coletiva, priorizando o conteúdo do texto a partir das inter-relações das diversas
áreas do conhecimento.
Etapa 2 – é a etapa de continuidade do processo de alfabetização, no qual se
sistematiza o processo de ler e escrever, fazendo com que o aluno compreenda as
funções sociais da língua e descubra os princípios ortográficos e o desenvolvimento
das estruturas lógico-matemáticas. Nesta etapa, são proporcionadas aos alunos
experiências que os levem a questionar, levantar hipóteses, associar, relacionar e
discutir as descobertas feitas pela interação com seu meio, para construírem, assim,
o seu conhecimento.
Etapa 3 – é a fase do aprofundamento do processo de alfabetização e das
estruturas lógico-matemáticas e de uma maior sistematização e automatização das
questões ortográficas à estrutura dos diferentes tipos de textos e à reflexão crítica
sobre a realidade.
Etapa 4 - é a etapa intermediária que visa à ampliação da capacidade de
leitura, escrita e operações matemáticas. Oportuniza estudos sobre meio ambiente,
a partir de pesquisas e análises de dados, ao desenvolver projetos na escola de
forma interdisciplinar, num trabalho integrado escola-comunidade.
42
Etapa 5 – proporciona a compreensão e ampliação das noções e estruturas
contempladas nas etapas anteriores. Dentro das possibilidades e, através de
experiências significativas, procura desenvolver a compreensão da função básica.
Etapa 6 – é a articulação e o aprimoramento dos conhecimentos construídos
e suas inter-relações, etapa final do ensino fundamental, busca garantir o alcance
dos requisitos mínimos para a saída deste nível de ensino, segundo a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei n. 9394/96.
Foram sujeitos desta pesquisa alunos da etapa 5, da Educação de Jovens e
Adultos, durante os meses de agosto a dezembro de 2006, no turno da noite, na
disciplina de Matemática.
Faz-se necessário esclarecermos que a escolha desta etapa foi porque
atuamos nas etapas 5 e 6 e, em razão de haver diversos alunos trabalhadores com
profissões interessantes para desenvolver a pesquisa.
A turma que fez parte do experimento foi constituída por trinta e seis (36)
alunos matriculados, com a faixa etária entre dezesseis e sessenta anos, sendo que
muitos jovens procuram a EJA ao se sentirem excluídos do ensino regular por
diversos fatores, enquanto que os adultos demonstram interesse em adquirir novos
conhecimentos, melhores oportunidades de trabalho e amizades. A grande maioria
desses alunos pertence a uma classe social desfavorecida do ponto de vista
econômico e cultural.
2.2 O contexto operacional da pesquisa
Para atender ao problema norteador e aos objetivos propostos, este estudo é
caracterizado como uma pesquisa qualitativa, pois, para Chizzotti (2001), ela parte
do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma
interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o
mundo objetivo e a subjetividade do sujeito.
A opção por esse tipo de pesquisa foi motivada por essa abordagem, porque,
segundo André e Ludke (1986, p. 18), “[...] é aquela que se desenvolve numa
situação natural, é rica em dados descritivos e tem um plano aberto e flexível e
focaliza a realidade de forma complexa e contextualizada” e por estar coerente com
a abordagem Etnomatemática adotada como nosso objeto de estudo.
A partir disso, preocupamo-nos em conhecer a realidade dos alunos da EJA
43
na sua especificidade e contribuir com um ensino contextualizado.
Conforme Chizzotti na:
[...] pesquisa qualitativa o pesquisador é parte fundamental, ele deve,
preliminarmente, despojar-se de preconceitos, predisposições para assumir
uma atitude aberta a todas as manifestações que observa, essa
compreensão será alcançada com uma conduta participante que partilhe da
cultura, das práticas, das percepções e experiências dos sujeitos da
pesquisa, procurando compreender a significação social por eles atribuída
ao mundo que os circunda e aos atos que realizam, e que todos os
envolvidos na pesquisa podem identificar criticamente seus problemas e
suas necessidades, encontrar e propor estratégias adequadas de ação
(2001, p. 82).
A partir da cultura e das experiências cotidianas em que o aluno estava
inserido, foi possível identificarmos os conhecimentos matemáticos prévios para,
posteriormente, desenvolvermos os saberes científicos com o emprego da
Etnomatemática, no decorrer das aulas.
A pesquisa qualitativa investiga a aprendizagem dos alunos, bem como a sua
reação diante da abordagem Etnomatemática, interpreta e analisa os valores, as
ações e as falas.
Para Bogdan; Bicklen (1994, p. 16), os dados recolhidos são considerados
qualitativos quando são “ricos em pormenores descritivos”, sendo relativos a
pessoas, locais ou conversas. Na investigação qualitativa, o pesquisador procura
interpretar os fatos, buscar suas respostas, compreender os fenômenos pela sua
descrição e interpretação. Nesse sentido, a pesquisa qualitativa envolve ativamente
pesquisador e alunos, pois as influências de um e de outro estão presentes nos
resultados obtidos.
Segundo Bogdan; Bicklen (1994), a investigação qualitativa tem cinco
características principais:
Permite ao pesquisador observar os fatos de forma mais próxima, pois
geralmente participa (mesmo que como observador) do que está sendo investigado.
A fonte de pesquisa é o “ambiente natural”, e o principal instrumento é o
“investigador” (p. 47). O investigador procura freqüentar o lugar de estudo porque se
preocupa com o contexto em que os dados foram coletados e a sua influência sobre
eles.
Nesta experiência de ensino, tivemos livre fluência entre os pesquisados. A
sala de aula e o ambiente de trabalho dos alunos propicio-nos a observação de
44
saberes, vivências, conhecimentos prévios e a aplicabilidade da Matemática no seu
cotidiano.
“Os dados obtidos estão organizados em forma de palavra ou imagens e
não de números” (p. 48), temos como objetivo deter o maior número possível de
informações, de forma a analisar toda a riqueza contida no registro. Esses registros
foram feitos no diário de campo, nas gravações e fotos para que, posteriormente,
pudéssemos fazer a análise das informações obtidas.
Os dados desta experiência foram descritivos, permitindo que o material fosse
rico em observações, análises, fotos e gravações das falas dos alunos.
Consideramos que o processo de pesquisa como um todo, sua história,
seus saberes e a sua valorização pessoal de todos os indivíduos envolvidos.
Na pesquisa qualitativa, buscamos a “compreensão dos
comportamentos a partir das perspectivas dos sujeitos da investigação” (p. 16),
levando em consideração o contexto do qual fazem parte. Por isso, não
consideramos hipóteses ou resultados previamente estabelecidos.
Valorizamos muito o significado.
A investigação qualitativa é mais trabalhosa e complexa, tendo em vista a
quantidade de informações coletadas e as diversas fontes utilizadas. Essa
abordagem parece-nos muito mais rica em significados, pois “são as realidades
múltiplas e não uma realidade única que interessam ao investigador qualitativo”
(BOGDAN, BICKLEN, 1994, p. 62).
Podemos admitir que, na investigação qualitativa, o pesquisador e os alunos
constroem os resultados, no decorrer da pesquisa. Acreditamos nesse tipo de
pesquisa para o desenvolvimento das aulas de Matemática com o emprego da
abordagem Etnomatemática.
Neste estudo, houve um acompanhamento detalhado do desenvolvimento da
experiência. Nesse sentido, Oliveira (2002, p. 117) ressalta as vantagens e
facilidades da abordagem qualitativa:
As pesquisas que se utilizam a abordagem qualitativa possuem a facilidade
de poder descrever a complexidade de uma determinada hipótese ou
problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar
processos dinâmicos experimentados por grupos sociais, apresentar
contribuições no processo de mudança, criação ou formação de opiniões de
determinado grupo e permitir, em maior grau de profundidade, a
interpretação das particularidades dos comportamentos ou atitudes dos
indivíduos.
45
Segundo D’ Ambrósio (2004), pesquisa qualitativa é o caminho para escapar
da mesmice. Na opinião do autor, esse tipo de pesquisa preocupa-se com as
pessoas, suas idéias, trazendo à tona falas que poderiam estar silenciosas.
Podemos dizer que esta experiência adentrou situações como essas, que estão
descritas nas aulas desenvolvidas da etapa em estudo da EJA.
O tipo de delineamento adotado foi um estudo de caso observacional,
envolvendo informações acerca do ambiente escolar, no qual ocorreu a pesquisa.
Conforme Trivinõs (1987, p. 135), em estudos de casos observacionais “[...] não é a
organização como um todo o que interessa, senão uma parte dela”.
Para André e Ludke (1986), os estudos de casos buscam a descoberta,
levando em conta elementos que podem emergir como importantes durante o estudo.
A compreensão do objeto se efetua a partir dos dados e em função deles. Os
estudos de caso enfatizam “a interpretação em contexto” e só é possível se for
levado em conta o contexto, no qual ele se insere. Para o leitor, é importante que ele
indague "O que eu posso (ou não posso) aplicar deste caso para a minha situação?”.
Sendo assim, procuramos utilizar os estudos de caso no contexto do cotidiano
do aluno, e ainda, selecionamos os casos considerados de maior relevância para a
pesquisadora, a fim de serem trabalhados em sala de aula.
Em seguida, foram escolhidos dezesseis alunos para visitas aos seus locais
de trabalho, já que suas profissões apresentavam a aplicabilidade da Matemática
com mais evidência. Destacamos as seguintes profissões encontradas na turma:
costureira de uma fábrica de sofá, balconista de uma padaria, ferreiro, apontador de
descarga de caminhão na construção de estrada, artesã, mecânico, supervisor de
produção de uma cooperativa de cereais, agricultor, eletrotécnico, atendente de um
mercado, marceneiro, metalúrgico, servente de pedreiro, revendedoras de produtos
cosméticos e duas alunas que trabalham em um hotel da cidade, incluindo também,
alunas donas de casa, empregadas domésticas, diaristas, doceiras e serviços gerais.
2.3 Os procedimentos e as técnicas utilizadas para a coleta de dados
Dentro do quadro teórico que fundamenta este trabalho, a participação do
aluno da EJA, como sujeito da pesquisa, é de suma importância. Conhecer os
saberes matemáticos presentes na prática dos alunos em seus postos de trabalho,
46
suas necessidades, interesses e valores para exploração na prática em sala de aula.
Para a coleta de informações, foram realizados questionários, visitas in loco,
entrevista, diário de campo e observação.
Segundo Triviños (1987), o questionário aberto e a observação livre são os
dois instrumentos mais decisivos para estudar os processos e produtos, nos quais o
investigador qualitativo está interessado.
Assim, demos início à pesquisa, com a utilização de um questionário aberto
(APÊNDICE A), tendo como objetivo investigar as aplicações dos conhecimentos
matemáticos no cotidiano dos alunos.
A observação, segundo Lakatos; Marconi (1991), “[...] é uma técnica de coleta
de dados para conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção de
determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas
também em examinar fatos ou fenômenos que se desejam estudar” (p. 190).
A partir disso, alguns alunos receberam nossas visitas, nos seus locais de
trabalho, onde foi possível realizarmos a observação do que desejávamos estudar,
conforme destaca o autor. Durante as visitas, realizamos uma entrevista com os
alunos, sendo essa um dos instrumentos utilizados para a coleta de informações
com o objetivo de descobrirmos quais os conceitos matemáticos que se fazem
presentes nos seus afazeres e no cotidiano para serem trabalhados, posteriormente,
em sala de aula.
Pádua (2000) coloca a entrevista como um dos procedimentos mais usados
em pesquisa de campo, porque pode ser utilizada por qualquer segmento da
população, que se poderá sentir desconfortável para responder às questões por
escrito.
O tipo de entrevista utilizada foi a não padronizada ou não-estruturada, pois
as perguntas foram abertas e puderam ser respondidas dentro de uma conversação
informal entre a pesquisadora e o aluno entrevistado.
Segundo Gil,
[...] convém lembrar que a entrevista possibilita o auxílio ao entrevistado
com dificuldade para responder, bem como a análise do seu comportamento
não verbal (2002, p. 115).
Como os alunos visitados estavam trabalhando, a entrevista surgiu da
observação do trabalho realizado por eles, sem um roteiro específico.
47
Questionávamos sobre os afazeres do aluno no seu trabalho. A cada
questionamento feito as respostas oportunizavam novas perguntas.
Conforme Lakatos e Marconi (1991), o uso do gravador é ideal na entrevista,
para obter as informações como foram ditas pelo pesquisado, mas “[...] o informante
deve concordar com a sua utilização” (p. 200). Destacamos que os alunos foram
informados e concordaram com a utilização do gravador durante a pesquisa.
Para Gil (1994), por estar presente com exclusividade em coleta de dados e
também em outros momentos de uma pesquisa, a observação, que se constituiu em
técnica de pesquisa, em alguns casos, chega até a ser considerada como método
de investigação.
Desse modo, a observação foi um elemento fundamental para o
desenvolvimento desta pesquisa, desempenhou papel imprescindível desde a coleta
de dados, permeando pelo período da experiência desenvolvida nas aulas com o
emprego da abordagem Etnomatemática até a elaboração das considerações finais.
O principal inconveniente da observação está em que a presença do
pesquisador, segundo Gil (1994, p. 105), “[...] pode provocar alterações no
comportamento dos observados, destruindo a espontaneidade dos mesmos e
produzindo resultados poucos confiáveis”. Tendo em vista que já interagíamos com
o grupo investigado, acreditamos que não houve alterações de comportamentos,
produzindo resultados confiáveis.
O tipo de observação empregada foi a participante ou observação ativa, que
consiste na participação real do observador na vida da comunidade, do grupo ou de
uma situação determinada. Sendo assim, o nosso papel foi o de observadora
participante, pois desde o início revelamos aos alunos sobre a pesquisa que estava
sendo desenvolvida, bem como os objetivos do estudo.
Os dados observados foram registrados a cada visita ao local de trabalho dos
alunos, no qual eram identificados os conceitos matemáticos presentes nas suas
diferentes práticas. Para isso, foram gravadas as falas dos alunos, tanto nas visitas
como no desenvolvimento das aulas para, posteriormente, serem descritas no diário
de campo. Destacamos que o acompanhamento do processo de elaboração do
conhecimento do aluno, a partir do emprego da abordagem da Etnomatemática,
aconteceu durante todos os momentos da pesquisa.
Segundo Sabino, (apud SAURIN, 2002), diário de campo é um instrumento
que implementa os dados obtidos em uma realidade, proporcionando uma interação
48
entre teoria e prática.
O diário de campo compreende as técnicas utilizadas e a análise dos dados,
estando dividido em duas partes: uma para as anotações específicas sobre os
dados obtidos no questionário e nas visitas in loco, e a outra para anotar as
observações obtidas pelos alunos durante o atendimento individual ou ao grupo em
sala de aula.
Esse instrumento foi muito importante para registrarmos conversas informais,
comportamentos cotidianos, valores desenvolvidos, como por exemplo: cooperação,
motivação, interesse, criatividade, autonomia, interação entre os colegas,
socialização entre outros.
À medida que íamos registrando no diário as observações que julgávamos
relevantes, passávamos a refletir sobre os conhecimentos matemáticos adquiridos
no decorrer das aulas, bem como as mudanças necessárias para a melhoria da
aprendizagem, enriquecendo-os.
49
3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS
A Etnomatemática, desde o momento inicial da pesquisa, aproximou-se de
uma das primeiras definições de D’Ambrosio (1990, p. 18):
[...] etnomatemática é matemática praticada dentro de um grupo cultural
identificável, tal como sociedades nacionais tribais, grupos de trabalho,
categorias de crianças de uma certa faixa etária, classes profissionais,
classes trabalhadoras, etc.
Os alunos da Educação de Jovens e Adultos, em sua grande maioria,
pertencem à classe de trabalhadores que, no turno da noite, freqüentam a escola em
busca de novos conhecimentos. São pessoas de diferentes idades, lutadoras que
vivem com responsabilidades sociais e familiares, cada um com seus valores
formados a partir de suas experiências de vida e da realidade na qual estão
inseridos.
Em cada aula ministrada, cada vez mais, motivavamo-nos para identificação
dos conceitos matemáticos existentes na prática cultural do aluno trabalhador.
Para coleta das informações que serviram de sustentação a este trabalho,
utilizamos questionário, visitas aos locais de trabalho e o interesse dos alunos. Para
interpretar os dados da experiência desenvolvida em sala de aula, foram analisados
os dados obtidos no questionário e nas observações realizadas nos postos de
trabalho dos alunos. Salientamos que, através desses instrumentos, obtivemos
dados para melhor conhecermos a contribuição da Etnomatemática.
3.1 Análise e interpretação dos dados do questionário que investigou as
vivências relacionadas ao fazer matemático no cotidiano do aluno
O primeiro questionário (APÊNDICE A) foi aplicado logo no início da
investigação, apresentando duas partes: na primeira, a identificação dos alunos e,
na segunda, oito questões com o objetivo de verificar o tempo que o aluno
permaneceu longe dos estudos, seus interesses e necessidades de freqüentar a
EJA, informações sobre a sua profissão, a utilização da Matemática no trabalho e no
seu dia a dia, o uso de instrumentos matemáticos no seu cotidiano e as dificuldades
50
matemáticas enfrentadas por ele.
Tratava-se de um questionário aberto, no qual o pesquisado pôde colocar,
livremente, suas opiniões, suas dificuldades em relação à disciplina de Matemática.
Lemos cada questão para os alunos, a fim de proporcionar-lhes liberdade de
expressão.
A etapa investigada foi composta por trinta e seis alunos matriculados, sendo
que, no dia da aplicação do questionário, estavam presentes vinte e oito alunos.
Constatamos que sessenta por cento (60%) dos que responderam às perguntas são
mulheres de dezesseis a quarenta e cinco anos e quarenta por cento (40%) são
homens de dezesseis a sessenta anos de idade.
Os resultados mostraram que os jovens de dezesseis anos, por motivos como
evasão, exclusão e repetência, procuraram a EJA para concluir os seus estudos,
tendo oportunidade de conviverem com colegas mais velhos, pessoas com valorosa
experiência de vida. Assim, aconteceu o entrosamento e a troca de saberes entre as
diferentes faixas etárias. Por isso, a EJA é uma promessa de qualificação de vida,
inclusive para as pessoas que possuem mais idade, as quais muito têm a ensinar
para as novas gerações. As experiências socioculturais trazidas pelos alunos
proporcionaram a todos atualização de conhecimentos e crescimento, fundamentais
para as atividades que desenvolvem.
3.1.1 Considerações sobre respostas dos alunos ao questionário
Na análise da questão 1, na qual o aluno informa o ano em que voltou a
estudar, constatamos que 3% retornaram em 2001, 11%, em 2004, 29%, em 2005 e
57%, em 2006.
Atualmente, as oportunidades de trabalho, por mais simples que sejam,
exigem a comprovação escolar. Isso justifica os 57% dos alunos entrevistados que
retornaram à escola no ano de 2006.
A questão 2 foi formulada para investigar os interesses e as necessidades
dos alunos da EJA. Após a análise, destacamos que a maioria dos alunos deseja
seguir seus estudos para conseguir uma profissão melhor, entrar no mercado de
trabalho, adquirir cultura e conhecimentos para prestar concursos públicos, ingressar
em cursos técnicos e faculdades de terceira idade, conviver com pessoas de
diferentes idades, aprender para ensinar os filhos, ter uma vida digna, não parar no
51
tempo, garantir o emprego que já possui, não ser explorada por ter pouca
escolaridade, aproveitar a oportunidade que a escola (EJA) oferece para pessoas de
mais idade retomar os estudos e ter um futuro cada vez melhor.
As questões 3 e 4 visaram a identificar o número de alunos trabalhadores e
suas profissões. Dos alunos, 21% encontram-se desempregados, enquanto que
78% possuem diferentes empregos sendo: serviços gerais, artesã, doceira,
costureira em uma fábrica de sofá, empregada doméstica, diarista, balconista em
uma padaria, ferreiro, apontador de descarga de caminhão, mecânico, metalúrgico,
supervisor de produção de uma cooperativa de cereais, agricultor, eletrotécnico,
atendente e motorista de um mercado, marceneiro, servente de pedreiro,
revendedoras de produtos cosméticos e aposentado inativo do exército, alguns com
carteira assinada e outros não.
Observamos que, no grupo em estudo, se fez presente um relevante índice
de desemprego, tendo em vista que 21% não estão empregados. Para os 78% que
trabalham, o salário recebido é razoável, mas há o desejo de melhores
oportunidades com salários mais justos.
As questões 5 e 6 se referiram à utilização da Matemática no trabalho e no
cotidiano dos alunos. Citamos algumas respostas identificadas no questionário sobre
a utilização da Matemática no dia a dia.
“para fazer pagamentos, receber, comprar no supermercado, fazer livro caixa
e outros cálculos..”
“o relógio para não chegar atrasada, o computador para bater o ponto para
fechar as horas trabalhadas, controle das minhas contas pessoais”
“meço e calculo o tamanho e a medida das peças que faço, calculo a
porcentagem de lucro”
“medindo, contando e somando”
“na quantia de adubo, uréia, calcário...”
“para medir as chapas, para cortar as peças, utilizo vários tipos de medidas”
52
“para calcular as minhas receitas, custos, lucros, medidas, porcentagem”
“nas contas bancárias e nas minhas compras diárias faço meus cálculos para
não ultrapassar o orçamento”
“as metragens dos caminhões e até das descargas deles”
“peso e calculo os ferros”
“se tenho 1h e meia para fazer uma tarefa, calculo as horas e minutos”
“quando vou fazer um bolo que eu preciso medir, como 3 xícaras e 2 copo”
“recebo os produtos em Kg e transformo em sacos, 15000 Kg de adubo
transformo para 300 sacos...”
“administro o meu salário, e no trabalho faço o controle de estoque”
“conto o número de sofás costurados por dia e por mês”
“fazendo contas no mercado, na cozinha, somando as contas para saber
quanto gasto”
“no controle do tempo”
“para fazer massa, vai 6 de areia para 1 de cimento e para concreto 3 de
areia, 2 de brita e 1 de cimento”
“somando e diminuindo voltagem, ohms, faço cálculos sobre meu balanço do
mês...”
“peso os produtos, faço peso vezes valor por kg e levo ao caixa”
53
“utilizo muita matemática na marcenaria, pois ela é fundamental para minha
profissão”
“eu uso de várias maneiras, ela está sempre presente em tudo, quando
vamos fazer o orçamento do mês, a matemática é fundamental nas contas da casa,
água, luz, telefone, farmácia, etc...”
Alguns desses relatos dos alunos, sujeitos da pesquisa, foram utilizados em
sala de aula para desenvolvermos as atividades matemáticas.
Segundo Pais (2002, p. 27), “[...] o valor educacional de uma disciplina
expande na medida em que o aluno compreende o vínculo do conteúdo estudado
com um contexto compreensível por ele”. Isso significa que todos esses relatos
servem de referência para a aprendizagem do aluno, ajudando-o na
contextualização do conhecimento.
A Matemática está presente, constantemente, na vida das pessoas, e,
conforme nos diz Silva (2006), em seu artigo, “Saberes matemáticos produzidos por
mulheres em suas práticas de compra e venda”, os saberes matemáticos se fazem
presentes em situações cotidianas, como no momento de encontrar o valor total a
ser pago no supermercado, no troco a ser recebido ou no cálculo do orçamento
doméstico.
Na questão 7, a pergunta ao aluno era sobre o uso diário de alguns
instrumentos matemáticos. Eventualmente, 50% dos alunos utilizam a calculadora
em seu dia a dia, enquanto que 21% usam fita métrica, 7% paquímetro e régua, 3%
linha de pescar, relógio, aparelho de umidade, impurezas e secagem de cereais,
esquadro, balança digital.
Destacamos algumas respostas relacionadas a essa questão:
“meus cálculos são quase que todos mentalmente pois já adquiri prática e
experiência, mas às vezes utilizo a calculadora”.
“medidas de copos, litros e quilos e às vezes quando vou trocar os móveis do
lugar preciso o metro”
“ faço contas no papel, pois não tenho muita certeza quando uso a
54
calculadora”
“utilizo bastante no meu trabalho a calculadora”
Esses instrumentos, utilizados pelos alunos nas suas atividades, fizeram-se
presentes nos diálogos da sala de aula.
Nesse contexto, Ávila (2004) afirma que “[...] a calculadora de bolso é, hoje
em dia, um instrumento de fácil acesso a qualquer pessoa” (p. 53). Sendo assim, os
alunos da EJA por serem adultos, utilizam, freqüentemente, no seu cotidiano a
calculadora. É de fácil acesso e se faz presente nas suas atividades profissionais.
Portanto, é imprescindível que trabalhemos com esse instrumento em sala de aula.
Outro autor, que muito tem a contribuir sobre o uso da calculadora pelos
alunos, é Bigode (1998), destacando que ela possibilita aos indivíduos enfrentarem
problemas realmente reais, com números próximos aos utilizados na vida cotidiana.
Desse modo, aprendendo a utilizar corretamente a calculadora, o educando
terá facilidade em operar máquinas mais modernas, computadores, caixas
eletrônicos, calculadoras científicas, entre outros.
Por outro lado, as atividades de cálculo mental apresentadas nas obras de
Imenes (2005) nos mostram que devemos trazer essas habilidades para a sala de
aula, tal como: “o cálculo mental que está presente no comércio”.
Diante das diversas situações do mundo do trabalho, que exigem raciocínio
lógico, foi preciso instigarmos o cálculo mental dos alunos durante as aulas e
também durante a visitação aos seus locais de trabalho, ou seja, no comércio.
Na última questão, solicitamos aos alunos que relatassem algumas
dificuldades ao empregar os números em suas atividades diárias. Somente 17% dos
alunos disseram não ter dificuldades com números. Citamos algumas escritas dos
outros alunos.
“todas possíveis, quando ouço a palavra “matemática” o meu cérebro pára”
“Sempre fui péssima em Matemática, mas as porcentagens, gráficos, medidas,
e áreas são as piores”
“fazer contas de cabeça”
55
“se preciso comprar uma toalha de mesa, preciso largura e comprimento, eu
acho difícil”
“eu tenho dificuldade nos números e na hora que preciso fazer uma medição
sem usar a calculadora”
“para fazer orçamentos de cubações”
Constatamos que 40% dos alunos encontram dificuldades em juros e
porcentagens.
Assim, apesar de a Matemática estar presente, desde cedo, nas mais
diversas situações em nossa vida, e apesar de ser considerada uma das principais
matérias escolares, algumas pessoas temem, odeiam, ou têm aversão a ela.
Para Rabelo (2004, p. 65),
[...] no ensino da matemática ao invés do conteúdo ser adaptado ao aluno, o
aluno é que tem que se adaptar ao conteúdo. Como normalmente isso não
acontece, o aluno não consegue compreender o que se ensina. Por isso a
maioria das pessoas não a compreende, dizem odiar a matemática.
Nosso trabalho confirma as palavras de Rabelo, pois estamos buscando a
identificação das dificuldades de aprendizagem encontradas pelos alunos da EJA,
para serem trabalhadas junto aos conteúdos matemáticos em sala de aula.
Isso reforça as palavras de Torres (1994), segundo o qual, os professores
devem rever profundamente os conteúdos e os métodos utilizados, pois práticas
desvinculadas da realidade dos alunos não despertam seu interesse e motivação.
Com isso, pretendemos que o aluno compreenda a utilização da Matemática,
deixando de falar que “a Matemática é difícil, complicada” mesmo sabendo da
importância que ela tem para nossas vidas.
A partir das respostas ao questionário, percebemos a existência de diversas
profissões no grupo de alunos, todas elas importantes. Coube-nos selecionar
algumas profissões que mais utilizam a Matemática para a visita in loco.
56
3.2 Análise dos dados obtidos nas visitas in loco
Foram selecionados dezesseis alunos trabalhadores para a visita, visando a
conhecer a prática diária de seu trabalho. Os alunos trabalhadores foram orientados
a solicitarem aos seus patrões autorização para nossa presença em seus locais de
trabalho, agendando datas e horários. Nem todos os selecionados foram receptivos,
mas outros demonstraram alegria e muito interesse.
Realizamos sete visitas nos seguintes estabelecimentos: marcenaria,
cooperativa de cereais, padaria, mercado, ferraria, hotel e artesanato. Com a
intenção de desenvolvermos um trabalho bem próximo à realidade do aluno, usamos,
além da observação e explicação do aluno, uma gravação para o registro no diário
de campo.
As problematizações surgiram das análises do questionário, das visitas, dos
interesses, necessidades, características pessoais, e dos conceitos matemáticos
utilizados no seu dia a dia, a seguir, foram planejadas sete aulas, desenvolvidas,
durante o segundo semestre de 2006, com a turma em estudo.
4 DESCRIÇÃO E RELATO DAS AULAS
Desenvolvemos sete aulas de Matemática para os alunos da EJA – Ensino
Fundamental da etapa 5.
A observação foi realizada a partir dos seguintes indicadores: a utilização da
Matemática na profissão do aluno, o interesse do aluno em aprender conteúdos
matemáticos relacionados ao seu meio social, ritmo de aprendizagem de cada um,
motivação dos alunos em aprender com a abordagem da Etnomatemática,
percepção dos alunos da EJA quanto à relação entre o conhecimento popularmente
construído por eles e o saber cientificamente elaborado, reação dos alunos diante da
proposta metodológica apresentada, favorecimento da construção de uma
aprendizagem significativa com a abordagem da Etnomatemática e os saberes do
cotidiano dos alunos da EJA.
Como conteúdos presentes nos saberes cotidianos dos alunos, foram
identificados cálculos das operações com números decimais, Matemática financeira,
comprimento da circunferência, porcentagem, ampliação e redução de figuras, razão,
57
proporção, juros, números fracionários, teorema de Pitágoras, medidas de
comprimento, massa e volume.
O diagnóstico em pauta serviu como base para a seleção de alguns
conteúdos, para ampliação dos saberes, conforme a descrição e os relatos das
aulas.
Como afirma Fernández (1990) apud Sacristán (1998):
A escola é uma trama de relações sociais materiais que organizam a
experiência cotidiana e pessoal do aluno(a) com a mesma força ou mais
que as relações de produção podem organizar as do operário na oficina ou
as do pequeno produtor do mercado. Por que então continuar olhando o
espaço escolar como se nele não houvesse outra coisa em que se fixar
alem das idéias que se transmitem? (p.152).
Portanto, os processos de socialização que ocorreram na escola em estudo
aconteceram como conseqüência das práticas sociais, das relações sociais que se
estabeleceram e se desenvolveram no grupo da EJA.
O conteúdo oficial do currículo converte-se numa aprendizagem para passar
nas provas e esquecer depois, enquanto que a aprendizagem dos mecanismos,
estratégias, normas e valores de interação social requer o êxito na complexa vida
acadêmica (SACRISTÁN, 1998).
Os objetivos das aulas partiram dos conhecimentos matemáticos, existentes
na prática cotidiana do aluno trabalhador, constatados nas problematizações e
compartilhados junto aos demais colegas e à professora. Assim, o aluno percebeu a
importância da Matemática presente na sua vida, no seu trabalho e nos seus
afazeres.
A cada aula procuramos ampliar esses conhecimentos, com novos conceitos
matemáticos, em busca de uma aprendizagem mais significativa, pois segundo
Ausubel (apud RABELO, 2004), aprendizagem significativa é um processo no qual
uma nova informação é relacionada a um aspecto relevante, presente na estrutura
de conhecimento de um indivíduo. Portanto, o interesse de sua teoria é na
estruturação do conhecimento, tendo por base as organizações conceituais já
existentes que funcionam como estruturas de ancoradouro e acolhimento de novas
idéias.
Acreditamos que, para ocorrer uma aprendizagem significativa, o aluno
precisa se apropriar do conhecimento matemático por meio de aproximações
58
sucessivas e com significado.
Dessa forma, na perspectiva de uma educação para toda a vida, Melo (2004)
nos diz que:
A escola deverá mover-se em sintonia com os quatros pilares da educação
para o século XXI, de modo a permitir aos seus educandos o
desenvolvimento das habilidades de “aprender a conhecer”, “aprender a
fazer”, “aprender a ser”, “aprender a conviver”, as quais lhes possibilitarão o
exercício de suas potencialidades cognitivas, afetivas e coletivas. Assim, é
concebido às pessoas, em qualquer momento de suas vidas, e nos seus
mais diversos espaços de atuação, o direito de aprender, ampliar e
transformar seus conhecimentos, habilidades, competências e valores (p.
12).
Concordamos com as palavras de Melo, pois a Educação de Jovens e
Adultos oportuniza, em qualquer momento da vida, o direito à educação com o
desenvolvimento de habilidades e valores.
As aulas foram determinadas por seções, contendo o tema, a
problematização, os conteúdos, os objetivos e os valores desenvolvidos.
Durante o desenvolvimento das aulas, utilizamos materiais como: quadro, giz,
caderno, régua, lápis, canetas, pincel atômico, borracha, papel pardo, tesouras,
calculadoras, fita métrica, trena, produtos com forma cilíndrica, objetos circulares,
papel quadriculado, revistas, livro caixa, entre outros.
A seguir, apresentaremos as atividades desenvolvidas em aula, focalizando
os conhecimentos matemáticos identificados em várias ações profissionais dos
alunos no contexto do trabalho.
4.1 Aula 1
Tema: Os saberes matemáticos presentes na marcenaria
Problematização:
O aluno A tem 41 anos e trabalha em uma marcenaria, localizada na cidade
em estudo. É uma pessoa calma e muito detalhista nos objetos que faz, produzindo
em madeira portas, janelas, móveis sob medida, rodas de carreta, pipas para vinho,
entre outros.
Observamos quanto o marceneiro utiliza a Matemática no seu trabalho, pois
precisa determinar a quantidade de material a ser utilizado para cada objeto, tirar as
medidas e calcular o preço do produto. Para isso, ele usa, constantemente, a trena e
59
a calculadora. Nosso aluno também verifica o prazo de entrega, confecciona os
móveis e faz a montagem no lugar onde o cliente desejar.
Além disso, o aluno marceneiro trabalha com a matemática financeira,
principalmente no que diz respeito à porcentagem, descontos, prestações, dívidas e
crédito.
Durante a visita, o aluno mostrou-nos o funcionamento dos aparelhos
utilizados na marcenaria. A seguir, a descrição de cada instrumento, segundo a
explicação do aluno.
- serrafita (faz cortes em forma de círculo na madeira);
Figura 1: o aluno A mostra a aplicabilidade da serrafita.
- desempenadeira (tira as quinas, ou seja, deixa a superfície lisa);
Figura 2: mostrando o funcionamento da desempenadeira
- desengruçadeira (deixa a madeira lisa e na espessura desejada);
60
Figura 3: mostrando a espessura da madeira
- tulipa (faz ranhuras, detalhes na madeira);
Figura 4: material utilizado para fazer detalhes nos móveis em madeira
- lixadeira (tira as imperfeições que há na madeira, muitas vezes deixadas por
outros utensílios, como a tulipa, desengruçadeira e desempenadeira);
Figura 5: o aluno utiliza no seu trabalho a lixadeira
Figuras 6 e 7: objetos construídos pelo aluno A
A seguir, temos alguns questionamentos feitos ao aluno durante a visita à
61
marcenaria e as suas respostas.
1) Quando falta algum instrumento de medida, o que você usa para substituí-
lo?
“Uma ripa ou palmos".
2) Quando você constrói uma estante, por que prega uma ripa inclinada no
fundo? Pode ser substituída por outra peça?
“Para dar sustentação e pode ser substituída por cantoneira”.
3) Como você faz o cálculo da quantidade de fórmica necessária para revestir
um móvel?
“Meço por peças”.
4) Como você determina a quantidade de litros de uma pipa?
“Meço o comprimento do meio da pipa, divido por dois, daí, pego o resultado
e multiplico pelo mesmo valor e, depois, vezes 3,1416, daí, vejo a resposta e
multiplico pela altura, assim, sei quantos litros caberá na pipa, dividindo por mil”.
Altura
Diâmetro
Trena
Calculadora
Figura 8: explicação do cálculo relacionado à pergunta 4
Questionamos ao aluno o que seria o 3,1416?
Figura 9: saber cotidiano do aluno
“Quando iniciei a trabalhar em uma marcenaria, um colega de trabalho me
62
ensinou... Nunca perguntei por que ele utiliza este número”.
Pode-se constatar que o valor 3,1416 foi utilizado de geração para geração,
sem saberem o significado científico.
Conteúdo desenvolvido: Comprimento da circunferência.
Objetivos:
- determinar o comprimento de uma circunferência;
- reconhecer a importância da aplicação do número irracional .
Tempo: 2 seções de 90 minutos.
No dia anterior a esta seção, solicitamos que os alunos levassem para a sala
de aula objetos de forma circular, como formas de pizza, bandejas, bicicletas, cds,
moedas, réguas, trenas e barbantes.
Ao iniciar a seção, a turma foi dividida em pequenos grupos e, a seguir,
distribuiram-se, aleatoriamente, os materiais e instrumentos de medidas.
Salientamos que a organização da sala de aula deve contribuir para a
efetivação do espaço, como nos dizem Smole e Diniz (2001). Concordamos com as
autoras também, quando afirmam que, dispondo os alunos em pequenos grupos,
eles discutem e descobrem uns com os outros a melhor maneira de conduzir as
ações, buscam alternativas e tomam decisões. Com a troca, eles enriquecem seus
conhecimentos e idéias e, juntos, buscam uma forma de articular o que sabem de
acordo com o que está sendo pedido.
Como tarefa inicial, solicitamos aos alunos que contornassem os objetos com
o barbante. Nesse momento, explicamos à turma que a medida do contorno dos
objetos chama-se circunferência e é representada pela letra C. A seguir, os alunos
mediram de um lado a outro, passaram pelo centro de cada um dos objetos,
registrando-os. Na ocasião, perguntamos à turma se alguém sabia como se
chamava essa medida. Alguns alunos responderam que tal medida é o diâmetro.
Então, foi complementado que essa medida é representada pela letra d.
Dando continuidade, apresentamos a tabela a seguir, na qual foi realizado um
trabalho coletivo.
63
Tabela 1: Cálculo Prático do Valor do
π
.
OBJETO
COMPRIMENTO ( C )
DIÂMETRO ( D )
CALCULE
d
C
Cds
Bandejas
Rodas da bicicleta
Formas de pizza
moedas
Nesse momento, destacamos a afirmação de (PONTE, 2003), ou seja, a
importância que o professor atribui ao registro escrito é bem interiorizada pelos
alunos, que se preocupam em escrever, o mais fielmente possível, os seus
resultados. Concordamos com o autor, pois a grande maioria dos alunos da EJA,
quando está realizando uma atividade, sempre questiona para o professor: “é para
copiar no caderno?...”. Eles se preocupam muito em copiar, têm medo de que o
professor apague e que não dê tempo para registrar no seu caderno, para posterior
estudo.
Em seguida, os alunos completaram a tabela. Depois de realizada a tarefa, a
maioria dos alunos concluiu que os resultados obtidos foram próximos de 3. Para
complementar este trabalho, aprofundamos os conhecimentos já adquiridos,
apresentando o símbolo
d
C
3 , que significa: “aproximadamente igual”.
Dizemos “aproximadamente igual” porque, no século XVII, provou-se que este
quociente constante é um número irracional.
O símbolo usado para designar a constante obtida pela razão entre a medida
do comprimento de uma circunferência e seu diâmetro é a letra grega
π
(lê-se “pi”),
que foi popularizada pelo matemático suíço Leonhard Euler, em 1737.
A letra grega
π
é a inicial da palavra contorno em grego:
O
π
tem infinitas casas decimais e não apresenta período.
π
= 3,1415926535897932384626
64
Como
d
C
=
π
, então C =
π
. d
Assim, podemos calcular a medida C do comprimento de uma circunferência
de diâmetro d, fazendo:
C =
π
. d ou d = 2 . r (r é o raio da circunferência)
C = 2 .
π
. r
Em geral, usamos aproximações racionais por
π
= 3,14.
O desenvolvimento deste conteúdo partiu da observação do trabalho do aluno
A durante a visita à marcenaria, pois ele utilizava o número 3,1416 sem saber que
era o valor do
π
.
Observações feitas durante o desenvolvimento da aula:
- no momento da entrega dos objetos aos grupos, o marceneiro explicou:
“medindo 3 vezes de um lado ao outro (diâmetro), temos o valor do comprimento da
circunferência”.
- os alunos A, H e C perceberam o que a professora estava solicitando. O
aluno H falou: “estamos achando o diâmetro nesta medida”. Outro aluno comentou: “
o
π
aparece em calculadoras mais modernas”.
Figura 10: atividades desenvolvidas com objetos circulares
Notamos que a aluna E encontrou dificuldades ao medir com a trena usada
pelos pedreiros, porque essa apresentava duas escalas, sendo uma em centímetros
e outra em polegadas. Um aluno de 46 anos, conhecedor do instrumento, já que o
utiliza no seu dia a dia, percebeu o equívoco da colega, que olhava o lado errado da
trena.
Isso remete ao que nos diz Smole e Diniz (2001, p. 158) “O receio de cometer
65
erros é superado à medida que se tem o outro para compartilhar as dúvidas e as
dificuldades surgidas no caminho”.
Desse modo, durante o desenvolvimento das atividades, a ajuda do colega
fez com que a aluna percebesse o erro cometido. A essa relação de ajuda que
ocorre entre os alunos nas atividades escolares das aulas de Matemática,
chamamos de “cooperação”. Segundo Liberato e Carvalho (2006), os professores de
EJA devem ter consciência do clima de cooperação existente entre os alunos no
decorrer das suas aulas. Os alunos presentes nas classes de EJA são de diversas
faixas etárias e possuem variados conhecimentos. Assim, quando as atividades
matemáticas são trabalhadas em grupo, há uma cooperação constante entre eles.
Figuras 11, 12 e 13: atividades práticas
Outro aluno do grupo teve dúvida na hora de usar a trena: não sabia se
começava a contar no zero ou no um.
Ao relatar sobre o valor do
π
, perguntamos se algum grupo tinha achado 3,14?
Três grupos responderam afirmativamente.
No final desta tarefa, as dúvidas e dificuldades de todos os alunos foram
sanadas coletivamente.
Figuras 14, 15 e 16: trabalhos em grupo
Na seção seguinte, foram realizados problemas envolvendo o número
π
.
Abaixo, alguns exemplos são apresentados.
66
1) O diâmetro da roda de uma bicicleta mede 0,70 m. Qual o comprimento da
roda da bicicleta? Essa mesma roda necessitará de quantas voltas para percorrer
1099 m?
2) A medida do contorno da forma de pizza é de 0,99 cm. Quanto mede o raio
dessa forma?
3) Um Cd tem 12 cm de diâmetro. Qual será o seu comprimento?
A seguir, há algumas observações realizadas durante as atividades:
Primeiramente, os alunos identificavam os dados dos problemas, depois
tentavam resolvê-los.
O aluno P comentou: “...na aula anterior, colocamos na tabela o valor do
diâmetro da forma de pizza, então o valor do raio é fácil”.
Para a realização dos cálculos, grande parte dos alunos utilizou a calculadora.
Alguns grupos perceberam que o valor solicitado, referente a alguns objetos,
já constava na tabela construída na aula anterior, assim era mais fácil saber a
resposta; outros, porém, não perceberam e aplicaram as fórmulas.
Valores desenvolvidos:
Durante a entrega de materiais e objetos aos grupos, para a realização de
atividades práticas, observamos a expectativa dos alunos em relação aos materiais.
Após a orientação, percebemos a motivação e o interesse dos componentes dos
grupos em utilizar os instrumentos para realizar as atividades.
Ocorreu também a socialização, já que os alunos mais ágeis e rápidos
auxiliaram aos demais colegas.
Esta atividade foi interessante, pois partimos da problematização do aluno
que trabalha no seu dia a dia com o
π
na marcenaria, mesmo sem conhecer o seu
real significado, mostrou que a Matemática está inserida nas diferentes práticas
diárias das pessoas, sendo fundamental para o desenvolvimento de certas
atividades.
Assim, é preciso que o professor de Matemática desperte para a realidade e
perceba que
o saber matemático não pode continuar sendo privilégio de poucos alunos,
67
tidos como mais inteligentes, cujo temperamento é mais dócil e, por isso,
conseguem submeter-se ao fazerem tarefas escolares sem se preocuparem
com o significado das mesmas no que se referem ao seu processo de
construção de conhecimento (Carvalho, 1991).
Conforme expresso nas Diretrizes da EJA (2004), é necessário formar
cidadãos que saibam resolver de modo inteligente seus problemas do cotidiano.
Procuramos a relação do conteúdo com situações-problema, enfrentadas pelo
homem no mundo. Dessa forma, por compreendermos as conexões dos conceitos
desenvolvidos nesta aula com a prática cotidiana do aluno, mostramos a importância
desse conteúdo para atender às necessidades práticas da vida social, indicando
realmente o significado matemático aplicado à prática do aluno.
4.2 Aula 2
Tema: O saber cotidiano na cooperativa (Cotrisel)
Problematização:
Realizamos uma visita na Cotrisel, cooperativa de produção de cereais,
localizada na cidade de São Pedro do Sul, para conhecer o ambiente de trabalho do
aluno B.
O referido aluno tem 43 anos de idade, após 30 anos, retornou aos seus
estudos na EJA, com o objetivo de concluir o Ensino Fundamental, adquirir maiores
conhecimentos e aprimorar o seu trabalho na cooperativa.
Durante a visitação, observamos que o aluno B administra o setor de
produção, a entrada e a saída de produtos. O recebimento de arroz, soja, trigo,
ração, adubo, veneno, controle de estoque, secagem, armazenagem, reforma dos
maquinários, montagem de equipamentos e limpezas em geral são funções
desempenhadas pelo aluno B.
O aluno utiliza no seu dia a dia vários instrumentos como a calculadora, a
balança, o paquímetro, além de aparelhos de umidade, impureza e secagem de
cereais. Demonstra também muita sabedoria em relação ao funcionamento dos
aparelhos no laboratório e ao processo do engenho.
Durante a entrevista, o aluno destacou a importância da área verde em torno
do engenho, dizendo com muito orgulho que ele ajudara a plantar as árvores alí
68
existentes.
Figura 17: a pesquisadora no local de trabalho do aluno da EJA
Observamos que a Matemática está bem presente no seu trabalho diário, ou
seja, na realização de funções como:
- transformação dos produtos que recebe em toneladas para kg e sacos;
- controle do horário de secagem;
- identificação da porcentagem de impurezas do arroz;
- comparação dos produtos, rendimento, valor mínimo, valor máximo e
prazos;
- controle de estoque registrados em planilhas;
- incubação de silos (volume);
- controle de umidade (graus).
Figura 18: a professora e o aluno no laboratório da cooperativa
Figuras 19 e 20: aparelho que controla a umidade dos produtos em graus
Ainda durante a visita ao trabalho do aluno B, ele nos explicou sobre as
alterações térmicas, fundamentais na secagem de grãos, afirmando que: “tem que
marcar 12 graus, se eu tiver 22 graus, tenho que secar até chegar aos 12 graus, se
marcar 20 graus, daqui a uma hora vai ter 18 graus, vou controlando, tenho que
achar o ponto certo, se der muito errado, tem que fazer a correção com o
termômetro”.
No seu trabalho, é muito utilizada a porcentagem para saber quais são as
69
impurezas dos produtos. Ele explicou: “Se tiver 5% de impureza no arroz, então
sabemos quanto vai ser o valor líquido, o rendimento e o tempo de secagem das
amostras dos produtos”.
Na seqüência da caminhada pelo engenho, chegamos ao elevador que ele
ajudou a construir. O aluno comentou: “tivemos que montar o elevador com tal altura
para ter um bom caimento....”. Nessa fala, constatamos o uso do teorema de
Pitágoras na construção do equipamento.
Ele nos mostrou os silos, em que são armazenados os produtos. “Cada silo
tem tantos anéis...”, disse ele. Perguntamos o que são anéis? Ele disse que 1m
3
de
chapa é 1 anel da chapa, cada chapa compreende o espaço de um parafuso a outro.
Ele conta a olho para verificar quantos anéis estão faltando.
Figura 21: silo
Verificamos nessa visita quanto o trabalho deste aluno é significante para o
crescimento da firma em que trabalha.
Conteúdos desenvolvidos: Volume do cilindro
Objetivo:
identificar e calcular o volume de um cilindro.
Tempo
: 3 seções de 90 minutos.
Inicialmente, comentamos com os alunos sobre a visita à cooperativa, em que
o colega B trabalha diariamente, mostrando algumas fotos que registram o momento
da visita, entre elas, o silo. Em seguida, os colegas ouviram B comentar sobre o seu
trabalho.
A seguir, a turma foi dividida em grupos de 4 alunos para trabalhar com os
objetos trazidos pela professora. Após o manuseio e a observação dos objetos, os
alunos foram questionados sobre a relação existente entre os objetos e o silo. Os
70
alunos disseram que todos tinham a mesma forma “cilíndrica”.
Os silos são objetos de grande porte utilizados pelas cooperativas para
armazenamento de cereais.
O aluno H disse: “... sei que os silos são em toneladas...”.
Para melhor entender como é feito o cálculo da capacidade de
armazenamento dos cereais nos silos, propusemos que os alunos calculassem o
volume de alguns objetos cilíndricos para terem a idéia de comparação.
Os alunos observaram que todos os objetos tinham a base redonda, ou seja,
circular.
De maneira mais prática, o cilindro é um corpo alongado e de aspecto roliço,
com o mesmo diâmetro ao longo de todo o comprimento.
Os alunos perceberam que as bases do sólido geométrico em questão são
círculos.
No entanto, como já sabem que a área da base de um círculo é
A
base
=
π
. r
2
foi mais fácil entenderem o cálculo do volume de um cilindro.
O volume do cilindro é obtido pela área da base do círculo vezes a altura,
então:
V = A
base
. h ou V =
π
. r
2
. h, em que:
π
= 3,14;
r é o valor do raio da base do cilindro;
h é a altura do cilindro.
Para saberem a área da base, os alunos fizeram o cálculo de imediato, e,
logo após, multiplicaram pelo valor da medida da altura dos objetos, obtendo assim,
o volume de cada objeto na unidade de medida centímetros cúbicos (cm
3
).
Na seqüência, desafiamos os alunos a descobrirem a quantidade de material
gasto para confeccionar os seguintes objetos: lata de ervilha, de milho, de molho de
tomate. Para o exercício, a turma foi dividida em grupos.
A seguir, estão os resultados da atividade realizada por um grupo que
trabalhou com a lata de milho. Lembrando que descrevemos no quadro todos os
passos da resolução e cada grupo analisava as medidas do seu objeto e realizava
as anotações pertinentes.
71
Figura 22: medida da altura do objeto cilíndrico
Os alunos, primeiramente, foram orientados para descobrirem o valor do
diâmetro da lata, não ocorrendo neste momento nossa intervenção.
d = 7,5 cm; como d = 2. r ; o raio do círculo é r = 3,75
A
base =
π
. r
2
A
base =
3,14 . (3,75)
2
= 44,16 cm
2
Perguntamos: “ que relação tem as duas bases”?.
Os alunos M, C, N, J disseram: “as bases são iguais”. Então
complementamos “as bases são congruentes”.
Então:
A
bases
= 2 . 44,16
A
bases
= 88,32 cm
2
Continuando, questionamos:
E para a superfície lateral?
A planificação da superfície lateral do cilindro é uma figura geométrica. Qual é
ela?
Nesse momento, os alunos receberam uma folha de ofício para fazerem a
planificação.
Primeiramente, mediram a altura do cilindro, sendo h =8,2cm. Com a régua,
mediram na folha de ofício e recortaram a largura.
Em seguida, perguntamos:
E para o comprimento?
Os alunos então fizeram os seguintes cálculos:
72
C = 2 .
π
. r
C = 2 . 3,14 . 3,75
C = 23,5 cm
Logo, esse é o valor do comprimento da folha de ofício.
As conclusões do alunos durante a atividade foram as seguintes:
“é um retângulo”;
“cabe bem certinho em roda da lata”;
“as medidas estão bem certinhas,mesmo”;
“ acho que recortei errado o papel, pois o meu não fecha”;
“ a minha altura está maior”.
23,5 cm
Perguntamos: “com estas medidas, é possível descobrir a área lateral?”
Um aluno disse: “se multiplicarmos os valores encontrados...”
Com um elogio ao raciocínio desse aluno, complementamos: - Está correto, a
área lateral é a multiplicação do comprimento pela largura.
Então:
A
lateral
= comprimento . largura
A
lateral
= 23,5 . 8,2
A
lateral
= 192,7 cm
2
Alguns alunos arredondaram para 193 cm
2
.
8,2 cm
73
Com isso, podemos calcular a área total da superfície do cilindro.
A
total
= A
bases
+ A
lateral
A
total
= 88,3 + 192,7
A
total
= 281 cm
2
São necessários 282 cm
2
de material para confeccionar a lata analisada pelo
grupo.
Em seguida, aplicando os mesmos dados, foi feito o cálculo do volume da lata
de milho.
Como r = 3,75 cm e h = 8,2 cm
V =
π
. r
2
. h
V = 3,14 . 3,75
2
. 8,2
V = 362,08 cm
3
Lembramos neste momento que 1 cm
3
= 1mL e o volume da lata pode ser
expresso em milílitros.
V = 362,08 mL.
Assim, todos os objetos que estavam sobre as mesas dos alunos serviram
como exemplo para a realização dos cálculos do volume, sob nossa intervenção
quando necessário.
Figura 23, 24: realização das atividades nos grupos
74
Figura 25: utilizando a régua para medir o diâmetro da lata
Também relacionado a este conteúdo matemático está a problematização do
saber cotidiano do aluno A, que trabalha na marcenaria, pois, durante a visita ao seu
local de trabalho, perguntamos sobre a capacidade de litros de vinho que uma pipa
comporta. Explicamos que a quantidade de litros é o volume da pipa, em dm
3
. Então,
ele mediu a altura da pipa, 25 cm e o seu raio, 10 cm, para saber de quantos litros
seria a capacidade de uma pipa de vinho.
No entanto, propusemos esse mesmo cálculo para os demais alunos e
surgiram algumas divergências. Alguns fizeram o desenho da pipa de vinho para
colocar os dados, outros aplicaram os dados diretamente na fórmula e outros
identificaram, primeiramente, os dados no lado esquerdo da folha para depois
realizarem os cálculos do volume do sólido cilíndrico.
Altura: h = 25 cm
Raio: r = 10 cm
π
= 3,14
V
cilindro
=
π
. r
2
.
h
V
cilindro
= 3, 14 . 10
2
. 25
V
cilindro
= 7850 cm
3
Perguntamos: O resultado encontrado foi 7850 cm
3
, a unidade é em cm
3
e
queremos saber quantos litros cabem na pipa, como iremos fazer essa
transformação?
A transformação de cm
3
para dm
3
não foi lembrada por alguns alunos, então,
fizemos uma revisão, mostrando como se realizam as transformações das unidades
de medida de capacidade de um sólido.
Smole e Diniz (2001, p. 72) afirmam que “[...] a falta de compreensão de um
75
conceito envolvido no problema, o uso de termos específicos da Matemática que,
portanto, não fazem parte do cotidiano do aluno e até mesmas palavras que têm
significados diferentes na Matemática, fora dela, podem constituir-se em obstáculos
para que ocorra a compreensão”.
Com isso, observamos o quanto se torna difícil para alguns alunos lembrarem
das transformações das unidades, sendo que o aluno que trabalha na marcenaria
realiza-a perfeitamente, automaticamente, “de cabeça”, como diria ele.
Dando continuidade, explicamos que uma das unidades mais utilizadas para
medir a capacidade de um sólido é o litro cuja abreviação é l.
De acordo com o Comitê Internacional de pesos e medidas, o litro é,
aproximadamente, o volume equivalente a um decímetro cúbico, ou seja:
1 litro = 1,000027 dm
3
Contudo, para todas as aplicações práticas simples, podemos definir:
1 litro = 1dm
3
O aluno A, imediatamente, falou “se 1 litro é 1 dm
3
(decímetro cúbico), então
devemos dividir o resultado por 1000”.
7850 cm
3
= (7850:1000) dm
3
= 7,85 dm
3
Como 1 litro é igual a 1 dm
3
, então caberão na pipa 7,85 litros.
Nesse momento, os alunos utilizaram as transformações de unidades de
capacidade, sendo sanadas as suas dificuldades.
No momento seguinte da aula, os grupos receberam os seguintes problemas
para resolverem.
1) Calcule a capacidade de um silo cilíndrico de 10 m de diâmetro por 20
m de altura?
2) Qual o volume de uma carga cilíndrica de uma caneta esferográfica,
sabendo-se que seu diâmetro é de 3mm e seu comprimento 12 cm?
3) Um reservatório de gasolina de forma cilíndrica tem uma altura de 22 m
e o diâmetro de sua base mede 16 m. Qual o volume desse reservatório?
4) Para construir uma piscina, cavou-se um buraco cilíndrico de 4 m de
diâmetro por 2,5 m de profundidade. Calcule o volume de terra retirado do buraco.
5) Uma lata de óleo de cozinha de forma cilíndrica tem 18 cm de altura e
10 cm de diâmetro, quantos cm
2
têm a superfície lateral da lata?
6) A altura de uma pipa é de 90 cm e o seu raio é de 30 cm, qual a
capacidade, em litros, dessa pipa?
76
7) Qual das duas latas da figura a seguir possui volume maior?
r = 2,5cm
r = 10cm
h =9,5 cm
h = 3cm
lata 1 lata 2
Observamos que os cálculos do aluno B foram rápidos e corretos, já que
possui a prática do seu trabalho na cooperativa. Por isso auxiliou os colegas do seu
grupo nos cálculos.
Alguns grupos não perceberam que precisavam fazer a transformação de
unidades, ou seja, de milímetro (mm) para centímetro (cm) no segundo exercício.
Outros alunos demonstraram um dinamismo e um desenvolvimento muito
grande na busca de soluções.
Os cálculos foram realizados com muito esforço pelos grupos, sendo que
alguns alunos tiveram que refazer alguns exercícios, porque haviam calculado de
maneira incorreta. Em um outro grupo, observamos que houve a inversão do valor
do diâmetro pelo valor do raio.
Valores Desenvolvidos:
A aprendizagem como uma atividade é um enfoque adequado à posição
construtivista, uma vez que é na atividade que se produzem as interações do
indivíduo com o objeto do conhecimento.
A atitude e iniciativa dos alunos visitados em colaborar com o andamento das
aulas, o interesse e o desempenho em relatar suas experiências de trabalho aos
demais colegas na sala de aula; a cooperação com os colegas para que ocorresse
de forma mais significativa a aprendizagem dos conhecimentos matemáticos foram
valores resgatados na sala de aula a partir de situações práticas do cotidiano dos
alunos.
77
Para Valente (2001) apud Scandiuzzi, talvez seja premente uma outra razão
científica, outra educação escolar que não priorize a “razão pura” em detrimento das
“emoções”. Uma razão surgida das vivências, dos pensamentos e das ações do
cotidiano.
Com esse enfoque, acreditamos que a linha da Etnomatemática dá liberdade
para o professor aprofundar-se no seu trabalho, podendo ampliar o conhecimento já
existente. Reforça esse pensamento Freire (1996), ao apontar que o respeito à
autonomia e à identidade do educando exigem uma prática coerente com este saber.
Assim, cada aluno(a) da EJA é um ser humano repleto de saberes, saberes
particulares, diversos, nascidos da interação com o meio físico, familiar, da
experiência com o trabalho, do fazer e dos papéis sociais que cada um de nós
desempenha em cada fase da vida.
Os alunos que fizeram parte da problematização desta aula adquiriram
maiores conhecimentos e contribuíram com suas experiências cotidianas em relação
aos demais colegas. Sentiram-se, com isso, mais valorizados, pois constataram que
partimos do conhecimento que observamos nas visitas in loco.
4.3 Aula 3
Tema: Obesidade
Problematização
:
Após uma palestra realizada na escola, sobre o tema “Como viver bem?”,
surgiu o interesse dos alunos da EJA em saber se eram ou não obesos.
Solicitamos aos alunos que verificassem o seu peso e a sua altura, trazendo
esse registro na aula seguinte, para a realização de uma atividade, em que cada um
identificaria seu Índice de Massa Corporal (IMC).
Conteúdos desenvolvidos
: Potenciação e divisão de números decimais.
Objetivos
:
- Analisar e comparar os dados de peso e altura.
- Construir gráficos do IMC.
Tempo
:
78
três seções de 90 minutos.
Na primeira seção, proporcionamos um diálogo entre os alunos sobre
obesidade, partindo do tema da palestra da noite anterior. Constatamos novamente
o interesse de cada um em saber se estava ou não acima do peso. A seguir, os
alunos foram orientados a aplicarem os seus dados, dividindo o seu peso pela sua
altura elevada ao quadrado cujo resultado é o Índice da Massa Corporal.
Logo depois de realizados os cálculos, os alunos confrontaram os seus
resultados com os da tabela que fornecemos, tiveram assim, conhecimento de
dados sobre a sua saúde.
Após a análise dos resultados obtidos, ocorreram discussões entre os alunos
sobre os seus hábitos alimentares e exercícios praticados no dia a dia, tendo em
vista a reflexão sobre sua qualidade de vida.
Para o cálculo do IMC, observamos que os alunos apresentaram dificuldades
no conteúdo de potenciação de números decimais.
Como exemplo, citamos a aluna C que pesa 60 Kg e mede 1,72m .
Resolvemos, primeiramente, a potenciação:
(1,72)
2
= 1, 72 x 1,72 = 2,9584
Depois aplicamos:
IMC =
2
)(altura
peso
=
9584,2
60
= 20,28
O resultado obtido do IMC é verificado na tabela da Organização Mundial de
Saúde - OMS:
79
Tabela 2: Índice de Massa Corporal (IMC)
Condição IMC em adultos
abaixo do
peso
abaixo de 18,5
peso normal
entre 18,5 e
24,9
acima do
peso
entre 25,0 e
29,9
Obeso acima de 30
Disponível em: < http://www.abeso.org.br/calc_imc.htm>.
Há outros critérios mais detalhados que são resultados da NHANES II survey
(National Health and Nutrition Examination Survey), uma pesquisa realizada nos
Estados Unidos, entre 1976-1980. Essa adotou os seguintes:
Tabela 3: IMC de Mulheres e Homens
Condição
IMC em
Mulheres
IMC em
Homens
abaixo do peso < 19,1 < 20,7
no peso normal 19,1 - 25,8 20,7 - 26,4
marginalmente acima do
peso
25,8 - 27,3 26,4 - 27,8
acima do peso ideal 27,3 - 32,3 27,8 - 31,1
obeso > 32,3 > 31,1
Disponível em: <http://www.abeso.org.br/calc_imc.htm>.
Depois de comparar o resultado obtido no cálculo com a tabela da
Organização Mundial da Saúde, verificou-se que a aluna C está com peso normal.
Na seção seguinte, a turma foi dividida em três grupos de alunos para a
análise dos seus dados, do grupo e construção de gráficos de coluna.
Nesse momento, foi feita a construção dos gráficos com materiais como régua,
80
lápis, borracha, canetas hidrocor, pincéis atômicos e papel pardo.
A leitura de gráficos é uma das maneiras de formar alunos leitores nas aulas
de Matemática, como afirmam Smole e Diniz (2001), “A leitura e a interpretação
desses recursos desenvolvem as habilidades de questionar, levantar e verificar
hipóteses, bem como procurar relações entre os dados” (p. 83).
Um dos grupos elaborou um gráfico geral da turma para ser apresentado no
seminário de encerramento do semestre com materiais disponíveis na escola.
Figura 26: gráficos de colunas
Valores desenvolvidos:
Reflexão, motivação e expectativa de melhoria da qualidade de vida.
Conforme Bishop (1991), deve ser dada importância à individualidade do
aluno e ao contexto social e cultural do ensino, visando a promover conexões e
significados pessoais no processo de aprendizagem.
A abordagem Etnomatemática, segundo Monteiro (2004), é compreendida
como aquela que se contrapondo a esse modelo domesticador e dominador, a
exemplo do que propõe Freire (1980), almeja a conscientização e libertação, ou seja,
almeja criar espaço para diferentes vozes, estimulando o respeito e o diálogo entre
os diferentes.
As atividades realizadas abriram espaços para a reflexão de cada pessoa
sobre a sua obesidade, levando à conscientização de como viver bem no mundo
atual.
81
4.4 Aula 4
Tema: Alunos trabalhadores do comércio
Problematização:
Após a análise do questionário aplicado aos alunos da etapa 5 da EJA, foram
agendadas visitas aos seus locais de trabalho.
4.4.1 Visita nº 1 - Padaria
A aluna J tem 37 anos, retornou aos bancos escolares em 2005, almejando
concluir a Educação Básica e cursar a faculdade de Educação Física.
Durante o decorrer das aulas, essa aluna demonstrou grandes conhecimentos
de vida, facilidade em assimilar novos conceitos, pleno domínio dos objetivos
propostos pela etapa, o que lhe possibilitou assim, o avanço para a etapa seguinte
em um curto período de tempo.
Ela trabalha durante todo o dia como atendente numa padaria, em São
Pedro do Sul, vende os produtos, embala e pesa, faz a conta, recebe o dinheiro e dá
o troco, realizando assim várias operações matemáticas.
Uma das coisas que nos chamou a atenção é que ela atende aos clientes,
anota num papel o valor de cada produto e depois soma esses valores. A aluna,
nem sempre usa a calculadora, prefere fazer os cálculos pelo processo mental, “de
cabeça”.
Durante a visita, observamos que J usou a balança digital para pesar o
presunto e o queijo. Perguntamos a ela: “E, se faltar luz, como você faz?” A aluna
respondeu: “Ah, daí, se o cliente pedir 200 gramas de presunto, já sei mais ou
menos quantas fatias são...”. Isso demonstra a sua experiência.
Logo após, ela iria tirar uma nota fiscal, aproximamo-nos para ver como iria
fazer. Esse processo é feito através de um programa informatizado. A aluna J
explicou que “para o pão francês, o código é 1. Tudo é com código”.
82
Figuras 27, 28 e 29: a aluna J no seu local de trabalho
Figura 30: J na sala de aula
4.4.2 Visita nº 2 – Mercado
O aluno P tem 41 anos, é alegre e dinâmico, retornou aos estudos para
adquirir mais conhecimentos, visando um futuro melhor para si e sua família. Esse
aluno trabalha até às 18h30min e às 19h10min já está na sala de aula com muita
vontade de aprender, o que impressiona a todos.
Trabalha em um pequeno mercado, na cidade de São Pedro do Sul,
exercendo muitas funções, como repor mercadorias nas prateleiras, realizar serviços
de banco e fazer a entrega de ranchos.
Observamos que utiliza a Matemática de várias formas: ao pesar os produtos,
calcular o tempo do trajeto realizado nas entregas de rancho, a quilometragem por
litro de combustível. P utiliza também a calculadora e a balança eletrônica.
Figura 31 e 32: O aluno P no seu trabalho e na sala de aula da EJA
83
4.4.3 Visita nº 3 – Ferraria
A aluna E tem 43 anos, é dona de casa, possui uma horta e faz artesanato.
Ela também adora desenhar e retornou aos estudos na EJA, após, 31 anos longe
dos bancos escolares. Trabalha em uma ferraria, na cidade de São Pedro do Sul,
onde mede, pesa e calcula o preço dos ferros, atende ao telefone, recebe
pagamentos, preenche cheques e calcula preços de venda. Utiliza instrumentos
como paquímetro e calculadora.
Durante a visita, a aluna mostrou uma peça de metal para ser colocada em
portões. Ela mesma relacionou isso ao conteúdo estudado anteriormente, nas aulas
de Matemática, fazendo assim uma experiência prática e teórica ao mesmo tempo.
Figura 33: A aluna E na ferraria
Figura 34: paquímetro
Figura 35: A aluna E na sala de aula
84
4.4.4 Visita nº 4 – Sítio Hotel
A aluna I é calma, dedicada, tem 28 anos e trabalha em um hotel da cidade, é
muito responsável e interessada, demonstrando prazer nas atividades que
desempenha. Sua jornada de trabalho começa às 6 horas da manhã e encerra às 16
horas.
Perguntamos a ela, quais eram as sua tarefas diárias; ela respondeu “aqui
faço de tudo um pouco, vou ao banco, faço o livro caixa, calculo a quantidade de
produtos necessários para as refeições dos hóspedes, fazendo a relação das
compras diárias e registro também em fichas as despesas dos clientes”.
Questionamos também sobre como realizava os cálculos. Respondeu que,
algumas vezes, faz à mão, no papel, mas na maioria das vezes, utiliza a calculadora,
pois se sente mais segura, além de ser mais rápido.
Figura 36 e 37: a aluna I no seu local de trabalho
Durante as visitas, observamos que alguns alunos realizavam os cálculos
mentalmente, mas a facilidade e praticidade da máquina de calcular têm a vantagem
da rapidez e da organização do trabalho. Com o passar dos anos, a calculadora foi
incorporada às atividades trabalhistas para garantir a exatidão, fazendo com que os
trabalhadores a utilizem freqüentemente.
Segundo Grinspun (1999), no cotidiano, calcular com a máquina significa
utilizar outras habilidades matemáticas, conseguindo sobreviver nas condições
adversas que fazem parte da vida diária de um trabalhador.
Hoje, é difícil uma atividade prática ou profissional que não use, no seu
cotidiano, uma calculadora. Ela faz parte do dia-a-dia das pessoas.
Para Ponte (apud KNIJNIK; WANDERER; OLIVEIRA, 2004), as calculadoras
85
são objetos matemáticos por excelência, e o desenvolvimento tecnológico se
encarregou de torná-las objetos de uso corrente.
No entanto, não está claro é a consciência que seus usuários têm desses
processos, isto é, se as pessoas realmente compreendem o que estão fazendo.
A Etnomatemática, no decorrer dos anos, tem se apresentado de maneira
bastante relevante para os estudos e as pesquisas em Educação Matemática. As
pesquisas, nessa área, são realizadas em diferentes contextos culturais e, em geral,
têm por objetivo compreender o uso da Matemática em diversas práticas.
Conforme Beatriz D´Ambrósio (1993), a Etnomatemática avalia a Matemática
dos diferentes grupos culturais e propõe uma maior valorização dos conceitos
matemáticos informais construídos pelos alunos através de suas experiências, fora
do contexto da escola. A autora afirma que a proposta da Etnomatemática requer
uma preparação do professor para reconhecer e identificar as construções
conceituais desenvolvidas pelos alunos.
Sendo assim, identificamos, através das visitas, o saber cotidiano desses
alunos da etapa em estudo.
Como o instrumento “calculadora” esteve presente nas visitas in loco aos
alunos trabalhadores da EJA, e que a sua utilização correta é de grande
importância nos dias atuais, decidiu-se planejar aulas com aplicações matemáticas,
usando a calculadora de maneira bem prática, em situações cotidianas.
Conteúdo: Porcentagem
Objetivos
:
- Entender o conceito de porcentagem;
- Realizar cálculos de porcentagem com o uso da calculadora.
Tempo
: seção de 90 minutos
Ao iniciar a seção, os alunos foram solicitados a falar o que sabiam sobre
porcentagem. Algumas respostas:
“ a metade é igual a 50%”;
4
1
é igual a 25%, 100% significa o inteiro”;
“para calcular 25%, dividimos o total por 4”;
“Para calcular 50%, dividimos o total por 2”;
“ se uma blusa custa R$65,00 e comprarmos à vista, podemos ter um
desconto de 10%, por exemplo”;
86
“a porcentagem é sempre dividida por 100”.
Foram distribuídos aos alunos alguns exercícios de porcentagem, com
diversos níveis de dificuldades, visando a identificar os conhecimentos já existentes.
Exemplos: 10% de R$ 100,00 , 20% de R$ 100,00 , 25% de 100,00, 25% de
800,00, entre outros.
Após a realização de vários exemplos de porcentagem, identificamos as
dificuldades e realizamos uma complementação com situações-problema sobre o
conteúdo em estudo, utilizamos a regra de três simples, o método prático e a da
calculadora, foi aplicado também o processo do cálculo mental (ou seja, de
“cabeça”).
A seguir, exemplos de exercícios abordados em aula e comentários dos
alunos.
1) O aluguel de uma casa é de R$ 420,00. Se houver um reajuste de 5%,
quanto será o aluguel?
2) Sobre um salário bruto de R$ 380,00, são descontados 8% para o Fgts. De
quanto é o total do desconto? Quanto sobrará do seu salário?
3) Por quanto Elizandra deverá vender um produto que custa R$ 40,00 para
obter um lucro de 30%?
4) Um comerciante comprou uma mercadoria por R$ 5.000,00. Querendo
obter um lucro de 12%, por qual preço deverá vender?
5) Ao ser paga com atraso uma prestação de R$ 300,00, qual será o novo
valor após sofrer um acréscimo de 5%?
6) Ana gastou em uma loja R$ 230,00 e obteve um desconto de 5%, quanto
pagou?
7) Márcia comprou uma blusa de inverno e obteve um desconto de R$ 5,00
que corresponde à taxa de 5%. Qual era o valor da blusa?
Comentários:
Os alunos resolveram as questões nos modos descritos abaixo:
Exercício 1:
- Método prático:
87
100
5
. 420 = 21
Como esse é o valor do reajuste, um aluno indagou: “professora, tem que
somar, né?” Percebeu-se, nesse momento, a realização do seguinte cálculo.
420 + 21 = 441
O aluguel do apartamento, com o reajuste, passa a ser R$ 441,00.
- Regra de 3 simples:
420 100%
x 5%
Ao resolver essa proporção, alguns alunos permaneceram em silêncio,
trocando olhares, até que um aluno resolveu perguntar: “professora, não lembro
como se resolve...”. Então, explicamos, passo a passo, a resolução da proporção
para toda a turma.
Notamos que os alunos apresentaram dificuldade em compreender a regra
fundamental das proporções, isto é, “o produto dos meios é igual ao produto dos
extremos”, isto é: “x vezes 100 é igual a 420 vezes 5” (100 . x = 420 . 5).
Temos: “420 está para x, assim como, 100 está para 5”
x
420
=
5
100
Logo, 420 e 5 são os extremos e, x e 100 são os meios.
Fazendo a multiplicação dos meios pelos extremos;
100 . x = 420 . 5
100 . x = 2100
x =
100
2100
x = 21
Logo, o novo aluguel será de R$ 420,00 + R$ 21,00 (reajuste) = R$ 441,00.
88
- Calculadora:
420 + 5% = 441
Logo, será de R$ 441,00 o aluguel da casa.
Vários alunos resolveram com o uso da calculadora. Um aluno comentou: “já
sei fazer com a calculadora, faço direto... Senão demoro muito fazendo os cálculos”.
Outra aluna: “prefiro o método prático na aula, mas no comércio, a
calculadora nos ajuda muito para sermos rápidos na resposta”.
Exercício 2:
- Método prático:
8% de 380
100
8
. 380 = 30,40
R$ 30,40 é o desconto.
O valor do ordenado é R$380,00 – R$30,40 (desconto) = R$349,60
O salário líquido será R$349,60.
- Regra de três simples:
380 100%
x 8%
x
380
=
8
100
Resolvendo a proporção:
x . 100 = 380 . 8
x=
100
3040
x= 30,4 é o desconto. Então o salário é de R$ 349,60.
Exercícios 3, 4 e 5:
Os alunos resolveram-nos da mesma forma que o primeiro exercício, pois
sabiam que, para obter lucro e acréscimo, deveriam somar o valor anterior com o
valor do aumento.
89
Exercício 6:
Alguns alunos utilizaram a calculadora, e outros fizeram os cálculos
mentalmente.
Na calculadora, operaram da seguinte forma:
230 – 5% = 11,50 (valor do desconto)
230 – 11,50 = 218,50
Logo, Ana pagou R$ 218,50.
Aos alunos que calcularam, mentalmente, indagamos como o fizeram:
Fala do aluno C: “ a cada R$100,00 são R$5,00 de desconto e a cada
R$10,00 são R$0,50 de desconto, então somando, dá 11,50 de desconto”.
Vamos mostrar como seria o pensamento do aluno, durante o processo:
100.............. 5,00
100.............. 5,00
10................ 0,50
10................ 0,50
10................ 0,50
total total
230 11,50
Logo, o desconto é de R$ 11,50.
Para o aluno M: “ multipliquei 230 por 5, daí deu 1150, depois dividi por 100,
ou simplesmente, passo a vírgula duas casas para a esquerda”.
Para Carvalho (1992),
A sala de aula não é o ponto de encontro de alunos totalmente ignorantes
com o professor totalmente sábio, e sim um local onde interagem alunos
com conhecimentos do senso comum, que almejam a aquisição de
conhecimentos sistematizados, e um professor cuja competência está em
medir o acesso do aluno a tais conhecimentos. (p.15)
Sabemos que cada aluno desenvolve o seu próprio cálculo mental, conforme
a sua necessidade de saber. Ele possui a capacidade própria de processar as
90
informações da realidade, cria significados próprios e constrói, dessa forma, o seu
próprio conhecimento. Desse modo, a sala de aula é o lugar de encontro e de troca
de saberes entre alunos e professor, mediante a intervenção deste, que guia o
acesso do aluno ao conhecimento.
Exercício 7:
- Regra de três simples:
x 100%
5 5%
Resolvendo a proporção, temos:
5
x
=
5
100
x = 100
O valor da blusa era de R$ 100,00, com desconto de R$ 5,00, pagou R$
95,00.
Neste momento, surgiram algumas dúvidas de como seriam distribuídos os
valores para o cálculo da regra de três, mas logo foram sanadas com a nossa
intervenção.
- Calculadora:
100 – 5% dá 95
Fala do aluno N: “ que bom que tem a calculadora, é rapidinho...”.
Fala do aluno A: “ eu uso muito a calculadora para saber o juro que irei pagar
em um atraso de uma conta...”.
Alguns alunos demonstraram saber como fazer os cálculos na calculadora,
no entanto, não sabiam o processo dos cálculos matemáticos ensinados durante a
aula.
Ao final da aula, os alunos aprenderam a resolver porcentagem pelo método
prático, pela regra de três simples e com o uso da calculadora. Alguns alunos de
mais idade fazem o cálculo mentalmente, sem fazê-los no papel, pois disseram que
é “mais difícil”.
Nesta aula, observamos que alguns alunos realizaram os cálculos com
91
segurança, utilizando a máquina de calcular, porém outros faziam no papel, passo a
passo, para ter certeza de que a resposta da calculadora estava correta. Isso
porque, segundo uma aluna: “faço cada passo, pois, quando estudar, fica mais fácil”.
O aluno P comentou: “hoje no mercado, só se usa máquina: computador e
calculadora”, o que nos remete a Fonseca (2002), porque, conforme esse autor, a
Educação de Jovens e Adultos torna-se uma necessidade no momento atual, pois a
sociedade exige que os indivíduos dominem, cada vez mais, as tecnologias do
mercado de trabalho para que possam produzir com mais qualidade.
Como reforço à idéia desse autor, uma aluna disse: “É importante
trabalharmos em sala de aula com a calculadora, pois no comércio temos que utilizar
para compras”. A aluna I falou: “Utilizando a calculadora, é rápido e prático, mas
devemos estar atentos para apertamos a tecla corretamente”.
Neste bloco, foram realizados problemas contextualizados, envolvendo
porcentagem para saber quanto os alunos compreenderam sobre o que estavam
fazendo.
Seção 2:
Conteúdo: Números Decimais
Objetivo: Entender o registro de débitos e créditos, proporcionando ao aluno
uma reflexão sobre o planejamento de sua renda familiar.
Tempo: 60 minutos.
Visando à ampliação dos conhecimentos dos alunos, foi proposta uma outra
seção para ser trabalhado o livro-caixa; nela, os alunos deveriam fazer o
preenchimento do livro caixa (ANEXO A), registrando: entradas, saídas e saldos,
com a ajuda da calculadora.
Para essa tarefa, eles utilizaram seus salários e as suas despesas pessoais.
Solicitamos aos alunos que levassem anotados para a próxima aula, a renda
familiar e os valores dos gastos durante o mês.
Para Piaget (apud KAMII, 1991),
[...] todo estudante normal é capaz de um bom raciocínio matemático se sua
atenção está concentrada sobre assuntos de seu interesse, e se por esse
método as inibições emocionais, que com freqüência fazem-no sentir-se
inferior nessa área, são removidas. Na maioria das aulas de matemática,
toda diferença está no fato de que se pede ao estudante para aceitar uma
disciplina intelectual já totalmente organizada fora dele mesmo, ao passo
92
que, no contexto de uma atividade autônoma, ele é chamado a descobrir as
relações e idéias por si mesmo, a recriá-las até que chegue o momento de
ser ensinado e guiado (p.63).
Assim, para que os alunos sintam-se interessados, é necessário envolvê-los
no conteúdo matemático, ou seja, as questões a serem trabalhadas devem partir do
cotidiano deles. Eles vão se engajar na busca por novas descobertas, e o mais
importante, vão sentir prazer em estudar Matemática.
Em continuidade, os alunos foram orientados a fazer o registro do seu
orçamento, colocando como entrada o salário do mês e alguns extras, “bicos”, como
eles chamam. Como saída, despesas com pagamentos de luz, água, mercado,
aluguel, farmácia, roupas, entre outros.
Ao confrontar as entradas e as saídas mensais, cada um teve condições de
analisar sua situação financeira do mês.
Nesse momento, foi relacionado os números decimais, sendo resolvidas por
eles várias atividades.
O cálculo do livro caixa é registrado da seguinte maneira:
Tabela 4: Exemplo do Livro Caixa Trabalhado por uma Aluna.
Data Histórico Entradas Saídas
03 - 08 - 06 Saldo anterior R$ 130,00
Luz R$ 63,50
Água R$ 32,80
Mercado R$ 112,00
Outras despesas R$ 100,00
Salário do mês R$ 500,00
Total do dia R$ 630,00 R$ 308,30
Saldo atual R$ 321,70
Para a realização do saldo atual, fizemos da seguinte maneira:
Somamos o total de entradas e o total de saídas, depois, subtraímos do valor
total das entradas o valor total das saídas e obtivemos o saldo atual.
93
Figura 38: a aluna realizando o seu cálculo no livro caixa
Valores desenvolvidos:
Num mundo de economia globalizante, conduzido pela acelerada
transferência de conhecimentos e informações, é imprescindível que a escola, como
integrante desse processo, perceba, dentro de um ideário político, as concepções
ideológicas exercidas pelos interesses econômicos cujo discurso remeta a uma
educação de qualidade (GRINSPUN, 1999).
Em busca de uma educação de qualidade, partimos de atividades em que os
alunos trabalhadores da EJA desenvolvessem o raciocínio, a rapidez e a agilidade.
Por isso, os assuntos eram relacionados ao seu dia-a-dia, diretamente ligados às
suas atividades.
Os alunos adquiriram conhecimentos e desenvolveram habilidades de como
utilizar a calculadora com maior rapidez para resolução exata das atividades e assim
construir o livro caixa de cada um. Com isso, demonstraram interesse em resolver as
atividades propostas, pois essas tinham relação com as compras do comércio.
Segundo Monteiro (2001), o termo “Etnomatemática” está relacionado a
conhecimentos presentes nas práticas cotidianas e, na maioria das vezes, está
aliado à solução de problemas, pois é pensada dentro de um conjunto de valores e
saberes que lhe dão significados.
Concordamos que temos de nos relacionar aos problemas do cotidiano dos
alunos adultos, porque eles possuem argumentos próprios ao se depararem com os
fatos do mundo que está ao seu redor.
4.5 Aula 5
Tema: O artesanato e as suas habilidades
94
Problematização:
Realizamos uma visita a aluna C. Ela nos recebeu em sua casa, onde
trabalha com artesanatos de tricô, crochê, pinturas e roupinhas de boneca. Muito
satisfeita com seu trabalho, mostrou-nos tudo o que produz.
Além disso, comentou: “sinto-me à vontade fazendo o meu trabalho. Chego
a esquecer os problemas do dia-a-dia, o que faço é uma terapia para mim. Tudo
que eu faço é com carinho e sai tudo perfeito”.
A aluna entrevistada tem 42 anos. Com apenas a segunda série, ela
resolveu retomar aos estudos na EJA. Possui interesse em aprimorar seus
conhecimentos para poder ensinar seus filhos.
Figura 39: a aluna mostrando como faz a ampliação dos desenhos no pano
Figura 40 e 41: trabalhos realizados pela aluna
95
Figura 42: amostra de uma revista que utiliza para fazer seus trabalhos manuais
Figura 43 e 44: a aluna como realiza ampliações e reduções das figuras retiradas das revistas
Durante a visita, constatamos o uso da calculadora, da fita métrica para medir
o tamanho das peças, o comprimento e a largura dos bordados e a quantidade de
pedrarias.
A aluna calcula o material para os trabalhos manuais e coloca a porcentagem
para saber o valor do seu produto no momento da venda.
Na ampliação e redução dos desenhos, C faz tudo automaticamente, pois já
possui a prática. Observamos também que ela faz uso da proporção.
Nosso encontro com a aluna C foi bastante importante, pois a entrevistada
nos mostrou como ela utiliza a Matemática no seu trabalho e, a partir desta visita,
elaboramos uma aula para que a aluna colaborasse com sua experiência,
mostrando à turma qual é a sua ocupação no dia a dia.
Conteúdos desenvolvidos: Figuras semelhantes e proporção.
Objetivos: Ampliar e reduzir figuras, nas quais o aluno verificará
experimentalmente que os ângulos se mantêm e os comprimentos são proporcionais.
Tempo: duas seções de 90 minutos
96
No início da seção, a professora comentou com a turma sobre a visita
realizada à aluna C e foram mostrados alguns trabalhos que ela faz para vender.
Foram utilizados nesta atividade os seguintes materiais: figuras, papel
quadriculado, régua, trena e calculadora. Os alunos organizaram-se em círculo, na
sala de aula.
A professora apresentou duas figuras aos alunos e indagou: “o que vocês
observam em relação ao tamanho das figuras? Qual é a relação que existe entre
elas?”.
Alguns comentários dos alunos:
- “Os tamanhos são diferentes, mas o desenho é o mesmo”.
- “É como se tivéssemos revelado uma foto com tamanho normal e a outra
pequena, tipo aquela da carteira de identidade”.
- “Tem a mesma forma e tamanhos diferentes”.
A professora solicitou aos alunos que utilizassem régua ou trena para medir o
tamanho das figuras, registrando-o.
Exemplo das medidas de duas figuras:
Altura = 4,78 cm Altura = 3,10 cm
Comprimento = 6,37 cm Comprimento = 4,13 cm
Nesse momento, os alunos observaram que as figuras tinham a mesma forma
e tamanhos diferentes. A professora então complementou que as figuras são
semelhantes, possuem os ângulos correspondentes e medidas proporcionais.
A aluna C colaborou com sua experiência, “se dividirmos a altura pelo
comprimento de cada figura, obtemos o mesmo valor”.
Então:
37,6
78,4
= 0,75 e
13,4
10,3
= 0,75
Ao incorporarmos as atividades matemáticas ao contexto das experiências
vivenciadas pela aluna, concordamos com Smole e Diniz (2001) que salientam que o
aluno vai além do que parece saber. É preciso entendermos o seu pensamento, bem
como os conhecimentos trazidos pela sua experiência de mundo e, a partir disso,
fazermos as interferências necessárias para levarmos cada aluno a ampliar suas
97
noções matemáticas.
Dando continuidade, explicamos que duas figuras são semelhantes, quando
elas têm a mesma forma com medidas correspondentes proporcionais, ou seja,
quando uma é a ampliação ou redução da outra. Isso significa que existe uma
proporção constante entre elas sem ocorrência de deformação.
Quando ampliamos ou reduzimos uma figura em uma proporção constante,
sem modificar a sua forma, a figura obtida e a original são chamadas figuras
semelhantes.
As figuras geométricas são semelhantes, quando existe uma igualdade entre
as razões dos segmentos que ocupam as correspondentes posições relativas nas
figuras.
Nesta aula, foram realizadas atividades práticas de ampliação, redução e
proporcionalidade de diversas figuras.
Figura 45: a aluna estava reduzindo a figura
Figuras 46 e 47: redução e ampliação de pentágonos
98
Figuras 48 e 49: redução e ampliação de flores
Durante as atividades, os alunos foram bem participativos, colocando para a
turma o seu ponto de vista, o seu pensamento, a sua experiência. A participação dos
alunos é de fundamental importância para o bom andamento da aula e crescimento
de todos. Como afirmam Smole e Diniz (2001), devemos dar oportunidades para os
alunos falarem nas aulas sobre suas experiências, fazer com que eles sejam
capazes de conectar as suas experiências pessoais com a linguagem da classe e da
área do conhecimento com que se está trabalhando.
Uma pergunta que fizemos à turma foi:
Dê exemplos de pares de objetos semelhantes?
Chamou-nos atenção a resposta de duas alunas que a relacionaram aos
objetos que encontramos no supermercado, como: caixa de sabão em pó, 1kg e 500
g, entre outros. Com isso, surgiu o interesse de outros colegas, que, no momento de
descrever os objetos não conseguiram lembrar.
O ensino é um conjunto de atividades sistemáticas, nas quais o professor e o
aluno compartilham parcelas de significados com relação aos conteúdos do currículo
escolar, ou seja, o professor guia suas ações para que o aluno participe das tarefas
e atividades. Assim, se há diálogo entre aluno e professor, as aulas tornam-se
significativas para ambos.
Valores desenvolvidos:
A aluna possui muita habilidade nos trabalhos que faz. Durante as aulas,
observamos a sua cooperação ao mostrar o seu trabalho e ajudar no crescimento
99
dos demais colegas.
No momento em que comentamos sobre a visitação e mostramos os
trabalhos feitos por ela, notamos o quanto a aluna se sentiu valorizada, inclusive
algumas encomendas foram feitas pelas colegas, ocorrendo a socialização.
Para Pompeo (1999), não basta apenas enxergar e aceitar os alunos como
diferentes. É necessário, também, conhecê-los mais, para compreendermos melhor
as suas expectativas e os seus procedimentos.
Essas atividades, em sala de aula, servem para compreender e conhecer
melhor como se reproduzem certos materiais presentes no nosso dia a dia.
Completamos nossos comentários com a idéia de Santomé (1998), ou seja,
tentar extrair experiências matemáticas das atividades dos alunos, nos trabalhos
manuais, nos quais surgem questões de medida e simetria; muitas formas são de
caráter geométrico, e às vezes, os desenhos devem ser reduzidos ou ampliados.
Desse modo, à medida que o professor desperta o interesse e a curiosidade
dos alunos vinculados a questões reais e práticas, estimula os sujeitos a analisarem
os problemas, com os quais se envolvem e a procurarem alguma solução para eles,
isso incentiva a formação de pessoas criativas e inovadoras.
4.6 Aula 6
Tema: Consultoras e Vendedoras de produtos cosméticos
Problematização:
Na etapa 5 da EJA, abordada neste estudo, há algumas revendedoras
autônomas dos produtos cosméticos: Natura, Contém 1g e Avon.
Após um diálogo com as alunas, constatamos que elas encontravam
dificuldade em analisar os boletos bancários, tendo em vista que existem diversas
opções de pagamentos.
Após constatação das dificuldades pelas revendedoras dos produtos,
solicitamos que trouxessem alguns produtos e boletos bancários para serem
trabalhados em aula.
100
Figura 50: análise dos boletos bancários com a professora
Figura 51: produtos cosméticos trazidos pelas alunas
Os conteúdos básicos desenvolvidos: Juros, multas, encargos financeiros.
Objetivo: Levar o aluno a analisar a melhor forma de pagamento
Tempo: Uma seção de 75 minutos
Com o objetivo de melhorar a auto-estima do aluno da EJA e valorizar o seu
trabalho, pedimos que trouxessem para a sala de aula alguns dos produtos que
vendem para divulgá-los junto à turma.
Foram selecionados os boletos bancários da Natura Cosméticos SA, por
serem considerados os mais completos e com as instruções de pagamento mais
claras.
A seguir, foram distribuídos aos grupos os boletos, com data de vencimento
diferentes (ANEXOS B e C), para análise e comparação das diferentes opções de
pagamentos.
A professora propôs os seguintes questionamentos:
Se vocês tivessem que pagar hoje, qual seria o valor?
Vocês teriam descontos ou juros no boleto?
Quais seriam os outros acréscimos?
Qual será o valor total cobrado pelo boleto?
Abaixo, a análise dos trabalhos em grupo:
Grupo 1:
101
Os alunos debateram e fizeram os cálculos corretamente.
Uma aluna comentou: “É, se tivesse sido pago no dia do vencimento, não
seria todo este valor de acréscimo, pois pensando bem, podemos pagar outra conta”.
Figura 52: troca de conhecimento entre os colegas
Grupo 2:
Os alunos não ficaram atentos ao dia do vencimento do boleto.
A seguir, temos a situação do boleto analisado pelo grupo 2:
Vencimento: 17-11-06
Valor do documento: R$ 624,87
Instruções:
1) De 18 -11 a 24 -11 receber o valor de R$ 638,42
2) A partir de 25-11 desconsiderar a instrução (1) acima e cobrar
encargos financeiros de R$ 1,93 a.d. (a partir do vencimento), acrescido de multa de
R$ 12,49 (2%).
O grupo fez os cálculos da seguinte maneira: multiplicou os dias de atrasos
pela mora a.d. mais o valor do acréscimo da taxa fixa (de 2%), e somou o valor do
item 1 das instruções para saber o total a pagar. Este grupo não observou que
precisava analisar apenas as instruções da segunda linha.
Com nosso auxílio e breve explicação, os alunos conseguiram entender o
boleto e realizar os cálculos.
Como são 10 dias de atraso, multiplicaram 10 por 1,93 que é o valor de atraso
por dia.
1,93 . 10 = 19,30
102
O juro é de R$ 19,30 mais a multa de R$ 12,49 que é igual a R$ 31,79.
Como desconsideramos a primeira instrução, somamos o valor do juro com o
valor do documento: R$ 624,87 + R$ 31,79 = R$ 656,66
Figura 53: cálculos de uma aluna
Grupo 3:
No início, este grupo apresentou muitas dúvidas, estavam confusos e sem
iniciativa.
Nós os ajudamos e eles conseguiram entender melhor e realizar, com cautela,
as atividades.
Fala dos alunos:
- “Até que o valor do juro fixo de 2% do valor não é tão alto, pois onde
trabalho é de 4% sobre o valor da nota”.
- “De acordo com a empresa, o juro é diferente”.
- “É, tem que cuidar para não atrasar, senão por um dia de atraso já pagamos
mais de 10,00”.
- “Os juros e multas acabam saindo da comissão dos produtos que
vendemos”.
figura 54: discussão no grupo 3 sobre os juros
103
Grupo 4:
Os alunos realizaram o cálculo final, somando-o ao valor da primeira instrução,
sendo que teriam que desconsiderar as primeiras instruções. Faltou atenção a este
grupo, ou seja, a interpretação correta do boleto bancário. Intervimos para sanar as
dificuldades encontradas.
Figura 55: discussão no grupo 4
Grupo 5:
Realizaram as atividades com muita atenção e o resultado foram cálculos
corretos.
Figura 56: grupo 5
Figura 57: os alunos do grupo realizando os cálculos matemáticos
Grupo 6:
Observamos que a maioria fazia cálculos com os 2% do valor da duplicata
104
para saber de onde surgiu aquele valor. O aluno H fez no caderno os cálculos e
mostrou para o seu colega: “olha como fiz...”, todo orgulhoso porque estava certo.
O grupo realizou os cálculos de porcentagem corretamente.
Figura 58: grupo 6
Smole e Diniz (2001) afirmam que:
(...) trocando experiências em grupo, comunicando suas descobertas e
dúvidas, ouvindo, lendo e analisando as idéias dos outros, o aluno
interioriza os conceitos e os significados envolvidos nessa linguagem e
relaciona-os com suas próprias idéias (p.16).
Assim, o trabalho realizado pelos grupos durante a aula foi uma maneira para
os alunos entenderem os conceitos, à medida que os colegas expunham os seus
pensamentos. Houve a troca de experiências e sanaram-se as dúvidas de todos,
também com o nosso auxílio.
Os alunos discutiram cada caso, debateram, compararam e chegaram à
conclusão da importância de controlar os gastos para não atrasarem os seus
pagamentos.
Valores desenvolvidos:
Para D`Ambrosio (2001, p.23):
[...] um importante componente da Etnomatemática é possibilitar uma visão
crítica da realidade, utilizando instrumentos de natureza matemática.
Análise comparativa de preços, de contas, de orçamento, proporciona
excelente material pedagógico.
Entendemos, conforme foi colocado por esse autor, que o estudo de
atividades relacionadas a situações do cotidiano proporciona uma construção muito
105
mais significativa pelo aluno.
Constatamos muito interesse, socialização, motivação no desenvolvimento
das atividades propostas.
Houve um dos grupos que se destacou ao comparar o tema da aula com o
conhecimento já existente sobre o assunto e despertou, assim, mais interesse em
toda a turma, pois ligou-o à sua prática cotidiana.
O objetivo, do trabalho, em sala de aula, foi levar os alunos a refletirem sobre
pagamentos do dia-a-dia, concluindo o que é melhor para cada um.
4.7 Aula 7
Tema: Receita na medida certa
Problematização:
A culinária é fruto do trabalho e da cultura de diferentes povos, é variada e
rica. Preparar um alimento de acordo com uma receita exige alguns saberes: razão e
proporção, medidas de massa e líquidos, além, das ervas e temperos. São saberes
que permeiam um trabalho corriqueiro que as cozinheiras aplicam, na maioria das
vezes, sem terem consciência de que sabem.
As alunas participantes desta etapa realizam atividades do lar, trabalham
como empregadas domésticas ou como diaristas.
Observamos, pelo questionário aplicado, o quanto elas ocupam a Matemática
em seu dia a dia, pois esta se faz presente no trabalho doméstico, no orçamento
familiar e nos afazeres diários.
Uma estudante colocou no questionário que encontrava dificuldades em
empregar as frações no seu cotidiano. Isso é um fato bastante relevante, pois no
trabalho doméstico se utilizam freqüentemente, medidas, principalmente nas receitas
de pães e bolos. Nós lhe perguntamos: “Quando você tem na receita ¼ de azeite,
como você faz ?” Ela respondeu: “eu coloco a rumo” (mais ou menos).
A partir dessa situação, fizemos o planejamento de uma aula prática para
todos os alunos da etapa em estudo. Por isso, pedimos aos alunos que trouxessem
diversas receitas culinárias para serem exploradas no próximo encontro, em sala de
aula.
Na primeira seção, aconteceu a análise e seleção de uma receita de bolo
106
para ser preparada na aula seguinte.
Na segunda seção, a turma foi convidada a participar da atividade prática na
cozinha da escola, onde foi preparada a receita por eles escolhida. Nessa atividade,
os alunos compararam os tamanhos de xícaras, colheres, copos, pois essas são as
medidas mais utilizadas nas receitas caseiras. Nesse momento, surgiram dúvidas
quanto aos tamanhos dos utensílios a serem utilizados.
Para melhor entendimento, utilizamos um copo com medidas, o que facilitou o
trabalho e o esclarecimento das dúvidas.
Figura 59: atividade prática na cozinha
Durante a prática, os alunos questionaram sobre a possibilidade da
preparação de três receitas ao mesmo tempo, pois a turma é grande e todos
gostariam de provar o bolo.
Atendendo ao interesse dos alunos, ficou combinado que, na aula seguinte,
trabalharíamos os conceitos básicos para melhor entendimento das quantidades dos
ingredientes a serem utilizados na nova receita.
Figura 60: a colega explicando os ingredientes da receita
Na terceira seção, foram desenvolvidos, em sala de aula, os conteúdos
matemáticos relacionados às dificuldades e aos interesses dos alunos.
Conteúdos: Números fracionários, razão e proporção.
Objetivo: Interpretar e resolver situações matemáticas que surgem nas
107
práticas culinárias.
Tempo: seções de 75 minutos.
Exploração da receita preparada pelos alunos.
Bolo de Laranja
Ingredientes:
3 xícaras de farinha de trigo
2 xícaras de açúcar
4 ovos
¼ xícara de azeite
1 copo (200 ml) de suco de laranja
1 colher de sopa de fermento em pó
Preparo:
Bata as claras em neve e reserve, bata os demais ingredientes até obter uma
massa leve e fofa. Acrescente as claras em neve e leve ao forno em forma
untada, por aproximadamente, 40 minutos.
Alguns questionamentos feitos durante a aula:
Se quisermos aumentar ou diminuir a receita, o que devemos fazer?
Na receita do bolo, usamos 3 xícaras de farinha de trigo. Quantas xícaras são
necessárias para dobrar a receita?
E para o azeite, quantas xícaras serão necessárias?
Comentários dos alunos:
“ se quisermos aumentar a receita, devemos aumentar todos os ingredientes
na mesma quantidade”.
“ para a farinha são 3 xícaras, passam então a ser 6 xícaras...”
“ o azeite...hum...é o mais complicado”
4
1
de xícara de azeite, o dobro é
4
1
+
4
1
=
4
2
“um meio, ou seja, a metade de uma xícara de azeite é necessária para
dobrar o bolo”.
Foi proposto que os alunos completassem a tabela abaixo.
108
Tabela 5: Receita Original e o Seu Dobro
Receita original Dobrando a receita
Farinha de trigo 3 xícaras
Açúcar 2 xícaras
Ovo 4 ovos
Suco de laranja 200 ml
Fermento 1 colher de sopa
Azeite ¼ xícara de azeite
Para o preenchimento da tabela, utilizamos as quantidades de ingredientes
proporcionais à receita original para que o bolo desse certo e ficasse gostoso.
Os alunos não apresentaram dificuldades em completar a tabela, pois
envolvia operações simples. Alguns alunos multiplicaram os valores da receita
original por dois e outros somaram duas vezes o valor da receita original.
Exemplo:
Para dobrar 3 xícaras de açúcar.
2 . 3 = 6 ou 3 + 3 = 6
Para dobrar
4
1
de xícara de azeite:
2 .
4
1
=
4
2
=
2
1
(metade de uma xícara).
109
Através de trabalhos em grupo, foi solicitado aos alunos que elaborassem, da
mesma forma, 3 receitas, ou seja, para triplicarem a receita.
Notamos em um grupo que uma aluna demonstrava ter medo de errar e de
mostrar aos colegas que não conseguia realizar a atividade proposta. Ela, então,
pediu-nos explicação individual. Para Kamii e Declark (1992, p. 221), “Em um
sentido piagetiano, autonomia significa a capacidade de decidir por si próprio entre
certo e errado (...)” e conclui que: “(...) pessoas heterônomas são governadas por
outra pessoa, na medida em que são incapazes de fazer julgamentos por si próprias”.
Dessa forma, os alunos muitas vezes, sentem-se inseguros na realização das
atividades, necessitando da orientação de alguém, seja colega seja professor. Isso,
porém, acarreta em dificuldade para obter autonomia.
A próxima seção partiu do seguinte questionamento:
Se tivéssemos 7 ovos na geladeira e quiséssemos usá-los no bolo, como
adaptaríamos a receita de 4 para 7 ovos?
Nesta ocasião, foi introduzido o conceito de proporcionalidade e proporções.
Tabela 6: Proporcionalidade e Proporção
Farinha de trigo
(xícara)
Ovo
(unidade)
3
4
X
7
Há proporcionalidade direta entre a quantidade de farinha e a de ovos. Então,
x
3
=
7
4
4 . x = 21 (vamos descobrir o valor de x, usando a operação inversa).
110
x =
4
21
, neste momento, os alunos C, H, D, F fizeram a conta 21 : 4 que deu
quociente 5 e resto 1, depois indagaram: “ e agora, como faço”.
Explicamos que, quando há uma fração, transformamo-la em número misto.
4
21
= 5
4
1
resto
divisor
quociente
Outros alunos fizeram da seguinte maneira:
4
21
= 5,25
Se 0,25 =
4
1
, são necessárias 5
4
1
xícaras de farinha de trigo para 7 ovos.
Tabela 7: Proporcionalidade
açúcar
(xícara)
Ovo
(unidade)
2
4
x
7
x
2
=
7
4
x =
4
14
= 3,5 são necessárias 3
2
1
xícaras de açúcar para 7 ovos.
Outros fizeram
4
14
, na qual o resultado foi 3 para o quociente e 2 para o resto,
mas não seguiram com a conta. Eles interpretaram da seguinte forma: 3
4
2
,
111
simplificando a fração por 2, ficou: 3
2
1
Tabela 8: Proporcionalidade
Suco de laranja
ml
Ovo
(unidade)
200
4
x
7
x
200
=
7
4
x =
4
1400
= 350.
Assim, devemos usar 350 ml de suco de laranja para 7 ovos.
Tabela 9: Proporcionalidade
fermento
(colher de sopa)
Ovo
(unidade)
1
4
x
7
x
1
=
7
4
x =
4
7
= 1,75. Como 0,75 =
4
3
, devemos usar 1
4
3
de colher de sopa de
fermento ou
4
7
= 1
4
3
.
112
Tabela 10: Proporcionalidade
Azeite
(xícara)
Ovo
(unidade)
¼
4
x
7
Como ¼ = 0,25 então:
x
25,0
=
7
4
x = 0,4375.
No momento da discussão de como seria feito o cálculo, um colega salientou
que: “
4
1
= 0,25, então com este valor fica mais fácil de fazer a proporção”.
Ao chegar à resposta, porém, surgiram outras dúvidas, pois “o que seria
0,4375 xícara de azeite?” Um aluno disse:” se a metade de uma xícara é
2
1
= 0,5,
então 0,4375 é um pouquinho menos que meia xícara...”. Os alunos concluíram que,
colocando um pouquinho menos que a metade de uma xícara de azeite, o bolo não
sofreria prejuízo. Uma aluna completou: “o azeite faz com que o bolo fique mais
macio e fofinho, pode até ser colocado um pouco a mais do que trazem as receitas”
Essa questão também poderia ser resolvida
4
1
: x =
7
4
, mas nenhum aluno
resolveu dessa forma.
A seguir, os alunos completaram a tabela, adaptada de 4 ovos para 7 ovos.
113
Receita
original para
4 ovos
Receita para
7 ovos
Farinha de trigo (xícara) 3
5,25 ou 5
4
1
Açúcar (xícara) 2
3,5 ou 3
2
1
Ovo (unidade) 4 7
Suco de laranja (ml) 200 350 ml
Fermento (colher de sopa) 1
1,75 ou 1
4
3
Azeite (xícara)
4
1
2
1
Nos cálculos referentes à última tabela, percebemos um pouco mais de
dificuldade na interpretação e transformação de dados.
Ao calcular a quantidade de azeite, lembramos a colocação inicial da aluna
que comentou: “coloco a rumo os ingredientes”, citada na problematização.
Valores desenvolvidos:
Para nós, professores, este é um conteúdo simples, mas para os alunos da
EJA, que ficaram vários anos sem estudar, surgem várias dificuldades. Por isso, é
necessário trabalhar teoria e prática ao mesmo tempo, pois isso facilita o processo
de aprendizagem do nosso aluno.
Notamos que a prática culinária foi motivadora, interessante e prazerosa, os
alunos da EJA interagiram, adquirindo novos conhecimentos, integração e
socialização.
Para Freire (1996), professores e alunos podem aprender, ensinar, produzir e,
juntos igualmente, resistir aos obstáculos.
Na sociedade atual, os homens estão atuando na culinária com destaque.
Exemplo disso, foi um aluno, agricultor de 55 anos, que participou com muito
interesse das atividades.
114
Conforme Fiorentini (1994), diariamente, buscam-se novos saberes e a
Matemática se reproduz nas relações sociais existentes. A aprendizagem de
Matemática não consiste apenas no desenvolvimento de habilidades ou na fixação
de conceitos. É no aprendizado significativo que se atribui sentido às idéias
matemáticas e é no ser capaz de pensar que se estabelecem relações, justificativas,
análises, discussões e criações.
Concordamos com o autor, pois, quando a prática e a teoria caminham juntas,
a aprendizagem tem um maior significado para o aluno adulto, sendo que ele próprio
faz a relação com o seu cotidiano.
A aprendizagem em aula não é meramente individual, limitada às relações
frente a frente de um professor/a e um aluno/a. É uma aprendizagem dentro de um
grupo social com interesses, preocupações, necessidades (SACRISTAN,1998, p.
64).
Sendo assim, percebemos que os alunos participaram das atividades na aula,
trouxeram seus conhecimentos diversos para a troca de experiências,
compartilhando, assim, um aprendizado significativo com os conceitos abordados.
115
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O propósito neste estudo foi trazer as questões dos afazeres e da vivência
cotidiana para a sala de aula de alunos trabalhadores, o que possibilitou a realização
de um trabalho pedagógico que permitisse o estabelecimento de uma conexão entre
o conhecimento matemático construído na prática e o conhecimento matemático da
base científica. Assim, foi possível construir e explicar as relações do que foi
observado e identificado no contexto dos saberes cotidianos, em termos de valores,
necessidades, comportamentos e conhecimentos de conceitos matemáticos, com as
atividades pedagógicas em sala de aula.
Destacamos que, com os dados obtidos por meio da coleta de informações,
como questionário, observação nos locais de trabalho dos alunos, gravações,
conversas informais, os momentos da sala de aula, bem como as contribuições da
Etnomatemática, foi-nos possível chegar aos seguintes resultados:
A realização do trabalho proporcionou ao aluno uma aprendizagem de
Matemática muito mais significativa do que a aprendizagem mecânica e
desconectada da realidade que ele possui.
O conhecimento das experiências de Matemática vivenciadas pelos alunos no
seu cotidiano, bem como os dados obtidos através das visitas foram elementos
fundamentais, que facilitaram, motivaram e instigaram o planejamento e
desenvolvimento das atividades em sala de aula.
Consideramos muito positivo e produtivo as visitas terem sido realizadas no
turno da tarde e as aulas serem à noite, no mesmo dia. A cada aula, relatávamos
para os demais colegas da turma sobre as visitas ocorridas naquele dia, destacando
a utilização da Matemática no trabalho do aluno. Nesse momento, observávamos
atentamente a reação do aluno visitado que demonstrava sentir-se valorizado e feliz
por poder contribuir com a sua prática.
Nesse processo, o aluno percebeu a importância da Matemática presente na
116
sua vida, no seu trabalho e nos seus afazeres. Assim, o uso da realidade e das
questões próprias do seu cotidiano, fez o educando sentir-se valorizado e envolver-
se nas discussões a partir de suas necessidades, ou seja, participou ativamente das
aulas.
A motivação dos alunos durante o processo de desenvolvimento das aulas
gerou participação, comunicação e entusiasmo pela aprendizagem da Matemática
que, antes para eles, representava um distanciamento de suas capacidades de
aprender por considerá-la um tabu.
A vinculação da Matemática à realidade social é de grande importância para o
sucesso da aprendizagem de jovens e adultos, e está presente no conhecer e fazer
de cada um, por exemplo: nas compras, vendas, descontos, juros, enfim, em muitas
outras situações que já foram descritas nas aulas e defendidas por vários autores
que deram sustentação a este trabalho. Como conteúdos mais significativos
presentes nesta experiência, destacamos: comprimento da circunferência, número
irracional
π
, volume do cilindro, figuras semelhantes, razão, proporção e
porcentagem.
Durante todo o processo da pesquisa, notamos a influência da Matemática na
vivência dos jovens e adultos que, sem perceberem, fazem dela um instrumento
primordial no processo da sua aprendizagem. Ao trabalhar a Matemática a partir da
construção humana desses jovens e adultos, percebemos que eles aprendem
melhor e vêem significado naquilo que lhes é ensinado. Desse modo,
compreendendo as conexões dos conceitos desenvolvidos nas aulas com a prática
cotidiana dos alunos, percebemos a importância de atendê-las, dadas às
necessidades práticas da vida social.
Ao chegar ao final desta pesquisa, salientamos a importância, para os alunos
e para nós, do trabalho desenvolvido em sala de aula, sendo constatado,
diariamente, que a aprendizagem acontecia com maior significado para o aluno que
interagia, que demonstrava sua participação ativa.
Os alunos da etapa em estudo reagiram com muito interesse e motivação
diante da construção científica do conhecimento desenvolvida em sala de aula.
Sentiram-se valorizados, pois o saber cientifico apresentou conexão com os seus
saberes cotidianos.
O processo de elaboração do conhecimento do aluno, por meio da construção
de conceitos etnomatemáticos, foi acompanhado, observado e registrado por nós,
117
professora pesquisadora, durante todos os momentos da investigação.
Foi possível analisarmos e interpretarmos a inter-relação dos conceitos
matemáticos desenvolvidos em sala de aula, a partir de diferentes práticas
vivenciadas pelos alunos jovens e adultos em seus ambientes de trabalho, bem
como de seus interesses.
O primeiro instrumento aplicado aos alunos teve a intenção de selecionar
aqueles que usassem a Matemática no seu cotidiano para a realização das visitas
aos locais de trabalho.
O objetivo das visitas in loco foi identificar a utilização da Matemática em sua
prática diária, o que foi vivenciado e percebido, pois a Matemática está realmente
presente na prática cotidiana dos alunos.
As visitas foram muito importantes e valiosas, fazer-nos presentes e
conhecermos o ambiente de trabalho dos alunos, permitiu uma maior aproximação
entre nós e os alunos, possibilitando que o trabalho de sala de aula se tornasse mais
significativo.
Nas atividades desenvolvidas no decorrer das aulas, constatamos os valores
desenvolvidos pelo grupo, como interesse, cooperação, motivação, criatividade e
socialização, entre outros, que se encontram descritos no final de cada aula, com
sua própria especificidade.
Notamos que as aulas desenvolvidas com estratégias de pequenos grupos
resultaram em uma aprendizagem mais significativa e produtiva, sendo que a ajuda
mútua acontecia constantemente entre os colegas.
A cada dia e a cada aula, íamos fortalecendo nossa relação com os alunos,
com isso, tinham maior liberdade para exporem suas necessidades, angústias,
questionamentos e interesses, participando ativamente das atividades propostas.
O desenvolvimento das aulas suscitou reflexões e oportunizou aos sujeitos
envolvidos a contribuição para uma formação com valores, correlacionada a diversos
saberes. Assim, professora e alunos foram beneficiados com a realização da
pesquisa, pois enriqueceram seus conhecimentos.
Em razão disso, concluímos que a melhor maneira de se trabalhar a
Matemática na Educação de Jovens e Adultos é fazermos o resgate da história de
vida de cada um, quanto a seus valores, experiências de vida, trabalho e habilidades
individuais ou em grupo.
Professores e alunos, quando trabalham juntos, desempenham, sem dúvida,
118
papéis diferenciados. Tradicionalmente, professor é aquele que ensina, e aluno é
aquele que aprende. Essa é uma premissa que, por muito tempo, orientou o trabalho
da escola e do professor. Concluímos, nesta pesquisa realizada diretamente com os
saberes dos alunos, que o professor não só ensina, mas também aprende na
relação que mantém com seus educandos. Dessa forma, o aluno que aprende
também leva seu professor a fazer descobertas sobre como ensinar, portanto
também ensina.
Nesse sentido, o professor precisa fazer a sua parte, partir para a implantação
de estratégias de ensino diferenciadas, buscar um ensino mais próximo dos seus
saberes cotidianos e culturais, conquistando assim, o interesse e a motivação dos
alunos, jovens e adultos, que permaneceram muitos anos afastados dos bancos
escolares.
Acreditamos que os alunos envolvidos nesta experiência, retornaram aos
seus locais de trabalho com uma ampliação de conhecimentos, o que resultará em
maior motivação e valorização pessoal, bem como maior produção no trabalho.
Portanto, essa possibilidade de construirmos uma prática pedagógica
alicerçada em uma concepção de trabalho que defende uma aproximação entre o
universo escolar e a realidade do aluno foi muito significativa ao ser trabalhada com
alunos da Educação de Jovens e Adultos.
Todavia, encontramos algumas dificuldades durante o andamento das aulas,
como a ausência de computadores para a resolução de algumas atividades da aula
4, já que observamos a presença do computador nos ambientes de trabalho dos
alunos. O uso do computador possibilitar-nos-ia a exploração dos conteúdos
matemáticos através de softwares. Por esse motivo, trabalhamos com a calculadora
que é de fácil acesso e está disponível para todos.
Da mesma maneira, na construção de gráficos realizados na aula 3,
utilizamos os materiais disponíveis pelos alunos e pela escola, como papel pardo,
régua, lápis, borracha e pincel atômico, por não haver recursos tecnológicos. Como
a escola não possui tais recursos, acaba se distanciando da realidade dos alunos e
impede que o ensino da Matemática contribua com instrumentos que estão
presentes na prática de alguns alunos trabalhadores do comércio.
Esta proposta da abordagem da Etnomatemática vem trazer grande
contribuição para a etapa em estudo, pois quando resgata os conteúdos na vida dos
alunos, a aprendizagem é bem mais significativa.
119
A proposta contribuiu para que os alunos percebessem que muitas atividades
que realizam no seu dia a dia fazem parte da Matemática escolar, pois a sua cultura,
os seus saberes cotidianos estão impregnados de práticas exploradas nas
problematizações em sala de aula.
No resultado geral deste relato de experiência, foi confirmada que a
Etnomatemática é uma abordagem que consiste em resgatar a intencionalidade do
sujeito cultural em seu fazer matemático e nas atividades desempenhadas em seu
cotidiano. A experiência foi gratificante e significativa, pois demonstrou que a
abordagem Etnomatemática é fundamental no trabalho com a Educação de Jovens
e Adultos.
De acordo com o exposto, pode se afirmar que o objetivo da nossa
investigação foi atingido, pois desenvolver os conteúdos, partindo da realidade dos
alunos, fez com que a aprendizagem fosse mais significativa nas aulas de
Matemática da EJA.
O emprego da Etnomatemática já foi objeto de estudo de vários
pesquisadores, citados no corpo do trabalho, mas essa pesquisa ainda não foi
exaurida em todos os seus aspectos. Os alunos da EJA que fazem parte desta
pesquisa possuem culturas diferenciadas, com diversos interesses e práticas sociais,
tendo a escola como um local de encontro que lhes proporciona a socialização e
aquisição de novos conhecimentos, por isso acreditamos que o nosso estudo é de
grande relevância.
Ao concluir este relatório, confirmamos as palavras de Ubiratan D`Ambrosio
(2001) sobre a Etnomatemática cuja abordagem valoriza a Matemática presente em
diferentes grupos socioculturais e propõe uma maior valorização dos conceitos
matemáticos informais, construídos pelos alunos por meio de suas experiências de
vida e de trabalho, contribuindo assim, para uma aprendizagem em sala de aula
voltada para um ensino contextualizado.
Esperamos que esta experiência pedagógica sirva como incentivo à
realização de outras pesquisas nesta linha para que beneficiem a Educação de
Jovens e Adultos, oportunizando aos educadores novas abordagens para o trabalho
em sala de aula.
120
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126
APÊNDICE A - Questionário.
127
Questionário.
Caro(a) aluno(a):
Solicito sua contribuição para o desenvolvimento de minha dissertação de
Mestrado, requisito para a obtenção do título de Mestre em Ensino de Matemática,
do Centro Universitário Franciscano de Santa Maria – UNIFRA, respondendo às
questões que são apresentadas no questionário abaixo.
Agradeço a sua colaboração.
Mestranda Letícia Menezes Panciera
Questionário aplicado aos alunos da etapa 5 da Educação de Jovens e Adultos da
Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora Hilda Koetz.
Nome:
Data de Nascimento:
Idade:
Endereço:
Telefone:
01) Em que ano você retornou aos estudos na EJA?
02) Quais os seus interesses e necessidades na EJA?
03) Você trabalha? Em quê?
04) Comente um pouquinho sobre o seu trabalho? O que você faz...
05) Você utiliza a Matemática no seu trabalho? Como? Dê alguns exemplos?
06) Como você utiliza a Matemática no seu cotidiano? Comente um
pouquinho...
07) Faz uso de alguns instrumentos matemáticos? Quais?
08) Relate algumas dificuldades de empregar os números?
128
APÊNDICE B - Consentimento Livre e Esclarecido.
129
Declaração
Nós, abaixo assinados, alunos da Educação de Jovens e
Adultos da etapa 5 da Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora
Hilda Koetz, da cidade de São Pedro do Sul, declaramos autorizar a utilização
de nossas fotos em publicações e trabalhos da professora Letícia Menezes
Panciera mestranda do Curso Profissionalizante em Ensino de Física e de
Matemática do Centro Universitário Franciscano – UNIFRA.
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São Pedro do Sul, julho de 2007.
130
ANEXO A – Livro Caixa
131
132
ANEXO B – Boleto Bancário
133
134
ANEXO C – Boleto Bancário
135
Livros Grátis
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